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Os Economistas ADAM SMITH A RIQUEZA DAS NAÇÕES INVESTIGAÇÃO SOBRE SUA NATUREZA E SUAS CAUSAS Com a Introdução de Edwin Cannan VOLUME I Apresentação de Winston Fritsch Tradução de Luiz João Baraúna Fundador VICTOR CIVITA 1907 1990 Editora Nova Cultural Ltda Copyright desta edição 1996 Círculo do Livro Ltda Rua Paes Leme 524 10º andar CEP 05424010 São Paulo SP Título original An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations Direitos exclusivos sobre a Apresentação de autoria de Winston Fritsch Editora Nova Cultural Ltda Direitos exclusivos sobre a tradução deste volume Círculo do Livro Ltda Impressão e acabamento DONNELLEY COCHRANE GRÁFICA E EDITORA BRASIL LTDA DIVISÃO CÍRCULO FONE 55 11 41914633 ISBN 8535108270 APRESENTAÇÃO l ADAM SMITH Adam Smith nasceu em Kirkcaldy Fifeshire Escócia em 17231 filho de uma típica família da classe alta não nobre da época Seu pai Adam Smith era funcionário público que chegou a ocupar postos de certa importância na administração escocesa e sua mãe Margareth Douglas Smith descendia de proprietários de terras do condado de Fife Da infância de Adam Smith pouco se registra além do fato pi toresco de que aos quatro anos quando em visita a seu avô materno teria sido raptado por um bando de ciganos mas felizmente recuperado poucas horas depois Um evento entretanto parece ter marcado seus primeiros anos e define os profundos laços afetivos que quase até o fim de sua vida o uniriam a sua mãe a morte prematura do pai poucos meses antes do nascimento de Smith que seria o único filho do casal Na opinião de contemporâneos íntimos de Smith Margareth Smith falecida apenas dois anos antes de sua morte foi o grande amor do grande filósofo e economista que nunca se casou O início de sua formação acadêmica teve lugar na Universidade de Glasgow para a qual Adam Smith foi admitido em 1737 após com pletar sua educação secundária em Kirkcaldy Dos três anos passados em Glasgow onde de acordo com o currículo de Humanidades da época iniciou o estudo dos clássicos grecoromanos Matemática Teo logia e Filosofia o fato mais importante a destacar é a grande in fluência sobre ele exercida por Francis Hutcheson um dos maiores teóricos protestantes da Filosofia do Direito Natural então Professor de Filosofia Moral em Glasgow2 Foi em seus cursos basicamente o que hoje seria considerado uma mistura de Ética Direito e princípios 5 1 A data precisa do nascimento de Smith é desconhecida A data de 5 de junho de 1723 dada por John Rae um de seus mais famosos biógrafos como a do nascimento de Smith é de fato a de seu batismo Ver sobre isso VINER J Guide to John Raess Life of Adam Smith In RAE J Life of Adam Smith J M Kelley Nova Yorque 1965 p 139 2 Sobre Hutcheson ver SCOTT W R Francis Hutcheson Cambridge 1900 Sua influência intelectual sobre Smith é discutida em seguida de Economia Política Comercial e Finanças Públicas3 que Smith iniciou o estudo dos problemas econômicos Em 1740 antes de completar os cinco anos então necessários para a graduação em Glasgow Smith aceita uma bolsa para prosseguir seus estudos em Balliol College Oxford Com a provável exceção de um maior refinamento no estudo dos clássicos e de literatura a expe riência em Balliol pouca influência teve sobre sua formação principal mente devido ao obscurantismo religioso e ao escolasticismo antira cionalista que ainda impregnava a maioria dos quadros docentes da grande universidade inglesa4 Entretanto aparentemente por pressões familiares Smith permaneceu em Oxford além do tempo requerido para o bacharelado Finalmente como é provável que já houvesse então optado pelo magistério a falta de estímulo intelectual e principalmen te o fato de que em Oxford a maioria dos cargos docentes fosse con dicionada ao ordenamento religioso o que a ele decididamente não interessava fazem com que Smith deixe Balliol em agosto de 1746 retornando à Escócia Após dois anos passados com a mãe em Kirkcaldy sem emprego regular embora procurando uma posição de tutoracompanhante5 Adam Smith ministra a partir do inverno de 174849 uma série de cursos avulsos em Edimburgo As conferências de Edimburgo em sua maioria sobre literatura inglesa embora houvessem culminado em um curso sobre problemas econômicos dado no inverno de 175051 no qual já advogava princípios liberais livrecambistas ampliam seu círculo de relações intelectuais e granjeamlhe reputação acadêmica suficiente para que em janeiro de 1751 seja eleito para a cadeira de Lógica de Glasgow onde lecionavase basicamente retórica e belles lettres To davia antes do início do ano letivo em outubro o súbito adoecimento de Craigie então professor de Filosofia Moral em Glasgow resultou em que Smith fosse convidado para assumir interinamente também o ensino dessa disciplina e com a subseqüente morte de seu titular logo após a efetivação desse arranjo temporário lhe fosse dada a possibi lidade de opção entre as duas disciplinas Adam Smith decidese pela cadeira outrora ocupada por Hutcheson para a qual é eleito em abril de 1752 e é como Professor de Filosofia Moral da Universidade de Glasgow cargo que irá ocupar ininterruptamente até o início de 1764 que se consolidam tanto sua reputação intelectual como seu interesse acadêmico pela Economia OS ECONOMISTAS 6 3 Para uma discussão mais extensa da estrutura do curso ver p 41 et seqs 4 Um episódio da vida de Adam Smith é ilustrativo dessa afirmação Por haver sido certa vez surpreendido por um membro da Universidade lendo o Tratado Sobre a Natureza Humana de David Hume o grande historiador e livrepensador contemporâneo Smith foi severamente repreendido e teve sua cópia do livro confiscada Cf RAE J Op cit p 24 5 Era comum que a nobreza britânica como forma alternativa à educação universitária formal confiasse a formação superior de seus filhos a preceptores que os acompanhassem às viagens ao exterior usualmente por um período de dois anos Os tutores eram regiamente pagos e na maior parte das vezes recebiam pensões vitalícias de seus empregadores após o cumprimento da tarefa A partir daí o crescimento do renome do jovem professor junto à elite intelectual escocesa é quase imediato e Smith passa a participar ativamente dos debates acadêmicos e políticos da época É admitido às principais sociedades eruditas escocesas tais como a Edinburgh Society para a qual é eleito já em 1752 ou a influente Select Society da qual é fundador em 1754 e que reunia intelectuais como o grande David Hume e políticos e economistas práticos eminentes como Lau derdale e Townshend e publica em periódicos de ampla circulação entre a intelligentsia da época como a Edinburgh Review É dessa época o desenvolvimento da sua profunda amizade e intimidade com Hume em casa de quem Smith hospedavase sempre que visitava Edim burgo e que duraria até a morte de seu amigo em 1776 O primeiro grande momento de sua carreira literária viria em 1759 com a publicação da Teoria dos Sentimentos Morais parte inicial de um ambicioso projeto literário que pretendia cobrir todas as áreas tratadas em seu curso de Filosofia Moral e que incluiria ainda um tratado sobre princípios de economia e política econômica o que viria a ser A Riqueza das Nações e um tomo final sobre legislação e jurisprudência que entretanto nunca seria publicado Do ponto de vista biográfico a publicação de seu primeiro tratado filosófico teve conseqüências marcantes Por um lado a obra republicada cinco vezes durante a vida do autor marca o início de sua reputação nacional como pensador de primeira grandeza Por outro lado leva Townshend entusiasmado com a performance de Smith a decidir confiarlhe a tutoria de seu enteado o Duque de Buccleugh tão logo o jovem duque completasse seus estudos secundários e em fins de 1763 oferece a Smith uma irrecusável pensão vitalícia de 300 libras anuais o equi valente ao dobro do salário por ele recebido em Glasgow Adam Smith renuncia a seu posto na Universidade e parte com Buccleugh no início do ano seguinte para uma viagem de dois anos e meio à França Radicado em Toulouse onde para passar o tempo6 começaria a escrever as primeiras notas para sua grande obra Adam Smith viaja intermitente mas intensamente a partir do segundo semestre de 1764 Visita a região de Bordeaux realiza um longo tour pelo sul da França e permanece dois meses em Genebra quando conheceu Voltaire de quem tornouse profundo e respeitoso admirador Em dezembro de 1765 mudouse para Paris onde Hume então Secretário da Legação Bri tânica e figura prestigiadíssima nos círculos oficiais e intelectuais fran ceses lhe abre as portas da corte e dos salões Adam Smith já reconhecido intelectualmente em Paris desde a publicação da tradução francesa da Teoria dos Sentimentos Morais no ano anterior teria aí a oportunidade de acesso ao restrito grupo dos économistes liderados por François Quesnay o que lhe valeria conhecer a fundo o pensamento fisiocrático à época segundo Schumpeter quase uma façon de salon ADAM SMITH 7 6 Carta de Smith a Hume de 5 de julho de 1764 citada in RAE J Op cit pp 178179 na alta sociedade parisiense O contato com os fisiocratas e especial mente com Turgot com quem segundo Condorcet Smith manteria correspondência por longo período após seu retorno à GrãBretanha teria grande influência sobre aspectos teóricos fundamentais de A Riqueza das Nações então ainda apenas em gestação conforme dis cutido mais abaixo Sua estada na França interrompese brusca e tragicamente em outubro de 1766 com o assassinato do irmão mais moço de Buccleugh também sob sua custódia desde fins de 1764 o que o obriga a retornar imediatamente a Londres onde permanece por seis meses em compa nhia de Townshend Durante esse período Smith prepara uma nova edição ampliada de seu primeiro livro usa o rico acervo bibliográfico londrino para completar anotações para seu segundo livro e assessora seu anfitrião agora Ministro da Fazenda e dedicado à solução dos candentes problemas relacionados à política fiscal a ser adotada para as colônias americanas Por fim aparentemente por discordar do de sastroso projeto de Townshend de impor uma tributação adicional sobre as importações americanas de chá e que levaria as colônias à rebelião7 Smith deixa Londres retornando à sua cidade natal Em Kirkcaldy Adam Smith permaneceria seis anos quase ex clusivamente absorvido pela composição de sua magnum opus Em fins de 1773 completado o manuscrito viaja novamente para Londres para tratar de sua publicação e receber o título de Fellow da Royal Society para a qual havia sido eleito alguns anos antes Entretanto os pequenos retoques que ainda pretendia fazer no manuscrito acabaram resultando em extensas modificações aos capítulos históricos e adições aos abun dantes exemplos práticos que ilustram a obra Finalmente a 9 de março de 1776 vem à luz A Riqueza das Nações A julgar pela enorme influência que A Riqueza das Nações viria a ter como ponto de partida obrigatório inquestionável para o estudo da Economia ao longo de quase todo o século XIX o impacto imediato de sua publicação não é impressionante Embora saibase que sua pri meira edição esgotouse em seis meses a tiragem dessa edição é des conhecida e sua repercussão não parece ter ido além do círculo restrito de intelectuais iniciados e políticos esclarecidos A obra só é mencionada pela primeira vez com peso de autoridade em debates parlamentares por Pitt o famoso ministro liberal que havia conhecido Smith em 1787 e se dizia seu discípulo em 1792 Pouco a pouco entretanto apesar da reação conservadora após o início das guerras napoleônicas contra a nova economia e seu uso dos princípios franceses do racio nalismo liberal o livro firma seu prestígio e antes do limiar do novo século nove edições inglesas já haviam sido dadas a público Sua difusão no exterior também acelerase em 1800 já estavam disponíveis várias edições americanas versões em francês alemão italiano dinamarquês OS ECONOMISTAS 8 7 Sobre isso ver SCOTT W R Adam Smith at Downing Street In Economic History Review 1935 e mesmo tendo sido inicialmente proibida na Espanha por sua baixeza de estilo e pela indefinição de seus princípios morais8 em espanhol Adam Smith entretanto não viveria o bastante para testemunhar a lenta mas avassaladora influência de seu grande tratado Logo após a publicação de A Riqueza das Nações ele retorna a Kirkcaldy e em 1777 é nomeado para um alto cargo na administração aduaneira es cocesa Mudase então com sua mãe para Edimburgo onde em Panmure House sua residência definitiva cercado por seus mais de 3 mil livros9 vive uma existência pacata de funcionário público interrompida espo radicamente por consultas oficiais sobre questões de política comercial e fiscal e enriquecida apenas pelo trabalho intermitente na preparação de adições e correções às sucessivas edições de suas obras Em 1787 recebe o que seria a última grande honraria de sua vida ao ser nomeado Reitor da Universidade de Glasgow cargo que ocupa por dois anos consecutivos Por fim já após seu retorno permanente a Edimburgo Adam Smith adoece e vem a falecer em 17 de julho de 1790 aos 67 anos de idade 2 A RIQUEZA DAS NAÇÕES A importância da grande obra econômica de Adam Smith é usual mente definida pelos efeitos de sua influência como alternativamente o marco do início do enfoque científico dos fenômenos econômicos ou a Bíblia da irresistível vaga livrecambista do século XIX Embora am bas as definições sejam apropriadas é interessante que preliminar mente à discussão desses aspectos metodológicos e políticos de A Ri queza das Nações seja apresentado um roteiro de seus principais as pectos teóricos e normativos de modo a fornecer ao leitor uma visão integrada do conjunto de suas proposições analíticas das quais a obra deriva sua característica adicional de fonte dos paradigmas teóricos sobre os quais foi construída a Economia Política clássica Do ponto de vista formal a teoria econômica apresentada em A Riqueza das Nações é essencialmente uma teoria do crescimento eco nômico cujo cerne é clara e concisamente apresentado em suas pri meiras páginas a riqueza ou o bemestar das nações é identificado com seu produto anual per capita que dada sua constelação de recursos naturais é determinado pela produtividade do trabalho útil ou pro dutivo que pode ser entendido como aquele que produz um excedente de valor sobre seu custo de reprodução e pela relação entre o número de trabalhadores empregados produtivamente e a população total Em bora Smith atribuísse explicitamente maior importância ao primeiro desses determinantes como fator causal a dinâmica de seu modelo de crescimento pode ser melhor entendida em termos do que Myrdal ba ADAM SMITH 9 8 RAE J Op cit pp 360361 9 Sobre a biblioteca de Adam Smith ver YANAIHARA Y A Full and Detailed Catalogue of Books which Belonged to Adam Smith Londres 1961 ou o excelente ensaio de VINER Jacob In VINER J Op cit p 117 et seqs tizou de um processo de causalidade circular cumulativa e em seus traços essenciais consiste no seguinte o crescimento da produtividade do trabalho que tem origem em mudanças na divisão e especialização do processo de trabalho ao proporcionar o aumento do excedente sobre os salários permite o crescimento do estoque de capital variável de terminante do volume de emprego produtivo a pressão da demanda por mãodeobra sobre o mercado de trabalho causada pelo processo de acumulação de capital provoca um crescimento concomitante dos salários e pela melhora das condições de vida dos trabalhadores da população o aumento paralelo do emprego salários e população amplia o tamanho dos mercados que para um dado estoque de capital é o determinante básico da extensão da divisão do trabalho iniciandose assim a espiral de crescimento Da representação esquemática esboçada acima não se deve inferir entretanto que Smith sustentasse uma visão essencialmente otimista do processo de crescimento a longo prazo Segundo ele o crescimento econômico não somente dependeria de fatores institucionais que afe tassem tanto a propensão a investir como a existência de garantias à propriedade e os regimes legais ou consuetudinários de posse e uso da terra quanto a extensão do mercado como a existência de restrições ao comércio mas ainda que sob sistemas ideais de Go verno não deveria sustentarse indefinidamente O estado estacionário no qual a acumulação líquida de capital tenderia a desaparecer embora logicamente não necessário era visto por ele como resultado inevitável da redução da taxa de lucro incentivo básico à acumulação pela exaustão das oportunidades de investimento e pelo crescimento dos salários conseqüente a um rápido e sustentado aumento do estoque de capital A estrutura teórica de seu modelo de crescimento é cuidadosa mente desenvolvida nos dois primeiros dos cinco livros em que se divide a obra O Livro Primeiro discute os determinantes do crescimento da produtividade do trabalho e da distribuição funcional da renda que regulam o excedente total disponível e portanto o potencial de acu mulação de capital Dada a importância atribuída por Smith à divisão social do trabalho o Livro se inicia com a discussão de sua relação com a propensão inata do homem à troca e com o processo de cresci mento econômico Capítulos I e II e dos limites impostos à sua extensão Capítulo III A relação direta notada por Smith entre a divisão do trabalho e o grau de mercantilização das relações econômicas leva ao estudo das conseqüências da difusão do uso da moeda como meio de troca Capítulo IV A introdução da moeda como numerário geralmente aceito coloca o problema da comparação intertemporal de valores e a necessidade da discussão das diferenças entre preços nominais e reais Capítulo V A teoria dos preços é apresentada em seguida Capítulos VI e VII distinguindose o preço de mercado determinado pela inte ração instantânea entre demanda efetiva e oferta e o que Smith OS ECONOMISTAS 10 chama de preço natural10 equivalente aproximado do preço normal de longo prazo da microeconomia marshalliana que é a medida de valor relevante para a análise do processo de crescimento desenvolvida na obra determinado pela soma dos níveis naturais das remunerações do trabalho do capital e da terra envolvidos no processo produtivo de cada mercadoria Os preços de mercado e os preços naturais estão contudo intimamente relacionados na ausência de imobilidade de ca pital por efeito por exemplo de restrições legais ou insuficiência de informação os preços de mercado gravitam estavelmente em torno dos preços naturais sob a influência de inúmeros fatores conjunturais mas ao longo de um período suficientemente longo de tempo devem ser suficientes para cobrir a remuneração normal dos fatores de pro dução empregados É interessante notar nesse ponto que embora acessória à preo cupação central da obra a teoria do valor apresentada em A Riqueza das Nações iluminou sob vários ângulos o fenômeno da formação de preços Por um lado na análise da interrelação dos preços naturais e de mercado Smith elaborou o fundamento da teoria da dinâmica de mercado incorporada pelos economistas clássicos e refinada posterior mente por Marshall isto é a noção de que o ajustamento de oferta e demanda se dá através de variações no emprego dos fatores no caso da teoria de Smith e dos clássicos essencialmente do capital pro vocadas pelo efeito de excessos ou insuficiências de oferta via preços sobre suas remunerações introduzindo de passagem a noção do papel fundamental dos preços para a alocação de recursos Por outro lado a teoria do valor de Adam Smith provoca o abandono da análise então tradicional do fenômeno do valor de troca apoiada em considerações sobre demandavalor de uso e escassez cuja utilidade é confinada por Smith ao estudo dos preços de mercado e é o ponto de partida do enfoque clássico do valor baseado em custos de produção que revela a ligação direta existente entre o sistema de preços e os fenômenos da produção e distribuição Esse enfoque do problema da formação de preços dominaria completamente o pensamento econômico até a revo lução marginalistautilitarista de um século depois A formulação da teoria do preço natural se completa com o estudo dos níveis naturais de remuneração dos fatores A determinação dos salários discutida no Capítulo VIII resulta como indicado acima da interação entre investimento e população Os lucros analisados no Ca pítulo IX são determinados pelo tamanho do estoque de capital dada uma taxa exógena de juros ajustada para levar em conta o risco em presarial O Capítulo X discute os diferenciais de salários e lucros existentes em diferentes empregos de trabalho e capital e finalmente a renda da terra entendida como um excedente determinado pelo preço dos produtos do solo dados os níveis de salários e lucros é analisada ADAM SMITH 11 10 Sobre o conteúdo filosófico do adjetivo natural em Smith ver item 3 no Capítulo XI Esse capítulo que conclui o Livro Primeiro contém ainda uma longa digressão empírica associada aos problemas teóricos discutidos no Capítulo V sobre as variações históricas do valor dos metais nos quatro séculos anteriores Nenhum comentário sobre o Livro Primeiro de A Riqueza das Nações pode omitir menção às inconsistências formais da análise do valor nele apresentada fruto da profunda imprecisão verbal de Smith em seu Capítulo V e fonte de controvérsias que tornaram ainda mais obscura a essência da teoria smithiana dos preços A origem dessas controvérsias é a famosa crítica de Ricardo à afirmativa feita por Smith no Capítulo V de que o valor de um bem é igual à quantidade de trabalho pela qual ele pode ser trocado ou comandar indiretamente como inconsistente com a teoria do valor trabalho pela qual o valor de troca de um bem é determinado pela quantidade direta e indireta de trabalho necessária à sua produção segundo ele defendida por Smith em outros pontos da obra11 De fato uma leitura atenta do Capítulo V onde Smith discute a influência das flutuações no valor do dinheiro sobre os preços reais e nominais das mercadorias mostra que embora proponha o uso do trigo como deflator por razões empí ricas12 defende categoricamente a idéia de que a única medida inva riante do valor de um bem é a quantidade de trabalho despendida em sua produção com base na hipótese psicológica da invariabilidade da desutilidade ou custo real do trabalho para o trabalhador13 Dessa hipótese e do fato de que Smith ali conduz a análise com referência a uma economia de produtores individuais na qual o processo de troca é motivado apenas pela conveniência da divisão social do trabalho resulta que uma dada quantidade de um bem só possa vir a ser trocada por quantidades de outros bens que seu vendedor suponha conter uma quantidade de trabalho equivalente à necessária à sua produção14 É esse resultado que o leva a afirmar que o valor de um bem é sempre igual à quantidade de trabalho que ele pode comprar ou ser trocado ou comandar É claro contudo que essa afirmativa é inconsistente com a realidade de uma economia caracterizada pela apropriação pri vada dos meios de produção e trabalho assalariado onde a produção não vise somente a troca mas o lucro e portanto com a análise do valor natural feita por Smith no capítulo seguinte A validade da pro posição nesse contexto necessitaria como notou Ricardo da hipótese institucionalmente absurda de que os trabalhadores se apropriassem do valor total do produto Deve ser notado entretanto que essa afir OS ECONOMISTAS 12 11 Para a crítica de Ricardo ver RICARDO D Princípios de Economia Política e Tributação São Paulo Abril SA Cultural e Industrial 1982 capítulo I 12 Para uma interessante interpretação das razões que o levaram a fazer essa proposta ver SYLOSLABINI P Competiton The Product Markets In WILSON T e SKINNER A S eds The Market and the State Essays in Honour of Adam Smith Oxford 1976 p 204 et seqs 13 Ver p 93 14 Id mativa destacada por Ricardo e ainda erradamente apresentada por alguns autores como sendo a teoria do valor de Smith não constitui sequer uma teoria dos preços pois não se refere ao que determina os preços ou seja nenhuma explicação é dada sobre por que o valor de um bem deve ser tal que possa ser trocado por uma dada quantidade de trabalho Além disso apesar das imprecisões verbais o comentário equívoco de Smith sobre o custo real do trabalho como medida de valor de troca não deve ser tomado como evidência de sua aceitação do prin cípio quantitativo de determinação dos preços característicos da teoria do valor trabalho Uma simples inspeção das páginas iniciais do Ca pítulo VI é suficiente para evidenciar que Smith restringe a validade da teoria do valor trabalho aos limites quase préhistóricos dos estados rudes e primitivos da sociedade onde não teria ainda ocorrido signi ficativa acumulação de capital ou apropriação privada da terra e de que sua verdadeira teoria do valor é baseada em custos de produção e fundamentase na noção de que em sociedades civilizadas a remu neração do capital e da terra influencia a formação dos preços A con troversa afirmativa do Capítulo V pode ser interpretada como sugere Meek apenas como uma proposição qualitativa e abstrata sobre o tra balho como fonte do valor no sentido de que o valor de troca de mer cadorias surge em sociedades caracterizadas pelo intercâmbio dos pro dutos de indivíduos somente em virtude do fato de serem elas resul tantes do trabalho desses indivíduos15 O Livro Segundo analisa as condicionantes e características da acumulação de capital que determina a oferta de emprego produtivo e sua distribuição setorial e contém a maior parte da teoria monetária de Smith No Capítulo I é apresentada e ilustrada a divisão analítica tornada clássica posteriormente entre capital fixo e circulante O papel da moeda e do crédito na circulação de mercadorias e na acumulação de capital é estudado no Capítulo II No Capítulo III o mais importante do Livro Segundo sob o aspecto teórico é discutido o conceito de trabalho produtivo e articulada a proposição de que é o volume de poupanças limitado pelo volume do excedente gerado acima das necessidades de autoreprodução do sistema econômico e determinado pela parcimônia dos agentes produtivos a causa imediata do aumento do estoque de capital como Smith sugere implicitamente que a cada ato de poupança está associada uma decisão de investimento os problemas de insufi ciência de demanda efetiva são ignorados por hipótese O Capítulo IV apresenta a teoria dos juros e o Capítulo V conclui com uma análise factual e algo idiossincrática da produtividade do capital em diferentes setores O Livro Terceiro contém uma síntese abrangente da evolução eco nômica da humanidade muito influenciada pela longa História da Ingla ADAM SMITH 13 15 MEEK R L Studies in the Labour Theory of Value 2ª ed Londres 1973 p 62 terra de Hume e constitui no contexto da obra o teste empíricohistórico da teoria do crescimento econômico apresentada anteriormente Por fim os Livros Quarto e Quinto enfeixam as proposições nor mativas de legislação e política econômica No primeiro Smith discute longamente os fundamentos das políticas comercial e colonial mercanti listas de onde emerge sua crítica devastadora sobre a racionalidade eco nômica da superestrutura jurídica do antigo sistema colonial Capítulos I a VIII e conclui com considerações sobre as propostas dos fisiocratas Capítulo IX onde Adam Smith não esconde sua enorme simpatia e respeito intelectual embora qualificado pela escola francesa O Livro Quin to trata de política fiscal analisando as políticas de gasto público onde desenvolve interessante discussão das vantagens e desvantagens da in tervenção do Estado em diferentes áreas de atividade Capítulo I de tributação Capítulo II e finalmente da dívida pública Capítulo III 3 O HOMEM E A OBRA EM PERSPECTIVA HISTÓRICA A obra econômica de Adam Smith é tão profundamente impreg nada pelas preconcepções filosóficas correntes na Inglaterra do período das luzes e pelo cenário econômico da época em que foi concebida que passados mais de dois séculos da publicação de A Riqueza das Nações é impossível avaliar corretamente sua contribuição intelectual sem re ferência a essas influências Um entendimento preciso da filosofia e do método subjacentes a A Riqueza das Nações requer que se recuperem os traços essenciais da formação intelectual extremamente eclética de Smith A influência original e mais marcante sobre Smith foi a de seu mestre Hutcheson herdeiro em linha direta de sucessão dos filósofos protestantes como Grotius e Pufendorf da Filosofia do Direito Natural Para os propósitos da presente discussão o jusnaturalismo pode ser definido como uma teologia racionalista que afirma existir uma ordem natural e harmônica do universo de origem divina mas revelada pela razão da qual se podem derivar princípios morais e de direito a partir da noção de que a ordem natural inclui normas éticas às quais a conduta individual e a legislação devem obedecer para o cumprimento da vontade divina Entretanto apesar de ser questionável que o traço unificador da con cepção de mundo de Smith deriva da Filosofia do Direito Natural ele veio a divergir das formulações mais ortodoxas do jusnaturalismo em dois importantes sentidos Por um lado influenciado diretamente por seu amigo Hume e inspirado na ciência experimentalista inglesa e na obra de Montesquieu Smith abandonou o método racionalista do jus naturalismo tradicional por uma metodologia essencialmente empiri cista isto é pela noção de que a ordem natural subjacente à organização do universo não podia ser apreendida aprioristicamente através apenas do raciocínio abstrato dedutivo mas que sua revelação deveria proceder através da construção de sistemas ou modelos baseados em princípios gerais obtidos por indução de observações empíricas a partir dos quais a lógica dos fenômenos universais poderia ser casual ou racionalmente OS ECONOMISTAS 14 deduzida16 Por outro lado já na Teoria dos Sentimentos Morais Smith afastase decisivamente da componente altruísta do jusnaturalismo de Hutcheson no que concerne à análise da ética das relações econômicas propondo em seu lugar a justificativa moral da defesa do interesse próprio nessa esfera das relações humanas com base na idéia de que da busca do interesse individual resultam benefícios sociais noção já exposta de forma contundente por Mandeville em sua Fábula das Abe lhas publicada entre 1714 e 1729 É da conjugação dessas influências filosóficas e metodológicas que emergem duas concepções pioneiras e revolucionárias contidas em A Riqueza das Nações A primeira é a análise dos fenômenos econômicos como manifestações de uma ordem natural a eles subjacente governada por leis objetivas e inteligíveis através de um sistema coordenado de relações causais Dessa noção de sistema econômico partilhada por Smith apenas com os fisiocratas dentre seus contemporâneos resultou nada menos do que a elevação da Economia à categoria de ciência por identidade de método e fundamento filosófico com as ciências na turais existentes rompendo com a tradição metafísica e com a polêmica empiricista vulgar que caracterizam respectivamente os escritos eco nômicos escolásticos e mercantilistas anteriores A segunda é a doutrina segundo a qual essa ordem natural requer para sua operação eficiente a maior liberdade individual possível na esfera das relações econômicas doutrina cujos fundamentos racionais são derivados de seu sistema teórico já que o interesse individual é visto por ele como a motivação fundamental da divisão social do trabalho e da acumulação de capital causas últimas do crescimento do bemestar coletivo Devese notar entretanto que ao contrário do que sugerem tanto a lógica obscura da crítica radical vulgar quanto a exegese ideológica liberalconservadora contemporânea a defesa qualificada que Smith faz ao laissezfaire não o classifica nem como apóstolo do interesse burguês e pregador da harmonia de interesses entre as classes sociais como querem os pri meiros nem como defensor empedernido da iniciativa privada e inimigo à outrance da interferência do Estado como querem os últimos Mesmo uma leitura perfunctória da obra é suficiente para revelar de um lado a flagrante simpatia com que Smith se refere aos economicamente desprotegidos e seu reconhecimento explícito das contradições de clas se17 e de outro lado sua ênfase nos limites impostos à liberdade eco nômica por princípios naturais de justiça e suas opiniões sobre a ampla gama de serviços úteis mas não atraentes para a iniciativa privada que caberia ao Estado prover18 A doutrina da liberdade natural de Adam Smith é dirigida isto sim contra as interferências da legislação e ADAM SMITH 15 16 Sobre esse aspecto da evolução do pensamento filosófico de Smith ver BITTERMANN H J Adam Smiths Empiricism and the Law of Nature In Journal of Political Economy 1940 17 Ver p 223 et seqs 18 Ver Capítulo I Livro Quinto das práticas exclusivistas características do mercantilismo que segundo ele restringem a operação benéfica da lei natural na esfera das relações econômicas É disso que a doutrina derivou seu apelo político e veio a constituirse no fundamento teórico do programa dos estadistas livrecam bistas em todo o mundo que no século seguinte acabaria por reduzir a ruínas o ordenamento jurídico da antiga ordem econômica internacional A análise feita acima das influências filosóficas sofridas por Smith conquanto permita entender o método por ele adotado e a coe rência abstrata entre o sistema teórico e as proposições normativas liberais contidas em A Riqueza das Nações é insuficiente para explicar as características do modelo econômico apresentado na obra isto é a escolha do crescimento econômico como variável a ser explicada e a especificação teórica das relações entre as principais variáveis do mo delo Parte dos nexos de sua construção teórica deriva é claro de influências de outros economistas Smith como qualquer autor sim plesmente se utilizou do avanço proporcionado pelos trabalhos de seus predecessores Por exemplo a essência de sua teoria dos diferenciais de salários em diferentes ocupações é de Cantillon grande parte da teoria monetária apresentada no Livro Segundo deriva de Hume Harris e Davenant suas discussões sobre comércio internacional e tributação devem muito a Hume e Petty respectivamente a noção fundamental da importância da divisão do trabalho para o progresso material já formulada por Locke e Petty Smith recebeu de Hutcheson e aos fi siocratas Adam Smith deve nada menos do que i a percepção da importância do estudo da distribuição funcional da renda em ligação com a formação de preços19 parte essencial da teoria do valor exposta em A Riqueza das Nações ii a libertação da noção mercantilista de que a riqueza ou o bemestar potencial depende do estoque de metais ou do balanço comercial do país em favor da noção moderna de produto e renda iii o conceito de trabalho produtivo embora aqui Smith se desvencilhasse da doutrina fisiocrática de produtividade exclusiva da agricultura e iv a idéia de um fluxo circular de renda e produto20 OS ECONOMISTAS 16 19 Isso foi evidenciado com a descoberta e publicação por Cannan em 1896 de um conjunto de notas de aula tomado por um aluno de Adam Smith em Glasgow portanto antes de sua viagem à França que não contém qualquer referência a problemas distributivos e onde a teoria dos preços ainda segue a linha por ele herdada de Hutcheson de análise baseada em escassez e demanda efetiva Ver SMITH A Lectures on Justice Police Revenue and Arms delivered in the University of Glasgow Reported by a Student in 1763 CANNAN Edwin ed Oxford 1896 20 A influência de Turgot sobre a teoria do capital de Smith também deve ser mencionada como uma possibilidade O argumento de Cannan de que as teorias do capital de Smith e Turgot embora similares foram desenvolvidas independentemente não deve ser tomado como definitivo pois como mostrado por Viner antes da publicação de A Riqueza das Nações Smith já possuía os números das Éphémérides du Citoyen o jornal dos fisiocratas onde a teoria de Turgot foi primeiro publicada Ver VINNER J Op cit pp 131132 De qualquer modo não há dúvida de que a idéia de que a poupança resulta de decisões de adiar o consumo e proporciona o crescimento do estoque de capital é de origem francesa Ver sobre isso também GROENEWEGEN P D Turgot and Adam Smith In Scottish Journal of Political Economy 1969 Entretanto dado o método essencialmente empiricista de Smith os traços essenciais de seu modelo a ênfase no crescimento econômico como o fenômeno a ser explicado e o crescimento de produtividade e acumulação de capital como suas causas finais devem ser buscados nos fatos da história econômica da Inglaterra e da Baixa Escócia no século XVIII onde o excelente desempenho da agricultura a substancial melhoria do sistema de transporte e o grande crescimento da indústria têxtil rural das manufaturas e do comércio propiciaram um progresso material sem precedentes Glasgow onde Smith passou a maior parte de sua vida adulta antes de iniciar a composição de sua grande obra recebeu ainda o estímulo adicional da abertura dos mercados coloniais ingleses a mercadorias escocesas após a união da Escócia ao Governo de Westminster na primeira década do século que transformou a região do estuário do Clyde no maior empório europeu de tabaco e proporcionou o desenvolvimento do núcleo da futura grande siderurgia escocesa e de inúmeras outras indústrias Smith não ficou alheio a essa transformação Grande parte de seu círculo de amizades em Glasgow era composta de homens de negócio da região21 e não é difícil portanto identificar na percepção direta dos fenômenos que acompanharam o processo acelerado de crescimento econômico britânico aumento de produtividade acumulação de ca pital melhoria dos padrões de vida e crescimento populacional a fonte de inspiração empírica de sua obra Seu toque genial decorre entretanto da percepção das conseqüências analíticas da paralela e acelerada generalização dos métodos capitalistas de organização da produção do progressivo aumento da competição e da maior mobilidade de capital entre as diferentes ocupações o surgimento do lucro na agricultura e na transformação industrial como forma estável e quan titativamente significativa do excedente e teoricamente distinta das outras parcelas distributivas no que concerne a sua formação e o papel da taxa de lucro na orientação dos investimentos como peça essencial do ajustamento dinâmico nesse novo contexto É a incorporação desses fatos históricos em uma teoria do lucro e da alocação de capital em seu modelo que constitui a grande contribuição de Smith ao desenvol vimento da Economia Política clássica e o traço distintivo entre Smith e outros economistas do período final do mercantilismo como Steuart que associava os lucros aos ganhos comerciais Petty que os incorporava à renda ou Hume e Cantillon que os identificavam analiticamente com os salários ou os fisiocratas que simplesmente ignoravam sua existência identificando o excedente sobre os salários com a renda fundiária Essa teoria como outras proposições teóricas revolucionárias na história do pensamento econômico não poderia ser postulada antes que se explicitassem certos fenômenos sócioeconômicos cuja explicação motiva o surgimento de novos paradigmas teóricos Nesse sentido con ADAM SMITH 17 21 Sobre isso ver SCOTT W R Adam Smith and the Glasgow Merchants In The Economic Journal 1934 siderada em perspectiva histórica A Riqueza das Nações não é somente produto de um intelecto poderoso e do fermento intelectual do Ilumi nismo inglês mas é também produto do desenvolvimento histórico do capitalismo 4 SMITHIANA A seção conclusiva deste breve ensaio introdutório tem a intenção de fornecer uma orientação bibliográfica inicial ao leitor interessado em prosseguir no estudo da obra de Adam Smith A edição moderna das obras completas de Smith é a The Glasgow Edition of the Works and Correspondence of Adam Smith patrocinada pela Universidade de Glasgow e editada pela Oxford University Press para comemorar o bicentenário da publicação de A Riqueza das Nações A coleção reúne The Theory of Moral Sentiments ed por D D Raphael e A L Macfie An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations ed por R H Campbell A S Skinner e W B Todd Essays on Philoso phical Subjects ed por W P D Wightman Lectures on Rethoric and Belles Lettres ed por J C Bryce Lectures on Jurisprudence ed por R L Meek D D Raphael e P G Stein que apresenta além das notas das aulas de Smith descobertas e publicadas por Cannan em 1896 um conjunto inédito de notas de aula descobertas por J M Lo thian em Aberdeen em 1958 e fragmentos de escritos econômicos de Adam Smith anteriores à publicação de A Riqueza das Nações Cor respondence of Adam Smith ed por E C Mossner e I S Ross e é acompanhada por uma nova Life of Adam Smith escrita por I S Ross e por uma coletânea de ensaios sobre a obra de Adam Smith The Market and the State Essays in Honour of Adam Smith ed por T Wilson e A S Skinner Para a localização da obra de Smith no contexto do pensamento econômico e filosófico de sua época a Parte II de J A Schumpeter History of Economic Analysis Londres 1954 ainda não tem rival assim como para uma visão de conjunto da obra econômica de Smith o artigo de E Cannan Adam Smith as an Economist in Economica 1926 ainda é um clássico As origens e a evolução do pensamento filosófico e do método de Smith são discutidas em dois artigos de O H Taylor Economics and The Idea of Natural Laws e Economics and the Idea of Jus Naturale in Quarterly Journal of Economics 19291930 por J Viner em Adam Smith and LaissezFaire in Viner J The Long View and the Short Glencoe 1958 por W F Campbell em Adam Smiths Theory of Justice Prudence and Beneficence in American Economic Review supl 1967 por N Devletogou em Montesquieu and the Wealth of Nations in Canadian Journal of Economics 1963 por A S Skinner em Eco nomics and History The Scottish Enlightenment in Scottish Journal of Political Economy 1965 e no artigo de Bittermann citado no item 3 acima A teoria smithiana do crescimento econômico sua relação com OS ECONOMISTAS 18 teorias contemporâneas e sua influência sobre o pensamento clássico são apresentadas de forma simples e magistral por Lord Robbins em The Theory of Economic Development in the History of Economic Thought Londres 1968 A evolução da noção smithiana de valor na direção de uma teoria de custos de produção é discutida por H M Robertson e W L Taylor em Adam Smiths Approach to the Theory of Value in The Economic Journal 1957 As teorias da distribuição apresentadas por Smith e sua influência sobre o pensamento clássico inglês são analisadas em E Cannan A History of the Theories of Pro duction and Distribution from 1776 to 1848 3ª edição Londres 1917 A noção de competição exposta em A Riqueza das Nações que difere em vários aspectos da noção moderna de competição perfeita é discu tida por P J McNulty em A Note on the History of Perfect Compe tition in Journal of Political Economy 1967 As teorias do comércio internacional de alguns predecessores li vrecambistas e sua influência sobre Adam Smith são discutidas em J Viner Studies in the Theory of International Trade e a questão da influência dos fisiocratas é analisada por R L Meek em The Economics of Phisiocracy Londres 1962 O leitor deve precaverse entretanto de que as referências exe géticas citadas acima formam apenas uma amostra extremamente se letiva da vastíssima literatura sobre a obra de Smith22 e de que A Riqueza das Nações ilustra de forma perfeita o dito usual de que no estudo da história do pensamento econômico nada substitui o original Winston Fritsch WINSTON FRITSCH Rio de Janeiro 1947 é Professor e Pesqui sador do Departamento de Economia da Ponti fícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e Professor da Faculdade de Economia e Admi nistração da Universidade Federal do Rio de Ja neiro da qual foi Diretor ADAM SMITH 19 22 Uma extensa bibliografia de 450 itens publicada por 1950 por B Franklin e F Cordasco omite segundo Blaug várias referências Ver BALUG M Economic Theory in Retrospect Londres 1961 p 65 Desde então especialmente por ocasião do bicentenário da publicação de A Riqueza das Nações vieram à luz inúmeros outros trabalhos A RIQUEZA DAS NAÇÕES INVESTIGAÇÃO SOBRE SUA NATUREZA E SUAS CAUSAS Com a Introdução de Edwin Cannan VOLUME I Tradução de Luiz João Baraúna Traduzido de SMITH Adam An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations Edited by Edwin Cannan Dois volumes em um Chicago The University of Chicago Press 1976 N do E INTRODUÇÃO DE EDWIN CANNAN A 1ª edição de A Riqueza das Nações foi publicada em 9 de março23 de 1776 em dois volumes inquarto sendo que o primeiro deles contendo os Livros Primeiro Segundo e Terceiro tem 510 páginas de texto e o segundo que contém os Livros Quarto e Quinto 587 A página do título descreve o autor como sendo Adam Smith LL D e F R S exprofessor de Filosofia Moral na Universidade de Glasgow A edição não tem prefácio nem índice Os itens que compõem o conteúdo integral da obra constam no início do Volume I O preço era de 1 libra e 16 xelins24 A 2ª edição foi publicada no início de 1778 sendo vendida ao preço de 2 libras e 2 xelins25 A aparência difere pouco da 1ª edição A paginação das duas edições coincide quase por inteiro e a única diferença bem visível é que o índice de matérias na 2ª edição está dividido entre os dois volumes Todavia há grande número de pequenas diferenças entre a 1ª e a 2ª edição Uma das menores a alteração de antigo para atual26 chama nossa atenção para o fato curioso de que escrevendo antes da primavera de 1776 Adam Smith considerou seguro escrever os últimos distúrbios27 referindose aos distúrbios americanos Não podemos dizer se ele achava que os distúrbios já haviam efetivamente ocorrido ou se somente podia supor com segurança que ocorreriam antes que o livro saísse do prelo Uma vez que dis túrbios presentes também ocorre perto de últimos distúrbios28 po demos talvez conjecturar que ao corrigir as provas no inverno de 177576 tenha mudado de opinião e só deixou escapar últimos por engano Grande parte das alterações são puramente verbais feitas visando a maior elegância ou propriedade de expressão tais como a mudança de tear and wear que ocorre também e m Lectures p 208 para a expressão mais comum wear and tear A maioria das notas de rodapé aparece pela primeira vez na segunda edição Depa 23 23 RAE John Life of Adam Smith 1895 p 284 24 Ibid p 285 25 Ibid p 324 26 The Wealth of Nations Ed Cannan 1976 v I p 524 v II p 575 27 Ibid v II p 90 bem como as passagens referidas na nota anterior 28 Ibid v II pp 85 98 130 ramos com algumas correções de conteúdo tais como a relacionada com a porcentagem do imposto sobre a prata na América espanhola v I pp 188 189 As cifras são corrigidas no volume I p 366 e no volume II pp 418 422 Aqui e acolá acrescentase alguma informação nova na longa nota à página 330 do volume I descrevese uma forma adicional de recolher dinheiro mediante notas fictícias acrescentamse os detalhes de Sandi quanto à introdução da manufatura da seda em Veneza v I p 429 da mesma forma os cálculos de imposto sobre criados na Holanda v II p 385 e a menção de uma importante característica embora muitas vezes esquecida do imposto sobre o solo ou seja a possibilidade de nova taxação dentro da freguesia v II p 371 A segunda edição apresenta algumas alterações interes santes na teoria referente à emergência de lucro e renda fundiária de condições primitivas aliás o próprio Smith provavelmente se surpreen deria com a importância que certos pesquisadores modernos atribuem a esses itens v I pp 5356 No volume I pp 109 e 110 é totalmente novo o falacioso argumento para provar que os altos lucros fazem os preços subirem mais do que altos salários embora a doutrina como tal seja afirmada em outra passagem v II p 113 A inserção na segunda edição de algumas referências especiais no volume I pp 217 e 349 que não ocorrem na 1ª edição talvez sugira que as Digressões sobre as Leis referentes aos cereais e ao Banco de Amsterdam repre sentavam acréscimos um tanto tardios ao esquema da obra Na 1ª edição a cerveja é um artigo necessário em um lugar e um artigo de luxo em outro ao passo que na 2ª edição nunca é considerada como um artigo necessário v I p 488 v II p 400 A condenação epigra mática da Companhia das Índias Orientais no volume II p 154 aparece pela primeira vez na 2ª edição No volume II à p 322 observamos que Católico Romano é substituído por Cristão e os puritanos in gleses que eram perseguidos na 1ª edição são apenas objeto de res trições na 2ª v II p 102 divergências em relação ao ponto de vista ultraprotestante talvez devidas à influência póstuma de Hume sobre seu amigo Entre a 2ª edição e a 3ª esta publicada na final de 178429 há diferenças consideráveis A 3ª edição se apresenta em três volumes inoctavo sendo que o primeiro vai até ao capítulo II do Livro Segundo e o segundo vai dali até o fim do capítulo sobre as colônias capítulo VIII do Livro Quarto A essa altura Adam Smith já não via mais objeção como ocorria em 1778 em acrescentar aos seus títulos30 seu cargo na Alfândega apresentandose portanto na página do título como Adam Smith LL D e FRS de Londres e Edimburgo um dos comissários da Alfândega de Sua Majestade na Escócia e exprofessor de Filosofia Moral na Universidade de Glasgow O editor é London impresso para a Strahan e T Cadell in the Strand Essa 3ª edição OS ECONOMISTAS 24 29 RAE Op cit p 362 30 Ibid p 323 era vendida por 1 guinéu31 Ela é precedida pela seguinte Advertência para a 3ª edição A 1ª edição da presente obra foi impressa no fim de 1775 e começo de 1776 Em virtude disso através da maior parte do livro toda vez que se fizer menção do presente estado de coisas entendase isto com referência ao estado vigente em torno do período em que eu estava escrevendo a obra ou em algum período anterior Entretanto nessa32 3ª edição fiz vários acréscimos particularmente no capítulo referente aos drawbacks e no referente aos subsídios acrescentei tam bém um novo capítulo intitulado A conclusão do sistema mercantil e um novo artigo ao capítulo sobre as despesas do Soberano Em todas esses acréscimos o presente estado de coisas designa sempre o estado de coisas durante o ano de 1783 e no início do presente33 ano de 1784 Confrontando a 2ª edição com a 3ª verificamos que os acréscimos feitos à 3ª são consideráveis Como observa o Prefácio ou Advertência que acabamos de transcrever o capítulo intitulado Conclusão do Sis tema Mercantil v II pp 159181 é totalmente novo o mesmo acon tecendo com a secção As obras e instituições públicas necessárias para facilitar setores especiais do comércio v II pp 253282 Aparecem pela primeira vez na 3ª edição também os seguintes tópicos ou itens certas passagens do Livro Quarto capítulo III sobre o caráter absurdo das restrições ao comércio com a França v I pp 496497 e pp 521 522 as três páginas perto do início do Livro Quarto capítulo IV sobre os detalhes de vários drawbacks v II pp 47 os dez parágrafos sobre o subsídio para a indústria do arenque v II pp 2429 com o apêndice sobre o mesmo assunto pp 487489 e uma parte da discussão sobre os efeitos do subsídio para os cereais v II pp 1314 Juntamente com vários outros acréscimos e correções de menor porte essas pas sagens foram impressas em separado inquarto sob o título Acréscimos e correções à 1ª e 2ª edições da Investigação do Dr Adam Smith sobre a natureza e as causas da riqueza das nações34 Escrevendo a Cadell em dezembro de 1782 Smith diz o seguinte Dentro de dois ou três meses espero enviarlhes a 2ª edição corrigida em muitas passagens com três ou quatro acréscimos consi deráveis sobretudo ao segundo volume Entre outras coisas figura uma história breve mas sem querer gabarme completa de todas as companhias de comércio existentes na GrãBretanha Desejo que esses acréscimos não somente sejam inseridos em seus devidos lugares na nova edição mas que sejam impressos em separata a ser vendida por 1 xelim ou 12 coroa aos compradores da edição velha O preço deve depender do volume das edições quando estiverem todas redigidas35 ADAM SMITH 25 31 Ibid p 362 32 A 4ª edição muda This esta para the a 33 A 4ª edição omite present 34 Com freqüência elas figuram ao final de cópias encadernadas existentes da 2ª ed É um erro a afirmação de Rae Life of Adam Smith p 362 de que foram publicadas de 1783 35 RAE Op cit p 362 Além dos acréscimos impressos em separado existem muitas mo dificações da 2ª para a 3ª edição tais como a nota complacente sobre a adoção do imposto sobre casa v II p 370 a correção do cálculo das possíveis taxas recolhidas nos postos de pedágio v II p 248 nota e a referência às despesas da guerra americana v II p 460 porém nenhuma dessas modificações reveste maior importância Mais importante é o acréscimo do longo índice com a inscrição um tanto estranha NB Os algarismos romanos referemse ao volume e os arábicos à página Não é de se esperar que um homem do caráter de Adam Smith fizesse ele mesmo seu índice e podemos estar absoluta mente certos de que não o fez ao verificarmos que o erro tipográfico tallie no volume II p 361 reaparece no índice SV Montauban em bora taille também ocorra ali Todavia o índice nem de longe sugere o trabalho de um mercenário pouco inteligente e o fato de que o Ayr Bank é mencionado no índice SV Banks embora no texto o nome do banco não apareça mostra ou que o autor do índice tem um certo conhecimento da história bancária da Escócia ou que Smith corrigiu o trabalho dele em certos lugares Que Smith recebeu no dia 17 de novembro de 1784 um pacote de Strahan contendo uma parte do índice sabemolo pelas suas cartas a Cadell publicadas no Economic Journal de setembro de 1898 Strahan havia perguntado se o índice devia ser impresso inquarto juntamente com as adições e as correções e Smith recordoulhe que a numeração das páginas tinha que ser mu dada completamente a fim de adaptála às duas edições anteriores cujas páginas em muitos lugares não correspondem Eis por que não há razão alguma para não considerar o índice como parte integrante da obra A 4ª edição publicada em 1786 está impressa no mesmo estilo e exatamente com a mesma paginação que a 3ª Reproduz a advertência constante na 3ª edição porém mudando esta 3ª edição para a 3ª edição e o presente ano de 1784 para o ano de 1784 Além disso encontramos a seguinte Advertência para a 4ª edição Nessa 4ª edição não introduzi alteração de espécie alguma To davia agora sinto a liberdade de exprimir meu grande reconhecimento ao Sr Henry Hop36 de Amsterdam É a esse cavalheiro que devo a mais honrosa e generosa informação sobre um assunto muito interes sante e importante a saber o Banco de Amsterdam Sobre esse assunto nenhum relato impresso me pareceu até hoje satisfatório nem mesmo inteligível O nome desse cavalheiro é tão conhecido na Europa e a OS ECONOMISTAS 26 36 A 5ª ed corrige para Hope A célebre firma de Hope comerciantesbanqueiros em Ams terdam foi fundada por um escocês no século XVII Ver Sir Thomas Hope In Dictionnaire of National Biography Henry Hope nasceu em Boston Mass em 1736 e passou seis anos em um Banco na Inglaterra antes de juntarse a seus parentes em Amsterdam Tornouse sócio deles e ao falecer Adrian Hope assumiu a responsabilidade suprema por todos os negócios da firma Quando os franceses invadiram a Holanda em 1794 retirouse para a Inglaterra Morreu a 25 de fevereiro de 1811 deixando 116 milhão de libras es terlinas Gentlemans Magazine Março de 1811 informação que dele provém deve honrar tanto a quem quer que tenha esse privilégio e tenho tanto interesse em expressar esse reconheci mento que não posso mais furtarme ao prazer de antepor a presente Advertência a esta nova edição do meu livro Em que pese a declaração de Smith de que não introduziu al teração de espécie alguma ele fez ou permitiu a introdução de algumas alterações insignificantes entre a 3ª e a 4ª edições O subjuntivo subs titui com muita freqüência o indicativo após if se sendo que par ticularmente a expressão if it was se era é constantemente alterada para if it were se fosse Na nota à página 78 do volume I late disturbances substitui present disturbances As demais alterações são tão insignificantes que podem tratarse de erros de leitura ou de correções não autorizadas devidas aos impressores A 5ª edição última publicada durante a vida de Smith sendo por conseguinte dela que reproduzimos a presente edição data de 1789 Ela é quase idêntica à 4ª a única diferença está em que os erros tipográficos da 4ª edição vêm corrigidos introduzindose porém um número considerável de novos erros de imprensa ao passo que várias concordâncias falsas ou consideradas como falsas vêm corrigidas ver v I p 119 v II pp 245 28237 A passagem constante no volume II p 200 evidencia que Smith considerou o título Uma investigação sobre a natureza e as causas da riqueza das nações como sinônimo de Economia Política e talvez pareça estranho o fato de ele não ter dado a seu livro o título de Economia Política ou então Princípios de Economia Política En tretanto cumpre não esquecer que esse termo era ainda muito recente em 1776 e que havia sido usado no título do grande livro de Sir James Steuart An Inquiry into the Principles of Political Oeconomy being an Essay on the Science of Domestic Policy in Free Nations publicado em 1767 Naturalmente em nossos dias nenhum autor tem qualquer pre tensão de reclamar o direito de exclusividade para o uso de título Reclamar o copyright para o título Princípios de Economia Política equivaleria no fundo a reclamar o direito de exclusividade para o título Aritmética ou Elementos de Geologia Em 1776 porém Adam Smith pode muito bem terse abstido de usar esse título por ter ele sido empregado por Steuart nove anos antes especialmente se consi ADAM SMITH 27 37 A maioria das edições modernas são cópias da 4ª ed Todavia a de Thorold Rogers embora seja apresentada no prefácio como cópia da 4ª ed na realidade segue a 3ª Em um exemplo efetivamente a omissão de so antes de along as no volume I p 47 linha 9 Ed Cannan o texto de Rogers concorda com o da 4ª e não com o da 3ª mas isso representa uma coincidência casual no erro o erro é muito fácil de ser cometido sendo corrigido nas errata da 4ª ed de maneira que na realidade não representa a leitura daquela edição A 5ª edição não deve ser confundida com uma espúria 5ª edição com acréscimos em dois volumes inoctavo publicada em Dublin em 1793 com a Advertência à 3ª ed deliberadamente falsificada pela substituição de 3ª por 5ª na frase Nesta 3ª edição porém introduzi vários acréscimos Foi talvez a existência dessa 5ª edição espúria que levou vários autores por exemplo RAE Life of Adam Smith p 293 a ignorar a 5ª edição genuína A 6ª edição é de 1791 derarmos que A Riqueza das Nações seria publicado pelo mesmo editor que lançara o livro de Steuart38 No mínimo desde 1759 existia já um primeiro esboço do que posteriormente constituiria A Riqueza das Nações na parte das pre leções de Smith sobre Jurisprudência que denominou Polícia Receita e Armas sendo que o resto da Jurisprudência é constituído pela Justiça e pelas Leis das Nações Smith definia Jurisprudência como a ciência que investiga os princípios gerais que devem constituir a base das leis de todas as nações ou então como a teoria sobre os princípios gerais da Lei e do Governo39 Antecipando suas preleções sobre o assunto ele dizia aos seus alunos Os quatro grandes objetos da Lei são a Justiça a Polícia a Receita e as Armas O objeto da justiça é a segurança contra danos constituindo o fundamento do governo civil Os objetos da polícia são o baixo preço das mercadorias a se gurança pública e a limpeza se os dois últimos itens não fossem tão insignificantes para uma preleção dessa espécie Sob o presente item consideraremos a opulência de um Estado Da mesma forma é necessário que o magistrado que dedica seu tempo e trabalho a serviço do Estado seja remunerado por isso Para este fim e para cobrir as despesas de administração devese recolher algum fundo Daí a origem da receita Eis por que o assunto a ser considerado nesse item serão os meios adequados para obter receita a qual deve provir do povo através do imposto taxas etc De modo geral devese preferir sempre a receita que puder ser recolhida do povo da maneira menos sensível propondonos a seguir mostrar de que modo as leis britânicas e as de outras nações européias foram elaboradas tendo em conta esse propósito Já que a melhor polícia não tem condições de oferecer segurança a não ser que o governo possua meios de defenderse de danos e ataques de fora o quarto objeto da Lei se destina a esse fim sob esse item mostraremos pois os diferentes tipos de armas com suas vantagens e desvantagens a formação de exércitos efetivos milícias etc Depois disso consideraremos as leis das nações40 A relação que a receita e as armas têm com os princípios gerais da Lei e com o governo é suficientemente óbvia não ocorrendo nenhum questionamento quanto à explicação dada pelo esboço supra para esses itens Entretanto considerar a opulência de um Estado sob o item polícia parece um tanto estranho à primeira vista Para a explicação disso vejamos o início da parte das preleções que se refere à polícia OS ECONOMISTAS 28 38 Os Principles de Steuart foram impressos por A Millar and T Cadell in the Strand A Riqueza da Nações por W Strahan and T Cadell in the Strand 39 Lectures on Justice Police Revenue and Arms Proferidas por Adam Smith na Universidade de Glasgow Divulgadas por um estudante em 1763 e editadas com uma introdução e notas de Edwin Cannan 1896 pp 13 40 Lectures pp 34 A polícia constitui a segunda divisão geral da Jurisprudência O termo é francês derivando sua origem do grego politeia que ade quadamente significava a política da administração civil mas agora significa somente os regulamentos das partes inferiores da adminis tração ou seja limpeza segurança e preços baixos ou abundância41 Que essa definição da palavra francesa era correta mostrao bem a seguinte passagem de um livro que como se sabe Smith possuía ao morrer42 as Institutions politiques de Biefeld 1760 t I p 99 O primeiro Presidente do Harlay ao admitir o Sr dArgenson ao cargo de tenente geral de polícia da cidade de Paris dirigiulhe estas palavras que merecem ser notadas O Rei vos pede Senhor segurança limpeza preços baixos para as mercadorias Com efeito esses três itens englobam toda a polícia que constitui o terceiro grande objeto da política para o Estado em sua vida interna Ao constatarmos que do chefe da polícia de Paris em 1697 se esperava que cuidasse dos preços baixos como da segurança e da lim peza não nos surpreende tanto a inclusão dos baixos preços ou fartura ou a opulência de um Estado na Jurisprudência ou nos princípios gerais da Lei e do governo Efetivamente preços baixos são a mesma coisa que fartura e a consideração dos preços baixos ou fartura é a mesma coisa que o caminho mais adequado para garantir riqueza e abundância43 Se Adam Smith houvesse sido um partidário antiquado do controle estatal sobre o comércio e a indústria teria descrito os regulamentos mais adequados para garantir a riqueza e a abundância e não haveria nada de estranho no fato de essa descrição enquadrarse sob os princípios gerais da Lei e do governo A real estranheza é simplesmente o resultado da atitude negativa de Smith de sua crença de que os regulamentos passados e presentes eram na maior parte puramente prejudiciais Quanto aos dois itens limpeza e segurança conseguiu liquidálos com muita brevidade o método correto para remover a sujeira das ruas e a execução da justiça no que concerne a regulamentos e normas para prevenir crimes ou o método de conservar uma guarda urbana embora itens de utilidade são excessivamente irrelevantes para serem considerados em uma exposição geral deste tipo44 Limitouse a ob servar que o estabelecimento das artes e ofícios do comércio gera in dependência constituindo portanto a melhor política para evitar cri mes Isso assegura ao povo melhores salários e em conseqüência disso teremos no país inteiro instaurada uma probidade geral de conduta Ninguém será tão insensato ao ponto de exporse nas rodovias se puder ganhar melhor o seu sustento de maneira honesta e trabalhando45 ADAM SMITH 29 41 Ibid p 154 42 Ver BONAR James Catalogue of the Library of Adam Smith 1894 43 Lectures p 157 44 Ibid p 154 45 Ibid p 156 Smith passou então a considerar os preços baixos ou a abun dância ou então o que é a mesma coisa o melhor meio para garantir a riqueza e abundância Começou essa parte considerando as neces sidades naturais da humanidade que devem ser atendidas46 tema que nos tratados de Economia tem sido tratado sob o termo de con sumo Mostra então que a opulência provém da divisão do trabalho ilustrando também por que é assim ou de que maneira a divisão do trabalho gera a multiplicação do produto47 e por que ela deve estar em proporção com a extensão do comércio Assim dizia ele a divisão do trabalho é a grande causa do aumento de opulência pública a qual sempre é proporcional à laboriosidade do povo e não à quantidade de ouro e prata como se imagina insensatamente Tendo assim mos trado o que gera a opulência pública diz que continuará sua exposição abordando o seguinte Primeiro as circunstâncias que determinam o preço das mercadorias Em segundo lugar o dinheiro em duas perspectivas primeiro como critério para medir o valor e depois como instrumento de comércio Em terceiro lugar a história do comércio parte em que se tratará das causas do progresso lento da opulência tanto nos tempos antigos como na época moderna mostrando quais as causas que afetam a agricultura as artes e ofícios e as manufaturas Finalmente considerarseão os efeitos do espírito comercial so bre o governo o caráter e as maneiras de agir de um povo sejam estas boas ou más e os remédios adequados48 Sob o primeiro desses itens trata do preço natural e do preço de mercado e das diferenças de salários mostrando que toda política que tenda a aumentar o preço de mercado acima do preço natural tende a diminuir a opulência pública49 Entre tais regulamentos per niciosos enumera taxas ou impostos sobre mercadorias monopólios e privilégios exclusivos de corporações Considera como igualmente per niciosos regulamentos que estabelecem um preço de mercado abaixo do preço natural e por isso condena o subsídio aos cereais que faz com que a agricultura acumule capital que poderia ter sido melhor empregado em algum outro comércio A melhor política é sempre deixar as coisas andarem seu curso normal50 Sob o segundo item Smith explica as razões do uso do dinheiro como um padrão comum e o uso dele decorrente como instrumento do comércio Mostra por que geralmente se escolheram o ouro e a prata e por que motivo se introduziu a cunhagem prossegue a exposição explicando os males da falsificação de moeda e a dificuldade de manter OS ECONOMISTAS 30 46 Lectures p 157 47 Ibid p 163 48 Ibid pp 172173 49 Ibid p 178 50 Ibid p 182 em circulação moedas de ouro e de prata ao mesmo tempo Sendo o dinheiro um estoque morto são benéficos os bancos e o crédito cambial que permitem prescindir do dinheiro e enviálo ao exterior O dinheiro enviado para o exterior trará para dentro do país alimentos roupas e moradia e quanto maiores forem as mercadorias importadas tanto maior será a opulência do país51 É má política impor restrições aos bancos52 Mun comerciante londrino afirmava que havendo evasão do dinheiro da Inglaterra ela deve caminhar para a ruína53 O Sr Gee também ele um comerciante procura mostrar que a Inglaterra seria em pouco tempo arruinada pelo comércio com países estrangeiros e que em quase todos os nossos negócios com outras nações saímos perdendo54 O Sr Hume havia mostrado o absurdo dessas e outras doutrinas similares embora mesmo ele não tivesse plena clareza sobre a tese de que a opulência pública consiste no dinheiro55 O dinheiro não é um bem de consumo e a consuntibilidade dos bens se nos for permitido usar este termo é a grande causa da operosidade humana56 A opinião absurda de que as riquezas consistem em dinheiro havia dado origem a muitos erros perniciosos na prática57 tais como a proibição de exportar moeda e tentativas de garantir uma balança comercial favorável Haverá sempre bastante dinheiro se deixarmos as coisas andarem livremente seu curso normal sendo que não tem êxito nenhuma proibição de exportar O desejo de garantir uma balança comercial favorável havia conduzido a normas e leis altamente pre judiciais58 como as restrições impostas ao comércio com a França Basta um mínimo de reflexão para evidenciar o absurdo de tais regulamentos Todo comércio efetuado entre dois países quaisquer deve necessariamente trazer vantagem para ambos O verdadeiro objetivo do comércio é trocar nossas próprias mercadorias por outras que acre ditamos serem mais convenientes para nós Quando duas pessoas co mercializam entre si sem dúvida isso é feito para que os dois aufiram vantagem Exatamente o mesmo acontece entre duas nações quais quer Os bens que os comerciantes ingleses querem importar da França certamente valem mais para eles do que aquilo que dão em troca59 Esses ciúmes e proibições têm sido extremamente danosos para as nações mais ricas e seria benéfico para a França e a Inglaterra em especial se todos os preconceitos nacionais fossem eliminados e se estabelecesse um comércio livre e sem interrupções60 Nação alguma ADAM SMITH 31 51 Ibid p 192 52 Ibid p 195 53 Ibid p 195 54 Ibid p l96 55 Ibid p 197 56 Ibid p 199 57 Ibid p 200 58 Ibid p 204 59 Ibid p 204 60 Lectures p 206 foi jamais arruinada por tal balança comercial Todos os escritores políticos desde o tempo de Carlos II tinham profetizado que dentro de poucos anos estaremos reduzidos a um estado de pobreza absoluta e no entanto a verdade é que hoje constatamos que somos muito mais ricos do que antes61 A tese errônea de que a opulência nacional consiste em dinheiro havia também dado origem à tese absurda de que nenhum consumo interno pode prejudicar a opulência de um país62 Foi também essa tese que levou ao esquema da Lei de Mississípi em comparação com o qual o nosso próprio esquema Mares do Sul era uma ninharia63 Os juros não dependem do valor do dinheiro mas da quantidade de capital O câmbio é um método para prescindir da transmissão do dinheiro64 Sob o terceiro item a história do comércio ou as causas do pro gresso lento da opulência Adam Smith tratou primeiro dos impedi mentos naturais e segundo da opressão por parte do governo civil65 Não consta que tivesse mencionado qualquer outro obstáculo natural afora a falta de divisão do trabalho em épocas primitivas e de barbárie devido à falta de capital66 Em compensação tinha muito a dizer sobre a opressão por parte do governo civil De início os governos eram tão fracos que não tinham condições para oferecer a seus súditos aquela segurança sem a qual ninguém tem motivação para dedicarse com empenho ao trabalho Depois quando os governos se tornaram sufi cientemente fortes para proporcionar segurança interna lutavam entre si e seus súditos eram fustigados por inimigos de fora A agricultura era prejudicada pelo fato de grandes extensões de terra estarem nas mãos de simples pessoas Isso levou inicialmente ao cultivo feito por escravos que não tinham motivação para o trabalho depois vieram os arrendatários por meação meeiros que não tinham suficiente es tímulo para melhorar o solo finalmente foi introduzido o atual método de cultivo por arrendatários porém estes por muito tempo não tinham estabilidade e segurança em suas terras pois eram obrigados a pagar aluguel em espécie o que implicava para eles o risco de serem muito prejudicados por más estações Os subsídios feudais desencorajavam o trabalho sendo que a lei da primogenitura o morgadio e as despesas inerentes à transferência de terras impediam que as grandes proprie dades rurais fossem divididas As restrições impostas à exportação de cereais ajudaram a paralisar o progresso da agricultura O progresso das artes e ofícios e do comércio foi também obstaculizado pela escra vatura bem como pelo antigo menosprezo pela indústria e pelo comér OS ECONOMISTAS 32 61 Ibid p 207 62 Ibid p 209 63 Ibid pp 211219 64 Ibid pp 219222 65 Ibid p 222 66 Ibid pp 222223 cio pela falta de apoio à validade dos contratos pelas várias dificul dades e perigos inerentes ao transporte pelo estabelecimento de feiras mercados e cidadesempórios por taxas impostas às importações e ex portações e pelos monopólios privilégios outorgados a certas corpora ções pelo estatuto dos aprendizes e pelos subsídios67 Sob o quarto e último item a influência que o comércio exerce sobre a conduta de um povo Smith dizia em suas preleções que toda vez que o comércio é introduzido em qualquer país sempre vem acompanhado da probidade e da pontualidade68 O comerciante compra e vende com tanta freqüência que acredita ser a honestidade a melhor política Do ponto de vista da probidade e da pontualidade os políticos não são os que mais se distinguem no mundo Menos ainda o são os embaixadores das diferentes nações69 a razão disso está no fato de ser muito mais raro as nações fazerem comércio entre si do que os comerciantes Todavia o espírito comercial gera certos inconvenientes A visão das pessoas se restringe e quando toda a atenção de uma pessoa se concentra no décimo sétimo componente de um alfinete ou no oitavo componente de um botão70 a pessoa se torna obtusa Negligenciase a educação das pessoas Na Escócia o carregador do nível mais baixo sabe ler e escrever ao passo que em Birmingham um menino de seis ou sete anos pode ganhar três ou seis pence por dia de sorte que seus pais o põem a trabalhar cedo negligenciando a sua educação É bom saber ao menos ler pois isso proporciona às pessoas o benefício da religião que representa uma grande vantagem não apenas do ponto de vista de um pio sentimento mas porque a religião fornece ao in divíduo assunto para pensar e refletir71 Além disso registrase outra grande perda em colocar os meninos muito cedo no trabalho Os me ninos acabam desvencilhandose da autoridade dos pais e entregamse à embriaguez e às rixas Conseqüentemente nas regiões comerciais da Inglaterra os trabalhadores estão em uma condição desprezível trabalhando durante meia semana ganham o suficiente para manter se e por falta de educação e formação não têm com que ocuparse no restante da semana entregandose a rixas e à devassidão Assim sendo não há erro em dizer que as pessoas que vestem o mundo todo estão elas mesmas vestidas de farrapos72 Além disso o comércio faz diminuir a coragem e apaga o espírito guerreiro a defesa do país fica assim entregue a uma categoria especial de pessoas e o caráter de um povo se torna efeminado e covarde como demonstrou o fato de que em 1745 quatro ou cinco mil montanheses ADAM SMITH 33 67 Ibid pp 223236 68 Ibid p 253 69 Ibid p 254 70 Ibid p 255 71 Ibid p 256 72 Ibid pp 256257 nus e sem armas teriam derrubado com facilidade o governo da Grã Bretanha se não tivessem encontrado a resistência de um exército efetivo73 Remediar tais males introduzidos pelo comércio seria um ob jetivo digno de ser estudado com seriedade A receita ao menos no ano em que Smith redigiu as anotações para suas preleções era tratada antes do último item da polícia que acabamos de expor obviamente porque ela representa efetivamente uma das causas do lento progresso da opulência74 De início ensinava Smith não havia necessidade de receita o funcionário público contentavase com o prestígio que o cargo lhe proporcionava e com os presentes que se lhe ofereciam Mas o recebi mento de presentes acabou conduzindo logo à corrupção De início também os soldados não recebiam remuneração mas isso não durou muito O método mais antigo adotado para garantir renda foi destinar terras para cobrir os gastos do governo Para manter o governo britânico seria necessário no mínimo dispor de um quarto de toda a área do país Depois que a manutenção do governo se torna dispendiosa o pior método possível de custeála é a renda fundiária75 A civilização vai de mãos dadas com os altos custos de administração pública Os Impostos podem ser assim divididos impostos sobre posses e impostos sobre mercadorias É fácil estabelecer impostos territoriais mas difícil estabelecer impostos para estoques ou dinheiro É muito pouco dispendioso recolher impostos territoriais eles não geram au mento do preço das mercadorias nem limitam o número de pessoas que possuem estoque suficiente para comercializar com elas É penoso para os proprietários de terras ter que pagar tanto imposto territorial quanto impostos sobre o consumo fato este que talvez ocasione a manutenção do que se chama juros dos Torios76 O melhor sistema de recolhimento de impostos sobre mercadorias é embutilos no próprio produto Nesse caso existe a vantagem de pagálos sem perceber77 já que ao comprarmos uma libra de chá não refletimos no fato de que a maior parte do preço consiste em uma taxa paga ao governo e por isso pagamola de bom grado como se fora simplesmente o preço natural da mercadoria78 Além disso tais impostos têm menos probabilidade de levar o povo à ruína do que os impostos territoriais pois o povo sempre tem condições de diminuir os seus gastos com a compra de artigos tributáveis Um imposto territorial fixo como o inglês é melhor do que um que varia de acordo com a renda como é o caso do imposto territorial francês e os ingleses são os maiores financistas da Europa sendo OS ECONOMISTAS 34 73 Ibid p 258 74 Ibid p 236 75 Ibid p 239 76 Ibid pp 241242 77 Ibid pp 242243 78 Ibid p 243 os impostos ingleses os mais adequadamente cobrados em confronto com os de qualquer outro país79 As taxas sobre importações são da nosas porque desviam o trabalho para um caminho não natural piores ainda são as taxas sobre exportações A crença generalizada de que a riqueza consiste em dinheiro não tem sido prejudicial como se poderia ter esperado no tocante às taxas incidentes sobre importações pois por coincidência essa crença levou a estimular a importação de maté riaprima e a desestimular a importação de artigos manufaturados80 A exposição sobre a receita levou Smith com naturalidade a tratar das dívidas nacionais o que o conduziu à discussão sobre as causas do aumento e da diminuição dos estoques e da prática da agiotagem81 Sob o item Armas Smith ensinou que de início todo o povo vai à guerra a seguir somente as classes superiores vão à guerra e as classes mais baixas continuam a cultivar a terra Mais tarde porém a introdução das artes e ofícios e das manufaturas tornou inconveniente aos ricos deixarem seus negócios cabendo então a defesa do Estado às classes mais baixas do povo Essa é a nossa situação atual na GrãBretanha82 Atualmente a disciplina se torna necessária intro duzindose exércitos permanentes O melhor tipo de exército é uma milícia comandada por donos de latifúndios e de cargos públicos da nação83 os quais nunca podem ter qualquer probabilidade de sacri ficar as liberdades do país É o que ocorre na Suécia Comparemos agora tudo isso com o esquema ou esboço de A Riqueza das Nações não como está descrito na Introdução e Plano mas tal como o encontramos no corpo da própria obra O Livro Primeiro começa mostrando que o maior aprimoramento das forças produtivas se deve à divisão do trabalho Depois da divisão do trabalho a obra trata do dinheiro de vez que necessário para facilitar a divisão do trabalho o que depende de intercâmbio Isso naturalmente leva a abordar os termos em que as trocas são efetuadas ou seja valor e preço O estudo do preço revela que esse se divide entre salários lucros do capital e renda fundiária e por isso o preço depende dos índices dos salários dos índices dos lucros do capital e da renda fun diária o que torna necessário abordar em quatro capítulos as variações desses índices O Livro Segundo trata primeiramente da natureza e das divisões do patrimônio e em segundo lugar de uma parcela particularmente importante do mesmo a saber o dinheiro e dos meios através dos quais essa parte pode ser economizada pelas operações bancárias em terceiro lugar trata da acumulação de capital que está relacionada com o emprego da mãodeobra produtiva Em quarto lugar considera ADAM SMITH 35 79 Ibid p 245 80 Ibid pp 246247 81 Ibid pp 247252 82 Ibid p 261 83 Ibid p 263 o aumento e a diminuição da taxa de juros em quinto e último lugar a vantagem comparativa dos diferentes métodos de emprego do capital O Livro Terceiro mostra que o progresso natural da opulência deve dirigir o capital primeiro para a agricultura depois para as ma nufaturas e finalmente para o comércio exterior mas que essa ordem foi invertida pela política dos Estados europeus modernos O Livro Quarto trata de dois sistemas diferentes de economia política 1 o sistema do comércio e 2 o sistema da agricultura en tretanto o espaço dedicado ao primeiro mesmo na 1ª edição é oito vezes maior que o dedicado ao segundo O primeiro capítulo mostra o absurdo do princípio do sistema comercial ou mercantil segundo o qual a riqueza depende da balança comercial os cinco capítulos sub seqüentes expõem detalhadamente e mostram a futilidade dos meios vis e danosos através dos quais os mercantilistas procuraram garantir seu objetivo absurdo isto é taxas protecionistas gerais proibições e altas taxas dirigidas contra a importação de bens de países específicos em relação aos quais a balança é supostamente desfavorável draw backs subvenções e tratados de comércio O capítulo sétimo que é longo trata das colônias Segundo o plano que se encontra no fim do capítulo I esse assunto é tratado aqui porque as colônias foram fundadas para estimular a exportação através de privilégios peculiares e monopólios Mas no próprio capítulo não há vestígio algum disso A história e o progresso das colônias são discutidos para fins particulares não se afirmando que as colônias importantes foram fundadas com o objetivo indicado no capítulo I No último capítulo do livro descrevese o sistema fisiocrático emitindose um julgamento contra esse sistema e contra o sistema comercial O sistema adequado é o da liberdade natural que libera o soberano da obrigação de supervisionar o trabalho das pessoas pri vadas e da obrigação de dirigilo para os objetivos mais convenientes ao interesse da sociedade O Livro Quinto trata das despesas do soberano no cumprimento dos deveres que lhe cabem da receita necessária para cobrir tais des pesas e do que ocorre quando as despesas ultrapassam a receita A discussão sobre as despesas para defesa inclui a discussão sobre dife rentes tipos de organização militar tribunais meios para manutenção de obras públicas educação e instituições eclesiásticas Confrontando esses dois esquemas podemos observar a estreita cor relação existente entre o livro e as preleções Lectures de Adam Smith Pelo fato de o título Police ser omitido por não designar ade quadamente o assunto tratado não há necessidade de mencionar a limpeza e as observações sobre a segurança são deslocadas para o capítulo referente ao acúmulo de capital Omitemse as duas partes sobre as necessidades naturais da humanidade84 revelando mais uma OS ECONOMISTAS 36 84 Existe uma reminiscência delas no capítulo A Renda da Terra v I pp 182183 Ed Cannan vez as dificuldades que os economistas geralmente têm sentido no to cante ao consumo As quatro partes seguintes dedicadas à divisão do trabalho acabam formando os três primeiros capítulos do Livro Pri meiro de A Riqueza das Nações A esta altura nas Lectures existe uma transição abrupta para os preços seguindose a exposição sobre o dinheiro a história do comércio e os efeitos do espírito comercial em A Riqueza das Nações isso é evitado começando com o dinheiro que é o instrumento através do qual se faz a divisão do trabalho e passandose então a tratar dos preços transição perfeitamente natural Nas preleções a exposição sobre o dinheiro conduz a uma consideração sobre a tese de que a riqueza consistiria no dinheiro e sobre todas as conseqüências perniciosas desse erro na restrição do comércio bancário e exterior Isso obviamente representa uma sobre carga para a teoria sobre o dinheiro e por isso a exposição sobre as operações bancárias em A Riqueza das Nações se desloca para o Livro que aborda o capital pelo fato de este prescindir do dinheiro o qual é um patrimônio morto e portanto economiza capital e com isso a exposição sobre a política comercial é automaticamente transferida para o Livro Quarto Além disso nas preleções a exposição sobre os salários é muito breve sendo feita sob o item preços e os lucros do capital e a renda da terra nem sequer são tratados em A Riqueza das Nações os salários os lucros do capital e a renda da terra são tratados longamente como componentes do preço afirmandose que toda a produção do país está distribuída entre esses três fatores como por ções que a compõem A parte seguinte das preleções que trata das causas do progresso lento da opulência constitui o fundamento para o Livro Terceiro de A Riqueza das Nações A influência do comércio sobre a conduta do povo desaparece como item independente mas a maior parte do assunto tratado nas preleções sob esse item é utilizada na exposição sobre educação e organização militar Além do consumo são totalmente omitidos em A Riqueza das Nações dois outros assuntos tratados com bastante detalhes nas pre leções Corretagem em Bolsa e o esquema Mississípi A descrição da agiotagem provavelmente foi omitida por ser mais adequada para os jovens estudantes que ouviam as preleções do que para os leitores do livro mais amadurecidos E o esquema Mississípi foi omitido como diz o próprio Smith por ter sido adequadamente tratado por Du Verney Aqui e acolá deparase com discrepâncias entre as teses expressas nas preleções e as expressas no livro A tese razoável e incisiva sobre os efeitos do subsídio aos cereais é substituída por uma doutrina mais velada embora menos satisfatória Outrossim não reaparece no livro a observação sobre a inconveniência do abrandamento das leis sobre comércio exterior por encorajarem o comércio com países dos quais a Inglaterra importava matériasprimas e desestimularem o comércio ADAM SMITH 37 com os países dos quais a Inglaterra importava manufaturados85 Prova velmente a passagem pertinente nas preleções é muito condensada e talvez não retrate fielmente o pensamento de Adam Smith Se o texto das preleções representar fielmente o pensamento de Smith é o caso de supor que ao tempo em que ministrou essas aulas o autor não se havia ainda libertado inteiramente das falácias da política protecionista86 Existem alguns acréscimos muito evidentes em A Riqueza das Nações O mais saliente é a exposição sobre o sistema fisiocrático ou agrícola francês que ocupa o último capítulo do Livro Quarto Também o artigo sobre as relações entre Igreja e Estado Livro Quinto capítulo I Parte III art 3 parece ser um acréscimo evidente ao menos em relação às preleções sobre police e receita Mas como veremos a tradição parece afirmar que Smith tratou das instituições eclesiásticas nessa parte de suas preleções sobre Jurisprudência de maneira que talvez o escrito das Lectures apresente falhas nesse ponto ou então o assunto foi omitido no ano específico em que as notas foram tomadas Além disso existe o longo capítulo sobre as colônias O fato de as colônias terem atraído a atenção de Adam Smith durante o período que vai entre as preleções e a publicação de seu livro não surpreende muito se recordarmos que esse intervalo coincidiu quase exatamente com o período entre o início da tentativa de taxar as colônias e a Declaração da Independência dessas colônias Contudo esses acréscimos são de pequeno porte em confronto com a introdução da teoria do patrimônio ou capital e do trabalho improdutivo no Livro Segundo a inserção de uma teoria da distribuição na teoria dos preços pelo fim do Livro Primeiro capítulo VI e a ênfase sobre a concepção da produção anual Essas mudanças não representam para a obra de Smith uma diferença real tão grande como se poderia supor a teoria da distribuição embora apareça no título do Livro Pri meiro não é uma parte essencial da obra e poderia facilmente ser eliminada cancelando alguns parágrafos no Livro Primeiro capítulo VI e algumas linhas em outros lugares mesmo que o Livro Segundo fosse omitido por inteiro os demais livros manterseiam perfeitamente por si sós Mas para a ciência econômica subseqüente esses acréscimos foram de importância fundamental Determinaram a forma dos tratados de Economia durante um século no mínimo Naturalmente esses acréscimos são devidos aos Économistes fran ceses com os quais Adam Smith travou conhecimento durante sua visita à França juntamente com o Duque de Buccleugh em 17641766 Temse afirmado que Smith pode ter travado conhecimento com muitas obras dessa escola antes de se redigirem as notas de suas preleções e assim pode ter sido realmente em teoria Mas as notas de suas pre leções constituem uma prova evidente de que na realidade Smith não tinha tal conhecimento ou em todo caso não havia assimilado as teorias OS ECONOMISTAS 38 85 The Wealth of Nations Ed Cannan 1976 p XXV 86 Ibid pp XLVI XLVII a respeito de uma conjetura sobre esse assunto econômicas principais dos economistas franceses Se verificarmos que não existe vestígio algum dessas teorias nas preleções e por outro lado em A Riqueza das Nações elas estão muito presentes e se con siderarmos que nesse meio tempo Smith havia estado na França e freqüentara a companhia de todos os membros proeminentes da seita incluindo seu mestre Quesnay é difícil compreender por que motivo sem evidência alguma devamos ser impedidos de acreditar que Smith sofreu a influência fisiocrática depois do período que passou em Glas gow e não antes ou durante esse período A profissão de fé dos Économistes está incorporada no Tableau Économique Quadro Econômico de Quesnay que um dos membros da escola descreveu como digno de ser qualificado juntamente com a imprensa e o dinheiro como uma das três maiores invenções do gênero humano87 Esse Quadro está reproduzido na próxima página tendo sido extraído do facsímile da edição de 1759 publicado pela British Economic Association atualmente denominada Royal Economic Socie ty em 1894 Para a presente edição foi utilizado o facsímile contido na edição do Tableau Économique des Physiocrates CalmannLévy Paris 1969 N do E Os que estiverem interessados em saber o exato significado das linhas em ziguezague no Quadro podem estudar a Explication de Ques nay publicada pela British Economic Association juntamente com a tabela em 1894 Para o objetivo a que aqui visamos é suficiente en tender 1 que a tabela envolve uma concepção da produção ou repro dução anual total de um país 2 que essa teoria ensina serem alguns trabalhos improdutivos e que para manter a produção anual são ne cessários certos avances e que essa produção anual é distribuída Adam Smith como demonstra seu capítulo sobre os sistemas agrícolas não atribuiu valor muito grande às minúcias dessa tabela mas certa mente adotou essas idéias básicas e as adaptou da melhor maneira que pôde às suas teorias desenvolvidas em Glasgow A concepção da produção anual não colidia de forma alguma com essas suas teorias de Glasgow não havendo nenhuma dificuldade em adotar a produção anual como a riqueza de uma nação embora com muita freqüência por esquecimento recaia em modos de falar mais antigos Quanto ao trabalho improdutivo Smith não estava disposto a condenar como es téreis todos os trabalhos executados em Glasgow mas a enquadrar os servidores medievais e mesmo os criados domésticos modernos na ca tegoria improdutiva Iria até um pouco mais longe colocando na mesma categoria todos aqueles cujo trabalho não produz objetos específicos vendáveis ou cujos serviços não são utilizados pelos seus empregadores para ganhar dinheiro Deixandose confundir um tanto por essas distin ADAM SMITH 39 87 Ibid v II p 200 n 2 TABLEAU ŒCONOMIQUE CONSIDERE dans le dépérissement de la culture dans les effets de tout genre qui en résultent DÉPENSES PRODUCTIVES relatives à lAgriculture c DÉPENSES DU REVENUE limpôt à la dime qui se partagent aux dépenses productives et aux dépenses féteri ções e pela doutrina fisiocrática dos avances Smith imaginou uma conexão estreita entre o emprego do trabalho produtivo e a acumu lação e emprego do capital Daí que partindo da observação comum de que onde aparece um capitalista logo surgem trabalhadores chegou à tese de que o montante de capital em um país determina o número de trabalhadores úteis e produtivos Finalmente intro duziu em sua teoria dos preços e de seus fatores componentes a idéia de que já que o preço de qualquer mercadoria está dividido entre salários lucros do capital e renda imobiliária assim também a produção total está dividida entre trabalhadores capitalistas e proprietários de terra Essas idéias sobre o capital e o trabalho improdutivo são indis cutivelmente de grande importância na história da teoria econômica mas eram fundamentalmente descabidas e nunca foram aceitas com aquela universalidade que comumente se supõe Não obstante isso a concepção da riqueza das nações como uma produção anual distribuída anualmente tem um valor imenso Como outras concepções desse tipo de qualquer forma essa também viria com certeza Poderia ter sido desenvolvida diretamente a partir de Davenant ou de Petty mais ou menos um século antes Não precisamos supor que algum outro autor qualquer não pudesse têla logo introduzido na economia inglesa se Adam Smith não o tivesse feito entretanto isto não nos impede de registrar o fato de que foi ele que a introduziu e que a introduziu em conseqüência de sua associação com os Économistes Se tentamos fazer remontar a história da gênese de A Riqueza das Nações para além da data das notas das preleções 1763 ou por volta desse ano ainda podemos encontrar alguma informação autêntica embora pouca Sabemos que Smith deve ter utilizado pra ticamente o mesmo esquema e divisão que em suas preleções de 1759 já que ele promete no último parágrafo de Moral Sentiments publicados naquele ano uma outra exposição na qual haveria de procurar apresentar os princípios gerais da lei e do governo e das diversas transformações pelas quais haviam passado no decurso das diferentes idades e períodos da sociedade não somente no que con cerne à justiça mas no que tange à ordem pública às rendas e às forças armadas e a tudo o mais que seja objeto da Lei Todavia parece provável que a parte econômica das preleções nem sempre se intitulou ordem pública rendas e forças armadas uma vez que Millar que freqüentou as preleções quando foram ministradas pela primeira vez em 175152 diz o seguinte Na última parte de suas preleções examinou os regulamentos políticos que se baseiam não no princípio da justiça mas no da con veniência e que se destinam a aumentar a riqueza o poder e a pros peridade de um Estado Sob esse ponto de vista considerou as insti tuições políticas em relação ao comércio às finanças às instituições eclesiásticas e militares O que ele expôs sobre esses assuntos continha ADAM SMITH 41 a essência da obra que depois publicou sob o título An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations88 Naturalmente isso não exclui necessariamente a possibilidade de que as preleções sobre Economia fossem intituladas ordem pública rendas e forças armadas mesmo naquela data entretanto a colocação das palavras justiça e conveniência se isso tiver sido feito por Millar sugere mais o contrário e não há como negar que a colocação de preços baixos ou fartura sob ordem pública pode muito bem ter sido uma reflexão posterior de Smith para justificar a introdução de boa quantidade de material sobre economia nas preleções que versavam sobre Jurisprudência Quanto ao motivo dessa introdução as circuns tâncias da primeira estadia ativa de Smith em Glasgow sugerem outra razão além de sua predileção pelo assunto a qual digase de pas sagem não o impediu de publicar antes sua doutrina sobre a Ética Cumpre lembrar que a primeira nomeação de Smith para Glasgow foi como professor de Lógica em janeiro de 1751 mas os seus com promissos em Edimburgo o impediram de fazêlo naquele período letivo Antes do início do próximo período letivo pediuselhe que substituísse Craigie o professor de Filosofia Moral que estava deixando a cidade para tratar da própria saúde Ele consentiu e conseqüentemente no período letivo de 17511752 teve que começar a lecionar duas matérias já que para uma delas tinha sido avisado com antecedência muito pequena89 Em tal situação qualquer professor faria tudo para utilizar qualquer material adequado que por acaso tivesse à mão e a maioria dos professores iria ainda além utilizando até algo que não fosse in teiramente adequado Ora sabemos que Adam Smith possuía em forma de manuscrito que se encontrava nas mãos de um secretário que o servia certas preleções que ministrara em Edimburgo no inverno de 175051 e sa bemos que nessas preleções expusera a doutrina sobre os efeitos be néficos da liberdade e segundo Dugald Stewart também muitas das teses mais importantes expostas em A Riqueza das Nações Existia quando Stewart escreveu um manuscrito breve elaborado pelo Sr Smith no ano de 1755 e por ele presenteado a uma sociedade da qual então era membro A respeito desse manuscrito Stewart afirma Muitas das teses mais importantes que se encontram em A Ri queza das Nações estão ali expostas pormenorizadamente citarei po rém só as seguintes frases O homem geralmente é considerado pelos estadistas e planejadores como objeto de uma espécie de mecânica política Os planejadores atrapalham a natureza no curso das operações naturais sobre os negócios humanos quando seria suficiente deixála sozinha deixála agir livremente na efetivação de seus objetivos a fim OS ECONOMISTAS 42 88 Dugald Stewart em seu Account of the Life and Writings of Adam Smith lido à Royal Society of Edinburgh em 1793 e publicado na obra póstuma de Adam Smith Essays on Philosophical Subjects 1795 p XVIII Ver RAE Life of Adam Smith pp 5355 89 RAE Life of Adam Smith pp 4245 de que ela realizasse os próprios planos E em uma outra passagem Além disso pouco se requer para levar um Estado da barbárie mais baixa para o mais alto grau de opulência além da paz impostos baixos e uma administração aceitável da justiça todo o resto é feito pelo curso natural das coisas Todos os governos que interferem nesse curso natural que forçam as coisas para outra direção ou que se empenham em sustar o progresso da sociedade em um ponto específico não são naturais e para subsistirem têm de ser opressivos e tirânicos Uma grande parte das teses observa Smith enumeradas neste ma nuscrito é tratada minuciosamente em algumas preleções que ainda tenho comigo e que foram escritas por um secretário que deixou o meu serviço há seis anos Todas elas têm constituído tema constante das minhas preleções desde que comecei a ensinar em lugar do Sr Craigie no primeiro inverno que estive em Glasgow até hoje sem nenhuma alteração de monta Todas elas têm sido objeto das preleções que ministrei em Edimburgo no outro inverno antes de deixar essa cidade e posso aduzir inúmeras testemunhas tanto daquele lugar como deste que garantem suficientemente serem de minha autoria90 Parece pois que quando Smith teve que assumir as duas cátedras em 1751 tinha em andamento algumas preleções as quais muito pro vavelmente explicavam o lento progresso da opulência e que como teria feito qualquer pessoa em tais circunstâncias as inseriu em seu curso de Filosofia Moral Efetivamente não havia nenhuma dificuldade em fazêlo Parece quase certo que o próprio Craigie sugeriu a idéia O pedido para que Smith assumisse o trabalho de Craigie veio por Cullen e ao responder à carta de Cullen que não foi conservada Smith afirma O Sr menciona a jurisprudência natural e a política como as partes das preleções dele que eu teria imenso prazer em lecionar De muito bom grado farei as duas coisas91 Sem dúvida Craigie estava a par do que Smith andara ensinando em Edimburgo no inverno anterior denomi nandoo Política Além do mais as tradições da cadeira de Filosofia Moral conforme Adam Smith as conhecia exigiam que se ministrassem certas partes de economia Doze anos antes ele mesmo tinha sido estudante quando o professor era Francis Hutcheson Quanto podemos julgar com base no System of Moral Philosophy de Hutcheson obra que como de monstrou o Dr W R Scott92 já existia quando Smith era estudante embora sua publicação não tivesse ocorrido antes de 1755 Hutcheson ensinou primeiro Ética logo depois o que muito bem poderia denomi ADAM SMITH 43 90 Stewart nos Essays de Smith pp LXXX LXXXI 91 RAE Op cit pp 4344 92 SCOTT W R Francis Hutcheson 1900 pp 210231 Em Introduction to Moral Philosophy 1747 Civil Polity é substituído por Oeconomicks and Politicks mas Oeconomicks sig nifica apenas Direito familiar isto é os direitos de esposos e esposas pais e filhos patrões e servos narse Jurisprudência Natural e em terceiro lugar Sociedade Civil Considerável parte de doutrina econômica espalhase pelas duas últimas Ao considerar A Necessidade de uma Vida Social Hutcheson as sinala que uma pessoa que vive em solidão por mais forte e instruída que seja nas artes e ofícios dificilmente conseguiria proverse nas mais simples necessidades vitais mesmo nos melhores solos ou clima Não só isso Sabese muito bem que a produção resultante dos trabalhos de qualquer número de pessoas por exemplo vinte em prover as coisas necessárias ou convenientes para a vida será muito maior confiando a um certo tipo de trabalho de uma espécie no qual logo adquirirá habilidade e destreza e confiando a um trabalho de tipo diferente do que se cada um dos vinte fosse obrigado a executar alternadamente todos os diferentes tipos de trabalho exigidos para a sua subsistência sem destreza suficiente para nenhum deles Utili zandose o primeiro método cada um produz quantidade maior de bens de uma espécie podendo trocar uma parte deles por bens obtidos pelos trabalhos de outros conforme a sua necessidade Um se torna perito na cultura da terra outro em apascentar e criar gado um terceiro em alvenaria um quarto na caça um quinto em siderurgia um sexto em tecelagem e assim por diante Assim todos são supridos através de escambo pelas obras de artífices completos No outro método difi cilmente alguém poderia ter habilidade e destreza em qualquer tipo de trabalho Além disso algumas obras da maior utilidade para as multidões podem ser eficientemente executadas pelos trabalhos conjugados de muitos obras essas que os trabalhos do mesmo número de pessoas jamais poderiam ter executado A força conjugada de muitos pode re pelir perigos provenientes de animais selvagens ou bandos de assal tantes que poderiam ter sido fatais para muitos indivíduos caso o confronto se desse em separado Os trabalhos conjugados de vinte ho mens proporcionarão o cultivo de florestas ou a drenagem de pântanos para as propriedades de cada um deles e providenciarão casas para morarem e cercados para seus rebanhos com muito maior rapidez do que os trabalhos separados do mesmo número de homens Juntando as forças e alternando o descanso podem manter vigília perpétua o que jamais conseguiriam sem tal providência93 Ao explicar os Fundamentos da Propriedade Hutcheson diz que quando a população era rarefeita o País era fértil e o clima ameno não havia muita necessidade de se aperfeiçoarem regras sobre a pro priedade mas na situação de hoje o trabalho de todos é claramente necessário para manter a humanidade e os homens devem ser mo tivados ao trabalho pelo interesse próprio e pelo amor à família Se não lhes forem assegurados os frutos do trabalho humano não se tem nenhuma outra motivação para trabalhar senão o amor genérico à OS ECONOMISTAS 44 93 HUTCHESON Francis System of Moral Phylosophy v I pp 288289 espécie o qual geralmente é muito mais fraco do que as afeições mais íntimas que dedicamos aos nossos amigos e parentes para não men cionar a oposição que nesse caso seria apresentada pela maioria dos indivíduos egoístas Numa sociedade comunista não se trabalha de boa vontade94 O maior bloco ininterrupto de doutrina econômica no System of Moral Philosophy encontrase no capítulo intitulado Os valores dos bens no comércio e a natureza da moeda que ocorre no meio da ex posição sobre contratos Nesse capítulo afirmase que é necessário para o comércio que os bens sejam avaliados Os valores dos bens dependem da procura e da dificuldade em adquirilos Os valores devem ser me didos com base em algum padrão comum e que deve ser algo desejado por todos de sorte que todos estejam dispostos a aceitálo na troca Para assegurálo o padrão deve ser algo portátil e divisível sem perda além de durável O ouro e a prata melhor atendem aos mencionados requisitos De início eram usados por quantidade ou peso sem cunha gem mas eventualmente o Estado oferecia garantia pela quantidade e qualidade através do carimbo A timbragem por constituir fácil lavor não acrescenta valor considerável A moeda sempre tem o valor de uma mercadoria no comércio como outros bens e isso em proporção à raridade do metal pois se trata de procura universal O único meio para elevarlhe artificialmente o valor seria restringir a produção das minas Dizemos comumente que a mãodeobra e os bens aumentaram desde que esses metais começaram a abundar e que a mãodeobra e os bens escasseavam quando também os referidos metais eram escassos considerandose o valor dos metais invariável porque os nomes legais das peças as libras os xelins ou pence continuam sempre os mesmos até que a lei os altere Mas o cavar ou arar de um dia era tão trabalhoso para um homem mil anos atrás quanto é hoje embora naquela época o homem não pudesse com esses trabalhos ganhar tanta prata quanto hoje e um barril de trigo ou de carne bovina tinha naquela época a mesma utilidade para sustentar o organismo humano que hoje quando é trocado por uma quantidade quatro vezes maior de prata O valor do trabalho dos cereais e do gado é sempre mais ou menos o mesmo já que servem para os mesmos fins na vida enquanto novas invenções de cultivo da terra e de apascentar o gado não gerarem uma disponi bilidade maior do que a demanda95 Baixar e elevar o valor das moedas são operações injustas e perniciosas Minas abundantes fazem baixar o valor dos metais preciosos O padrão como tal varia muito pouco e por isso se instituíssem os salários fixos que em todos os casos servissem aos mesmos fins ou remunerássemos os que têm direito a eles na mesma condição com ADAM SMITH 45 94 Ibid v I pp 319321 95 System of Moral Philosophy v II p 58 respeito a outros os salários não devem ser fixos nos nomes legais da moeda nem em um certo número de onças de ouro e prata Um decreto do Estado pode alterar os nomes legais e o valor das onças pode mudar pelo aumento ou diminuição das quantidades desses metais Tampouco esses salários devem ser fixados em quaisquer quan tidades de produtos manufaturados mais rebuscados pois belas invenções para facilitar o trabalho podem fazer baixar o valor de tais bens O salário mais invariável seria tanto dias de trabalho do homem ou determinada quantidade de bens produzidos pelos meros trabalhos não artificiais como os bens que correspondem aos fins comuns da vida O que mais se aproxima desse padrão são quantidades de cereais96 Os preços dos bens dependem das despesas dos juros do dinheiro empregado e também dos trabalhos do cuidado da atenção dos cál culos e o que a eles corresponde Às vezes devemos incluir também a condição da pessoa assim empregada já que a despesa de seu padrão de vida deve ser custeada pelo preço de tais trabalhos visto que eles merecem remuneração como qualquer outro Esse preço adi cional de seus trabalhos é o fundamento justo do lucro comum dos comerciantes No capítulo seguinte intitulado Os Contratos Principais em uma Vida Social observamos que o arrendamento ou aluguel de bens não diretamente produtivos como casas é justificado pelo fato de que o proprietário poderia ter empregado seu dinheiro ou trabalho em bens por natureza produtivos Se em qualquer tipo de comércio as pessoas conseguem obter com uma grande quantidade de dinheiro ganhos muito maiores do que poderiam ter obtido sem ele é muito justo que aquele que lhes fornece o dinheiro meio necessário para auferir esse ganho tenha pelo uso do mesmo alguma participação no lucro no mínimo igual ao lucro que poderia ter auferido comprando coisas por natureza produtivas ou que dão renda Isso demonstra o fundamento justo dos juros sobre o dinheiro emprestado embora ele não seja por natureza gerador de bens Casas não dão frutos nem ganho nem tampouco qualquer terreno arável proporcionará qualquer ganho sem grande trabalho O trabalho empregado em administrar o dinheiro no comércio ou nas manufaturas torna o dinheiro tão produtivo e frutífero como qualquer outra coisa Se os juros fossem proibidos ninguém emprestaria dinheiro a não ser por caridade e muitas pessoas laboriosas que não são objetos de ca ridade seriam excluídas de grandes ganhos de uma forma muito van tajosa para o público97 Os juros razoáveis variam conforme a situação do comércio e a quantidade da moeda Em um país jovem auferemse grandes lucros com somas pequenas e a terra equivale a menos anos de compra de sorte OS ECONOMISTAS 46 96 Ibid v II pp 6263 97 System of Moral Philosophy v II pp 7172 que é razoável cobrar juros mais altos As leis que regulam os juros devem observar essas causas naturais do contrário serão fraudadas98 No capítulo Sobre a Natureza das Leis Civis e sua Execução dizse que depois da piedade as virtudes mais necessárias para um Estado são a sobriedade a laboriosidade a justiça e a fortaleza O trabalho é a fonte natural da riqueza o fundo para todos os estoques para exportação através da parcela que ultrapassa o valor daquilo que uma nação importa o Estado aumenta sua riqueza e seu poder Uma agricultura adequada deve assegurar o suprimento dos produtos necessários para a vida e os materiais para todas as manu faturas e todas as artes mecânicas devem ser estimuladas a processar esses produtos para o consumo e para exportação Os bens preparados para exportação devem ser isentos de todos os encargos e taxas o mesmo acontecendo na medida do possível com bens necessariamente destinados ao consumo pelos artesãos que nenhum outro país possa vender a preço mais baixo bens semelhantes em um mercado estran geiro Quando só um país possui certos materiais podese em segurança impor taxas de exportação mas tão moderadas que não impeçam o consumo respectivo no exterior Se o povo não adquirir o hábito do trabalho os preços baixos de todos os artigos necessários para a vida estimulam a preguiça O melhor remédio contra isso é aumentar a demanda de todos os artigos necessários não somente através de prêmios de exportação o que aliás muitas vezes também é útil mas aumentando o número de pessoas que os consomem e quando os artigos forem caros exigirseão mais trabalho e aplicação em todos os tipos de comércio e artes para obtêlos Eis por que estrangeiros operosos devem ser convidados a trabalhar em nosso país e todas as pessoas que amam o trabalho devem viver entre nós sem serem molestadas Devese estimular o casamento daqueles que geram uma prole numerosa para o trabalho Os solteiros devem pagar impostos mais altos pois não têm o encargo de gerar e educar filhos para o Estado Devese banir toda e qualquer idéia tola de que as artes mecânicas são vis como se fossem indignas para pessoas de famílias melhores devendose encorajar pessoas de condição mais elevada por nascimento ou destino a se interes sarem por essas ocupações A indolência deve ser punida no mínimo com a servidão temporária Devese importar matériaprima estran geira e até oferecer prêmios se necessário de sorte que a nossa própria mãodeobra encontre emprego e para que exportando nós esses ma teriais importados e por nós transformados em produtos manufatura dos possamos obter do Exterior o preço do nosso trabalho O preço de manufaturados estrangeiros e produtos prontos para o consumo deve ser alto para o consumidor se não pudermos proibir totalmente o consumo de tais bens que esses produtos nunca sejam usados pelas ADAM SMITH 47 98 Ibid v II p 73 categorias mais baixas e mais numerosas da população cujo consumo seria muito maior do que o daqueles poucos que são ricos Devese encorajar a navegação ou o transporte de bens estrangeiros ou do mésticos pois esse é um negócio lucrativo que muitas vezes supera todo o lucro auferido pelo comerciante A navegação serve também à defesa marítima do país É inútil alegar que o luxo e a intemperança são necessários para a riqueza de um Estado já que estimulam todo tipo de trabalho e todas manufaturas pelo fato de gerarem um consumo elevado É claro que não há necessariamente vício em consumir os produtos mais finos ou em usar os artigos manufaturados mais caros desde que isto seja feito por pessoas cuja fortuna o permita de acordo com as suas obrigações E que aconteceria se as pessoas se tornassem mais frugais e se abstivessem mais desse tipo de coisas Poderseia exportar quan tidades maiores desses bens ou artigos mais finos e se isso não fosse possível o trabalho e a riqueza poderiam ser igualmente fomentados através de maior consumo de bens menos caros com efeito aquele que economiza diminuindo os gastos de seu luxo ou esplendor poderia ajudando generosamente a seus amigos e empregando alguns sábios métodos de caridade com os pobres fazer com que outros possam levar um padrão de vida mais elevado e consumir mais do que o que antes era consumido pelo luxo de um A menos portanto que se possa encontrar uma nação em que todos disponham em abundância de todos os bens necessários e convenientes para a vida as pessoas podem sem qualquer luxo consumir o máximo fazendo provisões abundantes para seus filhos praticando a generosidade e a liberalidade com os seme lhantes e pessoas indigentes dignas e compadecendose da desgraça dos pobres99 Sob o título Habilidade Militar e Fortaleza Hutcheson expõe o que posteriormente Adam Smith expôs sob o item Forças Armadas e sua opção a favor de um exército treinado100 No mesmo capítulo Hutcheson tem uma secção com o título mar ginal quais os impostos e tributos a preferir contendo um repúdio à política de taxar somente pela renda Quanto às taxas e impostos destinados a cobrir as despesas pú blicas os mais convenientes são aqueles que incidem em artigos de luxo e esplendor mais do que sobre os incidentes sobre os artigos de necessidade prefirase outrossim taxar os produtos e artigos manu faturados estrangeiros a taxar os produtos e artigos produzidos no país é conveniente também aplicar os impostos que podem ser cobrados com facilidade cujo recolhimento não acarrete muito trabalho dispen dioso Mas acima de tudo devese observar uma justa proporção em relação à riqueza das pessoas em todas as taxas ou impostos que forem recolhidos delas a não ser que se trate de impostos sobre produtos OS ECONOMISTAS 48 99 Ibid v II pp 318321 100 Ibid v I pp 323325 e manufaturados estrangeiros pois esses muitas vezes são necessários para estimular o trabalho no próprio país101 embora não haja despesas públicas Essa proporcionalidade na taxação em relação à riqueza de cada um segundo Hutcheson não pode ser conseguida a não ser fazendo periodicamente uma estimativa da riqueza das famílias pois impostos sobre terra oprimem indevidamente os proprietários de terras com dí vidas e deixam livres os que têm dinheiro enquanto as taxas e impostos são pagos pelo consumidor de sorte que pessoas generosas e hospi taleiras ou pessoas com família numerosa aceitam gentilmente car regar o peso principal ao passo que o miserável e sórdido solitário pouco ou nenhum peso carrega102 De tudo isso resulta com clareza que Smith foi grandemente in fluenciado pelas tradições vigentes em sua cátedra ao escolher seus tópicos de Economia O Dr Scott chama atenção para o curioso fato de que a própria ordem em que os assuntos são tratados no System de Hutcheson é mais ou menos idêntica àquela em que os mesmos assuntos são tratados nas Lectures de Smith103 Somos fortemente ten tados a presumir que quando Smith tinha que preparar às pressas suas aulas para a disciplina de Craigie consultava as anotações feitas nas preleções de seu antigo professor Hutcheson como fizeram antes e depois dele centenas de pessoas na mesma situação e agrupava os assuntos econômicos como uma introdução e continuação das pre leções que trouxera consigo de Edimburgo Hutcheson foi um professor que inspirava os alunos Seu colega Leechman afirma Já que todo ano tinha oportunidade no decurso de suas preleções de explicar a origem do governo e comparar suas diversas formas tomava cuidado especial ao tratar do assunto para inculcar a impor tância da liberdade civil e religiosa para a felicidade humana e já que um ardente amor à liberdade e um zelo viril no sentido de promovêla eram princípios soberanos em seu próprio íntimo sempre insistia lon gamente nisto desenvolvendo o tema com a maior força de argumen tação e veemência persuasiva e tinha tanto sucesso neste ponto im portante que poucos de seus alunos se é que tais havia por mais preconceitos que trouxessem consigo jamais deixavam de simpatizar com os conceitos que ele desposava e defendia quanto a esse ponto104 Meio século mais tarde Adam Smith referindose à cadeira de Filosofia de Glasgow dizia que ela era um cargo ao qual a habilidade e as virtudes do inesquecível Dr Hutcheson tinham conferido um al tíssimo grau de prestígio105 Todavia se temos razões para crer que Adam Smith foi influen ADAM SMITH 49 101 Ibid v II pp 340341 102 Ibid v I pp 341342 103 SCOTT W R Francis Hutcheson pp 232235 104 LEECHMAN Prefácio In HUTCHESON System of Moral Philosophy pp XXXV XXXVI 105 RAE Life of Adam Smith p 411 ciado por Hutcheson em sua orientação geral para o liberalismo não parece haver motivos para atribuir à influência de Hutcheson a con vicção sobre o caráter benéfico do interesse próprio que permeia sua obra A Riqueza das Nações e desde então constituiu um ponto de partida para a pesquisa econômica Como demonstram algumas das passagens por nós citadas Hutcheson era um mercantilista e todo o ensinamento econômico que se encontra em seu System é desprezível em confronto com as vigorosas preleções de Smith sobre os preços baixos ou a abundância com as suas denúncias tantas vezes repetidas contra o absurdo de teses correntes e contra os regulamentos per niciosos decorrentes desses erros Vinte anos após assistir às preleções de Hutcheson Adam Smith o criticou expressamente por dar muito pouco valor ao amor próprio No capítulo da Teoria Sobre os Sentimentos Morais relativo aos sistemas filosóficos para os quais a virtude consiste na benevolência afirma que segundo Hutcheson só é benevolência aquilo que imprime a uma ação o caráter de virtude a ação mais benevolente seria aquela que visa ao bem do maior número de pessoas e o amor próprio princípio que jamais poderia ser virtuoso embora inocente quando não tem outro efeito senão o de fazer o indivíduo cuidar de sua própria felicidade Esse sistema afável um sistema que tem uma tendência peculiar a alimentar e reforçar no coração humano a mais nobre e a mais agradável das afeições humanas tem para Smith o defeito de não explicar suficientemente donde vem a nossa aprovação das virtudes inferiores da prudência vigilância circunspec ção temperança constância firmeza Também no tocante à nossa própria felicidade e interesse par ticular prossegue ele em muitas ocasiões deparase com princípios de ação altamente elogiáveis Geralmente se supõe que os hábitos de economia laboriosidade discrição atenção e aplicação do pensamento são cultivados por motivos de interesse próprio e ao mesmo tempo afirmase que são qualidades altamente apreciáveis que merecem a estima e aprovação de todos Desaprovase universalmente o descuido e falta de economia não porém como procedentes de uma falta de benevolência mas de uma falta de atenção adequada aos objetos do interesse próprio106 Adam Smith manifestamente acreditava que o sistema de Hut cheson não dava o devido lugar ao interesse próprio Não foi Hutcheson que inspirou sua observação de que não é da benevolência do açou gueiro do fabricante de cerveja ou do padeiro que esperamos nosso jantar mas da consideração que eles têm pelo seu próprio interesse107 De Hutcheson Smith pode ter haurido um amor geral à liberdade mas de onde hauriu a convicção de que o interesse próprio contribui para beneficiar toda a comunidade econômica Naturalmente pode ter formado essa convicção por si mesmo sem jamais ter ouvido outra OS ECONOMISTAS 50 106 Moral Sentiments 1759 pp 464466 107 The Wealth of Nations Ed Cannan 1976 v I p 18 preleção ou ter lido outro livro após deixar de ser aluno de Hutcheson Mas parece provável mais do que isso não podemos afirmar com segurança que foi ajudado pelo estudo de Mandeville escritor ao qual não têm feito suficiente justiça os historiadores da Economia embora McCulloch faça uma alusão favorável sobre o assunto em sua Literature of Political Economy No capítulo de Moral Sentiments que segue ao que contém a crítica de Hutcheson Smith trata dos Sistemas Licenciosos Os fenômenos que se observam na natureza humana diz ele os quais à primeira vista parecem favorecer tais sistemas foram levemente esboçados com a elegância e delicada precisão do Duque de Rochefaucault e posteriormente mais plenamente descritos pela eloqüência viva e cheia de humor embora rude e rústica do Dr Mandeville108 Mandeville afirma Smith atribui todos os atos elogiáveis a um amor ao elogio e ao aplauso ou à vaidade e não contente com isso procura salientar a imperfeição da virtude humana sob muitos outros aspectos Sempre que em nossa reserva com respeito ao prazer não cor responder à abstinência mais ascética ele a considera como luxúria e sensualidade grosseiras Segundo ele é luxúria tudo o que vai além daquilo que é absolutamente necessário para a subsistência da natureza humana de sorte que há vício mesmo no uso de uma camisa limpa ou de uma moradia conveniente109 Todavia na opinião de Smith Mandeville incorreu na grande falácia de apresentar toda paixão como totalmente viciada em qualquer grau e direção Assim é que trata como vaidade tudo o que tenha qualquer refe rência àquilo que são ou devem ser os sentimentos dos outros e é através desse sofisma que afirma sua conclusão favorita de que os vícios privados são benefícios públicos Se o amor pela magnificência um gosto pelas artes elegantes e pelos requintes da vida humana por tudo aquilo que é agradável no vestir na mobília nos pertences pela arquitetura estatuária pintura e música deve ser considerado como luxúria sensualidade e os tentação mesmo naqueles que pela sua situação podem permitirse isso sem nenhum inconveniente é certo que a luxúria sensualidade e osten tação representam benefícios públicos pois sem as qualidades que ele considera adequado designar com tais termos vergonhosos as artes e ofícios que produzem objetos finos nunca seriam estimulados e deveriam fenecer por falta de utilização110 Tal é concluiu Smith o sistema do Dr Mandeville que já chegou a provocar tanto rebuliço no mundo Por mais destrutivo que pareça esse sistema pensa Smith nunca teria conseguido imporse a tantas pessoas nem despertar alarme tão generalizado entre os que ADAM SMITH 51 108 Moral Sentiments 1759 p 474 109 Ibid p 483 110 Ibid p 485 gostam de princípios melhores se sob algum aspecto não tivesse algo de verdadeiro111 A obra de Mandeville consistia em sua origem simplesmente em um poema de 400 linhas com o título A Colmeia Resmunguenta ou os Velhacos Virando Honestos poesia esta que segundo o próprio Mandeville foi publicada por volta de 1705112 em forma de um panfleto de seis pence Reimprimiua em 1714 anexandolhe uma quantidade muito maior de prosa sob o título de A Fábula das Abelhas ou seja Vícios Privados Benefícios Públicos com um Ensaio Sobre Caridade e Escolas de Caridade e uma Investigação sobre a Natureza da Socie dade Em 1729 acrescentoulhe uma segunda parte quase tão extensa como a primeira consistindo em um diálogo sobre o assunto Descre vese A Colmeia Resmunguenta que na realidade é uma sociedade humana em grande prosperidade estado esse que perdura enquanto prosperam os vícios Os piores de toda a multidão fizeram algo para o bem comum Esse era o ofício do Estado o qual mantinha o todo do qual dada parte se queixava Isso como harmonia musical fazia com que todos os que brigavam entre si concordassem no essencial Partidos frontalmente opostos ajudamse mutuamente como se fosse por despeito E a temperança com sobriedade estão a serviço da embriaguez e da glutoneria A raiz do mal a avareza esse vício condenável mau e pernicioso servia como escravo à prodigalidade esse pecado nobre ao passo que a luxúria proporcionava emprego a um milhão de pobres e o orgulho odioso dava emprego a outro milhão A própria inveja e a vaidade estavam a serviço da laboriosidade sua insensatez encantadora sua leviandade no comer nas mobílias e no vestir esse vício estranho e ridículo era a verdadeira roda que movimentava o comércio Suas leis e roupas eram igualmente objetos mutáveis pois o que um dia considerouse bom em meio ano tornouse um crime Entretanto embora alterando assim suas leis ainda encontrando e corrigindo falhas OS ECONOMISTAS 52 111 Moral sentiments p 487 112 Fable of the Bees 1714 Prefácio pela inconstância corrigiram faltas que nenhuma prudência podia prever Assim o vício nutria a inventividade que se juntava ao tempo e ao trabalho Tivessem as conveniências da vida alçado Seus prazeres reais confortos e vagares a alturas que tais os muito pobres melhor viveriam que os ricos outrora e nada mais a acrescentar113 Mas as abelhas resmungavam até que Júpiter furioso jurou que li bertaria a colmeia da fraude O enxame tornouse virtuoso frugal e honesto e a partir dali o comércio foi à ruína por cessarem os gastos Ao final da Investigação Sobre a Natureza da Sociedade o autor resume assim sua conclusão Depois disto orgulhome em ter demonstrado que os fundamen tos da sociedade não são as qualidades amigas e as afeições delicadas que são naturais ao homem nem as virtudes reais que o homem é capaz de adquirir pela razão e pela abnegação ao contrário aquilo que no mundo chamamos de mal quer se trate do moral ou do natural é o grande princípio que nos torna criaturas sociáveis a base sólida a vida e o esteio de todo o comércio e de todas as profissões sem exceção é nisso que devemos procurar a verdadeira origem de todas as artes e ciências e no momento em que o mal cessar a sociedade necessariamente estará arruinada se não totalmente dissolvida114 Em uma carta ao London Journal de 10 de agosto de 1723 que reimprimiu na edição de 1724 Mandeville defendeu essa passagem com vigor contra uma crítica hostil Se dizia ele estivesse es crevendo para ser entendido pelas inteligências mais mesquinhas teria explicado que toda carência é um mal que da multiplicidade dessas carências dependem todos esses serviços mútuos que os membros individuais de uma sociedade prestam um ao outro e que conseqüentemente quanto maior é a variedade de carências tanto maior é o número de indivíduos que podem encontrar seu interesse particular em trabalhar para o bem dos outros e unidos compor um só corpo115 Se levarmos em conta a crítica de Smith a Hutcheson e Mande ville acrescentando capítulos de Moral Sentiments e além disso re cordarmos que quase certamente ele deve ter conhecido a Fábula das Abelhas ao assistir às preleções de Hutcheson ou pouco depois é difícil não suspeitar que foi Mandeville quem primeiro o fez entender que não é da benevolência do açougueiro do fabricante de cerveja ou do padeiro que esperamos nosso jantar mas da consideração deles pelo ADAM SMITH 53 113 pp 1113 ed de 1705 114 pp 427428 2ª ed 1723 115 pp 465 ed de 1724 seu interesse próprio Considerando a palavra vício como um erro em lugar de amorpróprio Adam Smith poderia ter repetido cordialmente as já citadas linhas de Mandeville Assim o vício alimentava a inventividade a qual se associava à folga e ao trabalho Tivesse as conveniências da vida alçado Seus prazeres reais confortos e vagares a alturas que tais os muito pobres viveriam melhor que os ricos outrora Smith pôs versos maus em prosa e acrescentou algo do amor hutchesoniano à liberdade ao propor o que é realmente o texto da parte polêmica de Riqueza das Nações O esforço natural de cada indivíduo no sentido de melhorar sua própria condição quando sofrido para exercerse com liberdade e segu rança é um princípio tão poderoso que ele é capaz sozinho e sem qualquer ajuda não somente de levar a sociedade à riqueza e à prosperidade mas de superar centenas de obstáculos impertinentes com os quais a insensatez das leis humanas muitas vezes obstacula seus atos116 A experiência mostra que uma crença generalizada no caráter benéfico da força econômica do egoísmo nem sempre é suficiente para fazer de uma pessoa mesmo dotada de inteligência acima da média um livrecambista Conseqüentemente seria precipitado supor que o ceticismo de Smith face ao sistema mercantil era simplesmente o produto natural de sua crença geral na liberdade econômica As citações que Dugald Stewart traz de seu manuscrito de 1755 nada contêm que mostre que ele desprezasse a doutrina antes de deixar Edimburgo e nos primeiros anos de sua estadia em Glasgow Parece muito provável que a referência das Lectures aos ensaios de Hume que mostram o absurdo dessas e outras doutrinas semelhantes117 deve ser considerada como um reconhecimento obrigacional e que portanto foi Hume com seus Political Discourses sobre o dinheiro e a balança comercial de 1752 quem primeiro abriu os olhos de Adam Smith para esse assunto Essa probabilidade é levemente reforçada pelo fato de que nas Lectures as falácias mercantis no tocante à balança comercial eram expostas no contexto de Dinheiro como nos Discourses de Hume ao invés de serem expostas no lugar que teriam ocupado se Smith tivesse seguido a ordem de Hutcheson ou as tivesse colocado entre as causas do pro gresso lento da opulência Além disso talvez não seja mera coinci dência que embora tanto Hume em seus Discourses de 1752 como Smith nas preleções datadas de dez anos mais tarde rejeitem total mente o objetivo de garantir uma balança comercial favorável Hume continuava a crer na utilidade do protecionismo para as indústrias do OS ECONOMISTAS 54 116 The Wealth of Nations Ed Cannan 1976 v II p 49 117 Lectures p 197 País e também Smith como se conta fez concessões apreciáveis a essa teoria118 Seria inútil levar aqui mais adiante a investigação sobre a origem das teses de Adam Smith Talvez já a tenhamos levado muito longe No decurso de A Riqueza das Nações Smith cita realmente com seu próprio nome ou o de seus autores quase cem livros Um estudo atento das notas à presente edição convencerá o leitor de que embora algumas delas sejam citações de segunda mão o número realmente utilizado foi muito maior Geralmente Smith extrai muito pouco de cada autor citado às vezes somente um fato frase ou opinião individual de sorte que poucos autores haverá que mais do que Smith mereçam a censura de haver saqueado a obra de outros Na realidade esta acu sação nunca lhe foi feita com seriedade exceto em relação às Réflexions de Turgot e nesse caso concreto jamais se conseguiu apresentar sequer um mínimo de evidência que mostre haver Smith jamais usado ou mesmo visto o livro em questão A Riqueza das Nações não foi uma obra escrita com pressa como se o autor tivesse ainda vivas no cérebro as impressões hauridas de leituras recentes A redação da obra engloba no mínimo os 27 anos que vão desde 1749 até 1776 Durante esse período muitas idéias e concepções econômicas cruzaram e recruzaram muitas vezes o Canal da Mancha e seria inútil e até mesmo demons tração de inveja e hostilidade disputar sobre a parcela que cabe à GrãBretanha e à França no progresso efetuado Ir além disso e tentar atribuir a cada autor o mérito a que faz realmente jus é como postarse em uma praia e discutir se foi a esta ou àquela onda que mais se deveu a maré alta Pode parecer que uma onda teve o mérito de varrer para longe o primeiro castelo de areia de uma criança e uma outra onda pode evidentemente varrer o segundo castelinho de areia Mas os dois castelos teriam sido inundados da mesma forma e quase ao mesmo tempo em um dia perfeitamente tranqüilo com a mesma eficiência ADAM SMITH 55 118 Supra pp XXV XXVIII Aliás antes de publicar a 2ª edição de seus Discourses Hume escreveu a Adam Smith solicitando sugestões Que Smith não fez nenhuma observação sobre a passagem a favor do protecionismo contida no discourse sobre balanço de paga mentos parece poderse inferir do fato de a referida passagem ter permanecido inalterada Ver HUME Essays Green Grose v I pp 59 343 e 344 A RIQUEZA DAS NAÇÕES Investigação Sobre sua Natureza e suas Causas INTRODUÇÃO E PLANO DA OBRA O trabalho anual de cada nação constitui o fundo que original mente lhe fornece todos os bens necessários e os confortos materiais que consome anualmente O mencionado fundo consiste sempre na produção imediata do referido trabalho ou naquilo que com essa pro dução é comprado de outras nações Conforme portanto essa produção ou o que com ela se compra estiver numa proporção maior ou menor em relação ao número dos que a consumirão a nação será mais ou menos bem suprida de todos os bens necessários e os confortos de que tem necessidade Essa proporção deve em cada nação ser regulada ou determinada por duas circunstâncias diferentes primeiro pela habilidade destreza e bom senso com os quais seu trabalho for geralmente executado em segundo lugar pela proporção entre o número dos que executam tra balho útil e o dos que não executam tal trabalho Qualquer que seja o solo o clima ou a extensão do território de uma determinada nação a abundância ou escassez do montante anual de bens de que disporá nessa situação específica dependerá necessariamente das duas circuns tâncias que acabamos de mencionar Por outro lado a abundância ou escassez de bens de que a nação disporá parece depender mais da primeira das duas circunstâncias mencionadas do que da segunda Entre as nações selvagens de caça dores e pescadores cada indivíduo capacitado para o trabalho ocupase mais ou menos com um trabalho útil procurando obter da melhor maneira que pode os bens necessários e os confortos materiais para si mesmo ou para os membros de sua família ou tribo que são muito velhos ou muito jovens ou doentes demais para ir à caça e à pesca Todavia tais nações sofrem tanta pobreza e miséria que somente por falta de bens freqüentemente são reduzidas ou pelos menos pensam estar reduzidas à necessidade de às vezes eliminar e às vezes aban donar suas crianças seus velhos e as pessoas que sofrem de doenças prolongadas as quais perecem de fome ou são devoradas por animais selvagens Ao contrário entre nações civilizadas e prósperas embora grande parte dos cidadãos não trabalhe muitos deles com efeito con somem a produção correspondente a 10 ou até 100 vezes a que é con sumida pela maior parte dos que trabalham a produção resultante 59 de todo o trabalho da sociedade é tão grande que todos dispõem muitas vezes de suprimento abundante e um trabalhador mesmo o mais pobre e de baixa posição se for frugal e laborioso pode desfrutar de uma porção maior de bens necessários e confortos materiais do que aquilo que qualquer selvagem pode adquirir As causas desse aprimoramento nas forças produtivas do traba lho e a ordem segundo a qual sua produção é naturalmente distribuída entre as diferentes classes e condições de membros da sociedade cons tituem o objeto do Livro Primeiro desta obra Qualquer que seja a situação real da habilidade destreza e bom senso com os quais o trabalho é executado em uma nação a abundância ou escassez de seu suprimento anual depende necessariamente en quanto durar esse estado de coisas da proporção entre o número dos que anualmente executam um trabalho útil e o daqueles que não exe cutam tal trabalho O número dos que executam trabalho útil e pro dutivo como se verá mais adiante em toda parte está em proporção com a quantidade do capital empregado para darlhes trabalho e com a maneira específica de empregar esse capital Eis por que o Livro Segundo desta obra tratará da natureza do capital da maneira como ele pode ser gradualmente acumulado e das quantidades diferentes de trabalho que o capital põe em movimento de acordo com as diferentes maneiras como é empregado As nações razoavelmente desenvolvidas no tocante à habilidade destreza e bom senso com os quais o trabalho é executado têm adotado planos muito diferentes na gestão ou direção geral do referido trabalho sendo que esses planos diversos nem sempre têm favorecido de maneira igual a grandeza de sua produção A política de algumas nações in centivou extraordinariamente a indústria119 do campo ao passo que a de outras estimulou mais a indústria das cidades Dificilmente existe uma nação que tenha adotado a mesma política em relação a cada tipo de indústria Desde a queda do Império Romano a política da Europa tem favorecido as artes e ofícios as manufaturas e o comércio indústria das cidades mais do que a agricultura indústria do campo O Livro Terceiro expõe as circunstâncias que parecem ter introduzido e estabelecido essa política Embora esses planos diferentes talvez tenham sido de início in troduzidos pelos interesses particulares e preconceitos de classes es pecíficas de pessoas sem nenhuma consideração ou previsão das suas conseqüências para o bemestar da sociedade não obstante isso deram origem a concepções ou teorias de Economia Política muito diferentes entre si algumas delas enaltecem a importância da atividade OS ECONOMISTAS 60 119 A palavra indústria à época de Adam Smith designava todo tipo de atividade econômica inclusive a agrícola só mais tarde adquirindo o significado restrito que hoje lhe é atribuído Quando se trata da atividade designada atualmente por indústria de transformação aparece muitas vezes nesta obra a palavra manufature e suas derivadas traduzida literalmente com a conotação da época N do E das cidades outras encarecem a importância da do campo Essas teorias tiveram uma influência considerável não somente sobre as teses dos eruditos ou pesquisadores mas também sobre a gestão pública dos príncipes e governantes dos Estados No Livro Quarto procurei expli car da maneira mais completa e clara que pude essas diferentes teo rias bem como os efeitos principais que produziram nas diversas épocas e nações O objetivo desses quatro primeiros Livros é explicar em que con sistiu a receita ou renda do conjunto do povo ou qual foi a natureza desses fundos que em épocas e nações diferentes asseguraram seu consumo anual O quinto e último Livro trata da receita do soberano ou Commonwealth Neste Livro procurei mostrar primeiro quais são as despesas necessárias do soberano ou Commonwealth quais dessas despesas devem ser cobertas pela contribuição geral de toda a sociedade e quais delas devem ser cobertas somente pela contribuição de alguma parcela específica da população ou por alguns dos seus membros específicos em segundo lugar procurei expor quais são os diversos métodos pelos quais a sociedade inteira pode ser obrigada a contribuir para cobrir as despesas a cargo da sociedade toda e quais são as principais vantagens e inconveniências de cada um desses mé todos em terceiro e último lugar quais são as razões e causas que induziram quase todos os governos modernos a hipotecar uma parte dessa receita ou a contrair dívidas e quais têm sido os efeitos dessas dívidas sobre a riqueza real a produção anual da terra e do trabalho da sociedade ADAM SMITH 61 LIVRO PRIMEIRO As Causas do Aprimoramento das Forças Produtivas do Trabalho e a Ordem Segundo a qual sua Produção é Naturalmente Distribuída Entre as Diversas Categorias do Povo CAPÍTULO I A Divisão do Trabalho O maior aprimoramento das forças produtivas do trabalho e a maior parte da habilidade destreza e bom senso com os quais o trabalho é em toda parte dirigido ou executado parecem ter sido resultados da divisão do trabalho Compreenderemos mais facilmente os efeitos produzidos pela di visão do trabalho na economia geral da sociedade se considerarmos de que maneira essa divisão do trabalho opera em algumas manufa turas específicas É comum supor que a divisão do trabalho atinge o grau máximo em algumas manufaturas muito pequenas não talvez no sentido de que nessas a divisão do trabalho seja maior do que em outras de maior importância acontece porém que nessas manufaturas menores destinadas a suprir as pequenas necessidades de um número pequeno de pessoas o número total de trabalhadores é necessariamente menor e os trabalhadores empregados em cada setor de trabalho mui tas vezes podem ser reunidos no mesmo local de trabalho e colocados imediatamente sob a perspectiva do espectador Ao contrário nas gran des manufaturas destinadas a suprir as grandes necessidades de todo o povo cada setor do trabalho emprega um número tão grande de operários que é impossível reunilos todos no mesmo local de trabalho Raramente podemos em um só momento observar mais do que os ope rários ocupados em um único setor Embora portanto nessas manufaturas maiores o trabalho possa ser dividido em um número de partes muito maior do que nas manufaturas menores a divisão do trabalho não é tão óbvia de imediato e por isso tem sido menos observada Tomemos pois um exemplo tirado de uma manufatura muito pequena mas na qual a divisão do trabalho muitas vezes tem sido notada a fabricação de alfinetes Um operário não treinado para essa atividade que a divisão do trabalho transformou em uma indústria específica nem familiarizado com a utilização das máquinas ali em pregadas cuja invenção provavelmente também se deveu à mesma 65 divisão do trabalho dificilmente poderia talvez fabricar um único al finete em um dia empenhando o máximo de trabalho de qualquer forma certamente não conseguirá fabricar vinte Entretanto da forma como essa atividade é hoje executada não somente o trabalho todo constitui uma indústria específica mas ele está dividido em uma série de setores dos quais por sua vez a maior parte também constitui provavelmente um ofício especial Um operário desenrola o arame um outro o endireita um terceiro o corta um quarto faz as pontas um quinto o afia nas pontas para a colocação da cabeça do alfinete para fazer uma cabeça de alfinete requeremse 3 ou 4 operações diferentes montar a cabeça já é uma atividade diferente e alvejar os alfinetes é outra a própria embalagem dos alfinetes também constitui uma ati vidade independente Assim a importante atividade de fabricar um alfinete está dividida em aproximadamente 18 operações distintas as quais em algumas manufaturas são executadas por pessoas diferentes ao passo que em outras o mesmo operário às vezes executa 2 ou 3 delas Vi uma pequena manufatura desse tipo com apenas 10 empre gados e na qual alguns desses executavam 2 ou 3 operações diferentes Mas embora não fossem muito hábeis e portanto não estivessem par ticularmente treinados para o uso das máquinas conseguiam quando se esforçavam fabricar em torno de 12 libras de alfinetes por dia Ora 1 libra contém mais do que 4 mil alfinetes de tamanho médio Por conseguinte essas 10 pessoas conseguiam produzir entre elas mais do que 48 mil alfinetes por dia Assim já que cada pessoa conseguia fazer 110 de 48 mil alfinetes por dia podese considerar que cada uma produzia 4 800 alfinetes diariamente Se porém tivessem trabalhado independentemente um do outro e sem que nenhum deles tivesse sido treinado para esse ramo de atividade certamente cada um deles não teria conseguido fabricar 20 alfinetes por dia e talvez nem mesmo 1 ou seja com certeza não conseguiria produzir a 240ª parte e talvez nem mesmo a 4 800ª parte daquilo que hoje são capazes de produzir em virtude de uma adequada divisão do trabalho e combinação de suas diferentes operações Em qualquer outro ofício e manufatura os efeitos da divisão do trabalho são semelhantes aos que se verificam nessa fábrica insigni ficante embora em muitas delas o trabalho não possa ser tão subdi vidido nem reduzido a uma simplicidade tão grande de operações A divisão do trabalho na medida em que pode ser introduzida gera em cada ofício um aumento proporcional das forças produtivas do trabalho A diferenciação das ocupações e empregos parece haverse efetuado em decorrência dessa vantagem Essa diferenciação aliás geralmente atinge o máximo nos países que se caracterizam pelo mais alto grau da evolução no tocante ao trabalho e aprimoramento o que em uma sociedade em estágio primitivo é o trabalho de uma única pessoa é o de várias em uma sociedade mais evoluída Em toda sociedade de senvolvida o agricultor geralmente é apenas agricultor e o operário de indústria somente isso Também o trabalho que é necessário para OS ECONOMISTAS 66 fabricar um produto completo quase sempre é dividido entre grande número de operários Quantas são as atividades e empregos em cada setor da manufatura do linho e da lã desde os cultivadores até os branqueadores e os polidores do linho ou os tingidores e preparadores do tecido A natureza da agricultura não comporta tantas subdivisões do trabalho nem uma diferenciação tão grande de uma atividade para outra quanto ocorre nas manufaturas É impossível separar com tanta nitidez a atividade do pastoreador da do cultivador de trigo quanto a atividade do carpinteiro geralmente se diferencia da do ferreiro Quase sempre o fiandeiro é uma pessoa o tecelão outra ao passo que o arador o gradador o semeador e o que faz a colheita do trigo muitas vezes são a mesma pessoa Já que as oportunidades para esses diversos tipos de trabalho só retornam com as diferentes estações do ano é impossível empregar constantemente um único homem em cada uma delas Essa impossibilidade de fazer uma diferenciação tão completa e plena de todos os diversos setores de trabalho empregados na agri cultura constitui talvez a razão por que o aprimoramento das forças produtivas do trabalho nesse setor nem sempre acompanha os apri moramentos alcançados nas manufaturas As nações mais opulentas geralmente superam todos os seus vi zinhos tanto na agricultura como nas manufaturas geralmente porém distinguemse mais pela superioridade na manufatura do que pela su perioridade na agricultura Suas terras geralmente são mais bem cul tivadas e pelo fato de investirem mais trabalho e mais dinheiro nelas produzem mais em proporção à extensão e à fertilidade natural do solo Entretanto essa superioridade da produção raramente é muito mais do que em proporção à superioridade de trabalho e dispêndio Na agricultura o trabalho do país rico nem sempre é muito mais pro dutivo do que o dos países pobres ou pelo menos nunca é mais pro dutivo na mesma proporção em que o é geralmente nas manufaturas Por conseguinte o trigo do país rico da mesma qualidade nem sempre chega ao mercado com preço mais baixo do que o do país pobre O trigo da Polônia com o mesmo grau de qualidade é tão barato como o da França não obstante a maior riqueza e o grau superior de de senvolvimento da França O trigo da França é nas províncias tritícolas tão bom e freqüentemente quase do mesmo preço que o trigo da In glaterra embora em riqueza e progresso a França talvez seja inferior à Inglaterra As terras destinadas ao cultivo de trigo na Inglaterra são mais bem cultivadas do que as da França e como se afirma as da França são muito mais bem cultivadas que as da Polônia Todavia embora um país pobre não obstante a inferioridade no cultivo das terras possa até certo ponto rivalizar com os países ricos quanto aos baixos preços e à qualidade do trigo jamais poderá enfrentar a com petição no tocante às suas manufaturas ao menos se essas indústrias atenderem às características do solo do clima e da situação do país rico As sedas da França são melhores e mais baratas que as da In glaterra porque a manufatura da seda ao menos atualmente com os ADAM SMITH 67 altos encargos incidentes sobre a importação da seda em estado bruto não é tão adequada para o clima da Inglaterra como o é para o da França Em contrapartida as ferragens de ferro e as lãs rústicas da Inglaterra são de uma superioridade incomparável em relação às da França e também muito mais baratas no mesmo grau de qualidade Na Polônia afirmase não haver praticamente manufatura de espécie alguma excetuadas algumas indústrias caseiras de tipo mais primitivo com as quais nenhum país consegue subsistir Esse grande aumento da quantidade de trabalho que em conseqüên cia da divisão do trabalho o mesmo número de pessoas é capaz de realizar é devido a três circunstâncias distintas em primeiro lugar devido à maior destreza existente em cada trabalhador em segundo à poupança daquele tempo que geralmente seria costume perder ao passar de um tipo de trabalho para outro finalmente à invenção de um grande número de má quinas que facilitam e abreviam o trabalho possibilitando a uma única pessoa fazer o trabalho que de outra forma teria que ser feito por muitas Em primeiro lugar vejamos como o aprimoramento da destreza do operário necessariamente aumenta a quantidade de serviço que ele pode realizar a divisão do trabalho reduzindo a atividade de cada pessoa a alguma operação simples e fazendo dela o único emprego de sua vida necessariamente aumenta muito a destreza do operário Estou certo de que um ferreiro comum que embora acostumado a manejar o martelo nunca fez pregos se em alguma ocasião precisar e tentar fazêlo dificilmente conseguirá ir além de 200 ou 300 pregos por dia aliás de muito má qualidade Um ferreiro que está acostumado a fazer pregos mas cuja única ou principal atividade não tem sido esta ra ramente conseguirá mesmo com o esforço máximo fazer mais do que 800 ou 1 000 pregos por dia Tenho visto porém vários rapazes abaixo dos vinte anos que nunca fizeram outra coisa senão fabricar pregos e que quando se empenhavam a fundo conseguiam fazer cada um deles mais de 2 300 pregos por dia E no entanto fazer pregos não é de forma alguma das operações mais simples A mesma pessoa aciona o fole atiça ou melhora o fogo quando necessário aquece o ferro e forja cada segmento do prego ao forjar a cabeça do prego é obrigada a mudar de ferramentas As diferentes operações em que se subdivide a fabricação de um alfinete ou de um botão metálico são todas elas muito mais simples sendo geralmente muito maior a destreza da pessoa que sempre fez isso na vida A rapidez com a qual são executadas algumas das operações dessas manufaturas supera o que uma pessoa que nunca o presenciou acreditaria possível de ser conseguido pelo trabalho manual Em segundo lugar a vantagem que se aufere economizando o tempo que geralmente se perderia no passar de um tipo de trabalho para o outro é muito maior do que à primeira vista poderíamos ima ginar É impossível passar com muita rapidez de um tipo de trabalho para outro porque este é executado em lugar diferente e com ferra mentas muito diversas Um tecelão do campo que cultiva uma pequena OS ECONOMISTAS 68 propriedade é obrigado a gastar bastante tempo em passar do seu tear para o campo e do campo para o tear Se os dois trabalhos puderem ser executados no mesmo local certamente a perda de tempo é muito menor Mas mesmo nesse caso ela ainda é muito considerável Ge ralmente uma pessoa se desconcerta um pouco ao passar de um tipo de trabalho para outro Ao começar o novo trabalho raramente ela se dedica logo com entusiasmo sua cabeça está em outra como se diz e durante algum tempo ela mais flana do que trabalha seriamente O hábito de vadiar e de aplicarse ao trabalho indolente e descuida damente adquiridos naturalmente e quase necessariamente por todo trabalhador do campo que é obrigado a mudar de trabalho e de ferramentas a cada meia hora e a fazer vinte trabalhos diferentes a cada dia durante a vida toda quase sempre o torna indolente e pre guiçoso além de fazêlo incapaz de aplicarse com intensidade mesmo nas ocasiões de maior urgência Independentemente portanto de sua deficiência no tocante à destreza ou rapidez essa razão é suficiente para reduzir sempre e consideravelmente a quantidade de trabalho que ele é capaz de levar a cabo Em terceiro e último lugar precisamos todos tomar cons ciência de quanto o trabalho é facilitado e abreviado pela utilização de máquinas adequadas É desnecessário citar exemplos Limitarmeei portanto a observar que a invenção de todas essas máquinas que tanto facilitam e abreviam o trabalho parece ter sua origem na divisão do trabalho As pessoas têm muito maior probabilidade de descobrir com maior facilidade e rapidez métodos para atingir um objetivo quando toda a sua atenção está dirigida para esse objeto único do que quando a mente se ocupa com uma grande variedade de coisas Mas em con seqüência da divisão do trabalho toda a atenção de uma pessoa é naturalmente dirigida para um único objeto muito simples Eis por que é natural podermos esperar que uma ou outra das pessoas ocupadas em cada setor de trabalho específico logo acabe descobrindo métodos mais fáceis e mais rápidos de executar seu trabalho específico sempre que a natureza do trabalho comporte tal melhoria Grande parte das máquinas utilizadas nas manufaturas em que o trabalho está mais subdividido constituiu originalmente invenções de operários comuns os quais com naturalidade se preocuparam em concentrar sua atenção na procura de métodos para executar sua função com maior facilidade e rapidez estando cada um deles empregado em alguma operação muito simples Quem quer que esteja habituado a visitar tais manufaturas deve ter visto muitas vezes máquinas excelentes que eram invenção desses operários a fim de facilitar e apressar a sua própria tarefa no trabalho Nas primeiras bombas de incêndio um rapaz estava cons tantemente entretido em abrir e fechar alternadamente a comunicação existente entre a caldeira e o cilindro conforme o pistão subia ou descia Um desses rapazes que gostava de brincar com seus companheiros observou que puxando com um barbante a partir da alavanca da vál vula que abria essa comunicação com um outro componente da má ADAM SMITH 69 quina a válvula poderia abrir e fechar sem ajuda dele deixandoo livre para divertirse com seus colegas Assim um dos maiores aper feiçoamentos introduzidos nessa máquina desde que ela foi inventada foi descoberto por um rapaz que queria pouparse no próprio trabalho Contudo nem todos os aperfeiçoamentos introduzidos em máqui nas representam invenções por parte daqueles que utilizavam essas máquinas Muitos deles foram efetuados pelo engenho dos fabricantes das máquinas quando a fabricação de máquinas passou a constituir uma profissão específica alguns desses aperfeiçoamentos foram obra de pessoas denominadas filósofos ou pesquisadores cujo ofício não é fazer as coisas mas observar cada coisa e que por essa razão muitas vezes são capazes de combinar entre si as forças e poderes dos objetos mais distantes e diferentes Com o progresso da sociedade a filosofia ou pesquisa tornase como qualquer ofício a ocupação principal ou exclusiva de uma categoria específica de pessoas Como qualquer outro ofício também esse está subdividido em grande número de setores ou áreas diferentes cada uma das quais oferece trabalho a uma categoria especial de filósofos e essa subdivisão do trabalho filosófico da mesma forma como em qualquer outra ocupação melhora e aperfeiçoa a des treza e proporciona economia de tempo Cada indivíduo tornase mais hábil em seu setor específico o volume de trabalho produzido é maior aumentando também consideravelmente o cabedal científico É a grande multiplicação das produções de todos os diversos ofí cios multiplicação essa decorrente da divisão do trabalho que gera em uma sociedade bem dirigida aquela riqueza universal que se estende até as camadas mais baixas do povo Cada trabalhador tem para vender uma grande quantidade do seu próprio trabalho além daquela de que ele mesmo necessita e pelo fato de todos os outros trabalhadores estarem exatamente na mesma situação pode ele trocar grande parte de seus próprios bens por uma grande quantidade ou o que é a mesma coisa pelo preço de grande quantidade de bens desses outros Fornecelhes em abundância aquilo de que carecem e estes por sua vez com a mesma abundância lhe fornecem aquilo de que ele necessita assim é que em todas as camadas da sociedade se difunde uma abundância geral de bens Observese a moradia do artesão ou diarista mais comum em um país civilizado e florescente e se notará que é impossível calcular o número de pessoas que contribui com uma parcela ainda que reduzida de seu trabalho para suprir as necessidades deste operário O casaco de lã por exemplo que o trabalhador usa para agasalharse por mais rude que seja é o produto do trabalho conjugado de uma grande multidão de trabalhadores O pastor o selecionador de lã o cardador o tintureiro o fiandeiro o tecelão o pisoeiro o confeccionador de roupas além de muitos outros todos eles precisam contribuir com suas profissões específicas para fabricar esse produto tão comum de uso diário Calculese agora quantos comerciantes e carregadores além dos trabalhadores já citados devem ter contribuído para transportar OS ECONOMISTAS 70 essa matériaprima do local onde trabalham alguns para os locais onde trabalham outros quando muitas vezes as distâncias entre uns e outros são tão grandes Calculese quanto comércio e quanta navegação incluindo aí os construtores de navios os marinheiros produtores de velas e de cordas devem ter sido necessários para juntar os diferentes tipos de drogas ou produtos utilizados para tingir o tecido drogas essas que freqüentemente provêm dos recantos mais longínquos da terra Quão grande é também a variedade de trabalho necessária para produzir as ferramentas do menos categorizado desses operários Sem fazer menção de máquinas tão complexas como o navio ou barco do marujo o moinho do pisoeiro ou o próprio tear do tecelão consideremos apenas que variedades de trabalho são necessárias para fabricar esse dispositivo tão simples que é a tesoura com a qual o pastor tosa a lã das ovelhas O mineiro o construtor do forno destinado a fundir o minério o cortador de madeira o queimador do carvão a ser utilizado na câmara de fusão o oleiro que fabrica tijolos o pedreiro os operários que operam o forno o encarregado da manutenção das máquinas o forjador o ferreiro todos precisam associar suas habilidades profis sionais para poder produzir uma tesoura Se fizéssemos o mesmo exame das diferentes peças de roupa e de