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Filosofia

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Centro de Educação a Distância Universidade do Estado de Santa Catarina Universidade Aberta do Brasil Filosofa da EDUCAÇÃO FLORIANÓPOLIS CEADUDESCUAB Copyright CEADUDESCUAB 2011 Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer meio sem a prévia autorização desta instituição 1ª Edição Caderno Pedagógico Governo Federal Presidente da República Dilma Rousseff Ministro de Educação Fernando Haddad Secretário de Educação a DistânciaMEC João Carlos Teatini de Souza Climaco Diretor da Educação a Distância da CAPESUAB João Carlos Teatini de Souza Climaco Governo do Estado de Santa Catarina Governador João Raimundo Colombo Secretário da Educação Marco Antônio Tebaldi UDESC Reitor Sebastião Iberes Lopes Melo ViceReitor Antonio Heronaldo de Sousa PróReitora de Ensino de Graduação Sandra Makowiecky PróReitor de Extensão Cultura e Comunidade Paulino de Jesus F Cardoso PróReitor de Administração Vinícius A Perucci PróReitor de Planejamento Marcus Tomasi Centro de Educação a Distância Diretor Geral Estevão Roberto Ribeiro Diretora de Ensino de Graduação Ademilde Silveira Sartori Diretora de Pesquisa e Pós Graduação Sonia Maria Martins de Melo Diretora de Extensão Solange Cristina da Silva Diretor de Administração Ivair De Lucca Coordenadora Curso CEADUDESC Rose Clér Beche Secretária de Ensino de Graduação Maria Helena Tomaz Universidade Aberta do Brasil Coordenador Geral Estevão Roberto Ribeiro Coordenador Adjunto Ivair De Lucca Coordenadora de Curso Carmen Maria Cipriani Pandini Coordenadora de Tutoria Fátima Rosana Scoz Genovez Caroline Jaques Cubas Lidnei Ventura Florianópolis Diretoria da Imprensa Oficial e Editora de Santa Catarina 2011 Filosofia da Educação Caderno Pedagógico 1ª edição Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Universitária da UDESC V468f Ventura Lidnei Filosofia da educação caderno pedagógico Lidnei Ventura e Caroline Jaques Cubas design instrucional Lidiane Goedert e Carmen Maria Cipriani Pandini Florianópolis UDESCCEAD 2011 174 p il 28 cm Inclui bibliografia ISBN 9788564210172 1 Educação Filosofia I Cubas Caroline Jaques II Goedert Lidiane III Cipriani Carmen Maria Pandini IV Título CDD 3701 20 ed Professores autores Caroline Jaques Cubas Lidnei Ventura Design instrucional Lidiane Goedert Carmen Maria Cipriani Pandini Professor parecerista Sergio Sell Projeto instrucional Ana Claudia Taú Carmen Maria Pandini Cipriani Roberta de Fátima Martins Projeto gráfico e capa Adriana Ferreira Santos Elisa Conceição da Silva Rosa Pablo Eduardo Ramirez Chacón Diagramação Adriana Ferreira Santos Pablo Eduardo Ramirez Chacón Revisão de texto Roberta de Fátima Martins Apresentação 7 Introdução 9 Programando os estudos 11 CAPÍTULO 1 A Filosofia e o Pensamento Educacional Impregnações Mútuas 15 Seção 1 O conhecimento filosófico natureza e características 18 Seção 2 A Filosofia da Educação olhar reflexivo sobre o objeto educacional 26 Seção 3 Tendências atuais da Filosofia da Educação 35 CAPÍTULO 2 Do Mito à Invenção da Razão Contribuições da Filosofia Clássica e Medieval para o Pensamento Educacional 45 Seção 1 A racionalidade do mito 49 Seção 2 Os filósofos présocráticos e o princípio da physis 53 Seção 3 A invenção da razão Sócrates Platão e Aristóteles as bases da racionalidade ocidental e suas implicações pedagógicas 57 Seção 4 O Helenismo e o pensamento medieval universalização da racionalidade ocidental 77 Seção 5 A razão transformada em fé Santo Agostinho São Tomás de Aquino e o pensamento medieval 87 CAPÍTULO 3 O Pensamento Moderno e Contemporâneo e a Educação 99 Seção 1 O pensamento moderno e a educação como iluminação 103 Seção 2 Renascimento da dialética a Filosofia da Práxis e a educação 110 Seção 3 Política ética e liberdade o pensamento contemporâneo na educação 121 Sumário 6 CAPÍTULO 4 Filosofia da Educação e a PósModernidade 131 Seção 1 A emergência das identidades culturais e a educação na PósModernidade 134 Seção 2 PósModernidade e temáticas educacionais gênero relações étnicoraciais e diversidade 140 Seção 3 Educação e mídias um olhar filosófico 148 Considerações finais 159 Conhecendo os professores 161 Comentários das atividades 163 Referências 167 Referências das figuras 173 Apresentação Prezadoa estudante Você está recebendo o Caderno Pedagógico da disciplina de Filosofia da Educação Ele foi organizado didaticamente a partir da ementa e objetivos que constam no Projeto Pedagógico do seu Curso de Pedagogia a Distância da UDESC Este material foi elaborado com base na característica da modalidade de ensino que você optou para realizar o seu percurso formativo o ensino a distância É um recurso didático fundamental na realização de seus estudos organiza os saberes e conteúdos de modo que você possa estabelecer relações e construir conceitos e competências necessárias e fundamentais a sua formação Este Caderno ao primar por uma linguagem dialogada busca problematizar a realidade aproximando a teoria e prática a ciência e os conteúdos escolares por meio do que se chama de transposição didática que é o mecanismo de transformar o conhecimento científico em saber escolar a ser ensinado e aprendido Recebao como mais um recurso para a sua aprendizagem realize seus estudos de modo orientado e sistemático dedicando um tempo diário à leitura Anote e problematize o conteúdo com sua prática e com as demais disciplinas que irá cursar Faça leituras complementares conforme sugestões e realize as atividades propostas Lembrese que na educação a distância muitos são os recursos e estratégias de ensino e aprendizagem use sua autonomia para avançar na construção de conhecimento dedicandose a cada disciplina com todo o esforço necessário Bons estudos Equipe CEADUDESCUAB Introdução Prezadoa estudante O Caderno Pedagógico de Filosofia da Educação apresentase como um convite à reflexão sobre a educação enquanto objeto de investigação Ao mesmo tempo é uma viagem pelos caminhos para reconhecer como a humanidade foi inventando maneiras de compreender o mundo que podemos chamar de racionalidades Estas adquirem em cada momento histórico configurações originais e diversas de acordo com as condições históricosociais postas em cada tempo Como dizia o filósofo Francis Bacon 15611626 A verdade é filha do tempo não da autoridade Partese aqui do princípio de que a racionalidade ocidental foi inventada na Grécia Antiga com os filósofos chamados présocráticos cujas preocupações giravam em torno da busca pelo princípio elementar de todas as coisas a arché a origem daquilo que chamavam de physis natureza É importante dizer que a Filosofia só se tornou um gênero literário conhecido a partir de Sócrates Platão e Aristóteles cujas preocupações passam da natureza para o homem e para a sociedade Daí em diante esse gênero começou a ganhar força e se estabelecer culturalmente originando o modo de pensar a realidade segundo um método específico chamado filosofia A filosofia então é um modo de encarar a realidade e atribuirlhe significados Nessa concepção todo homem comum é também filósofo E de fato é mas poderíamos dizer que é um filósofo diletante pelo simples fato de pensar refletir sobre a realidade como dizia o filósofo italiano Antônio Gramsci Mas para ser considerado um filósofo propriamente dito é necessário ir além Sua reflexão segundo Dermeval Saviani 1996 é rigorosa porque se profunda radical porque vai às origens e é finalmente de conjunto porque tende a extrair conclusões que podem ser generalizadas para situações ou fenômenos semelhantes Se no Capitulo 1 caracterizamos a filosofia como uma formapensamento de encarar a realidade para no segundo capítulo elaborarmos um inventário históricosocial da invenção da razão incluindo o mito dentre as narrativas de compreensãointervenção do homem no mundo Já no capítulo 3 o objetivo é compreender o pensamento moderno enquanto oposição ao pensamento medieval e o pensamento contemporâneo enquanto crítica da modernidade 10 e suas implicações para a educação As relações da PósModernidade com a educação principalmente considerando a emergência de temáticas até então inexploradas no campo educacional são expressas no Capítulo 4 Certamente os conteúdos apresentados contextualizados constituem um conjunto de saberes necessários ao estudo Nessa introdução portanto consideramos indispensável dizer que o percurso escolhido no Caderno para conhecer a racionalidade ocidental foi um dentre tantos possíveis No entanto nossa preocupação foi sempre que possível articular a filosofia dominante de cada período com o contexto históricosocial e suas implicações para a educação Outros roteiros evidentemente poderiam ser possíveis e até mesmo mais completos Entretanto a proposta foi ser menos enciclopédico e mais reflexivo procurando vislumbrar as relações de mútua determinação entre Filosofia e Educação Finalmente desejamos que o percurso a ser trilhado seja tranquilo e proveitoso e que os conteúdos trabalhados sejam portadores e provocadores de um olhar crítico e reflexivo sobre a educação de modo a tornar a prática pedagógica uma práxis transformadora da educação Um ótimo estudo e que a leitura desse material e as reflexões dele decorridas sirvam para consolidar e aprimorar a sua prática pedagógica Os professores autores Programando os estudos Estudar a distância requer organização e disciplina assim como estudos diários e programados para que você possa obter sucesso na sua caminhada acadêmica Portanto procure estar atento aos cronogramas do seu curso e disciplina para não perder nenhum prazo ou atividade dos quais depende seu desempenho As características mais evidenciadas na Educação a Distância são o estudo autônomo a flexibilidade de horário e a organização pessoal Faça sua própria organização e agende as atividades de estudo semanais Para o desenvolvimento desta Disciplina você possui a sua disposição um conjunto de elementos metodológicos que constituem o sistema de ensino que são Recursos materiais didáticos entre eles o Caderno Pedagógico O Ambiente Virtual de Aprendizagem O Sistema de Avaliação avaliações a distância presenciais e de autoavaliação O Sistema Tutorial coordenadores professores e tutores Ementa A Filosofia e a sua caracterização O nascimento da Filosofia A origem Geográfica da Filosofia Implicações Pedagógicas da Filosofia Socrática Platônica e Aristotélica A Dialética A Idade Média e o poder das religiões O Renascimento A Modernidade Influências do Empirismo e do Racionalismo na Pedagogia A Lógica A Política e a Ética Elementos filosóficos para a análise e intervenção nas práticas educativas O ensino da Filosofia 12 Objetivos de aprendizagem Geral Compreender a importância da Filosofia da Educação para análise do processo educativo e as influências das reflexões filosóficas na constituição da teoria educacional da Grécia Antiga à sociedade contemporânea Específicos Conhecer a natureza e características do conhecimento filosófico Distinguir senso comum e reflexão filosófica Conceber a filosofia da educação como processo reflexivo da prática pedagógica Compreender o processo educacional como formação humana e processo de humanização para a prática da liberdade Identificar as relações de determinação entre concepções filosóficas e práticas educativas Compreender a racionalidade presente no pensamento mítico Identificar a invenção da razão na Grécia Clássica e os desdobramentos de seus pressupostos para a educação Compreender a formação ética como matriz na Filosofia Clássica Conhecer os pressupostos filosóficos e pedagógicos no Período Antigo Medieval e Moderno Identificar as preocupações atuais da Filosofia da Educação e seus impactos no fazer pedagógico Carga horária 54 horasaula 13 Anote as datas importantes das atividades conforme sua agenda de estudos DATA ATIVIDADE TIPO Conteúdo da Disciplina Veja a seguir a organização didática da Disciplina distribuída em capítulos os quais são subdivididos em seções com seus respectivos objetivos de aprendizagem Leiaos com atenção pois correspondem ao conteúdo que deve ser apropriado por você e faz parte do seu processo formativo Capítulos de estudo 4 Capítulo 1 O objetivo do primeiro capítulo é caracterizar a Filosofia enquanto formapensamento de encarar a realidade para em seguida passar à Filosofia da Educação enquanto formapensamento de reflexão do objeto educativo procurando determinar as tendências contemporâneas 14 Capítulo 2 O capítulo dois faz um inventário históricosocial da invenção da razão incluindo o mito dentre as narrativas de compreensão intervenção do homem no mundo Ao longo desse capítulo se procura extrair da Filosofia Clássica grega aqueles conceitos que se tornariam ícones e fundamentais para todo desenvolvimento filosófico posterior quer seja em razão de sua adesão como na Filosofia Helênica e Medieval ou para sua crítica como se deu na Modernidade Capítulo 3 No capítulo terceiro buscamos compreender o pensamento moderno enquanto oposição ao pensamento medieval e o pensamento contemporâneo enquanto crítica da modernidade e suas implicações para a educação O percurso escolhido foi identificar as raízes do pensamento moderno no renascimento e perceber as propostas educacionais inovadoras desse período Posteriormente discutese o princípio da educação como iluminação a partir do racionalismo característico do movimento iluminista Destacase ainda nesse capítulo a retomada da dialética como filosofia e método de compreensão da realidade incluindo nela o fenômeno educativo A partir da dialética procura se analisar as implicações da Filosofia da Práxis para a prática pedagógica levantando a importância de temas como ética e liberdade para a construção de uma educação fundamentada no princípio dialógico Capítulo 4 O quarto capítulo discute e apresenta as relações da Pós Modernidade com a educação principalmente considerando a emergência de temáticas até então inexploradas no campo educacional tais como gênero relações étnicoraciais e diversidade que só contemporaneamente fazem parte das preocupações dos educadores e das políticas públicas para a educação O capítulo discute ainda a importante questão da relação entre mídia e educação Passemos agora ao estudo dos capítulos CAPÍTULO 1 A Filosofia e o Pensamento Educacional Impregnações Mútuas Caroline Jaques Cubas Lidnei Ventura Neste capítulo você aprenderá a identificar as relações de impregnação mútua entre a Filosofia e o pensamento educacional Para tanto é preciso antes estudar a natureza e as características do conhecimento filosófico para então analisar as possibilidades que tem a Filosofia da Educação em destinar um olhar reflexivo sobre o objeto educacional CAPÍTULO 1 Refletir sobre a natureza e características do pensamento filosófico Entender a importância da Filosofia da Educação para análise do processo educativo e analisar as influências das reflexões filosóficas na constituição da tradição educacional Objetivos gerais de aprendizagem Seções de estudo Seção 1 O conhecimento filosófico natureza e características Seção 2 A Filosofia da Educação olhar reflexivo sobre o objeto educacional Seção 3 Tendências atuais da Filosofia da Educação A Filosofia e o Pensamento Educacional Impregnações Mútuas 18 Iniciando o estudo do capítulo Neste Caderno Pedagógico da Disciplina de Filosofia da Educação iniciamos uma discussão acerca das possibilidades da Filosofia como forma de compreensão e determinação da realidade e seus fenômenos Neste sentido a Filosofia da Educação enquanto campo de conhecimento específico tem como objeto de estudo a análise e reflexão da educação como instituição de formação de sujeitos para um determinado tempo histórico É do contexto dessa discussão mais geral sobre o campo filosófico que se pode vislumbrar as tendências atuais da Filosofia da Educação e suas críticas ao modelo positivista e racionalista que sustentam a concepção de educação herdada da modernidade Vamos às seções de estudo Seção 1 O Conhecimento filosófico natureza e características Objetivos de aprendizagem Conhecer a natureza e as características do conhecimento filosófico Distinguir senso comum e reflexão filosófica Para iniciar o estudo propomos uma reflexão Qual a diferença existente entre um cientista e um filósofo Podemos responder com a seguinte fundamentação Ainda que a partir da Modernidade o status do cientista tenha superado o do filósofo a Filosofia ainda goza de um status elevado É certo que o prestígio do cientista está bem mais em evidência na sociedade atual do que o do filósofo Aliás essa é uma situação no 19 Filosofia da Educação CAPÍTULO 1 mínimo paradoxal porque normalmente se associa o cientista aos procedimentos rigorosos de pesquisa objetividade experiências e em muitos casos às verdades Já o filósofo está associado à sabedoria à reflexão aos provérbios à contemplação e até mesmo à alienação das coisas mundanas como se fosse um místico Apesar dos estereótipos dizendo isso já fizemos de antemão uma diferença entre Ciência e Filosofia e entre o cientista e o filósofo De fato essas diferenças existem embora toda corrente científica opte por uma concepção filosófica o que poderíamos chamar de Filosofia da Ciência Mas o que afinal de contas é a Filosofia Que tipo de conhecimento humano ou como disse François Châtelet 1994 que gênero cultural é esse Para que serve a Filosofia e no caso deste Caderno Pedagógico a Filosofia da Educação Como você percebeu começamos aqui nosso exercício filosófico questionamos Na história da Filosofia essa atitude é marcante diríamos até essencial e ganhou muitos nomes maiêutica em Sócrates dialética em Platão meditação em Santo Agostinho dúvida sistemática em Descartes e toda tradição moderna e inquietação nos chamados pósmodernos Todavia dizer que a Filosofia se limita a fazer questionamentos é reduzila a uma fração do seu potencial crítico e criador O homem comum também questiona interroga pensa E certamente também obtém respostas Então o que distingue o pensamento filosófico do senso comum 20 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 1 O que distingue no entanto o pensar filosófico é a postura radical e rigorosa dos seus questionamentos e reflexões e a qualidade da universalidade totalidade das respostas que obtém Com isso não queremos dizer que o senso comum modo de pensar do homem do cotidiano deva ser desmerecido Mas é justamente por ser uma forma de pensamento inicial original irrefletida que precisa de reflexão ganhando consistência e complexidade podendose extrair dele aquilo que o filósofo italiano Antônio Gramsci 18911937 chamou de núcleo sadio isto é o bom senso É do bom senso um modo de racionalidade mais crítico que brotam as filosofias de vida que norteiam o modo de atuar conceber o mundo e as suas relações com base em alguns princípios que poderíamos chamar aqui de fundamentos É importante frisar que nas decisões embasadas na filosofia de vida há um grau maior de liberdade O sujeito opera de acordo com suas convicções pautando suas ações nos critérios provenientes de sua Filosofia E se todos os homens e mulheres pensam racionalmente logo são de algum modo filósofos como bem apontou Gramsci 1978 p 74 não se pode pensar em nenhum homem que não seja também filósofo que não pense precisamente porque pensar é próprio do homem como tal No sentido gramsciano o pensar é próprio da natureza humana Mas também é fato que essa natureza não é perpétua mudando de acordo com as condições de vida postas em determinada organização históricocultural Por isso é que pensar não basta É preciso dar um passo adiante e refletir Refletir vem do verbo latino reflectere que significa retroceder Sendo assim a reflexão é um pensar sobre o pensamento isto é voltar ao que foi pensado e analisar criticamente sua coerência e adequação à situação que 21 Filosofia da Educação CAPÍTULO 1 se impõe ao pensamento E o sujeito que chega a esse nível de racionalidade Gramsci chama de filósofo profissional Diz ele o filósofo profissional ou técnico não só pensa com maior rigor lógico com maior coerência com maior espírito de sistema do que os outros homens mas conhece toda a história do pensamento sabe explicar o desenvolvimento que o pensamento teve até ele e é capaz de retomar os problemas a partir do ponto em que se encontram depois de terem sofrido as mais variadas tentativas de solução GRAMSCI 1978 p 4445 Se vivemos a maior parte da nossa vida de acordo com o senso comum como discutimos anteriormente então qual a necessidade da Filosofia Figura 11 O Pensador de Auguste Rodin 18401917 Parece fato que não precisamos refletir muito para tocar nossa vida cotidiana Até mesmo alguns atos são automatizados tais como dirigir o carro ver televisão e ouvir música E isso se dá porque de certa forma já naturalizamos essas ações e muitas dessas decisões Entretanto o agir imediato prático apressado como se dá na vida contemporânea impedenos de ver quais interesses estão escondidos nessa ou naquela proposição seja quanto ao consumo manchetes da mídia discursos políticos etc Vamos pensar sobre isso para compreender melhor o que estamos abordando Então acompanhe o questionamento a seguir 22 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 1 Você já se deu conta do que o faz comprar todo mês um mesmo produto um creme dental por exemplo Vamos registrar as resposta Escreva seus argumentos nas linhas abaixo considerando os motivos pelos quais compra o creme dental X e não o Y O sabonete tal e não o outro a bolacha da marca X e não a marca Y e assim por diante O que baliza sua decisão O preço o sabor a sua fórmula ou o slogan e a sua propaganda Reflita sobre esta questão Continue essa reflexão para os demais produtos da sua compra e perceba o quanto você consome por sua vontade e o quanto é vontade alheia Esse é precisamente o papel da Filosofia um desvelar sistemático Escreva seus argumentos nas linhas do quadro a seguir Produto Argumentos 23 Filosofia da Educação CAPÍTULO 1 Sempre que possível compartilhe suas reflexões com outras pessoas O ato de contrapor ideias é um grande potencializador da aprendizagem O filósofo brasileiro Roberto Gomes 1977 cunhou um conceito bem simples e provocativo acerca da Filosofia no seu interessante livro chamado Crítica da Razão Tupiniquim Assim ele se expressa E o que é Filosofia É a tentativa penso de enxergar um palmo diante do nariz o que não é tão fácil nem inútil quanto muitos pensam Afinal o peixe é quem menos sabe da água GOMES 1994 p 15 Mas o que significa enxergar esse palmo diante do nariz Significa dizer que o conhecimento filosófico pergunta pelas coisas em suas origens pelas suas raízes com rigor E vai além procurando por uma visão abrangente dos fenômenos que estuda Nesse aspecto é totalizante Então as principais características da reflexão filosófica segundo o professor Dermeval Saviani 1990 é ser radical rigorosa e de conjunto totalidade Vamos verificar isso com mais alguns detalhes Siga as explicações dos termos em destaque 24 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 1 Reflexão sobre o termo radical O termo radical aqui diferese do sinônimo de ser inflexível intransigente ou intolerante do senso comum Radical é ir à raiz ou seja aos fundamentos aos princípios que definem esse ou aquele conceito ou orientam essa ou aquela ação Significa também exaurir as diversas possibilidades de abordagem dos temas ou objetos de estudo de modo que não haja ambiguidade ou contradição interna na sua forma de raciocinar A radicalidade permite ao homem se apropriar de um dado arsenal teórico que o instiga a agir conscientemente sobre a realidade a teoria também se converte em força material uma vez que se apossa dos homens A teoria é capaz de prender os homens desde que demonstre sua verdade face ao homem desde que se torne radical Ser radical é atacar o problema em suas raízes MARX 2005 p 12 Reflexão sobre o termo rigor Quando Gramsci disse que o filósofo pensa com maior rigor lógico estava se referindo à necessidade de uma forma sistemática de pensar isto é de um método de organização e exposição das ideias que lhe permita tirar conclusões Nesse sentido ser rigoroso é ir ao limite do pensamento é ir às últimas consequências de sua formulação Ao contrário do senso comum o filósofo não apenas afirma coisas ou invoca a tradição os costumes ou a fé ele precisa justificar logicamente os seus argumentos por meio de uma linguagem também rigorosa para definir seus conceitos e erigir seus fundamentos sua teoria O campo da linguagem é a forma principal de materialização de suas reflexões O rigor é essencial ao raciocínio filosófico mesmo considerando toda extensão das temáticas investigadas pelos filósofos O filósofo alemão Max Scheler 1874 1928 levantou bem esse problema já no início do seu livro Da essência da Filosofia A questão da essência da Filosofia está eriçada de dificuldades não por incapacidade humana mas por causa da índole do próprio tema Tais dificuldades não se podem comparar com as dificuldades igualmente consideráveis que costumam surgir quando com rigor se tenta circunscrever os objetos das diferentes ciências positivas SCHELER 2002 p 01 25 Filosofia da Educação CAPÍTULO 1 Reflexão de conjunto Eis aqui um princípio distintivo da Filosofia e da Ciência Enquanto que as ciências são mais conceituadas na medida em que se especializam nos seus objetos de estudo detalhando escrutinandoos ao máximo até a última molécula a Filosofia aspira à totalidade à globalidade relacionando os fenômenos entre si e destes com a realidade humana Isso se dá porque o objeto da Filosofia é tudo Com isso queremos dizer que o filósofo pode se interessar por qualquer coisa no mundo pois como dizia o escritor romano Terêncio 163 dC Homo sum humani nihil a me alienum puto Sou humano nada do que é humano me é estranho Qualquer coisa pode causar estranheza ao filósofo daí as mais variadas correntes filosóficas para explicar as coisas mais simples do cotidiano Tanto para Platão quanto Aristóteles a Filosofia inicia com uma admiração ou seja uma curiosidade que o faz parar para pensar refletir sobre a importância do que vê para procurar sua origem sua razão de ser Ainda sobre a totalidade a que aspira a Filosofia um filósofo alemão chamado Karl Jaspers 18831969 numa provocação aos detratores da Filosofia leva ao extremo a ideia da Filosofia como reflexão de conjunto Ele diz que O problema crucial é o seguinte a Filosofia aspira à verdade total que o mundo não quer A Filosofia é portanto perturbadora da paz Podemos relativizar a euforia de Jaspers entendendo que ele quer dizer que o objeto da Filosofia é a própria condição humana e isso significa que tem que se preocupar com tudo porque uma Filosofia só se justifica por sua preocupação com o homem e as suas relações Para que não haja confusão e fazendo jus a sua fala o filósofo alemão diz em seguida que a verdade é uma busca incessante e não a sua posse um caminho e nunca uma certeza Terminamos essa seção lembrando que em certo sentido o exercício filosófico é um bom antídoto contra o dogmatismo e outras formas de opressão ideológica que iludem e convencem as massas justamente por falta de reflexão Oportunamente citamos um pensamento do escritor português José Saramago extraído de uma entrevista à Revista do Expresso em 11 de outubro de 2008 que faz um apelo contemporâneo ao filosofar Acho que na sociedade actual nos falta Filosofia Filosofia como espaço lugar método de reflexão que pode não ter um objectivo determinado como a ciência que avança para satisfazer objectivos Faltanos reflexão pensar precisamos do trabalho de pensar e pareceme que sem ideias não vamos a parte nenhuma SARAMAGO 2008 26 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 1 Imbuídos desse espírito filosófico apresentamos na segunda seção como esse modo de racionalidade se volta para o fenômeno educacional dando origem à Filosofia da Educação Vamos lá Seção 2 A Filosofia da Educação olhar reflexivo sobre o objeto educacional Objetivos de aprendizagem Conceber a Filosofia da Educação como processo reflexivo da prática pedagógica Compreender o processo educacional como formação humana e processo de humanização para a prática da liberdade Identificar as relações de determinação entre concepções filosóficas e práticas educativas Você viu na seção anterior que filosofar é o ato de voltarse ao próprio pensamento refletindo o já pensado com rigor e radicalidade Nessa esteira de raciocínio filosofar sobre a educação é voltar o olhar sobre o objeto educacional refletindo sobre ele Dizendo assim parece simples mas a questão se torna mais complexa na medida em que se questiona os fins da educação ou como propõe o Professor Pedro Goergen A Filosofia da Educação deve perguntar com rigor e radicalidade em nome de quem se educa 2006 p 605 A amplitude do problema aumenta quando se concebe que a educação ou melhor o processo educativo objeto da Pedagogia é uma atividade essencialmente prática Então juntandose as duas discussões cabe à Filosofia da Educação pensar em nome de quem educar e também como em nome de quem educar Está 27 Filosofia da Educação CAPÍTULO 1 em discussão além dos princípios educativos também os métodos usados na educação Embora estejamos vivendo a tão comentada crise da razão alguns pressupostos não podem ser perdidos de vista no horizonte da Filosofia da Educação sob pena de se perder de mira a própria finalidade do ato educativo que não pode ser mais a herança iluminista redentora da Humanidade é preciso ter claro o que se quer quando se pensa a educação como processo de formação humana SEVERINO 2006 Mas o que significa exatamente a crise da razão O conceito de crise da razão tem origem na escola de Frankfurt início do século XX e se apresenta como uma reação ao caráter racionalista e utilitário da aplicação da razão ocidental sobretudo no que se refere aos ideais de objetividade administração total e progresso defendidos pela ciência moderna A Teoria Crítica elaborada inicialmente por Max Horkheimer e Theodor Adorno definem melhor a chamada crise da razão no livro Dialética do Esclarecimento de 1947 Podemos dizer então que o foco da Filosofia da Educação é a própria configuração de ser humano para determinado momento histórico E foi isso precisamente o que propuseram os chamados