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ARTIGOS SOCIEDADE E ESPAÇO NO BRASIL AS FASES DA FORMAÇÃO ESPACIAL BRASILEIRA HEGEMONIAS E CONFLITOS SOCIETY AND SPACE IN BRAZIL Ruy Moreira1 Cinco são as fases da formação espacialbrasileira balizando as formas de relação sociedadeespaço no Brasil no tempo a dos vetores fundacionais a dos ciclos de assentamento a da redivisão territorial industrial do trabalho a da privatização da gestão e desintegração espacial do projeto nacional e a da articulação das sociabilidadese as tendênciasde uma formaçãoespacial complexa São fasesmarcadaspor um contrapontoentremodelos comunitários engendrados espontaneamenteeomodelo desociedadedominante num conflitamento que tensiona a formação espacial brasileira por dentro em caráter reiterado e permanente Se no longo do tempo este contraponto foi mantido às ocultas pelo modo de regulação de espaço instituído pela face hegemónica emerge hoje à evidenciação da consciência social liberado pela reestruturação por que passa a formação espacial brasileira como resultado da entrada do modo de produção capitalista seu nexo estruturador no rumo duma forma de 1 Professor dos Cursos de Graduação e PósGraduação Mestrado e Doutorado em Geografia da Universidade Federal Fluminense 7 RUY MOREIRA organização e regulação espacial nova Evidenciação revelada na surgência dos seus novos sujeitos Quais as raízes históricas e as formas de tendência dessa realidade nova que a formação espacial brasileira aos poucos revela OS VETORES FUNDACIONAIS A formação espacial inicial do Brasil tem origens na ação de dois vetores da formação do território o bandeirantismo e a expansão do gado Caminhando em sentidos contrários no século XVIII estes dois vetores vão encontrarse no planalto central e assim cristalizar a matriz do arranjo da formação espacial que hoje conhecemos O bandeirantismo tem foco de irradiação em São Vicente e avança rumo a quatro direções o litoral sul seguindo pelo costeamento o sudoeste rumo ao território das missões jesuíticas o oeste e noroeste rumo aos territórios das comunidades indígenas do planalto central e da Amazônia e o nordeste rumo aos territórios quilombolas rebelados contra os centros canavieiros da zona da mata nordestina São incursões apresadoras e de repressão em cujos rastros os bandeirantes vão deixando manchas de cultivos e núcleos de futuras cidades que pontuarão a base logística da sociedade em formação Todavia a inspiração real é a descoberta de minas de ouro e prata intento perseguido tenaz e permanentemente com o destino de cumprir na Colónia a política do metalismo que norteia todo o empreendimento colonial de Espanha e Portugal neste momento Daí obandeirantismo perdurar por todo o correr dos séculos XVI ao XVIII culminando com a descoberta das minas de ouro e diamantes no planalto centralmineiro quando então cessa Em cada ponto para o qual se dirige combina então o apresamento de índios e a busca da descoberta do eldorado Estimulado pela demanda interna de trabalho escravo que 8 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 aumenta na Colónia com o sucesso e a expansão da economia açucareira dos engenhos o apresamento e venda de índios como escravos é o que motiva os bandeirantes em todos os seus movimentos de incursão pelo hinterland não respeitando o marco legal doTratado deTordesilhas pelo qual o domínio colonial português pouco vai além da faixa estreita do litoral doAtlântico MONTEIRO 1995 MOOG 1966 acumulando com o tempo uma experiência de guerra a quem recorre a classe plantacionista da zona da mata em diferentes momentos Neste propósito as incursões bandeirantes avançam rumo ao litoral sul onde suas tropas vão disputar hegemonias de território e de apresamento indígena com as tropas espanholas que aí também agem em nome da pertença dessas terras à Espanha segundo o Tratado de Tordesilhas Indo para além do limite da região de Laguna no litoral de Santa Catarina o movimento bandeirante alarga os domínios da Colónia portuguesa ao tempo que garante a mercadoria escrava que o motiva É mais rico de possibilidades todavia o apresamento nas missões jesuíticas que reúnem numerosa população deíndios guaranis aldeados desde 1610 em terras do atual Paraguai Argentina e Rio Grande do Sul Uma sequência de conflitos atravessa a história das relações de bandeirantes e a região missioneira que leva por fim à dissolução e dispersão das comunidades no século XVIII em 1768 quando são extintas Mas também são grandes atrativos as aldeias espalhadaspela imensidão dos sertões do CentroOeste e da Amazônia focos preferidos da ação de apresamento para muitas tropas de bandeirantes por seu menor poder de resistência e coincidir com a possibilidade de descoberta de metais preciosos unindo apresamento e descoberta num só movimento HOLANDA 1976 e 1986 Fogem a este escopo porém as incursões dos bandeirantes à região do Nordeste açucareiro PUNTONI 2002 Seguidamente derrotados em campos de batalha pelos negros escravos organizados nos quilombos de que Palmares ficou como grande símbolo a elite 9 RUY MOREIRA açucareira dos engenhos da Zona da Mata convoca os serviços do capitãodeguerra Domingos Jorge Velho esgarçandose uma série de confrontos que culmina com a morte de Zumbi em 1695 e a derrota dos palmarinos encerrando um período de revoltas de escravos no Nordeste que dura desde 1597 Os quilombos e as missões jesuíticas são contrapontos ao modelo de sociedade que Portugal institui na Colónia as missões jesuíticas desde seus começos de implantação e os quilombos quando o modelo já é uma forma de sociedade consolidada São ambas modelos comunitários de sociedade que se contrapõem ao modelo escravista que se implanta na América Portuguesa CARNEIRO 1966e LUGON 1968 Dado essa estrutura e organização por isso mesmo resistem longamente às investidas de sua extinção Palmares durando 98 anos 15971695 e as missões 158 anos 16101768 só desaparecendo no correr da segunda fase da formação espacial brasileira quase ao mesmo tempo e pelas mesmas mãos Mas esta é uma fase pontilhada também de inúmeras rebeliões indígenas algumas com estruturas de organização que lembram as missões e os quilombos como a Confederação dos Tamoios entre 1554 e 1567 nolitoral do Estado do Rio de Janeiro QUINTILIANO sd e a revolta de Ajuricaba entre 1723 e 1727 na Amazônia BRUNO 1961 As trilhas do gado seguem em sentido contrário ao vetor bandeirante Seu ponto de origem é a região açucareira da Zona da Mata com ponto de referência em Pernambuco de onde na forma de ondas a pecuária bovina avança rumo aos limites ocidentais do sertão nordestino no Piauí e Ceará na direção oeste e aos limites do planalto central através da calha do rio São Francisco na direção sul Tal como no caminho dos bandeirantes uma diversidade de pontos de parada vai dando origem a manchas de cultivos e de vilas de onde irão brotando os centros de referência da ocupação e formação do território Neste mister o movimento bandeirante e o movimento de expansão do gado forçam o deslocamento das fronteiras formais do 10 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 Tratado deTordesilhas empurrando oslimiteslegaiscrescentemente para os confins do hinterland forjando o domínio que o Tratado deMadrid de 1730 irá consagrar como o novo recorte de fronteira dascolónias de Portugale Espanhapraticamente riscando o desenho do território brasileiro de hoje PEREGALLI 1997 OS CICLOS DE ASSENTAMENTO O desenho combinado das trilhas bandeirante e pastoril traça os grandes riscos de linha da tela em cujos interstícios o pincel discreto da história se incumbirá de desenhar em grandes manchas de tinta as paisagens com que a sociedade brasileira inscreverá o seu espaço As grandes paisagens que a discrição da história paciente e incansavelmente desde então vai desenhando são os frutos de nossa evolução em seis grandes ciclos de espaçotempo paubrasil canadeaçúcar mineração gado borracha e café NORMANO 1975 1938 DIEGUES 1960 Ponto essencial desse processo esse plano geral de linhas e cores das paisagens é o planoguia de ocupação efetiva o roteiro dos assentamentos que os ciclos vão aqui e ali plantando no espaço As trilhas dos bandeirantes e do gado ora dos rios e ora dosinterflúvios para o gado também as grandes superfícies planas do planalto onde avança como uma mancha de óleo orientam a pontuação dos assentamentos da população e das atividades económicas no correr dos ciclos Os vales dos rios merecem o privilégio Primeiro momento dos ciclos da ocupação do território o ciclo do paubrasil inicia a história da formação espacial brasileira Vigora no correr dos séculos XVI e XVII e tem por domínio de abrangência a estreita faixa da franja costeira da mata atlântica do Rio Grande do Norte ao norte do Rio de Janeiro A extração do paubrasil cuja madeira de seiva vermelha será enviada à Europa para a produção de corante 11 RUY MOREIRA dá origem às primeiras áreas de ocupação da Colónia Instaladas como feitorias essas áreas fundam a toponímia e antecipam a depredação do meio ambiente como política colonial deixando atrás de si terra arrasada como herança para a história das relações da sociedade com o seu espaço no Brasil Entretanto é com o ciclo da canadeaçúcar que começa efetivamente o processo da ocupação e formação espacial da Colónia Sua área de localização privilegiada é a zona da mata nordestina onde se instala em 1532 com o tempo se multiplicando por novas áreas da mata atlântica particularmente no norte do Estado do Rio de Janeiro e em São Vicente o pólo de irradiação do bandeirantismo em São Paulo O ciclo da cana institui a sociedade agrária como modelo de sociedade no Brasil diferentemente da política de ocupação espanhola que por encontrar de imediato as minas de ouro e prata que representavam a ambição colonial das metrópoles institui como modelo uma sociedade mineradora e urbana nas terras da espanoamérica O caráter agrário e mercantil substanciará o conteúdo social da formação espacial brasileira desde o começo num contraste com a essência mineirourbana da formação espacial da América hispânica No século XVIII finalmente encontrado o ouro e os diamantes que desde o início o projeto colonial intentara a formação espacial colonial experimenta uma ligeira mas substantiva mudança Iniciase o ciclo da mineração que transfere o centro de gravidade da ocupação do litoral para o interior instalandoo nas áreas ricas de mineração que se multiplicam pelos planaltos central e mineiro e troca o caráter agrário pelo mineirourbano da formação colonial encerrando a fase do bandeirantismo e de expansão do gado Esse deslocamento de conteúdo e localização do centro de gravidade dura apenas até o final do século quando se encerra o ciclo restando a cultura de uma vida urbana que doravante terá efeitos profundos e de alta importância nas relações da Colónia 12 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 O encerramento precoce do ciclo da mineração dura menos de um século devolve o centro de referência da vida de volta aos núcleos açucareiros do litoral ao tempo que inicia nas antigas áreas mineiras o ciclo do gado O ciclo do gado é a culminância das ondasde deslocamento de rebanhos provenientes