mobília usadas pelo operário da tosca camisa de linho que lhe cobre a pele dos sapatos que lhe protegem os pés da cama em que se deita e de todas as diversas peças que compõem a sua mobília e seus pertences do fogão em que prepara os alimentos do carvão que se utiliza para isso escavado das entranhas da terra e trazido até ele talvez através de um longo percurso marítimo e terrestre de todos os outros utensílios de sua cozinha de todos os pertences da sua mesa faca e garfos travessas de barro ou de peltre em que serve as comidas das diferentes mãos que colaboraram no preparo de seu pão e sua cerveja da vidraça que deixa entrar o calor e a luz e afasta o vento e a chuva com todo o conhecimento e arte exigidos para chegar a essa bela e feliz invenção sem a qual as nossas regiões do norte dificilmente teriam podido criar moradias tão confor táveis juntamente com as ferramentas de todos os diversos operários empregados na produção dessas diferentes utilidades Se examinarmos todas essas coisas e considerarmos a grande variedade de trabalhos empregados em cada uma dessas utilidades perceberemos que sem a ajuda e cooperação de muitos milhares não seria possível prover às necessidades nem mesmo de uma pessoa de classe mais baixa de um país civilizado por mais que imaginemos erroneamente é muito pouco e muito simples aquilo de que tais pessoas necessitam Em com paração com o luxo extravagante dos grandes as necessidades e per tences de um operário certamente parecem ser extremamente simples e fáceis e no entanto talvez seja verdade que a diferença de necessi dades de um príncipe europeu e de um camponês trabalhador e frugal nem sempre é muito maior do que a diferença que existe entre as necessidades deste último e as de muitos reis da África que são se nhores absolutos das vidas e das liberdades de 10 mil selvagens nus ADAM SMITH 71 CAPÍTULO II O Princípio que Dá Origem à Divisão do Trabalho Essa divisão do trabalho da qual derivam tantas vantagens não é em sua origem o efeito de uma sabedoria humana qualquer que preveria e visaria esta riqueza geral à qual dá origem Ela é a conseqüência necessária embora muito lenta e gradual de uma certa tendência ou propensão existente na natureza humana que não tem em vista essa utilidade extensa ou seja a propensão a intercambiar permutar ou trocar uma coisa pela outra Não é nossa tarefa investigar aqui se essa propensão é simples mente um dos princípios originais da natureza humana sobre o qual nada mais restaria a dizer ou se como parece mais provável é uma conseqüência necessária das faculdades de raciocinar e falar De qualquer maneira essa propensão encontrase em todos os homens não se encontrando em nenhuma outra raça de animais que não pa recem conhecer nem essa nem qualquer outra espécie de contratos Por vezes temse a impressão de que dois galgos ao irem ao encalço de uma lebre parecem agir de comum acordo Cada um a faz voltarse para seu companheiro ou procura interceptála quando seu compa nheiro a faz voltarse para ele Mas isso não é efeito de algum contrato senão da concorrência casual de seus desejos acerca do mesmo objeto naquele momento específico Ninguém jamais viu um cachorro fazer uma troca justa e deliberada de um osso por outro com um segundo cachorro Ninguém jamais viu um animal dando a entender a outro através de gestos ou gritos naturais isto é meu isto é teu estou disposto a trocar isto por aquilo Quando um animal deseja obter alguma coisa de uma pessoa ou de outro animal não dispõe de outro meio de per suasão a não ser conseguir o favor daqueles de quem necessita ajuda Um filhote acaricia e lisonjeia sua mãe e um spaniel faz um sem número de mesuras e demonstrações para atrair a atenção de seu dono que está jantando quando deseja receber comida Às vezes o homem usa o mesmo estratagema com seus semelhantes e quando não tem 73 outro recurso para induzilos a atenderem a seus desejos tenta por todos os meios servis atingir este objetivo Todavia não terá tempo para fazer isso em todas as ocasiões Numa sociedade civilizada o homem a todo momento necessita da ajuda e cooperação de grandes multidões e sua vida inteira mal seria suficiente para conquistar a amizade de algumas pessoas No caso de quase todas as outras raças de animais cada indivíduo ao atingir a maturidade é totalmente in dependente e em seu estado natural não tem necessidade da ajuda de nenhuma outra criatura vivente O homem entretanto tem neces sidade quase constante da ajuda dos semelhantes e é inútil esperar esta ajuda simplesmente da benevolência alheia Ele terá maior pro babilidade de obter o que quer se conseguir interessar a seu favor a autoestima dos outros mostrandolhes que é vantajoso para eles fa zerlhe ou darlhe aquilo de que ele precisa É isto o que faz toda pessoa que propõe um negócio a outra Dême aquilo que eu quero e você terá isto aqui que você quer esse é o significado de qualquer oferta desse tipo e é dessa forma que obtemos uns dos outros a grande maioria dos serviços de que necessitamos Não é da benevolência do açougueiro do cervejeiro ou do padeiro que esperamos nosso jantar mas da consideração que eles têm pelo seu próprio interesse Dirigi monos não à sua humanidade mas à sua autoestima e nunca lhes falamos das nossas próprias necessidades mas das vantagens que ad virão para eles Ninguém a não ser o mendigo sujeitase a depender sobretudo da benevolência dos semelhantes Mesmo o mendigo não depende inteiramente dessa benevolência Com efeito a caridade de pessoas com boa disposição lhe fornece tudo o de que carece para a subsistência Mas embora esse princípio lhe assegure em última aná lise tudo o que é necessário para a sua subsistência ele não pode garantirlhe isso sempre em determinados momentos em que precisar A maior parte dos desejos ocasionais do mendigo são atendidos da mesma forma que os de outras pessoas através de negociação de per muta ou de compra Com o dinheiro que alguém lhe dá ele compra alimento A roupa velha que um outro lhe dá ele a troca por outras roupas velhas que lhe servem melhor por moradia alimento ou di nheiro com o qual pode comprar alimento roupas ou moradia conforme tiver necessidade Assim como é por negociação por escambo ou por compra que conseguimos uns dos outros a maior parte dos serviços recíprocos de que necessitamos da mesma forma é essa mesma propensão ou ten dência a permutar que originalmente gera a divisão do trabalho Em uma tribo de caçadores ou pastores por exemplo uma determinada pessoa faz arcos e flechas com mais habilidade e rapidez do que qual quer outra Muitas vezes trocálosá com seus companheiros por gado ou por carne de caça considera que dessa forma pode conseguir mais gado e mais carne de caça do que conseguiria se ele mesmo fosse à procura deles no campo Partindo pois da consideração de seu interesse próprio resolve que o fazer arcos e flechas será sua ocupação principal OS ECONOMISTAS 74 tornandose uma espécie de armeiro Um outro é particularmente hábil em fazer o madeiramento e as coberturas de suas pequenas cabanas ou casas removíveis Ele está habituado a ser útil a seus vizinhos dessa forma os quais o remuneram da mesma maneira com gado e carne de caça até que ao final acaba achando interessante dedicarse inteiramente a essa ocupação e tornarse uma espécie de carpinteiro dedicado à construção de casas Da mesma forma um terceiro tornase ferreiro ou apascentador de gado um quarto se faz curtidor ou pre parador de peles ou couros componente primordial da roupa dos sil vícolas E dessa forma a certeza de poder permutar toda a parte ex cedente da produção de seu próprio trabalho que ultrapasse seu con sumo pessoal estimula cada pessoa a dedicarse a uma ocupação es pecífica e a cultivar e aperfeiçoar todo e qualquer talento ou inclinação que possa ter por aquele tipo de ocupação ou negócio Na realidade a diferença de talentos naturais em pessoas dife rentes é muito menor do que pensamos a grande diferença de habi lidade que distingue entre si pessoas de diferentes profissões quando chegam à maturidade em muitos casos não é tanto a causa mas antes o efeito da divisão do trabalho A diferença entre as personalidades mais diferentes entre um filósofo e um carregador comum da rua por exemplo parece não provir tanto da natureza mas antes do hábito do costume da educação ou formação Ao virem ao mundo e durante os seis ou oito primeiros anos de existência talvez fossem muito se melhantes entre si e nem seus pais nem seus companheiros de folguedo eram capazes de perceber nenhuma diferença notável Em torno dessa idade ou logo depois começam a engajarse em ocupações muito di ferentes Começase então a perceber a diferença de talentos sendo que esta diferenciação vaise ampliando gradualmente até que ao final o filósofo dificilmente se disporá a reconhecer qualquer semelhança Mas sem a propensão à barganha ao escambo e à troca cada pessoa precisa ter conseguido para si mesma tudo o que lhe era necessário ou conveniente para a vida que desejava Todos devem ter tido as mesmas obrigações a cumprir e o mesmo trabalho a executar e não pode ter havido uma tal diferença de ocupações que por si fosse sufi ciente para produzir uma diferença tão grande de talentos Assim como é essa propensão que gera essa diferença de talentos tão notável entre pessoas de profissões diferentes da mesma forma é essa mesma propensão que faz com que a diferença seja útil Muitos grupos de animais todos reconhecidamente da mesma espécie trazem de nascença uma diferença de índole muito maior do que aquela que se verifica entre as pessoas anteriormente à aquisição de hábitos e à educação Por natureza a diferença entre um filósofo e um carregador de rua no tocante ao caráter básico e à disposição não representa sequer 50 da diferença que existe entre um mastim e um galgo ou entre um galgo e um spaniel ou entre este último e um cão pastor Entretanto esses tipos de animais embora sendo da mesma espécie dificilmente têm qualquer utilidade uns em relação aos outros A força ADAM SMITH 75 do mastim não se beneficia em nada da velocidade ou rapidez do galgo ou da sagacidade do spaniel ou da docilidade do cão pastor Os efeitos provenientes dessas diferenças de índole e talentos por falta da fa culdade ou propensão à troca não são capazes de formar um patrimônio comum e não contribuem o mínimo para o melhor atendimento das necessidades da espécie Cada animal individualmente continua obri gado a ajudarse e defenderse sozinho não dependendo um do outro não auferindo vantagem alguma da variedade de talentos com a qual a natureza distinguiu seus semelhantes Ao contrário entre os homens os caracteres e as habilidades mais diferentes são úteis uns aos outros as produções diferentes e dos respectivos talentos e habilidades em virtude da capacidade e propensão geral ao intercâmbio ao escambo e à troca são como que somados em um cabedal comum no qual cada um pode comprar qualquer parcela da produção dos talentos dos outros de acordo com suas necessidades OS ECONOMISTAS 76 CAPÍTULO III A Divisão do Trabalho Limitada pela Extensão do Mercado Como é o poder de troca que leva à divisão do trabalho assim a extensão dessa divisão deve sempre ser limitada pela extensão desse poder ou em outros termos pela extensão do mercado Quando o mercado é muito reduzido ninguém pode sentirse estimulado a dedicarse inteira mente a uma ocupação porque não poderá permutar toda a parcela ex cedente de sua produção que ultrapassa seu consumo pessoal pela parcela de produção do trabalho alheio da qual tem necessidade Existem certos tipos de trabalho mesmo da categoria mais baixa que só podem ser executados em uma cidade grande Um carregador por exemplo não consegue encontrar emprego e subsistência em ne nhum outro lugar Uma aldeia é pequena demais para isto é até difícil que uma cidade pequena dotada de um mercado seja suficientemente grande para oferecer ocupação constante para um carregador Nas casas isoladas e nas minúsculas aldeias espalhadas pelas regiões montanho sas da Escócia cada camponês deve ao mesmo tempo ser açougueiro padeiro e fabricante de cerveja de sua própria família Em tais situa ções dificilmente podemos esperar encontrar sequer um ferreiro um carpinteiro ou marceneiro num raio inferior a 30 milhas de um outro profissional da mesma ocupação As famílias espalhadas que vivem a 8 ou 10 milhas de distância uma da outra têm que aprender elas mesmas um grande número de ofícios e trabalhos para os quais se morassem em localidades mais povoadas chamariam os respectivos profissionais Os trabalhadores do campo quase sempre são obrigados a executar eles mesmos todos os diversos tipos de trabalho que têm afinidade tão grande entre si a ponto de poderem lidar com o mesmo tipo de materiais Um carpinteiro do campo faz todo tipo de trabalho com madeira e um ferreiro do campo faz qualquer tipo de serviço com ferro O primeiro é não somente carpinteiro mas também marceneiro e até mesmo entalhador de madeira construtor de carroças fabricante 77 de arados E os trabalhos de um ferreiro no campo são ainda mais variados Seria até impossível haver uma profissão como a do fabricante de pregos nas regiões afastadas e interioranas da Alta Escócia Tal operário produzindo 1000 pregos por dia e com 300 dias de trabalho no ano produzirá 300 mil pregos por ano Acontece que nessa região seria impossível vender 1 000 pregos ou seja a produção de apenas um dia de trabalho Já que o transporte fluvial ou marítimo abre um mercado mais vasto para qualquer tipo de trabalho do que unicamente o transporte terrestre é na costa marítima e ao longo dos rios navegáveis que naturalmente todo tipo de trabalho ou ocupação começa a subdividirse e aprimorarse e somente depois de muito tempo esses aperfeiçoamen tos se estendem ao interior de um país Uma carroça de rodas largas servida por dois homens e puxada por oito cavalos leva aproximada mente seis semanas para transportar de Londres a Edimburgo ida e volta mais ou menos 4 toneladas de mercadoria Mais ou menos no mesmo tempo um barco ou navio tripulado por seis ou oito homens e navegando entre os portos de Londres e Leith muitas vezes transporta ida e volta 200 toneladas de mercadoria Portanto seis ou oito homens por transporte aquático podem levar e trazer no mesmo tem po a mesma quantidade de mercadoria entre Londres e Edimburgo que cinqüenta carroças de rodas largas servidas por 100 homens e puxadas por 400 cavalos Para 200 toneladas de mercadorias portanto transportadas por terra de Londres para Edimburgo é necessário pagar a manutenção de 100 homens durante três semanas e o desgaste e a mobilização de 400 cavalos mais o de 50 carroças de rodas largas Ao contrário essa mesma quantidade de mercadorias se transportada por hidrovia será onerada apenas pela manutenção de 6 ou 8 homens e pelo desgaste e movimentação de um navio ou barco com carga de 200 toneladas além do valor do risco maior ou seja a diferença de seguro entre esses dois sistemas de transporte Se portanto entre essas duas localidades não houvesse outra possibilidade de comunicação senão por terra e já que não se poderia transportar entre as duas cidades ne nhuma outra mercadoria a não ser aquela cujo preço fosse bem elevado em proporção com seu peso só poderia haver uma pequena parte da quele comércio que atualmente existe entre as duas cidades e por conseguinte elas só poderiam dar uma pequena parte do estímulo que atualmente dão uma à outra Entre as regiões distantes da terra seria pequena ou até nula a possibilidade de comércio Que mercadorias poderiam por exemplo comportar o preço do transporte terrestre entre Londres e Calcutá Ou se houvesse alguma mercadoria tão preciosa que pudesse comportar um transporte tão dispendioso com que segu rança se efetuaria tal transporte passando por territórios habitados por tantas nações ainda em estado de barbárie E no entanto existe atualmente entre Londres e Calcutá um comércio considerável in tercambiando seus mercados Londres e Calcutá estimulam muito o trabalho e a produção entre si OS ECONOMISTAS 78 Se tais são portanto as vantagens do transporte fluvial ou ma rítimo é natural que os primeiros aperfeiçoamentos das artes e da manufatura se operem lá onde essa circunstância abrir mercado do mundo inteiro para a produção de cada tipo de profissão e que esses aperfeiçoamentos levem muito tempo para estenderse ao interior do país O interior do país pode durante muito tempo não ter nenhum outro mercado para a maior parte de suas mercadorias a não ser a região circunjacente que o separa da costa marítima e dos grandes rios navegáveis Por conseguinte a extensão de seu mercado deverá durante muito tempo ser proporcional à riqueza e à reduzida densidade demográfica daquela região e conseqüentemente seu aprimoramento sempre deverá vir depois do aprimoramento da região Em nossas co lônias norteamericanas as plantações sempre acompanharam a costa marítima ou as margens dos rios navegáveis e dificilmente se distan ciaram muito dessas vias de transporte Segundo a História bem documentada as primeiras nações a serem civilizadas foram obviamente as localizadas ao redor da costa do Mediterrâneo Esse mar o maior braço de mar que se conhece no mundo por não ter marés e conseqüentemente não apresentar outras ondas senão as provocadas pelo vento devido à lisura de sua superfície à multidão de suas ilhas e à proximidade de suas praias vizinhas demonstrouse extremamente favorável a uma navegação mundial incipiente épocas em que os homens por ignorarem ainda a bússola tinham receio de afastarse da costa e devido ao primitivismo da construção naval receavam exporse às ondas turbulentas do oceano No mundo antigo passar além das colunas de Hércules isto é além do estreito de Gibraltar foi considerado por muito tempo como uma façanha naval altamente perigosa e quase miraculosa Muito tempo decorreu até que os próprios fenícios e cartagineses os mais hábeis navegadores e construtores navais dos tempos antigos tentassem essa façanha e durante muito tempo foram eles os únicos que assumiram tal risco Dentre todos os países localizados na costa do Mediterrâneo o Egito parece ter sido o primeiro no qual a agricultura ou as manufaturas foram praticadas e puderam acusar um grau considerável de aperfei çoamento Em parte alguma o alto Egito dista mais do que algumas milhas do rio Nilo e no baixo Egito o Nilo se ramifica em uma mul tiplicidade de canais que com alguma habilidade parecem ter asse gurado uma comunicação fluvial não somente entre todas as grandes cidades mas também entre todas as aldeias de maior envergadura e até mesmo com muitas propriedades agrícolas do interior mais ou menos da mesma forma como isso ocorre hoje na Holanda em relação aos rios Reno e Mosa A extensão e a facilidade dessa navegação interna constituiu provavelmente uma das causas primordiais do antigo pro gresso e aprimoramento do Egito Os aperfeiçoamentos na agricultura e nas manufaturas parecem ter sido muito antigos também nas províncias de Bengala localizadas ADAM SMITH 79 nas Índias Orientais e em algumas das províncias orientais da China embora em nosso continente não disponhamos de fontes históricas au tênticas que documentem com certeza essa antigüidade Em Bengala o Ganges e vários outros grandes rios formam grande número de canais navegáveis da mesma forma que o Nilo no Egito Também nas pro víncias orientais da China vários rios grandes formam com seus di versos afluentes uma multidão de canais a comunicação entre esses canais fez com que surgisse uma navegação interna muito mais extensa do que a assegurada pelo Nilo ou pelo Ganges ou talvez até pelos dois juntos É notável que nem os antigos egípcios nem os indianos e chineses da Antigüidade estimularam o comércio externo e portanto parecem ter auferido sua grande riqueza de navegação puramente interna Em contrapartida todas as regiões do interior da África e toda a parte da Ásia localizada a uma distância maior ao norte dos mares Euxino e Cáspio a antiga Cítia a Tartária e a Sibéria modernas em todas as épocas ao que parece permaneceram no estado de barbárie que ainda hoje as caracteriza O mar da Tartária é o oceano gelado que não permite navegação e embora alguns dos maiores rios do mundo percorram essa região a distância entre uns e outros é excessivamente grande para permitir comunicação e comércio ao longo da maior parte de sua extensão Na África não existe nenhuma dessas grandes artérias como são o mar Báltico e o mar Adriático na Europa o Mediterrâneo e o Euxino na Europa e na Ásia e os golfos da Arábia Pérsia Índia Bengala e Sião na Ásia sendo portanto impossível es tender o comércio a essas distantes plagas do interior da África por outro lado os grandes rios da África são excessivamente distantes entre si para permitirem uma navegação de maior porte Além disso nunca pode ser muito considerável o comércio que uma nação pode manter através de um rio que não se ramifique em muitos afluentes ou canais e que percorre território estrangeiro antes de desembocar no mar isso porque a nação estrangeira pela qual passa a parte do rio que desemboca no mar pode a qualquer momento obstruir a co municação entre o país vizinho e o mar A navegação do Danúbio é de muito pouca utilidade para os Estados da Baviera a Áustria e a Hungria em comparação com o que seria se algum desses países pos suísse todo o percurso do Danúbio até ele desembocar no mar Negro OS ECONOMISTAS 80 CAPÍTULO IV A Origem e o uso do Dinheiro Uma vez plenamente estabelecida a divisão do trabalho é muito reduzida a parcela de necessidades humanas que pode ser atendida pela produção individual do próprio trabalhador A grande maioria de suas necessidades ele a satisfaz permutando aquela parcela do produto de seu trabalho que ultrapassa o seu próprio consumo por aquelas parcelas da produção alheia de que tiver necessidade Assim sendo todo homem subsiste por meio da troca tornandose de certo modo comerciante e assim é que a própria sociedade se transforma naquilo que adequadamente se denomina sociedade comercial Quando a divisão do trabalho estava apenas em seu início este poder de troca deve ter deparado freqüentemente com grandes empe cilhos Podemos perfeitamente supor que um indivíduo possua uma mercadoria em quantidade superior àquela de que precisa ao passo que um outro tem menos Conseqüentemente o primeiro estaria dis posto a vender uma parte de seu supérfluo e o segundo a comprála Todavia se esta segunda pessoa não possuir nada daquilo que a pri meira necessita não poderá haver nenhuma troca entre as duas O açougueiro tem consigo mais carne do que a porção de que precisa para seu consumo e o cervejeiro e o padeiro estariam dispostos a comprar uma parte do produto Entretanto não têm nada a oferecer em troca a não ser os produtos diferentes de seu trabalho ou de suas transações comerciais e o açougueiro já tem o pão e a cerveja de que precisa para seu consumo Neste caso não poderá haver nenhuma troca entre eles No caso o açougueiro não pode ser comerciante para o cervejeiro e o padeiro nem estes podem ser clientes do açougueiro e portanto diminui nos três a possibilidade de se ajudarem entre si A fim de evitar o inconveniente de tais situações toda pessoa prudente em qualquer sociedade e em qualquer período da história depois de adotar pela primeira vez a divisão do trabalho deve naturalmente ter se empenhado em conduzir seus negócios de tal forma que a cada 81 momento tivesse consigo além dos produtos diretos de seu próprio trabalho uma certa quantidade de algumas outras mercadorias mercadoria ou mercadorias tais que em seu entender poucas pessoas recusariam receber em troca do produto de seus próprios trabalhos Provavelmente muitas foram as mercadorias sucessivas a serem cogitadas e também utilizadas para esse fim Nas épocas de sociedade primitiva afirmase que o instrumento generalizado para trocas co merciais foi o gado E embora se trate de uma mercadoria que apresenta muitos inconvenientes constatamos que entre os antigos com fre qüência os bens eram avaliados com base no número de cabeças de gado cedidas para comprálos A couraça de Diomedes afirma Homero custou somente 9 bois ao passo que a de Glauco custou 100 bois Na Abissínia afirmase que o instrumento comum para comércio e trocas era o sal em algumas regiões da costa da Índia o instrumento era um determinado tipo de conchas na Terra Nova era o bacalhau seco na Virgínia o fumo em algumas das nossas colônias do oeste da Índia o açúcar em alguns outros países peles ou couros preparados ainda hoje segundo fui informado existe na Escócia uma aldeia em que não é raro um trabalhador levar pregos em vez de dinheiro quando vai ao padeiro ou à cervejaria Entretanto ao que parece em todos os países as pessoas acaba ram sendo levadas por motivos irresistíveis a atribuir essa função de instrumento de troca preferivelmente aos metais acima de qualquer outra mercadoria Os metais apresentam a vantagem de poderem ser conservados sem perder valor com a mesma facilidade que qualquer outra mercadoria por ser difícil encontrar outra que seja menos pe recível não somente isso mas podem ser divididos sem perda alguma em qualquer número de partes já que eventuais fragmentos perdidos podem ser novamente recuperados pela fusão uma característica que nenhuma outra mercadoria de durabilidade igual possui e que mais do que qualquer outra torna os metais aptos como instrumentos para o comércio e a circulação Assim por exemplo a pessoa que de sejasse comprar sal e não tivesse outra coisa para dar em troca senão gado estava obrigada a comprar de uma só vez sal na quantidade correspondente ao valor de um boi inteiro ou de uma ovelha inteira Raramente podia comprar menos pois o que tinha que dar em troca pelo sal dificilmente era passível de divisão sem perda e se desejasse comprar ainda mais pelas mesmas razões estava obrigada a comprar o dobro ou o triplo da quantidade ou seja o valor de 2 ou 3 bois ou 2 ou 3 ovelhas Ao contrário se em lugar de bois ou ovelhas tivesse metais a dar em troca facilmente podia ajustar a quantidade do metal àquela quantidade de mercadorias de que tinha necessidade imediata Diferentes foram os metais utilizados pelas diversas nações para esse fim O ferro era o instrumento comum de comércio entre os es partanos entre os antigos romanos era o cobre o ouro e a prata eram o instrumento de comércio de todas as nações ricas e comerciantes De início parece que os referidos metais eram utilizados para OS ECONOMISTAS 82 esse fim em barras brutas sem gravação e sem cunhagem Assim Plínio120 baseandose em Timeu historiador antigo nos conta que até à época de Sérvio Túlio os romanos não possuíam dinheiro cunhado mas faziam uso das barras de cobre sem gravação quando queriam comprar algo Por conseguinte naquela época essas barras brutas de metal desempenhavam o papel de dinheiro O uso de metais nesse estado apresentava dois inconvenientes muito grandes o da pesagem e o da verificação da autenticidade ou qualidade do metal Em se tratando dos metais preciosos em que uma pequena diferença de quantidade representa uma grande diferença no valor até mesmo o trabalho de pesagem se tiver que ser feito com a exatidão necessária requer no mínimo pesos e balanças muito exatos Particularmente a pesagem do ouro é uma operação precisa e sutil No caso de metais menos nobres evidentemente onde um erro pequeno não teria maiores conseqüências não se exigia uma precisão tão ele vada Entretanto consideraríamos altamente incômodo se toda vez que um indivíduo tivesse que comprar ou vender uma quantidade de mercadoria do valor de um farthing121 fosse obrigado a pesar essa minúscula moeda A operação de verificar a autenticidade ou quilate é ainda mais difícil e mais tediosa e a menos que uma parte do metal seja fundida no cadinho ou crisol utilizando dissolventes adequados é extremamente incerta qualquer conclusão que se possa tirar E no entanto antes de se instituir a moeda cunhada as pessoas que não se submetessem a essa operação difícil e tediosa estavam expostas às fraudes e imposições mais penosas pois em vez de librapeso de prata pura ou de cobre puro estavam sujeitas a receber pelas suas merca dorias uma composição adulterada dos materiais mais ordinários e baratos os quais porém em sua aparência se assemelhavam à prata ou ao cobre Para evitar tais abusos para facilitar as trocas e assim estimular todos os tipos de indústria e comércio considerouse neces sário em todos os países que conheceram um progresso notável fazer uma gravação oficial naquelas determinadas quantidades de metal que se usavam comumente para comprar mercadorias Daí a origem do dinheiro cunhado ou em moeda bem como das assim chamadas casas da moeda instituições essas exatamente da mesma natureza que as do aulnagers oficiais de inspeção e medição de tecido de lã stamp masters desbastadores de tecido de lã e de linho Todas elas têm por objetivo garantir por meio de gravação oficial a quantidade e a qualidade uniforme das diversas mercadorias quando trazidas ao mercado As primeiras gravações oficiais desse tipo impressas nos metais correntes em muitos casos parecem ter tido o objetivo de garantir o que era mais difícil e mais importante de garantir isto é a qualidade ou quilate do metal ao que parece essas gravações se assemelhavam à marca de esterlina que atualmente é impressa em chapas e barras ADAM SMITH 83 120 PLÍNIO História Naturalis Livro Trigésimo Terceiro capítulo III 121 Moeda de cobre equivalente a 14 do pêni inglês que circulou até 1961 N do E de prata ou à marca espanhola que às vezes é impressa em lingotes de ouro e que por incidirem somente em um dos lados da peça e não cobrirem a superfície inteira garantem o quilate mas não o peso do metal Abraão pesou para Efrom os 400 ciclos de prata que tinha con cordado em pagar pelo campo de Macpela Afirmase que eram o di nheiro corrente dos comerciantes de então mas foram recebidos pelo peso e não por número da mesma forma que hoje se recebem lingotes de ouro e barras de prata Pelo que se conta os antigos reis saxônios da Inglaterra recebiam sua remuneração não em dinheiro mas em espécie isto é em alimentos e provisões de todo tipo Foi Guilherme o Conquistador que introduziu o costume de pagálos em dinheiro Entretanto esse dinheiro durante muito tempo era recebido no Te souro Público por peso e não de contado O inconveniente e a dificuldade de pesar esses metais com exa tidão deram origem à instituição de moedas cuja gravação cobrindo inteiramente os dois lados da peça e às vezes também as extremidades visava a garantir não somente o quilate mas também o peso do metal Por isso essas moedas eram recebidas como hoje por unidades dis pensando o incômodo de pesálas Ao que parece as denominações dessas moedas de início expres savam o peso ou quantidade de metal nelas contido Na época de Sérvio Túlio o primeiro a cunhar moedas em Roma o asse ou pondo romano continha 1 libra romana de cobre de boa qualidade Foi dividida da mesma maneira que a libra Troy122 em 12 onças cada uma das quais continha 1 onça real de bom cobre A libra esterlina inglesa ao tempo de Eduardo I continha 1 librapeso peso Tower de prata de um quilate conhecido A libra Tower parece ter sido algo mais do que a libra romana e algo menos que a libra Troyes Esta última só foi introduzida na Casa da Moeda da Inglaterra no 18º ano do reinado de Henrique VIII A libra francesa ao tempo de Carlos Magno continha 1 libra Troyes de prata de um quilate conhecido A feira de Troyes na Cham panha era na época freqüentada por todas as nações da Europa e os pesos e medidas desse famoso mercado eram conhecidos e apreciados por todos A libra escocesa continha desde a época de Alexandre I até a de Robert Bruce 1 libra de prata do mesmo peso e quilate que a libra esterlina inglesa Também os pence ingleses escoceses e franceses continham de início o peso real de 1 pêni de prata a 120 da onça e a 1240 da libra Também o xelim parece ter sido originalmente a denominação de um peso Quando o trigo vale 12 xelins o quarter lêse numa antiga estátua de Henrique II 1 pão branco de 1 farthing deverá pesar 11 xelins e 4 pence Todavia a proporção entre o xelim e o pêni de um lado e o xelim e a libra de outro não parece ter sido tão constante e uniforme como a existente entre o pêni e a libra Durante a primeira geração da linhagem dos reis de França o sou ou xelim OS ECONOMISTAS 84 122 Parte do sistema inglês de pesos originariamente para pedras e metais preciosos recebendo esse nome da cidade francesa de Troyes onde era padrão N do E francês tem em ocasiões diferentes ora 5 ora 20 e ora 40 pence Entre os antigos saxões 1 xelim parece ter tido uma vez somente 5 pence não sendo improvável que tenha variado tanto quanto variava entre seus vizinhos os francos Desde o tempo de Carlos Magno entre os franceses e o de Guilherme o Conquistador entre os ingleses a pro porção entre a libra o xelim e o pêni parece ter sido uniformemente a mesma de hoje embora tenha sido muito diferente o valor de cada uma dessas moedas Com efeito em todos os países do mundo assim acredito a avareza e a injustiça dos príncipes e dos Estados sobe ranos abusando da confiança de seus súditos foram diminuindo gra dualmente a quantidade real de metal que originalmente continham as moedas O asse romano nos últimos anos da República foi reduzido 124 de seu valor original e ao invés de pesar 1 libra acabou pesando apenas 12 onça A libra e o pêni ingleses atuais contêm apenas em torno de 13 a libra e o pêni escocês apenas 136 e a libra e o pêni franceses apenas 166 de seu valor original Aparentemente mediante essas operações os príncipes e os Estados soberanos foram capazes de pagar suas dívidas e cumprir seus compromissos com uma quantidade de prata menor do que teria sido necessária em caso de não se alterarem os valores das moedas digo apenas aparentemente pois seus credores foram realmente fraudados de uma parte do que lhes era realmente devido Permitiuse a todos os demais credores dentro do país usarem do mesmo privilégio podendo eles pagar o mesmo montante nominal da moeda nova e desvalorizada qualquer que tivesse sido a quantidade que tivessem tomado de empréstimo em moeda velha Por conseguinte tais operações sempre se têm demonstrado favoráveis aos devedores e danosas para os credores e às vezes provocaram uma revolução maior e mais generalizada nas fortunas de pessoas privadas do que a que poderia ter sido gerada por uma grande calamidade pública Foi dessa maneira que em todas as nações civilizadas o dinheiro se transformou no instrumento universal de comércio através do qual são compradas e vendidas ou trocadas entre si mercadorias de todos os tipos Passarei agora a examinar quais são as normas que naturalmente as pessoas observam ao trocar suas mercadorias por dinheiro ou por outras mercadorias Essas regras determinam o que se pode denominar valor relativo ou valor de troca dos bens Importa observar que a palavra VALOR tem dois significados às vezes designa a utilidade de um determinado objeto e outras vezes o poder de compra que o referido objeto possui em relação a outras mercadorias O primeiro pode chamarse valor de uso e o segundo valor de troca As coisas que têm o mais alto valor de uso freqüen temente têm pouco ou nenhum valor de troca viceversa os bens que têm o mais alto valor de troca muitas vezes têm pouco ou nenhum valor de uso Nada é mais útil que a água e no entanto dificilmente se comprará alguma coisa com ela ou seja dificilmente se conseguirá trocar água por alguma outra coisa Ao contrário um diamante difi ADAM SMITH 85 cilmente possui algum valor de uso mas por ele se pode muitas vezes trocar uma quantidade muito grande de outros bens A fim de investigar os princípios que regulam o valor de troca das mercadorias procurarei mostrar Primeiro qual é o critério ou medida real desse valor de troca ou seja em que consiste o preço real de todas as mercadorias Em segundo lugar quais são as diferentes partes ou componentes que constituem esse preço real Finalmente quais são as diversas circunstâncias que por vezes fazem subir alguns desses componentes ou todos eles acima do natural ou normal e às vezes os fazem descer abaixo desse nível ou seja quais são as causas que às vezes impedem o preço de mercado isto é o preço efetivo das mercadorias de coincidir exatamente com o que se pode chamar de preço natural Nos três capítulos subseqüentes procurarei expor da maneira mais completa e clara que estiver ao meu alcance os três itens que acabei de citar Para isso desafio seriamente tanto a paciência quanto a atenção do leitor sua paciência pois examinarei um assunto que talvez possa parecer desnecessariamente tedioso em alguns pontos sua atenção para compreender aquilo que mesmo depois da explicação completa que procurarei dar talvez possa ainda parece algo obscuro Estou sempre disposto a correr um certo risco de ser tedioso visando à certeza de estar sendo claro e após fazer tudo o que puder para ser claro mesmo assim poderá parecer que resta alguma obscuridade sobre um assunto que aliás é por sua própria natureza extremamente abstrato OS ECONOMISTAS 86 CAPÍTULO V O Preço Real e o Preço Nominal das Mercadorias ou seu Preço em Trabalho e seu Preço em Dinheiro Todo homem é rico ou pobre de acordo com o grau em que consegue desfrutar das coisas necessárias das coisas convenientes e dos prazeres da vida Todavia uma vez implantada plenamente a di visão do trabalho são muito poucas as necessidades que o homem consegue atender com o produto de seu próprio trabalho A maior parte delas deverá ser atendida com o produto do trabalho de outros e o homem será então rico ou pobre conforme a quantidade de serviço alheio que está em condições de encomendar ou comprar Portanto o valor de qualquer mercadoria para a pessoa que a possui mas não tenciona usála ou consumila ela própria senão trocála por outros bens é igual à quantidade de trabalho que essa mercadoria lhe dá condições de comprar ou comandar Conseqüentemente o trabalho é a medida real do valor de troca de todas as mercadorias O preço real de cada coisa ou seja o que ela custa à pessoa que deseja adquirila é o trabalho e o incômodo que custa a sua aquisição O valor real de cada coisa para a pessoa que a adquiriu e deseja vendêla ou trocála por qualquer outra coisa é o trabalho e o incômodo que a pessoa pode poupar a si mesma e pode impor a outros O que é comprado com dinheiro ou com bens é adquirido pelo trabalho tanto quanto aquilo que adquirimos com o nosso próprio trabalho Aque le dinheiro ou aqueles bens na realidade nos poupam este trabalho Eles contêm o valor de uma certa quantidade de trabalho que permu tamos por aquilo que na ocasião supomos conter o valor de uma quan tidade igual O trabalho foi o primeiro preço o dinheiro de compra original que foi pago por todas as coisas Não foi por ouro ou por prata mas pelo trabalho que foi originalmente comprada toda a riqueza do mundo e o valor dessa riqueza para aqueles que a possuem e desejam 87 trocála por novos produtos é exatamente igual à quantidade de tra balho que essa riqueza lhes dá condições de comprar ou comandar Riqueza é poder como diz Hobbes Mas a pessoa que adquire ou herda uma grande fortuna não necessariamente adquire ou herda com isto qualquer poder político seja civil ou militar Possivelmente sua fortuna pode darlhe os meios para adquirir esses dois poderes mas a simples posse da fortuna não lhe assegurará nenhum desses dois poderes O poder que a posse dessa fortuna lhe assegura de forma imediata e direta é o poder de compra um certo comando sobre todo o trabalho ou sobre todo o produto do trabalho que está então no mercado Sua fortuna é maior ou menor exatamente na proporção da extensão desse poder ou seja de acordo com a quantidade de trabalho alheio ou o que é a mesma coisa do produto do trabalho alheio que esse poder lhe dá condições de comprar ou comandar O valor de troca de cada coisa será sempre exatamente igual à extensão desse poder que essa coisa traz para o seu proprietário Entretanto embora o trabalho seja a medida real do valor de troca de todas as mercadorias não é essa a medida pela qual geralmente se avalia o valor das mercadorias Muitas vezes é difícil determinar com certeza a proporção entre duas quantidades diferentes de trabalho Não será sempre só o tempo gasto em dois tipos diferentes de trabalho que determinará essa proporção Devese levar em conta também os graus diferentes de dificuldade e de engenho empregados nos respec tivos trabalhos Pode haver mais trabalho em uma tarefa dura de uma hora do que em duas horas de trabalho fácil como pode haver mais trabalho em uma hora de aplicação a uma ocupação que custa dez anos de trabalho para aprender do que em um trabalho de um mês em uma ocupação comum e de fácil aprendizado Ora não é fácil en contrar um critério exato para medir a dificuldade ou o engenho exigidos por um determinado trabalho Efetivamente ao permutar entre si pro dutos diferentes de tipos diferentes de trabalho costumase considerar uma certa margem para os dois fatores Essa porém é ajustada não por medição exata mas pela pechincha ou regateio do mercado de acordo com aquele tipo de igualdade aproximativa que embora não exata é suficiente para a vida diária normal Além disso é mais freqüente trocar uma mercadoria por outras mercadorias e portanto comprálas do que por trabalho Por conseguinte é mais natural estimar seu valor de troca pela quantidade de alguma outra mercadoria do que com base no trabalho que ela pode comprar Aliás a maior parte das pessoas tem mais facilidade em entender o que significa uma quantidade de uma mercadoria es pecífica do que o significado de uma quantidade de trabalho Com efeito a primeira é um objeto plenamente palpável ao passo que a segunda é uma noção abstrata que embora possamos tornála sufi cientemente inteligível não é basicamente tão natural e tão óbvia Acontece porém que quando cessa o comércio mediante troca de bens e o dinheiro se torna o instrumento comum é mais freqüente OS ECONOMISTAS 88 trocar cada mercadoria específica por dinheiro do que por qualquer outro bem Raramente o açougueiro leva suas carnes de boi ou de carneiro ao padeiro ou ao cervejeiro para trocálas por pão ou por cerveja o que faz é levar as carnes ao mercado onde as troca por dinheiro e depois troca esse dinheiro por pão ou cerveja A quantidade de dinheiro que recebe pelas carnes determina também a quantidade de pão e de cerveja que poderá comprar depois É pois mais natural e mais óbvio para ele estimar o valor das carnes pela quantidade de dinheiro a mercadoria pela qual as troca direta e imediatamente do que pela quantidade de pão e cerveja as mercadorias pelas quais ele pode trocar as carnes somente por meio de uma outra mer cadoria o dinheiro para ele é mais fácil e mais óbvio dizer que suas carnes valem 3 pence ou 4 pence por librapeso do que dizer que valem 3 ou 4 libraspeso de pão ou 3 ou 4 quarters de cerveja Ocorre portanto que o valor de troca das mercadorias é mais freqüentemente estimulado pela quantidade de dinheiro do que pela quantidade de trabalho ou pela quantidade de alguma outra mercadoria que se pode adquirir em troca da referida mercadoria Entretanto o ouro e a prata como qualquer outra mercadoria também variam em seu valor são ora mais baratos ora mais caros e ora são mais fáceis de comprar ora mais difíceis A quantidade de trabalho que uma quantidade específica de ouro e prata pode comprar ou comandar ou seja a quantidade de outros bens pela qual pode ser trocada depende sempre da abundância ou escassez das minas que eventualmente se conhecem por ocasião das trocas No século XVI a descoberta das ricas minas da América reduziu o valor do ouro e da prata na Europa a aproximadamente 13 do valor que possuíam antes Conseqüentemente como custava menos trabalho trazer esses metais das minas para o mercado assim quando eram colocados no mercado era menor a quantidade de trabalho que permitiam comprar ou co mandar Ora essa revolução no valor do ouro e da prata embora talvez a maior ocorrida não é absolutamente a única registrada pela história Assim como uma medida de quantidade como é o pé natural a braça ou a mancheia que varia continuamente em sua própria quantidade jamais pode ser uma medida exata do valor de outras coisas da mesma forma uma mercadoria cujo valor muda constantemente jamais pode ser uma medida exata do valor de outras mercadorias Podese dizer que quantidades iguais de trabalho têm valor igual para o trabalhador sempre e em toda parte Estando o trabalhador em seu estado normal de saúde vigor e disposição e no grau normal de sua habilidade e destreza ele deverá aplicar sempre o mesmo contingente de seu de sembaraço de sua liberdade e de sua felicidade O preço que ele paga deve ser sempre o mesmo qualquer que seja a quantidade de bens que receba em troca de seu trabalho Quanto a esses bens a quantidade que terá condições de comprar será ora maior ora menor mas é o valor desses bens que varia e não o valor do trabalho que os compra Sempre e em toda parte valeu este princípio é caro o que é difícil de ADAM SMITH 89 se conseguir ou aquilo que custa muito trabalho para adquirir e é barato aquilo que pode ser conseguido facilmente ou com muito pouco trabalho Por conseguinte somente o trabalho pelo fato de nunca variar em seu valor constitui o padrão último e real com base no qual se pode sempre e em toda parte estimar e comparar o valor de todas as mercadorias O trabalho é o preço real das mercadorias o dinheiro é apenas o preço nominal delas Contudo embora quantidades iguais de trabalho sempre tenham valor igual para o trabalhador para a pessoa que as emprega essas quantidades de trabalho apresentam valor ora maior ora menor o empregador compra o trabalho do operário ora por uma quantidade maior de bens ora por uma quantidade menor E para o empregador o preço do trabalho parece variar da mesma forma como muda o valor de todas as outras coisas Em um caso o trabalho alheio se apresenta ao empregador como caro em outro barato Na realidade porém são os bens que num caso são baratos em outro caros Em tal acepção popular portanto podese dizer que o trabalho da mesma forma que as mercadorias tem um preço real e um preço nominal Podese dizer que seu preço real consiste na quantidade de bens necessários e convenientes que se permuta em troca dele e que seu preço nominal consiste na quantidade de dinheiro O trabalhador é rico ou pobre é bem ou mal remunerado em proporção ao preço real do seu trabalho e não em proporção ao respectivo preço nominal A distinção entre o valor real e o valor nominal do preço das mercadorias e do trabalho não é simplesmente assunto para especu lação filosófica mas às vezes pode ser de grande utilidade na prática O mesmo preço real é sempre do mesmo valor todavia devido às variações ocorrentes no valor do ouro e da prata o mesmo preço nominal às vezes tem valores muito diferentes Eis por que quando se vende uma propriedade territorial com uma reserva de renda perpétua se quisermos que esta renda conserve sempre o mesmo valor é importante para a família em cujo favor se faz a reserva que a renda não consista em determinada soma de dinheiro Se tal ocorresse o valor dessa renda estaria sujeito a variações de dois tipos primeiro às decorrentes das quantidades diferentes de ouro e prata que em tempos diferentes estão contidos na moeda da mesma denominação em segundo lugar estaria exposta às variações derivantes dos valores diferentes de quantidades iguais de ouro e prata em momentos diferentes Os príncipes e os Estados soberanos freqüentemente imaginaram ter interesse temporário em diminuir a quantidade de metal puro con tido em suas moedas mas raramente imaginaram ter interesse em aumentála Eis por que a quantidade de metal contido nas moedas de todo o mundo acredito tem diminuído continuamente e di ficilmente aumentou em algum caso Tais variações portanto tendem quase sempre a reduzir o valor de uma renda deixada em dinheiro A descoberta das minas da América diminuiu o valor do ouro e da prata na Europa Costumase supor embora sem proválo com OS ECONOMISTAS 90 certeza em meu modo de ver que esta redução ainda continua gradualmente e assim continuará por muito tempo Com base nessa hipótese portanto tais variações têm mais probabilidade de diminuir do que de aumentar o valor de uma renda deixada em dinheiro mesmo estipulandose que ela seja paga não nessa ou naquela quantidade de dinheiro em moeda desta ou daquela denominação em tantas ou tantas libras esterlinas por exemplo mas em tantas ou tantas onças de prata pura ou de prata de um determinado padrão As rendas que foram reservadas em trigo conservaram muito melhor seu valor do que as reservadas em dinheiro mesmo que não tenham ocorrido mudanças na denominação do dinheiro No 18º ano do reinado de Isabel foi decretado que 13 da renda de todos os arrendamentos de terras feitos por Universidades fosse reservado em trigo e que essa renda fosse paga em espécie ou em conformidade com os preços correntes do trigo no mercado público mais próximo Ora segundo o Dr Blasckstone o dinheiro proveniente dessa renda em trigo embora originalmente cons tituísse apenas 13 do total na época atual representa quase o dobro do que provém dos outros 23 Segundo esse cálculo portanto as antigas rendas em dinheiro das Universidades ficaram reduzidas mais ou menos a 14 de seu antigo valor ou seja valem hoje apenas pouco mais de 14 da quantidade de trigo que valiam antigamente Ora desde o reinado de Filipe e de Maria a denominação do dinheiro inglês sofreu pouca ou ne nhuma alteração sendo que o mesmo número de libras xelins e pence tem contido quase a mesma quantidade de prata pura Logo essa redução do valor das rendas em dinheiro das Universidades se deve inteiramente à diminuição do valor da prata Quando a diminuição do valor da prata se associa à redução da quantidade de prata contida na moeda da mesma denominação a perda é muitas vezes ainda maior Na Escócia onde a denominação da moeda passou por mudanças muito maiores do que na Inglaterra e na França onde as mudanças foram ainda maiores do que na Escócia algumas rendas antigas originariamente de grande valor foram dessa forma reduzidas praticamente a zero Quantidades iguais de trabalho são compradas com maior pre cisão em um futuro distante com quantidades iguais de trigo a subsistência do trabalhador do que com quantidades iguais de ouro ou de prata ou talvez com quantidades iguais de qualquer outra mer cadoria Portanto em um futuro distante quantidades iguais de trigo terão o mesmo valor real com maior precisão possibilitando a quem as possui comprar com maior precisão a mesma quantidade de trabalho alheio Terão esse mesmo valor digo com maior exatidão do que quan tidades iguais de praticamente qualquer outra mercadoria já que mes mo em se tratando de trigo quantidades iguais não terão exatamente o mesmo valor que terão quantidades iguais de trabalho A subsistência do trabalhador ou o preço real do trabalho como procurarei demonstrar adiante varia muito de acordo com as ocasiões sendo mais liberal em uma sociedade que progride na riqueza do que em uma que está parada ADAM SMITH 91 e mais liberal em uma sociedade que está parada do que em uma que está regredindo Entretanto qualquer outra mercadoria em qualquer momento específico comprará uma quantidade maior ou menor de tra balho em proporção à quantidade de subsistência que ela pode comprar na referida ocasião Por conseguinte uma renda reservada em trigo está sujeita apenas às variações da quantidade de trabalho que pode ser comprada por uma determinada quantidade de trigo Ao contrário uma renda reservada em qualquer outra mercadoria está sujeita não somente às variações da quantidade de trabalho que se pode comprar por uma quantidade específica de trigo mas também às variações da quantidade de trigo que se pode comprar com qualquer quantidade específica da respectiva mercadoria Cumpre porém observar que embora o valor real de uma renda em trigo varie muito menos de um século para outro do que o valor de uma renda em dinheiro ele varia muito mais de um ano para outro O preço do trabalho em dinheiro conforme procurarei demonstrar adiante não flutua de ano para ano com a flutuação do preço do trigo em dinheiro mas parece ajustarse em toda parte não ao preço tem porário ou ocasional do trigo mas ao seu preço médio ou comum Por sua vez o preço médio ou comum do trigo como tentarei igualmente demonstrar mais adiante é regulado pelo valor da prata pela abun dância ou escassez das minas que fornecem este metal ao mercado ou pela quantidade de trabalho que é preciso empregar conseqüen temente pela quantidade de trigo que deverá ser consumida para fazer chegar uma determinada quantidade de prata das minas até o mercado Ora o valor da prata embora por vezes varie muito de um século para outro raramente apresenta grande variação de um ano para outro senão que geralmente continua inalterado ou quase inal terado durante meio século ou até durante um século inteiro Em con seqüência também o preço comum e médio do trigo em dinheiro pode continuar o mesmo ou quase o mesmo durante um período tão longo e juntamente com ele também o preço do trabalho em dinheiro desde que evidentemente a sociedade permaneça sob outros aspectos em condição igual ou que esta pouco se altere Nesse meiotempo o preço temporário ou ocasional do trigo pode muitas vezes em um ano dobrar em relação ao preço do ano anterior ou flutuar entre 25 e 50 xelins o quarter123 Mas quando o trigo estiver a esse preço de 50 xelins o quarter não somente o valor nominal mas também o valor real de uma renda em trigo terá o dobro do valor que tinha quando o quarter de trigo estava a 5 xelins ou seja conseguirá comprar o dobro da quantidade de trabalho ou da maior parte das outras mercadorias em contrapartida o preço do trabalho em dinheiro e juntamente com ele o da maioria das outras coisas continuará inalterado no decurso de todas as flutuações mencionadas OS ECONOMISTAS 92 123 Como aparecerá nas páginas seguintes quarter é uma medida inglesa para cereais equi valente a 14 do quintal ou seja 28 libras N do E Fica pois evidente que o trabalho é a única medida universal e a única medida precisa de valor ou seja o único padrão através do qual podemos comparar os valores de mercadorias diferentes em todos os tempos e em todos os lugares Não se pode estimar o valor real de mercadorias diferentes de um século para outro pelas quantidades de prata pelas quais foram compradas Não podemos estimar esse valor de um ano para outro com base nas quantidades de trigo Pelas quan tidades de trabalho podemos com a máxima exatidão calcular esse valor tanto de um século para outro como de um ano para outro De um século para outro o trigo é uma medida melhor do que a prata pois de século para século quantidades iguais de trigo poderão pagar a mesma quantidade de trabalho com maior precisão do que quanti dades iguais de prata De um ano para outro ao contrário a prata é uma medida melhor já que quantidades iguais de prata podem pagar com maior precisão a mesma quantidade de trabalho Contudo embora ao estabelecer rendas perpétuas ou mesmo no caso de arrendamentos muito longos possa ser útil distinguir entre o preço real e o preço nominal esta distinção não tem utilidade nas tran sações de compra e venda as mais comuns e normais da vida humana No mesmo tempo e no mesmo lugar o preço real e o preço nominal de todas as mercadorias estão exatamente em proporção um com o outro Por exemplo quanto mais ou quanto menos dinheiro se receber por uma mercadoria qualquer no mercado de Londres tanto mais ou tanto menos trabalho se poderá no mesmo tempo e no mesmo lugar comprar ou comandar No mesmo tempo e lugar portanto o dinheiro é a medida exata do valor real de troca de todas as mercadorias Assim é porém somente no mesmo tempo e no mesmo lugar Embora em lugares distantes não haja proporção regular entre o preço real e o preço em dinheiro das mercadorias o comerciante que leva bens de um lugar para outro só precisa considerar o preço em dinheiro ou a diferença entre a quantidade de prata pela qual os compra e aquela pela qual tem probabilidade de vendêlos Meia onça de prata em Cantão na China pode comandar uma quantidade maior de trabalho e de artigos necessários e convenientes para a vida do que 1 onça em Londres Portanto uma mercadoria que se vende por 12 onça de prata em Cantão pode ser lá realmente mais cara de importância real maior para a pessoa que a possui lá do que uma mercadoria que se vende por 12 onça em Londres Se porém um comerciante londrino puder comprar em Cantão por 12 onça de prata uma mercadoria que depois pode vender em Londres por 1 onça ga nhará 100 no negócio exatamente tanto quanto se 1 onça de prata tivesse em Londres exatamente o mesmo valor que em Cantão Não importa para ele se 12 onça de prata em Cantão lhe teria permitido comprar mais trabalho e quantidade maior de artigos necessários ou convenientes para a vida do que uma onça em Londres Uma onça de prata em Londres sempre lhe permitirá comandar o duplo da quanti dade de trabalho e de mercadorias em relação ao que lhe poderia ADAM SMITH 93 permitir 12 onça de prata em Cantão é precisamente isso que o comerciante quer Uma vez que portanto é o preço nominal das coisas ou seja o seu preço em dinheiro que em última análise determina se uma certa compra ou venda é prudente ou imprudente e conseqüentemente é esse o preço que regula quase toda a economia na vida real normal em que entra em jogo o preço não é de admirar que se lhe tenha dispensado muito mais atenção do que ao preço real Em uma obra como esta porém por vezes pode ser útil comparar os valores reais diferentes de uma mercadoria em tempos e lugares diferentes ou seja os diferentes graus de poder sobre o trabalho alheio que a referida mercadoria pode ter dado em ocasiões diferentes àqueles que a possuíam Nesse caso devemos comparar não tanto as diferentes quantidades de prata pelas quais a mercadoria era normalmente ven dida mas antes as diferentes quantidades de trabalho que poderiam ter sido compradas por essas quantidades diferentes de prata Todavia dificilmente se poderá saber com algum grau de precisão os preços correntes do trabalho em tempos e lugares distantes Os do trigo em bora só tenham sido registrados com regularidade em certos lugares geralmente são mais bem conhecidos e foram anotados com maior fre qüência pelos historiadores e outros escritores Geralmente pois temos que contentarnos com esses preços não como se estivessem sempre exatamente na mesma proporção que os preços correntes do trabalho mas como sendo a maior aproximação que geralmente se pode ter em relação a essa proporção Mais adiante terei ocasião de fazer várias comparações desse tipo À medida que avançava a indústria as nações comerciantes consi deraram conveniente cunhar dinheiromoeda em metais diferentes em ouro para pagamentos maiores em prata para compras de valor moderado e em cobre ou outro metal menos nobre para as compras de valor ainda menor Todavia sempre consideraram um desses metais como sendo a medida ou o padrão de valor mais peculiar do que o dos outros dois metais essa preferência parece geralmente haver sido dada àquele metal que havia sido o primeiro a ser usado por essas nações como instrumento de comércio Tendo uma vez começado a utilizar esse metal como seu padrão e o devem ter feito quando não dispunham de outro dinheiro geralmente as nações continuaram a utilizar como dinheiro esse metal mesmo quando a necessidade já não era mais a mesma Pelo que se diz os romanos só possuíam dinheiro em cobre até cinco anos antes da I Guerra Púnica124 quando então começaram pela primeira vez a cunhar moeda em prata Por isso ao que parece o cobre continuou mesmo depois disso a vigorar sempre como a medida de valor na República romana Em Roma todos os cálculos eram feitos ou em asses ou em sestércios e na mesma moeda eram também computadas OS ECONOMISTAS 94 124 PLÍNIO Op cit Livro Trigésimo Terceiro capítulo III todas as propriedades fundiárias Ora o asse sempre foi a denominação de uma moeda de cobre A palavra sestertius significa 2 12 asses Embora portanto originalmente o sestércio fosse uma moeda de prata seu valor era calculado em cobre Em Roma quem possuísse muito dinheiro era mencionado como tendo muito cobre de outras pessoas As nações nórdicas que se estabeleceram sobre as ruínas do Im pério Romano parecem ter adotado desde o início o dinheiro de prata e não ter conhecido moedas de ouro ou de cobre por muito tempo depois Havia moedas de prata na Inglaterra ao tempo dos saxões mas poucas moedas de ouro até à época de Eduardo III e nenhuma moeda de cobre até à de Jaime I da GrãBretanha Na Inglaterra portanto e em todas as outras nações européias modernas pelas mesmas razões como acredito todos os cálculos e a contabilidade são feitos em prata sendo em prata que também se computa geralmente o valor de todos os bens e propriedades Quando queremos expressar o valor da fortuna de alguém raramente mencionamos o número de guinéus o que fazemos é mencionar o número de libras esterlinas que supostamente se daria pela fortuna Inicialmente em todos os países creio um pagamento legal cor rente só podia ser feito na moeda do metal que era particularmente considerado como padrão ou medida de valor Na Inglaterra o ouro não era inicialmente considerado como moeda corrente ainda muito tempo depois de haver moedas de ouro A proporção entre os valores do ouro e da prata não era determinada por lei pública ou por procla mação mas sua fixação era deixada ao encargo do mercado Se um devedor oferecia pagamento em ouro o credor podia simplesmente re cusar este pagamento ou então aceitálo mas o valor era acordado entre as duas partes Atualmente o cobre não é moeda legal a não ser como troco para moedas de prata menores Nessa conjuntura a diferenciação entre o metal que era o padrão e o metal que não o era constituía algo mais que uma distinção nominal No decorrer do tempo e à medida em que as pessoas se fami liarizavam cada vez mais com o uso dos diversos metais em moeda e conseqüentemente também com a proporção existente entre os valores respectivos considerouse conveniente na maioria dos países con forme acredito fixar com segurança essa proporção sancionando por lei por exemplo que 1 guinéu de tal peso e tal quilate equivale a 21 xelins ou seja representa um pagamento legal para um débito desse montante Nessa situação e enquanto durar uma proporção re gulamentada desse tipo a distinção entre o metalpadrão e o metal que não é padrão tornase pouco mais do que uma distinção nominal Todavia se houver qualquer mudança nessa proporção regula mentada novamente a distinção tornase ou ao menos parece tor narse algo mais do que uma distinção puramente nominal Se por exemplo o valor de 1 guinéu regulamentado fosse reduzido para 20 xelins ou subisse para 22 xelins sendo todos os cálculos e a contabi lidade feitos em moedaprata e quase todas as obrigações de débito ADAM SMITH 95 sendo expressas na mesma moeda a maior parte dos pagamentos po deria ser feita com a mesma quantidade de moedaprata que antes todavia seriam necessárias quantidades muito diferentes de moeda ouro uma quantidade maior em um caso e uma quantidade menor no outro O valor da prata variaria menos que o do ouro A prata serviria para medir o ouro mas não viceversa O valor do ouro pare ceria depender da quantidade de prata pela qual seria trocado ao passo que o valor da prata não pareceria depender da quantidade de ouro pela qual seria trocada Essa diferença porém deverseia toda ela ao costume de contabilizar e exprimir o montante de todas as somas grandes e pequenas em moedaprata e não em moedaouro Uma das notas promissórias do Sr Drummond de 25 ou 50 guinéus continuaria a poder ser paga após uma alteração desse tipo com 25 ou 50 guinéus da mesma forma que antes Após tal mudança a nota poderia ser paga com a mesma quantidade de ouro que antes mas com quantidades muito diferentes de prata No pagamento dessa nota o valor de ouro seria menos variável do que o da prata O ouro mediria o valor da prata mas não viceversa No caso de se generalizar o costume de contabilizar e de expressar dessa forma notas promissórias e outras obrigações em dinheiro o ouro e não a prata seria considerado como o metalpadrão para medir o valor Na realidade enquanto perdurar alguma proporção regulamentada entre os respectivos valores dos diferentes metais em dinheiro o valor dos metais mais preciosos determina o valor de todo o dinheiro Doze pence de cobre contêm 12 libra avoirdupoids de cobre não da melhor qualidade o qual antes de ser cunhado raramente vale 7 pence em prata Mas como a regulamentação estabelece que 12 desses pence equi valem a 1 xelim o mercado considera que eles valem 1 xelim podendose a qualquer momento receber por eles 1 xelim Mesmo antes da última reforma da moedaouro da GrãBretanha o ouro ao menos a parte que circulava em Londres e nas vizinhanças em comparação com a maior parte da prata desceu menos abaixo de seu pesopadrão Todavia 21 xelins já desgastados e com a inscrição um tanto apagada eram con siderados como equivalentes a 1 guinéu o qual talvez também já apre sentava certo desgaste mas raramente tão grande como as moedas de xelins As últimas regulamentações talvez levaram a moedaouro o mais próximo de seu pesopadrão que é possível atingir em qualquer nação e a ordem de só receber moedaouro nos locais públicos por peso prova velmente preservará essa garantia enquanto essa ordem for aplicada A moedaprata continua ainda no mesmo estado de desgaste e desvalorização que antes da reforma da moedaouro No mercado porém 21 xelins dessa moedaprata desvalorizada continuam a ser considerados como valendo 1 guinéu dessa moeda de excelente ouro Evidentemente a reforma da moedaouro aumentou o valor da moedaprata que se dá em troca Na Casa da Moeda inglesa 1 librapeso de ouro é cunhada em 44 12 guinéus os quais valendo o guinéu 21 xelins equivalem a 46 OS ECONOMISTAS 96 libras 14 xelins e 6 pence Por conseguinte 1 onça dessa moedaouro vale 3 17 s 10 12 d em prata Na Inglaterra não se paga taxa pela cunhagem razão pela qual quem leva 1 librapeso ou 1 onça de ouropadrão à Casa da Moeda recebe de volta 1 librapeso ou 1 onça de ouro em moeda sem nenhuma dedução Dizse pois que 3 libras esterlinas 17 xelins e 10 12 pence por onça são o preço do ouro na Casa da Moeda da Inglaterra ou seja a quantidade de ouro em moeda que a Casa da Moeda paga pelo ouropadrão em lingote Antes da reforma da moedaouro o preço do ouropadrão em lingote no mercado durante muitos anos esteve acima de 3 18 s às vezes acima de 3 19 s e com muita freqüência acima de 4 libras esterlinas por onça sendo que esse montante no estado de desgaste e desvalorização da moedaouro provavelmente em poucos casos con tinha mais do que 1 onça de ouropadrão Desde a reforma da moe daouro o preço de mercado do ouropadrão em lingote raramente su pera 3 17 s 7 d por onça Antes da reforma da moedaouro o preço de mercado estava sempre mais ou menos acima do preço da Casa da Moeda A partir dessa reforma o preço de mercado esteve constante mente abaixo do preço da Casa da Moeda Mas esse preço de mercado é o mesmo quer seja pago em moeda de ouro ou em moeda de prata Por isso a recente reforma da moedaouro elevou não somente o valor da moedaouro mas também da moedaprata em proporção com o ouro em lingote e provavelmente também em proporção a todas as outras mercadorias embora pelo fato de o preço da maior parte das outras mercadorias ser influenciado por tantas outras causas o au mento do valor da moedaouro ou da moedaprata em proporção com as mercadorias possa não ser tão claro e perceptível Na Casa da Moeda da Inglaterra 1 librapeso de pratapadrão em barras é cunhada em 62 xelins contendo da mesma forma 1 librapeso de pratapadrão Dizse pois que 5 xelins e 2 pence por onça constituem o preço da prata na Casa da Moeda da Inglaterra ou a quantidade da moedaprata que a Casa da Moeda dá em troco de pratapadrão em barras Antes da reforma da moedaouro o preço de mercado da pratapadrão em barras era em ocasiões diferentes 5 xelins e 4 pence 5 xelins e 7 pence e com muita freqüência 5 xelins e 8 pence por onça Todavia 5 xelins e 7 pence parecem ter sido o preço mais comum A partir da reforma da moedaouro o preço de mercado da pratapadrão em barras caiu em certas ocasiões para 5 xelins e 3 pence 5 xelins e 4 pence e 5 xelins e 5 pence por onça sendo que dificilmente ultrapassou alguma vez esse último preço Embora o preço de mercado da pratapadrão em barras tenha caído consideravelmente desde a reforma da moedaouro não baixou tanto como o preço da Casa da Moeda Na proporção entre os diversos metais na moeda inglesa assim como o cobre é cotado muito acima do seu valor real da mesma forma a prata é cotada levemente abaixo do seu valor real No mercado da Europa na moeda francesa e na holandesa por 1 onça de ouro fino se obtêm aproximadamente 14 onças de prata fina Já no dinheiro ADAM SMITH 97 inglês por 1 onça de ouro fino se obtém em torno de 15 onças de prata isto é mais do que vale o ouro na estimativa geral da Europa Mas já que o preço do cobre em barras não é aumentado mesmo na Inglaterra pelo alto preço do cobre em dinheiro inglês o preço da prata em barras não é baixado pelo baixo valor da prata em dinheiro inglês A prata em barras ainda conserva sua proporção adequada com o ouro e pela mesma razão o cobre em barras conserva sua proporção adequada em relação à prata Com a reforma da moedaprata no reinado de Guilherme III o preço da prata em barras ainda continuou algo acima do preço da Casa da Moeda Locke atribuiu esse alto preço à permissão de exportar moedaprata Dizia ele que essa permissão de exportar fez com que a demanda de prata em barras fosse maior que a demanda de prata em moeda Todavia certamente o número de pessoas que desejam moe daprata para os usos comuns de comprar e vender no país certamente é muito superior ao daqueles que querem prata em barras ou para exportar ou para alguma outra finalidade Atualmente existe uma per missão semelhante para exportar ouro em lingote e uma proibição semelhante de exportar ouro em moeda e no entanto o preço do ouro em lingote desceu abaixo do preço da Casa da Moeda Ora no dinheiro inglês a prata estava então como hoje abaixo do preço em proporção com o ouro e o dinheiroouro que na época não parecia necessitar de reforma regulava tanto então como hoje o valor real de todo o dinheiro Já que a reforma da moedaprata não reduziu na época o preço da prata em barras ao preço da Casa da Moeda não é muito provável que uma reforma similar o fizesse hoje Se a moedaprata fosse novamente aproximada ao seu pesopadrão tanto quanto o ouro é provável que 1 guinéu de acordo com a proporção atual pudesse ser trocado por mais prata em dinheiro do que aquilo que o guinéu poderia comprar em barra Contendo a prata seu pleno peso padrão nesse caso haveria lucro em fundila a fim de primeiro vender a barra por moedaouro e depois trocar essa moedaouro por moedaprata a ser fundida da mesma forma Ao que parece o único método de evitar esse inconveniente consiste em fazer alguma alteração na proporção atual Possivelmente o inconveniente seria menor se a moedaprata fosse cotada acima da sua proporção adequada em relação ao ouro na mesma porcentagem em que atualmente está cotada abaixo dele isso desde que ao mesmo tempo se decretasse que a prata não fosse moeda legal para mais do que o câmbio de 1 guinéu da mesma forma como o cobre não é moeda legal para mais do que o câmbio de 1 xelim Nesse caso nenhum credor poderia ser fraudado em conseqüência da alta valorização da prata em dinheiro da mesma forma que atualmente nenhum credor pode ser fraudado em decorrência da alta valorização do cobre Somente os bancos sofreriam com tal regulamentação Quando eles são pressionados por uma corrida às vezes procuram ganhar tempo pagando em 6 pence ao passo que uma tal regulamentação os impediria de utilizar o condenável método de deixar de efetuar imediatamente OS ECONOMISTAS 98 os pagamentos Em conseqüência seriam obrigados a conservar sempre nos cofres uma quantidade de dinheiro disponível maior do que atual mente e embora essa regulamentação constituísse eventualmente um inconveniente considerável para os banqueiros ao mesmo tempo re presentaria uma segurança apreciável para seus credores 3 17 s e 10 12 d preço do ouro na Casa da Moeda certamente não contêm mesmo em nossa excelente moedaouro atual mais do que 1 onça de ouropadrão e poderseia pensar portanto que essa quantia não possa comprar mais ouropadrão em lingotes do que isso Mas o ouro em moeda é mais conveniente do que o ouro em lingote e embora na In glaterra a cunhagem seja livre o ouro que é levado em lingote à Casa da Moeda raramente pode ser restituído em dinheiro ao proprietário antes de algumas semanas e no ritmo atual de operação da Casa da Moeda isso não poderia ocorrer antes de vários meses Essa demora equivale a certa taxa ou imposto fazendo com que o ouro em dinheiro tenha valor algo maior do que uma quantidade igual de ouro em barra Se no sistema monetário inglês a prata fosse cotada de acordo com sua proporção adequada em relação ao ouro o preço da prata em barras provavelmente cairia abaixo do preço da Casa da Moeda mesmo sem nenhuma reforma da moedaprata e até o valor das atuais moedas de prata já tão desgastadas pelo uso seria regulado pelo valor da excelente moedaouro pela qual podem ser cambiadas Provavelmente a introdução de uma pequena taxa cobrada pela cunhagem tanto de ouro como de prata aumentaria ainda mais a supe rioridade desses metais em moeda em relação a uma quantidade igual de cada um desses dois metais em barra Nesse caso a cunhagem au mentaria o valor do metal cunhado em proporção à extensão dessa pequena taxa pela mesma razão que a moda aumenta o valor das baixelas de prata ou ouro em proporção com o preço dessa moda A superioridade da moeda sobre o metal em barras evitaria a fusão das moedas e desesti mularia sua exportação E se por alguma exigência do bemestar público se tornasse necessário exportar as moedas a maior parte delas voltaria logo espontaneamente No exterior essas moedas só poderiam ser ven didas pelo seu peso em barras Em nosso país elas poderiam ser vendidas por mais do que isso Por conseguinte haveria um lucro em reconduzilas ao país Na França impõese uma taxa de aproximadamente 8 na cu nhagem conforme se afirma a moeda francesa quando exportada re gressa novamente ao país espontaneamente As flutuações ocasionais do preço de mercado do ouro e da prata em barras derivam das mesmas causas que as flutuações similares que ocorrem no preço de mercado de todas as outras mercadorias A perda freqüente desses metais devido a acidentes de transporte por mar e terra ao consumo contínuo dos mesmos nas operações de douração e incrustação à confecção de adornos etc ao desgaste das moedas pelo uso freqüente exige em todos os países que não possuem minas próprias uma importação contínua a fim de compensar essas perdas Os impor tadores como aliás todos os comerciantes suponho procuram na ADAM SMITH 99 medida do possível adaptar suas importações à demanda imediata con forme seu cálculo de probabilidade Todavia não obstante todas as cautelas por vezes exageram nas importações por vezes ficam abaixo da demanda real Quando importam mais ouro ou prata do que a demanda exige em vez de assumirem o risco e o incômodo de reexportar o excedente às vezes preferem vender uma parte a preço levemente abaixo do preço normal ou médio Ao contrário quando importam menos do que o desejado pela de manda às vezes conseguem preços superiores aos normais ou médios Mas quando com todas essas flutuações ocasionais o preço de mercado do ouro ou da prata em barras continua durante vários anos consecutivos a man terse constantemente mais ou menos acima ou mais ou menos abaixo do preço da Casa da Moeda podemos estar certos de que essa constante superioridade ou inferioridade é resultante de alguma coisa no tocante ao estado da moeda fator esse que faz com que certa quantidade de moeda equivalha a mais ou a menos do que a quantidade exata de metal em lingote que a moeda deve conter A constância e a firmeza do efeito supõem constância e firmeza proporcionais na causa O dinheiro de qualquer país constitui em qualquer tempo e lugar específico uma medida mais ou menos acurada do valor conforme a moeda corrente compatibilizar mais ou menos exatamente com seu padrão ou seja conforme ela contiver com precisão maior ou menor a quantidade exata de ouro puro ou prata pura que deve conter Se por exemplo na Inglaterra 44 12 guinéus contivessem exatamente 1 librapeso de ouropadrão ou 11 onças de ouro fino e 1 onça de ouroliga a moedaouro na Inglaterra seria uma medida tão precisa do valor efetivo das mercadorias a qualquer tempo e lugar quanto a natureza das coisas permitisse Se ao contrário devido à fricção constante e ao uso 44 12 guinéus geralmente contiverem menos do que 1 librapeso de ouropadrão e a diminuição for maior em algumas peças do que em outras o dinheiro como medida do valor estará sujeito ao mesmo tipo de imprecisão ao qual estão expostos normalmente todos os outros pesos e medidas Já que raramente acontece que as moedas estejam totalmente de acordo com o padrão o comerciante ajusta o preço de suas mercadorias da melhor forma que pode não aos pesos e medidas ideais mas àquilo que na média e baseado na experiência considera serem os preços efetivos Em conseqüência de tal desajuste da moeda ajustase o preço das mercadorias não à quantidade de ouro ou prata puros que a moeda deveria conter mas àquilo que na média e com base na experiência se considera que ela contém efetivamente Cumpre observar que por preço das mercadorias em dinheiro entendo sempre a quantidade de ouro ou prata puros pela qual são vendidas abstraindo totalmente da denominação da moeda Por exem plo considero que 6 xelins e 8 pence na época de Eduardo I são o mesmo preço em dinheiro que 1 libra esterlina no momento atual isto porque os 6 xelins e 8 pence do tempo de Eduardo I continuam sendo na medida em que possamos julgar a mesma quantidade de prata pura de 1 libra esterlina nos dias de hoje OS ECONOMISTAS 100 CAPÍTULO VI Fatores que Compõem o Preço das Mercadorias No estágio antigo e primitivo que precede ao acúmulo de patri mônio ou capital e à apropriação da terra a proporção entre as quan tidades de trabalho necessárias para adquirir os diversos objetos parece ser a única circunstância capaz de fornecer alguma norma ou padrão para trocar esses objetos uns pelos outros Por exemplo se em uma nação de caçadores abater um castor custa duas vezes mais trabalho do que abater um cervo um castor deve ser trocado por ou então vale dois cervos É natural que aquilo que normalmente é o produto do trabalho de dois dias ou de duas horas valha o dobro daquilo que é produto do trabalho de um dia ou uma hora Se um tipo de trabalho for mais duro que o outro naturalmente devese deixar uma margem para essa maior dureza nesse caso o produto de uma hora de trabalho de um tipo freqüentemente pode equivaler ao de duas horas de trabalho de outro Ou então se um tipo de trabalho exige um grau incomum de destreza e engenho a estima que as pessoas têm por esses talentos naturalmente dará ao respectivo produto um valor superior àquele que seria devido ao tempo nele empregado Tais talentos raramente podem ser adquiridos senão mediante longa experiência e o valor superior do seu produto muitas vezes não pode consistir em outra coisa senão numa compensação razoável pelo tempo e trabalho despendidos na aquisição dessas habilidades Em sociedades desenvolvidas essa com pensação pela maior dureza de trabalho ou pela maior habilidade cos tuma ser feita através dos salários pagos pelo trabalho algo semelhante deve ter havido provavelmente nos estágios mais primitivos da civilização Nessa situação todo o produto do trabalho pertence ao traba lhador e a quantidade de trabalho normalmente empregada em ad quirir ou produzir uma mercadoria é a única circunstância capaz de regular ou determinar a quantidade de trabalho que ela normalmente deve comprar comandar ou pela qual deve ser trocada 101 No momento em que o patrimônio ou capital se acumulou nas mãos de pessoas particulares algumas delas naturalmente empregarão esse capital para contratar pessoas laboriosas fornecendolhes maté riasprimas e subsistência a fim de auferir lucro com a venda do tra balho dessas pessoas ou com aquilo que este trabalho acrescenta ao valor desses materiais Ao trocarse o produto acabado por dinheiro ou por trabalho ou por outros bens além do que pode ser suficiente para pagar o preço dos materiais e os salários dos trabalhadores deverá resultar algo para pagar os lucros do empresário pelo seu trabalho e pelo risco que ele assume ao empreender esse negócio Nesse caso o valor que os trabalhadores acrescentam aos materiais desdobrase pois em duas partes ou componentes sendo que a primeira paga os salários dos trabalhadores e a outra os lucros do empresário por todo o capital e os salários que ele adianta no negócio Com efeito o empresário não poderia ter interesse algum em empenhar esses bens se não esperasse da venda do trabalho de seus operários algo mais do que seria o su ficiente para restituirlhe o estoque patrimônio ou capital investido por outro lado o empresário não poderia ter interesse algum em em pregar um patrimônio maior em lugar de um menor caso seus lucros não tivessem alguma proporção com a extensão do patrimônio investido Poderseia talvez pensar que os lucros do patrimônio não passam de uma designação diferente para os salários de um tipo especial de trabalho isto é o trabalho de inspecionar e dirigir a empresa No entanto tratase de duas coisas bem diferentes o lucro é regulado por princípios totalmente distintos não tendo nenhuma proporção com a quantidade a dureza ou o engenho desse suposto trabalho de inspe cionar e dirigir É totalmente regulado pelo valor do capital ou patri mônio empregado sendo o lucro maior ou menor em proporção com a extensão desse patrimônio Suponhamos por exemplo que em deter minada localidade em que o lucro anual normal do patrimônio empe nhado em manufatura é de 10 existam duas manufaturas diferentes que empregam cada uma delas vinte operários recebendo cada um 15 libras esterlinas por ano ou seja tendo cada uma das duas manu faturas uma despesa de 300 libras esterlinas por ano para pagar os operários Suponhamos também que os materiais usados e as maté riasprimas processadas anualmente pela primeira manufatura sejam pouco refinadas e custem apenas 700 libras esterlinas ao passo que as matériasprimas utilizadas pela segunda são mais refinadas e cus tam 7 mil libras esterlinas Nesse caso o capital anual empregado na primeira é de apenas 1 000 libras ao passo que o capital empenhado na segunda será de 7 300 libras esterlinas À taxa de 10 portanto o primeiro empresário esperará um lucro anual aproximado de apenas 100 libras enquanto o segundo esperará um lucro anual de 730 libras esterlinas Todavia embora seus lucros sejam muito diferentes seu trabalho de inspeção e direção pode ser quase ou totalmente igual Em muitas manufaturas grandes esse trabalho de inspeção e direção é confiado a algum funcionário de relevo Seus salários expressam ade OS ECONOMISTAS 102 quadamente o valor desse tipo de trabalho Embora ao empregar esses funcionários geralmente se considere até certo ponto não somente seu trabalho e sua habilidade mas também a confiança que nele se depo sita esses fatores nunca têm uma proporção regular cuja administração eles supervisionam e o proprietário desse capital embora fique assim quase isento desse trabalho continua a esperar que seus lucros man tenham uma proporção regular com seu capital Por conseguinte no preço das mercadorias os lucros do patrimônio ou capital empenhado constituem um componente totalmente distinto dos salários pagos pelo trabalho sendo regulados por princípios bem diferentes Já nessa situação o produto total do trabalho nem sempre per tence ao trabalhador Na maioria dos casos este deve repartilo com o dono do capital que lhe dá emprego Também já não se pode dizer que a quantidade de trabalho normalmente empregada para adquirir ou produzir uma mercadoria seja a única circunstância a determinar a quantidade que ele normalmente pode comprar comandar ou pela qual pode ser trocada É evidente que uma quantidade adicional é devida pelos lucros do capital pois este adiantou os salários e forneceu os materiais para o trabalho dos operários No momento em que toda a terra de um país se tornou proprie dade privada os donos das terras como quaisquer outras pessoas gostam de colher onde nunca semearam exigindo uma renda mesmo pelos produtos naturais da terra A madeira da floresta o capim do campo e todos os frutos da terra os quais quando a terra era comum a todos custavam ao trabalhador apenas o trabalho de apanhálos a partir dessa nova situação têm o seu preço onerado por algo mais inclusive para o trabalhador Ele passa a ter que pagar pela permissão de apanhar esses bens e deve dar ao proprietário da terra uma parte daquilo que o seu trabalho colhe ou produz Essa porção ou o que é a mesma coisa o preço dessa porção constitui a renda da terra cons tituindo no caso da maior parte das mercadorias um terceiro compo nente do preço Importa observar que o valor real dos diversos componentes do preço é medido pela quantidade de trabalho que cada um deles pode comprar ou comandar O trabalho mede o valor não somente daquela parte do preço que se desdobra em trabalho efetivo mas também da quela representada pela renda da terra e daquela que se desdobra no lucro devido ao empresário Em toda sociedade o preço de qualquer mercadoria em última análise se desdobra em um ou outro desses três fatores ou então nos três conjuntamente e em toda sociedade mais evoluída os três com ponentes integram em medida maior ou menor o preço da grande maioria das mercadorias No preço do trigo por exemplo uma parte paga a renda devida ao dono da terra uma outra paga os salários ou manutenção dos tra balhadores e do gado empregado na produção do trigo e a terceira paga o lucro do responsável pela exploração da terra Essas três partes ADAM SMITH 103 perfazem diretamente ou em última análise o preço total do trigo Poderseia talvez pensar que é necessária uma quarta parte para substituir o capital do responsável direto pela exploração da terra ou para compensar o desgaste do gado empregado no cultivo e o desgaste de outros equipamentos agrícolas Todavia devese considerar que o próprio preço e qualquer equipamento ou instrumento agrícola como por exemplo de um cavalo utilizado no trabalho se compõe também ele dos mesmos três itens enumerados a renda da terra na qual o cavalo é criado o trabalho despendido em criálo e cuidar dele e os lucros do responsável pela exploração da terra que adianta tanto a renda da terra como os salários do trabalho Eis por que embora o preço do trigo possa pagar o preço e a manutenção do cavalo o preço total continua a desdobrarse diretamente ou em última análise nos três componentes renda da terra trabalho e lucros No preço da farinha de trigo ou de outras farinhas temos que acrescentar ao preço do trigo os lucros do moleiro e os salários de seus empregados no preço do pão os lucros do padeiro e os salários de seus empregados e no preço de ambos temos que acrescentar o trabalho necessário para transportar o trigo da casa do agricultor para o moinho e do moinho para a padaria juntamente com os lucros daqueles que adiantam os salários correspondentes àquele trabalho O preço do linho em estado bruto desdobrase nos mesmos três componentes que perfazem o preço do trigo No preço do tecido de linho é preciso acrescentar a esse preço os salários do preparador do fiandeiro do tecelão do branqueador etc além dos lucros de seus respectivos empregadores Quanto mais determinada mercadoria sofre uma transformação manufatureira a parte do preço representada pelos salários e pelo lucro se torna maior em comparação com a que consiste na renda da terra Com o progresso da manufatura não somente cresce o volume de lucros mas também cada lucro subseqüente é maior do que o an terior pois o capital do qual provém o lucro deve ser sempre maior Por exemplo o capital que dá emprego aos tecelões deve ser maior do que o capital que dá emprego aos fiandeiros porque esse capital repõe aquele capital com seus lucros como também paga os salários dos tecelões e os lucros sempre devem manter alguma proporção com o capital Nas sociedades mais desenvolvidas porém existem sempre al gumas mercadorias cujo preço se decompõe em apenas dois fatores os salários do trabalho e os lucros do patrimônio ou capital existindo também um número ainda menor de mercadorias em que o preço total consiste unicamente nos salários do trabalho No preço de peixe do mar por exemplo uma parte paga o trabalho dos pescadores e a outra os lucros do capital empregado na pesca É muito raro neste caso que a renda paga pelo arrendamento da terra também seja um com ponente do preço embora isto aconteça às vezes como exporei adiante É diferente o caso da pesca fluvial ao menos na maior parte dos países OS ECONOMISTAS 104 da Europa A pesca de salmão paga uma renda a qual embora no caso não se possa propriamente denominála renda por arrendamento de terra faz parte do preço de um salmão tanto quanto os salários e o lucro Em algumas regiões da Escócia certas pessoas se ocupam com juntar ao longo da praia essas pedrinhas variegadas comumente co nhecidas sob o nome de Scotch Pebbles O preço que o canteiro lhes paga é simplesmente o salário de seu trabalho no caso nem a renda da terra nem o lucro fazem parte do preço Entretanto o preço total de uma mercadoria ainda deve em úl tima análise constar de algum dos três componentes citados ou dos três conjuntamente visto que tudo o que restar desse preço total depois de pagos a renda da terra e o preço de todo o trabalho empregado em obter a matériaprima em fabricar a mercadoria e levála ao mercado necessariamente será o lucro de alguém Assim como o preço ou valor de troca de cada mercadoria espe cífica considerada isoladamente se decompõe em algum dos três itens ou nos três conjuntamente da mesma forma o preço ou valor de troca de todas as mercadorias que constituem a renda anual completa de um país considerandose as mercadorias em seu complexo total deve decomporse nos mesmos três itens devendo esse preço ser divi dido entre os diferentes habitantes do país ou como salários pelo tra balho como lucros do capital investido ou como renda da terra Assim sendo o que é anualmente obtido ou produzido pelo trabalho de cada sociedade ou o que é a mesma coisa o preço total disso é ori ginariamente distribuído entre alguns dos membros da sociedade Sa lários lucro e renda da terra eis as três fontes originais de toda receita ou renda e de todo valor de troca Qualquer outra receita ou renda provém em última análise de um ou de outro desses três fatores Todo aquele que aufere sua renda de um fundo que lhe pertence necessariamente a aufere de seu trabalho de seu patrimônio ou de sua terra A renda auferida do trabalho denominase salário A renda auferida do patrimônio ou capital pela pessoa que o administra ou o emprega chamase lucro A renda auferida por uma pessoa que não emprega ela mesma seu capital mas o empresta a outra denominase juros ou uso do dinheiro É a compensação que o tomador paga a quem empresta pelo lucro que pode auferir fazendo uso do dinheiro Natu ralmente uma parte desse lucro pertence ao tomador que assume o risco e arca com o incômodo de empregar o dinheiro e a outra parte pertence a quem faz o empréstimo proporcionando ao tomador a opor tunidade de auferir seu lucro Os juros do dinheiro são sempre uma renda derivativa a qual se não for paga do lucro auferido do uso do dinheiro deve ser paga de alguma outra fonte de renda a não ser que talvez o tomador seja um esbanjador que contrai uma segunda dívida para pagar os juros da primeira A renda auferida integralmente do arrendamento da terra é denominada renda fundiária pertencendo ao dono da terra A renda do arrendatário provém em parte de seu trabalho e em parte de seu capital Para ele a terra é somente o ADAM SMITH 105 instrumento que lhe permite ganhar os salários de seu trabalho e tirar lucro de seu próprio capital Todas as taxas impostos e toda a renda ou receita fundada neles todos os salários pensões e anuidades de qualquer espécie em última análise provêm de uma ou outra dessas três fontes originais de renda sendo pagos direta ou indiretamente pelos salários do trabalho pelos lucros do capital ou pela renda da terra Quando esses três tipos de renda pertencem a pessoas diferentes são distinguidos prontamente mas quando pertencem os três à mesma pessoa por vezes são confundidos entre si ao menos no linguajar comum Uma pessoa que cultiva uma parte de sua própria terra depois de pagar as despesas do cultivo deve receber tanto a renda que cabe ao proprietário da terra quanto o lucro de quem a explora Tal pessoa propende porém a considerar como lucro os ganhos todos confundindo assim a renda da terra com o lucro ao menos no linguajar comum Estão nessa situação a maioria dos nossos plantadores norteamerica nos e da Índia Ocidental A maior parte deles cultiva sua própria terra razão pela qual raramente ouvimos falar da renda dessas terras mas com freqüência ouvimos falar do lucro que elas produzem É raro os agricultores empregarem um supervisor para dirigir as operações Geralmente eles também trabalham muito com as pró prias mãos cultivando arando passando a grelha etc Por conseguinte o que resta da colheita após paga a renda da terra não somente deve restituirlhes o patrimônio ou capital empregado no cultivo juntamente com seu lucro normal mas deve também pagar os salários que lhes são devidos como trabalhadores e como supervisores E no entanto tudo o que resta após pagar a renda da terra e restituir o capital empregado é denominado lucro Ora evidentemente os salários repre sentam uma parte desse todo Economizando esses salários necessa riamente o arrendatário irá ganhálos Aqui portanto os salários são confundidos com os lucros Um manufator independente que tem capital suficiente tanto para comprar materiais como para manterse até poder levar seu pro duto ao mercado deve ganhar tanto os salários de um trabalhador contratado por um patrão quanto o lucro que o patrão realiza pela venda do produto do trabalhador E no entanto tudo o que esse ma nufator independente ganha é geralmente chamado de lucro também nesse caso os salários são confundidos com o lucro Um horticultor que cultiva pessoalmente sua própria horta de sempenha ao mesmo tempo três funções proprietário da terra res ponsável direto pela exploração da terra e trabalhador Conseqüente mente seu produto deve pagarlhe a renda que cabe ao primeiro o lucro que cabe ao segundo e os salários que cabem ao terceiro No entanto comumente tudo é considerado como proventos de seu trabalho Nesse caso tanto a renda da terra como o lucro são confundidos com os salários Já que em um país evoluído há somente poucas mercadorias cujo valor de troca provém exclusivamente do trabalho sendo que a renda OS ECONOMISTAS 106 da terra e o lucro contribuem em larga escala para perfazer o valor de troca da maior parte das mercadorias a produção do trabalho anual sempre será suficiente para comprar ou comandar uma quantidade de trabalho muito maior do que a que foi empregada para obter preparar e levar essa produção ao mercado Se a sociedade empregasse todo o trabalho que pode comprar anualmente já que a cada ano aumentaria consideravelmente a quantidade de trabalho a produção de cada ano sucessivo teria um valor muito superior ao da produção do ano anterior Entretanto não existe país algum em que toda a produção anual seja empregada na manutenção dos trabalhadores ativos Em toda parte os ociosos consomem grande parte desta produção De acordo pois com as diferentes proporções em que a produção anual é a cada ano dividida entre os ativos e os ociosos o valor comum ou médio dessa produção deverá de um ano para outro aumentar diminuir ou per manecer inalterado ADAM SMITH 107 CAPÍTULO VII O Preço Natural e o Preço de Mercado das Mercadorias Em cada sociedade ou nas suas proximidades existe uma taxa comum ou média para salários e para o lucro em cada emprego dife rente de trabalho ou capital Essa taxa é regulada naturalmente conforme exporei adiante em parte pelas circunstâncias gerais da sociedade sua riqueza ou pobreza sua condição de progresso es tagnação ou declínio e em parte pela natureza específica de cada emprego ou setor de ocupação Existe outrossim em cada sociedade ou nas suas proximidades uma taxa ou média de renda da terra também ela regulada como demons trarei adiante em parte pelas circunstâncias gerais da sociedade ou redondeza na qual a terra está localizada e em parte pela fertilidade natural da terra ou pela fertilidade conseguida artificialmente Essas taxas comuns ou médias podem ser denominadas taxas naturais dos salários do lucro e da renda da terra no tempo e lugar em que comumente vigoram Quando o preço de uma mercadoria não é menor nem maior do que o suficiente para pagar ao mesmo tempo a renda da terra os salários do trabalho e os lucros do patrimônio ou capital empregado em obter preparar e levar a mercadoria ao mercado de acordo com suas taxas naturais a mercadoria é nesse caso vendida pelo que se pode chamar seu preço natural Nesse caso a mercadoria é vendida exatamente pelo que vale ou pelo que ela custa realmente à pessoa que a coloca no mercado com efeito embora no linguajar comum o que se chama custo primário de uma mercadoria não inclua o lucro da pessoa que a revenderá se ele a vender a um preço que não lhe permite a taxa comum do lucro nas proximidades ele está tendo perda no negócio já que poderia ter auferido esse lucro empregando seu capital de alguma forma diferente Além disso seu lucro é sua renda o fundo adequado para sua subsis 109 tência Assim como ao preparar e colocar os bens no mercado ele adianta a seus empregados seus salários ou subsistência da mesma forma adianta a si mesmo sua própria subsistência a qual geralmente é consentânea ao lucro que ele pode esperar da venda de seus bens Portanto se esses bens não lhe proporcionarem esse lucro não lhe pagarão o que realmente lhe custaram Assim portanto embora o preço que lhe garante esse lucro não seja sempre o preço mais baixo ao qual um comerciante pode vender seus bens é o preço mais baixo ao qual tem probabilidade de vender por um período de tempo considerável ao menos onde existe plena liberdade ou onde puder mudar de ocupação tantas vezes quantas quiser O preço efetivo ao qual uma mercadoria é vendida denominase seu preço de mercado Esse pode estar acima ou abaixo do preço natural podendo também coincidir exatamente com ele O preço de mercado de uma mercadoria específica é regulado pela proporção entre a quantidade que é efetivamente colocada no mer cado e a demanda daqueles que estão dispostos a pagar o preço natural da mercadoria ou seja o valor total da renda fundiária do trabalho e do lucro que devem ser pagos para levála ao mercado Tais pessoas podem ser chamadas de interessados ou pretendentes efetivos e sua demanda pode ser chamada de demanda efetiva pelo fato de poder ser suficiente para induzir os comerciantes a colocar a mercadoria no mercado A demanda efetiva difere da demanda absoluta Em certo sentido podese dizer que uma pessoa muito pobre tem uma demanda de uma carruagem de luxo puxada por seis cavalos Pode até ser que ela gostasse de possuíla entretanto sua demanda não é uma demanda efetiva uma vez que jamais será possível colocar essa mercadoria no mercado para satisfazer a essa demanda específica Quando a quantidade de uma mercadoria colocada no mercado é inferior à demanda efetiva não há possibilidade de fornecer a quan tidade desejada a todos aqueles que estão dispostos a pagar o valor integral renda da terra salários e lucro que deve ser pago para colocar a mercadoria no mercado Em conseqüência ao invés de desejar essa mercadoria ao preço em que está alguns deles estarão dispostos a pagar mais Começará imediatamente uma concorrência entre os pretendentes e em conseqüência o preço de mercado subirá mais ou menos em relação ao preço natural na proporção em que o grau de escassez da mercadoria ou a riqueza a audácia e o luxo dos concorrentes acenderem mais ou menos a avidez em concorrer Entre concorrentes de riqueza e luxo igual o mesmo grau de escassez geralmente provocará uma concorrência mais ou menos forte de acordo com a menor ou maior importância para eles da aquisição da mercadoria Daí o preço exorbitante dos gêneros de primeira necessidade durante o bloqueio de uma cidade ou em caso de fome generalizada Quando a quantidade da mercadoria colocada no mercado ultra passa a demanda efetiva não há possibilidade de ser toda vendida àqueles que desejam pagar o valor integral da renda da terra dos OS ECONOMISTAS 110 salários e do lucro que devem ser pagos para colocar essa mercadoria no mercado Uma parte deve ser vendida àqueles que só aceitam pagar menos e o baixo preço que pagam pela mercadoria necessariamente reduz o preço total O preço de mercado descerá mais ou menos abaixo do preço natural na proporção em que o excedente aumentar mais ou menos a concorrência entre os vendedores ou segundo for para eles mais ou menos importante desembaraçarse imediatamente da merca doria O mesmo excedente na importação de artigos perecíveis laranjas por exemplo provocará uma concorrência muito maior do que na de mercadorias duráveis ferro velho por exemplo Quando a quantidade colocada no mercado coincide exatamente com o suficiente e necessário para atender à demanda efetiva muito naturalmente o preço de mercado coincidirá com o preço natural exa tamente ou muito aproximadamente Poderseá vender toda a quan tidade disponível ao preço natural e não se conseguirá vendêlas a preço mais alto A concorrência entre os diversos comerciantes os obriga todos a aceitar este preço natural mas não os obriga a aceitar menos A quantidade de cada mercadoria colocada no mercado ajustase naturalmente à demanda efetiva É interesse de todos os que empregam sua terra seu trabalho ou seu capital para colocar uma mercadoria no mercado que essa quantidade não supere jamais a demanda efetiva e todas as outras pessoas têm interesse em que jamais a quantidade seja inferior a essa demanda Se em algum momento a quantidade posta no mercado superar a demanda efetiva algum dos componentes de seu preço deverá ser pago abaixo de sua taxa natural Se for a renda da terra o interesse dos proprietários de terra imediatamente os levará a desviar dessa aplicação uma parte de suas terras e se forem os salários ou o lucro o interesse dos trabalhadores num caso e o dos seus empregadores no outro imediatamente os levará a deixar de aplicar uma parte de seu trabalho ou de seu capital ao negócio Dentro em breve a quantidade colocada no mercado não será senão a estritamente suficiente para suprir a demanda efetiva Todos os componentes do preço chegarão à sua taxa natural e o preço integral será o preço natural Se ao contrário em algum momento a quantidade colocada no mercado ficar abaixo da demanda efetiva alguns dos componentes de seu preço necessariamente deverão subir além de sua taxa natural Se for a renda da terra o interesse de todos os outros proprietários de terra os levará naturalmente a preparar mais terra na produção da mercadoria se forem os salários ou o lucro o interesse de todos os demais trabalhadores e comerciantes logo os levará a aplicar mais trabalho e mais capital no preparo e na colocação da mercadoria no mercado Em conseqüência a quantidade colocada no mercado será logo suficiente para atender à demanda efetiva Todos os componentes do preço dessa mercadoria logo descerão à sua taxa natural e o preço total da mercadoria a seu preço natural Conseqüentemente o preço natural é como que o preço central ADAM SMITH 111 ao redor do qual continuamente estão gravitando os preços de todas as mercadorias Contingências diversas podem às vezes mantêlos bastante acima dele e noutras vezes forçálos para baixo desse nível Mas quais quer que possam ser os obstáculos que os impeçam de fixarse nesse centro de repouso e continuidade constantemente tenderão para ele É dessa maneira que naturalmente todos os recursos anualmente empregados para colocar uma mercadoria no mercado se ajustam à demanda efetiva Todos objetivam naturalmente colocar no mercado a quantidade precisa que seja suficiente para cobrir a demanda sem por outro lado excedêla Não obstante isso em alguns setores a mesma quantidade de trabalho produzirá em anos diferentes quantidades muito diferentes de mercadorias enquanto em outros produzirá sempre a mesma ou quase a mesma quantidade O mesmo número de trabalhadores na agricultura produzirá em anos diferentes quantidades muito variadas de trigo vinho azeite lúpulo etc Entretanto o mesmo número de fiandeiros e tecelões produzirá cada ano a mesma ou quase a mesma quantidade de tecido de linho e lã e já que sua produção efetiva fre qüentemente é muito maior ou muito menor do que a sua produção média às vezes a quantidade de mercadorias colocada no mercado superará muito a demanda efetiva e outras vezes ficará bem abaixo da mesma Somente a produção média de um tipo individual de ocu pação pode ser ajustada sob todos os aspectos à demanda efetiva e já que sua produção efetiva com freqüência é muito maior ou muito menor do que a produção média a quantidade de mercadorias colocadas no mercado às vezes ultrapassará bastante a demanda efetiva e às vezes ficará abaixo dela Portanto mesmo que essa demanda permanecesse sempre a mesma seu preço de mercado estará sujeito a grandes flu tuações sendo que às vezes estará muito abaixo do preço natural e outras vezes estará muito acima desse preço Nos outros setores de trabalho sendo a produção de quantidades iguais de trabalho sempre a mesma ou quase exatamente a mesma ela pode ser ajustada com maior exatidão à demanda efetiva Por isso enquanto essa demanda continuar inalterada também o preço de mercado das mercadorias provavelmente fará o mesmo sendo totalmente ou muito aproximada mente o mesmo que o preço natural A experiência geral informa que o preço do tecido de linho e de lã não está sujeito a variações tão freqüentes e tão grandes como o preço do trigo O preço de um tipo de mercadorias varia somente com as variações de demanda ao passo que o de outras varia não somente com as variações na demanda mas também com as variações muito maiores e muito mais freqüentes da quantidade do que é colocado no mercado para suprir a demanda As flutuações ocasionais e temporárias no preço de mercado de uma mercadoria recaem principalmente sobre as partes ou componentes de seu preço que consistem nos salários e no lucro A parte que consiste na renda fundiária é menos afetada por tais variações Uma renda certa em dinheiro em nada é atingida por elas nem em sua taxa nem OS ECONOMISTAS 112 em seu valor Uma renda que consiste em certa porcentagem ou em certa quantidade de produto em estado bruto sem dúvida é afetada em seu valor anual por todas as flutuações ocasionais e temporárias que ocorrem no preço de mercado desse produto em estado bruto ra ramente porém é afetada por elas em sua taxa anual Ao acertar as cláusulas do arrendamento o proprietário de terra e o arrendatário procuram pelo melhor critério ajustar a taxa não ao preço temporário e ocasional mas ao preço médio e comum da produção Tais flutuações afetam tanto o valor como a taxa dos salários e do lucro conforme o mercado estiver saturado ou em falta de merca dorias ou de trabalho trabalho já executado ou trabalho a ser ainda executado Um luto público aumenta o preço do tecido preto que quase sempre está em falta no mercado em tais ocasiões e aumenta os lucros dos comerciantes que possuem uma quantidade considerável desse tecido Ele não tem efeito algum sobre os salários dos tecelões O mercado está em falta de mercadorias não de trabalho de trabalho executado não de trabalho a ser executado Ele faz subir os salários dos oficiais de alfaiate Aqui o mercado está em falta de mãodeobra Existe uma demanda efetiva de mais trabalho de mais trabalho a ser feito do que o que se pode conseguir O luto público faz baixar o preço das sedas e roupas coloridas e com isso reduz os lucros dos comerciantes que têm consigo uma quantidade considerável desses tecidos coloridos Faz também baixar os salários dos trabalhadores empregados na pre paração de tais mercadorias cuja demanda encontrase paralisada du rante seis meses talvez até durante doze meses Quanto a esse produto o mercado fica abarrotado de mercadorias e de mãodeobra Entretanto embora o preço de mercado de cada mercadoria esteja continuamente gravitando em torno do preço natural se assim se pode dizer ocorre por vezes que eventos específicos às vezes por causas naturais e às vezes por regulamentos específicos podem em muitas mercadorias manter por longo tempo o preço de mercado bem acima do preço natural Quando por efeito de um aumento da demanda efetiva o preço de mercado de uma mercadoria específica eventualmente sobe muito acima do preço natural os que empregam seu capital e estoques em suprir esse mercado geralmente tomam cuidado para esconder essa mudança Se ela chegasse ao conhecimento público seu alto lucro ten taria tantos novos rivais a empregarem seus estoques da mesma forma que uma vez atendida plenamente a demanda efetiva o preço de mer cado seria logo reduzido ao preço natural e quiçá até abaixo dele por algum tempo Se o mercado estiver muito distante da residência dos seus fornecedores às vezes pode preservar o segredo até por vários anos podendo destarte auferir seus lucros extraordinários sem novos rivais Reconhecese porém que é raro tais segredos serem guardados por muito tempo por outro lado os lucros extraordinários podem durar muito pouco mais do que esses segredos Os segredos industriais são suscetíveis de preservação por um ADAM SMITH 113 tempo mais prolongado do que os comerciais Um tintureiro que tenha descoberto o meio de produzir um corante específico com materiais que custam apenas a metade do preço dos comumente utilizados pode se tomar cuidado e enquanto viver desfrutar da vantagem de sua descoberta e até deixála em herança aos descendentes Seus ganhos extraordinários provêm do alto preço que é pago pelo seu trabalho privado Esses ganhos consistem precisamente nos altos salários pagos por esse trabalho Visto que porém tais ganhos se repetem sobre cada parcela do estoque e já que em razão disso o montante total desses ganhos mantém uma pro porção regular em relação a esse estoque são geralmente considerados como lucros extraordinários do capital ou estoque Tais elevações do preço de mercado são evidentemente os efeitos de contingências especiais de incidência porém às vezes perdurável por muitos anos seguidos Certos produtos naturais exigem características tais de solo e localização que até mesmo todas as terras de um grande país aptas para a produção deles podem ser insuficientes para atender à demanda efetiva Por conseguinte todo o estoque colocado no mercado pode ser vendido àqueles que estão dispostos a dar pelo produto mais do que o suficiente para pagar de acordo com suas taxas naturais a renda da terra que os produziu juntamente com os salários do trabalho e os lucros do capital empregados em preparálos e colocálos no mercado Tais mercadorias podem continuar a ser vendidas a esses preços altos durante séculos seguidos é a parte do preço que consiste na renda da terra que nesse caso é geralmente paga acima de sua taxa natural A renda da terra que proporciona tais produções singulares como a renda de alguns vinhedos na França de um solo e local particularmente favoráveis não tem proporção regular com a renda de terras da mesma fertilidade e igualmente bem cultivadas existentes nas proximidades Ao contrário os salários do trabalho e os lucros do capital empregado para colocar tais mercadorias no mercado raramente perdem sua pro porção natural com os das outras aplicações de mãodeobra e de capital em sua vizinhança Evidentemente tais elevações do preço de mercado são efeito de causas naturais que podem impedir que a demanda efetiva jamais seja plenamente atendida e que portanto podem perdurar para sempre Um monopólio outorgado a um indivíduo ou a uma companhia de comércio tem o mesmo efeito que um segredo comercial ou indus trial Os monopolistas por manterem o mercado sempre em falta por nunca suprirem plenamente a demanda efetiva vendem suas merca dorias muito acima do preço natural delas auferindo ganhos quer consistam em salários ou em lucros muito acima de sua taxa natural O preço de monopólio é em qualquer ocasião o mais alto que se possa conseguir Ao contrário o preço natural ou seja o preço da livre concorrência é o mais baixo que se possa aceitar não em cada ocasião mas durante qualquer período de tempo considerável e sucessivo O primeiro é em qualquer ocasião o preço mais alto que se possa ex OS ECONOMISTAS 114 torquir dos compradores ou que supostamente eles consentirão em pagar O segundo é o preço mais baixo que os vendedores comumente podem aceitar se quiserem continuar a manter seu negócio Os privilégios exclusivos detidos por corporações estatutos de aprendizagem e todas as leis que limitam em ocupações específicas a concorrência a um número inferior ao dos que de outra forma con correriam têm a mesma tendência embora em grau menor Constituem uma espécie de monopólios ampliados podendo freqüentemente du rante gerações sucessivas e em categorias inteiras de ocupações man ter o preço de mercado de mercadorias específicas acima de seu preço natural e manter algo acima de sua taxa natural tanto os salários do trabalho como os lucros do capital empregados nessas mercadorias Tais elevações do preço de mercado podem perdurar enquanto durar os regulamentos que lhes deram origem O preço de mercado de qualquer mercadoria específica pode por muito tempo continuar acima do preço natural da referida mercadoria mas raramente pode manterse muito tempo abaixo dele Qualquer que fosse o componente do preço pago abaixo da taxa natural as pessoas cujos interesses fossem afetados imediatamente perceberiam a perda e de imediato deixariam de aplicar na referida mercadoria um trato tal de terra ou tanto ou quanto de trabalho ou de capital e assim a quantidade colocada no mercado logo se reduziria ao estritamente su ficiente para atender à demanda efetiva Portanto o preço de mercado dessa mercadoria logo subiria ao preço natural Isso ocorreria ao menos onde reinasse plena liberdade Os mesmos estatutos de aprendizagem e outras leis de corpora ções que na verdade possibilitam ao trabalhador salários bastante aci ma da taxa natural quando uma manufatura está em fase de pros peridade às vezes fazem com que seu salário desça bastante abaixo da taxa natural quando a manufatura está em declínio Assim como na primeira hipótese esses fatores tiram muitas pessoas do emprego da mesma forma na segunda hipótese o trabalhador é excluído de muitos empregos O efeito desses regulamentos não é tão duradouro porém para fazer com que os salários do trabalhador desçam abaixo da taxa natural como o é para fazer com que os salários subam acima dessa taxa Sua influência pode no primeiro caso durar por muitos séculos ao passo que no segundo não pode durar mais do que o período de vida de alguns dos trabalhadores que se criaram no emprego na fase da prosperidade Quando estes desaparecerem o número dos que depois forem educados para a ocupação certamente haverá de satisfazer à demanda efetiva Somente uma política tão violenta como a do In dustão ou a do Egito Antigo onde todos eram obrigados por um prin cípio religioso a seguir a ocupação dos pais incorrendo no mais hor rendo sacrilégio quem ousasse mudar de profissão é capaz de em qualquer ocupação específica e por várias gerações sucessivas fazer os salários do trabalho ou lucros do capital descerem abaixo da taxa natural respectiva ADAM SMITH 115 Eis tudo o que por ora considero necessário observar no tocante à defasagem ocasional ou permanente entre o preço de mercado e o preço natural das mercadorias O próprio preço natural varia juntamente com a taxa natural de cada um dos componentes salários lucro e renda da terra e em cada sociedade essa taxa varia de acordo com as circunstâncias sua riqueza ou pobreza sua condição de economia em progresso estacionária ou declinante Nos próximos quatro capítulos procurarei explicar da ma neira mais completa e clara de que for capaz as causas dessas variações Primeiramente procurarei explicar quais são as circunstâncias que naturalmente determinam a taxa dos salários e de que maneira essas circunstâncias são afetadas pela riqueza ou pela pobreza de uma sociedade pelo seu estado de progresso sua situação estacionária ou seu declínio Em segundo lugar procurarei mostrar quais são as circunstâncias que naturalmente determinam a taxa de lucro e de que forma também essas circunstâncias são afetadas pelas mesmas variações das condições da sociedade Embora os salários em dinheiro e o lucro difiram muito de uma ocupação para outra e de um emprego de capital para outro parece haver geralmente certa proporção entre os salários em dinheiro em todas as diversas ocupações e os lucros pecuniários em todos os dife rentes empregos de capital Essa proporção como se verá adiante depende em parte da natureza dos diversos empregos e em parte das diferentes leis e políticas da respectiva sociedade Entretanto em bora sob muitos aspectos essa proporção dependa das leis e da política ela parece ser pouco afetada pela riqueza ou pela pobreza da sociedade pela sua condição de economia em progresso estacionária ou em de clínio permanecendo a mesma ou quase a mesma em qualquer uma dessas condições Em terceiro lugar portanto procurarei explicar todas as diversas circunstâncias que regulam essa proporção Em quarto e último lugar procurarei mostrar quais são as cir cunstâncias que regulam a renda da terra renda essa que levanta ou abaixa o preço real de todas as mercadorias que a terra produz OS ECONOMISTAS 116 CAPÍTULO VIII Os Salários do Trabalho O produto do trabalho é a recompensa natural do trabalho ou seja seu salário Naquele estado original de coisas que precede tanto a apropriação da terra quanto o acúmulo de capital o produto integral do trabalho pertence ao trabalhador Este não tem nem proprietário fundiário nem patrão com quem deva repartir o fruto de seu trabalho Se tal estado de coisas tivesse continuado os salários do trabalho teriam aumentado conjuntamente com todos os aprimoramentos intro duzidos nas forças produtivas do trabalho gerados pela divisão do trabalho Todas as coisas terseiam tornado gradualmente mais ba ratas Teriam sido produzidas por uma quantidade menor de trabalho e já que nesse estado de coisas as mercadorias produzidas por quan tidades iguais de trabalho teriam sido trocadas umas pelas outras teriam também sido compradas com o produto de uma quantidade menor de trabalho Contudo embora na realidade todas as coisas se teriam tornado mais baratas na aparência muitas poderiam terse tornado mais caras do que antes ou ter sido trocadas por uma quantidade maior de outros bens Suponhamos por exemplo que na maioria das ocupações as forças produtivas do trabalho tivessem melhorado dez vezes mais ou seja que em um dia o trabalhador pudesse produzir dez vezes mais trabalho do que antes suponhamos também que em uma determinada ocupação a melhoria das forças produtivas de trabalho houvesse apenas dupli cado ou seja que em um dia o trabalhador pudesse produzir apenas o dobro de trabalho do que produzia antes Ao se permutar o produto de um dia de trabalho na maioria das ocupações pelo produto de um dia de trabalho nessa ocupação a que acabamos de nos referir teríamos que uma quantidade de trabalho dez vezes maior do que antes na primeira hipótese compraria apenas o duplo da quantidade de trabalho de antes na segunda hipótese Em conseqüência qualquer quantidade 117 específica desse produto digamos por exemplo uma librapeso pareceria cinco vezes mais cara do que antes Na realidade porém seria duas vezes mais barata Embora para comprála fosse necessário uma quantidade cinco vezes maior de outros bens seria necessária apenas a metade da quantidade de trabalho para comprála ou para produzila Por conseguinte a aquisição seria duas vezes mais fácil do que antes Mas esse estado original de coisas no qual o trabalhador des frutava do produto integral de seu trabalho já não pôde perdurar quando se começou a introduzir a apropriação da terra e a acumular o capital Já estava no fim muito antes que se fizessem os aprimora mentos mais consideráveis nas forças produtivas do trabalho e portanto não teria nenhum propósito prognosticar quais teriam sido seus defeitos sobre a recompensa ou os salários de trabalho No momento em que a terra se torna propriedade privada o dono da terra exige uma parte de quase toda a produção que o traba lhador pode cultivar ou colher da terra Sua renda é a primeira dedução do produto do trabalho empregado na terra Raramente a pessoa que cultiva a terra tem recursos para man terse até o momento da colheita Sua manutenção geralmente é adian tada do capital de um patrão ou seja do arrendatário que lhe dá emprego o qual aliás não teria interesse em empregála a menos que pudesse ter parte no produto do seu trabalho ou a menos que seu capital tivesse de lhe ser restituído com lucro Esse lucro representa uma segunda dedução do produto do trabalho empregado na terra O produto de quase todos os outros trabalhos está sujeito à mesma dedução do lucro Em todos os ofícios e manufaturas a maior parte dos trabalhos tem necessidade de um patrão que lhes adiante o material para o trabalho salários e sua manutenção até completar o trabalho O patrão partilha do produto do trabalho dos empregados ou seja do valor que o trabalho acrescenta aos materiais trabalhados pelo empre gado é nessa participação que consiste o lucro do patrão Às vezes ocorre realmente que um trabalhador independente tenha capital suficiente tanto para comprar os materiais para seu tra balho como para manterse até completálo Nesse caso ele é ao mesmo tempo patrão e operário desfrutando sozinho do produto integral de seu trabalho ou seja do valor integral que seu trabalho acrescenta aos materiais por ele processados Esse valor inclui o que geralmente são duas rendas diferentes pertencentes a duas pessoas distintas o lucro do capital e os salários do trabalho Contudo esses casos não são muito freqüentes e em todas as partes da Europa para cada trabalhador autônomo existem vinte que servem a um patrão subentendese que os salários do trabalho são em todos os lugares como geralmente são quando o trabalhador é uma pessoa e o proprietário do capital que emprega o trabalhador é outra pessoa Quais são os salários comuns ou normais do trabalho Isso de pende do contrato normalmente feito entre as duas partes cujos inte OS ECONOMISTAS 118 resses aliás de forma alguma são os mesmos Os trabalhadores de sejam ganhar o máximo possível os patrões pagar o mínimo possível Os primeiros procuram associarse entre si para levantar os salários do trabalho os patrões fazem o mesmo para baixálos Não é difícil prever qual das duas partes normalmente leva vantagem na disputa e no poder de forçar a outra a concordar com as suas próprias cláusulas Os patrões por serem menos numerosos po dem associarse com maior facilidade além disso a lei autoriza ou pelo menos não os proíbe ao passo que para os trabalhadores ela proíbe Não há leis do Parlamento que proíbam os patrões de combinar uma redução dos salários muitas são porém as leis do Parlamento que proíbem associações para aumentar os salários Em todas essas disputas o empresário tem capacidade para agüentar por muito mais tempo Um proprietário rural um agricultor ou um comerciante mesmo sem empregar um trabalhador sequer conseguiriam geralmente viver um ano ou dois com o patrimônio que já puderam acumular Ao con trário muitos trabalhadores não conseguiriam subsistir uma semana poucos conseguiriam subsistir um mês e dificilmente algum conseguiria subsistir um ano sem emprego A longo prazo o trabalhador pode ser tão necessário ao seu patrão quanto este o é para o trabalhador porém esta necessidade não é tão imediata Temse afirmado que é raro ouvir falar das associações entre patrões ao passo que com freqüência se ouve falar das associações entre operários Entretanto se alguém imaginar que os patrões rara mente se associam para combinar medidas comuns dá provas de que desconhece completamente o assunto Os patrões estão sempre e em toda parte em conluio tácito mas constante e uniforme para não elevar os salários do trabalho acima de sua taxa em vigor Violar esse conluio é sempre um ato altamente impopular e uma espécie de reprovação para o patrão no seio da categoria Raramente ouvimos falar de conluios que tais porque costumeiros podendo dizerse constituírem o natural estado de coisas de que ninguém ouve falar freqüentemente os patrões também fazem conchavos destinados a baixar os salários do trabalho mesmo aquém de sua taxa em vigor Essas combinações sempre são conduzidas sob o máximo silêncio e sigilo que perdura até ao momento da execução e quando os trabalhadores cedem como fazem às vezes sem resistir embora profundamente ressentidos isso jamais é sabido de público Muitas vezes porém os trabalhadores reagem a tais conluios com suas associações defensivas por vezes sem serem provocados os trabalhadores combinam entre si elevar o preço de seu trabalho Seus pretextos usuais são às vezes os altos preços dos mantimentos por vezes reclamam contra os altos lucros que os patrões auferem do tra balho deles Entretanto quer se trate de conchavos ofensivos quer defensivos todos são sempre alvo de comentário geral No intuito de resolver com rapidez o impasse os trabalhadores sempre têm o recurso ao mais ruidoso clamor e às vezes à violência mais chocante e atroz ADAM SMITH 119 Desesperamse agindo com loucura e extravagância que caracterizam pessoas desesperadas que devem morrer de fome ou lutar contra seus patrões para que se chegue a um acordo imediato para com suas exi gências Em tais ocasiões os patrões fazem o mesmo alarido de seu lado e nunca cessam de clamar alto pela intervenção da autoridade e pelo cumprimento das leis estabelecidas com tanto rigor contra as associações dos serviçais trabalhadores e diaristas Por isso os tra balhadores raramente auferem alguma vantagem da violência dessas associações tumultuosas que em parte devido à interferência da au toridade em parte à firmeza dos patrões e em parte por causa da necessidade à qual a maioria dos trabalhadores está sujeita por força da subsistência atual geralmente não resultando senão na punição ou ruína dos líderes Mas embora nas disputas com os operários os patrões geralmente levem vantagem existe uma determinada taxa abaixo da qual parece impossível reduzir por longo tempo os salários normais mesmo em se tratando do tipo de trabalho menos qualificado O homem sempre precisa viver de seu trabalho e seu salário deve ser suficiente no mínimo para a sua manutenção Esses salários devem até constituirse em algo mais na maioria das vezes de outra forma seria impossível para ele sustentar uma família e os trabalha dores não poderiam ir além da primeira geração Baseado nisso o Sr Cantillon parece supor que os trabalhadores comuns da mais baixa qualificação devem em toda parte ganhar no mínimo o dobro do que é necessário para se manterem a fim de que possam criar dois filhos já que o trabalho da esposa pelo fato de ter ela que cuidar dos filhos mal é suficiente para ela manterse a si mesma Calculase que a metade das crianças nascidas morrem antes de chegar à maioridade De acordo com o que foi dito os trabalhadores mais pobres devem tentar educar pelo menos quatro filhos para que dois tenham igual possibilidade de chegar à idade adulta Ora supõese que o custo da manutenção de quatro crianças equivale ao da manutenção de um ho mem adulto Acrescenta o mesmo autor o trabalho de um escravo fisicamente capacitado é calculado para valer o dobro da sua manu tenção e o de um trabalhador livre nível mais baixo acredita ele não pode valer menos do que o de um escravo sadio Pelo que parece certo para criar uma família o trabalho do marido e da esposa juntos mesmo em se tratando das categorias mais baixas de trabalho deve ser capaz de proporcionar algo mais do que o estritamente necessário para a sua própria manutenção mas não estou em condições de afirmar qual das proporções desse ganho é a maior Existem porém certas circunstâncias que às vezes proporcionam vantagens aos trabalhadores possibilitandolhes aumentar seus salá rios consideravelmente acima dessa taxa normal que evidentemente é a mais baixa que se coaduna com o mínimo humanitário Quando em qualquer país a demanda de pessoas que vivem de salários trabalhadores do campo diaristas empregados de todo tipo OS ECONOMISTAS 120 está em contínuo aumento se a cada ano surge emprego para um número maior de trabalhadores do que o número dos empregados do ano anterior os operários não precisam associarse para aumentar seus salários A escassez de mãodeobra provoca uma concorrência entre os patrões que disputam entre si para conseguir operários e dessa forma voluntariamente violam o natural conluio patronal para que não se elevem salários É evidente que a demanda de pessoas que vivem de salário só pode aumentar na medida em que aumentam os fundos destinados ao pagamento de salários Esses fundos são de dois tipos primeiro a renda que vai além do necessário para a manutenção segundo o ex cedente do cabedal necessário para os respectivos patrões manterem seu negócio Quando o proprietário de terras beneficiário de anuidade ou ho mem rico possui uma renda maior do que a que considera necessária para manter sua própria família empregará todo o excedente ou parte dele para manter um ou mais empregados domésticos Aumentando esse excedente naturalmente aumentará o número desses criados Quando um trabalhador autônomo tal como um tecelão ou um sapateiro possui mais capital do que o suficiente para comprar os materiais necessários para seu trabalho e para manterse até vender o produto naturalmente empregará um ou mais diaristas com o ex cedente a fim de conseguir um lucro com o trabalho desses diaristas Aumentando esse excedente ele naturalmente aumentará o número de seus diaristas Por isso a demanda de assalariados necessariamente cresce com o aumento da renda e do capital de um país não sendo possível o aumento sem isso O aumento da renda e de capital é o aumento da riqueza nacional A demanda de assalariados portanto naturalmente aumenta com o crescimento da riqueza nacional sendo simplesmente impossível quando isso não ocorre Não é a extensão efetiva da riqueza nacional mas seu incremento contínuo que provoca uma elevação dos salários do trabalho Não é portanto nos países mais ricos mas nos países mais progressistas ou seja naqueles que estão se tornando ricos com maior rapidez que os salários do trabalho são os mais altos A Inglaterra é certamente no momento um país muito mais rico do que qualquer outra região da América do Norte No entanto os salários do trabalho são mais altos na América do Norte do que em qualquer parte da Inglaterra Na província de Nova York os trabalhadores comuns ganham125 por dia 3 xelins e 6 pence norteamericanos iguais a 2 xelins esterlinos os carpinteiros de navios ganham 10 xelins e 6 pence norteamericanos com um quartilho de aguardente no valor de 6 pence esterlinos equi valendo no total a 6 xelins e 6 pence esterlinos carpinteiros de casas ADAM SMITH 121 125 Isso foi escrito em 1773 antes do início dos recentes distúrbios e pedreiros ganham 8 xelins norteamericanos iguais a 4 xelins e 6 pence esterlinos oficiais de alfaiate ganham 5 xelins norteamericanos iguais a aproximadamente 2 xelins e 10 pence esterlinos Esses preços estão todos acima do preço de Londres afirmandose que são igual mente altos nas outras províncias que não Nova York O preço dos mantimentos é muito mais baixo nos Estados Unidos do que na In glaterra Nunca se conheceu carestia naquele país Nas piores estações os norteamericanos sempre tiveram o suficiente para si embora menos para exportação Se o preço do trabalho em dinheiro for mais alto do que é em qualquer outro lugar da mãepátria deve ser mais alto em uma proporção ainda maior o preço real ou seja o preço dos artigos necessários e dos confortos materiais para os trabalhadores Embora a América do Norte não seja ainda tão rica como a In glaterra é muito mais progressista avançando com rapidez muito maior para a aquisição de maiores riquezas O indício mais claro da prosperidade de um país é o aumento do número de seus habitantes Na GrãBretanha e na maioria dos países europeus supõese que a população necessita de no mínimo quinhentos anos para duplicar Na América do Norte verificouse que duplica em 20 ou 25 anos E não se pode dizer que atualmente esse aumento se deva principalmente à imigração contínua de estrangeiros devendose antes à multiplicação de espécie Afirmase que os norteamericanos que chegam a uma idade avançada com freqüência chegam a conhecer entre 50 e 100 descen dentes diretos e às vezes até mais O trabalho lá é tão bem remunerado que uma família numerosa ao invés de ser um peso representa uma fonte de riqueza e prosperidade para o país Calculase que o trabalho de cada filho antes de deixar o lar representa 100 libras esterlinas de ganho líquido para a família Uma viúva jovem com 4 ou 5 filhos pequenos a qual entre a classe média ou inferior da Europa teria tão pouco ensejo de conseguir um segundo marido freqüentemente é cor tejada com uma espécie de fortuna O valor dos filhos é o maior estímulo que se possa dar ao matrimônio Não há como admirar portanto que as pessoas na América do Norte casem muito cedo Não obstante o grande aumento provocado por tais casamentos contraídos cedo existe uma queixa contínua de escassez de mãodeobra na América do Norte Ao que parece a demanda de trabalhadores e os fundos destinados a mantêlos aumentam com rapidez maior do que a possibilidade que os norteamericanos têm de encontrar mãodeobra a empregar Mesmo que a riqueza de um país seja muito grande se ele estiver estagnado por muito tempo não podemos esperar encontrar nele sa lários muito altos Os fundos destinados ao pagamento dos salários ou seja a renda e o capital de seus habitantes podem ser elevadís simos entretanto se por vários séculos tiverem continuado os mesmos ou mais ou menos os mesmos o número de trabalhadores empregados anualmente poderá facilmente ser suficiente para o ano seguinte ou até ultrapassar o número necessário para o ano subseqüente Em tal situação raramente poderá ocorrer escassez de mãodeobra ou acon OS ECONOMISTAS 122 tecer que os patrões sejam obrigados a disputála No caso contrário a mãodeobra haveria de multiplicarse naturalmente além do neces sário Haveria uma escassez constante de empregos e os trabalhadores seriam obrigados a lutar entre si para conseguilos Se em tal país os salários do trabalho alguma vez tivessem sido mais do que suficientes para a manutenção do trabalhador além de capacitálo para criar uma família a concorrência dos trabalhadores e o interesse dos patrões logo os reduziriam à taxa mínima consentânea com a humanidade em geral A China foi por muito tempo um dos países mais ricos isto é um dos mais férteis mais bem cultivados mais industriosos e mais populosos do mundo Ao que parece porém há muito tempo sua economia esta cionou Marco Polo que a visitou há mais de quinhentos anos descreve sua agricultura sua indústria e densidade demográfica mais ou menos nos mesmos termos em que são descritos por viajantes de hoje Talvez tivesse conseguido aquele complemento pleno de riqueza que a natureza e as leis e instituições permitem adquirir Os relatos de muitos via jantes contraditórios sob muitos outros aspectos concordam em atestar a baixa taxa de salários e as dificuldades que um trabalhador tem para manter sua família na China Ele se satisfaz se após cavar o solo um dia inteiro puder conseguir o suficiente para comprar uma pequena porção de arroz à noite A situação dos artesãos é ainda pior se é que é possível Ao invés de esperar indolentemente pelos chamados dos clientes nas oficinas como acontece na Europa circulam continua mente pelas ruas empunhando os instrumentos de seu ofício oferecendo seu serviço e quase mendigando emprego A pobreza das camadas mais baixas do povo chinês supera de muito a das nações mais pobres da Europa Nas adjacências de Cantão afirmase que muitas centenas e até milhares de famílias não têm moradia vivendo constantemente em pequenos barcos de pesca nas margens dos rios e dos canais A subsistência que ali encontram é tão escassa que ficam ansiosos por apanhar o pior lixo lançado ao mar por qualquer navio europeu Qual quer carniça por exemplo a carcaça de um cachorro ou gato morto embora já em estado de putrefação e fedendo é para eles tão bemvinda quanto o alimento mais sadio para as pessoas de outros países O casamento é estimulado na China não porque ter filhos represente algum proveito mas pela liberdade que se tem de eliminálos Em todas as grandes cidades várias crianças são abandonadas toda noite na rua ou afogadas na água como filhotes de animais Afirmase até que eliminar crianças é uma profissão reconhecida cujo desempenho assegura a subsistência de certos cidadãos Embora a China pareça estacionária não aparenta estar regre dindo Em todos os lugares se observam cidades abandonadas pelos seus habitantes Em parte alguma observase que as áreas outrora cultivadas estejam agora negligenciadas Deve portanto estar sendo executado o mesmo ou mais ou menos o mesmo montante de trabalho que antes e portanto também os fundos destinados à manutenção da mãodeobra não devem ter diminuído sensivelmente Por conseguinte ADAM SMITH 123 os trabalhadores da classe mais baixa não obstante sua subsistência deficiente devem de uma forma ou outra estar conseguindo manter suas cifras habituais Diversa seria a situação em um país em que estivessem dimi nuindo sensivelmente os fundos destinados à manutenção da mãode obra Em todas as categorias de emprego cada ano a demanda de trabalhadores seria menor do que no ano anterior Muitos dos que possuíam seu negócio próprio não conseguindo encontrar emprego em sua própria atividade seriam obrigados a procurálo em atividades do nível mais baixo Uma vez que a classe mais baixa de empregos não somente já estaria supersaturada pelos operários dessa classe social mas passaria agora a ser procurada ainda por trabalhadores de outras classes a concorrência por emprego nessa classe mais baixa seria tão grande a ponto de reduzir os salários à subsistência mais mísera e deficiente do trabalhador Muitos não conseguiriam encontrar emprego mesmo nessas árduas condições e teriam que morrer de fome procurar sua subsistência na mendicância ou praticar atos os mais indignos Prevaleceriam imediatamente nessa classe a carência a fome e a mortalidade e a partir dali se estenderiam a todas as classes superiores até que o número de habitantes do país fosse reduzido à quantidade que pudesse ser facilmente mantida pela renda e pelo capital que ainda tivessem escapado à tirania ou à calamidade que houvesse destruído todo o resto Esse é talvez aproximadamente o estado atual de Bengala e de algumas outras colônias inglesas nas Índias Orientais Em um país fértil que antes tenha sido muito despovoado onde portanto a subsistência não deveria ser muito difícil e onde apesar disso 300 ou 400 mil pessoas morrem de fome a cada ano podemos estar certos de que os fundos destinados à manutenção dos trabalhadores pobres estão diminuindo rapidamente A diferença entre o caráter da Cons tituição britânica que protege e governa a América do Norte e o da Companhia Mercantil que oprime e domina as Índias Orientais não poderia talvez ser mais bem ilustrado do que pela diversidade das condições desses dois países Eis por que a remuneração generosa do trabalho é não somente o efeito necessário da riqueza nacional em expansão mas também seu sintoma natural Por outro lado a manutenção deficiente dos traba lhadores pobres constitui o sintoma natural de que a situação encon trase estacionária ao passo que a condição de fome dos trabalhadores é sintoma de que o país está regredindo rapidamente Na GrãBretanha nos tempos em que vivemos parece evidente que os salários do trabalho são superiores ao que é estritamente necessário para permitir ao trabalhador manter uma família Para não irmos muito longe no tocante a esse item não há necessidade de entrar em cálculos tediosos e duvidosos sobre qual pode ser o montante ínfimo indispensável para isso Há muitos sintomas claros de que em nenhuma parte desse país os salários do trabalho estão aquém da taxa ínfima que mal se coaduna com os mais comezinhos ditames da dignidade humana OS ECONOMISTAS 124 Primeiramente em quase todas as regiões da GrãBretanha exis te uma diferença entre os salários de verão e os de inverno mesmo nos tipos de trabalho menos qualificados Os salários de verão sempre são os mais altos Entretanto devido à despesa extraordinária de com bustível a manutenção de uma família é mais dispendiosa no inverno Se portanto os salários são os mais altos quando as despesas de ma nutenção da família são as mais baixas parece evidente que não são regulados pelo mínimo indispensável para essa despesa mas pela quan tidade e suposto valor do trabalho Podese com efeito afirmar que um trabalhador deve economizar parte de seu ordenado de verão para cobrir sua despesa no inverno e que considerandose o ano todo os salários não excedem o necessário para manter sua família durante o ano inteiro Todavia um escravo ou uma pessoa que dependesse de nós para sua subsistência imediata não seria tratado dessa forma Sua subsistência diária seria ajustada às suas necessidades diárias Em segundo lugar os salários do trabalho na GrãBretanha não flutuam com o preço dos mantimentos Esses variam em toda parte de ano para ano muitas vezes de mês para mês No entanto em muitos lugares o preço do trabalho em dinheiro permanece inalterado às vezes durante 50 anos seguidos Se portanto nesses lugares os trabalhadores pobres podem manter suas famílias em anos dispendiosos devem estar em situação cômoda em tempos de abundância moderada e em afluên cia em tempos de preços extraordinariamente baixos O alto preço dos mantimentos durante esses últimos 10 anos em muitas partes do Reino não tem sido acompanhado por nenhuma elevação sensível no preço do trabalho em dinheiro em algumas regiões isso ocorreu provavel mente mais devido ao aumento da demanda de mãodeobra do que ao aumento do preço dos mantimentos Em terceiro lugar assim como o preço dos gêneros varia mais de um ano para outro do que os salários do trabalho os salários do trabalho variam por outro lado mais de lugar para lugar do que o preço dos mantimentos Os preços do pão e da carne vendida pelos açougueiros geralmente são os mesmos ou mais ou menos os mesmos na maior parte do território do Reino Unido Esses artigos e a maioria dos demais que são vendidos no varejo maneira pela qual os tra balhadores pobres compram tudo geralmente são tão baratos ou mais baratos em cidades grandes do que em longínquas regiões do país por motivos que terei ocasião de explicar adiante Mas os salários do trabalho em uma cidade grande e nas suas proximidades são com freqüência 14 ou 15 ou seja 20 ou 25 mais altos do que a algumas milhas de distância Podese dizer que o preço comum do trabalho em Londres e nos arredores é 18 pence por dia À distância de algumas milhas esse preço cai para 14 e 15 pence Em Edimburgo e seus ar redores o preço do trabalho por dia está estimado em 10 pence A distância de algumas milhas esse preço cai para 8 pence o preço ha bitual de mãodeobra comum na maior parte da região baixa da Es cócia onde varia bem menos do que na Inglaterra Tal diferença de ADAM SMITH 125 preços da mãodeobra a qual aliás nem sempre parece suficiente para motivar a migração de uma pessoa de uma freguesia para outra necessariamente provocaria um transporte tal das mercadorias mais volumosas não somente de uma freguesia para outra mas de uma extremidade do Reino quase de uma extremidade do mundo para a outra que logo reduziria os preços a um só nível Depois de tudo o que foi dito sobre a leviandade e inconstância da natureza humana a experiência evidencia que uma pessoa é dentre todos os tipos de bagagem a mais difícil de ser transportada Se portanto os trabalha dores pobres conseguem manter suas famílias nas regiões do Reino em que o preço do trabalho é o mais baixo devem estar em afluência lá onde ele é o mais alto Em quarto lugar as variações no preço do trabalho não somente não correspondem nem em lugar nem em tempo às variações no preço dos mantimentos mas muitas vezes são totalmente opostas Os cereais o alimento do povo em geral são mais caros na Escócia do que na Inglaterra da qual a Escócia recebe quase todo ano supri mentos muito grandes Mas o trigo inglês precisa ser vendido mais caro na Escócia país para o qual é transportado do que na Inglaterra país do qual procede e em proporção à sua qualidade não pode ser vendido mais caro na Escócia do que o trigo escocês que compete com o trigo inglês no mesmo mercado A qualidade dos cereais depende sobretudo da quantidade de farinha que ele rende no moinho e sob este aspecto o trigo inglês é de tal forma superior ao escocês que embora muitas vezes seja aparentemente mais caro ou em proporção com a medida em volume na realidade geralmente é mais barato ou em proporção à sua qualidade ou até em relação com seu peso O preço da mãodeobra ao contrário é mais caro na Inglaterra do que na Escócia Se portanto os trabalhadores pobres conseguem manter suas famílias em uma parte do Reino Unido devem estar em afluência em outro A farinha de aveia fornece ao povo comum da Escócia a maior e a melhor parte de seu alimento o qual geralmente é muito inferior ao de seus vizinhos do mesmo nível na Inglaterra Essa dife rença porém no modo de sua subsistência não é a causa mas o efeito da diferença em seus salários embora com freqüência se pense que é a causa por falta de conhecimento Não é porque um anda de carruagem e seu vizinho anda a pé que um é rico e o outro pobre mas viceversa por ser rico um anda de carruagem e por ser pobre o outro anda a pé No decurso do século passado considerandose a média dos di versos anos os cereais eram mais caros nas duas partes do Reino Unido do que durante o decurso do presente século Esse fato não padece de dúvida e a prova disso é ainda mais decisiva se é que é possível em relação à Escócia do que em relação à Inglaterra Na Escócia o fato é confirmado pela evidência da fé pública homologada sob juramento nas avaliações anuais de acordo com o estado efetivo dos mercados de todos os vários tipos de cereais em cada condado da Escócia Se essa prova direta pudesse exigir alguma evidência colateral OS ECONOMISTAS 126 para confirmála observaria que isto ocorreu também na França e provavelmente na maioria dos países da Europa Com respeito à Fran ça existe prova mais clara Embora porém seja certo que nas duas partes do Reino Unido os cereais eram algo mais caros no século passado do que no atual é igualmente certo que a mãodeobra era muito mais barata Se pois os trabalhadores pobres conseguiam manter suas fa mílias então devem estar muito mais à vontade hoje No século passado o salário diário mais comum na maior parte da Escócia era 6 pence no verão e 5 pence no inverno Em algumas partes das regiões mon tanhosas e nas Ilhas Ocidentais ainda se continua a pagar 3 xelins por semana aproximadamente o mesmo preço Na maior parte da re gião baixa do País o salário mais habitual do trabalho comum é hoje 8 pence por dia e 10 pence às vezes 1 xelim em torno de Edimburgo nos condados que confinam com a Inglaterra provavelmente devido à vizinhança com a Escócia e em alguns outros lugares em que recen temente houve um aumento considerável da demanda de trabalho em torno de Glasgow Carron AyrShire etc Na Inglaterra os aperfeiçoa mentos da agricultura das indústrias e do comércio começaram muito antes do que na Escócia A demanda de mãodeobra e conseqüente mente o seu preço necessariamente deve ter aumentado com esses aprimoramentos Em decorrência disso no século passado como no atual os salários do trabalho eram mais altos na Inglaterra do que na Escócia Aumentaram consideravelmente também desde aquele tem po embora devido à maior diferença de salários pagos lá em lugares diferentes seja mais difícil saber com certeza em quanto subiram Em 1614 o soldo de um soldado de infantaria era o mesmo que hoje 8 pence por dia Quando foi fixado pela primeira vez esse soldo teria naturalmente sido regulado pelos salários usuais dos trabalhadores comuns a classe da qual comumente são recrutados os soldados de infantaria O Lord Juiz Supremo Hales que escreveu no tempo de Carlos II calcula a despesa necessária de uma família operária de seis pessoas pai mãe duas crianças capazes de executar algum trabalho e duas incapazes de qualquer trabalho em 10 xelins por semana ou seja 26 libras esterlinas por ano Se não conseguirem ganhar isso com seu trabalho ele supõe que devam arranjarse mendigando ou furtando Ele parece ter pesquisado com muita atenção esse assun to126 Em 1688 Gregory King cuja habilidade em aritmética política é tão enaltecida pelo Dr Davenant calculou a renda comum de tra balhadores e empregados extraordinários em 15 libras anuais para uma família que supunha constar em média de 35 pessoas Portanto seu cálculo embora diferente na aparência coincide muito aproxima damente no fundo com o do juiz Hales Ambos supõem que a despesa semanal dessas famílias gire em torno de 20 pence por cabeça Tanto a renda pecuniária quanto a despesa dessas famílias aumentaram con ADAM SMITH 127 126 Ver seu esquema para a manutenção dos pobres em BURN History of the Poorlaws sideravelmente desde então na maior parte do Reino Unido em alguns lugares mais em outros menos embora dificilmente em algum lugar o aumento tenha sido tão grande quanto alguns relatos recentes sobre os salários atuais da mãodeobra têm tentado fazer crer ao público Devese observar que o preço do trabalho não pode ser determinado com muita precisão em um lugar pelo fato de muitas vezes se pagarem diferentes preços no mesmo lugar e para o mesmo tipo de trabalho não somente de acordo com a diferença de habilidades dos trabalha dores mas também conforme a generosidade ou dureza dos patrões Onde os salários não são regulados por lei o máximo que possamos pretender determinar são os salários mais costumeiros aliás a expe riência parece mostrar que a lei jamais consegue regular os salários adequadamente embora muitas vezes tenha pretendido fazêlo A remuneração real do trabalho ou seja a quantidade real de bens necessários e confortos materiais que o salário pode assegurar ao trabalhador tem aumentado no decurso deste século talvez em uma proporção ainda maior do que o preço dos salários em dinheiro Não somente os cereais têmse tornado algo mais baratos mas muitas outras coisas das quais o pobre que é laborioso obtém uma variedade razoável e saudável de alimentos também se tornaram muito mais baratas As batatas por exemplo hoje não custam na maior parte do Reino Unido a metade do preço que costumavam custar 30 ou 40 anos atrás O mesmo podese dizer do nabo da cenoura do repolho coisas que antigamente nunca eram cultivadas a não ser com pá mas que hoje normalmente o são com arado Tornaramse mais baratos todos os tipos de artigo para horticultura A maior parte das maçãs e mesmo das cebolas consumidas na GrãBretanha eram no século passado im portadas do País de Flandres Os grandes aperfeiçoamentos introdu zidos nas indústrias do linho e da lã garantem aos trabalhadores roupa mais barata e de melhor qualidade sendo que os aperfeiçoamentos introduzidos na indústria dos metais menos nobres lhes asseguram instrumentos de trabalho mais baratos e de melhor qualidade bem como muitas peças bemfeitas e adequadas para uso doméstico O sabão o sal as velas o couro e licores fermentados se tornaram bem mais caros sobretudo em razão das taxas que se lhes têm imposto Todavia a quantidade desses artigos que o trabalhador pobre é obrigado a con sumir é tão irrelevante que o aumento de seu preço não compensa a diminuição no preço de tantas outras coisas A queixa comum de que o supérfluo se estende até as camadas mais baixas do povo e de que o trabalhador pobre atualmente não se contentará mais com a mesma comida a mesma roupa e alojamento que o satisfazia em tempos ante riores pode convencernos de que o aumento não foi somente no preço da mãodeobra em dinheiro mas também na sua remuneração real Deverseá considerar esta melhoria da situação das camadas mais baixas da sociedade como uma vantagem ou como um inconve niente para a sociedade A resposta é tão óbvia que salta à vista Os criados trabalhadores e operários dos diversos tipos representam a OS ECONOMISTAS 128 maior parte de toda grande sociedade política Ora o que faz melhorar a situação da maioria nunca pode ser considerado como um inconve niente para o todo Nenhuma sociedade pode ser florescente e feliz se a grande maioria de seus membros forem pobres e miseráveis Além disso manda a justiça que aqueles que alimentam vestem e dão alo jamento ao corpo inteiro da nação tenham uma participação tal na produção de seu próprio trabalho que eles mesmos possam ter mais do que alimentação roupa e moradia apenas sofrível A pobreza embora sempre desestimule o casamento nem sempre o impede Pelo contrário parece até favorecer mais a procriação Uma mulher das regiões montanhosas que passa fome muitas vezes gera mais de vinte filhos ao passo que uma mulher fina e bem alimentada muitas vezes não se dispõe sequer a gerar um e na maioria dos casos sentese esgotada se tiver 2 ou 3 A esterilidade tão freqüente entre mulheres de posição é muito rara entre as de classe inferior A luxúria no sexo feminino talvez por inflamar a paixão pelo prazer parece sempre enfraquecer e com freqüência destruir totalmente as energias procriadoras Entretanto a pobreza embora não evite a procriação é extre mamente desfavorável à educação dos filhos A tenra planta é produ zida mas o solo é tão frio e o clima tão rigoroso que logo murcha e morre Tenho sido freqüentemente informado de que na Alta Escócia não é raro para uma mãe que deu à luz vinte filhos não ter dois vivos Vários oficiais de grande experiência me asseguraram que desde o recrutamento de seus regimentos nunca foram capazes de suprilos com tambores e pífaros por causa de todos os filhos de soldados que lá haviam nascido No entanto raramente se pode ver um número maior de lindas crianças se não em uma barraca de soldados Muito poucas delas ao que parece chegam à idade de 13 ou 14 anos Em alguns lugares a metade das crianças nascidas morrem antes de com pletar quatro anos de idade em muitos lugares antes de completar sete e em quase todos os lugares antes de atingirem os 9 ou 10 anos Ora essa grande mortalidade se encontrará sobretudo entre as crianças do povo comum cujos pais não dispõem dos recursos para cuidar delas como as pessoas de melhor condição social Embora o matrimônio dos pobres seja normalmente mais fecundo do que o das pessoas de boa condição é menor a proporção de filhos dessas famílias que chegam à maturidade Em hospitais de enjeitados e entre as crianças mantidas em instituições de caridade a mortalidade é ainda maior do que entre as famílias de nível comum Toda espécie animal multiplicase naturalmente em proporção aos meios de que dispõe para sua subsistência sendo que nenhuma espécie pode multiplicarse sem esses meios Mas em uma sociedade civilizada é somente entre as camadas inferiores da população que a escassez de gêneros alimentícios pode estabelecer limites para a pos terior multiplicação da espécie humana ora só pode fazêlo destruindo uma grande parte das crianças nascidas de um matrimônio fecundo ADAM SMITH 129 A remuneração generosa do trabalho possibilitando aos traba lhadores cuidar melhor de seus filhos e conseqüentemente criar um número maior deles tende naturalmente a ampliar e estender esses limites Além disso cumpre observar que necessariamente faz isso tanto quanto possível na proporção exigida pela demanda de mãodeobra Se essa demanda aumentar continuamente a remuneração do trabalho necessariamente estimulará o matrimônio e a multiplicação de traba lhadores de tal forma que possa darlhes condições para atender a essa demanda em contínuo aumento com uma população cada vez mais numerosa Se a remuneração em algum momento for inferior ao que se requer para esse fim a carência de mãodeobra logo a fará aumentar e se em algum momento a remuneração for muito alta a multiplicação excessiva de mãodeobra logo a fará baixar para sua taxa necessária O mercado acusará uma falta tão grande de mãodeobra em um caso e uma saturação tão grande em outro que logo o preço da mãodeobra será forçado a posicionarse na taxa adequada exigida pelas circuns tâncias da sociedade É dessa forma que a necessidade de mãodeobra como a de qualquer outra mercadoria necessariamente regula a pro dução apressaa quando é muito lenta e a faz parar quando avança com excessiva rapidez E essa demanda que regula e determina o estado de propagação da espécie em todos os países do mundo na América do Norte na Europa e na China É esta demanda que faz com que essa propagação aumente rapidamente na América do Norte seja mais lenta e gradual na Europa e permaneça basicamente estacionária na China Temse dito que o desgaste de um escravo representa uma despesa que pesa sobre seu patrão ao passo que o de um empregado livre pesaria sobre ele mesmo Na realidade porém o desgaste deste último pesa tanto sobre o patrão quanto o do escravo Os salários pagos a diaristas e empregados de todo tipo devem ser tais que lhes possibilitem continuar a procriar diaristas e empregados conforme a demanda da sociedade crescente decrescente ou estacionária exigir eventual mente Mas embora