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INSTITUTO DE ECONOMIA Raízes da Concentração Industrial em São Paulo Raízes da Concentração Industrial em São Paulo Wilson Cano Quinta edição Wilson Cano Raízes da concentração industrial em São Paulo UNICAMP Reitor José Tadeu Jorge ViceReitor Fernando Ferreira Costa INSTITUTO DE ECONOMIA Diretor Márcio Percival Alves Pinto Raízes da concentração industrial em São Paulo Wilson Cano Quinta edição Campinas Universidade Estadual de Campinas Unicamp Instituto de Economia IE 2007 Obra publicada pelo Instituto de Economia da Unicamp 1a ed 1977 2a ed 1981 3a ed 1990 4a ed 1998 Prêmio Visconde de Cairú do Instituto Roberto Simonsen 1977 Copyright 2007 Wilson Cano Projeto GráficovisualNormalização Célia Maria Passarelli Revisão técnica Wilson Cano Revisão Lúcia Morelli Ficha catalográfica elaborada pelo Centro de Documentação Cedoc do Instituto de Economia da UNICAMP Cano Wilson Raízes da concentração industrial em São Paulo Wilson Cano 5 ed Campinas SP Unicamp IE 2007 ISBN 9788586215643 1 Concentração industrial São Paulo Estado 2 São Paulo Estado Indústrias História 3 São Paulo Estado Condições econômicas I Título Universidade Estadual de Campinas Instituto de Economia wwwecounicampbr Caixa Postal 6135 019 35215708 019 35215813 publicecounicampbr 13083970 Campinas São Paulo Brasil 338098161 C165r 5 ed Sumário Prefácio à quarta edição 7 Prefácio à terceira edição 9 Prefácio à segunda edição 13 Prefácio 15 Introdução 19 1 Complexo cafeeiro paulista e alguns complexos regionais 25 11 Formação e expansão do complexo cafeeiro 28 111 O café no Vale do Paraíba 32 112 O complexo cafeeiro escravista em São Paulo 40 113 O complexo cafeeiro capitalista de São Paulo 50 12 Algumas observações sobre a Amazônia o Nordeste e o Extremo Sul 94 121 A economia amazônica 95 122 O complexo nordestino 99 123 A economia do Extremo Sul 112 2 Os mecanismos do crescimento industrial 127 21 Os principais condicionantes 127 22 A expansão industrial 146 23 Principais mudanças na estrutura produtiva industrial 194 3 Alguns aspectos da concentração industrial 201 31 A concentração industrial em termos de empresas 203 32 A concentração industrial em São Paulo 233 321 Retrocesso industrial na Guanabara 249 322 A complementaridade das demais regiões 257 Conclusões 263 Bibliografia 267 Apêndice Estatístico 275 Prefácio à quarta edição Este livro fruto de minha tese doutoral 1975 já passou por três edições nas quais fiz apenas alguns pequenos reparos formais Ele representa em minha vida acadêmica o início de um caminho que buscava a melhor compreensão sobre este imenso país que é o Brasil o qual quando visto como um todo encobre quase sempre profundas diferenciações históricas econômicas políticas e sociais de suas porções regionais Nesse caminho permaneci durante 25 anos pesquisando ensinando orientando trabalhos acadêmicos e profissionais e sobretudo tentando ampliar e completar o período de análise histórica que neste livro situase entre 1850 e 1929 Do esforço inicial surgiram outras reflexões que me permitiram não só darlhe a continuidade histórica de uma análise integrativa nacional como também fazer algumas incursões sobre temas específicos Com um objetivo pedagógico destaco quatro desses novos trabalhos Economia do ouro em Minas Gerais Séc XVIII publicado em Contexto n 3 São Paulo jul 1977 republicado em Cadernos do IFCH Campinas n 10 out 1983 É um pequeno artigo que polemiza sobre a herança do ciclo do ouro a estrutura dessa economia e a falsa possibilidade de superação de sua inexorável crise via industrialização Padrões diferenciados das principais regiões cafeeiras 18501930 publicado em Estudos Econômicos São Paulo v 15 n 2 1985 tenta comparar aquelas economias São Paulo Rio de Janeiro Minas Gerais e Espírito Santo mostrando como as profundas diferenças de suas relações sociais de produção demarcam durante longo período suas trajetórias econômicas ao mesmo tempo em que explicam em grande medida o sucesso paulista Desequilíbrios regionais e concentração industrial no Brasil 193070 São Paulo GlobalCampinas UNICAMP 1985 que tenta mostrar a partir da Crise de 1929 como a inteligente política econômica então praticada da defesa da renda e do emprego nacionais não só retira a economia da depressão mas a coloca nos rumos da integração do mercado nacional Neste Wilson Cano 8 ano também estou reeditando esse livro atualizado para o período 197095 pelo Instituto de Economia da UNICAMP Base e superestrutura em São Paulo 18861929 In De Lorenzo H Costa Wilma P A década de 20 e as origens do Brasil moderno São Paulo UNESP 1997 artigo onde tento mostrar as recíprocas influências entre o econômico e o social as profundas transformações latentes na década de 20 e principalmente a diferenciação das principais frações de classe da burguesia paulista e de como elas atuariam nos rumos do movimento pósrevolução de 1930 Os esforços que empreendi individual e coletivamente resultaram em considerável acervo de trabalhos publicados ou não que culminaram com a instituição do Programa de Pósgraduação em Economia Regional Urbana Agrícola e do Meio Ambiente que ora desenvolvemos no Instituto de Economia da UNICAMP Considero aquele caminho o da reflexão regionalizada em termos pessoais como em grande parte completado com o que pude retomar minhas reflexões sobre o contexto nacional hoje seriamente comprometido pela imposição por nossas elites das políticas econômicas neoliberais que tantos males sociais e regionais têm causado a este país É para mim motivo de grande satisfação vêlo agora numa quarta edição como parte integrante de uma Coleção Comemorativa dos 30 anos de Economia da UNICAMP a cuja direção agradeço Campinas maio de 1998 Prefácio à terceira edição Nestes anos decorridos desde a primeira edição deste trabalho consegui avançar as pesquisas sobre o tema Primeiro interpretando o período histórico subseqüente ao abarcado neste livro 18501929 o de 193070 que resultou em um segundo texto Desequilíbrios regionais e concentração industrial no Brasil 193070 onde interpretei o processo de integração do mercado nacional e com o da década de 80 através de vários artigos meus ou em co autoria ou ainda pelo fecundo caminho da orientação de teses Essa via aliás ajudoume não só a entender melhor o país sua história suas regiões seus agentes como a colaborar direta ou indiretamente com a produção de novos estudos vários deles publicados que ampliaram o conhecimento que se tinha sobre alguns estados como Rio Grande do Sul Paraná São Paulo Rio de Janeiro Espírito Santo Minas Gerais Sergipe Rio Grande do Norte Ceará Pará e Acre e sobretudo a Região Nordeste Esse conjunto de trabalhos e o aprofundamento de minhas reflexões sobre o assunto consolidaram minha compreensão sobre a questão regional brasileira cujas raízes históricas foram discutidas neste livro Permitiramme comprovar o equívoco de se pensar o problema da pobreza através da perspectiva do desenvolvimento econômico regional Com efeito as antigas teses do imperialismo paulista e do malefício que a concentração industrial em São Paulo supostamente causava à periferia nacional foram sendo um pouco esquecidas na medida em que entre 1970 e meados da década de 80 a periferia nacional cresceu industrialmente acima das médias nacionais do Rio de Janeiro e também de São Paulo Essa aparente descentralização e efetiva desconcentração contudo não foi capaz de redimir a pobreza regional Permitiu além da incorporação Wilson Cano 10 de importantes contingentes no mercado de trabalho o enriquecimento isto sim de burguesias regionais nacionais e internacionais mas não dos milhões de miseráveis não incorporáveis que continuam a vegetar pelas várias direções deste sofrido país E isto repitase a despeito de constatada diminuição dos indicadores das disparidades regionais diferenciais de renda per capita de grau e desconcentração industrial etc Os fatos notadamente a natureza complementar ao pólo da industrialização periférica e as modificações das pautas do comércio inter regional contribuíram ainda para uma reflexão teórica e empírica mais séria e objetiva e menos ideológica sobre a questão do intercâmbio desigual dentro das fronteiras de um mesmo país Possibilitounos ainda aprofundar a reflexão sobre a questão crucial da dominação das antigas formas do capital mercantil regional responsável em última instância pela manutenção do atraso da miséria da dominação política econômica e social nas periferias nacionais e em grande medida pela majoritária bancada conservadora do Congresso Nacional Ainda que a grande discussão sobre o tema tenha diminuído o peso de certos mitos teóricos persistem ainda atitudes de cunho ideológico regionalista por ingenuidade falta de conhecimento ou por reacionarismo político Assim ainda que no âmbito acadêmico brasileiro essas visões e atitudes tenham diminuído o mesmo não ocorreu com igual intensidade no âmbito empresarial e da representação política Com efeito a luta pela preservação e ampliação do atual sistema de incentivos e subsídios para investimentos regionais pela classe empresarial e a atitude da maior parte das bancadas das regiões CentroOeste Norte e Nordeste para configurar na Nova Constituição um corte nitidamente regionalista são exemplos claro dessa maneira de ser Por outro lado a absurda aprovação pelo Governo Federal e pelos governos estaduais do Nordeste da implantação da Zona de Processamento de Exportações ZPE naquelas regiões põe novamente em evidência o despreparo e o oportunismo político das elites regionais e da tecnocracia que ajudou a aprovála Não percebem e parecem não fazer grande força para isso a gravidade e a profundidade dos problemas nacionais e a inequívoca necessidade de o país retomar o crescimento econômico nacional e de se regionalizar a política de desenvolvimento acompanhada necessariamente por Raízes da concentração industrial em São Paulo 11 políticas sociais que efetivamente redimam a pobreza nacional onde quer que ela se encontre Esta é a dimensão política deste trabalho Tentar apontar para os fatos de que a busca do bode expiatório sulista como causa da desgraça periférica não passa de argumento ideológico com o qual os conservadores regionalistas escondem as próprias causas internas da pobreza má distribuição da renda constante desvio do dinheiro público para locupletação dos grupos locais dominação do capital mercantil para manutenção do status quo a não reforma agrária etc a industrialização não é a única fonte criadora de riqueza e de emprego Mostro que em São Paulo foi justamente o extraordinário desenvolvimento agrícola que impulsionou a industrialização Não quero com isto sugerir a repetição do modelo apenas lembrar que há muito o que fazer em termos de desenvolvimento agrícola e principalmente agrário na periferia que o capitalismo tem suas intrínsecas leis e a da concentração é inevitável não podendo ser alterada por decreto O próprio movimento de desconcentração industrial observado entre fins da década de 60 e início da década de 80 mostra claramente isto enquanto o estado de São Paulo perde posição relativa na produção industrial do país seu interland Estado de São Paulo menos a Grande São Paulo aumentou consideravelmente seu peso nacional não apenas quantitativamente mas também qualitativamente com a implantação da indústria do álcool a partir da cana do desenvolvimento agroindustrial exportador das indústrias de material bélico aeronáutico de microeletrônica e de informática Wilson Cano Prefácio à segunda edição Por mais cuidado que se dedique à revisão de um texto quase sempre permanecem alguns erros e imperfeições Tento eliminálos nesta segunda edição1 Tais correções contudo não alteraram nem o significado desta obra nem quaisquer de suas conclusões A boa receptividade que teve o livro explicitada pelo número de resenhas e notas publicadas em vários órgãos da imprensa nacional por sua adoção em vários cursos superiores e pelas críticas recebidas de colegas e de meus alunos animoume a cuidar desta segunda edição Com isso vi meus esforços amplamente recompensados No transcorrer destes últimos anos me dei conta da grande relevância do estudo analítico da década de 20 Já na primeira edição de forma mais ou menos explícita tentei mostrar que embora a ruptura do padrão de acumulação de capital tivesse ocorrido entre 1929 e 1932 foi durante a década de 20 uma década essencialmente de transição que se gestaram as precondições para aquela ruptura Mais que isso deime conta de que ali foram gestadas não apenas as condições econômicas também o foram as condições políticas e sociais Além do amadurecimento específico para a industrialização cabe lembrar que é nessa década que o sistema bancário nacional desabrocha Cabe também lembrar que o aparelho do Estado começava a ser mais pressionado não mais pela exclusiva ou grande predominância da agricultura de exportação agora novas e importantes frações da classe dominante ampliavam seus interesses e reivindicações A indústria se diversificava e ensaiava uma embrionária fabricação de cimento e de aço os bancos nacionais haviam triplicado o volume de suas operações entre 1910 e 1928 e requeriam cada vez mais 1 Além da correção de pequenos erros gráficos que constavam da primeira edição a principal alteração efetuada foi a mudança das taxas de crescimento da produção industrial das regiões Brasil e Resto do país para o período 192028 que por erro de aproximação figuravam respectivamente como 45 e 34 conforme constava à página 289 da primeira edição e que passam a ser de 44 e 33 Raízes da concentração industrial em São Paulo 15 atenção maior do Estado culminando com sua marcante presença nas negociações da crise cafeeira pós1929 Embora não tenha tratado do tema sobre os movimentos sociais cabe lembrar nessa mesma década sua ampliação com o início da implantação de leis sociais voltadas para o trabalho e com o surgimento do movimento tenentista que desaguaria na Revolução de 1930 e da qual surgiria a guerra paulista de 1932 movimentos esses até hoje objeto de controversas interpretações Por último cabeme dizer que o estímulo da primeira edição cujo período de análise é o de 1850 a 1929 fez com que eu prosseguisse no estudo do tema No momento estou concluindo a redação final de pesquisa sobre o processo de agravamento da concentração industrial e dos desequilíbrios regionais no Brasil tratando do período 193070 Campinas novembro de 1980 Prefácio Minhas preocupações com o estudo dos desequilíbrios regionais da economia brasileira datam desde 195960 quando crescia o debate nacional sobre o tema Anos mais tarde trabalhando como economista do Centro de Desenvolvimento Econômico CEPALBNDE a oportunidade para o seu estudo era ampliada permitindome conhecer mais de perto a realidade nacional através dos cursos ministrados para aquele organismo em várias regiões brasileiras Data desse período também o início de grandes amizades contraídas nesse trabalho como as de Conceição Castro Lesa Gamboa e Ferdinando entre outras que anos mais tarde estariam reunidas em Campinas Em fins de 1967 entre a opção de ingressar no quadro internacional de funcionários da CEPAL e a de colaborar na formação de uma Escola de Economia em Campinas percebi desde cedo que se me oferecia na realidade uma rara oportunidade para prosseguir no aprofundamento do estudo da economia brasileira Aceitei prazerosamente o convite oferecido pelo Magnífico Reitor da Universidade Estadual de Campinas Professor Doutor Zeferino Vaz a quem neste momento agradeço de público não apenas pelo convite mas principalmente pelo constante apoio e estímulo assim como pela confiança em mim depositada durante todo esse tempo Estes sete anos de trabalho na UNICAMP confirmaram os fundamentos de minhas preocupações com a questão regional no Brasil Tanto pelos cursos de Economia Brasileira que ministrei quanto pela discussão com meus colegas de trabalho certificavame a cada momento de que a investigação desse assunto era tarefa importante e necessária Quando formulei o projeto de pesquisa acreditava pela leitura dos textos existentes que a investigação poderia iniciarse a partir da Grande Depressão Dava portanto como conhecido o período anterior a 1930 Assim essa fase seria contemplada em poucas páginas como simples introdução ao texto Entretanto à medida que ia aprofundando minhas reflexões sobre o estudo davame conta da necessidade de buscar as raízes do processo histórico da concentração industrial em São Paulo Raízes da concentração industrial em São Paulo 17 Os resultados da investigação a que procedi entretanto obrigaram me a transformar aquilo que seria uma simples introdução na tese propriamente dita Deixo portanto ainda por fazer a continuidade deste trabalho isto é a análise do período posterior a 1930 Pretendo se possível for retomar essa investigação futuramente Chegou a ser quase estafante a realização da tarefa proposta Nestes últimos três anos foi enorme a carga de trabalho absorvida por mim e por meus colegas mais antigos do Departamento de Economia a formação de três turmas de graduação a instalação do Mestrado já com duas turmas em funcionamento os trabalhos de orientação a alunos e a outros colegas recém chegados a distribuição de encargos administrativos e a colaboração a convênios firmados pela UNICAMP coincidiram no tempo com os trabalhos de elaboração das teses dos que aqui primeiro chegaram É fácil perceber que um clima de trabalho tão intenso embora profícuo impediu que as preocupações de cada um fossem discutidas mais pormenorizadamente por todos fosse isso possível certamente essas teses que Campinas ora apresenta poderiam ter sido antecipadas e no que cabe à minha creio sinceramente que a tarefa teria sido menos árdua Isso fez com que grande parte dos trabalhos de elaboração dessas teses se desse de forma mais pessoal e mais restringida a seus autores Disso decorreu no meu caso um fato curioso e agradável Preocupado em estudar as origens da formação e do desenvolvimento da economia brasileira reinterpretando seu processo histórico e pensandoo como um certo capitalismo retardatário meu colega João Manuel Cardoso de Mello assentava sua atenção no desenvolvimento da economia cafeeira e no processo por ela desencadeado para a formação industrial do país Seu período de análise limitouse assim também a 1930 A curiosidade do fato está em que sem discutirmos nossas teses estudávamos sob alguns aspectos os mesmos fenômenos Seu estudo tinha a perspectiva da economia brasileira e o meu a dos desequilíbrios regionais centrado evidentemente na concentração industrial em São Paulo Fomos felizes Quando terminava sua versão definitiva demo nos conta de que chegávamos a algumas conclusões comuns Estava quase pronta minha primeira versão quando discutimos o assunto e percebi então que J M Cardoso de Mello havia solucionado importantes aspectos comuns às duas teses alguns dos quais eu apenas havia aflorado mas não desenvolvido com a devida profundidade Em outros aspectos dada a especificidade de meu trabalho haviaos aprofundado mais Wilson Cano 18 A partir desse momento nossa amizade cresceu ainda mais se no prefácio de sua tese declarouse meu devedor digolhe agora que seu saldo é credor Após sua defesa de tese em março último sua colaboração crítica foi muito importante para a elaboração da versão definitiva deste trabalho Quero manifestar de público minha gratidão ao Prof João Paulo de Almeida Magalhães não só por se responsabilizar como orientador desta tese mas principalmente pelo seu constante estímulo e pela liberdade que me concedeu na elaboração deste trabalho Aos colegas Antônio B Castro Carlos Eduardo N Gonçalves Jorge L Miglioli Luciano Coutinho Maria C Tavares Rui Granziera e Sérgio Silva que leram partes deste trabalho agradeço pelas sugestões e críticas apresentadas algumas das quais foram incorporadas ao texto À amizade incondicional de Jorge L Miglioli João Manuel Cardoso de Mello Luiz Gonzaga M Belluzzo e Maria Conceição Tavares devo incontestavelmente o estímulo para a realização deste trabalho Muito cedo perceberam a importância da natureza do estudo e entenderam plenamente meus propósitos Em relação aos novos colegas do DEPE espero daqui em diante poder participar mais diretamente de suas preocupações profissionais Aos velhos ficam meus sinceros agradecimentos pelo convívio durante todos esses anos em que o trabalho e a discussão comum se fizeram com grande amizade e cooperação Carlos Eduardo Nascimento Gonçalves Ferdinando 0liveira Figueiredo Éolo Marques Pagnani João Manuel Cardoso de Mello Luiz Gonzaga Mello Belluzzo Manoel R Gamboa e Osmar Oliveira Marchese Desejo ainda agradecer ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico pelo Convênio UNICAMPBNDEFUNTEC e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo pelo fornecimento de recursos para esta investigação Não fossem o sacrifício e a dedicação de Selma que me deu ainda Newton e Marcelo durante a elaboração do trabalho a tarefa teria sido ainda mais difícil e árdua Campinas agosto de 1975 Introdução A Questão Regional quer dizer o problema dos desequilíbrios regionais da economia brasileira aflora definitivamente à consciência nacional entre fins da década de 1950 e início da seguinte Não é difícil atinar com as razões que determinaram o amplo debate em torno do tema Em primeiro lugar o grau de informação sobre os níveis de desenvolvimento regional aumentou gradativamente Eram dadas a conhecer em 1951 e 1952 respectivamente as Contas Nacionais e Regionais do Brasil que continham elementos objetivos adicionais para o exame das disparidades regionais1 Por outro lado o Censo de 1960 indicava que São Paulo detinha 56 da produção industrial brasileira valendo notar que a concentração no tocante às indústrias dinâmicas atingia perto de 60 As próprias Contas Nacionais ensejariam anos depois a comparação entre as taxas de crescimento real das economias regionais enquanto a renda interna de São Paulo cresceu à taxa média anual de 75 entre 1947 e 1960 a do resto do país o fez a 5 Em suma ficava cada vez mais claro que os desequilíbrios regionais tendiam a se acentuar Em segundo lugar outro fato teve marcada importância nessa tomada de consciência as grandes secas no final da década de 1950 ampliaram consideravelmente o número de retirantes nordestinos que se dirigiam principalmente ao sul em busca de sobrevivência As migrações internas tiveram extraordinária importância para as decisões políticas que seriam tomadas sobre a questão regional2 1 A primeira publicação das contas nacionais do Brasil sem discriminação regional encontrase na Revista Brasileira de Economia n 51 A primeira apresentação dos dados regionais foi dada no número de dezembro de 1952 com as informações referentes aos anos de 1950 e 1951 2 Hirschman 1965 apresenta um resumo das principais secas e medidas políticas adotadas para a questão no período de 18771959 Wilson Cano 20 Ademais cabe lembrar que nesse período ganham grande destaque em todo o cenário latinoamericano a divulgação e a aceitação das técnicas de planejamento para o desenvolvimento Isso fez com que aquela tomada de consciência se transformasse num anseio programado para se dar solução aos problemas do subdesenvolvimento nacional e regional Praticamente todas as regiões brasileiras e seus estados imaginaram nas técnicas de planejamento o antídoto para seus problemas até mesmo o estado de São Paulo delas fez largo uso com seu Plano de Ação3 Da mesma forma que no cenário internacional teriam aumentado as disparidades por causa da divisão internacional do trabalho desfavorável aos países subdesenvolvidos alegavase que internamente havia uma injusta divisão territorial do trabalho com a crescente concentração industrial em São Paulo e a conformação de uma produção predominantemente primária na periferia nacional A questão regional era portanto colocada nestes termos havia que industrializar as regiões menos desenvolvidas e na maioria delas promover um processo de substituição regional de importações Com isso e com outras reformas institucionais e econômicas a reforma agrária por exemplo alcançarse ia o desenvolvimento regional equilibrado Há que se fazer justiça a Furtado que dirigindo o Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste GTDN elaborou um diagnóstico e uma política de desenvolvimento do Nordeste de marcada profundidade pensando não apenas em industrializar a região mas principalmente em mudarlhe fundamentalmente a estrutura econômica 4 O diagnóstico resumidamente pretendia que se atacasse quatro frentes a industrialização a reforma da estrutura agrária na zona úmida a transformação da economia das zonas semiáridas e o deslocamento da fronteira agrícola Com isso aumentarseia a eficiência do antigo setor exportador ampliarseia a oferta de alimentos para suporte à nova 3 Seria exaustiva a enumeração dos documentos existentes sobre o assunto Limitome portanto a lembrar dos textos do Centro de Desenvolvimento Econômico CEPALBNDE 1967 da Comissão Interestadual da Bacia ParanáUruguai 1964 e do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais 1965 4 O documento básico é o do GTDN 1959 Ver também o conhecido texto de Furtado 1959 Raízes da concentração industrial em São Paulo 21 economia industrial e obterseia ainda a transferência de parte do excedente populacional para o Maranhão Em suma e ao contrário do que afirmavam muitos de seus críticos Furtado tentava criar aquilo que o Nordeste nunca tivera de forma mais avançada relações capitalistas de produção numa economia mais eficiente e internamente integrada De medidas assistemáticas passouse então para uma primeira tentativa de elaboração de política de desenvolvimento regional integrada com a criação da Sudene em 1959 Essa política estava centrada no subsídio ao capital através de incentivos fiscais cambiais e outros A crescente tomada de consciência a que me referi faria com que a política de incentivos ao desenvolvimento regional fosse a partir de 1963 estendida à Amazônia provocando uma primeira diversificação na carteira regional de investimentos beneficiando assim os Estados do Sul que são os maiores detentores das isenções fiscais do imposto sobre a renda5 A partir de 1967 ocorreriam várias modificações na política de incentivos fiscais ampliandose consideravelmente as alternativas para investimentos que além daquelas opções regionais passavam também a contar com opções setoriais desvinculadas estas últimas de localização compulsória do investimento Isso não quer dizer que tenha desaparecido a perspectiva regional dado que para isso foram instituídos programas especiais como o Programa de Integração Nacional o Programa de Redistribuição de Terras e de Estímulo à Agroindústria do Norte e Nordeste e outros parte deles utilizando também recursos dos incentivos fiscais Assim a política de incentivos fiscais a partir de 1967 seria estendida à indústria da pesca em 1968 seriam incluídos o turismo o reflorestamento e a compra subsidiada de ações de sociedades de capital aberto e em 1970 também seria incluída a indústria estatal aeronáutica 5 Por exemplo do total de deduções concedidas sobre o imposto de renda para aplicações em inversões entre 1965 e 1972 cerca de 50 originaramse de São Paulo Do total dos incentivos depositados para aplicações no Nordeste nesse mesmo período apenas cerca de 10 tiveram origem na própria região Entre 1968 e 1972 do total encaminhado para a Amazônia menos de 10 originramse nos estados da região Wilson Cano 22 O elenco de estímulos seria ainda integrado com as isenções e os créditos tributários concedidos pela política de expansão de exportações de manufaturados A partir de 1969 seriam estendidas as isenções dos impostos de importação de produtos industrializados e de circulação de mercadorias aos bens de capital e determinadas matériasprimas importados ou nacionais desde que vinculados a projetos de investimentos aprovados pelo Conselho de Desenvolvimento Industrial Por paradoxal que possa parecer essas isenções eram concedidas com grande liberalidade na alocação regional dos investimentos fossem implantados em São Paulo no Nordeste ou em outra região Isso fez com que o elenco de isenções que já havia proporcionado maiores alternativas regionais de inversões passasse também a oferecer maiores opções setoriais A mesma tomada de consciência que possibilitou a instituição de políticas sistematizadas de desenvolvimento regional no Brasil estimulou ao mesmo tempo a elaboração de um grande número de estudos sobre a questão regional6 Entretanto esses trabalhos em grande parte deixaram apreciável lacuna ao estudarem a dinâmica de suas regiões sem contudo procurar as origens do processo de concentração industrial em São Paulo Alguns embora com longa perspectiva histórica limitaramse mais às raízes históricas da dinâmica de cada uma das regiões ao problema de sua demanda externa e às relações estruturais de propriedade existentes em cada uma delas Outros ao examinarem as cifras disponíveis das contas nacionais concluíam que o atraso de algumas regiões se dera a partir de 1939 ano de referência mais antiga sobre as contas nacionais e mais especificamente após a realização dos investimentos do Programa de Metas 19561961 que beneficiavam principalmente São Paulo pela introdução nesse Estado dos compartimentos mais modernos da indústria7 6 É extenso o número de trabalhos sobre o assunto Mesmo correndo o risco de cometer injustiças pela omissão de alguns cito os seguintes além dos já enumerados nas notas anteriores Furtado 1961 Robock 1964 Andrade 1973 CAPES 1959 Singer HW 1962 Goodman e Albuquerque 1974 Castro 1969 1971 Singer P I 1968 Accurso Veras e Candal 1965 e Rattner 1972 Mais recentemente surgiram outros trabalhos vendo o problema sob outros aspectos Entre estes cabe lembrar os de Boiser Barros e Smolka 1972 e o de Haddad 1972 7 A análise do período de industrialização no pósguerra e especificamente do período que compreende o Programa de Metas está contemplada principalmente nos seguintes trabalhos Baer 1966 Candal 1969 Lessa 1964 e Tavares 1964 Raízes da concentração industrial em São Paulo 23 Não foram examinadas na realidade as raízes fundamentais do processo de concentração industrial em São Paulo nem seu papel na dinâmica interregional do país Como se verá no decorrer deste trabalho as origens do problema remontam efetivamente ao início do século XX e não como se pensa correntemente ao pósCrise de 29 quando muda o padrão de acumulação Não se trata como poderia parecer de analisar apenas a atividade cafeeira em São Paulo antes de 1930 mas sim de verificar o desenvolvimento de relações capitalistas de produção aí vigentes e a formação de um complexo econômico o complexo capitalista cafeeiro de São Paulo É este o objetivo deste trabalho ou seja analisar principalmente o período que compreende as duas últimas décadas do século XIX até a eclosão da crise cafeeira de 1929 É nele que a economia de São Paulo se prepara para a consolidação de sua posição no mercado nacional que se daria após a Grande Depressão Ao contrário das demais regiões São Paulo contou com os elementos fundamentais para sua expansão diversificada e concentradora avançadas relações capitalistas de produção amplo mercado interno e desde muito cedo uma avançada agricultura mercantil mesmo se excluído o café Daí decorreu seu processo de concentração industrial e já antes de 1930 sua estrutura industrial era a mais avançada do país contando inclusive com um incipiente compartimento produtor de bens de produção instalado com vistas ao mercado nacional Daí se estabeleceu desde cedo uma relação de forte predominância do complexo econômico paulista sobre as demais regiões do país imprimindolhes em grande medida uma relação comercial de centroperiferia Este trabalho está dividido em três partes Na primeira examino as origens da formação capitalista do complexo cafeeiro de São Paulo discutindo ainda os insucessos de alguns complexos regionais Na segunda trato da formação industrial de São Paulo contrapondoa à do restante do país finalmente na terceira tento discutir as duas faces do processo de concentração industrial a que se dá em nível de empresas e a concentração espacial 1 Complexo cafeeiro paulista e alguns complexos regionais Quando se tenta compreender o processo dinâmico de crescimento de uma economia tornase absolutamente necessário analisar que partes principais a compõem como atua cada uma delas nesse processo de crescimento e que graus e tipo de interrelacionamento entre elas possibilitam o surgimento de um conjunto econômico integrado A esse conjunto de atividades sobre o qual atua um certo número de variáveis independentes ou não ao conjunto creio que se lhe pode chamar de complexo econômico Tornase necessário portanto distinguilo de outras economias cujos componentes guardam pouca ou nenhuma interdependência entre eles o caso da economia mineradora do tipo enclave o de uma agricultura camponesa autosuficiente com tênues ligações com o resto do sistema na qual está inserida e o latifúndio quaseautárquico decadente e escravista que se forma em fins do século XVIII e início do século XIX em Minas Gerais com a exaustão mineradora Constituem a meu juízo clássicos exemplos de atividades econômicas muitas vezes as mais importantes atividades de um contexto regional ou nacional que embora especialmente inseridas num mesmo sistema regional ou nacional não possibilitaram a formação de um complexo integrado que pudesse desencadear um processo dinâmico de acumulação ao próprio sistema em que estão inseridas Pareceme óbvio também que não bastam as condições acima apontadas quanto ao interrelacionamento dos vários componentes do Wilson Cano 26 complexo É absolutamente fundamental que esse sistema de produção e circulação opere na base de relações capitalistas de produção Como se verá sucintamente neste Capítulo o complexo cafeeiro capitalista de São Paulo preencheu amplamente essas condições ao contrário do que ocorrera com o café no Vale do Paraíba com o complexo nordestino ou ainda com a economia amazônica da borracha Muito embora a idéia de complexo permita uma análise mais integrada da dinâmica de cada economia regional há que se ter presente entretanto que o essencial não é apenas isso acima dessa forma de análise devese colocar o que é mais fundamental ou seja as grandes transformações ocorridas nas relações de produção Claro que podemos analisar tanto a economia escravista como a capitalista pela ótica do complexo O que se deve destacar entretanto é que no escravismo há uma determinada dinâmica enquanto que no capitalismo outra porque há trabalho assalariado As razões da passagem do trabalho escravo para o trabalho livre serão aqui só em parte discutidas tanto pela sua complexidade e também pelo fato de que esse assunto foi devidamente tratado no trabalho recente de J M Cardoso de Mello1 O que cabe destacar aqui e resumidamente é que se para São Paulo principalmente a partir do Oeste Paulista cafeeiro houve condições extremamente satisfatórias para essa transformação o mesmo não se pode dizer quanto ao café escravista do Vale do Paraíba ou ainda exemplificando na economia açucareira do Nordeste As altas margens de lucro da cafeicultura paulista a alta produtividade e a grande disponibilidade de suas terras imprimindo alto ritmo na acumulação de capital do café pela expansão dos plantios exigiram radical solução ao problema da mãodeobra escrava cujo estoque em São Paulo permanecia praticamente estancado durante os últimos quinze anos da escravidão Resolvido esse problema pela imigração e dadas as condições da demanda externa do café a acumulação cafeeira não mais contaria com esse freio Não se entenda 1 Conf Cardoso de Mello 1975 especialmente capítulo 1 parte 2 item 3 Raízes da concentração industrial em São Paulo 27 com isso que é a escassez de mãodeobra a causa da abolição e sim o processo de acumulação de capital Diferentes situações enfrentaram o Vale do Paraíba e o Nordeste No Vale a escassez de terras e sua crescente exaustão imprimiram tanto um custo mais alto de inversão quanto uma baixa produtividade física acrescido a esses fatos o do encarecimento extraordinário do escravo ter seá como resultante não só a diminuição das margens de lucro como também a própria estagnação e futura decadência dessa economia No Nordeste a exígua disponibilidade de terras férteis para outros fins que não a da atividade açucareira faria com que a passagem do escravismo ao regime assalariado fosse mais formal do que efetiva fazendo com que seus efeitos fossem muito menos dinâmicos do que os ocorridos em São Paulo em termos da constituição e expansão de um mercado de bens de consumo corrente como dá a entender Furtado2 Pelo lado da produção entretanto o Nordeste pode ainda sobreviver embora a demanda externa houvesse imprimido uma crise crônica e secular à economia do açúcar a expansão do mercado interno na região Sul do país onde as terras eram preferencialmente dedicadas ao cultivo de alimentos e ao café permitiu a recuperação de sua economia a partir da segunda metade do século XIX Não contando com grandes concorrentes no mercado interno pode assim o Nordeste prosseguir sua acumulação de capital relativamente freada porém tanto pela baixa produtividade quanto pelos preços vigentes Por outro lado formas ainda mais distintas tiveram a economia do aviamento da borracha amazônica e a economia da pequena e média propriedade da agricultura produtora de alimentos do Extremo Sul do país A primeira regrediria e a segunda teria um desenvolvimento muito menos dinâmico do que o da economia paulista Dadas as condições do nível de informação existente tornase tarefa difícil senão impossível o tratamento separado no mesmo espaço e tempo da dinâmica de um complexo escravista e de um capitalista salvo ao nível da abstração Em alguns casos e principalmente no do Oeste Paulista poderseia distinguir na realidade quatro momentos 2 Ver no clássico trabalho de Furtado 1961 especialmente o capítulo 24 Wilson Cano 28 da evolução histórica cafeeira um primeiro em que a atividade é escravista um segundo em que predominando ainda o escravismo já existem alguns segmentos operando com trabalho assalariado ou com outras formas distintas do trabalho a parceria por exemplo o terceiro ao contrário do anterior seria aquele em que a predominância se daria na forma do trabalho assalariado e no último finalmente a escravidão estaria extinta A separação absoluta dos dois segmentos nos momentos 2 e 3 é praticamente impossível e a solução por mim adotada foi a de tratar como economia escravista os dois primeiros momentos e como capitalista o terceiro e o quarto Apenas o complexo cafeeiro paulista será assim tratado Dessa forma divido o primeiro tópico deste Capítulo em três partes as duas primeiras por sinal mais resumidas compreendem o café no Vale do Paraíba e o café escravista em São Paulo a terceira parte versará sobre o complexo cafeeiro capitalista de São Paulo No tópico dois trato da economia amazônica da borracha do Nordeste e do Extremo Sul Como o objetivo central deste trabalho é o estudo da concentração industrial de São Paulo a partir do complexo cafeeiro capitalista de São Paulo os complexos regionais a serem discutidos não receberão o mesmo tratamento analítico dado ao café inclusive no que se refere à separação de complexo escravista e complexo capitalista3 11 Formação e expansão do complexo cafeeiro Colocada a idéia de complexo que dentre seus componentes conta com uma atividade que é a principal e predominante como a do café cumpre em seguida apresentar os componentes do complexo 3 A discussão da economia da mineração do ouro no século XVIII em Minas Gerais não se enquadra nos limites propostos para este trabalho A referência que poderia se fazer a essa economia creio residir no problema na formação de um reservatório de mãodeobra quando de sua desagregação que mais tarde seria aproveitado pelo café Este aspecto foi ressaltado por Simonsen 1973 p 180 e por Furtado 1961 cap 15 20 Nota para a quarta edição Posteriormente à edição deste trabalho realizei um estudo específico sobre a mineração do século XVIII em Minas Gerais e outro para comparar as diferentes estruturas das cafeiculturas nos estados de Minas Gerais Espírito Santo e Rio de Janeiro com a de São Paulo já publicados Cano 1977 1985 Raízes da concentração industrial em São Paulo 29 cafeeiro bem como mencionar algumas das principais variáveis que sobre ele atuam Destaco entre seus principais componentes a atividade produtora do café a agricultura produtora de alimentos e matériasprimas vista em dois segmentos o primeiro representado pela produção desenvolvida dentro da área da propriedade cafeeira quer como cultivos intercalados quer como produção elaborada em terras cedidas pelo proprietário aos trabalhadores do café o segundo pela agricultura que produz essencialmente para o mercado operando fora da propriedade cafeeira a atividade industrial que em função do objeto de análise deve ser vista também em pelo menos três segmentos um representado pela produção de equipamentos de beneficiamento de café outro pela importante indústria de sacarias de juta para a embalagem do café e o terceiro representando os demais compartimentos produtivos da indústria manufatureira entre os quais notoriamente se destaca o têxtil a implantação e desenvolvimento do sistema ferroviário paulista a expansão do sistema bancário a atividade do comércio de exportação e de importação o desenvolvimento de atividades criadoras de infraestrutura portos e armazéns transportes urbanos e comunicações bem como daquelas inerentes à própria urbanização como o comércio por exemplo finalmente a atividade do estado tanto do governo federal como do estadual principalmente pela ótica do gasto público Além dos elementos acima destaco as seguintes variáveis o movimento imigratório a disponibilidade de terras os saldos da balança comercial com o exterior e com o resto do país o capital externo e por último as políticas tarifária monetária de câmbio e as políticas de defesa e valorização do café O interrelacionamento dos componentes e das variáveis que atuam no complexo cafeeiro será apresentado na medida do possível em termos dos seguintes efeitos efeitos redutores dos custos de produção efeitos ampliadores do nível da produtividade Wilson Cano 30 efeitos ampliadores do excedente efeitos ampliadores e diversificadores do investimento efeitos ampliadores do mercado Tais efeitos eram portanto geradores de economias de escala e de economias externas ao mesmo tempo em que expandiam mutuamente o mercado e propiciavam ampla acumulação de capital diversificadora do complexo Na análise do funcionamento e do interrelacionamento dos elementos componentes do complexo cafeeiro somente alguns deles serão tratados com maior detalhe Outros por sua complexidade específica o que implicaria a meu juízo em investigações aprofundadas que escapam aos contornos deste trabalho ou por serem de menor expressão relativa ou ainda por merecerem atenção específica nos Capítulos seguintes como é o caso da indústria manufatureira serão aqui tratados a nível mais resumido Pelo fato de que algumas atividades e variáveis não são aqui quantificadas e sim qualificadas tornase bastante difícil a análise integrada de todos os componentes do complexo que pudesse medir todos os efeitos cumulativos que ocorrem no transcorrer desse processo histórico Assim sendo prefiro tratálos separadamente remetendo sempre os resultados da análise de cada elemento ao conjunto do complexo cafeeiro A análise desses elementos não guarda necessariamente uma rígida ordem de importância em relação à ordem de sua apresentação Cabe aqui retomar o que foi enunciado na introdução deste Capítulo quanto à questão dos complexos escravista e capitalista Uma primeira advertência se faz necessária quanto ao sumário tratamento dado ao café do Vale do Paraíba e ao complexo cafeeiro escravista de São Paulo No caso do Vale do Paraíba isto se deve ao fato de que essa região entrou em estagnação e depois em decadência mesmo antes da abolição da escravatura Dadas suas precárias condições e sua impossibilidade de competir como café do Oeste Paulista que se expandia notavelmente durante a década de 1870 sua sorte estava selada A importância de sua Raízes da concentração industrial em São Paulo 31 análise fica assim naturalmente reduzida face aos objetivos deste trabalho Quanto ao complexo escravista de São Paulo seu resumido tratamento se deve ao fato de que na realidade as plantações do Oeste Paulista somente ganham maior expressão no período de 18761883 quando o novo plantio duplica o pequeno estoque de cafeeiros produtivos que era de 106 milhões em 1880 Esse período já mostrava claramente que a transição para o regime de trabalho assalariado se encontrava em marcha Embora o número de escravos fosse superior ao número de imigrantes a proporção entre o estoque de cativos e o de imigrantes baixava rapidamente de 151 em 1874 passava para 81 em 1880 atingindo 61 em 1883 e 31 em 1885 nesse transcurso o número de escravos era reduzido a pouco mais da metade enquanto que o de imigrantes quadruplicava Tabela 1 Há que se lembrar ainda que grande parte da escravaria estava alocada nas mais antigas regiões cafeeiras de São Paulo principalmente na região paulista do Vale do Paraíba onde é sabido era muito menor a existência de imigrantes não é difícil entender portanto que já no início da década de 1880 grande parte da nova expansão cafeeira de São Paulo se dava em grande medida com trabalho assalariado Assim sendo procuro me deter mais no caso do complexo cafeeiro capitalista o qual efetivamente criaria as condições necessárias para a formação e concentração da indústria A segunda advertência prendese ao fato de que entre os elementos e variáveis relacionados no início deste tópico alguns não terão idêntico tratamento quando analisados numa ou noutra forma de complexo Uma última advertência de caráter mais específico se refere à análise do papel desempenhado pela apropriação de terras no processo de acumulação Dado que a maior parte de terras tem sua utilização determinada pela grande expansão cafeeira que ocorre entre 18861897 esse tema será tratado no complexo capitalista muito embora ele também tenha gerado idênticos efeitos no complexo escravista Wilson Cano 32 111 O café no Vale do Paraíba4 Vejamos sucintamente em que condições operou a cafeicultura escravista na região oriental fluminense e no Vale do Paraíba durante a segunda metade do século XIX A produção cafeeira do estado do Rio de janeiro que fora de 1 milhão de sacas em 1835 passava a 15 milhão em 1840 crescendo lentamente para 18 milhão em 1870 e atingindo seu auge em 1882 com 26 milhões Simonsen 1973 p 189 Daí em diante entraria numa flagrante decadência O comportamento da demanda e dos preços externos estimulou um grande plantio de cafeeiros na primeira metade da década de 1830 provavelmente uma lenta expansão entre esse período e meados da década de 1860 dandose grande expansão nos primeiros sete anos da década de 1870 quando os preços internacionais do café retomam níveis fortemente crescentes passando de saca 168 em 1869 a 390 em 1877 Também não é difícil estimar a idade provável dos cafeeiros do Vale do Paraíba em 1882 certamente menos de 25 deles teriam idade inferior a vinte anos e mais de 60 idade superior a 45 anos o que lhes conferia baixíssima produtividade física5 Se já eram más as condições econômicas do café nessa região no início da década de 1880 a precipitação do processo abolicionista a crise de superprodução de 1897 e a política deflacionista de 1898 a 1902 viriam agravar a crise da qual não se recuperaria jamais Isto posto examinemos sumariamente as condições de operação principalmente no que se refere aos seus custos de produção e à geração e utilização do excedente virtual da cafeicultura escravista do Vale do Paraíba 4 Para elaboração deste tópico muito me valeram as consultas aos seguintes trabalhos Taunay 1943 Simonsen 1944 1973 Hollanda 19681972 tomo 1 e 2 Furtado 1961 Stein 1961 e Costa 1966 A Peregrinação de Zaluar 1945 constitui interessante testemunho da época 5 Pelas estimativas de Simonsen 1973 p 189 o Rio de Janeiro teria um estoque de 500 milhões de cafeeiros no início do século XX com uma produção em torno de um milhão de sacas no mesmo período São Paulo com o mesmo estoque produzia 57 milhões de sacas Raízes da concentração industrial em São Paulo 33 Planta que requer condições especiais de solo e de clima o café encontraria no Vale do Paraíba uma séria limitação de terras para a sua expansão e rendimento econômico Como demonstrou R Simonsen apenas nas terras mais altasaltitude entre 200 e 550 metros do Vale do Paraíba se davam as condições para o plantio econômico do café ao contrário das terras baixas e frias Simonsen 1973 p 181185 O esgotamento da região ocidental Resende Vassouras Barra Mansa e outras após 1860 provocaria o deslocamento do café para a região oriental Cantagalo Paraíba do Sul etc praticamente terminando aí sua possibilidade de expansão Os rotineiros processos agrícolas empregados e as próprias condições do solo e da topografia fariam com que à restrição ditada pela disponibilidade potencial de terras fosse adicionada outra gerada pela sua erosão e exaustão diminuindo assim a oferta de terras para o café acelerando novo deslocamento agora em direção ao Oeste Paulista6 O problema da oferta de terras ao contrário do que ocorreria em São Paulo agravaria seriamente os custos da inversão Entre 1870 e 1883 conforme mostra Viotti da Costa comentando os preços das terras na região de Vassouras o preço do alqueire de terras virgens passara nessa região de 450000 a um conto de réis enquanto o preço da terra já aproveitada para pastos e portanto já exausta para o café ou abrangendo capoeiras e capoeirões oscilava entre cinqüenta e cento e cinqüenta mil réis o alqueire Costa 1966 p 212213 Como se verá em seguida o menor preço das terras exaustas não se tornaria fator estimulante para a expansão de uma agricultura produtora de alimentos ao contrário do que se deu em São Paulo com as famosas terras de japonês face ao ponto de estrangulamento gravíssimo representado pelo problema da mãodeobra É exatamente quando ocorre a grande expansão do plantio na década de 1830 que começa a ganhar corpo o problema da repressão inglesa ao tráfico negreiro para o Brasil A 7 de novembro de 1831 conforme diz Viotti da Costa o governo imperial brasileiro institui uma lei proibindo e reprimindo o tráfico e impondo pesado ônus àqueles que se dedicavam a tal comércio Em que pese o não cumprimento dessa lei é 6 A esse respeito ver Prado Junior 1970 p 162164 Wilson Cano 34 óbvio que provocou o encarecimento do escravo que de 1821 a 1843 tem seus preços médios elevados de 250000 a 440000 para cerca de 700000 A mudança da política tarifária brasileira e a não prorrogação do acordo de comércio com a Inglaterra em 1844 contrariando os interesse desse país teriam segundo alguns historiadores agravado ainda mais o ânimo abolicionista inglês dificultando muito o tráfico e encarecendo ainda mais o preço do escravo Em 1850 finalmente o Brasil proibia legalmente o tráfico negreiro o qual entretanto ainda permanece agora na forma de declarado contrabando até meados de 18567 Oscilando os preços do escravo entre 700000 e 1 conto de réis à época do término do tráfico saltariam entre essa data e 1875 para cerca de 3 contos de réis e sua oferta era agora basicamente atendida pelo Nordeste brasileiro Em que pese os altos impostos provinciais instituídos nessa época encarecendo ainda mais seu preço gravandoo na saída ou na entrada de uma para outra província o número de escravos na província do Rio de Janeiro passa de 119000 em 1844 a 370000 em 1877 neste último ano Minas Gerais contava com igual número e São Paulo com cerca de 170000 escravos Dado que o comércio negreiro era realizado por traficantes brasileiros e estrangeiros é lícito se deduzir que uma fração importante da renda era transferida para o exterior diminuindo portanto o potencial de acumulação produtiva do complexo Outra fração aqui permaneceu ampliando os capitais comerciais que financiavam o fazendeiro na compra de meios de subsistência e de escravos através de hipotecas ou outros títulos por meio dos quais o agente escravista diante da caótica situação financeira do fazendeiro não raro lhe tomava a propriedade agrícola e seus pertences8 Esse capital comercial teria destacado papel a cumprir quando mais tarde se iniciasse a formação industrial do país Outro fator negativo residiria exatamente no próprio seio da cafeicultura com o crescente encarecimento da mãodeobra a agricultura cafeeira tende à especialização reduzindo os cultivos alimentares 7 As informações foram obtidas do citado trabalho de Viotti da Costa especialmente na primeira parte de seu livro 8 Sobre a situação financeira dos fazendeiros ver Costa 1966 p 215 Ver também Taunay 1943 v 7 p 383393 Raízes da concentração industrial em São Paulo 35 transformando assim uma parcela de custos que antes eram em grande parte nãomonetários uma vez que o escravo produzia grande parte de seu próprio alimento em efetivos desembolsos monetários com a compra de alimentos E o efeito negativo não é só esse além de passar a requerer um capital circulante adicional para a compra dos meios de subsistência de sua força de trabalho que implicava em crescente parcela de juros efetivos ou imputados em seus custos de produção esses gastos foram ainda mais acrescidos pela elevação de seus preços absolutos no mercado Com efeito entre 1855 e 1875 os preços do arroz e do feijão mais do que duplicam os do açúcar da farinha de mandioca e do toucinho crescem mais de 50 Costa 1966 p 133136 Mesmo se considerando o fato de que os preços internos do café duplicam nesse período o aumento dos preços dos alimentos o aumento dos preços dos escravos que triplicam e o aumento dos preços das terras que mais que duplicam fariam com que a expansão do plantio se desse a custos crescentes proporcionalmente maiores do que os aumentos dos preços internos do café Vale dizer essa expansão ocorria com margem decrescente de lucros diminuindo portanto o ritmo e o potencial da acumulação Se de um lado a elevação dos preços dos escravos e das terras imprimiu a necessidade de intensificar seu uso na produção cafeeira por outro lado isto não contribuiu para o desenvolvimento de uma agricultura produtora de alimentos no próprio complexo Se isto pudesse ter ocorrido ela significaria um reforço para o processo de acumulação de capital expandindo o excedente e o mercado local Entretanto isto não parece ter ocorrido em larga escala e a razão pela qual assim penso pode ser resumida da seguinte forma i se a agricultura está geograficamente vizinha da atividade cafeeira neste caso ela também opera a custos crescentes decorrentes dos mesmos problemas da terra e da mãodeobra ii se está geograficamente distante da zona cafeeira embora livre do problema do custo da terra era também atingida pelo alto custo de transporte e se escravista atingida igualmente pela alta dos preços da mãodeobra escrava Wilson Cano 36 Tanto pode ter ocorrido o caso i como o ii no entanto o aumento das importações brasileiras de alimentos que ocorre no último quartel do século XIX provavelmente restringiu ainda mais a expansão dessa agricultura diante da impossibilidade desta concorrer com os preços internacionais Pouco se pode dizer a respeito das técnicas de produção utilizadas nessa região No que se refere àquelas diretamente vinculadas à produção agrícola nossos escritos históricos mostram que elas eram tradicionais e o próprio arado parece ter sido empregado em escala apreciável só depois da abolição Quanto ao problema da tecnologia do beneficiamento do café Viotti da Costa examinando a relação de máquinas de beneficiar empregadas nas fazendas de café do Rio de janeiro relação essa apresentada durante a primeira exposição brasileira de café em 1881 conclui que a maioria do café produzido no Rio de Janeiro continuava sendo beneficiado no engenho de pilão e nos despolpadores Costa 1966 p 185 A maioria das máquinas e equipamentos para beneficiamento do café na realidade era muito mais utilizada no Oeste Paulista do que nessa região Este fato tem sua explicação na relativa incompatibilidade do progresso técnico via mecanização em relações de produção eminentemente escravistas e por outro lado no sério problema da penúria financeira desses fazendeiros principalmente na segunda metade da década de 1880 quando o uso dessas máquinas pode se tornar mais acessível em termos de preço e de disponibilidade interna de produção nacional Entretanto ainda que seu uso fosse mais intenso nessa época e nessa região seu significado econômico teria sido o de diminuir prejuízos ao contrário do seu significado no Oeste Paulista onde ela representou efetivamente um aumento de lucros isto pode parecer um sofisma se não se distinguir as diferenças marcantes entre uma expansão dinâmica com alta na taxa de lucro e outra que marcha aceleradamente para a decadência irremediável nesta última situação a diminuição de custos de produção somente poderá salvar aqueles produtores que se encontrem em situação econômica menos ruim do que os demais ou simplesmente retardar a agonia do produtor em piores condições Mas podese ainda Raízes da concentração industrial em São Paulo 37 perguntar o seguinte teriam os produtores que se encontravam endividados e hipotecados condições de aumentar seu investimento via mecanização da produção De onde obteriam esse capital adicional Que financiador filantrópico se prestaria a suprir tais recursos A expansão ferroviária talvez o elemento mais importante desse complexo teve sua maior fase de crescimento nas décadas de 1870 e 1880 Provavelmente pelo menos uma parte do capital aplicado nas ferrovias dessa região deve ter saído diretamente da cafeicultura representando assim uma nova oportunidade de inversão para o capital cafeeiro Entretanto dada a condição de crise crônica que atravessava a região ocidental do Vale depois de 1860 e de toda a região após 1883 é necessário um exame ainda que superficial das condições em que operavam essas ferrovias A principal delas a Estrada de Ferro D Pedro II depois Central do Brasil após atingir Barra do Pirai por volta de 1864 quando então totaliza pouco mais de 100 quilômetros de rede face aos seus graves problemas financeiros é encampada pelo governo imperial passando assim depois dessa data 1865 a ter toda a sua expansão custeada diretamente pelo estado e não pelo capital cafeeiro Outras de reduzida extensão quilométrica e portanto não se beneficiando de economias de escala tiveram apenas uma vida de empresa privada durante cerca de duas décadas já nos primeiros anos do século XX em sua maior parte também seriam encampadas pelo governo federal9 A introdução do sistema ferroviário sem dúvida alguma provocou redução apreciável nos custos de transporte do café anteriormente feitos em carro de boi ou através de tropas em direção aos mais próximos portos fluviais e marítimos da região Para o período entre 1860 e 1868 Sérgio Silva utilizando informações de Taunay conclui que o rebaixamento dos custos de transporte gerado pela ferrovia teria sido equivalente a cerca de 10 do preço de venda do café na região fluminense Silva S S 1973 p 5051 Isto permitiu novo alento à cafeicultura escravista a redução dos fretes compensou ainda que só em 9 Obtive essas informações em O Brasil suas riquezas naturais suas indústrias obra editada pelo Centro Industrial do Brasil 1909 mais conhecida como Censo de 1907 v 3 parte referente à indústria de transportes Wilson Cano 38 parte o agravamento dos custos permitindo dessa forma a continuidade da acumulação cafeeira Essa expansão ferroviária entretanto concorreu com o antigo sistema de pequenos portos fluviais e marítimos e com suas rodovias praticamente tornandoos sem utilização econômica O mesmo ocorre com a rede de armazéns existente junto a esses portos10 Como se vê parte dos efeitos positivos gerados pelos investimentos ferroviários na região foram em parte anulados pelos efeitos decorrentes da desutilização de parte da infraestrutura preexistente Por outro lado dois fatos ligados à expansão ferroviária devem ainda ser discutidos O primeiro deles se refere ao fato de que a expansão ferroviária nessa região em sua maior parte ocorreu depois que as plantações de café já estavam maturadas salvo no que se refere a partes da expansão cafeeira ocorrida na década de 1870 na região oriental não exercendo assim o pioneiro papel de criadora de terras como ocorreu com a maior parte das ferrovias paulistas e só trazendo economias externas e oportunidades de inversão numa situação retardada no tempo O outro fato é que vinda a explicitação da crise nos primeiros anos da década de 1880 também a ferrovia passa a sofrer seus efeitos tendendo a uma diminuição de sua taxa de lucro que culminaria numa estrutura deficitária e portanto tendo como único remédio a encampação estatal O Censo de 1907 constatou que em 1906 grande parte dessas ferrovias já era deficitária e aquelas que ainda apresentavam resultado positivo estavam na realidade em deplorável situação financeira como a Central do Brasil cujos custos representavam 965 de suas receitas Assim essa grande oportunidade de aplicação do capital cafeeiro nas ferrovias tornouse mais tarde uma aplicação improdutiva pelo menos do ponto de vista privado de uma inversão capitalista Creio que esse quadro crítico possibilita o melhor entendimento das razões pelas quais a industrialização do estado da Guanabara do qual era tributária essa região cafeeira por volta da primeira década do século XX perde o primeiro lugar na produção industrial do país e passa a apresentar crescimento industrial bastante inferior à média nacional E 10 A esse respeito ver Simonsen 1973 p 187188 Raízes da concentração industrial em São Paulo 39 isto em certa medida pode muito bem estar inserido na forma peculiar em que se deram as relações entre a agricultura dessa região e o capital comercialurbano residente na Guanabara essas relações de troca entre esses dois segmentos certamente não podem ser chamadas de normais mas sim de flagrante expropriação do parco excedente agrícola cafeeiro pelo comércio urbano Explico melhor A alta dos preços dos escravos que vinha ocorrendo desde o início da década de 1830 acelera seu nível após 1850 quando então essa mesma agricultura passa agora a comprar mais alimentos no mercado a preços crescentes pelo menos até 1875 Isto significa obviamente uma transferência abrupta de renda via preços do café para as classes comerciantes Notese que entre 1855 e 1875 a taxa de câmbio sobe muito pouco em relação à alta daqueles preços certamente favorecendo de muito o comércio importador do Rio de Janeiro Há que adicionar ainda o fato de que parte da alta dos preços do café que aumentam em 143 entre 1855 e 1875 nem mesmo chega às mãos dos fazendeiros ficando automaticamente retida nas mãos dos comerciantes e exportadores desse produto Por outro lado as atividades urbanas do Rio de janeiro possivelmente se beneficiaram duplamente da alta dos preços dos escravos de um lado pelo aumento dos lucros gerados por tal negócio e por outro lado pelo fato de que esse aumento anormal de preços fez com que houvesse uma transferência de escravos antes alocados nos serviços urbanos para a atividade do café criando assim as precondições para o desenvolvimento de um mercado de trabalho livre e conseqüentemente de um mercado para bens de consumo corrente Entretanto como a agricultura cafeeira limitou a expansão desses dois mercados no setor primário dessa economia para que o processo de acumulação urbana pudesse se desenvolver ele teria fatalmente que contar com mercados externos ao seu próprio meio o que a indústria da Guanabara parece ter efetivamente conseguido através da conquista de mercados no resto do Brasil Wilson Cano 40 112 O complexo cafeeiro escravista em São Paulo Esgotada a possibilidade de continuação da expansão do café na parte ocidental do Vale do Paraíba sua marcha continuou em parte dirigindose à região oriental no Rio de Janeiro penetrando também na zona mineira e no Espírito Santo mais tarde A outra parte marcharia em direção ao Oeste Paulista região onde o café não encontraria aquela limitação de terras Pelo contrário no Oeste Paulista a terra seria na verdade um livre conduto à expansão cafeeira tanto no que se refere à sua disponibilidade quantitativa quanto ao seu principal aspecto que é o das condições de clima fertilidade e topografia Persistiriam ainda por relativamente curto espaço de tempo os problemas de transporte A produção paulista de café até o início da década de 1870 representava apenas 16 do total brasileiro a partir desse momento ingressa num período de vigorosa expansão perfazendo em 1875 cerca de um quarto da produção nacional saltando dez anos depois para 40 Ainda que não se possa identificar como modernas para a década de 1870 as técnicas agrícolas usadas no Oeste Paulista já eram bem mais eficientes do que as observadas na antiga região Nesse período o uso do arado já se torna maior e graças à melhor topografia parte desta lavoura pode introduzir a máquina carpideira que utilizando um homem e um animal substituía com vantagem o trabalho de seis escravos Este melhor arranjo físico na agricultura paulista possibilitava por outro lado que o trabalho escravo pudesse ser mais intenso do que no Vale do Paraíba nessa região um escravo chegava a cuidar de um número de cafeeiros cerca de quatro vezes maior do que no oeste paulista fato este que implicava em menor cuidado com a plantação e certamente um rendimento econômico também menor Hollanda 1971 v 4 tomo 2 p 9698 A fertilidade das terras a menor idade média dos cafeeiros e as técnicas agrícolas mais eficientes proporcionavam ao café do oeste paulista uma produtividade física cerca de cinco vezes maior do que a verificada na antiga região como se deduz do trabalho de Simonsen 1973 p 189194 A Produtividade econômica cresceria ainda mais com a introdução do uso das máquinas de beneficiamento de café cuja Raízes da concentração industrial em São Paulo 41 fabricação já se desenvolvia em São Paulo na década de 1870 Essas máquinas eram representadas por um conjunto de equipamentos de uso específico como os despolpadores descascadores ventiladores brunidores para polimento separadoresclassificadores modificadores de tipos de café etc11 As indicações existentes sobre a diminuição dos custos de produção do café decorrentes da introdução dessas máquinas são poucas e disponho apenas das apontadas por Taunay Uma referindose a anos próximos a 1870 dá a entender que se reduziram os custos em montante equivalente a cerca de 10 dos preços de exportação do café12 Isso se refere a máquinas ainda um tanto rudimentares pois as outras para anos da década de 1880 mostram que a introdução de novos equipamentos permitia uma considerável melhoria da qualidade e da apresentação do café que resultava em melhorias equivalentes a 33 do preço recebido num caso e em outro Taunay mostra que os cafés de terreiro tinham preços em torno de 5000arroba enquanto que os beneficiados nos despolpadores obtinham um preço de 8000arroba13 Podese notar nos escritos de Taunay que a evolução quantitativa e qualitativa da produção e do uso dessas máquinas se torna bastante evidente a partir do início da década de 1880 que é o período em que a questão do trabalho escravo mais se agrava que se acelera a transição para o trabalho livre Por exemplo em 1885 é muito grande o número de patentes concedidas pelo governo a várias invenções e aperfeiçoamentos de máquinas e implementos para a agricultura e para o beneficiamento de café Muitas dessas patentes efetivamente resultaram em produção de novos equipamentos14 Essa alta produtividade das terras paulistas aumentando as margens de lucro da cafeicultura passava a exigir cada vez mais a 11 Para uma descrição pormenorizada dos processos de beneficiamento de café e dos equipamentos ver Taunay 1943 v 7 p 225282 e também o Censo de 1907 v 2 p 6770 12 Conf Taunay 1943 v 2 p 221223 apud Silva SS 1973 p 48 13 As indicações encontranse emTaunay 1943 v 7 a primeira página à página 238 e a segunda à página 280 14 A relação dos privilégios de patentes concedidas em 1885 está em Costa 1966 p 184 185 Taunay faz referência ao assunto em várias passagens de seu trabalho A relação de alguns fabricantes pode ser vista no livro de Bandeira 1908 Wilson Cano 42 ocupação de novas terras com o que podia converter lucros em inversões na forma de novos plantios Entretanto à medida que a fronteira agrícola do café mais se distanciasse em direção ao interior surgiria um freio natural a essa acumulação representado pelos altos custos de transporte do produto entre as zonas produtoras e o porto de embarque A superação desse obstáculo se daria pela implantação do sistema ferroviário Dessa forma as ferrovias paulistas se constituíram numa das mais importantes atividades componentes do complexo cafeeiro preenchendo múltiplos papéis Num primeiro plano cabe destacar sua atuação desbravadora da fronteira agrícola tornando economicamente acessíveis as terras virgens do oeste paulista A antiga São Paulo Railway que em 1867 completava o trajeto de Jundiaí a Santos implantada com capital inglês na realidade não preenche o papel desbravador uma vez que a região por ela servida já havia sido anteriormente ocupada15 A maior parte das outras ferrovias principalmente a Mogiana a Paulista e a Sorocabana vão cumprir plenamente esse papel pioneiro à medida que estendem seus trilhos o café vai desbravando as terras virgens assim depois de atingidas Campinas em 1872 e Itu em 1873 Mogi Mirim e Amparo eram alcançadas em 1875 Rio Claro em 1876 Casa Branca em 1878 e Ribeirão Preto em 1883 Morse 1970 p 228229 O papel dessas ferrovias não se restringiu porém a viabilizar uma acumulação pela apropriação das terras ou ainda a proporcionar lucros privados nas transações de terras em que a propriedade privada já estava consolidada Além disso ela exerceu um fundamental papel ao rebaixar os custos da produção cafeeira diminuindo os gastos com transporte anteriormente feitos por tropas muares Pelas informações contidas em alguns estudos os gastos com o transporte do café montariam antes de 1867 entre Jundiaí e Santos em cerca de 33 do preço de exportação por 15 Essa estrada entretanto cumpriria mais tarde um papel que também poderia ser chamado de desbravador por sua área de influência foram se formando vários núcleos urbanos e suburbanos em São Paulo tanto para a localização industrial como para a habitacional da mãode obra da cidade de São Paulo principalmente A esse respeito ver os trabalhos de Morse 1970 e de Langenbusch 1971 Além das citações específicas consultei também os trabalhos de Debes 1968 e de Matos 1974 O Censo de 1907 na parte referente às ferrovias v 3 constitui uma das mais importantes fontes informativas sobre o parque ferroviário brasileiro até o início do século XX Raízes da concentração industrial em São Paulo 43 volta de 1863 de Campinas a Santos aquele montante seria pouco superior a 40 e para a região de Rio Claro a Santos por volta de 1857 esse custo teria sido de aproximadamente 5016 Com a ferrovia os custos de transporte do café caíram sensivelmente situandose em média em torno de 20 do preço da saca de café exportada Isso permite concluir que em média houve uma diminuição dos custos cafeeiros em montante equivalente a cerca de 20 dos preços de exportação Por último cabe ainda lembrar que as ferrovias contribuíram também para elevar economicamente a produtividade física do café antes por deficiência dos transportes parte da produção de café perecia nas fazendas mais distantes e outra parte por pequena que fosse era extraviada ou destruída durante o longo período utilizado em seu transporte dadas as precárias condições em que esse serviço era executado Máquinas de beneficiamento e ferrovias as primeiras aumentando a produtividade e as últimas reduzindo os custos resultavam assim em forte ampliação das margens de lucros Dada a disponibilidade de terras e o comportamento da demanda externa isso implicava na necessidade de ampliar a acumulação cafeeira É exatamente neste momento que compreende os últimos anos da década de 1870 e os primeiros da década seguinte que esse alto poder de acumulação explícita a impossibilidade da permanência do escravismo no café dado o término do tráfico e a impossibilidade de criação de escravos no país para ampliar a força de trabalho Como J M Cardoso de Mello demonstrou a restrição da oferta de escravos tanto em termos de preços como de quantidades constituía o mais grave obstáculo para a acumulação assim sendo a única forma possível de se eliminar essa restrição seria o recurso ao trabalho livre Cardoso de Mello 1975 cap 1 parte 2 Vejamos em seguida e resumidamente alguns aspectos do problema da mãodeobra Há que se lembrar de início que uma região plenamente estruturada pelo regime escravocrata e em situação econômica decadente contaria com imensas dificuldades para ingressar num sistema 16 Os dados sobre custos de transporte e preços de café foram obtidos nas seguintes fontes Preços Anuário Estatístico do Brasil 193940 Custos de transportes Costa 1966 p 101 172 e 174 Hollanda 1971 v 3 tomo 2 p 259 e o Censo de 1907 v 2 Wilson Cano 44 assalariado ao contrário de outra como a de Campinas por exemplo onde o trabalho livre já viesse penetrando paulatinamente ou das zonas pioneiras em franca expansão A transição do sistema de trabalho escravo para o de trabalho livre em São Paulo adquiria portanto um caráter peculiar Ela seria bastante difícil no Vale do Paraíba que em 1883 ocupava 285 do total de escravos 174622 existentes em São Paulo e gradativa nas zonas mais antigas do Oeste Paulista regiões de Campinas de Sorocaba e de Bragança que detinham 42 as cidades de São Paulo e de Santos com suas regiões vizinhas de inexpressiva produção cafeeira detinham apenas 45 e a zona pioneira do Oeste Paulista os restantes 2517 O primeiro grande salto da expansão cafeeira de São Paulo entre 1876 a 1883 quando dobra a capacidade produtiva do café já seria feito parcialmente dentro de relações capitalistas de produção como se verá em seguida Analisandose essa expansão quando se plantam mais 105 milhões de cafeeiros Tabela 2 surge de imediato a seguinte questão dado que o estoque de escravos é relativamente constante no período e que o fluxo imigratório é pequeno como poderiam ser formados esses cafezais e quem faria sua colheita Admitindose uma cifra média de 2000 cafeeiros tratados e colhidos por um escravo e mais os trabalhos complementares requeridos segundo Roberto Simonsen essa expansão quando os cafeeiros se tomassem produtivos demandaria uma quantidade adicional de mãodeobra equivalente a 100 mil escravos Entretanto isto merece algumas considerações Em primeiro lugar esse novo plantio se deu ao longo de oito anos e as primeiras colheitas 5o ano teriam se manifestado só a partir de 1881 atingindo o seu máximo por volta de 1888 quando todas as plantas já seriam adultas Os dados levantados por Fraga confirmam isto a produção cresce a partir de 1881 1882 e atinge seu máximo entre 1887 e 188918 17 Porcentagens calculadas sobre as cifras fornecidas por Taunay 1943 v 7 p 451453 18 Conf Simonsen 1973 p 207208 Para os dados de produção ver o trabalho de Fraga 1963 Raízes da concentração industrial em São Paulo 45 A derrubada de matas e a abertura das terras virgens para esse plantio por certo não agravaria o problema Isto pode ser inferido pelas informações dadas por Taunay demonstrando em primeiro lugar que esse tipo de trabalho era feito também pela mãodeobra livre nacional Diz Geralmente eram os caboclos e os mineiros que de preferência faziam as derrubadas hoje geralmente cometidas nas zonas novas cafeeiras como se sabe a bahianos denominação que no farwest paulista abrange não só os filhos da Bahia como os do Norte de Minas Gerais19 Deduzi de outras informações dadas por Taunay que o trabalho de abertura dessas terras que estimo em 120 mil hectares requeriam o trabalho de menos de 2000 homens durante aqueles oito anos e é evidente que essa mãodeobra era potencialmente disponível dado o crescimento da população nacional livre Tabela 1 O problema grave seria o da colheita e do trato do cafeeiro Para isto como se sabe a mãodeobra nacional livre não era utilizada e só o era excepcionalmente20 Se o plantio e as safras correspondentes fossem homogeneamente distribuídos nesse período seriam requeridos em cada ano a partir de 1881 inclusive cerca de 12500 imigrantes totalizando cem mil em 1888 para o período como um todo não haveria problema uma vez que as estatísticas oficiais de imigração em São Paulo acusam um total de 155473 imigrantes no período Porém entre 1881 e 1885 entraram apenas 21739 implicando isso num déficit de cerca de 41000 trabalhadores para o total estimado de 62500 Como os serviços administrativos de imigração do estado de São Paulo só se completam em 1887 com a instalação da Hospedaria dos Imigrantes é possível que as estatísticas oficiais anteriores a essa data estejam subestimadas é o que dá a entender Roberto Simonsen quando diz que em 1880 já existiam em São Paulo mais de 50000 imigrantes europeus Em 1888 cerca de 19 Conf Taunay 1943 v 7 cap 5 A citação encontrase à página 139 Nesse texto Taunay se refere às derrubadas descritas em fins do século XIX por C F D Laerne Le Bresil et Java Rapport sur la culture du café en Amérique Asie et Afrique 1885 Os grifos na citação original de Taunay Outras referências também se encontram em Taunay v 8 p 20 ver ainda Furtado 1961 cap 26 20 O trabalho de Taunay contém várias informações sobre casos em que coexistiam colonos nacionais e imigrantes numa só propriedade e casos em que o trabalho era totalmente feito por caboclos Ver por exemplo no volume oito as páginas 116 179 a 181 Costa 1966 p 108 também cita exemplo dessa convivência de