de duas áreas extremas da Colónia o sertão do Nordeste e os campos do Sul atraídos para o planalto centralmineiro pela demanda de alimentos criada pelo ciclo da mineração É dos centros açucareiros que sai inicialmente o rebanho nordestino que subindo o vale do São Francisco chega e se espalha pelas áreas de vegetação de cerrado em busca dos mercados formados pelos núcleos urbanos da mineração Aí se encontra com o rebanho sulino vindo da região do pampa atraído pela mesma demanda Estes deslocamentos um vindo do Nordeste e outro do Sul colmatam e povoam no seu caminho a enorme diversidade de sertões que forma o então hinterland desde o pampa ao cerrado e à caatinga de modo que centrado no planalto central mineiro o ciclo do gado terá por real abrangência toda a imensidão do sertão brasileiro formado pelas áreas de vegetação campestre do pampa do planalto central e do planalto nordestino numa faixa quase contínua e alongada do hinterland no sentido da latitude E com isso sedimenta e consolida como espaço o território da Colónia estabelecido pelo Tratado de Madrid de 1730 O final do século XVIII é fase também do ciclo da borracha que vai ocorrer na região de florestas do vale do Amazonas Até este final de século e em paralelo aos ciclos do paubrasil da cana e dos metais preciosos vige no Norte o ciclo das drogas do sertão A instituição de aldeamentos indígenas pelo trabalho de aculturação dos jesuítas instaura a atividade do extrativismo como modo de vida dominante ao longo de todo o vale Este ciclo se esgota nos finais do século XVIII quando é substituído pelo da extração da borracha o novo ciclo reorganizando a economia regional como um todo O ciclo da borracha cria 13 RUY MOREIRA um novo modo de vida atraindo imigrantes do sertão nordestino assolados pelas secas do final do século alterando as relações existentes e formatando a relação de exploração da floresta em função do novo empreendimento O café o último dos ciclos domina o século XIX e as primeiras décadas do século XX com epicentro no planalto de São Paulo Instaurado inicialmente nas matas dos maciços interiores da cidade do Rio de Janeiro dai se expande para se instalar nas áreas florestadas da serra doMar e do vale do Paraíba nos Estados do Rio de Janeiro Minas Gerais e São Paulo para por fim chegar ao planalto paulista quando então atinge seu clímax O ciclo do café sustenta e faz inúmeras transições da colónia para a independência da escravidão para o capitalismo e da monarquia para a república assim antecipando o momento instaurador da grande transformação que ocorrerá na formação espacial brasileira com o advento da industrialização e urbanização do agora país Essa sequência de ciclosimplanta pois o formato de ocupação e assentamento económico e demográfico da formação espacial brasileira E cria o padrão do arranjo espacial que irá vigorar até meados do século XX em que a lavoura ocupa as áreas de floresta e a pecuária as de vegetação aberta num arranjo diferenciado em três grandes faixas de sentido latitudinal dispostas no sentido do litoralpara onorte amazônicoa de lavourase ocupações urbanas da região de mata atlântica disposta ao longo e em paralelo ao litoral a de pecuária das áreas dos sertões dispostas em faixa latitudinal quase contínua da caatinga nordestina ao pampa riograndense com a imensidão do sertão dos cerrados no meio e a do extrativismo vegetal daAmazônia fechando o mapa no sentido do extremo oestenorte A ocupação demográfica reproduz essa ocupação sócioeconômicaem três grandes faixas também variando do atlântico ao vale do Amazonas com maior densidade na faixa atlânticaeintensidadesucessivamentemenor atéminguar e mostrar se rala na faixa extrativista do extremo norte 14 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 1 É nesse longo período dos ciclos que se implanta o modelo de sociedade brasileira como uma sociedade concentradora e excludente levantando uma sequência de movimentos insurrecionais voltados para o propósito de experimentar um modelo comunitário de sociedade em contraposição ao modelo escravista latifundiário e monocultor dominante o modelo dos quilombos localizado em vários lugares com núcleo maior nas áreas montanhosas do agreste alagoanopernambucano entre 1597 e 1695 CARNEIRO 1966 e REIS e GOMES 1996 no período do ciclo da cana o modelo dos cabanos entre 1835 e 1840 localizado na Amazônia ROCQUE 1984 e Dl PAOLO 1985 no período de transição do ciclo das drogas para o ciclo da borracha e o modelo de Canudos entre 1893 e 1897 localizado no sertão norte da Bahia na transição da monarquia para a república CUNHA 1995 1901 e MONIZ 1978 além do modelo do Contestado entre 1912 e 1916 localizado no oeste de Santa Catarina GALLO 1999 e DERENGOSKI 2000 em pleno período do ciclo cafeeiro Todos reprimidos e dissolvidos pelo sistema dominante à semelhança da experiência comunitária das missões jesuíticas na fase do ciclo do bandeirantismo De um modo geral são experiências de constituição de um outro modelo de sociedade que vicejam na fímbria da instituição do modelo hegemónico da formação espacial brasileira e por isso mesmo se multiplicam principalmente na transição do regime escravista para o capitalista que domina o transcorrer do século XIX A estrutura binomial latifúndiominifúndio existente desde o tempo colonial e que se institui como base organizativa do período da transição período que se estende dos anos 1850 aos anos 1950 por cem anos e assemelharseía auma fase deacumulação primitiva no Brasil parece vir no sentido de neutralizálas e arrefecêlas 15 RUY MOREIRA A DIVISÃO TERRITORIAL INDUSTRIAL DO TRABALHO O século XX encontra a matriz da formação espacial brasileira fundamentalmente completada e consolidada em seu processo de constituição territorial e cartográfica E será essa matriz a base de que o Estado nacional doravante o regulador do desenvolvimento partirá para esgotar e ultrapassar a fase dos ciclos no rumo da industrialização Caracterizaa a diferenciação de áreas seja por sua arrumação em faixas e seja pela arrumação nas diferentes regiões originadas ciclo a ciclo A diferenciação regional em particular terá fundamental importância para o desenvolvimento da indústria dado o caráter de uma divisão territorial de trabalho em que ela é transformada pelo Estado com o fim de dela extrair as divisas de exportação necessárias ao desenvolvimento industrial Distinguemse a fase pré e a fase industrial da formação espacial brasileira agora em construção A década de 1950 é o marco temporal de passagem A industrialização tem seu fomento na passagem do modelo de economia para fora para o de uma economia para dentro TAVARES1972 Até os anos 50 aindústriautilizaem seu crescimento a economia de produção regional para fora legada dos ciclos coloniais crescendo com o consumo de suas divisas que usa para financiar a formação do capital inicial das indústrias na forma da importação de matériasprimas e equipamentos Após os anos 50 encontrase já desenvolvida e centrando a formação espacial brasileira no âmbito de uma organização espacial por ela inteiramente produzida e transformada e obediente à sua lógica intrínseca de mercado Oliveira designa transformação de uma economia regional nacionalmente organizada a da formação espacial herdada do período dos ciclos de espaçotempo para uma economia nacional regionalmente organizada nome da formação espacial do presente a essa passagem referenciada no antes e depois dos anos 50 OLIVEIRA 1984 1987 e 1988 16 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 A lei do desenvolvimento desigual e combinado passa então a reger a nova formação progressivamente desigualando e invertendo a forma das relações espaciais até então existente O campo passa o comando para a cidade as regiões passam o comando para o Sudeste e as indústrias regionais passam o comando para a concentraçãoem São Paulo assim se reorientando a regulação e o ordenamento espacial no interior da formação Essa metamorfose acontecida na formação espacial brasileira já dentro de sua fase industrial segue todavia dois distintos momentos Primeiramente a industrialização arranca e ultrapassa nessa arrancada a economia regional herdada da matriz dos ciclos a seguir dissolvendoa ao atingir o seu auge para reorganizar o espaço numa nova divisão de trabalho de tipo avançado Isto significa dois distintos momentos de divisão territorial do trabalho industrial aquele da conversão pura e simples que responderá por sua arrancada e aquele seguinte da redivisão que irá caracterizar a organização espacial do seu augeAprimeira divisão territorial do trabalho faz a dissolução da fase da formação espacial onde o campo comanda ainda a cidade as indústrias são ainda de bensdeconsumoe por issoencontramseinstaladasem praticamente todas regiões coladas em suas respectivas economias agrárias e a concentração industrial em São Paulo não é um traço distintivo aindaA segunda divisão territorial do trabalho é a da consolidação do arranjo do campo comandado pela cidade e da indústria e do espaço nacional comandado por São Paulo MOREIRA 2004 Uma ampla base de infraestrutura para tanto deve ser instalada que traga os meios de transporte de comunicação e de transmissão deenergiaorganizados numa vasta rede de circulação visando a que tudo convirja para a instauração docomando da cidade sobre o campoe da indústria paulista sobre o espaço nacional total No geral a rede que a urbanoindustrialização promove é a mesma das trilhas do bandeirantismo e da expansão do gado porém orientada agora para outra direção de relações e propósito com impacto em geral negativo para os núcleosiniciais 17 RUY MOREIRA de assentamento e suas localizações Ali por onde passa o eixo modernizante da urbanoindustrialização os velhos núcleos de assentamento são encarados como de efeito inercial não raro a industrialização dissolvendoos desalojando seus habitantes ou mesmo extinguindo seus espaços Demodoqueesseéumperíodo dominado por grandesconflitos não mais do tipo dos confrontamentos de modelos comunitário latifundiário do passado mas aqueles advindos dos reordenamentos tendo lugar conflitosdeordem ruralurbana eregional Nos conflitos rurais opõemse grandes proprietários e camponeses ao redor da questão da reforma agrária A forte concentração da propriedade rural herdada do período colonial e que atravessa sem mudança as transformações fundamentais do século XIX a independência a abolição da escravatura e a república agora é questionada por um campesinato que começa a ser expulso do campo por conta das mudanças com que a agropecuária responde às demandas urbanas e da industrialização reagindo o campesinato com a pressão pela partilha e redistribuição mais equânime da propriedade rural que equilibre as relações no campo e modernize socialmente as relações agrárias O apoio dos segmentos sociais da cidade que vêem um rebatimento positivo da reivindicação dos camponeses no seu modo de vida urbano caso dos trabalhadores com sua pauta de emprego salários e moradia e no alargamento do mercado caso dos industriais preocupados com os limites do mercado interno para seus produtos nacionaliza o movimento do campesinato por reforma agrária e faz dele uma bandeira de