o desgaste de um empregado livre também pese sobre seu patrão geralmente custalhe muito menos do que o do escravo O fundo destinado a substituir ou reparar se assim se puder dizer o desgaste de um escravo geralmente é administrado por um patrão negligente ou por um supervisor descuidado O fundo destinado a re parar ou substituir o desgaste de um homem livre é administrado por ele mesmo As desordens que geralmente prevalecem na economia dos ricos introduzemse naturalmente na administração do primeiro fundo da mesma forma que a estrita frugalidade e a atenção parcimoniosa dos pobres de modo natural se estabelecem na administração do se gundo fundo Com uma administração tão diferente o mesmo objetivo deve exigir graus muito diferentes de despesa para executálo Com base na experiência de todas as épocas e nações acredito pois que o trabalho executado por pessoas livres ao final se torna mais barato do que o executado por escravos Isso ocorre até em Boston Nova York e Filadélfia onde os salários do trabalho comum são altíssimos OS ECONOMISTAS 130 Por conseguinte assim como a remuneração generosa do trabalho é o efeito da riqueza crescente da mesma forma é a causa do aumento da população Queixarse disso equivale a lamentarse sobre a causa e o efeito necessário da prosperidade máxima da nação Talvez mereça ser observado que a condição dos trabalhadores pobres parece ser a mais feliz e a mais tranqüila no estado de progresso em que a sociedade avança para maior riqueza e não no estado em que já conseguiu sua plena riqueza A condição dos trabalhadores é dura na situação estacionária e miserável quando há declínio econômico da nação O estado de progresso é na realidade o estado desejável e favorável para todas as classes sociais ao passo que a situação esta cionária é a inércia e o estado de declínio é a melancolia Assim como a remuneração generosa do trabalho estimula a pro pagação da espécie da mesma forma aumenta a laboriosidade Os sa lários representam o estímulo da operosidade a qual como qualquer outra qualidade humana melhora em proporção ao estímulo que recebe Meios de subsistência abundantes aumentam a força física do traba lhador é a esperança confortante de melhorar sua condição e talvez terminar seus dias em tranqüilidade e abundância o anima a empenhar suas forças ao máximo Portanto onde os salários são altos sempre veremos os empregados trabalhando mais ativamente com maior di ligência e com maior rapidez do que onde são baixos é o que se verifica por exemplo na Inglaterra em comparação com a Escócia o mesmo acontecendo nas proximidades das cidades grandes em comparação com as localidades mais recuadas do interior Com efeito certos tra balhadores podendo ganhar em 4 dias o suficiente para se manterem durante uma semana folgarão nos três outros dias Este porém não é o caso da grande maioria Pelo contrário os empregados quando bem pagos por peça facilmente fazem horas extraordinárias e arruínam sua saúde e sua constituição em poucos anos Supõese que um car pinteiro em Londres e em alguns outros lugares não mantém seu vigor máximo além de 8 anos Algo semelhante ocorre em muitas outras ocupações nas quais os trabalhadores são pagos por peça como ge ralmente ocorre nas manufaturas e mesmo no trabalho rural onde os salários são mais altos que os costumeiros Quase todas as classes de artesãos estão sujeitas a uma enfermidade específica em decorrência da dedicação excessiva à profissão Ramuzzini eminente médico ita liano escreveu um livro especialmente sobre tais doenças Não enqua dramos nossos soldados entre as pessoas mais laboriosas deste país Todavia quando se lhes confiam certas modalidades de trabalho e quando são pagos generosamente por peça seus oficiais freqüentemente têm sido obrigados a ajustar com o patrão que não se lhes permita ganhar acima de um certo montante por dia de acordo com o seu nível salarial Antes dessa determinação a emulação mútua e o desejo de maior ganho muitas vezes os estimulavam a fazer horas extraordiná rias prejudicando sua saúde com o trabalho excessivo A aplicação excessiva durante 4 dias da semana é muitas vezes a causa real da ADAM SMITH 131 ociosidade que se observa nos 3 outros dias restantes alvo de tantas queixas Um trabalho intenso intelectual ou manual continuado por vários dias na maioria das pessoas é seguido naturalmente de um grande desejo de repouso o qual é praticamente irresistível a não ser que se intervenha com a força ou com outra medida forte Tratase de um imperativo da natureza a qual para recuperação exige recreação não bastando às vezes somente relaxar mas também dissipar e divertir Se essa exigência não for atendida as conseqüências são muitas vezes perigosas e por vezes fatais e sempre mais cedo ou mais tarde acar retam a doença típica do ofício Se os patrões se ativessem sempre aos ditames da razão e da justiça muitas vezes fariam melhor em moderar a dedicação de muitos de seus operários ao invés de estimulála Po derseá verificar pareceme em qualquer sorte de ocupação que a pessoa que trabalha com moderação de maneira a ter condições de trabalhar constantemente não somente preserva sua saúde ao máximo como executa a quantidade máxima de serviço no decurso do ano Afirmase que em anos de preços baixos os operários são geral mente mais ociosos e nos anos de preços altos são mais laboriosos do que comumente Então temse concluído que uma subsistência abun dante reduz a produtividade do trabalhador ao passo que uma sub sistência deficiente a aumenta Não resta dúvida de que uma fartura um pouco maior do que a comum pode tornar preguiçosos certos em pregados mas não parece muito provável que possa ter esse efeito sobre a maioria deles ou que as pessoas geralmente trabalham melhor quando mal alimentadas quando estão desanimadas do que quando estão em boa forma quando estão freqüentemente doentes do que quan do gozam de boa saúde Importa observar que os anos de carestia são geralmente entre o povo comum anos de doença e de mortalidade que não podem deixar de diminuir a produção resultante de seu trabalho Em anos de abundância muitas vezes os empregados abandonam seus patrões e procuram sua subsistência no trabalho autônomo Mas os mesmos preços baixos dos mantimentos por aumentarem o fundo destinado à manutenção dos empregados estimula os patrões sobre tudo os da agricultura a empregar um número maior de trabalhadores Em tais ocasiões os proprietários rurais esperam mais lucro de seu trigo mantendo alguns trabalhadores a mais do que vendendoo a baixo preço no mercado A demanda de mãodeobra aumenta ao passo que diminui o número dos que se oferecem para atender a tal demanda Freqüentemente portanto o preço da mãodeobra aumenta em anos de preços baixos Em anos de escassez a dificuldade e a incerteza da subsistência fazem toda essa gente voltar ansiosamente ao serviço Mas o alto preço dos gêneros por diminuir os fundos destinados à manutenção dos em pregados leva os patrões antes a diminuir do que a aumentar o número dos empregados também em anos de preços altos os trabalhadores autônomos pobres freqüentemente consomem o reduzido capital que haviam utilizado para adquirir os materiais necessários para seu tra OS ECONOMISTAS 132 balho sendo obrigados a tornarse novamente diaristas para poderem subsistir O número de candidatos a emprego é maior do que as vagas disponíveis no mercado de mãodeobra muitos se dispõem a trabalhar por salários mais baixos do que os normais sendo que tanto os salários dos empregados como o dos diaristas muitas vezes baixam em anos de preços altos Eis por que os patrões de todos os tipos muitas vezes fazem melhor os negócios com seus empregados em anos de preços altos do que em anos de preços baixos encontrandoos mais humildes e depen dentes na primeira hipótese do que na segunda É por isso que reco mendam naturalmente o primeiro como o mais favorável à produtivi dade do trabalho Além disso os proprietários de terra e os arrenda tários duas das maiores categorias de patrões têm outra razão para alegrarse com os anos de preços altos Com efeito a renda dos primeiros e o lucro dos segundos dependem muito do preço dos man timentos Nada porém pode ser mais absurdo que imaginar que nor malmente as pessoas trabalhem menos quando trabalham para si mes mos do que quando trabalham para terceiros De modo geral um trabalhador independente pobre será mais laborioso do que um diarista pago por peça O primeiro desfruta do produto integral de seu trabalho ao passo que o segundo o reparte com o patrão O primeiro em sua condição de autônomo está menos sujeito à tentação das más compa nhias as quais em grandes manufaturas tão freqüentemente arruínam o moral dos outros Ainda maior é provavelmente a superioridade do trabalhador autônomo em relação a empregados contratados por mês ou por ano e cujos salários não sofrem alteração trabalhando muito ou pouco Anos de preços baixos tendem a aumentar a proporção de trabalhadores independentes em relação a diaristas e empregados de todos os tipos e anos de preços altos tendem a diminuir o número deles Um autor francês de grande conhecimento e engenho Messance recebedor das talhas na eleição de St Etienne procura mostrar que os pobres produzem mais em anos de preços baixos do que em anos de preços altos comparando a quantidade e o valor dos bens fabricados nessas ocasiões diferentes nas três manufaturas seguintes uma de lãs brutas localizada em Elbeuf outra de linho e outra de seda estas duas estendendose a toda a província de Rouen De seu relato trans crito dos registros oficiais aparece que a quantidade e o valor dos bens fabricados nessas três manufaturas geralmente têm sido maior em anos de preços baixos do que em anos de preços altos e que as quantidades maiores sempre se registraram nos anos de preços mais baixos e a produtividade mínima ocorre nos anos de preços mais altos As três parecem ser manufaturas estacionárias ou seja embora sua produção possa apresentar alguma variação de um ano para outro no global não estão progredindo nem regredindo A manufatura de linho na Escócia e de lã bruta na parte ocidental do Yorkshire são manufaturas em crescimento cuja produção embora apresentando algumas variações geralmente está aumentando Toda ADAM SMITH 133 via após examinar os relatos publicados sobre sua produção anual não consegui comprovar que suas variações tenham alguma correlação sensível com os preços altos ou baixos das estações Em 1740 ano de grande escassez as duas manufaturas decaíram consideravelmente Mas em 1756 outro ano de grande escassez a manufatura escocesa registrou progressos acima do normal A manufatura de Yorkshire de clinou e sua produção não atingiu o que havia sido de 1755 até 1766 depois da rejeição da lei americana sobre o selo Naquele ano e no ano subseqüente superou de muito o que havia atingido antes e desde então tem continuado a crescer A produção de todas as grandes manufaturas de bens para venda a grande distância deve necessariamente depender não tanto dos pre ços altos ou baixos nos países em que operam mas antes das circuns tâncias que afetam a demanda nos países em que os bens são consu midos da situação de paz ou de guerra e da boa ou má disposição de seus clientes Além disso grande parte do trabalho extraordinário pro vavelmente executado nos anos de preços baixos nunca entra nos re gistros oficiais das manufaturas Os empregados que abandonam o serviço de seus patrões tornamse trabalhadores autônomos As mu lheres voltam à casa de seus pais e geralmente fiam para fazer tecidos para si e suas famílias Mesmo os trabalhadores autônomos nem sempre trabalham para vender ao público mas são empregados por alguns de seus vizinhos para fabricar artigos para uso familiar Portanto a pro dução de seu trabalho via de regra não figura nesses registros oficiais cujos dados às vezes são publicados com tanto alarido e com base nos quais seria inútil os nossos comerciantes e manufatores pretenderem proclamar a prosperidade ou o declínio dos maiores impérios Embora as variações no preço da mãodeobra não somente não coincidam sempre com as variações no preço dos mantimentos mas muitas vezes sejam frontalmente opostas não devemos com base nisto imaginar que o preço dos mantimentos não tenha nenhuma influência sobre o preço da mãodeobra O preço do trabalho em dinheiro é ne cessário por duas circunstâncias a demanda de mãodeobra e o preço dos artigos necessários e confortos materiais A demanda de mãode obra conforme estiver em aumento em estagnação ou em declínio determina a quantidade dos artigos necessários e dos confortos mate riais que devem ser assegurados ao trabalhador e o preço do trabalho em dinheiro é determinado pelo que é necessário para comprar esta quantidade Portanto embora o preço da mãodeobra em dinheiro seja às vezes alto quando o preço dos mantimentos é baixo seria ainda mais alto continuando a demanda inalterada se o preço dos gêneros fosse alto Se o preço da mãodeobra em dinheiro às vezes sobe em um caso e em outro desce é porque a demanda de mãodeobra aumenta em anos de abundância repentina e extraordinária e diminui nos anos de escassez repentina e extraordinária Em um ano de abundância repentina e extraordinária muitos OS ECONOMISTAS 134 dos empregadores têm fundos suficientes para manter e empregar um número maior de pessoas laboriosas do que o contingente já empregado no ano anterior e nem sempre se consegue este número extraordinário de trabalhadores Por isso os patrões que querem mais mãodeobra disputam para conseguilo o que às vezes faz subir tanto o preço real do trabalho quanto seu preço em dinheiro Em um ano de escassez repentina e extraordinária ocorre o con trário Os fundos destinados a empregar mãodeobra são menores que os disponíveis no ano inteiro Um número considerável de pessoas perde seu emprego e esses desempregados disputam as poucas vagas existentes o que por vezes faz baixar tanto o preço real da mãodeobra quanto seu preço em dinheiro Em 1740 ano de escassez incomum muitos estavam dispostos a trabalhar apenas para sobreviver Nos anos subseqüentes de abundância era mais difícil conseguir trabalhadores e empregados A escassez característica de um ano de preços altos por diminuir a demanda de mãodeobra tende a baixar seu preço assim como o alto preço dos mantimentos tende a levantálo Ao contrário a abun dância de um ano de preços baixos por aumentar a demanda tende a elevar o preço da mãodeobra assim como o preço baixo dos man timentos tende a baixálo Nas variações comuns do preço dos gêneros essas duas causas opostas parecem contrabalançarse mutuamente esta é provavelmente em parte a razão pela qual os salários do tra balho em toda parte são mais constantes e permanentes do que o preço dos gêneros O aumento dos salários do trabalho necessariamente faz subir o preço de muitas mercadorias por aumentar o componente salários tendendo assim a reduzir seu consumo tanto no país como no exterior Todavia a mesma causa que faz subir os salários do trabalho ou seja o aumento do capital tende a aumentar as forças produtivas do trabalho e fazer com que uma quantidade menor de mãodeobra produza uma quantidade maior de trabalho O dono do capital que emprega um grande número de trabalhadores necessariamente procura para sua própria vantagem fazer uma tal divisão e distribuição adequada do emprego que possam produzir o máximo de trabalho possível Pela mesma razão ele procura colocarlhes à disposição as melhores má quinas que tanto ele como os trabalhadores possam imaginar Ora o que ocorre entre os trabalhadores de uma oficina específica acontece pelas mesmas razões entre os trabalhadores de uma grande sociedade Quanto maior for seu número tanto mais se dividirão naturalmente em diferentes classes e subclasses de emprego É maior o número de cérebros ocupados em inventar as máquinas mais adequadas para exe cutar o trabalho de cada um sendo portanto maior a probabilidade de se inventarem efetivamente tais máquinas Haverá portanto muitas mercadorias que em conseqüência desses aperfeiçoamentos podem ser produzidas por um número tão reduzido de trabalhadores que o au mento do preço delas é mais do que compensado pela diminuição de sua quantidade ADAM SMITH 135 CAPÍTULO IX Os Lucros do Capital O aumento e a diminuição dos lucros do capital dependem das mesmas causas que o aumento e a diminuição dos salários do trabalho do estado de progresso ou de declínio da riqueza da sociedade porém essas causas afetam um e outro de maneira muito diferente O aumento do capital o qual faz subir os salários tende a baixar o lucro Quando o capital de muitos comerciantes ricos é aplicado no mesmo negócio naturalmente sua concorrência mútua tende a reduzir seus lucros e quando há semelhante aumento de capital em todos os diversos ramos de negócio de uma mesma sociedade a mesma concor rência produz necessariamente o mesmo efeito em todos eles Já foi observado que não é fácil dizer com certeza quais são os salários médios do trabalho mesmo em lugar determinado e em mo mento específico Mesmo nesse caso raramente podemos determinar outra coisa senão os salários mais comuns Ora mesmo isso raramente pode ser feito com referência aos lucros do capital O lucro flutua tanto que a própria pessoa que desenvolve determinado negócio nem sempre tem condições de dizernos qual é a média de seu lucro anual Este é afetado não somente por cada variação do preço das mercadorias com as quais a pessoa negocia mas também pela boa ou má sorte de seus concorrentes e de seus clientes e por um semnúmero de outras cir cunstâncias e eventos aos quais estão sujeitos os bens quando trans portados por mar ou por terra ou mesmo quando estocados em um armazém O lucro varia portanto não só de ano para ano mas de um dia para o outro e quase de uma hora para a outra Saber com certeza qual é o lucro médio de todos os empreendimentos em um vasto Reino será uma tarefa muito mais difícil e julgar com algum grau de precisão qual pode ter sido o lucro no passado recente ou em períodos remotos eis uma tarefa totalmente impossível Entretanto ainda que seja impossível determinar com algum grau de precisão qual é ou foi a média dos lucros do capital no presente 137 ou em tempos antigos a consideração dos juros do dinheiro é capaz de darnos uma idéia sobre os lucros Podese adotar como máxima que onde se pode ganhar muito com o uso do dinheiro muito se pagará por esse uso e onde pouco se pode ganhar com o uso dele menos ainda é o que se pagará comumente por esse uso Conforme portanto a taxa habitual de mercado dos juros variar em um país podemos ter certeza de que os lucros do capital variarão com ela baixam quando ela baixa e sobem quando ela sobe Portanto a evolução dos juros do dinheiro pode levarnos a formar alguma idéia sobre a evolução do lucro do capital O Decreto 37 de Henrique VIII declarou ilegais quaisquer juros acima de 10 Ao que parece antes dele por vezes se cobrava uma taxa superior a essa No reinado de Eduardo VI o zelo religioso chegou a proibir qualquer tipo de juro Afirmase porém que essa proibição como todas as outras desse tipo não produziu efeito algum e prova velmente aumentou o mal da usura ao invés de reduzilo O Estatuto de Henrique VIII foi renovado pelo Decreto 13 de Isabel no capítulo 8 sendo que 10 continuou sendo a taxa legal de juros até o Decreto 21 de Jaime I quando se operou uma redução para 8 Logo após a Restauração houve uma redução para 6 e o Decreto 12 da Rainha Ana a reduziu para 5 Todas essas regulamentações estatutárias parecem ter sido feitas com grande propriedade Parecem ter seguido e não antecipado a taxa de juros de mercado ou seja a taxa à qual pessoas de bom crédito costumavam tomar empréstimos Desde o tempo da rainha Ana 5 parece ter sido uma taxa mais acima do que abaixo da taxa de mercado Antes da última guerra o Governo tomava empréstimos a 3 e pessoas de bom crédito na capital e em muitas outras partes do Reino pagavam 35 4 e 45 Desde o tempo de Henrique VIII a riqueza e a renda do país têm progredido continuamente e no decurso de seu progresso parece que o ritmo foi sendo gradativamente acelerado e não retardado Ao que parece a riqueza e a renda do país não somente aumentaram mas aumentaram em ritmo cada vez mais rápido Durante o mesmo período os salários do trabalho aumentaram continuamente e na maior parte dos diversos ramos de comércio e das manufaturas os lucros do capital diminuíram Via de regra requerse um capital maior para movimentar um negócio em uma cidade grande do que em um vilarejo Os grandes capitais empregados em cada ramo de negócio e o número de concor rentes ricos geralmente reduzem a taxa de lucro nas cidades grandes abaixo da taxa que se pode conseguir no campo Ao contrário os salários do trabalho costumam ser mais altos em uma cidade grande do que em uma aldeia Em uma cidade próspera as pessoas que dispõem de grandes capitais a investir muitas vezes não conseguem ter a quan tidade de trabalhadores de que necessitam e por isso concorrem entre si para conseguir a quantidade possível o que aumenta os salários e OS ECONOMISTAS 138 diminui os lucros do capital Nas regiões afastadas do país muitas vezes não há capital suficiente para empregar todos os trabalhadores e nesta situação eles concorrem entre si para conseguir emprego o que faz baixar os salários e subir os lucros do capital Na Escócia embora a taxa de juros seja a mesma que na Ingla terra a taxa do mercado é geralmente mais alta As pessoas de exce lente crédito raramente pagam menos de 5 Mesmo banqueiros pri vados de Edimburgo pagam 4 pelas suas notas promissórias cujo pagamento total ou parcial pode ser solicitado à vontade Os ban queiros privados de Londres não pagam juros pelo dinheiro depositado em seus bancos Poucos são os negócios que não se podem fazer com um capital menor na Escócia do que na Inglaterra Por isso a taxa comum de lucro deve ser algo mais alta Já foi observado que os salários do trabalho são mais baixos na Escócia que na Inglaterra O próprio país não somente é muito mais pobre senão que também o ritmo do progresso pois é evidente que esse existe parece ser muito mais lento e retardado Na França a taxa legal de juros no decorrer deste século nem sempre se tem regulado pela taxa de mercado127 Em 1720 os juros foram reduzidos do 20º para o 15º pêni ou de 5 para 2 Em 1724 a taxa foi elevada para o 13º pêni ou seja 3 13 Em 1725 foi no vamente aumentada para o 20º pêni ou 5 Em 1766 durante a ad ministração de Laverdy os juros foram reduzidos para o 25º pêni isto é 4 Depois disso o padre Terray elevouos depois à velha taxa de 5 O suposto objetivo de tantas reduções violentas dos juros era pre parar o caminho para reduzir o nível das dívidas públicas objetivo que algumas vezes foi conseguido Talvez a França hoje não seja tão rica como a Inglaterra embora a taxa legal de juros no país muitas vezes tenha sido mais baixa que na Inglaterra a taxa de mercado geralmente tem sido mais alta pelo fato de que lá como em outros países se dispõem de métodos muito seguros e fáceis de evasão à lei Foime assegurado por comerciantes britânicos que negociaram nos dois países que os lucros são maiores na França do que na Inglaterra por isso não há dúvida de que muitos súditos britânicos preferem antes empregar seu capital em um país em que o comércio está desa creditado do que em um país onde ele é altamente respeitado Os salários do trabalho são mais baixos na França do que na Inglaterra Quando passamos da Escócia para a Inglaterra a diferença que po demos notar entre o modo de vestir e a aparência do povo em geral entre um país e outro constitui um indicador suficiente para aferir a diferença de condições entre os dois países O contraste é ainda maior se regressarmos da França A França embora sem dúvida seja um país mais rico que a Escócia parece não estar progredindo tão rapi damente quanto esta última No país existe a idéia generalizada mesmo ADAM SMITH 139 127 Ver DENISART Taux des Intérêts t III p 18 entre o povo de que a nação está regredindo opinião que em meu entender carece de fundamento no tocante à França e muito mais no caso da Escócia com efeito para convencerse do contrário basta olhar a Escócia hoje depois de têla visto há 20 ou 30 anos Por outro lado a província da Holanda em comparação com a extensão de seu território e o seu contingente populacional é um país mais rico que a Inglaterra Lá o Governo toma empréstimos a 2 e particulares de bom crédito pagam 3 Afirmase que os salários do trabalho são mais altos na Holanda do que na Inglaterra e como se sabe muito bem os holandeses negociam com taxas de lucro mais baixas do que qualquer outro povo da Europa Alguns pretendem que o co mércio na Holanda esteja em decadência isso pode talvez ser verdade em relação a alguns setores Todavia esses sintomas parecem constituir indicação suficiente de que não existe uma queda generalizada Quando o lucro diminui os comerciantes ficam muito propensos a queixarse de que o comércio em geral está em decadência embora a redução do lucro seja o efeito natural e sua prosperidade ou então uma conse qüência do fato de se estar aplicando um capital maior do que antes Durante a última guerra os holandeses conseguiram apoderarse de todo o comércio internacional de intermediação da França do qual ainda hoje conservam uma parcela ponderável Os grandes bens que possuem tanto nos fundos franceses como nos ingleses aproxima damente 40 milhões somente nos fundos ingleses como se afirma em bora eu pessoalmente acredite haver muito exagero nesta cifra e as grandes quantias que empresta a particulares em países em que a taxa de juros é mais alta do que em seu país são circunstâncias que indubitavelmente demonstram o excesso de seu capital ou seja que esse cresceu além do que conseguem aplicar com lucro aceitável em sua economia interna entretanto os holandeses não demonstram que seus negócios internos decresceram Assim como o capital de um par ticular embora adquirido por meio de um negócio determinado pode aumentar além do que seja capaz de empregar nele e não obstante isso esse negócio continua também a crescer o mesmo pode acontecer com o capital de uma grande nação Em nossas colônias norteamericanas e das Índias Ocidentais são mais altos que na Inglaterra não somente os salários mas também os juros do dinheiro e conseqüentemente os lucros do capital Nas diversas colônias as taxas de juros tanto a legal como a de mercado vão de 6 a 8 Entretanto altos salários e altos lucros de capital são coisas que talvez muito dificilmente andam juntas exceto nas circuns tâncias peculiares a colônias novas Uma colônia nova sempre deve durante algum tempo ter maior carência de capital em comparação com a extensão de seu território e ser mais subpovoada em comparação com a extensão de seu capital do que a maioria dos outros países Essas colônias recentes têm mais terra do que capital para investir nela O capital de que dispõem é portanto aplicado somente no cultivo das áreas mais férteis e melhor localizadas ou seja nas terras loca OS ECONOMISTAS 140 lizadas perto da costa marítima e ao longo das margens dos rios na vegáveis Essas áreas aliás são muitas vezes compradas a um preço abaixo do valor e mesmo abaixo do valor de sua produção natural O capital aplicado na compra e no aprimoramento dessas áreas neces sariamente produz um lucro muito grande podendose portanto pagar juros muito altos O acúmulo rápido de capital em um negócio tão rentável possibilita ao plantador aumentar sua mãodeobra em um ritmo mais rápido do que pode encontrála em uma nova colônia Os trabalhadores que o plantador consegue empregar portanto são muito liberalmente remunerados À medida que a colônia se desenvolve os lucros do capital diminuem gradualmente Quando as áreas mais férteis e mais bem localizadas estiverem todas ocupadas será menor o lucro que se poderá auferir do cultivo de áreas de qualidade e de localização menos privilegiadas sendo também mais baixos os juros que poderão ser pagos pelo capital ali aplicado Eis por que na maioria das nossas colônias tanto a taxa legal de juros como a taxa de mercado têm sido consideravelmente reduzidas durante o século atual Na medida em que aumentaram a riqueza os melhoramentos e a população os juros declinaram Os salários do trabalho não baixam com a diminuição dos lucros do capital A demanda de mãodeobra cresce com o aumento do capital quaisquer que sejam os lucros dele auferidos e depois que esses diminuem o capital não somente pode continuar a aumentar mas até a crescer mais rapidamente do que antes Com as nações laboriosas que progridem na aquisição da riqueza ocorre o mesmo que com indivíduos laboriosos Um capital grande embora produza lucros pequenos geralmente aumenta com maior rapidez que um capital re duzido com lucros elevados Segundo diz o provérbio dinheiro gera di nheiro Quando se tem um pouco de capital muitas vezes é fácil conseguir mais O grande problema é conseguir esse pouco inicial A correlação entre o aumento do capital e o aumento do trabalho ou seja da demanda de trabalho útil já foi em parte explicada mas explicação mais completa virá adiante quando tratarmos do acúmulo de capital A aquisição de novo território ou de novos setores de comércio às vezes pode aumentar os lucros do capital e com isso os juros do dinheiro mesmo em um país que está avançando com rapidez na aqui sição da riqueza Pelo fato de o capital do país não ser suficiente para todos os negócios que as riquezas conquistadas propiciam às diversas pessoas entre as quais está dividido o capital este passa a ser aplicado somente naqueles setores específicos que asseguram o máximo de lucro Uma parte do capital que anteriormente havia sido aplicado a outros tipos de comércio necessariamente passa a ser retirado dali e canalizado para algum negócio novo e mais rendoso Em conseqüência em todos esses negócios antigos a concorrência passa a ser menor do que antes O mercado passa a ser suprido com menor abundância de muitos tipos de bens O preço desses bens necessariamente aumenta mais ou menos dando um grande lucro para aqueles que os comercializam podendo eles portanto permitirse pagar juros mais altos Durante algum tempo ADAM SMITH 141 após o término da última guerra era comum não somente particulares com melhor crédito mas também algumas das melhores companhias de Londres contraírem empréstimos a 5 quando antes disso não costumavam pagar mais do que 4 ou 45 A grande conquista tanto de território como de comércio por nossas aquisições na América do Norte e nas Índias Ocidentais explicarão suficientemente esse fato sem se ter que supor uma diminuição no capital da sociedade Uma tão grande conquista de novos negócios a ser levados a cabo pelo antigo capital devem necessariamente ter diminuído a quantidade empregada em grande número de setores particulares nos quais sendo menor a concorrência o lucro deve terse tornado maior Mais adiante terei oportunidade de mencionar as razões que me levam a crer que o estoque de capital da GrãBretanha não diminui nem mesmo em conseqüência da enorme despesa ocasionada pela última guerra Entretanto a diminuição do estoque do capital de uma sociedade ou dos fundos destinados à manutenção da mãodeobra assim como baixa os salários aumenta os lucros do capital e conseqüentemente também os juros do dinheiro Pelo fato de baixarem os salários os donos do capital remanescente na sociedade têm condições para colocar suas mercadorias no mercado com despesas menores do que antes podendo vendêlas mais caro já que é menor do que antes o capital empregado para colocálas no mercado Portanto suas mercadorias cus tam menos para eles porém eles as vendem mais caro Pelo fato por tanto de estarem lucrando tanto na compra como na venda delas podem permitirse pagar juros mais altos As grandes fortunas adqui ridas tão de repente e com tanta facilidade em Bengala e nos outros estabelecimentos britânicos nas Índias Orientais comprovamnos que assim como os salários são muito baixos os lucros do capital são muito altos nesses países arruinados Com os juros do dinheiro ocorre a mesma correlação Em Bengala emprestase dinheiro aos agricultores a 40 50 e até 60 e a próxima colheita é hipotecada para o pagamento Assim como os lucros permitidos por essas taxas de juros necessaria mente comem quase toda a renda devida ao dono da terra da mesma forma essa usura de tal monta devora por seu turno a maior parte daqueles lucros Antes da queda da República dos romanos parece ter sido generalizada uma usura do mesmo tipo nas províncias sob a admi nistração desastrosa de seus procônsules Segundo nos informam as cartas de Cícero o virtuoso Brutus emprestava dinheiro em Chipre a 48 Em um país que tivesse adquirido toda a riqueza compatível com a natureza de seu solo e clima e com a sua localização em relação a outros países e que portanto não tivesse mais possibilidade de pro gredir mas ao mesmo tempo não estivesse regredindo aconteceria o seguinte tanto os salários do trabalho como os lucros do capital seriam provavelmente muito baixos Em um país totalmente povoado tanto em relação ao território necessário para manter essa população quanto em relação ao capital necessário para darlhe emprego a concorrência para conseguir emprego necessariamente seria tão grande que reduziria OS ECONOMISTAS 142 os salários ao estritamente necessário para conservar o número de trabalhadores sendo que esse número jamais poderia ser aumentado pois o país já estaria no caso totalmente povoado Em um país saturado de capital em relação a todos os negócios a transacionar esse montante tão alto de capital seria aplicado em todo e qualquer setor específico que a extensão do comércio comportasse Em conseqüência a concor rência seria em toda parte a máxima imaginável e o lucro comum do capital seria igualmente o mais baixo possível Talvez porém nenhum país tenha ainda chegado a esse grau de opulência A China parece ter permanecido estacionária por muito tempo e provavelmente muito antes havia atingido aquele máximo de riqueza consentâneo com a natureza de suas leis e instituições En tretanto esse máximo pode ser muito inferior ao que comportaria a natureza de seu solo seu clima e sua localização com outras leis e instituições Um país que negligencia ou menospreza o comércio exte rior e que só permite a entrada dos navios de outras nações em um ou outro de seus portos não pode efetuar o mesmo volume de negócios que teria condições de fazer com leis e instituições diferentes Além disso em um país em que embora os ricos ou seja os donos de grandes capitais desfrutam de muita segurança e os pobres ou seja os donos de capitais pequenos não têm praticamente nenhuma segurança e além disso estão sujeitos sob pretexto de justiça a serem pilhados e sa queados a qualquer momento pelos mandarins inferiores o volume de capital empregado nos diversos setores de comércio jamais pode ser igual àquilo que a natureza e a extensão desse negócio comportaria Em cada setor a opressão dos pobres deve levar ao monopólio dos ricos os quais reservando todo o comércio para si terão condições de auferir lucros extraordinários Afirmase pois que os juros comuns na China são de 12 sendo óbvio que os lucros normais auferidos do capital devem ser suficientes para permitir juros tão elevados Uma deficiência na lei pode às vezes aumentar consideravelmente a taxa de juros acima daquilo que seria exigido pela condição do país no tocante à riqueza ou pobreza Quando a lei não obriga o cumprimento dos contratos ela coloca os tomadores de empréstimos no mesmo pé e situação em que se encontram em países mais bem organizados os que foram à bancarrota ou as pessoas de crédito duvidoso A incerteza de recuperar o dinheiro emprestado faz com que o emprestador de dinheiro pratique o mesmo grau de usura que geralmente se espera de quem foi à bancarrota Entre as nações bárbaras que invadiram as províncias ocidentais do Império Romano o cumprimento dos contratos foi durante muito tempo deixado à boafé das partes contratantes Ra ramente os tribunais de justiça intervinham neste assunto É talvez a esta razão que se devem em parte as altas taxas de juros apresen tadas nessas épocas antigas Quando a lei proíbe totalmente os juros não conseguirá impedi los Muitas pessoas terão que tomar empréstimos e ninguém dará empréstimo sem levar em conta o uso de seu dinheiro que seja con ADAM SMITH 143 sentâneo não somente com o que se possa fazer com esse uso mas também com a dificuldade e o perigo de infringir a lei Para Montes quieu as altas taxas de juros vigentes entre as nações maometanas devem atribuirse não à pobreza desses povos mas em parte a essa causa e em parte à dificuldade de reaver o dinheiro emprestado A taxa normal mínima de juros deve sempre ser algo superior ao que é suficiente para compensar as perdas ocasionais às quais está exposta qualquer aplicação de capital Somente esse excedente pode ser considerado como lucro limpo ou líquido O que se denomina lucro bruto muitas vezes engloba não somente esse excedente mas também o que é retido para compensar tais perdas extraordinárias Os juros que o tomador de empréstimo pode permitirse pagar são proporcionais somente ao lucro líquido Analogamente a taxa normal mínima de juros deve ser algo mais do que o suficiente para compensar as perdas ocasionais às quais está exposto quem dá o empréstimo mesmo usando de razoável prudência Se a taxa de juros não englobar esse algo mais os únicos motivos que levam ao empréstimo só podem ser a caridade ou a amizade Em um país que tivesse atingido seu grau pleno de riqueza e no qual em todo ramo específico de negócios houvesse o volume máximo de capital que nele pudesse ser aplicado assim como a taxa normal de lucro líquido seria muito baixa da mesma forma a taxa normal de juros de mercado admissível seria tão baixa que seria impossível uma pessoa viver dos juros de seu dinheiro a não ser que se tratasse dos indivíduos mais ricos Todas as pessoas de fortuna pequena ou média seriam obrigadas a supervisionar elas mesmas o emprego de seu ca pital Seria necessário que praticamente cada um fosse um homem de negócios ou se empenhasse em algum tipo de comércio A província da Holanda parece estar se aproximando desse estágio Lá está fora da moda não ser um homem de negócios A necessidade fez com que seja normal cada um ser assim e em toda parte é o costume que regula a moda Assim como é ridículo não vestirse da mesma forma é ridículo até certo ponto não ter ocupação como os outros Assim como um civil se sente mal em um acampamento ou em uma guarnição militar correndo até o risco de ser alvo da chacota nesse ambiente o mesmo acontece com uma pessoa ociosa entre homens de negócio A taxa normal máxima de lucro pode ser tal que no preço da maioria das mercadorias absorve integralmente o que deve ir para a renda da terra e deixa somente o que é suficiente para pagar o trabalho de preparálas e leválas ao mercado de acordo com a taxa mínima à qual se pode em qualquer lugar pagar a mãodeobra ou seja a mera subsistência do trabalhador De uma forma ou de outra o trabalhador em qualquer hipótese deve ter ganho o suficiente para manterse en quanto estava trabalhando mas o dono da terra nem sempre já recebeu necessariamente o seu pagamento Os lucros do comércio executado pelos empregados da Companhia das Índias Orientais em Bengala tal vez não estejam muito longe dessa taxa OS ECONOMISTAS 144 A proporção que a taxa comum de mercado dos juros deve manter com a taxa normal de lucro líquido necessariamente varia conforme o lucro aumentar ou diminuir Juros duplos na GrãBretanha é o que os comerciantes denominam um lucro bom moderado razoável ter mos que entendo eu significam o mesmo que um lucro comum e nor mal Em um país em que a taxa normal de lucro líquido é 8 ou 10 pode ser razoável que a metade se integre aos juros onde quer que o negócio seja executado com dinheiro emprestado O capital fica sob o risco do tomador do empréstimo o qual por assim dizer assegurao ao emprestador e 4 ou 5 podem na maioria dos casos ser um lucro suficiente sobre o risco do seguro e uma remuneração suficiente para o trabalho empregar o capital Todavia a proporção entre os juros e o lucro líquido não poderia ser a mesma em países em que a taxa normal de lucro fosse muito mais baixa ou muito mais alta Se fosse muito mais baixa talvez não se poderia atribuir a metade dela aos juros e se fosse muito mais alta poderseia atribuirlhe mais da metade Em países que avançam rapidamente para a riqueza a baixa taxa de lucro pode no preço de muitas mercadorias compensar os altos salários do trabalho e possibilitar a esses países vender tão barato quanto seus vizinhos menos prósperos entre os quais os salários do trabalho podem ser mais baixos Na realidade os lucros altos tendem muito mais a aumentar o preço do trabalho do que os altos salários Se por exemplo na manu fatura do linho os salários das diversas categorias de trabalhadores cardadores de linho fiandeiros tecelões etc fossem todos au mentados em 2 pence por dia seria necessário aumentar o preço de uma peça de linho somente em 2 pence vezes o número de trabalhadores empregados nesse serviço multiplicando o resultado pelo número de dias empregados na fabricação dessa peça Portanto aquela parte do preço que é representada pelos salários haveria de subir através de todos os estágios da fabricação somente em proporção aritmética a esse aumento salarial Ao contrário se aumentarmos de 5 o lucro de todos os empregadores desses trabalhadores a parte do preço da mercadoria que é representada pelo lucro aumentaria através dos di versos estágios da fabricação em proporção geométrica a essa taxa de lucro O empregador dos cardadores de linho ao vender seu produto exigiria um adicional de 5 sobre o valor total dos materiais e salários que adiantou a seus empregados O empregador dos fiandeiros exigiria um adicional de 5 tanto sobre o preço do linho que pagou adiantado como sobre os salários dos fiandeiros que também foram antecipados E o empregador dos tecelões exigiria também seus 5 tanto sobre o preço dos fios de linho que pagou adiantado como sobre os salários dos tecelões Ao aumentar o preço das mercadorias o aumento dos salários opera da mesma forma que juros simples o fazem no acúmulo do débito ao passo que o aumento do lucro opera como juros compostos Nossos comerciantes e donos de manufaturas reclamam muito dos efei ADAM SMITH 145 tos perniciosos dos altos salários aumentando o preço das mercadorias e assim diminuindo a venda de seus produtos tanto no país como no exterior Nada dizem sobre os efeitos prejudiciais dos lucros altos Si lenciam sobre os efeitos danosos de seus próprios ganhos Queixamse somente dos ganhos dos outros OS ECONOMISTAS 146 CAPÍTULO X Os Salários e o Lucro nos Diversos Empregos de MãodeObra e de Capital Em seu conjunto as vantagens e desvantagens dos diversos em pregos de mãodeobra e de capital em regiões vizinhas entre si devem ser perfeitamente iguais ou continuamente devem tender à igualdade Se na mesma região houvesse alguma ocupação ou emprego que visi velmente fosse mais ou menos vantajoso que os demais no primeiro caso seriam tantos que o procurariam e no segundo seriam tantos os que o abandonariam que as vantagens logo voltariam ao nível dos demais empregos Isso aconteceria em todo caso em uma sociedade em que se deixasse as coisas seguirem seu curso natural e em que houvesse perfeita liberdade tanto para cada um escolher as profissões que acreditasse apropriadas como para mudar de profissão sempre que considerasse conveniente O interesse de cada um o levaria a pro curar o emprego vantajoso e evitar o desvantajoso Os salários em dinheiro e o lucro na realidade são extremamente diferentes em toda a Europa de acordo com os diferentes empregos de mãodeobra e de capital Essa diferença tem origem em parte em certas circunstâncias ou fatores inerentes aos próprios empregos fatores esses que realmente ou ao menos na imaginação das pessoas respondem por um pequeno ganho pecuniário em alguns e contrabalançam um grande ganho em outros e em parte na política vigente na Europa que em nenhum lugar permite que as coisas ocorram com plena liberdade A consideração específica dessas circunstâncias e da mencionada política faz com que este capítulo se divida em duas partes PARTE PRIMEIRA Desigualdades decorrentes da natureza dos próprios empregos São cinco as principais circunstâncias que segundo tenho podido 147 observar respondem por um pequeno ganho pecuniário em alguns em pregos e contrabalançam um ganho grande em outros primeiro o ca ráter agradável ou desagradável dos próprios empregos segundo a facilidade e o pouco dispêndio ou a dificuldade e o alto dispêndio exi gidos para a aprendizagem dos empregos terceiro a constância ou inconstância desses empregos quarto o grau pequeno ou grande de confiança colocado naqueles que os ocupam quinto a probabilidade ou improbabilidade de ter sucesso neles Primeiramente os salários do trabalho variam segundo a facili dade ou dureza o grau de limpeza ou sujeira o prestígio ou desprestígio da profissão Assim na maioria dos lugares considerandose o ano todo um oficial de alfaiate ganha menos do que um oficial de tecelão Seu trabalho é muito mais fácil Um oficial de tecelão ganha menos do que um oficial de ferreiro Seu trabalho nem sempre é mais fácil mas é muito mais limpo Um oficial de ferrador embora seja um artesão raramente ganha tanto em 12 horas o que um mineiro que é apenas um operário ganha em 8 horas Seu trabalho não é tão sujo é menos perigoso e é executado à luz do dia e em cima do solo A honra representa uma grande parcela na remuneração de todas as profissões honrosas Quanto aos ganhos pecuniários considerando tudo geralmente essas profissões são mal remuneradas como procurarei mostrar depois O desprestígio tem um efeito contrário A ocupação de um açougueiro é brutal e odiosa mas em muitos lugares é mais rendosa do que a maior parte das ocupações comuns O emprego mais detestável é de carrasco público que em comparação com o volume de trabalho executado é mais bem remunerado do que qualquer outro emprego comum A caça e a pesca ocupações mais importantes da humanidade no estágio primitivo da sociedade transformaramse no estágio social adiantado na diversão mais agradável sendo que as pessoas fazem então por prazer o que antes faziam por necessidade Portanto no estágio social adiantado são todas pessoas muito pobres aquelas que abraçam como profissão o que para outros é um passatempo Os pes cadores são os mesmos desde o tempo de Teócrito128 Um caçador furtivo é em toda parte da GrãBretanha uma pessoa muito pobre Em países em que o rigor da lei não admite essa ocupação o caçador com permissão legal não está em muito melhores condições O gosto natural por aqueles empregos faz com que um maior número de pessoas os prefiram em relação àquelas que podem viver confortavelmente por meio deles e o produto de seu trabalho em proporção à sua quantidade chega sem pre ao mercado muito barato para que possa permitir mais do que os meios mínimos de subsistência aos trabalhadores O caráter desagradável e o desprestígio afetam os lucros do capital da mesma maneira que os salários do trabalho O proprietário de uma estalagem ou taverna que nunca é dono de sua própria casa e que OS ECONOMISTAS 148 128 Ver Idyllium XXI está exposto à brutalidade de qualquer beberrão exerce uma profissão que não é nem muito agradável nem muito prestigiada No entanto dificilmente existe uma profissão comum na qual um capital tão re duzido produza um lucro tão grande Em segundo lugar os salários do trabalho variam com a facilidade e o pouco dispêndio ou a dificuldade e a alta despesa requeridas para aprender a ocupação Quando se instala uma máquina cara devese esperar que o trabalho extraordinário a ser executado por ela antes que se desgaste permita recuperar o capital nela investido no mínimo com o lucro normal Uma pessoa formada ou treinada a custo de muito trabalho e tempo para qualquer ocupação que exija destreza e habilidade ex traordinárias pode ser comparada a uma dessas máquinas dispendio sas Esperase que o trabalho que essa pessoa aprende a executar além de garantirlhe o salário normal de um trabalho comum lhe permita recuperar toda a despesa de sua formação no mínimo com os lucros normais de um capital do mesmo valor E isso deve acontecer dentro de um prazo razoável levandose em conta a duração muito incerta da vida humana da mesma forma como se leva em conta a durabilidade mais certa da máquina A diferença entre os salários do trabalho qualificado e os do tra balho comum está fundada nesse princípio A política européia considera o trabalho de todos os mecânicos artífices e operários de manufaturas como trabalho qualificado e o de todos os trabalhadores do campo como trabalho comum Parece supor que o trabalho dos primeiros é de natureza mais exata e mais delicada que o dos segundos Em alguns casos talvez isso seja verdade mas na maioria dos casos ocorre coisa bem diferente como procurarei mostrar mais adiante Eis por que as leis e costumes da Europa para qualificar uma pessoa a executar um determinado tipo de trabalho impõem a necessidade de uma aprendizagem embora com rigor diferente con forme os lugares Os outros empregos deixamnos livres e abertos a quem queira Durante o período de aprendizagem o trabalho integral do aprendiz pertence a seu patrão Durante esse período o aprendiz em muitos casos deve ser mantido pelos seus pais ou parentes e quase em todos os casos depende deles para vestirse Costumase tam bém pagar algum dinheiro ao patrão por ensinar ao aprendiz a ocu pação Os que não podem dar dinheiro dão tempo ou então perma necem sem remuneração por um período de anos maior do que o cos tumeiro um tratamento que além de não ser sempre vantajoso para o patrão devido à habitual preguiça dos aprendizes representa sempre uma desvantagem para estes últimos Ao contrário no trabalho do campo o trabalhador enquanto desempenha as tarefas mais fáceis aprende as tarefas mais difíceis da profissão e com seu próprio trabalho mantémse em todos os estágios de seu emprego É pois razoável que na Europa os salários dos mecânicos artífices e operários de manu faturas sejam algo mais altos que os dos trabalhadores comuns E ADAM SMITH 149 realmente o são e seus ganhos maiores fazem com que na maioria dos lugares sejam considerados como uma categoria superior de pes soas Todavia essa superioridade é geralmente muito pequena os ga nhos diários ou semanais dos oficiais nos tipos mais comuns de ma nufatura tais como a de tecidos simples de linho e lã se computada a média na maioria dos lugares representam pouco mais do que o salário diário dos trabalhadores comuns Certamente sua profissão é mais constante e uniforme e a superioridade de seus ganhos consi derado o ano todo pode ser algo maior Entretanto parece evidente que não é maior do que o suficiente para compensar o custo mais alto de sua formação A formação para as artes inventivas e para as profissões liberais é ainda mais cansativa e dispendiosa Em conseqüência disso a re muneração de pintores e escultores de advogados e médicos deve ser muito superior e realmente o é Os lucros do capital parecem ser muito pouco afetados pela fa cilidade de ou dificuldade de aprender a ocupação em que o capital é aplicado Com efeito todos os diversos modos de emprego comum de capital nas grandes cidades parecem ser mais ou menos igualmente fáceis e igualmente difíceis de aprender Determinado setor do comércio externo ou interno dificilmente pode ser uma ocupação muito mais complexa do que outra Em terceiro lugar os salários do trabalho em ocupações diferentes variam com a constância ou a inconstância do emprego O emprego é muito mais constante em algumas ocupações do que em outras Na maior parte das manufaturas um diarista pode estar bastante seguro de emprego quase todos os dias do ano em que tiver condições de trabalhar Ao contrário um pedreiro não tem con dições de trabalhar com geada forte ou com mau tempo e nas outras ocasiões seu emprego depende dos chamados ocasionais de seus clientes Conseqüentemente ele está com freqüência sujeito a não ter trabalho Por esse motivo o que ele ganha enquanto está ocupado não somente deve ser suficiente para mantêlo quando está ocioso mas também para darlhe alguma compensação por aqueles momentos de ansiedade e tristeza pelos quais às vezes passa ao pensar em sua situação pre cária Portanto lá onde os ganhos da maior parte dos operários ma nufatureiros estão mais ou menos ao mesmo nível dos salários diários dos trabalhadores comuns os salários dos pedreiros são entre 50 e 100 mais altos que aqueles Lá onde os trabalhadores comuns ganham 4 ou 5 xelins por semana os pedreiros com freqüência ganham 7 ou 8 lá onde os primeiros ganham 6 os segundos ganham 9 ou 10 e onde os primeiros ganham 9 ou 10 como em Londres os segundos geralmente ganham 15 ou 18 E no entanto nenhum tipo de trabalho qualificado parece mais fácil de se aprender do que o dos pedreiros Afirmase que os carregadores de cadeirinhas de Londres durante o verão às vezes se empregam como pedreiros Por conseguinte os altos salários desses trabalhadores não são tanto a recompensa de sua ha OS ECONOMISTAS 150 bilidade senão mais a remuneração pela instabilidade que caracteriza sua profissão Um carpinteiro de casas parece exercer uma ocupação de tipo mais aperfeiçoado e mais inventivo que um pedreiro No entanto em alguns lugares pois não é assim em todos seu salário diário é algo mais baixo Sua ocupação embora dependa muito dos clientes não depende tanto quanto a do pedreiro além disso seu trabalho não está sujeito a ser interrompido pelo mau tempo Em se tratando de ocupações que geralmente garantem emprego constante quando eventualmente deixam de oferecer essa segurança em um determinado lugar os salários dos trabalhadores em questão sobem bastante em relação à proporção normal dos salários dos tra balhadores comuns Em Londres quase todos os artífices diaristas estão expostos a serem despedidos pelos seus patrões de um dia para outro de uma semana para outra da mesma forma que os diaristas de outros lugares Por isso a categoria mais baixa de artesãos os oficiais de alfaiate ganham em Londres meia coroa por dia embora o salário de um trabalhador comum gire em torno de 18 pence Em cidades pequenas e vilarejos os salários dos oficiais de alfaiates muitas vezes dificilmente igualam os dos trabalhadores comuns entretanto em Londres esses profissionais muitas vezes permanecem semanas inteiras desocupados sobretudo durante o verão Quando a instabilidade do emprego se associa à dureza do tra balho à sua natureza desagradável e à sujeira do serviço essas cir cunstâncias por vezes fazem o salário dos trabalhadores comuns subir acima do salário dos artesãos mais qualificados Supõese que em New castle um mineiro que trabalha por tarefa ganha geralmente em torno do dobro em muitos lugares da Escócia até o triplo do salário pago ao trabalho comum Esses salários altos são totalmente devidos à dureza do trabalho à sua natureza desagradável e à sujeira com que tem que lidar o trabalhador no exercício de sua profissão Na maioria dos casos essa profissão lhe pode assegurar a estabilidade que ele quiser Os carregadores de carvão de Londres exercem uma profissão que no tocante à dureza ao caráter desagradável e sujo do serviço quase se emparelha com a dos mineiros devido à irregularidade inevitável das chegadas dos navios transportadores de carvão essa profissão necessariamente oferece muito pouca estabilidade para a maioria deles Se portanto os mineiros ganham duas e até três vezes o salário dos trabalhadores comuns não deve parecer estranho que os carregadores de carvão devam ganhar às vezes quatro ou cinco vezes o que ganham os trabalhadores comuns Na pesquisa feita sobre a condição deles alguns anos atrás constatouse que com a taxa de salário vigente para eles podiam ganhar de 6 a 10 xelins por dia Seis xelins correspondem mais ou menos a quatro vezes o salário de um trabalhador comum em Londres sendo que em cada ocupação específica o salário mínimo comum pode sempre ser considerado como o ganho efetivamente auferido pela maioria Entretanto por mais exorbitantes ADAM SMITH 151 que possam parecer esses salários se fossem mais do que o suficiente para compensar todos os fatores desagradáveis da profissão surgiria logo um número tão grande de concorrentes que obrigaria a reduzir esses salários a um nível mais baixo tanto mais em se tratando de uma ocupação que não tem nenhum privilégio exclusivo A estabilidade ou instabilidade oferecida por uma ocupação não pode afetar o lucro normal do capital em nenhuma ocupação Empregar constantemente ou não o capital não depende da ocupação mas de quem aplica o capital Em quarto lugar os salários do trabalho variam de acordo com o grau de confiança pequeno ou grande que se deve depositar nos trabalhadores Os salários dos ourives e joalheiros em toda parte são superiores aos de muitos outros trabalhadores de aptidão igual ou até de habilidade superior isso em razão dos materiais preciosos que lhes são confiados Confiamos nossa saúde ao médico nossa fortuna e às vezes nossa própria vida ao advogado ou procurador Tal confiança não poderia seguramente ser depositada em pessoas de condição menos que me diana ou baixa Por isso a remuneração desses profissionais deve ser tal que lhes permita ocupar na sociedade aquela posição exigida pela confiança tão grande que neles se deposita O grande dispêndio de tempo e de dinheiro necessário para formar um profissional dessa ca tegoria se aliado a essa circunstância aumenta necessariamente ainda mais o preço de seu trabalho Quando uma pessoa aplica somente seu próprio capital em um negócio não há lugar para confiança e o crédito que pode receber de outras pessoas não depende da natureza do seu negócio mas do conceito que esses têm sobre a fortuna a probidade e a prudência do investidor do capital Por isso as diferenças de taxas de lucro de um negócio ou tipo de comércio para outro não podem provir dos diferentes graus de confiança depositada nos comerciantes Em quinto lugar o salário do trabalho em ocupações diferentes varia de acordo com a probabilidade ou improbabilidade de sucesso que elas oferecem Difere muito de uma ocupação para a outra a probabilidade de que uma determinada pessoa se qualifique um dia para a ocupação para a qual é formada Na maior parte das ocupações mecânicas o sucesso é mais ou menos certo sendo porém muito incerto nas profissões liberais Coloquemos nosso filho como aprendiz de sapateiro e poucas dúvidas haverá de que aprenderá a fazer um par de sapatos Se porém o fizermos estudar Direito veremos que dentre vinte haverá no máximo um cuja eficiência seja suficiente para possibilitarlhe viver dessa ocu pação Em uma loteria perfeitamente honesta os que ganham os prê mios deveriam ganhar tudo aquilo que perdem os que não acertaram Em uma profissão em que vinte fracassam e apenas um tem sucesso este deveria ganhar tudo aquilo que deveria ser ganho pelos vinte que fracassaram O assessor jurídico que talvez já próximo aos 40 anos OS ECONOMISTAS 152 de idade começa a ganhar algo com sua profissão deve receber a retribuição não somente pela sua própria formação tão demorada e dispendiosa mas também a de mais de vinte outros que jamais terão a probabilidade de ganhar alguma coisa como advogados Por mais exorbitantes que possam parecer os honorários cobrados pelos advo gados ou assessores jurídicos sua retribuição real nunca é igual a isso Calculese em qualquer lugar específico o que ganha provavelmente por ano e o que provavelmente gastam anualmente todos os diferentes trabalhadores comuns tais como os sapateiros ou tecelões e se verá que os ganhos geralmente superam os gastos Façase agora o mesmo cálculo em relação a todos os advogados e estudantes de Direito em todas as diversas escolas de Direito em Londres e se verá que seus ganhos anuais têm muito pouca proporção com seu gasto anual mesmo que se acredite que os ganhos são grandes e as despesas pequenas A loteria do Direito está portanto muito longe de ser uma loteria per feitamente honesta essa como muitas outras profissões liberais e res peitáveis é evidentemente mal remunerada em termos de dinheiro Não obstante isso essas profissões mantêmse ao nível de outras ocupações e a despeito desses desestímulos todos os espíritos mais generosos e liberais anseiam por exercêlas Duas são as causas que contribuem para recomendálas primeiro o desejo da reputação que a carreira lhes promete segundo a confiança natural alimentada mais ou menos por cada um não somente em suas próprias capacidades mas também na boa sorte Sobressair em uma profissão na qual apenas alguns conseguem atingir a mediocridade constitui a marca mais decisiva do que se chama gênio ou talento superior A admiração pública que se dispensa a tais habilidades exímias sempre faz parte da remuneração que merecem maior ou menor na medida em que o grau for mais ou menos alto Em se tratando de uma profissão médica esta admiração pública re presenta uma parte considerável da remuneração que lhe é efetiva mente paga uma parte talvez ainda maior no caso de um advogado no caso de um poeta e de um filósofo a admiração e o respeito públicos representam quase a remuneração completa que se lhes dá Existem alguns belos e apreciáveis talentos que provocam uma espécie de admiração em relação àqueles que os possuem mas o exer cício desses talentos por amor ao lucro é considerado quer com razão ou por preconceito como uma espécie de prostituição pública A remu neração pecuniária portanto daqueles que exercem tal profissão deve ser suficiente não somente para pagar o tempo o trabalho e a despesa de adquirir os talentos como também para o descrédito que envolve o seu emprego como meio de subsistência Os honorários exorbitantes pagos a atores cantores de ópera dançarinos de ópera etc estão fun dados nesses dois princípios a raridade e beleza dos talentos e o des crédito de empregálos dessa maneira Salta à vista que seria absurdo menosprezar suas pessoas e não obstante isso remunerar seus talentos com prodigalidade tão excessiva Fazendo uma coisa porém necessa ADAM SMITH 153 riamente fazemos a outra Se a opinião ou o preconceito público algum dia mudassem em relação a essas ocupações sua remuneração pecu niária logo diminuiria Seriam mais numerosas as pessoas que as abra çariam e a concorrência logo reduziria rapidamente o preço de seu trabalho Esses talentos embora estejam longe de ser comuns de forma alguma são tão raros como se imagina Muitas pessoas os possuem à perfeição mas desdenham em utilizálos e muitas mais seriam as capazes de adquirir tais talentos se com eles se pudesse fazer algo digno de respeito O altíssimo conceito que a maior parte das pessoas tem de suas próprias habilidades constitui um mal antigo salientado pelos filósofos e moralistas de todas as épocas Temse dado pouca atenção à absurda presunção que elas têm quanto à própria sorte E no entanto quando possível ela é ainda mais ilimitada Não existe ninguém que com razoável saúde e disposição esteja totalmente isento desse defeito A possibilidade de lucro é mais ou menos supervalorizada por todos ao passo que a perda é subvalorizada pela maioria sendo pouquíssimos os que com razoável saúde e boa disposição são mais valorizados do que merecem Que a possibilidade de lucro é naturalmente supervalorizada concluise do sucesso universal das loterias O mundo jamais viu nem nunca verá uma loteria perfeitamente honesta ou em que o lucro total compense a perda total porque o empreiteiro nada poderia fazer nesse sentido Nas loterias do Estado os bilhetes realmente não valem o preço que é pago pelos assinantes originários e apesar disso geralmente se vendem no mercado por 20 30 e às vezes 40 com pagamento adiantado A esperança vã de ganhar algum dos grandes prêmios é a única razão dessa demanda As pessoas mais sóbrias dificilmente con sideram loucura pagar uma pequena quantia pela possibilidade de ga nhar 10 ou 20 mil libras embora saibam que mesmo essa pequena quantia é talvez 20 ou 30 mais do que vale a possibilidade Em uma loteria em que nenhum prêmio passasse de 20 libras não haveria a mesma procura de bilhetes Para ter melhor probabilidade de ganhar algum dos grandes prêmios alguns compram vários bilhetes e outros compram pequenas cotas em número ainda maior E no entanto não existe axioma mais certo em matemática do que o seguinte quanto mais bilhete se arrisca tanto maior é a probabilidade de perder Ar risquese a comprar todos os bilhetes de uma loteria e a certeza de perder é absoluta e quanto maior for o número de bilhetes que se comprar tanto maior será a certeza de perder Que o risco de perder é freqüentemente subvalorizado e dificil mente valorizado mais do que merece deduzimolo do lucro muito mo desto das seguradoras Para fazer seguro contra fogo ou contra os riscos do mar de toda maneira o prêmio normal deve ser suficiente para compensar as perdas comuns para pagar as despesas de administração e garantir um lucro igual ao que se teria auferido empregando o capital em qualquer negócio comum A pessoa que não paga mais do que isso OS ECONOMISTAS 154 evidentemente não paga mais do que o valor real do risco ou seja o preço mínimo ao qual pode razoavelmente esperar segurança contra o risco Mas enquanto muitos são os que ganharam pouco dinheiro com seguros muito poucos são os que conseguiram fazer uma grande fortuna com isso já a partir dessa consideração parece suficientemente óbvio que normalmente o balanço de lucros e perdas não é mais vantajoso nesse negócio do que em outros negócios comuns com os quais tantas pessoas fazem fortuna Por mais moderado que seja o prêmio geral mente pago pelo seguro muitos menosprezam excessivamente o risco despreocupandose de pagar por ele Considerando a média de todo o Reino Unido 19 casas dentre 20 ou talvez 99 dentre 100 não têm seguro contra fogo O caso do seguro contra riscos marítimos é mais alarmante para a maior parte das pessoas e a proporção dos navios assegurados em relação aos não assegurados é muito maior Muitos são os que navegam em qualquer estação e mesmo em tempo de guerra sem qualquer seguro É possível que às vezes isso não represente ne nhuma imprudência Quando uma grande companhia ou mesmo um grande comerciante tem 20 ou 30 navios no mar estes podem por assim dizer garantir segurança um ao outro O prêmio economizado por todos eles pode mais que compensar as perdas assim como são suscetíveis de enfrentar o curso comum de possibilidades Todavia a negligência que se observa no tocante ao seguro de navegação da mes ma forma que com referência a casas na maioria das vezes não é conseqüência de um cálculo ponderado das vantagens e desvantagens mas de mera precipitação despreocupada e de menosprezo presunçoso do risco O menosprezo do risco e a esperança presunçosa do sucesso em nenhuma fase da vida estão mais presentes do que na idade em que os jovens escolhem sua profissão Nessa idade o receio do insucesso tem muito pouca capacidade para equilibrar a esperança de sucesso Isso se evidencia na presteza do povo em geral de alistarse como soldado ou como marinheiro do que na ansiedade por parte dos de melhor posição de entrar nas chamadas profissões liberais São suficientemente óbvias as perdas às quais está sujeito um soldado comum Todavia sem levar em conta o perigo os voluntários jovens nunca se alistam com tanta prontidão como no início de uma nova guerra e embora dificilmente tenham pouquíssima oportunidade de ser promovidos imaginam em suas fantasias juvenis mil oportu nidades para conquistar honrarias e distinções que nunca ocorrem Essas esperanças românticas representam o preço total de seu sangue Sua remuneração é inferior à dos trabalhadores comuns e seu desgaste físico no serviço ativo é muito maior A loteria da vida no mar em seu conjunto não apresenta tantas desvantagens quanto a do exército O filho de um bom trabalhador ou artesão pode muitas vezes ser marinheiro com o consentimento de seu pai mas se se alista como soldado o faz sempre sem esse consentimento Outras pessoas enxergam algum jeito dele conseguir algo numa car ADAM SMITH 155 reira somente ele acha que nada se pode conseguir abraçando outra carreira O grande almirante é menos alvo de admiração pública de que o grande general e o maior sucesso no serviço da Marinha promete uma fortuna e uma reputação menos brilhantes do que igual sucesso em terra A mesma diferença encontrase em todos os graus inferiores de promoção nas duas carreiras Pelas regras da precedência um ca pitão da Marinha emparelha com um coronel de Exército mas aquele não emparelha com este no conceito comum Assim como os grandes prêmios da loteria são menos numerosos da mesma forma os prêmios menores são mais numerosos Por isso os marujos comuns fazem al guma fortuna e obtêm alguma promoção com mais freqüência que os soldados comuns sendo a esperança dos grandes prêmios que mais recomenda a carreira Embora sua habilidade e destreza sejam supe riores às de qualquer artesão e embora toda a sua vida seja um cenário contínuo de dureza e perigo por todas essas durezas e perigos enquanto permanecerem na condição de marujos comuns dificilmente recebem outra remuneração a não ser o prazer de se exercerem na vida dura e vencer os perigos Seus salários não são superiores aos dos traba lhadores comuns do porto que regulam o nível dos salários do pessoal da Marinha Já que estão continuamente navegando de um porto a outro o pagamento mensal dos que navegam partindo de todos os diversos portos da GrãBretanha aproximase mais da faixa do que o de quaisquer outros trabalhadores nesses diversos lugares e o nível que regula o salário de todos os restantes é o vigente no porto para o qual ou a partir do qual navega a maior parte deles Em Londres o salário da maior parte das diversas categorias de trabalhadores é mais ou menos o dobro do que é o dos da mesma categoria em Edim burgo Mas os marujos que navegam a partir do porto de Londres raramente ganham acima de 3 ou 4 xelins por mês mais do que os que navegam a partir do porto de Leith e muitas vezes a diferença não é tão grande Em tempo de paz e no serviço comercial o preço de Londres é de um guinéu até aproximadamente 25 xelins por mês civil Um trabalhador comum de Londres à taxa de 9 ou 10 xelins por semana pode ganhar em um mês civil de 40 a 45 xelins Certamente o marujo além de sua remuneração em dinheiro recebe alimentação Contudo o valor desta talvez nem sempre supere a diferença entre sua remu neração e a do trabalhador comum e mesmo que às vezes pudesse superar o excedente não representaria um ganho real para o marujo pois não pode partilhálo com sua esposa e família que precisa manter em casa com seu salário Os perigos e a difícil fuga de uma vida de aventuras ao invés de desencorajar os jovens parecem freqüentemente constituir uma car ta de recomendação para eles Uma mãe carinhosa entre as classes inferiores do povo muitas vezes tem medo de mandar o filho à escola em uma cidade portuária com medo de que a vista dos navios e as conversas e aventuras dos marujos o atraiam para o mar A perspectiva distante dos azares dos quais podemos esperar livrarnos pela coragem OS ECONOMISTAS 156 e habilidade não é desagradável para nós e não aumenta o salário do trabalho em nenhum emprego Acontece o contrário com aqueles em que a coragem e a habilidade podem não ser de nenhuma valia Nas ocupações que sabidamente são muito insalubres os salários são sempre muito ele vados A insalubridade é algo de desagradável sendo sob esse item que se deve enquadrar seus efeitos sobre os salários do trabalho Em todos os diversos empregos de capital a taxa normal de lucro varia mais ou menos de acordo com a certeza ou a incerteza do retorno Este geralmente é menos incerto no comércio interno do que no comércio exterior sendo também menos incerto em certos setores do comércio exterior do que em outros por exemplo o retorno é menos incerto no comércio com a América do Norte do que no comércio com a Jamaica A taxa normal de lucro sempre aumenta mais ou menos de acordo com o risco Todavia não parece variar sempre proporcionalmente ao risco ou de forma a compensálo por completo As bancarrotas são mais freqüentes nas ocupações mais arriscadas A mais arriscada de todas as profissões a dos contrabandistas embora seja também a mais rendosa quando as aventuras logram êxito é o caminho infalível para a bancarrota A esperança presunçosa de sucesso parece agir aqui assim como em todas as outras ocasiões e atrair tantos aventureiros a estas profissões arriscadas do que a sua competição reduz o lucro abaixo do suficiente para compensar o risco Para compensálo por completo o retorno normal deve além do lucro normal do capital não somente cobrir todas as perdas ocasionais mas também assegurar um lucro excedente da mesma natureza que o lucro das seguradoras Ora se o retorno normal fosse suficiente para cobrir tudo isso as bancarrotas não seriam mais freqüentes nessa ocupação do que em outras Portanto das cinco circunstâncias que fazem variar os salários do trabalho somente duas afetam os lucros do capital o caráter agra dável ou desagradável da ocupação e o risco ou segurança que a ca racteriza Quanto ao caráter agradável ou desagradável pouca ou ne nhuma diferença existe entre a maioria dos diversos tipos de aplicação de capital mas a diferença é grande entre os diversos tipos de trabalho Quanto ao risco embora o lucro normal do capital aumente com ele nem sempre parece aumentar na mesma proporção que ele De tudo o que expus seguese que na mesma sociedade ou em suas proximi dades as taxas normais e médias de lucro nos diversos empregos de capital devem estar mais niveladas do que os salários em dinheiro dos diversos tipos de trabalhos Na realidade assim é A diferença entre o salário de um trabalhador comum e o de um advogado ou médico bem empregados é evidentemente muito maior do que a diferença exis tente entre os lucros normais em dois setores quaisquer de emprego de capital Além disso a diferença aparente nos lucros de empregos diferentes de capital é geralmente uma ilusão derivante do fato de nem sempre distinguirmos o que deve ser considerado como salário do que deve ser considerado como lucro O lucro dos farmacêuticos tornouse proverbial denotando alguma ADAM SMITH 157 coisa fora do comum Todavia esse aparente lucro extraordinário mui tas vezes não é outra coisa senão o salário razoável do trabalho A habilidade exigida de um farmacêutico é algo muito maior e muito mais delicado do que o trabalho de qualquer artesão sendo muito maior a confiança que nele se deposita Ele é o médico dos pobres em todos os casos e também dos ricos quando o perigo não é muito grande Em conseqüência sua remuneração deve ser consentânea à habilidade que dele se requer e à confiança que nele se deposita e ela geralmente vem do preço ao qual ele vende seus remédios Por outro lado o total de remédios que um bom farmacêutico venderá em um ano em uma grande cidade talvez não lhe custe mais do que 30 ou 40 libras Embora portanto ele os venda por 300 ou 400 ou seja a 1000 a mais isso muitas vezes pode não representar mais do que o salário razoável de seu trabalho já que esse é o único meio de que dispõe para cobrar sua mãodeobra ou seja incluindoa no preço de seus remédios Como se vê a maior parte do lucro aparente é representada pelos salários reais disfarçados em forma de lucro Em uma pequena cidade portuária um pequeno merceeiro ga nhará 40 ou 50 sobre um capital de 100 libras enquanto que um grande atacadista na mesma localidade dificilmente ganhará 8 ou 10 sobre um capital de 10 mil O trabalho do merceeiro pode ser necessário para a conveniência dos moradores e a estreiteza do mercado pode não comportar o emprego de um capital maior Entretanto o trabalho de uma pessoa deve não somente darlhe o necessário para viver mas o necessário para viver de acordo com as qualificações que a profissão dela exige Além de possuir um pequeno capital ela deve ser capaz de ler escrever calcular e deve também ser um juiz razoável tendo talvez que emitir julgamento sobre 50 ou 60 tipos diferentes de mercadorias sobre seus preços sua qualidade e os mercados em que pode comprálas ao preço mais baixo Em suma deve ter todo o co nhecimento necessário para um grande comerciante sendo que nada o impede de sêlo senão a falta de capital suficiente Trinta ou 40 libras por ano não podem ser consideradas como remuneração excessiva pelo trabalho de tal pessoa com tantas aptidões Deduzase isso do lucro aparentemente grande de seu capital e pouco mais restará talvez do que os lucros normais do capital Também nesse caso portanto a maior parte do lucro aparente representa salários reais A diferença entre o lucro aparente do varejista e o do atacadista é muito menor na capital do que em cidades pequenas e nos vilarejos Onde se pode empregar um capital de 10 mil libras em uma mercearia os salários do trabalho do merceeiro representam um acréscimo insig nificante ao lucro real de um capital tão grande O lucro aparente do varejista rico portanto está mais ou menos no mesmo nível daquele do atacadista É por isso que as mercadorias vendidas no varejo são geralmente tão baratas e freqüentemente muito mais baratas na capital do que nas cidades pequenas e nas aldeias Por exemplo os artigos de mercearia geralmente são muito mais baratos o pão e a carne OS ECONOMISTAS 158 comprados do açougueiro muitas vezes têm o mesmo preço O custo do transporte de artigos de mercearia para uma grande cidade não é maior do que para um vilarejo entretanto é muito mais caro trans portar cereais e gado já que a maior parte dessas mercadorias devem ser trazidas de uma distância muito maior Por isso sendo igual o custo primário de artigos de mercearia nas duas localidades os artigos são mais baratos lá onde sobre eles pesa o menor lucro O custo primário do pão e da carne do açougueiro é maior na cidade grande do que no vilarejo embora o lucro seja menor por essa razão nem sempre são mais baratos lá mas muitas vezes têm o mesmo preço Tratandose de artigos como pão e carne de açougueiro a mesma causa que diminui o lucro aparente aumenta o custo primário A extensão do mercado por possibilitar a aplicação de um capital maior diminui o lucro apa rente mas por exigir suprimentos vindos de uma distância maior au menta o custo primário Na maioria dos casos essa diminuição de um e o aumento do outro parecem quase contrabalançarse mutuamente essa é provavelmente a razão pela qual embora os preços do trigo e do gado geralmente sejam muito diferentes nas diversas regiões do Reino os do pão e os da carne de açougueiro geralmente são mais ou menos os mesmos na maior parte do Reino Embora o lucro do capital tanto no comércio atacadista como no varejista seja geralmente menor na capital do que em cidades pequenas e aldeias apesar disso é freqüente ganharse grandes fortunas com capital inicial pequeno no comércio atacadista ao passo que dificilmente isso ocorre no comércio varejista Em cidades pequenas e em aldeias devido à estreiteza do mercado o comércio nem sempre pode ampliarse aumentandose o capital Por isso em tais localidades embora a taxa de lucro de uma pessoa específica possa ser muito alta a soma ou montante dos lucros nunca pode ser muito grande nem portanto a soma de seu acúmulo anual Ao contrário nas grandes cidades podese ampliar o comércio aumentando o capital sendo que o crédito de uma pessoa econômica e progressista aumenta com rapidez muito maior do que seu capital Seu comércio se amplia em proporção com o montante dos dois e a soma ou montante de seu lucro é proporcional à extensão de seu comércio sendo que seu acúmulo anual é proporcional ao mon tante de seu lucro Entretanto raramente acontece ganharse grandes fortunas mesmo em cidades grandes num setor de comércio regular estabelecido e bem conhecido mas em conseqüência de uma longa vida industriosa de economia e atenção Às vezes é possível ganhar fortunas repentinas em tais lugares mediante o que se chama comércio de especulação Com efeito o especulador não explora nenhuma atividade ou profissão regular estabelecida ou bem conhecida Nesse ano ele comercia com trigo no próximo trabalha com vinho e no ano seguinte opera com açúcar tabaco ou chá Entra em qualquer negócio ao prever que há probabilidade de auferir um lucro acima do normal e o abandona no momento em que prevê que os lucros desse negócio voltarão ao nível dos outros Seus lucros e perdas portanto não podem manter ADAM SMITH 159 nenhuma proporção regular em relação àqueles de quem quer que tenha estabelecido um ramo de negócio bem conhecido Um especulador audaz pode às vezes adquirir uma fortuna considerável com duas ou três especulações sucessivas porém tem probabilidade de perder sua fortuna em duas ou três especulações malsucedidas Esse tipo de co mércio só pode ter lugar em grandes cidades Somente em localidades de grande comércio e correspondência é possível obter as informações necessárias As cinco circunstâncias acima mencionadas embora gerem desi gualdades consideráveis de salário e de lucro do capital não produzem nenhuma desigualdade no conjunto global das vantagens e desvanta gens reais ou imaginárias dos diferentes empregos de mãodeobra e de capital A natureza dessas circunstâncias é tal que respondem por um ganho pequeno em alguns e contrabalançam com um ganho grande em outros Entretanto para que esta igualdade possa ocorrer no conjunto global de suas vantagens e desvantagens requeremse três coisas mes mo onde exista a liberdade mais completa Primeiro os empregos devem ser bem conhecidos e estar bem estabelecidos há muito tempo nas redondezas segundo devem estar em seu estado ou condição normal ou seja no que se pode chamar seu estado natural terceiro devem ser o único ou o principal emprego dos que os ocupam Primeiro essa igualdade só pode ocorrer naquelas ocupações que são bem conhecidas e que há muito tempo estão estabelecidas na região Em paridade com as demais circunstâncias os salários via de regra são mais altos em profissões novas do que em antigas Quando um planejador tenta estabelecer uma nova manufatura deve primeiro atrair seus operários de outros empregos oferecendo salários mais altos do que aqueles que esses podem perceber em seu emprego atual ou salários mais altos do que os que a natureza de seu trabalho de outra forma exigiria não esquecendo que passará muito tempo até ele poder aventurarse a reduzilos ao nível normal As manufaturas cuja de manda se deve totalmente à moda ou à imaginação mudam continua mente e raramente duram o suficiente para ser consideradas como manufaturas estabelecidas Ao contrário aqueles cuja demanda au menta principalmente em virtude do uso e da necessidade são menos suscetíveis de mudança sendo que a mesma forma ou textura podem continuar a ser objeto de demanda por vários séculos Portanto os salários do trabalho serão provavelmente mais altos nas manufaturas do primeiro tipo do que nas do segundo Birmingham tem sobretudo manufaturas do primeiro tipo ao passo que Sheffield tem mais das do segundo Pelo que se afirma as diferenças de salários entre essas duas cidades devemse a esta diferença de natureza desses dois tipos de manufatura A implantação de uma nova manufatura qualquer de um novo setor de comércio de uma nova prática na agricultura é sempre uma especulação da qual o planejador espera auferir lucros extraordinários OS ECONOMISTAS 160 Esses lucros são às vezes muito grandes em outros casos talvez mais freqüentes ocorre bem outra coisa de modo geral porém esses lucros não guardam qualquer proporção em relação a outros antigos comércios na vizinhança Se o negócio tiver êxito os lucros costumam ser muito altos no início Quando sua implantação estiver plenamente estabelecida e for completamente conhecida a concorrência reduzirá o lucro ao nível de outros investimentos Em segundo lugar essa igualdade no conjunto global das van tagens e desvantagens dos diferentes empregos de mãodeobra e capital só pode ocorrer no estado normal desses empregos ou seja o que se pode chamar de estado natural desses empregos A demanda de quase todos os tipos de mãodeobra é às vezes maior e às vezes menor do que a costumeira No primeiro caso as vantagens da ocupação aumentam acima do nível comum e no segundo descem abaixo dele A demanda de mãodeobra agrícola é maior na época do feno e na época da colheita do que durante a maior parte do ano ora os salários sobem com a demanda de mãodeobra Em tempo de guerra quando 40 ou 50 mil marinheiros são obrigados a passar da Marinha mercante para o serviço do rei a demanda de marinheiros para os navios mercantes necessariamente sobe devido à respectiva escassez sendo que em tais ocasiões seus salários normalmente sobem de 1 guinéu e 27 xelins para 40 xelins e 3 libras por mês Ao contrário em uma manufatura decadente muitos empregados em vez de aban donar seu velho emprego se satisfazem com salários menores do que os que em outras circunstâncias seriam adequados à natureza de seu trabalho O lucro do capital varia com o preço das mercadorias nas quais ele é aplicado Quando o preço de alguma mercadoria sobe acima da taxa normal ou média sobe acima de seu nível adequado também o lucro de pelo menos alguma parte do capital empregado para colocar a mercadoria no mercado e quando o preço da mercadoria cai o lucro do capital desce abaixo de sua taxa adequada Todas as mercadorias são mais ou menos sujeitas a variações de preço mas algumas delas o são muito mais que outras Em todas as mercadorias que são produto do trabalho humano o volume de trabalho empregado cada ano é ne cessariamente regulado pela demanda anual de sorte que a produção anual média possa quanto possível ser igual ao consumo anual médio Já se observou que em alguns empregos a mesma quantidade de tra balho produzirá sempre a mesma ou quase a mesma quantidade de mercadorias Nas manufaturas de linho e de lã por exemplo o mesmo número de operários fabricará cada ano mais ou menos a mesma quantidade de tecido de linho ou de lã Por isso as variações no preço de mercado de tais produtos só podem provir de alguma variação aci dental da demanda Um luto público faz subir o preço do tecido preto Mas já que é mais ou menos uniforme a demanda da maioria dos tipos de tecidos de linho simples e lã simples o mesmo acontecerá prova velmente com o preço Todavia há outros empregos nos quais o mesmo ADAM SMITH 161 volume de trabalho nem sempre produz a mesma quantidade de mer cadorias Por exemplo o mesmo volume de trabalho produzirá em anos diferentes quantidades muito diferentes de trigo vinho lúpulo açúcar tabaco etc Portanto o preço dessas mercadorias varia não somente de acordo com a demanda mas também de acordo com as variações bem maiores e mais freqüentes da quantidade produzida e por conseguinte nesse caso o preço das mercadorias é extremamente flu tuante Ora o lucro de alguns comerciantes necessariamente também flutuará de acordo com o preço das mercadorias É com tais mercadorias que trabalham sobretudo os especuladores Eles procuram comprar todo o estoque disponível quando prevêem que o seu preço está para subir e vendêlo antes que ele provavelmente baixe Em terceiro lugar essa igualdade no conjunto global das vanta gens e desvantagens dos diversos empregos de mãodeobra e de capital só pode ocorrer nas ocupações que constituem o único ou principal emprego que as pessoas ocupam Quando uma pessoa ganha sua subsistência com uma ocupação que não lhe absorve a maior parte do tempo nos intervalos de lazer ela muitas vezes está disposta a exercer outra ocupação por um salário inferior ao normalmente exigido pela natureza da atividade Em muitas regiões da Escócia subsiste ainda um tipo de pessoas denominadas cotters ou cottagers embora menos freqüente hoje do que há alguns anos São uma espécie de servos de fora dos donos das terras e dos arrendatários A remuneração que costumam receber de seus patrões consiste em uma casa uma pequena horta para legumes bem como grama suficiente para alimentar uma vaca e talvez um ou dois acres de terra arável de má qualidade Quando o patrão tem necessidade de seu trabalho dálhes além disso 2 celamins de farinha de aveia por semana valendo aproximadamente 16 pence esterlinos Durante grande parte do ano o patrão tem pouca ou nenhuma neces sidade do trabalho deles mas o cultivo do pequeno terreno de que dispõem não é suficiente para ocupálos plenamente Na época em que essas pessoas eram mais numerosas do que hoje dizse que estavam dispostas a dar seu tempo livre a qualquer um por uma remuneração muito pequena e que trabalhavam por salários mais baixos que outros empregados Antigamente parece que isso era comum em toda a Eu ropa Em regiões mal cultivadas e pouco habitadas a maioria dos proprietários e arrendatários dispunham de outro meio para conseguir o contingente extraordinário de mãodeobra que o trabalho no campo exige em certas épocas do ano A remuneração diária ou semanal que esses trabalhadores recebiam de seus patrões evidentemente não re presentava o preço total de seu trabalho já que sua pequena moradia representava uma parte considerável do preço Parece porém que essa remuneração diária ou semanal foi considerada como a remuneração total paga por muitos escritores que pesquisaram os preços do trabalho e dos mantimentos em tempos antigos e que sentiram prazer em apre sentar como extremamente baixa essa remuneração OS ECONOMISTAS 162 O produto desse tipo de trabalho por sua natureza muitas vezes chega ao mercado com preço inferior àquele que lhe conviria Em muitas partes da Escócia podese comprar meias tricotadas em casa por preço muito abaixo daquelas feitas no tear em qualquer lugar que seja Elas são produzidas por criados e trabalhadores que auferem a maior parte de sua subsistência de algum outro emprego Anualmente Leith importa mais de 1 000 pares de meias de Shetland sendo seu preço 5 a 7 pence o par Em Learwick pequena capital das ilhas Shetland asse guraramme que normalmente se paga 10 pence por dia a um traba lhador comum Nas mesmas ilhas tricotam meias de lã ao valor de 1 guinéu ou mais o par Na Escócia a fiação de linho é feita por pessoas cujo emprego principal é outro mais ou menos da mesma forma como se fazem meias com tricô As pessoas que quisessem ganhar a vida só com uma dessas duas ocupações teriam que contentarse com uma subsistência muito precária Na maior parte da Escócia é uma boa fiandeira a mulher que conseguir ganhar 20 pence por semana Em países ricos o mercado geralmente é tão vasto que qualquer comércio é suficiente para empregar todo o trabalho e capital daqueles que o exercem É sobretudo em regiões pobres que ocorrem casos em que a pessoa vive de um emprego e ao mesmo tempo aufere algum ganho de outra ocupação Todavia na capital de um país muito rico encontrase o seguinte exemplo de algo do mesmo tipo Não existe nenhuma cidade da Europa acredito em que o aluguel de casa seja mais caro do que em Londres e no entanto não conheço nenhuma capital em que se possa alugar um apartamento mobiliado por preço tão baixo O alojamento não somente é muito mais barato em Londres do que em Paris mas é mais barato do que em Edimburgo com o mesmo grau de qualidade e o que pode parecer mais estranho o alto preço do aluguel de casa é a causa do baixo preço do alojamento O alto preço do aluguel de casa em Londres provém não somente daquelas causas que o tornam caro em todas as grandes capitais o alto preço da mãodeobra de todos os materiais de construção os quais geral mente precisam ser trazidos de longe e sobretudo o alto preço da renda da terra já que cada dono de terra age como monopolista exi gindo muitas vezes por 1 acre de terra de má qualidade em uma cidade uma renda maior do que a que se pode auferir de 100 acres da melhor terra no campo mas deriva também em parte das ma neiras e costumes peculiares do povo que obrigam o chefe de uma família a alugar uma casa inteira de cima a baixo Na Inglaterra uma casa para morar significa tudo o que está contido debaixo do mesmo teto ao passo que na França na Escócia e em muitas outras partes da Europa geralmente não mais do que um só andar Um co merciante em Londres é obrigado a alugar uma casa inteira naquele bairro da cidade em que vivem seus clientes Sua loja é no andar térreo sendo que ele e sua família dormem no sótão e o inquilino procura pagar uma parte do aluguel da casa sublocando os dois andares ADAM SMITH 163 do meio a locatários Ele espera manter sua família com seu negócio e não com o dinheiro que recebe de seus inquilinos ao passo que em Paris e Edimburgo as pessoas que alugam imóveis geralmente não dispõem de outro meio de subsistência sendo que o preço do aluguel deve pagar não somente o aluguel da casa mas também toda a despesa da família PARTE SEGUNDA Desigualdades oriundas da política na Europa Essas são as desigualdades no conjunto global das vantagens e desvantagens dos diversos empregos de mãodeobra e de capital ge radas necessariamente pela falta de algum dos três requisitos que acabamos de mencionar mesmo onde existir a mais completa liberdade Mas a política vigente na Europa por não deixar as coisas terem seu livre curso provoca outras desigualdades muito mais importantes Três são as maneiras pelas quais a política européia provoca essas desigualdades Primeiro limitando a concorrência em se tratando de alguns empregos a um número menor de pessoas do que o número daquelas que de outra forma estariam dispostas a concorrer segundo aumentando em outros empregos a concorrência além da que ocorreria naturalmente terceiro criando obstáculos à livre circulação de mão deobra e de capital tanto de uma profissão para outra como de um lugar para outro Primeiramente a política vigente na Europa gera uma desigualdade muito ponderável no conjunto global das vantagens e desvantagens dos diversos empregos de mãodeobra e de capital ao restringir a concorrência em algumas profissões a um número menor de pessoas do que aquelas que de outra forma poderiam estar dispostas a participar dela Os privilégios exclusivos das corporações constituem o meio prin cipal de que se lança mão para atingir esse objetivo O privilégio exclusivo de um comércio incorporado restringe ne cessariamente a concorrência na cidade em que ele está estabelecido àqueles que estão livres dessa ocupação O requisito necessário geral mente exigido para obter essa liberdade é ter passado por uma apren dizagem na cidade sob um mestre devidamente qualificado Por vezes os regimentos internos da corporação regulam o número de aprendizes que cada mestre pode ter e quase sempre determinam o número de anos de aprendizagem que cada aprendiz deve cumprir A intenção dessas duas normas é limitar a concorrência a um número muito menor do que o que de outra forma estaria disposto a entrar na profissão A limitação do número de aprendizes restringeo diretamente e a longa duração da aprendizagem o restringe de maneira mais indireta porém com a mesma eficiência aumentando a despesa do aprendizado Em Sheffield nenhum mestre cuteleiro pode ter mais que um aprendiz por vez por força do regimento interno da corporação Em OS ECONOMISTAS 164 Norfolk e Norwich nenhum mestre tecelão pode ter mais de dois apren dizes sob pena de pagar 5 libras mensais ao rei Em qualquer lugar da Inglaterra ou nos estabelecimentos ingleses nenhum mestre cha peleiro pode ter mais de dois aprendizes sob pena de pagar 5 libras por mês sendo metade para o rei e a outra para aquele que mover processo em algum tribunal Esses dois regulamentos embora confir mados por um decreto oficial do Reino são evidentemente ditados pelo mesmo espírito de corporação sancionado pelo regimento interno de Sheffield Os tecelões de seda de Londres após apenas um ano de seu reconhecimento como corporação sancionaram um regimento interno proibindo a qualquer mestre de ter mais de dois aprendizes ao mesmo tempo Foi necessário um decreto especial do Parlamento para invalidar esse regimento Ao que parece o período normal de aprendizagem determinado para a maioria dos comércios incorporados parece ter sido antigamente de sete anos em toda a Europa Todas essas incorporações se chamavam antigamente de universidades termo latino efetivamente adequado para qualquer incorporação A universidade dos ferreiros a univer sidade dos alfaiates etc são expressões com que deparamos comumente nas velhas patentes de antigas cidades Quando se estabeleceram pela primeira vez essas corporações que agora se denominam universida des o número de anos que era necessário estudar até obter o grau de mestre de artes e ofícios foi evidentemente copiado da duração do aprendizado para as ocupações comuns cujas incorporações eram muito mais antigas Assim como o ter trabalhado sete anos sob a direção de um mestre devidamente qualificado era necessário para que uma pessoa se qualificasse como mestre e pudesse ter aprendizes em uma ocupação comum da mesma forma era necessário ter estudado sete anos com um mestre devidamente qualificado para se tornar mestre professor ou doutor termos sinônimos antigamente nas artes liberais e para poder ter alunos ou aprendizes termos também sinônimos em sua origem para ensinar sob sua orientação Pelo 5º Decreto de Elizabeth comumente denominado Estatuto de Aprendizagem ninguém poderia futuramente exercer qualquer co mércio ofício ou mister existente na Inglaterra da época se não tivesse passado pela respectiva aprendizagem durante o mínimo de sete anos assim o que até ali havia sido o regimento de muitas corporações específicas tornouse na Inglaterra a lei geral e oficial para todas as ocupações existentes em cidadesmercado Com efeito embora os termos do estatuto sejam muito genéricos parecendo incluir o Reino todo a interpretação limitou sua aplicação às cidadesmercado levandose em conta que em vilarejos uma pessoa pode exercer várias ocupações di ferentes sem ter passado por sete anos de aprendizado em cada uma sendo isto necessário para convivência da população e porque muitas vezes o número de pessoas não era suficiente para se poder exigir que cada ocupação fosse exercida por trabalhadores preparados para ela Por efeito de uma interpretação estrita dos termos do estatuto ADAM SMITH 165 a aplicação estatutária foi limitada àquelas ocupações que estavam estabelecidas na Inglaterra antes do 5º Decreto de Isabel não tendo nunca sido aplicado desde aquele tempo Essa limitação resultou em uma série de distinções as quais se consideradas como normas de política parecem tão tolas quanto se possa imaginar Foi decretado por exemplo que um fabricante de carruagens não pode fazer ele mesmo as rodas nem contratar oficiais para fazêlas devendo comprálas de um mestre carpinteiro de rodas já que esta última ocupação existia na Inglaterra antes do 5º Decreto de Isabel por outro lado um car pinteiro de rodas embora nunca tivesse passado por uma aprendizagem junto a um fabricante de carruagens está autorizado a fabricar car ruagens ou contratar oficiais para fabricálas já que o ofício de fabri cante de carruagens não se enquadra no Estatuto por não ser uma profissão exercida na Inglaterra ao tempo em que o estatuto foi san cionado Por esse motivo muitas das manufaturas de Manchester Bir mingham e Wolverhampton não se enquadram no Estatuto por não serem profissões exercidas na Inglaterra antes do 5º Decreto de Isabel Na França a duração da aprendizagem difere conforme as cidades e as profissões Em Paris exigese cinco anos para um grande número de ocupações mas para muitas delas se requer mais cinco anos de trabalho como oficial se o interessado quiser ser qualificado para exercer a profissão como mestre Durante esses cinco anos adicionais o trabalhador é chamado de companheiro de seu mestre e o termo em si é companheirismo Na Escócia não há nenhuma lei geral que regule com validade geral a duração da aprendizagem A duração do aprendizado difere de uma corporação para outra Quando a duração é longa uma parte pode geralmente ser remida pagandose uma pequena multa Além disso na maioria das cidades uma multa insignificante é suficiente para comprar a liberdade de entrar em corporação Os tecelões de roupa de linho e cânhamo principais manufaturas do país bem como outros artesãos filiados a elas os carpinteiros de rodas os fabricantes de carretéis etc podem exercer sua profissão em qualquer cidade em que haja uma corporação sem pagar multa alguma Em todas as ci dades em que há corporação todos podem vender carne de açougue em qualquer dia permitido da semana A duração habitual da apren dizagem na Escócia é de três anos mesmo em certas profissões muito qualificadas de modo geral não conheço nenhum país europeu onde as leis corporativistas sejam tão pouco opressivas A propriedade que cada pessoa tem em sua própria ocupação assim como é o fundamento original de toda e qualquer outra proprie dade da mesma forma constitui a propriedade mais sagrada e invio lável O patrimônio do pobre reside na força e destreza de suas mãos sendo que impedilo de utilizar essa força e essa destreza da maneira que ele considerar adequada desde que não lese o próximo constitui uma violação pura e simples dessa propriedade sagrada Estamos dian te de uma evidente interferência na justa liberdade tanto do traba lhador como daqueles que poderiam desejar a qualquer momento con OS ECONOMISTAS 166 tratar seus serviços Assim como se impede o trabalhador de trabalhar como lhe parecer mais indicado da mesma forma impedese os outros de empregar a quem considerarem mais oportuno Julgar se o trabalhador é apto para o emprego é uma função que seguramente pode ser confiada à discrição dos empregadores que tanto interesse têm no caso O receio por parte do legislador de que os empregadores contratem pessoas inadequadas evidenciase como uma medida impertinente e opressiva A instituição de longa aprendizagem não é capaz de oferecer garantia alguma de comercializar mãodeobra incapaz Quando isso ocorre geralmente é por fraude e não por falta de habilidade ora nem o aprendizado mais longo é capaz de oferecer garantias contra a fraude Para evitar esses abusos requerse normas bem diferentes A marca identificadora de uma libra esterlina e o carimbo impresso nos tecidos de linho e de lã proporcionam ao comprador uma garantia muito maior do que qualquer estatuto de aprendizagem O comprador costuma examinar essas marcas identificadoras do dinheiro ou dos tecidos mas nunca perderá tempo em verificar se os trabalhadores passaram ou não por sete anos de aprendizagem regulamentar A instituição de longa aprendizagem não tende absolutamente a formar jovens para o trabalho Um oficial que trabalha por peça ou tarefa provavelmente será laborioso pois aufere um benefício de cada produto do seu trabalho Um aprendiz provavelmente será preguiçoso e quase sempre isso acontece porque não tem nenhum interesse imediato em comportarse de outra forma Nas ocupações inferiores o prêmio que se espera consiste pura e simplesmente na remuneração do trabalho Os que chegam antes à condição de desfrutar da recom pensa do trabalho são provavelmente os que antes chegam a sentir gosto por ele e cedo adquirem o hábito da aplicação Um jovem natu ralmente contrai aversão ao trabalho se durante muito tempo não aufere nenhum benefício dele Os meninos entregues pelas casas de caridade ao aprendizado geralmente estão vinculados por um período superior ao número habitual de anos e ao saírem da aprendizagem via de regra são extremamente preguiçosos e imprestáveis para o trabalho O instituto da aprendizagem era totalmente desconhecido entre os antigos Os deveres recíprocos de mestres e aprendizes perfazem um capítulo considerável em todos os códigos modernos Ao contrário o Direito Romano não conhece uma palavra sobre isso Desconheço qualquer palavra grega ou latina creio poder arriscarme a afirmar que não existe nenhuma que expresse o conceito que hoje atribuímos à palavra aprendiz ou seja um servo obrigado a trabalhar em uma determinada ocupação em benefício de um mestre durante certo nú mero de anos sob a condição de que o mestre lhe ensine essa profissão As longas aprendizagens são totalmente desnecessárias As artes que são muito superiores aos ofícios comuns tais como fazer relógios de parede de bolso não encerram nenhum mistério do tipo que exija um longo período de aprendizagem Com efeito a invenção pro priamente dita dessas maravilhosas máquinas e mesmo de alguns dos ADAM SMITH 167 instrumentos utilizados para fabricálas sem dúvida deve ter sido a obra de reflexão e pesquisa profunda e diuturna podendo com justiça ser catalogada entre as realizações mais felizes do engenho humano Uma vez inventadas essas máquinas porém e uma vez bem entendido seu mecanismo não se pode honestamente afirmar que para ensinar a um jovem da maneira mais completa possível como utilizar os ins trumentos e como construir tais máquinas se requeira mais do que algumas semanas talvez até se possa dizer que bastam alguns dias de ensinamento Em se tratando das ocupações mecânicas comuns certamente o ensino de alguns dias é suficiente Com efeito a destreza manual no trabalho mesmo nas ocupações comuns não pode ser ad quirida sem muito exercício e experiência Todavia um jovem haveria de exercitarse com muito mais aplicação e atenção se desde o início trabalhasse como oficial sendo pago proporcionalmente ao pouco serviço que pode executar e pagando por sua vez os materiais que eventual mente estragar por incúria ou inexperiência Dessa maneira sua for mação geralmente seria mais eficaz e em qualquer hipótese menos cansativa e menos dispendiosa Quem perderia com isso seria o mestre Ele perderia todos os salários do aprendiz que agora são dele durante sete anos seguidos Ao final talvez também o aprendiz perderia pois em uma ocupação tão fácil de ser aprendida ele teria mais concorrentes e seu salário quando ele viesse a ser um profissional completo estaria muito abaixo do nível atual O mesmo aumento da concorrência redu ziria o lucro dos mestres e os salários dos trabalhadores As profissões os ofícios e os misteres todos sairiam perdendo Mas o público sairia ganhando pois se assim se fizesse o produto de todos os artífices e trabalhadores chegaria ao mercado com preços muito mais baixos Todas as corporações bem como a maior parte das leis relativas a elas foram implantadas precisamente para impedir essa redução dos preços e conseqüentemente a redução dos salários e dos lucros restringindo aquela livre concorrência que certamente haveria de con seguir esse objetivo Para constituir uma corporação em muitas regiões da Europa não se exigia antigamente nenhuma outra autoridade senão a da Câmara Municipal da cidade em que a corporação se estabelecia Na Inglaterra porém exigiase uma licença do rei Mas essa prerro gativa da Coroa parece terlhe sido reservada mais para extorquir di nheiro do súdito do que para a defesa da liberdade em geral e contra tais monopólios opressivos Pagandose uma multa ao rei parece que se concedia a patente e quando uma categoria específica de artesãos ou comerciantes consideravam bom agir como uma corporação sem ter patente essas corporações adulterinas como se chamavam nem sempre perdiam o privilégio por essa razão mas eram obrigadas a pagar anualmente ao rei a permissão de exercer seus privilégios usur pados129 A inspeção imediata de todas as corporações e dos regimentos OS ECONOMISTAS 168 129 Ver MADOX Firma Burgi p 26 etc internos que elas pudessem considerar adequados sancionar para seu governo cabia à Câmara Municipal da cidade em que estavam esta belecidas e qualquer punição que fosse imposta a elas geralmente procedia não do rei mas daquela incorporação maior da qual aqueles subordinados eram apenas partes ou membros O governo das câmaras municipais estava totalmente nas mãos de comerciantes e artesãos tendo evidentemente cada categoria deles interesse em evitar que o mercado de cada tipo de mãodeobra espe cífica ficasse saturado o que na realidade significava mantêlo sempre carente de mãodeobra Cada categoria porfiava em baixar determi nações adequadas para esse propósito e se isso lhe fosse permitido de bom grado consentia em que todas as outras categorias profissionais fizessem outro tanto Em conseqüência desses regulamentos cada ca tegoria era obrigada a comprar de cada um dos outros dentro da cidade as mercadorias de que necessitava a preço um pouco mais caro do que o faria normalmente Em compensação eles por sua vez tinham o direito de vender suas próprias mercadorias a preço bem mais alto de sorte que até aqui diziam eles dá no mesmo Portanto nos ne gócios que as diversas categorias faziam entre si no âmbito da cidade ninguém perdia com essas normas Nos negócios com o campo porém todos ganhavam ora é nesses negócios que consiste todo o comércio que sustenta e enriquece cada cidade Toda cidade com efeito tira do campo toda a sua subsistência todas as matériasprimas para o trabalho E o pagamento que a cidade faz ao campo é feito sobretudo de duas maneiras primeiro reenviando ao campo uma parte desses materiais processados pelas manufaturas caso em que seus preços são aumentados pelos salários dos trabalha dores e os lucros dos patrões ou empregadores diretos em segundo lugar enviandolhe uma parte dos produtos brutos e manufaturados de outros países ou de regiões distantes do mesmo país importados à cidade sendo que também nesse caso os preços originais desses bens são aumentados pelos salários dos transportadores ou marinheiros e pelos lucros dos comerciantes que os empregam A vantagem que a cidade aufere pelas suas manufaturas consiste no que ganha no pri meiro dos dois ramos de comércio que acabei de mencionar e a que aufere de seu comércio interno e externo consiste naquilo que ganha no segundo Os salários dos trabalhadores e os lucros de seus diversos empregadores representam tudo o que é ganho nesses dois tipos de negócio Por conseguinte quaisquer regulamentos tendentes a aumen tar esses salários e lucros além do que seriam normalmente tendem a possibilitar à cidade comprar com uma quantidade menor de seu trabalho o produto de uma quantidade maior de trabalho do campo Essas normas dão aos comerciantes e artesãos da cidade uma vantagem sobre os senhores de terra arrendatários e trabalhadores do campo quebrando essa igualdade natural que de outra forma reinaria no co mércio executado entre a cidade e o campo Toda a produção anual do trabalho da sociedade é anualmente dividida entre duas categorias de ADAM SMITH 169 pessoas Mediante essas leis os habitantes da cidade recebem um qui nhão maior do que normalmente lhes caberia e os do campo têm que contentarse com um quinhão menor O preço que a cidade paga realmente pelos mantimentos e ma tériasprimas que nela entram anualmente é a quantidade de produtos manufaturados e outros bens que ela envia anualmente para fora Quanto maior for o preço ao qual foram vendidos estes últimos tanto mais baixo será o preço pelo qual são comprados os primeiros O tra balho da cidade tornase mais vantajoso e o do campo passa a ser menos vantajoso Que o trabalho executado nas cidades em toda a Europa é mais vantajoso do que o executado no campo sem querermos entrar em cálculos muito detalhados podemos constatálo partindo de uma ob servação muito simples e óbvia Em todos os países da Europa encon tramos no mínimo 100 pessoas que adquiriram grandes fortunas co meçando modestamente no comércio e na manufatura tipo de ocu pação específica das cidades para um que conseguiu enriquecer so mente com o trabalho do campo ou seja colhendo a produção através dos aprimoramentos e do cultivo da terra A indústria portanto deve ser mais bem recompensada os salários de trabalho e os lucros de capital evidentemente maiores numa situação do que na outra Ora tanto o capital como a mãodeobra procuram naturalmente os empregos mais vantajosos acorrendo portanto o mais que podem para a cidade e desertando o campo Os habitantes de uma cidade por estarem reunidos num só lugar podem associarse com facilidade Eis por que as ocupações mais in significantes nas cidades têm formado corporações em um lugar ou em outro e mesmo onde nunca houve tal incorporação geralmente prevalecem nelas o espírito de corporação o ciúme em relação aos estranhos à profissão a aversão a admitirem aprendizes ou a trans mitirem o segredo da profissão ensinandolhes muitas vezes mediante associações e acordos voluntários a impedir a livre concorrência quan do não conseguem proibila por regimentos internos As profissões que empregam apenas um número reduzido de trabalhadores com a má xima facilidade participam de tais associações Talvez seja suficiente meia dúzia de cardadores de lã para manter ocupados 1 000 fiadores e tecelões Combinando entre si não admitir aprendizes não somente podem monopolizar a profissão mas também reduzir a manufatura toda a uma espécie de sua escrava e a elevar o preço de seu trabalho muito acima do que lhe é devido por sua natureza Os habitantes do campo dispersos que estão em localidades dis tantes não têm facilidade em associarse Não somente jamais forma ram corporações oficiais mas também o próprio espírito de corporação nunca prevaleceu entre eles Nunca se considerou necessária nenhuma aprendizagem para os trabalhos da agricultura a grande ocupação dos que vivem no campo E no entanto depois das belasartes e das pro fissões liberais não existe talvez nenhuma ocupação que exija uma OS ECONOMISTAS 170 variedade tão grande de conhecimento e de experiência Os inúmeros volumes que se têm escrito sobre a matéria em todos os idiomas podem convencernos de que entre as nações mais sábias e mais instruídas a agricultura jamais foi considerada uma ocupação tão fácil de ser aprendida Seria inútil pretender coligir de todos esses volumes o co nhecimento das operações variadas e complexas da profissão agrícola possuído geralmente até pelo agricultor comum por maior que seja o menosprezo com o qual alguns autores desprezíveis falam do assunto Ao contrário dificilmente existe algum ofício mecânico normal cujas operações não possam ser explicadas de forma mais completa e mais clara em um simples panfleto de pouquíssimas páginas ilustrado com dizeres e figuras Na história das artes atualmente publicada pela Academia Francesa de Ciências várias dessas ocupações mecânicas são efetivamente explicadas dessa forma Além disso a direção das operações agrícolas devendo variar conforme as mudanças meteorológicas e em de corrência de muitos outros eventos e circunstâncias requer muito mais capacidade de julgamento e discrição do que a gestão das operações me cânicas que são sempre as mesmas ou quase sempre as mesmas Não somente a arte do agricultor e a direção geral das operações da agricultura mas também muitos setores inferiores do trabalho do campo requerem muito maior habilidade e experiência do que a maioria dos ofícios mecânicos A pessoa que trabalha com latão e ferro trabalha com instrumentos e com materiais cuja têmpera é sempre a mesma ou aproximadamente a mesma Ao contrário a pessoa que ara a terra com vários cavalos ou bois trabalha com instrumentos cuja saúde força e disposição diferem muito de acordo com as circunstâncias Tam bém a condição dos materiais é tão variável quanto a dos instrumentos com os quais trabalha sendo que ambos precisam ser manuseados com muito bom senso e discrição Ao arador comum embora geralmente considerado como o protótipo da ignorância e da estultície dificilmente falta discernimento e discrição Certamente ele está menos habituado ao intercâmbio social do que o mecânico que vive na cidade Sua voz e seu falar são menos polidos e mais difíceis de serem entendidos por aqueles que não estão habituados a eles Todavia pelo fato de estar ele habituado a lidar com uma variedade maior de objetos sua inte ligência geralmente é muito superior à do mecânico da cidade o qual desde a manhã até à noite concentra toda a sua atenção em uma ou duas operações muito simples Até onde vai a superioridade real das pessoas mais simples do campo em confronto com os habitantes da cidade sabemno todos os que por curiosidade ou em virtude de sua ocupação tiveram oportunidade de entrar em contato com os dois tipos de pessoa Eis por que na China e no Industão se afirma que tanto a classe social como os salários dos trabalhadores do campo são superiores aos da maior parte dos artesãos e manufatureiros O mesmo aconteceria provavelmente em toda parte se isso não tivesse sido impedido pelas leis e pelo espírito de corporação A superioridade que o trabalho das cidades apresenta em todos ADAM SMITH 171 os países da Europa em relação ao trabalho do campo não é devida exclusivamente às corporações e suas leis Ela é também apoiada por muitos outros regulamentos Visam a esse objetivo todas as altas taxas impostas a manufaturados estrangeiros e a todos os bens importados As leis das corporações possibilitam aos habitantes das cidades au mentar seus preços em temor de preços mais baixos por parte da concorrência de seus próprios conterrâneos Os regulamentos lhes pro porcionam outrossim segurança contra a concorrência estrangeira Em última análise a elevação dos preços provocada por ambos é paga pelos proprietários de terras pelos arrendatários e pelos trabalhadores do campo que raramente se têm oposto à formação desses monopólios Os que trabalham na terra geralmente não têm inclinação nem capa cidade para fazer parte de tais conluios sendo que o clamor e os so fismas dos comerciantes e dos manufatores facilmente os persuadem de que o interesse particular de um partido aliás uma parcela subordinada da sociedade representa o interesse geral da nação Na GrãBretanha a superioridade do trabalho das cidades em relação ao do campo parece haver sido maior em épocas antigas do que hoje Atualmente os salários dos trabalhadores do campo aproxi mamse mais dos salários dos operários das fábricas sendo que também os lucros do capital empregado na agricultura se aproximam mais dos lucros do capital empregado no comércio e na manufatura em relação ao que se afirma ter existido no século passado ou no início deste Esta mudança pode ser considerada como conseqüência necessária em bora muito tardia dos estímulos extraordinários concedidos ao trabalho nas cidades O capital acumulado nas cidades por vezes chega a ser tão elevado que não pode mais ser aplicado com o antigo lucro e àquele tipo de trabalho que lhe é peculiar Esse trabalho tem seus limites como qualquer outro e o aumento do capital pelo fato de aumentar a concorrência diminui o lucro A redução do lucro nas cidades força o capital a migrar para o campo onde criando uma nova demanda de mãodeobra agrícola necessariamente aumenta seus salários O capital como que se expande através das regiões agrícolas e ao ser aplicado na agricultura é em parte restituído ao campo donde havia originariamente fugido para acumularse nas cidades em prejuízo da economia rural Mais adiante procurarei mostrar que em toda parte na Europa os maiores progressos no campo são devidos à volta do capital das cidades para a economia rural ao mesmo tempo procurarei mostrar que embora alguns países tenham dessa forma atingido um grau apreciável de riqueza este avanço é em si mesmo necessariamente lento incerto estando sujeito a ser perturbado e interrompido por inú meros eventos e sob todos os aspectos é contrário à ordem da natureza e à razão No terceiro e quarto livros desta obra procurarei explicar da maneira mais completa e clara possível os interesses os preconceitos as leis e os costumes que levaram a isso As pessoas da mesma profissão raramente se reúnem mesmo que seja para momentos alegres e divertidos mas as conversações OS ECONOMISTAS 172 terminam em uma conspiração contra o público ou em algum incita mento para aumentar os preços Efetivamente é impossível evitar tais reuniões por meio de leis que possam vir a ser cumpridas e se coadunem com espírito de liberdade e de justiça Todavia embora a lei não possa impedir as pessoas da mesma ocupação de se reunirem às vezes nada deve fazer no sentido de facilitar tais reuniões e muito menos para tornálas necessárias Essas reuniões são facilitadas por um regulamento que obriga todos os pertencentes à mesma profissão a inscreverem seus nomes e endereços em um registro público Isso faz com que possam entrar em contato entre si pessoas que de outra forma nunca se teriam conhecido dando a cada um o endereço em que pode localizar qualquer outra pessoa do grupo O que torna tais reuniões necessárias é um regulamento que possibilita aos membros da mesma profissão a se imporem taxas com o objetivo de cuidar do sustento de seus pobres seus doentes suas viúvas e órfãos inspirando em todos um interesse comum Uma incorporação não somente torna essas reuniões necessárias como ainda faz com que as decisões da maioria sejam obrigatórias para todos Em uma profissão livre não é possível estabelecer uma combinação ou acordo efetivo a não ser mediante o consentimento unâ nime de todos não podendo esse acordo perdurar a não ser enquanto cada um continuar a manter seu consentimento Ao contrário em uma corporação a maioria pode sancionar um regimento com punições ade quadas as quais limitem a concorrência de maneira mais eficiente e mais durável do que qualquer outra combinação voluntária Carece de qualquer fundamento a pretensão de que as corporações são necessárias para o melhor funcionamento das profissões e do co mércio A inspeção real e efetiva exercida sobre um trabalhador não é a da sua corporação mas a de seus clientes É o medo de perder o emprego que limita as fraudes e corrige as negligências do trabalhador Uma corporação exclusiva necessariamente enfraquece a força dessa inspeção obrigando a contratar determinados trabalhadores quer se comporte bem ou mal É por essa razão que em muitas cidades grandes com muitas corporações não se consegue encontrar trabalhadores ra zoáveis mesmo em algumas das profissões mais indispensáveis Se alguém quiser que seu trabalho seja razoavelmente executado isso deve ser feito nos subúrbios onde os trabalhadores não tendo nenhum privilégio exclusivo só dependem do próprio caráter devendose então introduzilo na cidade como puder É dessa maneira que a política adotada na Europa limitando a concorrência em algumas profissões a um número menor do que aquele que de outra forma participaria da concorrência provoca uma desi gualdade muito grande no conjunto global das vantagens e desvanta gens dos diversos empregos de mãodeobra e de capital Em segundo lugar a política européia ao aumentar em algumas profissões a concorrência além do que ocorreria naturalmente gera ADAM SMITH 173 uma outra desigualdade do tipo oposto no conjunto das vantagens e desvantagens dos diversos empregos de mãodeobra e de capital Temse atribuído tamanha importância a que seja educado um número adequado de jovens para certas profissões que às vezes o público ou a piedade dos fundadores privados tem estabelecido muitos pensionatos escolas bolsas de estudo etc para essa finalidade o que faz com que a essas profissões acorra um número de pessoas muito maior do que os que normalmente as abraçariam Em todos os países cristãos creio que a formação da maior parte dos eclesiásticos é paga dessa forma Pouquíssimos são totalmente formados às próprias ex pensas Acontece então que a educação longa cansativa e dispendiosa desses elementos nem sempre lhes proporcionará uma remuneração conveniente uma vez que a igreja está cheia de pessoas que para conseguir emprego estão dispostas a aceitar uma remuneração inferior àquela à qual lhes daria direito a formação que tiveram dessa forma a concorrência dos pobres sempre absorve e desvia a remuneração dos ricos Sem dúvida seria indecente comparar um pároco ou um capelão a um oficial de qualquer profissão comum Contudo o pagamento dado a um pároco ou a um capelão pode ser considerado sem exagero do mesmo valor que o salário de um desses diaristas Os três são pagos de acordo com o contrato eventualmente feito com seus respectivos superiores Até depois da metade do século XIV 5 merks130 contendo praticamente a mesma quantidade de prata que dez libras do nosso dinheiro atual representaram na Inglaterra o salário normal de um pároco ou de um padre coadjutor como podemos depreender dos de cretos de vários concílios nacionais Na mesma época verificamos que a remuneração de um mestre pedreiro era de 4 pence diários contendo a mesma quantidade de prata que um xelim dos nossos dias sendo que um oficial pedreiro recebia 3 pence por dia iguais a 9 pence em nosso dinheiro atual131 Como se vê os salários desses dois profissionais se os considerarmos como constantes eram muito superiores aos de um pároco O salário do mestre pedreiro supondo que este ficasse desocupado durante uma terça parte do ano seria perfeitamente igual ao do eclesiástico Com efeito o Decreto 12º da Rainha Ana no capítulo 12 estabelece o seguinte Já que em vários lugares os párocos têm recebido uma remu neração insuficiente para sua manutenção e para seu estímulo fica facultado ao bispo decretar de próprio punho e com seu selo uma certa remuneração suficiente ou máxima não acima de 50 e não abaixo de 20 libras por ano Atualmente consideramse 40 libras por ano como sendo uma remuneração muito boa para um pároco mas apesar desta lei do par lamento existem muitos párocos recebendo menos de 20 libras por OS ECONOMISTAS 174 130 Antiga moeda de prata da Escócia equivalente a 13 s 4 d N do E 131 Ver Statute of Labourers p 25 3ª ed ano Há em Londres oficiais de sapateiro ganhando 40 libras por ano sendo difícil entrar nessa cidade algum trabalhador operoso que não ganhe mais do que 20 libras Essa soma realmente não ultrapassa o que muitas vezes ganham os trabalhadores comuns em muitas paró quias do país Sempre que a lei tentou regular os salários dos traba lhadores foi mais para baixálos do que para aumentálos Todavia a lei tentou muitas vezes levantar os salários dos eclesiásticos e para a dignidade da Igreja tentou obrigar vigários administradores a lhes pagar mais do que a mísera manutenção com a qual às vezes tinham que contentarse Nos dois casos a lei parece ter sido sempre ineficaz não sendo capaz de elevar os salários dos eclesiásticos nem de reduzir os salários dos trabalhadores ao nível desejado isto porque a lei nunca foi capaz de impedir os eclesiásticos de aceitar menos que aquilo a que por lei teriam direito devido à indigência de sua situação e à multidão de concorrentes da mesma forma a lei nunca foi capaz de impedir os outros os demais trabalhadores de receberem mais devido à concorrência contrária daqueles que esperavam auferir lucro ou prazer do fato de os empregarem Os grandes benefícios e outras dignidades eclesiásticas sustentam a honra e o prestígio da Igreja não obstante a situação precária de alguns seus membros inferiores Também o respeito público votado a essa pro fissão compensa de alguma forma a insignificância da remuneração pe cuniária Efetivamente na Inglaterra e em todos os países católicoro manos a loteria da Igreja é muito mais vantajosa do que o necessário O exemplo das Igrejas da Escócia de Genebra e de várias outras Igrejas protestantes demonstra que em uma profissão tão respeitável na qual existem tantas facilidades para a formação a esperança de benefícios muito mais modestos será capaz de atrair para as sacras ordens um número suficiente de homens instruídos decentes e respeitáveis Em profissões nas quais não existem benefícios tais como o Direito e a Medicina se um contingente igual de pessoas fosse formado às expensas públicas a concorrência logo cresceria a tal ponto que a remuneração pecuniária desses profissionais baixaria muito poderseia chegar à si tuação de que já não valeria a pena os pais formarem um filho às suas custas para essa profissão Os meninos e rapazes ficariam então inteira mente abandonados à formação dada pelos institutos de caridade e devido ao grande número e às necessidades teriam que contentarse com uma remuneração muito miserável para degradação completa das profissões do Direito e da Medicina hoje tão respeitadas A estirpe não próspera das pessoas comumente chamadas ho mens de letras está hoje mais ou menos na mesma situação em que estariam os advogados e os médicos na hipótese que acabamos de apontar Na maior parte da Europa a maioria desses letrados foram educados para a Igreja porém foram impedidos de abraçar as ordens sacras por motivos diversos Por isso geralmente foram formados às expensas públicas e o seu número em toda parte é tão grande que a remuneração financeira de seu trabalho geralmente é miserável ADAM SMITH 175 Antes da invenção da imprensa a única ocupação na qual uma pessoa de letras podia empregar seus talentos era a de professor público ou particular ou seja transmitindo a outros os conhecimentos curiosos e úteis por ele previamente adquiridos esse é ainda um ofício certa mente mais digno mais útil e de modo geral até mais rendoso do que o ofício de livreiro profissão essa gerada pela invenção da imprensa O tempo e o estudo o talento o conhecimento e a aplicação necessários para qualificar um eminente mestre de ciências são no mínimo iguais aos exigidos para formar os grandes advogados e médicos No entanto a remuneração costumeira do professor ilustre não tem proporção al guma com a do advogado ou a do médico isso porque a profissão de professor está apinhada de pobres formados às expensas do público ao passo que entre os advogados e médicos são muito poucos os que não se tenham formado às próprias custas Todavia a remuneração costumeira dos professores públicos e particulares seria sem dúvida ainda menor se não se tivesse excluído do mercado a concorrência daqueles letrados ainda mais pobres que escrevem apenas para ganhar o pão Antes da invenção da imprensa os termos letrado e mendigo parecem ter sido mais ou menos sinônimos Ao que parece os reitores das universidades muitas vezes outorgavam a seus professores e alunos licença para mendigar Nos tempos antigos antes de se estabelecerem quaisquer insti tuições de caridade para a formação de pobres para essas profissões de letrados parece ter sido muito melhor a remuneração paga aos professores ilustres Isócrates no chamado discurso contra os sofistas repreende a incoerência dos professores de seu tempo Eles fazem as promessas mais estupendas a seus alunos diz ele e lhes ensinam a serem sábios felizes e justos e como recompensa por um serviço tão importante estipulam a miserável remuneração de 4 ou 5 minas132 Os que ensinam a sabedoria continua ele devem ser eles mesmos sábios ora uma pessoa disposta a vender um serviço desses por tal preço seria condenada por insanidade Certamente Isócrates não pretende exagerar na remuneração podemos estar certos de que ela não era menor do que ele descreve Quatro minas eram iguais a 13 6 s 8 d e 5 minas representavam 16 13 s 4 d Portanto não menos do que essa última soma deve ter sido a remuneração usual paga naquela época aos mestres mais emi nentes de Atenas O próprio Isócrates exige de cada aluno 10 minas ou seja 33 6 s 8 d Quando era professor em Atenas afirmase que tinha 100 alunos Entendo que esse era o número de alunos a quem ele ensinava em um único turno ou seja o número de pessoas que freqüentavam um de seus cursos contingente esse que não parece ser OS ECONOMISTAS 176 132 Unidade de peso e moeda da Grécia Antiga equivalente a 100 dracmas N do E extraordinário para um professor de tanto renome em uma cidade grande sendo ainda que a matéria por ele ensinada era a Retórica uma das ciências mais em voga na época Portanto para cada curso deve ter ganho 1 000 minas ou seja 3 333 6 s 8 d Em outra passagem Plutarco diz ter sido de 1 000 minas portanto o seu Di dactron ou seja o preço habitual pago pelo ensino Muitos outros ilustres professores dessa época parecem ter ganho grandes fortunas Górgias fez um presente ao templo de Delfos oferecendo sua própria estátua em ouro maciço embora não deva ter sido uma estátua de tamanho natural presumo Seu padrão de vida assim como o de Hípias e Protágoras dois outros ilustres professores da época é descrito por Platão como sendo esplêndido chegando à ostentação Afirmase que o próprio Platão vivia na magnificência Aristóteles depois de ter sido tutor de Alexandre recebendo para isto uma remuneração muito elevada do próprio Alexandre como de seu pai Filipe como é atestado por todos não obstante isso considerou valer a pena regressar a Atenas para reassumir a sua escola Professores de ciências provavelmente eram a esse tempo menos freqüentes do que uma ou duas gerações posteriores quando a concorrência provavelmente reduziu ligeiramente o preço de seu trabalho e a admiração de que eram alvo Ao que parece porém os mais eminentes deles desfrutavam de um grau de consideração muito superior à que hoje se dispensa a qualquer desses profissionais Os ate nienses enviaram o acadêmico Carnéades e o estóico Diógenes a Roma na qualidade de emissários especiais embora Atenas não estivesse mais em seu antigo esplendor ainda constituía uma república independente e considerável Carnéades era babilônio de nascimento e portanto já que nunca houve povo tão zeloso como os atenienses a ponto de não admitir estrangeiros para cargos públicos a consideração que tinham por esse sábio deve ter sido muito grande Essa desigualdade de remuneração no global talvez seja mais vantajosa do que prejudicial ao público Pode até certo ponto degradar a profissão de um professor oficial mas o baixo preço da formação literária representa uma vantagem que supera de muito esse pequeno inconveniente Além disso o público poderia auferir benefício ainda maior se a constituição ou estrutura dessas escolas e institutos fosse mais razoável do que é no presente na maior parte da Europa Em terceiro lugar a política européia pelo fato de dificultar a livre circulação da mãodeobra e do capital tanto de um emprego para outro como de um lugar para outro em certos casos provoca uma desigualdade muito inconveniente no conjunto das vantagens e des vantagens dos diferentes empregos de mãodeobra e de capital O Estatuto da Aprendizagem dificulta a livre circulação de mão deobra de um emprego para outro até no mesmo lugar E os privilégios exclusivos das corporações dificultam essa livre circulação de um lugar para outro até na mesma ocupação Acontece com freqüência que em uma manufatura se pagam altos salários aos trabalhadores ao passo que os de outra precisam conten ADAM SMITH 177 tarse com o indispensável para a subsistência A primeira ocupação está em estado de progresso o que faz com que seja contínua a demanda de nova mãodeobra ao contrário a segunda está em declínio o que faz aumentar ainda mais a disponibilidade de mãodeobra já supe rabundante Essas duas manufaturas às vezes podem estar localizadas na mesma cidade e às vezes na mesma região circunvizinha não ha vendo possibilidade alguma de ajudarem uma à outra pois no primeiro caso isso é impedido pelo estatuto da aprendizagem e no segundo é impedido tanto pelo estatuto da aprendizagem como pelos privilégios exclusivos das corporações Ora em muitas manufaturas diferentes as operações executadas são tão semelhantes que os trabalhadores com facilidade poderiam mudar de ocupação entre si se isso não fosse impedido por essas leis absurdas Assim por exemplo a arte de tecer linho e seda comuns são praticamente quase a mesma coisa A arte de tecer lã comum é algo diverso porém essa diferença é tão insig nificante que tanto um tecelão de linho como um tecelão de seda podem em poucos dias transformarse em razoável tecelão de lã No caso portanto de alguma dessas três manufaturas de capital importância vir a entrar em declínio os trabalhadores poderiam encontrar emprego nas duas outras que estivessem em condições mais prósperas além disso os salários não subiriam demais na manufatura próspera nem desceriam demais na decadente A manufatura do linho na Inglaterra está efetivamente aberta a todos em virtude de um estatuto peculiar todavia ela não é muito cultivada na maior parte do país não podendo portanto oferecer grandes possibilidades a trabalhadores egressos de outras manufaturas decadentes esses trabalhadores em toda parte onde vigora o estatuto da aprendizagem não têm outro recurso senão ampararse nas paróquias ou então passar a operar como trabalha dores comuns trabalhos esses para os quais devido a seus hábitos estão muito menos qualificados do que para qualquer outro ofício se melhante ao que tiveram que abandonar Eis por que geralmente aca bam refugiandose nas paróquias Tudo o que dificulta a livre circulação de mãodeobra de uma profissão para outra dificulta igualmente a circulação do capital de um emprego para outro uma vez que o volume de capital que se pode aplicar em determinado setor depende muito da quantidade de mão deobra que o setor pode empregar Todavia as leis das corporações criam obstáculos menos à livre circulação de capital de um emprego para outro do que à livre circulação da mãodeobra Em toda parte é muito mais fácil um comerciante rico obter o privilégio de exercer o comércio em uma cidade em que existe corporação do que um artesão pobre obter o privilégio de trabalhar nessa cidade Segundo acredito são comuns a todos os países da Europa os obstáculos colocados pelas leis das corporações à livre circulação de mãodeobra Entretanto quanto saiba são peculiares à Inglaterra os obstáculos colocados pela legislação sobre os pobres Esse obstáculo consiste na dificuldade que o pobre tem para conseguir estabelecerse OS ECONOMISTAS 178 ou mesmo para ser admitido a exercer sua profissão em qualquer pa róquia a não ser a que pertence As leis das corporações só impedem a livre circulação de artesãos e operários de manufatura Ao contrário a dificuldade de estabelecerse cria obstáculo até mesmo à livre circu lação da mãodeobra comum Pode ser útil expor algo sobre a origem a evolução e o estado atual dessa desordem talvez a maior de todas existente na política da Inglaterra Quando em virtude da destruição dos mosteiros os pobres foram privados do recurso à caridade dessas casas religiosas depois de al gumas tentativas infrutíferas de solucionar o problema o Decreto 43 capítulo 2 da Rainha Isabel determinou que cada paróquia deveria cuidar de seus próprios pobres e que anualmente se nomeasse inspe tores para os pobres esses juntamente com os fabriqueiros das Igrejas deveriam recolher quantias de dinheiro para assistência aos pobres por meio de uma taxa paroquial Esse estatuto impunha a cada paróquia em particular a neces sidade de cuidar ela mesma de seus próprios pobres Em conseqüência passou a assumir uma certa importância esta questão quem deve ser considerado como os pobres de cada paróquia Depois de algumas in certezas e variações este problema foi resolvido pelos Decretos 13 e 14 de Carlos II os quais estabelecem que 40 dias de moradia inin terrupta garantiam a qualquer pessoa a residência em uma paróquia acrescentando porém que dentro desse período se os curadores de igreja ou os zeladores dos pobres apresentassem alguma queixa contra o recémchegado dois juízes de paz tinham o direito legal de removêlo novamente para a paróquia donde havia saído a menos que ele alugasse um alojamento de 10 libras por ano ou então estivesse em condições de oferecer à nova paróquia algum valor que os referidos juízes de paz considerassem suficiente para desonerar financeiramente a paróquia Pelo que se afirma esse estatuto deu margem a fraudes Havia funcionários que às vezes subornavam os pobres de sua paróquia e os convenciam a se estabelecer em outra mantendoos porém nessa outra paróquia em situação clandestina durante os quarenta dias necessários para adquirirem o direito de residência visando com isso desonerar a paróquia à qual pertenciam originariamente os pobres Eis por que o Decreto 1 de Jaime II determinou que os quarenta dias necessários para se obter a residência deviam ser contados somente a partir do momento em que o respectivo pobre entregasse a um dos curadores ou dos zeladores da nova paróquia uma notificação por escrito indi cando o seu endereço e o número de pessoas que compunha sua família Entretanto ao que parece os oficiais paroquiais nem sempre eram mais honestos em relação à sua paróquia do que haviam sido em relação a outras e por vezes se mostravam coniventes com tais intrusões recebendo a notificação mas não adotando as medidas ade quadas depois disso Já que portanto supostamente cada membro da paróquia tinha o máximo interesse em não onerar mais os custos de sua paróquia com novos intrusos o Decreto 3 de Guilherme III ADAM SMITH 179 sancionou que os quarenta dias deveriam ser contados somente a partir da publicação da notificação por escrito na respectiva igreja no do mingo imediatamente após o serviço divino Tudo somado afirma o Dr Burn é muito raro alguém conseguir essa residência decorridos quarenta dias contínuos de moradia após a publicação escrita da notícia o intento da lei não é tanto favorecer a concessão de novos direitos de resi dências mas impedila criando obstáculos a entradas clandes tinas com efeito a notificação é uma arma a mais para a pa róquia poder remover o novo candidato Entretanto se a situação de uma pessoa é tal que é duvidoso se pode ou não ser removida ou a notificação obriga a paróquia a conceder a residência sem contestação deixando que o cidadão continue a residir ali os quarenta dias ou então obriga a remover o candidato da pa róquia mediante denúncia e processo judicial Conseqüentemente esse estatuto praticamente tornou impossível a qualquer pobre a obtenção de uma nova residência pelo velho sistema da moradia durante quarenta dias consecutivos na nova paróquia Contudo para não fechar totalmente a possibilidade de pessoas comuns de uma paróquia conseguirem residência em outra o estatuto oferecia quatro ou tros meios para conseguir isto sem ter que entregar uma notificação e sem necessidade de publicação da mesma O primeiro consistia em com prometerse a pagar as taxas paroquiais e pagálas efetivamente o se gundo em ser eleito para um ofício paroquial anual servindo nessa função durante um ano o terceiro passando por uma aprendizagem na paróquia e o quarto sendo contratado para o serviço da paróquia durante um ano e permanecendo no mesmo serviço durante todo o referido ano Pelos dois primeiros meios nenhum pobre podia obter uma re sidência a não ser por consentimento da paróquia inteira a qual estava perfeitamente consciente das conseqüências financeiras decorrentes da adoção de um novo habitante que não dispusesse de outro patrimônio senão seu próprio trabalho Por outro lado mesmo os dois últimos meios estavam pratica mente fechados a um homem casado Dificilmente um aprendiz pode ser casado aliás a lei prescreve expressamente que não se dê residência a nenhum casado através de contratação por um ano O efeito principal da introdução da concessão de residência por serviço foi abolir em grande parte o velho costume de contratar para um ano costume esse anteriormente tão habitual na Inglaterra que mesmo hoje se não hou ver cláusula específica que diga o contrário a lei entende que todo empregado é contratado por um ano Todavia nem sempre os mestres estão dispostos a conceder residência a seus empregados contratan doos dessa maneira e os próprios empregados nem sempre estão dis postos a ser contratados dessa forma pois já que uma nova residência implica em cancelamento das anteriores os empregados poderiam vir OS ECONOMISTAS 180 a perder sua residência original nos lugares em que nasceram mo radia de seus pais e de seus parentes É evidente que nenhum trabalhador independente quer seja operário ou artesão tem probabilidade de obter uma nova residência seja por apren dizagem ou por serviço Se portanto tal pessoa levasse sua atividade para uma nova paróquia estaria sujeita a ser afastada por mais saudável e operosa que fosse ao arbítrio de qualquer curador de igreja ou inspetor a menos que pagasse 10 libras por ano coisa impossível para quem vive exclusivamente de seu trabalho ou então pudesse oferecer uma garantia financeira considerada por dois juízes de paz como suficiente para desonerar financeiramente a paróquia A lei deixava a critério da pessoa o tipo de garantia a ser oferecida na realidade porém não se tinha condições de exigir menos de 30 libras pois era lei que mesmo a compra de uma pro priedade livre e alodial de menos de 30 libras não assegura a uma pessoa uma nova residência por não ser suficiente para desonerar financeiramente a paróquia Ora isto é uma garantia que dificilmente pode ser oferecida por uma pessoa que vive de seu trabalho aliás na realidade muitas vezes se exige uma garantia bem superior Com o objetivo de restaurar de alguma forma aquela circulação livre de mãodeobra impossibilitada quase totalmente por esses di versos estatutos partiuse para a invenção dos certificados Os Decretos 8 e 9 de Guilherme III determinaram que toda pessoa que trouxesse um certificado da última paróquia dizendo que possuía residência legal certificado esse assinado pelos curadores da igreja e pelos inspetores dos pobres e com a permissão de dois juízes de paz qualquer outra paróquia estava obrigada a receber tal pessoa os decretos estabeleciam além disso que tal pessoa não poderia ser removida da paróquia so mente pelo fato de haver alguma probabilidade de se tornar onerosa mas somente pelo fato de se tornar efetivamente onerosa e que nesse caso a paróquia que expediu o certificado é obrigada a pagar tanto a manutenção da pessoa como as despesas de sua remoção à nova pa róquia E para dar segurança máxima à paróquia em que viesse a residir tal pessoa munida de certificado o mesmo estatuto prescreveu que a pessoa não poderia obter ali nenhum direito de residência por nenhum meio a não ser pagando 10 libras por ano ou então servindo por conta própria em um ofício paroquial durante um ano inteiro excluindose portanto a possibilidade de conseguir a residência por notificação por aprendizagem ou por pagamento de taxas paroquiais Além disso o Decreto 12 da Rainha Ana estatuto Ic 18 determinou que nem os empregados nem os aprendizes de tal pessoa munida de certificado podiam obter residência na paróquia na qual viesse a residir tal pessoa munida de certificado passado por outra paróquia Até onde essa invenção conseguiu restabelecer aquela livre cir culação de mãodeobra que havia sido quase inteiramente impossibi litada pelos estatutos anteriores podemos deduzir das observações mui to judiciosas do Dr Burn que passo a transcrever É óbvio que há várias boas razões para exigir certificados para ADAM SMITH 181 pessoas que passam a instalarse em uma nova localidade isto é que tais pessoas não podem obter residência nem mediante aprendizagem nem prestando serviço nem por notificação nem pagando taxas paroquiais que não podem obter residência nem para aprendizes nem para empregados seus que no caso de tais pessoas se tornarem onerosas sabese para onde removê las sendo que a paróquia anterior está obrigada a pagar tanto as despesas da remoção como da manutenção da pessoa nesse meiotempo e que se tal pessoa adoecer a paróquia que emitiu o certificado deve mantêla Tudo isto não pode ocorrer sem certificado Ora essas mesmas razões valem proporcionalmente para paróquias que não concediam certificados em casos ordi nários pois é muito provável que mais cedo ou mais tarde terão que receber de volta as pessoas a quem haviam dado certificado aliás em condições piores do que antes A lição a ser tirada dessas observações é que ao que parece o certificado deve ser exigido pela paróquia na qual passa a residir um novo pobre mas que ao mesmo tempo esse certificado muito raramente deve ser fornecido pela paróquia que o pobre pretende deixar Existe certa crueldade nessa matéria de certificados afirma o mesmo inteligente autor em sua History of the Poor Laws ao confiar ao critério de um funcionário paroquial o poder de aprisionar uma pessoa como se fosse para o resto da vida isso por mais inconveniente que seja para esse pobre continuar a morar no lugar onde teve a infelicidade de adquirir o que se chama de residência ou por maior que seja a vantagem que ele possa esperar propondose a morar alhures Embora o certificado não contenha nenhum testemunho de boa conduta pois se limita a atestar que a pessoa faz parte da paróquia à qual pertence realmente fica inteiramente a critério dos funcionários paroquiais conceder ou negar tal certificado Segundo o Dr Burn foi feito um mandato no sentido de obrigar os curadores e inspetores a assinarem o certificado todavia os juízes da Corte Real rejeitaram essa moção como uma tentativa muito estranha Os salários extremamente desiguais com que deparamos freqüen temente na Inglaterra em localidades não muito distantes uma da outra são provavelmente devidos aos obstáculos que a lei da residência coloca para um pobre que destituído de certificado deseja transferir seu trabalho de uma paróquia para outra Com efeito um trabalhador solteiro operoso e dotado de boa saúde poderá às vezes residir em outra paróquia sem certificado embora enfrentando sofrimentos mas um homem com mulher e família que tentasse essa aventura na maioria das paróquias certamente acabaria sendo removido o mesmo acontecendo geralmente a um solteiro no momento em que viesse a casarse Por isso a escassez de mãodeobra em uma paróquia nem sempre pode ser remediada pela superabundância existente em outra como acontece constantemente na Escócia e conforme OS ECONOMISTAS 182 acredito em todos os outros países em que não existem essas dificul dades para a residência Nesses países embora os salários possam ser um pouco mais altos nas proximidades de uma cidade grande ou em outros lugares em que existir uma demanda extraordinária de mão deobra e diminuir gradualmente à medida em que aumenta a distância de tais centros até recaírem novamente na taxa comum do país nunca deparamos com essas diferenças repentinas e imprevisíveis que por vezes encontramos na Inglaterra em localidades vizinhas onde fre qüentemente é mais difícil para uma pessoa pobre atravessar os limites artificiais de uma paróquia do que atravessar um braço de mar ou uma cadeia de altas montanhas divisas naturais que às vezes separam níveis salariais nitidamente diferenciados em outros países Remover uma pessoa que não cometeu nenhuma falta de uma paróquia onde escolheu residir constitui uma violação evidente da liber dade e da justiça natural E no entanto as pessoas simples do povo da Inglaterra tão ciosas da sua liberdade mas nunca perfeitamente cons cientes do conteúdo e do significado autêntico dessa prerrogativa como aliás acontece na maioria dos outros países têm suportado já durante mais de um século tal tipo de opressão sem encontrar saída para esse impasse Embora também pessoas ponderadas por vezes se tenham quei xado da lei da residência como de uma calamidade pública esta nunca foi objeto de clamor geral do povo como ocorreu contra as garantias gerais sem dúvida uma prática abusiva mas que provavelmente não provocava uma opressão geral Arriscarmeia a afirmar que dificilmente existe na Inglaterra um pobre de quarenta anos de idade que em algum período de sua vida não tenha sentido em sua própria pele a opressão cruel dessa infeliz lei sobre a residência Concluirei este longo capítulo observando que embora antiga mente fosse costume definir níveis salariais primeiro por meio de leis gerais extensivas ao país inteiro e depois mediante regulamentos par ticulares dos juízes de paz em cada condado específico atualmente essas duas práticas estão totalmente em desuso Com base na experiência de mais de 400 anos diz o Dr Burn parece chegado o momento de deixar de lado todas as tentativas de definir rigorosamente por lei aquilo que pela pró pria natureza parece impossível de delimitação estrita com efei to se todas as pessoas que exercem o mesmo tipo de trabalho devessem receber salários iguais não haveria emulação não haveria margem para a iniciativa e a generosidade A despeito disso às vezes o Parlamento mediante leis específicas tenta regulamentar os salários em ocupações específicas e em deter minados lugares Assim o Decreto 8 de Jorge III proíbe sob ameaça de incorrer em penalidades severas todos os mestres alfaiates de Lon dres e até 5 milhas ao seu redor pagar e aos seus trabalhadores aceitar mais do que 2 xelins e 7 12 pence por dia excetuado o caso de um luto oficial Sempre que os legisladores tentam regulamentar as ADAM SMITH 183 diferenças entre os mestres e seus trabalhadores seus conselheiros são sempre os mestres Por isso quando a regulamentação favorece os traba lhadores é sempre justa e eqüitativa ao passo que às vezes ocorre o con trário quando a regulamentação favorece aos mestres Assim a lei que obriga os mestres em várias profissões a pagar seus trabalhadores em dinheiro e não em bens é perfeitamente justa e eqüitativa Ela não impõe nada de duro aos mestres mas simplesmente os obriga a pagar em dinheiro aquele valor que pretendiam pagar em bens e que na realidade nem sempre pagavam Essa lei favorece os operários Mas o Decreto 8 de Jorge III favorece os mestres Quando estes combinam entre si para reduzir os sa lários de seus empregados é comum assumirem um compromisso particular de sob pena de incorrerem em alguma penalidade não pagar mais do que um determinado salário Se os empregados fizessem entre si um acordo contrário do mesmo tipo de não aceitarem determinado salário sob pena de incorrerem em alguma penalidade a lei os puniria com grande rigor Ora se a lei fosse imparcial deveria tratar os mestres da mesma forma No entanto o Decreto 8 de Jorge III seleciona por lei aquela mesma regulamentação que os patrões às vezes tentam estabelecer em seus con luios Parece totalmente fundada a queixa dos trabalhadores de que tal lei coloca os mais capazes e os mais aplicados em pé de igualdade com o trabalhador comum Também nos tempos antigos era habitual tentar regulamentar os lucros dos comerciantes e de outros profissionais determinando o preço dos mantimentos e de outros bens Pelo que sei o único remanescente desse antigo costume é a questão do preço do pão Onde existe uma corporação com direitos exclusivos talvez seja recomendável regulamentar o preço do alimento mais elementar Mas onde isso não existe a concor rência regulará tal preço de maneira muito mais eficaz do que qualquer tribunal A questão de fixar o preço do pão estabelecido pelo Decreto 31 de Jorge II não pôde ser aplicado na Escócia devido a uma deficiência na lei já que a sua execução depende do cargo de amanuense do mercado que lá não existe Essa deficiência só foi remediada com o Decreto 3 de Jorge III A falta de uma sessão de um tribunal para fixação do preço não gerou nenhum inconveniente sério e por outro lado a existência de tal órgão nos poucos lugares onde até agora funcionou não acarretou nenhuma vantagem significativa Todavia na maior parte das cidades da Escócia existe uma corporação de padeiros que reclama privilégios exclusivos embora esses não sejam observados com muito rigor Ao que parece a proporção entre os diferentes níveis salariais e de lucro nos diferentes empregos de mãodeobra e de capital não é muito afetada como já observei pela riqueza ou pobreza de uma sociedade ou pela sua condição de progresso estacionária ou de declínio Tais transformações no bemestar público embora afetem os níveis gerais dos salários e do lucro em última análise os afetam de maneira igual em todos os empregos ou ocupações Por conseguinte a proporção entre eles permanece necessariamente a mesma não podendo ser al terada por tais transformações ao menos por um período significativo OS ECONOMISTAS 184 CAPÍTULO XI A Renda da Terra A renda da terra considerada como o preço pago pelo uso da terra é naturalmente a maior que o arrendatário pode permitirse pagar nas circunstâncias efetivas da terra Ao ajustar as cláusulas do arrendamento o dono da terra faz o possível para deixar ao arrenda tário uma parcela da produção não superior ao que é suficiente para pagar ao arrendatário o capital do qual ele fornece as sementes paga a mãodeobra compra e mantém o gado e outros instrumentos e dis positivos agrícolas juntamente com o lucro normal do capital empre gado segundo a taxa vigente na região Evidentemente isso é o mínimo com o qual o arrendatário pode contentarse se não quiser sair perdendo no negócio e raramente o proprietário da terra está disposto a darlhe mais do que isso Toda e qualquer parcela da produção ou o que é a mesma coisa toda parcela do preço da produção que ultrapasse a porcentagem destinada ao arrendatário o dono da terra naturalmente procura reservála para si como sendo a renda que lhe é devida pelo uso da terra essa renda pleiteada pelo proprietário naturalmente é a máxima que o arrendatário puder pagarlhe nas circunstâncias con cretas da terra Por vezes de fato a liberdade do proprietário mais freqüentemente a ignorância dele o leva a contentarse com uma parcela algo inferior a isso por outro lado às vezes embora mais raramente a ignorância do arrendatário o faz submeterse a pagar algo mais do que a citada porcentagem ou a contentarse com algo menos do que o lucro do capital a investir lucro esse calculado pelo índice vigente na redondeza Entretanto essa parcela ainda pode ser considerada como a renda natural que deriva do uso da terra ou seja a renda pela qual naturalmente se entende que deva ser geralmente locada a propriedade Poderseia pensar que a renda proveniente da locação da terra freqüentemente não seja outra coisa senão um razoável lucro ou juros pelo capital empatado pelo dono da terra para melhorála Sem dúvida 185 isso pode ocorrer em determinados casos mas só em parte o proprie tário exige uma renda mesmo pela terra em que não implantou ne nhuma melhoria e os supostos juros ou lucro sobre as despesas das melhorias constituem geralmente um acréscimo a essa renda original Além disso as melhorias introduzidas na terra nem sempre são feitas com o capital do proprietário mas às vezes com o do arrendatário No entanto quando se renova a locação geralmente o locador exige o mesmo aumento da renda que pleitearia no caso de todas as melhorias terem sido feitas com seu próprio capital Por vezes o proprietário exige renda por uma terra que simples mente não está em condições de receber melhorias A alga marinha é uma espécie de planta que ao ser queimada produz um sal alcalino útil para fazer vidro sabão e para várias outras finalidades Cresce em várias regiões da GrãBretanha