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João Fragoso Maria de Fátima Gouvêa Organizadores Na Trama das Redes Política e negócios no império português séculos XVIXVIII CIVIIIZAÇÃO 8RASII4tIRA Rio de Janeiro 2010 r t 1 I 4 i A Vitorino Magalhães Godinho Para os nossos alunos de graduação e pósgraduação COPYRIGHT O 2010 João Fragoso e herdeiro de Maria de Fátima Gouvêa PROJETO GRÁFICO DE MIOLO Evelyn Grumach e João de Souza Leite DIAGRAMAÇÃO DE MIOLO Abreu s System CIP Brasil Catalogaçãonafonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros RJ N 11 Na trama das redes política e negócios no império português séculos XVIXVIII I organizadores João Fragoso e Maria de Fátima Gouvêa Rio de Janeiro Civilização Brasileira 2010 ISBN 9788520008454 1 Brasil História Período Colonial 15 001822 2 Portugal Colônias América História 3 Portugal Colônias História 4 Rede de relações sociais I Fragoso João 11 Gouvêa Maria de Fátima 19582009 100758 CDD 98103 Todos os direitos reservados Proibida a reprodução armazenamento ou transmissão de partes deste livro através de quaisquer meios sem prévia autorização por escrito Texto revisado segundo o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa Direitos desta edição adquiridos pela EDITORA CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA Um selo da EDITORA JOSÉ OLYMPIO LTDA Rua Argentina 171 20921380 Rio de Janeiro RJ Tel 25852000 Seja um leitor preferencial Record Cadastrese e receba informações sobre nossos lançamentos e nossas promoções Atendimento e venda direta ao leitor mdiretorecordcombr ou 21 25852002 Impresso no Brasil 2010 cAPiTULO 11 Tradições de governança consensual na construção da jurisdição do Estado nos impérios europeus da Epoca Moderna na érica Jack P Greene i Texto traduzido do inglês por Thadeus Blanchet I Professor emérito em Humanidades do Departamento de História da Universida de johns Hopkins l 1 l I i I I Em tudo exceto no comércio exterior observou Adam Smith em 1776 considerando as causas do rápido desenvolvimento de novas socie dades coloniais em Wealth ofNations A riqueza das nações a liberdade dos colonos ingleses é total E em todos os aspectos igual à dos concida dãos em seu país de origem e lhes é assegurada da mesma forma por uma assembleia de representantes do povo O governo das colônias inglesas observou ele é talvez o único que desde que o mundo come çou podia dar perfeita segurança aos habitantes de uma província tão distante 1 Nesses trechos Smith chamounos a atenção para a caracterís tica mais significativa dos primeiros anos da governança colonial inglesa moderna a transferência de instituições parlamentares para a Irlanda e para a América Aonde quer que colonos ingleses tenham ido em gran des números as instituições políticas e legais inglesas os acompanharam Na época em que Smith escreveu e na época em que treze das colônias americanas pertencentes à GrãBretanha se separaram do império britâ nico em 1783 essa prática era parte tão fundamental da colonização britânica no alémmar que era virtualmente impensável que qualquer co munidade política com um número expressivo de proprietários britâni cos pudesse operar sem instituições representativas britânicas Durante o século XIX assentamentos de colonos no Canadá na Aus trália na Nova Zelândia e na África do Sul rotineiramente estabeleciam tais instituições e no século XX também estabeleciam instituições desse tipo até mesmo sociedades que não fossem de colonos com pequenos 97 núcleos treinados de funcionários políticos e militares britânicos dirigin do grandes populações nativas o que certamente é um dos legados mais duradouros da colonização britânica no alémmar Como por que e por quem foram estabelecidas as fundações desse legado na América colonial britânica durante o começo da Era Moderna são os assuntos sobre os quais versa este artigo As observações de Smith poderiam ser entendidas como se sugerissem que a transferência de instituições parlamentares para as colônias fazia parte de algum planejamento maior feito às vésperas da colonização com o objetivo de replicar a comunidade política inglesa com sua divisão de jurisdição entre a coroa e um parlamento de câmaras alta e baixa Mas essa sugestão pouco se assemelha ao que de fato ocorreu Como Edmund Burke observou em 1757 em seu estudo em dois volumes pouco valori zado dos primeiros duzentos e cinquenta anos da ocupação europeia das Américas nenhum vestígio de um espírito legislativo e abrangente apa rece no planejamento de nossas colônias Ao invés disso observou ele com franqueza o assentamento de nossas colônias nunca seguiu um planejamento regular mas elas se formaram cresceram e floresceram obedecendo ao acaso dependendo de acidentes da natureza do clima e da iniciativa isolada de certos indivíduos 2 As observações de Burke descrevem de forma precisa a natureza ad hoc do processo que os ingleses usaram para implantar colônias na América du rante os três primeiros quartéis do século XVII não tendo sido a experiên cia da Inglaterra de forma alguma extraordinária No começo da era da colonização moderna nenhum dos Estadosnação emergentes da Europa tinha quer os recursos coercitivos necessários para estabelecerem sua hege monia em partes do Novo Mundo quer os meios para mobilizar aqueles recursos Como consequência durante os primeiros estágios da coloniza ção qualquer Estadonação que contemplasse empreendimentos de risco no ultramar delegava a tarefa a grupos particulares organizados em compa nhias de comércio autorizadas ou a pessoas influentes Para obterem tal au torização da coroa e na expectativa de conseguirem vantagens econômicas e sociais expressivas esses aventureiros concordavam em se responsabili zar pelas pesadas despesas decorrentes da fundação defesa e apoio aos for tes da ocupação europeia na América Em verdade os soberanos europeus davam a esses agentes particulares licenças com amplos poderes para opera rem em domínios sobre os quais o poder do Estado era bem tênue e nao 98 I I I I I I i I TRADIÇOES DE GOVERNANÇA CONSENSUAL r exercia um controle efetivo muito menos autoridade sobre os habitantes indígenas Se esse jogo fosse bemsucedido os soberanos europeus assegu ravam ao menos uma jurisdição mínima sobre as populações e os territó rios americanos com um custo mínimo para o Tesouro real Alguns desses primeiros agentes particulares do imperialismo euro peu em especial as companhias de comércio operando sob a égide dos portugueses e holandeses tiveram bastante sucesso ao estabelecer ba ses operacionais comerciais para explorar o potencial econômico do Novo Mundo No entanto a menos que eles encontrassem ricos impé rios nativos ricos depósitos minerais ou uma abundância de mão de obra nativa o que aconteceu em larga escala somente no México e no Peru poucos aventureiros particulares possuíam os recursos ne cessários para sustentar por mais do que um curto período os altos custos de colonização administração e desenvolvimento de uma colô nia Logo a maioria viuse forçada a procurar ajuda e contribuições dos colonos negociantes e outros indivíduos participantes do processo de colonização O empenho em recrutar tal tipo de cooperação acarretava o reconhe cimento de que o processo de estabelecimento de centros efetivos de po der europeu na América era frequentemente mais o resultado do esfor ço dos muitos grupos e indivíduos que tomaram posse efetiva da terra do que o resultado de atividades dos organizadores das colônias ou seus li cenciados Tais grupos e indivíduos construíram propriedades e negócios e transformaram cenários indígenas em cenários ao menos parcialmente europeus construídos e administrados por meio de um sistema viável de organização econômica criando cidades ou outras unidades políticas Subjugaram transformaram em mão de obra barata mataram ou expul saram os habitantes autóctones Para compensar a escassez de recursos econômicos milhares de europeus por sua diligência e iniciativa cria ram espaços sociais para si mesmos e suas famílias na América angarian do assim para si próprios status capital e poder Durante o princípio da Era Moderna os participantes individuais e independentes do processo de colonização das novas Américas europeias estavam dessa forma engajados em um processo profundo e generaliza do de autocapacitação tanto individual como corporativa Na Europa da Época Moderna somente uma pequena fração da população masculina conseguia sair de um estado de dependência socioeconômica para alcan 99 çar a competência cívica ou seja o pleno direito de ter voz em decisões políticas que era a prerrogativa dos proprietários independentes Em contraste com essa situação como uma consequência de fácil disponibili dade de terra ou outros recursos uma grande proporção dos colonos adultos brancos adquiriu terra ou outros recursos construiu proprieda des e alcançou independência pessoal Esse desenvolvimento gerou fortes reivindicações por parte das gran des populações de colonos fortalecidos de que fossem estendidos às co lônias os mesmos direitos de segurança ou propriedade e participação cí vica que cabiam aos proprietários independentes e detentores de poderes e alto status nas comunidades políticas de onde eles haviam emigrado Na visão deles a governança colonial não menos que a governança metro politana deveria garantir que homens de sua reputação não seriam go vernados sem consulta ou de forma patentemente contrária a seus inte resses Somadas à grande distância das colônias em relação à Europa essas circunstâncias impeliram aqueles que eram nominalmente respon sáveis pelas colônias ao estabelecimento e tolerância de estruturas políti cas que envolviam consultas e até mesmo pedidos formais de autorização a colonos locais As consultas significavam que as populações locais iriam com mais boa vontade tanto reconhecer a legitimidade da jurisdição das agências particulares de colonização como contribuir para os custos lo cais Os primeiros estágios de colonização resultaram assim no surgi mento de novas fronteiras coloniais de muitos centros novos e relativa mente autônomos do poder europeu que estavam na realidade sob o controle local Esses centros eram invariavelmente reflexos dos mundos europeus de onde se originavam os colonizadores Querendo criar ramificações do Velho Mundo no Novo os grandes números de emigrantes para as colô nias insistiam em trazer suas leis e instituições com eles transformando as nos alicerces das novas sociedades que almejavam criar Para essas so ciedades as leis e instituições funcionavam como algo concomitante à emigração Tais leis e instituições não eram como observado por um es tudioso impostas aos povoadores mas antes exigidas por eles 3 Elas serviam como um sinal vívido e simbolicamente poderoso das aspirações mais profundas dos emigrantes para que mantivessem em seus novos lu gares de moradia suas identidades como meffibros das sociedades euro peias às quais eles estavam ligados Tais identidades a seus olhos estabe 100 I TRADIÇÕES DE GOVERNANÇA CONSENSUAL Ieciam sua superioridade em relação ao povo aparentemente inculto e rude que eles procuravam desapropriar além de os distinguirem dles As colônias inglesas estabelecidas na América do Norte nas Indias Ocidentais e nas ilhas atlânticas de Bermuda e das Bahamas dãonos um estudo de casos de como esse processo funcionava Entre os principais componentes da identidade emergente