O Pensamento Pósformal como Paradigma do Desenvolvimento Cognitivo do Adulto

See discussions stats and author profiles for this publication at httpswwwresearchgatenetpublication337567970 O pensamento pósformal como paradigma do desenvolvimento cognitivo do adulto In Revista Portuguesa de Psicologia Article January 1994 DOI 1021631rpp307 CITATIONS 2 READS 1396 1 author Some of the authors of this publication are also working on these related projects Tech4SocialGood promoting prosociality in schools to prevent cyberbullying PTDCPSIGER19182020 View project Journalists occupational stress View project Alexandra MarquesPinto University of Lisbon 100 PUBLICATIONS 3367 CITATIONS SEE PROFILE All content following this page was uploaded by Alexandra MarquesPinto on 27 November 2019 The user has requested enhancement of the downloaded file ALEXANDRA MARQUES PINTO O PENSAMENTO PÓSFORMAL COMO PARADIGMA DO DESENVOLVIMENTO COGNITIVO DO ADULTO Separata da REVISTA PORTUGUESA DE PSICOLOGIA Número 30 Ano 1994 LISBOA 1995 Face à diversidade de formulações do desenvolvimento cognitivo pósformal existente adotouse como quadro de referência fundamental os trabalhos de D Kramer sobre o desenvolvimento do pensamento dialético 1 INTRODUÇÃO 1 Natureza Relativa do Conhecimento As diversas formulações do pensamento pósformal consideram que com a entrada na vida adulta o indivíduo se insere num mundo social muito alargado o qual inclui pontos de vista distintos e papéis potencialmente incompatíveis 2 Aceitação da Contradição como Característica do Real Como vimos com a entrada na vida adulta e num sistema social mais alargado o indivíduo é confrontado com pontos de contradição 3 Integração da Contradição A aceitação da contradição como característica do real coloca ao adulto o problema da organização desses conhecimento A expressão pensamento pósformal tem por referente o trabalho de Piaget sobre o desenvolvimento cognitivo na adolescência e simultaneamente a ideia de que é possível expandir o modelo piagetiano que conceptualiza as operações forma a uma análise comparada dos dois tipos de pensamento socorrendose de uma analogia com as perspectivas do mundo de Pepper o pensamento formal estária próximo das perspectivas analíticas de Pepper Formismo e Mecanicismo ao passo que o pensamento pósformal perfilharia algumas características das perspectivas sintéticas de Pepper 2 CRÍTICAS AO MODELO PIAGETIANO DAS OPERAÇÕES FORMAIS 5 VERIFICAÇÃO EMPÍRICA DO DESENVOLVIMENTO PÓSFORMAL Diversos estudos têm verificado que com a entrada na idade adulta ou na meia idade de 40 um aumento na incidência do pensamento relativista e dialético nomeadamente Basseches 1980 Commons 1982 Furby 1979 King 1983 Langford 1975 Olsen 1982 Perry 1970 e Sinnott 1982 entre outros citados por Kramer 1983 1984 1986 Outros estudos no entanto não têm constatado essa diferença por exemplo Hairston 1980 Powell 1980 e Sinnott 1983 citados por Kramer 1986 Desta forma e no conjunto estes resultados não podem ser claramente interpretados de um ponto de vista desenvolvimentista Kramer 1984 p 1 51 ESTUDO REALIZADO POR KRAMER 1986 Kramer 1986 realizou um estudo na área do desenvolvimento cognitivo do adulto tendo em vista por um lado explorar as diferenças relativas à idade a nível do pensamento relativista e dialético e por outro testar directamente em que medida as operações formais são necessárias mas não suficientes para o desenvolvimento dessas formas de pensamento As hipóteses de trabalho colocadas foram as seguintes A O pensamento relativista e dialético deverá ter uma maior incidência em grupos de idade mais velhos enquanto que as operações formais que se presume serem uma aquisição da adolescência não mostrarão uma mudança de incidência com a idade Kramer 1986 p 282 B As operações formais representam uma condição necessária mas não suficiente para o pensamento relativista e dialético Kramer 1986 p 282 Relativamente à metodologia adoptada destacase os seguintes aspectos 16 Pela sua relevância para a problemática do pósformal importa aqui explicar mais claramente tais críticas População foram utilizados 60 sujeitos distribuídos por três grupos de 20 sendo 10 do sexo feminino e 10 do sexo masculino de acordo com a faixa etária a que pertenciam 1725 anos 4055 anos e 6075 anos Todos os sujeitos tinham um nível educacional equivalente excepto os de meiaidade do sexo masculino que mostraram ter um nível superior Kramer 1986 Procedimento consistiu na administração individual do seguinte conjunto de provas 1 Ammons Quick Tests 2 Provas Operatórias Formais avaliando a capacidade de separar mentalmente variáveis e a capacidade de coordenação dos sistemas de referência 3 Entrevista Clínica de Kramer avaliando o pensamento relativista e dialético Kramer 1986 Os resultados obtidos