trabalhadores nacionais e estrangeiros Wilson Cano 46 200000 Estes dados excedem os oficiais em mais de 25000 imigrantes e se aqueles estivessem corretos o déficit estaria bastante reduzido e passível considerandose a época de transição de uma solução distinta reaproveitamento de escravos fugidos de zonas decadentes de libertos ou mesmo aproveitamento de mãodeobra nacional21 De 1886 em diante não haveria maiores problemas o crescente fluxo imigratório solucionaria a escassez da oferta de mãodeobra consolidando ao mesmo tempo a passagem para o sistema de trabalho assalariado Tabela 1 População Livre Imigração e Escravos no Estado de São Paulo I II III III IIIII IIII IV Anos Escravos População Imigrantes II I III Total totacumul 1854 117731 a 417149 a 4209 0282 0010 0036 295209 1872 156612 837354 10464 0187 0012 0067 670278 1873 174662 11054 0063 1874 169964 11174 0066 1880 168950 22242 0132 1883 174622 32602 0187 1885 128000 b 43981 0344 1886 106665 c 1221380 c 53517 0087 0044 0502 1061198 1887 107829 85629 0794 1890 1384753 243899 0176 1140854 1897 862530 1900 2282279 963486 0422 1318793 Fontes I Taunay História do Café no Brasil vol7 páginas 445450 II Censos Demográficos III Boletim da Directoria de Terras Colonização e Immigração 1937 página 49 a Viotti da Costa Da Senzala à Colônia páginas 205207 b Grahan e Holanda Migration Regional and Urban Growth and Development in Brazil página 31 c Camargo Crescimento da População no Estado de São Paulo e seus Aspectos Econômicos páginas 5357 Vejamos em síntese as diferentes formas assumidas pelo trabalho livre durante a transição e especificamente as vantagens decorrentes da instituição do sistema do colonato 21 Conf Simonsen 1973 p 208 Taunay v 8 cap 1 também lança suspeitas sobre possível subestimação do número de imigrantes Tabela 1 População livre imigração e escravos no estado de São Paulo Fontes I Taunay História do café no Brasil v 7 p 445450 II Censos Demográficos III Boletim da Directoria de Terras Colonização e Immigração p 49 1937 a Viotti da Costa 1966 p 205207 b Grahan e Holanda Filho 1971 p 31 c Camargo 1953 p 5357 Raízes da concentração industrial em São Paulo 47 Coexistiram durante algum tempo nas lavouras cafeeiras do Oeste Paulista distintos sistemas de emprego além do escravista naturalmente e de remuneração da mãodeobra o de parceria que permitia ao parceiro o plantio intercalado ou não de alimentos e estabelecia a divisão entre o proprietário e o parceiro dos lucros obtidos tanto no café como na venda dos produtos agrícolas produzidos pelo parceiro o de salário fixo e o do colonato que compreendia um sistema misto de pagamento e de renda um salário fixo pelo trato de determinado número de cafeeiros um variável pela colheita de café e o direito de plantio e criação de animais dentro da propriedade cafeeira22 Coexistindo cada um destes sistemas com o trabalho escravo muitas vezes na mesma fazenda podese entender como essas mudanças não surtiam melhor efeito Tanto no que se refere às relações proprietário trabalhadores que em certa medida continuariam se pautando como se no escravismo como também nos níveis de remuneração ao trabalho que permaneceriam muito baixos Devese ainda lembrar da inconveniência causada pela promiscuidade local de trabalhadores livres e de escravos Com efeito o regime de parceria que ganhava expressão a partir de 1847 na Fazenda Ibicaba em São Paulo entraria em declínio já a partir de 1860 sendo paulatinamente substituído pelo sistema de salário fixo e mais tarde pelo do colonato Entre a parceria e o salário fixo é difícil saber qual dos dois tenha sido mais precário se o primeiro ao prometer juridicamente a divisão dos lucros criava a ilusão de grandes ganhos ao parceiro e por isso mesmo aumentavalhe a insatisfação e a ineficiência quando recebia o seu quinhão ou o de salário fixo embora não criasse quaisquer ilusões ao trabalhador davalhe entretanto um rendimento ainda mais inferior do que o recebido pelos parceiros23 Era evidente que diante dos preços relativamente baixos do café que em média se verificaram nas décadas de 1850 e de 1860 e dos altos custos de transporte os fazendeiros usariam de todos os ardis possíveis para pressionar para baixo o custo da mãodeobra Essa pressão deve ter atingido o seu máximo pois chegaram fazendeiros e autoridades entre 22 Informações detalhadas sobre essas sistemas podem ser encontradas em Hollanda 1969 v 3 tomo 2 livro segundo cap 1 Taunay v 8 p 1194 Costa 1966 cap 2 e 3 23 Ver a respeito Costa 1966 p 106109 Wilson Cano 48 1870 e 1883 a pensar na importação de trabalhadores chineses os chamados coolies que tradicionalmente recebiam ínfimos salários em vários países abaixo mesmo dos trabalhadores portugueses utilizados no regime de salário fixo no Oeste Paulista Simonsen 1973 p 205 Graças aos insucessos na introdução do trabalhador livre chinês o sistema teve de achar a solução através da imigração européia para o regime de colonato que se expande vagarosamente a partir de 1870 e se acelera a partir de 1883 Examinandose as condições estabelecidas para o regime de colonato podese concluir que elas significaram grandes vantagens para o fazendeiro e relativas vantagens para os colonos No regime anterior o escravo significava um capital fixo pela sua compra eou um custo fixo pelo seu aluguel ou manutenção no regime de trabalho livre aquele capital fixo passava a circulante para o financiamento de seus salários até a venda da produção e os custos eram agora repartidos em duas parcelas uma fixa pelo trato do cafezal e uma variável pela colheita Essa mudança diminuindo as imobilizações financeiras do fazendeiro rebaixava também suas despesas financeiras com juros O seguinte exemplo citado por Taunay é bastante esclarecedor compara o trabalho de uma família de imigrantes que tratava 17000 cafeeiros e que havia custado em termos de passagens instalação gastos iniciais etc cerca de 663 mil réis ao fazendeiro quantia esta saldada pelos colonos no ano seguinte de sua chegada para a mesma tarefa executada pelos imigrantes seriam necessários cinco escravos que custariam onze contos e quinhentos milréis computados apenas os juros equivalentes à inversão de um só desses escravos encontrase a soma de 276 milréis importância bastante superior aos custos fixos mais os custos variáveis representantes pelo pagamento a um imigrante Taunay 1943 v 8 p 103 Os exemplos citados por Viotti da Costa mostram por outro lado que os salários médios de um imigrante em período próximo à abolição situavamse em torno de 240 mil réis quantia essa muito próxima dos gastos anuais com a manutenção de um escravo em termos de alimentação e roupas Costa 1966 p 197202 Comparando os custos de produção de uma saca de café Simonsen afirma que nas fazendas com regime escravista ela chegava a custar 15000 ao passo que nas fazendas Raízes da concentração industrial em São Paulo 49 com regime de trabalho livre ela custava entre 7200 a 9800 Simonsen 1973 p 210 Mesmo se considerarmos que muitas famílias de imigrantes recebiam ganhos anuais bastante superiores aos acima apontados há que se entender que isso significava aumento dos custos totais variáveis da produção cafeeira amplamente compensados pelo aumento da produção física e da produtividade significando também uma diminuição dos custos fixos dos salários por unidade produzida Tabela 2 Expansão cafeeira no estado de São Paulo milhões de cafeeiros Período Cafeeiros em produção Produção de café milhões de sacas Novos cafeeiros plantados a Preços médios de exportação Período b Quant CrSaca Ourosaca 1880 106 12 1876 a 1883 105 305 311 1888 211 26 1884 a 1885 9 244 215 1890 220 290 1886 a 1896 306 560 316 1901 526 89 1897 159 556 174 1902 685 102 1898 a 1901 4 450 154 1906 689 69 1902 8 311 154 1907 697 1540 1903 a 1906 318 184 1911 697 850 1907 a 1908 25 290 182 1913 722 95 1909 a 1910 13 356 226 1915 735 92 1911 a 1913 99 523 349 1918 834 122 1914 a 1916 10 394 212 1921 844 102 1917 28 415 217 1922 872 82 1918 27 474 255 1923 899 70 1919 50 946 510 1924 949 104 1920 2 747 351 1925 951 92 1921 15 824 219 1926 966 101 1922 82 1187 312 1927 1048 99 1923 75 1469 305 1928 1123 180 1924 30 2059 462 1929 1153 88 1925 35 2151 550 1930 1188 1950 1926 77 1797 505 1931 1265 101 1927 174 1704 415 1932 1439 187 1928 65 2046 500 1933 1504 150 1929 a 1930 57 1911 e 1195 d 471 e 269 d 1935 1561 117 a 1942 c 384 1442 e 143 e a A quantidade de novos plantios foi estimada pelo autor pela simples variação do estoque de cafeeiros já produzindo significando na realidade um conceito de plantio líquido isto é novos plantios menos prováveis erradicações e replantios não considerados b A periodização foi estimada supondose que um novo cafeeiro só se torna plenamente produtor após 5 anos de seu plantio c Possivelmente a partir de 1935 d Preços médios de 1929 e de 1930 respectivamente e Preços médios do período 1931 a 1939 Fontes Prado Jr 1970 IBC 1962 Alves 1933 Simonsen 1973 Anuário Estatístico do Brasil 193940 Fraga 1963 A instituição do trabalho livre não precisamos sublinhar teve grande importância não apenas para a grande expansão cafeeira que se daria a partir de 1886 Como se verá na parte seguinte complexo capitalista e nos dois últimos capítulos deste livro desempenhou papel fundamental tanto para a acumulação cafeeira quanto para a industrial Wilson Cano 50 No que se refere aos demais componentes do complexo cafeeiro escravista pelas razões já apontadas e também para que se evitem desnecessárias repetições serão eles apresentados no estudo do complexo capitalista 113 O complexo cafeeiro capitalista de São Paulo Como se verá as mais avançadas e dinâmicas relações capitalistas de produção desse complexo possibilitaram acelerado e diversificado crescimento da economia paulista Ao longo desse processo de crescimento foise afirmando sua predominância em relação às demais regiões do país que não contaram com igual dinamicidade e nem com o mesmo avanço de suas relações capitalistas de produção Considerando as dificuldades já apontadas para a elaboração de uma análise integrada do complexo cafeeiro verifico inicialmente i a expansão e comportamento da atividade nuclear o café Em seguida destaco ii a expansão da oferta de mãodeobra iii a expansão ferroviária e seu papel na acumulação do complexo iv o papel desempenhado pela apropriação de terras v o desenvolvimento da agricultura produtora de alimentos e de matériasprimas e vi resumidamente os demais componentes do complexo mais representativos de seu segmento urbano i A expansão cafeeira a partir de 1886 Comecemos examinando rapidamente as linhas gerais da expansão cafeeira a partir de 1886 Resolvida a questão do suprimento de mãodeobra e recuperados os preços do café que haviam caído desde 1882 as condições para a expansão do plantio a partir de 18861887 eram extremamente favoráveis Com efeito entre 1886 e 1887 Tabela 2 o novo plantio totaliza 465 milhões de cafeeiros triplicando o estoque anterior 220 milhões e situando a capacidade produtiva em 685 milhões no que resultaria o aumento da participação paulista no total da produção brasileira de 40 em 1885 para mais de 60 na abertura do século XX Raízes da concentração industrial em São Paulo 51 A partir de 1897 entretanto os preços externos e internos do café caem provocando longa crise que terminaria por volta de 19101911 Notese que nos treze anos que compreendem o período 1898 a 1910 é diminuto o acréscimo das plantações tendo em vista não apenas os preços baixos mas principalmente os efeitos decorrentes da política deflacionista que se inicia com o governo de Campos Salles 18981902 e que continua no de Rodrigues Alves 19021906 A instituição por um qüinqüênio de um imposto de dois contos de réis sobre cada novo alqueire plantado com café a partir de 1902 prorrogado por mais cinco anos e as demais restrições decorrentes das normas estabelecidas pelo Convênio de Taubaté em 1906 tornava praticamente proibitivo qualquer novo plantio24 A recuperação dos preços a partir de 1910 mantendose altos até 1913 estimularia novo plantio que totaliza mais 99 milhões de cafeeiros no triênio 19111913 Foi lenta a expansão verificada durante a primeira guerra mundial com preços baixos e relativamente estáveis até meados de 1917 ano em que a floração dos cafezais anunciavam para 1918 uma safra excepcionalmente grande da mesma forma como se dera em 1906 1907 O temor de nova precipitação baixista dos preços fez com que se instituísse o segundo plano de valorização financiado com recursos do governo federal repassados ao governo do estado de São Paulo A intervenção do Estado e a grande geada de 1918 elevaram violentamente os preços que duplicam entre 1918 e 1919 estimulando assim um plantio de 50 milhões de cafeeiros em 1919 A nova perspectiva de uma grande safra para 1921 e a crise econômica ocorrida em 19201922 nos Estados Unidos provocariam novas quedas nos preços externos entre 1920 e 1923 que se recuperam internamente após 1922 pela desvalorização da taxa de câmbio que passa de Cr 1659 em 1920 para 2898 em 1921 e 4469 em 192325 Notese Tabela 2 que o plantio se reduz tão somente durante 19201921 Evidentemente não foi apenas a desvalorização a responsável pela expansão vigorosa que se processa a partir de 1922 a firme intervenção do Estado a partir de 1921 comprando 24 Sobre as políticas de valorização e defesa do café utilizei os seguintes textos Delfim Netto 1966 Simonsen 1973 e Villela e Suzigan 1973 25 Conforme Estey 1960 gráfico anexo à página 32 Wilson Cano 52 excedentes não exportáveis desta vez com recursos internos e externos praticamente avalizou o novo plantio de 157 milhões de cafeeiros que se daria entre 1922 e 1923 A defesa permanente instituída pelo governo federal a partir de 1922 que entre as várias medidas preconizadas estabeleceu o sistema de armazéns reguladores no interior encerrava contradição como mostrou Delfim Netto o café anteriormente depositado nos armazéns gerais era negociado na base dos warrants títulos esses passíveis de desconto bancário nos armazéns reguladores o fazendeiro recebia apenas como prova do café armazenado o conhecimento de transporte e armazenagem título este sem negociação bancária Delfim Netto 1966 p 117 Assim ainda que os preços externos e internos estivessem altos a situação financeira do cafeicultor e do intermediário na compra e venda do café era de falta de liquidez o que colocava o fazendeiro numa inferior posição de negociação obrigado a vender seu café por preços inferiores às cotações vigentes Durante o conturbado período do governo de Arthur Bernardes 19221926 a política cafeeira praticamente limitouse à instituição do sistema de armazéns reguladores Estes dois fatos certamente contribuíram para que a expansão do plantio em 1924 e 1925 se desse de forma relativamente moderada Em fins de 1924 o governo federal transfere a política de defesa permanente ao governo do estado de São Paulo de que resultariam a criação do Instituto Paulista da Defesa Permanente do Café que só passaria a ter existência concreta a partir de 1926 com a denominação de Instituto do Café do Estado de São Paulo e a transformação do antigo Banco de Crédito Hipotecário e Agrícola do Estado de São Paulo no Banco do Estado de São Paulo que passaria a partir dessa data a financiar o café estocado nos armazéns reguladores com a emissão de warrants e não dos antigos conhecimentos de embarque O financiamento contava com empréstimo externo de 10 milhões de libras esterlinas e teria como fonte para resgate a instituição de um imposto interno taxa de viação de um mil réisouro por saca Esse quadro seria complementado pela instituição da Caixa de Estabilização em fins de 1926 pelo governo federal cujo objetivo era o de evitar a valorização cambial do mil réis face ao ingresso Raízes da concentração industrial em São Paulo 53 de recursos externos e às altas cotações do café a partir de 1924 que persistiriam até fins de 192926 Em fins de 1929 além da expectativa de uma enorme safra para o ano seguinte se dá a eclosão da crise mundial precipitando os preços do café para baixo em 1930 embora os preços tivessem caído cerca de 45 em relação a 1928 situavamse ainda em níveis superiores aos vigentes durante a longa crise de 18971909 Este fato associado à perspectiva de que o sistema de defesa permanente teria um sucesso continuado permite que a grande expansão do plantio que se inicia em 1926 só termine em 1930 já em plena crise expandindose ainda as plantações neste último ano Façamos algumas observações suplementares Em primeiro lugar Tabela 2 a expansão maior do plantio que se realiza a partir de 1926 somente se transformaria em capacidade produtiva adicional por volta de 19311932 as surpreendentes safras de 19271928 e de 19291930 que produziram em São Paulo respectivamente 18 e 195 milhões de sacas se devem muito mais às excepcionais condições naturais desses dois anos e como mostrou Delfim Netto possivelmente também em função de melhor tratamento dispensado às plantações graças à melhoria dos preços do café Delfim Netto 1966 p 120129 A expansão do plantio que se dá a partir de 1926 quer me parecer deve ter sido fortemente influenciada pela explicitação clara da política de defesa permanente instituída pelo governo do estado de São Paulo entre 1925 e 1926 depois de período 19221924 de indefinição do governo federal É evidente que os preços superiores a 4 libras esterlinas por saca foram decisivos para essa expansão Entretanto eles já se situavam a esse nível desde 1924 em que o plantio inclusive o realizado em 1925 foi relativamente moderado Observese Tabela 3 que as produções qüinqüenais apresentavamse relativamente estabilizadas entre 19011905 e 19211925 no estado de São Paulo a despeito da expansão do plantio evidentemente as baixas safras que se seguem à geada de 1918 e uma possível redução da produtividade dos velhos cafezais podem explicar a 26 Estas informações foram obtidas fundamentalmente do citado trabalho de Delfim Netto Wilson Cano 54 tendência estabilizadora Quanto aos demais estados produtores a tendência parece ser um pouco distinta ela vinha declinando entre a primeira e a segunda década deste século principalmente no Rio de Janeiro e em Minas Gerais e o qüinqüênio 19211925 mostra um acréscimo de produção em torno de 32 sobre a produção do qüinqüênio anterior alterando a tendência e fazendo a produção subir ainda mais no qüinqüênio seguinte Uma explicação possível reside no fato de que os demais estados produtores de café podiam perfeitamente operar como ofertantes marginais da mesma forma que os demais países concorrentes do Brasil até o período de 1911 a 1920 a produção paulista perfazia cerca de 70 a 75 da produção nacional e na década seguinte pouco mais de 60 Tabela 3 Produção exportável de café São Paulo milhões de sacas por qüinqüênio estoque médio Anos de cafeeiros Brasil A São PauloB A B em produção milhões 190105 649 413 236 653 190610 731 507 224 695 191115 680 479 201 715 191620 660 451 209 813 192125 726 450 276 903 192630 994 660 334 1095 Fonte Constantino C Fraga Resenha Histórica do Café no Brasil Há que se lembrar por exemplo que durante o primeiro plano de valorização Convênio de Taubaté o comportamento dos demais estados cafeeiros havia sido um tanto reticente quanto às restrições e imposições que decorriam dos termos do Convênio ratificado por São Paulo Rio de Janeiro e Minas Gerais fazendo com que São Paulo conduzisse sozinho essa política por muito tempo Só à custa de concessões adicionais dadas por São Paulo àqueles dois estados é que finalmente se deu a adesão de fato ao cumprimento do programa Delfim Netto 1966 p 65 67 139 Quanto ao Rio de Janeiro parece bastante claro que sua decadência cafeeira certamente o impediu de tomar maiores controles ou restrições Tabela 3 Raízes da concentração industrial em São Paulo 55 quanto a Minas Gerais e Espírito Santo parecem ter se beneficiado pelos efeitos da política de sustentação de preços basicamente conduzida por São Paulo Notese que a grande expansão da produção dos demais estados que se dá a partir do qüinqüênio de 19211925 possivelmente foi decorrência de expansão de plantios realizados sob o amparo da política de valorização realizada em São Paulo entre 1917 e 1920 continuada pela de 1921 a 1924 e reforçada ainda mais o que permitiria também o início da expansão no Paraná em fins da década de 1920 pela política de defesa permanente a partir de 192627 A combinação de plantios adicionais nos demais estados e das condições excepcionais dos anos 19271928 e 19291930 faria com que a produção exportável do Brasil se cotejada a produção total da década de 19111920 134 milhões de sacas e a de 19211930 172 milhões fosse incrementada de 38 milhões de sacas das quais cabiam 18 milhões a São Paulo e 20 milhões aos demais estados Não pretendo com isso afirmar que se a produção dos demais estados não tivesse crescido dessa forma não ocorreria a grave crise cafeeira de 1930 Mas é certo todavia que esse acréscimo muito colaborou para a rápida precipitação da crise Apesar de responsáveis por pouco mais de um terço da oferta brasileira antes da vertiginosa expansão seu acréscimo 20 milhões de sacas representava entre 19211930 mais de 50 do excesso produzido no período 38 milhões de sacas Como se verá pelo exame dos componentes do complexo cafeeiro de São Paulo esta atividade foi sem qualquer dúvida superior a qualquer outra do país quer em termos de sua própria dimensão absoluta quer em termos de sua capacidade geradora de dinâmico processo de acumulação quer em termos de expansão interna do mercado 27 Efetivamente o número de cafeeiros em produção nos demais estados aumentou mais do que em São Paulo e como se vê na Tabela 3 essa expansão deve ter sido antecipada à expansão do plantio em São Paulo Os dados abaixo utilizados por Castro 1971 v 2 p 89 mostram claramente o fenômeno milhões de cafeeiros produtores 1921 1930 São Paulo 8436 11881 Demais estados 8868 13426 Wilson Cano 56 ii Expansão da oferta de força de trabalho Como se viu no estudo do complexo escravista a partir de 1886 a questão do suprimento de mãodeobra estava praticamente resolvida Com isso não apenas se permitia a continuidade da acumulação cafeeira mas se resolvia fundamental problema pela criação e expansão de um mercado de trabalho livre com oferta abundante e com salários flexíveis É possível mesmo se pensar que se não tivesse ocorrido a grande baixa dos preços do café entre 1882 e 1886 que refreou a expansão do plantio a transição para o regime de trabalho assalariado teria sido antecipada de alguns anos Entre 1882 e 1885 a média anual de imigrantes para São Paulo fora de 48 mil em 1886 esse número sobe para 95 mil em 1887 para 321 mil e de 1888 a 1897 685 mil perfazendo o total de 727 mil imigrantes entre 1886 e 189728 Obviamente nem todas as regiões paulistas foram igualmente beneficiadas com esse influxo Tomado o período de 1901 a 1920 do total de imigrantes alocados pelos serviços oficiais de imigração a região do Vale do Paraíba recebia apenas 06 e a de Campinas Sorocaba e Bragança que se poderia chamar de região intermediária 9 a Capital e sua vizinha região 10 enquanto as zonas pioneiras da Mogiana e as de Rio Claro Catanduva e Rio Preto abrigavam respectivamente 30 e 34 A da Noroeste que dava apenas seus primeiros passos acolhia 1529 Considerado o período de 18871930 entraram em São Paulo cerca de 25 milhões de imigrantes dos quais 280 mil brasileiros nordestinos e mineiros principalmente e 85 mil japoneses Dado que a taxa de permanência entradassaídasentradas era de aproxima damente 30 podese estimar em cerca de 850 mil o número líquido de imigrantes para São Paulo30 Entre 1920 e 1929 cresceria muito a imigração de japoneses e de trabalhadores nacionais que totalizam 28 Conf Boletim da Diretoria de Terras Colonização e Imigração São Paulo Secretaria da Agricultura Indústria e Comércio v 1 p 52 out 1937 29 As porcentagens foram calculadas sobre os valores absolutos constantes no trabalho de Camargo 1953 v 1 p 124132 30 Para a taxa de permanência ver Camargo 1953 v 2 p 29 Para a imigração japonesa e total ver a fonte citada nas notas 41 e 42 Raízes da concentração industrial em São Paulo 57 respectivamente 56 mil e 226 mil imigrantes31 A partir desse momento a participação dos imigrantes nacionais sobre o total de imigrantes seria francamente predominante Essa alteração qualitativa que se processa na década de 1920 teria importância fundamental a imigração japonesa embora em grande parte alocada na cafeicultura proporcionou desde cedo notável diversificação na agricultura produtora de alimentos32 a imigração nacional originada de regiões deprimidas e em parte em decorrência de secas regionais onde a taxa de salário era muito baixa ao mesmo tempo em que engrossava a oferta de mãodeobra contribuía também para que a taxa de salário em São Paulo não se elevasse Devese lembrar nesse sentido que é exatamente durante a grande expansão do plantio da segunda metade da década de 1920 que a imigração de trabalhadores nacionais para São Paulo cresce entram no período nada menos do que 156000 trabalhadores principalmente nordestinos e mineiros33 No que se refere à questão da flexibilidade dos salários cabem as seguintes observações É evidente que até o momento em que havia escassez absoluta ou relativa de mãodeobra eles poderiam se rigidificar mesmo em épocas de queda de preços Entretanto quando aumentam os fluxos migratórios os salários monetários passam a ser flexíveis para baixo Por exemplo entre 1883 e 1886 em que se verifica queda dos preços do café os salários mantiveramse relativamente rígidos Entretanto durante a longa crise de preços que se inicia em 1897 quando a oferta de trabalhadores já é abundante há uma queda expressiva dos salários34 Na crise de 1929 quando a oferta de trabalhadores nacionais e estrangeiros era muito grande e crescente ver Apêndice Estatístico a queda dos salários dos trabalhadores no café chega a ser 30 a 4035 31 Para a imigração nacional ver os trabalhos de Camargo 1960 p 123 e Nogueira 1964 p 28 32 Ver mais adiante o item v expansão da agricultura produtora de alimentos 33 A questão sobre o reduzidíssimo aproveitamento da mãodeobra nacional na economia cafeeira antes de 1920 foi inicialmente discutida por Furtado 1961 cap 2124 e por Graham e Hollanda Filho 1971 p 3346 Tal discussão não será aqui retomada pois a meu juízo extravasa os limites deste trabalho 34 Os dados sobre a evolução dos salários encontramse no trabalho de Michael Hall The origins of mass immigration in Brazil 18711914 Conforme Cardoso de Mello 1975 p 134147 35 Dados obtidos no trabalho de Delfim Netto p 132 Ver também em Basbaum 1968 v 2 p 154 e 255 Wilson Cano 58 Assim o regime de trabalho livre não só permitia a baixa dos salários comprimindo portanto os custos para a defesa da taxa de lucro como também permitia a dispensa pelo menos temporária de alguns trabalhadores durante as crises mais agudas36 Em síntese o regime de trabalho livre possibilitou ao complexo cafeeiro as seguintes e principais vantagens a diminuição dos custos de produção cafeeira e o aumento de sua produtividade permitindo um uso mais intenso e extenso de equipamentos agrícolas a cessão de terras para o plantio sem o ônus do regime de parceria permitiu um aumento da renda em espécie e também da monetária quando existissem mercados para os excedentes agrícolas dos colonos e implicou na diversificação agrícola do complexo o regime de salários permitiu ainda o surgimento de uma ampla camada social com poder aquisitivo capaz de dilatar o mercado para bens de consumo corrente ampliando dessa forma as oportunidades internas de inversão no complexo proporcionou também o alargamento da disponibilidade de mãode obra para a expansão urbanaindustrial tanto pela entrada direta de imigrantes nãoagrícolas como pelo próprio movimento de atração e fuga de imigrantes gerado pelas crises do café37 iii A expansão ferroviária em São Paulo38 Ao contrário do que ocorreu com a maior parte das ferrovias nas demais regiões brasileiras as implantadas em São Paulo tiveram um padrão de eficiência contribuindo poderosamente para a expansão do processo de acumulação do complexo 36 Podese ver pelo exame das tabelas sobre imigração constantes no apêndice estatístico que o número elevado de imigrantes que deixaram São Paulo em relação ao número dos que entravam em São Paulo permitia uma constante renovaçãodo estoque de mãodeobra 37 Por exemplo do total de 1 221 282 imigrantes entrados em São Paulo entre 1908 e 1936 apenas 59 deles eram declaradamente trabalhadores agrícolas conforme o Boletim da Diretoria de Terras Colonização e Imigração p 74 out 1937 ver também Morse p 239 38 A fim de evitar um número excessivo de notas de rodapé informo que salvo nas citações específicas que faço os informes utilizados neste item foram obtidos das seguintes publicações Simonsen 1973 p 197201 Anuário Estatístico do Estado de São Paulo vários anos e do Censo de 1907 v 3 Raízes da concentração industrial em São Paulo 59 É bem verdade que elas contaram com o monopólio do transporte do produto mais dinâmico da economia brasileira até 1930 mas também é certo que mesmo após a crise de 1929 continuariam operando com eficiência e lucratividade graças ao fato de prestarem seus serviços à mais avançada economia capitalista do país39 Tabela 4 Estado de São Paulo Movimento Financeiro e Expansão da Rede Ferroviária da Cia Mogyana e da Cia Paulista Médias Via Férrea Contos de Réis Saldo Anuais Kma Receita Despesa Saldo Receita 18761880 431 25894 10542 15352 593 18811885 611 41792 18336 23456 561 18861890 1034 47141 32876 14265 303 18911895 1624 213851 125204 88647 415 18961900 1726 366571 184602 181969 496 19011905 2078 383466 180860 203506 531 19061910 2327 432855 196774 236081 545 Fonte Dados Brutos Anuário Estatístico de São Paulo 1910 Repartição de Estatística e Archivo do Estado São Paulo 1912 a Quilometragem no último ano de cada período Das vinte ferrovias existentes em 1910 em São Paulo apenas duas eram de propriedade do governo federal uma do governo estadual uma do capital estrangeiro e as restantes 16 de propriedade nacional privada destacandose entre estas a Mogiana e a Paulista Até 1876 antes do início da expansão do plantio que vai até 1883 a Mogiana e a Paulista juntas totalizavam apenas 200 km de penetração além de Jundiaí quando se inicia a nova expansão de plantio em 1886 essas duas estradas Tabela 4 já haviam penetrado 611 km e ao final dessa expansão 1897 já contavam com mais de 1600 km Além de outros os fazendeiros de café foram os grandes organizadores e investidores da maior parte das ferrovias paulistas e principalmente da Mogiana e da Paulista 39 Mesmo durante a crise da década de 1930 a relação despesareceitas situouse em torno de 07 Conforme Boletim do Departamento Estadual de Estatística São Paulo p 43 out 1941 Tabela 4 Estado de São Paulo Movimento financeiro e expansão da Rede Ferroviária da Cia Mogyana e da Cia Paulista Wilson Cano 60 Para que se tenha uma noção mais direta de sua importância vejamos algumas de suas principais cifras O capital total de 96000 contos de réis nelas investido até 1885 passaria para cerca de 360000 contos de réis em 1910 descontados desta última importância os capitais investidos nas ferrovias federais e na de propriedade inglesa restam 242500 contos 65000 dos quais referentes à Sorocabana pertencente ao governo do estado 161500 referentes ao capital da Paulista e da Mogiana e o restante representando as demais pequenas estradas de capital privado Esses dados ganham realce se comparados por exemplo com os capitais empregados na indústria de transformação do estado de São Paulo cuja soma importava em 127700 contos em 1907 ou com os capitais empregados pela indústria têxtil algodoeira paulista em 1910 que totalizavam 46650 contos Se de um lado as ferrovias transferiram sensíveis economias externas e diminuíram os custos aos cafeicultores por outro lado esses mesmos cafeicultores cuidaram para que ela fosse também lucrativa Desta forma a ferrovia passa a cumprir mais dois importantes papéis Um por se tomar uma nova e rentável oportunidade de inversão a parcelas do excedente gerado pelo complexo cafeeiro tornandose destino para parte desses capitais outro referese a sua lucratividade relativamente alta que lhe confere o caráter de origem de novos capitais que permitem nova ampliação do excedente do complexo As receitas ferroviárias que em 1907 totalizavam 84000 contos equivaliam naquele mesmo ano a 71 do valor bruto dá produção industrial paulista Somadas apenas as receitas da Paulista e da Mogiana nesse mesmo ano elas representavam 95 do valor da produção têxtil Tomada a média do qüinqüênio 19061910 Tabela 4 as receitas dessas duas empresas representavam nesse período cerca de 145 do valor das exportações paulistas de café Enquanto a indústria paulista empregava 24186 pessoas em 1907 as ferrovias em 1910 empregavam 18501 pessoas Quanto à lucratividade algumas poucas cifras permitem o seu claro entendimento a Sorocabana de propriedade do estado tinha nesses últimos anos saldos positivos em torno de 6000 contos que para um capital de 65000 lhe conferia uma taxa de lucro de cerca de 9 a Raízes da concentração industrial em São Paulo 61 Mogiana e a Paulista para um capital total de 161500 contos apresentavam saldos equivalentes a 146 desse capital À época da expansão ferroviária em que vigorava o sistema de garantia de juros 5 pelo governo federal e mais 2 pelo estadual também as ferrovias paulistas se utilizaram desse sistema entretanto a São Paulo Railway por exemplo recebeu juros até 1874 e em 1887 já havia devolvido ao governo as importâncias a esse título recebidas e a Paulista já em 1881 também havia restituído os juros recebidos Diferente foi a situação da grande maioria das ferrovias de outras regiões brasileiras na impossibilidade de saldar seus juros ao governo terminaram por transferir sua propriedade a ele Já em 1907 do total de 17605 km da rede ferroviária brasileira 45 pertenciam ao governo federal Cabe lembrar ainda mais um efeito positivo Como as ferrovias requerem grande aparato em termos de construção e reparos mecânicos é fácil compreender sua importância nos primórdios de nossa industrialização quando instalaram importantes oficinas de reparo construção e montagem promovendo inclusive treinamento e habilitação da mãodeobra iv O papel desempenhado pela apropriação de terras Dadas as poucas informações de que disponho sobre os custos de obtenção de terras limitome aqui à tentativa de esboçar aquilo que seriam as linhas gerais da função desempenhada pela terra na expansão cafeeira paulista De início cabe especificar os tipos de terra que se prestaram a essa atividade a terras já utilizadas com cultivos comerciais açúcar por exemplo e de posse e propriedade privada definidas b terras não cultivadas virgens com propriedade privada definida c terras com cultivos de caboclo roçados simples de posse privada mas sem estatuto definido da propriedade d terras ocupadas por índios e terras virgens sem posse e propriedade privadas ou seja as propriamente chamadas devolutas As terras de tipo a somente seriam utilizadas no café pelo mesmo proprietário quando dispusesse de capital suficiente para arcar Wilson Cano 62 com o custo de formação do cafezal que como é sabido imobiliza recursos durante cinco anos com retorno praticamente nulo nesse período Uma outra condição seria a de que a extensão dessa terra fosse compatível com o tamanho requerido pelo café Caso não fossem preenchidas as duas condições essa terra provavelmente deveria ser vendida a terceiros As de tipo b requereriam evidentemente as mesmas condições com a diferença fundamental de que certamente seu preço de venda custo de aquisição para o cafeicultor seria inferior ao a As de tipo c e d são as expropriadas pacificamente ou não de seus antigos ocupantes e seu custo de aquisição certamente era inferior às de tipo a e b e talvez superior às do tipo e Não só o preço efetivamente pago mas também o estatuto jurídico da propriedade dessas terras desempenharam papel importante no processo de acumulação de capital do complexo cafeeiro40 O fato de que tanto a economia interna de mercado como o fluxo de exportações de São Paulo antes da expansão cafeeira eram de pequenas dimensões permite a formulação da hipótese de que as terras de tipo a teriam sido de pouca expressão quantitativa em relação às terras que o café ocupou principalmente depois de 1875 A parte das terras de tipo a convertidas pelo antigo proprietário em cultivo de café significa a inexistência de gastos efetivos com o custo de aquisição o que por sua vez implica em maior relação entre seus lucros monetários e os recursos financeiros efetivamente aplicados O mesmo raciocínio de lucratividade e inversão se aplica às terras de tipo b com uma vantagem adicional que é o fato de serem virgens e obviamente resultarem em níveis maiores de produtividade física As de tipo c e d bem como as de tipo e depois de legalizada sua posse e propriedade significam ainda baixo custo de aquisição Excluídas as terras de tipo a todas as demais possuem um significado comum antes da expansão cafeeira elas não tinham um uso alternativo em economia de mercado e seu valor era nulo com a expansão cafeeira seu uso é solicitado e lhe é conferido um valor como parte do capital empregado na atividade cafeeira Assim seus primeiros 40 Ver a esse respeito os trabalhos de Sérgio S Silva e de Alberto P Guimarães 1968 Raízes da concentração industrial em São Paulo 63 apropriadores passam a dispor de um bem que agora tem valor de uso e de troca e que na realidade teve um custo nulo ou quase nulo de aquisição Resolvido o problema da necessidade de mãodeobra para trabalhar essas terras elas se convertem efetivamente em capital fixo Com as informações disponíveis podese estimar que até 1875 o café teria ocupado apenas 15 cerca de 135 mil hectares da área que estaria ocupando em 1907 cerca de 900 mil hectares com o novo plantio que se deu entre 1876 e 1883 teriam sido incorporados cerca de 150 mil hectares e com o de 1886 a 1897 mais 600 mil Entre 1907 e 1930 a expansão do café indica que sua área plantada teria mais que duplicado atingindo 23 milhões de hectares Por outro lado a expansão dos demais segmentos da agricultura paulista entre 1900 e 1930 incorporou ainda outros 2 milhões de hectares O papel das terras incorporadas no entanto preenche ainda outro requisito fundamental o qual só pode ser apreendido quando se examina a marcha dinâmica do café Como mostrou Castro podese distinguir num só momento quando a cultura já adquiriu dimensão espacial maior três espaços ocupados pelo café as zonas velhas onde a produtividade do cafeeiro já é baixa as intermediárias onde o cafeeiro adulto encontra o seu pleno nível de produção e produtividade e as pioneiras onde ele está sendo plantado ou se encontra em idade muito nova Castro 196971 v 2 p 61 O que pretendo colocar aqui é a hipótese de um mecanismo dinâmico de substituição do uso do solo e da propriedade desse solo Ele funcionaria com as seguintes condições em primeiro lugar os rendimentos físicos e econômicos dessas zonas seriam grandes na zona intermediária baixos na zona velha e os mais altos na zona pioneira em função disso os preços dessas terras custo de aquisição seriam possivelmente baixos nas zonas velhas altos nas intermediárias e nas zonas pioneiras os preços das terras ainda não ocupadas com café estariam provavelmente situados num ponto entre os preços das duas outras zonas Esse mecanismo seria acionado basicamente pela seguinte razão À medida que aumentasse a exaustão das terras nas zonas velhas baixando a produtividade e os lucros a existência de terras virgens nas zonas pioneiras se constituía em excelente alternativa de inversão para o Wilson Cano 64 fazendeiro41 Este vendendo suas terras nas zonas velhas desmobilizava capital podendo reinvertêlo na formação de novos cafezais nas zonas pioneiras com alta produtividade A alternativa de continuar operando nas terras velhas exigiria para evitar baixa nos lucros uma melhoria no tratamento das plantações e alguma recuperação da fertilidade do solo Isto entretanto se bem que pudesse recuperar melhores níveis de produtividade provocava aumento nos custos e portanto as margens de lucro seriam ainda assim deprimidas Isto seria agravado sempre que as crises do café fossem mais longas como a de 18971910 por exemplo com baixa acentuada nos preços Assim seria mais vantajoso ao cafeicultor vender suas terras a preços mais baixos do que os vigentes para as terras virgens nas zonas pioneiras Essa baixa do preço da terra e a possibilidade de seu fracionamento possibilitaria sua venda principalmente a excolonos que tivessem acumulado algum capital42 Com isto vários efeitos importantes poderiam ocorrer e entre eles destaco a diversificação de cultivos fora da propriedade cafeeira e portanto mais inseridos numa economia de mercado b para o antigo proprietário a conversão de suas terras em capital financeiro permitia maior fluidez do dinheiro no complexo facultando inclusive a canalização desse dinheiro para outros compartimentos do sistema ou para a própria cafeicultura Uma última consideração sobre a questão dos preços das terras deve ainda ser colocada Ainda que tivesse ocorrido uma especulação de terras pioneiras do Oeste Paulista os preços decorrentes dessa especulação teriam como limite superior o preço de transferência das propriedades cafeicultoras das zonas intermediárias descontado o custo 41 Simonsen 1973 p 189 194 e 202 dá informações sobre produtividades médias de 20 arrobas por 1000 cafeeiros na decadente zona do Vale do Paraíba e nas zonas pioneiras do oeste paulista informa sobre casos em que a produtividade chegou a atingir até 300 arrobas e nas zonas intermediárias ela atingiria a 100 arrobas Ver também no trabalho de Hollanda 1969 v 3 t 2 p 175 os contrastes entre as produtividades médias de 80 a 100 arrobas no Oeste Paulista e de 20 a 30 arrobas no Vale do Paraíba ver ainda Costa 1966 p 197 42 O fracionamento poderia ser evitado por exemplo se o novo uso fosse dedicado à atividade pecuária Raízes da concentração industrial em São Paulo 65 de formação do cafezal naturalmente Como a expansão do plantio foi realmente grande tornase evidente que os preços de exportação do café não os preços de baixa naturalmente teriam sido compatíveis com uma taxa de lucros aceitável E certamente ela o foi pois a expansão que ocorre após 1921 não teria outra justificativa De qualquer forma esse sobrepreço de especulação adquire o significado de um excedente antecipadamente apropriado do fazendeiro pelo intermediário de terras que se converte em capital financeiro podendo assim ter outra aplicação produtiva na acumulação do complexo v A diversificação da agricultura paulista O período entre 1880 e 1910 que compreende a grande expansão da capacidade produtiva e da produção cafeeira paulista coincide com o momento em que a economia brasileira é submetida a grandes pressões por aumento de importações Elas saltam de uma média de 16 milhões de na década de 1880 para cerca de 25 milhões na década de 1890 para mais de 30 milhões entre 1900 e 1910 e mais de 50 milhões na década seguinte Cerca de 40 até 1901 a 30 média aproximada de 1901 a 1920 desse montante se referiam a gastos com importações de alimentos Dado que entre 1887 e 1920 entram em São Paulo fundamentalmente para a atividade cafeeira cerca de um milhão de imigrantes europeus em sua grande maioria e considerandose também que a cidade de São Paulo entre 1890 e 1920 passa de 65 mil a 579 mil habitantes e o estado de São Paulo passa de 14 milhão a 46 milhões estes fatos poderiam sugerir a causa daquele aumento de importações de alimentos Entretanto nesse mesmo período ocorre forte expansão demográfica na Guanabara cuja população eminentemente urbana e portanto nãoprodutora de alimentos cresce entre 1890 e 1920 de 522 mil a 1158 mil habitantes na mesma época a Amazônia atravessava a fase áurea da borracha passando sua população de 476 mil a 1439 mil habitantes Entre fins do século XIX e início do XX do total das importações brasileiras cerca de 10 se destinava à Amazônia e mais de 40 se destinava ao porto do Rio de Janeiro43 Notese que a Amazônia em 1900 43 Dados obtidos em Comércio Exterior do Brasil 19011910 Wilson Cano 66 tinha pouco menos de 4 dá população do país notese também que somadas as populações de Minas Gerais do estado do Rio de Janeiro e da Guanabara uma vez que o seu porto também serve em grande parte àqueles estados resultava uma soma de pouco mais de 30 da população do país Assim essas regiões perfazendo menos de 35 da população importavam mais de 50 do total importado pelo país Nesse transcurso São Paulo que tinha 13 da população brasileira importava pouco mais de 20 do total e exportava cerca de 35 a 40 do total das exportações brasileiras As estatísticas de importações mostram que o total de alimentos importados pelo porto do Rio de Janeiro no período de 1888 a 1899 no que se refere ao arroz milho charque e banha representariam algo em torno de 50 do total das importações brasileiras desses produtos Villela Suzigan 1973 p 112113 A Amazônia em 1913 no período áureo da borracha importava arroz no equivalente a 28 do total de arroz importado pelo país 35 do feijão 35 do milho e 17 da batata44 Tabela 5 Alguns produtos alimentares importados do exterior pelo Estado de São Paulo relacionados com os totais importados pelo Brasil e com os totais produzidos no Estado de São Paulo em calculadas sobre os volumes físicos Produtos sobre a produção paulista 190105 190610 191115 191620 190105 191115 191620 arroz 264 206 114 00 500 10 00 feijão 55 37 80 00 06 05 00 milho 90 15 181 18 00 00 00 charque 08 04 06 00 00 batata 168 148 147 128 100 47 Fontes dados brutos a Brasil Villela e Suzigan página 60 b São Paulo as mesmas da tabela 6 e Anuário Estatístico de São Paulo vários anos sobre a importação brasileira Os dados contidos na Tabela 5 são bastante elucidativos a respeito das importações paulistas de alimentos simples No caso do arroz que é o produto de maior expressão as importações caem a partir de 1907 a menos de 10 do que São Paulo importava em 19051906 e já a partir daquele ano representam menos de 2 da produção em São Paulo 44 Estes dados estão em Jobim 1941 p 3138 Tabela 5 Alguns produtos alimentares importados do exterior pelo estado de São Paulo relacionados com os totais importados pelo Brasil e com os totais produzidos no estado de São Paulo em calculadas sobre os volumes físicos Raízes da concentração industrial em São Paulo 67 Na realidade o que se deve destacar nas importações paulistas de alimentos provenientes do exterior são aqueles produtos para os quais o Brasil pelo menos até aquele momento não tinha condições de substituí los por produção interna Refirome a produtos não só de consumo de massa mas também a produtos de consumo das camadas de maior renda como queijos e manteiga francesas vinhos finos azeite de oliva conservas etc esses produtos mais o bacalhau o trigo e a farinha de trigo que São Paulo vai substituindo por moagem interna das crescentes importações de trigo em grão perfaziam em média na primeira década do século XX cerca de 70 das importações paulistas em alimentos e na década seguinte passam a representar cerca de 90 Por serem de consumo obrigatório e de difícil produção interna ou por serem consumidas pelas altas classes essas importações dificilmente são comprimíveis tanto é que somente após a crise de 1930 exclusive o caso do trigo é que se conseguiu sua efetiva substituição por produtos nacionais na maioria dos casos45 Ainda assim as importações totais de alimentos representavam de 1905 a 1930 para o estado de São Paulo o equivalente a cerca de 13 a 15 das exportações totais paulistas enquanto no resto do país Brasil exclusive São Paulo elas significavam porcentagem maior que 25 representando portanto uma demanda relativa e absoluta de divisas maior do que a verificada em São Paulo ver Apêndice Estatístico O desenvolvimento e diversificação da agricultura paulista exclusive café está intimamente vinculado ao processo de desenvolvimento da cafeicultura que se expandiu ao se consolidar o sistema do colonato Neste regime de trabalho como se sabe além do salário fixo e do salário variável pagos pelo fazendeiro ao colono o proprietário ainda permitia que o colono plantasse e desenvolvesse pequenas criações dentro da propriedade cafeeira permitindolhe o plantio intercalado nas ruas do cafezal de arroz milho e feijão enquanto as 45 No Apêndice Estatístico incluo dados sobre as importações de alimentos realizados pelo resto do país e pelo estado de São Paulo Wilson Cano 68 plantas cafeeiras fossem pequenas e muitas vezes milho e feijão mesmo quando o cafezal já era adulto46 Quando tal permissão não fosse dada quer por razões de fertilidade do solo ou quer por outras razões quaisquer o fazendeiro cedia terras não ocupadas com o café para aquele mesmo fim Dessa forma o colono obtinha parte fundamental de sua subsistência vendendo ainda eventuais excedentes nas zonas urbanas em expansão Essa agricultura era totalmente dependente da atividade nuclear o café e portanto tinha autonomia muito relativa estava vinculada em síntese às sobras e aos tempos sobrantes de recursos semiutilizados pelo café horashomem horasmáquina e áreas de terra não utilizadas pelo café Entendida dessa forma vêse que seu desenvolvimento tendia a um limite ditado pela atividade nuclear À medida que o complexo cafeeiro se desenvolve e gera um processo crescente de urbanização decorrente de atividades afins do comércio da indústria etc o sistema reclama também a expansão da agricultura independente da atividade nuclear ou seja aquela que é feita fora da propriedade cafeeira operando com seus próprios recursos físicos Esta modalidade agrícola cresceu mais dinamicamente após 1900 período em que a expansão da cidade de São Paulo e de alguns outros núcleos urbanos paulistas se torna evidente A vitivinicultura por exemplo é uma exceção ao condicionante da urbanização em grande escala mas ao mesmo tempo ela requer uma atividade especializada razão pela qual só se desenvolve independentemente da atividade cafeeira Já no início do século XX ela surge em São Paulo principalmente em pequenas propriedades de excolonos mas sua expansão era contida pelos reduzidos preços dos vinhos estrangeiros e por sua melhor qualidade naturalmente cujas importações equivaliam a cerca de 25 das importações alimentares ou a cerca de 8 das importações totais do estado de São Paulo47 46 Entre os inúmeros trabalhos que trataram da matéria cito os seguintes Nogueira 1973 p 8586 Guimarães 1968 p 146 Prado Júnior 1970 p 228 Delfim Netto 1966 p 43 Taunay 1943 v 8 cap 13 Costa 1966 p 221224 47 Cálculos elaborados com os dados das pautas de comércio exterior do estado de São Paulo publicadas pelo Anuário Estatístico do Estado de São Paulo as porcentagens se referem à média do período 1901 a 1910 Raízes da concentração industrial em São Paulo 69 Outro fator que pode ser adicionado como estimulante à expansão da segunda modalidade agrícola é o do aumento do protecionismo que se estabelece em 190548 Sem dúvida esse fato muito contribuiu para a expansão agrícola em São Paulo mas não se pode esquecer que exatamente nesse período 1897 a 1910 ocorre a grande baixa dos preços do café gerando a crise financeira para muitos fazendeiros principalmente nos segmentos de menor produtividade imprimindo ainda uma compressão nas taxas de salários49 Se nesse momento atuasse o mecanismo conversar do uso da terra e transferidor da propriedade fragmentandoa conforme já disse é claro que se criam as precondições para a expansão diversificada dessa agricultura que se vê duplamente reforçada pela fuga de imigrantes de um lado porque eram também produtores de alimentos e ao deixar a cafeicultura é provável que diminua a intensidade da produção agrícola interna ao café de outro lado nem todos os imigrantes que abandonam cafezais se transformam em pequenos agricultores independentes ou deixam o país mas uma parte deles emigra para os núcleos urbanos à procura de melhor ocupação e com isso deixam de ser produtores de alimentos para se tornarem consumidores de alimentos ativando assim essa demanda Uma observação adicional deve ser feita a respeito da alteração importante que se processa nos fluxos imigratórios A partir de 1908 a imigração japonesa no Brasil se expande entrando entre 1908 e 1918 em São Paulo cerca de 25000 japoneses total esse que atingiria 85000 até 1929 Como se vê em recente estudo sobre o tema esse imigrante mostrava grande predisposição para se libertar da condição de colono do café passando a arrendatário ou a pequeno proprietário Desenvolvia agricultura diversificada incluindo atividades hortigranjeiras e frutíferas além da cerealífera do arroz sendo esta mais praticada às margens do Rio Grande na divisa de São Paulo com Minas Gerais onde as terras não eram propícias à cafeicultura Esse trabalho mostra ainda que antes de 1918 o Consulado japonês em São Paulo informava a existência de 455 pequenas propriedades de japoneses em São Paulo número que seria 48 Lei 1452 de 30 de dezembro de 1905 que estabeleceu a cobrança de 506 dos direitos aduaneiros em ouro para os gêneros alimentícios e para alguns produtos industriais Conf Luz 1961 p 130 49 Entre 1902 e 1908 o número de imigrantes que saem de São Paulo é maior do que o número dos que entram ver Apêndice Estatístico Wilson Cano 70 bastante acrescido até 1922 com a instalação da colônia de Registro no sul do estado Outro fato importante ressaltado nesse trabalho é que o imigrante japonês ao contrário de outros tinha objetivo de se fixar as saídas desses imigrantes em relação ao total das entradas em São Paulo no período de 1908 a 1918 representam apenas 7 ao passo que para todos os imigrantes estrangeiros em São Paulo atingia a alta cifra de 7050 Tabela 6 Expansão da produção de alguns produtos agrícolas e agroindustriais no Estado de São Paulo 1000 toneladas Médias anuais Açúcar Alfafa Algodão pluma Arroz com casca Batata inglesa Farinha de mandioca Feijão Milho Vinho 1000 000L 1901 a 1903 138 18 288 416 4226 05 1904 a 1906 159 28 602 831 4782 13 1907 a 1909 43 1910 a 1912 a 248 58 1071 975 6196 15 1913 a 1915 b 278 62 723 331 1128 5958 17 1916 a 1918 294 108 1521 1771 7334 1919 a 1921 c 318 307 2750 407 2125 10093 16 1922 a 1924 d 338 174 1733 789 7880 23 1925 a 1927 e 306 173 173 2673 661 415 1947 9818 28 1928 a 1930 698 150 61 3459 658 601 2177 9506 33 1931 a 1933 1144 98 220 5371 1602 798 2298 14192 38 1934 a 1936 1388 143 1286 5473 1145 699 1890 12086 44 1937 a 1939 f 1588 145 2414 4005 902 840 1777 12989 60 1940 a 1942 1720 76 3237 4003 494 1098 7412 1943 a 1945 g 2213 118 3623 6008 1750 1541 10267 73 Fontes Anuário Estatístico do Brasil vários anos Anuário Estatístico do Estado de São Paulo vários anos Boletim da Diretoria de Ind e Comércio de São Paulo vários anos Relatório do Ministro da Agric Ind e Comércio vários anos p algodão Stanley J Stein The Brazilian cotton manufacture p 197 Notas a feijão milho e vinho anos de 1911 e 1912 b batata 1913 e 1914 vinho 1913 e 1915 c arroz feijão e milho 1919 e 1920 batata 1920 vinho 1921 d arroz feijão e milho 1922 e 1924 vinho 1923 e 1924 e alfafa batata e farinha de mandioca 1926 e 1927 g vinho 1944 e 1945 50 O trabalho é o de Nogueira A R 1973 p 201 207 216226 Raízes da concentração industrial em São Paulo 71 Os dados contidos na Tabela 6 permitem uma apreciação sumária sobre a evolução da produção agrícola exclusive café do estado de São Paulo Na verdade não consegui reconstituir as séries sobre a produção animal e sobre a produção frutífera o que enseja uma lacuna apreciável Em que pese isso os produtos constantes nessa tabela representavam já em 1906 cerca de 13 da produção primária paulista incluindose o café e essa percentagem sobe para cerca de 15 a 20 em média para os anos compreendidos no período de 19201929 e essa última oscilação se deve às variações da produção cafeeira Como já considerei as importações provenientes do exterior limitome aqui a umas breves observações sobre essa produção e o comércio de cabotagem Tomandose como índice 100 a produção média de 19011906 os principais produtos evoluem entre aquela média e a observada no período 19251930 da seguinte forma açúcar 338 feijão 331 milho 215 arroz 689 algodão 509 e café 192 No mesmo período a população total do estado duplicava Examinemos as estatísticas do comércio de cabotagem de São Paulo Nesse período a maior dependência paulista residia na importação de banha do Sul do país após 1910 quando praticamente se conclui a substituição da banha importada pela nacional e em menor importância nas importações sulinas de cebola e de alguns cereais O vinho gaúcho só ganharia destaque após a crise de 1929 e antes dela suas remessas para São Paulo eram equivalentes à própria produção paulista que somada às remessas gaúchas não atingiam sequer 20 do volume importado por São Paulo do exterior Quanto ao charque as importações provenientes do sul do país já eram baixas e reduzemse violentamente já em 1919 a produção paulista de charque equivalia a 64 do total nacional com produtividade média 67 superior a da indústria gaúcha no final da década de 1920 as exportações por cabotagem de São Paulo já totalizavam em média 2000 toneladas quantia essa mais de cinco vezes maior do que as importadas51 As importações de outros estados de milho e de feijão eram ainda mais insignificantes do que as já reduzidas importações do exterior As de batata situavamse a níveis absolutos equivalentes às importações 51 Conf Censo de 1920 v 5 p 478 seção 11 para o comércio de cabotagem as cifras foram obtidas de Comércio de Cabotagem pelo Porto de Santos vários anos Wilson Cano 72 do exterior mantendose baixas ao longo do período de 1901 a 1930 As de arroz nunca foram significativas a não ser em 1915 e 1925 anos de forte seca em São Paulo quando atingem volumes equivalentes a 15 e 8 respectivamente da produção paulista naqueles anos Com relação à alfafa era bastante importada do exterior até 1914 e a partir daí passa a ser suprida por importações de outros estados até 1925 quando então a produção paulista já perfaz mais de 75 de suas necessidades É evidente que a produção paulista não era e não é auto suficiente Por questões de limitação de recursos naturais de clima ou de solo sempre ocorrem importações dos mais variados produtos agrícolas Essas importações podem crescer repentinamente sempre que ocorra um problema mais grave com a agricultura como por exemplo as fortes secas de 1915 e de 19241925 ou as fortes geadas de 1902 e de 1918 ou ainda a ocorrência de pragas como a do mosaico que atinge violentamente os canaviais paulistas por volta de 1923 a 1926 Sobre a produção frutífera não disponho de melhores informações a não ser as referentes à bananicultura que cresce 117 no período de 1920 a 1928 e à produção vinhateira como mostra a Tabela 6 pela produção de vinho que cresce persistentemente ao longo do período de 1901 em diante No que se refere à atividade criatória o estado de São Paulo a ela pouco se dedicava mas cedo se empenhou na engorda de gado e sua industrialização As exportações de carnes inexpressivas até 1914 atingem em 1915 a 8 mil toneladas e entre 19191920 saltam para mais de 30 mil toneladas Em 1927 a produção de carnes nos frigoríficos sediados no estado atingia cerca de 125 mil toneladas e em 1930 São Paulo exportava para o exterior cerca de 44000 toneladas52 A única comparação possível com os dados de outros estados a partir dos dados contidos no Censo Agrícola de 1920 mostra que o valor da produção animal do estado de São Paulo já equivalia a um terço da congênere gaúcha ou a 28 da produção do estado de Minas Gerais Esse mesmo recenseamento constata também que São Paulo detinha a maior e mais 52 Esses dados referentes à indústria de carnes foram obtidos nas seguintes publicações Anuário Estatístico do Estado de São Paulo vários anos Boletim do Departamento Estadual de Estatística São Paulo 1939 Boletim da Agricultura São Paulo vários anos ver ainda o Apêndice Estatístico Raízes da concentração industrial em São Paulo 73 avançada agricultura do Brasil sendo superior à de qualquer dos demais estados brasileiros excluindose o café São Paulo detinha 242 da produção nacional de lavouras e 208 da produção primária total exclusive café se incluído esse produto aquelas percentagens passavam a 288 e 254 respectivamente ver Apêndice Estatístico Vejamos agora os casos específicos do algodão e do açúcar Tabela 6 O açúcar tem sua produção praticamente estagnada entre 1910 e 1927 e o algodão que apresentava um forte crescimento até por volta de 1921 entra em franco declínio só se recuperando após a crise de 1929 Examino primeiro o caso do algodão Sabese que este produto tem seu preço ditado pela situação do mercado internacional já desde o século XIX e assim sendo sua produção no Brasil oscilava sempre ao sabor das influências dos preços externos e da própria situação da oferta internacional principalmente da norteamericana que era e é a principal supridora do produto Após a alta dos preços internacionais verificada no início do século XIX eles cairiam daí em diante exceto os vigentes durante a guerra de secessão e só tornariam a subir a níveis altos durante a primeira guerra mundial permanecendo altos até 1925 quando se inicia um novo período de queda de preços que se agravaria na Grande Depressão Evidentemente a produção algodoeira paulista não estava imune a tais reflexos tanto é assim que o algodão produzido em São Paulo até 1915 mal atingia 30 do consumo das fiações paulistas e os restantes 70 eram supridos pela produção nordestina53 A partir de 19161917 os preços externos atingem níveis elevadíssimos o que obviamente implicaria em aumento dos preços do algodão nordestino e eventualmente dos custos da indústria têxtil paulista É exatamente a partir desse período que a produção paulista de algodão cresce passando da média de 6 mil toneladas entre 19131915 para 30 mil toneladas em média nos anos de 1919 a 1921 A partir desse momento a produção paulista atendia cerca de 70 do consumo industrial de São Paulo Entretanto com a queda dos preços internacionais a partir de 1926 e com a crise têxtil paulista que ocorre no 53 Estimei o consumo de algodão no estado de São Paulo convertendo a produção de tecidos de algodão com base na média de 150 gramas por metro e adicionando o desperdício industrial de 2096 no processo de transformação do algodão em pluma em tecido Wilson Cano 74 mesmo período os preços internos do algodão em São Paulo sofrem acentuada baixa desestimulando fortemente sua produção que caí para menos de 10 mil toneladas a partir de 192754 São esses fatos que a meu juízo explicam o retrocesso algodoeiro em São Paulo após 1926 assim como o seu precário desenvolvimento antes de 1917 Tendo um mercado interno a indústria têxtil paulista que ainda consumia baixa tonelagem de algodão e convivendo ao lado da cultura de maior rendimento e produtividade do país a cafeeira a agricultura paulista não tinha porque competir com a atrasada cotonicultura nordestina nessa produção Com a crise de 1929 com violenta queda dos preços do café que alteraria profundamente a estrutura relativa da rentabilidade das diferentes culturas a situação então se modificaria e o algodão retomaria um papel extremamente importante na agricultura paulista O caso do açúcar merece algumas reflexões adicionais A produção paulista até meados da década de 1920 não atingiria provavelmente 20 de seu consumo Tendo problemas semelhantes aos do algodão quanto a preços e demanda externa o açúcar tem ainda uma agravante uma vez que para a sua produção é necessário alto investimento em máquinas e equipamentos Este fato é importante quando se sabe que essa atividade vinha de longo declínio com as exportações brasileiras reduzidas nas décadas de 1900 e de 1910 à metade das exportações verificadas entre 1840 e 1900 Melhor sorte não tinham seus preços cujo declínio desde meados do século XIX só tiveram curta recuperação entre 1916 e 1920 e entre 1923 e 1925 Embora nesse curto interregno os preços tenham subido consideravelmente triplicam em relação aos vigentes de 1880 a 1911 não se dá uma expansão notável da produção paulista durante o período de alta 1916 a 1920 e nos anos de 1924 a 1926 ocorre uma queda da produção atribuída à praga do mosaico que devastou grande parte dos canaviais paulistas55 54 De 14000 por arroba em 19241925 o preço do algodão cai para 8000 em 19251926 Conforme Boletim da Diretoria da Indústria e Comércio São Paulo referente ao ano de 1927 55 Ver a esse respeito o trabalho de Gnaccarini 1972 p 66 No que se refere aos preços internos a cotação do mercado atacadista do Rio de Janeiro mostram altas acentuadas entre 1915 e 1920 com pequena queda entre 1921 e 1922 nova alta entre 1923 e 1925 e nova queda entre 1926 e 1927 conforme Anuário Estatístico do Brasil 193940 p 13821383 Raízes da concentração industrial em São Paulo 75 Além dos problemas dos baixos preços e da convivência com outras atividades de melhor rentabilidade no complexo cafeeiro a expansão do açúcar paulista se via entravada por dois outros fatores De um lado pela permanência da produção nordestina que tendo perdido os mercados externos onde era produtor marginal continuava resistindo ao declínio dos preços substituindo o mercado externo pelo interno onde despontava o mercado paulista Agravando essa dificuldade que é a de concorrer com um produtor o Nordeste que supre pelo menos 80 do mercado paulista com preços deprimidos a outra face do problema açucareiro paulista talvez residisse nas próprias condições de sua comercialização e refinação em São Paulo A concentração em poucas empresas tanto da refinação quanto da comercialização do açúcar bruto e refinado exercia um controle cartelizado do mercado açucareiro paulista controle esse que obviamente atendia mais aos interesses dos comerciantes e refinadores do que aos interesses dos usineiros paulistas56 Não é difícil compreender que seria muito mais lucrativo a esse oligopólio auferir os lucros decorrentes da compra do açúcar nordestino a baixos preços e de seu beneficiamento e revenda a preços altos do que investir capitais numa atividade agroindustrial de baixa rentabilidade Com a alta dos preços externos e sua repercussão no nível interno a atuação do oligopólio que também era um oligopsônio certamente tenderia a mudar uma vez que a alta dos preços do açúcar nordestino poderia muito bem significar uma diminuição do excedente por eles apropriado nessas transações e se assim ocorresse a alternativa de investir recursos na produção açucareira paulista poderia se tornar mais rentável Penso que a mencionada praga que atinge os canaviais paulistas responsável pelas quedas de produção que ocorrem entre 1924 e 1926 retardou essa reorientação muito embora a praga tenha produzido um efeito positivo ao obrigar a lavoura a substituir as antigas espécies até então plantadas por variedades de canas javanesas e indianas com melhor resistência e maior rendimento do que as anteriores57 Já a partir de 1927 a produção recupera os níveis de 1922 56 Sobre o problema da comercialização do açúcar ver o trabalho de Gnaccarini 1972 cap 23 57 Ver a esse respeito o trabalho de Gnaccarini 1972 p 6467 Wilson Cano 76 expandindose continuamente e acelerando a substituição do açúcar nordestino pelo paulista Creio finalizando que a apresentação deste tópico deixou claro que a expansão diversificada da agricultura paulista não ocorria apenas em função das crises cafeeiras Como se viu ela ocorre tanto nas crises como nas fases de expansão do café e isso se deve a meu juízo pela crescente independência que a agricultura praticada fora da propriedade cafeeira vai adquirindo à medida que o mercado urbano se expandiu Ela cumpriu assim a clássica função de suprir a expansão urbana com seus excedentes de alimentos e de matériasprimas e dada sua relativamente avançada técnica então utilizada possibilitou também que parte da expansão demográfica e da imigratória pudesse alimentar os requisitos de mãodeobra reclamados pela expansão urbana que já se processava em São Paulo58 59 vi Breves considerações sobre os outros componentes À medida que a atividade nuclear se ampliava passou a induzir crescentemente o surgimento de uma série de atividades tipicamente urbanas como a industrial a bancária escritórios armazéns e oficinas de estradas de ferro comércio atacadista comércio de exportação e importação e outros requerendo e facultando ainda a expansão do aparelho do Estado No momento em que estas crescessem uma série de outras mais vinculadas ao processo de urbanização também se desenvolveriam o comércio varejista os transportes urbanos comunicações energia elétrica construção civil equipamentos urbanos 58 Pelos dados contidos no Censo Agrícola de 1920 a mecanização da agricultura paulista só era superada pela do Rio Grande do Sul Devese levar em consideração que as condições e requisitos de máquinas agrícolas são distintas no caso de culturas perenes como o café em São Paulo e de culturas temporárias como o trigo arroz feijão etc e ainda que os equipamentos para colheita de café inexistiam à essa época esses fatos certamente contribuíam para um número absoluto menor de equipamentos agrícolas em São Paulo Pelos dados apresentados por Camargo 1960 às páginas 69 a 74 de seu trabalho podese concluir que em 1920 a agricultura paulista em relação à agricultura brasileira empregava 25 dos arados existentes no Brasil 40 dos cultivadores 25 dos tratores e entre 10 e 15 das grades ceifadeiras e semeadeiras 59 Em que pese o fato de que a avaliação do volume da população urbana no Brasil só é feita a partir de 1940 Basbaum 1968 v 2 p 141 cita as estimativas feitas por Eugênio Gudin e relatadas na III Conferência Rural Brasileira e que conferem ao estado de São Paulo em 1920 uma população urbana equivalente a 37 da população total o que daria para essa época 17 milhão de habitantes urbanos para o estado de São Paulo Raízes da concentração industrial em São Paulo 77 etc Quanto mais avançava esse processo mais interdependentes se tornavam todas essas atividades gerando uma intrincada rede de conexões econômicas financeiras e de serviços Esse processo tem seu momento decisivo de aceleração a partir de 1886 e mais especificamente entre 18901900 quando a produção cafeeira paulista perfaz 57 do total nacional Ao contrário da Guanabara que já em 1872 tinha uma população de 275000 habitantes a cidade de São Paulo nessa data contava apenas 31000 que era o dobro dos 15500 existentes em 1855 Desde meados do século XVIII a Guanabara se distinguia como importante centro comercial e financeiro decorrendo daí não apenas o desenvolvimento do comércio de exportação e importação como também em grande parte o desenvolvimento da própria cafeicultura da região A pobreza da então província de São Paulo somente seria superada com o advento cafeeiro e este como já se viu somente ganharia real expressão em São Paulo a partir de fins da década de 1870 é fácil se deduzir portanto como eram acanhadas as atividades comerciais e financeiras paulistas de então60 A grande expansão cafeeira de 18861897 provocaria forte crescimento demográfico a população do estado em milhões de habitantes passava de 08 em 1872 para 14 em 1890 e 23 em 1900 daí até 1920 duplicaria atingindo 46 milhões A capital de São Paulo crescia a ritmo ainda mais intenso em mil habitantes passava de 314 em 1872 para 649 em 1890 para 2398 em 1900 e 5790 em 1920 Se em 1872 a população da capital paulista equivalia apenas a 12 da população da Guanabara em 1920 aquela cifra já crescia para 50 Como a expansão cafeeira em São Paulo só tem sua fase decisiva a partir de 1886 o desenvolvimento do comércio importador neste estado ocorre de forma mais diversificada em suas origens externas uma vez que o Brasil já havia superado as etapas de forte predomínio dos portugueses e depois dos ingleses nos negócios de importação Assim o comércio de importação em São Paulo parece ter sido mais diversificado com importadores vinculados a um maior número de países como Inglaterra Estados Unidos França Alemanha Portugal Itália e outros A estrutura 60 Ver a respeito Morse 1970 partes 2 e 3 Wilson Cano 78 do comércio de exportação do café em São Paulo era semelhante à que se formara no Rio de Janeiro A fazendeiro B comissionário C ensacador D corretor e E exportador atividade em que predominava o capital forâneo principalmente o norteamericano61 Eram poucos os fazendeiros que também exerciam as demais atividades e a maior ocorrência de casos em que ele exercia mais de uma se limitava até o serviço de comissariar os negócios cafeeiros dado que o capital externo praticamente controlava a exportação de café Até fins do século XIX o fluxo de exportações do café obedecia o trânsito normal de A a E passando pela intermediação de B C e D O fazendeiro enviava seu café ao comissário que mediante o recebimento de uma comissão de 3 encarregavase de efetuar a venda aos ensacadores ou diretamente aos exportadores O papel dos ensacadores era o de comprar pagando ao comissário no prazo de 31 dias e misturar os diferentes tipos de café obtendo assim as chamadas ligas ou seja os tipos específicos procurados pelos exportadores reensacado o café em sacaria nova vendiamno aos exportadores com pagamento feito em 20 dias As vendas diretas dos comissários aos exportadores ou as do ensacador ao exportador eram também intermediadas pela figura do corretor de café Foi extremamente importante o papel desempenhado pelo comissário até a Primeira Guerra Mundial Suas funções não se limitavam apenas à intermediação cafeeira Dada a inexpressividade do sistema bancário paulista onde predominava o crédito pessoal que era muito mais apropriado à conhecida pessoa do comissário do que ao fazendeiro que residia e produzia em cidades distantes das praças comerciais e financeiras era o comissário que financiava grande parte das operações de custeio do café e em alguns casos a própria formação de novos cafezais Vinda a crise de preços e a política deflacionista dos primeiros anos do século XX a situação de muitos comissários passaria a ser crítica tanto pelo fato de operarem com seus recursos próprios como também 61 Para esta discussão sobre a estrutura de comercialização cafeeira e sobre a decadência do comissário utilizei fundamentalmente os seguintes trabalhos Taunay 1943 v 7 p 2789 v 9 p 304309 v 10 p 219233 v 12 p 402416 Delfim Netto 1966e Franco 1969 Raízes da concentração industrial em São Paulo 79 por se responsabilizarem junto aos bancos por empréstimos que repassavam aos fazendeiros Dessa forma desempenharam pioneiramente o papel de banqueiros Além dessas funções eram eles também os principais orientadores dos fazendeiros no que se refere à aplicação dos lucros da cafeicultura o que lhes conferia destacado papel no processo de acumulação de capital do complexo cafeeiro Muitos deles também se transformaram em fazendeiros banqueiros comerciantes e industriais Já a partir da abolição a figura do comissário vai perdendo importância e pela regulamentação das empresas de Armazéns Gerais em 1903 facilitando a realização de negócios diretos entre o fazendeiro e o exportador sua situação é agravada sendo esse processo acompanhado também pela diminuição da participação intermediária do ensacador Delfim Netto 1966 p 4748 À medida que se expande o sistema bancário de São Paulo e que aumenta o grau de intervenção do Estado nos planos de valorização esses dois intermediários tendem a desaparecer restando somente os corretores e os exportadores Às razões acima mencionadas devo acrescentar ainda uma terceira que na realidade reflete a contradição entre esses intermediários e o exportador Este ao manipular o café brasileiro pelo sistema de ligas obtinha tipos médios de cafés a preços inferiormente cotados em relação aos cafés finos vendendoos no exterior como se fossem de outra procedência não raro usando marcas como Ceylão Java ou Malabar que tinham cotação mais alta do que os tipos Rio ou Santos obtinham grandes lucros nessas transações Assim o interesse do exportador era o de manipular os preços do café para a baixa o que lhe aumentava os lucros enquanto que os comissários e em menor medida os ensacadores como recebiam porcentagem sobre o preço de exportação na base das cotações dos tipos médios negociados interessavamse sempre em obter preços altos o que também estava conforme aos interesses do fazendeiro Ao romper essa cadeia intermediária aumentando suas compras diretamente ao fazendeiro o exportador praticamente eliminava parte dessa contradição reforçando seu poder de negociação no mercado uma vez que agora sua posição oligopsonista não se defrontava mais com o relativamente Wilson Cano 80 reduzido número de vendedores comissários e ensacadores mas sim com o elevado número de fazendeiros62 A expansão do sistema bancário no Brasil ganharia maior expressão a partir da Reforma Bancária em 1890 que além de conceder aos bancos o privilégio de emissão ainda lhes facultava o exercício de atividades extrabancárias como por exemplo a do comércio da indústria de colonização construção de estradas etc63 Tem início então a fase conhecida como a do Encilhamento com grande expansão do meio circulante e proliferação de empresas comerciais industriais bancos estradas de ferro etc muitas delas sem qualquer viabilidade econômica como por exemplo projetos de estradas de ferro ligando Parati no Rio de Janeiro a Iguape no sul do estado de São Paulo ou a de Ponta Grossa no Paraná a Nioaque em Mato Grosso Entretanto em que pese o número excessivo de empresas economicamente inexeqüíveis a expansão monetária gerada por essa etapa não significou apenas uma mirabolante onda inflacionária Muitos empreendimentos principalmente têxteis se tornaram realidade como mostrou Stein 1957 p 8597 Aliás esse autor parece ter sido um dos raros analistas da economia brasileira que viu