filósofos clássicos da Antiguidade até hoje Eles não somente inventaram novos modos de encarar a realidade ou o que consideravam realidade mas legaram aos seus interlocutores e contemporâneos também modos de vida princípios éticos políticos e estéticos Diante da constatação que toda Filosofia tem sua face política e ideológica podemos afirmar que nenhuma Filosofia é neutra pelo contrário está sempre a favor ou contra seja de pessoas classes 28 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 1 movimentos teorias etc Isto se dá porque no âmbito de sua reflexão filosófica que considera a mais correta ou adequada ao seu tempo o filósofo entende que pode guiar os seus concidadãos seja à felicidade revolução iluminação autonomia emancipação conscientização etc Assim as grandes Filosofias foram também Pedagogias no sentido etimológico grego de condução das crianças Basta ver que os dois mais proeminentes filósofos da Antiguidade Platão e Aristóteles fundaram suas escolas a primeira chamada Academia por ficar nos jardins em homenagem ao mitológico herói Academos e a outra o Liceu por ficar próximo do templo de Apolo Lício Essa vinculação entre Filosofia e Educação está tão arraigada no pensamento ocidental que academia e liceu são nomes ainda correlatos de escolas E assim parece transcorrer até hoje pois nenhum filósofo pensa por pensar Ele direta ou indiretamente propõe derivações práticas de suas análises seja no campo da política da ética ou da estética Todos querem de certa forma aplicar ao campo social suas reflexões conclusões divagações e até mesmo seus devaneios Inclusive aqueles que defendem o fim da Filosofia do seu jeito apresentam sua antifilosofia como mais uma corrente filosófica Como dizia o filósofo Karl Jaspers a antifilosofia é uma Filosofia embora pervertida que se aprofundada engendraria sua própria aniquilação 1971 p 138 Mesmo as doutrinas mais idealistas querem ao seu modo mudar o mundo Esse era o intuito de Platão que ao criar a sua teoria das ideias que parece transcendental a primeira vista queria influenciar as coisas no mundo real grego quando predominava em Atenas o governo democrático com todas as ressalvas da democracia ateniense que para ele era inconcebível Lembrando ainda de Jaspers contudo nem mesmo a mais profunda meditação terá sentido se não se relacionar à existência do homem aqui e agora op cit p 139 29 Filosofia da Educação CAPÍTULO 1 E quais as convicções da Filosofia da Educação Sob esse enfoque as Filosofias da educação também querem legitimar no ato educativo suas convicções Daí o cuidado acerca dos fundamentos que regem a prática pedagógica já que todo empreendimento educativo tem um pressuposto que a fundamenta O que pode e frequentemente ocorre é que aquele que executa determinada ação pedagógica não tenha clareza dos seus elementos teóricos norteadores ou em outras palavras da Filosofia da Educação subjacente a sua prática Sobre isso o professor Dermeval Saviani chama de ativismo 1990 p 05 aquela prática ou ação educativa destituída de fundamentos por outro lado chama de verbalismo aquelas teorizações que não têm a prática como ponto de partida e chegada Aflora aqui o caráter humanoativo da ação educacional que é intencional e politicamente comprometida Esse caráter humano ativo é próprio do ser humano que projeta sua ação no tempo e no espaço já tendo uma perspectiva da projeção realizada em sua mente antes da execução É um ato teleológico como na metáfora da aranha a que Marx se referiu no livro O Capital e que Vygotsky adotou como base central na sua teoria históricocultural de formação da consciência Diz ele Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão e a abelha envergonha mais de um arquiteto humano com a construção dos seus favos de sua colméia Mas o que distingue de antemão o pior arquiteto da melhor abelha é que ele construiu o favo em sua cabeça entes de construí lo em cera No fim do processo de trabalho obtémse um resultado que já no início deste existiu na imaginação do trabalhador e portanto idealmente MARX 1985 p 149 30 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 1 Considerando esses fundamentos é que afirmamos homens e mulheres como seres teóricopráticos ao mesmo tempo conceituais e realizadores Esse é aliás o diferencial da espécie Theodor Adorno e Max Horkheimer filósofos da Escola de Frankfurt importante movimento cultural das primeiras décadas do século XX utilizamse justamente da ideia de ser atuante e conceitual para diferenciar o homem dos outros animais A Escola de Frankfurt foi uma forma de nomear os pensadores marxistas vinculados ao Instituto para Pesquisa Social de Frankfurt fundado em 1923 vinculado à Universidade de Frankfurt Alemanha notabilizado por investigações de base marxista nos campos filosófico sociológico estético e psicanalítico entre outros Os expoentes mais famosos da Escola de Frankfurt são Theodor Adorno Max Horkheimer Walter Benjamin Erich Fromm Herbert Marcuse e mais tardiamente Jürgen Habermas Assim eles se expressam O mundo do animal é um mundo sem conceito Nele nenhuma palavra existe para fixar o idêntico no fluxo dos fenômenos a mesma espécie na variação dos exemplos a mesma coisa na diversidade das situações Mesmo que a recognição seja possível a identificação está limitada ao que foi predeterminado de maneira vital No fluxo nada se acha que se possa determinar como permanente e no entanto tudo permanece idêntico porque não há nenhum saber sólido acerca do passado e nenhum olhar claro mirando o futuro ADORNO HORKHEIMER 1985 p 230 Como você percebeu Adorno e Horkheimer atribuem um sentido altamente importante ao conceito e a palavra na constituição daquilo que chamamos de natureza histórica do ser humano E de fato a palavra carrega consigo o conceito o sentido daquilo que queremos referenciar e através da linguagem também nos apropriamos do mundo E quanto mais a palavra adquire novos e expressivos sentidos mais temos condições de reorganizar a experiência humana e nos situarmos mais como protagonistas dos saberes e fazeres humanos e menos em condições de usurpados e alienados menos prisioneiros de mistificações e engodos Adorno nos faz lembrar que os animais estão préconfigurados na sua 31 Filosofia da Educação CAPÍTULO 1 essência quando diz que para esses tudo permanece idêntico enquanto que na condição humana se há alguma coisa de essencial parafraseando é justamente tudo parecer diferente na sua temporalidade histórica No sentido atribuído por Adorno a linguagem tem potencial tanto alienante quanto libertadora Cabe não somente mas também à Filosofia da Educação perguntar incomodamente qual a concepção sentido e função de linguagem utilizada na educação Dependendo da escolha temos uma educação libertadora ou castradora tradicional ou vanguardista adaptadora ou transformadora pois assim como toda Filosofia nenhuma pedagogia é neutra e como já vimos em Châtelet desde Platão a Filosofia tem sido também pedagogia Perceba pela explicação abaixo o quanto a pedagogia depende de definições filosóficas Quando se coloca o homem em condição de educabilidade há um projeto para sua formação que pode se resumir a domesticação instrução ou transmissão como pode também significar de outro lado emancipação conscientização ou libertação Veja que tudo está relacionado aos pressupostos acerca do que se entende por natureza humana Se considerarmos por exemplo que a criança é um ser que chega à escola sem história sem passado sem cultura e que deve ser modelada pela educação a prática educativa vai se servir de princípios e métodos que possam encher esse recipiente vazio Daí nasce uma prática educativa que enfatiza a memorização a associação a padronização e o condicionamento O tipo de saber resultante é essencialmente enciclopédico doutrinador aquilo que o filósofo da educação Paulo Freire chamou de educação bancária por conta dos depósitos de conteúdos nas cabeças dos alunos que no final das contas tenta padronizar os sujeitos 32 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 1 Figura 12 Educação Bancária Por outro lado se pensarmos a natureza humana como construção históricocultural como devir vamos propor um modelo educativo que seja um mediador entre os sujeitos em formação e o movimento da vida e da história Sob essa concepção o que é essencial na formação humana está sujeito a sua temporalidade às condições históricas que estão postas em determinada configuração social Isso quer dizer que há uma clara ambiguidade no processo educativo pois ele é ao mesmo tempo conservador porque deve instrumentalizar as pessoas para viverem no seu tempo mas é também transformador pois é preciso oferecer principalmente às crianças formas conceituais e práticas para compreender as contradições o funcionamento da estrutura social e lutar por sua transformação Como você pôde perceber os conteúdos processos didáticos metodologias de ensinoaprendizagem e outros cânones preceitos da educação institucionalizada só fazem sentido para o sujeito se forem na direção de sua emancipação levandoo à compreensão do mundo e das relações que os homens estabelecem entre si em cada tempo histórico Nesse sentido a educação se confunde com o próprio processo de humanização para uma dada configuração social Visto que a ação humana não pode ser concebida individualmente pelo simples fato de sermos seres sociais o zoon politikon animal social como disse Aristóteles o processo educativo deve se balizar pelas exigências da organização social de modo que o indivíduo 33 Filosofia da Educação CAPÍTULO 1 possa se apropriar tornar próprio seu dos bens culturais e materiais que o conjunto da sociedade produziu até a sua geração Somente desta forma é que ele pode exercer um papel ativo nas relações sociais e estabelecer sua condição de humanidade enquanto ser que pensa decide e age em liberdade Em condições diversas o sujeito só poderá estar alienado e oprimido E é a favor da liberdade é que a prática pedagógica precisa ser pensada e implementada Senão é puro condicionamento treinamento como dizia o filósofo iluminista Immanuel Kant 2002 p 07 O homem pode ser ou treinado instruído mecanicamente ou ser em verdade ilustrado Treinamse os cães e os cavalos e também os homens podem ser treinados Entretanto não é suficiente treinar as crianças urge que aprendam a pensar Nessa discussão retornamos àquela anterior sobre a função da Filosofia da Educação isto é questionar no âmbito da educação formal a quem ela está servindo De acordo com Paulo Freire no seu brilhante livro Pedagogia do oprimido 1970 a educação tanto pode servir para humanização quanto desumanização dos sujeitos imersos no processo educativo Diz ele Humanização e desumanização dentro da história num contexto real concreto objetivo são possibilidades dos homens como seres inconclusos e conscientes de sua inconclusão FREIRE 1970 p 16 Nossa opção todavia deve ir ao encontro do que o autor chama de vocação humana que é o processo de humanização que só pode acontecer na medida em que os sujeitos oprimidos se libertem dos seus condicionamentos opressivos Nessa mesma esteira seguem o pensamento de Adorno e Horkheimer 1985 trocando o termo libertação por emancipação Neles todavia a emancipação é em relação ao que eles chamaram de sociedade administrada que se impõe ao sujeito pela massificação da informação subjugandoo e transformandoo em mais uma coisa uma mercadoria Assim eles esclarecem 34 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 1 O indivíduo vêse completamente anulado em face dos poderes econômicos Ao mesmo tempo estes elevam o poder da sociedade sobre a natureza a um nível jamais imaginado Numa situação injusta a impotência e a dirigibilidade da massa aumentam com a quantidade de bens a ela destinados A elevação do padrão de vida das classes inferiores materialmente considerável e socialmente lastimável reflectese na difusão hipócrita do espírito Sua verdadeira aspiração é a negação da reificação Mas ele necessariamente se esvai quando se vê concretizado em um bem cultural e distribuído para fins de consumo A enxurrada de informações precisas e diversões assépticas desperta e idiotiza as pessoas ao mesmo tempo ADORNO HORKHEIMER 1985 p 06 E para evitar a idiotização das pessoas os autores propõem como tarefa da educação o processo de emancipação dos sujeitos em direção a sua autonomia nas tomadas de decisões livrandose do que chamam de charlatanice e superstição Nesse campo é tarefa da Filosofia da Educação propor reflexões acerca não somente dos fins da educação mas dos porquês e como ensinar pois o que está em questão é a formação das gerações e sua responsabilidade em transformar o mundo em um lugar digno de existência para todas as pessoas Definimos nas duas primeiras seções os termos Filosofia e Filosofia da Educação Já na terceira seção você terá a oportunidade de analisar as tendências atuais da Filosofia da Educação no sentido de refletirmos acerca de nosso papel e nossas possibilidades no fazer pedagógico 35 Filosofia da Educação CAPÍTULO 1 Seção 3 Tendências atuais da Filosofia da Educação Objetivos de aprendizagem Conhecer as tendências atuais da Filosofia da Educação e suas implicações educacionais Relacionar questões pontuais da Filosofia da Educação com nossas possibilidades de ação pedagógica Iniciamos essa seção com outra reflexão interessante Observe a figura abaixo e procure relacionála com outra situada na primeira seção o pensador do escultor Auguste Rodin Faça uma comparação entre as duas obras e registre suas impressões Figura 13 O Pensador 36 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 1 Você percebeu o novo cenário em que está situado o pensador O céu é riscado por forças diversas imbricadas em forma de teia o pensador substitui suas características realista e seus traços de humanidade por entalhes rápidos e inexatos o horizonte é resplandecente como se fosse uma luz no fim do túnel Enfim na imagem acima somos levados a uma nova visão e percepção de O Pensador de Auguste Rodin A escultura original bastante simbólica da prática filosófica por representar o ato reflexivo foi agora estilizada e posta em contato com diferentes horizontes e conjecturas Tal imagem nos leva a seguinte indagação Para onde apontam estes horizontes Quais as preocupações da Filosofia nos dias atuais Ao que ela se direciona Quais as potências em tantas linhas que se entrecruzam Vivemos em um mundo veloz moderno globalizado onde as fronteiras geográficas determinam nacionalidades e ao mesmo tempo são rompidas através do ciberespaço Onde os discursos de igualdade e inclusão são cada vez mais presentes e cotidianamente assistimos práticas de violência e intolerância através da televisão eou internet Como a Filosofia pode nos auxiliar a compreender nosso lugar nesta sociedade Antes de discutirmos sobre as tendências atuais da Filosofia da Educação é importante pontuar as dificuldades em se pensar a Filosofia na contemporaneidade Isto porque se refere ao mesmo 37 Filosofia da Educação CAPÍTULO 1 período em que estamos vivendo Dessa forma não temos o distanciamento necessário para ponderar acerca de quais questões são mais ou menos pertinentes para o pensamento filosófico Mesmo conscientes destas dificuldades elencaremos abaixo alguns dos conceitoschave para pensar contextualmente a filosofia contemporânea datada a partir de fins do século XIX Observe o quadrosíntese que apresentamos abaixo Conceitos Características Progresso No século XX ao contrário de ideia positivista de progresso contínuo a história começou a ser pensada como uma descontinuidade onde cada cultura se desenvolvia a partir de suas características e valores Essa visão foi fortalecida pelo surgimento da etnologia e antropologia Ciência Enquanto o século XIX é conhecido pela sua credulidade em relação ao saber científico e paixão ao progresso que este poderia engendrar o século XX pensa a ciência com certa desconfiança A atitude filosófica passa a ser a da dúvida Razão A noção de inconsciente desenvolvida por Freud desestabilizou os estudos da psicologia trazendo incertezas em relação ao alcance da ciência Marx também fragiliza a preponderância da razão ao abordar a ideia de Ideologia como uma forma de dominação Teoria Crítica A ascensão dos regimes autoritários nazismo fascismo stalinismo cria forte desencanto em relação à noção de razão triunfante Deste desencanto é desenvolvida a teoria crítica representada por Max Horkheimer para quem as transformações sociais devem ter por objetivo último a emancipação e não a dominação Existencialismo Corrente filosófica representada entre outros por JeanPaul Sartre Preocupase mais com a noção de existência que com a de essência questionando o ser humano em contraposição à sua liberdade e compromissos históricosociais Fenomenologia Pensa a linguagem métodos e fundamentos das ciências Estudo das possibilidades e limites do conhecimento Filosofia Analítica Detémse à linguagem como objeto filosófico Suas formas funcionamento e métodos distintos são focos de análise Quadro 11 Conceitoschave para pensar a filosofía contemporânea Fonte DIMENSTEIN STRECKER GIANSANTI 2003 38 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 1 Ainda que o quadro seja meramente introdutório permite nos perceber que a Filosofia Contemporânea não pode ser caracterizada como algo homogêneo São diferentes preocupações engendradas por um período em que as transformações acontecem em velocidade intensa Essa variedade também está presente quando nos reportamos à Filosofia da Educação Conforme vimos anteriormente a Filosofia da Educação pode ser compreendida como um ato reflexivo sobre a educação inquirindo o quê como e em nome de quem se educa Quais os princípios que regem a educação e por que estes podem ser considerados efetivamente princípios Estes questionamentos legítimos em vários contextos históricos são muito pertinentes nos dias de hoje Vivemos um mundo em contínua transformação no qual o aprimoramento tecnológico é incorporado diariamente ao nosso cotidiano a internet nos atualiza acerca do que ocorre em diferentes pontos do Globo fronteiras são rompidas e restabelecidas a todo o momento Sendo assim a Filosofia da Educação deve justamente aterse ao papel da educação neste contexto no qual a tecnologia prevalece ao mesmo tempo em que a Razão parece ter perdido o seu primado Os discursos de igualdade são proferidos ao mesmo tempo em que atos de preconceito ganham ampla publicidade Tudo que é sólido desmancha no ar como diria Marx sobre os tempos modernos Tempos de incertezas conforme Eric Hobsbawm ou Tempos líquidos e fluidos para Zygmunt Bauman O processo educativo inserido nesse contexto deve ser pensado de forma plural Se lembrarmonos que ao educar educamos em nome de algo ou alguém na contemporaneidade este algo deve ser a possibilidade de formação de sujeitos éticos críticos e participativos Sujeitos que tenham consciência de seu papel social e que atuem em prol da construção de uma sociedade onde a equidade seja mais que um projeto Para tanto a educação deve ser pensada como um processo dialógico considerando as características étnicas 39 Filosofia da Educação CAPÍTULO 1 e culturais dos educandos Valorizando aquilo que conhecem e que lhes é significativo e contribuindo para ampliação de seu conhecimento visão de mundo consciência e seus sonhos Paulo Freire já alertava que é a conscientização o passo principal para a conquista da autonomia Cabe à Filosofia da Educação portanto refletir acerca dos elementos que subsidiarão a construção deste sujeito autônomo assim como das formas através das quais estes elementos serão apresentados e problematizados Considerando o contexto que expomos acima a Filosofia da Educação na atualidade elenca temáticas relacionadas às questões de definições identitárias em um mundo marcado pela pluralidade e diversidade Ao pensar em identidade lembramos que esta se refere ao conjunto de elementos com os quais os sujeitos se reconhecem e que por isso acabam por caracterizálos As identidades podem ser étnicas sexuais de gênero religiosas nacionais entre outras O sujeito não se aporta apenas em uma delas sendo caracterizado pelo conjunto de várias como nos faz refletir o seguinte poema de Fernando Pessoa 1942 Leia atentamente Eu que me aguente comigo E com os comigos de mim E em meio a essa multiplicidade penso eu Pensar no eu Mas quem verdadeiramente sou eu Eu sou um Eu sou um em um milhão Eu sou um milhão Quando trazemos as questões das identidades para a educação a reflexão ganha complexidade afinal o que deve ser ensinado Para quem Que importância determinados conteúdos tem para 40 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 1 diferentes grupos Estas perguntas fundamentais para a Filosofia da Educação perpassam os tempos contemporâneos se pensarmos que atualmente as salas de aula são caracterizadas pela diversidade cultural e social Como positivar as diferenças Como lidar com as ausências de grupos como os indígenas ou africanos nos livros e materiais didáticos Qual abordagem da diversidade é mais adequada para o desenvolvimento da atitude reflexiva e do protagonismo Estas questões ainda serão discutidas Por hora é importante ressaltar que a Filosofia da Educação se detém à reflexão acerca dos elementos essenciais que regem a prática pedagógica em diferentes períodos e contextos e que na contemporaneidade caracterizada pela diversidade e pela ascensão das tecnologias esses elementos devem ser compreendidos a partir da discussão sobre identidades culturais No próximo capítulo iniciaremos uma intrigante jornada pela invenção da racionalidade ocidental analisando as características do pensamento mítico da Filosofia Clássica e Medieval ponderando acerca das bases dessa racionalidade e suas implicações pedagógicas 41 Filosofia da Educação CAPÍTULO 1 Síntese do capítulo O conhecimento filosófico tem como características ser rigoroso radical e de conjunto distinguindose do senso comum pela reflexão filosófica No senso comum entretanto há um núcleo válido o bom senso a partir do qual nos guiamos na vida cotidiana A Filosofia da Educação tem como objeto de análise a educação enquanto formação humana dirigindose para a prática a fim de tornála reflexiva Partindo do princípio que há uma relação de determinação entre concepção filosófica e prática pedagógica a Filosofia da Educação compreende a ação educativa como processo de humanização para a prática da liberdade apontando para a superação de pedagogias pautadas em princípios filosóficos conservadores As tendências atuais da Filosofia da Educação precisam ser compreendidas a partir do estudo das características contextuais da contemporaneidade Entre as temáticas abordadas pelas tendências atuais da Filosofia da Educação damos especial atenção às questões referentes à pluralidade e as identidades culturais Você pode anotar a síntese do seu processo de estudo nas linhas a seguir 42 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 1 Atividades de aprendizagem 1 O conhecimento filosófico segundo o professor Dermeval Saviani tem como característica ser rigoroso radical e de conjunto Explique brevemente a importância desses três conceitos relacionandoos com o conhecimento do senso comum 43 Filosofia da Educação CAPÍTULO 1 2 Como podemos desenvolver trabalhos em sala de aula que estejam de acordo com as tendências atuais da Filosofia da Educação Que temáticas devem ser privilegiadas e por quê 44 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 1 Aprenda mais Sobre as características da sociedade contemporânea existem inúmeras obras que podem ser de grande auxílio Apresentamos algumas HALL Stuart Identidade cultural São Paulo Fundação Memorial da América Latina 1997 LYOTARD JeanFrançois O pósmoderno Trad Ricardo Corrêa Barbosa Rio de Janeiro José Olympio 1986 LÉVY P As tecnologias da inteligência o futuro do pensamento na era da informática Rio de Janeiro Editora 34 1998 HARVEY D Condição pósmoderna uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural São Paulo Loyola 1994 CAPÍTULO 2 Neste capítulo será estudada a origem da racionalidade ocidental e suas implicações para o pensamento educacional Nele se discute a ideia de racionalidade que preside o mito e identifica que além de suas funções de narrativa explicação e revelação também tem uma função pedagógica que era de transmitir aos descendentes as verdades convencionadas por determinados grupos sociais Conheça todo o conteúdo fazendo leitura e estudos atentos bem como anotando os pontos principais Do Mito à Invenção da Razão Contribuições da Filosofia Clássica e Medieval para o Pensamento Educacional Lidnei Ventura CAPÍTULO 2 Compreender e contextualizar a importância da narrativa mítica da Filosofia Clássica e Medieval para a construção da racionalidade ocidental Conhecer as influências da narrativa mítica da Filosofia Clássica e Medieval nas concepções pedagógicas até os dias atuais Objetivos gerais de aprendizagem Seções de estudo Seção 1 A racionalidade do mito Seção 2 Os filósofos présocráticos e o princípio da physis Seção 3 A invenção da razão Sócrates Platão e Aristóteles as bases da racionalidade ocidental e suas implicações pedagógicas Seção 4 O Helenismo e o pensamento medieval universalização da racionalidade ocidental Seção 5 A razão transformada em fé Santo Agostinho São Tomás de Aquino e o pensamento medieval Do Mito à Invenção da Razão Contribuições da Filosofia Clássica e Medieval para o Pensamento Educacional 48 Universidade do Estado de Santa Catarina Neste capítulo será estudada a origem da racionalidade ocidental e suas implicações para o pensamento educacional O capítulo discute a ideia de racionalidade que preside o mito e identifica que além de suas funções de narrativa explicação e revelação também tem uma função pedagógica que era de transmitir aos descendentes as verdades convencionadas por determinados grupos sociais Em seguida partese para o estudo dos filósofos présocráticos e com eles a invenção da filosofia enquanto uma visão separada do mito para explicação da physis isto é da natureza e seus elementos Já os filósofos clássicos da Grécia Sócrates Platão e Aristóteles centraram suas preocupações não na natureza mas no homem focando sua análise nas relações éticas estabelecidas na cidade estado na pólis Daí emergiram as duas correntes filosóficas que influenciariam a filosofia e a educação até os nossos dias o platonismo e o aristotelismo com a queda de Atenas como centro cultural da Antiguidade espalhouse por toda Europa e Ásia a partir das conquistas de Alexandre o Grande iniciando o período filosófico e cultural chamado Helenismo Com a queda do Império Romano temse o fim do Período Helenista e início do Período Medieval com predomínio da Igreja e do Cristianismo que em boa medida foi fundamentado por Santo Agostinho a partir das ideias de Platão Já a influência de Aristóteles nesse período deveuse a sua conversão ao Cristianismo por São Tomás de Aquino que representa uma reação da Europa cristã à hegemonia árabe no que se refere à tradução e resgate dos gregos clássicos Como instituição hegemônica em todo Período Medieval a Igreja prescreveu os princípio educativos que vigoraram durante muito tempo e ainda influenciam a educação atual Vamos ao estudo Iniciando o estudo do capítulo 49 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação Seção 1 A racionalidade do mito Objetivos de aprendizagem Compreender a racionalidade presente no pensamento mítico Analisar as funções de narrativa explicação e revelação postas no mito A partir do Iluminismo ainda nas origens da Modernidade o pensamento mítico passou por um crivo rigoroso sendo daí em diante considerado um saber inferior antagônico à racionalidade inclusive sendo constantemente relacionado à falta de consciência e até mesmo às trevas Hoje entretanto antes de julgar o mito procurase apreender seu princípio explicativo sua razão de ser pois como diz Châtelet a passagem do mito à razão significa precisamente que já havia de um lado uma lógica do mito e que de outro lado na realidade filosófica ainda está incluído o poder do lendário CHÂTELET 1973 p 21 Iluminismo O Iluminismo Ilustração ou Esclarecimento foi um movimento filosófico e político europeu do século XVIII Além de inspirar movimentos revolucionários importantes como a revolução inglesa francesa e americana propôs uma nova concepção de mundo que se opunha ao Período Medieval que consideravam período de trevas Daí o século XVIII ser conhecido como o Século das Luzes marcado pela compilação e publicação da enciclopédia e estabelecimento do primado da razão na explicação dos fenômenos físicos e sociais Voltaire Rousseau e Diderot eram iluministas franceses John Locke e David Hume eram ingleses e Immanuel Kant representa o iluminismo alemão Como você estudou anteriormente todo pensamento humano é uma forma de racionalidade o fato de essa racionalidade ser mais ou menos radical rigorosa e universal vai depender das condições históricas postas em determinada organização sociocultural e 50 Universidade do Estado de Santa Catarina das necessidades com que os homens se deparam em condições objetivas de vida para continuar existindo Deste ângulo o pensamento mítico não é menos verdadeiro do que o conhecimento científico ambos mais as filosofias de vida filosofia profissional e outros saberes sempre conviveram O fato de um deles ser hegemônico e portanto tido como verdade vai depender da correlação de forças travadas entre os homens pela sua existência e dos poderes dominantes no quadro social Se por exemplo a Teologia palavra formada pelo prefixo grego TEO que significa deus ou deuses e LOGOS que é estudo foi a expressão da verdade por mais de dez séculos isso não nos autoriza a dizer que os homens que viveram todo esse tempo eram mais infelizes ou eram inferiores a nós que conhecemos a ciência moderna Cabe dizer que toda religião tem sua teologia e através dela organiza suas práticas rituais e modos de vida de seus adeptos O progresso da técnica não é sinônimo de humanização parece até mesmo que pelo mal que estamos fazendo ao planeta e seus habitantes é inclusive o seu oposto Sendo assim para compreender a razão do mito é preciso buscar as formas de relações entre os homens e destes com natureza em tempos longínquos O que