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JOÃO GUIMARÃES ROSA COMPANHIA DAS LETRAS GRANDE SERTÃO VEREDAS GUIMARÃES ROSA GRANDE SERTÃO VEREDAS EDITORA NOVA AGUILAR 1994 João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 2 PRIMEIRA EDIÇÃO 1994 BIBLIOTECA LUSOBRASILEIRA SÉRIE BRASILEIRA JOÃO GUIMARÃES ROSA FICÇÃO COMPLETA EM DOIS VOLUMES VOLUME II João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 3 NONADA TIROS QUE O SENHOR ouviu foram de briga de homem não Deus esteja Alvejei mira em árvores no quintal no baixo do córrego Por meu acerto Todo dia isso faço gosto desde mal em minha mocidade Daí vieram me chamar Causa dum bezerro um bezerro branco erroso os olhos de nem ser se viu e com máscara de cachorro Me disseram eu não quis avistar Mesmo que por defeito como nasceu arrebitado de beiços esse figurava rindo feito pessoa Cara de gente cara de cão determinaram era o demo Povo prascóvio Mataram Dono dele nem sei quem for Vieram emprestar minhas armas cedi Não tenho abusões O senhor ri certas risadas Olhe quando é tiro de verdade primeiro a cachorrada pega a latir instantaneamente depois então se vai ver se deu mortos O senhor tolere isto é o sertão Uns querem que não seja que situado sertão é por os camposgerais a fora a dentro eles dizem fim de rumo terras altas demais do Urucuia Toleima Para os de Corinto e do Curvelo então o aqui não é dito sertão Ah que tem maior Lugar sertão se divulga é onde os pastos carecem de fechos onde um pode torar dez quinze léguas sem topar com casa de morador e onde criminoso vive seu cristojesus arredado do arrocho de autoridade O Urucuia vem dos montões oestes Mas hoje que na beira dele tudo dá fazendões de fazendas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 4 almargem de vargens de bom render as vazantes culturas que vão de mata em mata madeiras de grossura até ainda virgens dessas lá há O gerais corre em volta Esses gerais são sem tamanho Enfim cada um o que quer aprova o senhor sabe pão ou pães é questão de opiniães O sertão está em toda a parte Do demo Não gloso Senhor pergunte aos moradores Em falso receio desfalam no nome dele dizem só o QueDiga Vote não Quem muito se evita se convive Sentença num Aristides o que existe no buritizal primeiro desta minha mão direita chamado a VeredadaVacaMansadeSantaRita todo o mundo crê ele não pode passar em três lugares designados porque então a gente escuta um chorinho atrás e uma vozinha que avisando Eu já vou Eu já vou que é o capiroto o quediga E um José Simpilício quem qualquer daqui jura ele tem um capeta em casa miúdo satanazim preso obrigado a ajudar em toda ganância que executa razão que o Simpilício se empresa em vias de completar de rico Apre por isso dizem também que a besta pra ele rupeia nega de banda não deixando quando ele quer amontar Superstição José Simpilício e Aristides mesmo estão se engordando de assim nãoouvir ou ouvir Ainda o senhor estude agora mesmo nestes dias de época tem gente porfalando que o Diabo próprio parou de passagem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 5 no Andrequicé Um Moço de fora teria aparecido e lá se louvou que para aqui vir normal a cavalo dum diaemeio ele era capaz que só com uns vinte minutos bastava porque costeava o Rio do Chico pelas cabeceiras Ou também quem sabe sem ofensas não terá sido por um exemplo até mesmo o senhor quem se anunciou assim quando passou por lá por prazido divertimento engraçado Háde não me dê crime sei que não foi E mal eu não quis Só que uma pergunta em hora às vezes clareia razão de paz Mas o senhor entenda o tal moço se há quis mangar Pois hem que despontar o Rio pelas nascentes será a mesma coisa que um se redobrar nos internos deste nosso Estado nosso custante viagem de uns três meses Então Que Diga Doideira A fantasiação E o respeito de dar a ele assim esses nomes de rebuço é que é mesmo um querer invocar que ele forme forma com as presenças Não seja Eu pessoalmente quase que já perdi nele a crença mercês a Deus é o que ao senhor lhe digo à puridade Sei que é bem estabelecido que grassa nos SantosEvangelhos Em ocasião conversei com um rapaz seminarista muito condizente conferindo no livro de rezas e revestido de paramenta com uma vara de mariapreta na mão proseou que ia adjutorar o padre para extraírem o Cujo do corpo vivo de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 6 uma velha na CachoeiradosBois ele ia com o vigário do CampoRedondo Me concebo O senhor não é como eu Não acreditei patavim Compadre meu Quelemém descreve que o que revela efeito são os baixos espíritos descarnados de terceira fuzuando nas piores trevas e com ânsias de se travarem com os viventes dão encosto Compadre meu Quelemém é quem muito me consola Quelemém de Góis Mas ele tem de morar longe daqui na Jijujã Vereda do Buriti Pardo Arres me deixe lá que em endemoninhamento ou com encosto o senhor mesmo deverá de ter conhecido diversos homens mulheres Pois não sim Por mim tantos vi que aprendi RinchaMãe Sangue dOutro o MuitosBeiços o RasgaemBaixo FacaFria o FanchoBode um Treciziano o Azinhavre o Hermógenes Deles punhadão Se eu pudesse esquecer tantos nomes Não sou amansador de cavalos E mesmo quem de si de ser jagunço se entrete já é por alguma competência entrante do demônio Será não Será De primeiro eu fazia e mexia e pensar não pensava Não possuía os prazos Vivi puxando difícil de dificel peixe vivo no moquém quem mói no aspro não fantaseia Mas agora feita a folga que me vem e sem pequenos dessossegos estou de range rede E me inventei neste gosto de especular idéia O diabo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 7 existe e não existe Dou o dito Abrenúncio Essas melancolias O senhor vê existe cachoeira e pois Mas cachoeira é barranco de chão e água se caindo por ele retombando o senhor consome essa água ou desfaz o barranco sobra cachoeira alguma Viver é negócio muito perigoso Explico ao senhor o diabo vige dentro do homem os crespos do homem ou é o homem arruinado ou o homem dos avessos Solto por si cidadão é que não tem diabo nenhum Nenhum é o que digo O senhor aprova Me declare tudo franco é alta mercê que me faz e pedir posso encarecido Este caso por estúrdio que me vejam é de minha certa importância Tomara não fosse Mas não diga que o senhor assisado e instruído que acredita na pessoa dele Não Lhe agradeço Sua alta opinião compõe minha valia Já sabia esperava por elajá o campo Ah a gente na velhice carece de ter sua aragem de descanso Lhe agradeço Tem diabo nenhum Nem espírito Nunca vi Alguém devia de ver então era eu mesmo este vosso servidor Fosse lhe contar Bem o diabo regula seu estado preto nas criaturas nas mulheres nos homens Até nas crianças eu digo Pois não é ditado menino trem do diabo E nos usos nas plantas nas águas na terra no vento Estrumes O diabo na rua no meio do redemunho João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 8 Hem Hem Ah Figuração minha de pior pra trás as certas lembranças Mal hajame Sofro pena de contar não Melhor se arrepare pois num chão e com igual formato de ramos e folhas não dá a mandioca mansa que se come comum e a mandiocabrava que mata Agora o senhor já viu uma estranhez A mandiocadoce pode de repente virar azangada motivos não sei às vezes se diz que é por replantada no terreno sempre com mudas seguidas de manaíbas vai em amargando de tanto em tanto de si mesma toma peçonhas E ora veja a outra a mandiocabrava também é que às vezes pode ficar mansa a esmo de se comer sem nenhum mal E que isso é Eh o senhor já viu por ver a feiúra de ódio franzido carantonho nas faces duma cobra cascavel Observou o porco gordo cada dia mais feliz bruto capaz de pudesse roncar e engolir por sua suja comodidade o mundo todo E gavião corvo alguns as feições deles já representam a precisão de talhar para adiante rasgar e estraçalhar a bico parece uma quicé muito afiada por ruim desejo Tudo Tem até tortas raças de pedras horrorosas venenosas que estragam mortal a água se estão jazendo em fundo de poço o diabo dentro delas dorme são o demo Se sabe E o demo que é só assim o significado dum azougue maligno tem ordem de seguir o caminho dele tem licença para campear Arre ele está misturado em tudo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 9 Que o que gasta vai gastando o diabo de dentro da gente aos pouquinhos é o razoável sofrer E a alegria de amor compadre meu Quelemém diz Família Deveras É e não é O senhor ache e não ache Tudo é e não é Quase todo mais grave criminoso feroz sempre é muito bom marido bom filho bom pai e é bom amigodeseusamigos Sei desses Só que tem os depois e Deus junto Vi muitas nuvens Mas em verdade filho também abranda Olhe um chamado Aleixo residente a légua do Passo do Pubo no da Areia era o homem de maiores ruindades calmas que já se viu Me agradou que perto da casa dele tinha um açudinho entre as palmeiras com traíras praalmas de enormes desenormes ao real que receberam fama o Aleixo dava de comer a elas em horas justas elas se acostumaram a se assim das locas para papar semelhavam ser peixes ensinados Um dia só por graça rústica ele matou um velhinho que por lá passou desvalido rogando esmola O senhor não duvide tem gente neste aborrecido mundo que matam só para ver alguém fazer careta Eh pois empós o resto o senhor prove vem o pão vem a mão vem o são vem o cão Esse Aleixo era homem afamilhado tinha filhos pequenos aqueles eram o amor dele todo despropósito Dê bem que não nem um ano estava passado de se matar o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 10 velhinho pobre e os meninos do Aleixo aí adoeceram Andaço de sarampão se disse mas complicado eles nunca saravam Quando então sararam Mas os olhos deles vermelhavam altos numa inflama de sapiranga à rebelde e susseguinte o que não sei é se foram todos duma vez ou um logo e logo outro e outro eles restaram cegos Cegos sem remissão dum favinho de luz dessa nossa O senhor imagine uma escadinha três meninos e uma menina todos cegados Sem remediável O Aleixo não perdeu o juizo mas mudou ah demudou completo agora vive da banda de Deus suando para ser bom e caridoso em todas suas horas da noite e do dia Parece até que ficou o feliz que antes não era Ele mesmo diz que foi um homem de sorte porque Deus quis ter pena dele transformar para lá o rumo de sua alma Isso eu ouvi e me deu raiva Razão das crianças Se sendo castigo que culpa das hajas do Aleixo aqueles meninozinhos tinham Compadre meu Quelemém reprovou minhas incertezas Que por certo noutra vida revirada os meninos também tinham sido os mais malvados da massa e peça do pai demônios do mesmo caldeirão de lugar Senhor o que acha E o velhinho assassinado eu sei que o senhor vai discutir Pois também Em ordem que ele tinha um pecado de crime no João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 11 corpo por pagar Se a gente conforme compadre meu Quelemém é quem diz se a gente torna a encarnar renovado eu cismo até que inimigo de morte pode vir como filho do inimigo Mire veja se me digo tem um sujeito Pedro Pindó vizinho daqui mais seis léguas homem de bem por tudo em tudo ele e a mulher dele sempre sidos bons de bem Eles têm um filho duns dez anos chamado Valtei nome moderno é o que o povo daqui agora apreceia o senhor sabe Pois essezinho essezim desde que algum entendimento alumiou nele feito mostrou o que é pedido madrasto azedo queimador gostoso de ruim de dentro do fundo das espécies de sua natureza Em qual que judia ao devagar de todo bicho ou criaçãozinha pequena que pega uma vez encontrou uma crioula benta bêbada dormindo arranjou um caco de garrafa lanhou em três pontos a popa da perna dela O que esse menino babeja vendo é sangrarem galinha ou esfaquear porco Eu gosto de matar uma ocasião ele pequenino me disse Abriu em mim um susto porque passarinho que se debruça o vôo já está pronto Pois o senhor vigie o pai Pedro Pindó modo de corri gir isso e a mãe dão nele de miséria e mastro botam o menino sem comer amarram em árvores no terreiro ele nu nuelo mesmo em junho frio lavram o corpinho dele na peia e na taca depois limpam a pele do sangue com cuia de salmoura João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 12 A gente sabe espia fica gasturado O menino já rebaixou de magreza os olhos entrando carinha de ossos encaveirada e entisicou o tempo todo tosse tossura da que puxa secos peitos Arre que agora visível o Pindó e a mulher se habituaram de nele bater de pouquinho em pouquim foram criando nisso um prazer feio de diversão como regulam as sovas em horas certas confortáveis até chamam gente para ver o exemplo bom Acho que esse menino não dura já está no blimbilim não chega para a quaresma que vem Uêuê então Não sendo como compadre meu Quelemém quer que explicação é que o senhor dava Aquele menino tinha sido homem Devia em balanço terríveis perversidades Alma dele estava no breu Mostrava E agora pagava Ah mas acontece quando está chorando e penando ele sofre igual que se fosse um menino bonzinho Ave vi de tudo neste mundo lá vi até cavalo com soluço o que é a coisa mais custosa que há Bem mas o senhor dirá deve de e no começo para pecados e artes as pessoas como por que foi que tanto emendado se começou Ei ei aí todos esbarram Compadre meu Quelemém também Sou só um sertanejo nessas altas idéias navego mal Sou muito pobre coitado Inveja minha pura é de uns conforme o senhor com toda leitura e suma João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 13 doutoração Não é que eu esteja analfabeto Soletrei anos e meio meante cartilha memória e palmatória Tive mestre Mestre Lucas no Curralinho decorei gramática as operações regradetrês até geografia e estudo pátrio Em folhas grandes de papel com capricho tracei bonitos mapas Ah não é por falar mas desde o começo me achavam sofismado de ladino E que eu merecia de ir para cursar latim em Aula Régia que também diziam Tempo saudoso Inda hoje apreceio um bom livro despaçado Na fazenda O Limãozinho de um meu amigo Vito Soziano se assina desse almanaque grosso de logogrifos e charadas e outras divididas matérias todo ano vem Em tanto ponho primazia é na leitura proveitosa vida de santo virtudes e exemplos missionário esperto engambelando os índios ou São Francisco de Assis Santo Antônio São Geraldo Eu gosto muito de moral Raciocinar exortar os outros para o bom caminho aconselhar a justo Minha mulher que o senhor sabe zela por mim muito reza Ela é uma abençoável Compadre meu Quelemém sempre diz que eu posso aquietar meu temer de consciência que sendo bemassistido terríveis bonsespíritos me protegem Ipe Com gosto Como é de são efeito ajudo com meu querer acreditar Mas nem sempre posso O senhor saiba eu toda a minha vida pensei por mim forro sou nascido diferente Eu sou é eu mesmo Diverjo de todo o mundo Eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 14 quase que nada não sei Mas desconfio de muita coisa O senhor concedendo eu digo para pensar longe sou cão mestre o senhor solte em minha frente uma idéia ligeira e eu rastreio essa por fundo de todos os matos amém Olhe o que devia de haver era de se reuniremse os sábios políticos constituições gradas fecharem o definitivo a noção proclamar por uma vez artes assembléias que não tem diabo nenhum não existe não pode Valor de lei Só assim davam tranqüilidade boa à gente Por que o Governo não cuida Ah eu sei que não é possível Não me assente o senhor por beócio Uma coisa é pôr idéias arranjadas outra é lidar com país de pessoas de carne e sangue de miletantas misérias Tanta gente dá susto de saber e nenhum se sossega todos nascendo crescendo se casando querendo colocação de emprego comida saúde riqueza ser importante querendo chuva e negócios bons De sorte que carece de se escolher ou a gente se tece de viver no safado comum ou cuida só de religião só Eu podia ser padre sacerdote se não chefe de jagunços para outras coisas não fui parido Mas minha velhice já principiou errei de toda conta E o reumatismo Lá como quem diz nas escorvas Ahã João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 15 Hem Hem O que mais penso testo e explico todoo mundo é louco O senhor eu nós as pessoas todas Por isso é que se carece principalmente de religião para se desendoidecer desdoidar Reza é que sara da loucura No geral Isso é que é a salvaçãodaalma Muita religião seu moço Eu cá não perco ocasião de religião Aproveito de todas Bebo água de todo rio Uma só para mim é pouca talvez não me chegue Rezo cristão católico embrenho a certo e aceito as preces de compadre meu Quelemém doutrina dele de Cardéque Mas quando posso vou no Mindubim onde um Matias é crente metodista a gente se acusa de pecador lê alto a Bíblia e ora cantando hinos belos deles Tudo me quieta me suspende Qualquer sombrinha me refresca Mas é só muito provisório Eu queria rezar o tempo todo Muita gente não me aprova acham que lei de Deus é privilégios invariável E eu Bofe Detesto O que sou o que faço que quero muito curial E em cara de todos faço executado Eu não tresmalho Olhe tem uma preta Maria Leôncia longe daqui não mora as rezas dela afamam muita virtude de poder Pois a ela pago todo mês encomenda de rezar por mim um terço todo santo dia e nos domingos um rosário Vale se vale Minha mulher não vê mal nisso E estou já mandei recado para uma João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 16 outra do VauVau uma Izina Calanga para vir aqui ouvi de que reza também com grandes meremerências vou efetuar com ela trato igual Quero punhado dessas me defendendo em Deus reunidas de mim em volta Chagas de Cristo Viver é muito perigoso Querer o bem com demais força de incerto jeito pode já estar sendo se querendo o mal por principiar Esses homens Todos puxavam o mundo para si para o concertar consertado Mas cada um só vê e entende as coisas dum seu modo Montante o mais supro mais sério foi Medeiro Vaz Que um homem antigo Seu Joãozinho Bem Bem o mais bravo de todos ninguém nunca pôde decifrar como ele por dentro consistia Joca Ramiro grande homem príncipe era político ZéBebelo quis ser político mas teve e não teve sorte raposa que demorou Só Candelário se endiabrou por pensar que estava com doença má Titão Passos era o pelo preço de amigos só por via deles de suas mesmas amizades foi que tão alto se ajagunçou Antônio Dó severo bandido Mas por metade grande maior metade que seja Andalécio no fundo um bom homemdebem estouvado raivoso em sua toda justiça Ricardão mesmo queria era ser rico em paz para isso guerreava Só o Hermógenes foi que nasceu formado tigre e assassim E o UrutuBranco Ah não me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 17 fale Ah esse tristonho levado que foi que era um pobre menino do destino Tão bem conforme O senhor ouvia eu lhe dizia o ruim com o ruim terminam por as espinheiras se quebrar Deus espera essa gastança Moço Deus é paciência O contrário é o diabo Se gasteja O senhor rela faca em faca e afia que se raspam Até as pedras do fundo uma dá na outra vãose arredondinhando lisas que o riachinho rola Por enquanto que eu penso tudo quanto há neste mundo é porque se merece e carece Antesmente preciso Deus não se comparece com refe não arrocha o regulamento Pra quê Deixa bobo com bobo um dia algum estala e aprende esperta Só que às vezes por mais auxiliar Deus espalha no meio um pingado de pimenta Haja Pois por um exemplo faz tempo fui de trem lá em SeteLagoas para partes de consultar um médico de nome me indicado Fui vestido bem e em carro de primeira por via das dúvidas não me sombrearem por jagunço antigo Vai e acontece que perto mesmo de mim defronte tomou assento voltando deste brabo Norte um moço Jazevedão delegado profissional Vinha com um capanga dele um secreta e eu bem sabia os dois de que tanto um era ruim como o outro ruim era A verdade que diga primeiro tive o estrito de me desbancar para João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 18 um longe dali mudar de meu lugar Juízo me disse melhor ficasse Pois ficando olhei E lhe falo nunca vi cara de homem fornecida de bruteza e maldade mais do que nesse Como que era urco trouxo de atarracado reluzia um cru nos olhos pequenos e armava um queixo de pedra sobrancelhonas não demedia nem testa Não ria não se riu nem uma vez mas falando ou calado a gente via sempre dele algum dente presa pontuda de guará Arre e bufava um poucadinho Só rosneava curto baixo as meiaspalavras encrespadas Vinha reolhando historiando a papelada uma a uma as folhas com retratos e com os pretos dos dedos de jagunços ladrões de cavalos e criminosos de morte Aquela aplicação de trabalho numa coisa dessas gerava a ira na gente O secreta xereta todo perto sentado junto atendendo caprichando de ser cão Me fez um receio mas só no bobo do corpo não no interno das coragens Uma hora uma daquelas laudas caiu e eu me abaixei depressa sei lá mesmo por que não quis não pensei até hoje crio vergonha disso apanhei o papel do chão e entreguei a ele Daí digo eu tive mais raiva porque fiz aquilo mas aí já estava feito O homem nem me olhou nem disse nenhum agradecimento Até as solas dos sapatos dele só vendo que solas duras grossas dobradas de enormes parecendo ferro bronze Porque eu sabia esse Jazevedão quando prendia alguém a primeira quieta coisa que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 19 procedia era que vinha entrando sem ter que dizer fingia umas pressas e ia pisava em cima dos pés descalços dos coitados E que nessas ocasiões dava gargalhadas dava Pois osga Entreguei a ele a folha de papel e fui saindo de lá por ter mão em mim de não destruir a tiros aquele sujeito Carnes que muito pesavam E ele umbigava um princípio de barriga barriguda que me criou desejos Com minha brandura alegre que eu matava Mas as barbaridades que esse delegado fez e aconteceu o senhor nem tem calo em coração para poder me escutar Conseguiu de muito homem e mulher chorar sangue por este simples universozinho nosso aqui Sertão O senhor sabe sertão é onde manda quem é forte com as astúcias Deus mesmo quando vier que venha armado E bala é um pedacinhozinho de metal Tanto digo Jazevedão um assim devia de ter precisava Ah precisa Couro ruim é que chama ferrão de ponta Haja que depois negócio particular dele nesta vida ou na outra cada Jazevedão cumprido o que tinha descamba em seu tempo de penar também até pagar o que deveu compadre meu Quelemém está aí para fiscalizar O senhor sabe o perigo que é viver Mas só do modo desses por feio instrumento foi que a jagunçada se findou Senhor pensa que Antônio Dó ou Olivino Oliviano iam ficar bonzinhos por pura soletração de si ou por João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 20 rogo dos infelizes ou por sempre ouvir sermão de padre Te acho Nos visos De jagunço comportado ativo para se arrepender no meio de suas jagunçadas só deponho de um chamado Joé Cazuzo foi em arraso de um tirotei pra cima do lugar SerraNova distrito de RioPardo no ribeirão Traçadal A gente fazia má minoria pequena e fechavam para riba de nós o pessoal dum Coronel Adalvino forte político com muitos soldados fardados no meio centro comando do Tenente Reis Leme que depois ficou capitão Agüentamos hora mais hora e já dávamos quase de cercados Aí de bote aquele Joé Cazuzo homem muito valente se ajoelhou giro no chão do cerrado levantava os braços que nem esgalho de jatobá seco e só gritava urro claro e urro surdo Eu vi a Virgem Nossa no resplandor do Céu com seus filhos de Anjos Gritava não esbarrava Eu vi a Virgem Ele almou Nós desigualamos Trape por meu cavalo que achei pulei em meu assento nem sei em que rompetempo desatei o cabresto de amarrado em pé de pau Voei vindo Bala vinha O cerrado estrondava No mato o medo da gente se sai ao inteiro um medo propositado Eu podia escoicear feito burro bruto dáque dáque Umas duas ou três balas se cravaram na borraina da minha sela perfuraram de arrancar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 21 quase muita a paina do encheio Cavalo estremece em pró em meio de galope sei pensa no dono Eu não cabia de estar mais bem encolhido Baleado veio também o surrão que eu tinha nas costas com poucas minhas coisas E outra de fuzil em ricochete decerto esquentou minha coxa sem me ferir o senhor veja bala faz o que quer se enfiou imprensada entre em mim e a aba da jereba Tempos loucos Burumbum o cavalo se ajoelhou em queda morto quiçá e eu já caindo para diante abraçado em folhagens grossas ramada e cipós que me balançaram e espetavam feito eu estava pendurado em teião de aranha Aonde Atravessei aquilo vida toda De medo em ânsia rompi por rasgar com meu corpo aquele mato fui sei lá e me despenquei mundo abaixo rolava para o oco de um grotão fechado de moitas sempre me agarrava rolava mesmo assim depois depois quando olhei minhas mãos tudo nelas que não era tirado sangue era um amasso verde nos dedos de folhas vivas que puxei e masgalhei Pousei no capim do fundo e um bicho escuro deu um repulão com um espirro também doido de susto que era um papamel que eu vislumbrei para fugir esse está somente Maior sendo eu me molhou meu cansaço espichei tudo E um pedacinho de pensamento se aquele bicho irara tinha jazido lá então ali não tinha cobra Tomei o lugar dele Existia cobra nenhuma Eu podia me largar Eu era só João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 22 mole moleza mas que não amortecia os trancos dentro do coração Arfei Concebi que vinham me matavam Nem fazia mal me importei não Assim uns momentos ao menos eu guardava a licença de prazo para me descansar Conforme pensei em Diadorim Só pensava era nele Um joãodebarro cantou Eu queria morrer pensando em meu amigo Diadorim manoohmão que estava na Serra do PaudArco quase na divisa baiana com nossa outra metade dos sócandelários Com meu amigo Diadorim me abraçava sentimento meu iavoava reto para ele Ai arre mas que esta minha boca não tem ordem nenhuma Estou contando fora coisas divagadas No senhor me fio Atéque atéque Diga o anjodaguarda Mas conforme eu vinha depois se soube que mesmo os soldados do Tenente e os cabras do Coronel Adalvino remitiram de respeitar o assopro daquele Joé Cazuzo E que esse acabou sendo o homem mais pacificioso do mundo fabricador de azeite e sacristão no São Domingos Branco Tempos Por tudo réiscoado fico pensando Gosto Melhor para a idéia se bem abrir é viajando em tremdeferro Pudesse vivia para cima e para baixo dentro dele Informação que pergunto mesmo no Céu fim de fim como é que a alma vence se esquecer de tantos sofrimentos e maldades no recebido e no dado A João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 23 como O senhor sabe há coisas de medonhas demais tem Dor do corpo e dor da idéia marcam forte tão forte como o todo amor e raiva de ódio Vai mar De sorte que então olhe o Firmiano por apelidado PiolhodeCobra se lazarou com a perna desconforme engrossada dessa doença que não se cura e não enxergava quase mais constante o branquiço nos olhos das cataratas De antes anos teve de se desarrear da jagunçagem Pois uma ocasião algum esteve no rancho dele no Alto Jequitaí depois contou que vira tempo vem assunto ele dissesse Me dá saudade é de pegar um soldado e tal pra uma boa esfola com faca cega Mas primeiro castrar O senhor concebe Quem tem mais dose de demo em si é índio qualquer raça de bugre Gente vê nação desses para lá fundo dos gerais de Goiás adonde tem vagarosos grandes rios de água sempre tão clara aprazível correndo em deita de cristal roseado PiolhodeCobra se dava de sangue de gentio Senhor me dirá mas que ele pro nunceia aquilo fora boca maneira de representar que ainda não estava velho decadente Obra de opor por medo de ser manso e causa para se ver respeitado Todos tretam por tal regra proseiam de ruins para mais se valerem porque a gente ao redor é duro dura O pior mas é que acabam pelo mesmo vau tendo de um dia executar o declarado no real Vi tanta cruez Pena não paga contar se vou não esbarro E me desgosta três que me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 24 enjoa isso tudo Me apraz é que o pessoal hoje em dia é bom de coração Isto é bom no trivial Malícias maluqueiras e perversidades sempre tem alguma mas escasseadas Geração minha verdadeira ainda não eram assim Ah vai vir um tempo em que não se usa mais matar gente Eu já estou velho Bom ia falando questão isso que me sovaca Ah formei aquela pergunta para compadre meu Quelemém Que me respondeu que por perto do Céu a gente se alimpou tanto que todos os feios passados se exalaram de não ser feito sem modez de tempo de criança másartes Como a gente não carece de ter remorso do que divulgou no latejo de seus pesadelos de uma noite Assim que tosouse floreouse Ahã Por isso dito é que a ida para o Céu é demorada Eu confiro com compadre meu Quelemém o senhor sabe razão da crença mesma que tem que por todo o mal que se faz um dia se repaga o exato Sujeito assim madruga três vezes em antes de querer facilitar em qualquer minudência repreensível Compadre meu Quelemém nunca fala vazio não subtrata Só que isto a ele não vou expor A gente nunca deve de declarar que aceita inteiro o alheio essa é que é a regra do rei O senhor Mire veja o mais importante e bonito do mundo é isto que as pessoas não estão sempre iguais ainda não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 25 foram terminadas mas que elas vão sempre mudando Afinam ou desafinam Verdade maior É o que a vida me ensinou Isso que me alegra montão E outra coisa o diabo é às brutas mas Deus é traiçoeiro Ah uma beleza de traiçoeiro dá gosto A força dele quando quer moço me dá o medo pavor Deus vem vindo ninguém não vê Ele faz é na lei do mansinho assim é o milagre E Deus ataca bonito se divertindo se economiza A pois um dia num curtume a faquinha minha que eu tinha caiu dentro dum tanque só caldo de casca de curtir barbatimão angico lá sei Amanhã eu tiro falei comigo Porque era de noite luz nenhuma eu não disputava Ah então saiba no outro dia cedo a faca o ferro dela estava sido roído quase por metade por aquela agüinha escura toda quieta Deixei para mais ver Estala espoleta Sabe o que foi Pois nessa mesma da tarde aí da faquinha só se achava o cabo O cabo por não ser de frio metal mas de chifre de galheiro Aí está Deus Bem o senhor ouviu o que ouviu sabe o que sabe me entende Somenos não ache que religião afraca Senhor ache o contrário Visível que aqueles outros tempos eu pintava cré que o caroá levanta a flor Eli bom meu pasto Mocidade Mas mocidade é tarefa para mais tarde se desmentir Também eu desse de pensar em vago em tanto perdia minha mãode João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 26 homem para o manejo quente no meio de todos Mas hoje que raciocinei e penso a eito não nem por isso não dou por baixa minha competência num fogoeferro A ver Chegassem viessem aqui com guerra em mim com más partes com outras leis ou com sobejos olhares e eu ainda sorteio de acender esta zona ai se se É na boca do trabuco é no téretêretém E sozinhozinho não estou hádeo Pra não isso hei coloquei re dor meu minha gente Olhe o senhor aqui pegado vereda abaixo o Paspe meeiro meu é meu Mais légua se tanto tem o Acauã e tem o Compadre Ciril ele e três filhos sei que servem Banda desta mão o Alaripe soubesse o senhor o que é que se preza em rifleio e à faca um cearense feito esse Depois mais o João Nonato o Quipes o PacamãdePresas E o Fafafa este deu lances altos todo lado comigo no combate velho do Tamanduátão limpamos o vento de quem não tinha ordem de respirar e antes esses desrodeamos O Fafafa tem uma eguada Ele cria cavalos bons Até um pouco mais longe no pédeserra de bando meu foram o Sesfredo Jesualdo o Nélson e João Concliz Uns outros O Triol E não vou valendo Deixo terra com eles deles o que é meu é fechamos que nem irmãos Para que eu quero ajuntar riqueza Estão aí de armas areiadas Inimigo vier a gente cruza chamado ajuntamos é hora dum bom tiroteiamento em paz exprimentem ver Digo isto ao João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 27 senhor de fidúcia Também não vá pensar em dobro Queremos é trabalhar propor sossego De mim pessoa vivo para minha mulher que tudo modomelhor merece e para a devoção Bemquerer de minha mulher foi que me auxiliou rezas dela graças Amor vem de amor Digo Em Diadorim penso também mas Diadorim é a minha neblina Agora bem não queria tocar nisso mais de o Tinhoso chega Mas tem um porém pergunto o senhor acredita acha fio de verdade nessa parlanda de com o demônio se poder tratar pacto Não não é não Sei que não há Falava das favas Mas gosto de toda boa confirmação Vender sua própria alma invencionice falsa E alma o que é Alma tem de ser coisa interna supremada muito mais do de dentro e é só do que um se pensa ah alma absoluta Decisão de vender alma é afoitez vadia fantasiado de momento não tem a obediência legal Posso vender essas boas terras daí de entre as VeredasQuatro que são dum senhor Almirante que reside na capital federal Posso algum Então se um menino menino é e por isso não se autoriza de negociar E a gente isso sei às vezes é só feito menino Mal que em minha vida aprontei foi numa certa meninice em sonhos tudo corre e chega tão ligeiro será que se há lume de responsabilidades Se sonha já se fez Dei rapadura ao jumento Ahã Pois Se tem alma e tem ela é de Deus estabelecida nem que a pessoa queira ou não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 28 queira Não é vendível O senhor não acha Me declare franco peço Ah lhe agradeço Se vê que o senhor sabe muito em idéia firme além de ter carta de doutor Lhe agradeço por tanto Sua companhia me dá altos prazeres Em termos gostava que morasse aqui ou perto era uma ajuda Aqui não se tem convívio que instruir Sertão Sabe o senhor sertão é onde o pensamento da gente se forma mais forte do que o poder do lugar Viver é muito perigoso Eh que se vai Jajá É que não Hoje não Amanhã não Não consinto O senhor me desculpe mas em empenho de minha amizade aceite o senhor fica Depois quinta demanhã cedo o senhor querendo ir então vai mesmo me deixa sentindo sua falta Mas hoje ou amanhã não Visita aqui em casa comigo é por três dias Mas o senhor sério tenciona devassar a raso este mar de territórios para sortimento de conferir o que existe Tem seus motivos Agora digo por mim o senhor vem veio tarde Tempos foram os costumes demudaram Quase que de legítimo leal pouco sobra nem não sobra mais nada Os bandos bons de valentões repartiram seu fim muito que foi jagunço por aí pena pede esmola Mesmo que os vaqueiros duvidam de vir no João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 29 comércio vestidos de roupa inteira de couro acham que traje de gibão é feio e capiau E até o gado no grameal vai minguando menos bravo mais educado casteado de zebu desvém com o resto de curraleiro e de crioulo Sempre no gerais é à pobreza à tristeza Uma tristeza que até alegra Mas então para uma safra razoável de bizarrices reconselho de o senhor entestar viagem mais dilatada Não fosse meu despoder por azias e reumatismo aí eu ia Eu guiava o senhor até tudo Lhe mostrar os altos claros das Almas rio despenha de lá num afã espuma próspero gruge cada cachoeira só tombos O cio da tigre preta na Serra do Tatu já ouviu o senhor gargaragem de onça A garoa rebrilhante da dosConfins madrugada quando o céu embranquece neblim que chamam de xererém Quem me ensinou a apreciar essas as belezas sem dono foi Diadorim A daRaizama onde até os pássaros calculam o giro da lua se diz e canguçu monstra pisa em volta Lua de com ela se cunhar dinheiro Quando o senhor sonhar sonhe com aquilo Cheiro de campos com flores forte em abril a ciganinha roxa e a nhiíca e a escova amarelinhas Isto no Saririnhém Cigarras dão bando Debaixo de um tamarindo sombroso Eh frio Lá geia até em costas de boi até nos telhados das casas Ou no Meãomeão depois dali tem uma João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 30 terra quase azul Que não que o céu esse é céuazul vivoso igual um ovo de macuco Ventos de não deixar se formar orvalho Um punhado quente de vento passante entre duas palmas de palmeira Lembro deslembro Ou o senhor vai no soposo de chuvachuva Vê um córrego com má passagem ou um rio em turvação No BuritiMirim Angical Extremade SantaMaria Senhor caça Tem lá mais perdiz do que no Chapadão das Vertentes Caçar anta no CabeçadeNegro ou no BuritiComprido aquelas que comem um capim diferente e roem cascas de muitas outras árvores a carne de gostosa diverseia Por esses longes todos eu passei com pessoa minha no meu lado a gente se querendo bem O senhor sabe Já tenteou sofrido o ar que é saudade Dizse que tem saudade de idéia e saudade de coração Ah Dizse que o Governo está mandando abrir boa estrada rodageira de Pirapora a Paracatu por aí Na Serra do Cafundó ouvir trovão de lá e retrovão o senhor tapa os ouvidos pode ser até que chore de medo mau em ilusão como quando foi menino O senhor vê vaca parindo na tempestade De em de sempre Urucuia acima o Urucuia tão a brabas vai Tanta serra esconde a lua A serra ali corre torta A serra faz ponta Em um lugar na encosta brota do chão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 31 um vapor de enxofre com estúrdio barulhão o gado foge de lá por pavor Semelha com as serras do Estrondo e do Roncador donde dão retumbos vez em quando Hem O senhor Olhe o rio Carinhanha é preto o Paracatu moreno meu em belo é o Urucuia paz das águas É vida Passado o Porto das Onças tem um fazendol Ficamos lá umas semanas se descansou Carecia Porque a gente vinha no caminhar a pé para não acabar os cavalos mazelados Medeiro Vaz em lugares assim fora de guerra prazer dele era dormir com camisolão e barrete antes de se deitar ajoelhava e rezava o terço Aqueles foram meus dias Se caçava cada um esquecia o que queria de decomer não faltava pescar peixe nas veredas O senhor vá lá verá Os lugares sempre estão aí em si para confirmar Muito deleitável Claráguas fontes sombreado e sol Fazenda BoiPreto dum Eleutério Lopes mais antes do CampoAzulado rumo a rumo com o Queimadão Aí foi em fevereiro ou janeiro no tempo do pendão do milho Tresmente que com o capitãodocampo de prateadas pontas viçoso no cerrado o anis enfeitando suas moitas e com florzinhas as dejaniras Aquele capimmarmelada é muito restível redobra logo na brotação tão verdemar filho do menor chuvisco De qualquer pano de mato de deentre quase cada encostar de duas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 32 folhas saíam em giro as todas as cores de borboletas Como não se viu aqui se vê Porque nos gerais a mesma raça de borboletas que em outras partes é trivial regular cá cresce vira muito maior e com mais brilho se sabe acho que é do seco do ar do limpo desta luz enorme Beiras nascentes do Urucuia ali o povi canta altinho E tinha o xenxém que tintipiava de manhã no revoredo o sacidobrejo a doidinha a gangorrinha o tempo quente a rolavaqueira e o bemtevi que dizia e araras enrouquecidas Bom era ouvir o mom das vacas devendo seu leite Mas passarinho de bilo no desvéu da madrugada para toda tristeza que o pensamento da gente quer ele repergunta e finge resposta Tal de tarde o bentovieira tresvoava em vai sobre vem sob rebicando de vôo todo bichinhozinho de finas asas pássaro esperto Ia dechover mais em mais Tardinha que enche as árvores de cigarras então não chove Assovios que fechavam o dia o papabanana o azulejo a garrichadobrejo o suiriri o sabiáponga o grunhatádocoqueiro Eu estava todo o tempo quase com Diadorim Diadorim e eu nós dois A gente dava passeios Com assim a gente se diferenciava dos outros porque jagunço não é muito de conversa continuada nem de amizades estreitas a bem eles se misturam e desmisturam de acaso mas cada um é João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 33 feito um por si De nós dois juntos ninguém nada não falava Tinham a boa prudência Dissesse um caçoasse digo podia morrer Se acostumavam de ver a gente parmente Que nem mais maldavam E estávamos conversando perto do rego bicame de velha fazenda onde o agrião dá flor Desse lusfús ia escurecendo Diadorim acendeu um foguinho eu fui buscar sabugos Mariposas passavam muitas por entre as nossas caras e besouros graúdos esbarravam Puxava uma brisbisa O ianso do vento revinha com o cheiro de alguma chuva perto E o chiim dos grilos ajuntava o campo aos quadrados Por mim só de tantas minúcias não era o capaz de me alembrar não sou de à parada pouca coisa mas a saudade me alembra Que se hoje fosse Diadorim me pôs o rastro dele para sempre em todas essas quisquilhas da natureza Sei como sei Som como os sapos sorumbavam Diadorim duro sério tão bonito no relume das brasas Quase que a gente não abria boca mas era um delém que me tirava para ele o irremediável extenso da vida Por mim não sei que tontura de vexame com ele calado eu a ele estava obedecendo quieto Quase que sem menos era assim a gente chegava num lugar ele falava para eu sentar eu sentava Não gosto de ficar em pé Então depois ele vinha sentava sua vez Sempre mediante mais longe Eu não tinha coragem de mudar para mais perto Só de mim era que Diadorim às vezes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 34 parecia ter um espevito de desconfiança de mim que era o amigo Mas essa ocasião ele estava ali mais vindo a meiamão de mim E eu mal de não me consentir em nenhum afirmar das docemente coisas que são feias eu me esquecia de tudo num espairecer de contentamento deixava de pensar Mas suce dia uma duvidação ranço de desgosto eu versava aquilo em redondos e quadrados Só que coração meu podia mais O corpo não traslada mas muito sabe adivinha se não entende Perto de muita água tudo é feliz Se escutou banda do rio uma lontra por outra o issilvo de plim chupante Ta que mas eu quero que esse dia chegue Diadorim dizia Não posso ter alegria nenhuma nem minha mera vida mesma enquanto aqueles dois monstros não forem bem acabados E ele suspirava de ódio como se fosse por amor mas no mais não se alterava De tão grande o dele não podia mais ter aumento parava sendo um ódio sossegado Odio com paciência o senhor sabe E aquilo forte que ele sentia ia se pegando em mim mas não como ódio mais em mim virando tristeza Enquanto os dois monstros vivessem simples Diadorim tanto não vivia Até que viesse a poder vingar o histórico de seu pai ele tresvariava Durante que estávamos assim fora de marcha em rota tempo de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 35 descanso em que eu mais amizade queria Diadorim só falava nos extremos do assunto Matar matar sangue manda sangue Assim nós dois esperávamos ali nas cabeceiras da noite junto em junto Calados Me alembro ah Os sapos Sapo tirava saco de sua voz vozes de osga idosas Eu olhava para a beira do rego A ramagem toda do agrião o senhor conhece às horas dá de si uma luz nessas escuridões folha a folha um fosforém agrião acende de si feito eletricidade E eu tinha medo Medo em alma Não respondi Não adiantava Diadorim queria o fim Para isso a gente estava indo Com o comando de Medeiro Vaz dali depois daquele carecido repouso a gente revirava caminho ia em cima dos outros deles procurando combate Munição não faltava Nós estávamos em sessenta homens mas todos cabras dos melhores Chefe nosso Medeiro Vaz nunca perdia guerreiro Medeiro Vaz era homem sobre o sisudo nos usos formado não gastava as palavras Nunca relatava antes o projeto que tivesse que marchas se ia amanhecer para dar Também tudo nele decidia a confiança de obediência Ossoso com a nuca enorme cabeçona meia baixa ele era dono do dia e da noite que quase não dormia mais sempre se levantava no meio das estrelas percorria o arredor vagaroso em passos calçado com suas boas botas de caititu tão antigas Se ele em honrado juízo achasse que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 36 estava certo Medeiro Vaz era solene de guardar o rosário na algibeira se traçar o sinaldacruz e dar firme ordem para se matar uma a uma as mil pessoas Desde o começo eu apreciei aquela fortaleza de outro homem O segredo dele era de pedra Ah eu estou vivido repassado Eu me lembro das coisas antes delas acontecerem Com isso minha fama clareia Remei vida solta Sertão estes seus vazios O senhor vá Alguma coisa ainda encontra Vaqueiros Ao antes a um ao Chapadão do Urucuia aonde tanto boi berra Ou o mais longe vaqueiros do BrejoVerde e do Córrego do QuebraQuinaus cavalo deles conversa cochicho que se diz para dar sisado conselho ao cavaleiro quando não tem mais ninguém perto capaz de escutar Creio e não creio Tem coisa e cousa e o ó da raposa Dali para cá o senhor vem começos do Carinhanha e do Piratinga filho do Urucuia que os dois de dois se dão as costas Saem dos mesmos brejos buritizais enormes Por lá sucuri geme Cada surucuiú do grosso voa corpo no veado e se enrosca nele abofa trinta palmos Tudo em volta é um barro colador que segura até casco de mula arranca ferradura por ferradura Com medo de mãecobra se vê muito bicho retardar ponderado paz de hora de poder água beber esses escondidos atrás das touceiras de buritirana Mas o sassafrás dá mato João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 37 guardando o poço o que cheira um bom perfume Jacaré grita uma duas as três vezes rouco roncado Jacaré choca olhalhão crespido do lamal feio mirando na gente Eh ele sabe se engordar Nas lagoas aonde nem um de asas não pousa por causa da fome de jacaré e da piranha serrafina Ou outra lagoa que nem não abre o olho de tanto junco Daí longe em longe os brejos vão virando rios Buritizal vem com eles buriti se segue segue Para trocar de bacia o senhor sobe por ladeiras de beirademesa entra de bruto na chapada chapadão que não se devolve mais Água ali nenhuma não tem só a que o senhor leva Aquelas chapadas compridas cheias de mutucas ferroando a gente Mutucas Dá o sol de onda forte dá que dá a luz tanta machuca Os cavalos suavam sal e espuma Muita vez a gente cumpria por picadas no mato caminho de anta a ida da vinda De noite se é de ser o céu embola um brilho Cabeça da gente quase esbarra nelas Bonito em muito comparecer como o céu de estrelas por meados de fevereiro Mas em deslua no escuro feito é um escurão que peia e pega É noite de muito volume Treva toda do sertão sempre me fez mal Diadorim não ele não largava o fogo de gelo daquela idéia e nunca se cismava Mas eu queria que a madrugada viesse Dia quente noite fria Arrancávamos caneladeema para acender fogueira Se a gente tinha o que comer e beber eu dormia logo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 38 Sonhava Só sonho mal ou bem livrado Eu tinha uma lua recolhida Quando o dia quebrava as barras eu escutava outros pássaros Tiriri graúna a fariscadeira juritidopeitobranco ou a pombavermelhadomatovirgem Mas mais o bemtevi Atrás e adiante de mim por toda a parte parecia que era um bemtevi só Gente Não se acha até que ele é sempre um em mesmo perguntei a Diadorim Ele não aprovou e estava incerto de feições Quando meu amigo ficava assim eu perdia meu bom sentir E permaneci duvidando que seria que era um bemteviexato perseguindo minha vida em vez me acusando de máshoras que eu ainda não tinha procedido Até hoje é assim Dali vindo visitar convém ao senhor o povoado dos pretos esses bateavam em faisqueiras no recesso brenho do VargemdaCria donde ouro já se tirou Acho de baixo quilate Uns pretos que ainda sabem cantar gabos em sua língua da Costa E em andemos jagunço era que perpassava ligeiro no chapadão os legítimos coitados todos vivem é demais devagar pasmacez A tanta miséria O chapadão no pardo é igual igual a muita gente ele entristece mas eu já nasci gostando dele As chuvas se temperaram João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 39 Digo outro mês outro longe na Aroeirinha fizemos paragem Ao que num portal vi uma mulher moça vestida de vermelho se ria Ô moço da barba feita ela falou Na frente da boca ela quando ria tinha os todos dentes mostrava em fio Tão bonita só Eu apeei e amarrei o animal num pau da cerca Pelo dentro minhas pernas doíam por tanto que desses três dias a gente se sustava de custoso varar circunstância de trinta léguas Diadorim não estava perto para me reprovar De repente passaram aos galopes e gritos uns companheiros que tocavam um boi preto que iam sangrar e carnear em beira dágua Eu nem tinha começado a conversar com aquela moça e a poeira forte que deu no ar ajuntou nós dois num grosso rojo avermelhado Então eu entrei tomei um café coado por mão de mulher tomei refresco limonada de pêradocampo Se cha mava Nhorinhá Recebeu meu carinho no cetim do pêlo alegria que foi feito casamento esponsal Ah a mangaba boa só se colhe já caída no chão de baixo Nhorinhá Depois ela me deu de presente uma presa de jacaré para traspassar no chapéu com talento contra mordida de cobra e me mostrou para beijar uma estampa de santa dita meia milagrosa Muito foi Mãe dela chegou uma velha arregalada por nome de Ana Duzuza falada de ser filha de ciganos e dona adivinhadora da João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 40 boa ou má sorte da gente naquele sertão essa dispôs de muita virtude Ela sabia que a filha era meretriz e até contanto que fosse para os homens de fora do lugarejo jagunços ou tropeiros não se importava mesmo dava sua placença Comemos farinha com rapadura E a Ana Duzuza me disse vendendo forte segredo que Medeiro Vaz ia experimentar passar de banda a banda o liso do Suçuarão Ela estava chegando do arranchado de Medeiro Vaz que por ele mandada buscar ele querendo suas profecias Loucura duma Para quê Eu nem não acreditei Eu sabia que estávamos entortando era para a Serra das Araras revinhar aquelas corujeiras nos bravios de ali além aonde tudo quanto era bandido em folga se escondia lá se podia azo de combinar mais outros variáveis companheiros Depois de arte que o Liso do Suçuarão não concedia passagem a gente viva era o raso pior havente era um escampo dos infernos Se é se Ah existe meu Eh Que nem o VãodoBuraco Ah não isto é coisa diversa por diante da contravertência do Preto e do Pardo Também onde se forma calor de morte mas em outras condições A gente ali rói rampa Ah o Tabuleiro Se nhor então conhece Não esse ocupa é desde a Veredada VacaPreta até Córrego Catolé cá embaixo e de em desde a nascença do Peruaçu até o rio Cochá que tira da Várzea da Ema Depois dos cerradões das mangabeiras João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 41 Nada nada vezes e o demo esse Liso do Suçuarão é o mais longe pra lá pra lá nos ermos Se emenda com si mesmo Água não tem Crer que quando a gente entesta com aquilo o mundo se acaba carece de se dar volta sempre Um é que dali não avança espia só o começo só Ver o luar alumiando mãe e escutar como quantos gritos o vento se sabe sozinho na cama daqueles desertos Não tem excrementos Não tem pássaros Com isso apertei aquela Ana Duzuza e ela não agüentou a raiva em meus olhos Seô Medeiro Vaz pois foi ele mesmo próprio quem me contou ela teve de falar Soturnos Não era possível Diadorim estava me esperando Ele tinha lavado minha roupa duas camisas e um paletó e uma calça e outra camisa nova de bulgariana Às vezes eu lavava a roupa nossa mas quase mais quem fazia isso era Diadorim Porque eu achava tal serviço o pior de todos e também Diadorim praticava com mais jeito mão melhor Ele não indagou donde eu tinha estado e eu menti que só tinha entrado lá por causa da velha Ana Duzuza a fim de requerer o significado do meu futuro Diadorim também disso não disse ele gostava de silêncios Se ele estava com as mangas arregaçadas eu olhava para os João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 42 braços dele tão bonitos braços alvos em bem feitos e a cara e as mãos avermelhadas e empoladas de picadas das mutucas No momento foi que eu caí em mim que podia ter perguntado à Ana Duzuza alguma passagem de minha sina por vir Também uma coisa de minha fechada eu devia de perguntar Coisa que nem eu comigo não estudava não tinha a coragem E se a Duzuza adivinhasse mesmo conhecesse por detrás o pano do destino Não perguntei não tinha perguntado Quem sabe podia ser eu estava enfeitiçado Me arrependi de não ter pedido o resumo à Ana Duzuza Ah tem uma repetição que sempre outras vezes em minha vida acontece Eu atravesso as coisas e no meio da travessia não vejo só estava era entretido na idéia dos lugares de saída e de chegada Assaz o senhor sabe a gente quer passar um rio a nado e passa mas vai dar na outra banda é num ponto muito mais embaixo bem diverso do em que primeiro se pensou Viver nem não é muito perigoso Redisse a Diadorim o que eu tinha surripiado que o projeto de Medeiro Vaz só era o de conduzir a gente para o Liso do Suçuarão a dentro adiante até ao fim E certo é É certo Diadorim respondeu me afrontando com a surpresa de que ele já sabia daquilo e a mim não tinha antecipado nem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 43 miúda palavra E veja eu vinha tanto tempo me relutando contra o querer gostar de Diadorim mais do que a claro de um amigo se pertence gostar e agora aquela hora eu não apurava vergonha de se me entender um ciúme amargoso Sendo sabendo que Medeiro Vaz depunha em Diadorim uma confiança muito maior do que em nós outros todos de formas que com ele externava os assuntos Essa diferença de regra agora me turvava Mas Medeiro Vaz era homem de outras idades andava por este mundo com mão leal não variava nunca não fraquejava Eu sabia que ele a bem dizer só guardava memória de um amigo Joca Ramiro loca Ramiro tinha sido a admiração grave da vida dele Deus no Céu e Joca Ramiro na outra banda do Rio Tudo o justo Mas ciúme é mais custoso de se sopitar do que o amor Coração da gente o escuro escuros Então Diadorim o resto me descreveu Pra por lá do Suçuarão já em tantos terrenos da Bahia um dos dois Judas possuía sua maior fazenda com os muitos gados lavouras e lá morava sua família dele legítima de raça mulher e filhos A gente suprisse de varar o Liso em boas farsas se chegava lá sem ser esperados arrastava aquele pessoal por dura surpresa acabouse com aquilo Mesmo quem havia de deduzir que o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 44 Liso do Suçuarão prestasse para nele caminho se impor Ah eles prosperavam em sua fazenda feito num quartel de bronze com que por outros cantos não se podia remeter pois de arredor decerto tinham vigias reforço de munição e récua de camaradas pelos pontos de passagem dificultosa que eles governavam em cada grota e cada ipueira Truco que de repente do lado mais impossível a gente fosse surgir de sobrevento soflagrar aqueles desprevenidos Eu escutei e perfiz até um arrepio Mas Diadorim de vez mais sério temperou Essa velha Ana Duzuza é que inferna e não se serve Das perguntas que Medeiro Vaz fez ela tirou por tino a tenção dele e não devia de ter falado as pausas Essa carece de morrer para não ser leleira Ouvi mal ouvi Me vim dáguas frias Diadorim era assim matar se matava era para ser um preparo O judas algum na faca Tinha de ser nosso costume Eu não sabia Não sou homem de meiodia com orvalhos não tenho a fraca natureza Mas me venceu pena daquela Ana Duzuza ela com os olhos para fora a gente podia pegar nos dedos Coisa que me contou tantas lorotas Trem caco de velha boca que se fechava aboborosa de sem dentes Raspava a rapadura com a quicé ia ajuntando na palma da mão o farelo peguento preto João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 45 ou se não segurava o naco rechupando lambendo A gente engrossava nojo salivava Por que é então que ela merecia tanto dó Eu não tive solércia de contradizer As vontades de minha pessoa estavam entregues a Diadorim A razão dele era do estilo acinte Só previ medo foi de que ele falasse para eu mesmo ir voltar lá por minhas próprias acabar a Ana Duzuza Eu não sojigava tudo por sentir Fazia tempo que eu não olhava Diadorim nos olhos Mas de seguinte eu pensei se matarem a velha Duzuza pelo resguardar o segredo então é capaz que matem a filha também Nhorinhá então é assassinar Ah que se puxou de mim uma decisão e eu abri sete janelas Disso que você disse desconvenho Bulir com a vida dessa mulher para a gente dá atraso eu o quanto falei Diadorim me adivinhava Já sei que você esteve com a moça filha dela ele respondeu seco quase num chio Dente de cobra Aí entendi o que pra verdade que Diadorim me queria tanto bem que o ciúme dele por mim também se alteava Depois dum rebate contente se atrapalhou em mim aquela outra vergonha um estúrdio asco E eu quase gritei Aí é a intimação Pois fizerem eu saio do meio de vós pra todo o nunca Mais tu há de não me ver Diadorim pôs mão em meu braço Do que me estremeci de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 46 dentro mas repeli esses alvoroços de doçura Me deu a mão e eu Mas era como tivesse uma pedra pontuda entre as duas palmas Você já paga tão escasso então por Joca Ramiro Por conta duma bruxa feiticeira e a mávida da filha dela aqui neste confim de gerais ele baixo exclamou E tive ira Dou falei Todo o mundo então todos tinham de viver honrando a figura daquele de Joca Ramiro feito fosse Cristo Nosso Senhor o exato E por aí eu já tinha pitado dois cigarros Ser dono definito de mim era o que eu queria queria Mas Diadorim sabia disso parece que não deixava Riobaldo escuta pois então Joca Ramiro era o meu pai ele disse não sei se estava pálido muito e depois foi que se avermelhou Devido o que abaixou o rosto para mais perto de mim Acalmou meu fôlego Me cerrou aquela surpresa Sentei em cima de nada E eu cri tão certo depressa que foi como sempre eu tivesse sabido aquilo Menos disse Espiei Diadorim a dura cabeça levantada tão bonito tão sério E corri lembrança em Joca Ramiro porte luzido passo ligeiro as botas russianas a risada os bigodes o olhar bom e mandante a testa muita o topete de cabelos anelados pretos brilhando Como que brilhava ele todo Porque Joca Ramiro era mesmo assim sobre os homens ele tinha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 47 uma luz rei da natureza Que Diadorim fosse o filho agora de vez me alegrava me assustava Vontade minha foi declarar Redigo Diadorim estou com você assente em todo sistema e com a memória de seu pai Mas foi o que eu não disse Será por quê Criatura gente é não e questão corda de três tentos três tranços Pois para mim pra quem ouvir no fato essa Ana Duzuza fica sendo minha mãe foi o que eu disse E fe chando quase gritei Por mim pode cheirar que chegue o manacá não vou Reajo dessas barbaridades Tudo turbulindo Esperei o que vinha dele De um aceso de mim eu sabia o que compunha minha opinião era que eu às loucas gostasse de Diadorim e também recesso dum modo a raiva incerta por ponto de não ser possível dele gostar como queria no honrado e no final Ouvido meu retorcia a voz dele Que mesmo no fim de tanta exaltação meu amor inchou de empapar todas as folhagens e eu ambicionando de pegar em Diadorim carregar Diadorim nos meus braços beijar as muitas demais vezes sempre E tinha nojo maior daquela Ana Duzuza que vinha talvez separar a amizade da gente Em mesmo eu quase reconheci um surdo prestígio de sendo preciso ir lá por mim reduzir a velha só não podia maltratar era Nhorinhá que ao tanto afeto eu eu bemqueria Háde que eu certo não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 48 regulasse ôxe Não sei não sei Não devia de estar relembrando isto contando assim o sombrio das coisas Lengalenga Não devia de O senhor é de fora meu amigo mas meu estranho Mas talvez por isto mesmo Falar com o estranho assim que bem ouve e logo longe se vai embora é um segundo proveito faz do jeito que eu falasse mais mesmo comigo Mire veja o que e ruim dentro da gente a gente perverte sempre por arredar mais de si Para isso é que o muito se fala E as idéias instruídas do senhor me fornecem paz Principalmente a confirmação que me deu de que o Tal não existe pois é não O Arrenegado o Cão o Cramulhão o Indivíduo o Galhardo o PédePato o Sujo o Homem o Tisnado o Coxo o Temba o Azarape o CoisaRuim o Mafarro o PéPreto o Canho o DubaDubá o Rapaz o Tristonho o Nãoseiquediga Oquenuncaseri o SemGracejos Pois não existe E se não existe como é que se pode se contratar pacto com ele E a idéia me retorna Dum mau imaginado o senhor me dê o lícito que ou então será que pode também ser que tudo é mais passado revolvido remoto no profundo mais crônico que quando um tem noção de resolver a vender a alma sua que é porque ela já estava dada vendida sem se saber e a pessoa sujeita está só é certificando o regular dalgum velho trato João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 49 que já se vendeu aos poucos faz tempo Deus não queira Deus que roda tudo Diga o senhor sobre mim diga Até podendo ser de alguém algum dia ouvir e entender assim quem sabe a gente criatura ainda é tão ruim tão que Deus só pode às vezes manobrar com os homens é mandando por intermédio do diá Ou que Deus quando o projeto que ele começa é para muito adiante a ruindade nativa do homem só é capaz de ver o aproximo de Deus é em figura do Outro Que é que de verdade a gente pressente Dúvido dez anos Os pobres ventos no burro da noite Deixa o mundo dar seus giros Estou de costas guardadas a poder de minhas rezas Ahã Deamar deamo Relembro Diadorim Minha mulher que não me ouça Moço toda saudade é uma espécie de velhice Mas aí eu estava contando quando eu gritei aquele desafio raivoso Diadorim respondeu o que eu não esperava Tem discórdia não Riobaldo amigo se acalme Não é preciso se haver cautela de morte com essa Ana Duzuza Nem nós vamos com Medeiro Vaz para fazer barbaridade com a mulher e filhos pequenos daquele pior dos dois Judas tão bem que mereciam porque ele e os da laia dele têm costumes de proceder assim Mas o que a gente quer é só pegar a família conosco prisioneira então ele vem se vem E vem obrigado pra João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 50 combates Mas se você algum dia deixar de vir junto como juro o seguinte hei de ter a tristeza mortal Disse Tinha tornado a pôr a mão na minha mão no começo de falar e que depois tirou e se espaçou de mim Mas nunca eu senti que ele estivesse melhor e perto pelo quanto da voz duma voz mesmo repassada Coração isto é estes pormenores todos Foi um esclaro O amor já de si é algum arrependimento Abracei Diadorim como as asas de todos os pássaros Pelo nome de seu pai Joca Ramiro eu agora matava e morria se bem Mas Diadorim mais não supriu o que mais não explicava E quem sabe para deduzir da conversa me perguntou Riobaldo se lembra certo da senhora sua mãe Me conta o jeito de bondade que era a dela Na ação de ouvir digo ao senhor tive um menos gosto na ação da pergunta Só faço que refugo sempre quando outro quer direto saber o que é próprio o meu no meu ah Mas desci disso o minuto vendo que só mesmo Diadorim era que podia acertar esse tento em sua amizade delicadeza Ao que entendi Assim devia de ser Toda mãe vive de boa mas cada uma cumpre sua paga prenda singular que é a dela e dela diversa bondade E eu nunca tinha pensado nessa ordem Para mim minha mãe era a minha mãe essas coisas Agora eu achava A bondade especial João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 51 de minha mãe tinha sido a de amor constando com a justiça que eu menino precisava E a de mesmo no punir meus demaseios quererbem às minhas alegrias A lembrança dela me fantasiou fraseou só face dum momento feito grandeza cantável feito entre madrugar e manhecer Pois a minha eu não conheci Diadorim prosseguiu no dizer E disse com curteza simples igual quisesse falar barra beiras cabeceiras Fosse cego de nascença Por mim o que pensei foi que eu não tive pai quer dizer isso pois nem eu nunca soube autorizado o nome dele Não me envergonho por ser de escuro nascimento Orfão de conhecença e de papéis legais é o que a gente vê mais nestes sertões Homem viaja arrancha passa muda de lugar e de mulher algum filho é o perdurado Quem é pobre pouco se apega é um giroo giro no vago dos gerais que nem os pássaros de rios e lagoas O senhor vê o ZéZim o melhor meeiro meu aqui risonho e habilidoso Pergunto ZéZim por que é que você não cria galinhasdangola como todo o mundo faz Quero criar nada não me deu resposta Eu gosto muito de mudar Está aí está com uma mocinha cabocla em casa dois filhos dela já tem Belo um dia ele tora É assim Ninguém discrepa Eu tantas mesmo digo Eu dou proteção Eu isto é Deus por João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 52 baixos permeios Essa não faltou também à minha mãe quando eu era menino no sertãozinho de minha terra baixo da ponta da Serra das Maravilhas no entre essa e a Serra dos Alegres tapera dum sítio dito do Caramujo atrás das fontes do Verde o Verde que verte no Paracatu Perto de lá tem vila grande que se chamou Alegres o senhor vá ver Hoje mudou de nome mudaram Todos os nomes eles vão alterando É em senhas São Romão todo não se chamou de primeiro Vila Risonha O Cedro e o Bagre não perderam o ser O TabuleiroGrande Como é que podem remover uns nomes assim O senhor concorda Nome de lugar onde alguém já nasceu devia de estar sagrado Lá como quem diz então alguém havia de renegar o nome de Belém de NossoSenhorJesusCristo no presépio com Nossa Senhora e São José Precisava de se ter mais travação Senhor sabe Deus é definitivamente o demo é o contrário Dele Assim é que digo eu que o senhor já viu que tenho retentiva que não falta recordo tudo da minha meninice Boa foi Me lembro dela com agrado mas sem saudade Porque logo sufusa uma aragem dos acasos Para trás não há paz O senhor sabe a coisa mais alonjada de minha primeira meninice que eu acho na memória foi o ódio que eu tive de um homem chamado Gramacedo Gente melhor do lugar eram todos dessa família Guedes Jidião Guedes quando saíram de lá nos trouxeram junto minha mãe e eu Fica João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 53 mos existindo em território baixio da Sirga da outra banda ali onde o deJaneiro vai no São Francisco o senhor sabe Eu estava com uns treze ou quatorze anos De sorte que do que eu estava contando ao senhor uma noite se passou todo o mundo sonhado satisfeito Declaro que era em abril em entrar Medeiro Vaz para o que traçava tinha querido se adiar das restadas chuvas de março dia de São José e sua enchente temposa para pegar céu perfeito com os campos ainda subindo verdes pois visto a gente ia baixar primeiro por campinas de brejais e daí avançar aquilo que se disse depo depois Porque era extraordinária verdade logo conheci não achei terrível Tangemos esbarrando dois dias no Vespê lá se tinha boa cavalaria descansada outros cavalos sob guarda dum sitiante amigo Jõe Engrácio por nome Nos caminhos ainda se lambuzava muita lama de ontem Versar viagem a cavalo sem ter estradas só doido é quem faz isso ou jagunz aquele Jõe Engrácio falou esse era homem sério trabalhador mas demais de simplório e do que ele falava ele mesmo logo se ria fortemente Mas erro era porquanto Medeiro Vaz sempre soube rumo prático pelo firme Modo mesmo assim ele Jõe Engrácio reparou na quantidade de comidas e mantimentos que a gente tinha reunido em tantos burros cargueiros e que era João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 54 despropósito por amor daquela fartura as carnes e farinhas e rapadura nem faltava sal nem café De tudo E ele vendo o que via perguntou aonde se ia dando dizendo de querer ir junto Bobou foi só o que Medeiro Vaz indeferiu Bobei chefe Perdão peço Jõe Engrácio reverenciou Medeiro Vaz não era carrancista Somente de mais sisudez a praxe homem baseado Às vezes vinha falando surdo de resmão Com ele ninguém vereava De estado calado ele sempre aceitava todo bom e justo conselho Mas não louvava cantoria Estavam falando todos juntos Então Medeiro Vaz não estava lá O que tinha sido antanha a história mesma dele o senhor sabe Quando moço de antepassados de posses ele recebera grande fazenda Podia gerir e ficar estadonho Mas vieram as guerras é os desmandos de jagunços tudo era morte e roubo e desrespeito carnal das mulheres casadas e donzelas foi impossível qualquer sossego desde em quando aquele imundo de loucura subiu as serras e se espraiou nos gerais Então Medeiro Vaz ao fim de forte pensar reconheceu o dever dele largou tudo se desfez do que abarcava em terras e gados se livrou leve como que quisesse voltar a seu só nascimento Não tinha bocas de pessoa não sustinha herdeiros forçados No derradeiro fez o fezpor suas mãos pôs fogo na distinta casade João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 55 fazenda fazendão sido de pai avô bisavô espiou até o voejo das cinzas lá hoje é arvoredos Ao que aí foi aonde a mãe estava enterrada um cemiteriozinho em beira do cerrado então desmanchou cerca espalhou as pedras pronto de alívios agora se testava ninguém podia descobrir para remexer com desonra o lugar onde se conseguiam os ossos dos parentes Daí relimpo de tudo escorrido dono de si ele montou em ginete com cachos darmas reuniu chusma de gente corajada rapaziagem dos campos e saiu por esse rumo em roda para impor a justiça De anos andava Dizem que foi ficando cada vez mais esquisito Quando conheceu Joca Ramiro então achou outra esperança maior para ele loca Ramiro era único homem pardefrança capaz de tomar conta deste sertão nosso mandando por lei de sobregoverno Fato que Joca Ramiro também igualmente saía por justiça e alta política mas só em favor de amigos perseguidos e sempre conservava seus bons haveres Mas Medeiro Vaz era duma raça de homem que o senhor mais não vê eu ainda vi Ele tinha conspeito tão forte que perto dele até o doutor o padre e o rico se compunham Podia abençoar ou amaldiçoar e homem mais moço por valente que fosse de beijar a mão dele não se vexava Por isso nós todos obedecíamos Cumpríamos choro e riso doideira em juízo Tenente nos gerais ele era A gente era os medeirovazes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 56 Razão dita de boacara se aceitou quando conforme Medeiro Vaz com as poucas palavras que íamos cruzar o Liso do Suçuarão e cutucar de guerrear nos fundões da Bahia Até o tanto houve prezando um rebuliço de festejo O que ninguém ainda não tinha feito a gente se sentia no poder fazer Como fomos dali do Vespê tocamos descendo esbarrancados e es corregador Depois subimos A parte de mais árvores dos cerrados cresce no se caminhar para as cabeceiras Boi brabeza pode surgir do caatingal tresfuriado com o que de gente nunca soube vem feio pior que onça Se viam bandos tão compridos de araras no ar que pareciam um pano azul ou vermelho desenrolado esfiapado nos lombos do vento quente Daí se desceu mais e de repente chegamos numa baixada toda avistada felizinha de aprazível com uma lagoa muito correta rodeada de buritizal dos mais altos buriti verde que afina e esveste belimbeleza E tinha os restos de uma casa que o tempo viera destruindo e um bambual por antigos plantado e um ranchinho Ali se chamava o Bambual do Boi Lá a gente seria de pernoitar e arrumar os finais preparos Eu estava de sentinela afastado um quartodelégua num alto retuso Dali eu via aquele movimento os homens enxergados tamanhinho de meninos numa alegria feito nuvem de abelhas em flor de araçá esse alvoroço como tirando roupa e correndo para aproveitarem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 57 de se banhar no redondo azul da lagoa de donde fugiam espantados todos os pássaros as garças os jaburus os marrecos e uns bandos de patospretos Semelhava que por saberem que no outro dia principiava o peso da vida os com panheiros agora queriam só pular rir e gozar seu exato Mas uns dez tinham de sempre ficar formando prontidão com seus rifles e granadeiras que Medeiro Vaz assim mandava E de tardinha quando voltou o vento era um fino soprado seguido nas palmas dos buritis roladas uma por uma E o bambual quase igualmente Som bom de chuvas Então Diadorim veio me fazer companhia Eu estava meio dúbito Talvez quem tivesse mais receio daquilo que ia acontecer fosse eu mesmo Confesso Eu cá não madruguei em ser corajoso isto é coragem em mim era variável Ah naqueles tempos eu não sabia hoje é que sei que para a gente se transformar em ruim ou em valentão ah basta se olhar um minutinho no espelho caprichando de fazer cara de valentia ou cara de ruindade Mas minha competência foi comprada a todos custos caminhou com os pés da idade E digo ao senhor aquilo mesmo que a gente receia de fazer quando Deus manda depois quando o diabo pede se perfaz O Danador Mas Diadorim estava a suaves Olha Riobaldo me disse nossa destinação é de glória Em hora de desânimo você lembra de sua mãe eu lembro de meu pai Não fale nesses João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 58 Diadorim Ficar calado é que é falar nos mortos Me faltou certeza para responder a ele o que eu estava achando Que von tade era de pôr meus dedos de leve o leve nos meigos olhos dele ocultando para não ter de tolerar de ver assim o chamado até que ponto esses olhos sempre havendo aquela beleza verde me adoecido tão impossível Dormiuse bem De manhãzim moal de aves e pássaros em revôo e pios e cantos a gente toda discorria se esparramava atarefados ajudando para o derradeiro Os bogós de couro foram enchidos nas nascentes da lagoa e enqueridos nas costas dos burrinhos Também tínhamos trazido jumentos só modo para carregar Os cavalos ainda pastavam um pouco do capimgrama que tapava os pés deles Se dizia muita alegria Cada um pegava também sua cabaça dágua e na capanga o diário de se valer com o que comer paçoca Medeiro Vaz depois de não dizer nada deu ordem de seguida Primeiro para adiante foi uma turma de cinco homens a patrulhazinha Constante que com a gente estavam três bons rastreadores Suzarte Joaquim Beiju e Tipote esse Tipote sabia meios de descobrir cacimbas e grotas com o bebível o Suzarte desempenhava um faro de cachorromestre e Joaquim Beiju conhecia cada recanto dos gerais de dia e de noite referido João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 59 deletreado quisesse podia mapear planta Saímos semoventes Seis novilhos gordos a gente repontava serviam para se carnear em rota De repente com a gente se afastando os pássaros todos voltavam do céu que desciam para seus lugares em ponto nas frescas beiras da lagoa ah a papeagem no buritizal que lequelequeia A ver e o sol em pulo de avanço longe na banda de trás por cima de matos rebentava aquela grandidade Dia desdobrado Em o que afundamos num cerrado de mangabal indo sem volvência até perto de hora do almoço Mas o terreno aumentava de soltado E as árvores iam se abaixando menorzinhas arregaçavam saia no chão De vir lá só algum tatu por mel e mangaba Depois se acabavam as mangabaranas e mangabeirinhas Ali onde o campo largueia Os urubus em vasto espaceavam Se acabou o capinzal de capimredondo e paspalho e paus espinhosos que mesmo as moitas daquele de prateados feixes capins assins Acabava o grameal naquelas paragens pardas Aquilo vindo aos poucos dava um peso extrato o mundo se envelhecendo no descampante Acabou o sapé brabo do chapadão A gente olhava para trás Daí o sol não deixava olhar rumo nenhum Vi a luz castigo Um gaviãoandorim foi o fim de pássaro que a gente divulgou Achante pois se estava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 60 naquela coisa taperão de tudo fofo ocado arrevesso Era uma terra diferente louca e lagoa de areia Onde é que seria o sobejo dela confinante O sol vertia no chão com sal esfaiscava De longe vez capins mortos e uns tufos de seca planta feito cabeleira sem cabeça Asexalastrava a distância adiante um amarelo vapor E fogo começou a entrar com o ar nos pobres peitos da gente Expondo ao senhor que o sucedido sofrimento sobrefoi já inteirado no começo daí só mais aumentava E o que era para ser O que é pra ser são as palavras Ah porque Por quê Juro que pontual nos instantes de o raso se pisar um sujeito dos companheiros um João Bugre me disse ou disse a outro do meu lado O Hermógenes tem pauta Ele se quis com o Capiroto Eu ouvi aquilo demais O pacto Se diz o senhor sabe Bobéia Ao que a pessoa vai em meianoite a uma encruzilhada e chama fortemente o Cujo e espera Se sendo háde que vem um pédevento sem razão e arre se comparece uma porca com ninhada de pintos se não for uma galinha puxando barrigada de leitões Tudo errado remedante sem completação O senhor João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 61 imaginalmente percebe O crespo a gente se retém então dá um cheiro de breu queimado E o dito o Coxo toma espécie se forma Carece de se conservar coragem Se assina o pacto Se assina com sangue de pessoa O pagar é a alma Muito mais depois O senhor vê superstição parva Estornadas O Hermógenes tem pautas Provei Introduzi Com ele ninguém podia O Hermógenes demônio Sim só isto Era ele mesmo A gente viemos do inferno nós todos compadre meu Quelemém instrui Duns lugares inferiores tão monstro medonhos que Cristo mesmo lá só conseguiu aprofundar por um relance a graça de sua sustância alumiável em as trevas de véspera para o Terceiro Dia Senhor quer crer Que lá o prazer trivial de cada um é judiar dos outros bom atormentar e o calor e o frio mais perseguem e para digerir o que se come é preciso de esforçar no meio com fortes dores e até respirar custa dor e nenhum sossego não se tem Se creio Acho proseável Repenso no acampo da Macaúba da Jaíba soante que mesmo vi e assaz me contaram e outros as ruin dades de regra que executavam em tantos pobrezinhos arraiais baleando esfaqueando estripando furando os olhos cortando línguas e orelhas não economizando as crianças pequenas atirando na inocência do gado queimando pessoas ainda meio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 62 vivas na beira de estrago de sangues Esses não vieram do inferno Saudações Se vê que subiram de lá antes dos prazos figuro que por empreitada de punir os outros exemplação de nunca se esquecer do que está reinando por debaixo Em tanto que muitos retombam para lá constante que morrem Viver é muito perigoso Mas mor o infernal a gente também media Digo A igual igualmente As chuvas já estavam esquecidas e o miolo mal do sertão residia ali era um sol em vazios A gente progredia dumas poucas braças e calcava o reafundo do areião areia que escapulia sem firmeza puxando os cascos dos cavalos para trás Depois se repraçava um entranço de viceversa com espinhos e restolho de graviá de áspera raça verdepreto cor de cobra Ca minho não se havendo Daí trasla um duro chão rosado ou cinzento gretoso e escabro no desentender aquilo os cavalos arupanavam Diadorim sempre em prumo a cabeça o sorriso dele me dobrava o ansiar Como que falasse Hê valentes somos corruscubas sobre ninguém que vamos padecer e morrer por aqui Os medeirovazes Medeiro Vaz se estugasse adiante junto com os que rastreavam Será que de lá ainda se podia receder De devagar vi visagens Os companheiros se prosseguindo só prosseguindo receei de ter João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 63 um vágado como tonteira de truaca Havia eu de saber por quê Acho que provinha de excessos de idéia pois caminhadas piores eu já tinha feito a cavalo ou a pé no tostasol Medo meu medo Agüentei Tanto tudo o que eu carregava comigo me pesava eu ressentia as correias dos correames os formatos A com léguaemeia de andada bebi meu primeiro chupo dágua da cabaça eu tinha avarezas dela Alguma justa noção não emendei eu pensava desconjuntado Até que esbarramos Até que no mesmo padrão de lugar sem mudança nenhuma nenhuma árvore nem barranco nem nada se viu o sol de um lado deslizar e a noite armar do outro Nem auxiliei a tomar conta dos bois nem a destravar os burros de albarda Onde era que os animais iam poder pastar Noite redondeou noite sem boca Desarreei peei o animal caí e dormi Mas no extremo de adormecer ainda intruji duas coisas em cruz que Medeiro Vaz estava insensato e que o Hermógenes era pactário Tomo que essas traves fecharam meus olhos De Diadorim aí jaz que descansando do meu lado assim ouvi Pois dorme Riobaldo tudo háde resultar bem Antes palavras que picaram em mim uma gastura cansada mas a voz dele era o tantotanto para o embalo de meu corpo Noite essa astúcia que tive uma sonhice Diadorim passando por debaixo de um arcoíris Ah eu pudesse mesmo gostar dele os gostares João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 64 Como vou achar ordem para dizer ao senhor a continuação do martírio em desde que as barras quebraram no seguinte na brumalva daquele falecido amanhecer sem esperança em uma sem o simples de passarinhos faltantes Fomos Eu abaixava os olhos para não reter os horizontes que trancados não alteravam circunstavam Do sol e tudo o senhor pode completar imaginado o que não pode para o senhor é ter sido vivido Só saiba o Liso do Suçuarão concebia silêncio e produzia uma maldade feito pessoa Não destruí aqueles pensamentos ir e ir vir e só e que Medeiro Vaz estava demente sempre existido doidante só agora pior se destapava era o que eu tinha rompência de gritar E os outros companheiros que é que os outros pensavam Sei De certo nadas e noves iam como o costume sertanejos tão sofridos Jagunço é homem já meio de sistido por si A calamidade de quente E o esbraseado o estufo a dor do calor em todos os corpos que a gente tem Os cavalos venteando só se ouvia o resfol deles cavalanços e o trabalho custoso de suas passadas Nem menos sinal de sombra Água não havia Capim não havia A debeber os cavalos em cocho armado de couro e dosar a meio eles esticando os pescoços para pedir eles olhavam como para seus cascos mostrando tudo o que cangavam de esforço e cada restar de bebida carecia de ser poupado Se ia o pesadelo Pesadelo mesmo de delírios Os João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 65 cavalos gemiam descrença Já pouco forneciam E nós estávamos perdidos Nenhum poço não se achava Aquela gente toda sapirava de olhos vermelhos arroxeavam as caras A luz assassinava demais E a gente dava voltas os rastreadores fare jando procurando Já tinha quem beijava os bentinhos se rezava De mim entreguei alma no corpo debruçado para a sela numa quebreira Até minhas testas formaram de chumbo Valentia vale em todas horas Repensei coisas de cabeçabranca Ou eu variava A saudade que me dependeu foi de Otacília Moça que dava amor por mim existia nas Serras dos Gerais Buritis Altos cabeceira de vereda na Fazenda Santa Catarina Me airei nela como a diguice duma música outra água eu provava Otacília ela queria viver ou morrer comigo que a gente se casasse Saudade se susteve curta Desde uns versos Buriti minha palmeira lá na vereda de lá casinha da banda esquerda olhos de onda do mar Mas os olhos verdes sendo os de Diadorim Meu amor de prata e meu amor de ouro De doer minhas vistas bestavam se embaçavam de renuvem e não achei acabar para olhar para o céu Tive pena do pescoço do meu cavalo pedação tábua João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 66 suante padecente Voltar para trás para as boas serras Eu via queria ver antes de dar à casca um pássaro voando sem movimento o chão fresco remexido pela fossura duma anta o cabecear das árvores o riso do ar e o fogo feito duma arara O senhor sabe o que é o frege dum vento sem uma moita um pé de parede pra ele se retrasar Diadorim não se apartou do meu lado Caso que arredondava a testa pensando Adivinhou que eu roçava longe dele em meus pensamentos Riobaldo não se matou a Ana Duzuza Nada de reprovável não se fez falou E eu não respondendo Agora o que era que aquilo me importava de malfeitos e castigos Eu ambicionava o suíxo manso dum córrego nas lajes o bom sumiço dum riacho mato a fundo E adverti memória dos derradeiros pássaros do Bambual do Boi Aqueles pássaros faziam arejo Gritavam contra a gente cada um asia sua sombra num palmo vivo dágua O melhor de tudo é a água No escaldado Saio daqui com vida deserteio de jaguncismo vou e me caso com Otacília eu jurei do proposto de meus todos sofrimentos Mas mesmo depois naquela hora eu não gostava mais de ninguém só gostava de mim de mim Novo que eu estava no velho do inferno Dia da gente desexistir é um certo decreto por isso que ainda hoje o senhor aqui me vê Ah e os poços não se achavam Alguém já tinha declarado de morto O Miquim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 67 um rapaz sério sincero que muito valia em guerreio esbarrou e se riu Será que não é sorte Depois se sofreu o grito de um adiante Estou cego Mais aquele o do pior caiu total virado torto embaraçando os passos das montadas De repente um rosnou reclamou baixo Outro também Os cavalos bobejavam Vi uma roda de caras de homens Suas as caras Credo como algum até as orelhas dele estavam cinzentas E outro todo empretecido e sangrava das capelas e paposdos olhos Medeiro Vaz a nada não atendia Ouvi minhas veias Aí a rumo eu pude pegar a rédea do animal de Diadorim aquelas peças doeram na minha mão tive que fiquei um instante no inclinado Daqui deste mesmo de lugar mais não vou Só desarrastado vencido mas falei Diadorim pareceu em pedra cão que olha Contanto me mirou a firme com aquela beleza que nada mudava Pois vamos retornar Riobaldo Que vejo que nada campou viável Tal tempo truquei mais forte rouco como um guariba Foi aí que o cavalo de Diadorim afundou aberto espalhado no chão e se agoniou Eu apeei do meu Medeiro Vaz estava ali num aspeito repartido Pessoal companheiro em redor se engasgavam pelo o resultado Nós temos de voltar chefe Diadorim solicitou Acabou de falar e parou um gesto para nós a gente sofreasse Tom bom mas se via que Medeiro Vaz não podia outro querer João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 68 a não ser o que Diadorim perguntava Medeiro Vaz então por primeira vez abriu dos lados as mãos de nada não poder fazer e ele esteve de ombros rebaixados Mais não vi e entendi Peguei minha cabaça bebi gole amargo de felém Mas era mesmo o final de se voltar Deus me disse E o senhor mais saiba de supeto já eu estava remoçado são disposto Todos influídos assim Pra trás sempre dá o prazer Diadorim apalpou meu braço Vi os olhos dele marejados Mor que depois eu soube que a idéia de se atravessar o Liso do Suçuarão ele Diadorim era que a Medeiro Vaz tinha aconselhado Mas para que contar ao senhor no tinte o mais que se mereceu Basta o vulto ligeiro de tudo Como Deus foi servido de lá do estralal do sol pudemos sair sem maiores estragos Isto é uns homens mortos e mais muitos dos cavalos Mesmo o mais grave sido que restamos sem os burros fugidos por infelizes e a carga quase toda toda com os mantimentos a gente perdemos Só não acabamos sumidos dextraviados por meio do regular das estrelas E foi Saímos dali num pintar de aurora E em lugares deerrados Mais não se podia Céu alto e o adiado da lua Com outros nossos padecimentos os homens tramavam zuretados de fome caça não achávamos até que tombaram à bala um macaco vultoso destrincharam quartearam e estavam comendo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 69 Provei Diadorim não chegou a provar Por quanto juro ao senhor enquanto estavam ainda mais assando e manducando se soube o corpudo não era bugio não não achavam o rabo Era homem humano morador um chamado José dos Alves Mãe dele veio de aviso chorando e explicando era criaturo de Deus que nu por falta de roupa Isto é tanto não pois ela mesma ainda estava vestida com uns trapos mas o filho também escapulia assim pelos matos por da cabeça prejudicado Foi assombro A mulher fincada de joelhos invocava Algum disse Agora que está bem falecido se come o que alma não é modo de não morrermos todos Não se achou graça Não mais não comeram não puderam Para acompanhar nem farinha não tinham E eu lancei Outros também vomitavam A mulher rogava Medeiro Vaz se prostrou com febre diversos perrengavam Aí então é a fome uns xingavam Mas outros conseguiram da mulher informação que tinha obra de quartodelégua de lá um mandioca sobrado Arre que não ouvi gritarem que de certo por vingança a mulher ensinasse aquilo de ser mandiocabrava Esses olhavam com terrível raiva Nesse tempo o Jacaré pegou de uma terra qualidade que dizem que é de bom aproveitar e gostosa Me deu comi sem achar sabor só o pepego esquisito e enganava o estômago Melhor engolir capins e folhas Mas uns já enchiam até capanga com tor João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 70 rão daquela terra Diadorim comeu A mulher também aceitou a coitada Depois Medeiro Vaz passou mal outros tinham dores pensaram que carne de gente envenenava Muitos estavam doentes sangrando nas gengivas e com manchas vermelhas no corpo e danado doer nas pernas inchadas Eu cumpria uma disenteria garrava a ter nojo de mim no meio dos outros Mas pudemos chegar até na beira do dosBois e na Lagoa Suçuarana ali se pescou Nós trouxemos aquela mulher o tempo todo ela temia de que faltasse outro decomer e ela servisse Quem quiser bulir com ela que me venha Diadorim garantiu Que só venha eu secundei do lado dele Matouse capivara gorda por fim Dum geralista roto ganhamos farinhadeburiti sempre ajudava E seguimos o corgo que tira da Lagoa Su çuarana e que recebe o do Jenipapo e a Vereda doVitorino e que verte no Rio Pandeiros esse tem cachoeiras que cantam e é dágua tão tinto que papagaio voa por cima e gritam sem acordo É verde É azul É verde É verde E longe pedra velha remeleja vi Santas águas de vizinhas E era bonito no correr do baixo campo as flores do capitãodasalatodas vermelhas e alaranjadas rebrilhando estremecidas de reflexo É o cava lheirodasala Diadorim falou entusiasmado Mas o Alaripe perto de nós sacudiu a cabeça Em minha terra o nome dessa ele disseé donajoana Mas o leite dela é venenoso João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 71 Esbandalhados nós estávamos escatimados naquela esfrega Esmorecidos é que não Nenhum se lastimava filhos do dia acho mesmo que ninguém se dizia de dar por assim Jagunço é isso Jagunço não se escabreia com perda nem derrota quase que tudo para ele é o igual Nunca vi Pra ele a vida já está assentada comer beber apreciar mulher brigar e o fim final E todo o mundo não presume assim Fazendeiro também Querem é trovão em outubro e a tulha cheia de arroz Tudo que eu mesmo do que mal houve me esquecia Tornava a ter fé na clareza de Medeiro Vaz não desfazia mais nele digo Confiança o senhor sabe não se tira das coisas feitas ou perfeitas ela rodeia é o quente da pessoa E despaireci meu espírito de ir procurar Otacília pedir em casamento mandado de virtude Fui fogo depois de ser cinza Ah algum isto é que é a gente tem devassalar Olhe Deus come escondido e o diabo sai por toda parte lambendo o prato Mas eu gostava de Diadorim para poder saber que estes gerais são formosos Talmente também se carecia de tomar repouso e aguardo Por meios e modos sortimos arranjados animais de montada arranchamos dias numa fazenda hospitaleira na Vereda do Alegre e viemos vindo atravessando o Pardo e o Acari em toda a parte a gente era recebida a bem Tardou foi para se ter sinal João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 72 dos bandos dos Judas Mas a vantagem nossa era que todos os moradores pertenciam do nosso lado Medeiro Vaz não maltratava ninguém sem necessidade justa não tomava nada à força nem consentia em desatinos de seus homens Esbarrávamos em lugar as pessoas vinham davam o que podiam em comidas outros presentes Mas os Hermógenes e os cardões roubavam defloravam demais determinavam sebaça em qualquer povoa àtoa renitiam feito peste Na ocasião o Hermógenes beirava a Bahia de lá se soube e eram um mundo enorme de má gente E o Ricardão Estivesse esperasse Dando meias andadas nós chegamos num pontoverdadeiro num BuritidoZé Dono de lá Sebastião Vieira tinha curral e casa E guardava munição da gente mais de dez mil tiros de bala Por que foi que não se fez combate depois naqueles meses todos A verdade digo ao senhor os soldados do Governo perseguiam a gente Major Oliveira Tenente Ramiz e Capitão Melo Franco esses não davam espaço E Medeiro Vaz pensava era um pensamento a gente mamparreasse de com eles não guerrear não se esperdiçar porque as nossas armas guardavam um destino só de dever Escapulíamos esquipávamos Vereda em vereda como os buritis ensinam a gente varava para após Se passava o Piratinga que é fundo se passava ou no Vau da Mata João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 73 ou no Vau da Boiada ou então pegando mais por baixo o São Domingos no Vau do José Pedro Se não subíamos beira desse até às nascentes no São Dominguinhos A ser o importante que se tinha de estudar era avançar depressa nas boas passagens nas divisas quando militar vinha cismado empurrando É preciso de saber os trechos de se descer para Goiás em debruçar para Goiás o chapadão por lá vai terminando despenha Tem quebra cangalhas e ladeiras terríveis vermelhas Olhe muito em além vi lugares de terra queimada e chão que dá som um estranho Mundo esquisito Brejo do Jatobazinho de medo de nós um homem se enforcou Por aí extremando se chegava até no Jalapão quem conhece aquilo tabuleiro chapadoso proporema Pois lá um geralista me pediu para ser padrinho de filho O menino recebeu nome de Diadorim também Ah quem oficiou foi o padre dos baianos saiba o senhor população de um arraial baiano inteira que marchava de mudadahomens mulheres as crias os velhos o padre com seus petrechos e cruz e a imagem da igreja tendo até bandinhademúsica como vieram com todos parecendo nação de maracatu Iam para os diamantes tão longe eles mesmo dizendo nos rios Uns tocavam jumentos de almocreve outros carregavam suas coisas sacos de mantimentos trouxas de roupa rede de caroá a tiracol O padre com chapéudecouro pràtrasado Só era uma João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 74 procissão sensata enchendo estrada às poeiras com o plequeio das alpercatas as velhas tiravam ladainha gente cantável Rezavam indo da miséria para a riqueza E pelo prazer de tomar parte no conforto de religião acompanhamos esses até à Vila da PedradeAmolar Lá venta é da banda do poente no tempodas águas na seca o vento vem deste rumo daqui O cortejo dos baianos dava parecença com uma festa No sertão até enterro simples é festa Às vezes eu penso seria o caso de pessoas de fé e posição se reunirem em algum apropriado lugar no meio dos gerais para se viver só em altas rezas fortíssimas louvando a Deus e pedindo glória do perdão do mundo Todos vinham comparecendo lá se levantava enorme igreja não havia mais crimes nem ambição e todo sofrimento se espraiava em Deus dado logo até à hora de cada uma morte cantar Raciocinei isso com compadre meu Quelemém e ele duvidou com a cabeça Riobaldo a colheita é comum mas o capinar é sozinho ciente me respondeu Compadre meu Quelemém é um homem fora de projetos O senhor vá lá na Jijujã Vai agora mês de junho A estrela dalva sai às três horas madrugada boa gelada É tempo da cana Senhor vê no escuro um quebrapeito e é ele mesmo já João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 75 risonho e suado engenhando o seu moer O senhor bebe uma cuia de garapa e dá a ele lembranças minhas Homem de mansa lei coração tão branco e grosso de bom que mesmo pessoa muito alegre ou muito triste gosta de poder conversar com ele Todo assim o que minha vocação pedia era um fazendão de Deus colocado no mais tope se braseando incenso nas cabeceiras das roças o povo entoando hinos até os pássaros e bichos vinham bisar Senhor imagina Gente sã valente querendo só o Céu finalizando Mas diverso do que se vê ora cá ora ali lá Como deu uma moça no BarreiroNovo essa desistiu um dia de comer e só bebendo por dia três gotas de água de pia benta em redor dela começaram milagres Mas o delegado regional chegou trouxe os praças determinou o desbando do povo baldearam a moça para o hospício de doidos na capital dizse que lá ela foi cativa de comer por armagem de sonda Tinham o direito Estava certo Meio modo acho que foi bom Aquilo não era o que em minha crença eu prezava Porque num estalo de tempo já tinham surgido vindo milhares desses para pedir cura os doentes condenados lázaros de lepra aleijados por horríveis formas feridentos os cegos mais sem gestos loucos acorrentados idiotas héticos e hidrópicos de tudo criaturas que fediam Senhor enxergasse aquilo o senhor desanimava Se tinha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 76 um grande nojo Eu sei nojo é invenção do QueNãoHá para estorvar que se tenha dó E aquela gente gritava exigiam saúde expedita rezavam alto discutiam uns com outros desesperavam de fé sem virtude requeriam era sarar não desejavam Céu nenhum Vendo assaz se espantava da seriedade do mundo para caber o que não se quer Será acerto que os aleijões e feiezas estejam bem convenientemente repartidos nos recantos dos lugares Se não se perdia qualquer coragem O sertão está cheio desses Só quando se jornadeia de jagunço no teso das marchas praxe de ir em movimento não se nota tanto o estatuto de misérias e enfermidades Guerra diverte o demo acha Mire veja um casal no Rio do Borá daqui longe só porque marido e mulher eram primos carnais os quatro meninos deles vieram nascendo com a pior transformação que há sem braços e sem pernas só os tocos Arre nem posso figurar minha idéia nisso Refiro ao senhor um outro doutor doutor rapaz que explorava as pedras turmalinas no vale do Araçuaí discorreu me dizendo que a vida da gente encarna e reencama por progresso próprio mas que Deus não há Estremeço Como não ter Deus Com Deus existindo tudo dá esperança sempre um milagre é possível o mundo se resolve Mas se não tem Deus háde a gente perdidos no vaivem e a vida é burra É o aberto perigo das João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 77 grandes e pequenas horas não se podendo facilitar é todos contra os acasos Tendo Deus é menos grave se descuidar um pouquinho pois no fim dá certo Mas se não tem Deus então a gente não tem licença de coisa nenhuma Porque existe dor E a vida do homem está presa encantoada erra rumo dá em aleijões como esses dos meninos sem pernas e braços Dor não dói até em criancinhas e bichos e nos doidos não dói sem precisar de se ter razão nem conhecimento E as pessoas não nascem sempre Ah medo tenho não é de ver morte mas de ver nascimento Medo mistério O senhor não vê O que não é Deus é estado do demônio Deus existe mesmo quando não há Mas o demônio não precisa de existir para haver a gente sabendo que ele não existe aí é que ele toma conta de tudo O inferno é um semfim que nem não se pode ver Mas a gente quer Céu é porque quer um fim mas um fim com depois dele a gente tudo vendo Se eu estou falando às flautas o senhor me corte Meu modo é este Nasci para não ter homem igual em meus gostos O que eu invejo é sua instrução do senhor De Araçuaí eu trouxe uma pedra de topázio Isto sabe o senhor por que eu tinha ido lá daqueles lados De mim conto Como é que se pode gostar do verdadeiro no falso Amizade com ilusão de desilusão Vida muito esponjosa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 78 Eu passava fácil mas tinha sonhos que me afadigavam Dos de que a gente acorda devagar O amor Pássaro que põe ovos de ferro Pior foi quando peguei a levar cruas minhas noites sem poder sono Diadorim era aquela estreita pessoa não dava de transparecer o que cismava profundo nem o que presumia Acho que eu também era assim Dele eu queria saber Só se queria e não queria Nem para se definir calado em si um assunto contrário absurdo não concede seguimento Voltei para os frios da razão Agora destino da gente o senhor veja eu trouxe a pedra de topázio para dar a Diadorim ficou sendo para Otacília por mimo e hoje ela se possui é em mão de minha mulher Ou conto mal Reconto Ao que nós acampados em pé duns brejos brejal cabo de várzea Até lá era favorável de defender que os cavalos se espairassem por ter manga natural onde se encostar e currais falsos de pegar gado brabeza Natureza bonita o capim macio Me revejo de tudo daquele diaadia Diadorim restava um tempo com uma cabaça nas duas mãos eu olhava para ele Seja por ser Riobaldo que em breve rompemos adiante Desta vez a gente tange guerra pronunciou a prazer como sempre quando assim em véspera Mas balançou a cabaça tinha um trem dentro um ferro o que me deu desgosto taco de ferro sem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 79 serventia só para produzir gastura na gente Bota isso fora Diadorim eu disse Ele não contestou e me olhou de um hesitado jeito que se eu tivesse falado causa impossível Em tal guardou o pedaço de ferro na algibeira E ficava todaavida com a cabaça nas mãos era uma cabaça baiana fabricada desenhada de capricho mas que agora sendo para nojo E como me deu sede eu peguei meu copo de corno lavrado que não quebra nunca e fomos apanhar água num poço que ele me disse Era por esconso por uma palmeira duma de nome que não sei de curta altura mas regrossa e com cheias palmas reviradas para cima e depois para baixo até pousar no chão com as pontas Todas as palmas tão lisas tão juntas fechavam um coberto remedando choupã de índio Assino que foi de avistarem umas assim que os bugres acharam idéia de formar suas tocas Aí a gente se curvar suspendia uma folhagem lá entrava O poço abria redondo quase ou ovalado Como no recesso do mato ali intrim toda luz verdeja Mas a água mesma azul dum azul que haja que roxo logo mudava A vai coração meu foi forte Sofismei se Diadorim segurasse em mim com os olhos me declarasse as todas as palavras Reajo que repelia Eu Asco Diadorim parava normal estacado observando tudo sem importância Nem provia segredo E eu tive decepção de logro por conta desse sensato silêncio Debrucei ia catar água Mas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 80 qual se viu um bicho rã brusca feiosa botando bolhas que à lisa cacheavam Resumo que nós dois sob num tempo demos para trás discordes Diadorim desconversou e se sumiu por lá por aí consoante a esquisitice dele de sempre às vezes desaparecer e tornar a aparecer sem menos Ah quem faz isso não é por ser e se saber pessoa culpada No que vim para um grupo de companheiros esses estavam jogando buzo enchendo folga Por simples que a companheirada naqueles derradeiros tempos me caceteava com um enjôo todos eu achava muito ignorantes grosseiros cabras Somente que na hora eu queria a frouxa presença deles fulão e sicrão e beltrão e romão pessoal ordinário A tanto mesmo sem fome providenciei para mim uma jacuba no comecalado E quis que até me perguntei pensar na vida Penso Mas foi no instante em que todos levantaram as caras só sendo um rebuliço acolá na virada que principiava a vertente onde é que estavam uns outros que chamavam muito acenando especial Pois fomos ligeiro ver o que subindo pelo resfriado Passava era uma tropa os diversos lotes de burros que vinham de São Romão levavam sal para Goiás E o arrieiro mestre relatando uma infeliz notícia dessas da vida Ele era alto feições compridas dentuço Medeiro Vaz exigiu certeza João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 81 Olhe pois era o arrieiro respondeu e antes de morrer deu o nome que era SantosReis Mais não propôs dizer porque aí se exalou Comandante o senhor creia nós tivemos grande pena A gente em volta se consternava Aqueles tropeiros no Cururu tinham achado o SantosReis que morria urgente tinham acendido vela e enterrado Febres Ao menos mais a alma descansasse A gente tirou chapéus em voto todos se benzendo E o SantosReis era o homem que vivo fazia mais falta ele estava viajando para trazer recado e combinação da parte de Só Candelário e Titão Passos chefes em nosso favor na outra grande banda do Rio Agora alguém carece de ir Medeiro Vaz decidiu olhando salteado amém nós apreciávamos Eu espiei caçando Diadorim que ali que era a mocinha de cabelos louros Sesfredo me conta me fala nesse acontecer nem bem cem braças andadas eu já pedia a ele Era como se eu tivesse de caçar emprestada uma sombra de um amor E você não volta para lá Sesfredo Você agüenta o existir perguntei Guardo isso para às vezes ter saudade Berimbau Saudade só e ele alargou as ventas de tanto riso Vi que a estória da moça era falsa De inventar ouco se ganha Regra do mundo é João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 82 muito dividida O Sesfredo comia muito E sabia assoviar seguido copiando o de muitos pássaros Ao viável eu tinha de atravessar as tantas terras e municipios jogamos uma viagem por este Norte meia geral Assim conheço as províncias do Estado não há onde eu não tenha aparecido A que viemos por Extrema de Santa Maria Barreiro Claro Cabeça de Negro Córrego Pedra do Gervásio Acari Vieira e Fundo buscando jeito de encostar no de São Francisco Novidade não houve Passamos numa barca Só sempre bater para o nascente direitamente em cima de Tremedal chamada hoje MonteAzul Sabíamos um pessoal nosso perpassava por lá na Jaíba até à Serra Branca brabas terras vazias do Rio VerdeGrande De madrugada acordamos em sua janela um velhozinho dono de um bananal O velho zinho era amigo executou o recado Daí a cinco madrugadas retornamos Era para vir alguém quem veio foi João Goanhá próprio E as descrições que deu foram de todas as piores Só Candelário Morto em tiroteio de combate metralhadoras tinham serrado o corpo dele de esguelha por riba da cintura O Alípio preso levado para a cadeia de algum lugar Titão Passos Ah perseguido por uma soldadesca tivera de se escapar para a Bahia pela proteção do Coronel Horácio de Matos Só mesmo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 83 João Goanhá era quem ainda estava Comandava saldo de uns homens os poucos Mas coragem e munição não faltavam E os Judas perguntei com triste raciocínio por que era que os soldados não deixavam a gente em paz mas com aqueles não terçavam Se diz que eles têm uma proteção preta João Goanhá me esclareceu O Hermógenes fez o pauto É o demônio rabudo quem pune por ele Nisso todos acreditavam Pela fraqueza do meu medo e pela força do meu ódio acho que eu fui o primeiro que cri Ainda disse João Goanhá que estávamos em brevidade Porque ele sabia que os Judas reforçados tinham resolvido passar o Rio em dois lugares e marcharem em cima de Medeiro Vaz para acabar com ele de uma vez no país de lá Onde era que o perigo Medeiro Vaz precisava de nós Mas não pudemos Mal a gente se tocou para a Cachoeira do Salto e esbarramos com tropa de soldados tenente Plínio Foi fogo Fugimos Fogo no Jacaré Grande tenente Rosalvo Fogo no Jatobá Torto sargento Leandro Volteamos Sobre aí me senti pior de sorte que uma pulga entre dois dedos No formato da forma eu não era o valente nem mencionado medroso Eu era um homem restante trivial A verdade que diga eu bem defronte de mim se portava mesmo segurava uma vara João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 84 deferrão considerei nele certo propósito de despique gandaiado Apartei minhas vistas Requeri dei passo Se sendo ordens Chefe eu gostava era de ir Medeiro Vaz limpou a goela A meio eu estava me lançando mas mais negaceando prosápia duvidoso dele consentir pelo bom atirador que eu era o melhor e mor necessitavam de mim haviam de querer me mandar escoteiro dizedor de mensagem E aí se deu o que se deu o isto é Medeiro Vaz concordou Mas carece de levar um companheiro ele propôs Aí em tanto eu não devia de me calar deixar alheia a escolha do segundo que não me competia Ah ânsia que eu não queria o que de certo queria e que podia se surtir de repente E a vontade de fim que me ora vinha ranger na boca me levou num avanço Sendo suas ordens Chefe o Sesfredo comigo vai falei Nem olhei Diadorim Medeiro Vaz aprouve Me encarou demais e despachou em duríssimo Vai então e no caminho não morre A ser que Medeiro Vaz por esse tempo já acusava doença a quase acabada no peso do fôlego e no desmancho dos traços Estava amarelo almecegado se curvava sem querer e diziam que no verter água ele gemia Ah mas outro igual eu não conheci Quero ver o homem deste homem Medeiro Vaz o Rei dos Gerais João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 85 Por que era que eu estava procedendo àtoa assim Senhor sei O senhor vá pondo seu perceber A gente vive repetido o repetido e escorregável num mim minuto já está empurrado noutro galho Acertasse eu com o que depois sabendo fiquei para de lá de tantos assombros Um está sempre no escuro só no último derradeiro é que clareiam a sala Digo o real não está na saída nem na chegada ele se dispõe para a gente é no meio da travessia Mesmo fui muito tolo Hoje em dia não me queixo de nenhuma coisa Não tiro sombras dos buracos Mas também não há jeito de me baixar em remorso Sim que só duma coisa E dessa mesma o que tenho é medo Enquanto se tem medo eu acho até que o bom remorso não se pode criar não é possível Minha vida não deixa benfeitorias Mas me confessei com sete padres acertei sete absolvições No meio da noite eu acordo e pelejo para rezar Posso Constante eu puder meu suor não esfria O senhor me releve tanto dizer Mire veja o que a gente é mal dali a um átimo eu selando meu cavalo e arrumando meus dobros e já me muito entristecia Diadorim me espreitava de longe afetando a espécie duma vagueza No me despedir tive precisão de dizer a ele baixinho Por teu pai vou amigo manoohmano Vingar Joca Ramiro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 86 A fraqueza minha adulatória Mas ele respondeu Viagem boa Riobaldo E boasorte Despedir dá febre Galopando junto com Sesfredo larguei aquele lugar do Buriti das Três Fileiras Pesares que me desenrolavam E então eu decifrei meu arranque de ter querido vir com o Sesfredo Que ele se sabia tinha deixado fazia muitos anos em terras do Jequitinhonha uma moça que apaixonava e achava que não tinha nascido para aquilo de ser sempre jagunço não gostava Como é então que um se repinta e se sarrafa Tudo sobrevém Acho acho é do influimento comum e do tempo de todos Tanto um prazo de travessia marcada sazão como os meses de seca e os de chuva Será Medida de muitos outros igualasse com a minha esses também não sentindo e não pensando Se não por que era que eram aqueles aprontados versos que a gente cantava tanto todaavida indo em bando por estradas jornadas à alegria fingida no coração Olererê baiana eu ia e não vou mais eu faço que vou lá dentro oh baiana e volto do meio pra trás João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 87 João Goanhá por valentão e verdadeiro nem carecia de estadear orgulho Pessoa muito leal e briosa Ele me disse Agora da gente não sei o que vai ser Para guerra grande eu acho que só Joca Ramiro é que era capaz Ah mas João Goanhá também tinha suas cartas altas Homem de grito grosso E mesmo ignorante analfabeto de repente ele tirava sei não de onde terríveis mindinhas idéias mortes diversas Assim a gente experimentava cá e cá falseando fuga Os camposgerais ali também tem Tombadores Arre os tremedais já viu algum O chão deles consiste duro enxuto normal que engana quem não sabe o resto vem pisa vai avançando tropa com cavalos cavalama Seja sem espera quando já estão meio no meio aquilo sucrepa pega a se abalar ronca treme escapulindo feito gema de ovo na frigideira Ei Porque debaixo da crosta seca rebole ocultado um semifundo de brejão engolidor Pois em roda dali João Goanhá dispôs que a gente se amoitasse três golpes de homens tocaiando Ao de manhã primeiro passaram os do sargento Leandro esses eram os menos e um guia pagavam por conhecer o caminho firme Mas fomos lá às pressas espalhamos de lugar os ramos verdes de árvore que eles tinham botado para a certa informação No depois vinham os do tenente Tenente tenente tu quer Seguidos por ali entraram ah Dos nossos uns acolá deram tiros por disfarçação Iscas Cavalaria dos praças se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 88 avexou Ave e pronto de repente foi a casca de terra sacudia se rachou em cruzes estalando em muitos metros balofou Os cavalos entornados era como despejar prateleiras cheias e os soldados aiando gritos se abraçavam com os animais caintes ou com o ar uns a esmo desfechavam mosquetão Mas encalcados se afundando pra não mais A gente se queria mirava ainda acertava neles Coisas que vi vi vi oi Eu não atirei Não tive braçagem Talvez tive pena Tanto por tanto daí se encachorraram mais em nós por beber vinganças De campos e matas vargens e grotas em cada ponto para trás dos lados e adiante da gente ei eram só soldados montão se gerando FuradodoMeio Serra do DeusMe Livre Passagem da Limeira Chapada do Covão Solón Nélson morreu Arduininho morreu Morreram o Figueiró BatataRoxa Dávila Manhoso o Campelo o Clange Deovídio Pescoço Preto Toquim o Sucivre Elisiano Pedro Bernardo acho que foram esses todos Chapada do Sumidouro Córrego do Poldro Mortos mais uns seis Corrijo com outros que pegos presos se disse que foram acabados Doideamos A Bahia estava cercada nas portas Achavam de tomar regalia de desforra na gente até qualquer molambo de sujeito paisano morador Ah às vezes perdiam ligeiro essa graça Gerais da Pedra Lá o Eleutério se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 89 apartou da gente umas cem braças e foi a pé bateu em porta duma cafua por esclarecer O capiau surgiu ensinou alguma coisa errada Eleutério agradeceu deu as costas veio andando uns passos O capiau então chamou Eleutério virou para trás para ouvir o que havia e levou na cara e nos peitos o cheio duma carga de chumbo fino Cegou rodou entrupicado arreganhava os braços todo se sarapintando das manchas vermelhas que cresciam O cabelo dele aumentou em pé E a soldadesca atirava de emboscados no mato do córrego e na beira do cerrado da outra banda O capiau se encobriu detrás do forno de assar biscoito de lá fazia pontaria com a espingarda e balas nossas levantavam terra ao redor dali feito um ciscado de cachorro grande Dentro da cafua também restavam outros soldados que deram contas a Deus Ataliba com o facão pregou o capiau na taipa da cafua ele morreu mansinho parecia um santo Ficou lá espetado Nós eh bom Conseguimos aragem Até em um ponto de a salvo conversarmos Serra Escura Nem munição nem decomer não sobravam De forma que a gente carecia de se separar cada um por seu risco como pudesse caçar escape Se esparramavam os goanhás De si por si quem vivesse viesse para cá do Rio para reunião na juntura da Vereda Saco dos Bois com o Ribeirão Santa Fé Ou ir João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 90 de direto para onde estivesse Medeiro Vaz Ou caso o inimigo rondasse perto demais então no BuritidaVida São Simão do Bá ou mais em riba ali onde o Ribeirão Gado Bravo é vadeável Ao que João Goanhá mandou A pressa era pressa O ar todo do campo cheirava a pólvora e a soldados Diante de mim nunca terminava de atar as correias do gibão um Cunha Branco sarado cabra velho guerreiro ele boiava língua em boca aberta E medo meu medi muito maior Se despedimos Escorregando sem rumo eu fui vim o Sesfredo comigo também viemos Com a graça de Deus saímos fora da roda do perigo Chegamos no Córrego Cansanção não longe do Araçuaí Por durante um tempo carecíamos de ter algum serviço reconhecido no viver tudo cabe Nossas armas com parte das roupas campeamos um seguro lugar deixamos escondidas Aí a gente se ajustou no meio do pessoal daquele doutor que estava na mineração que eu já disse e o senhor sabe Por que não ficamos lá Sei e não sei Sesfredo esperava de mim toda decisão Algum remorso de não se cumprir de ir de desertados Não vê que não desafasto Gente sendo dois garante mais para se engambelar etcétera de traição não sopra escrúpulos como nem de crime nenhum não agasta igual lobisomem verte a pele Só se companheiros sobrantes a gente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 91 amiúda no ajuizar o desonroso assunto isto sim rança o descrédito de se ser tornadiço covarde Mas eu podia rever proveito caçar de voltar dali para a casagrande de Selorico Mendes exigir meu estado devido na Fazenda São Gregório Temeriam Assim e silva como em outro tempo adiante podia flauteado comparecer no Buritis Altos por conta de Otacília continuação de amor Quis não Suasse saudade de Diadorim A ponto no dizer menos Ou nem não tinha Só como o céu e as nuvens lá atrás de uma andorinha que passou Talvez eu acho também que foi juvenescendo em mim uma inclinação de abelhudice assaz eu queria me estar misturado lá com os medeirovazes ver o fim de tudo Em mês de agosto buriti vinhoso Araçuaí não eram os meus campos Viver é um descuido prosseguido Aí as noites cambando para o entrar das chuvas os dias mal Desengoli Tempo de ir Vamos eu disse para Sesfredo Vamos demais o Sesfredo me respondeu Ah eh e não altolá comigo que assim falseio o mesmo é Pois ia me esquecendo o Vupes Não digo o que digo se o do Vupes não orço que teve tãomente Esse um era estranja alemão o senhor sabe clareado constituído forte com os olhos azuis esporte de alto leandrado rosalgar indivíduo mesmo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 92 Pessoa boa Homem sistemático salutar na alegria séria Hê hê com toda a confusão de política e brigas por aí e ele não somava com nenhuma coisa viajava sensato e ia desempenhando seu negócio dele no sertão que era o de trazer e vender de tudo para os fazendeiros arados enxadas debulhadora facão de aço ferramentas rógers e roscofes latas de formicida arsênico e creolinas e até papavento desses moinhosdevento de sungar água com torre ele tomava empreitada de armar Conservava em si um estatuto tão diverso de proceder que todos a ele respeitavam Dizse que vive até hoje mas abastado na capital e que é dono de venda grande loja conforme prosperou Ah o senhor conheceu ele Õ titiquinha de mundo E como é mesmo que o senhor fraseia Wusp É Seo Emílio Wuspes Wupsis Vupses Pois esse Vupes apareceu lá logo vai me reconheceu como me conhecia do Curralinho Me reconheceu devagar exatão Sujeito escovado Me olhou me disse Folgo Senhor estar bom Folgo E eu gostei daquela saudação Sempre gosto de tornar a encontrar em paz qualquer velha conhecença consoante a pessoa se ri a gente se acha de voltar aos passados mas parece que escolhidas só as peripécias avaliáveis as que agradáveis foram Alemão Vupes ali e eu recordei lembrança daquelas mocinhas a Miosótis e a Rosauarda as que no Curralinho João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 93 eu pensava que tinham sido as minhas namoradas Seo Vupes eu também folgo Senhor também estar bom Folgo que eu respondi civilizadamente Ele pitava era charutos Mais me disse Sei senhor homem valente muito valente Eu precisar de homem valente assim viajar meu quinze dias sertão agora aqui muito atrapalhado gente braba tudo Destampei ri que ri de ouvir Mas o mais garboso fiquei prezei a minha profissão Ah o bom costume de jagunço Assim que é vida assoprada vivida por cima Um jagunceando nem vê nem repara na pobreza de todos cisco O senhor sabe tanta pobreza geral gente no duro ou no desânimo Pobre tem de ter um triste amor à honestidade São árvores que pegam poeira A gente às vezes ia por aí os cem duzentos companheiros a cavalo tinindo e musicando de tão armadose vai um sujeito magro amarelado saía da algum canto e vinha espremendo seu medo farraposo com um vintém azinhavrado no conco da mão o homem queria comprar um punhado de mantimento aquele era casado pai de família faminta Coisas sem continuação Tanto pensei perguntei Para que banda o senhor tora E o Vupes respondeu Eu direto cidade São Francisco vou forte Para falar nem com uma pontinha de dedo ele não bulia gesticulado Então era João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 94 mesmo meu rumo aceitei o destinar Daí falei com o Sesfredo que quis também o Sesfredo não presumia nada ele naquilo não tinha próprio destaque Mas os caminhos não acabam Tal por essas demarcas de GrãoMogol Brejo das Almas e Brasília sem confrontos de perturbação trouxemos o seu Vupes Com as graças dele aprendi muito O Vupes vivia o regulado miúdo e para tudo tinha sanguefrio O senhor imagine parecia que não se mealhava nada mas ele pegava uma coisa aqui outra coisinha ali outra acolá uma moranga uns ovos grelos de bambu umas ervas e depois quando se topava com uma casa mais melhorzinha ele encomendava pago um jantar ou almoço pratos diversos farto real ele mesmo ensinava o guisar tudo virava iguarias Assim no sertão e ele formava conforto o que queria Saibase Deixamos o homem no final e eu cuidei bem dele que tinha demonstrado a confiança minha Demos no Rio passamos E aí a saudade de Diadorim voltou em mim depois de tanto tempo me custando seiscentos já andava acoroçoado de afogo de chegar chegar e perto estar Cavalo que ama o dono até respira do mesmo jeito Bela é a lua lualã que torna a se sair das nuvens mais redondada recortada Viemos pelo Urucuia Meu rio de amor é o Urucuia O João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 95 chapadão onde tanto boi berra Daí os gerais com o capim verdeado Ali é que vaqueiro brama com suas boiadas espatifadas Ar que dá açoite de movimento o tempodaságuas de chegada trovoada