particularmente na Escócia so mente sobre rochas banhadas pela maré alta rochas essas que são cobertas pelo mar duas vezes ao dia e cujo produto portanto nunca foi aumentado pelo trabalho humano No entanto o proprietário de faixas de terra limitadas por praias de algas marinhas exige no caso a mesma renda que pleiteia por seus campos cerealíferos Nas proximidades das ilhas de Shetland quase sempre o mar tem peixes em grande abundância que constituem grande parte da subsistência dos que ali moram Todavia a fim de auferir proveito desse produto da água esses moradores precisam ter uma moradia na terra vizinha A renda do proprietário da terra é proporcional não àquilo que seu dono pode auferir dela mas àquilo que o arrendatário consegue auferir tanto da terra como da água Essa renda é em parte paga com peixe do mar efetivamente é nessa região que se encontra um dos poucos exemplos em que a renda da terra representa um com ponente do preço dessa mercadoria o peixe Conseqüentemente a renda da terra considerada como o preço pago pelo uso da terra é naturalmente um preço de monopólio De forma alguma é ela proporcional àquilo que o proprietário pode ter investido na melhoria da terra ou àquilo que ele pode extrair dela mas ela é proporcional ao que o arrendatário pode pagar Geralmente só podem ser comercializados aqueles produtos da terra cujo preço normal é suficiente para repor o capital que deve ser empregado para colocar os produtos no mercado juntamente com os lucros normais desse capital Se o preço normal da mercadoria for superior a isso a parcela excedente irá naturalmente para a renda da terra Se o preço normal não for superior a isso embora a mercadoria possa ser colocada no mercado não poderá proporcionar nenhuma renda ao proprietário da terra Quanto ao preço da mercadoria maior ou menor isso depende da demanda Há certos produtos da terra para os quais a demanda deve sempre ser tal que permita um preço superior ao que é suficiente para colocálos no mercado e outros há para os quais a demanda pode ou não ser tal que permita esse preço mais alto Os primeiros sempre devem pro OS ECONOMISTAS 186 porcionar uma renda ao proprietário da terra Os segundos às vezes podem proporcionar tal renda e às vezes não conforme as circunstâncias Cumpre observar portanto que a renda entra na composição do preço das mercadorias de uma forma diferente dos salários e do lucro Salários e lucros altos ou baixos são a causa do preço alto ou baixo das mercadorias ao passo que a renda da locação da terra alta ou baixa constitui o efeito dos preços altos ou baixos das mercadorias Se o preço de uma mercadoria é alto ou baixo é porque se precisa pagar salários e lucro altos ou baixos para comercializála Ao contrário é porque o preço da mercadoria é alto ou baixo muito mais pouco mais ou não mais do que o suficiente para pagar esses salários e esse lucro que a mercadoria proporciona uma renda alta uma renda baixa ou nenhuma renda O presente capítulo se divide em três partes nas quais se estudará respectivamente primeiro aqueles produtos da terra que sempre pro porcionam alguma renda segundo aqueles produtos da terra que às vezes podem proporcionar renda e às vezes não terceiro as variações que nos diferentes períodos de aprimoramento ou desenvolvimento da terra ocorrem naturalmente no tocante ao valor relativo dos dois tipos de produtos naturais da terra comparados tanto entre si como com as mercadorias manufaturadas PARTE PRIMEIRA Os produtos da terra que sempre proporcionam renda Uma vez que os homens como todos os outros animais se mul tiplicam naturalmente em proporção aos meios de sua subsistência podese dizer que basicamente sempre há demanda de alimentos Os alimentos sempre podem comprar ou comandar um volume maior ou menor de trabalho e sempre é possível encontrar alguém disposto a fazer algo para conseguilos Efetivamente o volume de trabalho que os alimentos podem comprar nem sempre é igual àquele que poderiam sustentar se geridos da maneira mais econômica devido aos altos salários que por vezes são pagos pela mãodeobra Todavia os ali mentos sempre podem comprar ou comandar um volume tal de trabalho que possam sustentar de acordo com a taxa pela qual esse tipo de trabalho é sustentado na região A terra em quase todas as situações produz uma quantidade maior de alimentos do que o suficiente para manter toda a mãodeobra necessária para colocálos no mercado por mais liberal que seja a remuneração paga à mãodeobra Também o excedente é sempre mais do que suficiente para repor o capital que deu emprego a essa mão deobra juntamente com o lucro desse capital Por isso sempre per manece algo para uma renda destinada ao proprietário da terra As charnecas mais desertas da Noruega e da Escócia produzem algum tipo de pastagem para o gado cujo leite e cuja procriação são ADAM SMITH 187 sempre mais do que suficiente não somente para manter toda a mão deobra necessária para isso e para pagar o lucro normal do arrenda tário ou do dono do rebanho mas também para proporcionar alguma renda ao dono da terra A renda aumenta proporcionalmente à boa qualidade das pastagens A mesma extensão de terra não somente mantém um número maior de cabeças de gado senão que pelo fato de esse gado ser mantido dentro de uma área menor requer menos mãodeobra para cuidar dele para fazer a coleta do produto O pro prietário da terra ganha de duas maneiras pelo aumento da produção e pela diminuição da mãodeobra mantida com esta produção A renda da terra varia não somente conforme a fertilidade qualquer que seja seu produto mas também de acordo com a sua localização qualquer que seja a fertilidade A propriedade localizada perto de uma cidade produz uma perda superior à que é proporcionada por uma terra da mesma fertilidade localizada no interior do país Embora o cultivo de uma não requeira maior mãodeobra ou trabalho do que o cultivo da outra necessariamente o custo será maior no caso de ter que colocar no mercado gêneros alimentícios trazidos de uma região longínqua Uma quantidade maior de trabalho portanto pode ser mantida fora dela e o excedente do qual se tira o lucro do agricultor e a renda do proprietário deve ser diminuído Mas nos locais distantes do país a taxa de lucro como já se demonstrou geralmente é maior do que nas proximidades de uma cidade grande Por conseguinte será menor também a porcentagem desse excedente diminuído que perten cerá ao dono da terra As boas estradas os canais e os rios navegáveis por diminuírem as despesas de transporte fazem com que as regiões mais longínquas do país possam aproximarse mais do nível vigente nas proximidades de uma cidade Sob esse aspecto essas facilidades de transporte representam as maiores melhorias Estimulam e encorajam o cultivo das regiões inte rioranas que necessariamente representarão sempre a maior parte do país Trazem vantagem à cidade por quebrarem o monopólio do campo em suas proximidades Acarretam vantagem até mesmo para aquela parte do campo Embora introduzam algumas mercadorias concorrentes no mer cado tradicional abrem muitos mercados novos para sua produção Além disso o monopólio representa um grande inimigo para a boa administração a qual só pode ser implantada em toda parte em conseqüência daquela concorrência livre e geral que obriga todos a recorrerem a ela em sua própria defesa Não faz mais de cinqüenta anos que alguns condados perto de Londres pleitearam ao Parlamento que não permitisse prolongar as grandes estradas com pedágio até os condados mais longínquos do país Alegavam que devido ao baixo preço da mãodeobra vigente nessas regiões mais afastadas esses condados teriam a possibilidade de vender sua forragem e seus cereais no mercado de Londres a preço mais baixo do que em seus próprios reduzindo com isso suas rendas e arruinando sua agricultura No entanto suas rendas aumentaram e sua agricultura se aprimorou desde essa época OS ECONOMISTAS 188 Um campo de cereais de razoável fertilidade produz uma quan tidade muito maior de alimento humano do que a melhor pastagem de igual extensão Embora seu cultivo exija muito mais trabalho é também muito maior o excedente que resta após repostas as sementes e mantida toda a mãodeobra Por isso se nunca se julgasse que uma librapeso de carne de açougue valesse mais do que uma libra de pão esse excedente maior seria em toda parte de valor maior e constituiria um fundo maior tanto para o lucro do arrendatário quanto para a renda do proprietário Parece ter ocorrido isso em toda parte nos rudes primórdios da agricultura Efetivamente os valores relativos desses dois alimentos o pão e a carne de açougue diferem muito nos diversos períodos da agri cultura Nos rudes primórdios da agricultura as regiões agrestes des tituídas de qualquer melhoria que nesse estágio ocupam a maior parte do país estão totalmente abandonadas ao gado Há mais carne de açougue do que pão e por isso é em torno do pão que encontramos a maior concorrência o que faz subir seu preço Segundo Ulloa em Bue nos Aires há 40 ou 50 anos o preço normal de um boi escolhido num rebanho de 200 ou 300 cabeças era de 4 reais ou seja 21 pence e 12 esterlino Ulloa não diz nada sobre o preço do pão provavelmente porque não havia notado nada de especial quanto a isso Diz ele que um boi em Buenos Aires custava pouco mais do que o trabalho de pegálo no pasto Ao contrário em toda parte o cultivo do trigo requer muito trabalho e num país localizado na região do rio da Prata naquela época o caminho direto da Europa para as minas de prata de Potosi o preço da mãodeobra em dinheiro não podia ser muito baixo É diferente quando o cultivo de cereais cobre a maior parte do país Nesse caso há mais pão do que carne de açougue A concorrência concentrase na carne sendo que então o preço dela ultrapassa o do pão Além disso à medida que o cultivo se amplia as regiões agrestes sem melhorias tornamse insuficientes para suprir a demanda de carne de açougue Grande parte das terras cultivadas precisa ser utilizada para criar e engordar gado cujo preço portanto deve ser suficiente para pagar não somente a mãodeobra exigida mas também a renda que teria o dono da terra e o lucro que teria o locatário utilizando a terra para cultivo O gado criado nas charnecas menos cultivadas ao ser colocado no mercado é vendido ao mesmo preço que o gado criado nas terras mais cuidadas se seu peso e a qualidade forem os mesmos Os proprietários dessas charnecas tiram proveito disso e auferem a renda de sua terra em proporção com o preço de seu gado Não faz mais de um século que nas regiões montanhosas da Escócia a carne de açougue era tão barata ou até mais barata que o próprio pão feito de farinha de aveia A união133 abriu o mercado da Inglaterra ao gado das montanhas escocesas Seu preço comum hoje é aproximadamente ADAM SMITH 189 133 Adam Smith se refere à formação do Reino Unido em 1707 quando a Escócia se ligou à Inglaterra N do E três vezes superior ao do início do século sendo que as rendas de muitas propriedades das montanhas triplicam ou quadruplicam no mes mo espaço de tempo Atualmente quase em toda a GrãBretanha 1 librapeso da melhor carne de açougue vale geralmente mais do que 2 libraspeso do melhor pão branco e em anos de abundância vale às vezes 3 ou 4 libraspeso É assim que com a continuidade dos melhoramentos a renda e o lucro das pastagens não melhoradas vêm a ser regulados até certo ponto pela renda e pelo lucro daquelas que tiveram melhoria e em ambos os casos pela renda e pelo lucro dos trigais O trigo se colhe uma vez ao ano A carne de açougue é um produto que requer para seu aproveitamento quatro ou cinco anos Já que portanto um acre de terra produzirá uma quantidade muito menor de um tipo de alimento do que do outro a inferioridade da quantidade deve ser compensada pela superioridade do preço Se fosse mais do que compensada seria maior a quantidade de terras para trigo que se transformaria em pas tagem e se não fosse compensada uma parte das terras utilizadas como pastagem voltaria a ser empregada para o plantio de trigo Todavia essa igualdade entre a renda e lucro das pastagens e a renda e lucro dos trigais da terra cujo produto imediato é o alimento para o gado e da terra cujo produto imediato é o alimento humano ocorre somente na maior parte das terras bem cuidadas de uma grande região Em certas situações locais especiais acontece bem outra coisa sendo a renda e o lucro das pastagens muito superiores ao que se pode auferir plantando cereais Assim nas redondezas de uma cidade grande a demanda de leite e de forragem para cavalos freqüentemente contribui juntamente com o alto preço da carne de açougue para elevar o preço da forragem acima daquilo que se pode chamar de sua proporção natural ao valor do trigo É evidente que essa vantagem local não pode estenderse às terras distantes Determinadas circunstâncias por vezes fizeram com que alguns países se tornassem tão povoados que o território inteiro como as terras localizadas nas proximidades de uma grande cidade não era suficiente para produzir tanto a forragem como para produzir o trigo necessário para a subsistência de seus habitantes Por esta razão suas terras eram empregadas sobretudo na produção de forragem a mer cadoria mais volumosa que além disso não se pode facilmente fazer vir de grandes distâncias sendo que os cereais alimentos da grande parte do povo eram importados de países estrangeiros A Holanda está hoje nessa situação sendo que também uma parte considerável da antiga Itália parece ter estado nessa situação durante a época de prosperidade dos romanos Segundo nos refere Cícero o velho Catão dizia que dar boas pastagens para o gado era a primeira coisa e a mais rentável na administração de uma propriedade particular dar pastagens razoáveis ao gado era a segunda e dar más pastagens era a terceira Arar a terra para ele estava apenas em OS ECONOMISTAS 190 quarto lugar no tocante ao lucro e às vantagens Efetivamente na parte da antiga Itália localizada nas proximidades de Roma o cultivo da terra parece ter sido muito pouco estimulado pelas distribuições de trigo feitas com freqüência ao povo gratuitamente ou a preço extre mamente baixo Esse trigo era trazido das províncias conquistadas dentre as quais ao invés de pagar impostos muitas eram obrigadas a fornecer à República de Roma um décimo de sua produção a um determinado preço aproximadamente seis pence por celamim O baixo preço desse trigo distribuído ao povo deve necessariamente ter feito baixar o preço do trigo que poderia ser trazido ao mercado de Roma do Lácio ou seja o antigo território de Roma e deve ter desestimulado o cultivo do trigo nessa região Além disso em um país aberto cujo produto principal é o trigo uma área bem delimitada e cercada de pastagem muitas vezes produzirá mais do que qualquer campo de trigo das proximidades É conveniente para o sustento do gado empregado no cultivo do trigo sendo que sua alta renda neste caso é paga não tanto do valor de sua própria produção mas antes do valor das terras empregadas para o trigo cultivadas com a respectiva renda Essa renda e lucro provavelmente baixarão no mo mento em que eventualmente as terras da região forem completamente cercadas A alta renda atual da terra cercada na Escócia parece deverse à escassez de terreno cercado perdurando provavelmente apenas enquanto perdurar a escassez A vantagem do cercado é maior para as pastagens do que para o trigo Poupa a mãodeobra necessária para guardar o gado que também se alimenta melhor quando não está sujeito a ser perturbado pelo guardador ou por seu cão Entretanto onde não existe uma vantagem local desse tipo a renda e o lucro do trigo ou de qualquer outro alimento vegetal comum do povo deve naturalmente regular a renda e o lucro das pastagens na terra que seja adequada para a produção de trigo Poderseia esperar que o uso de pastagens artificiais de nabos cenouras couve e dos outros vegetais a que se recorreu para obter uma quantidade igual de terra alimenta maior número de cabeças de gado do que a pastagem natural e poderia de alguma forma reduzir acreditase a superioridade que em uma região melhorada o preço da carne de açougue tem naturalmente em relação ao do pão Efeti vamente parece que isso tem ocorrido havendo até certo ponto mo tivos para crer que ao menos no mercado londrino o preço da carne de açougue em proporção com o preço do pão é hoje bastante mais baixo do que era no início do século passado No apêndice à Vida do Príncipe Henrique o Dr Birch nos deixou um relato sobre os preços da carne de açougue comumente pagos por esse príncipe O relato diz que quatro quartos de um boi pesando 600 libras normalmente lhe custavam 9 libras esterlinas e 10 xelins ou aproximadamente isso ou seja 31 xelins e 8 pence por cem libraspeso O Príncipe Henrique morreu a 6 de novembro de 1612 com 19 anos de idade ADAM SMITH 191 Em março de 1763 houve uma investigação do Parlamento sobre as causas do alto preço dos mantimentos na época Entre outras provas alegadas um comerciante da Virgínia evidenciou que em março de 1763 ele havia abastecido seus navios com um quintal de carne bovina por 24 ou 25 xelins que considerava como preço normal ao passo que naquele ano de preços elevados havia pago 27 xelins pelo mesmo peso e qualidade Entretanto esse alto preço em 1764 é 4 xelins e 8 pence mais barato do que o preço normal pago pelo Príncipe Henrique de vendose aliás observar que somente a carne bovina de melhor quali dade pode ser salgada para viagens tão longas O preço pago pelo Príncipe Henrique é de 3 45 pence por libra peso de toda carcaça englobando as partes melhores e as piores do boi e a essa taxa as partes melhores não podiam ter sido vendidas no varejo por menos do que 4 12 ou 5 pence por librapeso No inquérito parlamentar de 1764 as testemunhas constataram que o preço das melhores carnes bovinas para o consumidor era quatro e 4 14 pence por librapeso sendo que o preço das carnes inferiores em geral era de sete farthings até 2 12 e 2 34 pence e esse preço no dizer das testemunhas geralmente era 12 pêni mais caro do que o preço do mesmo tipo de carne vendida no mês de março Mas mesmo esse preço alto é ainda bastante mais barato do que bem podemos supor haver sido o preço vigente ao tempo do Príncipe Henrique Durante os doze primeiros anos do século passado o preço médio do melhor trigo no mercado de Windsor era de 1 18 s e 3 16 d pelo quarter de 9 bushels de Winchester Mas nos doze anos anteriores a 1764 incluindo aquele ano o preço médio da mesma medida do melhor trigo no mesmo mercado era de 2 l s e 9 12 d Portanto nos doze primeiros anos do século passado o trigo pa rece ter sido bem mais barato e a carne de açougue bem mais cara do que nos doze anos anteriores a 1764 incluindo aquele ano Em todos os grandes países a maior parte das terras cultivadas é empregada para produzir alimento humano ou alimento para o gado A renda e o lucro dessas terras determinam a renda e o lucro de todas as outras terras cultivadas Se um determinado produto proporcionasse renda e lucro menor a terra seria logo utilizada para trigo ou pastagem e se outro proporcionasse renda e lucro maior parte das terras de trigo ou de pastagem seria logo empregada para plantar aquele produto respectivo Com efeito os produtos que exigem uma despesa inicial maior de aprimoramento da terra ou uma despesa anual maior para o cultivo a fim de preparar a terra para esses produtos geralmente parecem proporcionar uma renda maior do que o trigo ou as pastagens no primeiro caso ou um lucro maior do que o trigo ou as pastagens no segundo caso Entretanto raramente essa superioridade represen tará mais do que os juros ou uma compensação razoável por essa des pesa superior OS ECONOMISTAS 192 Em um campo de lúpulo em um pomar em uma horta tanto a renda do proprietário como o lucro do arrendatário geralmente são maiores do que em um campo de trigo ou de pastagem Mas é maior a despesa que se requer para preparar a terra para esses tipos de cultivo Em conseqüência o proprietário da terra precisa auferir uma renda maior Além disso fazse mister também uma administração mais atenta e mais habilidosa razão pela qual também o lucro a ser auferido pelo arrendatário deverá ser maior Também a colheita ao menos no tocante ao lúpulo e às frutas é mais precária Portanto o seu preço além de compensar todas as perdas ocasionadas deve pro porcionar algo semelhante ao lucro do seguro A situação econômica dos horticultores geralmente pouco propícia e sempre modesta con vencenos de que sua grande engenhosidade geralmente não é muito bem recompensada Sua agradável arte é praticada por tantas pessoas ricas como lazer que pouca vantagem podem auferir os que se dedicam a essa ocupação para ganhar dinheiro uma vez que as pessoas que por natureza seriam seus melhores clientes produzem para si mesmas o melhor desse tipo de produtos Ao que parece a vantagem auferida de tais melhorias pelo dono da terra nunca foi maior do que o suficiente para compensar as despesas originais para implantálas Na agricultura antiga depois dos vinhedos uma horta bem irrigada parece ter sido a parte da propriedade que supostamente dava produtos mais valiosos Todavia Demócrito que escreveu sobre agricultura há mais ou menos 2 mil anos e que foi considerado pelos antigos como um dos pais desse tipo de cultivo opi nava não ser grande negócio cercar e manter uma horta Diz ele que o lucro não compensa a despesa de um muro de pedras além disso os tijolos dizia ele suponho eu tijolos cozidos ao sol se estragavam com a chuva e as intempéries do inverno exigindo reparos contínuos Columella que divulga esse parecer de Demócrito não o contesta mas propõe um método muito simples para cercado com uma cerca de sarça e urzes a qual baseandose em sua experiência afirma ser uma cerca duradoura e intransponível mas esse método não era conhecido na época de Demócrito ao que parece Paládio adota a opinião de Colu mella a qual já antes havia sido recomendada por Varrão No parecer desses antigos promotores de melhorias parece que a produção de uma horta era pouco mais do que o suficiente para cobrir a cultura extraordinária e a despesa da irrigação pois em países tão ensolarados se considerava apropriado tanto naquela época como hoje ter o controle de uma corrente dágua que pudesse ser conduzida a todos os recantos da horta Na maior parte da Europa supõese atualmente que uma horta não merece uma cerca melhor do que a recomendada por Colu mella Na GrãBretanha e em alguns outros países do norte não se consegue obter os melhores resultados com perfeição a não ser com a ajuda de muros Por isso nesses países o preço dos produtos deve ser suficiente para pagar a despesa da construção e da manutenção desses muros Com freqüência o muro do pomar rodeia a horta a qual dessa ADAM SMITH 193 forma desfruta do benefício de uma cerca que sua própria produção raramente seria capaz de pagar Que os vinhedos quando devidamente plantados e mantidos à perfeição representavam a parte mais valiosa da propriedade rural parece ter sido uma máxima pacificamente aceita na agricultura antiga o mesmo ocorrendo hoje em todos os países produtores de vinho To davia Columella nos diz que os antigos agricultores italianos discutiam sobre se era vantajoso plantar um vinhedo novo Ele se decide a favor da viticultura na qualidade de um verdadeiro amante de todas as culturas curiosas e procura demonstrar confrontando o lucro com a despesa que se tratava de um investimento altamente vantajoso Todavia tais comparações entre o lucro e a despesa de projetos novos são geralmente muito enganosas sobretudo na agricultura Se os ga nhos auferidos efetivamente com tais plantações tivessem sido geral mente tão grandes como ele imaginava não poderia ter havido con trovérsia sobre o assunto Ainda hoje tratase de matéria muitas vezes controvertida nos países produtores de vinho Na realidade os autores que nesses países escrevem sobre agricultura bem como os amantes e promotores dessa cultura parecem em geral inclinados a apoiar a tese de Columella a favor da viticultura Na França a preocupação dos proprietários dos vinhedos velhos em evitar o plantio de novos parece favorecer essa opinião indicando também uma consciência na queles que devem ter a devida experiência de que esse tipo de cultura é no momento no respectivo país mais rentável do que qualquer outra Todavia ao mesmo tempo parece indicar uma outra tese isto é de que o lucro maior só poderá durar enquanto durarem as leis que atual mente restringem a liberdade na viticultura Em 1731 obtiveram uma determinação do Conselho de Ministros proibindo tanto o plantio de novos vinhedos como a renovação dos velhos cujo cultivo estivesse interrompido por dois anos sem uma permissão específica do rei a ser concedida somente em conseqüência de uma informação do inten dente da Província atestando que havia examinado a terra e a con siderara inapta para qualquer outro tipo de cultura A alegação desse regulamento era a escassez de trigo e de pastagens e a superabundância de vinho Mas se essa superabundância tivesse sido real ela teria sem nenhuma intervenção do Conselho efetivamente impedido a plan tação de novos vinhedos através da redução dos lucros desse tipo de cultura abaixo da sua taxa natural em relação ao trigo e às pastagens Quanto à suposta escassez de trigo gerada pela multiplicação dos vi nhedos devese dizer que em parte alguma na França existe um cultivo do trigo tão esmerado como nas províncias viticultoras onde a terra é adequada para o trigo como é o caso da Borgonha Guienne e o Alto Languedoc A numerosa mãodeobra empregada em uma cul tura necessariamente estimula a outra garantindo um mercado pronto para seus produtos Diminuir o número daqueles que são capazes de pagar isso certamente constitui um meio muito pouco promissor para OS ECONOMISTAS 194 estimular o cultivo do trigo É como a política que pretendesse promover a agricultura desestimulando as manufaturas Por isso a renda e o lucro desses produtos que exigem uma despesa original maior para aprimorar a terra para preparála para a cultura ou uma despesa maior do cultivo anual embora muitas vezes sejam muito superiores aos gerados pelo trigo e pelas pastagens todavia quando apenas conseguem compensar tal despesa extraordinária na realidade são regu lados pela renda e pelo lucro dessas colheitas comuns Efetivamente acontece por vezes que a quantidade de terra que pode ser preparada para determinado produto é muito pequena para atender à demanda efetiva Toda produção pode ser utilizada por aque les que estão dispostos a dar algo mais do que é suficiente para pagar a renda total os salários e o lucro necessários para cultivar e comer cializar o produto de acordo com suas taxas naturais ou então de acordo com as taxas com as quais são pagos na maior parte de outras terras cultivadas Nesse caso e somente nesse a parte excedente do preço a que resta depois de cobrir toda a despesa de melhorias efetuadas na terra e para o cultivo pode geralmente não manter nenhuma proporção regular com o excedente similar de trigo ou de pastagem senão que o ultrapassa em muito ora a maior parte desse excedente vai naturalmente para a renda do proprietário da terra Por exemplo devese entender que a proporção usual e natural entre a renda e o lucro do vinho e os do trigo e pastagens só existe efetivamente em relação aos vinhedos que só produzem vinho comum de boa qualidade tal como se pode obter praticamente em qualquer terra em qualquer solo leve cascalhoso ou arenoso e que não tem outro título de recomendação a não ser o fato de ser um vinho forte e saudável Somente com tais vinhedos é que a terra comum do país pode competir com outras já que evidentemente não poderá nunca competir com terras de qualidade especial A videira é mais afetada pela diferença de solos do que qualquer árvore frutífera Em certos tipos de solo a uva produzida apresenta um gosto que supostamente nenhum cultivo ou habilidade é capaz de igualar em nenhum outro solo Esse sabor real ou imaginário às vezes é específico à produção de alguns vinhedos às vezes estendese à maior parte de um pequeno distrito e às vezes estendese a uma parte considerável de uma grande província Toda a quantidade de tais vinhos que se colocar no mercado é insuficiente para atender à demanda efetiva ou seja à demanda daqueles que estariam dispostos a pagar toda a renda o lucro e os salários necessários para comercializar tais vinhos de acordo com a taxa normal ou seja de acordo com a taxa pela qual são pagos nos vinhedos comuns Portanto podese vender toda a quantidade produzida àqueles que estão dispostos a pagar mais o que necessariamente eleva o preço acima dos vinhos comuns A diferença de preço é maior ou menor conforme o prestígio ou a escassez do vinho fizerem com que os concorrentes à compra sejam mais ou menos afoitos Qualquer que seja o preço é certo que a maior parcela ADAM SMITH 195 dele vai para a renda do proprietário da terra Pois embora tais vinhedos geralmente sejam cultivados com mais cuidado do que a maior parte dos demais o alto preço do vinho não parece ser tanto o efeito mas antes a causa desse cultivo esmerado Em se tratando de um produto tão valioso a perda provocada pela negligência é tão grande que mesmo os mais descuidados se sentem obrigados a esmerarse Por isso uma pequena parcela desse preço é suficiente para pagar os salários da mãodeobra extraordinária empregada em seu cultivo bem como o lucro do capital extraordinário que é necessário para manter em ação essa mãodeobra A esses vinhedos preciosos podem ser comparadas as colônias açucareiras dominadas pelas nações européias nas Índias Ocidentais A produção total dessas colônias é insuficiente para atender à demanda efetiva européia e dela podem dispor aqueles que podem dar mais do que o suficiente para cobrir toda a renda o lucro e os salários neces sários para cultivar e comercializar esse açúcar segundo a taxa à qual os preços são normalmente pagos por qualquer outro produto Na Co chinchina o açúcar branco da melhor qualidade é vendido por 3 piastras o quintal aproximadamente 13 xelins e 6 pence em nosso dinheiro conforme nos diz o Sr Poivre134 um observador muito atento da agri cultura daquele país O que lá se denomina quintal pesa de 150 a 200 libras parisienses ou seja em média 175 libras francesas o que reduz o preço das 100 libraspeso inglesas a aproximadamente 8 xelins que não corresponde sequer à quarta parte do que comumente se paga pelo açúcar castanho ou pelo mascavo importado de nossas colônias e nem sequer à sexta parte do que se paga pelo açúcar branco da melhor qualidade A maior parte das terras cultiváveis da Cochinchina são empregadas para produzir trigo e arroz o alimento básico da po pulação Provavelmente nesse país os preços respectivos do trigo do arroz e do açúcar estão em sua proporção natural ou seja aquela que ocorre naturalmente nas diferentes safras da maior parte da terra cultivada e que remunera o dono da terra e o arrendatário com a exatidão de cálculo possível de acordo com o que é geralmente a despesa original das melhorias da terra e a despesa anual do cultivo Entretanto em nossas colônias açucareiras o preço do açúcar não tem essa pro porção com o preço da produção de um arrozal ou de um trigal na Europa ou na América Costumase dizer que um plantador de canade açúcar espera que a aguardente e o melaço cubram a despesa integral do cultivo e que o açúcar seja lucro líquido em sua totalidade Se isto for verdade pois não pretendo afirmálo taxativamente é como se um culti vador de trigo esperasse custear as despesas do seu cultivo com o debulho e a palha e que o grão constituísse um lucro total Com freqüência vemos sociedades de comerciantes em Londres e em outras cidades comerciais comprarem terras devolutas em nossas colônias açucareiras terras essas que esperam melhorar e cultivar com lucro através de seus feitores e OS ECONOMISTAS 196 134 Voyages dun Philosophe representantes não obstante a grande distância e o retorno incerto em razão das precárias condições de funcionamento da justiça nesses países Ninguém tentará aprimorar e cultivar da mesma forma as terras mais férteis da Escócia da Irlanda ou as províncias tritícolas da América do Norte mesmo sabendose que sob o ponto de vista do bom funcionamento da justiça em tais países poderseia esperar retornos mais normais Nos Estados da Virgínia e Maryland preferese o cultivo do ta baco como sendo mais rentável que o dos cereais O tabaco poderia ser cultivado com vantagem na maior parte da Europa todavia em quase todos os países europeus o tabaco se tornou o principal alvo de taxação e se supôs que cobrar um imposto de cada propriedade do país na qual o produto viesse a ser cultivado seria muito mais difícil do que cobrar um imposto único na importação do produto nos postos alfandegários Essa é a razão pela qual se tomou a absurda decisão de proibir o cultivo do tabaco na maior parte da Europa o que neces sariamente confere uma espécie de monopólio aos países em que é permitida a cultura do tabaco sendo que a Virgínia e o Maryland produzem a maior quantidade beneficiandose em larga escala dessa vantagem embora tenham alguns concorrentes Todavia a cultura do tabaco não parece ter sido tão vantajosa como a da canadeaçúcar Nunca ouvi sequer falar de alguma plantação de tabaco que tivesse sido aprimorada e cultivada com o capital de comerciantes residentes na GrãBretanha sendo que as nossas colônias cultivadoras de tabaco não mandam para a Inglaterra esses plantadores ricos que com fre qüência nos vêm das nossas ilhas açucareiras Embora devido à pre ferência dada nessas colônias ao cultivo do tabaco em relação ao do trigo possa parecer que a demanda efetiva européia de tabaco não está plenamente atendida provavelmente essa demanda está mais bem atendida do que no caso do açúcar e embora o preço atual do tabaco seja provavelmente mais do que suficiente para cobrir toda a renda o lucro e os salários exigidos para o cultivo e a comercialização do produto de acordo com a taxa à qual eles são normalmente pagos nas terras de cultivo de trigo o preço atual do fumo não deve estar muito acima do preço atual do açúcar Em conseqüência os nossos plantadores de tabaco têm demonstrado o mesmo receio em relação ao excesso de fumo no mercado que os proprietários de vinhedos na França têm em relação à superabundância de vinho Por uma decisão da Assembléia limitaram seu cultivo a 6 mil pés de tabaco que supostamente pro duzirão mil libras de tabaco para cada negro entre 16 e 60 anos de idade O negro calculam eles além dessa quantidade de tabaco con segue cultivar quatro acres de trigo indiano Além disso para evitar que o mercado fique supersaturado em anos de abundância às vezes queimavam uma certa quantidade de tabaco para cada negro conforme nos conta o Dr Douglas135 suponho que ele tenha sido mal informado ADAM SMITH 197 135 Douglass Summary v II pp 372373 da mesma forma como se diz terem feito os holandeses com referência às especiarias Se há efetivamente a necessidade de recorrer a tais métodos violentos para manter o atual alto preço do tabaco a maior vantagem dessa cultura em relação ao cultivo do trigo se é que ainda existe provavelmente não terá longa duração É dessa maneira que a renda da terra cultivada na qual se produz alimentos para o homem regula a renda da maior parte das outras terras cultivadas Nenhum produto específico pode proporcionar uma renda inferior a essa pois se tal acontecer a terra seria imedia tamente empregada para outro tipo de cultura e se algum tipo de cultura produzir uma renda superior à do cultivo de alimentos huma nos é porque a quantidade de terra que pode ser preparada para esse fim será muito pequena para atender à demanda efetiva desse produto Na Europa o trigo é o produto principal da terra que serve ime diatamente como alimento humano Excetuadas certas situações especí ficas é a renda da triticultura na Europa que regula a renda de todas as outras terras cultivadas A GrãBretanha não precisa invejar nem os vinhedos da França nem os olivais da Itália Exceto em determinadas situações o valor desses é regulado pelo valor do trigo no qual a fertilidade da GrãBretanha não é muito inferior à desses dois países Se em algum país o alimento vegetal normal e favorito da po pulação fosse tirado de uma planta cuja terra mais comum com o mesmo ou mais ou menos o mesmo cultivo produzisse uma quantidade muito maior do que a produzida pela terra mais fértil para trigo seria necessariamente muito maior a renda do proprietário ou seja a quan tidade excedente de alimento que restaria para o arrendatário após pagar a mãodeobra e repor o capital do proprietário juntamente com os lucros normais deste Qualquer que fosse a taxa normal pela qual esta mãodeobra fosse remunerada no respectivo país esse excedente maior sempre poderia manter um contingente maior de mãodeobra e conseqüentemente possibilitaria ao dono da terra a compra dum con tingente maior de trabalho Necessariamente seriam muito maiores o valor real de sua renda seu poder e autoridade reais seu controle sobre os artigos necessários e convenientes para a vida que o trabalho de outras pessoas poderia proporcionarlhe Um arrozal produz uma quantidade maior de alimento que o mais fértil campo de trigo Com efeito segundo se afirma a produção normal de um acre de terra de arroz dá duas colheitas por ano com a produção de 30 a 60 bushels136 cada uma Embora portanto o cultivo do arroz requeira mais trabalho é muito maior seu excedente depois de paga toda essa mãodeobra Por isso nos países cultivadores de arroz em que este é o alimento vegetal comum e favorito da população e onde os cultivadores se mantêm sobretudo com o arroz o proprietário da terra deverá obter uma parcela maior desse excedente maior do OS ECONOMISTAS 198 136 Medida inglesa de capacidade para cereais equivalente a 3636 litros N do E que nos países que se dedicam à triticultura Na Carolina onde como em outras colônias britânicas os plantadores são ao mesmo tempo os proprietários da terra e os cultivadores e onde portanto a renda se confunde com o lucro o cultivo do arroz se mostra mais rendoso do que o do trigo ainda que os arrozais produzam apenas uma colheita anual e embora devido à prevalência dos costumes europeus o arroz não seja naquele país o alimento vegetal comum e favorito da população Um bom arrozal é um pantanal em todas as estações do ano e em uma das estações é um pantanal coberto de água Ele não é ade quado nem para o cultivo do trigo nem para pastagens ou vinhedos nem na realidade para qualquer outro produto vegetal de grande utilidade para o homem em contrapartida as terras adequadas para esses produtos não o são para o cultivo do arroz Por isso mesmo nos países cultivadores de arroz a renda proporcionada pelas terras de arroz não pode determinar a renda de outras terras de cultivo as quais nunca poderão ser empregadas para o cultivo de arroz O alimento produzido por um campo de batatas não é inferior em quantidade ao produzido por um arrozal e é muito superior ao que é produzido por uma plantação de trigo Doze mil libraspeso de batatas produzidas por um acre de terra tão normal como uma pro dução de 2 mil libraspeso de trigo Com efeito a comida ou o alimento sólido que se pode extrair dessas duas plantas de forma alguma é proporcional a seu peso devido à natureza aquosa das batatas Su pondo porém que a metade do peso dessa raiz é constituída de água margem muito grande temos que um acre de batatas ainda produz 6000 libraspeso de alimento sólido ou seja três vezes a quan tidade produzida por um acre de trigo O cultivo de um acre de batatas acarreta uma despesa inferior à de um acre de trigo já que o alqueive que geralmente precede à semeadura do trigo mais do que compensa o lavrar da terra e outros cuidados sempre indispensáveis para o cultivo da batata Se algum dia essa planta tuberosa viesse a se tornar em alguma região da Europa como o arroz em alguns países o alimento vegetal comum e favorito da população de maneira a ocupar a mesma proporção de terra agriculturável que a ocupada atualmente pelos ce reais para alimentação humana a mesma quantidade de terra cultivada manteria um número muito maior de pessoas e alimentandose ge ralmente os trabalhadores com batatas sobraria um excedente maior após repor todo o capital e pagar toda a mãodeobra empregada no cultivo Maior seria também a parcela desse excedente que pertenceria ao dono da terra A população se tornaria mais densa e as rendas aumentariam muito mais do que atualmente A terra adequada para a plantação de batatas é também indicada para quase todos os demais vegetais úteis Se a cultura de batatas ocupasse a mesma proporção de terra cultivada que o trigo ocupa no momento regularia da mesma forma a renda da maior parte das outras terras cultivadas Tenho ouvido dizer que em Lancashire se afirma constituir o pão ADAM SMITH 199 de farinha de aveia um alimento que dá mais vigor aos trabalhadores do que o pão de trigo e também na Escócia ouvi muitas vezes a mesma teoria Entretanto tenho alguma dúvida a respeito da veracidade dessa tese Com efeito o povo comum que na Escócia se alimenta com farinha de aveia geralmente não é tão forte nem tão saudável como a mesma classe de pessoas na Inglaterra que se alimenta com pão de trigo Nem o trabalho deles é da mesma qualidade nem a sua aparência é tão boa e já que não existe a mesma diferença entre as pessoas de posição nos dois países a experiência parece mostrar que o alimento do povo comum da Escócia não é tão adequado à constituição humana como o de seus vizinhos da mesma condição na Inglaterra Entretanto não parece ocorrer a mesma coisa com as batatas Os carregadores de cadeirinhas os car regadores e os transportadores de carvão de Londres bem como essas infelizes mulheres que vivem da prostituição talvez os homens mais fortes e as mais lindas mulheres dos domínios britânicos que geralmente se alimentam de batata são considerados em sua maior parte como per tencentes à mais baixa categoria da população da Irlanda Nenhum ali mento oferece uma demonstração mais concludente de sua qualidade nu tritiva ou de ser especialmente adequado à constituição humana E difícil conservar batatas durante todo o ano e impossível es tocálas como se faz com o trigo por dois ou três anos sucessivos O medo de não se conseguir vendêlas antes de apodrecerem desestimula o seu cultivo constituindo talvez esse o obstáculo principal para que a batata se tome um dia em algum grande país o alimento vegetal básico de todas as classes da população como ocorre com o trigo PARTE SEGUNDA O produto da terra que às vezes proporciona renda e às vezes não O alimento humano parece ser o único produto da terra que sempre e necessariamente proporciona alguma renda ao proprietário da terra Os outros tipos de produto às vezes podem gerar tal renda para o proprietário da terra e às vezes não de acordo com a diversidade das circunstâncias Depois da alimentação as duas grandes necessidades do homem são o vestuário e a moradia A terra em seu estado original e não tratada é capaz de pro porcionar os materiais para o vestuário e para a moradia a um número muito maior de pessoas do que ela pode alimentar Quando devidamente tratada a terra pode às vezes alimentar um número maior de pessoas do que o número de pessoas ao qual pode garantir vestuário e moradia ao menos da forma em que as pessoas exigem e estão dispostas a pagar No primeiro estado portanto existe sempre uma superabun dância daqueles materiais que são freqüentemente nesse sentido de pouco ou nenhum valor No outro estado existe freqüentemente escas OS ECONOMISTAS 200 sez que necessariamente aumenta seu valor No primeiro estado joga se fora como inúteis uma grande parte desses materiais e o preço dos materiais efetivamente empregados é apenas o trabalho e a despesa necessários para preparálos e adequálos para o uso real e portanto não são capazes de proporcionar renda alguma ao proprietário da terra No segundo estado da terra já trabalhada os materiais para vestuário e para moradia são sempre utilizados e muitas vezes a de manda supera a oferta Nessas circunstâncias sempre existe alguém disposto a pagar por cada parcela desses materiais mais do que é suficiente para cobrir as despesas necessárias para a sua comerciali zação Seu preço portanto sempre pode proporcionar alguma renda ao proprietário da terra As peles dos animais de maior porte constituíram os primeiros materiais de vestuário Por isso entre as nações de caçadores e pastores cujo alimento consiste principalmente na carne desses animais cada homem providenciando ele mesmo sua alimentação adquire os mate riais em quantidade maior do que poderá vestir Se não houvesse ne nhum comércio exterior a maior parte desses materiais seria jogada fora como objetos sem valor Esse era provavelmente o caso nas nações de caçadores da América do Norte antes de seu país ser descoberto pelos europeus com os quais agora permutam seu excedente de peles por cobertores armas de fogo e aguardente o que lhes dá algum valor No atual estágio comercial do mundo conhecido as nações mais pri mitivas acredito entre as quais está estabelecida a propriedade da terra têm algum comércio exterior desse tipo e encontram entre seus vizinhos mais ricos uma demanda de todos os materiais de vestuário produzidos pela sua terra e que não podem ser processados nem con sumidos internamente já que aumenta seu preço acima do que custa para exportálos a esses vizinhos mais ricos Portanto proporcionam alguma renda ao proprietário da terra Quando a maior parte do gado montanhês era consumido em suas próprias colinas a exportação de seus couros constituía o artigo mais considerável do comércio daquele país e aquilo pelo que eram trocados proporcionava algum acréscimo à renda das propriedades montanhesas A lã da Inglaterra que em tempos antigos não podia ser consumida nem produzida internamente encontrou um mercado no então mais rico e mais operoso país de Flan dres sendo que o seu preço proporcionava algo para a renda da terra de produção dessa lã Em países não tão bem cultivados como era então a Inglaterra ou como são atualmente as Terras Altas da Escócia e que não tinham nenhum comércio exterior os materiais para ves tuário evidentemente abundariam a tal ponto que grande parte deles seria jogada fora como algo de inútil e nesse caso nenhuma parcela dessa produção poderia proporcionar qualquer renda ao proprietário da terra Os materiais para construção de moradia nem sempre podem ser transportados a distâncias tão grandes quanto os destinados ao vestuário não sendo também possível preparálos com tanta rapidez ADAM SMITH 201 para exportação Quando superabundam no país que os produz acon tece com freqüência mesmo no atual estágio do comércio mundial que não tenham valor algum para o dono da terra Uma boa pedreira nas proximidades de Londres geraria uma renda considerável Em muitas partes da Escócia e do País de Gales ela não produz renda alguma As árvores não frutíferas de madeira destinada à construção têm grande valor em um país bem povoado e cultivado sendo que a terra que as produz proporciona uma renda considerável Entretanto em muitas regiões da América do Norte o dono da terra agradeceria muito a quem levasse embora a maior parte das suas grandes árvores Em algumas partes das Terras Altas da Escócia a casca é a única parte da madeira que por falta de estradas e de transporte aquático pode ser comercializada Deixase a madeira apodrecer no solo Quando os materiais para construção de casa são superabundantes a esse ponto a parte utilizada vale apenas o trabalho e a despesa necessários para adequálos ao respectivo emprego Não proporcionam renda alguma ao proprietário da terra o qual geralmente permite o uso deles a toda pessoa que solicitar permissão Entretanto às vezes a demanda de nações mais ricas lhe dá a possibilidade de auferir uma renda A pa vimentação das ruas de Londres possibilitou aos proprietários de al gumas pedreiras áridas da costa da Escócia auferir uma renda daquilo que nunca pudera ser aproveitado antes As madeiras da Noruega e das costas do Báltico encontram mercado em muitas regiões da Grã Bretanha mercado esse que não conseguiriam no respectivo país e portanto proporcionam alguma renda a seus proprietários Os países são populosos não em proporção ao número de pessoas que podem se vestir e morar com seus produtos mas em proporção ao número de pessoas que podem alimentar Quando há alimentação é fácil encontrar o necessário para vestir e morar Mas embora esses materiais estejam à mão freqüentemente pode ser difícil encontrar alimentos Mesmo em certas partes dos domínios britânicos o que se chama uma casa pode ser construído com o trabalho de um dia de um único homem Os tipos mais simples de vestimenta ou seja as peles de animais exigem um trabalho um tanto maior para adequálos a seu uso Eles não exigem no entanto muita coisa Entre nações sel vagens e primitivas a centésima parte ou pouco mais do trabalho de todo o ano será suficiente para prover de vestimenta e moradia satisfatórias a maior parte do povo As outras noventa e nove partes muitas vezes mal são suficientes para suprir esse povo de alimentos Entretanto quando em razão do aprimoramento e do cultivo da terra o trabalho de uma família é capaz de produzir alimentos para duas basta o trabalho da metade da sociedade para prover de alimentos o país inteiro A outra metade da população portanto ou ao menos a maior parte dela pode ser empregada em produzir outras coisas ou para atender a outras necessidades ou caprichos da humanidade Os objetos principais para satisfazer a maior parte dessas ne cessidades e caprichos são representados pelo vestuário e pela moradia OS ECONOMISTAS 202 pelos móveis domésticos e pelo que é chamado de equipamentos O rico não consome mais alimento do que seu vizinho pobre Pode haver muita diferença na qualidade sendo que para escolher e preparar essa melhor qualidade pode ser necessário mais trabalho e arte mas no que tange à quantidade é quase a mesma coisa Comparese porém a grande mansão e o grande guardaroupa do rico com o casebre e os poucos trapos do pobre e se notará que a diferença no vestuário e no mobiliário da casa é quase tão grande em quantidade quanto em qua lidade O desejo de alimento é limitado em cada um pela restrita ca pacidade do estômago humano mas o desejo de comodidades e de ar tigos ornamentais para a casa do vestuário dos pertences familiares e da mobília parece não ter limites ou fronteiras definidas Por isso aqueles que dispõem de mais alimentos do que a quantidade necessária para seu consumo sempre estão dispostos a trocar o excedente ou seja o que é a mesma coisa o preço deles por gratificações desse outro tipo O que vai muito além da satisfação do desejo limitado é dado para o atendimento daqueles desejos que não podem ser satis feitos mas que parecem ser todos eles infinitos Os pobres para obter alimento esforçamse por atender a esse capricho dos ricos e para ter mais certeza de conseguir esse objetivo porfiam entre si para manter o baixo preço e a perfeição de seu trabalho O número de trabalhadores cresce proporcionalmente ao aumento da quantidade de alimento ou seja ao crescente aprimoramento e cultivo das terras e já que a na tureza de suas ocupações permite a máxima subdivisão de trabalho a quantidade de materiais que podem elaborar aumenta em uma pro porção muito maior do que seu número Daí surge uma demanda por todo tipo de material que a criatividade humana pode empregar de maneira útil ou ornamental na construção no vestuário nos equipa mentos ou na mobília do lar surgindo também a demanda pelos fósseis e minerais contidos nas entranhas da terra pelos metais e pedras preciosas Dessa forma o alimento não é somente a fonte original da renda mas qualquer outra parte do produto da terra que depois proporciona renda deriva essa parcela de seu valor do aperfeiçoamento das forças de trabalho na produção de alimento através do aprimoramento e do cultivo da terra Contudo esses outros produtos da terra que depois geram renda não a geram sempre Mesmo em países desenvolvidos e cultivados a demanda desses produtos nem sempre é tal que garanta um preço maior do que o suficiente para pagar a mãodeobra e repor juntamente com seus lucros normais o capital que precisa ser aplicado para co mercializálos Se a renda é ou não suficiente para tanto depende de várias circunstâncias Por exemplo se uma mina de carvão gerar alguma renda isso depende em parte de sua fertilidade em parte de sua localização Podese dizer que qualquer tipo de mina é produtivo ou impro dutivo conforme a quantidade de minerais que dela se pode obter com ADAM SMITH 203 determinada quantidade de trabalho seja maior ou menor do que pode ser conseguido com uma quantidade igual pela maior parte das outras minas do mesmo tipo Algumas minas de carvão bem localizadas não podem ser explo radas devido à sua infertilidade A produção não paga a despesa Não podem gerar lucro nem renda Outras existem cuja produção é apenas suficiente para pagar a mãodeobra e repor juntamente com seu lucro normal o capital in vestido na exploração Proporcionam algum lucro ao empreiteiro mas nenhuma renda ao proprietário Só podem ser exploradas com vanta gem pelo proprietário da terra o qual sendo ele mesmo o empresário da obra aufere o lucro normal do capital por ele investido Muitas das minas de carvão da Escócia são exploradas dessa forma não podendo ser de outra O proprietário da terra não permitirá a nenhuma outra pessoa a exploração dessas minas sem que esta pague alguma renda e ninguém tem condições para fazêlo Outras minas de carvão do mesmo país suficientemente produ tivas não podem ser exploradas devido à sua localização Uma quan tidade de minério suficiente para cobrir a despesa da exploração poderia ser obtida pela quantidade normal de mãodeobra ou até menos do que isso Porém em se tratando de uma região interiorana pouco po voada e destituída de boas estradas ou de bom transporte fluvial esta quantidade não poderia ser vendida O carvão é um combustível menos aprimorado que a madeira e segundo alguns é também menos saudável Por isso geralmente a despesa com carvão nos lugares em que é consumido deve ser algo menor do que com a madeira O preço da madeira varia com o estado da agricultura mais ou menos da mesma forma e exatamente pela mesma razão que o preço do gado Em seu estado primitivo a maior parte da área de qualquer país está coberta de florestas que nessa situação não representam mais do que um estorvo sem nenhum valor para o proprietário da terra o qual teria prazer em presenteálas a quem quer que fosse para o corte À medida que progride a agricultura a mata é em parte roçada e limpa em função do cultivo e uma parte se deteriora em conseqüência do aumento do número de cabeças de gado Este embora não aumente na mesma proporção que o trigo que é integralmente uma aquisição do trabalho humano multiplicase sob o cuidado e a proteção do homem este último estoca na época da abundância aquilo que pode manter o gado no tempo da escassez fornece durante todo o ano uma quantidade de alimento maior do que a natureza hostil dá ao gado destruindo e extirpando todos os seus inimigos o que lhe dá segurança para desfrutar de tudo aquilo que a natureza lhe fornece Os numerosos rebanhos de gado quando se lhes permite andar pelas florestas embora não destruam as árvores velhas impedem árvores novas de crescerem de sorte que durante um século ou dois a floresta inteira se perde A escassez da madeira faz então com que seu preço OS ECONOMISTAS 204 suba Ela proporciona uma boa renda e por vezes o proprietário das terras acredita que dificilmente pode empregar suas melhores terras com mais vantagem do que cultivando árvores não frutíferas sendo que nesse caso o grande montante do lucro muitas vezes compensa a demora do retorno Este parece ser mais ou menos o estágio atual em que nos encontramos em várias regiões da GrãBretanha regiões essas nas quais se constata que o lucro que se tira das florestas é o mesmo que se aufere da cultura do trigo ou das pastagens A vantagem que o proprietário da terra usufrui das florestas em parte alguma pode ser maior ao menos durante um período considerável do que a renda que pode auferir do cultivo do trigo ou das pastagens e numa região do interior altamente cultivada muitas vezes não ficará muito abaixo dessa renda Com efeito na costa marítima de um país bem cultivado se o carvão pode ser usado como combustível às vezes pode ser mais barato trazer madeira de construção de países estrangeiros menos cul tivados do que cultivar a madeira no próprio país Na nova cidade de Edimburgo construída nesses poucos anos talvez não haja uma única peça de madeira escocesa Qualquer que seja o preço da madeira se o do carvão é tal que a despesa do fogo de carvão é quase igual ao obtido com madeira podemos estar certos de que nesse lugar e em paridade de circuns tâncias o preço do carvão é o mais alto possível Assim parece ser em algumas regiões do interior da Inglaterra especialmente no Oxford shire onde é costume mesmo nos fogões do povo misturar carvão e madeira e onde portanto não pode ser muito grande a diferença de preço desses dois combustíveis Nos países em que abunda o carvão o custo desse combustível em toda parte está muito abaixo desse preço mais alto Se assim não fosse o carvão não poderia suportar a despesa de um transporte a longa distância quer por terra quer por água Só se conseguiria vender uma quantidade pequena e os proprietários do carvão consideram mais interessante para eles vender uma quantidade maior a um preço pouco acima do mínimo do que vender uma quantidade pequena ao preço máximo Além disso a mina de carvão mais fértil regula o preço do carvão em todas as outras minas da região Tanto o proprietário como o empreiteiro da mina consideram o primeiro que pode obter uma renda maior e o segundo que pode auferir um lucro maior vendendo um pouco mais barato que todos os seus vizinhos que logo serão obri gados a vender pelo mesmo preço embora não possam facilmente fazêlo e embora isso sempre diminua sua renda e seu lucro às vezes até eliminandoos totalmente Algumas minas acabam sendo totalmente abandonadas ao passo que outras não têm condições para proporcionar renda alguma só podendo ser exploradas de forma rentável pelos proprietários O preço mínimo pelo qual o carvão pode ser vendido durante um período mais longo é como no caso de todas as demais mercadorias o preço apenas suficiente para repor juntamente com seu lucro normal ADAM SMITH 205 o capital que deve ser empregado para colocálo no mercado Em uma mina de carvão em que o proprietário da terra não tem condições de auferir nenhuma renda mas que deve explorála ele mesmo ou deixála simplesmente abandonada o preço real do carvão deve geralmente aproximarse desse preço mínimo A renda mesmo onde o carvão a proporciona geralmente repre senta uma parcela do preço menor do que em se tratando da maioria dos outros tipos de produtos brutos da terra A renda de uma proprie dade acima do solo costuma representar aproximadamente um terço da produção bruta sendo geralmente uma renda certa que independe das variações ocasionais da safra Em se tratando de minas de carvão um quinto da produção bruta representa uma renda considerável o normal é ela representar um décimo da produção bruta sendo rara mente uma renda certa pois dependerá das variações ocasionais da produção Elas são tão grandes que em um país em que trinta anos de compra são considerados como um preço moderado para o proprie tário de terra dez anos de compra são considerados como um bom preço para o caso de uma mina de carvão O valor de uma mina de carvão para o proprietário muitas vezes depende tanto de sua localização quanto de sua riqueza O de uma mina de metais depende mais da riqueza e menos de sua localização Os metais menos nobres e mais ainda os metais preciosos quando separados do minério são tão valiosos que geralmente podem suportar a despesa de um transporte de muito longe por terra e de mais distante ainda por mar Seu mercado não se limita aos países próximos à mina mas estendese ao mundo inteiro O cobre do Japão é comercializado na Europa o ferro da Espanha é comercializado no Chile e no Peru A prata do Peru é exportada não somente para a Europa mas da Europa para a China O preço do carvão em Westmorland ou em Shropshire pouco efeito pode ter sobre o seu preço em Newcastle sendo que o preço em Lionnois não pode ter efeito algum As produções dessas minas de carvão tão distantes jamais podem fazer concorrência entre si Isso pode ocorrer com freqüência porém com as produções das minas de metais mais distantes e de fato isso ocorre comumente Eis por que o preço dos metais menos nobres e mais ainda o dos metais preciosos nas minas mais ricas do mundo necessariamente afeta em medida maior ou menor o preço em qualquer outra parte O preço do cobre no Japão deve ter alguma influência sobre o seu preço nas minas de cobre eu ropéias O preço da prata no Peru ou a quantidade de trabalho ou de outros bens que ela pode comprar naquele país deve ter alguma in fluência em seu preço não somente nas minas de prata da Europa mas também nas da China Após a descoberta das minas do Peru as minas de prata da Europa em sua maior parte foram abandonadas O valor da prata foi reduzido a tal ponto que a produção já não era suficiente para pagar o trabalho da exploração das minas ou seja para repor juntamente com o lucro a alimentação a roupa a moradia OS ECONOMISTAS 206 e outros artigos consumidos naquela operação Foi o que ocorreu tam bém com as minas de Cuba e São Domingos e até mesmo com as antigas minas do Peru depois da descoberta das de Potosi Por isso o preço de cada metal em cada mina já que é regulado até certo ponto pelo seu preço nas minas mais ricas do mundo efeti vamente em operação pode na maior parte das minas conseguir muito mais do que pagar as despesas de trabalho e raramente pode propor cionar uma renda muito elevada ao dono da terra Portanto ao que parece na maior parte das minas a renda da terra representa uma pequena parcela no preço dos metais menos nobres e uma parcela ainda menor do preço dos metais preciosos Em ambos os casos a mãodeobra e o lucro representam a maior parte do preço Como nos diz o Rev Sr Borlace vicediretor das minas de es tanho no caso de minas de estanho da Cornualha as mais ricas que se conhecem no mundo todo a renda média proporcionada re presenta a sexta parte da produção bruta Algumas delas afirma ele proporcionam uma renda maior e em outras a renda não é tão elevada Também em várias minas muito ricas de chumbo da Escócia a renda da terra representa a sexta parte da produção bruta Segundo nos referem Frezier e Ulloa nas minas de prata do Peru o proprietário muitas vezes não consegue outra garantia a não ser o compromisso de que vai processar o minério em sua usina pa gandolhe a gratificação ou preço normal de processamento Com efeito até 1736 o imposto pago ao rei da Espanha era de 15 da pratapadrão o que até então podia ser considerado como a renda real da maior parte das minas de prata do Peru as maiores e mais ricas que se conheciam no mundo Se não tivesse havido imposto esse 15 natu ralmente teria pertencido ao dono da terra e terseia podido explorar muitas minas que permaneceram inativas por não poderem pagar esse imposto Supõese que o imposto pago ao Duque de Cornualha sobre o estanho era de mais de 5 ou seja 120 do valor e qualquer que possa ser sua proporção naturalmente ela pertenceria ao dono da mina se o estanho fosse isento de imposto Se porém somarmos 120 com 16 constataremos que a renda média integral das minas de estanho da Cornualha estava para a renda média integral das minas de prata do Peru como treze está para doze Atualmente porém as minas de prata peruanas não têm sequer condições para cobrir essa baixa renda sendo que em 1736 o imposto sobre a prata caiu de 15 para 110 Mesmo esse imposto sobre a prata é mais tentador para o contrabando do que o imposto de 120 sobre o estanho ora o contrabando deve ser muito mais fácil de ser praticado com metais preciosos do que com mercadorias volumosas Afirmase portanto que o imposto devido ao rei da Espanha é muito sonegado ao passo que o devido ao Duque de Cornualha geralmente é pago É pro vável pois que a renda represente uma parcela maior do preço nas minas de estanho mais ricas do que do preço da prata nas minas de prata mais ricas do mundo Após repor o capital investido na exploração ADAM SMITH 207 das diversas minas juntamente com seu lucro normal a parcela que resta para o proprietário ao que parece é maior nos metais menos nobres do que nos metais preciosos Também o lucro dos empreiteiros das minas de prata do Peru não costuma ser muito grande Os dois autores já citados altamente respeitáveis e bem informados relatam que quando uma pessoa em preende a exploração de uma nova mina no Peru é por todos consi derada como uma pessoa destinada à bancarrota e à ruína e é por isso evitada por todos Como aqui também lá ao que parece a mine ração é considerada uma loteria na qual os prêmios não compensam os bilhetes brancos embora o montante de alguns prêmios tente muitos aventureiros a jogar fora suas fortunas em projetos não propícios Todavia uma vez que o soberano aufere da produção de prata das minas uma parte apreciável de sua receita a lei peruana oferece toda sorte de estímulos à descoberta e à exploração de novas minas Toda pessoa que descobrir uma nova mina está autorizada a demarcar 246 pés de comprimento na direção que supõe ser a do veio e a metade disso em largura Tornase proprietário dessa porção da mina podendo explorála sem nada pagar ao proprietário da terra Os interesses do Duque de Cornualha o levaram a baixar um regulamento semelhante nesse antigo ducado Em terras agrestes e não cercadas qualquer pes soa que descobrir uma nova mina pode fixar seus limites em uma certa extensão o que se chama de demarcar uma mina O demarcador tornase o proprietário real da mina podendo explorála ele mesmo ou arrendála a outro sem o consentimento do dono da terra ao qual porém deverá pagar uma remuneração muito irrelevante por ocasião da exploração Nos dois regulamentos os sagrados direitos da proprie dade privada são sacrificados aos supostos interesses da receita pública O mesmo incentivo é dado no Peru à descoberta e à exploração de minas de ouro sendo que no tocante ao ouro o imposto régio é apenas a vigésima parte do metalpadrão Antigamente era 15 e depois 110 como o da prata constatouse porém que a exploração não su portaria sequer esse último imposto Entretanto segundo afirmam os mesmos Frezier e Ulloa é raro deparar com alguém que tenha feito fortuna com uma mina de prata e muito mais raro ainda é encontrar alguém que o tenha conseguido com uma mina de ouro A vigésima parte parece ser renda total paga pela maior parte das minas de ouro no Chile e no Peru Além disso o ouro também é muito mais passível de contrabando do que a própria prata não somente devido ao maior valor do metal em proporção com seu volume mas também em razão da maneira peculiar como a natureza o produz É muito mais raro encontrar a prata em estado virgem mas como a maior parte dos outros metais também ela geralmente está mesclada a outros corpos dos quais é impossível separála em uma quantidade que compense a despesa a não ser por uma operação muito laboriosa e cansativa que só pode ser executada em oficinas montadas para esse fim e portanto sujeitas à inspeção dos oficiais do rei Ao contrário o ouro quase sempre OS ECONOMISTAS 208 se encontra em estado virgem Por vezes é encontrado em peças de certo volume e mesmo quando se encontra mesclado a partículas quase imperceptíveis de areia terra e outros corpos estranhos pode ser iso lado mediante uma operação muito breve e simples que pode ser exe cutada em qualquer casa particular por qualquer pessoa que disponha de uma pequena quantidade de mercúrio Se pois se sonega o imposto real da prata é provável que a sonegação seja muito maior no caso do ouro conseqüentemente a renda representará uma parcela muito menor do preço do ouro do que do preço da própria prata O preço mínimo pelo qual se pode vender os metais preciosos ou a quantidade mínima de outros bens pela qual eles podem ser trocados durante um período de tempo considerável é regulado pelos mesmos princípios que determinam o preço normal mínimo de todos os demais bens O capital que deve comumente ser empregado os alimentos as roupas e o alojamento normalmente consumidos para extraílos da mina e colocálos no mercado são seus fatores determinantes O preço deles deve ser no mínimo suficiente para repor o capital com o lucro normal Entretanto o preço máximo dos metais preciosos não parece ser necessariamente determinado por outro fator a não ser a escassez ou abundância dos próprios metais Não é determinado pela escassez ou abundância de qualquer outra mercadoria como o preço do carvão é determinado pelo da madeira além do que nenhuma escassez pode aumentálo Aumentese a escassez do ouro até certo grau e a mínima parcela dele se tornará mais preciosa que um diamante podendo ser trocada por uma quantidade maior de outros bens A demanda desses metais provém em parte de sua utilidade e em parte de sua beleza Se excetuarmos o ferro são talvez mais úteis do que qualquer outro metal Por serem menos sujeitos à ferrugem e à impureza é mais fácil conserválos limpos sendo por isso que os utensílios de mesa e de cozinha muitas vezes são mais agradáveis quando feitos com esses metais Um caldeirão de prata é mais limpo e higiênico do que um de chumbo cobre ou estanho e a mesma ca racterística tornaria um caldeirão de ouro ainda melhor do que um de prata O mérito principal dos metais preciosos porém reside em sua beleza que os torna particularmente indicados para ornamentos do vestuário e do mobiliário Nenhuma pintura ou tintura é capaz de dar uma cor tão esplêndida quanto uma douração O mérito de sua beleza é grandemente realçado pela sua escassez Para a maior parte das pessoas ricas o prazer principal da riqueza consiste na ostentação dessa riqueza que a seus olhos nunca é totalmente completa como quando são vistas pelos outros como possuidoras daquelas marcas de cisivas de opulência que ninguém mais a não ser elas possuem Aos olhos dos ricos o mérito de um objeto que de certa forma seja útil ou belo é altamente realçado pela sua raridade ou pelo grande trabalho que se requer para juntar uma quantidade considerável dele trabalho esse que ninguém tem condições de pagar a não ser eles Os ricos desejam comprar tais objetos a um preço mais alto que coisas muito ADAM SMITH 209 mais belas e úteis porém mais comuns Essas características de uti lidade beleza e raridade constituem a razão e o fundamento básico do alto preço desses metais ou seja da grande quantidade de outros bens pela qual podem ser trocados em qualquer lugar Esse valor foi anterior e independente de terem sido empregados como moeda e foi a qualidade que os levou a tal emprego O emprego no entanto oca sionando nova demanda e diminuindo a quantidade que poderia ser empregada de qualquer outra maneira pode ter posteriormente con tribuído para manter ou aumentar seu valor A demanda de pedras preciosas provém totalmente da sua beleza Não têm utilidade mas servem como ornamentos sendo que o mérito de sua beleza é grandemente realçado pela sua raridade ou seja pela dificuldade e despesa para extraílas da mina Por conseguinte na maior parte dos casos os salários e o lucro perfazem o seu alto preço quase na sua totalidade A renda surge no preço mas com uma parcela mínima freqüentemente nenhuma somente as minas mais ricas pro porcionam uma renda considerável Quando Tavernier um joalheiro visitou as minas de diamantes de Golconda e Visiapour foi informado de que o soberano do país para cujo benefício as minas eram exploradas havia ordenado o fechamento de todas elas excetuadas as que forne ciam as pedras maiores e mais preciosas As outras ao que parece não compensavam ao proprietário sua exploração Já que o preço tanto dos metais preciosos como das pedras pre ciosas é regulado em todo o mundo pelo preço que têm na mina mais rica a renda que uma mina de metais preciosos ou de pedras preciosas pode oferecer ao proprietário é proporcional não à sua riqueza absoluta mas ao que se pode chamar sua riqueza relativa ou seja à sua supe rioridade em relação a outras minas da mesma espécie Se fossem descobertas novas minas tão superiores quanto às de Potosi como estas eram superiores àquelas da Europa o valor da prata poderia degra darse tanto a ponto de mesmo as minas de Potosi não serem dignas de exploração Antes da descoberta das Índias Ocidentais Espanholas as minas mais ricas da Europa podem ter dado a seus proprietários uma renda tão grande como as que as minas mais ricas do Peru pro porcionam atualmente Embora a quantidade de prata fosse muito me nor possivelmente talvez pudesse ser trocada por uma quantidade igual de outros bens e a parcela do proprietário poderia terlhe possibilitado comprar ou comandar uma quantidade igual de mãodeobra ou de mercadorias O valor tanto da produção quanto da renda o rendimento real que proporcionavam tanto ao público quanto ao proprietário de veriam ter sido os mesmos As minas mais abundantes de metais preciosos ou de pedras preciosas pouco poderiam acrescentar à riqueza do mundo Um produto cujo valor principal deriva de sua raridade é necessariamente desva lorizado por sua abundância Uma baixela de prata e os outros frívolos ornamentos de vestuário e mobiliário poderiam ser comprados por uma quantidade menor de trabalho ou por uma quantidade menor de mer OS ECONOMISTAS 210 cadorias e nisso consistiria a única vantagem que o mundo poderia auferir dessa abundância A situação é outra em se tratando de propriedades acima do solo O valor de sua produção e da renda da terra é proporcional à sua fertilidade absoluta e não à sua fertilidade relativa A terra que produz uma certa quantidade de alimentos material de vestuário e moradia sempre pode alimentar vestir e alojar certo número de pessoas e qualquer que seja a porcentagem que fica para o proprietário da terra sempre ela tem condições de oferecerlhe um controle proporcional do trabalho daquelas pessoas e das mercadorias com as quais aquele tra balho pode suprilos O valor das terras mais estéreis não é diminuído pela proximidade das terras mais férteis Pelo contrário é geralmente aumentado por ela O grande número de pessoas mantidas pelas terras férteis proporciona um mercado para muitas partes da produção das terras estéreis que jamais teriam podido encontrar entre aqueles que sua própria produção poderia manter Tudo aquilo que aumenta a fertilidade da terra na produção de alimentos aumenta não somente o valor das terras nas quais se im plantam aprimoramentos mas contribui igualmente para aumentar o valor de muitas outras terras criando uma nova demanda de sua pro dução Aquela abundância de alimentos da qual em conseqüência do aprimoramento da terra muitas pessoas dispõem além do que elas próprias podem consumir constitui a grande causa da demanda dos metais preciosos e das pedras preciosas bem como de quaisquer outras comodidades e ornamentos de vestuário moradia mobiliário e demais equipamentos O alimento não somente constitui a parte principal das riquezas do mundo mas é a abundância de alimentos que confere a parcela principal de valor a muitos outros tipos de riqueza Os habi tantes pobres de Cuba e de São Domingos ao serem descobertos pelos espanhóis costumavam usar pequenas peças de ouro como ornamento dos cabelos e de algumas peças de sua roupa Pareciam darlhes o mesmo valor que nós daríamos a quaisquer pequenos seixos de beleza pouco mais que a normal considerandoas como algo que paga apenas o trabalho de apanhálas mas que não se pensaria em recusar a quem os pedisse Davamnas aos seus hóspedes recémchegados ao primeiro pedido não dando a impressão de pensarem que estavam dando algum presente de valor Pasmavamse em observar como os espanhóis cobi çavam esses objetos não imaginando que poderia haver um país em que muitas pessoas dispusessem de tantos alimentos supérfluos sempre tão escassos entre eles que por uma quantidade mínima dessas bugigangas cintilantes estavam dispostas a pagar o que seria suficiente para manter uma família inteira durante muitos anos Se tivessem podido compreender isso a sofreguidão dos espanhóis não lhes teria causado surpresa ADAM SMITH 211 PARTE TERCEIRA As variações na proporção entre os respectivos valores daqueles tipos de produto que sempre proporcionam renda e daqueles tipos de produto que às vezes geram renda e às vezes não A abundância crescente de alimentos decorrente do aumento das melhorias e do cultivo da terra necessariamente aumenta a demanda de todo produto da terra que não seja alimento e que possa ser utilizado para o uso ou para ornamentação Poderseia portanto esperar que à medida que avança o desenvolvimento só deveria haver uma variação nos valores comparativos desses dois tipos de produtos O valor daquele tipo de produtos que às vezes proporcionam e às vezes não proporcionam renda deveria aumentar constantemente em proporção àquele tipo que sempre proporciona renda À medida que progridem a arte e os ofícios os materiais do vestuário e de moradia os fósseis e os minerais úteis da terra os metais preciosos e as pedras preciosas deveriam gradual mente transformarse em objetos de maior demanda deveriam gra dualmente poder ser permutados por uma quantidade sempre maior de alimentos ou em outras palavras deveriam tornarse gradualmente cada vez mais caros Isso ocorreu efetivamente com a maioria desses bens na maioria dos casos e teria acontecido com todos eles em qual quer caso se determinados eventos em determinadas ocasiões não tivessem aumentado a oferta de alguns deles em uma proporção ainda maior do que a demanda O valor de uma canteira de pedra lavrada por exemplo aumen tará necessariamente aumentando o aprimoramento e a população das terras que lhe estão próximas sobretudo se a pedreira for a única da região Em contrapartida o valor de uma mina de prata mesmo que não houvesse outra dentro de um raio de mil milhas não neces sariamente aumentará com o aprimoramento da terra em que a mina está localizada O mercado do produto de uma pedreira raramente pode estenderse mais do que algumas milhas ao redor e a demanda geralmente será proporcional ao grau de aprimoramento e à população desse pequeno distrito Mas o mercado para a produção de uma mina de prata pode estenderse a todo o mundo conhecido A menos portanto que o mundo todo crescesse em desenvolvimento e em população a demanda de prata poderia não aumentar em absoluto mesmo com o aprimoramento de uma grande região nas proximidades da mina Mesmo que o mundo todo fosse aprimorado se no decurso de seu aprimoramento se descobrissem novas minas muito mais ricas do que qualquer outra até então conhecida embora aumentasse ne cessariamente a demanda de prata não obstante isso a oferta poderia aumentar em uma proporção tanto maior de tal modo que o preço real desse metal poderia baixar gradualmente em outros termos qual OS ECONOMISTAS 212 quer quantidade de prata uma librapeso por exemplo poderia gra dualmente comprar ou controlar uma quantidade cada vez menor de trabalho ou ser permutada por uma quantidade cada vez menor de trigo artigo principal para a sobrevivência do trabalhador O grande mercado da prata é a parte comercial e civilizada do mundo Se em razão do progresso geral dos aprimoramentos aumentasse a demanda desse mercado ao passo que a oferta não aumentasse na mesma proporção o valor da prata aumentaria gradualmente em pro porção ao do trigo Qualquer quantidade de prata poderia ser trocada por uma quantidade cada vez maior de trigo ou em outras palavras o preço médio do trigo em dinheiro se tornaria progressivamente cada vez mais baixo Se pelo contrário por alguma eventualidade a oferta aumentasse por vários anos seguidos em proporção maior que a de manda o metal tornarseia cada vez mais barato ou em outras pa lavras o preço médio do trigo em dinheiro continuaria cada vez mais alto a despeito de todos os aprimoramentos Se porém o fornecimento do metal aumentasse mais ou menos na mesma proporção que a demanda continuaria a ser comprado ou trocado mais ou menos pela mesma quantidade de trigo sendo que o preço médio do trigo em dinheiro a despeito de todos os aperfeiçoa mentos continuaria mais ou menos o mesmo Essas parecem ser as três únicas combinações possíveis de even tos que podem ocorrer no progresso dos aprimoramentos no decurso dos quatro séculos que precedem o atual se pudermos julgar com base no que aconteceu tanto na França como na GrãBretanha cada uma dessas três diferentes combinações parece haver ocorrido no mercado europeu aliás mais ou menos na mesma ordem na qual acabei de enumerálas DIGRESSÃO SOBRE AS VARIAÇÕES DE VALOR DA PRATA NO DECURSO DOS QUATRO ÚLTIMOS SÉCULOS Primeiro Período Em 1350 e durante algum tempo antes o preço médio do quarter de trigo na Inglaterra não parece ter sido cotado a menos de 4 onças de prata peso Tower equivalentes a aproximadamente 20 xelins em nosso dinheiro atual Dali parece ter caído gradativamente para 2 onças de prata equivalentes a aproximadamente 10 xelins em nosso dinheiro atual essa é a cotação de preço que encontramos no início do século XVI e que parece ter permanecido até por volta de 1570 Em 1350 25º ano do reinado de Eduardo III foi sancionado o chamado Estatuto dos Trabalhadores No preâmbulo ele reclama muito da insolência dos servos que se empenhavam em aumentar seus salários acima do de seus senhores O decreto ordena pois que todos os servos e trabalhadores deveriam para o futuro contentarse com os mesmos ADAM SMITH 213 salários e provisões na época provisões significavam não somente a roupa mas também os mantimentos que costumavam receber no 20º ano de governo do rei e nos quatro anos precedentes e que por esse motivo suas provisões de trigo não deveriam em nenhuma parte ser estimadas além de 10 pence por bushel e ficar sempre a critério do patrão fazer o pagamento em trigo ou em dinheiro Portanto no 25º ano de reinado de Eduardo III consideravase que 10 pence por bushel representava um preço bem modesto do trigo já que foi necessário um estatuto específico para obrigar os servos a contentarse com isso em troca de suas provisões habituais de mantimentos e esse preço havia sido considerado um preço razoável dez anos antes ou seja no 16º ano de governo do rei termo ao qual se refere o Estatuto Mas no 16º ano de reinado de Eduardo III 10 pence continham aproximadamente 12 onça de prata peso Tower sendo quase igual a 12 coroa em nosso dinheiro atual Portanto 4 onças de prata peso Tower iguais a 6 xelins e 8 pence do dinheiro da época e a mais ou menos 20 xelins do dinheiro atual deve ter sido considerado um preço modesto para o quarter de 8 bushels Certamente esse Estatuto evidencia melhor o que na época se con siderava como sendo um preço moderado de cereal do que os preços característicos de alguns anos específicos que geralmente têm sido rela tados por historiadores e outros escritores em razão de serem extraordi nariamente altos ou baixos e com base nos quais portanto é difícil fazer um julgamento sobre qual possa ter sido o preço normal Além disso há outras razões para crer que no início do século XIV e durante algum tempo antes o preço usual do trigo não estava abaixo de 4 onças de prata por quarter e o de outros cereais da mesma proporção Em 1309 Ralph de Born prior da igreja de Santo Agostinho em Cantuária ofereceu uma festa no dia de sua posse festa essa da qual William Thorn conservou não somente o preço do cardápio mas também os preços de muitos itens específicos Naquela festa foram consumidos primeiro 53 quarters de trigo que custaram 19 libras ou seja 7 xelins e 2 pence por quarter iguais a aproximadamente 21 xelins e 6 pence em nosso dinheiro atual segundo 58 quarters de malte que custaram 17 esterlinos e 10 xelins ou seja 6 xelins por quarter equivalentes mais ou menos a 18 xelins de nosso dinheiro de hoje terceiro 20 quarters de aveia que custaram 4 libras ou 4 xelins por quarter equi valentes a aproximadamente 12 xelins em nosso dinheiro atual Os preços do malte e da aveia parecem aqui ser superiores à sua proporção normal com o preço de trigo Esses preços são registrados em virtude de seus preços extraor dinariamente altos ou baixos mas são mencionados incidentalmente como sendo os preços efetivamente pagos por grandes quantidades de cereais consumidos em uma festa famosa pela sua magnificência Em 1262 no 51º ano do reinado de Henrique III foi restabelecido um antigo estatuto denominado Determinação do Preço do Pão e da Cerveja Inglesa o qual como diz o rei no preâmbulo foi elaborado na OS ECONOMISTAS 214 época de seus progenitores já reis da Inglaterra Portanto o estatuto provavelmente remonta no mínimo à época de seu avô Henrique II podendo até remontar à época da conquista O estatuto regula o preço do pão de acordo com os eventuais preços do trigo de 1 até 20 xelins o quarter no dinheiro da época Mas geralmente se presume que es tatutos desse gênero zelam com cuidado igual por todos os desvios do preço médio tanto para os preços abaixo como para os preços acima da média A ser correta essa suposição portanto 10 xelins contendo 6 onças de prata peso Tower equivalentes a aproximadamente 30 xelins do nosso dinheiro de hoje eis o que deve ter sido calculado como o preço médio do quarter de trigo quando esse estatuto foi promulgado devendo ter permanecido durante o 50º ano do reinado de Henrique III Não podemos portanto estar muito enganados ao supor que o preço médio não era menor do que 13 do preço mais alto pelo qual o Estatuto regula o preço do pão ou do que 6 xelins e 8 pence do dinheiro daquela época contendo 4 onças de prata peso Tower Partindo desses diversos fatos portanto parece haver alguma razão para concluir que pelos meados do século XIV e durante muito tempo antes não se supunha que o preço médio ou comum do quarter de trigo fosse inferior a 4 onças de prata peso Tower Dos meados do século XIV até o início do século XVI ao que parece o que se considerava o preço razoável e moderado ou seja o preço médio comum do trigo baixou gradativamente para aproximadamente a metade do preço acima chegando ao final a cair a cerca de 2 onças de prata peso Tower equivalentes a mais ou menos 10 xelins do nosso dinheiro atual continuando esse preço até cerca de 1570 No livro familiar de Henrique o quinto conde de Northumberland datado de 1512 deparamos com duas estimativas diferentes do trigo Em uma delas ele é computado a 6 xelins e 8 pence o quarter na outra apenas a 5 xelins e 8 pence Em 1512 6 xelins e 8 pence continham somente 2 onças de prata peso Tower sendo iguais a aproximadamente 10 xelins de nosso dinheiro de hoje Desde o 25º ano de Eduardo III até o início do reinado de Isabel durante o espaço de mais de duzentos anos 6 xelins e 8 pence segundo se infere de vários estatutos continuava a ser o preço moderado e razoável isto é preço médio ou comum do trigo Todavia a quantidade de prata contida nessa soma nominal diminuíra continuamente durante o curso desse período em conseqüência de algumas alterações intro duzidas na moeda Parece porém que o aumento do valor da prata havia compensado a tal ponto a diminuição da quantidade contida na mesma soma nominal que a legislação não considerou valer a pena atender a essa circunstância Assim em 1436 foi decretado que o trigo podia ser exportado sem autorização específica quando o preço baixasse a 6 xelins e 8 pence E em 1463 resolveuse que não se importasse qualquer espécie de trigo se o preço não fosse superior a 6 xelins e 8 pence o quarter Os legisladores imaginavam que quando o preço estivesse tão baixo ADAM SMITH 215 não haveria inconveniente em exportar e quando ele subisse seria prudente permitir a importação Por conseguinte 6 xelins e 8 pence contendo mais ou menos a mesma quantidade de prata que 13 xelins e 4 pence de nosso dinheiro atual 13 a menos do que a mesma soma nominal contida ao tempo de Eduardo III foi naquela época conside rado como sendo o que se chama o preço moderado e razoável do trigo Em 1554 nos anos primeiro e segundo de Filipe e Maria e em 1558 no ano primeiro de Isabel proibiuse de maneira similar a ex portação de trigo toda vez que o preço do quarter excedesse a 6 xelins e 8 pence que na época não continha 2 pence equivalente a mais prata que atualmente contém a mesma soma nominal Mas logo achou se que limitar a importação de trigo até que o preço baixasse tanto equivalia na realidade a proibila totalmente Por isso em 1562 ano 5º de Isabel permitiuse a exportação de trigo a partir de certos pontos toda vez que o preço do quarter não ultrapassasse os 10 xelins contendo quase a mesma quantidade de prata que a mesma soma nominal de hoje Esse era pois o que se considerava na época o preço moderado e razoável do trigo Esse preço coincide aproximadamente com a esti mativa do livro de Northumberland de 1512 Que também na França o preço médio dos cereais era muito mais baixo ao final do século XV e no início do século XVI do que nos dois séculos anteriores foi observado tanto pelo Sr Duprè de St Maur quanto pelo elegante autor do Ensaio sobre a política dos cereais O preço dos cereais durante o mesmo período havia provavelmente bai xado da mesma maneira na maior parte da Europa Esse aumento do valor da prata em proporção ao valor do trigo pode haver ocorrido inteiramente devido ao aumento da demanda desse metal em conseqüência de crescentes melhoramentos e do cultivo con tinuando o suprimento nesse meio tempo o mesmo de antes ou então permanecendo igual à demanda o aumento do valor da prata pode ter sido inteiramente decorrente da redução gradual da oferta tendose esgotado em grande parte a maioria das reservas então conhecidas e portanto aumentando muito a despesa da sua exploração ou então o fato pode terse devido em parte a uma dessas circunstâncias e em parte à outra Ao final do século XV e no início do século XVI a maior parte dos países europeus se aproximava de uma forma de governo mais estável do que havia vigorado durante várias gerações anteriores Evidentemente o aumento da segurança fazia aumentar o trabalho a operosidade e os aprimoramentos E também a demanda de metais preciosos bem como de qualquer outro artigo de luxo e ornamentos naturalmente aumentariam com o crescimento da riqueza Uma pro dução anual maior exigiria uma quantidade maior de moeda para cir cular essa produção e um número maior de pessoas ricas exigiria uma quantidade maior de baixelas e outros ornamentos de prata É outros sim natural supor que a maior parte das minas que forneciam prata ao mercado europeu estivessem bastante esgotadas e a sua exploração OS ECONOMISTAS 216 se tornasse mais dispendiosa Isto havia ocorrido com muitas delas desde o tempo dos romanos No entanto a opinião comum da maior parte dos autores que escreveram sobre os preços das mercadorias nos tempos antigos é que desde a Conquista talvez até desde a invasão de Júlio César até à descoberta das minas da América o valor da prata diminuiu conti nuamente Os autores parecem ter chegado a essa opinião em parte pelas observações que puderam fazer quanto aos preços do trigo e de alguns outros produtos da terra e em parte fundados no conceito po pular de que da mesma forma como a quantidade de prata natural mente aumenta em cada país com o aumento da riqueza da mesma forma seu valor diminui quando sua quantidade aumenta Nas observações feitas por esses autores sobre os preços do trigo três circunstâncias parecem havêlos com freqüência conduzido a con clusões errôneas Primeiramente nos tempos antigos quase todas as rendas da terra eram pagas em espécie isto é em certa quantidade de trigo gado aves domésticas etc Todavia às vezes o dono da terra estipulava que o arrendatário pudesse optar entre o pagamento anual em espécie ou o pagamento de uma certa soma de dinheiro O preço pelo qual o pagamento em espécie era trocado por uma certa soma em dinheiro denominase preço de conversão na Escócia Já que cabe sempre ao proprietário da terra optar entre o pagamento em espécie ou em di nheiro é necessário para a segurança do arrendatário que o preço de conversão esteja antes abaixo do que acima do preço médio de mer cado Por isso em muitos lugares não está muito acima da metade desse preço Na maior parte da Escócia esse costume ainda continua vigorando em relação às aves domésticas e em algumas localidades também em relação ao gado Poderia provavelmente ter continuado a ocorrer isso também em relação ao trigo se a instituição dos arren damentos públicos permanentes não tivesse posto fim a isso Tratase no caso de avaliações anuais feitas de acordo com o julgamento de uma comissão do preço médio de todos os tipos de cereais e de cada qualidade dos mesmos conforme o preço efetivo de mercado vigente em cada condado Essa instituição tornou suficientemente seguro para o arrendatário e muito mais conveniente para o proprietário da terra converter como se diz a renda do trigo mais segundo o preço eventual dos arrendatários permanentes de cada ano do que segundo um de terminado preço fixo Mas os autores que pesquisaram os preços do trigo nos tempos antigos parecem muitas vezes ter confundido o que se chama na Escócia de preço de conversão com o preço efetivo de mercado Em uma ocasião Fleetwood reconhece haver cometido esse erro Já que porém escreveu seu livro em função de um determinado objetivo não considera indicado reconhecer esse equívoco senão depois de transcrever esse preço de conversão quinze vezes O preço é 8 xelins o quarter do trigo Essa soma em 1423 ano em que começa sua pes quisa continha a mesma quantidade de prata de 16 xelins de acordo ADAM SMITH 217 com a nossa moeda atual Mas em 1562 ano em que ele conclui a pesquisa ela não continha mais do que a mesma soma nominal atualmente Em segundo lugar os autores foram induzidos a equívocos pelo desleixo com o qual alguns antigos estatutos de fixação dos preços foram às vezes transcritos por copistas negligentes e às vezes talvez efetivamente redigidos pelos legisladores Ao que parece os antigos estatutos de fixação dos preços come çavam determinando qual deveria ser o preço do pão e da cerveja inglesa quando o preço do trigo e da cevada eram os mais baixos pas sando progressivamente a determinar qual deveria ser o preço à me dida que os preços desses dois tipos de cereais subissem progressiva mente acima de seu preço mínimo Entretanto os que transcreveram esses estatutos parecem haver com freqüência considerado suficiente copiar as determinações até os três ou quatro primeiros preços mais baixos economizando assim trabalho e tempo e pensando como suponho que isso era suficiente para mostrar qual devia ser a pro porção de aumento a ser observada em todos os preços mais altos Assim por exemplo na determinação do preço do pão e da cerveja pelo Decreto 51 de Henrique III o preço do pão foi regulado de acordo com os diferentes preços do trigo desde 1 xelim até 20 xelins o quarter na moeda da época Entretanto nos manuscritos dos quais se extraíram todas as edições dos estatutos anteriores à do Sr Ruffhead os amanuenses nunca transcreveram essa determinação além do preço de 12 xelins Com isso vários autores deixandose conduzir por essa transcrição defeituosa concluíram com muita naturalidade que o preço médio 6 xelins o quarter equivalente a aproximadamente 18 xelins de nosso dinheiro atual era o preço comum ou médio do trigo naquela época No estatuto de Tumbrel e Pillory sancionado mais ou menos na mesma época o preço da cerveja inglesa é regulado segundo o aumento de cada 6 pence no preço da cevada desde 2 até 4 xelins o quarter Ora que 4 xelins não eram considerados como o preço máximo que poderia na época atingir com freqüência a cevada e que esses preços só foram indicados como um exemplo da proporção que deveria ser observada em todos os outros preços fossem eles mais altos ou mais baixos podemos inferir das últimas palavras do estatuto et sic de inceps crescetur uel diminuetur per sex denarios A expressão não é das mais felizes mas o significado é suficientemente claro que o preço da cerveja deve ser aumentado ou diminuído de acordo com cada au mento ou redução de 6 pence no preço da cevada Na redação desse estatuto os próprios legisladores parecem ter sido tão negligentes quan to os copistas na transcrição do estatuto Em um manuscrito antigo do Regiam Majestatem antigo tratado de leis da Escócia existe um estatuto de padrões no qual o preço do pão é regulado de acordo com todos os diversos preços do trigo desde 10 pence até 3 xelins o boll escocês igual a mais ou menos 12 quarter inglês Três xelins escoceses ao tempo em que se supõe ter sido emitida essa determinação eqüivaliam a aproximadamente 9 xelins esterlinos OS ECONOMISTAS 218 ingleses atuais Disso o Sr Ruddiman parece concluir137 que 3 xelins era o preço máximo jamais atingido pelo trigo naquele tempo e que os preços comuns eram 10 pence 1 xelim ou geralmente no máximo 2 xelins A consulta do manuscrito porém evidencia que todos os preços são indicados apenas a título de exemplo da proporção que deve ser observada entre os preços respectivos do trigo e do pão As últimas palavras do estatuto são reliqua judicabis secundum praescripta ha bendo respectum ad pretium bladi Os demais casos sejam julgados à luz do acima prescrito levando em conta o preço do trigo Em terceiro lugar os autores parecem ter sido induzidos a erro pelo preço muito baixo pelo qual o trigo às vezes era vendido em tempos muito antigos e ter imaginado que sendo o seu preço mínimo muito mais baixo do que em épocas anteriores seu preço comum deve igual mente ter sido muito mais baixo Todavia poderiam ter verificado que naqueles tempos antigos que seu preço máximo atingia valores tanto mais acima como o preço mínimo atingia valores abaixo do que jamais viria a se conhecer em épocas posteriores Assim em 1270 Fleetwood nos indica dois preços do quarter de trigo Um é 4 libras e 16 xelins em dinheiro da época equivalentes a 14 libras e 8 xelins do dinheiro atual o outro é 6 libras esterlinas e 8 xelins equivalendo a 19 libras e 4 xelins em dinheiro atual No final do século XV ou no início do século XVI não conseguimos encontrar preço algum que se aproxime desses preços exorbitantes O preço do trigo ainda que sujeito a variações em todos os tempos varia mais naquelas sociedades tur bulentas e desorganizadas nas quais a interrupção de todo comércio e comunicação impede a fartura de uma parte do país de aliviar a escassez de outra região Na situação desordenada da Inglaterra sob os Plantagenetas que a governaram mais ou menos desde meados do século XII até mais ou menos o fim do século XV um distrito podia ter fartura enquanto outro não muito distante do primeiro por ter sido sua safra destruída pelas intempéries ou incursão de algum barão vizinho podia estar sofrendo todos os horrores da fome nessa situação se entre os dois distritos estivessem localizadas as terras de algum senhor hostil um deles poderia não estar em condições de dar a menor assistência ao outro Sob a vigorosa administração dos Tudor que governaram a Ingla terra durante a última parte do século XV e por todo o século XVI nenhum barão tinha poder suficiente para ousar perturbar a segurança pública No final do presente capítulo o leitor encontrará todos os preços do trigo pesquisados por Fleetwood de 1202 até 1597 incluindo os dois anos extremos sendo esses preços convertidos ao valor do dinheiro atual e ordenados em ordem cronológica distribuídos em sete divisões de doze anos cada Ao final de cada divisão encontrará o preço médio dos doze anos de que ela consiste Nesse longo período de tempo Fleet wood conseguiu coligir os preços de não mais do que 80 anos de sorte ADAM SMITH 219 137 Ver seu prefácio a Diplomata Scotiae de Anderson que faltam 4 anos para perfazer os últimos doze anos Eis por que acrescentei os preços de 159815991600 e 1601 baseado nos relatos do Eton College É o único acréscimo feito por mim O leitor observará que desde o início do século XIII até depois dos meados do século XVI o preço médio de cada doze anos se torna gradativamente mais baixo e que pelo final do século XVI o preço começa a subir novamente Com efeito os preços que Fleetwood conseguiu pesquisar parecem ter sido sobretudo aqueles notáveis por serem extraordinariamente altos ou baixos e não pretendo afirmar que deles se possa tirar alguma conclusão muito segura Na medida porém em que provam alguma coisa confirmam aquilo que venho tentando expor O próprio Fleetwood porém como a maioria dos demais autores parece haver acreditado que durante todo esse período o valor da prata devido à sua abundância crescente diminuía constantemente Os preços do trigo pesquisados por ele próprio certamente não abonam essa opinião Concordam per feitamente com aquela opinião do Sr Duprè de St Maur e com a que venho procurando explanar O Bispo Fleetwood e o Sr Duprè de St Maur são os dois autores que parecem haver coligido com maior dili gência e fidelidade os preços das mercadorias em tempos antigos Não deixa de ser curioso que embora suas opiniões difiram tanto os fatos por eles apontados ao menos no que tange ao preço do trigo coincidam com tanta precisão Todavia não é tanto do baixo preço do trigo do que de algumas outras partes da rústica produção da terra que os mais judiciosos es critores inferiram o grande valor da prata naqueles velhos tempos Tem se afirmado que sendo o trigo um tipo de produto manufaturado era naquelas épocas rudes muito mais caro em relação à maior parte de outras mercadorias isso significa quero crer que a maior parte das mercadorias não manufaturadas tais como gado aves domésticas caça de todos os tipos etc naquela época de pobreza e de barbarismo eram sem dúvida proporcionalmente muito mais baratas do que o trigo Mas esse baixo preço não era conseqüência do alto valor da prata porém do baixo valor daquelas mercadorias Isso ocorria não porque a prata comprasse ou representasse naquela época uma quantidade maior de trabalho mas porque tais mercadorias comprariam ou re presentariam uma quantidade muito menor do que em tempos de maior opulência e desenvolvimento Certamente a prata deve ser mais barata na América espanhola do que na Europa no país onde ela é produzida do que naquele para o qual é levada à custa de um transporte a longa distância tanto por terra como por mar de um frete e um seguro Todavia como nos refere Ulloa não faz muitos anos que em Buenos Aires o preço de um boi escolhido em um rebanho de 300 ou 400 cabeças era de 21 12 pence esterlinos E o Sr Byron nos conta que na capital do Chile o preço de um bom cavalo era 16 xelins esterlinos Em um país naturalmente fértil mas no qual a maior parte da terra ainda é completamente não cultivada o gado as aves domésticas a caça de todos os tipos etc pelo fato de poderem ser adquiridos com OS ECONOMISTAS 220 muito pouco trabalho serão comprados ou encomendados em pequeníssima quantidade O baixo preço em dinheiro pelo qual podem ser vendidos não constitui prova de que o valor real da prata seja ali muito alto mas sim de que o valor real daquelas mercadorias é muito baixo O trabalho não se deve esquecer e não qualquer mercadoria ou conjunto de mercadorias em especial constitui a medida real do valor tanto da prata como de todas as outras mercadorias Mas em países quase desérticos com pequena densidade demo gráfica o gado as aves domésticas a caça de todos os tipos etc por serem produções espontâneas da natureza muitas vezes são em muito maior número do que o exigido por seus habitantes Em tal estado de coisas é comum a oferta superar a procura Por isso em condições diferentes da sociedade em estágios diferentes de aperfeiçoamento e desenvolvimento essas mercadorias representarão serão equivalen tes a quantidades muito diferentes de trabalho Em qualquer condição da sociedade em qualquer estágio de de senvolvimento o trigo é produto do trabalho humano Ora a produção média de todo tipo de trabalho sempre é adequada com precisão maior ou menor ao consumo médio e portanto a oferta média costuma ade quarse à demanda média Além disso em cada novo estágio diferente de desenvolvimento o cultivo de quantidades iguais de trigo no mesmo solo e clima em média exigirá mais ou menos as mesmas quantidades de trabalho ou o que dá no mesmo o preço de quantidades iguais de trabalho O aumento contínuo das forças produtivas do trabalho em um estágio de cultivo em desenvolvimento é mais ou menos contraba lançado pelo preço continuamente crescente do gado instrumento prin cipal da agricultura Por isso em virtude de todas essas razões podemos ter certeza de que quantidades iguais de trigo em qualquer sociedade em qualquer estágio de desenvolvimento representarão com maior aproximação ou seja equivalerão com maior aproximação quan tidades iguais de trabalho ou mãodeobra do que quantidades iguais de qualquer outro produto natural da terra Por isso como já observei o trigo constitui em todos os estágios de riqueza e de desenvolvimento uma medida muito mais precisa de valor do que qualquer outra mer cadoria ou conjunto de mercadorias Eis por que em todos esses diversos estágios o melhor critério para avaliar o valor da prata é comparálo com o valor do trigo melhor do que comparandoo com o de qualquer outra mercadoria ou conjunto de mercadorias O trigo portanto ou qualquer outro que seja o alimento vegetal comum e favorito da população constitui em todo país civilizado a parte principal da subsistência do trabalhador Em conseqüência da extensão da agricultura a terra de cada país produz uma quantidade muito maior de alimentos vegetais do que de alimento derivado de animais sendo que o trabalhador em toda parte vive sobretudo do alimento saudável que é mais barato e mais abundante A carne de açougue se excetuarmos os países mais prósperos ou aqueles em que o trabalho recebe uma remuneração particularmente alta perfaz ape ADAM SMITH 221 nas uma parte insignificante da subsistência do trabalhador sendo que as aves domésticas representam uma parcela ainda menor e a caça não representa parcela alguma Na França e mesmo na Escócia onde a mãodeobra é um pouco mais bem remunerada do que na França os pobres que trabalham raramente comem carne de açougue a não ser em dias santos e em outras ocasiões extraordinárias O preço da mãodeobra em dinheiro portanto depende muito mais do preço médio em dinheiro do trigo a subsistência do trabalhador do que do preço médio da carne de açougue ou de qualquer outro produto natural da terra Por conseguinte o valor real do ouro e da prata ou seja a quantidade real de trabalho que poderão comprar ou comandar depende muito mais da quantidade de trigo que conseguem comprar ou comandar do que da quantidade de carne de açougue ou de qualquer outro produto natural da terra Entretanto essas ligeiras observações sobre os preços do trigo ou de outras mercadorias não teriam provavelmente confundido tantos autores inteligentes se não tivessem sido influenciados ao mesmo tem po pela concepção popular segundo a qual enquanto a quantidade de prata aumenta naturalmente em todo país à medida em que aumenta a riqueza do país da mesma forma o seu valor diminui na medida em que sua quantidade aumenta Ora essa noção parece totalmente destituída de fundamento Duas são as causas que em qualquer país podem gerar um au mento da quantidade de metais preciosos ou a maior abundância das minas que fornecem esses metais ou o aumento da riqueza do povo decorrente do aumento da produção resultante de seu trabalho anual A primeira dessas causas sem dúvida tem conexão necessária com a diminuição do valor dos metais preciosos ao passo que isso não ocorre com a segunda Ao descobriremse minas mais abundantes aumenta a quanti dade de metais preciosos colocados no mercado e se continuar inal terada a quantidade de artigos necessários ou convenientes para a vida pelos quais se trocará essa maior quantidade de metais preciosos necessariamente se terá que quantidades iguais de metais poderão ser trocadas por quantidades menores de mercadoria Na medida portanto em que o aumento da quantidade de metais preciosos em um país provém da maior abundância das minas necessariamente esse aumento provoca uma redução de seu valor Ao contrário quando aumenta a riqueza de um país quando a produção anual de seu trabalho gradativamente vai se tornando maior tornase necessária uma quantidade maior de moeda para fazer circular uma quantidade maior de mercadorias conseqüentemente o povo na medida em que puder permitirse isso na medida em que tiver mais mercadorias para trocar por prata naturalmente comprará uma quan tidade sempre crescente de prataria A quantidade de moedas que comprarão aumentará por necessidade e a quantidade de sua prataria aumentará por variedade e ostentação ou pelo fato de que a quantidade OS ECONOMISTAS 222 de finas estátuas quadros e de qualquer outro artigo de luxo ou que desperte curiosidade é suscetível de aumentar entre eles Mas assim como não há probabilidade de que os pintores e fabricantes de estátuas se contentem em tempos de riqueza e prosperidade com uma remu neração inferior à que recebem em tempos de pobreza e depressão da mesma forma não há probabilidade de que o ouro e a prata sejam mais baratos O preço do ouro e da prata a não ser quando a eventual descoberta de minas mais abundantes o mantenha baixo assim como aumenta naturalmente com a riqueza de um país da mesma forma qualquer que seja o estado das minas é sempre naturalmente mais alto em um país rico do que em um país pobre O ouro e a prata como aliás todas as demais mercadorias naturalmente procuram os mercados em que se pagam os melhores preços e o melhor preço para qualquer mer cadoria geralmente é pago no país que tiver melhores condições para isso O trabalho cumpre recordar novamente é em última análise o preço básico que se paga por qualquer coisa e em países em que a remuneração da mãodeobra é do mesmo nível o preço do trabalho em dinheiro será proporcional ao preço da subsistência do trabalhador Ora o ouro e a prata naturalmente poderão ser trocados por uma quantidade maior de subsistência em um país rico que em um país pobre ou seja em um país onde a subsistência é farta do que em outro onde ela é razoavelmente suprida Se os dois países estiverem muito distantes entre si a diferença poderá ser muito grande pois embora os metais naturalmente passem do mercado pior para o melhor pode ser difícil transportálos em quantidades suficientes para aproximar ou igualar o seu preço nos dois países Se os países estiverem próximos a diferença será menor podendo às vezes ser apenas per ceptível pois nesse caso o transporte será fácil A China é um país muito mais rico do que qualquer região da Europa e a diferença de preço dos gêneros alimentícios na China e na Europa é muito grande O arroz na China é muito mais barato do que o trigo em qualquer parte da Europa A Inglaterra é muito mais rica que a Escócia mas a diferença entre o preço do trigo em dinheiro nesses dois países é muito menor sendo apenas perceptível Em comparação com a quan tidade ou medida o trigo escocês geralmente parece ser muito mais barato que o inglês mas em comparação com sua qualidade certamente é um pouco mais caro A Escócia recebe quase todo ano enormes su primentos da Inglaterra sendo que cada mercadoria deve normalmente ser um pouco mais cara no país ao qual é transportada do que naquele do qual provém Por isso o trigo inglês deve ser mais caro na Escócia do que na Inglaterra e não obstante isso em proporção com sua qua lidade ou seja à quantidade e qualidade da farinha ou alimento que dele se extrai geralmente não pode ser vendido mais caro do que o trigo escocês que vem a competir com ele no mercado A diferença entre o preço da mãodeobra em dinheiro na China e na Europa é ainda maior do que a diferença entre o preço dos man ADAM SMITH 223 timentos em dinheiro nas duas regiões pois a remuneração real do trabalho é mais elevada na Europa do que na China já que a maior parte da Europa está desenvolvida ao passo que a China ainda parece estacionária O preço do trabalho em dinheiro é mais baixo na Escócia do que na Inglaterra porque a remuneração real da mãodeobra é muito mais baixa pois a Escócia embora avançando para uma riqueza maior avança muito mais lentamente do que a Inglaterra A freqüência da emigração da Escócia e a raridade da emigração da Inglaterra demonstram suficientemente que a demanda de mãodeobra nos dois países é muito diferente A proporção entre a remuneração real do trabalho em países diferentes importa relembrar é naturalmente regulada não pela riqueza ou pobreza efetiva mas pelo seu estado de progresso de declínio ou pela sua situação estacionária O ouro e a prata assim como têm naturalmente o valor máximo entre as nações ricas da mesma forma têm o valor mínimo nas nações mais pobres Entre os selvagens que representam as nações mais po bres não têm praticamente valor algum Em cidades grandes o trigo sempre é mais caro do que nas regiões afastadas do país Isso porém não é efeito do baixo preço real da prata mas do baixo preço real do trigo Não custa menos trabalho transportar prata para uma grande cidade do que para as longínquas regiões do país mas custa muito mais trabalho transportar trigo Em alguns países muito ricos e comerciais tais como a Holanda e o território de Gênova o trigo é caro pela mesma razão que o é nas cidades grandes Não produzem o suficiente para manter seus habi tantes São países ricos no trabalho e na habilidade de seus artífices e manufatores em todo tipo de máquina capazes de facilitar e abreviar o trabalho são ricos também em navegação e em todos os outros ins trumentos e meios de transporte e comércio porém são pobres em trigo o qual pelo fato de precisar vir de países distantes deve com um acréscimo no preço pagar pelo transporte daqueles países Não custa menos trabalho transportar prata de Amsterdam para Dantzig mas custa muito mais transportar trigo O custo real da prata deve ser mais ou menos o mesmo nos dois lugares mas será muito diferente o do trigo Diminuase a opulência real da Holanda ou do território de Gênova permanecendo inalterado o seu contingente populacional diminuase sua capacidade de importar mercadorias de países distan tes e o preço do trigo ao invés de baixar com essa diminuição da quantidade de sua prata a qual necessariamente acompanhará esse declínio como causa ou como efeito subirá tanto quanto em época de penúria Quando temos falta de gêneros de primeira necessidade devemos renunciar a todas as coisas supérfluas cujo valor assim como sobe em tempos de opulência e prosperidade da mesma forma desce em tempos de pobreza e miséria Com os gêneros de primeira neces sidade não é assim Seu preço real a quantidade de trabalho que podem comprar ou comandar aumenta em tempos de pobreza e miséria e baixa em tempos de opulência e prosperidade que são sempre tempos OS ECONOMISTAS 224 de grande abundância pois de outra forma não seriam tempos de opu lência e prosperidade O trigo é um gênero de primeira necessidade mas a prata não passa de um produto supérfluo Eis por que qualquer que possa ter sido o aumento da quantidade de metais preciosos que durante o período entre meados do século XIV e do século XVI ocorreu devido ao aumento da riqueza e do desenvolvi mento esse aumento não poderia tender a diminuir seu valor quer na GrãBretanha ou em qualquer outra região da Europa Se portanto aque les que pesquisaram os preços das mercadorias em tempos antigos não tiveram nenhuma razão em inferir a diminuição do valor da prata partindo de observações que fizeram sobre os preços do trigo ou de outras merca dorias menos razão ainda tinham para inferir isso de qualquer outro suposto aumento de riqueza e desenvolvimento Segundo Período Por mais diferentes que possam ter sido as opiniões dos eruditos no tocante à evolução do valor da prata durante o primeiro período são unânimes quanto a esse valor no segundo período Desde aproximadamente 1570 até mais ou menos 1640 durante um período de aproximadamente setenta anos a variação da proporção entre o valor da prata e o do trigo manteve um ritmo totalmente oposto A prata baixou em seu valor real ou seja era trocada por uma quantidade menor de trabalho do que antes e o trigo aumentou em seu preço nominal e ao invés de ser vendido comumente por aproximadamente duas onças de prata o quarter ou seja em torno de 10 xelins de nosso dinheiro atual veio a ser vendido por 6 e 8 onças de prata o quarter ou seja aproxima damente 30 e 40 xelins de nosso dinheiro atual A descoberta das abundantes minas da América parece haver sido a única razão dessa redução do valor da prata em comparação com o valor do trigo Todos são acordes quanto a isso e nunca houve qualquer discussão a respeito do fato ou de sua causa Durante esse período a maior parte da Europa estava progredindo em termos de trabalho e desenvolvimento e portanto a demanda de prata deve ter conseqüentemente aumentado Mas o aumento da oferta ao que pa rece superou a tal ponto o da demanda que o valor desse metal di minuiu consideravelmente Observese que as descobertas das minas da América não parecem ter tido nenhum efeito muito sensível sobre os preços na Inglaterra até os anos que se seguiram a 1570 embora mesmo as minas de Potosi tivessem sido descobertas mais de vinte anos antes De 1595 até 1620 incluindo esses dois anos o preço médio do quarter de 9 bushels do melhor trigo no mercado de Windsor parece com base nos relatos do Eton College ter sido 2 1 s 6 913 d Par tindose dessa soma desprezada a fração e deduzindose 19 ou seja 4 xelins e 7 13 pence o preço de um quarter de 8 bushels resulta em 1 16 s 10 23 d E partindose dessa soma desprezada igualmente ADAM SMITH 225 a fração e deduzindose 19 ou seja 4 xelins e 1 19 pence para a diferença entre o preço do melhor trigo e o do médio o preço do trigo médio resulta ter sido aproximadamente 1 12 s 8 89 d isto é em torno de 6 13 onças de prata De 1621 a 1636 incluídos os dois anos o preço médio da mesma medida do melhor trigo no mesmo mercado e com base nos mesmos relatos parece ter sido 2 libras e 10 xelins partindose dessa soma e fazendose as mesmas deduções que no caso anterior o preço médio do quarter de 8 bushels de trigo médio resulta ter sido 1 19 s 6 d isto é aproximadamente 7 23 onças de prata Terceiro Período Entre 1630 e 1640 ou seja em torno de 1636 parece ter se completado o efeito da descoberta das minas da América na redução do valor da prata ao que parece em tempo algum o valor da prata baixou mais do que nessa época em proporção com o preço do trigo Parece ter subido algo no decurso do século atual sendo provável que o aumento tenha começado mesmo algum tempo antes do fim do século passado De 1637 até 1700 incluindo os dois anos sendo esses os últimos 64 anos do século passado o preço médio do quarter de 9 bushels do melhor trigo no mercado de Windsor e com base nos mesmos relatos parece ter sido 2 11 s 13 d portanto apenas 1 xelim e 13 pêni mais caro do que havia sido durante os 16 anos precedentes Todavia no decurso desses 64 anos ocorreram dois eventos que devem ter pro duzido uma escassez muito maior de trigo do que a que poderia ter sido provocada normalmente pelo curso das estações a qual portanto sem supor qualquer outra redução do valor da prata é muito mais do que suficiente para explicar esse aumento muito pequeno do preço O primeiro desses eventos foi a guerra civil a qual desestimu lando a agricultura e interrompendo o comércio deve ter aumentado muito mais o preço dos cereais do que o faria normalmente o curso das estações Deve ter tido esse efeito mais ou menos em todos os mercados do Reino mas particularmente nas proximidades de Londres mercados esses que tiveram que ser supridos pelos mercados mais longínquos Em 1648 portanto com base nos mesmos relatos o preço do trigo de melhor qualidade no mercado de Windsor parece ter sido de 4 libras e 5 xelins e em 1649 parece ter sido 4 libras o quarter de 9 bushels O excedente que ultrapassa 2 libras e 10 xelins desses dois anos preço médio dos 16 anos anteriores a 1637 é de 3 libras e 5 xelins o que dividido entre os últimos 64 anos do século passado é mais ou menos suficiente para explicar esse pequeno aumento do preço que parece haver ocorrido neles Entretanto embora esses sejam os preços máximos de maneira alguma parecem ter sido os únicos preços altos provocados pelas guerras civis O segundo evento foi o subsídio à exportação do trigo concedido OS ECONOMISTAS 226 em 1688 Muitos têm pensado que o subsídio estimulando a agricultura pode a longo prazo ter provocado uma abundância maior do trigo e por conseguinte uma maior baixa do seu preço no mercado interno do que se ele não tivesse existido Mais adiante mostrarei como o subsídio está longe de produzir esse efeito no momento limitome a observar que entre 1688 e 1700 o subsídio não teve tempo para gerar esse efeito Durante esse curto período o seu único efeito deve ter sido encorajando a exportação do excedente de produção de cada ano e dessa forma impedindo a abundância de um ano de compensar a es cassez do outro o de aumentar o preço no mercado interno A escassez que prevaleceu na Inglaterra de 1693 a 1699 incluídos esses dois anos embora incontestavelmente se deva sobretudo às intempéries e portanto abrangeu grande parte da Europa deve ter sido agravada em algo pelo subsídio Em conseqüência em 1699 proibiuse a ulterior exportação de trigo por nove meses Um terceiro evento ocorreu no decurso do citado período o qual apesar de não poder ser a causa da escassez do trigo nem talvez de qualquer aumento real da quantidade de prata costumeiramente paga por ele deve ter necessariamente ocasionado algum aumento da soma nominal Esse evento foi a grande desvalorização da moeda de prata em virtude do desgaste e do uso Esse mal começara no reinado de Carlos II e veio aumentando continuamente até 1695 quando conforme nos relata o Sr Lowndes o valor da moeda corrente de prata esteve em média aproximadamente 25 abaixo de seu valorpadrão Ora a soma nominal que constitui o preço de mercado de qualquer mercadoria é regulada não tanto pela quantidade de prata que pelo seu padrão a moeda deveria conter mas antes pela quantidade que na prática ela contém realmente Essa soma nominal pois é necessariamente superior quando a moeda está muito desvalorizada pelo desgaste e pelo uso do que quando está próxima de seu valorpadrão No decurso do século atual o dinheiro em prata nunca esteve mais abaixo de seu peso padrão do que no momento Mas embora muito desfigurado o valor da moeda de prata foi mantido pela moeda de ouro pela qual é trocada Com efeito embora antes da última re cunhagem a moeda de ouro também estivesse muito desfigurada não o estava tanto como a de prata Ao contrário em 1695 o valor do dinheiroprata não foi mantido pela moedaouro pois um guinéu era cambiado nessa época por 30 xelins de prata desgastada e usada Antes da última recunhagem do ouro o preço do lingote de prata ra ramente ultrapassou 5 xelins e 7 pence por onça o que representa em torno de 5 pence acima do preço da casa da moeda Mas em 1695 o preço comum da prata em lingotes era de 6 xelins e 5 pence por onça138 o que representa 15 pence acima do preço da casa da moeda Mesmo antes da última recunhagem do ouro pois tanto a moedaouro como ADAM SMITH 227 138 LOWNDES Essay on the Silver Coin p 68 a moedaprata se comparada ao lingote de prata não se supunha estar mais de 8 abaixo de seu valorpadrão Em 1695 ao contrário supõese haver estado aproximadamente 25 abaixo desse valor Mas no início do século atual isto é imediatamente depois da grande re cunhagem no tempo do rei Guilherme a maior parte da moedaprata corrente deve ter estado ainda mais próxima ao seu peso padrão do que atualmente No decurso do século atual aliás não houve nenhuma calamidade pública comparável à guerra civil que pudesse desestimu lar a agricultura ou interromper o comércio interno do país E embora o subsídio havido durante a maior parte deste século sempre fizesse subir o preço do trigo um pouco acima do que aconteceria normalmente na situação atual da agricultura todavia já que no decurso deste século o subsídio teve tempo suficiente para produzir todos os bons efeitos comumente imputados a ele de estimular a agricultura e por tanto aumentar a quantidade de trigo no mercado interno podese supor com base nos princípios de um sistema que explicarei e exami narei mais adiante que ele deve ter contribuído em algo para baixar o preço dessa mercadoria de um lado e aumentálo de outro Muitos supõem que ele fez mais Nos primeiros 64 anos do século atual por tanto o preço médio do quarter de 9 bushels do melhor trigo no mercado de Windsor com base nos relatos do Eton College parece ter sido 2 0 s 6 1932 d isto é mais do que 25 mais barato do que havia sido durante os últimos 64 anos do século passado e aproximadamente 9 xelins e 6 pence mais barato do que havia sido durante os 16 anos que precederam 1636 quando se acredita que a descoberta das abun dantes minas da América tenha produzido seu pleno efeito e aproxi madamente 1 xelim mais barato do que havia sido nos 26 anos que precederam 1620 antes que aquela descoberta pudesse ter produzido seu pleno efeito como se pode supor Segundo esse cálculo o preço médio do trigo médio durante esses 64 primeiros anos do século atual resulta haver sido em torno de 32 xelins o quarter de 8 bushels Em conseqüência o valor da prata parece ter subido algo em proporção ao do trigo durante o curso do presente século tendo pro vavelmente até começado a subir algum tempo antes do fim do século passado Em 1687 o preço do quarter de 9 bushels do melhor trigo no mercado de Windsor era de 1 5 s 2 d o preço mais baixo desde 1595 Em 1688 o Sr Gregory King famoso pelo seu conhecimento de matérias desse gênero estimou o preço médio do trigo para o produtor em anos de fartura moderada em 3 s 6 d o bushel isto é 28 xelins o quarter Entendo que o preço para o produtor seja o mesmo que às vezes se chama de preço de contrato ou seja o preço pelo qual o agricultor se compromete durante um certo número de anos a entregar uma determinada quantidade de trigo a um comerciante Já que um contrato desse tipo poupa ao agricultor a despesa e o incômodo da comercialização o preço de contrato geralmente é mais baixo do que se supõe ser o preço médio de mercado O Sr King julgou que 28 OS ECONOMISTAS 228 xelins o quarter era o preço normal de contrato em anos de fartura moderada Foime assegurado que antes da escassez ocasionada pela última série extraordinária de más estações esse era o preço normal de contrato em todos os anos normais Em 1688 foi concedido o subsídio parlamentar para a exportação do trigo Os senhores do campo que na época tinham no corpo legislativo ainda mais representantes do que atualmente sentiram que o preço do trigo em dinheiro estava baixando O subsídio foi um expediente para eleválo artificialmente ao alto preço pelo qual tinha sido fre qüentemente vendido nos tempos de Carlos I e Carlos II Esse subsídio deveria ter vigência portanto até que o trigo alcançasse o preço de 48 xelins o quarter isto é 20 xelins ou 57 mais caro do que o preço estimado pelo Sr King exatamente naquele ano como preço para o produtor em tempos de fartura moderada Se os cálculos do Sr King merecerem algo da reputação que granjearam universalmente 48 xelins o quarter era um preço que sem um expediente como o subsídio não se podia esperar naquele tempo a não ser em anos de escassez fora do comum Mas o governo do rei Guilherme não estava plenamente consolidado Ele não tinha absolutamente condições para recusar algo aos senhores do campo dos quais estava solicitando exatamente nessa época a implantação do imposto territorial anual Portanto o valor da prata em proporção ao preço do trigo pro vavelmente havia subido pouco antes do fim do século passado e parece ter continuado a subir durante o curso da maior parte do presente embora o processamento necessário do subsídio deva ter impedido que o aumento se tornasse tão sensível como aconteceria se ocorresse na situação real da lavoura Em anos de fartura o subsídio provocando uma exportação ex traordinária necessariamente aumenta o preço do trigo acima do que seria nesses anos Estimular a agricultura mantendo o preço do trigo mesmo nos anos mais fartos era o objetivo confesso da instituição Na realidade o subsídio geralmente era suspenso em anos de grande escassez Todavia deve ter tido algum efeito mesmo sobre os preços de muitos desses anos Pela exportação extraordinária que gera em anos de fartura deve freqüentemente impedir que a fartura de um ano compense a escassez de outro Por conseguinte tanto em anos de fartura como em anos de escassez o subsídio eleva o preço do trigo acima do que naturalmente aconteceria no estado real da agricultura Se portanto durante os primeiros 64 anos do século atual o preço médio foi mais baixo do que durante os últimos 64 anos do século passado necessariamente teria sido muito mais baixo no mesmo estado da agricultura se não fosse esse subsídio Poderseia porém dizer que sem o subsídio o estado da agri cultura não teria sido o mesmo Quaisquer que possam ter sido os efeitos dessa instituição sobre a agricultura do país procurarei mostrar adiante quando tratar explicitamente dos subsídios De momento li mitome a observar que esse aumento do valor da prata em proporção ADAM SMITH 229 ao do trigo não tem sido uma peculiaridade da Inglaterra Três pes quisadores de preço do trigo extremamente confiáveis atentos e la boriosos os Srs Duprè de St Maur Messance e o autor do Ensaio Sobre a Política dos Cereais observaram esse fenômeno na França durante o mesmo período e mais ou menos na mesma proporção Mas na França até 1764 a exportação de cereais era proibida por lei ora é difícil supor que mais ou menos a mesma redução do preço que se verificou em um país apesar dessa proibição em outro país fosse devida ao estímulo extraordinário dado à exportação Talvez seja mais apropriado considerar essa variação no preço médio do trigo em dinheiro mais como o efeito de algum aumento gradual do valor da prata no mercado europeu do que de alguma queda no valor real médio do trigo O trigo como já se tem observado em períodos de tempo distantes constitui uma medida mais acurada de valor do que a prata ou talvez qualquer outra mercadoria Quando depois da descoberta das abundantes minas da América o preço do trigo chegou a ser três e quatro vezes seu preço original em dinheiro esta mudança foi universalmente atribuída não a qualquer aumento do valor real do trigo mas à queda do valor real da prata Se pois durante os 64 primeiros anos do presente século o preço médio do trigo em dinheiro caiu algo abaixo do que havia sido durante a maior parte de século passado devemos igualmente atribuir essa mudança não a alguma queda no valor real do trigo mas a alguma elevação do valor real da prata no mercado europeu Com efeito o alto preço do trigo durante esses dez ou doze anos passados gerou uma suspeita de que o valor real da prata continua ainda a cair no mercado europeu Todavia esse alto preço do trigo parece ter sido o efeito das condições atmosféricas extraordinariamente desfavoráveis devendo pois ser considerado não como um evento per manente mas como um fato transitório e ocasional As estações para esses dez ou doze anos passados foram desfavoráveis na maior parte da Europa e as desordens da Polônia aumentaram em muito a escassez em todos esses países os quais em anos de altos preços costumavam ser supridos por aquele mercado Uma série tão longa de estações desfavoráveis embora não seja um evento muito comum não é de forma alguma um acontecimento singular e quem quer que tenha in vestigado a fundo a história dos preços do trigo nos tempos anteriores não terá dificuldade em deparar com vários outros exemplos do mesmo tipo Além disso dez anos de escassez extraordinária não são de se admirar mais do que dez anos de fartura extraordinária O baixo preço do trigo de 1741 até 1750 incluídos esses dois anos pode muito bem estar em oposição a seu alto preço durante esses oito ou dez últimos anos De 1741 até 1750 o preço médio do quarter de 9 bushels do melhor trigo no mercado de Windsor com base nos dados do Eton College era apenas 1 13 s 9 45 d o que é aproximadamente 6 s e 3 d abaixo do preço médio dos 64 primeiros anos do presente século O preço médio do quarter de 8 bushels de trigo de qualidade média OS ECONOMISTAS 230 segundo esse cálculo resulta ter sido somente 1 6 s 8 d durante esses dez anos Entre 1741 e 1750 porém o subsídio deve ter impedido o preço do trigo de baixar no mercado interno como naturalmente teria acon tecido Dos registros alfandegários consta que durante esses dez anos a quantidade de todos os tipos de cereais exportados ascendeu a nada menos do que 8 029 156 quarter de bushel O subsídio pago por isto ascendeu a 1 514 962 17 s 4 12 d Eis por que em 1749 o Sr Pelham primeiroministro na época observou à Câmara dos Comuns que para os três anos anteriores se havia pago uma soma muito alta como subsídio para a exportação de trigo Tinha ele boas razões para fazer essa observação e no ano seguinte poderia têla feito com maior razão ainda Naquele único ano o subsídio pago representou nada menos de 324 176 10 s 6 d139 É supérfluo observar quanto essa exportação forçada deve ter feito subir o preço do trigo acima do que teria acontecido normalmente no mercado interno No fim da lista de preços anexa a este capítulo o leitor encontrará o cálculo específico desses dez anos separados do resto Encontrará ali também o cálculo específico dos dez anos anteriores cuja média está também abaixo embora não muito da média geral dos primeiros 64 anos do século O ano de 1740 porém foi um ano de escassez fora do comum Esses vinte anos anteriores a 1750 podem muito bem ser co locados em oposição aos vinte anos anteriores a 1770 Assim como os primeiros estiveram bastante abaixo da média geral do país apesar da presença intermediária de 1 ou 2 anos de alta da mesma forma os últimos estiveram bastante acima dela apesar da presença inter mediária de 1 ou 2 anos de baixa o de 1759 por exemplo Se os primeiros não estiveram tanto abaixo da média geral como os últimos estiveram acima devemos provavelmente atribuílo ao subsídio Evi dentemente a mudança foi repentina demais para poder ser atribuída a alguma mudança no valor da prata que sempre é lenta e gradual O caráter repentino do efeito só pode ser explicado por uma causa que possa ocorrer subitamente a variação acidental das estações Com efeito o preço da mãodeobra em dinheiro aumentou na GrãBretanha durante o curso do século atual Isso porém parece ter sido o efeito não tanto de alguma diminuição no valor da prata no mercado europeu mas antes do aumento da demanda de mãodeobra na GrãBretanha devido ao grande e mais ou menos geral aumento da prosperidade do país Na França um país não tão próspero obser vouse que o preço da mãodeobra em dinheiro desde meados do século passado caiu gradualmente com o preço médio do trigo em dinheiro Tanto no século passado como no atual afirmase que os salários diários do trabalho comum têm sido segundo se tem dito bastante uniformes cerca de 120 do preço médio do septier de trigo medida que contém ADAM SMITH 231 139 Cf Tracts on the Corn Trade Tract 3 pouco mais de 4 bushels de Winchester Na GrãBretanha a remune ração real do trabalho como já demonstrado as quantidades reais de artigos necessários e de confortos materiais que se pagam ao traba lhador aumentaram consideravelmente durante o curso do século atual O aumento de seu preço em dinheiro parece ter sido o efeito não de uma diminuição do valor da prata no mercado geral da Europa mas de um aumento no preço real do trabalho no mercado específico da GrãBretanha em razão das circunstâncias particularmente favo ráveis do país Durante algum tempo após a primeira descoberta da América a prata continuaria a ser vendida a seu preço anterior ou não muito abaixo Os lucros da mineração seriam muito altos durante algum tempo muito acima de sua taxa natural Todavia os que na Europa impor tavam esse metal logo constatariam ser impossível vender toda a im portação anual a esse preço elevado A prata passaria gradativamente a ser trocada por uma quantidade sempre menor de bens Seu preço baixaria gradativamente até chegar a seu preço natural ou ao preço apenas suficiente para pagar de acordo com suas taxas naturais a mãodeobra os lucros do capital e a renda da terra preço este a ser pago para trazer o produto das minas para o mercado Na maior parte das minas de prata do Peru o imposto pago ao rei da Espanha que chega a 110 da produção bruta devora como já se observou toda a renda proveniente do uso da terra Esse imposto era inicialmente a metade da produção bruta logo depois baixou para 13 depois para 15 e finalmente para 110 continuando assim até hoje Ao que parece na maior parte das minas de prata do Peru isso é tudo o que resta após repor o capital do empreiteiro juntamente com seus lucros nor mais e parece reconhecerse universalmente que esses lucros que eram muito elevados agora são tão baixos quanto possam sêlo de confor midade com a continuação das obras O imposto pago ao rei da Espanha foi reduzido à quinta parte da prata registrada em 1504140 41 anos antes de 1545 a data da descoberta das minas de Potosi No decurso de noventa anos ou antes de 1636 essas minas as mais ricas de toda a América tiveram tempo suficiente para produzir seu pleno efeito ou para fazer descer o valor da prata no mercado europeu tão baixo quanto podia cair enquanto continuavam a pagar esse imposto ao rei da Espanha Noventa anos são tempo suficiente para reduzir qualquer mercadoria que não seja objeto de monopólio a seu preço natural ou ao preço mínimo pelo qual enquanto paga um imposto específico continua ao mesmo tempo sendo vendido durante um período considerável O preço da prata no mercado europeu poderia talvez ter baixado ainda mais e poderia terse tornado necessário reduzir o imposto não somente a 110 como em 1736 mas a 120 da mesma forma que o OS ECONOMISTAS 232 140 SOLORZANO v II imposto sobre o ouro ou interromper a exploração da maior parte das minas americanas hoje em funcionamento O aumento gradativo da demanda da prata ou a ampliação gradual do mercado para a produção das minas de prata da América constitui provavelmente a causa que impediu que isso acontecesse e que não só manteve o valor da prata no mercado europeu como tem talvez mesmo tornado mais alto do que era em torno dos meados do século passado Desde a primeira descoberta da América o mercado para a pro dução de suas minas de prata tornouse gradualmente mais amplo Primeiramente foi o mercado europeu que se ampliou cada vez mais de forma gradual Desde a descoberta da América a maior parte da Europa se desenvolveu muito A Inglaterra a Holanda a França a Alemanha e mesmo a Suécia a Dinamarca e a Rússia todas elas progrediram consideravelmente tanto na agricultura como em manu faturas A Itália não parece haver regredido A queda da Itália precedeu à conquista do Peru Desde aquela época parece haverse recuperado um pouco Espanha e Portugal ao contrário parece haverem retroce dido Entretanto Portugal representa uma parte mínima da Europa e o declínio da Espanha talvez não seja tão grande quanto geralmente se imagina No início do século XVI a Espanha era um país muito pobre mesmo em comparação com a França que tanto evoluiu desde essa época O imperador Carlos que com tanta freqüência viajava pelos dois países fez a conhecida observação de que na França tudo se en contrava com fartura ao passo que na Espanha havia falta de tudo A produção crescente da agricultura e das manufaturas européias deve necessariamente ter exigido um aumento gradual da quantidade de dinheiroprata para fazer circular essa riqueza e o número crescente de indivíduos ricos deve ter exigido o mesmo aumento da quantidade de baixelas e demais ornamentos de prata Em segundo lugar a própria América é um novo mercado para a produção de suas minas de prata e uma vez que seus progressos na agricultura na indústria e na população são muito mais rápidos do que os dos países europeus mais prósperos sua demanda de prata deve também aumentar com rapidez muito maior As colônias inglesas constituem um novo mercado o qual em parte para a moeda e em parte para os artigos de prata exige um fornecimento em contínuo aumento de prata em um grande continente onde nunca antes houve tal demanda Também a maior parte das colônias espanholas e por tuguesas representam novos mercados A Nova Granada o Iucatan o Paraguai e os Brasis antes de serem descobertos pelos europeus eram habitados por nações selvagens que não possuíam nem artes nem agri cultura Entrementes todos esses países já evoluíram muito sob este aspecto Mesmo o México e o Peru embora não possam ser considerados absolutamente como mercados novos certamente constituem hoje mer cados muito maiores do que em qualquer época anterior Depois de todas as histórias fantasiosas publicadas sobre o estado esplêndido desses países em tempos antigos toda pessoa que ler com algum grau ADAM SMITH 233 de discernimento a história de sua primeira descoberta e conquista evidentemente saberá que nas artes na agricultura e no comércio os habitantes desses países eram muito mais ignorantes do que são hoje os tártaros da Ucrânia Mesmo os peruanos a nação mais civilizada embora usassem ouro e prata como ornamentos não conheciam dinheiro cunhado de espécie alguma Todo o seu comércio era por escambo e por isso dificilmente conheciam alguma divisão do trabalho Os que cultivavam a terra eram obrigados a construir suas próprias casas a fazer suas próprias mobílias suas próprias roupas sapatos e instru mentos agrícolas Segundo se afirma os poucos artesãos entre eles eram todos mantidos pelo soberano os nobres os sacerdotes e prova velmente eram seus servos ou escravos Todas as antigas artes do México e do Peru jamais forneceram um único manufaturado à Europa Os exércitos espanhóis apesar de raramente ultrapassarem 500 ho mens muitas vezes não chegavam sequer à metade disso quase sempre tinham dificuldade em encontrar o necessário para sua sub sistência A epidemia de fome que segundo se diz eles causavam em quase todos os lugares para onde iam em países tidos ao mesmo tempo como muito populosos e bem cultivados demonstram à saciedade que esta quantidade de habitantes e este alto nível de cultivo são em alto grau histórias fabulosas As colônias espanholas estão sob um governo que sob muitos aspectos é menos favorável à agricultura ao desen volvimento e ao aumento populacional do que o das colônias inglesas Entretanto todas essas nações americanas parecem estar progredindo em ritmo muito mais rápido que qualquer país europeu Em um solo fértil e um clima propício ao que parece a grande abundância e o baixo preço da terra circunstância comum a todas as colônias novas representam uma vantagem tão grande que compensa muitas de ficiências no governo civil Frezier que visitou o Peru em 1713 descreve Lima como tendo entre 25 e 28 mil habitantes Ulloa que residiu no mesmo país entre 1740 e 1746 fala em mais de 50 mil A diferença de seus relatos no tocante ao alto número de habitantes de várias outras cidades principais do Chile e do Peru é mais ou menos a mesma e já que não parece haver motivo algum para duvidar de que ambos estavam bem informados esta diferença denota um aumento pouco inferior ao aumento da população das colônias inglesas Portanto a América é um novo mercado para a produção de sua própria prata cuja demanda deve crescer muito mais rapidamente do que a do mais próspero país da Europa Em terceiro lugar as Índias Orientais constituem outro mercado para a produção de prata das minas da América um mercado que desde o tempo da primeira descoberta dessas minas tem absorvido uma quantidade sempre maior de prata Desde aquela época o comércio direto entre a América e as Índias Orientais mantido pelos navios de Acapulco tem aumentado continuamente sendo que o intercâmbio in direto através da Europa tem aumentado em uma proporção ainda maior Durante o século XVI os portugueses eram a única nação eu OS ECONOMISTAS 234 ropéia que mantinha um comércio regular com as Índias Orientais Nos últimos anos daquele século os holandeses começaram a interferir nesse monopólio e em poucos anos expulsaram os portugueses de suas fundações principais na Índia Durante a maior parte do século passado essas duas nações dividiram entre si a parcela mais considerável do comércio com a Índia Oriental sendo que o comércio dos holandeses continuamente aumentou em uma proporção muito maior do que de clinou o dos portugueses Os ingleses e franceses mantiveram algum comércio com a Índia no século passado aumentando muito no decurso deste O comércio dos suecos e dinamarqueses com a Índia Oriental começou no decurso do século atual Até os moscovitas agora mantêm comércio regular com a China através de uma espécie de caravanas que atravessam por terra a Sibéria e a Tartária indo até Pequim Tem estado em contínuo aumento o comércio de todos esses países com a Índia Oriental se excetuarmos o dos franceses que foi quase aniquilado pela última guerra O crescente consumo de bens da Índia Oriental na Europa é ao que parece tão grande que proporciona um aumento gradual do emprego de todos esses bens O chá por exemplo era um produto muito pouco usado na Europa antes da metade do século passado Atualmente o valor do chá importado anualmente pela Companhia Inglesa das Índias Orientais para consumo de seus con terrâneos sobe a mais de 15 milhão por ano e mesmo isso não basta pois é constante a entrada de outras cargas de chá por contrabando que entram no país através dos portos da Holanda de Gottenburg na Suécia e também da costa francesa enquanto prosperava a Companhia Francesa das Índias Orientais O consumo de porcelana da China e das especiarias das Molucas das quinquilharias de Bengala e de inú meros outros artigos aumentou mais ou menos em proporção seme lhante Por isso a tonelagem de todos os navios empregados no comércio com as Índias Orientais em qualquer período do século passado talvez não fosse muito maior do que a da Companhia Inglesa das Índias Orientais antes da última redução de sua esquadra Ora nas Índias Orientais especialmente na China e no Industão o valor dos metais preciosos quando os europeus começaram a manter comércio com aqueles países era muito mais alto do que na Europa e ainda hoje assim é Em países produtores de arroz com geralmente duas ou três colheitas por ano cada uma delas mais abundante do que qualquer colheita de trigo a abundância de alimentos deve ser muito maior do que em qualquer país produtor de trigo de igual ex tensão Tais países são portanto mais populosos Neles igualmente tendo os ricos uma superabundância de alimento a seu dispor maior do que eles mesmos podem consumir têm meios para comprar uma quantidade muito maior do trabalho de outros povos Conseqüente mente a comitiva de uma pessoa de posição na China ou no Industão é assim em todos os sentidos muito mais numerosa e esplêndida do que a dos indivíduos mais ricos da Europa A mesma superabundância de alimento do qual dispõem para vender lhes possibilita pagar uma ADAM SMITH 235 quantidade maior dele por todos esses produtos singulares e raros que a natureza fornece em quantidade muito pequena tais como os metais e as pedras preciosas grandes objetos de concorrência entre os ricos Embora portanto as minas que supriam o mercado indiano fossem tão abundantes quanto as que supriam o mercado europeu tais mer cadorias seriam naturalmente trocadas por uma quantidade maior de alimento na Índia do que na Europa Mas as minas que forneciam metais preciosos ao mercado indiano parecem ter sido muito menos abundantes e as que lhe forneciam pedras preciosas muito mais abun dantes que as minas que supriam o mercado europeu Por isso os metais preciosos podiam ser trocados na Índia por uma quantidade algo maior de pedras preciosas e por uma quantidade muito maior de alimento do que na Europa O preço monetário dos diamantes o maior dos supérfluos era um tanto mais baixo e o do alimento o primeiro dos artigos necessários bastante mais baixo em um país em relação ao outro Entretanto como já se observou o preço real do trabalho a quantidade real de produtos vitais que é dada ao traba lhador é menor tanto na China como no Industão os dois grandes mercados da Índia do que na maior parte da Europa Os salários do trabalhador comprarão quantidades menores de alimento e já que o preço dos alimentos em dinheiro é muito mais baixo na Índia do que na Europa o preço do trabalho em dinheiro é lá mais baixo por duas razões devido à pequena quantidade de alimentos que poderá comprar e devido ao baixo preço desses alimentos Mas em países de artes e indústria iguais o preço monetário da maior parte dos manufaturados será proporcional ao preço do trabalho em dinheiro e nas artes ma nufatureiras e industriais a China e o Industão embora inferiores não parecem ser muito mais inferiores a qualquer parte da Europa O preço em dinheiro da maior parte das manufaturas por isso será naturalmente muito mais baixo naqueles grandes impérios do que em qualquer lugar na Europa Através da maior parte da Europa a despesa do transporte terrestre aumenta muito mais tanto o preço real como o nominal de muitas manufaturas Custa mais trabalho e portanto mais dinheiro trazer ao mercado primeiro os materiais e depois a manufatura completa Na China e no Industão a extensão e a varie dade nas navegações internas poupam a maior parte desse trabalho e conseqüentemente desse dinheiro e com isso reduzem ainda mais o preço real e nominal da maioria de suas manufaturas Por todos esses motivos os metais preciosos constituem uma mercadoria que sempre foi e ainda continua a ser de extrema vantagem levar da Europa à Índia Dificilmente há uma mercadoria que obtenha lá melhor preço ou que em proporção à quantidade de trabalho e de mercadorias que custa na Europa compensará ou comandará maior quantidade de tra balho e de mercadorias na Índia Também é mais vantajoso levar para lá prata do que ouro porque na China e na maioria dos outros mercados da Índia a proporção entre a prata pura e o ouro puro é apenas de 10 ou no máximo de 12 para 1 ao passo que na Europa é de 14 ou OS ECONOMISTAS 236 15 para 1 Na China e na maior parte dos outros mercados da Índia 10 ou no máximo 12 onças de prata comprarão 1 onça de ouro en quanto que na Europa requeremse de 14 a 15 onças Por isso nas cargas da maior parte dos navios europeus que navegam para a Índia a prata tem sido geralmente um dos artigos mais valiosos É o artigo mais valioso nos navios de Acapulco que navegam para Manila A prata do Novo Continente parece assim ser uma das mercadorias prin cipais mediante as quais é feito o comércio entre as duas extremidades do Velho Continente sendo por esse meio que em grande parte aquelas regiões longínquas se interligam entre si Para suprir um mercado tão amplo a quantidade de prata ex traída anualmente das minas deve não somente ser suficiente para suportar esse contínuo aumento tanto de moeda quanto de prataria que se exige em todos os países em progresso mas também para reparar aquele desperdício e consumo contínuo de prata que ocorre em todos os países em que esse metal é utilizado É muito considerável o contínuo consumo de metais preciosos em moeda pelo uso e da prataria tanto pelo uso como pelas operações de limpeza e tratandose de mercadorias cujo uso é tão extenso e amplo isso bastaria para exigir um suprimento anual muito elevado O consumo desses metais em alguns manufaturados específicos embora no global talvez possa não ser maior do que esse consumo gradual é no entanto muito mais sensível por ser muito mais rápido Somente nas manufaturas de Birmingham afirmase que a quantidade de ouro e prata anualmente empregada na douração e no prateamento quan tidade essa que portanto fica desqualificada para aparecer depois na forma desses metais ascende a mais de 500 mil libras esterlinas Daí podemos ter uma noção de como pode ser grande o consumo anual em todas as partes do mundo ou nas manufaturas do mesmo tipo que as de Birmingham em rendas bordados objetos de ouro e prata dou ração de livros mobílias etc Uma quantidade considerável também deve perderse ao se transportar os metais de um lugar a outro tanto por mar como por terra Além disso na maior parte dos governos da Ásia o costume mais ou menos universal de esconder tesouros nas entranhas da terra sendo que o segredo do paradeiro deles muitas vezes morre com o falecimento de quem os escondeu deve gerar a perda de uma quantidade ainda maior A quantidade de ouro e prata importada em Cádiz e Lisboa in cluindose não somente o que vem registrado mas também o que se pode supor venha de contrabando representa segundo os melhores cálculos aproximadamente 6 milhões de esterlinos ao ano Segundo o Sr Meggens141 a importação anual de metais preciosos na Espanha em uma média de seis anos isto é de 1748 até 1753 ADAM SMITH 237 141 Postscriptum ao Universal Merchant pp 15 e 16 Esse postscriptum só foi impresso em 1756 três anos após a publicação do livro o qual nunca teve uma segunda edição Por isso só há poucas cópias do postscriptum Ele corrige vários erros contidos no livro incluídos os dois anos e em Portugal em uma média de sete anos de 1747 até 1753 incluídos os dois anos foi de 1 101 107 libraspeso de prata e de 49 940 libraspeso de ouro A prata a 62 xelins por libratroy ascende a 3 413 431 libras e 10 xelins esterlinos O ouro a 44 12 guinéus por libratroy ascende a 2 333 446 libras e 14 xelins esterlinos Os dois juntos representam a soma de 5 746 878 libras e 4 xelins esterlinos Meggens asseguranos ser exato o cálculo da quan tidade importada sob registro Indicanos os detalhes dos lugares es pecíficos dos quais foram trazidos o ouro e a prata e da quantidade específica de cada metal que segundo os registros cada um deles pro porcionou Ele também deixa uma margem para a quantidade dos dois metais que supõe poder ter sido contrabandeada A grande experiência desse criterioso comerciante confere grande peso à sua opinião Segundo o eloqüente e às vezes bem informado autor da Philo sophical and Political History of the Establishment of the Europeans in the Two Indies a importação anual de ouro e prata registrada na Espanha em uma média de onze anos de 1754 a 1764 incluídos os dois anos foi de 13 984 185 34 piastras de 10 reais Levandose em conta porém o que pode ter entrado por contrabando supõe ele que o total da importação anual pode ter ascendido a 17 milhões de piastras o que equivalendo a piastra a 4 s 6 d é igual a 3825 milhões de libras esterlinas Também ele indica os detalhes dos lugares específicos donde vieram o ouro e a prata e das quantidades específicas dos dois metais fornecidos por cada lugar segundo os registros In formanos também que se avaliássemos a quantidade de ouro anual mente importada dos Brasis para Lisboa com base na soma total dos impostos pagos ao rei de Portugal que parece ser 15 do metalpadrão poderíamos avaliála em 18 milhões de cruzados isto é 45 milhões de libras francesas equivalendo mais ou menos a 2 milhões de libras esterlinas Todavia considerando o que pode ter entrado de contra bando diz ele que podemos com segurança acrescentar à referida soma 18 a mais isto é 250 mil libras esterlinas de sorte que o total as cenderia a 225 milhões de libras esterlinas Segundo esse relato por tanto o total das importações anuais de metais preciosos na Espanha e Portugal sobe a aproximadamente 6 075 000 de libras esterlinas Foime assegurado que vários outros relatos muito fidedignos ainda que manuscritos concordam em indicar como soma anual dessas importações uma média em torno de 6 milhões de esterlinos às vezes um pouco mais às vezes um pouco menos Com efeito a importação anual de metais preciosos em Cádiz e em Lisboa não é igual ao total da produção anual das minas da América Uma parte é enviada anualmente a Manila pelos navios de Acapulco outra parte é empregada no comércio de contrabando que as colônias espanholas mantêm com as de outras nações européias e uma outra parte certamente permanece no país Além disso as minas da América não representam em absoluto as únicas minas de ouro e prata do mundo São porém por larga margem as mais abundantes Reconhe OS ECONOMISTAS 238 cese que a produção de todas as outras minas conhecidas é significativa em comparação com a das americanas reconhecese também que a maior parte da produção dessas outras minas é anualmente importada por Cádiz e Lisboa Mas somente o consumo de Birmingham à taxa de 50 mil libras por ano equivale à 120ª parte dessa importação anual à taxa de 6 milhões por ano Portanto o total do consumo anual de ouro e prata em todos os países do mundo nos quais esses metais são utilizados pode talvez ser mais ou menos igual a toda a produção anual É possível que o resto não seja mais do que suficiente para atender à demanda crescente de todos os países em progresso podendo até ter ficado abaixo dessa demanda aumentando um pouco o preço desses metais no mercado europeu A quantidade de latão e de ferro trazida das minas para o mercado é fora de todas as proporções maior do que a de ouro e prata Nem por isso porém imaginamos que aqueles metais menos nobres tenham a probabilidade de multiplicarse além dessa demanda ou que se tor nem gradativamente mais baratos Por que motivo imaginaríamos que os metais preciosos tenham essa probabilidade Os metais menos no bres com efeito embora mais duros são empregados para usos muito mais pesados e por terem menos valor cuidase menos de sua pre servação Os metais preciosos tanto quanto os outros não são neces sariamente imperecíveis mas estão também sujeitos a perda a des gaste e a serem consumidos das formas as mais variadas O preço de todos os metais ainda que sujeito a variações lentas e graduais varia menos de ano para ano do que o preço de quase todos os outros produtos naturais da terra sendo que o preço dos metais preciosos é ainda menos sujeito a variações repentinas do que o dos metais menos nobres A durabilidade dos metais constitui o fun damento dessa extraordinária