você sabe sobre a origem e o significado do mito na Filosofia Registre o que sabe sem consultar livros ou sites Em seguida siga a leitura e perceba se estava no caminho certo Reflita sobre a questão Se atém ao estudo da existência natu reza e das relações entre os deuses e os homens A teodiceia se preocupa em fundamentar racio nalmente a teologia estruturando sua narrativa Em todo Período Medieval no Ocidente vigorou a teologia cristã que tem a Bíblia como seu livro base do qual deriva seus princípios e dogmas 51 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação O historiador da ciência John Bernal no seu livro Ciência na História 1965 Volume I defende que a origem do mito deve ser buscada nas condições de domínio técnico dos agrupamentos antigos e nas suas relações como mundo natural Nessa interpretação a criação da magia do mito tem muito de artifício para apaziguar as intempéries da natureza Segundo o autor pensou que podia persuadir e ludibriar a natureza por meio de métodos que pareciam eficazes como os membros de sua tribo e com os animais que caçava A magia nasceu da necessidade de preencher a lacuna criada pelas limitações da técnica Ao fazer de cada animal ou planta útil o totem de uma tribo particular ou de uma secção da tribo e usando imagens símbolos e danças imitativas o membro da tribo primitiva acreditavase capaz de influenciar esse animal ou planta encorajandoo a crescer e a multiplicarse BERNAL 1969 p 74 Todavia além de apaziguar os titãs fenômenos da natureza ao mito era reservada ainda outras funções dentre elas a pedagógica Através dele transmitiase além dos valores e crenças da tribo as regras da estrutura social e também a visão de mundo daquele grupo ou sua cosmovisão Como diz o historiador Pierre Brunel 2000 p XVI o mito é uma narrativa sendo assim ele conta simbolicamente a origem do cosmo do homem e suas relações Além disso o mito explica ou seja é um conjunto articulado de fatos e acontecimentos até chegar à situação atual Ainda segundo Brunel o mito tem uma terceira função talvez a mais enfática que é de revelação O mito revela o ser os homens os deuses e portanto é uma narrativa do sagrado do suprahumano De modo que podemos sintetizálo assim O mito é uma narrativa que pretende explicar através de forças ou seres considerados superiores aos humanos a origem seja de uma realidade completa como o cosmos seja de partes desta realidade pretende também explicar efeitos provocados pela interferência desses seres ou forças Tal narrativa não é questionada ela é objeto de crença de fé nessa medida se refere à religião ao místico canaliza as emoções coletivas tranqüilizando o homem num mundo que o ameaça É indispensável na vida social na medida em que fixa modelos da realidade e das atividades humanas ANDERY et al 1988 p 22 52 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 Você deve ter percebido que falamos do mito no âmbito das sociedades antigas então pode estar pensando que as mitologias se limitaram a elas Mas como você estudou na primeira seção ninguém fica racionalizando o tempo todo ninguém filosofa em tempo integral por isso vivemos muito do senso comum No âmbito dos mitos acontece o mesmo já que está nos domínios da crença da fé A sociedade moderna e contemporânea arrogantes de sua ciência e tecnologia no afã de exorcizar e abolir de vez o pensamento mítico criou uma infinidade de novas deidades convertendose no seu contrário Os mitos do progresso da razão infalível da verdade absoluta da tecnocracia da objetividade da neutralidade científica e tantos outros inscrevemse na nova mitologia cientificista e tecnológica da sociedade totalmente administrada ADORNO HORKHEIMER 1985 p 15 Para o cientificista o conhecimento só pode ser verdadeiro se for objetivo metódico quantificado e descoberto a partir de repetidas experiências em laboratório O fato é que o mito evoca não apenas a razão mas a invenção a imaginação a transcendência Mas como lembra o filósofo Georges Gusdorf O mito propõe todos os valores puros e impuros Não é da sua atribuição autorizar tudo o que sugere O mito propõe mas cabe à consciência dispor E foi talvez porque um racionalismo estreito demais fazia profissão de desprezar os mitos que estes deixados sem controle tornaramse loucos apud ARANHA 1993 p 59 No âmbito de tantos mitos e rituais que propõem práticas seguindo a orientação acima de Gusdorf é preciso que a consciência disponha crivando crítica e racionalmente aqueles que são contrários ao processo de libertação e que atentam contra a dignidade das pessoas que convivem nesse rico território de interações É a crença na ciência como único conhe cimento verdadeiro e definitivo Em boa medida a herança cientificista da Modernidade se deve ao Positivismo de Auguste Comte 53 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação Seção 2 Os filósofos présocráticos e o princípio da physis Objetivos de aprendizagem Conhecer as ideias dos filósofos présocráticos e as condições históricosociais para o surgimento da Filosofia Compreender o pensamento présocrático como forma de explicação do mundo natural separada do mito Antes de passar às principais ideias dos filósofos chamados pré socráticos que viveram antes de Sócrates século IV aC é preciso explicar o contexto histórico em que um gênero cultural novo chamado filosofia teve sua origem Você irá perceber que esse inventário histórico se faz necessário pois o chamado uso da razão enquanto tentativa de explicação da realidade só existiu por conta do aumento da complexidade da organização social principalmente pela criação da polis grega ainda no período arcaico Períodos gregos Tempos Homéricos séculos XII a VIII a C período de formação da civilização grega narrado de forma épica nos poemas de Homero Período Arcaico séculos VIII a VI a C advento das cidadesestados pólis e movimento de expansão territorial grega colonização das ilhas do Mar Egeu territórios da Ásia Menor e sul da Península Itálica Período Clássico séculos V e IV a C apogeu e domínio da civilização grega Predominância de Atenas sobre as outras polis e nascimento da filosofia clássica Sócrates Platão e Aristóteles Período Helenístico séculos III e II a C decadência do domínio político e militar da Grécia domínio macedônico e depois romano Este período é marcado pela influência das civilizações orientais e disseminação do pensamento Grego no Império Romano 54 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 Abrimos aqui um parêntese para reafirmar a ideia de que o mito não é uma prérazão Ele é uma explicação para uma dada realidade Quanto mais simples forem as relações sociais estabelecidas mais o mito é suficiente pois se trata de uma narrativa histórica um relembrar das tradições e dos feitos heróicos de um povo Mas na medida em que as relações entre os homens e destes com natureza foram se tornando mais complexas sobretudo pela criação da cidadeestado uso intenso da escrita da circulação de moedas e desenvolvimento de novas técnicas agrícolas e comerciais o mito tornouse insuficiente abrindo campo para um gênero novo de discurso e explicação da realidade chamado Filosofia Precisamente no sentido de a explicação para a existência dos homens e da natureza não ser tributária dos deuses o discurso filosófico apresentouse como uma ruptura com o mito condição essa que inaugurou uma nova versão do logos razão humano A invenção da filosofia é contemporânea da invenção da polis grega que eram unidades autônomas na forma de Estados independentes com autonomia econômica política e cultural cuja formação se deu entre os séculos VII e VI aC na região da Jônia na Ásia Menor ver mapa abaixo GRÉCIA ATENAS MAR EGEU PELOPONESO Figura 21 Mapa da Grécia Clássica 55 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação Como toda região da Jônia servia como entreposto comercial da Grécia com o Oriente onde havia intenso trânsito de produtos e ideias estavam dadas as condições para o surgimento de uma formapensamento desapegada das tradições e dos costumes de modo que a autonomia da cidade passava a significar também autonomia do destino dos homens Em uma dessas cidades Mileto viveu Tales um dos primeiros pensadores a elaborar um discurso estruturado a partir da observação da natureza physis e do uso sistemático de argumentos que foram sintetizados numa cosmovisão num sistema explicativo do universo Reza a lenda que se deve a ele a invenção do termo filosofia filos amigo mais sofia sabedoria O filósofo então era aquele que cultivava procurava o conhecimento o saber Assim como ele ficaram famosos outros filósofos da chamada Escola Jônica que tinham em comum a procura pela arkhé o princípio primordial natural explicativo de todas as coisas a substância essencial Pela primeira vez na história humana a explicação da natureza era buscada nela mesma Para Tales de Mileto a substância essencial que compunha todas as coisas era a água para Anaximandro discípulo de Tales era o apeíron o ilimitado para Anaxímenes discípulo de Anaximandro a origem de todas as coisas era o ar já para Heráclito da cidade de Éfeso o princípio de tudo era o fogo Com a invasão da Jônia pelos persas a continuidade da investigação passou do norte da Grécia ao sul da Itália onde surgiram outros filósofos famosos como Pitágoras Parmênides e Demócrito entre outros A preocupação era a mesma da filosofia Jônica ou seja a busca do elemento essencial da physis Para Pitágoras a arché era o número para Parmênides o ser para Leucipo e Demócrito o átomo Apesar de ter chegado a nós apenas fragmentos dos pensadores présocráticos eles lançaram as bases do que seria a razão ocidental Além de estabelecerem princípios explicativos para a origem da physis alguns filósofos pré socráticos se preocupa ram com a vida na cidade criando leis e desenvol vendo conhecimentos na área da Matemática Astronomia e Geometria 56 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 enquanto fundamentos e enquanto método de investigação e comunicação dos resultados de suas reflexões Mesmo sem entrar nos detalhes de seus princípios seria oportuno falar sobre dois filósofos que influenciaram sobremaneira o pensamento ocidental ainda que em lados completamente opostos Parmênides e Heráclito de Éfeso Figura 22 Parmênides e Heráclito Para Parmênides o ser é imóvel e portanto a realidade também Segundo o fundador da escola eleática de Eléia o Ser é o não ser não é com isso afirmando que só há a possibilidade de identidade no ser e não na contradição É uma resposta lógica ao paradigma da transformação resultando na concepção de imutabilidade do mundo E para resolver o impasse Parmênides atribui a ilusão dos sentidos à ideia de movimento É no fórum da razão do intelecto do logos é que este problema é resolvido e não na opinião vulgar ou na experimentação sensualista Esse pensamento influenciou toda tradição do pensamento ocidental inaugurando o racionalismo a crença definitiva na razão enquanto possibilidade de tudo conhecer Para Heráclito tudo flui tudo está em contradição perpétua em movimento Ele estabelece uma unidade de contrários quentefrio dianoite amoródio que está presente em todas as transformações a que o Ser se destina o devir Por isso Heráclito é considerado o pai da dialética enquanto discurso filosófico defendendo a transformação perpétua da natureza e do próprio homem Sobre este temse o famoso aforismo de Heráclito um homem não 57 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação toma banho no mesmo rio pois da segunda vez já não é o mesmo homem nem a mesma água Para Parmênides o Ser é para Heráclito o Ser é ele mesmo e o seu contrário o não ser ou aquilo que um dia será Se para os eleáticos o mundo é estático para o jônico Heráclito de Éfeso ele está em constante mutação Pouco se tem de escritos dos filósofos présocráticos e parte do que se sabe se deve aos comentários dos pensadores que fundaram a racionalidade ocidental principalmente Platão e Aristóteles que foram fortemente influenciados por eles Enquanto os présocráticos estavam preocupados em explicar a ordem geral do universo a geração socrática voltouse aos problemas da pólis e das relações sociais E como a educação é um processo que tem como ponto de partida e chegada a sociedade os chamados filósofos gregos clássicos socráticos desenvolveram o seu pensamento apontando para o processo educativo e para a formação ética dos cidadãos ou seja dos homens da cidade É esse pensamento com forte influência na Pedagogia até nossos dias que veremos na próxima seção Seção 3 A invenção da razão Sócrates Platão e Aristóteles as bases da racionalidade ocidental e suas implicações pedagógicas Objetivos de aprendizagem Identificar a invenção da razão nos filósofos clássicos gregos Conhecer as principais ideias de Sócrates Platão e Aristóteles e suas implicações para a educação 58 Universidade do Estado de Santa Catarina Estabelecidas as bases da cidadeestado por toda Grécia foi em Atenas que a democracia emergiu da correlação de forças entre a classe social representada por mercadores artesãos e comerciantes e a oligarquia agrária que dominou por todo período arcaico Ainda que fosse uma democracia restrita a poucos já que a participação era reservada ao homem de nascimento ateniense ficando de fora as mulheres os escravos e os estrangeiros metecos O século de Péricles que marcou o apogeu da hegemonia ateniense na Grécia tem como marca principal o incentivo ao comércio às artes e marca o surgimento do cidadão Neste contexto a palavra adquire na democracia uma função especial tanto no que se refere às funções públicas quanto na condição de molamestra da educação É pela palavra que o cidadão defende seus argumentos na Ágora praça pública que convence seus compatriotas que prega sua filosofia Enfim saber falar argumentar e contraargumentar se torna fundamental já que o processo democrático é de participação direta Vem daí o sucesso das escolas fundadas pelos chamados sofistas Eram professores de retórica e política e ensinavam a argumentar e a usar bem a palavra nas assembleias de modo a convencer Sócrates e Platão criticavam os sofistas chamandoos de embusteiros e mercenários Na época de Sócrates eram professores particulares que cobravam por seu ensino Muitos deles se tornaram famosos como Protágoras e Isócrates A imagem dos sofistas e sua filosofia começaram a ser resgatas somente no século XIX devido ao preconceito histórico ao qual seus nomes estavam associados Mas como diz Châtelet 1999 ao seu modo Sócrates 469399 aC aprox também é um sofista pois faz da palavra sua arma de intervenção social E é pela palavra que o filósofo Sócrates tenta convencer seus concidadãos que a Virtude com V maiúsculo é o melhor caminho para a existência humana Para ele a Virtude é o Bem supremo a felicidade eterna que é essencial ao homem nasce com ele é próprio de sua natureza O método socrático consiste em aflorar no homem aquilo que lhe é essencial Para tanto sai pela cidade afora questionando o conhecimento que as pessoas acham que tem de si das suas virtudes ou de sua profissão 59 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação Vamos conhecer o método filosófico de Sócrates Esse método chamado ironia é essencialmente dialógico e tem dois momentos distintos refutação e maiêutica No primeiro momento do diálogo ele questiona o que o seu interlocutor sabe crivandoo de tantas perguntas a ponto de se chegar ao consenso de que ele efetivamente não sabe do que está falando Chegado esse momento era preciso extrair seu conhecimento interior por meio da maiêutica que significa parir fazer nascer aquilo que é imanente ao homem a sua virtude Portanto para Sócrates o conhecimento verdadeiro e o autoconhecimento ou como ele dizia conhecete a ti mesmo parte inicialmente de uma consciência da própria ignorância só sei que nada sei para chegar a um conhecimento de si mesmo Neste contexto qual a principal preocupação de Sócrates A preocupação do filósofo era melhorar o homem para que a sociedade melhorasse Encontrando a virtude em cada um o conjunto social seria virtuoso também Neste sentido a filosofia socrática tem um caráter eminentemente ético e moral O Bem é o universal a ser perseguido e a vida virtuosa deve ser buscada a qualquer preço Tanto que Sócrates é condenado à morte pelo tribunal ateniense acusado de perverter a juventude sem renunciar as suas crenças Poderia ter pagado uma modesta multa ou ter aceitado o plano de fuga dos amigos dentre eles Platão mas como isso trairia suas 60 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 convicções e o que considerava a missão que o deus Apolo havia lhe confiado conforme lhe havia dito o oráculo de Delfos recusou e se tornou o primeiro mártir da Filosofia Em um dos diálogos de Platão Teeteto o próprio Sócrates explica o seu método de obtenção do conhecimento Vejamos o fragmento abaixo Ora bem toda minha arte de obstetra é semelhante a essa mas difere enquanto se aplica aos homens e não às mulheres e relacionandose com as suas almas parturientes e não com os corpos Sobretudo na nossa arte há a seguinte particularidade que se pode averiguar por todo o meio se o pensamento do jovem vai dar à luz a algo de fantástico e de falso ou de genuíno e verdadeiro Pois acontece também a mim como às parteiras sou estéril de sabedoria e o que muitos têm reprovado em mim que interrogo os outros e depois não respondo nada a respeito de nada por falta de sabedoria na verdade pode me ser censurado E esta a causa que Deus obrigame a agir como obstetra porém vedame de dar à luz E eu pois não sou sábio nem posso mostrar nenhuma descoberta minha gerada por minha alma PLATÃO TEETETO apud ANDERY et al 1988 p 70 Como você pode ver ao seu modo Sócrates é acima de tudo um educador um condutor da iluminação interior do homem Incentivando o autoconhecimento favorece ao que hoje se denomina de metaconhecimento ou seja o conhecimento acerca daquilo que se conhece fundamental nos processos educacionais sobretudo na educação a distância Nesse sentido conhecer é ao mesmo tempo um questionamento uma reflexão sobre o que se sabe e sobre o que importa saber E mais é uma reflexão sobre o que se conhece melhora o sujeito ou de alguma forma colabora com o seu processo educativo De certa forma educar é também parir fazendo emergir do processo um sujeito autodescoberto conhecedor dos seus limites e potencialidades Todavia numa visão socrática precisa emergir da educação um sujeito engajado eticamente para melhorar a vida em sociedade isso porque para ele a existência do mal é produto da ignorância do Bem que habita no próprio homem 61 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação Sócrates nada escreveu o que se sabe dele é através dos seus discípulos Xenofonte e Platão que o imortalizaram em seus diálogos E mesmo vivendo há mais de dois mil anos seu legado é providencialmente contemporâneo na medida em que evoca o diálogo como metodologia de descoberta de conhecimento Toda educação só pode ser autêntica se for pautada no diálogo na paridade argumentativa entre o educador e o aluno E como toda relação dialógica é atribuidora de sentido para os interlocutores a maiêutica a parturiência do conhecimento se dá nas várias dimensões do sujeito não podem ser unilaterais Neste aspecto Sócrates é o primeiro pensador clássico que evoca a reflexão sobre o homem no âmbito da Filosofia que antes dele estava preocupada com a origem da physis A partir dele há uma inflexão nos interesses filosóficos indo da natureza em geral para a natureza humana Figura 23 Louis David 1787 Óleo sobre tela 130 x 196 cm Metropolitan Museum of Art New York As filosofias de Platão e Aristóteles A condenação e morte de Sócrates pela democracia ateniense despertaram a indignação e a repulsa do seu mais dedicado e famoso discípulo Platão 427347 aC um jovem aristocrata seduzido pela mensagem socrática Após a morte do mestre Platão 62 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 se impôs a missão de continuar o seu legado e propagar as suas ideias Na verdade Platão fez mais do que isso legou à posteridade a missão socrática nos seus diálogos escritos com uma riqueza literária de incomparável valor histórico e filosófico É como se ele tivesse se tornado o portador da mensagem socrática e perpetuador do método dialético para o porvir Ao mesmo tempo serviuse dos diálogos para criticar a debilidade do sistema democrático a ilusão dos sofistas e ridicularizar os poderosos do seu tempo Ao contrário de Sócrates que afirmava nada saber além de prescrever normas de conduta ética e moral aos seus contemporâneos Platão também propôs formas de organização política e social que estão consubstanciadas no seu mais famoso livro A República O filósofo François Châtelet 1994 diz que a Filosofia só pode existir com relação a Platão Não que toda filosofia seja platônica mas de alguma forma remetida a ele pró ou contra E isso é verdade pois sempre que nos voltamos à história da filosofia de certo modo Platão está presente seja na Patrística de Santo Agostinho Período Medieval no racionalismo de Descartes ou no Idealismo Hegeliano Modernidade Inclusive é o parâmetro que dá origem à pósModernidade já que a preocupação de Friedrich Nietzsche é provocar a reversão do platonismo VIEIRA 2008 ou aqueles a quem chamava de alucinados do aquém mundo CHÂTELET 1994 p 38 De modo que Platão acabou se tornando um pensador atemporal Platão fundou sua Academia em 387 aC e certamente não era uma escola barata e nem para todos Mesmo porque na sua mente aristocrática somente alguns poderiam chegar ao conhecimento da Verdade aqueles cuja alma fosse propensa à Ciência 63 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação Segundo alguns historiadores havia um ensino místico e secreto na escola platônica que somente alguns iniciados tinham acesso CHÂTELET op cit E para chegar até ele o plano de estudos era extremamente longo e extenuante de tal sorte que somente com 30 ou 35 anos é que se passaria ao estudo dos mistérios das Ideias ou daquilo que em grego se chamava de theôrein visão teoria É claro que seria difícil alguém terminar os estudos numa escola como essa Além de iniciar nos estudos esotéricos o projeto da Academia é certamente prover a cidade de bons governantes para que fosse justa e perfeita sendo corrigidos os males provocados pelo sistema democrático neste aspecto a Academia representa um projeto político Então Platão deu continuidade ao método socrático Sim além de adaptar o diálogo socrático às novas pretensões conservouo como forma discursiva de sua filosofia usando a dialética como método para se chegar à essência das coisas por aproximações e induzindo o interlocutor às concordâncias necessárias Seu método se destinava sempre à determinação do conceito já que estava preocupado em chegar às formas essenciais supra humanas das coisas investigadas Era um saber contemplativo porque estava destinado à racionalidade e não a sua aplicação material ou técnica Como todo aristocrata grego desprezava a aplicação do conhecimento à produção pois os ofícios eram considerados arte de segunda categoria 64 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 Segundo Platão o conhecimento nasce da razão inerente aos sujeitos e sua via de acesso principal é a matemática justamente pelas suas regularidades e simetrias perfeitas Inclusive havia uma advertência na entrada da Academia Que não entre quem não saiba geometria Isso se aplica bem a sua teoria das ideias já que podemos por pensamento admitir a existência de formas matemática perfeitas Como isso ocorre na Matemática também haveria de existir a Justiça a Sabedoria o Bem e outros arquétipos suprarreais Para compreender a teoria das ideias de Platão pense nas formas geométricas um quadrado por exemplo Quando você pensa nele não vem à mente a imagem de um quadrilátero com quatro lados e ângulos iguais Pois bem para o nosso filósofo esse objeto tem existência real nas ideias assim como demais objetos e conceitos Por isso sua filosofia é também chamada de realismo da ideias Figura 24 Conhecete a ti mesmo E a função da Filosofia gradativamente seria atingir esse mundo ideal para longe dos equívocos e imperfeições dos sentidos humanos o que só poderia ocorrer vendo se com os olhos da alma Afinal quando nascemos segundo Platão nossa alma traz consigo as lembranças do mundo perfeito onde habita a Ideia de tudo o que há no mundo real só que decaído defeituoso meras aparências cabendo à Filosofia extrair da alma as suas vocações lembranças e tudo o que remetesse ao mundo ideal feito 65 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação de essências era essa a teoria da reminiscência Nesse sentido educar o homem é relembrálo do que já sabe em potencial neste caso lembra o aforismo socrático Conhecete a ti mesmo Foi assim que Platão definiu o conhecimento filosófico que seria a investigação do mundo das essências teoria das ideias separando a opinião comum do conhecimento científico Decorre da teoria das Ideias a classificação do conhecimento em dois tipos a doxa se refere ao conhecimento do senso comum da opinião já a episteme é o conhecimento científico o saber verdadeiro a contemplação da verdadeira essência das coisas Isso fica muito claro nos diálogos do filósofo grego quando pergunta a um interlocutor o que é a Justiça e este responde que fulano é justo logo ele volta ao questionamento inicial dizendo que não está interessado na justiça dos homens na sua aparência aquilo que parece ser mas em saber qual a essência da Justiça somente ao final se poderá julgar se fulano é justo ou não mas nunca a partir da opinião inicial mas da investigação Assim Platão inaugura a ideia de que o conhecimento da realidade nunca é imediato mas depende sempre da mediação metodológica E a investigação no seu caso depende do recurso à Matemática e à Lógica dialética pois com ela é possível passar do mundo sensível ao inteligível ou conceitual É importante remeter o estudo à célebre Alegoria da Caverna uma bela metáfora descrita por Platão no livro sétimo da sua obra mais completa A República onde ele exemplifica sua teoria da ideias a partir de um diálogo entre Sócrates e Glauco Vamos ver como ele apresenta suas ideias acerca do mundo visível e inteligível no fragmento a seguir 66 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 SÓCRATES Figurate agora o estado da natureza humana em relação à ciência e à ignorância sob a forma alegórica que passo a fazer Imagina os homens encerrados em morada subterrânea e cavernosa que dá entrada livre à luz em toda extensão Aí desde a infância tem os homens o pescoço e as pernas presos de modo que permanecem imóveis e só vêem os objetos que lhes estão diante Presos pelas cadeias não podem voltar o rosto Atrás deles a certa distância e altura um fogo cuja luz os alumia entre o fogo e os cativos imagina um caminho escarpado ao longo do qual um pequeno muro parecido com os tabiques que os pelotiqueiros põem entre si e os espectadores para ocultarlhes as molas dos bonecos maravilhosos que lhes exibem GLAUCO Imagino tudo isso SÓCRATES Supõe ainda homens que passam ao longo deste muro com figuras e objetos que se elevam acima dele figuras de homens e animais de toda a espécie talhados em pedra ou madeira Entre os que carregam tais objetos uns se entretem em conversa outros guardam silêncio GLAUCO Singular quadro e não menos singulares cativos SÓCRATES Pois são nossa imagem perfeita Mas dizeme assim colocados poderão ver de si mesmos e de seus companheiros algo mais que as sombras projetadas à claridade do fogo na parede que lhes fica fronteira SÓCRATES Vejamos agora o que aconteceria se se livrassem a um tempo das cadeias e do erro em que laboravam Imaginemos um destes cativos desatado obrigado a levantarse de repetente a volver a cabeça a andar a olhar firmemente para a luz Não poderia fazer tudo isso sem grande pena a luz sobre serlhe dolorosa o deslumbraria impedindolhe de discernir os objetos suja sombras antes via SÓCRATES Pois agora meu caro Glauco é só aplicarem com toda a exatidão esta imagem da caverna a tudo o que antes havíamos dito O antro subterrâneo é o mundo visível O fogo que o ilumina é a luz do sol O cativo que sobe à região superior e a contempla é a alma que se eleva ao mundo inteligível Ou antes já que o queres saber é este pelo menos meu modo de pensar que só Deus sabe se é verdadeiro Quanto a mim a coisa é como passo a dizerte Nos extremos limites do mundo inteligível está a idéia do bem a qual só com muito esforço se pode conhecer mas que conhecida se nos impõe à razão como a causa universal de tudo o que é belo e bom criadora da luz e do sol no mundo visível autora da inteligência e da verdade no mundo invisível e sobre a qual por isso mesmo cumpre ter os olhos fixos para agir com sabedoria nos negócios particulares e públicos 1956 p 288291 Fonte PLATÃO A república São Paulo Atena Editora 1956 67 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação Perceba que para Platão a atribuição principal do filósofo era sair da caverna contemplar a Ideia perfeita e governar com Sabedoria e Justiça a cidade a polis E por lhe condoer ver o comando da cidade nas mãos de artesãos e políticos inescrupulosos escreveu em sua obra mais completa e expressiva A República que a cidade deve ser harmonicamente organizada de acordo com as aptidões naturais da alma de cada pessoa Quem eram os filósofosreis Os filósofosreis seriam os homens essencialmente destinados ao governo da República Mas isso só seria possível se fossem dedicados a anos de estudos e pudessem contemplar a Verdade episteme pois conhecendo sua essência ideal poderiam aplicála para o Bem geral mas não se pense que a vida do filósoforei seria fácil pois teria que depois de ter contemplado a Verdade voltar ao mundo das aparências à caverna e aplicar seus conhecimentos Na verdade isso era para ele um castigo mas tinha esse compromisso com a disseminação da Justiça de acordo com suas aptidões e estudos Por discordar de sua filosofia principalmente no que se refere ao mundo das ideias Platão seria severamente criticado por Aristóteles que diria Sou amigo de Platão mas mais amigo da verdade Então os dois maiores filósofos que a Humanidade já viu se desentenderam Para o bem da Filosofia sim 68 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 