trovoando Vaqueiros todos vaquejando O gado esbravaçava A mal que as notícias referiam demais a cambada dos Judas aumentável a corja A tantos quantos eu pondo meu perguntar Os muitos Uma monarquia deles os vaqueiros respondendo Mas Medeiro Vaz não se achava os nossos deles ninguém não sabia bem Tocamos fim que o mundo tivesse Só deerrávamos Assim como o senhor que quer tirar é instantâneo das coisas aproximar a natureza Estou entendido Esbarramos num varjeado esconso lugar por entre o daGarapa e o daJibóia ali tem três lagoas numa com quatro cores se diz que a água é venenosa E isso de que me serve Águas águas O senhor verá um ribeirão que verte no Canabrava o que verte no Taboca que verte no Rio Preto o primeiro Preto do Rio Paracatu pois a daquele é sal só vige salgada grossa azula muito quem conhece fala que é a do mar descritamente nem boi não gosta não traga eh não E tanta explicação dou porque muito ribeirão e vereda nos contornados por aí redobra nome Quando um ainda não aprendeu se atrapalha faz raiva Só Preto já molhei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 96 mão nuns dez Verde uns dez Do Pacari uns cinco Da Ponte muitos Do Boi ou da Vaca também E uns sete por nome de Formoso São Pedro Tamboril Santa Catarina uma porção O sertão é do tamanho do mundo Agora por aqui o senhor já viu Rio é só o São Francisco o Rio do Chico O resto pequeno é vereda E algum ribeirão E agora me lembro no Ribeirão EntreRibeiros o senhor vá ver a fazenda velha onde tinha um cômodo quase do tamanho da casa por debaixo dela socavado no antro do chão lá judiaram com escravos e pessoas até aos pouquinhos matar Mas para não mentir lhe digo eu nisso não acredito Reconditório de se ocultar ouro tesouro e armas munição ou dinheiro falso moedado isto sim O senhor deve de ficar prevenido esse povo diverte por demais com a baboseira dum traque de jumento formam tufão de ventania Por gosto de rebuliço Querem porquequerem inventar maravilhas glorionhas depois eles mesmos acabam crendo e temendo Parece que todo o mundo carece disso Eu acho que Assim olhe tem um marimbu um brejo matador no Riacho Cizlá se afundou uma boiada quase inteira que apodreceu em noites depois deu para se ver deitado a fora se deslambendo em vento do cafofo e perseguindo tudo um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 97 milhão de lavareda azul de jãdelãfo fogofá Gente que não sabia avistaram e endoideceram de correr fuga Pois essa estória foi espalhada por toda a parte viajou mais se duvidar do que eu ou o senhor falavam que era sinal de castigo que o mundo ia se acabar naquele ponto causa de em épocas terem castrado um padre ali perto umas vinte léguas por via do padre não ter consentido de casar um filho com sua própria mãe A que até cantigas rimaram do FogoAzuldoFimdoMundo Hê hê Agora a forca eu vi forca moderna esquadriada arvorada bem erguida no elevado em madeira de boa lei parda sucupira Ela foi num morrote depois do São Simão do Bá perto da banda da mãodireita do Pripitinga A estúrdia forca de enforcar construída aprovada ali particularmente porque não tinham recurso de cadeia e pajear criminoso por viagens era dificultoso tirava as pessoas de seus serviços Aí então usavam Às vezes da redondeza vinham até trazendo o condenado a cavalo para a forca pública Só que um pobre veio morar próximo quase debaixo dela cobrava sua esmola em cada útil caso dando seguida cavava a cova e enterrava o corpo com cruz No mais nada Semelhante não foi quando um homem Rudugério de Freitas dos Freitas ruivos da ÁguaAlimpada mandou obrigado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 98 um filho dele ir matar outro buscar para matarem esse outro que roubou sacrário de ouro da igreja da Abadia Aí então em vez de cumprir o estrito o irmão combinou com o irmão os dois vieram e mataram mesmo foi o velho pai deles distribuído de foiçadas Mas primeiro enfeitaram as foices urdindo com cordões de embira e várias flores E enqueriram o cadáver paterno em riba da casa casinha boa de telhas a melhor naquele trecho Daí reuniram o gado que iam levando para distante vender Mas foram logo pegos A pegar a gente ajudou Assim prisioneiros nossos Demos julgamento Ao que fosse Medeiro Vaz enviava imediato os dois para tão razoável forca Mas porém o chefe nosso naquele tempo já era o senhor saiba Zé Bebelo Com Zé Bebelo oi o rumo das coisas nascia inconstante diferente conforme cada vez A papo Coah Por que foi que vocês enfeitaram premeditado as foices ele interrogou Os dois irmãos responderam que tinham executado aquilo em padroeiragem à Virgem para a Nossa Senhora em adiantado remitir o pecado que iam obrar e obraram dito e feito Tudo que Zé Bebelo se entesou sério em pufo empolo mas sem rugas em testa eu prestes vi que ele estava se rindo por de dentro Tal tal disse Santíssima Virgem E o pessoal todo tirou os João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 99 chapéus em alto respeito Pois se ela perdoa ou não eu não sei Mas eu perdôo em nome dela a Puríssima Nossa Mãe Zé Bebelo decretou O pai não queria matar Pois então morreu dá na mesma Absolvo Tenho a honra de resumir circunstância desta decisão sem admitir apelo nem revogo legal e lealdado conformemente Aí mais Zé Bebelo disse como apreciava Perdoar é sempre o justo e certo pirlimpim pimpão Mas como os dois irmãos careciam de algum castigo ele requisitou para o nosso bando aquela gorda boiada a qual pronto revendemos embolsamos E desse caso derivaram também uma boa cantiga violeira Mas deponho que Zé Bebelo somente determinou assim naquela ocasião pelo exemplo pela decência Normal quando a gente encontrava alguma boiada tangida ele cobrava só imposto de uma ou umas duas reses para o nosso sustento nos dias Autorizava que era preciso se respeitar o trabalho dos outros e entusiasmar o afinco e a ordem no meio do triste sertão Zé Bebelo ah Se o senhor não conheceu esse homem deixou de certificar que qualidade de cabeça de gente a natureza dá raro de vez em quando Aquele queria saber tudo dispor de tudo poder tudo tudo alterar Não esbarrava quieto Seguro já nasceu assim zureta arvoado criatura de confusão Trepava de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 100 ser o mais honesto de todos ou o mais danado no tremeluz conforme as quantas Soava no que falava artes que falava diferente na autoridade mas com uma autoridade muito veloz Desarmado uma vez caminhou para o Leôncio Du que tinha afastado todo o mundo e meneava um facãozão Como gritou Você quer vermelho Te racho fré Ao de que o Leôncio Du decidiu deixou o facão cair e se entregou Senhor ouve e sabe Zé Bebelo era inteligente e valente Um homem consegue intrujar de tudo só de ser inteligente e valente é que muito não pode E Zé Bebelo pegava no ar as pessoas Chegou um brabo cabra da Zagaia recomendado Tua sombra me espinha juazeiro Zé Bebelo a faro saudou E mandou amarrar o sujeito sentar nele uma surra de peia Atual o cabra confessou que tinha querido vir drede para trair em empreita encobertada Zé Bebelo apontou nos cachos dele a máuser estampido que espatifa as miolagens foram se grudar longe e perto A gente pegou cantando a ModadoBoi No regular Zé Bebelo pescava caçava dançava as danças exortava a gente indagava de cada coisa laçava rês ou topava à vara entendia dos cavalos tocava violão assoviava musical só não praticava de buzo nem baralho declarando ter receios por atreito demais a vício e riscos de jogo Sem menos se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 101 entusiasmava com qualmequer o que houvesse choveu louvava a chuva trapo de minuto depois prezava o sol Gostava com despropósito de dar conselhos Considerava o progresso de todos como se mais esse todo Brasil territórios e falava horas horas Vim de vez disse quando retornou de Goiás O passado para ele era mesmo passado não vogava E de si parte de fraco não dava nenhão nunca Certo dia se achando trotando por um caminho completo novo exclamou Ei que as serras estas às vezes até mudam muito de lugar sério E era E era mas que ele estava perdido deerrado de rota há há Ah mas com ele até o feio da guerra podia alguma alegria tecia seu divertimento Acabando um combate saía esgalopado revólver ainda em mão perseguir quem achasse só aos brados Viva a lei Viva a lei e era o pipocopaco Ou Paz Paz gritava também e bala se entregaram mais dois Viva a lei Viva a lei Hádeo que quilate que lei alguém soubesse Tanto aquilo sucinto a fama correu Doulhe qual que uma vez ele corria a cavalo por exercício e um veredeiro que isto viu se assustou pulou de joelhos na estrada requerendo Não faz vivalei em mim não môrdeDeus seu Zebebel por perdão E Zé Bebelo jogou para o pobre uma cédula de dinheiro gritou Amonta aqui irmão na garupa trouxe o outro para com a gente jantar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 102 Esse era ele Esse era um homem Para Zé Bebelo melhor minha recordação está sempre quente pronta Amigo foi uma das pessoas nesta vida que eu mais prezei e apreciei Pois porém ao fim retomo emendo o que vinha contando A ser que de campinas a campos por morros areiões e varjas o Sesfredo e eu chegamos no Marcavão Antes de lá inchou o tempo para chover Chuva de desenraizar todo pau tromba chuvão que come terra a gente vendo Quem mede e pesa esses demais dágua Rios foram se enchendo Apeamos no Marcavão beira do doSono Medeiro Vaz morreu naquele país fechado Nós chegamos em tempo Ao quando encontramos o bando foi ali Medeiro Vaz já estava mal talvez por isso a alegria comum não pôde se dizer nem Diadorim me abraçou nem demonstrou um salves por minha volta Fiquei sincero A tristeza e a espera má tomavam conta da gente O mais é o pior é que tem inimigo próximo tocaiando Alaripe me disse Muito chovido de noiteas árvores esponjadas Mesmo dava um frio vento com umidades Para agasalhar Medeiro Vaz tinham levantado um boi o senhor sabe um couro só espetado numa estaca por resguardar a pessoa do rumo donde vem o vento o bafebafe Acampávamos debaixo de grandes árvores O barulhim do rio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 103 era de bicho em bicheira Medeiro Vaz jazente numa manta de pele de bode branco aberto na roupa o peito cheio de cabelos grisalhados A barriga dele tinha inflamado muito mas não era de hidropisia Era de dores Quando vislumbrou de mim aí armou no se aprumar pelejando para me ver Os olhos o alvor como miolo de formigueiro Mas se abriu arriou os braços e mediu o chão com suas costas Está no bilimbilim eu pensei Ah a cara arre de amarela o amarelamento de palha Assim desse jeito ele levou o dia quase a termo A tarde foi escurecendo Ao menos Diadorim me chamou adeparte ele tramava as lágrimas Amizade Riobaldo que eu imaginei em você esse prazo inteiro e apertou minha mão Avesso fiquei meio sem jeito Aí chamaram Acode que o chefe está no fatal Medeiro Vaz arquejando cumprindo tudo E o queixo dele não parava de mexer grandes momentos Demorava E deu a panca troztroz forte como de propósito Uma chuva de arrobas de peso Era quase sonoite Reunidos em volta ajoelhados a gente segurava uns couros abertos para proteger a morte dele Medeiro Vaz o rei dos gerais como era que um daquele podia se acabar A água caía às despejadas escorria nas caras da gente em fios pingos Debruçando por debaixo dos couros podiase ver o fim que a alma obtém do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 104 corpo E Medeiro Vaz se governando mesmo no remar a agonia travou com esforço o ronco que puxava gosma de sua goela e gaguejou Quem vai ficar em meu lugar Quem capitaneia Com a estrampeação da chuva os poucos ouviram Ele só falava por pedacinhos de palavras Mas eu vi que o olhar dele esbarrava em mim e me escolhia Ele averme lhava os olhos Mas com o cirro e o vidrento Coração me apertou estreito Eu não queria ser chefe Quem capitaneia Vi meu nome no lume dele E ele quis levantar a mão para me apontar As veias da mão Com que luz eu via Mas não pôde A morte pôde mais Rolou os olhos que ralava no sarrido Foi dormir em rede branca Deu a venta Era seu dia de alta tarefa Quando estiou a chuva procuramos o que acender Só se trouxe uma vela de carnaúba o toco e um brandão de tocha Eu tinha passado por um susto Agora a meio a vertigem me dava desnorteado na vontade de falar aqueles versos como quem cantasse um coreto Meu boi preto mocangueiro árvore para te apresilhar Palmeira que não debruça João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 105 buriti sem entortar Deviam de tocar os sinos de todas as igrejas Cobrimos o corpo com palmas de buriti novo cortadas molhadas Fizemos quarto todos até ao quebrar da barra Os sapos gritavam latejado O sapocachorro arranhou seu rouco Alguma anta assoviava assovio mais fino que o relinchorincho dum poldrinho De aurora cavacamos uma funda cova A terra dos gerais é boa Tomouse café e Diadorim me disse firme Riobaldo tu comanda Medeiro Vaz te sinalou com as derradeiras ordens Todos estavam lá os brabos me olhantes tantas meninasdosolhos escuras repulavam às duras grão e grão era como levando eu de milhares uma carga de chumbo grosso ou chuvasdepedra Aprovavam Me queriam governando Assim estremeci por interno me gelei de não poder palavra Eu não queria não queria Aquilo revi muito por cima de minhas capacidades A desgraça de João Goanhá não ter vindo Rente mente que eu não desejava arreglórias mão de mando Engoli cuspes Avante por fim como que respondi às gagas isto disse Não posso Não sirvo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 106 Mano velho Riobaldo tu pode Tive testa Pensei um nome feio O que achassem achassem mas ninguém ia manusear meu ser para brincadeiras Mano velho Riobaldo tu crê que não merece mas nós sabemos a tua valia Diadorim retornou Assim instava mão erguida Onde é que os outros rodaaroda denotavam assentimento Tatarana Tatarana uns pronunciaram sendo Tatarana um apelido meu que eu tinha Temi Terçava o grave Assim Diadorim dispunha do direito de fazer aquilo comigo Eu que sou eu bati o pé Não posso não quero Digo definitivo Sou de ser e executar não me ajusto de produzir ordens Tudo parava por átimo Todos esperando com suspensão Senhor conheceu por dedentro um bando empé de jagunços quando um perigo poja sabe os quantos lobos Mas eh não o pior é que é a calma uma sisudez das escuras Não que matem uns aos outros ver mas a pique de coisinha o senhor pode entornar seu respeito sobrar desmoralizado para sempre neste vale de lágrimas Tudo rosna Entremeio Diadorim se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 107 maisfez avançando passo Deixou de me medir vigiou o ar de todos Aí ele era mestre nisso de astuto se certificar só com um rabeio ligeiro de mirada tinha gateza para contador de gado E muito disse A pois então eu tomo a chefia O melhor não sou oxente mas porfio no que quero e prezo conforme vocês todos também A regra de Medeiro Vaz tem de prosseguir com tenção Mas se algum achar que não acha o justo a gente isto decide a ponta darmas Hê mandacaru Oi Diadorim belo feroz Ah ele conhecia os caminhares Em jagunço com jagunço o poder seco da pessoa é que vale Muitos ali haviam de querer morrer por ser chefes mas não tinham conseguido nem tempo de se firmar quente nas idéias E os outros estimaram e louvaram Reinaldo O Reinaldo foi o aprovo deles Ah Num nu nisto nesse repente desinterno de mim um nego forte se saltou Não Diadorim não Nunca que eu podia consentir Nanje pelo tanto que eu dele era louco amigo e concebia por ele a vexável afeição que me estragava feito um mau amor oculto por mesmo isso nimpes nada era que eu não podia aceitar aquela transformação negócio de para sempre João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 108 receber mando dele doendo de Diadorim ser meu chefe nhem hem Nulo que eu ia estuchar Não hem clamei que como um sino desbadala Discordo Todos me olhassem Não vi não tremi Visivo só vi Diadorim resumo do aspecto e esboço dele para movimentos as mãos e os olhos de reguarda Como em relance corri cálculo de quantos tiros eu tinha para à queimabucha dar e uma balazinha primeira botada na agulha da automática ah eu estava com milho no surrão De devagar os companheiros os outros não se buliram tanto esperavam decerto que saldavam antipatia de mim repugnados por eu estar seguidamente atrapalhando as decisões achassem que eu agora não tinha mais direito de parecer pois a chefia própria eu enjeitara Quem sabe será se praziam no poder ver nós dois Diadorim comigo que antes como irmãos até ali a gente se estraçalhar nas facas Torci vontade de matar alguém para pacificar minha aflição alguém algum Diadorim não digo Decerto isso em mim eles perceberam Os calados Só o Sesfredo inesperado assim disse um também Discordo Por me estimar ele me secundava E o Alaripe séria pessoa Tem de que Deixa o Riobaldo razoar Endireitei os chifres Chapei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 109 Vejo Marcelino Pampa é quem tem de comandar Mediante que é o mais velho e demais de mais velho valente e consabido de ajuizado Cara de Marcelino Pampa ficou enorme Do que constei dos outros concordantes estabeleci que eu tinha acertado solerte dei na barra Mas Diadorim De olhos os olhos agarrados nós dois Asneira eu naquela hora supria suscitar alto meu maior bemquerer por Diadorim mesmo mesmo assim mesmo eu arcava em cru com o desafio desde que ele brabasse desde que ele puxasse Tempo instante que empurrou morros para passar Afinal aí Diadorim abaixou as vistas Pude mais do que ele Se riu depois de mim Sempre sendo que falou firme Com gosto Melhor do que Marcelino Pampa não tem nenhum Não ambicionei poderes Falou como corajoso E Tresdito que é a vez de se estar contornados unidos sem porfiar o Alaripe inteirou Amém todos voz a voz aprovavam Marcelino Pampa então principiou falou assim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 110 Aceito por precisão nossa o que obrigação minha é Até enquanto não vem algum dos certos de realce maior João Goanhá Alípio Mota Titão Passos A tanto careço do bom conselho de todos que tiverem segura fiança Assentes que vamos Sobre mais disse sem importância sem noção pois Marcelino Pampa possuía talentos minguados Somente pensei que ele estava pondo um peso no lombo por sacrifício Ao que em melhores tempos aprazia bem capitanear mas agora aquela ocasião a gente por baixos e essas misérias qualquer um não havia de desgostar de responsabilidade à aí observei como Marcelino Pampa desde o instante expunha outro ar de ser a sisuda extravagância soberbo satisfeito Ser chefe por fora um pouquinho amarga mas por dentro é rosinhas flores Meu era um alívio Mesmo não duvidei de meu menos valer alguém lá tem a feição do rosto igualzinha à minha Eh de primeiro meu coração sabia bater copiando tudo Hoje eu desconheço o arruído rumor das pancadas dele Diadorim veio para perto de mim falou coisas de admiração muito de afeto leal Ouvi ouvi aquilo copos a fora mel de melhor Eu precisava Tem horas em que penso que a gente carecia de repente de acordar de alguma espécie de encanto As pessoas e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 111 as coisas não são de verdade E de que é que a miúde a gente adverte incertas saudades Será que nós todos as nossas almas já vendemos Bobéia minha E como é que havia de ser possível Hem Olhe conto ao senhor Se diz que no bando de Antônio Dó tinha um grado jagunço bem remediado de posses Davidão era o nome dele Vai um dia coisas dessas que às vezes acontecem esse Davidão pegou a ter medo de morrer Safado pensou propôs este trato a um outro pobre dos mais pobres chamado Faustino o Davidão dava a ele dez contos de réis mas em lei de caborje invisível no sobrenatural chegasse primeiro o destino do Davidão morrer em combate então era o Faustino quem morria em vez dele E o Faustino aceitou recebeu fechou Parece que com efeito no poder de feitiço do contrato ele muito não acreditava Então pelo seguinte deram um grande fogo contra os soldados do Major Alcides do Amaral sitiado forte em São Francisco Combate quando findou todos os dois estavam vivos o Davidão e o Faustino A de ver Para nenhum deles não tinha chegado a horaedia Ah e assim e assim foram durante os meses escapos alteração nenhuma não havendo nem feridos eles não saíam Que tal o que o senhor acha Pois mire e veja isto João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 112 mesmo narrei a um rapaz de cidade grande muito inteligente vindo com outros num caminhão para pescarem no Rio Sabe o que o moço me disse Que era assunto de valor para se compor uma estória em livro Mas que precisava de um final sustante caprichado O final que ele daí imaginou foi um que um dia o Faustino pegava também a ter medo queria revogar o ajuste Devolvia o dinheiro Mas o Davidão não aceitava não queria por forma nenhuma Do discutir ferveram nisso ferravam numa luta corporal A fino o Faustino se provia na faca investia os dois rolavam no chão embolados Mas no confuso por sua própria mão dele a faca cravava no coração do Faustino que falecia Apreciei demais essa continuação inventada A quanta coisa limpa verdadeira uma pessoa de alta instrução não concebe Aí podem encher este mundo de outros movimentos sem os erros e volteios da vida em sua lerdeza de sarrafaçar A vida disfarça Por exemplo Disse isso ao rapaz pescador a quem sincero louvei E ele me indagou qual tinha sido o fim na verdade de realidade de Davidão e Faustino O fim Quem sei Soube so mente só que o Davidão resolveu deixar a jagunçagem deu baixa do bando e com certas promessas de ceder uns alqueires de terra e outras vantagens de mais pagar conseguiu do Faustino João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 113 dar baixa também e viesse morar perto dele sempre Mais deles ignoro No real da vida as coisas acabam com menos formato nem acabam Melhor assim Pelejar por exato dá erro contra a gente Não se queira Viver é muito perigoso A que o que logo vi que Marcelino Pampa por bem de seu dispor não dava altura A tento de se acertar nos primeiros rumos de se mexer ele me chamou mais João Concliz Os Judas estão aqui mesmo de nós a umas quinze léguas e sabem da gente Deveras atacar não atacam com este tempo de todas chuvas e ribeirões cheios Mas vão fechando modo de rodear a gente de menos longe porque a quantidade deles é à farta Re curso que eu acho é dois ou se fugir para o chapadão enquanto tempo mas é perder toda esperança e diminuir da vergonha Ou então forçar tudo e experimentar um caminho por entremeio deles se vai para a outra banda do Rio caçar João Goanhá e os outros companheiros Mais ainda não sei quero toda razoável opinião Assim ele Marcelino Pampa disse Mas se souberem a notícia que Medeiro Vaz morreu hoje mesmo é capaz que sejam de vir em riba de nós foi o que João Concliz achou e estava muito certo Eu não atinava com o que dizer as confusões dessas horas me encostavam O que era na situação que Medeiro Vaz havia de fazer E Joca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 114 Ramiro E Só Candelário Ao esmo esses pensamentos em mim Ai de foi que reconheci como súcia de homens carece de uma completa cabeça Comandante é preciso para aliviar os aflitos para salvar a idéia da gente de perturbações desconformes Não sabia hoje será que sei a regra de nenhum meiotermo Sem ação eu podia gastar ali minha vida inteira debulhando Também logo depois depois de muitos silêncios e poucas palavras Marcelino Pampa resolveu que de tarde nossa conversa ia ter repetição Atontados três Dali fui para perto de Diadorim Riobaldo ele mal disse você está vendo que não temos remédio Aí esbarrou pensou um tempo com uma mão por cima da outra E vocês que foi que determinaram de se fazer me perguntou Respondi Hoje de tarde é que se toma decisão Diadorim Você está mal satisfeito Ele endireitou o corpo Foi falou Sei o meu Cá por mim isso tudo pouco adianta Quente quero poder chegar junto dum dos Judas para terminar Eu sabia que ele falava coisas de pelejar por cumprir Eu tinha mais cansaço mais tristeza Quem sabe se Para ter jeito de chegar perto deles até se não era melhor assim ele desabafou em trago e recolhido num estado de segredo Por seus grandes olhos onde aquilo redondeou cri que armasse João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 115 agarrar o comando por meio de acender o bando todo em revolta Qualquer loucura semelhante era a dele Mas não mais disse Foi você mesmo Riobaldo quem governou tudo hoje Você escolheu Marcelino Pampa você decidiu e fez Era Gostei em cheio de escutar isso soprante Ah porém estaquei na ponta dum pensamento e agudo temi temi Cada hora de cada dia a gente aprende uma qualidade nova de medo Mas depois de janta quando estávamos outra vez reunidos Marcelino Pampa eu e João Concliz não se teve nem o tempo de principiar Pelo que ouvimos um galope o chegar o riscar o desapeio o xaxaxo de alpercatas Sendo assim o Feliciano e o Quipes que traziam um vaqueirinho escoltado Que vieram quase correndo O vaqueirinho não devia de ter mais de uns quinze anos e as feições dele mudavamde mestre pavor Arte que este tal passou às fugas meio arupa Pegamos Aí ele tem grande coisa pra contar e empurraram um pouco o vaqueirinho De medo a gente olhava para ele e de nossos olhos ele se desencostava Afe por fim bebeu gole de ar e soluceou É um homem Só sei É um homem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 116 Te acerta mocinho Aqui você está livre e salvo Aonde é que está indo Marcelino Pampa regrou É briga enorme É um homem Vou indo pra longe para a casa de meu pai Ah é um homem Ele desceu o Rio Paracatu numa balsa de buriti Que foi mais que o homem fez então João Concliz perguntou Deu fogo O homem com mais cinco homens Avançaram do mato deram fogo contra os outros Os outros eram montão mais duns trinta Mas fugiram Largaram três mortos uns feridos Escaramuçados Ei E estavam a cavalo O homem e os cinco dele estão a pé Homem terrível Falou que vai reformar isto tudo Vieram pedir sal e farinha no rancho Emprestei Tinham matado um veadinho campeiro me deram naca de carne Qual é que é o nome dele Fala Como é que os outros dizem Aí e que jeito que semelhança de figura é que ele tem Ele O jeito que é o dele que ele tem Em é mais baixo do que alto não é velho não é moço Homem branco Veio de Goiás O que os outros falam e tratam Deputado Desceu o Rio Paracatu numa balsa de buriti Estávamos em jejum de briga ele mesmo disse Ele e seus cinco deram fogo feito João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 117 feras Gritavam de onça e de uivado Disse vai remexer o mundo Desceu o Rio Paracatu numa balsa de buriti Desce ram Nem cavalo eles não têm É ele Mas é ele Só pode ser aí alguém lembrou E é E então está do nosso lado outro completou Temos de mandar por ele foi a palavra de Marcelino Pampa Onde é que estará Na Pavoã Alguém tem de ir lá É ele É ver a vida quem pensava E é homem danado zuretado Está a favor da gente E ele sabe guerrear E era Repegava a chuva trozante mas mesmo assim o Quipes e Cavalcânti montaram e saíram por ele da Pavoã no rumo De certo não acharam fácil pois até à hora de escurecer não tinham aparecido Mas aquele homem para que o senhor saiba aquele homem era Zé Bebelo E na noite ninguém não dormiu direito em nosso campo De manhã com uma braça de sol ele chegou Dia da abelha branca De chapéu desabado avantes passos veio vindo acompanhado de seus cinco cabras Pelos modos pelas roupas aqueles eram gente do Alto Urucuia Catrumanos dos gerais Pobres mas atravessados de armas e com cheias cartucheiras Marcelino Pampa caminhou ao encontro dele seguinte de nosso comandante nós formávamos Valia ver Essas cerimônias João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 118 Paz e saúde chefe Como passou Como passou mano Os dois grandes se saudavam Aí Zé Bebelo reparou em mim Professor ara viva Sempre a gente tem de se avistar De nomes e caras de pessoas ele em tempo nenhum se esquecia Vi que me prezava cordial não me dando por traidor nem falso Riu redobrado De repente desriu Refez pé para trás Vim de vez ele disse disse desafiando quase Em boa veio chefe É o que todos aqui representamos Marcelino Pampa respondeu A pois Salve Medeiro Vaz Deus com ele amigo Medeiro Vaz ganhou repouso Aqui soube Lux eterna e Zé Bebelo tirou o chapéu e se persignou parando um instante sério num ar de exemplo que a gente até se comoveu Depois disse Vim cobrar pela vida de meu amigo Joca Ramiro que a vida em outro tempo me salvou de morte E liquidar com esses dois bandidos que desonram o nome da Pátria e este sertão nacional Filhos da égua e ele estava com a raiva tanta que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 119 tudo quanto falava ficava sendo verdade Pois então estamos irmãos E esses homens Os urucuianos não abriram boca Mas Zé Bebelo rodeou todos num mando de mão e declarou forte o seguinte Vim por ordem e por desordem Este cá é meus exércitos Prazer que foi ouvir o estabelecido A gente quisesse brigar aquele homem era em frente crescia sozinho nas armas Vez de Marcelino Pampa dizer Pois assim amigo por que é que não combinamos nosso destino Juntos estamos juntos vamos Amizade e combinação aceito mano velho Já ajuntar não Só obro o que muito mando nasci assim Só sei ser chefe Sobre curto Marcelino Pampa cobrou de si suas contas Repuxou testa demorou dentro dum momento Circulou os olhos em nós todos seus companheiros seus brabos Nada não se disse Mas ele entendeu o que cada vontade pedia Depressa deu o consumado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 120 E chefe será Baixamos nossas armas esperamos vossas ordens Com coragem falou como olhou para a gente outra vez Acordo eu disse Diadorim disse João Concliz disse todos falaram Acordo Aí Zé Bebelo não discrepou pim de surpresa parecia até que esperava mesmo aquele voto De todo poder Todo o mundo lealda ainda perguntou ringindo seriedade Confirmamos Então ele quase se aprumou nas pontas dos pés e nos chamou Ao redor de mim meus filhos Tomo posse Podiase rir Ninguém ria A gente em redor dele misturando em meio nosso os cinco homens do Urucuia Adiante Pois estamos É o duro diverso meu povo Mas os assassinos de Joca Ramiro vão pagar com seiscentossetecentos ele definiu apanhando um por um de nós no olhar Assassinos els são os Judas Desse nome agora que é o deles explicou João Concliz Arre vote dois judas podemos romper as aleluias Aleluia Aleluia Carne no prato farinha na cuia ele aprovou deu aquilo feito um viva Nós respondemos E assim era que Zé Bebelo era Como quando trovejou desse trovôo de alto e rasto dos gerais entrementes antes dos gotejos de chuva esquentada o trovão afunda largo pé da gente apalpa a terra Conforme foi João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 121 trovejou de calaaboca e Zé Bebelo tocou um gesto de costas da mão respeitoso disse Isto é comigo Do que se tratava retorno e conto ele o seguinte revelou Tudo eu não tinha com os meus munição para nem meiahora A gente reconheceu mais a coragem dele Isto é qualquer um de nós sabia que aquilo podia ser mentira Mesmo por isso somenos por detrás de tanta papagaiagem um homem carecia de ter a valentia muito grande A cômodo ele começou nesse dia nessa hora não esbarrou mais Achou de ir ver o lugar da cova e as armas e trens que Medeiro Vaz deixava essas determinou que o morto não tendo parentes então para os melhores mais chegados como lembrança ficassem as carabinas e revólveres a automática de rompida e ronco punhal facão o capote o cantil revestido as capangas e alforjes as cartucheiras de trespassar Alguém disse que o cavalo grande murzelomancho devia de ficar sendo dele mesmo Não quis Chamou Marcelino Pampa a ele fez donativo grave Este animal é vosso Marcelino merecido Porque eu ainda estou para ver outro com igual siso e caráter Apertou a mão dele num toques Marcelino Pampa dobrou de ar perturbado Desse fato em diante era capaz de se morrer por Zé Bebelo Mas para si mesmo Zé Bebelo guardou somente o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 122 pelego berbezim de forrar sela e um bentinho milagroso em três baetas confeccionado Daí levou a eito vendo examinando disquirindo Aprendeu os nomes de um em um e em que lugar nascido resumo da vida quantos combates e que gostos tinha qualquer oficio de habilidade Olhou e contou as pencas de munição e as armas Repassou os cavalos prezando os mais bem ferrados e os de agüentada firmeza Ferraduras ferraduras Isto é que é importante vivia dizendo Repartiu os homens em quatro pelotões três drongos de quinze e um de vinte em cada um ao menos um bom rastreador Carecemos de quatro buzinas de caçador para os avisos reclamou Ele mesmo tinha um apito pendurado do pescoço que de muito longe se atendia Para capitanear os drongos escolheu Marcelino Pampa João Concliz e o Fafafa Pessoalmente ficou com o maior o de vinte nesse figuravam os cinco urucuianos e eu Diadorim Sesfredo o Quipes Joaquim Beiju Coscorão Dimas Doido o Acauã MãodeLixa Marruaz o Credo Marimbondo Rasga emBaixo Jiribibe e Jõe Bexiguento dito Alparcatas Só que tidos todos repartidos ainda sobravam nove serviram para esquadrão adeparte tomar conta dos burros cargueiros com petrechos e mantimentos O testa deles foi Alaripe por bom João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 123 que fosse para tudo ser Aos esses mesmo se comediu obrigação Quim Queiroz zelava os volumes de balas o jacaré exercia de cozinheiro todo tempo devia de dizer o de comer que precisava ou faltava Doristino ferrador dos animais tratador deles e os outros ajudavam mas Raimundo Lê que entendia de curas e meizinhas teve cargo de guardar sempre um surrão com remédios O que remédio por ora não havia nenhum Mas Zé Bebelo não se atontava Aí em qualquer parte depois se compra se acha meu filho Mas vai apanhando folha e raiz vai tendo vai enchendo O que eu quero é ver o surrão à mão O acampamento da gente parecia uma cidade Assuntos principais Zé Bebelo fazia lição e deduzia ordens Trabucar duro para dormir bem publicava Gostadamente Morrendo eu depois vocês descansam e ria Mas eu não morro Sujeito muito lógico o senhor sabe cega qualquer nó E engraçado dizer a gente apreciava aquilo Dava uma esperança forte Ao um modo melhor que tudo é se cuidar miudamente trabalhos de paz em tempo de guerra O mais eram traquejos a cavalo para lá e para cá ou esbarrados firmes em formatura então Zé Bebelo perequitava assoviando manobrava as patrulhas vaite voltate Somente Arre temos nenhum tempo gente Capricha Sempre no fim por animar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 124 levantava demais o braço Ainda quero passar a cavalos levando vocês em grandes cidades Aqui o que me faz falta é uma bandeira e tambor e cornetas metais mais Mas heide Ah que vamos em Carinhanha e Montes Claros ali no haja vinho Arranchar no mercado da Diamantina Eli vamos no Paracatu doPríncipe Que boca que o apito apitava A sério ele me chamava para o lado dele e ia mandando vir outros Marcelino Pampa João Concliz Diadorim o urucuiano Pantaleão e o Fafafa vicemandantes Todos tinham de expor o que sabiam daquele gerais território as distâncias em léguas e braças os vaus o grau de fundo dos marimbus e dos poços os mandembes onde se esconder os mais fartos pastos Como Zé Bebelo simplificava os olhos e perguntando e ouvindo avante Às vezes riscava com ponta duma vara no chão tudo representado Ia organizando aquilo na cabeça Estava aprendido Com pouco sabia mais do que nós juntos todos Bem eu conhecia Zé Bebelo de outros currais Bem eu desejasse ter nascido como ele Aí saía por caçar Sucinto que gostava de caçar mas estava era sujeitando a exame o morro discriminando O mato e o campo como dois é um par Veio e foi figurava tomava a opinião da gente Com dez homens naquela altura e outros dez espalhados na vertente se podia impedir a passagem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 125 de duzentos cavaleiros pelo resfriado Com outros alguns dando a retaguarda então Nesfartes só nisso ele pensava quase que Sendo que expedia sobre hora alguém adiante se informar do meximento dos Judas trazer notícias vivas E homem feliz feito Zé Bebelo naquele tempo afirmo ao senhor nunca não vi Diadorim também que dos claros rumos me dividia Vinha a boa vingança alegrias dele se calando Vingar digo ao senhor é lamber frio o que outro cozinhou quente demais O demônio diz mil Esse Vige mas não rege Qual é o caminho certo da gente Nem para a frente nem para trás só para cima Ou parar curto quieto Feito os bichos fazem Os bichos estão só é muito esperando Mas quem é que sabe como Viver O senhor já sabe viver é etcétera Diadorím alegre e eu não Transato no meio da lua Eu peguei aquela escuridão E de manhã os pássaros que bemmeviam todo tal tempo Gostava de Diadorim dum jeito condenado nem pensava mais que gostava mas aí sabia que já gostava em sempre Oi suindara linda cor Dando o dia de repente Zé Bebelo determinou que tudo e tudo fosse pronto para uma remarcha em exercícios como geral Só por festa Ao que os burrinhos comiam amadrinhados em bom pasto Menininhos responsabilidade de cangalhas em vocês carregando a nossa munição Zé Bebelo mandou Mas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 126 montado declarou Meu nome dora por diante vai ser ahoh ah o de Zé Bebelo Vaz Ramiro Como confiança só tenho em vocês companheiros meus amigos zébebelos A vez chegou vamos em guerra Vamos vamos rebentar com aquela cambada de patifes Saímos solertes entes Para isso a lua não era boa Quem põe praça de cavalhadas por desbarranco de estradas lamentas desmancho empapado de chão a chuva ainda enxaguando Convinha esperar regras dágua O Rio Paracatu está cbeio alguém disse Mas Zé Bebelo atalhou O São Francisco é maior Com ele tudo era assim extravagável e não queria conversas de cutilquê Rompemos Melava de chover baixo mimelava Até o derradeiro do momento parecia que íamos atravessar o Paracatu Não atravessamos Tudo aquele homem retinha estudado Daí distribuiu as patrulhas O drongo dele viemos pela beira sempre o Paracatu à mão esquerda Trovejou de perturbar Ele disse Melhor dou surpresa Só uma boa surpresa é que rende Quero é atacar A gente ia para o Buriti Pintado A lá consta de dez léguas doze Na hora cada um deve de ver só um algum judas de cada vez mirar bem e atirar O resto maior é com Deus já vai que falava Para um trabalho que se quer sempre a ferramenta se tem Só com estes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 127 cavalos só à ligeireza de lugar para lugar para a frente e para trás Sei mas o principal dos combates vamos dar é bem a pé Na beira do rio Soninho descansamos Animais de carga a ponta de mulas ficaram botados escondidos numa bocaina na balsa Só três homens tomavam conta Eu é que escolho a hora e o lugar de investir Zé Bebelo disse E num lugar de remanso passamos o rio Soninho no escuro sem ensolvar bala em boca De manhã de três lados demos fogo Aí Zé Bebelo tinha meditado tudo como um ato de desenho Primeiro João Concliz avançou com seus quinze iam fazendo de conta que desprevenidos Quando os outros vieram nós todos já estávamos bem amoitados em pontos bons Duma banda então o Fafafa recruzou seus cavaleiros que estavam muito juntos embolados do modo por que um bando de cavaleiros ou cavalos dá ar de ser muito maior do que no real é Todos cavalos ruços ou baios cor clara também aumenta muito a visão do tamanho deles Ah e gritavam Assaz os judas atiravam mal discordados nadinha nem Aí de poleiro pego prévio abrimos nossa calamidade neles Pessoal do Hermógenes Não se disse guavai Supetume Só bala de aço Dou duelo Ei tibes Só o quanto de se quebrar galho e rasgar roupagem Um judas correu errado do lado onde o Jiribibe estava triste daquele Ouh foi o que ele fez de contrição perfeita Outro levantou o corpo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 128 um pouco demais Tu Tu pensa que tem Deusemeio Zé Bebelo disse depois de derrubar o tal com um tiro de nhambu baixo Outro fugia esperto Tem talento nos pés Os que enviei deixei de numerar por causa de caridade Ai deles Vitória é isto Ou o senhor pensa que é em alegre mal feito numa caçada Descansar Quem disse não foi ouvido Vou lá deixar essa cambada birbar por aí em sossego Bis minha gente Vamos neles Zé Bebelo se frigia Mas o próprio pessoal de João Concliz tinha segurado mão nos cavalos daqueles Toquemos na mão do norte lá a cara do chão é minha mais Não o caminho era da banda contrária Tínhamos de cair em riba do grosso da judadas Por resfriados e atalhos mesmo com aquela cavalhada adestra tocamos tocamos Estrada capaz de quatro lado a lado No OiMãe Lá tem um lajeiro largo onde grandes pedras do fundo do chão vêm à flor Chegamos de sobremão vagarosinho Zé Bebelo recomendava feito rondando quarto de doente Ele cheirava até o ar Sonso parecia um gato Se vendo que no inteiro mesmo de sua cabeça ele antes tudo traçava e guerreava Seja por um exemplo havia uma cava grande o inimigo estava emboscado dos dois lados nos socavões nas paredes Como era que Zé Bebelo já sabia João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 129 Orçando longe volta João Concliz levou seus homens muito adiante de lá na borda do campo de recacha Dado tempo então nosso pelotão rastejou para os altos até chega estávamos por cima dos beiços da cava Ah e aí o Fafafa veio vindo descuidado à mostra com seus cavaleiros surgiam inocentemente feito veados para se matar Mas há então por de riba da cava desfechamos demos urros e o rifleio transcruzando nos inferiores Lá vai obra Hêhê Deu de abelhas de pau oco os das socavas entornaram o sanguefrio demais se assustaram correndo em fuga maior debaixo de tiros xingos às pragas João Condiz pois é o senhor sabe Urubus puderam voar cererém uns urubus declarados Mas daí voltamos desatravessando outra vez o Soninho até onde estava a nossa mulada com munição e o mais Mesmo viemos negaceando de recuar Assim era pena mas carecíamos de flautear desse jeito sustância nossa não dava para se acabar com aqueles judas de uma vez Sempre sempre para enganar no que vissem Zé Bebelo variava de se viajar uma hora quase todos juntos outra hora despedidos espalhados Ainda por suma vantagem disso demos um tiroteio ganho na fazenda São Serafim dos diabos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 130 Rumo a rumo de lá mas muito para baixo é um lugar Tem uma encruzilhada Estradas vão para as Veredas Tortasveredas mortas Eu disse o senhor não ouviu Nem torne a falar nesse nome não É o que ao senhor lhe peço Lugar não onde Lugares assim são simples dão nenhum aviso Agora quando passei por lá minha mãe não tinha rezado por mim naquele momento Assim feito no Paredão Mas a água só é limpa é nas cabeceiras O mal ou o bem estão é em quem faz não é no efeito que dão O senhor ouvindo seguinte me entende O Paredão existe lá Senhor vá senhor veja É um arraial Hoje ninguém mora mais As casas vazias Tem até sobrado Deu capim no telhado da igreja a gente escuta a qualquer entrar o borbolo rasgado dos morcegos Bicho que guarda muitos frios no corpo Boi vem do campo se esfrega naquelas paredes Deitam Malham De noitinha os morcegos pegam a recobrir os bois com lencinhos pretos Rendas pretas defunteiras Quando se dá um tiro os cachorros latem forte tempo Em toda a parte é desse jeito Mas aqueles cachorros hoje são do mato têm de caçar seu decomer Cachorros que já lamberam muito sangue Mesmo o espaço é tão calado que ali passa o sussurro de meia noite às nove horas Escutei um barulho Tocha de carnaúba estava alumiando Não tinha ninguém restado Só vi um papagaio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 131 manso falante que esbagaçava com o bico algum trem Esse vez em quando para dormir ali voltava E eu não revi Diadorim Aquele arraial tem um arruado só é a rua da guerra O demônio na rua no meio do redemunho O senhor não me pergunte nada Coisas dessas não se perguntam bem Sei que estou contando errado pelos altos Desemendo Mas não é por disfarçar não pense De grave na lei do comum disse ao senhor quase tudo Não crio receio O senhor é homem de pensar o dos outros como sendo o seu não é criatura de pôr denúncia E meus feitos já revogaram prescrição dita Tenho meu respeito firmado Agora sou anta empoçada ninguém me caça Da vida pouco me resta só o deogratias e o troco Bobéia Na feira de São João Branco um homem andava falando A pátria não pode nada com a velhice Discordo A pátria é dos velhos mais Era um homem maluco os dedos cheios de anéis velhos sem valor as pedras retiradas ele dizia aqueles todos anéis davam até choque elétrico Não Eu estou contando assim porque é o meu jeito de contar Guerras e batalhas Isso é como jogo de baralho verte reverte Os revoltosos depois passaram por aqui soldados de Prestes vinham de Goiás reclamavam posse de todos animais de sela Sei que deram fogo na barra do Urucuia em São Romão aonde João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 132 aportou um vapor do Governo cheio de tropas da Bahia Muitos anos adiante um roceiro vai lavrar um pau encontra balas cravadas O que vale são outras coisas A lembrança da vida da gente se guarda em trechos diversos cada um com seu signo e sentimento uns com os outros acho que nem não misturam Contar seguido alinhavado só mesmo sendo as coisas de rasa importância De cada vivimento que eu real tive de alegria forte ou pesar cada vez daquela hoje vejo que eu era como se fosse diferente pessoa Sucedido desgovernado Assim eu acho assim é que eu conto O senhor é bondoso de me ouvir Tem horas anti gas que ficaram muito mais perto da gente do que outras de recente data O senhor mesmo sabe Mire veja aquela moça meretriz por lindo nome Nhorinhá filha de Ana Duzuza um dia eu recebi dela uma carta carta simples pedindo notícias e dando lembranças escrita acho que por outra alheia mão Essa Nhorinhá tinha lenço curto na cabeça feito crista de anubranco Escreveu mandou a carta Mas a carta gastou uns oito anos para me chegar quando eu recebi eu já estava casado Carta que se zanzou para um lado longe e para o outro nesses sertões nesses gerais por tantos bons préstimos em tantas algibeiras e capangas Ela tinha botado por fora só Riobaldo que está com João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 133 Medeiro Vaz E veio trazida por tropeiros e viajores recruzou tudo Quase não podia mais se ler de tão suja dobrada se rasgando Mesmo tinham enrolado noutro papel em canudo com linha preta de carretel Uns não sabiam mais de quem tinham recebido aquilo Ultimo que me veio com ela quase por engano de acaso era um homem que por medo da doença do toque ia levando seu gado de volta dos gerais para a caatinga logo que chuva chovida Eu já estava casado Gosto de minha mulher sempre gostei e hoje mais Quando conheci de olhos e mãos essa Nhorinhá gostei dela só o trivial do momento Quando ela escreveu a carta ela estava gostando de mim de certo e aí já estivesse morando mais longe magoal no São Josezinho da Serra no indo para o RiachodasAlmas e vindo do Morro dos Ofícios Quando recebi a carta vi que estava gostando dela de grande amor em lavaredas mas gostando de todo tempo até daquele tempo pequeno em que com ela estive na Aroeirinha e conheci concernente amor Nhorinhá gosto bom ficado em meus olhos e minha boca De lá para lá os oito anos se baldavam Nem estavam Senhor subentende o que isso é A verdade que em minha memória mesmo ela tinha aumentado de ser mais linda De certo agora não gostasse mais de mim quem sabe até tivesse morrido Eu sei que isto que estou dizendo é dificultoso muito entrançado Mas o senhor vai João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 134 avante Invejo é a instrução que o senhor tem Eu queria decifrar as coisas que são importantes E estou contando não é uma vida de sertanejo seja se for jagunço mas a matéria vertente Queria entender do medo e da coragem e da gã que empurra a gente para fazer tantos atos dar corpo ao suceder O que induz a gente para más ações estranhas é que a gente está pertinho do que é nosso por direito e não sabe não sabe não sabe Sendo isto Ao doido doideiras digo Mas o senhor é homem sobrevindo sensato fiel como papel o senhor me ouve pensa e repensa e rediz então me ajuda Assim é como conto Antes conto as coisas que formaram passado para mim com mais pertença Vou lhe falar Lhe falo do sertão Do que não sei Um grande sertão Não sei Ninguém ainda não sabe Só umas raríssimas pessoas e só essas poucas veredas veredazinhas O que muito lhe agradeço é a sua fineza de atenção Foi um fato que se deu um dia se abriu O primeiro Depois o senhor verá por quê me devolvendo minha razão Se deu há tanto faz tanto imagine eu devia de estar com uns quatorze anos se Tínhamos vindo para aqui circunstância de cinco léguas minha mãe e eu No porto do RiodeJaneiro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 135 nosso o senhor viu Hoje lá é o porto do seo Josozinho o negociante Porto lá como quem diz porque outro nome não há Assim sendo verdade que se chama no sertão é uma beira de barranco com uma venda uma casa um curral e um paiol de depósito Cereais Tinha até um pé de roseira Rosmes Depois o senhor vá verá Pois naquela ocasião já era quase do jeito O deJaneiro dali abaixo meialégua entra no São Francisco bem reto ele vai formam uma esquadria Quem carece passa o de Janeiro em canoa ele é estreito não estende de largura as trinta braças Quem quer bandear a cômodo o São Francisco também principia ali a viagem O porto tem de ser naquele ponto mais alto onde não dá febre de maresia A descida do barranco é indo por apique melhoramento não se pode pôr porque a cheia vem e tudo escavaca O São Francisco represa o deJaneiro alto em grosso às vezes já em suas primeiras águas de novembro Dezembro dando é certo Todo o tempo as canoas ficam esperando com as correntes presas na raiz descoberta dum pau dóleo que tem Tinha também umas duas ou três gameleiras de outrora tanto recordo Dá dó ver as pessoas descerem na lama aquele barranco carregando sacos pesados muita vez A vida aqui é muito repagada o senhor concorde Outro meu tempo então o que é que não havia de ser João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 136 Pois tinha sido que eu acabava de sarar duma doença e minha mãe feito promessa para eu cumprir quando ficasse bom eu carecia de tirar esmola até perfazer um tanto metade para se pagar uma missa em alguma igreja metade para se pôr dentro duma cabaça bem tapada e breada que se jogava no São Francisco a fim de ir Bahia abaixo até esbarrar no Santuário do Santo Senhor BomJesus da Lapa que na beira do rio tudo pode Ora lugar de tirar esmola era no porto Mãe me deu uma sacola Eu ia todos os dias E esperava por lá naquele parado raro que alguém vinha Mas eu gostava queria novidade quieta para meus olhos De descer o barranco me dava receio Mas espiava as cabaças para bóia de anzol sempre dependuradas na parede do rancho Terceiro ou quarto dia que lá fui apareceu mais gente Dois ou três homens de fora comprando alqueires de arroz Cada saco amarrado com broto de buriti a folha nova verde e amarela pelo comprido meio a meio Arcavam com aqueles sacos e passavam nas canoas para o outro lado do deJaneiro Lá era como ainda hoje é mata alta Mas por entre as árvores se podia ver um carrodebois parado os bois que mastigavam com escassa baba indicando vinda de grandes distâncias Daí o senhor veja tanto trabalho ainda por causa de uns metros de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 137 água mansinha só por falta duma ponte Ao que mais no carrodebois levam muitos dias para vencer o que em horas o senhor em seu jipe resolve Até hoje é assim por borco Aí pois de repente vi um menino encostado numa árvore pitando cigarro Menino mocinho pouco menos do que eu ou devia de regular minha idade Ali estava com um chapéu decouro de sujigola baixada e se ria para mim Não se mexeu Antes fui eu que vim para perto dele Então ele foi me dizendo com voz muito natural que aquele comprador era o tio dele e que moravam num lugar chamado OsPorcos meiomundo diverso onde não tinha nascido Aquilo ia dizendo e era um menino bonito claro com a testa alta e os olhos aosgrandes verdes Muito tempo mais tarde foi que eu soube que esse lugarim OsPorcos existe de se ver menos longe daqui nos gerais de Lassance Lá é bom perguntei Demais ele me respondeu e continuou explicando Meu tio planta de tudo Mas arroz este ano não plantou porque enviuvou de morte de minha tia Assim parecesse que tinha vergonha de estarem comprando aquele arroz o senhor veja João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 138 Mas eu olhava esse menino com um prazer de companhia como nunca por ninguém eu não tinha sentido Achava que ele era muito diferente gostei daquelas finas feições a voz mesma muito leve muito aprazível Porque ele falava sem mudança nem intenção sem sobejo de esforço fazia de conversar uma conversinha adulta e antiga Fui recebendo em mim um desejo de que ele não fosse mais embora mas ficasse sobre as horas e assim como estava sendo sem parolagem miúda sem brincadeira só meu companheiro amigo desconhecido Escondido enrolei minha sacola aí tanto mesmo em fé de promessa tive vergonha de estar esmolando Mas ele apreciava o trabalho dos homens chamando para eles meu olhar com um jeito de siso Senti modo meu de menino que ele também se simpatizava a já comigo A ser que tinha dinheiro de seu comprou um quarto de queijo e um pedaço de rapadura Disse que ia passear em canoa Não pediu licença ao tio dele Me perguntou se eu vinha Tudo fazia com um realce de simplicidade tanto desmentindo pressa que a gente só podia responder que sim Ele me deu a mão para me ajudar a descer o barranco As canoas eram algumas elas todas compridas como as de hoje escavacadas cada qual em tronco de pau de árvore Uma João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 139 estava ocupada apipada passando as sacas de arroz e nós escolhemos a melhor das outras quase sem água nem lama nenhuma no fundo Sentei lá dentro de pinto em ovo Ele se sentou em minha frente estávamos virados um para o outro Notei que a canoa se equilibrava mal balançando no estado do rio O menino tinha me dado a mão para descer o barranco Era uma mão bonita macia e quente agora eu estava vergonhoso perturbado O vacilo da canoa me dava um aumentante receio Olhei aqueles esmerados esmartes olhos botados verdes de folhudas pestanas luziam um efeito de calma que até me repassasse Eu não sabia nadar O remador um menino tam bém da laia da gente foi remando Bom aquilo não era tão pouca firmeza Resolvi ter brio Só era bom por estar perto do menino Nem em minha mãe eu não pensava Eu estava indo a meu esmo Saiba o senhor o dejaneiro é de águas claras E é rio cheio de bichos cágados Se olhava a lado se via um vivente desses em cima de pedra quentando sol ou nadando descoberto exato Foi o menino quem me mostrou E chamou minha atenção para o mato da beira em pé paredão feito à régua regulado As flores ele prezou No alto eram muitas flores subitamente vermelhas de olhodeboi e de outras João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 140 trepadeiras e as roxas do mucunã que é um feijão bravo porque se estava no mês de maio digo tempo de comprar arroz quem não pôde plantar Um pássaro cantou Nhambu E periquitos bandos passavam voando por cima de nós Não me esqueci de nada o senhor vê Aquele menino como eu ia poder deslembrar Um papagaio vermelho Arara for ele me disse E quêquêquê o araçari perguntava Ele o menino era dessemelhante já disse não dava minúcia de pessoa outra nenhuma Comparável um suave de ser mas asseado e forte assim se fosse um cheiro bom sem cheiro nenhum sensível o senhor represente As roupas mesmas não tinham nódoa nem amarrotado nenhum não fuxicavam A bem dizer ele pouco falasse Se via que estava apreciando o ar do tempo calado e sabido e tudo nele era segurança em si Eu queria que ele gostasse de mim Mas com pouco chegávamos no doChico O senhor surja é de repentemente aquela terrível água de largura imensidade Medo maior que se tem é de vir canoando num ribeirãozinho e dar sem espera no corpo dum rio grande Até pelo mudar A feiúra com que o São Francisco puxa se moendo todo barrento vermelho recebe para si o dejaneiro quase só um rego verde só Daqui vamos voltar eu pedi ansiado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 141 O menino não me olhou porque já tinha estado me olhando como estava Para quê ele simples perguntou em descanso de paz O canoeiro que remava em pé foi quem se riu decerto de mim Aí o menino mesmo avançação enorme rodaaroda o que até hoje minha vida avistei de maior foi aquele rio Aquele daquele dia As remadas que se escutavam do canoeiro a gente podia contar por duvidar se não satisfaziam termo Ah tu tem medo não nenhum ao canoeiro o menino perguntou com tom Sou barranqueiro o canoeirinho tresdisse repontando de seu orgulho De tal o menino gostou porque com a cabeça aprovava Eu também O chapéudecouro que ele tinha era quase novo Os olhos eu sabia e hoje ainda mais sei pegavam um escurecimento duro Mesmo com a pouca idade que era a minha percebi que de me ver tremido todo assim o menino tirava aumento para sua coragem Mas eu agüentei o aque do olhar dele Aqueles olhos então foram ficando bons retomando brilho E o menino pôs a mão na minha Encostava e ficava fazendo parte melhor da minha pele no profundo desse a minhas carnes alguma coisa Era uma mão branca com os dedos dela delicados Você também é animoso me disse Amanheci minha aurora Mas a vergonha que eu sentia agora era de outra qualidade Arre vai o canoeiro cantou feio moda de copla que gente barranqueira João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 142 usa Meu Rio de São Francisco nessa maior turvação vim te dar um gole dágua mas pedir tua benção Aí o desejado arribamos na outra beira a de lá Ao ver o menino mandou encostar só descemos Você não arreda daqui fica tomando conta ele falou para o canoeiro que seguiu de cumprir aquela autoridade desde que amarrou a corrente num paupombo Aonde o menino queria ir Sofismei mas fui andando fomos na vargem no meio avermelhado do capimpubo Sentamos por fim num lugar mais salientado com pedras rodeado por áspero bamburral Sendo de permanecer assim sem prazo isto é o quase calados somente Sempre os mosquitinhos era que arreliavam o vulgar Amigo quer de comer Está com fome ele me perguntou E me deu a rapadura e o queijo Ele mesmo só tocou em miga Estava pitando Acabou de pitar apanhava talos de capimcapivara e mastigava tinha gosto de milhoverde é dele que a capivara come Assim quando me veio vontade de urinar e eu disse ele determinou Háte vai ali atrás longe de mim isso faz Mais não conversasse e eu reparei me acanhava comparando como eram pobres as minhas roupas junto das dele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 143 Antojo então por detrás de nós sem avisos apareceu a cara de um homem As duas mãos dele afastavam os ramos do mato me deu um susto somente Por certo algum trilho passava perto por ali o homem escutara nossa conversa À fé era um rapaz mulato regular uns dezoito ou vinte anos mas altado forte com as feições muito brutas Debochado ele disse isto Vocês dois uê hem Que é que estão fazendo Aduzido fungou e mão no fechado da outra bateu um figurado indecente Olhei para o menino Esse não semelhava ter tomado nenhum espanto surdo sentado ficou social com seu prático sorriso Hem hem E eu Também que se sorriu sem malícia e sem bondade Não piscava os olhos O canoeiro sem seguir resolução varejava ali na barra entre duas águas menos fundas brincando de rodar mansinho com a canoa passeada Depois foi entrando no doChico na beirada para o rumo de acima Eu me apeguei de olhar o mato da margem Beiras sem praia tristes tudo parecendo meio podre a deixa lameada ainda da cheia derradeira o senhor sabe quando o doChico sobe os seis ou os onze metros E se deu que o remador encostou quase a canoa nas canaranas e se curvou queria quebrar um galho de maracujádomato Com o mau jeito a canoa desconversou o menino também tinha se levantado Eu disse um grito Tem nada não ele falou até meigo muito Mas então vocês João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 144 fiquem sentados eu me queixei Ele se sentou Mas sério naquela sua formosa simpatia deu ordem ao canoeiro com uma palavra só firme mas sem vexame Atravessa O canoeiro obedeceu Tive medo Sabe Tudo foi isso tive medo Enxerguei os confins do rio do outro lado Longe longe com que prazo se ir até lá Medo e vergonha A aguagem bruta traiçoeira o rio é cheio de baques modos moles de esfrio e uns sussurros de desamparo Apertei os dedos no pau da canoa Não me lembrei do CaboclodÁgua não me lembrei do perigo que é a onça dágua se diz a ariranha essas desmergulham em bando e becam a gente rodeando e então fazendo a canoa virar de estudo Não pensei nada Eu tinha o medo imediato E tanta claridade do dia O arrojo do rio e só aquele estrape e o risco extenso dágua de parte a parte Alto rio fechei os olhos Mas eu tinha até ali agarrado uma esperança Tinha ouvido dizer que quando canoa vira fica boiando e é bastante a gente se apoiar nela encostar um dedo que seja para se ter tenência a constância de não afundar e aí ir seguindo até sobre se sair no seco Eu disse isso E o canoeiro me contradisse Esta é das que afundam inteiras É canoa de peroba Canoa de peroba e de paudóleo não sobrenadam Me deu uma tontura O ódio que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 145 eu quis ah tantas canoas no porto boas canoas boiantes de faveira ou tamboril de imburana vinhático ou cedro e a gente tinha escolhido aquela Até fosse crime fabricar dessas de madeira burra A mentira fosse mas eu devo de ter arregalado doidos olhos Quieto composto confronte o menino me via Carece de ter coragem ele me disse Visse que vinham minhas lágrimas Dói de responder Eu não sei nadar O menino sorriu bonito Afiançou Eu também não sei Sereno sereno Eu vi o rio Via os olhos dele produziam uma luz Que é que a gente sente quando se tem medo ele indagou mas não estava remoqueando não pude ter raiva Você nunca teve medo foi o que me veio de dizer Ele respondeu Costumo não e passado o tempo dum meu suspiro Meu pai disse que não se deve de ter Ao que meio pasmei Ainda ele terminou Meu pai é o homem mais valente deste mundo Aí o bambalango das águas aro o mulato veio insistindo E por aí eu consegui falar alto contes tando que não estávamos fazendo sujice nenhuma estávamos era espreitando as distâncias do rio e o parado das coisas Mas o que eu menos esperava ouvi a bonita voz do menino dizer Você meu nego Está certo chega aqui A fala o jeito dele imitavam de mulher Então era aquilo E o mulato satisfeito caminhou para se sentar juntinho dele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 146 Ah tem lances esses se riscam tão depressa olhar da gente não acompanha Urutu dá e já deu o bote Só foi assim Mulato pulou para trás ô de um grito gemido urro Varou o mato em fuga se ouvia aquela corredoura O menino abanava a faquinha nua na mão e nem se ria Tinha embebido ferro na coxa do mulato a ponta rasgando fundo A lâmina estava escorrida de sangue ruim Mas o menino não se aluía do lugar E limpou a faca no capim com todo capricho Quicé que corta foi só o que disse a si dizendo Tornou a pôr na bainha Meu receio não passava O mulato podia voltar ter ido buscar uma foice garrucha a reunir companheiros de nós o que seria daí a mais um pouco Ao menino ponderei isso encarecendo que a gente fosse logo embora Carece de ter coragem Carece de ter muita coragem ele me moderou tão gentil Me alembrei do que antes ele tinha falado de seu pai Indaguei Mas então você mora é com seu tio Aí ele se levantou me chamando para voltarmos Mas veio demorão vagarosinho até aonde a canoa E não olhava para trás Não medo do mulato nem de ninguém ele não conhecia Tem de tudo neste mundo pessoas engraçadas o remadorzinho estava dormindo espichado dentro da canoa com João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 147 os seus mosquitos por cima e a camisa empapada de suor de sol Se alegrou com o resto da rapadura e do queijo nos trouxe remando no meio do rio até mais cantava Dessa volta não lhe dou desenho tudo igual igual Menos que por vez me pareceu depressa demais Você é valente sempre em hora eu perguntei O menino estava molhando as mãos na água vermelha esteve tempo pensando Dando fim sem me encarar declarou assim Sou diferente de todo o mundo Meu pai disse que eu careço de ser diferente muito diferente E eu não tinha medo mais Eu O sério pontual é isto o senhor escute me escute mais do que eu estou dizendo e escute desarmado O sério é isto da estória toda por isto foi que a estória eu lhe contei eu não sentia nada Só uma transformação pesável Muita coisa importante falta nome Minha mãe estava lá no porto por mim Tive de ir com ela nem pude me despedir direito do Menino De longe virei ele acenou com a mão eu respondi Nem sabia o nome dele Mas não carecia Dele nunca me esqueci depois tantos anos todos Agora que o senhor ouviu perguntas faço Por que foi que eu precisei de encontrar aquele Menino Toleima eu sei Dou de O senhor não me responda Mais que coragem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 148 inteirada em peça era aquela a dele De Deus do demo Por duas por uma isto que eu vivo pergunta de saber nem o compadre meu Quelemém não me ensina E o que era que o pai dele tencionava Na ocasião idade minha sendo aquela não dei de mim esse indagado Mire veja um rapazinho no Nazaré foi desfeiteado e matou um homem Matou correu em casa Sabe o que o pai dele temperou Filho isso é a tua maioridade Na velhice já tenho defesa de quem me vingue Bolas ora Senhor vê o senhor sabe Sertão é o penal criminal Sertão é onde homem tem de ter a dura nuca e mão quadrada Mas onde é bobice a qualquer resposta é aí que a pergunta se pergunta Por que foi que eu conheci aquele Menino O senhor não conheceu compadre meu Quelemém não conheceu milhões de milhares de pessoas não conheceram O senhor pense outra vez repense o bem pensado para que foi que eu tive de atravessar o rio defronte com o Menino O São Francisco cabe sempre aí capaz passa O Chapadão é em sobre longe beira até Goiás extrema Os gerais desentendem de tempo Sonhação acho que eu tinha de aprender a estar alegre e triste juntamente depois nas vezes em que no Menino pensava eu acho que Mas para quê por quê Eu estava no porto do deJaneiro com minha capanguinha na mão ajuntando esmolas para o Senhor BomJesus no dever de pagar promessa feita por minha mãe João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 149 para me sarar de uma doença grave Deveras se vê que o viver da gente não é tão cerzidinho assim Artes que foi que fico pensando por aí Zé Bebelo um tanto sabia disso mas sabia sem saber e saber não queria como Medeiro Vaz como Joca Ramiro como compadre meu Quelemém que viaja diverso caminhar Ao quê Não me dê dês Mais hoje mais amanhã quer ver que o senhor põe uma resposta Assim o senhor já me compraz Agora pelo jeito de ficar calado alto eu vejo que o senhor me divulga Adiante Conto O seguinte é simples Minha mãe morreu apenas a Bigri era como ela se chamava Morreu num dezembro chovedor aí foi grande a minha tristeza Mas uma tristeza que todos sabiam uma tristeza do meu direito De desde até hoje em dia a lembrança de minha mãe às vezes me exporta Ela morreu como a minha vida mudou para uma se gunda parte Amanheci mais De herdado fiquei com aquelas miserinhas miséria quase inocente que não podia fazer questão lá larguei a outros o pote a bacia as esteiras panela chocolateira uma caçarola bicuda e um alguidar somente peguei minha rede uma imagem de santo de pau um canecodeasa pintado de flores uma fivela grande com ornados um cobertor de baeta e minha muda de roupa Puseram para mim tudo em João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 150 trouxa como coube na metade dum saco Até que um vizinho caridoso cumpriu de me levar por causa das chuvas numa viagem durada de seis dias para a Fazenda São Gregório de meu padrinho Selorico Mendes na beira da estrada boiadeira entre o rumo do Curralinho e o do Bagre onde as serras vão descendo Tanto que cheguei lá meu padrinho Selorico Mendes me aceitou com grandes bondades Ele era rico e somítico possuía três fazendasdegado Aqui também dele foi a maior de todas De não ter conhecido você estes anos todos purgo meus arrependimentos foi a sincera primeira palavra que ele me disse me olhando antes Levei dias pensando que ele não fosse de juizo regulado Nunca falou em minha mãe Nas coisas de negócio e uso no lidante também quase não falava Mas gostava de conversar contava casos Altas artes de jagunçosisso ele amava constante histórias Ah a vida vera é outra do cidadão do sertão Política Tudo política e potentes chefias A pena que aqui já é terra avinda concorde roncice de paz e sou homem particular Mas adiante por aí arriba ainda fazendeiro graúdo se reina mandador todos donos de agregados valentes turmas de cabras do trabuco e na carabina escopetada João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 151 Domingos Touro no Alambiques Major Urbano na Macaçá os Silva Salles na Crondeúba no VauVau dona Próspera Blaziana Dona Adelaide no CampoRedondo Simão Avelino na BarradaVaca Mozar Vieira no São João do Canastrão o Coronel Camucim nos Arcanjos comarca de Rio Pardo e tantos tantos Nisto que na extrema de cada fazenda some e surge um camarada de sentinela que sobraça o paudefogo e vigia feito onça que come carcaça Ei Mesma coisa no barranco do rio e se descer esse São Francisco que aprova cada lugar é só de um grande senhor com sua família geral seus jagunços mil ordeiros ver São Francisco da Arrelia Januária Carinhanha Urubu Pilão Arcado Xiquexique e SentoSé Demais falasse tendo conhecido o Neco se lembrava de quando Neco forçou Januária e Carinhanha nas eras do ano de 79 tomou todos os portos Jatobá Malhada e Manga fez como quis e pôs sede de suas fortes armas no arraial do jacaré que era a terra dele Estive lá com carta firmada pelo Capitão Severiano Francisco de Magalhães que era companheiro combinado do Neco O pessoal que eles numeravam em guerra comprazia uma babilônia Botavam até barcas cheias de homens com bacamartes cruzando para João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 152 baixo e para cima o rio de parte a parte Dia e noite a gente ouvia gritos e tiros Cavalaria de jagunços galopando saindo para distâncias marcadas Abriam festa de bombareal e foguetório quando entravam numa cidade Mandavam tocar o sino da igreja Arrombavam a cadeia soltando os presos arrancavam o dinheiro em coletoria e ceiavam em Casada Câmara Meu padrinho Selorico Mendes era muito medroso Contava que em tempos tinha sido valente se gabava goga Queria que eu aprendesse a atirar bem e manejar porrete e faca Me deu logo um punhal me deu uma garrucha e uma granadeira Mais tarde me deu até um facão enterçado que tinha mandado forjar para próprio quase do tamanho de espada e em formato de folha de gravata Sentei em mesa com o Neco bebi vinho almocei Debaixo da chefia dele paravam uns oitocentos brabos só obedeciam e rendiam respeito Meu padrinho hóspede do Neco de recontar isso ele sempre se engrandecia Naquela dita ocasião todas as pessoas importantes tinham fugido da Januária desamparadas de poderdelei foram esperar melhor sorte em Pedrasde MariadaCruz Neco Ah Mandou mais que Renovato ou o Lióbas estrepoliu mais do que João Brandão e os João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 153 Filgueiras E meu padrinho me mostrou um papel com escrita de Neco era recibo de seis ancorotes com pólvora e uma remessa de iodureto a assinatura rezava assim Manoel Tavares de Sá Mas eu não sabia ler Então meu padrinho teve uma decisão me enviou para o Curralinho para ter escola e morar em casa de um amigo dele Nhô Maroto cujo Gervásio Lê de Ataíde era o verdadeiro nome social Bom homem Lá eu não carecia de trabalhar de forma nenhuma porque padrinho Selorico Mendes acertava com Nhô Maroto de pagar todo fim de ano o assentamento da tença e impêndio até de botina e roupa que eu precisasse Eu comia muito a despesa não era pequena e sempre gostei do bom e do melhor A ser que alguma vez Nhô Maroto me pedia um ou outro serviço usando muito bico de palavreado me agradando e dizendo que estimava como um favor Nunca neguei a ele meus pés e mãos e mesmo não era o nenhum trabalho notável Vai acontece ele me disse Baldo você carecia mesmo de estudar e tirar cartadedoutor porque para cuidar do trivial você jeito não tem Você não é habilidoso Isso que ele me disse me impressionou que de seguida formei em pergunta ao Mestre Lucas Ele me olhou um tempo era homem de tão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 154 justa regra e de tão visível correto parecer que não poupava ninguém às vezes teve dia de dar em todos os meninos com a palmatória e mesmo assim nenhum de nós não tinha raiva dele Assim Mestre Lucas me respondeu É certo Mas o mais certo de tudo é que um professor de mãocheia você da va E desde o começo do segundo ano ele me determinou de ajudar no corrido da instrução eu explicava aos meninos menores as letras e a tabuada Curralinho era lugar muito bom de vida contentada Com os rapazinhos de minha idade arranjei companheirice Passei lá esses anos não separei saudade nenhuma nem com o passado não somava Aí namorei falso asnaz ah essas meninas por nomes de flores A não ser a Rosauarda moça feita mais velha do que eu filha de negociante forte seo Assis Wababa dono da venda O Primeiro Barateiro da Primavera de São José ela era estranja turca eles todos turcos armazém grande casa grande seo Assis Wababa de tudo comerciava Tanto sendo bizarro atencioso e muito ladino ele me agradava dizia que meu padrinho Selorico Mendes era um freguesão diversas vezes me convidou para almoçar em mesa O que apreciei carne moída com semente de trigo outros guisados recheio bom em abobrinha ou em folha de uva e aquela moda de azedar o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 155 quiabo supimpas iguarias Os doces também Estimei seo Assis Wababa a mulher dele dona Abadia e até os meninos irmãozinhos de Rosauarda mas com tamanha diferença de idade Só o que me invocava era a linguagem garganteada que falavam uns com uns a aravia Assim mesmo afirmo que a Rosauarda gostou de mim me ensinou as primeiras bandalheiras e as completas que juntos fizemos no fundo do quintal num esconso fiz com muito anseio e deleite Sempre me dizia uns carinhos turcos e me chamava de Meus olhos Mas os dela era que brilhavam exaltados e extraordinários pretos duma formosura mesmo singular Toda a vida gostei demais de estrangeiro Hoje é que reconheço a forma do que meu padrinho muito fez por mim ele que criara amparado amor ao seu dinheiro e que tanto avarava Pois várias viagens ele veio ao Curralinho me ver na verdade também ele aproveitava para tratar de vender bois e mais outros negócios e trazia para mim caixetas de doce de buriti ou de araticum requeijão e marmela das Cada mês de novembro mandava me buscar Nunca ralhou comigo e me dava de tudo Mas eu nunca pedi coisa nenhuma a ele Dez vezes mais me desse e não se valia Eu não gostava dele nem desgostava Mais certo era que com ele eu não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 156 soubesse me acostumar Acabei por razão outra fugindo do São Gregório o senhor vai ver Nunca mais vi meu padrinho Mas por isso ele não me desejou mal nem entendo Decerto ficou entusiasmado quando teve notícias de que eu era o jagunço E me deixou por herdeiro em folha de testamento das três fazendas duas peguei Só o São Gregório foi que ele testou para uma mulata com que no fim de sua velhice se ajuntou Disso não fiz conta Mesmo o que recebi eu menos merecia Agora derradeiramente destaco quando velho ele penou remorso por mim eu velho a curtir arrependimento por ele Acho que nós dois éramos mesmo pertencentes Depois pouco que voltei do Curralinho definitivo grande fato se deu que ao senhor não escondo Certa madrugada os cachorros todos latiram no São Gregório alguém estava batendo Era mês de maio em má lua o frio fiava E quando tão moço eu custava muito para me levantar não por fraca saúde mas por preguiça mal corrigida Assim que saí da cama e fui ver se era de se abrir meu padrinho Selorico Mendes com a lamparina na mão já estava pondo para dentro da sala uns homens que eram seis todos de chapéugrande e trajados de capotes e capas arrastavam esporas Ali entraram com uma aragem que me deu susto de possível reboldosa Admirei tantas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 157 armas Mas eles não eram caçadores Ao que farejei pé de guerra Meu padrinho mandou eu ir lá dentro chamar alguma das mulheres que coasse café quente Quando voltei um dos homens Alarico Totõe estava expondo explicando Todos continuavam sem tomar assentos Alarico Totõe sendo um fazendeiro do GrãoMogol conhecido de meu padrinho Ele com seu irmão Aluiz Totõe pessoas finas gente de bem Tinham encomendado o auxílio amigo dos jagunços por uma questão política logo entendi Meu padrinho escutava aprovando com a cabeça Mas para quem ele sempre estava olhando com uma admiração toda perturbosa era para o chefe dos jagunços o principal E o senhor sabe quem era esse Joca Ramiro Só de ouvir o nome eu parei na maior suspensão Adrede Joca Ramiro estava de braços cruzados o chapéu dele se desabava muito largo Dele até a sombra que a lamparina arriava na parede se trespunha diversa na imponência pojava volume E vi que era um homem bonito caprichado em tudo Vi que era homem gentil Dos lados ombreavam com ele dois jagunões depois eu soube que seus segundos Um se chamava Ricardão corpulento e quieto com João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 158 um modo simpático de sorriso compunha o ar de um fazendeiro abastado O outro Hermógenes homem sem anjodaguarda Na hora não notei de uma vez Pouco pouco fui receando O Hermógenes ele estava de costas mas umas costas desconformes a cacunda amontoava com o chapéu raso em cima mas chapéu redondo de couro que se que uma cabaça na cabeça Aquele homem se arrepanhava de não ter pescoço As calças dele como que se enrugavam demais da conta enfolipavam em dobrados As pernas muito abertas mas quando ele caminhou uns passos se arrastava me pareceu que nem queria levantar os pés do chão Reproduzo isto e fico pensando será que a vida socorre à gente certos avisos Sempre me lembro dele me lembro mal mas atrás de muitas fumaças Naquela hora eu estava querendo que ele não virasse a cara Virou A sombra do chapéu dava até em quase na boca enegrecendo No terminar Alarico Totõe pediu que precisavam de um recanto oculto onde a tropa dos homens passasse o dia que vinha pois que viajavam de noite dando surpresa e desmanchando rastro Tem ótimo reconditório meu padrinho consentiu E mandou que eu fosse guiar aquela gente até aonde o poço do Cambaubal num fechado mato caapuão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 159 Primeiro tomouse café Assim Joca Ramiro corria pronto os olhos em tudo ali sorrindo franco a cara muito galharda e pôs as mãos nos bolsos Ricardão ria grosso E aquele Hermógenes veio para sair comigo mais o outro homem um cabeçachata alvaço com muita viveza no olhar desse gostei Alaripe se chamava até hoje se chama Em que eles dois a cavalo eu a pé viemos até onde estavam esperando os outros dois passos no baixo da estrada Aí mês de maio falei com a estreladalva O orvalho pripingando baciadas E os grilos no chirilim De repente de certa distância enchia espaço aquela massa forte antes de poder ver eu já pressentia Um estado de cavalos Os cavaleiros Nenhum não tinha desapeado E deviam de ser perto duns cem Respirei a gente sorvia o bafejo o cheiro de crinas e rabos sacudidos o pêlo deles de suor velho semeado das poeiras do sertão Adonde o movimento esbarrado que se sussurra duma tropa assim feito de uma porção de barulhinhos pequenos que nem o dum grande rio do aflor A bem dizer aquela gente estava toda calada Mas uma sela range de seu tine um arreaz estribo e estribeira ou o coscós quando o animal lambe o freio e mastiga Couro raspa em couro os cavalos dão de orelha ou batem com o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 160 pé Daqui dali um sopro um meioarquejo E um cavaleiro ou outro tocava manso sua montada avançando naquele bolo mudando de lugar bridava Eu não sentia os homens sabia só dos cavalos Mas os cavalos mantidos montados É diferente Grandeúdo E aos poucos divulgava os vultos muitos feito árvores crescidas lado a lado E os chapéus rebuçados as pontas dos rifles subindo das costas Porque eles não falavam e restavam esperando assim a gente tinha medo Ali deviam de estar alguns dos homens mais terríveis sertanejos em cima dos cavalos teúdos parados contrapassantes Soubesse sonhasse eu Decerto de guarda apartado dos mais se via um cavaleiro inteiro Veio vindo para cá o cavalo dele era escuro era um alazão de bom pisar Capixum é eu mais o siô Hermógenes o cabeça chata falou aviso A bom Alaripe o de lá respondeu A gente se encostava no frio escutava o orvalho o mato cheio de cheiroso estalinho de estrelas o deduzir dos grilos e a cavalhada a peso Dava o raiar entreluz da aurora quando o céu branquece Ao o ar indo ficando cinzento o formar daqueles cavaleiros escorrido se divisava E o senhor me desculpe de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 161 estar retrasando em tantas minudências Mas até hoje eu represento em meus olhos aquela hora tudo tão bom e o que é é saudade De junto com o Capixum se aproximou outro um também de sotochefe que o Hermógenes tratou de siéMarques O Hermógenes tinha voz que não era fanhosa nem rouca mas assim desgovernada desigual voz que se safava Assim fantasia de dizer o ser de uma irara com seu cheiro fedorento Aoh uê alguém irmão aquele siéMarques perguntou tratando de minha pessoa De paz mano velho Amigo que veio mostrar à gente o arrancho o Hermógenes contestou Deu ainda um barulho de boca e goela qual um rosno Sem mais delongas nenhumas saí caminhando ao lado do cavalo do Hermógenes puxando todos para o Cambaubal Atrás de nós eu ouvia os passos postos da grande cavalaria o regular esse empurro continuado Eu não queria virar e espiar achassem que eu era abelhudo Mas agora eles conversavam alguns riam diziam graças Presumi que estavam muito contentes de ganhar o repouso de horas pois tinham navegado na sela a noite toda Um falou mais alto aquilo era bonito e sem tino Siruiz cadê a moça virgem Largamos a estrada no capim molhado meus pés João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 162 se lavavam Algum aquele Siruiz cantou palavras diversas para mim a toada toda estranha Urubu é vila alta mais idosa do sertão padroeira minha vida vim de lá volto mais não Vim de lá volto mais não Corro os dias nesses verdes meu boi mocho baetão buriti água azulada carnaúba sal do chão Remanso de rio largo viola da solidão quando vou pra dar batalha convido meu coração Vinham quebrando as barras Dia de maio com orvalho eu disse Lembrança da gente é assim Me emprestaram um cavalo e eu fui com o Alaripe esperar a chegada da tropa de burros adiante na boca da ponte Não tardava já vinham aparecendo Um lote de dez mulas com os cargueiros Mas vinham com os cincerros tapados tafulhados João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 163 com rama de algodão afora o gemegeme das cangalhas não faziam nenhum rumor Guiamos os tropeiros também para o Cambaubal Mas aí meu padrinho chegou com Joca Ramiro Ri cardão e os Totões Meu padrinho insistiu me trouxe outra vez para casa O dia já estava clareando completo Meu coração restava cheio de coisas movimentadas Não vi mais o acampo deles as esporas tilintim Não pude Padrinho Selorico Mendes mandou que eu fosse no OCocho buscar um homem chamado Rozendo Pio esse homem meu padrinho me disse rastreava E era para ele vir debaixo de todos os segredos tapejar o bando de Joca Ramiro por bons trilhos e atalhos na Serra das Trinta Voltas modo de caber em duas noites sem perigo maior o que se não durasse seis ou sete Sendo assim só eu mesmo merecia confiança de ir Fui com desgosto Três léguas três léguas e meia longe Mas eu tinha de levar um cavalo adestro para o homem E esse Rozendo Pio era tratantaz e tolo Demorou muito com desculpa de arranjos No caminho na vinda ele nem sabia de nada de jagunços quase não conversava não quis dar demonstração Nem fazia prazer naquilo Quando chegamos era o anoitecido o bando estava pronto para sair Se separavam em pequenos golpes Meu padrinho tinha mandado amarrar os cachorros todos da fazenda João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 164 Se foram Achei mesmo que tudo tinha perdido a graça o de se ver Semanas seguintes meu padrinho só falou nos jagunços Dito que Joca Ramiro era um chefe cursado muitos iguais não nascem assim dono de glórias Aquela turma de cabras tivesse sorte podia impor caráter ao Governo Meu padrinho levara aquele dia todo no meio deles Contava o cuidado nos arranjos as coisas todas regradas aquele dormir de ordem aquela autoridade enorme no entremeamento Nem nada faltava As sacas de farinha tantas e tantas arrobas de carnedesol a munição bem zelada caixote com pães de sabão para cada um lavar a roupa e o corpo Até tinham um mestreferrador com sua tendinha e os pertences uma bigorna e as tenazes fole de mão ferramenta exata e capanga de alveitar com vários sortidos flames de sangrar cavalos adoecidos E as mais coisas meu padrinho descrevia com muito agrado de que tinha ouvido sincera narração As lutas dos jocaramiros os barulhos as manhas traçadas para se ganhar em combate maço de estórias de toda raça de artes e estratagemas De ouvir meu padrinho contar aquilo se comprazendo sem singeleza começava a dar em mim um enjôo Parecia que ele queria se emprestar a si as façanhas dos jagunços e que Joca Ramiro estava ali junto de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 165 nós obedecendo mandados e que a total valentia pertencia a ele Selorico Mendes Meu padrinho era antipático Ficava mais sendo Eu achava Num lugar parado assim na roça carece de a gente de vez em quando ir alterando os assuntos Não estou caçando desculpa para meus errados não o senhor reflita O que me agradava era recordar aquela cantiga estúrdia que reinou para mim no meio da madrugada ah sim Simples digo ao senhor aquilo molhou minha idéia Aire me adoçou tanto que dei para inventar de espírito versos naquela qualidade Fiz muitos montão Eu mesmo por mim não cantava porque nunca tive entôo de voz e meus beiços não dão para saber assoviar Mas reproduzia para as pessoas e todo o mundo admirava muito recitados repetidos Agora tiro sua atenção para um ponto e ouvindo o senhor concordará com o que por mesmo eu não saber não digo Pois foi que eu escrevi os outros versos que eu achava dos verdadeiros assun tos meus e meus todos sentidos por mim de minha saudade e tristezas Então Mas esses que na ocasião prezei estão goros remidos em mim bem morreram não deram cinza Não me lembro de nenhum deles nenhum O que eu guardo no giro da memória é aquela madrugada dobrada inteira os cavaleiros no sombrio amontoados feito bichos e árvores o refinfim do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 166 orvalho a estreladalva os grilinhos do campo o pisar dos cavalos e a canção de Siruiz Algum significado isso tem Meu padrinho Selorico Mendes me deixava viver na lordeza No São Gregório do razoável de tudo eu dispunha querer querendo E de trabalhar seguido eu nem carecia Fizesse ou não fizesse meu padrinho me apreciava mas não me louvava Uma coisa ele não tolerava e era só que alguém indagasse justo quanto era o dinheiro que ele tinha Com isso eu nunca somei não sou especula Eu vivia com o meu bom corpo Alguém há de achar algum regime melhor Mas um dia de tanto querer não pensar no princípio disso acabei me esquecendo quem me disseram que não era à toa que minhas feições copiavam retrato de Selorico Mendes Que ele tinha sido meu pai Afianço que no escutar em roda de mim o tonto houve o mundo todo me desproduzia numa grande desonra Pareceu até que de algum encoberto jeito eu daquilo já sabia Assim já tinha ouvido de outros aos peda cinhos ditos e indiretas que eu desouvia Perguntar a ele fosse Ah eu não podia não Perguntar a mais pessoa nenhuma chegava Não desesquentei a cabeça Ajuntei meus trens minhas armas selei um cavalo fugi de lá Fui até na cozinha conduzi um naco de carne dois punhados de farinha no bornal Achasse João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 167 algum dinheiro à mão pegava disso eu não tinha nenhum escrúpulo Virei bem fugido Toquei direto para o Curralim Razão por que fiz Sei ou não sei De as eu pensava claro acho que de bês não pensei não Eu queria o ferver Quase mesmo aquilo me engrossava desarrazoado feito o vicio dum ruim prazer Eu fazia minha raiva Raiva bem não era isto é só uma espécie de despique a dentro o vexame que me inçava não me dava rumo para continuação Único reger era me empinar e assoprar em esta minha cabeça aí a confusão e desordem e altos desesperos Arremessei o cavalo galopei demais Não ia para a casa de Nhô Maroto Ante antes ia para o seo Assis Wababa aquela hora eu queria só gente estranha muito estrangeira estrangeira inteira Só fosse um pouco para ver a Rosauarda essa assim eu amava Ah não Gostasse da Rosa uarda mais aí nas delícias dela minha idéia não podendo se firmar porque aumentava o desamparo de minha vergonha Ia para a escola de Mestre Lucas A lá perto da casa de Mestre Lucas morava um senhor chamado Dodó Meireles que tinha uma filha chamada Miosótis Assim à parva às tantices essa mocinha Miosótis também tinha sido minha namorada agora por muitos momentos eu achava consolo em que ela me visse que soubesse eu com minhas armas matadeiras tinha dado revolta João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 168 contra meu padrinho saíra de casa aos gritos danado no animal pelo cerrado a fora capaz de capaz Daí a Mestre Lucas eu tinha de dar uma explicação Eu não gostava daquela Miosótis ela era uma bobinhã no São Gregório nunca tinha pensado nela gostava era de Rosauarda Mas Nhô Maroto havia de logo saber que eu tivesse chegado no Curralim e meu padrinho ia ter o pronto aviso Mandava alguém me buscar Vinha ele Não me importava De repente eu sabia o que eu estava querendo era isso mesmo Ele viesse me pedisse para voltar me prometendo tudo ah até nos meus pés se ajoelhava E não viesse Se demorasse a vir Aí o que era que eu ia fazer caçar meio de vida aturar remoque sei lá de todos me repartir no miudinho de cada dia tão penoso aborrecido A bis então cresceu minha raiva Tive outras lágrimas nos bobos olhos Adramado pensei em minha mãe com todo querer e afirmei alto que seria só por conta dela que eu estava procedendo pelo avesso gritei Mas aquilo se fingia mal espécie de minha vergonha esteve sendo maior Como o cavalo em rogo de misericórdia escureceu o pêlo de todo suor Sosseguei as espo ras Viemos a passo de marcha Eu tinha medo por causa de minha vida quando entramos no Curralinho João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 169 Em casa de seo Assis Wababa me deram trato regozijante No que jantei ri conversei Só a praga duma surpresa me declararam a de que a Rosauarda agora estava sendo noiva para se casar com um Salino Cúri outro turco negociante nos derradeiros meses para lá vindo Assumi em trela tristeza e alívio aquele amor não seria mesmo para mim pelos motivos pessoais Nublo em que me vi mas me governei trancei as pernas comecei cara de falar pouco senhornão senhorsim acautelado sisudo e indagando dos grandes preços assim fossem cuidar que essa minha viagem era por tramar importante encargo para o meu padrinho Selorico Mendes Seo Assis Wababa oxente se prazia aquela noite com o que o Vupes noticiava que em breves tempos os trilhos do tremdeferro se armavam de chegar até lá o Curralinho então se destinava ser lugar comercial de todo valor Seo Assis Wababa se engordava concordando trouxe canjirão de vinho Me alembro eu entrei no que imaginei na ilusãozinha de que para mim também estava tudo assim resolvido o progresso moderno e que eu me representava ali rico estabelecido Mesmo vi como seria bom se fosse verdade Mas estava lá o Vupes Alemão Vupes que eu disse seo Emílio Wusp que o senhor diz Das vezes que viera a passar pelo Curralinho ele já era meu conhecido Tresdobrado homem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 170 Sendo que entendia tudo de manejar com armas mas viajava sem cano nenhum dizia Níquites Desarmado eu completo eu assim eles todos mesmo vão muito mais me respeitar oh no sertão Ele me viu afinar mira uma vez e me louvou por eu de nascença saber tão bem na horinha segurar de não respirar Mesmo dizia Senhor atira bem porque atira com espírito Sempre o espírito é que acerta Soante que dissesse sempre o espírito é que mata Mas a bem agora aquela hora estava lá o Vupes assim foi Porque num desastre de instante eu tinha pegado a pensar o que resolvia minha situação era trabalhar para ele se viajar vendendo ferramentas por aí descaroçador de algodão Nem ponderei mas disse Seo Vupes o senhor não quererá me ajustar em seu serviço Minha bestice Níquites conforme que o Vupes constante exclamava Ali nem acabei de falar e em mim eu já estava arrependido com toda a velocidade Idéia nova que imaginei que mesmo pessoa amiga e cortês virando patrão da gente vira mais rude e reprovante Mordi boca já tinha falado Ainda quis emendar garantindo que era por gracejo mas seo Assis Wababa e o Vupes me olhavam a menos com desconfianças me senti rebaixado demais A contra mim tudo contra o só ensejo das coisas me sisava Dali logo saí me despedindo bem Aonde Só se fosse ver o Mestre Lucas Assim vim andando mediante desespero Me alembro vinha andando e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 171 agora era que eu pegava a pensar livre e solto na Rosauarda lindas pernas as lindas grossas ela no vestido de nanzuque nunca havia de ser para meu regalo Dum modo senti como me recordei depois tempos quando foi arte se cantar uma cantiga Seu pai fosse rico tivesse negócio eu casava contigo e o prazer era nosso Isso mas totalmente às vezes Ao que digo ao senhor pergunto em sua vida é assim Na minha agora é que vejo as coisas importantes todas em caso curto de acaso foi que se conseguiram pelo pulo fino de sem ver se dar a sorte momenteira por cabelo por um fio um clim de clina de cavalo Ah e se não fosse cada acaso não tivesse sido qual é então que teria sido o meu destino seguinte Coisa vã que não conforma respostas As vezes essa idéia me põe susto Mas o senhor veja cheguei em casa do Mestre Lucas ele me saudou tão natural Achei também tudo o natural eu estava era cansado E quando Mestre Lucas me perguntou se eu vinha era de passeata ou de recado da fazenda expliquei que não que eu tinha merecido licença de meu padrinho para começar vida João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 172 própria em Curralinho ou adiante a fito de desenvolver mais estudos e apuramento só de cidade Dizendo o que disse eu mesmo jurava que Mestre Lucas não ia acreditar Mas acreditou até melhor Sabe o senhor por quê Porque naquele dia justo ele estava remexido no meio de um assunto que preparava o desejo dele para aí me acreditar Digo ele me ouviu e disse Riobaldo pois você chega em feita ocasião Aí me explicou um senhor no Palhão na fazenda Nhanva altas beiras do Jequitaí para o ensino de todas as matérias estava encomendando um professor Com urgência era homem de sua situação garantia boa paga Assim queria que Mestre Lucas fosse que deixasse alguém dando escola no lugar dele no Curralim por uns tempos isso claro não podia Eu queria ir O senhor acha que eu posso perguntei para principiar qualquer tarefa quase que eu sozinho nunca tive coragem Ei pode o Mestre Lucas declarou Já que estava acondicionando numa bruaca os livros todos geografia arimética cartilha e gramática e borracha lápis régua tinteiro tudo o que pudesse ter serventia Aceitei Um entusiasmo nosso me botava brioso Melhor que era para logo para o seguinte dois camaradas do dito fazendeiro estavam ali no Curralinho esperando decisão agora me levavam Dona Dindinha mulher João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 173 de Mestre Lucas no despedir me abraçou me deu umas lágrimas de bondade Tem tanta gente ruim neste mundo meu filho E você assim tão moço tão bonito Aí nem cheguei a ver aquela menina Miosótis A Rosauarda vi de longes olhares Os dois camaradas em tanto percebi eram capangas Mas sujeitos de seu trato sem altosebaixos nem as maiores asperezas me deram toda consideração Viajamos juntos quatro dias quase trinta léguas bom tempo beirando o Riachão e enxergando à mão esquerda os vultos da SerradoCabral Meus companheiros quase que não me informavam de nada ou nada Tinham outras ordens Mas mesmo antes da gente entrar em ter ras do Palhão fui vendo coisas calculosas dei meio para duvidar Patrulhas de cavaleiros em armas troco de conversa de vigiação e uma tropa de burros cargueiros mas no meio dos tocadores vinham três soldados Mais perto em maiores me vi Chegar lá declamava surpresa A Nhanva enxameava de gente homem pralaprá de feira em praça E era vistosa fazenda assobradada com grandes currais e um terreirão Vi logo o dono Ele era imediatamente estúrdio vestido de brim azul e calçando botas amareladas Era nervoso magro um pouco mais para baixo do que o tamanho mediano e com braços que pareciam demais de compridos de tanto que podiam gesticular João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 174 Fui indo ele veio vindo o grande revólver na cintura um lenço no pescoço dele esvoaçava E aquele cabelo bom despenteado alto topete arrepiadinho Apressei o passo e ele esbarrou com as mãos nas cadeiras Me olhou frenteante deu risada de certo nem estava sabendo quem eu era E gritou caçoando Me vem com o andar de sapo me vem Ahohah o destempo de estar sendo debochado se irou de mim Esbarrei também Me fiz mouco Mas ele veio para mim então saudou com um modo sensato de simpatia Adiado eu disse Sou o moço professor A alegria dele me ouvindo foi estupefacta Me ferrou do braço com porção de falas e agrados subiu a escada comigo me levou para um quarto lá dentro ligeiro parecia até que querendo me esconder de todos Uma doidice de quê Ah mas ah esse quem era o homem Zé Bebelo A fixe de fato tudo nele para mim tirava mais para fora uma real novidade Disse ao senhor eu estava pensando que ia dar escola para os filhos dum fazendeiro Engano O comum com Zé Bebelo virava diferente adiante aprazava engano Estudante sendo ele mesmo Me avisou Quis antever os cadernos livros pegar com as mãos Assim ler e escrever e as quatro contas ele já soubesse consumia jornais Remexeu tarabuz e tudo foi João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 175 arrumando na mesa grande do quarto senhorjesuscristo que assoviava o cantarolado Mas e aí comigo falou sério naquilo se tinha de sungar segredo eu visse Vamos constar é que estou assentando os planos Você fica sendo meu secretário Nesse mesmo ido dia a gente começou Aquele homem me exercitou tonto eh ô me fino fiz Ânsia assim e anfa e poder de entender demais nunca achei quem outro O que ele queria era botar na cabeça duma vez o que os livros dão e não Ele era a inteligência Vorava Corrido passava de lição em lição e perguntava reperguntava parecia ter até raiva de eu saber e não ele despeitos de ainda carecer de aprender contrafim Queimava por noite duas três velas Ele mesmo falava Relógio não vou olhar Aí estudo estudo até que estico um cochilão Cochilão me vem então espairo o livro e me deito que me durmo Pela sua vontade dele simples De dia estávamos debulhando páginas e de repente se levantava ele chegava na janela apitava num apito ministrava aquela brama de ordens dez vinte executações duma vez O pessoal corria cumpriam aquilo semelhava um circo bom teatro Mas com menos de mês Zé Bebelo se tinha senhoreado de reter tudo sabia muito mais do que eu mesmo soubesse Aí a alegria dele ficou demasiadamente Sobrevinha com o livro me fazia de queimacara um punhado de perguntas Ao tanto eu demorava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 176 treteava no explicar errando a esmo caloteava Aiaiai dele atalhar as minhas palavras mostrar no livro que eu estava falso corrigir o dito me dar quinau Se espocava às gargalhadas espalmava mão expendia outras normas próprias de sua idéia lá dele e sendo feliz de nessas dificuldades me ver eu a ignorante esmorecido e escabreado Só aí digo foi que ele ficou gostando de mim Certo Me deu um abraço me gratificou em dinheiro me fez firmes elogios Siô Baldo já tomei os altos de tudo Mas carece de você não ir sembora não mas antes prosseguir sendo o secretário meu Aponto que vamos por esse Norte por grandes fatos que você não se arrependerá me disse Norte más bandas Soprou só enche que ventava Porque ele tinha me estatutado os todos projetos Como estava reunindo e pervalendo aquela gente para sair pelo Estado acima em comando de grande guerra O fim de tudo que seria romper em peito de bando e bando acabar com eles liquidar com os jagunços até o último relimpar o mundo da jagunçada braba Somente que eu tiver feito siô Baldo estou todo entro direito na política Antes me confessou essa única sina que ambicionava de muito coração e era de ser deputado Pediu segredo e eu não gostei Porque eu estava sabendo que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 177 todos já aventavam aquela toleima por detrás dele até antecipavam alcunha o Deputado O mundo é assim Mas mesmo desse jeito o pessoal todo não regateava a ele a maior dedicação de respeito Por via de sua macheza Ah Zé Bebelo era o do duro sete punhais de sete aços trouxados numa bainha só Atirava e tanto com qualquer quilate de arma sempre certeira a pontaria laçava e campeava feito um todo vaqueiro amansava animal de maior brabeza burro grande ou cavalo duelava de faca nos espíritos solertes de onça acuada sem parar de pôr e medo ou cada parente de medo ele cuspia em riba e desconhecia Contavam ele entrava de cheio pessoalmente e botava paz em qualquer rutuba Ô homem couronágua enfrentador Dava os urros E mesmo para ele parecia não ter nada impossível Com tanta bobéia assim desfrutável e escurril e ai de quem pensasse em poitar olho de chacotas morria vertiginoso O único homemjagunço que eu podia acatar siô Baldo já está falecido Agora temos de render este serviço à pátria tudo é nacional Esse que já tinha morrido que ele falava era Joãozinho BemBem das Aroeiras de redondeante fama Se dizia tinha estudado a vida dele nos pormenores com tanta devoção especial que até um apelido em si se apôs Zé Bebelo causa que de nome em verdade era José Rebelo Adro Antunes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 178 Sei seja de se anuir que sempre haja vergonheira de jagunços a sobrecorja Deixa que daqui a uns meses neste nosso Norte não se vai ver mais um qualquer chefe encomendar para as eleições as turmas de sacripantes desentrando da justiça só para tudo destruírem do civilizado e legal Assim dizendo na verdade sentava o dizer com ira razoável A gente devia mesmo de reprovar os usos de bando em armas invadir cidades arrasar o comércio saquear na sebaça barrear com estrumes humanos as paredes da casa do juizdedireito escramuçar o promotor amontado à força numa má égua de cara para trás com lata amarrada na cauda e ainda a cambada dando morras e aí soltando os foguetes Até não arrombavam pipas de cachaça diante de igreja ou isso de se expor padre sacerdote nu no olho da rua e ofender as donzelas e as famílias gozar senhoras casadas por muitos homens o marido obrigado a ver Ao quando falava com fogo que puxava de si Zé Bebelo tinha de se esbarrar ia até na varanda ou na janela a apitar o apito ditar as boas ordens Daí mais renovado voltava para perto de mim repunha Ah cujo vou siô Baldo vou Só eu que sou capaz de fazer e acontecer Sendo porque fui eu só que nasci para tanto Dizendo que depois estável que abolisse o jaguncismo e deputado fosse então reluzia perfeito o Norte botando pontes baseando fábricas remediando a saúde de todos preenchendo a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 179 pobreza estreando mil escolas Começava por aí durava um tempo crescendo voz na fraseação o muito instruído no jornal Ia me enjoando Porque completava sempre a mesma coisa Mas minha vida na fazenda era ruim ou era boa Se melhor era Arre eu estava feito um inhampas Aí lordeei Me acostumei com o fácil movimento entrei de amizade com os capangas Sempre chegavam pessoas de fora que conversavam em sozinhos com Zé Bebelo gente de cidade De um eu soube que era delegado em missão E ele me apresentava com a honra de Professor Riobaldo secretário sendo Nas folgas vagas eu ia com os companheiros obra de légua dali no Leva aonde estavam arranchadas as mulheres mais de cinqüenta Elas vinham vindo tantas que quase todo dia mais tinham de baratear Não faltava esse bom divertir Zé Bebelo aprovava Onde é que já se viu homem valer se não tem à mão estadas raparigas Ondé Mesmo cachaça ele fornecia com regra Melhor se não eles por si providenceiam dão logo em abusos patuléias isto explicava Demais de tudo ali se prazia fartura confortável Abastada comida armamento de primeira monte de munição roupas e calçados para os melhores E o cobre para semanal de pagamento pois nenhum daqueles João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 180 homens estava ali por amordedeus mas ajeitando seu meio de viver Diziam que era dinheiro do cofre do Governo Parecia A tal que enfim veio o dia de se sair guerreiramente por vales e montes a gente toda Oi o alarido Aos quantos gritos um araral revôo avante de pássaros o senhor mesmo nunca viu coisa assim só em romance descrito De glória e avio de própria soldadesca e cavalos que davam até medo de não se achar pasto que chegasse e o pessoal perto por uns mil Acompanhado dos chefesdeturma que ele dava patente de serem seus sotenentes e oficiais de seu terço Zé Bebelo montado num formudo ruço pombo e com um chapéu distintíssimo na cabeça repassava daqui prali eguando bem vistoriava Me chamou para junto eu tinha de ter à mão um caderno grosso para por ordem dele assentar nomes números e diversos amanuense Com eles eu estava vindo então o senhor vê Vinha para conhecer esse destinomeudeus O que me animou foi ele predizer que quando eu mais não quisesse era só opor um aceno e ele dava baixa e alta de me ir membora Digo que fui digo que gostei A passeata forte pronta comida bons repousos companheiragem O teor da gente se distraía bem Eu avistava as novas estradas diversidade de terras Se amanhecia num lugar se ia à noite noutro tudo o que podia João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 181 ser ranço ou discórdia consigo restava para trás Era o enfim Era Mais mais háde dará é para diante quando se formar combate uns proseavam Zé Bebelo querendo Sabia o que queria homem de muita raposice Já no sair da Nhanva tinha composto seu povo em avulsos cada grupo cada rumo Um pelo São Lamberto da mão direita outro pegou o Riacho Fundo e o Córrego do Sanhar outro se separou da gente no SóAqui indo o Ribeirão da Barra outro tomou sempre à mão esquerda encostando ombro no São Francisco mas nós que vínhamos mais Zé Bebelo mesmo em capitania rompemos no meio se guindo o traço do Córrego Felicidade Passamos perto de Vila Inconfidência viemos acampar no arraial PedraBranca beira do ÁguaBranca E tudo correndo bem Dum batalhão para outro se expedia gente com ordens e recados Arrastávamos uma rede grande peixe grande por pegar E foi Eu não vi essa célebre batalha eu tinha ficado na PedraBranca Não por medo não Mas Zé Bebelo me mandou Tem paciência você espera para reunir os municipais do lugar e fazer discurso logo que um estafeta vier relatar qual foi nossa primeira vitória Se deu o que se disse Só que em vez de estafeta a galope veio Zé Bebelo mesmo Eu tinha ficado com ruma de foguetes para soltar e foi festa Zé Bebelo mandou dispor uma tábua por João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 182 cima de um canto de cerca conforme ele ali subiu e muito falou Referiu Para lá do Rio Pacu no município de Brasília tinham volteado um bando de jagunços o com o valentão Hermógenes à testa e derrotado total Mais de dez mortos mais de dez cabras agarrados presos infelizmente só foi que aquele Hermógenes conseguira de fugir Mas não podia ir a longe Ao que Zé Bebelo elogiou a lei deu viva ao governo para perto futuro prometeu muita coisa republicana Depois enxeriu que eu falasse discurso também Tive de Você deve de citar mais é em meu nome o que por meu recato não versei E falar muito nacional se me se soprou Cumpri O que um homem assim devia de ser deputado eu disse encalquei Acabei ele me abraçou O povo eu acho que apreciava Daí quando se estava no depois do almoço vieram cavaleiros nossos tangendo o troço de presos Senti pena daqueles pobres cansados azombados quase todos sujos de sangues secos se via que não tinham esperança nenhuma decente Iam de leva para a cadeia de Extrema e de lá para outras cadeias de certo até para a da Capital Zé Bebelo olhando me olhou notou moleza Tem dó não São os danados de façanhosos Ah era Disso eu sabia Mas como ia não ter pena O que demasia na gente é a força feia do sofrimento própria não é a qualidade do sofrente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 183 Pensei que agora podíamos merece maior descanso Ah sim Montar e galopar Tem mais Tem Zé Bebelo chamou Tocamos Conversando no caminho eu perguntei não sei E Joca Ramiro Zé Bebelo tiscou de ombros parece que não queria falar naquele Daí me deu um gosto de menor maldade de explicar como era fabuloso o estado de Joca Ramiro como tudo ele sabia e provia e até que trazia um homem só para o oficio de ferrador com a tendinha e as ferramentas e o tudo mais versante aos animais O que ouvindo Zé Bebelo esbarrou Ah é uma idéia que vale ora veja Isso a gente tem de conceber também é o bom exemplo para se aproveitar ele atinou E eu que já ia contar mais do diverso das peripécias que meu padrinho dizia que Joca Ramiro inventava no dar batalha então eu como me concertei em mim e calei a boca Mire veja o senhor tudo o que na vida se estorva razão de pressentimentos Porque eu estava achando que se contasse perfazia ato de traição Traição mas por quê Dei um tunco A gente não sabe a gente sabe Calei a boca toda Desencurtamos os cavalos No entre o Condado e a Lontra se foi a fogo Aí vi aprendi A metade dos nossos que se apeavam no avanço entremeados disfarçantes suas armas em arte escamoteados pelas árvores e de repente ligeiros se jazendo para o rastejo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 184 com as cabeças farejavam toda a vida Aqueles sabiam brigar desde de nascença Só avistei isso um instante Sendo que seguindo Zé Bebelo reviramos volta para o Gameleiras onde houve o pior O que era era o bando do Ricardão que quase próximo que cercamos Para acuar só faltando cães E demos inferno Se travou Tiro estronda muito no meio do cerrado se diz que é estampido que é rimbombo Tive noção de que morreram bastantes Vencemos Não desci de meu animal Nem prestei nem estive no fim como o galope se desabriu os ho mens perseguindo uns que com o mesmo Ricardão se escapavam Mas mais não se aproveitou o Ricardão já tinha tido fuga Então os nossos de jeriza com os oito prisioneiros feitos queriam se concluir Eh de jeito nenhum epa Não consinto covardias de perversidade Zé Bebelo se danou Apreciei a excelência dele no sistema de não se matar Assim eu quis que o ar de paz logo revertesse o alimpado o povo gritando menos Aquele dia tinha sido forte coisa De longe e sossego eu careci demais Se teve pouco Arranjado o preciso só se tomou prazo breve porque recombinaram por diante os projetos e desarrancamos para a Terra Fofa quase na demarca com o Grão Mogol Mas lá não cheguei Em certo ponto do caminho eu resolvi melhor minha vida João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 185 Fugi De repente eu vi que não podia mais me governou um desgosto Não sei se era porque eu reprovava aquilo de se ir com tanta maioria e largueza matando e prendendo gente na constante brutalidade Debelei que descuidassem de mim restei escondido retardado Vimme Isso que pelo ajustado eu não carecia de fazer assim Podia chegar perto de Zé Bebelo desdizer Desanimei declaro de retornar para o Curralim Não podia Mas na hora mesma em que eu a decisão tomei logo me deu um enfaro de Zé Bebelo em trosgas a conversação Nem eu não estava para ter confiança nenhuma em ninguém A bem me fugi e mais não pensei exato Só isso O senhor sabe se desprocede a ação escorregada e aflita mas sem sustância narrável Meu cavalo era bom eu tinha dinheiro na algibeira eu estava bem armado Virei vagaroso Meu rumo mesmo era o do mais incerto Viajei vim acho que eu não tinha vontade de chegar em nenhuma parte Com vinte dias de remanchear e sem as trapalhadas maiores foi que me encostei para o Rio das Velhas à vista da barra do Córrego Batistério Dormi com uma mulher que muito me agradou o marido dela estava fora na redondeza Ali não dava maleita De manhã cedo a mulher me disse Meu pai existe daqui a quartodelégua Vai lá tu almoça João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 186 e janta De noite se meu marido não tiver voltado eu te chamo dando avisos Eu falei Você acende uma fogueira naquele alto eu enxergo eu cá venho Ela falou Ao que não posso alguém mais avistando havia de poder desconfiar Eu falei Assim mesmo eu quero Fogueira uma fogueirinha de nada Ela falou Quem sabe eu acendo A gente sérios nem se sorrindo Aí eu fui Mas o pai dessa mulher era um homem finório de esperto com o jeito de tirar da gente a conversa que ele constituía A casa dele espaçosa casadetelha e caiada era na beira ali onde o rio tem mais troas Se chamava Manoel Inácio Malinácio dito e geria uns bons pastos com cavalhada pastando e os bois Me deu almoço me pôs em fala Eu estava querendo ser sincero E notei que ele no falar me encarava e no ouvir piscava os olhos e quem encara no falar mas pisca os olhos para ouvir não gosta muito de soldados Aos poucos então contei que dos zébebelos não tinha querido fazer parte o que era a valente verdade E Joca Ramiro ele me perguntou Eu disse um pouco por me engrandecer e pôr minha prosa que já tinha servido Joca Ramiro e com ele conversado Que mesmo por isso é que eu não podia ficar com Zé Bebelo porque meu seguimento era por loca Ramiro em João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 187 coração em devoção E falei no méu padrinho Selorico Mendes e em Aluiz e Alarico Totõe e de como foi que Joca Ramiro pernoitou em nossa fazenda do São Gregório Mais coisas de certo eu disse e aquele homem Malinácio me ouvia só se fazendo de sossegado Mas eu percebi que ele não estava Deu jeito de aconselhar que eu fosse embora Que ali miasmava braba maleita Não acertei Eu queria esperar para ver se a fogueira por minha sorte se acendia eu tinha gostado muito da filha dele casada Por um instante o sabido do homem se tardou no que fazer Mas eu requerendo um lugar para armar minha rede na sombra e descansar eu disse que não andava bem de saúde isso pareceu ser de seu agrado Me levou para um quarto onde tinha um jirau com enxergão me botou lá à Ia vontade fechou a porta Ferrei abraçado com minhas armas Acordei só no aquele Malinácio me chamando para jantar Cheguei na sala e dei com outros três homens Disseram de si que tropeiros eram e estavam assim vestidos e parecidos Mas o Malinácio começou a glosar e reproduzir minha conversa tida com ele disso desgostei segredos frescos contados não são para todos E o arrieiro dono da tropa que era o de cara redonda e pra clara me fez muita interrogação Não estive em boas cócoras Construí de desconfiar Não do fato dele tal João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 188 encarecer pois todo tropeiro sempre muito pergunta mas do jeito como os outros dois ajudavam aquele a me ver de tudo perseverado tomando conta Ele queria saber para onde eu mesmo me ia além Queria saber por que se eu punia por loca Ramiro e estava em armas por que então eu não tinha caçado jeito de trotar para o Norte a fito de com o pessoal ramiros me juntar Quem desconfia fica sábio dizendo como pude muito confirmei mas confirmei acrescentando que chegara até ali por dar volta cautelosa e mesmo para sobre ter a calma de resolver os projetos em meu espírito Ah mas ah enquanto que me ouviam mais um homem tropeiro também vinha entrando na soleira da porta Agüentei aquele nos meus olhos e recebi um estremecer em susto desfechado Mas era um susto de coração alto parecia a maior alegria Soflagrante conheci O moço tão variado e vistoso era pois sabe o senhor quem mas quem mesmo Era o Menino O Menino senhor sim aquele do porto do deJaneiro daquilo que lhe contei o que atavessou o rio comigo numa bamba canoa toda a vida E ele se chegou eu do banco me levantei Os olhos verdes semelhantes grandes o lembrável das compridas pestanas a boca melhor bonita o nariz fino afiladinho Arvoamento desses a gente estatela e não entende que dirá o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 189 senhor eu contando só assim Eu queria ir para ele para abraço mas minhas coragens não deram Porque ele faltou com o passo num rejeito de acanhamento Mas me reconheceu visual Os olhos nossos donos de nós dois Sei que deve de ter sido um estabelecimento forte porque as outras pessoas o novo notaram isso no estado de tudo percebi O Menino me deu a mão e o que mão a mão diz é o curto às vezes pode ser o mais adivinhado e conteúdo isto também E ele como sorriu Digo ao senhor até hoje para mim está sorrindo Digo Ele se chamava o Reinaldo Para que referir tudo no narrar por menos e menor Aquele encontro nosso se deu sem o razoável comum sobrefalseado como do que só em jornal e livro é que se lê Mesmo o que estou contando depois é que eu pude reunir relembrado e verdadeiramente entendido porque enquanto coisa assim se ata a gente sente mais é o que o corpo a próprio é coração bem batendo Do que o que o real roda e põe diante Essas são as horas da gente As outras de todo tempo são as horas de todos me explicou o compadre meu Quelemém Que fosse como sendo o trivial do viver feito uma água dentro dela se esteja e que tudo ajunta e amortece só rara vez se consegue subir com a cabeça fora dela feito um milagre João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 190 peixinho pediu Por quê Dizquedirei ao senhor o que nem tanto é sabido sempre que se começa a ter amor a alguém no ramerrão o amor pega e cresce é porque de certo jeito a gente quer que isso seja e vai na idéia querendo e ajudando mas quando é destino dado maior que o miúdo a gente ama inteiriço fatal carecendo de querer e é um só facear com as surpresas Amor desse cresce primeiro brota é depois Muito falo sei caceteio Mas porém é preciso Pois então Então o senhor me responda o amor assim pode vir do demo Poderá Pode vir de umquenãoexiste Mas o senhor calado convenha Peço não ter resposta que se não minha confusão aumenta Sabe uma vez no Tamanduátão no barulho da guerra eu ven cendo aí estremeci num relance claro de medo medo só de mim que eu mais não me reconhecia Eu era alto maior do que eu mesmo e de mim mesmo eu rindo gargalhadas dava Que eu de repente me perguntei para não me responder Você é o reidoshomens Falei e ri Rinchei feito um cavalão bravo Desfechei Ventava em todas as árvores Mas meus olhos viam só o alto tremer da poeira E mais não digo chus Nem o se nhor nem eu ninguém não sabe Conto Reinaldo ele se chamava Era o Menino do Porto já expliquei E desde que ele apareceu moço e igual no portal João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 191 da porta eu não podia mais por meu próprio querer ir me separar da companhia dele por lei nenhuma podia O que entendi em mim direito como se no reencontrando aquela hora aquele MeninoMoço eu tivesse acertado de encontrar para o todo sempre as regências de uma alguma a minha família Se sem peso e sem paz sei sim Mas assim como sendo o amor podia vir mandado do Dê Desminto Ah e Otacília Otacília o senhor verá quando eu lhe contar ela eu conheci em conjuntos suaves tudo dado e clareado suspendendo se diz quando os anjos e o vôo em volta quase quase A Fazenda Santa Catarina nos BuritisAltos cabeceira de vereda Otacília estilo dela era toda exata criatura de belezas