no Encilhamento não apenas o seu véu monetário mas também uma importante via para a acumulação de capital Da vigorosa expansão monetária que surge com o nascimento da república se passaria a partir de 1896 no governo Prudente de Moraes a uma política de contenção que associada à crise do café e à crise cambial faria com que os rumos da política econômica se mantivessem francamente deflacionistas tanto no governo de Campos Sales 18981902 quanto no quadriênio seguinte de Rodrigues Alves Cassado o privilégio de emissão aos bancos em 1896 e desencadeada a deflação o sistema atingiria seu ponto crítico em 1900 com a crise bancária quando vão à falência nada menos de 17 bancos nacionais Nesse período aproximadamente 1896 a 1906 são inúmeras as transformações bancárias 62 Esta situação de franca dependência do fazendeiro em relação ao exportador só se modificaria pelo aprimoramento do sistema de classificação do café e pela ação estatal através dos planos de valorização principalmente quando se promove a regularização dos embarques e das remessas de café aos portos de saída com o que se consegue controlar melhor o afluxo cafeeiro durante o ano Nem por isso entretanto a ação baixista dos exportadores diminui 63 Para o estudo do Encilhamento ver Calógeras 1910 A lei de reforma bancária pode ser vista também em Carone 1973 p 202206 Raízes da concentração industrial em São Paulo 81 que ocorrem como falências novos bancos fusões etc e a interpretação desse fenômeno bem como o papel desempenhado por essas instituições na acumulação de capital está por merecer uma investigação mais profunda Tomandose as informações para 1910 quando a situação bancária já está plenamente recuperada notase quê dos 14 bancos existentes em São Paulo 7 eram de propriedade estrangeira detendo 70 dos ativos e 70 dos empréstimos e descontos bancários Dos sete bancos paulistas só tinham expressão o Comércio e Indústria de São Paulo que detinha 21 dos ativos bancários e que era o segundo maior banco no estado fundado em 1890 e o Banco de São Paulo fundado em 1889 que era o sexto maior banco e detinha cerca de 7 dos ativos bancários Nada menos do que seis deles haviam sido fundados em pleno período do Encilhamento Haviam ainda dezenas de bancos denominados Banco de Crédito Rural sediados em grande número de municípios paulistas que eram entretanto de diminuto porte em termos de ativos e sobre os quais não consegui maiores informações64 Será com o abandono da política deflacionista por volta de 1908 1910 e com o advento da primeira guerra mundial que se dá maior desenvolvimento dos bancos nacionais paulistas até 1918 eles instalaram 11 agências no estado número que subiria para 53 em 1924 e 88 em 1927 quando passam a financiar mais decisivamente a agricultura Taunay v 12 p 415 Nessa nova etapa de desenvolvimento bancário parece ter predominado a expansão de bancos nacionais paulistas que é notória triplicam os empréstimos e depósitos entre 1910 e 1921 triplicandoos outra vez entre esse último ano e 192865 Além de maior e melhor distribuição de crédito agrícola é certo que seu papel deve ter crescido também no financiamento industrial e comercial No que se refere ao capital estrangeiro sua principal atuação em São Paulo até 1930 quantitativamente falando residiu nos 64 Conf Anuário Estatístico do Estado de São Paulo vários anos Essa fonte constata ainda várias empresas de serviços de utilidade pública como de propriedade de bancos No trabalho de Bandeira figuram várias fazendas e indústrias de propriedade de bancos 65 Conf Boletim do Departamento Estadual de Estatística de São Paulo p 45 out 1941 Wilson Cano 82 financiamentos ao café Ao todo segundo os esquemas de valorização do café esses recursos externos alcançaram uma cifra pouco superior a 60 milhões de libras esterlinas quantia que equivale aproximadamente a 75 do valor total das exportações paulistas de café realizadas de 1901 a 1930 Levandose em conta a deficiente estrutura tributária da época a crônica situação deficitária do governo e a difícil situação do serviço da dívida externa eram limitadas as possibilidades de se efetuar as operações de sustentação do café com recursos públicos internos Dada também a precariedade do sistema bancário de então ainda menores seriam as possibilidades de se obter recursos privados internos Ainda assim os recursos públicos internos utilizados para esse fim teriam atingido o equivalente a 10 milhões de libras 9 dos quais concedidos pelo governo federal e 1 pelo estadual Acredito que a limitação ao uso maior de recursos públicos internos se deva tanto aos cânones da conversibilidade ortodoxa quanto às pressões que as crises cambiais exerciam sobre a capacidade para importar Há que se considerar entretanto que desde o último quartel do século XIX a balança comercial de São Paulo com o exterior apresentava em média saldos positivos equivalentes a mais de 50 das divisas geradas por suas exportações Na realidade o crucial problema das pressões sobre o balanço de pagamentos situavase na esfera do governo central e de outros governos estaduais tanto pela maior concentração de empréstimos externos quanto pela deficitária balança comercial do resto do país com o exterior Também no setor ferroviário de São Paulo o papel do capital externo foi muito menor do que no resto do país Limitouse ao investimento de cerca de 67 milhões de libras valor declarado em 1910 na Estrada de Ferro de Santos a Jundiaí concluída em 186766 De menor expressão havia sido a construção do ramal ferroviário de Rio Claro com 66 Essa inversão está representada pelo capital empregado declarado pela empresa em 1910 conf Anuário Estatístico do Estado de São Paulo 1911 p 2425 Cabe lembrar contudo que a concessão para essa estrada fora dada ao Barão de Mauá que a organiza em Londres constituindo a São Paulo Railway Company sendo um de seus acionistas Mauá desenvolveu os projetos iniciais dando início à construção da ferrovia Como a empresa passava por dificuldades financeiras Mauá lhe concedeu vários empréstimos que totalizaram cerca de 400000 libras dívida essa nunca saldada pela empresa A cobrança da dívida foi levada aos tribunais porém foi dada como prescrita pelas leis inglesas Um amplo relato sobre esse fato pode ser lido no trabalho de Faria 1933 cap 11 28 e 29 Raízes da concentração industrial em São Paulo 83 capitais também ingleses investimento esse adquirido pela Cia Paulista de Estradas de Ferro ainda no século XIX Além disso consta apenas o arrendamento da Estrada de Ferro Sorocabana de propriedade do Governo Estadual a capitalistas franceses cujos recursos foram utilizados no primeiro plano de Valorização do Café Ainda nesta segunda forma de atuação a do investimento direto podese lembrar dos investimentos externos no sistema bancário paulista já citados Na agricultura os capitais externos parecem não ter sido aplicados em grande escala Fazendas de café bananicultura e algodão este em pequena escala antes de 1930 foram os compartimentos aparentemente preferidos Na expansão capitalista de São Paulo até 1930 esses investimentos diretos parecem ter se concentrado além dos já citados no setor de serviços públicos gás eletricidade comunicações e transportes urbanos Assim mesmo o capital nacional não esteve ausente desses compartimentos fazendeiros banqueiros e outros capitalistas imigrantes ou não também participavam nessas inversões Das 50 empresas telefônicas existentes no estado antes da primeira guerra mundial não se nota participação expressiva do capital externo Dos 75 mil contos investidos em eletricidade e gás nas 44 empresas existentes em 1910 cerca de 20 do capital era de propriedade de nacionais e nos restantes 80 predominava o grupo Light Só em fins da década de 1920 com a entrada de outro grupo estrangeiro AMFORP é que esse setor passaria a ser praticamente controlado pelo capital forâneo No setor manufatureiro também foi pouco expressivo até a primeira guerra Durante e principalmente após essa guerra sua penetração começa a crescer frigoríficos algumas poucas empresas têxteis uma fábrica de cimento depois transferida para o capital nacional montagem de veículos pela Ford e GM etc Para que não se incorra em erro grave superestimando o papel do capital forâneo há que se distinguir a inversão aqui realizada por uma subsidiária de empresa existente no exterior da inversão estrangeira praticada por imigrantes que aqui se radicaram Estas últimas tanto podem ter origem de capitais vindos do exterior ou aqui mesmo apropriados Por outro lado os efeitos decorrentes de seu funcionamento são distintos a inversão realizada pelo imigrante na maior parte dos casos se nacionaliza e os efeitos Wilson Cano 84 decorrentes de sua atividade aqui permanecem acrescentando as forças internas de acumulação No caso dos inversores estrangeiros típicos boa parte do produto de sua ação interna é canalizado para o exterior reduzindo assim seu papel na acumulação de capital Não se pode comparar como estrangeiros os italianos Matarazzo e Crespi com a italiana Pirelli ou por exemplo um Zerenner Cia Antárctica ou um Diederichsen com a Sucreries Brésilienes com uma Bayer ou uma Krupp Assim para se ter uma idéia mais concreta sobre a participação do capital externo no setor manufatureiro é necessário se despejar das relações estatísticas existentes sobre a propriedade dos ativos industriais aqueles outros estrangeiros que são os imigrantes que em grande parte aqui se radicaram O papel do investimento estrangeiro na indústria será retomado no capítulo final Outro tipo de atuação do capital externo é o que se refere aos financiamentos concedidos por empresas e bancos do exterior a empresas aqui radicadas e pertencentes tanto a imigrantes como a brasileiros natos Infelizmente a ausência de registros de balanço de pagamentos nesse período não permite sua avaliação Finalmente no que se refere a financiamentos para o setor público principalmente os destinados a obras públicas efetuadas pelo estado de São Paulo e seus municípios parece que essa modalidade não teve maior expressão nesse período ao contrário do que ocorreu com as demais regiões e com o próprio governo federal conforme se depreende do exame dos dados sobre empréstimos estrangeiros e dívida externa do período67 Sobre a atuação do setor público cabe ressalvar que me restringi a algumas informações quantitativas principalmente às do déficit do governo estadual de São Paulo A atuação do governo federal é tratada ao longo deste trabalho Restrinjome aqui a alguns aspectos relacionados com sua aplicação de 67 O Anuário Estatístico do Brasil de 19391940 na parte histórica referente às Finanças Públicas fornece indícios nesse sentido Um exemplo marcante é o da construção do Porto de Santos construído e administrado pelo capital nacional empresa constituída por Candido Gafrée e Eduardo Guinle atualmente Cia Docas de Santos a partir de 1888 com investimentos iniciais de 4 mil contos conforme relata Taunay 1943 v 15 p 217223 No resto do país ao contrário a maior parte dos portos foi construída ou pelo estado ou pelo capital estrangeiro na maioria dos casos com financiamento externo Raízes da concentração industrial em São Paulo 85 recursos na economia paulista Por exemplo cabe lembrar sua atuação na questão imigratória facilitando e subsidiando parte dos fluxos de imigrantes para São Paulo antes que o estado de São Paulo assumisse decisivamente essa função o que faria a partir de fins da década de 1880 Cabe mais uma vez mencionar o papel do governo federal nos planos de valorização do café quer concedendo recursos a São Paulo quer se responsabilizando perante o exterior pelos empréstimos obtidos por São Paulo para esse fim No que se refere ao parque ferroviário paulista coubelhe a consolidação da construção da Estrada de Ferro Noroeste e a compra da Estrada de Ferro São PauloCachoeira que pertencia ao governo do estado O papel desempenhado pelo governo do estado pode em breves linhas assim ser resumido ele arcou com as principais obrigações financeiras e administrativas do problema imigratório e à sua ação deve ser creditada a introdução de cerca de 12 milhão de imigrantes por ele subsidiados entre 1887 e 1930 Não menos importante foi sua ação ao instituir os chamados núcleos coloniais de imigrantes para a agricultura de subsistência bem como sua ação na distribuição de terras devolutas para a expansão cafeeira e principalmente na política de valorização do café Seu papel em termos de apoio à expansão dos investimentos do complexo cafeeiro tanto pode ser lembrado por exemplo na construção da Estrada de Ferro São PauloCachoeira como na compra ao governo federal da Estrada de Ferro Sorocabana Sua ação contemplou ainda o financiamento agrícola pelo Banco do Estado de São Paulo na garantia enquanto foi necessária de 2 a vários empreendimentos ferroviários assim como adquiriu armazéns do governo federal para a regularização dos embarques cafeeiros No campo das finanças públicas talvez tenha residido sua mais importante atuação no processo de acumulação de capital do complexo Cerca de 23 de suas receitas provinham do imposto de exportação fazendo com que grande parte do gasto público recaísse de forma indireta quando os preços do café estavam em alta e em 20 dos 42 anos que vão de 1889 a 1930 o café teve preços médios acima de 3saca esse imposto na realidade era pago pelos consumidores estrangeiros Wilson Cano 86 Somente quando o café estava em baixa é que o ônus tributário recaía sobre o fazendeiro e devese lembrar que os preços médios do café durante aquele período só estiveram abaixo de 2saca em treze anos Dessa forma a carga tributária sobre as demais classes capitalistas de São Paulo era suavizada não pressionando portanto suas margens de lucro Pela ótica da despesa pública tomado o período de 1901 a 1930 somente no ano de 1904 e no de 1920 é que a receita foi superior à despesa passando o estado por uma situação deficitária durante 28 desses trinta anos No período de 1901 a 1916 em média a receita do Governo do Estado equivalia a cerca de 30 do total das receitas de todos os demais estados brasileiros e entre 1917 e 1930 situouse em torno de 35 a 38 Sua despesa que perfazia cerca de 29 do total das despesas públicas de todos os demais estados brasileiros sobe para 35 entre 1907 e 1916 para 39 entre 1917 e 1926 elevandose ainda mais para 43 entre 1926 e 1930 É claro que isso está intimamente relacionado com o serviço da dívida externa decorrente dos empréstimos para o amparo cafeeiro A relação média nesses trinta anos entre o déficit e as receitas situouse em torno de 30 e esse déficit pode ser estimado em cerca de 13 milhão de contos de réis Para que se possa ter uma idéia relativa do montante das despesas do Governo do Estado de São Paulo podese comparálas com as despesas do governo federal no mesmo período as estaduais representavam apenas 7 das federais na média do período 19011914 quando sobem para 15 entre 1914 e 1923 aumentando para 25 nos anos restantes da década de 192068 Creio ser desnecessário alongarse mais sobre esse assunto De propósito deixei para o fim aquele que mais tarde seria o principal componente do complexo a indústria manufatureira Dado que sua análise tomará os dois Capítulos restantes deste trabalho tratoa aqui sumariamente apresentandoa em três segmentos O primeiro compreende a fabricação de máquinas e implementos para a atividade agrícola e para o beneficiamento do café o segundo a produção de 68 Essas informações quantitativas sobre o gasto e a receita pública são encontradas no Anuário Estatístico do Brasil 19391940 na parte histórica Os trabalhos de Ellis Jr 1933 1937 apresentam interessantes confrontos de São Paulo e outros estados tanto no que se refere às finanças públicas como aos saldos do comércio exterior e interregional Raízes da concentração industrial em São Paulo 87 sacarias de juta para a embalagem do café o terceiro abarca os demais subsetores manufatureiros onde nessa etapa do nosso desenvolvimento predominam os bens de consumo corrente O primeiro grupo como se viu diminui os custos de produção do café e aumenta sua produtividade poupando mãodeobra melhorando a qualidade do produto e de seu preço de venda Ao reduzir os custos e ampliar os lucros da atividade nuclear este compartimento também ampliava o excedente do complexo introduzia nova tecnologia ao mesmo tempo em que proporcionava novas oportunidades de inversão A indústria de sacarias em que pese o fato de não ser uma atividade redutora de custos uma vez que seu preço teto é ditado pela margem de proteção tarifária é lucrativa para os industriais e assim preenche plenamente a função de ampliar as oportunidades de inversão aos capitais acumulados no complexo cafeeiro O terceiro grupo preenche a importante função de complementar a manutenção da força de trabalho do complexo além de produzir alguns poucos bens de produção Quando de sua instalação recebe um mercado criado previamente pelo complexo e ao entrar em funcionamento e crescer amplia seu próprio mercado Por sua alta lucratividade oferece enorme ampliação das oportunidades de inversão ao complexo ampliandolhe também consideravelmente o excedente69 A análise da indústria manufatureira como já disse será objeto dos Capítulos restantes e assim sendo limitome aqui a uns breves comentários sobre os dois primeiros grupos citados Do primeiro não disponho de informações precisas sobre níveis de produção ou de emprego nas atividades produtoras de implementos agrícolas dado que as empresas que a ela se dedicavam tinham uma produção amplamente diversificada e atendiam a vários setores produtivos Face a isso limiteime a três empresas produtoras de máquinas de beneficiamento contempladas no trabalho de Bandeira e no 69 No capítulo 8 The golden years que se refere ao período de 1900 a 1930 Stein 1957 apresenta dados sobre altas rentabilidades de várias fábricas têxteis brasileiras e uma taxa satisfatória para a média das empresas têxteis Lamentavelmente não disponho de informações desse gênero para os demais ramos industriais Entretanto como se verá na parte referente à análise do setor manufatureiro a expansão industrial que ocorre nas primeiras décadas do século XX é um forte indício para confirmar a rentabilidade das indústrias Wilson Cano 88 Censo de 1907 e que eram as fábricas Lidgerword Mac Hard e a de Arens instaladas em São Paulo Jundiaí e Campinas pouco antes de 188070 A Cia Mechanica e Importadora de São Paulo não foi por mim incluída pelo fato de que sua produção era amplamente diversificada produzindo e importando equipamentos para vários setores produtivos Esta empresa como se pode ver no Censo de 1907 tinha um capital de cinco mil contos o que lhe conferia o quinto lugar na indústria paulista em relação ao capital empregado Computadas portanto apenas as três mencionadas dispunham elas de um capital de pouco mais de dois mil contos e o valor da produção das três era de 2463 contos de réis o que equivalia em 1907 a cerca de 2 do valor da produção industrial do estado de São Paulo e seu emprego de mãodeobra a cerca de 28 do total da indústria paulista As duas fábricas de sacarias de juta tinham em 1907 o expressivo capital de 9610 contos aproximadamente 75 do capital industrial e o valor de sua produção somava 12600 contos 106 do total empregando ainda 1826 operários 74 do total A maior delas pertencia a Álvares Penteado instalada em 1889 com capitais provenientes de sua fazenda de café71 Essa fábrica empregava um capital de 8793 contos o que lhe conferia o terceiro lugar na indústria paulista o segundo na indústria têxtil paulista e o oitavo na têxtil brasileira Em resumo essas indústrias de máquinas e de sacarias detinham juntas cerca de 9 do capital da indústria paulista geravam 126 do valor da produção industrial e empregavam aproximadamente 102 dos operários industriais segundo o Censo de 1907 Como se vê os estímulos que o café proporcionou à indústria não se limitaram a efeitos para a frente entendidos pela constituição de um amplo mercado para bens industriais de consumo corrente Seus efeitos para trás foram também significativos para o início da formação industrial de São Paulo Para concluir este tópico devo fazer ainda algumas considerações 70 Essas referências foram obtidas nas seguintes fontes Censo Industrial 1907 v 3 p 123 Taunay 1943 v 7 p 230232 e Bandeira 1908 p 111 132 71 Conf Prado Jr 1970 p 261 Ver também no trabalho de Bandeira relato sobre essa empresa Raízes da concentração industrial em São Paulo 89 A primeira diz respeito ao fato de que a atividade cafeeira compreendida desde a produção até a exportação não teve os aspectos negativos de uma acentuada concentração de renda e nem de uma excessiva dispersão de seu excedente Tabela 7 Distribuição do valor de uma saca de café beneficiado mil réis 1 Mão de obra na fazenda trato colheita e terreiro 29833 191 2 Custo de beneficiamento e ensaque 8000 51 3 Carretos embarques e reensaque 7165 46 4 Frete ferroviário Jaú a Santos 5200 34 5 Comissões corretagens e despesas cambiais 8580 55 6 Sacaria nova para exportação 3500 23 7 Tributos estaduais imposto de exportação taxaouro e sobre taxa de 5 francos 21060 135 8 Transportes e outras despesas entre Santos e New York 12075 77 9 Subtotal 95587 612 10 Resultado bruto para o fazendeiro inclui deprecia ções juros sobre empréstimos lucros líquidos etc 60587 388 11 Preço de uma saca de café CIFNew York 156000 1000 Fonte dados brutos Taunay volume duodécimo páginas 305 a 307 Obs Tratamse de custos apresentados em uma fazenda no município de Jaú no estado de São Paulo com alta produtividade 150 arrobas1000 cafeeiros Taunay referese ao ano de 1927 mas creio que uma boa parte dos custos provavelmente se referem a 1926 aos dados publicados por Taunay fiz algumas adaptações de nomenclatura de custos e algumas conversões de quantidades por exemplo café em coco para ser beneficiado litros e alqueiros para quilos etc bem como tomei os valores máximos dos apresentados por Taunay com exceção de uma parcela de gorjetas para embarque para a qual tomei o valor médio incluído no item 3 Como no período os preços do café estavam altos é possível que decorra disso a alta porcentagem do crédito do fazendeiro Podese verificar Tabela 7 que os maiores apropriadores da renda cafeeira foram além do fazendeiro a mãodeobra que com isso ampliaria o mercado para bens de consumo simples e o próprio estado o qual entretanto como já se viu devolveu essa renda pelo gasto público em proporção maior do que recebeu Da renda apropriada pelo fazendeiro item 10 da Tabela 7 devese deduzir a parcela de juros sobre empréstimos tomados pelos fazendeiros aos bancos ou aos comissários e se esse juros pudessem ser estimados às taxas de 10 a 12 sobre os custos calculados item 9 essa parcela de juros representaria cerca de 7 do preço final do café diminuindo assim a aparentemente grande concentração de renda pelo fazendeiro da qual na realidade ainda se deveria deduzir as depreciações dos ativos fixos do café e os juros Tabela 7 Distribuição do valor de uma saca de café beneficiado Wilson Cano 90 decorrentes de eventuais financiamentos obtidos para a inversão da propriedade cafeeira Se admitida uma parcela de juros sobre o capital fixo pelo menos igual a dos juros sobre o capital circulante os intermediários financeiros teriam uma apropriação equivalente a 14 do valor bruto da produção cafeeira e o fazendeiro teria um lucro bruto de aproximadamente 25 desse total o estado apropriaria 135 os intermediários comerciais item 5 55 as ferrovias 34 e a indústria de sacarias 23 O conjunto desses agentes se apropriaria de cerca de 23 da massa de recursos gerados pelo café e representariam segundo entendo as principais fontes do processo de acumulação do complexo às quais devese acrescentar a indústria produtora de bens de consumo corrente que se apropria de parte da massa de salários da cafeicultura via mercado Uma consideração especial deve ser feita a respeito de duas variáveis extremamente importantes os saldos da balança comercial de São Paulo e o déficit do governo estadual No que se refere à balança comercial e dados os objetivos de meu trabalho divido seus elementos em dois segmentos e duas regiões o comércio de São Paulo com o exterior e com o resto do país e o comércio do resto do país com o exterior e com São Paulo Tomado todo o período de 1901 a 1930 esses saldos comerciais foram os seguintes em milhões de contos de réis72 São Paulo BrasilSão Paulo 1 Saldo no comércio exterior 120 15 2 Saldo no comércio entre as duas regiões 17 17 3 Saldo líquido 1 2 103 02 72 O comércio interior se refere apenas ao de cabotagem o por vias terrestres era então de dimensão pequena e não se dispõe de seus dados antes de 1911 e depois de 1920 levantei os dados para 1905 a 1930 cabotagem e como não dispunha dos valores para o período de 1901 a 1904 estimeios da seguinte forma calculei a relação porcentual entre as exportações por cabotagem e as exportações para o exterior entre o período de 1905 a 1910 que foi de aproximadamente 5 e apliquei essa porcentagem às exportações para o exterior do período de 1901 a 1904 estimando assim a exportação por cabotagem desse período idêntico processo apliquei às importações por cabotagem e do exterior onde a porcentagem calculada foi de 352 As fontes utilizadas podem ser verificadas nas tabelas do Apêndice Estatístico Como as exportações e do período 19011904 são pequenas em relação aos totais importações de 19011930 42 e 26 respectivamente possíveis erros nos coeficientes de estimação não afetariam substancialmente o resultado Raízes da concentração industrial em São Paulo 91 Os dados acima esclarecem o equívoco da hipótese de que a economia de São Paulo cresceu expropriando substância econômica do restante do país Isto parece não ter ocorrido pelo menos até 1930 no marco das trocas comerciais entre as duas regiões O que se vê na realidade é que esse comércio possibilitou ao restante do país compensar os negativos resultados de suas trocas com o resto do mundo Entretanto podese imaginar que o comércio entre as duas regiões tenha reproduzido internamente relações típicas de centro periferia principalmente no que se refere a diferenciais de preços e de produtividade pouco se apropriando a periferia nacional dos chamados frutos do progresso73 Entretanto a comprovação de tal hipótese requer pesquisas complexas e aprofundadas que superam de muito os limites deste trabalho O indício existente para tal formulação consiste no fato de que desde cedo a estrutura do comércio interregional refletia a predominância de produtos manufaturados 75 da pauta nas exportações paulistas para o resto do Brasil e de gêneros alimentícios e matériasprimas 80 da pauta nas exportações dessa região para São Paulo ver Apêndice Estatístico A importância do excedente de comércio exterior no caso a soma dos saldos no comércio com o exterior e no comércio com as demais regiões e do déficit governamental no processo de acumulação de capital do complexo cafeeiro pode ser comparada por exemplo com a acumulação de capital que se deu no setor industrial e no setor comercial de São Paulo no mesmo período74 Conforme mostra o Censo Econômico de 1940 os capitais investidos na indústria e no comércio paulista entre 1900 e 1930 foram respectivamente 4044 mil contos e 1438 mil contos totalizando aproximadamente 55 milhões de contos equivalendo a 474 do total do excedente do comércio externo de São Paulo 103 milhões e 73 Sobre a formulação e discussão do desenvolvimento latinoamericano e da problemática CentroPeriferia ver a ampla bibliografia do Pensamento Cepalino que tem como marco o famoso Estudio Econômico de América Latina 1949 em que cabe destacar entre outros Prebisch 1949 1962 1963 Pinto 1967 Pinto e Kñakal 1971 Sunkel e Paz 1970 Furtado 1961 196la 1969 Tavares 1964 e Castro 1969 Ver também o trabalho de Magalhães 196la sobre a controvérsia entre as teses cepalinas e a corrente de economistas brasileiros mais representativos da ortodoxia econômica 74 Sobre a importância do excedente de exportações e do déficit público no processo de acumulação de capital na economia capitalista ver o trabalho de Kalecki 1956 p 4754 Wilson Cano 92 do déficit do governo estadual 13 milhão somados 116 milhões de contos A terceira consideração referese à questão das várias faces do capital cafeeiro75 A expansão cafeeira inicial do Oeste Paulista como se sabe teve seu capital inicial gerado anteriormente na atividade açucareira local em transferências de capitais anteriormente gerados nas velhas zonas cafeeiras do Rio de janeiro Vale do Paraíba e Minas Gerais e ainda possivelmente em capitais acumulados em atividades comerciais previamente desenvolvidas em outras regiões76 À medida que o grande plantio de 1876 a 1883 se torna acréscimo efetivo de capacidade produtiva duplicandoa o capital nela investido é reproduzido ou seja o capital cafeeiro passa efetivamente a conduzir e dominar o processo de acumulação do complexo Como já se viu parte dessa acumulação foi vinculada pelos próprios fazendeiros na expansão ferroviária o que fez com que o motor da acumulação tivesse um aumento em sua potência ampliando o excedente O novo plantio de 1886 a 1997 quando o estoque de cafeeiros salta de 220 milhões para 685 milhões ampliaria consideravelmente a oferta de café e precipitaria a crise aguda dos preços externos Aparentemente a queda dos preços externos em cerca de 50 indicaria uma violenta compressão nas taxas de lucro Entretanto devese lembrar que grande parte do acréscimo de cafeeiros produtivos existentes em 1901 teria uma idade bem inferior a dez anos o que lhes conferia uma produtividade física de 2 a 5 vezes maior do que os cafezais das zonas intermediárias e velhas Este diferencial de produtividade obviamente pode muito bem permitir para estes novos cafezais uma taxa de lucro satisfatória em que pese a baixa dos preços Lembro mais uma vez que a crise cafeeira do início do século XX também comprimiu os salários o que impediu maior queda nas margens de lucros 75 Este tema foi anteriormente tratado nos seguintes trabalhos Cardoso de Mello 1975 cap 2 Silva SS 1973 cap 45 76 Ver a esse respeito Simonsen 1973 p 190197 e Taunay 1943 v 15 p 321330 Raízes da concentração industrial em São Paulo 93 Assim sendo e considerandose a quase paralisação do plantio o café liberava recursos para a diversificação do investimento no complexo Se agregada a este panorama a política deflacionista de então é lícito supor que grande parte desses lucros na realidade foi apropriado pela intermediação financeira Bancos Comissários etc via juros cobrados por empréstimos ao café Diante da perspectiva de preços baixos que continuaria até 1910 e que tornaria a ocorrer entre 1914 e 1918 é lícito também supor que a parte dos lucros apropriados diretamente pelos fazendeiros tivesse outro destino mais rentável na forma de inversões em ferrovias bancos indústrias comércio etc Dessa forma o capital que anteriormente se poderia chamar de cafeeiro vai por destino adquirindo outras denominações bancário industrial comercial etc Devese lembrar que no caso particular dos bancos o dinheiro neles aplicado tem forma peculiar de crescimento via multiplicador bancário pelo mecanismo encaixedepósitos empréstimos além do clássico mecanismo de crescimento do capital via juros Ocorrida a expansão bancária e parados os investimentos em ampliações do plantio cafeeiro o complexo paulista passaria a contar com mais uma reforçada fonte de capital para a continuidade de seu crescimento Essa etapa até 1914 é fértil em aplicações dos Bancos que investem diretamente em indústrias empresas de serviço público e outras bem como no financiamento de investimentos industriais concedidos a terceiros O livro de Dean contém inúmeras passagens relatando esses fatos Esse processo certamente foi acentuado entre 1914 1918 quando o plantio é mínimo neste período face às restrições do suprimento externo o vazamento reforçou as crescentes necessidades de capital circulante na indústria e no comércio via bancos Desta etapa em diante o complexo cafeeiro acelera a sua diversificação e como o plantio só cresce de modo expressivo a partir de 1922 quando os preços retomam seu antigo patamar o capital cafeeiro continua a promover a diversificação e expansão dos segmentos urbanos Notese contudo que a partir de 1920 a atividade industrial já adquirira maior expressão e sua massa de lucros pode muito bem ter sustentado boa parte do acréscimo de sua capacidade produtiva Wilson Cano 94 Concluindo quero enfatizar que efetivamente foi a reprodução do capital cafeeiro a essência do processo de acumulação da economia brasileira até 1930 isto é ele foi dominante durante o transcorrer desse processo Acredito ainda que a forma pela qual a intermediação financeira se apropriou de grande parte do capital cafeeiro mascarou a sua origem não se dando conta de que os capitais industrial financeiro e comercial são eles próprios fundamentalmente faces do capital cafeeiro Um ponto que reforça ainda mais o mascaramento da origem desses capitais do complexo paulista se deve à própria transferência de capital cafeeiro investido diretamente por fazendeiros ou via relações familiares em atividades urbanas e que em inúmeros casos o transforma em banqueiro industrial comerciante importador etc mesmo quando o fazendeiro não abandonou em definitivo sua condição anterior de capitalista rural 12 Algumas observações sobre a Amazônia o Nordeste e o Extremo Sul Como se verá nos Capítulos finais não bastaria o estudo da economia paulista para que se pudesse tirar maiores conclusões sobre o problema da concentração industrial em São Paulo Tornase também necessário o exame ainda que sumário de outras economias regionais do país face ao seu interrelacionamento com o crescente predomínio do comércio cafeeiro de São Paulo Assim incluo tanto a discussão do nascimento e decadência da economia amazônica da borracha quanto algumas das mais antigas economias regionais como a do Nordeste e a do Extremo Sul77 Quanto à economia amazônica da borracha cabe de início ressaltar que seu desenvolvimento não pode ser chamado de simples surto quer pelo fato de que seu período de desenvolvimento durou meio século quer pelo alto volume de suas exportações que nesse transcurso equivaleram a cerca da metade das exportações paulistas de café 77 Além de não tratar de outras economias regionais de menor expressão para a época outras de grande importância como Minas Gerais Rio de Janeiro e Guanabara não recebem neste trabalho um estudo sistemático Desta forma essas regiões receberão apenas referências quando isto for possível e pertinente O estudo sistematizado dessas economias envolvem na realidade pesquisas complexas que extravasam os limites deste trabalho Raízes da concentração industrial em São Paulo 95 Sabese que seu insucesso originouse tanto pelas condições da oferta e demanda internacionais quanto pela sua estrutura de economia coletora florestal Cabe indagar entretanto porque durante sua fase de expansão não gerou um complexo econômico diversificador de sua estrutura produtiva que pudesse pelo menos atenuar o impacto da crise da borracha A resposta a isso parece residir no fato de que essa economia teve relações de produção consubstanciadas na forma da economia do aviamento Também é conhecido o fato de que a estagnação e decadência do Nordeste se deve tanto às condições depressivas do mercado internacional do açúcar e em grande parte também do algodão como às próprias condições de sua tradicional estrutura produtiva Embora tenha conseguido substituir seu fracasso no mercado externo pelo abastecimento do mercado nacional o que lhe permitiria lenta recuperação não conseguiria aproveitarse plenamente disso uma vez que sua transição para o regime de trabalho assalariado foi débil não lhe possibilitando um desenvolvimento capitalista mais evoluído Isto tanto lhe restringiu a acumulação de capital como a expansão de seu próprio mercado interior impedindoo assim de promover uma implantação industrial mais dinâmica Quanto à economia do Extremo Sul ressaltamos sua estrutura agrária de pequena e média propriedade que lhe atomizou a aplicação produtiva do excedente gerando também uma indústria em que predominou a pequena e média empresa Por outro lado a grande competitividade da oferta de alimentos no mercado nacional tanto entre os estados dessa região como de outras impossibilitoulhe maior dinamismo freando assim sua acumulação de capital Esses fatos implicaram num condicionamento à sua formação industrial que não teria meios eficientes para competir com a indústria mais desenvolvida de outras regiões à medida que se integrasse o mercado nacional 121 A economia amazônica Excluída a economia maranhense a região amazônica manteve se até meados do século XIX na atividade extrativistaflorestal ligando se precariamente ao comércio internacional A atividade extratora da borracha expandiuse lentamente nas décadas de 1860 e de 1870 Wilson Cano 96 atingindo na seguinte um período mais expressivo chegando ao auge entre 1890 e 1920 Essa expansão foi induzida pela subida de seus preços externos que triplicam entre 1880 e 1910 situandose na média do período de 19111920 a nível 60 mais alto do que os preços médios vigentes no período de 1881189078 No sentido de poder avaliar qualitativamente o potencial econômico dessa atividade julgo conveniente uma comparação entre a evolução da economia da borracha e a expansão cafeeira em São Paulo no período de 1870 a 1920 Vejamos o confronto das exportações paulistas de café e das exportações de borracha pela Amazônia assim como o de suas respectivas populações Tabela 8 Estado de São Paulo e Amazônia Exportações de café e de borracha e relação populacional Exportações 1000 contos Anos Borracha Café habitantes AM SP AMSP AMSP 1871 a 1880 1079 2218 486 397 1881 a 1890 1855 4907 378 344 1891 a 1900 11633 28600 407 305 1901 a 1910 22688 28992 783 1911 a 1920 14068 49420 285 313 Fonte Anuário Estatístico do Brasil IBGE Rio 193940 e Fraga Constantino C Resenha Histórica do Café no Brasil em Agricultura em São Paulo 163 SPaulo para a população Censos Demográficos de 1872 1890 1900 e 1920 Acrescentese ainda que no mesmo período o fluxo imigratório para a Amazônia equivaleu a 385 do recebido por São Paulo79 Somadas as exportações desse meio século as de borracha equivaleram aproximadamente a 45 das exportações paulistas de café Dados esses fatos poderseia perguntar porque razões a Amazônia não conseguiu transformar essa fonte primária de energia econômica que foi a borracha gerando um complexo econômico tão dinâmico quanto foi o cafeeiro guardadas as proporções relativas de ambos Não parece difícil responder a essa indagação 78 Sobre as linhas gerais da evolução da economia da borracha ver Furtado 1961 cap 23 79 Essa porcentagem é calculada com base nas quantificações efetuadas para São Paulo por Camargo 1953 e para a Amazônia por Furtado 1961 cap 23 Tabela 8 Estado de São Paulo e Amazônia Exportações de café e de borracha e relação populacional Fonte Anuário Estatístico do Brasil IBGE Rio 193940 e Fraga Constantino C Resenha Histórica do Café no Brasil Agricultura em São Paulo 163 São Paulo para a população Censo Demográfico 1872 1890 1900 1920 Raízes da concentração industrial em São Paulo 97 Em primeiro lugar o problema maior parece ter residido na forma principal em que se desenvolveram as relações de produção na economia da Amazônia ou seja na preponderância do aviamento80 Consistia e consiste esse sistema numa cadeia de agentes cujo primeiro elo o maior e mais poderoso é representado pelas grandes casas exportadoras e naturalmente também importadoras que concedem crédito aviam a intermediários menores emprestandolhes dinheiro e adiantando meios de subsistência e bens de produção os rudimentares instrumentos auxiliares da produção da borracha81 Os médios e pequenos intermediários por sua vez repassam o crédito recebido e portanto são ao mesmo tempo aviados e aviadores aos últimos elos dessa cadeia que são exatamente os produtores diretos da atividade extrativa Estes últimos constituem genuinamente os aviados Esse fluxo de crédito cuja componente monetária é pequena predominando a fração em espécie tem como contra partida outro fluxo em espécie a borracha e mais tarde também a juta que é contabilizado a preços estabelecidos pelo primeiro elo da cadeia82 Esse fluxo compreende as seguintes parcelas o valor dos bens de produção utilizados o custo de subsistência do produtor direto e os juros e lucros da cadeia de intermediação A diferença contábil de ajuste nos dois fluxos é o saldo do produtor devedor na maioria das vezes o que o torna ainda mais dependente ao sistema de aviamentos Quando credor representa no entanto parcela insignificante Tratase portanto de um sistema em que cabe ao comprador determinar ao produtor independente o preço de produção provendoo ainda dos meios de subsistência a preços da mesma maneira estabelecidos fixando a renda do produtor ao nível de subsistência física 80 Para o tema sobre o aviamento consultei especificamente o excelente trabalho de Santos 1968 81 Como o próprio autor citado na nota anterior mostra é evidente que à medida em que o sistema bancário se desenvolve e penetra mais no interior da Amazônia o sistema de aviamento é enfraquecido ainda hoje ele subsiste tanto na atividade extrativa da borracha como na da produção de juta 82 Ver Santos 1968 p 2427 alguns exemplos da contabilização das contas entre aviadores e produtores através dos quais se conclui que efetivamente os fluxos em espécie são predominantes nessas típicas relações Wilson Cano 98 Em suma a economia da borracha está organizada em torno do pequeno produtor independente que é dominado e explorado pelo capital comercial Isto posto examinemos as raízes da baixa diferenciação da economia da borracha Em primeiro lugar é necessário lembrar que devido à existência de ampla rede fluvial não se requereram maiores aplicações para a implantação de sistema de transportes Tais inversões restringiramse à construção de portos e a oficinas de reparos de embarcações Por outro lado não se estabeleceram as condições mínimas requeridas para o surgimento de uma agricultura mercantil de alimentos Não naturalmente porque inexistisse demanda que foi atendida por importações de alimentos em volumes apreciáveis Ao contrário foi o modo de organização da atividade extrativa fundada no pequeno produtor independente internado e disperso na floresta virgem que bloqueou obviamente seu nascimento Quer dizer nem há como no café uma empresa agrícola onde a atividade primária se desenvolve sob o comando do capital nem muito menos disponibilidade de terras abertas pela atividade exportadora em que a produção de alimentos pudesse ser efetivada nem ainda força de trabalho que excedesse ao requerido pela extração da borracha que proporcionava ao capital comercial uma rentabilidade extremamente alta Por razões semelhantes não se criam também oportunidades de inversão industrial mais expressivas apesar da existência de mercado ainda que de dimensões reduzidas devido à baixa remuneração dos aviados e à extremamente limitada urbanização83 Com efeito as características de sua indústria em 1907 e 1919 refletiam esses negativos aspectos a indústria da madeira respondia por 25 da produção industrial da Amazônia a de bebidas alimentação e fumo juntas representavam outros 25 O Censo de 1907 não constatou a existência de indústrias têxteis na região e a existente em 1919 perfazia apenas 5 da produção industrial da região 83 Notese nesse sentido que ainda em 1939 a população rural perfazia cerca de 75 da população total da Amazônia Raízes da concentração industrial em São Paulo 99 Vista a estrutura industrial pela dimensão dos estabelecimentos os resultados não eram mais promissores os estabelecimentos maiores concentravam apenas um quarto do capital industrial tanto quanto a típica estrutura industrial da economia gaúcha constituída basicamente pela pequena e média empresa A indústria amazônica acompanharia a decadência da economia da borracha em 1907 a região tinha produção industrial equivalente a 43 do total nacional e em 1919 já na crise essa participação era violentamente reduzida para 13 Por outro lado dado o elevado número de intermediários em que estava assentada a economia do aviamento podese pensar ainda numa relativa atomização do excedente dificultando portanto a transformação do capital comercial em capital produtivo Justamente por tudo isto que exprime a profunda dominação do capital comercial na economia da borracha é que boa parte dos lucros se transformou em construções suntuárias grandes importações de bens de luxo e remessa de rendimento para o exterior dado a participação do capital estrangeiro no comércio exportadorimportador Como essa base produtiva não se diversificou o suficiente para proporcionar a efetiva acumulação de capitais nela gerados vinda a crise ao longo da década de 1920 seria quase fatal a sua estagnação e posterior atrofiamento uma vez que dadas suas condições naturais poucas seriam as possibilidades de integração em novas correntes de comércio exterior ou interior84 Nem mesmo a expansão da indústria nacional de pneumático em meados da década de 1930 faria com que a Amazônia retomasse seus anteriores níveis de produção da borracha As experiências feitas pelos imigrantes japoneses no cultivo da juta e fibras similares somente alcançaram plenos resultados após a segunda guerra o que retardou em cinqüenta anos a integração dessa produção com a indústria de sacaria de São Paulo que floresce desde 1889 122 O complexo nordestino Limitarmeei neste passo a reproduzir sumariamente alguns pontos mais relevantes dos principais trabalhos que contemplaram o 84 Ver a respeito o citado trabalho de Furtado 1961 cap 23 Wilson Cano 100 estudo do Nordeste brasileiro adicionando algumas observações complementares a alguns deles85 Cabe de início relembrar a herança colonialescravista do Nordeste e a lenta tentativa de recuperação de suas exportações ao longo do século XIX e sua difícil complementação com as economias do sul do país Na etapa colonial a alocação interna do excedente potencial tinha duas limitações de um lado o exíguo mercado interno dado que as relações sociais eram escravistas de outro o que é fundamental o fato de que essa economia tem como objetivo básico a apropriação da maior parcela possível do excedente pela metrópole colonizadora ou por outras metrópoles parceiras do jogo colonial Novais 1974 Passada a etapa colonial persistindo o escravismo uma terceira limitação se faz presente através do agravamento do secular problema da queda dos preços de seus produtos básicos o açúcar e o algodão em que pese a lenta recuperação dos volumes exportados que se processa ao longo do século XIX Poderseia esperar que com a alteração das relações fundamentais de produção resultariam dois efeitos importantes de um lado a ampliação do potencial de investimento pela não imobilização em escravaria de outro o aumento da massa de salários que poderia expandir o mercado criando condições melhores para a alocação diversificada de inversões Isto não se deu de modo significativo Vejamos porque Os preços do açúcar que eram de 120 por tonelada no início do século XVII caíram ao longo desse século atingindo 72 por volta de 1710 cerca de 30 ao iniciarse o século XIX 16 na metade desse século e 9 no início do século XX86 85 A bibliografia sobre o Nordeste brasileiro é ampla razão pela qual apenas algumas obras serão citadas no decorrer deste tema Ainda assim permitome lembrar da Formação econômica do Brasil especialmente as partes 2 e 3 que constituem a melhor sistematização sobre o complexo nordestino 86 Para os preços do açúcar até o início do século XIX usei como fonte Simonsen 1944 v 1 Tabela anexa à página 172 para os preços a partir de 1821 Anuário Estatístico do Brasil 1939 40 p 1378 Raízes da concentração industrial em São Paulo 101 A média anual de 30000 toneladas exportadas no século XVII cairia para 20000 no século seguinte recuperandose plenamente no século XIX quando supera a marca das 100000 toneladas Entretanto o açúcar de cana esbarraria com a crescente expansão do açúcar de beterraba que chega a dominar cerca de 50 do mercado mundial em 1882 atingindo 75 por volta de 1900 Sodré 1967 p 90 Para essa atividade portanto restaria tão somente a perspectiva do mercado nacional o qual entretanto não se apresentaria muito promissor face à expansão da produção açucareira que ocorreria mais tarde no sul do país87 Excetuado o surto exportador ocorrido em meados do século XVIII principalmente no Maranhão a economia algodoeira se constituiria durante o século XIX numa importante atividade do complexo nordestino Se eliminarmos as excepcionais exportações das décadas de 1860 de 1870 e de 1880 principalmente da primeira quando os preços do algodão se situam ao dobro do nível médio do século essa atividade teve um crescimento lento mas persistente passando de cerca de 110000 a 190000 toneladas entre a primeira década do século XIX e a primeira do século XX Entretanto a grande expansão algodoeira norteamericana e mundial operando a níveis maiores de eficiência precipitaria os preços para baixo fazendo com que com exceção dos anos 60 o nível médio de preços se situasse 30 abaixo do verificado no início do século XIX Já no final do século a indústria têxtil brasileira consumia cerca de 60 do algodão produzido no país e sua acelerada expansão entre 19001920 faria com que o algodão nordestino passasse agora a ter no mercado interno a fonte para sua expansão88 87 Para uma análise do problema açucareiro do Nordeste em suas relações com o Sul ver Gnaccarini 1972 especialmente as partes 1 e 2 88 Entretanto já na década de 1920 São Paulo iniciaria um trabalho de pesquisa e classificação de algodão que a partir da crise de 1930 lhe permitiria expandir aceleradamente essa cultura passando daí em diante a ser o primeiro produtor nacional O Nordeste dada a peculiaridade de que boa parte de seu algodão é do tipo de fibra longa e do sul é de fibra curta não perderia o mercado sulino em termos absolutos Dados sobre a produção algodoeira paulista no período 1900 a 1930 podem ser obtidos do livro de Stein 1957 p 197 Wilson Cano 102 Operando também com trabalho livre e induzindo uma importante atividade industrial de beneficiamento parece ter sido o algodão guardadas as proporções relativas uma atividade mais dinâmica em termos de urbanização comércio e industrialização do que o açúcar Acrescentese a isso o fato de que a baixa de preços do algodão seu alto custo de transporte e o tipo de embalagem requerida tela de enfardamento teriam estimulado a instalação local das primeiras fábricas têxteis de algodão que produziam sacos e tecidos grossos já a partir de meados da década de 185089 Entretanto como já se viu a cotonicultura paulista avançaria no século XX inclusive operando em bases tecnicamente mais eficientes fazendo com que a partir da crise de 1929 São Paulo dominasse amplamente essa atividade O Nordeste que era um produtor exportador marginal no mercado internacional passava agora a sêlo também no mercado nacional Vejamos resumidamente os demais componentes do complexo nordestino a pecuária a agricultura de subsistência o transporte ferroviário e a indústria que surge entre o final do século XIX e o início do XX90 Além de seu importante papel histórico de ocupação do território e de suporte para a atividade açucareira a pecuária desempenhou outro não menos relevante na configuração do complexo nordestino a consolidação de um regime latifundiário de propriedade da terra que fora iniciado e perpetuado pelo açúcar É nestas condições que a maioria da população livre se integra numa ou noutra atividade vivendo a situação de morador de condição Não sendo proprietária residia precariamente no latifúndio obrigada a prestar serviço remunerado ou 89 Stein 1957 p 221 nota 3 relata que antes da instalação ferroviária na Bahia por volta de 1860 o custo do transporte do algodão do Vale do São Francisco aos portos de embarque oscilava entre 61 e 65 do preço de mercado para exportação Nesse mesmo trabalho às páginas 20 e 21 Stein afirma que a Bahia até 18661875 tinha a maior parte da indústria têxtil algodoeira do Brasil entre as razões que ele alega para esse fato estão a urbanização mercado local fonte local supridora de algodão porto e uma Lei Provincial da época que mandava cobrar impostos suplementares sobre produtos exportados que utilizassem sacarias importadas 90 Evidentemente o Nordeste contava com outros produtos básicos de exportação como por exemplo o fumo o couro e o cacau os quais entretanto eram de menor expressão do que o açúcar ou o algodão Raízes da concentração industrial em São Paulo 103 não ao dono da terra e tendo a permissão de cultivar um pedaço de terra para obter seu próprio sustento Andrade 1973 p 104105 Dotada de uma característica própria de acumulação natural e de um alto poder de resistência à multissecular crise do setor exportador a pecuária contribuiria em muito para a formação de um imenso reservatório de mãodeobra91 Na agricultura de subsistência caracterizada principalmente pela pequena e média propriedade na região do agreste também se produziriam o algodão e plantas forrageiras A exígua urbanização os altos custos de transportes a relativa autosuficiência da pecuária e da atividade açucareira e a pequena dimensão de suas propriedades reforçariam o círculo vicioso da pouca dinamicidade dessa agricultura principalmente em termos de mercado e de acumulação de capital Da mesma forma que a pecuária a agricultura de subsistência teria grande importância para a expansão do reservatório de mãodeobra A implantação ferroviária e a urbanização parecem ter sido durante muito tempo componentes que também não puderam propiciar ao complexo nordestino efeitos tão dinâmicos como os que se verificaram no complexo cafeeiro Já na década de 1860 a expansão ferroviária no Nordeste se fez basicamente com investimentos de propriedade britânica No início do século XX a maior parte da rede já estava encampada pelo governo federal Outra característica é que na primeira década do século XX a maioria dessas estradas no Nordeste tinham uma relação despesasreceitas em torno de 80 ou mais ao contrário das ferrovias paulistas cuja relação não era superior a 50 o que nos permite estimar para as primeiras margens de lucros de 4 a 5 vezes menores do que para as paulistas Podese depreender portanto que essas ferrovias embora tenham reduzido os custos de transportes para o algodão e para o açúcar certamente não desempenharam os dois outros papéis cumpridos pelas paulistas quando de propriedade externa pouco significaram em termos 91 Acumulação natural no sentido de que o capital físico principal da pecuária o gado é produzido e reproduzido dentro do próprio setor independentemente das condições de mercado Conf Furtado 1961 cap 10 Wilson Cano 104 de ampliação das oportunidades de inversão aos capitais locais por terem reduzidíssima lucratividade operavam com garantia de juros 5 pelo governo federal e mais 2 pelos estaduais e dessa forma além de não ampliarem os lucros ainda lhe extraíam uma parte carreandoo para fora do complexo No que se refere ao problema de urbanização o que se pode dizer resumidamente é que esse processo no Nordeste foi lento e atomizado Suas principais aglomerações urbanas se estendem pelo litoral principalmente as oito das nove capitais e também pelo interior Como não se conta com dados da população urbana antes de 1940 resta como forma aproximativa a esse fato o volume das populações das capitais nordestinas que são conhecidas desde 1872 Tabela 9 População 1000 habitantes de algumas capitais Anos Nordeste a Salvador Recife Rio de Janeiro São Paulo 1872 424 129 116 275 32 1890 468 174 112 523 65 1900 551 206 113 811 240 1920 905 280 240 1158 579 1940 1270 290 348 1764 1330 Fonte Censos demográficos a total das nove capitais Essa urbanização foi muito lenta Tabela 9 e se descontarmos Salvador e Recife do total nordestino fica igualmente claro o fenômeno da dispersão espacial Poderseia questionar os dados acima com a alegação de que os demais centros urbanos do Nordeste se incluídos nesse quadro permitiriam outra conclusão Sua inclusão entretanto não alteraria aquela realidade Esta verificação só é possível a partir de 1939 ano em que as populações urbanas do Nordeste total da região e do estado de São Paulo totalizavam 34 e 32 milhões de habitantes respectivamente apesar de que São Paulo nesse ano tinha uma população total equivalente a 50 da população total nordestina Evidentemente essa dispersão urbana envolve um sério problema de deficiência de economias externas e de economias de escala principalmente quando o sistema local de transportes é deficiente Tabela 9 População 1000 habitantes de algumas capitais Raízes da concentração industrial em São Paulo 105 Pareceme claro que pelo menos até a primeira década do século XX o complexo nordestino não conseguira superar sua conformação estrutural que se reflete basicamente no problema do excedente e no problema do mercado Com efeito a rígida estrutura da propriedade tornando a oferta de terra praticamente inelástica faz com que o regime de salários se torne de fato de fachada Com isto as mudanças nas relações de produção pouco se alteram qualitativamente perpetuando portanto a baixa eficiência a baixa produtividade e os reduzidíssimos salários rigidificandose assim não somente a estrutura mas também a própria dinâmica da demanda de bens de consumo simples de bens de luxo e principalmente de bens de produção A recuperação das exportações durante o século XIX teve seus resultados afetados pelo secular declínio dos preços exceto para os preços do algodão na década de 1860 Quando essa economia ingressa no século XX o cenário não é mais promissor do que o fora antes em que pese o crescente processo de integração que se dá entre a oferta nordestina algodão e açúcar principalmente e o Sul do país a produção similar nesta última região também cresceria principalmente após a crise de 1929 Com essa configuração histórica pouco se poderia esperar do complexo nordestino em termos de uma diversificada e crescente acumulação de capital no compartimento industrial O Censo de 1907 constata isso mostrando que o complexo nordestino só aparentemente tinha um valor de produção industrial aproximadamente igual ao de São Paulo Descontado o valor da produção da agroindústria açucareira a relação NordesteSão Paulo se reduziria a pouco mais de 65 e se deduzido também o fumo essa cifra cai para menos de 58 A expansão acelerada em São Paulo faria com que essa mesma relação em 1919 fosse de menos de 40 Tomados ainda os dados de 1907 o Nordeste tinha uma indústria têxtil cujo valor de produção equivalia a cerca de 80 da indústria têxtil de São Pauto92 Entretanto esse valor absoluto deve ser melhor 92 Notese que nesse período a população nordestina era duas e meia vezes maior do que a de São Paulo Wilson Cano 106 qualificado Por um lado por ter sido instalada em grande medida pioneiramente essa indústria certamente pagou muito cedo o preço de adotar formas técnicas de produção que fatalmente seriam ultrapassadas entre os fins do século XIX e o início do XX Por outro lado a estrutura da demanda regional certamente teria condicionado a estrutura de sua oferta calcada basicamente em tecidos grosseiros de baixos preços e de baixa produtividade econômica93 Estes dois fatores refletemse no baixo valor médio da produção por operário da indústria têxtil nordestina que naquele ano fora de 22 contos representando tão somente 47 dos 46 contos produzidos em São Paulo Não era mais significativa a produção industrial do complexo nordestino em outros ramos que não o têxtil ou o açucareiro o valor da produção de outros bens de consumo como por exemplo móveis calçados e chapéus totalizavam juntos apenas 30 da produção similar de São Paulo em 1907 Faço em seguida algumas observações críticas a respeito de duas teses referentes ao processo histórico do complexo nordestino formuladas por P I Singer e N H Leff94 Singer procura demonstrar que o surto exportador de algodão durante a década de 1860 promovido pela Guerra de Secessão norte americana condicionou a expansão açucareira tanto em termos de quantidade pela disputa de terras entre o algodão e a cana como em termos de renovação tecnológica Diz O processo de industrialização da manufatura açucareira que vinha avançando vigorosamente na década de 1850 foi enfraquecido pelo surto algodoeiro durante a década seguinte Enquanto se manteve a alta do algodão dificilmente poderia ser atraente a grande inversão representada por um engenho a vapor Este atraso na Revolução Industrial do açúcar no Nordeste provocado pela alta do algodão vai representar um handicap quando o Brasil tentar recuperar seu lugar no mercado mundial a partir do último quartel do século XIX O algodão dando rendimentos muito elevados deve ter disputado a terra da Zona da Mata à cana que antes a monopolizava Singer 1968 p 292 293 93 O citado trabalho de Stein 1957 especialmente na parte referente ao século XIX fornece algumas indicações nesse sentido 94 As afirmações estão contidas nos trabalhos de Singer 1968 cap 6 e Leff 1972 p 321 Raízes da concentração industrial em São Paulo 107 A argumentação está baseada na afirmativa de M C de Andrade sobre a disputa de terras e nas estatísticas de exportação de açúcar e de algodão por Recife no período 1857 a 188295 Examinando as séries estatísticas de 1821 a 1939 para o Brasil verifiquei o seguinte tomadas as médias anuais das exportações para os dois produtos em 1000 toneladas efetivamente entre os períodos de 18571860 e 18611870 as do açúcar caem para o Brasil de 116 para 111 e para Pernambuco de 63 para 56 e as de algodão sobem de 15 para 29 Brasil e de 2 para 10 Pernambuco Tomados os períodos de 18611870 e 18711880 as de açúcar sobem de 111 para 168 Brasil e de 56 para 84 Pernambuco e as de algodão sobem de 29 para 38 no Brasil mantendo se constantes naquele estado Como explicar que nesta última década o açúcar se expande em quase 50 e o algodão se mantém constante sabendose que existem maiores restrições de solo e clima para a cana do que para o algodão Como explicar ainda tomando por exemplo os anos de 18571858 e 1871 1872 que as exportações pernambucanas de açúcar e de algodão passam respectivamente no primeiro período das médias de em 1000 toneladas 732 e 17 para 872 e 266 que foi o ponto mais alto do algodão entre 1857 e 1882 Os três períodos mostram exatamente o seguinte no primeiro o açúcar se contrai e o algodão se expande no segundo um tem um aumento de 50 e o outro permanece constante no terceiro o açúcar aumenta em 20 e o algodão em 1560 Pareceme que houvesse ou não ocorrido disputas de terras não teria sido a terra o fator limitativo para a expansão de uma ou outra atividade Se não foi a terra o fator limitativo à expansão açucareira essa resposta deveria ser obtida pelo exame do comportamento dos preços internacionais das demais condições do mercado internacional do açúcar e das próprias condições para a renovação técnica principalmente se a atividade opera a custos altos com preços de mercado em baixa Entre 1821 e 1930 os preços relativos açúcaralgodão só foram favoráveis ao açúcar nas décadas de 1840 e de 1850 diferença relativa mínima e no restante desse período sempre desfavoráveis principalmente na década de 1860 95 Ver Andrade 1973 p 150159 Para as exportações ver o Apêndice Estatístico Wilson Cano 108 Como se sabe os preços do açúcar estavam historicamente debilitados certamente em níveis relativos mais baixos do que os do algodão As condições do mercado internacional da mesma forma eram desfavoráveis ao açúcar brasileiro já de longa data Adicionese a isso aquela configuração estrutural a que antes me referi mais especificamente sobre as condições precárias de geração do excedente e de sua acumulação e não se tornará difícil perceber a imensa dificuldade que teria essa atividade para renovar tecnologicamente sua capacidade produtiva Operando historicamente a preços baixos e em condições adversas no mercado internacional não contaria com um grande excedente que lhe permitisse realizar a inversão nem mesmo com uma taxa de lucro suficiente para amortizar empréstimos de grande porte Tanto é assim e o próprio Singer mostra isso que foi necessária a ação governamental assumindo o risco e empresariando capitalistas estrangeiros dandolhes garantia de juros pelo governo federal e estadual para que instalassem e operassem os modernos Engenhos Centrais durante a década de 1880 principalmente Singer 1968 p 296300 São bastante conhecidas as razões do fracasso dos Engenhos Centrais e me permito citar uma delas que julgo ser a não menos importante em que pese a garantia de juros pelo governo é exatamente nessa década que os preços médios do açúcar atingem seu ponto mais baixo no século Apresentando tão somente cerca de 44 dos preços vigentes na década de 182096 Na realidade se a expansão algodoeira tivesse sido contínua e maior do que em média foi e se efetivamente tivessem os senhores de engenho durante um período maior de tempo principalmente após a expansão ferroviária redutora de custos de transportes dos dois produtos dedicado terras de cana para o cultivo do algodão possivelmente essa diversificação poderia ter contribuído para a geração de um excedente maior Esta mera hipótese entretanto colide com outra como a indústria açucareira estava em crise e certamente operando com 96 Ver além do trabalho de Singer Gnaccarini 1972 p 107114 Raízes da concentração industrial em São Paulo 109 capacidade ociosa a retirada de terras de cana para o cultivo do algodão poderia se diminuída a oferta de cana agravar ainda mais a situação financeira da atividade açucareira que efetivamente havia imobilizado um capital fixo exclusive a terra maior e que para sobreviver tinha de amortizar pelo menos seus custos fixos monetários A tese de Leff pode ser assim resumida não aceitando de todo as explicações correntes sobre a estagnação e decadência das exportações nordestinas de algodão e açúcar Leff conclui que essa estagnação foi produto de um mercado cambial unificado cuja taxa de câmbio refletia crescentemente a alta produtividade cafeeira e o crescimento de suas exportações fazendo com que a remuneração em moeda nacional ao café fosse alta e a do algodão e do açúcar baixa Diz Nessas circunstâncias o Nordeste teria ficado melhor como unidade política separada com seu próprio sistema monetário Seu comércio e desenvolvimento teriam sido determinado pela própria vantagem comparativa da região Leff 1972 p 18 Mais adiante afirma que O desenvolvimento do Nordeste também teria sido retardado por outra circunstância relacionada com considerações de união da moeda a obrigação de sic região de manter paridade fixa em suas transações com o Sudeste Sua paridade fixa dentro do Brasil implica que a taxa cambial da região em relação ao Sudeste também estava sobrevalorizada p 19 Finalmente conclui que na medida em que as economias das duas regiões eram ou poderiam ter sido complementares a sobrevalorização cambial tendia também a reduzir o volume das exportações nordestinas para um Sudeste em rápido desenvolvimento comparativamente ao que ocorreria num regime cambial diverso Isso reduzia os efeitos de encadeamento das duas regiões o qual seria presumivelmente o principal benefício econômico do Nordeste em permanecer dentro da mesma unidade política com o Sudeste p 20 Já discuti o problema do comportamento das exportações de algodão e de açúcar e portanto limitome aqui a algumas observações em torno do problema cambial e da possível complementação econômica interregional Em primeiro lugar os saldos da balança comercial brasileira tiveram comportamento distinto entre 1821 e 1861 e depois dessa data Wilson Cano 110 Nesses 41 anos o saldo só foi ligeiramente positivo em 10 e negativo nos outros 31 na década de 1860 foi positivo o saldo acumulado de 184 mil contos e ele tanto pode ter surgido pelo acréscimo das exportações de algodão mais 227 mil contos em relação à década anterior como do café mais 256 mil contos na de 1870 antes da expansão da borracha parece que os crescentes saldos positivos da balança comercial podem ser atribuídos ao café Portanto não se pode afirmar ter sido a expansão cafeeira a responsável pela fixação de uma taxa cambial supervalorizada como afirma Leff se considerarmos ainda que de 1830 a 1870 as exportações de café situamse em torno de 45 do total e as do açúcar e do algodão juntos perfazem aproximadamente 32 que se adicionadas às do fumo e do cacau em sua maior parte exportados pelo Nordeste chegavam a cerca de 35 Mesmo no período de 1880 a 1910 não se pode atribuir apenas ao café a evolução dos saldos da balança comercial Há que se considerar Tabela 10 que embora suas exportações aumentem consideravelmente no período as importações totais crescem ainda mais Por outro lado deve se ter presente que também se elevam as exportações de borracha que contribuem para a elevação do saldo da balança comercial Lembro ainda por exemplo que na primeira década do século XX o saldo da balança comercial foi de 27 milhões de contos em que pese o fato de que as exportações de café tenham caído em 05 milhão obviamente neste período o saldo deve ser imputado tanto ao aumento das exportações da borracha que sobem mais 11 milhão de contos quanto à contração das importações que caem de 1 milhão de contos Tabela 10 Comércio exterior do Brasil 1000 contos Variações absolutas por décadas Exportações e Importações 188190 187180 189100 188190 190110 189100 Saldo da balança comercial a 303 952 2732 Exportações de borracha 78 978 1106 Exportações de café 372 3200 530 Importações totais 481 4295 1007 Fonte Anuário Estatístico do Brasil 193940 a Os valores para o saldo não representam variações entre décadas referemse às de 1880 1890 e 1900 Raízes da concentração industrial em São Paulo 111 Não pretendo ignorar obviamente nem a influência política do café que poderia exercer pressões na fixação da taxa de câmbio nem que sua produtividade era alta O que desejo mostrar é que não foi ele o único responsável por uma suposta folga cambial Mesmo que fosse cumpriria adicionar um fato não considerado por Leff o papel da dívida externa e de seu serviço Villela e Suzigan demonstraram claramente que em que pese os grandes empréstimos obtidos no exterior entre 1822 a fins de 1889 o serviço da dívida externa constituiu cerca de uma vez e meia todo o saldo da balança comercial verificado naquele período No regime republicano entre 1890 e 1933 cerca de 75 dos saldos foram empregados no pagamento da dívida externa 1973 p 332333 Assim parece evidente a inexistência de folga cambial mas sim de um precário equilíbrio de balanço de pagamento se adicionarmos as entradas por empréstimos porém sempre inferiores ao serviço da dívida Não havendo folga cambial mas antes um possível déficit parece evidente que o comportamento da taxa cambial não poderia ser estável e nem muito supervalorizado com efeito ela passa Cr de 63 na década de 1820 crescendo continuamente para 89 na de 1840 102 na de 1860 notese que nesta década ocorre a grande expansão algodoeira 109 na de 1880 e para 25 na última década do século XIX Em determinados períodos como as décadas de 1850 e de 1870 o câmbio é estável ou mesmo ligeiramente declinante Vista a questão pelo ângulo da geração e gastos regionais de divisas para a qual lamentavelmente só disponho de informações para os anos de 18521857 e para o de 1919 constatase um equilíbrio entre a geração e o gasto regional de divisas no Nordeste e no Sudeste Tabela 11 Porcentagem do total das importações e exportações brasileiras Estados Importações Exportações 185257 1919 185257 1919 AMGOMG 01 11 01 31 PAMAPICE 76 36 72 65 RNPBPEALSEBA 319 135 312 133 ESRJMGSPGB 552 723 545 681 SCPRRS 52 95 70 90 Fonte Inst Hist e Geog Brasileiro Diccionário Histórico Geographico e Ethnographico do Brasil I 544 Rio de Janeiro 1922 apud JF Normano página 16 Tabela 11 Porcentagem do total das importações e exportações brasileiras Fonte Inst Hist e Geog Brasileiro Diccionário Histórico Geographico e Ethnographico do Brasil I 544 Rio de Janeiro 1922 apud J F Normano p 16 Wilson Cano 112 O único desequilíbrio acentuado que se nota Tabela 11 é o referente ao primeiro e segundo grupo de estados para 1919 naturalmente explicado pelo surto da borracha Leff parece não ter se preocupado com isso Evidentemente se houvesse uma desvalorização cambial ainda que restrita à região nordestina caso isso fosse politicamente possível ela resultaria unicamente na elevação dos preços de bens de consumo suntuários e dos bens de capital importados numa hipótese otimista de industrialização crescente no Nordeste Entretanto caso isto ocorresse as condições de competitividade NordesteSudeste se tornariam gravosas para o açúcar e o algodão únicos produtos comercializáveis em grande escala pelo Nordeste Se a desvalorização abrangesse todas as regiões provavelmente a estrutura interna de preços relativos não se alteraria resultando em ausência de ganhos ou perdas relativas para quaisquer das regiões Para concluir devese considerar ainda que se houvesse ocorrido uma paridade interna de preços proporcionalmente mais favorável ao Nordeste o Sul poderia obter açúcar e algodão no mercado internacional ou então desenvolveria sua indústria açucareira e sua cotonicultura mais rapidamente agravando ainda mais o problema do complexo nordestino 123 A economia do Extremo Sul Examinandose historicamente a evolução do Paraná Santa Catarina e do Rio Grande do Sul notamse além das conhecidas semelhanças principalmente no que se refere à dotação de alguns recursos naturais marcadas diferenciações quer na dinâmica de cada um dos estados quer nas mudanças que se verificaram em suas respectivas estruturas de produção Por outro lado a crescente competição que entre eles se desenvolve na conquista de mercados exteriores para a colocação de seus produtos constitui problema que impede pelo menos para o objetivo deste trabalho que se trate a região como um só agregado Assim os três estados serão apresentados separadamente só me referindo ao conjunto quando isto for pertinente Raízes da concentração industrial em São Paulo 113 Essa região foi pioneira no abastecimento do mercado nacional desde o século XVIII quando se dedicou à caça e criação de gado bovino eqüino e muar fornecendoo às zonas de mineração No século XIX quando se expande a economia cafeeira a economia do Extremo Sul entretanto passaria a contar com outros competidores tanto os do exterior através das importações de alimentos provenientes principalmente do Prata como de outras regiões do país notadamente de Minas Gerais após sua decadência cafeeira em fins do século XIX Por outro lado a dinâmica economia paulista desde o início do século XX ampliava consideravelmente sua agricultura de forma que já em 1919 sua produção de lavouras exclusive café equivalia a 99 da produção similar dos três estados sulinos juntos A falta de uma política protecionista adequada à produção agrícola nacional seu atraso tecnológico e os altos custos de transportes também retardaram a expansão da agricultura sulina Devese lembrar por exemplo que a ligação ferroviária do Rio Grande e Santa Catarina a São Paulo e ao Rio só foi concluída em 1910 e que a expansão agrícola paranaense só ocorreu após 1925 Isto não só contribuiu para o atraso na substituição de importações de alimentos mas retardou igualmente tanto a expansão agrícola como a industrial do Extremo Sul do país Notese ainda que entre 1890 e 1913 a Amazônia importou grande quantidade de alimentos e ao que tudo indica tanto a agricultura do Extremo Sul quanto a do resto do país não aproveitaram suficientemente essa oportunidade A imposição protecionista à importação de alimentos em fins de 1905 não constituiu um acidente ou o resultado de um grande esforço político nacionalista refletiu isto sim uma necessidade inadiável para o prosseguimento do processo de acumulação de capital e diversificação produtiva do complexo cafeeiro de São Paulo Essa medida não beneficiaria apenas São Paulo também a decadente cafeicultura mineira e fluminense tinha interesse em sua efetivação assim como a economia do Extremo Sul e a indústria nacional que dando apoio político à causa obtinha também aumento no grau de proteção a seus produtos Evidentemente apenas o comércio importador tentaria torpedear a consolidação da medida contudo sem obter resultado Luz 1961 p 130 Wilson Cano 114 Dado o alto grau de semelhança da produção agropecuária sulina e o fato de que o dinamismo da demanda estava centrado em decisões externas no resto do Brasil e no resto do mundo essa economia sofria permanentemente um processo de competição interna que se agravaria particularmente para o Rio Grande quando o Paraná figurasse mais tarde como seu mais direto concorrente97 Por outro lado é possível que uma parcela razoável do excedente gerado pela economia do Extremo Sul tenha sido apropriado pelo comércio atacadista localizado nos grandes centros urbanos do país principalmente Rio e São Paulo onde já de longa data havia radicado seus interesses sedes e operações Quanto maior fosse essa parcela menores seriam as possibilidades das economias abastecedoras acumularem capitais para expandir e diversificar sua capacidade produtiva A maioria dos trabalhos sobre a economia do Extremo Sul costuma destacar que essa expansão foi induzida pela integração dessa economia com o mercado criado pela expansão cafeeira É também comum o destaque dado ao fato de que o Rio Grande do Sul tinha um nível de produção industrial quase tão importante quanto o de São Paulo em 1907 respectivamente 135 e 159 do total do Brasil Um exame mais detalhado das informações disponíveis exige entretanto alguns reparos a essas afirmações Nas páginas seguintes tento colocar algumas observações sobre esses fatos O Paraná O processo de colonização e expansão paranaense foi