Em diversas passagens os dois grandes titãs da Filosofia discordaram mas talvez a principal distinção esteja centrada na relação entre essênciaaparência Enquanto que para Platão o mundo que vemos é mera aparência do mundo essencial para Aristóteles que também busca a essência das coisas ela deve ser buscada no mundo material no empírico naquilo que vemos e concebemos todos os dias No belíssimo quadro abaixo o pintor renascentista Rafael Sanzio 14831520 parece ter captado bem a contenda entre os dois filósofos gregos na obra chamada Escola de Atenas por volta de 1510 Vamos analisar o quadro Figura 25 Escola de Atenas Ao centro temos talvez o maior debate travado no campo da Filosofia até hoje Platão aponta para o céu ou seja para o mundo das Ideias pois como vimos a Verdade está situada num plano superior já Aristóteles aponta para o mundo material para as coisas do jeito que nos aparecem para a experiência diária do homem que precisa viver em sociedade daí a sua definição do homem como zoon politikon animal político 69 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação Agora aproxime bem seus olhos do centro do quadro e fixe os olhos nas obras que os dois filósofos principais carregam Figura 26 Platão e o Timeu Observe que Platão leva em mãos o seu Timeu o diálogo em que explica sua cosmogonia ou seja a origem do mundo e da alma e afirma a existência do grande demiurgo Deus como criador de todas as coisas Por sua vez Aristóteles traz consigo sua inseparável Ética a Nicômaco na qual determina os critérios para uma vida virtuosa e feliz neste mundo mesmo que só tem sentido se for uma vida em comunidade na pólis por isso sua ética é essencialmente política e empírica prática 70 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 TIMEU O diálogo platônico Timeu Τίμαιος escrito por volta de 360 aC é a forma mais acabada do pensamento de Platão sobre sua cosmologia ou seja sua visão acerca da origem do Universo e do homem principalmente de sua alma No texto por meio da fala de Sócrates e seu discípulo Timeu Platão primeiramente distingue o conhecimento científico episteme da mera opinião doxa para em seguida detalhar sua Teoria das Ideias e explicar as relações entre o mundo sensível matéria e inteligível alma Como se trata de um livro escrito em plena maturidade no Timeu temse uma verdadeira síntese do pensamento de Platão talvez por isso o pintor Rafael tenha optado por incluílo na sua belíssima pintura ÉTICA Em algumas de suas obras Aristóteles trata da ética enquanto campo de atuação voluntária e moral do indivíduo mas sua Ética a Nicômaco dedicada a seu filho é o produto mais acabado das suas discussões Ao longo de dez livros melhor seria dizer capítulos Aristóteles dá as orientações fundamentais para uma vida virtuosa e feliz a fim de se chegar à finalidade da vida humana o bem Cada livro desse texto magnífico se destina a uma explicação das virtudes humanas tais como a própria virtude moral generosidade justiça amor amizade e no último livro a felicidade e o prazer Sendo a ética a principal marca da filosofia aristotélica certamente por isso Rafael tenha se remetido a ela no seu afresco sobretudo por se tratar de um texto de caráter prático destinado ao agir no mundo O fato de apontar para o mundo material como critério de busca do conhecimento é um marco em Aristóteles Enquanto que os présocráticos procuravam uma essência para o cosmos e Platão uma essência eterna para a realidade Ideias para Aristóteles a busca da essência das coisas não tinha outra causa que não elas mesmas Como disse Julián Marias Aristóteles de certo modo é um naturalista É um homem atento às coisas concretas E naturalmente vai dizer que as ideias estão nas coisas justamente e é o que chamará eidos 19992000 Mas será que tem alguma influência de Platão em Aristóteles 71 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação Sim principalmente porque Aristóteles adota um pensamento platônico fundamental que é o de elaborar um discurso com bases em afirmações universais que possa servir de esteio e ao mesmo tempo guia para obtenção da aletheia da verdade universal ou como diz Châtelet 1994 p 46 um discurso capaz de julgar todos os outros discursos e todas as condutas E como Platão ele também pretendeu guiar pedagogicamente seus contemporâneos com a boa intenção de que fossem felizes vindo daí sua importância na definição de uma ética que pudesse ser ao mesmo tempo racional e praticável para salvar a pólis das guerras e outros males E tem mais influência pois Aristóteles tanto quanto Platão desprezava a democracia pois considerava que era uma corrupção da verdadeira natureza de um estado bem governado pois advogando uma destinação natural para as coisas e para os homens a democracia colocava no poder qualquer um e não o mais dotado para o cargo Tal como seu mestre seu pensamento político resguardava sua ascensão de casta já que descendia de um clã médico macedônico chamado Asclepíades BERNAL 1975 p 208 sendo seu pai médico do rei Amintas II pai de Felipe da Macedônia que subjugaria Grécia Portanto seu pensamento é elitista como convinha a um cidadão grego ser naqueles tempos Sobre isso dizia que os bárbaros homens não gregos só têm em comum com os homens os pés Para fazer essa afirmação sobre os bárbaros Aristóteles evoca sua teoria do ser Como seu mestre a primeira pergunta que Aristóteles vai fazer é O que é o ser Entretanto diferente de Platão para quem o ser é a Ideia Aristóteles vai dizer que a palavra ser usase em muitos sentidos pois de uma parte significa a essência e a existência individual de outra a qualidade a quantidade e cada um dos atributos da espécie semelhante e mais adiante afirma que a substância será o primeiro 72 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 ser Metafísica VII 1 apud ANDERY et al 1988 p 8586 Logo a essência das coisas deveria se procurada nelas mesmas e o propósito da Filosofia era identificar a essência material das coisas e dos fenômenos Eis o seu programa de estudos E por isto antes agora e sempre a investigação e o problema que é o ser equivale a isto que é a substância op cit p 86 Como ele mesmo disse seu projeto era trazer as ideias do céu para a terra Para definir então a essência do fenômeno em Aristóteles podemos dizer que é aquilo que não muda mesmo mudando sua aparência ou forma Veja uma explicação Há uma essência que garante a humanidade um homem ideal que independentemente de sua raça cor caráter que são características acidentais continua sendo garantia de Humanidade Mesmo tendo um braço apenas ou nenhum continua sendo homem pois para ele o homem é um ser que fala é um ser social um ser racional algumas das essências humanas para Aristóteles Dando sequência é importante dizer que decorre da mesma condição de naturalidade que o escravo é um ser inferior e que justifica sua escravidão o que no final das contas justificava as conquistas e a própria escravidão Lembramos que a visão de mundo aristotélica prescinde de um lugar natural para cada coisa ou seja tudo na natureza se destina a cumprir uma função Parece que esse pensamento marcou profundamente o seu aluno Alexandre já que pretendeu tornar todo o mundo um mundo helênico É dessa forma então que Aristóteles define o que é substancial do que é essencial 73 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação Isso mesmo Deste modo o Estagirita por Aristóteles ter nascido em Estagira na Trácia separa a substância do acidente mas a essência é o que podemos chamar na sua filosofia de universais E para que o discurso filosófico possa subtrair todos os demais discursos não é preciso apelar para o aquémmundo basta enunciar princípios universais Entramos assim no método que Aristóteles chama de Órganon guia que é uma ferramenta magnífica de expressão lógica ou como ele dizia um instrumento Como tanto se tem dito não se pode falar de lógica sem se remeter ao silogismo aristotélico No seu livro Analíticos primeiros Aristóteles define sua lógica O silogismo é um discurso em que estabelecidas algumas coisas premissas se deriva necessariamente algo diferente das premissas estabelecidas conclusão pelo fato mesmo de que elas são Digo pelo fato que elas são no sentido de que delas se deriva a conclusão e digo que delas se deriva no sentido de que não é necessário nenhum termo estranho para que se tenha necessidade da conclusão apud ANDERY et al op cit p 97 A clássica lógica formal até hoje ensinada era garantia de expressão correta do processo de argumentação Aristóteles dispôs do binômio induçãodedução para garantir a efetividade e convencimento por meio do discurso Vejamos o clássico exemplo de Sócrates Todos os homens são mortais Sócrates é um homem Logo Sócrates é mortal Perceba que a indução leva necessariamente a uma dedução que como ele mesmo explicou a conclusão deriva das premissas Não 74 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 há como escapar É uma verdadeira armadilha da linguagem CHÂTELET 1994 p 48 Estabelecido o método de obtenção e de exposição Organun faltava ainda um elo essencial para formulação do seu grande edifício teórico as premissas primeiras ou os universais aquelas verdade obtidas seja por meio dos sentidos de estudos de outros pensadores de experiências etc E quanto a isso há uma longa história que procuraremos resumir Aristóteles se achava o mais credenciado para suceder Platão na administração da Academia Mas eis que ela foi confiada a Espeusipo ao que se sabe primo ou sobrinho de Platão Sob essa contrariedade Aristóteles saiu de Atenas e foi ser preceptor de Alexandre filho de Felipe da Macedônia no seu retorno fundou sua própria escola o Liceu Diferentemente da Academia que valorizava somente o saber contemplativo e as discussões dos diálogos no Liceu as investigações se multiplicaram Certamente financiado pelo então rei da Macedônia Alexandre Magno 356 323 a C acorriam para o Liceu os maiores e melhores exemplares de espécimes exóticos da fauna e flora dos confins do mundo pedras raras pergaminhos livros mapas e tudo o mais que fosse objeto portador de conhecimento uma verdadeira enciclopédia Daí suas pesquisas nas mais variadas áreas do conhecimento Física Biologia Lógica Política Astronomia e outras Dizem os historiadores que seu acervo tinha compilado 158 constituições e catalogado cerca de 540 espécies de animais Por ter tanto acesso ao que havia se produzido até ele Aristóteles realizou grandes sínteses e isso ficou marcado na sua obra Sempre que discutia um assunto remetia aos pensadores que vieram antes dele tanto para demonstrar que sabia do que estava falando quanto apontando seus pontos fracos e evidentemente destacando a sua superação Já no seu tempo acreditase que havia feito uma monumental obra de classificação codificando as coisas segundo suas semelhanças 75 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação e diferenças A verdade para ele estava nas coisas e suas propriedades e um dos seus aforismos mais conhecidos conceitua o juízo que tinha da verdade Não é porque pensamos de modo verdadeiro que tu és branco mas é porque tu és branco que ao dizer que tu o és dizemos a verdade apud CHÂTELET op cit p 47 Tudo o que foi dito até agora sequer chega perto da grande contribuição de Aristóteles para a história do pensamento humano Ficaram de fora conceitos fundamentais como atopotência matériaforma teoria das quatro causas e uma infinidade de ideias conceitos que ainda marcam a tradição filosófica do Ocidente Desses conceitos brotaram articuladamente sua cosmovisão aplicadas a diversos ramos do conhecimento tais como a Física Metafísica Retórica Fisiologia Biologia Meteorologia Cosmologia Astronomia Ciência Política Ética etc com tamanho vigor que seu pensamento tornouse hegemônico por mais de um milênio e meio sendo questionado e combatido tão somente a partir da Modernidade com a Física de Galileu e Newton e da Astronomia de Copérnico e Kepler Como é próprio de uma sociedade escravista como a grega a técnica aplicada à produção não era vista com bons olhos e paixão pela contemplação não permitiu a sua indústria o desenvolvimento de instrumentos e a Aristóteles botar a mão na massa e desenvolver experiências empíricas Ainda assim sem telescópio ou microscópio desenvolveu uma Cosmologia e uma Biologia milenares Daí seus renomados equívocos no campo da Física Biologia e outras áreas que os modernos ridicularizaram No seu tempo parece que o Liceu era uma escola muito popular e certamente acorriam a ele os promissores filhos das famílias mais influentes Devido o grande número de alunos Aristóteles antecipou a solução democrática de Anísio Teixeira em mais de dois mil anos ou seja instituiu a metodologia peripatética peripato do grego caminhar discutir em movimento em caminhada e entregou a eles o controle da administração escolar conforme no relato do historiador Will Durant Quando com a idade de cinqüenta e três anos Aristóteles criou o Liceu tantos estudantes afluíram que se fez mister 76 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 organizar regras complicadas para manter a ordem Os próprios estudantes estabeleciam essas regras elegendo de dez em dez dias um dos seus colegas para dirigir a escola Não se pense porém que lá reinasse disciplina rígida ao contrário as cenas cujas descrições chegavam até nós são de estudantes a tomar em comum as refeições com o mestre e a aprender com ele enquanto passeavam ao longo do campo atlético do qual o Liceu tomou o nome DURANT 1940 p 105 Como se vê nessa passagem há uma aura intensamente democrática na gestão da escola aristotélica ainda que ele desprezasse o governo democrático O fato dos alunos estabelecerem regras para o funcionamento escolar de fato ocorreu só excepcionalmente na história da humanidade Como Aristóteles concebia a participação do cidadão no governo Para além do seu viés aristocrático acreditava que todo cidadão deveria participar do governo com exceção das mulheres estrangeiros e dos escravos que não eram considerados cidadãos e pregava a alternância do poder sendo função da educação preparar as gerações para dar continuidade ao processo civilizatório Por isso via na juventude o vigor necessário a potência que colocaria em ato uma sociedade melhor Em tudo estavam presentes os fundamentos de sua filosofia Dizia ele que se um jovem comete uma falta é sempre por excesso ou exagero originando uma psicologia do ser jovem sua forma de ser sua natureza o que poderíamos chamar hoje de subjetividade marcada pela resposta emocional que dá ao meio A importância que Aristóteles dá a educação é tamanha que na sua visão ela deveria ser pública e caberia ao legislador pensar um modelo de educação que levassem em conta a felicidade da pólis formando o homem virtuoso Esse é um pensamento muito avançado para o seu tempo pois a educa ção só se tornou pública no século XVIII muito distante de sua época 77 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação A escola aristotélica nos remete à reflexão sobre a imobilidade que graça nas nossas escolas e o quanto lhe falta de peripatética de caminhada de movimento de liberdade para o corpo Lembrando Aristóteles o ser jovem tem uma essência que é puro movimento fogofátuo energia Mas nas nossas escolas e historicamente se deu desta forma o que impera é o imobilismo a inatividade como se o sujeito dispusesse de uma mente sem corpo ou que fosse raciocínio puro Mas você há de notar que o grande legado dos clássicos gregos foi sem dúvida a importância atribuída ao diálogo à consideração do outro no debate seja para convencêlo guiálo ou refutálo isso pouco importa o fato que é que parâmetro da discussão filosófica passa da natureza da physis ao interlocutor como a dizer que só somos essencialmente humanos por conta do outro humano que nos serve de referência Infelizmente assim como com o tempo a escola abandonou o movimento a filosofia aristotélica também perdeu seu vigor quando se converteu em dogmatismo e cânone oficial da Igreja no Período Medieval Mas antes disso alguns pensadores se destacaram em meio à instabilidade do mundo grego após a morte de Alexandre originando o período chamado Helenismo que veremos na seção seguinte Seção 4 O Helenismo e o pensamento medieval universalização da racionalidade ocidental Objetivos de aprendizagem Conhecer as principais correntes do pensamento helenista estoicismo epicurismo e ceticismo 78 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 Compreender o Helenismo como herança filosófica do pensamento clássico Para iniciar esta seção destacamos que o período que se seguiu ao fim da hegemonia ateniense desencadeou uma luta fraticida entre as cidades gregas e abriu as portas para as aspirações imperiais de Felipe II rei da Macedônia Vencida a batalha de Queroneia pelo pai de Alexandre foi decretado o fim da CidadeEstado e a velha Hélade se transformou em um grande império Coube ao jovem Alexandre a façanha de unificar o império e abrir fronteiras para disseminação do pensamento grego seu modelo de racionalidade e o novo gênero literário que rapidamente se popularizou a Filosofia As conquistas de Alexandre o Grande foram muito além do que qualquer grego poderia imaginar naquele momento A cultura grega espalhouse vigorosamente e conquistou os quatro cantos do mundo Todavia na ânsia de colonizar o mundo inteiro os conquistadores acabaram seduzidos pela milenar cultura asiática incorporando no seu próprio modo de vida costumes crenças e valores daqueles a quem chamavam de bárbaros Uma novidade importada por Alexandre foi crucial para a definição política desses novos tempos a divindade do monarca ANDERY et al 1988 p 103 DURANT 1940 p 115 Esse fundamento enterrou de uma só vez o modelo de autonomia das cidadesestado a democracia e o revezamento do poder que passou a ser centralizado em um único soberano Deste modo as decisões que antes eram tomadas publicamente na Ágora passaram ao reduto doméstico ou minimizadas em um conselho real Iniciavase o fim de uma era já que Atenas deixava de ser o centro cultural e político da Antiguidade cedendo lugar a Alexandria Samos e outras mais ao Oriente Como acontece em épocas de graves transições e inseguranças o pensamento procura se adaptar às intempéries e se refugiar em um lugar seguro Os clássicos tinham como parâmetro a pólis e toda sua 79 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação filosofia pendia para ela seja na República ideal platônica ou a ética nicomaqueia de Aristóteles ou ainda nos discursos retóricos dos sofistas Não havendo mais para onde se voltar a Filosofia e os filósofos acabaram focando suas preocupações no indivíduo postulando modelos de salvação biporalizado no hedonismo do grego hedonê prazer ou no recolhimento e abnegação do tipo estóico aphatheia apatia originando o movimento que ficou conhecido como Helenismo marcado pela mundialização da cultura grega Sob esse nome genérico entretanto reúnemse correntes tão distintas quanto o epicurismo estoicismo e ceticismo dentre as mais influentes O fato é que estava quebrada a unidade do saber filosófico mas ao mesmo tempo iniciavase uma era de mais de 600 anos de uma grande produção científica no Museu de Alexandria Daí saiu nomes altamente relevantes como Euclides cuja geometria vicejou até o século XVII Vamos conhecêlos assim aprendemos um pouco mais Aristarco de Samos quem pela primeira vez elaborou a teoria heliocêntrica que serviria de base para Galileu e Copérnico Ptolomeu fonte de toda cosmologia medieval que durou mais de mil anos Arquimedes de quem Galileu e Newton herdaram elementos de Matemática e Física Galeno importante médico e diversos outros renomados pensadores e cientistas Além do que junto ao Museu funcionava a memorável biblioteca de Alexandria a partir da qual foram conservados os clássicos que serviriam de base para a teologia medieval de São Tomaz e as pesquisas renascentistas e modernas Em meio às crises sociais constantes e a alta instabilidade econômica e política que se estabeleceu desde a perda de hegemonia da 80 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 civilização grega estavam dadas as condições históricas para o surgimento de pensadores preocupados em sistematizar uma ética do indivíduo e em postular fórmulas de felicidade e bem viver retraindose das preocupações de cunho coletivo para tranquilizar o espírito colocando a razão a serviço da subjetividade humana e da investigação da natureza o que levou o historiador da ciência John Bernal a dizer que tal postura refletia em grau muito elevado o isolamento do cidadão grego BERNAL 1975 p 225 Por sua influência na história da filosofia e na posteridade vamos destacar nesta seção as contribuições de três correntes importantes estoicismo epicurismo e ceticismo cuja missão autoimposta é salvar a Humanidade em meio às turbulências de sua época como diz Will Durant a apática aceitação da derrota e o esforço para olvidála nos braços do prazer eram teorias para poderse ainda ser feliz apesar da sujeição ou escravidão 1940 p 115 O Estoicismo e o princípio da apathéia Diante de uma sociedade decadente é próprio que o espírito humano tenha uma tendência no refúgio de si mesmo e principalmente em cultivar a resignação ou uma espécie de apatia filosófica Você já deve ter ouvido falar que fulano aguentou sua dor estoicamente ou que sicrano suportou estoicamente às adversidades O que isso significa e que relação tem com a corrente estoicismo Está ligada ao estoicismo a ideia de resignação diante do destino ou da vontade de Deus Vem daí o sucesso dessa corrente na ascensão do cristianismo já que suas éticas estão muito próximas 81 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação pois em ambos o sofrimento revelase como provação necessária ao fortalecimento do caráter ou da salvação após a morte O momento histórico de surgimento do estoicismo é justamente o do ocaso do império alexandrino Quando Zenão de Cício 322264 aC aprox um mercador fenício introduziu o estoicismo em Atenas esta já tinha perdido sua importância política e cultural e com a morte do jovem imperador o mundo helênico viuse envolvido em caos e instabilidade restando apenas a resignação a aphatéia indiferença filosófica e certo obscurantismo como aconteceria também com a queda do império romano Mas o fato é que diante da instabilidade social e política prosperam as doutrinas que pregam a vida futura a salvação e a felicidade individual diante de uma vida moralmente correta Para os estóicos o universo tem uma lógica imanente e essa racionalidade orienta o seu funcionamento e fluxo Diferente do mundo estático aristotélico os estóicos admitiram um movimento perpétuo no universo mas não em movimento uniforme e sim livre e de acordo com uma racionalidade natural préexistente Sendo o homem um ser natural parte do universo estava também em constante interação e sujeito as suas leis De modo que poderia o homem compreender o seu destino mas nunca alterálo decorrendo daí o princípio da resignação Uma característica da tradição estóica foi a junção das três partes da Filosofia Física Lógica e Moral campos separados na tradição clássica Essa unidade representava a própria unidade do universo cabendo à razão humana por esforço próprio descobrir a verdade e expressála sistematicamente por meio da linguagem As preocupações com o funcionamento do universo e da natureza levaram os estóicos a considerarem também as investidas empíricas 82 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 e os dados provenientes dos sentidos de modo a capturarem os fenômenos e o seu destino Na continuidade do estoicismo grego surge por volta do século I dC o estoicismo romano Vamos conhecer as seguir suas características e principais representantes Nessa era romana os principais representantes do estoicismo foram Sêneca o imperador Marco Aurélio e o escravo Epicteto De suas obras se destacaram as prédicas morais e o sentimento de conformismo com o destino assim como era de se esperar em um momento político instável Sêneca foi preceptor de Nero e no início sua influência foi positiva mas a vida em uma corte tão dissoluta e corrupta não permitiria ao jovem imperador ouvir por muito tempo a rígida moral estóica e por ser considerado suspeito e perigoso o filósofo foi condenado à morte uma morte estóica por certo Por outro lado a influência das Meditações de Marco Aurélio e Enquirídio e Práticas de Epicteto serviram de base para a fé cristã primitiva e quase imperceptivelmente o Império se transformou em Papado DURANT 1940 p 121 O Epicurismo e o princípio do prazer Ao contrário dos estóicos que se refugiavam na apathéia na indiferença com as coisas transitórias do mundo Epicuro 341270 aC aprox defendia o princípio da ataraxia que é a tranquilidade a paz de espírito que só pode ser encontrada quando se cultiva o prazer que é o motor da vida Dizia ele que Chamamos ao prazer princípio da vida feliz apud ARANHA MARTINS 1993 p 289 83 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação todavia o prazer epicurista não é sensual ou mundano é sim o prazer do viver bem fazendose o que faz bem Diante de um mundo instável Epicuro voltase para a vida íntima e propõe a felicidade individual libertando o homem do medo do destino da ira divina do céu e do inferno advogando a efemeridade da vida e retomando a teoria atômica e materialista dos filósofos présocráticos Leucipo e Demócrito Sua Filosofia tem como função libertar o homem do medo e da infelicidade pelo conhecimento do funcionamento do universo e seus fenômenos essa compreensão lhe permitiria viver em plena em plena tranquilidade O foco no indivíduo na sua intimidade é uma condição imposta pela dissolução da cidadeestado e o perigo de se meter nas coisas públicas diante do poder centralizado no monarca e na corte Se a felicidade coletiva na pólis era impossível melhor então procurála na reclusão da vida privada Por isso Epicuro dizia que O essencial para nossa felicidade é a nossa condição íntima e desta somos nós os amos Contradizendo os estóicos Epicuro não admitia nenhum destino prefixado ao homem ou qualquer divindade a estabelecer o curso do universo ao contrário este era obra do acaso e do movimento incessante dos átomos que originavam todas as coisas da matéria mais pesada aos tênues fluidos Não admitia a existência de nenhum lugar sagrado para o homem após a morte afirmando que também a alma humana era composta de átomos que se desintegravam após a morte corporal Com isso até o medo da morte se submetia a paz de espírito epicurista O mesmo princípio atômico regia a possibilidade do conhecimento que nada mais era do que sensações produzidas no sujeito pelos fluidos que emanavam dos objetos e eram reconhecidos pelos sentidos Como os átomos e seus fluidos eram alterados pelo tempo e pelo espaço cada sentido captava o objeto de modo diferente Epicuro viveu conforme pregava sua filosofia em paz e tranquilidade num jardim que ele mesmo cultivava enquanto ensinava seus discípulos chamado posteriormente de Jardim de Epicuro Era o mais estóico dos epicuristas 84 Universidade do Estado de Santa Catarina Com os espólios de guerra que os romanos levaram da Grécia por volta de 146 aC estava também a doutrina epicurista defendida pelo escritor Lucrécio cujo textopoema Sobre a natureza das coisas propunha uma ordem universal baseada na própria evolução da natureza e num evolucionismo mecanicista apropriado ao espírito prático e belicoso dos romanos Antecipando em muito as teorias de Darwin entre outros princípios dizia que nada existe além das leis naturais da evolução e dissolução dos átomos e do movimento Assim o poeta latino explica a ordem do universo Não perdura coisa alguma tudo passa Partículas juntamse a partículas crescem as coisas assim até as conhecermos e darmolhes nomes E gradualmente se dissolvem e não são mais as coisas que conhecemos Feitos de átomos a cair lentos ou rápidos no vácuo vejo os sóis e as constelações erguerse no firmamento e essas constelações e seus sóis declinarão vagarosos em seu eterno curso Tu também ó Terra com teus impérios terras e mares e estrelas e via lácteas formada do mesmo modo também passarás assim Hora em hora já estás a passar como aqueles apud DURANT 1940 p 119120 Na luta por adeptos o estoicismo saiu provisoriamente vencedor na medida em que era mais adequado aos princípios do cristianismo nascente já no declínio do Império Romano Mas a doutrina epicurista seria revalorizada no chamado Século das Luzes quase dois mil anos depois provocando uma verdadeira revolução no pensamento nas crenças e nos modos de vida modernos 85 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação O ceticismo e abstinência do saber Como já foi dito com o fim da polis como referência para articulação do pensamento diversas correntes voltaramse para o aspecto individual para a subjetividade como critério para elaboração de seus enunciados O ceticismo foi mais uma corrente individualista afirmando justamente a impossibilidade do conhecimento A palavra cético vem do grego skepptomai que significa observação ou exame significando certa abstinência quanto à emissão de opinião acerca das coisas Devese a Pirrón 365275 aC que havia viajado na expedição de Alexandre à conquista da Ásia a origem desta corrente filosófica que se tornou popular na sua cidade em Eleia Certamente o contato com o misticismo oriental principalmente com os gimnosofistas sábios do corpo em contradição com o racionalismo grego produziu no expintor uma posição de abstenção diante de tantas tendências filosóficas políticas e religiosas optando somente por observar e não emitir juízo sobre coisa alguma Pirrón nada escreveu e tudo que se sabe foi através de seu discípulo Tímon e ao longo da história da Filosofia o ceticismo ganhou adeptos importantes como o filósofo francês Montaigne que nos seus Ensaios advogava a questão do ponto de vista quanto à diversidade de opiniões existes sobre os mais diversos assuntos Dizia ele O mesmo contraste aparece na natureza os pintores admitem que os movimentos e pregas do rosto de quem chora se assemelham aos de quem ri E com efeito contemplai um quadro antes que o pintor tenha acabado de dizer sequer que seu personagem chore ou ria não sabereis ao certo o que vai exprimir o riso confina com a lágrima apud ANDERY et al p 110 Essa é