Depois lhe conto tudo tem o tempo Mas o mal de mim doendo e vindo é que eu tive de compesar numa mão e noutra amor com amor Se pode Vem horas digo se um aquele amor veio de Deus como veio então o outro Todo tormento Comigo as coisas não têm hoje e anfontem amanhã é sempre Tormentos Sei que tenho culpas em aberto Mas quando foi que minha culpa começou O senhor por ora mal me entende se é que no fim me entenderá Mas a vida não é entendível Digo afora esses dois e aquela mocinha Nhorinhá da Aroeirinha filha de Ana Duzuza eu nunca supri outro amor nenhum E Nhorinhá eu deamei no passado com um retardo custoso No passado eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 192 digo e sei sou assim relembrando minha vida para trás eu gosto de todos só curtindo desprezo e desgosto é por minha mesma antiga pessoa Medeiro Vaz antes de sair pelos Gerais com mão de justiça botou fogo em sua casa nem das cinzas carecia a possessão Casas por ordem minha aos bradados eu incendiei eu ficava escutando o barulho de coisas rompendo e caindo e estralando surdo desamparadas lá dentro Sertão Logo que o Reinaldo me conheceu e me saudou não tive mais dificuldade em dar certeza aos outros de minha situação Ao quase sem sobejar palavras ele afiançou o meu valimento para aquele mestre de cara redonda e bom parecer que passava por arrieiro da tropa e se chamava Titão Passos De fato tropeiros não eram eu soube mas pessoal brigal de Joca Ramiro E a tropa Essa que se estava para seguir porquanto pra o Norte com os três lotes de bons animais era para levar munição Nem tiveram mais prevenimento de esconder isso de mim Aquele Malinácio era o guardador com as munições bem encobertadas Defronte da casa dele mesmo e para cima e para baixo o rio possuía as croas de areia cada qual com seu nome que os remadores do dasVelhas botavam e que todos tanto conheciam Três croas e uma ilha Mas uma delas três maior também sendo meio ilha isto é ilha de terra na parte de baixo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 193 com grandes pedras e árvores e suja de matinho capim o alecrim viçoso remolhando suas folhagens nágua e o bundade negro verde vivente e croa só de areia na parte de cima Uma croacomilha que é conforme se diz A CroacomIlha do Malinácio dita A lá que aonde estava o oculto a gente ia em canoa baldear a munição Os outros companheiros afetados de tropeiros sendo ó Triol e João Vaqueiro e mais Acrísio e Assunção de sentinelas e Vove Jenolim e Admeto que acabavam de enquerir a carga na mulada A gente jantouse já se estava de saída para toda viagem Eu ia com eles Pois fomos Nem tive pesar nenhum de não esperar o sinal da fogueira da mulher casada filha do Malínácio E ela era bonita sacudida Mulher assim de ser que nem braçada de cana da bica para os cochos dos cochos para os tachos Menos pensei A andada de noite principiava como sobre algodão produzida cuidadosa Aquilo era munição de contos e contos de réis a gente prezava grandes responsabilidades Se vinha sem beiradear mas sabendo o rio Titão Passos comandava De seguir assim sem a dura decisão feito cachorro magro que espera viajantes em ponto de rancho o senhor quem sabe vá achar que eu seja homem sem caráter Eu mesmo pensei Conheci que estava chocho dado no mundo vazio de um meu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 194 dever honesto Tudo naquele tempo e de cada banda que eu fosse eram pessoas matando e morrendo vivendo numa fúria firme numa certeza e eu não pertencia a razão nenhuma não guardava fé e nem fazia parte Abalado desse tanto transtornei um imaginar Só não quis arrependimento porque aquilo sempre era começo e descoroçoamento era mododematéria que eu já tinha aprendido a protelar Mas o Reinaldo vinha comigo no mesmo lote e não caçava minha companhia não se chegou para perto de mim nem vez não dava sinal de prosse guir amizade A gente descarecia de cuidar dos burros um por um enfileirados naquela paciência na escuridão da noite eles tudo enxergavam Se eu não tivesse passado por um lugar uma mulher a combinação daquela mulher acender a fogueira eu nunca mais nesta vida tinha topado com o Menino era o que eu pensava Veja o senhor eu puxava essa idéia e com ela em vez de me alegre ficar por ter tido tanta sorte eu sofria o meu Sorte O que Deus sabe Deus sabe Eu vi a neblina encher o vulto do rio e se estralar da outra banda a barra da madrugada Assaz as seriemas para trás cantaram Ao que esbarramos num sitiozinho se avistou um preto o preto já levantado para o trabalho descampando mato O preto era nosso fizemos paragem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 195 Dali rezei minha avemariazinha de demanhã enquanto se desalbardava e amilhava Outros escovavam os burros e mulas ou a cangalhada iam arrumando a carga toda se pôde resguardar quase que ocupou inteira a casinha do pretoO qual era tão pobre desprevenido tivemos até de dar comida a ele e à mulher e seus filhinhos deles quantidade E notícia nenhuma de nada não se achava A gente ia ao menos dormir o dia mas três tinham de sobreficar de vigias O Reinaldo se dizendo ser um deles eu tive coragem de oferecer também que ficava não tinha sono tudo em mim era nervosía O rio objeto assim a gente observou com uma croa de areia amarela e uma praia larga manhãzando ali estava recheio em instância de pássaros O Reinaldo mesmo chamou minha atenção O comum essas garças enfileirantes de toda brancura o jaburu o patoverde o patopreto topetudo marrequinhos dançantes martim pescador mergulhão e até uns urubus com aquele triste preto que mancha Mas melhor de todos conforme o Reinaldo disseo que é o passarim mais bonito e engraçadinho de rio abaixo e rioacima o que se chama o manuelzinhodacroa Até aquela ocasião eu nunca tinha ouvido dizer de se parar apreciando por prazer de enfeite a vida mera deles pássaros em seu começar e descomeçar dos vôos e pousação Aquilo era João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 196 para se pegar a espingarda e caçar Mas o Reinaldo gostava É formoso próprio ele me ensinou Do outro lado tinha vargem e lagoas Pra e pra os bandos de patos se cruzavam Vigia como são esses Eu olhava e me sossegava mais O sol dava dentro do rio as ilhas estando claras É aquele lá lindo Era o manuelzinhodacroa sempre em casal indo por cima da areia lisa eles altas perninhas vermelhas esteiadas muito atrás traseiras desempinadinhos peitudos escrupulosos catando suas coisinhas para comer alimentação Machozinho e fêmea às vezes davam beijos de biquinquim a galinholagem deles É preciso olhar para esses com um todo carinho o Reinaldo disse Era Mas o dito assim botava surpresa E a macieza da voz o bemquerer sem propósito o caprichado ser e tudo num homemdarmas brabo bem jagunço eu não entendia Dum outro que eu ouvisse eu pensava frouxo está aqui um que empulha e não culha Mas do Reinaldo não O que houve foi um contente meu maior de escutar aquelas palavras Achando que eu podia gostar mais dele Sempre me lembro De todos o pássaro mais bonito gentil que existe é mesmo o Manuelzinhodacroa Depois conversamos de coisas miúdas sem valor alheio e eu tive uma influência para contar artes de minha vida falar a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 197 esmo leve me abrir em amáveis bom Tudo me comprazia por diante eu não necessitava de prolongares Riobaldo Reinaldo de repente ele deixou isto em dizer Dão par os nomes de nós dois A de dar palavras essas que se repartiram para mim pincho no em que já estava de alegria para ele um viceversa de tristeza Que por quê Assim eu ainda não sabia O Reinaldo pitava muito não acerto como podia conservar os dentes tão asseados tão brancos Ao em tanto que também de pitar se carecia porque voltaemeia abespinhavam a gente os mosquitinhos chupadores donos da vazante uns mosquitinhos dançadinhos tantos de se despertar Eu fui contando minha existência Não escondi nada não Relatei como tinha acompanhado Zé Bebelo o foguetório que soltei e o discurso falado na PedraBranca o combate dado na beira do Gameleiras os pobres presos passando com as camisas e as caras sujadas de secos sangues Riobaldo você é valente Você é um homem pelo homem ele no fim falou Sopesei meu coração povoado enchido se diz me cri capaz de altos para toda seriedade certa proporcionado E aí desde aquela hora conheci que o Reinaldo qualquer coisa que ele falasse para mim virava sete vezes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 198 Desculpa me dê o senhor sei que estou falando demais dos lados Resvalo Assim é que a velhice faz Também o que é que vale e o que é que não vale Tudo Mire veja sabe por que é que eu não purgo remorso Acho que o que não deixa é a minha boa memória A luzinha dos santosarrependidos se acende é no escuro Mas eu lembro de tudo Teve grandes ocasiões em que eu não podia proceder mal ainda que quisesse Por quê Deus vem guia a gente por uma légua depois larga Então tudo resta pior do que era antes Esta vida é de cabeçaparabaixo ninguém pode medir suas perdas e colheitas Mas conto Conto para mim conto para o senhor Ao quando bem não me entender me espere Aí nesse mesmo meiodia rendidos na vigiação o Reinaldo e eu não estávamos com sono ele foi buscar uma capanga bonita que tinha com lavores e três botóezinhos de abotoar O que nela guardava era tesoura tesourinha pente espelho sabão verde pincel e navalha Dependurou o espelho num galho de marmelodomato acertou seu cabelo que já estava cortado baixo Depois quis cortar o meu Me emprestou a navalha mandou eu fazer a barba que estava bem grandeúda Acontecendo tudo com risadas e ditos amigos como quando com seu arreleque porescuro uma nhaúma devoou ou quando João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 199 eu pulei para apanhar um raminho de flores e quase caí comprido no chão ou quando ouvimos um him de mula que perto pastava De estar folgando assim e com o cabelo de cidadão e a cara raspada lisa era uma felicidadezinha que eu principiava Desde esse dia por animação nunca deixei de cuidar de meu estar O Reinaldo mesmo no mais tempo comprou de alguém uma outra navalha e pincel me deu naquela dita capanga Às vezes eu tinha vergonha de que me vissem com peça bordada e historienta mas guardei aquilo com muita estima E o Reinaldo doutras viagens me deu outros presentes camisa de riscado fino lenço e par de meia essas coisas todas Seja o senhor vê até hoje sou homem tratado Pessoa limpa pensa limpo Eu acho Depois o Reinaldo disse eu fosse lavar corpo no rio Ele não ia Só por acostumação ele tomava banho era sozinho no escuro me disse no sinal da madrugada Sempre eu sabia de tal crendice como alguns procediam assim esquisito os caborjudos sujeitos de corpofechado No que era verdade Não me espantei Somente o senhor tenha tanto sacrifício des conforto de esbarrar nos garranchos às tatas na ceguez da noite não se diferenciando um ai dum ei e pelos barrancos lajes escorregadas e lama atolante mais o receio de aranhas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 200 caranguejeiras e de cobras Não eu não Mas o Reinaldo me instruiu aquilo e me deixou na beira da praia alegrias do ar em meu pensamento Cheguei a encarar a água o Rio das Velhas passando seu muito um rio é sempre sem antiguidade Cheguei a tirar a roupa Mas então notei que estava contente demais de lavar meu corpo porque o Reinaldo mandasse e era um prazer fofo e perturbado Agançagem eu pensei Destapei raivas Tornei a me vestir e voltei para a casa do preto devia de ser hora de se comer a janta e arriar a tropa para as estradas Agora o que eu queria era ímpeto de se viajar às altas e ir muito longe A ponto que nem queria avistar o Reinaldo Estou contando ao senhor que carece de um explicado Pensar mal é fácil porque esta vida é embrejada A gente vive eu acho é mesmo para se desiludir e desmisturar A senvergonhice reina tão leve e leve pertencidamente que por primeiro não se crê no sincero sem maldade Está certo sei Mas ponho minha fiança homem muito homem que fui e homem por mulheres nunca tive inclinação pra aos vícios desencontrados Repilo o que o sem preceito Então o senhor me perguntará o que era aquilo Ah lei ladra o poder da vida Direitinho declaro o que durando todo tempo sempre mais às vezes menos comigo se passou Aquela mandante amizade Eu não pensava em adiação João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 201 nenhuma de pior propósito Mas eu gostava dele dia mais dia mais gostava Diga o senhor como um feitiço Isso Feito coisa feita Era ele estar perto de mim e nada me faltava Era ele fechar a cara e estar tristonho e eu perdia meu sossego Era ele estar por longe e eu só nele pensava E eu mesmo não entendia então o que aquilo era Sei que sim Mas não E eu mesmo entender não queria Acho que Aquela meiguice desigual que ele sabia esconder o mais de sempre E em mim a vontade de chegar todo próximo quase uma ânsia de sentir o cheiro do corpo dele dos braços que às vezes adivinhei insensatamente tentação dessa eu espairecia aí rijo comigo renegava Muitos momentos Conforme por exemplo quando eu me lembrava daquelas mãos do jeito como se encostavam em meu rosto quando ele cortou meu cabelo Sempre Do demo digo Com que entendimento eu entendia com que olhos era que eu olhava Eu conto O senhor vá ouvindo Outras artes vieram depois Assim mesmo naquele estado exaltado em que andei concebi fundamento para um conselho na jornada por diante a gente tinha de deixar duma bando o rio ir passar a Serrada Onça e entestar com a travessia do Jequitaí por onde podia ter tropa de soldados mais ajuizado não seria se enviar só um até lá espiar o que se desse e colher outras informações João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 202 Titão Passos era homem ponderado em simples achou boa a minha razão Todos acharam Aquela munição era de ida urgente mas também valia mais que ouro que sangue se carecia de todo cuidado Fui louvado e dito valedor certo nas idéias Ao senhor confesso desmedi satisfação no ouvir aquilo que a assoprada na vaidade é a alegria que dá chama mais depressa e mais a ar Mas logo me reduzi atinando que minha opinião era só pelo desejo encoberto de que a gente pudesse ficar mais tempo ali naquele lugar que me concedia tantos regalos Assim um rôo de remorso tantos perigos ameaçando e a vida tão séria em cima e eu mexendo e virando por via de pequenos prazeres Sempre fui assim descabido desamarrado Mas meu querer surtiu efeito novas ordens Para assuntar e ver com ver o Jenolim saiu em rumo do Jequitaí de sua LagoaGrande e com a mesma tenção rebuçado viajou o Acrísio até Porteiras e o Pontal da Barra com todos os ouvidos bem abertos E nós ficamos esperando a volta deles cinco dias lá com grande regozijo e repouso na casa do preto Pedro Segundo de Rezende que era posteiro em terras da Fazenda São Joãozinho de um coronel Juca Sá Até hoje não me arrependo retratando Os dias que passamos ali foram diferentes do resto de minha vida Em horas andávamos pelos matos vendo o fim do sol nas palmas dos tantos coqueiros macaúbas e caçando cortando palmito e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 203 tirando mel da abelhadepoucasflores que arma sua cera corde rosa Tinha a quantidade de pássaros felizes pousados nas croas e nas ilhas E até peixe do rio se pescou Nunca mais até o derradeiro final nunca mais eu vi o Reinaldo tão sereno tão alegre E foi ele mesmo no cabo de três dias quem me perguntou Riobaldo nós somos amigos de destino fiel amigos Reinaldo pois eu morro e vivo sendo amigo seu eu respondi Os afetos Doçura do olhar dele me transformou para os olhos de velhice da minha mãe Então eu vi as cores do mundo Como no tempo em que tudo era falante ai sei De manhã o rio alto branco de neblim e o ouricuri retorce as palmas Só um bom tocado de viola é que podia remir a vivez de tudo aquilo Dos outros companheiros conosco deixo de dizer Desmexi deles Bons homens no trivial cacundeiros simplórios desse Norte pobre uns assim Não por orgulho meu mas antes por me faltar o raso de paciência acho que sempre desgostei de criaturas que com pouco e fácil se contentam Sou deste jeito Mas Titão Passos digo apreciei porque o que salvava a feição dele era ter o coração nascido grande cabedor de grandes amizades Ele achava o Norte natural Quando que conversamos perguntei a ele se Joca Ramiro era homem bom João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 204 Titão Passos regulou um espanto uma pergunta dessa decerto que nunca esperou de ninguém Acho que nem nunca pensou que Joca Ramiro pudesse ser bom ou ruim ele era o amigo de Joca Ramiro e isso bastava Mas o preto deRezende que estava perto foi quem disse risonho bobeento Bom Um messias O senhor sabe preto quando é dos que encaram de frente é a gente que existe que sabe ser mais agradecida Ao que em tanto no ouvir falar de Joca Ramiro o Reinaldo se aproximou Parecia que ele não gostava de me ver em comprida conversa amiga com os outros ficava quasezinho amuado Com o tempo dos dias fui conhecendo também que ele não era sempre tranqüilo igual feito antes eu tinha pensado Ah ele gostava de mandar primeiro mandava suave depois visto que não fosse obedecido com as setepedras Aquela força de opinião dele mais me prazia Aposto que não Mas eu con cordava quem sabe por essa moleza que às vezes a gente tem sem tal nem razão moleza no diário coisa que até me parece ser parente da preguiça E ele o Reinaldo era tão galhardo garboso tão governandor assim no sistema pelintra que preenchia em mim uma vaidade de ter me escolhido para seu amigo todo leal Talvez também seja Anta entra nágua se rupeia Mas não Era não Era era que eu gostava dele Gostava dele quando eu fechava os olhos Um bemquerer que vinha do ar de meu nariz e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 205 do sonho de minhas noites O senhor entenderá agora ainda não me entende E o mais que eu estava criticando era me a mim contando logro jigajogas Você vai conhecer em breve Joca Ramiro Riobaldo o Reinaldo veio dizendo Vai ver que ele é o homem que existe mais valente Me olhou com aqueles olhos quando doces E perfez Não sabe que quem é mesmo inteirado valente no coração esse também não pode deixar de ser bom Isto ele falou Guardei Pensei Repensei Para mim o indicado dito não era sempre completa verdade Minha vida Não podia ser Mais eu pensando nisso uma hora outra hora Perguntei ao compadre meu Quelemém Do que o valor dessas palavras tem dentro ele me respondeu não pode haver verdade maior Compadre meu Quelemém está certo sempre Repenso E o senhor no fim vai ver que a verdade referida serve para aumentar meu pejo de tribulação Fim do bom logo vem mas O Acrísio retornou pasmaceira na barra do rio a nenhuma novidade Retornou o Jenolim o Jequitaí estava passável E saímos simples com a tropa sem menos dessossego nem mais receio serra para cima pelos caminhos tencionados Daí hora grave me veio com três João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 206 léguas de marcha Mazelas de mais pesares E donde menos temi no pior me vi Titão Passos começou a me perguntar Titão Passos era homem liso bom me fazia as perguntas com natureza tão honrosa que eu não tinha ânimo de mentir nem de me caber calado Nem podia De lá mais adiante atravessando o Jequitaí tudo ia se abrir a ser para nós todos campo de fogo e aos perigos de mortes As turmas de cavaleiros de Zé Bebelo campeavam naquele país caçando gente sopitan do vigiando Do povo morador não faltava quem desconfiando de nós mandasse a eles envio de denúncia pois todos queriam aproveitar a ocasião para se acabar com os jagunços para sempre Morrer morrer a gente sem luxo se cede o Reinaldo disse Mas a munição tem de chegar em poder de loca Ramiro Eu podia pensar tranqüilo na minha morte por ali Podia pensar no Reinaldo morrendo E o que Titão Passos queria saber era tudo que eu soubesse a respeito de Zé Bebelo das malasartes que ele usava em guerra de seus aprovados costumes suas forças e armamentos Tudo o que eu falasse podia ajudar O saber de uns a morte de outros Para melhor pensar fui malrespondendo me calando falando o que era vasto Como eu ia depor Podia Tudo o que eu mesmo quisesse Mas traição não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 207 Não Nem era por retente de dever por lei honesta nenhuma ou floreado de noção Mas eu não podia Tudo dentro de mim não podia Dou vendido em pecas riquezas o que eu cansei naquela hora minhas caras deviam de estar pegando fogo Que se eu contasse não contasse essas ânsias Eu não podia como um bicho não pode deixar de comer a avistada comida como uma bichafêmea não pode fugir deixando suas criazinhas em frente da morte Eu devia Não devia Vi vago o adiante da noite com sombras mais apresentadas Eu quem é que eu era De que lado eu era Zé Bebelo ou Joca Ramiro Titão Passos o Reinaldo De ninguém eu era Eu era de mim Eu Riobaldo Eu não queria querer contar Falei e refalei inútil consoante e quer ver que Titão Passos aceitava aquilo assim Me acreditava Lembrei que ainda tinha guardada estreito comigo aquela lista de nomes e coisas de Zé Bebelo num caderno Alguma valia aquilo tinha Não sei sabia não Andando peguei oculto rasguei em pedacinhos taquei tudo no arrojo dum riacho Aquelas águas me lavavam E de tudo que a respeito do resto eu sabia cacei em mim um esforço de me completo me esquecer Depois Titão Passos disse Você pode ser de muita ajuda Se a gente topar com a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 208 zebelância você entra de bico fala que é um deles que esta tropa você está levando Com isso me conformei Aos poucos mesmo compunha uma alegria de ser capaz de auxiliar e pôr efeito como o justo companheiro A que no bando de loca Ramiro eu havia de prestar toda a minha diligência e coragem E nem fazia mal que eu não relatasse a respeito de Zé Bebelo mais porquanto o prejuízo que disso se tivesse por ele eu também padecia e pagava No caso em vista de que agora eu estava também sendo um ramiro fazia parte De pensar isso eu desfrutei um orgulho de alegria de glória Mas ela durou curta Oi barros de água do Jequitaí que passaram diante de minha fraqueza Foi que Titão Passos pensando mais me disse Tudo temos de ter cautela Se eles já souberam notícia de que você fugiu e te encontram são sujeitos para quererem logo te matar imediato por culpas de desertor Ouvi retardado não pude dar resposta Me amargou no cabo da língua Medo Medo que maneia Em esquina que me veio Bananeira dá em vento de todo lado Homem É coisa que treme O cavalo ia me levando sem data Burros e mulas do lote de tropa eu tinha inveja deles Tem diversas invenções de medo eu sei o senhor sabe Pior de todas é essa que tonteia primeiro depois esvazia Medo que já João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 209 principia com um grande cansaço Em minhas fontes cocei o aviso de que um suor meu se esfriava Medo do que pode haver sempre e ainda não há O senhor me entende costas do mundo Em tanto eu devia de pensar tantas coisas que de repente podia cursar por ali gente zebebela armada me pegavam por al por mal eu estava soflagrante encostado rendido sem salves atirado para morrer com o chão na mão Devia de me lembrar de outros apertos e dar relembro do que eu sabia de ódios daqueles homens querentes de ver sangues e carnes das maldades deles capazes demorando vingança com toda judiação Não pude não pensava demarcado Medo não deixava Eu estando com um vapor na cabeça o miolo volteado Mudei meu coração de posto E a viagem em nossa noite seguia Purguei a passagem do medo grande vão eu atravessava A tristeza Aí o Reinaldo na paragem veio para perto de mim Por causa da minha tristeza sei que de mim ele mais gostava Sempre que estou entristecido é que os outros gostam mais de mim de minha companhia Por quê Nunca falo queixa de nada Minha tristeza é uma volta em medida mas minha alegria é forte demais Eu atravessava no meio da tristeza o Reinaldo veio Ele bemmequis aconselhou brincando Riobaldo puxa as orelhas do teu jumento Mas amuado eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 210 não estava Respondi somente Amigo e não disse nem mais Com toda minha cordura Mas de feito eu carecia de sozinho ficar Nem a pessoa especial do Reinaldo não me ajudava Sozinho sou sendo de sozinho careço sempre nas estreitas horas isso procuro O Reinaldo comigo par a par e a tristeza do medo me eivava de a ele não dar valor Homem como eu tristeza perto de pessoa amiga afraca Eu queria mesmo algum desespero Desespero quieto às vezes é o melhor remédio que há Que alarga o mundo e põe a criatura solta Medo agarra a gente é pelo enraizado Fui indo De repente de repente tomei em mim o gole de um pensamento estralo de ouro pedrinha de ouro E conheci o que é socorro Com o senhor me ouvindo eu deponho Conto Mas primeiro tenho de relatar um importante ensino que recebi do compadre meu Quelemém E o senhor depois verá que naquela minha noite eu estava adivinhando coisas grandes idéias Compadre meu Quelemém muitos anos depois me ensinou que todo desejo a gente realizar alcança se tiver ânimo para cumprir sete dias seguidos a energia e paciência forte de só fazer o que dá desgosto nojo gastura e cansaço e de rejeitar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 211 toda qualidade de prazer Diz ele eu creio Mas ensinou que maior e melhor ainda é no fim se rejeitar até mesmo aquele desejo principal que serviu para animar a gente na penitência de glória E dar tudo a Deus que de repente vem com novas coisas mais altas e paga e repaga os juros dele não obedecem medida nenhuma Isso é do compadre meu Quelemém Espécie de reza Bem rezar aquela noite eu não conseguia Nisso nem pensei Até para a gente se lembrar de Deus carece de se ter algum costume Mas foi aquele grão de idéia que me acuculou me argumentou todo Ideiazinha Só um começo Aos pouquinhos é que a gente abre os olhos achei de per mim E foi que no dia que amanhecia eu não ia pitar por forte que fosse o vício de minha vontade E não ia dormir nem descansar sentado nem deitado E não ia caçar a companhia do Reinaldo nem conversa o que de tudo mais prezava Resolvi aquilo e me alegrei O medo se largava de meus peitos de minhas pernas O medo já amolecia as unhas Íamos chegando numa tapera nas Lagoas do Córrego Mucambo Lá nós tínhamos pastos bons O que resolvi cumpri Fiz Ah aquele dia me carregou abreviei o poder de outras aragens Cabeça alta digo Esta vida está cheia de ocultos caminhos Se o senhor souber sabe não sabendo não me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 212 entenderá Ao que por outra ainda um exemplo lhe dou O que há que se diz e se faz que qualquer um vira brabo corajoso se puder comer cru o coração de uma onçapintada É mas a onça a pessoa mesma é quem carece de matar mas matar à mão curta a ponta de faca Pois então por aí se vê eu já vi um sujeito medroso que tem muito medo natural de onça mas que tanto quer se transformar em jagunço valentão e esse homem afia sua faca e vai em soroca capaz que mate a onça com muita inimizade o coração come se enche das coragens terríveis O senhor não é bom entendedor Conto De não pitar me vinham uns rangidos repentes feito eu tivesse ira de todo o mundo Agüentei Sobejante saí caminhando com firmes passos bis tris ia e voltava Me deu vontade de beber a da garrafa Rosnei que não Andei mais Nem não tinha sono nenhum desmenti fadiga Reproduzi de mim outro fôlego Deus governa grandeza Medo mais Nenhum algum Agora viesse corja de zebebelos ou tropa de meganhas e me achavam Me achavam ah bas tantemente Eu aceitava qualquer vuvu de guerra e ia em cima enorme sangue ferro por ferro Até queria que viessem duma vez pelo definitivo Aí quando os passos escutei vi era o Reinaldo que vindo Ele queria direto comigo se conferir João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 213 Eu não podia tão depressa fechar meu coração a ele Sabia disso E ele curtia um engano pensou que eu estava amofinado e eu não estava O que era sisudez de meu fogo de pessoa ele tomou por mãmolência Queria me trazer consolo Riobaldo amigo me disse Eu estava respirando muito forte com pouca paciência para o trivial pelo tanto respondi alguma palavra só Ele em hora comum com muito menos que isso a gente marfava Na vez não se ofendeu Riobaldo não calculei que você era genista ainda gracejou Dei a nenhuma resposta Momento calados ficamos se ouvia o corrute dos animais que pastavam à bruta no capim alto O Reinaldo se chegou para perto de mim Quanto mais eu tinha mostrado a ele a minha dureza mais amistoso ele parecia maldando isso pensei Acho que olhei para ele com que olhos Isso ele não via não notava Ah ele me queriabem digo ao senhor Mas graçasadeus o que ele falou foi com a sucinta voz Riobaldo pois tem um particular que eu careço de contar a você e que esconder mais não posso Escuta eu não me chamo Reinaldo de verdade Este é nome apelativo inventado por necessidade minha carece de você não me perguntar por quê Tenho meus fados A vida da gente faz sete voltas se diz A vida nem é da gente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 214 Ele falava aquilo sem rompante e sem entonos mais antes com pressa quem sabe se com tico de pesar e vergonhosa suspensão Você era menino eu era menino Atravessamos o rio na canoa Nos topamos naquele porto Desde aquele dia é que somos amigos Que era eu confirmei E ouvi Pois então o meu nome verdadeiro é Diadorim Guarda este meu segredo Sempre quando sozinhos a gente estiver é de Diadorim que você deve de me chamar digo e peço Riobaldo Assim eu ouvi era tão singular Muito fiquei repetindo em minha mente as palavras modo de me acostumar com aquilo E ele me deu a mão Daquela mão eu recebia certezas Dos olhos Os olhos que ele punha em mim tão externos quase tristes de grandeza Deu alma em cara Adivinhei o que nós dois queríamos logo eu disse Diadorim Diadorimcom uma força de afeição Ele sério sorriu E eu gostava dele gostava gostava Aí tive o fervor de que ele carecesse de minha proteção toda a vida eu terçando garantindo punindo por ele Ao mais os olhos me perturbavam mas sendo que não me enfraqueciam Diadorim Solsepôr saímos e tocamos dali para o Canabrava e o Barra João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 215 Aquele dia fora meu me pertencia Íamos por um plaino de varjas lua lá vinha Alimpo de lua Vizinhança do sertão esse AltoNorte brabo começava Estes rios têm de correr bem eu de mim dei Sertão é isto o senhor sabe tudo incerto tudo certo Dia da lua O luar que põe a noite inchada Reinaldo Diadorim me dizendo que este era real o nome dele foi como dissesse notícia do que em terras longes se passava Era um nome ver o quê Que é que é um nome Nome não dá nome recebe Da razão desse encoberto nem resumi curiosidades Caso de algum crime arrependido fosse fuga de alguma outra parte ou devoção a um santoforte Mas havendo o ele querer que só eu soubesse e que só eu esse nome verdadeiro pronunciasse Entendi aquele valor Amizade nossa ele não queria acontecida simples no comum sem encalço A amizade dele ele me dava E amizade dada é amor Eu vinha pensando feito toda alegria em brados pede pensando por prolongar Como toda alegria no mesmo do momento abre saudade Até aquelaalegria sem licença nascida esbarrada Passarinho cai de voar mas bate suas asinhas no chão Hoje em dia verso isso emendo e comparo Todo amor não é uma espécie de comparação E como é que o amor desponta Minha Otacília vou dizer Bem que eu conheci João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 216 Otacília foi tempos depois depois se deu a selvagem desgraça conforme o senhor ainda vai ouvir Depois após Mas o primeiro encontro meu com ela desde já conto ainda que esteja contando antes da ocasião Agora não é que tudo está me subindo mais forte na lembrança Pois foi Assim que desta banda de cá a gente tinha padecido toda resma de reveses e que soubemos que os judas também tinham atravessado o São Francisco então nós passamos viemos procurar o poder de Medeiro Vaz única esperança que restava Nos gerais Ah buriti cresce e merece é nos gerais Eu vinha com Diadorim com Alaripe e com João Va queiro mas Jesualdo e o Fafafa Aos BuritisAltos digo ao senhor vereda acima até numa Fazenda Santa Catarina se chegar A gente tinha ciência de que o dono era favorável do nosso lado lá se devia de esperar por um recado Fomos chegando de tardinha noitinha já era noite noite fechada Mas o dono não estava não só ia vir no seguinte e sor Amadeu o graça dele era Quem acudiu e falou foi um velhozinho já santificado de velho só se apareceu no parapeito da varanda parece que estava receoso de nossa forma não solicitou de se subir nem mandou dar nada de comer mas disse licença da gente dormir na rebaixa do engenho Avô de Otacília esse velhinho era se chamava Nhô Vô Anselmo Mas em tanto que ele falava e mesmo com a confusão e os latidos de muitos cachorros eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 217 divulguei qual que uma luz de candeia mal deixava a doçura de uma moça no enquadro da janela lá dentro Moça de carinha redonda entre compridos cabelos E o que mais foi foi um sorriso Isso chegasse Às vezes chega às vezes Artes que morte e amor têm paragens demarcadas No escuro Mas senti me senti Águas para fazerem minha sede Que jurei em mim a Nos sa Senhora um dia em sonho ou sombra me aparecesse podia ser assim aquela cabecinha figurinha de rosto em cima de alguma curva no ar que não se via Ah a mocidade da gente reverte em pé o impossível de qualquer coisa Otacília O prêmio feito esse eu merecia Diadorimdirá o senhor então eu não notei viciice no modo dele me falar me olhar me quererbem Não que não fio e digo Hádeo outras coisas O senhor duvida Ara mitilhas o senhor é pessoa feliz vou me rir Era que ele gostava de mim com a alma me entende O Reinaldo Diadorim digo Eli ele sabia ser homem terrível Suspa O senhor viu onça boca de lado e lado raivável pelos filhos Viu rusgo de touro no alto do campo brabejando cobra jararacuçu emendando sete botes estalados bando doido de queixadas se passantes dando febre no mato E o senhor não viu o Reinaldo guerrear Essas coisas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 218 se acreditam O demônio na rua no meio do redemunho Falo Quem é que me pega de falar quantas vezes quero Assim ao feito quando logo que desapeamos no acampo do Hermógenes e quando Ah lá era um cafarnaum Moxinife de más gentes tudo na deslei da jagunçagem bargada Se estavam entre o FuradodeSãoRoque e o FuradodoSapo rebeira do Ribeirão da Macaúba por fim da Mata da Jaíba A lá chegamos num detardinha Às primeiras horas conferi que era o inferno Aí com três dias me acostumei O que eu estava meio trans tornado da viagem A ver o que eu contava quem não conhecia o Reinaldo ficou pronto conhecendo Digo Diadorim Nós tínhamos em fim chegado sem soberba nenhuma contentes por topar com tanto número de companheiros em armas de todos todos eram garantia Entramos no meio deles misturados para acocorar e prosear caçamos um pé de fogo Novidade nenhuma o senhor sabe em roda de fogueira toda conversa é miudinhos tempos Algum explicava os combates com Zé Bebelo nós o nosso roteiro todo da viagem aos poucos para se historiar Mas Diadorim sendo tão galante moço as feições finas caprichadas Um ou dois dos homens não achavam nele jeito de macheza ainda mais que pensavam que ele era novato Assim loguinho João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 219 começaram aí gandaiados Desses dois um se chamava de alcu nha o FanchoBode tratantaz O outro um tribufu se dizia Fulorêncio veja o senhor Mau par A fumaça dos tições deu para a cara de Diadorim Fumacinha é do lado do delicado o FanchoBode teatrou Consoante falou soez com soltura com propósito na voz A gente quietos Se vai lá aceitar rixa assim de graça Mas o sujeito não queria pazear Se levantou e se mexeu de modo fazendo xetas mengando e castanhetando numa dança de furtapasso Diadorim se esteve em pé se arredou de perto da fogueira vi e mais vi ele apropriar espaços Mas esse FanchoBode era abusado vinha querer dar umbigada E o outro muito comparsa lambuzante preto estumou assim como fingiu falsete cantarolando pelo nariz Pra gauder Gaudêncio E aqui pra o Fulorêncio Aquilo lufou De rempe tudo foi um ão e um cão mas o que havia de haver eu já sabia Oap o assoprado de um refugão e Diadorim entrava de encontro no FanchoBode arrumou mão nele meteu um sopapo um safado nas queixadas e uma sobarbada e calçou com o pé se fez em fúria Deu com o FanchoBode todo no chão e já se curvou em cima e o punhal João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 220 parou ponta diantinho da goela do dito bem encostado no gogó da parte de riba para se cravar deslizado com bom apoio e o pico em pele de belisco para avisar do gosto de uma boamorte era só se soltar que pelo peso um fato se dava O fechabrir de olhos e eu também tinha agarrado meu revólver Arre eu não queria presumir de prevenir ninguém mais queria mesmo era matar se carecesse Acho que notaram Ao que em hora justa e certa nunca tive medo Notaram Farejaram pressentindo como cachorro sabe Ninguém não se meteu pois desapartar assim é perigoso Aquele Fulorêncio instantâneo esbarrou com os acionados indecentes me menos olhou uma vez daí não quis me encarar mais Coca bronco Diadorim mandou o Fancho se levantasse que puxasse também a faca viesse melhor se desempenhar Mas o FanchoBode se riu amistoso safado como tudo tivesse constado só duma brincadeira Oxente Homem tu é manovelho patrício Estava escabreado Dava nojo ele com a cara suja de maus cabelos que cresciam por todo lado Guardei meu revólver respeitosamente Aqueles dois homens não eram medrosos só que não tinham os interesses de morrer tão cedo assim Homem é rosto a rosto jagunço também é no quemcomquem E eles dois não estavam ali muito estimados Comprazendo conosco outros companheiros deram ar de amizade E mesmo por gracejo cordial o Fulorêncio me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 221 perguntou Mano Velho me compra o que eu sonhei hoje Divertindo também para o ar dei resposta Só se for com dinheiro da mãe do jacaré Todos riram De mim não riram O Fulorêncio riu também mas riso de velho Cá pensei silencioso silenciosinho Um dia um de nós dois agora tem de comer o outro Ou se não fica o assunto para os nossos netos ou para os netos dos nossos filhos Tudo em mais paz me ofereceram bebi da januária azulosa um gole me foi cachaça muito nomeada Aquela noite dormi conseguintemente Sempre disse ao senhor eu atiro bem E esses dois homens FanchoBode e Fulorêncio bateram a bota no primeiro fogo que se teve com uma patrulha de Zé Bebelo Por aquilo e isso alguém falou que eu mesmo tinha atirado nos dois no ferver do tiroteio Assim por exemplo no circundar da confusão o senhor sabe quando bala raciocina Adiante falaram que eu aquilo providenciei motivo de evitar que mais tarde eles quisessem vir com alguma tranquibérnia ou embusteria em fito de tirarem desforra Nego isso não é verdade Nem quis nem fiz nem praga roguei Morreram porque era seu dia deles de boa questão Até o que morreu foi só um O outro foi pego preso eu acho deve de ter acabado com dez anos em alguma boa cadeia A cadeia de Montes Claros João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 222 quem sabe Não sou assassino Inventaram em mim aquele falso o senhor sabe como é esse povo Agora com uma coisa eu concordo se eles não tivessem morrido no começo iam passar o resto do tempo todo me tocaiando mais Diadorim para com a gente aprontarem em ocasião alguma traição ou maldade Nas estórias nos livros não é desse jeito A ver em surpresas constantes e peripécias para se contar é capaz que ficasse muito e mais engraçado Mas qual quando é a gente que está vivendo no costumeiro real esses floreados não servem o melhor mesmo completo é o inimigo traiçoeiro terminar logo bem alvejado antes que alguma tramóia perfaça Também sei o que digo em toda a parte por onde andei e mesmo sendo de ordem e paz conforme sou sempre houve muitas pessoas que tinham medo de mim Achavam que eu era esquisito Só o que mesmo devo de dizer como atiro bem que vivo ainda por encontrar quem comigo se iguale em pontaria e gatilho Por meu bom de desde mocinho Alemão Vupes pouco me ensinou Naquele tempo já eu era Dono de qualquer cano de fogo revólver clavina espingarda fuzil reiúno trabuco clavinote ou rifle Honras não conto alto porque acho que acerto natural assim é de Deus dom dado Pelo que compadre meu Quelemém me explicou que eu devo de noutra vida por certo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 223 em encarnação ter trabalhado muito em mira em arma Seja Pontaria o senhor concorde é um talento todo na idéia O menos é no olho compasso Aquele Vupes era profeta Certa vez entrei num salão os companheiros careciam que eu jogasse mor de inteirar a parceiragem Bilhar quero dizer Eu não sabia total Tinha nunca botado a mão naquilo Faz mal nenhum o Advindo disse Você forma comigo que sou tão no taco João Nonato com o Escopil jogam de contralado Aceitei Combinado ficou que o Advindo pudesse me superintender e pronunciar cada toque com palavras e noção de conselhos mas sem licença de apoiar mão em minha mão ou braço nem encostar dedo no taco É de ver que mesmo do jeito não bobeei um ceitil o Advindo me lecionava o rumo medido da vantagem e eu encurvava o corpo amolecia barriga e taqueava o meu chofre querendo aquilo no verde era o justo repique umas carambolas de todos estalos retruque e recompletas com recuanço ladeio perfeito efeito produzido e reproduzido por fim eu me reprazia mais escutando rebrilhar o concoco daquelas bolas umas nas outras deslizadas E pois conforme dizia por meu tiro me respeitavam quiseram pôr apelido em mim primeiro Cerzidor depois Tatarana lagartadefogo Mas firme não pegou Em mim apelido quase que não pegava Será eu nunca esbarro pelo quieto num feitio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 224 No que foi no que me vi no acampo do Hermógenes Cabralhada Tiba De boa entrada ao que me gasturei no vendo Aqueles eram mais de cento e meio sofreúdos que todos curtidos no jagunçar rafaméia mera gente Azombado que primeiro até fiquei mas daí quis assuntação achei a meu cômodo Assim isto é me acostumei com meiosó meu coração naquele arranchamento Propriamente pessoal do Hermógenes Digo bons e maus uns pelos outros como neste mundo se per tence Por um que ruim seja logo mais para adiante se encontra outro pior E a situação nossa era de guerra Mesmo com isso a peito pronto ninguém se perturbou com perigos de tanta gravidade Se vivia numa jóvia medindo mãos em vavavá e conversa de festa tomando tempo Aqueles não desamotinavam A ajunta ali assim de tantos atrás do ar na va gagem manga de homens por zanzar ou estar àtoa ou parar formando rodas ou uns dormindo como boi malha ou deitados no chão sem dormir só aboboravam Assaz toda espécie de roupa divulguei até sujeito com cinta larga de lã vermelha outro com chapéu de lebre e colete preto de fino pano cidadão outros com coroça e bedém mesmo sem chuva nenhuma só que de branco vestido não se tinha que com terno claro não se guerreia Mas jamais ninguém ficasse nudeDeus João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 225 ou indecente descomposto no meio dos outros isso não e não Andando que sentados jogando jogos ferrando queda de braço assoando o nariz mascando fumo forte e cuspindo longe e pitando picando ou dedilhando fumo no covo da mão com muita demora o mais sempre no proseio Aventes baldrocavam suas pequenas coisas trem objeto que um tivesse e menos quisesse que custou barato E ninguém furtava Furtasse era perigar morte Cantavam cantarol uns aboiavam sem bois Ou cuidavam do espírito da barriga O serviço que cumpriam era alimpar as armas bem marcadas as cruzes nas feições das coronhas E tudo o mais que faziam que fosse coisa de semo quefazer Por isso se dizia que ali corresse muita besouragem de falação mal de rapatachos Tinham lá até cachorros vadiando geral mas o dono de cada um se sabia convinha não judiar com cão por conta do dono Ao àstantas me aceitaram mas meio atalhados Se o que fossem mesmo de constância assim por tempero de propensão ou então por me arrediarem porquanto me achando deles diverso Somente isto nos princípios Sendo que eu soube que eu era mesmo de outras extrações Semelhante por este exemplo como logo entendi eles queriam completo ser jagunços por alcanço gala mestra conforme o que avistei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 226 seguinte Pois não era que num canto estavam uns permanecidos todos se ocupando num manejo caprichoso e isto que eles executavam que estavam desbastando os dentes deles mesmos aperfeiçoando os dentes em pontas Se me entende Senhor ver essa atarefação o tratear dava alojo e apresso dava até aflição em aflito abobante Os que lavravam desse jeito o Jesualdo mocinho novo com sua simpatia o Araruta e o Nestor os que ensinavam a eles eram o Simião e o Acauã Assim um uso correntio apontar os dentes de diante a poder de gume de ferramenta por amor de remedar o aguçoso de dentes de peixe feroz do rio de São Francisco piranha redoleira a cabeçadeburro Nem o senhor não pense que para esse gasto tinham instrumentos próprios alguma liminha ou ferro lixador Não aí era à faca O Jesualdo mesmo se fazia fazia aquilo sentado num calcanhar Aviava de encalcar o corte da faca nas beiras do dente rela releixo e batia no cabo da faca com uma pedra medidas pancadas Sem espelho sem ver ao tanto que era uma faca de cabo de niquelado Ah no abreboca comum que babando às vezes sangue babava Ao mais gemesse repuxando a cara pelo que verdadeiro muito doía Agüentava Assim esquentasse demais para refrescar então ele bochechava a breve com um caneco de água com pinga Os outros dois também O Araruta procedia sozinho igual batendo na faca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 227 com a prancha de outra O Nestor não para ele o Simião com um martelinho para os golpes era quem raspava mas decerto o Nestor ao outro para isso algum tanto pagasse Abrenunciei Arrenego eu disse Deveras Então manovelho pois tu não quer o Simão em gracejo me perguntou Me fez careta e acredite o senhor ele que exercia lâmina nos do outro ele não possuía próprio dente mais nenhum nas gengivas conforme aquela vermelha boca banguela toda abriu e me mostrou Repontei Eu acho que para se ser valente não carece de figurativos O Acauã que já era bom conhecido meu assim mesmo achou de se reagir São gostos Mas um outro que chegando veio falou o mais seco Tudo na vida são gostos companheiro Mas não será o meu Olhei para esse que me deu o apoio E era um Luís Pajeú com a faca punhal do mesmo nome e ele sendo de sertão do mesmo nome das comarcas de Pernambuco Sujeito despachado moreno bem queimado mas de anelados cabelos e com uma coragem terrivelmente Ah mas o que faltava lá nele que ele mais não tinha era uma orelha que rente cortada fora pelo sinal Onde era que o Luís Pajeú havia de ter deixado aquela orelha Será gosto meu não de descasear dentaduras conciso declarou falava meio cantado mole fino Alto e forte foi outro falar de outro que no instante também ouvi Uê em minha terra se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 228 afia guampa é touro ixi E esse um trolado demais franco e desempenado cavaleiro era o Fafafa Fiz conhecença Dele tenho para mais depois Ao que lá não faltava a farta comida pelo que logo vi Gêneros e bebidas boas De donde vinha tudo em redondezas tão pobrezinhas a gente parando assim quase num deserto E a munição tanta que nem precisaram da que tínhamos trazido e que foi levada mais adiante para os escondidos de Joca Ramiro perto do arraial do Bró E a jorna para satisfazer àquela cabroeira vivente que estavam ali em seu emprego de cargo Ah tinham roubado saqueado muito grassavam A sebaça era a lavoura deles falavam até em atacar grandes cidades Foi ou não foi Mas mire e veja o senhor nas eras de 96 quando os serranos cismaram e avançaram tomaram conta de São Francisco sem prazo nem pena Mas nestes derradeiros anos quando Andalécio e Antônio Dó forcejaram por entrar lá quase com homens mil e meiomil a cavalo o povo de São Francisco soube se reuniram e deram fogo de defesa dizque durou combate por tempo de três horas tinham armado tranquias na boca das ruas com tapigos montes de areia e pedra e árvores cortadas de través brigaram como boa população Daí aqueles João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 229 retornaram arremeteram mesmo senhores da cidade quase toda conforme guerrearam contra o Major Alcides Amaral e uns soldados cercados numas duas ou três casas e um quintal guerrearam noites e dias A ver por vingar porque antes o Major Amaral tinha prendido o Andalécio cortado os bigodes dele Andalécio o que de nome real Indalécio Gomes Pereira homem de grandes bigodes Sei de quem ouviu se recordava sempre com tremores de quando no tiroteio de inteira noite Andalécio comandava e esbarrava para gritar feroz Sai pra fora cão Vem ver Bigode de homem não se corta Tudo gelava de só se escutar Aí quem trouxe socorro para salvar o Major foi o delegado Doutor Cantuária Guimarães vindo às pressas de Januária com punhadão de outros jagunços de fazendeiros da política do Governo Assim que salvaram mandaram desenterrar para contar bem mais de sessenta mortos uns quatorze juntos numa cova só Essas coisas já não aconteceram mais no meu tempo pois por aí eu já estava retirado para ser criador e lavrador de algodão e cana Mas o mais foi ainda atual agora recentemente quase isto é foi logo de se emendar depois do barulhão em Carinhanha mortandades quando se espirrou sangue por toda banda o senhor sabe Carinhanha é bonitinha uma verdade que barranqueiro canta remador Carinhanha é que sempre foi de um homem de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 230 valor e poder o coronel João Duque o pai da coragem Antônio Dó eu conheci certa vez na Vargem Bonita tinha uma feirinha lá ele se chegou com uns seus cabras formaram grupo calados arredados Andalécio foi meu bom amigo Ah tempo de jagunço tinha mesmo de acabar cidade acaba com o sertão Acaba Atinei mal no começo com quem era que mandava em nós todos O Hermógenes Mas perto duns cinqüenta nesse meio o Acauã Simão Luís Pajeú Jesualdo e o Fafafa obedeciam a João Goanhá eram dele E tinha um grupo de brabos do Ricardão Onde era que estava o Ricardão Reunindo mais braçosdearmas beira da Bahia Se esperava também a vinda de Só Candelário com os seus Se esperava o chefe grande acima de todos Joca Ramiro falado aquela hora em Palmas Mas eu achava aquilo tudo dando confuso Titão Passos cabodeturma com poucos homens à mão era nãostante muito respeitado E o sistema diversiava demais do regime com Zé Bebelo Olhe jagunço se rege por um modo encoberto muito custoso de eu poder explicar ao senhor Assim sendo uma sabedoria sutil mas mesmo sem juízo nenhum falável o quando no meio deles se trança um ajuste calado e certo com semelho mal comparando com o governo de bando João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 231 de bichos caititu boi boiada exemplo E de coisas faziam todo segredo Um dia foi ordem ajuntar todos os animais de sela e de carga iam ser levados para amoitamento e pasto entre serras no Ribeirão Poço Triste num varjal Para mim até o endereço que diziam do lugar devia de ser mentira Mas tive de entregar meu cavalo completo no contragosto Me senti a pé como sem segurança nenhuma E tem as pequenas coisas que aperreiam enquanto estava com meu animal eu tinha a capoteira a bolsa da sela os alforjes podia guardar meus trecos De noite dependurava a sela num galho de árvore botava por debaixo dela o dobro com as roupas dormia ali perto em paz Agora eu ficava num descômodo Carregar os trens não podia chegava o peso das armas e das balas e cartuchame Perguntei a um onde era que tudo se depositava Eh bereu Bota em algum lugar Joga fora Oxe tu carrega ouro nesses dobros Quê que se importavam Por tudo eram fogueiras de se cozinhar fumaça de alecrim panela em gancho de mariquita e cheiro bom de carne no espeto torrada se assando e batatas e mandiocas sempre quentes no soborralho A farinha e rapadura quantidades As mantas de carneceará Ao tanto que a carnedesol não faltasse mesmo amiúde ainda saíam alguns e retornavam tocando uma rês que repartiam Muitos misturavam a jacuba pingando no coité um dedo de aguardente eu nunca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 232 tinha avistado ninguém provar jacuba assim feita Os usares A ver como o Fafafa abria uma cova quadrada no chão ajuntava ali brasas grandes direto no brasal malassasse pedação de carne escorrendo sangue pouco e pouco revirava com a ponta do facão só pelo chiar Disso definitivo não gostei A saudade minha maior era de uma comidinha guisada um frango com quiabo e abóboradágua e caldo um refogado de caruru com ofa de angu Senti padecida falta do São Gregório bem que a minha vidinha lá era mestra Diadorim notou meus males Me disse consolo Riobaldo tem tempos melhores Por ora estamos acuados em buraco Assistir com Diadorim e ouvir uma palavrinha dele me abastava aninhado Mas mesmo achei que ali convinhável não era se ficar muito tempo juntos apartados dos outros Cismei que maldavam desconfiassem de ser feio pegadio Aquele povo estava sempre misturado todo o mundo Tudo era falado a todos do comum às mostras às vistas Diferente melhor foi quando estivemos com Medeiro Vaz o maior número lá era de pessoal dos gerais gente mais calada em si e sozinha moradores das grandes distâncias Mas por fim um se acostuma isto é eu me acostumei Sem receio de ser tirado de meu dinheiro que eu empacotava ainda boa quantia que Zé Bebelo sempre me pagou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 233 no pontual e gastar eu não tinha onde Recontei Aí quis que soubessem logo como era que eu atirava Até gostavam de ver Tatarana põe o dez no onze me pediam por festar De duzentas braças bala no olho de um castiçal eu acertava Num aquele alvo só as todas todas Assim então esbarrei aquilo com que me aperreavam os coscuvilhos Se alguém falou mal de mim não me importo Mas não quero que me venham me contar Quem vier contar e der notícias é esse mesmo que não presta e leva o puto nomedamãe e de que é filho eu informei O senhor sabe nomedamãe e o depois quer dizer meu pinguelo Sobre o fato para de mim não desaprenderem não se esquecerem eu pegava o rifle tive rifle de winchester até de quatorze tiros e dava gala de entremez Corta aquele risco Tatarana me aprovavam Se eu cortasse Nunca errei Para rebater reproduzia tudo a revólver Vem um cismo de fio de cabelo no ar que eu acerto Sobrefiz Social eu andava com minhas cartucheiras triplas só que atochadas sempre Ao que me gabavam e louvavam então eu esbarrava sossegado Surgidamente aí principiou um desejo que tive que era o de destruir alguém a certa pessoa O senhor pode rir seu riso tem siso Eu sei Eu quero é que o senhor repense as minhas tolas palavras E olhe tudo quanto há é aviso Matar a aranha em teia Se não por que era que já me vinha a idéia desejável que joliz João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 234 havia de ser era se meter um balaço no baixo da testa do Hermógenes A bronzes O ódio pousa na gente por umas criaturas Já vai que o Hermógenes era ruim ruim Eu não queria ter medo dele Digo ao senhor que aquele povo era jagunços eu queria bondade neles Desminto Eu não era criança nunca bobo fui Entendi o estado de jagunço mesmo assim sendo eu marinheiro de primeira viagem Um dia agarraram um homem que tinha vindo à traição espreitar a gente por conta dos bebelos Assassinaram Me entristeceu aquilo até ao vago do ar O senhor vigie esses comem o cru de cobras Carecem Só por isso para o pessoal não se abrandar nem esmorecer até Só Candelário que se prezava de bondoso mandava mesmo em tempo de paz que seus homens saíssem fossem para estropelias prática da vida Ser ruim sempre às vezes é custoso carece de perversos exercícios de experiência Mas com o tempo todo o mundo envenenava do juízo Eu tinha receio de que me achassem de coração mole soubessem que eu não era feito para aquela influição que tinha pena de toda cria de Jesus E Deus Diadorim uma hora eu perguntei Ele me olhou com silenciozinho todo natural daí disse em resposta Doca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 235 Ramiro deu cinco contos de réis para o padre vigário de Espinosa Mas o Hermógenes era fel dormido flagelo com frieza Ele gostava de matar por seu miúdo regozijo Nem contava valentias vivia dizendo que não era mau Mas outra vez quando um inimigo foi pego ele mandou Guardem este Sei o que foi Levaram aquele homem entre as árvores duma capoeirinha o pobre ficou lá nhento amarrado na estaca O Hermógenes não tinha pressa nenhuma estava sentado recostado A gente podia caçar a alegria pior nos olhos dele Depois dum tempo ia lá sozinho calmoso Consumia horas afiando a faca Eu ficava vendo o Hermógenes passado aquilo ele estava contente de si com muita saúde Dizia gracejos Mas mesmo para comer ou falar ou rir ele deixava a boca própria se abrir alta no meio como sem vontade boca de dor Eu não queria olhar para ele encarar aquele carangonço me perturbava Então olhava o pé dele um pé enorme descalço cheio de coceiras frieiras de remeiro do rio pépubo Olhava as mãos Eu acabava achando que tanta ruindade só conseguia estar naquelas mãos olhava para elas mais com asco Com aquela mão ele comia aquela mão ele dava à gente Entremeando eu comparava com Zé Bebelo aquele homem Nessa hora eu gostava de Zé Bebelo quase como um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 236 filho deve de gostar do pai As tantas coisas me tonteavam eu em claro De repente eu via que estava desejando que Zé Bebelo vencesse porque era ele quem estava com a razão Zé Bebelo devia de vir forte viesse liquidar mesmo a rãs com o inferno da jagunçada E eu estava ali cumprindo meu ajuste por fora com todo rigor mas estava tudo traindo traidor no cabo do meu coração Alheio ao que encostei minhas costas numa árvore Aí eu não queria ficar doido no nem mesmo Puxei conversa com Diadorim Por que era que Joca Ramiro sendo chefe tão subido de nobres costumes consentia em ter como seu alferes um su jeito feito esse Hermógenes remarcado no mal Diadorim me escutou depressa tal duvidou de meu juízo Riobaldo onde é que você está vivendo com a cabeça O Hermógenes é duro mas leal de toda confiança Você acha que a gente corta carne é com quicé ou é com colherdepau Você queria homens bem comportados bonzinhos para com eles a gente dar combate a Zé Bebelo e aos cachorros do Governo A espichado nesse dia calei Assim uma coisa eu estava escondendo mesmo de Diadorim que eu já parava fundo no falso dormia com a traição Um nublo Tinha perdido meu bom conselho E entrei em máquinas de tristeza João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 237 Então eu era diferente de todos ali Era Por meu bom Aquele povo da malfa no dia e noite de relaxação brigar beber constante comer Comeu loboE vozear tantas asneiras mesmo de Diadorim e de mim já pensavam Um dia um disse Eh esse Reinaldo gosta de ser bom amigo Ao quando o Leopoldo morreu ele quase morreu também dos demorados pesares Desentendi mediante meu querer Mas não me adiantou Dai persistentemente essa história me remoía esse nome de um Leopoldo Tomava por ofensa a mim que Diadorim tivesse tido mesmo tão antes um amigo companheiro Até que vai cresci naquela idéia que o que estava fazendo falta era uma mulher E eu era igual àqueles homens Era Com não terem mulher nenhuma lá eles sacolejavam bestidades Saindo por aí dizia um qualquer uma que seja não me escapole Ao que contavam casos de mocinhas ensinadas por eles aproveitavelmente de seguida em horas safadas Mulher é gente tão infeliz me disse Diadorim uma vez depois que tinha ouvido as estórias Aqueles homens quando estavam precisando eles tinham aca almiscravam Achavam manejavam Deus me livrou de endurecer nesses costumes perpétuos A primeira que foi bonita moça eu estava com ela João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 238 somente Tanto gritava que xingava tanto me mordia e as unhas tinha Ao cabo que pude a moça fechados os olhos não bulia não fosse o coração dela rebater no meu peito eu entrevia medo Mas eu não podia esbarrar Assim tanto de repente vindo ela estremeceuzinha Daí abriu os olhos aceitou minha ação arfou seus prazeres constituído milagre Para mim era como eu tivesse os mais amores Pudesse levava essa moça comigo fiel Mas depois num sítio perto da Serra Nova foi uma outra a moreninha miúda e essa se sujeitou fria estendida para mim ficou de pedras e terra Ah era que nem eu nos medonhos fosse e o senhor crê a mocinha me agüentava era num rezar tempos além Às almas fugi de lá larguei com ela o dinheiro meu eu mesmo roguei pragas Contanto que nunca mais abusei de mulher Pelas ocasiões que tive e de lado deixei ofereço que Deus me dê alguma minha recompensa O que eu queria era ver a satisfação para aquelas pelo meu ser Feito com a Rosa uarda sempre formosa a filha de Assis Wababa sonhos meus turcamente e que a qual não lhe disse o pai dela que era forte negociante em todo tempo nanja que não desconfiou Feito com aquela moça Nhorinhá filha de Ana Duzuza Digo ao senhor Mas o senhor releve eu estar glosando assim a seco essas coisas de se calar no preceito devido Agora o tudo que eu conto é porque acho que é sério preciso João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 239 Permeio com quantos removido no estatuto deles com uns poucos me acompanheirei daqueles jagunços conforme que os anjosdaguarda Só quase a boa gente Sendo que são por todos estes Capixum caboclo sereno viajado filho dos gerais de São Felipe Fonfredo que cantava todas as rezas de padre e comia carne de qualidade nenhuma e que nunca dizia de onde era e viera o que rimava verso com ele Sesfredo desse já lhe contei o TestaemPé baiano ladino chupava muito o Paspe vaqueiro jaibano o homem mais habilidoso e serviçal que já topei nesta minha vida Dadá SantaCruz dito o Caridoso queria sempre que se desse resto de comida à gente pobre com vergonha de vir pedir o CarrodeBoi gago gago O Catocho mulato claro era curado de bala Lindorífico chapadeiro minas novense com mania de aforrar dinheiro O Diolo preto de beiço maior Juvenato Adalgizo o SanguedeOutro Ei tantos para que que eu fui querer começar a descrever Dagobé o Eleutério PescoçoPreto José Amigo Amigo Homem desses alguém dizendo a um que ele é demônio de ruim ele ria de não querer ser capaz até de nessa raiva matar o outro Afirmo ao senhor do que vivi o mais difícil não é um ser bom e proceder honesto dificultoso mesmo é um saber definido o que quer e ter o poder de ir até João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 240 no rabo da palavra Ezirino matou um companheiro que Ba tatinha se chamava o pobre dum cafuz magrelo só que tinha o danado defeito de contrariar qualquer coisa que a gente falava Ezirino caiu no mundo Daí começou voz que ele tinha fugido para se bandear com os zébebelos pago por sua traição e que Batatinha somente morreu porque disso sabia Todo o mundo andava encrespo forjicavam muita cilada e enredos de desconfianças Mudamos para outros lugares mais a coberto em distância obra de sete léguas para a parte do poente Muito vi que não estávamos fazendo isso por escapulir mas que o Hermógenes Titão Passos e João Goanhá antes acharam de combinar aquilo em suas conversas era o arrumo para melhores combates com Zé Bebelo Ah e aí lá chegaram com satisfação de todos dez homens a Só Candelário pertencidos Traziam cargueiros com mais sal bom café e uma barrica de bacalhau Delfim era um daqueles tocava E o Luzié alagoano de Alagoas Nesse dia eu saí com esquadra fomos rondar os caminhos de porventura dos bebelos andamos mais de três léguas e tanto no meio da noite retornamos De manhã cedo eu soube tinham até dançado aquela véspera Diadorim você dança logo perguntei Dança Aquilo é pé de salão quem respondeu foi o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 241 Garanço o de olhos de porco Ouvindo o que me sobrou um enjôo O Garanço era um mocorongo mermado com estúrdias feições e pessoa muito agradável de seu natural Ele tinha idéias às vezes parecia criança pequena Punha nome em suas armas o facão era torturum o revólver rouxinol a clavina era berrabode Com ele a gente ria sempremente Mais o Garanço dava de procurar a companhia nossa minha e de Diadorim aquele tempo ele vinha costumeiro para perto Às vezes como naquilo ele me produzia jeriza verdadeira Diadorim não dizia nada estava deitado de costas num pelego com a cabeça num feixe de capim cortado Ali naquele lugar ele contumaz dormia Dia dorim menos gostava de rede O Garanço era sanfranciscano dum lugar chamado Morpará Hásde queria que a gente escutasse ele recontar compridas passagens de sua vida Aquilo aborrecia Eu queria estarestâncias dos violeiros que tocavam sentimento geral Depois Diadorim se levantou ia em alguma parte Guardei os olhos meio momento na beleza dele guapo tão aposto surgido sempre com o jaleco que ele tirava nunca e com as calças de vaqueiro em couro de veado macho curtido com aroeirabrava e campestre De repente uma coisa eu necessitei de fazer Fiz fui e me deitei no mesmo dito pelego na cama que ele Diadorim marcava no capim minha cara posta no próprio lugar Nem me fiz caso do Garanço só com o violeiro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 242 somei A zangarra daquela viola Por não querer meu pensamento somente em Diadorim forcejei Eu já não presenciava nada nem escutava possuído fiquei sonhejando o ir do ar meus confins Aí pensei no São Gregório A bem no São Gregório não mas peguei saudade dos passarinhos de lá do poço no córrego do batido do monjolo dia e noite da cozinha grande com fornalha acesa dos cômodos sombrios da casa dos currais adiante da varanda de ver nuvens O senhor sabe não acerto no contar porque estou remexendo o vivido longe alto com pouco caroço querendo esquentar demear de feito meu coração naquelas lembranças Ou quero enfiar a idéia achar o rumozinho forte das coisas caminho do que houve e do que não houve As vezes não é fácil Fé que não é Mire veja naqueles dias na ocasião devem de ter acontecido coisas meio importantes que eu não notava não surpreendi em mim Mesmo hoje não atino com o que foram Mas no justo momento me lembrei em madrugada daquele nome de Siruiz Refiro que perguntei ao Garanço por aquele rapaz Siruiz que cantava cousas que a sombra delas em meu coração decerto já estava O que eu queria saber não era próprio do Siruiz mas da moça virgem moça branca perguntada e dos pésdeverso como eu nunca tive poder de formar um igual Mas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 243 o Garanço já tinha respondido Eh eh ô O Siruiz já morreu Morreu morto no tiroteio entre o Morcego e o Suaçuapara passado para cá o Pacuí Do choque com que ouvi essa confirmação de notícia fui arriando para um desânimo Como se assim ele tivesse falado Siruiz Mas não foram vocês mesmos que mataram Eu não Nessa vez eu tinha restado longe por fora na PedraBranca não vi combate Como era que eu podia O Garanço tomava rapé Era um sujeito de intenções muito parvas Perguntou se o Siruiz não seria meu amigo meu parente Quem sabe se era eu respondi de toleima O Garanço vi que não gostou Viver perto das pessoas é sempre dificultoso na face dos olhos Nem eu quis indagar o mais certo estava de que ele Garanço não sabia nada do que tivesse valor Mas eu guardava triste de cor a canção recantada E Siruiz tinha morrido Então me instruíram na outra que era cantiga de se viajar e cantar guerrear e cantar nosso bando toda a vida Olererêêê baiana Eu ia e não vou mais Eu faço que vou lá dentro oh baiana e volto do meio pra trás O senhor aprende Eu entôo mal Não por boca de ruindade lá como quem diz Sou ruim não sou homem de gostar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 244 dos outros quando não me aperreiam sou de tolerar Não tenho a caixeta da raiva aberta Rixava com nenhum ali aceitava o regime na miudez das normas Vai daí comigo erraram Um errou Um paijagunço chamado Antenor acho que era coração dejesusense começou a temperar conversa sagaz de fiúza notei Ele era homem chegado ao Hermógenes se sabia dessa parte De diz em diz rodeava a questão Queria saber que apreço eu tinha por loca Ramiro por Titão Passos os outros todos Se eu conhecia Só Candelário que estava por chegar O giro dos assuntos ele me tenteava a fala Notei E devagar vinha querendo deixar em mim uma má vazante me largar em dúvida Não era Aquilo eu inteligenciava Esse Antenor sempre louvando e vivando Joca Ramiro acabou por me dar a entender curtamente o em conseguinte que Joca Ramiro talvez fazia mal em estar tanto tempo por longe alguns de bofe ruim já calculavam que ele estivesse abandonando seu pessoal em horas de tanta guerra que Joca Ramiro era rico dono de muitas posses em terras e se arranchava passando bem em casas de grandes fazendeiros e políticos deles recebia dinheiro de munição e paga seô Sul de Oliveira coronel Caetano Cordeiro doutor Mirabô de Melo Que era que eu achava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 245 Eu escutei Respondi Ah ah Sou lá para achar nenhuma coisa Não tinha nascido no ontem cedo tomei experiência de homens por homens Disse só que decerto Joca Ramiro estava formando gente e meios para vir em ajuda de nós jagunços em lei e nesse meiotempo punha toda confiança no Hermógenes em Titão Passos João Goanhá fortes no fato valor e na lealdade Gabei o Hermógenes principal bispei Com isso aquele Antenor concordou A bem dizer aprovou o quanto eu disse Mas realçou mais altamente a fama do Hermógenes e do Ricardão também esses dois seriam os chefes de encher a mão em paz regalada mas por igual nos combates Esse sujeito Antenor sabia coçar queixo de cobra e semear sal em roças verdes Vulto perigoso nas ações o Garanço me preveniu com a boa noção vinda de sua redondice de atinar Ações O que eu vi sempre é que toda ação principia mesmo é por uma palavra pensada Palavra pegante dada ou guardada que vai rompendo rumo Aquele Antenor já tinha depositado em mim o anúvio de uma má idéia disidéia a que por minhas costas logo escorreu traiçoeirinha como um rabo de gota de orvalho Que explicação dou ao senhor Acreditar no que ele tinha suso dito não acreditei Mas em mim para mim aquilo tudo era era assim como um lugar com maucheiro no campo uma árvore lugar fedido onde é que alguma jaratataca acuou por se defender João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 246 do latido dos cachorros E grande aviso naquele dia eu tinha recebido mas menos do que ouvi real do que do que eu tinha de certo modo adivinhado De que valeu Aviso Eu acho que quase toda a vez que ele vem não é para se evitar o castigo mas só para se ter consolo legal depois que o castigo passou e veio Aviso Rompe ferro Cacei Diadorim Mas eu estreava umas ânsias Como fosse falei do novo e do velho mal foi que falei em zanga desrazoadamente e de primeira entrada Acho que por via disso Diadorim não deu a devida estimação às minhas palavras Alheio eh Só ojerizado em estilos ele esteve um raio de momento foi de ouvir que alguém pudesse duvidar do proceder de loca Ramiro loca Ramiro era um imperador em três alturas loca Ramiro sabia o se ser governava nem o nome dele não podia à toa se babujar E aqueles outros o Hermógenes Ricardão Sem Joca Ramiro eles num átimo se desaprumavam deste mundo desapareciam valiam o que pulga pula O Hermógenes Certo um bom jagunço cabodeturma mas desmerecido de situação política sem tino nem prosápia E o Ricardão rico dono de fazendas somente vivia pensando em lucros querendo dinheiro e ajuntando Diadorim do Ricardão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 247 era que ele gostava menos Ele é bruto comercial disse e fechou a boca forte feito fosse cuspir Eu então disse pelo conseguinte A bom e bem Diadorim Mas se é ou se não é por que é que não vamos levar informação sutil a loca Ramiro para o enfim Aí refalei muito ao tanto que escondi minha raiva Quem sabe Joca Ramiro na lei da caminhação não estava esquecido de conhecer os homens deixando de farear o mudar do tempo Viesse Joca Ramiro podia detalhar o podre do são recontar seus brabos entre as mãos e os dedos Podia devia de mandar embora aquele monstro do Hermógenes Se sendo etcétera se carecesse eh uai se matava Diadorim pôs muito os olhos em mim vi que com um espanto reprovador não me achasse capaz de estipular tanta maldade sem escrúpulo Mau não sou Cobra ele disse Nem cobra serepente malina não é Nasci devagar Sou é muito cauteloso Mais em paz comigo mais Diadorim foi me desinfluindo Ao que eu ainda não tinha prazo para entender o uso que eu desconfiava de minha boca e da água e do copo e que não sei em que mundodelua eu entrava minhas idéias O Hermógenes tinha seus defeitos mas puxava por Joca Ramiro fiel punia e terçava Que eu mais uns dias esperasse e ia ver o ganho do sol João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 248 nascer Que eu não entendia de amizades no sistema de ja gunços Amigo era o braço e o aço Amigo Aí foi isso que eu entendi Ah não amigo para mim é diferente Não é um ajuste de um dar serviço ao outro e receber e saírem por este mundo barganhando ajudas ainda que sendo com o fazer a injustiça aos demais Amigo para mim é só isto é a pessoa com quem a gente gosta de conversar do igual o igual desarmado O de que um tira prazer de estar próximo Só isto quase e os todos sacrifícios Ou amigo é que a gente seja mas sem precisar de saber o por que é que é Amigo meu era Diadorim era o Fafafa o Alaripe Sesfredo Ele não quis me escutar Voltei da raiva Digo ao senhor nem em Diadorim mesmo eu não firmava o pensar Naqueles dias então eu não gostava dele Em pardo Gostava e não gostava Sei sei que no meu eu gostava permanecente Mas a natureza da gente é muito segundase sábados Tem dia e tem noite versáveis em amizade de amor Antes o que me atazanava a mor disso crio razoável lembrança era o significado que eu não achava lá no meio onde eu estava obrigado naquele grau de gente Mesmo repensando as palavras de Diadorim eu apurava só este resto João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 249 que tudo era falso viver deslealdades Traição Traição minha fosse no que fosse Quase tudo o que a gente faz ou deixa de fazer não é no fim traição Hádeo a alguém a alguma coisa E eu não tardei no meu querer lá eu não podia mais ficar Donde eu tinha vindo para ali e por que causa e sem paga de preço me sujeitava àquilo Eu iame embora Tinha de ir embora Estava arriscando minha vida estragando minha mocidade Sem rumo Só Diadorim Quem era assim para mim Diadorim Não era aquela ocasião pelo próprio dito de estar perto dele de conversar e mais ver Mas era por não agüentar o ser se de repente tivesse de ficar separado dele pelo nunca mais E mesmo forte era a minha gastura por via do Hermógenes Malagourado de ódio que sempre surge mais cedo e às vezes dá certo igual palpite de amor Esse Hermógenes belzebu Ele estava caranguejando lá Nos soturnos Eu sabia Nunca mesmo depois eu nunca soube tanto disso como naquele tempo O Hermógenes homem que tirava seu prazer do medo dos outros do sofrimento dos outros Aí arre foi que de verdade eu acreditei que o inferno é mesmo possível Só é possível o que em homem se vê o que por homem passa Longe é o Semolho E aquele inferno estava próximo de mim vinha por sobre mim Em escuro vi sonhei coisas muito duras Nas larguezas do sono da gente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 250 A já que ia membora fugia Onde é que estava Diadorim Nem eu não imaginava que pudesse largar Diadorim ali Ele era meu companheiro comigo tinha de ir Ah naquela hora eu gostava dele na alma dos olhos gostava da banda de fora de mim Diadorim não me entendeu Se engrotou Assaz também acho que me acuso que não tive um ânimo de franco falar Se fosse eu falasse total Diadorim me esbarrava no tolher não me entendia A vivo o arisco do ar o pássaro aquele poder dele Decerto vinha com o nome de Joca Ramiro Joca Ramiro Esse nem a gente conseguia exato real era um nome só aquela graça sem autoridade nenhuma avistável andava por longe se era que andava Teve um instante bambeei bem Foi mesmo aquela vez Foi outra Alguma foi me alembro Meu corpo gostava de Diadorim Estendi a mão para suas formas mas quando ia bobamente ele me olhou os olhos dele não me deixaram Diadorim sério testalto Tive um gelo Só os olhos negavam Vi ele mesmo não percebeu nada Mas nem eu eu tinha percebido Eu estava me sabendo Meu corpo gostava do corpo dele na sala do teatro Maiormente As tristezas ao redor de nós como quando carrega para toda chuva Eu podia pôr os braços na testa ficar assim lorpa sem encaminhamento nenhum Que é que queria Não quis o que estava no ar para isso mandei vir uma idéia de mais longe Falei sonhando Diadorim você não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 251 tem não terá alguma irmã Diadorim voz minha eu perguntei Sei lá se ele riu O que disse que resposta Sei quando a amargura finca o que é o cão e a criatura De tristeza tristes águas coração posto na beira Irmã nem irmão ele não tinha Só tenho Deus Joca Ramiro e você Riobaldo ele declarou Hê de medo coração bate solto no peito mas de alegria ele bate inteiro e duro que até dói rompe para diante na parede Diadorim então quem foi esse moço Leopoldo que morreu seu amigo eu indaguei de semtempo nem sei porquê eu não estava pensando naquilo Antes já eu estava para trás de ter perguntado palavras fora da boca Leopoldo Um amigo meu Riobaldo de correta amizade e Diadorim desfez assoprado um suspiro o que muda melhor Até te falaram nele Riobaldo Leopoldo era o irmão mais novo de loca Rami ro Aquilo eu já soubesse demais que Joca Ramiro se realçasse por riba de tudo reinante Mas pude ter a língua sofreada Vamos embora daqui juntos Diadorim Vamos para longe para o porto do deJaneiro para o sertão do baixio para o Curralim SãoGregório ou para aquele lugar nos gerais chamado OsPorcos onde seu tio morava De arrancar de meu falar de uma sede Aos tantos fui abaixando os olhos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 252 constando que Diadorim me agarrava com o olhar corre que um silêncio de ferro Assombrei de mim de desprezo desdenhado de duvidar da minha razão O que eu tinha falado era umas doideiras Diadorim esperou Ele era irrevogável Então eu saí dali querendo esquecer ligeiro o atual Minha cara estava pegando fogo Andei em dei até que lembrei o Garanço Bom o Garanço esse ia comigo me seguia em tudo era pobre homem à espera de qualquer ordem cordial Isto ele mesmo nem sabia mas era que carecia era de alguma amizade Estava lá curvado cabeçudo como uma cigarra Estava cozinhando pequis numa lata Eh eh nós ele assim dizia Ladeei conversa Ele me ouvia com anuídos e fazendo uma cara de entender Não conseguia Só conseguia demonstrar os tamanhos de sua cabeça Ao que bastava um meu maior cochicho e o Garanço vinha servia de companheiro para fugirmos O mais que pudesse haver era ele primeiro perguntar E o Reinaldo porque já estava acostumado com eu e Diadorim sermos dois e ele querer ser o três Então eu respondi Segredo eh Garanço Segredo eh e vamos e que Diadorim era para vir depois O Garanço tinha alguma diferença por alguma banda de sua natureza ele se desapartava da jagunçagem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 253 Mas eu não cheguei a falar não quis não expliquei nada Que era que eu ia fazer às fugas com aquele prascóvio pelo sul e pelo norte nos sertões da Jaíba Ele só sabia cumprir obediência no que eu riscasse governado por meu querer e por minha idéia um companheiro assim não aumentava segurança minha nenhuma Quero sombra Quero eco Quero cão Não com ele eu não me fazia melhor esperar eu ia ficando Desse no que desse mais um tempo Algum dia podia Diadorim mudar de tenção Em Diadorim era que eu pensava de fugir junto com ele era que eu carecia como o rio redobra O Garanço se regalava com os pequis relando devagar nos dentes aquela polpa amarela enjoada Aceitei não daquilo não provo por demais distraído que sou sempre receei dar nos espinhos craváveis em língua Eh eh nós o Garanço reproduzia tão satisfeito Minha amizade sobrou um pouco para ele que era criatura de simples coração Digo ao senhor naquele dia eu tardava no meio de sozinha travessia Ah mas falo falso O senhor sente Desmente Eu desminto Contar é muito muito dificultoso Não pelos anos que se já passaram Mas pela astúcia que têm certas coisas passadas de fazer balancê de se remexerem dos lugares O que eu falei foi exato Foi Mas teria sido Agora acho que nem não São tantas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 254 horas de pessoas tantas coisas em tantos tempos tudo miúdo recruzado Se eu fosse filho de mais ação e menos idéia isso sim tinha escapulido calado no estar da noite varava dez léguas madrugada me escondia do largo do sol varava mais dez passava o São Felipe as serras as VinteeUmaLagoas encostava no São Francisco bem de frente da Januária passava chegava em terra cidadã estava no pique Ou me pegassem no caminho bebelos ou Hermógenes me matassem Morria com um bé de carneiro ou um au de cão mas tinha sido um mais destino e uma mor coragem Não valia Não fiz Quem sabe nem pensei sério em Dia dorim ou pensei algum foi em vezo de desculpa Desculpa para meu preceito mesmo Quanto pior mais baixo se caiu maismente um carece próprio de se respeitar De mim toda mentira aceito O senhor não é igual Nós todos Mas eu fui sempre um fugidor Ao que fugi até da precisão de fuga As razões de não ser O que foi que eu pensei Nas terríveis dificuldades certamente meiamente Como ia poder me distanciar dali daquele ermo jaibão em enormes voltas e caminhadas aventurando aventurando Acho que eu não tinha conciso medo dos perigos o que eu descosturava era medo de errar de ir cair na boca dos perigos por minha culpa Hoje sei medo meditado foi isto Medo de errar Sempre tive Medo de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 255 errar é que é a minha paciência Mal O senhor fia Pudesse tirar de si esse medodeerrar a gente estava salva O senhor tece Entenda meu figurado Conforme lhe conto será que eu mesmo já estava pegado do costume conjunto de ajagunçado Será sei Gostar ou não gostar isso é coisa diferente O sinal é outro Um ainda não é um quando ainda faz parte com todos Eu nem sabia Assim que o Paspe tinha agulhas grandes fio e sovela consertou minhas alpercatas Lindorífico me cedeu por troco de espórtula um bentinho com virtudes fortes dito de sãossalavá e cruzcomsangue E o Elisiano caprichava de cortar e descascar um ramo reto de goiabeira ele que assava a carne mais gostosa as beiras tostadas a gordura chiando cheio E o Fonfredo cantava loas de não se entender o Duvino de tudo armava risada e graça o Delfim tocando a viola Leocádio dançava um valsar com o Diodolfo e Geraldo Pedro e o Ventarol que queriam ficar espichados dormindo o tempo todo o Ventarol roncasse ele possuía uma rede de casamento de bom algodão com chuva de rendas rendadas Aí e o Jenolim e o Acrísio e João Vaqueiro que depunham por mim com uma estima diferente só porque se tinha viajado juntos vindo do das Velhas Viva companheiro tropeiro saudavam Ao que se jogava truque e douradinha e douradão por cima de couros de rês Aí a troça em beirada de fogueiras o vuvo de falinhas e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 256 falas no encorpar da noite Artes que havia uma alegria Alegria é o justo Com os casos que todos iam contando de combates e tiroteios perigos tantos vencidos escapulas milagrosas altas coragens Aquilo era uma gente Ali eu estava no entremeio deles esse negócio Não carecia de calcular o avante de minha vida a qual era aquela Saísse dali tudo virava obrigação minha trançada estreita de cor para a morte Homem foi feito para o sozinho Foi Mas eu não sabia Saísse de lá eu não tinha contrafim Com tantos com eles gente vivendo sorte se cumpria o grosso de uma regra por termo havia de vir um ganho como não havia de ter desfecho geral Por que era que todos ficavam ali por paz e por guerra e não se desmanchava o bando não queriam ir embora Reflita o senhor nisso que foi o que depois entendi vasto Desistir de Diadorim foi o que eu falei Digo desdigo Pode até ser por meu desmazelo de contar o senhor esteja crendo que no arrancho do acampo eu pouco visse Diadorim amizade nossa padecesse de descuido ou míngua O engano Tudo em contra Diadorim e eu a gente parava em som de voz e alcance dos olhos constante um não muito longe do outro De manhã à noite a afeição nossa era duma cor e duma peça Diadorim sempre atencioso esmarte correto em seu bom João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 257 proceder Tão certo de si ele repousava qualquer mau ânimo Por que é então que eu salto isso em resumo como não devia de nesta conversa minha abreviã Veja o senhor o que é muito e mil estou errando Estivesse contando ao senhor por tudo somente o que Diadorim viveu presente mim o tempo em repetido igual trivial assim era que eu explicava ao senhor aquela verdadeira situação de minha vida Por que é então que deixo de lado Acho que o espírito da gente é cavalo que escolhe estrada quando ruma para tristeza e morte vai não vendo o que é bonito e bom Seja E aquele Garanço olhe o que eu dele disse de bondade e amizade não foi estrito Sei que naquela vez não senti Só senti e achei foi em recordação que descobri depois muitos anos Coitado do Garanço ele queria relatar me falava Fui almocreve no Serem Tive três filhos Mas que sorte de jagunço recluta era ele assim meninoso jalofo e bom Eta e você já matou seus muitos homens Garanço pois perguntei O riso dele ficava querendo ser mais grosso Eh eh nós Sou algum medroso E mecê encomenda o que no rifle que está em minha mão mano velho Eh não desprevino não lhe envergonho o desse O Garanço mesmo afirmo acho que nunca duvidou de coisa nenhuma Toda tardeza dele não deixava E só Comum de benquistar e malquistar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 258 O senhor entenderá Eu não entendo Aquele Hermógenes me fazia agradados demo que ele gostava de mim Sempre me saudando com estimação condizia um gracejo amistoso ou umas boas palavras nem parecia ser o bedegueba Por cortesia e por estatuto eu tinha de responder Mas em mal Me irava Eu criava nojo dele já disse ao senhor Aversão que revém de locas profundas Nem olhei nunca nos olhos dele Nojo pelos eternos razão de mais distâncias Aquele homem para mim não estava definitivo E arre que ele não desconfiava não percebia Queria conversa me chamava eu tinha de ir ele era o chefe Fiquei de ensombro Diadorim notou me deu conselho Modera esse gênio que você tem Riobaldo As pessoas não são tão ruins agrestes Dele não me temo eu respondi Eu podia xingar com os olhos Aí o Hermógenes me presenteou com um nagã e caixas de balas Estive para nem aceitar Eu já possuía revólver meu carecia algum daquele de tanto só cano tão enorme Por insistências dele mesmo com aquilo fiquei Cuspi depois Dado que eu nunca ia retribuir Queria eu lá viver perto de chefes Careço é de pousar longe das pessoas de mando mesmo de muita gente conhecida Sou peixe de grotão Quando gosto é sem razão descoberta quando desgosto também Ninguém com dádivas e gabos não me transforma Aquele Hermógenes era matador o de judiar de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 259 criaturas filhosdedeus felão de mau Meus ouvidos expulsavam para fora a fala dele Minha mão não tinha sido feita para encostar na dele Ah esse Hermógenes eu padecia que ele assistisse neste mundo Quando ele vinha conversar comigo no silêncio da minha raiva eu pedia até ao demônio para vir ficar de permeio entre nós dois para dele me apartar Eu podia rechear de balas aquele nagã próprio e descarregar nele tiros entre os todos olhos O senhor tolere e releve estas palavras minhas de fúria mas disto sei era assim que eu sentia sofria Eu era assim Hoje em dia nem sei se sou assim mais Do ódio sendo Acho que às vezes é até com ajuda do ódio que se tem a uma pessoa que o amor tido a outra aumenta mais forte Coração cresce de todo lado Coração vige feito riacho colominhando por entre serras e varjas matas e campinas Coração mistura amores Tudo cabe Conforme contei ao senhor quando Otacília comecei a conhecer nas serras dos ge rais Buritis Altos nascente de vereda Fazenda Santa Catarina Que quando só vislumbrei graça de carinha de riso e boca e os compridos cabelos num enquadro de janela por o mal aceso de uma lamparina Mas logo fomos para acomodar numa rebaixa de engenhodepilões lá pernoitamos Eu com Diadorim Alaripe João Vaqueiro e Jesualdo e o Fafafa No que repontávamos de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 260 dura viagem tudo o que era corpo era bom cansaço Mas eu dormi com dois anjosdaguarda O que lembro tenho Venho vindo de velhas alegrias A Fazenda Santa Catarina era perto do céu um céu azul no repintado com as nuvens que não se removem A gente estava em maio Quero bem a esses maios o sol bom o frio de saúde as flores no campo os finos ventos maiozinhos A frente da fazenda num tombado respeitava para o espigão para o céu Entre os currais e o céu tinha só um gramado limpo e uma restinga de cerrado de donde descem borboletas brancas que passam entre as réguas da cerca Ali a gente não vê o virar das horas E a fogoapagou sempre cantava sempre Para mim até hoje o canto da fogoapagou tem um cheiro de folhas de assa peixe Depois de tantas guerras eu achava um valor viável em tudo que era cordato e correntio na tiração de leite num papudo que ia carregando lata de lavagem para o chiqueiro nas galinhas dangola ciscando às carreiras no fedegosobravo com florezinhas amarelas e no vassoural comido baixo pelo gado e pelos porcos Figuro que naquela ocasião tive curta saudade do São Gregório com uma vontade vã de ser dono de meu chão meu por posse e continuados trabalhos trabalho de segurar a alma e endurecer as mãos Estas coisas eu pensava repassadas E João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 261 estava lá outra vez nos gerais O ar dos gerais o senhor sabe Tomamos farto leite Trouxeram café para nós em xicrinhas Ao que ficamos por ali àtoa depois de uma conversa com o velhozinho avô Otacília eu revi já foi na sobremanhã Ela apareceu Ela era risonha e descritiva de bonita mas hojeemdia o senhor bem entenderá nem ficava bem conveniente me dava pejo de muito dizer Minha Otacília fina de recanto em seu realce de mocidade mimo de alecrim a firme presença Fui eu que primeiro encaminhei a ela os olhos Molhei mão em mel regrei minha língua Aí falei dos pássaros que tratavam de seu voar antes do mormaço Aquela visão dos pássaros aquele assunto de Deus Dioadorim era quem tinha me ensinado Mas Diadorim agora estava afastado amuado longe num emperreio Principal que eu via eram as pombas No bebedouro pombas bando E as verdadeiras altas cruzando do mato Ah já passaram mais de vinte verdadeiras palavras de Otacília que contava Essa principiou a nossa conversa Salvo uns risos e silêncios a tão Toda moça é mansa é branca e delicada Otacília era a mais Mas na beira da alpendrada tinha um canteirozinho de jardim com escolha de poucas flores Das que sobressaíam era João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 262 uma flor branca que fosse caeté pensei e parecia um lírio alteada e muito perfumosa E essa flor é figurada o senhor sabe Morada em que tem moças plantam dela em porta da casade fazenda De propósito plantam para resposta e pergunta Eu nem sabia Indaguei o nome da flor Casacomigo Otacília baixinho me atendeu E no dizer tirou de mim os olhos mas o tiritozinho de sua voz eu guardei e recebi porque era de sentimento Ou não era Daquele curto lisim de dúvidas foi que minou meu maisquerer E o nome da flor era o dito tal se chamava mas para os namorados respondido somente Consoante outras as mulheres livres dadas respondem Dormecomigo Assim era que devia de haver de ter de me dizer aquela linda moça Nhorinhá filha de Ana Duzuza nos Gerais confins e que também gostou de mim e eu dela gostei Ah a flor do amor tem muitos nomes Nhorinhá prostituta pimentabranca boca cheirosa o bafo de menino pequeno Confusa é a vida da gente como esse rio meu Urucuia vai se levar no mar Porque no meio do momento me virei para onde lá estava Diadorim e eu urgido quase aflito Chamei Diadorim e era um chamado com remorso e ele veio se chegou Aí por alguma coisa dizer eu disse que estávamos falando daquela flor Não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 263 estávamos E Diadorim reparou e perguntou também que flor era essa qual sendo perguntou inocente Ela se chama é liroliro Otacília respondeu O que informou altaneira disse vi que ela não gostava de Diadorim Digo ao senhor que alegria que me deu Ela não gostava de Diadorim e ele tão bonito moço tão esmerado e prezável Aquilo para mim semelhava um milagre Não gostava Nos olhos dela o que vi foi asco antipatias quando em olhar eles dois não se encontraram E Diadorim Me fez medo Ele estava com meia raiva O que é dose de ódio que vai buscar outros ódios Diadorim era mais do ódio do que do amor Me lembro lembro dele nessa hora nesse dia tão remarcado Como foi que não tive um pressentimento O senhor mesmo o senhor pode imaginar de ver um corpo claro e virgem de moça morto à mão esfaqueado tinto todo de seu sangue e os lábios da boca descorados no branquiço os olhos dum terminado estilo meio abertos meio fechados E essa moça de quem o senhor gostou que era um destino e uma surda esperança em sua vida Ah Diadorim E tantos anos já se passaram Desde esse primeiro dia Diadorim guardou raiva de Otacília E mesmo eu podia ver que era açoite de ciúme O senhor espere o meu contado Não convém a gente levantar escândalo de começo só aos poucos é que o escuro é claro Que Diadorim tinha ciúme de mim com qualquer mulher eu já sabia fazia tempo até Quase desde o princípio E naqueles meses todos a gente vivendo em par a par por altos e baixos amarguras e perigos o roer daquilo ele não conseguia esconder bem que se esforçava Vai e vem me intimou a um trato que enquanto a gente estivesse em oficio de bando que nenhum de nós dois não botasse mão em nenhuma mulher Afiançado falou Promete que temos de cumprir isso Riobaldo feito jurado nos SantosEvangelhos Severgonhice e airado aveio servem só para tirar da gente o poder da coragem Você cruza e jura Jurei Se nem toda a vez cumpri ressalvo é as poesias do corpo malandragem Mas Diadorim dava como exemplo a regra de ferro de Joãozinho BemBem o sempre sem mulher mas valente em qualquer praça Prometi Por um prazo jejuei de nem não ver mulher nenhuma Mesmo Tive penitência O senhor sabe o que isso é Desdeixei duma roxa a que me suplicou os carinhos vantajosos E outra e tantas E uma rapariga das de luxo que passou de viagem e serviu aos companheiros quase todos e era perfumada proseava gentil sobre as sérias João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 265 imoralidades tinha beleza Não acreditei em juramento nem naquilo de seo Joãozinho BemBem mas Diadorim me vigiava De meus sacrifícios ele me pagava com seu respeito e com mais amizade Um dia no não poder ele soube ele quase viu eu tinha gozado hora de amores com uma mocinha formosa e dianteira morena cor de docedeburiti Diadorim soube o que soube me disse nada menos nada Um modo eu mesmo foi que uns dias calado passei na asperidão sem tristeza De déu em demos falseando sempre tive fogo bandoleiro Diadorim não me acu sava mas padecia Ao que me acostumei não me importava Que direito um amigo tinha de querer de mim um resguardo de tamanha qualidade Às vezes Diadorim me olhasse com um desdém fosse eu caso perdido de lei descorrigido em bandalho Me dava raiva Desabafei disse a ele coisas pesadas Não sou o nenhum não sou frio não Tenho minha força de homem Gritei disse mesmo ofendendo Ele saiu para longe de mim desconfio que com mais até ele chorasse E era para eu ter pena Homem não chora eu pensei para formas Então eu ia deixar para a boca dos outros aquela menina que se agradou de mim e que tinha cor de docedeburiti e os seios tão grandes Ah essa agora não estava a meu dispor tínhamos viajado muito para longe de onde ela morava Mas entramos num arraial maior João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 266 com progresso de bordel no hospedado daquilo usufruí muito sou senhor Diadorim firme triste apartado da gente naquele ar raial me lembro Saí alegre do bordel acinte Depois o Fafafa numa venda perguntou se não tinham chá de mate seco comercial e um homem tirou instantâneo nosso retrato Se chamava o lugar São João das Altas Mulher esperta cinturinhazinha que me fez bem O senhor releve e não reprove Demasias de dizer sobem com as lembranças da mocidade Não estou contando Pois minha vida em amizade com Diadorim correu por muito tempo desse jeito Foi melhorando foi Ele gostava destinado de mim E eu como é que posso explicar ao senhor o poder de amor que eu criei Minha vida o diga Se amor Era aquele latifúndio Eu ia com ele até o rio Jordão Diadorim tomou conta de mim E ainda falhamos dois dias na Fazenda Santa Catarina Naquele primeiro dia eu pude conversar outras vezes com Otacília que para mim hora em mais hora embelezava Minha alma que eu tive e minha idéia esbarrada Conheci que Otacília era moça direta e opiniosa sensata mas de muita ação Ela não tinha irmão nem irmã Sor Amadeu chefiava largo grandes gados em léguas de alqueires Otacília não estava noiva de ninguém E João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 267 ia gostar de mim De moçadefamília eu pouco entendesse A ser a Rosauarda Assim igual eu Otacília não queria querer salvante assente que da Rosauarda nunca me lembrei com desprezo não vê não cuspo no prato em que o bom já comi Sete voltas sete dei pensamentos eu pensava Revirei meu fraseado Quis falar em coração fiel e sentidas coisas Poetagem Mas era o que eu sincero queria como em fala de livros o senhor sabe de belver belfazer e belamar O que uma mocinha assim governa sem precisão de armas e golpes guardada macia e fina em sua casagrande sorrindo santinha no alto da alpendrada E ela queria saber tudo de mim mais ainda me perguntava Donde é mesmo que o senhor é donde Se sorria E eu não medi meus alforjes fui contando que era filho de Seô Selorico Mendes dono de três possosas fazendas assistindo na São Gregório E que não tinha em minhas costas crime nenhum nem estropelias mas que somente por cálculos de razoável política era que eu vinha conduzindo aqueles jagunços para Medeiro Vaz o bom foro e patente fiel de todos estes Gerais Aqueles Diadorim e os outros Eu era diferente deles João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 268 Fiquei esperando o que ela desse em resposta Nem nada não acreditava Mas Otacília mudou para séria a feição do rosto não queria mais de minha vida só assim meiamente indagar Os de todos lindos olhos dela estavam me assinalando o céu com essas nuvens Eu tinha renegado Diadorim travei o que tive vergonha Já era para entardecendo Vindo na vertente tinha o quintal e o mato com o garrulho de grandes maracanãs pousadas numa embaúba enorme e nas mangueiras que o sol dourejava Da banda do serro se pegava no céu azul com aquelas peças nuvens sem movimento Mas de parte do poente algum vento suspendia e levava rabosdegalo como que com eles fossem fazer um seu branco ninho muito longe ermo dos Gerais nas beiras matas escuras e águas todas do Urucuia e nesse céu sertanejo azulverde que mais daí a pouco principiava a tomar raias feito de ferro quente e sangues Digo porque até hoje tenho isso tudo do momento riscado em mim como a mente vigia atrás dos olhos Por que meu senhor Lhe ensino porque eu tinha negado renegado Diadorim e por isso mesmo logo depois era de Diadorim que eu mais gostava A espécie do que senti O sol entrado Daí sendo a noite aos pardos gatos Outra nossa noite na rebaixa do engenho deitados em couros e esteiras nem se tinha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 269 o espaço de lugar onde rede armar Diadorim perto de mim Eu não queria conversa as idéias que já estavam se acontecendo eram maiores Assim eu ouvindo o ciciri dos grilos Na beira da rebaixa a fogueira feita sarrava se acabando Alaripe ainda esteve lá mexendo em tição pitou um cigarro O Jesualdo Fafafa e João Vaqueiro não esbarravam de falar mais o Alaripe também repesavam as vantagens da Santa Catarina No que eu pensava Em Otacília Eu parava sempre naquela meiaincerteza sem saber se ela simse Ao que nós todos pensávamos as mesmas coisas o que cada um sonhava quem é que sabia Aquilo é poço que promete peixe o Jesualdo disse Dela devia de ser Amigo não toque no nome dessa moça amigo eu falei Ninguém deu resposta eles viam que era a sério fatal deviam de estar agora desqueixelados no escuro Por longe a mãodalua suspirou o grito Floriano foi foi foi que gemia nas almas Então era que em alguma parte a lua estava se saindo a mãedalua pousada num cupim fica mirando apaixonada abobada Deitado quase encostado em mim Diadorim formava um silêncio pesaroso Daí escutei um entredizer percebi que ele ansiava raiva De repente Riobaldo você está gostando dessa moça João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 270 Aí era Diadorim meio deitado meio levantado o assopro do rosto dele me procurando Deu para eu ver que ele estava branco de transtornado A voz dele vinha pelos dentes Não Diadorim Estou gostando não eu disse neguei que reneguei minha alma obedecia Você sabe do seu destino Riobaldo Não respondi Deu para eu ver o punhal na mão dele meio ocultado Não tive medo de morrer Só não queria que os outros percebessem a má loucura de tudo aquilo Tremi não Você sabe do seu destino Riobaldo ele reperguntou Aí estava ajoelhado na beira de mim Se nanja sei não O demônio sabe eu respondi Pergunta Me diga o senhor por que naquela extrema hora eu não disse o nome de Deus Ah não sei Não me lembrei do poder da cruz não fiz esconjuro Cumpri como se deu Como o diabo obedece vivo no momento Diadorim encolheu o braço com o punhal se defastou e deitou de corpo outra vez Os olhos dele dançar produziam de estar brilhando E ele devia de estar mordendo o correiame de couro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 271 Assisado me enrolei bem no cobertor mas não adormeci Eu tinha dó de Diadorim eu ia com meu pensamento para Otacília Me balanceei assim adiantado na noite em tanto gaio em tanto piongo com todas as novas dúvidas e idéias e esperanças no claro de uma espertina Com muito me levantei Saí Tomei a altura do seteestrelo Mas a lua subia estada abençoando redondo o friinho de maio Era da bordadocampo que a mãedalua sofria seu cujo de canto do vulto de árvores da mata cercã Quando a lua subisse mais as estrelas se sumiam para dentro e até as seriemas podiam se atontar de gritar Ao que fiquei bom tempo encostado no cajueiro da beira do curral Só olhava para a frente da casadafazenda imaginando Otacília deitada rezada feito uma gatazinha branca no cavo dos lençóis lavados e soltos ela devia de sonhar assim E de repente pres senti que alguém tinha vindo por detrás de mim me vigiava Diadorim fosse Não virei a cara para ver Não tive receio Nunca posso ter medo das pessoas de quem eu gosto Digo Esperei mais outro tempo Daí vim voltando Mas lá não estava pessoa nenhuma entre claridade e sombras Ilusão minha a fantasiação Bebi água do rego com o frio da noite ela corria morna Tornei a entrar na rebaixa Diadorim permanecia lá jogado de dormir De perto senti a respiração dele remissa e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 272 delicada Eu aí gostava dele Não fosse um como eu disse a Deus que esse ente eu abraçava e beijava E com o vago devo de ter adormecido porque acordei quando Diadorim no mexe leve se levantou saiu sem rumor levando a capanga ia tomar seu banho em poço de córrego das barras no clarear Desde o que depressa eu tornei a me dormir Mas cedo no amanhecer o sor Amadeu tinha chegado e com notícia urgente que o grosso do bando de Medeiro Vaz recruzava de lá a quinze léguas da VeredaFunda para a Ratragagem e nós tínhamos de seguir sem folga supraditamente No que Nhô Vô Anselmo me deu um dito afeiçoado e diferente entendi que o velhozinho sabia de alguma coisa e que não desgostava que eu viesse a ficar neto dele Nós almoçamos e montamos Diadorim Alaripe Jesualdo e João Vaqueiro se retiraram em adiantando e o Fafafa Mas eu cacei melhor coragem e pedi meu destino a Otacília E ela por alegria minha disse que havia de gostar era só de mim e que o tempo que carecesse me esperava até que para o trato de nosso casa mento eu pudesse vir com jus Saí de lá aos grandes cantos tempodoverde no coração Por breve pensei era que eu me despedia daquela abençoada fazenda Santa Catarina excelentes produções Não que eu acendesse em mim ambição de teres e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 273 haveres queria era só mesma Otacília minha vontade de amor Mas com um significado de paz de amizade de todos de sossegadas boas regras eu pensava nas rezas nas roupagens na festa na mesa grande com comedorias e doces e no meio do solene o sor Amadeu pai dela que apartasse destinado para nós dois um buritizal em dote conforme o uso dos antigos Vim Diadorim nada não me disse A poeira das estradas pegava pesada de orvalho O birro e o jesusmeudeus cantavam O melosal maduro alto com toda sua roxidão roxura Mas o mais e do que sei eram mesmo meus fortes pensamentos Sentimento preso Otacília Por que eu não podia ficar lá desde vez Por que era que eu precisava de ir por adiante com Diadorim e os companheiros atrás de sorte e morte nestes Gerais meus Destino preso Diadorim e eu viemos vim de rota abatida Mas desse dia desde sempre uma parte de mim ficou lá com Otacília Destino Pensava nela Às vezes menos às vezes mais consoante é da vida Às vezes me esquecia às vezes me lembrava Foram esses meses foram anos Mas Diadorim por onde queria me levava Tenho que quando eu pensava em Otacília Diadorim adivinhava sabia sofria João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 274 Essas coisas todas se passaram tempos depois Talhei de avanço em minha história O senhor tolere minhas más devassas no contar É ignorância Eu não converso com ninguém de fora quase Não sei contar direito Aprendi um pouco foi com o compadre meu Quelemém mas ele quer saber tudo diverso quer não é o caso inteirado em si mas a sobrecoisa a outracoisa Agora neste dia nosso com o senhor mesmo me escutando com devoção assim é que aos poucos vou indo aprendendo a contar corrigido E para o dito volto Como eu estava com o senhor no meio dos Hermógenes Destaque feito Zé Bebelo vinha vindo Vinham por nós E tivemos notícia a légua dali eles estavam chegando no meio do dia patrulhão de cavaleiros Légua não era verdade mas obra de seis léguas o sim E eram só uns sessenta por aí Todo o tempo eu vinha sabendo que nosso fim era esse mas mesmo assim foi feito surpresa Eu não podia imaginar que ia entrar em fogo contra os bebelos De certo modo eu prezava Zé Bebelo como amigo Respeitava a finura dele Zé Bebelo sempre entendidamente E uma coisa me esmoreceu a torto Medo não mas perdi a vontade de ter coragem Mudamos de acampo para perto para perto É agora É hoje O Hermógenes reunia o pessoal todos A gente carecia de levar o préstimo maior de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 275 munição que se pudesse Aonde Diadorim por um gesto me cortou de fazer mais perguntas Às armas Diadorim ia para aquilo prezável de passeata Ah uma coisa não referi ao senhor Que era que aquele tempo no arranchamento do Hermógenes minha amizade com Diadorim estava sendo feito água que corre em pedra sem pepa de barro nem pó de turvação Da voz de homens e do tinir de armas em má véspera não se podia deixar de receber um lufo de dureza de mais próprio respeito e muita coisinha se empequenava Zé Bebelo é arisco de aviso Diadorim Ele joga seguro por aí perto em esconso deve de ter outra tropa de guerra prontos para virem dar retaguarda Eu sei bem essa a norma dele Carece de prevenir o Hermógenes João Goanhá Titão Passos eu não retive e disse Eles sabem Riobaldo Toda guerra é essa Diadorim me respondeu E eu estava sabendo que eu já dizer aquilp era traição Era Hoje eu sei que não que eu tinha de zelar por vida e pela dos companheiros Mas era traição isto também sim era porque eu pensava que era Agora depois mais do tudo que houve não foi Agarrei minha mochila comi fria a minha jacuba Tudo estava sendo determinado decidido até o que a gente tinha de fazer depois Aí João Goanhá apartava o pessoal em punhados João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 276 de quinze ou vinte cada um desses acabado o fogo devia de se reunir em lugar certo comum Daquela hora em diante íamos ter de brigar em pequenas quantidades Pelas caras dos homens eu via que estavam satisfeitos parecia muito e pouco Com regozijo um golinho se bebeu Toma este breve Riobaldo Foi minha mãedecriação quem costurou para mim Mas eu carrego dois Era o Feijó um sacudido oitavão ele manobrava rifle de três canos Que simpatia demonstrada era essa eu nunca tinha dado fé daquele Feijó A vamos Hoje se faz o que não se faz um se exaltava assim tive medo de castigo de Deus Quem quisesse rezar podia tinha praça outros contritos acompanhavam Outros ainda comiam zampando limpavam a boca com as duas mãos Não é medo não amigos é o trivial do corpo explicavam alguns que ainda careciam de ir por suas necessidades Restantes risadas davam Ao que faltava nem meiahora para o sol ir entrando Daquele lugar vazio de moradas e de terras lavradias a gente ouvia o gugo da juriti como um chamado acabado junto com lobo guará já dando gritos de penitência Presta uma demão aqui Ajudei Era um mon tesclarense acho que o cujo nome esqueci que queria passar tiras de pano por sola das alpercatas e peito dos pés reforçando Terminou e fez os passos de dança maneiro nas juntas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 277 assobiava Aquele rapaz pensava alguma coisa Riobaldo Diadorim me disse arruma jeito de mudar de lugar na hora sempre que puder E põe cautela homem rasteja por entre as moitas e vem pular nas costas da gente relampeando faca Diadorim sorria sério Um outro me esbarrou quando passava Era o Delfim violeiro Onde era que a viola ele ia poder guardar Eu apertei a mão de Diadorim e queria sair andar gastar Conto que chegou o Hermógenes A voz do Hermógenes dando ordens de guerra já disse ao senhor ficava clara e correta um podia dizer que até ficava Ao menos ele sabia aonde ia levar a gente e o que queria Deu resumo do traço Que todos cumprissem que todos soubessem A partida dos zebebelos estava com posição no Alto dos Angicos tabuleirinho de chã Podiam ter espalhado sentinelas muito longe até na beira do córrego Dinho ou para lá em volta nas contravertentes Mas disso logo se ia saber porqual os espias nossos rondavam O que se tinha era de chegar já como o escuro e engatinhar às ladeiras no durado da noite na arte vagarosa Só íamos abrir fogo de surpresa no clarearzinho da madrugada Cada um de seu Ponto melhor Tudo tinha de valer Pm cnnsagato e finice até se carecia de respirar só por metade Se algum topasse com inimigos por másorte antes ele que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 278 escorresse como pudesse ou dependesse na faca atirar com arma é que não podendo Sendo que podendo mas só depois do Hermógenes que era quem era o dono o primeiro tiro ele dava Como cada qual tinha de atirar com sanguefrio de matar exato Porque nosso prazo seria acabar com todos com brevidade mais antes que outros deles pudessem vir para um reforço Mesmo assim Titão Passos ia com uns trinta companheiros reguardar o caminho de vinda à emboscada num tombador de pedra Já vai que o Hermógenes explicava devagar e tudo repetia com paciência o dever absoluto era que até o mais tonto aprendesse e estava definido o rumo de tarefa por onde cada um devia de se pôr no chão e começar a engatinhar virada arriba Mas eu catei o sentido de tudo já na primeira razão e de cada vez que ele repetia eu reproduzia em minha idéia os acontecimentos se passando eu já estava lá e rastejava me aprontava Peguei a sentir Me fiz fácil nas armas Por jeito Com o que se deu que eu não contava O Hermógenes me chamou Aí as cintas e cartucheiras mochilão rede passada e um cobertor por tudo cobrir ele estava parecendo até um homem gordo Riobaldo Tatarana tu vem Lugar nosso vai ser o mais perigoso Careço de três homens bons no próximo de meu cochicho Para que vou mentir ao João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 279 senhor Com ele me apartar assim me conferindo valia um certo aprazimento me deu Natureza da gente bebe de águas pretas agarra gosma Quem sabe Eu gostei Mesmo com aversão que digo que foi que forte era como um escrúpulo A gente o que vida é é para se envergonhar Mas aí eu fiquei inteiriço Com a dureza de querer que espremi de minha sustância vexada fui sendo outro eu mesmo senti eu Riobaldo jagunço homem de matar e morrer com a minha valentia Riobaldo homem eu sem pai sem mãe sem apego nenhum sem pertencências Pesei o pé no chão acheguei meus dentes Eu estava fechado fechado na idéia fechado no couro A pessoa daquele monstro Hermógenes não encostava amizade em mim E nem ele naquela hora não era Era um nome sem índole nem gana só uma obrigação de chefia E por cima de mim e dele estava Joca Ramiro Pensei em Joca Ramiro Eu era feito um soldado obedecia a uma regra alta não obedecia àquele Hermógenes Dentro de mim falei Eu Riobaldo eu Joca Ramiro é que era a obrigação de chefia Mas Joca Ramiro parava por longe era feito uma lei uma lei determinada Pensei nele só forte Pensando Joca Ramiro Joca Ramiro Joca Ramiro A arga que em mim roncou era um despropósito uma pancada de mar Nem precisava mais de ter ódio nem receio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 280 nenhum E fui desertando da cobiça de mimar o revólver e desfechar em fígados Refiro ao senhor mas tudo isso no bater de ser Só Dessas boas fúrias da vida Aí ele tinha que eu escolhesse os para vir juntos Eu Ele estava me experimentando E não tardei O Garanço eu disse e este aqui completei para aquele montesclarense apontando Bem que eu queria também o Feijó mas deviam de ser só dois a conta já estava E Diadorim o senhor perguntará Ah por Diadorim era que eu não dizia o pensamento nele me repassava O tempozinho todo naquele soflagrante E estúrdio eu principalmente não queria Diadorim perto de mim para as horas Por quê Por que é o que eu mesmo não sabia Seria que me desvalesse a presença dele comigo pelos perigos que eu visse virem a ele no meio do combate ou seria que a lembrança de ter Diadorim junto naqui lo me desgostasse por me enfraquecer agora eu assim duro ferro diante do Hermógenes leão coração Se sei sei Porque era como eu estava E assim respondi que então o Garanço e o Montesclarense iam com a gente Como saímos viemos vindo desfeitos aos dois aos três aos sozinhos Já a já era noite Noite da Jaíba dá de uma asada João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 281 uma pancada só Háde que se acostumar com o escuro nos olhos Conto tudo ao senhor O caminhar da gente se media em silencioso nem o das alpercatas não se ouvia De tantos matos baixos carrascal o chio dos bichinhos era um milhão só Por lá a coruja grande avoa que sabe bem aonde vai sabe sem barulho A quando o vulto dela assombrava em frente da gente no ar eu fechava os olhos três vezes O Hermógenes rompia adiante não dizia palavra Nem o Garanço também nem o Montesclarense Isso em meu sentir eu a eles agradecia Quem vai morrer e matar pode ter conversa Só esses pássaros de pena mole gerados da noite tantos bacuraus insensatos o sebastião que chamava a fêmea com grandes risadas pedindo tabacobom Digo ao senhor o que eu ia pensando em nada Só esforçava tenção numa coisa que era que devia de guardar tenência simples e constância miúda esperando a novidade de cada momento Minha pessoa tomava para mim um valor enorme Aquele pássaro medeléguas erguia vôo de pousado no meio da estrada toda vez ia se abaixar dez braças mais adiante do jeito mesmo conforme de comum esses fazem Bobice dele não via que o perigo torna a vir sempre Digo tudo disse mataremorrer Toleima Nisso mesmo era que eu não pensava Descarecia Era assim eu ia indo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 282 cumprindo ordens tinha de chegar num lugar aperrar as armas acontecia o seguinte o que viesse vinha tudo não é sina Nanja não queria me alembrar de nenhum nenhuma Com meialégua andada por um trilho É preciso não roçar forte nas ramagens não partir galhos Caminhar de noite no breu se jura sabença o que preza o chão o pé que adivinha A gente imagina uns bu racões disformes A gente espera vozes Eh Pouquinhas estrelas dando céu a noite barrava bruta Digo ao senhor a noite é da morte Nada pega significado em certas horas Saiba o que eu mais pensei No seguinte como é que curiango canta Que o curiango canta é Curíangú A obra de umas cem braças do riacho o Hermógenes esbarrou Con chegamos E com as mãos apalpávamos uns os outros Dali em diante era junto a junto O Hermógenes puxando enxergava por nós Que olhos que esse descascavam de dentro do escuro qualquer coisa olhar assim que nem o de suindara Cada um com punhal a ponto atravessamos o córrego pulando pelas alpondras mais para baixo sabíamos de uma estiva mas lá se temia que tivessem botado sentinelas Ali era o lugar pior um estremecimento me desceu senti o espaço da minha nuca Do escurão tudo é mesmo possível No outro lado o Hermógenes sussurrou ordens Deitamos Eu estava atrás João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 283 duma árvore uma almêcega Mais atrás de mim o riacho passante por suas pedras Naquela espera carecíamos de persistir horas dando tempo Assim a água perto os mosquitos vêm eles acordam com o cheiro da cara da gente não concedem sossego Acender cigarro e pitar não se podia A noite é uma grande demora Ah o que os mosquitos infernizavam Por isso mesmo direi era que Hermógenes tinha escolhido ali que ninguém pegasse no sono que a mosquitada não deixava Mas não seria de mim que pudesse ferrar no sono assim perto daquele homem príncipe das tantas maldades O que eu queria era que tudo sucedesse mal ou bem aquela noite tivesse termo de terminada Tá aqui toma ouvi Era o Hermógenes um taco de fumo me dando que em forte cachaça ele tinha acabado de empapar Era para se esfregar na cara e nas mãos Aceitei Fosse coisa de comer não aceitava Nada não disse não agradeci Aquilo era do serviço de armas fazia parte E esfreguei bem Ao que os mosquitos deixaram de me ferroar Desde fiquei pois então me divertindo de beliscar a casca da almêcega aquela resina de icií Daí os pensamentos que tive foram os que nem merecem e eu não sou capaz de dar narração retrato de pessoas diversas ressalte de conversas tolas coisas em vago das viagens que eu tinha feito A noite durava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 284 Haja de contar o que foi o todo de se escorregar para cima a encosta até ao ponto donde a espera de tocaia devia de ser Aquilo o igual sempre sendo Um homem se arraiga em terra no capim no chão e vai vai sendo serepente de gato emcaça Carece de repartir frouxo o peso do corpo semelhante fosse nadando cotovelo e joelho é que transpõem Tudo um ai de vagar que chega aporreia tem que ser Não vale arranco de pressa o senhor tem de ficar o comprido que pode por mais de As juntas da gente estalam o senhor mesmo escuta Se coça a canela com o calcanhar estando com polaina não adianta De cada vez o senhor vira o corpo num lado e olha escuta Qualquer barulho sem tento que se faz verte perigo Pássaro pousado em moita que se assusta forte a vôo dá aviso ao inimigo Pior são os que têm ninho feito às vezes esvoaçam aos gritos no mesmo lugar dão muito aviso Aí quando é tempo de vagalume esses são mil demais sobre toda a parte a gente mal chega eles vão se esparramando de acender na grama em redor é uma esteira de luz de fogo verde que tudo alastra é o pior aviso O que nós estávamos fazendo era uma razão de loucura muita coisa que só mesmo em guerra é que se quer O punhal travessado na boca sabe sem querer a gente rosna Às guardas qualquer mato ameaçava que ia bulir com o inimigo vindo dele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 285 Árvores branquiçadas traiçoeiramente