permitiram contribuir apenas parcialmente para as duas hipóteses de trabalho A No que diz respeito à primeira hipótese formulada verificouse que as operações formais se mantiveram relativamente inalteradas ao longo das diversas faixas etárias ao passo que se detectaram diferenças de idade no que se refere ao pensamento relativista e dialético No entanto as esperadas diferenças entre jovens adultos faixa etária dos 1725 anos e adultos de meiaidade faixa etária dos 4055 anos a nível do pensamento pósformal não se verificaram Kramer 1986 B Quanto à segunda hipótese de trabalho verificouse que contrariamente ao previsto a Consciência do Relativismo mostrou ser uma condição necessária mas não suficiente ao pensamento operacional formal pelo que esta forma de pensamento pode ser caracterizada como um desenvolvimento pósformal por interacção as operações formais mostraram ser necessárias mas não suficientes para o desenvolvimento do raciocínio relativista Kramer 1986 17 3 SIGNIFICADOS DO TERMO PÓSFORMAL DIVERSIDADE DE FORMULAÇÕES Quadro 1 Notas obtidas pelos sujeitos e respectivo estágio de desenvolvimento do pensamento lógico em que se situam nas provas de permutações quantificação de probabilidades e curvas mecânicas da Échelle de Développement de la Pensée Logique Estádio de desenvolvimento do pensamento lógico em que se situam em termos globais SUJEITOS PROVAS 1 2 3 4 5 6 7 8 9 Permutações 5 6 6 6 6 F F F Quantificação de Probabilidades 2 8 8 8 15 15 Curvas Mecânicas 8 8 1 8 5 2 8 Estádio de Desenvolvimento do Pensamento Lógico F F F F F F F F F Legenda C Concreto I Intermediário F Formal 18 6 DO PENSAMENTO FORMAL AO PÓSFORMAL UMA MUDANÇA ESTRUTURAL Uma reflexão em torno deste tema envolve um conjunto de questões de caráter simultaneamente empírico e conceitual SERÁ NECESSÁRIO RECORRER A UMA NOVA ESTRUTURA PARA DAR CONTA DO PENSAMENTO RELATIVISTA E DIALETICO Tomando em primeiro lugar o caso das operações relativistas Inhelder e Piaget 1958 mostraram que o grupo INRC pode dar conta de pelo menos uma forma muito simples de pensamento relativista através da coordenação de dois sistemas de referência No entanto autores como Arlin 1980 citado por Kramer 1983 1984 contestam esta perspectiva e afirmam que o pensamento formal não permite explicar a coordenação simultânea de muitas perspectivas nem a coordenação de sistemas de referência abstratos Esta afirmação está no entanto por verificar Para verificar estará igualmente outra ideia defendida por alguns autores de que o relativismo seria uma capacidade desenvolvida paralelamente às operações formais Assim segundo Kramer 1983 continua a ser necessário provar que as operações formais não permitem dar conta do pensamento relativista e demonstrar como o grupo INRC é integrado numa nova e mais completa estrutura Paralelamente também não é claro que as perspectivas formal e pósformal possam ser consideradas tão diferentes já que ambas pressupõem que a investigação evolui a partir do conflito e promovem resoluções interativas A investigação relativista pode apresentarse como uma alternativa a esta visão pois que elementos contraditórios passam a constituir casos específicos Desta forma é difícil determinar empiricamente como se distinguem as orientações de formal e do pósformal Kramer 1983 MOSTRAR QUE AS OPERAÇÕES FORMAIS SÃO NECESSÁRIAS MAS NÃO SUFICIENTES PARA O DESENVOLVIMENTO PÓSFORMAL SERÁ UMA PROVA CONCLUSIVA DE MUDANÇA ESTRUTURAL 7 À PROCURA DE CONCLUSÕES Se de facto o pensamento operativo formal e o pensamento pósformal perfilham pressupostos distintos sobre a realidade segundo Kramer 1983 p 101 é ainda prematuro concluir que um transcende o outro isto é que o pensamento pósformal constitui um quarto estágio de pensamento Resumo Este artigo tem por base uma investigação realizada na tradição dos estudos sobre o desenvolvimento do pensamento pósformal e mais especificamente dos trabalhos levados a cabo por D Kramer neste domínio Nesta linha a investigação realizada teve por objetivo fundamental explorar o potencial desenvolvimento cognitivo durante a idade adulta não restringindo aos processos racionalistas e lógicosproposicionalis próprios do pensamento formal mas abrangendo questões do domínio da cognição social tidas como subjacentes à maior parte das situações problemáticas da vida adulta O procedimento adoptado consistiu essencialmente na análise aprofundada de dois casos de jovens adultos mediante a aplicação individual da Échelle de Développement de la Pensée Logique Longot 1979 e da RelativismDialiectic Interview Kramer 1990 No final do artigo procurouse ainda clarificar os resultados obtidos em função da natureza do estudo bem como refletir sobre uma questão fundamental neste domínio em que medida o desenvolvimento pósformal constitui uma mudança estrutural