fortemente influenciado pela expansão cafeeira de São Paulo Com efeito entre 1829 e 1934 o Paraná havia recebido apenas cerca de 116000 imigrantes estrangeiros número relativamente inexpressivo se comparado com a imigração ocorrida nos dois outros estados sulinos e principalmente em 97 Em que pese esse fato não ocorreria uma regressão absoluta ou relativa da agricultura gaúcha em relação ao total nacional passaria de 12 em 1919 oscilando em torno de 135 no período 1939 a 1969 mantendo sua posição de terceiro lugar na agricultura nacional a participação de Santa Catarina dobraria passando de 2 em 1919 para cerca de 4 em 1969 o que apresentaria o maior crescimento acelerado seria o Paraná que com 5 em 1919 saltaria do 70 lugar nacional para o 20 em 1969 com 14 do total brasileiro Raízes da concentração industrial em São Paulo 115 São Paulo Nicholls 1970 p 42 Esse processo começaria a dar seus primeiros passos quando o café e a ferrovia paulista atingissem no fim da primeira década do século XX a região fronteiriça de Ourinhos em São Paulo iniciandose a partir daí a penetração ferroviária e cafeeira ainda que modestamente no norte do Paraná Entretanto teria um lento prosseguimento explicável pela notável expansão do plantio que ocorreria durante a segunda metade da década de 1920 no Oeste Paulista Dois fatores foram decisivos na caracterização desse processo a crise cafeeira na década de 1930 retardando em quase vinte anos a expansão do café no Paraná e o sistema de colonização na base da pequena e média propriedade conduzido pela Companhia de Terras Norte do Paraná a partir de 192598 Dessa forma a colonização passaria a ter expressão maior a partir da década de 1930 com a pequena e média propriedade produtora de alimentos e a cafeicultura teria maior desempenho somente em meados da década seguinte99 De início com a produção alimentar desenvolvida na pequena propriedade e mais tarde também com a intercalada no café o Paraná contaria com excelentes condições que o transformariam mais tarde num grande celeiro nacional Entretanto certamente pagou o preço por chegar tarde como dá a entender Nicholls coube ao Estado de São Paulo e não ao Velho Paraná a liderança da penetração econômica do norte do Paraná que ficou intimamente ligado ao porto dominante de Santos à maior concentração de serviços financeiros e de comercialização no estado vizinho e aos mais importantes mercados interiores do país para alimentos e culturas industriais produzidas na região 1970 p 48 Grifo meu 98 Conf o citado trabalho de Nicholls 99 Isto poderia sugerir a seguinte hipótese para uma investigação específica até que ponto essa abertura colonizadora em regime de pequena e média propriedade com financiamento de terras não teria constituído um razoável amortecedor social e econômico para pequenos e médios fazendeiros paulistas virtualmente quebrados com a crise cafeeira É exatamente após a crise que se acelera o movimento de imigração de paulistas no Paraná e o movimento de imigração nordestina para a agricultura paulista na forma de trabalho assalariado mais do que compensando numericamente a saída de paulistas Wilson Cano 116 Menos vinculado pela demanda paulista de alimentos dada a quase suficiência da agricultura paulista e mais pela atividade comercial distribuidora e industrial é provável que tenha sido o Paraná dos três estados sulinos o mais afetado pelos efeitos de atração exercidos pela economia paulista E isto deve ter ocorrido em grande escala uma vez que o precário sistema rodoviário paranaense não interligava a região com sua capital e seus portos Sua precária articulação interna e seu retardamento econômico resultaram numa implantação industrial incipiente cujo valor da produção em 1919 equivalia a 34 do total nacional menor portanto do que sua participação em 1907 que fora de 45 Essas participações relativas no entanto são enganosas se considerarmos que grande parte dessa indústria na realidade estava mais ligada ao setor primário Por exemplo em 1907 do total de sua produção industrial o beneficiamento de erva mate compreendia 49 as serrarias de madeira 13 e suas 3 fábricas de fósforos 21 setores esses que perfaziam 83 do total Não seria diferente sua estrutura em 1919 O estado de Santa Catarina Conforme demonstraram Singer e Castro o estado de Santa Catarina é internamente pouco integrado constituído por várias regiões com atividades econômicas bastante diferenciadas como a região carbonífera a madeireira a industrial etc cada uma delas com sua Capital regional Joinville Blumenau Florianópolis Criciúma e Lages entre as principais Dessa escassa integração resultaria uma urbanização muito dispersa representada por cidades de tamanho relativamente pequeno Sua população passa de 2 a 25 do total brasileiro entre 1890 e 1930 e o Censo de 1920 constatou uma produção agrícola e industrial em torno de 2 do total nacional Se excluída a formação histórica da pecuária gaúcha a colonização catarinense guarda traços semelhantes com a gaúcha estrutura fundiária de pequena e média propriedade produção primária bastante similar com excedentes de alimentos à procura de mercados exteriores dificuldades de transportes com o resto do país o único meio era o de cabotagem até 1910 etc Raízes da concentração industrial em São Paulo 117 É pertinente aqui colocarse a seguinte questão quais seriam esses mercados A resposta comumente dada é a de que essa agricultura se integrou à expansão cafeeira Entretanto isto seria simplificar a questão Em primeiro lugar cabe lembrar que a cafeicultura foi escravista até a penúltima década do século XIX alimentando precariamente sua mãodeobra Mais ainda até onde o permitisse a disponibilidade e fertilidade do solo assim como a carga de trabalho dada à escravaria essa mesma mãodeobra produzia em parte seus próprios alimentos Mesmo depois de instituído o regime assalariado a agricultura nacional não contou com barreiras alfandegárias suficientes pelo menos até fins de 1905 como se pode ver pelas grandes importações que se faziam do início do século XX tanto de alimentos simples como feijão arroz batata charque trigo etc como de produtos relativamente mais nobres queijos manteiga conservas vinhos etc Resolvida a questão do escravismo e mais tarde a do protecionismo pareceria não mais existirem maiores problemas para a expansão dinâmica da agricultura sulina que além do mercado criado pela entrada de mais de dois milhões de imigrantes até 1910 contava também com a grande expansão amazônica da borracha Entretanto essa expansão não ficaria totalmente aberta à oferta sulina grande parte do contingente migratório é alocado diretamente na atividade cafeeira e se permitiu desde cedo que o imigrante desenvolvesse na própria fazenda de café uma agricultura produtora de alimentos e em certos casos também uma pequena atividade criatória com vendas de eventuais excedentes Isto não quer dizer obviamente que essa produção fosse bastante para todo o consumo sequer do rural uma parte continuaria ainda a ser importada do exterior trigo bacalhau azeite conservas laticínios vinhos etc e outra importada do resto do país açúcar do Nordeste alguns cereais vinhos e derivados de produção animal de outras regiões Com isto grande parte do mercado alimentar para os excedentes sulinos ficava automaticamente contido Com efeito um sumário exame nas estatísticas de produção e importação de São Paulo de produtos alimentares mostra claramente o seguinte Wilson Cano 118 antes de 1905 São Paulo tornavase autosuficiente em arroz feijão e milho antes da Primeira Guerra Mundial a produção de batatas situavase provavelmente em torno de 70 a 80 do consumo as importações de charque provenientes do exterior ou do resto do país eram relativamente insignificantes gravitando em torno de uma a duas mil toneladas quando o resto do país importava do exterior cerca de 50 a 60 mil toneladas no início do século XX os baixos preços do vinho estrangeiro e a diferente qualidade do vinho nacional tanto o paulista como o gaúcho ou catarinense só permitiram a conquista do mercado paulista aos vinhos sulinos após a crise de 1929 é evidente que o mercado paulista foi dinâmico para determinados produtos sulinos como alguns cereais cebola manteiga e principalmente banha Assim sendo e sem pretender negar uma dinamicidade às exportações sulinas para o expansivo mercado paulista tanto de alimentos como de matériasprimas couro fumo carvão lã etc concluo que na realidade a expansão sulina agroindustrial não se deu direta e fundamentalmente através da expansão do complexo cafeeiro paulista100 Uma pesquisa mais aprofundada certamente poderia revelar que parte apreciável das exportações sulinas tiveram como destino os mercados em aberto permitidos pela insuficiente agricultura nordestina e pela exigüidade da agricultura da Guanabara mercados esses potencialmente representados por uma população equivalente a 40 do total brasileiro em 1920 Mesmo durante a grande expansão do café em São Paulo na década de 1920 que é fortemente acelerada entre 1926 e 1929 não se verificou qualquer retração da produção agropecuária paulista pelo contrário ela se manteve crescente para a maioria de seus produtos e quando ocorreram quedas ou estancamentos em seus níveis de produção estas são explicadas por ocorrências de intempéries de pragas ou ainda devido a problemas maiores e específicos a determinados produtos 100 No caso do carvão e da lã na realidade eles se tornam importantes apenas durante e após a segunda guerra uma vez que antes dessa data São Paulo importavaos basicamente do exterior Raízes da concentração industrial em São Paulo 119 como o algodão e o açúcar Isto pode ser melhor compreendido pelos seguintes fatos ocorridos em São Paulo a imigração japonesa entre 1920 e 1929 totalizava 55878 pessoas 99 deles eram agricultores a maioria encaminhada à lavoura cafeeira e parte à produção de alimentos como batata hortigranjeiros frutas etc101 no mesmo período entram 225183 migrantes nacionais nordestinos e mineiros principalmente que seriam segundo Camargo predominantemente encaminhados para a lavoura desbravando as novas zonas agrícolas102 não houve disputa de terras entre o café e as demais culturas alimentares a expansão do café nesse período se dá principalmente nas terras virgens do Oeste Paulista Acrescentese ainda o mecanismo conversor do uso da terra a que já me referi a forma de cultura intercalar ou em terras cedidas como já se viu fez com que esses novos produtores de café também fossem produtores de alimentos Parece evidente que diante dos fatos já apontados bem como da competitividade com o Rio Grande do Sul Minas Gerais e mais tarde com o Paraná e de sua típica estrutura agrária não seriam muito promissoras as possibilidades dessa economia engendrar um crescente processo de acumulação de capital capaz de diversificar de forma acentuada sua estrutura produtiva Sua indústria que perfazia 19 do total nacional em 1907 e 2 em 1919 manterseia a partir daí nesse mesmo nível Isto se torna mais claro quando se examina a estrutura industrial catarinense em 1907 e 1920 O beneficiamento da erva mate 266 a produção da banha 121 a de manteiga 74 e a moagem de farinha 65 totalizavam em 1907 nada menos do que 47 dessa produção e em 1920 se incluindo o falquejamento e serraria de madeira que representa neste ano 99 aquele total subia para 52 É evidente também que essa indústria em grande parte constituída por artesanatos poucas possibilidades teria para desenvolver empresas maiores e mais competitivas e à medida que avançava a dinâmica 101 Dados extraídos do Boletim da Diretoria de Terras Colonização e Imigração São Paulo n 1 out 1937 102 Conf Camargo 1953 v 1 p 232 1960 p 121126 Wilson Cano 120 indústria de São Paulo muitos artesanatos catarinenses provavelmente encerram suas atividades Dessa forma essa indústria teria que se modificar iniciando um precoce processo de especialização anos mais tarde para se tornar competitiva Essa relativa especialização como mostraram Singer e Castro constituiuse provavelmente na verdadeira tábua de salvação para a indústria catarinense uma vez que lhe permitiu uma concentração mais expressiva de capital em poucos ramos evitando assim uma suicida dispersão maior de recursos103 Pelo menos no que se refere à indústria de beneficiamento e transformação de produtos agropecuários alimentação bebidas fumo e outras parece não haver maiores dúvidas quanto ao fato de que seu capital se originou da expansão da economia camponesa implantada pelos imigrantes Entretanto podese questionar a origem dos segmentos industriais mais complexos que requeriam maior intensidade de capital como a indústria têxtil por exemplo Essa indústria que participava apenas com 38 do valor da produção industrial catarinense em 1907 só teria maior expressão em 1919 quando perfaz 14 daquela produção Seu crescimento mais significativo portanto parece ter ocorrido durante e após a Primeira Guerra Lamentavelmente não se dispõe de maiores informações sobre a origem de seu capital Refirome ao fato de que em grande parte essas indústrias poderiam ter sido implantadas por imigrantes que teriam trazido seus capitais e conhecimentos técnicos associandose ou não a capitalistas locais Como indício a essa hipótese lembro que os registros oficiais de autorização para o funcionamento de sociedades mercantis no Brasil constatam a ocorrência de vários investimentos de capital estrangeiro em Santa Catarina entre 1890 e 1920 tanto em indústrias como em bancos Rio Grande do Sul Analisando esta economia disse Castro Aliás repetidamente se observa na história do Rio Grande do Sul que o difícil para este não é descobrir novos produtos o problema consiste em 103 Conf Singer 1968 cap 3 e Castro 1971 p 132141 Raízes da concentração industrial em São Paulo 121 manter os mercados uma vez que outras áreas mais bem situadas se lancem no ramo 1971 p 54 Parece correta essa afirmação sobre o problema da demanda que em várias situações se viu agravado pelas próprias condições inerentes à produção riograndense Efetivamente ao longo de sua história vários exemplos confirmam isso A decadência da mineração no século XVIII implicaria na perda substancial do mercado para o gado sulino a promissora expansão da produção de trigo entre fins desse século e início do século XIX é cortada entre outros pela ocorrência da ferrugem mas também e principalmente face à expansão da pecuária charque Esta requerendo menos mãodeobra tornavase mais rentável do que o trigo cuja produção era ainda desestimulada pelo sistema de requisições feitas pelas tropas militares do Sul aos agricultores locais104 O charque gaúcho por outro lado contava com fortes competidores no mercado nacional a Argentina e o Uruguai e também os Estados Unidos Nova Zelândia e Austrália Cardoso 1962 p 6670 234 Padecia ainda dos altos custos de sua produção escravista em relação aos países que produziam em regime capitalista Como já disse anteriormente mesmo o crescimento do mercado interno gerado pela expansão cafeeira não se tornou cativo ao Rio Grande ele beneficiou muito mais as importações provenientes da Argentina e do Uruguai antes de 1906 proporcionando depois a diversificação agrícola de São Paulo Com o vinho que encontra no Rio Grande ótimas condições de produção foi necessária a extraordinária compressão das importações na crise da década de 1930 para que ele pudesse se apropriar efetivamente do mercado nacional A banha que foi um de seus principais produtos de exportação passaria a se defrontar desde logo com a produção similar de Santa Catarina e de Minas Gerais e mais tarde entraria em franco estancamento face ao seu moderno competidor a indústria de óleos vegetais esse fato também se daria com a lã mais tarde pela sua crescente substituição por fibras sintéticas na produção têxtil nacional 104 Sobre as condições políticas sociais e econômicas que vigoravam na economia escravista gaúcha ver o excelente trabalho de Cardoso 1962 A questão apontada sobre o trigo encontrase às páginas 48 e 49 desse trabalho Wilson Cano 122 Em seu clássico trabalho Fernando H Cardoso analisa profundamente a difícil situação da produção escravista de charque no Rio Grande demonstrando que não tinha condições de competir rentavelmente com a capitalista produção congênere do Prata105 Essa situação era agravada pela quase ausência de proteção tarifária decorrente dos interesses da escravista produção do açúcar e do café uma vez que o charque era basicamente consumido por seus escravos Cardoso 1962 p 179186 Esse fato permite realçar a seguinte contradição entre a situação desses produtos e a do charque o café atravessava uma situação privilegiada de oferta dominante no mercado internacional e o açúcar embora sofresse uma decadência multissecular no mercado externo gozava no mercado interno de uma situação protegida o charque gaúcho ao contrário não só perdia seus mercados externos das Antilhas principalmente como também pelas condições internas já apontadas tinha suas possibilidades de expansão via mercado interno seriamente condicionadas Nem mesmo a expansão cafeeira da secunda metade do século XIX pode propiciar melhor desempenho ao charque gaúcho tomandose as cifras apontadas por Singer para as exportações gaúchas de charque nos anos de 1861 e de 1894 em mil contos 59 e 117 respectivamente e deflacionando o valor de 1894 pela variação da taxa cambial entre esses dois anos obtémse resultado para esse último ano 23 inferior ao observado em 1861106 Esse fato parece estar em consonância com os altos níveis das importações brasileiras que com efeito foram de 50000 toneladas média anual entre 18911905 baixando para 34000 no período 19061910 após a instituição do protecionismo tarifário e para 14000 em 19111915 Ainda em 1907 essas importações equivaliam a cerca de 45 do valor da produção similar gaúcha Essa substituição de importações que praticamente se completa na primeira guerra mundial não ofereceria entretanto um promissor futuro ao charque é exatamente nesse período que se instalam no país e também no Rio Grande modernos e grandes frigoríficos a maioria de capitais estrangeiros superando entraves existentes na produção e distribuição interna de carnes após o término da guerra 105 Conforme Cardoso 1962 p 6670 78 81 146150 189 194 106 Dados extraídos do trabalho de Singer 1968 p 158 163 Raízes da concentração industrial em São Paulo 123 Cabe lembrar ainda que a grande expansão cafeeira da década de 1890 em São Paulo se fez com o concurso da imigração de 800 mil europeus principalmente italianos portugueses e espanhóis com distintos hábitos alimentares do escravo E este fato é o único que parece explicar a razão das baixas importações paulistas de charque já citadas A partir de 1919 pelo menos já figuram cotações de preços de charque paulista e mineiro no mercado atacadista do Rio a preços menores do que o gaúcho107 Para esse mesmo ano o Censo de 1920 constata que a produção paulista de charque já equivalia a 10 da produção gaúcha e operava com produtividade 67 mais elevada A explicação possível para essa produção crescente talvez resida em parte no aumento da imigração nordestina para São Paulo Em meados da década de 1930 a produção paulista já equivalia à metade da gaúcha competindo ambas no mercado nacional Excluindose a banha cujas importações paulistas originárias do Sul do país equivaliam no início do século XX a cerca de 25 do total produzido pelo Rio Grande e Santa Catarina as demais exportações sulinas para São Paulo eram extremamente diversificadas e de menor expressão Na realidade devem ter sido os mercados nordestino e do Rio que permitiram maior expansão às exportações gaúchas Vejamos os seguintes fatos entre 1872 e 1900 tanto a população do Rio Guanabara como a de São Paulo apresentam crescimentos próximos 195 e 173 respectivamente causados basicamente pela imigração européia no caso de São Paulo e pela migração externa e interna no caso do Rio Nessa região esses imigrantes tanto os nacionais como os estrangeiros ocuparamse fundamentalmente em atividades urbanas sendo portanto consumidores e não produtores de alimentos ao contrário do que ocorreu em São Paulo108 É provável que essa diferença entre as imigrações no Rio menor quantidade de estrangeiros com destaque para o elemento português e em São Paulo maior quantidade de estrangeiros e na maioria italianos tenha influído nos padrões alimentares dessas regiões de forma um tanto diferenciada tomada a primeira década do século XX 107 Conf Anuário Estatístico do Brasil 193040 p 1383 já figurava a cotação de batata a partir de 1913 108 As estimativas do número de imigrantes de origem nacional e estrangeira são as calculadas por Graham e Hollanda 1971 às páginas 28 a 46 desse trabalho estão contidas as estimativas para o período de 1872 a 1900 através das quais se pode inferir que o total de imigrantes de origem nacional no estado da Guanabara superou o total de imigrantes estrangeiros enquanto que em São Paulo os nacionais não atingiram 25 do total Wilson Cano 124 do total das importações brasileiras do exterior entram em São Paulo cerca de 30 do vinho e do trigogrão e farinha apenas cerca de 10 do bacalhau e quanto ao charque menos de 1 entre 19011905 caindo para menos de 05 entre 19061910 e quase nulo a partir de 1913 Tabela 12 Comércio por Cabotagem do Estado de São Paulo Valor 1000 contos e Médias anuais dos períodos RS SC Demais Total RS SC Demais Total RS SC Demais Total estados estados estados 1909 86 17 336 439 49 13 124 186 a 057 076 037 042 1911 196 39 765 1000 263 43 694 1000 1922 764 146 2684 3594 509 116 1776 2401 a 067 080 066 067 1926 212 40 748 1000 212 48 740 1000 1930 754 123 2305 3182 1002 228 2712 3942 a 133 185 118 124 1934 237 39 724 1000 254 58 688 1000 1935 1778 225 2807 4810 3166 341 2936 6443 a 178 152 105 134 1938 370 47 583 1000 491 53 456 1000 1943 2661 957 8385 12003 4047 902 14135 19084 a 152 094 169 159 1944 222 80 698 1000 212 47 741 1000 Fontes Anuário Estatístico do Estado de São Paulo Repartição de Estatística e Archivo do Estado vários anos São Paulo Comércio de Cabotagem pelo Porto de Santos Departamento Estadual de Estatística vários anos São Paulo XM Exportações X Destino Importações M Origem Tornase difícil uma comparação relativa das exportações por cabotagem do Rio Grande para São Paulo antes de 1939 face à inexistência de dados sobre a renda ou produto Para contornar parcialmente esse problema relacionei essas exportações ao valor bruto da produção física agricultura e indústria do Rio Grande nos anos de 1907 1919 e 1939 situaramse em torno de 3 a 4 apenas antes da crise da década de 1930 subindo para cerca de 6 em 1939109 109 Como inexistem informações sobre a agricultura valor da produção gaúcha em 1907 adotei como estimativa bastante conservadora que a produção agrícola desse estado fosse pelo menos igual à do setor industrial como não disponho das exportações de cabotagem em 1907 adoto para esse ano a média dos anos 1909 e 1910 que se apresentam com peso físico e valor crescentes Ambas estimativas só podem evidentemente superestimar o peso relativo das exportações gaúchas para São Paulo em 1907 e não subestimálas Tabela 12 Comércio por cabotagem do estado de São Paulo Valor 1000 contos e Fontes Anuário Estatístico do Estado de São Paulo Repartição de Estatística e Archivo do Estado vários anos São Paulo Comércio de Cabotagem pelo Porto de Santos Departamento Estadual de Estatística vários anos São Paulo Raízes da concentração industrial em São Paulo 125 Embora o comércio de cabotagem de São Paulo com o Rio Grande do Sul tenha sido expressivo representando pouco mais de 20 do comércio de cabotagem de São Paulo no período de 1909 a 1944 notase claramente Tabela 12 a tendência que cedo se descortina em termos de uma reversão de saldos negativos para positivos da balança comercial de cabotagem de São Paulo De 1909 a 1911 as importações gaúchas provenientes de São Paulo eram 43 menores do que suas exportações para São Paulo Observese ainda que o Rio Grande apresentava uma situação comercial com São Paulo desde 1909 menos vantajosa do que os demais estados cujas importações originárias de São Paulo eram 73 menores do que suas exportações As exportações do Nordeste para São Paulo significavam cerca da metade das importações paulistas por cabotagem e suas importações originárias de São Paulo situavamse abaixo de um quarto do total exportado por São Paulo A tendência que se esboça entre a primeira e segunda décadas do século XX na reversão do saldo da balança comercial paulista atinge praticamente todos os estados que de exportadores líquidos para São Paulo até antes da crise de 1929 se transformariam em importadores líquidos de São Paulo com volumes de importação superiores em cerca de 50 aos de suas exportações para São Paulo Pelo exame da Tabela 12 parece que fica suficientemente claro que na realidade o Rio Grande do Sul foi um dos estados mais atingidos por essa reversão110 A Grande Depressão comprimindo violentamente a capacidade para importar provocaria o agravamento da reversão permitindo à economia de São Paulo consolidar suas relações econômicas com o resto do país Entretanto essa crise foi apenas o instrumento de aceleração desse processo não bastaria sua ocorrência mas seria necessário que a economia de São Paulo tivesse já antes da crise como efetivamente o teve a mais avançada estrutura capitalista de produção do país tanto na agricultura como principalmente na indústria Apenas para finalizar estas notas sobre o Rio Grande do Sul julgo conveniente que se qualifique um pouco mais as afirmações correntes de que a indústria gaúcha até a primeira guerra mundial tinha dimensão muito próxima à da indústria paulista Examinandose a estrutura 110 No Apêndice Estatístico incluo a evolução da balança comercial exterior e inter regional de São Paulo e do resto do país para anos alternados entre 1911 e 1968 Wilson Cano 126 industrial gaúcha em 1907 e em 1919 verificase que cerca de 23 do valor dessa produção eram representados por produtos cuja transformação industrial significava na realidade um simples e direto prolongamento da atividade primária extrativa ou agropecuária Retirei então tanto da produção gaúcha como da paulista e da brasileira o valor da produção de serrarias preparo de couros moagem produtos animais charque e banha principalmente laticínios açúcar e preparo de fumos recalculando o valor da produção e as participações relativas do Rio Grande do Sul e de São Paulo Os novos resultados a meu juízo seriam mais significativos do que os anteriores em termos de uma industrialização mais dinâmica quanto à geração de renda à ampliação do excedente e ao desenvolvimento tecnológico Retirados aqueles produtos as anteriores participações relativas no valor da produção industrial brasileira em 1907 e em 1919 que para o Rio Grande eram de 135 e 118 passam agora para 8 e 66 enquanto que as de São Paulo que eram de 159 e 33 passam para 192 e 369 Um traço marcante dessa indústria é o de que sua implantação se fez através de uma verdadeira pulverização de recursos investidos não só em muitos setores mas também em muitas pequenas e médias empresas Por motivos um tanto diferentes o mesmo fato ocorreu com a indústria de Minas Gerais no que se refere a essa estrutura de tamanhos de empresas Porém a indústria mineira foi menos vulnerável do que a gaúcha na competição com outras indústrias regionais como tento mostrar no Capítulo 3 deste trabalho Assim estruturada a indústria gaúcha teria imensas dificuldades em competir vantajosamente com a moderna e concentrada indústria de São Paulo e do Rio ao longo do processo de industrialização brasileira Por exemplo sua indústria têxtil que em 1907 representava 53 da nacional já em 1919 caí para 35 caindo mais a partir dessa época representando 95 da indústria têxtil da região do Extremo Sul em 1907 perderia essa posição situandose mais tarde a menos de 13 desse total As razões para essa menor e decrescente participação devem ser procuradas não apenas nas condições de sua demanda externa exterior e resto do país mas principalmente nos condicionantes internos ao seu processo de acumulação de capital Devo dizer concluindo que estas notas não tiveram outra pretensão que a de apontar e levantar algumas questões que a meu juízo estão por merecer estudos posteriores 2 Os mecanismos do crescimento industrial No Capítulo 1 foram apresentadas as formas pelas quais se dão a gestação expansão e diversificação do complexo cafeeiro ao qual está vinculada a formação industrial de São Paulo que se caracteriza fundamentalmente pela implantação de indústrias produtoras de bens de consumo Detenhome aqui especificamente na análise do processo de expansão industrial tentando discutir de que forma ele se insere no processo de acumulação do complexo cafeeiro quando se dão as marchas e contramarchas da expansão industrial e quais as principais modificações que ocorrem em sua estrutura produtiva A forma pela qual se dá essa primeira fase da industrialização em estreita interdependência com a expansão do complexo cafeeiro impõe um período de análise que se inicia em fins do século XIX e termina na recuperação da crise de 29 em 1932 Tal periodização se justifica portanto pelo fato de ter sido distinta a forma do desenvolvimento industrial anterior à crise de 1929 quando há subordinação do capital industrial ao capital cafeeiro 21 Os principais condicionantes A questão fundamental que deve ser colocada desde logo é a seguinte quem promoveu e sob que condições o início da implantação industrial em São Paulo Wilson Cano 128 Esta questão foi parcialmente respondida no capítulo anterior quando me referi ao caráter do capital cafeeiro e no modo pelo qual ele forma e diversifica o complexo econômico paulista Limitome aqui a ressaltar esse caráter de subordinação que o capital cafeeiro imprime à implantação industrial resumindo as marchas e contramarchas por que passa a indústria nesse período1 O café como atividade nuclear do complexo cafeeiro possibilitou efetivamente o processo de acumulação de capital durante todo o período anterior à crise de 1930 Isto se deveu não só ao alto nível da renda por ele gerado mas principalmente por ser o elemento diretor e indutor da dinâmica da acumulação do complexo determinando inclusive grande parte da capacidade para importar da economia brasileira no período Ao gerar capacidade para importar o café resolvia seu problema fundamental que era o da subsistência de sua mãodeobra atendia às exigências do consumo de seus capitalistas às necessidades de insumos e de bens de capital para a expansão da economia bem como indicava em grande parte os limites em que o Estado podia ampliar o seu endividamento externo É preciso que se entenda porém que a expansão cafeeira tende a se dar de forma cíclica Quando se examina a expansão cafeeira no Brasil o que se vê são fases de expansão do plantio e posteriormente da produção encadeadas com fases em que os preços se deprimem Na fase de expansão grande parte dos recursos disponíveis são investidos na formação das plantações e com a chegada dos preços baixos fazendo baixar a lucratividade média da cafeicultura criamse condições para que parte dos lucros cafeeiros sejam investidos em outros segmentos do complexo bancos estradas indústrias usinas etc Entretanto se visto o conjunto da atividade cafeeira o mecanismo do ciclo encobre o 1 Para a elaboração deste primeiro tópico utilizei em grande parte a periodização adotada por J M Cardoso de Mello 1975 que em seu citado trabalho especialmente no capítulo II estabelece as linhas gerais que nortearam o processo de acumulação de capital no período 18861933 Como esse autor toma a perspectiva da economia brasileira embora centrado no problema cafeeiro e eu torno a perspectiva do complexo cafeeiro paulista e das diversas economias regionais isto me obrigou a fazer algumas modificações e complementações A questão referente à subordinação do capital industrial ao capital cafeeiro foi inicialmente formulada por Sérgio S Silva 1973 p 96 112 Raízes da concentração industrial em São Paulo 129 funcionamento e a ação das partes constitutivas do todo cafeeiro Refiro me mais especificamente ao fato de que quando se dá uma grande onda de expansão do plantio por exemplo a de 188697 as plantações feitas no início dessa onda em 1886 cinco anos depois começam a produzir e a gerar lucros 1891 enquanto ainda segue a onda expansionista para as demais frações do todo cafeeiro Assim parte desses novos lucros e evidentemente parte dos lucros nesse mesmo momento gerados por plantações mais antigas podem perfeitamente se transferir direta ou indiretamente da atividade nuclear para a indústria mesmo que a expansão do plantio ainda siga por mais algum tempo Quando surge a baixa dos preços internacionais do café por exemplo a que se inicia em 189697 fazendo diminuir a lucratividade cafeeira é preciso ter em mente que as plantações mais antigas que operam a baixos níveis de produtividade física sofrem efetivamente uma forte compressão em suas margens de lucro enquanto que as mais novas com alta produtividade física podem ainda sustentar margens de lucros satisfatórios o que lhes permite aplicar parte desses lucros de forma a diversificar seu investimento transformando assim capital cafeeiro em capital industrial2 Em resumo enquanto o todo cafeeiro pelo menos aparentemente vai mal algumas de suas partes vão bem Esse quadro pode ser completado com o seguinte raciocínio Quando os preços externos do café estão altos e portanto os lucros também estão altos e a situação cambial e a capacidade para importar se encontram a níveis normais não pecando por excesso é claro esse vazamento de lucros do café se fará desde que uma parte do aumento do plantio tenha efetivamente se transformado em capacidade produtiva gerando assim mais lucros e aumentando o excedente do sistema Para que os investimentos canalizados para a indústria adquiram importância maior é condição necessária a existência de um protecionismo tarifário que ampare aquelas indústrias que não contam naturalmente com condições de competição com os produtos similares importados sem o que essas poupanças seriam alocadas em outros compartimentos com 2 É claro que o Estado pode mediante a desvalorização cambial preservar a lucratividade Ainda assim entretanto se a baixa dos preços persistir por muito tempo será pouco provável que se continue a formar novos plantios ver Tabela 2 no Capítulo 1 Basicamente o plantio será retomado quando houver a retomada dos preços externos Wilson Cano 130 rentabilidade mais certa como por exemplo os títulos da dívida pública estradas de ferro etc3 Na depressão de preços externos do café quando o Estado desvaloriza o câmbio defendendo as margens de lucro da cafeicultura essa mesma medida se traduz em modificações nos níveis relativos de preços externos e internos da produção industrial aumentandolhe a lucratividade Tornase assim atrativa a inversão de capitais na indústria e a condição fundamental para que essa inversão seja intensa será a da existência de uma capacidade para importar que tenha a suficiente folga para viabilizar as importações de bens de produção requeridos por essas novas inversões4 Se a capacidade para importar for violentamente comprimida pela crise dos preços e o Estado não tomar nenhuma medida de amparo ao investimento industrial dandolhe prioridade de câmbio por exemplo em que pese a possibilidade de altos lucros industriais os níveis de inversão estarão comprometidos e quando muito se concentrarão naquelas indústrias de reduzida relação capitalproduto Uma parte dessas inversões pode ainda ser alocada para a integração da indústria importando apenas os equipamentos necessários a essa integração Por exemplo na própria indústria têxtil podese investir numa fiação que integre uma tecelagem préexistente em filatórios para fios finos teares para tecidos especiais máquinas complementares para acabamento etc ou ainda se pode incluir a hipótese de instalação de unidades menores não integradas como pequenas fiações pequenas tecelagens unidades especiais de acabamentos etc5 3 Algumas manufaturas simples mais diretamente vinculadas à agricultura e de grande peso e baixo preço o que implica em altos custos de transporte podem contar com uma condição natural de competitividade frente a similares estrangeiros Lembro que o charque gaúcho entretanto necessitou de proteção tarifária para poder competir com o similar platino Outras manufaturas que dependem menos de matériasprimas importadas e de tecnologia e mais da habilidade manual e de baixos salários também seriam competitivas como a de calçados por exemplo 4 Ver a respeito o trabalho de M C Tavares 1972 especialmente as páginas 35 a 38 5 A importância de tais investimentos de complementação muitas vezes é ignorada uma vez que eles são menos visíveis do que aqueles que expandem a capacidade produtiva do produto final Por exemplo quando se complementa uma fábrica têxtil com a implantação do compartimento de fiação a capacidade produtiva da tecelagem não se altera mas entretanto o surgimento dessa fiação implica em substituir importações de fios aumentando o produto e a renda nacional e obviamente ampliando a capacidade de produção de bens intermediários Raízes da concentração industrial em São Paulo 131 Na hipótese da impossibilidade concreta de se importar os bens de produção necessários e também na impossibilidade de produzilos internamente aqueles estímulos que favorecem a expansão industrial convertemse na realidade apenas em expansão do uso da capacidade produtiva previamente instalada expandindose esta apenas de forma pouco significativa Ainda assim a massa crescente de lucros que é gerada nesse período tanto pela atividade industrial quanto pela cafeeira poderá finalmente se converter em inversão industrial logo que a capacidade para importar retome níveis mais favoráveis Não é lícito portanto se supor que a indústria vai mal ou não cresceu pelo fato de que sua capacidade produtiva não cresceu O importante é que foram acionados os mecanismos para que num período seguinte esse crescimento se transforme efetivamente em capacidade produtiva acrescida6 Notese ainda que tanto os empréstimos externos para solucionar problemas do déficit público como aqueles destinados ao financiamento de obras públicas podem agravar a situação da dívida externa comprimindo assim a capacidade para importar e dessa forma dificultando a expansão do investimento industrial7 Esse problema se tornaria ainda maior sempre que tais fatos coincidissem com períodos de queda externa dos preços do café Por outro lado há que se ter presente inclusive que a instituição de políticas monetárias restricionistas podem também constituir um freio àquela expansão industrial A subordinação da expansão industrial ao capital cafeeiro além de se exprimir na capacidade para importar que obviamente se refere à importação de alimentos matériasprimas e bens de capital para a 6 Comentando a crítica que Dean fez a Roberto Simonsen sobre a questão do crescimento industrial durante a primeira guerra Fishlow 1972 p 1821 põe em evidência esse fator positivo ou seja o acúmulo de reservas para investimentos posteriores 7 Por exemplo a situação da dívida externa brasileira em fins do Império e agravada nos primeiros anos da República era originada fundamentalmente desses problemas déficit público e obras públicas Quando os preços do café se precipitam para a baixa em 18961897 o problema da capacidade para importar tornase ainda mais grave comprimindo a capacidade para importar que permanece baixa até por volta de 1904 dificultando assim a expansão da capacidade produtiva industrial Ver a respeito o citado trabalho de Villela e Suzigan 1973 p 331340 Wilson Cano 132 indústria reaparece também na questão do mercado do suprimento de mãodeobra e dos níveis salariais O problema do mercado efetivamente esteve subordinado sendo apenas atenuado pela expansão da agricultura produtora de alimentos e de matériasprimas aproximadamente após 1905 como se viu no capítulo anterior que além de criar um mercado adicional para a indústria resolvia em grande parte o problema do suprimento alimentar para a força de trabalho industrial e em certa medida o do fornecimento de matériasprimas para a indústria açúcar fibras couros etc criando assim uma certa folga para a indústria no que se refere às possíveis limitações na capacidade para importar bens de produção industriais A questão do suprimento de mãodeobra e a dos níveis salariais parece ter sido a de mais fácil solução com a intensificação dos fluxos imigratórios para São Paulo Depois que o café soluciona o grave problema de suprimento de mãodeobra para a sua própria expansão fica quase que automaticamente resolvido o problema para a demanda de mãodeobra requerida pela indústria Desde 1898 a 1907 passa a ocorrer um fenômeno que só iria reforçar o suprimento urbano de mãodeobra o êxodo rural proporcionado pela crise cafeeira e desse último ano até 1910 o estancamento do plantio que contribuiu ainda mais para que não houvessem pressões sobre o mercado de trabalho Desse período em diante como já mostrei no capítulo anterior tanto a retomada e modificações qualitativas dos fluxos imigratórios quanto o próprio crescimento demográfico impediriam qualquer bloqueio maior Acrescentese a isso que no início do século XX como mostrou A F Bandeira Júnior era expressiva a ocupação de mulheres e de crianças no emprego fabril e o Censo de 1919 constata também uma grande porcentagem representada pelo emprego feminino 337 da ocupação operária em São Paulo em proporção maior do que as registradas nos estados sulinos e na Guanabara menos de 308 O emprego de mulheres 8 Das 160 empresas relacionadas por esse autor que totalizam 13700 pessoas ocupadas 36 delas trazem informações detalhadas sobre o operariado e totalizam 4936 pessoas das quais 3291 67 eram homens 943 19 eram mulheres e 702 14 eram crianças A página XIII de seu trabalho Bandeira 1908 menciona o fato de que era considerável o número de menores a contar de 5 anos de idade que trabalhavam nas fábricas paulistas Raízes da concentração industrial em São Paulo 133 e de menores evidentemente amplia ainda mais a oferta de mãodeobra e pressiona o salário do homem adulto para baixo Se relacionado o total de operários ocupados na indústria de transformação de São Paulo com a população total desse estado eles representariam pouco mais de 05 em 1901 cerca de 10 em 1907 e 18 em 1919 da população No que se refere aos salários seus níveis eram determinados pela taxa de acumulação cafeeira A forma dos contratos de trabalho do colonato estabelecia uma remuneração ao trabalhador agrícola que compreendia três partes a primeira representando um custo fixo era o pagamento pelo trato da plantação a segunda um custo variável era a remuneração pela colheita e a terceira ao contrário das outras duas não significava um desembolso efetivo por parte do fazendeiro era a renda em espécie que o agricultor obtinha cultivando as terras cedidas com culturas alimentares Esta última desde que suprisse boa parte da subsistência alimentar do trabalhador agrário e considerandose a oferta de trabalho plenamente suprida pelas imigrações permitia ao fazendeiro comprimir as taxas de salários sempre que houvesse uma deterioração dos preços do café Quanto mais acentuada fosse essa baixa dos salários com limite no nível de subsistência tanto melhor para a atividade urbano industrial que poderia passar a contar com um reforço para o seu suprimento de mãodeobra via êxodo rural ao mesmo tempo que podia comprimir para baixo ou pelo menos manter as taxas de salários urbanos Até o momento em que a indústria de São Paulo não atingisse um volume absoluto relativamente mais importante do que o verificado antes do fim da década de 1920 e enquanto sua estrutura produtiva fosse marcadamente constituída por indústrias simples não haveria maiores pressões no mercado de trabalho quer em termos de quantidade de trabalhadores quer em termos de qualificação aprimorada da mãode obra Ligado este fato com o da oferta abundante de trabalho via café e da praticamente ausente legislação trabalhista e ainda com o do emprego de mulheres e de menores em larga escala podese inferir daí que a indústria paulista operou durante todo esse período com níveis baixos de salários Uma indicação nesse sentido são os dados contidos na Tabela 13 onde se vê que embora São Paulo já liderasse o crescimento industrial em 1919 o salário médio dos operários paulistas homens adultos de vários Wilson Cano 134 setores era inferior aos pagos em estados do sul do norte e da Guanabara Pela Tabela 13 podese ainda verificar que as diferenças entre os salários dos homens e das mulheres em São Paulo eram menores que os de outros estados na indústria têxtil por exemplo as mulheres recebiam 19 a menos do que os homens em São Paulo 23 a menos na Guanabara 29 a menos no Rio de Janeiro 42 a menos no Rio Grande do Sul e no Nordeste Tabela 13 Salário médio na indústria de transformação Réis por dia 1919 Adultos Menores Estados Homem Mulher Homem Mulher 1 Indústria têxtil a Rio de Janeiro 5759 4089 2253 2052 Guanabara 6720 5165 2479 2825 São Paulo 5729 4684 2211 2272 R G do Sul 7035 4062 2595 2160 Brasil 5329 3738 1973 1994 2 Indústria produtos alimentares b Rio de Janeiro 3709 2490 1483 1291 Guanabara 5845 3856 2617 878 c São Paulo 5616 3567 2028 2403 R G do Sul 5679 3011 2398 1829 Brasil 5111 2957 2004 1858 3 Indústria do vestuário d Rio de Janeiro 4713 2069 1547 1447 Guanabara 7582 4216 2376 2049 São Paulo 6382 3467 2142 1773 R G do Sul 6748 4176 2887 3025 Brasil 6712 3652 2174 1885 4 Indústria metalúrgica 5 Indústria de calçados Estados Homem adulto Homem adulto Fundidor Torneiro Cortador Acabador Rio de Janeiro 5033 5750 5178 3100 Guanabara 6853 8887 8747 7679 São Paulo 8405 7506 5687 5286 R G do Sul 8775 8986 7422 7850 Brasil 7483 8107 7656 7076 Fonte Censo de 1920 vol V 2a parte p XIXVI a os salários dos adultos masculinos em São Paulo são inferiores aos vigentes em PA SC RJ GB e RS b idem nota a AM MT ES GB e RS c provável erro tipográfico d idem nota a PA GB RS e BR Raízes da concentração industrial em São Paulo 135 Este fato antes representa um barateamento que um encarecimento da força de trabalho uma vez que a menor diferença relativa dos salários masculinos e femininos amplia o emprego feminino rebaixando assim o salário médio total Com menor diferença relativa o mesmo fenômeno ocorria com os salários dos menores Como se viu as relações entre o capital cafeeiro e a expansão do capital industrial não se davam num só sentido ou numa só direção Em determinadas situações o café poderia estar mal e a indústria bem como no período 19061910 por exemplo quando a indústria cresce e o plantio estanca convivendo com baixos preços externos e internos para o café assim como ambos poderiam atravessar situações bastante favoráveis por exemplo entre 1890 e 1894 ou entre 1927 e 1928 se não considerarmos a crise têxtil algodoeira nestes últimos anos e em outros períodos o café poderia ir bem e a indústria ir mal como por exemplo no período 1924 a 1926 em que a deterioração tarifária e a política de valorização cambial desfavorecem acentuadamente a indústria enquanto o café atravessa um período de altos preços externos e internos Finalmente ambos poderiam ir mal como no período de 1895 a 1897 ou nos primeiros anos da Crise de 1929 Retomando agora a questão inicialmente colocada no início deste tópico pareceme claro que efetivamente foi o capital cafeeiro quem promoveu essa primeira expansão industrial tanto de forma direta como indireta Os próprios fazendeiros investiam seus lucros em indústrias diretamente e indiretamente quando seus lucros transitavam pelo sistema bancário ou eram investidos na própria constituição de bancos ou por outra forma qualquer de intermediação financeira e de capital9 Não se quer com isso afirmar que apenas os fazendeiros promoveram a implantação de indústrias As evidências históricas demonstram que também comerciantes bancos imigrantes importadores e outros agentes do complexo cafeeiro fundaram ou adquiriram empresas industriais como se vê nos trabalhos de Bandeira e de Dean 9 Por exemplo o Banco União de São Paulo fundado por fazendeiros investiu em vários empreendimentos não bancários tais como extração de mármore a Fábrica de Calçados União que em 1901 empregava 156 pessoas e a Fabrica de Tecidos Votorantim cujo capital em 1907 equivalia a 57 do capital da indústria paulista Estes informes foram obtidos do confronto entre o citado trabalho de Bandeira Jr 1908 p 22 23 47 e o Censo de 1907 p 120 Wilson Cano 136 As colocações acima feitas sobre o caráter subordinador do capital cafeeiro ao capital industrial e sobre a forma pela qual essa expansão industrial avança ou retrocede exigem algumas reflexões sobre duas hipóteses centrais colocadas por Dean em sua Industrialização em São Paulo Na primeira delas Dean tenta criticar uma teoria de que a indústria cresceu porque o comércio exportador declinou Modificando um pouco essa formulação inicial diz mais adiante Conquanto o papel as exportações de café na estimulação da indústria seja geralmente reconhecido pelos que analisaram o desenvolvimento inicial de São Paulo costumase afirmar por estranho que pareça que o desenvolvimento da indústria não decorreu do crescimento do comércio do café mas do seu gradativo colapso Mais à frente comentando os escritos de Werner Baer mostra como sumaria as idéias de vários autores brasileiros que teriam sustentado a hipótese de que a industrialização do início do século XX se deu graças aos choques recebidos pelas crises do comércio exterior ou pelas guerras reduzindo fisicamente o suprimento de importações ou a quantidade de divisas para pagar as importações10 Continuando o raciocínio Dean aceita o fato de que os desequilíbrios no setor externo fazendo contrair a quantidade de divisas possam gerar pressões no sentido de elevação tarifária eou cambial mas põe em dúvida se isso não elevava também os custos industriais pelo aumento dos preços das matériasprimas e dos bens de capital importados E mais adiante Dean parece ter pretendido estabelecer uma relação causal mencionando vários anos em que as importações e a atividade industrial haviam caído juntas e anos em que ambas haviam crescido citando especificamente os anos de 1921 1926 1930 1932 e 1938 para o primeiro caso e os de 19231925 1928 1935 1936 e 1939 para o segundo caso11 Finalmente conclui que podese sugerir que uma teoria que associa o crescimento ao colapso do comércio agrada aos sentimentos nacionalistas pois implica que as fontes 10 O livro de Baer que Dean está comentando é a edição original em língua inglesa da Industrialização e o Desenvolvimento Econômico no Brasil editado no Brasil pela Fundação Getúlio Vargas 11 As citações foram tiradas do livro de Dean 1971 p 21 9495 117 Raízes da concentração industrial em São Paulo 137 estrangeiras de suprimentos não são merecedoras de confiança e que a produção nacional é capaz de aceitar qualquer desafio Além disso uma teoria assim é útil aos intelectuais e burocratas brasileiros urbanos por demonstrar às elites econômicas recalcitrantes a inevitabilidade da industrialização Os escritos de Celso Furtado por exemplo estão prenhes dessa mensagem12 Dean parece não ter compreendido bem o pensamento de Furtado exposto na Formação Econômica do Brasil e lamentavelmente não tomou contato com o conhecido trabalho de M C Tavares Auge e Declínio do Processo de Substituição de Importações no Brasil pois não o cita em nenhuma passagem de seu livro13 Se o tivesse feito veria que ali não existem formulações teóricas que expliquem uma industrialização causada pelo decréscimo do comércio exterior Pelo contrário Furtado disse textualmente que O desenvolvimento econômico não acarreta necessariamente redução da participação do comércio exterior no produto nacional Furtado mostra ainda que além de não ser necessária uma redução absoluta também não é necessária uma redução relativa E em seguida afirma que à medida em que uma economia se desenvolve o papel que nela desempenha o comércio exterior se vai modificando Na primeira etapa a indução externa constituí o fator principal na determinação do nível da procura efetiva E se referindo à crise do setor externo diz Se se prolonga a contração da procura externa tem início um processo de desagregação e a conseqüente reversão a formas de economia de subsistência Esse tipo de interdependência entre o estímulo externo e o desenvolvimento interno existiu plenamente na economia brasileira até a Primeira Guerra Mundial e de forma atenuada até fins do terceiro decênio deste século Nas etapas em que o desenvolvimento atinge níveis maiores ou seja em que a indústria implantada por indução do setor exportador cresce o comércio externo muda de papel e passa a ser estratégico em termos da determinação da capacidade para importar o que permite atender aos requisitos de bens de produção para a indústria14 12 Conforme Dean 1971 p 108 13 Esse artigo data de 1963 e em 1964 foi publicado no Boletim Econômico da América Latina em março desse ano Foi republicado em 1972 no livro citado na nota 4 deste capítulo 14 As citações utilizadas encontramse na Formação Econômica do Brasil 1961 p 258 259 Wilson Cano 138 Esses autores na realidade só pensaram numa industrialização por substituição de importações a partir da década de 1930 e no que se refere ao período anterior trataram a industrialização como um processo induzido pelas exportações não se referindo portanto a uma teoria dos choques15 16 Além de não ter compreendido o enfoque cepalino Dean não viu também a importante lacuna que persistia e que J M C Mello desenvolveu no capítulo II de seu trabalho qual seja a da análise do crescimento industrial vista pelo ângulo do processo interno de acumulação engendrado pelo complexo cafeeiro Preocupado em demasia em criticar a teoria dos choques Dean parece não ter se apercebido disso pois o que se nota constantemente em seu livro é o declarado objetivo de tentar demonstrar uma relação direta e num só sentido entre a industrialização e o comércio do café O exemplo mais flagrante disso é que enumerando vários anos maus e bons para as importações e para o crescimento industrial diz que a ser correta a teoria dos choques a curva da produção manufatureira estaria em relação inversa com a da curva das importações o que evidentemente seria ignorar o próprio mecanismo do crescimento industrial17 É claro que a curva de importações poderia ter uma inclinação menor do que a curva da produção manufatureira mas nunca um sentido inverso coisa aliás que ninguém afirmou Quanto ao problema dos anos bons e maus enumerados por Dean cabe lembrar por exemplo que 1920 ao qual Dean não se refere foi um ano em que a indústria paulista parece não ter crescido satisfatoriamente e que teve um volume de importações medido em libras esterlinas 60 maiores do que as de 1919 e duas vezes maiores do que as de 1921 o que poderia aliás representar em grande parte uma recomposição de estoques da economia Essas importações de 1920 aliás 15 Ver a respeito o citado trabalho de M C Tavares 16 Em sua Formação Econômica da América Latina 1969 Furtado deixa ainda mais clara essa questão especialmente nos capítulos X e XI onde especifica o processo de industrialização anterior à recuperação da Crise de 1929 como induzido pelas exportações tratando a industrialização posterior pelo processo de substituição de importações 17 Conforme Dean 1971 p 117 Raízes da concentração industrial em São Paulo 139 foram ainda mais elevadas em libras esterlinas do que as observadas para o período 19271929 No que se refere ao ano de 1926 que ele também aponta como de retração de importações efetivamente são pouco menores do que as de 1925 porém muito maiores do que a média observada entre 1920 a 1924 e portanto não significa efetivamente uma retração É curioso que ele aponte 1923 como bom quando as importações estavam a um nível menor do que as verificadas em 1921 que ele aponta como mau 1924 realmente tem um nível relativamente alto de importações porém inferior ao de 1926 que ele aponta também como mau18 Quanto ao argumento dos aumentos de custos dos componentes importados pelas desvalorizações volto a ele mais adiante Em que pese as críticas feitas desejo afirmar que o trabalho de Warren Dean teve uma grande importância e deve ter possibilitado a muitos estudiosos da economia brasileira uma reflexão maior não só sobre o enfoque cepalino da industrialização brasileira como também sobre as próprias críticas a esse enfoque feitas por Dean e por outros A segunda hipótese referese àquilo que Dean denominou de A matriz econômica a importação título dado ao capítulo II de seu livro e que tenta mostrar a figura do importador como origem da industrialização dizendo que os importadores além de não constituírem obstáculo à industrialização foram claramente a origem de um setor industrial que cresceu a par das empresas agroindustriais dos fazendeiros19 Em seguida ele menciona as três circunstâncias que teriam favorecido os importadores para que se transformassem também em industriais a os importadores já efetuavam algumas operações de montagem de complementação ou mesmo pequenas transformações industriais a fim de poder entregar e às vezes também instalar e exercer manutenção local ao usuário o produto final pronto para uso Esta atividade complementar portanto já lhe facultava a possibilidade de uma futura produção do bem anteriormente importado 18 É possível que Dean tenha tomado a série de importações em moeda nacional sem examinar o problema das oscilações cambiais Usei a série em libras esterlinas obtida da publicação Estatística do Comércio Exterior do Porto de Santos 19 Conforme Dean 1971 p 26 Wilson Cano 140 b a segunda circunstância apontada decorre do conhecimento que o importador tinha das condições internas de comercialização e de mercado bem como do acesso ao crédito que o importador obtinha derivado totalmente em última instância do estrangeiro quer através de fabricantes ou distribuidores europeus quer através de agências locais de bancos europeus c a terceira se refere a uma etapa em que o consumo interno já é mais amplo e diversificado e que a procura de máquinas mais complexas é maior criando assim estímulos para que o importador converta sua agência de vendas em fábricas autorizadas Os argumentos de Dean são realmente convincentes no que se refere às possibilidades de o importador se transformar também em industrial e ele apresenta em seu livro inúmeros exemplos de transformações desse tipo que ocorreram no período anterior a 1930 A questão é pertinente embora Dean não tenha lhe apreendido as raízes Discutindo aquilo que denominou de gênese do capital industrial em sua citada tese J M C de Mello mostra claramente de que forma o capital cafeeiro vaza para os segmentos urbanos a indústria inclusive paralelamente amparado pela política protecionista não intencional é claro pois a política tributária era eminentemente fiscalista e pelas reformas financeiras e bancárias que ocorrem no início da República E ele mostra também como a capacidade para importar já sendo fortemente pressionada pelo serviço da dívida externa passa também a ser pressionada pela nascente indústria por importações de bens de produção e de alimentos fazendo com que através da desvalorização cambial e da proteção tarifária esse implante industrial amplie sua rentabilidade própria E conclui apontando para o fato de que os segmentos sociais que dispusessem de capitaldinheiro principalmente os lucros dos fazendeiros dadas as condições favoráveis do período mãodeobra salários baixos política protecionista etc teriam assim as condições de transformálo em capital industrial Por tudo que se viu até este ponto é inquestionável o fato de que efetivamente foi o capital cafeeiro o núcleo e o peso maior dessa transformação Ademais é evidente que a elevação da rentabilidade Raízes da concentração industrial em São Paulo 141 industrial de um lado e as restrições na capacidade para importar de outro lado praticamente impunham aos importadores a transformação de seus lucros de comércio em capital industrial Se não o fizessem quer por falta de condições propícias a essa transformação quer por outros motivos aqui não apontados correriam o risco de não poder transformar seus lucros em novo capital produtivo e portanto correr também eventualmente o risco de serem alijados desse processo de acumulação ou então de se transformarem simplesmente em comerciantes de produtos nacionais fabricados por outros O próprio Dean apresenta dados e informações mostrando a realização de investimentos industriais por outros agentes que não os importadores Em seu livro ele expõe vários casos de agentes não importadores comerciantes técnicos etc que se transformaram em industriais assim como outros em que industriais por necessidades inerentes aos processos de produção e também para rebaixar custos transformavamse também em importadores com o que ganhavam para si as chamadas margens de comercialização tradicionalmente vinculadas aos negócios de importação20 Dean ainda enumera vários fazendeiros que se transformaram em industriais e comentando os dados levantados por Bandeira Júnior conclui que naquele levantamento de indústria feito por esse autor em 1901 as indústrias pertencentes aos fazendeiros empregariam algo em torno da metade dos operários ocupados na indústria21 É curioso que Dean levantou o problema mas não desenvolveu essa questão Diz Os importadores paulistas mal se haviam estabelecido quando descobriram a necessidade de adaptarse ao declínio da capacidade do café para custear as mercadorias vindas do estrangeiro Vale notar que enquanto os importadores de São Paulo se voltavam para a indústria à medida que a importação se tornava cada vez mais difícil os do Rio vendiam suas empresas industriais e voltavam à ocupação original a de simples atacadistas Dean 1971 p 35 20 Conforme Dean 1971 p 3638 21 Conforme Dean 1971 p 4551 Wilson Cano 142 Ele mostra claramente porém de forma muito resumida que a atrofia no caso do Rio se devia evidentemente ao crescimento mais lento daquela região justificando por esse fato a involução daqueles importadores Dean na realidade deveria ter questionado melhor esse fato usando aquelas mesmas três circunstâncias favoráveis por ele apontadas para perguntar o seguinte por que os importadores do Rio não usaram de sua experiência técnica e fabril e do crédito amplo fornecido pelos bancos estrangeiros e pelos fornecedores estrangeiros para assim ampliar a transformação por Dean apontada e consolidar sua posição no mercado nacional dado o amplo conhecimento da comercialização e do mercado que tinham Não se pode esperar evidentemente que aquelas circunstâncias no Rio fossem desfavoráveis ao contrário de São Paulo o que Dean não viu foram as diferenças fundamentais entre a dinâmica do complexo cafeeiro paulista e a involução da região cafeeira vizinha e tributária do Rio Em que pese o fato de não se dispor de dados maiores sobre os fluxos de capital estrangeiro para financiamento interno direto ou via bancária podese pelo menos perguntar o seguinte qual teria sido a principal fonte de alimentação do sistema bancário excluindose o Estado naturalmente nesse período inicial de crescimento industrial Não pode ser difícil se entender que era o capital cafeeiro e todo o movimento financeiro dele decorrente tanto em termos de constituição do capital e dos ativos de bancos onde os bancos predominantemente formados por fazendeiros detinham pouco mais de 20 do capital bancário em São Paulo já antes da primeira guerra e seus ativos perfaziam pouco menos de 30 do total dos ativos bancários em São Paulo mas principalmente em termos da alimentação que esse movimento financeiro proporcionava ao sistema bancário paulista O que interessa destacar no problema é o fato obviamente conhecido do papel desempenhado pelos bancos que na realidade giram mais com o capital de terceiros do que com o seu próprio capital a relação entre o capital próprio dos bancos nesse período e suas exigibilidades era de aproximadamente 17 sendo ainda maior a dos bancos estrangeiros do que a dos nacionais O banco na realidade é um intermediário financeiro Raízes da concentração industrial em São Paulo 143 dotado de poder especial ao multiplicar os meios de pagamento pelo conhecido mecanismo de empréstimosdepósitos Sem negar aquela entrada de recursos externos sugerida por Dean acredito que o capital cafeeiro exerceu papel preponderante nessa expansão bancária proporcionando portanto financiamento indireto às demais atividades econômicas A situação no Rio dada a decadência cafeeira seria na verdade muito mais dependente da ação governamental e do capital estrangeiro do que a de São Paulo Sendo o café em São Paulo uma atividade mais dinâmica e de maior produtividade que no Rio não é difícil se depreender que o capital cafeeiro em São Paulo tinha maiores e melhores condições para vazar do núcleo para os segmentos urbanos tanto na forma de inversão direta como do financiamento direto pelos bancos dos fazendeiros principalmente e indireto através do sistema bancário em geral Deixei de propósito para esta parte a argumentação de Dean sobre o problema do aumento de custos ocasionado pelas desvalorizações cambiais Em primeiro lugar como apontou J M C de Mello os preços dos bens de produção eram realmente afetados porém tal impacto era minimizado por dois fatos primeiro porque a intensidade de capital tanto a referente à relação capitalproduto como à relação capital trabalho era relativamente baixa e em segundo lugar as isenções tarifárias concedidas às importações de bens de capital poderiam diminuir aquele impacto altista Notese ainda que em 1919 do capital empregado na indústria paulista apenas um terço se refere a equipamentos outro terço a estoques e a última terça parte a terrenos e edifícios ver Apêndice Estatístico No que se refere aos insumos importados é evidente também que seus custos se elevavam com as desvalorizações logicamente podendo diminuir a rentabilidade industrial Entretanto isto merece algumas considerações Esse fato não afetou a indústria têxtil algodoeira por exemplo uma vez que esta era praticamente integrada utilizando o algodão em pluma nacional não precisando dessa forma importar suas principais matériasprimas com exclusão naturalmente de peças Wilson Cano 144 acessórios e insumos químicos por exemplo No caso da indústria de sacaria o governo havia concedido redução dos direitos de importação sobre os fios de juta e aumento das tarifas sobre as sacarias importadas e não foi por mera coincidência que um ano após essa medida 1889 era instalada em São Paulo a maior fábrica têxtil de sacaria do Brasil por Álvares Penteado22 Certamente em outros tipos de indústria que não essas duas a desvalorização cambial poderia elevar mais acentuadamente os custos de produção Na Tabela 14 construo um exemplo hipotético de estrutura de custos de um produto industrial que num primeiro momento era totalmente importado Calculado o preço externo os custos de internação e a comercialização e tendo em conta a hipótese de que o preço externo e a proteção tarifária determinam os limites superiores para a fixação do preço interno suponho que no primeiro caso constante dessa tabela caso A o importador tem margem de lucro em relação aos custos totais de 111 no caso B ele passa a importar o produto desmontado e ganha para si a diferença do imposto de importação que lhe eleva assim a lucratividade para 190 No caso C seu lucro aumenta ainda mais pois passa a importar apenas alguns componentes do produto fabricando internamente a custos maiores do que os de importação os demais componentes do produto as diferenças de impostos seguros e fretes compensam o acréscimo de custos internos ampliandolhe ainda a margem de lucro que agora é de 250 No caso D ele passa a importar apenas algumas matériasprimas aumentando ainda mais a rentabilidade nos casos E e F suponho uma desvalorização cambial de 100 aumento esse que atinge todos os componentes de custos importados ou não com exclusão dos salários que suponho aumentados em apenas 50 Esta hipótese pode ser aceita se a valorização ocorre face a uma crise cafeeira que deprima as taxas de salário nominal e mesmo real mas também pode ser aceita quando se sabe que os salários nunca são reajustados instantaneamente e seu reajuste não necessariamente é feito ao mesmo nível da desvalorização 22 Por exemplo o Decreto 3348 de 20 de outubro de 1888 reduziu as tarifas sobre fios de juta e a Lei 3396 de 24 de novembro de 1888 aumentou as tarifas sobre as sacarias Conforme Nicia V Luz 1961 p 160 Raízes da concentração industrial em São Paulo 145 Por outro lado insisto ainda mesmo que o reajuste salarial seja equivalente à desvalorização ele se dá de uma forma defasada no tempo o que implica em que o custo médio anual digamos da mãodeobra não cresça com a mesma intensidade dos demais custos Tabela 14 Custos e lucros hipotéticos com importações e produção interna de um bem industrial valores em unidades monetárias A B C D E F 1 Custo dos produtos importados 100 80 50 20 40 40 2 Frete e seguro 10 10 5 2 4 4 3 Tarifa 50 50 40 25 10 20 4 Custo int de fabricação 40 80 148 148 5 Custo int de montagem 20 20 20 37 37 6 Custo int de comercialização 20 20 20 20 37 37 7 Custo total exclusive impostos internos 180 170 160 152 286 266 8 Preço 200 200 200 200 340 340 9 Lucro 20 30 40 48 54 74 LucroCusto Total 111 190 250 316 189 278 Notas B o produto é importado desmontado C parte ainda é importada 50 e o restante 30 é produzido internamente a maior custo 40 D agora são importadas apenas matériasprimas 20 E é idêntico ao caso D com desvalorização cambial de 100 aumentando os custos 1 2 e 3 em 100 e os custos e preços 4 5 6 e 8 em proporção menor F é idêntico a E porém com isenção tarifária Supus que 30 do valor desses itens corresponde a salários nos casos E e F eles são reajustados em 50 e os restantes custos 70 são reajustados em 100 a partir do caso B os produtores poderiam obter lucros adicionais nos itens 4 5 e 6 mas eu os considerei nulos Os preços têm um teto com o limite nos preços de importação mais custos de internação 2 3 e 6 e os produtores não podem exceder esse limite os lucros adquirem aqui a conotação de residuais com a diferença entre o preço e o custo total 87 supus que nos casos E e F os produtores não teriam condições de reajustar seus preços em 100 200 para 400 Suponho ainda nos casos E e F que os produtores não dispõem de condições para reajustar o preço ao nível relativo determinado antes preço externo mais proteção tarifária o reajuste se dá a um nível digamos de 70 inferior aos 100 da desvalorização e ainda assim o negócio é rentável apresentando a lucratividade de 189 que é mais alta do que no caso inicial Mas quando se supõe a isenção tarifária para as matériasprimas importadas caso F a lucratividade é bastante alta 278 Não se deve esquecer ainda que no caso das empresas integradas por exemplo as têxteis que contam com a fiação e a tecelagem a tributação sobre a matériaprima sobre os fios no caso é excelente uma vez que não dependendo dessas importações ganham com isso uma margem extra de lucros em relação às empresas menores Wilson Cano 146 e não integradas as integradas poderiam ser representadas pelo caso F transferindose os custos de frete seguro e importação em custos internos de fabricação e as não integradas poderiam ser representadas pelo caso E23 De qualquer forma para a indústria têxtil algodoeira isto não foi relevante uma vez que a quantidade importada de fios de algodão até a primeira guerra não representou em média nem o equivalente a 5 da quantidade física de tecidos produzidos e na época predominavam os estabelecimentos industriais integrados24 25 Como se vê os impactos das desvalorizações cambiais nos custos de produção nem sempre são proporcionais para todas as empresas e para todos os setores Às vezes podem mesmo se tornar extremamente benéficas para determinadas empresas ou setores quando estes conseguem aumentar a participação dos componentes nacionais na produção final 22 A expansão industrial Colocada em suas linhas gerais a forma pela qual se dá o surgimento do capital industrial em São Paulo examino em seguida as marchas e contramarchas da expansão industrial A análise que se segue apresenta as linhas gerais do crescimento industrial de São Paulo desde sua gênese até 1929 Dado que as informações censitárias industriais se iniciam somente em 1907 isto me levou à necessidade de tentar reconstituir ainda que precariamente a evolução industrial até aquele ano periodizandoa tanto em função do ciclo cafeeiro como em função da política econômica Isto foi feito mediante a identificação parcial de empresas contempladas no Censo de 1907 e em outras publicações que versaram sobre a indústria paulista 23 Quanto à importância desse setor industrial basta lembrar por exemplo que em 1925 a indústria têxtil algodoeira tinha um valor de produção equivalente a 59o do total da indústria têxtil e de 27 do total de todas as indústrias juntamente com a indústria da juta aquelas porcentagens eram de 81 e 37 respectivamente Conforme Boletim da Diretoria de Indústria e Comércio São Paulo n 45 p 6365 1927 24 Sobre o alto nível protecionista existente para várias manufaturas especialmente para a têxtil ver Villela e Suzigan 1973 p 346351 e Stein 1957 p 124 25 Conforme Luz 1961 p 52 Raízes da concentração industrial em São Paulo 147 principalmente no que se refere à propriedade e às datas de fundações daquelas empresas Vejamos inicialmente a evolução industrial até 1907 pelo exame dos resultados da compatibilização dos trabalhos citados na Tabela 15 com o Censo Industrial de 1907 que relacionou 326 estabelecimentos em São Paulo Nessas fontes consegui identificar 95 empresas que também constavam no Censo de 1907 as quais totalizavam 821 do capital industrial declarado nesse ano sendo ainda mais alta a representatividade para a indústria têxtil cujas 19 empresas identificadas perfaziam 894 do capital desse setor Entre as 58 empresas constantes no trabalho de Bandeira e não encontradas no Censo de 1907 predominavam pequenas empresas individuais sendo que 47 delas produziam chapéus calçados alimentos bebidas móveis serrarias e produtos diversos cinco eram pequenas oficinas metalúrgicas duas eram empresas têxteis de porte médio e as quatro restantes fabricavam produtos químicos simples como sabão velas e medicamentos É bem provável que os difíceis anos de 1901 a 1904 tenham contribuído para o desaparecimento de algumas ou para a transferência de sua propriedade fato este aliás que se verifica muito no confronto entre esses dois levantamentos Uma síntese do resultado desse confronto é apresentada na Tabela 15 onde é ressaltada a indústria têxtil sem dúvida alguma a principal atividade industrial em todo esse largo período Pouco se pode dizer das tentativas de implantação industrial em São Paulo até 1880 cujos investimentos principais no caso da Indústria têxtil parecem ter tido sua origem tanto nos negócios do algodão do açúcar e talvez do café No que se refere aos demais setores industriais destacavamse três empresas mecânicas cujos capitais perfaziam menos de 20 do capital aplicado pelas empresas fundadas até 1880 vinculadas diretamente à produção de máquinas e implementos destinados à atividade cafeeira e ainda uma usina de açúcar Entre as demais empresas fundadas até 1880 e existentes em 1907 destacavamse fábricas de chapéus e de calçados produtos para os quais parece ter havido satisfatórias condições naturais de competição com os produtos similares Wilson Cano 148 importados e se caracterizavam como mostra o trabalho de Bandeira por alto emprego de mãodeobra e baixo de capital com maior utilização de matériaprima local Entre essas empresas fundadas até 1880 e constantes do levantamento feito por Bandeira figuram ainda 16 diminutas empresas produtoras de alimentos bebidas e produtos diversos e uma têxtil de porte médio que podem não ter sobrevivido até 1907 pois não constam do censo industrial desse ano A gênese do capital industrial em São Paulo deuse no período que vai de 1881 a 1894 os dados da Tabela 15 revelam um total de 50 do capital industrial recenseado em 1907 e de 60 para a indústria têxtil sendo que essas cifras possivelmente seriam ainda maiores caso se pudesse identificar as datas de fundação de todas as empresas Tabela 15 Capital empregado na Indústria de Transformação no estado de São Paulo segundo a data de fundação das empresas capital declarado em 1907 Indústria têxtil Demais indústrias Total Período de Fundação Estabele cimentos Capital Estabele cimentos Capital Estabele cimentos Capital Contos Contos Contos A até 1880 3 3700 67 12 3957 59 15 7657 63 B de 1881 a 1886 4 5952 108 9 7769 117 13 13721 113 C de 1887 a 1889 1 8793 160 8 12103 182 9 20896 172 D de 1890 a 1894 4 18402 334 17 7580 114 21 25982 213 E de 1895 a 1897 1 2000 36 10 7573 114 11 9573 79 F de 1898 a 1901 3 6827 124 10 5515 83 13 12342 101 G até 1901 sem data 2 1620 29 5 2206 33 7 3826 31 H Subtotal 18 47294 858 71 46703 702 89 93997 772 I de 1903 a 1907 1 2000 36 5 4000 60 6 6000 49 J até 1907 sem data 12 5790 106 219 15915 238 231 21705 179 K Total 31 55084 1000 295 66618 1000 326 121702 a 1000 Fontes Capital e Estabelecimentos 1 Censo Industrial de 1907 Datas de Fundação 2 Bandeira Jr 1908 3 Piccarolo e Finocchi 1918 4 Sawyer 1905 Lima 1954 a Exclusive 6000 contos referentes à contagem tripla de uma empresa dos 30 estabelecimentos com capital maior ou igual a 1000 contos 23 deles foram fundados até 1901 e 7 provavelmente de 1902 a 1907 O período de 1881 a 1886 ainda que mostre resultados mais elevados do que os de 1880 representa um montante relativamente modesto de inversões industriais explicado de um lado pela crise cafeeira de 18831885 e de outro em 1886 pela forte expansão do plantio de café Outros fatores que certamente atuaram negativamente nesse