A gente amassa com a barriga espinhos e gravetos é preciso de saber quando é que é melhor se calcar no estrepe firme com gosto que é o que mais defende dele não se cravar O inimigo pode estar engatinhando também versa por detrás nunca se tem certeza O cheiro de terra agoura mal Capim de beira em fio que corta a cara E uns gafanhotos pulam têm um estourinho tlique eu figurava que era das estrelas remexidas titique delas caindo por minhas costas Trabalhos de unha O capim escorria do sereno da noite lagrimado Ah e cobra Pensar que num corisco de momento se pode premer mão numa rodilha grossa de cascavel numa certa morte dessas Pior é a surucucu que passeia longe noturnazã monstro essa é o que há com mais doida ligeireza neste mundo Rezei a jaculatória de São Bento A água do sereno me molhava da macega das folhas é o que digo ao senhor me desgostava Raio de um repente afastaram a erva alta minha cabeça eu encolhi Era um tatu que ia entrando no buraco fungou e escutei o esfrego de suas muxibas Tatupeba e eu no rés dele Que modo quê Rastejando de minha banda da direita o Hermógenes rompia eu sentia o bafo duma boca e aquele avultar deitado de bicho duro braço por braço O Garanço e o Montesclarense espigavam vez mais adiante vez mais atrás Quando de sem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 286 menos o Hermógenes me esbarrou Ele falou um murmo me cochichou de mão em concha É aqui mesmo ele redisse Onde era que estavam as estrelas dianteiras e os macios pássaros da noite pensei Eu tinha fechado os olhos O cheiro dum araçábranco formava bolas Quietei Até que o dia deu que é que foi do meu tempo que horas que se passaram Aí eu podia medir pelas estrelas que vão em movimento descendo no rumo de seu poente elas viravam Mas digo ao senhor eu não olhei para o céu Não queria Não podia Assim espichado no escabro um sofre o festo da noite o chão esfriava Pensei será se eu fosse adoecer um longe de dorde dente já me indispondo Aquilo que cochilei dormir eu em firme rejeitava O Hermógenes um homem existente encostado no senhor calado curto o pensamento dele assanha feito um berreiro Aquelas mortes que eram para daí a pouco já estavam na cabeça do Hermógenes Eu não tinha nada com aquilo próprio eu não estava só obedecendo Pois não era Ao que o meu primeiro fogo tocaieiro Danado desuso disso é o antes tanto antes ror O senhor acha que é natural Osgas que a gente tem de enxotar da idéia eu parava ali para matar os outros e não era pecado Não era não era eu resumi Osgas Cochilei tenho Por descuido de querer Dormi mesmo Eu não era o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 287 chefe loca Ramiro queria aquilo E o Hermógenes mandante perto em sua capatazia Dito por uns no céu coisa como uma careta preta É erro Não nada oi Nada Eu ia matar gente humana Dali a pouco o madrugar clareava eu tinha de ver o dia vindo Como era o Hermógenes Como vou dizer ao senhor Bem em bró de fantasia ele grosso misturado dum cavalo e duma jibóia Ou um cachorro grande Eu tinha de obedecer a ele fazer o que mandasse Mandava matar Meu querer não correspondia ali por conta nenhuma Eu nem conhecia aqueles inimigos tinha raiva nenhuma deles Pessoal de Zé Bebelo povo reunido na beira do Jequitaí por ganhar seu dinheirinho fiel feito tropa de soldo Quantos não iam morrer por minha mão Andante que perpassou um vento entre ele o crico de grilos e tantos bichinhos divagados Assaz a noite com sombras vermelhas O exemplar da morte dessa é que é num átimo tão ligeira tão direitinha As coisas que eu nem queria pensar mas pensava mais elas vinham Vezo de falar do Geraldo Pedro que disse Aquele Hoje ele não existe mais virou sombração Matei E o Catocho contando doutro Lá tem uns órfãos meus lá Tive de matar o pai deles Por que era que falavam essas perversidades Por que é que falavam Por que era que eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 288 tinha de obedecer ao Hermógenes Ainda estava em tempo se eu quisesse sacanhava meu revólver gastava nele um breve tiro bem certo e corria ladeira abaixo às voltas caçava de meu sumir nesse vaitemundo Ah nada então aí mesmo era que o fogo feio começava por todas as partes de todo jeito morresse muita gente primeiro de todos morria eu Mesmo estava sem remédio O Hermógenes mandava em mim Que que quer ele era mais forte Pensei em Diadorim O que eu tinha de querer era que nós dois saissemos sobrados com vida desses todos combates acabasse a guerra nós dois largávamos a jagunçada íamos embora para os altos Gerais tão ditos viver em grande persistência Agora aqueles outros os contrários não estavam também com poder de me matar À asneira E eu ia numa madrugadinha a cavalo por uma estrada de areia branca no BuritidoÁ beira de vereda emparelhado com um capiauzinho bondoso companheiro qualquer a gente ria conversava de tantas miúdas coisas sem maldade se pitava eu ia levando meio saco de milho na garupa ia para um moinho para uma fazenda para berganhar o milho por fubá sonhos que pensava À fé aqueles zebebelos também não tinham varado o Norte para des truir gente E pois O que tivesse de ser somente sendo Não era nem o Hermógenes era um estado de lei nem dele não era João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 289 eu cumpria todos cumpriam Vou para os Gerais Vou para os Gerais eu dizia me dizia Numa minha perna então torci o de dar cãibra Depois tirei a dureza dos dedos A ver Diadorim a gente ia indo nós dois a cavalo o campo cheirava dez metros de chão de flor Por que que eu ia ter pena dos outros Algum tinha pena de mim Cabeça de homem é fraca repensava O que se carecia justo de fazer era acabar logo com a guerra acabar com aqueles zebebelos Pensar em Diadorim era o que me dava cordura de paz Ah digo ao senhor dessa noite não me esqueço Posso Aos poucos fui ficando soporado nem bom nem ruim Matar matar que que me importava Dessa noite esquecer não posso Garoou para a aurora Como clareia é aos golpes no céu a escuridão puxada aos movimentos A gente estava de costas para as barras do dia Me lembro do que me lembro o Hermógenes cruzou adiante chato no chão relando barriga em macio Aquele homem era danado de tigre estava cochichando na cabeça do Garanço depois com o Montesclarense mostrava a eles os lugares em que deviamde Arre voltou para perto de mim agora veio da outra banda Disse Tento Riobaldo Eu vi quando o Garanço rojou indo indo pegou postura na proteção dum cupim grande obra de cinco metros para a minha frente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 290 pouquinho para esta banda da esquerda No não longe rumo a rumo divulguei o Montesclarense Eu ainda mudei distância de uns passos aproveitei tapação duma árvore de boa grossura um araçádepomba fechado De sovigia o Hermógenes não me largava Doesse na gente mesmo aquele principiozinho de madrugada Apertava a necessidade Por que não se avançava de uma vez para tudo vir às brabas Ah não se podia Só logo no primeiro entremear com os bebelos nós quatro havíamos de restar mortos cosidos nas parnaíbas E dos companheiros outros não se sabia Sendo somente que o acampamento dos bebelos devia de estar a uma hora dessas cercado exato em boa distância à roda toda Tudo era paciência Vinha um ventozinho folheando Tantos homens amoitados que só espiavam na obrigação refleti Até achei bonito agora Aí passarinhos que já vão voando com o menorzinho ralo de luz eles se contentam para seu só isso de caçar o de comer Triste triste um tiriri cantou Alegre para mim a peitica Olhei adiante curto lá era que eles estavam por entre umas árvores pequenas dava réstia de claridade e um formato de homem contravisto Ele ia acender fogo E apareceram vultos de outros levantantes Com pouco alguns podiam vir descendo buscar mais água no corguinho se carecessem Asneiras que pensei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 291 será que eles gastaram muita água Será que um esmorece por medo ter Eu não campeava a morte Seguro nasci sou feito Do Hermógenes ali junto estar naquela hora digo ao senhor gostei Riobaldo Tatarana É o é ele me governou de repente Aceitei Desamarrei mão de vez pronta eu já tinha resumido pontaria eu tive consolo duma coisa que era que aquele homem alto não podia ser Zé Bebelo Não tremi e escutei meu tiro e o do Hermógenes e o homem alto caiu certo morto rolou na má poeira Me deu uma raiva dele deles todos E em toda a parte a sobre o tiroteio tinha começado Estrondou Falavam os rifles e outros manlixa granadeira e comblém Festa de guerra Mais digo ao senhor Atirei minhas vezes Aí tomei ar O senhor já viu guerra A mesmo sem pensar a gente esbarra e espera espera o que vão responder A gente quer porções Demais é que se está muito no meio de nada A morte A coisa que o que era xô e bala Que qual agora não se podia mais ter outros lados Agora era só gritar ódio caso quisesse e o ar se estragou trançado de assovios de ferro metal O senhor ali não tem mãe não vê que a vida é só brabeza Revém ramo cortado de árvore aí e o comum que cavacam poeiras e terras Digo ao João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 292 senhor dou conversa Aquilo era Artes que carreguei o rifle escorei repetente Aquele povo inimigo nosso esperdiçava muita munição atiravam com nervosia Não queriam morrer por nossa mão não queriam Ri me ri e o Hermógenes me chamou com assombro Em isso ele me crendo endoidado Mas eu estava era de repente pensando em meu padrinho Selorico Mendes Agora tu mesmo vai lá vai Tu não quer foi o que arranjei vontade de gritar com o Hermógenes Cão que ele Ri mais Homem sozinho com sua carabina em mãos o Hermógenes era um como eu igual igual até pior atirava E aqueles bebelos tinham feito madrugada para levar fogo Fiquei meu Se todos passam mão em arma e fecham volta de tiroteio uns contra os outros então o mundo se acaba acho que pensei Eram só tolicezinhas que por minha mente marinhavam Os tiros peguei a querer contar Aquilo como durou demorava um oco O dia tinha clareado saído eu todo podendo descrever o Montesclarense atrás dum toro de pau e moitas de anduzinho Para que conto isto ao senhor Vou longe Se o senhor já viu disso sabe se não sabe como vai saber São coisas que não cabem em fazer idéia João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 293 Combate quanto combate grande Ser menos que a gente não rastejava alterando de lugar que não era o caso Quase que só quando se pega no defendimento é que isso é de se fazer para pensarem que se vai em número maior que a verdade Como não mais valia garantir o bom do posto sem desguar Tiro de lá chama tiro de cá e vira em vira Disparo que eu dava era catando mover alheio cujo descuido como malandro malandreia Nem cento ecinqüenta braças era o eito jaculação minha Aquilo servia até para carga de bocamorte E mais de um eu etcétera aí pelo que sei pelo que vejo Mas só aqueles que para morrer estavam com dia marcado Minto O senhor releve idéias Era assim Deu vez de os muitos tiros se assanhavam de prão em riba dum trecho só Queriam costurar Aí e as horas não acabavam O sol encostava na nuca da gente Sol solão debaixo eu suava transpirava dos cabelos e pelo dentro das roupas de sentir as cócegas grossas no meio do lombo e essas dormências numas partes do corpo Então eu atirava Não se ia avançar Não nem Os outros picavam forte o fogo deles não desmerecia Cachorrada Xingar mesmo ia servir só para mostrar mais alvo Ao que eu descansava meus olhos nas costas do Garanço ali quase em minha frente O Garanço tinha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 294 arrumado no chão o bissaco e o cobertor estava sem jaleco só com a camisa de xadrezim Eu vi o suor minar em mancha na camisa no meio das costas dele Garanço aquela nódoa escura ia crescendo arredondada alargada O Garanço disparava sacudia o corpo ele era amigo meu com minúcia de valentia Rapaz de como se querer homem de leal qualidade Então eu atirava também Bala e chumbo eu peguei a dizer Bala e chumbo Bala e chumbo O lugar do coração me apertando eu era carne muita e calor bravo O que foi Que é o Hermógenes me perguntou Nada não respondi Bala e chumbo Chumbo e bala Estrumes Pelo que foi de repente bem apartado da banda esquerda de nós uns homens dos nossos deram figura se pulando para diante aos gritos investiram contra o contra Ao que eram dois Três Diá o Hermógenes rosnou Deu a fúria nesses bute Raspa que eles por lá entraram iam de coronhada e faca Não se atirou suspendemos fôlego E vai o Hermógenes me segurou tente que o Montesclarense coitado também tinha crescido para avante no igual e de lá nele balearam Caiu catando cacos Pobre Deu doidice Antes aí os outros nossos que se danando no vespeiro dos bebelos roncavam em poeira deles decerto se acabavam João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 295 estraçalhados que nem coelho com a cainça Tomara tivessem aprontado seus alguns Assim aquilo sossegou povo nosso demos raiva de fogo aí é que foi atirar O Hermógenes me resignou os ímpetos Tatarana te trava não dá de esquentar arma gasta munição não Só os tiros bons poucos Só cobrar o dizmo Aquele homem fazia frio feito caramujo de sombra A ver que tive sede mas minha cabaça não dava gota mais Guardei meu cuspe Aquilo não ia ter pique de ponto guerra que não se sabe terminar Assunto que apostaram os mil tiros para cima de nossa redondez de lugar esses assoviaços Triplavam No ferrenho tive um tempo de coisa espécie de mais medo o que um não confessa vara verde ver Mas morresse eu descansava Descansava de todo desânimo Andando que aquele ataque nosso não servia para resultado nenhum e eu carecia de avistar os outros saber de qualquer contagem de balanço de quantos tinham morrido ou estavam mal Eu queria saber dos deles e dos nossos Combate sem cabimento Só o tiroteio repetido reproduzido Meio peguei um pensamento se o Hermógenes sungasse raiva se o Ele desse nele por um vir Que mandasse avançasse a fino de faca nós todos tínhamos de avançar Então eu estava ali era feito um escravo de morte sem querer meu no João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 296 puto de homem no danadório E eu não podia virar só o corpo um pouco abocar minha arma nele Hermógenes desfechar Podia não logo senti Tem um ponto de marca que dele não se pode mais voltar para trás Tudo tinha me torcido para um rumo só minha coragem regulada somente para diante somente para diante e o Hermógenes estava deitado ali em mim encostado era feito fosse eu mesmo Ah e toda hora ele estavas sempre estava Que me disse Tatarana toma come e agradece ao corpo um poucado Háde que estava me oferecendo a capanga paçoca de carnes Tanto que os tiros tinham esbarrado quase em completo em partes Eu tendo comida minha de matula no bornal Aí e munição minha de balas no surrão Eu carecia lá do Hermógenes Mas por que foi então que aceitei que mastiguei daquela carne nem fome acho que não tinha direito engoli daquela farinha E pedi água Mano velho bebe que esta é competente ele riu O que estava me dando na cabacinha era água com cachaça Bebi Limpei os beiços Escorei o cano do rifle num duro de moita Eu olhava aquele bom suor nas costas do Garanço Ele atirava Eu atirava A vida era assim mesmo coração quejando Até me caceteou uma lombeira João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 297 E daí deuse Da banda de longe lá pelo tombador de pedra onde nossa gente com Titão Passos estavam escondidos para a esparrela foi um tirotear forte fogo por salvas Ah então era outra partida de zébebelos que deviam de estar chegando drongo deles cavaleiros O Hermógenes esticou o pescoço rijo ouvindo Soante que atiravam sucedidos o tiroteio foi mudando de feição Tou gostando não o que o Hermógenes disse Mais disse O diabo deu em erro Homem atilado cachorral Seja que sabidos vieram eh pressentiram Sei se por ora o trabalho está desandado Aí eu estava escutando Eu olhei Olhava para as costas do Garanço ela a mancha estava ficando de outra cor O suor vermelho Era sangue Sangue que empapava as costas do Garanço e eu entendi demais aquilo O Garanço parado quieto sempre empinado com a frente do corpo semelhando que o cupim ele tivesse abraçado A morte é corisco que sempre já veio Ânsias ao em que bola me vinha goela arriba do arrocho grosso imposto que às vezes em lágrimas nos olhos se transforma A bobagem Tu Tatarana Riobaldo agora é a má hora era o Hermógenes prevenindo Demo eu repontei Mas ele não entendeu minha soltura Soprou A muita cautela Temos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 298 que se foge em boa ordem os que estão chegando vêm rodear a gente vão dar retaguarda E era Como que esse maldito tudo sabia adivinhava o seguinte vivo das coisas esse Hermógenes trapaças Mas ainda me prezei quem é que me segurava de ir rastejei de esquinado os metros em afogo carecia de ver se o Garanço podia ter ajuda A pa trás mano Te cuida ouvi o rispe do Hermógenes que eu não me desgraçasse Mas não se deixa um cristão amigo deitar seu sangue no capim das moitas feito um traste roto caititu caçado Peguei com meus braços não adiantava era corpo Ele estava defunto de não fechar boca aí defunto airado Todo vejo o sangue dele a mofos cheirasse Anda que vinham vôo os mosquitos chupadores e moscaverde que se ousou sem o zumbo frisso perto no ar Porque os tiros E nem um momento de vela acesa o Garanço não ia poder ter Vem tu vem que estamos no amém estreitos que enfezado o Hermógenes chamou Dei para trás O perigo saca toda tristeza E a vez era esta que o Hermógenes encheu os peitos e soltou um rinchado zurro dos de jumento velho em beira de campo Três tantos Ele estava dando a retirada Por outros lados mais longe outros o mesmo oncoerincho copiavam Arre fogo agora forte fogo o Hermógenes me mandou Atirei Atiramos teúdo Ao que os João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 299 companheiros todos atiravam Assaz à retirada se estava rinchando mas os inimigos não sabiam carecia que eles pensassem que a gente ia dar um ataque final Acharam E sei A bala com bala ripostavam Mas nós nesse entrequanto rompemos o arvoredo aqui e ali rojamos para baixo embora mesmo Desunir assim verga pior do que avançar A lanço a lanço fui pulei nos abertos entre árvores acompanhei o Hermógenes Aí eu já estava para lá dele mas virei e esperei Porque na desordem de mente do alvoroço aquela hora era só no Hermógenes que eu via salvamento para meu cão de corpo Quem que diz que na vida tudo se escolhe O que castiga cumpre também Vim Ainda divulguei nas sofraldas descentes homens que corriam meus iguais às vezes se subiam do bamburral baixo feito acãoada codorniz Viemos Repassamos o corguinho do Dinho beiramos uma ipueira Entramos no cerrado Tu tem tudo Tatarana Munição as armas o Hermógenes me indagou Tenho se tenho eu respondi bem E ele para mim Então está certo Agora ele falasse grosseado com modo de chefe e mando era assim E fomos para cinco léguas entre o norte e o poente no Cansanção lugar aonde um punhado dos da gente devia de se engrupar Para lá fomos de rastros apagados Caminhamos prazo dentro de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 300 riacho depois escolhemos para pisar pedras de nosso pisado com ramos as marcas desmanchamos e o mais do caminho se seguiu por muitos diversos rodeios De tudo não falo Não tenciono relatar ao senhor minha vida em dobrados passos servia para quê Quero é armar o ponto dum fato para depois lhe pedir um conselho Por daí então careço de que o senhor escute bem essas passagens da vida de Riobaldo o jagunço Narrei miúdo desse dia dessa noite que dela nunca posso achar o esquecimento O jagunço Riobaldo Fui eu Fui e não fui Não fui porque não sou não quero ser Deus esteja E dizendo vou No mais que quando se alcançou o nosso bom esconder num boqueirãozinho já achamos companheiros outros diversos vindos de armas e que chegavam separadamente naquela satisfação de vida salva Um era o Feijó Será se tinha avistado o Reinaldo sem perigo A meio perguntei Por causa que só em Diadorim era que eu pensava O Feijó em tanto tinha notado Diadorim na retirada bem conseguido depois se retrasou por uma cacimba de grota Estava com sangue numa perna de calça Para mim foi nada arranho àtoa O que me ensombreceu então Diadorim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 301 estava ferido Aí eu mesmo esbarrei beirávamos o riachinho do Jio eu quis lavar os pés que muito me doíam Acho que de cansado estava também com dores redondas de cabeça molhei minhas fontes Cansaço faz tristeza em quem dela carece Diadorim estivesse ali somentemente espaço disso me alegrava eu não havia de querer conversar reportório de tiros e combates eu queria calado a conseqüência dele Ao modo que eu nem conhecia bem o estorvo que eu sentia Pena Dos homens que incerto matei ou do sujeito altão e madrugador quem sabe era o pobre do cozinheiro deles na primeira mão de hora varado retombado Em tenho que não Dó que me dava era do Garanço e o Montesclarense Quase com um peso por minha culpa dos dois eles eu era quem tinha escolhido para conduzir e depois tudo Logo esses o senhor sabe o senhor segue comigo Remorso Por mim digo e nego Olhe légua e outra daqui vereda abaixo tigre canguçu estragou e arruinou a perna do Sizino Ló um que foi desse rio de São Francisco foguista de vapor depois cá herdou uns alqueires Comprouse para ele então uma boa pernadepau Mas assim talvez por se ter sacolejado um pouco do juizo ele nunca mais quer sair de casa nem se levanta quase do catre vive repetindo e dizendo Ai quem tem dois tem um quem tem um não tem nenhum Todo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 302 o mundo ri E isso é remorso Desgraça a mando era que eu cumpria azo de que tivesse perdido alguma coisa Porque dó de amizade é num sofrerzinho simples e o meu não era E cheguei no CansançãoVelho chamado também o Jio dito Lá com pouco a gente era doze Os alguns faltavam dos que eram para se reunir ali mas decerto ainda vinham vir Num ponto me agradei então em guerra quase não se morre E mesmo nas más horas é que vem bom consolo para o Jio tinha tocado de antevéspera o Braz nessa antecedência em dois jumentos ele tinha trazido mantimento de feijão e arroz e tou cinho para torresmos e pratos e panela se cozinhou um jantar Tanto que comi deitei Dormi impado Que caso que eu carecia de pensar que não fosse que na morte do Garanço e do Montesclarense eu não devia nenhum dolo e que Diadorim ia chegar a vir também aonde estávamos mais tardar no romper da aurora Dormi Mas daí a logo acordei mão no rifle como se vez fosse E não havia a coisa nenhuma nem vulto nem barulho Os outros no estar pesados no sono cada um em seu recanto estufando suas redes penduradas de árvore em árvore Só vi um o Jõe Bexiguento sobrechamado o Alpercatas esse era homem de estranhez em muitos seus costumes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 303 conforme se dizia e era notado Jõe Bexiguento parecia não estar querendo ir dormir tinha ficado na beira do fogo remexendo as brasas num fusco em vermelho dava para a cara dele se divulgar E ele pitava Meigo repus o rifle virei para o outro lado Adormecer pude mas com outros minutos tornei naquele mau susto de acordar Isso aconteceu três vezes reformadas Jõe Bexiguento reparou em meu dessossego veio para o pé de minha rede sentou no chão Horas destas tem galo já cantando noutros lugares ele falou Não sei se dei alguma resposta Agora eu estava cismado Ou se fosse que algum perigo se produzia por ali e eu colhia o aviso Não é que com muitos dose disso sucedesse Eu sabia tinha ouvido falar jagunços que pegam esse condão adivinham o invento de qualquer sobrevir por isso em boa hora escapam O Hermógenes João Goanhá mais do que todos era atreito a esses palpites de fino ar coraçãoados Atual isso comigo Que os bebelos rodeavam para ali quem sabe perto já rastejavam Zé Bebelo mandava neles Em todos o momentos em Zé Bebelo sempre pensei e em como a vida é cheia de passagens emendadas Eu na Nhanva ensinando lição a ele ditado e leitura as contas de juros depois de noite na sala grande na mesa grande se comia canjica temperada com leite João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 304 queijo cocodabaía amendoim açúcar canela e manteigade vaca Fofo faço e em prazo siô Baldo acabar para uma vez com essa cambada canalha de jagunços ele referia com rompante e festa no dizer bebendo seu coité de cháde congonha que de tão quente pelava Então agora era eu também Zé Bebelo vinha de lá comandando armas de esqua drões e o que ele tinha jurado naquela ocasião ficava sendo também de acabar comigo com minha vida Mas eu prezava Zé Bebelo minha simpatia é uma só dada definitiva às altas sempre fui assim Sendo que não fosse ele em sua pessoa se ele no meio não estivesse tudo tinha outra ordem eu podia pôr meu afinco o farto destravado no querer combater Mas brigar cruzando morte com Zé Bebelo eu vi que era isso que me dava uma re pugnância em minha inteligência Levantei da rede e convidei Jõe Bexiguento para se botar mais lenha no fogo Ele disse Convém não Ocasiões assim convém acender nem vela de cera preta Enrolei um cigarro Contei ao Jõe o que eu estava sentindo estúrdio se não era agouramento E ele me apaziguou que anjo aviso não vinha desse jeito antes era uma certeza que minava fininha de dentro da idéia da gente sem razoado nem discussão O que eu purgava era ranço nervoso sobra da esquentação curtida nas horas de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 305 tiroteio Comigo assim depois de cada forte fogo me dá esse porém É uma coceira na mente comparando mal Faz regular uns seis anos que estou na jagunçagem medo de guerra não conheço mas na noite passado cada fogo não me livro disso essa desinquietação me vem Pela causa me disse era que ele não vencia dormir nem um pisco naquela comprida noite e nem experimentava Jõe Bexiguento achava que não tinha mais sustância para ser jagunço duns meses disse andava padecendo da saúde erisipelava e asmava Cedo aprendi a viver sozinho Pra o Riachão vou derrubo lá um bom mato Era o projeto em tal que ele formava vez em quando Trabalhar de amassar as mãos Que isso é que sertanejo pode mesmo na barra da velhice Você era amigo do Garanço Jõe em manso perguntei Assim o dito pela rama Que foi com ele Deu o fim mesmo legal Acho que esse sempre se esteve meio caipora Ele mesmo sabia que era Ainda ouvindo as palavras conheci que tinha perguntado pelo Garanço só para depois perguntar por Diadorim digo o Reinaldo Mas outra coragem não tive Faltou razão para mim Que desconversei Caipora se cura Jõe Você sabe rezas fortes por aí devo que indaguei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 306 bobéia minha assunto A que cujo se caipora não curasse Todo o mundo dela tem nos tempos ele me repositou Mas desses ensalmos quis aprender não Memória que Deus me deu não foi para palavrear avesso nele com feitas ofensas Pecados vagância de pecados Mas a gente estava com Deus Jagunço podia Jagunço criatura paga para crimes impondo o sofrer no quieto arruado dos outros matando e roupilhando Que podia Esmo disso disso queri por pura toleima que sensata resposta podia me assentar o Jõe broeiro peludo do Riachão do Jequitinhonha Que podia A gente nós assim jagunços se estava em permissão de fé para esperar de Deus perdão de proteção Perguntei quente Uai Nós vive foi o respondido que ele me deu Mas eu não quis aquilo Não aceitei Questionei com ele duvidando rejeitando Porque eu estava sem sono sem sede sem fome sem querer nenhum sem paciência de estimar um bom companheiro Nem o ouro do corpo eu não quisesse aquela hora não merecia brancura rosada de uma moça depois do antes da luademel Discuti alto Um que estava com sua rede ali a próximo de certo acordou com meu vozeio e xingou xiu Baixei mas fui ponteando opostos Que isso foi o que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 307 sempre me invocou o senhor sabe eu careço de que o bom seja bom e o rúim ruim que dum lado esteja o preto e do outro o branco que o feio fique bem apartado do bonito e a alegria longe da tristeza Quero os todos pastos demarcados Como é que posso com este mundo A vida é ingrata no macio de si mas transtraz a esperança mesmo do meio do fel do desespero Ao que este mundo é muito misturado Mas Jõe Bexiguento não se importava Duro homem jagunço como ele no cerne era a idéia dele era curta não variava Nasci aqui Meu pai me deu minha sina Vivo jagunceio ele falasse Tudo poitava simples Então eu pensei por que era que eu também não podia ser assim como o Jõe Porque veja o senhor o que eu vi para o Jõe Bexiguento no sentir da natureza dele não reinava mistura nenhuma neste mundo as coisas eram bem divididas separadas De Deus Do demo foi o respondido por ele Deus a gente respeita do demônio se esconjura e aparta Quem é que pode ir divulgar o corisco de raio do borro da chuva no grosso das nuvens altas E por aí eu mesmo mais acalmado ri me ri ele era engraçado Naquele tempo também eu não tinha tanto o estrito e precisão nestes assuntos E o Jõe contava casos Contou Caso que se passou no sertão jequitinhão no arraial de São João Leão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 308 perto da terra dele Jõe Caso de Maria Mutema e do Padre Ponte Naquele lugar existia uma mulher por nome Maria Mutema pessoa igual às outras sem nenhuma diversidade Uma noite o marido dela morreu amanheceu morto de madrugada Maria Mutema chamou por socorro reuniu todos os mais vizinhos O arraial era pequeno todos vieram certificar Sinal nenhum não se viu e ele tinha estado nos dias antes em saúde apreciável por isso se disse que só de acesso do coração era que podia ter querido morrer E naquela tarde mesma do dia dessa manhã o marido foi bem enterrado Maria Mutema era senhora vivida mulher em preceito sertanejo Se sentiu foi em si se sofreu muito não disse guardou a dor sem demonstração Mas isso lá é regra entre gente que se diga pelo visto a ninguém chamou atenção O que deu em nota foi outra coisa foi a religião da Mutema que daí pegou a ir à igreja todo santo dia afora que de três em três agora se confessava Dera em carola se dizia só constante na salvação de sua alma Ela sempre de preto conforme os costumes mulher que não ria esse lenho seco E estando na igreja não tirava os olhos do padre João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 309 O padre Padre Ponte era um sacerdote bomhomem de meiaidade meio gordo muito descansado nos modos e de todos bem estimado Sem desrespeito só por verdade no dizer uma pecha ele tinha ele relaxava Gerara três filhos com uma mulher simplória e sacudida que governava a casa e cozinhava para ele e também acudia pelo nome de Maria dita por aceita alcunha a Maria do Padre Mas não vá maldar o senhor maior escândalo nessa situação com a ignorância dos tempos antigamente essas coisas podiam todo o mundo achava trivial Os filhos bem criados e bonitinhos eram os meninos da Maria do Padre E em tudo mais o Padre Ponte era um vigário de mãocheia cumpridor e caridoso pregando cora muita virtude seu sermão e atendendo em qualquer hora do dia ou da noite para levar aos roceiros o conforto da santa hóstia do Senhor ou dos santos óleos Mas o que logo se soube e disso se falou era em duas partes que a Maria Mutema tivesse tantos pecados para de três em três dias necessitar de penitência de coração e boca e que o Padre Ponte visível tirasse desgosto de prestar a ela paiouvido naquele sacramento que entre dois só dois se passa e tem de ser por ferro de tanto segredo resguardado Contavam mesmo que das primeiras vezes povo percebia que o padre ralhava com ela João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 310 terrível no confessionário Mas a Maria Mutema se desajoelhava de lá de olhos baixos com tanta humildade serena que uma santa padecedora mais parecia Daí aos três dias retornava E se viu bem que Padre Ponte todas as vezes fazia uma cara de verdadeiro sofrimento e temor no ter de ir a junjo escutar a Mutema Ia porque confissão clamada não se nega Mas ia a poder de ser padre e não de ser só homem como nós E daí mais que passando o tempo como se diz no decorrido Padre Ponte foi adoecido ficando de doença para morrer se viu logo De dia em dia ele emagrecia amofinava o modo tinha dores e em fim encaveirou duma cor amarela de palha de milho velho dava pena Morreu triste E desde por diante mesmo quando veio outro padre para o São João Leão aquela mulher Maria Mutema nunca mais voltou na igreja nem por rezar nem por entrar Coisas que são E ela dado que viúva soturna assim que não se cedia em conversas ninguém não alcançou de saber por que lei ela procedia e pensava Por fim no porém passados anos foi tempo de missão e chegaram no arraial os missionários Esses eram dois padres estrangeiros pra fortes e de caras coradas bradando sermão forte com forte voz com fé braba De manhã à noite durado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 311 de três dias eles estavam sempre na igreja pregando confessando tirando rezas e aconselhando com entusiasmados exemplos que enfileiravam o povo no bom rumo A religião deles era alimpada e enérgica com tanta saúde como virtude e com eles não se brincava pois tinham de Deus algum encoberto poder conforme o senhor vai ver por minha continuação Só que no arraial foi grassando aquela boa bemaventurança Aconteceu foi no derradeiro dia isto é véspera pois no seguinte que dava em domingo ia ser festa de comunhão geral e glória santa E foi de noite acabada a benção quando um dos missionários subiu no púlpito para a prédica e tascava de começar de joelhos rezando a salverainha E foi nessa hora que a Maria Mutema entrou Fazia tanto tempo que não comparecia em igreja por que foi então que deu de vir Mas aquele missionário governava com luzes outras Maria Mutema veio entrando e ele esbarrou Todo o mundo levou um susto porque a salverainha é oração que não se pode partir em meio em desde que de joelhos começada tem de ter suas palavras seguidas até ao tresfim Mas o missionário retomou a fraseação só que com a voz demudada isso se viu E mal no amém ele se levantou cresceu na beira do púlpito em brasa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 312 vermelho debruçado deu um soco no pau do peitoril parecia um touro tigre E foi de grito A pessoa que por derradeiro entrou tem de sair A pra fora já já essa mulher Todos no estarrecente caçavam de ver a Maria Mutema Que saia com seus maus segredos em nome de Jesus e da Cruz Se ainda for capaz de um arrependimento então pode ir me esperar agora mesmo que vou ouvir sua confissão Mas confissão esta ela tem de fazer é na porta do cemitério Que vá me esperar lá na porta do cemitério onde estão dois defuntos enterrados Isso o missionário comandou e os que estavam dentro da igreja sentiram o rojo dos exércitos de Deus que lavoram em fundura e sumidade Horror deu Mulheres soltaram gritos e meninos outras despencavam no chão ninguém ficou sem se ajoelhar Muitos muitos daquela gente choravam E Maria Mutema sozinha em pé torta magra de preto deu um gemido de lágrimas e exclamação berro de corpo que faca estraçalha Pediu perdão Perdão forte perdão de fogo que da dura bondade de Deus baixasse nela em dores de urgência João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 313 antes de qualquer hora de nossa morte E rompeu fala por entre prantos ali mesmo a fim de perdão de todos também se confessava Confissão edital consoantemente para tremer exemplo raio em pesadelo de quem ouvia público que rasgava gastura como porque avessava a ordem das coisas e o quieto comum do viver transtornava Ao que ela onça monstra tinha matado o marido e que ela era cobra bicho imundo sobrado do podre de todos os estercos Que tinha matado o marido aquela noite sem motivo nenhum sem malfeito dele nenhum causa nenhuma por que nem sabia Matou enquanto ele estava dormindo assim despejou no buraquinho do ouvido dele por um funil um terrível escorrer de chumbo derretido O marido passou lá o que diz do oco para o ocão do sono para a morte e lesão no buraco do ouvido dele ninguém não foi ver não se notou E depois por enjoar do Padre Ponte também sem ter queixa nem razão amargável mentiu no confessionário disse afirmou que tinha matado o marido por causa dele Padre Ponte porque dele gostava em fogo de amores e queria ser concubina amásia Tudo era mentira ela não queria nem gostava Mas com ver o padre em justa zanga ela disso tomou gosto e era um prazer de cão que aumentava de cada vez pelo que ele não estava em poder de se defender de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 314 modo nenhum era um homem manso pobre coitado e padre Todo o tempo ela vinha em igreja confirmava o falso mais declarava edificar o mal E daí até que o Padre Ponte de desgosto adoeceu e morreu em desespero calado Tudo crime e ela tinha feito E agora implorava o perdão de Deus aos uivos se esguedelhando torcendo as mãos depois as mãos no alto ela levantava Mas o missionário no púlpito entoou grande o Bendito louvado seja e enquanto cantando mesmo fazia os gestos para as mulheres todas saírem da igreja deixando lá só os homens porque a derradeira pregação de cada noite era mesmo sempre para os ouvintes senhores homens como conforme E no outro dia domingo do Senhor o arraial ilustrado com arcos e cordas de bandeirolas e espoco de festa foguetes muitos missa cantada procissão mas todo o mundo só pensava naquilo Maria Mutema recolhida provisória presa na casadeescola não comia não sossegava sempre de joelhos clamando seu remorso pedia perdão e castigo e que todos vies sem para cuspir em sua cara e dar bordoadas Que ela exclamava tudo isso merecia No meiotempo desenterraram da cova os ossos do marido se conta que a gente sacolejava a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 315 caveira e a bola de chumbo sacudia lá dentro até tinia Tanto por obra de Maria Mutema Mas ela ficou no São João Leão ainda por mais de semana os missionários tinham ido embora Veio autoridade delegado e praças levaram a Mutema para culpa e júri na cadeia de Araçuaí Só que nos dias em que ainda esteve o povo perdoou vinham dar a ela palavras de consolo e juntos rezarem Trouxeram a Maria do Padre e os meninos da Maria do Padre para perdoarem também tantos surtos produziam bem estar e edificação Mesmo pela arrependida humildade que ela principiou em tão pronunciado sofrer alguns diziam que Maria Mutema estava ficando santa E foi isso que Jõe Bexiguento a mim contou e que de certo modo me divagasse Mas foi ele acabar de contar e escutamos o assovio combinado dos nossos e demos resposta era um que chegava o Paspe se aparecendo macio dos escuros com alpercatas sem barulho e o rifle em bandoleira Ele tinha formado para a esparrela com Titão Passos agora vinha trazer notícia dos dele seguidos para se ajuntarem ao covo do Capão e pedir ordens Rio de homem esse Paspe que não temia nem se cansava Contou que aquilo que era para estratagemas deu foi em por águaabaixo porque os bebelos tinham botado espiação ou tomado o faro Assim o inimigo contornando em vez de vir João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 316 simples e tochando resposta antes de pergunta fogo feio dois mortos dos titãopassos companheiros bons mais três muito feridos Guerra tinha disso também Ah e Zé Bebelo mesmo estava lá no comando daqueles em sua dita pessoa perguntei Decerto que estava A cujo o Paspe falou e pediu logo quem tivesse um golinho de cachaça Devo então que perguntei por Diadorim Puro por perguntar sem esperanças de informação E mesmo más notícias eu ainda tinha o receio de ouvir Serviço que me foi o Paspe me respondeu Vi esse por mim passou até me deu um recado uail e para você mesmo Vai diz por mim ao Riobaldo Tatarana que eu tenho um quefazer ao que vou por dias poucos com breve estou de volta foi o que falou Assim passou a cavalo onde terá sido que arrumou montada Decerto conseguiu algum animal dos bebelos mesmo que restou no meio de tirotei Ouvi e não cri Ele Diadorim Aonde ia sem mim então não podia ser ele foras de norma E ao Paspe reperguntei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 317 pedindo o exato Era Mas não seria então que ele estivesse ferido numa perna Ao que nem não nem sim mais pelo não que pelo sim o Paspe completou Não tinha reparado no relance de tempo Só viu que o arreio era um socadinho quase novo e o cavalo alto desbarrigado mas pronto de si riscando com todas as ferraduras murzeloandrino Aí ai oi espécie de dor em meus cantos o senhor sabe Agora eu pateteava Que que era ser fiel donde estava o amigo Diadorim na pior hora tinha desertado de minha companhia Às certas fuga fugida ele tinha ido para perto de Joca Ramiro Ah ele que de tudo sabia em tudo agora assim de tenção me largava lá sem uma palavra própria da boca sem um abraço sabendo que eu tinha vindo para jagunço só mesmo por conta da amizade Acho que me escabreei De sorte que tantos pensamentos tive duma viragem que senti foi esfriar as pontas do corpo e me vir o peso de um sono enorme sono de doença de malaventurança Que dormi Dormi tão morto sem estatuto que de manhã cedo por me acordarem tiveram de molhar com água meus pés e minha cabeça pensando que eu tinha pegado febre de estupor Foi assim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 318 Vou reduzir o contar o vão que os outros dias para mim foram enquanto Desde que da rede levantei com aquele peso anoitecido amanhecido nos olhos Tempo de minha vazante A ver como veja tem sofrimento legal padecido e mordido e remordido sofrimento assim do mesmo que tem roubo sucedido e roubo roubado Me entende Dias que marquei fo ram onze Certo que a guerra ia indo Demos um tiroteio mediano uma escaramucinha e um meiocombate Que isso merece que se conte Miúdo e miúdo caso o senhor quiser dou descrição Mas não anuncio valor Vida e guerra é o que é esses tontos movimentos só o contrário do que assim não seja Mas para mim o que vale é o que está por baixo ou por cima o que parece longe e está perto ou o que está perto e parece longe Conto ao senhor é o que eu sei e o senhor não sabe mas principal quero contar é o que eu não sei se sei e que pode ser que o senhor saiba Agora o senhor exigindo querendo está aqui que eu sirvo forte narração dou o tampante e o que for de trinta combates Tenho lembrança Pelo tempo durado de cada fogo se é capaz até do cálculo da quantidade de balas Contar Do que se agüentou de arvoados tiros e a gente atirando a truz no meio de pobre roça alheia canavial cortante eito de verde feliz ou palhada de milho morto que se pisava e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 319 quebrava De vez em que rifle trauteava tanto e eram os estalos passando repassando que vai se aconchava mão em orelha sem saber por que feita uma esperança de se conseguir milagre de algum barulhinho diverso outro qualquer que aquele não fosse na ensurdescência E quando toró de chuva deu bomba desmanchando a função de briga e empapando todos ensolvando as armas De se olhar em frente o morro sem desconfiança e de repente do nu do morro despejarem descarga De um entrar em poço atravessando e mesmo com água quase até pelos peitos ter de se virar em direção e desfechar De como no prazo duma hora só careci de ir me vendo escorando rifle e alvejando em quentes em beira de mato e campo em virada de espigão descendo e subindo ramal de ladeirinhas pequenas e atrás de cerca debaixo de cocho trepado em jatobá e pequizeiro deitado no azul duma laje grande e rolando no bagaço doce de cana e rebentando por dentro de uma casa E de companheiro em sopas de sangue mais sujeira de suas tripas lá dele se abraçando com a gente de mandado da dor para morrer só mesmo seja que amaldiçoando em lei toda mãe e todo pai E como quando no refervo combatendo no dano da mormaceira a raiva de fúria de repente igualava todos nos mesmos urros e urros uns e uns contras e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 320 contrários chega se queria combinar de botar fora as armasde fogo para o aproximaço de se avir em mãos às duras brancas para se oferecer fim oferecer faca Isso é isto Sobejidão O senhor mais queria saber Não Eu sabia que não Menos mortandades Aprecio uns assim feito o senhorhomem sagaz solerte Vir voltemos Aqueles dias eu empurrei mudando em raiva falsa a falta que Diadorim me fazia Aí curti amargos Por me ver casca em chão que é o figurado de desprezo e mais tudo o que em ocasiões dessas se sente conforme o senhor decerto conhece e sabe Mas o pior era o que eu mesmo mais sentia feito se do íntimo meu tivessem tirado o esteiomor pédecasa E conforme sempre se dá segundo se está assim em calibre de cão e malquerente repuxei idéias Me alembrei do que tinha soprado em intriga o Antenor e dei razão à cisma dele quem sabe mesmo Joca Ramiro estava no propósito de deixar a gente se acabar ali na má guerra em sertão plano E então Diadorim disso sabia estava no enredo agora tinha ido para junto de loca Ramiro que era a única pessoa que ele bastantemente prezava Fiquei em mim desiludido caí numa lazeira Mas cuspi três vezes forte no chão e risquei de mim Diadorim Homem como eu não é todo capaz de guardar a parte de amor em desde que recebe João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 321 muitas ofensas de desdém Só que depois o que há é a alma assim meio adoecida Digo fiquei lazo Me veio de pensar em falar com o Antenor Não fiz Dúvidas dessas eu não ia repartir com estranhas pessoas E não gostei nunca de homem intrujão com esses não começo conversa não hio e não chio Tanto que mesmo foi o Hermógenes que um dia me chamou veio caçoando Eh valente tu é Tatarana Gosto dessa sua bizarria Sas ordens sor eu só falei Porque ele pelo jeito logo entendi que ia me fazer algum espontâneo obséquio ou me dar alguma boa notícia todo que um assim nessas horinhas logo muda de modo antes aproveita um tico para falar de cima jeitoso de dono bom ou de pai que cede E foi que não errei O que o Hermógenes queria me prometer era que em breve iam estar acabados aqueles riscos de trabalho e combate com liquidados os bebelos e então a gente ficava livre para lidar melhormente atacando bons lugares em serviço para chefes políticos E que nessa ocasião ele queria me escolher para comandar uma parte dos seus por ser isso de minha rija competência cabodeturma João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 322 Tanto gabado elogio que não me mudou não me fez Descarei Experimentando o homem só aproveitei foi para uma deixa Joca Ramiro eu disse com uma risadazinha minha velhaca que entre dois podia pegar qualquer incerto significado E me esperei Mas o Hermógenes se saiu em só dizer sério confioso que Joca Ramiro era maludo capitão vero no real Sonsice de Hermógenes Não senhor Sei e vi que o sincero Por que era que todos davam assim tantas honras a Joca Ramiro esse louvo sereno com doado Isso meio me turvava Mas do Hermógenes então me atormentou sempre aquele meu receio que eu carecia de pôr em raiva Assim por isso falei em mim comigo A ele nego água na boca do pote Esconjurar desse jeito leve me trouxe sossego Ao que eu carecia Tanto mesmo que eu não queria ter de pensar naquele Hermógenes e o pensa mento nele sempre me vinha ele figurando eu cativo Ser que pensava amiúde em ele ser carrasco como tanto se dizia senhor de todas as crueldades No começo aquilo me corria só os calafrios de horror a idéia minha refugava Mas a pouco peguei às vezes uma ponta de querer saber como tudo podia ser eu imaginava Digo ao senhor se o demônio existisse e o senhor visse ah o senhor não devia de não convém espiar para esse João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 323 nem mi de minuto não pode não devede São se só as coisas se sendo por pretas e a gente de olhos fechados Ao tanto com o esforço meu em esquecer Diadorim digo que me dava entrante uma tristeza no geral um prazo de cansado Mas eu não meditava para trás não esbarrava Aquilo era a tristonha travessia pois então era preciso Água de rio que arrasta Dias que durasse durasse até meses Agora eu não me importava Hoje eu penso o senhor sabe acho que o sentir da gente volteia mas em certos modos rodando em si mas por regras O prazer muito vira medo o medo vai vira ódio o ódio vira esses desesperos desespero é bom que vire a maior tristeza constante então para o um amor quanta saudade aí outra esperança já vem Mas a brasinha de tudo é só o mesmo carvão só Invenção minha que tiro por tino Ah o que eu prezava de ter era essa instrução do senhor que dá rumo para se estudar dessas matérias Daí eu caçava o jeito de me espairecer junto com todos Conversas com o Catocho com Jõe Bexiguento com o Vove com o Feijó de mais sisudez ou com Umbelino o de cara de gato Se ria fora de aperreio de combate muito se vadiava Assimassei naquela influição Vinha ordem então a gente se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 324 reunia em bando grande depois tornava a em grupozinhos se apartar A guerra era a igual E ali dava de se sentir o faltoso e o imperfeito como no mais acontece em quantidade maior O São Francisco não é turvo sempre E o que se falava mais era em mulher Isso fazia muito boa falta Cada um queria delas no que só pensava As mocinhas próprias de se provar ou rua alegre cheia de alegria o bom sempre melhor o bom Amigo meu o Umbelino esse que dizia que por não ter mulher ali se tinha de muito lembrar Ele era do Rio Sirubim de um lugar para trás das cachoeiras Valia como companheiro capaz darmas Que que pequeno era bom Relembrava Já tive uma mulher amigável só minha na RuadoAlecrim em São Romão e outra mais na RuadoFogo Essas conversas com o calor Calor em que cão pendura a língua o senhor sabe Já viu por aí Em Januária ou São Francisco tinha estação de tempo em que não se podia deixar um ovo guardado com umas duas ou três horas já se estragava Todos contavam estórias de raparigas que tinham sido simples somente essas senvergonhagens Mas de noite é de crer a gente sabia dos que queriam qualquer reles suficiente consolo E eram brabos sarados guerreiros que nunca noutro ar Coisas Canta que cantavam de dia nenhum sabia pédeverso direito ou não queriam ensinar era só aquela João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 325 invenção e cantando fanhoso no nariz Ou ficavam dizendo graças e ditérios Nem feito meninos não sendo Por esse sem quefazer a gente ainda mais comia quase que por divertimento Os uns iam torar palmito colher mandioca em mandiocalzinho sem dono dono tinha fugido longe Gostei de favas do mato muito murici quixaba e jaca O Fonfredo tinha um blilbloquê a gente brincava de jogar Tudo jogado a dinheiro baixo Os espertos teve quem pôs a jogo até bentinho de pescoço sem dizer desrespeito E faziam negócio desses breves contado que alguns arrumavam até escapulários falsos Deus perdoa O senhor podia perguntar Deus para qualquer um jagunço sendo um inconstante patrão que às vezes regia ajuda mas outras horas sem espécie nenhuma desandava de lá proteção se acabou e pronto marretava Que rezavam Jõe Bexiguento mesmo quis que diversos tomassem parte em novena numa mal rezada novena a santo de sua redobrada tenção e a qual ele nem teve persistência para nos dias medidos completar E mas o Hermógenes Sobreveja o senhor o meu descrever ele vinha por ali à refalsa socapa de se rir e se divertir no meio dos outros sem a soberba sendo em sendo o raposo meco Naqueles dias ele andava de pénochão mais com uma calça apertada nas canelas e encurtada e mesmo muito João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 326 esmolambado na camisa Até que de barba grande parecia um pedidor E caminhava com os largos passos mais o muito nas pontas vinha e ia com um sorrizinho besteante rodeava por toda a parte Nem eu no achar mais que ele era o ferrabrás O que parecia era que assim estivesse o tempo todo produzindo alguma tramóia Estudei uma dúvida Ao que será que seria o ser daquele homem tudo Algum tinha referido que ele era casado com mulher e filhos Como podia Aide vai meu pensamento constante querendo entender a natureza dele virada diferente de todas a inocência daquela maldade A qual que me aluava O Hermógenes numa casa em certo lugar com sua mulher ele fazia festas em suas crianças pequenas dava conselho dava ensino Daí saía Feito lobisomem Adiante de quem atrás do quê A cruz o senhor faça meu senhor Aí eu acreditei que tivesse de haver mesmo o inferno um inferno precisava E o demônio seria o inteiro louco o doido completo assim irremediável Ah me aluei O Hermógenes esquipático diverso Comigo eu começava numa espécie o ror vontade de ir para perto reparar em tudo que fazia dele escutar suas causas Aos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 327 poucos o incutido do incerto me acostumando eu não tirava isso da cabeça O Hermógenes ele dava a pena dava medo Mas ora vez eu pressentia que do demônio não se pode ter pena nenhuma e a razão está aí O demônio esbarra manso mansinho se fazendo de apeado tanto tristonho e o senhor pára próximo aí então ele desanda em pulos e prezares de dança falando grosso querendo abraçar e grossas caretas boca alargada Porque ele é é doido sem cura Todo perigo E naqueles dias eu estava também muito confuso Será o Hermógenes também gosta de mulheres eu careci de saber perguntei Eh Apreceia não Só se não gosta um disse Quá Acho que ele gosta demais é só nem dele mesmo demais demais algum outro atalhou Que ele era assim eu fiquei em pausas e os companheiros todos sabiam do ser e achavam então que ato assim era possível natural Como que não achavam Até por eu ter o assunto já um vinha Daqui a seis léguas é a baixada do Brejinho lá tem logradouro Tem fêmeas Esse que disse era o Dute me parece ou foi outro Mas o Catocho desafirmou que tinha estado lá não viu ar de mulherdavida nenhuma só uma vendinha de roça e uma velha pitando cachimbo no batente duma porta pitando cachimbo e trançando peneiras Que que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 328 riam mulheres principalmente a fim estava certo eu também Eu queria com as faces do corpo mas também com entender um carinho e melhorrespeito sempre a essas do mel eu dei louvor de meu agradecimento Renego não o que me é de doces usos graças a Deus toda a vida tive estima a toda meretriz mulheres que são as mais nossas irmãs a gente precisa melhor delas dessas belas bondades Mas o Lindorífico lembrava um pagode em algum ao lugarejo para baixo de lá do que batucavam o pro puxado das sanfonas cachaça muita as mulheres vinham dar umbigadas tiravam a roupa cavalheiros levavam damas nas moitas no escuro do sebo outros desafiavam outros para brigar Para quê Por que não gozar o geral mas com educação sem as desordens Saber aquilo me entristecia Tem coisas que não são de ruindade em si mas danam porque é ao caso de virarem feito o que não é feito Feito a garapa que se azeda Viver é muito perigoso já disse ao senhor No mais mal me lembro mas sei que naqueles dias eu estive muito maltrapilho Em que era que eu podia achar graça De manhã quando eu acordava sempre supria raiva Um me disse que eu estava estando verde má cara de doença e que devia de ser de figado Pode que seja tenha sido O Paspe que cozinhava cozinhou para mim os chás o de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 329 macela o de ervadoce o de losna Oi Dor mesmo nenhuma eu não tinha Somente perrengueava Do que de uma feita por me valer eu entendi o casco de uma coisa Que quando eu estava assim cada demanhã com raiva de uma pessoa bastava eu mudar querendo pensar em outra para passar a ter raiva dessa outra também igualzinho soflagrante E todas as pessoas seguidas que meu pensamento ia pegando eu ia sentindo ódio delas uma por uma do mesmo jeito ainda que fossem muito mais minhas amigas e eu em outras horas delas nunca tivesse tido quizília nem queixa Mas o sarro do pensamento alterava as lembranças e eu ficava achando que o que um dia tivessem falado seria por me ofender e punha significado de culpa em todas as conversas e ações O senhor me crê E foi então que eu acertei com a verdade fiel que aquela raiva estava em mim produzida era minha sem outro dono como coisa solta e cega As pessoas não tinham culpa de naquela hora eu estar passeando pensar nelas Hoje que enfim eu medito mais nessa agenciação encoberta da vida fico me indagando será que é a mesma coisa com a bebedice de amor Toleima O senhor ainda me releve Mas na ocasião me lembrei dum conselho que Zé Bebelo na Nhanva um dia me tinha dado Que era que a gente carece de fingir às vezes que raiva tem mas raiva João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 330 mesma nunca se deve de tolerar de ter Porque quando se curte raiva de alguém é a mesma coisa que se autorizar que essa própria pessoa passe durante o tempo governando a idéia e o sentir da gente o que isso era falta de soberania e farta bobice e fato é Zé Bebelo falava sempre com a máquina de acerto inteligência só Entendi Cumpri Digo reniti fazendo fincapé em força para não esparramar raivas Lembro que naquela manhã também o calor era menos e o ar era bondoso Aí eu à paz com vontade de alegria como se estimasse recebendo um aviso Demorei bom estado sozinho em beira dágua escutei o fife dum pássaro sabiá ou saci De repente dei fé e avistei era Diadorim que chegando ele já parava perto de mim Ele mesmo me disse com o sorriso sentido Como passou Riobaldo Não está contente por me ver A boa surpresa Diadorim vindo feito um milagre alvo Ao que pela pancada do meu coração Aí mas um resto de dúvida a inteira dúvida que me embaraçava real em a minha satisfação Eu era o que tinha ele o que devia Retente então permaneci não fiz mostra nenhuma Esperei as primeiras palavras dele Mais falasse retardei limpei a goela João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 331 A pois Por onde andou se mal pergunto aí falei Aquela amizade pontual escolhida para toda a vida dita a minha nos grandes olhos ele pronunciando Você também não está bom de saúde Riobaldo estou vendo Você derradeiramente não tem passado bem Vivendo minha sorte com lutas e guerras Ao que Diadorim me deu a mão que malamal aceitei E ele disse de contar Segundo tinha procurado aqueles dias sozinho recolhido nas brenhas para se tratar dum ferimento tiro que pegara na perna dele perto do joelho sido só de raspão Menos entendi A real que estando ofendido por que era que não havia de vir para o meio da gente para receber ajuda e ter melhor cura Doente não foge para um recanto ou mato solitário consigo feito bicho faz Aquilo podia não ser verdade Afiguro aí bem que criei suspeitas aonde Diadorim não teria andado ido e que feia ação para aprontar com parte na fingida estória As incertezas que tive que não tive Assaz ele falava assim afetuoso tão sem outras asas e os olhos de ver e de mostrar de querer bem não consentiam de quadrar nenhum disfarce Magro ele estava quasso empalidecido muito até ainda um pouco man João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 332 cava Que vida penosa não era capaz de ter levado tantos dias sem o auxílio de ninguém tratando o machucado com emplastros de raízes e folhas comendo o quê Assunto de fome e toda sorte de míngua devia de ter penado E de repente eu estava gostando dele num descomum gostando ainda mais do que antes com meu coração nos pés por pisável e dele o tempo todo eu tinha gostado Amor que amei daí então acreditei A pois o que sempre não é assim Além do que era sazão de sentimento sereno arte que a vida mais regateia A vida não dá demora em nada Nos seguintes logo tornamos para tornar em guerra com assanhamentos De formas que perdi o semelhar de tantos manejos e movimentos e a certa razão das ordens que a gente cumpria Mas fui me endurecendo às pressas no fazer meu particípio de jagunço fiquei caminhadiço Agora eu tinha Diadorim assim perto de afeto o que ainda valia mais no meio desses perigos de fato Sendo que a sorte também prevalecia do nosso lado aí vi a morte é para os que morrem Será Ao que com João Goanhá de testachefe saímos uns cinqüenta pegar uma tropa de cargueiros dos bebelos que vinham ao descuidado de noite no BentoPedro lugar num João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 333 braço de brejo arrozal Surpreender custou barato bobearam as sentinelas sem se haver um gritodearmas foi só pôr em fugida Aquela carga era enorme maior em dobro uma riqueza tinha de tudo até cachaça de pago imposto as caixas de quarentae oito garrafas cada Ao tanto levamos os lotes de burros para esconder no Capão dos Ossos onde tem carrascais e caminhos de caatinga pobre com lagoas secando as ipueiras verdolengas Daí tivemos mando no PoçoTriste de tornar a amontar nos animais Aquilo era uma alegria Minha alma estava o troteio a poeirada que levantavam os cavalos que rinchavam bem Acinte bebi água de dedentro dum gravatá em flor Aquelas aranhas grandes armavam de árvore para árvore velhices de teia Parecia que a guerra já tinha se terminado bem Berimbau um disse Agora é gozar gozo Mas Ah e Zé Bebelo perguntei Um Federico Xexéu que vinha de recado botava o fácil desânimo Ih Zé Bebel Evém ele com gentes de nuvens gentes A desléguas se guerreava A gente recebia a no ticia Aí cavalaria chusma arruá que chegando aos estropes terras arribavam Eta é Sendo que era não Só era Só Candèlário de repente Apareceu com aqueles muitos homens Sus esbarrou o cavalo tão de repente que o corpo dele se encurtou pela metade Só Candelário Esse era alto trigueiro azul João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 334 quase preto com bigode amarelecido Homem forçoso homem de fúria Mandou que mandava Em hora de fogo pulava à frente de todos bramava o burro Tomou a chefia geral debaixo dele o Hermógenes parecia um diabo coitado Só Candelário era o para enfrentar Zé Bebelo Salvante que seria para tudo Se apeou ficou um demorado tempo de costas para a gente Saudei o Fafafa que era homem também dele com os de Só Candelário o Alaripe e o Fafafa tinham outra vez aparecido O Fafafa o que ele pois então me falou numa ocasião terrível Ah mas o que eu antes não contei o do preso Antes como foi que se passou como estávamos em bons escondidos em volta da casa dum sitiante no TimbaTuvaca casa caiada casade telhas Uns em grota uns em altos de árvores tinha gente até dentro de chiqueiro na lama dos porcos Aí chegaram os bebelos uns trinta Tiroteamos na suspensão deles os quantos que matamos matamos os mais fugiram sem após Um ficou preso Nem tinha nenhum ferimento Que é que vão fazer com ele eu perguntei Será que iam matar É verdade acho que sim Pois amigo a gente tem lá meios para guardar prisioneiro vivo Se degola é da banda da direita para a esquerda o que o Fafafa me respondendo No que dizia ele tinha razão Mas quem seria que ia cumprir de dar o fim naquele pobre moço O João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 335 Hermógenes Decerto era ele Cocei os olhos eu queria saber e não saber Sabia nem o nome como se chamava o rapaz que ia morrer assim no meio de toda boa ordem por necessidade nossa porque se solto ele tornava a se juntar com os outros dar relatórios Vim para a beira do córrego Vendo como levavam o rapaz como ele caminhava normal seguindo para aquilo com seus dois pés Essa injustiça não podia ser Assim os que passavam depois que decerto iam para matar eram outros não vi o Hermógenes Um um Adílcio com vaidade de ser capaz da maldade qualquer pavão de penas O outro Luís Pajeú Imaginado a que iam matar o homem lá nas primeiras árvores da capoeira assim Ânsia de dó apalpei o nó na goela ardi Aquilo fosse sonho mero então só sonho ou não fosse então eu carecia de uma realidade no real sem divago Ajoelhei na beirada debrucei bebi água com encostando a boca com a cara feito um cachorro um cavalo A sede não passava minha barriga devia de estar inchada igual a de um sapo igual um saco de todo tamanho A umas cem braças para cima onde o córrego atravessava a capoeira estavam esfaqueando o rapaz e eu espiava para a água esperando ver vir misturado o sangue vermelho dele e que eu não era capaz de deixar de beber Acho que eu estava com uma febre João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 336 Aquele grande gritar de se estremecer Diadorim me puxou Só Candelário subido em sela aforçurado regendo a pronto ele queria o punhadão de homens se ia para o ÉJá pra lá do Bró em todo o seguir Vamos Riobaldo É para se esperar Joca Ramiro Assim Diadorim me empurrou Montei Sem tento pisei um estribo o outro o meu pé não achava Tocar ligeiro Riobaldo Diadorim me atanazando Aquilo que lavorava em minha cabeça ah mas aí quem é que eu vi O rapaz aquele o preso vivo e exato Também montado num cavalo Assim o que me contaram que não ia morrer não iam matar não Só Candelário tinha favorecido perdão a ele por causa de sua mocidade Ele é baiano para a Bahia volta vamos levar mais adiante para se soltar para lá Me alegrei de estrelas Conforme mais me deram explicação aquele não oferecia perigo mais de tornar a se juntar com os outros bebelos e vir outra vez de armas contra a gente porque se tinha providenciado de rezar nele uma reza de tirar a coragem de guerra feito ato mandraca de se abobar Tudo tinha graça Mas e o Luís Pajeú e o Adílcio então do modo que vi Pois esses passaram com as facasdearrasto mas porque iam ajudar a retalhar o porco porção que se levava dali em carne e toucinhos Ah eu tinha bebido àtoa gorgol dágua Se deu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 337 galope Me pareceu que daí adiante a partir disso o tudo era para só ser a desatinada doidice Só Candelário galopava em frente de todos Se ia feito o rei dos ventos O lugar onde esbarramos no ÉJá era logo depois da ponte de pau que estando esburacada atravessamos mais embaixo mau vau por espirro de águas e escorrego em lisas pedras soltadas no ribeirão lajeal Ter lá ainda não tinha ninguém até me deu desengano Mas tudo no redor era verde capim em beira fresca aguada e pastos bons Atrevi que quis E Joca Ramiro Mas Diadorim se compôs Agora aqui Riobaldo é o ponto inimigo vindo morremos mas nem um bebelo não tem licença quieta de passar Diadorim a tanto impante eu debiquei Ah me importa Não é o que é se ver Joca Ramiro Pois eu estou vendo Rezinga não Riobaldo A horas destas Joca Ramiro deve de estar investindo aqueles e tudo destralhado vencendo foi o que ele perfez Atrás disso eu em ojeriza Você sabe hem sabe Os grandes segredos fui falei Mas em passos desses Diadorim sempre me apeava Como o que reprovou Sei de nada Sei o que você pode saber também Riobaldo Mas conheço Joca Ramiro sozinho que pensa as partes Conheço Só Candelário que só comparece é em fecho de forte decisão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 338 Ao que era Nos dias em que tivemos de montar guarda nos lajeiros e lajeados aprendi os rasgos daquele homem Só Candelário como vou explicar ao senhor Ele era um Acho que nem dormia comia o nada nada às pressas pitava o tempo todo E olhava para os horizontes sem paciência neles parecia querer mesmo guerra a guerra muita guerra Donde ele era donde vindo Me disseram desses desertos da Bahia Passava não me olhava Ocasião então Diadorim a ele me mostrou Este é o meu amigo Riobaldo chefe Aí Só Candelário me divisou sempre me viu Rir sorrir ele não sabia mas sossegava um modo nos olhos que tomavam um sério bom por um seu instante apagando de serem aqueles olhos encarniçados e isso figurava de ser um riso Que conhecia Diadorim e prezando muito desde vi Riobaldo Tatarana eu sei ele falou Tu atira bem tem o adestro darmas E foi andando acho que dele ainda ouvi amizade nas festas Conseguia nem ficar parado E por um ponto ou outro que eu não divulguei bem ele tinha algum estilo de ar de parecença com o próprio Zé Bebelo Mas o Alaripe foi que me contou uma coisa que todos sabiam e nela falavam Que Só Candelário caçava era a morte E bebia quase constantemente sua forte cachaça Por quê Digo ao senhor ele tinha medo de estar com o maldelázaro Pai dele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 339 tinha adoecido disso e os irmãos dele também depois e depois os que eram mais velhos Lepra mais não se diz ai é que o homem lambe a maldição de castigo Castigo de quê Disso é que decerto sucedia um ódio em Só Candelário Vivia em fogo de idéia Lepra demora tempos retardada no corpo de repente é que se brota em qualquer hora aquilo podia variar de aparecer Só Candelário tinha um sestro não esbarrava de arregaçar a camisa espiar seus braços a ponta do cotovelo coçava a pele de em sangue se arranhar E carregava espelhinho na algibeira nele furtava sempre uma olhada Danado de tudo A gente sabia que ele tomava certos remédios acordava com o propor da aurora o primeiro bebia a triaga e saía para lavar o corpo em poço para a beira do córrego ia indo nu nu feito perna de jaburu Aos dava Hoje que penso de todas as pessoas Só Candelário é o que mais entendo As favas fora ele perseguia o morrer por conta futura da lepra e no mesmo do tempo do mesmo jeito forcejava por se sarar Sendo que queria morrer só dava re sultado que mandava mortes e matava Doido era Quem não é mesmo eu ou o senhor Mas aquele homem eu estimava Porque ao menos ele possuía o sabido motivo Tanto que o inimigo não dava de vir pois bem a gente ficava em nervosias Alguns não Feito aquele Luzié que cantava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 340 sem mágoas cigarra de entrechuvas Às vezes pedi que ele cantasse para mim os versos os que eu não esqueci nunca formal a canção de Siruiz Adiantes versos E quando ouvindo eu tinha vontade de brincar com eles Minha mãe ela era que podia ter cantado para mim aquilo A brandura de botar para se esquecer uma porção de coisas as bestas coisas em que a gente no fazer e no nem pensar vive preso só por precisão mas sem fidalguia Diadorim quando cuidava que sozinho estivesse cantarolava fio que com boa voz Mas próximo da gente nunca que ele queria A ver que também fiquei sabendo que os outros não consideravam naqueles versos de Siruiz a beleza que eu achava Nem Diadorim mesmo Você tem saudade de seu tempo de menino Riobaldo ele me perguntou quando eu estava explicando o que era o meu sentir Nem não Tinha saudade nenhuma O que eu queria era ser menino mas agora naquela hora se eu pudesse possível Por certo que eu já estava crespo da confusão de todos Em desde aquele tempo eu já achava que a vida da gente vai em erros como um relato sem pés nem cabeça por falta de sisudez e alegria Vida devia de ser como na sala do teatro cada um inteiro fazendo com forte gosto seu papel desempenho Era o que eu acho é o que eu achava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 341 Ao do jeito de Só Candelário Esse variava raja Arre que vê estamos sem noticias não sei A notícia a gente tem de ir por ela mesmo entrar no mundo para se buscar isso Só Candelário quase exclamava Mandou três homens que saíssem a cavalo estrada avante até a uma légua colher do que houvesse espiar os espias Me mandou também Mas a bem dizer fui eu quem quis na hora à frente dei o passo olhei muito para ele encarado Tu Tatarana vai Quando ele falava Tatarana eu assumia que ele estava sério prezando minha valia de atirador Montei fui trotando travado Diadorim e o Caçanje iam já mais longe regulado umas duzentas braças Arte que perceberam que eu vinha se viraram nas selas Diadorim levantou o braço bateu mão Eu ia estugar esporeei queria um meiogalope para logo alcançar os dois Mas aí meu cavalo filosofou refugou baixo e refugou alto se puxando para a beira da mão esquerda da estrada por pouco não deu comigo no chão E o que era que estava assombrando o animal era uma folha seca esvoaçada que sobre se viu quase nos olhos e nas orelhas dele Do vento Do vento que vinha rodopiado Redemoinho o senhor sabe a briga de ventos O quando um esbarra com outro e se enrolam o doido espetáculo A poeira subia a dar que dava escuro no alto o ponto às voltas folharada e ramaredo quebrado no João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 342 estalar de pios assovios se torcendo turvo esgarabulhando Senti meu cavalo como meu corpo Aquilo passou embora o róró A gente dava graças a Deus Mas Diadorim e o Caçanje se estavam lá adiante por me esperar chegar Redemonho o Caçanje falou esconjurando Vento que enviesa que vinga da banda do mar Diadorim disse Mas o Caçanje não entendia que fosse redemunho era dEle do diabo O demônio se vertia ali dentro viajava Estive dando risada O demo Digo ao senhor Na hora não ri Pensei O que pensei o diabo na rua rio meio do redemunho Acho o mais terrível da minha vida ditado nessas palavras que o senhor nunca deve de renovar Mas me escute A gente vamos chegar lá E até o Caçanje e Diadorim se riram também Aí tocamos Até à barra dos dois riachos onde tem a cachoeira de escadinhas Nem pensei mais no redemoinho de vento nem no dono dele que se diz morador dentro que viaja o Sujo o que aceita as más palavras e pensamentos da gente e que completa tudo em obra o que a gente pode ver em folha dum espelho preto o Ocultador Ao então chegamos na barra dos riachinhos na cachoeira ficamos lá até o sol entrar Como é que se podia trazer notícias para Só Candelário Notícia é coisa que se tira a desejo do fim do sol Lá tinha um capãodemato Ou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 343 era mata muito velha Os coatis desciam espirrando de sua sesta deles nas árvores e os jacus voavam para outras árvores se empoleirando para o sono da noite com um escarcéu de galinheiro Tristeza é notícia Tanto eu tinha um aperto de de sânimo de sina vontade de morar em cidade grande Mas que cidade mesma grande nenhuma eu não conhecia digo Assim eu aproveitei para olhar para a banda de donde ainda se praz qualquer luz da tarde Me lembro do espaço pensamentos em minha cabeça O riacho cão lambendo o que viesse O coqueiro se mesmando A fantasia minha agora nesta conversa o senhor me atalhe Se não o senhor me diga preto é preto branco é branco Ou quando é que a velhice começa surgindo de dentro da mocidade Noitezinha viemos Primeira coruja que a ãoar eu era capaz de acertar nela um tiro Mas Só Candelário não era tolo nas meças No outro dia notícias tivemos E que Dali a lá as notícias todas andaram de vir em lote e réstia Um Sucivre que fino chegou esgalopado Disse Nhô Ricardão deu fogo no Ribeirão do Veado Titão Passos pegou trinta e tantos deles num bom combate no esporão da serra Os bebelos se desabelhavam zuretas de baixo de fatos machos e zuo de balas A tanto a gente em festa se alegrava Só Candelário subiu no jirau de varasque tinha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 344 mandado fazer nele era que dormia sem repousar e assim espiou esquecido tempo espiava as paradas distâncias feito um gavião querendo partir em vôo Agora era a guerra mesmo estariam rompendo as aleluias lá por lá Donde daí veio o Adalgizo Seô Hermógenes passou obra de seis léguas vai dar combate Nossa hora de fogo estava perto Assim os bebelos tinham de passar de fugida por ali no ÉJá resvés Só Candelário chega exclamava chorava dizia que nunca tinha chefiado pessoal tão valente feito nós com tantas capacidades E queria logo logo o inimigo vindo Todas as horas tocaiadas e de noite com um olho só se ia dormir que das armas não se largava A redobrar as sentinelas em avemarias e alvorada Combate vem é feito raio cai Tudo era alarme dado cuquiada um pontapé em tição o punhado de terra jogado para apagar as fogueiras de repente e se assobiava cruzado Vez deram até tiros mas nada não era só um boi loango com muita fome e pouco sono que veio sozinho pastando e deu a cara comprida ali foras dhora no capinzal bom Tudo que é estúrdio comparece em tempo de guerra Vote vais algum disse E teve gente que se riu disso até à beira da madrugada Daquilo tudo eu gostei gostava cada dia mais Fui aprendendo a achar graça no dessossego Aprendi a medir a noite em meus dedos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 345 Achei que em qualquer hora eu podia ter coragem Isso que vem de mansinho com uma risada boa cachaça aos goles dormida com a gente encostado em coronha de sua arma O que carece é acompanheiragem de todos no simples assim irmãos Diadorim e eu a sombra da gente uma só uma formava Amizade na lei dela Como a gente estava estava bem Só Candelário era o chefe ao meu gosto como eu imaginava Ah e Joca Ramiro Antes foi uma coisa acontecida repentina aquele alvoroço na cavalhada geral Aí o mundo de homens anunciando de si e sobre o vasto chegando da banda do Norte Joca Ramiro Doca Ramiro se gritava Só Candelário pulou em sela assim como ele sempre era mola de aço Deu um galope em encontro Nós todos de começo ficamos atarantados Vi um sol de alegria tanta nos olhos de Diadorim até me apoquentou Eu tinha ciúme Riobaldo tu vai ver como ele é Diadorim exclamou se abraçou comigo Parecia uma criança pequena naquela bela resumida satisfação Como era que eu ia poder raivar com aquilo E no abrevento a toda cavaleirama chegando empiquetados com ferragem de cascos no pedregulho Eram de ser uns duzentos quase tudo manos velhos baianos gente nova trazida Gritavam vivas para a gente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 346 saudavam E Joca Ramiro A figura dele Era ele num cavalo branco cavalo que me olha de todos os altos Numa sela bordada de Jequié em lavores de pretoebranco As rédeas bonitas grossas não sei de que trançado E ele era um homem de largos ombros a cara grande corada muito aqueles olhos Como é que vou dizer ao senhor Os cabelos pretos anelados O chapéu bonito Ele era um homem Liso bonito Nem tinha mais outra coisa em que se reparar A gente olhava sem pousar os olhos A gente tinha até medo de que com tanta aspereza da vida do serão machucasse aquele homem maior ferisse cortasse E quando ele saía o que ficava mais na gente como agrado em lembrança era a voz Uma voz sem pingo de dúvida nem tristeza Uma voz que continuava Sobre o no meio daquele rebuliço menos colhi de ver e de escutar Os chefes tinham apeado dos cavalos e os homens todos em balbúrdia com sensatez Só Candelário não arredava pé de Joca Ramiro e explicava as diversas coisas com grandes gestos quase ele não dava conta de se falar A demora era pouca Aí o forte bando tinha de se aluir para adiante em re dobro de marcha iam para ferrar fogo em lugar e hora determinados semelhante se soube Tempo de beberem um café Mas Joca Ramiro veio de lá em alargados vagarosos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 347 passos queria correr o acampamento saudar um e outro a palavrinha que fosse um dito de apreço e apraz O andar delevi certo alteado e imponente como o de ninguém Diadorim olha va e também tinha lágrimas vindo por caso Decidido deu um àfrente pegou a mão de Joca Ramiro beijou Joca Ramiro que firme contemplando só um instante seja mas o docemente achável com um calor diferente de amizade A quantia que ele gostava de Diadorim e pousou nas costas dele um abraço Ao que se virou para nós que estávamos E eu fiz como Diadorim nem sei porquê peguei a mão daquele homem beijei também Todos os que eram mais moços beijavam Os mais velhos tinham vergonha de beijar Este aqui é o Riobaldo o senhor sabe Meu amigo A alcunha que alguns dizem é Tatarana Isto Diadorim disse A tento Joca Ramiro tornando a me ver fraseou Tatarana pêlos bravos Meu filho você tem as marcas de conciso valente Riobaldo Riobaldo Disse mais Espera Acho que tenho um trem para você Mandou vir o dito e um cabra chamado João Frio foi lá nos cargueiros e trouxe Era um rifle reiúno peguei mosquetão de cavalaria Com aquilo Joca Ramiro me obsequiava Digo ao senhor minha satisfação não teve beiras Pudessem afiar inveja em mim pudessem Diadorim me olhava com um contentamento Me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 348 chamou de lado Vi que mesmo sendo assim querido e escolhi do de Joca Ramiro ele procedia mais de ficar de longe por ninguém se queixar não acharem que ali havia afilhadagem Não é que ele é mesmo o chefe de todos Não é que é mandante Diadorim me perguntava Era Mas eu não percebi o vivo do tempo que passava Eles já estavam indo de saída Montado no cavale branco Joca Ramiro deu uma despedida Vi que ele com os olhos caçou Diadorim Só Candelário gritou Viva Jesus em rotas e vantagens E num bufúrdio todos esporaram andaram ao assaz A alta poeira que demorava Aquilo parecia uma música tocando Desde ver a figura dele tinha parado no meio da gente noutra coisa não se falava Aí em festa feita a gente tramava nas armas Joca Ramiro entrava direto em combate então ia ser o fim da guerra Só Candelário queria ir também mas teve de aceitar ordem de ficar Diadorim me explicou Segundo disse que Só Candelário por aquela ânsia e soência de avançar a avançar agora podia desequilibrar a boa regra de tudo Seria para ficar de espera tapando o mundo aos que aqui o mundo quisessem Assim mais Joca Ramiro tinha mandado que nosso grupo se repartisse em aos três ou quatro piquetes para valer de vigiar bem os vaus e suas estradas Diadorim e eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 349 fizemos parte duma turma dessas duns quinze homens chefia de João Curiol fomos para a baixa dos Umbuzeiros lugar feio com os gravatás poeirentos e uns levantados de pedra Partindo desse vau a gente pega uma chapadinha a Chapadada SeriemaCorrendo A que parecia mesmo de propósito Porque foi lá com todo o efeito que a cara da caça se apareceu Aquilo terrível Conto já ao senhor duma vez Terrível tido por causa da ligeireza com que aquilo veio Surpresa a gente sempre tem o senhor sabe mesmo em espera dá a vez e não se vê à parva Não se crê que é Tão de repente O vento vinha bom da parte deles chegarem de formas que o galope pronto se ouviu Escoramos as armas Assim que eles eram uns vinte Passaram o ribeirão com tanta pressa que a água se esguichou farta vero bonito aquilo no sol Demos fogo Do que podia suceder Vi homem despencado demais os cavalos patatrás Dada a desordem Só cavalo sozinho podia fugir mas os homens no chão no cata cata Ao que a gente atirava Se morria se matava matava Os cavalos não Mas teve um veio à de se doidar se espinoteava o cavaleiro não agüentava na rédea chegaram até perto de nós aí todos os dois morreram de repente Meu senhor tudo numa estraga João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 350 extraordinária Mas aqueles eram homens Trampe logo que puderam os sobrantes deles se desapearam e rastejaram respondendo ao fogo Ah puderam tomar oculto atrás de outras fragas de pedra nisso a gente não conseguiu ter mão Ainda deviam de ser uns dez ou uns oito Afa que gritavam em febre de ódio xingando todo nome A gente também Anhãnhãe berrávamos fogo quando sinal de homem tremeluzia As balas rachavam as pedras só partiam escalhas Um se mostrou caiu logo Munição deles era pouca Fugir mesmo não podiam A gente atirava Aí deviam de ser uns seis que é a meiadúzia Aoê sabe quem está lá comandando o rastejador Roque me disse Sabe quem Ah eu sabia Eu tinha sabido o em desde o primeiro momento Era quem eu não queria para ser Era Zé Bebelo Assim eu condenado para matar Aqui eu não sei o que o senhor não sabe A fogo A crevo isto João Curiol gritava Antes do depois neles a gente ia ir a pano de facão Tralha Lá vai obra cão carujo Roncolho isto era a voz de Zé Bebelo gritava Eu não gritei Diadorim também atirava calado Munição deles quase nenhuma Eles deviam de ser uns quatro ou três O cano do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 351 meu rifle esquentava demais Roncolho Toma Um Freitas nosso gritou caiu muito ferido A bala era de Zé Bebelo Atiramos grosso Eles respondendo Respondiam pouco Deviam de ser os quantos Digo ao senhor eu gostava de Zé Bebelo Redigo que eu menos atirava do que pensava Como era possível assim com minha ajuda a morte dele Um homem daquela qualidade o corpo dele a idéia dele tudo que eu sabia e conhecia Nessas coisas eu pensei Sempre Zé Bebelo a gente tinha que pensar Um homem coisa fraca em si macia mesmo aos pulos de vida e morte no meio das duras pedras Senti em minha goela Aquela culpa eu carregava Arresto gritei Joca Ramiro quer esse homem vivo loca Ra miro quer este homem vivo Joca Ramiro faz questão A que nem não sei como tive o repente de isso dizer falso verdadeiro inventado Gritei firme repeti Os outros companheiros aceitavam aquilo diziam também até João Curiol loca Ramiro quer este homem vivo É ordem de Joca Ramiro De lá não atiravam mais Só bala ou outra só Arre à unha chefe o SanguedeOutro perguntou João Curiol respondeu que não Eles deviam de estar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 352 reservando balas para um final Ordem de loca Ramiro é pegar o homem vivo ainda eu disse Ali Zé Bebelo eu sal vasse Todos aprovaram Eu sei eu sei O senhor agora vai não me entendes O como são as coisas Todos me aprovaram e aí extraordinariamente eu dei um salto de espírito O que Mas então eu não tinha pensado tudo o real O que era que eu estava fazendo que era que eu estava querendo que pegassem vivo Zé Bebelo em carnes e ossos para depois judiarem com ele matarem de outro pior jeito a fácil Minha raiva deu em mim Me mordi me abri meamargo Tanto tudo ia sendo sempre por minha culpa E daí pedi tudo ao rifle é às cartucheiras Eu atirava atirava queria por toda a lei alcançar um tiro em Zé Bebelo para acabar com ele de uma vez sem martírio de sofrimentos Tu está louco Riobaldo Diadorim gritou rastejando para perto de mim travando em meu braço Joca Ramiroquer o homem vivo Joca Ramiro quer deu ordem todos agora me gritavam Assim contra mim assim todos O que eu havia de desmentir E não vi direito o fato O que vi foi Zé Bebelo aparecendo de repente garnisé O que ele tinha numa mão era o punhal na outra uma garrucha grande fogocentral Mas descarregou a garrucha atirando no chão perto dos pés dele mesmo Arrancou poeira João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 353 Por trás daquela poeira ele reapareceu dava pensamento assim aprumado teso de briga Lampejou com o punhal e esperou Ele mesmo estava querendo morrer à brava depressamente Olhei olhei De atirar nele de todo jeito não tive coragem Ah não tinha E um dos nossos não sei quem jogou o laço Zé Bebelo mal ainda bateu com um pé por se firmar e caiu arrastado voz que gritou Canalha Canalha Mas todos foram nele desarmaram do punhal Eu parei quieto vago se me estranho Não queria ah não queria que ele me reconhecesse Sobrevinha o tropel grande de cavaleiros Aos quais era Joca Ramiro com sua gente total Subiu pó e pó por ouros poeira de entupir o narii e os olhos Agarrei de mim sentado lá no mesmo meu lugar atrás do pedação de pedra O que eu estava era envergonhado O fuzuê se fez um enorme Sendo que chegavam também os outros grupos nossos escutei os brados de Só Candelário A roda de cavaleiros tantos no raso sempre maior Algum soprou o buzo do corno de boi Tocavam para o acampamento Mas Diadorim estava me caçando e mais João Curiol pelos mortos e feridos que também tínhamos e também ali ele devia de ter perdido algum trem seu objeto Homem danado ouvi o que um dizia Meus olhos firmavam no chão agora eu via que tremia Ipa Zé Bebelo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 354 oxém ganhou patente É estragador Eu falei É e neste entretanto Ao menos Diadorim raiava o todo alegre às quase danças Vencemos Riobaldo Acabouse a guerra A mais Joca Ramiro apreciou bem que a gente tivesse pegado o homem vivo Aquilo me rendia pouco sossego E depois Para que Diadorim Agora matam Vão matar Mal perguntei Mas o João Curiol virou e disse Matar não Vão dar julga mento Julgamento não ri não entendi Aposto que sei Aí foi ele mesmo quem quis O homem estúrdio Foi defrontar com Joca Ramiro e assim agarrado preso do jeito como desgraçado estava brabo gritou Assaca Ou me matam logo aqui ou então eu exijo julgamento correto legal e foi Aí Joca Ramiroconsentiu aprazme prometeu julgamento já isto o que falou João Curiol para me dar a explicação Agradeci mesmo isso a cisma não era para pôr peso em meus peitos Saímos ainda com João Concliz a ir em longe arredor prevenir os que faltavam A vinda geral A gente de Titão Passos e do Hermógenes mandava aviso de estarem em caminho Os do Ricardão já aos tantos chegavam Saí com esses de João Concliz Fui Fiz questão Eu não queria retornar logo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 355 com os outros não enxergar Zé Bebelo eu achava melhor Montamos e sumimos por aqueles campos essa estrada esses pequizeiros Homem engraçado homem doido Diadorim ainda achava Sabe o que ele falou como foi E me deu notícia Tinha sido aquilo Joca Ramirochegando real em seu alto cavalo branco e defrontando Zé Bebelo a pé rasgado e sujo sem chapéu nenhum com as mãos amarradas atrás e seguro por dois homens Mas mesmo assim Zé Bebelo empinou o queixo inteirou de olhar aquele cima a baixo Daí disse Dê respeito chefe O senhor está diante de mim o grande cavaleiro mas eu sou seu igual Dê respeito O senhor se acalme O senhor está preso Joca Ramiro respondeu sem levantar a voz Mas com surpresa de todos Zé Bebelo também mudou de toada para debicar com um engraçado atrevimento Preso Ah preso Estou pois sei que estou Mas então o que o senhor vê não é o que o senhor vê compadre é o que o senhor vai ver João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 356 Vejo um homem valente preso aí o que disse Joca Ramiro disse com consideração Isso Certo Se estou preso é outra coisa O que mano velho É é o mundo à revelia isso foi o fecho do que Zé Bebelo falou E todos que ouviram deram risadas Assim isso Toleimas todas Não por não Também o que eu não entendia possível era Zé Bebelo preso Ele não era criatura que se prende pessoa coisa de se haver às mãos Azougue vapor E ia ter o julgamento Tanto que voltamos manhã cedinho estávamos lá no acampo debaixo de forma Arte o julgamento O que isso tinha de ser achei logo que ninguém ao certo não sabia O Hermógenes me ouviu e gostou É e é Vamos ver vamos ver o que não sendo dos usos foi o que ele citou Ei agora é julgamento os muitos caçoavam em festa fona Cacei de escutar os outros Está certo está direito Joca Ramirosabe o que faz foi o que disse Titão Passos Melhor mesmo Carece de se terminar o mais definitivo com João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 357 essa cambada falou Ricardão E só Candelário que agora não se apeava vinha exclamando Julgamento É isto Têm de saber quem é que manda quem é que pode Ao espraia as margens Agora estavam todos mais todos reunidos estávamos no acampamento do ÉJá onde ali mal tanto povo cabia e lotes e pontas de burros a cavalhada pastando jagunços de toda raça e qualidade que iam e vinham co miam bebiam bafafavam Só Candelário tinha remetido dois homens longe no São José Preto só para comprarem foguetes que no fim teriarA de pipocar E onde estava Zé Bebelo Apartado recolhido de toda vista numa tenda de lona essa única que se tinha porque Joca Ramiro mesmo se desacostumava de dormir em barraca por o abafo do calor Não se podia ver o prisioneiro que ficava lá dentro feito guardado Contaram que ele aceitava comida e água e estivesse deitado num couro de vaca pitando e pensando Gostei O de que eu carecia era de que ele não botasse olhos em mim Eu apreciava tanto aquele homem e agora ele não havia de ser meu pesadelo Aonde é que vamos Onde é que esse julgamento vai ser perguntei a Diadorim quando surpreendi os suspensos de se ter saída Homem não sei Diadorim disso não sabia Só depois se espalhou voz Ao que se ia para a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 358 Fazenda SempreVerde depois da Fazenda BrejinhodoBrejo aquela a do doutor Mirabô de Melo Mas por que causa iam dar com aquele homem tamanha passeata Carecia algum Diadorim não me respondeu Mas pelo que não disse e disso tirei por tino Assim que Joca Ramiro fazia questã de navegar três léguas a longe com acompanhamento de todos os jagunços e capatazes e chefes e g prisioneiro levado em riba dum cavalo preto e todas as tropas com munição coisas tomadas e mantimentos de comida rumo do Norte tudo por glória O julgamento também Estava certo Saímos de trabuz No naquele a gente podia ver resenho de toda geração de montadas Zé Bebelo lá ia rodeado por cavaleiros de guarda pessoal de Titão Passos logo na cabeça do cortejo Ia com as mãos amarradas como de uso Amarrar as mãos não adiantava Eu não quis ver Me dava travo me ensombrecia Fui ficando para trás Zé Bebelo lá preso demais em conduzido Aquilo com aquilo aí a minha idéia diminuía Tanto o antes que fiz a viagem toda na rabeira ladeando o bando bonzinho de jegues orelhudos que fechavam a marcha A pobreza primeira deles me consolava os jumentinhos feito meninos Mas ainda pensei ele bom ou ele ruim podiam acabar com Zé Bebelo Quem tinha capacidade de pôr Zé Bebelo em julgamento Então ressenti um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 359 fundo desânimo Sem mais Zé Bebelo então o restado consolo só mesmo podia ser aqueles jericos baianos que de nascença sabiam todas as estradas Assim passamos pelo BrejinhodoBrejo assim chegamos na Sempre Verde Aí fomos chegando Que me deu de repente Esporeei e galopeis para dianteira fomentado repinchando dessas angústias Vim Eu queriá sobressalto de estar ali perto catar tudo nos olhos o que acontecia maior Nem não importei mais que Zé Bebelo me visse Passei quase para a frente de todos Estavam pensando que eu viesse com um recado Que foi Riobaldo que foi gritou para mim Diadorim Dei nenhuma resposta pessoa ali não me entendia Só mesmo Zé Bebelo era quem pudesse me entender A Fazenda SempreVerde era a casa enorme viemos saindo da estrada e entrando nas cheganças os curraisdeajuntamento Aquele mundo de gente que fazia vulto Parecia um mortório Antes passei afanhou a porteira aí fomos enchendo os currais com tantos os nossos cavalos A casadefazenda estava fechada Não carece de se abrir Não carece de se abrir era uma ordem que todos repetiam de voz em voz Ave não arrombassem aquilo era de amigos o doutor Mirabô de Melo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 360 mesmo ausente Esbarramos no eirado liso grande de tanto tamanho Aí tinham apeado Zé Bebelo do cavalo ele estava com as mão amarradas sim mas adiante do corpo feito algemas Ata amarra os pés também algum enfezado gritou Outro se chegou com uma boa peia de couro de capivara Que era que aquela gente pensavam Que era que queriam Doideira de todos Daí Joca Ramiro Só Candelário o Hermógenes o Ricardão Titão Passos João Goanhá eles todos reunidos no meio do eirado numa confa Mas Zé Bebelo não estava aperreado Tomou corpo num alteamento feito quando o peru estufa e estoura e caminhou em direitura Que que pequeno era bom homem às graças Caminhou mesmo Oxente Para diante de Joca Ramiro no meio do eirado tinham trazido um mocho deixado botado lá era um tamborete de tripés o assento de couro Zé Bebelo ligeiro nele se sentou Oxente se dizia A jagunçama veio avançando feito um rodear de gado fecharam tudo só deixando aquele centro com Zé Bebelo sentado simples e Joca Ramiro em pé Ricardão em pé Só Candelário em pé o Hermógenes João Goanhá Titão Passos todos Aquilo sim que sendo um atrevimento caso não o que maluqueira só Só ele sentado no mocho no meio de tudo Ao que cruzou as pernas E João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 361 Se abanquem Se abanquem senhores Não se vexem ainda falou de papeata com vênias e acionados e aqueles gestos de cotovelo querendo mostrar o chão em roda o dele Arte em esturdice nunca vista O que vendo os outros se franziram faiscando Acho que iam matar não podiam ser assim desfeiteados não iam aturar aquela zombaria Foi um silêncio todo Mandaram a gente abrir muito mais a roda para o espaço ficar sendo todo maior Se fez Mas de repente Joca Ramiro astuto natural aceitou o louco oferecimento de se abancar risonho ligeiro se sentou no chão defronte de Zé Bebelo Os dois mesmos se olharam Aquilo tudo tinha sido tão depressa e correu por todos um arruído entusiasmado dando aprovação Ah Joca Ramiro para tudo tinha resposta Joca Ramiro era lorde homem acreditado pelo seu valor A modo que Zé Bebelo sabe o senhor então o que ele fez Se levantou jogou para um lado o tamborete com pontapé e a esforço se sentou no chão também diante de Joca Ramiro Foi aquele falatório geral contente De coisas de tarasco assim a gente não gostava E até os outros chefes todos um por um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 362 mudaram de jeito não se sentaram também mas foram ficando moleados ou agachados por nivelar e não diferir Ao que o povaréu jagunço com ansiedade de ver e ouvir o que se desse se espremendo em volta sem remangar das armas Aquele povo rio que se enche com intervalo dos estremecimentos regular como o piscar de olho dum papagaio Vigiei o Hermógenes Eu sabia dele havia de vir o pior Com o que todo o mundo parado formaram uns silêncios Menos no mais Joca Ramiro ia falar as palavras consagradas O senhor pediu julgamento ele perguntou com voz cheia em beleza de calma Toda hora eu estou em julgamento Assim Zé Bebelo respondeu Aquilo fazia sentido Mas ele não estava lorpa nem desfeliz bom para a forca Que até capivara se senta é para pensar não é para se entristecer E rodou aprumada a cara vistoriando as caras de tantos homens Ar que inchou o peito e o queixo levantou valendo se valendo Criatura assim sente tudo adivinhado de relâmpago na ponta dos olhos da gente Eu tinha confiança nele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 363 Lhe aviso o senhor pode ser fuzilado duma vez Perdeu a guerra está prisioneiro nosso Joca Ramiro fraseou Com efeito Se era para isso então para que tanto requifife Zé Bebelo repostou com toda a ligeireza De ouvir dividi o riso do siso A pois Ele mesmo tinha inventado exigido esse julgamento e agora torcia o motivo como se em fim de um julgamento ninguém competisse de ser fuzilado Saranga ele não era Mas estava brincando com a morte que para cada hora livrava Ao que bastava Joca Ramiro perder um ponto da paciência um pouco Só que por sorte pa ciência Joca Ramiro nunca perdia motejou não mais Adianta querer saber muita coisa O senhor sabia lá para cima me disseram Mas de repente chegou neste sertão viu tudo diverso diferente o que nunca tinha visto Sabença aprendida não adiantou para nada Serviu algum Sempre serve chefe perdi conheço que perdi Vocês ganharam Sabem lá Que foi que tiveram de ganho O puro lorotal E atrevimento muito Os jagunços em roda não entendiam o escutado e uns indicavam por gestos que Zé Bebelo estava gira da idéia outros quadrando um calado de mau João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 364 sinal Até o que disse De lá não sai barca Assim se diz Joca Ramiro não reveio logo Mexeu com as sobrancelhas Só daí O senhor veio querendo desnortear desencaminhar os sertanejos de seu costume velho de lei Velho é o que já está de si desencaminhado O velho valeu enquanto foi novo O senhor não é do sertão Não é da terra Sou do fogo Sou do ar Da terra é é a minhoca que galinha come e cata esgaravata Que visse o senhor os homens o prospeito Aqueles muitos homens completamente os de cá e os de lá cercando o oco em raia da roda com as coronhas no chão e as tantas caras como sacudiam as cabeças com os chapéus rebuçantes Joca Ramiro tinha poder sobre eles Joca Ramiro era quem dispunha Bastava vozear curto e mandar Ou fazer aquele bom sorriso debaixo dos bigodes e falar como falava constante com um modo manso muito proveitoso Meus meninos Meus filhos Agora advai que aquietavam no estatuto Nanja o senhor nessa sossegação que se fie O que fosse eles podiam referver em imediatidade o banguelê num zunir que vespassem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 365 Estavam escutando sem entender estavam ouvindo missa Um por si de nada não sabia mas a montoeira deles exata soubesse tudo Estudei foi os chefes Naquela hora o senhor reparasse que é que notava Nada mesmo O senhor mal conhece esta gente sertaneja Em tudo eles gostam de alguma demora Por mim vi assim serenados assim os cabras estavam desejando querendo o sério divertimento Mas os chefes cabecilhas esses ao que menos expunham um certo se aborrecer segundo seja Cada um conspirava suas idéias a respeito do prosseguir e cumpriam seus manejos no geral esses com suas responsabilidades Uns descombinavam dos outros no sutil Eles pensavam Conforme vi Só Candelário duma banda de Joca Ramiro com Titão Passos e João Goanhá o Ricardão da outra com o Hermógenes Atual Zé Bebelo foi começando a conversar comprido na taramelagem como de seu gosto aí o Ricardão armou um bocejo e Titão Passos se desacocorou com a mão num ombro que devia de ter algum machucado O Hermógenes fez beiço João Goanhá aquele ar sonsado quase de tolo no grosso do semblante O Hermógenes botava pontas de olhar some escuro nuns visos Só Candelário ficado em pé sacudia o moroso das pernas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 366 Joca Ramiro deve de ter percebido aquele repiquete Porque ele sobre se virou para Só Candelário ao de indagar Meu compadre que é que se acha Sô Candelário fungou e logo abriu naqueles sestros que tinha movimental Sendo por ele querer se desengonçar e não podendo como era alto e magro duro aquele homem Sarre os onhos olhos amarelos de gavião dele hem Não achou as palavras para dizer disse Ao que a ver Ao que estou compadre chefe meu A lesto que Joca Ramiro assentiu com cabeça conforme se Só Candelário tivesse afirmado coisas de sincera importância Zé Bebelo abriu muito a boca tirando um ronco como que de propósito Alguns mais riram dele Em menos Joca Ramiro esperou um instante A gente pode principiar a acusação Aprovaram os todos todos Até Zé Bebelo mesmo Assim Joca Ramiro refalou normal seguro de sua estança por mais se impor uma fala que ele drede avagarava Dito disse que ali sumetido diante só estava um inimigo vencido em combates e que agora ia receber continuação de seu destino João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 367 Julgamento já Ele mesmo Joca Ramiro como de lei deixava para dar opinião no fim baixar sentença Agora quem quisesse podia referir acusação dos crimes que houvesse de todas as ações de Zé Bebelo seus motivos e propor condena Rés o que começasse quem O Hermógenes limpou a goela De primeira entrada eu vinha sabendo esse Hermógenes precisava de muitas vinganças Ele era sujeito vindo saindo de brejos pedras e cachoeiras homem toda cruzado De uns assim tudo o que escapa vai em retinge de medo ou de ódio Observei digo ao senhor Carece de não se perder sempre o vezo da cara do outro os olhos Advertido que pensei e se eu puxasse meu revól ver berrasse fogo nele Se acabava um Hermógenes estava ali são no vão e num átimo se via era papas de sangue ele voltava para o inferno Que era que me acontecia Eu tomava castigo mortal de mão de todos Deixasse que tomasse Medo não tive Só que a idéia boa passou muito fraca por mim entrada por saída Fiquei foi querendo ouvir e ver o que vinha mais Demarcava que iam acontecendo grandes fatos Desde Diadorim conseguindo caminho por entre o povo aí chegou se encostou em mim tão junto mesmo sem conversar mas respirava como João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 368 era com a boca tão cheirosa Háde haja o Hermógenes tinha levantado para falar Acusação que a gente acha é que se devia de amarrar este cujo feito porco O sangrante Ou então botar atravessado no chão a gente todos passava a cavalo por riba dele a ver se vida sobrava para não sobrar Quá Zé Bebelo debicou esticando o pescoço e batendo com a cabeça para diante diversas vezes feito picapau em seu oficio em árvore Mas o Hermógenes com aquilo não somou foi pondo Cachorro que é bom para a forca O tanto que ninguém não provocou não era inimigo nosso não se buliu com ele Assaz que veio por si para matar para arrasar com sobejidão de cacundeiros Dele é este Norte Veio a pago do Governo Mais cachorro que os soldados mesmos Merece ter vida não Acuso é isto acusação de morte O diacho cão Ih Arre foi o que Zé Bebelo ponteou Assim contracenando todo o tempo medo do Hermógenes remedou de feias caretas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 369 É o que eu acho É o que eu acho O Hermógenes então quase gritou por terminar Sujeito que é um tralha Posso dar uma resposta Chefe Zé Bebelo perguntou sério a joca Ramiro Joca Ramiro concedeu Mas para falar careço que não me deixem com as mãos amarradas Nisso não havendo razão ou dúvida E Joca Ramiro deu ordem João Frio que de perto dele não se apartava veio de lá cortou e desatou a manupeia nas juntas dos pulsos Que era que Zé Bebelo ia poder fazer Isto Pr aqui mais pr aqui por este mais este cotovelo disse batendo mão e mão com o acionado de desplante E riu chiou feito um sõim o caretejo Parecia mesmo querer fazer raiva no outro em vez de tomar cautela Vi que tudo era enfinta mas podia dar em mal O Hermógenes pulou passo fez menção de reluzir faca Se teve mão em si foi por forte costume E Joca Ramiro também tinha atalhado com uma aspação Tento e paz compadre manovelho Não vê que ele ainda está é azuretado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 370 Ei Com seu respeito discordo Chefe maximé Zé Bebelo falou Retenho que estou frio em juízo legal raciocínios Reajo é com protesto Rompo embargos Porque acusação tem de ser em sensatas palavras não é com afrontas de ofensa de insulto Encarou o Hermógenes Homem não abusa homem Não alarga a voz Mas o Hermógenes arriçado crível que estivesse todo no poder bravo de uma coceira falou para Joca Ramiro e para todos que estávamos lá falou numa voz rachada em duas voz torta entortada Tibes trapo o desgraçado desse canalha que me agravou Me agravou mesmo estando assim vencido nosso e preso Meu direito é acabar com ele Chefe Vi a mão do perigo Muitos homens resmungaram em aprovo ali rodeando os tantos dez ou vinte círculos anéis de gente Rentes os do bando do Hermógenes chegaram a dar altas palavras de calca pá Questionouse a respeito disso Tinham barulhos na voz Mesmo os chefes entre si cochicharam Mas Joca Ramiro sabia represar os excessos Joca Ramiro era mesmo o tutumumbuca grande maioral Temperou somente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 371 Mas ele não falou o nomedamãe amigo E era verdade Todo o mundo concordou pelo que vi de todos Só para o nomedamãe ou de ladrão era que não havia remédio por ser a ofensa grave Com Joca Ramiro explicar assim não havia jagunço que não aceitasse o razoável da ponderação o relembrado O Hermógenes mesmo se melou na atrapalhação das ligeirezas e aí tinha de condizer Nada ele não disse mas abriu quadrada a boca em careta de quem provou pedra de sal E Zé Bebelo mesmo aproveitou para mudar o aspecto para uma certa circunspecção Se via que ele pensava a curto ganho no estreito por detrás daquele sonsar Trabalho de idéia em aperto pelo pão de salvar sua vida da estrosca Imediato Joca Ramiro deu a vez a Só Candelário não deixando frouxura de tempo para mais motim Hê e você compadre Qual é a acu sação que se tem Sobre o que sobreveio Só Candelário arre avante aos priscos a figura muita o gibão desombrado Sobrava fala Com efeito Com efeito falou Vai vai forteou mais a voz Só quero pergunta se ele convérn em nós dois resolvermos isto à faca Pergunto para briga de duelo É o que acho Carece mais de discussão não Zé Bebelo e eu nós dois na faca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 372 Só Candelário mais longe não conseguia de dizer só repetia aquilo desafio e no mais se mexer feito com sãoguido ou escaravelho Sem raiva quase nenhuma notei mas também sem nenhuma paciência Só Candelário sendo assim Mas aí Joca Ramiro remediou dizendo resistencioso e escondeu o de que ria Resultado e condena a gente deixa para o fim compadre Demore que logo vai ver Agora é a acusação das culpas Que crimes o compadre indica neste homem Crime Crime não vejo É o que acho por mim é o que declaró com a opinião dos outros não me assopro Que crime Veio guerrear como nós também Perdeu pronto A gente não é jagunços A pois jagunço com jagunço aos peitos papos Isso é crime Perdeu rachou feito umbuzeiro que boi comeu por metade Mas brigou valente mereceu Crime que sei é fazer traição ser ladrão de cavalos ou de gado não cumprir a palavra Sempre eu cumpro a palavra dada gritou de lá Zé Bebelo Só Candelário olhou encarado para ele rente repente como se nos instantes antes não soubesse que ele estava ali a três passos Só assim mesmo prosseguiu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 373 Pois sendo assim o que acho é que se deve de tornar a soltar este homem com o compromisso de ir ajuntar outra vez seu pessoal dele e voltar aqui no Norte para a guerra poder continuar mais perfeita diversificada Ressaltados os homens ouvindo isso rosnaram de bem cá e lá coragem sempre agradava Diadorim apertou meu braço como sussurrou Doideira dele Riobaldo Só Candelário está doido varrido Aí podia ser Mas eu tinha relanceado um afio de onde ódio que ele mirou no Her mógenes enquanto falando e entendi Só Candelário não gostava do Hermógenes Sendo que ele podia até nem saber disso não ter noção firme de que não gostava mas era a maior verdade Sucinto só por conta disso eu apreciei demais aquele rompante Só Candelário esbarrou de falar secado Só aos bufos surdo de se ver que ele tinha feito o grande esforço todo sopitante Se afundava para os altos Apraz ao senhor compadre Ricardão Joca Ramiro solicitou passando a vez Aquele retardou tanto para começar a dizer que pensei fosse ficar para sempre calado Ele era o famoso Ricardão o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 374 homem das beiras do Verde Pequeno Amigo acorçoado de importantes políticos e dono de muitas posses Composto homem volumoso de meças Se gordo próprio não era isso só por no sertão não se ver nenhum homem gordo Mas um não podia deixar de se admirar do peso de tanta corpulência a coisa de zebu guzerate As carnes socadas em si parecia que ele comesse muito mais do que todo o mundo mais feijão fubá de milho mais arroz e farofa tudo imprensado calcado sacas e sacas Afinal ele falou fosse o Almirante Balão Compadre Joca Ramiro o senhor é o chefe O que a gente viu o senhor vê o que a gente sabe o senhor sabe Nem carecia que cada um desse opinião mas o senhor quer ceder alar de prezar a palavra de todos e a gente recebe essa boa prova Ao que agradecemos como devido Agora eu sirvo a razão de meu compadre Hermógenes que este homem Zé Bebelo veio caçar a gente no Norte sertão como mandadeiro de políticos e do Governo se diz até que a soldo A que perdeu perdeu mas deu muita lida prejuízos Sérios perigos em que estivemos o senhor sabe bem compadre Chefe Dou a conta dos companheiros nossos que ele matou que eles mataram Isso se pode repor E os que ficaram inutilizados feridos tantos e tantos Sangue e os sofrimentos desses clamam Agora que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 375 vencemos chegou a hora dessa vingança de desforra A ver fosse ele que vencesse e nós não onde era que uma hora destas a gente estava Tristes mortos todos ou presos mandados em ferros para o quartel da Diamantina para muitas cadeias para a capital do Estado Nós todos até o senhor mesmo sei lá Encareço chefe A gente não tem cadeia tem outro despacho não que dar a este só um é a misericórdia duma boa bala de metebucha e a arte está acabada e acertada Assim que veio não sabia que o fim mais fácil é esse Com os outros não se fez Lei de jagunço é o momento o menos luxos Relembro também que a responsabilidade nossa está valendo respeitante ao seo Sul de Oliveira doutor Mirabô de Melo o velho Nico Estácio compadre Nhô Lajes e coronel Caetano Cordeiro Esses estão agüentando acossamento do Governo tiveram de sair de suas terras e fazendas no que produziram uma grande quebra vai tudo na mesma desordem A pois em nome deles mesmo eu sou deste parecer A condena seja sem tardança Zé Bebelo mesmo zureta sem responsabilidade nenhuma verte pemba perigoso A condena que vale legal é um tiro de arma Aqui chefe eu voto A babas do que ele vinha falando o povaréu jagunço movia que louvava confirmava Aí nhães pelos que davam mais João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 376 demonstração medi quantidade dos que eram do Ricardão próprio Zé Bebelo estava definito eu pensei qualquer rumorzinho de salvação para ele se mermando se no mel no pra passar Mire e veja o senhor e o pior de tudo era que eu mesmo tinha de achar correto o razoado do Ricardão reconhecer a verdade daquelas palavras relatadas Isso achei meio me entristeci Por quê O justo que era aquilo estava certo Mas de outros modos que bem não sei não estava Assim por curta idéia que eu queira dividir certo no que Zé Bebelo tinha feito mas errado no que Zé Bebelo era e não era Quem sabe direito o que uma pessoa é Antes sendo julgamento é sempre defeituoso porque o que a gente julga é o passado Eh bê Mas para o escriturado da vida o julgar não se dispensa carece Só que uns peixes tem que nadam rioarriba da barra às cabeceiras Lei é lei Loas Quem julga já morreu Viver é muito perigoso mesmo Nisso Joca Ramiro já tinha transferido a mão de fala a Titão Passos esse era como um filho de Joca Ramiro estava com ele nos segredos simples da amizade Abri ouvidos Idéia me veio que ia valer vivo o que ele falasse Aí foi João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 377 Ao que aprecio também Chefe a distinção minha desta ocasião de dar meu voto Não estou contra a razão de companheiro nenhum nem por contestar Mas eu cá sei de toda consciência que tenho a responsabilidade Sei que estou como debaixo de juramento sei porque de jurado já servi uma vez no júri da Januária Sem querer ofender ninguém vou afiançando O que eu acho é que é o seguinte que este homem não tem crime constável Pode ter crime para o Governo para delegado e juizdedireito para tenente de soldados Mas a gente é sertanejos ou não é sertanejos Ele quis vir guerrear veio achou guerreiros Nós não somos gente de guerra Agora ele escopou e perdeu está aqui debaixo de julgamento A bem se na hora a quente a gente tivesse falado fogo nele e matado aí estava certo estava feito Mas o refrego de tudo já se passou Então isto aqui é matadouro ou talho Ah eu não Matar não Suas licenças Coração meu recomprei com as palavras de Titão Passos Homem em regra capaz de mim Cacei jeito de sorrir para ele aprovei com a cabeça não sei se ele me viu E mais não houve rebuliço Só que notei estopim os homens ficando diferentes Agora tomavam mais ânsia de saber o que era que iam decidir os manantas O pessoal próprio de Titão Passos era que formavam João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 378 o bando menor de todos Mas gente muito valente Valentes como aquele bom chefe De que bando eu sou comigo pensei Vi que de nenhum Mas dali por diante eu queria encostar direto com as ordens de Titão Passos Ele é meu amigo Diadorim no meu ouvido falou Ele é bisneto de Pedro Cardoso trasneto de Maria da Cruz Mas eu nem tive surto de perguntar a Diadorim o resumo do que ele pensasse loca Ramiro agora queria o voto de João Goanhá o derradeiro falante que rente dificultava João Goanhá fez que ia levantar mas permaneceu agachado mesmo Resto que retardou um pouco no dizer e o que disse que digo Eu cá ché eu estou plo qu o ché pro fim expedir Mas não é bem o caso compadre João Vocês dão o voto cada um Carece de dar foi o que Joca Ramiro explicou mais A tanto João Goanhá se levantou espanou com os dedos no nariz Daí pegou e repuxou seu canhão de cada manga Arrumou a cintura com as armas num propósito de decisão Que ouvi um tlim moveu meus olhos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 379 Antão pois antão ele referiu forte meu voto é com o compadre Só Candelário e com meu amigo Titão Passos cada com cada Tem crime não Matar não Eh diá Rezo que ele falou aquilo aquele capiau peludo renasceu minha alegria Rezo que falou grosso como se fosse por um destaque de guerra De ripipe espiei o Hermógenes esse preteou de raiva O Ricardão não acabava de cochilar cara grande de sapo O Ricardão no exatamente era quem mandava no Hermógenes Cochilava fingido eu sabia E agora Que é que tinha mais de ter Não estava tudo por bem em bem terminado Ah não o senhor mire e veja Assim Joca Ramiro era homem de nenhuma pressa Se abanava com o chapéu Ao em uma soberania sem manha de arrocho perpasseou os olhos na roda do povo Antante disse alto Que tenha algum dos meus filhos com necessidade de palavra para defesa ou acusação que pode depor Tinha Não tinha Todo o mundo se olhava num desconcerto como quem diz lá cada um com a cara atrás da sela Para falar ali não estavam Por isso nem ninguém tinha esperado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 380 Com tanto uns fatos extraordinários Haja veja que Joca Ramiro repetiu o perguntar Que por aí no meio de meus cabras valentes se terá algum que queira falar por acusação ou para defesa de Zé Bebelo dar alguma palavra em favor dele Que pode abrir a boca sem vexame nenhum Artes o advogo aí é que vi Alguém quisesse Duvidei foi o que foi Digo ao senhor estando por ali para mais de uns quinhentos homens se não minto Surgiu o silêncio deles todos Aquele silêncio que pior que uma alarida Mas por que não davam brados não falavam todos total de torna vez para Zé Bebelo ser botado solto me enfezei Sus pensei com um empurrão de força em mim Ali naquelhorinha meu senhor foi que eu lambi idéia de como às vezes devia de ser bom ter grande poder de mandar em todos fazer a massa do mundo rodar e cumprir os desejos bons da gente De sim sim pingo Acho que eu tinha suor nas beiras da testa Ou então eu quis ou então que se armasse ali mesmo rixa feia metade do povo para lá metade para cá uns punindo pelo bem da justiça os outros nas voltas da cauda do demo Mas que facae fogo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 381 houvesse e braços de homens até resultar em montes de mortos e pureza de paz Sal que eu comi só Abre que ah outra vez Joca Ramiro reproduziu a pergunta Que se tiver algum e isto e aquilo tudo o mais Me armei dum repente Me o meu Eu agora ia falar por que era que não falava Aprumei corpo Ah mas não acertei em primeiro um outro começou Um Gu certo papaabóbora beiradeiro tarraco mas da cara comprida esse discorreu Com vossas licenças chefe cedo minha rasa opinião Que é se vossas ordens forem de se soltar esse Zé Bebelo isso produz bem Oséquio feito que se faz vem a servir à gente mais tarde em alguma necessidade que o caso for Não ajunto por mim observo é pelos chefes mesmo com esta vênia A gente é braço darmas para o risco de todo dia para tudo o miúdo do que vem no ar Mas se alguma outra ocasião depois que Deus nem consinta algum chefe nosso cair preso em mão de tenente de meganhas então também hão de ser tratados com maior compostura sem sofrer vergonhas e maldades A guerra fica sendo de bemcriação bom estatuto Aquilo era razoável A ver tinha saído tão fácil até Joca Ramiro em passagens animou o Gu com acenos Tomei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 382 coragem mais comum Abri a minha boca AI mas um outro campou ligeiro tomou a mão para falar Era um denominado Dosno ou Dosmo groteiro de terras do Cateriangongo entre o Ribeirão Formoso e a Serra Escura e ele tinha olhos muito incertos e vesgava Que era que podia guardar para dizer um ho mem desses capiau medido por todos os capiaus do meu Norte Escutei Tomém pego licença sós chefes Em que pior não veja destorcendo meu desatino Éque éque Que eu acho que seja melhor em antes de se remitir ou de se cumprir esse homem pois bem indagar de fazer ele dizer ondé que estão a fortuna dele em cobre A mó que se diz que ele possederá o bom dinheiro em quantia amoitado por aí É só por mim é só com vosso perdão Com vosso perdão Riram uns por que é que riram rissem Dei como um passo adiante levantei mão e estalei dedo feito menino em escola Comecei a falar Diadorim ainda experimentou de me reter decerto assustado Espera Riobaldo tive o siso da voz dele no ouvido Aí eu já tinha principiado O que eu acho disse supri neste mais menos fraseado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 383 Dê licença grande chefe nosso Joca Ramiro que licença eu peço O que tenho é uma verdade forte para dizer que calado não posso ficar Digo ao senhor que eu mesmo notei que estava falando alto demais mas de me abrandar não tinha prazo nem jeito eu já tinha começado Coração bruto batente por debaixo de tudo Senti outro fogo no meu rosto o salteio de que todos a finque me olhavam Então eu não aceitei niw guém o que eu não queria era