também a visão de Pirrón pois as coisas sendo iguais a si mesmas cada uma teria uma impressão sobre ela daí as diferentes Grupo de ascetas que na Índia antiga pra ticavam a meditação nus ou usando somen te uma tanga ficando conhecidos por sábios nus faquires ou yogues Os gregos fizeram contato com eles na campanha de Alexandre à Índia por volta de 325 aC 86 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 concepções portanto o mais certo era absterse de emitir juízos acerca do mundo e das coisas mantendose em silêncio pois a apreensão da realidade era subjetiva Notase novamente um pessimismo filosófico próprio de tempos de crise social pois em última análise o ceticismo tende a cultivar a mesma resignação dos estóicos sujeitandose aos dissabores do destino e cultivando uma paz ilusória na pura observação sem ação Mesmo no tempo de Sócrates e Platão o sofista Górgias já advogava que diante de tantas concepções o melhor seria sustentar uma posição skeptikós ou seja que observa Atribuise a ele a seguinte afirmação Nada existe Mesmo se existisse alguma coisa não poderíamos conhecêla concedido que algo exista e que o podemos conhecer não o podemos comunicar aos outros apud ARANHA MARTINS 1993 p 25 Levandose essa concepção ao extremo é possível dizer que ela é impossível de se afirmar já que se tornaria lembrando Karl Jaspers uma antifilosofia pois o conhecimento do mundo seria impossível Mas lembrando ainda o filósofo alemão a antifilosofia é também uma filosofia ou seja negar a possibilidade do conhecimento é também uma tendência filosófica então na tentativa de não afirmar nada já está o cético afirmando ainda que seja a negação de conhecer O ceticismo todavia ganhou fôlego nos séculos afora seja em relação ao sujeito cognoscente ou com relação ao objeto ou aos fenômenos a serem conhecidos Mas o certo é que nele paira uma dúvida eterna sobre o fato da possibilidade do conhecimento Em resumo todas as correntes filosóficas do Helenismo tiveram grandes expoentes e sua preocupação com a educação era tema recorrente inclusive pelo fato de muitos deles serem mestres e suas reflexões chegarem até nós por meio de seus discípulos e continuadores 87 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação Apesar das diferenças já apontadas entre eles os filósofos do Período Helenista tinham em comum a opinião na maioria das vezes não expressa do poder da educação e da sua função civilizadora Alguns deles mesmo defendendo uma postura individualista estavam preocupados mesmo era com os caminhos da sociedade Caso contrário não tinham se misturado à vida política do seu tempo tais como o estadista Sêneca ou mesmo o imperador Marco Aurélio Seção 5 A razão transformada em fé Santo Agostinho São Tomás de Aquino e o pensamento medieval Objetivos de aprendizagem Identificar as principais ideias de Santo Agostinho e São Tomás de Aquino e sua influência no mundo e na educação durante o Período Medieval Compreender as conversões do pensamento grego clássico para o cristianismo Platão por Santo Agostinho e Aristóteles por São Tomás de Aquino Quando Aurélio Agostinho 354430 posteriormente conhecido como Santo Agostinho converteuse ao cristianismo em 386 tornouse um dos pensadores mais importantes da Igreja Neste momento o mundo já presenciava o final da Antiguidade Clássica quando uma nova razão já se instalava sendo ele próprio um dos portavozes mais importantes dessa nova era o Período Medieval O antes poderoso Império Romano já estava em decadência e junto com ele também definhavam as correntes filosóficas do Helenismo Algumas banidas pelo novo credo o cristianismo e outras absorvidas ou servindo de base filosófica para ele como ocorreu com o estoicismo e sua ideia de abstinência e conformação com o 88 Universidade do Estado de Santa Catarina destino De modo que a razão autônoma dos gregos λόγος logos e romanos ratio aos poucos foi cedendo lugar à fé e a nova razão passou a se chamar Deus Ainda nesse momento fazia muito sucesso a escola Neoplatônica de Alexandria já sob domínio dos céticos contra quem Santo Agostinho escreveu o livro chamado Contra os Acadêmicos defendendo possibilidade de o homem encontrar a verdade A esse respeito conclui contra os céticos da academia creio que os homens devem ser conduzidos à esperança de encontrar a verdade Tributário da Filosofia Platônica para Santo Agostinho a verdade é sinônimo de iluminação divina É muito mais uma revelação do que produto da razão humana ainda que esta seja também necessária enquanto ferramenta para se chegar ao conhecimento verdadeiro Santo Agostinho foi um dos responsáveis pela consolidação da Filosofia Patrística dos padres da Igreja e enquanto doctor ecclesiae doutor da Igreja realizou uma síntese poderosa entre o pensamento de Platão e o cristianismo contribuindo para a formação do pensamento filosófico medieval que só viria a ser renovado no século XIII com São Tomaz de Aquino só que neste a base era Aristóteles Retomando os problemas centrais dos primeiros teólogos apologistas cristãos São Justino Clemente de Alexandria Orígenes e outros a respeito da relação entre fé e razão sintetizou sua visão na seguinte sentença Intellige ut credas crede ut intelligas Compreende para crer crê para compreender Ou seja tudo o que a razão descobrir não pode contrariar a fé nem os livros sagrados sendo assim o filosofar fica subordinado ao dogmatismo de verdades préconcebidas Aliás no pensamento medieval a filosofia se torna ancilla theologiae isto é serva da teologia deixando de ser método na busca do conhecimento para se tornar uma ferramenta de justificação da revelação divina 89 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação Esse modo de conciliar fé e razão Santo Agostinho vai buscar nas teorias de Platão acerca da distinção entre o sensível e inteligível entre o mundo real e das ideias sendo o primeiro uma cópia imperfeita do segundo Tal transformação foi possível apenas convertendo o Bem platônico no Deus cristão Como vimos em Platão na célebre Alegoria da Caverna ele havia mostrado que o Bem age como um sol que ilumina o homem para que este saia da ignorância passando das trevas à luz então todo conhecimento verdadeiro seria uma revelação da divindade para o espírito humano uma iluminação Tal como Platão Santo Agostinho mantém a dualidade mente corpo e vai mais além admitindo a coexistência de uma Cidade de Deus obra escrita por volta de 413 e outra dos homens devendo a primeira ter precedência sobre a segunda assim como a alma se sobrepõe ao corpo Neste caso a obtenção do conhecimento verdadeiro como em Platão é uma contemplação da ideia verdadeira da luz divina E foi a partir dessa dualidade que Agostinho resolveu o problema do ceticismo dos acadêmicos dizendo que as sensações são fonte de conhecimento mas não permanentes e estão sujeitas à imprecisão e instabilidade já o conhecimento verdadeiro seria a descoberta de leis imutáveis ou formas universais que derivam diretamente de Deus Quando a Igreja foi acusada de ser responsável pelo caos que assolava e anunciava o fim do Império Romano Agostinho contemporizou dizendo que os impérios pertencem à cidade dos homens e os desastres eram a mão de Deus atuando para o triunfo do cristianismo em outro momento percebendo que a polêmica a respeito da relação entre a graça divina e o livrearbítrio poderia levar a um cisma na Igreja tentou conciliar as duas ideias dizendo que o homem é responsável por escolher o bem ou o mal mas só pode escolher o bem por concurso da graça divina já sem a ajuda de Deus escolheria inevitavelemente o mal consituindo assim sua teoria da predestinação por conta do pecado original Há em Santo Agostinho também um viés político que exerceria forte influência sobre a tradição medieval Sua distinção dos dois mundos coexistentes e até certo ponto antitéticos o mundo dos homens e o espiritual sendo o mundo divino hierarquicamente superior ao terreno levou ao recrudescimento de uma ideia que já O espírito conciliador levou Santo Agostinho a sínteses muito inte ressantes tentando com isso manter a unidade da Igreja inicial e funda mentar filosoficamente sua teologia e seus dogmas 90 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 vinha sendo gestada desde o primeiros séculos a supremacia do poder da Igreja sobre o poder secular mundano Em seu livro A cidade de Deus defende a ideia de que o reino de Deus coexiste com o reino terrestre e todos os males existentes no mundo são produtos do livrearbítrio humano que por sua natureza pecadora escolhe o mal Cabe à Cidade de Deus precisamente ao cristianismo e à Igreja restaurar e conduzir o homem à salvação de sua alma Como a alma é superior ao corpo também o governo de Deus é naturalmente superior ao governo terrestre logo o poder celeste deveria prevalecer Essas teses levadas ao extremo transformaram a Igreja em um poder paralelo e em muitos casos superior ao dos imperadores Já no início da Idade Média com a formação dos feudos os imperadores eram coroados pelos papas demonstrando que seu governo só teria legitimidade se fosse avalizado pela Igreja Aqueles que desafiavam o poder papal eram destituídos ou excomungados outros tinham que pagar penitências para que fossem perdoados como no caso do rei Henrique IV da Germânia que após indisposição com o papa Gregório VII teve que pedir perdão humildemente descalço por três dias às portas do castelo papal Também demonstra o poder da Igreja no Período Medieval a pomposa investidura do imperador Carlos Magno no ano 800 que consolidou de vez a aliança entre a Cidade de Deus e a cidade dos homens sendo o segundo investido de divindade pela Igreja Sendo divinizado não poderia mais ser contestado o poder secular e essa tradição durou mais de mil anos Mas é necessario dizer que sempre foi grande a tensão entre as duas cidades e uma linha muito tênue era constantemente rompida por um dos lados do poder dando origem às constantes crises do Período Medieval 91 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação Períodos Medievais É importante lembrar que a Idade Média é um evento tipicamente europeu não havendo consenso quanto às periodizações A classificação abaixo é meramente didática Alta Idade Média Vai da queda do Império Romano 476 até por volta do ano de 1300 e é caracterizada dentre outros fenômenos pela ruralização da sociedade economia quase totalmente autossustentada feudalismo consolidação e expansão do poder da igreja cristã domínio cultural do clero e expansão das conquistas islâmicas Baixa Idade Média do ano de 1300 a 1453 queda do Império Romano do Oriente surgimento da burguesia e do capitalismo comercial e decadência do feudalismo neste período surgem as universidades e o início da Renascença Se na alta Idade Média o pensamento dominante foi dos Padres da Igreja principalmente Santo Agostinho já na baixa Idade Média o pensamento dominante foi de São tomaz de Aquino que legou à posteridade da Igreja uma teologia baseada em Aristóteles muito bem fundamentada Enquanto a Europa romana entrava cada vez mais em crise e o misticismo tomava conta do pensamento pelo domínio quase exclusivo da cultura letrada por parte da Igreja o império islâmico vivia um renascimento cultural expressivo Ao contrário dos reis e imperadores europeus que por ordem da Igreja e em nome da fé perseguiam intolerantemente as heresias eou crenças diferentes do cristianismo os califas árabes tinham no início por hábito a tolerância quanto aos credos dos povos conquistados e principalmente a proteção e patrocínio mecenato de artistas filósofos e cientistas De modo que no início das conquistas árabes os clássicos gregos foram retomados e traduzidos principalmente Platão e Aristóteles Postura bem contrária a dos europeus que apesar da conversão de Platão por Santo Agostinho ainda consideravam perigoso o paganismo grego Contudo a tomada da Península Ibérica provocou uma verdadeira redescoberta dos clássicos gregos sobretudo da filosofia aristotélica O nome mais importante deste período é o juiz médico e filósofos Averróes 11261198 Ficaram famosos seus comentários de Aristóteles o que lhe garantiu o título de o grande comentador 92 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 No século XIII a cristandade se assustou como a desvantagem intelectual em relação aos árabes e seu conhecimento dos clássicos gregos Restava todavia ainda uma mente brilhante e poderosa a de São Tomás de Aquino que realizou a grande síntese e converteu Aristóteles ao credo cristão Retomando a polêmica original do cristianismo sobre a relação entre fé e razão São Tomás propõe a importância de ambas para a explicação do mundo e do devir espiritual do homem evidentemente com prioridade para a crença nos livros sagrados ou para a revelação divina No seu livro Súmula contra os gentios São Tomás se utiliza do métodos silogístico de Aristóteles para afirmar a prioridade da fé sobre a razão Perceba como ele elabora seus argumentos de acordo com a lógica do filósofo grego Se é verdade que a verdade da fé cristã ultrapassa as capacidade da razão humana nem por isso os princípios inatos naturalmente à razão podem estar em contradição com esta verdade sobrenatural Tampouco é permitido considerar falso aquilo que cremos pela fé e que Deus confirmou de maneira tão evidente Já que só o falso constitui o contrário do verdadeiro como se conclui claramente da definição dos dois conceitos é impossível que a verdade da fé seja contrária aos princípios que a razão humana conhece em virtude de suas forças naturais SANTO TOMÁS DE AQUINO apud ARANHA MARTINS 1993 p 103 E mantendose fiel à tradição escolástica evoca o princípio de autoridade do maior expoente da filosofia patrística dizendo Também a autoridade de Santo Agostinho o confirma o Santo afirma o seguinte Aquilo que a verdade descobrir não pode contrariar aos livros sagrados quer do Antigo quer do Novo Testamento 93 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação Com São Tomás a teologia medieval ganha novo fôlego e as categorias aristotélicas serão nela incorporadas Em um primeiro momento parecem revigorar o pensamento ocidental e inibir a ascensão cultural árabe mas com o tempo serão transformadas em novos dogmas e o melhor de Aristóteles sua sanha investigativa sequer seria considerada Por outro lado o pensamento aristotélico cairia como uma luva no estático mundo feudal onde cada coisa parece ter sido criada para um fim específico o senhor no seu castelo o servo para a gleba e a Igreja para a salvação o que a rigor viria ao encontro da origem nobre de Aquino Diria o Santo É evidente portanto que Deus criou as coisas em vista de um fim Dessa forma adota a teoria da finalidade de Aristóteles ao afirmar que as coisas são como são porque existe nelas a possibilidade de ser ou seja uma causa final Figura 27 Regime feudal Esse pensamento vem ao encontro da ordem feudal e São Tomás reforça a hierarquia existente divinizando o poder da realeza e jamais permitindo a rebelião Dizia ele que na presença de uma injustiça era preciso procurar o caminho das leis e se ainda assim a contenda não fosse resolvida deverseia colocar a questão nas mãos de Deus As influências do clero durante todo Período Medieval restringiram à educação ao âmbito da Igreja Tanto as escolas paroquiais quanto monásticas eram controladas pela Igreja e reforçavam à 94 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 conformação aos dogmas católicos Mesmo nas escolas palatinas criadas pelo imperador Carlos Magno dominava a teologia Reza a lenda que o próprio imperador não sabia ler condição da grande maioria das pessoas durante todo Período Medieval Preocupada com as reformas protestantes que solapavam fiéis à Igreja uma instituição tornouse vanguarda no movimento de Contrarreforma Católica ao lado da Inquisição a Companhia de Jesus fundada em 1534 por Inácio de Loyola O objetivo dessa ordem religiosa era levar para os quatro cantos da terra o cristianismo católico exercendo forte impacto na educação mundial A característica principal dos chamados soldados de Jesus era unidade em torno de um método comum de ensino em todas as suas escolas o Ratio studiorom publicado em 1599 um conjunto de 467 regras que orientam jurídica e didaticamente o método jesuítico O filósofo Dermeval Saviani diz que o Ratio está na base da escola tradicional moderna Segundo ele As ideias pedagógicas expressas no Ratio corresponde ao que passou a ser conhecido na modernidade como pedagogia tradicional Essa concepção pedagógica caracterizase por uma visão essencialista do homem isto é o homem é concebido como constituído por uma essência universal e imutável A expressão mais acabada dessa vertente é dada pela corrente do tomismo que consiste numa articulação entre a filosofia de Aristóteles e a tradição cristã tal trabalho de sistematização foi levado a cabo pelo filósofo e teólogo medieval Tomás de Aquino de cujo nome deriva a designação da referida corrente SAVIANI 2008 p 58 Durante muito tempo o ensino religioso quase absolutamente católico foi obrigatório na educação sobretudo no Brasil ainda que a escola moderna tenha como característica principal a laicidade Inclusive a atual Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional N 939496 continua prevendo o oferecimento do ensino religioso nas escolas Art 33 mesmo com matrícula facultativa Como na história humana tudo flui e nada é permanente no século XIII vão se constituindo novas cidades e as estradas rasgadas pelos 95 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação cruzados inundaram a Europa de especiarias vindas do Oriente e com elas um novo modo de vida pautado não na fé mas no experimento Essa atitude com o tempo daria luz à invenção de uma nova razão que pode ser chamada de experiência ou empiria que marcaria o fim do Período Medieval e inauguraria a Modernidade Síntese do capítulo Neste capítulo foi estudado a origem da racionalidade ocidental ou como chamou François Châtelet a invenção da razão O capítulo discutiu a função do mito como uma cosmovisão original e levantou as principais contribuições dos filósofos présocráticos de Sócrates Platão e Aristóteles e sobretudo suas influências para construção da racionalidade ocidental principalmente no que se refere à ética e à educação O capítulo conclui com análise das influências dos filósofos clássicos no pensamento medieval cujos principais expoentes são Santo Agostinho e São Tomás de Aquino 96 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 2 Atividades de aprendizagem 1 Como é longo este capítulo sobretudo por consubstanciar as principais correntes filosóficas e pensadores que estão nas bases da racionalidade ocidental e principalmente para sistematizar melhor suas contribuições sugerimos a elaboração de um quadro conceitual contendo a tendência filosófica estudada o período histórico e as ideias principais Abaixo postamos um quadro referencial PERÍODO HISTÓRICO CORRENTEPENSADOR IDEIAS PRINCIPAIS 97 CAPÍTULO 2 Filosofia da Educação Aprenda mais Para aprofundar conhecimentos acerca da Grécia Antiga sobretudo a respeito de sua mitologia vamos sugerir alguns filmes Ulisses Classic Line 1954 mais antigo mas é considerado um clássico fiel à história original A Odisséia de Homero Tróia Warner Bros 2004 traz uma narrativa agradável da Guerra de Tróia baseada na obra de mesmo nome de Homero Os diálogos trazem em muitos momentos a importância que os gregos atribuíam aos deuses e suas relações com os homens Alexandre Warner 2004 conta as aventuras de Alexandre o Grande que conquistou 90 do mundo conhecido na antiguidade e consolidou a cultura helênica levandoa aos confins do mundo deixando pelo caminho a construção de cidades importantes como Alexandria A respeito da influência da lógica aristotélica na Idade Média e o controle cultural exercido pela Igreja indicamos o clássico O nome da rosa 1980 adaptado do livro de Humberto Eco Mas se preferir leia o livro que é muito mais rico em diálogos e disputas filosóficas e teológicas realizada num Mosteiro Beneditino Italiano por volta de 1327 Como o capítulo é longo e complexo vamos indicar um livro que faz uma síntese ainda que básica dos pensadores clássicos e seus principais conceitos O livro completo da filosofia Editora Madras de James Mannion aborda as ideias centrais dos filósofos desde os pré socráticos até os principais pensadores do século XX CAPÍTULO 3 Neste capítulo você estudará como o pensamento moderno representado pelo iluminismo e pela ascensão do racionalismo vem marcando as reflexões sobre a educação até os dias atuais Além disso este mesmo período foi palco de um processo de politização da educação através da Filosofia da Práxis que ainda hoje é considerado bastante atual O Pensamento Moderno e Contemporâneo e a Educação Caroline Jaques Cubas CAPÍTULO 3 Compreender a ascensão do pensamento racionalista sobre a educação Relacionar as características da Filosofia da Educação no Período Moderno com seus elementos contextuais Conhecer os elementos filosóficos que embasam a ideia da práxis Entender a ascensão do movimento conhecido como virada linguística e suas implicações para a Filosofia da Educação Objetivos gerais de aprendizagem Seções de estudo Seção 1 O pensamento moderno e a educação como iluminação Seção 2 Renascimento da dialética a Filosofia da Práxis e a educação Seção 3 Política ética e liberdade o pensamento contemporâneo na educação O Pensamento Moderno e Contemporâneo e a Educação 100 Universidade do Estado de Santa Catarina Conforme acabamos de observar ao longo de dez séculos a Igreja Católica foi a instituição determinante no que se refere à produção intelectual e estruturação da educação Com o fim da Idade Média novas formas de conhecimento incitadas por descobertas científicas descobrimentos geográficos e a ascensão da burguesia começaram a questionar esta supremacia religiosa Figura 31 O Homem Vitruviano Leonardo Davinci 1490 O Homem Vitruviano referente a Marcos Vitrúvio arquiteto romano do século I a C é bastante representativo destas transformações Neste desenho composto por Leonardo da Vinci o homem é situado exatamente no centro de um círculo que por sua vez está sobreposto a um quadrado A figura lembra as proporções métricas do corpo humano e se atentarmos bem os membros se movem mas o umbigo que é o centro permanece imóvel uma interessante metáfora antropocêntrica O homem vitruviano representa o foco do conhecimento e caracteriza o movimento renascentista o qual permeou a rede de acontecimentos acima citados Retomando a cultura da Antiguidade Clássica este movimento buscava estabelecer novos parâmetros para a produção artística e cultural da época influenciando o modo de vida das pessoas que experienciavam aquele contexto Nesse capítulo estudaremos as relações entre os elementos que caracterizam o pensamento moderno e a Filosofia da Educação Iniciando o estudo do capítulo 101 Filosofia da Educação CAPÍTULO 3 Seção 1 O pensamento moderno e a educação como iluminação Objetivos de aprendizagem Compreender a ascensão do pensamento racionalista Entender a influência do pensamento racionalista para a Filosofia da Educação Se desejarmos compreender as reflexões que se voltaram à educação durante o Período Moderno é necessário termos uma visão contextual sobre o momento dentro do qual estas transformações aconteceram Vejamos portanto algumas das características do chamado Renascimento Renascimento São múltiplos os caminhos do pensamento renascentista e certamente a variedade a pluralidade de pontos de vista e opiniões foi um dos fatores mais notáveis de sua fertilidade Grande parte das trilhas que foram abertas nós percorremos até hoje É inútil procurar uma diretriz única no humanismo ou mesmo em todo o movimento renascentista a diversidade é o que conta Fato que de resto era plenamente coerente com sua insistência sobre a postura crítica o respeito à individualidade seu desejo de mudança A concepção de que tudo já está realizado no mundo e que aos homens só cabem duas opções o pecado ou a virtude não faz mais sentido O mundo é um vórtice infinito de possibilidades e o que impulsiona o homem não é representar um jogo de cartas marcadas mas confiar na energia da pura vontade na paixão de seus sentimentos e na lucidez da razão Enfim o homem é a medida de si mesmo e não pode ser tolhido por regras deste ou de outro mundo que limitem suas capacidades SEVCENKO 1986 p 23 O fim do sistema feudal que caracterizava social e economicamente a Idade Média pode ser compreendido a partir dos séculos XIV e XV e de movimentos que implementaram modificações políticas sociais e culturais A Crise do Século XIV configurouse pela Guerra dos Cem anos a Peste Negra e uma série de revoltas populares que 102 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 3 se alastraram pela Europa devido à situação de miserabilidade a qual grande parte da sociedade estava submetida Esses movimentos a ascensão da burguesia e a Formação dos Estados Nacionais Modernos que centralizaram o poder nas mãos de um rei e não mais dos senhores feudais foram determinantes para novas formas de relações e organizações sociais A reforma protestante ocorrida no século XVI foi um elemento a mais que auxiliou o enfraquecimento da Igreja Católica nas questões políticas e culturais Além dessas transformações vários inventos e descobertas marcaram a transição entre a chamada Idade Média e o Período Moderno a descoberta da América a invenção do relógio de bolso as inovações na perspectiva matemática a invenção da luneta astronômica da imprensa e de instrumentos de engenharia foram acontecimentos determinantes para as reflexões sobre o conhecimento e consequentemente a Educação A educação do Humanismo ao Racionalismo Durante o período renascentista um movimento conhecido como Humanismo se formata Neste a preocupação principal era a valorização da obra humana A Humanidade não seria considerada como um elemento essencial ou inerente à natureza humana mas uma característica a ser conquistada e lapidada através da educação Nos séculos XVI e XVII a máxima de Erasmo de Rotterdam sintetiza com clareza as funções da educação Não se nasce homem torna se Essa forma de pensar as funções da educação pode ser aliada ao movimento de ideias que resgatou os autores clássicos especialmente os gregos apregoando noções de liberdade e consciência individual em detrimento do controle rígido e excessivamente disciplinado característico da Idade Média Ainda que seja tarefa bastante complexa demarcar espaçotemporalmente os limites do Renascimento alguns autores mesmo não escrevendo 103 Filosofia da Educação CAPÍTULO 3 expressamente sobre a educação acabaram por contribuir ao desenvolvimento de inúmeras reflexões Rabelais 14941533 tornouse célebre por Gargântua e Pantagruel Neste romance não encontramos um pensamento sistematizado sobre a temática da educação O autor no entanto apresenta em seu texto elementos que enfatizam a passagem entre um tempo obscuro e um tempo novo um tempo tenebroso em suas palavras onde a dignidade e prestígio foram devolvidos às letras De uma forma bastante sarcástica Rabelais tece críticas ao obscurantismo que segundo ele vigorava durante o Período Medieval e defende a possibilidade da livre tomada de consciência como característica notável do homem moderno Rabelais propunha a libertação da ignorância através da educação Tal atitude está plenamente de acordo com os valores do humanismo uma vez que A atitude humanista propõe uma ordem intelectual nova ao mesmo tempo para o estudo mas também como garantia de uma liberdade a da realização de uma natureza humana e de uma força da inteligência Ela encontra como suporte o elo da memória elo direto dos antigos aos modernos mas também o elo humano imortalidade literária e filosófica Reatando pela memória filiação e renascimento a atitude humanista propõe uma dupla relação da educação com a liberdade formação para o livre exercício intelectual e fundamento de uma liberdade de consciência e de ação MORANDI 2002 p 69 Montaigne 15331592 também se enquadra nesta perspectiva humanista ao acreditar que liberdade e honra eram atributos a serem conquistados através da educação Lutava contra a autoridade imposta através da possibilidade de julgamento de valores conquistados pela instrução 104 Universidade do Estado de Santa Catarina Figura 32 Erasmo Rabelais e Montaigne No século XVII temos uma mudança significativa nas reflexões sobre a educação Descartes 15961650 ainda que não tenha sistematizado um pensamento sobre a Filosofia da Educação inaugurou fundamentos para esta ao propor um novo método A partir deste a educação seria considerada como um exercício racional Para este autor a dúvida contundente a respeito de todas as certezas levaria à verdade e à razão uma vez que estas poderiam ser encontradas apenas diante de evidências Pregava que o método para atingir a razão era justamente a dúvida metódica É atribuída a ele a máxima Cogito ergo sum penso logo existo Com ele entramos em contato com o pensamento racionalista segundo o qual a essência humana não poderia ser desvinculada da certeza conquistada através da reflexão Esta forma de pensamento apregoava que ter um bom espírito não era o suficiente pois o principal seria a boa educação O Racionalismo e o Humanismo congregam a recusa ao ensino escolástico característico da Idade Média O termo vem do la tim schola Referese ao ensino medieval responsável por pro mover a unidade da cristandade através das disseminações da verdade católica Engloba também o período de propagação das es colas e universidades medievais onde o ensino congregava a Filosofia e a Teologia através de métodos bastante rígidos de leitura memorização e repetição 105 Filosofia da Educação CAPÍTULO 3 Além do racionalismo cartesiano é fundamental fazermos referência ao empirismo inglês representado aqui por John Locke 16321704 Seus escritos englobam principalmente questões relacionadas à política ética teoria do conhecimento e à educação Para ele não existem ideias inatas sendo que o conhecimento provém da experiência Pensadas desta forma as ideias dos homens se desenvolvem por meio de experiências sejam elas sensíveis advindas do que é externo ao humano como cheiro cor temperatura ou reflexivas advindas de sensações como dor e desejo A partir delas o