curto período poderiam te sido a redução dos direitos de importação que Raízes da concentração industrial em São Paulo 149 se verifica em fins de 1881 pelo Decreto 8360 31 de dezembro de 1881 e a pequena contração dos meios de pagamento que se observa entre 1881 e 1889 que evidentemente pode ter se transformado em problema importante diante da abolição da escravatura que então se aproximava Nesse período os principais investimentos são os da Cia Melhoramentos de São Paulo fundada em 1883 uma usina de açúcar fundada em 1882 e uma fábrica têxtil em 1886 todas as três fundadas por fazendeiros Juntas representam 65 do capital referente a este período de 1881 a 1886 e das 10 restantes 2 eram usinas de açúcar e as outras 8 empresas eram pequenos estabelecimentos industriais A Cia Melhoramentos no Censo de 1907 é computada três vezes como a maior produtora dos setores de papel cal e cerâmica O período de 1887 a 1889 é fixado em razão das várias mudanças econômicas e institucionais que o delimitam Se de um lado nestes anos há uma forte expansão do plantio do café estimulada pela elevação externa de preços de outro devese levar em conta que o plantio anterior 1876 a 1883 já vinha ampliando a massa de lucros a partir de 1881 quando começa a crescer efetivamente a capacidade produtiva cafeeira A pressão do endividamento externo e do déficit público federal certamente devem ter dificultado a capacidade para importar que era ainda pressionada pelo aumento das importações necessárias à subsistência da crescente imigração para o café26 Em que pese isso tudo as várias alterações tarifárias que se realizam em 1887 e 1888 talvez em grande parte devido aos problemas do déficit público elevando os direitos sobre matériasprimas e produtos finais já produzidos no país e reduzindo os direitos em 1888 sobre matériasprimas não produzidas no país como os fios de juta proporcionaram aumento da lucratividade industrial27 O investimento no período é alto destacandose duas fábricas açúcar e sacarias de juta com capital originário do café 9400 contos e a cervejaria Antarctica com 26 Entre 1886 e 1890 entraram aproximadamente 162000 imigrantes no Estado de São Paulo o que na época equivalia a cerca de 12 da população paulista 27 Decreto 9746 de 22 de abril de 1887 Decreto 3348 de 20 de outubro de 1888 Lei 3396 de 24 de novembro de 1888 Conforme Luz 1961 p 157160 Wilson Cano 150 capital de 10000 contos essas três fábricas totalizavam 93 do capital desse período Essa etapa na realidade representa uma transição para o período seguinte que efetivamente apresentaria condições ainda melhores para a expansão industrial No período de 1890 a 1894 além da retaguarda o protecionista estabelecida desde 1887 elevouse ainda mais o grau de proteção à indústria com exclusão do ano de 1892 Certamente a desvalorização cambial que começa a partir de 1891 e que aumenta em todo o período junto com o protecionismo tarifário proporcionou acréscimo da rentabilidade industrial28 A expansão da massa de lucros do café que se dá tanto pelo aumento dos preços externos e internos como pelo aumento da capacidade produtiva gerada a partir de 1886 cujos primeiros frutos ocorrem já a partir de 1891 encontra nesse aumento de rentabilidade industrial o campo preferido para a transformação do capital cafeeiro em capital industrial Recordese também que a capacidade para importar talvez um pouco menos pressionada do que no período anterior tanto pelo aumento das exportações como pela reorganização dos serviços da dívida externa passa agora a sentir novas pressões originadas tanto pelas novas demandas de bens de produção para a indústria como pelo aumento das importações de alimentos e de outros bens necessários à subsistência Desse descompasso entre o aumento de lucros e a capacidade para importar surgem as condições para que outras classes além da cafeicultora como a dos comerciantes importadores principalmente transformem seus lucros crescentes em capital industrial 28 Decreto 391C de 10 de maio de 1890 Lei da tarifaouro inicialmente cobrando em ouro 20 dos direitos e posteriormente 100 pelo Decreto 804 de 4 de outubro de 1890 Decreto 836 de 11 de outubro de 1890 Tarifa Rui Barbosa Lei Orçamentária 25 de 30 de dezembro de 1891 revogou a cobrança em ouro elevando os adicionais sobre a tarifa em 50 e 60 Lei Orçamentária 126A de 21 de novembro de 1892 eleva as tarifas de vários bens finais isentando os bens de capital e matériasprimas não produzidos no país Decreto 947 de 4 de novembro de 1890 Lei dos Similares proíbe isenção para produtos similares Conforme Luz 1961 p 107 111 163170 ver também o Relatório do Ministro da Fazenda de Rui Barbosa edição do Ministério da Educação e Cultura 1950 p 203205 Raízes da concentração industrial em São Paulo 151 O período é marcado por importantes alterações econômicas e institucionais Cabe aqui dentre elas ressaltar a reforma bancária através da qual é concedido a bancos particulares o poder de emissão transformandoos ainda em promotores do desenvolvimento A lei permitia aos bancos a exploração direta ou indiretamente de outras atividades extrabancárias O grande aumento do meio circulante a partir de 1890 reforçaria ainda mais as positivas condições desse período A ênfase dada em nossa literatura econômica sobre o caos monetário e a nuvem de papel em que se constitui o Encilhamento com a enorme expansão monetária e desvalorização cambial ajudou a entorpecer por muito tempo o real papel desempenhado pela efetiva acumulação que ocorre no período Argumentações como as que tentam mostrar que os possíveis efeitos positivos gerados pela expansão bancária e pelos meios de pagamento teriam sido anulados ou compensados pela desvalorização cambial e pela alta interna dos preços ambas aumentando os custos de inversão e de produção internos ou outras que vêm o Encilhamento como um período de intensa especulação de papéis e de criação de empresas fantasmas prestaram desserviço à correta compreensão desse período Stanley Stein mostra claramente que nem tudo foi fictício nesse processo inflacionário Ele calcula para a indústria têxtil que do total de capital subscrito na formação e ampliação de empresas de maio de 1889 a janeiro de 1892 no Rio de Janeiro que somava 84 mil contos nesta última data cerca de 60 foi efetivamente integralizado Por outro lado adverte que grande parte das empresas que foram incorporadas até aquela data e que logo encomendaram e pagaram as importações de seus bens de capital ou seja antes que a desvalorização atingisse níveis muito elevados puderam efetivamente transformar esses recursos financeiros em ativos reais Vinda a desvalorização essas mesmas empresas passaram então a se beneficiar importaram bens de capital a preços antigos mais baixos e passavam a operar a um nível interno de preços novos mais altos ditados pelo desnível cambial o que lhes acrescia o nível de proteção e a margem de lucros29 29 Conforme Stein 1957 p 8597 Wilson Cano 152 Fishlow concordando com Stein realça ainda mais o aspecto da defasagem entre o aumento das emissões de papel moeda e da apropriação de créditos e a elevação da taxa cambial mostrando que o meio circulante cresceu mais rápido do que a desvalorização cambial e que as importações de bens de capital originados da Inglaterra em libras aumentaram cerca de 70 por cento entre 18851889 e 1890189430 Em suas estimativas da produção de tecidos de algodão fica claro que entre 18901894 e 18951899 a produção cresce de forma muito acelerada e as importações de tecidos de algodão sofrem queda acentuada de aproximadamente 30 Essa defasagem de preços apontada por esses autores pode ser vista pelos dados da Tabela 16 Tabela 16 Evolução de alguns índices de preços 1889 100 Anos Papel moeda em circulação Preço do café em moeda nacional Taxa cambial Padrão de vida no Rio de Janeiro a I II 1890 141 120 110 103 108 1891 212 171 177 116 137 1892 248 201 219 158 197 1893 300 276 227 188 211 1894 337 290 262 216 204 Fonte Anuário Estatístico do Brasil 193940 a Índice de preços de alimentos nacionais e importados elaborado por Eulália M L Lobo e outros 1971 O Índice I tem base de ponderação o ano de 1856 e o II o ano de 1919 Ainda que se faça ressalvas sobre os índices do custo de vida incluídos na Tabela 16 tanto pela forma de sua elaboração como por terem sido calculados para o Rio de Janeiro na realidade superestimam o custo de vida e não subestimam se comparados por exemplo com o calculado por Onody para o período de 1887 a 1896 o índice de Onody revela um aumento de 115 e o utilizado na Tabela 16 revela um aumento de 26131 Acrescentese ainda o fato de que os salários dos colonos de café entre 1888 e 1895 tanto para carpa como para colheita 30 Conforme Fishlow 1972 p 1014 31 Oliver Onody 1960 p 25 Face ao problema da periodização utilizada por esse autor não pude usar esse índice Raízes da concentração industrial em São Paulo 153 aumentam menos ainda do que o custo de vida seus aumentos foram respectivamente de 80 e 100 Hall 1972 p 186 apud Cardoso de Mello 1975 p 34 Como se vê o capital cafeeiro no período em estudo contou com excelentes condições para ativar seu processo de acumulação diversificada amplo crédito lucros elevados preços do café internos superiores à desvalorização cambial contando ainda com elevação menor do custo de sua mãodeobra Nessa situação francamente positiva teria que ser alta a inversão em indústrias ainda mais quando se recorda que as condições de lucratividade industrial também atingem níveis maiores nesse período Voltando à Tabela 15 notase que essas inversões foram realmente as maiores do período totalizando 334 do capital da indústria têxtil e 213 do capital de toda a indústria Dessas inversões totais Tabela 15 de 25982 contos os investimentos feitos diretamente por fazendeiros de café foram responsáveis por 46 representados pela maior indústria mecânica e pela segunda mais importante fábrica têxtil de São Paulo32 O lado negativo dos anos de 1895 a 1897 está representado pela queda dos preços externos do café pequena até 1896 e acentuada em 1897 que é parcialmente compensada pela taxa cambial os preços externos caem entre 1894 e 1897 de 53 enquanto os internos diminuem em 38 Por outro lado em fins de 1896 o governo cancelava o privilégio anteriormente concedido aos bancos de emitir papel moeda convertendoo em monopólio estatal Ainda o peso da dívida externa e do déficit público tanto pressiona o balanço de pagamentos quanto a receita fiscal33 Finalmente o aumento das importações de alimentos comprimia ainda mais a capacidade para importar34 32 Essa porcentagem é referente às inversões da Cia Mecânica e Importadora de São Paulo 5000 contos e da Fábrica de Tecidos Votorantim 6920 contos Os fundadores dessas empresas pelo que se depreende do trabalho de Bandeira Jr eram capitalistas cujos recursos provinham de suas fazendas de café ou de bancos fundados pelos próprios fazendeiros 33 Conforme Villela e Suzigan 1973 p 105 34 Devese lembrar que entre 1890 e 1894 entraram mais 320000 imigrantes em São Paulo e entre 1895 e 1897 mais 337000 conforme Boletim da Diretoria de Terras Colonização e Imigração São Paulo n 1 out 1937 Wilson Cano 154 Sob outros aspectos esses anos são tão positivos quanto o período anterior representam o início de um difícil momento para o café e para a expansão da inversão industrial mas se pode destacar a continuidade da expansão monetária da desvalorização cambial e do protecionismo fatores que devem ter proporcionado excelentes condições para a expansão da produção industrial Não poderia ter sido grande a inversão industrial nesse período conforme se vê pela Tabela 15 que mostra uma porcentagem de 79 do total aplicado Dos 9573 contos que figuram no capital declarado em 1907 pelas empresas cuja fundação foi identificada como sendo desse período 2000 contos correspondem à fundação da fábrica de tecidos de Crespi e 6040 contos correspondem a aplicações cujos recursos eram conhecidamente originários de fazendeiros 1040 contos da vidraria Santa Marina fundada por Antonio Prado e 5000 contos referentes à fábrica de cimento Rodovalho fundada pelo Coronel Antonio Proost Rodovalho em 1897 Com exceção da fábrica têxtil as duas outras eram fábricas mais complexas e possivelmente operavam com maior intensidade de capital do que a média da indústria Este fato poderia questionar a argumentação que usei mais acima a respeito da desvalorização cambial e dos custos de inversão Entretanto a fábrica de vidros certamente gozava condições excepcionais de concorrência no mercado pois junto com outra vidraria existente em 1907 no estado da Guanabara controlavam 75 da produção nacional A fábrica de São Paulo tinha ainda uma vantagem por ser a fornecedora quase exclusiva de garrafas para a indústria de bebidas que crescia bastante na época A Fábrica de Cimento Rodovalho tinha efetivamente uma grande quantidade de máquinas e equipamentos como demonstrou Bandeira A fábrica parece não ter tido sucesso pois no Censo de 1907 ela já pertencia a outra firma e segundo relata Dean foi mais tarde adquirida pelas Indústrias Votorantim35 Não consegui localizar qualquer informação sobre a produção paulista de cimento antes de 1926 ano em que se inicia a atividade da fábrica de cimento de Perus em São Paulo comumente tida como a primeira fábrica de cimento que se instala no país 35 Conforme Dean 1971 p 112 Raízes da concentração industrial em São Paulo 155 A fábrica Rodovalho encerrou suas atividades provavelmente por problemas de altos custos fixos de produção uma vez que a capacidade produtiva seria suficiente para cobrir mais da metade das importações brasileiras de cimento nos primeiros anos de 1900 ficando a impressão de que surgiram dificuldades com a competição do cimento importado36 No período crítico de 1898 a 1901 os preços externos do café baixaram ainda mais e os preços internos foram também afetados pela valorização cambial A entrada de mais 173 000 imigrantes em São Paulo também pressionava os salários da cafeicultura fazendoos cair até 1901 em cerca de 30 e à medida que a crise avançava os salários seriam ainda mais comprimidos37 Certamente essa baixa dos salários rurais refletiuse também na economia urbana porém ao mesmo tempo em que essa baixa salarial reduzia os custos de produção industrial comprimia também a demanda de bens de consumo corrente agravando dessa forma as condições de funcionamento da indústria A crise bancária de 1900 e a restritiva política monetária do período devem ter agravado a competição entre as empresas industriais provocando a quebra das mais frágeis A proteção tarifária que diminui em 1898 ressurge em 1899 quando é instituída a quotaouro de 10 sobre os impostos de importação chegando a 25 em 1901 com o que se compensava parcialmente os efeitos negativos da valorização cambial que ocorre no período38 Esse aumento do grau de proteção à indústria operava dessa forma mais como um mecanismo de sobrevivência da indústria nacional do que propriamente como fator estimulante ao aumento da produção industrial Na realidade ele deve ter evitado que os efeitos decorrentes dessa crise fossem ainda mais desastrosos para a indústria 36 Algumas informações adicionais sobre essa fábrica bem como os traços biográficos do Cel Rodovalho podem ser vistos no trabalho de Heitor F Lima 1954 37 Conforme Hall 1972 p 186 apud Cardoso de Mello 1975 p 147 38 Decreto 2743 de 17 de novembro de 1897 reduz as tarifas Lei 559 de 31 de dezembro de 1898 estabelece a quotaouro de 10 Lei 581 de 20 de julho de 1899 estabelece a quotaouro de 15 Decreto 3617 de 19 de março de 1900 Tarifa Murtinho estabelece a quotaouro de 25 e reestrutura a tarifa Conforme Luz 1961 p 115 118 176 Wilson Cano 156 Embora o plantio do café estivesse praticamente paralisado tão deprimidos estavam os preços do café que poucas possibilidades existiriam para que ocorressem importantes vazamentos de lucros desse setor para a indústria Por outro lado muito embora a valorização cambial barateasse os bens de capital importados para a indústria a capacidade para importar estava ainda restringida e só melhoraria após 1900 Diante desse quadro não poderiam ser muito promissoras as inversões industriais do período Tabela 15 as adições mais importantes foram os 4000 contos do moinho de Matarazzo e três fábricas têxteis que totalizavam 6827 contos39 Nesses anos os investimentos industriais aplicados diretamente por fazendeiros de café foram mínimos situando se em pouco menos de 20 do total investido A partir de 1901 a política econômica segue sua trajetória conseguindo a estabilização cambial em 1905 e a taxa cambial se manteria até 1913 A situação dos meios de pagamento mantinhase estacionária até 1906 crescendo muito lentamente até 1908 e voltando a crescer um pouco mais acentuadamente daí até 19121913 Os preços externos do café se recuperam um pouco da baixa a partir de 1904 crescendo significativamente após 1909 principalmente graças à política de valorização O protecionismo à indústria que se mantinha elevado é aumentado em fins de 1905 propiciando também à agricultura nacional um grau maior de proteção Em 1911 com a instituição da Lei dos Similares ampliase ainda mais o grau de proteção industrial40 Com exceção dos anos de 1911 a 1913 quando se plantam perto de 100 milhões de novos cafeeiros é extremamente reduzido o plantio que se verifica até 1918 Acrescentandose a isso o fato de que a capacidade para importar somente começa a se recuperar a partir de 1905 fica mais evidente que a retomada do investimento industrial em termos 39 O trabalho de Martins 1967 se constitui num importante estudo sobre a biografia de Matarazzo e a evolução de suas empresas No trabalho de Lima 1954 p 152163 também se encontram os principais traços biográficos desse industrial 40 Lei Orçamentária 1452 de 30 de dezembro de 1905 eleva a quotaouro para 50 atingindo os alimentos matériasprimas e manufaturas já produzidas no país e para os demais produtos a quotaouro era de 35 Decreto 947A de 4 de novembro de 1890 Lei dos Similares reformulado pelo Decreto 8592 de 8 de março de 1911 Conforme Dean 1971 p 93 e Luz 1961 p 130 Raízes da concentração industrial em São Paulo 157 significativos somente se daria em 19041905 passando a crescer mais aceleradamente depois de 190741 Tentando fazer uma comparação das novas inversões que se realizaram entre 1901 e 1907 nada pude conseguir além dos valores constantes na linha I 6000 contos da Tabela 15 Desse total 3200 contos correspondem a três fábricas de Matarazzo e os restantes 2800 contos a três usinas de açúcar formadas por fazendeiros de café42 O montante de 21705 contos do qual não apurei as datas de fundação das empresas a ele correspondentes envolve na realidade capitais de empresas fundadas entre 1901 e 1907 Por isso as inversões realizadas entre 1901 e 1907 seguramente devem se situar a níveis maiores do que o apresentado naquela tabela O único teste possível para o período consiste em compatibilizar as inversões anteriores a 1890 que excluindo o açúcar são iguais a 364 mil contos declarados em 1907 com os dados do Censo de 1919 exclusive açúcar que permite deduzir do capital industrial declarado naquele ano as parcelas correspondentes às inversões das empresas fundadas entre 1890 e 1919 Dos 5378 mil contos que era o capital total em 1919 correspondiam 4948 mil contos a empresas fundadas naquele período e para as fundadas antes de 1890 o resíduo apontava o valor de 430 mil contos importância essa muito próxima dos 364 mil contos declarados em 1907 considerandose que esse capital em 1919 certamente teria crescido Assim as inversões deste último período devem ser encaradas dentro dos limites mínimos de 60 mil contos ao máximo de 277 mil contos Considerandose que tanto o levantamento de Bandeira como o Censo de 1907 tiveram menor abrangência principalmente em relação às pequenas empresas o que se confirma pelos dados do Censo de 1919 que mostra a sobrevivência de 393 empresas fundadas antes de 1900 de 334 entre 1900 e 1904 e de 414 entre 1905 e 1909 fico com a hipótese de que as inversões das empresas fundadas entre 1901 e 1907 estariam mais próximas do limite superior do que do inferior 41 Dados sobre a capacidade para importar e sobre a formação de capital na indústria podem ser consultados em Villela e Suzigan 1973 p 437 441 42 Os dados sobre a fundação das usinas de açúcar foram obtidos do trabalho de Sawyer 1905 Wilson Cano 158 Muito raras são as informações existentes sobre a produção industrial no período anterior a 1907 e as conhecidas se referem à produção de chapéus que cresce 30 entre 1900 e 1905 a de calçados que cresce 24 e a de tecidos de algodão que cresce pouco mais de 9 Esses três produtos representavam em 1907 cerca de 30 do valor da produção industrial paulista chapéus e calçados 10 e tecidos de algodão 20 e a situação econômica que configura o período 1900 a 1905 parece pender o resultado possível da produção industrial mais para as baixas taxas dos tecidos do que para as altas taxas dos dois outros produtos43 O setor têxtil algodoeiro duplica sua produção física entre 1905 e 1910 crescendo também significativamente a de chapéus 85 e a de calçados 90 indicadores estes que espelham bem a mudança da situação econômica posterior a 1905 Foi entretanto efetivamente após 1907 que a produção e os investimentos tiveram uma forte aceleração Disponho apenas de duas indicações para isso a primeira diz respeito à indústria têxtil algodoeira cuja produção entre 1905 e 1907 aumenta em 167 enquanto a verificada entre 1907 e 1910 aumenta em 775 No primeiro desses períodos 1900 1905 muitas fábricas haviam feito investimentos de complementação e integração pois enquanto a produção crescia pouco o número de fusos dobrava significando maior independência em relação aos fios importados e o de teares crescia em menos de 40 como a produção cresce pouco eles devem ter sido instalados por volta de 1905 O salto maior é dado entre 1905 e 1910 quando duplicam os fusos duplicam os teares a potência instalada e o número de operários A segunda indicação referese às importações de máquinas e equipamentos para a indústria e a agricultura publicadas a partir de 1904 pelo Anuário Estatístico de São Paulo entre 1904 e 1906 a média dessas importações girava em torno de 7000 toneladas elas saltam para mais de 12000 toneladas em 1907 1908 e 1909 subindo para mais de 17000 em 1910 para 27400 em 1911 alcançando as cifras de 40000 em 1912191344 43 Esses dados sobre a produção física encontramse em Villela e Suzigan 1973 p 357 44 Essas importações embora fossem estatisticamente agregadas como máquinas para a indústria e a agricultura são mais representativas para a indústria dado o pequeno volume de equipamentos agrícolas contidos nessas importações Raízes da concentração industrial em São Paulo 159 A capacidade produtiva do setor têxtil algodoeiro cresce entre 1910 e 1915 em mais de 40 nas tecelagens e em 48 nas fiações ampliando a integração do parque têxtil paulista como se pode ver inclusive pela série de importação de fios de algodão que se mantém em níveis baixos O período de 1907 até 1913 parece ter sido realmente excelente tanto para o aumento da produção quanto para a capacidade produtiva da indústria Não tenho informações sobre os níveis das taxas de lucro no período mas os dados fornecidos por Stein revelam para muitas empresas do Rio de Janeiro e da Guanabara taxas de lucro extremamente elevadas45 A crise de préguerra que ocorre ainda em 1913 e o início da guerra em 1914 provocariam uma desaceleração no investimento industrial mantendoo a níveis relativamente baixos mesmo durante os restantes anos da guerra A produção passado o período crítico de 1913 1914 retomaria altos níveis de crescimento Tomado todo o período que vai de 1907 a 1919 a produção de tecidos de algodão em São Paulo quadruplicava aumento de 325 enquanto a do resto do país aumentava apenas de 60 Tudo leva a crer que não tenha sido apenas a produção têxtil algodoeira que cresceu tão fortemente nesse período Os censos de 1907 e o de 1919 mostram para São Paulo que o valor nominal da produção industrial exclusivo a de açúcar aumenta de 790 e o emprego operário cresce de 276 quando as cifras para o resto do país foram respectivamente 255 e 65 apenas Os problemas da dívida externa aumentada inclusive pelos empréstimos à valorização do café e a crise mundial de préguerra que precipita os preços do café para baixo diminuindo a receita das exportações que aliás já estavam agravadas pela queda dos preços da borracha desde 1911 provocam forte desequilíbrio cambial em 1913 e 1914 gerando pressões desvalorizadoras Essas pressões só não se traduziram em aumentos grandes da taxa em 1914 graças ao mecanismo estabilizador do câmbio criado pela instituição da Caixa de Conversão A situação entre 19131914 invertese passando a Caixa a vender câmbio à 45 Conforme Stein 1957 p 101105 Wilson Cano 160 taxa fixada que era maior do que a do mercado enquanto que o mercado cambial sentia pressões altistas Esse desnível provocou uma corrida aos depósitos de divisas da Caixa cujos recursos se esgotam em 1914 provocando o seu fechamento Se por um lado a caixa impediu em certa medida uma alta maior do câmbio nesse curto período a venda maciça de divisas provocou uma violenta retirada de papel moeda para a compra de divisas em circulação o qual em 1913 apresenta uma redução de 10 do total existente em 191246 A situação dos meios de pagamento e do câmbio somente se resolveriam em meados de 1914 com a desvalorização e com novas emissões de papel moeda com objetivo específico de atender aos problemas da crise industrial Reajustados os níveis monetários e cambiais e levandose em conta as restrições circunstanciais às importações estava assim reaberto o caminho para a expansão da produção industrial O período da primeira guerra mostraria uma forte elevação do papel moeda em circulação e uma desvalorização cambial entre 1914 e 1918 Nos dois anos seguintes um forte aumento dos preços externos do café ampliou a capacidade para importar criando assim condicionantes positivos para a inversão industrial Isto me conduz novamente a fazer alguns comentários às críticas feitas por Warren Dean aos índices de crescimento da produção industrial estimados a calculados por Roberto C Simonsen cujos resultados apontavam o crescimento real da indústria paulista em 126 e em 109 para a brasileira no período de 1914 a 1919 Examinemos os principais argumentos de Dean47 46 Para as emissões ver Stein 1957 p 105106 que mostra que elas totalizam 250 mil contos em fins de 1914 quantia essa equivalente a 25 do papel moeda em circulação desse ano Sobre a questão da dívida externa e da crise de 19131914 ver Villela e Suzigan 1973 p 106107 337 Sobre a instituição funcionamento e extinção da Caixa de Conversão ver o citado trabalho de Villela e Suzigan p 115 314316 Ainda sobre a Caixa consultar também Normano 1939 p 242243 47 Os índices de Simonsen estão publicados em seu trabalho 1973 p 26 As críticas de Dean basicamente encontramse no capítulo VI de seu livro Raízes da concentração industrial em São Paulo 161 Em relação aos índices calculados por Simonsen Dean faz suas críticas corretas a primeira se refere à base tomada no ano de 1914 um ano de crise em que os níveis da produção eram baixos podendo assim distorcer os índices dos anos seguintes A segunda crítica se refere ao deflator usado por Simonsen que era um índice do custo de vida tido por inadequado para se deflacionar um índice nominal de produção industrial Criticando vários autores que estudaram a economia brasileira e que aceitaram as conclusões de Simonsen Dean desenvolve ademais uma série de argumentos e de observações Alega primeiramente que a representatividade do Censo de 1907 subestima o valor da produção desse ano o que provoca uma superestimação do crescimento industrial verificado entre 1907 e 1919 Mostra que esse último censo constata a existência de 727 firmas em São Paulo fundadas antes de 1905 Dean 1971 p 101 Admitindo que as empresas não contadas no Censo de 1907 fossem em média de cinco operários e que tivessem uma produtividade igual a das grandes empresas estima que o total para 1907 deveria ser de 1500 empresas 30000 operários e 155 mil contos de produção quando o Censo de 1907 mostrava 326 empresas 24186 operários e 118 mil contos de produção Dean 1971 não demonstra a forma pela qual fez a estimativa da existência de 1500 empresas p 102 Referindose em seguida à interrupção do comércio pela guerra afirma que a importação de bens de capital e de matériasprimas foi muito mais drasticamente reduzida do que a importação de bens de consumo que consistiam principalmente em gêneros alimentícios mostrando com isso possíveis dificuldades da indústria em crescer Vendo entretanto algo positivo no período entende que será despropositado concluir que não houve avanço algum na produção industrial durante os anos de guerra pondera que pouquíssimas fábricas novas se construíram e conclui que os aumentos da produção se deram principalmente por maior número de horas trabalhadas Dean 1971 p 99 104 Preocupado finalmente com a questão de mercado adicional para que a indústria aumentasse a produção entende que o desafio a que Wilson Cano 162 foi submetida a indústria parece haver consistido muito mais na manutenção do equipamento e da produção e muito menos na expansão de mercados compradores Faz essa afirmação depois de mostrar que entre 19091913 e 19141918 as importações de tecidos de algodão sofreram queda de 62 e os produtos químicos e farmacêuticos queda de 43 Mostra que essa mesma espécie de aumento da produção por maior quantidade de horas trabalhadas parece anômala uma vez que houve declínio das exportações de café de 1915 a 1918 Aparentemente se contradizendo diz A fabricação nacional não se aparelhou para satisfazer a um mercado interno faminto ao invés disto quase toda a nova capacidade de produção e a maior parte da produção aumentada ocorreram em setores da indústria que estavam desviando seu produto para a exportação Usa de argumentos semelhantes a respeito das exportações de produtos agrícolas algumas na realidade eram subtraídas da provisão destinada às massas urbanas e não resultavam de maneira alguma de um aumento de produção Em seguida comenta os aumentos de exportações de carne cereais açúcar etc mostrando que exigiam a instalação de novas usinas E conclui Outra espécie de mercado novo foi explorado pela indústria paulista o do Rio de Janeiro e da sua hinterlândia Dean 1971 p 99 104106 No que se refere à argumentação do primeiro ponto levantado cabe de início dizer que Dean está certo quanto às suas críticas do uso da base de 1914 ano de crise e do deflator usado por Simonsen Quanto ao problema do anobase Dean sugere que se deveria tomar o ano de 1913 ou o período de 1910 a 1913 Lamentavelmente não disponho de informações sobre a produção física para vários produtos e para vários anos mas apenas para todos os anos de 1912 a 1920 de dados sobre a produção têxtil de algodão lã e juta A produção de tecidos de seda só é conhecida para anos isolados e embora entre 1915 e 1920 cresça quase sete vezes não influiria acentuadamente um índice de produção física têxtil dado o seu peso menor na produção Efetivamente a produção de tecidos de algodão em 1914 é 17 inferior à de 1913 a de tecidos de lã entretanto é 17 maior e a de juta é 66 menor Tabela 17 Tabela 17 Índices de crescimento físico da produção industrial 1914 100 Anos Tec algodão Tec de lã Tec de juta São PauloBrasil Val Real Prod Ind Tot SPBR do val total da São Paulo Resto do país São Paulo Resto do país São Paulo Resto do país Tec algodão Tec lã Tec juta São Paulo Resto do país prod ind 1905 52 84 151 1907 59 105 67 60 254 289 138 307 547 159 1912 120 129 67 113 199 175 210 190 610 1913 117 124 83 133 166 137 213 200 626 1914 100 100 100 100 100 100 223 286 580 100 100 307 1915 173 143 100 87 236 128 258 316 717 119 118 312 1916 192 139 183 113 223 111 284 393 735 145 138 316 1917 229 159 217 153 301 169 293 361 710 206 193 324 1918 210 142 250 133 293 51 298 429 887 181 167 325 1919 250 168 217 240 65 90 300 265 497 226 201 330 1920 266 164 267 107 179 286 318 500 463 206 180 335 Fontes Anuário Estatístico do Brasil 193940 Simonsen 1973 p 26 Boletim da Diretoria de Ind E Com de São Paulo n 9 p 1927 1927 Para 1907 cálculos com base no censo daquele ano Para 1905 Brasil Stein 1957 p 191 Nota Tecidos índices da produção física Produção industrial índices e valores calculados por Roberto C Simonsen o uso destes últimos índices tem mais um sentido comparativo interregional do que propriamente para evolução na produção face ao problema dos deflatores usados por Simonsen Grande parte da queda de produção nesses anos se deve às baixas safras cafeeiras assim como a elevada produção de 1917 e 1918 possivelmente se deva ao fato de que se previam grandes safras que entretanto não vingaram graças à geada de 1918 Raízes da concentração industrial em São Paulo 163 Wilson Cano 164 Considerandose que essas três atividades eram responsáveis por quase 100 da produção têxtil paulista em 1907 e que em 1921 só a produção de tecidos de algodão perfazia quase 90 do total têxtil as indicações sobre seus níveis de produção durante os anos de guerra confirmam a evolução da indústria têxtil no período que em 1919 perfazia 30 da produção industrial de São Paulo Se bem que os níveis de 1914 fossem mais baixos do que os de 1913 não é menos verdade que em 1918 tomandose 1914 como igual a 100 os índices da produção física de tecidos de algodão lã e juta situavamse respectivamente nos níveis 210 250 e 293 mudada a base para 1913 como sugere Dean em 1918 eles continuariam altos com os valores de 179 301 e 176 respectivamente ver Tabela 17 A conclusão que se pode tirar desses números é que efetivamente houve um substancial crescimento dessa produção durante a guerra e portanto que pelo menos 30 da indústria paulista entre 1913 e 1918 teve um crescimento que merece a mesma qualificação Tratando da mesma questão Fishlow construiu um índice de crescimento industrial para o Brasil que representa apenas 60 do valor adicionado em 1919 como o autor esclarece e concluiu que a taxa média anual de crescimento industrial entre 19111913 e 1919 teria sido de 44 e o mesmo cálculo para 1914 a 1918 dá como resultado uma taxa anual de 85 Fishlow 1972 p 1820 Fishlow mostra inclusive que a ênfase dada por Dean às exportações adicionais como as maiores responsáveis pelo crescimento verificado não foi assim tão grande para o Brasil e estima que os acréscimos de exportações de produtos industriais teria sido responsável no máximo por apenas 20 do crescimento industrial Não tenho dúvida em afirmar que as taxas médias anuais de crescimento industrial em São Paulo foram significativamente maiores em relação ao crescimento do resto do país48 Para isso aliás basta se verificar que os valores da produção industrial de São Paulo crescem em termos nominais segundo as cifras estimadas por Simonsen mais do que 48 Mais adiante neste capítulo apresento estimativas para essas taxas de crescimento Ver também o Apêndice Estatístico Raízes da concentração industrial em São Paulo 165 os valores para o Brasil e a participação da indústria paulista no total da brasileira passa de 307 em 1914 ela havia sido de 159 em 1907 para 335 em 1920 No que se refere ao deflator do custo de vida utilizado por Simonsen para o cálculo do valor real da produção industrial não há qualquer dúvida insisto de que ele realmente é inadequado Mas se ele é inadequado para se deflacionar todo o valor da produção industrial pelo menos pode servir de indicador do teto em que os custos da mãode obra podem crescer na hipótese certamente rara nesse período de que a taxa de salários seja reajustada ao nível do índice do custo de vida Embora Dean não tenha se referido a uma possível contração dos custos de mãodeobra ele diz em seu livro que surgiram inúmeros problemas nas relações trabalhocapital durante a guerra principalmente no que se refere a reivindicações trabalhistas por aumentos de salários de acordo com o aumento do custo de vida dia de oito horas de trabalho e proibição do trabalho aos domingos pagamento à vista solicitações essas feitas no transcorrer de várias greves Dean 1971 p 174175 Fishlow 1972 observou corretamente o seguinte Nem os salários nem o preço do algodão acompanharam a ascensão dos preços dos produtos têxteis Grandes lucros em 1916 e 1917 foram uma conseqüência p 1949 Dean vendo que os preços de exportação do algodão subiram de 900 mil réis para 3700 mil réis entre 1914 e 1918 inferiu que os custos industriais tivessem subido muito agravados ainda pelo fato de que Até o algodão local foi desviado pela procura ultramarina Dean 1971 p 102103 Parece não ter examinado o fato de que as exportações brasileiras de algodão que vinham se recuperando antes da guerra atingindo 37000 toneladas em 1913 e 30 000 em 1914 caem abruptamente 49 Mais adiante ver Tabela 19 retomo a discussão dos salários durante a primeira guerra mostrando a queda do salário real nesse período Por exemplo entre 1914 e 1918 enquanto os preços de fábrica dos tecidos de algodão aumentavam em 122 e o custo de vida em 44 os salários para o trato do cafezal aumentavam apenas em 11 o de alguns ferroviários em cerca de 15 e o dos operários industriais em 30 após terem sofrido compressão ainda maior no período 19131917 no salário real No Apêndice Estatístico incluo séries de preços e salários entre 1913 e 1934 Wilson Cano 166 para a média de 3650 toneladas durante os anos de 1915 a 1918 mantendose ainda baixas em 1919 quando somam 12000 toneladas Como se viu no Capítulo 1 o complexo cafeeiro havia expandido a produção algodoeira cuja média de 3400 toneladas em 19141915 passa para 9 200 em 19161917 para 13 900 em 1918 e para 49 600 em 1919 Ao mesmo tempo as exportações paulistas de algodão em 1914 atingem 6 632 quilos em 1915 caem para 266 quilos só atingindo uma cifra expressiva em 1919 quando totalizam 6003 toneladas Decorrem duas conclusões primeiro a de que a economia paulista teve condições para responder aos desafios de guerra ativando ainda mais sua agricultura produtora de matériasprimas segundo que o próprio decréscimo das exportações brasileiras deuse paralelamente com a expansão da produção que no resto do país passa de 53700 toneladas em 1917 para 76500 toneladas em 1918 e para 90400 toneladas em 1919 ampliando assim a oferta de algodão ao mesmo tempo em que as exportações estavam restritas50 É provável que o aumento do preço para o mercado interno se deu em proporção menor do que o aumento do preço externo como aconteceu com o açúcar que entre 1914 e 1918 teve o preço de exportação aumentado em 310 e as cotações médias no mercado atacadista do Rio de janeiro apresentam altas de 160 para o cristal branco de 150 para o cristal amarelo e de 130 para o mascavo51 Esse desnível de preços ocorreu quando as exportações de açúcar aumentavam de 31000 toneladas em 1914 para 116000 toneladas em 1918 Tudo leva a crer 50 Curiosamente o próprio Dean 1971 p 144 lembra que as exportações brasileiras de algodão durante a guerra foram proibidas pelo governo Além das proibições obviamente a situação da guerra provocou sérios transtornos nos transportes marítimos afetando também as exportações de café que são reduzidas em 19171918 como relata Delfim Netto 1966 p 9196 Os dados estatísticos foram obtidos nas seguintes fontes exportações brasileiras Anuário Estatístico do Brasil 193940 p 1377 produção paulista ver Tabela 6 produção brasileira Roberto Simonsen 1973 p 272 exportações paulistas Anuário Estatístico do Estado de São Paulo 1915 a 1920 51 Conforme Anuário Estatístico do Brasil 193940 p 1375 1382 No mesmo período as cotações no mercado atacadista de São Paulo mostravam aumentos que oscilavam entre 71 e 173 se tomada a base de 1912 essa alta 19121918 seria ainda menor situandose entre 25 e 118 Conforme Boletim da Diretoria de Indústria e Comércio São Paulo p 125 jan 1927 Raízes da concentração industrial em São Paulo 167 assim que os preços do algodão para o mercado interno não tenham subido na mesma proporção de seus preços de exportação Embora este problema do deflator não tenha aparentemente solução uma vez que até o momento os existentes para o período são todos inadequados ainda mais inadequada é a crítica que Dean faz a Simonsen tentando mostrar com o aumento de 130 nos preços dos tecidos de algodão entre 1914 e 1917 que o deflator de Simonsen que para esse período acusa aumento de 283 está muito subestimado e que referindose à produção têxtil o deflacionamento deveria ser feito usandose o aumento de 130 Em primeiro lugar Simonsen não deflacionou a produção têxtil e sim a produção total da indústria e em segundo lugar os preços dos tecidos de algodão parecem ter subido muito mais do que a média dos preços do período entre 1914 e 1917 o custo de vida calculado por Oliver Onody acusa um aumento inferior ao utilizado por Simonsen 22 contra 28 bastante inferior aos dos tecidos de algodão importados do exterior 92 e ao do preço médio implícito da produção paulista desses tecidos que aumenta de 130 Tomado o período de 1915 a 1920 os desníveis são ainda mais acentuados o utilizado por Simonsen acusa um aumento de 51 o de Onody aumenta em 50 o dos tecidos de algodão importados aumentam em 120 e o dos produzidos em São Paulo crescem de 241 Para verificar esse problema deduzi da produção industrial total a produção têxtil algodoeira para a qual se conhecem dados de quantidades físicas e de preços esse restante da produção industrial parece ter sido menos afetado pela crise de 19131914 pois seu valor que em 1910 era de 150 mil contos atinge 259 mil contos em 1914 e certamente parte desse valor estava inflado pela alta de preços que se manifesta já a partir de meados de 1914 A produção têxtil algodoeira cujo volume físico cresce de 1910 a 1913 apresenta um valor de produção de 387 mil contos em 1910 e de 350 mil contos em 1914 evidenciando queda de preços em 1914 que se prolonga até 1915 equivalente a 32 dos preços implícitos de 1910 e a produção física sendo 74 menor do que a de 1910 fazendo então o valor da produção cair em 10 Wilson Cano 168 Como os preços implícitos de tecidos de algodão caem entre 1914 e 1915 cerca de 2 enquanto a economia ingressa num período inflacionário as cotações de alguns gêneros alimentícios no comércio atacadista do Rio de janeiro apresentam altas significativas para vários produtos entre 1914 e 1915 é possível pensar na hipótese verossímil de que passada a crise e ampliados os estímulos da guerra os preços de têxteis de algodão subissem mais que proporcionalmente aos demais preços entre 1914 e 1918 ou 1919 como efetivamente parece que aconteceu O teste simples que fiz foi deflacionar o restante da produção industrial pelo deflator implícito da produção têxtil algodoeira e os resultados obtidos são verdadeiramente absurdos uma vez que o crescimento real desse agregado total menos têxteis de algodão é igual a zero entre 1914 e 1917 e negativo 20 entre 1914 e 1920 Parece claro portanto que se o deflator usado por Simonsen peca por escassez a comparação feita por Dean peca por excesso Tomado o período de 1915 a 1920 onde a produção física de vários produtos cresce esse método dá um resultado ainda mais espantoso o crescimento é também negativo 38 No que se refere à baixa representatividade do Censo de 1907 a crítica de Dean é pertinente Porém creio que novamente ele pecou por excesso Ficou demonstrado mais acima que a tendência do crescimento da produção industrial na primeira década apresentava condições mais favoráveis entre 1907 e 1910 do que entre 1905 e 1907 parecendo portanto quer pelos indicadores da produção têxtil quer pelo das importações de máquinas para a indústria e agricultura que o crescimento de 19071910 foi mais acelerado do que o verificado entre 19051907 Dean estimou um novo total para a produção de 1907 em 155 mil contos e estimei outro de 1286 mil contos ambos portanto acima do valor apontado pelo censo 1181 mil contos Deduzi desses três valores o total da produção de tecidos de algodão encontrando assim três outros para o restante da produção industrial e em seguida calculei as taxas de crescimento total entre esses períodos como se pode ver a seguir Raízes da concentração industrial em São Paulo 169 Crescimento nominal total nos períodos 1905 a 1907 1907 a 1910 1905 a 1910 I tecidos de algodão 142 720 965 IIa restante da indústria base censo 59 572 665 IIb restante da indústria minha estimativa 175 417 665 IIc restante da indústria estimativa Dean 412 179 665 Como se nota acima as estimativas de Dean invertem a tendência do crescimento industrial o restante da indústria desacelera o crescimento enquanto os tecidos de algodão aceleram a sua expansão Pareceme que deste ponto de vista o da tendência do crescimento as estimativas de Dean para 1907 lançaram muito acima o presumível valor desse ano Foram dois os motivos que me levaram à elaboração dessa estimativa o primeiro se refere à taxa possível de sobrevivência das empresas fundadas até 1904 e existentes em 1919 o segundo se refere à produtividade média por operário valor bruto da produção por operário Verifiquei que os 727 estabelecimentos apontados por Dean como existentes em São Paulo se relacionados com a sua estimativa de 1500 estabelecimentos que possivelmente existiriam em 1907 dá uma porcentagem de 48 Fiz cálculo semelhante para o resto do Brasil e vi que aquela cifra seria de 65 e comparando ainda os censos de 1939 e de 1949 verifiquei que as taxas de sobrevivência das empresas fundadas entre 1920 e 1929 e as fundadas entre 1930 e 1939 apresentavam para São Paulo e para o resto do país 603 e 605 para as primeiras e 451 e 456 para as da década de 1930 Dessa forma aplicando aquela taxa de 65 do resto do país em 1919 às 727 sobreviventes 72706525 encontrei o número de 1114 estabelecimentos que seria o provável universo de 1907 No que se refere à produtividade média Dean concluía que a das pequenas empresas seria equivalente à das maiores Fiz os cálculos necessários e possíveis para o Censo de 1907 e verifiquei que havia um acentuado desnível entre os diferentes tamanhos de estabelecimento mostrando claramente que o método empregado por Dean também neste caso pecava Wilson Cano 170 por excesso52 Utilizei assim o conceito de produção média por estabelecimento e não o de produtividade Em seguida mesmo reconhecendo que o método é precário verifiquei que o peso do valor da produção de tecidos de algodão em relação ao valor total da produção industrial apresentava uma nítida tendência crescente 01786 em 1905 01905 em 1907 e 02044 em 1910 Verifiquei então que a estimativa de Dean 155000 contos dava como resultado um peso de 01452 para os tecidos de algodão em 1907 o que contrariava a tendência e fiz a hipótese de que esse coeficiente para 1907 se a indústria restante não estivesse subestimada fosse de 01786 como o de 1905 O resultado foi um valor de produção total de 125980 contos que excedia o valor do censo em 7893 contos Dividi esse valor pela produção média dos estabelecimentos que em 1907 tinham até três operários e obtive como resultado um acréscimo de 593 estabelecimentos não computados no censo Como os estabelecimentos faltantes seriam possivelmente 788 ou seja 1114 menos os recenseados multipliquei os 788 estabelecimentos pela produção média já apontada 133 contos por estabelecimento de até três operários e obtive então um valor extra de 10480 contos muito abaixo dos 36913 encontrados por Dean Notese que minha estimativa faz com que o total da produção dos estabelecimentos que ocupavam em 1907 até cinco operários 10480 contos não recenseados mais 1752 52 Poderia parecer estranho tomarse a taxa de sobrevivência estimada para o resto do país entre os censos de 1907 e de 1919 e considerála semelhante à de São Paulo dado que estou adotando essa hipótese em função das taxas de sobrevivência observadas entre os censos de 1939 e de 1949 As observações entre os censos de 1919 e de 1939 mostram disparidades acentuadas para São Paulo e Guanabara em relação ao resto do país e isto possivelmente pode ser decorrência dos efeitos mais agudos que a crise dos anos de 1930 provoca nesses dois Estados As taxas de sobrevivência entre os censos de 1919 e 1939 foram as seguintes SP GB resto do país estabelecimentos fundados até 1901 0275 0328 0380 idem entre 1910 e 1919 0182 0133 0280 É natural que se deva ainda salientar o fato de que essas taxas são sempre menores para os estabelecimentos fundados em períodos de crise aguda ou de guerra do que em períodos normais Raízes da concentração industrial em São Paulo 171 contos computados no censo perfaz agora 95 da produção total reestimada 128567 contos porcentagem essa ainda bastante elevada em relação à estrutura industrial brasileira anterior a 193053 Por outro lado o valor da produção de tecidos de algodão dada a nova estimativa para o total apresenta um coeficiente muito próximo ao do utilizado 0175 espelhando mais fielmente a tendência do crescimento entre 1905 e 1907 Observese ainda que o valor imputado por Dean aos pequenos estabelecimentos faltantes e mais o valor existente no censo daria um total de 25 da produção industrial a esses estabelecimentos o que também é um excesso Já me referi às diferentes situações de aumento de capacidade produtiva e de produção Lembremos ainda que as importações de equipamentos industriais que a economia paulista faz após 1904 têm uma aceleração que é marcante até 1913 Mesmo as do ano de 1914 são ainda expressivas para o conjunto da economia muito embora as importações de equipamentos para a indústria têxtil em 1914 tenham sido equivalentes apenas a 20 do total de 1913 parecendo ter sido um dos setores que mais restringiu suas importações de bens de capital desde o início da guerra A evolução dessas importações pode ser vista a seguir54 53 Adotei a produção média dos estabelecimentos de até 3 operários pelo fato de que no Censo de 1907 na classe que vai de zero a cinco operários é baixa a representatividade dos estabelecimentos de zero a um operário e o de quatro a cinco operários como a frequência dos estabelecimentos de 2 e de 3 operários é maior essa média que contém mais estabelecimentos de 2 e de 3 operários do que de zero e de um estaria mais próxima do ponto médio da classe de zero a cinco operários Por outro lado é óbvio que a maior falta de abrangência do Censo de 1907 certamente estaria nessa última classe onde predominam as empresas de menor tamanho e que não utilizam energia elétrica No Censo de 1919 por exemplo a classe de zero a quatro operários continha 2376 estabelecimentos que perfaziam 573 do total de estabelecimentos industriais de São Paulo 54 As importações de máquinas e equipamentos para a indústria e a agricultura em 1912 totalizaram 40547 toneladas e 32000 contos eram 220 superiores às observadas na média do período 19071909 Em 1913 essas importações atingiam o valor de 33000 contos e em 1914 alcançavam 13389 contos Os níveis observados em 19121913 parecem ter sido os mais elevados de todo o período anterior a 1930 salvo do ano de 1925 que é o ponto mais alto da série Conforme Anuário Estatístico do Estado de São Paulo vários anos Wilson Cano 172 Importações de equipamentos para a indústria têxtil de S Paulo 1 toneladas Anos Máquinas não especificadas Teares Acessórios 1913 3563 271 476 1914 616 11 151 1915 605 86 170 1916 966 93 269 1917 406 120 260 1918 987 165 316 1919 762 301 229 1920 1016 182 405 1 As séries dessas importações para São Paulo e para o Brasil encontramse no Apêndice Estatístico Aparentemente essas importações foram drasticamente reduzidas A série para anos anteriores a 1913 lamentavelmente não é disponível porém as séries posteriores ver apêndice estatístico mostram claramente que os altos níveis dessas importações de 1913 só foram superados em 1925 e 1938 tomandose o período 19131940 Para o resto do país as importações equivalentes só foram superadas em 1925 tomandose o mesmo período Os dados abaixo sobre a expansão da capacidade produtiva instalada no período mostram claramente que o aumento verificado na produção têxtil algodoeira não foi obtido apenas por aumento de horas trabalhadas Tabela 18 Expansão da indústria têxtil algodoeira paulista Índice da expansão da capacidade produtiva instalada Nas fiações Nas tecelagens Índice do aumento do número de operários Índice do aumento da produção de tecidos de algodão IV II IV III Anos I II III IV 1910 100 100 100 100 100 100 1915 148 141 134 160 114 119 1616 180 164 158 178 109 113 1917 188 171 170 211 124 124 1920 229 189 201 246 130 122 Fonte Apêndice Estatístico Tabela 18 Expansão da indústria têxtil algodoeira paulista Raízes da concentração industrial em São Paulo 173 Supondose que a indústria operasse em 1910 a um nível normal de horas trabalhadas e que as novas máquinas instaladas entre esse ano e 1920 tivessem a mesma eficiência e produtividade o aumento de horas extras trabalhadas teria sido próximo aos resultados das duas últimas colunas do quadro acima Entretanto essas máquinas que incrementam a capacidade instalada seriam mais novas embora possivelmente com o mesmo nível técnico do que o parque de 1910 o que permitiria um certo aumento de eficiência e de produção por máquina Podese ainda considerar o fato de que o impressionante aumento do emprego coluna III é bastante compatível com a expansão do parque de máquinas fazendo isso crer que o aumento de horas extras estaria possivelmente mais bem refletido pelos dados da última coluna se mantida constante a produtividade do trabalhador Finalmente os aumentos observados entre 1917 e 1920 poderiam ser parcialmente atenuados face a que 1918 tem produção inferior à de 1917 e que os aumentos da produção em 1919 e em 1920 teriam sido facilitados em parte pela instalação de máquinas já construídas no imediato pósguerra como talvez seja lícito se inferir dos dados ver mais acima sobre as importações de máquinas têxteis Teria ocorrido um sobreinvestimento no imediato pósguerra É certo que sim e se considerarmos a crise de 19131914 é também possível se pensar que parte dos equipamentos importados nesse ano somente entraram efetivamente em operação em anos posteriores principalmente a partir de 1915 Qualquer que seja a hipótese correta entretanto a indústria parece não ter sofrido muito o problema eventual de uma falta de equipamentos durante a guerra Outro ponto deve ser acrescentado no tocante às importações de bens de capital ferro e aço e cimento Com o agravamento das restrições às importações e da crise o setor naturalmente mais atingido é sempre o da construção civil que pode ficar bloqueado durante quatro ou cinco anos sem que isso cause um transtorno muito grande ao problema de moradias e de vias públicas E isto ocorreu durante esse período como mostra Roberto C Simonsen55 O número de construções na cidade de São 55 Ver em seu citado trabalho 1973 p 403405 Para dados mais específicos ver o trabalho de Caldeira 1939 Wilson Cano 174 Paulo em relação aos níveis de 1913 sofre queda em 1914 de cerca de 40 caindo em 1915 para 20 do nível de 1913 caindo mais ainda entre 1916 e 1919 quando se reduz a níveis mais inferiores essa depressão como mostra aquele autor foi ainda mais drástica em termos relativos do que a verificada na construção civil durante a crise da década de 1930 É óbvio que em tal depressão vários produtos e matériasprimas utilizados pela construção civil são passíveis de serem usados na atividade industrial como o ferro e o aço cuja produção interna pode eventualmente ser convertida para tipos apropriados à metalurgia As próprias séries de importações de produtos de ferro e aço e de máquinas podem encobrir uma drástica redução daqueles produtos antes destinados à construção civil e uma redução menor dos produtos destinados à produção industrial Quanto à alegação de Dean de que poucas fábricas teriam sido construídas durante a guerra reafirmo parte das críticas que Sérgio S Silva lhe fez mostrando que para o conjunto do Brasil o capital empregado pelas indústrias criadas no período 19151919 totalizava 242 do capital industrial recenseado em 1919 representados por 5936 novos estabelecimentos criados entre 1915 e 1919 e em São Paulo 323 novas empresas foram criadas entre 1915 e 1917 e neste mesmo período o setor têxtil algodoeiro passava de 41 para 46 fábricas cujos operários aumentaram de 18 mil para 23 mil56 Curiosamente Dean escreve na seguinte passagem de seu livro que O metal usado ou seja a sucata pode ser retrabalhado e as fundições requeriam apenas um equipamento simplíssimo para entrar em ação Abriramse portanto numerosas oficinas metalúrgicas que faziam peças de máquinas e máquinas inteiras de ferro fundido para a agricultura e outras finalidades Afirmando em seguida que a maioria delas fechou assim que terminou a guerra ele diz mais adiante que nem todas desapareceram quando a guerra se acabou Dean 1971 p 106107 Por último cabe lembrar que uma economia que sofre restrições do tipo das surgidas com a guerra gera tensões e estímulos internos que 56 Ver o citado trabalho de Sérgio S Silva 1973 p 101104 O próprio Censo de 1920 mostra que em São Paulo foram fundados 1867 estabelecimentos entre 1915 e 1919 Raízes da concentração industrial em São Paulo 175 podem ensejar algumas transformações É exatamente durante a guerra que surgem alguns passos de iniciativas importantes para a instalação siderúrgica no país A própria produção nacional de ferro gusa embora em quantidade relativamente pequena expandese durante a guerra passando de 4267 toneladas em 1916 para 11748 em 1918 atingindo 14056 em 1920 quando então perfazia 67 do consumo nacional como mostra Baer 1970 p 7987 Creio já ter respondido nas páginas anteriores os argumentos apontados por Dean referentes ao fato de que a indústria não teria se aparelhado para enfrentar um mercado faminto Restam assim apenas três pontos para serem comentados O primeiro se refere ao suposto fato de que as exportações de produtos agrícolas teriam significado uma subtração ao consumo interno No Capítulo 1 ver Tabela 6 mostrei o extraordinário crescimento da produção agrícola paulista e aqui me limito apenas a lembrar que por exemplo as produções de arroz feijão e milho entre outras haviam mais que duplicado seus níveis de produção anteriores à guerra o arroz passa de 80000 para 350000 toneladas entre 19131914 e 1920 Esse aumento de produção foi plenamente suficiente para suportar as crescentes exportações que ocorrem durante a guerra Mesmo no caso da batata cuja produção cresce 23 as exportações apenas superam ligeiramente o acréscimo da produção Quanto às exportações de carne não se pode propriamente falar em desvio da produção para as exportações uma vez que a capacidade produtiva que se instala no início da guerra frigoríficos teve como objetivo específico o atendimento do mercado exterior e não o interior57 Mais uma questão pode ainda ser colocada ao fato relatado por Dean de que as importações de alimentos entre os períodos de 19091913 e 19141918 sofrem uma diminuição de 65000 toneladas aproxima damente 6 do total Consultando essas estatísticas verifiquei que as 57 Essas exportações praticamente se iniciam em 1914 atingindo no ano seguinte 8 200 toneladas Atingem a média de 30 900 toneladas em 19181920 32600 toneladas na média de 19211924 21900 na média de 19251928 e 46400 na média de 19291930 Conforme Comércio Exterior pelo Porto de Santos São Paulo vários anos Wilson Cano 176 reduções nas importações de vinhos europeus foram responsáveis por 85 daquela redução ficando portanto claro que as reduções se deram em produtos não essenciais Dean 1971 p 98 O que ocorreu nesse período daí as suspeitas de Dean foram os aumentos de preços que decorrem tanto da especulação comercial como também das próprias pressões inflacionárias que existiam no período posterior a 1914 Outro fator que deve ser levado em conta nesta crítica é que as pressões demográficas diminuíram no período 19141920 tanto pela sensível diminuição dos fluxos imigratórios quanto pela passageira queda do coeficiente de natalidade observado na cidade de São Paulo durante a guerra58 Essa diminuição da entrada líquida de imigrantes pode ser entendida como um fator que restringe a possibilidade de um aumento mais amplo na oferta de trabalhadores ao mesmo tempo em que a demanda por novos trabalhadores crescia vigorosamente para atender à expansão da indústria e da agricultura exclusive café paulista Essa contradição poderia ter gerado pressões altistas no sentido de que se elevasse a taxa de salário real Mas por outro lado cabe lembrar que nesse mesmo período tanto por causa de pressões inflacionárias como pelos efeitos decorrentes da guerra os preços dos bens e serviços que incidem no custo de vida passam a crescer fortemente deteriorando de forma acentuada a taxa de salário real Em que pese a limitação dos dados sobre os salários urbanos do operariado constantes na Tabela 19 a amplitude do levantamento ver nota explicativa na tabela permite que se acredite nesta conclusão59 58 Por exemplo entre 1908 e 1914 o saldo líquido migratório para São Paulo foi de 212000 pessoas enquanto que para o período de 19141919 esse saldo foi apenas de 36000 pessoas mesma fonte na nota 190 A questão referente à diminuição da natalidade pode ser verificada no trabalho de Ubirajara D Mendes 1942 que mostra claramente que o aumento populacional da cidade de São Paulo entre 19141920 foi inferior ao verificado entre 19081914 59 Como se vê na Tabela 19 a classe patronal agiu de forma antagônica a essas forças só reajustando os salários ao final da guerra Essa deterioração dos salários reais poderia ter sido forte motivação para o desencadeamento dos conhecidos movimentos grevistas que ocorrem no período Por exemplo JS Martins 1967 relata o fato de que 40 das greves ocorridas no Estado de São Paulo entre 19161920 ocorreram na Capital de 61 greves observadas 16 tiveram como motivação principal a questão dos salários entre 19111920 Ver também neste capítulo as notas 49 e 58 Raízes da concentração industrial em São Paulo 177 Não pretendo afirmar com isso que tenha ocorrido um encolhimento do mercado para bens de consumo corrente Na verdade a expansão do emprego urbano e rural deve ter compensado essa queda de salários reais ampliando ainda que modestamente a massa total de salários Tabela 19 Alguns indicadores de preços e salários no estado de São Paulo a Anos A Gêneros alimentícios B Aluguel de casa C Salários rurais D Salários de oper industr E Salários de ferroviá rios F Tecidos de algodão preço de fabr G DA H DF 1913 95 94 105 100 105 105 95 1914 100 100 100 100 100 100 100 100 1915 117 107 95 75 101 98 64 77 1916 119 113 97 86 101 147 72 59 1917 132 119 94 86 104 232 65 37 1918 148 125 102 130 122 222 88 59 1919 146 138 107 160 119 342 110 47 Fontes F Apêndice Estatístico A a E Cardim 1936 a Embora o método de cálculo dos salários utilizado por Cardim tenha sido precário índices de médias simples as tabelas contidas no texto citado confirmam uma tendência de estancamento ou queda dos salários na maior parte das 27 categorias profissionais arroladas O segundo ponto da argumentação diz respeito ao problema do mercado Dean pensa não ter havido expansão dos mercados compradores e que o declínio das exportações de café teriam agravado esse problema Inicialmente é preciso esclarecer que as exportações de café declinam apenas em 1917 e 1918 tendo apresentado alto nível em 1919 e em 19151916 após a queda verificada em 1914 Entretanto as exportações paulistas para o resto do país de manufaturados e de produtos agrícolas mais do que compensam a queda das exportações do café a qual apresentava um resultado médio anual em 19171918 reduzido de aproximadamente 150000 contos se comparado com os níveis da média de 19151916 enquanto que as demais exportações apresentavam um resultado médio anual acrescido de 255000 contos Por si só este fato demonstra claramente que houve expansão do mercado interno paulista pelo menos o induzido pelas exportações Mas Dean parece ter esquecido também que além desse crescimento induzido o próprio aumento da produção industrial gera também efeitos expansionistas diretos para o mercado tanto industrial como agrícola Wilson Cano 178 O terceiro ponto vinculado ao anterior diz respeito às exportações de produtos industrializados De início cabe apontar que o exterior não foi um mercado significativo para a indústria de São Paulo nem antes nem durante e nem após a guerra Praticamente as únicas exportações de peso foram as de carnes resfriadas ou congeladas e seu valor equivalia aproximadamente de 4 a 5 do valor da produção industrial paulista Os demais produtos industrializados exportados para o exterior atingiram em média 15 do valor da produção industrial no período 19141918 Dean comete mais um equívoco neste ponto ao afirmar que Os mercados da Argentina e da África do Sul dependiam totalmente da Europa no tocante ao fornecimento de tecidos e São Paulo os supriu enquanto durou a guerra 1971 p 105 grifo meu Ora as exportações de tecidos de algodão para o exterior durante a guerra embora tenham sido maiores do que antes da guerra foram muito pequenas e essas exportações paulistas atingiram seu ponto máximo em 1919 quando totalizam aproximadamente 100 toneladas o que representava algo em torno de 03 da produção paulista de tecidos de algodão e essas exportações mal dariam para suprir um mercado de uma cidade de um porte médio de 30 000 habitantes durante um ano O que na realidade ocorre com os tecidos de algodão tomados os períodos 19101913 e 1916 1919 é que as importações brasileiras desse produto e também as paulistas sofrem redução de 67 enquanto a produção nacional aumenta em 60 e a paulista em 90 suprindo isto sim esses novos mercados de São Paulo e do resto do país este parcialmente No que se refere às exportações de produtos industrializados para o resto do país elas foram realmente significativas e representaram as seguintes porcentagens em relação ao valor bruto da produção industrial em São Paulo 1914 227 1918 315 1915 311 1919 237 1916 298 1920 242 1917 395 Raízes da concentração industrial em São Paulo 179 Os dados acima poderiam levar a crer que o aumento dessas exportações teriam proporcionado um desvio do consumo interno de São Paulo para o resto do país Construí a Tabela 20 para testar essa suposição Embora a proporção entre os aumentos das exportações e os da produção industrial seja bastante alta nos anos de 1915 e 1917 parece que não se pode falar em subtração ao consumo interno uma vez que os acréscimos da produção são sempre maiores do que os acréscimos das exportações Por outro lado devese ainda lembrar que as exportações são mensuradas por níveis de preços distintos dos preços fobfábrica tipicamente industriais Tabela 20 São Paulo exportações de produtos industrializados para o exterior e resto do país mil contos Anos Exportações A Produção industrial B BA A B Variações anuais absolutas 1914 646 2937 2291 1915 1212 3793 1581 566 856 1916 1712 4966 3254 500 1173 1917 3490 7782 4292 1778 2816 1918 3058 7704 4646 432 78 1919 2782 9891 7079 276 2157 1920 2798 9878 7080 16 17 Fontes Exportações Anuário Estatístico do Estado de São Paulo vários anos Produção Simonsen 1973 Os preços de exportação quando não subsidiados são sempre maiores do que os preços de produção e esse fator superestima o peso real das exportações sobre a produção industrial Por exemplo as exportações de tecidos de algodão durante esse período apresentam proporções elevadíssimas em relação ao valor da produção 66 em 1915 1916 e 86 em 1917 e mesmo que se considere o valor das exportações não em relação à produção mas sim à produção mais as importações ainda assim em 1917 essa relação é de 79 o que sem dúvida constitui cifra muito elevada Ainda que se descontasse do valor dessas exportações uma taxa de comercialização em torno de 30 as cifras para 1917 continuariam muito altas e se efetivamente os registros oficiais estão Wilson Cano 180 certos em 1917 teria ocorrido uma grande liquidação de estoques nas fábricas e no comércio atacadista que poderiam ser em parte recompostos pelos altos níveis da produção de 1919 Qualquer que seja a comparação que se faça entretanto a argumentação de Dean sobre a restrição ao consumo interno encontraria acolhida no caso dos produtos industrializados exclusive a carne apenas em 1917 em que pese repito o fato de não se dispor dos dados sobre as importações paulistas por vias internas as quais se porventura cresceram na mesma intensidade que as importações por cabotagem certamente diminuiriam o provável déficit sugerido por Dean Ainda assim lembro que a produção de tecidos de algodão em 1917 era 129 maior do que a de 1914 e quase o dobro da produção de 1913 em termos físicos e que essas exportações foram responsáveis por um terço das exportações de produtos industrializados entre 1914 e 1919 Um fato adicional pode ainda reforçar mais a hipótese de que não tenha ocorrido desvio do consumo interno paulista Os tecidos de algodão como é sabido foram os produtos cujas exportações mais cresceram no período e descontando as exportações e somando as importações à produção paulista não computando as importações por vias internas que são desconhecidas e que certamente aumentariam a disponibilidade líquida a resultante disponibilidade por habitante seria de cerca de 291 quilos em 19141915 e de cerca de 510 quilos em 1919 1920 ambos níveis elevados se comparados com os de 38 1938 ou de 39 1950 para o Brasil ou mesmo com os 35 quilos para o Brasil em 1919192060 Não aceitando a hipótese de que o mercado interno de São Paulo não tivesse crescido concordo entretanto com Dean de que a tônica imprimida ao crescimento industrial desse período foi dada pelo aumento das exportações para o resto do país fato que fica bastante evidente entre 19171918 com o agravamento da crise cafeeira Podese notar ainda que o crescimento industrial que se dá entre 19181919 não poderia ser causado por qualquer descompressão do consumo mas sim 60 Para 19191920 produção física dividida pelo número de habitantes Para os demais anos ver A demanda de tecidos no Brasil Brasil Têxtil São Paulo p 7 abr 1962 Raízes da concentração industrial em São Paulo 181 fundamentalmente pela extraordinária recuperação das exportações do café que aumentam em 600000 contos atingindo o total de 950000 contos em 1919 No imediato pósguerra a indústria paulista se defrontaria com uma situação problemática que deve ser examinada sob diversos ângulos A forte acumulação de lucros gerados pela expansão da produção durante a guerra reclamava uma imediata transformação em inversões tanto para reposição quanto para crescimento da capacidade produtiva uma vez que certamente essa massa de lucros excederia de muito a simples taxa de reposição Ao mesmo tempo em que a capacidade para importar resultante da guerra e da extraordinária recuperação dos preços do café em 1919 viabilizava a conversão desses lucros em investimentos possibilitava também a retomada dos níveis anteriores das importações de bens de consumo A relação entre importações de bens de capital e o valor bruto dá produção industrial que se apresentava em 19121913 com a alta porcentagem de 98 caía bastante durante a guerra atingindo apenas cerca de 20 recuperandose em 19201921 75 baixando novamente em 19221923 cerca de 4 atingindo novamente níveis elevados entre 19241929 quando foram superiores a 7 em média e chegando a 11 em 1925 ver Apêndice Estatístico As importações de manufaturados exclusive bens de capital que durante a guerra perfaziam cerca de 12 da produção industrial sobem para 285 em 1920 caindo para a média de 15 entre 19211923 quando se contraem os preços do café e se desvaloriza o câmbio permanecendo em média em torno de 26 no período 19241929 36 em 1925 durante o qual se dá a notável expansão dos preços do café e a valorização cambial61 61 O problema da valorização é atenuado em 19271929 com a criação da Caixa de Estabilização em fins de 1926 que funcionava nos moldes da antiga Caixa de Conversão Conforme Villela e Suzigan 1973 p 155 A valorização trouxe ainda como conseqüência negativa a contração do papel moeda em circulação que em 19251926 se reduz de 10 em relação aos níveis de 1924 retomando ao antigo nível em 1927 com a criação da Caixa Wilson Cano 182 Este último período envolve o agravamento da contradição acima apontada cresce a capacidade produtiva industrial mas parte do incremento do nível da renda interna decorrente da expansão cafeeira é absorvida por aumentos nas importações reforçando então o grau de capacidade ociosa No caso da indústria têxtil algodoeira por exemplo o número de fusos e de teares aumentou em 40 entre 1920 e 19271928 ao passo que a produção cresceu apenas em 12 A inflação que vinha desde a guerra e que continua após o seu término corroera o grau efetivo de proteção tarifária fato que combinado com a valorização cambial se traduziu em aumento das importações Mas o efeito direto desse aumento deve ter afetado relativamente mais as outras indústrias do que a têxtil algodoeira seu coeficiente de importações de tecidos que fora de 25 antes da guerra caíra paro 8 entre 19141918 subindo para 11 em 1920 e se situando em cerca de 17 no período 19241928 muito abaixo portanto das demais indústrias o que parece reforçar a hipótese do excesso de capacidade produtiva e de produção e não do excesso de importações sobre os níveis de produção62 O problema da indústria têxtil na realidade é agravado pela tentativa de sobrevivência de sua congênere do resto do país Ambas são afetadas pela retomada das importações e ambas haviam ampliado seus níveis de capacidade produtiva Tomandose 1905 como índice 100 a capacidade de fiação do setor têxtil algodoeiro paulista saltava para 375 em 1921 e a de tecelagem para 377 no restante do país a ampliação fora acentuadamente menor atingindo os índices de 177 para as fiações e de 198 para as tecelagens Stein 1957 p 101 62 Na tentativa de quantificar o efeito do acréscimo das importações de bens de consumo sobre a produção industrial estimei novos níveis de importações compatíveis com um coeficiente importações de bens de consumovalor da produção industrial igual a 01543 que fora observado para a média 19211923 Mantendoo constante no período 19241929 o efetivo foi igual a 0260 não alterando a soma produção mais importações de cada ano dessa série e incorporando à produção as reduções estimadas para as importações O efeito decorrente dessa estimação dá como resultado um novo valor de produção industrial apenas 10 superior aos valores efetivos do período 19241929 mostrando com isso que o aumento das importações não teria afetado os níveis de produção tão gravemente como se tem pensado Como o resto do país teve em média um coeficiente de importações superior ao de São Paulo é evidente que aquele efeito teria sido maior naquela região ver Apêndice Estatístico Raízes da concentração industrial em São Paulo 183 Mesmo se tomarmos como base os elevadíssimos níveis de importações de equipamentos para todo o setor têxtil que se verificaram em 1913 o descompasso entre as duas regiões tornase ainda mais notório a média dessas importações no período 1921 a 1923 equivalia para São Paulo a 84 dos níveis importados em 1913 enquanto que no restante do país os níveis situavamse apenas em 40 Se em 1913 as importações paulistas de equipamentos têxteis equivaliam apenas a 48 das efetuadas pelo restante do país no período 19211923 os volumes importados pelas duas regiões eram praticamente iguais Por outro lado a produção física de tecidos de algodão observada na média do período 19121913 apresentavase em 1922 com um crescimento de 161 para São Paulo e de apenas 32 para o restante do país Obviamente a retomada mais acelerada da inversão têxtil nos anos de 19211923 provocaria para ambas regiões a necessidade de ampliação de seus níveis de produção o que efetivamente se deu em 1923 quando em relação a 1922 a produção de tecidos de algodão no resto do país passa de 409 a 451 milhões de metros e a paulista de 217 a 488 milhões de metros63 Esta última cifra tem sido posta em dúvida pela maioria dos autores que estudaram esse problema e tive o cuidado de examinar as principais publicações da mesma fonte em anos posteriores verificando que não existe nenhuma correção àquele dado Em que pese o fato do número ser surpreendentemente grande e representar um acréscimo de 270 milhões de metros para a produção paulista daquele ano esse incremento poderia ser diluído pelo decréscimo acumulado da produção do resto do país que entre 1924 a 1928 totaliza cerca de 389 milhões de metros uma vez relacionada a variação da produção entre esse período e a média de 1922192364 Mesmo que essa cifra pudesse ser errônea acredito que a verdadeira produção paulista em 1923 deveria ter sido consideravelmente mais alta do que a verificada em 1922 O que reforça minha hipótese é que de um lado a produção paulista observada para a média dos anos de 1924 a 1928 situouse cerca de 10 abaixo dos níveis 63 Os dados foram obtidos das Tabelas 30 46 e 58 64 Lamentavelmente as exportações por vias internas não são conhecidas para esse período As de cabotagem de São Paulo para o resto do país em toneladas apresentam um aumento de 50 se relacionadas a média de 19221929 com a média dos altos níveis observados durante os anos de 19151918 crescem de 31 mil toneladas para 47 mil toneladas Wilson Cano 184 verificados em 1922 Por outro lado se aquele dado fosse totalmente errado e portanto a produção paulista daquele ano tivesse um nível normal de digamos 220230 milhões de metros a pergunta que permaneceria sem solução seria a seguinte por que razão a produção paulista teria permanecido estancada com um nível crescente de seu próprio marcado mesmo se computados as crescentes importações diante do acentuado declínio da produção do resto do país E finalmente porque nessa última região a produção caiu tão fortemente Vejamos em suas linhas gerais o problema enfrentado pela expansão da