ver o Hermógenes Não pôr as capas dos olhos nem a idéia no Hermógenes que Hermógenes nenhum neste mundo não tivesse nenhum para mim nenhum de si Por isso prendi minhas vistas só num homem um que foi o qualquer sem nem escolha minha e porque estava bem por minha frente um pardo Pobre esse notando que recebia tanto olhar abaixou a cara amassado de não poder outra coisa No eu falando Eu conheço este homem bem Zé Bebelo Estive do lado dele nunca menti que não estive todos aqui sabem Saí de lá meio fugido Saí porque quis e vim guerrear aqui com as ordens destes famosos chefes vós Da banda de cá foi que briguei e dei mão leal com meu cano e meu gatilho Mas agora eu afirmo Zé Bebelo é homem valente de bem e inteiro que honra o raio da palavra que dá Aí E é chefe jagunço de primei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 384 ra sem ter ruindades em cabimento nem matar os inimigos que prende nem consentir de com eles se judiar Isto afirmo Vi Testemunhei Por tanto que digo ele merece um absolvido escorreito mesmo não merece de morrer matado àtoa E isto digo porque de dizer eu tinha como dever que sei e cumprindo a licença dada por meu grande chefe nosso Joca Ramiro e por meu cabochefe Titão Passos Tirei fôlego de fôlego latejei Sei que me desconheci Suspendi do que estava A guerra foi grande durou tempo que durou encheu este sertão Nela todo o mundo vai falar pelo Norte dos Nortes em Minas e na Bahia toda constantes anos até em outras partes Vão fazer cantigas relatando as tantas façanhas Pois então xente hão de se dizer que aqui na SempreVerde vieram se reunir os chefes todos de bandos com seu cabras valentes montoeira completa e com o sobregoverno de Joca Ramiro só para no fim fim se acabar com um homenzinho sozinho se condenar de matar Zé Bebelo o quanto fosse um boi de corte Um fato assim é honra Ou é vergonha Para mim é vergonha o que em brilhos ouvi e quem falou assim foi Titão Passos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 385 Vergonha Raios diabos que vergonha é Estrumes A vergonha danada raios danados que seja assim e quem gritou isto a mais foi Só Candelário Tudo tão aos traques derepente não sei eu nem acabei o relance que me arrepiou minha idéia que eu tinha feito grande toleima que decerto ia ser para piorar o que foi no eu dizer que Zé Bebelo não matava os presos porque se do nosso lado se matava então não iam gostar de escutar aquilo de mim que podia parecer forte reprovação Aos brados bramados de Sô Candelário temi perder a vez de tudo falar Aí nem olhei para Joca Ramiro eu achasse ligeiro demais que Joca Ramiro não estava aprovando meu saimento Aí porque nem não tive tempo porque imediato senti que tinha de completar o meu assim A ver Mas se a gente der condena de absolvido soltar este homem Zé Bebelo a mãvazias punido só pela derrota que levou então eu acho é fama grande Fama de glória que primeiro vencemos e depois soltamos em tanto terminei de pensar que meu receio era tolo que jagunço pelo que é quase que nunca pensa em reto eles podiam achar normal que da banda de cá os inimigos presos a gente matasse João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 386 mas apreciavam também que Zé Bebelo como contrário tivesse deixado em vida os companheiros nossos presos Gente airada Seja fama de glória Só o que sei Chagas de Cristo eta Só Candelário tornou a atalhar Desadorouse Senhor de bofe bruto sapateou de arrompe os de perto se afastando depressa por a ele darem espaço Agora o Hermógenes havia de alguma coisa dizer O Hermógenes experimentava os dentes nos beiços Ricardão fazia que cochilava Só Candelário era de se temer inteiro Somente que em vez do trestampo que a gente esperasse e que ninguém bridava ele Só Candelário espiou para cima às pasmas consoante sossegado estúrdio recitou assim em tom a bonita voz de espírito Seja a fama de glória Todo o mundo vai falar nisso por muitos anos louvando a honra da gente por muitas partes e lugares Hão de botar verso em feira assunto de sair até divulgado em jornal de cidade Ele estava mandarino mesmo Aí eu pensei eu achei Não Eu disse Disse o verdadeiro o ligeiro o de não se esperar para dizer E que perigo que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 387 tem Se ele der a palavra de nunca mais tornar a vir guerrear com a gente decerto cumpre Ele mesmo não há de querer tornar a vir É o justo Melhor é se ele der a palavra de que vaisembora do Estado para bem longe em desde que não fique em terras daqui nem da Bahia eu disse disse mansinho mãe mansice caminhos de cobra Tenho uns parentes meus em Goiás Zé Bebelo falou avindado de repente E falou quando não se aguardava e também assim com tanta vontade de falar que alguns muito se riram Eu não ri Tomei uma respiração e aí vi que eu tinha terminado Isto é que comecei a temer Num esfrio num átimo me vesti de pavor O que olhei Joca Ramiro teria estado a gestos Joca Ramiro fazendo um gesto então queria que eu calasse absolutamente a boca eu não possuía vênia para discorrer no que para mim não era de minha alta conta Eu quis de repentemente tornar a ficar nenhum ninguém safado humildezinho Mas Titão Passos trucou senhormoço Titão Passos levantava a testa Ele que no normal falava tão pouco pudesse dar capacidade de tantas constâncias João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 388 Titão Passos disse Então ele indo para bem longe está punido desterrado É o que eu voto por justo Crime maior ele teve Pelos companheiros nossos que morreram ou estão ofendidos passando mal tenho muito dó Só Candelário disse Mas morrer em combate é coisa trivial nossa para que é que a gente é jagunço Quem vai em caça perde o que não acha Titão Passos disse E mortes tantas isso não é culpa de chefe nenhum Digo E mais que esses grandes de nossa amizade doutor Mirabô de Melo coronel Caetano e os outros hão de concordar com a resolução que a gente tome em desde que seja boa e de bom proveito geral É o que eu acho Chefe Às ordens Titão Passos terminou O silêncio todo era de Joca Ramiro Era de Zé Bebelo e de Joca Ramiro Ninguém não reparava mais em mim não apontavam o eu ter falado o forte solene o terrivelmente e então agora para todos os de lá eu não existisse mais existido Só Diadorim que quase me abraçava Riobaldo tu disse bem Tu é homem de todas valentas Mas os outros perto de mim por que era que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 389 não me davam louvor com as palavras Gostei de ver Tatarana Assim é que é assim Só que eu tinha pronunciado bem Diadorim mais me disse e que tinha sido menos por minhas tantas palavras do que pelo rompante brabo com que falei acendido exportando uma espécie de autoridade que em mim veio E para Zé Bebelo eu não tinha olhado Que era que ele de mim devia de estar pensando E Joca Ramiro Esses se fronteavam um ao outro e o em meio se mediam Rente que nesse resto de tempo decerto cruzaram palavras que não deram para eu ouvir Pois porque Zé Bebelo teve ordem de falar devia de ter tido A licença Principiou Foi discorrendo vagaroso de entremeado coisa sem coisa Vi e vi ele estava só apalpando o vau Sujeito finório Aí o qualquer zunzo que houvesse ele colhia e entendia no ar estava com as orelhas por isso aquela cabeça sobrenadando Já um pouco descabelado Mas serenou sota para diante Altas artes que agradeço senhor chefe Joca Ramiro este sincero julgamento esta bizarria Agradeço sem tremor de medo nenhum nem agências de adulação Eu José Zé Bebelo é meu nome José Rebelo Adro Antunes Tataravô meu Francisco Vizeu Antunes foi capitãodecavalos Demarco idade de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 390 quarentaeum anos sou filho legitimado de José Ribamar Pacheco Antunes e Maria Deolinda Rebelo e nasci na bondosa vila mateira do Carmo da Confusão Oragos Para que a tanta sensaboria toda essas filosofias Mas porém ele pronunciava com brio sem as papeatas de em antes sem o remonstrar nem os reviretes Agradeço os que por mim bem falaram e puniram Vou depor Vim para o Norte pois vim com guerra e gastos à frente de meus homens minha guerra Sou crescido valente contra homens valentes quis dar o combate Não está certo Meu exemplo em nomes foram estes Joca Ramiro Joãozinho Bem Bem Só Candelário e tantos outros afamados chefes uns aqui presentes outros que não estão Briguei muito mediano não obrei injustiça nem ruindades nenhumas nunca disso me reprovam Desfaço de covardes e de biltragem Tenho nada ou pouco com o Governo não nasci gostando de soldados Coisa que eu queria era proclamar outro governo mas com a ajuda depois de vós também Estou vendo que a gente só brigou por um malentendido maximé Não obedeço ordens de chefes políticos Se eu alcançasse entrava para a política mas pedia ao grande Joca Ramiro que encaminhasse seus brabos cabras para João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 391 votarem em mim para deputado Ah este Norte em remanência progresso forte fartura para todos a alegria nacional Mas no em mesmo o afã de política eu tive e não tenho mais A gente tem de sair do sertão Mas só se sai do sertão é tomando conta dele a dentro Agora perdi Estou preso Mudei para adiante Perdi isto é por culpa de máhora de sorte o que não creio Altos descuidos alheios De ter sido guardado prisioneiro vivo e estar defronte de julgamento isto é que eu louvo e que me praz Prova de que vós nossos jagunços do Norte são civilizados de calibre que não matam com o distrair de mão um qualquer inimigo pegado Isto aqui não são essas estrebarias Estou a cobro de desordens malinas Estimei Dou viva Joca Ramiro seus outros chefes comandantes de seus terços E viva sua valente jagunçada Mas homem sou Sou de altas cortesias Só que medo não tenho nunca tive no travável Anda que fez um gesto bonito Assaz aí se espiritou Ao que de vez foi grandeúdo Uê vim guerrear de peito aberto com estrondos Não vim socolor de disfarces com escondidos e logro Perdi por um desguardo Não por má chefia minha Não devia de ter querido contra Joca Ramiro dar combate não deviade Não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 392 confesso culpa nem retrauta porque minha regra é tudo que fiz valeu por bem feito É meu consueto Mas hoje sei não devia de Isto é depende da sentença que vou ter neste nobre julga mento Julgamento digo que com arma ainda na mão pedi e que deste grande Joca Ramiro mereci de sua alta fidalguia Julgamento isto é o que a gente tem de sempre pedir Para quê Para não se ter medo É o que comigo é Careci deste julgamento só por verem que não tenho medo Se a condena for às ásperas com a minha coragem me amparo Agora se eu receber sentença salva com minha coragem vos agradeço Perdão pedir não peço que eu acho que quem pede para escapar com vida merece é meiavida e dobro de morte Mas agradeço fortemente Também não posso me oferecer de servir debaixo darmas de Joca Ramiro porque tanto era honra mas não condizia bem Mas minha palavra dando minha palavra as mil vezes cumpro Zé Bebelo nunca roeu nem torceu E sem mais por dizer espero vossa distinta sentença Chefe Chefes Digo ao senhor foi um momento movimentado Zé Bebelo acabando nas palavras ali sentadinho ficou repequeno pequenininho encolhido ao mais Já um pouco descabelado Era uma bolinha de gente Fechouse um homem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 393 Olhei olhei Só a gente mal ouvisse o sussurro de todos lá que foi bom conheci que era O sujeito machacá Assopres Arre maluco é mas frege Capaz que castra garrote com as unhas dos dedos Não o que Diadorim não disse mas ele estava assim por pálido Vai vi os chefes Eles conversaram um circuitozinho ligeiro O Hermógenes e o Ricardão e Joca Ramiro para eles sorriu seus compadres O Ricardão e o Hermógenes eles dois eram chouriço e morcela Só Candelário conforme seus conformes avançanteJoca Ramirosorriu para Só Candelário O jeito de João Goanhá richarte Só Titão Passos espiava desolhadamente ele tão aposto homem tão bom tão sério com as mãos ajuntadas baixo em frente da barriga só esperava o nada virar coisas Acontecesse o que Joca Ramiro ia decidir Sobre o simples o Hermógenes ainda ia se debruçar para um dizer em orelha Mas Joca Ramiro encurtou tudo num gesto Era a hora O poder dele veio distribuído endireito em Zé Bebelo O quando falou O julgamento é meu sentença que dou vale em todo este norte Meu povo me honra Sou amigo dos meus amigos políticos mas não sou criado deles nem cacundeiro A sentença vale A decisão O senhor reconhece João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 394 Reconheço Zé Bebelo aprovou com firmeza de voz ele já descabelado demais Se fez que as três vezes até Reconheço Reconheço Reconheço estreques estalos de gatilho e pinguelo o que se diz essas detonações Bem Se eu consentir o senhor irse embora para Goiás o senhor põe a palavra e vai Zé Bebelo demorou resposta Mas foi só minutozinho E pois A palavra e vou Chefe Só solicito que o senhor determine minha ida em modo correto como compertence A falando Que se ainda tiver homens meus vivos presos também por aí que tenham ordem de soltura ou licença de vir comigo igualmente Ao que Joca Ramiro disse Topo Topo E que tendo nenhum eu viaje daqui sem vigia nenhuma nem guarda mas o senhor me fornecendo animalde sela arreado e as minhas armas ou boas outras com alguma munição mais o decomer para os três dias legal João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 395 Ao que aí Joca Ramiro assim três vezes Topo Topo Então honrado vou Mas agora com sua licença a pergunta faço pelo quanto tempo eu tenho de estipular sem voltar neste Estado nem na Bahia Por uns dois três anos Até enquanto eu vivo for ou não der contraordem Joca Ramiro ai disse em final E se levantou num de repente Ah quando ele levantava puxava as coisas consigo parecia as pessoas o chão as árvores desencontradas E todos também ao em um tempo feito um boi só ou um gado em círculos ou um relincho de cavalo Levantaram campo Reinou zoeira de alegria todo o mundo já estava com cansaço de dar julgamento e se tinha alguma certa fome Diadorim me chamou fomos caminhando no meio da queleléia do povo Mesmo eu vi o Hermógenes ele se amargou engolindo de boca fechada Diadorim eu disse esse Hermógenes está em verde nas portas da inveja Mas Diadorim por certo não me ouviu bem pelo que começou dizendo Deus é servido Não sosseguei Aquele pessoal tribuzava O encarregado da SempreVerde abriu cozinha panelas grandes e caldeirões cozinhando de tudo o que vale a valer Tinha sempre algum batendo mãodepilão Digo não por João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 396 nada não mas pelo exato ser eu tinha estalando nos meus olhos a lembrança do Hermógenes na hora do julgamento De como primeiro ele soturno não se sobressaía só escancarava muito as pernas facãozão na mão mas depois ficou artimanhado com uma tristeza fechada aos cantos como cão que consome raivas E o Ricardão Esse uma pesadureza na cara toda mas quando esbarrou de cochilar aqueles olhos grossos rebolando que nem apostemados sem bom preceito Assente enfim tudo estava passado terminado Estava Pois pedi espera a Diadorim na beira do rego eu queria cuidar do meu cavalo dissesse desarrear e escovar Dei com o Hermógenes Dito a bem eu cacei onde estava o Hermógenes tempo parei perto dele Virando que eu quis ir lá e escutar quase quis Um dizer ouvi Mamãezada Ao que seria O Hermógenes não era nenhum toleimado para desfazer na decisão de Joca Ramiro MamãezadaMais não ouvi relembro que não sei direito Com pouco Zé Bebelo estava dando as despedidas Se viu montado num bom cavalo de duas cores arreado com sela boa de Minas Velhas Deram que levasse carabina suas outras armas e cruz cruz cartucheiras Aí já tinha jantado E o bornal com matlotagem Sobre o cavalo se houve se upou na sela Se foi Saiu em marcha de estrada sem olhar para trás o sol na beira João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 397 Só o Triol devia de prestar acompanhamento a ele por o uso de resguardado território de uma légua Me deu certa tristeza Mas a minha satisfação ainda era maior Daí estávamos todos pegando o que comer que eram essas grandes abundâncias Angu e couve abóboramoranga cozida torresmos e em toda fogueira assavam mantas de carnes Quem quisesse sopa era só ir se aquinhoar na portada cozinha A quantidade de pratos era que faltava E assaz muita cachaça se tomou que Joca Ramiro mandou satisfazer goles a todos extraordinária de boa O senhor havia de gostar de ver aquela ajuntação de povo as coisas que falavam e faziam o jeito como podiam se rir na vadiação todos bem comidos entalagados Daí escureceu Homens deitados no chão escornados até quase debaixo do mijo dos cavalos pastantes Eu estava que impava queria um bom sono A ver fui com Dia dorim para o rumo dos pés de fruta seguindo o rego Com a entrada da noite o passar da água canta friinho permeio engrossa e a gente aprecia o cheiro do musguz das árvores Zé Bebelo tinha ido embora para sempre no cavalo de duas cores fez pouca poeira Nós estávamos no jaz ali repimpados enfunando as redes Disso não esqueço Não esqueço A gente estava desagasalhados na alegria feito meninos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 398 Eu tinha vindo para ali para o sertão do Norte como todos uma hora vêm Eu tinha vindo quase sem mesmo notar que vinha mas presado precisão de agenciar um resto melhor para a minha vida Agora me expulsassem Do jeito isto é tinham repelido para trás Zé Bebelo Não me esqueci daquelas palavras dele que agora era o mundo à revelia Disse a Diadorim Mas Diadorim menos me respondeu Ao dar que falou Riobaldo você prezava de ir viver nOsPorcos que lá é bonito sempre com as estrelas tão reluzidas Dei que sim Como ia querer dizer diferente pois lá nOsPorcos não era a terra de Diadorim própria lugar dele de crescimento Mas mesmo enquanto que essas palavras eu pensasse que Diadorim podia ter me respondido assim nestas fações Mundo à revelia Mas Riobaldo desse jeito mesmo é que o mundo sempre esteve Toleima sei bobéia disso a basba do basbaque Que eu dizia e pensava numa coisa mas Diadorim recruzava com outras Zé Bebelo Diadorim que é que você achou daquele homem ainda indaguei Para ele de agora não tem dia nem noite vai seu rumo fazendo a viagem Teve sorte Entestou foi com Joca Ramiro com sua alta bondade foi o que Diadorim me respondeu E ficou pensando ficamos Aí quando eu acabei até à pontinha meu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 399 cigarro ainda perguntei A ver quem salvou Zé Bebelo da morte Diadorim o que quis me dizer foi em tanto segredo que ele puxou a beira da minha rede para a gente falar quase cara a cara Ah quem salvou Zé Bebelo de morte Pois abaixo de Joca Ramiro por começar foi ele Zé Bebelo mesmo Depois numa ponta do dito de Zé Bebelo tomou figura Só Candelário homem esquipático e enorme de si mas fiel e que põe mais de trezentas armas Cabras que por um gesto dele avançam e matam e matam Eu queria que ele tivesse explica do o fato de outro jeito Mas Diadorim estava prosseguindo A ser que você viu o Hermógenes e o Ricardão gente estarrecida de iras frias Agora esses me dão receio meu medo Deus não queira Depois ele terminou assim Ao enquanto Joca Ramiro pode precisar da gente você mesmo me prometeu Riobaldo a gente persiste por aqui Prometi outra vez confirmei Desde no sereno da noite não se conversou mais não me recordo Diadorim estava triste na voz Eu também estive Por quê háde o senhor querer saber Por causa de Zé Bebelo ter ido embora e aquilo era motivo Depois de Paracatu é o mundo Zé Bebelo ido sei lá bem porque tirava meu poder de pensar com a idéia em ordem e eu sentia minha barriga demais João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 400 cheia demais de tantas comidas e bebidas Só o que me consolava era ter havido aquele julgamento com a vida e a fama de Zé Bebelo autorizadas O julgamento Digo aquilo para mim foi coisa séria de importante Por isso mesmo é que fiz questão de relatar tudo ao senhor com tanta despesa de tempo e miúcias de palavras O que nem foi julgamento legítimo nenhum só uma extração estúrdia e destrambelhada doideira acontecida sem senso neste meio do sertão o senhor dirá Pois por isso mesmo Zé Bebelo não era réu no real Ah mas no centro do sertão o que é doideira às vezes pode ser a razão mais certa e de mais juizo Daquela hora em diante eu cri em Joca Ramiro Por causa de Zé Bebelo Porque Zé Bebelo na hora naquela ocasião estava sendo maior do que pessoa Eu gostava dele do jeito que agora gosto de compadre meu Quelemém gostava por entender no ar Por isso o julgamento tinha dado paz à minha idéia por dizer bem meu coração Dormi adeus disso Como é que eu ia poder ter pressentimento das coisas terríveis que vieram depois conforme o senhor vai ver que já lhe conto Curtamente dali da SempreVerde com um dia mais desapartamos O bando muito grande de jagunços não tem composição de proveito em ocasião normal só serve para chamar soldados e dar atrásamento e desrazoada despesa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 401 Constava que João Goanhá torasse para a Bahia e que o Antenor seguindo rumo em beira do Ramalhada com um punhado dos Hermógenes Novas ordens muitas ordens Alaripe ia vir com Titão Passos Titão Passos chamou a gente Diadorim e eu Se tinha um roteiro sendo para ser o mais encostado possível no São Francisco até para lá do Jequitaí e mais Aquilo por quê A gente não ia junto com Joca Ramiro em caso de lhe a ele podermos valer em caso com maior ajuda mão a mão Ah mas nossa tarefa era de muito encoberto empenho e valor pelo que tínhamos de estanciar em certos lugares com o fito de receber remessas e em acontecer de vigiar algum rompimento de soldados que para o Norte entrassem Arreamos montamos saímos Naquela mesma da hora Joca Ramiro dava partida também de volta para o São João do Paraíso Lá ia ele deveras em seu cavalão branco ginete ladeado por Só Candelário e o Ricardão igual iguais galopavam Saíam os chefes todos assim o desenrolar dos bandos em caracol aos gritos de vozear Ao que reluzia o bem belo Diadorim olhou e fez o sinaldacruz cordial Assim ele me botou a benção foi o que disse Dá sempre tristezas algumas um destravo de grande povo se desmanchar Mas nesse dia mesmo em nossos cavalos tão bons dobramos nove léguas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 402 As nove Com mais dez até à Lagoa do Amargoso E sete para chegar numa cachoeira no Gorutuba E dez arranchando entre QuemQuem e Solidão e muitas idas marchas sertão sempre Sertão é isto o senhor empurra para trás mas de repente ele volta a rodear o senhor dos lados Sertão é quando menos se espera digo Mas saímos saímos Subimos Ao quando um belo dia a gente parava em macias terras agradáveis As muitas águas Os verdes já estavam se gastando Eu tornei a me lembrar daqueles pássaros O marrequim a garrixadobrejo frangosdágua gaivotas O manuelzinhoda croa Diadorim comigo As garças elas em asas O rio des mazelado livre rolador E aí esbarramos parada para demora num campo solteiro em varjaria descoberta pasto de muito gado Lugar perto da Guararavacã do Guaicuí Tapera Nhã nome que chamavase Ali era bom Sossegava Mas tem horas em que me pergunto se melhor não seja a gente tivesse de sair nunca do sertão Ali era bonito sim senhor Não se tinha perigos em vista não se carecia de fazer nada Nós estávamos em vinte e três homens Titão Passos determinou uma esquadrazinha deles com Alaripe em testa fossem para a outra banda do morro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 403 baixada própria da Guararavacã esperar o que não acontecesse Nós ficamos O que por começo corria destino para a gente ali era bondosos dias Madrugar vagaroso vadiado se escutando o grito a mil do pássaro rexenxão que vinham voando aquelas chusmas pretas até brilhantes amanheciam duma restinga de mato e passavam sem necessidade nenhuma a sobre E as malocas de bois e vacas que se levantavam das malhadas de acabar de dormir suspendendo corpo sem rumor nenhum no meioescuro como um açúcar se derretendo no campo Quando não ventava o sol vinha todo forte Todo dia se comia bom peixe novo pescado fácil curimatã ou dourado cozinheiro era o Paspe fazia pirão com fartura e dividia a cachaça alta Também razoável se caçava A vigiação era revezada de irmãos e irmãos nunca faltava tempo para àtoa se permanecer Dormi sestas inteiras por minha vida Gavião dava gritos até o dia muito se esquentar Aí então aquelas fileiras de reses caminhavam para a beira do rio enchiam a praia parados ou refrescavam dentro dágua Às vezes chegavam a nado até em cima duma ilha comprida onde o capim era lindo verdejo O que é de paz cresce por si de ouvir boi berrando à forra me vinha idéia de tudo só ser o passado no futuro Imaginei esses sonhos Me lembrei do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 404 nãosaber E eu não tinha notícia de ninguém de coisa nenhuma deste mundo o senhor pode raciocinar Eu queria uma mulher qualquer Tem trechos em que a vida amolece a gente tanto que até um referver de mau desejo no meio da quebreira serve como beneficio Um dia sem dizer o que a quem montei a cavalo e saí a vão escapado Arte que eu caçava outra gente diferente E marchei duas léguas O mundo estava vazio Boi e boi Boi e boi e campo Eu tocava seguindo por trilhos de vacas Atravessei um ribeirão verde com os umbuzeiros e ingazeiros debruçados e ali era vau de gado Quanto mais ando querendo pessoas parece que entro mais no sozinho do vago foi o que pensei na ocasião De pensar assim me desvalendo Eu tinha culpa de tudo na minha vida e não sabia como não ter Apertou em mim aquela tristeza da pior de todas que é a sem razão de motivo que quando notei que estava com dordecabeça e achei que por certo a tristeza vinha era daquilo isso até me serviu de bom consolo E eu nem sabia mais o montante que queria nem aonde eu extenso ia O tanto assim que até um corguinho que defrontei um riachim àtoa de branquinho olhou para mim e me disse Não e eu tive que obedecer a ele Era para eu não ir mais para diante O riachinho me tomava a benção Apeei O João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 405 bom da vida é para o cavalo que vê capim e come Então deitei baixei o chapéu de tapacara Eu vinha tão afogado Dormi deitado num pelego Quando a gente dorme vira de tudo vira pedras vira flor O que sinto e esforço em dizer ao senhor repondo minhas lembranças não consigo por tanto é que refiro tudo nestas fantasias Mas eu estava dormindo era para reconfirmar minha sorte Hoje sei E sei que em cada virada de campo e debaixo de sombra de cada árvore está dia e noite um diabo que não dá movimento tomando conta Um que é o romãozinho é um diabo menino que corre adiante da gente alumiando com lanterninha em o meio certo do sono Dormi nos ventos Quando acordei não cri tudo o que é bonito é absurdo Deus estável Ouro e prata que Diadorim aparecia ali a uns dois passos de mim me vigiava Sério quieto feito ele mesmo só igual a ele mesmo nesta vida Tinha notado minha idéia de fugir tinha me rastreado me encontrado Não sorriu não falou nada Eu também não falei O calor do dia abrandava Naqueles olhos e tanto de Diadorim o verde mudava sempre como a água de todos os rios em seus lugares ensombrados Aquele verde arenoso mas tão moço tinha muita velhice muita velhice querendo me contar coisas que a idéia da gente não dá para se entender e acho que é por João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 406 isso que a gente morre De Diadorim ter vindo e ficar esbarrado ali esperando meu acordar e me vendo meu dormir era engraçado era para se dar feliz risada Não dei Nem pude nem quis Apanhei foi o silêncio dum sentimento feito um decreto Que você em sua vida toda toda por diante tem de ficar para mim Riobaldo pegado em mim sempre que era como se Diadorim estivesse dizendo Montamos viemos voltando E digo ao senhor como foi que eu gostava de Diadorim que foi que em hora nenhuma vez nenhuma eu nunca tive vontade de rir dele A Guararavacã do Guaicuí o senhor tome nota deste nome Mas não tem mais não encontra de derradeiro ali se chama é Caixeirópolis e dizem que lá agora dá febres Naquele tempo não dava Não me alembro Mas foi nesse lugar no tempo dito que meus destinos foram fechados Será que tem um ponto certo dele a gente não podendo mais voltar para trás Travessia de minha vida Guararavacã o senhor veja o senhor escreva As grandes coisas antes de acontecerem Agora o mundo quer ficar sem sertão Caixeirópolis ouvi dizer Acho qqe nem coisas assim não acontecem mais Se um dia acontecer o mundo se acaba Guararavacã O senhor vá escutando João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 407 Aquele lugar o ar Primeiro fiquei sabendo que gostava de Diadorim de amor mesmo amor mal encoberto em amizade Me a mim foi de repente que aquilo se esclareceu falei comigo Não tive assombro não achei ruim não me reprovei na hora Melhor alembro Eu estava sozinho num repartimento dum rancho rancho velho de tropeiro eu estava deitado numa esteira de taquara Ao perto de mim minhas armas Com aquelas reluzentes nos canos de cuidadas tão bem eu mandava a morte em outros com a distância de tantas braças Como é que dum mesmo jeito se podia mandar o amor O rancho era na borda damata De tarde como estava sendo esfriava um pouco por pejo de vento o que vem da Serra do Espinhaço um vento com todas almas Arrepio que fuxicava as folhagens ali e ia lá adiante longe na baixada do rio balançar esfiapado o pendão branco das canabravas Por lá nas beiras cantava era o joãopo bre pardo banhador Me deu saudade de algum buritizal na ida duma vereda em capim temte que verde termo da chapada Saudades dessas que respondem ao vento saudade dos Gerais O senhor vê o remôo do vento nas palmas dos buritis todos quando é ameaço de tempestade Alguém esquece isso O vento é verde Aí no intervalo o senhor pega o silêncio põe no colo Eu sou donde eu nasci Sou de outros lugares Mas lá na João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 408 Guararavacã eu estava bem O gado ainda pastava meu vizinho cheiro de boi sempre alegria faz Os quemquem aos casais corriam catavam permeio às reses no liso do campo claro Mas nas árvores picapau bate e grita E escutei o barulho vindo do dentro do mato de um macuco sempre solerte Era mês de macuco ainda passear solitário macho e fémea desemparelhados cada um por si E o macuco vinha andando sarandando macucando aquilo ele ciscava no chão feito galinha de casa Eu ri Vigia este Diadorim eu disse pensei que Diadorim estivesse em voz de alcance Ele não estava O macuco me olhou de cabecinha alta Ele tinha vindo quase endireito em mim por pouco entrou no rancho Me olhou rolou os olhos Aquele pássaro procurava o quê Vinha me pôr quebrantos Eu podia dar nele um tiro certeiro Mas retardei Não dei Peguei só num pé de espora joguei no lado donde ele Ele deu um susto trazendo as asas para diante feito quisesse esconder a cabeça cambalhota fosse virar Daí caminhou primeiro até de costas fugiuse entrou outra vez no mato vero foi caçar poleiro para o bom adormecer O nome de Diadorim que eu tinha falado permaneceu em mim Me abracei com ele Mel se sente é todo lambente Diadorim meu amor Como era que eu podia dizer aquilo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 409 Explico ao senhor como se drede fosse para eu não ter vergonha maior o pensamento dele que em mim escorreu figurava diferente um Diadorim assim meio singular por fantasma apartado completo do viver comum desmisturado de todos de todas as outras pessoas como quando a chuva entre ondeoscampos Um Diadorim só para mim Tudo tem seus mistérios Eu não sabia Mas com minha mente eu abraçava com meu corpo aquele Diadorimque não era de verdade Não era A ver que a gente não pode explicar essas coisas Eu devia de ter principiado a pensar nele do jeito de que decerto cobra pensa quando maisolha para um passarinho pegar Mas de dentro de mim uma serepente Aquilo me transformava me fazia crescer dum modo que doía e prazia Aquela hora eu pudesse morrer não me importava O que sei tinha sido o que foi no durar daqueles antes meses de estropelias e guerras no meio de tantos jagunços e quase sem espairecimento nenhum o sentir tinha estado sempre em mim mas amortecido rebuçado Eu tinha gostado em dormência de Diadorim sem mais perceber no fofo dum costume Mas agora manava em hora o claro que rompia re bentava Era e era Sobrestive um momento fechados os olhos sufruía aquilo com outras minhas forças Daí levantei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 410 Levantei por uma precisão de certificar de saber se era firme exato Só o que a gente pode pensar em pé isso é que vale Aí fui até lá na beira dum fogo onde Diadorim estava com o Drumõo o Paspe e Jesualdo Olhei bem para ele de carne e osso eu carecia de olhar até gastar a imagem falsa do outro Diadorim que eu tinha inventado Hê Riobaldo eh uê você carece de alguma coisa ele me perguntou quem mevê com o certo espanto Eu pedi um tição acendi um cigarro Daí voltei para o rancho devagar passos que dava Se é o que é eu pensei eu estou meio perdido Acertei minha idéia eu não podia por lei de rei admitir o extrato daquilo Ia por paz de honra e tenência sacar esquecimento daquilo de mim Se não pudesse não ah mas então eu devia de quebrar o morro acabar comigo com uma bala no lado de minha cabeça eu num átimo punha barra em tudo Ou eu fugia virava longe no mundo pisava nos espaços fazia todas as estradas Rangi nisso consolo que me determinou Ah então eu estava meio salvo Aperrei o nagã precisei de dar um tiro no mato um tiraço que ribombou Ao que foi me gritaram pergunta sempre riam do tiro tolo dado Acho que um macaquinho miúdo que acho que errei eu expendi Tanto também fiz de conta estivesse olhando Diadorim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 411 encarando para duro calado comigo me dizer Nego que gosto de você no mal Gosto mas só como amigo Assaz mesmo me disse De por diante acostumei a me dizer isso sempres vezes quando perto de Diadorim eu estava E eu mes mo acreditei Ah meu senhor como se o obedecer do amor não fosse sempre ao contrário O senhor vê nos Gerais longe nuns lugares encostando o ouvido no chão se escuta barulho de fortes águas que vão rolando debaixo da terra O senhor dorme em sobre um rio Segundo digo o tempo que paramos na Guararavacã do Guaicuí regulou em dois meses Bom ermo De lá a gente cruzou as vizinhanças todas fizemos grande redondeza Todo dia trocávamos recado de avisos com o pessoal do Alaripe Notícia nenhumas Nada não chegava em envio do que fosse para chegar Da outra banda do rio se sucedeu a queima dos campos quando o vento dava para trás trazia as tristes fumaças De noite o morro se esclarecia vermelho asgrava em labaredas e brasas Da banda de cá num rumo daí a obra de duas léguas tinha uma lavourinha de um sujeito ainda moço que era amigo nosso Ah se ele quisesse alugar a mulherzinha dele para a gente bem caros preços que eu pagava assim o que dizia o Paspe suspiroso Mas quem vinha eram os meninos do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 412 lavrador montados num cavalo magro traziam feixes de cana para vender para a gente Às vezes vinham em dois cavalos magros e eram cinco ou seis meninos amontados agarrados uns nos outros uns mesmo não se sabia como podiam de tão mindinhos Esses meninozinhos todos queriam todo o tempo ver nossas armas pediam que a gente desse tiros Diadorim gostava deles pegava um por cada mão até carregava os menor zinhos levava para mostrar a eles os pássaros das ilhas do rio Olha vigia o manuelzinhodatroa já acabou de fazer a muda Um dia em que tínhamos caçado uma paca bem gorda o Paspe pitou de sal um quarto dela enrolou em folhas e deu ao menino mais velho Pra tu leva de presente dá à tua mãe fala que quem mandou fui eu ele recomendou A gente ria Os meninos receavam o gado ali no meio tinha reses muito bravas um dia uma vaca deu corrida em alguém querendo bater Mas depois com o secar de magros e fracos os bois se atolavam no embrejado até morreram alguns Os urubus espaceavam quando o céu empoeirado Pousavam no pindaibal do brejo João Vaqueiro chamava a gente ia desatolar os bois que podia Uns eram mansos por um punhado de sal se chegavam lambiam o chão nos pés da gente João Vaqueiro sabia tudo Chega passava a mão nas tetas de uma vaca capins João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 413 tão bons o senhor crê algumas ainda guardavam leite naqueles peitos A gente carecia era de dar um fogo de sair por aí por combate sensato se dizia Que jagunço amolece quando não padece A quase meiorumo de norte e nascente a quatro léguas de demorado andamento tinha uma venda de roça no começo do cerradão Vendiam licor de banana e de pequi muito forte geléia de mocotó fumo bom marmelada toucinho Sempre só um de nós era que ia lá para não desconfiarem Ia o Jesualdo A gente outorgava a ele o dinheiro cada um encomendava o que queria Diadorim mandou comprar um quilo grande de sabão de coco de macaúba para sé lavar corpo O dono da venda tinha duas filhas o Jesualdo cada vez que voltava carecia de explicar à gente de dia é de noite como elas eram formosuramente Ei que quando vier o tempo que de guerra se tiver licença ah e se esse vendeiro for contra nós ah eu vou lá pego uma das duas de mocinha faço ela virar mulher o Vove disse O que tu não faz Porque o que eu quero é o exato que eu vou lá prezado peço em casamento e nóivo o Triol contestou E o Liduvino e o Admeto cantavam coisas de sentimento cantavam pelo nariz João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 414 Ao que perguntei e aquela canção de Siruiz Mas eles não sabiam Sei não gosto não Cantigas muito velhas eles desqueriam Daí deu um sutil trovão Trovejouse outro As tanajuras revoavam Bateu o primeiro toró de chuva Cortamos paus folhagem de coqueiros aumentamos o rancho E vieram uns campeiros rever o gado da Tapera Nhã no renovame levaram as novilhas em quadra de produzir Esses eram homens tão simples pensaram que a gente estava garimpando ouro Os dias de chover cheio foram se emendando Tudo igual às vezes é uma semgracez Mas não se deve de tentar o tempo As garças é que praziam de gritar o garcejo delas e o socóboi range cincerros e o socó latindo sucinto Aí pelo mato das pindaíbas avante tudo era um sapal Coquexavam De tão bobas tristezas a gente se ria no friinho de entrechuvas Dada a primeira estiada voltou aquele vaqueiro Bernabé em seu cavalinho castanho e vinha trazer requeijão que se tinha incumbido a ele e que por dinheirinho bom se pagou A vida tem de mudar um dia para melhor a gente dizia Requeijão é com café bem quente que é mais gostoso Aquele vaqueiro Bernabé voltou outras diversas vezes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 415 Ah e vai um feio dia lá ele apontou na boca da estrada que saía do mato o cavalinho castanho dava toda pressa de vinda nem cabeceava Achamos que fosse mesmo ele Aí não era Era um brabo nosso um cafuz pardo de sonome o Gavião Cujo que de mais norte chegava Ele tinha tomado muitas chuvas que tudo era lamas dos copos do freio à boca da bota e pelos vazios do cavalo Esbarrou e desapeou num pronto ser se via que estava ancho com muitas plenipotências O que era O GaviãoCujo abriu os queixos mas palavra logo não saiu ele gaguejou ar e demorou decerto porque a notícia era urgente ou enorme Aruê então Titão Passos quis Te rogaram alguma praga O GaviãoCujo levantou um braço pedindo prazo À fé quase gritou Mataram Joca Ramiro Aí estralasse tudo no meio ouvi um uivo doido de Diadorim todos os homens se encostavam nas armas Aí ei feras Que no céu só vi tudo quieto só um moído de nuvens Se gritava o araral As vertentes verdes do pindaibal avançassem feito gente pessoas Titão Passos bramou as ordens Diadorim tinha caído quase no chão meio amparado a tempo por João Vaqueiro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 416 Caiu tão pálido como cera do reino feito um morto estava Ele todo apertado em seus couros e roupas eu corri para ajudar A vez de ser um desespero O Paspe pegou uma cuia dágua que com os dedos espriçou nas faces do meu amigo Mas eu nem pude dar auxílio mal ia pondo a mão para desamarrar o coletejaleco e Diadorim voltou a seu si num alerta e me repeliu muito feroz Não quis apoio de ninguém sozinho se sentou se levantou Recobrou as cores e em mais vermelho o rosto numa fúria de pancada Assaz que os belos olhos dele formavam lágrimas Titão Passos mandava o GaviãoCujo falava Assim os companheiros num estupor Ao que não havia mais chão nem razão o mundo nas juntas se desgovernava Repete Gavião Ai chefe ai chefe que mataram Joca Ramiro Quem Adonde Conta Arre eu surpreendi eriço de tremor nos meus braços Secou todo cuspe dentro do estreito de minha boca Até atravessado na barriga me doeu Antes mais o pobre Diadorim Alheio ele dava um bufo e soluço orço que outros João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 417 olhos se suspendia nas sussurrosas ameaças Tudo tinha vindo por cima de nós feito um relâmpago em fato Matou foi o Hermógenes Arraso cão Caracães O cabrobó de cão Demônio Traição Que me paga constante não havendo quem não exclamasse O ódio da gente ali em verdade armava um pojar para estouros Joca Ramiro podia morrer Como podiam ter matado Aquilo era como fosse um touro preto sozinho surdo nos ermos da Guararavacã urrando no meio da tempestade Assim Joca Ramiro tinha morrido E a gente raivava alto para retardar o surgir do medo e a tristeza em cru sem se saber por que mas que era de todos unidos malaventurados O Hermógenes Os homens do Ricardão O Antenor Muitos Mas adonde onde A desgraça foi num lugar na Jerara terras do Xanxerê beira da Jerara lá onde o córrego da Jerara desce do morro do Vôo e cai barra no Riachão Riachão da Lapa Dizse que foi sido de repente não se esperava Aquilo foi à traição toda Morreram os muitos que estavam persistindo lealmente Aí João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 418 mortos João Frio o Bicalho Leôncio Fino Luís Pajeú o Cambó LeitedeSapo Zé Inocêncio uns quinze Até se deu um tiroteio terrível mas o pessoal do Hermógenes e do Ricardão era demais numeroso Dos bons quem pôde fugiram corretamente Silvino Silva conseguiu fuga com vinte e tantos companheiros Mas Titão Passos de arrompe atalhou a narração ele agarrou o GaviãoCujo pelos braços Hem diá Mas quem é que está pronto em armas para rachar Ricardão e Hermógenes e ajudar a gente na vingança agora nas desafrontas Se tem e ondé então que estão Ah sim chefe Os todos os outros João Goanhá Só Candelário Clorindo Campelo João Goanhá pára com porçanheira de homens na Serra dos Quatis Aí foi ele quem me mandou trazer este aviso Só Candelário ainda está para o Norte mas o grosso dos bandos dele se acha nos pertos da LagoadoBoi em juramento Já foi portador para lá Sendo que se despachou um positivo também para dar parte a Medeiro Vaz nos Gerais no de lado de lá do Rio Sei que o sertão pega em armas mas Deus é grande João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 419 Louvado Ah então graças a Deus Ao que então está bem Titão Passos se cerrou E estava Era a outra guerra A gente ficávamos aliviados Aquilo dava um sutil enorme Teremos de ir Teremos de ir falou Titão Passos e todos responderam reluzentemente Tínhamos de tocar sem atraso para a Serra dos Quatis a um lugar dito o Amoipira que é perto de Grão Mogol Artes que o GaviãoCujo ainda contava mais as miúcias parecia que tinha medo de esbarrar de contar Que o Hermógenes e o Ricardão de muito haviam ajustado entre si aquele crime se sabia O Hermógenes distanciou Joca Ramiro de Só Candelário com falsos propósitos conduziu Joca Ramiro no meio de quase só gente dele Hermógenes mais o pessoal do Ricardão Aí atiraram em Joca Ramiro pelas costas carga de balas de três revólveres Joca Ramiro morreu sem sofrer E enterraram o corpo Diadorim perguntou numa voz de mais dor como saía ansiada Que não sabiao Gavião Cujo respondeu mas que decerto teriam enterrado conforme cristão lá mesmo na Jerara por certo Diadorim tanto empa lidecesse ele pediu cachaça Tomou Todos tomamos Titão Passos não queria ter as lágrimas nos olhos Um homem de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 420 tão alta bondade tinha mesmo de correr perigo de morte mais cedo mais tarde vivendo no meio de gente tão ruim ele me disse dizendo num modo que parecia ele não fosse também jagunço como era de se ser Mas agora tudo principiava terminado só restava a guerra Mão do homem e suas armas A gente ia com elas buscar doçura de vingança como o rominhol no panelão de calda Joca Ramiro morreu como o decreto de uma lei nova A daí carecia fosse alguém do lado de lá do morro pela gente do Alaripe Pois vamos Riobaldo Diadorim se pôs Vi que ele fervia ali assim no pego do parado Selamos os cavalos Serra acima fomos Ao no galope cada um engolia suas palavras A mesmo estava o céu encoberto e um mormaço Mas na descambada Diadorim me reteve me entregou á ponta do cabresto para segurar De tudo nesta vida a gente esquece Riobaldo Você acha então que vão logo olvidar a honra dele me perguntou Devo que retardei muito em responder com cara de não compreensão Porque Diadorim completou dele a glória do finado Do que se finou E dizia aquilo com uma misturação de carinho e raiva tanto desespero que nunca vi Desamontou foi andando sem governar os passos tapado pelas moitas e árvores Eu restei ficando tomando conta do ca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 421 valo Pensei que ele tivesse ido a lá por necessitar Mas demorou tanto a volta que eu resolvi tocar atrás para o que havia ver esporei e vim puxando o cavalo dele adestro E aí o que vi foi Diadorim no chão deitado debruços Soluçava e mordia o capim do campo A doideira Me amargou no cabo da língua Diadorim chamei Ele sem se aprumar virou o rosto apertou os olhos no choro Falei falei meus consolos e ele atendia em querelenga me pedindo que sozinho fosse deixasse ele ali até minha volta Joca Ramiro era seu parente Diadorim eu indaguei com muita cordura Ah era sim ele me respondeu com uma voz de pouco corpo Seu tio será Que era ele deu em gesto Entreguei a ele o cabresto do cavalo e continuei ida Em certa distância para prevenir os alaripes e evitar atraso esbarrei e disparei tiros para o ar umas vezes Cheguei lá estavam todos reunidos por meu feliz E estava chovendo de acordo com o mormaço Trago notícia de grande morte sem desapear eu declarei Eles todos tiraram os chapéus para me escutar Então eu gritei Viva a fama do nosso Chefe Joca Ramiro E pela tristeza que estabeleceu minha voz muito me entenderam Ao que quase todos choraram Mas agora temos de vingar a morte do falecido eu ainda pronunciei Se aprontaram num átimo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 422 para comigo vir Mano velho Tatarana você sabe Você tem sustância para ser um chefe tem a bizarria no caminho o Alarípe me disse Desmenti De ser chefe mesmo era o que eu tinha menos vontade Mas assim se deu que no seguinte dia no romper das barras saímos tocando Diadorim do meu lado mudado triste muito branco os olhos pisados a boca vencida Deixamos para trás aquele lugar que disse ao senhor para mim tão célebre a Guararavacã do Guaicuí do nunca mais Redeando rumamos em tralha e torto por aquele afora a gente ia investir o sertão os mares de calor Os córregos estavam sujos Aí depois cada rio roncava cheio as várzeas embrejavam e tantas cordas de chuva esfriavam a cacunda daquelas serras A terrível notícia tinha se espalhado assaz em todas as partes o povo fazia questão de obsequiar à gente e fala vam muito bem do falecido Mas nós passávamos feito flecha feito faca feito fogo Varamos todos esses distritos de gado Assomando de dia por dentro de vilórios e arraiais e ocupando a cheio todas as estradas sem nenhum escondimento a gente queria que todo o mundo visse a vingança Alto do Amoipira quando terminamos lá os cavalos já afracavam João Goanhá João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 423 em toda economizada estatura foi ver a gente vindo e abriu seus bons braços Ele estava com próprios trezentos guerreiros E sempre outros chegavam Meu irmão Titão Passos Meu irmão Titão Passos ele falou crescente E vocês todos valentes cabras Agora é que vai ser a grande briga Disse que com três dias se saía em armas João Goanhá ia na vaca e no boi não estava com pororas E Só Candelário onde era que estava Só Candelário piorado doente devia de estar um tempo desses nos Lençóis para onde portador seguira com pressa de chamado Mesmo assim João Goanhá desnecessitava de esperar por ele para aos dois judas traidores dar batalha No que achamos bom conselho E outros vinham chegando oferecendo peito de ajuda com prestança em ponta Veio até quem não se imaginou como aquele Nhão Virassaia com seus trinta e cinco cacundeiros o que carregava nome de fama por todo o Rio VerdeGrande E o velho Ludujo Filgueiras montesclarense com vinte e dois atiradores E o grande fazendeiro coronel Digno de Abreu que mandou seus trinta e tantos capangas também por Luís de Abreuzinho comandados que era dele filhonatural E o gado em pé que se provia para se abater e se comer chegava a ser uma boiada Com sacas de farinha surrão de sal e açúcar preto e café até em carrodebois os mantimentos de fubá e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 424 arroz e feijão entregados Só em quantidades de munição era que a gente não produzia luxo e Titão Passos se entristeceu de não poder ter trazido a nossa na Guararavacã tão em vão esperada Mas a lei de homem não é seus instrumentos Saímos em guerra Ãhã do norte da LagoadoBoi com troca de avisos sobrevinha também o bastante da rapaziada dos baianos debaixo do comando de Alípio Mota cunhado de Só Candelário A simples íamos cercar bonito os Judas não tinham escape Aindas que se escapassem para o poente atravessassem o rio ah encontravam ferro e fogo lá estava Medeiro Vaz o rei dos Gerais Saímos sobre fomos Mas descemos no canudo das desgraças ei saiba o senhor Desarma do tempo hora de paga e perdas e o mais que a gente tinha de purgar segundo se diz Tudo o melhor fizemos e tudo no fim desandava Deus não devia de ajudar a quem vai por santas vinganças Devia Nós não estávamos forte em frente com a coragem esporeada Es távamos Mas então Ah então mas tem o Outro o figura o morcegão o tunes o cramulhão o debo o carocho do péde pato o malencarado aquele oquenãoexiste Que não existe que não que não é o que minha alma soletra E da existência desse me defendo em pedras pontudas ajoelhado beijando a barra do manto de minha Nossa Senhora da Abadia Ah só Ela João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 425 me vale mas vale por um mar sem fim Sertão Se a Santa puser em mim os olhos como é que ele pode me ver Digo isto ao senhor e digo paz Mas naquele tempo eu não sabia Como é que podia saber E foram esses monstros o sobredito Ele vem no maior e no menor se diz o grãotinhoso e o cãomiúdo Não é mas finge de ser E esse trabalha sem escrúpulo nenhum por causa que só tem um curto prazo Quando protege vem protege com sua pessoa Montado mole nas costas do Hermógenes indicando todo rumo Do tamanho dum bago de aívim dentro do ouvido do Hermógenes por tudo ouvir Redondinho no lume dos olhos do Hermógenes para espiar o primeiro das coisas O Hermógenes que por valente e valentão para demais até ao fim deste mundo e do juízofinal se danara oco de alma Contra ele a gente ia Contra o demo se podia Quem a quem Milagres tristes desses também se dão Como eles conseguiram fugir das unhas da gente se escaparam o Ricardão e o Hermógenes os Judas Pois eles escapuliram passaram perto légua quartode légua com toda sua jagunçama e não vimos não ouvimos não soubemos tivemos jeito nenhum para cercar e impedir Avançaram calados escorregando pelos matos ganhando o mais poente para o São Francisco Atravessaram por nós sem a gente perceber como a noite atravessa o dia da manhã à tarde seu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 426 pretume dela escondido no brancor do dia se presume Quando pudemos saber a distância deles já era impossível Nós estávamos pegando o ar Duro de desanimável hem E pois demore o senhor para o pior o que veio em sobre os soldados do Governo Os soldados soldadesca tantas tropas Surgiram de todos os lados de supetão e agatanhavam naquela sanha é ver cachorrada caçante Soldados do Tenente Plínio companhia de guerra Tenente Reis Leme outra E veio depois com muitos mais outros um capitão Carvalhais maior da marca esse bebia café em cuité e cuspia pimenta com pólvora Sofremos rolamos por aí aqui se rolou vida é vez de injustiças assim quando o demo leva o estandarte Pois aquela soldadama viera para o Norte era por vingar Zé Bebelo e Zé Bebelo já andava por longes desterrado e nisso eles se viravam contra a gente que éramos de Joca Ramiro que tinha livrado a vida de Zé Bebelo das facas do Hermógenes e Ricardão e agora por sua ação o que eles estavam era ajudando indireto àqueles sebaceiros Mas quem era que podia explicar isso tudo a eles que vinham em máquina enorme de cumprir o grosso e o esmo tendo as garras para o pescoço nosso mas o pensante da cabeça longe só geringonciável na capital do Estado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 427 De contar tudo o que foi me retiro o senhor está cansado de ouvir narração e isso de guerra é mesmice mesmagem Combatemos o quanto mais pudemos está aí Consoante começou no Curral de Vacas perto do Morro do Cocuruto onde nos pegaram num relaxo Fugimos depois de grande fogo Fogo demos daí no Cutica na Chapada Simão Guedes mas rodaram com a gente de retruz Serra da Saudade a gente se desarranjou fugimos bem Ah e Córrego Estrelinhas Córrego da Malhada Grande Ribeirão Traçadal tudo foram as feiezas Recito frente ao senhor e é rol de nomes Para mim ficaram em assento de sustos e sofrimento Nunca me queixei Sofrimento passado é glória é sal em cinza De tanta maneira Diadorim assistia comigo como um gravatá se fechou Semeei minha pre sença dele o que da vida é bom eu dele entendia Tomando o tempo da gente os soldados remexiam este mundo todo Milho crescia em roças sabiá deu cria gameleira pingou frutinhas o pequi amadurecia no pequizeiro e a cair no chão veio veranico pitanga e caju nos campos Ato que voltaram as tempestades mas entre aquelas noites de estrelaria se encostando Daí depois o vento principiou a entortar rumo mais forte porque o tempo todo das águas estava no se acabar Tenente Reis Leme nos escaramuçando queria correr com a gente a pano de sabre João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 428 Matouse montanha de bons soldados Estávamos em terras que entestam com a Bahia Em Bahia entramos e saímos cinco vezes sem render as armas Isto que digo sei de cor brigar no espinho da caatinga pobre onde o cãcã canta Chão que queima branco E aqueles cristais pedracristal quase de sangue Chegamos até no cabo do mundo Quadrante o que havia me esconjuro Parecia que a gente ia ter de passar o resto da vida guerreando com os praças Mas nosso constar era outro com sangue de urgência aquela luta de morte contra os Judas e que era briga nossa particular Não se tendo recurso competente Ah Diadorim mascava Para ódio e amor que dói amanhã não é consolo Eu mesmeava Mas dando um dia a gente teve certas notícias os do Hermógenes estando senhores arranchados conforme retouçavam da banda de lá do Rio do Chico nas vertentes da beira da mão direita do Carinhanha no Chapadão de Antônio Pereira Questionouse nisso Se pensou e falou em tudo por fazer e não fazer Resultado foi este que o principal era a gente mandar reforço para Medeiro Vaz uns cinqüenta ou cem homens repartidos em miúdos grupos caçando jeito de safança por entre os lugares perigáveis Enquanto tanto João Goanhá Alípio Mota e Titão Passos cada qual de lado seu deviam de ir desmanchar os rastos na caatinga João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 429 e depois se esconderem por uns tempos em fazendas de donos amigos até que a soldadesca se espairecesse E era bom e era justo Era certo Deus em armas nos guardava De mim vim com Diadorim Alaripe Jesualdo e João Vaqueiro e o Fafafa Era para o outro lado era para os meus Gerais eu vinha alegre contente E saímos com o seguinte risco o Imbiruçu a Serra do PaudArco o Mingu a Lagoa dos Marruás o DôminusVobíscum o CruzeirodasEmbaúbas o DetrásdasDuasSerras O Brejo dos Mártires a Cachoeirinha Roxa o Mocó a Fazenda RiachoAbaixo a Santa Polônia a Lagoa da Jabuticaba E daí por uns atalhos o Córrego Assombrado o Sassapo o Poço dAnjo o Barreiro do Muquém Nesse meu caminho fazendo tirei minha desforra faceirei Severgonhei Estive com o melhor de mulheres Na Malhada comprei roupas O vau do mundo é a alegria Mas Diadorim não se fornecia com mulher nenhuma sempre sério só se em sonhos Dele eu ainda mais gostava E então se deu que tínhamos esbarrado em frente da Lagoa Clara Já era o do Chico o poder dele largas águas seu destino A ver o portode balsa que distava pouco Travessia ali podia ser perigosa com tantos soldados vizinhantes A gente se apartar Ah mas o que bastava o balseiro se chamar Hô passador Hô passador João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 430 ele viesse Assim para uma invenção que se teve O balseiro só avistando João Vaqueiro e o Fafafa estes ele então podia passar com cinco dos cavalos falavam que era para uns caçadores Da outra banda João Vaqueiro e o Fafafa fossem levando os cavalos para um lugar para cima da barra no Urucuia chamado o OlhodAguadasOutras Lá a gente se encontrava Somente ficados com um cavalinho só Alaripe e eu Diadorim e Jesualdo andamos beirario no vagarosamente A gente esperava o que acontecesse Ali mais adiante era um porto delenha Você tem receio Riobaldo Diadorim me perguntou Eu Com ele em qualquer parte eu embarcava até na prancha de Pirapora Vau do mundo é a coragem eu disse E com os rifles escorados acenamos para uma grande barca aquela a caradepau que tinha no bico da frente era uma cabeça de touro boasorte nos dava O barqueiro tocou um berro no buzo encostaram A gente os quatro com o cavalo era nada as arrobazinhas E nós entramos depois que o patrão nos saudou em nome de Nosso Senhor CristoJesus e disse Eu cá sou amigo de todos segundo a minha condição E o Alaripe aceitou dele um gole de cachaça aceitamos Jesualdo disse re postando Amigo de todos Rioabaixo na canoa quem governa é o remador Bem que rioacima é que era mas com João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 431 remeiros muito bons esforçados Aí constante o velejo vento em pano nem remeiro com o varejão não carecia de fazer talento Pediram notícias do sertão Essa gente estava tão devolvida de tudo que eu não pude adivinhar a honestidade deles O sertão nunca dá notícia Eles serviram à gente farta jacuba Por onde os senhores vieram o patrão indagou Viemos da Serra RompeDia respondemos Mentiras dágua Tanto fazia dizer que tínhamos vindo da de São Felipe O barqueiro não acreditou deu o zé de ombros Mas levou a gente travessia fácil frenteando a boca do Urucuia Ah o meu Urucuia as águas dele são claras certas E ainda por ele entramos subindo légua e meia por isso pagamos uma gratificação Rios bonitos são os que correm para o Norte e os que vêm do poente em caminho para se encontrar com o sol E descemos num pojo num ponto sem praia onde essas altas árvores a caraíbadeflor roxa tão urucuiana E o folhalarga o adernopreto o paude sangue o pauparaíba sombroso O Urucuia suas abas E vi meus Gerais Aquilo nem era só mata era até florestas Montamos direito no OlhodAguadasOutras andamos e demos com a primeira vereda dividindo as chapadas o flaflo de vento agarrado nos buritis franzido no gradeai de suas folhas altas e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 432 sassafrazal como o da alfazema um cheiro que refresca e aguadas que molham sempre Vento que vem de toda parte Dando no meu corpo aquele ar me falou em gritos de liberdade Mas liberdade aposto ainda é só alegria de um pobre caminhozinho no dentro do ferro de grandes prisões Tem uma verdade que se carece de aprender do encoberto e que ninguém não ensina o beco para a liberdade se fazer Sou um homem ignorante Mas me diga o senhor a vida não é cousa terrível Lengalenga Fomos fomos Assim pois foi como conforme que avançamos rompidas marchas duramente no varo das chapadas calcando o sapê brabão ou areias de cor em cimento formadas e cruzando somente com gado transeunte ou com algum boi sozinho caminhador E como cada vereda quando beirávamos por seu resfriado acenava para a gente um fino sossego sem notícia todo buritizal e florestal ramagem e amar em água E que com nosso cansaço em seguir sem eu nem saber o roteiro de Deus nas serras dos Gerais viemos subindo até chegar de repente na Fazenda Santa Catarina nos BuritisAltos cabeceira de vereda Ques borboletas E era em maio pousamos lá dois dias flor de tudo como sutil suave no conhecimento meu com Otacília O senhor me ouviu Em como Otacília e eu ficamos gostando um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 433 do outro conversamos combinados no noivável e na sobremanhã eu me despedi ela com sua cabecinha de gata alva no topo da alpendrada me dando a luz de seus olhos e de lá me fui com Diadorim e os outros E de como viemos em cata do grosso do bando de Medeiro Vaz que dali a quinze léguas recruzava da Ratragagem para a VeredaFunda e com eles nos ajuntamos economizando rumo num lugar chamado o Bom Buriti Me alembro meu é Ver belo o céu poente de sol de tardinha a roséia daquela cor E lá é cimo alto pintassilgo gosta daquelas friagens Cantam que sim Na Santa Catarina Revejo Flores pelo vento desfeitas Quando rezo penso nisso tudo Em nome da Santíssima Trindade O que o seguinte foi este o encontro da gente com Medeiro Vaz no BomBuriti num ressaco conforme já disse ele no meio de seus fortes homens exatos naquela bocaina de campo Medeiro Vaz retrata barbaça com grande chapéu rebuçado aquela pessoa sisuda circunspecto com todas as velhices sem nem velho ser Cujo eu me disse É bom ho mem E ele beijou a testa de Diadorim e Diadorim beijou aquela mão A um assim a gente podia pedir a benção se prezar Medeiro Vaz tomava rapé Medeiro Vaz mandando passar as ordens E tinha quartelmestre Subindo em esperança de lá João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 434 saímos para chão e sertão Sertão bravo as araras O só que Medeiro Vaz comandou foi isto Aleluia Diadorim tinha comprado um grande lenço preto que era para ter luto manejável funo guardado em sobre seu coração Chapadão de duro Daí passamos um rio vadoso rio de beira baixinha só buriti ali os buritis calados E a flor de caraíba urucuiã roxo astrazado um roxo que sobe no céu Naquele trecho também me lembro Diadorim se virou para mim com um ar quase de meninozinho em suas miúdas feições Riobaldo eu estou feliz ele me disse Dei um sim completo E foi assim que a gente principiou a tristonha história de tantas caminhadas e vagos combates e sofrimentos que já relatei ao senhor se não me engano até ao ponto em que Zé Bebelo voltou com cinco homens descendo o Rio Paracatu numa balsa de talos de buriti e herdou brioso comando e o que debaixo de Zé Bebelo fomos fazendo bimbando vitórias acho que eu disse até um fogo que demos bem dado e bem ganho na Fazenda São Serafim Mas isso o senhor então já sabe Só sim Ah meu senhor mas o que eu acho é que o senhor já sabe mesmo tudo que tudo lhe fiei Aqui eu podia pôr ponto Para tirar o final para conhecer o resto que falta o que lhe basta que menos mais é pôr atenção no que contei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 435 remexer vivo o que vim dizendo Porque não narrei nada àtoa só apontação principal ao que crer posso Não esperdiço pala vras Macaco meu veste roupa O senhor pense o senhor ache O senhor ponha enredo Vai assim vem outro café se pita um bom cigarro Do jeito é que retorço meus dias repensando Assentado nesta boa cadeira grandalhona de espreguiçar que é das de Carinhanha Tenho saquinho de relíquias Sou um homem ignorante Gosto de ser Não é só no escuro que a gente percebe a luzinha dividida Eu quero ver essas águas a lume de lua Urubu Um lugar um baiano lugar com as ruas e as igrejas antiqüíssimo para morarem famílias de gente Serve meus pensamentos Serve para o que digo eu queria ter remorso por isso não tenho Mas o demônio não existe real Deus é que deixa se afinar à vontade o instrumento até que chegue a hora de se dançar Travessia Deus no meio Quando foi que eu tive minha culpa Aqui é Minas lá já é a Bahia Estive nessas vilas velhas altas cidades Sertão é o sozinho Compadre meu Quelemém diz que eu sou muito do sertão Sertão é dentro da gente O senhor me acusa Defini o alvará do Hermógenes referi minha má cedência Mas minha pa droeira é a Virgem por orvalho Minha vida teve meiodo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 436 caminho Os morcegos não escolheram de ser tão feios tão frios bastou só que tivessem escolhido de esvoaçar na sombra da noite e chupar sangue Deus nunca desmente O diabo é sem parar Saí vim destes meus Gerais voltei com Diadorim Não voltei Travessias Diadorim os rios verdes A lua o luar vejo esses vaqueiros que viajam a boiada mediante o madrugar com lua no céu dia depois de dia Pergunto coisas ao buriti e o que ele responde é a coragem minha Buriti quer todo azul e não se aparta de sua água carece de espelho Mestre não é quem sempre ensina mas quem de repente aprende Por que é que todos não se reúnem para sofrer e vencer juntos de uma vez Eu queria formar uma cidade da religião Lá nos confins do Chapadão nas pontas do Urucuia O meu Urucuia vem claro entre escuros Vem cair no São Francisco rio capital O São Francisco partiu minha vida em duas partes A Bigri minha mãe fez uma promessa meu padrinho Selorico Mendes tivesse de ir comprar arroz nalgum lugar por morte de minha mãe Medeiro Vaz reinou depois de queimar sua casadefazenda Medeiro Vaz morreu em pedra como o touro sozinho berra feio conforme já comparei uma vez touro preto todo urrando no meio da tempestade Zé Bebelo me alumiou Zé Bebelo ia e voltava como um vivo demais de fogo e vento zás de raio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 437 veloz como o pensamento da idéia mas a água e o chão não queriam saber dele Compadre meu Quelemém outrotanto é homem sem parentes provindo de distante terra da Serra do Urubu do Indaiá Assim era Joca Ramiro tão diverso e reinante que mesmo em quando ainda parava vivo era como se já estivesse constando de falecido Só Candelário Só Candelário se desesperou por forma Meu coração é que entende ajuda minha idéia a requerer e traçar Ao que Joca Ramiro pousou que se desfez enterrado lá no meio dos carnaubais em chão arenoso salgado Só Candelário não era de certo modo parente do compadre meu Quelemém o senhor sabe Diadorim me veio de meu nãosaber e querer Diadorim eu adivinhava Sonhei mal E em Otacília eu sempre muito pensei tanto que eu via as baronesas amarasmeando no rio em vidro jericó e os lírios todos os líriosdobrejo coposdeleite lágrimasdemoça são josés Mas Otacília era como se para mim ela estivesse no ca marim do Santíssimo A Nhorinhá nas Aroeirinhas filha de Ana Duzuza Ah não era rejeitã Ela quis me salvar De dentro das águas mais clareadas aí tem um sapo roncador Nonada A mais com aquela grandeza a singeleza Nhorinhá puta e bela E ela rebrilhava para mim feito itamotinga Uns talismãs A mocinha Miosótis Não A Rosauarda Me alembrei dela todas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 438 as minhas lembranças eu queria comigo Os dias que são passados vão indo em fila para o sertão Voltam como os cavalos os cavaleiros na madrugada como os cavalos se arraçoam O senhor se alembra da canção de Siruiz Ao que aquelas troas de areia e as ilhas do rio que a gente avista e vai guardando para trás Diadorim vivia só um sentimento de cada vez Mistério que a vida me emprestou tonteei de alturas Antes eu percebi a beleza daqueles pássaros no Rio das Velhas percebi para sempre O manuelzinhodatroa Tudo isso posso vender Se vendo minha alma estou vendendo também os outros Os cavalos relincham sem causa os homens sabem alguma coisa da guerra Jagunço é o sertão O senhor pergunte quem foi que foi que foi o jagunço Riobaldo Mas aquele menino o Valtei na hora em que o pai e a mãe judiavam dele por lei ele pedia socorro aos estranhos Até o Jazevedão estivesse ali vinha com brutalidade de socorro capaz Todos estão loucos neste mundo Porque a cabeça da gente é uma só e as coisas que há e que estão para haver são demais de muitas muito maiores diferentes e a gente tem de necessitar de aumen tar a cabeça para o total Todos os sucedidos acontecendo o sentir forte da gente o que produz os ventos Só se pode viver perto de outro e conhecer outra pessoa sem perigo de ódio se a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 439 gente tem amor Qualquer amor já é um pouquinho de saúde um descanso na loucura Deus é que me sabe O Reinaldo era Diadorim mas Diadorim era um sentimento meu Diadorim e Otacília Otacília sendo forte como a paz feito aqueles largos remansos do Urucuia mas que é rio de braveza Ele está sempre longe Sozinho Ouvindo uma violinha tocar o senhor se lembra dele Uma musiquinha até que não podia ser mais dançada só o debulhadinho de purezas de virarvirar Deus está em tudo conforme a crença Mas tudo vai vivendo demais se remexendo Deus estava mesmo vislumbrante era se tudo esbarrasse por uma vez Como é que se pode pensar toda hora nos novíssimos a gente estando ocupado com estes negócios gerais Tudo o que já foi é o começo do que vai vir toda a hora a gente está num cômpito Eu penso é assim na paridade O demônio na rua Viver é muito perigoso e não é não Nem sei explicar estas coisas Um sentir é o do sentente mas outro é o do sentidor O que eu quero é na palma da minha mão Igual aquela pedra que eu trouxe do Jequitinhonha Ah pacto não houve Pacto Imagine o senhor que eu fosse sacerdote e um dia tivesse de ouvir os horrores do Hermógenes em confissão O pacto de um morrer em vez do outro e o de um viver em vez do outro então Arrenego E se eu quiser fazer outro pacto com Deus João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 440 mesmo posso então não desmancha na rãs tudo o que em antes se passou Digo ao senhor remorso Como no homem que a onça comeu cuja perna Que culpa tem a onça e que culpa tem o homem Às vezes não aceito nem a explicação do Compadre meu Quelemém que acho que alguma coisa falta Mas medo tenho mediano Medo tenho é porém por todos É preciso de Deus existir a gente mais e do diabo divertir a gente com sua dele nenhuma existência O que há é uma certa coisa uma só diversa para cada um que Deus está esperando que esse faça Neste mundo tem maus e bons todo grau de pessoa Mas então todos são maus Mas mais então todos não serão bons Ah para o prazer e para ser feliz é que é preciso a gente saber tudo formar alma naconsciência para penar não se carece bicho tem dor e sofre sem saber mais porquê Digo ao senhor tudo é pacto Todo caminho da gente é resvaloso Mas também cair não prejudica demais a gente levanta a gente sobe a gente volta Deus resvala Mire e veja Tenho medo Não Estou dando batalha É preciso negar que o QueDiga existe Que é que diz o farfal das folhas Estes gerais enormes em ventos danando em raios e fúria o armar do trovão as feias onças O sertão tem medo de tudo Mas eu hoje em dia acho que Deus é alegria e coragem que Ele é bondade adiante quero João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 441 dizer O senhor escute o buritizal E meu coração vem comigo Agora no que eu tive culpa e errei o senhor vai me ouvir Vemos voltemos O BuritiPintado o OiMãe o rio Soninho a Fazenda São Serafim com outros mal esquecidos seja Ao pé das chapadas no entremeio do se encher de rios tantos ou aí subindo e descendo solaus recebendo o empapo de chuva e mais chuva a gente se fervia debaixo desses extraordinários de Zé Bebelo a gente lambia guerra Zé Bebelo Vaz Ramiroviva o nome A gente vinha sobre o rastro deles dos Hermógenes por matar por acabar com eles por perseguir No borrusco o Hermógenes corria longes de nós sempre Às artes que fugiam Mas eu com aquilo já tinha inteirado costume Era ruim e era bom Aí quando muito vento abriu o céu e o tempo deu melhora a gente estava na erva alta no quase liso de altas terras Se ia aos vintes e trintas com Zé Bebelo de botafogo Assim expresso chapadão voante O chapadão é sozinho a largueza O sol O céu de não se querer ver O verde carteado do grameal As duras areias As arvorezinhas ruiminhas de minhas A diversos que passavam abandoados de araras araral conver santes Aviavam vir os periquitos cota o cantoclim Ali chovia João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 442 Chove e não encharca poça não rola enxurrada não produz lama a chuva inteira se soverse em minuto terra a fundo feito um azeitezinho entrador O chão endurecia cedo esse rareamento de águas O fevereiro feito Chapadão chapadãochapadão De dia é um horror de quente mas para a noitinha refresca e de madrugada se escorropicha o frio o senhor isto sabe Para extraviar as mutucas a gente queimava folhas de arapavaca Aquilo bonito quando tição aceso estala seu fim em faíscas e labareda dalalala Alegria minha era Diadorim Soprávamos o fogo juntos ajoelhados um frenteante o ao outro A fumaça vinha engasgava e enlagrimava A gente ria Assim que fevereiro é o mês mindinho mas é quando todos os cocos do buritizal maduram e no céu quando estia a gente acha reunidas as todas estrelas do ano todo Mesmas vezes eu ria Homem dorme com a cabeça para trás dois dedos no queixo Era o Pitolô Um Pitolô sei lá cabra destemido com crimes nos maniçobais perto para cima de Januária mas era nascido no barranco No Carinhanha rio quase preto muito imponente comprido e povooso Ademais que ele contava casos de muito amor Diadorim às vezes gostava Mas Diadorim sabia era a guerra Eu no gozo de minha idéia era que o amor virava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 443 senvergonhagemTurvei tanto Andorinha que vem e que vai quer é ir bem pousar nas duas torres da matriz de Carinhanha o Pitolô falava Eu tinha súbitas outras minhas vontades de passar devagar a mão na pele branca do corpo de Diadorim que era um escondido E em Otacília eu não pensava No escasso pensei Nela para ser minha mulher aqueles usosfrutos Um dia eu voltasse para a Santa Catarina com ela passeava no laranjal de lá Otacília mel do alecrim Se ela por mim rezava Rezava Hoje sei E era nessas boas horas que eu virava para a banda da direita por dormir meu sensato sono por cima de estados escuros Mas levei minha sina Mundo o em que se estava não era para gente era um espaço para os de meiarazão Para ouvir gavião guinchar ou as tantas seriemas que chungavam e avistar as grandes emas e os veados correndo entrando e saindo até dos velhos currais de ajuntar gado em rancharias sem morador Isso quando o ermo melhorava de ser só ermo A chapada é para aqueles casais de antas que toram trilhas largas no cerradão por aonde e sem saber de ninguém assopram sua bruta força Aqui e aqui os tucanos senhoreantes enchendo as árvores de mim a um tiro de pistola isto resumo mal Ou o zabelê choco chamando seus pintos para esgaravatar terra e com eles os bichinhos comíveis catar A fim o birro e o garrixo sigritando João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 444 Ah e o sabiápreto canta bem Veredas No mais nem mortalma Dias inteiros nada tudo o nada nem caça nem pássaro nem codorniz O senhor sabe o mais que é de se navegar sertão num rumo sem termo amanhecendo cada manhã num pouso diferente sem juízo de raiz Não se tem onde se acostumar os olhos toda firmeza se dissolve Isto é assim Desde o raiar da aurora o sertão tonteia Os tamanhos A alma deles Mas Zé Bebelo andante estava esperdiçando o consistir E que o Hermógenes só fizesse por se fugir toda a vida isso ele não entendia Vai cavacando buraco vai que tu vê oco da paciência ele resmungou Ainda que nesses dias ele menos falasse ou quando falava eu não queria ouvir Digo que no cível trivial Zé Bebelo me indispunha com algum enjôo A antes uma conversa com Alaripe somente simples ou com o Fafafa que estimava irmãmente os cavalos deles tudo entendia mestre em doma e em criação Zé Bebelo só tinha graça para mim era na beira dos acontecimentos em decisões de necessidade forte e vida virada horas de se fazer O traquejar Se não aquela mente de prosa já me aborrecia A monte andante ao adiável aí assim e assaz eu airei meu pensamento Amor eu pensasse Amormente Otacília era a bemdizer minha noiva Mas eu carecia era de mulher João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 445 ministrada da vaca e do leite De Diadorim eu devia de conservar um nojo De mim ou dele As prisões que estão re fincadas no vago na gente Mas eu aos poucos macio pensava desses acordados em sonho e via o reparado como ele principiava a rir quente nos olhos antes de expor o riso daquela boca como ele falava meu nome com um agrado sincero como ele segurava a rédea e o rifle naquelas mãos tão finas brancamente Esses Gerais em serras planas beleza por ser tudo tão grande repondo a gente pequenino Como se eu estivesse calçando par de chinelo muito flote e eu queria um sinapismo botim reiúno duro redomão Agora e os outros o senhor dirá Ah meu senhor homens guerreiros também têm suas francas horas homem sozinho sem par supre seus recursos também Surpreendi um o Conceiço que jazia vadio deitado se ocultando atrás de fechadas moitas momento que raro se vê feito o cagar dum bicho bravo É essa natureza da gente ele disse eu não tinha perguntado explicação O que eu queria era um divertimento de alívio Ali com a gente nenhum cantava ninguém não tinha viola nem nenhum instrumento No peso ruim do meu corpo eu ia aos poucos perdendo o bom tremor daqueles versos de Siruiz João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 446 Então eu forcejei por variar de mim que eu estava no não acontecido nos passados O senhor me entende De Diadorim não me apartava Cobiçasse de comer e beber os sobejos dele queria pôr a mão onde ele tinha pegado Pois por quê Eu estava calado eu estava quieto Eu estremecia sem tremer Porque eu desconfiava mesmo de mim não queria existir em tenção soez Eu não dizia nada não tinha coragem O que tinha era uma esperança Mesmo parava tempos no pensar numa mulher achada Nhorinhá a minha moça Rosauarda aquela mocinha Miosótis Mas o mundo falava e em mim tonto sonho se desmanchando que se esfiapa com o subir do sol feito neblina noruega movente no frio de agosto A noite que houve em que eu deitado confesso não dormia com dura mão sofreei meus ímpetos minha força esperdiçada de tudo me prostrei Ao que me veio uma ânsia Agora eu queria lavar meu corpo debaixo da cachoeira branca dum riacho vestir terno novo sair de tudo o que eu era para entrar num destino melhor Anda que levantei a pé caminhei em redor do arrancho antes do romper das horas dalva Saí no grande orvalho Só os pássaros pássaro de se ouvir sem se ver Ali se madruga com céu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 447 esverdeado Zé Bebelo podia pautear explicação de tudo de como a gente ia alcançar os Hermógenes e dar neles grave derrota podia referir tudo que fosse de bem se guerrear e reger essa política com suas futuras benfeitorias De que é que aquilo me servisse Me cansava E vim vindo para a beira da vereda Consegui com o frio esperei a escuridão se afastar Mas quando o dia clareou de todo eu estava diante do buritizal Um buriti tetéia enorme Aí sendo que eu completei outros versos para ajuntar com os antigos porque num homem que eu nem conheci aquele Siruiz eu estava pensando Versos ditos que foram estes conforme na memória ainda guardo descontente de que sejam sem razoável valor Trouxe tanto este dinheiro o quanto no meu surrão pra comprar o fim do mundo no meio do Chapadão Urucuia rio bravo cantando à minha feição é o dizer das claras águas que turvam na perdição Vida é sorte perigosa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 448 passada na obrigação toda noite é rioabaixo todo dia é escuridão Mas estes versos não cantei para ninguém ouvir não valesse a pena Nem eles me deram refrigério Acho que porque eu mesmo tinha inventado o inteiro deles A virtude que tivessem de ter deu de se recolher de novo em mim a modo que o truso dum gado mal saído que em sustos se revolta para o curral e na estreitez da porteira embola e rela Sentimento que não espairo pois eu mesmo nem acerto com o mote disso o que queria e o que não queria estória sem final O correr da vida embrulha tudo a vida é assim esquenta e esfria aperta e daí afrouxa sossega e depois desinquieta O que ela quer da gente é coragem O que Deus quer é ver a gente aprendendo a ser capaz de ficar alegre a mais no meio da alegria e inda mais alegre ainda no meio da tristeza Só assim de repente na horinha em que se quer de propósito por coragem Será Era o que eu às vezes achava Ao clarear do dia Aí o senhor via os companheiros um por um prazidos em beira do café Assim também por que se agüentava aquilo era por causa da boa camaradagem e dessa movimentação João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 449 sempre Com todos quase todos eu bem combinava não tive questões Gente certa E no entre esses que eram o senhor me ouça bem Zé Bebelo nosso chefe indo à frente e que não se diava folga nem cansaço o Reinaldoque era Diadorim sabendo deste o senhor sabe minha vida o Alaripe que era de ferro e de ouro e de carne e osso e de minha melhor estimação Marcelino Pampa segundo em chefe cumpridor de tudo e senhor de muito respeito João Concliz que com o Sesfredo porfiava assoviando imitado de toda qualidade de pássaros este nunca se esquecia de nada o Quipes sujeito ligeiro capaz de abrir num dia suas quinze léguas cavalos que haja Joaquim Beiju rastreador de todos esses sertões dos Gerais sabente o Tipote que achava os lugares dágua feito boi geralista ou buriti em broto de semente o Suzarte outro rastreador feito cão cachorro ensinado boa pessoa o Queque que sempre tinha sau dade de sua rocinha antiga desejo dele era tornar a ter um pedacinho de terra plantadeira o Marimbondo faquista perigoso nos repentes quando bebia um tanto de mais o Acauã um roxo esquipático só de se olhar para ele se via o vulto da guerra o MãodeLixa porreteiro nunca largava um bom cacete que nas mãos dele era a pior arma Freitas Macho grãomogolense contava ao senhor qualquer patranha que prouvesse e assim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 450 descrevia o senhor acabava acreditando que fosse verdade o Conceiço guardava numa sacola todo retrato de mulher que ia achando até recortado de folhinha ou de jornal José Gervásio caçador muito bom José itirana filho dum lugar que se chamava a CapelinhadoChumbo esse sempre dizia que eu era muito parecido com um tio dele Timóteo chamado o Preto Mangaba da CachoeiradoChoro diziase que entendia de toda mandraca João Vaqueiro amigo em tanto o senhor já sabe o Coscorão que tinha sido carreiro de muito ofício mas constante que era canhoto o jacaré cozinheiro nosso Cavalcânti competente sujeito só que muito soberbose ofendia com qualquer brincadeira ou palavra o Feliciano caolho o Marruaz homem desmarcado de forçoso capaz de segurar as duas pernas dum poldro Guima que ganhava em todo jogo de baralho era do sertão do Abaeté Jiribibe quase menino filho de todos no afetual paternal o Moçambicão um negro enorme pai e mãe dele tinham sido escravos nas lavras Jesualdo rapaz cordato a ele fiquei devendo sem me lembrar de pagar quantia de dezoito milréis o Jequitinhão antigo capataz arrieiro que só se dizia por ditados o Nélson que me pedia para escrever carta para ele mandar para a mãe em não sei onde moradora Dimas Doido que doido mesmo não era só valente e esquentado o Sidurino João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 451 tudo o que ele falava divertia a gente PacamãdePresas que queria qualquer dia ir cumprir promessa de acender velas e ajoelhar adiante no São Bom Jesus da Lapa RasgaemBaixo caolho também com movimentos desencontrados dizia que nunca tinha conhecido mãe nem pai o Fafafa sempre cheirando a suor de cavalo se deitava no chão e o cavalo vinha cheirar a cara dele Jõe Bexiguento sobrenomeado Alparcatas deste qual o senhor recital já sabe um José Quitério comia de tudo até calango gafanhoto cobra um infeliz Treciziano o irmão de um José Félix o Liberato o Osmundo E os urucuianos que Zé Bebelo tinha trazido aquele Pantaleão um Salústio João os outros E que ia me esquecendo Raimundo Lê puçanguara entendido de curar qualquer doença e Quim Queiroz que da munição dava conta e o Justino ferrador e alveitar A mais que nos dedos conto o Pitolô José Micuim Zé Onça Zé Paquera Pedro Pintado Pedro Afonso Zé Vital João Bugre Pereirão o Jalapa Zé Beiçudo Nestor E Diodolfo o Duzentos João Vereda Felisberto o Testaem Pé Remigildo o Jósio Domingos Trançado Leocádio PaunaCobra Simião Zé Geralista o Trigoso o Cajueiro Nhô Faísca o Araruta Durval Foguista Chico Vosso Acrísio e o Tuscaninho Caramé Amostro para o senhor ver que eu me alembro Afora algum de que eu me esqueci isto é mais muitos Todos juntos aquilo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 452 tranqüilizava os ares A liberdade é assim movimentação E bastantes morreram no final Esse sertão esta terra A verdade que com Diadorim eu ia ambos e todos Além de que Zé Bebelo comandava Ao que vamos vamos meu filho Professor arrumar esses bodes na barranca do rio e impor ao Hermógenes o combate Zé Bebelo preluzia comedindo pompa com sua grande cabeça Assim de loguinho não aprovei então ele imaginou que eu estava descrendo Agora coage tua cisma que eu estou senhor dos meus projetos Tudo já pensei e repensei guardo dentro daqui o resumo bem traçado e ele pontoava com dedo na testa Acreditar eu acreditasse não duvidei O que eu podia não saber era se eu mesmo estava em ocasiões de boasorte A ser porque numa volta do RibeirãodoGalhodaVida a gente tinha topado com turma de inimigos retornados para lá por espiação Aí foi curto fogo mas eu levei uma bala de raspaz na carne do braço perdi muito sangue Raimundo Lê banhou com casca de angico na hora melhorei Diadorim amarrou bem com pano duma camisa rasgada Apreciei a delicadeza dele Atual todos prestaram em mim amizade de atenção aquilo vinha a ser até um consolo Só que depois de dois dias o braço me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 453 doía inteiro e inchava sei que a inchação me cansasse muito sempre eu queria esbarrar pra água beber Se eu tiver de atirar então como é que faço Não posso era outro meu receio Admirei porque o José Félix também tinha tido ferimento na coxa e na perna mas a natureza dele era limpa o ofendido secava por si nem parecendo ser Assim a primeira vez que me sucedia um amal isso me perturbasse O que me sofria até nas margens do peito e nos dedos da mão não me concedendo movimentos Muito temi por meu corpo Ah minha Otacília eu gemi em mim Pode que nunca mais você me veja e então nem viúva minha você não vai ser Uns recomendavam arnicadocampo outros aconselhavam emplastro de bálsamo com isso rente se sarava Aí Raimundo Lê garantiu cura com ervaboa Mas onde era que ervaboa se ia achar À Fazenda dos Tucanos chegamos lá esbarramos é na beira da Lagoa Raposa passada a Vereda do Enxu Visitamos o fazendão vazio não tinha almaviva de se ver E do RiodoChico longe não se estava Assim então por que era que não se avançar logo às duras marchas para atacar Sei de mim sei Zé Bebelo menos disse sem explicação Desconheci Cacei um catre camadevento num quarto meio escuro com coisa nenhuma não me importei Retém as forças Riobaldo Vou campear o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 454 remédio nesses matos Diadorim falou A gente nos Tucanos ia falhar dois dias ali ficamos comendo palmito e secando em sol a carne de dois bois No primeiro dia de tardinha apareceu um boiadeiro que com seus camaradas viajando Vinham de CampoCapão Redondo em caminhada para Morrinhos Por que tinham riscado aquela grande volta O senhor dá paz à gente Chefe o boiadeiro perguntou Dou paz damos amigos Zé Bebelo respondeu A quieto o boiadeiro então achou que devia de as novidades relatar Que se estava em meio de perigos Sim Os soldados Os que soldados esses mano velho Soldadesca pronta do Governo mais de uns cinqüenta Assim onde era que estavam Ao que estão em São Francisco e em Vila Risonha e mais outros deles vão vindo chegando Chefe é o que eu ouvi dizer Zé Bebelo escutando redondamente Só quis mais saber Se isso se aquilo Se o boiadeiro sabia o nome do Promotor de Vila Risonha e do juiz de Direito do Delegado do Coletor do Vigário O do Oficial comandante da tropa o boiadeiro não acertava dizer Aquele boiadeiro era homem sério com palavra merecida e vontade de estar bem com todos Tinha uma garrafa de vinho depurativo na bagagem me presenteou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 455 com um gole me fez bem Pousou lá no outro dia se foram muito cedo Nesse entremear eu senti meu braço melhor e estive mais disposto Andei andando vi aquela fazenda Essa era enorme o corredor de muitos grandes passos Tinha as senzalas na raia do pátio de dentro e na do de fora em redor o engenho a casadosarreios muitas moradas de agregados e os depósitos esse pátio de fora sendo largo lajeado e com um cruzeiro bem no meio Mas o capim crescia regular enfeite de abandono Não de todo Pois tinham desamparado um gato ali esquecido o qual veio para perto do jacaré cozinheiro suplicar comida Até por dentro do eirado mansejavam uns bois e vacas gado reboleiro Aí João Vaqueiro viu um berrante bom pendurado na parede da salagrande pegou nele chegou na varanda e tocou as reses entendiam uma ou outra respondendo e entraram no curral para a beira dos cochos na esperança de sal Não faz mês que o povo daqui aqui ainda estava João Vaqueiro declarou E era verdade com efeito pois na despensa muita coisa se encontrando aproveitável Nos Tucanos valia a pena Os dois dias ficaram três que tão depressa passaram João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 456 Madrugada no em que se ia partir dali eu acordei ainda com o escuro no amiudar Só assim acordei por um rumor seria o Simião que estava dormindo no mesmo cômodo e tacteando se levantava Mas me chamou A gente vai pegar a cavalhada Vamos ele disse Não gostei Estou enfermo Então vou Quem é que rala a minha mandioca repontei áspero Virei para o canto assim eu estava apreciando aquele catre de couro O Simião decerto ia mais o Fafafa e Doristino estavam bons para o orvalho dos pastos Diadorim que dormia num colchão encostado na outra banda já tinha se levantado antes e desaparecido do quarto Ainda persisti numa madorna Aquela moradia hospedava tanto assim sem donos só para nós Aquele mundo de fazenda sumido nos sussurros os trastes grandes o conforto das arcas de roupa a cal nas paredes idosas o bolor Aí o que pasmava era a paz Pensei por que seria tudo alheio demais um sujo velho respeitável e a picumã nos altos Pensei bobagens Até que escutei assoviação e gritos tropear de cavalaria Ah os cavalos na madrugada os cavalos de repente me lembrei antiqüíssimo aquilo eu carecia de rever Afoito corri compareci numa janela era o dia clareando as barras quebradas O pessoal chegava com os cavalos Os cavalos enchiam o curralão prazentes Respirar é que era bom tomar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 457 todos os cheiros Respirar a alma daqueles campos e lugares E deram um tiro Deram um tiro de rifle mais longe O que eu soube Sempre sei quando um tiro é tiro isto é quando outros vão ser Deram muitos tiros Apertei minha correia na cintura Apertei minha correia na cintura o seguinte emendando que nem sei como foi Antes de saber o que foi me fiz nas minhas armas O que eu tinha era fome O que eu tinha era fome e já estava embalado aprontado Às tantas o senhor assistisse àquilo uma confusão sem confusão Saí da janela um homem esbarrou em mim em carreira outros bramaram Outros Só Zé Bebelo as ordens de sobrevoz Aonde o quê Todos eram mais ligeiros do que eu Mas ouvi Mataram o Simião Simião Perguntei E o Doristino Ãã Homem não sei alguém me respondendo Mataram o Simião e o Aduvaldo E eu ralhei Basta Mas sobre o instante virei Ah e o Fafafa O que ouvi Fafafa não Fafafa está é matando Assim era real verdadeiramente de repente caído como chuva o rasgo de guerra inimigos terríveis investindo São eles Riobaldo os Hermógenes Diadorim aparecido ali em minha frente isto João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 458 falou Atiraram um horror duma vez tiros e tiros que estavam contra nós desfechando Atiravam nas construções da casa Dia dorim sacripante se riu encolheu um ombro só Para ele olhei o tanto o tanto até ele anoitecer em meus olhos Eu não era eu Respirei os pesos Agora agora estamos perdidos sem socorro inventei na mente E raciocinei a velocidade disto Ser pego na tocaia é diverso de tudo e é tolo Assim enquanto eu escutando na folha da orelha as minúcias recontadas as passadas dos companheiros no corredor o assoviar e o dar das balas que nem um saco de bagos de milho despejado Feito cuspissem o pôr e pôr Senti como que em mim as balas que vinham estragar aquela morada alheia de fazenda Medo nem tive não deu para ter foi outra noção diferente Me salvei por um espetar de pensamento que Diadorim cenho franzindo fosse mandar eu ter coragem Ele nem disse Mas eu me inteirei ligeiro demais num só destorcer Eh pois vamos É a hora eu declarei pus a mão no ombro dele Respirei depressa demais Aquele me apatetar saiba o senhor não deve de ter durado nem os menos minutos No átimo supri a claridade completa de idéia o sanguefrio maior essas comuns tranqüilidades E por aí eu sabia mesmo exato a gente já estava debaixo de cerco João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 459 Achei especial o jeito de João Concliz vir ansiado cauteloso Ação em que qualquer um anda nessas semelhantes ocasiões só encostado nas paredes Você fica aqui mais você e você Você dessa banda Você ali vocêaí acolá arrumação ele ordenava Riobaldo Tatarana tu toma conta desta janela Daqui não sai nem relaxa por via nenhuma Arredado lá embaixo avistei Marcelino Pampa indo para as senzalas com uns cinco ou seis companheiros Com outros Freitas Macho corria para a tulha e para o engenho uns junto com Jõe Bexiguento dito Alparcatas Meus peitos batendo tresdobro forte eu dividido naquela alarida A grave escorei meu rifle limpo arma minha amásia Ainda reconheci o Dimas Doido e o Acauã deitados atrás do cruzeiro do pátio Um daqueles urucuianos apareceu mais outro traziam balaio grande com algodão em rama Mais homens com sacos de sabugos foram buscar outros sacos carregavam um caixote também Tudo eles estavam transportando por entranqueirar o pátio de fora tábuas tamboretes cangalhas e arreios uma mesa de carapina retombada Arranjos de guerra esses são engenhados sempre com uma graça variada diversa dos aspectos de trabalho de paz isto vi o senhor vê homens e homens repulam no afã tão unidamente sujeitos maneiros feito João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 460 o meigo do demo assoprasse neles ou até mesmo os espíritos Suspirei de bestagem Ao menos alguém fungou e me cutucou era o Preto Mangaba mandado guarnecer ali comigo junto Preto Mangaba me oferecia dum pão de docedeburiti repartia amistoso Eu então me alembrei de que estava com fome Mas Quim Queiroz trazia mais munição ele ajudado por alguns arrastavam um couro o couro esse cheio repleto de munição arrastavam no assoalho do corredor Da janela da outra banda pus o olhar espiei o desdém do mundo distâncias Abalavam fogo contra a gente outra vez contra o espaço da casa Ixe de inimigo que não se avistava Somente eu queria saber era se agüentava manejar como era que estava sentindo meu braço Aí ergui mão para coçar minha testa aí me cismei e fiz com todo o respeito o pelosinal Sei que o cristão não se concerta pela má vida levável mas sim porém sucinto pela boa morte ao que a morte é o sobrevir de Deus entornadamente Atirei Atiravam Isso não é isto Nonada A aragem Diadorim onde estivesse Soube que ele parava em outro ponto em seu posto em praça Sustentava picando João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 461 alvos a para a frente junto com o Fafafa o Marruaz Guima e Cavalcânti na barra da varanda Todo lugar não era lugar Não se podendo esbarrar de jeito nenhum no arrebentar nas manivelas da guerra Aprendi os momentos Assim assazmente João Concliz tornava a vir zelante com Alaripe José Quitério e RasgaemBaixo Espera ele mandou Pelo que vinham também o Pitolô e o Moçambicão puxando uns couros de boi Esses couros inteiros eram para a gente pregar lá em riba nas padieiras ficarem dependurados de cortinado bambo nos vãos das janelas Depois o PacamãdePresas mais o Conceiço socavando com ferramenta a fito de abrir torneiras nas paredes por onde buraco de se atirar Aquela guerra ia durar a vida in teira O que eu atirava ouvia menos Mas o dos outros assovios bravos o achispe isto de ferro as balas apedrejadas Eu e eu Até meus estalos que a cada no próprio do coração À mira de enviar um grão de morte acertado naquelas raras fumaças dançáveis Assim é que é assim Ah E então aí no súbito aparecer Zé Bebelo chegou se encostou quase em mim Riobaldo Tatarana vem cá ele falou mais baixo meio grosso com o que era uma voz de combinação não era a voz de autoridade A de ver o que ele quisesse de mim Para eu passar avante na posição me transpor João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 462 para um lugar onde se matar e morrer sem beiras de maior marca Andei e segui presente que com Zé Bebelo tudo carecia mais era de ser depressa Mesmo me levou Mas me levou foi para um outro cômodo Ali era um quarto pequeno sem cama nenhuma o que se via era uma mesa Mesa de madeira vermelha respeitável cheirosa Desentendi Dentro daquele quarto como que não entrava a guerra Mas o pensar de Zé Bebelo ansiado eu sabia era coisa que estralejava inventaste e forte Mais antes larga o rifle aí deposita ele falou O depor meu rifle Pois botei em cima da mesa esquinado de través botei com o todo cuidado Ali se tinha lápis e papel Senta mano ele pois ele Ofereceu a cadeira cadeira alta de pau com recosto Se era para sentar assentei em beira de mesa Zé Bebelo de revólver pronto na mão mas que não contra mim o revólver era o comando o constante revirar e remexer da guerra E ele nem me olhou e me disse Escreve Caí num pasmo Escrever numa hora daquelas O que ele explicado mandou eu fui e principiei que obedecer é mais fácil do que entender Era Não sou cão não sou coisa Antes isto que sei para se ter ódio da vida que força a gente a ser filho João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 463 pequeno de estranhos Ah o que eu não entendo isso é que é capaz de me matar me lembrei dessas palavras Mas palavras que em outra ocasião quem tinha falado era Zé Bebelo mesmo Escreve O zunzum da guerra acontecendo era que me estorvava de direito pensar E Zé Bebelo não estava ali não era para isso para pensar por todos Como que fosse o papel para o que carecia era pouco Tinham de caçar mais papel qualquer por ali devia de ter Enquanto isso eu cumprisse de escrever na seca mão da necessidade E ouvimos praga de dor Ao que foi Uns gemidos despautados de sorrogo Companheiro ofendido O Leocádio ouvimos Semmodos se precipitado Zé Bebelo avançou para ali para ver Sem determinação tomada de ir eu também já estava lá atrás dele O homem o primeiro ferido caído sentado as pernas estendidas para diante as costas amparadas na parede com a mão esquerda era que ele suportava sua testa mas com a direita ainda segurava o rifle que o asno rifle ele não tinha largado Conforme Raimundo Lê já tinha exigido alguns vinham da cozinha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 464 trazendo as latas dágua Raimundo Lê lavava a cara do homem ensangüentada do Leocádio Esse estava atirado pelas queixadas má bala que lhe partira o osso o vermelho brabotava e pingava Meu filho tu agüenta ainda brigar Zé Bebelo quis saber O Leocádio que fez careta garantiu que podia O que posso Em nome de Deus e de meu São Sebastião guerreiro o que posso Sempre sendo a careta sem gracejo pois falar era o que para ele custava e maltratava E da Lei E da lei também Ah então vamos faz vingança menino faz vingança Zé Bebelo aforçurou Semelhante só botasse apreço nos fatos por resultar Zé Bebelo se endemoninhava Segurou meu braço suscitado de se voltar para a mesa para se escrever amanuense Pelo discorrer revólver na mão às vezes achei em minha fantasia que ele estava me ameaçando Ei ai vamos ver Que tenho esquadrão reiúno esses é que vão vir me dar retaguarda ele falasse Eu escrevesse com mais urgência Os bilhetes missiva para o senhor oficial comandante das forças militares outro para o excelentíssimo juiz da comarca de São Francisco outro para o presidenteda câmara de Vila Risonha outro para o promotor Apresta A massa do volume deles também dá valor ele regendo Acertei Escrevi O teor era aquilo mesmo o simples que se os João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 465 soldados no soflagrante viessem de rota abatida sem esperdiçar minuto então aqui na Fazenda dos Tucanos pegavam caça grossa reunida de lobo jaguatirica e onça de toda a jagunçada maior reinante no vezvez desses gerais sertões A rasa à justa e cerrar com fecho formal Ordem e Progresso viva a Paz e a Constituição da Lei Assinado José Rebelo Adro Antunes cidadão e candidato No pique dum momento perdi e achei minha idéia e esbarrei A em pé agora formada eu conseguia a alumiação daquela desconfiança Assim Em que maldei foi aquilo não seria traição Rasteiro tive que olhei Zé Bebelo no grude dos olhos Daí tão claro e aligeirado pensei os prefácios Aquele tinha sido homem pago estipendiado pelo Governo agora os soldados do Governo com ele se encontravam E nós todos Diadorim e eu os tristes e alegres sofrimentos da gente a célebre morte de Medeiro Vaz a vingança em nome de Joca Ramiro Nem eu sabia ao certo depois no correr de tantos meses o extrato da vida de Zé Bebelo o que ele tinha realmente feito somenos se cumprida a viagem de ida até em Goiás Soubesse o pior era que ele por oficio e por espécie não podia esbarrar de pensar não podia esbarrar de pensar inventado para adiante sem repouso sempre mais A gente estava por conta dele e sem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 466 repouso nenhum também nenhum o portanto E ele tinha trazido o bando cá para perto do São Francisco tinha querido falhar os três dias naquela fazenda atacável Quem sabe então o recado para os soldados virem ele mesmo já não teria enviado desde tempos Idéia essa Arre de espanto ah como quando onça delado pula quando a canoa revira quando cobra chicoteia Desse de ser Ao caminho dos infernos para prazo Aí careci de querer a calma O tiroteio já redobrava Ouvi a guerra Decerto eu estava exagerado Antes Zé Bebelo havendo de ser mesmo o chefe para a hora safado capaz Nem se desprazia Oi xô Pra esses munição não falta ele escarnecendo disse quando as descargas vieram em salva mais forte o fiufiu e os papocos Ah as balas que partiam telhas e que as paredes todas recebiam Cacos caindo do alto Te apressa Tatarana que nós dois temos também de atirar Alegre dito Na janela ali tinham pendurado igualmente um daqueles couros de boi bala dava zaquezaque empurrando o couro daí perdia a força e baldava no chão A cada bala o couro se fastava brando no ter o choque balangava e voltava no lugar só com mossa feita sem se rasgar Assim ele amortecia as todas para isso era que o couro servia Traição eu não queria pensar Eu já tinha preenchido João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 467 três cartas Não é do tutuco nem do zumbiz das balas o que daquele dia em minha cabeça não me esqueço mas do bater do couro preto adejante que sempre duro e mole no ar se repetia Advindo que algum me trouxe mais papel achado por ali nos quartos em remexidas gavetas Só coisa escrita já de tinta firme mas a gente podendo aproveitar o espaço embaixo ou a banda de trás reverso dita Que era que estava escrito nos papéis tão velhos Um favor de carta de tempos idos num vigente fevereiro 11 quando ainda se tinha Imperador no no me dele com respeito se falava E noticiando chegada em poder de remessa de ferramenta remédios algodão trançado tinto A fatura de negócios com escravos compra os recibos por Nicolau Serapião da Rocha Outras cartas Escreve filho escreve ligeiro A traição então Altamente eu escutava os gritos dos companheiros xingatório no meio da desbraga do quanto combate na torração Aqui mesmo esgueirados para a janela o Duzentos e o RasgaemBaixo agora ombreavam armas seu vezemquando a ponto atiravam Assim como não pude eu esbarrei outra vez e encarei Zé Bebelo sem final João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 468 Que é Que é lá ele me perguntou Devia ter me deduzido dos meus olhos mesmo melhor do que o que eu sabia de mim A pois Por que é que o senhor não se assina ao pé Zé Bebelo Vaz Ramiro como o senhor outrora mesmo declarou eu cacei contra reperguntando Ato visível que ele esteve pego no usual de seu modo assim de se espantar no ar Conheci Às vezes também um atraiçoa sem nem saber o que é que está produzindoàs falsas hajas Mas ele não tinha surpreendido a verdade do meu indagar a expedição de minha dúvida Conforme prazido consigo recachou e me disse me engambelando Ah hãan Também pensei Tanto que pensei mas não se pode Muito alta e sincera é a devoção mas o exato das praxes impõe é outras coisas impõe é o duro legal Aí fui escrevendo Simples fui porque fui ah porque a vida é miserável A letra saía tremida no demoroso Meu outro braço também recomeçava a doer quaseque Traição sem querer eu fui lançando no papel a palavra mas risquei Uma bala no couro assoviou soco outra entrou atrás entrou com o couro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 469 levantado deu na parede defronte ricocheteou e veio cair quente perto da gente Ali na parede tinha um chifre de boi de se dependurar roupa até armador de rede era de chifre de boi naquela Casa Sumamente eu esperei o pispissiu de alguma outra bala eu queria Soubesse por quê O pensar caladíssimo de Zé Bebelo me perturbava Mas ele disse Que é que é se debruçando Que erro que foi Não viu porque eu já tinha riscado Mas então ele muito falou Ia explicando De noite no escuro feito ia mandar dois cabras dos mais espertos viajeiros para rastejarem por ali furando o cerco cada um levava ruma igual daquelas cartas Assim Deus azado ajudasse e eles ou ao menos um deles conseguisse então era resumo certo que a soldadesca se mo vimentava de vir Apareciam os trapezavam apropositavam arrebentavam com os Hermógenes E a gente eu perguntei Ãe A gente A ver que você não me entendeu A gente obra jeito de se escapar no cererê da confusão Antes tanto que era muito difícil eu repostei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 470 Ah sim dificultoso é meu filho Mas pego é o nosso recurso Se não se outra que saldo é que temos e Zé Bebelo do dito sagaz se rigozijava Então com respeito eu disse que a gente podia experimentar de fazer isso mesmo agora furar uma saída por entre os Hermógenes brigando e matando Eu disse isso Mas tinha esquecido que estava era encostado em Zé Bebelo no questionar Aí quem era que podia com a idéia daquele homem quem era que se sustentava A foro pois assim ele me respondeu Pois era Tatarana Olhe escuta pensa esses Hermógenes não são mais valentes do que nós nem estão em quantidade maior mas fato é que eles chegaram a surdas e nos cercaram tomaram tudo quanto há de melhor nessas posições Asseados é que estão Agora nesta hora a gente forçar um escape pode ser que se tenha sorte mas mesmo assim sofrendo muitas mortes e sem meios para descontar essas sem alcance nenhum para se matar um bom poucado desses inimigos Tu entende Mas se os soldados chegarem têm de dar o forte fogo primeiro contra os Hermógenes fazendo neles muito estrago Aí se foge com tenção só na escapula Ao menos algum lucro se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 471 teve Ah tu vê o que se quer Ah o que tu também quer pois não quer Não nas artes que produzia mas no armar de falar assim ele era razoável Se riu qual Riu Eu sendo água me bebeu eu sendo capim me pisou e me ressoprou eu sendo cinza Ah não Então eu estava ali em chão em acu atôo de acuado Um ror de meu sangue me esquentou as caras o redor dos ouvidos cachoeira que cantava pancada Eu apertei o pé na alpercata espremi as tábuas do assoalho Desconheci antes e depois uma decisão firme me transtornava E eu vi fiquei sabendo me queimassem em fogo eu dava muitas labaredas muito altas Ah dava O senhor acha que menos acho Mais digo Mais fiz Antes veja o que eu pensei o que seguinte ia ser e ficou formado um decreto de pedra pensada que na hora de os soldados sobrechegarem eu parava perto de Zé Bebelo e que ele fizesse feição de trair eu abocava nele o rifle efetuava Matava só uma vez E daí Daí eu tomava o comandamento o competentemente eu mesmo e represava a chefia e forçando os companheiros para a impossível salvação Aquilo por amor do rijo leal eu fazia era capaz pelo certo que a vida deve de ser Mesmo não gostando de ser chefe descrendo do enfado de responsabilidades Mas fazia Aí pego a facapunhal e o facão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 472 grande tornei a pensar Até chegar a hora eu não ia falar disso com pessoa nenhuma nem com Diadorim Mas fazia procedia E eu mesmo senti a verdade duma coisa forte com a alegria que me supriu eu era Riobaldo Riobaldo Riobaldo A quase que gritei aquele este nome meu coração alto gritou Arre então quando eu experimentei os gumes dos meus dentes e terminei de escrever o derradeiro bilhete eu estive todo tranqüilizado e um só e insensato resolvido tanto que mesmo acho que aquele na minha vida foi o ponto e ponto e ponto E entreguei o escrito a Zé Bebelo minha mão não espargiu nenhum tremor O que regeu em mim foi uma coragem precisada um desprezo de dizer o que disse O senhor chefe o senhor é amigo dos soldados do Governo E eu ri ah riso de escárnio direitinho ri para me constar assim que de homem ou de chefe nenhum eu não tinha medo E ele se sustou fez espantos Ele disse Tenho amigo nenhum e soldado não tem amigo Eu disse Estou ouvindo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 473 Ele disse Eu tenho é a Lei E soldado tem é a lei Eu disse Então estão juntos Ele disse Mas agora minha lei e a deles são às diversas uma contra a outra Eu disse Pois nós a gente pobres jagunços não temos nada disso a coisa nenhuma Ele disse Minha lei sabe qual é que é Tatarana É a sorte dos homens valentes que estou comandando Eu disse É Mas se o senhor se reengraçar com os soldados o Governo lhe repraz e lhe premeia O senhor é da política Pois não é Õ gente deputado Ah e feio ri porque estava com vontade Aí pensei que ele fosse logo querer o a gente se matar A sorte do dia eu cutucava Mas ruim não foi Zé Bebelo só encurtou o cenho no carregoso Fechou a boca pensou bem Ele disse Escuta Riobaldo Tatarana você por amigo eu tenho e te apreceio porque vislumbrei tua boa marca Agora se eu achasse o presumido com certeza de que você está desconcordando de minha lealdade por malícias ou de que você quer me aconselhar canalhagem separada velhaca para vantagem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 474 minha e sua Se eu soubesse disso certo olhe Eu disse Chefe morte de homem é uma só Eu tossi Ele tossiu Diodolfo correndo vindo disse O Jósio está morrendo com um tiro no pescoço lá dele Alaripe entrou disse Eles estão querendo pôr mãos e pés no chiqueiro e na tulha Se assanham Eu disse Dê as ordens Chefe Eu disse gerido eu não disse copiável Sei que Zé Bebelo sorriu aliviado Zé Bebelo botou a mão no meu ombro era o da banda do braço que doía A vamos a vamos com macacos e bananas A cá na saladejantar meu filho ele instou À janela Agachei e escorei meu rifle arma capital Agora era obrar E aqueles sujeitos estavam loucos Cabeça de um se bolou redondante feito um coco por cima da palha de buriti que cobria uma casa de vaqueiro Adesfechei e vi arrebentar em pedaços o casco daquilo Daí a dor me doeu no ferimento do braço mordi meus beiços por essa causa Mas cacei Outro afundei logo cujo varei os peitos com outra bala certeira duas balas Ave que afoitos Ao tanto eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 475 gemia e apontava Eles em um e um caíam aceitavam o poder da morte que eu mandava Fiz conta uns seis sei até a hora do almoço meiadúzia Essas coisas não gosto de relatar não são para que eu alembre não se deve de Ao senhor só agora sim é de declaração é até ao desamargado dos sonhos Que eu ali jajão Conheço quando homem só disfarça quando se encolhe somente ferido ou mas quando retomba mesmo por desmanchado Mortes diferentes mortes iguais Pena se tive Vá se ter dó de canguçu dever finezas a escorpião Pena de errar algum eu ter podia ah mas não errava Deixa que deixavam só uns dois dedos de corpo em descoberto lateral e minha bala se comportava Como aquele meu braço me doendo ai dor doía de arrancado parecendo que um fogo desenraizava tudo dos ocos respondia até na barriga A cada que eu dava um tiro forcejava minha careta chorejava Ria despois Aperta esta minha parte de natureza com um cabresto com um pano companheiro eu supliquei Alaripe servente rasgou uma colcha de cama me passou dobras daquelas tiras arrochadas Também doesse que doesse que me importava arrasos em redor de mim Trastanto derrubei mais um mais vizinho Os outros uns Esse urubu já bicou Esse ia pulando em lanço para um canto da cerca esse repulou no ar esse deu um grito soltado Menos veja João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 476 e mire eu catasse de querer espécies de homens para alvejar feito se por cabeça ganhasse prêmio de contoderéis Mas mais de muitos a vida salvei pelo medo que de mim tomavam para não avançar nos lugares pelos tirázios Ainda demos um tiroteio varredor ainda batemos Aí eles desistiram para trás desandavam Assim pararam o balançar da guerra parou até para o almoço em boa hora E então conto o do que ri que se riu uma borboleta vistosa veio voando antes entrada janelas a dentro quando junto com as balas que o couro de boi levantavam assim repicava o espairar o vôo de reverências não achasse o que achasse e era uma borboleta dessas de cor azul esverdeada afora as pintas e de asas de andor Ara viva maria boasorte o Jiribibe gritou Alto ela entendesse Ela era quase a paz A comida para mim ali mesmo me trouxeram todos em minha pontaria punham prezado valor O imaginar o senhor não pode como foi que eu achei gosto naquela comida às ganas que era de feijão carneseca arroz mariagomes e angu Ao que bebi água muita bebi restilo O café que chupo E Zé Bebelo revindo me gabou Tu é tudo Riobaldo Tatarana Cobra voadeira Antes Zé Bebelo me ofereceu mais restilo o tanto também bebeu às saúdes Seria só por desconto de um começo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 477 de remorso por me temer em consciências A gente sabe mais de um homem é o que ele esconde Ah o Urutu Branco assim é que você devia se chamar E amigos somos A ver um dia a gente vai entrar juntos no triunfal na forte cidade de Januária aprontado ele falou Ao que resposta não dei Amigo Eu ali do lado de Zé Bebelo mas Zé Bebelo não estava do lado de ninguém Zé Bebelo cortador de caminhos Amigo Eu era sim senhor Aquele homem me sabia entendia meu sentimento A ser que entendia meu sentimento mas só até uma parte não entendia o depoisdofim o confrontante Assemelhado a ele pensei Pensei eu visse que traindo ele estivesse ele morria Morria da mão de um amigo Jurei calado E desde naquela hora a minha idéia se avançou por lá na grande cidade de Januária onde eu queria comparecer mas sem glórias de guerra nenhuma nem acompanhamentos Alembrado de que no hotel e nas casas de família na Januária se usa toalha pequena de se enxugar os pés e se conversa bem Desejei foi conhecer o pessoal sensato eu no meio uns em seus pagáveis trabalhos outros em descanso comedido o povo morador A passeata das bonitas moças morenas tão socialmente alguma delas com os cabelos mais pretos rebrilhados cheirando a óleo de umbuzeiro uma flor João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 478 airada enfeitando o espírito daqueles cabelos certos À Januária eu ia mais Diadorim ver o vapor chegar com apito a gente esperando toda no porto Ali o tempo a rapaziada suava cuidando nos alambiques como perfeito se faz Assim essas cachaças a vinteeseis cheirosa tomando gosto e cor queimada nas grandes dornas de umburana Ao menos daí desajoelhei e vim para a alpendrada avistar o que se passava com Diadorim e eu estipulava meu direito de reverter por onde que eu quisesse porque meu rifle certeiro era que tinha defendido de tomação o chiqueiro e a tulha nos assaltos e então até a Casa Diadorim guerreava a seu comprazer sem deszelar sem querer ser estorvado Datado que Deus que me livrou livrava também meu amigo de todo comezinho perigo As raivas naquela varanda vinham e caíam demasiadas vi Tiros altos revoantes eram os bandos de balas Assunto de um homem que estava deitado mal atravessado pensei que assim em pouco descanso Vamos levar para a capela Zé Bebelo mandou Assunto que era o Acrísio morto no meio torto Devia de ter se passado sem tribulação Agora não caçavam uma vela para em provisão dele se acender Quem tem um rosário Mas no sobrevento o Cavalcânti se exclamou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 479 A que estão matando os cavalos Arre e era Aí lá cheio o curralão com a boa animalada nossa os pobres dos cavalos ali presos tão sadios todos que não tinham culpa de nada e eles cães aqueles sem temor de Deus nem justiça de coração se viravam para judiar e estragar o rasgável da alma da gente no vivo dos cavalos a torto e direito fazendo fogo Ânsias ver aquilo Altebaixos entendendo sem saber que era o destapar do demônio os cavalos desesperaram em roda sacolejados esgalopeando uns saltavam erguidos em chaça as mãos cascantes se deitando uns nos outros retombados no enrolar dum rolo que reboldeou batendo com uma porção de cabeças no ar os pescoços e as crinas sacudidas esticadas espinhosas eles eram só umas curvas retorcidas Consoante o agarre do rincho fino e curtinho de raiva rinchado e o relincho de medo curto também o grave e rouco como urro de onça soprado das ventas todas abertas Curro que giraram trompando nas cercas escouceantes no esparrame no desembesto naquilo tudo a gente viu um não haver de doidas asas Tiravam poeira de qualquer pedra Iam caindo achatavam no chão abrindo as mãos só os queixos ou os topetes para cima numa tremura Iam caindo quase todos e todos agora os de tardar no morrer rinchavam de dor o que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 480 era um gemido alto roncado de uns como se estivessem quase falando de outros zunido estrito nos dentes ou saído com custo aquele rincho não respirava o bicho largando as forças vinha de apertos de sufocados Os mais malditos Os desgraçados O Fafafa chorava João Vaqueiro chorava Como a gente toda tirava lágrimas Não se podia ter mão naquela malvadez não havia remédio À tala eles os Hermógenes matavam conforme queriam a matança por arruinar Atiravam até no gado alheio nos bois e vacas tão mansos que desde o começo tinham querido vir por se proteger mais perto da casa Onde se via os animais iam amontoando mal morridos os nossos cavalos Agora começávamos a tremer Onde olhar e ouvir a coisa inventada mais triste e terrível por no escasso do tempo não caber A cerca era alta eles não tiveram fuga Só um um cavalão claro que era o de MãodeLixa e se chamava Safirento Se aprumou nas alças ficou suspenso cochilasse debruçado na régua que nem que sendo pesado em balança um ponto as nádegas ancas mostrava para cá grossas carnes depois tombou para fora se afundou para lá nem a gente podia ver como terminava A pura maldade A gente jurava vinganças E aí não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 481 se divulgava mais cavalo correndo todos tinham sido distribuídos derrubados Aquilo pedia que Deus mesmo viesse carnal em seus avessos os olhos formados Nós rogávamos as pragas Ah mas a fé nem vê a desordem ao redor Acho que Deus não quer consertar