confrontos das mais fortes Nos conflitos urbanos opõemse capital e trabalho com pano de fundo no mundo da indústria numa pauta de reivindicações do operariado em que predomina o pleito igualmente de mudança estrutural reforma urbana que redistribua a terra e garanta o direito à moradia na cidade redistribuição da renda que reduza a desigualdade da riqueza 18 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 e estabilidade no emprego e ampliação da seguridade social que estabeleça um modo de vida mais apropriado Demandas que o patronato industrial ambiguamente vê como pressão contra o capital e ao mesmo tempo favorável na medida que fortaleça o mercado sem o qual o desenvolvimento da economia fica obstaculizado São pontos que se somam à grande reivindicação da reforma agrária Todos pleitos que remetem a uma radical reformulação dos privilégios da formação espacial passada e antepostos à formação do presente considerado o interesse da urbanização e da indústria Nos conflitos inter regionais por fim pontuam as dissonâncias entre as velhas oligarquias rurais regionais e as novas nascidas da urbanoindustrialização acentuada pela passagem da velha para a nova divisão interregional do trabalho ressaltando em particular o contraste que então se estabelece entre Sudeste e Nordeste Todos esses conflitos expressam a passagem de uma formação paraoutraeanecessidadedesedimentarsearegulaçãocorrespondente A forte concentração da economia industrial no pólo paulista a subordinação das atividades regionais à performance económica da indústria concentrada em São Paulo a canalização e transferência de meios de uma região para outra e a disparidade do desenvolvimento entre o campo e a cidade são todos conflitos referidos à forma de regulação espacial conflitos que ocorrem praticamente nas linhas de clivagem dos recortes territoriais que demarcam a relação cidade campo regiãoregiãoecidadeespaço E são aspolíticas territoriaisdo Estadoviaaçãosuperestruturalepolíticasdeinfraestruturaqueregulam esses conflitos canalizandolhes as energias para a integração e desenvolvimento da formação espacial no seu todo 19 RUY MOREIRA A PRIVAI IZAÇÃO DA GESTÃO DO ESPAÇO E DESINTEGRAÇÃO DO PROJETO NACIIONA A resposta desses confrontos não vem no entanto pelo viés das reformas mas de uma reordenação espacial que orienta o desenvolvimento na linha de uma modernização conservadora Estratégia de ação que usa da rearrumação do espaço no lugar da transformação estrutural da sociedade demandada pelos movimentos próreformas de base do período da industrialização a modernização conservadora afeta e altera de modo ainda mais radical o mapa dos assentamentos introduzindo na formação espacial brasileira um período de desarrumação demográfica e sócioambiental anteriormente nunca vistos GUSMÃO 1990 É a reestruturação do espaço brasileiro MOREIRA 2003 De que a década de 1970 é o marco temporal Três eixos seguem esta reestruturação a modernização da agricultura a redistribuição territorial da indústria e a despatrimonializaçãodesestatizaçãoqueprivatizaa gestãodoespaço A reestruturação começa pela modernização da agropecuária que tem na expansão da sojicultura para as áreas do cerrado o seu carrochefe Esta expansão todavia é anterior aos anos 70 relacionandose à migração de pequenos produtores das regiões de colonização alemã e italiana do Sul para a calha do rio Paraná buscando reassentarse no noroeste do Rio Grande do Sul oeste de Santa Catarina e oeste do Paraná afetados em suas propriedades pelo desenvolvimento da agricultura gaúcha motivada pela industrialização de São Paulo e pela acentuada fragmentação da propriedade relacionada às seguidas transmissões de heranças Premidos por essas dificuldades esses pequenos produtores empreendem um movimento de migração que nos anos 6070 chega ao Mato Grosso e que os governos militares aproveitam para orientar no sentido da política de colonização da fronteira amazônica É o Estado que está por trás da geração de uma técnica agronómica de uso dos solos dos cerrados pela EMBRAPA 20 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 que estimula o movimento migratório e abre esta área para a implementação agrícola em grande escala E ainda da estratégia de desenvolvimento do setor de indústria para a agricultura que leva a mecanização da agricultura a acelerarse em toda a região Em poucas décadas a soja toma conta do cerrado A política dos grandes projetos estratégia de desconcentração industrial coincide com essa fase de aceleração da modernização agrícola Consiste essa política em transferir para o arco de periferia do paí s as indústrias de bens intermediários implementandoas na forma de grandes pólos míneroindustriais muitos dos quais vão instalarse nas áreas da fronteira agrícola a exemplo do pólo Grande Carajás um enorme centro míneroflorestalsiderúrgico instalado na província ferrífera de Carajás no Sudeste do Pará voltado para a produção de lingotes de ferro para exportação apoiado em alto consumo de lenha extraída da floresta amazônica O suporte dessa implementação combinada de modernização agrícola e desconcentração industrial é uma política de ampliação para as áreas do CentroOeste e da Amazônia da implantação de meios de transporte comunicação e transmissão de energia elétrica que vinha sendo implementada no Sudeste desde os anos 5060 Um número crescente de grandes usinas hidrelétricas torres de transmissão de energia e longos eixos de transporte por rodovias cobre e integra em rede essas áreas aos centros de comando do Sudeste articulando e unificando todo o território nacional com referência nesses centrosAorigem da desconcentração industrial é entretanto a deseconomia de aglomeração que afeta a concentração urbana e industrial da grande São Paulo nos anos 70 provocada pelo acúmulo de um conjunto de conflitos dos conflitos do trabalho aos conflitos ambientais que pressiona pela desconcentração da indústria que irá ocorrer em São Paulo via iriteriorização e em nível nacional pela política dos pólos Nas décadas de 8090 o espaço brasileiro assim se redesenha e se descomprime As atividades agrícolas pecuárias 21 RUY MOREIRA e industriais estão agora rriais disseminadas A rede de transporte comunicação e linhas de transmissão de energia mais difundidas E como efeito a população as cidades e as trocas comerciais amplamente redistribuídas por todo o território Assim a matriz segundo a qual a formação espacial brasileira até então se organizara ganha novo formato Já não mais são as faixas de sentido litoralinterior e as regiões oriundas dos ciclos as formas da diferenciação de áreas As paisagens se dissolvem e se misturam a lavoura passa a ser feita nas áreas de vegetação campestre e o gado nas antigas áreas de matas E a forma de regulação desfazse num movimento institucional de desmonte e remonte com duas principais consequências 1 a desarrumação socioambiental do país em ampla escala e 2 o desalojamento expulsão e desterritorialização da população dos velhos nichos de assentamento Ambos com ocorrência no campo e na cidade Os efeitos socioambientais são conhecidos MOREIRA 2003b Peguemos três exemplosA combinaçãode modernização monoagrícola grandes usinas hidrelétricas e grandes pólos de produção míneroindustrial validada como política territorial para todo o país nacionaliza o problema ambiental antes concentrado nas grandes regiões industriais do Sudeste A propagação da soja pelo topo dos chapadões do planalto central sobre a base da mecanização e consumação de água para irrigação tirada dos lençóis subterrâneos a grandes profundidades e em grande escala esgota as reservas hídricas submete os solos a intensos desgastes assoreia e altera a rede de drenagem desorganizando o ecossistema do cerrado E por fim a opção pelo transporte rodoviário destinado a favorecer o escoamento dos grãos e da madeira intensamente explorada junto à ocupação predatória do cerrado e da floresta reforça a desarrumação socioambiental que já vem na esteira da ocupação rodoviária do Centro e do Norte desde a abertura da BelémBrasília ainda na década de 60 VALVERDE e DIAS 1967 e VALVERDE 1979 22 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 Bem como são conhecidos os efeitos sociais Nas áreas rurais o melhor exemplo é o desalojamento dos assentamentos onde as populações se localizavam desde os pontos de trilhas do bandeirantismo e da expansão do gado com seus embriões de vilas e comunidades rurais localizadas no fundo dos vales dos rios pelos lagos de barragem das usinas Os lagos inundam as áreas justamentedesses antigosassentamentosexpulsam as comunidades indígenas e camponesas de seus lugares históricos e forçamnas a ter de reinventar seus modos de vida em ambientes totalmente distintos aos seus multiplicando a população dos camponeses sem terraindígenas barrageiros e desempregados do campo Nas áreas urbanas os desalojados são os trabalhadores despedidos de suas ocupações e empregos pela chamada flexibilização do trabalho dividindoa populaçãotrabalhadora urbana em população do trabalho formal e informal quase simetricamente num volume de trabalhadores informais até então desconhecido na realidade social brasileira KRAYCHETE 2000 Essa combinação de efeitos no campo e na cidade desterritorializa e torna flutuante grande massa de população que no campo vai alimentar a pressão dos sem terra por novos assentamentos e na cidade a pressão por empregos urbanos para onde migra em levas sucessivas Uma população flutuante para a qual reinventar os modos de vida torna se urna imperiosa necessidade Há assim um movimento de desregulação em marcha e que a política de privatização das empresas estatais dos anos 8090 transforma na instituição da gestão privada do território Responsável pelas empresas atuantes nos ramos estratégicos da infraestrutura e de bens intermediários chaves no comando da economia a exemplo das empresas estatais organizadoras e gestoras do pólos míneroindustriais implantados no correr dos anos 8090 a privatização dessas empresas privatiza a gestão das suas respectivas áreas Quando somados seus espaços aos da cultura da soja centrados no poder das grandes propriedades a 23 RUY MOREIRA escala da privatização da gestão do espaço se torna um fato de abrangência nacional O poder dessas empresas fatia o controle do território desvincula sua administração do Estado define por sua lógica de mercado a lógica da regulação do espaço e por essa via dissocia a formação espacial brasileira do projeto nacional que até determinara o seu conteúdo A ARTICULAÇÃO DAS SOCIABILIDADES E AS TENDÊNCIAS DE UMA FORMAÇÃO ESPACIAL COMPLEXA A privatização da gestão do território desmonta a forma histórica de regulação do espaço até então associada à ação pública do Estado e institui como nova forma uma combinação privadopública e setorialglobal de gestão em que a face privada e setorial se expressa na intervenção simbiótica das empresas e das Agências de Regulação e a face pública e global na intervenção paralela do Estado e dessas mesmas Agências As Agências Reguladoras são o dado novo do esquema de gestão da formação espacial brasileira Criadas uma para cada setor chave da economia as primeiras das quais foram a ANP a ANATEL