indústria paulista de bens de consumo corrente durante a década de 1920 De um lado a acumulação de reservas financeiras durante a guerra pelas empresas industriais tanto as de São Paulo como as de outras regiões forçou um decisivo aumento do nível de inversão no que expandiu consideravelmente a capacidade produtiva instalada dessa indústria Isto evidentemente passava a exigir uma expansão equivalente do mercado para que aquela ampliação potencial pudesse se transformar em aumento efetivo da produção Entretanto essa compatibilização não se realizou plenamente Ao mesmo tempo em que a eliminação dos entraves às importações permitia notável aumento da entrada de novos equipamentos propiciava também grande expansão das importações de bens de consumo Estes fatos ocorrem tanto entre 19191920 e mais especificamente durante a valorização cambial de 19241926 Se no primeiro desses períodos a expansão da capacidade produtiva não pode se transformar em parte na expansão efetiva da produção implicando isso portanto num aumento da competição entre as empresas industriais no segundo a valorização cambial precipitou os preços dos bens importados para baixo Este fato associado à deterioração que a inflação vinha causando às tarifas de importação acarretava maior rebaixamento do preço teto Com isto a competição tendia a agravarse Dado que os níveis de inversão foram relativamente maiores em São Paulo do que no resto do país podese concluir que São Paulo obteve um maior grau de modernização industrial aumentandolhe assim as possibilidades de enfrentar a concorrência com a indústria das demais regiões Raízes da concentração industrial em São Paulo 185 O problema entretanto não termina aí Ao mesmo tempo em que a indústria nacional era pressionada pelo aumento das importações de bens de consumo há que se ter presente o fato de que a economia das demais regiões apresentava fraco desempenho tanto no que se refere à produção industrial quanto à agrícola65 Isto fica mais claro quando se comparam por exemplo as exportações calculadas em libras esterlinas de ambas as regiões para o mercado internacional Tomandose a média anual do volume exportado na década de 1920 com a média verificada na década anterior a economia paulista ampliara aquele fluxo em 33 ao passo que o restante do país apresentara um medíocre incremento de menos de 1 em suas exportações ver Tabelas 21 e 31 Tabela 21 Comércio com o exterior Totais dos períodos A 19111920 e B 19211930 Exportações e importações São Paulo Resto do país Milhões de Índice Milhões de Índice 1 Exportações A totais B 3302 4397 1000 1332 3958 3994 1000 1009 2 Importações A totais B 1606 2550 1000 1589 4293 4492 1000 1046 3 Saldos 12 A B 1696 1847 335 498 4 Exportações A de café B 2817 3983 1000 1414 831 1627 1000 1958 5 Demais A exportações 14 B 485 414 1000 854 3127 2367 1000 757 Fontes Anuário Estatístico do Brasil 19391940 Comércio Exterior pelo Porto de Santos vários anos Em que pese o fato de que as exportações a indústria e a agricultura de São Paulo cresceram mais do que no resto do país o ritmo de crescimento de seu próprio mercado não foi suficiente para compatibilizar a elevada taxa de acumulação na indústria Já mostrei antes ver nota 62 que o efeito líquido dos acréscimos das importações de manufaturados pode ter afetado apenas em cerca de 10 os níveis da produção industrial paulista 65 Conforme Villela e Suzigan 1973 p 43 é pequeno o aumento da produção agrícola para o conjunto do país no período ao contrário da notável expansão que ocorre na agricultura paulista como mostrei no Capítulo 1 Considerandose que a produção industrial do resto do país teve também um fraco desempenho é possível se concluir que essa renda do agregado Brasil exclusive São Paulo tenha tido um desempenho bastante sofrível nesse período Wilson Cano 186 Acredito que a agravante que passa a ocorrer na década de 1920 e especialmente após a valorização cambial de 1924 é que a economia do resto do país além de não ter um bom desempenho de suas exportações amplia ainda mais suas importações fazendo com que seu déficit com o exterior nessa década fosse 163 milhões de libras maior do que o observado na década anterior Isto associado com o fato de que também o resto do país havia ampliado sua capacidade produtiva industrial e que seu mercado tinha um medíocre desempenho certamente fez com que a concorrência se ampliasse tanto nos mercados internos cada indústria em suas próprias regiões como nos mercados exteriores as indústrias das duas regiões competindo agudamente de forma interregional Vejamos alguns fatos referentes a esse problema Em primeiro lugar no que diz respeito à indústria têxtil algodoeira a indústria paulista levou vantagem nessa competição embora pagando o preço da estagnação porém a altos níveis de produção a do resto do país pagou o preço com a queda da produção Isto reforça minha hipótese sobre aqueles altos níveis de produção em 1923 ainda mais se considerando que os preços implícitos da produção paulista de tecidos de algodão foram mantidos entre 1920 e 1927 situandose mesmo abaixo em termos relativos dos preços dos tecidos importados do exterior e os preços dos tecidos paulistas exportados para o resto do país apresentam queda durante os anos da década de 1920 ao passo que as importações paulistas de tecidos provenientes do resto do país apresentamse durante o mesmo período com nível relativo de preços crescente em relação aos paulistas Isto poderia significar eventualmente que a indústria do resto do país não teria condições para suportar a manutenção de seus preços tanto quanto as indústrias de São Paulo66 O problema do aumento da 66 A pauta de importações de tecidos do resto do país para São Paulo não é desagregada o que impede saber se houve alterações nos tipos desse produto ao longo desse período por exemplo de tecidos grossos e baratos para finos e caros entretanto se excluídas as importações provenientes da Guanabara é pouco provável que isso tenha ocorrido Por volta de 19191920 os preços médios dos tecidos importados por São Paulo das demais regiões eram cerca de 50 inferiores aos preços médios da produção paulista e tal diferença praticamente desaparece por volta de 19271928 parecendo indicar que o restante do país não teve condições de manter aquele nível relativo de preços mais baixos Enquanto os preços da produção paulista sobem 21 entre 19201928 e o de suas exportações caem de 16 o das exportações provenientes do exterior sobem de 29 e os provenientes do resto do país sobem de 82 Raízes da concentração industrial em São Paulo 187 competição interregional no setor têxtil algodoeiro foi inicialmente levantado por Stein que relata diversos fatos concernentes a esse fenômeno a eliminação pelos industriais têxteis de alguns intermediários tanto na compra do algodão como na venda de tecidos b saturação dos mercados rurais e regionais principalmente Minas Gerais e Nordeste para os tecidos grossos que constituíam a maior parte da produção nacional c diversificação da produção de tecidos grossos para médios e finos de algumas grandes fábricas principalmente da região sul do país d tentativa de ampliar as exportações de tecidos para os mercados sul americanos onde tiveram bem pouco sucesso aliás e eliminação de concorrentes como no caso drástico da Cia Agro Fabril que produzindo linhas para coser foi forçada a vender seus ativos provavelmente para a maior empresa do setor segundo Stein os quais foram fisicamente destruídos e atirados no Rio São Francisco em 1927 Stein 1957 p 114 144145 O aumento do grau de integração de modernização e da maior diversificação da produção levado a efeito principalmente pelas empresas do sul do país deramlhes portanto melhores condições para enfrentarem a concorrência interregional Dean também apresenta fatos nesse sentido como por exemplo articulações cartelizadoras compra de empresas falidas e grande quantidade de falências principalmente de empresas pequenas Stein 1957 p 131133 147150 Agrego ainda outro fato que parece muito sintomático da luta pela conquista de mercados exteriores as exportações de manufaturas paulistas para o resto do país como porcentagem da produção industrial de São Paulo passam de 85 entre 19191923 para 151 entre 19241928 e as exportações de manufaturas do resto do país para São Paulo também relacionadas ao valor da produção industrial paulista passam de 41 para 64 no mesmo período Essas exportações são as realizadas via cabotagem e não se dispõe de dados sobre as exportações por vias internas ver apêndice estatístico Entretanto se fosse mantida nesse Wilson Cano 188 período a relação verificada entre as exportações por cabotagem e as exportações por vias internas entre 1914 e 1920 que fora de quase 50 no caso de São Paulo essas exportações totais teriam atingido níveis tão grandes como os verificados durante a primeira guerra Como se pode verificar Tabela 23 as exportações paulistas não se considerando o caso dos fios de algodão apresentam comportamento distinto das exportações do resto do país caem no apósguerra durante o período de reajustamento das importações 19191920 e da crise de 1921 aumentando vigorosamente à medida que a atividade industrial se recupera dos níveis relativamente baixos de 19201921 As exportações do resto do país para São Paulo entretanto apesar de crescerem já a partir de 19191920 não se considerando o caso dos tecidos de algodão não conseguem atingir níveis absolutos de grande expressão Esse reajustamento das importações pode assim ser resumido Tabela 22 Variações entre as médias Saldos acumulados da de 19141918 e de balança comercial 19191920 milhões de Exportação Importação 19141918 19191920 São Paulo 163 174 580 586 Resto do país 21 69 195 194 Sobre o declínio das exportações ver Tabela 33 no Apêndice Estatístico Estes fatos parecem conduzir à confirmação de duas hipóteses por crescerem já a partir do imediato pósguerra poderia significar que o reajustamento das importações de 19191920 teria afetado mais intensamente a indústria do resto do país exatamente no momento em que as exportações do resto do país para o mercado internacional entram em declínio certamente originando uma crise de demanda para bens de consumo manufaturados de produção nacional acentuando assim a possibilidade de diminuição do grau de utilização da capacidade produtiva de sua indústria e sofrendo mais agudamente essa crise Ao mesmo tempo o fato de que não conseguem atingir níveis absolutos maiores parece mostrar uma debilidade da indústria do resto do país na competição com a paulista tanto no que se refere à possibilidade de uma tomada maior do mercado paulista quanto à consolidação de seu próprio mercado Raízes da concentração industrial em São Paulo 189 Tabela 23 Estado de São Paulo comércio por cabotagem com o resto do país toneladas Médias anuais Fios de algodão Tecidos de algodão a Tecidos de juta b Calçados Chapéus Export Import Export Import Export Import Export Import Export Import 191418 50 11 2886 2114 2539 41 311 28 215 16 191921 256 112 2002 1385 2053 50 206 30 138 63 192228 503 151 4717 2853 2819 197 617 94 289 57 Fonte Comércio de cabotagem pelo Porto de Santos São Paulo a predominantemente de algodão b tecidos e sacos Em resumo a problemática enfrentada pela indústria paulista nesse período se deve em primeiro lugar ao descompasso entre a alta inversão ampliadora da capacidade produtiva e a expansão de seu próprio mercado e secundariamente aos efeitos decorrentes do reajustamento do coeficiente de importações de bens de consumo Esses dois efeitos combinados com o crescimento menor dos mercados das demais regiões imprimiram à indústria paulista um ritmo de crescimento pouco menor do que o observado na década anterior Mesmo assim entretanto a taxa média anual do crescimento da produção industrial paulista no período de 1920 a 1928 que foi de 66 ou 57 se tomada a base no ano de 1919 pode ser considerada satisfatória mesmo quando comparada com a taxa média anual estimada para o período de 19111913 a 191967 Se excluído o período 19241926 em que efetivamente os níveis de produção de outros tecidos e de vários produtos como por exemplo os calçados chapéus álcool e carnes frigorificadas caem em alguns desses anos mais especificamente em 1925 e 1926 a rigor a crise têxtil teve o seu peso maior no problema já referido dos tecidos de algodão os demais tecidos apresentam crescimentos significativamente altos entre 1919 e 1928 algodão 9 lã 285 seda 955 e os tecidos de juta se relacionados não à base de 1919 onde há crise no setor e sim ao alto nível de 1918 crescem 103 entre esse ano e 1928 Há que se esclarecer contudo que as altas taxas verificadas para a lã e a seda ocorrem exatamente no período áureo da expansão desses segmentos e seus níveis 67 Ver no Apêndice Estatístico as notas explicativas sobre os índices do crescimento industrial de São Paulo Wilson Cano 190 absolutos de produção eram pequenos antes de 1920 a expansão da juta por outro lado está calçada pela expansão das safras cafeeiras a partir de 1924 As queixas da indústria têxtil algodoeira contra a corrosão tarifária e a competição dos tecidos importados encontrariam eco apenas em 1929 ano em que seus níveis de produção eram praticamente os mesmos de 1918 149 e 147 milhões de metros respectivamente68 Os dados abaixo extraídos do apêndice estatístico mostram bem a evolução industrial do período no que se refere à produção têxtil de vestuário e alimentar Tabela 24 Índice da Produção Física Industrial do Estado de São Paulo base 1920 100 Índice A Índice B Índice A exclusive 10 produtos 1 tecidos de algodão 1918 787 786 1919 930 923 1921 1025 999 1922 1147 1135 1923 1881 2 1364 1924 1316 1371 1925 1181 1235 1926 1302 1318 1927 1441 1686 1928 1691 2157 1 Dado o diferente comportamento da produção têxtil algodoeira e seu peso na produção industrial paulista 214 em 1919 construí dois índices O primeiro é constituído por 10 produtos quatro tipos de tecidos calçados chapéus cerveja álcool e aguardente açúcar e carnes frigorificadas O segundo exclui desses 10 produtos os tecidos de algodão esses 9 produtos restantes representavam 306 da produção industrial paulista em 1919 e o índice agregado 10 produtos totaliza assim 52 da produção industrial O resíduo 48 foi deduzido por deflação e não está incorporado nos índices A e B ver Apêndice Estatístico 2 O alto volume de produção de tecidos de algodão é o responsável por esse elevado crescimento O restante da produção industrial não compreendida no índice A representava em 1919 cerca de 48 da produção total manufatureira e parece não ter crescido no mesmo ritmo os índices são 821 em 1918 1104 em 1919 e 1643 em 1928 se minhas estimativas estiverem pelo 68 Conforme Luz 1961 p 194 as tarifas foram reajustadas em 9 de janeiro de 1929 pelo decreto 5650 Raízes da concentração industrial em São Paulo 191 menos aproximadas da realidade ver apêndice estatístico69 Esse resíduo abarca cerca de 11 da produção têxtil e de vestuário 48 da produção alimentar e o total da produção dos demais ramos e estimei seu crescimento deflacionando seu valor de produção por um deflator implícito obtido através do índice B Parece assim que excluídos os produtos dos índices A e B mais tipicamente produtores de bens de consumo o restante da produção industrial nele incluída a indústria metalúrgica química e outras mais tipicamente produtoras de bens de produção teria crescido menos do que aqueles em que pese o fato de que em meados da década se instalam novos compartimentos produtivos de bens de produção como o da fabricação do raion de cimento de aço etc A implantação da indústria do cimento e do aço dados os problemas de tecnologia dimensão de escala de produção e dos custos bem como do montante de inversões que tais produtos requerem somente teria condições positivas para sua implantação quando o Estado através da política econômica criasse condições favoráveis para isso o que efetivamente se deu após 1918 Com efeito uma série de medidas legislativas são tomadas pelo governo federal nesse período criando uma série de incentivos para esses dois ramos produtivos isenção de imposto de consumo isenção do imposto de importação para máquinas e equipamentos para essas indústrias tarifas ferroviárias e marítimas fortemente subsidiadas para o transporte de matériasprimas e bens de capital de produção nacional ou estrangeiros desde que não tivesse produção similar interna Ao mesmo tempo que dava tais incentivos o governo criava algumas exigências como a da utilização de matériasprimas nacionais desde que possível é claro a de que o emprego de mãodeobra nacional nessas plantas fosse 69 A contradição no movimento dos índices resíduo 1104 para 1000 e A 930 para 1000 entre 19191920 poderia ser decorrente do efeito de reajustamento das importações cujo impacto maior não se deu na produção correspondente ao índice A e sim principalmente sobre produtos metálicos químicos e outros Entre 19191920 as importações de tecidos como as dos outros manufaturados duplicam porém enquanto o coeficiente de importaçõesprodução para os tecidos passam de 7 em 1919 para 14 em 1920 o das demais manufaturas exclusive alimentos e têxteis passam de 29 para 55 impondo portanto um impacto maior a essas manufaturas O aumento de 24 nas importações de alimentos foi fortemente influenciado pelas importações de vinho cujo volume físico duplica nesses anos Wilson Cano 192 pelo menos de 50 e ainda a obrigatoriedade da venda 30 no caso do cimento e garantia de compra de 13 no caso do aço de parte da produção ao governo aos preços externos mais a tarifa e demais despesas o que significava na realidade antes reserva de mercado que restrição No caso do aço um incentivo adicional beneficiou várias empresas a concessão de empréstimos a longo prazo e a baixos juros Contornada a questão dos altos custos pelo Estado garantiase a lucratividade do empreendimento Evidentemente dado o vulto das inversões e embora com alto grau de proteção tarifária e de subsídios os riscos que tais empreendimentos envolvem parece claro que a participação do capital nacional nessas plantas estaria limitada ou a empreendimentos pequenos mesmo para a época ou a simples participação acionaria No caso do cimento com a instalação da Cia Brasileira de Cimento Portland em 1924 em São Paulo com inversões predominantes de capital estrangeiro 70 do capital esse problema ficava resolvido Iniciada a produção em 1926 com 13 mil toneladas passava já em 1929 a 96 mil toneladas representando isso cerca de 15 do consumo aparente nacional muito embora a fábrica tivesse uma capacidade instalada para produzir 200000 toneladas No caso do aço se excluída a planta da Belgo Mineira que se instala em 1921 em Minas Gerais adquirindo uma pequena siderúrgica nacional e ampliandoa consideravelmente parece ter predominado o capital nacional nas plantas menores Três plantas Belgo Mineira Morro Grande e a Cia Brasileira de Mineração e Metalurgia esta em São Paulo produziam cerca de 96 do total de lingotes de aço com predominância da Belgo Mineira que perfazia 50 da produção nacional A Morro Grande tinha uma planta em Minas Gerais onde produzia o ferro gusa e outra planta no Estado do Rio de Janeiro onde transformava o gusa em aço A Cia Brasileira de Mineração e Metalurgia em São Paulo produzia e laminava aço provavelmente utilizando sucata Essas três empresas praticamente monopolizavam o mercado nacional de lingotes e suas estratégicas localizações permitiam inclusive uma divisão regional de mercado Raízes da concentração industrial em São Paulo 193 A produção paulista de lingotes de aço que era de 45 mil toneladas em 1924 passava a 89 mil toneladas em 1929 e a média produzida entre 1924 e 1927 equivalia a 83 da produção nacional de lingotes baixando essa porcentagem para cerca de 13 à medida que a Belgo Mineira e outras expandiam a produção Além daquela empresa paulista que eu diria de porte pequeno para médio várias outras empresas menores se instalaram em São Paulo com produção de lingotes equivalente a pouco menos de 10 do total produzido em São Paulo70 Embora já antes da primeira guerra o Estado Brasileiro tivesse legislado sobre a concessão de incentivos para a implantação das chamadas indústrias básicas creio que o condicionamento causado às importações estratégicas de bens de produção durante a guerra pode muito bem ter provocado o início de uma tomada de consciência para com a necessidade dessa instalação industrial71 Por outro lado não se pode ignorar que as próprias condições do crescimento industrial em São Paulo estavam implicitamente reclamando a diversificação da estrutura industrial mais especificamente através da implantação dos compartimentos produtores de bens de produção a fim de que o processo de acumulação industrial pudesse saltar para níveis maiores ampliando dessa forma os mercados mútuos da indústria Meses antes do histórico outubro de 1929 os principais centros financeiros mundiais de Londres e Nova Iorque já mostravam sintomas de inquietação diante da especulação bolsista que então se desenvolvia e obviamente não poderiam deixar de lançar algum reflexo nas economias subdesenvolvidas Por outro lado as alterações na situação monetária e 70 A legislação referente a esses setores é a que segue cimento Decreto 16755 de 31 de dezembro de 1924 aço Decretos 12943 e 12944 de 30 de março de 1918 Decreto 15188 de 21 de dezembro de 1921 Decreto 4422 de 28 de dezembro de 1921 Decreto 15595 de 9 de agosto de 1922 Decreto 16214 de 28 de novembro de 1923 e Decreto 4801 de 9 de janeiro de 1924 conforme Luz 1961 p 188191 e Peláez 1972 p 202 As demais informações utilizadas quanto ao cimento e ao aço foram extraídas das seguintes fontes do citado trabalho de Peláez p 143169 197202 Villela e Suzigan 1973 p 175177 351353 Baer 1970 p 7990 e Pestana 1927 p 3 7 Para uma síntese da história da siderurgia em São Paulo ver também o trabalho de Felicíssimo Jr 1969 71 As medidas entretanto não tiveram maior conseqüência Ver a respeito Luz 1961 p 188191 Wilson Cano 194 de crédito no Brasil entre 1928 e 1929 no sentido de um retorno à estabilização provocava uma restrição nos meios de pagamento cujo montante se contrai em 1929 caindo para 94 dos níveis de 192872 A situação de expectativa inquietante em que se encontrava a cafeicultura no início de outubro de 1929 diante da perspectiva de um iminente desastre do comércio cafeeiro e os aspectos depressivos acima apontados antes repito da eclosão do colapso da Bolsa de Nova Iorque na segunda quinzena de outubro de 1929 já configurava um clima pouco favorável à expansão industrial Após a eclosão da crise externa com a precipitação dos preços do café para a baixa eclode a crise interna confirmando dessa forma a depressão que já era latente Como demonstraram vários de nossos historiadores mesmo que não ocorresse a crise mundial naquele momento dificilmente a economia cafeeira sairia ilesa de sua própria e independente crise de superprodução arrastando consigo em certa medida o seu subordinado parque industrial73 A partir desse momento a indústria teria de buscar caminhos mais autônomos o que conseguiria ainda que um tanto precariamente dentro do próprio transcorrer da crise dos anos de 1930 23 Principais mudanças na estrutura produtiva industrial Qualquer tentativa de aprofundamento da análise das modificações da estrutura produtiva industrial no período anterior a 1930 tanto para São Paulo como para o Brasil tornase extremamente difícil por duas razões principais A primeira e talvez a mais importante se deve ao fato de que o período 19201930 não é coberto por levantamentos censitários e os indicadores de que se dispõe apontam exatamente para esse período como sendo aquele em que ocorrem as principais mudanças com a implantação ou expansão de alguns compartimentos industriais 72 As séries monetárias para o período estão em Villela e Suzigan 1973 p 412 413 73 Sobre a impossibilidade de que o sistema de Defesa Permanente do café pudesse manter ainda por mais tempo a privilegiada situação brasileira que vigorava até antes da crise consultei Furtado 1961 cap 30 e Delfim Netto 1966 p 128136 O citado trabalho de Taunay v 13 principalmente nos capítulos XV e XVIII a XXII apresenta muitos depoimentos e informações tanto sobre a expectativa dessa crise como de sua própria eclosão Raízes da concentração industrial em São Paulo 195 mais complexos e dinâmicos indústrias químicas de produtos metalúrgicos e de cimento74 O segundo tipo de dificuldade mesmo para o período coberto por censos que são os anos de 1907 e de 1919 prendese ao fato de que as mudanças ocorridas na estrutura industrial não são plenamente visíveis se a análise é feita em termos de ramo fechado a dois dígitos chegando mesmo a apresentar aparentes contradições no tipo de mudança visível75 Por esse método indústrias como a alimentar a de bebidas e de fumo das mais simples por sinal aumentam seu peso relativo entre 1907 e 1919 passam de 235 para 370 do total enquanto outras como a química metalúrgica e de minerais não metálicos diminuem seu peso relativo em São Paulo Não fossem as peculiaridades da formação industrial brasileira no período esses fatos poderiam conduzir a uma enganosa visão de um suposto retrocesso nas mudanças do perfil industrial Em termos de ramos as principais modificações visíveis são as verificadas na indústria de material de transporte cuja produção que perfazia 05 do total em 1907 passa para 21 em 1919 assim como o ramo de perfumarias sabões e velas que de 08 passa para 21 no mesmo período Considerado o extraordinário crescimento verificado no período para a indústria como um todo essas mudanças apontam claramente uma expansão mais que proporcional para esses ramos A indústria têxtil que totaliza 387 da produção industrial cai para 293 em que pese a notável expansão de sua produção física bem como o fato de que em 1907 representava 263 do total da indústria têxtil brasileira e em 1919 essa cifra era de 366 A única explicação possível para isso reside no fato de que outros ramos cresceram muito mais do que o têxtil como por exemplo a indústria alimentar que passa de 19 para 31 no mesmo período 74 Devese lembrar da precoce implantação da indústria de máquinas e equipamentos para o café que se dá nas últimas décadas do século XIX ver Capítulo 1 Entretanto sua reduzida dimensão impede que se lhe atribua um caráter de importância maior no setor industrial 75 As informações correspondentes estão no Apêndice Estatístico Wilson Cano 196 As razões desse crescimento excepcional da indústria alimentar ao que tudo indica residem principalmente tanto no atraso em que se deu a substituição de importações desses produtos e no próprio atraso da expansão da agricultura produtora de alimentos uma vez que é após 1905 que se dá seu maior desenvolvimento como no relativo atraso e peculiaridade do processo de urbanização brasileira considerandose que a parte mais moderna dessa indústria alimentar para o período evidentemente como o refino de açúcar frigorificação de carnes conservas de vegetais leite congelado e outros constituía classes de produtos tipicamente urbanos76 Considerada a pequena dimensão dos compartimentos industriais de maior complexidade tecnológica e de vinculação marcante como produtores de bens de produção e também de consumo durável não resta qualquer dúvida que a expansão industrial verificada em São Paulo até 1930 foi decisivamente calcada no crescimento dos ramos mais vinculados à produção de bens de consumo não durável ver Tabela 23 Embora o primeiro desses compartimentos tenha diminuído sua participação no total manufatureiro entre 1907 e 1919 passam de 185 para 150 em São Paulo caindo muito mais no resto do país cabe esclarecer que seu desempenho entretanto deve ser considerado bastante satisfatório Notese pela Tabela 23 que no caso específico de São Paulo essa diminuição do peso relativo é explicada pelo crescimento maior do segundo compartimento ao contrário do que ocorre no resto do país onde seu crescimento é simplesmente medíocre se admitida uma taxa inflacionária em torno de 100 para o período 19071919 assim como o crescimento nominal das indústrias mais simples indústrias de tipo B na Tabela 25 no resto do país é também sensivelmente inferior ao observado em São Paulo 76 Refirome ao alto grau de dispersão urbana no Brasil como já mostrei no Capítulo 1 Tabela 9 A acelerada expansão da indústria alimentar entre 1907 e 1919 é coerente com o aumento da população urbana sua expansão em termos nominais em São Paulo naquele período foi cerca de três vezes maior do que a expansão dessa indústria no resto do país Tomados os censos de 1900 e de 1920 a capital de São Paulo tinha um aumento populacional superior a 142 enquanto que as demais capitais brasileiras em média aumentavam de 61 Raízes da concentração industrial em São Paulo 197 O caso específico do estado da Guanabara como se depreende do exame da citada tabela mostra claramente a inflexão a que foi submetido esse estado pela decadência cafeeira de sua região tributária e pela larga dependência externa de seu abastecimento de alimentos e matérias primas Não é de se estranhar portanto que esse estado tenha apresentado entre 1900 e 1920 o menor crescimento demográfico verificado entre todos os demais Estados com exclusão de Sergipe Além dos já apontados problemas decorrentes da falta de conhecimento técnico de maior risco do investimento e em muitos casos de dimensões mínimas de escala de produção o relativo retardamento da implantação e expansão das indústrias mais complexas como a química a metalmecânica e outras parece em grande parte ter sido causado por dois tipos de contradições ocorridas durante a primeira guerra e a década de 1920 Penso ainda que os obstáculos decorrentes de tais contradições foram muito maiores nas demais economias do resto do país inclusive no próprio estado da Guanabara do que em São Paulo dadas principalmente as menores dimensões absolutas de seus mercados regionais e de seus potenciais de acumulação Tabela 25 Estrutura e expansão da indústria de transformação entre 1907 e 1919 Regiões Participação regional Part setorial Ind ATotal Crescimento nominal da produção 1907 100 Ind A Ind B Total 1907 1919 1907 1919 1907 1919 1907 1919 Ind A Ind B Total São Paulo 180 427 155 301 159 315 185 150 695 890 854 Guanabara 352 261 292 202 302 208 188 139 220 315 298 Demais estados 468 272 553 497 539 477 139 73 200 411 382 Brasil 1000 1000 1000 1000 1000 1000 161 111 298 457 432 Fonte Censo Industrial 1097 1920 1950 dados retrospectivos de 1920 1 A compreende as seguintes industrias minerais não metálicos metalúrgica mecânica mat de transporte papel borracha química e farmacêutica B compreende os demais ramos 2 Compatibilizei o Censo de 1907 com o de 1919 incluindo neste último a produção açucareira 3 Censo de 1920 ajustado com a produção açucareira A primeira contradição que ocorre durante a primeira guerra referese ao fato de que se por um lado as restrições ao fluxo de Wilson Cano 198 importações favoreceram a expansão dos setores mais simples da produção industrial por outro lado essa mesma restrição atingiu profundamente a possibilidade de suprimento de insumos mais nobres ou mais complexos e de bens de capital impedindo dessa forma a implantação de alguns dos compartimentos mais complexos Cabe destacar ainda que por volta de 1914 a expansão da rede de eletricidade em São Paulo facultava ainda mais essa expansão industrial uma vez que esse suprimento energético diminuía as cargas de capital necessárias à implantação das indústrias mais mecanizadas A experiência acumulada durante a primeira guerra principalmente pelas oficinas mecânicas que se dedicaram à reparação ou mesmo construção de peças e de equipamentos simples poderia ter frutificado muito mais na década de 1920 não fosse outro tipo de contradição que nela ocorre77 Da antiga restrição quase absoluta daquele fluxo de importações a economia passa a contar com uma ampla retomada daquelas importações o que em parte se constitui em barreiras à instalação de indústrias produtoras desses mesmos bens Em que pese isso a política cambial e monetária vigente de 1921 a 1923 e de 1927 a 1929 que se traduz em desvalorizações cambiais e em expansão de meios de pagamentos bem como as políticas específicas de incentivo às indústrias de cimento e de siderurgia que são instituídas principalmente a partir de 1924 superam o problema da excessiva capacidade para importar e permitem a implantação de várias unidades produtoras desses ramos industriais mais dinâmicos e complexos a siderurgia o cimento fibras químicas para a indústria têxtil equipamentos agrícolas equipamentos têxteis principalmente teares equipamentos para a pequena indústria do açúcar etc Esses investimentos realizados na indústria paulista nesse período estariam destinados a cumprir papel extremamente importante 77 No trabalho de Dean 1971 p 124126 há uma relação nominal de empresas produtoras de equipamentos Consultei também os trabalhos de Varlot 1964 cap VI sobre a indústria de máquinas têxteis e o de Queda 1972 p 169 sobre a indústria açucareira trabalhos esses que mostram os esforços que se iniciam na década de 1920 para a fabricação desses equipamentos Raízes da concentração industrial em São Paulo 199 em termos de aumento da autonomia desse parque industrial mormente durante a depressão dos anos da década seguinte onde diante de nova e mais profunda restrição da capacidade para importar contariam a seu favor com ampla reserva de mercado que lhes garantiria um acentuado crescimento diversificado Na análise interna dos ramos industriais também são poucas as modificações da estrutura que podem ser observadas no período Ainda que de pequeno valor absoluto elas representam entretanto uma verdadeira preparação do terreno para o que seria mais tarde a diversificada indústria paulista Cito especificamente as transformações verificadas na indústria têxtil com o desenvolvimento da produção de tecidos de lã de seda natural de raion e de tecidos ele malha criando condições de expansão mútua com setores da agricultura e da indústria química As transformações verificadas dentro da indústria de alimentação desencadearam iguais efeitos pelo maior desenvolvimento da refinação do açúcar produção de conservas de vegetais e animais extração e refino de óleos vegetais etc Na própria indústria metalúrgica a produção de fundição e laminação a produção das oficinas mecânicas e a incipiente produção de bens de capital que já em 1919 perfaziam 34 do valor da produção total metalúrgica de São Paulo passavam a 38 em 1928 e quase duplicariam essa porcentagem no decorrer da década seguinte Além da autonomia relativa já apontada em termos de criação de mercados mútuos e complementares à indústria paulista isto também significava a preparação das bases para a futura consolidação de seus mercados exteriores São Paulo modernizara e diversificara seu parque industrial não ocorrendo o mesmo com a indústria do resto do país 3 Alguns aspectos da concentração industrial As peculiaridades inerentes à formação industrial no chamado mundo subdesenvolvido e particularmente as especificidades da economia brasileira criam dificuldades apreciáveis para a análise e a interpretação do fenômeno da concentração industrial tanto no que se refere ao seu aspecto regional quanto ao relativo à concentração em termos das unidades produtoras Em primeiro lugar destaco o fato de que a implantação industrial no Brasil efetuada até o início do século XX não pode ser comparada com os processos clássicos de industrialização Este assunto foi bastante estudado na Teoria do Desenvolvimento Econômico e não cabe dentro dos contornos deste trabalho senão lembrar que nossa economia não percorreu os mesmos caminhos históricos no que se refere tanto aos aspectos institucionais quanto à própria evolução das relações de produção Mesmo no que se refere ao contexto latinoamericano as especificidades históricas e estruturais imprimiram diferenciações apreciáveis em cada país ou grupo de países Em segundo lugar os principais estudos sobre o tema da concentração industrial hoje existentes foram feitos tomando em conta observações de países de capitalismo avançado ou maduro Mesmo quando os trabalhos são referidos aos países subdesenvolvidos dizem respeito a momentos históricos em que a industrialização já se encontra em etapas mais avançadas Quero dizer com isso que são muito grandes as dificuldades que se apresentam quando se pretende investigar esse problema na indústria brasileira até 1930 Não se conta com modelos históricos pelo menos Wilson Cano 202 aproximativos aos países desenvolvidos evidentemente e muito menos com teorizações sobre a concentração industrial que pudessem ser utilizadas para esse período da economia brasileira1 É diante dessas dificuldades que tento apresentar alguns traços mercantes e a meu juízo fundamentais que poderiam eventualmente explicar nossa precoce concentração industrial em termos de empresas bem como os fatos que demarcaram as raízes e a evolução do processo de concentração regional2 Além de ter sido retardatária a formação industrial brasileira adquire outra peculiaridade decorrente da própria dimensão continental do país ao comportar economias regionais com tênues interligações engendrou uma indústria relativamente menos concentrada em termos espaciais até o início do século XX Quanto à concentração de empresas este trabalho tentará mostrar que já era acentuada quer se examine a questão pelo lado dos ramos industriais quer se examine pelo lado da produção industrial de cada um dos estados As exceções a essas duas regras gerais menor concentração regional e maior concentração de empresas serão tratadas ao longo das duas seções seguintes tornandose claro que a primeira é devida principalmente ao atraso na formação de um mercado nacional e a segunda bastante complexa por sinal principalmente a problemas tecnológicos e de mercados locais3 1 A teorização que mais corresponde ao caso brasileiro está contida naquilo que se denominou de pensamento cepalino O trabalho de J M C de Mello 1975 tratando o desenvolvimento brasileiro como um caso de capitalismo tardio constitui uma importante contribuição crítica a esse enfoque Uma bibliografia básica sobre o assunto pode ser vista no trabalho acima citado Quanto aos problemas teóricos que envolvem tanto os aspectos do fenômeno da concentração industrial quanto os decorrentes da problemática da competição entre as pequenas e médias empresas e o oligopólio devo citar pelo menos os excelentes trabalhos que se bem não se apliquem plenamente ao caso brasileiro no período por mim estudado fornecem importantes pistas para o seu estudo o de Labini 1966 e o de Steindl 1952 Como leitura mais específica sobre o problema de concentração industrial também constituem trabalhos importantes os livros de Utton 1971 e o editado por Yamey 1973 2 Como se depreende da leitura deste texto o problema da concentração regional está sendo tratado ao longo do trabalho Na parte final deste Capítulo tento resumilo em seus aspectos mais específicos à indústria 3 O problema das indústrias voltadas para mercados locais e para mercados mais amplos no contexto brasileiro foi inicialmente tratado por Castro 1971 no ensaio sobre A industrialização descentralizada e por Singer 1968 principalmente nos capítulos referentes a Porto Alegre e Blumenau Raizes da concentração industrial em São Paulo 203 Este assunto será apresentado em dois cortes o primeiro seção 31 se refere aos aspectos mais específicos da concentração de empresas o segundo seção 32 versará sobre o processo de concentração regional de São Paulo As dificuldades de reconstituição histórica do processo de concentração industrial no Brasil levaramme a conduzir a análise em dois momentos No primeiro tento apresentar o quadro geral da indústria no início do século 1907 e embora faça algumas considerações sobre sua gênese não se trata de forma alguma de tentar uma explicação mais aprofundada No segundo que abarca o período que segue até 1929 tento apresentar a análise do movimento tanto no que se refere às mudanças na concentração de empresas quanto ao processo de concentração regional da indústria 31 A concentração industrial em termos de empresas Examinado o processo histórico de nossa formação econômica concluo que os fatores que determinaram e possibilitaram a dinâmica específica do processo de concentração industrial de empresas foram fundamentalmente a a inexistência de um mercado nacional integrado b a dinâmica de cada uma das economias regionais e sua estrutura de concentração da propriedade e da renda e c os problemas decorrentes da relativa rigidez tecnológica Passo em seguida a examinálos A primeira questão deve ser vista sob dois ângulos o da competição com produtos nacionais de outras regiões e o da competição com produtos importados Nesse sentido em que pese o fato de que nossa formação urbana tenha se delineado de longa data configurando os principais núcleos urbanos no litoral a predominância de atividades econômicas primárias forçava o surgimento de outros centros importantes interiorizados No primeiro caso devemse destacar as grandes distâncias marítimas entre NorteNordeste NordesteLeste LesteExtremo Sul que encareciam muito os custos de transporte de mercadorias nacionais dificultando a permeabilidade interregional dos mercados Esse fato entretanto não impedia a abertura desses Wilson Cano 204 mercados litorâneos fosse no Norte no Leste ou no Sul à entrada de produtos estrangeiros Em que pese isso as maiores distâncias marítimas permitiam a implantação de grandes empresas cujos mercados tinham amplitude maior se bem que ainda de âmbito regional e sempre condicionados a um grau mínimo de proteção aduaneira ante os produtos similares provenientes do exterior Salvo nos casos que exemplifico mais adiante raras eram as indústrias localizadas nas regiões mais distantes que contavam com uma dimensão multirregional ou nacional Situação um tanto distinta ocorria em relação aos núcleos mais interiorizados as dificuldades ou grandes distâncias para o acesso no sentido litoralinterior criavam barreiras naturais adicionais que reforçavam a proteção por custos diferenciais de transporte às atividades industriais aí localizadas abrigandoas tanto da competição com os produtos importados em menor medida é claro quanto da concorrência com produtos nacionais de outras regiões ou mesmo de outros locais da mesma região porém relativamente mais distanciados Quer dizer beneficiavamse assim de uma dupla proteção Um exemplo bastante flagrante disso pode ser verificado no estado de Minas Gerais com as cidades do Triângulo Mineiro e as da subregião de Montes Claros ou as da subregião de Juiz de Fora quanto mais interiorizadas fossem essas cidades maiores condições surgiriam para que o implante industrial se desse de forma nitidamente espraiada permitindo que se produzisse localmente uma ampla variedade de bens ressalvadas as possíveis restrições da tecnologia ou da ausência local de insumos fundamentais para essa produção4 Dessa forma predominaram em Minas Gerais a pequena e a média empresa em seu mercado interiorizado mas as regiões desse estado que são mais próximas ao estado de São Paulo ou à região do Rio de Janeiro teriam limitadas possibilidades se tentassem implantar 4 A palavra localmente deve aqui ser entendida em um sentido mais elástico significando tanto a implantação de pequenas indústrias eou artesanatos em locais mais restritos pequenas localidades quanto a implantação de médias empresas que atendessem a um mercado local um pouco mais ampliado representado no caso por um conjunto de pequenas localidades Sempre que tais mercados locais tivessem dimensões mais importantes surgiam então possibilidades para combinações distintas de tamanhos de plantas uma grande ou algumas médias ou ainda combinações entre pequenas e médias Raizes da concentração industrial em São Paulo 205 indústrias de porte multirregional uma vez que fatalmente se defrontariam com as maiores indústrias daqueles dois estados Se bem que essa margem extra de proteção proporcionasse uma formação industrial diversificada ao mesmo tempo restringia essa indústria aos mercados locais Dito de outra forma se bem que os altos custos de transporte no sentido litoralinterior criassem aquela margem extra de proteção esses mesmos custos no sentido interiorlitoral impediam a conquista de mercados exteriores àquelas localidades restringindo assim a possível ampliação de tais indústrias O segundo fator condicionante do tamanho dos estabelecimentos industriais residia tanto na dinâmica como na estrutura da propriedade e da renda de cada atividade predominantemente em cada região o açúcar no Nordeste a borracha na Amazônia o café em São Paulo ou a atividade produtora de alimentos no Extremo Sul do país Como esse assunto em certa medida já foi discutido no início deste trabalho ele aqui será resumidamente tratado Em primeiro lugar mesmo naquelas economias regionais que se encontravam em estagnação ou relativa decadência sempre existiria um excedente por menor que fosse passível de alocação distinta da atividade predominante por exemplo do açúcar no Nordeste ou da borracha na Amazônia E isso se deve ao fato de que mesmo no caso em que a economia esteja em declínio relativo até mesmo parte do montante de recursos alocáveis a título de investimento de reposição pode em certos casos ser canalizada para novas inversões diversificadoras No caso das economias estagnadas ou relativamente estagnadas aquilo que poderia ser chamado de investimento líquido potencial pode igualmente ser dirigido a outras atividades mais promissoras Em ambos os casos os detentores de tais capitais estarão tentando diversificar sua carteira de inversões com o objetivo básico de elevar a taxa de lucros Claro que tais vazamentos somente serão alocados na própria região se houver condições mínimas de mercado força de trabalho etc para sua viabilização econômica Daí terem surgido implantes industriais em todas as regiões do país normalmente voltados para o próprio mercado regional quer na forma de atividades complementares à atividade predominante sacarias Wilson Cano 206 para a agricultura regional instrumentos metálicos simples para a extração da borracha oficinas de reparação ou mesmo construção de equipamentos de açúcar etc ou então voltadas para o mercado consumidor da região como foi o caso de inúmeras fábricas têxteis implantadas em todas as regiões brasileiras com exclusão do Amazonas Pará Mato Grosso e Goiás Em segundo lugar cabe lembrar que tanto a dinamicidade quanto o padrão de concentração da propriedade e da renda prevalecente em cada região resultavam em determinada extensão e intensidade de cada um dos mercados regionais condicionando dessa forma seu padrão industrial Não se considerando eventuais restrições tecnológicas ou aquelas causadas pela ausência de determinados insumos básicos na região era portanto a estrutura da propriedade que pelo lado da fonte dos recursos passíveis de inversão condicionava em grande medida o próprio tamanho das fábricas Se a estrutura fosse muito concentrada permitiria a implantação de indústrias de tamanho grande ao passo que se fosse pouco concentrada por exemplo no sistema em que predomina a pequena e a média propriedade da terra poderia resultar numa séria restrição à instalação de fábricas de grande tamanho facilitando por outro lado a proliferação da pequena e da média empresa como por exemplo ocorreu no Extremo Sul do país Claro é que a extensão do mercado era o reverso dessa medalha tornandose também uma condicionante no dimensionamento das fábricas Um importante elemento que tanto poderia reforçar como modificar esse condicionamento gerado pela estrutura da propriedade e da renda era o capital acumulado pelas atividades comerciais de cada região tanto as vinculadas ao comércio externo de exportação e importação quanto aquelas voltadas para o abastecimento regional e interregional Apropriando parcelas importantes do excedente gerado em cada região ou em regiões tributárias como a Guanabara em relação à sua vizinha região cafeeira esse capital tanto poderia promover a diversificação do investimento local quanto poderia se constituir em mais um freio a essa diversificação como se pode pensar das duas hipóteses seguintes Raizes da concentração industrial em São Paulo 207 a se a propriedade desse capital fosse de residentes no exterior parte do excedente poderia vazar para o estrangeiro na forma de remessas de lucros juros etc b qualquer que fosse sua propriedade o excedente poderia ser convertido em capital circulante financiando o aumento dos fluxos de mercadorias provenientes do exterior ou de outras regiões para o abastecimento local em vez de ser transformado em capital industrial De qualquer forma pelo menos no que se refere ao comércio de exportação e ao comércio atacadista há que se ter em mente que essas atividades são concentradoras da distribuição de mercadorias e assim sendo também concentram em poucas mãos o excedente apropriado Em que pese esse fato nas regiões onde predominavam a pequena e a média propriedade como no Extremo Sul do país o papel concentrador do capital comercial não parece ter atuado de forma a alterar acentuadamente a concentração industrial haja vista o reduzido número de estabelecimentos industriais de grande porte que foram instalados nessa região ver Tabela 62 no Apêndice Estatístico Apesar de que em algumas de nossas economias regionais as estruturas da propriedade e da renda permitiam uma abertura maior à entrada de empresários capitalistas de porte médio no compartimento industrial ainda assim dada a histórica concentração da propriedade e da renda no Brasil penso que seria exagero imaginar a existência de uma ampla camada de empresários médios no período O próprio sistema bancário que na época era fundamentalmente baseado no crédito pessoal certamente se constituiu em verdadeiro freio ao surgimento de empresas de porte médio principalmente naqueles ramos em que a tecnologia exigia uma certa mecanização da atividade industrial Representava isso portanto mais uma barreira à entrada de empresas médias O terceiro e talvez o mais importante fator condicionante dos tamanhos das plantas industriais decorria do grau de rigidez ou flexibilidade ditado pela tecnologia Esse aspecto para a época em questão apresentase bastante complexo Ainda assim entretanto é possível fazer uma certa exploração interpretativa sobre as poucas informações disponíveis e levantar algumas hipóteses auxiliares Para Wilson Cano 208 alguns segmentos industriais como por exemplo os de vidro cimento papel siderurgia e têxtil o problema técnico parece ter sido bastante rígido não só quanto às técnicas de produção propriamente ditas como também em termos de exigências de mecanização e de tamanhos de fábricas O ramo têxtil não só por sua complexidade tecnológica mas também pelo fato de que era inquestionavelmente a principal atividade de transformação industrial do país é merecedor de algumas considerações especiais É comum vincular a indústria têxtil àqueles ramos industriais pouco sensíveis a economias de escala de inversão principalmente quando são comparados diferentes tamanhos de estabelecimentos não integrados como tecelagens ou mesmo estabelecimentos integrados como os de fiação e tecelagem No caso das tecelagens nãointegradas isto é verdadeiro pois é possível o dimensionamento bastante harmônico entre os simples equipamentos de preparação à tecelagem como as urdideiras e as espuladeiras e os teares e esses equipamentos eram dimensionados para pequenas combinações com reduzido número de teares No caso de outros estabelecimentos nãointegrados como as fiações ou como a fase de acabamento tinturaria e estamparia de tecidos não é fácil conseguir combinações harmônicas entre as distintas fases de processamento industrial por exemplo entre a preparação para fiação e a fiação propriamente dita Determinados equipamentos de preparação para fiação como os batedores e os abridores são dimensionados para um certo número de fusos de fiação e para que a primeira fase de processamento não opere com alto grau de capacidade ociosa é necessário que se faça uma combinação mais adequada entre as duas Isso implica necessariamente que o tamanho das fiações não pode ser reduzido devendo mesmo apresentar dimensões relativamente grandes Dimensionada uma fiação para que se obtenha um ajustamento harmônico com a tecelagem há que se adequar as escalas de capacidade produtiva de ambas as fases e isso naturalmente dado que a fiação foi dimensionada para um tamanho grande implica também o dimensionamento maior da tecelagem Caso contrário a empresa operaria com capacidade ociosa justamente na fase industrial de maior investimento que é a fiação Tabela 26 Estado de São Paulo Relação capitalprodução e intensidade de capital na indústria de transformação 1 1907 Fonte Dados primários Censo Industrial de 1907 1 A cal e cimento papel fósforos metalúrgica extração de óleos usinas de açúcar e vidro B têxtil C cerveja aqui separada por sua situação especial de coexistirem 49 pequenos estabelecimentos e um grande que conta com 92 do capital do setor D demais indústrias Essas indústrias tinham a seguinte participação porcentual no capital total da indústria A 27 B 42 C 85 D 212 Os grupos A e B consumiam juntos 23 da energia exclusive manual e animal 2 Os dois estabelecimentos do grupo D são de tamanho inexpressivo e provavelmente essa energia deriva de outras atividades principais dessas empresas 3 N que se refere às manuais predominam pequenos estabelecimentos muitos dos quais parecem ser artesanais artefatos de couro jóias luvas gravatas instrumentos musicais etc e nestas atividades não existem estabelecimentos com outra fonte de energia os estabelecimentos desse grupo que utilizam vapor ou rede elétrica compreendem basicamente empresas pequenas e algumas médias raramente figurando alguma de porte maior Tomado o grupo D como um todo a maior parte dos estabelecimentos pareceriam ser verdadeiras empresas familiares e isso pode diminuir artificialmente o número de operários e aumentar o valor médio por operário Se a relação fosse medida em termos de valor agregado certamente essas médias seriam inferiores às que se observariam nos demais grupos 4 Rede elétrica representa a energia elétrica adquirida de terceiros Tabela 26 Estado de São Paulo Relação CapitalProdução e Intensidade de Capital na Indústria de Transformação 1 1907 Tipo de Energia N de Estabelecimentos Capital Operário Valor Bruto da produção Capitalvalor bruto da utilizada Contos de Réis operário contos de réis produção A B C D A B C D A B C D A B C D Hidrelétrica 23 5 2 27 78 30 95 49 47 2 239 160 064 Vapor 35 18 5 96 50 49 244 40 39 48 81 62 3 129 102 302 065 Rede elétrica 4 12 5 32 52 47 32 34 39 56 3 153 121 057 Manual 3 3 44 50 05 08 17 18 29 27 39 49 3 016 031 045 037 Animal 6 13 25 050 Outras 1 1 5 50 10 16 96 40 23 052 025 069 Total 54 31 50 191 58 56 180 35 40 46 69 58 146 122 261 061 Fonte Dados primários Censo Industrial de 1907 1 A cal e cimento papel fósforos metalúrgica extração de óleos usinas de açúcar e vidro B têxtil C cerveja aqui separada por sua situação especial de coexistirem 49 pequenos estabelecimentos e um grande que conta com 92 do capital do setor D demais indústrias Essas indústrias tinham a seguinte participação porcentual no capital total da indústria A 27 B 424 C 85 D 212 Os grupos A e B consumiam juntos 23 da energia exclusive manual e animal 2 Os dois estabelecimentos do grupo D são de tamanho inexpressivo e provavelmente essa energia deriva de outras atividades principais dessas empresas 3 No que se refere às manuais predominam pequenos estabelecimentos muitos dos quais parecem ser artesanais artefatos de couro jóias luvas gravatas instrumentos musicais etc e nestas atividades não existem estabelecimentos com outra fonte de energia os estabelecimentos desse grupo que utilizam vapor ou rede elétrica compreendem basicamente empresas pequenas e algumas médias raramente figurando alguma de porte maior Tomado o grupo D como um todo a maior parte dos estabelecimentos pareceriam ser verdadeiras empresas familiares e isso pode diminuir artificialmente o no de operários e aumentar o valor médio por operário Se a relação fosse medida em termos de valor agregado certamente essas médias seriam inferiores às que se observariam nos demais grupos 4 Rede elétrica representa a energia elétrica adquirida de terceiros Wilson Cano 210 Se havia um grau mínimo de flexibilidade para as fiações de algodão uma rigidez muito grande surgia no que se referia à juta ao linho e à lã Em que pesem as oscilações de nossa política econômica o estabelecimento de tarifas sobre a importação dos fios provocava inequivocamente uma elevação dos custos de produção interna de tecidos Para que se tornassem competitivos perante o similar importado exigiase portanto a produção nacional de fios integrada nas tecelagens Dessa forma tanto o problema técnico quanto o tarifário praticamente impunham o estabelecimento de fábricas integradas e de porte grande A complexidade e o custo dos equipamentos muito maior existente para as fibras de juta linho e lã levou necessariamente ao retardamento da plena integração dessas indústrias no país Mas por outro lado como essas fibras apresentam complexidades também relevantes na preparação de tecelagem e no acabamento caso específico da lã decorria também um alto custo de inversão e um tamanho médio para grande que resultava obviamente numa quantia alta de inversão Mas há uma grande implicação como essa indústria impunha tamanhos relativamente grandes de plantas e como era bastante mecanizada requeria portanto uma quantidade de energia muito grande Ora como as redes de distribuição de energia elétrica não existiam senão a partir dos primeiros anos do século XX e basicamente em São Paulo ao capitalista eram exigidas efetivamente duas inversões uma para compra instalação e funcionamento da fábrica e outra para a produção de energia concretizada na forma de construção de usinas térmicas ou hidrelétricas5 São bem conhecidos os problemas da opção técnica entre a produção de energia hidrelétrica e a térmica A primeira para ter custos satisfatórios requer escalas mínimas de produção e o ônus mais pesado reside no alto investimento requerido operando apenas a custos fixos os variáveis são bastante reduzidos A térmica a despeito de permitir a instalação de usinas de tamanhos pequeno médio e grande tendo ainda menores cargas de inversão opera a custos mais altos tanto fixos como variáveis resultando assim numa produção de energia a custos altos Se bem que esta segunda alternativa permita a criação energética para 5 Uso o termo energia térmica tanto para a obtida diretamente da caldeira a vapor quanto para a produzida por gerador ou turbina a vapor Raizes da concentração industrial em São Paulo 211 empresas industriais de porte médio e em alguns casos também para as pequenas de qualquer forma acrescenta o montante de inversão requerida e provoca aumento nos custos industriais de produção dificultando a entrada das médias empresas mormente nos segmentos industriais em que a flexibilidade tecnológica permite o funcionamento de empresas pequenas ou mesmo artesanais com reduzida mecanização O exame da Tabela 26 mostra claramente esse fato em 1907 As indústrias mais complexas grupos A e B dessa Tabela eram as que apresentavam a maior intensidade de capital por operário ocupado 65 maior do que as simples e intermediárias e a maior relação capitalvalor bruto da produção mais de duas vezes maior do que a do último grupo Era muito reduzido o número de pequenos estabelecimentos menos de dez para o total de 84 estabelecimentos dos grupos A e B da mesma forma que do total dos 106 estabelecimentos recenseados que só utilizavam energia manual ou animal apenas seis deles pertenciam a esses dois grupos principais 44 eram pequenas cervejarias e os restantes 56 estavam incluídos nos grupos mais simples Por sua peculiaridade destaco ainda o ramo cervejeiro cujo único estabelecimento grande apresentava resultados muito díspares em relação aos demais ramos industriais Isso é compreensível dado que as grandes cervejarias na realidade eram obrigadas a efetuar quatro inversões distintas a primeira que se refere aos equipamentos propriamente ditos de fabricação da cerveja a segunda para a produção de sua própria energia elétrica a terceira representada pelo maciço investimento em meios próprios de transporte veículos de tração animal e a última dada pela necessidade de um grande estoque de material de embalagem caixas garrafas barris etc No Apêndice Estatístico incluo ainda uma Tabela mostrando que das 89 empresas que empregavam até quatro operários 70 delas utilizavam energia animal ou manual e entre as 70 empresas que empregavam mais de 100 operários 50 delas geravam sua própria energia elétrica e apenas uma utilizava energia manual Em que pese o fato de que já a partir de 1901 em São Paulo e de 1906 Rio de JaneiroGuanabara o grupo Light tivesse iniciado o serviço de distribuição de energia elétrica ampliandoo consideravelmente a Wilson Cano 212 partir de 1911 o Censo Industrial de 1907 mostra que do total da energia elétrica consumida pela indústria da Guanabara apenas 5 eram adquiridos de terceiros e 95 de geração própria das empresas industriais para São Paulo nesse mesmo ano a geração própria das empresas representava 82 do total consumido e portanto apenas 18 eram adquiridos de terceiros Ainda em 1919 as indústrias paulistas geravam 43 da energia elétrica consumida6 Tomando como indicadores o problema tecnológico e o energético classifico em seguida os principais segmentos industriais de São Paulo em 1907 segundo uma perspectiva que considera tanto o tamanho quanto a relativa complexidade industrial7 Assim esses segmentos constituiriam três grupos principais simples complexos e intermediários os segmentos simples são aqueles com precário uso de máquinas e de energia elétrica Como certamente as economias de escala seriam nulas podendo mesmo haver deseconomias de escala tratase de um grupo que permite a entrada predominante de pequenos estabelecimentos e restringe os de grande porte não em termos de uma barreira à entrada mas sim pelo fato de que o grande capital teria melhores condições de inversão em outros ramos cuja produção não fosse tão atomizada Essa restrição obviamente não é absoluta e nele ainda figuram algumas empresas de porte médio Dele fazem parte serrarias e móveis de madeira pequenas oficinas mecânicas de reparação olarias artefatos de 6 Como mostrou Singer 1968 p 5657 não foi a implantação daquela concessionária estrangeira que possibilitou a expansão industrial de São Paulo mas exatamente o contrário É a expansão industrial paulista que cria mercado para aquela empresa a qual só atingiria dimensões maiores quando a indústria paulista já apresentasse um mercado energético mais amplo O investimento dessa concessionária não pode ser considerado como do tipo pioneiro que tem caráter germinativo de novos investimentos industriais Da mesma forma que em São Paulo na região da Guanabara e do Rio de Janeiro foram os próprios industriais que criaram aquela infra estrutura ainda em 1907 dada a carência de quedas dágua na Guanabara sete empresas têxteis localizadas no Rio de Janeiro mas com centro de decisões na Guanabara representando 60 do capital empregado nesse ramo produziam sua própria energia hidrelétrica que totalizava 86 da potência hidrelétrica instalada no Rio de Janeiro 7 Para elaborar o agrupamento de indústrias segundo graus de complexidade examinei com atenção Censo de 1907 a forma pela qual estavam estruturadas as indústrias em cada estado do país Particularmente observei com mais cuidado as indústrias de Minas Gerais Rio Grande do Sul Rio de Janeiro Guanabara e São Paulo embora meu propósito mais específico tenha sido a indústria paulista Raizes da concentração industrial em São Paulo 213 couro exclusive calçados confecções e malharia massas alimentícias moagem de cereais exclusive do trigo panificação biscoitos e confeitaria bebidas alcoólicas e refrigerantes exclusive cerveja perfumaria sabões e velas produtos químicos simples e farmacêuticos etc o grupo intermediário caracterizase por uma pequena flexibilidade tecnológica e pequeno uso de energia elétrica e na maior parte dos casos com reduzida maquinização Compreendendo fundamentalmente empresas de médio porte permite entretanto a coexistência de um apreciável número de pequenas empresas Da mesma forma que o grupo anterior as economias de escala para todos os segmentos seriam relativamente pequenas e a modesta extensão do mercado para algumas delas como por exemplo para a incipiente indústria de bens de capital e de material de transporte constitui um impedimento de fato mas não absoluto à entrada de grandes empresas Este conjunto compreende entre outros calçados curtumes chapéus charque cigarros material de transporte oficinas construtoras de bens de capital etc as indústrias chamadas de complexas pelos fatos já apontados eram aquelas mais sujeitas a economias de escala a mecanização mais intensa em quase todos os casos e a uso maior de energia elétrica com exclusão do vidro que dada a peculiaridade desta indústria utilizava basicamente combustível na forma de gás Dados esses requisitos técnicos e o montante necessário de inversão essas indústrias praticamente eram fechadas à entrada de pequenas empresas salvo em atividades conexas como por exemplo a lapidação do vidro ou a cartonagem e raras eram as de médio porte Compreendiam basicamente fiação e tecelagem papel cimento siderurgia vidro construção naval moinhos de trigo fósforos usinas de açúcar e outras O caso da indústria cervejeira é muito peculiar Nela convivem em termos nacionais inúmeras pequenas cervejarias com energia manual duas grandes mecanizadas e usando energia elétrica e um reduzido número de empresas médias As pequenas como regra geral localizavamse nos centros menores e as grandes nos centros maiores Rio de Janeiro e São Paulo Tomandose isoladamente a região do Rio de Wilson Cano 214 JaneiroGuanabara conviviam nessa região 34 cervejarias das quais três pertenciam a uma só empresa que detinha 76 do capital do setor Em São Paulo uma das cinqüenta cervejarias existentes detinha 92 do capital do setor e entre as 49 pequenas 44 não utilizavam energia elétrica Excluindose as seis localizadas na capital a grande e mais cinco pequenas 44 estavam espraiadas por dezesseis cidades paulistas8 Pelo exame das estatísticas de exportações interestaduais de São Paulo notase que já na primeira década do século XX as exportações paulistas de cerveja eram relativamente expressivas podendose supor que essa grande empresa já atuava num mercado multirregional da mesma forma que possivelmente a outra grande existente na Guanabara dado que ambas tinham porte similar Muito provavelmente as dificuldades de transportes pelo menos para as localidades não servidas por ferrovias para o interior teriam sido um fator importante na manutenção por muitos anos ainda dessa coexistência entre grandes e pequenas dentro dessas duas regiões em face do alto risco e do custo do transporte desse produto Nosso processo histórico de formação industrial revestese de mais uma peculiaridade importante aqui não se deu a clássica e gradativa transformação de uma produção manufatureira ou artesanal para uma produção mecanizada Muito embora nossa história registre a ocorrência de certas atividades artesanais como algumas produções têxteis caseiras realizadas em algumas fazendas carpintarias alfaiatarias joalherias etc estas eram muito precárias tanto pelo fato de que o regime de importações era liberal quanto porque à época nossa economia era escravista restringindo portanto a formação de um mercado interno9 Muitas dessas atividades efetivamente eram mais prestadoras de 8 Deane 1973 p 147148 mostra como as cervejarias que não contavam com mercados mais amplos na Inglaterra em fins do século XVIII não podiam utilizar máquinas a vapor da mesma forma como essa restrição também afetava a indústria moageira Esse autor mostra ainda como apenas poucas cidades poderiam dar condições à instalação de tais equipamentos mecanizados Chama ainda a atenção para o fato de que à medida que os tamanhos das plantas se tornavam maiores isto criava uma dificuldade adicional em termos do aumento das necessidades de capital circulante fato que se tornava uma barreira adicional para a entrada de empresas maiores 9 A esse respeito ver a conhecida obra de Lima 1954 especialmente as páginas 206 a 214 Raizes da concentração industrial em São Paulo 215 serviços artífices e artistas do que produtoras de bens industriais para o mercado Daí portanto sua precária possibilidade de realizar uma acumulação de capital que possibilitasse sua transformação técnica e seu desenvolvimento Algumas dessas artesanias teriam possibilidades de sobreviver como por exemplo as carpintarias as alfaiatarias e as sapatarias dado o lento avanço tecnológico Outras entretanto teriam selada a sua sorte a partir do momento em que fábricas mecanizadas fossem introduzidas no país planejadas para atender a mercados de dimensão maior de âmbito regional pelo menos ou então para os grandes centros urbanos da época Há que se lembrar contudo que esse implante precário de algumas fábricas mecanizadas vai ocorrendo à medida que surjam condições mais favoráveis quanto à formação de capitais de maior vulto sobrantes de uma atividade predominante que tanto poderia ser a agrícola como a comercial e quanto à formação de mercados mais extensos Dado que esse mercado somente poderia existir na medida em que os segmentos de população livre tivessem maior significado em termos de poder de compra de bens nãosuntuários o que viria a ocorrer de forma plena quando a economia estivesse funcionando basicamente no regime de trabalho livre é fácil compreender que tais implantes se deram de forma bastante defasada no tempo principalmente após 1850 e no espaço dada nossa dimensão continental e dada também a existência de economias regionais específicas De conformidade com o estado do conhecimento técnico vigente no momento de seu nascimento essas fábricas tinham dimensões e níveis técnicos modernos dado que os equipamentos utilizados eram aqueles existentes no mesmo momento nos países já industrializados Entretanto como essa implantação fabril ocorre lentamente durante um período que grosso modo envolve o intervalo entre 1850 e 1880 iria paulatinamente passando de moderna a antiquada principalmente quando se dá a grande expansão industrial da década de 1890 Dessa forma além da aparente convivência que persiste entre formas artesanais e formas industriais maquinizadas e de porte maior em alguns segmentos industriais em outros passa a ocorrer outro tipo de Wilson Cano 216 aparente convivência as grandes plantas modernas com as plantas que no passado também tinham tais características e que agora tornaramse antiquadas e menores10 Assim convivem no mesmo território nacional e em muitos casos em uma mesma região ou centro maior tanto atividades primitivas quanto modernas e tanto empresas de grande como de pequeno ou médio porte Embora algumas das razões que explicariam essa aparentemente estranha coexistência implícita nos dados do Censo de 1907 já tenham sido apresentadas nesta seção tento complementálas nas linhas abaixo a argumentação já apresentada quanto à questão dos mercados locais protegidos por custos de transporte permite a hipótese de que a implantação espraiada de empresas de pequeno e médio porte atendendo a mercados locais mais restritos faz com que a concorrência seja apenas aparente Quando se tomam os dados do Censo agregados em termos de um só estado a informação de que convive um grande número de empresas pequenas e médias na mesma produção similar dá a ilusão de que possivelmente esse grupo de empresas é muito competitivo quando na realidade ele está subdividido em agrupamentos menores espraiados em mercados mais restritos do que o mercado estadual o mesmo se pode dizer a respeito de grandes estabelecimentos mas em pequeno número localizados em regiões longínquas A proteção natural decorrente dos altos custos de transporte e a inexistência de um mercado nacional integrado conferemlhes uma situação privilegiada de ausência de competição com outros grandes estabelecimentos de outras regiões nos segmentos em que as restrições tecnológicas e energéticas foram mais rígidas no sentido de que as fábricas necessariamente deveriam ser de grande porte não haveria obviamente competição entre grandes e pequenas empresas e nos casos em que a produção estava concentrada 10 Isto não quer dizer que o nível técnico das empresas permanecesse estancado para todas e durante todo o tempo Obviamente alguma renovação ou adaptação seria necessária para a manutenção de seus equipamentos Por outro lado cabe lembrar que a diversificação horizontal do capital conhecida pelo menos para os grandes grupos nacionais Stein 1957 p 101 industrial se dá não apenas em estabelecimentos industriais complementares à atividade original por exemplo fabricação de farinha e de sacarias como também em outras atividades industriais agrícolas bancárias imobiliárias etc Raizes da concentração industrial em São Paulo 217 em um número muito reduzido de grandes fábricas o vidro e o cimento poderiam ser exemplos de precoces monopólios regionais a própria dimensão regional do mercado permitia a sua convivência pouco competitiva quando coexistiam no mesmo mercado regional tipos de estabelecimentos que poderiam insinuar uma existência mais competitiva um número maior de empresas grandes ou um grande número de pequenas e médias ou a existência de empresas grandes e médias ou de empresas novas e antigas devese levar em consideração que a quando a convivência se dava entre empresas predominantemente grandes por exemplo o ramo têxtil algodoeiro a ausência de competição poderia ter sido facilitada pela cartelização dessas empresas caso isso fosse necessário É preciso ter em conta contudo que até o momento em que não se dá a formação do mercado nacional e que grande parte da expansão da produção está apenas deslocando produtos anteriormente importados não há objetivamente disputa de mercado uma vez que este excede em muito a capacidade produtiva do ramo b mesmo no caso em que convivem num mesmo mercado várias empresas de uma mesma classe de produtos tornase necessário examinar mais cuidadosamente os tipos de produtos que embora pertencentes a uma só classe podem ser de gênero distinto Tomese por exemplo a fabricação de calçados ou de chapéus desde cedo muitas fábricas se especializam na produção de calçados ou chapéus para homens outras para mulheres ficando agora mais claro que a existência de um número x de fábricas de calçados ou de chapéus num mesmo mercado pode dar uma falsa idéia do possível grau de concorrência existente Nesse mesmo grupo podem ainda figurar de forma encoberta fábricas de chinelos ou de tamancos ampliando ainda mais o grande número de empresas do setor A indústria metalúrgica pode também conter esse tipo de visão quando existem fábricas tão diferenciadas como caldeirarias fundições serralherias oficinas de reparação de construção de máquinas etc A indústria têxtil é um exemplo ainda melhor para essa época dos 31 estabelecimentos recenseados em 1907 apenas três eram sacarias de juta outros três eram tecelagens de lã dois de casimiras e um Wilson Cano 218 de tecidos mistos de lã cinco pequenas malharias uma pequena tecelagem de seda e finalmente os 19 restantes eram fiações e tecelagens de algodão Mesmo assim examinados os produtos fabricados por esses 19 estabelecimentos verificase que alguns produziam brins outros produziam lonas outros produziam morins etc demonstrando dessa forma uma diferenciação importante dessa produção c no caso em que a convivência se dava também em termos de modernas x antigas fosse ou não esse tipo de convivência também expresso em termos de tamanhos grandes x médias ou grandes x pequenas ou médias x pequenas há que se ter em mente que as modernas certamente operavam a custos mais baixos de produção do que as antigas para cada tipo de tamanho equivalente Se o produto em questão tinha um similar que poderia ser ou era importado obviamente o preço teto no mercado era fixado pelo preço externo mais os custos de internação e me parece evidente que o preço vigente no mercado determinado anteriormente pelas antigas possibilitava uma taxa de lucro maior às modernas Isso evidentemente poderia atuar como um precoce mecanismo de ausência de concorrência de preços Poderiam se enquadrar nesse caso entre outros exemplos o açúcar em termos das novas usinas x os antigos engenhos e os têxteis de algodão fábricas modernas x fábricas antigas Claro que em determinados momentos particularmente nas crises surge ou se acirra a concorrência de preços por exemplo a crise pósencilhamento que se prolonga até por volta de 19041905 certamente provocou algumas fissuras nesse quadro É possível que a despeito do aumento do grau de proteção cambial e tarifária que ocorre no início do século a crise cafeeira e as restrições da política monetária tenham implicado a quebra de empresas mais débeis Essa quebra provavelmente teria provocado uma reformulação do colar de relações custopreço dado pelas diferentes empresas de cada segmento A quebra das menos eficientes que operam a custo maior pode em certos casos provocar um reajustamento de preços para baixo fazendo diminuir um pouco a taxa de lucro que dadas as condições acima apontadas deveria certamente se situar em níveis muito elevados Raizes da concentração industrial em São Paulo 219 Devese lembrar contudo que nos segmentos industriais em que a tecnologia permanecesse ainda de forma atrasada provavelmente calçados chapéus vários produtos alimentares etc e que portanto as pequenas empresas neles operantes fossem pouco utilizadoras de maquinaria as quebras desse tipo de empresas não deveriam ter