sujeito seria capaz de tornar mais complexas as reflexões organizandoas No que diz respeito à educação Locke acredita que ela é fundamental na preparação da criança para a vida adulta A educação intelectual também ganha importância na medida em que é trabalhada a partir do que é sensível Por fim Locke preocupase também com a educação moral É importante frisar que seus escritos dirigemse principalmente à educação do homem burguês Contemporâneo a Descartes temos em Comenius 15921670 uma reflexão sistematizada sobre educação Este por sua vez acreditava na necessidade da formação do ser humano Isto não se daria apenas através do método racional já que este precisava ser guiado Para Comenius o poder reformador do homem não se restringia ao conhecimento mas se ampliava aos domínios da sociedade civil dos costumes e da religião A educação deveria valorizar a experiência e estar voltada para a ação cabendo ao método didático ensinar tudo a todos como era o propósito do seu livro Didática Magna tratado da arte universal de ensinar tudo a todos 1638 Sobre a visão de educador e homem moderno de Comenius o professor Gilberto Luis Alves explica que Comènio está na origem da escola moderna A ele mais do que a nenhum outro coube o mérito de concebêla Nessa empreitada foi impregnado pela clareza de que o estabelecimento escolar deveria ser pensado como uma oficina de homens ALVES 1998 p 58 106 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 3 Com ideia de simplificar o trabalho do professor e alcançar um público maior Comenius cunhou a principal ferramenta do professor para os séculos futuros o livro didático inscrevendo a educação no mundo burguês que se anunciava O Século das Luzes O desenvolvimento do pensamento iluminista ao longo do século XVIII foi bastante profícuo para o desenvolvimento daquelas que seriam mais tarde chamadas de Ciências Humanas Para caracterizar os iluministas A Dominguez Ortiz utiliza os seguintes termos O pensamento iluminista Os iluministas eram racionalistas acreditavam no progresso humano na possibilidade de o homem atingir a perfeição na necessidade de difundir estes ideais através da ação governamental e de uma política educativa Eram tolerantes e compreensivos pelo menos em teoria já que na prática mostraramse muitas vezes intransigentes e autoritários na defesa e implantação das suas idéias Dentro destas normas muito gerais cabiam posicionamentos muito diversos Este fato pode ser observado com particular clareza no domínio religioso onde podemos encontrar posições desde o mais radical ateísmo à piedade mais sincera O ponto de convergência estava na recusa de todo o elemento sentimental e irracional incompreensão face às atitudes místicas às manifestações da religiosidade popular ORTIZ 1993 p 23 O movimento Iluminista apregoava a necessidade de fugir das trevas difundidas pela ignorância medieval e deixarse iluminar pela luz da razão Acreditava na razão como fonte única da verdade Incitava a dúvida em relação aos dogmas da fé acreditando que a verdade só seria atingida através do exercício da razão Voltaire 16941778 afirmava que a ciência deveria se opor às certezas de fé As escolas deveriam ser o centro de difusão destas novas verdades Ademais os descobrimentos e os avanços científicos a descoberta da América a forma geoide do planeta Terra sugeriam dúvidas em relação à infalibilidade da Igreja fortalecendo ainda mais o ideal racionalista 107 Filosofia da Educação CAPÍTULO 3 É importante nesse momento citar também o papel dos Enciclopedistas Diderot 1713 1784 e DAlembert 1717 1783 O Enciclopedismo segundo Amaral Azevedo foi o nome dado ao sistema que possibilitou a elaboração de uma obra a Enciclopédia na qual se tinha a pretensão de registrar o conhecimento da humanidade O projeto ganhou dimensão considerável envolvendo numerosos intelectuais de valor que encontravam na obra o espaço de que necessitavam para expor suas novas e polêmicas ideias No que se refere à educação esta começou a ser pensada como a grande possibilitadora do progresso da Humanidade A educação representava a civilização enquanto a natureza humana era sinônimo de selvageria A obra Émile de Rousseau 17121778 é neste sentido bastante representativa Apresenta a ideia de que a transformação da sociedade seria possível apenas a partir do cuidado com as crianças e transformação através da educação Ela seria o elemento de equilíbrio entre natureza e cultura na sociedade Uma não deveria ser sobreposta a outra mas é por meio da educação que o homem aprenderia a desenvolver sua própria natureza É em Rousseau que nos deparamos com a ideia de que o homem nasce livre porém é corrompido pela sociedade O objetivo principal da educação seria portanto tornar o homem livre convertendose em espaço e meio de realização humana Já para Kant 17241804 considerado um dos grandes pensadores da Modernidade a educação consiste na orientação do pensamento e definição de condições do progresso humano A educação é por ele pensada como uma arte racional e não uma atividade natural Este exercício da razão e tudo que seria possibilitado através dela legou ao século XVIII a alcunha de Século das Luzes Kant acreditava que esta iluminação Aufklarung era a saída do homem de sua menoridade e que esta atitude era responsabilidade de cada indivíduo Afirmava também que os indivíduos deveriam agir de acordo com sua consciência moral e que esta ao se construir a partir dos postulados da liberdade e autonomia exige aprendizado e disciplina 108 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 3 Essa forma racional de se posicionar a respeito da sociedade aliados aos movimentos de industrialização e desenvolvimento das ciências impõe novas necessidades de organização escolar O dualismo entre uma educação popular e outra elitista tornavase cada vez mais explícito Ao mesmo tempo o estudo exclusivo das humanidades não parecia suficiente a uma sociedade que assistia a emergência do espírito científico Essas questões vão ditar novas reflexões sobre o papel da educação Seção 2 Renascimento da dialética a Filosofia da Práxis e a educação Objetivos de aprendizagem Identificar o renascimento da dialética na Filosofia da Práxis Conhecer os fundamentos da Filosofia da Práxis e suas implicações educacionais Compreender o ato educativo como atividade humana teóricoprática transformadora Dialética e Filosofia da Práxis características e percurso A Filosofia da Práxis é ao mesmo tempo um produto e uma contestação do projeto da modernidade É um produto moderno porque as investigações de Marx e Engels tinham por objetivo a criação de uma ciência da história ou um socialismo científico reafirmando o primado da ciência como conhecimento verdadeiro ao mesmo tempo nenhuma corrente teórica se preocupou tanto com a crítica e contestação do positivismo e sua racionalidade pragmática o que levou a elaborações teóricocríticas tais como os 109 Filosofia da Educação conceitos de sociedade administrada e emancipação de Adorno e Horkheimer A Filosofia da Práxis foi denominada de diversas formas e cada uma delas aponta a um campo de ação possível dessa vigorosa teoria tais como Marxismo Materialismo Histórico Materialismo Histórico Dialético Perspectiva Histórica e Socialismo Científico Cada um desses nomes vai numa direção de campos de investigação e atividades humanas todas ligadas ao fazer humano em processo em construção em fluxo em devir enfim em contradição Para fins desse estudo vamos usar a denominação do filósofo italiano Antônio Gramsci Filosofia da Práxis por expressar com mais clareza o movimento dialético que caracteriza a história humana enquanto produção própria do homem superando ao mesmo tempo uma visão dialéticoidealista como em Hegel e a visão dialética materialistamecanicista como nos iluministas e no marxismo vulgar Sendo a dialética o centro da Filosofia da Práxis é preciso retomar esse conceito e explicar suas acepções ao longo da história Você estudou que foi no período de Sócrates e Platão que teve origem a dialética mas enquanto método de exposição dos argumentos no diálogo pois ainda que exista nela implicitamente a categoria de contradição está mais ligada à oposição de argumentos e não ao movimento de forças contrárias Essa é uma dialética formal longe da ideia do présocrático Heráclito de Éfeso filósofo defensor de que tudo no universo está em contradição e fadado à destruição pois trazem em si o germe do seu contrário É a metáfora do homem e do rio que vimos anteriormente Em Aristóteles com sua hierarquização do mundo não há lugar para uma dialética verdadeira a não ser no seu uso lógicoformal assim como em todo Período Medieval endurecido e estratificado pela ordem feudal e teológica não há espaço para um pensamento volátil e revolucionário como a concepção dialética É somente a partir da Modernidade mediante as transformações materiais e políticas do século XVIII que a dialética é revigorada e vira não apenas método de exposição mas também método de Etimologicamente vem do grego dialektikós διαλεκτική e é formada pelas ideias de dualidade diá e de diálogo lektikós apto à palavra significando no início a arte de argumentar no diálogo como se dá originalmen te em Platão No século XVIII e XIX com Hegel Marx e Engels dialética ganha o significado de Filosofia e método 110 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 3 investigação e Georg Wilhelm Friedrich Hegel 1770 a 1831 é o seu portavoz O renascimento da dialética em Hegel só foi possível porque ele viveu exatamente um período de transformações exigidas e buscadas pela sociedade em diversos campos de atuação na política caracterizada sobretudo pelo episódio da Queda da Bastilha e pela Revolução Francesa 1789 em cuja homenagem Hegel e seus discípulos haviam plantado em 1790 a Freheitsbaum árvore da felicidade 1790 na economia com a produção e consumo em massa como efeito da Revolução Industrial na demografia com o êxodo do campo e nascimento do proletariado urbano e da burguesia industrial etc Em um mundo revolucionado e revolucionário como esse não caberia domínio da Filosofia escolástica e muito menos da teologia o mundo estratificado não poderia mais existir Passavase como diz Alexander Koyré do mundo do mais ou menos ao universo da precisão 1991 p 271 Estava aberto espaço para que a dialética renascesse haja vista seu caráter intrínseco de movimento contradição transformação e revolução Entretanto a dialética hegeliana é idealista e como diria Marx está de pernas pro ar Para Hegel o mundo se move por conta do pensamento e sendo racional o pensamento é que determina o mundo Dizia ele que o que é real é racional e o que é racional é real Com esse primado da razão nasce uma dialética que naturaliza tanto a natureza quanto a história como se o real fosse a materialização do desejo daquilo que Hegel chamou de Espírito Absoluto Todavia o alto fôlego de sua construção teórica abriu caminhos para a dialética e para uma concepção de transitoriedade da história e da condição humana como algo e ser construído muito diferente de um mundo pronto e acabado como concebido no Período Medieval 111 Filosofia da Educação CAPÍTULO 3 Vem de Hegel a caracterização da dialética como metodologia de investigação e como Filosofia Segundo ele o mundo o real está em constante movimento de integração de contrários passando o pensamento e realidade por momentos distintos de afirmação negação e superação em alemão aufheben alavancar superar elevar Na formulação filosófica os três momentos da dialética seriam TESE é a afirmação do objeto ou fenômeno referese à identidade e possibilidade de seu conhecimento ANTÍTESE é a manifestação da contradição ou negação da matéria ou fenômeno referese tanto ao real físico quanto ao humano SÍNTESE é o momento de negação da negação ou elevação de nível quando se dá a superação dialética O exemplo de dialética mais comum na natureza é a semente A semente é a afirmação a identidade do objeto tese Mas nela existe uma planta em potencial enquanto contradição que luta inexoravelmente para emergir Quando o broto nasce antítese temse a primeira negação da semente dando origem a um novo ser Entretanto as forças contraditórias da planta levamna ao florescimento e morte originando novas sementes síntese que tendem a negála e até mesmo a matála ao mesmo tempo em que conservam suas principais características e propriedades Assim ininterruptamente originamse novos ciclos pois a contradição é inerente ao ser Todavia é preciso atentar que a dialética não defende o eterno retorno ou seja a repetição dos mesmos ciclos eternamente o processo dialético não é um processo linear mas como Marx afirmava uma espiral em que as novas 112 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 3 sínteses são cada vez mais elevadas de graus No caso das sementes cada árvore nova está mais bem adaptada ao solo às intempéries às mudanças climáticas e essas informações são transmitidas a cada nova geração Notese que a dialética trabalha sempre com a noção totalidade que é o ser integral seja do objeto ou fenômeno físico ou social A verdade é o todo como dizia Hegel cabendo ao pensamento a tarefa de investigar as partes e suas relações de mútua determinação Esses princípios quando remetidos à explicação da condição humana fazem emergir uma metodologia que ao contrário do Positivismo que enxerga harmonia em tudo principalmente na sociedade passa a ver as contradições as crises os conflitos e os interesses contrários que as classes e os grupos têm sob o capitalismo Mas é importante ainda dizer que mesmo em contradição afirma se a presença em potencial do que foi superado E isso se refere também ao movimento da história pois a tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos MARX 1984 p 203 Desta forma é que até que tenha esgotado todas as suas forças há uma luta dos contrários para se afirmar se a semente é a nova vida em potencial a árvore que a sustenta não deixa de lutar e extrair com suas raízes condições de vida até não poder mais mas no fim inevitavelmente sucumbe 113 Filosofia da Educação CAPÍTULO 3 Dialética Coube a Friedrich Engels amigo e colaborador de Marx sintetizar as leis desse desenvolvimento dialético no livro Dialética da Natureza em 1875 Vamos ver as leis da dialética segundo Engels a Lei da interpenetração dos contrários Tanto no universo material quanto humano tudo está em fluxo perpétuo em contradição Ao contrário da lógica aristotélica que dizia que uma coisa não pode ser ela e o seu oposto ao mesmo tempo princípio da nãocontradição na lógica dialética isso não somente é concebido como é um de seus fundamentos É justamente essa unidade dos contrários que permite o movimento a antítese que é gerada a partir da luta que os opostos travam para se afirmarem eou superarem No processo de germinação do ovo por exemplo a contradição que está posta é sua permanência em ovo ou transformação em pinto dentro do ovo coexistem forças vitais de superação e conservação O mesmo acontece com a história humana As forças materiais que produziram a burguesia tiveram sua origem no feudalismo inclusive foram criadas por estatutos feudais e por séculos estes opostos estiveram unidos Apesar de as classes dominantes nesse período a nobreza e o clero tentarem por longo tempo a conservação do modelo feudal foi preciso a sua destruição e isso foi feito por meio de muitas revoluções burguesas b Lei da negação da negação Assim que a antítese se estabelece enquanto negação estão em jogo as forças de superação que são antitéticas o resultado então é a própria negação do que foi negado a síntese que é emergência do novo Na medida em que a semente germina nega a sua própria situação de grão logo a planta é a sua negação Em seguida ela própria será negada tendose uma negação de segunda ordem ou seja as novas sementes serão muito mais capazes No processo social não por forças naturais mas pela ação humana as forças postas em circulação são transformadoras algumas delas com consciência plena e outras devido aos condicionantes de suas ações Por exemplo para existir a classe burguesa como afirmação dependeu e depende até hoje do proletariado que representa a sua contradição e segundo Marx sua possibilidade de negação e superação c Lei da passagem da quantidade à qualidade Estamos aqui diante do princípio do salto qualitativo que se dá a partir de mudanças quantitativas mínimas que vão se acumulando ao logo do tempo para emergir uma coisa nova como a borboleta que sai da crisálida É próprio do pensamento dialético a relação contraditória entre quantitativo e qualitativo de modo que em determinado momento o acréscimo quantitativo eleva de nível aufhebem o objeto o fenômeno Na natureza é fácil a verificação desse princípio um átomo de oxigênio a mais numa molécula de água resultando em H2O2 transforma qualitativamente a água potável em oxigenada até a temperatura de 100C a qualidade da água é o estado líquido chegando nessa temperatura começa a evaporar dando por assim dizer um salto qualitativo Nas sociedades humanas muitos processos quantitativos como continua 114 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 3 a acumulação de capitais intensificação comercial financiamentos etc resultam em mudanças qualitativas na estrutura social originando novas forças sociais e até mesmo matando forças sociais reacionárias que impedem o salto qualitativo Exemplo disso foram às reações da Igreja a uma série de contestação de seus princípios que resultariam na emergência da ciência moderna Enquanto foi produção de poucos homens as forças de reação poderiam controlar como no caso da condenação de Jordano Bruno e Galileu Galilei mas quando as novas gerações se apropriaram dessa nova visão foi inevitável condenar a teologia ao ostracismo e o salto qualitativo foi inevitável Nesse contexto sociocultural a ideia de movimento estava no ar a transformação e conservação da energia com Lavoisier a complexidade da célula descoberta por Robert Hooke a gravitação universal de Newton a infinitude matemática de Gauss a lei da evolução das espécies de Darwin enfim a dialética mostrava na prática que o mundo e as sociedade humanas estavam em perpétuo movimento Enquanto os novos cientistas encontravam a contradição e o movimento na Terra e no Universo Hegel percebeu a transformação da sociedade e do homem fundando a sua Filosofia da história Todavia ainda atrelado ao idealismo dizendo que as transformações são em última estância obra do Espírito Absoluto Coube a Marx e Engels a tarefa de transformar a dialética idealista de Hegel em Filosofia da Práxis e aplicála à explicação das transformações sociais Categorias da Filosofia da Práxis A práxis é muito mais do que mera unidade entre teoria e prática vai além porque funda um novo princípio ontológico desenvolvimento do ser para a existência humana Isso porque para prover a sua existência e dar um salto qualitativo na sua relação com o ambiente o homem desde o início se apropriou do mundo de forma teórica e prática construindo ferramentas e representando o mundo na sua consciência De modo que no agir prático humano há sempre 115 Filosofia da Educação CAPÍTULO 3 um agir teleológico projetado tanto para o passado quanto para o futuro Dessa forma nossos atos mais simples são de antemão refletidos e projetados Existem evidentemente ações de reflexo instintivas quando somos confrontados com perigos iminentes ou fortes emoções Mas a rigor a ação humana é consciente de suas finalidades porque é uma ação guiada por uma vontade que a determina E quanto mais refletida é a ação mais teorizada ela é mais planejada e por certo com maior possibilidade de êxito Para a Filosofia da Práxis teoria e prática não se opõem ao contrário se completam interagem dialeticamente Nenhuma tem preponderância sobre a outra pois tudo que se faz tem uma intenção ainda que não declarada É uma relação contraditória pois da prática emergem informações que são processadas e exigem saltos qualitativos de modo que a prática está sempre sendo questionada e transformada pela teoria que tornandose obsoleta obrigase também a saltos qualitativos Vem daí o caráter materialista da Filosofia da Práxis já que o real não é um real do pensamento da ideia como queria Hegel mas um real que provoca e interage com o pensamento por isso Marx propõe que a dialética de Hegel está de cabeça para baixo No livro A ideologia alemã Marx e Engels 1845 fazem a seguinte afirmação Não é a consciência que determina a vida é a vida que determina a consciência No primeiro modo de consideração partese da consciência como indivíduo vivo no segundo que corresponde à vida real partese dos próprios indivíduos vivos reais e considerase a consciência apenas como a sua consciência MARX ENGELS 1985 p 23 É importante contextualizar que dessa definição de consciência enquanto produto histórico inacabado construída em condições objetivas de vida é que o psicólogo russo Lev S Vygosty 1986 1934 derivou sua Psicologia Histórico Cultural considerandoa como um conjunto interdependente de funções psicológicas superiores atenção memória percepção etc Nessa concepção invertese o modo de conceber o mundo o conhecimento a sociedade e suas relações que passam a ser analisados de acordo com o seu desenvolvimento histórico real 116 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 3 Sendo assim a categoria de história ganha status determinante para toda consideração acerca da práxis pois o homem e a sociedade só podem ser compreendidos a partir de seu desenvolvimento históricosocial Segundo François Châtelet a grande contribuição de Marx teria sido justamente transformar a Filosofia da História em ciência da história 1994 p 132 O próprio Marx explica sua perspectiva Conhecemos apenas uma única ciência a Ciência da História A história pode ser considerada de dois lados dividida em história da natureza e história dos homens No entanto estes dois aspectos não se podem separar enquanto existirem homens a história da natureza e a história dos homens condicionamse mutuamente A história da natureza a chamada ciência da natureza não é a que aqui nos interessa na história dos homens porém teremos de entrar visto que quase toda a ideologia se reduz ou a uma concepção deturpada desta história ou a uma completa abstração dela A ideologia é ela mesma apenas um dos aspectos desta história 1984 p 11 Destacamos aqui três aspectos fundamentais dessa perspectiva vamos conhecêlos 1 A primeira é o materialismo opondose a uma concepção idealista que supõe a história com um motor próprio a se mover numa determinada direção seja a traçada por entidades além do homem ou pela própria natureza 2 A segunda é o cunho humanista das transformações ou seja o homem é colocado no centro das atenções adquirindo um papel ativo na história 3 A terceira que tem a ver com o caráter dinâmico e contraditório das transformações seu aspecto dialético A partir das contradições das classes dos grupos e das épocas é que se dão as revoluções por isso a Filosofia da Práxis também tem o nome de Materialismo HistóricoDialético É preciso fazer aqui uma consideração para não dar margem a uma interpretação deturpada do homem na Filosofia da Práxis Nela o 117 Filosofia da Educação CAPÍTULO 3 homem precisa ser entendido enquanto síntese de determinada época que só se realiza em sociedade ou como Marx resgata de Aristóteles O homem é no sentido mais literal um dzoon politkhón não só um animal social mas animal que só em sociedade pode isolar se 1983 p 202 Esse parêntese é necessário na medida em que avançaram as concepções liberais que vivem afirmando o individualismo como se a sociedade se opusesse ao indivíduo ao contrário em Marx o indivíduo é o ser genérico da sociedade que se individualiza já que pelo processo educativo no lar na escola no trabalho os sujeitos vão se apropriando individualmente de uma produção que é coletiva Essa última categoria da Filosofia da Práxis a sociedade enquanto contradição de interesses de classes e grupos é de fundamental importância para compreender suas convergências e implicações para o ato educativo e para a própria história da educação Implicações para a educação do método dialético Ao aplicarmos as categorias da Filosofia da Práxis ao ato educativo primeiramente é preciso buscar as múltiplas relações totalidade que condicionam esse fenômeno e seus agentes Enquanto agente o educador é um sujeito cujo agir é teórico prático ou seja por mais que não se dê conta dos fundamentos que norteiam sua ação não deixa de expressar pela sua prática determinada teoria É comum se ouvir que os educadores estão fartos de tantas teorias e o que importa é a prática Ora enquanto diz isso fica demonstrado que o educador não está consciente dos fundamentos que orientam sua atividade agindo desse modo sua práxis deixa de ser transformadora para se tornar reificada ou seja abandona o agir consciente em nome de um agir alienado sob vontade alheia 118 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 3 Mas que vontade alheia é essa Sobre esta questão é preciso analisar os discursos de propostas curriculares livros didáticos consultorias etc Quando age sob a práxis reificada as finalidades do trabalho pedagógico são alheias ao educador e este segue executando a deriva seu trabalho Podemos resumir essa questão assim quando nega a importância da teoria ou quando dá prioridade a uma teoria desvinculada de sua atividade prática o educador é prisioneiro de uma práxis fetichizada como dizia o filósofo húngaro Georg Lukács uma práxis reificada Por outro lado a práxis se torna transformadora quando há uma interação dialética entre teoria e prática é o princípio da açãoreflexãoação Para a Filosofia da Práxis a verdade está na prática social logo é preciso que o educador reflita teoria a todo momento se o que ensina e o modo como o faz prática responde aos anseios de uma sociedade em transformação e mais se o que e como ensina é transformador ou reacionário Levando em consideração temáticas atuais como gênero etnia inclusão educação integral letramento e outros é preciso que o educador se dê conta de que a sociedade propõe questões autênticas que envolvem diretamente o seu trabalho e que exigem dele uma postura Daí sua decisão por uma práxis reificada ou transformadora 119 Filosofia da Educação CAPÍTULO 3 Como a Filosofia da Práxis trabalha com a categoria de totalidade é preciso que o educador perceba as relações de macro determinação de sua atuação docente formação salário condições de trabalho políticas econômicas e educacionais etc para que possa agir consciente no micro espaço de determinações de sala de aula de modo a formar sujeitos em condições de realizar leituras críticas do real a fim de transformar relações de dominação exploração discriminação preconceito alienação e outras a que estão submetidos no seu dia a dia Na educação brasileira a Filosofia da Práxis influenciou tanto as propostas educacionais libertárias Pedagogia Libertária quanto libertadoras Pedagogia Libertadora todavia sua sistematização em Filosofia educacional aconteceu na década de 1980 com a Pedagogia Crítico Social dos Conteúdos cujo principal expoente é Dermeval Saviani que exerceu grande influência na formulação de propostas curriculares pelo Brasil inteiro nas décadas de 80 e 90 Seção 3 Política ética e liberdade o pensamento contemporâneo na educação Objetivos de aprendizagem Refletir sobre as possibilidades do pensamento contemporâneo a respeito da educação Contextualizar os conceitos de ética política e liberdade Segundo Paulo Freire 2000 a educação que não podendo jamais ser neutra tanto pode estar a serviço da decisão da transformação do mundo da inserção crítica nele quanto a serviço da imobilização 120 Universidade do Estado de Santa Catarina da permanência possível das estruturas injustas da acomodação dos seres humanos à realidade tida como intocável Diante das diversas reflexões e formas de se pensar a educação apresentadas ao longo deste Caderno Pedagógico compreendemos aqui a Educação como um elemento da formação humana Quando falamos em formação não estamos nos referindo a um modelo único homogêneo e limitador Tampouco a ideia de formatação e enquadramento Assim como a educação recebeu sentidos e usos diversos ao longo da História atualmente estes sentidos estão ligados aos elementos que compõe as características dos sujeitos Ainda que hoje estejamos pensando a Educação como um processo de formação para atuar no mundo social é importante frisar que esta recebeu diferentes sentidos ao longo do tempo Neste ínterim o papel atribuído à Filosofia da Educação não é o de situar a educação em uma temporalidade de correntes filosóficas mas através de um esforço interpretativo compreender os sentidos atribuídos à prática educativa Ela a Filosofia da Educação preocupase com as questões epistemológicas da educação em diferentes contextos Entre esses sentidos podemos afirmar que a educação pode ser pensada historicamente através de seus direcionamentos éticos e políticos Para tanto é necessário concebêla como um processo históricocultural e lógicoconceitual Como já foi visto no primeiro capítulo durante a Antiguidade Clássica e mesmo a Idade Média a educação tinha uma finalidade de aprimoramento éticopessoal Ela representava o princípio aristotélico do Ato e Potência Aqueles que possuíam acesso à educação através da correta instrução tinham o que correspondia a uma garantia de humanização Estariam aptos a participar efetivamente da vida política e social Na medievalidade os princípios éticos eram arraigados à religião A Igreja Católica determinava não apenas os aspectos relacionados à fé mas às As características dos sujeitos estão relacionadas aos aspectos sociais culturais políticos e econômicos configuram possibi lidades de atuação e transformação social Acredita mos que o sujeito através da educação constrói subsídios de compreensão e ação social 121 Filosofia da Educação CAPÍTULO 3 normas de conduta social e julgava aqueles que tidos como ineptos ao modelo considerado ideal Com o advento da modernidade o homem começou a ser pensado como um ser social Os pressupostos pedagógicos eram a partir de então compreendidos dentro de pressupostos políticos Jean Jacques Rousseau nesse momento começa a apresentar a infância como uma fase específica do desenvolvimento