dos ingleses na Inglaterra do iní cio da Era Moderna o protestantismo e cada vez mais durante o século XVIII o lento e crescente poderio comercial e estratégico da nação ingle sa eram ambos importantes Bem mais significativos no entanto eram os sistemas de lei e liberdade que segundo consenso de muitos observado res tanto contemporâneos ingleses como estrangeiros distinguiam o povo inglês de todos os outros povos da face da Terra4 A jactância orgu lhosa dos ingleses era que por uma gama de conquistas e levantes eles tinham sido capazes em marcante contraste com a maioria das outras so ciedades políticas da Europa de manter sua identidade como um povo li vre que tinha assegurado sua liberdade pela consagração do que mais tarde analistas identificaram como o império da lei Uma antiga tradição do discurso político de jurisprudência sustentava essa consagração Enfatizando o papel da lei como uma limitação ao po der da coroa essa tradição estava enraizada em escritos anteriores como o De laudibus legum Angliae de Sir John Fortescue escrito durante o sé culo XV mas não publicado até 1616 e vários dos mais famosos juízes e estudiosos da jurisprudência do princípio do século XVII incluindo Sir Edward Coke Sir john Davies e Nathaniel Bacon discorreram de forma abrangente sobre essa tradição em uma série de trabalhos importantes Escrevendo em uma época em que exceto nos Países Baixos toda grande nação europeia deslizava ao absolutismo e os dois primeiros reis da di nastia Stuart pareciam estar tentando ampliar as prerrogativas da coroa e até mesmo talvez eliminar os parlamentos na Inglaterra esses primeiros jurisprudentes estavam bastante ansiosos para erigir restrições legais e constitucionais que assegurassem estabilidade de vida liberdade e pro priedade contra tais extensões do poder real5 Essa tradição de jurisprudência emergente baseavase em uma dis tinção já integralmente elaborada por Fortescue entre duas espécies fundamentalmente distintas de monarquia o que Fortescue denominou monarquia real e monarquia política Enquanto em uma monarquia real como na França O que agradava ao príncipe como escreveu 101 Fortescue tinha a força da lei em uma monarquia política como na Inglaterra o poder real era restrito pela lei política Obrigados por seus juramentos da coroação à observância das leis inglesas os reis in gleses não podiam nem mudar as leis ao seu belprazer nem fazer novas leis sem o consentimento de seus súditos O resultado feliz desse sistema de acordo com Fortescue foi que o povo inglês em con traste com seus vizinhos era governado por leis com as quais ele havia concordado e como Coke e outros escritores observaram isso era ver dade tanto em relação ao direito consuetudinário o qual as pessoas acatavam por uso prolongado e costume quanto em referência às leis estatutárias aprovadas pelo parlamento para o qual eles enviavam seus representantes 6 Com uma grande variedade de outros escritores políticos contempo râneos os expoentes da tradição da jurisprudência inglesa concordaram que a afortunada capacidade de o povo inglês preservar sua liberdade se apoiava em grande parte em duas instituições para determinar e fazer a lei os tribunais e o parlamento Garantindo que nenhum caso legal viesse a ser determinado exceto pelo veredicto de seus pares ou iguais seu próximos e aqueles de sua condição escreveu o jornalista político libe ral Henry Care os tribunais davam a todas as pessoas um quinhão na parte executiva da lei Por sua vez ao dar a cada pessoa independente através de seus representantes escolhidos uma parte no Poder Legis lativo o parlamento assegurava que nenhuma lei seria aprovada sem o consentimento dos possuidores de bens da nação Esses dois grandes pi lares da liberdade inglesa declarou Care parafraseando Coke davam aos ingleses uma herança maior do que aquela que eles jamais recebe ram de seus progenitores imediatos Assim para os ingleses a liberda de não era somente uma condição exigida pela lei mas sim a própria es sência de sua identidade nacional emergente 7 Para os ingleses migrando para o ultramar a fim de formarem novas comunidades de povoação a capacidade de usufruírem de possuírem o sistema inglês de lei e liberdade foi dessa forma crucial para sua ha bilidade de manterem sua identidade como ingleses e para continuarem a se achar e a ser considerados ingleses Por essa razão e também porque eles consideravam os sistemas legal e constitucional inglês a melhor for ma de preservação das propriedades que eles esperavam adquirir em seus novos lares é pouco surpreendente que ao estabelecer enclaves locais de 102 TRADIÇ0ES DE GOVERNANÇA CONSENSUAL poder durante os primeiros anos de colonização os colonos ingleses por toda a América fizeram todo o esforço possível para construílos com base nas fundações legais inglesas Como o historiador de leis George Dargo observou a tentativa de estabelecer a lei inglesa e os direitos e li berdades dos ingleses foi constante do primeiro povoado até a revolução americana e depois disso 8 Não obstante como Yunlong Man mostrou em seu cuidadoso estudo do primeiro meio século de desenvolvimento das instituições políticas provinciais nas cinco mais bemsucedidas colônias da Inglaterra as auto ridades inglesas não anteciparam o surgimento dessas exigências quando tentaram criar um modo de governança para as colônias Durante a pri meira metade do século XVII os anos formativos das comunidades polí ticas coloniais na opinião de Man as autoridades inglesas nunca deli nearam ou mesmo conceberam um sistema pelo qual a governança colonial seria modelada segundo o governo nacional da Inglaterra Em vez disso eles permaneceram leais a uma forma conciliatória de gover nança colonial do tipo planejado para a Virgínia durante seus primeiros anos de colonização Essa forma de governança consistia na indicação de um governador e conselheiros e não incluía mecanismos formais para consulta à população em geral e eles continuaram por várias décadas a pensar nessa forma conciliatória como a norma para a governança colo nial inglesa 9 No entanto vários desdobramentos durante os estágios iniciais do processo de colonização encorajaram a criação de um componente repre sentativo nas constituições coloniais emergentes Para atrair povoadores os organizadores das colônias logo descobriram que eles tinham de lhes oferecer não somente propriedades em forma de terra mas também ga rantir a eles a propriedade por meio de direitos da mesma forma que os ingleses tinham suas posses materiais tradicionalmente asseguradas As sim em 1619 a Companhia da Virgínia de Londres achou necessário criar uma comunidade política que incluísse uma assembleia representa tiva através da qual os povoadores pudessem na forma tradicional dos ingleses fazer e aprovar formalmente as leis que regiam suas vidas Di rigidas por líderes da companhia para imitar e seguir a política da forma de governo leis costumes maneira de julgamentos e outros processos jurídicos usados no reino da Inglaterra a nova assembleia o primeiro organismo dessa natureza no ainda pequeno mundo a111ericano perten 103 cente à Inglaterra imediatamente tomou a si o direito de consentir a to dos os impostos arrecadados dos habitantes da Virginia10 j Os instrumentos legais da colonização inglesa cartas patentes car l tas constitucionais proclamações encorajaram essa tentativa de três formas Primeiramente eles frequentemente especificavam que os povoa dores e seus descendentes deveriam ser tratados como súditos naturais da Inglaterra e portanto sugeriam com veemência que não haveria dis tinções legais entre os ingleses que viviam na terra natal e aqueles que sidiam nas colônias Em segundo lugar eles exigiam que as colônias não obedecessem a quaisquer leis repugnantes às Leis Estatutos Costum e Direitos do Nosso Reino da Inglaterra e assim sugeriam fortemen que as leis da Inglaterra serviam de modelo e de padrão para todas as I das colônias Em terceiro lugar a começar pela carta constitucional Maryland em 1632 eles também estipulavam que as colônias dev usar e usufruir todos os Privilégios Direitos de Voto e Liberdades de Nosso Reino da Inglaterra livre sossegada e pacificamente para ter possuir da mesma forma que nossos vassalos natos ou para lio4 wo dentro de nosso dito Reino da Inglaterra sem Obstáculo Sofrimen f Mautrato Denúncia ou Motivo de Queixa e que nenhuma lei aprovada sem o consentimento dos homens livres da colônia 11 1 Em não mais de vinte anos depois da fundação de uma colônia e fre quentemente muito antes disso essas condições e avanços encorajavam o estabelecimento de instituições representativas Entre aproximadamen 1620 e 1660 toda colônia americana com um número expressivo de po voadores adotou algum tipo de assembleia eleita para aprovar leis as comunidades políticas que eles estavam criando Virgínia e Bermu t na década de 1620 Massachusetts Bay Maryland Connecticut Plymou th New Haven e Barbados na década de 1630 St Kitts Antigua e Rho de Island na década de 1640 Montserrat e Nevis na década de 1650 Até o ano de 1660 todas as treze colônias nas Américas já possuíam as sembleias representativas em funcionamento Da Nova Inglaterra a Bar bados a América inglesa colonial provou ser um campo extraordinaria mente fértil para a governança parlamentar12 Até mesmo em situações nas quais funcionários das companhias oi proprietários tomaram a iniciativa de estabelecer os primeiros corpos legi lati vos como foi o caso com a Virgínia Bermuda e Maryland os órgãos representativos nunca agiam como os empregados passivos e peticioná 104 TRADIÇÕES DE GOVERNANÇA CONSENSUAL rios de prerrogativas como tinha sido o caso com a Câmara dos Comuns no período medieval Muito pelo contrário historiadores modernos têm ficado impressionados ao constatar a eficiência e espírito de reivindica ção desses grupos Geralmente a partir de suas primeiras reuniões no tou Michael Kammen eles agiam como os portavozes dinâmicos dos as sentamentos que proliferavam dentro das colônias Exigindo os direitos de seus constituintes aos princípios tradicionais ingleses de governança con sensual eles insistiram desde o começo que não seriam criados leis ou im postos sem o seu consentimento exigiram uma participação na legislação e se transformaram em altas cortes de apelo e jurisdição original na forma da Câmara dos Comuns da época medieval além de raramente fugir aos conflitos com executivos locais proprietários ou com a coroa13 Em verdade demorou cerca de vinte anos para que esses órgãos se materializassem se estabilizassem e tomassem forma definitiva em cada colônia Durante os primeiros anos não atuaram geralmente como um órgão separado reuniramse com o conselho consultivo do governador ou até mesmo com o governador em pessoa para ouvir casos e aprovar leis 14 Mas eles logo se encaminharam para atingir independência do Exe cutivo e por volta da década de 1640 as colônias maiores Virgínia em 1643 Massachusetts Bay em 1644 Maryland em 1650 e Barbados em 1652 haviam decidido cada qual por iniciativa própria adotar uma legislatura de duas câmaras com a câmara mais baixa se reunindo sepa radamente do governador e do conselho Exigências locais não imitação impulsionaram essa iniciativa Em todos os casos a forma específica de uma comunidade política provincial foi o produto do que Yunlong Man chama de uma invenção nativa Alguns governadores provinciais popu