sido tão grandes tanto pelo fato de que elas operavam a baixos custos fixos como pelo fato de que a maior parte delas era composta na realidade de empresas familiares tendo assim uma resistência maior nas crises Diferentemente as pequenas empresas que operassem com mecanização mais intensa estariam muito mais propensas a quebrar Lembro exemplificando que o número de empresas que não utilizavam energia elétrica cresce muito entre 1907 e 1919 ano em que representam 50 dos estabelecimentos industriais tanto em São Paulo como no conjunto do Brasil O conjunto dessas observações leva a supor que esse início de formação industrial deve ter proporcionado uma taxa média de lucro alta pelo menos para as grandes e médias empresas modernas em face da quase inexistência de competição que se pode depreender desse quadro Façamos agora algumas observações sobre as transformações ocorridas nessa estrutura diante das mudanças importantes que ocorrem com relação ao suprimento de energia elétrica com o próprio alargamento industrial e com os primeiros passos da formação de um mercado nacional11 As restritas informações disponíveis para o período fizeram com que o trabalho de análise sobre a evolução da concentração no nível de empresas ficasse subordinado ao exame dos Censos de 1907 e de 1919 quanto à comparabilidade regional e a informações disponíveis para a década de 1920 no que se refere ao estado de São Paulo 11 A respeito das mudanças verificadas na concentração em nível de empresas as poucas comparações que podem ser feitas entre São Paulo e o resto do país repousam nas limitadas informações dos Censos de 1907 e de 1920 Para São Paulo consigo prolongar o exame dessas mudanças até 1929 utilizando publicação específica a esse estado Estatística Industrial do Estado de São Paulo Não pude usar plenamente os cortes de tamanho segundo classes de números de operários no Censo de 1920 Para contornar esse problema tive de utilizar outros cortes analíticos como o de tamanho segundo níveis de valor de produção e os referentes à constituição jurídica das empresas firmas individuais sociedades anônimas etc Wilson Cano 220 De início cabe lembrar que entre 1907 e 1919 a potência energética da indústria cresceu 184 para o conjunto do país 146 para a região Rio de JaneiroGuanabara 407 para São Paulo dos quais a terça parte ainda por geração das próprias indústrias e nos demais estados 127 Em que pese o fato de que nas duas primeiras regiões a energia fornecida por terceiros representava em média dois terços do total consumido no restante do país a geração própria ainda permanecia com a alta cifra de 83 Como já se viu este fato terá importantes repercussões na evolução desse processo São dois os benefícios diretos que as indústrias recebem quando não precisam construir suas próprias fontes energéticas De um lado pela diminuição das necessidades de investimentos tanto se libera capital para o empreendimento industrial como não se sobrecarregam os custos fixos Por outro lado como normalmente a energia adquirida da rede elétrica tem um custo menor do que a decorrente da geração própria essas empresas se beneficiam também por um impacto menor nos seus custos variáveis Os dois efeitos combinados expandem as margens de lucro Fica bastante claro assim que as empresas industriais dos demais estados continuavam a necessitar de maior intensidade relativa de capital e a operar com maior sobrecarga em seus custos Os dados abaixo calculados pelas informações do Censo de 1919 deixam clara essa situação Tabela 27 Estados CapitalProduto CapitalOperário ProdutoOperário São Paulo 1221 100 640 100 524 100 Guanabara 1574 129 786 123 499 95 Rio de Janeiro 1566 128 751 117 480 92 Rio G do Sul 1678 137 1017 159 606 116 Minas Gerais 1230 101 485 76 394 75 Demais Estados 1328 109 491 77 370 71 Produto valor de transformação industrial colunas 3 e 5 contos de réis No que se refere à região do Rio de JaneiroGuanabara a alta intensidade de capital que figura na Tabela 27 expressa bem esse problema Esses dois estados situavamse entre os que mais cedo implantaram indústrias Tomandose no Censo de 1919 o capital industrial dessa região 444 dele pertencia a empresas fundadas antes de 1890 e é fácil entender que devem ter sido muito oneradas com o problema energético Raizes da concentração industrial em São Paulo 221 Claro é por outro lado que essa alta intensidade de capital expressa para todas as regiões além do problema energético também o decorrente da falta de economias externas principalmente quanto a transportes e comunicações Também nesse sentido a indústria paulista parece ter sido mais bem servida uma vez que a economia cafeeira gerou precocemente uma eficiente rede de transportes e de comunicações12 Como já disse as deficiências do Censo de 1919 no que se refere aos cortes por tamanhos de empresas segundo o número de operários dificultam a comparabilidade das empresas em termos regionais Na tentativa de contornar esse problema usei duas outras informações a estrutura de tamanhos segundo classes de valor de produção e a estrutura segundo o tipo de constituição jurídica da empresa que estabelece as participações relativas entre as firmas individuais em regra as pequenas empresas as sociedades anônimas geralmente as maiores empresas e os demais tipos de empresas cooperativas sociedades em nome coletivo etc em que predominam as médias empresas a despeito do fato de que nessa categoria também estão incluídas algumas das grandes Esses dados encontramse no Apêndice Estatístico e a com base neles duas considerações podem ser feitas Primeiro fica evidenciado que as maiores empresas de São Paulo as que produziam mais de 5000 contos em 1919 totalizavam 08 do número de estabelecimentos e empregavam 315 do total dos operários enquanto para o resto do país esses estabelecimentos totalizavam pouco menos de 07 e empregavam 219 dos operários cifra essa bem abaixo da equivalente a São Paulo À medida que se caminha para as classes menores de valor de produção no sentido da grande para a média e da média para a pequena empresa a estrutura de São Paulo concentra relativamente menos estabelecimentos e menos operários comparativamente à do resto do país parecendo isso indicar que em São Paulo a concentração pelas grandes empresas era mais acentuada no que se refere às maiores 12 Por exemplo o Censo de 1920 mostra que a relação entre os gastos com fretes e carretos e o valor bruto da produção industrial era de 2 a 3 em São Paulo Rio de Janeiro e Guanabara ao passo que em Minas Gerais ela atingia 5 crescendo no Piauí em Sergipe e Goiás onde se situava entre 7 e 8 sendo de 8 a 9 no Pará e no Paraná e de 10 a 14 em Santa Catarina Acre e Mato Grosso Wilson Cano 222 No restante do país embora a concentração também fosse acentuada como se viu as médias e as grandes que figuram abaixo da classe das maiores concentravam 65 dos operários enquanto em São Paulo a cifra era de 56 Excluindose as maiores as demais empresas no resto do país concentravam assim 78 do emprego e em São Paulo a cifra era de 68 Isto é mais um indício de que na economia industrial do resto do país as maiores empresas tinham dimensão absoluta inferior à de São Paulo uma vez que tinham em média 698 operários e as paulistas 802 Esse fato fornece mais um elemento seria absurdo pensar que esse tamanho menor de emprego de mãodeobra pudesse ser explicado por um diferencial tecnológico mais aprimorado no resto do país do que em São Paulo Assim sendo os estabelecimentos maiores no resto do país em média eram menores do que os de São Paulo se excluídos os da Guanabara que tinham dimensões maiores do que os de São Paulo O segundo corte confirma esse fato As sociedades anônimas paulistas tinham um valor bruto da produção média que era 28 maior do que as congêneres do resto do país embora o desnível da ocupação média de ambas fosse mínimo Além de se confirmar os dados da Tabela 27 fica claro ainda que as pequenas empresas paulistas tinham ocupação média de operários ligeiramente menor do que as do resto do país firmas individuais uma intensidade de capital ligeiramente superior e obviamente uma produtividade média também ligeiramente superior levando a crer com isso serem mais tecnificadas e produtivas do que as do resto do país Resumidamente esses fatos parecem indicar que à medida que a indústria paulista crescia exigindo criando usinas próprias ou obtendo rede elétrica uma expansão energética as condições para a entrada de pequenas principalmente e médias empresas se ampliavam facultando assim mais rapidamente a conformação futura de uma estrutura industrial que comporta todos os estratos de tamanhos de empresas em proporções mais adequadas ao processo de acumulação Fogem tanto ao padrão paulista quanto ao padrão do resto do país os estados de Santa Catarina e da Guanabara que tomo como exemplos relativamente extremos O primeiro caracterizaria uma indústria tipicamente de pequena e média empresa e o segundo talvez pelo fato de estar instalado num só centro urbano estava caracterizado Raizes da concentração industrial em São Paulo 223 por estabelecimentos com dimensão média superior à média nacional e estruturado fundamentalmente na grande e na média empresa ambas com expressivas dimensões absolutas A gradativa expansão das redes de energia elétrica em São Paulo e na região do Rio de JaneiroGuanabara e em menor escala em outros centros permite recolocar o problema tecnológico em seus próprios termos Resolvido o problema energético as barreiras tecnológicas que persistem restringindo uma conformação mais completa da estrutura industrial tanto em termos de tamanhos de fábricas quanto em termos de diversificação da produção são as decorrentes dos problemas que envolvem a extensão do mercado o volume de inversões e de recursos financeiros necessários o risco o período de maturação etc Quanto ao problema do mercado é preciso lembrar que durante todo o período que vai até 1930 dependia predominantemente da economia cafeeira no que se refere obviamente aos estados cafeeiros e em certa medida aos estados que mantinham uma relação comercial mais intensa com a economia cafeeira A despeito de ser subordinado ao café a própria formação dos mercados guarda alguns graus de liberdade parte deles é suprida com importações do exterior parte com suprimentos de outras regiões a indústria da Guanabara por exemplo atendendo a parte da demanda paulista de bens industriais e a indústria do Rio Grande do Sul atendendo a parte do suprimento de alimentos industrializados etc e uma parte menor no início é suprida por produção industrial local Isso entretanto é uma visão meramente estática e quando examinamos a evolução dinâmica do fenômeno ele se torna mais complexo deixando em aberto algumas possibilidades de expansão da indústria local É óbvio que uma série de condições devem existir para que tais possibilidades se concretizem Restrinjome portanto a lembrar das possibilidades específicas que essa indústria local tem para se expandir Ela pode crescer deslocando parte das importações provenientes do exterior ou de outras regiões e pode também conquistar gradativamente grande parte da expansão marginal do próprio mercado a que está subordinada Lembro por exemplo o equívoco que tem persistido em vários trabalhos sobre economia brasileira dos que afirmam ter sido a década de 1920 um período de precária expansão industrial Já evidenciei esse fato mostrando que se isso é verdade para o conjunto do Brasil não o Wilson Cano 224 foi para São Paulo dada a notável expansão da economia cafeeira e da agricultura produtora de alimentos no período Sem dúvida alguma a indústria paulista consolida nessa década sua própria reserva de mercado interno cujo processo já marcara passos importantes durante a Primeira Guerra Mundial Um novo elemento deve aqui ser introduzido à medida que esse mercado atingiria a condição de maior centro dinâmico da economia do país a própria expansão da indústria ampliará seu excedente de maneira tal que para que possa transformálo em efetivo aumento de capacidade produtiva passará a reclamar pela expansão do mercado Dado que esse mercado é limitado pela atividade predominante a cafeeira fica claro que a contradição só pode ser resolvida por um processo de conquista de mercados exteriores13 Tais mercados obviamente estariam representados pelas demais regiões e sua conquista seria acelerada à medida que o processo de formação do mercado nacional pudesse ser implementado por melhores meios de comunicação e de transportes14 Mesmo antes de que se inicie o processo de conquista dos mercados exteriores a indústria paulista pode crescer a ritmo mais acelerado do que o crescimento da demanda de seu subordinador mercado o que evidentemente faz com que a acumulação de capitais cresça muito rapidamente Isso permite portanto um alargamento industrial no sentido de facilitar a entrada de empresas tanto pequenas como médias O problema grave surgirá quando o incremento de capacidade produtiva alcançar ou mesmo superar como parece ter sido o caso para alguns ramos na década de 1920 o crescimento do mercado interior Nesse momento as próprias forças de acumulação exercerão pressões intensas no sentido de um alargamento do mercado exportando parte apreciável de sua produção para os mercados das demais regiões e o que dá no mesmo instalando novas plantas de complementação industrial 13 O próprio retardamento da instalação do compartimento produtor de bens de produção torna ainda mais necessária a expansão dos mercados exteriores para o compartimento produtor de bens de consumo 14 Esse processo é facilitado pela expansão da rede ferroviária nacional que em 1919 já dispunha de 28000 quilômetros passando a 32000 em 1928 e atingindo 34000 na década de 1930 pouco se alterando a partir desse momento Raizes da concentração industrial em São Paulo 225 planejadas não para o mercado regional ou local mas sim com dimensões multirregionais ou nacionais Esse processo reclama assim a implantação de segmentos industriais de complementação para a crescente indústria produtora de bens de consumo a introdução de novas unidades produtoras de insumos básicos e de alguns equipamentos Estes por outro lado somente poderiam ser instalados quando houvesse um mercado local que consumisse apreciável parte de sua programada produção para minimizar custos de transportes o que se dá de forma concomitante com as pressões exercidas pela indústria de bens de consumo para alargar sua demanda Na medida em que esta amplia sua produção local para vender mais em mercados exteriores está ao mesmo tempo alargando o mercado local para as produtoras de bens de produção Disso resulta um feliz casamento local entre esses dois compartimentos autogerando economias externas e acelerando ainda mais o processo de acumulação Feitas essas considerações podemos lançar nova luz sobre as relações entre a concentração em nível de empresas e a expansão do mercado O alargamento do mercado interior de São Paulo por ser o mais dinâmico e provavelmente o maior se comparado com o dos demais estados permitiu aquela estruturação adequada de tamanhos de empresas criando assim uma funcionalidade interna também adequada à acumulação uma vez que facultava uma concorrência pouco competitiva em preços Com a gradativa conquista dos mercados exteriores a precária competição no mercado interior será substituída pela competição interregional É desnecessário entrar em maiores detalhes para saber quem é o vencedor a indústria que melhor se estruturou e que opera em níveis maiores de eficiência e produtividade ou seja basicamente a paulista A competição inclusive não requer maiores sacrifícios em termos de uma compressão maior de preços basta em certa medida que as empresas principalmente as grandes ampliem seus níveis de produção utilizando mais sua capacidade produtiva e com isso rebaixem seus custos fixos por unidade de produto tornandose mais competitivas nos mercados exteriores e não requerendo para isso uma pressão maior sobre sua taxa de lucro Wilson Cano 226 Por outro lado além de as empresas instaladas nos mercados exteriores sofrerem esse tipo de competição a própria questão de sobrevivência impele a instauração de um processo interno de concorrência Se antes as empresas ali instaladas com tamanhos maiores e melhor eficiência se beneficiavam dos altos custos de produção das empresas menores e menos eficientes operando obviamente a um mesmo preço no mercado agora são forçadas a rebaixar seus preços o que implica maior sacrifício para as menores e menos eficientes fazendo com que muitas delas sejam eliminadas A eliminação ao mesmo tempo permite às grandes remanescentes aumentar suas possibilidades de sobrevivência Stanley J Stein mostra vários fatos que refletem o processo de luta interregional especificamente entre os empresários têxteis do Sul Rio e São Paulo principalmente e os do Nordeste não raro estes se queixando inclusive das cartelizações feitas por aqueles Da mesma forma Dean demonstra uma série de articulações de empresas e ramos industriais paulistas muitas delas à margem da lei que efetivamente culminam no seu fortalecimento no sentido de cercear uma competição maior15 Na tentativa de dar um balanço do problema da concentração em termos de empresas em São Paulo retomo aquela classificação feita para os diferentes tipos de indústrias simples intermediárias e complexas No que se refere ao agrupamento de indústrias simples não foram apreciáveis as transformações nele ocorridas quanto a uma possível melhoria acentuada das técnicas A expansão da rede energética certamente permitiu algum grau de tecnificação que resultou no aparecimento de um número maior de pequenas e médias empresas As poucas empresas de porte grande que surgem nesse agregado não concentram parte substancial do setor Isso pode ser visto pelo exame da Tabela 28 surgem grandes empresas nos ramos de artigos de couro malharia serrarias e gráficas tendo entretanto participação relativa não muito grande em cada um desses segmentos Entre as exceções mais visíveis embora de interesse secundário um dos antigos estabelecimentos produtores de vassouras escovas e pincéis cresce concentrando 83 do setor 15 Ver a respeito Stein 1957 p 114 143 e Dean 1971 p 131136 Raizes da concentração industrial em São Paulo 227 Tabela 28 Estado de São Paulo concentração do capital empregado na Indústria de Transformação Estabelecimentos com capital igual ou superior a Classe de 1000 contos Ano de 1907 4000 contos ano de 1929 Produtos Estabelecimentos Capital Estabelecimentos Capital N N Açúcar 4 333 606 Cerveja 1 20 926 2 d 28 722 Moinhos 2 286 882 Óleos vegetais 1 200 672 1 59 320 Cigarros 2 80 592 Couros 1 06 209 Calçados 3 12 544 Chapéus 2 17 260 Têxtil algodão 9 391 913 29 257 794 Têxtil juta 1 500 917 3 429 894 Têxtil aramina 1 1000 1000 Têxtil lã 3 750 999 1 50 207 Têxtil seda 4 58 334 Malharia 2 13 233 Cordoalha 1 500 977 1 33 562 Cal e cimento a 2 1000 1000 1 1000 1000 Cerâmica 1 91 487 Vidros 1 330 806 1 71 581 Metalúrgica 1 42 526 8 13 425 Papel 1 250 955 4 333 727 Borracha 1 34 574 Serrarias 1 04 104 Vassouras escovas 1 77 833 Fósforos b 1 250 714 6 750 993 Prod Químicos diversos 4 08 219 Editorial e gráfica 1 03 190 Total c 300 27 679 79 09 520 e Fonte 1907 Censo Industrial 1929 Estatística Industrial do Estado de São Paulo indica inexistência setores não contemplados nesses levantamentos a apenas cimento em 1929 b os 6 estabelecimentos pertenciam a 2 das 4 empresas existentes em 1929 c Para 1907 as porcentagens do total foram calculadas sobre os valores ajustados do Censo de 1907 que passariam a ser 1114 estabelecimentos e 1319 mil contos de capital ver explicações no texto capítulo 2 tópico 2 Se fossem calculadas sobre os valores originais do Censo seriam 93 para os estabelecimentos e 702 para o capital Esse ajustamento foi feito apenas para o total sendo que as porcentagens de cada ramo foram calculadas pelos dados originais d 2 estabelecimentos pertencentes à mesma empresa neste caso tomei o capital registrado em 1930 e Possivelmente subestimado dada a ausência do cômputo do açúcar dos moinhos e dos frigoríficos Um fato sumamente importante ocorre no período com respeito à indústria de produtos alimentares As mudanças tarifárias e a notável expansão da agricultura paulista às quais já me referi resultaram numa Wilson Cano 228 extraordinária abertura em leque para a transformação industrial desse importante ramo Isso permitiu a entrada de um número muito grande de pequenos estabelecimentos industriais pouco mecanizados a maior parte deles não utilizando energia elétrica Das antigas fábricas pequenas de produtos químicos diversos parece que apenas uma cresceu tornando se um grande estabelecimento e as demais grandes existentes em 1929 são novas plantas das quais falarei mais adiante No grupo das indústrias intermediárias tanto pela expansão do mercado como pelo efeito da maior disponibilidade de energia elétrica as modificações tecnológicas devem ter sido mais sensíveis do que nos segmentos simples Surgem assim empresas de grande porte poucas ainda tais como as de cigarros onde dois dos 25 estabelecimentos existentes concentrara 59 do capital do setor as de calçados onde três dos 248 estabelecimentos concentram 54 do ramo e as de chapéus onde dois dos 116 estabelecimentos concentram apenas 26 desse ramo Nota se por conseguinte que este tipo de indústria apresenta algumas transformações importantes no sentido da conformação da estrutura industrial segundo tamanhos mais diferenciada A existência desses novos estabelecimentos de porte maior mostra claramente como evoluíram esses segmentos Não contando com fábricas de grande porte como se vê pelo Censo de 1907 já em 1919 se faz notar uma concentração importante da produção e do capital e também em termos regionais A produção paulista de cigarros por exemplo que naquela data anterior não atingia 1 da produção nacional em 1919 já perfazia quase 15 a de calçados antes com 24 do total nacional passava a 34 e a de chapéus antes com a participação de 22 passava a perfazer 61 da produção nacional Cabe lembrar finalizando que algumas atividades que antes poderiam se classificar como intermediárias dado que continuavam a operar em mercados relativamente restritos e também pelo fato de que as introduções tecnológicas teriam sido de pequena monta passariam paulatinamente a se incorporar no grupo de indústrias mais simples O caso da indústria de curtumes é o exemplo talvez mais claro disso Por outro lado muitas das atividades antes aqui classificáveis passariam a constituir o grupo das complexas como se verá a seguir Raizes da concentração industrial em São Paulo 229 Considerado o período que vai até 1930 raros seriam os segmentos anteriormente classificados como complexos que perderiam essa característica Há que se ter presente inclusive que vários viriam a constituir os compartimentos mais importantes da indústria tanto pela introdução de tecnologia modernizadora como pelo seu caráter de atividade complementar na maioria deles Uns como por exemplo as indústrias de papel siderurgia e fósforos apresentariam com o decorrer do tempo uma concentração tipicamente oligopólica outros como o cimento e o vidro praticamente operariam durante ainda muito tempo numa situação claramente monopolista Pouco se altera a situação da indústria açucareira uma vez que sua grande evolução em São Paulo somente se daria após a crise de 1929 As indústrias têxteis e moageiras passariam por transformações que implicariam uma abertura maior à entrada de empresas médias e em alguns segmentos também de pequenas empresas O alargamento da indústria têxtil permitindo a integração vertical das fábricas transformadoras de algodão e lã permitia que a capacidade produtiva de fios se ampliasse Isso combinado com o efeito decorrente da expansão energética permitia a entrada de médias e pequenas tecelagens o que ampliava a funcionalidade interempresarial desse setor criando o chamado colchão amortecedor que as pequenas e médias proporcionam às grandes Nos compartimentos produtores de juta e linho a integração vertical igualmente se processou porém dada sua peculiaridade são estruturados com um número reduzido de empresas numa caracterização tipicamente oligopólica O caso do setor têxtil algodoeiro como já disse deve ser examinado com cuidado em face não só do problema da diferenciação da produção como também ds possibilidades de cartelização Embora sob este último aspecto Warren Dean tenha negado qualquer cartelização têxtil algodoeira o trabalho de Stein deixa muito clara a existência de certas articulações empresariais A própria organização sindical do patronato têxtil paulista em 1919 e a capacidade reivindicatória que o setor sempre mostrou junto ao governo estão a demonstrar a existência de um mecanismo importante de defesa de seus interesses Wilson Cano 230 O início da fabricação nacional de fios e fibras de raiom na década de 1920 viria provocar lentamente um processo que mais tarde atingiria o nível de um perfeito controle de todos os níveis da produção de tecidos de fibras artificiais e sintéticas Originariamente implantado com apenas duas empresas uma estrangeira e outra nacional estas fixavam os preços e as quantidades aos usuários as tecelagens no caso dos fios e as fiações no caso das fibras A entrada de novas tecelagens nesse setor de seda artificial ficava assim condicionada ao controle e à expansão da produção daquelas duas empresas A introdução desse setor químico por sinal muito importante para a época viria provocar uma ruptura no esquema do setor algodoeiro permitindo dessa forma a entrada de inúmeras pequenas e médias empresas no novo segmento têxtil Quer pelo controle da oferta de fios de algodão quer pelo controle da oferta de fios de náilon entretanto o fato concreto é que as tecelagens obviamente recebiam como um dado as condições de fornecimento de sua principal matériaprima não se permitindo maiores graus de liberdade a essas empresas No que se refere aos segmentos metalúrgicos transformações importantes se processariam principalmente na década de 1920 Algumas das antigas e pequenas oficinas mecânicas metalúrgicas e pequenas fundições passariam por um processo de expansão transformandose em importantes produtores da incipiente indústria de bens de produção De forma mais significativa surgem nesse período a fabricação de motores aparelhos elétricos equipamentos têxteis equipamentos para a indústria açucareira empresas laminadoras de metal etc Onde entretanto as inovações tecnológicas aliadas ao problema do volume de inversões do risco empresarial e de eventuais problemas com patentes internacionais tivessem muita influência poucas possibilidades teriam os empresários nacionais de entrar Ingressam nessa produção a Ford a GM a Philips a International Harvester a Rhodia e outras montando veículos aparelhos elétricos introduzindo importantes segmentos da química e da farmacêutica etc Em outros casos o próprio governo cuidava de contornar parte daqueles problemas como se fez com o capital estrangeiro investido em cimento e aço Raizes da concentração industrial em São Paulo 231 Em que pesem essas primeiras incursões do capital externo na indústria nacional sua participação no total industrial em São Paulo não era ainda proeminente dos 79 estabelecimentos que em 1929 tinham um capital igual ou superior a 4000 contos apenas onze controlados por nove empresas eram subsidiárias estrangeiras perfazendo 17 do capital industrial total daqueles 79 estabelecimentos Por outro lado a concentração não foi ainda maior do que a revelada na Tabela 28 talvez pelo fato de que os grandes grupos nacionais como Votorantim e Matarazzo não concentraram maciçamente seus capitais em reduzido número de negócios preferindo ao contrário diversificar amplamente suas carteiras de inversões com o que obviamente diminuíam o risco do capital Outros grupos nacionais de expressão também seguiram os mesmos passos alguns anos mais tarde a família Matarazzo seria proprietária de 26 empresas a família Simonsen de doze os Jafet de onze o grupo Votorantim de sete Siciliano de seis Crespi de oito Silva Prado de 16 e Vidigal de 2116 Por último a indústria cervejeira vista como caso especial demoraria ainda algum tempo para se transformar na forma como ela é hoje conhecida controlada em alto grau por duas empresas Entretanto à medida que foi sendo resolvido o problema da energia elétrica pelo menos nos centros de porte relativamente maior foram surgindo estabelecimentos de tamanho médio alguns dos quais pertencentes às duas maiores empresas que com isso obviamente diminuíam seus custos de transporte e controlavam melhor o mercado A tendência desse setor seria a de caminhar continuamente para uma concentração maior Destaco finalmente três pontos importantes quanto ao problema da concentração em termos de empresas com reflexos significativos no problema da concentração regional O primeiro indaga se a concentração em São Paulo teria aumentado ou diminuído no que se refere às grandes empresas Na Tabela 28 se nota que as 30 maiores que tinham em 1907 capital igual ou superior a 1000 contos detinham 679 do total do capital empregado na indústria paulista e apenas 135 do total do capital da indústria 16 Ver a respeito Lima 1954 p 131137 Wilson Cano 232 brasileira Para 1929 as empresas com capital igual ou superior a 4000 contos que penso ser um valor próximo aos 1000 contos de 1907 em virtude do aumento dos preços totalizavam 79 estabelecimentos e perfaziam 52 do capital total da indústria paulista O fato de que nas estatísticas de 1929 não figuram os moinhos de trigo geralmente grandes as usinas de açúcar pelas informações disponíveis parece não ter ocorrido nenhuma transformação importante no ramo que alterasse substancialmente seu grau de concentração e os quatro grandes frigoríficos que controlavam alta porcentagem da produção industrial de carne leva a supor que aquela cifra de 52 estaria subestimada Mesmo considerando essa cifra como certa é preciso entender que essa aparente desconcentração na indústria paulista de um lado seria real devido aos fatos já apontados sobre a entrada de um maior número de pequenas e médias empresas Mas por outro dado o fato de que em 1907 o peso relativo da indústria de São Paulo no conjunto do país era de aproximadamente 16 quanto ao valor da produção e de 19 quanto ao emprego do capital cabe lembrar que em 1929 a participação paulista havia aumentado para 375 Se ponderados os 52 por esse novo peso relativo 375 o peso dessas 79 grandes empresas no total da indústria brasileira seria agora de 195 mostrando na realidade um processo de aumento de concentração em nível nacional e não de desconcentração O segundo ponto que desejo destacar referese ao fato de que a expansão industrial em São Paulo ocorrendo em sua maior parte num período 19071919 posterior ao período em que é implantada nas regiões do Rio de JaneiroGuanabara permitiu que a indústria paulista certamente operasse em níveis melhores de eficiência do que sua congênere naquela região Isso se deve lembro mais uma vez ao fato de que as novas inversões se faziam com menores gastos de capital graças ao problema energético o que obviamente rebaixava os custos fixos e variáveis ainda que não houvesse alteração tecnológica de importância nesse hiato o simples fato de utilizar máquinas mais novas certamente permitia melhor rendimento de operação Raizes da concentração industrial em São Paulo 233 O terceiro ponto referese à mais rápida evolução da estrutura industrial de São Paulo no sentido de completar gradativamente é claro os diferentes estratos de tamanhos com uma abertura maior à entrada das pequenas e médias empresas Como já se viu esse fato parece não ter aumentado a precária competitividade industrial porventura antes existente Parece na realidade ter criado as condições mais propícias a uma melhor funcionalidade interempresarial pelo menos em dois sentidos a expansão do número de pequenas e médias empresas ao ampliar o emprego de mãodeobra normalmente a taxas salariais mais baixas do que as praticadas na grande empresa cumpre papel importante pressionando a taxa de salários para baixo Por outro lado isto se torna possível porque esse tipo de empresas em quase todos os setores produtivos é na realidade uma escola formadora e qualificadora de mãodeobra beneficiando sempre com isso as empresas maiores quando estas necessitam expandir a ocupação o outro ponto positivo reside no problema das diferenças de custos entre as menores e as maiores empresas através do qual os maiores custos das pequenas requerem preços de mercado a eles adequados e os menores custos das grandes que operam a preços no mesmo nível das pequenas possibilitam taxa de lucro maior às grandes Chamo finalmente a atenção para o fato de que esta separação que fiz entre concentração em termos de empresas e concentração regional quando se está analisando uma economia aberta e sem barreiras institucionais ou seja a existência de um livre comércio inter regional só pode ser feita por uma questão de método analítico uma vez que os dois problemas são faces de uma mesma moeda 32 A concentração industrial em São Paulo Ao contrário do que se pensa o processo de concentração industrial em São Paulo constitui fenômeno que tem seu ponto de partida já no início do século XX Como se verá Tabela 32 é por volta de 1905 1907 que se dá o início daquilo que chamo de grande salto quantitativo da indústria paulista Entre 1907 e 1919 calculada a expansão industrial Wilson Cano 234 em termos nominais a indústria de São Paulo cresceria 85 vezes alterando sua participação no total da indústria brasileira de 159 para 315 no período A indústria do resto do país apresentaria resultados bastante inferiores crescendo apenas 35 vezes e diminuindo sua participação de 841 para 685 A década de 1920 proporcionaria nova expansão da indústria paulista igualmente defasada do crescimento do resto do país consolidando dessa forma o processo concentrador Inicialmente cabe lembrar que a economia cafeeira de São Paulo foi a que apresentou o maior dinamismo no contexto nacional Resolvendo pioneiramente sérios problemas de infraestrutura como o dos transportes ferroviários o do porto marítimo o de comunicações e de urbanização estava ao mesmo tempo criando um acúmulo de economias externas que beneficiariam a formação industrial reduzindolhe os gastos de inversão e os custos de produção Além disso o complexo cafeeiro paulista desde cedo precipitou a gestação de algo não menos importante a formação e o desenvolvimento de um mercado de trabalho que dadas as condições em que é formado e ampliado resultaria em menores pressões nos custos de produção industrial O satisfatório desempenho da agricultura paulista por outro lado proporcionava grande parte do suprimento alimentar à sua força de trabalho e garantia o abastecimento local de matériasprimas à indústria nascente Dado que a questão dos altos níveis de produtividade da indústria paulista já foi discutida detenhome um pouco mais no exame da questão dos salários Em primeiro lugar as próprias condições operantes no mercado de trabalho de São Paulo proporcionaram um estímulo maior ao trabalho feminino diminuindo as diferenças absolutas entre os salários da mulher e do homem Tabela 13 Isto resultava num emprego de trabalho feminino mais importante quantitativamente do que na média do resto do país o que permitia a São Paulo reduzir sua taxa média de salários Em alguns estados as arcaicas relações de produção e a típica dicotomia latifúndiominifúndio encarregavamse de dificultar a maior participação da mulher no trabalho industrial ao mesmo tempo em que seus salários industriais se comparados com os dos homens eram Raizes da concentração industrial em São Paulo 235 sensivelmente inferiores Ao contrário de São Paulo esses menores níveis absolutos de salários femininos quando ponderados pela sua menor participação no emprego não proporcionavam aquela apontada tendência a uma diminuição do salário médio industrial tanto quanto fora possível à indústria paulista Em outros estados em que a base agrícola era calcada na estrutura da pequena e da média propriedades o trabalho feminino não teria também uma participação acentuada na produção industrial salvo nas indústrias caseiras diretamente vinculadas à base agrícola O emprego de menores parece ter sido comum em quaisquer das regiões assim como não se notam substanciais diferenças na relação salários de menoressalários de adultos dando a impressão de que o salário médio em todas as regiões era igualmente afetado pela participação do menor Quanto à diferença entre os salários rurais e os salários urbanos ela também parece ter sido menor em São Paulo do que em outras regiões principalmente no que se refere às mais industrializadas Os dados contidos na Tabela 29 mostram que as diferenças entre os salários agrícolas e industriais em São Paulo eram menores do que as verificadas em outros estados de produção industrial relevante por exemplo enquanto em São Paulo o operário têxtil tinha um salário 45 maior do que o trabalhador de enxada essa diferença era de 72 no Rio Grande do Sul de 75 no Rio de Janeiro e de 78 para a média brasileira com algumas variações o fenômeno também se faz notar quanto a outras categorias profissionais Tabela 29 Comparação de salários médios agrícolas e industriais 1919 São Paulo 100 Salário urbano Salário rural Estados Operário indústria têxtil Operário indústria alimentar Operário indústria vestuário Metalúr gico torneiro Acabador calçados Trabalho de enxada Operário têxtil trabalhador de enxada Torneiro trabalha dor de enxada São Paulo 1000 1000 1000 1000 1000 1000 145 190 Rio de Janeiro 1005 660 738 766 586 832 175 175 Guanabara 1173 1041 1188 1184 1453 Rio G do Sul 1228 1011 1057 1197 1485 1038 172 219 Brasil 930 910 1051 1080 1339 750 178 271 Fonte Censo Industrial de 1920 v V 2a parte p XIXXVI Wilson Cano 236 Não é difícil explicar o fenômeno o café o principal compartimento da economia paulista e também o maior empregador de força de trabalho determinava a taxa de salários que flutuava de acordo com seu movimento cíclico Na expansão ao promover um fluxo imigratório que excedia suas próprias necessidades proporcionava um excedente de trabalhadores livres ao setor urbano Na crise não restava qualquer alternativa aos trabalhadores do café senão a de emigrar para as cidades uma vez que os outros complexos exportadores eram incapazes de absorvêlos Assim na crise a oportunidade que efetivamente existia era a de se empregarem nas atividades urbanas principalmente na indústria e nas ferrovias Os salários industriais desde cedo se mantiveram em níveis baixos estabelecidos em última análise pelo café No início da expansão ferroviária essa atividade pagava altos salários Quando seu ritmo de crescimento decai e especialmente se dá a constituição do mercado de trabalho os salários dos ferroviários tendem a se comprimir aproximandose cada vez mais dos salários rurais e industriais No Apêndice Estatístico Tabela 53 poderseá ver a defasagem crescente nos reajustamentos salariais dos ferroviários tanto em relação aos dos operários industriais quanto aos dos próprios trabalhadores do café Nas regiões em que a dicotomia latifúndiominifúndio predominava e cuja agricultura não raro era incapaz de prover os centros urbanos com oferta alimentar a preços moderados a taxa de salário na indústria teria necessariamente que ser muito mais alta do que a dos salários agrícolas tanto pela rarefação do mercado de trabalho imposto por aquela estrutura de propriedade quanto pelo alto custo de alimentação urbana Essa situação pouco se alteraria desde que se mantivesse aquela estrutura de propriedade e que o minifúndio suportasse seu próprio crescimento demográfico Somente a partir do momento em que as pressões demográficas sobre a disponibilidade da terra minifundiária se fizessem sentir de forma mais aguda é que esse virtual excedente de mãodeobra poderia efetivamente participar das fileiras engrossadoras do mercado de trabalho É muito difícil se estimar o período e as localidades em que Raizes da concentração industrial em São Paulo 237 esse fenômeno tenha ocorrido As grandes secas nordestinas que ocorrem entre a segunda metade da década de 1920 e o início da década seguinte podem muito bem ter encoberto o problema ao fazer crer que a grande migração nordestina para o Sul que daí em diante se acentuaria seria unicamente motivada pelas secas Qualquer que tenha sido o motivo dessa migração interregional o que importa destacar é que os maiores beneficiários foram inquestionavelmente os estados sulinos mais industrializados principal mente São Paulo onde a maior parte dessa mãodeobra nacional veio suprir o declínio imigratório externo na metade da década de 1920 não permitindo assim que a taxa de salário atingisse níveis mais altos do que os efetivamente alcançados Esses fatos estão portanto a indicar que a indústria paulista operava com oferta abundante de mãodeobra a taxas relativamente baixas de salários E apontam também para um aparente paradoxo a região mais industrializada e que apresentava as maiores taxas de crescimento industrial não era a que pagava os maiores salários Uma comprovação adicional pode ser vista quando se examina a relação total de saláriosvalor de transformação industrial que reflete naturalmente também os diferenciais de produtividade em 1919 essa relação era de 259 em São Paulo situandose em níveis inferiores aos verificados no Amazonas no Maranhão no Piauí na Guanabara e na Bahia sendo inclusive inferior à média verificada para o conjunto Brasil exclusive São Paulo Ainda em 1939 essa relação continuava sendo inferior à verificada na maioria dessas mesmas regiões acima apontadas A situação específica da Guanabara que sempre teve uma taxa média de salários superior à dos demais estados será discutida mais adiante Retomo em seguida a questão da acumulação de capital e da expansão do mercado para a indústria paulista lembrando mais uma vez que sua gênese havia sido proporcionada direta e indiretamente pelo capital cafeeiro Ao longo de seu processo de implantação a indústria continuava sendo alimentada pelo capital cafeeiro ao mesmo tempo em que sua alta lucratividade lhe permitia a constituição de nova e importante fonte de Wilson Cano 238 recursos para a continuidade do processo de acumulação Por outro lado a participação do capital estrangeiro em forma de investimento direto somente se faria notar com alguma importância a partir de meados da década de 1920 Os dados da Tabela 30 mostram claramente como foi acelerada a inversão industrial em São Paulo se comparada com os dados para o restante do país Tomado o biênio 19051906 como base as importações de bens de capital crescem vigorosamente até 19111913 quase quintu plicando no ano de 1912 para São Paulo e apresentando resultados menores para o conjunto do país Devo chamar a atenção para o fato de que não consegui construir um índice para Brasil exclusive São Paulo mas acredito que se possa entender facilmente que o crescente peso das importações de bens de capital por São Paulo que se pode comprovar pelo crescente peso da indústria paulista no conjunto do país certamente influi no crescimento do índice para o total do país Se feita a desagregação o resultado para o resto do país mostraria claramente o ritmo muito menos acelerado de tais importações como aliás se depreende do exame das importações de máquinas têxteis embora apresentem níveis relativamente baixos para São Paulo entre 1913 e 1920 para o restante do país o volume é simplesmente medíocre sendo também sofríveis as importações verificadas no período de 19201928 Embora a série de importações de máquinas têxteis não possa ser reconstituída para o período anterior a 1913 uma forma de comprovar a tendência acelerada de São Paulo é permitida pelas informações levantadas por Stanley Stein sobre a expansão da capacidade produtiva da indústria têxtil algodoeira Stein 1957 p 101 Desses informes pode se constatar que entre 1905 e 1915 essa capacidade se expande em São Paulo em 230 tanto para os fusos como para os teares enquanto na região Rio de JaneiroGuanabara o aumento verificado foi de apenas 50 e para o conjunto Brasil exclusive São Paulo o aumento foi também pequeno situandose em torno de 75 Examinada portanto a concentração regional pelo lado da acumulação de capital na indústria fica bastante evidenciado que o Raizes da concentração industrial em São Paulo 239 fenômeno tem início nos anos que se seguem a 19051906 acelerandose por volta de 19111913 Isso permite explicar claramente que a indústria paulista havia se preparado suficientemente para enfrentar a insatisfeita demanda que ocorreria durante a Primeira Guerra em face das restrições externas Há que se fazer agora algumas considerações pelo lado da demanda Creio que até o início da Primeira Guerra a indústria paulista contava com uma peculiaridade toda especial instalada num mercado mais amplo do que sua capacidade de oferta dado que esse mercado era atendido também por importações do exterior e de outras regiões teve um largo horizonte para ampliar sua capacidade produtiva Dito de outra forma sua taxa de acumulação pôde crescer até o início da década de 1920 em ritmo maior do que a taxa de crescimento do mercado gerado pelo complexo cafeeiro substituindo importações regionais e estrangeiras e garantindo para si a expansão marginal desse mercado Tabela 30 Importações de bens de capital Anos e Mé Brasil a São Paulo b Máquinas e acessórios pInd Têxtil dias anuais Total para a Indústria pa indúste agric c Brasil 1 SPaulo 2 1 2 19051906 100 100 100 19071908 152 148 180 19091910 200 173 214 19111912 359 280 481 1913 351 238 100 100 100 19141915 95 69 16 19 15 19161917 70 50 17 24 13 19181919 107 79 122 21 32 16 1920 233 188 283 32 37 29 19211922 168 169 221 48 70 38 19231924 244 211 243 71 106 55 1925 420 326 582 134 182 111 19261927 328 217 374 64 71 61 1928 369 207 453 47 68 37 Fontes Para São Paulo e para Indústria Têxtil tabelas 45 e 46 para o Brasil Villela A V e Suzigan W Política do governo e crescimento da economia brasileira18891945 página 442 a as colunas total e para a indústria são os índices calculados por Villela e Suzigan alterada a sua base Esses índices significam o quantum dessas importações b para a indústria têxtil são índices calculados com base nas quantidades físicas toneladas importadas de máquinas e acessórios para a Ind Têxtil o índice para a ind e agricultura é calculado da mesma forma c é provável que a composição do item máquinas para a indústria e agricultura em São Paulo esteja mais próxima do item total para o Brasil Tabela 30 Importações de bens de capital Wilson Cano 240 O processo de concentração da produção industrial paulista pela ótica de mercado revela dois momentos o primeiro que se poderia chamar de concentração por estímulo compreenderia o período da Primeira Guerra Mundial quando a produção paulista cresce em grande parte atendendo à demanda do resto do país momentaneamente insatisfeita pelas restrições já apontadas Num segundo momento que se poderia localizar na década de 1920 a expansão da produção paulista cresce concentrando por necessidade isto é há que conquistar mercados exteriores para viabilizar o processo de acumulação Entretanto se não houvesse ocorrido a Primeira Guerra é muito provável que aquilo que teria sido uma concentração por estímulo tivesse de ser uma concentração por necessidade pela razão simples de que a acelerada acumulação que precede a guerra talvez também impusesse a necessidade da conquista de mercados exteriores já naquele período a fim de evitar a ociosidade de grande parte de seus equipamentos A introdução de compartimentos industriais complexos como os dos bens de capital de cimento aço química etc enquadrarseia naturalmente nesse processo Ocorrendo durante a década de 1920 aquilo que se poderia chamar de uma primeira onda de inversão de bens de produção tais investimentos obviamente encontrariam em São Paulo as melhores condições de localização principalmente pelo lado da demanda o que reforçaria ainda mais o processo de concentração regional Dimensionados para um âmbito maior do que uma simples região sua implantação em São Paulo reduzia ao mínimo as possibilidades de que o restante do país pudesse contar com plantas similares O exame do comércio de São Paulo com o exterior e com o resto do país constitui mais um elemento esclarecedor desse processo17 Por um lado notase que do total exportado por São Paulo a participação do que vai para o exterior que era muito alta na primeira década do século XX 17 No Apêndice Estatístico incluí uma série de informações sobre comércio exterior e interregional Em algumas delas por exemplo para a estrutura da pauta e para os saldos da balança comercial de São Paulo e do resto do país a série cronológica ultrapassa o período de análise 1930 propositadamente para que se possa ver como é aprofundado o processo de conquista dos mercados exteriores a partir da crise de 1929 apresentando ganhos crescentes para São Paulo Raizes da concentração industrial em São Paulo 241 mais de 85 vai caindo gradativamente atingindo menos de 75 na década de 20 Quer dizer as exportações para o resto do país antes inferiores a 15 do movimento total sobem paulatinamente para mais de 25 Esta última cifra tornarseia maior do que 50 a partir da crise dos anos da década de 1930 quando então esse processo se acentuaria cada vez mais Esses dados revelam uma crescente integração do mercado nacional com predominância da economia paulista Essa integração entretanto é ao mesmo tempo reveladora de um específico sistema de trocas interregionais de São Paulo para o resto do país aumentam continuamente as exportações de produtos industriais ao passo que as importações paulistas vão cada vez mais se constituindo de matérias primas e de gêneros alimentícios demonstrando claramente uma relação estrutural de comércio típica de centroperiferia Dessa forma já antes de 1930 as funções exercidas pelo comércio exterior de São Paulo começariam a apresentar evidentes sinais de uma profunda modificação as exportações para o exterior que antes exerciam o papel fundamental de atividade nuclear da economia paulista determinando o mercado e conduzindo o processo de acumulação passariam cada vez mais a desempenhar papel proeminente na geração de divisas capaz de sustentar as necessidades de importações de bens de produção para a economia paulista Quanto às importações antes realizando a função de complementar a oferta interna predominantemente de bens de consumo gradativamente adquiririam outro caráter ao suprir essa economia basicamente de bens de produção18 É evidente como mostro no Apêndice Estatístico que essas transformações por que passa o comércio com o resto do mundo somente seriam perfeitamente sentidas e compreendidas a partir do período posterior à crise de 1929 tanto pela expansão diversificada da agricultura paulista quanto pelo notável crescimento industrial de São Paulo o comércio com o resto do 18 Para as transformações das funções do comércio exterior no processo brasileiro de industrialização tanto em termos teóricos quanto no que se refere ao exame da realidade ver Tavares 1964 e o clássico texto de Furtado 1961 especialmente os capítulos 30 a 35 Wilson Cano 242 país também passava por importantes modificações As importações provenientes de outras regiões supriam parcialmente a economia de São Paulo com alimentos e outros bens de consumo industrializados ou não passavam agora gradativamente a abastecer a economia paulista de matériasprimas e de gêneros alimentícios que eram escassamente ou dificilmente produtíveis em São Paulo por exemplo açúcar minérios madeiras animais de corte etc Por outro lado as exportações paulistas para as demais regiões do país paulatinamente iriam cumprir um destacado papel representado pela conquista dos mercados exteriores No fim da Primeira Guerra as exportações totais de produtos industriais de São Paulo para o resto do país já equivaliam a cerca de 10 do valor bruto da produção industrial do conjunto Brasil exclusive São Paulo sendo que em 1939 aquela cifra dobraria atingindo quase 20 daquele agregado Tomada a média do período 19091911 as exportações paulistas de produtos manufaturados exclusive alimentos industrializados para o resto do país eram 75 superiores em valor ao total similar importado do resto do país por São Paulo durante a Primeira Guerra esse percentual atingia 173 e após um ligeiro declínio provocado certamente pela retomada das importações do exterior na média de 19211923 quando aquele excesso foi de 86 essa diferença seria mantida na média do período 19241929 em torno de 130 ver Apêndice Estatístico O resultado mais evidente desse processo de concentração aparece na Tabela 31 perfazendo 159 da produção industrial brasileira em 1907 a indústria paulista cresceria aceleradamente de tal sorte que já em 1919 aquela cifra alcançava 315 e 375 em 1929 segundo R Simonsen consolidando sua posição em 1939 quando atinge o total de 45419 Cabe neste momento fazer alguns comentários em torno do próprio conceito de concentração regional da produção Principalmente quando se está analisando a indústria nascente em que sua produção em relação à oferta total produção mais importações é ainda pequena o cuidado no manejo de tal conceito deve ser ainda maior Calculadas as 19 Essa participação relativa continuaria a crescer atingindo 479 em 1949 556 em 1959 e 561 em 1970 Raizes da concentração industrial em São Paulo 243 participações da produção dos ramos x y ou z da indústria da região i nos totais nacionais da produção de X Y ou Z ainda que o resultado numérico tenha sido expressivo mostrando altos graus de concentração da produção cumpre investigar a possível ocorrência de três casos Vejamos o primeiro Se a participação regional no ramo X é alta concentrando grande parte da produção nacional mas ao mesmo tempo as importações têm peso muito elevado na oferta total desse ramo aquela alta concentração regional não revela na realidade qualquer controle mais expressivo sobre a oferta total Tratase no caso de um tipo de concentração regional que mostra apenas o fato de que a região i ou ingressou mais cedo nesse ramo de produção ou tem níveis absolutos de produção maiores do que os do restante do país Dependendo da evolução dinâmica de sua economia e da dinâmica das demais regiões essa concentração aparente tanto poderá se tornar com o decorrer do tempo efetiva como também poderá se efetivar em outra região ou mesmo continuar aparente em outra região Como exemplos marcantes cito os casos das indústrias de produtos metálicos de produtos químicos e de papel Em 1907 o estado da Guanabara concentrava respectivamente 48 33 e 38 da produção nacional daqueles bens para a média dos três ramos o grau de concentração seria de 40 Entretanto como a participação da produção nacional na oferta total desses bens era de cerca de um terço isso fazia com que aqueles graus de concentração agora relacionados não com a produção e sim com a oferta tivessem um significado menor reduzindo se em média a cerca de 13 a 14 da oferta total Dado que entre 1907 e 1919 a economia paulista entra em franca expansão e que as demais regiões do país apresentam um crescimento industrial sensivelmente inferior ao observado em São Paulo seria essa região a que passaria a apresentar níveis mais elevados de concentração industrial Se em 1907 São Paulo concentrava apenas 13 da produção nacional daqueles três ramos citados já em 1919 aquela cifra aumentaria para 38 e a Guanabara passaria de 40 para 31 Mesmo assim dado que a participação da produção nacional havia aumentado ainda mais no decorrer desse período situandose agora em cerca de 37 da oferta total aqueles graus de concentração da Wilson Cano 244 produção 38 para São Paulo e 31 para a Guanabara passavam apenas a ser um pouco mais significativos somandose os 14 referentes à participação da produção guanabarina na oferta total em 1907 aos 5 a que equivalia a produção paulista esses dois estados controlavam apenas 19 da oferta desses produtos feitos os cálculos para 1919 as duas regiões participariam agora com 25 da oferta total 14 referentes a São Paulo e os 11 restantes à Guanabara Como se vê a despeito de que essas duas regiões controlavam 69 da produção nacional desses ramos em 1919 total que havia sido de 53 em 1907 ainda assim se tratava mais de uma concentração aparente do que efetiva A diferença deste segundo caso para o primeiro reside em que neste a participação da produção nacional na oferta total é alta Assim sendo o cálculo dos graus de concentração regional da produção é relevante podendo caso a produção nacional esteja altamente concentrada ou então cartelizada por produtores de mais de uma região refletir um decisivo controle sobre a oferta total Tecidos de algodão calçados e chapéus constituem exemplos típicos dessa situação como se pode ver pelos dados abaixo que mostram as participações da produção de São Paulo e da Guanabara no total nacional Tomandose os dados para a produção total desses dois ramos e considerandose que o peso da produção nacional sobre a oferta total era de 65 em 1907 e de 88 em 1919 aqueles graus de concentração da produção ponderados pelas porcentagens acima passam agora a refletir uma participação sobre a oferta total de 38 em 1907 SP com 16 e GB com 22 aumentando para 53 em 1919 SP com 33 e GB com 20 Valor da produção de São Paulo e Guanabara em relação ao total do Brasil Produtos 1907 1919 Tecidos e outros têxteis SP 22 38 de algodão GB 27 49 17 55 Calçados SP 24 36 GB 56 80 42 78 Chapéus SP 30 66 GB 42 72 27 93 Todos os produtos têxteis SP 25 37 e de vestuário GB 33 58 23 60 Raizes da concentração industrial em São Paulo 245 Como desmembramento do caso anterior pode ocorrer também o fato de que embora sendo alta a participação da produção nacional sobre a oferta total o fenômeno não possa ser tratado como o de uma típica concentração nacional ou de um controle sobre a oferta nacional Dado o maior atraso relativo de algumas regiões e de sua estrutura de demanda e de oferta o consumo ou a utilização no caso de bens de produção ainda não incorpora certos tipos de bens ou os incorpora marginalmente Altos graus de concentração nesse caso significam efetivamente concentração da oferta regional e não nacional Como exemplos podem ser citados aparelhos e instrumentos elétricos cuja utilização está ainda mais restringida pela precariedade ou inexistência das redes de distribuição de energia elétrica Certos insumos mais complexos químicos e metálicos por exemplo assim como determinados bens de capital produzidos no país só eram utilizados naqueles centros onde a indústria já era um pouco mais diversificada Mesmo para alguns bens de consumo como por exemplo móveis tapeçarias e decorações cabe lembrar que tais produtos ainda não tinham uma utilização ampla em todas as regiões Isso fica mais claro ao se lembrar que era muito baixo o grau de urbanização da população brasileira no início do século XX Tanto pela rusticidade do mobiliário rural quanto pela precária urbanização podese depreender que a maior parte da produção da então moderna indústria desse ramo deveria naturalmente se concentrar nos maiores centros urbanos como na Guanabara e nas regiões de economia mais dinâmica como São Paulo Uma outra forma de ver esta questão decorre da verificação dos baixos níveis das exportações e importações interregionais de tais produtos o que configura uma situação de produção restrita à própria região Essas três ressalvas acima apontadas podem ser consideradas como válidas para o início de nossa formação industrial Entretanto elas passariam a sofrer substanciais modificações à medida que ocorressem profundas alterações na dinâmica regional e que a indústria fosse cada vez mais se implantando em poucas regiões Obviamente naquelas regiões onde mais cedo a indústria havia se concentrado principalmente na Guanabara e em São Paulo estavam por Wilson Cano 246 assim dizer criadas as condições mínimas para que a concentração aparente se transformasse gradativamente em concentração efetiva Tanto a decadência relativa da economia guanabarina como sua proximidade geográfica com a acelerada indústria paulista fariam com que aqueles altos graus de concentração que se observam em 1907 na Guanabara caíssem gradativamente sendo substituídos pelos crescentes graus observados na indústria paulista em 1919 Feitas essas ressalvas faço em seguida um breve comentário sobre os resultados desse processo para a indústria paulista Em 1907 Tabela 31 apenas quatro ramos industriais se destacam em termos de concentração da produção minerais nãometálicos papel têxtil e vestuário O primeiro deles se enquadra no terceiro caso significando apenas uma concentração aparente cuja produção atende basicamente ao mercado de São Paulo O ramo de papel e seus produtos enquadrase no primeiro pois a despeito de São Paulo concentrar 378 dessa produção em 1907 as importações desses produtos são ainda muito elevadas em relação à oferta Para que se tenha uma noção mais adequada da dimensão absoluta desse ramo naquela data basta dizer que seu valor de produção era mais de vinte vezes menor do que o valor da produção têxtil paulista A rigor nesse ano apenas os ramos têxtil e do vestuário apresentamse com alguma significação em termos de concentração regional efetiva O Censo de 1919 já coloca mais claramente os reflexos da aceleração da indústria paulista Em dez dos vinte ramos industriais essa indústria concentrava mais de 30 da produção nacional similar e em cinco ramos o grau de concentração atingia níveis superiores a 45 Em que pese isso apenas três desses ramos poderiam configurar uma efetiva concentração regional têxtilvestuário concentrando 37 da produção nacional e bebidas destacandose a produção de cerveja com 34 perfaziam juntos 45 da produção industrial de São Paulo e tinham expressiva participação nas exportações de manufaturas paulistas para o resto do país Os altos níveis verificados para os produtos metálicos já começavam então a ter significado um pouco mais expressivo em termos Raizes da concentração industrial em São Paulo 247 regionais e sua participação no valor da produção industrial em São Paulo já atingia um valor de cerca de 6 A indústria química e o papel que figuram em 1919 com graus de concentração de 309 e 48 respectivamente são ainda ramos industriais que estão dando seus primeiros passos tendo por conseguinte diminuta participação na própria produção industrial paulista 33 do total Tratavase ainda principal mente no caso da química do surgimento de pequenos e médios estabelecimentos industriais que operavam em escala regional raramente fabricando produtos de maior complexidade Tabela 31 Concentração industrial e produtividade relativa de São Paulo Ramos Concentração Industrial de São Paulo a Produtividade relativa de São Paulo b 1907 1919 1939 1907 1919 1939 c c Minerais nãometálicos 304 501 438 1015 1176 1101 Metalúrgica 454 414 699 1304 1200 Mecânica 198 730 1048 Mat elét e de comunic 675 964 Mat de transporte 39 546 871 960 365 11087 Madeira 105 221 310 939 1298 1324 Mobiliário 120 275 424 862 1120 1258 Papel 378 480 473 2286 1136 1032 Borracha 259 336 599 350 Couros e peles 146 321 290 1422 1320 1257 Química 309 612 1021 651 Farmacêutica 115 127 232 518 1108 1014 Perf Sabões e velas 38 258 386 772 794 1155 Têxtil 263 366 606 1538 1308 1997 Vestuário 220 380 449 766 1044 1310 Alimentar 99 260 330 1122 1318 1467 Bebidas 127 341 376 1009 992 1190 Fumo 09 147 344 3475 1793 2665 Editorial e gráfica 394 1107 Diversas 115 242 508 985 489 858 Total 159 315 454 1000 1122 1356 Fonte Censos Industriais de 1907 1920 e 1950 a Porcentagem do Valor Bruto da produção Industrial de S Paulo em relação ao total do Brasil b Valor Bruto da Produção por operário Índice 100 em cada ano resultado médio do total do Brasil exclusive S Paulo Ajustado o valor de 1919 com inclusão da produção açucareira Como já demonstrei seria precisamente durante o transcorrer da década de 1920 que se iniciaria aquilo que denominei de preparação de terreno para que a indústria paulista consolidasse sua posição no Wilson Cano 248 mercado nacional através da instalação de um ainda incipiente compartimento produtor de bens de produção Cimento aço metalurgia mais complexa e indústria química já então despontam com plantas de porte maior operando então em escala nacional Nesse período a concentração já deixa então de ser aparente para rapidamente se transformar em efetiva a indústria química já totalizava 8 da produção paulista e a de produtos metálicos alcançava a expressiva cifra de 168 ambas calculadas para o ano de 1939 É importante destacar o fato de que dos seis ramos industriais de São Paulo cujo grau de concentração era superior a 50 do similar nacional quatro pertenciam a esses novos segmentos sendo expressivos seus graus respectivos de concentração da produção nacional em 1939 química com 61 material elétrico com 67 mecânica com 73 e material de transporte com 87 sendo isto clara demonstração de que as principais plantas industriais desses ramos haviam sido implantadas para operar em escala nacional Resumidamente o que se nota de mais importante nessa evolução é que o momento específico dessa transição se dá entre o final da década de 1920 e os anos da década seguinte quando os altos níveis de concentração da indústria paulista passam a expressar maior efetividade Dos vinte ramos constantes na Tabela 31 apenas em dois o grau de concentração é inferior a 30 do total nacional o de couros e peles com 29 por ser uma indústria amplamente disseminada pelo território do país e também por não contar com plantas de grande escala de produção e o ramo da indústria farmacêutica até então configurado pela existência dos pequenos e médios laboratórios nacionais Coloco ainda na Tabela 31 os resultados que expressam as produtividades médias da indústria paulista relacionadas com as médias observadas para o agregado Brasil exclusive São Paulo20 O exame 20 Para tornar comparáveis os Censos referidos aos anos de 1907 1919 e 1939 fui obrigado a utilizar o conceito de produtividade como quociente entre o valor bruto da produção e o número de operários No Apêndice Estatístico acrescento uma nota explicativa tentando esclarecer alguns aparentes paradoxos dos níveis regionais de produtividade Dadas as peculiaridades regionais da indústria em seus primeiros anos chamo a atenção para a necessidade da leitura dessa nota a fim de evitar possíveis equívocos de interpretação do fenômeno ver nota à Tabela 61 Raizes da concentração industrial em São Paulo 249 desses dados permite uma caracterização complementar às observações já feitas à medida que evoluía e que concentrava maiores parcelas da produção industrial do país a indústria paulista alcançava melhores resultados do que a indústria do resto do país Observese que em 1907 dentre os dezessete ramos industriais contemplados pelo Censo daquele ano apenas em sete a indústria paulista apresentava níveis de produtividade francamente superiores aos do restante do país Os Censos de 1919 e de 1939 já mostrariam resultados mais expressivos de forma que apenas em quatro dos vinte ramos industriais a indústria de São Paulo mostrava resultados inferiores aos verificados no restante do país Como seria de se esperar na maioria dos casos alta produtividade anda de mãos dadas com alta concentração Evidentemente os fatos até agora apontados salvo aqueles apresentados no Capítulo 1 não bastariam para explicar satisfatoria mente esse processo de concentração da indústria paulista Há que se ter em mente também as causas pelas quais o restante do país não reagiu pronta e eficientemente para preservar seus mercados e ampliar sua indústria Nesse sentido são ainda necessários alguns comentários sobre duas importantes questões o retrocesso relativo da indústria guanabarina o tipo de ajuste complementar entre a economia de São Paulo e a das outras regiões que se vai estruturando ao longo desse processo concentrador 321 Retrocesso industrial na Guanabara Tendo em seu porto marítimo a principal entrada e saída dos mais importantes fluxos da atividade mineradora do século XVIII e da cafeeira no século XIX e passando também a ser sede do governo central a partir de 1763 a Guanabara certamente usufruiu parte importante do excedente gerado por tais economias assim como se beneficiou de boa parcela do gasto público Principalmente por sua ação intermediadora nos fluxos da economia cafeeira é que floresce e se desenvolve uma intensa atividade comercial e financeira que conferiu à Guanabara a condição de Wilson Cano 250 primeiro centro comercial e financeiro do país pelo fato de ser a sede do governo isto lhe conferiu ainda o caráter de principal centro político nacional Além de intermediar os fluxos de sua vizinha e tributária região cafeeira Rio de Janeiro parte de Minas Gerais e de São Paulo o comércio atacadista da Guanabara também estendia suas atividades participando ativamente da distribuição comercial para outras regiões do país Essa região teve portanto excelentes condições para desenvolver um setor industrial mais amplo Entretanto algumas ressalvas devem ser feitas para demonstrar que essa aparente excepcionalidade teve contra si uma série de fatos que atenuaram sua capacidade germinativa Em primeiro lugar cabe lembrar que as deficientes condições de operação e de acumulação da economia escravista cafeeira restringiam a ampliação do excedente tanto pela necessidade de acumular na forma de compra de escravos quanto pelos apreciáveis gastos com importações de meios de subsistência Em segundo lugar a predominância do trabalho escravo tanto no café quanto nas demais economias do país limitou a expansão do mercado interno o que por sua vez obstaculizou também uma possível formação industrial mais ampla Por último as condições da política cambial e tarifária salvo em situações especiais não foram de molde a favorecer uma industrialização mais decisiva Esta última limitação aliás antes de significar uma contradição na realidade espelhava muito bem a defesa dos interesses da economia agrárioescravistaexportadora que obtinha pelas importações os meios de subsistência necessários a custos certamente menores do que os proporcionados por eventual produção interna Como exemplo lembro o caso da velha e prolongada luta riograndense para a tentativa de obter maior proteção tarifária para o charque nacional Em que pesem tais limitações a Guanabara despontou mais cedo do que as demais regiões na concretização de um implante industrial conforme mostra o Censo Industrial de 1920 487 do capital declarado pelas indústrias da Guanabara nesse ano pertencia a empresas fundadas antes de 1890 e depois dela a porcentagem mais alta é a que figura para o Rio de Janeiro com 299 Tomandose os dados para o total do Brasil Raizes da concentração industrial em São Paulo 251 inferese que até 1889 a Guanabara detinha 57 do capital industrial brasileiro exclusive o do açúcar cifra essa que baixaria para 29 em 1907 Disso se infere que à medida que a situação da antiga economia cafeeira do Vale do Paraíba e da vizinha região de Minas Gerais se agravava a Guanabara ia entrando num processo de atrofia relativa Ao mesmo tempo o surgimento e a expansão da nova cafeicultura paulista iam gradativamente deslocando o centro dinâmico da economia nacional para a região de São Paulo Penso que as facilidades decorrentes da política econômica vigente no período do encilhamento certamente permitiram um novo alento à indústria guanabarina retardando por mais algum tempo seu inexorável e relativo retrocesso industrial Stein sugere o fato de que é exatamente nesse momento que são instaladas naquele estado várias de suas maiores e mais eficientes fábricas de tecidos Por outro lado advinda a crise decorrente dessa política os principais auxílios financeiros do governo parecem ter beneficiado principalmente as fábricas da Guanabara21 Dadas a insignificância de sua agricultura a precariedade desse setor na região fluminense e a gradativa decadência do café a Guanabara teria de passar por uma profunda reestruturação de sua economia que se tornaria cada vez mais dependente de atividades prestadoras de serviços em que merece destaque especial o governo advindo daí portanto um sério freio à acumulação de capital para a expansão industrial Pelo lado do mercado cabe lembrar que a Guanabara além de contar com seu importante mercado urbano dispunha também dos mercados da tributária região cafeeira e ainda de parte do mercado do restante do país Essa amplitude de mercado explica em parte o alto grau de concentração industrial que figura no Censo de 1907 em que a Guanabara figura como detentora de 30 da produção industrial do país Entretanto uma análise mais acurada desse censo permite mostrar alguns fatos que esclarecem um pouco mais essa questão 21 Ver Stein 1957 especialmente as páginas 81 a 97 Wilson Cano 252 Em primeiro lugar essa indústria era uma das mais diversificadas do país tendose em conta que dos 98 grupos de produtos que figuram no Censo de 1907 a Guanabara tinha fábricas que produziam 78 desses grupos de produtos e em vinte deles ela era a única produtora no país Em que pese isso dezoito desses vinte grupos se caracterizam como segmentos formados por pequenos estabelecimentos cujos volumes de produção estavam obviamente vinculados ao mercado local Analisada essa indústria em termos dos dezoito ramos industriais existentes verificase que em apenas cinco deles estaria ocorrendo uma certa concentração moinhos de trigo com 56 da produção nacional vestuário com 55 o pequeno ramo de construção naval com 53 o de bebidas destacandose a fabricação de cerveja com 41 do total nacional e o de tecidos em que a porcentagem de 25 do total nacional não revela fielmente o grau de concentração Tanto pelo fato de que o coeficiente de importações desse ramo já era um dos mais baixos como pelo fato de que a população da Guanabara no início do século XX contava com um total de cerca de 800 mil habitantes e a sua produção física de tecidos 80 milhões de metros era certamente de quatro a cinco vezes superior ao seu consumo tornase claro que essa indústria tinha um apreciável volume de exportações interregionais Nos demais ramos em que pese o fato de que em alguns a porcentagem da participação no total nacional fosse alta por exemplo perfumarias sabões velas móveis etc creio que o grau de concentração era mais aparente do que efetivo22 Quando muito a concentração efetiva poderia ocorrer nos estados vizinhos mas não em nível nacional Um fator certamente importante que dava condições de competitividade à indústria guanabarina era o acentuadamente grande tamanho de suas principais fábricas cuja dimensão média excedia em muito a dimensão média das grandes fábricas paulistas Talvez seja esse o fator que pudesse 22 Isto se explica pelos seguintes fatos em primeiro lugar pelo fato de que indústrias como as de sabões e velas e de certa forma a de móveis eram indústrias mais restritas a mercados locais Perfumarias e móveis principalmente estavam diretamente vinculados ao consumo dos maiores centros urbanos Ver em páginas anteriores o terceiro dos três casos tratados em que discuto a questão da concentração aparente e efetiva Raizes da concentração industrial em São Paulo 253 explicar a produtividade maior da indústria dessa região em relação à de São Paulo até 190723 Além de sofrer os efeitos decorrentes da decadência cafeeira de sua região tributária que lhe restringiu suas fontes de acumulação também pelo lado do mercado a Guanabara passava a sofrer novos reveses essa mesma decadência cafeeira passava obviamente a atrofiar os mercados dessa região tributária reduzindo portanto esse escoadouro para a produção industrial da Guanabara a partir do final do século XIX a grande expansão cafeeira paulista resultaria numa acentuada expansão industrial em São Paulo ganhando destaque ainda maior a partir de 1907 fazendo com que o mercado paulista passasse em parte a ser suprido por sua própria indústria deslocando assim a produção manufatureira guanabarina Por outro lado essa deslocação implicava também reduzir o âmbito das atividades comerciais daquela região restava portanto àquele estado tentar preservar seu mercado interior e o de sua limítrofe região e na medida do possível conquistar parcialmente outros mercados ainda não atingidos pela indústria paulista O resultado desse período crítico de encolhimento de seus mercados e de suas fontes de acumulação pode ser visto pela comparação dos Censos de 1907 e de 1919 que mostra a queda da participação de sua indústria no total nacional dos 302 passava para 208 entre aqueles anos enquanto a produção industrial paulista de forma acentuada e a de Minas Gerais de forma modesta aumentavam suas participações Tabela 32 Um agravante desse quadro é que a indústria guanabarina era obrigada a pagar a maior taxa média de salário do país o que obviamente 23 Talvez decorrente de maiores economias de escala a relação operários estabelecimento era na Guanabara 43 maior do que em São Paulo a produtividade média daquele estado era 21 maior do que a da indústria paulista Essa situação se modificaria entre 1907 e 1919 como já mostrei na Tabela 27 A questão referente à grande dimensão média dos estabelecimentos individuais na Guanabara foi inicialmente abordada por Silva SS 1976 p 113 119 Wilson Cano 254 lhe encarecia os custos de produção24 Creio que a razão fundamental dessas maiores taxas de salários reside no fato de que o custo de alimentação da mãodeobra nessa região teria que ser muito alto por força da inexistência de agricultura local e da precariedade agrícola de seu mais próximo vizinho o estado do Rio de Janeiro Tomados por exemplo os dados do Censo de 1920 a população do Rio de Janeiro e a da Guanabara somadas representavam 89 do total nacional e sua produção agrícola exclusive café representava apenas 38 Se comparadas com São Paulo as populações daqueles dois estados