afinal até então as crianças eram vistas como adultos em miniatura sem necessidades ou cuidados especiais Grandes mudanças ocorreram a partir do momento em que as concepções políticas de Rousseau passaram a ser incorporadas para a educação O filósofo iluminista acreditava que os seres humanos nasciam essencialmente bons porém eram subvertidos pelo meio em que viviam Da mesma forma as crianças nasciam puras sendo que a responsabilidade por aquilo que eles viriam a ser era dos adultos responsáveis por sua educação Assistimos a uma inserção do sujeito na sociedade e a educação passou a ter uma função política específica Segundo o iluminista Immanuel Kant a educação tem uma finalidade explícita na modernidade do fim do século XVIII É a do projecto geral das Luzes libertar a humanidade do despotismo do despotismo político mas também da ignorância e da miséria A educação tem pois uma intenção fundamental fazer com que a nação a comunidade de facto se torne numa República de direito apud KECHIKIAN 1993 p 49 Kant acreditava que a educação era o meio através do qual se desenvolveria a razão libertadora Esta por sua vez seria a grande possibilitadora do almejado modelo republicano A educação como elemento da construção do homem deveria norteálo ao exercício da liberdade e à vida em sociedade Teria portanto uma dimensão política A liberdade moldada pelos padrões da família mononuclear e da escola tornavase o bem maior a ser alcançado Esta forma de se pensar a educação atravessou o Período Moderno e fundamentou a formação dos Estados Nacionais 122 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 3 Na contemporaneidade a reflexão sobre a educação foi complexificada Enquanto que na Modernidade cristalizouse a educação pautada pela racionalidade científica e explicativa na sociedade atual estas metanarrativas estão em descrédito ao mesmo tempo em que as tecnologias alteram contextos Tantas transformações acabam certamente tendo agravantes no cotidiano escolar e nas formas de se pensar a educação Durante o Período Moderno o conhecimento era uma forma de adaptar o homem a natureza Já na PósModernidade o sujeito busca conhecer a natureza para aprimorar suas possibilidades de autoconhecimento É neste momento de reconsiderações epistemológicas que a linguagem assume uma importância central ao ser compreendida como uma dimensão de existência O sujeito que não é mais universal e pleno de razão constróise pela linguagem Ele dá sentidos diversos a sua experiência através da palavra Esta mudança na forma de se pensar o sujeito e a construção do conhecimento é chamada de virada linguística A virada linguística linguistic turn implica em ressignificações do conhecimento conhecido através de múltiplas formas de linguagem A linguagem passa Portanto a ser uma nova forma de conhecimento e sendo assim objeto de estudo da Filosofia influenciando fortemente outras áreas como a história e os estudos literários Ao tentar definir a virada linguística em uma coletânea de textos Rorty afirma que O propósito do presente volume é fornecer material de reflexão sobre a maior parte da revolução filosófica recente a da Filosofia linguística Com a expressão Filosofia linguística estarei entendendo aqui uma visão de que os problemas filosóficos são problemas que poderiam se resolvidos ou dissolvidos pela reforma da linguagem ou por uma melhor compreensão da linguagem que usamos presentemente RORTY 1992 p 3 Uma das implicações da virada linguística é conceber o nosso conhecimento e compreensão do mundo social como necessariamente vinculado à própria forma como nome amos esse mundo SILVA 2002 123 Filosofia da Educação CAPÍTULO 3 Com esta emergência das questões centradas na linguagem assistimos a uma substituição da relação de conhecimento sujeito objeto para outra definida agora como sujeitosujeito Wittgenstein 18891954 trouxe uma contribuição bastante significativa ao definir os jogos de linguagens Estes implicavam em analisar as expressões que são costumeiramente ditas não conforme regras próprias da estrutura das línguas mas a partir de seu uso comum em meio social As linguagens devem ser compreendidas a partir de redes de interação e seu significado varia de acordo com as redes Essas noções são decisivas para pensar a educação uma vez que criou novas necessidades reflexivas Antes os conteúdos e currículos direcionavamse exclusivamente a uma realidade objetiva e comprovável Com a virada linguística a realidade deixa de ser comprovável e não pode mais ser compreendida desvinculada da linguagem A realidade ganha sentido na medida em que ela é posta em palavras Tomaz Tadeu da Silva define esse movimento como a autonomia do sujeito e de sua consciência cede lugar a um mundo social constituído em anterioridade e precedentemente aquele sujeito na linguagem e pela linguagem SILVA 2002 O mesmo distingue o sujeito que conquistaria a emancipação e autonomia através da consciência daquele imerso em um mundo constituído na e pela linguagem Além de fins pautados na linguagem no conhecimento racional ou moral a educação para alguns precisava ser assumidamente engajada Seu projeto político deveria seguir o da contestação do questionamento do amplo acesso Conforme vimos anteriormente a educação bancária que se pautava no depósito de conteúdos buscando um saldo ou resultado desejado sem levar em consideração as especificidades e desejos dos alunos foi amplamente criticada por Paulo Freire Este por sua vez acreditava no não silenciamento dos estudantes cujo conhecimento prévio 124 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 3 deveria não apenas ser levado em consideração mas determinar os cursos dos planejamentos Não foi apenas Paulo Freire porém que acreditava no poder da educação como prática dialógica Bakhtin utiliza o termo ao referenciar as questões éticas políticas e epistemológicas envolvidas na constituição dos sujeitos Sendo assim segundo Sueli Ferreira O processo dialógico desenvolvido na sala de aula promove a integração dos múltiplos aspectos que envolvem a cognição colaborando para que o homem aprenda a ser homem e o conhecimento científico possa florescer Partindo desse pressuposto tanto o homem quanto o saber científico avançam à medida que a multiplicidade de vozes interage FERREIRA 2011 Pensando desta forma valorizar as diferenças em sala de aula é incitar uma prática democrática onde a experiência também é pauta de reflexão A soberania exclusiva da razão passou a ser inaceitável uma vez que utilizada como forma de distinção social Além disso filósofos como Michel Foucault tornaram bastante explícitas as relações entre saber e poder em espaços escolares como determinantes de hierarquizações Isso porque a educação compreendida como um saber pedagógico é uma forma bastante eficaz de difusão de verdades e sendo assim institucionalmente se responsabiliza pela disciplina controle e vigilância A educação através do espaço escolar passa a ser um campo de possibilidades de constituição de sujeitos que seriam por sua vez alvo de exercício de poder O filósofo francês Michel Foucault é considerado um autor referencial para a reflexão sobre as instituições escolares como espaços de produção social 125 Filosofia da Educação CAPÍTULO 3 A educação compreendida como uma prática dialógica a qual considera conhecimentos prévios e desempodera a possibilidade de monopólio do saber deve deixar de ser pensada como uma exclusividade de poucos para ser sonhada como uma possibilidade para muitos Síntese do capítulo O pensamento humanista surge durante o movimento renascentista como uma forma de referenciar e revalorizar as ações do ser humano O pensamento racionalista apregoava que ter um bom espírito não era o suficiente pois o principal seria a boa educação O Racionalismo e o Humanismo congregam a recusa ao ensino escolástico característico da Idade Média No que se refere ao iluminismo esse movimento acreditava na necessidade de fugir das trevas difundidas pela ignorância medieval e deixarse iluminar pela luz da razão Acreditavam na razão como fonte única da verdade A Filosofia da Práxis pode ser considerada como um produto e uma contestação do projeto da modernidade Emerge das investigações de Marx e Engels e se preocupava com a crítica e oposição ao positivismo e sua racionalidade pragmática o que levou a elaborações teóricas críticas tais como os conceitos de sociedade administrada e emancipação de Adorno e Horkheimer A Filosofia da Práxis implica em compreender o fazer humano em processo em construção em fluxo em devir e em contradição O campo pedagógico pode ser pensado de diferentes formas relativas a diferentes contextos 126 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 3 A virada linguística propõe uma forma diferenciada de estudar o ser humano e a educação pautados na construção de sentidos ao mundo a partir da linguagem Você pode anotar a síntese do seu processo de estudo nas linhas a seguir Atividades de aprendizagem 1 Aponte os principais pensadores modernos e relacione suas contribuições na reflexão sobre a educação 127 Filosofia da Educação CAPÍTULO 3 2 De que forma a Filosofia da Práxis auxilia na compreensão do ato educativo como uma prática transformadora 128 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 3 Aprenda mais No que se refere aos filósofos modernos existem várias obras cuja leitura auxilia a compreensão de suas propostas Entre elas sugerimos DESCARTES René Discurso do método São Paulo Abril Cultura 1973 KANT Immanuel Sobre a Pedagogia 3 ed Piracicaba Unimep 2002 ROUSSEAU JeanJacques Emílio ou Da Educação 3 ed São Paulo Martins Fontes 2004 VOLTAIRE Cândido Rio de Janeiro Newton Compton Brasil 2000 Sobre a Filosofia da Práxis consulte FREIRE Paulo Pedagogia do oprimido 17 ed Rio de Janeiro Paz e Terra 1970 Para entender o pensamento contemporâneo na educação é importante conhecer BERMAN Marshal Tudo que é sólido desmancha no ar São Paulo Companhia das letras 1986 LYOTARD JeanFrançois A Condição PósModerna Rio de Janeiro José Olympio 2002 SILVA Tomaz Tadeu da Teoria Cultural e Educação um vocabulário Crítico Belo Horizonte Autêntica 2000 CAPÍTULO 4 O Capítulo 4 apresenta aspectos da Pós Modernidade e suas relações com a educação principalmente considerando a emergência de temáticas até então inexploradas no campo educacional tais como gênero relações étnico raciais e diversidade que só contemporaneamente fazem parte das preocupações dos educadores e das políticas públicas para a educação Discute ainda a importante questão da relação entre mídia e educação Filosofia da Educação e a PósModernidade Caroline Jaques Cubas CAPÍTULO 4 Conceituar PósModernidade e discutir as implicações do conceito Investigar os temas decorrentes desse conceito e suas aplicabilidades na esfera educacional Objetivos gerais de aprendizagem Seções de Estudo Seção 1 A emergência das identidades culturais e a educação na PósModernidade Seção 2 PósModernidade e temáticas educacionais gênero relações étnico raciais e diversidade Seção 3 Educação e mídias um olhar filosófico Filosofia da Educação e a PósModernidade 134 Universidade do Estado de Santa Catarina Iniciando o estudo do capítulo Você estudou as características da Filosofia e da Filosofia da Educação no pensamento moderno Conhece portanto a importância do uso da razão do método e da experiência na tentativa de comprovação de teorias diversas Pois bem se estes elementos caracterizam o pensamento moderno o que devemos entender por PósModernidade O que significa ser pós e quais a implicação deste prefixo para a Filosofia em geral e particularmente para a Filosofia da Educação Pense em uma sala de aula alunos e alunas diferenças de crenças etnias e gêneros todas no mesmo espaço Tal diversidade nos parece hoje tão corriqueira que é naturalizada e encarada como um modelo normal exemplo do que deve ser Surgem porém uma série de indagações em âmbito filosófico como por exemplo Quais valores éticos lecionar em uma sala de aula onde existem alunos de diferentes crenças Como lidar com a gritante diferença social sem promover ideologias excludentes Como trabalhar as questões referentes à sexualidade em turmas que desde meados do século passado são mistas sem reproduzir lugares de gênero patriarcais E em que medida tais problemas se relacionam com a noção de Pós Modernidade Seção 1 A emergência das identidades culturais e a educação na PósModernidade Objetivos aprendizagem Conhecer e analisar identidades culturais Entender a educação na PósModernidade Não raro se ouve alguém dizer essa roupa ou aquele carro são modernos Mas o que é ser moderno 135 Filosofia da Educação CAPÍTULO 4 Observe como Marshal Berman define modernidade Ser moderno é encontrar se em um ambiente que promete aventura poder alegria crescimento autotransformação e transformação das coisas em redor mas ao mesmo tempo ameaça destruir tudo o que temos tudo o que sabemos tudo o que somos A experiência ambiental da modernidade anula todas as fronteiras geográficas e raciais de classe e nacionalidade de religião e ideologia nesse sentido podese dizer que a modernidade une a espécie humana Porém é uma unidade paradoxal uma unidade de desunidade ela nos despeja a todos num turbilhão de permanente desintegração e mudança de luta e contradição de ambiguidade e angústia Ser moderno é fazer parte de um universo no qual como disse Marx tudo o que é sólido desmancha no ar BERMAN 1986 p 11 A noção de PósModernidade começou a fazer parte das principais discussões em Filosofia e Sociologia especialmente a partir de fins da década de 1970 Mais especificamente a partir de 1979 quando o filósofo francês JeanFrançois Lyotard publica seu polêmico livro A Condição PósModerna onde a noção de PósModernidade aparece pela primeira vez em uma obra filosófica Ao introduzir o trabalho Lyotard afirma o seguinte Este estudo tem por objeto a posição do saber nas sociedades mais desenvolvidas Decidiuse chamála de pós moderna A palavra é usada no continente americano por sociólogos e críticos Designa o estado da cultura após as transformações que afetaram as regras dos jogos da ciência da literatura e das artes a partir do final do século XIX Aqui essas transformações serão situadas em relação à crise dos relatos LYOTARD 2002 p 15 Esta crise dos relatos citada por Lyotard é um dos grandes motes da concepção de PósModernidade Enquanto a modernidade respaldavase nas chamadas metanarrativas a PósModernidade vem sugerir justamente que estas são insuficientes e não se adéquam as características da contemporaneidade 136 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 4 Metanarrativa As metanarrativas da modernidade podem ser compreendidas como postulados que buscavam afirmar certezas no que se refere ao uso da razão centralidade do homem necessidade de método e experimentação científica e teorias comprováveis São de acordo com Tomaz Tadeu da Silva sistemas teóricos ou filosóficos com pretensões de fornecer descrições ou explicações abrangentes e totalizantes do mundo ou da vida social SILVA 2000 p 78 A ideia de PósModernidade foi desenvolvida a partir das transformações ocorridas no âmbito das artes e arquitetura especialmente nos anos 1950 e 1960 com o pósmodernismo Este pode ser caracterizado por meio de suas críticas ao universalismo e ao racionalismo Para compreender as origens da ideia de pósmodernismo sugerimos a leitura de O que é pósmoderno de Jair Ferreira dos Santos Ed Brasiliense 1987 Essas críticas foram ampliadas e incorporadas pela teoria social apresentandose de acordo com Jair Ferreira dos Santos a partir de duas principais vertentes a Desconstrução dos princípios do pensamento ocidental críticas aos conceitos de Razão Sujeito Ordem Estado Sociedade b Desenvolvimento de temas anteriormente desconsiderados em Filosofia desejo loucura sexualidade linguagem poesia sociedades primitivas jogo cotidiano A incorporação de tais elementos possibilitaria novas 137 Filosofia da Educação CAPÍTULO 4 perspectivas sobre sujeito contemporâneo e suas possibilidades de ação em relação ao mundo pós moderno As metanarrativas começaram a ser consideradas por alguns pensadores insuficientes para a compreensão de uma sociedade em rápida transição na qual o desenvolvimento da ciência tecnologia das redes de informação do mundo globalizado colocavam em xeque os pressupostos modernos Os pressupostos que anteriormente eram considerados certezas tornavamse fragmentados Tornavase imperativa uma reflexão sobre o mundo que se constituía a partir de então Entres os filósofos e pensadores que se lançaram a este desafio podemos citar Michel Foucault Gilles Deleuze Jacques Derrida Jean Baudrillard JeanFrançois Lyotard Ernest Laclau Anthony Giddens e David Harvey É importante pontuar que a concepção de PósModernidade não é consensual e portanto gera desavenças no meio acadêmico Entre os principais críticos da PósModernidade podemos referenciar Fredric Jameson Sua reflexão referese ao fator generalizante e portanto incoerente atribuído ao pensamento pósmoderno Para ele a única possibilidade de unidade nesta corrente está na existência da modernidade como seu contraponto principal Sugere que o mundo contemporâneo deve ser pensado através de problematizações socioeconômicas e culturais Para tanto indica o uso do conceito de capitalismo tardio O conceito de capitalismo tardio referese à terceira fase do capitalismo posterior ao seu surgimento desenvolvimento e fase de super produção Esta terceira fase contemporânea é caracterizada pela expansão das multinacionais pela globalização consumo massificado ascensão da tecnologia e exploração intensificada de recursos naturais Para Jameson as características da pósmodernidade podem ser consideradas como uma parte resultante do capitalismo tardio 138 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 4 A PósModernidade e as identidades culturais Figura 41 Olhares Conforme você estudou uma das características desse pensamento pós moderno é a fragmentação Fragmentação de narrativas de certezas e de postulados científicos Tais concepções possibilitaram a emergência de discussões que até então não costumavam receber atenção ou mesmo não tinham status de cientificidade Uma dessas concepções foi a de identidade cultural Para Stuart Hall autor de A Identidade Cultural na Pós Modernidade as velhas identidades que por tanto tempo estabilizaram o mundo social estão em declínio fazendo surgir novas identidades e fragmentando o indivíduo moderno até aqui visto como um sujeito unificado A discussão em torno das metanarrativas questiona vários pressupostos da modernidade e entre eles temos a noção de sujeito moderno Este conforme os pressupostos do iluminismo era caracterizado como um indivíduo centrado unificado pleno de razão consciência e ação Com o advento da PósModernidade a sociedade e o indivíduo passaram a ser pensados de outra forma No lugar da unidade a fragmentação No lugar da razão o questionamento A noção de sujeito moderno ao qual nos referimos aqui é também conhecida por sujeito cartesiano Este supostamente descrito por Descartes tem como elementos característicos o fato de ser racional unificado homogêneo centrado reflexivo consciente Possuía uma espécie de núcleo o qual não seria modificado pela história ou pela sociedade 139 Filosofia da Educação CAPÍTULO 4 Esta forma de se pensar o sujeito começou a ser questionada com a ascensão da psicanálise em especial com Freud e Lacan Nesse momento o sujeito sofre um primeiro descentramento uma alteração em sua estrutura conhecida Ao invés de ser considerado consciente agora é a existência do inconsciente que o caracteriza O sujeito passa a ser compreendido através de um processo formativo e não mais através de um núcleo ou essência As teorias pósestruturalistas e perspectivas pósmodernas vão colocar em xeque definitivamente esta noção de sujeito Um dos responsáveis por estes questionamentos é Michel Foucault para quem o sujeito é construído através de práticas discursivas Passa a ser compreendido portanto como um efeito daquilo que se diz sobre ele É um produto histórico e social Estruturalismo e Pósestruturalismo Segundo Michel Peters o estruturalismo francês se origina na linguística estrutural desenvolvida por Ferdinand de Saussure e por Roman Jakobson Estes concebiam a linguagem como um sistema de significação vendo seus elementos de uma forma relacional O antropólogo LéviStrauss sugere neste sentido que as ciências sociais devem formular relações e que novas perspectivas se abrem permitindo que o antropólogo estude sistemas de parentesco da mesma forma que o linguista estuda fonemas Surge a antropologia estrutural Para Michel Foucault as investigações estruturalistas convergiam em um único ponto sua oposição à afirmação teórica do primado do sujeito O pósestruturalismo pode ser caracterizado como um modo de pensamento um estilo de filosofar e uma forma de escrita embora o termo não deva ser utilizado para dar qualquer ideia de homogeneidade singularidade ou unidade É um movimento de pensamento uma complexa rede de pensamento que corporifica diferentes formas de prática e crítica O pósestruturalismo é decididamente interdisciplinar apresentandose por meio de muitas e diferentes correntes Os pensadores pósestruturalistas desenvolveram formas peculiares de análise gramatologia desconstrução arqueologia genealogia semioanálise com frequência dirigidas para a crítica de instituições específicas como a família o Estado a prisão a clínica a escola a fábrica as forças armadas a universidade e até mesmo a própria Filosofia e para a teorização de uma ampla gama de diferentes meios a leitura a escrita o ensino a televisão as artes visuais as artes plásticas o cinema a comunicação eletrônica PETERS 2000 140 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 4 Esses elementos implicaram em uma reflexão sobre o indivíduo uma vez que se a sociedade não poderia ser pensada mais como unidade tampouco o sujeito poderia ter estas características Ao invés de tecer teorias acerca do que os sujeitos têm em comum do que os une entrou em pauta justamente o elemento contrário ou seja a diferença Diferenças culturais diferenças étnicas diferenças de gênero passaram a compor as novas concepções de identidade cultural que surgiam a partir de então O sujeito passava a ser compreendido a partir das diferentes características históricas e sociais que o formava e com as quais se identificava Seção 2 PósModernidade e temáticas educacionais gênero relações étnicoraciais e diversidade Ao pensar em Filosofia da Educação como um ato reflexivo e ao mesmo tempo prático que motiva a ação surgenos a pergunta Como estas discussões sobre PósModernidade incidem em nossa prática pedagógica De que maneira as diferentes identidades dialogam ou entram em conflito no espaço escolar Quais as principais temáticas engendradas pelos questionamentos considerados pósmodernos Entre os objetivos dos PCNs para o Ensino Fundamental encontramos Conhecer e valorizar a pluralidade do patrimônio sociocultural brasileiro bem como aspectos socioculturais de outros povos e nações posicionandose contra qualquer discriminação baseada em diferenças culturais de classe social de crenças de sexo de etnia ou outras características individuais e sociais BRASIL 1997 p 66 141 Filosofia da Educação CAPÍTULO 4 Mas será que este posicionamento em favor da diversidade tem relação com as discussões da PósModernidade Ao defender um posicionamento contra a discriminação cultural social religiosa de sexo ou etnia podemos perceber claramente que o texto dos PCNs engajase na opção pela diversidade A questão é abordada como um compromisso a ser assumido pelas escolas através do respeito às diferenças Estas não podem ser encaradas como obstáculos à ação educativa Tal ponto é claramente abordado também em relação à eleição do termo Pluralidade Cultural como um dos temas transversais dos Parâmetros Curriculares Nacionais Essa ideia de pluralidade é de suma importância por valorizar os diferentes elementos presentes na formação do Brasil em especial a contribuição dos grupos indígenas e das populações africanas na definição de hábitos e culturas que foram incorporadas e consideradas como brasileiras Além disso os estudos regionais também sugeridos pelos PCNs atuam na construção reconhecimento e valorização de identidades e diferenças A discussão de pluralidade cultural do direito a diferença e respeito à diversidade está presente em diferentes temáticas características da contemporaneidade e estão cada vez mais presentes em nossa prática pedagógica Falaremos de algumas a seguir 142 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 4 O gênero na escola Figura 42 Les demoiselles dAvignon Picasso 1907 Ao abordar a Pluralidade Cultural e Orientação Sexual os PCNs sugerem o uso do conceito de gênero como uma tentativa de desnaturalizar os comportamentos atribuídos ao feminino e masculino Hierarquias baseadas na biologia as quais muitas vezes eram utilizadas para determinar a superioridade do masculino sobre o feminino seriam relativizadas Dessa forma aquilo que antes era considerado uma verdade natural passaria a ser analisado como um processo de construção social Para a historiadora Joan Scott a utilização do conceito de gênero é de fundamental importância uma vez que implica em Enfatizar os significados variáveis e contraditórios atribuídos à diferença sexual os processo políticos através dos quais esses significados são construídos a instabilidade e maleabilidade das categorias mulheres e homens e os modos pelos quais essas categorias se articulam em termos da outra embora de maneira não consistente ou da mesma maneira em cada momento SCOTT 1994 p 2526 Os estudos de gênero provêm de uma série de lutas e movimentos em prol dos direitos das mulheres como o sufragismo desde fins do século XIX as reivindicações por oportunidade de estudo e por acesso ao mundo do trabalho de classe média na maioria Vale lembrar que no Brasil a mulher só conquistou o direito ao voto sob o governo de Vargas em 1932 143 Filosofia da Educação CAPÍTULO 4 Ao longo da década de 60 ocorreu a consolidação do movimento feminista quando preocupações políticas e sociais passaram a dividir espaço com construções teóricas Neste período os movimentos de liberação feminina ganharam mais amplitude com a revolução sexual e os movimentos juvenis contra diferentes formas de autoritarismo que ocorriam paralelamente Os estudos direcionados à condição da mulher vão a partir de então se fundamentar no debate entre militantes do feminismo e seus críticos Tais discussões que traziam muitas vezes por predicado o engajamento direcionavamse a problematizar a forma como determinadas características sexuais são representadas ou valorizadas visto que segundo Guacira Lopes Louro 1977 p 21 é aquilo que se diz ou pensa sobre elas que vai constituir efetivamente o que é o feminino e o masculino O conceito de gênero vem portanto refutar o determinismo biológico e acentuar o caráter social de distinções anteriormente baseadas no sexo As instituições e práticas que atuam sobre o sujeito são constituídas e constituem os mesmos sendo assim difundem discursos que regulam normatizam instauram e definem verdades O gênero é portanto um elemento formativo do sujeito Neste sentido ao exercitar o conceito de gênero em sua prática pedagógica o educador se compromete a uma postura política uma vez que a escola é um espaço de produção de diferenças Essas diferenças produzidas no espaço escolar podem ser consideradas como um legado da escola moderna que classificava hierarquizava e ordenava crianças por suas idades religião grupo social e gênero Tais distinções incidiamem sobre os sujeitos em formação conformando elementos de suas subjetividades É por isso que segundo Louro 1997 p 63 nosso olhar deve se voltar especialmente para as práticas cotidianas que envolvem todos os sujeitos É tarefa do educador portanto adotar uma atitude reflexiva e desconfiada em relação aos elementos que se apresentam como naturais no que se referem aos papéis atividades brincadeiras e deveres atribuídos a meninos e meninas Tanto os métodos de ensino quanto o material didático adotado podem ser seguramente considerados locais de construção das diferenças 144 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 4 de gênero Tornase indispensável portanto questionar o que é ensinado o modo como é ensinado e especialmente os sentidos atribuídos ao que foi lecionado Identidades étnicoraciais e diversidade Pelo tipo de coisa que aconteceu aquele dia na escola eles já estavam no primeiro grau Sem dúvida estavam Foi uma tarde os dois brincavam com suas cores quando o menino marrom misturou todas as tintas que tinha na caixinha de aquarela todas as cores do arcoíris E aí sabe o resultado que deu A mistura das cores todas deu um marrom Um marrom forte como o do chocolate puro O menino marrom olhou para aquela cor que ele tinha inventado e falou Olha aí é a minha cor ZIRALDO 1986 Além das questões de gênero a etnicidade também está presente quando nos referimos às identidades culturais coexistentes no espaço escolar e na prática educativa O texto de Ziraldo citado acima publicado em 1986 pela editora Melhoramentos é neste sentido bastante elucidativo O menino marrom descreve a relação de amizade entre um menino marrom e um menino rosa Este relacionamento e o olhar infantil para determinados acontecimentos suscitam diversas discussões sobre questões de preconceito e diversidade Mas como entender afinal a diversidade A ideia de diversidade pode ser melhor compreendida se pensarmos a princípio em Identidade e Diferença 145 Filosofia da Educação CAPÍTULO 4 Figura 43 Identidades Para entender o alcance do conceito de identidade devemos compreendêla como uma experiência histórica Nessa experiência na medida em que os sujeitos se identificam com determinados elementos históricoculturais aqueles que partilham elementos em comum passam a congregar a mesma identidade Um exemplo dessa forma de se compreender a identidade são os sentimentos nacionalistas amar a pátria conhecer o hino a bandeira e se enquadrar dentro de determinadas características culturais congrega um grande número de pessoas dentro de uma unidade nacional uma identidade Essa forma de se compreender a identidade pode