lares como Sir Williarn Berkeley em Virgínia e Philip Bell em Barbados incentivaram tais iniciativas mas ao fazêlo invariavelmente estavam apenas consolidando as estruturas políticas anteriormente planejadas pe los líderes locais emergentes e ao mesmo tempo aceitando que a capaci dade de governar na formulação de Man obrigava coroa companhia ou proprietário ao reconhecimento das estruturas locais do governo co lonial que haviam surgido a partir das condições existentes na colônia Por sua vez a coroa permanecia suspeitosa do governo representativo não reconhecendo oficialmente a continuidade da assembleia na Virginia até 1639 quase quinze anos após ela ter assumido responsabilidade go vernamental direta pela colônia 15 105 No final do segundo quartel do século XVII a tradição de governan ça consensual estava firmemente enraizada na América colonial ingle sa16 Além disso uma vez que os governos tinham adotado uma forma de administração com duas câmaras os poderosos provinciais não tinham dificuldade em perceber a notável semelhança entre as comunidades políticas coloniais e a maneira tradicional de governança metropolitana inglesa E assim começaram a defender como o fez o governo de Barba dos em 1651 as comunidades políticas que eles tinham criado porre presentarem o modelo de conformidade mais aproximado ao modelo sob o qual nossos predecessores na nação inglesa viveram e floresceram por mais de mil anos Os oficiais ingleses também ficaram impressiona dos com as semelhanças estruturais entre as comunidades políticas colo niais e o governo metropolitano Ao mesmo tempo o manifesto e proli feração na Inglaterra da teoria clássica de governo misto durante e após a guerra civil inglesa e sua rápida aceitação como a interpretação oficial j da constituição inglesa deram uma justificativa adicional para a aplicação J da teoria ao governo colonial nativo tripartite formado pelo governa J dor conselho e assembleia A monarquia dos Stuart concedeu sanção ti oficial a essa transformação conceitual em 1661 quando instaurou J um governo precisamente assim na Jamaica recémconquistada dos es panhóis e somente a segunda colônia inglesa a ficar sob o controle real instruindo seu novo governador a proceder de acordo com os bons justos e razoáveis costumes e instituições que são exercidos e estabeleci dos em nossas colônias e novos assentamentos 17 No entanto tal ação em relação à Jamaica não resolveu totalmente a questão da estrutura da governança colonial inglesa A maioria das no vas colônias donatárias criadas durante a Restauração as Carolinas as Jerseys a Pensilvânia e a nova colônia real de New Hampshire separada de Massachusetts em 1679 rapidamente resolveu instituir o tipo de comunidades políticas tripartidas que tinham se desenvolvido nas colô nias mais antigas Mas o duque de York o futuro James 11 donatário da colônia de Nova York capturada dos holandeses nos meados da década de 1660 resistiu à criação de uma assembleia por quase vinte anos até 1683 e imediatamente reverteu essa concessão quando se tornou rei Além disso a tentativa de James 11 de consolidar as colônias da Nova In glaterra em uma única comunidade política o Domínio da Nova Ingla terra sem instituições representativas ameaçou profundamente a tradi 106 1 1 il rj TRADIÇOES DE GOVERNANÇA CONSENSUAL ção estabelecida há tempos de governo representativo naquelas colônias Ações como essas faziam parte de um esforço empreendido pelos fun cionários ingleses durante a Restauração no sentido de impor a jurisdição metropolitana aos centros locais de poder que haviam surgido na Améri ca Por todas as décadas de 1660 a 1690 o governo metropolitano tomou uma série de medidas com a intenção de restringir as colônias ao que ele chamava de uma completa obediência à autoridade do Rei 18 Isso in cluía a subordinação das economias das colônias à da metrópole pelos atos de navegação aprovados entre 1651 e 1696 submetendo o maior número possível de colônias ainda particulares ao controle direto da co roa e reduzindo os poderes das instituições políticas coloniais Como su porte teórico desses esforços os funcionários metropolitanos no final da década de 1670 formularam a nova doutrina de ampliação do governo representativo nas colônias enquanto um ato de graça real Por todas essas colônias as intromissões metropolitanas nos negócios coloniais encontraram forte resistência Em resposta as assembleias pro vinciais expressaram a determinação dos proprietários representados por elas de assegurarem tanto suas propriedades como sua reivindicação a uma identidade inglesa obtendo o reconhecimento metropolitano de que como ingleses ou descendentes dos ingleses eles tinham a prerroga tiva de gozar de todos os direitos e proteções legais dos ingleses em sua terra natal Essa determinação estimulou uma ampla discussão constitu cional com o objetivo de identificar defesas explícitas legais que forneces sem uma base sólida para as exigências coloniais aos direitos ingleses e às proteções legais e assim proteger as colônias das intromissões em massa do poder metropolitano19 Nessas discussões portavozes coloniais articulavam uma argumenta ção elaborada visando a fortalecer as reivindicações anteriores ao que consideravam ser seus direitos herdados enquanto cidadãos ingleses De acordo com essa argumentação os colonos originais e seus descendentes eram todos igualmente considerados como nascidos cidadãos ingleses li vres que tinham deixado seu país nativo para estabelecer a hegemonia in glesa sobre porções do Novo Mundo Rejeitando a possibilidade de per der qualquer de seus direitos herdados por simplesmente emigrarem para a América eles indicavam que haviam criado seus próprios gover nos civis com o propósito específico de assegurar esses direitos para si 107 próprios Argumentavam que longe de ser uma concessão da coroa suas assembleias eram derivadas do direito básico inglês ao governo represen tativo e das muitas décadas de prática consuetudinária Como a própria Carta Magna eles sustentavam que nenhuma carta ou outro instrumento poderia assegurar aos ingleses um direito que eles já tinham como parte de sua herança Tais instrumentos como a Carta Magna constituíam simplesmente um reconhecimento por parte da coroa de que tais direi tos eram inerentes às próprias pessoas Nas colônias não menos do que na metrópole eles assim insistiam os parlamentos eram os bastiões das propriedades e liberdades do povo Embora o status legal das assembleias permanecesse objeto de disputaA até e após Revolução Americana a Revolução Gloriosa efetivamente en cerrou qualquer esforço em eliminar o governo representativo nas colôJ nias Até a primeira década do século XVIII as assembleias representati1 vas tinham se tornado uma característica permanente da governanÇa t colonial inglesa Algumas das primeiras colônias perderam seu status deQf 1 independência no decorrer do século XVII tendo Plymouth se unido aA Massachusetts New Haven a Connecticut e Jersey oriental a Jersey oi dental para juntas formarem a colônia de New Jersey Todas as dezo11i4j colônias povoadas ainda em existência em 1700 tinham sua própria legiSt latura eleita Após essa ocasião cada nova colônia britânica adquiria urrtâ assembleia logo que tivesse povoadores suficientes para sustentar tal 1i sembleia incluindo as Bahamas em 1729 a Georgia em 1755 e a NofQii Escócia em 1758 Em 1749 o ensaísta e historiador de Boston dt William Douglass podia com credibilidade se referir àquelas poucas 1 colônias inglesas com somente um governador tais como Newfouifi 1 dland Nova Escócia Baía de Hudson e Georgia como ainda nib completamente colonizadas Por não terem assembleia essas planta ções de acordo com Douglass não tinham a Essência de uma Constitui ção Britânica 2 Com a notável exceção de Quebec cuja população ma joritariamente francesa mostrou inicialmente pouco interesse em adaptar às instituições políticas inglesas todas as novas colônias adqu J das como resultado direto da Guerra dos Sete Anos Florida orien Florida ocidental Grenada São Vicente Tobago e Dominica estabj leceram assembleias entre 17 60 e o final da década de 1770 A nova J I lônia de St John teve uma assembleia logo depois de ter sido criada e l 1773 À época da Revolução Americana vinte e cinco parlamentos P 108 TRADIÇ0ES DE GOVERNANÇA CONSENSUAL vinciais sem contar o parlamento irlandês estavam funcionando no mundo do ultramarino britânico Já em 1700 as assembleias nas colônias mais antigas tinham atingi do uma posição se não superior ao menos paralela e independente dos governos e conselhos21 Na maioria dos casos elas tinham obtido um certo grau de independência as garantias costumeiras de eleições fre quentes e tradições de reuniões regulares mais constantes do que as rea lizadas na Câmara dos Comuns antes da Revolução Gloriosa De forma que durante o século XVIII as crescentes complexidades do processo político tornaramnas indispensáveis ao funcionamento das comunida des políticas da colônia as assembleias reuniamse mais regularmente e por períodos de tempo maiores aprovavam uma quantidade maior de leis menos ambíguas definiam seus procedimentos mais claramente es tabeleciam comissões permanentes contínuas exibiam maior continui dade de liderança desenvolviam um senso bem mais articulado de seus direitos corporativos abandonavam suas funções judiciais em prol de funções executivas e administrativas e de outros modos cuidavam para que atuando como as únicas promotoras de toda lei estatutária vigente dentro de uma colônia e na condição de instituições análogas à Câmara dos Comuns estavam elas investidas de autoridade carismática e pos suíam a guarda depositária de todos os direitos e privilégios sagrados do público Já poderosas nas últimas décadas do século XVII as assembleias fica ram ainda mais fortes durante o século XVIII Assemelharse o máximo possível à Câmara dos Comuns inglesa tornouse um objetivo consciente Nesse esforço elas tinham muitas fontes em que se basear incluindo os vários comentários parlamentares e livros processuais publicados no sé culo XVII Descobrindo a lógica da analogia entre as assembleias e a Câ mara dos Comuns os líderes coloniais legislativos não somente copiavam as formas e procedimentos do órgão da metrópole mas também insis tiam que estavam constitucionalmente investidos dos mesmos poderes e privilégios nas colônias que a Câmara dos Comuns na GrãBretanha22 Apesar desse poderoso impulso mimético o desenvolvimento do po der legislativo nas colônias divergiu consideravelmente daquele do país original Tendo exercido ampla jurisdição sobre as rendas desde os seus dias primórdios os legislativos coloniais gradualmente refinaram e am pliaram sua autoridade sobre todas as fases do levantamento e da distri 109 buição das rendas públicas Elas adquiriram uma considerável indepen dência legislativa por meio de ganhar controle sobre os procedimentos e obter garantias de privilégios parlamentares ingleses básicos e ampliaram seu poder para além daquele da Câmara dos Comuns por meio de ganhar ampla jurisdição em manejar negócios executivos incluindo o direito de nomear a maioria dos oficiais relacionados com a arrecadação de rendas provinciais e muitos outros funcionários executivos assim como partici par na formulação da política executiva Além disso seu desenvolvimento diferiu do da Câmara dos Comuns de outras maneiras As eleições eram