firmeza de preço O trigo colocado no mercado no ano passado estará totalmente ou quase totalmente consumido muito antes do final do presente ano Mas uma parte do ferro extraído das minas há 200 ou 300 anos ainda pode estar em uso acontecendo talvez o mesmo com uma parte do ouro extraído há 2 ou 3 mil anos Os diferentes volumes de trigo que nos diferentes anos devem suprir o consumo do mundo sempre serão mais ou menos pro porcionais à produção respectiva desses diferentes anos No entanto a proporção entre os diferentes volumes de ferro que podem estar em uso em dois anos diferentes será muito pouco afetada por alguma di ferença acidental na produção das minas de ferro dos dois anos e a proporção entre os volumes de ouro será ainda menos afetada por alguma diferença na produção das minas de ouro Ainda que portanto a produção da maior parte das minas metálicas varie talvez ainda mais de ano para ano do que a da maior parte dos campos de trigo essas variações não têm o mesmo efeito sobre o preço de um tipo de mercadoria e o da outra ADAM SMITH 239 VARIAÇÕES NA PROPORÇÃO ENTRE OS VALORES RESPECTIVOS DO OURO E DA PRATA Antes da descoberta das minas da América o valor do ouro puro em relação à prata pura era regulado nas diversas casas da moeda européias entre as proporções de 1 para 10 e 1 para 12 isto é supu nhase que 1 onça de ouro puro valia de 10 a 12 onças de prata pura Pelos meados do século passado o valor foi regulado entre as proporções de 1 para 14 e 1 para 15 isto é 1 onça de ouro puro supunhase igual a 14 ou 15 onças de prata pura O ouro aumentou seu valor nominal ou seja na quantidade de prata a ser paga por ele O valor real dos dois metais baixou ou seja na quantidade de trabalho que tinham condições de comprar mas a prata baixou mais que o ouro Embora o ouro e a prata das minas da América excedessem em abundância todas as minas que se conheciam até então parece que a riqueza das minas de prata era proporcionalmente ainda maior que a das minas de ouro As grandes quantidades de prata transportadas anualmente da Europa à Índia reduziram gradualmente em algumas das colônias inglesas o valor da prata em comparação com o do ouro Em Calcutá supõese que 1 onça de ouro puro vale 15 onças de prata pura da mesma forma que na Europa Na casa da moeda talvez seja avaliado muito alto em relação ao valor que tem no mercado de Bengala Na China a proporção do ouro para a prata continua sendo de 1 para 10 ou 1 para 12 No Japão afirmase que é de 1 para 8 A proporção entre as quantidades de ouro e prata anualmente importadas na Europa segundo o relato do Sr Meggens é aproxima damente de 1 para 22 isto é para 1 onça de ouro importase um pouco mais que 21 onças de prata A grande quantidade de prata enviada anualmente às Índias Orientais reduz supõe ele as quantidades da queles metais que permanecem na Europa à proporção de 1 para 14 ou 15 a proporção dos valores respectivos Ele parece pensar que a proporção entre seus valores deve necessariamente ser a mesma que a existente entre suas quantidades e seria portanto de 1 para 22 não fosse por essa maior exportação de prata Mas a proporção normal entre os valores respectivos de duas mercadorias não é necessariamente a mesma que a proporção entre as quantidades que normalmente estão no mercado O preço de um boi calculado em 10 guinéus é aproximadamente 60 vezes o preço de um cordeiro calculado em 3 s 6 d Entretanto seria absurdo inferir daí que comumente existem no mercado 60 cordeiros para cada boi e seria exatamente tão absurdo concluir do fato de 1 onça de ouro com prar geralmente de 14 a 15 onças de prata que comumente há no mercado somente 14 ou 15 onças de prata por cada onça de ouro É provável que a quantidade de prata existente geralmente no mercado seja muito maior em relação à quantidade de ouro do que o OS ECONOMISTAS 240 valor de uma certa quantidade de ouro seja maior em proporção com uma quantidade igual de prata A quantidade total de uma mercadoria barata colocada no mercado não é somente maior mas também de maior valor do que a quantidade total de uma mercadoria cara A quantidade total de pão comercializada anualmente não somente é maior mas também seu valor total é maior do que o da quantidade anual total de carne de açougue por sua vez a quantidade total de carne de açougue é maior que a quantidade total de carne de aves domésticas e a quantidade total de carne de aves domésticas do que a quantidade total de aves selvagens de caça Os compradores de mer cadorias baratas são tão mais numerosos que os de mercadorias caras que geralmente se pode vender não somente uma quantidade maior daquelas mas também um valor maior Portanto a quantidade total da mercadoria barata deve geralmente ser maior em proporção com a quantidade total da mercadoria cara do que o valor de uma certa quantidade da mercadoria cara o é em proporção de uma quantidade igual da mercadoria barata Quando comparamos os metais preciosos entre si a prata é barata e o ouro é caro Naturalmente devemos pois esperar que no mercado deve haver sempre não somente uma quantidade maior mas também um valor maior de prata do que de ouro Façamos qualquer pessoa que tenha um pouco de ouro e de prata comparar sua própria prata com sua baixela de ouro e ela pro vavelmente constatará que não somente a quantidade mas também o valor da prata excedem de muito o do ouro Além disso existem muitas pessoas que têm uma boa quantidade de prata mas não têm baixela de ouro este mesmo no caso dos que possuem geralmente se limita a caixas de relógio caixinhas de rapé e outras quinquilharias similares cuja quantia total raramente é de grande valor Na moeda britânica realmente o valor da prata é muito preponderante mas tal não ocorre na moeda de todos os países Na moeda de alguns países o valor dos dois metais é mais ou menos igual Na moeda escocesa antes da união com a Inglaterra o ouro tinha muito pouca preponderância embora houvesse alguma preponderância142 como transparece dos relatórios da casa da moeda Na moeda de muitos países prepondera a prata Na França as somas maiores são geralmente pagas em moedas de prata sendo lá difícil obter mais ouro do que o necessário para car regarmos conosco no bolso Entretanto o valor superior da prataria em relação ao do ouro que existe em todos os países mais do que compensa a preponderância da moeda de ouro sobre a prata que só existe em alguns países Embora em certo sentido a prata sempre foi e provavelmente sempre será mais barata que o ouro em outro sentido podese talvez dizer que no atual estado do mercado espanhol o ouro é algo mais barato que a prata Podese dizer que uma mercadoria é cara ou barata ADAM SMITH 241 142 Ver o prefácio de Ruddiman a Diplomata Scotiae de Anderson não somente de acordo com o nível absoluto alto ou baixo de seu preço real mas também de acordo com que o preço esteja mais ou menos acima do preço mínimo pelo qual é possível colocála no mercado por um período de tempo considerável Esse preço mínimo é o que sim plesmente repõe com um lucro moderado o capital que se precisa empregar para colocar a mercadoria no mercado É o preço que ne nhuma renda proporciona ao dono da terra é o preço no qual a renda não entra como componente pois ele se decompõe integralmente em salários e lucro Ora no presente estado do mercado espanhol o ouro certamente está algo mais próximo desse preço mínimo do que a prata O imposto do rei da Espanha sobre o ouro é apenas 120 do metalpa drão isto é 5 enquanto o imposto sobre a prata ascende a 110 ou 10 Já tem sido observado que é nesses impostos que consiste toda a renda da maior parte das minas de ouro e prata da América Espa nhola e o imposto sobre o ouro é ainda mais sonegado que o que incide sobre a prata O lucro dos empreiteiros das minas de ouro além disso por ser mais raro fazerem fortuna via de regra é necessariamente mais modesto que o dos empreiteiros das minas de prata Por isso o preço do ouro espanhol pelo fato de proporcionar menos renda e menos lucro deverá no mercado espanhol estar algo mais próximo do preço mínimo pelo qual é possível comercializálo do que o preço da prata espanhola Uma vez computadas todas as despesas ao que parece a quantidade total de ouro não pode no mercado espanhol ser vendida com tanta vantagem como a quantidade total de prata Com efeito o imposto do rei de Portugal sobre o ouro dos Brasis é o mesmo que o antigo imposto do rei da Espanha sobre a prata do México e do Peru ou seja 15 do metalpadrão Pode assim ser incerto se para o mercado geral da Europa o volume total do ouro americano se aproxima mais do preço mínimo pelo qual é possível leválo para lá do que o volume total de prata americana Talvez o preço dos diamantes e de outras pedras preciosas possa estar ainda mais perto do preço mínimo ao qual é possível comercia lizálos que o próprio preço do ouro É improvável que um dia se abra mão ao menos enquanto for possível pagálo de uma parcela do imposto que se impõe não somente a um dos artigos mais adequados à taxação por ser um simples artigo supérfluo e de luxo mas que assegura uma receita tão ponderável como é o imposto sobre a prata não obstante isso a própria impossibilidade de recolher este imposto que em 1736 obrigou a reduzilo de 15 para 110 pode eventualmente obrigar a reduzilo ainda mais da mesma forma como obrigou a reduzir o imposto sobre o ouro a 120 Toda pessoa que examinou o estado das minas reconhece que as minas de prata da América espanhola como todas as outras se tornam cada vez mais caras em sua exploração devido às grandes profundidades em que é preciso escavar e devido à ingente despesa necessária para extrair a água e fornecer ar fresco naquelas profundidades Essas causas que equivalem a uma escassez crescente da prata OS ECONOMISTAS 242 já que se pode dizer que uma mercadoria se torna mais rara quando passa a ser mais difícil e dispendioso conseguir determinada quantidade dela deverão com o tempo provocar um ou outro dos três seguintes eventos O aumento da despesa deverá 1 ser totalmente compensado por um aumento proporcional do preço do metal 2 ser compensado totalmente por uma diminuição proporcional do imposto sobre a prata 3 ser compensado parcialmente por um daqueles dois eventos Este terceiro evento é muito possível Assim como o ouro aumentou de preço em relação à prata não obstante uma grande redução do imposto in cidente sobre ele da mesma forma a prata poderia aumentar de preço em proporção com o trabalho e as mercadorias apesar de uma redução igual do imposto sobre a prata Tais reduções sucessivas do imposto embora não possam impedir totalmente o aumento do valor da prata no mercado europeu devem certamente retardálo em grau maior ou menor Em conseqüência de tal redução podese explorar muitas minas que antes era impossível explorar porque não tinham condições para cobrir o antigo imposto e a quantidade de prata colocada então no mercado anualmente deverá ser sempre algo maior e o valor de qualquer quantidade dada será algo menor do que teria sido de outra forma Em conseqüência da redução de 1736 provavelmente o valor da prata no mercado europeu embora hoje possa não ser mais baixo do que antes da redução é no mínimo 10 mais baixo do que teria sido se a Corte espanhola tivesse continuado a exigir a antiga taxa Os fatos e argumentos que acabei de mencionar levamme a crer ou melhor a suspeitar e conjecturar que apesar dessa redução o valor da prata durante o curso do século atual começou a subir um pouco no mercado europeu pois a melhor opinião que posso formar sobre esse assunto dificilmente mereça talvez o nome de crença Com efeito o aumento se é que houve foi até agora tão pequeno que depois de tudo o que se disse talvez a muitos poderá parecer incerto não somente se o fato aconteceu realmente mas também se talvez não terá ocorrido o contrário ou seja se o valor da prata não pode estar continuando a cair no mercado europeu Podese observar porém que qualquer que possa ser a suposta importação anual de ouro e prata deve haver um certo período em que o consumo anual desses metais será igual a essa importação anual Seu consumo deve aumentar na medida em que aumenta seu volume ou então em uma proporção muito maior Aumentado seu volume diminui seu valor Os metais passam então a ser mais usados haverá menos cuidado e conseqüentemente seu consumo aumentará em pro porção maior do que seu volume Portanto depois de um certo período o consumo anual desses metais deve assim tornarse igual à quantidade importada desde que a importação não aumente continuamente o que não se supõe ser o caso no momento atual Se quando o consumo anual tiver se tornado igual à importação anual essa começar a diminuir gradualmente poderá durante algum ADAM SMITH 243 tempo haver um excesso de consumo anual sobre a importação anual O volume daqueles metais pode diminuir gradual e imperceptivelmente aumentando seu valor também gradual e imperceptivelmente até que tornandose a importação anual novamente estacionária o consumo anual gradualmente e de maneira imperceptível se ajuste àquilo que a importação anual puder manter FUNDAMENTOS PARA SUSPEITAR QUE O VALOR DA PRATA CONTINUA A DECRESCER O crescimento da riqueza da Europa e a idéia popular de que assim como a quantidade dos metais preciosos naturalmente aumenta com o crescimento da riqueza da mesma forma seu valor diminui na medida em que aumenta a quantidade dos mesmos pode talvez induzir muitos a pensar que o valor dos metais preciosos ainda continua a baixar no mercado europeu e o preço ainda gradualmente em aumento de muitos produtos naturais da terra pode confirmálos ainda mais nessa opinião Já procurei mostrar que esse aumento da quantidade dos metais preciosos que em todo país deriva do aumento da riqueza não tem nenhuma tendência a diminuir o valor deles O ouro e prata natural mente se canalizam para países ricos pela mesma razão que todos os tipos de artigos de luxo e novidades o fazem não porque lá sejam mais baratos do que em países mais pobres mas porque são mais caros porque se paga um melhor preço por eles É a superioridade dos preços que os atrai a esses países mais ricos e tão logo cesse tal superioridade os metais preciosos deixam de se encaminhar para lá Já procurei mostrar que se excetuarmos os cereais e outros ve getais cultivados inteiramente pelo trabalho humano todos os outros tipos de produtos naturais o gado as aves domésticas a caça de todos os tipos os fósseis e minerais úteis da terra etc naturalmente se tornam mais caros na medida em que a sociedade progride em riqueza e de senvolvimento Embora pois essas mercadorias possam ser trocadas por uma quantidade maior de prata do que antes disso não se conclui que a prata se tenha realmente tornado mais barata ou que permita comprar menos trabalho do que antes mas que tais mercadorias se tornaram efetivamente mais caras isto é têm condições para comprar mais trabalho do que antes Não é somente seu preço nominal mas seu preço real que sobe com o avanço do desenvolvimento O aumento de seu preço nominal é o efeito não de alguma desvalorização da prata mas do aumento de seu preço real EFEITOS DIFERENTES DO AVANÇO DO DESENVOLVIMENTO SOBRE TRÊS DIFERENTES TIPOS DE PRODUTOS NATURAIS Esses diversos tipos de produtos naturais podem ser divididos em três categorias A primeira engloba aqueles que dificilmente o tra OS ECONOMISTAS 244 balho humano pode multiplicar A segunda aqueles que o trabalho humano pode multiplicar em proporção à demanda A terceira aqueles em que a eficácia do trabalho para multiplicálos é limitada ou incerta Com o avanço da riqueza e do desenvolvimento o preço real dos pri meiros pode aumentar indefinidamente não parecendo ter limites fixos O preço real dos bens da segunda categoria embora possa aumentar muito tem um certo limite além do qual não pode passar conjunta mente durante um período considerável de tempo O preço real dos produtos da terceira categoria embora sua tendência natural seja au mentar com o avanço do desenvolvimento pode às vezes até cair no mesmo grau de desenvolvimento podendo às vezes continuar inalte rado e às vezes pode aumentar mais ou menos conforme eventos di versos tornem mais ou menos bemsucedidos os esforços humanos feitos no sentido de multiplicar esses produtos naturais Primeiro tipo de produto O primeiro tipo de produtos naturais cujo preço sobe na medida em que avança o desenvolvimento é aquele que dificilmente o trabalho humano pode multiplicar Consiste naquelas coisas que a natureza produz apenas em certas quantidades e que sendo elas de natureza muito perecível é impossível acumular a produção de diversas estações Tais são por exemplo a maior parte dos pássaros e peixes raros e únicos muitos tipos de caça quase todas as aves selvagens de caça todas as aves migratórias em particular bem como muitas outras coisas Ao crescer a riqueza e o luxo que costuma acompanhála pro vavelmente aumentará a demanda desses produtos e não há trabalho humano capaz de aumentar a oferta para muito além do que ela era antes desse aumento de demanda Permanecendo portanto inalterada ou quase inalterada a quantidade dessas mercadorias ao passo que aumenta continuamente a concorrência para comprálas seu preço pode subir a uma escala exorbitante e ao que parece sem limites Se as galinholas viessem a se tornar de tal modo requisitadas a ponto de serem vendidas por 20 guinéus o exemplar nenhum esforço humano seria capaz de aumentar o número de galinholas muito além do que ele é atualmente Isso explica o alto preço pago pelos romanos na época de seu maior esplendor por pássaros e peixes raros Esses preços não eram efeito do baixo valor da prata na época mas do alto valor dessas raridades e curiosidades que o homem não tem condições de multiplicar a seu belprazer Durante algum tempo antes e depois da queda da República o valor real da prata era maior em Roma do que é atualmente na maior parte da Europa O preço que a República pagava pelo modius ou celamim de trigo siciliano pago a título de dízimo era de 3 sestércios equivalentes a mais ou menos 6 pence Entretanto esse preço provavelmente estava abaixo do preço médio de mercado e a obrigação de os sicilianos fornecerem seu trigo a esse preço era considerada como uma taxa incidente sobre os agricultores ADAM SMITH 245 da Sicília Quando portanto os romanos precisavam encomendar mais trigo do que aquele a que se elevava o dízimo de trigo eram obrigados a pagar o excedente à taxa de 4 sestércios isto é 8 pence por celamim sendo que este era provavelmente considerado o preço moderado e razoável isto é o preço de contrato médio ou normal daqueles tempos equivalendo aproximadamente a 21 xelins o quarter Antes dos recentes anos de escassez 28 xelins o quarter era o preço normal de contrato do trigo inglês que em qualidade é inferior ao siciliano e geralmente se vende mais barato no mercado europeu Por isso o valor da prata nos tempos dos antigos romanos deve ter sido em relação ao seu valor atual como 3 está para 4 inversamente ou seja 3 onças de prata teriam então comprado a mesma quantidade de trabalho e de merca dorias que quatro onças compram hoje Quando portanto lemos em Plínio que Seio143 comprou um rouxinol branco de presente para a imperatriz Agripina ao preço de 6 mil sestércios equivalendo a mais ou menos 50 libras esterlinas de hoje e que Asínio Céler144 comprou um salmonete ao preço de 8 mil sestércios equivalentes a aproxima damente 66 13 s 4 d em nossa moeda corrente a extravagância desses preços por muito que nos possa deixar surpresos no entanto pode nos parecer cerca de um terço a menos do que realmente custou Seu preço real a quantidade de trabalho e de subsistência que se pagava por eles era aproximadamente um terço mais do que seu preço nominal pode constituir um símbolo para nós na época atual Seio pagou pelo rouxinol o comando de uma quantidade de trabalho e de subsistência igual ao que 66 13 s 4 d comprariam hoje e Asínio Céler pagou pelo salmonete uma quantidade igual à que hoje se com praria com 88 17 s 9 13 d A causa da exorbitância desses preços não foi a abundância da prata mas antes a abundância de trabalho e subsistência de que os romanos dispunham além do que era neces sário para seu próprio uso A quantidade de prata de que dispunham era muito menor do que aquela que o comando da mesma quantidade de trabalho e subsistência poderia proporcionarlhes atualmente Segundo tipo de produto O segundo tipo de produtos naturais cujo preço sobe com o avanço do desenvolvimento é aquele que o trabalho humano pode multiplicar em proporção à demanda Consiste naquelas plantas e animais úteis que em países não cultivados a natureza produz em tal profusão que são de pouco ou nenhum valor e que à medida em que o cultivo au menta são obrigados a ceder lugar a algum produto mais rentável Durante um longo período no processo de avanço do desenvolvimento a quantidade desses produtos diminui continuamente ao mesmo tempo OS ECONOMISTAS 246 143 Livro Décimo cap XXIX Seios parece ser resultado de uma má interpretação da palavra latina scio N do E inglês 144 Livro Nono capítulo XVII que cresce continuamente a demanda deles Por isso seu valor real a quantidade real de trabalho que podem comprar ou comandar au menta gradualmente acabando por tornarse tão alto que se torna um produto tão rentável como qualquer outra coisa que o trabalho humano pode cultivar na terra mais fértil e mais bem tratada Quando subiu tão alto não pode subir mais Se isso acontecesse mais terra e mais trabalho seriam logo empregados para aumentar sua quantidade Quando por exemplo o preço do gado aumenta ao ponto de ser rentável cultivar terra para alimentar gado tanto quanto seria ren tável cultivála para produzir alimento humano não pode subir mais Se subisse mais terra de trigo se transformaria logo em pastagem A ampliação da lavoura diminuindo a quantidade de pastagens agrestes faz diminuir a quantidade de carne de açougue que o país naturalmente produz sem trabalho e cultivo e faz aumentar o número daqueles que têm cereais ou o que dá no mesmo o preço de cereais para dar em troca pela carne de açougue aumentando também a demanda Por isso o preço da carne de açougue e conseqüentemente do gado deve subir gradualmente até tornarse tão alto que se torne tão aproveitável para empregar as terras mais férteis e melhor cultivadas na produção de alimento para o gado quanto no cultivo de trigo Mas é preciso muito avanço de desenvolvimento antes que o cultivo possa se estender a um ponto tal que aumente o preço do gado a esse teto e até esse ponto se o país estiver efetivamente progredindo seu preço deve au mentar continuamente Existem talvez algumas regiões em que o preço do gado ainda não alcançou esse teto Antes da União em parte alguma da Escócia isso havia ocorrido Se o gado escocês sempre tivesse sido limitado ao mercado da Escócia em um país em que a quantidade de terra que só pode ser utilizada para a alimentação do gado é tão grande em proporção às que podem ser utilizáveis para outros objetivos talvez dificilmente poderia ocorrer que o preço do gado jamais pudesse subir ao ponto de ser rentável cultivar terra para alimentálo Na Inglaterra como já se observou o preço do gado parece nas proximidades de Londres ter atingido esse teto por volta do início do último século porém provavelmente foi muito mais tarde que isso ocorreu na maior parte dos condados mais afastados sendo que em alguns deles talvez dificilmente chegou a atingir esse alto preço De todos os produtos de subsistência porém que integram esse segundo grupo de produtos naturais da terra o gado é talvez aquele cujo preço primeiro atinge esse teto com o avanço do desenvolvimento Com efeito até que o preço do gado tenha atingido esse ponto máximo dificilmente parece possível que a maior parte das terras mesmo das que comportam o cultivo máximo possam estar completa mente cultivadas Em todas as propriedades excessivamente distantes de uma cidade para transportar dali adubo ou seja na grande maio ria das terras de um país extenso a quantidade de terra bem cul tivada deve ser proporcional à quantidade de adubo que a própria propriedade produz e esta por sua vez deve ser proporcional à quan ADAM SMITH 247 tidade de gado mantido nela A adubação da terra se faz deixando o gado pastar na própria terra ou alimentandoo nos estábulos e carre gando o adubo dali para a terra Mas a menos que o preço do gado seja suficiente para pagar tanto a renda como o lucro da terra cultivada o agricultor não pode permitir que o gado paste na terra podendo ainda menos permitir que ele se alimente nos estábulos Somente com a produção da terra aprimorada e cultivada é possível alimentar o gado no estábulo pois exigiria muito trabalho e seria excessivamente dispendioso coletar o produto escasso e espalhado das terras desgas tadas e não cultivadas Se portanto o preço do gado não for suficiente para pagar a produção da terra aprimorada e cultivada quando se deixa o gado pastar esse preço será ainda menos suficiente para pagar aquele produto quando ele precisa ser coletado com muito trabalho adicional e levado ao estábulo Nessas circunstâncias portanto não se pode alimentar com lucro mais gado no estábulo do que o necessário para o cultivo Mas esse gado jamais tem condições de produzir adubo suficiente para conservar sempre em bom estado todas as terras que ele é capaz de cultivar O adubo que o gado produz sendo insuficiente para toda a propriedade será naturalmente reservado para as terras cuja adubação seja mais vantajosa as mais férteis ou talvez as loca lizadas nas proximidades de um pátio da propriedade Essas portanto serão constantemente mantidas em boas condições para a cultura O restante a maior parte delas será deixado sem adubação e trato e dificilmente produzirá outra coisa senão pastagens precárias sufi cientes apenas para manter vivas algumas errantes e famintas cabeças de gado acontecerá então que a propriedade embora muito carente e desprovida em proporção com o que seria necessário para seu cultivo completo muitas vezes está provida em excesso com relação à produção real Entretanto uma porção dessa terra não cultivada depois de ter servido como pastagem precária durante 6 ou 7 anos seguidos pode ser arada podendo então proporcionar talvez uma ou duas colheitas pobres de aveia ou de algum outro cereal inferior e depois disso in teiramente esgotada precisa ficar novamente em repouso e servir no vamente como pastagem como antes depois do que novamente a terra poderá ser arada para ser novamente esgotada e devolvida ao repouso Esse era antes da União o sistema geral de administração das pro priedades rurais na Escócia em todas as terras baixas As terras que eram continuamente mantidas bem adubadas e em boas condições de cultivo dificilmente ultrapassavam a terceira ou quarta parte da pro priedade e às vezes não chegavam à quinta ou à sexta parte O resto nunca era adubado mas uma certa parte delas era no entanto regu larmente cultivada e se exauria Sob esse sistema de administração evidentemente mesmo aquelas partes de terras da Escócia suscetíveis de bom cultivo não produziriam muito em comparação ao que poderiam produzir Todavia por mais desvantajoso que se considere esse sistema parece que antes da União o baixo preço do gado o tornou mais ou menos inevitável Se não obstante um grande aumento do preço do OS ECONOMISTAS 248 gado esse sistema continua vigente na maior parte do país sem dúvida isso se deve em muitos lugares à ignorância e ao apego aos velhos usos mas em muitos outros aos obstáculos inevitáveis que o curso natural das coisas opõe à implantação imediata ou rápida de um sis tema melhor em primeiro lugar à pobreza dos arrendatários ao fato de não se ter ainda tido tempo de adquirir uma quantidade de gado suficiente para cultivar a terra de modo mais completo o mesmo au mento do preço que lhes tornaria vantajosa a manutenção de uma maior quantidade tomandolhes mais difícil adquirila e em segundo lugar por não terem ainda tido tempo de colocar suas terras em con dições de manter devidamente essa maior quantidade na suposição de que sejam capazes de adquirila O aumento da quantidade de gado e o aprimoramento da terra são duas coisas que devem andar de mãos dadas sendo que uma nunca pode avançar mais que a outra Sem algum aumento da quantidade de gado dificilmente poderá haver qual quer melhoria da terra mas só pode haver um aumento considerável da quantidade de gado apenas em conseqüência de um melhoramento considerável da terra porque de outra maneira a terra não poderia mantêlo Esses obstáculos naturais à implantação de um sistema me lhor só podem ser eliminados por um longo período de economia e trabalho talvez seja necessário meio século ou um século inteiro para ficar totalmente abolido no país inteiro o velho sistema que se está desgastando progressivamente Ora de todas as vantagens comerciais auferidas pela Escócia de sua união com a Inglaterra esse aumento do preço do gado talvez seja a maior Isso não somente fez aumentar o valor de todas as propriedades da Alta Escócia como também constituiu talvez a causa principal do desenvolvimento das terras da Baixa Escócia Em todas as colônias novas a grande quantidade de terras in cultas que durante muitos anos não podem ser utilizadas para outra coisa senão a criação de gado logo torna extremamente abundante o gado e seus preços baixos são a conseqüência necessária da sua grande abundância Embora todo o gado das colônias européias na América tenha inicialmente vindo da Europa logo ele se multiplicou tanto lá e seu valor se tornou tão baixo que mesmo os cavalos andavam soltos nas florestas sem que algum proprietário considerasse valer a pena reclamar sua posse Deve passar muito tempo após a fundação dessas colônias antes que se torne rentável alimentar gado com o produto das terras cultivadas Por conseguinte as mesmas causas a falta de adubo e a desproporção entre a quantidade de gado empregado no cultivo e a terra que o gado precisa cultivar provavelmente levarão a introduzir no local um sistema agrícola não muito diferente do que continua a funcionar em tantas regiões da Escócia O viajante sueco Sr Kalm ao referirse à agricultura de algumas colônias inglesas na América do Norte tal como as viu em 1749 observa que dificilmente conseguiu lá descobrir as características da nação inglesa tão habili dosa em todos os setores agrícolas Dificilmente adubam seus campos de trigo diz ele quando uma área de terra está esgotada por colheitas ADAM SMITH 249 contínuas roçam e cultivam uma outra extensão de terra virgem e quando esta também se esgota fazem o mesmo com uma terceira Deixam seu gado andar solto pelas florestas e outros solos não culti vados onde o gado vive esfomeado tendo há muito tempo arrancado quase todo o capim anual cortandoo muito cedo na primavera antes que pudesse florescer e dar sementes145 Ao que parece o capinzal anual era o melhor naquela região da América do Norte e quando os europeus lá chegaram ficandose pela primeira vez esses capinzais eram muito densos atingindo a altura de 3 ou 4 pés Uma área de terra que quando o autor escreveu não era suficiente para manter uma vaca anteriormente como foi informado tinha condições de manter quatro sendo que cada uma delas teria dado o quádruplo da quantidade de leite de uma Em sua opinião a pobreza das pastagens gerou o deterioramento do gado o qual degenerou sensivelmente de uma geração para outra O gado de lá provavelmente se assemelhava a essa raça decaída que era comum em toda a Escócia há trinta ou quarenta anos atrás e que agora está tão melhorada na maior parte da região baixa da Escócia não tanto por mudança de raça embora este meio tenha sido empregado em alguns lugares mas antes me diante um método mais completo de alimentação Embora portanto se requeira um período de desenvolvimento considerável para que o gado atinja um preço que torne rentável o cultivo de terras para alimentálo talvez se possa afirmar que de todos os produtos naturais que compõem a segunda categoria o gado é talvez o primeiro a atingir tal preço compensador antes que isso aconteça parece impossível que o desenvolvimento possa atingir sequer aquele grau de perfeição que atingiu em muitas regiões da Europa Se o gado está entre os primeiros talvez o veado esteja entre as últimas categorias dessa espécie de produção rústica que atingem tal preço O preço da carne de veado na GrãBretanha por mais exorbi tante que possa parecer nem sequer é suficiente para compensar a despesa de uma criação de cervídeos como sabem muito bem todos os que têm alguma experiência nesse setor Se não fosse assim a ali mentação de cervos logo se tornaria um negócio generalizado da mesma forma como ocorria entre os antigos romanos com a alimentação desses pequenos pássaros chamados turdídeos Varrão e Columela garantem nos que se tratava de um negócio altamente rendoso Afirmase que em algumas regiões da França é bom negócio engordar hortulanas aves migratórias que chegam magras ao país Se a caça ao veado con tinuar na moda e se a riqueza e o luxo continuarem a aumentar na GrãBretanha como aconteceu durante algum tempo no passado é muito provável que seu preço suba ainda muito mais do que atualmente Entre o período de avanço do desenvolvimento que eleva ao má ximo o preço de um artigo tão necessário como o gado e aquele que OS ECONOMISTAS 250 145 KALM Travels v I pp 343344 faz o mesmo com a carne de cervo artigo tão supérfluo há um intervalo muito grande no decurso do qual muitos outros tipos de produtos brutos atingem gradualmente seu preço máximo alguns mais cedo e outros mais tarde de acordo com circunstâncias diferentes Assim em toda propriedade rural os restos dos celeiros e está bulos manterão certo número de aves domésticas Pelo fato de serem estas alimentadas com coisas que de outra forma se perderiam cons tituem uma medida de economia e já que pouco ou nada custa sua criação o agricultor pode vendêlas a preço muito baixo Quase tudo o que ele obtém da venda é ganho líquido sendo que o preço dificilmente será tão baixo que desestimule a criar esse número Em países mal cultivados e portanto pouco povoados as aves domésticas criadas sem despesas muitas vezes são plenamente suficientes para atender a toda a demanda Nessa situação muitas vezes são tão baratas como a carne de açougue ou qualquer outro tipo de alimento animal En tretanto a quantidade total de carne de aves domésticas que a pro priedade produz sem despesas deve sempre ser muito inferior à quan tidade de carne de açougue produzida na respectiva propriedade e em épocas de riqueza e luxo o que é raro em paridade de mérito sempre é preferida àquilo que é comum Já que portanto a riqueza e o luxo aumentam em conseqüência do aprimoramento e do cultivo da terra o preço da carne de aves domésticas aos poucos supera o preço da carne de açougue até atingir um ponto em que se torna rentável cul tivar terra para criar tais aves Quando se atinge esse preço dificil mente ele pode subir mais E se subisse maiores áreas de terra seriam empregadas para isso Em várias províncias da França a criação de aves domésticas é considerada como um item muito importante na economia rural além de suficientemente rendoso para encorajar a cul tivar uma quantidade considerável de milho e trigo mourisco para esse fim Um proprietário médio poderá às vezes manter quatrocentas aves em seu galinheiro Na Inglaterra a criação de aves domésticas dificil mente chega a ser considerada geralmente como coisa de grande im portância Certamente porém são mais caras na Inglaterra do que na França já que a Inglaterra importa quantidades consideráveis da França Com o avanço do desenvolvimento o período no qual cada tipo de carne animal é mais caro deve naturalmente ser aquele que precede imediatamente a prática geral de cultivar terra para criar o respectivo tipo de animal Pois algum tempo antes que essa prática se generalize a escassez necessariamente fará subir o preço Depois de se generalizar costumase introduzir novos métodos de criação e alimentação os quais possibilitam auferir da mesma quantidade de terra uma quantidade muito maior do tipo específico de animal A abundância não somente obriga o agricultor a vender mais barato senão que também em con seqüência desses aprimoramentos ele pode permitirse vender mais barato pois se não o pudesse a abundância não seria de longa duração Foi provavelmente dessa maneira que a introdução de trevo nabos cenouras repolhos etc contribui para fazer o preço normal da carne ADAM SMITH 251 de açougue no mercado londrino descer algo abaixo do que era por volta do início do século passado O porco que encontra seu alimento no esterco e devora avida mente muitas coisas rejeitadas por qualquer outro animal útil também é originalmente mantido como uma medida de economia da mesma forma que as aves domésticas Enquanto o número de tais animais que podem ser assim criados com pouca ou nenhuma despesa for ple namente suficiente para atender à demanda este tipo de carne de açougue se vende a um preço muito mais baixo que qualquer outra carne de açougue Mas quando a demanda ultrapassa essa quantidade quando se torna necessário conseguir alimento para engordar porcos da mesma maneira que para alimentar e engordar gado o preço ne cessariamente sobe e se torna proporcionalmente mais alto ou mais baixo do que outras carnes de açougue conforme a natureza do país e o estado da sua agricultura tornarem a criação de porcos mais cara ou mais barata do que a de outros tipos de animais Segundo o Sr Buffon na França o preço da carne de porco é quase igual à de boi Na maior parte da GrãBretanha é atualmente um pouco mais cara O grande aumento do preço dos porcos e das aves domésticas tem sido freqüentemente atribuído na GrãBretanha à diminuição do número de aldeões e de outros pequenos sitiantes evento este que em toda a Europa foi o precursor imediato do desenvolvimento e do melhor cultivo mas que ao mesmo tempo pode haver contribuído para elevar o preço desses artigos porém um pouco antes e um pouco mais rapidamente do que de outra forma teria subido Assim como a família mais pobre pode muitas vezes manter um gato ou um cachorro sem nenhuma despesa da mesma forma os sitiantes mais pobres têm con dições para manter algumas aves domésticas ou uma porca e alguns porcos com muito pouca despesa Os pequenos restos de sua própria mesa o leite desnatado e o leiteiro fornecem uma parte da alimentação desses animais sendo que o resto podem encontrálo nos campos vi zinhos sem causarem prejuízo sensível a ninguém Ao diminuir o nú mero desses pequenos sitiantes portanto a quantidade desse tipo de mantimento produzido com pouca ou nenhuma despesa deve certa mente haver diminuído bastante e conseqüentemente seu preço deve haver aumentado antes e mais rapidamente do que teria ocorrido de outra forma Mais cedo ou mais tarde porém à medida em que avança o desenvolvimento o preço deve ter subido ao máximo possível ou seja ao ponto em que ele paga a mãodeobra e a despesa necessária para cultivar a terra que proporciona alimento a esses animais com a mesma compensação que na maior parte das outras terras cultivadas O negócio dos laticínios similarmente à criação de porcos e aves domésticas de início é feito como medida de economia O gado neces sariamente mantido em uma propriedade rural produz mais leite do que o necessário para a alimentação das crias e o consumo da família do criador sendo que em determinada estação a produção atinge o máximo Mas de todos os produtos da terra o leite talvez seja o mais OS ECONOMISTAS 252 perecível No verão quando sua abundância é maior dificilmente ele se conserva por vinte e quatro horas O agricultor ao transformálo em manteiga fresca estoca uma parte dele para uma semana e trans formandoo em manteiga salgada conservao por um ano fazendo quei jo conserva uma parcela muito maior de leite por vários anos Uma parte disto é reservada para o uso da própria família O resto é co mercializado à procura do melhor preço que se possa obter e que dificilmente pode ser tão baixo ao ponto de desestimular o agricultor a colocar no mercado o que além disso não é utilizado para o consumo de sua própria família Com efeito se o preço for muito baixo ele provavelmente administrará seus laticínios de forma muito desleixada e sem higiene e dificilmente achará que vale a pena manter um espaço ou construção específica para este fim contentandose em fazer a man teiga o queijo etc no meio de fumaça fuligem e sujeira de sua própria cozinha como acontecia em quase todos os laticínios de agricultores da Escócia 30 ou 40 anos atrás e como ocorre ainda hoje em muitos deles As mesmas causas que gradualmente fazem subir o preço da carne de açougue isto é o aumento da demanda e em conseqüência do aprimoramento da terra a diminuição da quantidade de animais que podem ser criados com pouca ou nenhuma despesa fazem subir igualmente o preço dos laticínios que naturalmente está ligado ao da carne de açougue ou à despesa de manutenção do gado O aumento do preço paga maior quantidade de trabalho de cuidado e de limpeza O negócio se torna mais convidativo para o agricultor melhorando gradualmente a qualidade do produto Ao final o preço sobe tanto que vale a pena empregar uma parte das terras mais férteis e melhor cultivadas para criar gado somente para comercializar laticínios quan do o preço chegou a essa altura dificilmente poderá aumentar E se aumentasse logo se destacaria mais terra para este fim Parece que o preço chegou a essa altura na maior parte da Inglaterra onde se costuma utilizar muitas áreas de boa terra para tal finalidade Se excetuarmos os arredores de algumas cidades grandes parece que ainda não se chegou a esse teto em nenhum lugar da Escócia onde os agri cultores comuns raramente empregam terra boa para plantar alimento para o gado visando somente a comercialização dos laticínios Embora o preço desses produtos tenha aumentado consideravelmente nesses poucos anos provavelmente ainda é muito baixo para que isso seja admitido Com efeito a inferioridade da qualidade comparada à en contrada nos laticínios ingleses é perfeitamente igual à inferioridade do preço Mas esta inferioridade da qualidade talvez seja mais efeito do baixo preço do que sua causa Mesmo que a qualidade fosse muito melhor penso que a maior parte do que pode ser levado ao mercado não poderia nas atuais circunstâncias do país ser vendida a um preço muito melhor sendo provável que o preço atual não pagaria a despesa da terra e da mãodeobra necessária para produzir uma qualidade muito superior Na maior parte da Inglaterra apesar da superioridade do preço o negócio dos laticínios não é considerado como um emprego ADAM SMITH 253 mais rendoso da terra do que o cultivo de cereais ou a engorda de gado os dois grandes objetivos da agricultura Portanto na maior parte da Escócia muito menos esse negócio já pode ser considerado como particularmente rendoso Evidentemente em nenhum país as terras podem ser completa mente cultivadas e aprimoradas antes que o preço de cada produto nelas cultivado seja tão compensador que pague a despesa de todo o melhoramento e cultivo Para isto o preço de cada produto específico deve ser suficiente em primeiro lugar para pagar a renda de uma boa terra para cereais já que é esta que regula a renda da maior parte de outras terras cultivadas em segundo lugar deve ser suficiente para pagar a mãodeobra e as despesas do arrendatário com a mesma compensação garantida por uma terra em que se cultivam cereais em outras palavras o preço do produto deve ser suficiente para repor juntamente com o lucro normal o capital empregado na terra pelo arrendatário Evidentemente este aumento do preço de cada produto específico deve anteceder ao aprimoramento e ao cultivo da terra des tinada a cultiválo O ganho é o objetivo de toda melhoria e uma coisa cuja conseqüência necessária fosse o prejuízo não mereceria o nome de melhoria ou aprimoramento Ora o prejuízo seria a conseqüência necessária do aprimoramento de uma terra se feito para produzir uma coisa cujo preço nunca pudesse cobrir os custos da melhoria implantada Se o aprimoramento e o cultivo constituírem como certamente cons tituem a maior vantagem pública esse aumento do preço de todos os tipos de produtos naturais da terra ao invés de ser considerado calamidade pública deve ser visto como o precursor necessário e res ponsável pelas maiores de todas as vantagens públicas Esse aumento do preço nominal ou em dinheiro desses diversos tipos de produtos naturais da terra foi o efeito não de uma perda de valor da prata mas de um aumento de seu próprio preço real Passaram a valer não somente uma quantidade maior de prata mas também uma quantidade maior de trabalho e de alimentos do que antes Assim como custa mais trabalho e mais alimentos para colocálos no mercado da mesma forma quando lá chegam representam ou são equivalentes a uma quantidade maior Terceiro tipo de produto O terceiro e último tipo de produtos naturais da terra cujo preço naturalmente sobe com o avanço do desenvolvimento é aquele no qual é limitada ou incerta a eficácia do trabalho humano para aumentar a quantidade dos mesmos Embora pois o preço real desse tipo de produtos naturais tenda a aumentar com o avanço do desenvolvimento todavia como diversos eventos podem tornar os esforços do trabalho humano mais ou menos bemsucedidos no sentido de aumentar a quantidade pode às vezes acontecer que essa quantidade caia às vezes para continuar a OS ECONOMISTAS 254 mesma em períodos muito diferentes de aprimoramento e outras vezes aumente em maior ou menor grau no mesmo período Há alguns tipos de produtos naturais que a natureza fez como uma espécie de acessórios de outros tipos de produtos de forma que a quantidade de um que o país pode produzir seja necessariamente limitada pela quantidade de outro Por exemplo a quantidade de lã ou de couro cru que um país pode produzir é necessariamente limitada pelo número grande ou pequeno de cabeças de gado que ele mantém Por sua vez este número é determinado pelo estágio de aprimoramento e pela natureza de sua agricultura Poderseia pensar que as mesmas causas que na medida em que avança o desenvolvimento aumentam gradualmente o preço da carne de açougue deveriam ter o mesmo efeito sobre os preços da lã e dos couros e que devessem fazêlos subir também nas mesmas pro porções Isso provavelmente seria assim se nos estágios iniciais e pri mitivos do desenvolvimento o mercado dessas últimas mercadorias fosse tão limitado quanto o das primeiras Ocorre porém que a extensão de seus respectivos mercados costuma ser extremamente diferente O mercado de carne de açougue é em toda parte mais ou menos confinado ao país que a produz Com efeito a Irlanda e uma parte da América britânica mantêm um comércio considerável de manti mentos salgados acredito porém que sejam os únicos países do mundo comercial que façam isto isto é que exportam a outros países uma parte considerável de sua carne de açougue Ao contrário o mercado da lã e dos couros crus muito raramente está nos estágios iniciais do desenvolvimento limitado ao país que os produz Podem ser facilmente transportados a países distantes a lã sem preparo algum e o couro cru com muito pouco preparo e por constituírem a matériaprima para muitos manufaturados outros paí ses podem ter demanda deles mesmo que a indústria do país que os produz não tenha nenhuma Em países mal cultivados e portanto pouco habitados o preço da lã e dos couros mantém sempre uma proporção muito maior em relação ao animal inteiro do que em países onde devido ao estágio mais avançado do desenvolvimento agrícola e populacional há mais demanda de carne de açougue O Sr Hume observa que no tempo dos saxões o velo era calculado a 25 do valor da ovelha inteira e que isto estava muito acima do cálculo atual Foime assegurado que em algu mas províncias da Espanha matase a ovelha simplesmente por causa do velo e do sebo Deixase muitas vezes a carcaça do animal apodrecer no chão ou então deixase que seja devorada por animais e aves de rapina Se isso acontece por vezes até na Espanha ocorre quase cons tantemente no Chile em Buenos Aires e em muitas outras regiões da América espanhola onde o gado de chifre quase sempre é abatido simplesmente em função do couro e do sebo Isso costumava acontecer quase sempre em Hispaniola quando infestada pelos piratas antes que a implantação o aprimoramento e a abundância das plantações ADAM SMITH 255 francesas que hoje se estendem em torno da costa de toda a metade ocidental da ilha dessem algum valor ao gado dos espanhóis que ainda possuem uma parte não somente a parte oriental da costa mas também todo o interior e a parte montanhosa da região Embora com o avanço de desenvolvimento e com o crescimento populacional aumente necessariamente o preço de todos os animais o preço da carcaça tem probabilidade de ser muito mais afetado por esse aumento do que o da lã e o do couro Pelo fato de estar o mercado da carcaça sempre limitado ao país produtor no estágio primitivo da so ciedade ele necessariamente se estende em proporção ao aprimora mento e à população do país Mas já que o mercado da lã e dos couros mesmo em um país primitivo muitas vezes se estende a todo o mundo comercial muito raramente ele pode ser ampliado na mesma proporção A situação de todo o mundo comercial raramente pode ser muito afetada pelo aprimoramento de um país específico e o mercado para tais mer cadorias pode permanecer o mesmo ou mais ou menos o mesmo que antes depois desse desenvolvimento Pelo curso natural das coisas porém deveria de modo global ser levemente ampliado em conse qüência dele Sobretudo se especialmente as manufaturas das quais aquelas mercadorias constituíssem a matériaprima florescessem no país seu mercado embora talvez não fosse muito ampliado estaria mais próximo do que antes e seu preço poderia ser no mínimo aumen tado na proporção daquilo que costumeiramente era a despesa de trans portálos a países distantes Embora portanto o preço talvez não au mentasse na mesma proporção que o da carne de açougue deveria naturalmente aumentar em algo e certamente não deveria baixar Na Inglaterra a despeito do estado florescente de sua manufatura de lã o preço da lã inglesa caiu consideravelmente desde o tempo de Eduardo III Há muitos documentos autênticos demonstrando que du rante o reinado desse príncipe em meados do século XIV ou em torno de 1339 o que se considerava como preço razoável do tod isto é vinte e oito libras peso de lã inglesa era nada menos de 10 xelins do dinheiro da época146 contendo à taxa de 20 pence por onça 6 onças de prata peso Tower equivalentes a mais ou menos 30 xelins em dinheiro de hoje Atualmente 2 xelins por tod pode ser considerado como um bom preço para a lã inglesa de primeira qualidade Portanto o preço da lã em dinheiro na época de Eduardo III estava para o seu preço atual em dinheiro como 10 está para 7 A superioridade de seu preço real era ainda maior À taxa de 6 xelins e 8 pence o quarter 10 xelins eram naquela época o preço de 12 bushels de trigo À taxa de 28 xelins o quarter 21 xelins é atualmente o preço de apenas 6 bushels Portanto a proporção entre os preços reais de então e de agora é como 12 para 6 ou 2 para 1 Nessa época antiga um tod de lã teria comprado o dobro da quantidade de mantimentos que compraria hoje e conse OS ECONOMISTAS 256 146 Ver SMITH Memoirs of Wool v I capítulos V VI e VII também v II capítulo CLXXVI qüentemente o dobro da quantidade de trabalho se a remuneração real da mãodeobra tivesse sido a mesma nas duas épocas Essa baixa do preço tanto do real como do nominal da lã jamais poderia ter ocorrido em conseqüência do curso normal das coisas Foi portanto efeito da violência e do artifício primeiro da proibição absoluta de exportar lã da Inglaterra segundo da permissão de im portála da Espanha com isenção de imposto terceiro da proibição de exportála da Irlanda para qualquer outro país que não fosse a Inglaterra Em decorrência desses regulamentos o mercado da lã in glesa em vez de ampliar um pouco em conseqüência do desenvolvi mento da Inglaterra temse confinado ao mercado interno onde se permite à lã de vários outros países concorrer com ela e onde a lã irlandesa é obrigada a concorrer com ela Já que também a manufatura de lã da Irlanda está tão completamente desestimulada quanto con seqüente com a justiça e a honestidade dos negócios os irlandeses podem elaborar no país apenas uma pequena parte de sua lã sendo portanto obrigados a enviar uma quantidade maior à GrãBretanha único mercado em que lhe é permitido vendêla Não tenho conseguido encontrar documentação autêntica similar no tocante ao preço dos couros crus nos tempos antigos A lã costumava ser paga como um subsídio ao rei e o valor deste subsídio nos dá certeza ao menos até certo grau sobre o preço comum então vigente Mas isto não parece ter sido o caso do couro cru Entretanto Fleetwood baseado em prestação de contas de 1425 entre o prior de Burcester Oxford e um de seus cônegos nos indica os preços ao menos como eram naquela ocasião específica ou seja 5 couros de boi a 12 xelins 5 couros de vaca a 7 xelins e 3 pence 36 peles de ovelha de dois anos de idade a 9 xelins 16 peles de bezerro a 2 xelins Em 1425 12 xelins continham aproximadamente a mesma quantidade de prata que 24 xelins de hoje Portanto um couro de boi segundo esse cálculo valia a mesma quantidade de prata que hoje valem 4 45 xelins do nosso dinheiro atual Seu preço nominal era bastante mais baixo que o de hoje Mas à taxa de 6 xelins e 8 pence o quarter 12 xelins daquela época poderiam comprar 14 45 bushels de trigo os quais a 3 xelins e 6 pence o bushel atualmente custariam 51 xelins e 4 pence Um couro de boi portanto compraria na época uma quantidade de trigo correspondente ao que hoje se compraria com 10 xelins e 3 pence Seu valor era igual a 10 xelins e 3 pence do nosso dinheiro atual Naquela época quando o gado quase morria de fome na maior parte do inverno não podemos supor que o gado tivesse um tamanho muito grande Um couro de boi que pesa 4 stone147 de 16 libras avoirdupois não é hoje considerado como ruim e naquela época provavelmente era ADAM SMITH 257 147 Unidade de peso usada na Inglaterra em geral equivalente a 14 libras avoirdupois O sistema avoirdupois era usado para todo tipo de mercadoria e nele 1 libra correspondia a 16 onças e não a 12 como no sistema troy empregado para metais e pedras preciosas N do E considerado como um couro muito bom Entretanto a meia coroa por stone que neste momento fevereiro de 1773 entendo ser o preço habitual tal couro custaria hoje apenas 10 xelins Portanto apesar de seu preço nominal ser mais alto hoje do que era nessa época antiga seu preço real isto é a quantidade real de mantimentos que pode comprar ou comandar é algo mais baixo O preço dos couros de vaca como estão documentados na referida prestação de contas está quase na proporção normal com o dos couros de boi O das peles de ovelha está bastante acima dos de boi pois provavelmente eram vendidos com a lã Ao contrário o preço das peles de bezerro estava bem abaixo das de boi Nos países em que o preço do gado é muito baixo os bezerros que não se pretende criar para manter o rebanho geralmente são abatidos em idade muito tenra como se fazia na Escócia há 20 ou 30 anos atrás Isto representa economia de leite que o preço dos bezerros não seria suficiente para pagar Por isso suas peles geralmente não valem quase nada O preço dos couros é bastante mais baixo hoje do que era alguns anos atrás provavelmente devido à supressão do imposto sobre peles de foca e por causa da permissão para um tempo limitado da im portação sem imposto de couros da Irlanda e das colônias feita em 1769 Considerando o total deste século como média o preço real dos couros provavelmente tem sido um pouco superior ao que foi na época A natureza dessa mercadoria não a torna tão indicada para transporte a mercados longínquos como ocorre com a lã Os couros sofrem mais com a conservação Um couro salgado é considerado inferior a um fresco vendendose por preço mais baixo Esta circunstância deve necessariamente influir no sentido de baixar o preço dos couros crus produzidos em um país que os manufatura Deve ter alguma tendência a fazer baixar seu preço em um país primitivo e a aumentálo em um país aperfeiçoado e manufatureiro Por isso deve ter tido alguma tendência a fazer baixar o preço antigamente e a aumentálo nos tempos modernos Além disso nossos curtidores não têm tido tanto sucesso como nossos fabricantes de roupas levando o bom senso geral a acreditar que a segurança da comunidade do reino depende da prosperidade de sua manufatura Por esse motivo têm sido muito menos favorecidos Com efeito foi proibida a exportação de couros sendo considerada como um prejuízo enquanto que sua importação de países estrangeiros tem sido sujeita a imposto aduaneiro e embora este imposto tenha sido suprido em se tratando de couros importados da Irlanda e das colônias somente para o tempo limitado de cinco anos apesar disso a Irlanda não foi obrigada a limitar à GrãBretanha a venda de seu excedente de couros isto é os que não são manufaturados no país Os couros de gado comum dentro desses poucos anos foram enquadrados entre as mercadorias que as colônias só podem exportar para a mãepátria nem o comércio da Irlanda foi até agora oprimido neste caso a fim de ajudar as manu faturas da GrãBretanha OS ECONOMISTAS 258 Todas as medidas que tendem a fazer baixar o preço da lã ou dos couros abaixo do que seria o preço natural devem em um país desenvolvido e cultivado tender de alguma forma a aumentar o preço da carne de açougue O preço do gado de grande e pequeno porte que é criado em terras trabalhadas e cultivadas deve ser suficiente para pagar ao proprietário da terra a renda e ao locatário o lucro que têm o direito de esperar de uma terra tratada e cultivada Se assim não for logo deixarão de criar gado Ora toda parcela desse preço que não for paga pela lã e pelo couro deve ser paga pela carcaça Quanto menos se pagar pela lã e pelo couro tanto mais se deverá pagar pela carne Desde que o dono da terra e o arrendatário recebam o preço devido não lhes interessa de que maneira os componentes do preço são subdivididos entre a lã o couro e a carne Por isso em um país onde as terras são trabalhadas e cultivadas tanto o interesse dos pro prietários da terra como o dos arrendatários não pode ser muito afetado por esses detalhes embora isto lhes interesse como consumidores de vido ao aumento do preço dos mantimentos Seria completamente di ferente no entanto em um país não desenvolvido e não cultivado onde a maior parte das terras só pudessem servir para criar gado e onde a lã e o couro constituíssem a parcela principal do valor do gado Neste caso o interesse dos proprietários das terras e dos arrendatários seria profundamente afetado por essas regulamentações ao passo que seu interesse como consumidores seria muito pouco afetado A queda do preço da lã e do couro nesse caso não haveria de gerar aumento do preço da carcaça porque com a maior parte das terras sendo utilizadas apenas para criar gado o mesmo número de cabeças continuaria a ser mantido Continuaria sendo igual a quantidade de carne de açougue colocada no comércio A demanda de carne de açougue não seria maior do que antes e portanto seu preço seria o mesmo que antes O preço total do gado diminuiria e com isto tanto a renda do proprietário como o lucro do arrendatário de todas as terras em que o gado fosse o produto principal isto é da maior parte das terras do país A proibição perpétua de exportar lã que se costuma muito erroneamente atribuir a Eduardo III nas circunstâncias de então teria representado a medida mais destrutiva que se teria podido imaginar Não somente teria re duzido o valor efetivo da maior parte das terras do reino senão que reduzindo o preço do mais importante tipo de gado de pequeno porte teria retardado muito seu subseqüente aprimoramento A lã da Escócia perdeu muito de preço em conseqüência da união com a Inglaterra que a excluiu do grande mercado da Europa ficando confinada ao limitado mercado da GrãBretanha O valor da maioria das terras dos condados do sul da Escócia que são sobretudo uma região de ovelhas teria sido profundamente afetado por tal evento se o aumento do preço da carne de açougue não tivesse compensado ple namente a queda do preço da lã Assim como é limitada a eficácia do empenho humano em au mentar a quantidade de lã e de couros na medida em que depende ADAM SMITH 259 da produção do país da mesma forma ela é incerta na medida em que depende da produção de outros países Ela depende não tanto da quantidade que produzem senão mais da quantidade que não manu faturam bem como das restrições que esses países possam considerar oportuno impor ou não à exportação desse tipo de produto natural Essas circunstâncias pelo fato de independerem totalmente do trabalho e dos esforços internos necessariamente fazem com que a eficácia dos esforços feitos no país seja mais ou menos incerta Ao multiplicar portanto esse tipo de produto natural a eficácia dos esforços internos da nação além de ser limitada é incerta Existe um outro tipo importante de produto natural o peixe cuja quantidade comercializada é igualmente limitada e incerta Ela é limitada pela situação local do país pela proximidade ou distância que separa do mar suas diversas províncias pelo número de seus lagos e rios e pelo que pode ser chamado de fertilidade ou esterilidade desses mares lagos e rios no tocante a peixes Na medida em que a população aumenta na medida em que a produção da terra e a mãodeobra do país aumentam sempre mais crescerá o número de compradores de peixe compradores esses que por sua vez terão maior quantidade e variedade de outros bens ou o que dá no mesmo o preço de uma maior quantidade e variedade de outros bens com que comprar peixe Por outro lado de modo geral será impossível suprir o grande e amplo mercado sem empregar uma quantidade de mãodeobra maior do que a que se exigiria para suprir um mercado limitado e confinado Um mercado que antes exigia apenas mil toneladas de peixe e agora passa a exigir 10 mil toneladas raramente poderá ser atendido sem empregar mais de 10 vezes a quantidade de mãodeobra até então suficiente para suprilo Normalmente o peixe deve ter trazido de uma distância maior devendose empregar embarcações maiores e utilizar máquinas mais dispendiosas de todos os tipos É pois natural que o preço real desta mercadoria aumente na medida em que cresce o de senvolvimento Efetivamente isto aconteceu mais ou menos em todos os países segundo acredito Embora o êxito de um dia de pesca possa ser muito incerto talvez se pense que supondose a situação local do país seja suficien temente certa a eficácia do trabalho empreendido para colocar no mer cado uma determinada quantidade de peixe considerandose um ano inteiro ou vários anos seguidos e sem dúvida assim é Mas já que depende mais da situação local do país do que de sua condição de riqueza e de trabalho já que por este motivo o sucesso pode em países diferentes ser o mesmo em períodos de desenvolvimento muito distintos e muito diferente no mesmo período sua conexão com o estado de desenvolvimento é incerta sendo desse tipo de incerteza de que estou falando Para aumentar a quantidade dos diversos minerais e metais ex traídos das entranhas da terra sobretudo em se tratando em particular OS ECONOMISTAS 260 dos metais mais preciosos a eficácia do trabalho humano não parece ser limitada mas sim totalmente incerta A quantidade de metais preciosos que se pode encontrar em um país não é limitada por algo existente em sua situação local como seria a riqueza ou a pobreza de suas próprias minas Esses metais muitas vezes abundam em países que não possuem minas Sua quan tidade em cada país específico parece depender de duas circunstâncias primeiro de seu poder de compra do estado de sua indústria da pro dução anual de sua terra e de sua mãodeobra em conseqüência do que pode permitirse empregar uma quantidade maior ou menor de mãodeobra e mantimentos para trazer ou comprar esses artigos su pérfluos como ouro e prata de suas próprias minas ou das de outros países em segundo lugar depende da riqueza ou pobreza das minas que em determinado momento fornecem esses metais ao mundo co mercial A quantidade desses metais nos países mais distantes das minas deve ser mais ou menos afetada por essa riqueza ou pobreza devido ao transporte fácil e barato dos metais de seu pequeno volume e grande valor Sua quantidade na China e no Industão deve ter sido mais ou menos afetada pela riqueza das minas da América Na medida em que a sua quantidade em determinado país de pende da primeira das duas circunstâncias mencionadas o poder de compra o preço real dos metais como o de todos os artigos de luxo e supérfluos provavelmente sobe com a riqueza e o desenvolvimento do país e baixa com sua pobreza e recessão Países que dispõem de uma grande quantidade de mãodeobra e de mantimentos em excesso podem permitirse comprar qualquer quantidade desses metais às ex pensas de uma quantidade maior de mãodeobra e de mantimentos do que países que têm menos excedente Na medida em que a quantidade desses metais em determinado país depende da segunda circunstância citada a riqueza ou pobreza das minas que suprem o mundo comercial seu preço real a quantidade real de mãodeobra e de mantimentos que poderão comprar ou dar em troca certamente baixará mais ou menos em proporção à riqueza das minas e aumentará em proporção à sua pobreza Todavia a riqueza ou pobreza das minas que eventualmente em um determinado país suprem o mundo comercial é uma circunstância que como é evidente pode não ter nenhuma conexão com o estado da indústria em um país Parece até não ter nenhuma conexão necessária com o estado da indústria do mundo em geral Com efeito como as artes e o comércio gradualmente se espalham cada vez mais pela terra a busca de novas minas por estenderse a uma área maior pode ter mais chance de sucesso do que quando está circunscrita a limites mais estreitos Todavia a descoberta de novas minas quando as velhas vão se esgotando gradualmente é algo que está sujeito ao grau máximo de incerteza não havendo habilidade ou engenho humano que possa assegurar isto Reconhecidamente todas as indicações são duvidosas sendo que a descoberta efetiva e a exploração bemsucedida de uma ADAM SMITH 261 nova mina são as únicas coisas que podem proporcionar certeza sobre a realidade de seu valor ou até de sua existência Nessa busca parece não existir nenhum limite certo nem para a possibilidade de sucesso do empenho humano nem para a possibilidade de uma decepção No decurso de um ou dois séculos é possível que sejam descobertas novas minas mais ricas do que todas as que se conheceram até então mas igual é também a possibilidade de que a mina mais rica até então conhecida possa ser mais pobre do que qualquer outra explorada antes da descoberta das minas da América Qual desses dois eventos ou hipóteses ocorre efetivamente isto tem muito pouca importância para a riqueza e prosperidade real do mundo para o valor real da produção anual da terra e do trabalho da humanidade Sem dúvida seu valor nominal a quantidade de ouro e prata pela qual essa produção anual poderia ser expressa ou representada seria muito diferente mas seu valor real a quantidade real de trabalho que poderia comprar ou co mandar seria exatamente a mesma Em um caso 1 xelim poderia não representar mais trabalho do que representa 1 pêni atualmente no outro caso 1 pêni poderia representar tanto quanto 1 xelim atualmente Mas em um caso aquele que tivesse 1 xelim no bolso não seria mais rico do que aquele que atualmente tem 1 pêni e no outro caso aquele que tem 1 pêni seria exatamente tão rico quanto o que tem 1 xelim hoje O preço baixo e a abundância do ouro e da prataria constituiriam a única vantagem que o mundo poderia auferir do primeiro evento e o preço alto e a escassez dessas coisas supérfluas seriam o único in conveniente que o mundo poderia experimentar do segundo evento CONCLUSÃO DA DIGRESSÃO SOBRE AS VARIAÇÕES DO VALOR DA PRATA A maior parte dos escritores que pesquisaram os preços das mer cadorias em dinheiro nos tempos antigos parecem ter considerado o baixo preço dos cereais em dinheiro e dos bens em geral ou em outras palavras o alto valor do ouro e da prata como uma prova não somente da escassez desses metais mas também da pobreza ou primitivismo do país ao tempo em que esse baixo preço ocorreu Essa idéia está ligada ao sistema de economia política que representa a riqueza nacional como consistindo na abundância do ouro e da prata e a pobreza nacional na sua escassez sistema que procurarei explicar e examinar em detalhe no IV livro desta obra De momento limitar meei a observar que o alto valor dos metais preciosos não constitui nenhuma prova da pobreza ou primitivismo de um país no tempo em que ocorreu Prova apenas a pobreza das minas ocorrida na época para suprir o mundo comercial Um país pobre assim como não pode permitirse comprar mais ouro e prata que um país rico da mesma forma e muito menos pode permitirse pagar mais caro por esses pro dutos e por isso o valor desses metais não tem probabilidade de ser maior no país pobre do que no país rico Na China país mais rico do OS ECONOMISTAS 262 que qualquer outro da Europa o valor dos metais preciosos é muito maior do que em qualquer parte da Europa Com efeito assim como a riqueza da Europa aumentou muito desde a descoberta das minas da América da mesma forma o valor do ouro e da prata diminuiu progressivamente Entretanto esta diminuição de seu valor não se deveu ao aumento da riqueza real da Europa da produção anual de sua terra e de seu trabalho mas à descoberta de minas mais abundantes do que todas as que antes se conhecia O aumento da quantidade de ouro e prata na Europa e o aumento de suas manufaturas e de sua agricultura constituem dois eventos que embora tenham ocorrido mais ou menos ao mesmo tempo derivam de causas muito diferentes e di ficilmente apresentam alguma correlação entre si Um se deve a um mero acidente no qual a prudência e a política não tiveram nem po deriam ter responsabilidade alguma o outro devese à queda do sistema feudal e à implantação de um governo que proporcionou à indústria o único estímulo que ela exige ou seja uma segurança razoável de que colherá os frutos de seu próprio trabalho A Polônia onde o sistema feudal ainda continua a vigorar é ainda um país tão pobre como antes do descobrimento da América No entanto o preço em dinheiro do trigo tem aumentado na Polônia e o valor real dos metais preciosos tem diminuído da mesma forma que em outras partes da Europa Sua quantidade portanto deve ter aumentado ali como em outras partes e aproximadamente na mesma proporção da produção anual da terra e do trabalho Apesar disso esse aumento da quantidade dos metais preciosos parece não ter aumentado a produção anual nem desenvolveu a manufatura e a agricultura do país nem melhorou as condições de seus habitantes Espanha e Portugal países que possuem as minas são talvez depois da Polônia os dois países mais miseráveis da Europa Todavia o valor dos metais preciosos deve ser mais baixo na Espanha e em Portugal do que em qualquer outra parte da Europa por ser desses dois países que os metais vêm para todos os outros países da Europa onerados não somente pelo frete e o seguro mas também pela despesa do contrabando sendo sua exportação proibida ou sujeita a pagamento de taxas alfandegárias Portanto em proporção com a pro dução anual da terra e do trabalho sua quantidade deve ser maior em Espanha e Portugal do que em qualquer outra parte da Europa e no entanto esses dois países são mais pobres do que a maior parte da Europa Embora o sistema feudal tenha sido abolido na Espanha e em Portugal ainda não foi substituído por um sistema muito melhor Portanto assim como o baixo valor do ouro e da prata não cons titui prova alguma da riqueza ou condição florescente do país onde isso acontece da mesma forma nem o alto valor dos metais nem o baixo preço em dinheiro dos bens em geral ou dos cereais em especial constituem qualquer prova da sua pobreza ou da sua condição primitiva Entretanto embora o baixo preço em dinheiro dos bens em geral ou dos cereais em particular não seja nenhuma prova da pobreza ou do primitivismo da época o baixo preço em dinheiro de alguns tipos ADAM SMITH 263 de bens tais como o gado as aves domésticas a caça de todos os tipos etc em proporção ao dos cereais certamente constitui uma prova muito decisiva disso Demonstra claramente primeiro a grande abundância dos mesmos em comparação com a dos cereais e conse qüentemente a grande extensão de terra que ocupavam em comparação com a terra ocupada para a cultura dos cereais segundo demonstra o baixo valor dessa terra em relação ao valor da terra ocupada pela cultura dos cereais e conseqüentemente o estado não cultivado e não trabalhado da maioria das terras do país Demonstra claramente que o capital e a população do país não mantiveram com a extensão de seu território a mesma proporção que costumam manter em países desenvolvidos e que a sociedade estava em sua infância naquele país e naquela época Do preço em dinheiro alto ou baixo dos bens em geral e dos cereais em especial só podemos deduzir que as minas que na época forneciam ouro e prata ao mundo comercial eram ricas ou pobres e não que o país era rico ou pobre Em contrapartida do alto ou baixo preço em dinheiro de alguns tipos de bens em comparação com o dos outros podemos inferir com um grau de probabilidade que se aproxima da certeza em maior ou menor grau que o país era rico ou pobre que a maior parte de suas terras estavam em condição de senvolvida ou não e que ele estava em um estágio mais ou menos primitivo ou em um estágio mais ou menos desenvolvido Qualquer aumento do preço em dinheiro dos bens que derivasse totalmente da redução do valor da prata afetaria de maneira igual todos os tipos de bens elevando seu preço em toda parte de 13 14 ou 15 conforme a prata perdesse eventualmente 13 14 ou 15 de seu valor anterior Ao contrário o aumento do preço dos mantimentos que tem constituído objeto de tanto raciocínio e discussão não afeta de maneira igual todos os tipos de mantimentos Tomando em média o curso do século atual reconhecidamente o preço dos cereais aumentou muito menos do que o preço de alguns outros tipos de mantimento Portanto o aumento do preço de alguns outros tipos de mantimento não pode deverse totalmente à redução do valor da prata Devese levar em conta igualmente algumas outras causas talvez as que acima assinalei expliquem suficientemente esse aumento de preço dos tipos específicos de mantimentos cujo preço efetivamente subiu em relação ao dos cereais sem que seja necessário para isso recorrer às supostas reduções do valor da prata Quanto ao preço do próprio trigo tem sido um tanto mais baixo durante os primeiros 64 anos do século atual e antes da recente série anormal de más estações do que foi durante os últimos 64 anos do século anterior Esse fato é atestado não somente pelos registros do mercado de Windsor mas também pelos arrendatários de todos os condados da Escócia e pelas cifras de vários mercados da França coligidas com grande diligência e fidelidade pelos Srs Messance e Duprè de St Maur A evidência é muito maior do que a que se poderia esperar OS ECONOMISTAS 264 tratandose de um assunto que pela sua própria natureza é tão difícil de proporcionar certeza Quanto ao alto preço dos cereais durante estes últimos 10 ou 12 anos ele pode ser suficientemente explicado pelas más estações sem supor qualquer redução do valor da prata Conseqüentemente a opinião de que a prata está continuamente perdendo valor não parece fundarse em boas observações sobre os preços dos cereais ou sobre os preços de outros mantimentos Poderseia talvez alegar que a mesma quantidade de prata atual mente mesmo de acordo com o cálculo por mim feito aqui compra uma quantidade muito menor de vários tipos de mantimento do que teria comprado durante uma parte do século passado e que constatar se esta mudança se deve a um aumento do valor desses bens ou a uma queda do valor da prata equivale apenas a colocar uma distinção vã e inútil que de nada serve para a pessoa que tem somente uma certa quantidade de prata para comercializar ou uma certa renda fixa em dinheiro Certamente não pretendo que o conhecimento dessa distinção lhe dará a possibilidade de comprar mais barato Nem por isso porém a distinção será necessariamente inútil A distinção feita acima pode ser de alguma utilidade para o pú blico por oferecer uma prova fácil da condição de prosperidade do país Se o aumento do preço de alguns tipos de mantimento se dever inte gralmente a uma queda do valor da prata ele é devido a uma circuns tância da qual nada se pode concluir senão a riqueza das minas ame ricanas Todavia não obstante essa circunstância a riqueza real do país a produção anual de sua terra e de seu trabalho podem estar declinando gradualmente como em Portugal e na Polônia ou podem estar progredindo como na maior parte dos outros países da Europa Mas se esse aumento do preço de alguns tipos de mantimento se dever a um aumento do valor real da terra que os produz à sua maior fertilidade ou em conseqüência de um desenvolvimento mais amplo e de um bom cultivo ao fato de ter sido a terra tratada para produzir cereais nesse caso o aumento de preço se deve a uma circunstância que indica da maneira mais clara a condição próspera e progressista do país A terra constitui de longe a parte maior a mais importante e a mais durável da riqueza de todo país extenso Pode certamente ser de alguma utilidade ou ao menos pode dar alguma satisfação ao público dispor de uma prova tão decisiva do crescente valor da parte maior mais importante e mais durável de sua riqueza A distinção feita acima pode ser também de alguma utilidade para o público na regulamentação da remuneração pecuniária de al guns de seus empregados de categoria inferior Se este aumento do preço de alguns tipos de mantimento for devido a uma queda do valor da prata certamente sua recompensa pecuniária deve ser aumentada em proporção à extensão dessa queda a menos que essa remuneração já anteriormente fosse excessivamente liberal Mas se o aumento do preço se dever ao aumento do valor desses mantimentos em conse ADAM SMITH 265 qüência da maior fertilidade da terra que os produz tornase muito mais fácil julgar em que proporção se deve aumentar qualquer recom pensa pecuniária ou se esse aumento não deve sequer ocorrer Segundo acredito a ampliação do aprimoramento e do cultivo da terra assim como necessariamente aumenta mais ou menos o preço de todo tipo de alimento derivado de animais em proporção ao preço dos cereais da mesma forma necessariamente baixa o preço de todo tipo de alimento vegetal Aumenta o preço do alimento derivado de animais porque pelo fato de se adequar para a produção de cereais uma grande parte da terra que produz alimento derivado de animais ela deve propor cionar ao dono da terra e ao arrendatário a renda e o lucro normais para uma terra em que se cultivam cereais já que aumentando a fertilidade da terra aumenta a abundância deles Além disso os apri moramentos da agricultura introduzem muitos tipos de alimentos ve getais os quais exigindo menos terra e não exigindo mais mãodeobra do que os cereais são vendidos mais barato Tais são a batata e o milho que se denomina indian corn as duas melhorias mais im portantes que a agricultura européia talvez a própria Europa recebeu através da grande extensão de seu comércio e de sua navegação Além disso muitos tipos de alimentos vegetais que no estágio primitivo da agricultura estão limitados à horta e são cultivados exclusivamente com a enxada quando a agricultura progride passam a ser introduzidos nos campos comuns e começam a ser cultivados com arado tais como nabo cenoura couve etc Se portanto progredindo a agricultura o preço real de uma espécie de alimento necessariamente aumenta e o de outra necessariamente cai tornase mais fácil julgar até que ponto o aumento de um pode ser compensado pela queda do outro Quando o preço real da carne de açougue uma vez chegou ao máximo o que em relação a todos os tipos excetuada talvez a carne de porco parece ter ocorrido em grande parte da Inglaterra há mais de um século qualquer aumento que possa ocorrer posteriormente no preço de qual quer outro tipo de alimento derivado de animais não pode afetar muito a situação das classes inferiores do povo Assim a situação dos pobres na maior parte da Inglaterra certamente não pode ser tão afetada por qualquer aumento do preço da carne das aves domésticas do peixe das aves silvestres ou de caça pelo fato de ser necessariamente aliviado pela queda do preço da batata Na atual estação de escassez o alto preço dos cereais certamente prejudica os pobres Mas em tempos de abundância razoável quando os cereais são vendidos a preço normal ou médio o aumento natural do preço de qualquer outro tipo de produto natural da terra não pode afetar muito os pobres Estes talvez sofram mais pelo aumento artificial que tem sido provocado por impostos e taxas no preço de algumas mercadorias manufaturadas tais como o sal o sabão o couro as velas o malte a cerveja a cerveja inglesa etc OS ECONOMISTAS 266 EFEITOS DO AVANÇO DO DESENVOLVIMENTO SOBRE O PREÇO REAL DOS MANUFATURADOS É efeito natural do desenvolvimento contudo reduzir gradual mente o preço real de quase todos os manufaturados O preço da mão deobra manufatora diminui talvez em todos eles sem exceção Em conseqüência do uso de máquinas mais perfeitas da maior destreza e de uma divisão e distribuição mais adequada do trabalho efeitos naturais do desenvolvimento requerse muito menos mãodeobra para executar qualquer parte determinada de trabalho e embora em conseqüência da situação florescente da sociedade o preço real da mão deobra possa aumentar consideravelmente a grande diminuição de sua quantidade será em geral mais do que compensadora do máximo aumento que possa ocorrer no preço dos manufaturados Há realmente alguns manufaturados em que o necessário au mento do preço real das matériasprimas anulará todas as vantagens que o aprimoramento pode introduzir na execução do trabalho Nos trabalhos de carpintaria marcenaria e no trabalho mais grosseiro de fabricação de móveis o aumento necessário no preço real da madeira em conseqüência dos melhoramentos da terra compensará em muito todas as vantagens que podem provir de melhores máquinas da des treza máxima e da mais adequada divisão e distribuição do trabalho Todavia em todos os casos em que o preço real das matérias primas não aumenta ou aumenta muito pouco o preço do material manufaturado baixa muito consideravelmente Essa diminuição do preço no decurso do século atual e do anterior tem sido mais acentuada nos manufaturados cuja matériaprima são os metais menos nobres Um relógio melhor do que aquele que se podia comprar em meados do século passado por 20 libras talvez agora possa ser comprado por 20 xelins No trabalho dos cuteleiros e serralheiros em todos os brinquedos fabricados com metais menos nobres e em todos os bens normalmente conhecidos sob o nome de produtos manu faturados de Birmingham e Sheffield houve durante o mesmo período uma grande redução de preço embora não tão grande como ocorreu nos relógios Entretanto foi suficiente para causar admiração a tra balhadores de todas as outras regiões da Europa que em muitos casos reconhecem não serem capazes de produzir um trabalho de qualidade igual pelo dobro ou até pelo triplo desse preço Talvez não exista ne nhuma manufatura em que a divisão do trabalho possa ser maior ou na qual a maquinaria comporte maior variedade de aprimoramentos do que aquelas cujas matériasprimas são os metais menos nobres Na manufatura de roupas não se registrou no mesmo período tal redução sensível dos preços Pelo contrário foime assegurado que o preço do tecido superfino subiu um pouco em proporção com sua qualidade no decurso desses 25 ou 30 anos isto segundo se disse devido a um considerável aumento do preço dos materiais que con ADAM SMITH 267 sistem totalmente em lã importada da Espanha Com efeito afirmase que o preço dos tecidos em Yorkshire fabricados exclusivamente com lã inglesa baixou muito em proporção à sua qualidade no decurso do século atual Entretanto a qualidade é um item tão discutível que considero mais ou menos inseguras todas as informações desse gênero Na manufatura de roupas a divisão do trabalho hoje é mais ou menos o que era há um século e também a maquinaria não é muito diferente Pode ter havido algum pequeno aprimoramento sob estes dois aspectos o qual pode ter provocado alguma redução do preço dos respectivos manufaturados Mas a redução se evidencia muito mais sensível e inegável se compararmos o preço desses manufaturados atualmente ao que vigo rava em uma época mais remota em torno do final do século XV quando provavelmente a subdivisão do trabalho era muito menos de senvolvida e as máquinas utilizadas muito mais imperfeitas do que atualmente Em 1487 que é o quarto ano do reinado de Henrique VII foi decretado por lei que toda pessoa que vender a varejo por mais de 16 xelins uma jarda do mais fino tecido escarlate tingido na fibra ou de outro tecido tingido na fibra e da melhor qualidade deverá pagar 40 xelins por cada jarda assim vendida Portanto 16 xelins contendo aproximadamente a mesma quantidade de prata que 24 xelins do di nheiro de hoje eram naquela época considerados como um preço ra zoável de uma jarda do tecido de melhor qualidade e já que no caso se trata de uma lei suntuária esse tecido provavelmente era vendido a um preço algo mais caro Hoje se pode dizer que o preço máximo é de 1 guinéu Portanto mesmo que a qualidade dos tecidos se supunha igual com muita probabilidade a dos tecidos de hoje é muito superior mesmo nessa hipótese o preço em dinheiro dos tecidos mais finos caiu consideravelmente desde o final do século XV Seu preço real porém sofreu uma redução muito maior Calculase que o preço médio de um quarto de trigo na época e ainda por muito tempo depois era 6 xelins e 8 pence Dezesseis xelins portanto era o preço de 2 quarters e mais de 3 bushels de trigo Avaliando atualmente 1 quarter de trigo a 28 xelins o preço real de uma jarda de tecido de primeira qualidade deve naquela época ter equivalido no mínimo a 3 6 s 6 d do nosso dinheiro atual O comprador deste tecido deve ter pago uma quantidade de trabalho e de mantimentos igual à que esta soma compraria hoje A redução do preço real do tecido de tipo inferior embora con siderável não foi tão grande como no caso dos tecidos finos Em 1463 no terceiro ano do reinado de Eduardo IV decretouse que nenhum trabalhador agrícola nenhum trabalhador comum ou empregado de artesão que morar fora de uma cidade ou burgo vista qualquer tecido que custe acima de 2 xelins por jarda longa No terceiro ano do reinado de Eduardo IV 2 xelins continham praticamente a mesma quantidade de prata que 4 xelins de nossa moeda atual Mas OS ECONOMISTAS 268 o tecido de Yorkshire que hoje é vendido por 4 xelins a jarda prova velmente é muito superior a qualquer tecido fabricado então para ser usado pela classe mais pobre dos servos comuns Portanto mesmo o preço nominal dos tecidos dos servos em proporção à qualidade pode ser um pouco inferior hoje em relação ao que era naquela época O preço real certamente é muito mais baixo O preço razoável de um bushel de trigo calculase naquela época ter sido de 10 pence Portanto 2 xelins era o preço de 2 bushels e quase 2 celamins de trigo o que hoje a 3 xelins e 6 pence o bushel equivaleria a 8 xelins e 9 pence Por uma jarda deste tecido o trabalhador pobre deve ter pago o poder de comprar uma quantidade de mantimentos igual à que hoje comprariam 8 xelins e 9 pence Também essa é uma lei suntuária que coibia o luxo e a extravagância dos pobres Por conseguinte sua roupa normalmente deve ter sido muito mais cara A mesma classe de pessoas em virtude da mesma lei é proibida de usar meias cujo preço devia superar 14 pence o par equivalentes a aproximadamente 28 pence de nosso dinheiro de hoje Ora 14 pence era naquela época o preço de um bushel e quase dois celamins de trigo que atualmente a 3 xelins e 6 pence o bushel custariam 5 xelins e 3 pence Atualmente deveríamos considerar isso como um preço muito alto para um par de meias para um trabalhador da classe mais pobre e mais baixa Todavia é efetivamente o equivalente a isso que ele deve ter pago na época por um par de meias No tempo de Eduardo IV a arte de fazer meias de tricô prova velmente não era conhecida em parte alguma da Europa As meias eram feitas de tecido comum o que pode ter sido uma das causas do seu alto preço Dizse que a primeira pessoa que usou meias na In glaterra foi a Rainha Isabel tendoas recebido de presente do embai xador espanhol Tanto na manufatura de lá menos fina como na mais fina a maquinaria empregada era muito mais imperfeita naquela época do que hoje Essa maquinaria recebeu desde então três melhorias muito importantes provavelmente além de muitas outras menores cujo nú mero e importância talvez seja difícil verificar Os três aprimoramentos capitais são primeiro a substituição da roca e do fuso pela roda de fiar a qual com o mesmo número de operários será capaz de executar mais que o dobro da qualidade de trabalho Em segundo lugar o uso de várias máquinas extremamente aperfeiçoadas que facilitam e abre viam em proporção ainda maior o enrolamento do fio fiado pronto para ser tecido e o do fio de lã ou seja a combinação adequada da urdidura com a trama antes dos fios serem colocados no tear uma operação que antes da invenção dessas máquinas deve ter sido extremamente cansativa e incômoda Em terceiro lugar o emprego do fulling mill para engrossar o tecido ao invés de calcálo com os pés na água Antes do início do século XVI não se conheciam na Inglaterra nem moinhos de vento nem moinhos de água de qualquer espécie nem quanto eu ADAM SMITH 269 saiba em qualquer parte da Europa ao norte dos Alpes Eles haviam sido introduzidos na Itália algum tempo antes A consideração dessas circunstâncias pode talvez até certo ponto explicarnos por que o preço real tanto do tecido inferior como do fino era tão mais alto nesses tempos antigos do que hoje Custava muita mãodeobra a colocação desses bens no mercado Ao serem comercia lizados devem ter comprado ou ter sido trocados pelo preço de uma quantidade maior Na Inglaterra os tecidos de tipo inferior provavelmente eram fabricados naquela época da mesma forma que sempre o foram em países em que as artes e as manufaturas estão em seu estágio primário Provavelmente a fabricação era feita em casa onde cada parte do tra balho era ocasionalmente executada por todos os diversos membros de quase toda família isoladamente mas de tal forma que se ocupavam com isso somente quando não tinham outra coisa a fazer sem que isso fosse a ocupação principal de onde todos eles auferiam a maior parte de sua subsistência O trabalho executado dessa forma como já observei sempre chega mais barato ao mercado do que aquele que constitui o fundo principal ou único da subsistência do trabalhador Por outro lado artigo de tipo mais fino não era naquela época fabricado na Inglaterra mas no rico e altamente comercial País de Flandres sendo lá confeccionado na época como ainda hoje por pessoas que auferiam disso toda a sua subsistência ou ao menos a parte principal dela Além disso era um manufaturado estrangeiro devendo ter pago algum imposto ao rei no mínimo o antigo tonnage e poundage148 esse imposto na realidade provavelmente não deve ter sido muito elevado Na época não era política da Europa limitar por meio de altas taxas alfandegárias a importação de produtos manufaturados estrangeiros mas antes estimulála para que os comerciantes tivessem condições de fornecer às pessoas abastadas a uma taxa mais fácil possível os artigos convenientes e de luxo que desejavam e que a indústria de seu próprio país era incapaz de fornecerlhes A consideração dessas circunstâncias talvez possa explicarnos até certo ponto por que naqueles tempos antigos o preço real dos tecidos de qualidade inferior em comparação com o dos tecidos finos era de tal modo mais baixo do que atualmente CONCLUSÃO DO CAPÍTULO Concluirei este capítulo extremamente longo observando que toda melhoria da situação da sociedade tende direta ou indiretamente a elevar a renda real da terra a aumentar a riqueza real do proprietário da terra seu poder de comprar trabalho ou a produção do trabalho de outras pessoas OS ECONOMISTAS 270 148 Respectivamente imposto pago por tonelada de carga num porto ou canal e imposto baseado no peso por libra esterlina N do E A expansão das melhorias e do cultivo da terra tende a elevar a renda da terra de maneira direta A parcela do proprietário da terra na produção necessariamente aumenta com o crescimento da produção O aumento do preço real desses produtos naturais da terra que primeiro é efeito da extensão do desenvolvimento e do cultivo e depois a causa de que se estendam ainda mais por exemplo a alta do preço do gado também tende a elevar diretamente a renda da terra aliás numa proporção ainda maior O valor real da parcela do proprietário da terra seu controle real sobre o trabalho de outras pessoas não somente aumenta com o valor real da produção como também a pro porção de sua parcela na produção total aumenta com ele Esse produto depois do aumento de seu preço real não requer mais mãodeobra do que antes para ser obtido Conseqüentemente uma porcentagem maior do produto deve pertencer ao proprietário da terra Todos esses aperfeiçoamentos das forças produtivas da mãode obra que diretamente tendem a reduzir o preço real dos artigos ma nufaturados tendem indiretamente a aumentar a renda da terra O proprietário da terra troca aquela parte de sua produção natural que está além de seu próprio consumo ou o que dá no mesmo o preço daquela parte do produto por produto manufaturado Tudo o que reduz o preço real do produto manufaturado aumenta o do produto natural Com isso uma quantidade igual do primeiro tornase equivalente a uma quantidade maior do segundo e o proprietário da terra tem a possibilidade de comprar uma quantidade maior de comodidades or namentos ou artigos de luxo de que necessita Todo aumento na riqueza real da sociedade todo aumento na quantidade de mãodeobra útil nela empregada indiretamente tende a aumentar a renda real da terra Certa porcentagem dessa mãode obra vai naturalmente para a terra Empregase um número maior de pessoas e de gado no cultivo da terra a produção aumenta com o aumento do capital assim aplicado no cultivo e a renda aumenta com a produção Por outro lado a situação contrária o menosprezo do cultivo e do aprimoramento da terra a queda do preço real de qualquer parcela da produção natural da terra o aumento do preço real dos produtos manufaturados devido ao declínio da arte manufatora o declínio da riqueza real da sociedade todos esses fatores tendem a baixar a renda real da terra a reduzir a riqueza real do proprietário da terra a di minuir seu poder de comprar trabalho ou o produto do trabalho de outras pessoas A produção anual total da terra e do trabalho de cada país ou o que é a mesma coisa o preço total dessa produção anual naturalmente se divide como já foi observado em três partes a renda da terra os salários da mãodeobra e o lucro do capital constituindo uma renda para três categorias de pessoas para aquelas que vivem da renda da terra para aquelas que vivem de salário e para aquelas que vivem do lucro Essas são as três grandes categorias originais e ADAM SMITH 271 constituintes de toda sociedade evoluída de cuja receita deriva em última análise a renda de todas as demais categorias O interesse da primeira dessas três grandes categorias como se depreende do que foi dito até agora está íntima e inseparavelmente ligado ao interesse geral da sociedade Tudo o que fomente ou obstrua o interesse do proprietário da terra necessariamente fomenta ou obstrui o interesse da sociedade Quando o público delibera em relação a qual quer regulamento ou lei de comércio ou política os proprietários da terra jamais podem enganálo visando promover o interesse de sua categoria específica ao menos se tiverem um conhecimento razoável desse interesse próprio Efetivamente muitas vezes faltalhes este co nhecimento razoável Eles são a única das três categorias cuja renda não lhes custa nem trabalho nem cuidado pois esta renda lhes vem por assim dizer espontaneamente independentemente de qualquer pla no ou projeto deles Essa indolência que constitui o efeito natural da tranqüilidade e segurança de sua situação muitas vezes os torna não somente ignorantes mas também incapazes de usar a inteligência no sentido de prever e compreender as conseqüências de toda e qualquer lei pública O interesse da segunda categoria a dos que vivem de salário está tão intimamente vinculado ao interesse da sociedade como o da primeira Já mostrei que os salários do trabalhador nunca são tão altos como quando a demanda de mãodeobra cresce continuamente ou quando o volume de mãodeobra empregado a cada ano aumenta consideravelmente Quando essa riqueza real da sociedade estaciona os salários são logo reduzidos ao estritamente suficiente para possibi litarlhe manter uma família ou seja perpetuar a descendência dos trabalhadores Quando a sociedade declina os salários caem até abaixo desse nível Talvez a categoria dos proprietários possa ganhar mais com a prosperidade da sociedade do que a dos trabalhadores não existe porém nenhuma classe que sofra tão cruelmente com o declínio da riqueza da sociedade quanto a dos operários Mas embora o interesse da classe trabalhadora esteja intimamente ligado ao interesse da so ciedade o trabalhador é incapaz tanto de compreender esse interesse quanto de compreender a vinculação do interesse da sociedade ao seu próprio Sua condição não lhe deixa tempo para receber a necessária informação e sua educação e hábitos costumam ser tais que o tomam inapto para discernir mesmo que esteja plenamente informado Por isso nas deliberações públicas sua voz é pouco ouvida e ainda menos levada em conta excetuadas algumas ocasiões específicas quando suas reivindicações são animadas incitadas e apoiadas pelos seus empre gadores que no caso lutam não pelos objetivos dos trabalhadores mas pelos seus próprios Os empregadores de mãodeobra representam a terceira catego ria a daqueles que vivem do lucro É o capital investido em função do lucro que movimenta a maior parte do trabalho útil de cada socie dade Os planos e projetos dos investidores de capital regulam e dirigem OS ECONOMISTAS 272 todas as operações mais importantes do trabalho sendo que o lucro constitui o objetivo proposto e visado por todos esses planos e projetos Entretanto a taxa de lucro não aumenta com a prosperidade da so ciedade e não diminui com o seu declínio como acontece com a renda da terra e com os salários Ao contrário essa taxa de lucro é naturalmente baixa em países ricos e alta em países pobres sendo a mais alta invariavelmente nos países que caminham mais rapida mente para a ruína Por isso o interesse dessa terceira categoria não tem a mesma vinculação com o interesse da sociedade como o das outras duas Nessa categoria os comerciantes e os donos de manufa turas são as duas classes de pessoas que comunente aplicam os maiores capitais e que pela sua riqueza atraem a si a maior parcela da con sideração pública Uma vez que durante toda a sua vida estão engajados em planos e projetos muitas vezes têm mais agudeza de entendimento do que a maioria dos senhores do campo Já que porém suas idéias giram mais em torno do interesse de seu próprio ramo específico de negócios do que em torno do interesse específico da sociedade seu julgamento mesmo quando emitido com a maior imparcialidade o que não tem acontecido em todas as ocasiões deve ser considerado muito mais dependente em relação ao primeiro daqueles dois objetos do que ao do último Sua superioridade em relação aos senhores do campo não está tanto no conhecimento que têm do interesse público mas antes no fato de conhecerem melhor seu interesse próprio do que os homens do campo conhecem o seu É em razão deste melhor conheci mento que possuem de seus próprios interesses que muitas vezes têm feito imposições à generosidade do proprietário rural persuadindoo a abrir mão tanto de seu próprio interesse quanto do interesse do público partindo de uma convicção muito simples mas muito legítima de que o interesse público é o deles e não o do proprietário de terras Ora o interesse dos negociantes em qualquer ramo específico de comércio ou de manufatura sempre difere sob algum aspecto do interesse público e até se lhe opõe O interesse dos empresários é sempre ampliar o mercado e limitar a concorrência Ampliar o mercado muitas vezes pode ser benéfico para o interesse público mas limitar a concorrência sempre contraria necessariamente ao interesse público e só pode servir para possibilitar aos negociantes pelo aumento de seus lucros acima do que seria natural cobrar em seu próprio benefício uma taxa absurda dos demais concidadãos A proposta de qualquer nova lei ou regula mento comercial que provenha de sua categoria sempre deve ser exa minada com grande precaução e cautela não devendo nunca ser ado tada antes de ser longa e cuidadosamente estudada não somente com a atenção mais escrupulosa mas também com a maior desconfiança É proposta que advém de uma categoria de pessoas cujo interesse jamais coincide exatamente com o do povo as quais geralmente têm interesse em enganálo e mesmo oprimilo e que conseqüentemente têm em muitas oportunidades tanto iludido quanto oprimido esse povo ADAM SMITH 273 OS ECONOMISTAS Preço do quarter de trigo em cada ano s d Média dos diversos preços do mesmo ano s d Preço médio de cada ano em moeda atual s d 1287 3 4 10 1288 1 6 3 1 9 1289 12 10 1 2 1290 16 2 8 1294 16 2 8 1302 4 12 1309 1 2 1 1 6 1315 3 1316 1 10 6 4 11 6 1317 1 19 6 5 18 6 1386 6 6 1388 3 4 10 Total 23 4 11 4 Preço médio 1 18 8 Preço do quartes de trigo em cada ano s d Média dos diversos preços do mesmo ano s d Preço médio de cada ano em moeda atual s d 1339 9 1 7 1349 2 5 2 1359 1 6 8 3 2 2 4 8 1361 2 1 15 1369 1 4 2 9 4 1379 4 9 4 1387 2 4 8 1390 14 14 5 1 13 7 1401 16 1 17 4 1407 3 10 8 11 1416 16 1 12 Total 15 9 4 Preço médio 1 5 9 Preço do quarter de trigo em cada ano s d Média dos diversos preços do mesmo ano s d Preço médio de cada ano em moeda atual s d 1453 5 4 10 8 1455 1 2 2 4 1457 7 8 15 4 1469 5 10 1460 8 1 10 3 8 1463 1 8 1 2 1 8 1466 6 8 10 1491 14 8 1 2 4 1494 4 6 1495 3 4 5 1499 4 6 1504 5 8 8 6 1521 1 10 1551 8 24 1553 8 8 1555 8 8 1556 8 8 1557 2 13 4 17 8 1 17 8 1 1558 8 1559 8 1560 8 Total 6 0 2 1 Preço médio 10 0 5 12 Distído de 12 anos Preços do quarter de 9 bushels do melhor ou mais caro trigo no mercado de Windsor no dia da Anunciação e no dia de São Miguel desde 1595 até 1794 incluídos os dois anos sendo que o preço de cada ano é a média dos preços máximos ocorridos nos dois men cionados dias de mercado ADAM SMITH 279 Anos Anos Anos Anos Trigo por quarter s d 1731 1 12 10 1732 1 6 8 1733 1 8 4 1734 1 18 10 1735 2 3 0 1736 2 0 4 1737 1 18 0 1738 1 15 0 1739 1 18 6 1740 2 10 8 10 18 12 8 1 17 3½ 1741 2 6 8 1742 1 14 0 1743 1 4 10 1744 1 7 6 1745 1 19 0 1746 1 14 10 1747 1 17 0 1748 1 17 0 1749 1 12 6 1750 10 16 18 2 1 13 9½ LIVRO SEGUNDO A Natureza o Acúmulo e o Emprego do Capital INTRODUÇÃO No estágio primitivo da sociedade em que não existe divisão do trabalho em que as trocas são raras e em que cada um se supre do necessário não é preciso de antemão acumular ou armazenar capital para o andamento dos negócios da sociedade Cada qual empenhase com seu próprio trabalho em atender às suas necessidades ocasionais conforme ocorrerem Quando tem fome vai caçar na floresta quando sua veste está gasta vestese com a pele do primeiro animal de porte que consegue abater e quando sua choupana começa a arruinarse reparaa da melhor maneira que puder com as árvores e a turfa que lhe estão mais próximas Entretanto uma vez implantada plenamente a divisão do traba lho o produto do trabalho de uma pessoa só consegue atender a uma parcela muito pequena de suas necessidades A maior parte delas é atendida com o produto do trabalho de outros que a pessoa compra com o produto de seu próprio trabalho ou seja com o preço do produto de seu trabalho Ora isto não pode ser feito enquanto a pessoa não terminar seu próprio trabalho e também enquanto não o tiver vendido Portanto antes de a pessoa executar seu trabalho e vendêlo é neces sário acumular em algum lugar certo estoque de bens de diversos tipos estoque este suficiente para manter o trabalhador e provêlo dos ma teriais e instrumentos necessários para seu trabalho Um tecelão não pode dedicarse inteiramente a seu trabalho específico se de antemão não houver em algum lugar em sua posse ou na posse de outra pessoa um capital suficiente para mantêlo e para fornecerlhe os materiais e instrumentos necessários para ele executar seu serviço antes que ele termine e também venda seu tecido Evidentemente essa acumu lação de capital deve anteceder à aplicação de seu trabalho por tanto tempo quanto exija um negócio particular Assim como a acumulação de capital por sua natureza deve ser anterior à divisão do trabalho da mesma forma o trabalho pode ser cada vez mais subdividido somente na proporção em que o estoque for previamente cada vez mais acumulado A quantidade de materiais que o mesmo número de pessoas pode processar aumenta em grande proporção na medida em que o trabalho se subdivide cada vez mais e já que as operações de cada trabalhador são gradualmente reduzidas 285 a um maior grau de simplicidade inventase uma variedade de novas máquinas para facilitar e abreviar essas operações Portanto na medida em que progride a divisão do trabalho para se poder dar emprego constante a um número igual de trabalhadores é preciso acumular previamente um estoque igual de mantimentos e um estoque maior de materiais e instrumentos do que o que teria sido necessário em uma sociedade em estágio primitivo Ora o número de trabalhadores em cada setor ocupacional geralmente aumenta com a divisão do tra balho nesse setor ou melhor é o aumento de seu número que possibilita aos trabalhadores subdividir o trabalho dessa maneira Assim como a acumulação prévia de capital é necessária para se efetuar esse grande aprimoramento das forças produtivas do tra balho da mesma forma ela conduz naturalmente a esse aprimoramento A pessoa que emprega seu capital para manter mãodeobra necessa riamente deseja empregálo de maneira a produzir a maior quantidade de trabalho possível Por isso ela procura distribuir o trabalho entre seus operários da melhor forma possível e procura fornecerlhes as melhores máquinas que ela mesma puder inventar ou comprar Nor malmente suas habilidades e capacidades sob esses dois aspectos são proporcionais à quantidade de seu capital ou seja ao número de pes soas que tiver condições de empregar Por conseguinte a quantidade de atividades não somente aumenta em cada país na medida em que aumenta o capital que lhe dá emprego mas também em conseqüência desse aumento a mesma quantidade de atividades produz uma quan tidade muito maior de trabalho Esses são de modo geral os efeitos do aumento do capital sobre as atividades e sobre suas forças produtivas Neste segundo livro procurarei explicar a natureza do capital os efeitos de seu acúmulo em capitais de diferentes tipos e os efeitos dos diferentes empregos desses capitais Este livro está dividido em cinco capítulos No capítulo I procurei mostrar quais são as diversas partes ou setores nas quais naturalmente se divide o capital seja de um indivíduo seja de uma grande sociedade No capítulo II procurei explicar a natureza e a operação do dinheiro considerado como um setor específico do estoque geral da sociedade O estoque acumulado em forma de capital pode ser empregado pela pessoa ao qual pertence ou pode ser emprestado a alguma outra pessoa Nos capítulos III e IV procurei pois examinar a maneira como ele opera nas duas situações O capítulo V e último trata dos diferentes efeitos que diferentes em pregos de capital produzem imediatamente sobre a quantidade de tra balho da nação e sobre a quantidade da produção anual da terra e do trabalho OS ECONOMISTAS 286 CAPÍTULO I A Divisão do Capital Quando o capital possuído por uma pessoa é suficiente apenas para mantêla durante alguns dias ou semanas raramente ela pensa em auferir alguma renda dele Consomeo da maneira mais econômica que puder e procura com seu trabalho adquirir algo com o qual possa repôlo antes de consumilo totalmente Nesse caso sua renda deriva exclusivamente de seu trabalho Essa é a condição da maior parte de todos os pobres que trabalham em todos os países Quando porém a pessoa possui capital suficiente para manterse durante meses ou anos naturalmente procurará auferir uma renda da maior parte dele reservando para seu consumo imediato somente o suficiente para manterse até que a renda comece a entrar Seu estoque total portanto distinguese em duas partes A parte que se gundo espera lhe proporcionará a citada renda denominase capital A outra parte é a que lhe garante seu consumo imediato esta parte consiste primeiro naquela porção de seu estoque total originalmente reservada para este fim segundo em sua renda auferida de qualquer forma na medida em que entra ou terceiro em coisas que ele havia comprado com uma dessas duas em anos anteriores e que ainda não estão totalmente consumidas tais como estoque de roupas mobília doméstica e similares Em um ou outro desses três itens consiste o estoque que as pessoas normalmente reservam para seu próprio con sumo imediato Há duas maneiras de se empregar um capital para que ele pro porcione uma renda ou lucro a quem o emprega Primeiro o capital pode ser empregado para obter fabricar ou comprar bens e vendêlos novamente com lucro O capital empregado desta forma não gera renda ou lucro a quem o emprega já que per manece na posse da pessoa ou conserva a mesma forma As mercadorias do comerciante não lhe proporcionam renda alguma nem lucro en quanto ele não os vender por dinheiro e também o dinheiro não lhe 287 proporciona renda ou lucro enquanto por sua vez não for trocado por bens Seu capital continuamente sai dele em uma forma e volta a ele de outra somente mediante essa circulação ou trocas sucessivas pode ele proporcionarlhe algum lucro Por isso esses capitais são adequa damente denominados de capitais circulantes Em segundo lugar o capital pode ser empregado no aprimora mento da terra na compra de máquinas úteis ou instrumentos de trabalho ou em coisas similares que geram uma renda ou lucro sem mudar de donos ou seja sem circularem ulteriormente Por isso tais capitais podem com muita propriedade ser chamados de capitais fixos Ocupações diferentes exigem porcentagens muito diferentes de capital fixo e de capital circulante empregados nelas O capital de um comerciante por exemplo é integralmente um capital circulante Ele não tem necessidade de máquinas ou de instru mentos de trabalho a não ser que os considere como tais sua loja ou armazém Uma parte do capital de todo mestre artesão ou manufator deve consistir nos instrumentos de seu ofício Essa parte é muito pequena em alguns ofícios e muito grande em outros Um mestre alfaiate não precisa de outros instrumentos senão de certa quantidade de agulhas Já os instrumentos de um mestre sapateiro são um pouco mais caros embora muito pouco Os do tecelão são bem mais caros do que os do sapateiro Entretanto a maior parte do capital de tais mestres artesãos é capital circulante consistindo nos salários de seus empre gados ou no preço de seus materiais reembolsados com lucro pelo preço do trabalho Em outras ocupações requerse um capital fixo muito maior Por exemplo em uma grande fundição o forno para fundir minério a forja a máquina de corte são instrumentos de trabalho que só podem ser implantados com uma despesa muito elevada Em minas de carvão e nas minas de qualquer espécie as máquinas necessárias para extrair a água e para outras finalidades não raro são ainda mais dispendiosas A parte do capital do agricultor que é empregada nos instrumen tos agrícolas constitui capital fixo e a empregada nos salários e na manutenção de seus empregados é capital circulante O agricultor au fere lucro do capital fixo conservandoo em sua própria posse e do capital circulante gastandoo O preço ou valor de seu gado empregado na agricultura é capital fixo bem como o dos instrumentos e equipa mentos agrícolas sua manutenção é um capital circulante da mesma forma como a manutenção dos empregados O agricultor aufere seu lucro mantendo o gado empregado na agricultura como gastando na manutenção desse gado Tanto o preço como a manutenção do gado que é comprado e engordado não para trabalho na agricultura mas para venda constituem capital circulante O agricultor aufere seu lucro gastando na compra e na manutenção do gado Um rebanho de ovelhas ou de gado que é comprado não para trabalhar na agricultura nem para ser vendido mas para se tirar lucro da lã do leite e da procriação OS ECONOMISTAS 288 do mesmo constitui um capital fixo Auferese lucro conservando esses rebanhos A manutenção desse gado é um capital circulante Auferese lucro desfazendose dele sendo que ele retorna juntamente com seu próprio lucro e com o lucro do preço total do gado no preço da lã do leite e de novas cabeças Também o valor total das sementes é capital fixo Embora esse capital circule continuamente entre o solo e o celeiro essas sementes nunca mudam de proprietário e por isso não se pode dizer adequadamente que constituam capital circulante O agricultor aufere lucro das sementes não vendendoas mas multiplicandoas O capital geral de um país ou de uma sociedade é o mesmo que a soma do capital de todos seus habitantes ou membros e por isso se divide naturalmente nas mesmas três partes e cada uma das quais tem uma função diferente A primeira é a parte reservada para o consumo imediato da so ciedade sendo que a característica dessa parte consiste em não gerar renda nem lucro Consiste no capital em alimentos roupas mobílias domésticas etc que foram comprados pelos seus consumidores mas ainda não estão totalmente consumidos Também o capital total em casas para moradia existente em um determinado momento do país faz parte desta primeira porção O capital investido em uma casa se esta se destina à moradia do proprietário deixa a partir deste momento de ser capital ou seja deixa de proporcionar renda ao dono Uma moradia como tal não traz renda alguma a quem mora nela embora sem dúvida ela seja extremamente útil ao morador é útil da mesma forma que lhe são a roupa e a mobília doméstica as quais porém fazem parte de sua despesa e não de sua renda Se a casa for alugada a um inquilino para efeito de renda já que a própria casa nada pode produzir o inquilino sempre deverá pagar ao proprietário o aluguel tirandoo de alguma outra renda a qual o inquilino auferirá do trabalho do capital ou da terra Embora portanto uma casa possa proporcionar renda a seu proprietário e conseqüentemente tenha para ele a função de capital não gera renda alguma para o público nem pode ter a função de capital para este sendo que uma casa jamais poderá au mentar no mínimo que seja a renda da sociedade como tal Da mesma forma as roupas e peças de mobília às vezes geram renda cumprindo assim a função de capital para determinadas pessoas Em países em que costuma haver baile de máscaras é uma ocupação alugar máscaras e roupas para uma noite Com freqüência os tapeceiros alugam peças de mobília por mês ou por ano Os donos de casas funerárias alugam por dia ou por semana os equipamentos para enterros Muitas pessoas alugam casas mobiliadas recebendo uma renda não somente pelo uso da casa mas também pelo uso da mobília Todavia a renda conseguida deve sempre ser em última análise obtida de alguma outra fonte de renda De todas as partes do capital seja de um indivíduo seja de uma sociedade reservadas para o consumo imediato a que consiste em casas é a que leva mais tempo para ser consumida Um capital em roupas pode durar vários anos mas um estoque de mobília pode ADAM SMITH 289 durar meio século ou até um século inteiro e um capital em casas bem construídas e bem cuidadas pode durar muitos séculos Embora porém leve mais tempo para consumilas totalmente durante todo este período elas continuam constituindo um estoque real reservado para o consumo imediato tanto quanto as roupas e a mobília doméstica A segunda parte na qual se divide o capital geral da sociedade é o capital fixo cuja característica consiste em proporcionar renda ou lucro sem circular ou mudar de proprietário Ela consiste sobretudo nos quatro itens seguintes Primeiro todas as máquinas úteis e instrumentos que facilitam e abreviam o trabalho Segundo todas as construções que constituem meios de renda não somente para seu proprietário que as aluga para renda mas tam bém para a pessoa que as ocupa e paga o aluguel tais são entre outras as lojas depósitos casas comerciais sedes de propriedade rural com todas as suas construções necessárias além disso estábulos ce leiros etc Diferem muito das casas para moradia São uma espécie de instrumento de trabalho podendo portanto ser classificadas pelo mesmo critério Terceiro as melhorias ou benfeitorias da terra ou seja o que se investiu rentavelmente em roçar limpar drenar cercar adubar e co locála nas condições mais adequadas para amanho e cultura Uma propriedade assim aprimorada pode com todo o direito ser considerada sob a mesma luz que as máquinas úteis que facilitam e abreviam o trabalho e mediante as quais um capital circulante igual pode pro porcionar uma renda muito maior a quem o emprega Uma propriedade dotada dessas melhorias é tão vantajosa como a mais durável de qual quer dessas máquinas e freqüentemente não requer outros reparos senão a mais rentável aplicação de capital do arrendatário empregado no cultivo dessa terra Em quarto lugar as habilidades úteis adquiridas por todos os habitantes ou membros da sociedade A aquisição dessas habilidades para a manutenção de quem as adquiriu durante o período de sua formação estudo ou aprendizagem sempre custa uma despesa real que constitui um capital fixo e como que encarnado na sua pessoa Assim como essas habilidades fazem parte da fortuna da pessoa da mesma forma fazem parte da sociedade à qual ela pertence A destreza de um trabalhador pode ser enquadrada na mesma categoria que uma máquina ou instrumento de trabalho que facilita e abrevia o trabalho e que embora custe certa despesa compensa essa despesa com lucro A terceira e última das três partes em que naturalmente se divide o capital geral da sociedade é o capital circulante cuja característica consiste em proporcionar renda somente circulando ou mudando de donos Também essa porção dividese em quatro partes Primeiro o dinheiro por meio do qual se faz a circulação das outras três e a distribuição aos respectivos consumidores Segundo o estoque de provisões em poder do açougueiro do cria OS ECONOMISTAS 290 dor de gado do arrendatário do comerciante de cereal do fabricante de cerveja etc e de cuja venda eles esperam auferir um lucro Terceiro os materiais quer em estado totalmente bruto quer mais ou menos manufaturados para fabricação de tecidos mobílias e construções que ainda não se inserem em nenhum desses três tipos mas que permanecem nas mãos dos cultivadores dos manufatureiros e dos merceeiros negociantes de fazendas madeireiros e marceneiros dos fabricantes de tijolos etc Quarto e último do trabalho acabado mas que ainda está nas mãos do comerciante ou do manufator e que ainda não foi vendido ou distribuído aos respectivos consumidores tal como o produto acabado que freqüentemente encontramos pronto nas lojas do ferreiro do mar ceneiro do ourives do joalheiro do comerciante de porcelana etc No caso o capital circulante consiste nos suprimentos nos materiais e nos produtos acabados de todos os tipos que estão nas mãos de seus respectivos negociantes e no dinheiro necessário para fazêlos circular e distribuílos aos que os utilizarão ou consumirão Dessas quatro partes três os suprimentos os materiais e o produto acabado são anualmente ou em período mais curto regu larmente retiradas do capital circulante sendo incorporadas ao capital fixo ou ao capital reservado para consumo imediato Todo capital fixo deriva originalmente de um capital circulante devendo ser continuamente mantido por ele Todas as máquinas e ins trumentos de trabalho úteis derivam originalmente de um capital cir culante que fornece os materiais dos quais são feitos bem como a manutenção dos trabalhadores que os fabricam Além disso requerem um capital da mesma espécie para mantêlos constantemente em bom estado Nenhum capital fixo pode proporcionar renda a não ser através de um capital circulante As máquinas e instrumentos mais úteis de trabalho não produzirão nada sem o capital circulante que assegure os materiais nos quais são usados e a manutenção dos empregados A terra mesmo que devidamente preparada não proporcionará ne nhuma renda sem um capital circulante que mantenha os trabalha dores que a cultivam e colhem os produtos O único objetivo e finalidade tanto do capital fixo como do circulante consiste em manter e aumentar o capital que pode ser reservado para o consumo imediato É esse capital que alimenta veste e dá moradia à população A riqueza ou pobreza da população depende do suprimento abundante ou escasso que esses dois tipos de capital têm condições de garantir ao capital reservado para o consumo imediato Uma vez que uma parte tão grande do capital circulante é con tinuamente retirada dele para ser incorporada aos dois outros setores do capital geral da sociedade é preciso reabastecer continuamente esse capital circulante sob pena de logo deixar ele de existir Essas fontes de abastecimento são sobretudo três a produção da terra das minas e da pesca Estas três fontes asseguram suprimentos e materiais con ADAM SMITH 291 tínuos dos quais uma parte é depois transformada em produto acabado e através dos quais são repostos os suprimentos os materiais e o pro duto acabado continuamente retirados do capital circulante Das minas extraise também o necessário para manter e aumentar aquela parte do capital circulante que consiste em dinheiro Com efeito embora no curso normal da economia o dinheiro não seja como as outras três partes necessariamente retirado do capital circulante para ser incor porado aos dois outros setores do capital geral da sociedade também ele como todas as outras coisas acaba desgastandose necessariamente e às vezes se perde ou tem que ser exportado motivo pelo qual também esta parte do capital circulante precisa ser continuamente rea bastecida com novos suprimentos embora sem dúvida muito menores As terras as minas e a pesca requerem tanto um capital fixo como um capital circulante para explorálas sendo que a sua produção repõe com lucro não somente esses dois tipos de capital mas todos os demais existentes na sociedade Assim o arrendatário repõe anual mente ao manufator os mantimentos que este consumiu e os materiais que ele processou no ano anterior e o manufator repõe ao arrendatário o produto acabado que este gastou no mesmo período Este é o inter câmbio real anualmente efetuado entre essas duas categorias de pessoa embora seja raro acontecer que o produto natural bruto do agricultor e o produto manufaturado do manufator sejam trocados diretamente um pelo outro já que muito raramente acontece que o agricultor venda seus cereais e seu gado seu fio de linha e sua lã exatamente à mesma pessoa da qual compra os tecidos a mobília e os instrumentos de que necessita Ele vende sua produção bruta por dinheiro com o qual pode então comprar onde for possível os produtos manufaturados de que carece A terra até repõe ao menos em parte os capitais com os quais são exploradas a pesca e as minas É a produção da terra que tira o peixe das águas e é a produção da superfície da terra que extrai os minerais de suas entranhas A produção da terra das minas e da pesca quando sua fertilidade natural for igual é proporcional à extensão e à aplicação adequada dos capitais nelas empregados Quando os capitais são iguais e sua aplicação também é igual a produção das três é proporcional à sua fertilidade natural Em todos os países onde houver uma segurança razoável toda pessoa de bom senso procurará empregar todo o capital sob seu controle para desfrutálo atualmente ou para auferir dele um lucro no futuro Se for empregado para uma satisfação imediata temos um capital reservado para o consumo imediato Se o empregar em função de um lucro futuro este capital deverá proporcionar o referido lucro perma necendo com o dono ou procurando outras mãos No primeiro caso será um capital fixo no segundo um capital circulante Num país onde houver tolerável segurança insensata seria a pessoa que não empre gasse todo o capital sob seu controle quer se trate de capital de OS ECONOMISTAS 292 sua propriedade ou de capital emprestado de terceiros de uma das três maneiras assinaladas Com efeito nesses países desafortunados onde as pessoas estão continuamente expostas à violência de seus superiores estas muitas vezes escondem grande parte de seu capital a fim de têlo sempre à mão para leválo a algum lugar seguro em caso de serem ameaçadas por algum desses infortúnios aos quais se sentem continuamente ex postas Pelo que se conta essa é uma situação que costuma ocorrer na Turquia no Industão e como acredito na maior parte dos países da Ásia Parece também ter sido uma prática comum entre os nossos antepassados durante a época de violência dos governos feudais Na quela época consideravase um tesouro descoberto e ainda sem dono como uma parte relevante da renda dos maiores soberanos da Europa Consistia em tesouros escondidos na terra e em relação aos quais nin guém podia alegar direitos Naquela época davase tanta importância a esses tesouros que se considerava pertencerem sempre ao soberano não cabendo direito nem a quem os descobrisse nem ao seu proprietário a não ser que na escritura constasse uma cláusula expressa que ga rantisse a este último tal direito Colocavamse esses tesouros em pé de igualdade com as minas de ouro e prata as quais salvo em casos de uma cláusula expressa na escritura nunca se supunha pertencer à concessão geral das terras embora as minas de chumbo cobre estanho e carvão o estivessem por serem coisas de menor valor ADAM SMITH 293 no text CAPÍTULO II O Dinheiro Considerado Como um Setor Específico do Capital Geral da Sociedade ou seja a Despesa da Manutenção do Capital Nacional No Livro Primeiro mostrei que o preço da maior parte das mer cadorias se decompõe em três elementos sendo que o primeiro paga os salários do trabalho o segundo paga os lucros do capital e o terceiro paga a renda da terra utilizada para produzilas e colocálas no mer cado Mostrei outrossim que há algumas mercadorias cujo preço se compõe somente de dois elementos os salários de mãodeobra e os lucros do capital e algumas pouquíssimas nas quais consiste apenas em um os salários da mãodeobra Finalmente mostrei que o preço de cada mercadoria necessariamente se compõe de um ou outro desses elementos ou dos três simultaneamente sendo que a parte que não vai para a renda da terra nem para os salários necessariamente cons titui lucro para alguém Observei que sendo isso o que acontece com respeito a cada mercadoria considerada isoladamente deve ocorrer o mesmo em relação a todas as mercadorias que compõem a produção anual total da terra e da mãodeobra de cada país considerada no conjunto O preço total do valor de troca dessa produção anual deve decomporse nessas mes mas três partes sendo distribuído entre os diversos habitantes do país como salários de seu trabalho como lucro de seu capital ou como renda de sua terra Mas embora o valor total da produção anual da terra e do tra balho de cada país esteja assim dividido entre os diversos habitantes e constitua uma renda para eles assim como na renda de uma pro priedade privada distinguimos entre a renda bruta da terra e a renda líquida da terra da mesma forma ocorre com a renda de todos os habitantes de um país A renda bruta da terra de uma propriedade privada engloba tudo o que é pago pelo arrendatário a renda líquida da terra o que resta 295 para o proprietário da terra após deduzir as despesas administrativas os reparos e todos os demais encargos necessários ou seja aquilo que sem prejudicar a sua propriedade ele pode incorporar ao seu capital reservado para o consumo imediato ou gastar em sua mesa em seus pertences nos acessórios de sua casa e sua mobília em seus diverti mentos e lazeres particulares Sua riqueza real é proporcional não à sua renda bruta mas à sua renda líquida da terra A renda bruta de todos os habitantes de um grande país com preende a produção anual total de sua terra e de seu trabalho a renda líquida engloba o que lhes resta livre após deduzir a despesa necessária à manutenção primeiro seu capital fixo segundo seu capital circu lante ou seja aquilo que sem interferir em seu capital conseguem incorporar a seu capital reservado para consumo imediato ou gastar em sua subsistência em suas comodidades e divertimentos Também aqui sua riqueza real está em proporção à sua renda líquida e não à sua renda bruta É evidente que o total de despesas necessárias para manter o capital fixo deve ser excluído da renda líquida da sociedade Jamais podem fazer parte dessa renda líquida os materiais necessários para suas máquinas úteis e seus instrumentos de trabalho suas construções etc nem o produto do trabalho necessário para processar esses ma teriais O preço dessa mãodeobra pode fazer parte da renda líquida já que os trabalhadores assim empregados podem incorporar o valor total de seus salários em seu capital reservado para o consumo imediato Mas em outros tipos de trabalho tanto seu preço como seu produto vão para esse capital o preço para o capital dos trabalhadores e o produto para o capital de outras pessoas cuja manutenção comodi dades e divertimentos são aumentados pelo trabalho desses empregados O propósito do capital fixo é aumentar as forças produtivas do trabalho ou possibilitar que o mesmo número de trabalhadores execute uma quantidade muito maior de trabalho Em uma propriedade em que todas as construções necessárias cercas escoadouros comunicações etc estão na mais perfeita ordem o mesmo número de trabalhadores e o mesmo número de cabeças de gado utilizadas na agricultura darão uma produção muito maior do que em uma propriedade da mesma extensão e com solo da mesma qualidade destituída dessas benfeitorias Nas manufaturas o mesmo número de trabalhadores utilizando as melhores máquinas processarão uma quantidade muito maior de bens do que se os instrumentos de trabalho forem menos perfeitos A despesa adequadamente investida em um capital fixo de qualquer espécie sem pre é reembolsada com grande lucro e acrescenta à produção anual um valor muito superior àquele representado pela manutenção dessas melhorias Essa manutenção porém ainda exige certa porção dessa produção Certa quantidade de materiais e o trabalho de certo número de operários os quais poderiam ter sido empregados imediatamente para aumentar o alimento a roupa e moradia a subsistência e os artigos úteis à sociedade são dessa forma desviados para outro em OS ECONOMISTAS 296 prego sem dúvida altamente vantajoso mas diferente daquele É por essa razão que se considera sempre como vantajosas para toda a so ciedade todas essas melhorias mecânicas que possibilitam ao mesmo número de operários executar com máquinas mais baratas e mais sim ples uma quantidade de trabalho igual à que se costumava executar antes Certa quantidade de materiais e o trabalho de certo número de operários que antes eram empregados para manter máquinas mais complexas e mais caras podem ser aplicados depois para aumentar a quantidade de trabalho que somente essas ou outras máquinas podem produzir O empresário de alguma grande manufatura que emprega uma quantia de mil por ano para manter sua maquinaria se puder reduzir essa despesa a quinhentos naturalmente empregará os outros quinhentos para comprar uma quantidade adicional de materiais a serem processados por um número maior de operários Portanto a quantidade de trabalho que somente suas máquinas foram capazes de executar será naturalmente aumentada e com isso aumentarão todas as vantagens e conveniências que a sociedade pode auferir desse trabalho A despesa necessária para manter o capital fixo em um grande país pode com muita propriedade ser comparada à despesa necessária para reparos em uma propriedade privada A despesa dos reparos pode muitas vezes ser necessária para manter a produção da propriedade e conseqüentemente tanto a renda bruta da terra como a renda líquida do dono da terra Se porém essa despesa puder ser diminuída mediante uma administração mais adequada sem acarretar nenhuma redução da produção a renda bruta da terra permanece no mínimo igual ao que era antes e a renda líquida da terra necessariamente aumentará Embora a despesa total de manutenção do capital fixo necessa riamente deva ser excluída da renda líquida da sociedade não acontece o mesmo com a despesa necessária para manter o capital circulante Dos quatro elementos que compõem esse capital o dinheiro os su primentos os materiais o produto acabado os três últimos como já observei são normalmente retirados do capital circulante e incor porados ao capital fixo da sociedade ou a seu capital reservado para o consumo imediato Toda porção desses bens de consumo que não for empregada na manutenção do capital circulante vai para o capital da sociedade constituindo uma parte da renda líquida desta Portanto a manutenção desses três componentes do capital circulante não retira da renda líquida da sociedade nenhuma porção da produção anual além do que é necessário para manter o capital fixo Sob esse aspecto o capital circulante de uma sociedade é diferente do de um indivíduo Em se tratando do capital circulante de um in divíduo está totalmente excluída a possibilidade dele fazer parte da sua renda líquida a qual deve consistir unicamente no lucro auferido pelo indivíduo Embora o capital circulante de cada indivíduo constitua uma parte do capital circulante da sociedade à qual pertence nem por isso está totalmente excluído que possa fazer parte também da renda líquida da sociedade Embora de forma alguma seja necessário incor ADAM SMITH 297 porar todos os bens existentes na loja de um comerciante ao seu próprio capital reservado para consumo imediato podem ser incorporados ao capital de outras pessoas as quais com uma renda auferida de outros fundos podem regularmente repor ao comerciante o valor dos bens juntamente com o lucro sem gerar nenhuma diminuição de seu capital ou do delas O dinheiro portanto é o único componente do capital circulante de uma sociedade cuja manutenção pode acarretar alguma diminuição na renda líquida da mesma O capital fixo e aquela parte do capital circulante que consiste em dinheiro assemelhamse muito entre si no que tange à maneira de afetarem a renda da sociedade Primeiramente assim como aquelas máquinas e instrumentos de trabalho etc exigem certa despesa primeiro para serem implantadas e depois para serem mantidas despesas essas que embora façam parte da renda bruta da sociedade representam deduções de sua renda líquida da mesma forma o capital em dinheiro que circula em cada país exige necessariamente certa despesa primeiro para ser recolhido e depois para ser mantido despesas essas que analogamente embora representem uma parte da renda bruta da sociedade representam de duções da renda líquida da mesma Certa quantidade de materiais muito valiosos ouro e prata e de mãodeobra muito rara em vez de aumentarem o capital reservado para consumo imediato os bens ne cessários para a subsistência as comodidades e os divertimentos dos indivíduos são empregados para manter esse grande mas dispendioso instrumento de comércio através do qual se distribuem a cada indivíduo da sociedade na proporção adequada os bens necessários para sua subsistência suas comodidades e seus divertimentos Em segundo lugar assim como as máquinas e instrumentos de trabalho etc que compõem o capital fixo de um indivíduo e de uma sociedade e não fazem parte nem da renda bruta nem da renda líquida do indivíduo nem da sociedade da mesma forma o dinheiro através do qual toda a renda da sociedade é regularmente distribuída a cada um de seus membros não faz parte dessa renda A grande engrenagem da circulação é totalmente diferente dos bens que essa roda faz circular A renda da sociedade consiste integralmente nesses bens e não na engrenagem que os faz circular Ao computar a renda bruta ou a renda líquida de uma sociedade devemos sempre deduzir da circulação anual total de dinheiro e de bens o valor total do dinheiro sendo que nem sequer um ceitil pode fazer parte da renda bruta ou da renda líquida da sociedade Somente a ambigüidade da linguagem pode fazer com que essa proposição pareça duvidosa ou paradoxal Se devidamente explicada e compreendida a proposição quase se evidencia por si mesma Quando falamos de determinada soma de dinheiro às vezes não entendemos outra coisa senão as peças metálicas de que ela se compõe e às vezes incluímos no significado alguma referência obscura aos bens OS ECONOMISTAS 298 que podemos obter em troca dele ou ao poder de compra que a posse do dinheiro nos dá Assim quando dizemos que o dinheiro em circulação na Inglaterra foi calculado em 18 milhões tencionamos apenas expres sar a soma ou montante de peças metálicas que alguns autores con sideraram ou antes supuseram circular nesse país Mas quando di zemos que um homem vale 50 ou 100 libras por ano entendemos geralmente expressar não somente o montante de peças metálicas que lhe são pagas anualmente mas também o valor dos bens que ele pode anualmente comprar ou consumir Costumamos geralmente constatar qual é ou deve ser seu padrão de vida ou a quantidade e a qualidade dos bens necessários e dos confortos que ele pode adequadamente se permitir Quando ao falar de uma quantia específica de dinheiro tencio namos expressar não somente a soma de peças metálicas de que se compõe esta quantia mas também incluir no seu significado alguma referência indefinida aos bens que se pode obter em troca da referida soma a riqueza ou renda que nesse caso a soma de dinheiro exprime é igual somente a um desses dois valores designados com alguma ambigüidade pelo mesmo termo nesse caso o termo dinheiro designa mais adequadamente o segundo sentido isto é o valor do dinheiro do que propriamente o dinheiro em si mesmo Assim se a pensão semanal de determinada pessoa for de um guinéu ela pode no decurso da semana comprar com essa soma certa quantidade de coisas necessárias e de confortos além de lazeres Con forme essa quantidade for grande ou pequena sua riqueza real sua renda semanal real será grande ou pequena Sua renda semanal cer tamente não é igual ao guinéu e àquilo que com o guinéu ela pode comprar mas é igual somente a um desses dois valores iguais mais adequadamente ao segundo do que ao primeiro ou seja mais adequa damente ao valor de um guinéu do que ao guinéu em si mesmo Se a pensão dessa pessoa lhe fosse paga não em ouro mas em um vale semanal de um guinéu sua renda certamente não consistiria propriamente em um pedaço de papel mas antes naquilo que a pessoa poderia comprar com isso Um guinéu pode ser considerado como uma nota de crédito equivalente a certa quantidade de bens necessários e de confortos que a pessoa pode emitir contra todos os comerciantes da região A renda da pessoa a quem se paga esse guinéu não consiste propriamente numa peça de ouro mas antes naquilo que ela pode comprar com essa moeda ou naquilo que a pessoa pode obter em troca da moeda Se a moeda não pudesse ser trocada por nada como seria o caso de uma nota de crédito emitida por alguém em bancarrota não teria mais valor do que o pedaço de papel mais inútil Analogamente embora a renda semanal ou anual de todos os diversos habitantes de um país possa serlhes e com freqüência é realmente paga em dinheiro sua riqueza real a renda real semanal ou anual de todos eles considerados em conjunto será sempre grande ou pequena conforme for grande ou pequena em proporção à quantidade ADAM SMITH 299 de bens de consumo que todos eles têm condições de comprar com esse dinheiro Evidentemente a renda total de todos eles tomados em conjunto não é igual ao dinheiro e aos bens de consumo mas somente a um desses dois valores mais propriamente ao segundo do que ao primeiro Por isso embora com freqüência expressemos a renda de uma pessoa pelas peças metálicas que lhe são pagas anualmente isso acon tece porque o montante dessas peças determina a extensão de seu poder de compra ou de valor dos bens que ela pode permitirse consumir anualmente Consideramos ainda que a renda da pessoa consiste nesse poder de compra ou de consumo e não nas peças que representam esse poder Mas se isso é suficientemente evidente com respeito a um indi víduo mais evidente ainda é no tocante a uma sociedade O montante de peças metálicas anualmente pago a um indivíduo é muitas vezes exatamente igual à sua renda e por isso constitui a expressão mais concisa e mais adequada do valor dessa renda Mas o montante de peças metálicas que circula em uma sociedade nunca pode ser igual à renda de todos os seus membros Já que o mesmo guinéu que paga a pensão semanal de uma pessoa hoje pode pagar a pensão semanal de outra pessoa amanhã e a de uma terceira depois de amanhã o montante de peças metálicas que circulam anualmente em qualquer país terá sempre muito menos valor do que a soma de todas as pensões em dinheiro pagas anualmente aos cidadãos Mas o poder de compra ou os bens que se pode sucessivamente comprar com o total dessas pensões em dinheiro quando são pagas sucessivamente sempre terá exatamente o mesmo valor que o dessas pensões como será também igual à renda das diversas pessoas às quais as pensões são pagas Essa renda portanto não pode consistir nessas peças metálicas cujo montante é tão inferior ao valor das pensões consistirá sim no poder de compra nos bens que se pode sucessivamente comprar com elas ao circularem de mão em mão O dinheiro portanto a grande roda da circulação o grande ins trumento do comércio como todos os outros instrumentos de comércio embora constitua uma parte e parte muito importante do capital não faz parte da renda da sociedade à qual pertence e embora as peças metálicas que compõem o dinheiro distribuam no curso de sua circu lação anual a cada pessoa a renda que adequadamente lhe pertence elas mesmas não fazem parte da citada renda Em terceiro lugar finalmente as máquinas e instrumentos de trabalho etc que compõem o capital fixo apresentam outra semelhança com a parte do capital circulante que consiste em dinheiro assim como toda economia de despesas que se fizerem na implantação e na ma nutenção das citadas máquinas desde que não sejam reduzidas as forças produtivas do trabalho constitui uma melhoria da renda líquida da sociedade da mesma forma toda economia de despesas de coleta OS ECONOMISTAS 300 e de manutenção da parte do capital circulante que consiste em dinheiro representa uma melhoria exatamente do mesmo tipo É suficientemente óbvio e isso já foi explicado em parte de que modo toda a economia de despesas feita na manutenção do capital fixo significa um aumento da renda líquida da sociedade O capital total do empresário de qualquer setor de trabalho dividese necessariamente entre seu capital fixo e seu capital circulante En quanto seu capital total permanecer o mesmo quanto menor for um dos dois capitais tanto maior será necessariamente o outro É o capital circulante que fornece os materiais e os salários do trabalho e movi menta a indústria Por conseguinte toda economia feita nas despesas de manutenção do capital fixo que não diminua as forças produtivas do trabalho deve necessariamente aumentar o fundo que movimenta a indústria e conseqüentemente a produção anual da terra e da mão deobra a renda real de cada sociedade A substituição do dinheiro em moeda de ouro e prata por papel moeda substitui um instrumento muito dispendioso de comércio por outro muito mais barato e às vezes igualmente adequado A circulação do dinheiro passa a ser feita através de uma nova roda cuja implan tação e manutenção custam menos do que a antiga De que maneira isso se faz e de que modo essa transformação tende a aumentar ou a renda bruta ou a renda líquida da sociedade eis um ponto não to talmente evidente e que portanto exige explicação mais detalhada Há vários tipos diferentes de papelmoeda entretanto as notas em circulação dos bancos e banqueiros são o tipo mais conhecido e que parece mais adequado para essa finalidade Quando a população de determinado país tem tal confiança na fortuna na probidade e na prudência de determinado banqueiro a ponto de acreditar que ele está sempre pronto a pagar quando solici tado as notas promissórias de sua emissão que lhes foram apresen tadas essas notas passam a ter a mesma aceitação que as moedas de ouro ou prata devido à confiança que se tem de que a qualquer momento elas podem ser trocadas por dinheiro Suponhamos que determinado banqueiro empreste a seus clientes suas próprias notas promissórias digamos até ao valor de 100 mil libras Uma vez que essas notas atendem a todos os objetivos do di nheiro seus devedores lhe pagam os mesmos juros como se o banqueiro lhes tivesse emprestado esse montante em dinheiro Esses juros cons tituem a fonte de seu ganho Embora algumas dessas notas retornem continuamente ao banqueiro como pagamento parte delas continua a circular por meses e anos sucessivos Embora portanto ele geralmente tenha em circulação notas até ao valor de 100 mil libras o montante de 20 mil libras em ouro e prata pode muitas vezes constituir a pro visão suficiente para atender às demandas ocasionais Por essa ope ração portanto 20 mil libras esterlinas em ouro e prata cumprem todas as funções que de outra forma poderiam ter sido cumpridas por 100 mil libras Com as notas promissórias do banqueiro no valor ADAM SMITH 301 total de 100 mil libras é possível efetuar as mesmas trocas podendose fazer circular e distribuir entre seus consumidores específicos a mesma quantidade de bens de consumo que se faria circular e se distribuiria com 100 mil libras em ouro e prata Com isso podese poupar a cir culação de 80 mil libras de ouro e prata no país E se ao mesmo tempo outros bancos e banqueiros fizerem coisa semelhante toda a circulação de bens no país pode ser efetuada com apenas 15 do montante de ouro e prata que de outra forma se exigiria Suponhamos por exemplo que o total da moeda circulante de determinado país em um dado momento seja de 1 milhão de libras esterlinas soma esta suficiente para fazer circular o total da produção anual da terra e da mãodeobra do respectivo país Suponhamos tam bém que algum tempo depois diversos bancos e banqueiros emitam notas promissórias pagáveis ao portador até ao valor de 1 milhão mantendo em seus diversos cofres uma reserva de 200 mil libras em ouro e prata para atender a demandas ocasionais Portanto perma neceriam em circulação 800 mil libras em ouro e prata e 1 milhão de notas bancárias ou seja um total de 18 milhão de libras Mas a produção anual da terra e da mãodeobra do país exigira antes apenas 1 milhão de libras para fazêla circular e a distribuir a seus consumi dores específicos e essa produção anual não podia ser imediatamente aumentada por aquelas operações bancárias Portanto depois das ci tadas operações bancárias será suficiente 1 milhão pra fazer circular essa produção Sendo exatamente os mesmos que antes os bens a serem comprados e vendidos será suficiente a mesma quantidade de dinheiro para comprálos e vendêlos O canal de circulação se me for per mitido usar essa expressão permanecerá exatamente o mesmo que antes Supusemos que 1 milhão é suficiente para encher o canal Tudo que portanto seja lançado no canal além dessa soma não poderá deslizar nele vindo a transbordar Colocase agora nesse canal 18 milhão de libras Portanto 800 mil libras esterlinas devem transbordar já que esta soma está além do que pode ser empregado na circulação deste país Todavia embora esta soma excedente não possa ser em pregada na circulação do país ela é muito valiosa para que se possa deixála ociosa Esta soma será portanto enviada ao exterior à procura de uma aplicação rentável que não é possível no país Mas não se pode enviar papel ao exterior pois ele não será recebido em pagamentos comuns normais devido a distância dos bancos emissores e do país no qual o pagamento pode ser cobrado por lei Enviarseão portanto ouro e prata no montante de 800 mil libras ao exterior e o canal da circulação interna permanecerá cheio com 1 milhão de dinheiro em papel em lugar do 1 milhão daqueles metais que o enchiam anteriormente Embora essa quantidade tão grande de ouro e prata seja enviada ao exterior não devemos imaginar que o seja de graça ou que os proprietários dêem essa quantia de presente a outras nações Trocá laão por bens do exterior deste ou daquele tipo a fim de suprir o consumo de algum outro país ou do seu próprio OS ECONOMISTAS 302 Se empregarem essa remessa comprando mercadorias em um país estrangeiro a fim de suprir o consumo de outro país ou seja no que se denomina comércio de transporte qualquer lucro que aufiram será um acréscimo à renda líquida de seu próprio país É como um novo fundo criado para desenvolver uma nova atividade comercial no comércio interno as transações serão efetuadas com papelmoeda sen do o ouro e a prata convertidos em um fundo para este novo tipo de comércio Se o dinheiro enviado ao exterior for empregado para comprar bens estrangeiros destinados ao consumo interno os proprietários do dinheiro exportado poderão primeiro comprar bens suscetíveis de se rem consumidos por pessoas ociosas que não produzem nada tais como vinhos estrangeiros sedas estrangeiras etc ou então poderão comprar um estoque adicional de materiais ferramentas e provisões a fim de manter e empregar um número adicional de pessoas operosas que reproduzem com lucro o valor de seu consumo anual Na medida em que o dinheiro exportado é utilizado da primeira forma ele promove esbanjamento aumenta a despesa e o consumo sem aumentar a produção ou sem criar qualquer fundo permanente para custear essa despesa o que é sob todos os aspectos prejudicial à sociedade Na medida em que o dinheiro for empregado da segunda maneira promove o trabalho e embora faça aumentar o consumo da sociedade gera um fundo permanente para custear esse consumo já que as pessoas que consomem no caso reproduzem com lucro o valor total de seu con sumo anual A renda bruta da sociedade a produção anual de sua terra e de sua mãodeobra é aumentada pelo valor total que o trabalho daqueles trabalhadores acrescenta aos materiais com que eles lidam e a renda líquida é aumentada pelo que sobra desse valor após deduzir o que é necessário para as ferramentas e instrumentos de sua profissão Parece não somente provável mas quase inevitável que a maior parte do ouro e da prata que por força das citadas operações bancárias é enviada ao exterior seja empregada para comprar bens estrangeiros para o consumo interno Embora certas pessoas às vezes possam au mentar sua despesa consideravelmente apesar de não aumentar em nada sua renda podemos estar certos de que nenhuma classe ou ca tegoria de pessoas faz isso pois embora os princípios da prudência comum nem sempre dirijam a conduta de cada indivíduo sempre in fluenciam a conduta da maioria dos membros de cada classe ou cate goria Mas a renda das pessoas ociosas consideradas como uma classe ou categoria não pode ser aumentada o mínimo que seja por essas operações bancárias Por isso sua despesa em geral não pode ser muito aumentada por elas embora a de alguns poucos indivíduos dentre eles o possa e na realidade às vezes o seja Portanto sendo a mesma ou quase a mesma que antes a procura de bens importados por parte das pessoas ociosas é provável que uma pequena parte do dinheiro enviado ao exterior por força das operações bancárias destinada a comprar ADAM SMITH 303 bens estrangeiros para o consumo interno seja suscetível de ser em pregada para comprar artigos de consumo para a classe dos ociosos A maior parte será naturalmente utilizada para a manutenção e di namização do trabalho e não para manter a ociosidade Ao computarmos a quantidade de trabalho que o capital circulante de uma sociedade pode empregar devemos sempre levar em conta apenas aquelas partes do mesmo que consistem em mantimentos ma teriais e serviço acabado a outra parte consistente em dinheiro e que serve somente para fazer circular as três primeiras deve sempre ser deduzida Para movimentar a indústria requeremse três coisas ma teriais com que trabalhar instrumentos de trabalho e salários ou re muneração em função dos quais se executa o trabalho O dinheiro não constitui material a ser trabalhado nem instrumento de trabalho e embora os salários do operário geralmente sejam pagos em dinheiro sua renda real como a de todas as outras pessoas não consiste no dinheiro mas no valor do dinheiro não consiste nas peças metálicas mas naquilo que com elas se pode comprar Evidentemente a quantidade de trabalho que um capital pode empregar deve ser igual ao número de operários aos quais pode fornecer materiais instrumentos e uma remuneração condigna com a natureza do serviço O dinheiro pode ser necessário para comprar os materiais e os instrumentos do trabalho bem como a manutenção dos trabalha dores Mas a quantidade de trabalho que o capital total pode empregar certamente não é igual ao dinheiro que compra aos materiais instru mentos e salários comprados com o dinheiro é igual somente a um ou outro desses dois valores e ao último mais adequadamente do que ao primeiro Quando se substitui o dinheiro em ouro e prata pelo dinheiro em papel a quantidade de materiais ferramentas e manutenção da mãodeobra que o total do capital circulante pode suprir deve ser aumentada pelo valor total do ouro e prata que antes costumavam ser empregados para comprálos O valor total da grande roda de circulação e distribuição é acrescido aos bens que circulam e são distribuídos pelo dinheiro Até certo ponto a operação assemelhase à do empresário de uma grande organização de trabalho o qual em conseqüência de al guma melhoria ou aperfeiçoamento mecânico elimina suas máquinas velhas e acrescenta a diferença entre o preço delas e o das máquinas novas ao seu capital circulante ao fundo através do qual compra ma teriais e paga salários a seus trabalhadores Talvez seja impossível determinar qual a proporção que o dinheiro circulante de qualquer país tem com o valor total da produção anual que é posta em circulação por esse capital Segundo diversos autores esta proporção tem sido calculada em 15 110 120 e 130 daquele valor Mas por pequena que seja a proporção que o dinheiro em cir culação possa ter com o valor total da produção anual já que somente uma parte e muitas vezes somente uma pequena parte dessa produção é destinada à manutenção do trabalho o dinheiro deve sempre repre OS ECONOMISTAS 304 sentar uma porcentagem considerável em relação a essa parte Quando portanto em virtude da entrada em vigor do papelmoeda o ouro e a prata necessários para a circulação são reduzidos a talvez 15 da quan tidade anterior se for acrescentado o valor de apenas a maior parte dos outros 45 aos fundos destinados à manutenção da indústria deve cons tituir um acréscimo bastante considerável à quantidade desse trabalho e conseqüentemente ao valor da produção anual da terra e do trabalho Uma operação desse tipo foi efetuada no decorrer dos últimos 20 ou 30 anos na Escócia pela implantação de novas sociedades ban cárias em quase todas as cidades de porte e até mesmo em algumas aldeias do interior Os efeitos dessa operação foram exatamente os acima descritos Os negócios do país são quase inteiramente efetuados com notas de emissão dessas sociedades bancárias notas essas com as quais se costuma fazer compras e pagamentos de todos os tipos A prata aparece muito raramente a não ser como troca de uma nota bancária de 20 xelins e o ouro ainda mais raramente Embora a conduta dessas sociedades bancárias não tenha sido totalmente correta exigindo até uma lei do Parlamento para regulamentála é evidente no entanto que o país hauriu grandes benefícios dessas operações Ouvi contar que o comércio da cidade de Glasgow duplicou em aproximadamente 15 anos depois da implantação dos bancos e que o comércio da Escócia mais que quadruplicou desde a implantação dos dois bancos oficiais de Edimburgo dos quais um denominado The Bank of Scotland foi criado por lei do Parlamento em 1695 o outro chamado The Royal Bank foi criado por decreto régio de 1727 Não me é dado saber com certeza se o comércio seja na Escócia em geral seja na cidade de Glasgow em especial aumentou realmente tanto durante um período tão breve Se o crescimento foi dessa ordem pareceme que o efeito é muito grande para poder ser atribuído exclusivamente a essa causa Que o comércio e a indústria da Escócia aumentaram muito durante o citado período e que os bancos contribuíram muito para que isso ocorresse eis um fato incontestável O valor do dinheiro em prata que circulava na Escócia antes da união com a Inglaterra em 1707 e que imediatamente depois foi levado ao banco da Escócia para ser recunhado montava a 411 117 10 s e 9 d Não se tem qualquer cálculo relativo à moeda de ouro todavia com base nos antigos relatos da casa de moeda da Escócia presumese que o valor do ouro cunhado anualmente superava um pouco o da prata149 Houve muitas pessoas na época que por descon fiarem do reembolso não levaram sua prata ao banco da Escócia ha vendo também alguma moeda inglesa que não foi entregue Por isso o valor total do ouro e da prata que circulava na Escócia antes da união não pode ser calculado em menos do que 1 milhão de libras esterlinas Este parece haver sido mais ou menos o total da moeda ADAM SMITH 305 149 Ver o prefácio de Ruddiman a Anderson Diplomata Scotiae circulante naquele país pois embora a circulação do banco da Escócia que não