a ANEELe a ANTT reguladoras respectivamente do setor do petróleo das telecomunicações da energia elétrica e dos transportes terrestres os setores estratégicos da regulação do espaço fazem elas um arremedo de gestão públicoprivado com o Estado Assimuma vez que oplanejamento global com que oEstado intervinha desde os anos 4050é substituídopela ação fragmentada por setores a ação passando a ser levada por esta combinação de públicoprivado com conveniente aparência de sociedade civil o Estado recua para a função de gestão e levantamento dos recursos financeiros em parceria com o capital privado estratégia das PPPs Parcerias PúblicoPrivadas deixando para as Agências a função da execução e fiscalização das políticas territoriais num mix de 24 p BOLETIM PÀULISTÁ DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 representações ao qual cabe por hipótese a tarefa de pensar e gerir o todo da nova formação espacial assim criada Todo um momento se abre nessa conjuminação de nova regra de regulação e flutuação em escala crescente de uma população desalojada dos assentamentos de onde tirava uma estabilidade relativa de modo de vida De um lado um mecanismo novo de regulação que só assegura estabilidade para o capital em sua busca de novos nichos de lucro De outro um quadro deinstitucionalidade do qual parte em restrição crescente da sociedade compartilha São os dois modos como o novo formato da formação espacial brasileira chega aos seus diferentes segmentos de população Como num momento novo essa desregulação entra na vida do capital tal qual um bicho voraz que sacode suas teias oferecendolhe o espaçotempo de reorganização institucional de suas estruturasAssim descarta as componentes que pesam nos seus custos realinha os vetores de sua política e traça o momento novo de sua cartografia Mas como num processo de brecha todavia solta ela as amarras que prendiam a criatividade do trabalho liberando as energias da gestão popular para a emergência de formas espontâneas de autoregulação dando asas ao desenvolvimento de formas coletivas e individuais de organização da produção e de vida antes amortecidas ou presas no âmbito da regulação antiga de capacidade de intervenção insuspeitadas Tudo indica tratarse de uma nova fase de contraponto cujos personagens são melhor exemplificados de um lado com os complexos agroindustriais ARAÚJO WEDEKIN e PINAZZA s d PINAZZA e ARAÚJO 1993 LOPES 1996 e BELIK 2001 que são a nova face dos monopólios e de outro lado com as formas urbanas de economia popular REIJNTJES HAVERKORTe WATERS BAYER orgs 1999 KREYCHETE LARA e COSTA orgs 2000 GAIGER 2004 e PACHECO 2004 a face das experiências comunitárias que reemergem Contraponto que encaminha a formação espacial brasileira rumo ao formato de um complexo 25 RUY MOREIRA de sociabilidades em que de modo claramente explícito coexistem a sociabilidade capitalista e as formas de sociabilidade nãocapitalista num quadro indicativo da entrada da formação espacial brasileira num momento deperfil societário ainda incerto mas que sugere a possibilidade de caminhos e sujeitos novos de sua organização MOREIRA 2005 São novos o paradigma do trabalho e da política novos em face da regulação do espaço O complexo agroindustrial é sem dúvida a expressão mais evidente do novo rumo da organização da formação espacial brasileira pelo lado das classes hegemónicas É uma economia indicativa da organização da sociedade e do espaço segundo padrões de regulação marcados pela ausência da divisão territorial do trabalho de um lado e do Estado de outro lado ilustrando o desaparecimento justamente das estruturas reguladoras das ações e dos ordenamentos do recente passado E assim a forma que melhor encarna os efeitos da nova base material trazida à organização da produção e do trabalho no modo de produção capitalista pela era técnica da terceira revoluçãoindustrial cujo epicentro são a microeletrônica e a engenharia genética e seu acontecimento num momento de hegemonia do capital de caráter eminentemente rentista tal como previsto por Bukarin em sua teoria da economia mundial capitalista nos começos do século XX BUKARIN sd Para além da fusão da agricultura e da indústria no complexo agroindustrial fundemse numa única estrutura de produção e trabalho os setores da agricultura das indústrias dos serviços e da pesquisatecnologia eliminando as separações setoriais em setores primário secundário terciário e quaternário e espaciais em cidade e campo e cidade e região e introduzindo um novo modo de organização espacial das sociedades novo porque sem as separações que segmentavam territorialmente as formações espaciais capitalistas Então as segmentações territoriais forrnarnse agora no plano da relação entre os corpos globais das empresas não mais entre os setores de especialização da economia todos os setores juntandose 26 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 fundidos numa só empresa e numa mesma estrutura em rede de espaço 0 equivalente na ponta urbana do complexo agro industrial é o complexo empresarial que junta a produtora a revendedora e a financiadora como um só domínio de empresa socializando o modelo de realização do valor do ramo das montadoras de automóveis para todos os ramos de indústria e levando esta a se estruturar nesse molde em que produção venda e financiamento se ligam numa só unidade corporativa eliminando as fronteiras e demarcações que separavam esses elos numa geografia segmentada de gestão e do trabalho e entregando a gestão do negócio inteiramente ao capital rentista representado na agência de financiamento do grupo Daí dizer se que o espaço tornouse uma rede de redes Um nome apropriado para o espaço dos complexos Assim também a economia em comum é a expressão mais evidente do lado popular Daí a liberação tanto no campo quanto na cidade das formas de sociabilidade até então ocultadas nos velhos nichos de assentamento No campo elas aparecem na evidenciação dos conhecimentos populares há séculos centrados na relação de biodiversidade e nas cidades sob o termo genérico de trabalho informal E daí a multiplicação na cidade e no campo das formas de economia popular ora designadas de economia dos setores populares e ora de economia solidária KREYCHETE 2000 E CORAGGIO 2000 que despontam da reestruturação capitalista e cuja natureza é o antigo modo de produção mercantil simples SINGER 2000 supostamente extinto na história São formas de produção e trabalho que tomam por braço de apoio nessa reemergência e caminhada para consolidação movimentos sociais organizados como o MSI FERNANDES 2000 e a CUT NETO e GIANNOTI 1993 estes dois particularmente para estabelecer seu confronto com a sociedade modelada nos complexos SOUZA CUNHA e DAKUZAKU 2003 27 RUY MOREIRA CONCLUSÃO Ao fazer desaparecer as divisões que distinguiam e separavam cidade e campo região e região e cidade e região e justificavam a necessidade da regulação que as unificasse por baixo do Estado ou dizendo de outro modo ao dissolver a fronteira das relações cidade e campo regiãoregião e cidade região superando a divisão territorial do trabalho criada pela indústria nos anos 5060 para ser o padrão de organização espacial da formação capitalista naquilo que a nova base material do capitalismo lhe traz de apoio a regulação privada do espaço abre para virem à tona sujeitos novos e formas novas dos antigos sujeitos da história e essas emergências trazem um modo novo de contraponto e embaralham a formação espacial brasileira BIBLIOGRAFIA ARAÚJO Ney Bittencourt WEDEKIN Ivan e PINAZZA Luiz Antonio sd Complexo Agroindustrial O agribusiness brasileiro São PauloRio de Janeiro Suma Económica BELIK Walter 2001 Muito Além da Porteira Mudanças nas formas de coordenação da cadeia agroalimentar no Brasil Campinas UNICAMPIE BRUNO Ernani Silva 1961 História do Brasil Geral e Regional Amazônia volume I São Paulo Editora Cultrix BIJKARIN N sd 1913 O Imperialismo e a Economia Mundial Análise económica Rio de Janeiro Editora Melso CARNEIRO Edson 1966 O Quilombo dos Palmares Rio de Janeiro Editora Civilização Brasileira CORAGGIO José Luís 2000 Da economia dos setores populares à economia do trabalho In KRAYCHETE Gabriel IARA Francisco e COSTA Beatriz orgs Economia dos Setores Populares entre a realidade e a utopia Rio de Janeiro Editora Vozes 28 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 CUNHA Euclides 1995 1901 Os Sertões Campanha de Canudos Rio de Janeiro Livraria Francisco Alves DERENGOSKI Paulo Ramos 2000 Guerra no Contestado Florianópolis Editora Insular Dl PAOLO Pasquale 1985 Cabanagem A revolução popular na Amazônia Belém Conselho Estadual da Cultura do Pará FERNANDES Bernardo Mançano 2000 A formação do MST no Brasil Rio de Janeiro Editora Vozes GAIGER Luiz Inácio 2004 Sentidos e Experiências da Economia Solidária noBrasilPortoAlegreEditora da UFRGSRede Unitrabalho GALLO Ivone Cecília DÁvila 1999 O Contestado O sonho do milénio igualitário Campinas Editora da UNICAMP GUSMÃORivaldoPinto Coord 1990 DiagnósticoBrasil aocupação do território e o meio ambiente Rio de Janeiro IBGE HOLANDA Sérgio Buarque 1976 Monções São Paulo Editora AlfaÔmega 1986 O ExtremoOeste São Paulo Editora Brasiliense KRAYCHETEGabriel 2000 Economia dos setores populares entre a realidade e a utopia In KRAYCHETE Gabriel LARA Francisco e COSTA Beatriz orgs Economia dos Setores Populares entre a realidade e a utopia Rio de Janeiro Editora Vozes KRAYCHETE Gabriel LARA Francisco e COSTA Beatriz orgs 2000 Economia dos Setores Populares entre a realidade e a utopia Rio de Janeiro Editora Vozes LOPES Mauro de Rezende 1966 Agricultura Política História dos grupos de interesse na agricultura Brasília EMBRAPASPI LUGON C 1968 A República Comunista Cristã dos Guaranis Rio de Janeiro Paz e Terra MONIZ Edmundo 1978 A Guerra Social de Canudos Rio de Janeiro Editora Civilização Brasileira MONTEIRO John Manuel 1995 Negro da Terra índios e bandeirantes nas origens de São Paulo São Paulo Companhia das Letras 29 RUY MOREIRA MOOG Vianna 1966 Bandeirantes e Pioneiros Rio de Janeiro Editora Civilização Brasileira MOREIRA Ruy 2005 Sociabilidade e Espaço As formas de organizaçãogeográficadas sociedades naera da terceira revolução industrial um estudo de tendências São Paulo X EGAL 2004 A nova divisão territorial do trabalho e as tendências de configuração do espaço brasileiro In LIMONAD Ester org Brasil Século XXI por uma nova regionalização Agentes Processos e escalas Niterói PPGEOUFF NERETMax Limonad 2003a Os quatro modelos de espaçotempo e a reestruturação espacial brasileira In MOREIRA Ruy org A Reestruturação Industrial e Espacial do Estado do Rio de Janeiro Niterói PPPEGUFFNERETGECEL 2003b Modelo Industrial e meio ambiente no espaço brasileiro In GEOgraphia ano V número 9 Niterói PPGEOUFF NETO Sebastião L e GIANNOTI Vito orgs 1993 Para Onde Vai a CUT São Paulo Scritta Editorial OLIVEIRA Francisco 1984 Mudança na divisão interregional do trabalho no Brasil In A Economia da Dependência Perfeita 4a edição 1a edição 1977 Rio de Janeiro Editora Graal 1987 Elegia para uma Religião Sudene Nordeste Planejamento e Conflitos de Classes 5a edição 1a edição 1977 Rio de Janeiro Editora Paz e Terra 1988 AEconomia Brasileira Crítica à razão dualista 