mais frequentes as exigências de residência para assentos legislativos eram a norma a maioria das colônias pagava a seus representantes por seus serviços como legisladores e se em penhavam com sucesso em muitas colônias em excluir funcionários pú blicos de ocuparem assentos legislativos e os representantes eram moni torados bem mais de perto por seus constituintes em ambientes eleitorais nos quais uma proporção bem maior dos habitantes adultos do sexo masculino cumpriam exigências do direito de voto 23 Durante quase a totalidade dos primeiros 150 anos da colonização britânica de alémmar nas Américas as colônias como Smith enfatizou no trecho citado no começo deste artigo tinham tido um assombroso nível de autogoverno e na tradição inglesa autogoverno significava go verno representativo Desde os primórdios do estabelecimento de um senado britânico declarou o escritor político Thomas Pownall em me ados da década de 1760 o princípio de estabelcer o governo com base em uma legislatura representativa tinha sido a característica defi nidora da governança britânica 24 Ao ampliar essa bela parte de nossa constituição as colônias disse George Dempster à Câmara dos Co muns em outubro de 1775 nossos sábios ancestrais uniram as partes diferentes e distantes desse poderoso império e propagaram de forma sem igual as bênçãos da liberdade e bom governo pelas no5sas provfn cias mais remotas 25 Permitindo assim que as colônias adotassem a forma de seu próprio governo observou Montesquieu a GrãBreta nha tinha efetivamente assegurado que as colônias prosperariam que grandes povos emergiriam das florestas e ilhas para as quais seus an cestrais tinham migrado e que os colonizadores seriam capazes de consi derar a si próprios e de serem considerados por outros intrinsecamente britânicos 26 110 I I I I i I I I I TRADIÇÕES DE GOVERNANÇA CONSENSUAL Os comentaristas da época não tinham dúvidas de que a GrãBreta nha tinha como disse Adam Smith tratado com mais liberalidade as suas colônias do que qualquer outra nação o tinha feito Nenhuma ou tra nação europeia parece ter estendido a seus colonos tanta liberdade para lidar com seus próprios negócios da forma que melhor lhes aprou vesse 27 0 caso de um país livre se ramificando da maneira como a GrãBretanha o fez e enviando para um mundo distante colônias que de começo incipientes e sob legislaturas livres próprias cresceram e forma ram um conjunto de estados poderosos repetiu o filósofo Richard Pri ce foi sem precedentes na história da humanidade28 Apesar disso se o sistema de autoridade negociada da Época Moder na que caracterizava a governança imperial no começo do império britâ nico da Epoca Moderna era distintamente britânico em sua atribuição de poder às instituições parlamentares ele não era de forma alguma peculiar entre os primeiros impérios modernos No último quarto de século o re novado interesse no processo de formação dos estados nos primeiros anos da Europa moderna modificou consideravelmente a forma como os historiadores pensam o processo de governança nos primeiros impérios modernos Entre outras coisas essa literatura mostrou que o primeiro Estado Moderno sempre limitado em seus recursos fiscais administrati vos e coercivos foi caracterizado por sistemas de governança indireta e por soberanias fragmentadas Os produtos de um processo de construção do Estado no qual a autoridade não tinha fluído do centro para a perife ria mas tinha sido construído através de uma série constante de negocia ções de barganhas recíprocas entre o centro e as periferias Esses siste mas envolviam alguma concentração de poder em agências do Estado central mas também deixavam considerável autoridade nas mãos dos principais detentores de poder nas periferias29 Os primeiros impérios modernos nas Américas eram construídos de forma parecida Naqueles impérios recursos fiscais nunca eram suficien tes nem mesmo no caso dos espanhóis para manter a máquina burocráti ca militar e naval necessária para impor a autoridade central de cima sem o consentimento ou a aquiescência das classes proprietárias dominantes nas periferias Para obter o consentimento e a cooperação daquelas classes os oficiais metropolitanos não tinham outra escolha a não ser negociar com eles sistemas de autoridade Esse processo de barganha tão semelhante ao que caracterizou a formação do Estado nos primórdios da Europa moder 1 1 1 na produziu variações de governo indireto que ao mesmo tempo definiu fronteiras claras em relação ao poder central reconheceu os direitos das localidades e das províncias a vários graus de autogoverno e assegurou que em circunstâncias normais as decisões metropolitanas que afetassem as periferias teriam de consultar ou respeitar interesses locais e provinciais Instituições representativas formais do tipo que se desenvolveu nas colô nias inglesas não eram necessárias para a governança consensual A infiltração nas agências de administração da colônia por parte de membros das elites coloniais e a naturalização de oficiais enviados do centro aumentou a influência das periferias na governança imperial du rante os primeiros anos da Era Moderna Desde que os oficiais metropo litanos não violassem sistemas estabelecidos de autoridade negociada e respeitassem o delicado equilíbrio entre interesses centrais e periféricos nos quais esses sistemas se baseavam esses processos de infiltração e na turalização poderiam funcionar para ajudar as comunidades políticas am pliadas a permanecer juntas e mesmo reforçar a autoridade central den tro delas Quando no entanto os oficiais metropolitanos violavam esses sistemas estabelecidos de autoridade como o fizeram tanto os britânicos como os espanhóis durante a segunda metade do século XVIII se depa raram com a poderosa resistência que entre 1775 e 1825 despedaçou essas comunidades políticas e levou à criação de novos estados indepen dentes nas Américas 30 NOTAS 1 Adam Smith An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Na tions in R H Campbell A S Skinner orgs The Glasgow Edition of the Works and Correspondence of Adam Smith 6 vols Oxford Oxford University Press 19761983 vol 2 p 572 e 583585 2 The settlement of colonies was never pursued upon any regular plan but they were formed grew and flourished as accidents the nature of climate or the disposition o f priva te men happened to operate Edmund e Wlliam Burke An Account o f the European Settlements in America 2 vols Lon dres Dodsley R e J 1757 vol 2 p 288 3 Jorg Frisch Law as a means andas an end Remarks on the funcio f european and noneuropean law in the process of european expanston tn 11 2 I TRADI ÇOE S O E G OVE R N AN ÇA CONSENSUAL W J Mommsen e J A de Moor orgs European Expansion and Law The Encounter of European and Indigenous Law in 19th and 20th Century Asia and Africa Oxford Oxford University Press 1992 p 21 4 Ver Richard Helgerson Forms o f Nationhood The Elizabethan Writing o f England Chicago University of Chicago Press 1992 Linda Colley The Britons Forging the Nations 17071787 New Haven Yale University Press 1992 e Benedict Anderson Imagined Communities Reflections on the Origin and Spread of Nationalism Londres Verso 1983 S A melhor análise dessa tradição ainda pode ser encontrada em J G A Pocock The Ancient Constitution and the Feudal Law English Historical Thought in the Seventeenth Century Cambridge Cambridge University Press 1957 6 Sir John Fortescue De laudibus legum Angliae Cambridge 1942 p 25 27 31 33 79 81 7 Henry Care English Liberties 53 ed Boston 1721 p 34 27 8 George Dargo Roots of the Republic A New Perspective on Early Ameri an Constitutionalism Nova York Prager 1974 p 58 9 Yunlong Man English Colonization and the Formation of AngloAmerican PolitiesJ 16061664 tese de doutorado inédita Johns Hopkins University 1994p 1761455 10 Posturas 24 de julho de 1621 Leis da Virginia março de 1624 in Jack P Greene org Great Britain and the American Colonies 16061783 Nova York Harper Row 1970 p 28 30 11 David S Lovejoy The Glorious Revolution in America Nova York Harper Row 1972 p 39 Constituição de Maryland 30 de junho de 1632 in Jack P Greene org Great Britain and the American Colonies p 24 12 Ver Michael Kammen Deputyes Liberties The Origins o f Representative Government in Colonial America Nova York Knopf 1969 p 1112 13 Ibidem p 7 9 62 67 14 Ibidem p 11 15 Yunlong Man op cit p 232414 O autor investiga esses desenvolvimen tos minuciosamente as citações são das páginas 416 e 455 16 Michael Kammen op cit p 61 17 Yunlong Man op cit p 1516 391392 18 Report of the comissioners sent to New England 30 de abril de 1661 in W Noel Sainsbury orgs Calendar os State Papers Colonial 44 vols Londres His Majestys Stationary Office 1860 16611668 p 25 19 Este assunto é discutido em mais detalhes em jack P Greene Peripheries and Center Constitutional Development in Extended Polities of the British Empire and the United States 16071788 Athens Georgia University of Georgia Press 1986 p 1218 20 William Douglass Summary Historical and Political o f the First Plantin Progressive lmprovement and Present State of the British Settlements in NorthAmerica 2 vols Londres R andJ Dodsley 17491751 vol 1 p 207 21 Yunlong Man op cit p 391 22 Ver Jack P Greene Political Mimesis A Consideration of the Historical and Cultural Roots of Legislative Behavior in the Eighteenth Century American Historical Review 75 1969 p 33767 23 Sobre essas questões ver Robert J Dinkin Voting in Provincial America A Study of Elections in the Thirteen Colonies 16891776 Westport Con necticut Greenwood Press 1977 Edmund S Morgan lnventing the Peo ple The Rise of Popular Sovereignty in England and America Nova York Norton 1988 J R Pole Political Representation in England and the Ori gins of the American Republic Nova York St Martins Press 1966 e The Gift of Government Política Responsibility from the English Restoration to American Independence Athens Georgia University of Georgia Press 1983 Jack P Greene The Quest for Power The Lower H ouses of Assembly in the Southern Royal Colonies 16891776 Chapel Hill University of North Carolina Press 1963 e Mary Patterson Clarke Parliamentary Priv ilege in the American Colonies New Haven Yale University Press 1943 24 Thomas Pownall The Administration of the Colonies 4 ed Londres J Walter 1768 p 175 25 George Dempster Discurso em 27 de outubro de 1775 in Richard Sim mons e P D G Thomas orgs Proceedings and Debates of the British Parliament Respecting North America 17541783 6 vols Millwood Nova York Krauss lnternational 19821987 vol 6 p 640 26 Citado em Richard Koebner Empire Cambridge Cambridge University Press 1961 p 92 297 27 Adams Smith op cit vol 2 p 572 57385 28 Bernard Peach org Richard Price and the Ethical Foundations of the American Revolution Durham Carolina do Norte Duke University Press 1979 p 82 29 Os trabalhos fundamentais são Charles Tilly Coercion Capital and Euro pean States AD 9901990 Cambridge Massachusetts Basil Blackwell 1990 e Mark Greengrass org Conquest and Coalescence The Shaping of the State in Early Modem Europe Londres Arnold 1991 30 Para uma explicação dessa argumentação ver Jack P Greene Negotiated authorities The problem of govemance in the extended polities of the Early Modem Atlantic world in Jack P Greene org Negotiated Au thorities Essays in Colonial Political and Constitutional History Charlot tesville Virginia University of Virgínia Press 1994 p 124 114