tinha então nenhum concorrente fosse considerável ela parece ter representado apenas uma pequena parte do total Atualmente o total do dinheiro em circulação na Escócia não pode ser calculado em menos de 2 milhões de libras esterlinas dos quais a parte consistente em moeda de ouro e prata muito provavelmente não chega a representar 05 milhão Mas ainda que durante esse período tenha diminuído muito o dinheiro em ouro e prata circulante na Escócia a riqueza real e a prosperidade do país não parecem ter nada sofrido Ao contrário sua agricultura sua manufatura comércio e a produção anual da terra e da mãodeobra obviamente aumentaram É sobretudo descontando letras de câmbio isto é adiantando dinheiro por elas antes de seu vencimento que a maior parte dos bancos e banqueiros emitem suas notas promissórias De qualquer soma adiantada deduzem sempre os juros de lei até o vencimento dos títulos O pagamento do título na data do vencimento restitui ao banco o valor do que tinha sido adiantado juntamente com o lucro completo dos juros O banqueiro que adianta dinheiro ao comerciante cujos títulos des conta não ouro e prata mas suas próprias notas promissórias tem a vantagem de poder descontar uma soma muito maior pelo valor total de suas notas promissórias que ele o sabe por experiência estão ge ralmente em circulação Com isto ele tem a possibilidade de ganhar juros líquidos sobre uma soma tanto maior O comércio da Escócia que no momento não é muito grande era ainda muito menor quando se criaram as duas primeiras sociedades bancárias mencionadas e essas sociedades teriam feito poucos negócios caso tivessem limitado suas operações a descontar letras de câmbio Por isso inventaram outro método de emissão de suas notas promis sórias permitindo as chamadas contas de caixa isto é liberando crédito até uma certa quantia 2 ou 3 mil libras por exemplo a todo indivíduo que pudesse apresentar dois avalistas de crédito inquestionável e donos de propriedades fundiárias garantindo que todo o dinheiro adiantado pelo banco até o montante do crédito concedido seria reembolsado quando solicitado juntamente com os juros de lei Segundo acredito créditos deste tipo costumam ser concedidos por bancos e banqueiros de todas as partes do mundo Mas as facilidades de reembolso que as sociedades bancárias da Escócia oferecem constituem algo de peculiar a elas pelo que sei constituindo talvez a causa principal do grande comércio desses bancos e do benefício que o país tem auferido dessas operações Toda pessoa que tem um crédito de tal gênero com um desses bancos e por exemplo toma dele um empréstimo de 1 000 libras pode reembolsar esta soma gradualmente em prestações em 20 e 30 libras por vez sendo que o banco desconta uma parte proporcional dos juros da soma total desde o dia em que cada parcela é paga até que o pagamento do total seja reembolsado Todos os comerciantes por tanto e quase todos os homens de negócio consideram convenientes OS ECONOMISTAS 306 manter tais contas de caixa nos bancos interessandose com isso em promover o comércio desses bancos recebendo prontamente suas notas em todos os pagamentos e encorajando todos aqueles junto aos quais exercem alguma influência a fazer outro tanto Os bancos quando os clientes os procuram para tomar empréstimos geralmente adiantam lhes o dinheiro em suas próprias notas promissórias Com estas por sua vez os comerciantes pagam aos manufatores pelas mercadorias os manufatores aos arrendatários pelos materiais e mantimentos os arrendatários aos proprietários de terra pelo arrendamento os donos da terra por sua vez pagam com elas aos comerciantes pelas como didades e artigos de luxo e os comerciantes as devolvem aos bancos para equilibrar suas contas de caixa ou para reporlhes o que even tualmente tomaram de empréstimo assim quase todos os negócios financeiros do país são transacionados por esses títulos bancários Daí o grande comércio dessas instituições bancárias Mediante essas contas de caixa sem cometer nenhuma impru dência cada comerciante pode efetuar um volume maior de negócios do que poderia sem elas Se há dois comerciantes um em Londres e outro em Edimburgo que aplicam capitais iguais no mesmo ramo co mercial o comerciante de Edimburgo pode sem imprudência efetuar maior volume de negócios e empregar um contingente maior de mão deobra do que o de Londres Este deverá sempre conservar consigo soma considerável de dinheiro ou em seus próprios cofres ou nos de seu banqueiro o qual não lhe paga juros por tal dinheiro essa reserva de dinheiro é necessária para atender aos pedidos de pagamento que lhe vêm continuamente dos fornecedores de quem comprou bens a cré dito Suponhamos que o montante normal dessa soma seja 500 libras O valor das mercadorias que ele manterá em seu depósito deverá ser sempre 500 libras a menos do que teria sido se ele não fosse obrigado a conservar essa soma sem aplicála Suponhamos que ele geralmente venda o estoque inteiro de que dispõe ou seja o valor correspondente a esses bens uma vez ao ano Por ser obrigado a manter uma soma de dinheiro tão grande sem aplicála ele é obrigado a vender em um ano 500 libras de valor em bens a menos do que poderia vender de outra forma Seu lucro anual será menor tanto quanto seria o lucro adicional que auferiria se pudesse vender bens no valor correspondente às 500 libras que mantém em reserva e também o contingente de mãodeobra à qual dará emprego será menor tanto quanto o acréscimo que poderia empregar para preparar as mercadorias que poderia co mercializar dispondo dessas 500 libras O comerciante em Edimburgo por outro lado não precisa manter dinheiro não aplicado para atender a tais demandas ocasionais de pagamento Quando estas aparecem ele as atende com sua conta de caixa que mantém no banco e pro gressivamente repõe a soma emprestada com o dinheiro ou os títulos que entram de vendas ocasionais de suas mercadorias Portanto com o mesmo capital ele pode sem imprudência ter a qualquer momento em seu depósito uma quantidade maior de mercadorias do que o co ADAM SMITH 307 merciante londrino podendo assim auferir um lucro maior e oferecer emprego constante a um contingente maior de trabalhadores que pre param esses bens para o mercado Daí o grande benefício que o país tem conseguido com essas operações bancárias Poderseia pensar que a facilidade de descontar letras de câmbio oferece ao comerciante inglês uma vantagem equivalente às contas de caixa do comerciante escocês Entretanto cumpre lembrar que os co merciantes escoceses podem descontar suas letras de câmbio com a mesma facilidade que os ingleses e além disso dispõem da vantagem adicional de suas contas de caixa O total de papelmoeda de qualquer tipo que pode facilmente circular em um país jamais pode ultrapassar o valor do ouro e prata com o qual supre a praça ou que circularia no país supondose que o comércio e seja o mesmo se não houvesse papelmoeda Se por exemplo cédulas de 20 xelins são o mais baixo papelmoeda corrente na Escócia o total dessas notas que pode facilmente circular no país não pode ultrapassar a soma de ouro e prata que seria necessária para efetuar as trocas no valor de 20 xelins ou mais usualmente realizadas no interior daquele país Se em determinado momento o papelmoeda em circulação ultrapassar essa soma o excedente não podendo ser enviado ao exterior nem ser empregado na circulação do país deveria retornar imediatamente aos bancos para ser cambiado por ouro e prata Muitas pessoas perceberiam imediatamente que têm mais papelmoeda do que o necessário para suas operações comerciais no país e por não poderem enviar esse dinheiro ao exterior solicitariam imediatamente o paga mento do mesmo aos bancos Quando esse papelmoeda supérfluo fosse convertido em ouro e prata facilmente poderiam utilizálo enviandoo ao exterior ao passo que nenhuma utilização haveria enquanto per manecesse em forma de papel Portanto haveria imediatamente uma corrida aos bancos à procura de todo o papel supérfluo e se estes dificultassem ou atrasassem o pagamento a corrida seria ainda maior devido ao alarme gerado por esta situação Além das despesas comuns a todo tipo de negócio tais como despesa do aluguel de casa salários dos empregados funcionários con tadores etc as despesas específicas dos bancos englobam sobretudo dois itens primeiro a despesa de manter a cada momento em seus cofres para atendimento às solicitações ocasionais de pagamento dos detentores de suas notas uma grande soma de dinheiro sobre a qual os bancos não ganham juros segundo a despesa de reabastecer esses cofres tão logo são esvaziados pelos pedidos ocasionais de pagamento das notas ou títulos emitidos pelo banco Um banco que emite mais papel do que o que pode ser empregado na circulação do país e cujo excesso continuamente retorna ao banco para pagamento deve aumentar a quantidade de ouro e prata que conserva sempre em seus cofres não somente em proporção a este aumento excessivo na circulação das notas mas em proporção muito maior já que suas notas voltam a ele muito mais rapidamente do que OS ECONOMISTAS 308 em proporção ao excesso de sua quantidade Tal banco portanto deve aumentar seu primeiro item de despesa não somente em proporção a este aumento forçado de seus negócios mas em escala muito maior Além disso os cofres desse banco embora devam ser reabaste cidos muito mais generosamente devem também esvaziarse com ra pidez maior do que no caso de seus negócios permanecerem dentro de limites mais razoáveis exigindo não somente uma despesa mais drás tica como também mais constante e ininterrupta para reabastecer os mencionados cofres Essa moeda continuamente retirada em quanti dades tão grandes de seus cofres não pode ser empregada na circulação do país Ela substitui um papel cuja quantidade ultrapassa o que a circulação comporta ultrapassando também ela portanto a circulação que o país permite Todavia uma vez que não é possível que tal moeda permaneça ociosa é preciso de uma forma ou de outra enviála ao exterior a fim de encontrar aquela aplicação rentável que não encontra no país e esta contínua exportação de ouro e prata aumentando as dificuldades deverá intensificar ainda mais a despesa do banco que consiste em encontrar mais ouro e mais prata para reabastecer seus cofres que se esvaziam com intensa rapidez Tal banco pois em pro porção a esse aumento forçado de seus negócios deverá aumentar o segundo item de sua despesa ainda mais do que o primeiro Suponhamos que o total de papel de determinado banco que a circulação do país pode com facilidade absorver e empregar represente exatamente 40 mil libras e que para atender aos pedidos ocasionais de pagamentos o banco seja obrigado a manter constantemente em seus cofres 10 mil libras em ouro e prata Se este banco tentar fazer circular 44 mil libras as 4 mil libras que ultrapassam o que a circulação pode facilmente absorver e empregar voltarão ao banco quase com a mesma rapidez com que são emitidas Portanto para atender aos pe didos ocasionais de pagamentos o banco deve manter constantemente em seus cofres não apenas 11 mil libras mas 14 mil Com isto não ganhará nada pois não receberá juros sobre as 4 mil libras que ultra passam a capacidade de circulação além disso perderá toda a despesa de recolher continuamente 4 mil libras em ouro e prata que sem cessar saem de seus cofres com a mesma rapidez com que entraram Se cada sociedade bancária tivesse sempre compreendido e aten dido a seu próprio interesse específico nunca poderia ter ocorrido um excesso de papelmoeda em circulação Todavia nem sempre todos os bancos compreenderam ou atenderam a seu próprio interesse ocorrendo com freqüência uma saturação de papelmoeda em circulação Ao emitir uma quantidade excessiva de papelmoeda cujo excesso voltava continuamente ao banco para ser cambiado por ouro e prata o Banco da Inglaterra durante muitos anos foi obrigado a cunhar ouro até o montante entre 800 mil e 1 milhão de libras por ano em média portanto aproximadamente 850 mil libras por ano Devido a esta grande cunhagem de dinheiro em conseqüência do estado de des gaste e desvalorização em que caíra o ouro há alguns anos o banco ADAM SMITH 309 muitas vezes foi obrigado a comprar ouro em lingotes ao alto preço de 4 libras por onça as quais logo emitiu em forma de moeda a 3 17 s 10 12 d por onça perdendo desta forma entre 2 e 25 na cunhagem de montante tão elevado Portanto embora o banco não pagasse se nhoriagem embora o Governo estivesse praticamente às expensas da cunhagem essa liberalidade do Governo não impediu totalmente a despesa do banco Os bancos escoceses em conseqüência de um excesso do mesmo tipo foram todos obrigados constantemente a empregar agentes em Londres para recolher dinheiro para eles tendo com isso uma despesa que raramente era inferior a 15 ou 2 Esse dinheiro era enviado por carroça à Escócia sendo assegurado pelas transportadoras a uma des pesa adicional de 34 ou 15 xelins para cada 100 libraspeso Nem sempre esses agentes conseguiam reabastecer os cofres de seus em pregadores com a mesma rapidez com que estes se esvaziavam Nesse caso o recurso dos bancos consiste em emitir sobre os seus correspon dentes em Londres letras de câmbio até ao montante que eles preci savam Depois quando esses correspondentes solicitavam ao banco o pagamento dessa soma juntamente com os juros e uma comissão al guns desses bancos devido à situação desastrosa em que se encontra vam em decorrência da emissão excessiva às vezes não tinham outra alternativa senão emitir uma segunda série de letras de câmbio para o mesmo ou para outros correspondentes londrinos e a mesma soma ou melhor letras correspondentes à mesma soma dessa forma às vezes faziam mais que duas ou três viagens sendo que o banco devedor sempre pagava os juros e a comissão sobre o valor total da soma acu mulada Mesmo os bancos escoceses que nunca se distinguiram por imprudência extrema viramse às vezes obrigados a lançar mão desse recurso altamente prejudicial A moeda de ouro que era paga pelo Banco da Inglaterra ou pelos bancos escoceses em troca daquela parte de papelmoeda que ultra passava o montante que podia circular no país pelo fato de também ele ultrapassar o que a circulação do país comportava às vezes era enviado ao exterior em forma de moeda às vezes era fundido e enviado ao exterior sob a forma de lingotes e às vezes fundido e vendido ao Banco da Inglaterra ao alto preço de 4 libras a onça Somente as peças mais novas mais pesadas e melhores eram cuidadosamente recolhidas sendo enviadas ao exterior ou fundidas No próprio país e enquanto permaneciam na forma de moeda essas peças pesadas não tinham mais valor que as moedas leves valiam porém mais que elas quando eram enviadas ao exterior ou quando fundidas em lingotes permane ciam no país O Banco da Inglaterra apesar da grande cunhagem anual que fazia constatou com surpresa que todo ano havia a mesma escassez de moedas que no ano anterior e que a despeito da grande quantidade de moedas boas e novas emitidas anualmente pelo Banco o estado da moeda ao invés de melhorar tornavase pior de ano para ano Cada ano viase na necessidade de cunhar quase a mesma quan OS ECONOMISTAS 310 tidade de ouro do ano anterior e devido ao aumento contínuo do preço do ouro em lingote decorrência do incessante uso e desgaste das moe das a cada ano tornavase maior a despesa dessa grande cunhagem anual Cumpre observar que o Banco da Inglaterra ao suprir seus próprios cofres com moeda é indiretamente obrigado a suprir o reino todo para o qual as moedas continuamente fluem desses cofres de múltiplas maneiras Por isso todo dinheiro em moeda que era neces sário para manter essa circulação excessiva de papelmoeda inglês e escocês todos os vazios que essa circulação excessiva gerava nas re servas de moeda do reino o Banco da Inglaterra era obrigado a su prilos Sem dúvida os bancos escoceses todos eles pagaram muito caro por sua própria imprudência e falta de atenção O Banco da In glaterra porém pagou muito caro não somente pela própria impru dência mas também pela imprudência muito maior de quase todos os bancos escoceses O comércio excessivo de certos planejadores ousados tanto na Inglaterra como na Escócia foi a causa original desse excesso de cir culação de papelmoeda O que um banco pode adequadamente adiantar a um comerciante ou a um empresário de qualquer tipo não é o capital total com o qual ele comercializa nem mesmo uma parte considerável do mesmo mas somente aquela parte do capital que o tomador de outra forma teria que conservar consigo sem aplicála ou seja em dinheiro vivo para atender a pedidos ocasionais Se o papelmoeda que o banco empresta nunca ultrapassar este valor nunca poderá superar o valor do ouro e da prata que necessariamente circularia no país se não houvesse pa pelmoeda jamais poderá exceder a quantidade que a circulação do país pode com facilidade absorver e empregar Quando um banco desconta para um comerciante uma letra de câmbio real emitida por um credor real sobre um devedor real e que na data do vencimento é realmente paga pelo devedor o banco somente adianta ao comerciante uma parte do valor que de outra forma seria obrigado a manter consigo sem empregála em forma de dinheiro vivo para atender aos pagamentos solicitados O pagamento do título na data do vencimento repõe ao banco o valor que ele adiantara jun tamente com os juros Os cofres do banco na medida em que seus negócios se limitam a tais clientes assemelhamse a um reservatório dágua do qual embora continuamente saia uma torrente uma outra torrente continuamente entra perfeitamente igual à que sai de modo que sem outra atenção ou cuidado o reservatório mantém sempre um nível igual ou quase igual Pouca ou nenhuma despesa pode ser ne cessária para reabastecer os cofres de tal banco Um comerciante mesmo sem ter um comércio excessivo muitas vezes pode ter necessidade de uma soma em dinheiro vivo mesmo que não tenha título algum para descontar Quando um banco além de descontar seus títulos lhe adianta em tais ocasiões essas somas em sua conta de caixa aceitando reembolso parcelado na medida em que ADAM SMITH 311 o comerciante recebe da venda de suas mercadorias com as mesmas facilidades oferecidas pelos bancos da Escócia dispensao inteiramente da necessidade de ele conservar consigo qualquer parte de seu capital não aplicado em forma de dinheiro vivo para atender aos pedidos oca sionais Quando tais pedidos realmente vencem o comerciante pode atendêlos suficientemente com sua conta de caixa O banco porém ao negociar com tais clientes deve observar com grande cuidado se no decurso de um breve período por exemplo 4 5 6 ou 8 meses a soma dos reembolsos que ele costuma receber dos clientes é ou não exatamente igual à soma dos adiantamentos que costuma conceder a esses tomadores Se nesses breves períodos a soma dos reembolsos feitos por certos clientes na maioria dos casos é igual à soma dos adiantamentos concedidos pode o banco tranqüilamente continuar a negociar com eles Embora a torrente que nesse caso sai constantemente de seus cofres seja muito grande a torrente que entra continuamente neles deve ser pelo menos igualmente grande de maneira que sem outros cuidados ou cautelas é provável que esses cofres sempre estarão plena ou quase plenamente cheios e dificilmente ocorrerá a necessidade de uma despesa extraordinária para reabastecêlos Se ao contrário a soma dos reembolsos de certos outros clientes costuma com muita freqüência ficar muito abaixo dos adiantamentos a eles concedidos o banco não poderá com segurança continuar a negociar com tais toma dores pelo menos enquanto continuarem a agir dessa forma A torrente que neste caso continuamente jorra de seus cofres será muito maior do que a torrente que constantemente entra de maneira que esses cofres cedo estarão totalmente esgotados a menos que sejam reabas tecidos por algum esforço de despesa grande e contínua Em razão disto as sociedades bancárias da Escócia durante muito tempo tiveram muito cuidado em exigir reembolsos freqüentes e regu lares de seus tomadores recusandose a negociar com qualquer pessoa por maior que fosse sua fortuna e por melhor que fosse seu crédito que não efetuasse com eles o que chamavam de operações freqüentes e regulares Esta atenção além de poupar quase totalmente a despesa extraordinária para reabastecer seus cofres lhes assegurou duas outras vantagens consideráveis Em primeiro lugar esse cuidado lhes possibilitou fazer um jul gamento razoável sobre a condição boa ou má de seus devedores sem terem de que procurar outra prova senão a fornecida pelos seus livros contábeis já que na maioria dos casos as pessoas são regulares ou irregulares em seus reembolsos conforme sua situação financeira as cendente ou descendente Um particular que empresta seu dinheiro talvez a 6 ou 12 devedores pode pessoalmente ou através de seus agentes observar e investigar constante e cuidadosamente a conduta e a situação de cada um deles Mas um banco que empresta dinheiro talvez a quinhentas pessoas diferentes e cuja atenção é continuamente ocupada por assuntos de natureza muito diferente não poderá ter in formações regulares sobre a conduta e a situação financeira da maior OS ECONOMISTAS 312 parte de seus devedores além do controle resultante de sua própria contabilidade Exigindo reembolsos freqüentes e regulares de seus to madores os bancos da Escócia provavelmente tiveram em vista essa vantagem Em segundo lugar usando desse cuidado os bancos se garantiram contra a possibilidade de emitir mais papelmoeda do que o quanto podia facilmente absorver e comportar a circulação no país Quando observavam que dentro de curtos períodos de tempo os reembolsos dos clientes na maioria dos casos eram perfeitamente iguais aos em préstimos que iam fazerlhes podiam ter a certeza de que o papel moeda que lhes haviam adiantado nunca excedia a reserva de ouro e prata que de outra forma teriam sido obrigados a manter para atender aos pagamentos ocasionais e que conseqüentemente o papelmoeda que circulava desta forma nunca tinha excedido a quantidade de ouro e prata que teria circulado no país na hipótese de não haver papel moeda A freqüência a regularidade e as somas dos reembolsos eram suficientes para demonstrar que o montante de seus adiantamentos nunca superara aquela parte de seu capital que de outra forma teriam sido obrigados a conservar consigo não aplicada e em forma de dinheiro vivo para pagamentos ocasionais isto é com o propósito de manter o resto de seu capital em constante movimentação É somente esta parte de seu capital que dentro de curtos períodos de tempo retoma conti nuamente a todo comerciante em forma de dinheiro em moeda ou em papel e continuamente sai dele da mesma forma Se os adiantamentos do banco tinham comumente excedido esta parte de seu capital o mon tante normal de seus reembolsos não poderia nos limites de curtos períodos de tempo igualar o montante normal de seus adiantamentos A torrente que através de suas transações entrava continuamente nos cofres do banco não poderia ter sido igual à torrente que mediante essas mesmas operações saía continuamente deles Os adiantamentos dos títulos do banco por excederem a quantidade de ouro e prata que se não tivessem ocorrido tais empréstimos teria sido obrigado a manter consigo para o atendimento dos pagamentos ocasionais logo poderiam superar a quantidade total de ouro e prata que supondose que o comércio permaneça o mesmo teria circulado no país se não tivesse havido papelmoeda e conseqüentemente o papelmoeda superaria a quantidade que a circulação do país poderia facilmente absorver e apli car e o excesso desse papelmoeda teria imediatamente retornado ao banco para ser cambiado por dinheiro em ouro e prata Esta segunda vantagem embora igualmente real talvez não tenha sido imediata mente bem compreendida por todos os bancos da Escócia Quando em parte pela conveniência de descontar títulos e em parte pela conveniência das contas de caixa os comerciantes dignos de crédito de qualquer país podem ser dispensados da necessidade de manter qualquer parte de seu capital sem aplicação e em forma de dinheiro vivo para pagamentos ocasionais não podem razoavelmente esperar mais ajuda dos bancos e banqueiros os quais tendo chegado ADAM SMITH 313 tão longe não podem ir ainda mais além sob risco de comprometerem seus interesses e sua segurança Um banco se quiser salvaguardar seus próprios interesses não pode adiantar a um comerciante toda ou mesmo a maior parte do capital circulante com o qual opera com efeito embora esse capital retorne constantemente ao banco em forma de dinheiro e continuamente saia dele na mesma forma ainda assim é excessivamente longo o tempo que decorre entre o total das saídas e o total dos retornos e a soma de desembolsos não poderia igualar a soma de seus adiantamentos nos limitados períodos de tempo como convém aos interesses de um banco Muito menos o banco poderia permitirse adiantar ao comerciante uma parte considerável de seu capital fixo por exemplo do capital que o empresário de uma forjaria emprega em implantar sua forja e sua oficina de fundição seus alber gues e seus depósitos as moradias de seus trabalhadores etc ou então do capital que o explorador de uma mina emprega em cavar seus poços na instalação das máquinas para extração de água em construir es tradas e trilhos para os vagões etc ou então do capital que uma pessoa que empreende a melhoria da terra emprega em roçar drenar cercar adubar e arar campos baldios e não cultivados em construir sedes de propriedades rurais com todos os acessórios exigidos estábu los celeiros etc Os retornos do capital fixo em quase todos os casos são muito mais lentos do que os do capital circulante e tais despesas mesmo quando feitas com a máxima prudência e discernimento ge ralmente só dão retorno ao empresário depois de muitos anos período excessivamente longo para um banco Sem dúvida os comerciantes e outros empresários podem muito bem executar parte considerável de seus projetos com dinheiro emprestado Se porém quiserem ser justos para com seus credores neste caso seu capital próprio deve ser sufi ciente para garantir se assim posso dizer o capital desses credores ou garantir que seja extremamente improvável que tais credores in corram em alguma perda mesmo que o êxito do projeto fique bem aquém do esperado pelos planejadores Mesmo com essa precaução o dinheiro que é tomado em empréstimo e que supostamente só poderá ser reembolsado após decorridos vários anos não deve ser tomado de um banco mas deve ser emprestado sob garantia de obrigação ou hipoteca de pessoas particulares que se propõem a viver dos juros de seu dinheiro por não quererem sofrer elas mesmas os incômodos de aplicar seu capital e que portanto estão dispostas a emprestar este capital a pessoas de bom crédito com possibilidades de mantêlo por vários anos Com efeito um banco que emprestasse seu dinheiro sem a despesa de papel selado ou dos honorários advocatícios para garantir obrigações ou hipotecas e que aceitasse reembolsos nos termos facili tados oferecidos pelos bancos escoceses sem dúvida seria um credor muito indicado para tais comerciantes e empresários Mas esses co merciantes e empresários seriam certamente devedores muito pouco indicados para tal banco Faz agora mais de 25 anos que o papelmoeda emitido pelas OS ECONOMISTAS 314 diversas sociedades bancárias da Escócia equivalia plenamente ou era até um tanto superior àquilo que a circulação do país podia facilmente absorver e empregar Tais bancos portanto deram por longo tempo toda assistência aos comerciantes e outros empresários da Escócia o que é possível a bancos e banqueiros dar em consonância com seus próprios interesses Haviam feito até algo mais Haviam comercializado um pouco arcando eles mesmos com aquela perda ou pelo menos com aquela redução de lucro que neste ramo específico de negócios jamais deixa de ocorrer ao menor grau de supercomercialização Entretanto esses comerciantes e empresários depois de receber tanta assistência dos bancos e banqueiros desejavam ainda mais Os bancos assim pareciam pensar poderiam ampliar seus créditos até quanto preci sassem sem incorrer em nenhuma outra despesa afora algumas poucas resmas de papel Queixavamse da estreiteza de vistas e da covardia das diretorias dos bancos que segundo alegavam se recusavam a ampliar seus créditos na proporção da extensão do comércio do país entendendo sem dúvida por extensão do comércio do país a am pliação de seus próprios projetos além daquilo que eles mesmos tinham capacidade para executar quer com seu próprio capital quer com o que tinham de crédito para emprestar de particulares pelo costumeiro sistema de obrigações ou hipotecas Pareciam imaginar que os bancos tinham a honrosa obrigação de suprir esta falta de dinheiro e de for necerlhes todo o capital que desejassem para comerciar Os bancos porém tinham opinião diferente e ao recusarem ampliar seus créditos alguns desses comerciantes lançaram mão de um expediente que du rante algum tempo atendeu a seus propósitos embora acarretando uma despesa muito maior do que ocorreria se os bancos ampliassem ao máximo os créditos Esse expediente outro não foi senão a bem conhecida prática de sacar e ressacar recurso ao qual comerciantes menos avisados às vezes recorrem quando estão à beira da falência A prática de levantar dinheiro desta forma era de há muito conhecida na Inglaterra e parece ter sido muito comum no decurso da última guerra quando os altos lucros do comércio constituíam uma grande tentação no sentido de fechar negócios em excesso Da Inglaterra esta prática passou para a Escócia onde em proporção ao comércio muito limitado e devido à reduzida disponibilidade de capital no país o sis tema foi praticado com intensidade muito maior do que na Inglaterra A prática de sacar e ressacar é tão conhecida de todos os homens de negócio que poderia talvez parecer supérfluo deterse nela Mas já que este livro pode cair nas mãos de muitas pessoas que não são homens de negócios e já que os efeitos dessa prática sobre o comércio bancário talvez não sejam suficientemente conhecidos pelos próprios homens de negócio tentarei explicála da maneira mais clara possível Os hábitos comerciais implantados quando as leis bárbaras da Europa não garantiam o cumprimento das cláusulas dos contratos e que durante o curso dos dois últimos séculos foram incorporados à legislação de todas as nações européias têm dado privilégios tão ex ADAM SMITH 315 traordinários às letras de câmbio que se costuma adiantar dinheiro mediante o aceite dessas letras com muito mais rapidez do que através de qualquer outro tipo de títulos ou obrigações isto sobretudo quando o vencimento das letras é de apenas 2 ou 3 meses após a data da emissão Se no vencimento do título o aceitante não paga no próprio ato da apresentação a partir deste momento ele entra em falência O título é protestado e retorna ao sacador o qual se não o pagar ime diatamente também entra em falência Se antes de chegar o título às mãos da pessoa que o apresenta ao aceitante para pagamento tivesse passado por várias outras pessoas que houvessem adiantado sucessi vamente um ao outro o valor do título em dinheiro ou em mercadorias e se essas pessoas para atestarem que cada uma delas tinha recebido esses valores tivessem todas endossado o título isto é assinado seu nome no dorso do título cada endossador por sua vez assume a responsabilidade e a obrigação perante o proprietário do título pelo valor expresso no mesmo e se deixar de pagar ele também a partir daquele momento entra em falência Embora o sacador o aceitante e os endossadores do título sejam todos eles pessoas de crédito duvidoso mesmo assim o curto prazo de vencimento da letra dá certa segurança ao seu proprietário Embora todos eles tenham muita probabilidade de entrar em falência é casual que isto ocorra com todos dentro de um prazo tão curto A casa está para ruir assim raciocina um viajante exausto a casa não resistirá por muito tempo mas só casualmente cairá esta noite arriscarei portanto dormir nela esta noite Suponhamos que o comerciante A de Edimburgo saca uma letra contra B comerciante de Londres letra esta com vencimento de dois meses após a data da emissão Na realidade o comerciante londrino B não deve nada a A comerciante de Edimburgo mas ele concorda em aceitar a letra de A sob condição de que antes do vencimento ele possa ressacar contra A em Edimburgo pela mesma soma e mais os juros e uma comissão uma outra letra letra esta que também ela terá vencimento dois meses após a emissão Assim antes de expirar os dois meses do vencimento da primeira letra B ressaca esta letra contra A comerciante de Edimburgo este novamente antes de expi rarem os dois meses do vencimento da segunda letra emite uma se gunda letra contra B igualmente pagável dois meses após a data da emissão e antes de expirarem esses dois meses deste terceiro B saca outra letra contra A de Edimburgo também ela com vencimento dois meses após a emissão Essa prática às vezes estendeuse não somente durante vários meses mas até vários anos com a letra sempre retor nando a A em Edimburgo com os juros e comissão acumulados de todos os títulos anteriores Os juros eram de 5 ao ano e as comissões nunca ficavam abaixo de 05 em cada nova emissão Repetindose esta comissão mais de seis vezes por ano qualquer soma que A con seguisse levantar com este expediente necessariamente deveria cus tarlhe um pouco mais de 8 ao ano e às vezes muito mais isto é quando o preço da comissão subia ou quando era obrigado a pagar OS ECONOMISTAS 316 juros compostos sobre os juros e a comissão de títulos anteriores A esta prática deuse o nome de levantar dinheiro mediante circulação Em um país em que os lucros normais do capital na maioria dos projetos comerciais supostamente oscilam entre 6 e 10 deve ter sido uma especulação muito bemsucedida cujo retorno era capaz não somente de cobrir a enorme despesa do empréstimo do dinheiro necessário para executar o projeto mas também de garantir um bom excedente ao pla nejador Muitos projetos de grande porte foram empreendidos e executados durante vários anos sem outro fundo a não ser o dinheiro recolhido dessa forma com despesas tão elevadas Sem dúvida os comerciantes que em preendiam tais projetos tinham um visão nítida desse grande lucro em seus sonhos dourados Ao acordarem do sonho porém no final dos projetos ou mesmo antes quando percebiam que já não tinham mais capacidade de leválos adiante muito raramente segundo acredito constatavam que o lucro sonhado correspondia à realidade150 Quanto aos títulos emitidos por A em Edimburgo contra B em Londres A regularmente os descontava dois meses antes de seu ven cimento em algum banco ou banqueiro de Edimburgo e quanto aos títulos reemitidos por B em Londres contra A em Edimburgo B também os descontava com a mesma regularidade que A no Banco da Inglaterra ou com alguns outros banqueiros em Londres Todo o dinheiro adian tado contra a apresentação de tais letras circulantes era adiantado em Edimburgo em papelmoeda dos bancos escoceses e em Londres quan do eram descontados no Banco da Inglaterra no papelmoeda desse banco Embora os títulos contra os quais esse papelmoeda era adian ADAM SMITH 317 150 O método descrito no texto de forma alguma era o mais comum ou o mais dispendioso que esses aventureiros às vezes utilizavam para levantar dinheiro através da circulação Acon tecia com freqüência que A em Edimburgo possibilitava a B em Londres pagar a primeira letra de câmbio sacando poucos dias antes do vencimento desta uma segunda letra com vencimento para três meses depois contra o mesmo B em Londres Essa letra sendo pagável à sua própria ordem A vendiaa em Edimburgo em paridade de câmbio e com esse dinheiro comprava títulos sobre Londres pagáveis a vista à ordem de B ao qual os enviava por correio No final da última guerra o câmbio entre Edimburgo e Londres apresentava muitas vezes uma defasagem de 3 em desfavor de Edimburgo sendo esse o prêmio ou ágio que esses títulos a vista devem ter custado a A Sendo essa transação repetida no mínimo quatro vezes por ano e incluindo um encargo de comissão de no mínimo 05 em cada repetição a transação deve ter custado a A no mínimo 14 ao ano Em outras ocasiões A possibilitava a B liberar a primeira letra de câmbio sacando poucos dias antes do ven cimento desta uma segunda letra com data de vencimento para dois meses depois a uma terceira pessoa C por exemplo em Londres Essa outra letra era pagável à ordem de B o qual após o aceite de C a descontava em algum banco de Londres e A possibilitava a C liquidála sacando alguns dias antes do vencimento desta uma terceira letra também ela com vencimento para dois meses depois ora contra seu primeiro correspondente B ora contra uma quarta ou quinta pessoa D ou E por exemplo Essa terceira letra era pagável à ordem de C o qual tão logo ela fosse aceita a descontava da mesma forma em algum banco londrino Sendo tais operações repetidas no mínimo seis vezes por ano e sendo a comissão sobre cada repetição no mínimo 05 juntamente com os juros de lei de 5 esse método de levantar dinheiro da mesma forma como o descrito no texto deve ter custado a A algo mais do que 8 Todavia pelo fato de se poupar o câmbio entre Edimburgo e Londres esse método era pouco menos dispendioso do que o mencionado na primeira parte desta nota nesse caso porém exigiase que a pessoa tivesse bom crédito em mais de um estabelecimento em Londres condição esta que muitos desses aventureiros não conseguiam cumprir tado fossem todos reembolsados por sua vez na data do vencimento nunca o valor que tinha sido realmente adiantado contra a primeira letra voltava aos bancos que haviam adiantado esse dinheiro isso por que antes do vencimento de cada título sempre se emitia um outro com uma quantia um pouco maior do que a letra cujo vencimento era iminente e o desconto desta outra letra era essencialmente necessário para o pagamento daquele em vias de vencimento Portanto este pa gamento era totalmente fictício A torrente que uma vez saía neces sariamente dos cofres dos bancos através dessas letras de câmbio cir culantes nunca era substituída por qualquer torrente real que entrasse nos cofres O papelmoeda emitido para cobrir essas letras de câmbio circu lantes representava em muitos casos o total do fundo necessário para executar algum amplo e extenso projeto de agricultura comércio ou manufatura e não somente para aquela parte da soma total que se não tivesse havido emissão de papelmoeda o autor do projeto teria sido obrigado a conservar consigo sem empregála mantendoa dispo nível para eventuais pagamentos solicitados Por conseguinte a maior parte deste papelmoeda ultrapassava o valor do ouro e prata que teria circulado efetivamente no país se não tivesse ocorrido emissão de pa pelmoeda Portanto estava além daquilo que a circulação no país tinha condições de absorver e empregar com facilidade e assim voltava ime diatamente aos bancos a fim de ser trocado por ouro e prata que se podia encontrar quando se desejasse Era um capital que esses autores de projetos muito habilmente conseguiam tomar emprestado dos ban cos não somente sem o conhecimento ou o consentimento deliberado desses últimos mas durante algum tempo talvez até sem que os bancos sequer suspeitassem haver efetivamente adiantado este dinheiro Quando duas pessoas continuamente sacam e ressacam uma con tra a outra descontam seus títulos sempre no mesmo banqueiro este imediatamente descobrirá o truque constatando que as duas estão comerciando não com capital próprio mas com o capital que o banqueiro lhes adianta Todavia não é tão fácil descobrir isto quando as duas descontam seus títulos ora num banco ora em outro e quando elas não sacam e ressacam sempre uma contra a outra mas eventualmente alargam o círculo englobando na operação outros autores de projetos que acham interessante ajudarse entre si na prática deste método de levantar dinheiro contribuindo para que seja o mais difícil possível distinguir entre uma letra de câmbio real e uma fictícia ou seja entre um título emitido por um credor real contra um devedor real e um título para o qual não havia propriamente nenhum credor real a não ser o banco que o descontou nem nenhum devedor real a não ser o autor do projeto que utilizava o dinheiro E mesmo que um banco descobrisse este artifício às vezes isso poderia acontecer quando já era muito tarde e já havia descontado os títulos desses autores de projetos em tal quantidade que se deixasse de descontar outros títulos talvez pudesse leválos todos à falência e arruinandoos assim talvez OS ECONOMISTAS 318 se arruinasse a si próprio Portanto em tal situação o banco atendendo a seu próprio interesse e segurança podia considerar necessário con tinuar a descontar tais títulos fictícios por algum tempo empenhan dose contudo gradualmente em dificultar cada vez mais o desconto deles a fim de forçar progressivamente os responsáveis de tais projetos a recorrerem a outros bancos ou a outros métodos de levantar dinheiro de sorte que o referido banco conseguisse sair deste círculo o mais cedo possível Efetivamente as dificuldades que o Banco da Inglaterra os principais banqueiros de Londres e mesmo os bancos mais prudentes da Escócia começaram a opor depois de certo tempo e quando já haviam avançado demais para descontar tais títulos fictícios não somente alarmaram esses empresários senão que os irritaram ao ex tremo Alegavam que sua calamidade cuja causa imediata foi sem dúvida essa reserva prudente e necessária por parte dos bancos era a calamidade do país e essa calamidade diziam eles deviase à ignorância à pusilanimidade e à má conduta dos bancos que não davam ajuda suficientemente generosa à iniciativa daqueles que tudo faziam para embelezar melhorar e enriquecer o país Era dever dos bancos pareciam pensar continuar a conceder empréstimos por quanto tempo e na medida que eles mesmos desejassem Entretanto os bancos ao recusarem conceder mais crédito àqueles aos quais já haviam adian tado dinheiro em excesso adotaram o único método viável para salvar seu próprio crédito ou o crédito público do país Em meio a esse clamor e a essa calamidade criouse na Escócia um novo banco com a finalidade expressa de aliviar a calamidade do país O propósito era generoso mas a execução foi imprudente sendo que talvez não se tenha compreendido bem a natureza e as causas da calamidade que era preciso remediar Esse banco era mais liberal do que jamais o havia sido qualquer outro banco anteriormente tanto na concessão de contas de caixa como no desconto de letras de câmbio Quanto a estas últimas parece ter raramente feito a distinção entre títulos reais e títulos circulantes descontando todos indistintamente Era princípio confesso desse banco fazer adiantamento com qualquer garantia razoável o capital integral a ser investido em melhorias cujos retornos são os mais lentos e demorados tais como as melhorias da terra Chegouse a afirmar que a principal função pública para a qual foi criado esse banco era promover tais melhorias Pela sua liberalidade em conceder contas de caixa e em descontar letras de câmbio sem dúvida esse banco emitiu grandes quantidades de notas bancárias Mas já que a maioria dessas notas ultrapassava aquilo que a circulação no país tinha condições de absorver e empregar com facilidade elas voltavam ao banco para serem trocadas por dinheiro em ouro e prata com a mesma rapidez com que as notas eram emitidas Seus cofres nunca estavam bem abastecidos O capital deste banco subscrito em duas ocasiões diferentes ascendia a 160 mil libras sendo que apenas 80 foram pagos A soma deve ter sido paga em várias prestações Grande parte dos proprietários ao pagarem a primeira prestação abri ADAM SMITH 319 ram uma conta de caixa no banco e os diretores acreditandose obri gados a tratar seus acionistas com a mesma liberalidade que dispen savam a todas as outras pessoas permitiram a muitos deles tomar emprestado do banco através de sua conta de caixa o que elas pagaram ao banco com todas as suas prestações subseqüentes Tais pagamentos feitos pelos acionistas portanto não faziam outra coisa senão repor em um cofre aquilo que pouco antes havia sido retirado de outro Mas mesmo que os cofres desse banco fossem reabastecidos sempre tão bem sua circulação excessiva deve têlos esvaziado mais rapida mente do que poderiam ser abastecidos por qualquer outro expediente que não fosse a prática ruinosa de sacar sobre Londres e no vencimento da letra pagandoa juntamente com juros e comissão com outra emis são contra Londres Tendo seus cofres sido tão mal abastecidos afir mase que o banco foi forçado a apelar para esse recurso poucos meses depois de começar a operar As terras dos proprietários deste banco valiam vários milhões e no ato de assinarem o contrato original de acionistas do banco foram efetivamente penhoradas como aval para atender a todos os compromissos e obrigações do banco Em virtude do vasto crédito representado por uma penhora tão grande de bens apesar da conduta excessivamente liberal do banco ele teve condições de operar durante mais de dois anos Quando foi obrigado a fechar suas portas ele havia colocado em circulação cerca de 200 mil libras em notas de banco A fim de dar sustentação à circulação dessas notas bancárias que continuamente retornavam ao banco com a mesma ra pidez com que eram emitidas o banco continuamente sacava letras de câmbio sobre Londres cujo número e valor estavam aumentando continuamente sendo que quando o banco cessou de operar ascendiam a mais de 600 mil libras Por conseguinte este banco em pouco mais de dois anos de operação emprestou a várias e diferentes pessoas mais de 800 mil libras a 5 Sobre as 200 mil libras que o banco fez circular em notas bancárias esses 5 poderiam talvez ser considerados como lucro líquido sem qualquer outra dedução a não ser as de despesas da administração Entretanto sobre as mais de 600 mil libras pelas quais o banco continuamente emitia letras de câmbio sobre Londres ele estava pagando em forma de juros e comissões mais de 8 e portanto perdendo mais de 3 sobre mais de 34 de todos os seus negócios As operações desse banco parecem ter produzido efeitos total mente contrários aos desejados pelas pessoas que o planejaram e di rigiram Essas pessoas parecem ter pretendido apoiar as iniciativas pioneiras como elas consideravam as que estavam sendo tomadas em diversas regiões do país ao mesmo tempo queriam reservar para si todas as operações bancárias suplantar todos os outros bancos esco ceses sobretudo os estabelecidos em Edimburgo cuja relutância em descontar letras de câmbio era motivo de escândalo Sem dúvida o referido banco deu algum apoio temporário àqueles planejadores pos sibilitandolhes executar seus projetos durante cerca de dois anos a OS ECONOMISTAS 320 mais do que poderiam de outra forma ter agüentado Isto porém não fez outra coisa senão enterrálos em dívidas tais que quando a ruína chegou ela se abateu com tanto mais peso tanto sobre eles quanto sobre seus credores Portanto as operações desse banco ao invés de aliviarem agravaram a longo prazo a má situação a que esses empre sários levaram a si próprios e a seu país Teria sido muito melhor tanto para eles como para seus credores e seu país se a maioria deles tivesse sido obrigada a paralisar suas atividades dois anos antes do que realmente aconteceu No entanto o alívio temporário que o referido banco deu a esses planejadores constituiu um alívio real e permanente para os outros bancos escoceses Com efeito todos os que comerciavam com letras de câmbio circulantes letras essas que os outros bancos tanto relutavam em descontar recorriam a este novo banco onde eram recebidos de braços abertos Por isso os outros bancos puderam com grande facilidade sair desse círculo fatal do qual de outra forma não teriam podido evadirse sem incorrer em perdas consideráveis e talvez até parte de seu crédito A longo prazo portanto as operações do citado banco acabaram agravando a calamidade nacional para cujo alívio ele havia sido criado na realidade livraram de uma grande crise precisamente aqueles ban cos rivais que pretendia suplantar Quando o referido banco iniciou suas operações alguns pensavam que por mais que seus cofres se esvaziassem rapidamente ele poderia facilmente reabastecêlos levantando dinheiro sobre as garantias das pessoas às quais o banco havia adiantado seu dinheiro em papel Se gundo acredito a experiência logo os convenceu de que este método de levantar dinheiro era excessivamente lento para atender a seus propósitos e de que os cofres que inicialmente estavam tão mal abas tecidos e que se esvaziavam com tanta rapidez não poderiam ser rea bastecidos de outra forma senão pelo método danoso de sacar letras sobre Londres e no ato do vencimento dessas letras pagandoas por outro saque sobre o mesmo local com juros e comissão acumulados Entretanto embora através desse método o banco tivesse condi ções de levantar dinheiro com tanta rapidez quanto o desejava todavia em vez de auferir lucro deve ter sofrido uma perda em cada operação deste gênero de sorte que a longo prazo necessariamente deve terse arruinado como sociedade mercantil embora talvez não tão cedo como teria acontecido recorrendo à dispendiosa prática de sacar e ressacar Mesmo assim o banco não poderia ganhar nada com os juros do papel que ultrapassando aquilo que a circulação no país podia absorver e empregar voltava ao banco para ser trocado por ouro e prata com a mesma rapidez com a qual era emitido e para cujo pagamento o próprio banco era continuamente obrigado a tomar empréstimos em dinheiro Ao contrário toda a despesa dessa tomada de empréstimos para em pregar agentes para procurar pessoas que tivessem dinheiro para em prestar para negociar com essas pessoas e para sacar a própria obri gação deve ter recaído sobre o banco representando uma perda ainda ADAM SMITH 321 mais evidente no equilíbrio de suas contas O projeto de reabastecer seus cofres dessa forma pode ser comparado ao de uma pessoa que tivesse um tanque dágua do qual saísse continuamente uma torrente sem que nele entrasse constantemente outra torrente sendo que a pessoa se propusesse a manter a água do tanque sempre ao mesmo nível empregando uma série de pessoas que continuamente fossem com baldes a um poço a algumas milhas de distância a fim de trazerem água para reabastecer seu tanque Mas mesmo que essa operação se comprovasse não somente pra ticável e até rendosa para o banco como sociedade mercantil o país não poderia auferir disto ganho algum pelo contrário teria sofrido uma perda muito considerável Essa operação não poderia aumentar em nada a quantidade de dinheiro a ser emprestado O máximo que poderia fazer seria transformar esse banco numa espécie de agência de empréstimos para todo o país Os que desejassem tomar empréstimos deveriam solicitálos a esse banco ao invés de recorrer a pessoas par ticulares que lhes teriam emprestado o dinheiro Mas um banco que empresta dinheiro talvez a 500 pessoas sobre a maioria das quais os diretores podem conhecer muito pouco não tem probabilidade de ter mais discernimento na seleção dos devedores do que um particular que empresta dinheiro a umas poucas pessoas que conhece e em cuja conduta sóbria e moderada tem boas razões para confiar Os devedores de tal banco sobre cuja conduta fiz alguma referência provavelmente seriam planejadores visionários pelo menos a maioria desses sacadores e ressacadores de letras de câmbio circulantes que aplicariam o di nheiro em projetos extravagantes que não obstante toda a ajuda que se lhes desse jamais seriam capazes provavelmente de levar a termo e que mesmo que os levassem jamais reembolsariam a despesa que tinham realmente custado e nunca seriam capazes de conseguir um fundo suficiente para manter o contingente de mãodeobra igual àquele que tinha sido empregado Ao contrário os devedores sóbrios e mode rados de pessoas particulares teriam mais probabilidade de empregar o dinheiro emprestado em projetos sóbrios proporcionais a seu capital projetos que embora não tão grandiosos e mirabolantes seriam mais sólidos e rentáveis e assim reembolsariam com grande lucro tudo o que se investira neles e que portanto assegurariam um fundo capaz de manter um contingente de mãodeobra muito maior do que a efe tivamente empregada no projeto Portanto o sucesso de tal operação sem aumentar em nada o capital do país não teria feito outra coisa senão transferir grande parte do mesmo de empreendimentos prudentes e rentáveis para empreendimentos imprudentes e não lucrativos O célebre Sr Law era de opinião de que a Escócia definhava por falta de dinheiro e propunhase a remediar essa falta de dinheiro criando um banco de caráter particular o qual em sua concepção deveria emitir papelmoeda até a soma de valor de todas as terras existentes no país O Parlamento da Escócia não considerou aconse lhável aceitar o projeto quando Law o propôs pela primeira vez Mas OS ECONOMISTAS 322 ele foi mais tarde adotado com algumas variações pelo Duque de Orleans na época regente da França A idéia da possibilidade de mul tiplicar o papelmoeda quase indefinidamente constituiu o fundamento real do que se chama o esquema Mississípi o projeto mais extravagante tanto na área bancária quanto na especulação da bolsa que o mundo talvez já tenha conhecido As diversas operações desse esquema são explicadas com tantos detalhes clareza ordem e precisão pelo Sr Du Verney em seu Examination of the Political Reflections upon Commerce and Finances of Mr Du Tot que não me deterei sobre o assunto Os princípios sobre os quais se fundava o esquema são explicados pelo próprio Sr Law em uma exposição sobre o dinheiro e o comércio que publicou na Escócia ao propor pela primeira vez seu projeto As idéias maravilhosas mas visionárias apresentadas nesta e em algumas outras obras sobre os mesmos princípios continuam a impressionar muitas pessoas tendo talvez contribuído em parte para o excesso de insti tuições bancárias do qual ultimamente se tem lamentado tanto na Escócia como em outros lugares O Banco da Inglaterra é o maior banco de circulação na Europa Foi fundado em decorrência de uma lei do Parlamento por uma carta patente do selo real em data de 27 de julho de 1694 Naquela época o banco emprestou ao governo a soma de 12 milhão de libras com uma anuidade de 100 mil libras correspondente a 96 mil libras de juros anuais à taxa de 8 e a 4 mil libras anuais por despesas ad ministrativas Somos levados a crer que o crédito do novo governo criado pela Revolução deve ter sido muito baixo já que ele foi obrigado a levantar um empréstimo a juros tão elevados Em 1697 permitiuse ao banco aumentar seu capital por ações com um enxerto de 1 001 171 10 s Seu capital por ações portanto ascendia então a 2 201 171 10 s Segundo se afirma essa injeção de capital foi para reforçar o crédito do banco junto ao público Em 1696 os registros de contas tinham um desconto de 4050 e 60 e as notas bancárias de 20151 Durante a grande recunhagem da prata que se realizou nessa época o banco considerou conveniente interrom per o pagamento de suas notas o que necessariamente acarretou o descrédito das mesmas Em cumprimento do Decreto 7º da Rainha Ana capítulo VII o banco adiantou e pagou ao erário público a soma de 400 mil libras completando ao todo a soma de 16 milhões de libras que tinha adian tado sobre sua anuidade inicial de 96 mil libras de juros e 4 mil libras por despesas administrativas Em 1708 portanto o crédito do Governo era tão bom quanto o de pessoas particulares já que ele podia tomar empréstimos a 6 de juros taxa legal e de mercado normal da época Em obediência ao mesmo decreto o banco cancelou letras do Tesouro Público no montante de 1 775 027 17 s 10 12 d a 6 de juros e ao ADAM SMITH 323 151 POSTLETHWAITE James History of the Public Revenue p 301 mesmo tempo obteve permissão para aceitar subscrições a fim de du plicar seu capital Em 1708 portanto o capital do banco era de 4 402 343 libras tendo adiantado ao Governo a soma de 3 375 027 17 s 10 12 d Através de uma solicitação de 15 em 1709 foi pago e feito capital de 656 204 1 s 9 d e de outra solicitação de 10 em 1710 houve outro de 501 448 12 s 11 d Em conseqüência dessas duas solicitações pois o capital do banco ascendeu a 5 559 995 14 s 8 d Em obediência ao Decreto 3º de Jorge I capítulo 8 o banco en tregou 2 milhões de letras do Tesouro Público para serem canceladas Nessa época portanto havia adiantado ao Governo 5 375 027 17 s 10 d Em cumprimento ao Decreto 8º de Jorge I capítulo 21 o banco comprou da South Sea Company capital no montante de 4 milhões de libras e em 1722 em conseqüência das subscrições feitas para possi bilitarlhe fazer esta compra seu capital por ações foi acrescido de 34 milhões de libras Nessa época portanto o banco havia adiantado ao público 9 375 027 17 s 10 12 d ao passo que seu capital por ações era de apenas 8 959 995 14 s 8 d Foi nessa ocasião que a quantia adiantada pelo banco ao público e pela qual recebia juros pela primeira vez começou a superar seu capital por ações isto é a soma pela qual pagava dividendos aos proprietários do capital por ações em outros termos foi a primeira vez que o banco passou a ter um capital indiviso além de seu capital dividido A partir de então o banco passou a ter sempre um capital indiviso do mesmo tipo Em 1746 o banco havia em diversas ocasiões adiantado ao público 11 686 800 libras e seu capital dividido havia aumentado através de várias solicitações e subs crições para 1078 milhões de libras Desde então a situação dessas duas quantias continuou a ser a mesma Em cumprimento do Decreto 4º de Jorge III capítulo 25 o banco concordou em pagar ao Governo para renovação de sua patente 110 mil libras sem juros ou reembolso Essa soma portanto não aumentou nenhuma dessas duas quantias Os dividendos pagos pelo banco têm variado de acordo com as flu tuações da taxa de juros que tem recebido em épocas diversas pelo dinheiro adiantado ao público bem como em virtude de outras circunstâncias Essa taxa de juros foi sendo gradualmente reduzida de 8 para 3 Durante alguns anos os dividendos pagos pelo banco foram de 55 A estabilidade do Banco da Inglaterra é igual à do Governo bri tânico Tudo o que foi adiantado ao Estado deve figurar na conta de perdas antes que seus credores possam sofrer qualquer perda Nenhu ma outra instituição bancária na Inglaterra pode ser criada por uma lei do Parlamento nem pode ter mais de seis membros Ele age não somente como qualquer banco comum mas como uma grande máquina do Estado Recebe e paga a maior parte das anuidades devidas aos credores do Estado coloca em circulação títulos do Tesouro e adianta ao Governo o montante anual dos impostos territoriais e taxas sobre o malte dinheiro que muitas vezes só é pago anos depois Nessas diversas operações em virtude de suas obrigações para com o Estado OS ECONOMISTAS 324 ele às vezes pode ser obrigado a emitir papelmoeda em excesso sem culpa de seus diretores Da mesma forma desconta letras mercantis e em várias ocasiões teve de sustentar o crédito dos principais bancos não somente da Inglaterra como também de Hamburgo e da Holanda Certa ocasião em 1763 afirmase ter adiantado em uma semana cerca de 16 milhão de libras para esse fim grande parte dessa soma em lingotes de ouro Não posso assegurar porém que o empréstimo tenha atingido esse montante ou o período tenha sido tão curto Em outras ocasiões esse grande banco foi constrangido a pagar em dinheiro contado Não é aumentando o capital do país mas tornando ativa e pro dutiva uma parcela maior desse capital que as operações bancárias mais acertadas podem desenvolver a indústria do país A parte de seu capital que um agente financeiro é obrigado a manter consigo sem aplicar e em forma de dinheiro disponível para atender a eventuais pedidos permanece como capital ocioso e enquanto permanecer assim nada produz para ele nem para o país São as operações bancárias criteriosas que permitem ao banco converter esse capital ocioso em capital ativo e produtivo em materiais com que trabalhar em instru mentos de trabalho e em suprimentos e mantimentos para a manu tenção de mãodeobra em capital que produza algo para si próprio e para o país O dinheiro em ouro e em prata que circula em qualquer país e através do qual o produto de sua terra e de seu trabalho circula e é distribuído aos consumidores próprios é da mesma forma que o dinheiro disponível do agente financeiro capital ocioso Tratase de uma parcela altamente valiosa do capital do país mas que nada produz para ele As operações bancárias criteriosas substituindo grande parte desse ouro e dessa prata por papelmoeda possibilitam ao país con verter grande parte deste capital ocioso em capital ativo e produtivo isto é em capital que produza algo para o país O dinheiro em ouro e prata que circula em qualquer país pode com muita propriedade ser comparado a uma grande rodovia a qual embora faça circular e trans porte ao mercado toda a forragem e os cereais do país não produz ela mesma a mínima parcela desses produtos As operações bancárias criteriosas pelo fato de proporcionar uma espécie de rodovia suspensa no ar se me for permitida metáfora tão extremada possibilita ao país digamos assim converter grande parte de suas rodovias em boas pastagens e em campos de cereais aumentando consideravelmente desta forma a produção anual de sua terra e de seu trabalho Importa reconhecer porém que o comércio e a indústria do país embora possam ser de certo modo ampliados por essas operações ban cárias no global não desfrutam de tanta segurança já que estão por assim dizer suspensas nas asas de Dédalo do papelmoeda viajam sobre o solo firme do ouro e da prata Além dos acidentes aos quais ficam expostos em razão da inabilidade dos administradores desse pa pelmoeda estão sujeitos a vários outros que nem a prudência nem a habilidade desses administradores são capazes de eliminar Uma guerra malsucedida por exemplo na qual o inimigo se apos ADAM SMITH 325 sasse do capital e conseqüentemente do tesouro que dá sustentação ao crédito do papelmoeda causaria uma confusão muito maior em um país em que toda a circulação se operasse através de papelmoeda do que em um país no qual a maior parte dela fosse feita em moedas de ouro e prata No momento em que o instrumento usual de comércio perdesse seu valor não se poderia fazer trocas senão por escambo ou por crédito Se todas as taxas tivessem sido usualmente pagas em papelmoeda o príncipe não teria mais com que pagar suas tropas ou reabastecer seus depósitos e a situação do país seria muito mais ir reparável do que se a maior parte da sua circulação consistisse em ouro e prata Por essa razão um príncipe preocupado em manter seus domínios sempre no estado em que tenha maiores condições de defen dêlos com a máxima facilidade deve precaverse não somente contra o perigo da multiplicação excessiva de papelmoeda a qual arruína os próprios bancos que a emitem mas também contra aquela multiplicação de papelmoeda que lhes possibilita realizar com ele a maior parte da circulação do país Podese dizer que a circulação de qualquer país se divide em dois diferentes ramos a circulação entre os próprios comerciantes e a circulação entre os comerciantes e os consumidores Embora as mes mas unidades de dinheiro em papel ou em metal possam ser às vezes empregadas em uma circulação e às vezes na outra todavia já que constantemente ocorre que as duas se efetuam ao mesmo tempo cada qual exige certo capital em dinheiro de um ou outro tipo para se efetivar O valor das mercadorias que circulam entre os diversos comerciantes nunca pode superar o das que circulam entre os comerciantes e os consumidores tudo quanto é comprado pelos comerciantes destinase em última análise a ser vendido aos consumidores A circulação entre os comerciantes pelo fato de se efetuar no atacado geralmente exige uma soma bastante elevada para cada transação específica Ao con trário a circulação entre os comerciantes e os consumidores já que é efetuada geralmente no varejo muitas vezes requer apenas somas mui to pequenas sendo que com freqüência basta 1 xelim ou até 12 pêni Mas quantias pequenas circulam com rapidez muito maior do que as grandes Um xelim muda de dono com mais facilidade do que 1 guinéu e uma moeda de 12 pêni com mais freqüência do que 1 xelim Por isso embora as compras anuais de todos os consumidores sejam no mínimo iguais em valor às de todos os comerciantes comumente elas podem efetuarse com uma quantidade muito menor de dinheiro as mesmas peças circulando com maior rapidez servem como instrumento de muito mais compras num caso do que no outro O papelmoeda pode ser regulado de tal forma que se limite ba sicamente seu uso à circulação entre os diversos comerciantes ou então seu uso se estenda também a grande parte daquela entre os comer ciantes e os consumidores Onde não circulam notas bancárias de valor inferior a 10 libras como em Londres o papelmoeda limitase basica mente à circulação entre os comerciantes Quando uma cédula bancária OS ECONOMISTAS 326 de 10 libras chega às mãos de um consumidor ele geralmente é obrigado a trocála na primeira loja em que tiver que comprar mercadorias no valor de 5 xelins de sorte que ela muitas vezes retorna às mãos do comerciante antes que o consumidor gaste a quadragésima parte do dinheiro Onde cédulas bancárias são emitidas em somas tão pequenas como de 20 xelins como na Escócia o papelmoeda é utilizado também em considerável parte da circulação entre comerciantes e consumidores Antes da lei do Parlamento que suspendeu a circulação de notas de 10 e 5 xelins o papelmoeda respondia ainda pela maior parte da circulação entre comerciantes e consumidores Nos dinheiros em cir culação da América do Norte o papel era comumente emitido em soma tão diminuta como 1 xelim e englobava quase que o total dessa cir culação Em alguns papéismoeda em circulação no Yorkshire sua emis são foi até no valor irrelevante de 6 pence Onde a emissão de cédulas bancárias de valor mínimo é permitida e comumente praticada possibilitase e encorajase muitas pessoas de condições modestas a se tornar banqueiros De uma pessoa cuja nota promissória de 5 libras ou mesmo de 20 xelins fosse rejeitada por todo mundo essa nota seria recebida sem escrúpulos quando emitida no valor irrelevante de 6 pence Entretanto as falências freqüentes às quais devem estar sujeitos os banqueiros em situação precária podem gerar um inconveniente muito grande e às vezes até uma calamidade imensa para muitas pessoas pobres que tivessem recebido suas notas promissórias em pagamento Talvez fosse melhor que em nenhuma parte do reino se emitissem cédulas de valor abaixo de 5 libras Nesse caso o uso de papelmoeda provavelmente ficasse circunscrito em todo o território do reino à circulação entre os vários comerciantes como ocorre atualmente em Londres onde não se emitem cédulas de valor abaixo de 10 libras uma vez que na maioria das regiões do reino 5 libras representam uma quantia que embora compre talvez pouco mais da metade da quantidade de mercadorias é tão considerada e tão raramente gasta totalmente de uma vez quanto 10 libras nos intensos gastos de Londres Cumpre observar que onde o papelmoeda está praticamente li mitado à circulação entre os próprios comerciantes como no caso de Londres há sempre muito ouro e prata Em contrapartida o papel moeda encontra amplo uso na circulação entre comerciantes e consu midores como na Escócia e ainda mais na América do Norte e acaba expulsando quase inteiramente do país o ouro e a prata já que quase todas as transações comuns de seu comércio interno são feitas em papel A supressão de notas bancárias de 10 e 5 xelins remediou de certa forma a escassez de ouro e prata na Escócia e a supressão das notas de 20 xelins provavelmente a aliviaria ainda mais Pelo que se diz esses metais se tornaram mais abundantes na América após a supressão de alguns de seus papéismoeda em circulação Afirmase também terem sido eles mais abundantes antes da instituição desse meio circulante ADAM SMITH 327 Embora o papelmoeda devesse ficar muito mais circunscrito à circulação entre os próprios comerciantes os bancos e banqueiros po deriam ainda estar em condições de dispensar mais ou menos a mesma assistência à indústria e ao comércio do país como tinham feito quando o papelmoeda era quase a única moeda em circulação O dinheiro disponível que um comerciante é obrigado a conservar consigo para atender a pagamentos ocasionais é totalmente destinado à circulação entre ele e outros comerciantes dos quais ele compra mercadorias Esse comerciante não tem oportunidade de conservar consigo dinheiro disponível para a circulação entre ele próprio e seus consumidores que são seus clientes e que lhe trazem dinheiro disponível ao invés de tomar dele qualquer soma Embora portanto não se permitisse emitir qualquer papelmoeda a não ser em quantias tais que se cir cunscrevesse em certa medida à circulação entre os comerciantes ainda assim seja em parte para o desconto de letras de câmbio reais seja também para emprestar através de contas de caixa os bancos e ban queiros poderiam ainda estar em condições de liberar a maior parte desses comerciantes da necessidade de conservar uma parte conside rável de seu capital sob a forma de dinheiro não aplicado e disponível para atender a pedidos ocasionais Poderiam ainda estar em condições de dispensar a máxima ajuda que os bancos e banqueiros podem com justeza dar a todos os comerciantes Poderseá alegar que impedir particulares de receber em paga mento as notas promissórias de um banqueiro qualquer soma que fosse grande ou pequena quando estão dispostos a aceitálas ou im pedir um banqueiro de emitir tais notas quando todos os seus vizinhos desejam aceitálas é uma violação manifesta da liberdade natural que constitui o próprio objetivo da lei não infringir mas apoiar Sem dúvida tais regulamentos podem ser considerados sob certo aspecto uma violação da liberdade natural Todavia tais atos de liberdade natural de alguns poucos indivíduos pelo fato de poderem representar um risco para a segurança de toda a sociedade são e devem ser res tringidos pelas leis de todos os governos tanto dos países mais livres como dos mais despóticos A obrigação de erguer muros refratários visando a impedir a propagação de um incêndio constitui uma violação da liberdade natural exatamente do mesmo tipo dos regulamentos do comércio bancário aqui propostos O papelmoeda que consiste em notas bancárias emitidas por pessoas de crédito indiscutível e pagáveis incondicionalmente quando cobradas e na realidade sempre pagas quando apresentadas tem sob todos os aspectos valor igual ao do dinheiro em ouro e prata já que a qualquer momento pode ser trocado por ouro e prata Tudo o que se compra ou se vende com tal papelmoeda deve necessariamente ser comprado ou vendido tão barato como se fosse com ouro e prata Temse alegado que o aumento de papelmoeda por aumentar a quantidade e conseqüentemente diminuir o valor de todo o dinheiro em circulação necessariamente aumenta o preço das mercadorias em OS ECONOMISTAS 328 dinheiro Entretanto uma vez que a quantidade de ouro e prata que é retirada do dinheiro em circulação sempre é igual à quantidade de papel acrescentada à mesma o papelmoeda não aumenta necessaria mente toda a quantidade do dinheiro em circulação Desde o início do século passado até hoje os mantimentos nunca foram mais baratos na Escócia do que em 1759 embora nesse ano devido à circulação de células de 10 e de 5 xelins houvesse no país mais papelmoeda do que atualmente A proporção entre o preço dos mantimentos na Escócia e o preço dos mantimentos na Inglaterra é hoje a mesma que antes da grande proliferação de instituições bancárias na Escócia Na maioria das vezes o trigo é tão extremamente barato na Inglaterra como na França embora haja uma grande quantidade de papelmoeda na In glaterra e muito pouca na França Em 1751 e 1752 quando o Sr Hume publicou seus Political Discourses e logo após a grande proli feração de papelmoeda na Escócia houve uma alta muito sensível do preço dos mantimentos provavelmente devido às intempéries e não em razão da multiplicação do papelmoeda Outra seria realmente a situação se o papelmoeda consistisse em notas promissórias cujo pagamento imediato dependesse sob qual quer aspecto da boa vontade dos seus emitentes ou de uma condição que o portador das notas nem sempre pudesse cumprir ou então de que o pagamento não fosse exigível a não ser depois de certo número de anos e que durante esse tempo não rendesse juros Indubitavel mente o papelmoeda cairia mais ou menos abaixo do valor da prata caso a dificuldade ou incerteza de obter pagamento imediato fosse su postamente maior ou menor ou de acordo com o maior ou menor lapso de tempo em que o pagamento fosse exigível Alguns anos atrás as diversas instituições bancárias da Escócia adotaram a prática de inserir em suas notas bancárias o que denomi navam cláusula opcional pela qual prometiam pagamento ao portador tão logo a nota fosse apresentada ou por opção dos diretores do banco somente seis meses após a apresentação juntamente com os juros de lei pelos seis meses transcorridos Por vezes os diretores de alguns bancos valiamse dessa cláusula opcional e às vezes ameaçavam os que exigiam ouro e prata em troca de um grande número de suas notas de que se aproveitariam a menos que os solicitantes se conten tassem com apenas parte do que exigiam As notas promissórias desses bancos constituíam decididamente na época a maior parte do dinheiro em circulação da Escócia que essa incerteza de pagamento necessa riamente aviltou pondoas abaixo do valor do dinheiro de ouro e prata Enquanto continuava esse abuso que prevaleceu sobretudo em 1762 1763 e 1764 quando entre Londres e Carlisle havia paridade de câm bio entre Londres e Dumfries o câmbio acusava às vezes uma diferença de 4 em desfavor de Dumfries embora essa cidade não diste 30 milhas de Carlisle É que em Carlisle os títulos eram pagos em ouro e prata ao passo que em Dumfries eram pagos em notas de bancos escoceses e a incerteza em trocar essas notas por moedas de ouro e ADAM SMITH 329 prata fazia com que o valor das mesmas fosse 4 inferior ao da moeda A mesma lei do Parlamento que suprimiu as cédulas de 10 e 5 xelins suprimiu também essa cláusula opcional restaurando assim o câmbio entre a Inglaterra e a Escócia à sua taxa natural ou à que o rumo de comércio e das remessas poderia permitir No dinheiro circulante em papelmoeda de Yorkshire o paga mento de notas do valor irrelevante de 6 pence às vezes dependia da condição de o portador apresentar em troco 1 guinéu ao emitente da nota condição que os portadores de tais notas muitas vezes consi deravam muito difícil satisfazer e que deve ter desvalorizado esse di nheiro em circulação abaixo do valor em dinheiro de ouro e de prata Por esse motivo uma lei do Parlamento declarou ilegais todas essas cláusulas e suprimindo da mesma forma que na Escócia todas as notas promissórias pagáveis ao portador abaixo do valor de 20 xelins O dinheiro circulante em papelmoeda vigente na América do Norte consistia não em notas bancárias pagáveis ao portador sob so licitação mas em títulos do Governo cujo pagamento só era exigível vários anos após a emissão E embora os Governos da colônia não pagassem nenhum juro aos portadores desses títulos declararam que era e de fato o interpretaram como moeda legal de pagamento no valor total em que foi emitida Todavia admitindose que a garantia da colônia fosse perfeitamente segura 100 libras pagáveis quinze anos depois por exemplo num país em que a taxa de juros é de 6 equi valem a pouco mais do que 40 libras de dinheiro à vista Eis por que obrigar um credor a aceitar isso como pagamento integral de uma dívida de 100 libras efetivamente pagas em dinheiro à vista constituía um ato de injustiça tão clamorosa que dificilmente talvez jamais tenha sido tentado pelo Governo de qualquer outro país que se consi derasse livre Tal medida traz as marcas evidentes daquilo que o ho nesto e decidido Dr Douglas afirma ter ela sido realmente em sua origem um método usado por devedores fraudulentos para enganar seus credores Efetivamente o Governo da Pensilvânia ao fazer sua primeira emissão de papelmoeda em 1722 pretendeu dar a esses papéis o mesmo valor das moedas de ouro e prata impondo penalidades a todos aqueles que estabelecessem alguma diferença de preço de suas mercadorias quando as vendiam por tais títulos coloniais ou quando as vendiam por moedas de ouro e prata um regulamento igualmente tirânico porém muito menos efetivo do que aquele que pretendia apoiar Uma lei positiva pode trocar uma moeda legal de 1 xelim por 1 guinéu já que pode orientar as cortes de justiça a desonerarem o devedor que fez aquela moeda Todavia nenhuma lei positiva pode obrigar uma pessoa que vende mercadorias e que tem a liberdade de vender ou não vender conforme lhe aprouver a aceitar como preço de suas mer cadorias 1 xelim como equivalente a 1 guinéu Não obstante todas as leis desse gênero constatouse no decurso do intercâmbio com a GrãBretanha que 100 libras eram em certas ocasiões consideradas como equivalentes em algumas colônias a 130 libras e em outras OS ECONOMISTAS 330 a até 1 100 libras em dinheiro circulante sendo que esta diferença de valor provinha da diferença de quantidade de papel emitido nas di versas colônias e da distância e da probabilidade do termo de sua quitação e resgate finais Por isto nada mais justo do que a lei do Parlamento tão injustamente atacada nas colônias para a qual nenhum dinheiro circulante em papelmoeda que se viesse a emitir futuramente nas colônias pudesse ser considerado moeda legal de pagamentos A Pensilvânia sempre foi mais moderada em suas emissões de papelmoeda do que qualquer outra de nossas colônias Eis por que seu dinheiro circulante em papelmoeda segundo se diz nunca desceu abaixo do valor do ouro e da prata correntes na colônia antes da pri meira emissão de seu papelmoeda Antes dessa emissão a colônia havia elevado a denominação de sua moeda determinando por uma decisão da Assembléia que 5 xelins passariam na colônia para 6 xelins e 3 pence e depois para 6 xelins e 8 pence A moeda circulante em libras na colônia portanto mesmo quando essa moeda era em ouro e prata era mais de 30 inferior ao valor de uma libra esterlina e quando aquela moeda corrente se transformou em papelmoeda rara mente seu valor foi mais do que 30 inferior àquele valor O objetivo alegado para elevar a denominação da moeda era evitar a exportação de ouro e prata fazendo com que quantidades iguais desses metais passassem por quantias maiores na colônia do que na mãepátria Cons tatouse porém que o preço de todas as mercadorias provenientes da GrãBretanha elevouse exatamente na proporção em que a colônia elevou a denominação de sua moeda de sorte que seu ouro e prata eram exportados com a mesma rapidez de sempre Já que o papelmoeda emitido por cada colônia era aceito no paga mento das taxas provinciais pelo valor integral de sua emissão esse uso fez com que as notas adquirissem um valor adicional além do valor que elas teriam tido com base no prazo real ou presumido de seu resgate e quitação finais Esse valor adicional era maior ou menor conforme a quantidade de papel emitido estivesse mais ou menos acima da quantidade que podia ser empregada para o pagamento das taxas da respectiva colônia que o emitisse Em todas as colônias essa quantidade emitida estava muito acima do que podia ser utilizado dessa forma Com isso um príncipe que decretasse que certa parte de seus impostos fosse paga em papelmoeda de um certo tipo podia dar um determinado valor a esse papelmoeda mesmo que o prazo de seu resgate e quitação finais dependesse totalmente da vontade do príncipe Se o banco que emitia esse papel tivesse cuidado em conservar a quan tidade dele sempre um tanto abaixo do que podia ser facilmente em pregado dessa forma a demanda desse papelmoeda poderia ser tal que ele poderia até mesmo fazêlo constituir um prêmio ou ser vendido no mercado por um valor levemente superior ao da quantidade de dinheiro circulante de ouro ou prata pelo qual fora emitido É a isso que alguns atribuem o assim chamado ágio do banco de Amsterdam ADAM SMITH 331 ou a superioridade das notas bancárias em relação à moeda corrente embora este dinheiro bancário pretensamente não possa ser retirado do banco à vontade do proprietário A maior parte das letras de câmbio estrangeiras deve ser paga com dinheiro de banco isto é por uma transferência nos livros do banco alegase que os diretores do banco têm o cuidado de manter a quantidade total de dinheiro bancário sem pre abaixo da demanda gerada por esta utilização Afirmase ser esta a causa pela qual o dinheiro de banco se vende com um prêmio ou encerra um ágio de 4 ou 5 sobre a mesma quantia nominal de dinheiro circulante em ouro e prata do país Todavia como se verá abaixo esta versão do banco de Amsterdam em grande parte é uma quimera O dinheiro circulante em papelmoeda que cai abaixo do valor da moeda de ouro e prata nem por isto faz descer o valor desses metais nem faz com que quantidades iguais dos mesmos possam ser trocadas por uma quantidade menor de mercadorias de qualquer outro gênero A proporção entre o valor do ouro e da prata e o valor das mercadorias de qualquer outro tipo depende em todos os casos não da natureza ou da quantidade de determinado papelmoeda vigente neste ou naquele país mas da riqueza ou pobreza das minas que no momento possam estar fornecendo esses metais ao grande mercado do mundo comercial Depende da proporção entre a quantidade de mãodeobra necessária para lançar determinada quantidade de ouro e prata no mercado e aquilo que é necessário para levar ao mercado certa quantidade de qualquer outra espécie de mercadoria Se os banqueiros forem impedidos de emitir quaisquer notas ban cárias circulantes ou notas pagáveis ao portador abaixo de um deter minado valor e se ficarem sujeitos a um pagamento imediato e incon dicional de tais notas tão logo forem apresentadas seu negócio pode com segurança para o público deixarlhes inteira liberdade em todos os outros sentidos A última proliferação de bancos tanto na Inglaterra como na Escócia evento que tem alarmado a muitos ao invés de diminuir aumenta a segurança do público Obriga todos os bancos a serem mais cuidadosos em sua conduta e evitando aumentar seu di nheiro circulante além da devida proporção com seu dinheiro em caixa levaos a se acautelarem contra esses golpes maliciosos que a rivalidade de tantos concorrentes está sempre pronta a infligirlhes Essa multi plicação de instituições bancárias restringe a circulação de cada banco em particular a um círculo mais estreito reduzindo o número de suas notas circulantes Dividindose a circulação total entre um número maior de partes terão conseqüências menos danosas para o público eventuais erros cometidos por um determinado banco acidentes que não se pode excluir totalmente pelo curso normal das coisas Além disso esta livre concorrência obriga todos os banqueiros a serem mais liberais ao tratar com sua clientela sob pena de que seus rivais atraiam seus clientes De modo geral se determinado ramo de comércio ou qualquer divisão de trabalho trouxer vantagens para o público haverá sempre uma concorrência mais livre e mais generalizada OS ECONOMISTAS 332 CAPÍTULO III A Acumulação de Capital ou o Trabalho Produtivo e o Improdutivo Existe um tipo de trabalho que acrescenta algo ao valor do objeto sobre o qual é aplicado e existe outro tipo que não tem tal efeito O primeiro pelo fato de produzir um valor pode ser denominado produ tivo o segundo trabalho improdutivo152 Assim o trabalho de um ma nufator geralmente acrescenta algo ao valor dos materiais com que trabalha o de sua própria manutenção e o do lucro de seu patrão Ao contrário o trabalho de um criado doméstico não acrescenta valor algum a nada Embora o manufator tenha seus salários adiantados pelo seu patrão na realidade ele não custa nenhuma despesa ao patrão já que o valor dos salários geralmente é reposto juntamente com um lucro na forma de um maior valor do objeto no qual seu trabalho é aplicado Ao contrário a despesa de manutenção de um criado doméstico nunca é reposta Uma pessoa enriquece empregando muitos operários e em pobrece mantendo muitos criados domésticos O trabalho destes últimos não deixa de ter o seu valor merecendo sua remuneração tanto quanto o dos primeiros Mas o trabalho do manufator fixase e realizase em um objeto específico ou mercadoria vendável a qual perdura no mínimo algum tempo depois de encerrado o trabalho É por assim dizer uma certa quantidade de trabalho estocado e acumulado para ser empregado se necessário em alguma outra oca sião Este objeto ou o que é a mesma coisa o preço deste objeto pode posteriormente se necessário movimentar uma quantidade de trabalho igual àquela que originalmente o produziu Ao contrário o trabalho do criado doméstico não se fixa nem se realiza em um objeto específico ou mercadoria vendável Seus serviços normalmente morrem no próprio 333 152 Alguns autores franceses de grande erudição e engenho têm empregado essas palavras em um sentido diferente No último capítulo do Livro Quarto procurarei mostrar que sua con ceituação é inadequada instante em que são executados e raramente deixam atrás de si algum traço ou valor pelo qual igual quantidade de serviço poderia poste riormente ser obtida O trabalho de algumas das categorias sociais mais respeitáveis analogamente ao dos criados domésticos não tem nenhum valor pro dutivo não se fixando nem se realizando em nenhum objeto permanente ou mercadoria vendável que perdure após encerrado o serviço e pelo qual igual quantidade de trabalho pudesse ser conseguida posterior mente O soberano por exemplo com todos os oficiais de justiça e de guerra que servem sob suas ordens todo o Exército e Marinha são trabalhadores improdutivos Servem ao Estado sendo mantidos por uma parte da produção anual do trabalho de outros cidadãos Seu serviço por mais honroso útil ou necessário que seja não produz nada com o que igual quantidade de serviço possa posteriormente ser obtida A proteção a segurança e a defesa da comunidade o efeito do trabalho dessas pessoas neste ano não comprarão sua proteção segurança e defesa para o ano seguinte Na mesma categoria devem ser enquadra das algumas das profissões mais sérias e mais importantes bem como algumas das mais frívolas eclesiásticos advogados médicos homens de letras de todos os tipos atores palhaços músicos cantores de ópera dançarinos de ópera etc O trabalho de qualquer dessas pessoas mesmo da categoria mais medíocre tem um certo valor regulado exatamente pelos mesmos princípios que regulam o de qualquer outro tipo de ser viço e aquela das mais nobres e mais úteis nada produz que pudesse posteriormente comprar ou obter uma quantidade igual de trabalho Paralelamente ao que ocorre com a declamação do ator a fala do orador ou a melodia do músico o trabalho de todos eles morre no próprio instante de sua produção Tanto os trabalhadores produtivos como os improdutivos e bem assim os que não executam trabalho algum todos são igualmente man tidos pela produção anual da terra e da mãodeobra do país Esta produção por maior que seja nunca pode ser infinita necessariamente tem certos limites Conforme portanto se empregar uma porcentagem menor ou maior dela em qualquer ano para a manutenção de mãos improdutivas tanto mais no primeiro caso e tanto menos no segundo sobrará para as pessoas produtivas e na mesma medida a produção do ano seguinte será maior ou menor uma vez que se excetuarmos os produtos espontâneos da terra o total da produção anual é efeito do trabalho produtivo Embora o total da produção anual da terra e do trabalho de um país seja sem dúvida em última análise destinado a suprir o consumo de seus habitantes e a proporcionarlhes uma renda não deixa de ser verdade que a produção no momento em que sai do solo ou das mãos dos trabalhadores produtivos se divide naturalmente em duas partes Uma delas muitas vezes a maior destinase em primeiro lugar a repor um capital ou renovar as provisões de mantimentos materiais e o trabalho acabado retirados de um capital a outra parcela destinase OS ECONOMISTAS 334 a constituir uma renda para o dono deste capital como lucro de seu capital ou para outras pessoas como renda de sua terra Assim da produção da terra uma parte repõe o capital investido pelo arrenda tário e a outra paga seu lucro e a renda da terra ao dono desta constituindo portanto uma renda tanto para o proprietário deste ca pital como sendo o lucro de seu capital como para algumas outras pessoas por exemplo o aluguel pago ao dono da terra pela locação da mesma Igualmente da produção de uma grande manufatura uma parte sempre a maior repõe o capital do empresário da obra sendo que a outra paga seu lucro constituindo destarte uma renda ao proprietário desse capital A parte da produção anual da terra e do trabalho de qualquer país que repõe um capital nunca é imediatamente empregada para outra finalidade que não seja a manutenção de pessoas produtivas Essa parte paga exclusivamente os salários do trabalho produtivo A parte que se destina imediatamente a constituir uma renda como lucro ou como renda da terra pode ser empregada para manter indiferen temente pessoas produtivas ou pessoas improdutivas Toda parcela do estoque que um proprietário emprega como ca pital ele sempre espera que lhe seja reposta com lucro Ele a emprega portanto exclusivamente para manter trabalhadores produtivos esta parte após servirlhe como capital constitui uma renda para esses trabalhadores Toda vez que ele empregar qualquer parte do mesmo para manter pessoas improdutivas de qualquer espécie esta parte a partir desse momento é retirada de seu capital e colocada em seu estoque reservado para consumo imediato Os trabalhadores improdutivos e os que não trabalham são todos mantidos por uma renda primeiramente por aquela parte da produção anual originalmente destinada a constituir uma renda para determi nadas pessoas seja como renda da terra ou como lucros do capital ou em segundo lugar por aquela parte da produção que embora ori ginalmente destinada apenas a repor um capital ou a manter traba lhadores produtivos não obstante isso quando chega às suas mãos toda porção dela que ultrapassar sua própria manutenção pode ser empregada para manter indiferentemente pessoas produtivas ou pes soas improdutivas Portanto não somente o grande proprietário de terras ou o comerciante rico mas até mesmo o trabalhador comum desde que seus salários sejam consideráveis têm condições de manter um criado doméstico que também pode às vezes assistir a uma peça ou show de marionetes contribuindo com a sua parcela para manter um grupo de trabalhadores improdutivos ou então pode pagar certos impostos e dessa forma ajudar a manter outro grupo mais respeitável e útil sim mas igualmente improdutivo Entretanto nenhuma parte da produção anual originalmente destinada a repor um capital jamais é dirigida para a manutenção de mãos improdutivas antes de haver posto em movimento seu complemento pleno de trabalho produtivo ou tudo aquilo que poderia movimentar da maneira como foi empregado ADAM SMITH 335 Antes de poder empregar qualquer parcela de seus salários dessa forma o trabalhador deve têlos ganho pelo serviço prestado Aliás essa parte geralmente é pequena É apenas a renda que lhe sobra a qual no caso dos trabalhadores produtivos raramente representa muito Mas geral mente têm um pouco dessa renda e com o pagamento de impostos o número elevado desses contribuintes pode até certo ponto compensar a pequenez da contribuição Portanto a renda da terra e os lucros do capital constituem em toda a parte as fontes primordiais das quais as pessoas improdutivas haurem sua subsistência Esses são os dois tipos de renda que os proprietários geralmente costumam ter à dispo sição para gastar Com isso podem manter indiferentemente pessoas produtivas ou improdutivas No geral porém parecem ter predileção pelo segundo grupo Basicamente a despesa de um grande senhor alimenta mais as pessoas ociosas do que as que trabalham O comerciante rico embora com seu capital só mantenha pessoas operosas ainda assim com sua despesa isto é pelo emprego de sua renda geralmente mantém exa tamente o mesmo tipo de pessoas que o grande senhor Donde se infere que a proporção entre pessoas produtivas e im produtivas depende muitíssimo em todo país da proporção entre aque la parte da produção anual que tão logo sai do solo ou das mãos dos trabalhadores produtivos se destina a repor um capital e aquela que se destina a constituir uma renda como renda da terra ou como lucro Essa proporção difere muito conforme o país for rico ou pobre Assim atualmente nos países ricos da Europa uma parte muito grande freqüentemente a maior da produção da terra destinase a repor o capital do agricultor rico e independente sendo que a outra parte serve para pagar seu lucro e a renda que cabe ao dono da terra Antigamente porém quando prevalecia o governo feudal bastava uma porção muito pequena da produção para repor o capital empregado no cultivo da terra Consistia geralmente em umas poucas e magras ca beças de gado mantidas integralmente pela produção espontânea da terra não cultivada e que portanto podiam ser consideradas como parte dessa produção espontânea Além disso essa parcela geralmente pertencia também ao proprietário da terra sendo por ele adiantada aos ocupantes da terra Todo o restante da produção também lhe per tencia no verdadeiro sentido da palavra como renda da terra ou como lucro do precário capital empatado Os ocupantes da terra costumavam ser servos cujas pessoas e pertences também eram propriedade do dono da terra Os que não eram servos eram locatários a título precário e embora o aluguel nominal que pagavam muitas vezes não passasse de um pagamento em moeda em lugar da prestação de serviços na realidade equivalia à produção total da terra Em qualquer momento o proprietário da terra tinha o direito de exigir seu trabalho em tempos de paz e seu serviço na guerra Embora vivessem distante da casa do proprietário da terra dependiam tanto dele quanto os domésticos que viviam em sua casa Mas a produção total da terra indubitavelmente pertence àquele que dispõe do trabalho e dos serviços de todos aqueles OS ECONOMISTAS 336 que mantém Na atual situação da Europa a parcela da produção que cabe ao dono da terra raramente ultrapassa a 13 e por vezes nem sequer a 14 de toda a produção da mesma Todavia a renda da terra em todas as regiões evoluídas triplicou e quadruplicou desde aquela época remota e esse 13 ou 14 da produção anual da terra ao que parece representa hoje 3 ou 4 vezes mais do que representava anti gamente a produção total Com o progresso dos aperfeiçoamentos a renda da terra embora aumente em proporção com a extensão diminui em proporção com a produção da terra Nos países ricos da Europa empregamse atualmente grandes capitais no comércio e nas manufaturas Na situação antiga o re duzido comércio e as poucas manufaturas domésticas e primitivas exis tentes exigiam capitais muito pequenos No entanto devem ter dado lucros muito grandes A taxa de juros em lugar algum era inferior a 10 e os lucros auferidos devem ter sido suficientes para pagar juros tão altos Atualmente a taxa de juros nas regiões evoluídas da Europa em lugar algum está acima de 6 e em algumas das áreas mais desenvolvidas é tão baixa que chega a 4 3 e até 2 Ainda que a parcela da renda dos habitantes decorrente do lucro do capital seja sempre muito maior nos países ricos do que nos pobres isto é porque o capital é muito maior em proporção ao capital os lucros geralmente são muito menores Eis por que a parcela da produção anual que tão logo sai do solo ou das mãos dos trabalhadores produtivos é destinada a repor um capital não somente é maior nos países ricos do que nos pobres mas mantém uma proporção muito maior em relação à parte destinada imediatamente a constituir uma renda como renda da terra ou como lucro Os fundos destinados à manutenção de trabalhadores produtivos não somente são muito maiores nos países ricos do que nos pobres como também representam proporção muito maior em relação aos fun dos que embora possam servir para a manutenção dos cidadãos pro dutivos ou dos improdutivos em geral são empregados para a manu tenção dos improdutivos A proporção entre esses dois fundos necessariamente determina em cada país o caráter geral dos habitantes no tocante ao trabalho ou à ociosidade Trabalhamos mais do que nossos antepassados porque nos dias de hoje em relação ao que ocorria há dois ou três séculos os fundos destinados à manutenção do trabalho são muito maiores em proporção aos destinados à manutenção dos ociosos Nossos ancestrais eram indolentes por falta de estímulos suficientes para o trabalho Segundo diz o provérbio é melhor brincar de graça do que trabalhar de graça Nas cidades comerciais e industriais onde as classes inferiores da população são mantidas sobretudo pelo emprego de capital a po pulação costuma ser operosa sóbria e progressista como acontece em muitas cidades inglesas e na maioria das cidades da Holanda Nas cidades que se mantêm primordialmente com os fundos e rendas pro venientes da residência constante ou ocasional de uma corte e onde ADAM SMITH 337 as classes inferiores da população se mantêm primordialmente com os gastos da renda dos grandes a população em geral é indolente dissoluta e pobre como ocorre em Roma Versalhes Compiegne e Fontainebleau Se excetuarmos Rouen e Bordéus existe pouco comércio ou indústria em todas as cidades francesas que sediam uma assembléia legislativa e as classes inferiores da população por se manterem sobretudo às expensas dos membros das cortes de Justiça e daqueles que ocorrem a elas para apelações costumam ser ociosas e pobres O grande comércio existente em Rouen e Bordéus parece deverse totalmente à localização das duas cidades Rouen é necessariamente o entreposto de quase todas as mercadorias trazidas de países estrangeiros ou das províncias ma rítimas da França para o consumo da grande cidade de Paris Analo gamente Bordéus é o entreposto dos vinhos fabricados nas regiões localizadas nas margens do rio Garonne e dos que nele desembocam uma das regiões mais ricas em vinhos do mundo e que parece produzir o melhor vinho para exportação ou o mais condizente com o paladar dos estrangeiros Tais localizações vantajosas necessariamente atraem um grande capital pela vasta aplicação que a região lhe proporciona sendo o emprego desse capital a causa do progresso dessas duas cidades Nas demais cidades francesas que são sede de assembléias legislativas parece haverse empregado muito pouco capital além do necessário para suprir seu próprio consumo vale dizer pouco mais do que o capital mínimo que nelas se pode investir O mesmo se pode dizer de Paris Madri e Viena Dessas três cidades Paris é de longe a mais progressista sendo também o principal mercado de todas as manufaturas nela es tabelecidas e seu próprio consumo é o objetivo primordial de todo o comércio que desenvolve Londres Lisboa e Copenhague são talvez as únicas cidades européias em que ao mesmo tempo reside uma corte e podem também ser consideradas cidades comerciais isto é cidades que comerciam não somente para seu próprio consumo como também para o de outras cidades e países A localização das três é extremamente vantajosa naturalmente propícia para servirlhes como entrepostos de grande parte das mercadorias destinadas ao consumo de regiões dis tantes Em uma cidade em que se gasta uma renda elevada empregar com vantagem um capital para qualquer outro objetivo que não seja suprir o consumo da própria cidade é provavelmente mais difícil do que em uma cidade na qual as classes inferiores da população só con seguem manterse com o que auferem do emprego desse capital A ociosidade da maior parte das pessoas mantidas pelos gastos da renda corrompe provavelmente a operosidade dos que deveriam manterse pelo emprego de capital fazendo com que seja menos vantajoso aplicar um capital lá do que em outros lugares Antes da união com a Ingla terra havia pouco comércio ou indústria em Edimburgo ela tornouse uma cidade de algum comércio e indústria quando o Parlamento escocês deixou de ter sede nela quando deixou de ser a residência necessária da principal nobreza e da pequena nobreza da Escócia Todavia Edim burgo continua a ser a sede dos principais tribunais de Justiça da OS ECONOMISTAS 338 Escócia e dos postos alfandegários de recolhimento de impostos etc Por tanto continuase a gastar na cidade uma renda considerável Em comércio e indústria é muito inferior a Glasgow cujos habitantes se mantêm so bretudo mediante emprego de capital Temse às vezes observado que os habitantes de uma aldeia grande depois de terem progredido considera velmente nas manufaturas se tornaram indolentes e pobres pelo fato de um grande senhor ter passado a residir na redondeza Em conseqüência a proporção entre o capital e a renda parece regular em todo lugar a proporção entre pessoas trabalhadoras e pes soas ociosas Onde quer que predomine o capital prevalece o trabalho e onde quer que predomine a renda prevalece a ociosidade Por isso todo aumento ou diminuição de capital tende a aumentar ou a diminuir a quantidade real de trabalho o contingente de cidadãos produtivos e conseqüentemente o valor de troca da produção anual da terra e do trabalho do país a riqueza e renda reais de todos os seus habitantes Os capitais são aumentados pela parcimônia e diminuídos pelo esbanjamento e pela má administração Tudo aquilo que uma pessoa economiza de sua renda ela o acres centa a seu capital quer empregandoo ela mesma para manter um con tingente adicional de mãodeobra produtiva quer dando possibilidade a outra pessoa de fazêlo emprestandolhe o capital com juros vale dizer em troca de uma participação nos lucros Assim como o capital de um indivíduo só pode ser aumentado por aquilo que poupa de sua renda anual ou de seus ganhos anuais da mesma forma o capital de uma so ciedade que é equivalente à soma dos capitais de todos os indivíduos que a compõem só pode ser aumentado dessa maneira A parcimônia e não o trabalho é a causa imediata do aumento de capital Com efeito o trabalho fornece o objeto que a parcimônia acumula Com tudo o que o trabalho consegue adquirir se a parcimônia não economizasse e não acumulasse o capital nunca seria maior A parcimônia aumentando o fundo destinado à manutenção de mãodeobra produtiva tende a ampliar o contingente daquelas pessoas cujo trabalho enriquece o valor do objeto ao qual é aplicado Tende pois a aumentar o valor cambiável da produção anual da terra e do trabalho do país Põe em movimento uma quantidade adicional de trabalho o qual dá um valor extra à produção anual O que se economiza anualmente é consumido com a mesma re gularidade que aquilo que se gasta anualmente e também quase ao mesmo tempo todavia o consumo é feito por uma categoria diferente de pessoas A parte da renda do rico que este gasta anualmente na maioria dos casos é consumida por hóspedes ociosos e criados domés ticos que nada deixam atrás de si em troca de seu consumo Aquela parte da renda que ele economiza anualmente já que é imediatamente empregada como capital em função do lucro é igualmente consumida e quase simultaneamente mas por uma categoria diferente de pessoas trabalhadores manufatores e artífices que reproduzem com lucro o valor de que consomem anualmente Suponhamos que a renda do rico ADAM SMITH 339 lhe fosse paga em dinheiro Se ele tivesse gasto toda esta renda em alimento roupa e moradia que a renda total teria podido comprar teriam sido distribuídos entre os ociosos ou improdutivos Ao econo mizar porém parte dessa renda já que esta parcela é imediatamente aplicada como capital em função do lucro por ele mesmo ou por qual quer outra pessoa o alimento a roupa e a moradia que se pode comprar com esta parte são necessariamente reservados a pessoas produtivas O consumo é o mesmo mas os consumidores são diferentes Através daquilo que uma pessoa frugal poupa anualmente não somente se assegura manutenção a um contingente adicional de mão deobra produtiva para aquele ano ou para o próximo senão que como o fundador de um albergue cria por assim dizer um fundo perpétuo para a manutenção de um contingente igual em todas as ocasiões futuras Com efeito a alocação e a destinação permanente deste fundo nem sempre são asseguradas por uma lei positiva por um documento jurídico ou título de bens no entanto elas são sempre as seguradas por um princípio muito poderoso isto é o interesse óbvio de todo indivíduo a quem pertença o fundo Nenhuma porção dele poderá futuramente ser empregada a não ser para manter mãodeobra produtiva sem que haja uma perda evidente para a pessoa que o desvia de sua destinação própria Assim o esbanjador desvia o capital da destinação correta Por não limitar sua despesa à sua renda ele interfere em seu capital Como aquele que desvia para objetivos profanos as rendas de uma fundação pia ele paga os salários dos ociosos com os fundos que a frugalidade de seus antepassados tinha por assim dizer consagrado à manutenção de pessoas produtivas Diminuindo os fundos destinados ao emprego de mãodeobra produtiva necessariamente ele diminui na medida em que isso depende dele a quantidade daquele tipo de trabalho que acrescenta valor ao objeto ao qual é aplicado e em con seqüência ao valor da produção anual da terra e do trabalho do país inteiro à riqueza e à renda de seus habitantes Se a prodigalidade de alguns não for compensada pela frugalidade de outros a conduta de todo perdulário por alimentar os ociosos com o pão pertencente aos trabalhadores produtivos tende não só a reduzilo à miséria como a empobrecer o país Mesmo que os gastos do esbanjador fossem com mercadorias do próprio país e não com mercadorias estrangeiras seriam iguais os efeitos sobre os fundos produtivos da sociedade Todo ano continuaria havendo uma certa quantidade de alimento e roupa que deveria ter servido para a manutenção de mãodeobra produtiva no entanto é empregada para manter pessoal improdutivo Portanto em cada ano continuaria a haver ainda alguma diminuição daquilo que de outra forma teria o valor da produção anual da terra e do trabalho do país Poderseá alegar talvez que pelo fato de tal despesa não ser gasta em mercadorias estrangeiras não acarretando portanto expor tação de ouro e prata para fora do país este ficaria com a mesma OS ECONOMISTAS 340 quantidade de dinheiro que antes Entretanto se a quantidade de ali mentos e de roupas que nessa hipótese seria consumida por pessoal improdutivo tivesse sido distribuída entre pessoas produtivas estas teriam reproduzido com lucro o valor integral consumido Nesse caso além de ter permanecido no país a mesma quantidade de dinheiro teria havido uma reprodução de um valor igual de bens de consumo A mesma quantidade de dinheiro portanto teria igualmente perma necido no país e haveria além disso a reprodução de um valor igual de mercadorias consumíveis Haveria dois valores ao invés de um Além disso a mesma quantidade de dinheiro não pode perma necer por muito tempo em um país no qual diminuiu o valor da produção anual A única utilidade do dinheiro é fazer circular bens de consumo Ora é através do dinheiro que os mantimentos materiais e o produto acabado são comprados e vendidos bem como distribuídos a seus próprios consumidores Conseqüentemente a quantidade de di nheiro que se pode anualmente empregar em um país deve ser deter minada pelo valor dos bens de consumo que anualmente o dinheiro faz circular nele Esses bens de consumo devem consistir necessaria mente na produção direta da terra e do trabalho do próprio país ou em algo que tivesse sido comprado com uma parte dessa produção Seu valor portanto deve diminuir na medida em que diminui o valor dessa produção e com ele também a quantidade de dinheiro que pode ser empregada em fazêla circular Entretanto o dinheiro que em vir tude dessa redução anual da produção é cada ano retirado da circulação interna do país não poderá permanecer ocioso O interesse dos pro prietários desse dinheiro exige que ele seja aplicado Mas não havendo qualquer aplicação no país ele será enviado ao exterior a despeito de todas as leis e proibições para a compra de bens de consumo que possam ser de alguma utilidade no país Dessa forma a exportação anual desse dinheiro continuará por algum tempo a acrescentar alguma coisa ao consumo anual do país além do valor de sua própria produção anual O que se conseguira economizar nos dias de prosperidade dessa produção anual e que fora empregado em comprar ouro e prata con tribuirá por algum tempo pouco aliás para sustentar seu consumo em épocas adversas Nesse caso a exportação de ouro e prata não é a causa mas o efeito do declínio do país e pode até por pouco tempo aliviar a calamidade desse declínio Ao contrário a quantidade de dinheiro deve em cada país crescer naturalmente na medida em que aumenta o valor da produção anual Sendo maior o valor dos bens de consumo que anualmente circulam no seio da sociedade exigirseá uma quantidade maior de dinheiro para operar tal circulação Por isso parte da produção aumentada será natu ralmente empregada para comprar onde for possível a quantidade adi cional de ouro e prata necessária para fazer circular o restante da produção anual O aumento desses metais será neste caso o efeito e não a causa da prosperidade pública O ouro e a prata em toda parte são comprados da mesma forma O alimento roupa e moradia a renda e a manutenção ADAM SMITH 341 de todos aqueles cujo trabalho ou capital é empregado em trazer os metais das minas ao mercado é o preço pago para isto tanto no Peru como na Inglaterra O país que tiver esse dinheiro para pagar nunca permanecerá muito tempo sem a quantidade desses metais de que carece em contrapartida nenhum país reterá por muito tempo uma quantidade de ouro e prata de que não tiver necessidade Conseqüentemente o que quer que imaginemos consistir a ri queza e a renda reais de um país seja no valor da produção anual de sua terra e de seu trabalho como parece indicálo a sã razão seja na quantidade de metais preciosos que circulam no país como o supõem preconceitos populares qualquer que seja a teoria defendida um fato é certo todo esbanjador é um inimigo do público e toda pessoa que poupa é um benfeitor do público Os efeitos da má administração são muitas vezes os mesmos que os do esbanjamento Todo projeto imprudente e malsucedido na agricul tura mineração pesca comércio ou manufaturas tende igualmente a di minuir os fundos destinados à manutenção do trabalho produtivo Em todo projeto desse tipo embora o capital seja consumido somente por mãodeobra produtiva ainda assim devido ao mau emprego que se faz desse capital esses trabalhadores não reproduzem o valor integral do que consomem devendo ocorrer sempre certa diminuição daquilo que de outra forma teriam sido os fundos produtivos da sociedade Na realidade raramente poderá acontecer que a situação de uma grande nação seja muito afetada pela prodigalidade ou má adminis tração dos indivíduos já que o esbanjamento e a imprudência de alguns sempre são mais do que compensados pela frugalidade e boa adminis tração de outros Quanto ao esbanjamento o princípio que leva a gastar é a paixão de divertirse no presente paixão que embora por vezes violenta e muito difícil de ser contida é em geral apenas momentânea e ocasional Ao contrário o princípio que leva a poupar é o desejo de melhorar nossa condição um desejo que embora comumente calmo e isento de paixão herdamos do seio materno e nunca nos abandonará até a se pultura Em todo o espaço de tempo que medeia entre o berço e a sepultura dificilmente talvez haverá um só momento em que uma pessoa esteja tão perfeita e completamente satisfeita com sua situação que não deseje alguma mudança ou melhoria de qualquer tipo que seja Um aumento de fortuna é o meio pelo qual a maior parte das pessoas se propõe e deseja melhorar sua condição É o meio mais comum e mais óbvio e o meio mais suscetível de aumentar a fortuna é poupar e acumular uma parte do que as pessoas adquirem regular e anual mente ou então em condições extraordinárias Embora portanto o princípio de gastar prevaleça em relação a quase todas as pessoas em algumas ocasiões e em outras quase sempre na maioria das pessoas tomando por média todo o decurso de sua vida o princípio da fruga lidade parece não só prevalecer mas prevalecer muitíssimo No que concerne à má administração o número de empreendi OS ECONOMISTAS 342 mentos conduzidos com prudência e com sucesso é em toda parte muito maior do que o de empreendimentos imprudentes e malogrados Apesar de todas as nossas queixas sobre a freqüência das bancarrotas os infelizes que caem nesse infortúnio representam uma porcentagem mui to reduzida do total de pessoas empenhadas no comércio e em todos os outros tipos de negócios talvez não ultrapasse muito a média de um por mil A bancarrota é talvez a maior e mais humilhante cala midade que possa acometer uma pessoa ingênua Por isso a maioria das pessoas são suficientemente cuidadosas para evitála Algumas porém não a evitam como há quem não evite a forca As grandes nações nunca empobrecem devido ao esbanjamento ou à imprudência de particulares embora empobreçam às vezes em conseqüência do esbanjamento e da imprudência cometidos pela ad ministração pública Toda ou quase toda a renda pública é empregada na maioria dos países em manter cidadãos improdutivos Tais pessoas constituem uma corte numerosa e esplêndida um grande estabeleci mento eclesiástico grandes esquadras e exércitos que em tempos de paz nada produzem e em tempo de guerra nada adquirem que possa compensar os gastos de sua manutenção mesmo enquanto perdura a guerra Essas pessoas que nada produzem são mantidas pela produção do trabalho de terceiros Quando portanto esse contingente é multi plicado além do necessário em determinado ano ele pode consumir uma parcela tão grande da produção anual a ponto de não deixar o suficiente para manter os trabalhadores produtivos que reproduziriam no ano vindouro o que foi gasto neste Em conseqüência a produção do ano seguinte será menor do que a do precedente e se a mesma situação confusa continuar a produção do terceiro ano será ainda in ferior à do segundo Os cidadãos improdutivos que deveriam ser man tidos apenas por uma parcela da renda economizada pelo povo podem chegar a consumir parte tão relevante da renda total e com isso obrigar tão grande número de pessoas a interferir em seu capital nos fundos destinados à manutenção de mãodeobra produtiva que toda a fru galidade e a boa administração dos indivíduos podem ser incapazes de compensar o desperdício e o aviltamento da produção gerados por essa intromissão violenta e forçada Na maioria dos casos porém como ensina a experiência a fru galidade e a boa administração são suficientes para compensar não somente o esbanjamento e a má administração individuais como tam bém as exorbitâncias públicas do Governo O esforço uniforme cons tante e ininterrupto de toda pessoa no sentido de melhorar sua con dição princípio do qual derivam originalmente tanto a riqueza nacional e pública como a individual é suficientemente poderoso para manter o curso natural das coisas em direção à melhoria a despeito das ex travagâncias do Governo e dos maiores erros de administração Como o princípio desconhecido da vida animal esse princípio muitas vezes restitui a saúde e o vigor à constituição apesar não somente da doença mas também das absurdas receitas do médico ADAM SMITH 343 A produção anual da terra e do trabalho de um país só pode aumentar de valor com o acréscimo do contingente de mãodeobra produtiva ou das forças produtivas dos trabalhadores já empregados E evidente que o número de trabalhadores produtivos de um país nunca pode ser muito aumentado a não ser em conseqüência de um aumento do capital ou dos fundos destinados à sua manutenção E as forças produtivas do mesmo número de trabalhadores só podem ser aumen tadas em decorrência quer de algum acréscimo e aperfeiçoamento das máquinas e instrumentos que facilitam e abreviam o trabalho quer de uma divisão e distribuição mais apropriada do emprego Em ambos os casos quase sempre se requer um capital adicional Somente através de um capital adicional é que o empresário de uma fábrica tem condições de prover seus trabalhadores com máquinas melhores de operar entre eles uma distribuição de tarefas mais adequada Quando o serviço a ser feito comporta operações diversificadas manter cada empregado constantemente ocupado em uma função exige capital muito maior do que quando cada empregado é sucessivamente utilizado em cada uma das operações conforme as necessidades Quando pois compararmos o estágio de uma nação em dois períodos diferentes e constatarmos que a produção anual de sua terra e do seu trabalho é obviamente maior no segundo do que no primeiro que suas terras estão melhor cultivadas suas manufaturas são mais numerosas e mais florescentes e seu comércio mais extensivo podemos estar certos de que seu capital aumentou entre esses dois períodos e que a boa administração de alguns acrescentou a essa produção o que dela tinha sido tirado pela má ad ministração privada de outros ou pelo esbanjamento público do governo Constataremos porém que esse foi o caso de quase todas as nações em todas as épocas razoavelmente tranqüilas e pacíficas mesmo da quelas que não tiveram governos mais sensatos e parcimoniosos Com efeito para formar um juízo correto a respeito precisamos comparar a situação do país em períodos algo distantes um do outro Muitas vezes o progresso é tão gradual que em períodos muito próximos entre si o progresso não somente não é sensível como também em virtude do declínio de certos setores de trabalho ou de certas regiões do país coisas que às vezes acontecem não obstante o país gozar de muita prosperidade freqüentemente surge a suspeita de que estão em de cadência a riqueza e o trabalho em sua totalidade A título de exemplo a produção anual da terra e do trabalho da Inglaterra é hoje certamente muito superior ao que era há um século na época da restauração de Carlos II Embora atualmente poucas pes soas duvidem disso assim acredito no decorrer desse período dificilmente passavam cinco anos em que não se publicasse algum livro ou panfleto escritos com habilidade suficiente para conseguir certo crédito junto ao público e que pretendiam demonstrar que a riqueza da nação estava declinando rapidamente que o país estava despovoado a agricultura negligenciada as manufaturas decaindo o comércio des feito Tampouco podese afirmar que essas publicações tenham sido OS ECONOMISTAS 344 todas panfletos partidários subprodutos da falsidade e da venalidade Muitas dessas obras foram escritas por pessoas muito sinceras e in teligentes que não escreviam senão aquilo em que acreditavam sem nenhum outro motivo senão porque de fato acreditavam De igual forma a produção anual da terra e do trabalho da Inglaterra era certamente muito maior na época da Restauração do que possamos supor ter sido cerca de cem anos antes quando Isabel subiu ao trono Temos todas as razões para crer que também nessa época o país estava muito mais evoluído em melhorias do que por volta de cem anos atrás quando estavam se encerrando as dissensões entre as casas de York e Lancaster E mesmo naquela época provavelmente o país estava em melhores condições do que ao tempo da conquista dos normandos e na época dessa conquista provavelmente a situação era melhor do que durante o tumulto da Heptarquia Saxônica Mesmo nessa última época a Ingla terra certamente era um país mais evoluído do que quando da invasão de Júlio César época em que a população estava mais ou menos no mesmo estágio dos selvagens da América do Norte Em cada um desses períodos entretanto havia não somente mui to esbanjamento por parte de particulares e da administração pública muitas guerras dispendiosas e supérfluas grandes desvios da produção anual destinada à manutenção de mãodeobra produtiva e improdu tiva por vezes também em meio ao tumulto do conflito civil havia tão grande desperdício e destruição de capital que como é de supor não apenas retardou o acúmulo natural das riquezas como deixou o país mais pobre ao término do período do que no início Assim durante o mais feliz e afortunado dentre todos esses períodos o período depois da Restauração quantas desordens e infortúnios ocorreram que se pudessem ter sido previstos poderseia deles esperar não somente o empobrecimento do país mas até a sua ruína total Lembremos o incêndio e a praga de Londres as duas guerras holandesas as desor dens da revolução a guerra na Irlanda as quatro dispendiosas guerras francesas de 1688 1702 1742 e 1756 juntamente com as duas rebeliões de 1715 e 1745 No decurso das quatro guerras francesas a nação contraiu um débito superior a 145 milhões além de outros gastos anuais extraordinários gerados por essas guerras de modo que no cômputo geral o mínimo deve ter atingido 200 milhões Tão exorbitante parcela da produção anual da terra e do trabalho do país foi empregada desde a revolução em ocasiões diversas para manter um contingente eleva díssimo de pessoas improdutivas Mas se essas guerras não tivessem obrigado a canalizar um capital tão elevado para esse uso a maior parte dele teria naturalmente sido aplicado para manter mãodeobra produtiva cujo trabalho haveria reposto com lucro o valor integral de seu consumo O valor da produção anual da terra e do trabalho do país teria sido consideravelmente aumentado por ele todo ano e o au mento de cada ano teria elevado ainda mais o do ano seguinte Mais casas teriam sido construídas mais terras melhoradas e as anterior mente aprimoradas teriam sido melhor cultivadas mais manufaturas ADAM SMITH 345 teriam sido estabelecidas e as já implantadas teriam sido mais am pliadas Na realidade talvez não seja muito fácil sequer imaginar quan to teriam aumentado então a riqueza e a renda reais do país Contudo embora os altos gastos do Governo sem dúvida devam ter retardado o curso natural da Inglaterra em direção à riqueza e ao desenvolvimento não foi possível sustálo A produção anual da terra e do trabalho na Inglaterra é sem dúvida muito maior hoje do que na época da Restauração ou da revolução Em conseqüência maior deve ter sido também o capital empregado anualmente no cultivo da terra e para manter essa mãodeobra Em meio a todas as exceções feitas pelo governo esse capital foi sendo silenciosa e gradualmente acumulado pela frugalidade e pela boa administração de indivíduos particulares por seu esforço geral contínuo e ininterrupto no sentido de melhorar sua própria condição Foi esse esforço protegido pela lei e permitido pela liberdade de agir por si próprio da maneira mais vantajosa que deu sustentação ao avanço da Inglaterra em direção à grande riqueza e ao desenvolvimento em quase todas as épocas ante riores e que como é de esperar acontecerá em tempos futuros Mas pelo fato de nunca ter sido a Inglaterra agraciada com governos muito parcimoniosos assim a parcimônia jamais constituiu virtude caracte rística de seus habitantes É altamente impertinente e presunçoso por parte dos reis e ministros pretenderem vigiar a economia das pessoas particulares e limitar seus gastos seja por meio de leis suntuárias seja proibindo a importação de artigos de luxo do exterior São sempre eles sem exceção alguma os maiores perdulários da sociedade Ins pecionem eles bem seus próprios gastos e confiem tranqüilamente que as pessoas particulares inspecionarão os seus Se seu próprio esbanjamento não arruína o país não será o de seus súditos que um dia o fará Assim como a frugalidade aumenta e o esbanjamento diminui o capital público assim a conduta daqueles cuja despesa eqüivale exa tamente a sua renda sem acumulação ou abusos nem a aumenta nem a diminui Todavia certos tipos de gastos parecem contribuir mais para o crescimento da riqueza do país do que outros A renda de um indivíduo pode ser gasta em coisas consumidas de imediato caso em que a despesa de um dia não pode aliviar nem sustentar a de outro ou em coisas de maior durabilidade as quais portanto podem ser acumuladas caso em que o gasto de cada dia pode a seu critério aliviar ou sustentar e aumentar o efeito do gasto do dia seguinte Uma pessoa rica por exemplo tanto pode gastar sua renda em uma mesa farta e suntuosa na manutenção de grande número de criados domésticos e uma multidão de cães e cavalos quanto con tentarse com uma mesa frugal e alguns poucos criados pode investir a maior parte da mesma em embelezar sua casa sua vila campestre em construções úteis ou decorativas em móveis úteis ou ornamentais em coleções de livros estátuas quadros ou então em coisas mais frí volas como jóias bugigangas berloques de vários tipos ou então o que é mais fútil de todos os gastos poderá comprazerse em acumular OS ECONOMISTAS 346 uma grande quantidade de vestimentas finas como fez o favorito e ministro de um grande príncipe que faleceu há poucos anos Se duas pessoas de igual riqueza fossem gastar suas rendas uma sobretudo da primeira forma indicada a outra da segunda veríamos que a magnificência da pessoa que gastou sobretudo em mercadorias duráveis aumentaria continuamente já que a despesa de cada dia contribuiria em algo para sustentar e aumentar o efeito da despesa do dia seguinte ao contrário a magnificência da outra não seria maior no fim do período do que no início Além disso no final do período a segunda seria a mais rica dos dois Possuiria um estoque de mercadorias deste ou daquele tipo o qual embora talvez não valesse tudo o que custou sempre valeria alguma coisa Ao contrário no caso do último não sobraria qualquer vestígio dos gastos efetuados e os efeitos de dez ou vinte anos de esbanjamento seriam tão nulos como se jamais tivessem existido Assim como em se tratando dos indivíduos um tipo de gasto favorece mais a riqueza de um do que a de outro o mesmo acontece no caso de uma nação As casas a mobília as roupas dos ricos dentro de pouco tempo tornamse úteis para as classes inferiores e médias da população Estas têm condições de comprálas dos ricos quando estes se cansam delas e assim a condição geral de todo o povo melhora progressivamente quando esse tipo de gastos se generaliza entre os ricos Em países em que durante muito tempo reinou a riqueza fre qüentemente deparamos com pessoas de classe social inferior proprie tárias de casas e mobílias em perfeito estado mas que não poderiam ter mandado construir no primeiro caso ou ter comprado para seu próprio uso no segundo O que antigamente era a residência da família dos Seymour hoje não passa de uma estalagem na estrada de Bath A cama de casal de Jaime I da GrãBretanha que sua rainha trouxe consigo da Dinamarca como presente de um soberano a outro era até alguns anos atrás uma peça decorativa de uma cervejaria de Dun fermline Em certas cidades antigas que permaneceram estacionárias durante muito tempo ou sofreram certa decadência raramente se en contra uma casa sequer que os atuais ocupantes pudessem ter mandado construir E se entrarmos nessas casas com freqüência veremos muitas peças excelentes embora antiquadas de mobílias ainda perfeitamente adequadas ao uso e que tampouco poderiam ter sido fabricadas para os usuários atuais Nobres palácios vilas magníficas grandes coleções de livros estátuas quadros e outras curiosidades muitas vezes repre sentam tanto um ornamento como uma honra não somente para a vizi nhança mas para o país inteiro ao qual pertencem Versalhes constitui um ornamento e uma honra para a França Stowe e Wilton o mesmo para a Inglaterra A Itália ainda hoje tem uma espécie de veneração pelo número de monumentos desse gênero que ela possui embora tenha decaído a riqueza que os produziu e embora o gênio que os planejou pareça extinto talvez pelo fato de não ter o mesmo emprego Além disso os gastos feitos em mercadorias duráveis favorecem não somente o acúmulo de estoque mas também a poupança Se uma pessoa ADAM SMITH 347 em dado momento se exceder nesse ponto pode facilmente voltar atrás sem exporse à censura do público Reduzir de muito o número de criados domésticos fazer com que a mesa do rico passe de uma grande abundância para uma grande frugalidade dispensar seu equipamento depois de têlo instalado são mudanças que não podem escapar à ob servação dos vizinhos e que supostamente implicam certo reconheci mento de má administração anterior Por isso poucos entre aqueles que em determinada época tiveram a infelicidade de ir tão longe nesse tipo de despesa muniramse depois de coragem de voltar atrás antes que a ruína e a falência os obrigassem a isso Mas se uma pessoa em algum momento foi longe demais nos gastos com construção mobília livros ou quadros sua mudança de conduta não pode ser considerada imprudência Existem coisas em que o gasto ulterior muitas vezes se torna desnecessário devido ao gasto anterior de maneira que quando uma pessoa interrompe a execução parece agir assim não porque se excedeu em sua riqueza mas porque já satisfez seu capricho Além disso os gastos com mercadorias duráveis garantem comu mente a manutenção de um número maior de pessoas do que os gastos efetuados com a mais pródiga das hospitalidades De 200 ou 300 li braspeso de mantimentos que às vezes podem ser servidas em uma grande festa talvez a metade seja atirada ao lixo além de grande quantidade que sempre é desperdiçada e mal utilizada Mas se a des pesa desse festival tivesse sido feita para dar trabalho a pedreiros carpinteiros tapeceiros mecânicos etc uma quantidade de gêneros de valor igual teria sido distribuída entre um contingente ainda maior de pessoas que os teriam comprado com pence e libraspeso corres pondentes a seu valor sem ter perdido ou jogado fora uma onça sequer dos mesmos No primeiro caso além disso essa despesa mantém mão deobra produtiva no outro improdutiva No primeiro caso portanto ela aumenta e no outro não aumenta o valor de troca da produção da terra e do trabalho do país Não desejo porém dar a entender com tudo isso que um tipo de gasto sempre denota um espírito mais liberal ou generoso do que o outro Quando um homem rico gasta sua renda sobretudo em hos pitalidade ele partilha a maior parte de sua renda com seus amigos e companheiros ao passo que ao empregála para comprar as citadas mercadorias duráveis muitas vezes gasta tudo em si mesmo não dando nada a ninguém sem receber o equivalente Portanto este último tipo de gasto principalmente quando dirigido para coisas frívolas como pequenos ornamentos de vestuário e de mobília jóias berloques e ou tras bugigangas muitas vezes revela não somente um caráter frívolo como também uma personalidade inferior e egoísta Tudo quanto pre tendo dizer é que um tipo de gasto pelo fato de sempre gerar algum acúmulo de mercadorias de valor por favorecer mais a frugalidade particular e conseqüentemente o aumento do capital da sociedade e por manter mais pessoas produtivas do que improdutivas é mais ade quado que o outro para fazer crescer a riqueza pública OS ECONOMISTAS 348 CAPÍTULO IV O Dinheiro Emprestado a Juros O dinheiro emprestado a juros é sempre considerado como um capital pelo emprestador Este espera que no devido tempo ele lhe seja restituído e que nesse meiotempo o tomador lhe pague uma certa renda anual pelo uso do mesmo O tomador do empréstimo por sua vez pode utilizálo como capital ou como um dinheiro reservado para seu consumo imediato Se o emprega como capital utilizao para a manutenção de mãodeobra produtiva a qual reproduz o valor com lucro Neste caso o tomador tem condições tanto para repor o capital como para pagar os juros sem alienar qualquer outra fonte de sua renda nem interferir nela Se utiliza o dinheiro emprestado para con sumo imediato age como um perdulário dissipando na manutenção de pessoas ociosas aquilo que se destinava a manter pessoas operosas Neste caso ele não tem condições nem para repor o capital nem para pagar os juros sem alienar alguma outra fonte de renda como por exemplo a propriedade ou a renda da terra ou sem interferir nela O dinheiro emprestado a juros pode sem dúvida ser utilizado ocasionalmente das duas maneiras citadas mas é muito mais freqüente empregálo da primeira A pessoa que toma emprestado para gastar logo se arruína e quem lhe empresta geralmente terá que arrependerse da insensatez cometida Tomar emprestado ou emprestar para esse fim portanto em todos os casos em que não houver usura é contrário aos interesses das duas partes e embora às vezes aconteça certas pessoas fazerem isso podemos estar certos de que devido à conside ração que cada um tem pelo seu próprio interesse isso não ocorre com tanta freqüência como talvez poderíamos imaginar Perguntese a qual quer pessoa rica dotada de razoável grau de prudência a qual desses dois tipos de pessoas tem emprestado a maior parte de seu dinheiro àqueles que na opinião dela o empregarão de forma rentável ou àqueles que o gastarão na ociosidade e veremos que zombará da pergunta feita Mesmo entre os tomadores de empréstimo que não 349 são particularmente conhecidos como os cidadãos mais frugais o número dos frugais e operosos supera de muito o dos pródigos e ociosos As únicas pessoas a quem se costuma emprestar dinheiro sem esperar que dele façam uso lucrativo são senhores de terras que tomam empréstimos sob hipoteca Mesmo eles dificilmente tomam empréstimos só para gastar Podese dizer que em geral já gastaram antecipada mente o que tomam emprestado Eles geralmente consumiram tal quan tidade de bens que lhes foram adiantados a crédito por lojistas e co merciantes que consideram necessário tomar emprestado a juros para pagar a dívida O capital emprestado repõe os capitais desses lojistas e comerciantes que os senhores de terra não poderiam haver reposto com a renda recebida de suas propriedades O empréstimo é tomado não propriamente para gastar mas para repor um capital que já fora gasto anteriormente Quase todos os empréstimos a juros são feitos em dinheiro seja em papelmoeda ou em ouro e prata Entretanto o que o tomador quer na realidade e o que o emprestador lhe fornece não é o dinheiro em si mesmo senão o valor que ele tem vale dizer os bens que com ele se podem comprar Se o que ele precisa é dinheiro para consumo ime diato tratarseá exclusivamente dos bens que ele pode colocar em lugar do dinheiro Se o que ele quiser for um capital para empregar em mãodeobra tratarseá somente daqueles bens que podem asse gurar aos trabalhadores instrumentos de trabalho materiais e subsis tência necessária para a execução do trabalho Pelo empréstimo o emprestador como que cede ao tomador seu direito a uma certa parcela da produção anual da terra e do trabalho para que o tomador a em pregue como lhe aprouver Por conseguinte a quantidade de dinheiro que pode ser empres tada a juros em qualquer país não é regulada pelo valor do dinheiro seja em papel ou em moeda que serve como instrumento para os diversos empréstimos feitos no país mas pelo valor daquela parcela da produção anual que tão logo sai da terra ou das mãos dos traba lhadores produtivos destinase não somente a repor um capital mas um capital que um proprietário não deseja ter o incômodo de ele mesmo aplicar Uma vez que tais capitais costumam ser emprestados e res tituídos em dinheiro constituem o que se chama de juros do dinheiro Eles diferem não somente dos juros de terras como também dos juros do comércio e da manufatura já que nesses são os próprios proprietários que empregam seu próprio capital Todavia mesmo no caso dos juros do dinheiro o dinheiro seria por assim dizer como que o instrumento de cessão ou transferência que passa de uma a outra mão aqueles capitais que os respectivos proprietários não se importam em empregar eles mesmos Esses capitais podem ser maiores em quase toda pro porção que o montante de dinheiro que serve como instrumento de sua transferência já que as mesmas peças de dinheiro servem para muitos empréstimos sucessivos bem como para muitas compras dife rentes Por exemplo A empresta a W 1 000 libras esterlinas com as OS ECONOMISTAS 350 quais W imediatamente compra de B mercadorias no valor de 1 000 libras B por não ter pessoalmente necessidade do dinheiro empresta as mesmas moedas ou cédulas a X com as quais X compra imediata mente de C outra quantidade de mercadorias no valor de 1 000 ester linas Da mesma forma e pela mesma razão C com elas empresta esse dinheiro a Y o qual novamente compra mercadorias de D Dessa maneira as mesmas peças em moeda ou papel podem no decurso de alguns dias servir como instrumento de três empréstimos diferentes e para três compras diferentes cada uma das quais é igual em valor ao montante total do dinheiro O que as três pessoas A B e C transferem aos tomadores W X e Y é o poder de fazer as referidas compras Nesse poder consiste tanto o valor como a utilidade dos empréstimos O di nheiro emprestado pelas três pessoas abastadas é igual ao valor das mercadorias que com ele se podem comprar sendo três vezes maior do que o valor do dinheiro com o qual se fazem as compras No entanto esses empréstimos podem ser todos absolutamente garantidos e as mercadorias compradas pelos diversos devedores podem ser emprega das de tal forma que no momento oportuno repõem com lucro um valor igual de dinheiro em moeda ou em papel E como as mesmas peças de dinheiro podem dessa forma servir como instrumento de empréstimos diferentes a três ou pela mesma razão a 30 vezes o seu valor da mesma forma podem servir sucessivamente como instrumento de reembolso Dessa maneira um capital emprestado a juros pode ser consi derado como uma transferência do emprestador para o tomador de certa parcela considerável da produção anual sob a condição de que o tomador em troca e durante a vigência do empréstimo pague anual mente ao emprestador uma parcela menor denominada juros e ao final da vigência do empréstimo reponha ao emprestador uma parcela da mesma grandeza que aquela que o emprestador lhe havia cedido o que se chama reembolso Embora o dinheiro seja em moeda seja em papel sirva geralmente como instrumento de transferência tanto para a parcela menor como para a parcela mais considerável é em si mesmo totalmente diferente daquilo que é cedido através dele Na proporção em que aquela parte da produção anual que tão logo saia do solo ou das mãos dos trabalhadores produtivos é des tinada a repor um capital aumenta em qualquer país o que se chamam juros do dinheiro naturalmente aumenta com ela O aumento desses capitais particulares dos quais os proprietários desejam auferir uma renda sem o incômodo de empregálos eles mesmos acompanha naturalmente o aumento geral dos capitais em outras palavras à me dida que o dinheiro aumenta a quantidade de dinheiro a ser empres tada a juros cresce gradativamente em proporções cada vez maiores À medida que a quantidade de dinheiro a ser emprestada a juros aumenta os juros ou preço que deve ser pago pelo uso daquele dinheiro necessariamente diminui não apenas em virtude daquelas causas ge rais que comumente provocam a diminuição do preço das coisas quando ADAM SMITH 351 sua quantidade aumenta mas em conseqüência de outras causas pe culiares nesse caso especial Quando os capitais aumentam em qualquer país necessariamente diminui o lucro que se pode auferir do emprego dos mesmos Tornase cada vez mais difícil encontrar dentro do país um método proveitoso de aplicar qualquer novo capital Em conseqüên cia surge uma concorrência entre os diversos capitais procurando o proprietário de um deles apossarse daquele emprego já ocupado por outro Mas na maioria dos casos ele só pode ter esperança de afastar o outro de seu emprego se negociar em termos razoáveis O concorrente deve não somente vender um pouco mais barato aquilo com que negocia mas também para poder fazer isso às vezes precisa comprálo mais caro A demanda de mãodeobra produtiva aumentando os fundos destinados à sua manutenção tornase cada dia maior Os trabalha dores encontram facilidade de emprego mas os donos de capitais sen tem dificuldade em conseguir trabalhadores para empregar Sua con corrência faz subir os salários do trabalho e baixar os lucros gerados pelo capital Mas quando os lucros que se pode auferir com emprego do capital diminuem digamos assim nas duas extremidades neces sariamente diminui também juntamente com eles o preço que se pode pagar pelo uso do capital ou seja a taxa de juros Os Srs Locke Law e Montesquieu bem como muitos outros au tores parecem haver imaginado que o aumento da quantidade de ouro e prata em conseqüência da descoberta das Índias Ocidentais espa nholas constituiu a causa real da baixa da taxa de juros na maior parte da Europa Pelo fato de terem esses metais diminuído de valor alegam eles necessariamente passou também a ter menos valor o uso de toda parcela específica dos mesmos e conseqüentemente o preço que por eles se podia pagar Esse raciocínio que parece plausível à primeira vista foi tão bem exposto pelo Sr Hume que talvez seria supérfluo acrescentar algo mais sobre o assunto Entretanto a argu mentação que se segue muito breve e simples poderá servir para se entender mais claramente a falácia que parece ter induzido a erro os referidos escritores Antes da descoberta das Índias Ocidentais espanholas a taxa normal de juros na maior parte da Europa parece ter sido de 10 A partir de então em diversos países ela baixou para 6 5 4 e 3 Su ponhamos que em determinado país o valor da prata tenha baixado exatamente na mesma proporção da taxa de juros e que por exemplo nesses países em que os juros foram reduzidos de 10 para 5 a mesma quantidade de prata possa agora comprar apenas a metade da quan tidade de bens que poderia ter comprado antes Em meu entender essa hipótese pouco condiz com a verdade mas é a mais favorável à opinião que vamos examinar e mesmo com base nessa hipótese é simplesmente impossível que a baixa do valor da prata pudesse ter a mínima influência na baixa da taxa de juros Se 100 libras não valem hoje nesses países mais do que 50 naquele tempo 10 libras hoje não podem valer mais do que 5 na época Quaisquer que tenham sido as OS ECONOMISTAS 352 causas que baixaram o valor do capital as mesmas causas devem ne cessariamente ter feito baixar o valor dos juros e exatamente na mesma proporção A proporção entre o valor do capital e o dos juros deve ter permanecido a mesma ainda que a taxa nunca tivesse mudado Pelo contrário alterandose a taxa alterase necessariamente a proporção entre esses dois valores Se hoje 100 libras esterlinas não valem mais do que 50 na época 5 libras hoje não podem valer mais do que valiam 2 libras e 10 xelins na época Portanto reduzindose a taxa de juros de 10 para 5 pagamos pelo emprego de um capital que supomos ser igual à metade do seu valor anterior juros equivalentes a apenas 14 do valor dos juros anteriores Qualquer aumento da quantidade de prata permanecendo idên tica a quantidade de mercadorias que fazia circular não poderia ter outro efeito do que diminuir o valor desse metal O valor nominal de todos os tipos de mercadorias seria maior mas seu valor real seria exatamente o mesmo de antes As mercadorias seriam trocadas por uma quantidade maior de moedas de prata mas a quantidade de tra balho que poderiam comandar e o número de pessoas às quais poderiam dar emprego e manutenção seriam exatamente os mesmos O capital do país seria o mesmo embora poderia ser necessário um número maior de moedas para fazer passar uma quantidade igual de capital de uma para outra mão Os instrumentos de transferência como a escritura de transmissão de um advogado prolixo seriam mais incô modos mas a coisa cedida seria exatamente a mesma que antes e só poderia produzir os mesmos efeitos Sendo os mesmos os fundos des tinados à manutenção de mãodeobra produtiva a mesma seria tam bém a demanda de mãodeobra produtiva O preço dela portanto isto é seus salários seriam na realidade os mesmos embora nominalmente maiores Seriam pagos com um número maior de moedas de prata mas comprariam a mesma quantidade de mercadorias que antes Os lucros do dinheiro seriam os mesmos tanto nominalmente como na realidade Os salários do trabalhador costumam ser computados pela quantidade de prata que lhe é paga Quando essa aumenta portanto aparentemente os salários do trabalhador aumentam embora às vezes possam na realidade não ser maiores do que antes mas os lucros do dinheiro não são computados pelo número de moedas de prata com as quais são pagos mas pela proporção que essas moedas mantêm com o capital total empregado Assim em determinado país dizse que o salário normal do trabalhador é de 5 xelins por semana e que o lucro normal do dinheiro é de 10 Entretanto sendo o mesmo de antes o capital total do país a concorrência entre os diversos capitais seria também a concorrência entre os diversos capitais dos indivíduos entre os quais está dividido o capital total Todos negociariam com as mesmas vantagens e desvantagens Portanto seria igual a proporção normal entre o capital e os lucros e conseqüentemente seriam também os mesmos os juros normais do dinheiro pois o que se pode pagar pelo ADAM SMITH 353 uso do dinheiro necessariamente depende do que se pode normalmente ganhar com a aplicação do mesmo Ao contrário qualquer aumento da quantidade de mercadorias anualmente em circulação no país permanecendo igual a quantidade de dinheiro que a faz circular produziria muitos outros efeitos além de aumentar o valor do dinheiro O capital do país embora nominal mente permanecesse o mesmo na realidade seria aumentado Poderia ele continuar a ser expresso pela mesma quantidade de dinheiro mas poderia comandar um contingente maior de mãodeobra Seria maior o contingente de mãodeobra produtiva que poderia manter e empre gar e conseqüentemente aumentaria também a demanda dessa mão deobra Seus salários naturalmente aumentariam juntamente com essa demanda e no entanto aparentemente poderiam diminuir Pode riam ser pagos com uma quantidade menor de dinheiro mas essa quantidade menor de dinheiro poderia comprar uma quantidade maior de mercadorias do que uma quantidade menor o podia antes Os lucros do capital diminuiriam tanto aparentemente como na realidade Au mentando o capital total do país naturalmente aumentaria com ele a concorrência entre os capitais individuais que compõem o total Os donos desses capitais individuais seriam obrigados a contentarse com uma porcentagem menor da produção da mãodeobra específica em pregada por esses capitais Os juros do dinheiro que sempre acompa nham os lucros do capital poderiam assim diminuir muito embora aumentasse bastante o valor do dinheiro ou seja a quantidade de bens que se poderia comprar com determinada quantia Em alguns países a lei proibiu cobrar juros do dinheiro Mas já que sempre se pode ganhar algo com o emprego do dinheiro da mesma forma sempre se pagará algo pelo uso do mesmo Essa proibição portanto ao invés de impedir a usura fez aumentar esse mal como demonstra a experiência pois obrigou o tomador a pagar não somente pelo uso do dinheiro mas também pelo risco necessariamente assumido pelo credor ao aceitar uma compensação por esse uso Ele é obrigado se assim podemos dizer a pagar ao credor um seguro contra as pena lidades impostas a quem pratica a usura Nos países em que os juros são permitidos a lei visando a impedir a extorsão mediante a usura geralmente fixa a taxa máxima que se pode cobrar sem incorrer em penalidades Essa taxa deve sempre estar algo acima do preço mínimo de mercado ou seja o preço normalmente pago pelo uso do dinheiro por aqueles que têm condições de oferecer segurança absoluta Se essa taxa legal de juros for fixada abaixo da taxa mínima de mercado os efeitos necessariamente serão mais ou menos os mesmos que os decorrentes de uma proibição pura e simples dos juros O credor não emprestará seu dinheiro por valor inferior ao uso do mesmo e o devedor acabará tendo que pagarlhe o risco que o credor assume ao aceitar o valor total desse uso do dinheiro E se a taxa legal de juros coincidir exatamente com a taxa mínima de mercado arruína juntamente com as pessoas honestas que respeitam as leis OS ECONOMISTAS 354 do país o crédito de todos aqueles que não têm condições de oferecer a garantia máxima e os obriga a recorrer a usurários gananciosos Em um país em que como na GrãBretanha o dinheiro é emprestado ao governo a 3 e a pessoas particulares com boa margem de segu rança a 4 e até a 45 a taxa atualmente fixada por lei de 5 talvez seja a mais adequada de todas Cumpre salientar que se a taxa legal de juros deve estar algo acima da taxa mínima de mercado não deve estar muito acima Se na GrãBretanha por exemplo esta taxa de lei fosse fixada a 8 ou 10 a maior parte do dinheiro a ser emprestado sêloia a perdulários e a empresários imprudentes já que só eles estariam dispostos a pagar juros tão altos Pessoas prudentes e sóbrias dispostas a pagar pelo uso do dinheiro apenas uma parte daquilo que com ele ganharão não se arriscariam a entrar na concorrência Dessa forma grande parte do capital do país seria desviada daqueles que teriam mais probabili dade de utilizar esse capital de maneira rentável e vantajosa sendo carreada precisamente para aqueles que com maior probabilidade o desperdiçariam e destruiriam Ao contrário onde a taxa legal de juros está muito pouco acima da taxa mínima de mercado em toda parte se dá preferência a tomadores sóbrios e não a perdulários e empresários imprudentes A pessoa que empresta o dinheiro recebe quase tantos juros dos primeiros quanto se arrisca cobrar dos segundos e esse di nheiro está muito mais seguro nas mãos dos primeiros do que nas dos segundos Dessa maneira a maior parte do capital do país cairá na quelas mãos que com maior probabilidade o empregarão de maneira vantajosa Não há lei que consiga reduzir a taxa normal de juros abaixo da taxa mínima de mercado vigente no momento em que a lei é pro mulgada Não obstante o edito de 1766 com o qual o rei da França tentou reduzir a taxa de juros de 5 para 4 continuouse a emprestar dinheiro no país a 5 burlando a lei de várias maneiras Importa notar que o preço normal de mercado da terra depende em todo lugar da taxa normal de juros de mercado A pessoa que possui um capital do qual deseja auferir uma renda sem assumir o incômodo de aplicálo ela mesma reflete se lhe convém mais comprar terra ou emprestálo a juros A maior segurança oferecida pela posse de terras juntamente com algumas outras vantagens que costumam acompanhar esse tipo de propriedade geralmente a levam a conten tarse com uma renda menor da terra do que com a que poderia auferir emprestando seu dinheiro a juros Essas vantagens são suficientes para compensar uma certa diferença de renda mas não passam disso com efeito se fosse maior do que isso a diferença entre a renda da terra e a auferida do empréstimo do dinheiro a juros ninguém compraria terras e isso logo reduziria seu preço normal Ao contrário se as van tagens compensassem amplamente a diferença todos comprariam ter ra o que elevaria seu preço normal Quando os juros eram 10 a terra costumava ser vendida pelo valor de dez ou doze anos de renda ADAM SMITH 355 À medida que os juros baixavam para 65 ou 4 o preço da terra subia para o valor de 20 25 e até 30 anos de renda A taxa de juros de mercado é mais elevada na França do que na Inglaterra e o preço normal da terra é mais baixo Na Inglaterra a terra é vendida nor malmente pelo valor de 30 anos de renda ao passo que na França geralmente se vende pelo valor de 20 OS ECONOMISTAS 356 CAPÍTULO V Os Diversos Empregos de Capitais Embora todos os capitais se destinem exclusivamente à manu tenção de mãodeobra produtiva a quantidade de mãodeobra que capitais iguais têm condições de acionar varia ao extremo de acordo com a diversidade das aplicações desses capitais variando também ao extremo o valor que esse emprego acrescenta à produção anual da terra e do trabalho do país Um capital pode ser aplicado de quatro maneiras diversas pri meiro para se obter a produção natural ou bruta da terra exigida anualmente para o uso e consumo da sociedade segundo para ma nufaturar e preparar essa produção bruta da terra para o uso e consumo imediato terceiro para transportar a produção bruta ou a produção manufaturada dos lugares onde há abundância para aqueles onde há escassez finalmente para dividir porções específicas desses produtos brutos ou manufaturados em pequenas parcelas de acordo com a de manda ocasional dos que necessitam No primeiro caso empregamse os capitais de todos aqueles que empreendem o aprimoramento ou o cultivo da terra a exploração das minas e da pesca no segundo os capitais de todos os donos de manufaturas no terceiro os capitais de todos os comerciantes atacadistas finalmente os capitais de todos os comerciantes varejistas É difícil imaginar algum tipo de aplicação de capital que não se enquadre em um ou outro desses quatro itens Cada uma dessas maneiras de empregar capital é essencialmente necessária para a existência e a ampliação das três outras ou para a conveniência geral da sociedade Se não se empregasse um capital para obter produtos brutos em certo grau de abundância não poderia existir nem comércio nem in dústria de espécie alguma Se não se empregasse capital na manufatura daquela parte da produção bruta que exige muito preparo antes que possa ser usada e consumida jamais seria produzida porque não haveria nenhuma de 357 manda ou se fosse produzida espontaneamente ela não teria nenhum valor de troca e nada poderia acrescentar à riqueza da sociedade A menos que se empregasse capital para o transporte quer da produção bruta ou manufaturada dos locais onde ela é abundante para aqueles em que é escassa nada mais poderia ser produzido além do necessário para o consumo da vizinhança O capital do comerciante troca o produto supérfluo de um local por aquele de outro incentivando a indústria e aumentando a satisfação de ambos Se não se empregasse capital para dividir e repartir certas porções da produção bruta ou da produção manufaturada em parcelas pequenas de acordo com a demanda dos consumidores cada um seria obrigado a comprar uma quantidade de mercadorias superior àquela de que realmente necessita de imediato Se por exemplo não houvesse açou gueiro cada um seria obrigado a comprar cada vez um boi ou uma ovelha inteira Isso geralmente seria inconveniente para os ricos e muito mais para os pobres Se um trabalhador pobre fosse obrigado a comprar de uma só vez as provisões para um ou para seis meses grande parte do dinheiro que ele emprega como capital nos instru mentos de seu trabalho ou para aparelhar sua oficina os quais lhe proporcionam uma renda ele teria que canalizála para aquela parte de seu dinheiro reservada ao seu consumo imediato que não lhe dá nenhuma renda Nada convém mais a tal pessoa do que poder comprar diariamente o de que necessita para viver ou até mesmo a cada hora conforme o desejar Com isso ela tem a possibilidade de aplicar em forma de capital quase todo o dinheiro que possui Com isso tem con dições de oferecer seu serviço profissional a preço maior e o lucro que ele assim consegue compensa amplamente o preço adicional que o lucro do varejista impõe às mercadorias que vende Os preconceitos de alguns autores de Política contra os lojistas e comerciantes carecem totalmente de fundamento Não há necessidade alguma de imporlhes impostos nem de limitar seu número nunca eles podem ser tão numerosos que prejudiquem o público embora sua proliferação excessiva possa pre judicar a eles mesmos Por exemplo a quantidade de bens de mercearia que pode ser vendida em uma cidade é limitada pela demanda da cidade e suas redondezas Por isso o capital que pode ser aplicado em uma mercearia não pode ultrapassar o que é suficiente para comprar essa quantidade Se esse capital for dividido entre dois merceeiros a concorrência entre eles tenderá a fazer com que sejam obrigados a vender mais barato do que se houvesse um só merceeiro e se houvesse vinte a concorrência entre eles seria muito maior e a possibilidade de se unirem para aumentar o preço muito menor A concorrência entre eles poderia levar alguns deles à ruína entretanto cabe a eles mesmos resolverem esse problema podendose tranqüilamente confiar no bom senso dos próprios interessados Essa proliferação ou concorrência nun ca poderá prejudicar ao consumidor ou ao produtor pelo contrário tenderá a fazer os varejistas venderem mais barato e comprarem mais caro do que se o negócio todo fosse monopolizado por um ou dois É OS ECONOMISTAS 358 possível que às vezes alguns desses varejistas consigam induzir um cliente a comprar aquilo de que não tem necessidade Todavia esse mal é muito pequeno para merecer a atenção pública e isso não seria necessariamente evitado limitandose o número deles Para dar o exem plo mais suspeito não é o grande número de cervejarias que gera uma disposição à embriaguez entre a população simples mas é essa ten dência decorrente de outras causas que necessariamente dá trabalho a um grande número de cervejarias As pessoas que empregam seus capitais de qualquer uma das quatro formas assinaladas são elas mesmas trabalhadores produtivos Seu trabalho quando dirigido adequadamente fixase e realizase no objetivo ou mercadoria vendável que lhe é designada e geralmente acrescenta ao preço dela pelo menos o valor da manutenção e o consumo desses trabalhadores Os lucros do agricultor do manufatureiro do atacadista e do varejista provêm totalmente do preço das mercadorias que os dois primeiros produzem e que os dois últimos compram e ven dem Todavia capitais iguais empregados em cada uma dessas quatro aplicações acionarão contingentes muito diferentes de mãodeobra pro dutiva e farão também aumentar em proporções muito diferentes o valor da produção anual da terra e do trabalho da sociedade à qual pertencem O capital do varejista repõe somado aos lucros o capital do ata cadista do qual ele compra mercadorias possibilitando assim ao co merciante atacadista levar avante o seu negócio O próprio varejista é o único trabalhador produtivo ao qual esse capital dá imediatamente emprego Seus lucros consistem em todo o valor que o emprego desse capital acrescenta à produção anual da terra e do trabalho da sociedade O capital do comerciante atacadista repõe juntamente com os lucros os capitais dos agricultores e manufatores dos quais o atacadista compra a produção bruta e manufaturada com a qual