6a edição 1a edição 1972 Rio de Janeiro Editora Vozes PACHECO Tânia 2004 Sustentabilidade Meio Ambiente e Democracia no III FSM visões e concepções Rio de Janeiro FASEBSDFBOMS PINAZZA Luiz Antonio e ARAÚJO Ney Bittencourt 1993 Agricultura na Virada do Século XX Visão de agribusiness São Paulo Editora GloboAbag 30 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 PEREGALLI Enrique 1997 Como o Brasil Ficou Assim São Paulo Global Editora PUNTONI Pedro 2002 A Guerra dos Bárbaros Povos indígenas e a colonização do sertão do Nordeste do Brasil 16501720 São Paulo Editora Hucitec QUINTILIANO Aylton sd AGuerra dos Tamoios Rio de Janeiro Reper REIJNTJES Coen HAVERKORT Bertus e WATERSBAYERAnn 1999 Agricultura para o Futuro Uma introdução à agricultura sustentável e baixo uso de insumos externos Rio de Janeiro LeusdenHolanda ASPTAILEIA REIS João José e GOMES Flávio dos Santos 1996 Liberdade por um Fio História dos quilombos no Brasil São Paulo Companhia das Letras ROCQUEA Carlos 1984 Cabanagem Epopéia de um povo Belém Imprensa Oficial SINGER Paul 2000 Economia dos setores populares propostas e desafios In KRAYCHETE Gabriel LARA Francisco e COSTA Beatriz orgs org Economia dos Setores Populares entre a realidade e a utopia Rio de Janeiro Editora Vozes SOUZAAndré Ricardo CUNHA Gabriela Cavalcanti e DAKUZAKU Regina Yoneko 2003 Uma Outra Economia é Possível Paul Singer e a economia solidária São Paulo Editora Contexto TAVARES Maria da Conceição 1972 Da Substituição de Importações ao capitalismo Financeiro Ensaios sobre a economia brasileira Rio de Janeiro Zahar Editores VALVERDE Orlando e DIAS Catharina Vergulino 1967 ARodovia BelémBrasília estudo de geografia regional Rio de Janeiro IBGE coord 1979 A Organização do Espaço na Faixa da Transamazônica Rio de Janeiro IBGE 31
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ARTIGOS SOCIEDADE E ESPAÇO NO BRASIL AS FASES DA FORMAÇÃO ESPACIAL BRASILEIRA HEGEMONIAS E CONFLITOS SOCIETY AND SPACE IN BRAZIL Ruy Moreira1 Cinco são as fases da formação espacialbrasileira balizando as formas de relação sociedadeespaço no Brasil no tempo a dos vetores fundacionais a dos ciclos de assentamento a da redivisão territorial industrial do trabalho a da privatização da gestão e desintegração espacial do projeto nacional e a da articulação das sociabilidadese as tendênciasde uma formaçãoespacial complexa São fasesmarcadaspor um contrapontoentremodelos comunitários engendrados espontaneamenteeomodelo desociedadedominante num conflitamento que tensiona a formação espacial brasileira por dentro em caráter reiterado e permanente Se no longo do tempo este contraponto foi mantido às ocultas pelo modo de regulação de espaço instituído pela face hegemónica emerge hoje à evidenciação da consciência social liberado pela reestruturação por que passa a formação espacial brasileira como resultado da entrada do modo de produção capitalista seu nexo estruturador no rumo duma forma de 1 Professor dos Cursos de Graduação e PósGraduação Mestrado e Doutorado em Geografia da Universidade Federal Fluminense 7 RUY MOREIRA organização e regulação espacial nova Evidenciação revelada na surgência dos seus novos sujeitos Quais as raízes históricas e as formas de tendência dessa realidade nova que a formação espacial brasileira aos poucos revela OS VETORES FUNDACIONAIS A formação espacial inicial do Brasil tem origens na ação de dois vetores da formação do território o bandeirantismo e a expansão do gado Caminhando em sentidos contrários no século XVIII estes dois vetores vão encontrarse no planalto central e assim cristalizar a matriz do arranjo da formação espacial que hoje conhecemos O bandeirantismo tem foco de irradiação em São Vicente e avança rumo a quatro direções o litoral sul seguindo pelo costeamento o sudoeste rumo ao território das missões jesuíticas o oeste e noroeste rumo aos territórios das comunidades indígenas do planalto central e da Amazônia e o nordeste rumo aos territórios quilombolas rebelados contra os centros canavieiros da zona da mata nordestina São incursões apresadoras e de repressão em cujos rastros os bandeirantes vão deixando manchas de cultivos e núcleos de futuras cidades que pontuarão a base logística da sociedade em formação Todavia a inspiração real é a descoberta de minas de ouro e prata intento perseguido tenaz e permanentemente com o destino de cumprir na Colónia a política do metalismo que norteia todo o empreendimento colonial de Espanha e Portugal neste momento Daí obandeirantismo perdurar por todo o correr dos séculos XVI ao XVIII culminando com a descoberta das minas de ouro e diamantes no planalto centralmineiro quando então cessa Em cada ponto para o qual se dirige combina então o apresamento de índios e a busca da descoberta do eldorado Estimulado pela demanda interna de trabalho escravo que 8 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 aumenta na Colónia com o sucesso e a expansão da economia açucareira dos engenhos o apresamento e venda de índios como escravos é o que motiva os bandeirantes em todos os seus movimentos de incursão pelo hinterland não respeitando o marco legal doTratado deTordesilhas pelo qual o domínio colonial português pouco vai além da faixa estreita do litoral doAtlântico MONTEIRO 1995 MOOG 1966 acumulando com o tempo uma experiência de guerra a quem recorre a classe plantacionista da zona da mata em diferentes momentos Neste propósito as incursões bandeirantes avançam rumo ao litoral sul onde suas tropas vão disputar hegemonias de território e de apresamento indígena com as tropas espanholas que aí também agem em nome da pertença dessas terras à Espanha segundo o Tratado de Tordesilhas Indo para além do limite da região de Laguna no litoral de Santa Catarina o movimento bandeirante alarga os domínios da Colónia portuguesa ao tempo que garante a mercadoria escrava que o motiva É mais rico de possibilidades todavia o apresamento nas missões jesuíticas que reúnem numerosa população deíndios guaranis aldeados desde 1610 em terras do atual Paraguai Argentina e Rio Grande do Sul Uma sequência de conflitos atravessa a história das relações de bandeirantes e a região missioneira que leva por fim à dissolução e dispersão das comunidades no século XVIII em 1768 quando são extintas Mas também são grandes atrativos as aldeias espalhadaspela imensidão dos sertões do CentroOeste e da Amazônia focos preferidos da ação de apresamento para muitas tropas de bandeirantes por seu menor poder de resistência e coincidir com a possibilidade de descoberta de metais preciosos unindo apresamento e descoberta num só movimento HOLANDA 1976 e 1986 Fogem a este escopo porém as incursões dos bandeirantes à região do Nordeste açucareiro PUNTONI 2002 Seguidamente derrotados em campos de batalha pelos negros escravos organizados nos quilombos de que Palmares ficou como grande símbolo a elite 9 RUY MOREIRA açucareira dos engenhos da Zona da Mata convoca os serviços do capitãodeguerra Domingos Jorge Velho esgarçandose uma série de confrontos que culmina com a morte de Zumbi em 1695 e a derrota dos palmarinos encerrando um período de revoltas de escravos no Nordeste que dura desde 1597 Os quilombos e as missões jesuíticas são contrapontos ao modelo de sociedade que Portugal institui na Colónia as missões jesuíticas desde seus começos de implantação e os quilombos quando o modelo já é uma forma de sociedade consolidada São ambas modelos comunitários de sociedade que se contrapõem ao modelo escravista que se implanta na América Portuguesa CARNEIRO 1966e LUGON 1968 Dado essa estrutura e organização por isso mesmo resistem longamente às investidas de sua extinção Palmares durando 98 anos 15971695 e as missões 158 anos 16101768 só desaparecendo no correr da segunda fase da formação espacial brasileira quase ao mesmo tempo e pelas mesmas mãos Mas esta é uma fase pontilhada também de inúmeras rebeliões indígenas algumas com estruturas de organização que lembram as missões e os quilombos como a Confederação dos Tamoios entre 1554 e 1567 nolitoral do Estado do Rio de Janeiro QUINTILIANO sd e a revolta de Ajuricaba entre 1723 e 1727 na Amazônia BRUNO 1961 As trilhas do gado seguem em sentido contrário ao vetor bandeirante Seu ponto de origem é a região açucareira da Zona da Mata com ponto de referência em Pernambuco de onde na forma de ondas a pecuária bovina avança rumo aos limites ocidentais do sertão nordestino no Piauí e Ceará na direção oeste e aos limites do planalto central através da calha do rio São Francisco na direção sul Tal como no caminho dos bandeirantes uma diversidade de pontos de parada vai dando origem a manchas de cultivos e de vilas de onde irão brotando os centros de referência da ocupação e formação do território Neste mister o movimento bandeirante e o movimento de expansão do gado forçam o deslocamento das fronteiras formais do 10 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 Tratado deTordesilhas empurrando oslimiteslegaiscrescentemente para os confins do hinterland forjando o domínio que o Tratado deMadrid de 1730 irá consagrar como o novo recorte de fronteira dascolónias de Portugale Espanhapraticamente riscando o desenho do território brasileiro de hoje PEREGALLI 1997 OS CICLOS DE ASSENTAMENTO O desenho combinado das trilhas bandeirante e pastoril traça os grandes riscos de linha da tela em cujos interstícios o pincel discreto da história se incumbirá de desenhar em grandes manchas de tinta as paisagens com que a sociedade brasileira inscreverá o seu espaço As grandes paisagens que a discrição da história paciente e incansavelmente desde então vai desenhando são os frutos de nossa evolução em seis grandes ciclos de espaçotempo paubrasil canadeaçúcar mineração gado borracha e café NORMANO 1975 1938 DIEGUES 1960 Ponto essencial desse processo esse plano geral de linhas e cores das paisagens é o planoguia de ocupação efetiva o roteiro dos assentamentos que os ciclos vão aqui e ali plantando no espaço As trilhas dos bandeirantes e do gado ora dos rios e ora dosinterflúvios para o gado também as grandes superfícies planas do planalto onde avança como uma mancha de óleo orientam a pontuação dos assentamentos da população e das atividades económicas no correr dos ciclos Os vales dos rios merecem o privilégio Primeiro momento dos ciclos da ocupação do território o ciclo do paubrasil inicia a história da formação espacial brasileira Vigora no correr dos séculos XVI e XVII e tem por domínio de abrangência a estreita faixa da franja costeira da mata atlântica do Rio Grande do Norte ao norte do Rio de Janeiro A extração do paubrasil cuja madeira de seiva vermelha será enviada à Europa para a produção de corante 11 RUY MOREIRA dá origem às primeiras áreas de ocupação da Colónia Instaladas como feitorias essas áreas fundam a toponímia e antecipam a depredação do meio ambiente como política colonial deixando atrás de si terra arrasada como herança para a história das relações da sociedade com o seu espaço no Brasil Entretanto é com o ciclo da canadeaçúcar que começa efetivamente o processo da ocupação e formação espacial da Colónia Sua área de localização privilegiada é a zona da mata nordestina onde se instala em 1532 com o tempo se