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João Fragoso Maria de Fátima Gouvêa Organizadores Na Trama das Redes Política e negócios no império português séculos XVIXVIII CIVIIIZAÇÃO 8RASII4tIRA Rio de Janeiro 2010 r t 1 I 4 i A Vitorino Magalhães Godinho Para os nossos alunos de graduação e pósgraduação COPYRIGHT O 2010 João Fragoso e herdeiro de Maria de Fátima Gouvêa PROJETO GRÁFICO DE MIOLO Evelyn Grumach e João de Souza Leite DIAGRAMAÇÃO DE MIOLO Abreu s System CIP Brasil Catalogaçãonafonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros RJ N 11 Na trama das redes política e negócios no império português séculos XVIXVIII I organizadores João Fragoso e Maria de Fátima Gouvêa Rio de Janeiro Civilização Brasileira 2010 ISBN 9788520008454 1 Brasil História Período Colonial 15 001822 2 Portugal Colônias América História 3 Portugal Colônias História 4 Rede de relações sociais I Fragoso João 11 Gouvêa Maria de Fátima 19582009 100758 CDD 98103 Todos os direitos reservados Proibida a reprodução armazenamento ou transmissão de partes deste livro através de quaisquer meios sem prévia autorização por escrito Texto revisado segundo o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa Direitos desta edição adquiridos pela EDITORA CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA Um selo da EDITORA JOSÉ OLYMPIO LTDA Rua Argentina 171 20921380 Rio de Janeiro RJ Tel 25852000 Seja um leitor preferencial Record Cadastrese e receba informações sobre nossos lançamentos e nossas promoções Atendimento e venda direta ao leitor mdiretorecordcombr ou 21 25852002 Impresso no Brasil 2010 cAPiTULO 11 Tradições de governança consensual na construção da jurisdição do Estado nos impérios europeus da Epoca Moderna na érica Jack P Greene i Texto traduzido do inglês por Thadeus Blanchet I Professor emérito em Humanidades do Departamento de História da Universida de johns Hopkins l 1 l I i I I Em tudo exceto no comércio exterior observou Adam Smith em 1776 considerando as causas do rápido desenvolvimento de novas socie dades coloniais em Wealth ofNations A riqueza das nações a liberdade dos colonos ingleses é total E em todos os aspectos igual à dos concida dãos em seu país de origem e lhes é assegurada da mesma forma por uma assembleia de representantes do povo O governo das colônias inglesas observou ele é talvez o único que desde que o mundo come çou podia dar perfeita segurança aos habitantes de uma província tão distante 1 Nesses trechos Smith chamounos a atenção para a caracterís tica mais significativa dos primeiros anos da governança colonial inglesa moderna a transferência de instituições parlamentares para a Irlanda e para a América Aonde quer que colonos ingleses tenham ido em gran des números as instituições políticas e legais inglesas os acompanharam Na época em que Smith escreveu e na época em que treze das colônias americanas pertencentes à GrãBretanha se separaram do império britâ nico em 1783 essa prática era parte tão fundamental da colonização britânica no alémmar que era virtualmente impensável que qualquer co munidade política com um número expressivo de proprietários britâni cos pudesse operar sem instituições representativas britânicas Durante o século XIX assentamentos de colonos no Canadá na Aus trália na Nova Zelândia e na África do Sul rotineiramente estabeleciam tais instituições e no século XX também estabeleciam instituições desse tipo até mesmo sociedades que não fossem de colonos com pequenos 97 núcleos treinados de funcionários políticos e militares britânicos dirigin do grandes populações nativas o que certamente é um dos legados mais duradouros da colonização britânica no alémmar Como por que e por quem foram estabelecidas as fundações desse legado na América colonial britânica durante o começo da Era Moderna são os assuntos sobre os quais versa este artigo As observações de Smith poderiam ser entendidas como se sugerissem que a transferência de instituições parlamentares para as colônias fazia parte de algum planejamento maior feito às vésperas da colonização com o objetivo de replicar a comunidade política inglesa com sua divisão de jurisdição entre a coroa e um parlamento de câmaras alta e baixa Mas essa sugestão pouco se assemelha ao que de fato ocorreu Como Edmund Burke observou em 1757 em seu estudo em dois volumes pouco valori zado dos primeiros duzentos e cinquenta anos da ocupação europeia das Américas nenhum vestígio de um espírito legislativo e abrangente apa rece no planejamento de nossas colônias Ao invés disso observou ele com franqueza o assentamento de nossas colônias nunca seguiu um planejamento regular mas elas se formaram cresceram e floresceram obedecendo ao acaso dependendo de acidentes da natureza do clima e da iniciativa isolada de certos indivíduos 2 As observações de Burke descrevem de forma precisa a natureza ad hoc do processo que os ingleses usaram para implantar colônias na América du rante os três primeiros quartéis do século XVII não tendo sido a experiên cia da Inglaterra de forma alguma extraordinária No começo da era da colonização moderna nenhum dos Estadosnação emergentes da Europa tinha quer os recursos coercitivos necessários para estabelecerem sua hege monia em partes do Novo Mundo quer os meios para mobilizar aqueles recursos Como consequência durante os primeiros estágios da coloniza ção qualquer Estadonação que contemplasse empreendimentos de risco no ultramar delegava a tarefa a grupos particulares organizados em compa nhias de comércio autorizadas ou a pessoas influentes Para obterem tal au torização da coroa e na expectativa de conseguirem vantagens econômicas e sociais expressivas esses aventureiros concordavam em se responsabili zar pelas pesadas despesas decorrentes da fundação defesa e apoio aos for tes da ocupação europeia na América Em verdade os soberanos europeus davam a esses agentes particulares licenças com amplos poderes para opera rem em domínios sobre os quais o poder do Estado era bem tênue e nao 98 I I I I I I i I TRADIÇOES DE GOVERNANÇA CONSENSUAL r exercia um controle efetivo muito menos autoridade sobre os habitantes indígenas Se esse jogo fosse bemsucedido os soberanos europeus assegu ravam ao menos uma jurisdição mínima sobre as populações e os territó rios americanos com um custo mínimo para o Tesouro real Alguns desses primeiros agentes particulares do imperialismo euro peu em especial as companhias de comércio operando sob a égide dos portugueses e holandeses tiveram bastante sucesso ao estabelecer ba ses operacionais comerciais para explorar o potencial econômico do Novo Mundo No entanto a menos que eles encontrassem ricos impé rios nativos ricos depósitos minerais ou uma abundância de mão de obra nativa o que aconteceu em larga escala somente no México e no Peru poucos aventureiros particulares possuíam os recursos ne cessários para sustentar por mais do que um curto período os altos custos de colonização administração e desenvolvimento de uma colô nia Logo a maioria viuse forçada a procurar ajuda e contribuições dos colonos negociantes e outros indivíduos participantes do processo de colonização O empenho em recrutar tal tipo de cooperação acarretava o reconhe cimento de que o processo de estabelecimento de centros efetivos de po der europeu na América era frequentemente mais o resultado do esfor ço dos muitos grupos e indivíduos que tomaram posse efetiva da terra do que o resultado de atividades dos organizadores das colônias ou seus li cenciados Tais grupos e indivíduos construíram propriedades e negócios e transformaram cenários indígenas em cenários ao menos parcialmente europeus construídos e administrados por meio de um sistema viável de organização econômica criando cidades ou outras unidades políticas Subjugaram transformaram em mão de obra barata mataram ou expul saram os habitantes autóctones Para compensar a escassez de recursos econômicos milhares de europeus por sua diligência e iniciativa cria ram espaços sociais para si mesmos e suas famílias na América angarian do assim para si próprios status capital e poder Durante o princípio da Era Moderna os participantes individuais e independentes do processo de colonização das novas Américas europeias estavam dessa forma engajados em um processo profundo e generaliza do de autocapacitação tanto individual como corporativa Na Europa da Época Moderna somente uma pequena fração da população masculina conseguia sair de um estado de dependência socioeconômica para alcan 99 çar a competência cívica ou seja o pleno direito de ter voz em decisões políticas que era a prerrogativa dos proprietários independentes Em contraste com essa situação como uma consequência de fácil disponibili dade de terra ou outros recursos uma grande proporção dos colonos adultos brancos adquiriu terra ou outros recursos construiu proprieda des e alcançou independência pessoal Esse desenvolvimento gerou fortes reivindicações por parte das gran des populações de colonos fortalecidos de que fossem estendidos às co lônias os mesmos direitos de segurança ou propriedade e participação cí vica que cabiam aos proprietários independentes e detentores de poderes e alto status nas comunidades políticas de onde eles haviam emigrado Na visão deles a governança colonial não menos que a governança metro politana deveria garantir que homens de sua reputação não seriam go vernados sem consulta ou de forma patentemente contrária a seus inte resses Somadas à grande distância das colônias em relação à Europa essas circunstâncias impeliram aqueles que eram nominalmente respon sáveis pelas colônias ao estabelecimento e tolerância de estruturas políti cas que envolviam consultas e até mesmo pedidos formais de autorização a colonos locais As consultas significavam que as populações locais iriam com mais boa vontade tanto reconhecer a legitimidade da jurisdição das agências particulares de colonização como contribuir para os custos lo cais Os primeiros estágios de colonização resultaram assim no surgi mento de novas fronteiras coloniais de muitos centros novos e relativa mente autônomos do poder europeu que estavam na realidade sob o controle local Esses centros eram invariavelmente reflexos dos mundos europeus de onde se originavam os colonizadores Querendo criar ramificações do Velho Mundo no Novo os grandes números de emigrantes para as colô nias insistiam em trazer suas leis e instituições com eles transformando as nos alicerces das novas sociedades que almejavam criar Para essas so ciedades as leis e instituições funcionavam como algo concomitante à emigração Tais leis e instituições não eram como observado por um es tudioso impostas aos povoadores mas antes exigidas por eles 3 Elas serviam como um sinal vívido e simbolicamente poderoso das aspirações mais profundas dos emigrantes para que mantivessem em seus novos lu gares de moradia suas identidades como meffibros das sociedades euro peias às quais eles estavam ligados Tais identidades a seus olhos estabe 100 I TRADIÇÕES DE GOVERNANÇA CONSENSUAL Ieciam sua superioridade em relação ao povo aparentemente inculto e rude que eles procuravam desapropriar além de os distinguirem dles As colônias inglesas estabelecidas na América do Norte nas Indias Ocidentais e nas ilhas atlânticas de Bermuda e das Bahamas dãonos um estudo de casos de como esse processo funcionava Entre os principais componentes da identidade emergente