nada a não ser pelo completo contrato Deus é uma plantação A gente e as areias Aturado o que se pegou a ouvir eram aqueles assombrados rinchos de corposo sofrimento aquele rinchado medonho dos cavalos em meiamorte que era a espada de aflição e carecia de alguém ir para com pontaria caridosa em um e um com a dramada deles acabar apagar o centro daquela dor Mas não podíamos O senhor escutar e saber os cavalos em sangue e espuma vermelha esbarrando uns nos outros para morrer e não morrer e o rinchar era um choro alargado despregado uma voz deles que levantava os couros mesmo uma voz de coisas da gente os cavalos estavam sofrendo com urgência eles não entendiam a dor também Antes estavam perguntando por piedade Arre eu vou lá eu vou lá livrar da vida os pobrezinhos foi o que o Fafafa bramou Mas não deixamos porque isso consumava loucura Não dava dois passos no eirado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 482 e ele morria fuzilamento em balas se varava ah Agarramos segurado o Fafafa A gente tinha de parar presa dentro de casa combatendo no possível enquanto a ruindade enorme acontecia O senhor não sabe rincho de cavalo padecente assim de repente engrossa e acusa buracões profundos e às vezes dão ronco quase de porco ou que desafina esfregante traz a dana deles no senhor as dores e se pensa que eles viraram outra qualidade de bichos excomungadamente O senhor abre a boca o pêlo da gente se arrupeia de total gastura o sobregelo E quando a gente ouve uma porção de animais se ser em grande martírio a menção na idéia é a de que o mundo pode se acabar Ah que é que o bicho fez que é que o bicho paga Ficamos naquelas solidões Alembrar que tão bonitos tão bons inda ora há pouco esses eram cavalinhos nossos sertanejos e que agora estraçalhados daquela maneira não tinham nosso socorro Não podíamos E que era que queriam esses Hermógenes De certo seria tenção deles deixar aqueles relinchos infelizes em roda da gente diaenoite noiteedia diaenoite para não se agüentar no fim de alguma hora e se entrar no inferno Senhor então visse Zé Bebelo ele terrivelmente todo pensava feito o carro e os bois se desarrancando num atoleiro Mesmo mestremente ele comandava Apuremos fogo Abaixado fogo daqui João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 483 dali em ira de compaixão Adiantava nada Com pranchas de munição que a gente gastasse não alcançávamos de valer aos animais com o curral naquela distância Atirar de salva no inimigo amoitado não rendia No que se estava se estava o despoder da gente O duro do dia A pois então me subi para fora do real rezei Sabe o senhor como rezei Assim foi que Deus era fortíssimo exato mas só na segunda parte e que eu esperava esperava esperava como até as pedras esperam A faz mal não faz mal não tem cavalo rinchando nenhum não são os cavalos todos que estão rinchando quem está rinchando desgraçado é o Hermógenes nas peles de dentro no sombrio do corpo no arranhar dos órgãos como um dia vai ser por meu conforme Assim dhojeemdiante doravante sempre temos de ser ele o Hermógenes meu de morte eu militão ele guer reiro Assim o relincho em restos trescortado Aqueles cavalos suavam de derradeira dor Agarrávamos o Fafafa segurado disse ao senhor Mas mais de repente o Marruaz disse A bom vigia olha lá O que era Que eles quem havia de não crer que eles mesmos agora estavam atirando por misericórdia nos cavalos sobreferidos para a eles dar paz Ao que estavam As graças a Deus exclamou Zé Bebelo alumiado com um alívio de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 484 homem bom Ah é marmo o Alaripe exclamou também Mas o Fafafa nem nada não disse não conseguia o quanto pôde se assentou no chão com as duas mãos apertando os lados da cara e cheio chorou feito criança com todo o nosso respeito com a valentia ele agora se chorava Aí então se esperou Durado de um certo tempo descansamos os rifles nem um tirozinho não se deu O intervalo para deixar a eles folga de matarem em definitivo nossos pobres cavalos Mesmo quando o arraso do último rincho no ar se desfez de vez a gente ainda se estarrecia quietos um tempo grande mais prazo até que o som e o silêncio e a lembrança daquele sofrer pudessem se enralecer embora para algum longe Daí depois tudo recomeçou de novo em mais bravo E nisto que conto ao senhor se vê o sertão do mundo Que Deus existe sim devagarinho depressa Ele existe mas quase só por intermédio da ação das pessoas de bons e maus Coisas imensas no mundo O grandesertão é a forte arma Deus é um gatilho Mas conto menos do que foi a meio por em dobro não contar Assim seja que o senhor uma idéia se faça Altas misérias nossas Mesmo eu que o senhor já viu reviro retentiva com espelho cemdobro de lumes e tudo graúdo e miúdo guardo mesmo eu não acerto no descrever o que se passou assim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 485 passamos cercados guerreantes dentro da Casa dos Tucanos pelas balas dos capangas do Hermógenes por causa Vá de retro nanje os dias e as noites não recordo Digo os seis e acho que minto se der por os cinco ou quatro não minto mais Só foi um tempo Só que alargou demora de anos às vezes achei ou às vezes também por diverso sentir acho que se perpassou no zuo de um minuto mito briga de beijaflor Agora que mais idoso me vejo e quanto mais remoto aquilo reside a lembrança demuda de valor se transforma se compõe em uma espécie de decorrido formoso Consegui o pensar direito penso como um rio tanto anda que as árvores das beiradas mal nem vejo Quem me entende O que eu queira Os fatos passados obedecem à gente os em vir também Só o poder do presente é que é furiável Não Esse obedece igual e é o que é Isto já aprendi A bobéia Pois de mim isto o que é o senhor saiba é lavar ouro Então onde é que está a verdadeira lâmpada de Deus a lisa e real verdade A ser que aqueles dias e noites se entupiram emendados num ataranto servindo para a terrível coisa só Aí era um tempo no tempo A gente povoava um alvo encoberto confinado O senhor sabe o que é se caber estabelecido dessa constante maneira Se deram não sei os quantos mil tiros isso nas minhas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 486 orelhas aumentou o que azoava sempre e zinia pipocava proprial estralejava Assentes o reboco e os vedos as linhas e telhas da antiga casarona alheia era o que para a gente antepunha defesa Um pudesse narrar falo para o senhor crer que a casa grande toda ressentia rangendo queixumes e em seus escuros paços se esquentava Ao por mim hora em que pensei eles iam acabar arriando tudo aquela fazenda em quadradão Não foi Não foi como logo o senhor vai ver Porque o que o senhor vai é ouvir toda a estória contada Morreu mais o Berósio Morreu o Cajueiro O Moçambicão e Quim Queiroz para a gente se sortir traziam as quantidades de balas Rente Zé Bebelo andava em toda a parte mandando se atirar economizado e certeiro Ah oé meus filhos não vão desperdiçar Matem só gente viva ele trestampava É coragem e quépete que o morto morrido e matado não agride mais Aí cada um gritava para os outros valentia de ex clamação para que o medo não houvesse Aí os judas xingávamos Para não se ter medo Ah para não se ter medo é que se vai à raiva A sebo De dor do calor de inchação aquele meu braço sempre piorava Alaripe me cedeu de bondoso uma vasilha com água fria carreou para mim em entremeio de atirar eu molhava bem um pano torcia por cima do braço o gotejado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 487 frescor de alívio Um companheiro sempre me ajudando confor me agradeci Um urucuiano daqueles cinco urucuianos de Zé Bebelo Isso no instante estranhei Notei de repente aquele homem fazia tempo que não se arredava de mim sempre me seguindo por perto Solevei uma desconfiança Sempre o vulto presente daquele homem seria só por acasos O urucuiano deles que o Salústio se chamava O que tinha os olhos miudinhos em cara redonda boca mole e sete fios de barba compridos no queixo Arreliado falei Que que é Tu amigou comigo Tatu tua casa para ele Semisério ele se riu Comparsa urucuiano dos olhos verdes homem muito feioso Ainda nada não disse coçou a bar riga com as costas dobradas da mão gesto de urucuiano Eu bati com a minha mão direita por cima da canhota que pegava o rifle e deixei deixada gesto de jagunço Apertei com ele Ao que me quer Me deu resposta Ao assistir o senhor sua bizarrice O senhor é atirador É no junto do que sabe bem que a gente aprende o melhor A verdade com que ele me louvava Se riu muito sincero Não desgostei da companhia dele para os bastantes silêncios Assim é o que digo que quando o tiroteio batia forte de lá e daí de repente estiava aquilo servia um pesado salteação Surdo pensei aqueles Hermógenes eram gente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 488 em tal como nós até pouquinho tempo reunidos companheiros se diz irmãos e agora se atravavam naquela vontade de desigualar Mas por quê Então o mundo era muita doideira e pouca razão De perto a doideira não se figurava transcrita Pois o urucuiano Salústio João mais olhei Ali ajoelhado ele mirava e atirava Atirava e fechava os olhos Quando abria outra vez que ria ver alguém vivo Sosseguei Aí eu não devia de pensar tantas idéias O pensar assim produzia mal já era invocar o receio Porque então eu sobrava fora da roda havia de ir esfriar sozinho Agora por me valer eu tinha de me ser como os outros a força unida da gente mamava era no suscenso da ira O ódio quase sem rumo sem porteira Do Hermógenes e do Ricardão Neles eu nem pensava Antes pensei outra vez foi no embuste do urucuiano Atual ele se ajoelhava dobroso com a perna muito para trás a outra muito para diante Aquele homem achei estava mandado por Zé Bebelo para espreitar meus atos A prova que era de que Zé Bebelo despachava traição As espumas dele me espirravam Será que fosse para o urucuiano Salústio no primeiro descuido meu me amortizar Tanto não apostei Zé Bebelo me queria vigiado para eu não contar aos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 489 outros a verdade Ora bem que uns companheiros tinham avistado os bilhetes eu escrever o fato esquisito assim em hora de começo de fogo mas por certo pensavam que era para fazen deiros amigos nossos chefes de homens rogando que viessem com retaguarda e reforço Agora Zé Bebelo temia que eu candongasse Aí mandou o urucuiano fazer a minha sombra Mas Zé Bebelo carecia de mim enquanto o cerco de combate desse de durar Traidor mesmo traidor e eu também não precisava dele da cabeça de pensar exato Ao que naquele tempo eu não sabia pensar com poder Aprendendo eu estava Não sabia pensar com poder por isso matava Eu aqui os de lá do lado de lá A anhanga que em riba da gente despejavam balaços de tantos rifles balas que quebram tetos e portas Ah isso era desgraça sem mão mandante ofensa sem nenhum fazedor quase feito uma chuvadepedra acontecer de trovões e raios tempestade parecesse Eu ia ter raiva dos homens que não enxergava Podia ter Tinha toda era dos que eu matava bem Mas nem bem não era mesmo raiva era só confirmação Desse jeito foi que entardeceu o sol piscou a gente tendo perdido a certeza dos horários do dia Afã de dessossego era só Daí pegava um cansaço Fechasse a noite o perigo podia vir a ser maior Os Hermógenes não iam investir mediante trevas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 490 para um fim ali dentro de coronha e faca Morreu mais o Quiabo Outros atestavam uns ferimentos Por se necessitar da capela os defuntos a gente foi levando para um cômodo pequeno e sem janela que era pegado na escadinha do corredor Alaripe apareceu com uma vela acendeu enfiada numa garrafa Vela sozinha para eles todos Aí as lamparinas e candeias não bastavam Debaixo dum alumiar de candeia Zé Bebelo estava me convidando Arte que logo entendi Ele tinha mandado vir Joaquim Beiju e o Quipes para um segredado Agora aqueles dois era para surtirem saindo rastejando conforme o quiçá e cada um levava seu punhado de bilhetes enviados Por uma banda um o outro da outra o que Deus aprovasse chegava Assim eles aceitaram de cumprir e motivos não perguntaram Tudo em encoberto Então se Zé Bebelo guardava uma tenção honesta por que dito e feito era que não punha todo o mundo ciente do tramado Ainda esperei Mas dirá o senhor por que era que eu também não delatava aquilo os efeitos e projetos ao menos a Diadorim e Alaripe eu não contava Deponho que não sei Aos perigos os perigos Só duma coisa eu forte sabia Só que eu ia vigiar sempre Zé Bebelo Ele trair vivo eu não deixava Zé Bebelo tinha sua espécie de natureza que servia ou atraiçoava Ah depois eu ia ver João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 491 Ah eu ia ver se no engasgo da hora ele ia querer se estrapafar Joaquim Beiju e o Quipes ainda foram na cozinha cortar um decomer arranjar matula Por essa volta o jacaré mesmo combatia também às vezes em que não estava cozinhando e vinha atirar da beira duma janela com o Mijafogo A noite breava própria o mais escuro ia ser regulando em antes das dez horas que quando depois podia subir um caco de lua Aos poucos foi dando um tão respeitável silêncio não se atirava de parte nem de outra a gente mesma ficava na cautela de não se fabricar rumor nenhum de não se pautear sem necessidade De noite o clarão das pólvoras marca denúncia do lugar do atirador Noite é pra surpresas de estratagemas noite é de bicho no usável o Alaripe baixo falou O cearense bom esse per manecia em tudo igual com ele a gente desproduzia qualquer remorso o brigar parava sendo obrigação de vivente conciso dever de homem Por uns assim eu punia Por uns assim eu devia de ser inteiro leal eu mesmo Mas então eu carecia de encostar Zé Bebelo o espremer na franca fala A que ele soubesse de minha lei a que ele sem um aviso não se desgraçasse Mesmo por causa da gente porque Zé Bebelo era a perdição mas também só ele podia ser a salvação nossa Então João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 492 com ele eu ia falar o quieto desafio Adiantava Aí não adiantasse Mas então eu carecia de armar um poder carecia de subir para cima daquele homem Eu tinha de encher de medo as algibeiras de Zé Bebelo Só isso era o que valia Contra o quanto ele lavorava em firmes pelo mais pensável não descumpria de praxe nenhuma Determinou o pessoal para sono e sentinela revezados Onde perto de cada um dormindo um parava acordado Outros rondavam Zé Bebelo mesmo ele não dormia Sendo esse o segredo dele Dava o ar de querer saber o mundo universo administrava Ao quase que A água para a serventia da casa vinha num rego que beirava a cozi nha encostado no lateral descia e passava ainda por baixo da coberta A gente podia encher as latas sem arrisco O que eles hãode é de demover o rego lá em riba botar fácil a gente a seco Zé Bebelo ponderou Mandou reservar quantia repleta as vasilhas achadas e procuradas Fizemos Mas de destorcerem o veio do rego nunca que sucedeu aquilo Até o derradeiro final correu água bastante todo o tempo fresca abarulhava Ao se fossem também empeçonhar o de beber Toleima Aonde iam ter sortimento de veneno para águas correntes corromper João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 493 Deus escritura só os livrosmestres Na noite Zé Bebelo saiu engatinhando por mais escuro e revestido com as roupas bem pretas que arranjou dum e doutro Ele devia de ter ido até longe como rato em beira de paiol que coruja come Queria era farejar com os olhos o reprofundo Voltou aí deu ordem de outra coisa que todos aproveitassem o semlua para suas necessidades boçais aquelas tapadas estâncias A gente ia num vão de buracos da banda das senzalas Assim Zé Bebelo instruiu e se virou para mim Inimigo que faz igual numeração ou menor do que a nossa Por via disso é que não tomam coragem de dar assalto e é também que eles não conhecem o interior desta boa casa Falou o tanto comigo Por que era que ele me escolhia para os sussurros segredar Me achava comparsa Os beócios sem idéias Não chegam a ser contrários para mim ele muxoxou até desapontado A modo que eu em Zé Bebelo quase que tinha perdido toda minha fiança A amizade dele eu para longe de mim já encostava porquanto que por mão minha no incerto ele podia ainda vir a precisar de ser matado Eu estava em claro Eu tinha preenchido aqueles bilhetes e cartas amanuense os linguados de papel eu compartia as culpas A invencionice de ambicioneiro Riobaldo Tatarana tu vem comigo porque tu é João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 494 ponteiro bom fica de estadomaior meu ele avolumou Me inteirei Ali era a vez Ali era a alçada para eu fazer e falar o que já disse que eu estava com essa razão na cabeça Se tanto pensei É a minha viveza Pelo que repontei É Eu vou com o senhor e o urucuiano Salústio vem comigo Vou com o senhor e esse urucuiano Salústio vem comigo mas é na hora da situação Aí na hora horinha estou junto perto para ver A para ver como é que será vai ser O que será vai ser ou vai não ser alastrei no mau falar no gaguejável Senhor sabe por quê Só porque ele me mirou ainda mais mor arrepentinamente e eu a meio me estarreci apeado goro Apatetado Nem não sei Tive medo não Só que abaixaram meus excessos de coragem só como um fogo se sopita Todo fiquei outra vez normal demais o que eu não queria Tive medo não Tive moleza melindre Agüentei não falar adiante Zé Bebelo luziu ele foi de rajada Ao silêncio Riobaldo Tatarana Eh eu sou o Chefe João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 495 Saiba o senhor lá como se diz no vertiginosamente avistei meus perigos Avistei como os olhos fechei desvislumbrado Aí como as pernas queriam estremecer para amolecer Aí eu não me formava pessoa para enfrentar a chefia de Zé Bebelo Agora pois Mas agora não tinha outro jeito Ah Mas aí nem sei eu não estava mais aceitando os olhos de Zé Bebelo me olhar No mundo não tem Zé Bebelo nenhum Existiu mas não existe Nem nunca existiu Tem esse chefe nenhum Tem criatura nem visagem nenhuma com essa parecença presente nem com esse nome eu estabeleci em mansas idéias Aceitei os olhos dele não agarrei de olhar só para um lugarzinho naquele peito pinta de lugar titiquinha de lugar aonde se podia cravar certeira bala de arma na veia grossa do coração Imaginar isso no curto Nada mais nada Tive medo não Só aquele lugarzinho mortal Teso olhei tão docemente Sentei em cima de um morro de grandes calmas Eu estava estando Até quando minha tosse ouvi depois ouvi minha voz que falando a dável resposta Pois é Chefe E eu sou nada não sou nada não sou nada Não sou mesmo nada nadinha de nada de nada Sou a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 496 coisinha nenhuma o senhor sabe Sou o nada coisinha mesma nenhuma de nada o menorzinho de todos O senhor sabe De nada De nada De nada Ao dito falei por quê Mas Zé Bebelo me ouviu inteiramente As surpresas Ele expôs uma desconfiança perturbada Esticou o beiço Bateu três vezes com a cabeça Ele não tinha medo Tinha as inquietações Sei disso soube logo Assim eu tinha acertado Zé Bebelo então se riu modo generoso Adiantava Ainda falou Ah qual Tatarana Tu vale o melhor Tu é meu homem para alargamentos Murmurei o sosso de coisa o que nem era palavras A bem vamos animar esses rapazes amém ele disse espetaculava Daí desapartamos eu para a cozinha ele para a varanda O que eu tinha feito Não por saber mas somente pelo querer eu tinha marcado Agora ele ia pensar em mim mas meditado muito Achei Agora ele ia não poder trair simples mas havia de raciocinar as vezes dar de rédea para trás do avançado para traição A certa graça a situação dele aparvada Eu estava com o bom jogo Aquela noite meu quinhão dormi no amiudardogalo o tiroteio já principiava renovado Mas só os tiros espaços para não esperdiçar e render porque eles estavam procedendo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 497 como nós o igual imediato A guerra fina caprichada bordada em bastidor Fui ver o madrugar a manhã uma brancura O senhor sabe no levante clareou o céu com o sol das barras Mas o curralão já estava pendurado de urubus os usos como eles viajam de todas as partes urubu passarão dos distúrbios E quando dava que rondava o vento o curral fedia Mas perdoando Deus tresandava mais era dentro da casa mesmo sendo enorme os companheiros falecidos Se taramelou o quarto por tapar a soleira da porta se forrava com algodão em rama e aniagens O fedor revinha surgindo sempre traspassava A tanto depois a gente ouviu miados Sape O gato está lá algum gritou Ah era o gato que sim Saiu soltado surripiadamente foi tornar a se ocultar debaixo dum catre noutro cômodo Carecia de se oferecer a ele de comer que quem bemtrata gato consegue boasorte No menos na salade fora ocupei meu oficio de mosquetear A ganho conforme as vazas mais de um homem derrubei que rolou em réu sei que defini Avistante que os urubus já destemiam o se combater dos tiros assaz eles baixavam para o chão do curral rebicavam grosso depois paravam às filas na cerca acomodados acucados Quando pulavam de asas abanassem aquele fedor O dia andando a catinga no ar aumenta Aí eu não queria provar de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 498 sal roi farinha seca com punhado de rapadura Na casa toda como que não se achava um litro de cal um caneco de creolina por vil remédio Morreu o Quim Pidão se botou o corpo por cima dum banco na sala provisório ninguém não queria mais coragem de ir abrir com presteza o quarto dos defuntos O dia envelhecia A roubo estive perto de Diadorim quase só para espiar quase sem a conversação De ver Diadorim com agrado minha tenência pegava a se enfraquecer Outros receios eu concebendo O prazo que ali assim íamos ter de tolerar no carrego da guerra A gente até carecesse no derradeiro durar de comer somente os couros assados conforme o caso terrível de Dutra Cunha de um diabo que em sua fazenda do Canindé resistiu ao cerco de Cosme de Andrade e Olivino Oliviano Esse Dutra Cunha era o homem de um olho só Zé Bebelo bem sabia a história dele Agora de Zé Bebelo eu risse Montante de outras coisas ainda podiam suceder de desde a madrugadinha até à viração da tarde Mas ninguém falava em Joaquim Beiju e no Quipes A uma hora dessas ou eles já estavam arriados pelo inimigo ou então traquejando nos caminhos a rumo de cidades Assim entardecer anoitecer galopassem em algum cavalo arranjado nos campos e o tempo da gente eles estendiam Será que haviam de vir os soldados Aquele outro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 499 dia morreu mais o Acerejo A tudo o cheiro de morte velha O maufétido que vai terminar mazelando a gente sempre um dizer A dita morrinha até a água que se bebia pegava na boca da gente e rançava A Casa dos Tucanos agüentava as batalhas aquela casa tão vasta em grande com dez janelas por banda e aprofundada até em pedras de piçarrão a cava dos alicerces A Casa acho que falava um falar resposta ao assovioso a quando um tiro estrala em dois dois De embiricica entrantes as balas vinham puxavam um fio de ar Eh lascassem Mas os companheiros por conta àtoa riam não acrescentavam cangalha aos pesares Mesmo quando se sobrecarregava um rir os que estavam mais longe mandavam saber o porquê ou gritavam por perguntar em empenho de combate A resto um Zé Vital deu ataque o qual era um acesso sacramentado de feioso principiando depois que ele se queixava de sentir o nariz quente ele mesmo já sabia a data e daí proclamava um grito de porco com frio e caía estatelado no chão duro como um cano de arma mas atazanava batendo com os braços e pernas querendo às ânsias coisa ou criatura em que se agarrar o onde esbugalhava os olhos a boca aspumada escumando Se disse Isto é doença velha pertencida isto não é fato de guerra Acesso que passava a estado meio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 500 semimorto num vago pois deitaram o Zé Vital numa canastra de couro Ao para a tarde para a noite Aí tudo navegava A Casa estava se enchendo de moscas dessas de enterro as produzidas A cada que cada elas presumiam o sujo em penca maior pretejavam Para as coisas que há de pior a gente não alcança fechar as portas Desdenhei Diadorim De ver Diadorim que em febre de acertar e executar não tomava consigo muita cautela só forcejava por vingança punições maravilhosas Diadorim mesmo a cara muito branca de da alma não se reconhecer os olhos rajados de vermelho o encovo Aquilo era o crer da guerra Por que causa Porque Joca Ramiro constava de assassinado morrido A razão normal de coisa nenhuma não é verdadeira não maneja Arreneguei do que é a força e que a gente não sabe assombros da noite A minha terra era longe dali no restante do mundo O sertão é sem lugar A Bigri mulher minha mãe não tinha me rogado praga Alta manhã em tudo repetido o igual o cantar do rifleio afora o feder ruim dos mortos e cavalos e a moscaria que se esparramava Mesmo com a minha vontade toda de paz e descanso eu estava trazido ali no extrato no meio daquela diversidade despropósitos com a morte da banda da mão esquerda e da banda da mão direita com a morte nova em João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 501 minha frente eu senhor de certeza nenhuma Sem Otacília minha noiva que era para ser dona de tantos territórios agrícolas e adadas pastagens com tantas vertentes e veredas formosura dos buritizais O que era isso que a desordem da vida podia sempre mais do que a gente Adjaz que me aconformar com aquilo eu não queria descido na inferneira Carecia de que tudo esbarrasse momental meu para se ter um recomeço E isso era Pela última vez pelas últimas Eu queria minha vida própria por meu querer governada A tristeza por Diadorim que o ódio dele no fatal por uma desforra parecia até ódio de gente velha sem a pele do olho Diadorim carecia do sangue do Hermógenes e do Ricardão por via Dois rios diferentes era o que nós dois atravessávamos Do lado de Diadorim restei um tanto no afã de escopetear O inimigo nunca se via nem bem o malmal na fumacinha expelida de cada uma pólvora Arte artimanha que agora eles decerto andavam disfarçados de mbaiá o senhor sabe isto é revestidos com moitas verdes e folhagens Adequado que embaiados assim sempre escapavam muito de nosso ver e mirar Ah mas deles tiros vinham bala estripitriz e o trapuz de nossas telhas se despencando A mãe morte Quem devia mais esse morria Õ xente Não é que pegaram em mim e eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 502 estou passando estou ficando cegado exclamou o Evaristo Caitité quando descuidou a meiabanda e levou em si uma carga total Ele já estava sem jogo nenhum no corpo as partes das pernas se esfriavam Antes quase rindo se acabou ficou tão de olhos O que é que ele vê Vê a vitória Zé Bebelo se cresceu no dizer A vitória e os urubus que a farto comiam e o ManuelzinhodaCroa meu cavalinho pedrês que eu nele não ia poder nunca mais amontar Assustava era o alopro dos companheiros que não se sujeitavam mais de dormir estavam pertencidos perturbados A caso de se ter mão na nervosia deles que queriam dar saída e lanços avançar no ar Doidagem desses comuns repentes o desfazer do ajuntado A firmeza meus filhos Fôlego e paciência a gente sempre tem é só requerer e repuxar mais um dedo e outro dedo dobrado Zé Bebelo media os modos de valer Assim sendo agora só o remedeio com as esperanças extraordinárias A um jeito de se escapar dali a gente a salvos Zé Bebelo era a única possibilidade para isso como constante pensava e repensava obrava E eu cri Zé Bebelo que gostava sempre de deixar primeiro tudo piorar bem no complicado Um gole de cachaça me deu bom conselho Sem a vinda dos soldados se viessem a gente não estava perdidos Zé Bebelo não era quem tinha chamado os soldados Ah mas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 503 agora Zé Bebelo não ia mais trair não ia e isso só por minha causa Zé Bebelo carecia de rédeas de um outro diverso poder e forte sentir que tomasse conta desse rumo a ele Assim eu estava sendo Eu sabia Zé Bebelo mesmo nos relances de me olhar fingia não conhecer minha vigiação afetava Mas ele se estreitava em meus palpos conscienciado Agora ele tinha de especular de afinar a cabeça para o trabalho de imaginar maior achar alguma outra invenção para resolver o final com acerto para a vitória de nós todos sem traição nem airagem A tanto cri acreditado Sabia que Zé Bebelo era muito capaz Só não ri Ao menos outro deles dos Hermógenes quero ver se resgato de abater até vir o sereno do anoitecido eu meditei Não deu Não pude O que houve o conseguinte foi que Zé Bebelo pegou em meu ombro Ele mudou de lugar e pôs a cara no meio da luz Aí está ouvindo Tatarana Riobaldo está ouvindo ele disse com um sorriso de tão grandes brilhos que não era de ruindade e nem de bondade Aquilo foi num dia devia de estar sendo por volta de umas três da tarde pelo rumo do sol Ouvi Mas então a soldadesca tinha vindo alcançada estavam chegando Era Era Remexendo um rebuliço de nós todos mesmo porque os mais não conheciam aquele motivo de nada não soubessem o tencionado Os praças O tiroteio deles João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 504 pegando os Hermógenes de supetão surpresa bruta de retaguarda Os tiros que eram a bala bala bala bala bala ba la a bala bá desfechavam com metralhadora Aí arrejarrajava feito um capitão de vento Até destroçavam também nas custas da Casa Apre meninos faz mal não A vantagem do valente é o silêncio do rumor Zé Bebelo sentenciava Zé Bebelo trepava em altas serras Duvidava de nada Que vencia Quem vence é custoso não ficar com a cara de demônio Dele de perto não saí a atenção e ordem ele recomendava O cano de meu rifle era tutor dele Antes de minha hora no que ele mandasse opor e falasse eu não podia basear dúvidas Mas desde vez aquilo a vir gastava as minhas forças Ali sem a vontade mas por mais do que todos saber eu estava sendo o segundo Andando que Zé Bebelo falecesse ou trastejasse eu tinha de tomar assumida a chefia e mandar e comandar Outro fosse eu não Jesus e guia É baixo os homens não iam me obedecer nem de me entender eles não eram capazes Capaz de me entender e de me obedecer nos casos só mesmo Zé Bebelo A jus pensei Zé Bebelo somente era que podia ser o meu segundo Estúrdio isso nem eu não sabendo bem por que mas era preciso Era eu o motivo não sabendo Se fiz de saber foi João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 505 pior O que é que uma pessoa é assim por detrás dos buracos dos ouvidos e dos olhos Mas as pernas não estavam Ah fiquei de angústias O medo resiste por si em muitas formas Só o que restava para mim para me espiritar era eu ser tudo o que fosse para eu ser no tempo da quelas horas Minha mão meu rifle As coisas que eu tinha de ensinar à minha inteligência Agora o que era que se esperava Só Zé Bebelo decerto podia responder mas ele não dava senha de mudança Onde o normal Aí já se via o dia quase em fim com as cores do sol Voavam uns guaxes Dos soldados e dos judas quase que não se ouvia empipoco de arma só os tiros salteados a cá e lá como se escasso quisessem briga A gente sobrossosa nesse ensino de onça traiçoeiros todos Astúcias que manobrando em esconso deviam de estar para trás e para os lados pelo jeito melhor de pegarem o encoberto dos lugares querendo enrolar os outros para o remate de dar bote Soldado pede é cautela e o dobro soldo acho que um disse Aquela era a ocasião mais arriscada Ao que jagunço é isto o senhor ponha letreiro Ao encosto no rifle e apreparo nas patronas isso era o que bastava Nenhum dos companheiros estava desinquieto nem ralava apreensão Nenhum conversava precisando de saber a maneira de escapulir vivos dali da Fazenda dos Tucanos Com a chegada João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 506 da soldadesca o que parecia moagem era para eles era festa Assim uns gritaram feito araras machas Gente Feito meninos Disso eu fiz um pensamento que eu era muito diverso deles todos que sim Então eu não era jagunço completo estava ali no meio executando um erro Tudo receei Eles não pensavam Zé Bebelo esse raciocinava o tempo inteiro mas na regra do prático E eu Vi a morte com muitas caras Sozinho estive o senhor saiba Mas nisso conforme o acontecido exato uma coisa muito inesperada se deu Da banda do mato de repente por cima das moitas de lobolobo alguém levantou um pano branco na ponta de uma vara A gente não tinha licença de abrir fogo no alvo daquele trapo Apraz que a gente ia consentir em negócio com os judas Aqueles para mim guardavama definitiva marca e só o que podiam trazer era a maldição Mas Zé Bebelo maneiro em presteza já tinha amarrado um grande lenço branco na ponta de um rifle e mandou que o MãodeLixa aquilo erguesse e sacudisse no ar A regra que é regra Zé Bebelo disse A solenidade de embaixador sempre se tem de consentir até para herege até para bugre Aprovavam os outros deram razão Achei que estavam com a vontade de saber que notícias eram o que vir vinha Com o que mais admirei a mensagem daqueles João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 507 panos brancos de lá e de cá durou um certo tempo Como tudo nesta vida carece de se acertar direito Depois um sujeito apareceu do capim e veio devia de ter passado por um rombo feito na cerca A certa distância estava no eirado e um dos nossos disse reconhecendo Ah é o Rodrigues Peludo homem devoto do Ricardão Que era que era os outros companheiros concordaram Atrás desse meio engatinhando também surgiu mais um É o Lacrau E o Rodrigues Peludo virava para trás falava qualquer coisa parecia que estava mandando o Lacrau ir sembora Mas o Lacrau teimava seguia acompanhando o outro Xente dond é que está se comparecendo esse Lacrau Faz tempo que não se tinha ciência nenhuma dele O qual era dos Gerais do Bolor terra jequitinhonha e homem de certa valia Caboclo claro E que ele sendo réu tinha esfaqueado na sala de júri um promotor em outroras De ver os dois perto assim pessoas escada acima e presentes em pé diante da gente nas decididas condições achei muita esquisitice Rodrigues Peludo levantou os olhos feito se a gente estivesse no céu e saudou normal Daí disse Seô Chefe Homem te vira de costas Zé Bebelo regrou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 508 No assim simples eles obedeceram tanto um tanto o outro Mas estavam muito armados Momentos que foram eu louvei a coragem calma daqueles dois que de qualquer longe recanto um soldado talvez estivesse em poder de derrubar por belprazer Porque os soldados não pertenciam nessa cerimônia Afiguro o que pensei E Zé Bebelo perguntou impondo ordem de resposta que mandatela eles traziam Do lado meu o Diodolfo chiava boca num dente conforme sestro dele e o José Gervásio sussurrou Tramóia Mas Zé Bebelo regia tudo mão em revólver Um homem falar seu recado de costas no meio dos contrários na boca de tantas armas o senhor já presenciou essas circunstâncias Assim o Rodrigues Peludo deu conta sem rasgo de tremor na voz Com sua licença dada e nos usos estou trazendo estas palavras Seô Chefe que para repetir ao senhor fui mandado Que em vistas desses soldados e do mais que é contra todos se não era mais aproveitável para uma parte e outra de se fazer trato de paz por uns tempos E por essa oferta é que venho por ordens Que se serve ou valor tem o dito pergunta faço João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 509 e se o senhor há de estar ou não de acordo me dando a resposta que queira dar para eu levar para os meus chefes Que chefes Zé Bebelo indagou sem tom de nenhuma malícia Rodrigues Peludo demorou um ponto fazendo menção de virar o rosto mas o que deixou em tempo de fazer E contestou Nhô Ricardão E seô Hermógenes E eles então estão querendo paz Estão propondo um acordo correto Em boa distância do mato do grotal estralejou um tiro que era de fuzil E uns outros muito estampidos O que aquilo me constou era que era falta de respeito Tiros que não beiravam por aqui Mas mesmo assim Zé Bebelo disse Homem vocês podem abaixar o corpo Rodrigues Peludo sempre de costas se agachou depositou o rifle no chão o Lacrau meio ajoelhado ficou Agora eles estavam entre trincheiras Agora a roda nossa ajuntados os muitos companheiros brabos com a bafagem da boa cachaça o Marruaz que representou a dedo o sinosalomão no peito no rumo do coração o Preto Mangaba que mudando de estar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 510 esbarrou em mim do que me lembro e sei porque doeu em meu braço e Diodolfo cuspiu forte soluçou dos estômagos E o Fafáfa repontante Em paz quem é que devolve vida em nossos cavalos Aí o Moçambicão atrás de mim me ressoprou como um boi reconhecendo minhas costas Mas minha mão por si pegou a mão de Diadorim eu nem virei a cara aquela mão é que merecia todo entendimento Mão assim apartada de tudo nela um suave de ser era que me pertencia um calor a coisa macia somente São as palavras Mas aí espiei para Diadorim e ele despertou do que tinha se esquecido deixado de sua mão que ele retirou da minha outra vez quase num repelão de repugno E ele estava sombrio os olhos riscados sombrio em sarro de velhas raivas descabelado de vento Demediu minha idéia o ódio é a gente se lembrar do que não devede amor é a gente querendo achar o que é da gente O palavreado destes Diadorim chiou por detrás dos dentes Diadorim queria sangues fora de veias E eu não concordava com nenhuma tristeza Só remontei um pasmo e um consolo expedito porque a guerra era o constante mexer do sertão e como com o vento da seca é que as árvores se entortam mais Mas pensar na pessoa que se ama é como querer ficar à beira dágua esperando que o riacho alguma hora pousoso esbarre João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 511 de correr E Alaripe buliu no bissaco estava recheando de novo as suas cartucheiras Mas isto tudo que conto ao senhor se compartiu de caber em pouquinhos minutos instantes E do modo de um prosseguir sem partes Porque Zé Bebelo as mãos na cinta se encurtava frio em siso feito uma a cobra O que disse o quanto Homem e o que mais Era tudo o que eu já falei Chefe seô Ao que peço vossa resposta para conduzir E em caso de algum acordo que é de bom respeito as ordens tenho para com meu juramento fechar trato foi a resposta de Rodrigues Peludo com a clara voz de quem está mais cumprindo do que querendo Até inveja eu tive dele porque para viver um punhado completo só mesmo em instâncias assim Antes bem Zé Bebelo glosou quem é que está rodeando e vexando os outros e atacando O em usos é a gente Isto é o Rodrigues Peludo compôs o confessar Ah Isto era Ah e então Ao que vim ajustar é propostas Ao para salvo e lucro das nulas partes As ambas Caso se Ossa Seoria se concorde João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 512 Somenos aprumo nem o tom Mas de tudo seja também o que gravei aí desse Rodrigues Peludo foi um tertem de existidas lealdades Assim que inimigo persistia só inimigo surunganga mas enxuto e comparado contrahomem sem o desleixo de si E que podia conceber sua outra razão também Assim que então os de lá os judas não deviam de ser so mente os cachorros endoidecidos mas em tanto pessoas feito nós jagunços em situação Revés que por resgate da morte de J oca Ramiro a terrível que fosse agora se ia gastar o tempo inteiro em guerras e guerras morrendo se matando aos cinco aos seis aos dez os homens todos mais valentes do sertão Uma poeira dessa dúvida empoou minha idéia como a areia que a mais fininha há que é a que o rio Urucuia rola dentro de suas largas águas quando as chuvaradas do inverno Ali dos meus companheiros tantos mortos Acaso que companheiros eram e agora o que se depositava deles era o assunto de lembranças e aquele amassado e envelhecido feder que às horas repontava Constado que produziam isso mesmo estando amontoados no cômodo soturno entrapadas as frestas da porta e cá fora se torrando couros com folhas polvreadas Mediante os estoques desse maucheiro por certo Rodrigues Peludo e o Lacrau iam orçar a boa conta de nossos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 513 mortos afora os feridos leves e graves Mas Zé Bebelo ante teve de mandar chamar Marcelino Pampa João Concliz e muitos diversos outros e o apinho e apessoar nosso ombros em ombros aprazava efeito de bando significado numeroso Com os vivos é que a gente esconde os mortos Aqueles mortos o Jósio entortado prestes com pedaços de sangue pendurados do nariz e dos ouvidos o Acrísio repousado numa agência quieta que ele não havia de em vida o Quim Pidão no pormiúdo de honesto que nunca nem tinha enxergado tremdeferro voltaeoutra a perguntar como seria e Evaristo Caitité com os altos olhos afirmados esse sempre sido prazenteiro no meio de todos Tudo por culpa de quem Dos malguardos do sertão Ali ninguém não tinha mãe Redigo ao senhor quando o raio quando arraso o Gerais res ponde com esses urros A culpa daquele Rodrigues Peludo por um exemplo Desmenti O ódio de Diadorim forjava as formas do falso Odio a se mexer em certo e justo para ser era o meu mas na dita ocasião eu daquilo sabia só a ignorância Àtoa até que estava relembrando o Hermógenes Assim pensando no Hermógenes só por precisão de com alguém me comparar E com Zé Bebelo eu me comparar mais eu não podia Agora Zé Bebelo eu eu mesmo eu era João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 514 quem estava botando debaixo de julgamento Isso ele soubesse Ah naquela cabeça grande o que Zé Bebelo pensava era o útil o seco e a pressa De curto ponto ele disse concedendo um foral Resolvo Sendo em séria fiança eu aceito o intervalo de armas com o prazo demarcado de três dias De três dias digo Agora homem tu vai remete isto ao que estiver o seu chefe seja lá quem A vou o Rodrigues Peludo se prometeu Se sendo em séria fiança então de lá um dê três tiros pra o trato fechado Assim assente para esta noite no instinto em que a primeirinha estrela se frisar A vou O Rodrigues Peludo repuxava bandoleira do rifle e salvava saudação Às vozes do ruído reponho que nenhum de nós não sabendo se a decisão de Zé Bebelo era justa e convinhável ninguém disse mote de dúvida nem de aprovo Nisso no olho do silêncio ainda era só o que me prevalecia Rodrigues Peludo botou o rifle no sovaco já no jeito de que ia engatinhar descendo a escada Mandava a vontade de um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 515 sabente de si Zé Bebelo mandava ele tinha os feios olhos de todo pensar A gente preenchia Menos eu isto é eu resguardava meu talvez Mas aí de abalo o Lacrau que tinha persistido quieto feito ouvindo santamissa perto do altar ele surge se vira virou pelo repente a traque disse Aqui eu eu fico no meio de vós meu Chefe a que vim para isto Sou homem que sempre fui do estado de Joca Ramiro ele é o das próprias cores Agora meu braço ofereço Chefe A por tudo quanto se sepreponha o senhor de me aceitar A acarra daquilo tão exclamaste a forte palavra Assomo assim de frechar surpresa a gente capistrou grossamente e sem fala Tudo o que ele disse o Lacrau se empinou empé Onde mais deixou o silêncio se perfazer da questão anterior a suplicação o concitado O que era fato imponente digo ao senhor mire veja mire veja Ânimo nos ânimos A quanto semelhavelmente esse Lacrau não se comportava sem consciência sisuda no amor mais àmão para se segurar com trincheiras mas assim mesmo a gente em aperto de cerco ele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 516 tinha querido vir para sócio Alguém ficou como pasmado Zé Bebelo não Aqui me praz que te aceito rapaz Zé Bebelo deferiu A guerra tem destas coisas contar é que não é plausível Mas mente pouco quem a verdade toda diz Trás isso o Rodrigues Peludo esbarrou o instante mas endurecendo a cabeça para não se virar para espiar para o Lacrau Em tanto que o Lacrau meio mostrando o rifle pronunciou Estou na regra tio mano que na regra estou como senhor de minhas ações contra quem eu seja E a carabina porque sempre foi minha de posse arma que de patrão não ganhei Estou inteiro Ninguém respondeu palavra Sendo que o Rodrigues Peludo deixou de contravir e puxando pelo sair assim escorregou adiante o corpo se foi Numa rodamorta se esperou ré que de lá da dobrada duma ladeirinha os três tiros eles deram somando o aprovado A tanto tresmente também se respondeu desfechando Aí para a gente Zé Bebelo disse Sou lá o maluco Aqueles outros não têm a constância de observar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 517 não merecem a palavra dada O que fiz foi encaminhar o que vamos pôr em obra E aceitei nossa vitória Seja ou não se aquele negócio entendessem os companheiros aprovavam Até Diadorim Seja Zé Bebelo levantava a idéia maior os prezados ditos uma idéia tão comprida O teatral do mundo um de estadela os outros ensinados calados Sempre sendo em todo o caso que Zé Bebelo me semiolhava espreitado avulso sob receios e respeito Só eu afora ele ali misturava as matérias Só eu era que guardava minha exata esperaçao o que me engraçava O que era que Zé Bebelo ia proceder nas horas vespertinas no postoque Do que ele tinha pensado e principiado as tramóias de trair ia poder largar e achar feição para outro salvamento agora nessa con junção Mas porém não nego que eu mesmo por estima queria que ele bem acertasse na tarefa de meter seu siso de remerecer O raciocínio que dele eu gostava constante de admiração e pela necessidade Medonho e esquisito achei que fosse para ter de matar completo Zé Bebelo Como é que Mas ele abria lugar demais o perto demais sobre papel que não era o pra ele a meu parecer Pelo que eu tinha precisão de me livrar daquele movi mento sem termo nem nenhumas outras ociosidades O senhor João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 518 me organiza Saiba essas coisas eu pouco pensei no lazer de um momento Amigos agora eu louvo e a todos gabo cada um qual melhor E então vamos voltados papocar fogo pra paga até a noitinha se ilustrar Zé Bebelo determinou tão versado A este ponto que por se possuir basta munição a gente se prezasse de atirar por sustos e estragos primeiramente para o aviável do matinho dos pastos e da baixada e dos morrotes cerradeiros onde existiam uns valos Com o que no ablativo do mandado Marcelino Pampa ia retornar para as senzalas o Freitas Macho para a tulha e para o engenho o Jõe Bexiguento sobrenomeado Alparcatas Mas Zé Bebelo reservou que eu estivesse com ele e mais Alaripe por se pôr o Lacrau em conversa deposta Onde o que o Lacrau teve para relatar era pouco pouco Deu razão das coisas perguntadas Dizendo que o inimigo se formava em tanto de uns cem mas a quanta parte deles de jagunços mal assentados sem quilates ainda aguardavam outra gente por vir de refrescos que decerto em pronto não viessem por estorvo dos soldados Nisso não sabia contar das pessoas nem dos maiores motivos do Hermógenes e do Ricardão nem acerca da morte de loca Ramiro aumentava passagens mais do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 519 que as de todos já entendidas Daí no que Zé Bebelo e Alaripe se afastaram no corredor ele Lacrau aliviado se gracejou de rosto como falou O esmarte homem que é este chefe nosso Zebebéo Outro não vi para espiritar na gente o pavor e a ação de acerto As agudezas A vez da má verdade Fomos Fui Para o recanto duma janela nesse comenos A pra efetuar fogo A ordem não erade Desígnios esses de Zé Bebelo Sucinto em cada puxada de gatilho relembrei o dito do Lacrau que Zé Bebelo o que era Sendo que uma criatura só a presença tira o leite do medo de outra Aí Diadorim mesmo que era o mais corajoso sabia tanto O que o medo é um produzido dentro da gente um depositado e que às horas se mexe sacoleja a gente pensa que é por causas por isto ou por aquilo coisas que só estão é fornecendo espelho A vida é para esse sarro de medo se destruir agunço sabe Outros contam de outra maneira A ordem de se jantar o jacaré veio avisando Comi a pura farinha Tomei mais Os soldados era o que mais se perguntava Tinham esbarrado tiroteio a gente não escutava o costurar Medido nas suas partes o dia estava gastado beirava o prazo da decisão Excogitei Diadorim esta noite no começo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 520 da hora você vem para perto me assiste comigo Mas Diadorim contradisse de querer saber que modos meus que eram as tantas espécies Ainda pensei no Alaripe A ele me fiz A de paga amigo Ora veja o Alaripe divertido me achou De qual deles agora eu ia cobrar e arrecadar Acauã ou o Mão deLixa ou Diodolfo Todos seguiam caminho de seus costumes no novo não conseguiam de se nortear Três tristes de mim Ali eu era o indez Noção eu nem acertava de reger eu não tinha o tato mestre nem a confiança dos outros nem o cabedal de um poder os poderes normais para mover nos homens a minha vontade Mesmo meu braço do ferimento que já estava muito melhorado por si aí tornou a doer no injusto em tanto que isto se passava Adrede no retorcer do vento apurei o ruto de nossos cavalos os ossos de feder só a lástima Será que eu tivesse por dever de peitar pessoas Ah nos curtos momentos eu não ia explicar a eles coisas tão divagadas e que podiam mesmo não vir a ter fundamento nenhum Porque eu digo ao senhor eu mesmo duvidava Tivesse de vigiar no estreito Zé Bebelo atravessar o projeto dele se o caso fosse que modo que eu ia enfrentar um homem assim Ah o julgamento no SempreVerde tinha sido relaxado em brando para valer preços Zé Bebelo sozinho por si em outro sobrecalor de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 521 regimento servisse para governar os arrancos do sertão Não me importo Não me importo eu quis com outras palavras tais Ali eu não tinha risco Ali alguém ia me chamar de Senhor meumuitorei Ali nada eu não era só a quietação Conto os extremos Só esperei por Zé Bebelo o que ele ia achar de fazer ufano de si de suas proezas malazarte Deu comigo Riobaldo Tatarana Anda que me encarava os sagazes olhos piscados Aquele me entendia me temesse Riobaldo Tatarana vem comigo quero ver a opinião sem sinal nem prova Ali me levou para uma janela da cozinha de lá a grande espaço se tinha vista para o morro com seus matos Zé Bebelo pegou o caneco que encheu no pote dágua Também bebi Assim escutei ele falava comigo com o efeito de uma amizade Rapaz você é um que aceita o matar ou morrer simples igualmente eu sei você é desabusado na coragem melhor que é a da valentia produzida Só mostrei meus ombros seja que eu secundei A tão bom que é que eles agora vão fazer os da banda contrária aí ele indagou de mim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 522 Ora O que não sei e saber quero é a gente o que é que a gente agora vai fazer perguntei para cima Outro tal repontei Estou em claro E estou em dúvida Todo tempo me gasta isto assim dito Só que Zé Bebelo queria não ouvir a seu seguro Te põe no lugar Hem O que eles fazem é que a estas horas estão no desembargar para aquele morro que é aonde soldados não apertam cerco De lá foram por esse sul abaixo via torta de madruga já por lá no BuritiAlegre que foram surgir escrevo Agora hem maximé e os soldados Andam tomando contas daí que são lugares rededores salvante a sapata do morro e dela os pertos a cava porque lá conforme a boa regra de razão paravam com os tiros sobre si Oh se sabe Noves e nada eu não dissesse A bem à e nós Zé Bebelo tornou a indagar A resposta não dei Aquilo tudo eu estava pondo de remissa Ah tempo de partida A gente nós vamos é rente por essa cava Riobaldo meu filho Sem tardadaporque daqui a pois sai é a lua declaradamente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 523 Ao que já se estava no ponto Anoitecido A uma estrela se repicava nos pretos altos o que vi em virtude A estrelinha lume lume Assim quem era que tinha podido mais Zé Bebelo ou eu Será quem era que tinha vencido Quite com isso no cumprir entreguei os destinos O truztruz Com pouco nesse passo os todos homens se apessoando no corpo daquele corredor as fileiras em mexe mexe desde a saladefora até à cozinha sobre mais entre os conspirados silêncios os movimentos com energias Arte e tanto Zé Bebelo expunha o que recomendava Sempre uma ou outra lamparina se acendeu para os companheiros empalidecidos Agora a gente ia romper a pé sem os recursos dava dó era a quantia de munição de se largar ali no se pôr em salvo Assaz então tudo o que possível se encheu de balas e caixas os bornais e capangas patronas e cartucheiras Mas não bastava A ser que daí um inventou uma fronha de cama a que presada com correia ou corda para tiracol concabia tiros em boa dose e muitos assim aproveitavam logo não restou fronha a dispor Mesmo a alguma matula também se devia por garantir Desde aí no concorrer se saía por uma porta O quanto a noite se atravava de bom grosso Adiante primeiro foram mandados João João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 524 Concliz Moçambicão e Suzarte para reconhecerem se estava limpo o caminho rumo de fuga sem o estorvável Ponto que os poucos feridos que havendo se queixavam em condições mesmo o Nicolau que se escorava no rifle e às vezes se retarda va Só ficando na Casa os mortos que não careciam de se rezar a eles adeus os soldados amanhã que viessem que enterrassem Soformamos diversos golpes acho que cinco Diadorim e eu entramos no derradeiro com o comando do próprio Zé Bebelo e com o Acauã o Fafafa Alaripe e Sesfredo que acompanhavam comigo Saíram os de primeiramente iam um ante outro como um rio a buscar baixo ou um cão cão A gente demorava Aquela cozinha grande no cabo do negócio muito aprisionava de sobreleve e contei os companheiros as respirações Saíram outros e outros Dos dianteiros nem se percebia rumor Toda a hora eu esperava um tiro e um grito de altoláorei Mas era só o tremer daquela paz em proporção Admirei Zé Bebelo A vez nossa chegada ali o acostumar os olhos com o outro mudar Abaixamos e saímos também Semoveuse Livrados No escuso o tudo ajudando fizemos passagem avante mais Tempo que andamos contracalados soprando o sangue para se esfriar até que se cobrou veras de perigo não haver no regozijo de poupados de qualquer espreita ou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 525 agredimento Se esbarrou para ar um sueto de uns momentos Não é que o gato ficou lá um risonho falou Ah demais A lá é a Casa outro se pôs Aquela àmorte fazenda grande dos Tucanos Vai eu o cheiro fartado bom de folhas folhagens e do capim do campo enunciou em meu lembrar o maucheiro dos defuntos que agora próprio no meu nariz eu nem não aventava mais E Zé Bebelo segredando comigo espiou para trás observou assim pegando na minha mão Riobaldo escuta botei fora minha ocasião última de engordar com o Governo e ganhar galardão na política Era verdade e eu limpei o haver ele estava pegando na mão do meu caráter Aí aclarava era o fornido crescente o azeite da lua Andávamos Saiba o senhor pois saiba no meio daquele luar me lembrei de Nossa Senhora A de entre entramos pela esquerda e rumo do norte Desde o depois o do poente mesmo Com foras e auroras estávamos outra vez no público do campo Antes da manhã agora se passava a VeredaGrande no VaudosMacacos Ao que em rompendo a luz toda da manhã se chegou no sítio dum Dodó Ferreira onde a gente bebeu leite e os meus olhos pulavam nas árvores Aquilo de verdade e eu em mim como um boi que se sai da canga e estrema o corpo por se prazer João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 526 Assim foi que nesse arraiar de instantes eu tornei a me exaltar de Diadorim com esta alegria que de amor achei Alforria é isso Sobre mesmo a pé e com o peso completo caminhar pelos Gerais parecia que pouquinho me cansava Diadorim o nome perpetual Mas os caminhos é que estão se jazendo em tudo no chão sempre uns contra os outros retorce que os falsíssimos do demo se reproduzem O senhor vá me ouvindo vá mais me entendendo No sítio desse Dodó Ferreira o Nicolau e o Leocádio iam ficar acoitados lá até que pudessem sarar de todo somenos Nós não De que desde dali rifles nas costas riscamos de rota abatida para o CurraisdoPadre para renovame porque lá se tinha resguardada uma boa cavalaria À força de inchar pé e esmorecer pernas pelo que aquilo nem foi viagem era rojão de escabrear menção de cativeiros Desgraça de estrada as pedras do mundo minhas léguas arrependidas De que serve eu lhe contar minuciado o senhor não padeceu feliz comigo Saber as revezadas do capim Ah então que foram mimoso sempre verde marmelada agrestes e gramadeburro A caminhada é assim é ser despesa grossa o abalo Contra a mera vontade que meio me lembro aquelas ladeiras de chapadas Subindo para terreno concertado cada tabuleiro que o fim dele é dificultoso João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 527 pior do que batoqueira de caatingal Os muitos campos com tristeza agora bota valesse menos que alpercata O vento endureceu Aí passa gavião apanha guincho de todas as estirpes deles o que gaviãozinho quiriquitou E lá era que o senhor podia estudar o juízo dos bandos de papagaios O quanto em toda vereda em que se baixava a gente saudava o buritizal e se bebia estável Assim que a madotagem desmereceu em acabar mesmo fome não curtimos por um bem se caçou boi A mais ainda tinha araticum maduro no cerrado Mas para balear uma rês da solta era o mister de toda sorte e diligência por ser um gado estruso estranhador O fumo de pitar se acabando repentino na algibeira de uns e outros bondade dos companheiros era que acudia E deu daquele vento trazedor chegou chuva A gente se escondendo divididos embaixo dos pequizeiros que tempesteava Dormir remolhado se dormia com a lama da friagem De madrugar depois se achava era pé de onça circulando as marcas E a gente ia recomeçado se andava no desânimo nas campinas altas Tão território que não foi feito para isso por lá a esperança não acompanha Sabia sei O pobre sozinho sem um cavalo fica no seu permanece feito numa croa ou ilha em sua beira de vereda Homem a pé esses Gerais comem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 528 Diadorim vinha constante comigo Que viesse sentido soturno Não era não isso eu é que estava crendo e quase dois dias enganoso cri Depois somente entendi que o emburro era mesmo meu Saudade de amizade Diadorim caminhava correto com aquele passo curto que ó dele era e que a brio pelejava por espertar Assumi que ele estava cansado sofrido também Aí mesmo assim escasso no sorrir ele não me negava estima nem o valor de seus olhos Por um sentir às vezes eu tinha a cisma de que só de calcar o pé em terra alguma coisa nele doesse Mas essa idéia que me dava era do carinho meu Tanto que me vinha a vontade se pudesse nessa caminhada eu carregava Diadorim livre de tudo nas minhas costas Até o que me alegrava era uma fantasia assim como se ele por não sei que modo percebesse meus cuidados e no próprio sentir me agradecendo O que brotava em mim e rebrotava essas demasias do coração Conti nuando feito um bem que sutil e nem me perturbava porque a gente guardasse cada um consigo sua tenção de bemquerer com esquivança de qualquer pensar do que a consciência escuta e se espanta e também em razão de que a gente mesmo deixava de excogitar e conhecer o vulto verdadeiro daquele afeto com seu poder e seus segredos assim é que hoje eu penso Mas então num determinado eu disse João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 529 Diadorim um mimo eu tenho para você destinado e de que nunca fiz menção o qual era a pedra de safira que do Araçuaí eu tinha trazido e que à espera de uma ocasião sensata eu vinha com cautela guardando enrolada numa pouca de algodão dentro dum saquitel igual ao de um breve costurado no forro da bolsa menorzinha da minha mochila De desde que falei Diadorim quis muito saber o presente qual era assim apertando comigo com perguntas que sem aperreio deixei de responder até de tarde quando fizemos estância A parança que foi conforme estou vivo lembrado numa vereda sem nome nem fama corguinho deitado demais de água muito simplificada Aí quando ninguém não viu eu saquei a mochila desfiz a ponta de faca as costuras e entreguei a ele o mi mo com estilo de silêncio para palavras Diadorim entrefez o pratrás de uma boa surpresa e sem querer parou aberto com os lábios da boca enquanto que os olhos e olhos remiravam a pedradesafira no covo de suas mãos Ao que se sofreou no bridado se transteve sério apertou os beiços e sem razão sensível nem mais tornou a me dar a pedrinha só dizendo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 530 Deste coração te agradeço Riobaldo mas não acho de aceitar um presente assim agora Aí guarda outra vez por um tempo Até em quando se tenha terminado de cumprir a vingança por Joca Ramiro Nesse dia então eu recebo Isso de arrevés eu li com hagá e mesmo antes quando apontou no rosto dele para o avermelhar de cor a palidez de espécie Delongando ainda restei com a pedradesafira na mão aquilo dadoetomado Donde declarei Escuta Diadorim vamos embora da jagunçagem que já é o depoisdevéspera que os vivos também têm de viver por só si e vingança não é promessa a Deus nem sermão de sacramento Não chegam os nossos que morremos e os judas que matamos para documento do fim de loca Ramiro Ah foi ele me ouvir e se encurtar em duro que revi que nem ossos Ao crespo de um com a afronta a meiagoela e os olhos davam o que deitavam O que durou só um átimo tanto que ele teve mão em seu gênio conciso com um suspiro mas mesmo me retrouxe remoque Riobaldo você teme João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 531 Tomei sem ofensa Mas muita era minha decisão que eu já tinha aperfeiçoado lá na Fazenda dos Tucanos e que só vinha esperando para executar com mais regimento de ordem quando se tivesse chegado no CurraisdoPadre conforme meu sistema nesses procedimentos Tem que temerei Você aí faz o que em seu querer esteja Eu viro minha boa volta Dar o mal por mal assim Eu tinha a quanta razão Eu guardei a pedrinha na algibeira depois melhor botei no bolso do cinto contei minhas favas refavas Diadorim respirava muito Dele foi o relance Riobaldo você pensa bem você jurou vinga você é leal E eu nunca imaginei um desenlace assim de nossa amizade ele botouse adiante Riobaldo põe tento no que estou pedindo tu fica E tem o que eu ainda não te disse mas que de uns tempos é meu pressentir que você pode mas encobre que quando você mesmo quiser calcar firme as es tribeiras a guerra varia de figura Arredei Tu diz missa Diadorim Isso comigo não me toca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 532 Da maneira ele me tentava Com baboseira a prosável diguice queria abrandar minha opinião Então eu ia crer Então eu não me conhecia Um com o meu retraimento de nascença deserdado de qualquer lábia ou possança nos outros eu era o contrário de um mandador A pra agora achar de levantar em sanha todas as armas contra o Hermógenes e o Ricardão aos instigares Rebulir com o sertão como dono Mas o sertão era para aos poucos e poucos se ir obedecendo a ele não era para à força se compor Todos que malmontam no sertão só alcançam de reger em rédea por uns trechos que sorrateiro o sertão vai virando tigre debaixo da sela Eu sabia eu via Eu disse nãozão Me desinduzi Talento meu era só o aviável de uma boa pontaria ótima em arma qualquer Ninguém nem mal me ouvia achavam que eu era zureta ou impostor ou vago em aluado Mesmo eu não era capaz de falar a ponto A conversa dos assuntos para mim mais importantes amolava o juizo dos outros caceteava Eu nunca tinha certeza de coisa nenhuma Diadorim disse Ei retenteia Coragem faz coragem Demais eu disse Sou CapitãoGeneral Antes tantas astúcias em empalhar que eu não fosse embora que eu ficasse preso naquele urjo de guerra sem cabo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 533 nem ponta sem costas nem frente e que maçava Recachei A mão dele doçura de dada de leve na minha Temi afracar E em duro repostei com outra ombrada Vou e vou Só inda acompanho é até o Curraisdo Padre Lá eu requeiro para mim um cavalo bom E trovejo no mundo Verdadeiro meu propósito era esse como está dito Eu não caturrava Eu sou assim amorcomamor e ingratidão não E bem por isso Diadorim não persistiu com palavras cordatas mas por fim disse de motejo zombariazinha Então que quer mesmo ir vai Riobaldo eu sei que você vai para onde relembrado de rever a moça clara da cara larga filha do dono daquela grande fazenda nos gerais da Serra na Santa Catarina Com ela tu casa Cês dois assentam bem como se combinam Nonde nada eu não disse Se menos pensei em Otacília Nem maldisse Diadorim de que não se calava A mais pirraçou Vaite pega essa prenda jóia leva dá para ela de presente de noivado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 534 Demorei no fazer um cigarro Nós estávamos na beira do cerrado cimo donde a ladeirinha do resfriado principia a gente parava debaixo dum paratudo pau como diz o goiano que é a caraíba mesma árvore que respondia à saudade de suas irmãs dela crescidas em lontão nas boas beiras do Urucuia Acolá era a vereda Com o tempo se refrescando e o desabafo do ar buriti revira altas palmas A por perto se ouvia a algazarra dos companheiros De ver eu tinha dó minha pena sincera de Diadorim nessas jornadas De verdade entardecia Derradeira arara já revoava Ou quem sabe você resolve melhor mandar de dádiva para aquela mulherzinha especial a da RamadeOuro filha da feiticeira Arte que essa mais serve Riobaldo ela faz o gozo do mundo dá açúcar e sal a todo passante Não era na RamadeOuro era na Aroeirinha Mas por que era que ele falava no nome de Nhorinhá com tão cravável lembrança Ao crer que soubesse mais do que eu mesmo o que eu produzia no coração o encoberto e o esquecido Nhorinhá florzinha amarela do chão que diz Eu sou bonita E tudo neste mundo podia ser beleza mas Diadorim escolhia era o ódio Por isso era que eu gostava dele em paz No não gostava por João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 535 destino fosse do antigo do ser donde vem a conta dos prazeres e sofrimentos Igual gostava de Nhorinhá a semmesquinhice para todos formosa de saia cordelimão prostitutriz Só que de que gostava de Nhorinhá eu ainda não sabia filha de Ana Duzuza O senhor estude o buriti é das margens ele cai seus cocos na vereda as águas levam em beiras o coquinho as águas mesmas replantam dai o buritizal de um lado e do outro se alinhando acompanhando que nem que por um cálculo Você se casa Riobaldo com a moça da Santa Catarina Vocês vão casar sei de mim se sei ela é bonita reconheço gentil moça paçã peço a Deus que ela te tenha sempre muito amor Estou vendo vocês dois juntos tão juntos prendido nos cabelos dela um botão de bogari Ah o que as mulheres tanto se vestem camisa de cassa branca com muitas rendas A noiva com o alvo véu de filó Diadorim mesmo repassava carinho naquela fala Melar mel de flor E me embebia o que estava me ensinando a gostar da minha Otacília Era Agora falava devagarinho de sonsom feito se imaginasse sempre a si mesmo uma estória recontasse Altas borboletas num desvoejar Como se eu nem estivesse ali ao pé Ele falava de Otacília Dela vivendo o razoável de cada João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 536 dia no estar Otacília penteando compridos cabelos e perfumando com óleo de seteamores para que minhas mãos gostassem deles mais E Otacília tomando conta da casa de nossos filhos que decerto íamos ter Otacília no quarto rezando ajoelhada diante de imagem e já aprontada para a noite em camisola fina de ló Otacília indo por meu braço às festas da cidade vaidosa de se feliz e de tudo em seu vestido novo de molmol Ao tanto deusdadamente ele discorresse De meu juízo eu perdi o que tinha sido o começo da nossa discussão agora só ficava ouvinte descambava numa sonhice Com o coração que batia ligeiro como o de um passarinho pombo Mas me lembro que no desamparo repentino de Diadorim sucedia uma estranhez alguma causa que ele até de si guardava e que eu não podia inteligir Uma tristeza meiga muito definitiva No tempo não apareci no meio daquilo Assim foi que foi Até que vieram uns companheiros com João Concliz Sidurino e João Vaqueiro que ajuntaram lenhas e armaram um fogo bem debaixo do paratudo Ao relançar das labaredas e o refreixo das cores dando lá acima nos galhos e folhas essas trocavam tantos brilhos e rebrilhos de dourado vermelhos e alaranjado às brasas essas esplendências com mais realce que todas as pedras de Araçuaí do Jequi tinhonha e da Diamantina Era diadeanos daquela árvore Ao João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 537 quando bem anoiteceu foi assim A gente só sabe bem aquilo que não entende O senhor veja eu de Diadorim hoje em dia eu queria recordar muito mais coisas que valessem do esquisito e do trivial mas não posso Coisas que se deitaram esqueci fora do rendimento O que renovar e ter eu não consigo modo nenhum Acho que é porque ele estava sempre tão perto demais de mim e eu gostava demais dele Na surgida manhã saímos para a parte final da caminhada Zé Bebelo certa hora me chamou Inda que avante Zé Bebelo mesmo devia de estar curtindo más e piores fio que ele amargava a vitória que tinha inventado Noção dos inimigos nossos que seja lá por onde puxavam posse de sua munição e de suas montadas e cargas socorridos de tudo quanto careciam Um Hermógenes quer tomar conta do sertão dos Gerais eu tirei liberdade para dizer Mesmo mais indiretas disse e isso me realiviou no dizer pouco somente que era só por picardia Direto disso Zé Bebelo não me respondeu ele pensava as mil coisas Em tanto nesses cálculos de meditação ele ligeiro sobrezumbia com os beiços e balangava às esquerdasedireitas as abas enfunadas do chapéu e às vezes assoprava sem ser por can João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 538 saço de marcha O que das idéias sobrava era que ele referia Ainda não entendo Ainda não entendo Até agora reconheço ele tem tido uma sorte Sapo semcolarinho rei gordo Mas deixa a gente ir e vir que os ovos e dúzias ele paga Do Hermógenes discursava orçamento do Hermógenes E de ouvir que a sorte do Hermógenes existia alta isso me penou tanto me certificava Aí fiquei a menos Nem eu não queria arreliar Zé Bebelo Mas para mim ele estava muito errado pelos passos e movimentos porque gostava prático da guerra do que provava um muito forte prazer e por isso não tinha boa razão para um resultado final Assim achei espiando o alto céu que é com as nuvens e os urubus repartido Deponho de que é que aquilo me adiantava E chuvas dadas derramadas Aí vai chegamos no CurraisdoPadre O lugar que não tinha curral nenhum nem padre só o buritizal com um morador Mas o ao em redor em grandes pastos era o capim melhor milagroso que o que deixava de ser provisório rico era o meloso de muito óleo a não ver uns fios de santaluzia azul e do durodobrejo nas baixadas e nos altos com pedregal o jasmimdaserra De lá vinham saindo renascidos engordados os nossos cavalos isto é os que tinham sido de Medeiro Vaz e que agora herdávamos Regozijei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 539 Escolhi um animal vistoso celheado acastanhado murzelo que bem me pareceu e dei em erro porque ele era meio sendeiro e historiento Daqui veio que o nome que teve foi de Padrim Selorico Mas o dono do sítio que não sabia ler nem escrever assim mesmo possuía um livro capeado em couro que se chamava o Senclér das Ilhas e que pedi para deletrear nos meus descansos Foi o primeiro desses que encontrei de romance porque antes eu só tinha conhecido livros de estudo Nele achei outras verdades muito extraordinárias Além de que tudo o que eu tivesse de resolver de minha vida fui deixando para os seguintes Dia de ser de chuva que madrugou tarde boi nos cinzentos E os pássaros de passagem precisavam de gritar muito uns para os outros Diadorim moderava o falar comigo e me ver recolhido em certo vexame receoso eu achei Já disse ao senhor dia a dia ele raiava em formosura E chuva alta que envinha estava mandando urubu voar para casa Os cavalos pastavam com mais pressa Nunca em todos meus tempos eu vi inverno tamanho demorado Era para espera Mesmo assim Zé Bebelo pôs ordem de se ir Porque estávamos quase todos montados em pêlo carecíamos de tocar para o Curral Caetano onde se tinha quantidade grande de arreios guardados Depois daí para buscar munição na Virgem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 540 Mãe Prazo não se perdia Aos caminhos barrancosos de sopega feito torrão de açúcar preto se derretendo empapados Aos barros fomos como perdidas criaturas de se rir se chorar E mas o senhor sabe o que isso é aqueles nossos cavalos não tinham ferraduras Pra mais onde Ah aonde os altos bons o Chapadão do Urucuia em que tanto boi berra Mas nunca chegamos nem na VirgemMãe Afiguro desde o começo desconfiei de que estávamos em engano Rumos que eu menos sabia no viável Como a serra que vinha vindo enquanto para ela eu ia indo em tantos dias longe lá de repente os olhos da gente percebem um fio de tremor se vê é um risquinho preto que com léguas andadas vira cinzento e vira azul daí depois parede de morro se faz No arquear dali foi que se pegou o primeiro caminho achado para se passar Bem baixamos Os rios estavam sujos em espumas Não havendo a ajuda de Joaquim Beiju que estava dando para dela se sentir falta Zé Bebelo em assarapanto até os dedos da mão dele não deixavam de se perpassar contando rosário nas tiras da rédea Que andávamos desconhecidos no errado Disso tarde se soube quem que guiava tinha enredado nomes em vez da VirgemMãe creu de se levar tudo para a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 541 VirgemdaLaje logo lugar outro vereda muito longe para o sul no sítio que tem engenhodepilões Mas já era tarde Trovoou truz dava vento E chuvas que minha língua lambeu Nelas mais não falo Mas quando estiou o tempo de vez não sei se foi melhor porque bateu de começo a fim dos Gerais um calor terrível Aí quem sofreu e não morreu ainda se lembra dele Esses meses do ar como que estavam desencontrados Doenças e doenças Nosso pessoal montão deles pegou a mazelar Mas isto eu refiro depois O senhor já que me ouviu até aqui vá ouvindo Porque está chegando hora deu ter que lhe contar a coisas muito estranhas Quadrante que assim viemos por esses lugares que o nome não se soubesse Até até A estrada de todos os cotovelos Sertão se diz o senhor querendo procurar nunca não encontra De repente por si quando a gente não espera o sertão vem Mas aonde lá era o sertão churroo próprio mesmo Ia fazendo receios perfazendo indagação Descemos por umas grotas no meio de serras de partevento e suas mães árvores O pongo de um ribeirão o boqueirão de um rio O Abaeté não era se bem fosse que parecia largo rio Abaete no escalavrado beiras amarelas Aquele rio fazia uma grande volta acolá clareado com João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 542 a vista de uns coqueiros Ali era um lugar longe e bonito como que me acenava Mas não endireitamos para ele porque o rumo determinado era outro torando desviado muito consoante E mais maninhava Topar um vivente é que era mesmo grande raridade Um homenzinho distante roçando lenhando ou uma mulher zinha fiando a estriga na roca ou tecendo em seu tear de pau na porta de uma choça de buriti toda Outro homem quis me vender uma arara mansa que a qual falava toda palavra que tem á Outra velha que estava fumando o pito de barro Mas ela enrolou a cara no xale não se ajuizaram os olhos dela E o gado mesmo vasqueava só por pouco acaso um boi ou vaca de solidão bicho passeado sem dono Veado sim vi muitos tinha vez que pulavam num sonhoso correndo de corta campo tanto tantos uns dois uns três uns vinte em grupos mateiros e campeiros Faltava era o sossego em todo silêncio faltava rastro de fala humana Aquilo perturbava me sombreava já depois com andada de três dias não se percebeu mais ninguém Isso foi até onde o morro quebrou Nós estávamos em fundos fundos Isto é nos arrampadouros Tinha uma estrada aí na subida dela houvesse coisas Uns galhos de árvores colocados ramalhos e jaribaras forma de sinal para não se passar Mas esse aviso havia de ser particular para o uso de outros não para João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 543 o nosso destino Não respeitamos de jeito nenhum Fomos indo No entrar numa guapira se redobrou o achado daquelas ramas verdes que não obedecemos Eu vinha adiante com o Acauã e o Nélson instruindo o caminho Já estávamos pelas rédeas para outra subida de ladeira mas aí escutamos o latir de cachorros E enxergamos um homem no alto da virada uns homens Esses estavam com espineardas Os quantos homens de estranhoso aspecto que agitavam manejos para voltarmos de donde estávamos Por certo não sabiam quem a gente era e pensavam que três cavaleiros menos valessem Mas entendendo que do caminho não desgarrávamos começaram a ficar estramontados Um eu vi que dava ordens um roceiro brabo arrastando as calças e as esporas Mas os outros chusmote deles eram só molambos de miséria quase que não possuíam o respeito de roupas de vestir Um aos menos trapos nem bem só o esporte de uma tanga esfarrapada e em lugar de camisa a ver a espécie de colete de couro de jaguacacaca Eram uns dez a quinze Não consegui sentido no que eles ameaçavam e vi que estavam aperrando as armas Queriam cobrar portagem Andavam arrumando alguma jerimbamba Não convinha avançar assim por cima deles logo mas também dar recuada podia ser uma vergonha Esbarramos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 544 neles quase encostados Íamos esperar o resto do pessoal E eles ali confrontes não explicavam razão nenhuma Só um disse Pode não Pode não E renuía com a cabeça o banglafumém mesmo quando falava com uma voz de qualidade diversa costumada daquela terra de lugar e os outros renuindo também Ah pode não Pode não com o vozeio soturno Nos tempos antigos devia de ter sido assim Gente tão em célebres conforme eu nunca tinha divulgado nem ouvido dizer na vida O das esporas foi se amontar num jumento esse era o único animaldesela que ali tinham Acho que montou para oferecer à gente maior vulto de respeito tocava batendo palma de mão na anca do jegue veio vindo para primeiro se presenciar Olhei para todos Um tinha a barba muito preta e aqueles seus olhos permeando Um mesmo em dia de horas tão calorosas ele estava trajado com uma baeta vermelha comprida acho que por falta de outra vestimenta prestável Ver a ver o sacerdote Ih Essa gente tem piolho e muquiranas o Nélson disse contrabaixo Todos estavam com alguma garantia que eram lazarinas bo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 545 cudas baludas garruchas e bacamartes escopetas e trabucão peças de armas de outras idades Quase que cada um era escuro de feições curtidos muito mas um escuro com sarro ravo amarelos de tanto comer só polpa de buriti e fio que estavam bêbados de beber tanta saeta Um zambo troncudo segurava somente um calaboca mas devia de ser de braço terrível no manobrar aquele cacete O quanto feioso de dar pena constado chato o formo do nariz estragada a boca grande demais em três Outro que tinha uma foice encabada muito comprido e um porongo pendurado a tiracol por uma embira cochichava com os restantes uma séria falação a qual uma espécie de pajelança Artes vezes ele guinchava feito o demônio gemedeiro Esse que por nome de Constantino acudia Todos eles com seus saquinhos chumbeiros e surrões e polvorinhos de corno e armamento tão desgraçado mesmo assim não tomavam bastante receio de nossos rifles Para o nosso juízo eles eram doidos Como é que desvalimento de gente assim podiam escolher ofício de salteador Ah mas não eram Que o que acontecia era de serem só esses homens reperdidos sem salvação naquele recanto lontão de mundo groteiros dum sertão os catrumanos daquelas brenhas O Acauã que explicou o Acauã sabia deles Que viviam tapados de Deus assim nos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 546 ocos Nem não saíam dos solapos segundo refleti dando cria feito bichos em socavas Mas por ali deviam de ter suas casas e suas mulheres seus meninos pequenos Cafuas levantadas nas burguéias em dobras de serra ou no chão das baixadas beira de brejo às vezes formando mesmo arruados Aí plantavam suas rocinhas às vezes não tinham gordura nem sal Tanteei pena deles grande pena Como era que podiam parecer homens de exata valentia Eles mesmos faziam preparo da pólvora de que tinham uso ralado salitre das lapas manipulando em panelas Que era uma pólvora preta fedorenta que estrondava com espalhafato enchendo os lugares de fumaceira E às vezes essa pólvora bruta fazia as armas rebentarem queimando e matando o atirador Como era que eles podiam brigar Conforme podiam viver E enfim os companheiros apontaram em vinda e subiram a primeira ladeira aquele tropeado de guerreiros em tão grande número numeroso Quase eu queria me rir do susto então dos catrumanos Mas foi não porque eles não se aluíram do ponto onde estavam só que olhavam para o chão calados acho que porque essa é a forma de declararem seus espantos O do jegue Teofrásio que era quem capitaneava deu alguma intimação para o da foice esse que o DosAnjos se chamava era o falador e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 547 que foi quem veio adiante saudar Zé Bebelo e render explicação Ossenhor uturje mestre a gente vinhemos no graminhá Ossenhor uturje Ossos e queixos e aquela voz que o homem guardava nos baixos peitos era tôo que nem de se responder em ladainha dos santos encomendação de mortos responsório Ossenhor uturje mestre Não temos costume Não temos costume Que estamos resguardando essas estradas De não vir ninguém daquela banda povo do Sucruiú que estão com a doença que pega em todos Ossenhor é grande chefe dando sua placença Ossenhor é Vossensenhoria Peste de bexiga preta Mas povoado da gente é o Pubo que traslada do brejão ossenhor com os seus passaram perto de lá valor dis tante meialégua As mulheres ficaram cuidando cuidando A gente vinhemos no graminhá Faz três dias Cercar os caminhos O povo de Sucruiú estão dizendo nem não estão enterrando mais os defuntos deles Pode querer vir algum com recado trazendo a doença e esta é a razão Veio um querendo pedir auxílios relatar bobagens essas mogúncias e brogúncias Mas teve de voltar deveras retornou não demos passa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 548 gem Estão com a maldição a urros Castigo de Deus Jesus Povo do Sucruiú gente dura de rúim Ossenhor uturje mestre convém desemendar deste lado não passar no Sucruiú respraz Bexiga da preta E aquele homem o DosAnjos tinha largado a foice no chão botou o pé em riba e abria os braços depois ficou de mãos postas acho que estava produzindo algum feitiço com os olhos todos fechados Ele era magro magro da vista da gente não se ter Os outros deles devagarosamente tinham vindo se chegando também Zé Bebelo seguro que por não se rir sem caridade armou rosto reverso aquele semblante serioso e eles desconfiaram Porque um que era velhusco e estava com o chapéudepalha corroído nas todas beiras apareceu com um dinheiro na palma da mão oferecendo a Zé Bebelo como em paga por perdoamento A que era um dobrão de prata antigo do Imperador desses de novecentos esessenta réis em cunho mas que na Januária por ele dão dois milréis ainda com senhoriagem de valer até os dez na capital Mas Zé Bebelo com alta cortesia rejeitou aquele dado dinheiro e o catrumano velho não bem entendeu pelo que permaneceu um tempo com ele ofertado na mão Assim os outros não entrediziam palavras que só arregalados espiavam para Zé Bebelo e para a moeda João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 549 olhavam como se estivessem prestando conta de suas fortes invejas O jeito de estremecer deles às vezes era todo era de banda mas aquilo sendo da natureza constante do corpo e não temor pois quando pegavam receio iam ficando era mais escuros e respiravam com roncado rumor quietos ali Que aqueles homens eu pensei que nem mansas feras isto é que no comum tinham medo pessoal de tudo neste mundo Como que o senhor visse os catrumanos rir O da foice tornou a apanhar a foice o no jegue ficou segurando o chapéu em respeito o velho beobobo sumiu seu dobrão de prata em alguma algibeira A mais eles todos riram as tantas grandes bocas e não tinham quase nenhum dente Riam sem motivo justo agora mas para nos agradar Cônscio o da foice criou ânimo mesmo indagou O que mal não pergunto mas donde será que ossenhor está servido de estando vindo chefe cidadão com tantos agregados e pertences Ei do Brasil amigo Zé Bebelo cantou resposta alta graça Vim departir alçada e foro outra lei em cada esconso nas toesas deste sertão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 550 O velho agiu o pelosinal Ia remenicar alguma outra coisa Mas Zé Bebelo completo de escutar e ver deu não com a mão e abriu a marcha Tocamos Ora vi as derradeiras caras daqueles catrumanos que mostravam por nossa causa muitos pasmos de admiração e a cobiça que tinham de fazer centoedobro de perguntas que por receio de atrevimento nunca perguntavam Só dos rifles Úixete isto é lazarinha moderna Donde um deles o montado no jegue ainda gritou um conselho que a gente então principiasse volta no buritizal duma lagoazinha da banda da mão direita por via de se evitar de passar por dentro do Sucruiú e que retomada a estrada no quebrar da mão esquerda num vau perto da mata virgem era só se andar as sete léguas num sítio se chegava de um tal de seor Abrão que era hospitaleiro Isso aquele homem recomendou não por serviço de préstimo eu pelo tom e jeito bem entendi gritou no fim assim a fito somente de que os seus outros vissem que ele bem possuía coragem também de dar voz perante presença nossa de tantos grandes jagunços donos de arejo darmas Mas Zé Bebelo descrendo de temer o que eles anunciavam do arraial onde estava alastrando a varíola reinante deu ordem de seguirmos em reto em diante em frente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 551 Rir o que se ria De mesmo com as penúrias e descômodos a gente carecia de achar os ases naquele povo de sujeitos que viviam só por paciência de remendar coisas que nem conheciam As criaturas Mas eu não ri Ah daí não ri honesto nunca mais em minha vida Como que marquei que a gente ter encontrado aqueles catrumanos e conversado com eles desobedecido a eles isso podia não dar sorte A hora tinha de ser o começo de muita aflição eu pressentia Raça daqueles homens era diverseada distante cujos modos e usos mal ensinada Esses mesmo no trivial tinham capacidade para um ódio tão grosso de muito alcance que não custava quase que esforço nenhum deles e isso com os poderes da pobreza inteira e apartada e de como assim estavam menos arredados dos bichos do que nós mesmos estamos porque nenhumas más artes do demônio regedor eles nem divulgavam Só o mau fato de se topar com eles dava soloturno sombrio Apunha algum quebranto Mas mais que por conosco não avirem medida haviam de ter rogado praga De pensar nisso eu até estremecia o que estremecia em mim terreno do corpo onde está a raiz da alma Aqueles homens eram orelhudos que a regra da lua tomava conta deles e dormiam farejando E para obra e malefícios ti João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 552 nham muito governo Aprendi dos antigos Capatazia de soprar quente qualquer ódio nas folhas e secar a árvore ou de rosnar palavras em buraco pequeno que abriam no chão tapando depois para o caminho esperar a passagem de alguém e a ele fazer mal ou guardavam um punhado de terra no fechado da mão no prazo de três noites e três dias sem abrir sem largar e quando jogavam fora aquela terra em algum lugar nele com data de três meses ficava sendo uma sepultura De homem que não possui nenhum poder nenhum dinheiro nenhum o senhor tenha todo medo O que mais digo convém nunca a gente entrar no meio de pessoas muito diferentes da gente Mesmo que maldade própria não tenham eles estão com vida cerrada no costume de si o senhor é de externos no sutil o senhor sofre perigos Tem muitos recantos de muita pele de gente Aprendi dos antigos O que assenta justo é cada um fugir do que bem não se pertence Parar o bom longe do ruim o são longe do doente o vivo longe do morto o frio longe do quente o rico longe do pobre O senhor não descuide desse regulamento e com as suas duas mãos o senhor puxe a rédea Numa o senhor põe ouro na outra prata depois para ninguém não ver elas o senhor fecha bem E foi o que eu pensei Aqueles catrumanos pedindo por maldição como era que eu podia deixar de pensar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 553 neles Háde que se eles tivessem me pegado sozinho eu apeado e precisado decerto me matavam para roubar minhas armas as coisas e minhas roupas Amargo que acabavam comigo sem escrúpulos homessa que nem tinham porquanto eu era desconhecido e forasteiro De doente ou ferido perdendo meu sangue que eu estivesse algum deles ia ser capaz de me ceder gole duma cuia dágua Draste eu duvidava deles Duvidava dos fojos do mundo E por que era que há de haver no mundo tantas qualidades de pessoas uns já finos de sentir e proceder acomodados na vida tão perto de outros que nem sabem de seu querer nem da razão bruta do que por necessi dades fazem e desfazem Por quê Por sustos para vigiação sem descanso por castigos E de repente aqueles homens podiam ser montão montoeira aos milhares mis e centos milhentos vinham se desentocando e formando do brenhal enchiam os caminhos todos tomavam conta das cidades Como é que iam saber ter poder de serem bons com regra e conformidade mesmo que quisessem ser Nem achavam capacidade disso Haviam de querer usufruir depressa de todas as coisas boas que vissem haviam de uivar e desatinar Ah e bebiam seguro que bebiam as cachaças inteirinhas da Januária E pegavam as mulheres e puxavam para as ruas com pouco nem se tinha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 554 mais ruas nem roupinhas de meninos nem casas Era preciso de mandar tocar depressa os sinos das igrejas urgência implorando de Deus o socorro E adiantava Onde é que os moradores iam achar grotas e fundões para se esconderem Deus me diga Nem me diga o senhor que não aí foi que eu pensei o inferno feio deste mundo que nele não se pode ver a força carregando nas costas a justiça e o alto poder existindo só para os braços da maior bondade Isso foi o que eu pensei muito redoído no estufo do calor vingante E foi por durante quase uma hora montado no meu cavalo ruim chamado PadrimSelorico a passo por aqueles ruins campos até se chegar perto do povoado do Sucruiú onde que estava arranchada a horrorosa doença por cima da pior miséria Bobéia minha Porque os companheiros indo cuidando de seu ramerrão comum nenhum não punha tento em dessas idéias Então era só eu Era Eu que estava malinvocado por aqueles catrumanos do sertão Do fundo do sertão O sertão o senhor sabe Mas em tanto então levantei o meu entender para Zé Bebelo dele emprestei uma esperança apreciei uma luz Dei tino Zé Bebelo em testa chefe como chefe como executava nossa ida Da marca de um homem solidado assim que era João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 555 sempre alvissareiro Por ele eu crescia admiração e que era estima e fiança respeito era Da pessoa dele da grande cabeça dele era só que podia se repor nossa guarda de amparo e completa proteção eu via Porque Zé Bebelo previa de vir cá embaixo no escuro sertão e o que ele pensava queria e mandava tal a guerra por confrontação e para o sertão retroceder feito pusesse o sertão para trás E era o que íamos realizar de fazer Para mim ele estava sendo feito o canoeiro mestre com o remo na mão no atravessar o rebelo dum rio cheio Carece de ter coragem Carece de ter muita coragem eu relembrei Eu tinha Diadorim vindo do meu lado rosável mocinho antigo sofrido de tudo mas firme duro de temporal naquelas constâncias Sei que amava não amava Os outros os companheiros outros semelhavam no rigor umas pobres infâncias na relega que deles a gente precisasse de tomar conta Com Zé Bebelo da minha mão direita e Diadorim da minha banda esquerda mas eu o que é que eu era Eu ainda não era ainda Se ia se ia O cavalo pombo de Zé Bebelo era o de mais armada vista o maior de todos Cavalo selado montado e muito chão adiante Viajar mas de outras maneiras transportar o sim desses horizontes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 556 Desde porém como já entrávamos no perto do Sucruiú conforme as léguas que os cascos de nossos cavalos contando era de ver que voz Zé Bebelo dava se queria em reto ou atalho Ah em reto foi Mas nenhum de nós teve sobrosso O que era era Aquele desgraçado lugar devia de estar lá acolá no pião alto do campo em seu sempre Obra de um tiro de carabina E como deviam de estar cozinhando com tanto fogão porque subia para o pedaço de céu um povôo de fumaças feito andassem por lá renovando pastos desfora de tempo Fazia fole de calor Mas entre as vertentes no corguinho rabo serelepe que passamos de beiras de terra preta só os animais foram que beberam a toda sede que nós mesmo da água corrente a gente se receava Donde é que decorre a peste Até o ver o ar A poeira e miséria Azul desbotado puído sem os realces O sol carregando de envelhecer antesmente as folhagens o começo do mês de junho já dava parecença de alto fim de agosto Aquele ano declarava de não se ter nem frio pelo legal De que valeram as tantas chuvas Aí este mundo de sertão tinha se perdido eu mesmo me disse Como que íamos atravessar o Sucruiú lá se chegava O qual eram as cafuas em suas construções no entremeio da fumaça Essas choupanas Gente Não se divulgava E certo que não se tinha medo maior Antes todos queriam avistar de perto de passagem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 557 o que aquilo de verdade fosse Só que se tinha confiança nos bentinhos e verônicas E de repente correu aviso que Jõe Bexiguento e o PacamãdePresas sabiam reza para São Sebastião e São Camilo de Lélis que livram de todo mal vago Como se ter Como se aprender também Tempo não dava Mas o que vieram dizendo de um em um se virando para trás nos cavalos que não se carecia Assim aqueles dois iam praticar resumida a oração e cada um da gente consigo reproduzisse constantemente as fortes ave orarias e padrenossos que isso bastava Assim foi que fizemos Avante eu rezei Algum dia depois de hoje hei de esquecer aquilo Arruado que era até bem largo mas mal se enxergavam aquelas casas Ao demais rezando ao real vendo eu vim Casas coisa humana Em frente delas todas o que estavam era queimando pilhas de bosta seca de vaca O que subia enchia a fumaça acinzentada e esverdeada no vagaroso E a poeira que demos fez corpo com aquele fumegar levantante tanto tapava nos soturnos Aí tossi cuspi no entrecho de minhas rezas Voz nem choro não se ouviu nem outro rumor nenhum feito fosse decreto de todas as pessoas mortas e até os cachorros cada morador Mas pessoas mor que houvesse por trás da poeira para lá da fumaça verdolenga se vislumbravam os vultos e as tristes caras deles que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 558 branqueavam tantas máscaras Aos homens e mulheres apartados tão estranhos caladamente seriam os que estavam jogando todo o tempo mais rodelas de bosta seca nas fogueiras isso que deviam de ter por todo remédio Nem davam fé de nossa vinda de seus lugares não saíam não saudavam Do perigo mesmo que estava maldito na grande doença eles sabiam ter quanta cláusula Sofriam a esperança de não morrer Soubesse eu onde era que estavam gemendo os enfermos Onde os mortos Os mortos ficavam sendo os maus que condenavam A reza re ganhei com um fervor Aquela travessia durou só um instantezinho enorme Mesmo que os cavalos nossos indo iam devagar que é como se vai quando todos rezando sozinhos em cima deles devagar duma procissão Não se perturbou palavra E foi que dali acabamos de surgir da arrepoeira e fumaça de estrume e o corusco de labareda alguma e a mormaceira Deus que tornasse a tomar conta deles do Sucruiú daquele transfor mado povo Olhei o ilustre do céu Dado dava de um estar sotolivre conseguido se soltar das possibilidades horrorosas Revi todos e Diadorim que era uma cortesia de bondade Não espiei para trás não ver de enxergar o fim daquelas casas no vaporoso pardoazulado no exalante E o que rogava eram coisas de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 559 salvação urgente tão grande eu queria poder sair depressa dali para terras que não sei aonde não houvesse sufocação em incerteza terras que não fossem aqueles campos tristonhos Eu levava Diadorim Mas de começo não vi não fui sentindo que queria poder levar também Otacília e aquela moça Nhorinhá filha de Ana Duzuza e mesmo a velha Ana Duzuza e Zé Bebelo Alaripe os companheiros todos Depois todas as demais pessoas de meu conhecimento e as que mal tinha visto além de que a agradecida formosura da boa moça Rosauarda a mocinha Miosótis meu mestre Lucas dona Dindinha o comerciante Assis Wababa o Vupes Vusps Todos e meu padrinho Selorico Mendes Todos que em minha lembrança eu carecia de muitas horas para repassar Igual levava ah o povo do Sucruiú e agora o do Pubo os catrumanos escuros E que para o outro lugar levava restantes os cavalos os bois os cachorros os pássaros os lugares acabei que levasse até mesmo esses lugares de campos tão tristes onde era que então se estava Todos Não Só um era que eu não levava não podia e esse um era o Hermógenes Aí dele me lembrei na hora e esse Hermógenes eu odiasse Só o denunciar dum rancor mas como lei minha entranhada costume quieto definitivo dos cavos do continuado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 560 que tem na gente Era feito um nojo por ser Nem no meu juízo para essa aversão não carecia de compor explicação e causa mas era assim eu era assim Que ódio é aquele que não carece de nenhuma razão Do que acho para responder ao senhor a ofensa passada se perdoa mas como é que a gente pode remitir inimizade ou agravo que ainda é já por vir e nem se sabe Isso eu pressentia Juro de ser Ah eu Tivesse medo O medo da confusão das coisas no mover desses futuros que tudo é desordem E enquanto houver no mundo um vivente medroso um menino tremor todos perigam o contagioso Mas ninguém tem a licença de fazer medo nos outros ninguém tenha O maior direito que é meu o que quero e sobrequero é que ninguém tem o direito de fazer medo em mim São os momentos se sei Senti um cansaço Adiantamos ligeiro depois que passado o vau da matavirgem e tenteávamos pelo encontrável O sol ia entrando vi o céu nos roxos nos vermelhos Misturamos numa baixada no capim cacheado Umas lavourinhas Daí lá se estava no retiro do Abrão onde o campo largueia Era uma boa casa Mas de dentro saíram de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 561 repente por suas portas uns homens que fugiam corridos feito ratos se escapulindo do toucinho de um jacá Sendo que Zé Bebelo assim na dianteira sempre cavalhava vente superintendeu que não perseguíssemos aqueles tais nem neles se atirasse por comprazimento O que estavam era em mão de roubando se soube como que tinham até sacos para carregar dentro as coisas Num átimo eu reluzi quem que eles podiam ser Só acertei Pois não foi que um deles errando no abrir da fuga demorou e perdeu as facilidades então veio do nosso lado embrafustado quase debaixo dos cavalos Era um pretinho Um rapazola retinto mal aperfeiçoado por dizer um menino Nu da cintura para os queixos As calças rotas em todas as partes andavam caicaindo ele apertou perna em perna Arfava chiado como quem por todo engano de pressa tivesse chupado na boca um gole quente de café demais Bezerro doente de maldeano às vezes faz assim Cuido que por não perder de todo as calças como vestimenta ele se ajoelhou chato no chão mais deitado do que ajoelhado A benção pois disse E a idéia dele rodou ligeira pois quando se notou tinha tirado do bojo do saco o que estava lá que era um pé de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 562 alpercata de homem um candieirozinho pequeno desses que vinham da Bahia uma escumadeira de cozinha e um arranjado envernizado de couro preto que nem boldrié que tudo jogou fora para uma banda o longe que pôde Seguinte o que mos trou à gente o saco vazio e com isto dizendo arquejado Tirei não nada não Tenho nada Tenho nada Isso tudo se deu curto que nem o mijar dum sapo e dum modo tal inocente de quem visse risse E em coisa tão tola declarada assim a gente até crê razão por ser tão afã de absurdo Donde é que vocês vieram dondé Zé Bebelo indarguiu A gente quer voltar para casa Semos sim é do Sucruiú nhor sim Arte que a aproveitar ele tornou a atar melhor o resumo de embira que cinturava aqueles molambos de calças E se encolhia temia e se ria Que nome era capaz de ter Guirigó Minha graça é essa Sou filho de Zé Câncio seu criado sim senhor João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 563 Tão magro trestriste tão descriado aquele menino já devia de ter prática de todos os sofrimentos Olhos dele eram externados o preto no meio dum enorme branco de mandioca descascada O couro escuro dele era que tremia constante e tremia pelo miúdo como que receando em si o que não podia ser bom E quando espiava para a gente era de beiços mostran do a língua à grossa colada no assoalho da boca mas como se fosse uma língua demasiada demais que ali dentro não pudesse caber em bezerro pesteado às vezes se vê assim Menino muito especial Jagunço distraído vendo um desses do jeito à primeira era capaz da bondade de desfechar nele um tiro certo pensando que padecia agonia e que carecesse dessa ajuda por livração Guirigó qué que vieram caçar aqui Fala O que qu a gente veio caçar sim senhor Eles vieram eu também vim Buscar de comer Ih ques menino Quem te vê comer essa tralha que você amoitou aí no saco O pretinho espichado no chão sacudia a cabeça que não que não que parecia ter gosto de poder negar assim Mas o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 564 de comer todo se acabou Havia de negar tudo renegava até que tivesse tido mãe nascido dela até que a doença brava estivesse matando o povo do Sucruiú os parentes todos dele A gente queria que aquele traste de menino sentisse em si e se entristecesse por tantas suas desditas chorasse uma lágrima a lagrimazinha só por um momento que fosse Ah ele fizesse logo isso a gente ficava desconsolado e legítimo no triste a gente ficava tranqüilizados Qual o menino preto negava O que ele afirmava no descaramento firme de seu gesto era que nem era ninguém nem aceitava regra nenhuma devida do mundo nem estava ali defronte dos cascos dos cavalos da gente Ah queria salvar seu corpo queria escape Se abraçava com qualquer poeira De mais não queria saber Que podia que fosse logo embora Zé Bebelo consentiu ordem E ainda jogou um pedaço de rapadura que ele aparou fácil como numa abocada Pra tu adoçar essa tua tripinha preta foi o que Zé Bebelo gritou E aquele menino sem fungar sem olhar para trás pulou em rumo maneiro e leviano se sumiu por onde carecia de ir Não pensei que fosse tão pequeno conforme mesmo era Coitadinho os dentes dele estavam alumiando de brancos Diadorim disse João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 565 Hem Hem Zé Bebelo falou O que imponho é se educar e socorrer as infâncias deste sertão Eu ia fazer o sinaldacruz mas com a mão não cheguei a bulir porque isso me pareceu falta de caridade pensando no menino pretinho E com o determinado costumeiro de se espalhar os de vigia por todas as quatro bandas mais o movimento de procura dum pasto bem fechado e conveniente tomamos conta de tudo e entramos naquela casa para ver o visível e se fazer fogo de aprontar nosso jantar na fornalha de sua grande cozinha Virgem digo ao senhor o interior dela dava pena nunca vi nada tão remexido e roubado Total o que era de jeito de se carregar o em arcas e em trouxas e que no comum duma casa remediada se acha faltava Não se encontrou uma peça de roupa uma lamparina de folha uma folhinha na parede um gancho de rede uma raspadeira um cabresto pendurado uma esteira uma vasilha uma coisa alguma em que se pegar Eram só as mesas os catres os bancos Tinham limpado a carne daquele costelame Por onde andaria o dono Mas se ficou sabendo que o nome dele não era em verdade Abrão mas Habão que assim se chamava Consoante o diploma de patente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 566 que no chão num canto avistei lavrado preenchido cerimonial de que esse Habão era Capitão da GuardaNacional em válidos títulos Aquele retiro se chamava o Valado Com pouco mais uns dias que se passassem o pessoal do Sucruiú era capaz de desmanchar até o prédio da casa por seus esteios e caibros Para não falar que de gado galinhas e porcos e cachorros e o mais nem sinal se divulgava Sobravam só os passarinhos soltos como de toda parte no igual que piaram uns momentos pelo acabar da tardinha alegres assim no empobrecido Vai dentro de lá num quarto muito recanto sediava no escuro que já fazia um oratório em armariozinho construido pregado na parede que estava com suas poucas imagens e um toco para se acender de velabenta Nisso não tinham desrespeitado de mexer E nós então cada um depois dum viemos ao quartodooratório beijar a santa maior que era no seu manto como uma boneca muito perfeita que era a Minha Nossa Senhora MãedeTodos Se comeu se dormiu Se acordou bem o digo Cada dia é um dia E o tempo estava alisado Triste é a vida do jagunço dirá o senhor Ah fico me rindo O senhor nem não diga nada Vida é noção que a gente completa seguida assim mas só por lei duma idéia João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 567 falsa Cada dia é um dia Ora mais ordens já para antes do vir da aurora se cumprir dali Zé Bebelo já tinha dado E foi se saber o Suzarte e o Tipote e outros com o João Vaqueiro rastreavam redobrados onde em redor remediando o mundo a alho e faro Tudo eles achavam tudo sabiam em pouquinhas horas tudo tradiziam O chão em lugares guardava molde marcado dos cascos de muitíssimas reses calcados para um rumo só um caminho eito Aqueles rastros tinham vigorado por cima da derradeira lama da derradeira chuva E de quantidade e de quanto tinha chovido eles liam no capim e nos regos de enxurradas e na altura da cheia já rebaixada a deixa beiradas do ribeirão Pelo comido pastado das reses também muito se reconhecia Aos passos dos cavaleiros e cachorros As pessoas da casa tinham viajado para a banda de oestes Mas o gado escolhendo por si e sem tocada mas depois de solto por boa regra pegara ida espaçada mais virante acima aonde devia haver para se lamber salinas de barreiro E bastantes outras coisas eles decifravam assim vendo espiado o que de graça no geral não se vê Capaz de divulgarem até os usos e costumes das criaturas ausentes dizer ao senhor se aquele seô Habão era magro ou gordo seria forreta ou mãoaberta canalha inteirado ou razoável homemdebem Porque dos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 568 centos milhares de assuntos certos que parecem mágica de rastreador só com o Tipote e o Suzarte o senhor podia rechear livro E ainda antes do meiodia subir desemalocaram duas gordas novilhas carneadas fartas para a nossa refeição Um bom entendedor num bando faz muita necessidade E aquele lugar o Valado eu aceitei o senhor preste atenção para ficar uns meus tempos ali ainda me valia Senti assim meu destino Dormindo com um pano molhado em cima dos olhos e com a nuca repousada numa folha de faca de noite o destino da gente às vezes conversa sussurra explica até pede para não se atrapalhar o devido mas ajudar Crendice Mas coração não é meio destino Permanecer ao menos ali eu quis Mas Zé Bebelo duvidou de ficar Zé Bebelo suscitado determinou que a gente fosse mais para adiante Ele concebia medo Conheci Estava Zé Bebelo pegou a principiar medo Por quê Chega um dia se tem Medo dele era da bexiga do risco de doença e morte achando que o povo do Sucruiú podiam ter trazido o mauar e que mesmo o Sucruiú ainda demeava vizinho justo demais Tanto ri Mas ri por de dentro e procedi sério feito um pau do campo Assim mesmo em errei disso não sabia Mas o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 569 cabedal é um só do misturado viver de todos que mal vareia e as coisas cumprem norma Alguém estiver com medo por exemplo próximo o medo dele quer logo passar para o senhor mas se o senhor firme agüentar de não temer de jeito nenhum a coragem sua redobra e tresdobra que até espanta Pois Zé Bebelo que sempre se suprira certo de si tendo tudo por seguro agora bambeava Eu comecei a tremeluzir em mim Pelo que umas cinco léguas andamos De modo meio conforme decerto aquele algum seô Habão também tinha se ido Carecíamos Merecer logo ao menos uma semana de quieto é que era justo pois nenhum não estava mais em sua saúde Esses homens do Sucruiú cercados da banda outra pelos catrumanos ei que só podiam achar espaço por estes lados eles sim Nós no nosso Eu sei que um se mexer a esmo é sempre fácil e que com o cansaço é que se tapa o desânimo Mas o que eu queria real era estar sarado de alguma demorada doença comendo aos poucos o meu caldo com angu e em invernia de chuva fria esfriada me esquentando perto do borralho de um fogão e galo de manhã cantando em algum terreiro Era para ir Fôssemos Disso deslavava Descemos a Vereda do PorcoEs pim que não tinha nome verdadeiro anterior e assim chamamos porque um bicho daqueles por lá cruzou Chapadas de ladeira João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 570 pouca Depois uma lomba com o cerradão E por fim viemos esbarrar em lugar de algum cômodo mas feio como feio não se vê Tudo é gerais eu pensei por consolo Um homem que com a machadinha na mão e sua cabaça a tiracol tratava de desmelar cortiço num pau do mato esse indicou tudo necessário e deu a menção de onde é que estávamos Na Coruja um retiro taperado E ali redizendo o que foi meu primeiro pressentimento eu ponho que era por minha sina o lugar demarcado começo de um grande penar em grandes pecados terríveis Ali eu não devia nunca de me ter vindo lá eu não devia de ter ficado Foi o que assim de leve eu mesmo me disse no avistar o redondo daquilo e a velhice da casa Que mesmo como coruja era mas da orelhuda mais mor de tristes gargalhadas porque a suindara é tão linda nela tudo é cor que nem tem comparação nenhuma por cima de riscas sedas de brancura E aquele situado lugar não desmentia nenhuma tristeza A vereda dele demorava uma agüinha chorada demais Até os buritis mesmo estavam presos O que é que buriti diz É Eu sei e não sei Que é que o boi diz Me ensina o que eu sabia Bobice de todos Só esta coisa o senhor guarde meialégua dali um outro corgovereda parado sua água semcor por sobre de barro preto Essas veredas eram João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 571 duas uma perto da outra e logo depois alargadas formavam um tristonho brejão tão fechado de moitas de plantas tão apodrecido que em escuro marimbus que não davam salvação Elas tinham um nome conjunto que eram as VeredasMortas O senhor guarde bem No meio do cerrado ah no meio do cerrado para a gente dividir de lá ir por uma ou por outra se via uma encruzilhada Agouro Eu creio no temor de certos pontos Tem onde o senhor encosta a palmadamão em terra e sua mão treme pra trás ou é a terra que treme se abaixando A gente joga um punhado dela nas costas e ela esquenta aquele chão gostaria de comer o senhor e ele cheira a outroras Uma encruzilhada e pois o senhor vá guardando Aí mire e veja as Veredas Mortas Ali eu tive limite certo Os ruins dias o castigo do tempo todo ficado em que falhamos na Coruja conto malmente A qualquer narração dessas depõe em falso porque o extenso de todo sofrido se escapole da memória E o senhor não esteve lá O senhor não escutou em cada anoitecer a lugugem do canto da mãedalua O senhor não pode estabelecer em sua idéia a minha tristeza quinhoã Até os pássaros consoante os lugares vão sendo muito diferentes Ou são os tempos travessia da gente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 572 Daí despropositou o frio vezmente E quase que todos os companheiros já estavam adoecidos Refiro ao senhor que da bexigabrava não Mas de outras enfermidades Febres Em algum trecho por falta de sinal a gente devia de ter arranchado no sezonático Agora a maior parte dos companheiros tremiam em prazos com a intermitente Remédio que valesse de todo faltava Aquilo afracava no diário os homens perdiam a natureza E um andaço de defluxo que também me baqueou Pior não estive mas eu de mim sei Todos de em antes me davam por normal conforme eu era e agora instantantemente de dia em dia eu ia ficando demudado Com uma raiva espalhada em tudo frouxa nervosia É do fígado me diziam Dormia pouco com esforços Nessas horas da noite em que eu restava acordado minha cabeça estava cheia de idéias Eu pensava como pensava como o quemquem remexe no esterco das vacas Tudo o que me vinha era só entreter um planejado Feito num traslo copiado de sonho eu preparava os distritos daquilo que no começo achei que era fantasia mas que com o seguido dos dias se encorpava e ia tomando conta do meu juízo aquele projeto queria ser e ação E o que era eu ainda não digo mais retardo de relatar Coisa cravada Nela eu pensava ansiado ou em brando como a água João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 573 das beiras do rio finge que volta para trás como a baba do boi cai em tantos sete fios Ah mas aquilo por terrível que fosse eu tinha de levantar mas tinha Em tal já sabia do modo completo o que eu tinha de proceder sistema que tinha aprendido as astúcias muito sérias Como é Aos poucos pouquinhos perguntando em conversa a uns escutando de outros me lembrando de estórias antigo contadas A maneira que quase sem saber o que eu estava fazendo e querendo De em desde muito tempo Custoso pior não sendo no arrevesso Só o que demandava era uma fúria de quente frieza dura nos dentes um rompante de grande coragem Ao que era por tanto negrume e carregume a mais medonha responsabilidade possível ato que só raro mas raro um homem acha o querer para executar nesses sertões todos Vai um dia eu quis Antes o que eu vinha era adiando aquilo adiando Quis assim meio às tantas mesmo desfazendo de esclarecer no exato meus passos e motivos Ao que na moleza eu tateava Digo comecei Tinha preceito O que seja primeiro não se coma não se beba e é se bebe cachaça Um gole que era fogo solto na goela e nos internos Não quebrava o jejum do demo No que eu confiei que estava pronto para ir João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 574 avante no que eram obras de chão e escuridão Engano meu A aguardar até à hora eu carecia de não deixar que nem um fiozinho de idéia comum em mim esvoaçasse Deixei Aí foi um instante Diadorim estava perto de mim vivo como pessoa com aquela forte meiguice que ele denotava Diadorim conversou aceitei a companhia dele Logo larguei meu começo de mão relaxei aqueles propósitos Cacei comida Comi tanto zampei e meu corpo agradecia Diadorim com as pestanas compridas os moços olhos Desde aí naquelas outras coisas não queria pensar e ri pauteei dormi A vida era muito normal mesma e certa bem que estava Tanto o engano Os três dias passados eu reproduzi tudo com uma qualidade de remorsos aquelas decisões Sonhei coisas muito duras O porque era pior agora que eu tomei sombra vergonhosa por ter começado e não ter tido firmeza para levar a acabado E a herança de minhas queixas antigas Conforme eu pensava tanta coisa já passada e que é que eu era Um raso jagunço atirador cachorrando por este sertão O mais que eu podia ter sido capaz de pelejar certo de ser e de fazer e no real eu não conseguia Só a continuação de airagem trastejo trançar o vazio Mas por quê eu pensava Ah então sempre achei por causa de minha costumação e por causa dos outros Os outros João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 575 os companheiros que viviam àtoa desestribados e viviam perto da gente demais desgovernavam todaahora a atenção a certeza de se ser a segurança destemida e o alto destino possível da gente De que é que adiantava se não estatuto de jagunço Ah era Por isso eu tinha grande desprezo de mim e tinha cisma de todo o mundo Apartado De Zé Bebelo mais do que de todos Zé Bebelo doente não estava Doença com ele Sendo o que a um assim não podia permitido só se perdesse de todo o siso A não ser por essa malacafa Ei pois ele estava caipora Logo vi Daí tinha conta a nossa reles perdição aquele atrasamento geral Zé Bebelo para mim tinha gastado as vantagens Zé Bebelo murchava muda na cor não existia mais em viço para desatinos nada que falava era mais de se reproduzir aqueles exageros bonitos e tamanhos rasgos Só dizendo que tínhamos de esperar mesmo ali até que os adoecidos sarassem Assim em impossibilidades Tudo o que acontecia era a másorte Não digo por um Zé Vital que tornava a dar ataque dos de entortar boca escumante e se esbracejar e espernear com madeira de braçosepernas que de quem eram Mas uma jararaca picou o Gregoriano era aquela a rastejo no capim e nas folhas caídas nem chegava a quatro palmos e com poder de acabar e o Gregoriano morreu em pobres horas E João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 576 mais conto o que com um Felisberto se dava Assaz em aparências de saúde mas tendo sido baleado na cabeça fazia já alguns anos uma bala de garrucha a bala de cobre se dizia que estava encravada na vida de seus encaixes e carnes em ponto onde ferramenta de doutor nenhum não alcançava de escrafunchar Aí com o intervalo dos meses e de repente sem razão entendível nenhuma a cara desse Felisberto se esverdeava até os dentes de azinhavres ficava mal Ao que os olhos incha vam tudo fuscado em verde uma mancha só o muito grande O nariz entupia inchado Ele tossia E horror de se ver o metal do esverdeio Daí feito flor de joaninhasilva em muito sol do meiodia para a tarde virava era azul Aquilo era para poder sarar Quando que A tosse dum garrote entisicado Dizia naquelas horas que estava sem visiva nada não enxergava A maior felicidade era ele não saber quem tinha acertado nele aquela bala não carecer de imaginar onde era que tal pessoa estava nem de ódio constante de repensar nela Mas que em desregra a gente se comportava então de parar ali envelhecendo os dias na Coruja como fosse menose mais para aproveitar a carne fresca e desol que na campeação se conseguia as boiadas daqueles sertões Sempre Zé Bebelo não desistia de palavrear a raleza de projetos como fazdeconta A João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 577 mó de moinho que nela não caindo o que moer mói assim mesmo si mesma mói mói As doenças se curassem Minhas dúvidas Aí quem não pegara a maleita padecia por outros modos maldeinchar carregaçãodopeito meiasdores teve até agravado de estupor Adiantemente me desvali O que me coçava que nem se eu tivesse provado lombo de capivara no cio A ser o fígado que me doía mas não me certifiquei apalpar lugar de meu corpo por doença me dava um desalento pior Raimundo Lê cozinhou para mim um chá de urumbeba Era um recurso para aliviar meu achaque e era dado com bondade Isso mesmo foi o que eu disse a Raimundo Lê agradecido É um recurso para aliviar meu achaque e estou vendo que é dado com bondade Alaripe pegou a gabar a virtude mezinheira das mais raízes e folhas Até estas aqui duvidar devem de poder servir em doses de remédio para al gum carecer só que não se sabe ele disse por uma moita rosmunda de freijorge esfiada em tantos espetos e a pavoã por perto crescida Ali naquela hora eu conferi como era usual a gente estimar os companheiros em ajuntado Diadorim que graçasaDeus estava de todo são com os cuidados todos depunha assisado por mim E o Sidurino disse A gente carecia agora era de um vero tiroteio para exercício de não se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 578 minguar A alguma vila sertaneja dessas e se pandegar depois vadiando Ao assaz confirmamos todos estávamos de acordo com o sistema Aprovei também Mas mal acabei de pronunciar eu despertei em mim um estar de susto entendi uma dúvida de arpejo e o que me picou foi uma cobra bibra Aqueles ali eram com efeito os amigos bondosos se ajudando uns aos outros com sinceridade nos obséquios e arriscadas garantias mesmo não refugando a sacrifícios para socorros Mas no fato por alguma ordem política de se dar fogo contra o desamparo de um arraial de outra gente gente como nós com madrinhas e mães eles achavam questão natural que podiam ir salientemente cumprir por obediência saudável e regra de se espreguiçar bem O horror que me deu o senhor me entende Eu tinha medo de homem humano A verdade dessa menção num instante eu achei e completei e quantas outras doideiras assim haviam de estar regendo o costume da vida da gente e eu não era capaz