negocia possi bilitandolhes levarem avante seus respectivos negócios É principalmente mediante essa prestação de serviços que o atacadista contribui indi retamente para sustentar a mãodeobra produtiva da sociedade e au mentar o valor do que ela produz anualmente O capital do atacadista dá emprego também aos marinheiros e aos transportadores que levam suas mercadorias de um lugar para outro sendo que o preço das mer cadorias que vende é acrescido não somente do valor de seus próprios lucros mas também do valor dos salários desses agentes de transporte Essa é a única mãodeobra produtiva que o capital do atacadista põe em ação e o único valor que esse capital acrescenta imediatamente à produção anual Sob esses dois aspectos a operação do capital do comerciante atacadista é bastante superior à do capital do comerciante varejista Parte do capital do proprietário da manufatura é empregada como capital fixo nos instrumentos de seu trabalho e repõe juntamente com o respectivo lucro o capital de outro artesão do qual o proprietário compra tais instrumentos de trabalho Parte do capital circulante do ADAM SMITH 359 proprietário é empregada na compra de materiais repondo juntamente com os respectivos lucros os capitais dos exploradores da terra e das minas de quem compra tais materiais Mas grande parte do capital cir culante do proprietário é sempre distribuída anualmente ou com freqüên cia muito menor entre os operários aos quais dá emprego Ela acrescenta ao valor desses materiais o valor de seus salários o dos lucros de seus patrões sobre o total dos salários materiais e instrumentos de trabalho empregados no negócio Coloca pois em movimento um contingente muito maior de mãodeobra produtiva e adiciona à produção anual da terra e do trabalho da sociedade um valor muito maior do que um capital igual nas mãos de qualquer comerciante atacadista Não há nenhum capital igual que movimente uma quantidade maior de mãodeobra produtiva do que o capital do agricultor Não somente seus empregados mas também o gado utilizado no serviço agrícola são trabalhadores produtivos Além disso na agricultura a própria natureza trabalha juntamente com o homem e embora seu trabalho seja totalmente gratuito sua produção tem seu valor tanto quanto o do trabalhador mais caro As operações mais importantes da agricultura parecem visar não tanto a aumentar embora também o façam mas antes a dirigir a fertilidade da natureza para a produção das plantas mais aproveitáveis pelo homem Um campo cheio de sarças e espinheiros pode muitas vezes produzir uma quantidade tão grande de legumes quanto o vinhedo ou o trigal mais bem cultivados Fre qüentemente o plantio e o cultivo regularizam mais do que estimulam a fertilidade ativa da natureza sendo que depois de todo esse trabalho feito pelo homem e pelo gado grande parte do mesmo ainda fica por ser feito pela natureza Portanto os empregados e o gado utilizado na agricultura como os operários nas manufaturas não somente repro duzem um valor igual ao seu próprio consumo ou ao capital que lhes dá emprego juntamente com os lucros dos donos do capital como ainda reproduzem um valor muito maior Além do capital do arrendatário e de todos os seus lucros normalmente reproduzem o valor correspon dente à renda da terra paga ao dono da mesma Essa renda pode ser considerada como o produto dessas forças da natureza cuja utilização o dono da terra empresta ao arrendatário Ele é maior ou menor con forme a suposta extensão dessas forças ou em outros termos de acordo com a suposta fertilidade natural ou melhorada da terra É o trabalho da natureza que permanece depois de deduzir ou compensar tudo aqui lo que pode ser considerado como obra do homem Raramente é menos do que 14 e muitas vezes mais do que 13 da produção total Nenhuma quantidade igual de mãodeobra produtiva empregada nas manufatu ras é capaz de gerar uma reprodução tão grande Nelas a natureza nada faz é o homem que faz tudo e a reprodução deve sempre ser proporcional à força dos agentes que a geram Portanto o capital apli cado na agricultura não somente põe em movimento um contingente de mãodeobra maior do que qualquer capital igual empregado em manufaturas senão que também em proporção à quantidade de mão OS ECONOMISTAS 360 deobra produtiva a que dá emprego acrescenta um valor muito maior à produção anual da terra e do trabalho do país à riqueza e à renda real de seus habitantes De todos os modos de empregar um capital o em pregado na agricultura é de longe o mais vantajoso para a sociedade Os capitais empregados na agricultura e no comércio varejista de uma sociedade sempre devem inserirse nessa sociedade Seu em prego está limitado praticamente a um local preciso à propriedade rural e à loja do varejista Além disso geralmente esses capitais devem pertencer a membros residentes da sociedade excetuados alguns casos Ao contrário o capital de um comerciante atacadista não parece ter uma residência fixa ou necessária em parte alguma podendo des locarse de um lugar para outro enquanto puder comprar barato ou vender caro O capital do manufator deve sem dúvida se fixar no local onde a manufatura funciona mas nem sempre está determinado onde isso deve ser Muito freqüentemente poderá estar a grande distância tanto do lugar em que são produzidos os materiais como do local onde os produtos manufaturados são consumidos Lyon está muito distante tanto dos lugares que fornecem os materiais para suas manufaturas como dos lugares que consomem seus produtos As pessoas de posição da Sicília vestem sedas fabricadas em outros países porém a partir de materiais produzidos na própria ilha Parte da lã da Espanha é manufaturada na GrãBretanha e parte desses tecidos novamente ex portada para a Espanha Muito pouca diferença faz se é nacional ou estrangeiro o comer ciante cujo capital exporta a produção excedente de uma sociedade Se for um estrangeiro necessariamente o número de seus trabalhadores produtivos é menor se fosse um nacional na razão de apenas um ho mem e também o valor da produção anual desses trabalhadores tam bém é menor na razão dos lucros daquele único homem Os marinheiros ou os transportadores aos quais esse capital dá emprego também podem pertencer ao próprio país ao país deles ou a um terceiro país da mesma forma como se o comerciante fosse do país O capital de um estrangeiro acrescenta um valor à produção excedente da mesma forma que o de um nacional trocandoa por algo que é objeto de demanda no país Com a mesma eficiência repõe o capital da pessoa que produz esse excedente e lhe possibilita continuar seu negócio o serviço pelo qual o capital de um atacadista contribui sobretudo para sustentar a mãodeobra produtiva e para aumentar o valor da produção anual da sociedade à qual pertence Quanto ao capital do manufator a conseqüência é maior se esse capital estiver dentro do país Pois se assim for ele necessariamente movimenta uma quantidade maior de mãodeobra produtiva e acres centa um valor maior à produção anual da terra e do trabalho da sociedade Todavia o capital do manufator também pode ser muito útil ao país mesmo estando fora dele Os capitais dos manufatores britânicos que fabricam o linho e o cânhamo importados anualmente ADAM SMITH 361 das costas do mar Báltico certamente são muito úteis aos países que os produzem Esses materiais fazem parte do excedente de produção desses países excedente esse que se não fosse anualmente trocado por algo que lá está em falta não teria valor algum deixando logo de ser produzido Os comerciantes que exportam esse excedente repõem os capitais das pessoas que o produzem estimulandoas assim a con tinuarem sua produção e os manufatores britânicos repõem os capitais desses comerciantes Determinado país da mesma forma que determinado indivíduo muitas vezes pode não ter capital suficiente para aprimorar e cultivar toda a sua terra para industrializar e preparar toda a sua produção bruta destinada ao uso e consumo imediato para transportar o exce dente da produção bruta ou da produção industrializada a mercados distantes onde possa ser trocado por algo que está em falta no país Os habitantes de muitas regiões da GrãBretanha não dispõem de ca pital suficiente para melhorar e cultivar todas as suas terras Grande parte da lã dos condados sulinos da Escócia após um longo transporte através de péssimas estradas é industrializada no Yorkshire porque falta lá capital suficiente Há na GrãBretanha muitas pequenas cida des industriais cujos habitantes não têm capital suficiente para trans portar a produção de seu próprio trabalho aos mercados distantes onde há para ela demanda e consumo Se há algum comerciante entre eles são praticamente apenas agentes de comerciantes mais ricos que re sidem em algumas das cidades comerciais de maior importância Quando o capital de um país não é suficiente para todos esses três objetivos quanto maior for a parcela desse capital empregada na agricultura tanto maior será a quantidade de mãodeobra produtiva que ela movimentará dentro do país e tanto maior será também o valor que o emprego desse capital acrescentará à produção anual da terra e do trabalho da sociedade Depois da agricultura o capital in vestido em manufaturas movimenta o maior contingente de mãode obra produtiva e acrescenta o maior valor possível à produção anual O capital empregado no comércio de exportação é o que tem menos efeito dentre os três Assim o país que não tem capital suficiente para todos esses três objetivos ainda não chegou àquele grau de riqueza ao qual parece naturalmente destinado Entretanto tentar prematuramente e com um capital insuficiente fazer as três coisas certamente não é o caminho mais curto para um país da mesma forma como não seria para um indivíduo adquirir um capital suficiente A soma de todos os capitais individuais de uma nação tem os seus limites tanto quanto o capital de determinado indivíduo isolado podendo concretizar apenas alguns objetivos O capital da soma de indivíduos de uma nação aumenta da mesma forma que o capital de um indivíduo particular mediante o acúmulo contínuo acrescentando ao capital já existente tudo aquilo que se consegue economizar da renda Portanto esse capital tem pos sibilidades de aumentar o mais rapidamente quando empregado de OS ECONOMISTAS 362 maneira que proporcione a maior renda a todos os habitantes do país pois terão então condições de fazer enorme poupança Mas a renda de todos os habitantes do país é necessariamente proporcional ao valor da produção anual de sua terra e de seu trabalho A causa primordial do rápido progresso de nossas colônias ame ricanas rumo à riqueza e à grandeza reside no fato de terem até agora aplicado quase todos os seus capitais na agricultura Não têm manu faturas excetuadas as domésticas e menos refinadas que acompanham necessariamente o progresso da agricultura manufaturas essas devidas ao trabalho das mulheres e das crianças em cada família A maior parte do comércio da América tanto do costeiro como do de exportação é movimentada pelos capitais de comerciantes que residem na Grã Bretanha Mesmo muitos dos depósitos e armazéns que vendem aos varejistas em algumas regiões sobretudo na Virgínia e no Maryland pertencem a comerciantes que residem na GrãBretanha constituindo um dos poucos exemplos em que o comércio varejista de um país é movimentado pelos capitais daqueles que não são seus membros resi dentes Se os americanos por conluio ou por algum outro tipo de vio lência deixassem de importar manufaturados europeus e reservassem a patrícios seus o monopólio da fabricação desses bens desviando assim parte considerável de seu capital para a manufatura ao invés de ace lerarem o ulterior crescimento do valor de sua produção anual have riam de retardálo e ao invés de promoverem o progresso de seu país rumo à riqueza e à grandeza reais haveriam de obstruílo Isso ocorreria mais ainda se tentassem monopolizar para si todo o seu comércio de exportação Com efeito ao que parece a evolução da prosperidade humana raramente apresentou uma continuidade tão longa a ponto de possi bilitar a um grande país a aquisição de capital suficiente para todos os três objetivos mencionados a menos talvez que déssemos crédito aos relatos mirabolantes sobre a riqueza e o cultivo na China sobre o Egito Antigo e ao antigo Estado do Industão Mesmo esses três países os mais ricos do mundo porém segundo o relato de todos parecem ter se destacado por sua atividade manufatureira e agrícola Não pa recem ter sobressaído no comércio exterior Os antigos egípcios nutriam uma antipatia supersticiosa contra o mar uma superstição mais ou menos do mesmo tipo prevalece entre os hindus e os chineses nunca se distinguiram no comércio exterior Ao que parece a maior parte do excedente de produção desses três países era sempre exportada por estrangeiros que davam em troca alguma outra coisa de que eles tinham necessidade muitas vezes ouro e prata Assim pois o mesmo capital em um país movimentará um con tingente maior ou menor de mãodeobra produtiva e acrescentará um valor maior ou menor à produção anual de sua terra e de seu trabalho conforme às diferentes proporções em que esse capital for aplicado à agri cultura às atividades manufatureiras e ao comércio atacadista Além disso ADAM SMITH 363 a diferença é também muito grande conforme os diversos ramos de comércio atacadista em que se aplica alguma parte desse capital Todas as variedades de comércio atacadista ou seja toda compra de mercadorias visando a revendêlas no atacado podem ser reduzidas a três O comércio interno O comércio exterior para consumo interno e o comércio de transporte O comércio interno consiste em comprar em uma região do próprio país o produto do trabalho do país e revendêlo em outra Engloba tanto comércio terrestre como de cabotagem No comércio exterior para consumo interno compramse merca dorias estrangeiras para o consumo interno do país O comércio de transporte é utilizado na efetivação do comércio entre países estran geiros ou no transporte da produção excedente de um país para outro O capital empregado para comprar o produto do trabalho do pró prio país em uma região para revendêlo em outra do mesmo país geralmente repõe em toda operação desse tipo dois capitais diferentes que anteriormente haviam sido investidos na agricultura ou nas ma nufaturas desse país possibilitando aos agricultores e aos industriais continuarem essa aplicação Quando esse capital expede da loja do comerciante certo valor de mercadorias geralmente traz em troca pelo menos um valor igual de outras mercadorias Quando as duas são produzidas por trabalho doméstico esse capital necessariamente repõe em cada uma dessas operações dois capitais diferentes sendo que ambos haviam previamente sido investidos em sustentar mãodeobra produtiva possibilitandolhes assim continuarem esse investimento O capital que expede manufaturados escoceses para Londres e traz de volta para Edimburgo trigo e manufaturados ingleses necessariamente repõe em cada uma dessas operações dois capitais britânicos que an teriormente haviam sido aplicados na agricultura ou nas manufaturas da GrãBretanha Também o capital empregado em comprar mercadorias estran geiras para consumo interno quando essa compra é feita com produtos do próprio país repõe em cada uma dessas operações dois capitais diferentes mas somente um dos dois é empregado para sustentar o trabalho doméstico O capital que expede mercadorias britânicas a Por tugal e traz de volta mercadorias portuguesas para a GrãBretanha repõe em cada uma dessas operações somente um capital britânico sendo que o outro é português Ainda que portanto o retorno do co mércio externo de bens de consumo possa ser tão rápido quanto o do comércio puramente interno o capital investido nele só dará a metade do estímulo à industria ou mãodeobra produtiva do país Entretanto o retorno do comércio externo de bens de consumo rarissimamente é tão rápido quanto o assegurado pelo comércio interno O retorno do comércio interno ocorre em geral antes do fim do ano e em certos casos três ou quatro vezes ao ano O retorno do comércio externo de bens de consumo raramente ocorre antes do fim do ano e em certos casos demora dois ou três anos Portanto um capital aplicado no comércio interno às vezes comporta doze operações ou sairá e re OS ECONOMISTAS 364 tornará doze vezes antes que um capital empregado no comércio externo de bens de consumo efetue uma única operação Por conseguinte se os capitais forem iguais o primeiro proporcionará 24 vezes mais estí mulo e sustentação à indústria do país do que o segundo As mercadorias estrangeiras para consumo interno às vezes po dem ser compradas não com os produtos do próprio país mas com alguns outros produtos estrangeiros Todavia estes últimos devem ter sido comprados diretamente com o produto da indústria nacional ou com alguma coisa adquirida com ele com efeito excetuados os casos de guerra ou de conquista as mercadorias estrangeiras só podem ser adquiridas em troca de algo produzido anteriormente no país direta mente ou após duas ou mais trocas diferentes Conseqüentemente os efeitos de um capital empregado em tal comércio externo indireto de bens de consumo são sob todos os aspectos iguais àqueles da operação comercial mais direta do mesmo gênero exceto que o retorno final está sujeito a ser ainda mais demorado já que dependerá do retorno de duas ou três operações diferentes de comércio externo Se o linho e o cânhamo de Riga são comprados com o fumo importado da Virgínia o qual por sua vez tinha sido comprado com manufaturados bri tânicos o comerciante deve esperar o retorno de duas operações diferentes de comércio exterior antes de poder aplicar o mesmo capital para recomprar uma quantidade igual de manufaturados britânicos Ao contrário se o fumo da Virgínia tivesse sido comprado não com manufaturados britânicos mas com açúcar e rum da Jamaica que tinham sido comprados com aqueles manufaturados o comerciante teria que esperar o retorno de três operações de comércio exterior Se essas duas ou três operações diferentes de comércio exterior tivessem sido efetuadas por dois ou três comerciantes diferentes dos quais o segundo compra as mercadorias importadas pelo primeiro e o terceiro compra as importadas pelo segundo para reexportálas cada comerciante re ceberia nesse caso o retorno de seu próprio capital com mais rapidez contudo o retorno final do capital total empregado nesse comércio seria exatamente tão demorado como antes Se o capital total empre gado em tal comércio exterior mais indireto pertence a um só comer ciante ou a três não faz diferença alguma em relação ao país mas pode fazer uma diferença para os respectivos comerciantes Em ambos os casos deverseá empatar um capital três vezes maior para trocar um certo valor em mercadorias britânicas por uma certa quantidade de linho e cânhamo em comparação com o capital que teria sido ne cessário empatar no caso de o linho e o cânhamo terem sido trocados diretamente por manufaturados britânicos Por conseguinte o capital total empregado em tal espécie de comércio exterior de bens de consumo de tipo cruzado normalmente proporcionará menos estímulo e susten tação à mãodeobra produtiva no país em comparação com o estímulo e a sustentação que se teria no caso de um capital igual a ser empregado em uma operação mais direta de comércio externo Qualquer que seja a mercadoria estrangeira com a qual se com ADAM SMITH 365 pram os bens estrangeiros para consumo interno ela não pode acarretar nenhuma diferença essencial nem quanto à natureza do negócio nem quanto ao estímulo e sustentação que possa proporcionar à mãodeobra produtiva do país a partir do qual é feita a operação Tenham as mer cadorias sido compradas com o ouro do Brasil ou com a prata do Peru esse ouro e essa prata como o fumo da Virgínia devem por sua vez ter sido comprados com um produto interno do país ou com alguma outra coisa anteriormente comprada com produtos do país Por isso no que concerne à mãodeobra produtiva do país o comércio externo de bens de consumo efetuado mediante ouro e prata tem todas as vantagens e também todas as desvantagens de qualquer outro comércio externo indireto para consumo interno reproduzindo exatamente com a mesma rapidez ou com a mesma lentidão o capital diretamente em pregado em sustentar essa mãodeobra produtiva do país Parece até apresentar uma vantagem em relação a qualquer outra operação in direta de comércio externo de bens de consumo O transporte desses metais de um local para outro em razão de seu volume pequeno e de seu alto valor é menos dispendioso que o de quase todas as outras mercadorias estrangeiras de valor igual Seu frete é muito menos caro e o seguro a pagar não muito maior além disso não há mercadoria menos sujeita a danos em função do transporte Por conseguinte uma quantidade igual de mercadorias estrangeiras muitas vezes pode ser comprada com uma quantidade menor de produtos internos se a mer cadoria de troca for ouro e prata ao invés de outras mercadorias es trangeiras A demanda do país muitas vezes pode ser melhor atendida dessa maneira suprida mais completamente e com despesa menor do que de qualquer outra forma Outra questão é se em decorrência da exportação contínua desses metais preciosos um comércio dessa linha tem probabilidade de empobrecer o país do qual provêm Esse problema abordáloei minuciosamente mais adiante A parcela de capital de um país que é empregada no comércio de transporte exterior é totalmente retirada da sustentação da mão deobra produtiva do próprio país para sustentar a mãodeobra pro dutiva de alguns outros países estrangeiros Embora essa parcela de capital possa em cada operação repor dois capitais diferentes nenhum dos dois pertence ao respectivo país O capital do comerciante holandês que transporta o trigo da Polônia para Portugal trazendo de volta à Polônia as frutas e os vinhos de Portugal repõe em cada operação desse tipo dois capitais nenhum dos quais havia sido empregado para sustentar mãodeobra produtiva da Holanda pois um deles havia sido empregado para sustentar a mãodeobra produtiva da Polônia e o outro para sustentar a mãodeobra produtiva de Portugal Somente os lucros retornam regularmente à Holanda constituindo o único acrés cimo que esse tipo de comércio necessariamente traz para a produção anual da terra e do trabalho daquele país Sem dúvida quando o co mércio de transporte de determinado país é executado com navios e marinheiros desse país a parte do capital empregado nele que paga OS ECONOMISTAS 366 o frete é distribuída entre um certo número de trabalhadores do país mantendo essa mãodeobra produtiva Efetivamente quase todas as nações que tiveram uma parte considerável no comércio de navegação o efetuaram dessa forma O comércio provavelmente deriva seu nome desse fato já que são os habitantes desses países que transportam para outros países Todavia não parece que isso seja essencial para esse tipo de comércio Um comerciante holandês pode por exemplo empregar seu capital no comércio da Polônia e de Portugal transpor tando parte do excedente de produção de um país para outro não com navios holandeses mas com navios britânicos Podese até supor que faça isto em determinadas ocasiões É por esta razão que se supõe que o comércio de transporte de mercadorias é particularmente van tajoso para um país como a GrãBretanha cuja defesa e segurança dependem do número de seus marujos e de seus navios Mas o mesmo capital pode empregar tantos marujos e tantos navios no comércio externo de bens de consumo ou mesmo no comércio interno quando realizado com navios de cabotagem quantos poderia empregar no co mércio de transporte de mercadorias O número de marujos e navios que um determinado capital pode empregar não depende da natureza do comércio mas em parte do volume das mercadorias em comparação com seu valor e em parte da distância entre os portos para os quais as mercadorias são transportadas dependendo mais do primeiro fator Por exemplo o comércio de carvão entre Newcastle e Londres emprega mais navios do que todo o comércio exterior de transporte de merca dorias embora os portos não distem muito um do outro Eis porque forçar mediante estímulos extraordinários uma aplicação maior de capital de um país no comércio de transporte de mercadorias do que a parcela que seria naturalmente canalizada para ele não levará ne cessariamente a aumentar a frota mercante desse país Conseqüentemente o capital empregado no comércio interno de um país normalmente estimula e sustenta um contingente maior de mãodeobra produtiva naquele país e aumenta o valor de sua produção anual mais do que um capital igual empregado no comércio externo de bens de consumo e o capital empregado nesse último tipo de comércio apresenta sob esses dois aspectos uma vantagem ainda maior em relação a um capital empregado no comércio de transporte de merca dorias A riqueza e portanto o poder de um país na medida em que esse depende da riqueza devem ser sempre proporcionais ao valor de sua produção anual de cujo fundo em última análise devem ser pagos todos os impostos Mas o grande objetivo da economia política de um país consiste em aumentar sua riqueza e seu poder Ele não deve portanto dar preferência ou maiores estímulos ao comércio ex terno de bens de consumo em relação ao comércio interno nem ao comércio de transporte de mercadorias em relação aos dois outros tipos de comércio Ele não deve também forçar nem aliciar para algum desses dois canais uma parcela do capital do país superior àquela que espon taneamente fluiria para cada um deles ADAM SMITH 367 Todavia cada um desses diversos setores de comércio não somente acarreta vantagens mas é necessário e inevitável se forem introduzidos pelo curso normal dos acontecimentos sem coação ou violência Quando a produção de determinado setor ultrapassa a demanda do próprio país o excedente deve ser exportado e trocado por algo que esteja em falta no país Sem essa exportação cessará necessariamente uma parte do trabalho produtivo do país diminuindo o valor de sua produção anual A terra e o trabalho na GrãBretanha costumam pro duzir mais trigo mais lã e ferragens do que o exigido pela demanda interna Portanto o excedente desses produtos deve ser exportado e trocado por algo que esteja em falta no país Somente mediante essa exportação o excedente pode adquirir um valor para compensar o tra balho e as despesas necessárias para produzilo A proximidade das costas marítimas e de todos os rios navegáveis constitui localização vantajosa para a indústria somente porque facilita a exportação e a troca de tais produtos excedentes por alguma outra mercadoria que esteja mais em falta no respectivo país Quando as mercadorias estrangeiras compradas com o excedente da produção interna superam a demanda do próprio país o excedente dessas mercadorias importadas deve ser reexportado sendo trocado por alguma outra mercadoria que esteja mais em falta no país Com uma parte do excedente de manufaturados britânicos compramse anualmente em torno de 96 mil tonéis de tabaco da Virgínia e do Maryland Ora a demanda da GrãBretanha talvez não exija mais do que 14 mil Se os restantes 82 mil não pudessem ser exportados e trocados por alguma coisa mais em falta em nosso país a importação desse excedente deveria cessar imediatamente e com ela também o trabalho produtivo de todos aqueles habitantes da GrãBretanha que atualmente estão empregados em preparar as mercadorias mediante as quais são anualmente comprados esses 82 mil barris de fumo De verseia deixar de produzir essas mercadorias que constituem parte da produção da terra e do trabalho da GrãBretanha por não terem mercado no país e por têlo perdido também no exterior Por conse guinte em certas ocasiões o comércio externo mais indireto para o consumo interno pode em certos casos ser tão necessário quanto o comércio mais direto para sustentar o trabalho e a mãodeobra pro dutiva do país Quando o capital de um país cresceu a tal ponto que não pode ser totalmente aplicado no suprimento do consumo interno e para sus tentar a mãodeobra produtiva do respectivo país a parte excedente dele é naturalmente canalizada para o comércio de transporte externo de mercadorias sendo aplicada para cumprir as mesmas funções para outros países O comércio de transporte de mercadorias representa o efeito e o sintoma natural de grande riqueza nacional mas não parece ser a causa natural dela Os estadistas que se têm empenhado em fomentálo com incentivos especiais parecem ter confundido o efeito e o sintoma com a causa Eis porque a Holanda que em proporção com OS ECONOMISTAS 368 a extensão da terra e com o número de habitantes é de longe o país mais rico da Europa possui a parcela maior do comércio de transporte da Europa A Inglaterra talvez o segundo país mais rico da Europa supostamente também possui uma parte considerável desse comércio embora o que se costuma geralmente chamar de comércio de transporte da Inglaterra muitas vezes talvez não passe propriamente de um co mércio externo indireto para consumo interno Tal é em grande parte o transporte de mercadorias das Índias Orientais e Ocidentais e da América para diversos mercados europeus Essas mercadorias geral mente são compradas com produtos da indústria britânica ou com ou tras mercadorias anteriormente compradas com tais produtos internos sendo que os retornos finais dessas transações costumam ser usados ou consumidos na GrãBretanha O comércio de transporte em navios britânicos entre os diversos portos do Mediterrâneo e uma parte do mesmo tipo de comércio efetuado por comerciantes britânicos entre os diferentes portos da Índia representam talvez os setores principais do que se pode propriamente denominar o comércio de transporte de mer cadorias da GrãBretanha O volume de comércio interno e de capital que pode ser nele empregado é necessariamente limitado pelo valor do excedente de pro dução de todas as regiões do país que têm necessidade de trocar entre si seus respectivos produtos Por sua vez o volume do comércio externo de bens de consumo e do capital que pode ser empregado nele é limitado pelo valor do excedente de produção do país inteiro e daquilo que com esse excedente se pode comprar E o volume do comércio de transporte de mercadorias é limitado pelo valor do excedente de produção de todos os países do mundo O volume possível desse tipo de comércio portanto é de certo modo infinito em comparação com o volume dos outros dois tipos de comércio sendo capaz de absorver o máximo de capital A consideração de seu próprio lucro é o único motivo que faz com que o dono de um capital o aplique na agricultura nas atividades manufatureiras ou em algum setor específico do comércio atacadista ou varejista Ele nunca leva em consideração as diferentes quantidades de mãodeobra produtiva que seu capital pode movimentar e os valores que ele pode acrescentar à produção anual da terra e do trabalho do país conforme seu capital seja empregado em um ou em outro desses setores de comércio Por isso em países em que a agricultura representa o emprego de capital mais rentável e o cultivo e o aperfeiçoamento da terra representam os caminhos mais diretos para conseguir uma grande fortuna os capitais dos indivíduos serão naturalmente empregados da maneira mais vantajosa para os países Todavia os lucros auferidos da agricultura não parecem ser superiores aos assegurados por outros empregos de capital em nenhum país da Europa Sem dúvida em todos os recantos da Europa no decorrer desses últimos anos certos promotores de projetos agrícolas têm procurado convencer o público por meio de seus relatos mirabolantes dos grandes lucros que se podem auferir do cultivo e do aprimoramento da terra Todavia sem querer ADAM SMITH 369 adentrarme numa discussão detalhada de seus cálculos basta uma observação muito simples para convencernos de que os resultados de vem ser falsos A cada dia observamos surgirem as maiores fortunas adquiridas no decurso da vida de uma só pessoa por meio da atividade comercial e manufatureira muitas vezes a partir de um capital muito pequeno e às vezes sem nenhum capital inicial Ora talvez não haja em toda a Europa durante o decurso do corrente século um único exemplo de uma grande fortuna adquirida por meio da atividade agrí cola durante a vida de um único indivíduo e partindo de um capital pequeno ou nulo Por outro lado em todos os grandes países da Europa ainda restam muitas áreas de terra boa a serem cultivadas e grande parte da terra cultivada está longe de já ter recebido todas as melhorias que seria capaz de comportar A agricultura portanto quase em toda parte é capaz de absorver um capital muito maior do que o até agora investido nela Quais as circunstâncias da política européia que fizeram com que os negócios efetuados nas cidades sejam mais vantajosos do que os realizados no campo a tal ponto que os investidores particulares têm muitas vezes considerado mais rentável para eles aplicar seus capitais no comércio de transporte mais longínquo com a Ásia e com a América do que aplicálos na melhoria e no cultivo das terras mais férteis existentes em suas próprias regiões eis o que procurarei explicar detalhadamente nos dois próximos livros desta obra OS ECONOMISTAS 370 LIVRO TERCEIRO A Diversidade do Progresso da Riqueza nas Diferentes Nações CAPÍTULO I O Progresso Natural da Riqueza O grande comércio de todo país civilizado é o efetuado entre os habitantes da cidade e os habitantes do campo Consiste na troca de produtos em estado bruto por produtos manufaturados o que pode ser feito ou diretamente por meio do dinheiro ou por algum tipo de papel que represente o dinheiro O campo fornece à cidade os meios de sub sistência e os materiais a serem manufaturados A cidade restitui isso devolvendo aos habitantes do campo parte da produção manufaturada Podese afirmar com muita propriedade que a cidade na qual não há nem pode haver nenhuma reprodução de gêneros de subsistência ad quire toda a sua riqueza e subsistência do campo Nem por isso de vemos porém imaginar que ganhando a cidade o campo saia perdendo Os ganhos dos dois são mútuos e recíprocos sendo que a divisão de trabalho e de tarefas nesse como em outros casos traz vantagem para todas as ocupações em que se subdivide o trabalho Os habitantes do campo compram da cidade uma quantidade maior de bens manufatu rados com o produto de uma quantidade muito menor de seu próprio trabalho do que teriam que executar se tentassem eles mesmos trans formar essa sua produção bruta A cidade proporciona um mercado para o excedente de produção do campo vale dizer para aquilo que ultrapassa o necessário à manutenção dos agricultores sendo na cidade que os habitantes do campo trocam esse excedente por coisas que lhes fazem falta Quanto maior for o número e a renda dos habitantes da cidade tanto maior será o mercado que ela propicia aos habitantes do campo e quanto maior for esse mercado tanto maior será sempre a vantagem para um grande número de pessoas O trigo que cresce a uma milha de distância da cidade é vendido ali pelo mesmo preço que o trigo que vem da distância de vinte milhas Ora o preço deste último geralmente deve pagar não somente a despesa do cultivo do trigo e a despesa necessária para colocálo no mercado mas ainda garantir o lucro normal que cabe ao arrendatário da terra Por conseguinte os 373 donos e os cultivadores de uma propriedade rural localizada perto da cidade ganham no preço do produto que vendem não somente o lucro normal da agricultura mas também o valor integral do transporte do produto similar que é trazido de regiões mais distantes além de eco nomizarem no preço do que compram o valor integral desse transporte Comparese o cultivo de terras localizadas nas proximidades de uma grande cidade com o cultivo das terras localizadas a alguma distância dela e se compreenderá facilmente até que ponto o campo é beneficiado pelo comércio existente na cidade Entre todas as teorias absurdas propagadas no tocante à balança comercial jamais alguém chegou a pretender insinuar que o campo acaba perdendo no comércio com a cidade ou que a cidade acaba perdendo no comércio com o campo Assim como a subsistência pela própria natureza das coisas tem prioridade sobre o que são apenas comodidades e artigos de luxo da mesma forma a atividade que garante a subsistência tem necessaria mente prioridade sobre a que está a serviço das meras comodidades e do luxo Conseqüentemente o aprimoramento e o cultivo da terra pelo fato de assegurar o necessário para a subsistência deve forçosa mente ter prioridade sobre o crescimento da cidade que fornece apenas comodidades e artigos de luxo É somente o excedente da produção do campo isto é o que vai além do necessário para a manutenção do pessoal do campo que constitui a subsistência da cidade a qual pois só pode crescer na medida em que aumentar o excedente de produção do campo A cidade nem sempre consegue obter tudo o que é necessário para sua subsistência das propriedades rurais localizadas em sua re dondeza muitas vezes nem sequer é suficiente a produção vinda do país ao qual pertence havendo necessidade de recorrer a países muito distantes ora isso embora não constitua nenhuma exceção à regra geral tem gerado variações consideráveis no progresso da riqueza em épocas e em nações diferentes Essa ordem de coisas que a necessidade impõe de modo geral ainda que nem sempre em um país específico é reforçada em cada país pelas inclinações naturais do homem Se as instituições humanas nunca tivessem interferido nessas inclinações naturais jamais as ci dades poderiam em qualquer parte ter crescido além da medida com patível com o aprimoramento e o cultivo do território ou do país do qual fazem parte pelo menos até quando todo aquele território esti vesse completamente cultivado e aprimorado Em condições de paridade ou quase paridade de lucros a maioria das pessoas optará por empregar seus capitais na melhoria e no cultivo da terra ao invés de os canalizar para a manufatura ou para o comércio exterior A pessoa que aplica seu capital na terra temno sob suas vistas e sob seu controle direto e sua fortuna está muito menos exposta a acidentes do que a do co merciante que muitas vezes se vê obrigado a confiálo não somente aos ventos e às ondas mas também aos fatores mais incertos da in sensatez e da injustiça humana dando crédito em países distantes a pessoas cujo caráter e situação raramente chega a conhecer bem Ao OS ECONOMISTAS 374 contrário o capital do proprietário de terras que é aplicado na melhoria de sua terra parece estar tão bem assegurado quanto a natureza dos negócios humanos possa comportar Além disso a beleza do campo os prazeres de uma vida campestre a tranqüilidade de espírito que ela proporciona e onde a injustiça das leis humanas não a perturbar a autonomia que tal modalidade de vida assegura possuem encantos que atraem praticamente a todos e assim como o cultivo do solo sempre foi o destino natural do homem da mesma forma em todos os estágios de sua existência ele parece conservar uma predileção por essa ocu pação primitiva Todavia sem a ajuda de certos artífices não é possível cultivar a terra a não ser com grandes inconvenientes e interrupções contínuas Ferreiros carpinteiros fabricantes de rodas fabricantes de arados fa bricantes de tijolos pedreiros curtidores sapateiros alfaiates todos são pessoas de que o agricultor tem freqüente necessidade Também esses artífices por sua vez têm ocasionalmente necessidade de ajuda uns dos outros e já que sua residência não está necessariamente fixada a um lugar específico como é o caso dos agricultores naturalmente se estabelecem um perto do outro formando assim uma pequena cidade ou aldeia Logo se lhes juntam o açougueiro o cervejeiro o padeiro juntamente com muitos outros artífices e varejistas necessários ou úteis para atender às suas necessidades ocasionais e que contribuem para que a cidade cresça ainda mais Os habitantes da cidade e os do campo ajudamse mutuamente A cidade é uma feira ou mercado contínuo para onde confluem continuamente os habitantes do campo a fim de trocar sua produção em estado bruto por produtos manufaturados É esse comércio que fornece aos habitantes da cidade os materiais com que trabalham e os meios para sua subsistência A quantidade de produto acabado que vendem aos habitantes do campo necessariamente determina a quantidade de materiais e provisões que deles compram Portanto nem seu emprego nem sua subsistência podem aumentar senão na medida em que aumentar a demanda dos habitantes do campo em relação ao produto acabado da cidade por sua vez essa demanda dos habitantes do campo em relação aos produtos acabados da cidade só pode crescer na medida em que aumentar a extensão das terras aprimoradas e cultivadas Eis porque se as instituições humanas não tivessem interferido no curso natural das coisas a riqueza progressiva e o crescimento das cidades seriam em toda sociedade política con seqüência da melhoria e do cultivo da região ou do país sendo também proporcional a essa melhoria e a esse cultivo Nas nossas colônias norteamericanas onde ainda se podem com prar barato terras incultas em nenhuma cidade surgiram manufaturas destinadas a produzir para vender em locais distantes Quando um artífice adquire um capital pouco superior ao necessário para levar adiante sua ocupação de servir aos vizinhos do campo ele não procura na América do Norte implantar uma manufatura para vender seus produtos em locais distantes mas emprega seu capital para comprar ADAM SMITH 375 melhorar e cultivar a terra Transformase de artífice em plantador sendo que nem os bons salários nem a fácil subsistência que o país garante aos artífices conseguem aliciálo a trabalhar para os outros quando pode tra balhar para si mesmo Ele percebe que um artífice é escravo de seus clientes dos quais aufere sua subsistência e que um agricultor que cultiva sua própria terra auferindo sua subsistência do trabalho de sua própria família é realmente um patrão independente de todos Ao contrário em países onde não há mais terra inculta ou onde não existe terra que se possa comprar a preço baixo todo artífice que conseguiu acumular capital superior ao que consegue aplicar no aten dimento dos clientes da redondeza procura aplicálo em produzir para vender mais longe O ferreiro dá início a certo tipo de fundição o tecelão funda determinada manufatura de linho ou de lã Essas diversas manufaturas com o decorrer do tempo subdividemse gradualmente aprimorandose e refinandose assim de maneiras muito variadas o que é fácil conceber e que portanto não carece de ulterior explicação Ao se buscar uma forma de aplicar um capital em paridade ou quase paridade de lucros naturalmente se prefere as manufaturas ao comércio exterior pela mesma razão que às manufaturas se prefere a agricultura Assim como o capital do proprietário da terra ou do ar rendatário está mais seguro do que o do manufator da mesma forma o capital deste por estar sempre sob as vistas e sob o controle mais direto do patrão está mais seguro do que o capital empatado no co mércio exterior Com efeito em todas as épocas em qualquer sociedade o excedente da produção bruta ou da produção manufaturada isto é aquela parte para a qual não há mais demanda no país deve ser exportado para ser trocado por algum produto que esteja em falta no país Muito pouco importa se o capital que transporta essa produção excedente ao exterior é estrangeiro ou nacional Se a sociedade ainda não adquiriu capital suficiente para cultivar todas as suas terras e para manufaturar plenamente toda a produção bruta há mesmo uma grande vantagem em se exportar a produção bruta com capital estran geiro para que todo o capital da sociedade seja empregado para fins mais úteis A riqueza do antigo Egito a da China e a do Industão demonstram suficientemente que uma nação pode atingir um altíssimo grau de riqueza mesmo que a maior parte de seu comércio seja operada por estrangeiros O progresso das nossas colônias da América do Norte e das Índias Ocidentais teria sido muito mais lento se na exportação do excedente de produção dessas colônias não se tivesse empregado também capital estrangeiro além do nacional Pelo curso natural das coisas portanto a maior parte do capital de toda sociedade em crescimento é primeiramente canalizada para a agricultura em segundo lugar para as manufaturas e só em último lugar para o comércio exterior Essa ordem de prioridade é tão natural que segundo creio sempre foi observada até certo ponto em todo país que disponha de algum território Algumas de suas terras foram necessariamente cultivadas antes de se poder criar alguma cidade OS ECONOMISTAS 376 grande e algum tipo de atividade manufatureira mais primitiva deve ter havido nessas cidades antes de pensarem em dedicarse ao comércio exterior Todavia ainda que essa ordem de coisas tenha sido observada em certo grau em toda e qualquer sociedade em todos os modernos países da Europa essa ordem foi totalmente invertida sob muitos as pectos Nesses países foi o comércio externo de algumas de suas cidades que introduziu todas as suas manufaturas mais refinadas isto é aque las que eram indicadas para vender seus produtos em locais distantes e foram as manufaturas e o comércio exterior juntos que fizeram surgir os principais melhoramentos da agricultura Os hábitos e os costumes introduzidos pelo estilo de seus primeiros governos hábitos e costumes esses que permaneceram mesmo depois de ter esses governos passado por profundas alterações necessariamente lançaram esses países nessa ordem retrógrada e antinatural ADAM SMITH 377 no text CAPÍTULO II O Desestímulo à Agricultura no Antigo Estágio da Europa após a Queda do Império Romano Quando as nações germânicas e citas invadiram as províncias ocidentais do Império Romano as confusões que se seguiram a essa grande revolução perduraram durante vários séculos As rapinas e a violência cometidas pelos bárbaros contra os antigos habitantes inter romperam o comércio existente entre as cidades e o campo As cidades foram abandonadas e os campos deixados incultos sendo que as pro víncias ocidentais da Europa que durante o Império Romano haviam atingido considerável grau de riqueza caíram no estado mais baixo de pobreza e barbárie Enquanto perdurava esse estado de confusão os chefes e os líderes mais importantes dessas nações adquiriram ou usurparam a maior parte das terras desses países Grande parte delas permaneceu sem cultivo mas nenhuma cultivada ou não permaneceu sem proprietário Todas elas foram açambarcadas a maioria delas pas sando a ser propriedade de alguns grandes proprietários Essa apropriação original de terras incultas embora de vulto pode ter sido no entanto apenas um mal transitório Essas grandes propriedades territoriais poderiam ter sido nova mente repartidas ou subdivididas em áreas menores por sucessão ou por alienação Todavia a lei da primogenitura impedia a divisão dessas terras por sucessão e a introdução de morgadios evitava a divisão delas em áreas menores por alienação Quando a terra como os bens móveis só é considerada como meio de subsistência e de prazer a lei natural da sucessão leva à divisão dela e dos bens móveis entre todos os filhos da família poden dose supor que é igualmente cara ao pai a subsistência e o prazer de todos eles indiferentemente Eis porque essa lei natural da sucessão tinha vigência entre os romanos que não faziam mais distinção entre o filho mais velho e o mais jovem entre homem e mulher na herança de terras como nós hoje não fazemos diferença no tocante aos bens 379 móveis Mas quando a terra passou a ser considerada não somente como meio de subsistência mas também como instrumento de poder e de proteção considerouse melhor determinar que a terra fosse her dada indivisa por um filho só Naquela época de desordem todo grande senhor de terras era uma espécie de príncipe secundário Seus rendeiros eram seus súditos Ele era o juiz deles e sob certos aspectos seu legislador em tempos de paz e seu líder em tempos de guerra Fazia guerra a seu talante muitas vezes contra seus vizinhos e às vezes até contra seu soberano Portanto a segurança de uma grande pro priedade territorial a proteção que seu proprietário tinha condições de oferecer aos que nela moravam dependia da extensão da terra Dividila significava arruinála expor todas as suas partes a serem oprimidas e engolidas pelas incursões dos vizinhos Por isso a lei da primogenitura veio a implantarse não imediatamente mas com o cor rer do tempo na sucessão das propriedades rurais pela mesma razão pela qual geralmente se implantou na sucessão das monarquias embora nem sempre na sua instituição primitiva Para que o poder e conse qüentemente a segurança da monarquia não seja enfraquecida por di visões ela deve ser herdada por um único filho A qual deles deve darse tão grande preferência Isso deve ser determinado por uma norma geral fundada não nas distinções equívocas de méritos pessoais mas em uma diferença simples e óbvia que não admita contestação Ora entre os filhos da mesma família não pode haver nenhuma outra diferença inquestionável a não ser a de sexo e a da idade O sexo masculino é universalmente preferido ao feminino e em paridade com as outras condições a preferência recai sempre sobre o filho mais velho em todas as circunstâncias em detrimento do mais jovem Daí a origem do direito da primogenitura e daquilo que se chama sucessão linear Acontece que muitas vezes as leis conservam sua vigência ainda muito depois de cessarem de existir as circunstâncias que lhes deram origem circunstâncias essas que constituíam a única justificativa razoável de tais leis Na atual situação da Europa o proprietário de um único acre de terra tem a mesma segurança de posse que o proprietário de 100 mil acres Não obstante isso continuase a respeitar o direito da primo genitura e por ser dentre todas as instituições a mais apta para fomentar o orgulho das distinções de famílias provavelmente durará ainda muitos séculos Sob todos os outros aspectos nada pode contrariar mais o interesse real de uma família numerosa do que um direito que visando enriquecer um dos filhos transforma em mendicantes todos os demais O morgadio é a conseqüência natural da lei da primogenitura Foi introduzido para preservar uma certa sucessão linear cuja primeira idéia foi dada pela lei da primogenitura e para impedir que qualquer parcela da propriedade original saísse da linha proposta seja por doa ção seja por legado ou por alienação ou então pela insensatez ou pelo infortúnio de qualquer um de seus proprietários sucessivos O morgadio era totalmente desconhecido entre os romanos Nem as substituições nem os fideicommissos dos romanos apresentam qualquer semelhança OS ECONOMISTAS 380 com o morgadio embora alguns juristas franceses tenham considerado correto afirmar que o morgadio moderno não seja outra coisa senão novas denominações para as velhas instituições romanas Quando as grandes propriedades territoriais constituíam uma espécie de principados o morgadio não poderia ser desarrazoado Ana logamente ao que é chamado leis fundamentais de algumas monar quias o morgadio muitas vezes tinha condição de impedir que a se gurança de milhares de pessoas fosse comprometida pelo capricho ou extravagância de uma só pessoa Entretanto na atual situação da Eu ropa quando as leis dos respectivos países oferecem segurança tanto às propriedades pequenas como às grandes nada pode existir de mais absurdo O morgadio fundamentase na mais absurda das suposições isto é que toda geração sucessiva de cidadãos não tem um direito igual à terra e a tudo o que ela encerra mas que a propriedade da geração atual deve ser limitada e regulada segundo o capricho daqueles que faleceram talvez há 500 anos A despeito disso o morgadio é ainda hoje uma instituição respeitada na maior parte da Europa so bretudo nos países em que a nobreza de nascimento constitui um título necessário para o desfrute de honras civis ou militares O morgadio é considerado necessário para manter esse privilégio exclusivo que a nobreza tem no acesso aos grandes postos e honras de seu país e já que essa categoria de pessoas usurpou uma vantagem injusta dos de mais concidadãos para que a sua pobreza não a tornasse ridícula con siderase razoável garantirlhes outra vantagem Afirmase que a lei comum da Inglaterra detesta direitos perpétuos e conseqüentemente tais direitos são mais limitados nesse país do que em qualquer outra monarquia européia mesmo assim a Inglaterra não está totalmente isenta desses privilégios Na Escócia mais de 15 talvez mais de 13 do total das terras do país está ainda hoje rigorosamente sob o regime de morgadio como se afirma Em conseqüência do morgadio não somente grandes áreas de terras incultas foram açambarcadas por determinadas famílias como também excluiuse até para sempre na medida do possível a possi bilidade de dividilas Ora é raro o caso de um grande proprietário de terras empenharse em melhorálas Nos tempos de desordem que deram origem a essas instituições bárbaras a preocupação de um gran de proprietário consistia em defender seu próprio território ou então em estender sua jurisdição e autoridade ao território dos vizinhos Não dispunha de tempo para atender ao cultivo e ao aprimoramento da terra E quando a garantia das leis e da ordem lhe propiciava esse tempo muitas vezes lhe faltava o gosto para isto e quase sempre lhe faltavam as habilidades necessárias para tanto Se a despesa de sua casa e de sua pessoa superava ou igualava sua renda como acontecia com muita freqüência não dispunha de capital para aplicar na agri cultura Se era pessoa econômica geralmente considerava mais ren tável empregar suas poupanças anuais na compra de novas terras do que no melhoramento de sua velha propriedade O melhoramento da ADAM SMITH 381 terra com lucro como todos os demais projetos comerciais exige cuidado e atenção minuciosos a pequenas poupanças e pequenos ganhos coisa de que muito raramente é capaz um homem nascido com grande for tuna mesmo que por natureza ele seja frugal A situação de tal pessoa a dispõe naturalmente a voltarse mais para objetos de adorno que agradam à fantasia do que para o lucro do qual tem tão pouca ne cessidade Desde sua infância os objetos de suas maiores preocupações são a elegância no vestir a beleza de seus pertences de sua casa da mobília doméstica O tipo de mentalidade que esse hábito forma na turalmente o acompanha quando chega a pensar no aprimoramento da terra Ele talvez embeleze 400 ou 500 acres nas proximidades de sua casa gastando dez vezes mais do que a terra realmente vale depois de todas as melhorias implantadas considera que se fosse apri morar toda a sua propriedade dessa maneira já que não tem sen sibilidade e gosto para outra sorte de melhorias iria à falência antes de terminar a décima parte da obra Ainda restam na Inglaterra e na Escócia algumas grandes propriedades que continuaram sem in terrupção nas mãos da mesma família desde os tempos de anarquia feudal Comparese a situação atual dessas propriedades com a das terras dos pequenos proprietários da região e não haverá necessidade de outro argumento para convencerse até que ponto essa grande ex tensão de terra é desfavorável à introdução de melhorias Se se podia esperar poucas melhorias desses grandes proprietá rios muito menos se podia esperar daqueles que ocupavam efetiva mente a terra sob o comando deles Nas antigas condições da Europa os ocupantes de terras eram todos rendeiros a título precário Todos ou quase todos eram escravos embora sua escravatura fosse de um tipo mais mitigado que a conhecida entre os antigos gregos e romanos ou mesmo em nossas colônias das Índias Ocidentais Os escravos per tenciam mais diretamente à terra do que ao patrão Podiam portanto ser vendidos juntamente com a terra mas não independentemente dela Podiam casarse desde que com o consentimento do patrão o qual não podia posteriormente dissolver o casamento vendendo ma rido e mulher a pessoas diferentes Se mutilasse ou assassinasse algum deles estava sujeito a alguma penalidade embora geralmente pequena Todavia esses escravos rendeiros não tinham possibilidade de adquirir propriedade O que quer que adquirissem pertencia ao patrão o qual podia tirarlhes à vontade o que haviam adquirido Qualquer cultivo e melhoria que fossem feitos na terra com o trabalho de tais escravos contavam como feitos pelo patrão A despesa era dele As sementes o gado e os instrumentos agrícolas também lhe pertenciam Tudo era empregado em benefício do patrão Tais escravos não tinham condições de adquirir nada a não ser seu sustento diário Portanto era o próprio senhor da terra que na realidade ocupava sua terra e a cultivava por meio de seus servos Esse tipo de escravatura continua a existir na Rússia na Polônia na Hungria na Boêmia na Morávia e em outras OS ECONOMISTAS 382 regiões da Alemanha Ela foi gradualmente abolida de forma total apenas nas regiões do oeste e do sudoeste da Europa Ora se raramente se pode esperar grandes melhorias da terra por parte dos grandes proprietários muito menos se pode esperar quan do eles empregam escravos como trabalhadores Segundo acredito a experiência de todas as épocas e nações demonstra que o trabalho executado por escravos embora aparentemente custe apenas a própria manutenção dos escravos ao final é o mais caro de todos Uma pessoa incapaz de adquirir propriedade não pode ter outro interesse senão comer o máximo e trabalhar o mínimo possível Se algo ela fizer além do suficiente para pagar a própria manutenção só o fará se isso a beneficiar pessoalmente sendo impossível obrigála a fazer esse algo mais sob violência Tanto Plínio como Columella observaram como na antiga Itália a triticultura degenerou e como ela se tornou pouco rentável para o patrão quando passou a ser feita por escravos Na época de Aristóteles a situação não foi melhor na antiga Grécia Afirma ele falando da República ideal descrita nas leis de Platão que para manter 5 mil homens ociosos o contingente de guerreiros considerado necessário para a defesa da República juntamente com suas mulheres e servos seria necessário um território de extensão e fertilidade ili mitadas como as planícies da Babilônia O orgulho do homem faz com que ele goste de dominar os outros e nada o mortifica tanto como ser obrigado a mostrarse condescendente em persuadir seus subalternos Sempre que a lei e a natureza do tra balho a executar o permitirem o homem geralmente preferirá o serviço de escravos ao de homens livres As plantações de canadeaçúcar e de tabaco podem permitirse o emprego da dispendiosa mãodeobra escrava Ao contrário o cultivo do trigo atualmente não pode Nas colônias inglesas nas quais o produto principal são os cereais a maior parte do trabalho é executada em sua maior parte por pessoas livres A última resolução dos quacres na Pensilvânia no sentido de libertar todos os seus escravos negros pode convencernos de que seu número não pode ser muito elevado Se os escravos representassem uma parcela considerável de seus empregados nunca teriam concordado com essa resolução Ao contrário em nossas colônias açucareiras o trabalho todo é feito por escravos e nas colônias produtoras de fumo uma parte muito grande é executada por escravos Os lucros de um canavial em qualquer das nossas colônias das Índias Ocidentais são geralmente muito maiores do que os proporcionados por qualquer outra cultura conhecida na Europa ou na América e os lucros de uma plantação de fumo embora inferiores aos de um canavial são superiores aos pro porcionados pela cultura do trigo como já se observou Ambos podem permitirse a despesa do cultivo por escravos mas a cultura da cana deaçúcar o pode bem mais do que a do fumo Por isso o número de negros em confronto com o dos brancos é muito maior em nossas colônias açucareiras do que em nossas colônias produtoras de tabaco Aos agricultores escravos das épocas antigas sucedeu gradual ADAM SMITH 383 mente um tipo de agricultores conhecidos atualmente na França sob o nome de meeiros métayers Em latim são denominados coloni par tiarii Já faz tanto tempo que não existem mais na Inglaterra que não conheço nenhum termo inglês atual para designálos O proprietário da terra lhes fornecia as sementes o gado os instrumentos agrícolas enfim todo o capital necessário para o cultivo da propriedade A pro dução era dividida por igual entre o dono da terra e o meeiro depois de pôr de lado o que se considerava necessário para manter o capital sendo que este era restituído ao patrão quando o meeiro abandonava a propriedade ou era demitido A terra ocupada por essa casta de rendeiros é propriamente cul tivada às expensas do proprietário analogamente ao que acontece com a terra ocupada por escravos Mas existe uma diferença essencial entre os dois Tais rendeiros pelo fato de serem livres são capazes de adquirir propriedade e por terem direito a uma parte da produção da terra têm um interesse evidente em que a produção total seja a máxima possível para que grande seja também a parte que lhes cabe Ao con trário um escravo que não pode adquirir nada a não ser o necessário para sua subsistência atende a seu comodismo e interesse fazendo com que a terra produza o mínimo possível o estritamente necessário para sua própria manutenção Provavelmente foi em parte devido a essa vantagem e em parte devido às insubordinações que o soberano o qual sempre tinha inveja dos grandes senhores feudais gra dualmente encorajava seus camponeses a investirem contra a autori dade dos patrões feudais problemas esses que chegaram a um ponto tal que tornaram totalmente inconveniente tal tipo de servidão que essa instituição se desgastou progressivamente e desapareceu na maior parte da Europa Entretanto a época e a maneira quando e como se operou essa grande revolução constituem um dos pontos mais obscuros da história moderna A Igreja de Roma teve grande mérito nessa obra e é certo que já no século XII o Papa Alexandre III publicou uma bula sobre a emancipação geral dos escravos Todavia parece ter sido isso mais uma exortação piedosa do que uma lei drástica que exigisse obe diência por parte dos fiéis A escravatura continuou a existir quase em toda parte e durante vários séculos até ser gradualmente abolida pela cooperação conjunta dos dois interesses acima mencionados o dos pro prietários de terras por um lado e o do soberano por outro Um camponês liberto da escravidão e ao mesmo tempo tendo liberdade de continuar na posse da terra pelo fato de não ter capital próprio só tinha condições de cultivar a terra com os recursos que o senhor da terra lhe adiantava Eis o que deve ter sido o que os franceses denominam métayer Todavia mesmo esse tipo de agricultor jamais teria interesse em investir no ulterior aprimoramento da terra já que de qualquer parcela do pequeno capital que viesse eventualmente a economizar de sua cota de participação na produção o patrão mesmo não investindo nada continuaria a ter direito sobre a metade de toda a produção colhida O dízimo apenas a décima parte da produção representou um grande OS ECONOMISTAS 384 obstáculo para o aprimoramento das terras Por isso um imposto que atingia a metade deve ter sido uma eficaz barreira no caso Poderia interessar a um meeiro extrair da terra o máximo possível utilizando o capital fornecido pelo senhor da terra mas nunca lhe poderia inte ressar colocar qualquer parcela de seu próprio capital Na França onde segundo se conta cinco partes entre seis de todo o reino ainda são ocupadas por esse tipo de agricultores os proprietários queixamse de que seus meeiros aproveitam todas as oportunidades para utilizar o gado dos patrões mais para o transporte do que para a agricultura pois no primeiro caso ficam com o lucro todo e no segundo têm que repartilo com os patrões Esse tipo de rendeiro ainda existe em algumas regiões da Escócia Denominase steelbow tenants153 Provavelmente do mesmo tipo eram esses antigos rendeiros que o principal Barão Gilbert e o Dr Blackstone afirmam ter sido mais bailios do dono da terra do que agricultores propriamente ditos Depois desse tipo de locatários vieram embora muito gradual mente os arrendatários propriamente ditos que cultivavam a terra com seu próprio capital pagando ao proprietário uma renda fixa Quan do esses arrendatários têm um contrato de arrendamento por alguns anos às vezes podem ter interesse em investir algo de seu capital no aprimoramento ulterior da terra pois às vezes podem ter a esperança de recuperálo com grande lucro Todavia mesmo a posse de tais ar rendatários permaneceu por muito tempo extremamente precária e continua a sêlo em muitas regiões da Europa Se uma outra pessoa comprasse a propriedade o contrato em relação a esta podia legalmente ser rescindido mesmo antes do vencimento dele na Inglaterra isso podia ser feito até por uma ação fictícia de uma recuperação comum Se os arrendatários fossem excluídos ilegalmente da ocupação da terra pela violência de seus senhorios era extremamente imperfeita a medida pela qual recebiam reparação Ela nem sempre lhes restituía a posse da terra mas lhes dava uma indenização que nunca eqüivalia à perda real Mesmo na Inglaterra país europeu onde talvez a classe dos pe quenos proprietários rurais tem sido sempre a mais respeitada foi somente por volta do 14º ano do reinado de Henrique VII que se in ventou a ação de despejo através da qual o arrendatário recupera não somente os prejuízos sofridos mas também a posse e na qual sua reivindicação não se conclui necessariamente com uma decisão vaga de uma única sessão de um tribunal Essa ação tem sido considerada como um remédio tão eficiente que na prática moderna quando o senhor da terra precisa requerer a posse da mesma raramente faz uso das ações que propriamente lhe competem como senhor da terra a ordem do direito ou a ordem de posse mas requer em nome de seu arrendatário mediante a ordem de despejo Na Inglaterra por ADAM SMITH 385 153 A expressão se refere ao rendeiro ao qual o senhor da terra dá trigo gado feno e implementos agrícolas com os quais o rendeiro pode trabalhar a terra estando obrigado a devolver artigos iguais em valor e qualidade ao expirar o arrendamento N do T tanto a segurança do arrendatário é igual à do proprietário Além disso na Inglaterra um arrendamento por toda vida no valor de 40 xelins por ano é uma propriedade livre e alodial dando ao locatário o direito de votar em um membro do Parlamento e já que uma grande parte dos pequenos proprietários de terra tem uma propriedade livre e alodial desse tipo toda essa categoria merece respeito por parte dos grandes proprietários devido à importância política que lhes dá Acre dito não haver em toda a Europa exceto na Inglaterra exemplo algum em que o ocupante constrói sobre a terra da qual não teve arrendamento confiando em que a honra do seu senhorio não lhe permitirá tirar vantagem de tão grande benfeitoria Possivelmente essas leis e cos tumes tão favoráveis aos pequenos proprietários rurais tenham contri buído mais talvez para a grandeza atual da Inglaterra do que o conjunto tão elogiado de todas as leis e regulamentações sobre o comércio A lei que garante arrendamentos mais longos contra sucessores de qualquer espécie constitui pelo que sei uma peculiaridade da Grã Bretanha Foi introduzida na Escócia já em 1449 por um decreto de Jaime II Todavia sua influência benéfica tem sido bastante obstruída pelo morgadio já que os herdeiros do morgado geralmente são impe didos de locar terras arrendadas por muitos anos por vezes nem sequer por mais de um ano Sob esse aspecto uma lei recente do Parlamento abrandou um tanto esse rigor embora ele ainda continue sendo ex cessivo Além disso pelo fato de que na Escócia nenhuma posse por arrendamento dê direito a votar em um membro do Parlamento os pequenos proprietários rurais de lá são menos respeitados pelos grandes proprietários do que na Inglaterra Em outros países da Europa depois que se considerou conveniente garantir os rendeiros contra herdeiros e compradores o prazo de sua segurança continuou a ser limitado a um período muito curto na Fran ça por exemplo foi limitado a 9 anos a partir do início do arrenda mento Recentemente o prazo foi ampliado para 27 anos período ainda muito curto para estimular o arrendatário a empreender maiores ben feitorias na terra Antigamente os proprietários de terras eram os legisladores em todos os países da Europa Por isso as leis sobre a terra eram todas planejadas em defesa daquilo que acreditavam res ponder aos seus interesses Imaginavam que atendia a seus interesses prescrever que nenhum arrendamento feito por qualquer de seus pre decessores os pudesse impedir de desfrutar durante muitos anos do valor integral de sua terra A avareza e a injustiça sempre têm visão curta e por isso foram incapazes de prever até que ponto essa lei impede que os arrendatários empreendam melhorias na terra contra riando assim a longo prazo aos interesses do proprietário Pelo que se supõe os arrendatários além de pagarem a renda antigamente eram obrigados a executar muitos serviços para o proprie tário serviços esses raramente especificados no contrato de arrendamento ou regulamentados por qualquer outra lei precisa que não fosse o proveito e o costume do senhor ou do barão Por serem quase totalmente arbitrários OS ECONOMISTAS 386 esses serviços submetiam o arrendatário a muitos vexames Na Escócia a abolição de todos os serviços não estipulados com precisão no contrato de arrendamento alterou para muito melhor no decurso de alguns poucos anos a condição dos pequenos proprietários rurais no país Os serviços públicos que os pequenos proprietários rurais eram obri gados a prestar não eram menos arbitrários do que os particulares A construção e a manutenção das estradas públicas obrigação servil que segundo acredito subsiste em toda parte embora com diferentes graus de opressão conforme os diversos países não era o único Quando as tropas do rei sua família ou seus oficiais de qualquer escalão passavam por qualquer lugar os pequenos proprietários rurais eram obrigados a fornecerlhes cavalos carruagens e gêneros alimentícios a um preço re gulamentado pelo provedor Acredito que a GrãBretanha seja a única monarquia européia em que a opressão desse aprovisionamento foi intei ramente abolida Ela ainda subsiste na França e na Alemanha Tão irregulares e opressivos quanto os serviços eram os impostos cobrados dos arrendatários Os antigos senhores de terras embora eles mesmos fossem extremamente relutantes em dar qualquer ajuda pe cuniária a seu soberano com facilidade lhe permitiam impor a talha como diziam a seus rendeiros desconhecendo o quanto isso necessa riamente afetava afinal sua própria renda A talha como subsiste ainda hoje na França pode servir como um exemplo desses antigos tributos Tratase de uma taxa sobre o suposto lucro do arrendatário taxa essa calculada com base no capital que o inquilino tem na pro priedade Por isso os arrendatários têm interesse em que esse capital pareça ser o menor possível razão pela qual aplicam o mínimo possível no cultivo da terra e nenhum capital no seu aprimoramento Se um arrendatário na França chegasse a acumular algum capital a talha equivaleria mais ou menos a uma proibição de jamais aplicálo na terra Além disso esse imposto representa supostamente um despres tígio para quem deve pagálo degradandoo não somente abaixo do nobre mas também do habitante de um burgo sendo que a esse imposto está sujeito todo aquele que arrenda terra de outros Nenhum nobre nem mesmo qualquer habitante de burgo que tenha capital está dis posto a submeterse a esse rebaixamento Por conseguinte esse imposto não somente impede de aplicar no aprimoramento da terra o capital acumulado pelo arrendatário como também desvia dessa aplicação qualquer outro capital Da mesma natureza que a talha parecem ter sido sob esse aspecto os antigos impostos de dízimos ou décimosquintos tão conhecidos na Inglaterra em épocas anteriores Com todas essas circunstâncias e fatores desestimulantes pouco se podia esperar dos ocupantes da terra em termos de melhorias A situação dos arrendatários a despeito de toda a liberdade e segurança que a lei lhes possa oferecer deve sempre melhorar mas sob o peso de grandes desvantagens O arrendatário comparado ao proprietário é como um comerciante que negocia com dinheiro emprestado compa rado com um comerciante que negocia com o próprio dinheiro Pode ADAM SMITH 387 aumentar o capital de ambos mas o do primeiro ainda que sua ad ministração seja tão boa como a do segundo necessariamente aumen tará mais lentamente que o do segundo devido à grande parcela de lucros consumida pelos juros do empréstimo Da mesma maneira mes mo que as terras sejam cultivadas tão bem pelo arrendatário como pelo proprietário aquelas melhorarão menos rapidamente do que estas em razão da grande parcela de produção que é consumida pela renda da terra parcela que se o arrendatário fosse proprietário seria inves tida em seguida na melhoria do solo Além disso a posição social do arrendatário é inferior à do proprietário pela própria natureza das coisas Na maior parte da Europa os pequenos proprietários rurais são considerados como uma categoria inferior mesmo em relação à categoria dos melhores negociantes e artífices e em toda a Europa à dos grandes comerciantes e donos de manufaturas Conseqüentemente será muito raro poder acontecer que qualquer pessoa detentora de capital considerável abandone sua posição superior para abraçar uma posição social inferior Por isso mesmo na atual situação da Europa há pouca probabilidade de outros profissionais empregarem capital no aprimoramento e no cultivo da terra Isso talvez aconteça mais na GrãBretanha do que em qualquer outro país embora mesmo ali os grandes capitais que em alguns lugares são aplicados na agricultura tenham sido geralmente adquiridos mediante essa atividade agrícola atividade na qual talvez a aquisição de capital seja a mais lenta de todas No entanto depois dos pequenos proprietários são os ricos e grandes agricultores em todos os países os maiores responsáveis pelo aprimoramento do solo Na Inglaterra talvez eles sejam mais nu merosos do que em qualquer outra monarquia européia Afirmase que nos governos republicanos da Holanda e de Berna na Suíça os arren datários ou agricultores não são inferiores aos da Inglaterra Além de tudo isso a antiga política seguida na Europa era des favorável à melhoria e ao cultivo da terra fosse ela levada a efeito pelo proprietário ou pelo arrendatário Em primeiro lugar devido à proibição geral de exportar trigo sem licença especial o que parece ter sido uma regra muito generalizada em segundo em virtude das restrições impostas ao comércio interno não somente do trigo mas também de quase todos os outros produtos agrícolas por meio de leis absurdas contra os monopolizadores varejistas atravessadores e pelos privilégios das feiras e mercados Já se observou de que maneira a proibição de exportar trigo aliada a certo estímulo dado à importação de trigo estrangeiro impediu o cultivo na antiga Itália por natureza a região mais fértil da Europa e naquela época sede do maior império do mundo Talvez não seja tão fácil imaginar até que ponto essas restrições impostas ao comércio interno de trigo ao lado das proibições gerais de exportar devem ter desestimulado o cultivo de países menos férteis do que a Itália e em condições menos favoráveis do que as reinantes nesse país OS ECONOMISTAS 388 CAPÍTULO III A Ascensão e o Progresso das Metrópoles e Cidades após a Queda do Império Romano Depois da queda do Império Romano os habitantes das cidades grandes e pequenas não foram mais favorecidos que os habitantes do campo Com efeito constituíam uma categoria de pessoas muito dife rentes dos primeiros habitantes das antigas repúblicas da Grécia e da Itália Esses últimos eram primordialmente proprietários de terras entre os quais o território foi inicialmente dividido e que consideraram oportuno construir suas casas uma perto da outra cercandoas com um muro como defesa normal Ao contrário após a queda do Império Romano os proprietários de terras parecem ter vivido geralmente em castelos fortificados localizados em suas próprias terras e em meio a seus próprios inquilinos e dependentes As cidades eram habitadas sobretudo por negociantes e artífices que naquela época parecem ter sido de condição servil ou quase servil Os privilégios outorgados pelas antigas cartas aos habitantes de algumas das principais cidades da Europa revelam suficientemente o que eram antes da concessão desses privilégios Pessoas a quem se outorga o privilégio de poderem dar suas filhas em casamento sem o consentimento do patrão a quem se outorga o privilégio de ao morrerem passar seus bens a seus filhos e não ao seu patrão e a quem se outorga o privilégio de dispor a seu critério de seus próprios pertences tais pessoas antes da concessão de tais privilégios devem ter estado na mesma ou quase na mesma situação de servidão dos moradores do campo Ao que parece constituíam uma categoria de pessoas muito po bres e de classe inferior que costumavam deslocarse carregando con sigo seus bens de um lugar para outro de uma feira para outra à maneira dos mascates e vendedores ambulantes de hoje Em todos os países da Europa de então da mesma forma como ainda hoje ocorre em vários países tártaros da Ásia costumavase cobrar impostos sobre as pessoas e os bens dos viajantes quando passavam por certos do 389 mínios feudais quando atravessavam certas pontes quando levavam suas mercadorias de um lugar a outro na feira quando nela levantavam uma barraca ou banca para vendêlas Na Inglaterra esses diversos tipos de impostos eram conhecidos sob os termos de passage pontage lastage e stallage154 Por vezes o rei e outras vezes um grande senhor que ao que parece tinha em certas ocasiões autorização para isso concedia a determinados comerciantes sobretudo àqueles que viviam nas propriedades deles uma isenção geral de tais impostos Por essa razão tais comerciantes eram denominados comerciantes livres embo ra sob outros aspectos tivessem condição servil ou quase servil Em troca costumavam pagar a seu protetor uma espécie de imposto anual por cabeça Naquela época a proteção raramente era concedida sem uma valiosa compensação talvez esse imposto anual por cabeça possa ser considerado como uma compensação por aquilo que seus protetores poderiam perder concedendo aos protegidos isenção de outros impostos A princípio ambos esses impostos por cabeça e essas isenções parecem ter sido absolutamente pessoais e haver afetado somente particulares quer durante sua vida quer enquanto aprouver a seus protetores Nos relatos muito imperfeitos extraídos do cadastro de várias cidades da Inglaterra fazse às vezes menção ao imposto que determinados ha bitantes de burgos pagavam ao rei ou a algum outro grande senhor por esse tipo de proteção às vezes somente ao montante geral desses impostos155 Entretanto por mais servil que possa ter sido a condição original dos habitantes das cidades não há dúvida de que obtiveram a liberdade e a independência muito antes do que os moradores do campo A parte da renda do rei que provinha desses impostos por cabeça em cada cidade costumava ser deixada à administração durante um certo nú mero de anos por uma determinada renda às vezes do xerife do condado e às vezes de outras pessoas Os próprios habitantes de burgos muitas vezes conseguiam crédito suficiente para serem admitidos para admi nistrar as rendas desse tipo procedentes de sua própria cidade tor nandose conjunta e individualmente responsáveis pela renda total156 Segundo acredito essa forma era bastante agradável para a economia usual dos soberanos dos diversos países europeus que muitas vezes arrendavam domínios inteiros a todos os rendeiros dos mesmos que se tornavam conjunta e individualmente responsáveis pela renda in tegral em troca permitiaselhes coletar a renda por sua própria conta e pagála ao erário do rei através de seu próprio intendente ficando assim totalmente livres da insolência dos oficiais do rei fator consi derado da máxima importância naquela época OS ECONOMISTAS 390 154 Esses termos significam respectivamente licença de trânsito ou passagem pedágio tone lagem imposto pago pelo direito de manter barraca ou banca na feira N do T 155 Ver BRADY Historical Treatise of Cities and Burroughs 2ª ed 1711 p 3 et seq 156 Ver MADOX Firma Burgi p 18 e também History of the Exchequer capítulo 10 sec V p 223 1ª ed De início a área de terra da cidade era provavelmente deixada aos cidadãos dos burgos da mesma forma como o havia sido a outros arren datários somente por um certo número de anos Entretanto com o decorrer do tempo parece terse tornado praxe generalizada darlhes a área de terra como feudo isto é para sempre retendo uma determinada renda fixa que jamais podia ser posteriormente aumentada Tornandose assim perpétuo o pagamento tornavamse naturalmente perpétuas também as isenções em troca das quais o pagamento era feito Por conseguinte essas isenções deixavam de ser pessoais não podendo posteriormente ser con sideradas como pertencentes a indivíduos como tais mas como habitantes de um determinado burgo o qual por essa razão era chamado de burgo livre pelo mesmo motivo pelo qual eles tinham sido chamados burgueses livres ou comerciantes livres Além dessa concessão geralmente se dava aos burgueses da ci dade a quem ela era concedida também os importantes privilégios acima mencionados isto é o direito de darem suas filhas em casamento o direito de que seus filhos os sucedessem e o direito de dispor à vontade de seus próprios pertences Ignoro se esses privilégios tinham sido usualmente concedidos anteriormente paralelamente com a liberdade de comércio a determinados burgueses como indivíduos Isso não me parece improvável embora eu não tenha condições de aduzir provas evidentes Todavia como quer que tenha sido agora eles se tornaram realmente livres no sentido atual da palavra liberdade já que se ha viam livrado das principais características da servidão e da escravidão Isso não foi tudo Costumavase também ao mesmo tempo cons tituílos membros de uma entidade ou corporação com o privilégio de ter seus próprios magistrados e sua própria assembléia municipal o privilégio de criar leis secundárias para seu próprio governo de cons truir muros para sua defesa e de submeterem todos os seus habitantes a uma espécie de disciplina militar obrigandoos a montar guarda ou seja no sentido da época a guardar e a defender aqueles muros contra todos os ataques e surpresas noite e dia Na Inglaterra cos tumavam ser dispensados de procurar os tribunais da centúria e do condado sendo que todas as questões judiciais que surgissem entre eles excetuadas as da Coroa estavam entregues à decisão de seus próprios magistrados Em outros países freqüentemente se lhes con cediam jurisdições muito maiores e mais amplas157 Provavelmente podia ser necessário conceder às cidades às quais se permitia administrar suas próprias rendas algum tipo de jurisdição compulsória para obrigar seus próprios cidadãos a efetuarem paga mento Naquela época tumultuada deve ter sido extremamente incon veniente deixar que os cidadãos procurassem esse tipo de justiça em qualquer outro tribunal Todavia parece estranho que os soberanos ADAM SMITH 391 157 Ver MADOX Firma Burgi ver também PFEFFEL Nouvel Abrégé Chronologique de lHis toire et du Droit Public dAllemagne 1776 quanto aos eventos notáveis sob Frederico II e seus sucessores da Casa de Suábia de todos os países da Europa trocassem assim por um aluguel definido e fixo o qual jamais poderia ser aumentado esse tipo de renda que em comparação com todas as outras tinha talvez a maior probabilidade de aumentar pelo curso normal das coisas sem cuidados ou despesas por parte dos reis criando assim voluntariamente um tipo de república independente no coração dos próprios domínios Para compreenderse isso cumpre lembrar que naquela época talvez em nenhum país o soberano europeu tivesse condições para pro teger da opressão dos grandes senhores na totalidade de seus domínios a parte mais fraca de seus súditos Aqueles que a lei não tinha condições de proteger e que não eram suficientemente fortes para se defenderem a si mesmos eram obrigados a recorrer à proteção de um senhor po deroso e para isto tinham que tornarse seus escravos ou seus vas salos ou então a entrar em uma liga de defesa mútua destinada à proteção comum dos participantes Os habitantes das cidades e burgos considerados como indivíduos não tinham poder para defenderse to davia entrando em uma liga de defesa mútua juntamente com os seus vizinhos tinham condições de opor considerável resistência Os senhores feudais desprezavam os moradores dos burgos que eram para eles não somente de uma categoria diferente mas também uma parcela de escravos emancipados quase como uma espécie diferente da deles A riqueza dos habitantes dos burgos sempre provocavalhes inveja e indignação e todas as vezes que o pudessem os saqueavam sem mercê ou remorso Naturalmente os habitantes dos burgos odiavam e temiam os senhores feudais Também o rei os odiava e temia quanto aos ha bitantes dos burgos embora o soberano talvez os desprezasse tinha razões para não odiálos nem temêlos O interesse mútuo portanto levava os habitantes dos burgos a apoiarem o rei levando também o rei a apoiálos contra os senhores feudais Os habitantes dos burgos eram os inimigos dos adversários do rei sendo do interesse deste dar lhes o máximo de segurança e independência possível face aos senhores feudais inimigos do rei Ao concederlhes o direito de terem seus ma gistrados o privilégio de formularem leis secundárias para seu próprio governo o de construir muros para sua defesa e o de submeter todos os habitantes do burgo a uma espécie de disciplina militar o rei lhes dava todos os meios para conseguirem a máxima segurança e inde pendência possível em relação aos barões o que estava a seu alcance fazer Sem um governo próprio desse gênero sem alguma autoridade para obrigar seus habitantes a agirem dentro de um certo plano ou sistema nenhuma liga voluntária de defesa mútua teria sido capaz de possibilitarlhes uma segurança permanente ou lhes dar condições para apoiarem eficazmente o rei Ao concederlhes a administração de sua própria cidade como feudo o rei afastou daqueles a quem desejava ter como amigos e se assim se pode dizer como seus aliados qualquer motivo de ciúme ou suspeita de que jamais um dia pudesse vir a oprimilos novamente seja aumentando a renda proveniente da administração de sua cidade seja transferindoa a algum outro administrador OS ECONOMISTAS 392 Como se vê os soberanos que mantinham as piores relações com seus barões parecem ter sido os mais liberais na concessão desse gênero de privilégios a seus burgos Assim por exemplo o rei João da Ingla terra parece haver sido um benfeitor extremamente generoso das suas cidades158 Filipe I da França perdeu toda a autoridade sobre seus barões Quando estava para terminar seu reinado seu filho Luís mais tarde conhecido pelo nome de Luís o Gordo consultou segundo o padre Daniel os bispos dos domínios reais sobre os meios mais adequados para impedir a violência dos grandes senhores feudais Obteve deles como conselho duas propostas A primeira consistia em instituir uma nova ordem de jurisdição estabelecendo magistrados e uma assembléia municipal em todas as cidades de certo porte dentro do reino A outra consistia em formar nova milícia fazendo com que os habitantes dessas cidades sob o comando de seus próprios magistrados marchassem em defesa do rei quando necessário Segundo os antigos historiadores fran ceses é dessa época que data a instituição dos magistrados e das as sembléias municipais na França Foi outrossim durante os reinados infaustos dos príncipes da casa da Suábia que a maior parte das cidades livres da Alemanha receberam as primeiras outorgas de privilégios e que a renomada Liga Hanseática começou a adquirir um poder consi derável e temível159 As milícias das metrópoles não parecem ter sido inferiores na quela época às do campo e pelo fato de se poderem reunir com maior facilidade em ocasiões de emergência muitas vezes levavam vantagem nas disputas com os senhores feudais vizinhos Em países como a Itália e a Suíça em que o rei chegou a perder toda a sua autoridade seja em razão da grande distância das cidades em relação à sede central do governo seja devido ao poder natural do próprio país ou por algum outro motivo as metrópoles geralmente conseguiram transformarse em repúblicas independentes conquistando toda a nobreza ao seu redor obrigando os nobres a abandonar seus castelos no campo e a viver como qualquer pacato cidadão na metrópole Essa é em resumo a história da República de Berna bem como de várias outras metrópoles da Suíça Se excetuarmos o caso de Veneza já que sua história é um pouco diferente essa é também a história de todas as grandes repúblicas italianas das quais tantas nasceram e pereceram entre o final do século XII e o início do século XVI Em países como a França e a Inglaterra onde a autoridade do soberano embora em muitas ocasiões fosse bastante fraca nunca foi totalmente destruída as metrópoles não tiveram oportunidade de se tornar inteiramente independentes Todavia tornaramse tão impor tantes que o rei não tinha condições de imporlhes quaisquer taxas sem seu consentimento a não ser a renda decorrente da administração da cidade Por isso as cidades foram conclamadas pelo rei a enviar ADAM SMITH 393 158 Ver MADOX Firma Burgi pp 35 150 159 Ver PFEFFEL conforme nota 4 supra deputados à assembléia geral dos Estados do reino onde podiam jun tamente com o clero e os barões prestar alguma ajuda extraordinária ao rei em ocasiões de urgência Aliás pelo fato de as cidades geralmente serem mais favoráveis ao rei parece que às vezes ele utilizava esses deputados nessas assembléias para contrabalançar a autoridade dos grandes senhores feudais Aqui está a origem da representação de bur gos nos Estados Gerais de todas as grandes monarquias da Europa Dessa forma em uma época em que os moradores do campo estavam expostos a todo tipo de violência nas metrópoles se implantou a ordem e a boa administração e juntamente com elas a liberdade e a segurança dos indivíduos É natural que os habitantes do campo colocados nessa situação indefesa se contentassem com a sua subsis tência porque conseguir mais apenas provocaria a injustiça de seus opressores Ao contrário quando os cidadãos têm segurança de gozar dos frutos do trabalho empenhamse naturalmente em melhorar sua condição e em adquirir não somente o necessário mas também os confortos e o luxo que a vida pode proporcionar Portanto esse tipo de iniciativa operosa que almeja mais do que o simplesmente indis pensável para subsistir já existia de um modo geral muito antes entre os moradores das metrópoles do que entre os habitantes do campo Se um agricultor oprimido pela servidão feudal chegasse eventual mente a acumular algum capital muito naturalmente haveria de es condêlo cuidadosamente de seu patrão ao qual o capital teria que pertencer se viesse a descobrilo e aproveitar a primeira oportuni dade para abandonar o campo e correr para a cidade Naquela época a lei favorecia tanto aos habitantes das cidades e se empenhava tanto em diminuir a autoridade dos senhores feudais sobre os moradores do campo que se um fugitivo conseguisse esconderse de seu patrão em uma cidade durante um ano tornavase livre para sempre Por isso todo capital eventualmente acumulado nas mãos de agricultores dili gentes refugiavase nas grandes cidades que constituíam o único santuário em que uma pessoa tinha condições de guardar o capital adquirido Sem dúvida os habitantes de uma metrópole em última análise sempre auferirão do campo sua subsistência bem como todos os ma teriais e meios de trabalho Todavia os moradores das metrópoles lo calizadas na costa marítima ou às margens de um rio navegável não dependem necessariamente apenas da produção agrícola da região para sua subsistência Têm um raio de ação muito mais vasto podendo importar os recursos de que carecem dos mais longínquos confins do mundo seja em troca dos produtos de suas próprias manufaturas seja através do transporte marítimo ou fluvial entre países distantes tro cando assim a produção de uns pela de outros Assim sendo foi possível uma metrópole crescer e atingir alto grau de riqueza e de esplendor enquanto que não somente o país próximo bem como todos os países com os quais essa rica cidade comerciava permaneceram na maior pobreza e miséria Só um daqueles países tomado isoladamente talvez pudesse fornecer à referida cidade mas apenas uma pequena parcela OS ECONOMISTAS 394 do necessário para sua subsistência e grande atividade entretanto o conjunto dos países com os quais comerciava tinha condições de fornecer tudo aquilo de que carecia para uma boa subsistência e seu progresso Todavia no estreito círculo comercial daquela época existiam alguns países ricos e operosos Assim era o Império Grego enquanto subsistiu bem como o Império dos sarracenos durante os reinados dos Abássidas O mesmo ocorreu com o Egito até ser conquistado pelos turcos com alguma parte da costa da Barbaria e com todas as províncias da Es panha que estavam sob o domínio dos mouros As metrópoles da Itália parecem ter sido as primeiras da Europa que através do comércio atingiram um grau considerável de riqueza A Itália estava no centro do que era na época a região evoluída e civilizada do mundo Também as Cruzadas que devido ao grande desperdício de capital e da destruição entre os habitantes necessariamente retardaram o progresso da maior parte da Europa favoreceram extremamente o pro gresso de algumas metrópoles italianas Os grandes exércitos que de toda parte marcharam para a conquista da Terra Santa estimularam ao ex tremo a navegação de Veneza Gênova e Pisa às vezes transportando os cruzados para lá e sempre fornecendolhes provisões Se assim podemos dizer essas cidades foram os abastecedores desses exércitos e o furor mais destrutivo que jamais assolou as nações européias constituiu uma fonte de riqueza para essas repúblicas Os habitantes das metrópoles comerciais ao importarem produtos manufaturados mais aperfeiçoados e os caros artigos de luxo de países mais ricos alimentavam de certo modo a vaidade dos grandes pro prietários de terras que com grande avidez os compravam por meio de grandes quantidades de produtos naturais de suas propriedades Por isso o comércio de grande parte da Europa naquela época consistia sobretudo no intercâmbio de sua própria produção bruta por manufa turados de nações mais civilizadas Assim a lã da Inglaterra era co mumente permutada pelos vinhos da França e os tecidos finos do país de Flandres da mesma forma que o trigo da Polônia é hoje em dia trocado pelos vinhos e conhaques da França e pela sedas e veludos da França e da Itália Dessa maneira o comércio introduziu um gosto pelos manufatu rados mais finos e mais avançados em países nos quais tais manufa turados não existiam Mas quando esse gosto se tornou tão generali zado que provocou uma demanda considerável os comerciantes para economizar as despesas de transporte naturalmente procuravam im plantar algumas manufaturas do mesmo tipo em seu próprio país Disso originaramse as primeiras manufaturas para venda em locais distantes que parecem ter surgido nas províncias ocidentais da Europa após a queda do Império Romano Importa observar que nenhum grande país jamais subsistiu ou poderia subsistir sem que nele funcionasse algum tipo de manufatura e quando se diz que em um país não existem manufaturas isso deve ser entendido sempre no sentido de que não há manufaturas do tipo ADAM SMITH 395 mais refinado e aprimorado ou seja de produtos destinados à venda em locais distantes Em todos os grandes países tanto as roupas como a mobília da maioria das pessoas são o produto de seu próprio trabalho Isso ocorre mais nos países pobres dos quais se costuma dizer não terem manufaturas do que nos países ricos dos quais se diz que as possuem em abundância Nesses últimos geralmente se encontra tanto nas roupas como nas mobílias da camada mais baixa da popu lação uma porcentagem muito maior de produtos estrangeiros do que nos países mais pobres Dois parecem ter sido os modos pelos quais se introduziram em diversos países as manufaturas para venda em locais distantes Às vezes foram introduzidas da maneira supramencionada atra vés da operação violenta se assim podemos dizer dos capitais de de terminados comerciantes e empresários que as implantaram imitando algumas manufaturas estrangeiras do mesmo gênero Essas manufa turas portanto são o resultado do comércio exterior e tais parecem ter sido as antigas fábricas de sedas veludos e brocados que floresceram em Lucca durante o século XIII Foram expulsas de lá pela tirania de um dos heróis de Maquiavel Castruccio Castracani Em 1310 foram expulsas de Lucca 900 famílias das quais 31 se retiraram para Veneza oferecendose para lá introduzir a manufatura da seda160 Sua oferta foi aceita muitos privilégios lhes foram conferidos e a manufatura foi estabelecida com 300 trabalhadores Tais parecem ter sido também as manufaturas de tecidos finos que antigamente floresciam em Flandres e que foram introduzidas na Inglaterra no começo do reinado de Isabel tais são também as atuais manufaturas da seda de Lyon e de Spital fields Manufaturas introduzidas dessa maneira geralmente empregam matériasprimas estrangeiras sendo imitações de manufaturas estran geiras Quando a manufatura se estabeleceu em Veneza todas as ma tériasprimas eram trazidas da Sicília e do Levante Também a ma nufatura mais antiga de Lucca trabalhava com materiais importados do exterior O cultivo de amoreiras e a criação do bichodaseda não parecem ter sido comuns nas regiões setentrionais da Itália antes do século XVI Essas atividades não foram introduzidas na França antes do reinado de Carlos IX As manufaturas de Flandres trabalhavam sobretudo com lã espanhola e inglesa A lã espanhola foi a matéria prima não da primeira manufatura de lã da Inglaterra mas da pri meira implantada para vender em locais distantes Mais da metade das matériasprimas empregadas hoje nas manufaturas de Lyon con siste em seda estrangeira e quando essas manufaturas se implanta ram a totalidade ou quase totalidade de lã era importada Quanto à manufatura de Spitalfields provavelmente nenhuma matériaprima por ela utilizada tenha sido produzida na Inglaterra A sede de tais manufaturas pelo fato de ser geralmente implantada segundo o es OS ECONOMISTAS 396 160 Ver SANDI Istoria Civile de Vinezia Parte Segunda v I pp 247 e 256 quema e projeto de alguns poucos indivíduos às vezes é estabelecida em alguma grande cidade marítima e às vezes em uma cidade do interior conforme o interesse discernimento e capricho dos fundadores Outras vezes as manufaturas para venda dos produtos em locais distantes se desenvolvem natural e espontaneamente pelo aperfeiçoa mento gradual daquelas manufaturas domésticas e rústicas que devem sempre existir mesmo nos países mais pobres e primitivos Tais ma nufaturas geralmente empregam as matériasprimas produzidas pelo país e muitas vezes parecem ter sido aperfeiçoadas em regiões do interior que não distavam de forma excessiva mas consideravelmente da costa marítima e até mesmo de qualquer artéria fluvial Um país mediterrâneo naturalmente fértil e fácil de ser cultivado produz um grande excedente de gêneros além do necessário para a manutenção dos agricultores e devido à despesa do transporte terrestre e os in convenientes da navegação fluvial muitas vezes pode ser difícil enviar esse excedente para o exterior A abundância portanto barateia as mercadorias estimulando grande número de trabalhadores a se esta belecerem nas proximidades considerando que seu trabalho ali pode renderlhe mais do que em outros lugares Desenvolvem pois as ma tériasprimas produzidas pela terra trocando seu produto acabado isto é seu preço para obter mais materiais e provisões Acrescentam novo valor à parte excedente de sua produção bruta economizando a despesa do transporte até o local onde haja curso dágua navegável ou até algum mercado distante ao mesmo tempo fornecem aos agri cultores alguma coisa em troca daquilo que é agradável e útil para eles em condições mais fáceis do que poderiam conseguir antes Os agricultores obtêm um preço melhor pela sua produção excedente po dendo comprar por preço mais barato outros artigos de que necessitam para seu conforto Dessa forma têm a possibilidade sendo para isso também estimulados de aumentar o excedente de sua produção através de um ulterior aprimoramento e melhor cultivo da terra E assim como a fertilidade da terra fez nascer a manufatura da mesma forma o progresso dessa manufatura beneficia a terra e aumenta ainda mais a sua fertilidade De início essas manufaturas suprem a vizi nhança depois à medida em que elas progridem e se aprimoram suprem também mercados mais distantes Com efeito se nem a pro dução bruta nem a manufatura mais primitiva eram capazes de com portar a não ser com extrema dificuldade o custo de um transporte terrestre a considerável distância os produtos mais aprimorados e re finados já conseguem suportar com facilidade essa despesa Um pe queno volume muitas vezes contém grande quantidade de produto em estado bruto Por exemplo uma peça de tecido fino que pesa apenas 80 libras contém não somente o preço de 80 libraspeso de lã mas às vezes também o preço de vários milhares de libraspeso de trigo sus tento dos diversos trabalhadores e dos seus empregadores imediatos O trigo que dificilmente poderia ter sido transportado para fora do país em seu estado natural é dessa maneira virtualmente exportado ADAM SMITH 397 na forma do manufaturado completo podendo ser com facilidade trans portado para os recantos mais longínquos do mundo Foi dessa maneira que se desenvolveram natural e espontaneamente as manufaturas de Leeds Halifax Sheffield Birmingham e Wolverhampton Essas ma nufaturas são produtos da agricultura Na história moderna da Europa sua extensão e melhoria geralmente têm sido posteriores às das re sultantes do comércio exterior A Inglaterra era conhecida pela fabri cação de tecidos finos de lã espanhola mais de um século antes que alguma dessas manufaturas nascidas da agricultura fosse capaz de produzir para o mercado exterior A ampliação e o aperfeiçoamento destas últimas só poderiam ocorrer em conseqüência da ampliação e aperfeiçoamento da agricultura o último e maior efeito do comércio exterior e das manufaturas introduzidas diretamente por ele É o que passarei a expor no capítulo seguinte OS ECONOMISTAS 398 CAPÍTULO IV De que Maneira o Comércio das Cidades Contribuiu para o Progresso do Campo Três foram as maneiras pelas quais o progresso e a riqueza das cidades comerciais e manufatureiras contribuíram para o progresso e o cultivo das regiões às quais pertenciam Em primeiro lugar oferecendo um mercado grande e preparado para a produção bruta do campo estimularam o seu cultivo e posterior progresso Esse benefício não se limitou às regiões campestres em cujo raio estavam localizadas as cidades mas ainda se estendeu mais ou menos a todas as regiões com as quais as cidades negociavam A todas essas regiões as cidades ofereciam um mercado para certa parte de sua produção bruta ou para sua produção manufaturada e conseqüen temente estimularam até certo ponto o trabalho e o progresso de todas essas regiões Todavia as regiões circunvizinhas pela sua pro ximidade auferiram o máximo de benefício desse mercado que eram as cidades Pelo fato de a produção bruta das regiões próximas às cidades exigir menos transporte os comerciantes podiam pagar me lhores preços aos agricultores e também fornecer essa produção aos consumidores pelo mesmo preço que a produção vinda de regiões mais distantes Em segundo lugar a riqueza adquirida pelo habitantes das cidades muitas vezes era empregada para comprar terras à venda sendo que grande parte delas geralmente não era cultivada Os comerciantes fre qüentemente ambicionam ser aristocratas rurais e quando o conse guem são em regra os que mais se empenham na melhoria das áreas adquiridas Um comerciante está habituado a aplicar seu dinheiro so bretudo em projetos rentáveis ao passo que um aristocrata rural está acostumado sobretudo a gastar O primeiro muitas vezes aplica o dinheiro que a ele retorna com lucro enquanto que o segundo gasta o dinheiro e muito raramente espera algum lucro Esses hábitos dife rentes naturalmente afetam o caráter e a disposição de espírito dos 399 dois em qualquer tipo de negócio Um comerciante geralmente é um empresário audaz um aristocrata rural freqüentemente é um empre sário tímido O primeiro não tem medo de aplicar imediatamente um grande capital no aprimoramento da terra quando tem uma perspectiva razoável de auferir lucro proporcional ao gasto O segundo se chega a dispor de algum capital o que nem sempre acontece raramente se aventura a aplicálo dessa maneira Se consegue algum proveito geralmente não é com o capital mas apenas com o que pode economizar de sua renda anual Todos os que tiveram a oportunidade de viver em uma cidade mercantil localizada em uma região não cultivada devem ter observado muitas vezes como são muito mais animadoras as ini ciativas dos comerciantes sob esse aspecto em comparação com as dos aristocratas rurais Além disso os hábitos de ordem economia e cuidado para os quais a profissão do comércio naturalmente molda o comerciante o tornam muito mais apto a executar com lucro e sucesso qualquer projeto de desenvolvimento Em terceiro e último lugar o comércio e as manufaturas intro duziram gradualmente a ordem e a boa administração e com elas a liberdade e a segurança dos indivíduos entre os habitantes do campo que até então haviam vivido mais ou menos em um estado contínuo de guerra com os vizinhos e de dependência servil em relação a seus superiores Embora esse fator seja o último aqui apontado é sem dúvida o mais importante de todos Pelo que sei o Sr Hume foi o único que até agora se deu conta desse fato Em um país que não tem comércio exterior nem manufaturas mais aperfeiçoados um grande proprietário de terras por não ter nada pelo que possa trocar a maior parte da produção de sua terra que vá além do necessário para a manutenção dos agricultores consome tudo com seus hóspedes na casa de campo Se essa produção excedente for suficiente para sustentar 100 ou 1 000 pessoas só pode utilizála para isso e apenas para isso Ele está assim continuamente rodeado de uma multidão de clientes retainers e dependentes os quais não pos suindo nada de equivalente para dar em troca de seu sustento e por serem alimentados totalmente pela sua bondade têm que obedecerlhe pela mesma razão que os soldados precisam obedecer ao príncipe que lhes paga para isso Antes que o comércio e as manufaturas se difun dissem na Europa os gastos de hospedagem dos ricos e dos grandes desde o soberano até o barão do mais baixo escalão superavam tudo quanto hoje possamos ser capazes de imaginar O Westminster Hall era a sala de jantar de William Rufus e muitas vezes talvez fosse suficientemente amplo para acolher sua corte Consideravase como um gesto de munificência em Thomas Becket o fato de ele espalhar feno limpo ou juncos na época da estação propícia no chão de sua sala para que os cavaleiros e nobres rurais que não conseguiam as sento não estragassem suas finas vestes ao sentarse no chão para participar dos banquetes do anfitrião Contase que o grande Conde de Warwick diariamente dava banquetes em suas diversas mansões OS ECONOMISTAS 400 a 30 mil pessoas embora esse número possa ser exagerado deve ter sido de qualquer forma muito grande para que se chegasse a tal exagero Não faz muitos anos esse tipo de excesso ainda existia em muitas regiões da Alta Escócia Isso parece ser coisa comum em todos os países em que o comércio e as manufaturas estão pouco desenvolvidos Conta o Doutor Pocock ter visto um chefe árabe jantar nas ruas de uma cidade à qual havia vindo para vender seu gado e que convidava a participar de seu banquete todos os passantes até mesmo os mendigos comuns Sob todos os aspectos os ocupantes da terra dependiam tanto do grande proprietário de terras quanto seus clientes Mesmo aqueles que não estavam em estado de servidão eram rendeiros a título precário e pagavam uma renda inferior ao sustento que o cultivo da terra lhes proporcionava Uma coroa ou então 12 coroa uma ovelha um cordeiro constituíam até alguns anos atrás a renda normal para terras inteiras que sustentavam uma família na Alta Escócia Em alguns lugares essa é a renda ainda hoje nem se diga que o dinheiro hoje compre lá quantidade maior de mercadorias do que em qualquer outro lugar Em um país onde o excedente de produção de uma grande propriedade precisa ser consumido ali mesmo muitas vezes será mais conveniente para o proprietário que parte seja consumida a certa distância de sua própria casa desde que os que a consomem sejam tão dependentes dele quanto seus clientes e criados domésticos Com isso o proprietário se livra do incômodo de uma companhia muito numerosa ou de uma família excessivamente grande Um rendeiro a título precário que pos sui terra suficiente para manter sua família por pouco mais que sua renda é tão dependente do proprietário quanto qualquer criado ou cliente devendolhe obediência da mesma forma Assim sendo da mes ma forma como o proprietário sustenta seus criados e clientes em sua própria casa sustenta igualmente os rendeiros que moram em suas casas A subsistência deles todos depende da bondade do proprietário e a sua permanência na propriedade depende de suas boas graças Em tal situação o poder dos antigos barões fundavase na au toridade que os grandes senhores de terras possuíam necessariamente sobre seus rendeiros e clientes Para todos aqueles que moravam em suas propriedades os barões eram obrigatoriamente juízes em tempos de paz e líderes em tempos de guerra Tinham condições de manter a ordem e fazer cumprir a lei dentro de seus domínios porque cada um deles podia aplicar a força de seus habitantes contra a injustiça de qualquer um dos moradores Nenhuma outra pessoa dispunha de autoridade suficiente para tanto O rei em particular não a possuía Com efeito naquela época o rei não era no fundo muito mais do que o maior proprietário de terras existente em seu território a ele devido ao interesse comum de defesa contra inimigos comuns de fora os outros grandes proprietários devotavam certo respeito Se o rei pretendesse exigir o pagamento de uma pequena dívida dentro do território de algum desses grandes proprietários onde todos os moradores estavam armados e habituados a apoiaremse mutuamente isso lhe teria custado ADAM SMITH 401 se tentasse fazêlo com sua própria autoridade mais ou menos o mesmo trabalho que acabar com uma guerra civil Por isso o rei era obrigado a deixar a administração da justiça na maior parte do país àqueles que tinham condições de fazêlo pela mesma razão era obrigado a deixar o comando da milícia da Nação àqueles a quem obedecia essa milícia É um erro pensar que essas jurisdições territoriais se originaram da lei feudal Não somente as competências mais altas tanto civil como militar mas também o poder de recrutar tropas de cunhar moe das e até mesmo o poder de decretar leis secundárias para o governo de sua própria população tudo isso eram direitos adquiridos alodial mente pela maior parte dos proprietários de terras vários séculos antes que na Europa sequer se conhecesse o termo lei feudal Ao que parece a autoridade e a jurisdição dos senhores saxônicos na Inglaterra eram antes da conquista tão grandes quanto a autoridade e a jurisdição de qualquer um dos senhores normandos após a conquista Ora supõese que a lei feudal só se tornou lei comum na Inglaterra depois da con quista Também quanto à França não há dúvida nenhuma de que os grandes senhores possuíam alodialmente a maior autoridade e as maio res competências muito antes que no país fosse introduzida a lei feudal Essa autoridade e essas competências necessariamente provinham do fato de serem proprietários de terras da maneira acima descrita Sem remontar aos tempos mais antigos das monarquias francesa e inglesa em épocas muito posteriores podemos encontrar inúmeras provas de que tais efeitos sempre decorrem dessas causas Não faz nem trinta anos que o Sr Cameron de Lochiel um nobre de Lochabar na Escócia sem qualquer garantia legal e sem ser o que na época se chamava um senhor da realeza e nem mesmo um rendeirochefe mas simplesmente um vassalo do duque de Argyle e sem ocupar sequer um cargo do porte do de um juiz de paz não obstante isso costumava exercer a mais alta autoridade criminal sobre a sua própria população Segundo se afirma fêlo aliás com grande eqüidade embora sem qualquer for malidade peculiar à justiça podese até admitir como provável que a situação daquela região do país naquela época exigia que ele assim agisse para manter a harmonia pública Esse senhor cuja renda nunca ultrapassou 500 libras anuais em 1745 arrastou consigo à rebelião oitocentas pessoas da população que lhe estava sujeita A introdução da lei feudal longe de ampliar a autoridade dos grandes senhores alodiais pode ser considerada como uma tentativa para reduzila Ela estabeleceu uma subordinação regular acompa nhada de longa série de serviços e impostos desde o rei até o menor proprietário Enquanto o proprietário era menor de idade a renda juntamente com a administração das terras cata nas mãos de seu superior imediato conseqüentemente a renda e a administração das terras dos maiores proprietários estavam nas mãos do rei encarregado da manutenção e da educação do tutelado sendo que o rei pela sua qualidade de tutor supostamente tinha o direito de dispor sobre o OS ECONOMISTAS 402 casamento dele desde que fosse de forma compatível com a categoria do tutelado Entretanto embora essa instituição tendesse necessaria mente a reforçar a autoridade do rei e a enfraquecer a dos grandes proprietários rurais não conseguiu fazêlo em medida suficiente para estabelecer a ordem e a boa administração entre os habitantes do cam po pois não podia alterar suficientemente o estado de coisas e os cos tumes anteriores que haviam dado origem a essas desordens A au toridade de governo ainda continuou a ser como antes muito fraca na cabeça e muito forte nos membros inferiores e a força excessiva dos membros inferiores constituía a causa da fraqueza da cabeça Após a instituição da subordinação feudal o rei continuou na mesma inca pacidade de antes para cercear a violência dos grandes proprietários de terras Esses continuaram a fazer guerra a seu arbítrio quase in cessantemente uns contra os outros e muito freqüentemente contra o rei e os campos continuaram a ser cenário de violência rapinas e desordens Entretanto o que toda a violência das instituições feudais jamais poderia ter conseguido o foi gradualmente pela operação silenciosa e insensível do comércio exterior e das manufaturas Com o decorrer do tempo o comércio exterior e a manufatura foram fornecendo aos gran des proprietários rurais alguma coisa graças à qual podiam trocar todo o excedente da produção de suas terras produtos esses que podiam eles mesmos consumir sem terem que partilhálos com seus rendeiros ou clientes Tudo para nós e nada para os outros essa parece ter sido em todas as épocas do mundo a máxima vil dos senhores da humanidade Eis por que tão logo os grandes proprietários conseguiram encontrar um modo de consumir eles mesmos o valor total das rendas de suas terras não tiveram mais propensão a partilhálas com outras pessoas Por um par de fivelas de diamante ou talvez por alguma outra coisa igualmente frívola e inútil trocavam o sustento ou o que é a mesma coisa o preço do sustento anual de 1 000 homens e com isso todo o peso e autoridade que esse poderio era capaz de assegu rarlhes Todavia as fivelas deveriam pertencerlhes com exclusividade e nenhuma outra criatura teria parte nelas ao passo que no sistema mais antigo os senhores feudais tinham que partilhar sua renda no mínimo com 1 000 pessoas Essa diferença era decisiva para os ava liadores que deviam determinar a preferência e que em troca da sa tisfação da mais infantil da mais mesquinha e mais sórdida de todas as vaidades negociavam gradualmente todo o poder e toda a autoridade que possuíam Em um país onde não há comércio exterior nem manufaturas aperfeiçoadas uma pessoa que aufere uma renda anual de 10 mil libras não tem condições de empregar sua renda a não ser para manter talvez 1 000 famílias todas elas forçosamente sob seu comando Ora na situação atual da Europa uma pessoa com renda anual de 10 mil libras pode gastar toda ela e geralmente o faz sem sequer sus tentar diretamente vinte pessoas ou sem ser capaz de manter mais ADAM SMITH 403 de dez lacaios Indiretamente talvez ela sustente um número igual ou até maior de pessoas do que antes com o antigo sistema de gastos Com efeito embora seja muito pequena a quantidade de produtos pre ciosos pelos quais troca toda a sua renda deve ter sido muito grande o número de pessoas cujo trabalho foi necessário para produzir essas mercadorias O elevado preço dessas mercadorias geralmente provém dos salários da mãodeobra empregada e do lucro auferido pelos em pregadores diretos dessa mãodeobra Ao pagar esse preço o grande proprietário indiretamente paga todos esses salários e esse lucro con tribuindo assim indiretamente para o sustento de todos esses traba lhadores e respectivos empregadores Geralmente porém contribui com uma parte mínima para a manutenção de cada trabalhador ou empre gador considerado individualmente em relação a uns pouquíssimos contribui talvez com 110 para a manutenção de muitos deles nem sequer com 1100 e para a de alguns deles nem sequer com a milésima e nem mesmo com a décimamilésima parte de sua manutenção anual total Portanto ainda que o proprietário contribua para a manutenção de todos eles todos são mais ou menos independentes dele já que geralmente todos podem manterse sem ele Quando os grandes proprietários de terras gastam toda a sua renda na manutenção de seus rendeiros e clientes cada um deles sus tenta inteiramente todos os seus próprios clientes e cada um deles mantém integralmente todos os seus próprios rendeiros e clientes Ao contrário quando gastam na manutenção de comerciantes e artífices podem talvez se considerados em conjunto sustentar o mesmo número tão grande de pessoas que antes talvez até um número maior devido aos gastos normalmente feitos com a hospitalidade rústica Todavia cada um deles tomado individualmente contribui em geral com uma parcela mínima para a manutenção de cada indivíduo Com efeito cada comerciante e cada artífice aufere sua subsistência do serviço que presta não a um mas a 100 ou 1 000 clientes diferentes Embora de certa forma tenha obrigações para com todos esses clientes não de pende absolutamente de nenhum deles Aumentando gradualmente esse tipo de gastos por parte dos gran des proprietários de terras era inevitável que diminuísse progressiva mente o número de seus clientes até o dia em que todos fossem des pedidos A mesma razão os levou a despedir gradativamente o contin gente desnecessário de seus rendeiros As propriedades cultivadas fo ram ampliadas e os ocupantes da terra não obstante as queixas de despovoamento foram reduzidos ao estritamente necessário para cul tivar essas áreas segundo o estágio imperfeito da agricultura e de desenvolvimento daquela época Afastando as bocas desnecessárias e exigindo do agricultor o valor pleno que podia ser auferido da terra o proprietário conseguiu obter um excedente maior de produção vale dizer o preço de um excedente maior e para gastar a renda derivante desse novo acréscimo de produção os comerciantes e manu fatores passaram a fornecer novos produtos ao proprietário Continuan OS ECONOMISTAS 404 do esse processo o proprietário passou a desejar auferir da sua terra uma produção ainda maior Ora os rendeiros da terra só fariam isso sob uma condição que com o tempo eles tivessem a certeza da posse da terra durante um período de tempo suficiente para permitirlhes recuperar com lucro o que investissem no posterior aprimoramento da terra A vaidade dispendiosa do proprietário fêlo aceitar essa condição e aqui está a origem dos arrendamentos a longo prazo Mesmo um rendeiro a título precário que paga o valor total da terra não depende totalmente do proprietário As vantagens pecuniá rias que um recebe do outro são mútuas e iguais e tal tipo de rendeiro não exporá nem sua vida nem sua fortuna a serviço do proprietário Mas se ele tiver um contrato de locação durante muitos anos será totalmente independente do proprietário e este não deve esperar dele nenhum serviço mesmo o mais insignificante além do expressamente estipulado no contrato de locação ou do que lhe seja imposto pela lei comum e conhecida no país Dessa forma tornandose independentes os rendeiros e sendo demitidos os clientes os grandes proprietários não tinham mais con dições de interferir no andamento normal da justiça ou de perturbar a paz reinante Tendo vendido seu direito de primogenitura não como Esaú por um prato de lentilhas em uma época de fome e ne cessidade mas na de esbanjamento dos bens por berloques e bugi gangas mais próprios para brinquedos de crianças do que objetos dignos de adultos os grandes proprietários de terras tornaramse tão in significantes quanto qualquer burguês ou comerciante rico numa ci dade Estabeleceuse no campo um governo regular tal como na grande cidade E ninguém mais tinha poderes suficientes para perturbar a administração daquele governo tanto no campo como na cidade Não posso deixar de assinalar embora isso talvez não esteja diretamente relacionado com o tema que nos países comerciais é hoje muito rara a existência de famílias muito antigas que conservam alguma propriedade rural considerável transmitida de pai a filho du rante muitas gerações sucessivas Ao contrário em países em que há pouco comércio tais como o País de Gales ou a Alta Escócia tais famílias continuam sendo muito numerosas As histórias dos países árabes parecem estar todas elas cheias de genealogias sendo que uma delas escrita por um cã da Tartária e traduzida para vários idiomas europeus praticamente não contém outra coisa senão isso prova de que são muito comuns nesses países essas famílias antigas Em países em que uma pessoa rica não tem outra maneira de gastar sua renda a não ser mantendo quantas pessoas puder sustentar não está em condições de ultrapassar certos limites e sua benevolência raramente é tão grande a ponto de tentar ele manter mais pessoas do que pode Ao contrário em países onde o rico puder gastar a maior renda com a sua própria pessoa muitas vezes ele não impõe limite algum a seus gastos uma vez que não têm limites sua vaidade e seu amorpróprio Por isso em países de grande comércio é muito raro a riqueza per ADAM SMITH 405 manecer na mesma família a despeito de todo o rigor das leis que proíbem a dissipação dos bens Ao contrário nas nações mais pobres a permanência da riqueza na mesma família muitas vezes ocorre na turalmente sem necessidade de normas legais aliás em nações de pastores como os tártaros e os árabes a natureza consumível de suas posses necessariamente torna impossíveis quaisquer leis desse gênero Dessa maneira uma revolução da maior importância para o bem estar público foi levada a efeito por duas categorias de pessoas que não tinham a menor intenção de servir ao público A única motivação dos grandes proprietários era atender a mais infantil das vaidades Por outra parte os comerciantes e os artífices embora muito menos ridículos agiram puramente a serviço de seus próprios interesses fiéis ao princípio do mascate de com um pêni ganhar outro Nem os pro prietários nem os comerciantes e artífices conheceram ou previram a grande revolução que a insensatez dos primeiros e a operosidade dos segundos estavam gradualmente fermentando Assim é que na maior parte da Europa o comércio e as manu faturas das cidades ao invés de serem efeito do aprimoramento e do cultivo do campo foram sua causa Todavia pelo fato dessa evolução contrariar o curso natural das coisas ela é necessariamente lenta e incerta Comparese o progresso lento dos países europeus cuja riqueza depende muito do comércio e das manufaturas com o rápido avanço das nossas colônias norteame ricanas cuja riqueza está totalmente baseada na agricultura Através da maior parte da Europa supõese que para duplicar o número de habitantes requerse nada menos de 500 anos Em várias de nossas colônias norteamericanas ao contrário constatase que ela duplica em 20 ou 25 anos Na Europa a lei da primogenitura e direitos per pétuos de todos os tipos impedem a divisão das grandes propriedades rurais e com isso dificultam a multiplicação de pequenos proprietários Ora um pequeno proprietário que conhece todos os recantos de sua propriedade e que a vê com a predileção que toda propriedade inspira sobretudo quando pequena e que por esse motivo tem prazer não somente em cultivála mas até em adornála geralmente é o mais diligente o mais inteligente e o mais bemsucedido de todos os intro dutores de melhoramentos Além disso as mesmas leis fazem com que tantas sejam as áreas de terra subtraídas à venda que há sempre mais capitais para comprar terras do que áreas para vender de maneira que estas sempre são vendidas a preço de monopólio A renda nunca chega a pagar os juros do dinheiro com o qual se compraria a terra além de ser onerada com reparações e outros encargos ocasionais aos quais não estão sujeitos os juros do dinheiro Na Europa comprar terra é sempre uma aplicação de capital altamente desvantajosa para capitais pequenos Sem dúvida por amor à sua maior segurança uma pessoa de posses modestas quando se afasta do mundo dos negócios às vezes optará por investir seu pequeno capital na compra de terra Também um profissional cuja renda provém de uma outra fonte muitas OS ECONOMISTAS 406 vezes gosta de assegurar suas poupanças comprando terra Uma pessoa jovem que ao invés de optar pelo comércio ou por alguma profissão empregasse um capital de 2 mil ou 3 mil libras na compra e cultivo de uma pequena área de terra poderia na realidade esperar viver muito feliz e muito independente mas teria que abandonar definiti vamente qualquer esperança de um dia juntar grande fortuna ou ad quirir renome coisas que com uma aplicação diferente de capital po deria ter as mesmas possibilidades de conseguir da mesma forma que outras pessoas Além disso tal pessoa embora não possa aspirar a ser um proprietário muitas vezes sentirá desprezo em ser um agri cultor Por isso a pequena área de terra que está à venda e seu alto preço de venda impedem que grande número de capitais sejam inves tidos no cultivo e no aprimoramento da terra capitais que se fossem outras as circunstâncias seriam canalizados para esse fim Na América do Norte ao contrário muitas vezes bastam 50 ou 60 libras para co meçar a trabalhar na agricultura em terra própria Naquelas regiões a compra e o aprimoramento da terra não cultivada constituem a apli cação mais rentável tanto para os capitais menores como para os maio res sendo também o caminho mais direto para se conseguir toda a fortuna e renome a que se possa aspirar no país Com efeito naquelas regiões podese comprar terra quase gratuitamente ou a um preço muito inferior ao valor da produção natural coisa impossível na Europa ou em qualquer país em que as terras durante muito tempo foram de propriedade privada Se as propriedades fossem igualmente dividi das entre todos os filhos por ocasião da morte de um proprietário que deixa uma família numerosa a propriedade provavelmente seria posta à venda Haveria à venda tanta terra que ela não mais poderia ser vendida a preço de monopólio A renda líquida da terra se aproximaria mais do valor suficiente para pagar os juros do dinheiro empregado na compra da terra podendose então empregar na compra de terra um capital pequeno com a mesma rentabilidade garantida a outros empregos de capital A Inglaterra em conseqüência da fertilidade natural do solo da grande extensão da costa marítima em proporção com a extensão total do país e também dos muitos rios navegáveis que a atravessam e asseguram a vantagem do transporte fluvial a algumas de suas regiões mais afastadas da costa talvez seja por natureza tão conveniente como qualquer outro país da Europa para ser sede de comércio exterior de manufaturas para venda a locais distantes e de todos os melhoramentos que disso podem advir Além disso desde o início do reinado de Isabel os legisladores ingleses têm dispensado particular atenção aos inte resses do comércio e das manufaturas não havendo nenhum país na Europa inclusive a própria Holanda cujas leis no global favoreçam tanto esse tipo de atividade Em conseqüência durante todo esse pe ríodo o comércio e as manufaturas têm progredido continuamente Sem dúvida também a agricultura tem progredido gradativamente entretanto parece que seu progresso tem sido lento e menor do que ADAM SMITH 407 o registrado no setor do comércio e das manufaturas Antes do reinado de Isabel é provável que a maior parte do país não tivesse sido cul tivada uma parcela muito grande dele continua ainda hoje por cultivar e o cultivo de outra grande parte é muito inferior ao que poderia ser Por outro lado as leis inglesas favorecem a agricultura não somente de maneira indireta ao proteger o comércio mas também através de estímulos diretos Excetuados os períodos de escassez a exportação de trigo não somente é livre mas até incentivada por um subsídio Em épocas de abundância moderada a importação de trigo estrangeiro é onerada com taxas alfandegárias que equivalem a uma proibição A importação de gado vivo a não ser da Irlanda é proibida em qualquer época e só ultimamente é que se permitiu a importação da Irlanda Por isso os que cultivam a terra têm um monopólio face a seus con cidadãos dos dois maiores e mais importantes artigos da produção da terra o pão e a carne de açougue Esses estímulos ainda que no fundo como procurarei demonstrar mais adiante talvez sejam totalmente ilusórios são suficientes no mínimo para demonstrar a boa intenção dos legisladores em favorecer a agricultura Todavia o que é mais importante que todos estímulos os pequenos proprietários rurais da Inglaterra desfrutam da máxima segurança independência e respeitabilidade que as leis lhes podem conceder Por isso nenhum país em que existe o direito da primogenitura que pague dízimos e onde ainda se admitem direitos perpétuos embora contrariamente ao espírito da lei tem condições de estimular mais a agricultura do que a Inglaterra Não obstante tudo isso tal é a situação da agricultura no país Qual seria essa situação se a lei não tivesse dado a tal atividade nenhum qualquer estímulo direto além do que lhe propicia indireta mente o progresso do comércio e se tivesse deixado os pequenos pro prietários rurais na mesma condição que na maioria dos outros países europeus Já se passaram mais de duzentos anos desde o início do reinado de Isabel período tão longo quanto a duração da prosperidade humana costuma sustentar A França parece ter tido uma participação considerável no co mércio exterior quase um século antes que a Inglaterra se distinguisse como país comercial A marinha francesa era apreciável de acordo com os conceitos da época antes da expedição de Carlos VIII a Nápoles No entanto o cultivo e o aprimoramento da França em geral são inferiores aos da Inglaterra É que as leis do país jamais deram o mesmo estímulo direto à agricultura Muito considerável é também o comércio externo da Espanha e de Portugal com os demais países da Europa embora feito sobretudo com navios estrangeiros O comércio mantido com suas colônias é feito com navios do próprio país sendo muito maior em virtude da grande riqueza e da expressão dessas colônias Todavia esse comércio nunca fez surgir em nenhum daqueles dois países manufaturas de porte para venda em locais distantes e a maior parte da terra de ambos ainda hoje continua incultivada No entanto o comércio externo de Portugal OS ECONOMISTAS 408 é mais antigo do que o de qualquer outro grande país europeu se excetuarmos a Itália A Itália é o único grande país europeu que parece ter sido to talmente cultivado e melhorado integralmente pelo comércio exterior e pelas manufaturas criadas para fins de exportação Antes da invasão de Carlos VIII a Itália segundo Guicciardin era cultivada tanto nas regiões mais planas e férteis quanto nas partes mais montanhosas e estéreis A localização vantajosa do país e o grande número de Estados independentes que nele subsistiam na época provavelmente contribuí ram muito para esse fato Todavia não obstante essa afirmação geral de um dos mais sensatos e meticulosos historiadores modernos é pos sível que a Itália naquela época não estivesse mais bem cultivada do que o está a Inglaterra de hoje Por outro lado o capital que um país adquire por meio do comércio e das manufaturas constitui uma posse muito precária e incerta en quanto parte dele não tiver sido assegurada e não for aplicada no cultivo e na melhoria de suas terras Temse afirmado com muita propriedade que um comerciante não é necessariamente um cidadão de determinado país Em geral lhe é indiferente onde ele estabelece o seu comércio basta um pequeno desgosto para leválo a transferir seu capital de um país para outro e com seu capital todo o trabalho ao qual dá apoio Podese dizer que nenhuma parcela do capital do comerciante pertence a um determinado país enquanto esse capital não se espalhar pelo país sob a forma de construções ou de duradoura melhoria da terra Nenhum vestígio resta hoje da grande riqueza que segundo se relata possuía a maior parte das cidades da Liga Hanseá tica a não ser nas obscuras histórias dos séculos XIII e XIV Nem sequer se conhece hoje com certeza a localização exata de algumas dessas cidades ou a que cidades européias pertencem os nomes latinos dados a algumas daquelas cidades No entanto embora os infortúnios da Itália no final do século XV e no início do século XVI tenham reduzido sensivelmente o comércio e as manufaturas das cidades da Lombardia e da Toscana esses países continuam hoje a figurar entre os mais povoados e mais bem cultivados da Europa As guerras civis de Flan dres e o Governo espanhol que lhes seguiu suprimiram o grande co mércio de Antuérpia Gand e Bruges Entretanto Flandres continua sendo ainda hoje uma das províncias mais ricas melhor cultivadas e mais povoadas da Europa Os transtornos normais da guerra e as mudanças de governo facilmente fazem secar as fontes de riqueza re sultantes exclusivamente do comércio Todavia a riqueza proveniente dos mais sólidos aperfeiçoamentos da agricultura é muito mais durável não podendo ser destruída a não ser por convulsões mais violentas ocasionadas pelas depredações das nações hostis e bárbaras que se estenderam por um ou dois séculos seguidos tais como as que ocorreram nas províncias ocidentais da Europa durante algum tempo antes e depois da queda do Império Romano ADAM SMITH 409 LIVRO QUARTO Sistemas de Economia Política INTRODUÇÃO A Economia Política considerada como um setor da ciência pró pria de um estadista ou de um legislador propõese a dois objetivos distintos primeiro prover uma renda ou manutenção farta para a população ou mais adequadamente darlhe a possibilidade de conse guir ela mesma tal renda ou manutenção segundo prover o Estado ou a comunidade de uma renda suficiente para os serviços públicos Portanto a Economia Política visa a enriquecer tanto o povo quanto o soberano O progresso diferenciado da riqueza em épocas e nações dife rentes deu origem a dois sistemas distintos de Economia Política no tocante ao enriquecimento da população O primeiro pode ser denomi nado sistema de comércio o segundo sistema de agricultura Procurarei explicar o dois da maneira mais plena e clara possível começando pelo sistema de comércio É esse o sistema moderno sendo melhor com preendido em nosso próprio país e em nossa própria época 413 CAPÍTULO I O Princípio do Sistema Comercial ou Mercantil Que a riqueza consista no dinheiro isto é no ouro e na prata é uma idéia popular que deriva naturalmente da dupla função do di nheiro como instrumento de comércio e como medida de valor Pelo fato de ser instrumento de comércio quando temos dinheiro temos maior facilidade de conseguir mais prontamente do que por meio de qualquer outra mercadoria tudo aquilo de que possamos ter necessi dade Pensamos sempre que o grande problema e o grande negócio é ter dinheiro Dispondo dele não há dificuldade alguma em fazer qual quer outra compra Pelo fato de ser o dinheiro a medida do valor de outras coisas calculamos o valor de todas as demais mercadorias pela quantidade de dinheiro pela qual podem ser trocadas Dizemos que um rico vale muito dinheiro e que um pobre vale muito pouco dinheiro Dizse que um homem parcimonioso ou seja um homem que almeja ardentemente tornarse rico ama o dinheiro e dizse que um homem despreocupado generoso ou pródigo é indiferente ao dinheiro Tornar se rico nesse modo de pensar é adquirir dinheiro em suma a riqueza e o dinheiro no linguajar comum são considerados como sinônimos sob todos os aspectos Analogamente supõese que um país rico da mesma forma que um indivíduo rico é aquele que tem muito dinheiro nessa su posição acumular ouro e prata em um país constitui o caminho mais rápido para enriquecêlo Durante algum tempo após a descoberta da América a primeira pergunta dos espanhóis quando chegavam a al guma costa desconhecida costumava ser esta há ouro e prata nas imediações Conforme a informação que recebiam julgavam se valia a pena estabelecer uma colônia ali ou se valia a pena conquistar a região Plano Carpino monge enviado como embaixador pelo rei da França a um dos filhos do famoso Gêngis Khan conta que os tártaros costumavam perguntarlhe se havia muitas ovelhas e bois no reino da França A pergunta deles tinha o mesmo objetivo que a dos espanhóis 415 Queriam saber se o país era suficientemente rico para valer a pena conquistálo Entre os tártaros como entre todos os outros povos de pastores que geralmente ignoravam o uso do dinheiro o gado constitui o instrumento do comércio e a medida de valor das demais mercadorias Por isso no conceito deles a riqueza consistia em gado assim como para os espanhóis consistia em ouro e prata Das duas noções talvez a dos tártaros estivesse mais perto da verdade O Sr Locke adverte para uma diferença entre o dinheiro e os outros bens móveis Segundo ele todos os outros bens móveis são de natureza tão consumível que não se pode confiar muito na riqueza consistente neles e uma nação que num determinado ano tem abun dância deles pode ter grande escassez deles no ano seguinte mesmo sem exportálos simplesmente em decorrência de seu próprio uso e abuso Ao contrário o dinheiro é um amigo constante que embora possa circular de mão em mão desde que consigamos evitar que ele saia do país está pouco sujeito ao desgaste e ao consumo Segundo ele portanto o ouro e a prata constituem a parte mais sólida e subs tancial da riqueza móvel de uma nação por esse motivo no pensamento dele o grande objetivo da Economia Política de tal nação deve consistir em multiplicar esses metais Outros sustentam que se uma nação pudesse ser separada do resto do mundo pouco importaria se nela circulasse muito ou pouco dinheiro Os bens de consumo que circulavam por esse dinheiro seriam apenas trocados por uma quantidade maior ou menor de moedas mas a riqueza ou pobreza reais do país dependeriam totalmente da abun dância ou escassez dessas mercadorias de consumo Outro seria se gundo eles o caso de países que têm relações com nações estrangeiras e que são obrigados a fazer guerras com outros povos e a manter esquadras e exércitos em países distantes Isso dizem eles só é possível enviando dinheiro ao exterior para manter essas esquadras e exércitos ora uma nação não pode enviar muito dinheiro ao exterior a não ser que tenha muito no próprio país Por isso toda nação colocada nessa situação deve procurar em tempo de paz acumular ouro e prata para que quando a necessidade o exigir possa ter com que fazer guerra contra seus inimigos de fora Em conseqüência desses conceitos populares todas as nações da Europa têm se empenhado embora com pouca serventia em descobrir todos os meios possíveis de acumular ouro e prata em seus respectivos territórios A Espanha e Portugal proprietários das principais minas que fornecem esses metais à Europa proibiram totalmente a exportação de ouro e prata sob penas rigorosas ou impuseram pesadas taxas aduaneiras à respectiva exportação Proibição similar parece ter anti gamente constituído parte da política da maioria dos outros países europeus Ela existia até onde menos se poderia esperar em algumas leis antigas do Parlamento escocês que proibiam sob rigorosas penas levar ouro ou prata para fora do reino Antigamente a mesma política vigorava na França e na Inglaterra OS ECONOMISTAS 416 Quando esses países se transformaram em países comerciais os comerciantes consideraram diversas vezes tais proibições extremamen te inconvenientes Eles muitas vezes tinham a possibilidade de com prar mais vantajosamente com ouro e prata do que com qualquer outra mercadoria as mercadorias estrangeiras que queriam ou para importálas a seu próprio país ou para transportálas para alguma outra nação estrangeira Por isso os comerciantes protestavam contra tal proibição como prejudicial ao comércio Alegavam de início que a exportação de ouro e prata para com prar mercadorias estrangeiras nem sempre gerava uma diminuição da quantidade desses metais dentro do reino Pelo contrário diziam tal exportação com freqüência poderia fazer aumentar essa quantidade pois se com isso não aumentasse o consumo de bens estrangeiros no país esses bens poderiam ser exportados a outros países e ao serem vendidos lá com grande lucro trazer de volta ao país muito mais ouro e prata do que a quantidade que havia sido necessário exportar para comprálos O Sr Mun compara essa operação de comércio exterior com as fases da semeadura e da colheita na agricultura Se considerarmos apenas diz ele os atos do agricultor no tempo da semeadura quando ele lança ao solo grande quantidade de cereais de boa qualidade consideráloemos mais como um louco do que como um agricultor Se porém considerarmos seu tra balho na colheita que representa a meta final de seus esforços então veremos quanto valor tiveram seus trabalhos Em segundo lugar os comerciantes alegavam que essa proibição não conseguiria impedir a exportação de ouro e prata os quais sairiam facilmente do país através do contrabando em virtude de seu reduzido volume em comparação com seu alto valor Tal exportação diziam eles só poderia ser evitada atendendose devidamente ao que chamavam de balança comercial Sustentavam ainda que quando a Inglaterra exportava um valor superior ao que importava os países estrangeiros ficavam com balanço devedor em relação a ela dívida esta que neces sariamente teria de pagar com ouro e prata aumentando com isso a quantidade de ouro e prata no reino Analogamente se o reino impor tasse em valor maior do que exportava a balança comercial seria ne gativa para o reino em relação aos países estrangeiros caso em que o reino seria obrigado a pagar com ouro e prata diminuindo assim o estoque existente Nesse caso alegavam eles proibir a exportação des ses metais não lograria efeito o remédio seria fazer com que tal ex portação ficasse mais cara tornandoa mais dispendiosa Nesse caso o câmbio seria menos favorável ao país com balança comercial devedora já que o comerciante que comprasse um título no exterior seria obrigado a pagar ao banco que vendesse não somente o risco natural o incômodo e a despesa do envio do dinheiro ao exterior mas também o risco extraordinário derivado da proibição Ora quanto mais o câmbio for desfavorável a um país tanto mais a balança comercial se lhe tornará ADAM SMITH 417 desfavorável já que o dinheiro desse país necessariamente perde tanto mais valor em comparação com o dinheiro do país cuja balança co mercial é credora Assim por exemplo alegavam esses comerciantes se o câmbio entre a Inglaterra e a Holanda for 5 contra a Ingla terra serão necessárias 105 onças de prata na Inglaterra para comprar um título de 100 onças de prata na Holanda conseqüentemente 105 onças de prata na Inglaterra valerão apenas 100 onças de prata na Holanda podendo portanto comprar apenas uma quantidade propor cional de mercadorias holandesas ao contrário 100 onças de prata na Holanda valerão 105 onças na Inglaterra comprando uma quantidade proporcional de mercadorias inglesas por conseguinte as mercadorias inglesas que forem vendidas à Holanda o serão por preço mais baixo tanto quanto a diferença de câmbio entre os dois países e as merca dorias holandesas que forem vendidas à Inglaterra o serão por preço mais alto tanto quanto a diferença de câmbio entre os dois países conseqüentemente a primeira venda leva para a Inglaterra menos dinheiro holandês tanto quanto a diferença de câmbio entre os dois países e a segunda venda leva para a Holanda mais dinheiro inglês tanto quanto a diferença de câmbio entre os dois países Ao final portanto a balança comercial se tornará ainda mais desfavorável à Inglaterra exigindo ainda maior envio de ouro e prata à Holanda para equilibrála Tais argumentos em parte eram sólidos e em parte não passavam de sofismas Eram sólidos na medida em que afirmavam que a expor tação de ouro e prata por meio do comércio muitas vezes é vantajosa para um país Eram sólidos também ao afirmar que não há proibição que consiga impedir a exportação quando os particulares vêem van tagem na exportação Constituíam porém sofismas na medida em que supunham que para conservar ou para aumentar a quantidade de ouro e prata se exigia maior atenção e controle do governo do que para conservar ou aumentar a quantidade de quaisquer outras mer cadorias úteis que a liberdade de comércio nunca deixa de assegurar sem que seja necessário qualquer cuidado especial por parte do governo Possivelmente os argumentos eram sofismas também na medida em que afirmavam que o alto preço do câmbio necessariamente aumenta o que denominavam a balança comercial desfavorável ou ocasiona a exportação de quantidade maior de ouro e prata Na realidade esse alto preço era extremamente desvantajoso para os comerciantes que tinham dinheiro a pagar no exterior Pagavam assim muito mais caro pelos títulos que os banqueiros lhes outorgavam no exterior Todavia embora o risco resultante de tal proibição pudesse gerar alguma despesa extraordinária para os banqueiros não necessariamente levaria embora mais dinheiro do país Essa despesa seria geralmente toda ela investida no país sem contrabandear o dinheiro para fora dele e raramente poderia acarretar a exportação sequer de seis pence além da quantia correspondente necessária Além disso o alto preço do câmbio levaria naturalmente os comerciantes a se empenharem em equilibrar mais OS ECONOMISTAS 418 ou menos suas exportações com suas importações para que fosse a menor possível a quantia sobre a qual teriam que pagar esse alto câmbio Outrossim o alto preço do câmbio necessariamente deve ter funcionado como uma taxa aumentando o preço das mercadorias es trangeiras e com isso diminuindo seu consumo Por isso não tenderia a aumentar antes a diminuir o que denominavam a balança comercial desfavorável e portanto a exportação de ouro e prata Qualquer que fosse o valor dos argumentos o fato é que conven ceram as pessoas às quais eram dirigidos Os argumentos eram diri gidos por comerciantes aos parlamentos aos conselhos de príncipes aos nobres e aos aristocratas rurais àqueles que supostamente enten diam de comércio e àqueles que tinham consciência de nada entender do assunto Que o comércio exterior enriquece o país a experiência o demonstrou aos nobres e aos aristocratas rurais bem como aos comer ciantes mas como ou de que maneira ninguém o sabia com certeza Os comerciantes sabiam muito bem de que maneira o comércio exterior enriquecia a eles mesmos Tinham a obrigação de sabêlo pela sua própria profissão Mas saber de que maneira enriquecia o país isso não fazia parte de seu ofício Esse ponto nunca era alvo de consideração por parte deles a não ser quando sentiam a necessidade de pedir ao país que alterasse as leis relativas ao comércio exterior Nessa hora viam a necessidade de dizer algo sobre os efeitos benéficos do comércio exterior bem como sobre a maneira como as leis então vigentes im pediam a consecução desses efeitos Para os juízes que tinham que dar um julgamento sobre o assunto parecia uma explicação satisfatória quando ouviam dizer que o comércio exterior trazia dinheiro para o país mas que as leis atuais impediam que ele trouxesse tanto quanto poderia trazer se elas fossem alteradas Por isso os argumentos adu zidos pelos comerciantes produziram o efeito desejado A proibição de exportar ouro e prata foi limitada na França e na Inglaterra às res pectivas moedas Foi liberada a exportação de moeda estrangeira e de ouro e prata em lingotes Na Holanda e em alguns outros países liberouse até a exportação da moeda própria do país A atenção do Governo foi desviada do esforço de evitar a exportação de ouro e prata para o cuidado de zelar pela balança comercial como sendo a única causa que poderia gerar aumento ou diminuição desses metais precio sos De uma preocupação inútil a atenção do Governo deslocouse para uma preocupação muito mais complexa muito mais embaraçosa e igual mente inútil O título do livro de Mun Englands Treasure in Foreign Trade transformouse em um princípio fundamental da Economia Po lítica não somente da Inglaterra mas também de todos os demais países comerciais O comércio interno o mais importante de todos no qual um capital igual gera a renda máxima e cria o máximo de empregos para a mãodeobra do país passou a ser considerado apenas como subsidiário em relação ao comércio exterior Argumentavase que tal comércio não trazia nenhum dinheiro de fora como também não gerava nenhuma exportação de ouro e prata Nessas condições o país nunca ADAM SMITH 419 poderia tornarse mais rico ou mais pobre através desse tipo de comércio a não ser na medida em que o progresso ou a decadência desse comércio pudesse indiretamente influenciar a condição do comércio externo Um país que não possui minas próprias sem dúvida é obrigado a trazer de fora seu ouro e sua prata como acontece com quem não tem vinhedos próprios e tem que importar vinhos de fora Todavia não parece necessário que a atenção do Governo se voltasse mais para um objetivo do que para o outro Um país que tem com que comprar vinho sempre terá à disposição o vinho de que necessita e um país que tem com que comprar ouro e prata nunca terá falta deles Terão que ser comprados por determinado preço como qualquer outra mer cadoria e assim como o ouro e a prata representam o preço de todas as outras mercadorias da mesma forma todas as outras mercadorias representam o preço a ser pago por esses metais Com plena segurança achamos que a liberdade de comércio sem que seja necessária nenhuma atenção especial por parte do Governo sempre nos garantirá o vinho de que temos necessidade com a mesma segurança podemos estar certos de que o livre comércio sempre nos assegurará o ouro e prata que tivermos condições de comprar ou empregar seja para fazer circular as nossas mercadorias seja para outras finalidades A quantidade de uma mercadoria qualquer que o trabalho hu mano pode comprar ou produzir é naturalmente regulada em cada país pela demanda efetiva ou de acordo com a demanda daqueles que estão prontos a pagar toda a renda da terra a mãodeobra e o lucro necessários para preparar e comercializar a respectiva mercadoria Mas nenhuma mercadoria é regulada mais facilmente e com maior exatidão pela demanda efetiva do que o ouro e a prata com efeito devido ao seu volume reduzido e ao seu alto valor não há nenhuma outra mer cadoria que possa ser transportada mais facilmente de um lugar a outro dos lugares em que é barata para os lugares em que é cara dos lugares em que supera a demanda efetiva para aqueles em que está aquém desta Se por exemplo houvesse na Inglaterra uma de manda efetiva de uma quantidade adicional de ouro um navio poderia trazer de Lisboa ou de qualquer outro lugar onde houvesse ouro à venda 50 toneladas de ouro das quais se poderia cunhar mais de 5 milhões de guinéus No entanto se houvesse uma demanda efetiva de cereais do mesmo valor a importação desse volume exigiria a 5 guinéus por tonelada um embarque total de 1 milhão de toneladas ou seja 1 000 navios de 1 000 toneladas cada um A esquadra inglesa seria insuficiente para isso Quando a quantidade de ouro e prata importada em um país supera a demanda efetiva não há vigilância ou controle do Governo que consiga impedir sua exportação Nem mesmo todas as leis san guinárias da Espanha e de Portugal são capazes de evitar a evasão do ouro e da prata excedentes desses países As contínuas importações feitas do Peru e do Brasil ultrapassam a demanda efetiva da Espanha e Portugal fazendo com que o preço desses metais naqueles países OS ECONOMISTAS 420 desça abaixo do vigente nos países vizinhos Ao contrário se em algum país a sua quantidade não fosse suficiente para atender à demanda efetiva de forma a fazer subir o preço desses metais em comparação com os países vizinhos o Governo não precisaria preocuparse em im portar E se tentasse impedir tal importação não conseguiria fazêlo Quando os espartanos tinham com que comprar ouro e prata esses metais romperam todas as barreiras que as leis de Licurgo opunham à sua entrada na Lacedemônia Nem mesmo todas as sanguinárias leis aduaneiras são capazes de impedir a importação do chá da Com panhia das Índias Orientais da Holanda e de Gotemburgo pois ele é algo mais barato que o oferecido pela Companhia Britânica No entanto uma librapeso de chá representa aproximadamente 100 vezes o volume de um dos preços mais altos que se costuma pagar em prata por uma librapeso de chá isto é 16 xelins e mais do que 2 mil vezes o volume do mesmo preço em ouro sendo portanto exatamente tantas vezes mais difícil de contrabandear do que a prata e o ouro É em parte devido à facilidade de transportar ouro e prata dos lugares onde há abundância para aqueles em que há falta que o preço desses metais não flutua continuamente como o da maior parte das outras mercadorias cujo grande volume impede seu transporte fácil quando elas abundam ou estão em falta no mercado Certamente o preço do ouro e da prata não está totalmente isento de tais variações mas as alterações a que está sujeito são geralmente lentas graduais e uniformes Na Europa por exemplo supõese sem muito fundamento que no decurso do século atual e do anterior o ouro e a prata baixaram constantemente de valor mas gradualmente devido às contínuas im portações das Índias Ocidentais espanholas Todavia para que ocorra alguma variação repentina no preço do ouro e da prata de maneira que o preço em dinheiro de todas as outras mercadorias aumente ou baixe de repente de forma sensível e notável seria necessária uma revolução comercial tão grande quanto a descoberta da América Se não obstante tudo isso o ouro e prata em algum momento estivessem aquém da demanda efetiva em um país que tivesse com que comprar esses metais seria muito mais fácil substituílos do que importar em geral qualquer outra mercadoria Se houver falta de matériasprimas para a indústria esta tem que parar Se faltarem os gêneros alimentícios a população passa fome Mas se faltar dinheiro o escambo supre a sua falta embora com muitos inconvenientes Para remediar esses inconvenientes poderseá comprar e vender a crédito ou então os diversos comerciantes poderão compensar seus créditos entre si uma vez por mês ou uma vez por ano Por outro lado um sistema de papelmoeda bem organizado pode suprir a falta de dinheiro em moeda não somente sem inconveniente algum mas até em certos casos com algumas vantagens Em qualquer eventualidade portanto nunca a preocupação do Governo seria tão supérflua como quando está voltada para vigiar a conservação ou o aumento da quantidade de dinheiro em um país ADAM SMITH 421 No entanto não há queixa mais comum do que a de escassez de dinheiro O dinheiro da mesma forma que o vinho sempre e neces sariamente será escasso para aqueles que não têm com que comprálo nem têm crédito para tomálo emprestado Os que têm com que com prálo e têm crédito para tomálo emprestado raramente sentirão falta de dinheiro ou do vinho de que necessitam Entretanto essa queixa de falta de dinheiro nem sempre se limita aos perdulários imprevi dentes Ela por vezes é geral em toda uma cidade comercial e na região circunvizinha A causa disso geralmente é o excesso de comércio As pessoas sóbrias cujos projetos se tornaram desproporcionais em relação aos capitais que possuem estão tão sujeitas a não ter com que comprar dinheiro e a não dispor de crédito para tomálo emprestado quanto os perdulários cujos gastos não foram proporcionais à sua renda Antes que os projetos possam render seu capital se acabou e juntamente com ele seu crédito Andam por todos os lados em busca de dinheiro emprestado e todos lhes dizem que não têm Mesmo essas queixas generalizadas de escassez de dinheiro nem sempre provam que a quan tidade de moedas de ouro e prata em circulação seja inferior ao cos tumeiro provam apenas que muitos dos que têm falta dessas moedas são precisamente aqueles que não têm com que comprálas Quando os lucros do comércio chegam a ultrapassar o normal o comércio ex cessivo se toma um erro generalizado tanto entre os grandes comer ciantes como entre os pequenos Nem sempre exportam mais dinheiro do que normalmente mas compram a crédito tanto no país como fora uma quantidade de mercadorias fora do normal mercadorias que en viam para algum mercado distante esperando que o dinheiro retorne antes do prazo de vencimento dos pagamentos Acontece que a demanda dos pagamentos vem antes do retorno do dinheiro e eles nada têm em mãos com que possam comprar dinheiro ou oferecer alguma garantia sólida para empréstimos Portanto não é a escassez de ouro e prata mas a dificuldade que tais pessoas têm em tomar dinheiro emprestado e que seus credores têm em receber os pagamentos que gera as queixas generalizadas de falta de dinheiro Seria excessivamente ridículo empenharse seriamente em provar que a riqueza não consiste no dinheiro nem em ouro e