dos ingleses na Inglaterra do iní cio da Era Moderna o protestantismo e cada vez mais durante o século XVIII o lento e crescente poderio comercial e estratégico da nação ingle sa eram ambos importantes Bem mais significativos no entanto eram os sistemas de lei e liberdade que segundo consenso de muitos observado res tanto contemporâneos ingleses como estrangeiros distinguiam o povo inglês de todos os outros povos da face da Terra4 A jactância orgu lhosa dos ingleses era que por uma gama de conquistas e levantes eles tinham sido capazes em marcante contraste com a maioria das outras so ciedades políticas da Europa de manter sua identidade como um povo li vre que tinha assegurado sua liberdade pela consagração do que mais tarde analistas identificaram como o império da lei Uma antiga tradição do discurso político de jurisprudência sustentava essa consagração Enfatizando o papel da lei como uma limitação ao po der da coroa essa tradição estava enraizada em escritos anteriores como o De laudibus legum Angliae de Sir John Fortescue escrito durante o sé culo XV mas não publicado até 1616 e vários dos mais famosos juízes e estudiosos da jurisprudência do princípio do século XVII incluindo Sir Edward Coke Sir john Davies e Nathaniel Bacon discorreram de forma abrangente sobre essa tradição em uma série de trabalhos importantes Escrevendo em uma época em que exceto nos Países Baixos toda grande nação europeia deslizava ao absolutismo e os dois primeiros reis da di nastia Stuart pareciam estar tentando ampliar as prerrogativas da coroa e até mesmo talvez eliminar os parlamentos na Inglaterra esses primeiros jurisprudentes estavam bastante ansiosos para erigir restrições legais e constitucionais que assegurassem estabilidade de vida liberdade e pro priedade contra tais extensões do poder real5 Essa tradição de jurisprudência emergente baseavase em uma dis tinção já integralmente elaborada por Fortescue entre duas espécies fundamentalmente distintas de monarquia o que Fortescue denominou monarquia real e monarquia política Enquanto em uma monarquia real como na França O que agradava ao príncipe como escreveu 101 Fortescue tinha a força da lei em uma monarquia política como na Inglaterra o poder real era restrito pela lei política Obrigados por seus juramentos da coroação à observância das leis inglesas os reis in gleses não podiam nem mudar as leis ao seu belprazer nem fazer novas leis sem o consentimento de seus súditos O resultado feliz desse sistema de acordo com Fortescue foi que o povo inglês em con traste com seus vizinhos era governado por leis com as quais ele havia concordado e como Coke e outros escritores observaram isso era ver dade tanto em relação ao direito consuetudinário o qual as pessoas acatavam por uso prolongado e costume quanto em referência às leis estatutárias aprovadas pelo parlamento para o qual eles enviavam seus representantes 6 Com uma grande variedade de outros escritores políticos contempo râneos os expoentes da tradição da jurisprudência inglesa concordaram que a afortunada capacidade de o povo inglês preservar sua liberdade se apoiava em grande parte em duas instituições para determinar e fazer a lei os tribunais e o parlamento Garantindo que nenhum caso legal viesse a ser determinado exceto pelo veredicto de seus pares ou iguais seu próximos e aqueles de sua condição escreveu o jornalista político libe ral Henry Care os tribunais davam a todas as pessoas um quinhão na parte executiva da lei Por sua vez ao dar a cada pessoa independente através de seus representantes escolhidos uma parte no Poder Legis lativo o parlamento assegurava que nenhuma lei seria aprovada sem o consentimento dos possuidores de bens da nação Esses dois grandes pi lares da liberdade inglesa declarou Care parafraseando Coke davam aos ingleses uma herança maior do que aquela que eles jamais recebe ram de seus progenitores imediatos Assim para os ingleses a liberda de não era somente uma condição exigida pela lei mas sim a própria es sência de sua identidade nacional emergente 7 Para os ingleses migrando para o ultramar a fim de formarem novas comunidades de povoação a capacidade de usufruírem de possuírem o sistema inglês de lei e liberdade foi dessa forma crucial para sua ha bilidade de manterem sua identidade como ingleses e para continuarem a se achar e a ser considerados ingleses Por essa razão e também porque eles consideravam os sistemas legal e constitucional inglês a melhor for ma de preservação das propriedades que eles esperavam adquirir em seus novos lares é pouco surpreendente que ao estabelecer enclaves locais de 102 TRADIÇ0ES DE GOVERNANÇA CONSENSUAL poder durante os primeiros anos de colonização os colonos ingleses por toda a América fizeram todo o esforço possível para construílos com base nas fundações legais inglesas Como o historiador de leis George Dargo observou a tentativa de estabelecer a lei inglesa e os direitos e li berdades dos ingleses foi constante do primeiro povoado até a revolução americana e depois disso 8 Não obstante como Yunlong Man mostrou em seu cuidadoso estudo do primeiro meio século de desenvolvimento das instituições políticas provinciais nas cinco mais bemsucedidas colônias da Inglaterra as auto ridades inglesas não anteciparam o surgimento dessas exigências quando tentaram criar um modo de governança para as colônias Durante a pri meira metade do século XVII os anos formativos das comunidades polí ticas coloniais na opinião de Man as autoridades inglesas nunca deli nearam ou mesmo conceberam um sistema pelo qual a governança colonial seria modelada segundo o governo nacional da Inglaterra Em vez disso eles permaneceram leais a uma forma conciliatória de gover nança colonial do tipo planejado para a Virgínia durante seus primeiros anos de colonização Essa forma de governança consistia na indicação de um governador e conselheiros e não incluía mecanismos formais para consulta à população em geral e eles continuaram por várias décadas a pensar nessa forma conciliatória como a norma para a governança colo nial inglesa 9 No entanto vários desdobramentos durante os estágios iniciais do processo de colonização encorajaram a criação de um componente repre sentativo nas constituições coloniais emergentes Para atrair povoadores os organizadores das colônias logo descobriram que eles tinham de lhes oferecer não somente propriedades em forma de terra mas também ga rantir a eles a propriedade por meio de direitos da mesma forma que os ingleses tinham suas posses materiais tradicionalmente asseguradas As sim em 1619 a Companhia da Virgínia de Londres achou necessário criar uma comunidade política que incluísse uma assembleia representa tiva através da qual os povoadores pudessem na forma tradicional dos ingleses fazer e aprovar formalmente as leis que regiam suas vidas Di rigidas por líderes da companhia para imitar e seguir a política da forma de governo leis costumes maneira de julgamentos e outros processos jurídicos usados no reino da Inglaterra a nova assembleia o primeiro organismo dessa natureza no ainda pequeno mundo a111ericano perten 103 cente à Inglaterra imediatamente tomou a si o direito de consentir a to dos os impostos arrecadados dos habitantes da Virginia10 j Os instrumentos legais da colonização inglesa cartas patentes car l tas constitucionais proclamações encorajaram essa tentativa de três formas Primeiramente eles frequentemente especificavam que os povoa dores e seus descendentes deveriam ser tratados como súditos naturais da Inglaterra e portanto sugeriam com veemência que não haveria dis tinções legais entre os ingleses que viviam na terra natal e aqueles que sidiam nas colônias Em segundo lugar eles exigiam que as colônias não obedecessem a quaisquer leis repugnantes às Leis Estatutos Costum e Direitos do Nosso Reino da Inglaterra e assim sugeriam fortemen que as leis da Inglaterra serviam de modelo e de padrão para todas as I das colônias Em terceiro lugar a começar pela carta constitucional Maryland em 1632 eles também estipulavam que as colônias dev usar e usufruir todos os Privilégios Direitos de Voto e Liberdades de Nosso Reino da Inglaterra livre sossegada e pacificamente para ter possuir da mesma forma que nossos vassalos natos ou para lio4 wo dentro de nosso dito Reino da Inglaterra sem Obstáculo Sofrimen f Mautrato Denúncia ou Motivo de Queixa e que nenhuma lei aprovada sem o consentimento dos homens livres da colônia 11 1 Em não mais de vinte anos depois da fundação de uma colônia e fre quentemente muito antes disso essas condições e avanços encorajavam o estabelecimento de instituições representativas Entre aproximadamen 1620 e 1660 toda colônia americana com um número expressivo de po voadores adotou algum tipo de assembleia eleita para aprovar leis as comunidades políticas que eles estavam criando Virgínia e Bermu t na década de 1620 Massachusetts Bay Maryland Connecticut Plymou th New Haven e Barbados na década de 1630 St Kitts Antigua e Rho de Island na década de 1640 Montserrat e Nevis na década de 1650 Até o ano de 1660 todas as treze colônias nas Américas já possuíam as sembleias representativas em funcionamento Da Nova Inglaterra a Bar bados a América inglesa colonial provou ser um campo extraordinaria mente fértil para a governança parlamentar12 Até mesmo em situações nas quais funcionários das companhias oi proprietários tomaram a iniciativa de estabelecer os primeiros corpos legi lati vos como foi o caso com a Virgínia Bermuda e Maryland os órgãos representativos nunca agiam como os empregados passivos e peticioná 104 TRADIÇÕES DE GOVERNANÇA CONSENSUAL rios de prerrogativas como tinha sido o caso com a Câmara dos Comuns no período medieval Muito pelo contrário historiadores modernos têm ficado impressionados ao constatar a eficiência e espírito de reivindica ção desses grupos Geralmente a partir de suas primeiras reuniões no tou Michael Kammen eles agiam como os portavozes dinâmicos dos as sentamentos que proliferavam dentro das colônias Exigindo os direitos de seus constituintes aos princípios tradicionais ingleses de governança con sensual eles insistiram desde o começo que não seriam criados leis ou im postos sem o seu consentimento exigiram uma participação na legislação e se transformaram em altas cortes de apelo e jurisdição original na forma da Câmara dos Comuns da época medieval além de raramente fugir aos conflitos com executivos locais proprietários ou com a coroa13 Em verdade demorou cerca de vinte anos para que esses órgãos se materializassem se estabilizassem e tomassem forma definitiva em cada colônia Durante os primeiros anos não atuaram geralmente como um órgão separado reuniramse com o conselho consultivo do governador ou até mesmo com o governador em pessoa para ouvir casos e aprovar leis 14 Mas eles logo se encaminharam para atingir independência do Exe cutivo e por volta da década de 1640 as colônias maiores Virgínia em 1643 Massachusetts Bay em 1644 Maryland em 1650 e Barbados em 1652 haviam decidido cada qual por iniciativa própria adotar uma legislatura de duas câmaras com a câmara mais baixa se reunindo sepa radamente do governador e do conselho Exigências locais não imitação impulsionaram essa iniciativa Em todos os casos a forma específica de uma comunidade política provincial foi o produto do que Yunlong Man chama de uma invenção nativa Alguns governadores provinciais