porém suscitar problemas uma vez que acaba transformando tais características em padrões Aqueles que eventualmente não se enquadrem nesses padrões estarão automaticamente excluídos de determinado grupo identitário A identidade foi em diferentes ocasiões utilizada como justificativa de opressão da diferença 146 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 4 Durante a Segunda Guerra Mundial o Nazismo representado por Adolf Hitler partia de um pressuposto de raça pura a Raça Ariana Para que a Alemanha fosse uma nação forte acreditavam que todos os cidadãos que não correspondessem às características arianas não deveriam fazer parte da nação Para tanto milhares foram levados aos campos de concentração e exterminados em nome da tentativa de construção de uma raça pura e identidade única Você consegue pensar em exemplos similares Registreos abaixo Reflita sobre esta questão Nos últimos anos o termo identidade vem sendo utilizado no plural na tentativa de dar visibilidade à existência de diferentes características identitárias dentro de um mesmo grupo Ao invés de valorizar exclusivamente o que as pessoas teriam em comum são as diferenças que passam a ser ressaltadas como características dos sujeitos Mas por que as diferenças começaram repentinamente a ganhar espaço e visibilidade nas discussões ligadas a educação 147 Filosofia da Educação CAPÍTULO 4 A partir da década de 1990 leis que incentivavam a permanência das crianças na escola e a expansão do ensino tornaram imperativa a convivência de diferenças socioculturais em um mesmo espaço o espaço escolar Neste o mito da democracia racial que prega a convivência harmônica e respeitosa de diferentes raças conforme anunciado por Gilberto Freyre em Casa Grande e Senzala é colocado em xeque Tal constatação é facilmente percebida quando dentre as metas estabelecidas pelo Plano Nacional de Educação encontramos a seguinte Garantir oportunidades respeito e atenção educacional às demandas específicas de estudantes com deficiência jovens e adultos defasados na relação idadesérie indígenas afrodescendentes quilombolas e povos do campoPNE 20102020 Ora se oportunidades respeito e atenção educacional para aqueles que são enquadrados dentro do que se chama diversidade ainda é uma meta isso significa que a convivência harmônica e respeitosa ainda não foi atingida Além disso a referência às contribuições dos povos afrodescendentes indígenas e imigrantes ainda é bastante restrita nos livros e materiais didáticos Podemos perceber dessa forma que a construção cultural desenvolvida durante os anos de escolarização são muitas vezes excessivamente europeizados contrário portanto à ideia de democracia racial A discussão sobre diversidade não se refere unicamente às etnias mas aspectos religiosos e culturais também são definidores identitários de suma importância tanto para o sujeito quanto para o grupo social ao qual este pertence Ao pensarmos a diversidade em âmbito teórico é importante referenciar os Estudos Multiculturalistas O multiculturalismo tem sua origem nos EUA em fins do século XIX porém sua propagação ocorreu em meados do século XX A difusão desta corrente de pensamento se deu através de conflitos étnicoraciais políticos e sociais Um dos principais objetivos era a necessidade de 148 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 4 reconhecimento das diferentes culturas Tais discussões tinham como eixos norteadores especialmente o combate ao racismo e as lutas por direitos sociais De acordo com Maria José Albuquerque da Silva doutora em Educação da Universidade do Ceará o Multiculturalismo pode ser compreendido como uma estratégia política de reconhecimento e representação da diversidade cultural Não deve ser pensado portanto fora de seus contextos de lutas Além disso questiona os métodos de construção do conhecimento e as formas através das quais estes são transmitidos nas instituições escolares Entre os pensadores que de alguma forma representam o pensamento multiculturalista podemos referenciar Stuart Hall e Peter McLaren cujos trabalhos referemse diretamente às diferenças culturais e suas implicações políticosociais Em um momento em que o niilismo e o desespero começam a impor sua própria inevitabilidade é preciso construir uma contramemória um contradiscurso uma contra prática de libertação È um tempo que nos chama a refletir sobre a forma como nós na condição de trabalhadores da cultura fomos inventados pela cultura ocidental dentro de um processo de colonização e de formação do eurocentrismo PETER McLAREN 2000 p 53 Seção 3 Educação e mídias um olhar filosófico televisores videotapes videodiscos videogames videocassetes telas de computador monitores digitais de todo tipo sempre em fluxo selecionados por vontade ou capricho suplementados por palavras números frases fragmentos todos passando por telas que num único minuto podem exibir mais quadros que uma casa holandesa próspera do século XVII comportaria no decorrer de anos GITLIN 2003 p 25 149 Filosofia da Educação CAPÍTULO 4 Figura 44 Persistência da memória Salvador Dali 1931 Vivemos em um mundo veloz onde o tempo se esvai conforme o famoso quadro de Salvador Dali A velocidade de acesso às informações parece muitas vezes maior que aquele que possuímos para interpretálas compreendêlas e relacionálas com outros elementos aos quais temos acesso Informações do mundo todo são partilhadas e divulgadas fazendo com que a ideia de novidade precise ser repensada Vivemos em uma sociedade de imediatismo crescente e necessidade de realizações momentâneas Esses elementos adentram o espaço escolar e fazem parte do cotidiano de alunos cuja geração está imersa nessas multimídias Precisamos portanto desenvolver as habilidades e competências necessárias para atuar nesta Sociedade de Rede e na cibercultura onde assistimos a virtualização de fronteiras geográficas e a emergência de novas formas de relacionamento novos espaços de sociabilidades e novas formas de ensinar Para Pierre Levy a cibercultura é o conjunto de técnicas materiais ou intelectuais de práticas de atitudes de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço LEVY 1999 p 17 O ciberespaço por sua vez se refere ao conjunto de redes virtuais nos quais circulam diversos tipos de informações 150 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 4 O sujeito da cibercultura é portanto ativo em suas escolhas no que se refere ao que quer saber ver e ouvir O acesso a informação é extremamente rápido e facilitado ao mesmo tempo em que estas informações provem de inúmeras fontes nem sempre confiáveis É papel do professor auxiliar a utilização desses recursos e propiciar o desenvolvimento do educando de forma consciente em relação ao que as multimídias e as hipertextualidades podem oferecer Essa atuação é de suma importância para que o aluno não se perca em um mar de informação e possa efetivamente ser protagonista de seu processo de construção do conhecimento Pensar na utilização das mídias e tecnologias na educação nos leva em um primeiro momento à década de 70 quando a ascensão e imposição do ensino tecnicista sem a devida discussão sobre a utilização de recursos tecnológicos em ambientes pedagógicos gerava desconforto em relação às possibilidades das multimídias Além disso o investimento em tecnologias era irrisório limitando se a alguns colégios expoentes tais como as escolas técnicas e o glorioso Pedro II Na época as tecnologias aplicadas ao ensino eram olhadas com desconfiança pelo receio de que poderiam substituir o professor em sua função ou que não acrescentariam conteúdos efetivos a prática educativa Esses elementos fizeram com que o entusiasmo pela inovação fosse metodicamente cerceado Apenas a partir da década de 90 é possível perceber um olhar mais significativo para o uso das tecnologias no espaço educativo As tecnologias passaram a representar uma inovação ao mediar a prática pedagógica e possibilitar a ampliação de funções cognitivas Isso não representou um total engajamento ao uso das tecnologias na educação A resistência à utilização das mídias continuou e continua bastante presente Bachelard no primeiro quartel do século XX já anunciara semelhante resistência argumentando que a mesma se converteria em um obstáculo epistemológico É como um contrapensamento conflitivo Uma inércia vivenciada durante o processo de aprendizagem Tal inércia fruto de inseguranças na maioria das vezes é gerada pelo saber prévio como uma forma de defesa e garantia A novidade neste caso a utilização das mídias e tecnologias representa um elemento desestabilizador 151 Filosofia da Educação CAPÍTULO 4 do conhecimento outrora construído e sendo assim acaba por ser refutada As tecnologias digitais possibilitam a reconstrução de uma nova cartografia espaçotempo Elas não fornecem apenas o acesso rápido às informações como também propõem interações com diferentes pessoas em diferentes lugares Para Pierre Levy a internet desde que se tenha acesso a ela oportuniza uma ampla democratização da informação afinal sua pluralidade e diversidade são ilimitadas Fazemse presentes atualmente tanto nas esferas da vida cotidiana quanto nas atividades de ensinoaprendizagem As TICs tecnologias de informação e comunicação não devem ser encaradas como ferramentas redentoras da educação uma vez que são as pessoas que devem dar sentido às informações Registre em um pequeno parágrafo como você utiliza as tecnologias de informação e comunicação em seu cotidiano Quais sites visita A internet é uma ferramenta de estudo para você Reflita sobre esta questão 152 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 4 Além da incorporação das tecnologias ao ensino presencial não podemos olvidar o quão significativas e facilitadoras são para o desenvolvimento do Ensino a Distância Essa modalidade que já existe há muito tempo e se desenvolvia por meio de correspondências é potencializada através das multimídias A facilidade de acesso a informação conforme dito anteriormente somados a possibilidade de comunicação interação e contato entre professores tutores e alunos fazem com que a modalidade esteja em plena ascensão possibilitando e democratizando na medida do possível o acesso a educação formal Certamente que as estruturas tradicionais de ensino centralizadas na figura do professor como mantenedor do conhecimento acaba trazendo empecilhos para a funcionalidade desses meios midiáticos Segundo o especialista em ensino presencial e a distância José Manuel Moran Mesmo com tecnologias de ponta ainda temos grandes dificuldades no gerenciamento emocional tanto no pessoal como no organizacional o que dificulta o aprendizado rápido As mudanças na educação dependem mais do que das novas tecnologias de termos educadores gestores e alunos maduros intelectual emocional e eticamente pessoas curiosas entusiasmadas abertas que saibam motivar e dialogar pessoas com as quais valha a pena entrar em contato porque dele saímos enriquecidos São poucos os educadores que integram teoria e prática e que aproximam o pensar do viver MORAN 2007 Nessa sociedade que chamamos de globalizada as novas TICs possibilitam autonomia interatividade criatividade e outros elementos que podem contribuir com o processo educativo Para tanto é necessário que se discuta e reflita sobre as possibilidades 153 Filosofia da Educação CAPÍTULO 4 de uso sem no entanto limitar a educação às mesmas É papel das instituições e especialmente dos sujeitos ligados à prática pedagógica romper obstáculos possibilitando assim um maior equilíbrio nas relações estabelecidas com a tecnologia e as possibilidades que esta tem a oferecer 154 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 4 Síntese do capítulo A PósModernidade é a designação atribuída ao período no qual vivemos É caracterizado pela velocidade dos acontecimentos e informações pela globalização pela diversidade cultural religiosa e de gênero As dificuldades em analisála devemse entre outros fatores por não termos distanciamento temporal afinal se trata do período contemporâneo Atualmente estudamos os sujeitos a partir do conceito de identidades culturais Isso significa um sujeito heterogêneo o qual se reconhece com inúmeros elementos e dessa forma faz com que a sociedade moderna seja igualmente heterogênea Entre as formas de abordar esta heterogeneidade em sala de aula temos as noções de diversidade e do multiculturalismo que permitem valorizar as diferenças em sala de aula fazendo delas um elemento de construção do conhecimento As novas tecnologias são características da sociedade contemporânea e com a devida reflexão podem ser utilizadas em prol de uma proposta pedagógica inovadora e dialógica Você pode anotar a síntese do seu processo de estudo nas linhas a seguir 155 Filosofia da Educação CAPÍTULO 4 Atividades de aprendizagem 1 A partir da leitura e reflexão sobre o capítulo que acabamos de estudar monte estratégias de aulas sobre os temas Gênero ou Diversidade Cultural Como você abordaria esses temas e como utilizaria o suporte das tecnologias nessa atividade Descreva abaixo suas ideias 156 Universidade do Estado de Santa Catarina CAPÍTULO 4 2 Muito se tem falado a respeito do desinteresse dos alunos de Educação Básica sobre os conteúdos ministrados em sala de aula Algumas pessoas afirmam que a utilização das multimídias é uma forma de cativar e ganhar a atenção dos estudantes Você concorda com esta afirmação Justifique sua resposta 157 Filosofia da Educação CAPÍTULO 4 Aprenda mais Livros BERMAN Marshal Tudo que é sólido desmancha no ar São Paulo Companhia das letras 1986 LYOTARD JeanFrançois A Condição PósModerna Rio de Janeiro José Olympio 2002 SILVA Tomaz Tadeu da O Sujeito da Educação estudos foucautianos Petrópolis Vozes 2002 LOURO Guacira Gênero sexualidade e educação Petrópolis Vozes 1997 MCLAREN Peter Multiculturalismo Revolucionário Porto Alegre ArtMed 2000 MORAN José Manuel A educação que desejamos novos desafios e como chegar lá Rio de Janeiro Papirus 2007 BACHELARD Gaston A formação do espírito científico Rio de Janeiro Contraponto 1996 FREIRE Paulo Pedagogia da Indignação cartas pedagógicas e outros escritos São Paulo UNESP 2000 Para a discussão sobre multiculturalismo na escola sugerimos o filme Entre os muros da Escola Sony Pictures ClassicsImovision 2007 Direção Laurent Cantet Considerações finais Caroa estudante Estamos chegando ao final de nosso trajeto pela Filosofia da Educação Além de entrar em contato com diferentes pensadores modelos de racionalidade e de projetos para a educação esperamos que você possa experimentar a prática filosófica A Filosofia muito mais que um exercício de reflexão é uma forma de perceber e atuar no mundo É uma leitura diferenciada problematizadora repleta de contradições Um caminho de pequenas revoluções cotidianas A prática pedagógica tornase muito mais rica e produtiva quando temos a concepção de que tudo o que acontece ao nosso redor pode ser questionado repensado e transformado Daqui resulta o salto qualitativo da prática em práxis social comprometida Esta aliás é uma das grandes responsabilidades daqueles que se dedicam à educação A possibilidade de transformação e atuação no sentido de auxiliar a construção de um mundo mais justo ético e igualitário Como se pode perceber ao longo do Caderno Pedagógico estudado alguns pensadores ideias e temáticas carecem de aprofundamento por isso o ambiente virtual oportunizará maior dialogicidade e colaborará no aprofundamento dos seus estudos por meio de fóruns chats biblioteca midiateca e outras ferramentas de interação Esperamos que a companhia de Sócrates Aristóteles Santo Agostinho Tomás de Aquino Kant Rousseau Marx e tantos outros tenham apresentado a você diferentes formas de se pensar e posicionar no mundo em que vivemos e que as aprendizagens e discussões propostas possam acompanhálo ao longo de sua jornada acadêmica e profissional Bons Estudos Professores Caroline Jaques Cuba e Lidnei Ventura Conhecendo os professores AUTORES Caroline Jaques Cubas Possui graduação em História pela Universidade do Vale do Itajaí 2002 especialização em História pela Universidade do Estado de Santa Catarina 2006 e mestrado em História pela Universidade Federal de Santa Catarina 2007 Tem experiência na área de História com ênfase em História do Brasil República nas discussões que se referem às questões de identidades e etnicidades Atua principalmente nos seguintes temas religiosidade corpo subjetividades Apresenta grande interesse por aspectos teóricos e metodológicos do fazer historiográfico assim como seus possíveis entrecruzamentos com Literatura e Filosofia Atualmente é professora colaboradora do Centro de Educação a Distância CEAD da Universidade do Estado de Santa Catarina UDESC ministrando as disciplinas de Filosofia da Educação e História da Educação Lidnei Ventura Possui graduação em Pedagogia Habilitação Orientação Educacional pela Universidade do Estado de Santa Catarina UDESC Especialização em Alfabetização pela UDESC e Mestrado em Educação e Cultura pela UDESC 1999 Trabalha como Orientador Educacional da Prefeitura Municipal de Florianópolis desde 1994 Atuou como professor titular da Universidade do Vale do Itajaí no curso de graduação em Pedagogia Educação Infantil e Séries Iniciais de 2002 a 2005 Atuou como colaborador no curso de Pedagogia Magister do Centro de Ciências da Educação e no Curso de Pedagogia a Distância do Centro de Educação a Distância UDESC Trabalhou em cursos de especialização na área da educação na UDESC e CESUSC Atuou como Consultor Geral na Rede de Educação de Jovens e Adultos do município de Palhoça em 2007 Tem experiência na área de Educação com ênfase na formação de professores e produção de material didático em Educação Presencial e a Distância atuando desde educação infantil ensino fundamental e superior principalmente nos seguintes temas Educação Pedagogia Epistemologia Didática Alfabetização Ensinoaprendizagem e Concepções pedagógicas Atualmente é professor colaborador do Centro de Educação a Distância CEAD da Universidade do Estado de Santa Catarina UDESC ministrando as disciplinas de Filosofia da Educação e Organização e Gestão da Escola Brasileira 162 PARECERISTA Sergio Sell Possui graduação em Filosofia pela Universidade Federal de Santa Catarina Licenciatura 1999 e Bacharelado 1995 e mestrado em LetrasLingüística pela Universidade Federal de Santa Catarina 2002 Atualmente é professor da Universidade do Sul de Santa Catarina UNISUL com atuação na modalidade presencial desde 2000 e no ensino a distância na UNISUL Virtual desde 2005 Atua também como professor efetivo da rede pública estadual na disciplina de Filosofia para o ensino médio Na modalidade presencial leciona disciplinas de Filosofia Filosofia Ética Filosofia da Ciência Lógica e de aspectos metodológicos e textuais da redação científica Ciência e Pesquisa Leitura e Produção Textual TCC além de orientar estágios e monografias nos cursos de Pedagogia e Filosofia No ensino a distância atua como conteudista de materiais didáticos para EaD e como professortutor de disciplinas nesta modalidade Filosofia antiga metodologia da investigação filosófica e Lógica No ensino médio leciona a disciplina de Filosofia e coordena um grupo local de discussões sobre metodologia do ensino das ciências humanas e elaboração de materiais didáticos para ensino médio Atuou como professor substituto no Departamento de Filosofia da Universidade Federal de Santa Catarina 1998 1999 como professor horista no Curso de Pedagogia da Universidade do Vale do Itajaí 20002003 e também no Curso de Pedagogia da Faculdade Municipal de Palhoça 2010 Comentários das atividades Capítulo 1 1 O conhecimento filosófico segundo o professor Dermeval Saviani tem como característica ser rigoroso radical e de conjunto Expli que brevemente a importância desses três conceitos relacionan doas com o conhecimento do senso comum O conhecimento filosófico é rigoroso por se tratar de uma forma sistemática de pensar pressupondo também um método de organização e exposição das ideias É radical porque vai à raiz aos fundamentos de determinado conceito E é de conjunto porque aspira à universalidade ou seja à totalidade relacionando os fenômenos entre si e estes com a realidade humana O senso comum por sua vez situase no âmbito da opinião particular ou evoca tradições ou crenças não se constituindo como um sistema explicativo do homem ou da realidade humana 2 Como podemos desenvolver trabalhos em sala de aulas que este jam de acordo com as tendências atuais da filosofia da educação Que temáticas devem ser privilegiadas e por quê Nessa questão você deve refletir sobre a contemporaneidade e relacionála às temáticas de identidades e diversidade as quais muitas vezes não são contempladas em materiais didáticos ou mesmo em planos de ensino Capitulo 2 1 Como é longo este capítulo sobretudo por consubstanciar as principais correntes filosóficas e pensadores que estão nas bases da racionalidade ocidental e principalmente para sistematizar melhor suas contribuições sugerimos a elaboração de um quadro conceitual contendo a tendência filosófica estudada o período histórico e as idéias principais Abaixo postamos um quadro referencial 164 PERÍODO HISTÓRICO CORRENTEPENSADOR IDEIAS PRINCIPAIS Sugerimos que o quadro seja iniciado com o conhecimento mítico passando pelos filósofos présocráticos em bloco e detalhando as ideias dos filósofos clássicos Sócrates Platão e Aristóteles Em seguida o quadro continua detalhando as correntes do helenismo e termina com o pensamento filosófico medieval de Santo Agostinho e São Tomaz de Aquino Capitulo 3 1 Aponte os principais pensadores modernos e relacione suas contribuições na reflexão sobre a educação Nessa questão você deve procurar os filósofos citados ao longo do capítulo e destacar o que cada um deles pensava a respeito da Educação Pense que estas reflexões sempre estão relacionadas com o período vivido pelo filósofo em questão 2 De que forma a Filosofia da Práxis auxilia na compreensão do ato educativo como uma prática transformadora Ao aplicar as categorias da Filosofia da Práxis ao ato educativo busca se a totalidade dos fenômenos que condicionam esse fenômeno e principalmente seus agentes Nesta complexa rede de relações o educador é um sujeito cujo agir é teóricoprático ou seja por mais que não se dê conta dos fundamentos que norteiam sua ação não deixa de expressar pela sua prática determinada teoria Estando consciente dos pressupostos teóricopráticos que norteiam sua ação educativa a ação pedagógica pode se converter em prática transformadora na medida em que explicita as contradições sociais postas no modelo social 165 Capitulo 4 1 A partir da leitura e reflexão sobre o capítulo que acabamos de estudar monte estratégias de aulas sobre os temas Gênero ou Diversidade Cultural Como você abordaria esses temas e como utilizaria o suporte das tecnologias nessa atividade Descreva abaixo suas idéias Neste momento você deve estruturar um plano de aula que aborde um dos temas propostos Lembre de indicar o tema escolhido o objetivo os conteúdos possíveis e os encaminhamentos para o desenvolvimento destes conteúdos Durante os encaminhamentos tente incorporar o suporte das tecnologias em algum momento de seu planejamento 2 Muito se tem falado a respeito do desinteresse dos alunos de educação básica sobre os conteúdos ministrados em sala de aula Algumas pessoas afirmam que a utilização das multimídias é uma forma de cativar e ganhar a atenção dos estudantes Você concorda com esta afirmação Justifique sua resposta Essa questão parte de um posicionamento pessoal Seja qual for é de suma importância que você construa seu argumento a partir do que foi estudado ao longo do capítulo 4 Referências ALVES Gilberto Luis A produção da escola pública contemporânea Campinas Autores Associados 2000 ADORNO Theodor W HORKHEIMER Max Dialética do esclarecimento fragmentos filosóficos Rio de Janeiro Zahar 1985 ANDERY Maria Amália Org Para compreender a ciência uma perspectiva histórica Rio de Janeiro Espaço e Tempo São Paulo EDUC 1988 ARANHA M L de Arruda MARTINS M H Pires Filosofando introdução à filosofia São Paulo Moderna 1993 A Filosofia da educação 2 ed São Paulo Moderna 1996 BACHELARD Gaston A formação do espírito científico Rio de Janeiro Contraponto 1996 BERMAN Marshal Tudo que é sólido desmancha no ar São Paulo Companhia das letras 1986 BRASIL Secretaria de Educação Fundamental Parâmetros curriculares nacionais introdução aos parâmetros curriculares nacionais Brasília MEC SEF 1997 BRUNEL Pierre Org Dicionário de mitos literários Rio de Janeiro José Olympio 2000 CHÂTELET F Dir História da filosofia idéias doutrinas v 1 Rio de Janeiro Zahar Editores 1973 CHATELET François Uma história da razão entrevistas com Emile Noel Rio de Janeiro Jorge Zahar 1994 CHAUÍ Marilena Introdução à história da Filosofia dos présocráticos a Aristóteles v 1 São Paulo Brasiliense 1994 Convite à Filosofia12 ed São Paulo Ática 2002 168 DEON Everson et al Filosofia Moderna e Contemporânea Caderno Pedagógico II Curso de Pedagogia a Distância 3 ed Florianópolis UDESC 2002 DESCARTES René Discurso do método São Paulo Abril Cultura 1973 DEVECHI Catia Piccolo Viero Racionalidade comunicativa e a fundamentação da educação no contexto do pensamento pósmetafísico Programa de PósGraduação em Educação Tese Universidade Federal de Santa Catarina 2008 DIMENSTEIN STRECKER GIANSANTI Dez Lições de Filosofia para um Brasil Cidadão São Paulo FTD 2003 DURANT Will História da filosofia a vida e as idéias dos grandes filósofos Trad Godofredo Rangel e Monteiro Lobato São Paulo Companhia Editora Nacional 1940 ENGELS Friedrich A dialética da natureza 4 ed Rio de Janeiro Paz e Terra 1985 FREIRE Paulo Pedagogia da Indignação cartas pedagógicas e outros escritos São Paulo UNESP 2000 Pedagogia do oprimido 17 ed Rio de Janeiro Paz e Terra 1970 FERREIRA Sueli O professor e a prática dialógica um foca na construção do sentido funcional Revista Profissão Docente Uberaba Uniube v3 n 8 2003 GHIRALDELLI JÚNIOR Paulo Introdução à filosofia São Paulo Manole 2003 O que é filosofia da educação São Paulo DPA 2002 Filosofia da educação São Paulo Ática 2006 GILLES Thomas Ranson Filosofia da Educação São Paulo EPU 1983 GITLIN Todd Mídias sem Limite Tradução de Maria Beatriz de Medina Rio de Janeiro Civilização Brasileira 2003 169 GOERGEN Pedro Questões impertinentes para a Filosofia da educação Educação e Pesquisa USP São Paulo v 32 n3 p 589606 setdez 2006 GOMES Roberto Crítica da razão tupiniquim 11 ed São Paulo FTD 1994 Coleção prazer em conhecer GRAMSCI Antonio Concepção dialética da história Rio de Janeiro Civilização Brasileira 1986 HALL Stuart Identidade cultural São Paulo Fundação Memorial da América Latina 1997 HARVEY David Condição pósmoderna uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural São Paulo Loyola 1994 HOBSBAWN Eric Era dos Extremos o breve século XX São Paulo Cia das Letras 1995 JASPERS K Introdução ao pensamento filosófico São Paulo Cultrix 1971 KANT Immanuel Sobre a Pedagogia 3 ed Piracicaba Unimep 2002 Disponível em httpswwweadufrgsbrroodabibliotecaabrirArquivo phpturmas9281materiais11151pdf Acesso em 01 fev 2011 KECHIKIAN A Org Os filósofos e a educação Lisboa 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Juliani Filosofia de suas origens gregas ao renascimento Caderno Pedagógico I Curso de Pedagogia a Distância Florianópolis UDESC 2003 SILVA Tomaz Tadeu da Teoria Cultural e Educação um vocabulário Crítico Belo Horizonte Autêntica 2000 O Sujeito da Educação estudos foucautianos 5 ed Petrópolis Vozes 2002 172 VEIGANETO Alfredo Foucault e a Educação Belo Horizonte Autêntica 2003 VIEIRA Liszt Nietzsche e a reversão do platonismo Disponível em http www4sharedcomfile2457129388c2a9836Nietzscheeareversodoplato html Acesso em 1 dez 2010 VOLTAIRE Cândido Rio de Janeiro Newton Compton Brasil 2000 ZIRALDO O menino marrom São Paulo Melhoramentos 1986 Referências das figuras Figura 11 Pág 21 O Pensador de Auguste Rodin 18401917 Fonte Disponível em httpwwwsxchuphoto455452 Acesso em 13 jun 2011 Figura 12 Pág 32 Charge Educação Bancária Fonte Disponível em httprizomasnetchargessobre educacaohtml Acesso em 01 fev 2011 Figura 13 Pág 35 O Pensador Fonte Disponível em httpwwwovermundocombr uploadsbancomultiplas12445876811228326768h11jpg Acesso em 13 jun 2011 GRÉCIA ATENAS MAR EGEU PELOPONESO Figura 21 Pág 54 Mapa da Grécia clássica Fonte Equipe CEAD 2011 Figura 22 Pág 56 Parmênides e Heráclito Fonte adaptado de httpwwwsiasatemacomImages NewsLargPic2111390IMAGE634381115506780596jpg e de httpfilosofiadoveritasfileswordpresscom201104 fdias1jpg Acesso em 1 dez 2010 Figura 23 Pág 61 Louis David 1787 Óleo sobre tela 130 x 196 cm Metropolitan Museum of Art New York Fonte Disponível em httppolyphreniablogspot com200611mortedescrates26html Acesso em 1 dez 2010 Figura 24 Pág 64 Conhecete a ti mesmo Fonte Disponível emhttprevistatpmuolcombrrevista71 colunasaquiagorahtml Acesso em 1 dez 2010 Figura 25 Pág 68 Escola de Atenas Fonte Disponível em httpuploadwikimediaorgwikipedia commonscc8RafaelEscoladeAtenasjpg Acesso 1 dez 2010 174 Figura 26 Pág 69 Platão e Timeo Fonte Disponível emhttpuploadwikimediaorgwikipedia commons998Sanzio01PlatoAristotlejpg Acesso em 1 dez 2010 Figura 27 Pág 93 Regime feudal Fonte Disponível em http4bpblogspot com7u399TXmUbIS9huL056g9I AAAAAAAAAAc2pRaWle0bDIs1600feudodesjpg Acesso em 01 fev 2011 Figura 31 Pág 100 O homem vitruviano desenho feito por Leonardo Davinci por volta de 1490 Fonte Disponível em httpwwwchazitcomimages vitruvianojpg Acesso em 1 dez 2010 Figura 32 Pág 104 Erasmo Rabelais e Montaigne Fonte Erasmohttpwwwfilosofiacombrfigurasbiblioteca Erasmo20de20Roterdajpg Rabelais httpuploadwikimediaorgwikipediacommons thumb88dFrancoisRabelaisPortraitjpg250px FrancoisRabelaisPortraitjpg Montaigne httpwwwhenriivculturefrmediascommuns imagesgrandformat13904jpg Acesso em 13 jun 2011 Figura 41 Pág 136 Olhares Fonte Equipe CEAD 2011 Figura 42 Pág 140 Les demoiselles dAvignon Picasso 1907 Fonte httpwwwmomaorgcollectionimagesresized271 w500h420CRI151271jpg Acesso em 13 jun 2011 Figura 43 Pág 145 Identidades Ilustração de Filipi Amorin Figura 44 Pág 147 Persistência da memória 1931 Fonte Disponível em httpwwwauthenticsocietycomImages AtomsArtPaintingpersistenceofmemorydalilowestres jpg Acesso em 13 jun 2011