equivaliam a 59 da população paulista mas sua produção agrícola exclusive café equivalia a menos de 18 da produção similar de São Paulo Uma curiosa informação contida no Censo de 1920 e referida apenas ao estado da Guanabara parece ser um bom indicador da forma pela qual sua indústria tenta se defender do problema dos salários altos Aumento de salários dos operários entre 1920 e 1928 Homens adultos Homens menores Indústria têxtil 127 357 Indústria metalúrgica 496 777 Indústria química 523 1190 Indústria do vestuário 343 325 Fonte IBGE Censo de 1920 v V parte 21 p XIX Os dados acima parecem indicar claramente um aumento de salários dos menores com o intuito provável de forçar a ampliação do número desses trabalhadores na força de trabalho industrial da região com o que se rebaixaria a taxa média de salário Notese ainda que os reajustamentos dos salários dos adultos são visivelmente inferiores ao aumento do custo de vida calculado por Oliver Onody que para o 24 A relação entre o total de salários e o valor de transformação industrial era de 34 na Guanabara em 1919 sendo de 26 em São Paulo e de 27 para a média brasileira Como a produtividade industrial na Guanabara valor de transformação industrialoperário em 1919 era inferior à de São Paulo isso implica que também o excedente por operário era inferior ao observado na indústria paulista demonstrando com isso ser a indústria daquele estado tanto menos lucrativa opera a maiores custos com menor produtividade quanto menos competitiva do que a indústria paulista Além disso seu menor excedente certamente fazia diminuir suas fontes autônomas de acumulação Raizes da concentração industrial em São Paulo 255 mesmo período totalizava um acréscimo de 60 O distinto comportamento da indústria do vestuário talvez se deva a que por um lado grande parte do trabalho executado para essa indústria era ainda feita no próprio domicílio dos operários e por outro lado o emprego de mulheres e de menores já era bastante elevado nesse ramo A década de 1920 traria um novo alento à indústria guanabarina É durante esse período que a economia cafeeira de Minas Gerais se recupera e que ocorre a grande expansão cafeeira do estado do Espírito Santo mantendose ainda o lento declínio do café na zona fluminense Essa expansão cafeeira que em termos relativos foi maior do que a verificada em São Paulo no mesmo período e a expansão do gasto público federal parecem ter sido os fatores responsáveis pela atenuação do retrocesso industrial da Guanabara Em que pese isso fica a impressão de que a notável expansão industrial de São Paulo que continua a ser elevada nessa década deve ter inibido em grande parte essa tentativa de recuperação da Guanabara Não se dispõe de informações sobre a produção desse estado para o final da década e os dados mais próximos lamentavelmente são os fornecidos pelo Censo de 1939 Como entre esses dois períodos ocorre a grande depressão não tenho meios de saber qual a intensidade de tais eventos sobre essa indústria Em 1939 a participação da indústria guanabarina no total nacional caía ainda mais dos 208 observados em 1919 ela passava para 1725 A economia guanabarina passaria portanto gradativamente a ter nas atividades terciárias o seu núcleo principal Já em 1919 o Censo Demográfico mostrava que apenas 384 de sua população economi camente ativa estava alocada na produção física e os restantes 616 na produção de serviços 15 em serviços domésticos Essas cifras são muito importantes quando se pode comparálas com as de São Paulo que no mesmo período ocupava 805 de sua força de trabalho na produção física ou mesmo com as cifras das demais regiões brasileiras que apresentavam uma ocupação de 866 na produção física 25 E continuaria a cair cada vez mais passando a 138 em 1949 97 em 1959 e 85 em 1970 Para uma análise da situação econômica da Guanabara na década de 1950 ver Magalhães 1961 Wilson Cano 256 Uma indicação ainda mais concreta dessa transformação é dada pelo exame das Contas Nacionais que para o ano de 1939 mostram os seguintes dados YgYf YgYt YfYt Guanabara 465 120 258 São Paulo 93 41 447 Demais estados 112 63 560 Yg renda do setor governo Yf renda gerada pela produção física Yt renda interna total Fonte FGV IBRE Contas Nacionais do Brasil 1972 A despeito de sua reestruturação interna a Guanabara tentou reagir ao retrocesso certamente forçando uma penetração maior nos mercados das demais regiões do país aliás sem grande sucesso Calculada sua participação industrial não no total brasileiro mas sobre o agregado Brasil exclusive São Paulo o que se nota é que seu relativo retrocesso é menos acentuado de 359 em 1907 passava para 333 em 1919 para 311 em 1939 e após essa data sua queda se tornaria mais evidente passando para 266 em 1949 218 em 1959 e 193 em 1970 Como se depreende sua reação na realidade constituiuse mais em perder menos do que em ganhar As razões principais pelas quais essa queda não foi ainda mais grave penso residirem em dois fatos O primeiro é o de que sua indústria foi desde o início estruturada com estabelecimentos de grande porte e de alta produtividade o que lhe conferiu melhores condições de competitividade nas demais regiões O segundo talvez o mais importante reside em que constituindo ela o segundo mercado na escala nacional permitiuselhe embora não tanto como em São Paulo a implantação de ramos industriais complexos que ao mesmo tempo em que complementavam sua antiga produção industrial também garantiam para si uma reserva do mercado nacional Claro é que este último fato não decorreu substancialmente de decisões intrínsecas ao processo de acumulação de capital na própria região em grande medida isso foi proporcionado pela ação mais decisiva do setor público e por inversões diretas de capital estrangeiro Raizes da concentração industrial em São Paulo 257 322 A complementaridade das demais regiões As demais regiões do país exclusive a Guanabara ou se apresentavam praticamente desprovidas de indústrias como por exemplo o CentroOeste e o estado do Espírito Santo ou então haviam implantado uma indústria vinculada a uma base agrícola tradicional e relativamente especializada26 Esse implante industrial para quem verificasse apenas as participações de cada região na indústria brasileira em 1907 dava a falsa impressão de que algumas dessas regiões já haviam precocemente implantado uma indústria que pouca diferença teria em relação à de São Paulo Rio Grande do Sul com 135 do total nacional e o Nordeste com 167 situavamse dessa forma muito próximos aos 159 de São Paulo da mesma forma os 45 da representação industrial do Paraná eram ligeiramente superiores aos 44 de Minas Gerais Essa alta porcentagem na realidade estava mascarada pela produção de vários bens que de certa forma era decorrência de uma específica dotação local de recursos naturais ou de uma atividade agrícola ou pecuária de longa data implantada nessas regiões Muitas dessas atividades pouco tinham a ver efetivamente com a base e a dimensão de seus próprios mercados locais como por exemplo o charque no Rio Grande do Sul a banha em Santa Catarina o mate no Paraná o açúcar e o sal no Nordeste ou então a madeira no Paraná na Amazônia ou em Santa Catarina Estavam isto sim voltadas basicamente para mercados externos do exterior ou do resto do país Em grande medida portanto grande parte daquilo que se poderia chamar de concentração visível em termos regionais referiase na realidade a um problema de concentração por especialização natural de alguns segmentos da produção industrial Por outro lado esse tipo de concentração pouco tem a ver com uma dinâmica industrial própria efetivamente essa produção concentrada estava vinculada a uma dotação especial de recursos naturais ou então ligada a determinada base agropecuária cuja evolução já havia sido delineada no passado 26 No caso do Amazonas as principais indústrias locais estavam vinculadas à atividade extrativa da borracha como por exemplo a produção de pequenos artigos de folha de flandres e as atividades de apoio ao sistema de navegação local fundições principalmente Wilson Cano 258 Enquadramse nesse tipo de concentração os seguintes grupos de produtos cujo valor da produção industrial equivalia a 256 da produção industrial do Brasil em 1907 Produtos Principal região produtora da produção nacional do valor da produção industrial da região Madeira serrada Pará 225 385 Açúcar Nordeste 710 385 Sal Nordeste 895 69 Laticínios Minas Gerais 757 161 Charque e banha Rio Grande do Sul 946 496 Erva mate Paraná 717 489 Fonte IBGE Censo Industrial 1907 Davam assim a ilusão de uma indústria de porte nacional quando efetivamente tratavase de indústrias antigas e pouco dinâmicas em termos de efeitos de encadeamento com as próprias economias locais À medida que crescia o mercado nacional para tais produtos surgiam paralelamente novas fontes produtoras desses bens aumentando assim a competição entre essas regiões por exemplo a tradicional competição entre os estados sulinos e entre estes e o de Minas Gerais Isto obviamente enfraquecia ainda mais aquela precária e ilusória situação Mais grave ainda eram os casos de produtos exportáveis ou importáveis cuja demanda externa ou sua oferta externa imprimisse uma situação de deterioração de seus preços e de suas quantidades Tabela 32 Crescimento nominal e concentração da produção industrial a Regiões Concentração Crescimento Índice 1907 100 1919 100 Velocidade relativa do crescimento de São Paulo b 1907 1919 1939 1919 1939 1939 1919 1907 1939 1919 1939 1907 São Paulo 159 315 454 854 6020 704 100 100 100 Guanabara 302 208 170 298 1185 398 287 177 508 Rio de Janeiro 76 74 50 423 1396 330 202 213 431 Minas Gerais 44 56 65 543 3080 567 157 124 195 Rio G do Sul 135 111 98 354 1541 435 241 162 391 Demais 284 236 163 359 1208 337 238 209 498 Brasil 10000 10000 10000 432 2110 489 198 144 285 Fontes dados primários Censos Industriais reajustado o Censo de 1919 com a inclusão da produção açucareira a Cálculos sobre o valor bruto da produção industrial a preços correntes incluindo apenas a indústria de transformação Raizes da concentração industrial em São Paulo 259 b Divisão do índice de crescimento de São Paulo pelos índices dos demais estados Por outro lado o excepcional desempenho da agricultura paulista deslocava antigos e tradicionais supridores de seu mercado tanto no que se refere aos alimentos simples ou industrializados como em relação às matériasprimas Nem mesmo o algodão e o açúcar tradicionalmente produzidos e exportados pelo Nordeste escapariam anos mais tarde a essa depressiva trajetória A mais dinâmica economia do país explorava crescentemente toda e qualquer oportunidade diversificadora em sua própria região Essa situação seria ainda agravada em dois momentos precisos ver Tabela 32 O primeiro que compreende o período de 1907 a 1919 é aquele em que a indústria paulista dá seu grande salto quantitativo crescendo em termos nominais na proporção de 185 ao passo que a indústria do resto do país crescia na proporção de 135 Nesse momento a indústria paulista praticamente consolidava a preservação de seu próprio mercado fazendo inclusive durante a Primeira Guerra uma importante investida nos mercados das demais regiões do país No segundo momento a década de 1920 a indústria de São Paulo dá um novo grande salto dessa vez não apenas quantitativo mas também qualitativo ao implantar ainda que precoce e incipientemente um pequeno compartimento produtor de bens de capital e de insumos mais complexos diversificando também em certa medida sua produção de bens de consumo a têxtil principalmente É nesse período 19201928 que a indústria paulista cresce em termos reais à taxa média anual de 66 enquanto a do resto do país apresentava um crescimento bastante inferior em torno de 34 ver Apêndice Estatístico Esse segundo período foi portanto altamente significativo para a indústria paulista ao lhe preparar o terreno para a conquista do mercado nacional principalmente após a Grande Depressão É provável que a expansão industrial de São Paulo que se verifica entre 1919 e 1939 só não foi ainda maior em face dos problemas decorrentes das dificuldades impostas tanto pela grande depressão como pelo início da Segunda Guerra Mundial Entre esses dois anos em termos nominais a indústria de São Paulo cresce na proporção de 17 e a do resto do país cresce na proporção menor de 139 sendo a diferença entre as duas regiões um pouco menor do que a verificada no período 19071919 Wilson Cano 260 Calculada a velocidade relativa do crescimento industrial de São Paulo nos dois períodos 8535 e 739 verificase que os coeficientes resultantes 243 no primeiro período e 181 no segundo mostram uma diminuição relativa no ritmo de expansão da indústria paulista Fica portanto muito claro que o processo de concentração industrial de São Paulo já fora desencadeado entre 1907 e 1919 e graças à dinâmica da economia paulista que mantém altas taxas de crescimento na década de 1920 a indústria do resto do país não conseguiria jamais alcançála Com os dados que se dispõe tornase difícil saber quais dentre as demais regiões mais perdeu nessa depressiva trajetória se o Rio Grande do Sul que perfazendo 135 da produção industrial brasileira em 1907 passava a responder apenas por 98 em 1939 se Pernambuco que passava de 74 para 48 se a Bahia que passava de 34 para 14 ou se o Norte que alterava sua participação de 43 para apenas 11 Provavelmente o mais afetado de todos tenha sido o Nordeste 167 para 104 uma vez que sua base produtiva centrada principalmente no algodão e no açúcar passava agora a sofrer um duplo condicionamento exterior já secularmente atingida pelas adversas condições do mercado internacional sofria também o condicionamento de seu principal mercado no país a economia paulista que mais tarde substituiria com produção local grande parte do açúcar e do algodão nordestinos Dentre todas as demais regiões Minas Gerais foi a única que a rigor obteve um crescimento mais acentuado nesse transcurso É esse estado o que mais se aproxima da expansão de São Paulo e praticamente o único a ter um aumento na participação de sua indústria no total da indústria nacional ver Tabela 32 passando de 44 em 1907 para 56 em 1919 e para 66 em 1939 Esse desempenho assim penso deve ser atribuído aos seguintes fatos à crescente articulação de sua economia agrícola com o mercado nacional à expansão cafeeira que se dá na década de 1920 certamente contribuindo na expansão industrial desse estado porém o maior destaque para a expansão industrial mineira entre 1919 e 1939 é o que se refere à notável expansão de sua indústria metalúrgica a Raizes da concentração industrial em São Paulo 261 qual participando em 1919 com apenas 23 do valor da produção industrial desse estado cresceria para 233 em 1939 tendo seu valor nominal de produção aumentado em mais de 60 vezes enquanto os demais ramos industriais desse estado aumentavam em menos de 5 vezes Grande parte dessa expansão sem dúvida alguma estaria vinculada de forma complementar à expansão industrial de São Paulo a partir de meados da década de 1920 Finalizando concluo que as indústrias das demais regiões passariam a partir da década de 1930 a ter uma expansão industrial bastante condicionada Subsistiriam alguns compartimentos industriais específicos que ainda se beneficiavam de proteção natural enquanto outros vegetariam subordinados às condições dominantes da demanda externa27 Por outro lado os segmentos industriais que mais cresceriam seriam aqueles vinculados à complementação industrial ou ao abastecimento alimentar da economia paulista Portanto a partir desse momento as demais regiões passariam assim a sofrer um duplo condicionamento o do exterior para as tradicionais exportações de produtos primários e o da economia paulista tanto para as exportações tradicionais como para novos produtos demandados por essa dinâmica economia A periferia dessa forma jamais conseguiria ativar suas forças endógenas isto é aquelas inerentes à sua própria dinâmica para romper com esse quadro Tal ruptura se efetivamente tivesse condições de ocorrer somente poderia se dar através de uma ação maior do estado 27 Devese lembrar que a integração dos sistemas de transportes rodoviários somente atingiria níveis mais expressivos a partir da década de 1950 Conclusões Seria mera redundância colocar nestas últimas linhas as conclusões específicas a que cheguei no desenvolvimento de cada passo deste trabalho Limitome portanto aos resultados mais gerais e talvez mais relevantes Cabe lembrar de início que a economia cafeeira em São Paulo exigiu mais cedo a instituição do regime de trabalho livre a fim de que a acumulação cafeeira pudesse ter continuidade A solução desse problema pela imigração não eliminava apenas aquele freio à expansão do plantio cafeeiro fez muito mais do que isso criando um mercado amplo para alimentos e produtos industriais de consumo corrente abrindo dessa forma excelentes oportunidades de inversão tanto para o desenvolvi mento de uma agricultura mercantil quanto para a indústria Essa imigração constituindo uma superabundante oferta de força de trabalho permitiu ainda a formação de um mercado de trabalho livre que funcionou com baixas e flexíveis taxas de salários resolvendo precocemente o problema do suprimento de força de trabalho à economia urbana que se desenvolveu a partir da década de 1880 Portanto a nascente indústria paulista embora subordinada pelo capital cafeeiro dele beneficiavase duplamente recebia o mercado criado pelo café ao mesmo tempo em que dispunha de força de trabalho barata e abundante Café agricultura transportes indústria comércio e finanças cresciam assim dinâmica e integradamente ampliando consideravel mente o potencial de acumulação do complexo paulista Dessa forma a economia paulista contou com amplas condições para o seu desenvolvimento ao contrário do que ocorria no restante do país a Amazônia em face de sua típica economia do aviamento o Nordeste por suas precárias relações capitalistas de produção bem como por sua concentrada estrutura de propriedade e de renda o Extremo Sul pela forma de produção da economia camponesa que atomizava o excedente e gerava uma indústria constituída também pela pequena e média Wilson Cano 264 empresa a região do Rio de Janeiro pela decadência cafeeira e pela precariedade de sua agricultura Minas Gerais por sua indústria dispersa e desconcentrada que embora protegida por custos de transportes sofria por isso mesmo a limitação de seu próprio mercado Ao contrário das demais regiões São Paulo formou um compartimento industrial eficientemente estruturado com alta produtividade o que lhe conferia melhores condições de competitividade A indústria paulista entre 1907 e 1919 dava seu grande salto quantitativo crescendo em termos nominais mais do que o dobro do que a indústria do resto do país A Primeira Guerra por outro lado constituiu um verdadeiro teste para sua capacidade em conquistar o mercado nacional Entre 1919 e 1929 além da expansão quantitativa a indústria paulista também dava um salto qualitativo diversificando sua produção e introduzindo ainda que de forma incipiente alguns segmentos industriais mais dinâmicos de bens de produção já instalados com dimensão para suprir um mercado em escala nacional É nessa segunda etapa aliás que a concentração da indústria brasileira em São Paulo se tornaria mais efetiva Devo destacar também que não foi apenas pelo lado da produção industrial que as demais regiões perderam suas oportunidades também pelo lado da produção agrícola deixaram de ganhar pelo fato de que a agricultura mercantil de São Paulo desenvolveuse cedo abastecendo em grande medida a própria economia paulista A exceção a essa regra no período estudado foi exatamente a região mais sofrida o Nordeste por sua complementação com São Paulo no suprimento de açúcar e em parte também de algodão Isto me conduz a uma interrogação em que medida esse duplo condicionamento restringindo os mercados exteriores para as demais economias regionais e portanto impedindo um processo mais aberto de desenvolvimento poderia estar na base de conflitos subjacentes ao processo revolucionário de 1930 Sobrevinda a Grande Depressão a violenta compressão na capacidade para importar e os mecanismos acionados pelo estado para a defesa do nível de renda da cafeicultura desencadeariam nova forma de crescimento industrial O maior beneficiário obviamente teria de ser o Raizes da concentração industrial em São Paulo 265 compartimento industrial mais avançado do país isto é a indústria paulista que consolidaria dessa forma a conquista de seus mercados exteriores no restante do país Não se tratava portanto como se poderia pensar de novo modelo que criasse oportunidades de inversão indiscriminadamente a quaisquer regiões do país Furtado em sua clássica explicação dos mecanismos de recuperação da década de 1930 deixa bem claro o importante papel desempenhado nessa recuperação pelo grau de capacidade ociosa da indústria Penso que a leitura deste texto principalmente do Capítulo 3 deixou claro que a taxa de acumulação industrial foi mais elevada em São Paulo do que nas demais regiões o que possibilitou a essa economia fruir mais do que as outras aquela vantagem Entretanto isso não é tudo À recuperação industrial paulista com a retomada depois do investimento ampliador da capacidade produtiva adicionouse a transformação de sua agricultura principalmente com a expansão algodoeira e açucareira o que não só reforçava a economia paulista mas também iniba a economia do restante do país também nesse setor produtivo Finalizando penso ter sido claro ao mostrar que a expansão industrial de São Paulo se deu pelo dinamismo de sua própria economia e não como se poderia pensar pela apropriação líquida de recursos provenientes da periferia nacional Se isto também ocorreu certamente foi de menor expressão pelo menos até 1930 A periferia perdeu o jogo tanto pela sua débil integração ao comércio internacional quanto e principalmente por não ter desenvolvido relações capitalistas de produção mais avançadas e por isso mesmo não ter diversificado suficientemente sua estrutura econômica Bibliografia ACCURSO C VERAS A CANDAL A Análise do insuficiente desenvolvimento econômico do Rio Grande do Sul Porto Alegre Assembléia Legislativa 1965 ALMEIDA JR MEYER A C 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Agricultura Indústria e Comércio BOLETIM DA DIVISÃO DE ECONOMIA RURAL São Paulo Secretaria da Agricultura BOLETIM DO DEPARTAMENTO ESTADUAL DE ESTATÍSTICA São Paulo Departamento Estadual de Estatística Wilson Cano 268 BRASIL Ministério da Educação e Saúde Obras completas de Rui Barbosa Rio de Janeiro Imprensa Nacional 1950 Relatório do Ministro da Fazenda v 18 t 3 1891 BRASIL Ministério da Fazenda Comércio exterior do Brasil Rio de Janeiro Serviço de Estatística Comercial 190110 BRASIL Ministério da Agricultura e Comércio Relatório do Ministro Rio de Janeiro Imprensa Nacional CALDEIRA Nelson Mendes Aspectos da evolução urbana de São Paulo Boletim do Departamento Estadual de Estatística São Paulo jun 1939 CALOGERAS J P La politique monetaire du Brésil Rio de Janeiro Imprimérie Nationale 1910 CAMARGO José F de Crescimento da população no Estado de São Paulo e seus aspectos econômicos Boletim da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras USP São Paulo n 153 1953 Êxodo rural no Brasil formas 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São Paulo com o resto do Brasil Xexportações Mimportações Médias Anuais Índice da Tonelagem a Índice do Valor a Produtos manufaturados b 1000 contos Relação X M X M X M XM XM 19091911 100 100 100 100 145 83 72 175 19141918 259 138 322 260 508 186 322 273 19191920 341 144 590 331 913 334 579 273 19211923 353 202 759 582 1182 636 546 186 19241926 487 311 1393 916 2385 1076 1309 222 19271929 653 406 1990 1200 3452 1502 1950 230 a Total geral compreendendo todos os produtos b Só manufaturados excluídos os alimentos industrializados Fonte dados primários Comércio de Cabotagem pelo Porto de Santos Departamento Estadual de Estatística São Paulo vários anos Wilson Cano 276 Tabela 35 Comércio exterior Participação do Estado de São Paulo no total das exportações X e importações M brasileiras Anos X M Anos X M 1900 311 140 1945 505 394 19091910 a 365 202 1946 529 429 1915 446 269 1947 502 432 1921 492 301 1948 498 435 1925 545 381 1950 494 435 1928 528 401 1952 466 467 1930 508 339 1955 414 488 1931 516 370 1956 462 496 1932 442 292 1957 389 490 1933 555 370 1958 275 556 1934 561 393 1959 326 536 1935 505 657 1960 312 558 1936 529 393 1961 320 520 1937 486 390 1963 323 478 1938 541 385 1965 297 520 1939 542 398 1968 354 522 1940 492 417 1969 363 526 1941 477 412 1970 337 474 1942 419 363 1971 354 489 1943 445 298 1972 396 487 a Média anual Fonte Anuário Estatístico do Brasil IBGE Rio vários anos Anuário Estatístico de São Paulo Repetição de Estatística e Archivo do Estado SP 1912 Boletim do Departamento Estadual de Estatística de São Paulo SP vários anos Comércio de Cabotagem pelo Porto de Santos 19431944 Departamento Estadual de Estatística SP 1948 Tabela 36 Comércio exterior e interregional B Balança comercial do resto do Brasil Brasil exclusive São Paulo com o resto do mundo exterior E e com São Paulo cabotagem C e vias internas V a Cr 1000 Exportações X Importações M Saldos XM E C V Total E C V b Total E C V Total 1911c 5230 450 6008 204 486 6698 778 246 1915 5771 908 4261 519 1028 5808 1510 389 1918 7657 1752 7317 968 2181 10466 340 784 1920 8919 1447 14771 1356 1728 17855 5852 91 1928 18752 6013 22148 4182 3396 1831 1930 14792 3545 15489 3161 697 384 1935 20328 3870 23164 5866 2836 1996 1937 26191 5455 5996 37642 32432 6623 14190 53245 6241 1168 8194 15603 1939 25711 5698 8127 39536 30005 8183 15191 53379 4294 2485 7064 13843 1940 25214 6339 28944 10081 17399 56424 3730 3742 1941 35175 8360 32426 13043 27671 73140 2749 4683 1942 43544 8798 24908 77250 29907 13679 32641 76227 13637 4881 7733 1023 1943 48428 9187 35491 93106 43273 14529 51191 108993 5155 5342 15700 15887 1947 105445 22298 66908 196451 129400 25555 65425 220380 23955 3257 1483 25729 1948 108885 27242 119084 29767 56076 204927 10199 2525 1950 126070 23640 94028 253738 114782 34072 97130 245984 11288 432 3102 7754 1952 139213 41027 118647 298887 198111 43382 124317 365810 58898 2355 5670 66923 1955 319560 85366 208470 613396 308421 81375 217744 607540 11139 3991 9274 5856 1956 320071 132892 197607 115489 122464 17403 1957 370835 131860 441038 115031 70203 16829 1958 462252 133014 459047 120617 3205 12397 1959 737771 154384 748932 162946 11161 8562 1960 1011564 190051 889193 181556 122371 8495 1961 1667016 237589 1437949 237775 3428040 5103764 229067 186 1963 3722206 294874 4081501 235029 359295 59845 1965 15566358 1082268 9265843 696006 6300515 386262 1968 39904960 1696170 47855760 89456890 32660810 791160 109889800 7244150 905010 620340400 53884880 Notas Indica Informações incompletas a Para o comércio interregional só se considerou o comércio do Resto do Brasil com São Paulo eliminandose as transações interregionais efetuadas pelos Estados e territórios componentes do agregado resto do país b Para os anos de 1911 a 1920 equivalem apenas às exportações embarcadas pela estrada de Ferro Central do Brasil representando certamente apenas valores parciais c Nível anormalmente baixo de exportações para o exterior nesse ano Fonte Anuário Estatístico do Brasil IBGE Rio vários anos Estudos de Desenvolvimento Regional São Paulo CAPES Rio 1959 Comércio de Cabotagem pelo Porto de Santos 194344 Departamento Estadual de Estatística São Paulo 1948 Boletim do Departamento Estadual de Estatística de São Paulo São Paulo vários anos Anuário Estatístico de São Paulo 19111920 Repartição de Estatística e Archivo do Estado 19121922 SP Tabela 37 Comércio exterior e interregional A Balança comercial do Estado de São Paulo com o resto do mundo exterior E e com o resto do Brasil Brasil exclusive São Paulo cabotagem C e vias internas V a Cr 1000 Exportações X Importações M Saldos XM E C V Total E C Vb Total E C V Total 1911 4809 204 486 5499 1929 450 2880 246 1915 4652 519 1028 6199 1569 908 3083 389 1918c 3714 968 2181 6863 2577 1752 1137 784 1920 8605 1356 1728 11689 6135 1447 2470 91 1928 20951 4182 14801 6013 6150 1831 1930 14282 3161 7948 3545 6334 384 1935 20712 5866 15405 3870 5307 1996 1937 24730 6623 14190 45543 20714 5455 5996 32165 4016 1168 8194 13378 1939 30444 8183 15191 53818 19831 5698 8127 33656 10613 2485 7064 20162 1940 24391 10081 17399 51871 20697 6339 3694 3742 1941 32081 13043 27671 72795 22718 8360 9363 4683 1942 31458 13679 32641 77778 17020 8798 24908 50726 14438 4881 7733 27052 1943 38858 14529 51191 104578 18344 9187 35491 63022 20514 5342 15700 41556 1947 106349 25555 65425 197329 98493 22298 66908 187699 7856 3257 1483 9630 1948 108084 29767 56076 193927 90765 27242 17319 2525 1950 123065 34072 97130 254267 88352 33640 94028 216020 34713 432 3102 38247 1952 121437 43382 124317 289136 173675 41027 118647 333349 52238 2355 5670 44213 1955 225651 81375 217744 524770 293836 85366 208470 587672 68185 3991 9274 62902 1956 274672 115489 354781 132892 80109 17403 1957 235736 115031 423477 131860 187741 16829 1958 175273 120617 574282 133014 399009 12397 1959 356726 162946 863908 154384 507182 8562 1960 459662 181556 1122994 190051 663332 8495 1961 784492 237775 3428040 4450307 1555621 237589 771129 186 1963 1772803 235029 3740697 294874 1967894 59845 1965 6582074 696006 10030624 1082268 3448550 386262 1968 21874360 791160 109889800 132555320 35601200 1696170 47855760 85153130 13726840 905010 62034040 47402190 a Para o comércio interregional só se considerou o comércio do Resto do Brasil com São Paulo eliminandose as transações interregionais efetuadas pelos Estados e territórios componentes do agregado resto do país b Para os anos de 1911 a 1920 equivalem apenas às exportações embarcadas pela estrada de Ferro Central do Brasil representando certamente apenas valores parciais c Nível anormalmente baixo de exportações para o exterior nesse ano Fonte Anuário Estatístico do Brasil IBGE Rio vários anos Estudos de Desenvolvimento Regional São Paulo CAPES Rio 1959 Comércio de Cabotagem pelo Porto de Santos 194344 Departamento Estadual de Estatística São Paulo 1948 Boletim do Departamento Estadual de Estatística de São Paulo vários anos Anuário Estatístico de São Paulo 19111920 Repartição de Estatística e Archivo do Estado 19121922 SP Raízes da concentração industrial em São Paulo 279 Tabela 38 Comércio exterior e interregional do Estado de São Paulo estrutura das exportações e das importações com o exterior E e com o resto do Brasil cabotagem C e vias internas V Exportações Importações Anos E C V Total E C V Total 1911 875 37 88 100 1915 750 84 166 100 1918a 541 141 318 100 1920 736 116 148 100 1937 543 145 312 100 644 170 186 100 1939 566 152 282 100 589 169 242 100 1940 470 194 336 100 100 1941 441 179 380 100 100 1942 405 176 419 100 336 173 491 100 1943 372 139 489 100 291 146 563 100 1947 539 129 332 100 525 119 356 100 1948 557 153 290 100 100 1950 484 134 382 100 409 156 435 100 1952 420 150 430 100 521 123 356 100 1955 430 155 415 100 500 145 355 100 1961 176 53 771 100 1968 155 06 829 100 418 200 562 100 a Nível anormalmente baixo de exportações para o exterior nesse ano Fonte Anuário Estatístico do Brasil IBGE Rio vários anos Estudos de Desenvolvimento Regional São Paulo CAPES Rio 1959 Comércio de Cabotagem pelo Porto de Santos 194344 Departamento Estadual de Estatística São Paulo 1948 Boletim do Departamento Estadual de Estatística de São Paulo São Paulo vários anos Anuário Estatístico de São Paulo 1911 a 1920 Repartição de Estatística e Archivo do Estado 1912 a 1922 SP Indica informações incompletas Tabela 39 Comércio exterior e interregional do Estado de São Paulo estrutura das pautas de exportação e de importação do valor Anos Comércio com o exterior Comércio com o resto do Brasil cabotagem e vias internas Exportações Importações Exportações a Importações b Gêneros alimen tícios Maté rias primas Manufa turados Gêneros alimen tícios Maté rias primas Manufa turados Gêneros alimen tícios Maté rias primas Manufa turados Gêneros alimen tícios Maté rias primas Manufa turados 1911 999 01 00 245 213 542 187 46 767 558 235 207 1915c 993 07 00 412 258 330 201 37 762 590 182 228 1930 963 36 01 270 254 476 112 142 746 556 253 191 1939 639 355 06 128 338 534 180 104 716 534 273 193 1951d 659 337 04 204 247 549 170 120 710 350 550 100 1968e 731 161 108 166 190 644 113 51 836 a Para 1930 os dados se referem apenas à cabotagem b Para 1911 1915 1930 os dados se referem apenas à cabotagem os quais até esse último ano perfazem cerca de 40 do comércio interregional para 1968 dada a inexpressão da cabotagem cerca de 4 e o desconhecimento da pauta não se divulga a sua estrutura c A alta percentagem de alimentos importados do exterior reflete em parte a redução das demais importações no período de guerra d Dados sobre o comércio exterior se referem a 1948 e Dados sobre o comércio exterior se referem a 1967 Fonte dados brutos Anuário Estatístico do Brasil IBGE Rio vários anos Anuário Estatístico de São Paulo Repartição de Estatística e Archivo do Estado SP vários anos Comércio por Cabotagem CIEF Ministério da Fazenda Rio vários anos para 1951 Comércio Interregional Lebret PE L Et al Problemas de desenvolvimento Necessidades e possibilidades do Estado de São Paulo São Paulo CIBPU 1958 p 280 Raízes da concentração industrial em São Paulo 281 Tabela 40 Exportações de alguns produtos primários Totais decenais Exportações totais Milhões de librasouro Índice dos preços médios em libraouro Café Açú car Algodão em pluma Borra cha Café Açú car Algodão em pluma Borra cha 18211830 72 118 81 00 100 100 100 100 18311840 215 118 53 02 98 68 70 141 18411850 227 146 41 02 58 59 56 88 18511860 497 216 64 23 84 73 68 228 18611870 680 183 273 46 104 67 143 242 18711880 1130 235 191 110 138 57 76 352 18811890 1357 219 92 176 112 44 61 309 18911900 1879 174 78 437 112 53 74 395 19011910 2441 56 100 1344 83 35 78 753 19111920 3648 204 137 830 134 133 137 489 19211930 5610 114 194 206 178 58 129 197 Fonte Anuário Estatístico do Brasil 19391940 IBGE Rio Tabela 41 Exportações de açúcar e algodão em pluma toneladas Médias Anuais Brasil I Pernambuco II III Açúcar Algodão Açúcar Algodão Açúcar Algodão 18511860 121470 14125 1987 12138 18571860 116481 14769 63195 1725 53286 13044 18611870 111276 28894 56385 10050 55891 18844 18711880 168549 38244 84585 10320 83964 27924 18811882 195560 22733 96600 11805 98960 10928 18811890 202139 22778 Fontes Pernambuco Scully W Brazil its provinces and chief cities London 1886 p 198Falas dos Presidentes da Província de Pernambuco de 1866 1867 1868 1872 1874 Apud Singer P 1968 p 284 292 Brasil Anuário Estatístico do Brasil 193940 IBGE Rio Wilson Cano 282 Tabela 42 Exportações paulistas de café Anos Milhões de sacas Mil contos 1911 87 4777 1912 89 5275 1913 102 4880 1914 85 3501 1915 121 4537 1916 99 4567 1917 78 3368 1918 54 2684 1919 94 9466 1920 85 6714 1921 88 7613 1922 83 10717 1923 97 14900 1924 95 20310 1925 91 20750 1926 92 16569 1927 103 18657 1928 90 19943 1929 93 19659 1930 93 12795 Fonte Comércio Exterior pelo Porto de Santos S Paulo 19111930 Tabela 43 Exportações paulistas para o exterior de carne bovina congelada e resfriada mil toneladas Anos Mil toneladas Anos Mil toneladas 1914 14 1923 458 1915 82 1924 421 1916 187 1925 263 1917 293 1926 55 1918 327 1927 261 1919 307 1928 295 1920 309 1929 441 1921 247 1930 487 1922 178 Fonte Comércio Exterior pelo Porto de Santos S Paulo 19141931 Raízes da concentração industrial em São Paulo 283 Tabela 44 Importações de gêneros alimentícios do exterior Anos Importações de alimentos 1000 ouro I II Importações de alimentos como das exportações totais Total para o Brasil I Total para São PauloII BrasilSP São Paulo 1905 10281 1907 186 278 131 1907 10880 2600 239 193 121 1910 12338 2895 235 215 153 1915 11317 3498 309 268 139 1919 17479 5303 303 234 134 1930 13503 4901 363 254 150 1935 4964 1896 382 212 129 1939 4003 1625 406 145 83 Nota Para 1919 as exportações e importações foram calculadas pela média do período de 1917 a 1920 Fontes Anuário Estatístico do Brasil IBGE Rio vários anos e Anuário Estatístico de São Paulo Repartição de Estatística e Archivo do Estado SP vários anos Tabela 45 Estado de São Paulo importações de máquinas e equipamentos para a indústria e a agricultura Anos Mil toneladas Mil contos 1904 55 1905 70 59 1906 71 64 1907 124 122 1908 130 122 1909 125 116 1910 177 188 1911 274 235 1912 405 324 1913 333 1914 134 1915 65 1916 100 1917 148 1918 56 150 1919 116 300 1920 199 627 1921 178 879 1922 133 512 1923 191 901 1924 153 1189 1935 411 1708 1926 275 1179 1927 253 1415 1928 320 1770 1929 1995 1930 924 Fontes Anuário Estatístico do Estado de São Paulo vários anos e Comércio Exterior pelo Porto de Santos vários anos Wilson Cano 284 Tabela 46 Importações de máquinas e acessórios para a indústria têxtil em toneladas Anos Máquinas exclusive teares Máquinas e acessórios total São Paulo Resto do país São Paulo Resto do país 1913 3834 4310 9035 1914 627 778 1915 691 806 861 1333 1916 1059 592 1328 1122 1917 526 814 786 1216 1918 1152 1018 1468 1464 1919 1063 877 1292 1461 1920 1198 1973 1603 2659 1921 2368 2790 2822 3473 1922 2687 2274 3222 3413 1923 3958 2708 4833 4005 1924 3613 4998 4313 5879 1925 6987 8653 7848 10011 1926 3212 5310 3796 6634 1927 1787 3241 2362 4382 1928 2242 2493 2915 3329 1929 1364 1998 2036 2611 1930 437 822 825 1161 1931 648 1154 1932 354 714 1933 443 604 852 1199 1934 1565 1202 2150 1922 1935 1149 1215 2173 1675 1936 2242 1693 3364 1979 1937 3134 4654 3542 5105 1938 5109 5423 5714 1939 2778 3049 2806 1940 1737 1898 5193 Médias anuais 1913 3834 4310 9035 19151919 898 821 1147 1319 19201925 3469 3899 4107 4907 19261929 2151 3261 2777 4239 19301933 471 886 19341937 2022 2191 2807 2670 19381940 3208 3457 4571 Fontes Brasil Stein 1957 p 195 São Paulo Estatística do Comércio do Porto de Santos Sec de Agric e Obras Públicas do Estado de São Paulo vários anos Raízes da concentração industrial em São Paulo 285 Tabela 47 Exportações paulistas de produtos industriais segundo o destino para cada região a Anos Resto do país Total I Exterior Total II Carne Frigorificada Demais produtos 1911 996 04 04 1913 996 04 04 1914 998 02 02 1915 950 50 49 01 1916 866 134 111 23 1917 880 120 86 34 1918 794 206 124 82 1919 841 159 152 07 1920 856 144 136 08 a Calculadas pelo valor corrente dessas exportações I II 100 Fontes Anuário Estatístico do Estado de São Paulo vários anos Comércio Exterior pelo Porto de Santos vários anos Comércio de Cabotagem pelo Porto de Santos vários anos Tabela 48 Estado de São Paulo Coeficientes de importações do exterior de manufaturados em relação ao valor bruto da produção industrial a Anos Inclusive bens de capital Exclusive bens de capital São Paulo BrasilSP São Paulo 1905 02201 01815 1910 02648 02045 1911 03585 02779 1912 04014 03091 1913 04759 03723 1914 01941 03515 01485 1915 01366 01880 01194 1916 01698 02407 01496 1917 01329 01722 01139 1918 01279 02156 01084 1919 01762 02426 01458 1920 03478 04151 02844 1921 02917 03592 02059 1922 01706 02616 01319 1923 01871 02201 01431 1924 03390 03651 02627 1925 04699 04250 03593 1926 03188 03080 02513 1927 03495 03182 02801 1928 03207 02871 02540 1929 03407 02997 02616 1930 01684 02324 01273 a Cálculos feitos em cruzeiros correntes para 1905 a 1913 corrigi valor da produção industrial estimado por Paulo Pestana multiplicandoo pelo fator 13837 que foi a diferença verificada entre os valores atribuídos por esse autor entre 1914 e 1918 e os estimados por Simonsen neste último período Fontes Importações Anuário Estatístico do Estado de São Paulo vários anos e Comércio Exterior pelo Porto de Santos vários anos Produção Industrial a 19141930 Simonsen 1973 b 19051913 Pestana 1920 com valores corrigidos segundo a nota a Tabela 49 Estado de São Paulo Produção industrial e importação de manufaturados exclusive bens de capital 1000 contos Anos Valores Efetivos Valores Estimados Índices Produção I Importações II Total III ou IIIIV Produção III a Importações IV b I III 1919 9861 1438 11299 9861 1438 1000 1000 1920 9878 2809 12687 9878 2809 1002 1002 1921 10240 2108 12348 10240 2108 1038 1038 1922 13210 1748 14958 13210 1748 1340 1340 1923 20517 2937 23454 20517 2937 2081 2081 1924 15575 4091 19665 17036 2629 1579 1728 1925 15444 5549 20993 18186 2807 1566 1844 1926 17456 4386 21842 18922 2920 1770 1919 1927 20374 5706 26080 22593 3487 2066 2291 1928 26524 6736 33260 28813 4447 2690 2922 1929 25213 6595 31808 26827 4253 2557 2721 Média 19191920 9870 2124 11994 9870 2124 1000 1000 Média 19211922 11725 1928 13653 11725 1928 1188 1188 Média 1923 20517 2937 23454 20517 2937 2079 2079 Média 19241926 16158 4675 20833 18048 2785 1637 1829 Média 19271929 24037 6346 30383 26321 4062 2435 2667 a Os novos níveis estimados para a produção de 1924 a 1929 são obtidos pela dedução das importações estimadas IV do total III b Até 1923 são as mesmas da coluna II para 19241929 estimei novos valores aplicando à coluna I o coeficiente médio das importações sobre o valor da produção observado no período 19211923 que foi de 01543 Fontes Produção Simonsen 1973 Censo de 1920 Importações Comércio Exterior pelo Porto de Santos Anuário Estatístico do Estado de São Paulo vários anos Raízes da concentração industrial em São Paulo 287 Tabela 50 Comércio interestadual exportações e importações paulistas de produtos industriais em relação ao valor bruto da produção industrial paulista Anos Exportações Importações Cabotagem Vias Internas Total cabotagem 1914 793 1481 2274 385 1915 1081 2033 3114 519 1916 1007 1977 2984 358 1917 784 3161 3945 267 1918 1023 2129 3152 305 1919 800 1572 2372 241 1920 1050 1375 2425 435 1921 763 592 1922 901 383 1923 769 389 1924 1754 678 1925 1401 723 1926 1295 604 1927 1741 554 1928 1346 665 1929 1283 641 1930 1173 449 1931 1498 498 1932 1071 291 1933 1283 336 1934 1306 316 1935 1357 264 1936 1233 266 1937 1117 238 1938 1036 216 1939 842 1494 2336 169 1941 1076 2368 3444 168 1961 088 2159 2247 1968 2900 Fontes Produção 19141938 Simonsen 1973 1919 e 1939 Censos industriais 1961 e 1968 Produção Industrial IBGE Comércio Anuário Estatístico do Estado de São Paulo vários anos Comércio de Cabotagem pelo Porto de Santos vários anos Boletim do Departamento Estadual de Estatística de São Paulo vários anos Wilson Cano 288 Tabela 51 São Paulo dos preços médios implícitos de tecidos de algodão 1920 100 Anos Índices dos preços dos tecidos produzidos em São Paulo Índice dos preços importados Preços de produção Preços dos exportados p o resto do país cabotagem Do resto do país cabotagem do exterior 1920 100 100 100 100 1921 98 87 120 136 1922 98 68 150 118 1923 120 114 218 135 1924 102 117 150 124 1925 97 106 150 123 1926 106 96 150 99 1927 107 100 150 124 1928 121 84 183 130 Fontes da produção calculadas conforme dados da Tabela 57 do comércio Comércio Exterior pelo Porto de Santos e Comércio de Cabotagem pelo Porto de Santos Tabela 52 Salários médios diários na zona rural réis por dia sem sustento 1919 Estados Arados Cortador de cana Trabalhador de enxada Homem Adulto Mulher Adulta Menores Pernambuco 2860 2321 1916 1300 962 Minas Gerais 3945 2842 2704 1742 1272 Rio de Janeiro 3960 3500 3282 2580 1827 São Paulo 5391 4049 3944 2640 1805 Paraná 8868 4350 4685 3391 2371 Rio G do Sul 4583 4250 4094 3197 2293 Brasil 4662 2988 2992 2009 1424 Fonte Censo de 1920 volume V 2ª parte p XXV e XXVI Raízes da concentração industrial em São Paulo 289 Tabela 53 Estado de São Paulo Alguns indicadores da evolução de preços e salários Anos Salários Urbanos Salários rurais Tecidos de algodão a Custo de vida Operário de fábrica Caldeireiro ferrov b Trato anual do cafezal c Colheita de café d Câmara das 1913 105 100 104 109 100 1914 100 100 100 100 100 100 100 1915 98 109 75 100 103 95 88 1916 147 117 86 100 105 100 88 1917 232 128 86 104 109 109 88 1918 222 144 130 115 111 138 96 1919 342 149 160 119 127 126 102 1920 334 164 147 119 202 145 104 1921 328 168 167 144 206 148 107 1922 327 184 187 146 206 169 121 1923 400 203 311 171 250 200 154 1924 339 237 290 171 238 169 161 1925 324 253 311 172 238 200 171 1926 354 260 325 212 173 154 133 1927 356 267 325 218 173 169 133 1928 405 263 375 224 271 231 166 1929 405 261 375 232 379 308 166 1930 415 237 375 232 379 308 166 1931 229 229 325 232 162 154 133 1932 247 230 281 180 216 246 166 1933 266 228 281 180 238 246 166 1934 287 246 325 186 303 246 166 a Preços implícitos de produção valor da produção dividido pela quantidade b Ferroviários da Cia Paulista de Estradas de Ferro c Remuneração pelo trato anual de 1000 pés de café d Remuneração pela colheita de um alqueire 50 litros de café Fontes tecidos de algodão Tabela 57 custo de vida Simonsen 1973 salários Cardim 1936 Wilson Cano 290 Tabela 54 Participação do Estado de São Paulo na agricultura brasileira sobre o valor da produção 1920 Estados da Lavouras Lavouras florestal e animal população inclusive café exclusive café inclusive café exclusive café São Paulo 150 288 242 254 208 Minas Gerais 192 204 166 210 181 Rio G do Sul 71 104 138 122 154 Subtotal 413 596 546 586 543 RJGB 89 57 42 52 38 ES 15 27 10 24 10 Demais estados 587 404 454 414 457 Brasil 1000 1000 1000 1000 1000 Fonte Dados brutos Censos Demográfico e Econômico de 1920 Tabela 55 Lavoura utilização da área cultivada segundo as principais culturas 1920 1000 hectares Estados Total Arroz trigo milho feijão batata e mandioca Café Algodão cana fumo e mamona Cacau coco e maniçoba SP 19848 7959 10287 1588 14 MG 15575 7383 6507 1667 18 RSa 7565 7262 303 RJ 2863 681 1945 226 11 Outros 20570 8132 3418 5515 3505 BR 66421 31417 22157 9299 3548 a O sinal indica inexistência da cultura ou insignificância da área Fonte Censo Agrícola de 1920 Raízes da concentração industrial em São Paulo 291 Notas sobre a estimativa do crescimento real da indústria de São Paulo nos períodos de 191113 a 1919 e de 1918 a 1928 1 Período 191828 A Produção física e coeficientes de ponderação Elaborei a série de produção física ver Tabela 56 para o período em exame cujo peso de ponderação foi definido pela participação de cada produto no valor bruto da produção industrial constante no Censo de 1920 ano de 1919 volume V 1a parte p 461490 agregando ao valor da produção industrial o valor da produção açucareira computado em tabulação especial daquele recenseamento Os dez produtos constantes da série de produção física totalizavam 5201 do novo agregado decorrentes da inclusão do açúcar da produção industrial paulista em 1919 totalizando assim a parte residual o montante de 4799 para a qual infelizmente não se dispõe de uma série de produção física Tomado o valor da produção industrial paulista em 1928 através da publicação Estatística Industrial do Estado de São Paulo SP também ajustado com a inclusão da produção açucareira aqueles porcentuais totalizavam 5290 e 4710 respectivamente Os quatro tipos de tecidos incluídos na série representavam 89 do valor da produção têxtil em 1919 os chapéus e os calçados totalizavam também 89 da produção do ramo do vestuário e os outros quatro produtos perfaziam 52 do valor da produção da indústria alimentar incluída a produção de bebidas do açúcar e do álcool e da aguardente Coeficientes de ponderação 1919 1 tecidos de algodão 2144 2 tecidos de lã 114 3 tecidos de juta 085 4 tecidos de seda 083 5 chapéus 319 6 calçados 470 7 cerveja 332 8 álcool e aguardente 434 9 açúcar 565 10 carne produção dos frigoríficos 655 Total 5201 B Construção dos índices Na Tabela 56 apresento os índices simples individuais de cada um dos dez produtos acima especificados bem como os dois índices agregados um abarcando os 10 produtos e o segundo excluindo os tecidos de algodão ambos Wilson Cano 292 ponderados pelos pesos acima relatados A construção desse segundo índice prendese ao fato de que a produção de tecidos de algodão apresenta um comportamento distinto em relação aos outros nove produtos e dado o alto coeficiente de ponderação daquele produto um só índice agregado fatalmente induziria um erro maior na estimação do resíduo Ainda assim entretanto julguei que seria imprudente estimarse o crescimento real do resíduo dando lhe o mesmo crescimento atribuído ao segundo índice o agregado dos 9 produtos Dessa forma utilizei como critério para estimar a expansão real do agregado resíduo o método do deflator implícito obtido pela diferença entre o crescimento nominal valor da produção e o crescimento real expansão física dos produtos constantes no item A acima Entretanto a inexistência de informações de valor da produção para alguns produtos especialmente para tecidos de seda álcool e aguardente para alguns anos do período 192327 impediu a construção de um deflator implícito para todos os anos da série restringindome portanto à elaboração dos dados para os anos de 1918 1919 1920 e 1928 Nova dificuldade se apresentou pois os preços dos tecidos de algodão também apresentavam um comportamento bastante diferenciado em relação aos demais produtos acréscimo de 21 entre 1920 e 1928 enquanto que os preços médios dos demais produtos os outros nove cresciam de 713 no mesmo período Escolhi assim este último deflator para estimar o crescimento real do item resíduo tendo antes o cuidado de comparar esse aumento de preços com o deflator que se pode deduzir da série do valor da produção industrial estimada por Roberto C Simonsen na Evolução Industrial do Brasil e da série de índices do produto real estimados por Fishlow em seu trabalho Origens e conseqüências da substituição de importações no Brasil ambas as séries referidas ao conjunto do Brasil O deflator resultante do confronto dessas duas séries desses dois autores aponta um crescimento implícito de preços igual a 714 pouco acima do índice do custo de vida utilizado por Simonsen 606 e bastante próximo àquele deflator 713 por mim deduzido da série dos nove produtos Pelo fato de que a produção de tecidos de algodão certamente teria tido um comportamento bastante diferente da produção dos demais ramos industriais e considerando também por uma questão de precaução básica que o aumento da produção física verificado para os nove produtos 1157 entre 1920 e 1928 foi bastante elevado julguei mais correto utilizar o deflator implícito dessa série dos nove produtos para inferir a expansão real dos restantes segmentos industriais resíduo Corro com isso o erro de subestimar esse agregado ao imputarlhe um deflator mais elevado do que a média da indústria quando se considera também a elevação dos preços dos tecidos de algodão Um erro ainda Raízes da concentração industrial em São Paulo 293 maior repito seria atribuir a esse agregado o mesmo crescimento real observado para os nove produtos onde certamente se estaria fazendo um erro por superestimação ao agregado resíduo É evidente que quaisquer dos métodos induziriam a erros de estimativa e por essa razão não ousaria chamar de índice do produto real ao índice resultante na ponderação final índice dos tecidos de algodão dos nove produtos e do resíduo e prefiro chamálo de simples indicador de tendência da expansão real da indústria no período Os cálculos para a elaboração dos índices foram feitos da seguinte forma C Cálculos 1 Cálculo do deflator e estimativa do crescimento real do restante da produção industrial base 1920 100 Índice do valor Índice do quantum Deflator implícito 1918 1919 1928 1918 1919 1928 1918 1919 1928 Índice Itecido algodão 524 961 1240 789 940 1025 664 1022 1210 Índice II9 produtos 832 887 3696 786 923 2155 1059 961 1713 Índice IIIresíduo a 869 1061 2814 821 1104 a 1643 1059 961 1713 Índice IV II III 855 994 3157 807 1034 1843 1059 961 1713 Índice V IIIIII 760 984 2605 803 1014 1668 946 970 1562 a Ver nota 69 do Capítulo 2 a respeito da queda do índice III entre 191920 ao contrário dos índices I e II 2 Taxas médias anuais de crescimento 19181928 19191928 19201928 Índice I 27 10 03 Índice II 106 99 101 Índice III 72 45 64 Índice IV 86 66 79 Índice V 76 57 66 2 Estimativa do crescimento no período 191113 a 1919 As estimativas para este período são mais precárias do que as elaboradas no item 1 pela razão de que não consegui elaborar séries de produção física como aquelas O método utilizado foi o da estimativa deduzida pelas modificações da participação da indústria paulista no total industrial do país Conhecida a taxa média de crescimento para a indústria brasileira no período que foi a estimada por Fishlow em seu citado trabalho podese estimar a Wilson Cano 294 taxa de crescimento da indústria paulista através das modificações das participações relativas da indústria de São Paulo no conjunto do país A Participação da indústria paulista valor da produção no total nacional 1907 159 Censo Industrial de 1907 1914 307 Roberto C Simonsen obra citada 1919 330 Censo Industrial de 1920 1920 335 Roberto C Simonsen obra citada Como não são conhecidas essas participações para os anos de 1911 a 1913 estimeias por interpolação geométrica supondo ainda que face à crise industrial de 1914 a participação nesse ano era a mesma muito próxima em 1913 O resultado foi um coeficiente médio para aqueles três anos de 276 e portanto 724 para o resto do país1 B Cálculos dos índices pela estimativa da taxa média de crescimento do produto real da indústria brasileira calculada por Fishlow que foi de 44 anual no período estimei seu índice em 1295 para 1919 considerandose 191113 100 tomandose as participações relativas de São Paulo no período base 276 e em 1919 33 e conhecendose o índice de crescimento para o Brasil nesse último ano 1295 deduzi o índice de São Paulo da seguinte forma participação de índice de crescimento São Paulo 1919 X do Brasil 1919 100 100 participação de São Paulo 191113 ou seja 033 1295 100 1547 0276 o índice encontrado para São Paulo permite o cálculo da taxa média de crescimento industrial para o período que teria sido de 75 anual Conhecida a taxa para o Brasil 44 e a taxa para São Paulo 75 deduzi então a taxa média para o resto do país mediante o uso das ponderações observadas para o período 191113 Brasil 44 1000 4400 São Paulo 75 0276 2070 Resto do país x 0724 2330 onde x 32 1 Notese que por interpolação linear simples a participação média seria de 264 a qual se utilizada no cálculo elevaria ainda mais o índice de São Paulo Raízes da concentração industrial em São Paulo 295 3 Confronto dos resultados Utilizando o mesmo método em IIB3 e tomando a taxa média estimada por Fishlow para o período 1920 a 1928 para a indústria brasileira 44 anual e deduzindo a taxa média para a indústria paulista através da estimativa do seu crescimento real 66 apliquei os coeficientes de ponderação para 1920 estimando por diferença a taxa média anual para o resto do país taxa encontrada 33 Os resultados para os dois períodos teriam apresentado as seguintes prováveis taxas médias anuais de crescimento 191113 a 1919 1920 a 1928 Brasil 44 44 São Paulo 75 66 Resto do país 32 33 Pelo fato de que as estimativas feitas por Fishlow refirome às publicadas em seu citado trabalho não permitem um encadeamento entre os índices de 1919 e de 1920 as taxas acima apresentadas devem ser tomadas com a devida cautela uma vez que segundo minhas estimativas o ano de 1920 apresenta um resultado pouco inferior ao de 1919 Assim sendo as taxas médias de crescimento entre 1919 e 1928 seriam um pouco menores do que as observadas e estimadas para o período de 1920 a 1928 para São Paulo elas teriam sido de 57 e 66 respectivamente Tabela 56 Estado de São Paulo Produção de alguns bens da indústria de transformação 1918 1919 1920 1921 1922 1923 1924 1925 1926 1927 1928 1 Tecidos de algodão Milhões de m índice 1471 789 1753 940 1865 1000 1978 1061 2173 1165 4883 2618 2308 1238 2059 1104 2387 1280 2039 1093 1911 1025 2 Tecidos de lã Milhões de m índice 15 938 13 813 16 1000 19 1188 27 1688 23 1438 26 1625 35 2188 36 2250 49 3063 50 3125 3 Tecidos de juta Milhões de m índice 416 1638 92 362 254 1000 356 1402 458 1803 322 1268 530 2087 862 3394 979 3854 816 3213 846 3331 4 Tecidos de seda Toneladas índice 186 538 220 636 346 1000 472 1364 663 1916 651 1882 595 1720 401 1159 491 1419 1031 2980 2320 6706 5 Chapéus Mil de unid índice 24 1043 26 1130 23 1000 21 913 26 1130 39 1696 43 1870 40 1739 42 1826 43 1870 47 2043 6 Calçados Mil de pares índice 70 1029 62 912 68 1000 73 1074 83 1221 68 1000 103 1515 100 1471 109 1603 112 1647 126 1853 7 Cerveja Milhões de l índice 213 747 242 849 285 1000 328 1151 395 1386 490 1719 506 1775 500 1754 507 1779 544 1909 622 2182 8 Álcool e aguardente Milhões de l índice 627 657 843 884 954 1000 987 1035 1003 1051 976 1023 613 643 472 495 317 332 624 654 705 739 9 Açúcar 1000 t índice 143 451 294 927 317 1000 340 1073 319 1006 390 1230 209 659 136 429 271 855 445 1404 621 1959 10 Carne frigorífico 1000 t índice 416 773 548 1019 538 1000 373 693 449 835 838 1558 933 1734 703 1307 634 1178 988 1836 1416 2632 Índice total 1 a 10 787 930 1000 1025 1147 1881 1316 1181 1302 1441 1691 Índice total 2 a 10 786 923 1000 999 1135 1364 1371 1235 1318 1686 2157 Nota Os índices são ponderados Ver neste apêndice Notas sobre a estimativa do crescimento industrial entra 19111919 e entre 1918 a 1928 Fontes Boletins da Diretoria de Indústria e Comércio S Paulo vários anos Estatística Industrial do Estado de São Paulo vários anos Tabela 57 Indústria têxtil algodoeira de São Paulo Anos Estabele cimentos Capital 100 contos Operários 1000 Potência 1000 HP Teares 1000 Fusos 100 Produção de tecidos milhões de metros 1000 contos 1885 13 44 12 123 46 1900 17 227 46 18 28 554 335 176 1905 18 296 63 29 39 1110 366 197 1907 19 367 65 62 411 225 1910 24 467 134 86 85 2288 758 387 1912 840 438 1913 820 426 1914 702 347 1915 41 815 180 203 120 3383 1216 590 1916 44 884 212 231 139 4121 1347 978 1917 46 955 228 231 145 4294 1603 1838 1918 1471 1615 1919 1753 2961 1920 54 1062 270 300 161 5240 1865 3082 1921 1978 3204 1922 2173 3510 1923 4883 a 9653 a 1924 2308 3871 1925 64 1802 381 428 206 6633 2059 3295 1926 2387 4176 1927 81 2315 413 438 218 7213 2039 3588 1928 82 431 472 228 7308 1911 3823 1929 1490 2981 1930 119 2797 259 502 1353 2776 1931 113 2645 355 531 1815 2050 1932 112 2486 374 512 249 8035 2006 2450 1933 114 2765 429 532 2320 3054 1934 124 4738 473 565 2785 3943 1935 118 5838 521 635 2731 4181 1936 118 5457 523 630 2962 4418 1937 129 5163 521 662 2872 4647 a Os valores são de fonte oficial podendo ou não ser um erro tipográfico ou de cálculo apesar das publicações posteriores manterem esses números Fontes Boletim da Diretoria de Ind e Comércio S Paulo vários anos Boletim do Depto Estadual de Estatística S Paulo fevmar 1939 Pestana 1920 S Paulo A expansão econômica de S Paulo Sec da Agric Comércio e Obras Públicas 1922 S Paulo Boletim da Diretoria de Ind e Comércio S Paulo vários anos Suzigan Wilson A industrialização de S Paulo Rev Brasil de Economia abrjun 1971 Rio para 1907 cálculos do autor com base no Censo de 1907 Wilson Cano 298 Tabela 58 Produção de tecidos de algodão milhões de metros Anos SPaulo Resto do país Brasil 19121913 média 830 3094 3924 1914 702 2441 3143 1915 1216 3492 4708 1916 1347 3396 4743 1917 1603 3878 5481 1918 1471 3473 4944 1919 1753 4091 5844 1920 1865 4007 5872 1921 1978 3546 5524 1922 2173 4095 6268 1923 4883 4515 9398 1924 2308 3490 5798 1925 2059 3300 5359 1926 2387 3003 5390 1927 2039 3904 5943 1928 1911 3909 5820 1929 1490 3290 4780 1930 1353 3408 4761 Fontes Brasil Anuário Estatístico do Brasil 193940 São Paulo as mesmas da Tabela 57 Tabela 59 Índices de crescimento nominal do valor bruto da produção manufatureira a e do crescimento do número de operários b entre 1907 e 1919 1907 100 Regiões Valor da produção b A Operários B B 100 c A Norte 1316 996 132 Nordeste 5105 1496 341 MG 5227 1990 263 RJGB 3149 1535 205 RJ 3990 1364 293 GB 2975 1595 186 SP 8904 3757 237 Sul 3511 1677 209 PR 3092 1544 200 SC 4254 2561 166 RS 3545 1599 222 BRSP 3554 1646 216 Brasil 4433 1986 223 a Exclusive o setor de fabricação de açúcar mas incluindo o de refinação b Por serem inexpressivos os valores absolutos de Mato Grosso Goiás e Espírito Santo e por conterem sérias distorções entre 1907 e 1919 seus índices não são publicados neste quadro os baixos índices para a Amazônia certamente refletem a regressão da economia da borracha inclusive com modificações profundas nos níveis de preços locais c Estes deflatores na realidade incorporam os aumentos da produtividade do trabalho bem como as eventuais vantagens decorrentes de possíveis aumentos de preços relativos ocorrida durante a Primeira Guerra Mundial Fontes Censos Industriais de 1907 e 1919 Raízes da concentração industrial em São Paulo 299 Tabela 60 Estrutura produtiva da indústria de transformação do valor bruto da produção Ramos São Paulo BrasilS Paulo 1907 1919 a 1939 1907 1919a 1939 Minerais não metálicos 62 40 36 27 19 38 Metalúrgica 58 26 68 Mecânica 67 47 17 51 05 Mat elét e de comunic 14 06 Material de transporte 05 21 57 26 08 07 Madeira 29 28 19 46 46 36 Mobiliário 12 11 15 17 14 17 Papel 18 18 18 06 09 17 Borracha 01 04 00 01 07 Couros e peles 28 24 12 30 23 25 Químicas 20 72 20 38 Farmacêutica 32 03 08 47 10 24 Perf Sabões e velas 08 21 18 39 27 23 Têxtil 387 293 308 205 233 167 Vestuário 107 93 46 72 70 47 Alimentar 194 307 229 335 403 387 Bebidas 40 47 23 52 42 30 Fumo 01 16 13 32 41 21 Editorial e Gráfica 23 29 Diversas 10 06 10 15 08 08 Não especificado 04 Total 1000 1000 1000 1000 1000 1000 Fonte Censos industriais de 1907 1920 1940 e 1950 a Valor ajustado com a inclusão da produção de açúcar álcool e aguardente a recomposição a nível de ramos foi feita pelo confronto entre os Censos de 1919 e o de 1950 dados retrospectivos de 1919 permanecendo um resíduo pertencente a S Paulo Wilson Cano 300 Tabela 61 Brasil concentração industrial e produtividade relativa Regiões Concentração industrial a Produtividade relativa índices b 1907 1919c 1939 1907 1919 1939 Norte 43 13 11 1777 1089 792 Nordeste 167 161 104 660 704 651 MA PI 11 10 03 336 622 459 CE RN PB AL SE 48 55 39 632 645 682 Pernambuco 74 68 48 939 923 701 Bahia 34 28 14 515 517 510 Minas Gerais 44 56 65 705 901 838 Espírito Santo 01 07 04 1316 2013 906 Rio de Janeiro 76 74 50 841 1087 899 Guanabara 302 208 170 1301 1126 1404 São Paulo 159 315 454 1000 1122 1356 Paraná 45 32 22 1434 1332 1029 Sta Catarina 19 19 18 1378 1073 832 Rio G do Sul 135 111 98 1324 1363 1480 CentroOeste 09 04 04 299 1459 928 BrasilSP 841 685 546 1000 1000 1000 Brasil 1000 1000 1000 1000 1035 1135 a Porcentagem do valor bruto da produção industrial de cada região em relação ao total do Brasil b Valor bruto da produção por operário índice 100 em cada ano para o resultado médio do total do Brasil exclusive São Paulo ver nota explicativa abaixo c Ajustado o valor de 1919 com a inclusão da produção açucareira Fonte Censo Industrial de 1907 1920 1940 e 1950 Nota explicativa à Tabela 61 Os resultados referentes aos níveis regionais de produtividade merecem algumas considerações a fim de se evitar conclusões errôneas 1 Em primeiro lugar os cálculos foram feitos tomandose o valor bruto da produção pelo fato de inexistir o valor adicionado em 1907 e de não se conhecer essa informação para a indústria açucareira em 1919 2 Um outro fato que pode induzir a erro é aquele referente à situação de uma região x apenas produtora de matériaprima a couro por exemplo de uma região y que apenas produz o bem final b calçado por exemplo e de uma terceira região z que conta com as duas fases produtivas de a e de b Computados os valores dos insumos e dos bens finais assim como a quantidade de operários empregados nessa produção cada região poderá apresentar produtividades distintas e não raro a região y poderá apresentar a maior produtividade 3 Os altos níveis observados na indústria do Paraná em 1907 e 1919 estão fortemente influenciados pelos altos preços de exportação para a erva mate atividade essa que respondia por uma elevada porcentagem da produção industrial desse estado Também o estado de Santa Catarina era assim afetado em 1907 4 Certos tipos de atividade pouco empregadoras de mãodeobra como a de serrarias de madeira apresentam elevado valor bruto de produçãooperário cujos níveis são mais altos do que os que figuram em atividades produtoras do bem final altamente empregadores de mãodeobra como por exemplo a de fabricação de móveis Paraná Santa Catarina Rio Grande do Sul e Amazônia são atingidos por esse efeito em 1907 5 Outras situações podem ainda mascarar os desníveis regionais de produtividade como por exemplo diferenças regionais de preços de um mesmo produto ou diferenças regionais de produção para um mesmo ramo por exemplo perfumarias sabões e velas x produtos químicos no ramo da indústria química Uma produtividade física igual ou semelhante na indústria têxtil do algodão e da lã revela entretanto uma produtividade monetária mais alta na lã face aos maiores preços desse produto quando comparado com os do algodão 6 Regiões em que predominam os estabelecimentos pequenos muitos deles constituindo verdadeiras empresas familiares podem mascarar os dados do censo apresentando um reduzido número de operários compensado por maior emprego do trabalho familiar ou do proprietário elevando dessa forma a produtividade dessa indústria regional 7 Em que pese os fatos acima apontados a Tabela 61 mostra claramente que à medida que o implante industrial paulista crescia de forma mais acelerada aumentando o seu grau de concentração também sua produtividade média relativa crescia apresentando uma tendência distinta da maior parte das regiões Norte Espírito Santo Paraná e Santa Catarina apresentavam tendência declinante e Guanabara Rio de Janeiro Rio Grande do Sul e Nordeste apresentavam níveis relativamente estancados Tabela 62 Estabelecimentos industriais com capital maior ou igual a 1000 contos a 1907 Estados Estab Operários Capital 1000 Valor da prod 1000 Estabelec Operários Capital Val Prod Capoper Val prodoper nº nº contos contos R B R B R B R B contos contos NO 4 375 45 90 27 31 101 07 265 11 280 34 120 240 d NE 34 16914 789 429 77 266 440 300 557 202 346 162 47 25 MA PI 7 3008 89 40 333 55 614 53 610 23 500 15 30 13 CE RN PB AL SE 9 4451 191 106 40 70 386 79 468 49 298 40 43 23 PE 11 4675 313 156 93 86 388 83 533 80 283 58 67 33 BA 7 4780 196 127 90 55 480 85 710 50 506 49 41 27 MG 2 1211 44 24 04 16 127 21 158 11 73 09 36 20 ES RJ 24 7885 617 341 116 188 578 140 716 157 608 130 78 43 GB 25 13149 1244 924 37 195 373 234 732 318 413 350 95 70 SP b 30 11077 896 641 27 219 423 197 679 229 498 243 81 59 PR 2 820 40 53 07 16 174 15 192 10 160 20 49 65 e SC RS 6 1578 133 111 19 47 102 28 270 34 111 42 84 70 f CO 3 3300 110 30 20 22 696 58 719 28 435 10 33 09 Brasil SP 100 45232 3022 2002 34 781 354 803 562 771 320 757 67 43 Brasil c 130 56309 3918 2643 32 1000 366 1000 585 1000 349 1000 70 47 a Colunas assinaladas com R representam o peso dessas grandes empresas no total industrial de cada região B representa a participação das grandes de cada região no total brasileiro dessas grandes empresas b Aos dados oficiais para São Paulo somei os seguintes 788 estabelecimentos 1970 operários a 10480 contos na produção e 4212 contos no capital ver texto explicativo no capítulo II tópico 2 o valor ajustado do capital e do número de operários obedeceu à mesma metodologia cAos dados oficiais para o Brasil somei os acréscimos citados na nota acima d Valor elevado refletindo o nível elevadíssimo de preços que vigorava na Amazônia no período observese o absurdo da baixa relação capitalproduto 05 e Valor elevado dado o alto preço da ervamate principalmentef Valor elevado dada a predominância da produção têxtil lanígera Fonte Dados brutos Censo industrial de 1907 Tabela 63 Concentração industrial em 1907 Estabelecimentos com capital igual ou maior a 1000 contos de réis Estados Total de estabelec Nº de estabelecimentos Valor bruto da produção Total Têxtil Total Têxtil Contos do valor total da prod industrial Contos do valor da prod têxtil AM 92 1 1800 129 PA 54 3 7190 395 MA 15 5 5 3023 442 3023 619 PI 3 1 1 987 827 987 1000 CE 18 RN 15 1 1200 389 PB 42 2 1 1952 445 1152 1000 PE 118 11 5 15609 283 8234 836 AL 45 3 2 3991 385 2791 675 SE 103 3 2 3614 244 2014 770 BA 78 7 4 12693 506 10150 934 ES 4 MG 529 2 2 2382 74 2382 175 RJ 207 24 10 34115 609 17330 764 GB 663 25 12 92393 421 40060 935 SP 326 28 14 64062 542 37901 842 PR 297 2 5300 160 SC 173 RS 314 6 2 11091 111 6895 764 MT 15 3 3000 674 GO 135 BR 3246 127 60 264402 357 132919 777 Fonte Dados brutos O Brasil suas riquezas naturais suas indústrias Centro Industrial do Brasil vol III Rio 1909 Tabela 64 Estado de São Paulo capital empregado na indústria de transformação segundo o tipo de energia empregada e o tamanho dos estabelecimentos a 1907 Tipo de energia utilizada Classes de tamanho segundo o número de operários 0 a 4 5 a 19 20 a 49 50 a 99 100 e mais Total E Capital E Capital E Capital E Capital E Capital E Capital Vapor 18 589 06 31 510 20 42 838 80 19 784 121 44 535 773 154 573 1000 Hidráulica 3 55 06 1 09 04 6 236 990 10 197 1000 Rede elétrb 1 19 00 10 155 16 11 134 34 9 200 82 18 227 868 49 217 1000 Manual 64 363 252 30 186 454 5 28 164 1 01 130 100 09 1000 Animal 6 29 1000 6 00 1000 Outras 5 94 536 1 07 161 1 01 303 7 04 1000 Total 89 1000 06 79 1000 22 58 1000 55 30 1000 89 70 1000 828 326 1000 1000 a As porcentagens entre parênteses devem ser lidas no sentido das linhas e as outras no sentido das colunas as colunas assinaladas com a letra E representam o número de estabelecimentos industriais b A energia aqui denominada de elétrica é a fornecida por terceiros pelas empresas produtoras e transmissores de energia elétrica significando portanto energia adquirida As denominadas de vapor e hidráulica significam geração energética feita pelas próprias indústrias manufatureiras Fonte Dados brutos Censo Industrial de 1907 Tabela 65 Indústria Têxtil estrutura segundo o tamanho dos estabelecimentos e intensidade de capital a segundo o tipo de energia utilizada 1907 Tamanho segundo o nº de operários São Paulo Guanabara e Rio de Janeiro Minas Gerais Demais Estados Estabele cimentos Operá rios Capital Estabele cimentos Operá rios Capital Estabele cimentos Operá rios Capital Estabele cimentos Operá rios Capital 0 a 4 32 00 00 38 01 00 5 a 19 32 02 00 21 01 00 111 11 05 63 03 02 20 a 49 97 08 02 106 10 08 111 36 38 100 13 11 50 a 99 97 23 41 170 31 18 250 142 184 89 20 17 100 a mais 742 967 957 703 958 974 528 811 773 710 963 970 Total 1000 1000 1000 1000 1000 1000 1000 1000 1000 1000 1000 1000 Total nos abs 31 9738 54084 47 17421 121962 36 4702 16884 20131 20131 75841 Tipo de energia utilizada Oper por estabelec Capital por estabelec Capital por Ope rário Oper por estabelec Capital por estabelec Capital por Ope rário Oper por estabelec Capital por estabelec Capital por Ope rário Oper por estabelec Capital por estabelec Capital por Ope rário Manual 13 11 08 8 4 05 6 12 20 Rede elét b 378 1780 47 100 250 25 Vapor c 298 1451 49 344 2417 70 138 496 36 260 964 37 Hidrelét c 488 3808 78 555 3922 71 235 1089 46 Total 314 1745 56 371 2595 70 131 469 36 252 948 38 a Capital capital por operário e capital por estabelecimento contos de réis b Adquirida de terceiros c Geração própria Fonte Dados primários Censo Industrial de 1907 Tabela 66 Estrutura da indústria de transformação segundo a constituição jurídica das empresas 1919 Tipo de Empresas Região Estabel m Operários Capital Valor bruto da produção Oper por estabel Capital por oper contos Valor da produção por oper contos Sociedades Anônimas S BS 31 25 412 324 520 468 466 326 2704 2677 81 96 133 105 Firmas Individuais S BS 716 677 217 239 140 137 159 190 61 73 41 38 86 83 Outras S BS 253 298 371 437 340 395 375 484 297 306 59 60 119 116 Total S BS 1000 1000 1000 1000 1000 1000 1000 1000 203 208 64 67 117 105 S São Paulo BS Brasil exclusive São Paulo Fonte Dados primários Censo industrial de 1920 volume V 1a parte p LV e LVIII Wilson Cano 306 Tabela 67 Indústria de transformação Concentração dos estabelecimentos segundo o valor da produção e os operários ocupados 1919 Tamanho de valor de produção contos Estabelecimentos Operários S Paulo Brasil S Paulo Brasil Menos de 10 290 259 32 33 10 a 49 409 390 92 95 50 a 99 99 122 43 53 100 a 499 136 157 143 160 500 a 999 29 32 81 101 1000 a 4999 29 33 294 310 5000 ou mais 08 07 315 248 Total 1000 1000 1000 1000 Fonte Censo de 1920 volume V 1a parte p 176177 e 413 Tabela 68 Concentração dos estabelecimentos industriais segundo o valor da produção e o número de operários ocupados Operários Ocupados Estabelecimentos Operários Ocupados Valor da produção S Paulo Brasil S Paulo Brasil Brasil Até 4 573 519 64 57 63 De 5 a 19 316 351 130 74 78 De 20 a 49 51 69 79 71 77 De 50 a 99 25 26 83 101 127 Mais de 100 35 35 644 697 655 Total 1000 1000 1000 1000 1000 Fonte Censo de 1920 volume V 1ª Parte páginas LXXXIII e 164165 Tabela 69 Concentração dos estabelecimentos industriais segundo número de pessoas ocupadas Brasil 1912 Pessoas Ocupadas Estabel Pessoal ocupado Estabel Pessoal Ocupado Estabel acumulada Pessoal Ocupado acumulada Não especif 25 03 03 1 2286 2286 241 16 244 16 De 2 a 4 4946 13040 522 90 766 106 De 5 1 9 1169 6907 124 48 890 154 De 10 a 49 672 11482 71 79 961 233 De 50 a 199 214 20687 23 143 984 376 De 200 a 499 102 29849 111 207 995 583 Mais de 500 61 60269 05 417 1000 1000 Total 9475 111520 1000 1000 Fonte Dados primários Recenseamento das indústrias sujeitas ao imposto Raízes da concentração industrial em São Paulo 307 Tabela 70 Concentração dos estabelecimentos industriais segundo o capital empregado Brasil 1912 Capital contos Estabel Capital Estabel Capital Estabel acumulada Capital acumulada Não especif 74 08 08 Até 05 3131 973 330 02 338 02 05 a 1 1537 1375 163 03 501 05 1 a 5 2922 9105 308 19 809 24 5 a 10 601 5170 63 11 872 35 10 a 25 409 7318 43 15 915 50 25 a 50 269 10306 28 21 943 71 50 a 100 160 13266 17 27 960 98 100 a 500 203 55564 22 115 982 213 500 a 1000 67 50606 07 104 989 317 1000 a 2000 50 76275 05 157 994 474 Mais de 2000 52 255053 06 526 1000 1000 Total 9475 485011 1000 1000 Fonte Dados primários Recenseamento das indústrias sujeitas ao imposto de consumo em Censo de 1920 vol V 1a parte p XLM Tabela 71 Estrutura do capital empregado na Indústria 1919 São Paulo Brasil BrasilSP Mil contos Mil contos Mil contos Terras e edifícios 1968 366 6063 334 4095 321 Maquinismos 1452 270 5591 308 4139 324 Estoques 1958 364 6498 358 4540 355 Total 5378 1000 18152 1000 12774 1000 Fonte Dados primários Censo de 1920 volume V 1ªparte página LXM Wilson Cano 308 Tabela 72 Indústria de transformação Data da fundação dos estabelecimentos recenseados em 1919 nº de estabelecimentos São Paulo Guanabara Brasil BrasilSP Até 1889 94 138 636 542 1890 a 1894 138 47 452 314 1895 a 1899 161 47 472 311 1900 a 1904 334 87 1080 746 1905 a 1909 414 132 1358 944 1910 a 1914 1038 328 3135 2097 1915 a 1919 1867 771 5936 4069 Ignorado 99 267 168 Total 4145 1541 a 13336 9191 a Esse total é o verificado efetivamente no censo a soma das parcelas dá um total de 1550 tendo portanto ocorrido um erro tipográfico em algumas delas Fonte Censo de 1920 v V p 161 Tabela 73 Estado de São Paulo entrada de imigrantes estrangeiros e nacionais no período de 18201960 Períodos Total Estrangeiros Nacionais nº nº nº 18201900 974177 973312 9990 965 010 19011905 205297 193732 9439 11565 531 19061910 200487 190186 9486 10301 514 19111915 365045 339026 9522 17019 478 19161920 128539 100098 7787 28441 2213 19211925 279548 222711 7967 56837 2033 19261930 409086 253265 6191 155821 3809 19311935 275446 119204 4328 156242 5672 19361940 350320 56468 1612 293852 8388 19411945 148826 4763 320 144063 9680 19461950 445389 61030 1370 384359 8630 19561960 973586 210879 2166 762707 7834 19511955 676984 159360 2354 517624 7646 18201960 5423730 2883934 5317 2539796 4683 Fonte Departamento de Imigração e Colonização da Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo Estatística de Imigração 196062 apud Nogueira O 1964 Tabela 74 Estado de São Paulo movimento migratório Médias anuais Brasileiros Estrangeiros Total SaldoEntradas Saldo Entradas Saídas Saldo Entradas Saídas Saldo Entradas Saídas Saldo Bras Estr Total 190208 36650 40386 4036 190820 3905 5343 1438 42630 30086 12544 46535 35429 11106 0368 0294 0129 192134 22718 14809 7909 41737 25446 16291 64455 40255 24200 0348 0390 0327 193545 47341 10797 36544 7487 7602 115 54828 18399 36429 0772 0015 1003 190845 23410 10409 13001 32128 21868 10260 55538 32277 23261 0555 0310 0559 Fonte a 190208 Simonsen 1973 p 213 b Camargo 1953 v 3 p 29 Secretaria da Agricultura Indústria e Comércio Boletim da Diretoria de Terras Colonização e Imigração SP n 1 out 1937 Tabela 75 Crescimento da população no Brasil Rio de Janeiro Guanabara e São Paulo a Município de São Paulo Grande São Paulo Estado de São Paulo Estado da Guanabara Estados da Guanabara e do Rio de Janeiro Brasil Índice Índice Índice Índice Índice População 1000 hab 1872 100 03 100 84 100 28 100 106 100 99305 1890 207 05 165 97 190 37 132 98 144 143339 1900 764 14 273 131 295 47 164 100 176 174384 1920 1845 19 548 150 421 38 257 89 309 306356 1940 4225 32 39 857 174 641 43 341 88 415 412364 1950 7004 42 51 1091 176 865 46 442 90 523 519444 1960 12188 54 67 1549 183 1202 47 634 94 715 709923 1970 19050 63 86 2144 190 1569 46 861 96 952 945086 a Face às modificações municipais ocorridas entre 1872 e 1940 tornouse impossível uma exata estimativa para a Grande São Paulo nesta época 18721920 as porcentagens se referem ao total da população brasileira em cada ano Fontes Grande São Paulo Diagnóstico da 1a Região Administrativa Sec Economia e Planejamento do Estado de São Paulo Demais dados Censo Demográfico 1970 Wilson Cano 310 Tabela 76 Estrutura ocupacional da população economicamente ativa em 1920 Atividades Guanabara São Paulo Demais Estados Primárias 64 639 756 Industriais 320 166 110 Transporte e Comércio 274 101 65 Outros serviços incl Governo 193 61 36 Serviços domésticos 149 33 33 Total 1000 1000 1000 Fonte Anuário Estatístico do Brasil 19391940 p 13021303