popu lares como Sir Williarn Berkeley em Virgínia e Philip Bell em Barbados incentivaram tais iniciativas mas ao fazêlo invariavelmente estavam apenas consolidando as estruturas políticas anteriormente planejadas pe los líderes locais emergentes e ao mesmo tempo aceitando que a capaci dade de governar na formulação de Man obrigava coroa companhia ou proprietário ao reconhecimento das estruturas locais do governo co lonial que haviam surgido a partir das condições existentes na colônia Por sua vez a coroa permanecia suspeitosa do governo representativo não reconhecendo oficialmente a continuidade da assembleia na Virginia até 1639 quase quinze anos após ela ter assumido responsabilidade go vernamental direta pela colônia 15 105 No final do segundo quartel do século XVII a tradição de governan ça consensual estava firmemente enraizada na América colonial ingle sa16 Além disso uma vez que os governos tinham adotado uma forma de administração com duas câmaras os poderosos provinciais não tinham dificuldade em perceber a notável semelhança entre as comunidades políticas coloniais e a maneira tradicional de governança metropolitana inglesa E assim começaram a defender como o fez o governo de Barba dos em 1651 as comunidades políticas que eles tinham criado porre presentarem o modelo de conformidade mais aproximado ao modelo sob o qual nossos predecessores na nação inglesa viveram e floresceram por mais de mil anos Os oficiais ingleses também ficaram impressiona dos com as semelhanças estruturais entre as comunidades políticas colo niais e o governo metropolitano Ao mesmo tempo o manifesto e proli feração na Inglaterra da teoria clássica de governo misto durante e após a guerra civil inglesa e sua rápida aceitação como a interpretação oficial j da constituição inglesa deram uma justificativa adicional para a aplicação J da teoria ao governo colonial nativo tripartite formado pelo governa J dor conselho e assembleia A monarquia dos Stuart concedeu sanção ti oficial a essa transformação conceitual em 1661 quando instaurou J um governo precisamente assim na Jamaica recémconquistada dos es panhóis e somente a segunda colônia inglesa a ficar sob o controle real instruindo seu novo governador a proceder de acordo com os bons justos e razoáveis costumes e instituições que são exercidos e estabeleci dos em nossas colônias e novos assentamentos 17 No entanto tal ação em relação à Jamaica não resolveu totalmente a questão da estrutura da governança colonial inglesa A maioria das no vas colônias donatárias criadas durante a Restauração as Carolinas as Jerseys a Pensilvânia e a nova colônia real de New Hampshire separada de Massachusetts em 1679 rapidamente resolveu instituir o tipo de comunidades políticas tripartidas que tinham se desenvolvido nas colô nias mais antigas Mas o duque de York o futuro James 11 donatário da colônia de Nova York capturada dos holandeses nos meados da década de 1660 resistiu à criação de uma assembleia por quase vinte anos até 1683 e imediatamente reverteu essa concessão quando se tornou rei Além disso a tentativa de James 11 de consolidar as colônias da Nova In glaterra em uma única comunidade política o Domínio da Nova Ingla terra sem instituições representativas ameaçou profundamente a tradi 106 1 1 il rj TRADIÇOES DE GOVERNANÇA CONSENSUAL ção estabelecida há tempos de governo representativo naquelas colônias Ações como essas faziam parte de um esforço empreendido pelos fun cionários ingleses durante a Restauração no sentido de impor a jurisdição metropolitana aos centros locais de poder que haviam surgido na Améri ca Por todas as décadas de 1660 a 1690 o governo metropolitano tomou uma série de medidas com a intenção de restringir as colônias ao que ele chamava de uma completa obediência à autoridade do Rei 18 Isso in cluía a subordinação das economias das colônias à da metrópole pelos atos de navegação aprovados entre 1651 e 1696 submetendo o maior número possível de colônias ainda particulares ao controle direto da co roa e reduzindo os poderes das instituições políticas coloniais Como su porte teórico desses esforços os funcionários metropolitanos no final da década de 1670 formularam a nova doutrina de ampliação do governo representativo nas colônias enquanto um ato de graça real Por todas essas colônias as intromissões metropolitanas nos negócios coloniais encontraram forte resistência Em resposta as assembleias pro vinciais expressaram a determinação dos proprietários representados por elas de assegurarem tanto suas propriedades como sua reivindicação a uma identidade inglesa obtendo o reconhecimento metropolitano de que como ingleses ou descendentes dos ingleses eles tinham a prerroga tiva de gozar de todos os direitos e proteções legais dos ingleses em sua terra natal Essa determinação estimulou uma ampla discussão constitu cional com o objetivo de identificar defesas explícitas legais que forneces sem uma base sólida para as exigências coloniais aos direitos ingleses e às proteções legais e assim proteger as colônias das intromissões em massa do poder metropolitano19 Nessas discussões portavozes coloniais articulavam uma argumenta ção elaborada visando a fortalecer as reivindicações anteriores ao que consideravam ser seus direitos herdados enquanto cidadãos ingleses De acordo com essa argumentação os colonos originais e seus descendentes eram todos igualmente considerados como nascidos cidadãos ingleses li vres que tinham deixado seu país nativo para estabelecer a hegemonia in glesa sobre porções do Novo Mundo Rejeitando a possibilidade de per der qualquer de seus direitos herdados por simplesmente emigrarem para a América eles indicavam que haviam criado seus próprios gover nos civis com o propósito específico de assegurar esses direitos para si 107 próprios Argumentavam que longe de ser uma concessão da coroa suas assembleias eram derivadas do direito básico inglês ao governo represen tativo e das muitas décadas de prática consuetudinária Como a própria Carta Magna eles sustentavam que nenhuma carta ou outro instrumento poderia assegurar aos ingleses um direito que eles já tinham como parte de sua herança Tais instrumentos como a Carta Magna constituíam simplesmente um reconhecimento por parte da coroa de que tais direi tos eram inerentes às próprias pessoas Nas colônias não menos do que na metrópole eles assim insistiam os parlamentos eram os bastiões das propriedades e liberdades do povo Embora o status legal das assembleias permanecesse objeto de disputaA até e após Revolução Americana a Revolução Gloriosa efetivamente en cerrou qualquer esforço em eliminar o governo representativo nas colôJ nias Até a primeira década do século XVIII as assembleias representati1 vas tinham se tornado uma característica permanente da governanÇa t colonial inglesa Algumas das primeiras colônias perderam seu status deQf 1 independência no decorrer do século XVII tendo Plymouth se unido aA Massachusetts New Haven a Connecticut e Jersey oriental a Jersey oi dental para juntas formarem a colônia de New Jersey Todas as dezo11i4j colônias povoadas ainda em existência em 1700 tinham sua própria legiSt latura eleita Após essa ocasião cada nova colônia britânica adquiria urrtâ assembleia logo que tivesse povoadores suficientes para sustentar tal 1i sembleia incluindo as Bahamas em 1729 a Georgia em 1755 e a NofQii Escócia em 1758 Em 1749 o ensaísta e historiador de Boston dt William Douglass podia com credibilidade se referir àquelas poucas 1 colônias inglesas com somente um governador tais como Newfouifi 1 dland Nova Escócia Baía de Hudson e Georgia como ainda nib completamente colonizadas Por não terem assembleia essas planta ções de acordo com Douglass não tinham a Essência de uma Constitui ção Britânica 2 Com a notável exceção de Quebec cuja população ma joritariamente francesa mostrou inicialmente pouco interesse em adaptar às instituições políticas inglesas todas as novas colônias adqu J das como resultado direto da Guerra dos Sete Anos Florida orien Florida ocidental Grenada São Vicente Tobago e Dominica estabj leceram assembleias entre 17 60 e o final da década de 1770 A nova J I lônia de St John teve uma assembleia logo depois de ter sido criada e l 1773 À época da Revolução Americana vinte e cinco parlamentos P 108 TRADIÇ0ES DE GOVERNANÇA CONSENSUAL vinciais sem contar o parlamento irlandês estavam funcionando no mundo do ultramarino britânico Já em 1700 as assembleias nas colônias mais antigas tinham atingi do uma posição se não superior ao menos paralela e independente dos governos e conselhos21 Na maioria dos casos elas tinham obtido um certo grau de independência as garantias costumeiras de eleições fre quentes e tradições de reuniões regulares mais constantes do que as rea lizadas na Câmara dos Comuns antes da Revolução Gloriosa De forma que durante o século XVIII as crescentes complexidades do processo político tornaramnas indispensáveis ao funcionamento das comunida des políticas da colônia as assembleias reuniamse mais regularmente e por períodos de tempo maiores aprovavam uma quantidade maior de leis menos ambíguas definiam seus procedimentos mais claramente es tabeleciam comissões permanentes contínuas exibiam maior continui dade de liderança desenvolviam um senso bem mais articulado de seus direitos corporativos abandonavam suas funções judiciais em prol de funções executivas e administrativas e de outros modos cuidavam para que atuando como as únicas promotoras de toda lei estatutária vigente dentro de uma colônia e na condição de instituições análogas à Câmara dos Comuns estavam elas investidas de autoridade carismática e pos suíam a guarda depositária de todos os direitos e privilégios sagrados do público Já poderosas nas últimas décadas do século XVII as assembleias fica ram ainda mais fortes durante o século XVIII Assemelharse o máximo possível à Câmara dos Comuns inglesa tornouse um objetivo consciente Nesse esforço elas tinham muitas fontes em que se basear incluindo os vários comentários parlamentares e livros processuais publicados no sé culo XVII Descobrindo a lógica da analogia entre as assembleias e a Câ mara dos Comuns os líderes coloniais legislativos não somente copiavam as formas e procedimentos do órgão da metrópole mas também insis tiam que estavam constitucionalmente investidos dos mesmos poderes e privilégios nas colônias que a Câmara dos Comuns na GrãBretanha22 Apesar desse poderoso impulso mimético o desenvolvimento do po der legislativo nas colônias divergiu consideravelmente daquele do país original Tendo exercido ampla jurisdição sobre as rendas desde os seus dias primórdios os legislativos coloniais gradualmente refinaram e am pliaram sua autoridade sobre todas as fases do levantamento e da distri 109 buição das rendas públicas Elas adquiriram uma considerável indepen dência legislativa por meio de ganhar controle sobre os procedimentos e obter garantias de privilégios parlamentares ingleses básicos e ampliaram seu poder para além daquele da Câmara dos Comuns por meio de ganhar ampla jurisdição em manejar negócios executivos incluindo o direito de nomear a maioria dos oficiais relacionados com a arrecadação de rendas provinciais e muitos outros funcionários executivos assim como partici par na formulação da política executiva Além disso seu desenvolvimento diferiu do da Câmara dos Comuns de outras maneiras As eleições eram