multiplicando por novas áreas da mata atlântica particularmente no norte do Estado do Rio de Janeiro e em São Vicente o pólo de irradiação do bandeirantismo em São Paulo O ciclo da cana institui a sociedade agrária como modelo de sociedade no Brasil diferentemente da política de ocupação espanhola que por encontrar de imediato as minas de ouro e prata que representavam a ambição colonial das metrópoles institui como modelo uma sociedade mineradora e urbana nas terras da espanoamérica O caráter agrário e mercantil substanciará o conteúdo social da formação espacial brasileira desde o começo num contraste com a essência mineirourbana da formação espacial da América hispânica No século XVIII finalmente encontrado o ouro e os diamantes que desde o início o projeto colonial intentara a formação espacial colonial experimenta uma ligeira mas substantiva mudança Iniciase o ciclo da mineração que transfere o centro de gravidade da ocupação do litoral para o interior instalandoo nas áreas ricas de mineração que se multiplicam pelos planaltos central e mineiro e troca o caráter agrário pelo mineirourbano da formação colonial encerrando a fase do bandeirantismo e de expansão do gado Esse deslocamento de conteúdo e localização do centro de gravidade dura apenas até o final do século quando se encerra o ciclo restando a cultura de uma vida urbana que doravante terá efeitos profundos e de alta importância nas relações da Colónia 12 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 O encerramento precoce do ciclo da mineração dura menos de um século devolve o centro de referência da vida de volta aos núcleos açucareiros do litoral ao tempo que inicia nas antigas áreas mineiras o ciclo do gado O ciclo do gado é a culminância das ondasde deslocamento de rebanhos provenientes de duas áreas extremas da Colónia o sertão do Nordeste e os campos do Sul atraídos para o planalto centralmineiro pela demanda de alimentos criada pelo ciclo da mineração É dos centros açucareiros que sai inicialmente o rebanho nordestino que subindo o vale do São Francisco chega e se espalha pelas áreas de vegetação de cerrado em busca dos mercados formados pelos núcleos urbanos da mineração Aí se encontra com o rebanho sulino vindo da região do pampa atraído pela mesma demanda Estes deslocamentos um vindo do Nordeste e outro do Sul colmatam e povoam no seu caminho a enorme diversidade de sertões que forma o então hinterland desde o pampa ao cerrado e à caatinga de modo que centrado no planalto central mineiro o ciclo do gado terá por real abrangência toda a imensidão do sertão brasileiro formado pelas áreas de vegetação campestre do pampa do planalto central e do planalto nordestino numa faixa quase contínua e alongada do hinterland no sentido da latitude E com isso sedimenta e consolida como espaço o território da Colónia estabelecido pelo Tratado de Madrid de 1730 O final do século XVIII é fase também do ciclo da borracha que vai ocorrer na região de florestas do vale do Amazonas Até este final de século e em paralelo aos ciclos do paubrasil da cana e dos metais preciosos vige no Norte o ciclo das drogas do sertão A instituição de aldeamentos indígenas pelo trabalho de aculturação dos jesuítas instaura a atividade do extrativismo como modo de vida dominante ao longo de todo o vale Este ciclo se esgota nos finais do século XVIII quando é substituído pelo da extração da borracha o novo ciclo reorganizando a economia regional como um todo O ciclo da borracha cria 13 RUY MOREIRA um novo modo de vida atraindo imigrantes do sertão nordestino assolados pelas secas do final do século alterando as relações existentes e formatando a relação de exploração da floresta em função do novo empreendimento O café o último dos ciclos domina o século XIX e as primeiras décadas do século XX com epicentro no planalto de São Paulo Instaurado inicialmente nas matas dos maciços interiores da cidade do Rio de Janeiro dai se expande para se instalar nas áreas florestadas da serra doMar e do vale do Paraíba nos Estados do Rio de Janeiro Minas Gerais e São Paulo para por fim chegar ao planalto paulista quando então atinge seu clímax O ciclo do café sustenta e faz inúmeras transições da colónia para a independência da escravidão para o capitalismo e da monarquia para a república assim antecipando o momento instaurador da grande transformação que ocorrerá na formação espacial brasileira com o advento da industrialização e urbanização do agora país Essa sequência de ciclosimplanta pois o formato de ocupação e assentamento económico e demográfico da formação espacial brasileira E cria o padrão do arranjo espacial que irá vigorar até meados do século XX em que a lavoura ocupa as áreas de floresta e a pecuária as de vegetação aberta num arranjo diferenciado em três grandes faixas de sentido latitudinal dispostas no sentido do litoralpara onorte amazônicoa de lavourase ocupações urbanas da região de mata atlântica disposta ao longo e em paralelo ao litoral a de pecuária das áreas dos sertões dispostas em faixa latitudinal quase contínua da caatinga nordestina ao pampa riograndense com a imensidão do sertão dos cerrados no meio e a do extrativismo vegetal daAmazônia fechando o mapa no sentido do extremo oestenorte A ocupação demográfica reproduz essa ocupação sócioeconômicaem três grandes faixas também variando do atlântico ao vale do Amazonas com maior densidade na faixa atlânticaeintensidadesucessivamentemenor atéminguar e mostrar se rala na faixa extrativista do extremo norte 14 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 1 É nesse longo período dos ciclos que se implanta o modelo de sociedade brasileira como uma sociedade concentradora e excludente levantando uma sequência de movimentos insurrecionais voltados para o propósito de experimentar um modelo comunitário de sociedade em contraposição ao modelo escravista latifundiário e monocultor dominante o modelo dos quilombos localizado em vários lugares com núcleo maior nas áreas montanhosas do agreste alagoanopernambucano entre 1597 e 1695 CARNEIRO 1966 e REIS e GOMES 1996 no período do ciclo da cana o modelo dos cabanos entre 1835 e 1840 localizado na Amazônia ROCQUE 1984 e Dl PAOLO 1985 no período de transição do ciclo das drogas para o ciclo da borracha e o modelo de Canudos entre 1893 e 1897 localizado no sertão norte da Bahia na transição da monarquia para a república CUNHA 1995 1901 e MONIZ 1978 além do modelo do Contestado entre 1912 e 1916 localizado no oeste de Santa Catarina GALLO 1999 e DERENGOSKI 2000 em pleno período do ciclo cafeeiro Todos reprimidos e dissolvidos pelo sistema dominante à semelhança da experiência comunitária das missões jesuíticas na fase do ciclo do bandeirantismo De um modo geral são experiências de constituição de um outro modelo de sociedade que vicejam na fímbria da instituição do modelo hegemónico da formação espacial brasileira e por isso mesmo se multiplicam principalmente na transição do regime escravista para o capitalista que domina o transcorrer do século XIX A estrutura binomial latifúndiominifúndio existente desde o tempo colonial e que se institui como base organizativa do período da transição período que se estende dos anos 1850 aos anos 1950 por cem anos e assemelharseía auma fase deacumulação primitiva no Brasil parece vir no sentido de neutralizálas e arrefecêlas 15 RUY MOREIRA A DIVISÃO TERRITORIAL INDUSTRIAL DO TRABALHO O século XX encontra a matriz da formação espacial brasileira fundamentalmente completada e consolidada em seu processo de constituição territorial e cartográfica E será essa matriz a base de que o Estado nacional doravante o regulador do desenvolvimento partirá para esgotar e ultrapassar a fase dos ciclos no rumo da industrialização Caracterizaa a diferenciação de áreas seja por sua arrumação em faixas e seja pela arrumação nas diferentes regiões originadas ciclo a ciclo A diferenciação regional em particular terá fundamental importância para o desenvolvimento da indústria dado o caráter de uma divisão territorial de trabalho em que ela é transformada pelo Estado com o fim de dela extrair as divisas de exportação necessárias ao desenvolvimento industrial Distinguemse a fase pré e a fase industrial da formação espacial brasileira agora em construção A década de 1950 é o marco temporal de passagem A industrialização tem seu fomento na passagem do modelo de economia para fora para o de uma economia para dentro TAVARES1972 Até os anos 50 aindústriautilizaem seu crescimento a economia de produção regional para fora legada dos ciclos coloniais crescendo com o consumo de suas divisas que usa para financiar a formação do capital inicial das indústrias na forma da importação de matériasprimas e equipamentos Após os anos 50 encontrase já desenvolvida e centrando a formação espacial brasileira no âmbito de uma organização espacial por ela inteiramente produzida e transformada e obediente à sua lógica intrínseca de mercado Oliveira designa transformação de uma economia regional nacionalmente organizada a da formação espacial herdada do período dos ciclos de espaçotempo para uma economia nacional regionalmente organizada nome da formação espacial do presente a essa passagem referenciada no antes e depois dos anos 50 OLIVEIRA 1984 1987 e 1988 16 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 A lei do desenvolvimento desigual e combinado passa então a reger a nova formação progressivamente desigualando e invertendo a forma das relações espaciais até então existente O campo passa o comando para a cidade as regiões passam o comando para o Sudeste e as indústrias regionais passam o comando para a concentraçãoem São Paulo assim se reorientando a regulação e o ordenamento espacial no interior da formação Essa metamorfose acontecida na formação espacial brasileira já dentro de sua fase industrial segue todavia dois distintos momentos Primeiramente a industrialização arranca e ultrapassa nessa arrancada a economia regional herdada da matriz dos ciclos a seguir dissolvendoa ao atingir o seu auge para reorganizar o espaço numa nova divisão de trabalho de tipo avançado Isto significa dois distintos momentos de divisão territorial do trabalho industrial aquele da conversão pura e simples que responderá por sua arrancada e aquele seguinte da redivisão que irá caracterizar a organização espacial do seu augeAprimeira divisão territorial do trabalho faz a dissolução da fase da formação espacial onde o campo comanda ainda a cidade as indústrias são ainda de bensdeconsumoe por issoencontramseinstaladasem praticamente todas regiões coladas em suas respectivas economias agrárias e a concentração industrial em São Paulo não é um traço distintivo aindaA segunda divisão territorial do trabalho é a da consolidação do arranjo do campo comandado pela cidade e da indústria e do espaço nacional comandado por São Paulo MOREIRA 2004 Uma ampla base de infraestrutura para tanto deve ser instalada que traga os meios de transporte de comunicação e de transmissão deenergiaorganizados numa vasta rede de circulação visando a que tudo convirja para a instauração docomando da cidade sobre o campoe da indústria paulista sobre o espaço nacional total No geral a rede que