de acertar com elas todas de uma vez Aí para mim que não tenho rebuço em declarar isto ao senhor parecia que era só eu quem tinha responsabilidade séria neste mundo confiança eu mais não depositava em ninguém Ah o que eu agradecia a Deus era ter me emprestado essas vantagens de ser atirador João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 579 por isso me respeitavam Mas eu ficava imaginando se fosse eu tivesse tido sina outra sendo só um coitado morador em povoado qualquer sujeito à instância dessa jagunçada A ver então aqueles que agorinha eram meus companheiros podiam chegar lá façanhosos avançar em mim cometer ruindades Então Mas se isso sendo assim possível como era pois que agora eles podiam estar meus amigos O senhor releve o tanto dizer mas assim foi que eu pensei e pensei ligeiro Ah eu só queria era ter nascido em cidades feito o senhor para poder ser instruído e inteligente E tudo conto como está dito Não gosto de me esquecer de coisa nenhuma Esquecer para mim é quase igual a perder dinheiro Ateado no que pensei eu sem querer disse alto Só o demo E Uém um deles espantado me indagou Aí teimei e inteirei Só o QueNãoFala o QueNãoRi o MuitoSério o cão extremo Eles acharam divertido Algum fez o pelosinal Eu também Mas Diadorim que quando ferrava não largava falou O inimigo é o Hermógenes Disse me olhou Seja fosse para agradar o meu espírito Arte de docemente o que eu não pensei o que eu reproduzi firme João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 580 Que sim certo O inimigo é o Hermógenes Vigiei Diadorim ele levantou a cara Vi como é que olhos podem Diadorim tinha uma luz Reponho em tanto já estava noitinha escurecendo aquela escuridão queria mandar os outros embora O que Diadorim reslumbrava me lembro de heide me lembrar enquanto Deus dura Mas entre nós dois sem ninguém saber nem nós mesmos no exato o que a gente acabava de fazer entestando nos fundos definitivamente por morte era o julgamento do Hermógenes Hermógenes Saranhó Rodrigue Felipes como ele se chamava hoje neste sertão todo o mundo sabe até em escritos no jornal já saiu o nome dele Mas quem me instruiu disso na ocasião foi o Lacrau aquele que à custa de riscos conseguira nos Tucanos se baldear para o meio de nós consoante relatei A ele dei de perguntar ao mau respeito muitas coisas Assaz de contente ele me respondia Se era verdade o que se contava Pois era o Lacrau me confirmou o Hermógenes era positivo pactário Desde todo o tempo se tinha sabido daquilo A terra dele não se tinha noção qual era mas redito que possuía gados e fazendas para lá do Alto Carinhanha e no Rio do Borá e no Rio das Fêmeas nos gerais da Bahia E veja por que sinais se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 581 conhecia em favor dele a arte do CoisaMá com tamanha proteção Ah pois porque ele não sofria nem se cansava nunca perdia nem adoecia e o que queria arrumava tudo sendo que no fim de qualquer aperto sempre sobrevinha para corrigimento alguma revirada no instinto derradeiro E como era a razão desse segredo Ah que essas coisas são por um prazo Assinou a alma em pagamento Ora o que é que vale Que é que a gente faz com alma O Lacrau se ria só por acento Ele me dizia que a natureza do Hermógenes demudava não favorecendo que ele tivesse pena de ninguém nem respeitasse honestidade neste mundo Pra matar ele foi sempre muito pontual Se diz O que é porque o Cujo rebatizou a cabeça dele com sangue certo que foi o de um homem são e justo sangrado sem razão Mas a valência que ele achava era despropositada de enorme medonha mais forte que a de rezabrava muito mais própria do que a de fechamentodecorpo Pactário ele era se avezando por cima de todos Você que não cede nenhum valor à alma você Lacrau era capaz de fechar desse pacto eu indaguei Ah não mano quero lá não navegar por detrás das coisas Coragem minha é para se remedir contra homem levado feito eu não é para marcar a meianoite nessas encruzilhadas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 582 enfrentar a Figura Calado considerei comigo Esse Lacrau tirava a sensatez da insensatez Outras informações ele disse O senhor não é como eu Sem crer cri Às parlendas bobéia O medo que todos acabavam tendo do Hermógenes era que gerava essas estórias o quanto famanava O fato fazia fato Mas no existir dessa gente do sertão então não houvesse por bem dizer um homem mais homem Os outros o resto essas criaturas Só o Hermógenes arrenegado senhoraço destemido Rúim mas inteirado legíti mo para toda certeza a maldade pura Ele de tudo tinha sido capaz até de acabar com Joca Ramiro em tantas alturas Assim eu discerni sorrateiro muito estudantemente Nem birra nem agarre eu não estava acautelando Em tudo reconheci que o Hermógenes era grande destacado daquele porte igual ao pico do serro do Itambé quando se vê quando se vem da banda da MãedosHomens surgido alto nas nuvens nos horizontes Até amigo meu pudesse mesmo ser um homem que havia Mas Diadorim era quem estava certo o acontecimento que se carecia era de terminar com um Diadorim o Reinaldo me lembrei dele como menino com a roupinha nova e o chapéu novo de couro guiando meu ânimo para se aventurar a travessia do Rio do Chico na canoa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 583 afundadeira Esse menino e eu é que éramos destinados para dar cabo do Filho do Demo do Pactário O que era o direito que se tinha O que eu pensei deu de ser assim Mas em tanto com as mudanças e peripécias no afinco de tudo lhe referir ditas conforme digo não toco no nome de Otacília Nela eu queria pensar na ocasião mas mal que cada vez achava mais custoso A ser que se nublando a sustância da recordação a esquecida formosura Assim a nossa conversação de amor lá na Santa Catarina não consistisse mais do que em uma estória alheia escutada de outra pessoa contar Sei que eu queria uma saudade Para isso rezei a todas as minhas Nossas Senhoras Sertanejas Mas rebotei de lado aquelas orações na água fina e no ar dos ventos Elas era feito eu lavrasse falso não me davam nenhuma cortesia Só um vexame de minha extração e da minha pessoa a certeza de que o pai dela nunca havia de conceder o casamento nem tolerar meu remarcado de jagunço entalado na perdição sem honradez costumeira As quantias por paga O senhor entende o que conto assim é resumo pois no estado do viver as coisas vão enqueridas com muita astúcia um dia é todo para a esperança o seguinte para a desconsolação Mas eu achei aí a possibilidade capaz a razão A razão maior era uma O senhor não quer o senhor não está querendo saber João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 584 Aquilo que eu ainda não tinha sido capaz de executar Aquilo para satisfazer honra de minha opinião somente que fosse Ah qualquer dia destes qualquer hora era como eu me aprazava O dum dia duma noite Duma meianoite Só para confirmar constância da minha decisão pois digo acertar aquela fraqueza Ao que alguma espécie aquilo continha Na verdade real do Arrenegado a célebre aparição eu não cria Nem E agora com isto que falei já está ciente o senhor Aquilo o resto Aquilo era eu ir à meianoite na encruzilhada esperar o Maligno fechar o trato fazer o pacto Vejo que o senhor não riu mesmo em tendo vontade Também tive Ah hoje ah tomara eu ter Rir antes da hora engasga E eu me enviava pelo sério Uma precisão eu encarecia aí de sopesar minhas seguidas forças como quem pula a largura dum barranco como quem saca sua faca para relumiar E veio mesmo outra manhã sem assunto eu decidi comigo É hoje Mas dessa vez eu ainda remudei Sem motivo para sim sem motivo para não Delonguei deveras Não é que não foi de medo Nem eu cria que no passo daquilo pudesse se dar alguma visão O que eu tinha por mim só a invenção de coragem Alguma coisice por principiar O que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 585 algum tivesse feito por que era que eu não ia poder E o mais é peta nonada Do Tristonho vir negociar nas trevas de encruzilhadas na morte das horas soforma dalgum bicho de pêlo escuro por entre chorinhos e estados austeros e daí erguido sujeito diante de homem e se representando canhim beiçudo manquinho por cima dos pés de bode balançando chapéu vermelho emplumado medonho como exigia documento com sangue vivo assinado e como se despedia depois no estrondo e forte enxofre Eu não acreditava mesmo quando estremecia Tarreneguei Com isso o tempo mais parava Também fazia mais de mês que a gente estava naquela tapera de retiro cujo a Coruja era que era o nome por um desses impossíveis de Zé Bebelo Ao que mais foi que aconteceu ali Bem passa um bando de papagaios o senhor pensa que eles levaram de sua pessoa alguma diversão Mas os papagaios estão voando já longe e o rumor deles conforme o vento faz que nem estivessem retornando Diadorim esse nunca teve instante desiludido Sempre eu gostava muito dele Só que não falasse por aquele tempo eu quase não abria boca para conversação João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 586 E se deu que chegaram lá dois homens quando não se esperava um deles se vendo que sendo patrão e o outro algum vaqueiro de seu serviço Aí logo se soube era o dono daqueles lugares do retiro do Valado principalmente e ele conforme já disse seô Habão se chamava Ali quando dei fé ele já tinha se apeado estava curvado para o chão mas seguro com a mão esquerda na rédea de seu cavalo Era um homem de boa idade vestido com brim azul encorpado escuro e calçando pretas botas joelhudas Quando levantou o olhar outra vez notei que tinha boa catadura Mas o cavalo esse me entusiasmou era um animal gateado grande com imponência e todo brio de rabejo vasto e mais tarde o senhor verá o que ele era cavalo de cara alta de beiço mole cavalo que debruça bem e que em poço bebia remolhando a testa Ele sabia olhar redormirado a gente com simpatias ou com desprezos e respirava para dentro dos peitos a maior quantidade de ar que desejava por quantas ventas tão largas ele tinha Bem dele depois lhe conto Seô Habão estava conversando com Zé Bebelo Admirei a noção dele que era uma calma muito sensata e firmada junto com um miúdo comportamento E vigiava os traços simples do arredor não perdendo azo de reparar em todas as coisas como era que estavam em que pé Olhares de dono o senhor sabe E João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 587 assim foi que ele declarou a Zé Bebelo que na ocasião estava desprevenido não transportava consigo o dinheiro razoável Mas que se a gente desse a ele o gosto de seguirmos até à verdadeira sua fazendagrande que possuía na vertente do Resplandor dali a umas vinte léguas de lonjura ele havia de fornecer ademais um auxílio em espórtulas E ele falou aquilo com tantas sinceras medidas a gente se capacitando do profundo que o dinheiro para ele devia de ter valor Por aí vi que ele era adiantado e sagaz Porque ema no chapadão é a primeira que ouve e se sacode e corre e mesmo em quando tenha razão Mas com seus modos guerreiros Zé Bebelo abriu um gesto à fidalgamente nem deixando o outro estipular Ah isso não patrício meu amigo he mas absolutamente A gente não é gente da desordem E favor de sobra nós já devemos ao senhorpela pousada em suas terras e pelas cabeças de gado de sua posse que temos carneado por precisão de sustento O homem depressa pronunciou que tinha prazer naquilo que sua boiada toda estava às ordens mas como por uma regra perguntou assim mesmo quantas cabeças mais ou menos a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 588 gente já tinha consumido Assim ele dava balanço inquiria e espiava gerente para tudo como se até do céu e do vento suão homem carecesse de cuidar comercial Eu pensei enquanto aquele homem vivesse a gente sabia que o mundo não se acabava E ele era sertanejo Sobre minha surpresa que era Serras que se vão saindo para destapar outras serras Tem de todas as coisas Vivendo se aprende mas o que se aprende mais é só a fazer outras maiores perguntas Fiquei notando Em como Zé Bebelo aos poucos mais proseava com ensejos de ir mostrando a valia declarada que tinha de jagunço chefe famoso e daí sutil se reconhecia da parte dele um certo desejo de agradar ao outro Por causa que o outro era diferido composto em outra séria qualidade de preocupações E seô Habão que escutava com respeito devagar zinho pegava a fazer perguntas com a idéia na lavoura nos trabalhos perdidos daquele ano por desando das chuvas temporãs e do sol grave e das doenças sucedidas O que me dava a qual inquietação que era de ver conheci que fazendeiromor é sujeito da terra definitivo mas que jagunço não passa de ser homem muito provisório João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 589 E Zé Bebelo mesmo se cansava de falar demonstrado Porque seô Hahão mansoso e manso sem glória nenhuma era um toco de pau que não se destorce fincado sempre para o seu arrumo Ele só entendia de assuntos triviais mas cuidava deles com uma força vagarosa verdadeira de boidecoice E no mais nem ouvia apesar de toda a cortesia de respeito quando se falava em loca Ramiro no Hermógenes e no Ricardão em tiroteios com os praças e na grande tomada por quinhentos cavaleiros da formosa cidade de São Francisco que é a que o Rio olha com melhor amor Daí assim ia sendo que mesmo sem sentir o próprio Zé Bebelo se via principiando a ter de falar com ele em todas as pestes de gado e nas boas leiras de vazante no feijão daseca e nos arrozais cacheando em que os passarinhos de Deus viram em a má praga Com efeito nos intervalos daquela dividida conversa não sei o que Zé Bebelo sentia nem achava Eu digo me disse que um homem assim seô Habão era para se querer longe da gente ou pois então que logo se exigisse e deportasse Do contrário não tinha sincero jeito possível porque ele era de raça tão persistente no diverso da nossa que somente a estância dele em frente já media conferia e reprovava Mas sei lá só por um doente desejo de necessidade de ver bem se aquilo era o certo foi que não sosseguei até poder me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 590 presenciar com ele perto a perto e inventar conversação E nem custoso não me foi porque ele passou ali com a gente muitas horas quase que o dia todo Dei um jeito fazendo como se menos quisesse e vim em fala Seô Habão me olhou com tantã norma desusada que eu senti minhas falsidades E esqueci as palavras primeiras que tinha aprontado para declarar Seô Capitão Habão eu disse e num relance eu conheci que estava também tendo de falar o pr agradar Assim o que dissertei foi que eu sabia do título de capitão que ele usufruía por ter relido o diploma na casa do Valado que de roubos a furtos a gente do Sucruiú tinha devastado E contei a ele que a referida patente eu tinha por cautela apanhado do chão e guardado dentro do oratório por detrás das imagens dos santos Ele nem deu ar de interesse no fato não me agradeceu por isso perguntou nada Disse A bexiga do Sucruiú já terminou Estou ciente dos que morreram foram só dezoito pessoas E o que indagou foi se eu soubesse se tinham feito muitos estragos nos canaviais O que eles deixaram em pé e que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 591 lobo ou mãopelada não roeram sempre háde dar uns carros se move moagem Agora ele conservava os olhos sem olhar num vagar vago circunspecto pensava aqueles capítulos Disse que ia botar os do Sucruiú para o corte da cana e fazeção de rapadura Ao que a rapadura havia de ser para vender para eles do Sucruiú mesmo que depois pagavam com trabalhos redobrados De ouvir ele acrescentar assim com a mesma voz sem calor nenhum deu em mim de repente foram umas nervosias Ao que aqueles do Sucruiú fossem juntasdebois em canga criaturas de toda proteção apartadas Mas eu não tinha raiva desse seô Habão juro ao senhor que ele não era antipático Eu tinha era um começo de certo desgosto que seria meditável Para o ano se Deus quiser boto grandes roças no Valado e aqui O feijão milho muito arroz Ele repisava que o que se podia estender em lavoura lá era um desadoro E espiou para mim com aqueles olhos baçosos aí eu entendi a gana dele que nós Zé Bebelo eu Diadorim e todos os companheiros que a gente pudesse dar os braços para capinar e roçar e colher feito jornaleiros dele Até enjoei Os jagunços destemidos arriscando a vida que nós éramos e aquele seô Habão olhava feito o jacaré no juncal cobiçava a gente para escravos Nem sei se ele sabia que queria Acho que a idéia dele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 592 não arrumava o assunto assim à certa Mas a natureza dele queria precisava de todos como escravos Ainda confesso declarado ao senhor eu não tivesse raiva daquele seô Habão Porque ele era um homem que estava de mim em tão grandes distâncias A raiva não se tem duma jibóia porque jibóia constraga mas não tem veneno E ele cumpria sua sina de reduzir tudo a conteúdo Pudesse economizava até com o sol com a chuva Estava picando fumo no covo da mão garanto ao senhor que não esperdiçava nem o átomo dumas felpas A alegria dele era uma recontada repetição um condescendido vinte trinta carros de milho ah os mil alqueires de arroz Zé Bebelo que esses projetos ouvisse ligeiro logo era capaz de ficar cheio de influência exclamar que assim era assim mesmo para se transformar aquele sertão inteiro do interior com benfeitorias para um bom Governo para esse ôBrasil Em peta que um seô Habão esse não se entusiasmava Era só os carrosdebois carreando a cana E ele dava ordens Ordem que dava havia de ser costumeira e surda muito diferente da de jagunço Cada pessoa cada bicho cada coisa obedecia Nós íamos virando enxadeiros Nós Nunca Mas então eu antes queria ver chegar duma vez os do Hermógenes em galopadas e gritos berrando rifles em todo fogo e ai para se ouvir e sangue João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 593 para quem ver pudesse Aí era que iam saber o que sebaceiro é E por um despique foi que acertei meu correão com as armas e pronunciei Duvidar seô Habão o senhor conhece meu pai fazendeiro Senhor Coronel Selorico Mendes do São Gregório Pensei que ele nem fosse acreditar Mas juro ao senhor ele me olhou com muitos outros olhos Aquele olhar eu agüentei facilitado Seô Habão sacudia em sim a cabeçona surpreendido mas circunstante Dou notícia Dou notícia ele quase que se lastimou Nem sei se ele sabia que meu Padrinho Selorico Mendes fosse como era muito mais fornecido de renome e avultado em posses conforme até por estes sertões do gerais se contava Regozijei devagar mas não regozijei completo Do que destapei que um desses com a estirpe daquele seô Habão tirassem dele tomassem de repente tudo aquilo de que era dono e ele havia de choramingar que nem criancinha sem mãe e tatear toda a vida feito ceguinho catando no chão o cajado feito quem esquenta mãos por cima dum fogo fumacento A misericórdia também eu quase tive Natureza da gente não cabe em nenhuma certeza De ver o homem em pé diante de mim recrescer e tornar a minguar isto tudo no meu juízo nem sei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 594 de que estimas me esquecia e de que outras me lembrava E com pouco no rebaixar do sol ele tornou a amontar no seu cavalo gateado belo e se foi de rompido no rumo torto do Valado Sobre assim aí corria no meio dos nossos um conchavo de animação fato que ao senhor retardei devido que mesmo um contador habilidoso não ajeita de relatar as peripécias todas de uma vez Pois foi que o vaqueiro tal que acompanhava o seô Habão em conversa distraída com algum ou com outro por acasos mencionou que um bando de uns dez homens jagunços também pelo dito e visto andavam parapassando como que à espera de destino em entre o Fazendão Felício que é na beira da estradamor para esse poente todo e o Porto velho da Remeira no rio Paracatu aonde menos dia mais dia todo o mundo acaba vindo chegando Depressa então falaram o assunto ciente para Zé Bebelo que reconheceu pela descrição Chagas de Cristo É eles ei egüei Só pode que pode ser é mesmo o João Goanhá com uns outros E instantâneo expediu para lá dois próprios que tocassem ligeiro como sem senões e voltassem trazendo os comparsas amigos Isso com a certa alegria se ouviu porque eram novidades acontecendo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 595 Afora eu Achado eu estava A resolução final que tomei em consciência O aquilo Ah que agora eu ia Um tinha de estar por mim o Pai do Mal o Tendeiro o Manfarro Quem que não existe o SoltoEu o Ele Agora por quê Tem alguma ocasião diversa das outras Declaro ao senhor hora chegada Eu ia Porque eu estava sabendo se não é que fosse naquela noite nunca mais eu ia receber coragem de decisão Senti esse intimado E tanto mesmo nas idéias pequenas que já me aborrecendo e por causa de tantos fatos que estavam para suceder dia contra dia Eu pensava na vinda de João Goanhá e que a gente carecia de sair de novamente por ali por terras e guerras Pensei naquele seô Habão que nem num transtorno Mais não sei E essas coisas desconvinham em mim em espécie de necessidade A não me apartar àtoa dali das Veredas Mortas Sombra de sombra foi entardecendo fuscava Ao que eu estivesse destemido soberbo Da mão peluda eu firme estava Fazia muito tempo que eu não descabia de tão em arrojo Dou que nunca feito naquela hora e em aquele dia Somente com a alegria é que a gente realiza bem mesmo até as tristes ações Retrocedi de todos De Zé Bebelo demais que ele havia de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 596 desconfiar dizer o que era desordens que cabeça de homem não cogita De Diadorim refugi Ah deixa a agüinha das grotas gruguejar sozinha E no singular de meu coração dou dito o que eu gostava tanto de Diadorim tinha um escrúpulo queria que ele permanecesse longe de toda confusão e perigos Háde essa lembrança branda de minha ação minha Nossa Senhora ainda marque em meu favor Deus me tenha Adjaz o campo então eu subi de lá noitinha hora em que capivara acorda sai de seu escondido e vem pastar Deus é muito contrariado Deus deixou que eu fosse em pé por meu querer como fui Eu caminhei para as VeredasMortas Varei a quissassa depois tinha um lance de capoeira Um caminho cavado Depois era o cerrado mato fui surgindo Ali esvoaçavam as estopas eram uns caborés E eu ia estudando tudo Lugar meu tinha de ser a concruz dos caminhos A noite viesse rodeando Aí friazinha E escolher onde ficar O que tinha de ser melhor debaixo dum pauCardoso que na campina é verde e preto fortemente e de ramos muito voantes conforme o senhor sabe como nenhuma outra árvore nomeada Ainda melhor era a caparosa porque no chão bem debaixo dela é que o Careca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 597 dança e por isso ali fica um círculo de terra limpa em que não cresce nem um fio de capim e que por isso de caparosado judeu nome toma Não havia A encruzilhada era pobre de qualidades dessas Cheguei lá a escuridão deu Talentos de lua escondida Medo Bananeira treme de todo lado Mas eu tirei de dentro de meu tremor as espantosas palavras Eu fosse um homem novo em folha Eu não queria escutar meus dentes Desengasguei outras perguntas Minha opinião não era de ferro Eu podia cortar um cipó e me enforcar pelo pescoço pendu rado morrendo daqueles galhos queméque quem que me impedia Eu não ia temer O que eu estava tendo era o medo que ele estava tendo de mim Quem é que era o Demo o SempreSério o Pai da Mentira Ele não tinha carnes de comida da terra não possuía sangue derramável Viesse viesse vinha para me obedecer Trato Mas trato de iguais com iguais Pri meiro eu era que dava a ordem E ele vinha para supilar o ázimo do espírito da gente Como podia Eu era eu mais mil vezes que estava ali querendo próprio para afrontar relance tão desmarcado Destes meus olhos esbarrarem num ror de nada Esperar era o poder meu do que eu vinha em cata E eu não percebia nada Isto é que mesmo com o escuro e as coisas do escuro tudo devia de parar por lá com o estado e aspecto O João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 598 chirilil dos bichos Arre quem copia o riso da coruja o gritado Arrepia os cabelos das carnes E não conheci arriação nem cansaço Ele tinha que vir se existisse Naquela hora existia Tinha de vir demorão ou jajão Mas em que formas Chão de encruzilhada é posse dele espojeiro de bestas na poeira rolarem De repente com um catrapuz de sinal ou momenteiro com o silêncio das astúcias ele podia se surgir para mim Feito o Bode Preto O Morcegão O Xu E de um lugar tão longe e perto de mim das reformas do Inferno ele já devia de estar me vigiando o cão que me fareja Como é possível se estar desarmado de si entregue ao que outro queira fazer no se desmedir de tapados buracos e tomar pessoa Tudo era para sobrosso para mais medo ah aí é que bate o ponto E por isso eu não tinha licença de não me ser não tinha os descansos do ar A minha idéia não fraquejasse Nem eu pensava em outras noções Nem eu queria me lembrar de pertencências e mesmo de quase tudo quanto fosse diverso eu já estava perdido provisório de lembrança e da primeira razão por qual era que eu tinha comparecido ali E o que era que eu queria Ah acho que não queria mesmo nada de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 599 tanto que eu queria só tudo Uma coisa a coisa esta coisa eu somente queria era ficar sendo E foi assim que as horas reviraram A meianoite vai correndo eu quis falar O cote que o frio me apertava por baixo Tossi até Estou rouco Pouco eu mesmo sozinho conversei Ser forte é parar quieto permanecer Decidi o tempo espiando para cima para esse céu nem o setestrelo nem as trêsmarias já tinham afundado mas o cruzeiro ainda rebrilhava a dois palmos até que descendo A vulto quase encos tada em mim uma árvore mal vestida o surro dos ramos E qualquer coisa que não vinha Não vendo estranha coisa de se ver Ao que não vinha a lufa de um vendaval grande com Ele em trono contravisto sentado de estadela bem no centro O que eu agora queria Ah acho que o que era meu mas que o desconhecido era duvidável Eu queria ser mais do que eu Ah eu queria eu podia Carecia Deus ou o demo sofri um velho pensar Mas como era que eu queria de que jeito que Feito o arfo de meu ar feito tudo que eu então havia de achar melhor morrer duma vez caso que aquilo agora para mim não fosse constituído E em troca eu cedia às arras tudo meu tudo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 600 o mais alma e palma e desalma Deus e o Demo Acabar com o Hermógenes Reduzir aquele homem e isso figurei mais por precisar de firmar o espírito em formalidade de alguma razão Do Hermógenes mesmo existido eu mero me lembrava feito ele fosse para mim uma criancinha moliçosa e mijona em seus despropósitos a formiguinha passeando por diante da gente entre o pé e o pisado Eu muxoxava Espremia pr ali amassava Mas Ele o Dado o Danado sim para se entestar comigo eu mais forte do que o Ele do que o pavor dEle e lamber o chão e aceitar minhas ordens Somei sensatez Cobra antes de picar tem ódio algum Não sobra momento Cobra desfecha desferido dá bote se deu A já que eu estava ali eu queria eu podia eu ali ficava Feito Ele Nós dois e tornopio do pédevento o róró girado mundo a fora no dobar funil de final desses redemoinhos o Diabo na rua no meio do redemunho Ah ri ele não Aheu eu eu Deus ou o Demo para o jagunço Riobaldo A pé firmado Eu esperava eh De dentro do resumo e do mundo em maior aquela crista eu repuxei toda aquela firmeza me revestiu fôlego de fôlego de fôlego da maisforça de maiorcoragem A que vem tirada a mando de setenta e setentas distâncias do profundo mesmo da gente Como era que isso se passou Naquela estação eu nem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 601 sabia maiores havenças eu assim eu espantava qualquer pássaro Sapateei então me assustando de que nem gota de nada sucedia e a hora em vão passava Então ele não queria existir Existisse Viesse Chegasse para o desenlace desse passo Digo direi de verdade eu estava bêbado de meu Ah esta vida às não vezes é terrível bonita horrorosamente esta vida é grande Remordi o ar Lúcifer Lúcifer aí eu bramei desengolindo Não Nada O que a noite tem é o vozeio dum sersó que principia feito grilos e estalinhos e o sapocachorro tão arranhão E que termina num queixume borbulhado tremido de passarinho ninhante malacordado dum totalzinho sono Lúcifer Satanás Só outro silêncio O senhor sabe o que o silêncio é É a gente mesmo demais Ei Lúcifer Satanás dos meus Infernos Voz minha se estragasse em mim tudo era cordas e cobras E foi aí Foi Ele não existe e não apareceu nem respondeu que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 602 é um falso imaginado Mas eu supri que ele tinha me ouvido Me ouviu a conforme a ciência da noite e o envir de espaços que medeia Como que adquirisse minhas palavras todas fechou o arrocho do assunto Ao que eu recebi de volta um adejo um gozo de agarro daí umas tranqüilidadesde pancada Lembrei dum rio que viesse adentro a casa de meu pai Vi as asas Arquei o puxo do poder meu naquele átimo Aí podia ser mais A peta eu querer saldar que isso não é falável As coisas assim a gente mesmo não pega nem abarca Cabem é no brilho da noite Aragem do sagrado Absolutas estrelas Pois ainda tardei esbarrado lá no burro do lugar Mas como que já estivesse rendido de avesso de meus íntimos esvaziado E a noite não descamba Assim parava eu por reles desânimo de me aluir dali com efeito nem firmava em nada minha tenção As quantas horas E aquele frio me reduzindo Porque a noite tinha de fazer para mim um corpo de mãe que mais não fala pronto de parir ou quando o que fala a gente não entende Despresenciei Aquilo foi um buracão de tempo A mor bem na descida avante branquejavam aqueles grossos de ar que lubrinam que corrubiam Dos marimbus das João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 603 VeredasMortas Garoa da madrugada E a bem dizer por um caminho sem expedição saí fui vindo membora Eu tinha tanto friúme assim mesmo me requeimava forte sede Desci de retorno para a beira dos buritis aonde o pano dágua A clarida dezinha das estrelas indicava a raso a lisura daquilo Ali era bebedouro de veados e onças Curvei bebi bebi E a água até nem não estava de frio geral não apalpei nela a mornidão que deviade nos casos de frio real o tempo estar fazendo Meu corpo era que sentia um frio de si frior de dentro e de fora no me rigir Nunca em minha vida eu não tinha sentido a solidão duma friagem assim E se aquele gelado inteiriço não me largasse mais Foi orvalhando O ermo do lugar ia virando visível com o esboço no céu no mermar da dalva As barras quebrando Eu encostei na boca o chão tinha derreado as forças comuns do meu corpo Ao perto dágua piorava aquele desleixo de frio Abracei com uma árvore um pé de breubranco Anta por ali tinha rebentado galhos e estrumado Posso me esconder de mim Soporado fiquei permanecendo O não sei quanto tempo foi que estive Desentendi os cantos com que piam os passarinhos na madrugança Eu jazi mole no chato no folhiço feito se um morcegãocaiaria me tivesse chupado Só levantei de lá João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 604 foi com fome Ao alembrável ainda avistei uma meleira de abelha aratim no baixo do paudevaca o mel sumoso se escorria como uma mina dágua pelo chão no meio das folhas secas e verdes Aquilo se arruinava desperdiçado Senhor senhor o senhor não puxa o céu antes da hora Ao que digo não digo Cheguei no meio dos outros quando o jacaré estava terminando de coar café Tu treme friúra pegou da maleita algum me perguntou Que os carregue eu arrespondi E mesmo com o sol saindo bom cacei um cobertor e uma rede Arte o enfim que nada não tinha me acontecido e eu queria aliviar da recordação ligeiro o desatino daquela noite Assim eu estava desdormido cisado Aí mesmo no momento fui ecogitando que a função do jagunço não tem seu que nem pra que Assaz a gente vive assaz alguma vez raciocina Sonhar só não O demônio é o DosFins o Austero o SeveroMor Aporro Sabendo que de lá em diante jamais nunca eu não sonhei mais nem pudesse aquele jogo fácil de costume que de primeiro antecipava meus dias e noites perdi pago Isso era um sinal Porque os prazos principiavam E o que eu fazia era que eu pensava sem querer o pensar de novidades Tudo agora João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 605 reluzia com clareza ocupando minhas idéias e de tantas coisas passadas diversas eu inventava lembrança de fatos esquecidos em muito remoto neles eu topava outra razão sem nem que fosse por minha própria vontade Até eu não puxava por isso e pensava o qual assim mesmo quase sem esbarrar o todo tempo Nos começos aquilo bem que achei esquipático Mas com o seguinte vim aceitando esse regime por justo normal assim E fui vendo que aos poucos eu entrava numa alegria estrita contente com o viver mas apressadamente A dizer eu não me afoitei logo de crer nessa alegria direito como que o trivial da tristeza pudesse retornar Ah voltou não por oras não voltava Uai tão falante Tatarana Quem te veja me perguntaram o Alaripe perguntou Será que de mim debicavam Eu estava com efeito relatando mediante certos floreados umas passagens de meus tempos e depois descrevendo por diversão os benefícios que os grados do Governo podiam desempenhar remediando o sertão do desdeixo E nesse falar eu repetia os ditos vezeiros de Zé Bebelo em tantos discursos Mas o que eu pelejava era para afetar por imitação de troça os sestros de Zé Bebelo E eles os companheiros não me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 606 entendiam Tanto que foi só entenderem e logo pegaram a rir Aí riam de miséria melhorada Os mestres que está certo amigo o Àlaripe dissesse Deveras está certo manovelho outro o Rasga emBaixo inteirou Aquilo não tolerei Esse vesgueiro RasgaemBaixo o qual entornava de lado a cabeça gastando ar demais o que respirava três vezes forte e fuxicando o nariz numa fungação Desentendi e impliquei Certo de que nesta vida Pois eu nem costumo nunca xingar ninguém de filho daquela ou dessa por receio de que seja mesmo verdade Assim a eles eu disse Tanto enquanto riam apreciando me ouvir eu contei a estória de um rapaz enlouquecido devagar nos Aiáis não longezinho da Veredada Aldeia o qual não queria adormecer por um súbito medo que nele deu de que de alguma noite pudesse não saber mais como se acordar outra vez e no inteiro de seu sono restasse preso Mais me acudiam dessas fantasias E eu relanceei de repente e falei o que era que a gente precisava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 607 Urgentemente é se mandar portador a lugar de farmácia comprar adquirido remédio forte que há para se terminar com a maleita em definitividade Disse e daí todos aprovaram mais Zé Bebelo com aquilo concordou de imediato Portador foi Eu tinha enjôo de toda pasmacez Com Zé Bebelo falei Chefe o que se tem de obrar enviar algum comparsa esperto que cace de entrar para o bando dos Judas para no meio deles observar o serviço que se passa e remeter para a gente as notícias e deixar traço nos lugares Ou que mesmo dê jeito de liquidar mãomente o Hermógenes proporcionando venenos por um exemplo A maluqueira Tatarana isso que você está definindo Zé Bebelo me contestou Maluqueiras é o que não dá certo Mas só é maluqueira depois que se sabe que não acertou eu atalhei curto porque eu naquela hora achava Zé Bebelo inferior e porque que alguém falasse contra por cima das minhas palavras me dava raiva Zé Bebelo retardou em me rever Do fim o dizer João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 608 Um homem para a façanha assim só mesmo se Sol procura é as pontas dos aços eu cortei sem meio medir o razoado Ao tanto que Zé Bebelo completava Só eu ou você mesmo Tatarana Mas a gente somos garrotes remarcados Mas daí me entendendo bem ele fechou assim Riobaldo tu é um homem de estúrdia valia A dado sincero eu senti Ao perante diante de minhas presenças todos tinham mesmo de ser sinceros Só nos olhos das pessoas é que eu procurava o macio interno delas só nos onde os olhos O José Vereda cachimbava sentado perto de seus pertences O Balsamão estava ali junto Esse era maneiras grossas homem de muito sobrecenho Derradeiramente eles estavam muito amigos mesmo porque os dois eram da mesma terra geralistas das campinas Má vontade me veio de dizer eu disse Assunto aí não é capaz que haja Torto torto nasceu morto Olh lá caso se um de vocês tem mulher bonita e nova quando retornarem para casa Isso podia ser razão de desguisado Eu queria rixar Figuro de cientificar ao João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 609 senhor o costume meu nunca tinha sido esse Agora era que eu me espiritava só para arrelias e inconveniências E aí quando uns estavam querendo tirar oração por ser dia de domingo não estive que não falasse Reza é começo de quaresma Os que riram riram Foram deixando de lado aquela mexida igrejeira Apondo em balança que é que isso me representava Tudo eu palpava com os pés nisso eu respingava um tardar Daqui veio que Diadorim mesmo estranhou aqueles meus modos A entender me deu e eu reminiquei com soltura de palavras como é que ia tolerar conselho ou contradição Agravei o branco em preto Mas Diadorim perseverou com os olhos tão abertos sem resguardo eu mesmo um instante no encantado daquilo num vemvem de amor Amor é assim o rato que sai dum buraquinho é um ratazão é um tigre leão Conferindo que nem vergonha eu tive Não ter vergonha como homem é fácil dificultoso e bom era poder não se ter vergonha feito os bichos animais O que não digo o senhor verá como é que Diadorim podia ser assim em minha vida o maior segredo De manhã naquele mesmo dia ele tinha conversado de me dizer João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 610 Riobaldo eu gostava que você pudesse ter nascido parente meu Isso dava para alegria dava para tristeza O parente dele Querer o certo do incerto coisa que significava Parente não é o escolhido é o demarcado Mas por cativa em seu destinozinho de chão é que árvore abre tantos braços Diadorim pertencia a sina diferente Eu vim eu tinha esco lhido para o meu amor o amor de Otacília Otacília quando eu pensava nela era mesmo como estivesse escrevendo uma carta Diadorim esse o senhor sabe como um rio é bravo É toda a vida de longe a longe rolando essas braças águas de outra parte de outra parte de fugida no sertão E uma vez ele mesmo tinha falado Nós dois Riobaldo a gente você e eu Por que é que separação é dever tão forte Aquilo de chumbo era Mas Diadorim pensava em amor mas Diadorim sentia ódio Um nome rodeante Joca Ramiro José Otávio Ramiro Bettancourt Marins o Chefe o pai dele Um mandado de ódio No que eu sabia Não venci as ácidas picuinhas no relembrar Aquele hora destas deve de andar lá por entre o Urucuia e o Pardo O Hermógenes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 611 Ele acinzentou a cara Tremeu aos pingos no centrozinho dos olhos Revi que era o Reinaldo que guerreava delicado e terrível nas batalhas Diadorim semelhasse maninel mas diabrável sempre assim como eu agora eu estava contente de ver Como era que era o único homem que a coragem dele nunca piscava e que por isso foi o único cuja toda coragem às vezes eu invejei Aquilo era de chumbo e ferro E em relance em mais eu já estava carecendo de declarar aos companheiros todos os erros que vínhamos pagando por motivo do ultimamente conforme agora eu ladino deduzia Disse com modos ao próprio Zé Bebelo que isto de mim escutou Sem tenção de descrédito ou ofensa Chefe mas duvido de que bem fizemos em restar todos aqui comprando cura de doenças Mais ajuizado certo não seria se ter remetido meiadúzia de cabras dos sãos que tivessem ido buscar a munição nesse lugar a VirgemMãe e trazer Munição já estava aqui e a gente estava mais garantidos Zé Bebelo em mal amargo ele espinoteou com a cabeça arejou os queijos Desde depressinha me explicou a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 612 maior razão com palavras baixas Porque ele de tudo já soubesse foi então que me disse que o extravio nosso tinha sido mais completo porque a gente tinha vindo em má rota em vez da VirgemMãe para a VirgemdaLaje Eu escutei tei Em outras ocasiões uma notícia dessas era capaz de me perturbar Mas dessa viagem eu achava até divertido Figuro explicando ao senhor desde por aí tudo o que vinha a suceder era engraçado e novo servia para maiores movimen tos Com essas levezas eu seguia a vida Quando então trouxeram reunidos todos os animais estavam ajuntando a cavalhada Regulava subida manhã orçado o sol e eles redondeavam no aprazível tropilha grande pondo poeira dado o alvoroço de muitos cascos Fiz um rebuliz Dou confesso o que foi era de mim que eles estavam espantados Aí porque a cavalaria me viu chegar e se estrepoliu O que é que cavalo sabe Uns deles rinchavam de medo cavalo sempre relincha exagerado Ardido aquele nitrinte riso fininho e como não podiam se escapulir para longe que uns suavam e já escumavam e retremiam que com as orelhas apontavam Assim ficaram mas murchando e obedecendo quando com uma raiva tão repentina eu pulei para o meio deles Barzabu Aquieta cambada que eu gritei Me avaliaram Mesmo pus a mão no João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 613 lombo dum que emagreceu à vista encurtando e baixando a cabeça arrufava a crina conforme terminou o bufo de bufor Notei que os companheiros reparavam a estranhez daquilo dos cavalos e as minhas maneiras Só que se riam formados no costume de jagunços que é de frouxas essas leviandades Barzabu ô gente feito fosse minha certeza o DasTrevas E eu parava rente no meio de todos que de volta aceitavam minha presença esses cavalos Tu sendo peão amansador domador que o Ragásio caçoou comigo Mas eu me virei e já se ouvia outro tropel era aquele seô Habão que chegava Vinha com três homens estroteantes gentinha trabalhosa E o animal dele o gateado formoso deu que veio se esbarrar ante mim Foi o seô Habão saltando em apeio e ele se empinou de dobrar os jarretes e o rabo no chão o cabresto solto da mão do dono chicoteou alto no ar Barzabu xinguei E o cavalão lão lão pôs pernas para adiante e o corpo para trás como onça fêmea no cio mor Me obedecia Isto juro ao senhor é fato de verdade O seô Habão estava ali me desentendeu nos olhos Ele ficou a vermelho Mas eu acho que homem só vendido ao dinheiro e ao ganho às vezes são os que percebem primeiro o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 614 atiço real das coisas com a ligeireza mais sutil Ele não gaguejou Melhor me disse Se este praz ao senhor Se ele praz ao senhor Lhe dou amigavelmente com bom agrado assim como ele está moço ele é seu Não acreditei Reafirmo ao senhor meu coração não pulsou dúvidas Agradeci com meu brio peguei a ponta do cabresto Agora daquela hora era meu o cavalo grande com suas manchas e riscas ah como ele pisava peso no chão e como ocupava tão grande lugar Até passeei um carinho nas faces dele e pela tábuadopescoço a fora Meu o bicho era por posse e assim revestido conforme estava que era com um Bocadinho bom com caçambas de pau Mas sendo que dividido o instante eu já ali pensei por que seria que o seô Habão se engraçava de me presentear de repente com uma prenda dum valor desse eu que não era amigo nem parente dele que não me devia obrigação quase que nem me conhecia Aos que projetos ele engenhava em sua mente que possança minha ele adivinhava A pois fosse Aquele homem me temia Da admiração de meu povo todo dei fé borborinho com que me rodeavam Certo deviam de estar com invejas Fosse E a mãe A primeira coisa que um para ser alto nesta vida tem de aprender é topar firme as invejas dos outros restantes Me rejo me calejo Só por causa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 615 daquele cavalo até eu fui ficando mais e mais enfrentava Não me riram É deveras Animal de riqueza graúdo farto e manteúdo Sorte é isto Merecer e ter Ainda bem que foi bem empregado Só dissessem Disfarcei meu regozijo Disse logo foi a tenção de maiores idéias em desejos segundo a como apeirado aquele eu já queria que arreado à gaúcha com peitoral com pratas em meialua e as peças dos arreios chapeadas de belo metal Ara que assim ouvi Tatarana o nome que ele vai se chamar é mesmo Barzabu algum caçoou de me perguntar A não meu compadre torto Sossega a velha Nome que dou a ele dora em diante conferido é este quem que aprender aprende que é o cavalo SiruizL assim foi que eu respondi sem tempo nenhum para pensamento Montei Ah as coisas influentes da vida chegam assim sorrateiras ladroalmente Pois Zé Bebelo estava aparecendo ali e eu atinei ligeiro com o que não tinha refletido Ao que oferecer e receber um presente daquele naquelas condições era a mesma coisa que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 616 forte ofender Zé Bebelo Um dom de tanto quilate tinha de ser para o Chefe Reconheci aí Mas não tirei para trás Não desapeei É de ver que conforme em mim nesses enquantos eu já devia de estar fitando Zé Bebelo com um certo desprezo Ia haver o que ia haver e eu não me importei Um qualquer chefe de jagunço havia de ter ímpeto de resolver aquilo fatal Aí esperei Teria sido uma tenção dessas de arder a desordem no meio nosso a razão do seô Habão Pensei o dito num ínterim E pensei pontudo em minhas armas Mas Zé Bebelo acabando de saber o acontecido mirou em mim somente poupado risonho Tal te fica bem Professor amontado nesse estampo queremos havemos de te ver garboso guerreando as boas batalhas Em hora foi o que ele disse se me seja que gostou pouco Choveu para o meu arrozal Ah mesmo só inteligência só era que que era aquele homem Desapeei Como por um rasgo para solércias dei o cabresto ao Fafafa Disse Tu desarreia amilha e escova tu trata dele e isso fiz porque o Fafafa que tanto gostava simples de cavalos era o prestante para cuidar dum animal em mesmo que dele não sendo Mas eu tinha dado uma ordem Assim me refiz E o seô João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 617 Habão tinha trazido também boa quantidade de remédio para se tomar pela maleita das pastilhas mais amargosas Todo o mundo recebia Saí uns passos Eu estava dando as costas a Zé Bebelo Ele podia num relance me agredir de morte me atirar por detrás atentei Esbarrei em meu caminhar fiquei assim parado assim mesmo O medo nenhum eu estava forro glorial assegurado quem ia conseguir audácias para atirar em mim As deles haviam de amolecer e retombar com emortecidos braços eu podia dar as costas para todos O que o Drão o demonião me disse disse seria só Olhei para cima pegaram nas nuvens do céu com mãos de azul Aquela firme possança assim permaneci outro tempo acendido Eu leve leve feito de poder correr o mundo ao redor Ao senhor eu conto direto isto como foi num dia tão natural Será que de cousas tão forçosas eu ia poder me esquecer Aquele dia era uma véspera Em tanto o seô Habão jantou com a gente Raimundo Lê repartiu com os carecidos as pastilhas de remédio Diadorim meu amigo estava Zé Bebelo me chamou adeparte me expondo especializado diversas coisas que pretendia reformar de fazer Alaripe conversou comigo E dessa derradeira conversa quero João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 618 referir ao senhor Foi que eu puxando eu desejando saber se falou muito nessas orações de curar a gente contra bala de morte e em breves que fecham o corpo Alaripe então contou uma estória caso sucedido fazia tempos no giro do sertão O qual era o seguinte Um José Misuso uma vez estava ensinando a um Etelvininho a troco de quarenta milréis como é que se faz a arte de um inimigo ter de errar o tiro que é destinado na gente Do que deu o preceito Só o sanguefrio de fé é que se carece pra na horinha se encarar o outro e um grito pensar somente Tu erra esse tiro tu erra tu erra a bala sai vindo de lado não acerta em mim tu erra tu erra filho de uma cã Assim ele ensinou ao Etelvininho o Misuso Mas aí o Etelvininho reclamou Ara pois se é só isso só issozinho pois então eu já sabia mesmo por mim sem ninguém me ensinar já fiz executei assim umas muitas vezes E fez igualzinho conforme o que eu defini indagou o José Misuso duvidando Igualzinho justo Só que no fim eu pensava insultado era seu filho duma cuia o Etelvininho respondeu Ah pois então o José Misuso cortou a questão pois então basta que tu me pague só uns vinte milréis João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 619 A gente muito rimos todos A hora a ser de satisfa alegrias sobejavam Se caçoou se bebeu um cantou o sebastião Mansinho mãe chegaram as voltas da noite Dormi com a cara na lua Acordei A madrugada com luar me lembro acordei com o rumor de cavaleiros que vinham chegando no esquipado e que travavam repentino com áspero estremecimento os cavalos brrruuu Calculei uns dez Ao que eram Levantei pulando de minha rede quem podiam esses ser Todos os companheiros nos rifles e eu não tinha escutado aviso de sentinelas Madrugada essa boa claridade Luar que só o sertão viu Vim dele Aí é o nosso João Goanhá com os cabras disse Diadorim que tinha a rede dele armada da minha a uns três passos Assim era João Goanhá o Paspe Drumõo o compadre Ciril o Bobadela o Isidoro Tornar a encontrar companheiros desses aí é que se põe significado na vida se encompridando se encurtando O João Goanhá gordo forte barbudo Era a dele uma barba muito fechada muito preta Veio do luar chegou bom Todo o mundo falava a gente se abraçava Com pouco o fogo se acendia para o café para algum almoço Enquanto isso João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 620 Zé Bebelo formado em pé o mais rompante que pudesse pedia notícias por interrogação Antes as verdades essas as coisas comuns conforme foi que se passaram Mais não sei Mesmo não tinha botado idéia na cabeça acabando de despertar de meu sono Diadorim era o que estava alegrinho especial só se ele tinha bebido Diadorim de meu amor põe o pezinho em cera branca que eu rastreio a flor de tuas passadas Me recordo de que as balas em meu revólver verifiquei Eu queria a muita movimentação horas novas Como os rios não dormem O rio não quer ir a nenhuma parte ele quer é chegar a ser mais grosso mais fundo O Urucuia é um rio o rio das montanhas Rebebe o encharcar dos brejos verde a verde veredas marimbus a sombra separada dos buritizais ele Recolhe e semeia areias Fui cativo para ser solto Um buraquinho dágua mata minha sede uma palmeira só me dá minha casa Casinha que eu fiz pequena ô gente para o sereno remolhar O Urucuia o chapadão derredor dele Estas árvores essas árvores Conversa Zé Bebelo conversa com as marrecas chocas no meio das varas do juncal Mesmo na hora em que eu for morrer eu sei que o Urucuia está sempre ele corre O que eu fui o que eu fui E esses velhos chapadões dele dos Couros de Antônio Pereira dos Arrepiados do Couto João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 621 do Arrenegado Um homem é escuro no meio do luar da lua lasca de breu Dentro de mim eu tenho um sono e mas fora de mim eu vejo um sonho um sonho eu tive O fim de fomes Ei boto machado em toda árvore Eu caminhei para diante Em ô gente eu dei mais um passo à frente tudo agora era possível Não era de propósito o senhor não julgue Nem não fizeram espantos Não exclamei não pronunciei só disse Ah agora quem aqui é que é o Chefe Só perguntei Sei por quê Só por saber e quemsabe por excessos daquela minha mania derradeira de me comparecer com as doidivãs bestagens parlapatal De forma nenhuma eu não queria afrontar ninguém Até com preguiça eu estava A verdade porém que um tinha de ser o chefe Zé Bebelo ou João Goanhá Um para o outro olharam Agora quem é que é o Chefe Somente eu estava por cima da surpresa deles Zé Bebelo o pensante soberbo e opinioso João Goanhá duro homem tão simples vindo por meio de dificuldades e distâncias desde a outra banda do rio caçar a lei da companhia da gente como um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 622 costume necessário que sem isso ele não conseguia direito se pertencer Com meus olhos tomei conta Quem é que é o Chefe repeti Me olharam Saber não soubessem não podiam como responder porque nenhum deles não era Zé Bebelo ainda fosse Esse pardejou E o João Goanhá eu vi aquele mestre quieto se mexer em quente e frio diante das minhas vistasnem não tinha ossos tudo nele foi encurtando medidagesto fala olhar e estar Nenhum deles E eu ah eu era quem menos sabia porque o Chefe já era eu O Chefe era eu mesmo Olharam para mim Quem é qu E Ao que o pessoal os companheiros todos convocados fechavam roda Eu felão Não me entendessem Foi que alguns dos homens rosnaram E foi esse RasgaemBaixo o principal deles esse pelo que era pelo visto oculto inimigo meu que buliu em suas armas Sanha aos crespos luziu faca no agolpe Meu revólver falou bala justa o RasgaemBaixo se fartou no chão semeado já sem ação e sem alma nenhuma dentro E aí o irmão dele José Félix ele tremeu muito lateral livrou o ar de sua pessoa outro tiro eu também tinha dado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 623 é o Chefe Ato de todos quietos permanecidos esbarrados com tanta singelez de choques Ah eu meu nome era Tatarana E Diadorim jaguarado mais em pé que um outro qualquer se asava e abava de repor o medo mor Ele veio marechal Se viram se sentiram decerto que acertaram pelos altos de nós dois e porque logo aí Alaripe o Acauã o Fafafa o Nélson Sidurino Compadre Ciril PacamãdePresas e outros e outros já formavam do lado da gente Tenho de chefiar eu queria eu pensava Isso eu exigia Assim João Goanhá se riu para mim Zé Bebelo sacudiu uns ombros Ali era a hora E eu frentemente endireitei com Zé Bebelo com ele de barba a barba Zé Bebelo não conhecia medo Ao então era um sangue ou sangues o etcétera que fosse Eu não aceitava muita parlagem Quem é que é o Chefe eu quis Se quis foi com muita serenidade Zé Bebelo retardou Eu social encostado Conheci que ele tardava e pensava para ver o que fazer mais vagarosamente Quem éque eu brando apertei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 624 Eu sabia do respirar de todos Durasse mais aquilo eu já largava por me cansar por estar achando cacete Minha vontade estroina de paliar Seu Zé Bebelo velho tu me desculpe eu calei Zé Bebelo se encolheu um pouco só Aí ele não tremeu no sucinto dos olhos A rente Riobaldo Tu o chefe chefe é tu o Chefe fica sendo Ao que vale ele dissezinho fortemente mesmo mudado em festivo glo riando um fervor Mas eu temi que ele chorasse Antes em rosto de homem e de jagunço eu nunca tinha avistado tantas tristezas Sendo vós companheiros eu falei para em volta Tantos tantos homens os nos rifles e eles me aceitavam Assim aprovaram O Chefe Riobaldo Aos gritos todos aprovavam Rejuravam a pois A esses resultados No que eram com solenidade sinceridade Tudo dado em paz Só aqueles dois amaldiçoados irmãos baldeados mortos na ponta de unha Ali enterrar aqueles dois seria faltar a meu respeito Amém Tudo me dado O senhor mire e veja o senhor a verdade instantânea dum fato a gente vai departir e ninguém crê Acham que é um falso narrar Agora eu eu sei como tudo é as coisas que acontecem é porque já estavam ficadas prontas noutro ar no sabugo da unha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 625 e com efeito tudo é grátis quando sucede no reles do momento Assim Arte que virei chefe Assim exato é que foi juro ao senhor Outros é que contam de outra maneira Ao fim depois que João Goanhá me aprovou revi os aspectos de Zé Bebelo Acertar com ele O senhor agora eu quis dizer Não Riobaldo ele me atalhou Tenho de tanger urubu no membora Sei não ser terceiro nem segundo Minha fama de jagunço deu o final Daí riu e disse mesmo cortês Mas você é o outro homem você revira o sertão Tu é terrível que nem um urutu branco O nome que ele me dava era um nome rebatismo desse nome meu Os todos ouviram romperam em risos Contanto que logo gritavam entusiasmados O UrutuBranco Ei o UrutuBranco Assim era que na rudeza deles eles tinham muita compreensão Até porque mais não seria que eu chefe agora ainda me viessem e dissessem Riobaldo somente ou aquele apelido apodo conome que era de Tatarana Achei achava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 626 Vai e eu por um raio de momento eu tinha concebido que carecesse de tirar a vida a Zé Bebelo por maior sossego de meu reger no futuramente e agora eu estava quase triste com pena de ver que ele iasembora O divertido havia de ser sim isso de levar Zé Bebelo comigo de sotenente através desse através Ah homem como aquele não se matava Homem como aquele pouco obedecia A ele mandei fornecer mais um cavalo e um cargueiro com mantimento coisas munição melhor Dali a hora mesmo ele pegou caminho Para o sul Vi quando ele se despediu e tocou com o bom respeito de todos e fiquei me alembrando daquela vez de quando ele tinha seguido sozinho para Goiás expulso por julgamento deste sertão Tudo estava sendo repetido Mas da vez dessa o julgamento era ele ele mesmo quem tinha dado e baixado Zé Bebelo ia sembora conseguintemente Agora o tempo de todas as doideiras estava bicho livre para principiar De seguida parado persisti para um prazo de fôlego Aí vendo que o pessoal meu já me obedecia prático mesmo antes da hora Como que corriam e mexiam se aprontando para saída sacudiam no ar os baixeiros selavam os cavalos Tantos e tantos eu sabia o nome e o defeito maior de cada um daqueles homens e tantos seus braços e tantos rifles e coragens Aí eu mandava Aí João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 627 eu estava livre a limpo de meus tristes passados Aí eu desfechava Sinal como que me dessem essas terras todas dos Gerais pertencentes Por perigos que por diante estivessem eu aumentava os quilates de meu regozijo À fé quando eu mandasse uma coisa ah então tinha de se cumprir de qualquer jeito Tenho resoluto que e montei com a vontade muito confiada Dali a gente tinha logo de sair segundo ã regra exata Estradeei Nem olhei para trás Os outros me viessem Cantava o trincaferro Uma arara chiou cheio levou bala quase Atrás de mim os cabras deram vivas Eles vinham em vinham Eu contava prazido o tôo dos cascos Dei galope No Valado chegamos conforme íamos retornar por assim De galope como está dito Gente gentinha nos rodeou roceiros em seu serviço Aquele seô Habão incluso muito estarrecido Esbarramos parada O que eu carecia era de uns instantes sempre meus para estribar meu uso Era primeira viagem saída de nova jagunçagem e as extraordinárias cousas para que todos admirassem e vissem eu estava em precisão de fazer E vi um itambé de pedra muito lisa subi lá Mandei os homens ficassem embaixo eles outros esperavam Minha influência de afã alegria em artes não padecesse de se estorvar em monte de pessoas nenhumas De despiço olhei eles nem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 628 careciam de ter nomes por um querer meu para viver e para morrer era que valiam Tinham me dado em mão o brinquedo do mundo Fiquei lá em cima um tempo Quando desci umas coisas eu resolvia Aonde se ia em cata do Hermógenes Ah não Antes primeiro para o Chapadão do Urucuia onde tanto boi berra Ao que me seguissem Ah mas assim não O que foi o que eu pensei mas que não disse Assim não E veio perante minha presença o seô Habão mais antecipado que todos macio atarefadinho ele já me sussurrava Homem esse Ele queria me oferecer dinheiro com seus meios queria me facilitar Ah não de mim ele é que tinha de receber tinha de tomar Agarrei o cordão de meu pescoço rebentei com todas aquelas verônicas As medalhas umas delas que eu tinha de em desde menino Fiz gesto entreguei na mão dele O senhor havia de gostar de ver o ar daquele seô Habão forçado de aceitar pagamento do que nem eram correntias moedas de tesouro do rei mas costumeiras prendas de louvor aos santos Ele estava em todos tremores conforme esses homens que não têm vergonha de mostrar medo em desde que possam pedir à gente perdão com muita seriedade Digo ao senhor ele beijou minha mão Ele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 629 devia de estar imaginando que eu tinha perdido o siso Assim mesmo me agradeceu bem e guardou com muito apreço as medalhas na algibeira até porque não podia obrar de outra forma Matar aquele homem não adiantava Para o começo de concerto deste mundo que é que adiantava Só se a gente tomasse tudo o que era dele e fosse largar o cujo bem longe de lá em estranhas terras adonde ele fosse pretaebrancamente desconhecido de todos então ele havia de ter de pedir esmolas Isso naquela hora pensei Ah não E nem não adiantava mendigo mesmo duro tristonho ele havia ainda de obedecer de só ajuntar ajuntar até à data de morrer de migas a migalhas As verônicas e os breves ele vendesse ou avarasse para os infernos Comigo só o escapulário ainda ficou Aquele escapulário dito que conservava pétalas de flor em pedaço de toalha de altar recosturadas e que consagrava um pedido de benção à minha Nossa Senhora da Abadia Que mesmo mais tarde tornei a pendurar num fio oleado e retrançado Esse eu fora não botava ah agora podia desdeixar não inda que ele me reprovasse em hora e hora tantos meus malfeitos indas que assim requeimasse a pele de minhas carnes que debaixo dele meu peito todo torcesse que nem pedaço quebrado de má cobra João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 630 E num reverter de mão eu já estava pensando o que eu ia fazer com ele com o seô Habão por alguma alvíssara de mercê Porque em fato ele merecia e eu a ele devia Porque ele tinha vesprado em reconhecer meu poder antes de outro qualquer e mesmo um barão de presente dele tinha sido e era aquele meu formoso cavalo Siruiz em qual eu estava amontado Aí me lembrei de uma coisa e isso era próprio encargo para ele cabendo em sua marca de qualidade Me lembrei da pedra a pedra de valor tão bonita que do Araçuaí eu tinha trazido fazia tanto tempo Tirei o embrulhinho da bolsa do cinto Apresentei a ele Eu falei Seô Habão o senhor escute o senhor cumpra pega este mimo zelando com os dedos todos de suas mãos já e já o senhor viaje num bom animal siga rumo dos Buritis Altos cabeceira de vereda para a Fazenda Santa Catarina E mais disse que era para entregar de minha parte à moça da casa que Otacília se chamava a qual era minha sempre noiva Mas não dando razão de nomear minha pessoa pelos altos títulos nem citando chefia de jagunços Mas somente prezar que eu era Riobaldo com meus homens trazendo glória e justiça em território dos Gerais de todos esses grandes rios que do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 631 poente para o nascente vão desde que o mundo mundo é enquanto Deus dura Ah não em Deus não falasse Seô Habão pôs atenção perturbado mas sisudo ele cogitava O que ele dizia carecia de ser repetido esfiando o as sunto nas pontas dos dedos tostões Ser rico é um diverso dissabor Que um pudesse se acautelar assim me atanazava Quem era O que por primeira vez reparei que ele tinha as orelhas muito grandes tão grandonas até sem querer eu tive de experimentar com a mão o tamanho medido das minhas Melhor trazer esse sujeito comigo perto mais perto para poder vigiar por todas as partes Melhor não o melhor seria desmanchar a presença dele em definitivas distâncias Não vou comer teus peitos teu nariz teus duros olhos moles eu pensei Mas ele também tinha alguma espécie de chefia Eu virei a cara andei três passos dando com Diadorim O que eu tolero e desentendo esse homem que é porque dele não se consegue ter raiva nem ter pena falei Mas vi um adejo sombrio no meu amigo condenado que era de tristeza que não quer ceder suas lágrimas O quanto por causa da pedra de topázio eu reconheci Eu não tinha tido dó de Diadorim Deistá tem tempo Diadorim tem tempo pensei a meio Da amizade de Diadorim eu possuía completa certeza E mais João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 632 não me amofinei De manhã cedo o senhor esbarra para pensar que a noite já vem vindo O amor de alguém à gente muito forte espanta e rebate como coisa sempre inesperada E eu estava naquelas impaciências Trasmente que em Otacília mesmo verdadeiro eu quase nem cuidava de sentir de ter saudade Otacília estava sendo uma incerteza assunto longe começado Visse o que desse viesse O seô Habão ia levava a pedra de topázio a vida do mundo ia vivendo coração dá tantas mudanças meus dízimos eu pagava O pássaro que se separa de outro vai voando adeus o tempo todo Ah não eu não rio riachos não me amofinava Aquela tristeza de Diadorim eu não aceitei nem ceitil não recebi Ingratidão para o maistarde Mas o seô Habão não queria ter terminado negócio que carecia ainda de algum ponto Dei licença Ele perguntou sonseante se eu não prazia de enviar por ele algum recado também para o senhor meu pai Selorico Mendes dono do São Gregório e de outras boas e ricas fazendas Eu achei graça acenei que sim disse que fosse reproduzisse a minha saudação E então foi que o seô Habão levantou a cara aquietado até mediante sorriso De sorte que para corrigir em siso a tranqüilidade daquilo eu determinei O senhor vá logo logo de rota abatida E de lá não quero nenhuma resposta João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 633 enquanto ri de ver como ele me obedecia expresso sem necessidade de caráter Onde que mal dele livre me vi gritei despachado pelos demais Dand ordens A rodar por aí me trazerem os homens Ques homens Os todos que fossem e houvesse Quem tiver instrumento a toque Quem gostar de dançar arre melhor Pr apreparo trazer as mulheres também Com que as músicas de lá lá lá Tudo tinha de semelhar um social Ao pois quem era que ordenava se prazia e mandava Eu senhor eu por meu renome o UrutuBranco Ah não Festa Eu já estava resolvendo o contrário Mas reunir aquela porção de homens e formar todos de guerreiros A com a gente a que viessem Aquilo valia Os outros não falaram decerto não acharam ou acharam Ou quanto mais que eles os meus só mesmo o mover por me agradar só era o que de si desejavam e aquela minha lei era divertida Saíram espalhados sendo em caçar em boa alarida Mas trouxeram Me trouxeram rebanhal os todos possíveis Do Sucruiú uns pouquinhos alguns com as caras João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 634 secando os brotes das bexigas más marcas feito mijo na areia outros um ou outro de semblante liso fresco esses escapos de não terem tido a doença Os que fingiam não me temer achavam mais favorável querer ter vindo por próprio conselho mal abriam boca em risos Dei que pronto todos provassem gol dalguma cachaça Aquela gente depunha que tão aturada de todas as pobrezas e desgraças Haviam de vir junto à mansa força Isso era perversidades Mais longe de mimque eu pretendia era retirar aqueles todos destorcidos de suas misérias Até que fiz Ah mas mire e veja a quantidade maior eram aqueles catrumanos os do Pubo Eles em vozes Ou o senhor não pode refigurar que estúrdia confusão calada eles paravam acho que de ser chamados e reunidos eles estavam alertando em si o sair de um pavor Ao depois quando dei brado queriam se alinhalinhar mesmo solertes como se por soldados reconhecidos Seriam eles assim bons no ruim para guerra serviam para meter em formatura Tanto todo o mundo achava graça meus jagunços queriam pagode Ah os catrumanos iam de ser de refrescos Iam que nem onças comedeiras Não entendiam nada assim atarantados com temor ouviam minha decisão Filhosdamãe eu declarei Tive de repente fé naqueles desgraçados com suas desvalidas armas de toda João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 635 antiguidade e cabaças na bandola e panelas de pólvora escura e fedor de fumaça ceguenta Adivinhei a valia de maldade deles soube que eles me respeitavam entendiam em mim uma visão gloriã Não queriam ter cobiças Homens sujos de suas peles e trabalhos Eles não arcavam feito criminosos O mundo meus filhos é longe daqui eu defini Se queriam também vir perguntei Ao vavar o que era um dizer desseguido conjunto em que mal se entendia nada Ah esses melhor se sabiam se mudos sendo Dei brado Indaguei dum Tomou um esforço de beira de coragem para me responder Esse aquele era o do chapéu encartuchado rapaz moço Respondeu que Sinfrônio se chamava e indicou outro que era o pai Aquele outro o pai era um homem sem pescoço Respondeu que se chamava Assunciano E indicou outro Mais adiante não deixei Deixasse iam de dedo em dedo me passando para o daquelas pernas de fora que Osirino era as pernas forradas de lama seca ou para o que coçava suas costas em pau de árvore feito um bezerro ou um porco Visli a sorrateira malícia nos jeitos deles E mais o do jegue no jegue amontado permanecendo de perfil aquele bronzeado jumento que tinha o ho mam por nome Teofrásio e só não desamontava do jegue por ordem minha que em antes eu tinhadado Ele me disse Dou louvor Em tudo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 636 chefe vos obedecemos ele disse e de lá se virou o focinho branco do jumento O homem Teofrásio limpou a goela mas com respeito Assim vós prazido chefe Pedimos vossa benção E eu concedi que o Teofrásio meio chefim deles o do jegue que o jegue pudesse trazer Daí houve porém Que um o sem pescoço baixinho descoroçoou na desengraça observou Quem é que vai tomar conta das famílias da gente nesse mundão de ausências Quem cuida das rocinhas nossas em trabalhar pra o sustento das pessoas de obrigação O que falou tinha falado por todos Pra os roçados Pra os plantios E mesmo um outro de mãos postas como que para rezar choramingou Dou de comer à mea mulé e treis fio em debaixo de meu sapé e era um homem alto espingolado com todos os remendos em todos os molambos Como é a tua graça seô indaguei Se chamava Pedro Comprido Mas aí eu já tinha pensado Pois vamos As famílias capinam e colhem completo enquanto vocês estiverem em glórias por fora guerreando para impor paz inteira neste sertão e para obrar vingança pela morte atraiçoada de loca Ramiro eu determinei I j Maria é ver nós de Cristo jagunceando escutei dum Daí declarei mais Vamos sair pelo mundo tomando dinheiro dos que têm e objetos e as vantagens de toda João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 637 valia E só vamos sossegar quando cada um já estiver farto e já tiver recebido umas duas ou três mulheres moças sacudidas pra o renovame de sua cama ou rede Ah ô gente oh e eles que todos quase todos geral reluzindo aprovação Mesmo os meus homens Fiz gesto com meu contentamento Queria o que só me faltou que foi que o jumento do homem zurrasse Eu ia transformar os regimentos desses foros Convoquei todos nas armas E o Borromeu E o Borromeu ainda perguntavam Quem era que esse Borromeu Mandei vir Um cego ele era muito amarelo escreiento transformado Responde tu velho Borromeu que é que tu faz Estou no meu canto cá meu senhor Estou me acostumando com o momentozinho de minha morte Cego por ser cego ele tinha direito de não tremer Tu é devoto Pecador pior Pecador sem o que fazer pede preto pede padre Apontou com o dedo Levei os olhos Não vi nada É assim a esmo que os cegos fazem Aquele era o bom rumo do Norte Ah meu senhor eu sei é pedir muitas esmolas Pois então que viesse também o Borromeu viesse Mandei que montassem o dito num cavalo manso que da banda da minha mão direita devia sempre de se emparelhar Alguns riram E pelo que riram de certo não sabiam que um desses viajando parceiro com a gente adivinha a vinda das João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 638 pragas que outros rogam e vão defastando o mau poder delas conforme aprendi dos antigos E por nada mais me lembrei de repentinamente do menino pretozinho que na casa do Valado a gente tinha surpreendido que furtando num saco o que achava fácil de carregar E tiveram de campear esse menino Ele estava amoitado o tempo todo com a boca no chão no meio do mandiocal Quando foi pego xingava mordia e perneava Ele se chamava Guirigó com olhares demais muito espertos Guirigó tu vem vestido ou nu Como que não vinha Aprontaram um cavalo para ele só que devia de se emparelhar com o meu da banda de minha mão esquerda Háde há meu povo Todos tocamos Cavalos que chegassem bastados tinha não mas por diante animais alheios a gente topasse para se assenhorear a laço e mãos Os muitos vinham a pé aqueles catrumanos ainda meio vigiados Ver o seguinte Eu queria esses campos Pernoitamos com marcha de dez léguas assim mesmo Terçando um total de projetos com os entusiasmos no topo da cabeça minha poder não pude dormir mesmo com o cansaço em que estava na noite não preguei os olhos Mas conversei surgidamente com os que paravam espalhados de sentinelas e mandei acender foguinhos de assar mandioca e fogueiras de iluminar Ah a gente ia encher os espaços deste mundo adiante João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 639 Aonde é que jagunço ia À vã à vã Tinha minha vontade de estar em toda a parte Mas quadrando que primeiro mais para o norte para o Chapadão do Urucuia aonde tanto boi berra Que eu recordava de ver o rio meu beber em beira dele uma demão dágua Ah e essas estradas de chão branco que dão mais assunto à luz das estrelas Eu pensei eu quis E o Hermógenes os Judas Ara inimigo o senhor dê um passo em que rumo qualquer lá em sua frente o senhor encontra o mau Eu não tinha todo tempo Safra em cima eu em minha lordeza Mesmo deitado eu sentia que estava caminhando galopando Quando a madrugada bateu as asas eu já estava abotoando a espora Outra vez eu digo tem botim novo flote e chinelo velho redomão O dia ia ser lindo de leveza pelas beiradas do céu Forramos o estômago e saímos deslizando com a manhã com o merujo do orvalho O que eu via altos de mata e além As coisas todas eu pensava e nada nenhuma não me sombreasse Algum medo não palpitava frio por detrás de meus olhos e por via disso eu de todos era o chefe mesmo em silêncio singular Conforme assim chegamos no PédaPedra fazenda da Barbaranha Em perto de sete léguas E o que aí foi lhe conto Ao entrementes eu achei graça em que o Alaripe João Goanhá Marcelino Pampa João Concliz e mesmo Diadorim e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 640 outros mais velhos não carecessem de formar conselho As lérias Meu direito era contrariar as regras todas do chefe que antes fora para mim só mesmo o que servia era à solta a lei da acostumando Aí não viessem me dizer que a gente estava só com três dias de farinha e carneseca Toleima Todo boi enquanto vivo pasta Razão e feijão todo dia dão de renovar A coragem que não faltasse para engolir a polpa de buriti e carnes de rês brava Às léguas eu indo eles me seguindo Tu está vendo o tamanho do mundo Guirigó Que é que tu acha de maior boniteza Assim eu perguntei àquele sacizinho de duas pernas que preto reluzente afora os graúdos olhos brancos me remedando da banda de minha mão canhota sempre viesse encarapitado sobre seu alto cavalo E ele a cuja senvergonhice De todas as coisas boniteza melhor é dessa faquinha enterçada de metal que o senhor travessa na cintura Segundo tinha botado desejo no meu punhal puxável de cabo de prata o dioguim A pois no primeiro fogo que se der se tu não abrir boca e choro bué por medos a dita faca tu ganha presenteada eu prometi A falta de mantimentos por isso eu ia encurtar rédeas travar o passo A toleima A outra receita que descumpri era a de repartir o pessoal em turmas Cautelas Que não Eu fosse ter cautela pegava medo mesmo só no começar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 641 Coragem é matéria doutras praxes Aí o crer nos impossíveis só Seo Borromeu está gostando destes Gerais hem seo Borromeu ao cego da minha outra banda perguntei por desfrute Ah Chefe é sempre amanhecendo manhã e aqui a gente merece tudo vento que não vareia de ser Mas vento que vem dos amáveis ele me respondeu O que não vejo não devo não consumo continuou respondendo Ele gostava de conversar mas também preparava no silêncio Ia sacolejando em cima da sela do animal noutra quietação diversa Podia dar conselho Arte de jagunço meu Chefe Isto é ofício bonito para o vivo O ditado desses só somente para rir eu aceitava Mas dividir minha gente por oras eu detestava de obrar Por causa que o que me prazia mais era contemplar o volume profundo da ida deles de esquadrão De a de lado Todos eles passarem tropeando nós todos o rumor constante dos cascos Cavalo cavalaria Cortejo que fazia suas voltas pelos ermos pelos ocos pelos altos a forma duma mistura de gente amontada uma continuação grande solevando para adiante o aprumo de meus homens os chapéus deles quase todos bem engraxados com sebo de boi e nata de leite em ponta os canos dos rifles de guerra a tiracol Com qual seguimento Só o que esperava a gente era o pouso para jantar passeata para a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 642 estreladatarde Mas do que um falava outro mal ouvia e ria do que esses se riam outros ainda falavam Prosapeavam Me prazia Me prazia o ranger o couro das jerebas aquele chio de carne em asso A poeira avermelhava e branqueava poeiras que punham o vento mais áspero Uns homens em cavalos e armas Quem visse fuga fugia corria tinham de temer vigiando com seus olhos escondidos no mato em beiras de estrada Até os bichos do cerradão que escutam o começo de tudo de seu longe e de seu perto e logo sabem esperar ocultos no rareamento assim não se viam nenhuns não se achavam os pássaros sempre já tinham revoado Ah não eu bem que tinha nascido para jagunço Aquilo para mim que se passou e ainda hoje é forte como por um futuro meu Eu estou galhardo Naquilo eu tinha amanhecido Comi carne de onça Esquipando eu queria que a gente entrasse daquele jeito era em alguma grande verdadeira cidade Só às vezes em repente de receio eu ainda olhei em vão com as presenças de Zé Bebelo me cismava Se o que sei Com um arranco de freio raciocinado Mas dando de rédeas sem descanso derrubei dos ombros aquele meu costume Zé Bebelo terminara Só os meus homens Escutava olhava e eram aqueles que muitas estrepolias ainda iam decerto agir e muita má gente matar Aos dez e dezes digo afirmo que me lembro de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 643 todos Esses passam e transpassam na minha recordação vou destacando a contagem Nem é por me gabar de retentiva cabedora nome por nome mas para alimpar o seguimento de tudo o mais que vou narrar ao senhor nesta minha conversa nossa de relato O senhor me entende A mesmice dos cabras jagunços no contemplar a cavalhada no passo os animais dando dos quartos comuns assim que não fazem penachos que não tiram arredondamentos da magreza Os filhos nascidos de distritos de lugares diversos mas agora debaixo da minha estima completa dever de coração enérgico Até os capiaus e os catrumanos copiavam o comportamento uns amontados outros restantes apressados mesmo a pé e iam pegando o exato Até o catrumano Teofrásio em seu jegue que como prestável jumento cumpria bem seu ir desde que tinha companhia de outros animais E o Guirigó e o Borromeu eu meando os dois ao alcance de qualquer minha mão Sempre mesmo como sempre Mas um era Diadorim montado à baiana gineta com estribos curtos e rédea muito ponderada bridando bem em seu argel travado às upas cavalo bulideiro cavalo de olhos pretos conforme como a noite Diadorim que era o Menino que era o Reinaldo E eu Eu Nos estribos de ferro freio de ferro silha forte e silha mestra e o par de coldres Assaz então cantaram João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 644 Olererê Baiana eu ia e não vou mais Eu faço que vou lá dentro oh Baiana e volto do meio pra trás Ao demais eu ouvi soturno sorridente Ora vez que desse jeito fomos entortando entre as duas chapadas encalço da estrada do rio e se chegou na fazenda cercã que era por lá a Barbaranha dita em um lugar redondo e simples no PédaPedra O que eu já disse ao senhor respeitante Mas acrescento que o dono no atual era um seo Ornelas Josafá Jumiro Ornelas por nome todo De uns três dias foi o São João então amanhã é o São Pedro alguém disse de voz Soubessem que esse seo Ornelas era homem bom descendente posseiro de sesmaria Antes tinha valido com muitos passados por causa de políti ca e ainda valesse compadre que era do Coronel Rotílio Manduca em sua Fazenda Baluarte João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 645 Ao que ele tem mas tem mesmo muita coragem eu me fiz Aí falam em sessenta ou oitenta mortes contáveis o Marcelino Pampa afiançou e ainda não esmoreceu os ânimos Chegamos com proceder seguro e o céu por cima dali estava muito sereno Na fazenda tinfiam levantado um mastro na frente do pátio vi movimentos de gente As mulheres na boca do forno fumaçando mexiam com feixes verdes de mariana e vassourinha e carregavam as latas pretas de assar biscoitos Só aqueles formosos cheiros das quitandas e do forno quente varrido já confortavam meu estômago No mastro que era arvorado para honra de bandeira do santo eu amarrei o cabresto do meu cavalo Mas não desordeei nem coagi não dei em nenhuma desbraga Eu não estava com gosto de aperrear ninguém E o fazendeiro senhor dali de dentro saiu veio saudar convidar para a hospedagem me deu grandes recebi mentos Apreciei a soberania dele os cabelos brancos os modos calmos Bom homem abalável Para ele por nobreza tirei meu chapéu e conversei com pausas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 646 Amigo em paz Meu chefe entre a valer a casa velha é sua vossa ele pronunciou Eu disse que sim Mas para evitar algum acanhamento e desajeito mais tarde também falei Dou todo respeito meu senhor Mas a gente vamos carecer de uns cavalos Assim logo eu disse em antes de vir a amolecer as situações e estorvar o expediente negócio a boa conversação cordial O homem não treteou Sem se franzir nem sorrir me respondeu O senhor meu chefe requer e merece e com gosto eu cedo Acho que tenho para coisa de uns cinco ou sete em estado regular E eu entrei com ele na casa da fazenda para ela pedindo em voz alta a proteção de Jesus Onde tive os usuais agrados com regalias de comida em mesa Sendo que galinha e carnes de porco farofas bons quitutes ceamos sentados lá na sala Diadorim eu João Goanhá Marcelino Pampa João Concliz Alaripe e uns outros e o menino pretinho Guirigó mais o cego Borromeu em cujas presenças todos achavam muita graça e recreação A dona fazendeira era mulher já em idade fora de galas mas tinham três ou quatro filhas e outras parentas casadas ou moças bem orvalhosas Aquietei o susto delas e nenhuma falta de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 647 consideração eu não proporcionei nem consenti mesmo porque meu prazer era estar vendo senhoras e donzelas navegarem assim no meio nosso garantidas em suas honras e prendas e com toda cortesia social A ceia indo principiando somente falei também de sérios assuntos que eram a política e os negócios da lavoura e cria Só faltava lá uma boa cerveja e alguém com jornal na mão para alto se ler e a respeito disso tudo se falar Seo Ornelas me intimou a sentar em posição na cabeceira para principal Aqui é que se abancava Medeiro Vaz quando passou essas palavras Medeiro Vaz tinha regido nessas terras Verdade era Aquele velho fazendeiro possuía tudo Conforme jagunço de meiooficio tinha sido e amigo hospedador abastado em suas propriedades De ser de linhagem de família ele conseguia as ponderadas maneiras cidadão que se representava que isso ainda que eu pelejasse constante tarde seria para bem aprender Na verdade Aquela hora eu pelo que disse assumi incertezas Espécie de medo Como que o medo então era um sentido sorrateiro fino que outros e outros caminhos logo tomava Aos poucos essas coisas tiravam minha vontade de comer farto João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 648 O sertão é bom Tudo aqui é perdido tudo aqui é achado ele seo Ornelas dizia O sertão é confusão em grande demasiado sossego Essa conversa até que me agradou Mas eu dei de ombros Para encorpar minha vantagem às vezes eu fazia de conta que não estava ouvindo Ou então rompia fala de outras diversas coisas E joguei os ossinhos de galinha para os cachorros que ali nas margens esperavam perto da mesa com toda atenção Cada cachorro sungava a cabeça que sacudia chega estalavam as orelhas e aparava certeiro seu osso bem abocava E todos com a maior devoção por mim e simpatias iam passando os ossos para eu presentear aos cachorros Assim eu mesmo ria assim riam todos consentidos O menino Guirigó comeu demais cochilava afundado em seu lugar despertava com as risadas Aquele menino já tinha pedido que um dia se mandasse costurar para ele uma roupa e prover um chapéude couro para o tamanho de sua cabeça dele que até não era pequena e umas cartucheiras apropositadas Tu é existível Guirigó Vai pelos proveitos e preceitos eu caçoava Aí caçoei Duvidar é só dar um saco vastoso na mão dele e janela para pular para dentro e para fora capaz de supilar os recheios e pertences todos duma casagrande de fazenda feito esta salvo que seja E eu bem que já estava tomando afeição João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 649 àquele diabrim Pois com o Guirigó as senhoras e moças conversavam e brejeiravam como que só com ele por criança elas perdessem o acanhamento de falar Mas o seo Ornelas permanecia sisudo faço que ele afetava de propósito não reparar no menino Pelo tudo era como se ele reprovasse minha decisão de trazer para a mesa semelhantes companhias O menino e o cego Borromeu aqueles olhos perguntados As colheitas seo Ornelas supracitava Homem sistemático sestronho O moderativo de ser o apertado ensino em doutrinar os cachorros ele obrava tudo por um estilo velhoso de outras mais arredadas terras sei se sei E quase não comia Só vez outra jogava na boca um punhado seco de farinha Oxalá o senhor vai o senhor venha O sertão carece Isto é um homem forte ambulante se carece dele O senhor retorne consoante que quiser a esta casa Deus o traga Solei um vexame por não saber a resposta concernente nuns casos como esse resposta que eu achava que devia de ser uma só e a justa como em teatral em circo em pantomima bem levada O que é igual quase um calar À puridade eu sentia assim feito se estivesse pego numa ignorância mas que não era de falta de estudo ou inteligência mais uma minha falta de certos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 650 estados O que são bobéias limpei goela mudei de cara Amigo meu Medeiro Vaz a outra ocasião travou combates no ContaBoi daqui a duas léguas Contra os de um Tolomeu Guilherme Defunto amigo Medeiro Vaz que a alma dele Deus haja Adiante comandava em frente para o exemplo Enterramos os melhores mortos o homem descrevia Eu sei eu disse mesmo nada tencionando dizer A ver e que é que achava de mim aquele surdo velho Ah ele expunha os cabelos brancos mas faltava em barba que cofiasse Senhor saiba ao que Medeiro Vaz mesmo foi que entre todos me escolheu nos olhos da morte me determinou para capitanear e dar governo Tolomeu Guilherme que conheço é um que deve de estar presentemente embarcando cargas no porto em Pirapora Mas sou de mim o UrutuBranco Riobaldo que Tatarana já fui o senhor terá ouvido Aí o mais esse sertão tem de ver quem mais abre e mais acha assim eu disse um pouco enfurecido Pois maior honra é a minha meu Chefe que em posto de dono na pobreza desta mesa somente homens de alta valentia e valia de caráter se sentaram ele glosou sem sobrosso de perturbação Dobrei de costas castanheteei para os cachorros Assim ele havia de sentir o perigo de meu desprazer João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 651 havia de recear de mim aquilo como o outro diz quando o burro dá as ancas Aí no rever do instante percebi os olhos de Diadorim que me juntavam com uma das mocinhas de lá das que estavam servindo a mais vistosa de todas A mocinha essa de saia preta e blusinha branca um lenço vermelho na cabeça que para mim é a forma mais assentante de uma mulher se trajar Ela estava parada em pé no meio das outras quase encostada na parede O olhar de Diadorim era que estava me indicando que para aquela mocinha ia meu admirar Administrado chamei A senhora meninazinha chega aqui mais perto me faça obséquio da bondade E ela avermelhou as faces mas veio reparei que tinha as mãos aperfeiçoadas bonitas mãos para tecer minha rede A ela perguntei a graça É minha neta foi seo Ornelas quem disse E mal nem ouvi o nome com que ela me respondeu Assussurrada só gostei de ver como ela se mexia por ficar quieta vergonhosa como uma coalhada no prato Mas nos tons do velho Ornelas eu tinha divulgado um extravago de susto recuante o leve medo de tremor Isso foi o que me satisfez Aquele homem visconde e portoso em tudo ah João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 652 pelo mulheriozinho de sua casa ele não encobria o comprado eh sua família dele A avaliar o de Diadorim por igual como mostrava outros olhos o arregalo de ciúmes Aqui digo que se teme por amor mas que por amor também é que a coragem se faz Deu silêncio Aquilo tardou assim feito o tamanduá a língua põe feito quem quer comungar A mocinha me tentando com seu parado de águas a boniteza dela esteve em minhas carnes Ela perigou Não perigou no instante achei em minha idéia adiada uma razão maior que é o sutil estatuto do homem valente Aquela formosura aquela delicadezazinha então podiam mesmo ser assim em toda segurança feito ela fosse por um exemplo filha minha A mocinha eu de repente queria eu gostava de dar a ela muito forte proteção Diadorim não imaginasse isso Os olhos de Diadorim não me reprovavam os olhos de Diadorim me pediam muito socorro Seo Ornelas empalidecido Certo que num rebimbo de raio eu pronto o Ornelas estava caído muito a morto com uma bala entrolheolho antes de notar sequer que eu tinha pensado em arisco de mover nas armas Diadorim caso fosse ele eu desarmava e meus homens estariam ali todos de pé fechando praia de mar A meninamocinha que eu agarrava nos braços era uma quanta João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 653 coisa primorosa que se esperneia Mas eu não quis Ah hádeo quanto e qual não quis digo ao senhor e Deus mesmo baixa a cabeça que sim ah era um homem danado diverso era eu aquele jagunço Riobaldo Donde o que eu quis foi oferecer garantia a ela por sempre Ao que debati no ar os altos da cabeça Segurei meus cornos Assim retido sosseguei e melhor Como que depois do fogo de ferver no azeite em corpo de meu sangue todo agora sochupei aquele vapor fresco fortíssimo de vantagens de bondades Menina tu há de ter noivo correto bem apessoado e trabalhador quando for hora conforme tu merece e eu rendo praça que votos faço Não vou estar por aqui no dia para festejar Mas em todo tempo vocês carecendo podem mandar chamar minha proteção que está prometida igual eu fosse padrinho legítimo em bodas Alto estive atrás do que falei Ela se assustou outra vez sem capacidade nenhuma ainda mais ao avermelhar E eu também mercês colhi da alegria veraz nos meus olhos de Diadorim Será que será que por contentar profundo Diadorim eu tinha feito aquilo resoluto Ou por outra por aquele próprio velho homem seo Ornelas que nesse intervalo de instantes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 654 dizendo estava Agradece minha filha as todas palavras deste grande Chefe que é declarado sagrado nosso amigo perante as voltas todas que o mundo dá e der Realmente então eu virei para ele E daí deveras foi afoito que eu quis com ele outras conversas e prezei a amizade daquele homem dos sertões transatos O quanto fiz perguntas Aceitei o chá de laranjeira com que sempre dei bem numa tigela grande com capricho desenhada Minha gente junto comigo escutava O senhor tem noção de quem Zé Bebelo é eu indaguei uma hora por me confirmar Zé Bebelo Pode ser não digo Mas figuro que esse nome nunca ouvi não meu senhor foi o que ele respondeu Ao que isso era um fato possível Ele não sabia De Zé Bebelo nem do Ricardão nem do Hermógenes ele não sabia nem a preposição Mas então tudo naquela parte dos Gerais era ilusão de haver e não se saber O mundo ali tinha de ser de se recomeçar Sou de pouca política me desfiz de ser ele externou O chefe próprio dele ele não citou feito se eu ignorasse o qual era Célebre esse também e que o senhor pode ter conhecido igualmente pois era um que viajava amiúde João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 655 até no Rio de janeiro se bem que famanado homem de cabras em armamentos na política de jagunçagem Aquele sequinho espigadinho vestido cidadão com mãozinhas pequenas pezinhos e do ar sempre assustado constantemente Dele sozinho o que se diz umas duzentas mortes Conheceu o senhor No barranco do São Francisco o Coronel Rotílio Manduca em sua Fazenda Baluarte Agora paz Mas aí eu perguntei a respeito daquele seô Habão só mais para variação de conversa mudando o propósito Em resposta assim ouvi Esse um vem a ser até parente de minha mulher e longe meu aparentado Mas de desde mais de uns dez anos que cortamos conhecimento E como eu atalhei o assunto por convinhável nas boas normas pois a lembrança dum inimigo deixa qualquer homem agastado o seo Ornelas relatou à gente diversos casos E o que em mente guardei por esquipático mesmo no simples foi o seguinte conforme vou reproduzir para o senhor O qual se deu da parte da banda de fora da cidade da Januária Seo Ornelas nessa ocasião tinha amizade com o delegado dr Hilário rapaz instruído social de muita civilidade mas variado em sabedoria de inventiva e capaz duma conversação tão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 656 singela que era uma simpatia com ele se tratar Me ensinou um meiomil de coisas A coragem dele era muito gentil e preguiçosa Sempre só depois do final acontecido era que a gente reconhecia como ele tinha sido homem no acontecer Ao que numa tarde seo Ornelas segundo seu contar proseava nas entradas da cidade em roda com o dr Hilário mais outros dois ou três senhores e o soldado ordenança que à paisana estava De repente veio vindo um homem viajor Um capiau a pé sem assinalamento nenhum e que tinha um pau comprido num ombro com um saco quase vazio pendurado da ponta do pau Semelhasse que esse homem devia de estar chegando da Queimada Grande ou da Sambaíba Nele não se via fama de crime nem vontade de proezas Sendo que mesmo a miseriazinha dele era trivial no bemcomposta Seo Ornelas departia pouco em descrições Aí pois apareceu aquele homenzém com o saco malcheio estabeleci do na ponta do pau do ombro e se aproximou para os da roda suplicou informação O qual é que é aqui mó que pergunte por osséquio o senhor doutor delegadoele extorquiu Mas antes que um outro desse resposta o dr Hilário mesmo indicou um Aduarte Antoniano que estava lá o sujeito mau agarrado na ganância e falado de ser muito traiçoeiro O doutor é este amigo o dr Hilário João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 657 para se rir falsificou Apre ei e nisso já o homem com insensata rapidez desempecilhou o pau do saco e desceu o dito na cabeça do Aduarte Antoniano que nem fizesse questão de aleijar ou matar A trapalhada o homenzinho logo sojigado preso e o Aduarte Antoniano socorrido com o melor e sangue num quebrado na cabeça mas sem a gravidade maior Ante o que o dr Hilário apreciador dos exemplos só me disse Pouco se vive e muito se vê Reperguntei qual era o mote Um outro pode ser a gente mas a gente não pode ser um outro nem convém o dr Hilário completou Acho que esta foi uma das passagens mais instrutivas e divertidas que em até hoje eu presenciei Tal e outras contou o seo Ornelas senhor de prosa muito renovada Pelo que por todo o seroar deixei com ele a mão ainda que às vezes eu ficasse em dúvida se competia sendo eu um chefe aturar que um outro fiasse e tecesse guiando a fala E também com o tardio da noite veio a hora de se desapear da mesa e eu teimei em rejeitar oferta de cama em catre em quarto ou sala mas fui fora caçar o meio da minha gente por sinal que armei rede por entre cajueiro e jenipapeiro perto dos currais e para o segundo sono mudei de rearmar de faveira para faveira lá para dentro duma cerca Mas na mesa aquele menino Guirigó João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 658 na senvergonhice inocente de sua pouca geração tinha adormecido completo antecipadamente e eu consenti que as mulheres carregassem o coitadinho diabinho pesado como um de maioridade e levassem para dormir sei lá onde por entre colchão e lençol A vida inventa A gente principia as coisas no não saber por que e desde aí perde o poder de continuação porque a vida é mutirão de todos por todos remexida e temperada Assim eu tinha trazido o pretinho Guirigó do Sucruiú e agora ele estava indo para se deitar no limpo e fofo nos braços das jovens e donzelas carregado Somente que inteirado no sono ele mesmo disso não soubesse nem aproveitasse do que em sua existência dele era que estava se sucedendo A pois boa noite o senhor tenha Chefe com um aprazível amanhecer assim seo Ornelas me saudou Ao que eu regozijado e bem servido retribuí a ele quase com aquelas mesmas palavras As partes que se deram ou não se deram ali na Barbaranha eu aplico não por vezo meu de dar delongas e empalhar o tempo maior do senhor como meu ouvinte Mas só porque o compadre meu Quelemém deduziu que os fatos daquela era faziam significado de muita importância em minha vida verdadeira e entradamente o caso relatado pelo seo Ornelas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 659 que com a lição solerte do dr Hilário se tinha formado Aí narro O senhor me releve e suponha No outro dia acordei com a boca amarga e doce e o través de baixar alguma ordem comandando esse dia com essa noite não se pertencia Achamos de recrutagem os cavalos que pudemos o que foram os dez os burros e mulas também contados O seo Ornelas honrava os atos Além do que quis que eu falhasse para a festa com o meu povo mas achei mais sobressaído ir mesmo embora exato Semeei para trás de mim o bom ensejo para poder ser de vir a colher mais para diante outros assim tão bons e melhores Sincero o dito a gente agradeceu subindo todos em selas e a limpo seguimos a manhã ainda com diversas claridades Seo Ornelas externou as despedidas com o xtotó de foguetes conforme se lembrou de mandar começar a soltação cujos por bem uma meiadúzia O pessoal deu vivas gloriando o mastro com a bandeira do santo Ao que pelo mais puxei em frente pondo meu cavalo com espora rédea e pernas Deciso Rompemos umas duas léguas em estradas de muita areia Mas eu já estava agastado O que nesta vida muda com mais presteza é lufo de noruega caminhos de anta em setembro e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 660 outubro e negócios dos sentimentos da gente Assim de repente eu achei que a conversa com aquele seo Ornelas tinha me rebaixado Aos poucos eu tivesse perdido a vigiação de minha alçada no acaso da presença dele debaixo daqueles telhados A opinião das outras pessoas vai se escorrendo delas sorrateira e se mescla aos tantos mesmo sem a gente saber com a maneira da idéia da gente Se sério então um tinha de apertar os dentes drede em amouco opor seus olhos A cuspir para diante Alguma instância das outras pessoas pegava na gente assim feito doença com retardo Apartado de todos era a norma que me servia no sutil e no trivial A culpa minha maior era meu costume de curiosidades de coração Isso de estimar os outros muito ligeiro defeito esse que me entorpecia O tanto que daí depois essas pessoas andavam em minha desilusão de repente todos estavam endoidecendo Do agravo como ia em pensar achei asperezas até na goela e o cuspe não cabia em minha boca salgado como um suadouro de cangalha Aí então estou lembrado vendo como vi o Alaripe de mim a curta distância e que em tudo comedido guardava o balanceio brando no coxim da sela de vaqueiro de gado tangedor Chamei para ele vir Ah o velho entregou os cavalos hem Alaripe Coração dele aguou blasonei Deu por paz Alaripe ei essa paz João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 661 não te enjoa Ah é deveras A uns é o que sucede Mas a paz não é boa Então como é que ela enjoa assim mesmo Natureza da gente mal completada Tudo tu vê Alaripe eu acho que o enjôo da paz será também algum outro medo da guerra Pode que seja E mas só o medo da guerra é que vira valentia Mal bem não entendo meu chefe mas deve de ser Pois não é Só quando se tem rio fundo ou cava de buraco é que a gente por riba põe ponte Assaz essas coisas eu inventava em fala para ter meus eixos meus aços A boca do boi quer sal o sal do barro vermelho Eu estava chamando umas bizarrias Força dessa minha maneira eu estava pelo calor de tudo E a gente ia indo aquela comprida cavalhada Um ribeirão raso e estreito se passou nem bem seis braças Riacho desses que os que vão morrer chamam de rioJordão Todo o mundo passou por tanto diante de mim eu esbarrado em pé isto é a cavalo A virar o ar viemos em caminho não se descansou um dia Agora eram os brejos da beira do Paracatu Mas eu tinha conseguido encher em mim causas enormes Dispor do ror daquilo eu não conciliava conforme perseguia custoso vermelho meu Somente quis nem podia dizer aos outros o que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 662 queria somente então uns versos dei que se puxaram os meus seguintes Heide às armas fechei trato nas Veredas com o Cão Heide amor em seus destinos conforme o sim pelo não Em tempo de vaquejada todo gado é barbatão deu doideira na boiada soltaram o Rei do Sertão Travessia dos Gerais tudo com armas na mão O Sertão é a sombra minha e o rei dele é Capitão Arte que cantei e todas as cachaças Depois os outros à fanfa entoaram mesmo sem me entender só por bazófias mas rogando no estatuto daquela letra e retornando meu rompante cantavam melhor cantando De todos menos vi Diadorim ele era o em silêncios Ao de que triste e como eu ia poder levar em altos aquela tristeza Aí eu quis feito a correnteza Daí não quis não de repentemente Desde que eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 663 era o chefe assim eu via Diadorim de mim mais apartado Quieto muito quieto é que a gente chama o amor como em quieto as coisas chamam a gente E já se estava antefrente do Paracatu que também recovava o pouco e escasso Esbarrei não nem examinei o adiante Demiti meu cavalo nágua Os outros me acompanharam Assim atravessamos Vai viemos viemos Esses dias em ondas Sei só as encostas que subi a festo O Chapadão céu de ferro E era a lua nova Aquelas pedras brancas que de noite tanto esfriam As caraíbas estavam dando flor Por ponto de meu corpo medi o enrolar dos longes ventos Aí se viu em seus couros um vaqueiro pessoalmente A esse perfiz Amigo o amigo aqui é aqui Ao que ele confirmou Aqui o senhor meu senhor os senhores estão nos andares do rio Urucuia Aos campos Sentei que estava Estrela gosta de brilhar é por cima do Chapadão Tanta doideira fiz A prazo Como aquela vista reta vai longe longe nunca esbarra Assim eu entrei dentro da minha liberdade Oi grita arara araraúna para a tua voz desenrouquecer O Chapadão é uma estada estando Somente eu sabia respirar Sumo bebi de mim e do que eu não me tonteava Só estive em meus dias E ainda hoje o suceder deste meu coração copia é o eco daquele tempo e qualquer fio de meu cabelo branco que o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 664 senhor arranque declara o real daquilo daquilo sem traslado Ali eu diante de portas abertas por livre ir às larguras de claridade Acho que foi assim Assim Mas alguém me impediu Ou era que mesmo desse jeito tinha de ser Urubus perpassaram extremamente e para o poente vinham Diadorim me chamou pegando em meu braço Diadorim vigiou aquelas diferenças ele temeu temeu por minha salvação a minha perdição Ou foi que minha Nossa Senhora da Abadia mandou que assim tivesse de ser Mas Diadorim tirou o açoite de minha ação ele me puxou eu segurado o propósito para trás Nas grimpas naquelas o significado duma coisa tive que depois lhe relato Ah só no azul do anoitecer é que o Chapadão tem fim Foi na descida de algumas ladeiras no se costear um barrocão Diadorim disse Estou aqui te vejo mesmo Riobaldo Eu disse Ah não Ah paz Ele disse A uma coisa eu te digo Riobaldo Eu disse Pois fala João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 665 Diadorim disse a voz dele se paliava Por querer bem é que eu falo Riobaldo feito o sussurro nessas veredas mão mansa de tardinha descabelando o buritizal Eu disse Vai dizendo falei uma segunda palavra A testa dele merujava coisas grossas gotas mesmo me temesse aquele suor devia de se gelar Aí era um aviso que ele queria me fornecer Aí eu não queria ouvir o que fosse de repente eu não queria eu não queria fiz de ficar indignado No eu no meu não tivessem de me dar a toda aprovação Ao redor de mim assim obedecessem A chefia sabe chefiar Por certo que para a jagunçagem os Gerais mal serviam A pobreza daquelas terras só pobreza a sina tristezinha do pouco povo Aonde o povo no rareado pelo que faltava de água naquelas chapadas e a brabeza do gado que caminhava em triste achar Desejar de minha gente seria que se atravessasse o doChico ir em cata de vilas e grandes arraiais adonde se ajustar pagas e alugar muitos divertimentos Conforme no renovável servisse ir aonde houvesse política e eleição Sabia disso Eu não era pascácio Um chefe carece de saber é aquilo que ele não pergunta E mesmo eu sempre tive diversas saudades João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 666 Reprazia para mim um dia reverter para o rio das Velhas cujos campais de gado com coqueiral de macaúbas meio do mato sobre morro e o grande revôo baixo da nhaúma e o mimoso pássaro que ensina carinhos o manuelzinhodatroa Diadorim eu gostava dele Tem muitas épocas de amor Amor em perto às vezes sossega em muitos adiamentos ao homem da branca barba Tempo de guerrear eu disse para Alaripe o PacamãdePresas o Acauã e o Fafafa meus contraguias Em qualquer parte eu não podia arvorar bem fincado meu mastrode guerra Primeiro então por ali mesmo na areia roxa para tomar o instinto do ar a gente recruzava Mas dirá o senhor e o Hermógenes A guerra não era para ser contra o Hermógenes os Judas Sim sei Mas eles no meu ir eles iam vir haviamde Sabia isso era eu no coxim da sela suor nosso Seguindo no raso e no monte das areias tirando brilhos A mal o mundo serenava de tardinha quando os jaós cantavam Ou silêncio tão devassado completo que nos extremos dele a gente pode esperar o lãolalão de um sino Diadorim não me entendesse Ele entendia Assim eu tivesse muito ódio Diadorim havia de me entender Mas eu estava acontecido Por exemplo vinha uma boiada que passou no bombalanceio Aqueles vaqueiros esses com os laços enrodilhados nas garupas e que por prazer João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 667 aboiavam Apreciei de ver como todos souberam jeito de esconder o medo que de mim deviam de ter Boiada com rumo na barra do Paracatu salvante que mudassem de roteiro Mas a gente ia por lados contrários Deles até carneamos duas reses Se assou carne na moda do povo dos Gerais que era com espeto de vara de folhamiúda tanto tempo se esbrazeando para estorricar o naco de carne se torrava como um fumo e o gosto daquele cheiro se supria forte só por si punha a boca da gente aguando Dada a mais cachaça ao menino Guirigó e ao cego Borromeu para eles falarem coisas diferentes do que certas por em si desencontradas diversas de tudo Conselhos me davam Mesmo só o igual ao que pudesse dar o cajueiroanão e o araticum que consoante o senhor escrito apontará sobejam nesses campos Mas a minha sina formava o rebrilhar em tudo digo ao senhor Conforme fatos houve Da mulher que me chamaram ela não estava conseguindo botar seu filho no mundo E era noite de luar essa mulher assistindo num pobre rancho Nem rancho só um papiri àtoa Eu fui Abri destapei a porta que era simples encostada pois que tinha porta só não alembro se era um couro de boi ou um tranço de buriti Entrei no olho da casa lua me esperou lá fora Mulher tão precisada pobre que não teria o com que para João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 668 uma caixadefósforo E ali era um povoado só de papudos e pernósticos A mulher me viu da esteira em que estava se jazendo no pouco chão olhos dela alumiaram de pavores Eu tirei da algibeira uma cédula de dinheiro e falei Toma filha de Cristo senhora dona compra um agasalho para esse que vai nascer defendido e são e que deve de se chamar Riobaldo Digo ao senhor e foi menino nascendo Com as lágrimas nos olhos aquela mulher rebeijou minha mão Alto eu disse no me despedir Minha Senhora Dona um menino nasceu o mundo tornou a começar e saí para as luas Aquelas obras então Diadorim não visse Ah conselho de amigo só merece por ser leve feito aragem de tardinha palmeando em lumedágua O amor dá as costas a toda reprovação E era o que Diadorim agora desfazia em mim no amargoso Repuno que você está diferente de toda pessoa Riobaldo Você quer dansação e desordem Mexi meu cuspe dentro da boca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 669 A bem é que falo Riobaldo não se agaste mais E o que está demudando em você é o cômpito da alma não é razão de autoridade de chefias Diadorim disse e a voz dele ecosa me rodeou as certas sinceridades Amizade de amor surpreende uns sinais da alma da gente a qual é arraial escondido por detrás de sete serras Aí demorei Eu ia aceitar essa repreensão Ah nunca E desaguardadamente eu atinei com outro motivo para opor a extratada conversa que Diadorim tinha tido adeparte com o arrieiro de uma tropa Perguntei contra O segredo com o velho arrieiro da tropa Diadorim que se falaram era de minha pessoa Essa tropa que passara por nós dias antes rumava para o Abaeté com carga de fumo mantas de borracha couros de onça e de lontra e cera de palmeiral pouca coisa Fossem atravessar o rio num porto iam passar por terras minhas conhecidas nos sertões menores Agora eu queria saber Aquele levou um recado meu Instruí o homem que levasse um recado Um recado de mim Aí hei que Malfiz João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 670 Um recado Mais tu não pergunte Riobaldo que o que fiz foi Dizendo Diadorim se arredou de mim com uma decisão de silêncio Não vê que nem precisava Eu tinha guardado meus ouvidos Eu não queria escutar o reto naquela ocasião por desânimo de ser Diadorim tinha citado alma O que ele soubesse não soubesse não tinha ciência de coisa nenhuma da arte em que eu tinha ido estipular o Oculto nas Veredas Mortas no ermo da encruzilhada Aquilo não formava meu segredo E mesmo na dita madrugada de noite não tinha sucedido tão pois O pacto nenhum negócio não feito A prova minha era que o Demônio mesmo sabe que ele não há só por só que carece de existência E eu estava livre limpo de contrato de culpa podia carregar nômina rezo o bendito Trastempo mais outras coisas sobrevinham mas por roda normal do mundo ninguém podia afiançar o contrário Apus pedra por sobre pedra não guardo lembrança Eu era o chefe Vez minha de dar comando e estar por mais alto Zé Bebelo tinha de todo desaparecido Agora o que se carecia era de se pegar mais munição Todos deviam de me obedecer completamente Só eu não queria abusar Por que não queria Ah então eu estava em dúvidas Até por isso era que eu estremecia fino no ouvir certas menções A haver a coisa que de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 671 longe me ameaçasse feito o vemvem das nuvens de chuva O demo mesmo assim podia me marcar Se não fosse como era que Diadorim viesse vir com aquelas palavras Acho que eu não era capaz de ser uma coisa só o tempo todo Do que Diadorim se estranhava era do seguinte tinha sido o que aconteci com um sujeito senhor um que disse se chamar nhô Constâncio Alves que topamos no ChapéudoBoi E também do desgraçado do homenzinhonaégua com o cachorro dele que vieram vindo três léguas depois daquele As coisas vãs esparramáveis De que tivesse neste mundo um tal nhô Constâncio Alves o que era que eu ponderava com isso Mas ele mesmo ali loguinho falou que era nado no pé da serra de Alegres e sendo da minha primeira terra também Foi bem tratado Mas disse que podia ser de ter me conhecido quando eu menino Isso me disse aquele nhô Constâncio Alves Queria recompensas Aos princípios não desgostei de prosear com um antigo assim compatrício asseado em suas roupas e bemvindo Aí ele tomou café com a gente A dar que o homem foi se avontadeando encompridando as respostas eu mesmo dava jeito para que ele tomasse coragem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 672 Até que um certo momento o pretinho Guirigó se chegou sorrateiro e emitiu em minha orelha Iô chefe arenga do menino Guirigó que às vezes bem não regulava O capeta ele falou no capeta Ou então só de olhar para ele e escutar eu pensei no capeta mas que era do capeta eu entendi Daí de repente quem mandava em mim já eram os meus avessos Aquele homem tinha quantia consigo tinha consciência ruim e dinheiro em caixa assim eu defini Aquele homem merecia punições de morte eu vislumbrei adivinhado Com o poder de quê luz de Lúcifer E era somente sei A porque sem prazo se esquentou em mim o doido afã de matar aquele homem tresmatado O desejo em si que nem era por conta do tal dinheiro que bastava eu exigir e ele civilmente me entregava Mas matar matar assassinado por má lei Pois não era Aí esfreguei bem minhas mãos ia apalpar as armas Aí tive até um pronto de rir nhô Constâncio Alves não sabia que a vida era do tamanhinho só menos de que um minuto Ah mas então do sobredentro de minhas idéias do que nem certo sei se seja meu uma minhavoz vozinha forte demais de tão fraca suministrou um cochicho Foi Em tão curta ocasião que teve essa vozinha me deu aviso Ah um recanto tem miúdos remansos aonde o demônio não consegue espaço João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 673 de entrar então em meus grandes palácios No coração da gente é o que estou figurando Meu sertão meu regozijo Que isto era o que a vozinha dizia Tento cautela toma tento Riobaldo que o diabo fincou pé de governar tua decisão A anteguarda que ouvi e ouvi seteado e estribei minhas forças energias Que como Tem então freio possível Teve que teve Aí resisti o primeiramente Só orçava O instante que é é o senhor nele se segure Só eu sei Mas aquilo de ruimquerer carecia de dividimento e não tinha o demo então era eu mesmo Desordenei quase de minhas idéias Eu matava um tiquinho só Em nome de mim eu não matava Só forcejei por sobrenadar alto em mente o mando daquela vozinha Ru eh masquei meus beiços eu arrebentasse Vi que acabava tendo de matar e era o que eu mesmo queria Como que tivessem espalhado ombro com ombro pelos inteiros cabíveis do Chapadão os diabinhos mil e mil tocando lindas violas para acabar com o que eu mesmo me falasse e de mim quisesse por valia me entender contra o que o demôniomestre tinha determinado Sendo que mal resisti nas últimas saiba o senhor Ah mas E é preciso por aí o senhor ver quem é que era e que foi aquele jagunço Riobaldo Pois em instantâneo eu achei a doçura de Deus eu clamei pela Virgem Agarrei tudo em João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 674 escuros mas sabendo de minha Nossa Senhora O perfume do nome da Virgem perdura muito às vezes dá saldos para uma vida inteira Súbito sendo pois pois que um recurso eu tive e por uma greta me saí levando a salvo comigo o desgraçado nhô Constâncio Alves O conforme foi que isto eu espiritei que fazia a ele uma pergunta Respondesse a mal morresse mas de outro jeito recebia perdão Aí a pergunta seguinte Se sendo que o senhor é de minha terra a pois conheceu um homem que se chamava Gramacedo Será o senhor é parente dele Só esperei Ele dissesse que tinha conhecido o outro e aí morria por eu não poder nãomatar por quanto a salvação dele mermava que nem morrão de candeia E assim com obrigação minha mesma eu tinha para sempre combinado Mas nhô Constâncio Alves era para ganhar no azo daquilo pelo que deu de resposta Gramacedo Sinto dizer mas esse eu nunca vi nem dele ouvi falar Tenho parentescos com ninguém de tal nome A minha mão já tinha estado para o revólver brandamente Nhô Constâncio Alves percebeu o malamém Confuso como se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 675 rebaixou um pouquinho no tamanho ele devia de estar abrindo os joelhos por tremor de medo nas pernas Aí ele mesmo então achasse que carecia de muito morrer num pingo eu pensei traiçoeiro O medo mostrado chama castigo de ira e só para isso é que serve Ah mas ah não eu tinha decidido Tinha ou não tinha Eu Assim noutro repingo arejei que toda criatura merecia tarefa de viver que aquele homem merecia viver por causa de uma grande beleza no mundo à repentina Um anjo voou dali Eu tinha resistido a terceira vez Agora nhô Constâncio Alves estava delivrado de perigo Só que eu gritei O senhor tem seu dinheiro Ligeiro novo o homem caçou com suas mãos o surrãozinho que abriu estava cheio de notas bem enroladas e embrulhadas num pano e assim me dava me presenteava Mirei aquele triste pescoço O que em seco ele foi engolindo que podiam ser as contas todas dum terço Aproximei o cobre O ele nhô Constâncio Alves deixei que fosse embora Nem espiei para dele não ver as costas Mas aí então para me pacificar e enterter o Outro eu tive de falar alto Perdoei este mas o primeiro que se surgir destas estradas paga Eu disse Eu ia cumprir João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 676 De seguida o primeiro veio logo mais adiante quase no se inteirarem três léguas Conforme houve fatos coisa que se passou E foi numa várzea com uns boizinhos ali bem pastando Demos com um sujeito aparecido viajor Ele vinha numa égua Essa égua era acastanhada com alguma altura Aqueles arreios de velhos era que desfaziam Um cabo da rédea estava sendo de couro mas o outro de sedenho A égua também cambaiava O homem tinha cara de focinho avançando o formato dos ossos da boca não tinha queixo Desgraçado desse homem pelo que em sua vida ia ser pelo que seus aspectos indicavam Nem merecia dó assim achei Mas na companhia dele atrás vinha também um cachorrinho Eles esbarraram O cachorrinho pegou a latir nesse ofício que quase todo cão tem de ser presumido valente O homem bambeou de si em cima da égua ele estava pecando de pavor Como que num só relance ele transformou três caras E para o pretinho Guirigó me virei por perguntar Aqui este deveras eu mato Senhor mata Senhor vai matar o pretinho só se saiu pelos olhos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 677 Ao que escutei queixos e dentes do homem bater Súdito indivíduo assim não tinha ação de voz nem tirava um suplicar Tudo o que não sabia ele adivinhava Previsse que ia morrer só para indenizar do perdão dum outro só por preencher o lugar que devia de ser o do nhô Constâncio Alves Ah não Agora a vontade de matar tinha se acabado Sei e soube por certo que o demo agora escondia sua intenção por desconfiar de que eu não fosse querer cumprir Com ele meu senhor assim é sempre escolhe seus estilos Ao mais dessa vez ele sabia que não carecesse de me azuretar Sabia que eu estava até com enjôo da situação daquele homem da égua meu gosto era permitir que ele fosse sembora forro de qualquer castigo Mas sabia igual que eu estava na estrita obrigação de matar porque eu não podia voltar atrás na promessa da minha palavra declarada que os meus cabras tinham escutado e glosado Ah o demo bem me conhecia Devia de estar no astuto ali por perto feitor se pagodeando de mim querendo ver bem boa execução do meu dever de crime E o homem da égua o nada de tudo espiava por mais inteiriço não se ser se forcejava e um espírito de silêncio ele gemia Aí onde era que estava o anjodaguarda dele Aí tinha de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 678 morrer Carecia de morrer porque o diabo por novas voltas no nó de compromisso tinha me pegado e porque outro aomenos remédio não havia O cachorrinho por sua vez entendia isso e latiu cainhava ganiz mais conseguido do que o dono ele sabia dar de gemer Mas eu estava pensando redobrado Como era que eu ia matar aquele sujeito anunciado de pobre e matar em vez de um outro sadio em bojo e rico Aquilo era justiça Vai ver ele nem conhecesse o nhô Constâncio Alves nem soubesse quem fosse Era justiça Era possível Eu pensei O que era que Zé Bebelo numa urgência assim no arco inventava de fazer Eu tinha a preguiça de falar perguntas Os outros parados em volta esperavam por apreciar Ninguém não tinha pena do homem da égua mirei e vi Consideravam de espreitar meu procedimento A afleima de assim loguinho ter de botar e ouvir minhas palavras no ar me agravou E foi então para retardar os momentos que ao cego Borromeu eu indaguei Seja o que companheiro velho E eh lá isso Atabafado Até porque de pedir avisos a um cego assim em públicas varas eu tivesse de me vexar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 679 Se é se é Chefe