mais frequentes as exigências de residência para assentos legislativos eram a norma a maioria das colônias pagava a seus representantes por seus serviços como legisladores e se em penhavam com sucesso em muitas colônias em excluir funcionários pú blicos de ocuparem assentos legislativos e os representantes eram moni torados bem mais de perto por seus constituintes em ambientes eleitorais nos quais uma proporção bem maior dos habitantes adultos do sexo masculino cumpriam exigências do direito de voto 23 Durante quase a totalidade dos primeiros 150 anos da colonização britânica de alémmar nas Américas as colônias como Smith enfatizou no trecho citado no começo deste artigo tinham tido um assombroso nível de autogoverno e na tradição inglesa autogoverno significava go verno representativo Desde os primórdios do estabelecimento de um senado britânico declarou o escritor político Thomas Pownall em me ados da década de 1760 o princípio de estabelcer o governo com base em uma legislatura representativa tinha sido a característica defi nidora da governança britânica 24 Ao ampliar essa bela parte de nossa constituição as colônias disse George Dempster à Câmara dos Co muns em outubro de 1775 nossos sábios ancestrais uniram as partes diferentes e distantes desse poderoso império e propagaram de forma sem igual as bênçãos da liberdade e bom governo pelas no5sas provfn cias mais remotas 25 Permitindo assim que as colônias adotassem a forma de seu próprio governo observou Montesquieu a GrãBreta nha tinha efetivamente assegurado que as colônias prosperariam que grandes povos emergiriam das florestas e ilhas para as quais seus an cestrais tinham migrado e que os colonizadores seriam capazes de consi derar a si próprios e de serem considerados por outros intrinsecamente britânicos 26 110 I I I I i I I I I TRADIÇÕES DE GOVERNANÇA CONSENSUAL Os comentaristas da época não tinham dúvidas de que a GrãBreta nha tinha como disse Adam Smith tratado com mais liberalidade as suas colônias do que qualquer outra nação o tinha feito Nenhuma ou tra nação europeia parece ter estendido a seus colonos tanta liberdade para lidar com seus próprios negócios da forma que melhor lhes aprou vesse 27 0 caso de um país livre se ramificando da maneira como a GrãBretanha o fez e enviando para um mundo distante colônias que de começo incipientes e sob legislaturas livres próprias cresceram e forma ram um conjunto de estados poderosos repetiu o filósofo Richard Pri ce foi sem precedentes na história da humanidade28 Apesar disso se o sistema de autoridade negociada da Época Moder na que caracterizava a governança imperial no começo do império britâ nico da Epoca Moderna era distintamente britânico em sua atribuição de poder às instituições parlamentares ele não era de forma alguma peculiar entre os primeiros impérios modernos No último quarto de século o re novado interesse no processo de formação dos estados nos primeiros anos da Europa moderna modificou consideravelmente a forma como os historiadores pensam o processo de governança nos primeiros impérios modernos Entre outras coisas essa literatura mostrou que o primeiro Estado Moderno sempre limitado em seus recursos fiscais administrati vos e coercivos foi caracterizado por sistemas de governança indireta e por soberanias fragmentadas Os produtos de um processo de construção do Estado no qual a autoridade não tinha fluído do centro para a perife ria mas tinha sido construído através de uma série constante de negocia ções de barganhas recíprocas entre o centro e as periferias Esses siste mas envolviam alguma concentração de poder em agências do Estado central mas também deixavam considerável autoridade nas mãos dos principais detentores de poder nas periferias29 Os primeiros impérios modernos nas Américas eram construídos de forma parecida Naqueles impérios recursos fiscais nunca eram suficien tes nem mesmo no caso dos espanhóis para manter a máquina burocráti ca militar e naval necessária para impor a autoridade central de cima sem o consentimento ou a aquiescência das classes proprietárias dominantes nas periferias Para obter o consentimento e a cooperação daquelas classes os oficiais metropolitanos não tinham outra escolha a não ser negociar com eles sistemas de autoridade Esse processo de barganha tão semelhante ao que caracterizou a formação do Estado nos primórdios da Europa moder 1 1 1 na produziu variações de governo indireto que ao mesmo tempo definiu fronteiras claras em relação ao poder central reconheceu os direitos das localidades e das províncias a vários graus de autogoverno e assegurou que em circunstâncias normais as decisões metropolitanas que afetassem as periferias teriam de consultar ou respeitar interesses locais e provinciais Instituições representativas formais do tipo que se desenvolveu nas colô nias inglesas não eram necessárias para a governança consensual A infiltração nas agências de administração da colônia por parte de membros das elites coloniais e a naturalização de oficiais enviados do centro aumentou a influência das periferias na governança imperial du rante os primeiros anos da Era Moderna Desde que os oficiais metropo litanos não violassem sistemas estabelecidos de autoridade negociada e respeitassem o delicado equilíbrio entre interesses centrais e periféricos nos quais esses sistemas se baseavam esses processos de infiltração e na turalização poderiam funcionar para ajudar as comunidades políticas am pliadas a permanecer juntas e mesmo reforçar a autoridade central den tro delas Quando no entanto os oficiais metropolitanos violavam esses sistemas estabelecidos de autoridade como o fizeram tanto os britânicos como os espanhóis durante a segunda metade do século XVIII se depa raram com a poderosa resistência que entre 1775 e 1825 despedaçou essas comunidades políticas e levou à criação de novos estados indepen dentes nas Américas 30 NOTAS 1 Adam Smith An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Na tions in R H Campbell A S Skinner orgs The Glasgow Edition of the Works and Correspondence of Adam Smith 6 vols Oxford Oxford University Press 19761983 vol 2 p 572 e 583585 2 The settlement of colonies was never pursued upon any regular plan but they were formed grew and flourished as accidents the nature of climate or the disposition o f priva te men happened to operate Edmund e Wlliam Burke An Account o f the European Settlements in America 2 vols Lon dres Dodsley R e J 1757 vol 2 p 288 3 Jorg Frisch Law as a means andas an end Remarks on the funcio f european and noneuropean law in the process of european expanston tn 11 2 I TRADI ÇOE S O E G OVE R N AN ÇA CONSENSUAL W J Mommsen e J A de Moor orgs European Expansion and Law The Encounter of European and Indigenous Law in 19th and 20th Century Asia and Africa Oxford Oxford University Press 1992 p 21 4 Ver Richard Helgerson Forms o f Nationhood The Elizabethan Writing o f England Chicago University of Chicago Press 1992 Linda Colley The Britons Forging the Nations 17071787 New Haven Yale University Press 1992 e Benedict Anderson Imagined Communities Reflections on the Origin and Spread of Nationalism Londres Verso 1983 S A melhor análise dessa tradição ainda pode ser encontrada em J G A Pocock The Ancient Constitution and the Feudal Law English Historical Thought in the Seventeenth Century Cambridge Cambridge University Press 1957 6 Sir John Fortescue De laudibus legum Angliae Cambridge 1942 p 25 27 31 33 79 81 7 Henry Care English Liberties 53 ed Boston 1721 p 34 27 8 George Dargo Roots of the Republic A New Perspective on Early Ameri an Constitutionalism Nova York Prager 1974 p 58 9 Yunlong Man English Colonization and the Formation of AngloAmerican PolitiesJ 16061664 tese de doutorado inédita Johns Hopkins University 1994p 1761455 10 Posturas 24 de julho de 1621 Leis da Virginia março de 1624 in Jack P Greene org Great Britain and the American Colonies 16061783 Nova York Harper Row 1970 p 28 30 11 David S Lovejoy The Glorious Revolution in America Nova York Harper Row 1972 p 39 Constituição de Maryland 30 de junho de 1632 in Jack P Greene org Great Britain and the American Colonies p 24 12 Ver Michael Kammen Deputyes Liberties The Origins o f Representative Government in Colonial America Nova York Knopf 1969 p 1112 13 Ibidem p 7 9 62 67 14 Ibidem p 11 15 Yunlong Man op cit p 232414 O autor investiga esses desenvolvimen tos minuciosamente as citações são das páginas 416 e 455 16 Michael Kammen op cit p 61 17 Yunlong Man op cit p 1516 391392 18 Report of the comissioners sent to New England 30 de abril de 1661 in W Noel Sainsbury orgs Calendar os State Papers Colonial 44 vols Londres His Majestys Stationary Office 1860 16611668 p 25 19 Este assunto é discutido em mais detalhes em jack P Greene Peripheries and Center Constitutional Development in Extended Polities of the British Empire and the United States 16071788 Athens Georgia University of Georgia Press 1986 p 1218 20 William Douglass Summary Historical and Political o f the First Plantin Progressive lmprovement and Present State of the British Settlements in NorthAmerica 2 vols Londres R andJ Dodsley 17491751 vol 1 p 207 21 Yunlong Man op cit p 391 22 Ver Jack P Greene Political Mimesis A Consideration of the Historical and Cultural Roots of Legislative Behavior in the Eighteenth Century American Historical Review 75 1969 p 33767 23 Sobre essas questões ver Robert J Dinkin Voting in Provincial America A Study of Elections in the Thirteen Colonies 16891776 Westport Con necticut Greenwood Press 1977 Edmund S Morgan lnventing the Peo ple The Rise of Popular Sovereignty in England and America Nova York Norton 1988 J R Pole Political Representation in England and the Ori gins of the American Republic Nova York St Martins Press 1966 e The Gift of Government Política Responsibility from the English Restoration to American Independence Athens Georgia University of Georgia Press 1983 Jack P Greene The Quest for Power The Lower H ouses of Assembly in the Southern Royal Colonies 16891776 Chapel Hill University of North Carolina Press 1963 e Mary Patterson Clarke Parliamentary Priv ilege in the American Colonies New Haven Yale University Press 1943 24 Thomas Pownall The Administration of the Colonies 4 ed Londres J Walter 1768 p 175 25 George Dempster Discurso em 27 de outubro de 1775 in Richard Sim mons e P D G Thomas orgs Proceedings and Debates of the British Parliament Respecting North America 17541783 6 vols Millwood Nova York Krauss lnternational 19821987 vol 6 p 640 26 Citado em Richard Koebner Empire Cambridge Cambridge University Press 1961 p 92 297 27 Adams Smith op cit vol 2 p 572 57385 28 Bernard Peach org Richard Price and the Ethical Foundations of the American Revolution Durham Carolina do Norte Duke University Press 1979 p 82 29 Os trabalhos fundamentais são Charles Tilly Coercion Capital and Euro pean States AD 9901990 Cambridge Massachusetts Basil Blackwell 1990 e Mark Greengrass org Conquest and Coalescence The Shaping of the State in Early Modem Europe Londres Arnold 1991 30 Para uma explicação dessa argumentação ver Jack P Greene Negotiated authorities The problem of govemance in the extended polities of the Early Modem Atlantic world in Jack P Greene org Negotiated Au thorities Essays in Colonial Political and Constitutional History Charlot tesville Virginia University of Virgínia Press 1994 p 124 114