prata mas que ela consiste naquilo que o dinheiro compra e no valor de compra que ele tem Sem dúvida o dinheiro sempre constitui uma parte do capital nacional mas já se mostrou que ele costuma representar apenas uma parcela pequena e sempre a parte menos rentável do capital Se o comerciante costuma achar mais fácil comprar mercadorias com dinheiro do que com outros bens não é porque a riqueza consistiria mais no dinheiro do que nas mercadorias mas porque o dinheiro é o instrumento de comércio reconhecido e estabelecido como tal pelo qual prontamente se pode trocar qualquer outra coisa sem que porém se possa com presteza igual conseguir dinheiro em troca de qualquer outra mercadoria Além disso a maioria dos bens são mais perecíveis do que o dinheiro e conseqüentemente muitas vezes o comerciante OS ECONOMISTAS 422 pode sair perdendo muito mais guardando mercadorias do que guar dando dinheiro Além do mais quando o comerciante tem as merca dorias em mãos ele está mais sujeito a dispor de pouco dinheiro para fazer pagamentos do que quando tem em caixa o dinheiro das mer cadorias já vendidas Além de tudo isso o lucro do comerciante vem mais diretamente daquilo que ele vende do que daquilo que compra e por todos esses motivos ele costuma preocuparse muito mais em trocar suas mercadorias por dinheiro do que em trocar seu dinheiro por mercadorias Contudo embora um comerciante individual que tem estoque abundante de mercadorias às vezes possa ir à ruína por não conseguir vendêlas em tempo uma nação ou país não está sujeito ao mesmo perigo Todo o capital de um comerciante muitas vezes consiste apenas em bens perecíveis destinados a comprar dinheiro Entretanto em se tratando da produção anual de terra e do trabalho de um país é apenas uma parcela mínima dela que se destina a comprar ouro e prata de seus vizinhos De longe a maior parte dessa produção anual circula e é consumida no seio da população e mesmo quanto ao exce dente que é exportado a maior parte dele costuma ser empregada para comprar outras mercadorias estrangeiras que não dinheiro Por isso mesmo que o país não conseguisse comprar ouro e prata com as mercadorias destinadas a essa finalidade a nação como tal não iria à ruína Poderia sim sofrer alguma perda ou transtorno e ser até forçada a recorrer a algum desses meios que são necessários para suprir o lugar do dinheiro Todavia mesmo então a produção anual de sua terra e de seu trabalho continuaria a mesma ou mais ou menos a mesma de sempre já que se estaria empregando o mesmo ou mais ou menos o mesmo capital consumível para sustentar essa produção anual E embora as mercadorias nem sempre comprem dinheiro com a mesma rapidez com que o dinheiro compra mercadorias a longo prazo elas compram mais necessariamente dinheiro do que o dinheiro compra mercadorias As mercadorias podem servir a muitos outros objetivos além de comprar dinheiro ao passo que o dinheiro não serve para nenhum outro objetivo senão comprar mercadorias Por conse guinte o dinheiro necessariamente corre atrás das mercadorias ao passo que estas nem sempre ou necessariamente correm atrás do di nheiro Quem compra nem sempre pretende revender muitas vezes sua intenção é usar ou consumir o que comprou ao passo que quem vende sempre pretende comprar novamente O que compra muitas vezes já completou com isso seu negócio ao passo que o que vende com essa operação nunca chega a fazer mais do que a metade do negócio que pretendia fazer Se as pessoas procuram dinheiro não é por causa do dinheiro em si mesmo mas por causa daquilo que com ele se pode comprar Alegase que as mercadorias de consumo logo perecem ao passo que o ouro e a prata são de natureza mais durável e não fora a ex portação contínua poderiam ser acumulados durante gerações inteiras aumentando assim incrivelmente a riqueza real do país Por conse guinte afirmase nada poderia ser mais prejudicial a um país do que ADAM SMITH 423 o comércio que consista na troca desses bens tão duráveis por merca dorias tão perecíveis Entretanto não consideramos como desvantajoso o comércio que consista na troca de ferragens inglesas pelos vinhos franceses no entanto esses produtos metalúrgicos constituem uma mercadoria de durabilidade muito grande e não fora sua exportação contínua também eles poderiam ser acumulados durante gerações se guidas aumentando assim incrivelmente o número de panelas e ca çarolas no país A isso se objeta prontamente que a quantidade de tais utensílios metalúrgicos é em cada país necessariamente limitada pela utilidade que eles podem ter no país e que seria absurdo ter mais panelas e caçarolas do que seriam necessárias para cozinhar os ali mentos que lá se costuma consumir e que se a quantidade de alimentos aumentasse juntamente com ela também aumentaria com a mesma rapidez a quantidade de panelas e caçarolas empregandose então parte da quantidade adicional de alimentos para comprar essas panelas e caçarolas para sustentar um contingente adicional de operários em pregados em sua fabricação A isso devese retrucar com a mesma prontidão que também a quantidade de ouro e prata é em cada país limitada pela utilização que esses metais podem ter no país que a sua utilidade consiste em fazer circular mercadorias em forma de moe das e em servir como uma espécie de adorno doméstico na forma de prataria que a quantidade de moedas em cada país é regulada pelo valor das mercadorias que elas estão destinadas a fazer circular que aumentandose esse valor imediatamente uma parte delas será ex portada para o exterior para comprar onde for possível a quantidade de moedas necessária para fazêlas circular que a quantidade de pra taria é determinada pelo número e pela riqueza das famílias particu lares que optam por esse artigo de luxo aumentando a riqueza e o número dessas famílias uma parte dessa riqueza adicional será muito provavelmente empregada em comprar onde for possível uma quan tidade adicional de prataria que tentar aumentar a riqueza de um país introduzindo ou mantendo nele uma quantidade desnecessária de ouro e prata é tão absurdo quanto seria tentar aumentar a quan tidade de alimentos de famílias particulares obrigandoas a manter um número supérfluo de utensílios de cozinha Assim como os gastos para comprar esses utensílios desnecessários acabariam diminuindo ao invés de aumentar a quantidade ou a qualidade das provisões da família da mesma forma o gasto feito para comprar uma quantidade desnecessária de ouro e prata necessariamente fará diminuir em qual quer país a riqueza que alimenta veste e dá moradia que sustenta e dá emprego à população Cumpre lembrar que o ouro e a prata quer em forma de moeda quer em forma de prataria são utensílios tanto quanto os artigos e equipamentos de cozinha Aumentandose sua uti lização aumentandose a quantidade de mercadorias de consumo que precisam circular ser administradas e preparadas através do ouro e da prata infalivelmente aumentarseá a quantidade desses metais entretanto se tentarmos aumentar essa quantidade por meios artifi OS ECONOMISTAS 424 ciais com a mesma certeza infalível diminuiremos sua utilização e até mesmo a quantidade que nesses metais nunca pode ser maior do que o uso exige Se algum dia esses metais fossem acumulados acima dessa quantidade seu transporte é tão fácil e a perda decorrente no caso de permanecerem ociosos ou sem utilização é tão grande que nenhuma lei conseguiria impedir a sua exportação imediata Nem sempre é necessário acumular ouro e prata para que um país possa fazer guerra contra estrangeiros e manter esquadras e exér citos em terras distantes As esquadras e exércitos não se mantêm com ouro e prata mas com bens de consumo A nação que da produção anual de sua indústria nacional da renda anual proveniente de suas terras de sua mãodeobra e do seu capital consumível tiver com que comprar esses bens de consumo em países distantes tem condições de manter guerras nesses países Uma nação pode pagar um exército em um país distante e com prarlhe os mantimentos necessários de três maneiras enviando ao exterior em primeiro lugar alguma parte de seu ouro e prata acumu lados em segundo parte da produção anual de suas manufaturas ou em terceiro parte de sua produção agrícola bruta anual O ouro e prata que se pode considerar devidamente acumulados ou estocados em um país podem ser de três tipos primeiro o dinheiro circulante segundo a prataria de famílias particulares terceiro o di nheiro que se pode acumular em muitos anos de parcimônia aplicandoo no Tesouro do príncipe Raramente deverá acontecer que se possa retirar muito dinheiro circulante do país pois nele raramente pode haver grande abundância O valor das mercadorias anualmente compradas e vendidas em um país exige certa quantidade de dinheiro para fazêlas circular e dis tribuílas a seus consumidores adequados não sendo possível empregar mais do que isso O canal da circulação necessariamente atrai uma quantia suficiente para enchêlo nunca comportando mais do que isso Todavia no caso de guerras externas sempre se costuma retirar algo desse canal Devido ao grande número de cidadãos que precisam ser mantidos fora do país menor será o número dos que serão mantidos dentro Diminui a quantidade de mercadorias que circulam no país sendo necessário menos dinheiro para essa circulação Em tais ocasiões emitese na Inglaterra uma quantidade muito grande de papelmoeda ou de algum outro tipo de dinheiro tais como notas do Tesouro cédulas da Marinha Mercante e títulos bancários Fazendose com que esse tipo de dinheiro substitua o ouro e a prata em circulação é possível enviar para o exterior uma quantidade maior de dinheiro em moeda Tudo isso porém constituiria um recurso muito insignificante para manter uma guerra fora do país que implica em grandes gastos e pode durar vários anos Um recurso ainda mais insignificante tem consistido sempre em fundir a prataria de famílias particulares No início da última guerra ADAM SMITH 425 a França não auferiu desse expediente vantagem suficiente para com pensar a perda das peças originais Em tempos antigos os tesouros acumulados do príncipe propor cionavam um recurso muito maior e muito mais durável Atualmente se excetuarmos o rei da Prússia parece que os príncipes europeus não adotam a política de acumular tesouros Os fundos que serviram para sustentar as guerras externas do século atual talvez as mais dispendiosas registradas pela história parecem ter dependido pouco da exportação do dinheiro circulante da prataria de famílias particulares ou do Tesouro do príncipe A última guerra contra a França custou à GrãBretanha acima de 90 milhões incluindo não somente os 75 milhões de novas dívidas contraídas mas também o acréscimo de 10 ao imposto territorial e o que foi anual mente tomado emprestado do fundo em baixa Mais de 23 desses gastos foram feitos em países distantes na Alemanha Portugal América nos portos do Mediterrâneo nas Índias Orientais e Ocidentais Os reis da Inglaterra não tinham tesouros acumulados Tampouco jamais ou vimos falar da fusão de extraordinárias quantidades de prataria Su põese que o ouro e prata circulante no país não ultrapassavam os 18 milhões Todavia desde a última recunhagem de ouro acreditase que foram bastante subestimados Suponhamos pois segundo o cômputo mais exagerado de que me lembro jamais haver visto ou ouvido o ouro e prata juntos atingissem 30 milhões Se a guerra tivesse sido feita com o nosso dinheiro mesmo segundo tal cálculo todo esse dinheiro em circulação deveria ter sido enviado para fora e voltado novamente no mínimo duas vezes em um lapso entre seis e sete anos Raciocinando nestes termos teríamos o argumento mais decisivo para demonstrar quão desnecessário é o Governo preocuparse em reter o dinheiro no país já que nessa hipótese todo o dinheiro do país deveria ter saído e retornado a ele novamente duas vezes em um período tão breve sem que ninguém tivesse nenhuma noção disso O canal da circulação no entanto jamais esteve tão vazio do que como durante qualquer parte desse período Poucos eram os que não conseguiam dinheiro desde que tivessem com que comprálo Na realidade os lucros do comércio exterior foram maiores do que de costume durante todo o período da guerra mas sobretudo próximo a seu final Isso gerou o que sempre gera um comércio excessivo com todos os portos da Grã Bretanha o que por sua vez gerou a costumeira queixa da falta de dinheiro que sempre acompanha um comércio em excesso Muitos ti nham falta de dinheiro mas eram pessoas que não tinham com que comprálo nem crédito para tomálo emprestado e já que os devedores encontravam dificuldade em receber empréstimos os credores tinham dificuldades em conseguir os pagamentos No entanto o ouro e a prata geralmente podiam ser comprados pelo respectivo valor por aqueles que tivessem com que pagar o respectivo preço Por isso a enorme despesa da última guerra deve ter sido paga principalmente não pela exportação de ouro e prata mas pela expor OS ECONOMISTAS 426 tação de mercadorias britânicas de várias espécies Quando o Governo ou aqueles que agiam em nome dele contratavam com um comerciante uma remessa a algum país estrangeiro naturalmente se empenhavam em pagar seu correspondente estrangeiro ao qual tinham entregue um título enviando ao exterior mercadorias preferencialmente a ouro e prata Se as mercadorias britânicas não estavam em demanda naquele país procuravase exportálas a algum outro do qual a GrãBretanha pudesse comprar um título O transporte de mercadorias quando aten de às necessidades do mercado sempre gera um lucro considerável ao passo que o transporte de ouro e prata raramente acarreta lucro Quando esses metais são enviados ao exterior para comprar mercado rias estrangeiras o lucro do comerciante resulta não da compra mas da venda das mercadorias trazidas de volta Mas quando o ouro e a prata são enviados para fora simplesmente para pagar uma dívida o comerciante não recebe mercadorias de retorno e conseqüentemente não aufere lucro algum Por isso ele naturalmente aciona sua criati vidade para encontrar um meio de pagar suas dívidas fora mais com a exportação de mercadorias do que com a exportação de ouro e prata Eis por que a grande quantidade de mercadorias britânicas exportadas durante a última guerra sem trazer de volta retorno algum foi assi nalada pelo autor de The Present State of the Nation Em todos os países que comerciam existe além dos três tipos de ouro e prata acima mencionados bastante ouro e prata em lingotes alternadamente importados e exportados para fins de comércio exterior Esses metais em lingotes por circularem entre os diversos países co merciais da mesma forma que a moeda nacional circula em cada país especificamente podem ser considerados como o dinheiro da grande república comercial internacional A moeda nacional é movimentada e guiada pelas mercadorias que circulam dentro dos limites de cada país ao passo que o dinheiro da república comercial é movimentado pelas mercadorias que circulam entre os diversos países Os dois tipos de moeda são empregados para facilitar os intercâmbios uma é em pregada para efetuar o intercâmbio de mercadorias entre indivíduos do mesmo país a outra é empregada para efetuar as trocas de mer cadorias entre nações diferentes Uma parte desse dinheiro da grande república comercial pode ter sido empregada e provavelmente o foi para custear a ótima guerra Em tempo de guerra generalizada é natural supor que se movimente e se dê uma destinação a esses metais em lingotes destinação essa diferente da que se lhes dá em tempos de paz é natural que esse tipo de moeda circulasse mais nos países em que se dava a guerra e fosse mais empregada em comprar lá e nos países vizinhos o pagamento e as provisões dos diversos exércitos Entretanto qualquer que tenha sido a quantidade desse tipo de di nheiro da república comercial que a Inglaterra possa ter anualmente empregado dessa forma essa quantidade deve ter sido anualmente comprada com mercadorias britânicas ou com alguma outra coisa que por sua vez havia sido comprada com elas o que nos remete nova ADAM SMITH 427 mente para as mercadorias a produção anual da terra e do trabalho do país como sendo os últimos recursos que nos possibilitaram fazer a guerra Com efeito é natural supor que um gasto anual tão elevado tenha sido coberto com uma elevada produção anual O gasto de 1761 por exemplo ascendeu a mais de 19 milhões Nenhuma acumulação poderia ter sustentado um esbanjamento anual tão grande Nenhuma produção anual de ouro e prata lhe teria feito frente Segundo os me lhores cálculos o total de ouro e prata anualmente importado pela Espanha e Portugal juntos não costuma superar 6 milhões de libras esterlinas quantia que em certos anos mal teria sido suficiente para cobrir quatro meses de despesa da última guerra As mercadorias mais adequadas para serem transportadas a paí ses distantes a fim de lá comprar o pagamento e as provisões de um exército ou uma parte do dinheiro da república comercial a ser em pregado para comprar isso parecem ser os manufaturados mais finos e mais aperfeiçoados podem além disso comporse de tal forma que contenham um valor elevado em volume reduzido suscetíveis de ser exportados para longe sem grandes despesas Um país que produz um grande excedente anual de tais manufaturados que costuma ex portar para países estrangeiros tem condições de conduzir uma guerra muito dispendiosa que dure muitos anos sem exportar quantidades consideráveis de ouro e prata e até sem possuílas Neste caso sem dúvida é necessário exportar uma parte considerável do excedente anual do respectivo país e isso sem trazer de volta outras mercadorias para o país embora traga retorno para o respectivo comerciante já que o Governo compra do comerciante seus títulos de países estran geiros para destes comprar o pagamento e as provisões de um exército Todavia parte desse excedente pode ainda continuar a trazer para o país algum retorno Durante a guerra os manufatores têm uma dupla demanda a atender primeiro devem produzir mercadorias a serem exportadas para pagar os títulos sacados em países estrangeiros para o pagamento e as provisões do Exército segundo devem produzir mer cadorias necessárias para comprar as mercadorias normais de retorno que são consumidas no país Portanto em meio à mais violenta guerra externa a maior parte das manufaturas do país muitas vezes pode registrar um período de grande florescimento e viceversa acusar um declínio quando voltar a paz São capazes de florescer em meio à ruína de seu país e começar a decair quando o país voltar à sua era de prosperidade Como prova do que se acaba de dizer basta considerar a situação em que se encontravam muitas manufaturas britânicas du rante a última guerra e a situação em que vieram a encontrarse algum tempo depois de sobrevir a paz Nenhuma guerra muito dispendiosa ou de longa duração poderia ter sido custeada simplesmente com a exportação da produção agrícola em estado bruto A despesa do envio de tal quantidade de produtos naturais da terra a um país estrangeiro suscetível de comprar o pa gamento e as provisões de um exército seria muito alta Além do mais OS ECONOMISTAS 428 poucos são os países cuja produção agrícola bruta seja muito superior àquilo de que a própria nação necessita para seu consumo interno Conseqüentemente exportar uma quantidade considerável dessa pro dução significaria exportar parte da subsistência necessária à própria população O mesmo não ocorre com a exportação de manufaturados Retémse no país a quantidade necessária para a manutenção dos tra balhadores empregados nessas manufaturas exportandose apenas o excedente de sua produção O Sr Hume assinala repetidamente a in capacidade dos antigos reis da Inglaterra em fazer uma guerra externa de longa duração sem interrupções Naquela época os ingleses não tinham com que pagar e comprar as provisões para os exércitos no exterior a não ser a produção direta da terra da qual pouco se podia exportar sob pena de comprometer a subsistência da população ou então alguns produtos manufaturados de fabricação mais primi tiva cujo transporte era excessivamente dispendioso da mesma forma como seria o transporte da produção da terra em estado bruto Essa incapacidade não provinha da falta de dinheiro mas da falta de pro dutos manufaturados mais refinados e aperfeiçoados Na Inglaterra as compras e vendas eram então feitas com dinheiro da mesma forma que hoje em dia A quantidade de dinheiro em circulação deve ter tido a mesma proporção com o número e o valor das compras e vendas que na época se faziam em relação ao que acontece hoje diríamos até que na época deve ter sido maior a quantidade de dinheiro em circulação pois então não havia papelmoeda que hoje ocupa em larga escala o lugar do dinheiro em moeda Em nações em que o comércio e as ma nufaturas são pouco conhecidos o soberano em ocasiões extraordiná rias raramente tem condições de obter grande ajuda de seus súditos por motivos que explicarei mais adiante É pois nesses países que o soberano geralmente procura acumular um tesouro como o único re curso de que dispõe em tais emergências Independentemente dessa necessidade ele naturalmente está disposto em tal circunstância a exercer a parcimônia exigida para acumular dinheiro Em tais condições de simplicidade o gasto mesmo de um soberano não é ditado pela vaidade com que costuma deliciarse nos adereços extravagantes de uma corte e sim o dinheiro é gasto na liberalidade com seus rendeiros e com a hospitalidade para com seus clientes Ora a liberalidade e a hospitalidade muito raramente levam à exorbitância ao passo que a vaidade quase sempre leva a esses excessos É por isso que todos os príncipes tártaros possuem um tesouro Afirmase que eram muito gran des os tesouros de Mazepa chefe dos cossacos na Ucrânia e famoso aliado de Carlos XII Todos os reis franceses da estirpe dos merovíngios também possuíam tesouros Quando dividiram seu reino entre os filhos dividiram também seus tesouros Igualmente os príncipes saxônicos e os primeiros reis depois da Conquista parecem ter acumulado tesou ros O primeiro ato de todo novo reinado consistia geralmente na to mada de posse do tesouro do rei anterior como sendo a medida mais fundamental para garantir a sucessão Os soberanos dos países evo ADAM SMITH 429 luídos e comerciais não têm a mesma necessidade de acumular tesouros pois geralmente têm condições de obter de seus súditos ajudas extraor dinárias em ocasiões extraordinárias Outrossim estão menos incli nados a acumular tesouros Natural e talvez necessariamente seguem a moda dos tempos e seus gastos acabam sendo determinados pela mesma vaidade extravagante que pauta a conduta dos demais grandes proprietários que moram em seus domínios A pompa de sua corte de início insignificante tornase cada dia maior e os gastos por ela acar retados não somente impedem qualquer acumulação de tesouros como ainda muitas vezes dilapidam os fundos destinados a despesas mais necessárias Da corte de vários príncipes europeus podese dizer o mes mo que Dercílidas afirmou sobre a corte da Pérsia isto é que lá ob servou e viu muito esplendor mas pouco poder muitos criados mas poucos soldados A importação de ouro e prata não é o benefício principal e muito menos o único que uma nação aufere de seu comércio exterior Quais quer que sejam os países ou regiões com os quais se comercializa todos eles obtêm dois benefícios do comércio exterior Este faz sair do país aquele excedente da produção da terra e do trabalho para o qual não existe demanda no país trazendo de volta em troca alguma outra mercadoria da qual há necessidade O comércio exterior valoriza as mercadorias supérfluas do país trocandoas por alguma outra que pode atender a uma parte de suas necessidades e aumentar seus prazeres Devido ao comércio exterior a estreiteza do mercado interno não impede que a divisão do trabalho seja efetuada até à perfeição máxima em qualquer ramo do artesanato e da manufatura Ao abrir um mercado mais vasto para qualquer parcela de produção de sua mãodeobra que possa ultrapassar o consumo interno o comércio exterior estimula essa mãodeobra a melhorar suas forças produtivas e a aumentar sua pro dução ao máximo aumentando assim a renda e a riqueza reais da sociedade O comércio externo presta continuamente esses grandes e relevantes serviços a todos os países entre os quais ele é praticado Todos eles auferem grandes benefícios dele embora o maior proveito caiba geralmente ao país onde o comerciante reside já que este cos tuma empenharse mais em atender às necessidades e aos supérfluos de seu próprio país do que aos dos outros Sem dúvida a importação do ouro e da prata que possam ser necessários para os países que não dispõem de minas próprias constitui uma função do comércio exterior entretanto tratase de uma função muito pouco importante Um país que praticasse o comércio externo só em função disso dificilmente che garia a fretar um navio em um século Se a descoberta da América enriqueceu a Europa não foi por causa da importação de ouro e prata Em virtude da riqueza das minas americanas esses metais baixaram de preço Podese hoje comprar uma baixela de prata por aproximadamente 13 do trigo ou 13 do trabalho que ela teria custado no século XV Com o mesmo custo de mãodeobra e de mercadorias por ano a Europa pode comprar anual OS ECONOMISTAS 430 mente mais ou menos três vezes a quantidade de prataria que poderia ter comprado naquele tempo Mas quando uma mercadoria é vendida por 13 do que havia sido seu preço habitual não somente os que antes a compravam têm condições agora de comprar o triplo da quantidade que compravam antes mas também o preço da prataria se torna aces sível a um número muito maior de clientes talvez a dez vezes mais que o número anterior Assim sendo pode agora haver na Europa não somente três vezes mais senão mais de vinte vezes do que a quantidade de prataria que poderia existir nela mesmo no atual estágio de evolução e aperfeiçoamento se jamais tivessem sido descobertas as minas da América Dessa forma a Europa sem dúvida adquiriu um bem real embora certamente se trate de uma mercadoria muito trivial O baixo preço do ouro e da prata torna esses metais até menos adequados para fins de dinheiro do que o eram antes Para efetuar as mesmas compras precisamos carregar uma quantidade maior desses metais tendo que levar no bolso 1 xelim quando antes bastava um groat161 É difícil dizer qual dos dois é mais insignificante esse inconveniente ou a con veniência oposta Nem um nem outro poderia ter feito surgir alguma diferença essencial da situação da Europa Entretanto a descoberta da América certamente trouxe uma diferença muito essencial Pelo fato de ela abrir um novo e inexaurível mercado para todas as mer cadorias européias deu margem a novas divisões do trabalho e aper feiçoamento profissional que no estreito círculo do comércio antigo jamais poderiam ter surgido por falta de um mercado para absorver a maior parte de sua produção Melhoraram as forças produtivas da mãodeobra e sua produção aumentou em todos os diversos países da Europa e juntamente com ela a renda e a riqueza reais dos habitantes As mercadorias da Europa eram quase todas novas para a América e muitas mercadorias da América eram novas para a Europa Em con seqüência iniciouse uma nova série de intercâmbios que nunca ha viam sido imaginados antes intercâmbios esses que naturalmente se riam igualmente vantajosos para o Novo como para o Velho Continente Infelizmente a injustiça selvagem dos europeus fez com que um evento que deveria ser benéfico para todos se tornasse prejudicial e destrutivo para várias dessas infelizes nações A descoberta de uma passagem para as Índias Orientais através do cabo da Boa Esperança que ocorreu mais ou menos na mesma época deu talvez uma amplitude ainda maior ao comércio exterior do que a própria descoberta da América não obstante a distância maior Havia apenas duas nações na América sob todos os aspectos superiores às selvagens que foram destruídas logo depois da descoberta do Con tinente As outras nações não passavam de regiões selvagens Ao con trário os impérios da China Industão Japão bem como vários outros nas Índias Orientais sem possuírem minas mais ricas de ouro ou prata ADAM SMITH 431 161 Antiga moeda inglesa equivalente a 4 pence N do E eram muito mais ricos sob muitos outros aspectos mais bem cultivados e mais adiantados em todos os ofícios e artes do que o México ou o Peru mesmo se dermos crédito àquilo que simplesmente não merece crédito algum os relatos exagerados de escritores espanhóis no to cante ao antigo estado daqueles impérios americanos Ora nações ricas e civilizadas sempre têm condições de intercambiar entre si produtos de valor muito superior do que se o intercâmbio for feito com nações selvagens e bárbaras No entanto a Europa até agora auferiu muito menos vantagem de seu comércio com as Índias Orientais do que do comércio com a América Os portugueses monopolizaram para si o comércio com a Índia Oriental durante aproximadamente um século sendo só indiretamente e através de Portugal que as demais nações européias puderam vir a exportar mercadorias para aquele país ou dele importálas Quando os holandeses no início do século passado começaram a interferir no monopólio português reservaram todo o comércio com a Índia Oriental a uma companhia exclusiva Os ingleses franceses suecos e dinamarqueses seguiram o exemplo dos holandeses de sorte que nenhuma grande nação européia se beneficiou até agora de um comércio com as Índias Orientais Desnecessário apontar qual quer outra razão pela qual esse comércio nunca foi tão vantajoso como o comércio com a América o qual é livre para todos os súditos de quase todas as nações européias e suas próprias colônias Os privilégios exclusivos dessas Companhias das Índias Orientais sua grande rique za o grande favor e proteção que conseguiram obter de seus respectivos governos provocaram muita inveja contra essas Companhias Essa in veja muitas vezes tem apresentado esse comércio como totalmente per nicioso devido às grandes quantidades de prata que cada ano são exportadas às Índias Orientais a partir dos países em que essas Com panhias operam As respectivas partes retrucaram que seu comércio por essa exportação contínua de prata poderia tender efetivamente a empobrecer a Europa em geral mas não o país específico a partir do qual ela era efetuada já que através da reexportação de uma parte dos produtos orientais para outros países europeus anualmente en trava no país uma maior quantidade de prata do que a exportada Tanto a objeção quanto a resposta fundamse na idéia popular que acabei de examinar Por isso é supérfluo estenderme sobre uma e outra Pela exportação anual de prata às Índias Orientais a prataria provavelmente é um tanto mais cara na Europa do que poderia ser e a prata em moeda provavelmente compra maior quantidade de mão deobra e mercadorias O primeiro desses dois efeitos representa uma perda muito pequena e o segundo uma vantagem muito pequena sendo que ambos são excessivamente insignificantes para merecer maior atenção do público O comércio com as Índias Orientais por abrir um mercado para as mercadorias européias ou o que equivale mais ou menos à mesma coisa para o ouro e a prata que se compram com essas mercadorias deve necessariamente tender a aumentar a produção anual das mercadorias européias e conseqüentemente a ri OS ECONOMISTAS 432 queza e a renda reais da Europa Se o aumento até aqui tem sido tão pequeno isso se deve provavelmente às restrições às quais esse tipo de comércio está sujeito em toda parte Considerei necessário embora com o risco de cansar o leitor examinar detalhadamente esse conceito popular de que a riqueza con siste em dinheiro vale dizer no ouro e na prata Como já observei o dinheiro na linguagem popular geralmente significa riqueza e essa ambigüidade de expressão nos tornou essa idéia popular tão familiar que mesmo aqueles que estão convencidos de se tratar de uma idéia absurda facilmente se inclinam a esquecer seus próprios princípios fazendo com que no decurso de seu raciocínio acabem por considerar essa tese como uma verdade certa e indiscutível Alguns dos melhores autores ingleses que escrevem sobre comércio começam observando que a riqueza de um país não consiste apenas no ouro e na prata mas em suas terras casas e nos bens de consumo de todos os tipos No entanto no decurso de sua argumentação parecem desaparecer de sua memória as terras as casas e os bens de consumo e ela muitas vezes leva a supor que a riqueza consiste totalmente em ouro e prata e que o grande objetivo da manufatura e do comércio da nação consiste em multiplicar esses metais Uma vez estabelecidos os dois princípios que a riqueza consiste no ouro e prata e que em se tratando de um país que não possui minas esses metais só podem entrar pela balança comercial isto é exportando um montante maior que o montante do valor importado necessariamente passouse a considerar como o grande objetivo da Economia Política diminuir o máximo possível a importação de mer cadorias estrangeiras para consumo interno e aumentar ao máximo possível a exportação de produtos do próprio país Conseqüentemente os dois grandes motores para enriquecer um país consistiriam em res tringir a importação e estimular a exportação As restrições à importação têm sido de dois tipos Primeiro restrições à importação de produtos estrangeiros para consumo interno que pudessem ser produzidos no próprio país qualquer que fosse a nação da qual se importasse Segundo restrições às importações de bens de quase todos os tipos feitas a partir de países específicos em relação aos quais se supunha ser desfavorável a balança comercial Esses diversos tipos de restrições têm consistido às vezes em altas taxas alfandegárias e outras em proibições absolutas A exportação foi estimulada às vezes pelos drawbacks às vezes por subsídios outras por tratados comerciais vantajosos com países estrangeiros e ainda pela implantação de colônias em países distantes Os drawbacks foram concedidos em duas ocasiões quando os produtos manufaturados do país estavam sujeitos a alguma taxa ou imposto muitas vezes no ato de sua exportação se devolvia ao expor tador toda a taxa cobrada ou uma parte dela e quando se importava mercadorias estrangeiras sujeitas a algum direito alfandegário para ADAM SMITH 433 exportálas novamente às vezes restituíase todo esse direito ou uma parte dele por ocasião da reexportação Os subsídios têm sido concedidos para estimular certas manufa turas em fase de implantação ou então outras indústrias consideradas como merecedoras de favores especiais Através de tratados comerciais vantajosos têmse outorgado privi légios especiais às mercadorias e aos comerciantes de determinado país além daqueles concedidos às mercadorias e comerciantes de outros países Através da implantação de colônias em terras distantes têmse outorgado não somente privilégios especiais mas muitas vezes um mo nopólio para as mercadorias e os comerciantes do país que conquistou essas terras Os dois tipos de restrições às importações acima mencionados juntamente com esses quatro estímulos à exportação constituem os seis meios principais por meio dos quais o sistema comercial se propõe a aumentar a quantidade de ouro e prata em qualquer país fazendo com que a balança comercial lhe seja favorável Passarei a considerar cada um desses meios em um capítulo específico e sem levar muito em conta sua suposta tendência em trazer dinheiro para o país exa minarei sobretudo quais são os efeitos prováveis de cada um deles para a produção anual do país Com efeito na medida em que cada um deles tende a aumentar ou a diminuir o valor da produção nacional anual cada um deve evidentemente tender a aumentar ou a diminuir a riqueza e a renda reais do país OS ECONOMISTAS 434 CAPÍTULO II Restrições à Importação de Mercadorias Estrangeiras que Podem Ser Produzidas no Próprio País Ao se restringir por altas taxas alfandegárias ou por proibições absolutas a importação de bens estrangeiros que podem ser produzidos no próprio país garantese mais ou menos o monopólio do mercado interno para a indústria nacional que produz tais mercadorias Assim a proibição de importar gado vivo ou gêneros alimentícios salgados de países estrangeiros assegura aos criadores de gado da GrãBretanha o monopólio do mercado interno para a carne de açougue As altas taxas alfandegárias impostas à importação de trigo que em épocas de abundância moderada equivalem a uma proibição garantem uma van tagem similar aos cultivadores desse produto Da mesma forma a proi bição de importar lãs estrangeiras favorece os fabricantes de lã A manufatura da seda embora empregue exclusivamente matériaprima estrangeira conseguiu recentemente a mesma vantagem A manufa tura do linho ainda não a conseguiu mas estão sendo dados grandes passos nesse sentido Analogamente muitas outras categorias de ma nufatureiros têm obtido na GrãBretanha um monopólio total ou quase total em oposição a seus concidadãos A variedade de mercadorias cuja importação está proibida na GrãBretanha de maneira absoluta ou em certas circunstâncias supera de muito o que facilmente supõem os que não estão bem familiarizados com as leis alfandegárias Não cabe dúvida de que esse monopólio do mercado interno mui tas vezes dá grande estímulo àquele tipo específico de indústria que se beneficia dele e muitas vezes canaliza para ela um contingente maior de mãodeobra e de capital da sociedade do que o que de outra forma teria sido empregado nela Entretanto talvez não seja igual mente evidente que tal monopólio tende a aumentar a atividade geral da sociedade ou a darlhe a direção mais vantajosa A atividade geral da sociedade nunca pode ultrapassar aquilo que o capital da sociedade tem condições de empregar Assim como o 435 número de operários que podem ser empregados por uma determinada pessoa deve manter certa proporção ao capital que ela possui da mesma forma o número de pessoas que podem continuamente ser empregadas pela totalidade dos membros de uma grande sociedade deve manter uma certa proporção com o capital total dessa sociedade não podendo jamais ultrapassar essa proporção Não há regulamento comercial que possa au mentar a quantidade de mãodeobra em qualquer sociedade além daquilo que o capital tem condições de manter Poderá apenas desviar parte desse capital para uma direção para a qual de outra forma não teria sido canalizada outrossim de maneira alguma há certeza de que essa direção artificial possa trazer mais vantagens à sociedade do que aquela que tomaria caso as coisas caminhassem espontaneamente Todo indivíduo empenhase continuamente em descobrir a apli cação mais vantajosa de todo capital que possui Com efeito o que o indivíduo tem em vista é sua própria vantagem e não a da sociedade Todavia a procura de sua própria vantagem individual natural ou antes quase necessariamente levao a preferir aquela aplicação que acarreta as maiores vantagens para a sociedade Em primeiro lugar todo indivíduo procura empregar seu capital tão próximo de sua residência quanto possível e conseqüentemente na medida do possível no apoio e fomento à atividade nacional desde que tal aplicação sempre lhe permita auferir o lucro normal do capital ou ao menos um lucro que não esteja muito abaixo disso Assim pois em paridade ou quase paridade de lucros todo co merciante atacadista prefere naturalmente o comércio interno ao co mércio externo de bens de consumo e este último ao comércio de trans porte de mercadorias estrangeiras No comércio interno seu capital nunca está durante tanto tempo longe de seu controle como acontece muitas vezes no caso do comércio externo de bens de consumo Ele tem melhores condições de conhecer o caráter e a situação das pessoas em quem confia e se ocorrer o caso de ser enganado conhece melhor as leis nacionais das quais se pode valer para indenizarse Em se tratando do comércio de transporte de mercadorias estrangeiras o ca pital do comerciante está como que dividido entre dois países estran geiros sendo que nenhuma das parcelas necessariamente é trazida para casa nem fica sob sua vista e controle imediatos O capital que um comerciante de Amsterdam emprega em transportar trigo de Kö nigsberg para Lisboa e frutas e vinhos de Lisboa para Königsberg em regra está 50 em Königsberg e 50 em Lisboa Nenhuma parcela desse capital entra necessariamente em Amsterdam A residência na tural de tal comerciante deve ser Königsberg ou Lisboa e somente circunstâncias muito especiais podem induzilo a preferir residir em Amsterdam Todavia a intranqüilidade que esse comerciante sente em estar tão longe de seu capital geralmente o leva a trazer parte tanto das mercadorias de Königsberg destinadas ao mercado de Lisboa como parte das mercadorias de Lisboa destinadas ao mercado de Königsberg a Amsterdam e embora isso necessariamente o obrigue ao duplo ônus OS ECONOMISTAS 436 de carregar e descarregar bem como ao pagamento de algumas taxas alfandegárias não obstante isso para poder ter sempre sob suas vistas e controle parte de seu capital ele se submete de bom grado a esse duplo ônus extraordinário Assim é que todo país que tenha alguma participação considerável no comércio de transporte externo de mer cadorias sempre se torna o empório vale dizer o mercado geral para as mercadorias de todos os diversos países cujo comércio ele movimenta O comerciante a fim de economizar um segundo carregamento e des carregamento sempre procura vender no mercado interno o máximo que pode das mercadorias desses outros países para transformar seu comércio de transporte em comércio externo de bens de consumo da mesma forma um comerciante ocupado no comércio exterior de bens de consumo quando recolhe mercadorias para mercados estrangeiros sempre terá satisfação com lucro igual ou quase igual em vender o máximo possível dessas mercadorias em seu próprio país Ele poupa a si mesmo o risco e o incômodo de exportar sempre que na medida do possível transforma seu comércio externo de bens de consumo em comércio interno Se assim posso dizer o mercado interno é pois o centro em torno do qual circulam continuamente os capitais dos ha bitantes de cada país e para o qual tendem constantemente todos ainda que em virtude de determinadas circunstâncias esses capitais possam às vezes ser desviados desse centro e encontrar emprego em lugares ou países mais distantes Ora como já mostrei um capital aplicado no mercado interno necessariamente movimenta um contin gente maior de atividade interna e assegura renda e emprego a um contingente maior de habitantes do país do que um capital igual apli cado no comércio externo de bens de consumo da mesma forma um capital empregado no comércio externo de bens de consumo apresenta a mesma vantagem em relação a um capital igual aplicado no comércio de transporte de mercadorias estrangeiras Eis por que em paridade ou quase paridade de lucros todo indivíduo naturalmente está inclinado a aplicar seu capital da maneira que ofereça as maiores possibilidades de sustentar a atividade interna e assegurar renda e emprego ao nú mero máximo de pessoas de seu próprio país Em segundo lugar todo indivíduo que emprega seu capital no fo mento da atividade interna necessariamente procura com isso dirigir essa atividade de tal forma que sua produção tenha o máximo valor possível O produto da atividade é aquilo que esta acrescenta ao objeto ou às matériasprimas aos quais é aplicada Na proporção em que o valor desse produto for grande ou pequeno da mesma forma o serão os lucros do empregador Mas se alguém emprega um capital para fomentar a atividade assim o faz exclusivamente em função do lucro conseqüentemente sempre se empenhará no sentido de aplicar esse capital no fomento daquela atividade cujo produto é suscetível de atingir o valor máximo isto é daquele produto que possa ser trocado pela quantidade máxima de dinheiro ou de outras mercadorias Ora a renda anual de cada sociedade é sempre exatamente igual ADAM SMITH 437 ao valor de troca da produção total anual de sua atividade ou mais precisamente equivale ao citado valor de troca Portanto já que cada indivíduo procura na medida do possível empregar seu capital em fomentar a atividade nacional e dirigir de tal maneira essa atividade que seu produto tenha o máximo valor possível cada indivíduo neces sariamente se esforça por aumentar ao máximo possível a renda anual da sociedade Geralmente na realidade ele não tenciona promover o interesse público nem sabe até que ponto o está promovendo Ao preferir fomentar a atividade do país e não de outros países ele tem em vista apenas sua própria segurança e orientando sua atividade de tal ma neira que sua produção possa ser de maior valor visa apenas a seu próprio ganho e neste como em muitos outros casos é levado como que por mão invisível a promover um objetivo que não fazia parte de suas intenções Aliás nem sempre é pior para a sociedade que esse objetivo não faça parte das intenções do indivíduo Ao perseguir seus próprios interesses o indivíduo muitas vezes promove o interesse da sociedade muito mais eficazmente do que quando tenciona realmente promovêlo Nunca ouvi dizer que tenham realizado grandes coisas para o país aqueles que simulam exercer o comércio visando ao bem público Efetivamente é um artifício não muito comum entre os comer ciantes e não são necessárias muitas palavras para dissuadilos disso É evidente que cada indivíduo na situação local em que se en contra tem muito melhores condições do que qualquer estadista ou legislador de julgar por si mesmo qual o tipo de atividade nacional no qual pode empregar seu capital e cujo produto tenha probabilidade de alcançar o valor máximo O estadista que tentasse orientar pessoas particulares sobre como devem empregar seu capital não somente se sobrecarregaria com uma preocupação altamente desnecessária mas também assumiria uma autoridade que seguramente não pode ser con fiada nem a uma pessoa individual nem mesmo a alguma assembléia ou conselho e que em lugar algum seria tão perigosa como nas mãos de uma pessoa com insensatez e presunção suficientes para imaginarse capaz de exercer tal autoridade Outorgar o monopólio do mercado interno ao produto da atividade nacional em qualquer arte ou ofício equivale de certo modo a orientar pessoas particulares sobre como devem empregar seus capitais o que em quase todos os casos representa uma norma inútil ou danosa Se os produtos fabricados no país podem ser nele comprados tão barato quanto os importados a medida é evidentemente inútil Se porém o preço do produto nacional for mais elevado que o do importado a norma é necessariamente prejudicial Todo pai de família prudente tem como princípio jamais tentar fazer em casa aquilo que custa mais fabricar do que comprar O alfaiate não tenta fazer seus próprios sa patos mas compraos do sapateiro O sapateiro não tenta fazer suas próprias roupas e sim utiliza os serviços de um alfaiate O agricultor não tenta fazer ele mesmo seus sapatos ou sua roupa porém recorre aos dois profissionais citados Todos eles consideram de seu interesse OS ECONOMISTAS 438 empregar toda sua atividade de forma que aufiram alguma vantagem sobre seus vizinhos comprando com uma parcela de sua produção ou o que é a mesma coisa com o preço de uma parcela dela tudo o mais de que tiverem necessidade O que é prudente na conduta de qualquer família particular difícil para mente constituirá insensatez na conduta de um grande reino Se um país estrangeiro estiver em condições de nos fornecer uma merca doria a preço de mais baixo do que o da mercadoria fabricada por nós mesmos é melhor comprála com uma parcela da produção de nossa própria atividade empregada de forma que possamos auferir alguma vantagem A atividade geral de um país por ser sempre proporcional ao capital que lhe dá emprego não diminuirá com isso da mesma forma como não diminui a atividade dos profissionais acima mencio nados o que apenas resta é descobrir a maneira pela qual ela pode ser aplicada para trazer a maior vantagem possível Ora certamente essa atividade não é empregada com o máximo de vantagem se for dirigida para um produto que é mais barato quando se compra do que quando se fabrica O valor da produção anual da atividade do país certamente diminui mais ou menos quando ele é artificialmente im pedido de produzir mercadorias que evidentemente têm mais valor do que a mercadoria que está orientado a produzir Segundo se supõe a respectiva mercadoria poderia ser comprada fora a preço mais baixo do que custa produzila no país Por isso poderia ter sido comprada com uma parte apenas isto é com apenas uma parte do preço das mercadorias que a atividade empregada por um capital igual teria produzido no país caso se deixasse a atividade nacional seguir seu caminho natural Dessa forma a atividade do país é desviada de um emprego mais vantajoso de capital e canalizada para um emprego me nos vantajoso conseqüentemente o valor de troca da produção anual do país ao invés de aumentar como pretende o legislador ne cessariamente diminui por força de cada norma que imponha tais restrições à importação Sem dúvida tais restrições às vezes permitem que possamos adquirir determinada mercadoria com maior rapidez do que se ela tivesse que ser importada e depois de certo tempo ela poderá ser fabricada a preço tão baixo ou até mais baixo do que a mercadoria produzida fora do país Embora porém a atividade da sociedade possa ser dessa forma dirigida com vantagem para um canal específico mais rapidamente do que de outra forma aconteceria de maneira alguma resulta que tal regulamento restritivo possa jamais aumentar a soma total da atividade ou da renda do país A atividade da sociedade só pode aumentar na proporção em que aumenta seu capital e este só pode aumentar na proporção em que se puder aumentar o que se poupa gradualmente de sua renda Mas o efeito imediato de todas essas restrições às importações é diminuir a renda do país e o que diminui essa renda certamente não tem muita probabilidade de aumentar o capital da sociedade mais rapidamente do que teria au ADAM SMITH 439 mentado espontaneamente caso se tivesse deixado o capital e a ati vidade encontrarem seus empregos naturais Ainda que não havendo tais restrições às importações a socie dade nunca viesse a adquirir o produto manufaturado proposto nem por isso ela ficaria mais pobre em qualquer período de sua existência Em cada período de sua existência o total do capital e da atividade do país continuaria a poder ser empregado embora aplicandoo a ob jetos diferentes da maneira mais vantajosa no respectivo período Em cada período a renda do país poderia ter sido a máxima que seu capital poderia permitir e tanto o capital como a renda poderiam ter aumen tado com a máxima rapidez possível As vantagens naturais que um país tem sobre outros na produção de determinadas mercadorias por vezes são tão relevantes que todo mundo reconhece ser inútil pretender concorrer com esses outros países Utilizando vidros viveiros e estufas podese cultivar excelentes uvas na Escócia podendose com elas fabricar vinhos muito bons com uma despesa aproximadamente trinta vezes superior àquela com a qual se pode importar de outros países vinhos pelo menos da mesma qualidade Seria porventura uma lei racional proibir a importação de todos os vinhos estrangeiros simplesmente para incentivar a fabricação de vi nho clarete e borgonha Ora se é verdade que seria absurdo evidente canalizar para algum emprego trinta vezes mais capital e atividade nacionais do que o necessário para comprar de fora quantidade igual das mercadorias desejadas logicamente é também absurdo ainda que não tão gritante mas certamente do mesmo gênero canalizar para tal emprego a trigésima ou até mesmo a trigentésima parte mais de capital e de atividade Sob este aspecto não interessa se as vantagens que um país leva sobre outro são naturais ou adquiridas Enquanto um dos países tiver estas vantagens e outro desejar partilhar delas sempre será mais vantajoso para este último comprar do que fabricar ele mes mo A vantagem que um artesão tem sobre seu vizinho que exerce outra profissão é apenas uma vantagem adquirida no entanto os dois consideram mais vantajoso comprar de um outro artesão do que cada um fazer aquilo que não é do seu ofício específico Os comerciantes e os manufatores são aqueles que auferem a maior vantagem desse monopólio do mercado interno A proibição de importar gado estrangeiro e mantimentos salgados bem como as altas taxas alfandegárias sobre cereais importados que em épocas de fartura moderada equivalem praticamente a uma proibição de importar não trazem tantas vantagens para os criadores de gado e os agricultores da GrãBretanha quanto outras restrições do mesmo tipo proporcionam aos que comercializam e aos que manufaturam as respectivas merca dorias Os produtos manufaturados especialmente os de tipo mais re finado são transportados de um país a outro com maior facilidade do que os cereais ou o gado Eis por que o comércio exterior se ocupa mais com a procura e transporte de produtos manufaturados Em se tratando destes basta uma vantagem muito pequena para possibilitar OS ECONOMISTAS 440 aos estrangeiros venderem abaixo do preço aos nossos próprios traba lhadores mesmo no mercado interno Ao contrário requerse uma van tagem muito grande para possibilitarlhes fazer o mesmo no caso dos produtos naturais do solo Caso se permitisse a livre importação de manufaturados estrangeiros vários manufaturados nacionais prova velmente sofreriam prejuízo alguns deles talvez até ficassem total mente arruinados e uma parcela considerável do capital e da atividade empregada neles seria forçada a encontrar outra aplicação Entretanto a importação mais livre da produção natural do solo não poderia ter esse efeito sobre a agricultura do país Se um dia por exemplo se desse liberdade tão grande de importar gado estrangeiro a quantidade que se importaria seria tão pequena que a criação de gado no país pouco seria afetada com isso O gado vivo talvez seja a única mercadoria cujo transporte é mais caro por mar do que por terra Se o transporte for terrestre é o próprio gado que se transporta ao mercado No caso do transporte marítimo é preciso transportar com grandes despesas e inconvenientes não somente o gado mas também a ração e água de que ele necessita durante a viagem Sem dúvida o fato de ser pequena a distância marítima entre a Irlanda e a GrãBretanha torna mais fácil a importação de gado irlandês Entretanto embora a livre importação ultimamente per mitida somente por um período limitado tenha sido autorizada para prazo indeterminado não teria maiores efeitos para os interesses dos criadores de gado da GrãBretanha As regiões da GrãBretanha que confinam com o mar da Irlanda são todas criadoras de gado Nunca houve condições de importar gado irlandês para o consumo nessas regiões devendo ele então ter sido transportado através dessas regiões muito extensas com grandes despesas e inconvenientes antes de che gar ao seu mercado apropriado Não havia possibilidade de transportar gado gordo a tão grande distância Portanto só era possível importar gado magro essa importação podia prejudicar aos interesses das regiões criadoras de gado e não aos interesses das regiões de alimentação e engorda de gado já que para estas a importação antes traria certas vantagens com a redução do preço do gado magro O reduzido número de cabeças de gado irlandês importadas desde a permissão de impor tação bem como o bom preço pelo qual se continua a vender o gado magro parecem demonstrar que mesmo as regiões criadoras da Grã Bretanha nunca terão probabilidade de ser muito afetadas pela livre importação de gado irlandês Sem dúvida pelo que se conta o povo da Irlanda às vezes opôs forte resistência à exportação de seu gado Entretanto se os exportadores tivessem vislumbrado alguma grande vantagem em continuar a exportar com facilidade teriam podido quan do a lei os favorecia esperar essa oposição tumultuosa Além disso as regiões de alimentação e engorda de gado sempre precisam ser altamente aprimoradas ao passo que as regiões de criação geralmente são incultas O alto preço do gado magro pelo fato de aumentar o valor da terra inculta é como que um subsídio contra o ADAM SMITH 441 aprimoramento da terra Para qualquer região que estivesse bem cultivada seria mais vantajoso importar seu gado magro do que criálo E eis por que segundo se diz a província da Holanda passou atualmente a adotar essa máxima As montanhas da Escócia de Gales e de Northumberland certamente não comportam grande aprimoramento das terras e parecem por natureza destinadas a ser regiões de criação de gado da GrãBretanha A plena liberdade de importação de gado estrangeiro não poderia ter outro efeito senão impedir essas regiões criadoras de tirar vantagem do aumento de população e do aprimoramento do resto do reino de elevar seu preço a um nível exorbitante e de impor um imposto real às regiões mais aprimoradas e cultivadas do país Da mesma forma também a plena liberdade de importar man timentos salgados poderia ter tão pouco efeito sobre os interesses dos criadores de gado da GrãBretanha quanto a de gado vivo Os manti mentos salgados não somente constituem uma mercadoria muito vo lumosa como também comparados à carne fresca constituem uma mercadoria de qualidade inferior e também mais cara por exigirem mais mãodeobra e gastos Por esse motivo nunca poderiam competir com a carne fresca embora tivessem condições de competir com os mantimentos salgados do país Poderiam ser utilizados para abastecer navios em viagens distantes e outras finalidades do mesmo gênero mas jamais constituir parte considerável da alimentação do povo A pequena quantidade de mantimentos salgados importados da Irlanda desde que a importação foi liberada constitui uma prova experimental de que nossos criadores de gado nada têm a temer dessa medida Não há evidência de que o preço da carne de açougue jamais tenha sido seriamente afetado por ela Mesmo a livre importação de cereais estrangeiros pouco poderia afetar os interesses dos agricultores da GrãBretanha Os cereais re presentam uma mercadoria muito mais volumosa do que a carne de açougue Uma libra de trigo ao preço de 1 pêni é tão cara como 1 libra de carne de açougue a 4 pence A quantidade reduzida de cereais im portados mesmo em épocas da maior escassez demonstra aos nossos agricultores que nada têm a temer dessa liberdade de importação Segundo o muito bem informado autor de folhetos sobre o comércio de cereais a quantidade média importada anualmente monta apenas a 23 728 quarters de todos os tipos de cereais não ultrapassando 1571 do consumo anual Todavia assim como o subsídio concedido ao trigo gera um aumento de exportação maior em anos de fartura da mesma forma deve gerar um aumento de importação em anos de escassez maior do que ocorreria no estado real do cultivo Desse modo a abun dância de um ano não compensa a escassez de outro e assim como desse modo a quantidade média exportada é forçosamente aumentada da mesma forma deve aumentar a quantidade importada no estado real do cultivo Se não houvesse subsídio pelo fato de se exportar menos trigo é provável que também se importasse menos do que agora OS ECONOMISTAS 442 um ano pelo outro Os comerciantes de trigo que fazem encomendas e se encarregam do transporte de trigo entre a GrãBretanha e outros países teriam muito menos ocupação e poderiam ser consideravelmente prejudicados os aristocratas rurais e os arrendatários porém muito pouco seriam afetados Eis por que foi entre os comerciantes de trigo mais do que entre os aristocratas rurais e arrendatários que pude observar as maiores preocupações pela renovação e continuidade do subsídio Para grande honra dos aristocratas rurais e arrendatários dentre todas as pessoas são eles os menos propensos ao mesquinho espírito de monopólio O dono de uma grande manufatura às vezes se alarma com o estabelecimento de outro empreendimento do mesmo tipo num raio de 20 milhas de distância O proprietário holandês da manufatura de lã em Abbeville estipulou que não se estabelecesse nenhum em preendimento do mesmo tipo no limite de 30 léguas daquela cidade Ao contrário os arrendatários e aristocratas rurais em geral mostram se mais dispostos a promover do que a obstruir o cultivo e a melhoria das propriedades de seus vizinhos Não têm segredos tais como os da maior parte dos manufatores e geralmente gostam de comunicar a seus vizinhos e de divulgar ao máximo possível qualquer nova prática que tenham constatado ser vantajosa Pius Questus afirma Catão o Velho stabilissimusque minimeque invidiosus minimeque male cogitantes sunt qui in eo studio occupati sunt162 Os aristocratas rurais e arrendatários dispersos em regiões diferentes do país não têm a mesma facilidade de se associar que os comerciantes e que os fabri cantes que por viver concentrados nas cidades e por estar habituados a esse espírito de corporação que predomina entre eles naturalmente se empenham em conseguir em oposição a seus concidadãos o mesmo privilégio exclusivo que geralmente possuem em oposição aos habitan tes de suas respectivas cidades Por isso parecem ter sido eles os primeiros inventores dessas restrições à importação de mercadorias estrangeiras que lhes asseguram o monopólio do mercado interno Foi provavelmente à imitação deles e para colocaremse em pé de igualdade com aqueles que em seu entender queriam oprimilos que os arren datários e aristocratas rurais da GrãBretanha esqueceram a genero sidade resultante de sua situação passando a exigir o privilégio ex clusivo de fornecer a seus concidadãos trigo e carne de açougue Talvez não se tenham dado ao trabalho de considerar que a liberdade de comércio prejudica muito menos os seus interesses do que os dos co merciantes e manufatores cujos exemplos seguiram Proibir por uma lei perpétua a importação de trigo e gado es trangeiros na realidade equivale a determinar que a população e a atividade de um país nunca devem ultrapassar aquilo que a produção natural de seu solo tem condições de sustentar ADAM SMITH 443 162 Pio Questo varão muito sólido e de forma alguma invejoso os que se dedicaram a essa ocupação agricultura de maneira alguma têm más intenções De Re Rustica ad init N do T Contudo parece haver dois casos nos quais geralmente será van tajoso impor alguma restrição à atividade estrangeira para estimular a nacional O primeiro ocorre quando se trata de um tipo específico de ati vidade necessária para a defesa do país A defesa da GrãBretanha por exemplo depende muito do número de seus marujos e navios Por isso a lei sobre a navegação com muita propriedade procura assegurar aos marinheiros e à esquadra britânicos o monopólio do comércio de seu próprio país em certos casos através de proibições absolutas e em outros impondo pesadas restrições à navegação de outros países Os principais dispositivos dessa lei são os seguintes Primeiro todos os navios cujos donos capitães e 34 da tripulação não forem súditos britânicos estão proibidos sob pena de confisco do navio e da carga de comercializar em colônias e estabelecimentos bri tânicos ou de participar do comércio de cabotagem da GrãBretanha Segundo grande variedade dos artigos de importação mais vo lumosos só pode ser introduzida na GrãBretanha por navios nas con dições acima descritas ou por navios do país produtor dessas merca dorias cujos proprietários capitães e 34 da tripulação pertençam ao respectivo país e quando tais mercadorias são importadas mesmo por navios nessas condições têm que pagar o dobro da taxa incidente sobre importação Se importadas em navios de qualquer outro país a pena lidade é o confisco do navio e da carga Ao se promulgar essa lei os holandeses eram como continuam sendo hoje os grandes transporta dores da Europa em virtude dessa lei foram totalmente excluídos da condição de transportadores para a GrãBretanha ou de importar para ela mercadorias de qualquer outro país europeu Terceiro a citada lei proíbe importar grande número das mer cadorias de importação mais volumosas mesmo em navios britânicos a partir de qualquer país que não seja o país produtor sob pena de confisco do navio e da carga Também essa restrição provavelmente visava aos holandeses Tanto hoje como na época a Holanda era o grande empório para todas as mercadorias européias sendo que com essa lei se proibiu que os navios britânicos carregassem em portos holandeses mercadorias de qualquer outro país europeu Quarto o peixe salgado de qualquer tipo barbatanas ossos gor dura e óleo de baleias não capturadas por navios britânicos ou não defumadas a bordo deles no caso de serem importados pela GrãBre tanha estão sujeitos a pagar o dobro da taxa para importação Os holandeses que ainda hoje são os principais pescadores da Europa que se empenham em fornecer peixe a outras nações eram na época os únicos Essa lei impôs restrições muito pesadas aos fornecimentos da Holanda à GrãBretanha Ao se promulgar a lei sobre a navegação embora a Inglaterra e a Holanda não estivessem efetivamente em guerra subsistia a animo sidade mais violenta entre as duas nações Ela havia começado durante o governo do Parlamento Longo que primeiro projetou essa lei e ir OS ECONOMISTAS 444 rompeu logo depois nas guerras holandesas durante o governo do Pro tetor e de Carlos II É possível pois que algumas das medidas decre tadas por essa famosa lei tenham se originado dessa animosidade entre as duas nações Todavia essas medidas são tão sábias como se todas elas tivessem sido ditadas pela mais prudente sabedoria A animosidade nacional daquela época em especial visava exatamente ao mesmo ob jetivo que teria sido recompensado pela mais prudente sabedoria isto é a redução do poder naval da Holanda a única de poder naval capaz então de pôr em risco a segurança da Inglaterra A lei da navegação não favorece o comércio externo nem o cres cimento da riqueza que dele pode decorrer O interesse de uma nação em suas relações comerciais com países estrangeiros tanto quanto o de um comerciante em relação a todas as pessoas com as quais co mercializa é comprar mais barato e vender o mais caro possível Mas há para a nação maior probabilidade de comprar barato quando através da máxima liberdade de comércio ela estimula todas as nações a ex portarem para ela os bens que precisa comprar pela mesma razão terá a máxima probabilidade de vender caro quando seus mercados são procurados pelo maior número possível de compradores É verdade que a lei da navegação não impõe restrições a navios estrangeiros que exportam produtos da indústria britânica Mesmo a antiga taxa es trangeira que se costumava pagar sobre todas as mercadorias expor tadas ou importadas foi suprimida através de várias leis subseqüentes para a maior parte dos artigos de exportação Entretanto se impedir mos os estrangeiros por proibições ou por altas taxas de virem em nosso país nem sempre eles poderão permitirse vir comprar de nós já que se vierem sem carga necessariamente perderão o frete de seu país para a GrãBretanha Ao diminuirmos portanto o número de vendedores necessariamente reduziremos o número de compradores e com isso provavelmente não só teremos que comprar mercadorias estran geiras mais caro como também vender as nossas mais barato do que se houvesse uma liberdade maior de comércio Visto que porém a defesa é muito mais importante do que a riqueza a lei da navegação representa possivelmente a mais sábia de todas as leis comerciais da Inglaterra O segundo caso em que geralmente será vantajoso impor alguma restrição à indústria estrangeira para estimular a nacional ocorre quando dentro do país se impõe alguma taxa aos produtos nacionais Nesse caso parece razoável impor uma taxa igual ao produto similar do país estrangeiro Isso não asseguraria à indústria nacional o mo nopólio do mercado interno nem canalizaria para um emprego espe cífico uma parcela de capital e de mãodeobra do país maior do que a que naturalmente para ele seria canalizada Somente pelo imposto se impediria de ser desviada para uma direção menos natural alguma parcela daquilo que naturalmente seria canalizado para esse emprego e se deixaria a concorrência entre a indústria estrangeira e a nacional depois do imposto o mais possível no mesmo nível que antes Na Grã Bretanha quando se impõe essa taxa aos produtos da indústria na ADAM SMITH 445 cional costumase ao mesmo tempo a fim de atender às queixas cla morosas de nossos comerciantes e manufatores de que seus produtos terão que ser vendidos a preço mais baixo no país impor uma taxa alfandegária muito mais pesada à importação de todos os produtos estrangeiros do mesmo tipo De acordo com alguns essa segunda limitação à liberdade de comércio deveria em certos casos ser estendida muito além das mer cadorias estrangeiras que poderiam competir com aquelas anterior mente taxadas no país Alegam que quando se taxam os artigos de maior necessidade em um país é conveniente taxar não somente os artigos de necessidade similares importados de outros países mas tam bém todos os tipos de mercadorias estrangeiras que possam vir a con correr com qualquer produto nacional Salientam que a subsistência se torna inelutavelmente mais cara em conseqüência de tais taxas e que o preço da mãodeobra também subirá sempre com o aumento do preço da manutenção dos trabalhadores Por isso toda mercadoria pro duzida dentro do país ainda que não seja imediatamente taxada tor nase mais cara em decorrência de tais taxas já que encarece a mão deobra que a produz Argumentam pois que tais taxas são na rea lidade equivalentes a uma taxa imposta a cada mercadoria específica produzida no país Portanto acrescentam que se quisermos colocar a indústria nacional em pé de igualdade com a estrangeira é necessário impor alguma taxa a todas as mercadorias estrangeiras taxa essa equivalente a esse aumento do preço das mercadorias nacionais com as quais elas podem vir a concorrer Mais adiante quando tratar dos impostos direi se as taxas im postas aos artigos de maior necessidade tais como na GrãBretanha ao sabão ao sal ao couro às velas etc necessariamente aumentam o preço da mãodeobra e conseqüentemente o de todas as outras mercadorias Mesmo admitindo porém que as taxas tenham esse efeito como o têm sem dúvida esse aumento geral do preço de todas as mercadorias em decorrência do aumento do preço da mãodeobra constitui um caso que difere sob dois aspectos que passarei a apontar do aumento de preço de uma mercadoria específica cujo preço aumentou em virtude de uma taxa específica que lhe foi imediatamente imposta Em primeiro lugar é sempre possível saber com grande exatidão quanto é o aumento de preço provocado pela taxa imposta a tal mercadoria em contrapartida nunca será possível verificar com exatidão aceitável até que ponto o aumento geral do preço da mãodeobra pode afetar o aumento do preço de cada mercadoria específica em que se emprega essa mãodeobra Por conseguinte seria impossível estabelecer uma proporção razoavelmente precisa entre a taxa imposta a cada mercadoria estrangeira e esse aumento do preço de cada mercadoria nacional Em segundo lugar as taxas impostas a artigos de maior neces sidade têm mais ou menos o mesmo efeito sobre as condições da po pulação que um solo pobre e um clima desfavorável Tais taxas enca recem os gêneros da mesma forma como se fossem necessários um OS ECONOMISTAS 446 trabalho e uma despesa extraordinária para cultiválos e colhêlos Assim como no caso da escassez natural decorrente da pobreza do solo e das más condições climáticas seria absurdo orientar as pessoas sobre como devem empregar seus capitais e seu trabalho o mesmo acontece em se tratando da escassez artificial dos gêneros decorrente de tais taxas Nos dois casos é evidente que o mais vantajoso para as pessoas é deixar que elas se adaptem da melhor forma que puderem ao seu trabalho e sua situação e que descubram aqueles empregos nos quais apesar das circunstâncias desfavoráveis possam auferir al guma vantagem no mercado interno ou no exterior Imporlhes uma nova taxa pelo fato de já estarem sobrecarregados de taxas e de que já pagam demais pelos gêneros de maior necessidade fazendolhes pagar também demasiado caro parte das outras mercadorias certa mente constitui a maneira mais absurda de remediar o mal Tais taxas quando atingem certo montante representam uma praga igual à esterilidade da terra e à inclemência do tempo não obstante isso tem sido nos países mais ricos e mais operosos que elas têm sido geralmente impostas Países mais pobres não conseguiriam suportar tal desordem Assim como somente os organismos mais fortes têm condições de sobreviver e gozar saúde em um regime não sadio da mesma forma somente conseguirão subsistir e prosperar com tais taxas as nações que em qualquer tipo de trabalho têm as maiores vantagens naturais e adquiridas A Holanda é o país europeu em que mais abundam essas taxas e que em razão de circunstâncias pecu liares continua a prosperar não por causa dessas taxas como se tem suposto absurdamente mas a despeito delas Assim como há dois casos em que geralmente será vantajoso impor alguma taxa a produtos estrangeiros para incentivar a produção nacional da mesma forma existem dois outros em que às vezes pode ser matéria de deliberação no primeiro até que ponto é indicado con tinuar a permitir a livre importação de certas mercadorias estrangeiras no segundo até que ponto ou de que maneira pode ser aconselhável reintroduzir tal liberdade de importação depois de ela ter sido sustada por algum tempo O caso em que às vezes pode ser conveniente refletir até que ponto é aconselhável continuar a importar certas mercadorias estran geiras ocorre quando alguma nação estrangeira restringe através de altas taxas alfandegárias ou através de proibições a importação de algumas de nossas mercadorias pelo seu país Nesse caso a vingança naturalmente dita a retaliação que nos leva a impor taxas aduaneiras iguais e as mesmas proibições à importação por nosso país de algumas ou de todas as mercadorias da respectiva nação Eis por que é raro as nações deixarem de retaliar dessa maneira Os franceses têm favo recido de maneira particular suas manufaturas restringindo a impor tação de mercadorias estrangeiras que pudessem concorrer com elas Nisso consistiu grande parte da política do Sr Colbert o qual a despeito de sua grande habilidade nesse caso parece ter sido vencido pelos ADAM SMITH 447 sofismas de comerciantes e fabricantes que sempre exigem monopólio face a seus concidadãos Atualmente as pessoas mais inteligentes da França estão convencidas de que tais medidas de Colbert não benefi ciaram o país Mediante a tarifa de 1667 aquele ministro impôs taxas aduaneiras extremamente altas a um grande número de manufaturados estrangeiros Como ele se recusasse a mitigálas em favor dos holan deses estes em 1671 proibiram a importação de vinhos conhaques e manufaturados da França A guerra de 1672 parece ter sido em parte provocada por essa disputa comercial A paz de Nimega pôs fim a essa disputa em 1678 suavizando algumas dessas taxas em favor dos holandeses que por seu turno suprimiram sua proibição de im portações Foi mais ou menos na mesma época que os franceses e ingleses começaram a prejudicar a indústria uns dos outros recorrendo às mesmas taxas aduaneiras e proibições sendo que coube aos fran ceses parece ter dado o primeiro passo O espírito de hostilidade que passou a subsistir entre as duas nações desde então tem impedido até agora a mitigação dessas medidas dos dois lados Em 1697 os ingleses proibiram a importação de renda de bilros um manufaturado de Flan dres O governo daquele país na época sob o domínio da Espanha proibiu em represália a importação de lãs inglesas Em 1700 aboliuse a proibição de importar renda de bilros na Inglaterra sob a condição de que a importação de lãs inglesas pelo país de Flandres fosse colocada no mesmo nível que anteriormente Retaliações desse gênero podem constituir boa política quando há probabilidade de com isso se conseguir a supressão das altas taxas alfandegárias ou das proibições que deram motivo às retaliações A recuperação de um grande mercado estrangeiro geralmente mais do que compensa o inconveniente passageiro de pagar mais caro durante um breve período alguns tipos de mercadorias Avaliar se tais reta liações têm probabilidade de produzir esse efeito talvez não seja tanto da alçada do legislador cujas decisões devem orientarse com base em princípios gerais que são sempre os mesmos mas antes compete à habilidade desse animal insidioso e astuto vulgarmente denominado estadista ou político cujos conselhos se orientam pelas flutuações mo mentâneas dos negócios Quando não há nenhuma probabilidade de conseguir a supressão das medidas que oprimem o nosso comércio parece ser mau método compensar o dano infligido a certas classes da nossa população retrucando nós mesmos com retaliações prejudiciais que não afetarão somente essas classes mas praticamente todas as categorias da população Quando nossos vizinhos proíbem a importação de algum manufaturado nosso costumamos proibir não somente a im portação da mesma mercadoria já que somente isto dificilmente os afetaria muito mas também alguma outra mercadoria deles Sem dúvida isso pode estimular alguma categoria de trabalhadores do nosso país e por excluir alguns de seus rivais pode darlhes a possibilidade de aumentar o seu preço no mercado interno Todavia os trabalhadores que sofreram com a proibição imposta pelos nossos vizinhos não serão OS ECONOMISTAS 448 beneficiados pela nossa proibição Pelo contrário eles e quase todas as outras classes da nossa população serão com isso obrigados a pagar certas mercadorias mais caro do que antes Por isso toda lei desse gênero impõe uma taxa real ao país inteiro não em favor daquela categoria específica de trabalhadores que foi lesada pela proibição dos nossos vizinhos mas em favor de alguma outra categoria O caso sobre o qual às vezes pode ser conveniente refletir até que ponto e de que maneira é indicado restabelecer a livre importação de mercadorias estrangeiras depois de ela ter sido sustada por algum tempo ocorre quando determinados produtos manufaturados devido às altas taxas ou proibições impostas a todas as mercadorias estran geiras que podem vir a concorrer com eles foram ampliados de maneira a exigir o emprego de grande quantidade de mãodeobra Nesse caso o espírito de humanidade pode exigir que a liberdade de comércio seja restaurada apenas lenta e gradativamente com boa dose de reserva e ponderação Se essas altas taxas e proibições fossem abolidas de uma só vez haveria o perigo de mercadorias estrangeiras mais baratas do mesmo tipo invadirem tão rapidamente o mercado interno que ime diatamente muitos milhares de nossos cidadãos ficassem privados de seu emprego normal e dos meios de subsistência Poderia certamente ser de proporções consideráveis o problema criado por tal medida En tretanto é sumamente provável que seria uma desordem muito menor do que se costuma imaginar Isso pelas duas razões que seguem Primeira a liberdade total de importação de mercadorias estran geiras poderia afetar muito pouco todos aqueles produtos manufatu rados dos quais uma parte costuma ser exportada a outros países eu ropeus sem subsídios Tais manufaturados devem ser vendidos no ex terior tão barato quanto qualquer outra mercadoria da mesma quali dade e espécie e conseqüentemente devem ser vendidos mais barato no mercado interno Portanto continuariam a manter a posse do mer cado interno e mesmo que uma pessoa de posição por capricho viesse eventualmente preferir mercadorias estrangeiras simplesmente pelo fato de virem de fora as mercadorias mais baratas e melhores do mesmo tipo fabricadas dentro do país essa insensatez pela própria natureza das coisas seria tão pouco comum que não poderia ter re percussões sensíveis no emprego geral da população Mas grande parte dos diversos produtos de nossas manufaturas de lã do nosso couro curtido e das nossas ferragens é anualmente exportada a outros países europeus sem nenhum subsídio e são precisamente essas as manu faturas que empregam o maior contingente de mãodeobra Possivel mente a manufatura da seda seria a que mais sofreria com essa li berdade de comércio e depois dela a do linho embora muito menos que a da seda Segunda mesmo que muitas pessoas perdessem repentinamente seu emprego costumeiro e a subsistência que lhes advém desse emprego específico em decorrência do restabelecimento da liberdade de comér cio de forma alguma disso decorreria que seriam simplesmente pri ADAM SMITH 449 vadas de todo emprego e dos meios de subsistência Em virtude da redução do exército e da esquadra no final da última guerra perderam repentinamente seu emprego normal mais de 100 mil soldados e ma rujos número igual ao empregado pelas maiores manufaturas ora ainda que isso tenha representado um certo inconveniente para eles nem por isso foram privados simplesmente de emprego e dos meios de subsistência É provável que a maioria dos marinheiros aos poucos tenha recorrido ao serviço mercante conforme fossem surgindo opor tunidades e necessidades sendo que nesse meio tempo tanto eles como os soldados foram sendo absorvidos na grande massa da popu lação empregandose em uma grande variedade de ocupações Mudança tão grande na situação de mais de 100 mil homens todos habituados ao uso das armas e muitos deles à rapina e ao saque não somente não gerou nenhuma grande convulsão no país como nenhuma desordem de monta Dificilmente se pode dizer que o fato tenha provocado em algum lugar aumento sensível do número de andarilhos nem mesmo os salários sofreram redução em qualquer ocupação que seja ao menos quanto saiba se excetuarmos o caso dos marujos do serviço mercante Mas se compararmos os hábitos de um soldado com os de qualquer trabalhador das manufaturas veremos que os deste último não tendem a desqualificálo tanto para empregarse em nova ocupação quanto os do soldado o desqualificam para empregarse em qualquer outro trabalho O trabalhador manufatureiro sempre esteve habituado a procurar sua subsistência exclusivamente no seu trabalho ao passo que o soldado a auferir sua subsistência do soldo que recebe O primeiro caracterizase pela aplicação e pela operosidade o segundo pela ocio sidade e a dissipação Ora certamente é muito mais fácil para um operário mudar de uma ocupação para outra do que uma pessoa ha bituada à ociosidade e à dissipação abraçar qualquer ocupação Além disso como já se observou para a maior parte das ocupações manu fatureiras existem outras manufaturas afins de natureza tão seme lhante que um trabalhador facilmente passa de uma ocupação para outra Finalmente a maior parte desses trabalhadores ocasionalmente se empregará também no trabalho do campo O capital que lhes deu emprego anteriormente em determinada manufatura continuará no país para dar emprego a um contingente igual de pessoas de alguma outra forma Permanecendo inalterado o capital do país também a demanda de mãodeobra será a mesma ou mais ou menos a mesma embora ela possa ser utilizada em lugares diferentes e para ocupações diferentes Com efeito os soldados e os marujos uma vez liberados do serviço ao rei estão livres para exercer qualquer profissão em qualquer cidade ou lugar da GrãBretanha ou da Irlanda Restituase a todos os súditos de Sua Majestade a mesma liberdade natural de exercerem a ocupação que quiserem da mesma forma que isso se permite aos soldados e aos marujos após o término de seu serviço ao rei em outros termos acabese com os privilégios exclusivos das corporações e com o estatuto de aprendizagem porque ambos constituem interferências OS ECONOMISTAS 450 reais na liberdade natural dos cidadãos e suprimase também a lei das residências de sorte que um trabalhador pobre ao perder o emprego em alguma ocupação ou em algum lugar possa procurar emprego em outra ocupação ou em outro lugar sem receio de perseguição ou re moção e se verá que nem o público nem os indivíduos sofrerão muito mais pela dispensa ocasional de certas categorias específicas de ope rários de fábrica do que com a de soldados Os nossos operários sem dúvida têm grandes méritos face ao país mas seus méritos não são superiores aos daqueles que defendem a pátria com o sangue nem tampouco merecem melhor tratamento que os soldados Na verdade esperar que a liberdade de comércio seja um dia totalmente restabelecida na GrãBretanha é tão absurdo quanto esperar que um dia nela se implante uma Oceana ou Utopia Opõemse irre sistivelmente a isso não somente os preconceitos do público mas tam bém o que constitui um obstáculo muito mais intransponível os interesses particulares de muitos indivíduos irresistivelmente contrá rios a tal coisa Se os oficiais do Exército se opusessem com o mesmo ardor e unanimidade a qualquer redução do contingente de tropas com o qual os donos de manufaturas tomam posição contra qualquer lei suscetível de aumentar o número de seus concorrentes no mercado interno se os primeiros incitassem seus soldados da mesma forma que os segundos incitam seus operários a atacar com violência e afronta quem ousar propor tais leis se tal ocorresse tentar reduzir o Exército seria tão perigoso como se tornou perigoso atualmente tentar reduzir sob qualquer aspecto o monopólio que nossos manufatores conseguiram conquistar em oposição a nós Esse monopólio fez aumentar tanto o número de alguns grupos específicos desses manufatores que à maneira de um grande exército permanente tornaramse temíveis ao governo e em muitas ocasiões intimidam os legisladores Todo membro do Parlamento que apoiar qualquer proposta no sentido de reforçar esse monopólio seguramente adquirirá não somente a reputação de entender do assunto mas também grande popularidade e influência junto a uma categoria de homens que devido ao seu número e à sua riqueza adquirem grande importância Ao contrário se esse parlamentar se lhes opuser e mais ainda se tiver autoridade suficiente para contra riálos nem a probidade mais reconhecida nem a graduação hierár quica mais elevada nem os maiores serviços públicos prestados são capazes de defendêlo do vitupério e da detração mais infames dos insultos pessoais e às vezes nem mesmo do perigo real derivante do ultraje insolente de monopolistas enfurecidos e decepcionados Sem dúvida muito sofreria o empresário de uma grande manu fatura o qual no caso de ser o mercado interno subitamente aberto à concorrência estrangeira fosse obrigado a abandonar seu negócio Talvez pudesse sem grandes dificuldades encontrar outra aplicação àquela parte de seu capital que ele costumava empregar para comprar materiais e pagar seus trabalhadores Contudo a parte do capital des tinada às oficinas de trabalho e aos instrumentos de comércio dificil ADAM SMITH 451 mente poderia ser vendida sem grande prejuízo Exige assim a justiça que em atenção a tal interesse mudanças desse gênero nunca sejam introduzidas súbita mas lenta e gradualmente e após demorada ad vertência Precisamente por isso os legisladores se fosse possível que suas deliberações sempre se orientassem não pela clamorosa impor tunidade de interesses facciosos mas por uma consideração global do bem geral deveriam manterse particularmente atentos para não criar novos monopólios deste gênero nem ampliar os já existentes Toda medida desse tipo cria até certo ponto uma desordem real na estrutura do país desordem que será depois difícil remediar sem gerar outra desordem Até que ponto pode ser aconselhável impor taxas à importação de mercadorias estrangeiras não para evitar a importação delas mas para elevar a receita do Governo Considerarei isso ao tratar das taxas As taxas impostas com o intuito de impedir ou mesmo de diminuir a importação constituem obviamente medidas que destroem tanto a renda proveniente da alfândega quanto a liberdade de comércio OS ECONOMISTAS 452 CAPÍTULO III As Restrições Extraordinárias à Importação de Mercadorias de Quase Todos os Tipos dos Países com os Quais a Balança Comercial É Supostamente Desfavorável PARTE PRIMEIRA A irracionalidade dessas restrições mesmo com base nos princípios do sistema comercial Impor restrições extraordinárias à importação de mercadorias de quase todos os tipos daqueles países com os quais a balança comercial é supostamente desfavorável constitui o segundo meio através do qual o sistema comercial propõe aumentar a quantidade de ouro e prata Assim na GrãBretanha é permitido importar tecidos finos da Silésia para consumo interno pagandose certos direitos Entretanto proíbese importar cambraias e tecidos finos franceses a não ser no porto de Londres sendo ali estocados para exportação Impõemse direitos mais elevados aos vinhos franceses do que aos portugueses ou na realidade aos provenientes de qualquer outro país Em virtude do assim chamado imposto 1692 um direito de 25 de tarifa ou valor foi imposto a todas as mercadorias francesas ao passo que as de todas as outras nações a maioria delas estavam sujeitas a direitos muito mais baixos que raramente ultrapassam 5 Excetuavamse o vinho o conhaque o sal e o vinagre da França sujeitos a outros direitos elevados seja por força de outras leis seja por determinadas cláusulas da mesma lei Em 1696 impôsse um segundo direito de 25 por se considerar que o primeiro não era suficiente para desestimular a importação a todas as mercadorias francesas excetuando o conhaque juntamente com um novo direito de 25 libras por tonelada de vinho francês e um outro de 15 libras esterlinas por tonelada de vinagre francês As mer 453 cadorias francesas nunca foram omitidas em qualquer desses subsídios gerais ou direitos de 5 que foram impostos a todos ou à maior parte das mercadorias enumeradas no livro de tarifas Se considerarmos os subsídios de 13 e de 23 como perfazendo um subsídio completo houve cinco desses subsídios gerais de maneira que antes do início da guerra atual podese estimar como sendo de 75 o direito mais reduzido ao qual estava sujeita a maior parte dos bens cultivados produzidos ou manufaturados na França Para a maioria desses bens no entanto esses direitos equivalem a uma proibição de importação De sua parte os franceses como acredito trataram nossas mercadorias e nossos manufaturados exatamente com a mesma dureza embora eu não esteja bem familiarizado com o rigor específico das taxas por eles impostas a tais produtos Essas restrições mútuas puseram fim a quase todo o comércio eqüitativo entre as duas nações sendo atualmente contrabandistas os principais importadores de mercadorias britânicas na França ou de mercadorias francesas na GrãBretanha Os princípios que examinei no capítulo anterior originaramse do interesse privado e do espírito de monopólio os que passarei a examinar no presente capítulo originaramse do preconceito e da animosidade entre as nações Por isso como se poderia esperar são ainda mais irracionais E assim o são mesmo com base nos princípios do sistema comercial Em primeiro lugar ainda que fosse certo que no caso de um comércio livre entre a França e a Inglaterra por exemplo a balança comercial fosse favorável à França de forma alguma se poderia concluir que tal comércio seria desvantajoso para a Inglaterra ou que com isso a sua balança comercial no conjunto seria mais desfavorável Se os vinhos da França forem melhores e mais baratos que os de Portugal ou os linhos franceses melhores e mais baratos que os da Alemanha seria mais vantajoso para a GrãBretanha comprar da França o vinho e o linho estrangeiros de que necessitasse do que comprar de Portugal e da Alemanha Embora com isso se aumentasse muito o valor das importações anuais da França diminuiria o valor total das importações anuais na proporção em que as mercadorias francesas da mesma qua lidade fossem mais baratas do que as dos dois outros países Isso ocor reria mesmo na suposição de se consumir na GrãBretanha todas as mercadorias francesas importadas Em segundo lugar grande parte dessas mercadorias poderiam ser reexportadas a outros países onde sendo vendidas com lucro po deriam trazer à GrãBretanha um retorno talvez igual ao valor do custo primário de todas as mercadorias francesas importadas O que muitas vezes se tem dito do comércio com a Índia Oriental talvez pudesse ocorrer também em relação ao comércio com a França isto é embora a maior parte das mercadorias da Índia Oriental fosse com prada com ouro e prata a reexportação de uma parte delas a outros países trouxe de volta mais ouro e prata ao país importador do que o custo primário do montante total No momento atual um dos setores mais importantes do comércio holandês consiste no transporte de mer OS ECONOMISTAS 454 cadorias francesas a outros países europeus Até uma parte do vinho francês consumido na GrãBretanha é clandestinamente importada da Holanda e da Zelândia Se houvesse liberdade de comércio entre a França e a Inglaterra ou se as mercadorias francesas pudessem ser importadas pagandose somente os mesmos direitos exigidos das mer cadorias procedentes de outras nações européias e se fosse permitido aos exportadores recuperar essas taxas no ato da exportação a Ingla terra poderia ter alguma participação nesse comércio que se considera tão vantajoso para a Holanda Em terceiro e último lugar não existe nenhum critério seguro pelo qual possamos determinar para que lado pende o que se denomina balança comercial entre dois países ou qual dos dois exporta o valor maior Os princípios que geralmente ditam nosso julgamento em todas as questões referentes a isso são o preconceito e a animosidade nacio nais sempre movidos pelo interesse privado de determinados comer ciantes Existem porém dois critérios aos quais se tem recorrido com freqüência em tais ocasiões os livros de registro da alfândega e o curso do câmbio Quanto aos registros da alfândega admitese comumente hoje assim acredito que constituem um critério muito pouco se guro devido à inexatidão com que a maior parte das mercadorias são neles avaliadas Talvez se possa dizer mais ou menos o mesmo quanto ao critério do curso cambial Quando o câmbio entre dois lugares por exemplo Londres e Paris está ao par afirmase constituir isso um sinal de que os débitos de Londres em relação a Paris são compensados pelos débitos de Paris em relação a Londres Ao contrário quando em Londres se paga um prêmio por um título de Paris afirmase que isso é um sinal de que os débitos de Londres em relação a Paris não são compensados pelos débitos de Paris em relação a Londres devendose então enviar de Londres uma compensação em dinheiro sendo que o prêmio é exigido e pago pelo risco pelo trabalho e pela despesa de exportar essa com pensação em dinheiro Afirmase que o estado normal de débito e crédito entre essas duas cidades deve necessariamente ser regulado pelo curso normal das transações comerciais efetuadas entre elas Quando ne nhuma das duas importa da outra um montante superior ao que para ela exporta os débitos e créditos de cada uma das duas podem com pensarse mutuamente Todavia quando uma delas importa da outra um valor superior ao que para ela exporta necessariamente a primeira fica devendo à segunda um montante maior do que o devido pela se gunda à primeira nesse caso os débitos e créditos de cada uma delas não se compensam mutuamente devendo então a cidade cujo débito supera o crédito exportar dinheiro Conseqüentemente se o curso nor mal do câmbio constituiu uma indicação do estado normal do débito e do crédito entre dois lugares ele deve também ser indicativo do curso normal de suas exportações e importações já que estas obriga toriamente determinam esse estado Contudo mesmo admitindose que o curso normal do câmbio cons ADAM SMITH 455 titua uma indicação suficiente do estado normal de débito e crédito entre dois lugares disso não decorreria que a balança comercial fosse favorável àquele lugar que tivesse a seu favor o estado normal do débito e do crédito Nem sempre o estado normal de débito e crédito entre dois lugares é inteiramente determinado pelo curso normal de suas transações comerciais mútuas senão que muitas vezes é influen ciado pelo curso normal das transações comerciais de cada um dos dois lugares com muitos outros Se por exemplo os comerciantes da Inglaterra costumassem pagar as mercadorias que compram de Ham burgo Danzig Riga etc com títulos da Holanda o estado normal de débito e crédito entre a Inglaterra e a Holanda não seria determinado inteiramente pelo curso normal das transações comerciais vigentes en tre esses dois países mas seria influenciado pelo curso normal das transações comerciais da Inglaterra com esses outros locais A Ingla terra pode ser obrigada a enviar anualmente dinheiro à Holanda em bora suas exportações anuais para esse país possam ultrapassar de muito o valor anual de suas importações da Holanda embora o que se denomina balança comercial seja altamente favorável à Inglaterra Além disso da maneira como se tem até agora computado a paridade de câmbio o curso normal do câmbio não tem condições para servir como indicativo suficiente de que o estado normal de débito e crédito é favorável ao país que parece ter a seu favor ou que se supõe ter a seu favor o curso normal do câmbio em outras palavras o câmbio real pode ser e na realidade é muitas vezes tão diferente do câmbio computado que em muitos casos não se pode tirar nenhuma conclusão segura do curso deste último em relação ao curso do primeiro Quando por uma soma de dinheiro paga na Inglaterra con tendo de acordo com o padrão da Casa da Moeda inglesa um certo número de onças de prata pura se recebe um título correspondente a uma soma em dinheiro a ser paga na França contendo segundo o padrão da Casa da Moeda francesa um número igual de onças de prata pura afirmase que está ao par o câmbio entre a Inglaterra e a França Quando se paga mais supõese que se paga um prêmio dizendose então que o câmbio é desfavorável à França Quando se paga menos supõese que se recebe um prêmio dizendose então que o câmbio é desfavorável à França e favorável à Inglaterra Todavia primeiro cumpre observar o seguinte nem sempre po demos determinar o valor da moeda corrente de países diferentes com base no padrão de suas respectivas moedas Com efeito em alguns países a moeda está mais usada e desgastada ou de qualquer forma mais desvalorizada em relação ao seu padrão original e em outros está menos Ora o valor da moeda corrente de cada país comparado ao da moeda de qualquer outro é proporcional não à quantidade de prata pura que deveria conter mas à quantidade que efetivamente contém Antes da reforma da moeda de prata na época do rei Guilherme o câmbio entre a Inglaterra e a Holanda computado da maneira usual OS ECONOMISTAS 456 de acordo com o padrão das duas respectivas Casas da Moeda era 25 desfavorável à Inglaterra Entretanto como disse o Sr Lowndes o valor da moeda corrente inglesa na época estava na realidade mais do que 25 abaixo de seu valor padrão Por conseguinte o câmbio real mesmo naquela época pode ter sido favorável à Inglaterra não obstante o câmbio computado serlhe tão desfavorável um número menor de onças de prata pura efetivamente pagas na Inglaterra pode ter comprado um título por um número maior de onças de prata pura a ser pago na Holanda sendo que uma pessoa que supostamente estava pagando o prêmio na realidade poderia estar recebendo o prêmio Antes da recente reforma da moedaouro inglesa a moeda francesa estava muito menos desgastada do que a inglesa estando talvez dois ou três por cento mais próxima de seu padrão Se o câmbio computado com a França não fosse mais do que dois ou três por cento desfavorável à Inglaterra o câmbio real poderia ter sido favorável à Inglaterra Desde a reforma da moedaouro o câmbio tem sido constantemente favorável à Inglaterra e desfavorável à França Em segundo lugar em alguns países a despesa da cunhagem é paga pelo Governo ao passo que em outros ela é paga pelas pessoas privadas que levam seu metal em lingotes à Casa da Moeda e o Governo chega até a auferir alguma renda da cunhagem Na Inglaterra a cunhagem é paga pelo Governo e se alguém levar uma librapeso de pratapadrão à Casa da Moeda recebe de volta 62 xelins contendo uma librapeso da mesma prata padrão Na França deduzse uma taxa de 8 para a cunhagem o que não somente cobre a despesa da mesma como ainda proporciona pequena renda ao Governo Na Inglaterra pelo fato de a cunhagem não custar nada a moeda corrente nunca pode valer muito mais do que a quantidade de metal que ela contém efetivamente Na França onde se paga o trabalho da cunhagem esse trabalho se acres centa ao valor da moeda da mesma forma como o trabalho executado para se obter a prataria aumenta o valor da prataria trabalhada Por isso uma soma em dinheiro francês contendo certo peso de prata pura vale mais do que uma quantia de moeda inglesa contendo peso igual de prata pura exigindose mais prata em lingotes ou quantidade maior de outras mercadorias para comprála Por conseguinte ainda que a moeda corrente dos dois países estivesse igualmente próxima dos padrões das respectivas Casas da Moeda determinada quantia de dinheiro inglês dificilmente poderia comprar uma quantidade de di nheiro francês contendo um número igual de onças de prata pura e conseqüentemente um título francês no valor correspondente à men cionada quantia Se por tal título não se pagasse nenhuma soma adicional além do suficiente para compensar a despesa da cunhagem francesa o câmbio real poderia estar ao par entre os dois países seus débitos e créditos poderiam compensarse mutuamente enquanto o câmbio computado seria muito favorável à França Se pelo citado título se pagasse menos o câmbio real poderia ser favorável à Inglaterra e o câmbio computado favorável à França ADAM SMITH 457 Em terceiro e último lugar em algumas cidades como Amster dam Hamburgo Veneza etc pagamse letras de câmbio estrangeiras com o que se chama bilhete de banco ao passo que em outras como em Londres Lisboa Antuérpia Livorno etc elas são pagas em moeda corrente normal do país O assim chamado bilhete de banco sempre vale mais do que a mesma quantia nominal de moeda comum Por exemplo 1 000 florins no Banco de Amsterdam valem mais do que 1 000 florins em moeda corrente de Amsterdam A diferença entre os dois valores é denominada ágio bancário o qual em Amsterdam geralmente é de cerca de 5 Na suposição de a moeda corrente de dois países estar igualmente próxima ao padrão das respectivas Casas da Moeda e de que uma pessoa pague títulos estrangeiros nessa moeda corrente ao passo que outra os paga em bilhete de banco é evidente que o câmbio computado pode ser favorável àquela que paga em bilhete de banco embora o câmbio real seja favorável àquela que paga em moeda corrente pela mesma razão que o câmbio computado pode ser favorável àquela que paga em dinheiro melhor ou seja em dinheiro que está mais próximo ao seu próprio padrão embora o câmbio real seja favo rável àquela que paga em dinheiro pior Antes da recente reforma da moedaouro o câmbio computado costumava ser desfavorável a Lon dres em relação a Amsterdam Hamburgo Veneza e segundo acredito em relação a todos os outros lugares que pagam com o assim chamado bilhete de banco Todavia de forma alguma isso significa que o câmbio real seja desfavorável a Londres Desde a reforma da moedaouro tal câmbio tem sido favorável a Londres mesmo em relação a essas cidades O câmbio computado tem sido geralmente favorável a Londres em relação a Lisboa Antuérpia Livorno e se excetuarmos a França acre dito que também em relação à maior parte das cidades da Europa que pagam em moeda corrente e não é improvável que também o câmbio real fosse favorável a Londres DIGRESSÃO SOBRE OS BANCOS DE DEPÓSITO ESPECIALMENTE SOBRE O DE AMSTERDAM A moeda corrente de um grande país como a França ou a In glaterra geralmente consiste quase inteiramente em sua própria moe da Por isso se esta moeda em algum momento desgastarse ou de qualquer forma desvalorizarse abaixo de seu valorpadrão mediante uma reforma de sua moeda o país poderia eficazmente restabelecer o valor de sua moeda Entretanto moeda corrente de um país pequeno tais como Gênova ou Hamburgo raramente consiste exclusivamente em sua própria moeda devendo comporse em grande parte de moedas de todos os países vizinhos com os quais seus habitantes mantêm in tercâmbio comercial contínuo Por isso tal país nem sempre tem con dições de estabelecer o valor de sua moeda reformando seu dinheiro No caso de se pagarem letras de câmbio estrangeiras com essa moeda o valor incerto de qualquer quantia de algo que por sua própria na OS ECONOMISTAS 458 tureza é tão incerto fará com que o câmbio seja sempre muito desfa vorável a esse país já que sua moeda em todos os países estrangeiros é necessariamente avaliada até abaixo do que vale A fim de remediar tal inconveniente ao qual esse câmbio des favorável deve ter sujeitado seus comerciantes esses países pequenos quando começaram a cuidar dos interesses comerciais muitas vezes decretaram que as letras de câmbio estrangeiras de um certo valor fossem pagas não em moeda corrente comum mas por uma ordem contra determinado banco ou por uma transferência às contas de um determinado estabelecimento bancário criado com o crédito e sob a proteção do Estado sendo esse banco sempre obrigado a pagar em dinheiro bom e verdadeiro exatamente de acordo com o padrão do país Ao que parece os bancos de Veneza Gênova Amsterdam Ham burgo e Nuremberg foram todos originalmente fundados com essa finalidade embora alguns deles possam posteriormente ter sido utili zados para outros objetivos Pelo fato de o dinheiro desses bancos ser melhor que a moeda corrente do país necessariamente comportava um ágio maior ou menor conforme se supunha estar a moeda corrente mais ou menos abaixo do padrão do país O ágio do banco de Hamburgo por exemplo que segundo se afirma costuma ser aproximadamente de 14 constitui a suposta diferença entre o bom dinheiro padrão do país e a moeda usada desgastada e desvalorizada de todos os Estados vizinhos que flui no país Antes de 1609 a grande quantidade de moeda estrangeira usada e desgastada trazida a Amsterdam pelo amplo comércio do país com todas as regiões da Europa reduziu o valor da moeda de Amsterdam aproximadamente 9 abaixo do valor da boa moeda recémsaída da Casa da Moeda Tal dinheiro logo que aparecia era imediatamente fundido ou levado embora como sempre acontece em tais circunstân cias Os comerciantes com muito dinheiro nem sempre conseguiam encontrar uma quantidade suficiente de dinheiro bom para suas letras de câmbio e o valor dessas letras tornouse em grande parte incerto a despeito de várias medidas adotadas para evitálo A fim de remediar tais inconvenientes fundouse em 1609 um banco sob garantia da cidade de Amsterdam Esse banco recebia tanto moeda estrangeira como moeda desgastada com peso abaixo de seu padrão e em seu valor real intrínseco no bom dinheiropadrão do país deduzindo apenas o necessário para cobrir a despesa da cunhagem e as demais despesas de administração Após efetuar essa pequena dedução o banco concedia um crédito em suas contas pelo valor remanescente Esse crédito era denominado bilhete de banco o qual por representar dinheiro exa tamente segundo o padrão da Casa da Moeda sempre tinha o mesmo valor real e intrinsecamente valia mais do que a moeda corrente Ao mesmo tempo determinouse que todas as letras emitidas ou negociadas em Amsterdam em valor igual ou superior a 600 florins fossem pagas com bilhete de banco o que imediatamente eliminou toda e qualquer insegurança quanto ao valor desses títulos Em conseqüência dessa medida ADAM SMITH 459 legal todo comerciante era obrigado a manter uma conta com o banco a fim de pagar suas letras de câmbio estrangeiras o que forçosamente gerou uma certa procura de bilhete de banco O bilhete de banco além de sua superioridade em relação à moeda corrente e do valor adicional que por força lhe advém da citada de manda apresenta algumas outras vantagens Ele é assegurado contra fogo roubo e outros acidentes a cidade de Amsterdam garante esse bilhete com ele podemse efetuar pagamentos através de uma simples transferência sem o incômodo de contálo e sem o risco de transportálo de um lugar a outro Em conseqüência dessas diversas vantagens pa rece que desde o início ela comportou um ágio e geralmente acreditase que todo o dinheiro originalmente depositado no banco podia nele per manecer sem que ninguém se preocupasse em requerer pagamento de um débito que tinha condições de vender no mercado por um prêmio Ao requerer pagamento do banco o possuidor de um crédito bancário perdia esse prêmio Assim como um xelim recémsaído da Casa da Moeda não comprará no mercado mais mercadorias do que um dos nossos xelins comuns desgastados da mesma forma o dinheiro bom e autêntico que poderia passar dos cofres do banco aos de uma pessoa privada por mesclarse e confundirse com a moeda corrente do país não teria mais valor do que essa moeda corrente da qual não poderia mais ser prontamente distinguido Enquanto esse dinheiro permanecia nos cofres do banco sua superioridade era conhecida e garantida Ao passar para os cofres de uma pessoa privada sua superioridade não poderia ser bem certificada senão com um maior esforço que talvez não valesse a diferença Além disso ao ser retirado dos cofres do banco esse dinheiro perdia todas as outras vantagens características do bi lhete de banco sua segurança sua transferibilidade fácil e segura sua utilidade ao pagamento de letras de câmbio estrangeiras Além de tudo esse bilhete não podia ser retirado dos cofres do banco como se verá mais adiante sem antes ser efetuado o pagamento por têlo guardado Esses depósitos em moeda ou esses depósitos que o banco era obrigado a restituir em moeda constituíam o capital original do banco ou o valor total do que era representado pelo que se denomina bilhete de banco Atualmente supõese que esse bilhete constitui apenas uma parte muito reduzida do capital A fim de facilitar o comércio de metal em lingotes o banco durante esses vários anos tem adotado a prática de conceber crédito em sua escrituração sobre depósitos de ouro e prata em lingotes Esse crédito costuma ser em torno de 5 abaixo do preço do metal em lingotes na Casa da Moeda Ao mesmo tempo o banco dá o que se chama um certificado habilitando a pessoa que faz o depósito ou o portador a retirar novamente o metal em lingotes a qualquer momento dentro de seis meses mediante retransferência ao banco de uma quantidade de bilhete de banco igual àquela pela qual foi concedido o crédito em sua escrituração ao ser feito o depósito e mediante pagamento de 025 por têlo guardado se o depósito foi em prata e de 05 se foi em ouro ao mesmo tempo o banco declara OS ECONOMISTAS 460 que não ocorrendo tal pagamento e ao expirar esse prazo o depósito pertencerá ao banco ao preço ao qual foi recebido ou pelo qual se deu o crédito nas contas de transferência O que é assim pago pela guarda do depósito pode ser considerado como uma espécie de aluguel de ar mazenamento Têmse ventilado várias razões para justificar por que motivo esse aluguel de armazenagem deve ser tanto mais caro para o ouro do que para a prata Assinalouse que a pureza do ouro é mais difícil de ser certificada do que a da prata As fraudes são praticadas com mais facilidade e ocasionam perda maior no metal mais precioso Além disso sendo a prata o metalpadrão salientouse que o Estado deseja estimular mais os depósitos de prata do que os de ouro Os depósitos de ouro e prata em lingotes são feitos na maioria dos casos quando o preço é algo mais baixo do que de ordinário e novamente retirados quando o preço sobe Na Holanda o preço de mercado da barra está geralmente acima do preço da Casa da Moeda pela mesma razão que assim aconteceu na Inglaterra antes da última reforma da moedaouro Afirmase que a diferença costuma oscilar entre aproximadamente seis e dezesseis stivers163 por marco ou oito onças de prata de onze partes de prata pura e uma de liga metálica O preço do banco ou o crédito que ele dá por depósitos de tal prata quando feitos em moeda estrangeira cuja pureza é bem conhecida e certificada como dólares mexicanos é de 22 florins por marco o preço da Casa da Moeda é aproximadamente de 23 florins e o preço de mercado é de 23 florins e 6 stivers até 23 florins e 16 stivers ou de 2 a 3 acima do preço da Casa da Moeda164 As proporções entre o preço do ADAM SMITH 461 163 Antiga moeda holandesa de pequeno valor N do E 164 São os seguintes os preços pelos quais o Banco de Amsterdam recebe atualmente setembro de 1775 ouro e prata em barras e moeda de diversos tipos PRATA dólares mexicanos coroas francesas B 22 por marco moeda inglesa em prata dólares mexicanos em nova cunhagem 21 10 ducatões 3 dólares rix 2 8 A barra de prata contendo 1112 de prata pura 21 por marco e nesta proporção até 14 pela qual são dados 5 florins Barras puras 23 por marco OURO moeda portuguesa guinéus B 310 por marco luíses de ouro novos Idem velhos 300 ducados novos 4 19 8 por ducado Recebese ouro em barra ou lingote em proporção à sua pureza comparada com a moeda de ouro estrangeira acima mencionada Para barras finas o banco paga 340 marcos Em geral porém pagase por moeda de pureza conhecida um pouco mais do que por ouro e prata em barras cuja pureza só pode ser certificada mediante um processo de fusão e análise Denominaço de algumas moedas de prata valendo cerca de 1 dólar que circulavam na Europa entre os séculos XVI e XIX banco o preço da Casa da Moeda e o preço de mercado do ouro em barras são mais ou menos as mesmas Uma pessoa geralmente pode vender seu certificado pela diferença entre o preço do lingote na Casa da Moeda e o preço de mercado Um certificado para lingotes quase sempre vale alguma coisa e por isso é muito raro acontecer que alguém deixe expirar seu certificado isto é deixe seus lingotes passarem a propriedade do banco ao preço pelo qual foram recebidos ou não os retirando antes do término dos seis meses ou deixando de pagar o 025 ou 05 a fim de obter um novo certificado para outros seis meses Entretanto embora isso aconteça raramente afirmase que por vezes acontece e com maior freqüência em relação ao ouro do que à prata devido ao aluguel de armazenamento mais alto que se paga pela guarda do metal mais precioso A pessoa que efetuando um depósito em lingotes de ouro ou prata obtém tanto um crédito bancário quanto um certificado paga suas letras de câmbio com seu crédito bancário à medida em que elas vão vencendo quanto ao certificado vendeo ou conservao conforme julgar que o preço do lingote tem probabilidade de subir ou baixar O certificado e o crédito bancários raramente permanecem juntos por muito tempo não havendo necessidade de que isso ocorra A pessoa que tem um certificado e que deseja retirar ouro ou prata em barras sempre encontra bastante crédito bancário ou moeda bancária à venda ao preço normal e a pessoa que possui moeda bancária e deseja retirar as barras também encontra sempre certificados em igual abundância Aqueles que têm créditos bancários e os portadores de certificados constituem dois tipos diferentes de credor em relação ao banco O por tador de um certificado não pode retirar as barras em troca das quais o recibo é dado sem pagar novamente ao banco uma soma de moeda bancária igual ao preço pelo qual recebeu em barras Se ele não tiver moeda de banco próprio tem que comprála de quem a tem O possuidor de moeda bancária não pode retirar as barras sem apresentar ao banco certificados pela quantidade que deseja Se ele não os possuir dele mesmo deve comprálos de quem o tiver O portador de um certificado quando compra moeda bancária compra o poder de retirar uma quan tidade de barras cujo preço na Casa da Moeda está 5 acima do preço do banco Por isso o ágio de 5 que ele costuma pagar é pago não por um valor imaginário mas por um valor real O possuidor de moeda bancária ao comprar um certificado compra o poder de retirar uma quantidade de ouro ou prata em barras cujo preço de mercado geral mente está entre 2 e 3 acima do preço da Casa da Moeda O preço que ele paga pelo certificado portanto também é pago por um valor real O preço de um certificado e o preço da moeda bancária perfazem conjuntamente o valor total ou o preço total das barras Por depósito em moeda corrente ao país o banco dá certificado bem como créditos bancários entretanto esses certificados muitas vezes não têm nenhum valor não encontrando preço no mercado Por duca tões por exemplo que na moeda corrente circulam por três florins e OS ECONOMISTAS 462 três stivers cada o banco dá um crédito de apenas três florins ou 5 abaixo do valor corrente O banco dá também um certificado que habilita o portador a retirar o número de ducatões depositados a qualquer momento dentro de seis meses pagando 025 por têlo guardado Esse recibo muitas vezes não encontrará preço no mercado Três florins de moeda bancária geralmente se vendem no mercado por três florins e três stivers valor pleno dos ducatões se fossem retirados do banco e antes de se poder retirálos devese pagar 025 pela guarda que representaria pura perda para no portador do certificado Todavia se o ágio do banco cair em algum momento a 3 tais certificados con seguiriam obter algum preço o mercado podendo ser vendidos por 175 Entretanto sendo o ágio do banco atualmente de aproximada mente 5 com freqüência se deixa que esses certificados expirem ou seja como se diz caiam nos cofres do banco Com freqüência ainda maior isso acontece com os certificados dados por depósitos de ducados de ouro já que antes de poder retirálos novamente é preciso pagar um aluguel mais elevado de armazenamento isto é 05 pela guarda respectiva Os 5 que o banco obtém quando se deixam depósitos de moeda ou de barras passarem para a propriedade do banco podem ser considerados como o aluguel que se paga pelo armazenamento perpétuo de tais depósitos Deve ser bem considerável a quantia de bilhete de banco corres pondente a certificados que expiraram Abrange todo o capital original do banco o qual como geralmente se supõe permitiuse permanecer no banco desde o momento de seu primeiro depósito sem que ninguém se preocupasse em renovar seu certificado ou retirar seu depósito uma vez que pelas razões já indicadas qualquer uma dessas duas operações representaria uma perda Entretanto qualquer que seja o montante dessa soma acreditase ser muito pequena a porcentagem representada por essa quantia em relação ao total dos bilhetes de banco O banco de Amsterdam tem sido durante esses vários últimos anos o grande depósito da Europa para ouro e prata em barras cujos certificados muito raramente se deixa expirarem ou como se costuma dizer caem na posse do banco Supõese que a maior parte dos bilhetes de banco ou dos créditos nas contas do banco originouse durante esses muitos anos decorridos desses depósitos que os comerciantes de ouro e prata em barra estão continuamente efetuando e retirando Só se pode requisitar pagamento ao banco contra apresentação de um certificado O volume menor de bilhete de banco correspondente a certificados expirados mesclase e confundese com o volume muito maior correspondente aos certificados ainda em vigor isso de tal forma que embora possa ser considerável a quantia de bilhetes de banco para a qual não há certificados não existe nenhuma quantia ou porção específica de bilhete de banco cujo pagamento não possa ser exigido a qualquer momento por um certificado O banco não pode dever a mesma coisa a duas pessoas e aquela que possui bilhete de banco e que não tem certificado não está em condições de exigir pagamento ADAM SMITH 463 do banco antes de comprar algum Em épocas normais e tranqüilas a pessoa não encontra nenhuma dificuldade em comprar certificado a preço de mercado o qual geralmente coincide com o preço pelo qual pode vender a moeda ou o metal em barras que o certificado lhe pos sibilita retirar do banco A situação poderia ser diferente em tempos de calamidade pú blica por exemplo no caso de uma invasão tal como a dos franceses em 1672 Pelo fato de todos os proprietários de bilhetes bancários que rerem ansiosamente retirálo do banco para têlo em suas próprias mãos a procura de certificados poderia ter feito aumentar seu preço a um nível exorbitante Nessas condições os portadores de certificado podem ter alimentado expectativas fora do comum e ao invés de exigir 2 ou 3 ter exigido a metade dos bilhetes de banco para o qual se havia dado crédito com base nos depósitos pelos quais o banco havia dado os respectivos certificados O inimigo sabedor da constituição do banco poderia até comprar todos esses certificados a fim de evitar a drenagem do tesouro Supõese que em tais emergências o banco pas saria por cima da norma comum de só efetuar pagamento aos portadores que apresentassem certificado Nesse caso os portadores de certifica dos que não possuíam bilhete de banco devem ter recebido entre 2 ou 3 do valor do depósito pelo qual o banco havia emitido os respec tivos certificados Nesse caso afirmase que o banco não teria nenhum escrúpulo em pagar com dinheiro ou com metal em barras o valor pleno da soma creditada em seus livros contábeis aos possuidores de bilhete de banco que não conseguiam certificados e pagaria ao mesmo tempo 2 ou 3 aos portadores de certificado que não possuíssem aquele bilhete já que este seria o valor total que justificadamente lhes seria devido em tal situação Mesmo em tempos normais e tranqüilos os portadores de certi ficados têm interesse em fazer baixar o ágio seja para comprar muito mais barato bilhete de banco conseqüentemente o metal em barras que seus certificados os habilitariam então a retirar do banco seja para vendêlo mais caro àqueles que possuem bilhete de banco e que desejam retirar metal em barras tão mais caro isto porque o preço de um certificado costuma ser igual à diferença entre o preço de mercado do bilhete de banco e o do da moeda ou das barras pelo qual se concedeu certificado Ao contrário os proprietários de bilhete de banco têm in teresse em fazer subir o ágio seja para vender seu bilhete tanto mais caro seja para comprar um certificado tanto mais barato Para evitar os truques de especulação na bolsa que esses interesses opostos pode riam às vezes gerar o banco adotou nos últimos anos a decisão de vender sempre bilhete de banco por moeda corrente a 5 de ágio e recomprálo novamente a 4 de ágio Em decorrência dessa resolução o ágio nunca pode subir além de 5 nem descer abaixo de 4 e que a proporção entre o preço de mercado do bilhete de banco e da moeda corrente sempre é mantida muito próxima da proporção entre seus valores intrínsecos Antes que se tomasse esta resolução o preço de OS ECONOMISTAS 464 mercado do bilhete de banco às vezes chegava a subir até 9 de ágio e às vezes a descer tão baixo quanto ao par conforme a influência eventualmente exercida sobre o mercado pelos interesses opostos O banco de Amsterdam declara não emprestar nenhuma parte do que é nele depositado mas para cada florim a que concede crédito em sua escrituração contábil conservar o valor de um florim em di nheiro ou em barra Dificilmente se pode duvidar que o banco conserve em seus cofres todo o dinheiro ou barras para os quais há certificados em vigor dinheiro e barras esses que podem ser exigidos pelos porta dores de certificados a qualquer momento e que na realidade são continuamente depositados e retirados dos cofres do banco Entretanto talvez não seja tão certo que o banco faça o mesmo em relação à parte de seu capital cujos certificados já expiraram há muito tempo dinheiro esse que em tempos normais e tranqüilos não pode ser exigido e que na realidade muito provavelmente permanecerá no banco para sempre enquanto subsistirem os Estados das Províncias Unidas Em Amster dam no entanto não existe artigo de fé mais firme do que este por cada florim que circula como bilhete de banco existe no tesouro do banco um florim correspondente em ouro ou prata A cidade é uma garantia de que assim deve ser O banco está sob a direção dos quatro burgomestres reinantes substituídos a cada ano Cada novo quadrun virato de burgomestres visita o tesouro comparao com a escrituração contábil recebeo sob juramento e o entrega com a mesma espantosa solenidade aos quatro burgomestres que lhe sucedem e nesse país sóbrio e religioso os juramentos até agora não têm sido desrespeitados Uma rotatividade desse tipo constitui por si só uma garantia suficiente contra quaisquer práticas inconfessáveis Em meio a todas as revoluções geradas no governo de Amsterdam pelas dissensões partidárias a parte vencedora nunca acusou seus predecessores de deslealdade na admi nistração do banco Nenhuma acusação poderia ter afetado mais pro fundamente a reputação e o destino da parte perdedora e se tal acu sação pudesse ter sido comprovada podemos estar certos de que ela teria sido apresentada Em 1672 quando o rei francês estava em Utrecht o barco de Amsterdam pagou com tanta prontidão que não restou dúvida sobre a lealdade com que havia observado seus compro missos Algumas das moedas que foram retiradas dos cofres do banco naquela época parecem ter sido chamuscadas pelo incêndio ocorrido no prédio logo depois da criação do banco Concluise pois que essas moedas devem ter permanecido nos cofres do banco desde aquela época Durante muito tempo os curiosos vêm especulando no sentido de saber qual é o montante do tesouro encerrado nos cofres do banco Quanto a isso não há nada além de conjeturas Calculase que há aproximadamente 2 mil pessoas que mantêm contas com o banco su pondose que cada uma possui o valor de 1 500 libras esterlinas em suas respectivas contas uma suposição muito generosa o total dos bilhetes de banco e conseqüentemente do tesouro do banco deverá aproximarse de 3 milhões de libras esterlinas ou seja ao câmbio de ADAM SMITH 465 onze florins por libra esterlina 33 milhões de florins montante elevado suficiente para operar uma circulação bem ampla porém muito inferior às somas descomunais imaginadas por alguns A cidade de Amsterdam aufere uma renda considerável do banco Além do que se pode denominar o aluguel de armazenagem supra mencionado cada pessoa ao abrir a primeira conta do banco paga uma taxa de dez florins e por outra nova conta três florins e três stivers por nova transferência dois stivers e se a soma transferida for inferior a 300 florins pagamse seis stivers a fim de desestimular a multiplicação de pequenas transações A pessoa que deixa de fazer balanço de sua conta duas vezes ao ano paga uma multa de 25 florins A pessoa que solicita uma transferência de uma soma superior à que possui em sua conta é obrigada a pagar 3 sobre a soma sacada a descoberto e seu pedido é desprezado na transação Além disso su põese que o banco aufere lucros consideráveis vendendo moeda ou barras estrangeiras que passam a pertencer ao banco por vencimento dos certificados dinheiro que sempre é conservado até poder ser ven dido com lucro Aufere lucro também vendendo bilhete de banco a 5 de ágio e comprandoo a 4 Estes diversos emolumentos representam um montante bem superior ao necessário para pagar os salários dos funcionários e para cobrir as despesas de administração Acreditase que o que se paga pela guarda do ouro e prata em barras sob certificado por si só representa uma renda líquida anual entre 150 mil e 200 mil florins Não obstante isso essa instituição bancária teve como objetivo original a utilidade pública e não a renda Seu objetivo era livrar os comerciantes do incômodo de um câmbio desvantajoso Não se previa a renda que o banco geraria podendose considerála como acidental Já é tempo todavia de encerrar esta longa digressão à qual fui im perceptivelmente levado no empenho de explicar as razões pelas quais o câmbio entre os países que pagam com o chamado bilhete de banco e os que pagam em moeda corrente geralmente parece ser favorável aos primeiros e desfavorável aos segundos Os primeiros pagam com um tipo de dinheiro cujo valor intrínseco é sempre o mesmo e que equivale exatamente ao padrão de suas respectivas Casas da Moeda os segundos pagam com um tipo de dinheiro cujo valor intrínseco varia con tinuamente estando quase sempre mais ou menos abaixo desse padrão PARTE SEGUNDA A irracionalidade dessas restrições extraordinárias com base em outros princípios Na primeira parte do presente capítulo procurei mostrar mesmo com base nos princípios do sistema comercial o quanto é desnecessário impor restrições extraordinárias à importação de mercadorias dos paí ses com os quais a balança comercial segundo se supõe é desfavorável No entanto não há nada mais absurdo que toda essa teoria da OS ECONOMISTAS 466 balança comercial na qual se baseiam não somente as referidas res trições mas também quase todas as demais normas sobre o comércio Quando dois lugares ou cidades comercializam entre si essa teoria supõe que se a balança comercial entre os dois estiver em equilíbrio nenhum dos dois ganha ou perde ao passo que se a balança pender em qualquer grau para um dos lados uma delas perde e a outra ganha na proporção em que a balança se desviar de seu ponto exato de equilíbrio Ambas as suposições são falsas Como procurarei mostrar mais adiante um comércio que é forçado por subsídios e monopólios pode e costuma ser desvantajoso para o país que acredita estarse beneficiando com essas medidas Ao contrário o comércio que sem violência ou coação é efetuado com naturalidade e regularidade entre dois lugares sempre traz vantagem para os dois lados ainda que essa vantagem não seja sempre igual para ambos Por vantagem ou ganho entendo não o aumento da quantidade de ouro e prata mas o aumento do valor de troca da produção anual da terra e da mãodeobra do país ou seja o aumento da renda anual de seus habitantes Se a balança comercial estiver em equilíbrio e se o comércio entre os dois lugares consistir exclusivamente no intercâmbio de suas mercadorias nacionais na maioria dos casos não somente os dois au ferirão vantagem senão que o ganho será igual ou quase igual nesse caso cada um oferecerá um mercado para uma parte do excedente de produção do outro cada um reporá um capital que fora empregado em cultivar e preparar para a comercialização essa parte do excedente de produção do outro e que havia sido distribuída entre eles proporcio nando renda e sustento a um certo número de seus habitantes Por isso parte dos habitantes de cada um auferirá indiretamente sua renda e seu sustento do outro Assim como supostamente também as mer cadorias trocadas são de valor igual da mesma forma serão na maioria dos casos também iguais ou quase iguais os capitais empregados pelas duas partes no comércio e pelo fato de serem os dois capitais empre gados para produzir as mercadorias nacionais dos dois países iguais ou quase iguais serão a renda e o sustento que a distribuição dessas mercadorias proporcionará aos habitantes dos dois países Essa renda e esse sustento proporcionados mutuamente dessa forma serão maio res ou menores conforme a extensão das transações entre os dois países Se por exemplo elas representarem um montante anual de 100 mil libras ou então 1 milhão de cada lado cada um dos dois países pro porcionará aos habitantes do outro uma renda anual no primeiro caso de 100 mil libras esterlinas e no segundo de 1 milhão Se o comércio entre os dois países for tal que um deles só exporta ao outro mercadorias nacionais ao passo que o segundo só exporta ao primeiro mercadorias estrangeiras ainda nesse caso seria de supor que a balança comercial entre os dois estaria em equilíbrio já que as mercadorias são pagas com mercadorias Os dois estariam ganhando nesse caso mas o ganho não seria igual os habitantes do país que só ADAM SMITH 467 exportasse mercadorias nacionais estaria auferindo a renda máxima do comércio Por exemplo se a Inglaterra só importasse da França mercadorias produzidas por aquele país e não possuindo ela mesma as mercadorias inglesas em falta na França pagasse anualmente suas importações francesas enviando à França grande quantidade de mer cadorias estrangeiras suponhamos fumo e mercadorias das Índias Orientais esse tipo de comércio embora proporcionasse alguma renda aos habitantes dos dois países produziria para os habitantes da França uma renda superior à que produziria para os habitantes da Inglaterra Todo o capital francês empregado anualmente nesse comércio seria anualmente distribuído entre a população da França Ao contrário só seria anualmente distribuída entre a população da Inglaterra a parte do capital inglês empregada em produzir as mercadorias inglesas com as quais foram compradas as referidas mercadorias estrangeiras ex portadas à França A maior parte desse capital inglês reporia os capitais empregados na Virgínia no Industão e na China capitais que pro porcionariam renda e sustento aos habitantes desses longínquos países Por isso se os capitais fossem iguais ou quase iguais esse emprego do capital francês aumentaria muito mais a renda da população fran cesa do que o emprego do capital inglês aumentaria a renda da popu lação da Inglaterra Nesse caso a França estaria efetuando com a Inglaterra um comércio exterior direto para o consumo próprio ao passo que a Inglaterra estaria efetuando um comércio do mesmo tipo com a França mas indireto Ora já explicamos exaustivamente a di ferença de efeitos produzidos por um capital empregado no comércio exterior direto de bens de consumo e os produzidos por um capital empregado no comércio exterior indireto de bens de consumo Na realidade provavelmente não existe entre dois países quaisquer um comércio que consista exclusivamente na troca de mercadorias nacio nais dos dois lados ou exclusivamente na troca de mercadorias nacionais de um lado e de mercadorias estrangeiras do outro Quase todos os países trocam entre si em parte mercadorias nacionais e em parte mer cadorias estrangeiras Ganhará mais sempre o país que exportar o máximo de mercadorias nacionais e o mínimo de mercadorias estrangeiras Se a Inglaterra pagasse as mercadorias anualmente importadas da França não com fumo e mercadorias importadas das Índias Orien tais mas com ouro e prata supõese que nesse caso sua balança comercial ficaria desequilibrada já que as mercadorias importadas da França não seriam pagas com mercadorias mas com ouro e prata E no entanto nesse caso como no precedente tal tipo de comércio geraria alguma renda para os habitantes dos dois países mais para os da França e menos para os da Inglaterra Geraria sim alguma renda para a população da Inglaterra O capital anteriormente empregado para produzir as mercadorias inglesas com as quais se comprou essa quantidade de ouro e prata o capital que fora distribuído a certos habitantes da Inglaterra e lhes proporcionara renda seria reposto com este comércio possibilitandolhe continuar esse emprego O capital total OS ECONOMISTAS 468 da Inglaterra não sofreria com essa exportação de ouro e prata uma diminuição maior do que a que sofreria com a exportação de um valor igual de quaisquer outras mercadorias Ao contrário na maioria dos casos esse capital total aumentaria Não se exportam ao exterior senão mercadorias cuja demanda supostamente é maior no exterior do que no próprio país e cujos retornos conseqüentemente assim se acredita terão mais valor no país do que as mercadorias exportadas Se o fumo que na Inglaterra vale apenas 100 mil esterlinos ao ser exportado à França comprar vinho que na Inglaterra vale 110 mil libras ester linas a troca fará com que o capital da Inglaterra aumente de 10 mil libras Se da mesma forma 100 mil libras de ouro inglês compra vinho francês que na Inglaterra vale 110 mil essa hora irá aumentar igual mente o capital da Inglaterra em 10 mil libras Assim como um co merciante que tem 110 mil esterlinos de vinho em sua adega é mais rico do que o que possui somente 100 mil esterlinos em fumo em seu armazém da mesma forma ele é mais rico do que aquele que só possui 1 000 esterlinos em ouro e prata em seus cofres Ele tem condições de movimentar um volume maior de trabalho e proporcionará renda sustento e emprego a um contingente maior de pessoas do que os dois outros Ora o capital do país é igual à soma dos capitais de todos os seus habitantes e a quantidade de trabalho que o país tem condição de sustentar anualmente é igual ao volume total de trabalho que pode ser mantido pela soma de todos esses capitais individuais Assim ne cessariamente esse tipo de comércio fará geralmente aumentar tanto o capital do país como o volume de trabalho que o país tem condições de sustentar anualmente Sem dúvida seria mais vantajoso para a Inglaterra se ela pudesse comprar os vinhos da França com suas pró prias ferragens e tecidos grosseiros do que com o fumo da Virgínia ou com o ouro e prata do Brasil e do Peru Um comércio exterior direto de bens de consumo sempre traz vantagem maior do que um comércio indireto Entretanto um comércio exterior indireto de bens de consumo efetuado com ouro e prata não parece ser menos vantajoso do que qualquer outro comércio exterior indireto de bens de consumo Analo gamente um país sem minas próprias não tem maior probabilidade de ter exauridas suas reservas de ouro e prata exportando anualmente esses metais do que um país que não cultiva fumo tem probabilidade de esgotar suas reservas de fumo exportando anualmente esse produto Assim como um país que tem com que comprar fumo jamais permanecerá muito tempo em falta dele da mesma forma não permanecerá por muito tempo em falta de ouro e prata um país que tiver com que comprálos Afirmase constituir uma perda o negócio que um trabalhador efetua numa cervejaria dizse outrossim que o comércio que uma nação manufatora efetuasse naturalmente com um país produtor de vinho pode ser considerado uma perda Respondo que o negócio com a cervejaria não acarreta necessariamente uma perda para quem o efetua Em si mesmo tal negócio é tão vantajoso quanto qualquer outro embora talvez esteja um tanto mais sujeito a abusos A ocupação ADAM SMITH 469 de um fabricante de cerveja e mesmo a de um varejista de bebidas fermentadas são divisões de trabalho tão necessárias como quaisquer outras Geralmente será mais vantajoso para um operário comprar do fabricante de cerveja a quantidade de que precisa do que fabricála ele mesmo e se for um operário pobre geralmente lhe será mais van tajoso comprar a cerveja do varejista pouco a pouco do que adquirir uma grande quantidade diretamente do fabricante de cerveja Sem dúvida ele pode comprar demais de ambos como pode comprar demais de qualquer outro comerciante da sua vizinhança por exemplo do açougueiro se for glutão ou do negociante de fazenda se desejar apa recer como um galã entre seus companheiros Entretanto é vantajoso para o grande conjunto de trabalhadores que todos esses tipos de co mércio ou ocupações sejam livres embora todos possam abusar dessa liberdade conquanto talvez o abuso seja maior em uns do que em outros Embora às vezes determinados indivíduos possam arruinar sua sorte consumindo bebidas fermentadas em excesso não parece haver perigo de que tal aconteça com uma nação Ainda que em todo país existam muitas pessoas que gastam mais do que podem com be bidas alcoólicas sempre existem muitas mais que gastam menos Me rece destacarse também que se recorrermos à experiência o baixo preço do vinho não parece ser a causa da embriaguez mas antes da sobriedade Os habitantes dos países produtores de vinho costumam ser as pessoas mais sóbrias da Europa como o testemunham os espa nhóis italianos e os habitantes das províncias do sul da França Ra ramente as pessoas consomem em excesso produtos por elas produzidos em sua faina diária Ninguém se mostra liberal e bom companheiro tendo bebidas alcoólicas em abundância tão baratas quanto uma cer vejinha Ao contrário nos países em que devido ao calor ou ao frio excessivo não há viticultura e onde por conseguinte o vinho é caro e constitui raridade a embriaguez é um vício generalizado como nas nações setentrionais e entre aqueles que vivem nos trópicos os negros por exemplo da costa da Guiné Ouvi muitas vezes dizer que quando um regimento francês vem de algumas províncias setentrionais da França onde o vinho é um pouco mais caro e fica aquartelado nas províncias do sul onde ele é muito barato os soldados de início se entregam a exageros pelo baixo preço e pela novidade do bom vinho entretanto após alguns meses de residência a maior parte deles se torna tão sóbria quanto os demais habitantes Suprimir de uma vez as taxas aduaneiras que gravam os vinhos estrangeiros e os impostos de consumo sobre o malte a cerveja comum e a cerveja inglesa poderia igualmente tornar a embriaguez bastante generalizada e temporária na GrãBretanha entre as classes média e inferior da população a qual porém provavelmente logo seria seguida de uma sobriedade per manente e mais ou menos total Atualmente a embriaguez de forma alguma constitui o vício de pessoas de posição ou daqueles que facil mente podem comprar as mais caras bebidas alcoólicas Dificilmente se tem visto entre nós uma pessoa de posição embriagarse com cerveja OS ECONOMISTAS 470 inglesa Além disso as restrições ao comércio de vinhos na GrãBre tanha não parecem devidamente bem elaboradas para impedir as pes soas de freqüentarem a cervejaria se assim posso me expressar as antes para evitar que freqüentem os lugares em que podem comprar a melhor bebida e a mais barata Favorecem o comércio de vinhos com Portugal e desestimulam o comércio de vinhos com a França Efetiva mente afirmase que os portugueses são melhores clientes para os nossos manufaturados do que os franceses devendo portanto ser esti mulados de preferência aos franceses Afirmase que da mesma ma neira que os portugueses nos tratam assim devemos tratálos Dessa forma os artifícios astuciosos de comerciantes subalternos são trans formados em máximas políticas para a conduta de um grande império com efeito são somente os comerciantes mais subalternos que trans formam em regra utilizar os serviços principalmente de seus próprios clientes Um grande comerciante sempre compra suas mercadorias onde elas são mais baratas e melhores sem atender a pequenos interesses desse gênero Foi por meio de tais máximas contudo que se ensinou às nações que seu interesse consiste em mendigar junto a todos os seus vizinhos Fezse com que cada nação olhe com inveja para a prosperidade de todas as nações com as quais comercializa e considere o ganho dessas nações como uma perda para ela mesma O comércio que deveria naturalmente ser entre as nações como entre os indivíduos um traço de união e de amizade transformouse na mais fecunda fonte de discórdia e de animo sidade A ambição extravagante de reis e ministros durante o século atual e o passado não tem sido mais fatal para a tranqüilidade da Europa do que a inveja impertinente dos comerciantes e dos manufatores A vio lência e a injustiça dos governantes da humanidade constitui um mal antigo para o qual receio que a natureza dos negócios humanos dificilmente encontre um remédio Entretanto embora talvez não se possa corrigir a vil capacidade e o espírito monopolizador dos comerciantes e dos manu fatores que não são nem deveriam ser os governantes da humanidade podese com muita facilidade impedilos de perturbar a tranqüilidade de pessoas que não sejam eles mesmos Não cabe dúvida de que foi o espírito de monopólio que original mente inventou e propagou essa teoria e os primeiros que a ensinaram de forma alguma eram tão insensatos como os que nela acreditaram Em cada país sempre é e deve ser de interesse do grande conjunto da população comprar tudo o que quiser daqueles que vendem a preço mais baixo A proposição é de tal evidência que parece ridículo em penharse em demonstrála e ela jamais poderia ter sido questionada se os sofismas interesseiros dos comerciantes e dos manufatores não tivessem confundido o senso comum da humanidade Sob este aspecto o interesse deles é diretamente oposto ao do grande conjunto da po pulação Assim como é interesse dos homens livres de uma corporação impedir os demais habitantes de empregar outros trabalhadores afora eles mesmos da mesma forma é do interesse dos comerciantes e dos ADAM SMITH 471 manufatores de cada país assegurar para si mesmos o monopólio do mercado interno Daí na GrãBretanha e na maioria dos demais países europeus os direitos descomunais exigidos de quase todas as merca dorias importadas por comerciantes estrangeiros Daí os elevados di reitos e proibições impostas a todas as manufaturas estrangeiras que podem vir a concorrer com as nossas próprias mercadorias Daí também as pesadas restrições impostas à importação de quase todos os tipos de mercadorias dos países em relação aos quais se supõe ser desfavo rável a balança comercial ou seja dos países contra os quais a ani mosidade nacional é mais inflamada No entanto a riqueza de uma nação vizinha embora seja perigosa na guerra e na política certamente é vantajosa para o comércio Em estado de hostilidade essa riqueza dos vizinhos pode possibilitar aos nossos inimigos manterem esquadras e exércitos superiores aos nossos mas em estado de paz e de comércio essa riqueza também pode pos sibilitarlhes trocar conosco um valor maior de mercadorias e propor cionarnos um mercado melhor seja para a produção direta do nosso próprio país seja para tudo aquilo que se compra com essa produção Assim como uma pessoa rica provavelmente será um cliente melhor para as pessoas operosas de sua vizinhança do que uma pessoa pobre o mesmo acontece com uma nação rica Com efeito um indivíduo rico se for um manufator constitui um vizinho muito perigoso para todos os que comerciam da mesma maneira Todavia todos os demais vizinhos que constituem a grande maioria tiram proveito do bom mercado que os gastos do rico lhes proporcionaram Eles tiram proveito até mesmo vendendo a preço mais baixo que os trabalhadores mais pobres que negociam do mesmo modo que ele Da mesma forma os manufa tores de uma nação rica podem sem dúvida ser rivais muito perigosos para os de seus vizinhos Entretanto essa própria concorrência é van tajosa para a maioria da população que além disso tira grande proveito do bom mercado que os grandes gastos de tal nação rica lhe proporciona de qualquer outra forma As pessoas particulares que desejam fazer fortuna nunca pensam em dirigirse às províncias longínquas e pobres do país antes vão para a capital ou para alguma das grandes cidades comerciais Sabem que onde circula pouca riqueza pouco podem con seguir mas que onde se movimenta uma grande riqueza têm condições de partilhar de parte dela Assim as mesmas regras que devem dirigir o senso comum de um de dez ou de vinte indivíduos devem orientar o julgamento de um de dez ou de vinte milhões e fazer com que uma nação inteira veja as riquezas de seus vizinhos como uma provável causa e oportunidade para ela mesma adquirir riquezas Uma nação que se enriquecesse com o comércio externo certamente teria maior probabilidade de se enriquecer quando seus vizinhos são todos nações ricas operosas e comerciantes Uma grande nação cercada de todos os lados por selvagens nômades e pobres bárbaros certamente poderia adquirir riquezas com o cultivo de suas próprias terras e com seu próprio comércio interno mas não com o comércio externo Parece ter OS ECONOMISTAS 472 sido dessa forma que os antigos egípcios e os modernos chineses ad quiriram sua grande riqueza Segundo se diz os antigos egípcios ne gligenciavam o comércio exterior e os chineses modernos como se sabe o desprezam ao máximo e dificilmente se dignam a darlhe a proteção conveniente das leis As modernas regras do comércio exterior ao visarem ao empobrecimento de todos os nossos vizinhos longe de conseguirem o efeito desejado tendem a tornar esse comércio exterior insignificante e desprezível Foi em conseqüência dessas regras que o comércio entre a França e a Inglaterra nos dois países tem estado sujeito a tantos desestímulos e tantas restrições Entretanto se esses dois países considerassem seu interesse real sem rivalidade nem animosidade nacional o comércio da França poderia ser mais vantajoso para a GrãBretanha do que o de qualquer outra nação e pela mesma razão o mesmo aconteceria com o comércio britânico em relação à França A França é o vizinho mais próximo da GrãBretanha No comércio entre a costa meridional da Inglaterra e as costas setentrional e noroeste da França poderse iam conseguir retornos da mesma forma que no comércio interno qua tro cinco ou seis vezes por ano Por conseguinte o capital empregado nesse comércio poderia em cada uma das duas nações movimentar quatro cinco ou seis vezes o volume de trabalho proporcionando em prego e subsistência quatro cinco ou seis vezes o contingente de pessoas em relação ao que poderia movimentar um capital igual empregado na maior parte dos outros setores de comércio exterior Entre as regiões francesas e britânicas mais afastadas entre si poderseiam esperar retornos no mínimo uma vez por ano e mesmo esse comércio sob tal aspecto daria no mínimo a mesma vantagem que a maior parte dos demais setores do nosso comércio externo europeu Esse comércio seria no mínimo três vezes mais rentável do que o tão decantado comércio com as nossas colônias norteamericanas onde o retorno raramente demora menos de três anos e muitas vezes requer no mínimo quatro ou cinco anos Além disso a França tem ao que se supõe uma população de 24 milhões de habitantes Nossas colônias norteamericanas nunca tiveram ao que se calcula mais do que três milhões E a França é um país muito mais rico do que a América do Norte embora devido à maior desigualdade no tocante à distribuição das riquezas exista muito mais pobreza e mendicância na França do que na América do Norte Por isso a França poderia oferecer um mercado no mínimo oito vezes mais amplo e em razão da freqüência maior dos retornos um mercado 24 vezes mais vantajoso do que o mercado que as nossas colônias norteamericanas jamais nos conseguiram oferecer Igualmente vantajoso para a França seria o comércio com a GrãBretanha e em proporção com a riqueza a população e a proximidade dos dois países o comércio da França com a GrãBretanha teria exatamente a mesma superioridade sobre o comércio que a França mantém com suas pró prias colônias Tal é a enorme diferença existente entre esse comércio que o bom senso das duas nações considerou conveniente deses ADAM SMITH 473 timular e o comércio atualmente existente que as duas nações o têm favorecido ao máximo Ora exatamente as mesmas circunstâncias que teriam tornado tão vantajoso para as duas nações um comércio aberto e livre entre elas têm constituído os obstáculos principais para esse comércio Sendo vizinhas a GrãBretanha e a França são necessariamente inimigas entre si e por esse motivo a riqueza e o poder de cada uma delas se tornam tanto mais temíveis à outra e aquilo que poderia aumentar a vantagem da amizade nacional serve apenas para inflamar a violência da animosidade nacional Tratase de duas nações ricas e operosas e os comerciantes e os manufatores de cada uma delas têm medo da concorrência da habilidade e da atividade dos comerciantes e dos ma nufatores da outra Excitase com isto a rivalidade mercantil infla mando pela violência a animosidade nacional e sendo por ela inflamada E os comerciantes dos dois países anunciaram com toda a apaixonada confiança da falsidade interesseira a certeza da ruína de cada uma delas em conseqüência dessa balança comercial desfavorável que se gundo alegam constituiria o efeito infalível de um comércio sem res trições entre as duas Não existe nenhum país comercial europeu cuja ruína iminente não tenha sido muitas vezes predita pelos pretensos doutores desse sistema mercantil como decorrência de uma balança comercial desfa vorável No entanto depois de todas as preocupações e temores que levantaram em torno desse assunto depois de todas as tentativas vãs por parte de quase todas as nações comerciais no sentido de fazer com que essa balança comercial lhes fosse favorável e desfavorável a seus vizinhos não há sinais de que alguma nação européia sob qualquer aspecto tenha empobrecido por esse motivo Ao contrário cada cidade e cada país na medida em que abriram seus portos a todas as nações ao invés de serem arruinados por esse comércio livre como nos induziriam a crer os princípios do sistema comercial enriquece ram com isso De fato ainda que haja na Europa algumas cidades que sob alguns aspectos mereçam o nome de portos livres não há nenhum país em que exista tal liberdade de comércio A Holanda é talvez o país que mais próximo está dessa prática embora ainda bem longe dela ora reconhecese que a Holanda aufere do comércio exterior não somente toda a sua riqueza como também grande parte de sua subsistência Na verdade há uma outra balança que já foi explicada e que é muito diferente da balança comercial esta sim conforme for favorável ou desfavorável necessariamente gera a prosperidade ou o declínio de uma nação É a balança de produção e consumo anuais Já observei que se o valor de troca da produção anual superar o valor de troca do consumo anual o capital da sociedade deve aumentar proporcio nalmente a esse excedente Nesse caso a sociedade vive nos limites de sua renda e o que anualmente se economiza dessa renda é natu ralmente acrescentado a seu capital e empregado para aumentar ainda OS ECONOMISTAS 474 mais a produção anual Ao contrário se o valor de troca da produção anual for inferior ao consumo anual o capital da sociedade deve di minuir anualmente em proporção a essa diferença ou insuficiência Neste caso a despesa da sociedade supera sua renda interferindo for çosamente em seu capital Por isso seu capital necessariamente dimi nui e juntamente com ele o valor de troca da produção anual de sua atividade Essa balança de produção e consumo é totalmente diferente da assim chamada balança comercial Ela poderia ocorrer em uma nação que não tivesse nenhum comércio exterior mas estivesse totalmente separada do resto do mundo Ela pode ocorrer no mundo inteiro cuja riqueza população e desenvolvimento podem estar gradualmente au mentando ou gradualmente declinando A balança de produção e con sumo pode ser constantemente favorável a uma nação ainda que a chamada balança comercial lhe seja geralmente contrária É possível a uma nação importar um valor superior ao que exporta e isso talvez durante meio século contínuo é possível que o ouro e a prata que entram nesse país durante todo esse tempo sejam imediatamente en viados para fora sua moeda circulante pode diminuir gradualmente sendo substituída por diversos tipos de papelmoeda podem até au mentar gradualmente dívidas que o país contrai junto às principais nações com as quais comercializa não obstante isso a riqueza real desse país o valor de troca da produção anual de suas terras e de seu trabalho podem durante esse mesmo período ter aumentado em uma proporção muito maior A situação das nossas colônias norteamerica nas e do comércio que efetuavam com a GrãBretanha antes do início dos atuais distúrbios pode servir como prova de que isso de forma alguma representa uma suposição impossível ADAM SMITH 475 ÍNDICE Apresentação de Winston Fritsch 5 A RIQUEZA DAS NAÇÕES Introdução de Edwin Cannan 23 Introdução e Plano da Obra 59 LIVRO PRIMEIRO As Causas do Aprimoramento das Forças Produtivas do Trabalho e a Ordem Segundo a qual sua Produção é Naturalmente Distribuída Entre as Diversas Categorias do Povo 63 CAP I A Divisão do Trabalho 65 CAP II O Princípio que Dá Origem à Divisão do Trabalho 73 CAP III A Divisão do Trabalho Limitada pela Extensão do Mercado 77 CAP IV A Origem e o Uso do Dinheiro 81 CAP V O Preço Real e o Preço Nominal das Mercadorias ou seu Preço em Trabalho e seu Preço em Dinheiro 87 CAP VI Fatores que Compõem o Preço das Mercadorias 101 CAP VII O Preço Natural e o Preço de Mercado das Merca dorias 109 CAP VIII Os Salários do Trabalho 117 CAP IX Os Lucros do Capital 137 CAP X Os Salários e o Lucro nos Diversos Empregos de Mão deObra e de Capital 147 Parte Primeira Desigualdades decorrentes da natureza dos próprios empregos 147 Parte Segunda Desigualdades oriundas da política na Europa 164 CAP XI A Renda da Terra 185 477 Parte Primeira Os produtos da terra que sempre propor cionam renda 187 Parte Segunda O produto da terra que às vezes propor porciona renda e às vezes não 200 Parte Terceira As variações na proporção entre os res pectivos valores daqueles tipos de produto que sempre proporcionam renda e daqueles tipos de produto que às vezes geram renda e às vezes não 212 Digressão sobre as variações de valor da prata no decurso dos quatro últimos séculos 213 Primeiro Período 213 Segundo Período 225 Terceiro Período 226 Variações na proporção entre os valores respectivos do ouro e da prata 240 Fundamentos para suspeitar que o valor da prata continua a decrescer 244 Efeitos diferentes do avanço do desenvolvimento sobre três dife rentes tipos de produtos naturais 244 Primeiro tipo de produto 245 Segundo tipo de produto 246 Terceiro tipo de produto 254 Conclusão da digressão sobre as variações do valor da prata 262 Efeitos do avanço do desenvolvimento sobre o preço real dos ma nufaturados 267 Conclusão do capítulo 270 LIVRO SEGUNDO A Natureza o Acúmulo e o Emprego do Capital 283 Introdução 285 CAP I A Divisão do Capital 287 CAP II O Dinheiro Considerado como um Setor Específico do Capital Geral da Sociedade ou seja a Despesa da Ma nutenção do Capital Nacional 295 CAP III A Acumulação de Capital ou o Trabalho Produtivo e o Improdutivo 333 CAP IV O Dinheiro Emprestado a Juros 349 CAP V Os Diversos Empregos de Capitais 357 OS ECONOMISTAS 478 LIVRO TERCEIRO A Diversidade do Progresso da Riqueza nas Diferentes Nações 371 CAP I O Progresso Natural da Riqueza 373 CAP II O Desestímulo à Agricultura no Antigo Estágio da Europa após a Queda do Império Romano 379 CAP III A Ascensão e o Progresso das Metrópoles e Cidades após a Queda do Império Romano 389 CAP IV De que Maneira o Comércio das Cidades Contribuiu para o Progresso do Campo 399 LIVRO QUARTO Sistemas de Economia Política 411 Introdução 413 CAP I O Princípio do Sistema Comercial ou Mercantil 415 CAP II Restrições à Importação de Mercadorias Estrangeiras que Podem Ser Produzidas no Próprio País 435 CAP III As Restrições Extraordinárias à Importação de Mer cadorias de Quase Todos os Tipos dos Países com os Quais a Balança Comercial É Supostamente Desfavorável 453 Parte Primeira A irracionalidade dessas restrições mesmo com base nos princípios do sistema comercial 453 Digressão sobre os bancos de depósito especialmente sobre o de Amsterdam 458 Parte Segunda A irracionalidade dessas restrições ex traordinárias com base em outros princípios 466 ADAM SMITH 479