a urbanoindustrialização promove é a mesma das trilhas do bandeirantismo e da expansão do gado porém orientada agora para outra direção de relações e propósito com impacto em geral negativo para os núcleosiniciais 17 RUY MOREIRA de assentamento e suas localizações Ali por onde passa o eixo modernizante da urbanoindustrialização os velhos núcleos de assentamento são encarados como de efeito inercial não raro a industrialização dissolvendoos desalojando seus habitantes ou mesmo extinguindo seus espaços Demodoqueesseéumperíodo dominado por grandesconflitos não mais do tipo dos confrontamentos de modelos comunitário latifundiário do passado mas aqueles advindos dos reordenamentos tendo lugar conflitosdeordem ruralurbana eregional Nos conflitos rurais opõemse grandes proprietários e camponeses ao redor da questão da reforma agrária A forte concentração da propriedade rural herdada do período colonial e que atravessa sem mudança as transformações fundamentais do século XIX a independência a abolição da escravatura e a república agora é questionada por um campesinato que começa a ser expulso do campo por conta das mudanças com que a agropecuária responde às demandas urbanas e da industrialização reagindo o campesinato com a pressão pela partilha e redistribuição mais equânime da propriedade rural que equilibre as relações no campo e modernize socialmente as relações agrárias O apoio dos segmentos sociais da cidade que vêem um rebatimento positivo da reivindicação dos camponeses no seu modo de vida urbano caso dos trabalhadores com sua pauta de emprego salários e moradia e no alargamento do mercado caso dos industriais preocupados com os limites do mercado interno para seus produtos nacionaliza o movimento do campesinato por reforma agrária e faz dele uma bandeira de confrontos das mais fortes Nos conflitos urbanos opõemse capital e trabalho com pano de fundo no mundo da indústria numa pauta de reivindicações do operariado em que predomina o pleito igualmente de mudança estrutural reforma urbana que redistribua a terra e garanta o direito à moradia na cidade redistribuição da renda que reduza a desigualdade da riqueza 18 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 e estabilidade no emprego e ampliação da seguridade social que estabeleça um modo de vida mais apropriado Demandas que o patronato industrial ambiguamente vê como pressão contra o capital e ao mesmo tempo favorável na medida que fortaleça o mercado sem o qual o desenvolvimento da economia fica obstaculizado São pontos que se somam à grande reivindicação da reforma agrária Todos pleitos que remetem a uma radical reformulação dos privilégios da formação espacial passada e antepostos à formação do presente considerado o interesse da urbanização e da indústria Nos conflitos inter regionais por fim pontuam as dissonâncias entre as velhas oligarquias rurais regionais e as novas nascidas da urbanoindustrialização acentuada pela passagem da velha para a nova divisão interregional do trabalho ressaltando em particular o contraste que então se estabelece entre Sudeste e Nordeste Todos esses conflitos expressam a passagem de uma formação paraoutraeanecessidadedesedimentarsearegulaçãocorrespondente A forte concentração da economia industrial no pólo paulista a subordinação das atividades regionais à performance económica da indústria concentrada em São Paulo a canalização e transferência de meios de uma região para outra e a disparidade do desenvolvimento entre o campo e a cidade são todos conflitos referidos à forma de regulação espacial conflitos que ocorrem praticamente nas linhas de clivagem dos recortes territoriais que demarcam a relação cidade campo regiãoregiãoecidadeespaço E são aspolíticas territoriaisdo Estadoviaaçãosuperestruturalepolíticasdeinfraestruturaqueregulam esses conflitos canalizandolhes as energias para a integração e desenvolvimento da formação espacial no seu todo 19 RUY MOREIRA A PRIVAI IZAÇÃO DA GESTÃO DO ESPAÇO E DESINTEGRAÇÃO DO PROJETO NACIIONA A resposta desses confrontos não vem no entanto pelo viés das reformas mas de uma reordenação espacial que orienta o desenvolvimento na linha de uma modernização conservadora Estratégia de ação que usa da rearrumação do espaço no lugar da transformação estrutural da sociedade demandada pelos movimentos próreformas de base do período da industrialização a modernização conservadora afeta e altera de modo ainda mais radical o mapa dos assentamentos introduzindo na formação espacial brasileira um período de desarrumação demográfica e sócioambiental anteriormente nunca vistos GUSMÃO 1990 É a reestruturação do espaço brasileiro MOREIRA 2003 De que a década de 1970 é o marco temporal Três eixos seguem esta reestruturação a modernização da agricultura a redistribuição territorial da indústria e a despatrimonializaçãodesestatizaçãoqueprivatizaa gestãodoespaço A reestruturação começa pela modernização da agropecuária que tem na expansão da sojicultura para as áreas do cerrado o seu carrochefe Esta expansão todavia é anterior aos anos 70 relacionandose à migração de pequenos produtores das regiões de colonização alemã e italiana do Sul para a calha do rio Paraná buscando reassentarse no noroeste do Rio Grande do Sul oeste de Santa Catarina e oeste do Paraná afetados em suas propriedades pelo desenvolvimento da agricultura gaúcha motivada pela industrialização de São Paulo e pela acentuada fragmentação da propriedade relacionada às seguidas transmissões de heranças Premidos por essas dificuldades esses pequenos produtores empreendem um movimento de migração que nos anos 6070 chega ao Mato Grosso e que os governos militares aproveitam para orientar no sentido da política de colonização da fronteira amazônica É o Estado que está por trás da geração de uma técnica agronómica de uso dos solos dos cerrados pela EMBRAPA 20 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 que estimula o movimento migratório e abre esta área para a implementação agrícola em grande escala E ainda da estratégia de desenvolvimento do setor de indústria para a agricultura que leva a mecanização da agricultura a acelerarse em toda a região Em poucas décadas a soja toma conta do cerrado A política dos grandes projetos estratégia de desconcentração industrial coincide com essa fase de aceleração da modernização agrícola Consiste essa política em transferir para o arco de periferia do paí s as indústrias de bens intermediários implementandoas na forma de grandes pólos míneroindustriais muitos dos quais vão instalarse nas áreas da fronteira agrícola a exemplo do pólo Grande Carajás um enorme centro míneroflorestalsiderúrgico instalado na província ferrífera de Carajás no Sudeste do Pará voltado para a produção de lingotes de ferro para exportação apoiado em alto consumo de lenha extraída da floresta amazônica O suporte dessa implementação combinada de modernização agrícola e desconcentração industrial é uma política de ampliação para as áreas do CentroOeste e da Amazônia da implantação de meios de transporte comunicação e transmissão de energia elétrica que vinha sendo implementada no Sudeste desde os anos 5060 Um número crescente de grandes usinas hidrelétricas torres de transmissão de energia e longos eixos de transporte por rodovias cobre e integra em rede essas áreas aos centros de comando do Sudeste articulando e unificando todo o território nacional com referência nesses centrosAorigem da desconcentração industrial é entretanto a deseconomia de aglomeração que afeta a concentração urbana e industrial da grande São Paulo nos anos 70 provocada pelo acúmulo de um conjunto de conflitos dos conflitos do trabalho aos conflitos ambientais que pressiona pela desconcentração da indústria que irá ocorrer em São Paulo via iriteriorização e em nível nacional pela política dos pólos Nas décadas de 8090 o espaço brasileiro assim se redesenha e se descomprime As atividades agrícolas pecuárias 21 RUY MOREIRA e industriais estão agora rriais disseminadas A rede de transporte comunicação e linhas de transmissão de energia mais difundidas E como efeito a população as cidades e as trocas comerciais amplamente redistribuídas por todo o território Assim a matriz segundo a qual a formação espacial brasileira até então se organizara ganha novo formato Já não mais são as faixas de sentido litoralinterior e as regiões oriundas dos ciclos as formas da diferenciação de áreas As paisagens se dissolvem e se misturam a lavoura passa a ser feita nas áreas de vegetação campestre e o gado nas antigas áreas de matas E a forma de regulação desfazse num movimento institucional de desmonte e remonte com duas principais consequências 1 a desarrumação socioambiental do país em ampla escala e 2 o desalojamento expulsão e desterritorialização da população dos velhos nichos de assentamento Ambos com ocorrência no campo e na cidade Os efeitos socioambientais são conhecidos MOREIRA 2003b Peguemos três exemplosA combinaçãode modernização monoagrícola grandes usinas hidrelétricas e grandes pólos de produção míneroindustrial validada como política territorial para todo o país nacionaliza o problema ambiental antes concentrado nas grandes regiões industriais do Sudeste A propagação da soja pelo topo dos chapadões do planalto central sobre a base da mecanização e consumação de água para irrigação tirada dos lençóis subterrâneos a grandes profundidades e em grande escala esgota as reservas hídricas submete os solos a intensos desgastes assoreia e altera a rede de drenagem desorganizando o ecossistema do cerrado E por fim a opção pelo transporte rodoviário destinado a favorecer o escoamento dos grãos e da madeira intensamente explorada junto à ocupação predatória do cerrado e da floresta reforça a desarrumação socioambiental que já vem na esteira da ocupação rodoviária do Centro e do Norte desde a abertura da BelémBrasília ainda na década de 60 VALVERDE e DIAS 1967 e VALVERDE 1979 22 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 Bem como são conhecidos os efeitos sociais Nas áreas rurais o melhor exemplo é o desalojamento dos assentamentos onde as populações se localizavam desde os pontos de trilhas do bandeirantismo e da expansão do gado com seus embriões de vilas e comunidades rurais localizadas no fundo dos vales dos rios pelos lagos de barragem das usinas Os lagos inundam as áreas justamentedesses antigosassentamentosexpulsam as comunidades indígenas e camponesas de seus lugares históricos e forçamnas a ter de reinventar seus modos de vida em ambientes totalmente distintos aos seus multiplicando a população dos camponeses sem terraindígenas barrageiros e desempregados do campo Nas áreas urbanas os desalojados são os trabalhadores despedidos de suas ocupações e empregos pela chamada flexibilização do trabalho dividindoa populaçãotrabalhadora urbana em população do trabalho formal e informal quase simetricamente num volume de trabalhadores informais até então desconhecido na realidade social brasileira KRAYCHETE 2000 Essa combinação de efeitos no campo e na cidade desterritorializa e torna flutuante grande massa de população que no campo vai alimentar a pressão dos sem terra por novos assentamentos e na cidade a pressão por empregos urbanos para onde migra em levas sucessivas Uma população flutuante para a qual reinventar os modos de vida torna se urna imperiosa necessidade Há assim um movimento de desregulação em marcha e que a política de privatização das empresas estatais dos anos 8090 transforma na instituição da gestão privada do território Responsável pelas empresas atuantes nos ramos estratégicos da infraestrutura e de bens intermediários chaves no comando da economia a exemplo das empresas estatais organizadoras e gestoras do pólos míneroindustriais implantados no correr dos anos 8090 a privatização dessas empresas privatiza a gestão das suas respectivas áreas Quando somados seus espaços aos da cultura da soja centrados no poder das grandes propriedades a 23 RUY MOREIRA escala da privatização da gestão do espaço se torna um fato de abrangência nacional O poder dessas empresas fatia o controle do território desvincula sua administração do Estado define por sua lógica de mercado a lógica da regulação do espaço e por essa via dissocia a formação espacial brasileira do projeto nacional que até determinara o seu conteúdo A ARTICULAÇÃO DAS SOCIABILIDADES E AS TENDÊNCIAS DE UMA FORMAÇÃO ESPACIAL COMPLEXA A privatização da gestão do território desmonta a forma histórica de regulação do espaço até então associada à ação pública do Estado e institui como nova forma uma combinação privadopública e setorialglobal de gestão em que a face privada e setorial se expressa na intervenção simbiótica das empresas e das Agências de Regulação e a face pública e global na intervenção paralela do Estado e dessas mesmas Agências As Agências Reguladoras são o dado novo do esquema de gestão da formação espacial brasileira Criadas uma para cada setor chave da economia as primeiras das quais foram a ANP a ANATEL a ANEELe a ANTT reguladoras respectivamente do setor do petróleo das telecomunicações da energia elétrica e dos transportes terrestres os setores estratégicos da regulação do espaço fazem elas um arremedo de gestão públicoprivado com o Estado Assimuma vez que oplanejamento global com que oEstado intervinha desde os anos 4050é substituídopela ação fragmentada por setores a ação passando a ser levada por esta combinação de públicoprivado com conveniente aparência de sociedade civil o Estado recua para a função de gestão e levantamento dos recursos financeiros em parceria com o capital privado estratégia das PPPs Parcerias PúblicoPrivadas deixando para as Agências a função da execução e fiscalização das políticas territoriais num mix de 24 p BOLETIM PÀULISTÁ DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 representações ao qual cabe por hipótese a tarefa de pensar e gerir o todo da nova formação espacial assim criada Todo um momento se abre nessa conjuminação de nova regra de regulação e flutuação em escala crescente de uma população desalojada dos assentamentos de onde tirava uma estabilidade relativa de modo de vida De um lado um mecanismo novo de regulação que só assegura estabilidade para o capital em sua busca de novos nichos de lucro De outro um quadro deinstitucionalidade do qual parte em restrição crescente da sociedade compartilha São os dois modos como o novo formato da formação espacial brasileira chega aos seus diferentes segmentos de população Como num momento novo essa desregulação entra na vida do capital tal qual um bicho voraz que sacode suas teias oferecendolhe o espaçotempo de reorganização institucional de suas estruturasAssim descarta as componentes que pesam nos seus custos realinha os vetores de sua política e traça o momento novo de sua cartografia Mas como num processo de brecha todavia solta ela as amarras que prendiam a criatividade do trabalho liberando as energias da gestão popular para a emergência de formas espontâneas de autoregulação dando asas ao desenvolvimento de formas coletivas e individuais de organização da produção e de vida antes amortecidas ou presas no âmbito da regulação antiga de capacidade de intervenção insuspeitadas Tudo indica tratarse de uma nova fase de contraponto cujos personagens são melhor exemplificados de um lado com os complexos agroindustriais ARAÚJO WEDEKIN e PINAZZA s d PINAZZA e ARAÚJO 1993 LOPES 1996 e BELIK 2001 que são a nova face dos monopólios e de outro lado com as formas urbanas de economia popular REIJNTJES HAVERKORTe WATERS BAYER orgs 1999 KREYCHETE LARA e COSTA orgs 2000 GAIGER 2004 e PACHECO 2004 a face das experiências comunitárias que reemergem Contraponto que encaminha a formação espacial brasileira rumo ao formato de um complexo 25 RUY MOREIRA de sociabilidades em que de modo claramente explícito coexistem a sociabilidade capitalista e as formas de sociabilidade nãocapitalista num quadro indicativo da entrada da formação espacial brasileira num momento deperfil societário ainda incerto mas que sugere a possibilidade de caminhos e sujeitos novos de sua organização MOREIRA 2005 São novos o paradigma do trabalho e da política novos em face da regulação do espaço O complexo agroindustrial é sem dúvida a expressão mais evidente do novo rumo da organização da formação espacial brasileira pelo lado das classes hegemónicas É uma economia indicativa da organização da sociedade e do espaço segundo padrões de regulação marcados pela ausência da divisão territorial do trabalho de um lado e do Estado de outro lado ilustrando o desaparecimento justamente das estruturas reguladoras das ações e dos ordenamentos do recente passado E assim a forma que melhor encarna os efeitos da nova base material trazida à organização da produção e do trabalho no modo de produção capitalista pela era técnica da terceira revoluçãoindustrial cujo epicentro são a microeletrônica e a engenharia genética e seu acontecimento num momento de hegemonia do capital de caráter eminentemente rentista tal como previsto por Bukarin em sua teoria da economia mundial capitalista nos começos do século XX BUKARIN sd Para além da fusão da agricultura e da indústria no complexo agroindustrial fundemse numa única estrutura de produção e trabalho os setores da agricultura das indústrias dos serviços e da pesquisatecnologia eliminando as separações setoriais em setores primário secundário terciário e quaternário e espaciais em cidade e campo e cidade e região e introduzindo um novo modo de organização espacial das sociedades novo porque sem as separações que segmentavam territorialmente as formações espaciais capitalistas Então as segmentações territoriais forrnarnse agora no plano da relação entre os corpos globais das empresas não mais entre os setores de especialização da economia todos os setores juntandose 26 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 fundidos numa só empresa e numa mesma estrutura em rede de espaço 0 equivalente na ponta urbana do complexo agro industrial é o complexo empresarial que junta a produtora a revendedora e a financiadora como um só domínio de empresa socializando o modelo de realização do valor do ramo das montadoras de automóveis para todos os ramos de indústria e levando esta a se estruturar nesse molde em que produção venda e financiamento se ligam numa só unidade corporativa eliminando as fronteiras e demarcações que separavam esses elos numa geografia segmentada de gestão e do trabalho e entregando a gestão do negócio inteiramente ao capital rentista representado na agência de financiamento do grupo Daí dizer se que o espaço tornouse uma rede de redes Um nome apropriado para o espaço dos complexos Assim também a economia em comum é a expressão mais evidente do lado popular Daí a liberação tanto no campo quanto na cidade das formas de sociabilidade até então ocultadas nos velhos nichos de assentamento No campo elas aparecem na evidenciação dos conhecimentos populares há séculos centrados na relação de biodiversidade e nas cidades sob o termo genérico de trabalho informal E daí a multiplicação na cidade e no campo das formas de economia popular ora designadas de economia dos setores populares e ora de economia solidária KREYCHETE 2000 E CORAGGIO 2000 que despontam da reestruturação capitalista e cuja natureza é o antigo modo de produção mercantil simples SINGER 2000 supostamente extinto na história São formas de produção e trabalho que tomam por braço de apoio nessa reemergência e caminhada para consolidação movimentos sociais organizados como o MSI FERNANDES 2000 e a CUT NETO e GIANNOTI 1993 estes dois particularmente para estabelecer seu confronto com a sociedade modelada nos complexos SOUZA CUNHA e DAKUZAKU 2003 27 RUY MOREIRA CONCLUSÃO Ao fazer desaparecer as divisões que distinguiam e separavam cidade e campo região e região e cidade e região e justificavam a necessidade da regulação que as unificasse por baixo do Estado ou dizendo de outro modo ao dissolver a fronteira das relações cidade e campo regiãoregião e cidade região superando a divisão territorial do trabalho criada pela indústria nos anos 5060 para ser o padrão de organização espacial da formação capitalista naquilo que a nova base material do capitalismo lhe traz de apoio a regulação privada do espaço abre para virem à tona sujeitos novos e formas novas dos antigos sujeitos da história e essas emergências trazem um modo novo de contraponto e embaralham a formação espacial brasileira BIBLIOGRAFIA ARAÚJO Ney Bittencourt WEDEKIN Ivan e PINAZZA Luiz Antonio sd Complexo Agroindustrial O agribusiness brasileiro São PauloRio de Janeiro Suma Económica BELIK Walter 2001 Muito Além da Porteira Mudanças nas formas de coordenação da cadeia agroalimentar no Brasil Campinas UNICAMPIE BRUNO Ernani Silva 1961 História do Brasil Geral e Regional Amazônia volume I São Paulo Editora Cultrix BIJKARIN N sd 1913 O Imperialismo e a Economia Mundial Análise económica Rio de Janeiro Editora Melso CARNEIRO Edson 1966 O Quilombo dos Palmares Rio de Janeiro Editora Civilização Brasileira CORAGGIO José Luís 2000 Da economia dos setores populares à economia do trabalho In KRAYCHETE Gabriel IARA Francisco e COSTA Beatriz orgs Economia dos Setores Populares entre a realidade e a utopia Rio de Janeiro Editora Vozes 28 BOLETIM PAULISTA DE GEOGRAFIA SÃO PAULO n 83 p 731 2005 CUNHA Euclides 1995 1901 Os Sertões Campanha de Canudos Rio de Janeiro Livraria Francisco Alves DERENGOSKI Paulo Ramos 2000 Guerra no Contestado Florianópolis Editora Insular Dl PAOLO Pasquale 1985 Cabanagem A revolução popular na Amazônia Belém Conselho Estadual da Cultura do Pará FERNANDES Bernardo Mançano 2000 A formação do MST no Brasil Rio de Janeiro Editora Vozes GAIGER Luiz Inácio 2004 Sentidos e Experiências da Economia Solidária noBrasilPortoAlegreEditora da UFRGSRede Unitrabalho GALLO Ivone Cecília DÁvila 1999 O Contestado O sonho do milénio igualitário Campinas Editora da UNICAMP GUSMÃORivaldoPinto Coord 1990 DiagnósticoBrasil aocupação do território e o meio ambiente Rio de Janeiro IBGE HOLANDA Sérgio Buarque 1976 Monções São Paulo Editora AlfaÔmega 1986 O ExtremoOeste São Paulo Editora Brasiliense KRAYCHETEGabriel 2000 Economia dos setores populares entre a realidade e a utopia In KRAYCHETE Gabriel LARA Francisco e COSTA Beatriz orgs Economia dos Setores Populares entre a realidade e a 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