Ahem Se é o que mecê sumeteu enhém Senhor quer que seja que se mate um tal semtermo do cego me respondeu semrazão Ao que eu tinha trazido aquele comigo para a nenhuma utilidade Senhor mesmo é que vai matar o menino Guirigó suputou o diabo falou como uma flauta Te acanha dioguim nãoseiquediga Vai sebo eu ralhei Onde os outros riram rabo Mas entre isso o homem condenável em cima da égua amontado sempre chorava por si mesmo sensato sério chorava decerto o ter crescido de sua longe meninice Nem perguntei o nome dele nem donde era que era Um naqueles casos de nada carecia nem necessitava A cara dele pelo malaventurar se quebrava das formas e cor e perpassava ele era um ser com a cara desmanchada Aí o Acauã por um gesto de aviso meu assestava nele sobrestante porque mesmo no magoar do terror por vez um se assopra de adoido dá bote dá nas armas Agarrado todo na égua só encolhido encarapitado o pobre Vai sebo eu tornei a xingar o meninodeinfância Adforma que eu tinha de resolver Antes ligeiro para os meus homens não me acharem aparvo Ou o demo O demo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 680 Ainda que muito eu sei Agora esse se prespiritava por lá sabível mas invisível e ele estava se rindo de mim meu próximo Ah não Somei que tive pena do homem A cachorrinha se latia Mas como era que eu podia atirar numa triste pessoa daquelas que semelhava com os ombros debaixo de todas ventanias A cachorrinha perturbava os cavalos Aperto do dever que eu tinha de cumprir de editada palavra Ou eu temi também o Tranjão o Tibes o Cujo que eu mesmo ajustara por meu vigiador Seja o que hoje mais rezo O homem nas costas da égua desinquieta que agora dava debate Decerto porque animal de montada no que percebe aquele humano pavor alheio o todo desprezo ao cavaleiro está obrigado a demonstrar Conseguinte que sobre assim todos riram mais Oé eh ele já está se deixando algum reparou Se via Se o homem dera de obrar mesmo permeando para a sela que se sujava Às caçoadas constavam de querer ver aquilo Daí o cachorro por resguardo de seu dono agrediu os cavaleiros com qual a latição dele e os arreganhos os cavalos de uns desgostavam e se empinavam por reboliz O homem mesmo era que se franzia no não dizer não desbobeava Ah e Zé Bebelo repentino relembrei as remotas vezes Os cavalos saltando assim os cavaleiros bramando recordação de Zé Bebelo Só Zé Bebelo servia para apurar um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 681 impedimento desses no deslindar Onde ele Ah Ah e foi aí então que estouradamente achei fortes idéias Rapatrás fazendo meu cavalo também se arquear e empinar às patas eu disse Disse que bradei num entusiasmamento daqueles mesmos de Zé Bebelo a fala igual à de Zé Bebelo na baralhada em pompa dos animais arre crinas na arroubagem de arruaça Eu pronunciei Raiaputapô Não tenho que matar este desgraçado porque minha palavra prenhada não foi com ele quem eu vi primeiro e avistei foi esse cachorrinho Só um assarapanto de silêncio Daí me vivavam Todos entenderam me admiraram A tanto que sei Agora eu digo ao senhor dele do Demo naquele instante agora era eu quem ria Eiei gente segura o cão dei ordem Num três tempo a cachorrinha estava pega se esbrabejava No que uma peia um laço ou um cabresto eram desconformes para isso então o PacamãdePresas e o Jiribibe arrumaram uma jarda de fina corda com ela se amarrou o bichinho num pé de assaleitão Não deixem ela uivar Não deixem ela uivar foi o que o cego Borromeu disse pelo modo ele tinha medo de uivado de cachorro A bom cachorro a gente enforca o menino João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 682 Guirigó deu atrevimento de ensinar Mandei que esse menino fosse para mais longe perder as influências Deram uma palmada na anca do cavalo dele que o João Vaqueiro puxou para ir exilar os dois em boa conveniente distância Um cachorro quando se enforca chora lágrimas os olhos dele regulam com os de gente foi o que o Alaripe disse com simples voz A tudo pensei Agora matar aquela cachorrinha O que menos eu pudesse só mesmo por pragas Pelo tanto que a cachorrinha se prezava correta latindo tão relatado Ah não Ah não não matava Mais por aí eu também já tinha aprendido das sutilezas Tornei a transdizer Adoude E nem não foi essa cadela A égua essa é que foi a que primeiro deu nas minhas vistas Real mudando o propósito e para que isto bem se entenda Fio que me aprovaram Divertidos todos quem é que ia me contrariar Eu era senhor dali e daqui eu falando ficava sendo Do Demo mesmo não tirei noção Agora eu estava com outra pressa Desapeiem o homem mandemos embora que se vá em ato ordenei Até porque ele se cessava sem entendimento das coisas sem ação Transes que em instante temi aquele homem morresse roqueado no medo rebaixado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 683 dessa forma então ah aí então o destino de lugar para mim estava definitivo só sendo nas extremas do fim do Inferno Com jeito com asco uns dos meus cumpriram meu mandado desamontaram o homem e o homem quase nem se impunha de ficar em pé Tu foge fora daqui tu te vai embora eu disse tive de gritar Aí ele entendeu e saiu Por um momento pensei que fosse correr Mas esbarrou sem espiar para trás Agora era que achava pranto com bem de choro estava chorando soluços fortes igual se fosse criança pequena Aquilo não tinha nenhuma sensatez e me dava gastura astúcia que remexia com minhas resistências Aborrecidos os do meu pessoal gritaram com ele que tornou a pegar a correr ao tom dos brados Ainda esbarrou outra vez devia de estar chorando conforme os ombros dele se sacudiam Arrochei Assim foi em arrebrusco sobreveio em mim a estúrdia arfagem de chorar também eu nas margens do mar Não quis e nem pude Ânsia que meus olhos para dentro davam em escuro As graças darte sabe o senhor na escuridão não se chora por não se ver como não se pita cigarro Com isso desgostei de mim Ah no final da vez o que ria o riso principal era ele o demo O Tisnado Assim por causa da judiação que eu mesmo por querer salvar a vida dele eu tinha procedido de demorar assim com aquele homem Antes tivesse logo matado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 684 Como é que se podia desrespeitar tudo desse jeito numa desgraçada pessoa roupeada Como é E o homem não tinha vislumbrado de espiar para trás para saber de sua cachorrinha E a cachorrinha estava ali bem amarrada na dignidade Tanto ela não latia mais que todos tinham se esquecido dela Agora eu colhi em mim um estado de desânimo A ser que por conta daquele homem por meus desmandos quem sabe eu ia ter mais para adiante de pagar com graves castigos Algum tempo estava se passando daí já tinham desarreado a égua e o lombilho e os baixeiros botaram dependurados num galho de árvore de beira estrada Ali estava aquele magro animal preso somentemente no cabresto que o Fafafa segurava assim esperavam que eu desse cabo dela eu mesmo ou que mandasse outro fazer segundo tinha sido a minha decisão A cachorrinha essa eu pensei eu dava para Diadorim que perto todo o tempo tinha ficado calado durante tudo E pois era a hora de minha acertação mesmo com a contrariedade Ao dito porque eu tinha começado a desastrada estória que um final razoável carecia de ter Suficiente sacar garrucha e mirar o tiro na testa da égua que se debruçava de pernas abertas se acabando A tanto pois João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 685 Ao que o Fafafa que não teve poder em si de se consentir silêncio virou para mim e disse Nosso Chefe com vênia eu peço o senhor aceite de eu pagar em dinheiro o preço deste inocente animal que seja poupado A egüinha não é de todo ruim Aonde que ele disse outros secundaram eu deixasse Repente meu foi meio irado porque até o Fafafa me atravessava Os demais a ver que reprovavam minha decisão de que a égua se matasse A gente revoltosa Ah não que em seguida gostei eu mesmo Instante em que me prazia ouvir o meu pessoal discordar daquilo com a égua a frio e por fria razão Do demo era que eles discordavam Rapaziada boa solerte Só que assim como eles queriam não estava em meu regulamento resolver Vender não vendia a vida da égua ao Fafafa Ah não Resumi um recurso por aí alerta O que foi como pronunciei Delibero o certo o primeiro que eu vi foi essa égua Ela tinha de receber a morte Ah mas égua não é gente não é pessoa que existe E que Ah então não é cabível que se mate a égua por tanto que a minha palavra decidida era de se matar um homem Não executo A alçada da palavra se perdeu por si e se gastou pois não está dito Acho e dou que o negócio veio ao terminado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 686 Verdadeiramente com alegria foi que todos me aprovaram Ou seja que me admiravam em real pela esperteza de toda solução que eu achava e mesmo nem sabiam que essas minhas espertezas eram cobradas da manha do Tentador Contente tanto e descontente comigo era que eu estava Porque essas coisas de certo modo me tiravam o poder do chão Mas uma na outra eu limpei o seco de minhas mãos Aí correr alguém em tempo de campear outra vez esse homem eu disse Trazer a modo de se dar a ele dinheiro se dar de comer e um café e tornar a entregar a ele o que é dele Eu falava era por devolver a égua E o Suzarte José Gervásio e Jiribibe torcendo em galope foram pelo homem A égua que se soltou caçava moitas de capim para pastar Com o que já que se estava por descanso e espera e se tinha boa aguada na vereda perto o jacaré armou a trempe e coou café Sentei na sombra dum paudoce fiquei ouvindo os gabos que os em redor de mim me dessem como arras de procedimentos maiores Tal a tal o Chefe tira mais finíssimas artimanhas do que o Zé Bebelo próprio um disse João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 687 À fé que determina com a mesma justiça queMedeiro Vaz outro falou mais aduloso Isso bom louvo sossegava a minha perturbação Aquela hora eu estimava meus homens que vivessem que falassem Mas para afirmar idéia e respeito de que eu estava em minha chefia independente mandei que aquietassem pelo que eu ia aproveitar para uma sesta de soneques Aprazia escutar o ventinho do chapadão com o suave rumor que assopra e faz nas folhas do batecaixa A cachorrinha amarrada mesmo se sujeitava de não latir figuro que alguém estava dando a ela pedaços de carneseca Alembro que eu ainda podia caber nesse domingozinho de tranqüilidade O melhor ah pensei o melhor de tudo era que o Anhangão não aparecesse não se visse porfiando no meio de todos e que mesmo o mais certo era dele demo não competir por não ter nenhuma existência Tirei minha madorna a pouco Suzarte Jiribibe e José Gervásio já retornavam com o vazio tido sem o resultado algum Sujeito se sumiu nesse mundo carregando com o rastro medo dele era medonho Só achamos o nada dele assim rendiam explicação Que é que se podia remediar Seguir nossa marcha sem mais tardanças A gente largava a égua ali João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 688 acaso algum dia o homem voltava ou dela por boca de outros tinha notícia Amontamos E a cachorrinha Reinaldo essa tu quer perguntei a Diadorim Meante o que ele melhor respondeu Só convém se soltar a coitadinha de seguro ela vai se encontrar com onde estiver o dono E ele mesmo desatou Valia o senhor ver o raio de amor que tangeu a cachorrinhazinha que latiu suas alegrias e airada correu sem nenhuma demora feito fosse para um pronto destino háde asas Foi ela em longe desaparecer e nós tocamos no caminho contrário A égua ficou lá pastando e o arreio do homem como um espantalho pendurado no ramo de árvore até as moscas do campo já se ajuntassem nele Do que acontecido me senti muito livre Trotei adiante Eu ia à meia rédea não me instava não pensava Será mal pergunto eu ao senhor que viajei este sertão com o Outro sendo meu sócio Vá retro Mas não tenho modo de entender como Diadorim estranhou meus semblantes E por via disso é que tinha sido a nossa conversação por causa do de que agora lhe dei conta miudamente Do que discuti com Diadorim do que derradeiro ele me disse me ficou um retardo Aquele passo me envergonhava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 689 Como ser Eu queria e não queria ouvir não queria e queria Resto de toda resposta que tivesse tinha de ser acusação E eu quis Deu o que me deu e eu vim perguntar forçado sentido perguntei O recado mandado Diadorim tu diz Teu falar no exato dever de toda lealdade é que eu a duras exijo o que me reverte Sou teu amigo O recado aquele Riobaldo pedi ao arrieiro para dar a uma mulher Ah então foi para uma moça para a filha do fazendeiro da Santa Catarina que Otacília é e que é minha noiva será Riobaldo pois foi Em que é que você malda Ao que por praga eu relutei no freio Até o campolino meu cavalo assumiu um espanto Porque surpreendi o mundo desequilibrado rústico o que me pertencia e o que não me pertencia Se a vida coisas assim às horas arranja então que segurança de si é que a gente tem Diadorim me olhava Diadorim esperou sempre com serenidade O amor dele por mim era de todo quilate ele não tartameava mais de ciúme nem de medo Disse assim Pedi a ela que rezasse por você João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 690 Riobaldo Assim pela esperança de saudade que ela tivesse que não esbarrasse de rezar o todo tempo por costume antigo No argame no esquisito desgosto de meu espírito vi que mesmo antes dele falar eu já sabia que aquilo era o que ele não evitava de me dizer Rude que ainda reperguntei mesmo assim Ah não Ah você acha que eu careço de suas rezas orações por minha ajuda Diadorim Acho de manhã à noite Riobaldo Demais Nem sei mesmo se alguém te botou o malefício Tua mãe mesma que estivesse viva achava Mor mor aí recebi surto de meu sangue forte no corpo da cara e na beira das orelhas e logo doeu no meu beiço o que eu estava me mordendo assim para não insultar Diadorim com nomes que fossem da maior ofensa Com um tapa na rédea eu tirei de perto dele a cara de meu cavalo Acha tua vida rapaz Careço é de menos amizades ainda eu maldisse me apartando Ao que bem pensei Hásde Rezas essas o contra Atira tu em anta com chumbo fino e ri mamente O que era que me transtornava do meio para o fim por essa fraseação João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 691 Sendo que depois logo quando esbarramos a caminhada do dia eu fiz questão de não querer prosa nem presenças de ninguém para que vissem que eu estava pensativo de projetos e raivoso Tristonho A gente parava no findar do Chapadão longe no poente segundo se ia indo por meu comando As muitas sérias coisas referi comigo quando eu estava provando a fresca da tarde Por curto minto se não conto que estava duvidoso E o senhor sabe no que era que eu estava imaginando em quem Ele é Ele pode Ainda hoje eu conheço tormentos por saber isso trastempo que agora quando as idades me sossegam E o demo existe Só se existe o estilo dele solto sem um ente próprio feito remanchas nágua A saúde da gente entra no perigo daquilo feito num calor num frio Eu então Ao que fui na encruzilhada à meianoite nas Veredas Mortas Atravessei meus fantasmas Assim mais eu pensei esse sistema assim eu menos penso O que era para haver se houvesse mas que não houve esse negócio Se pois o Cujo nem não me apareceu quando esperei chamei por ele Vendi minha alma algum Vendi minha alma a quem não existe Não será o pior Ah não não declaro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 692 Desgarrei da estrada mas retomei meus passos O senhor segurado não acha Ao que tropecei e o chão não quis minha queda De hoje em dia eu penso eu purgo Eu tive pena de minhas velhas roupas E rezo Para a minha reza Deus dá as costas mas abaixa meio ouvido Rezo Queria ver ainda uma igreja grande brancas torres reinando de alto sino no estado do Chapadão Como que algum santo ainda não há de vir das beiras deste meu Urucuia E o diabo não há Nenhum É o que tanto digo Eu não vendi minha alma Não assinei finco Diadorim não sabia de nada Diadorim só desconfiava de meus mesmos ares Escuto o claro riso dele que era raramente quer dizer me alembro Compadre meu Quelemém me dá conselhos de tranqüilidade O que ele renova é Em presente e futuros Eu sei Sempre sei realmente Só o que eu quis todo o tempo o que eu pelejei para achar era uma só coisa a inteira cujo significado e vislumbrado dela eu vejo que sempre tive A que era que existe uma receita a norma dum caminho certo estreito de cada uma pessoa viver e essa pauta cada um tem mas a gente mesmo no comum não sabe encontrar como é que sozinho por si alguém ia poder encontrar e saber Mas esse norteado tem Tem que ter Se não a vida de todos ficava sendo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 693 sempre o confuso dessa doideira que é E que para cada dia e cada hora só uma ação possível da gente é que consegue ser a certa Aquilo está no encoberto mas fora dessa conseqüência tudo o que eu fizer o que o senhor fizer o que o beltrano fizer o que todoomundo fizer ou deixar de fazer fica sendo falso e é o errado Ah porque aquela outra é a lei escondida e vivivel mas não achável do verdadeiro viver que para cada pessoa sua continuação já foi projetada como o que se põe em teatro para cada representador sua parte que antes já foi inventada num papel Ora veja Remedeio peco com pecado Me torço Com essa sonhação minha compadre meu Quelemém concorda eu acho E procurar encontrar aquele caminho certo eu quis forcejei só que fui demais ou que cacei errado Miséria em minha mão Mas minha alma tem de ser de Deus se não como é que ela podia ser minha O senhor reza comigo A qualquer oração Olhe tudo o que não é oração é maluqueira Então não sei se vendi Digo ao senhor meu medo é esse Todos não vendem Digo ao senhor o diabo não existe não há e a ele eu vendi a alma Meu medo é este A quem vendi Medo meu é este meu senhor então a alma a gente vende só é sem nenhum comprador João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 694 Divulgo o meu Essas coisas que pensei assim mas pensei abreviado O que era como eu tivesse de furtar uma folga nos centros de minha confusão por amor de ter algum claro juizo espaço de três credos E o resto já vinha O senhor verá pois Porém mais além Na Serra do Tatu o frio ali é tal que em madrugadas a gente necessita de uns três cobertores Na Serra dos Confins meados de julho lá já está sovertendo o laçaço dos ventos desencontrados de agosto como que venta árvores caídas Aonde eu ia todos achavam natural Chefe é chefe Será que eles não sabiam que eu não sabia aonde ia Isto é digo isto é Não soubessem os começos e os finais Dalgum modo eu estava indo e sabendo Sobre como é que a coruja conseguiu modo de poder voar sem se escutar o rumor do vôo Ao que eu estava sofismado Menos que não guardei raiva de Diadorim nem sentimentos O desar que ele tinha falado e feito aquela ruim conversa nossa não deixou nem nublo melhor fugiu de todo de minha lembrança O palpite meu primeiro era de chegar até na Serra do Meio cruzar na CachoeiradoUrucuia Daí desisti De repente torci direto para o norte foi no Lagamar a travessia Mas fujo de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 695 dizer que antes no LugardoTouro se arrecadou a exata munição Ainda antes se dando dias que a gente tinha recebido uma boa surpresa O Quipes Assim o Quipes que retornava depois de tantos meses De desde que tinha cumprido a ordem de sair por travesso socorro de lá ondonde estávamos cercados em combates na Fazenda dos Tucanos o senhor se alembrará Ele vinha certo e alegre E de ver um companheiro assim se aparecer de ausências a gente ganhava mais mocidade Lampeiro o Quipes entrado em boas roupas montado num bom cavalo amarelo pitando maço de cigarros de fábrica rico feito um Mascarenhas Arte que puxava um burro e uma burra adestros e tinha comprado coisas até trempe e caçarolas e açúcar real e chocolate em pó Ao fagueiro pujante mesmo Ara veja como passou E dond é que soube de nós eu em atiço perguntei Ao que pois Tatarana em faltas de notícia formei meu pião por aí Já estive em Ingazeiras na BarradaVaca no Oi Mãe em Morrinhos O Urucuia não é o meio do mundo assim ele se temperou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 696 O que não era toda a verdade O que ele estava era recém chegando E me tratou de Tatarana O seja que tivesse vivido esses tempos tangendo urubu adformas que vinha agora na ignorância de que eu é que era o Chefe Indagou por Zé Bebelo e pois de Zé Bebelo mesmo ele tudo não sabia Nem o parar do Hermógenes Nem não tinha nenhum sinal do Joaquim Beiju assim como aviso de outras novidades do mundo não deu Só por terminar se gabou de ter tido duas ofertas para servir de jagunço de Dona Adelaide no Capão Redondo e do Coronel Rotílio Manduca em sua Fazenda Baluarte Ah entrei gozando de minha pessoa de paz até nas cidades de Januária e SãoFrancisco ainda proseou Devia deser verdade Assim como verdade completa que a burra e o burro e a tralha ou o dinheiro para tudo adquirir ele devia de ter roubado tomado em terra de riquezas Tal que disse Isto eu bem comprei na venda do José Vassalo Desajuizado gastador esse o Quipes Tanto ouvi muito macambúzio Onde que então eu varava mundo em comando e ainda não prezava o meu nome Eu o UrutuBranco Ser Chefe de jagunço era isso Ser o que não dava realce qualquer um podia fazendeiro com posses mão em João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 697 políticas O sertão tudo não aceita A minha pessoa era nada glória de Zé Bebelo era nada O que dá fama dá desdém O menos de me importar O que eu carecia era de dar primeiras batalhas Suspender a alta coragem adiante de meus cabras Ou será que já estavam mas era se aplicando no vagavagar Cigano sou eu pensei enraivecido Tinha o norte para a gente Dei ordem Aí torcemos caminho numa poeira danã A reto viemos beirando o Ribeirão da Areia de rota abatida O que era que eu tencionava fazer O senhor espere Narro que não rendi melindres do feito de Diadorim digo o recado enviado Mas à vez balancei uma inquietação daquilo que era para eu bem estranhar a decisão dele de tanto absurdo Essas desordenadas da vida da gente tudo o que estoura manso e guampa quieto e que só tem a razoável explicação para quem está mesmo longe dos motivos Ao meio do meio duma coisa eu tinha certeza que Diadorim não ia me mentir O amor só mente para dizer maior verdade Diadorim me compassava por força Mas para mandar à minha Otacília assim aquela embaixada era porque ele soubesse no zelo de seu coração que então Otacília me tinha amor E tanto igual sabia também de mim Naqueles dias era Abrandei minha lembrança em Otacília que sincera me aguardasse em sua casa em seu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 698 meigo estar Agora eu ia indo às avessas de lá da Santa Catarina mas de arribada minha intenção de saudade vinha voltando Tudo nesta vida é muito cantável Até a seguir por um afino de momento eu me arrepiei por trás da testa Ato do que meio confuso imaginei por um vão imaginar que me querendobem a mais de meu merecimento e crendo que eu enfrentava os duros riscos ela Otacília pudesse praticar o estouvamento gentil de se fugir de casa e vir aventurada em minha cata por todos os pousos deste sertão Ah ela vinha montada num bom cavalo corcel aparecia de repente por meu nome perguntando E eu declarava a grandeza real dela definida bem do meu lado na frente do grande bando de meus homens Assim de jeito tão desigual do comum minha vida granjeava outros fortes significados E isso variou em meu pensamento inesperado de ligeiro supor que a bem notado nem foi um pensar Arremedo de sonho também não seria de ser Então emendando de novo o vero juízo tive um receio por causa que aquilo podia ser aviso do que estivesse por vir rumo de profecias Otacília me alembrei da luzinha de meio mel no demorar dos olhares dela Aquelas mãos que ninguém tinha me contado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 699 que assim eram assim para gozo e sentimento O corpo em lei dos seios e da cintura todo formoso que era de se ver e logo decorar exato E a doidice da voz que a gente depois viajasse viajasse e não faltava frescura dágua em nenhumas todas as léguas e chapadas Isso tudo então não era amor Por força que era E pelo sim receei será tivesse Diadorim falseado fala e o recado na verdade fosse outro o para ela vir afoitamente que eu dela muito carecia Divulgo o desuso disso que era extravagâncias Mas o senhor acreditando que alguma coisa humana é de todo impossível então é que o senhor não pode mesmo ser chefe de jagunço nem na menor metade só de um diazinho nem somente nos vastos imaginados Ora essas digo Se Otacília viesse aparecesse lá em no meio de nós que seguimento de coisas havia de suceder A bobéia toleima Otacília estava guardada protegida na casa alta da Fazenda Santa Catarina junto com o pai e a mãe com a família lá naquele lugar para mim melhor mais longe neste mundo E eu sem ser por motivo ou razão cada dia tocava com a minha gente por contrárias bandas para mais apartado de donde ela assistia Ao cada dia mais distante eu mais Diadorim mire veja O senhor saiba Diadorim que bastava ele me olhar com os olhos verdes tão em sonhos e por mesmo de minha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 700 vergonha escondido de mim mesmo eu gostava do cheiro dele do existir dele do morno que a mão dele passava para a minha mão O senhor vai ver Eu era dois diversos O que não entendo hoje naquele tempo eu não sabia Máximo me lembro é de que na minguante se estava no veredal das cabeceiras de um córrego lugar de desmedidas pastagens adonde os cavalos usufruírem descanso A lá esbarramos e paramos por uns dias Me lembro eu quis escrever uma carta Essa minha carta eu podia destacar um homem dos ligeiros ele ia levava em mão à Otacília minha noiva trazia a resposta O que eu cogitei de escrever era muito singelo as notícias de minha saúde pergunta de como era que ela e os parentes iam passando saudações de lembranças Admiro que achei natural de não falar coisa de minha glória de chefia por oras Por quê Pois E tive vontade de traçar uns versos também mas que a aragem não ajudava a deduzir Era uma sinceridade muito dificultosa Escrevi metade Isto é como é que podia saber que era metade se eu não tinha ainda ela toda pronta para medir Ah viu Pois isto eu digo por riso por graça mas também para lhe indicar importante João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 701 fato que a carta aquela eu somente terminei de escrever e remeti quase em data dum ano muito depois Digo o porquê Próprio porque não pude Guarde o senhor não pude completo Mas guarde por outra o dia vindo depois da noiteesse é o motivo dos passarinhos Falo por palavras tortas Conto minha vida que não entendi O senhor é homem muito ladino de instruída sensatez Mas não se avexe não queira chuva em mês de agosto Já conto já venho falar no assunto que o senhor está de mim esperando E escute Tinha o Maligno Às vezes penso Um boneco de capim vestido com um paletó velho e um chapéu roto e com os braços de pau abertos em cruz no arrozal não é mamolengo O passopreto vê e não vem os passarinhos se piam de distância Homem é O senhor nunca pense em cheio no demo O mato é dos porcosdomato O sertão aceita todos os nomes aqui é o Gerais lá é o Chapadão lá acolá é a caatinga Quem entende a espécie do demo Ele não fura rascrava Demorar comigo ele podia E o que não existe de se ver tem força completa demais em certas ocasiões A ele vazio assim como é que eu ia dizer Te arreda desta minha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 702 conversa Ao que pois o que eu ia pondo na carta era quase que uma ordenada lembrança a igualzinha repetição daquilo de Diadorim que ela rezasse por mim Otacília orações rezasse Ia Ah mas aí houve Amoleci mão antes de coração não pude Não pude diabralmente desarrazoado por outras fortes ordens e então de repente tive vergonha desgostei de estar querendo escrever aquela carta Desisti guardei na mochila aquela metade Um homem é um homem no que não vê e no que consome Ah não Otacília eu não merecia Diadorim era um impossível Demiti de tudo O demo tive raiva dele Pensei nele Em vezes O que era em mim valentia não pensava e o que pensava produzia era dúvidas de meenleios Repensava no esfriar do dia A quando é o do sol entrar que então até é o dia mesmo por seu remorso Ou então ainda melhor no madrugal logo no instante em que eu acordava e ainda não abria os olhos eram só os minutos e ali durante em minha rede eu preluzia tudo claro e explicado Assim Tu vigia Riobaldo não deixa o diabo te pôr selaisto eu divulgava Aí eu queria fazer um projeto como havia de escapulir dele do Temba que eu tinha mal chamado Ele rondava por me governar Mas então governar pudesse eu não era o UrutuBranco não vinha a ser chefe de nada coisa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 703 nenhuma Ah eu carecia dum jeito dum esperto socorro para tentear com o Sujo em suas próprias portas e mediante me pôr livre de fim fatal De que modo Mas acontece que o instante entre o sono e o acordado era assaz curto só perpassava não dava pé Eu não podia me firmar em coisa nenhuma a clareza logo cessava Daqueles avisos e propósitos o montante movimento do mundo me delia igual a um secar E eu mesmo estava contra mim o resto do tempo Não estava Todo o mundo cada dia me obedecia mais e mais me exaltavam Com o que peguei aos poucos o costume de pular num átimo da rede feito fosse para evitar aquela inteligencinha benfazeja que parecia se me dizer era mesmo do meio do meu coração Num arranco desfazia aquilo faísca de folga presença de beijaflor que vai começa e já se apaga e daí já estava inteirado no comum nas meiasalegrias a meiabondade misturada com maldade a meio Agora levantava puxava e arreava meu Siruiz cavalo para alvoradas Saía sozinho Sair na escuridão o senhor sabe aqueles galhos de árvores batendo na cabeça da gente Sempre eu ia até longe quando voltava encontrava o pessoal se aprontando café já coado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 704 cavalaria em fila para a viagem Uma vez inda mais longe fui do que nas outras E dei com o lázaro Ele se achava como que tocaiando no alto duma árvore por se esconder feito uma cobra ararambóia Quase levei o susto E era um homem em chagas nojentas leproso mesmo um terminado Para não ver coisas assim jogo meus olhos fora Promovi meu revólver Aquele de repente se encolheu tremido e tremeu tanto depressa que as ramagens da árvore enroscaram um rumor de vento forte Não gritou não disse nada Será que possuía sobra dalguma voz Eu tinha de esmagalhar aquela coisa desumana Dum fato na hora me lembrei do que tinham me contado da vez em que Medeiro Vaz avistou um enfermo desses num goiabal O homem tinha vindo lamber de língua as goiabas maduras por uma e uma no pé com o fito de transpassar o mal para outras pessoas que depois comessem delas Uns assim fazem Medeiro Vaz que era justo e prestimoso acabou com a vida dele Isso contavam já de dentro do meu ouvido A quizília que em mim ânsia forte o lázaro devia de feder onde estivesse adonde fosse lambuzava pior do que lesma grande e tudo empestava da doença amaldita Arte de que as goiabas de todo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 705 goiabal viravam fruta peçonhenta e deu dar no gatilho lei leal essa de Medeiro Vaz Ô guaimoré xinguei E gritei pulhas Acho que insultava era por de certo modo retardar meu dever Ele não respondeu Em ante mim assim ninguém não respondesse Mas fincava de me olhar ah ele tinha dois olhos no meio das folhas da folhagem Muito coitado ele era o senhor esteja de acordo Mas aí foi que vi e repeli o que que é ódio de leproso Na cabeça daqueles olhos eu armei minha pontaria E ouvi o vir dum cavaleiro Esperei Não dissessem que eu tinha baleado à traição o maldelazento com escondidos de não ter testemunhas Quem vinha Em já madrugamanhã tudo clareado reconheci Diadorim Embolsei a arma sem razão Diadorim me perseguia Vigia Diadorim tu pune por este eu havia de indagar apontando o esconso do leproso Estou aqui te vejo é você mesmo Riobaldo ele ia dizer Riobaldo tem tento A imaginação dessa conversa eu pensei de relance como uma brasa chia em dentro de vasilha dágua Assim estremeci eu ente Porque do bafo mesmo de minha idéia vã eu estava catando tal anúncio de acusação Tu traz o Arrenegado Eu e ele o Dê Então num sutil podia mesmo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 706 ser que ele quisesse estar tomando conta de mim Aí nem nunca nem eu rosnei riso Espinoteei na sela feito acordado dum cochilo de cão E Diadorim tropeava chegando Mas eu virei rédea e roseteei com brado meu animal cumprindo rompemos em galope que era um abismo Eh diogo dianho Eh diogo eh dião Retos fomos desabalando que um quartodelégua quase por doidejo Nós três Que eu pensei E esbarrei por tanto meu cavalo sacudiu o pescoço todo Espiei em roda até com a mão Não vi o demo Meu espírito era uma coceira enorme Como eu ia poder contra esse vapor de mal que parecia entrado dentro de mim pesando em meu estômago e apertando minha largura de respirar Aí eu carecia de negar pouso a ele A nega Eu quis Eu quis Como olhei Diadorim estava acolá estacado parado no lugar perto da árvore do homem Por certo ele tinha enxergado a coisa viva e estava desentendendo meu espaço esses desatinos Contemplei Diadorim daquela distância Montado sempre teso de consciência ele me parecia mais alto de ser e não bulia por mim avistado E o lázaro Ah esse que se espertasse que fugisse para não falecer Que é que adiantava que àquela hora João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 707 os passarinhos cantassem acabando de amanhecer o campo sertão A enquanto sobejasse de viver um lázaro assim mesmo muito longe neste mundo tudo restava em doente e perigoso conforme homem tem nojo é do humano Condenado de maldito por toda lei aquele estrago de homem estava remarcado seu corpo sua culpa Se não então por que era que ele não dava cabo do mal ou não deixava o mal dar logo cabo dele Homem ele já estava era morto Que o que Diadorim dissesse que dissesse Que aquele homem leproso era meu irmão igual criatura de si Eu desmentia Como era que sabendo de um lázaro assim eu ia poder prezar meu amor por Diadorim por Otacília E eu não era o UrutuBranco Chefe não era para arrecadar vantagens mas para emendar o defeituoso Esporeei voltando Não sou do demo e não sou de Deus pensei bruto que nem se exclamasse mas exclamação que havia de ser em duas vozes uma muito diferente da outra Vim feito Tornei a empunhar o revólver Mas completei eu mesmo aquilo que Diadorim decerto ia me responder Riobaldo tu mata o pobre mas ao menos por não desprezar mata com tua mão cravando facatu vê que por trás do podre o sangue do coração dele é são e quente Encostar nele a ponta de minha franqueira de cabo prateante Toma Tu cai no João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 708 chão Agalopando assim joguei fora meu revólver Joguei ou foi um ramo de rompegibão que relou arrancando a arma de meu pulso Cheguei esbarrei Meu cavalo tão airoso batia mão rapava ele deu um bufo de burro Vi Diadorim Mas o leprento tinha ganhado para se ir graças que não assisti à arriação dele decerto descendo às pressas se escapando de gatas nas moitas de feijãobravo Desse tive um cansaço enorme pode que seja por não saber se matava ou não matava caso ele ainda estivesse lá Do leproso Mas Diadorim conforme diante de mim estava parado reluzia no rosto com uma beleza ainda maior fora de todo comum Os olhosvislumbre meu que cresciam sem beira dum verde dos outros verdes como o de nenhum pasto E tudo meio se sombreava mas só de boa doçura Sobre o que juro ao senhor Diadorim nas asas do instante na pessoa dele vi foi a imagem tão formosa da minha Nossa Senhora da Abadia A santa Reforço o dizer que era belezas e amor com inteiro respeito e mais o realce de alguma coisa que o entender da gente por si não alcança Mas repeli aquilo Visão arvoada Como que eu estava separado dele por um fogueirão por alta cerca de achas por João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 709 profundo valo por larguez enorme dum rio em enchente De que jeito eu podia amar um homem meu de natureza igual macho em suas roupas e suas armas espalhado rústico em suas ações Me franzi Ele tinha a culpa Eu tinha a culpa Eu era o chefe O sertão não tem janelas nem portas E a regra é assim ou o senhor bendito governa o sertão ou o sertão maldito vos governa Aquilo eu repeli Antes que Diadorim mesmo abrisse boca para me sorrir me falar eu tive de fazer uma coisa A meio em ânsia meio em astúcia meio em raiva Como foi que peguei o vivo de tal idéia em gesto como se deu de que me alembrei daquilo Homem não sei Mas enfiei mão por entre armas e cartucheiras e correias de mochilas abri à berra meu jaleco e a minha camisa Aí peguei o cordão o fio do escapulário da Virgem que em tanto cortei por não poder arrebentar e joguei para Diadorim que aparou na mão Ia me fazer alguma pergunta que eu não consenti a voz dele era que mais significava Isto é porque eu primeiro falei como resumo Heiá voltar que o povoão está de minha espera eu enfim disse eu ainda estava respirando muito ligeiro demais João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 710 Assim eu dava era ordem como convinha Eu não estava de francamentes Para mim um palmo àquela hora podia medir três braças Apertei Nem meu cavalo carecia disso era eu encolher um pé e ele já via vôo À paz Mas Diadorim vez de logo vir tocou em contrário Sustentei em esbarro meu Siruiz a ver querendo as curiosidades Diadorim estava indo lá modo de caçar e recolher o revólver que de minha mão tinha caído Num repousozinho de coração calado eu agradeci à amizade dele essa fineza Daí vim Sempre longe em frente portanto que meu cavalo soberbo não dava alcance para ele se emparelhar Daí cantei Mesmo mal me canteipor causa que via que medeando tão grandes silêncios era que Diadorim tomava mais sorrateiro poder em meu afeto que não era possível concernente Entre isso chegamos de volta no arranchamento Mas cheguei lá foi para ter ocupação de uma estúrdia novidade Com os urucuianos O senhor estando lembrado aqueles cinco soturnos homens catrumanos também dos Gerais cabras do Alto Urucuia Os primeiros que com Zé Bebelo tinham vindo surgidos e que com ele desceram o Rio Paracatu numa balsa de talos de buriti Esses sempre mereceram pouca história da gente por quietos e certos bem procedidos sujeitos de furtadas palavras Agora eles comigo queriam um entendimento Um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 711 Diodato esse era o cabo deles Formou em frente dos outros puxando a parlagem Queriam conversa comigo em só apartada Eu apreciasse aqueles homens A valentia deles estava por dentro de muita seriedade Urucuiano conversa com o peixe para vir no anzol o povo diz As lérias Como contam também que nos Gerais goianos se salga o decomer com suor de cavalo Sei lá sei Um lugar conhece outro é por calúnias e falsos levantados as pessoas também nesta vida Mas aqueles cinco me condiziam Admirei de ver que eles todos ainda estavam a pé mas com dobros e bissacos nas costas feito prontos para pedestre viagem Sisudez deles ainda semelhava maior Então constituí meus ouvidos para o cabecilho Diodato Praz vosso respeito Chefe a gente decidiram A gente vamosembora Praz vossas ordens o homem me disse assim mesmo casmurro com serenidade Tive de ver bem suas feições uma cara assim se examinava aos poucos Entendi mas reperguntei O homem não coçou a cabeça Olhos de santo de madeira O nariz dele era bem grande nariz que não se empinava Só tinha a barbazinha que tem um queixo de cavalo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 712 O homem não coçou a cabeça Firme disse Queriam ir sembora duma vez careciam Ah eles bem que conheciam a regra que um jagunço sai do bando quando quer só tem que definir a ida e devolver o que ao chefe ou ao patrão pertence As armas eles não devolviam porque eram deles mas como tinham de primeiro vindo a pé largavam bem agora os cavalos Pegavam era um tanto de matula trivial de farinha e carneseca e rapadura para uns três dias mal Mesmo assim era doideira achei Doideira tencionarem vagar reto dali donde estávamos alto ermo distantes brenhas Por que é que iam nem esperando eu desse minha primeira ganhada A isso meio acontecidos Chefe A conforme a gente carece praz vosso respeito senhor sim o homem meio respondeu bastante sincero Reparei no chapéu na cabeça dele que era de couro de veado suaçuapara com macias abas e formato muito composto A cara dele mesmo dava um ar honrável circunspecto por mal que com manchas sarro de alguma velha moléstia semelhando nódoas de caldo de caju Sua graça toda é Diodato de quê indaguei Diodato Nariz por alcunha ele disse disse de brancura Conheci como eu nunca tinha dado tento datenção naqueles homens cuja valia Assim que eles eram de batismo e o Pantaleão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 713 Salústio João João Tatu e OBispo Naquela hora era que eu punha tino Nunca mais tive notícia desses Hoje repenso Naquela hora eu cogitava jeito de conservar todos em companhia Remei minhas perguntas Donde que eram Desses córregos Do BuritiComprido Tamboril Cambaúba Virgens MataCachorro das Cobras Para cima da BazradaVaca Ari nos Em sertão são Isso que são lugares E que é que me adiantava saber que tinham suas ocas por lá O que eu inventei de conhecer era donde tinham estado quando Zé Bebelo deu com eles que vinha voltando de Goiás Ah senhor sim nas beiras Roças do rio São Marcos senhor sim no Esparramado Fazenda duma Dona Mogiana Cabras dessa Dona Mogiana Eram Tinham sido Mas com sua labuta de plantações Que qualidades de crimes eles tinham feito para principiar crimes de boa inerência E por que era que tinham querido vir com Zé Bebelo Isso eu quis perguntar O que de repente perguntei Por via de que é que vocês desespiritaram de seguir vinda com a gente Falei e refuguei para não ter falado que gabo e questão não são regra de se negociar Mas o homem Diodato distanciado duma minha pergunta dessas esbarrou vez demorão mesmo num desajeito ele fungava E ele comigo não tinha ajuste mas não queria me ofender sem a razão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 714 Chega olhou para os companheiros que acenavam devagar com as cabeças mas numa maneira brandazinha de sonsa fora de tudo o mais para não se entender se é sestro ou anuído que é do jeito comum como essa gente costuma Ara senhor sim por fim ele falou resposta que a influência esmoreceu A gente gastou o entendido e estava quase meio envergonhado Eu disse A pois Não vê Chefe praz vosso respeito as coisas demudaram Que viemos com siu Zé Bebel Vai a gente gastou o entendido ele disse O que Zé Bebelo falou quando chamou vocês A foi Quando chamou senhor sim Ele prometeu vantagens Não se diz Chamou Falou misturado A gente viemos E o que é que falou Agora a gente não sabe mais Falou muito razoável Falou muito razoável Agora com perdão vosso a gente esquecemos a gente gastou o entendido Mas muito razoável falou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 715 De irritado de afleima dei o discutir Pois por que é então que não foram logo com Zé Bebelo quando Zé Bebelo se foi Deixamos o tempo dos outros passar Não temos questão Não temos questão Mirei e vi o que desde de antes me invocava Aquele homem por uns astutos indícios se apartando ele desconfiasse de mim Aqueles outros homens os do todo sertão das brenhas os com as ventas largas para baixo cadaum um cão o que era que eles achavam em meu ser Repensei ah Ah então para avaliar em prova a dúvida deles tive um recurso A manha como de inesperadamente de repente eu muito disse Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo Senhor vendo como foi o supetão de susto que ele teve arregalado conforme me olhava e naquilo ouvido não acreditava o tanto que retardou para responsar todo baixo o Para sempre Ah Despedidos estavam podiam ir Ah Ah não A bobéia Se ele em fato estranhou foi somente por causa do tom de minha voz Se foi por minha voz foi João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 716 porque no afã de querer pronunciar sincero demais o santíssimo nome eu mesmo tinha desarranjado fala essas nervosias E eles iam sembora conforme desisti de sobreguardar esses homens Do jeito de que é que me valiam O contrato de coragem de guerreiros não se faz com vara de meirinho não é com dares e tomares Fino que me abespinhei por conta Ao que aqueles homens não eram meus de lei eram de Zé Bebelo E Zé Bebelo era assim instruído e inteligente em salão de fazenda Desisti dado Não baboseio E o mais Era como alguém dizendo Vai declarar seca por esse Norte e homem e mulher vão vir A vida é um vago variado O senhor escreva no caderno sete páginas Aqueles urucuianos não iam em cata de Zé Bebelo conforme sem nem satisfação fiquei sabendo Voltavam de volta para os seus recantos Quartel de mandioca em qualquer parte se planta e o senhor derruba um mato faz um chão bom roça também se semeia Eles foram embora deixei levarem os cavalos Reparti com eles alguma quantia e com alegria se arregalaram dinheiro é sempre amigoseja Estúrdio é o que digo nesta verdade que eu livre longe deles desaluídos é que eles estavam comigo mas eu quisesse com gana o préstimo deles então só me serviam era na falsidade O senhor me entende E digo que eles eram homens tão diversos de mim tão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 717 suportados nas coisas deles que por contar o que achei que devia de ter pedido a eles a lembrança de muito rezarem por meu destino Mas de desertarem de mim então será que era um agouro Não sei Que sei Tive fé em mim sozinho O que juro e que sei é que tucano tem papo Achava Adiante dias de caminho achei de querer e não querer em contrários instantes que rezassem por mim a rogo e paga Reza boa de outros singela que mais me valesseessas avemariazinhas novenas Assim conforme Diadorim tinha expedido o recado para minha Otacília mediante o arrieiro de uma tropa Pelejei por afirmar a idéia nisso que próprio depois eu enxotava Às vezes as melhores haviam de ser as rezas de mais longe desconhecidamente Me lembrei de um homem de minha meninice Um do outro lado do rio O sujeito que escondia uma oração tão entremunhada desguisada que duvido mesmo um padre aquilo entendesse e desse licença Pois ora me servia Ou a mulher que teve seu meninozinho parido no chão do rancho no povoado dos papudos ela me devia mercês então não podia encaminhar a Deus por miM nem um louvamém Só será que o arrieiro passa e vai na Santa Catarina João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 718 Isso perguntei a Diadorim O que perguntei era por uma opinião Eu queria pensar nisso de tarde nos repontos De assento Mas logo esse sossego manso me largava nuvenzinha dele Vaqueiro pode laçar o lugar do ar Às voltas e revoltas eu pelejava contra o meu socorro Hoje eu sei pois sei porquê Mas eu não falava sozinho Figuro que estava em meu são juízo Só que andava às tortas num lavarinto Tarde foi que entendi mais do que meus olhos depois das horrorosas peripécias que o senhor vai me ouvir Só depois quando tudo encurtou Dei decreto de fim em essas esquisitices No que não perguntei Diadorim me respondeu A muita coragem Riobaldo Se carece de ter muita coragem Ah eu sabia A coragem eu Aí quem era que me vencesse nesse dever alirolé quem podia afrontar minha presença feito morro padastro Tinha mãos e ações que davam para lavar meus trajes Mas o que Diadorim disse não me fez mossa Dou exemplo Do que houve e se passou uma vez no Carujo um arraial triste em antigos tempos O povo dali fugiu por alguma guerra ou pressa fecharam a igrejinha com um morto lá dentro entre as velas Eu gostava de Diadorim corretamente gostava aumentado por demais separado de meus sobejos Aquilo davandito ele tinha falado solto e sem serviço era só uma João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 719 recordação assim um fraseado verdadeiro ditado da vida O que não fosse destinado para ele nem para mim mas que era para todos Ou então sendo para mim mas em outros passados de primeiro Ali naquele lugar o Carujo no reabrirem depois de uns meses a igreja o defunto tinha se secado sozinho Ao por tanto que se ia conjuntamente Diadorim e eu nós dois como já disse Homem com homem de mãos dadas só se a valentia deles for enorme Aparecia que nós dois já estávamos cavalhando lado a lado par a par a vaiavida inteira Que coragem é o que o coração bate se não bate falso Travessia do sertão a toda travessia Só aquele sol a assaz claridade o mundo limpava que nem um tremer dágua Sertão foi feito é para ser sempre assim alegrias E fomos Terras muito deserdadas desdoadas de donos avermelhadas campinas Lá tinha um caminho novo Caminho de gado Arte que eu achei o meu projeto Só digo como foi do prazer mesmo sai a estonteação como que um perde o bom tino Porque viver é muito perigoso Diadorim o rosto dele era fresco a boca de amor mas o orgulho dele condescendia uma tristeza Matéria daquilo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 720 que me desencontrava motivo esse que me entristeceu A nenhum Eu já estava chefe de glórias Nem Diadorim não duvidava do meu roteiro que fosse para encontrar o Hermógenes Desse jeito a gente ia descendo ladeiras Ladeiras areentas e com pedras com os abismos dos lados e tão a pique que podiam rebentar os rabichos dos arreios no despenhado no ali descer os cavalos muito se agachavam de ancas feito se os pescoços deles se encompridassem e montões de pedras para baixo rola vam Até ri Diadorim ainda cria mais no meu fervor em se ir perseguir o Hermógenes Essas ladeiras era que me atrasavam Depois dali eu ia ter muita pressa demais Agora o senhor saiba qual era esse o meu projeto eu ia traspassar o Liso do Suçuarão Senhor crê sem estar esperando Tal que disse Ainda hoje eu mesmo disso para mim eu peço espantos Qu é que me acuava Agora eu velho vejo quando cogito quando relembro conheço que naquele tempo eu girava leve demais e assoprado Deus deixou Deus é urgente sem pressa O sertão é dele Eh o que o senhor quer indagar eu sei Porque o senhor está pensando alto em quantidades Eh Do demo Se é como corujão que se voa de silêncio em silêncio pegando ratomestre João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 721 o qual carrega em mão curva No nada disso não pensei como é que pudesse A invenção minha era uma os minutos todos tivesse um relógio A atravessar o Liso do Suçuarão Ia Indo fui ficando airoso Por forma como a gente rodeou outra volta não se passando no Vespê e no BambualdoBoi nenhum de meus homens não tirou palpite desse propósito Pasmo deles ia ser Daí uns desconfiavam de se estar onde estávamos Donde a perto dele umas poucas cinco léguas o desmenso o raso enorme por detrás dos morros E a gente dava a banda da mão esquerda ao VãodoOco e ao VãodoCuio esses buracões precipícios grotão onde cabe o mar e com tantos enormes degraus de florestas o rio passa lá no mais meio oculto no fundo do fundo só sob o bolo de árvores pretas de tão velhas que formam mato muito matagal Isto é um vão E num vão desses o senhor fuja de descer e ir ver aindas que não faltem as boas trilhas de descida no barranco matoso escalavrado entre as moitarias de xaxim Ao certo que lá embaixo dá onças que elas vão parir e amamentar filhos nas sorocas e anta velhusca moradora livre de arma de caçador Mas o que eu falo é por causa da maleita da pior febre ali no oco é coisa é grossa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 722 mesma Terçã maligna pega o senhor a terçã brava que pode matar perfeito o senhor antes do prazo de uma semana No que eu no meu destino não pensei Diadorim em sombra de amor foi que me perguntou aquilo Riobaldo tu achasses que uma coisa mal principiada algum dia pode que terá bom fim feliz Ao que eu abirado reagi Mano meu mano te desconheço Me chamo não é UrutuBranco Isto que heide já maximé Diadorim persistiu calado guardou o fino de sua pessoa Se escondeu e eu não soubesse Não sabia que nós dois estávamos desencontrados por meu castigo Hoje eu sei isto é padeci O que era uma estúrdia queixa e que fosse sobrosso eu pensei Assim ele acudia por me avisar de tudo e eu em quentes me regendo não dei tino Homem sei A vida é muito discor dada Tem partes Tem artes Tem as neblinas de Siruiz Tem as caras todas do Cão e as vertentes do viver O que na hora achei foi que Diadorim estivesse me relembrando de Medeiro Vaz não ter conseguido cruzar a travessia do raso Mas Diadorim também não adivinhou meu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 723 espírito Pois por aquela conta mesma era que eu queria Sobre o que eu era um homem em sim fantasia forra tendo em nada aqueles perigos capaz do caso Para vencer vitória aonde nenhum outro antes de mim tivesse Respinguei dessas faíscas constantes Eu não o cujo do orgulho de mim do impossível Descia e subia a fumaça da noite Esbarramos Era numa curta vereda duns brejos buritizalzinho Acendemos fogo Aí mal dormi fortíssimo no meu segredo Um meu primeiro sono sim O resto foi ondas Reprazer cru dessa espiritação eu ardia em mim e em satisfa contente feito fosse véspera duma patusqueira As forças me amanheceram acordado Adiante da gente o mangabeiral Depois o raso Aí o Liso do Suçuarão em fundo e largo as cinqüenta léguas e as quase trinta léguas das mais Ninguém me fazia voltar a seco de lá Aquela hora eu só não me desconheci porque bebi de mim esses mares Também eu não ia naquilo sem alguma razão mas movido merecido Por conta do Hermógenes Nossos dois bandos viajavam em guerra e contraguerra e desenrolando caminhos por esses Gerais cães se caçando Só que o sertão é grande ocultado demais Então eu ia varava o Liso ia atacar a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 724 Fazenda dele com família Ovo é coisa esmigalhável E a bem Para vencer justo o senhor não olhe e nem veja o inimigo volte para a sua obrigação Mas eu dava as costas à cobra e achava o ninho dela para melhor acerto Ao que esse não tinha sido o arrojo de Medeiro Vaz O dia parava formoso suando sol mesmo o vento suspendido Vi o chão mudar com a cor de velho e as lagartixas que percorriam de leve por debaixo das moitas de caculucage O pessoal meu não devia de estar com inquietação Vi uma coruja mas corujinha entortadeira e coruja só agoura mesmo é em centro de noite quando dá para risã E cuspi no branco leite duma mariabrava que toda às sãs cheirosa florescia Era a hora Repuxei os freios bem esbarrando Equei os meus homens Aqui gente Guerreiros em minha presença Com certo rebuliço como todos vieram para saber daquela novidade Declarei a eles Todos me entenderam Em fila as caras todas ficando iguais Me seguissem Ah nenhum não tinha ar do que ia ser e que fazia tantos dias eu tencionava Nem João Goanhá Marcelino Pampa João Concliz nem o Alaripe Nem Diadorim Diadorim me olhou tremeluzentemente de coragem de disposto Ele sim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 725 Mas os outros Seria que medissem meu mor atrevimento Era feito se eu estivesse aloucado extenso Porque o que eu estava mandando nem Medeiro Vaz mesmo não teria sido capaz de crer eu queria tudo sem nada Aprofundar naquele raso perverso o chão esturricado solidão chão aventesma mas sem preparativos nenhuns nem cargueiros repletos de bom mantimento nem bois tangidos para carneação nem bogós de courocru derramando de cheios nem tropa de jegues para carregar água Para que eu carecia de tantos embaraços Pois os próprios antigos não sabiam que um dia virá quando a gente pode permanecer deitada em rede ou cama e as enxadas saindo sozinhas para capinar roça e as foices para colherem por si e o carro indo por sua lei buscar a colheita e tudo o que não é o homem é sua dele obediência Isso não pensei mas meu coração pensava Eu não era o do certo eu era era o da sina E nem enviei adiante nenhuma patrulha de farejadores nem Suzarte Nélson ou o Quipes que tapejassem nem o Tipote para trilhar e entender ver se divulgava os socorros alguma grota duvidável dágua Se o cada um que se valesse cada um que me seguisse Agora vamos entrar para pernoitar lá dentro eu determinei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 726 Só era se aviar Mas o menino Guirigó mal me ouvindo falou A gente A gente Esse era um menino eu não devia de mandar alguém conduzir o Guirigó de volta para que em lugar seguro deixassem No ar não fiz Se não por que era então que ele para tudo tinha vindo Os outros não me cumprissem eu havia de voltar de lá dar de mão de minha tenção Nuncas Só melhor sozinho eu ia Ia por meus brancos ossos Transe tempo que esperei a resposta deles Dei a palavra Meus homens Ah jagunço não despreza quem dá ordens diabradas Se amanhã meu dia for em depoisdamanhã não me vejo Antes de menino nascer hora de sua morte está marcada Teu destino dando em data da meianoite tu vivente não passa Os que diziam assim eram todos eles secundando os cabecilhas Valentes que eram e como foram se animando Ao que me obedeciam ao meu melhor em redor A gente andou no comum até ao fim do grameal Aí se estava se esbarrava frente a frente com o Liso Rédeas às ordens A gente se moveu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 727 Sol em glória Eu pensei em Otacilia pensei como se um beijo mandasse Soltando rédeas entrei nos horizontes Aonde entrei na areia cinzenta todos me acompanhando E os cavalos vagarosos viajavam como dentro dum mar O senhor vê e vê Alguém a alto me levou alguém salvo a um seguinte Águas não desmanchavam meu torrão de sal Ah nem eu não tive incerteza em mente Assim fomos Aí eu em frente adiante A fortes braços de anjos sojigado O digo Os outros a em passo em passo usufruíam quinhão da minha andraja coragem Rasgamos sertão Só o real Se passou como se passou nem refiro que fosse difícilah essa vez não podia ser Sobrelégios Tudo ajudou a gente o caminho mesmo se economizava As estrelas pareciam muito quentes Nos nove dias atravessamos Todos bem todos tirante um Que conto O que era que o raso não era tão terrível Ou foi por graças que achamos todo o carecido nãostante no ir em rumos incertos sem mesmo se percurar De melhor em bom sem os maiores notáveis sofrimentos sem emerrar ponto O que era no cujo interior o Liso do Suçuarão era um feio mundo por si exagerado O chão sem se vestir que quase sem seus tufos de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 728 capim seco em apraz e apraz e que se ia e ia até nãoonde a vista não se achava e se perdia Com tudo que tinha de tudo Os trechos de plano calçado rijo casco que fere faíscas cavalo repisa em pedra azul Depois o frouxo palmo de areia de cinza emsobre pedras E até barrancos e morretes A gente estava encostada no sol Mas com a sorte nos mandada o céu enuveou o que deu pronto mormaço e refresco Tudo de bom socorro em az A uns lugares estranhos Ali tinha carrapato Que é que chupavam por seu miudinho viver Eh achamos reses bravas gado escorraçado fugido que se acostumaram por lá ou que de lá não sabiam sair um gado que assiste por aqueles fins e que como veados se matava Mas também dois veados a gente caçou e tinham achado jeito de estarem gordos Ali então tinha de tudo Afiguro que tinha Sempre ouvi zum de abelha O dar de aranhas formigas abelhas do mato que indicavam flores Todo o tanto que de sede não se penou demais Porque solerte subitamente pra um mistério do ar sobrechegamos assim em paragens No que nem o senhor nem ninguém não crê em paragens com plantas De justiça digo também uma regra se teve sem se saber de quem foi que veio a idéia dessa combinação Qual foi que a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 729 gente se apartou em grupos de poucos jornadeando com a maior distância aberta Mas que assim quando um avistasse qualquer coisa diversa podia dar sinal chamando os outros para novidade boa Eu que digo Mesmo não era só capim áspero ou planta peluda como um gambá morto o cabeçadefrade pintarroxa um mandacaru que assustava Ou o xiquexique espinharol cobrejando com suas lagartonas aquilo que em chuvas de flor dói em branco Ou cacto preto cacto azul bicho luíscacheiro Ah não Cavalos iam pisando no quipá que até rebaixado esgarço no chão e começavam as folhagens que eram urtigão e assapeixe e o neves mas depois a tintadosgentios de flor belazul que é o aniltrepador e até essas sertanejaassim e a mariazipe amarelas pespingue de orvalhosas e a sinhazinha muito melindrosa flor que também guarda muito orvalho orvalho pesa tanto parece que as folhas vão murchar E erva curraleira E a quixabeira que dava quixabas Digo se achava água O que não emapenas água de touceira de gra vatá conservada Mas em lugar onde foi córrego morto cacimba dágua viável para os cavalos Então alegria E tinha até uns embrejados onde só faltava o buriti palmeira alalã João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 730 pelas veredas E buracopoço água que dava prazer em se olhar Devido que nas beiras o senhor crê se via a coragem de árvores árvores de mata indas que pouco altaneiras simaruba o anis caneladobrejo pauamarante o pombo e gameleira A gameleira branca Como outrotempo se cantava Sombra só de gameleira na beira do riachão Assim achado tudo e o mais sem sobranço nem desgosto eu apalpei os cheios O respeito que tinham por mim ia crescendo no bom entendido dos meus homens Os jagunços meus os riobaldos raça de UrutuBranco Além Mas daí um pensamento que raro já era que ainda me vinha de fugida esse pensamento então tive O senhor sabe O que me mortifica de tanto nele falar o senhor sabe O demo Que tanto me ajudasse que quanto de mim ia tirar cobro Deixa no fim me ajeito que eu disse comigo Triste engano Do que não lembrei ou não conhecesse que a bula dele é esta aos poucos o senhor vai crescendo e se esquecendo Daí mesmo que certa hora Diadorim se chegou com uma avença Para meu sofrer muito me lembro Diadorim todo formosura João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 731 Riobaldo escuta vamos na estreitez deste passo ele disse e de medo não tremia que era de amor hoje sei Riobaldo o cumprir de nossa vingança vem perto Daí quando tudo estiver repago e refeito um segredo uma coisa vou contar a você Ele disse com o amor no fato das palavras Eu ouvi Ouvi mas mentido Eu estava longe de mim e dele Do que Diadorim mais me disse desentendi metade Só sei que no meio reino do sol era feito parássemos numa noite demais clareada Assim figuro Dentro de muito sol eu estava reparando uma cena que era um jumentinho um jegue já selvagem caatingano no limpo do campo caçando o que roer assaz pelos cardos Eu não tinha de tomar tento em coisas mais graves Mire veja o senhor Picapau voa é duvidando do ar Que tal Zé Bebelo na hora me lembrei quando mal irado ou quando conforme querendo impor medo a todos Norte de Minas Norte de Minaso que bramava E ele estava com a razão Mas Zé Bebelo era projetista Eu eu ia por meu constante palpite Usando de toda ajuda que me vinha mas prevenido sempre contra o Maligno que o que rança o que azeda As traças dele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 732 são novas sempre e povoadas tantas são que nem os tins de areia grãoindo em areal Então eu não sabia Ah quase que eu estava cogitando nisso quando o homem rosnou Quem ele era digo em qualidade um troncudo pardaz genista filho não sei de que terra Assim casta de gente Ah não Por meu bem eu estava em todo o meu siso Até mais Não faço caso eu disse isto é pensei dizendo Eu não queria somar com aquilo nenhum porque cheirava ao Cujo esses estratagemas Era do demo eu tirei um enredo Pois então paz eu falei me falei Não faço conta me prometi Eu estava em manhas Estive que estive no embalançar em equilibrável Tico tanto pensei Mas tudo era frisado ligeiro ligeiro feito cavalo que pressente fúria de boi Aí escutei a voz a voz dele tremia nervosa como de cabrito da maneira que gritou à briga Um desfeliz Levei os olhos Ah quem o homem era eu já sabia ele se chamava Treciziano O bruto para falar com ele só a cajado Eu sabia Rebém que desconfiei do demo Ali esse Treciziano era fraco de paciências ou será que estivesse curtindo mais sede do que os João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 733 outros segundo esse tremor das ventas e pegou a malucar Diziam que ele criava dordecabeça e padecia de erupções e dartros Estava falando contra comigo reclamando gritou uma ofensa Homem zuretado esbraseia os olhos Eu senhor de minhas inteligências como fica dito Eu estava podendo refletir em passo de jumento Siô deixa o padre of recer missa falei para mim mesmo Eu queria tolerar primeiro porque o demo não era homem para mandar em mim e me pôr em raiva Aí era só eu forçar calma tenteador depois com palavras de energia boa eu acautelava evitando a jerimbamba e daí repreendia esse Treciziano revoltoso próprio por autoridade minha mas sem pau nem pedra Que dessa chefe eu o O não me pilhava Mas ah quem diga um faz mas não estipula O que houve que se deu Que vi Com a sede sofrida um incha padece nas vistas chega fica cego Mas vi Foi num átimo Como que por distraído num dividido de minuto a gente perde o tino por dez anos Vi ele o chapéu que não quebrava bem o punhal que sobressaía muito na cintura o monho o mudar das caras Ele era o demo de mim diante O Demo Fez uma careta que sei que brilhava Era o Demo por escarnir próprio pessoa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 734 E ele endireitou pontudo para sobre mim jogou o cavalo O demo Em mim danouse Como vinha terrível naquele agredimento de boi bravo Levantei nos estribos Ehê Esse luzluziu a faca afiafe e urrou de ódio de enfiar e cravar se debruçando para diante todo Tirou uma estocada Cerrei com ele A ponta daquela pegou por um mau movimento nas coisas e trens que eu tinha na cintura e a tiracol se prendeu ali um mero Às asas que eu com a minha quicé a lambe leal pajeuzeira em dura mão peguei por baixo o outro encortei recortei desde o princípio da nuca ferro ringiu rodeando em ossos deu o assovião esguichado no se lesar o canodoar e mijou alto o sangue dele Cortei por cima do adão Ele Outro caiu do cavalo já veio antes do chão com os olhos duros apagados Morreu maldito morreu com a goela roncando na garganta E o que olhei Sangue na minha faca bonito brilho feito um verniz veludo E ele estava rente aos espinhos dum mandacaruquadrado Conforme tinha sido Ahoh Aoh mas ninguém não vê o demônio morto O defunto que estava ali era mesmo o do Treciziano João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 735 A morte dele deu certo E era segundo tinha de ser E tinha de ser por tanto que o demo não existe As tramóias armadilhas Nem nunca mais daí por diante eu queria pensar nele Nem no pobre do Treciziano que estava ali degolal que eu tinha Um frio profundíssimo me tremeu Sofri os pavores disso da mão da gente ser capaz de ato sem o pensamento ter tempo Somente todos me gabaram com elogios e palavras prezáveis porque a minha chefia era com presteza Fosse de tiro tanto não admiravam a tanto porque a minha fama no gatilho já era a qual à faca eh fiz E do outro grupo longe mas que era o mais perto da banda da mão esquerda um escutou ou viu e veio Era o Jiribibe mocinho Jiribibe num cavalo preto galopeiro Diadorim tinha disparado tiro só esmo de nervosia Dentro de pouco todos iam ficar cientes da proeza daquele homem tão morto das beiras do corte lá nele a pele subia repuxada a outra para baixo tinha descaído tamanhamente quase nas maminhas até deixavam formado o buraco medonho horrendo se aparecendo a toda carnança Aí Alaripe esclareceu Ao que sei este era da Serra dUmã O de tão longe o sapo leiteiro Uns estavam remexendo nele não tinha um pêlo nos peitos Assim queriam desaliviar aquele corpo das coisas de valor João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 736 principais Do que alguém disse que ele guardava um dixe joiazinha de prata e as esporas eram as excelentes de bom metal Não turveei Morte daquele cabra era em ramo de suicídios A modo que morreu Ele foi para os infernosindagou em verdade o menino Guirigó Antes o que era que eu tinha com isso como todos me louvaram Sendo minha a culpa a morte isso sei mas o senhor me diga meussenhor a horinha em que foi a horinha Como que o cego Borromeu garrou um fanhoso recitar pelos terços e responsos Medo de cego não é o medo real Diadorim me olhava eu estivesse para trás da lua Só aí revi o sangue Aquele em minha roupa a plasta vermelha fétida Do sangue alheio que grosso me breava mal me alimpei o queixo eu desgostoso de sangue mas deixava de sinal Ah não pois ali me salteou o horror maior Sangue Sangue é a coisa para restar sempre em entranhas escondida a espécie para nunca se ver Será por isso também que imensa mais é a oculta glória de grandeza da hóstia de Deus no ouro do sacrário toda alvíssima e que mais venero com meus joelhos no duro chão Por mais o corpo ali ficava para o ar do raso Sumimos de lá háse que tocávamos adiante À viajadamente eu ia desconversei meu espírito Até às aleluias João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 737 Que como conto Aquele Treciziano tinha redobrado destino de tristefim de louco Pois nem bem três léguas andadas daí depois a gente saía do Liso como que a ponto dávamos com uma varzeazinha e um esporão da serra chapadas digo Apeei na terra cristã Se estava no para ver esses campos crondeubais da Bahia Adiante vim para pedir gole dágua todo pacífico no rancho de um solteiro esse deu informação de que dez léguas em volta o povoal ia existindo sem questão Somente seguimos Dali antes a gente tinha passado o AltoCarinhanha lá é que o ReiDiabo pinta a cara de preto Onde chegados na aproximação do lugar que se cobiçava Dado dia e meio descrevendo no rumo que certo achamos logo se havia de ter a casa da raça do Hermógenes Lei de que íamos dar lá madrugando madrugada pegando todos desprevenidos em movível supetão Pois o Hermógenes parava longe em hora recruzando meus antigos rastros estes rasgos ele não adivinhava Aí era o meu contrabalanço Ah choca mal quem sai do ninho Ao que por isso não tardamos não tivessem a primeira notícia da gente Não se tomou nem um dia de fôlego A trote e a chouto vencemos uma grande noite e demos lá no luzir dalva João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 738 Abarcamos as condições do lugar em cerco entendidos uns com uns por meio de avisos que eram canto de acauã e assovio de macaco Porque sempre eles deviam de ter alguns curimbabas na defesa capangas e carabinas Daí só se esperou o listrar da primeira barra e a ponta da manhã estremecente Segundo nosso uso Demos fogo Digo franco feio o acontecido feio o narrado Sei Por via disso mesmo resumo não gloso No fim o senhor me completa Mas fazia tempo que não se dava combate e o propor da gente era tribuzana essas ferocidades assim A casa da fazenda aquele reto claro caiado mas era um casarão acabando o tope do morrete enganando até parecia torta Varejamos o total a tiro Aí e o que se gritava azurradamente Aqueles que estavam lá eram homens ordinários derreteram debaixo do pé de meus exércitos O que foi um desbarate Como que já estavam de asas quebradas nem provaram resistências deles mal ouvi uns tiros E a gente nós estouramos para o centro a surto sugre destrambelhando na polvorada feito rodeio de vento Assaz Do que fiz desisto Todos não fizeram Volvido receei que Diadorim não me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 739 aprovasse mas Diadorim concordou com os fatos em armas em frente O que se matou e estragou de gente humana e bichos até boi manso que lambia orvalhos até porco magro em beira de chiqueiro O mal regeu Deus que de mim tire Deus que me negocie À vez De seguida tochamos fogo na casa pelos quinze cantos mortos Armou incendião queimou de uma vez como um pau de umburana branca E de lá saímos quando o fogo rareou tardezinha E na manhã que veio acampouse em beiradágua de sossego A gente traspassava de cansaços e sobra de sono Mas trazida presa já em muito nosso poder estava a merecida que se queria tanto a mulher legal do Hermógenes Aquela mulher sabia dureza riscava Ela discordava de todo destino Assim estava com um vestido preto surrado muito desbotado caiu o pano preto que tinha enlaçado na cabeça e ela não se importou de ficar descabelada Deixaram ela sentar sentou Nunca encurtou a respiração Devia de ter sido bonita nos festejos da mocidade ainda era Deram a ela de comer comeu De beber bebeu A curto respondeu a algumas duas ou três coisas e logo depois de falar apertava demais a boca fechada estreitos finos beiços Mas falava quase assoviado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 740 Figuro que não mascava fumo nem cachimbava mas mesmo assim cuspia em roda mas não passava a sola do pé por cima para alimpar o chão como é costume de se fazer nessas condições Adverti que estava descalça e assim devia de ser fora do uso decerto por causa da hora e confusão em que tinha sido pega Se arranjou para ela par de alpercatas Ela soubesse que não se pertencia com a gente Aceitou meu olhar seca seca com resignação em quieto ódio pudesse até com as unhas dos pés me matava Enrolou a cara num xale verde verde muito consolado Mas eu já estava com ela com os olhos dela para a minha memória Magreza na cara fina de palidez mas os olhos diferiam de tudo eram pretos repentinos e duráveis escuros secados de toda boa água E a boca marcava velhos sofrimentos Para mim ela nunca teve nome Não me disse palavra nenhuma e eu não disse a ela Tive um receio de vir a gostar dela como fêmea Meio receei ter um escrúpulo de pena certo não temi abrir razão de praga Muito melhor que ela não carecesse de vir Ser chefe às vezes é isso que se tem de carregar cobras na sacola sem concessão de se matar E ela ficava assim embiocada sem semblantes com as mãos abertas de palmas para cima como se para sempre demonstrar que não escondia arma de navalha ou porque pedisse esmola a Deus Lembro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 741 dessa mulher como me lembro de meus idos sofrimentos Essa que fomos buscar na Bahia É de ver que não esquentamos lugar na redondez mas viemos contornando só extorquindo vantagens de dinheiro mas sem devastar nem matar sistema jagunço E duro capitaneei animado de espírito O Jalapão me viu os todos Gerais me viram demais Aqueles distritos que em outros tempos foram do valentão VoltaGrande Depois mesmo Goiás a baixo a vago A esses muito desertos com gentinha pobrejando Mas o sertão está movimentante todotempo salvo que o senhor não vê é que nem braços de balança para enormes efeitos de leves pesos Rodeando por terras tão longes mas eu tinha raiva surda das grandes cidades que há que eu desconhecia Raivaporque eu não era delas produzido E nave guei salaz Tem as telhas e tem as nuvens Eu podia lá torcer o azul do céu por minhas mãos Virei os tigres mas mesmo virei sendo o UrutuBranco por demais Somente que me valessem indas que só em breves e poucos na idéia do sentir uns lembrares e sustâncias Os que por exemplo os seguintes eram a cantiga de Siruiz a Bigri minha mãe me ralhando os buritis dos buritis assim aos cachos o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 742 existir de Diadorim a bizarrice daquele pássaro galante o manuelzinhodacroa a imagem de minha Nossa Senhora da Abadia muito salvadora os meninos pequenos nuzinhos como os anjos não são atrás das mulheres mães deles que iam apanhar água na praia do Rio de São Francisco com bilhas na rodilha na cabeça sem tempo para grandes tristezas e a minha Otacília No sirgo fio dessas recordações acho que eu bateava outra espécie de bondade Devo que devia também de ter querido outra vez os carinhos daquela moça Nhorinhá nessas ocasiões Por que será que aí eu não formei a clareza disso de a propósito Por lá adiante na vastança era rumo de onde ela agora morava Isso sim andadamente Mas não conheci e demos volta Tempos escurecidos O que meus olhos não estão vendo hoje pode ser o que vou ter de sofrer no dia depois damanhã Ao que inventei enquanto assim se vinha por pobres lugares aos poucos eu estive amaestrando os catrumanos o senhor está lembrado deles ensinando aqueles catrumanos para as coisas de armas do que houvesse de pior Eles já prometiam puxo eh burro só não gosta é de principiar viagens Aprovei de ver o Teofrásio principal deles apontando em homem malandro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 743 inocente com a velha garrucha que era a dele com os dois canos encavalados Mas que atirasse não consenti Zé Bebelo havia de admitir assim de se fazer excessos Ali quem se lembrava de Zé Bebelo eram minhas horas de muita inteligência Assim ele ainda vivesse certo havia de ter algum dia notícia do que eu estava executando que a gente trazia a Mulher com ela agarrada em mãos se ia necessitar o Hermógenes a dar combate Essa mulher conforme vinha num definitivo mau silêncio a cara desaparecida pelo xale verde escanchada em seu cavalo Tinham dado a ela um chapéudepalha de ouricuri por se tapar do forte sol baiano A mais dela não se ouviu queixa ou reclamação nem mesmo palavra O que eu desentendia nela era aquela suave calma tão feroz que seria aferrada em esperar essa capacidade Se o ódio só era que dava a ela certeza de si o ódio então era bom na razão desse sentido que às vezes é feito uma esperança já completada Deus que dele me livrasse Mas o homem em quem o catrumano Teofrásio com sua garrucha antiqüíssima apontou era um velho Desse eu digo salvei a vida Socorrido assim pelo fato deu não conseguir conhecer a intenção da existência dele sua razão de sua consciência Ele morava numa burguéia em choça muito de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 744 solidão entre as touças da semprevivaserrã e lustro das folhagens de palmeirapindoba Eu com outros tinha subido no tope do morro que era de espalhaventos De lá do alto a mente minha era poder verificar muitos horizontes E mire veja em quinze léguas para uma banda era o São Josezinho da Serra terra florescida onde agora estava assistindo Nhorinhá a filha de Ana Duzuza Assunto que na ocasião meu espírito me negou digo o dito Além além Dela eu ainda não tinha podido receber a carta enviada Para mim era só uma saudade a se guardar Hoje é que penso Nhorinhá namorã que recebia todos ficava lá era bonita era a que era clara com os olhos tão dela mesma E os homens porfiados gostavam de gozar com essa melhora de inocência Então se ela não tinha valia como é que era de tantos homens Mas no vir de cimas desse morro do Tebá quero dizer Morro dos Oficios redescendo demos com o velho na porta da choupã dele mesmo Homem no sistema de quasedoido que falava no tempo do Bom Imperador Baiano barba de piaçava goianobaiano O pobre que não tinha as três espigas de milho em seu paiol Meio sarará A barba de capinzal sujo e os cabelos dele eram uma ventania Perguntei uma coisa que ele não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 745 caprichou de entender e o catrumano Teofrásio que já queria se mostrar jagunço decisivo o catrumano Teofrásio bramou abocou a garruchona em seus peitos dele Mas que não deu tujo Esse era o velho da paciência Paciência de velho tem muito valor Comigo conversou Com tudo que em tão dilatado viver ele tinha aprendido Deus pai como aquele homem sabia todas as coisas práticas da labuta da lavoura e do mato de tanto tudo Mas agora que tanto aforrava de saber o derrengue da velhice tirava dele toda possança de trabalhar e mesmo o que tinha aprendido ficava fora dos costumes de usos Velhinho que apertava muito os olhos Seria velhacal Não fio E isto que retrato é devido à estúrdia opinião que divulgou em mim esse velho homem Que por armas de sua personalidade só possuía ali era uma faquinha e um facão cego e um calaboca Porrete esse que em parte ocado e recheio de chumbo por valer até para mortes E ele mancava estragado por tanto que a metade do pé esquerdo faltava cortado produção por picada de cobra urutu geladora se supõe Animado comigo em fim me pediu um punhado de sal grande regular e aceitou um naco de carnedesol Porque no comer de comum ele aproveitava era qualquer calango sinimbu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 746 ou gambás que jogando neles certeiramente o calaboca sempre conseguia de caçar Me chamou de Chefão cangaceiro Acabando que para me render beneficio de agradecimento ele me indicou muito conselhante que num certo resto de tapera de fazenda sabia seguro de um dinheirão enterrado fundo quantia desproposital Eu fosse lá ele disse eu escavasse tal fortuna que merecida para meus companheiros e para mim Aonde rumo indaguei por comprazer Ele piscou para o mato Por lá trinta e cinco léguas num Riacho dasAlmas Toleima Eu ia navegar assim para acolá passar matos furar a caatinga por batoqueiras por louvar loucura alheia Minha guerra nem não me dava tempo E mesmo se ele sabia assim e verdade fosse por que era que não ia muito pessoalmente cavacar o ouro para si Derri dele brando Por que é que se dá conselho aos outros Galinhas gostam de poeira de areia suas asas E o velho homem cujo Ele entendia de meus dissabores Eu mesmo era de empréstimo Demos o demo E possuía era meu caminho nos peitos de meu cavalo Siruiz Aleluia só E o velho no esquipático de olhar e ser qualquer coisa em mim ele duvidava dela Mas que é que era que é que era Eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 747 carecia de indagar E mesmo porque a chefe não convém deixar os outros repararem que ele está ansiando preocupação incerta tive de indagar leixo remediando com gracejo diversificado Mano velho tu é nado aqui ou de donde Acha mesmo assim que o sertão é bom Bestiaga que ele me respondeu e respondeu bem e digo ao senhor Sertão não é malino nem caridoso mano oh mano ele tira ou dá ou agrada ou amarga ao senhor conforme o senhor mesmo Respondeu com uma insensatez ar de ir me ferir por tanto jacaré já Respondeu apontando com o dedo para o meu peito Desgostou de meu debique Dele o dito eu não decifrava Sertanejo sem remanso Mas desabandonamos aquilo às pressas porque o velho assoava o nariz com todos os dedos de uma mão em modo que me deu nojo Descemos flauteando o resto do morro Quando chegamos cá no acampo as ramas dárvores já iam pegando o pó da noite Ermo meu Do que hoje sei tiro passadas valias Eli fome de bacurau é noitezinha Porque o tesouro do velho era minha razão Tivesse querido ir lá ver nesse RiachodasAlmas em trinta e cinco léguas e o caminho passava pelo São Josezinho da Serra onde assistia Nhorinhá lugarejo ditoso Segunda vez João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 748 com Nhorinhá sabível sei então minha vida virava por entre outros morros seguindo para diverso desemboque Sinto que sei Eu havia de me casar feliz com Nhorinhá como o belo do azul vir aquémde Maiores vezes ainda fico pensando Em certo momento se o caminho demudasse se o que aconteceu não tivesse acontecido Como havia de ter sido a ser Memórias que não me dão fundamento O passado é ossos em redor de ninho de coruja E do que digo o senhor não me mal creia que eu estou bem casado de matrimônio amizade de afeto por minha bondosa mulher em mim é ouro toqueado Mas se eu tivesse permanecido no São Josezinho e deixado por feliz a chefia em que eu era o UrutuBranco quantas coisas terríveis o ventodas nuvens havia de desmanchar para não sucederem Possível o que é possível o que foi O sertão não chama ninguém às claras mais porém se esconde e acena Mas o sertão de repen te se estremece debaixo da gente E mesmo possível o que não foi O senhor talvez não acha Mas e o que eu estava dizendo mas mesmo pensando em Nhorinhá por causa Dói sempre na gente alguma vez todo amor achável que algum dia se desprezou Mas como jagunços que se era a gente rompeu adiante com bons cavalos novos para retroco Sobre os gerais João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 749 planos de areia cheios de nada Sobre o pardo nas areias que morreram sem serras de quebravento Com a campina roxa brandamente vagarosa por onde fomos tocamos querendo o poente e tateando tudo chapada sem lugar de fim Só os punhados daquele capim de lá com sua magra dureza O para bem valer era que agora quando alguém com o nosso brabo cortejo deparava seriam gente já distante desconhecida dela e que não diziam mais Aquela é a dona de um seô Hermógenes que estão remetendo para as enxovias Essa mesma não dava trabalhos a mulher ocultada no xale verde como dizer A mulher sem resgate isto é dizer que ia para morte de outro homem à sina sorte Eu tinha era receio de que ela adoecesse Dei as todas ordens de bom tratamento Tanto a tanto decidi disposto que não se entrasse com bruteza nos povoados nem se amolasse ninguém sem a razoável necessidade Também pelo que aquilo não me dava glória e eu ia para um grande fim Até estive nervoso Desde as crondeúbas nascidas em extraordinárias quantidades e os montes de areia quase alvos com as seriemas por cima perpassando e o mais tudo eu tinha avistado Que vi córrego que corta e salga e comi coco de ouricuri Desordens João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 750 não me tentavam o assaltar e o rixar Agora para essas e outras jagunçagens assim mesmo como para pautear àtoa de abocabaque eu não tinha interesse de tempo Não por moleza ou falta de hombridade ah não tanto em que durou minha chefia e acho mesmo que de dantes eu agüentei tudo o que é cão e leão Corrijo e digo só o frio é que mal tolerei Quando geava dormi deveras estreito entre diversas fogueiras O frio desdiz com jagunço A gente indo ali mesmo nos altos tabuleiros enchemos surrões com talos de caneladeema boa acendedora de fogo A caneladeema de qualidade crescida mais de metro acertante Depois da madrugada de guardado eu bebia um chá de jurema me restabelecesse todos os ânimos Daí diante melhor foi desamainando a friagem das madrugadas E já fazia tempo que eu não passava navalha na cara contrário de Diadorim Minha barba luzia grande e preta conferindo conspeito isto eu mesmo podia fácil ver mirando na folha da água quando meu cavalo Siruiz se debruçava para beber em qualquer riachinho da largura de duas braças Estórias Consabido que meus homens por sincera precisão de mulher armavam querer de trazer umas delas pegadas pelas beiras de estradas me vinham com lelê disso O que eu enérgico debelei e reprovei não se estava ainda em ponto para esse João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 751 desmazelo de bempassar Pelo mal de que essas mulheres não davam para ser ao menos uma para cada um e por via de jus dessas condições a companhia delas podia estragar a lei do viver da gente com arrelias de vuvu e rusgas O que ajuntávamos trazendo era cada bom cavalo que se pegasse E tocamos conosco cinqüentaetantas reses de gado baiano àtoa Por campos gramados quando havendo isso ia mais sem estorvo em conformes Depois piorou Mas outras coisas melhoraram O senhor tenha na ordem seu quinhão de boa alegria que até o sertão ermo satisfaz Digo mesmo de meu expor falante de mulheres Quando se viaja varado avante sentado no quente acaba o coxim da sela fala de amores E eu surgia em sossego assim passo compasso o chapadão tão alargante Lá o ar é repousos Os Hermógenes andavam por bem longe E nunca que pelotão de soldados havia de ali vir por cima de nossas batidas Sossego traz desejos Eu não lerdeava mas queria festa simples achar um arraial bom em feiradegado Queria ouvir uma bela viola de Queluz e o sapateado de pés dançando Mas por lei eu carecia de nudezes de mulher Nesses dias moderei minha inclinação Baixei ordens severianas que todos pudessem se divertir saudavelmente com as mulheres bem dispostas não deixando no vaivigário mas não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 752 obrassem brutalidades com os pais e irmãos e maridos delas consoante que eles ficassem cordatos Estatuto meu era esse Por que destruir vida àtoa àtoa de homem são trabalhador Zé Bebelo não teria outro reger E vejo pergunto donde era que estava então o demo perseguição Devo redizer eu queria delícias de mulher isto para embelezar horas de vida Mas eu escolhia luxo de corpo e cara festiva O que via com um desprezo era moça toda donzela leiga do sãogonçalodo amarante e mulher feiosa muito mãedefamília Essas as bisonhas eu repelia Mas daí então me deram notícia do Verde Alecrim Joguei de galope Torei o cavalo para lá Guia era um exato rapaz vaqueiro goiano do Uruú Esse me discriminou o VerdeAlecrim formava somente um povoado sete casas por entre os pés de piteiras beirando um claro riozinho Meiadúzia de cafuas coitadas sapé e taipade sebe Mas tinha uma casa grande com alpendre as vidraças de janelas de malacacheta casa caiada e de telhas de verdade essa era a das mulheresdamas Que eram duas raparigas bonitas que mandavam no lugar aindas que os moradores restantes fossem santas famílias legais com suas honestidades Cheguei e logo achei que lugar tal devia era de ter nome de Paraíso João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 753 Antes primeiro pensei em todos para o justo quinhão porque eu era chefe Reparti o pessoal em grupos determinando que saíssem indo adiante com via por trechos remarcados Pois mesmo a poucas léguas de lá aonde eu eles iam achar por um exemplo dois arraiais o Adroado e o São Pedro e até o BarroBranco que era um vilório Entanto que Diadorim conforme conveniente enviei também expresso ele comandasse os guias tenteadores Tudo pronto vim acompanhado só com uma guarda de dez homens O que eu não disse que o VerdeAlecrim ficava em aprazível fundo no centro de uma serra enrodilhada Dum alto se via duma olhada e olhar Esporeei desci de batida Aí cheguei bem de mão Meus homens deixei que fossem para as casas domésticas conversar casadas e suas crias Eu apeei na das duas Escolhi assim Bom quando há leal é amor de militriz Essas entendem de tudo práticas da belavida Que guardam prazer e alegria para o passante e gostar exato das pessoas a gente só gosta mesmo puro é sem se conhecer demais socialmente Eu chegasse de noite e elas estavam com casa alumiada para me admitir Como que o amor geral conserva a mocidade digo de Nhorinhá casada com muitos e que sempre amanheceu flor E isto a torto digo porque as duas não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 754 se comparavam com Nhorinhá não davam nem para lavar os pés dela Mas que porém beleza a elas também não faltava isto sim Uma MariadaLuz era morena só uma oitava de canela Os cabelos enormes pretos como por si a grossura dum bicho quase tapavam o rosto dela mesma aquela nhazinhamoura Mas a boquinha era gomo ponguda e tão carnuda vermelha se demonstrava Ela sorria para cima e tinha o queixo fino e afinado E os olhos águamel com verdolências que me esqueciam em Goiás Ela tinha muito traquejo Logo me envotou Não era siguilgaita simples A outra Hortência meã muito dindinha era a Ageala conome assim porque o corpo dela era tão branquinho formoso como frio para de madrugada se abraçar Ela era ela até no recenso dos sovacos E o fiodolombo mexidos em curvos de riacho serrano desabusava Comprimento exato dele assim o senhor medir nunca conseguia No meio delas duas juntamente eu descobri que até mesmo meu corpo tinha duros e macios Aí eu era jacaré fui seja o que sei No meio daquela noite andei com fome não quis cachaça Me descansei comi uma coalhada muito fria Comi bolo com João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 755 cidrão Bebi bom café adoçado com um açúcar de primeira branco igual Porque as duas minhasdamas eram ricas dizer deviam de ter muito dinheiro de prata aforrado Por lá na casa delas era ponto de pernoite de lavradores de posses feito estalagem com altas pagas Mas as duas mesmas provinham de muito boas famílias a Ageala Hortência era filha de grande fazendeiro paranãnista falecido Eram donas de terras possuíam aquelas roças de milho e feijão nas vertentes da serra nos dependurados Ali mesmo no VerdeAlecrim delas era toda a terra plantável Por isso os moradores e suas famílias serviam a elas com muita harmonia de ser e todos os préstimos obsequiando e respeitando conforme eu mesmo achei bem um sistema que em toda a parte devia de sempre se usar Como se deu que enquanto se bebia o café escutamos uma tosse da banda de fora E era do homem que eu tinha deixado de vigia O qual tinha acontecido de ser o Felisberto o que por ter uma bala de cobre introduzida na cabeça vez em quando todo verdeava verdejante como já foi dito E então elas duas pensaram em se mandar o Felisberto entrar para provar do café também dando que não é justo ficar um desconfortado no sereno enquanto os outros se acontecem Sendo as duas o senhor vê pessoas muito bondosas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 756 Assenti boamente nisso em que elas estavam com a razão Só que pelo respeito eu sendo Chefe não ia poder deixar o Felisberto me avistar assim perfeito descomposto nu como eu estava MariadaLuz aí trouxe uma roupagem velha dela que era para eu amarrar na cintura tapando as partes Experimentei Daí entendi o desplante me brabeei com um repelão arredei a mulher e desatei aquilo joguei longe Tornei a vestir minhas roupas botei até jaleco Elas melhor me riam Eu era algum saranga Eu podia dar bofetadas não fosse a só beleza e a denguice delas e a estroina alegria mesma que meio me encantava O Felisberto entrou saudou comeu e bebeu Naquela ocasião ele estava passando bem normal Só assim ao silenciosamente Entendo que mais fosse para o galhardo que para o semgraça rapaz desses de que as mulheres se arregalam Em ver seria mais moço do que eu mais calmo Não quisesse ardores com damas quisesse os poucos recantos para devagar se resignar Não cobiçou a qual ou agrados Nem na hora reparei que a MariadaLuz com ele se olhasse Só bem o que ela refletiu quando o Felisberto comido e bebido tornou a sair ela me disse que se eu no caso dúvida não pusesse o Felisberto podia com ela se introduzir no outro cômodo por variação João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 757 dumas duas horas constante que nesse breve prazo eu ainda restava felizardo com a Ageala Hortência Danado eu disse que não e ela Tu achou a gente casual aqui no afrutado Tu veio e vai fortunosamente Tu não repartindo tu tem assim ela me modificou A doidivã era uma afiançada mulher No sertão tem de tudo E eu tinha falado meu não era mais somente porque não se pode falhar na regra de só se pandegar com sentinela posta Eu era o chefe O Felisberto era sentinela Aquela casa de lugar as delícias que estavam eu melhores neste mundo não achasse pensei Eu quisesse reinar lá pelos meus prazeres O senhor sabe eu chefe o outro sentinela Esse Felisberto pelo jeito ia viver tão escasso tempo podia bem que nem fizesse mais conta do ofício Sendo o mais que pensei eu sentinela O senhor sabe Ah ainda que no nocivo desses andares eu conseguia meditar minhamente ah eu não tive os chifreschavelhos nem os pés de cabra Ali pelos meus prazeres eu quisesse me reinar descambava para fecho de termo A morte estava com esse Felisberto coitado desgraçado A coisa estranha que uma bala de arma tinha entrado nos centros da cabeça mesma dele recessos da idéia dele de lá de vezes em vezes perturbava com excessos daí um dia em curto era a morte fatal Agora podia João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 758 bem ser que ele quisesse largar de mão de ser jagunço Aquele fato daquela bala entrada depositada no dentro de um e que não se podia tirar de nenhum jeito nem não matava de uma vez mas não perdoava na data me enticava Aquele homem mes mo com a valia e bizarria dele eu pudesse querer mais no meu bando As duas mulheres belezas assins dando delícias bilistrocas Outra idéia eu tive Só eu sei eu sentinela Só não posso dar uma descrição ao senhor do estado que eu pensei achei só sei em bases Amanheceu claro Mas MariadaLuz não era logrã isso conheci no ver como ela olhou para o Felisberto com modos mimosos Quem sabe ele havia de gostar de ficar para sempre permanecido ali Perguntei O Felisberto se riu tão incerto feliz que eu logo vi que tinha justo pensado E elas demais Deixa o moço que nós prometemos Tomamos bom cuidado nele e tudo regalado sustento Que de nada ele háde nunca sentir falta Tanto elas disseram que tudo transformavam Mulheres E o Felisberto ia permanecer a siso arrecadado na sujeição desses deleites podia ter um remédio de fim de vida melhor Em tal abracei o companheiro e abracei as duas dando para sempre a minha despedida e fazendo mostra de falar de farto Mulheres sagazes Até mesmo que nas horas vagas no lambarar as duas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 759 viviam amigadas uma com a outra se soube O que quando eu já ia saindo acharam de me dizer Isto Mas você já vai mesmo nego Visitademédico Como não pude sofrear meu rir Reuni meus outros meus homens Abalei de lá Bem que eu sentia eu exalava uma certa inveja do Felisberto Mas aí eu estimei o Felisberto como se ele fosse um meu irmão Como Céu há com esplendor e aqui beleza de mulher que é sede Deus que abençoe muito aquelas duas A pois me ia e elas ficavam as flores naquele povoadozinho como se para mim ficassem na beira dum mar Ah eu sentinela o senhor sabe Assim eu queria me esquecer de tudo terminada aquela folga O dever de minha hombridade Aí mais quando tornei a rever Diadorim constante vi que andava à minha espera com os companheiros num papuã matando perdizes E encaminhei para Diadorim com a meiadúvida Eu não tinha razão Porque Diadorim já sabia de tudo Como sabia Ah o que era meu logo perdia o encoberto para ele real no amor Riobaldo você vadiou com as do VerdeAlecrim Você está comprazido ele de franca frente me perguntou Eu tibes Corri mão por meu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 760 peito Mas admirei que Diadorim não estivesse jeriza Mesmo ele ao leve se riu e o modo era de malina satisfação Você já está desistido dela em fim ele indagou Hem Hem Dela quem dela Tu significa essas velhacas palavras eu só fiz que respondi redatado Mediante porque aí logo entendi no instante E ele cerrou a conversa Porque eu entendi que a referida era Otacília Minha noiva Otacília tão distante o belo branco rosto dela aos poucos formava nata dos escuros Tudo isto para o senhor meu senhor não faz razão nem adianta Mas eu estou repetindo muito miudamente vivendo o que me faltava Tão minhas coisas eu sei Morreu a lua Mas eu sou do sentido e reperdido Sou do deslembrado Como vago vou E muitos fatos miúdos aconteceram Conforme foi Eu conto o senhor me ponha ponto Pelo que do trecho voltamos Para mais poente do que lá só uruburetamas E o caminho nosso era retornar por essas gerais de Goiás como lá alguns falam O retornar para estes gerais de Minas Gerais Para trás deixamos várzeas cafundão deixamos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 761 fechadas matas O joãocongo piava cânticos triste lá e ali em mim Isto é minto hoje é triste naquele tempo eram as alegrias Suaçuapara corria da gente com a cabeça empinada quase nas costas protegendo para não prender nas árvores sua galhadura dele Galheiro suaçupucu com sua fêmea suaçuapara Um dia vez se matou uma sucuri de trintaeseis palmos que de ar engravidava Dava lugares em que de noite se estava de repente no cabo do revólver ou em carabinas mesmo e carecia de se acender maiores fogueiras porque no cheio oco do escuro podia vir cruzar permeio à gente algum bicho estranhão formas de grandes onças que rodeando esturravam ou a mãedalua de vôo não ouvido corujante ou de supetão às brutas com forte assovio vindo do lado do vento algum macho danta cavalorão E foi aí que o Veraldo que era do SerroFrio reconheceu uma planta que se chamasse guiatorto se certo suponho mas que se chamava candeia na terra dele a qual se acendia e prendia em forquilha de qualquer árvore ela aí ia ardendo luminosa clara feito uma tocha Atravessamos campos Dias tão claros céu de toda altura Assaz voavam eram os gaviões E Goiás estava pondo fogo nos seus pastos Arte que fumaçava fumaceava o tisne O sol roxo requeimão Tive uma saudade de outras audácias Morreu o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 762 Pitolô por bala de arma que disparou sem ser por querer de ninguém caso muito acontecível Num sítio PadrePeixoto morreu o Freitas Macho também de uma dor forte no vão da barriga bandadamãodireita remédio de chá nele não produziu o vero efeito Alaripe teve uma carregaçãodosolhos O Conceiço destroncou o braço deu trabalho e dores para se repor no lugar Advertido que antes dessas passagens assim não lhe vinha minuciando e que elas corretamente sempre se dão mas que eram somente as mortes sérias serenas doutras desgraças diversas ou doenças para molestar E dos fazendeiros remediados e ricos se cobrava avença em bom e bom dinheiro aos cinco dez doze contos todos tinham mesmo pressa de dar Com o que enchi a caixa E abriam para a gente pipotes de cachaça a qual escanceavam Se jantava banquete depois um coreto se cantava As vezes não sei porque eu pensava em Zé Bebelo perguntava por ele em outros tempos e ninguém conhecia aquele homem lá ali O de que alguns tives sem notícia era da fama antiga de Medeiro Vaz Daí me dava raiva de ter pensado refletido em Zé Bebelo Bobéias E andantemente só me engracei foi duma mulher casada essa que com tremor enorme me desgostou neste responder Ai querendo Deus que o meu marido quiser Ao que eu atalhei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 763 Ah pois nem eu não quero mais não minha senhora dona Não estou de maneira E sem ser de propósito até botei mau olhado num menino pequeno que estava perto Que assim viemos Mas conto ao senhor as coisas não conto o tempo vazio que se gastou E glose manter firme uma opinião na vontade do homem em mundo transviável tão grande é dificultoso Vai viagens imensas O senhor faça o que queira ou o que não queira o senhor todaavida não pode tirar os pés que háde estar sempre em cima do sertão O senhor não creia na quietação do ar Porque o sertão se sabe só por alto Mas ou ele ajuda com enorme poder ou é traiçoeiro muito desastroso O senhor Tomei mais certeza da minha chefia Quer ver que eu tinha deixado de parte todas as minhas dúvidas de viver e que apreciava o sóestar do corpo no balanço daqueles dias temperados tão bem quando o céu varreu Dias tão claros Tanto que as cigarras chiavam em grosas e de que talarte valessem por um atraso das chuvas do ano alguns já queriam desejar Não foi Mas eu cria por mim nas melhores profecias E sempre dei um trato respeitável amistoso aos homens de valia mais idosa vigentes no sério de uma responsabilidade mais costumeira João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 764 Esses eram João Goanhá Marcelino Pampa João Concliz Alaripe e outros uns restantes que mereciam de si e não me esqueci das praxes Tirante que não pedi conselhos Mas não houvesse mas pedir conselho é não ter paciência com a gente mesmo mal hajante Nem não contei meus projetados O Rio Urucuia sai duns matos e não berra desliza o sol nele é que se palpita no que apalpa Minha vida toda E refiro que fui em altos minha chefia Diadorim mesmo mal me entendeu Qual que recordo foi num durante de tarde a incertas horas quando se vinha por um selado estirão escampante Nós dois em dianteira par de homens um diabo de calor e os cavalos pisavam légua destinada de cristal e malacachetas Céu e céu em azul ao deusdar O senhor vá ver em Goiás como no mundo cabe mundo E o que Diadorim me disse principiou deste jeito assim que perguntou esconso se eu queria aquela guerra completamente Tal achei áspero que ele me condenava o vir dando tantas voltas em vez de reto para topar o inimigo ir Remeniquei Uai Diadorim pois você mesmo não é que é o dono da empreita e mais meio debiquei com estas Que eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 765 vencendo vou é menos feito GuydeBorgonha Acho que as palavras que eu disse agora não estou trastejando Mas Diadorim repuxou freio e esbarrou e com os olhos limpos limpos ele me olhou muito contemplado Vagaroso que dizendo Riobaldo hojeemdia eu nem sei o que sei e o que soubesse deixei de saber o que sabia Demorei que ele mesmo por si pudesse pôr explicação E foi ele disse Por vingar a morte de Joca Ramiro vou e vou e faço consoante devo Só e Deus que me passe por esta que indo vou não com meu coração que bate agora presente mas com o coração de tempo passado E digo Afirmo que não colhi a grã do que ele disse porque naquela hora as idéias nossas estavam descompassadas surdas um do outro a gente desregulava E o tom mesmo de sério que ele impunha rumou meu pensamento para outros pontos o Urucuia lá onde houve matas sem sol nem idade A MatadeSãoMiguel é enorme sombreia o mundo E Diadorim podia ter medo duvidei Eu sempre sabia um dia o medo consegue subir faz João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 766 oco no ânimo do mais valente qualquer Com tanto eu fui e disse Tudo na vida cumpre essa regra Duvidei pouco Diadorim não temia O que ele não se vexou de me dizer Menos vou também punindo por meu pai Joca Ramiro que é meu dever do que por rumo de servir você Riobaldo no querer e cumprir Nem considerei É o Hermógenes tem de acabar eu disse Diadorim ia ter certas lágrimas nos olhos de esperança empobrecida Me mirava e não atinei Será que até eu achasse uma devoção dele merecida trivial Certo seja Não dividi as finuras Mas também afiguro que responder mais não pude por motivos de divertência Qual que na hora deu de dar diante um desvôo de tanajuras que pelas grandes quantidades delas desabelhadas foi coisa muito valente para mim foi o visto nunca visto em riscos zunindo como enchiam o ar caintes então porque a lei delas é essa como porque o corpo traseiro pesa tão bojudo ovado bichão maduro elas não agüentam o arco de voar iam semeando palmos de chão de preto em acobreadas e tudo mesmo cheirava à natureza delas cheiro cujo que de limão ruivo que se assasse na chapa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 767 Bagos dessas muito mundialmente Caso que os cavalos se espantavam uns na só cisma até refugando E o menino Guirigó de ver mais que todos tocou cá para adiante com gritos e arteirices tão entusiasmável como tanto aprovei porque o menino Guirigó do Sucruiú eu tinha botado viajante comigo era mesmo para ele saber do mundo Mas o esbagoar estirante das tanajuras vinha para toda parte mesmo no meio da gente chumechume fantasiado duma chuva de pedras e elas em tudo caíam e perturbavam nos ombros dos homens e no pêlo dos animais Como digo que eu mesmo a tapas enxotei muitas e ou tras que depois tive de sacudir fora da croa de meu chapéu por asseio Içá savitu já ouvi dizer que homem faminto come frita com farinhas essa imundície E os pássaros eles sim gaviãozinho que no campo esmeirinhavam havendo com o que encher os papos Mas bem porém que cada tanajura mal ia dando com o chão no desabe sabia que tinha de furar um buraco ligeirinho e se sumir desaparecida na terra sem escolha de sorte privas de suas asas que elas mesmas já de si picavam desfolhadas feito papelzinho Isso é dos bichos do mundo uso Mas então quando mirei e não vi Diadorim se desaportou de meus olhos Afundou no grosso dos outros Aide hei e eu tinha mal entendido João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 768 E o senhor tenha bons estribos que informo que o que disse se deu bem em antes dele Diadorim ter tido a conversa com a mulher do Hermógenes Que agora do que sei vou tosquejar Como de fato desamarrou o tempo Formou muita chuva Com assim emendados chovidos três dias então certificamos de permanecer esse tempo em prédio e enchemos a Fazenda Carimã que era de um denominado Timóteo Regimildiano da Silva do Zabudo no vulgar Esse constituía parentesco proximado com os Silvalves paracatuanos cujos tiveram sesmarias na confrontação das divisas das duas bandas iguais Do Zabudo o senhor preste atenção no homem para ver o que é um ser esperto Primeiro encontramos de repente com ele quando se ia por um assente chapadazinha dessas de capim fraco Conciso já principiava a chuviscar e eu estava pensando que por ali menos longe algum rancho ou alguma casa de sitiante havia de vagar Nessa mesma horinha o tal se apareceu Conforme vinha num cavalo baio com uma daquelas engraçadas selas cutucas que eles usam e introduzido em botasdemontar muito boas dessas de couro de sucuriju de que eles faziam antigamente No natural que foi ele ver a gente e levou choque João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 769 Instantezinho porém se converteu Isto que se desapeou ligeiro e tirou o chapéu com cortesia mor com gesto de braço e manifestou Senhores meus cavaleiros podem passar sem susto e com gosto que aqui está é um amigo Amigo de quem eu revidei Vosso meussenhor cavaleiro Amigo e criado Esperança dele era ver a gente pelas costas Com ele apertei aonde que morasse Lá daquela banda meussenhor Sitiozinho raso outrarte ele respondeu nhento pasmado Atalhei A pois pra lá vamos adonde menos chova O senhor mostre Aí ele remudou os modos falando em muito aprazimento em honras de sinceridade A fazenda era ali só a uns passos Assim ele já se astuciava Do Zabudo homem somítico muito enjoativo e sensato Requeri dele o prêmio que marquei em arras de sete contos e ele se desesperou conforme caretas e suas costas das mãos mesmas uma e depois a outra diversas vezes ele beijava Sempre gemendo que não e que sim pediu vênia de me noticiar como os negócios da lavoura para ele nos derradeiros três anos andavam João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 770 desandando com peste que no gado deu e redeu e praga no canavial por via dela nem fervia mais safra E tudo que falava explicava e redizia mesmo se fiou de querer me levar debaixo de temporal para exemplificar minhas vistas com o pejorativo de suas posses Por causa da caceteação concedi rebates acabei deixando o estipulado em trêscontosquinhentos e também por receio de se pegar em mim a nhaca daquele atraso Se bem que no repleto de dinheiro ganho goiano como já se estando eu descarecia de sistema de bruteza com ninguém E mesmo se traçou que o sustento nosso ele por metade fornecia gracioso sem estipêndio escatimava mas dava Ao tanto que o resto eu pagava caro e os percebidos certas dúzias de ferraduras o milho para os animais umas mantas de toicinho e dez quartilhos de cachaça que em justo dizer nem prestava Bom lá era o fumo de rolo E já dava de ser como desemboque eu pagasse a ele só para se comportar calado Por fim penso a falha nossa lá para aquele doZabudo ficou quase de graça E dito e referido que chovia em Goiás todo assistimos dentro de casa só saindo no quintal para chupar jabuticabas A gente tinha baralhos se jogou roubamonte e escopa porque truque eu não consentia por achar que me faltava floreado rompante para os motes e gritos que nesse endiabrado jogo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 771 compertencem e mesmo por achar vadiado para a minha chefia Então bem enquanto a gente formava essa distração o do Zabudo ia e vinha flauteando excogitando decerto para ratinhar e sisar a gente com mangonhas outras velhaquices choradas E foi de repente ele se chegou com esta que não se esperava por barato nem caro Que a nhã senhora aquela suplicava o favor dum particular com o moço chamado Reinaldo Essa nhã refiro era a mulher do Hermógenes que em reserva fechada se tinha no quartodooratório E Diadorim saber o senhor tem era o conhecido por Reinaldo Que me invocou o senhor vai dizer me causou espantos Haviade Eu estava na saladejantar jogando com João Goanhá João Concliz e Marcelino Pampa Alaripe com a baciinha de lixívia em areia e com estopa na soleira da porta para o quintal acendrava as armas Ele falou Deus que olh lá que se o Reinaldo não dá cabo da criatura Descontamos Eh ela será que faz mandraca João Goanhá alvitrou com essas risadas Ara para obrar bom feitiço que valha dizse que só mesmo negra ou negro Isto que Marcelino Pampa deu de opinião enquanto pegava o setebelo com o setedepaus Eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 772 joguei e João Goanhá somou seis e três na mesa conforme pegou com um valete e escopou Diadorim se tinha encaminhado para onde estava a mulher para ir ouvir o que ela queria que ele ouvisse Tocou minha vez de baralhar e repartir cartas Ou seria algum pedido que ela tivesse de fazer a ele bem Daí João Goanhá esteve dizendo que a mulher rogava era por sua liberdade E eu desconversei observando casual primeiro a respeito do luxo de tantos anéis que João Goanhá gostava de botar em cheios dedos e depois chamei atenção para as goteiras abertas na telhavã daquele grande cômodo que se carecia de dispor umas latas em diversos pontos e até uma gamela no meio da mesa fim de se aparar águas da chuva Mas mesmo por mim eu já tinha perdido a simpatia no divertimento do jogo e me ergui de lá fui ver a coisa nenhuma no alpendre onde até homens dormiam madraços aborrecidos com um chover tão constante Diadorim não vinha não dava de sair do quartodo oratório E quando foi que veio não me contou nada O que disse comum Ah ela só chorou mágoas Não perguntei passo Devido que não perguntei logo à primeira depois foi não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 773 ficando bem para o meu brio o perguntar Diadorim se atarantava quieto nem não era correto o que ele estava fazendo escondendo fatos Palavras que vieram a gume em minha boca foram estas Que eu não gostava de hipocrisias Pensei e não disse Eu podia duvidar das ações de Diadorim Lá ele alguma criatura para traição Rosmes Idéia essa não aceitei por plausível nenhum Mas de motivo como me desgostei assim resolvi a saída da gente dali da Carimã no instante mesmo e dei ordem Fossem trazer os cavalos e arrear atrás do tempo que fizesse enxurradas tais nuvens grossas céu nubloso e trovão em ronco Chuvas com que os caminhos se afundavam E assim cumpriram Mas aí nem bem os cavalos vieram no curral se deu uma estiada muito repentina por um montão de vento O céu firmou e sol com todos os bons sinais Ante o que por isso e por tanto a admiração do pessoal foi de grandes mostras E eu vi que menos me entendiam mais me davam os maiores poderes de chefia maior Só o doZabudo saiba o senhor parava fora da roda sem influência nenhuma feito um tratante Saiba o senhor que assim ele ainda me veio com visagens e embaraços por amortecer a paga pedindo ágios de calote e prazos mercantis Agora mais João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 774 que tudo saiba o senhor uma coisa a que ele para os fins executou na hora da confusão da saída no zafamar Pois de repente trouxe e ofertou a Diadorim de regalo uma caixeta da boa e melhor marmelada goiana dada a valores Ademais o senhor prove o de que demais gostará A de Santa Luzia perto desta perde por famosa Dando aquilo a Diadorim ele não queria disfarçado me agradar por vantagens Se sei O que é que estivesse adedentro das idéias daquele homem O jeito estúrdio e ladino de olhar a gente outrolhos e que na hora não me fez explicação Sendo que mediado esse obséquio a Diadorim ele conseguiu mesmo me adular Saranga fui contracontas contra aquele paranãnista lordaço Ele se saiu quite por pouco não pegou até dinheiro meu emprestado Mesmo pelos cavalos e burros que cedeu recebeu igual quantidade dos nossos bem melhores somente que estavam cansados Teve até permissão de conservar o dele próprio o baio que disse ser de venerada estimação por herdado pessoal do pai Nele amontado prazido naquela dita cutuca pandegamente pois ainda veio por quarto delégua fazendo companhia à gente Coisa assim não se vê Tanto ambicionava que nem temia Sempre me olhava finório com as curiosidades E assim Agora o senhor prestou toda a atenção nesse homem doZabudo O diabo dele O senhor me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 775 diga o senhor desconfiou de alguma arte concebeu alguma coisa Sumimos de lá Em cinco léguas vi o barro se secar O campo reviçava Mas concedi que a viagem viesse à branda serenada Queria quis O burrinho de Nosso Senhor Jesus Cristo também não levava freio de metal Isso na ocasião emendo que não refleti Razão minha era assim de ter prazos para que meu projeto formasse em todos pormenores Mas isto afianço ao senhor também eu não sentia açoite de malefício herege ne nhum nem tinha asco de ver cruz ou ouvir reza e religião Mesmo me sobrasse tempo algum de interesse para reparar nesses assuntos Eu vinha entretido em mim constante para uma coisa que ia ser Queria ver ema correndo num pé só Acabar com o Hermógenes Assim eu figurava o Hermógenes feito um boi que bate Mas por estúrdio que resuma eu a bem dizer dele não poitava raiva Mire veja ele fosse que nem uma parte de tarefa para minhas proezas um destaque entre minha boa frente e o Chapadão Assim neblimneblim mal vislumbrado que que um fantasma E ele ele mesmo não era que era o realce meu eu carecendo de derrubar a dobradura dele para remediar minha grandeza façanha E perigo não vi como não estava cismando incerteza Tempo do verde Êpa eu ia erguer mão e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 776 gritar um grito mandante e o Hermógenes retombava Onde era que estava ele Sabia não sem nenhuma razoável notícia mas notícia que se vai ter amanhã hoje mesmo ela já se serve Sabia sei Como cachorro sabe Assim o que nada não me dizia isto é me dizia meu coração que o Hermógenes e eu sem dilato a gente ia se frentear em algum trecho nos Gerais de Minas Gerais Eu conhecia A pressa para quê Ao ir ao que ir aí contra a Serra das Divisões ou sobre o Rio São Marcos Estradareal estrada do mal Como de fato aquilo estava impossível breado de barro alto num reafundo num desmancho que comia com engolo as ferraduras mesmo cravadas novas e assujeitava a gente a escorregão e tombos teve animal que rachou canela quebrou pescoço Este caminho tem tripas se dizia bem Às loucuras E a jorna não rendia não se podia deszelar o pisar Retardamos Retardar mesmo se me dava de agradável Eu ia numa caçada com o grande gosto ah Pois não era Mais tempo se gastou esbarrados em casasdefazendas ou em povoados Melhor por lá também haviam de aprender a referir meu nome De em desde bem que já cumpriam de me recompensar e me favorecer pela vantagem porque eu ia livrar o mundo do Hermógenes O Hermógenes pelejei para relembrar as feições João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 777 dele Achei não Antes devia de ser como o pior odiado com mira na gente Diadorim pensei assopra na mão a tua boa vingança O Hermógenes mal sem razão Para poder matar o Hermógenes era que eu tinha conhecido Diadorim e gostado dele e seguido essas malaventuranças por toda a parte Retardamos Até que tomando sazão boa no veranico seguimos em fim estrotejando Parávamos léguas perto das divisas mandei ir vigias e dianteiros Conferi meu povo nas armas Tudo prazia O barranco mineiro ou o barranco goiano Da beira de Minas Gerais vinha um mato vagaroso E piorou um tico o tempo em Minas entramos serra acima com os cavalos esticados Aí o truvisco e buzegava O ladeirão ruim rampa mas pegamos a ponta da chapada Foi ver que com o vento nas orelhas o vento que não vareia de músicas Tudo consabia bem isto sim digo no remedido do trivial espaço de chuva a gente em avanço por esses tabuleiros fazia rio por debaixo entre as pernas de meu cavalo Sertão velho de idades Porque serra pede serra e dessas altas é que o senhor vê bem como é que o sertão vem e volta Não adianta se dar as costas Ele beira aqui e vai beirar outros lugares tão distantes Rumor dele se escuta Sertão sendo do sol João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 778 e os pássaros urubu gavião que sempre voam às imensidões por sobre Travessia perigosa mas é a da vida Sertão que se alteia e se abaixa Mas que as curvas dos campos estendem sempre para mais longe Ali envelhece vento E os brabos bichos do fundo dele Com trovôo Trovoadão nos Gerais a ror a rodo Dali de lá eu podia voltar não podia Ou será que não podia não Bambas asas me não sei Bambas asas Sei ou o senhor sabe Lei é asada é para as estrelas Quem sabe tudo o que já está escrito tem constante reforma mas que a gente não sabe em que rumo está em bem ou mal todootempo reformando Meus homens adianteiros retornaram que vindos com uma notícia os Hermógenes bando enorme tocavam meio para cá decerto também já cientes de meu caminhar Era o devido Se estremeceu de pressas Vim Viemos Trastopamos com uns campeiros e outros que vaquejavam ou que levando gado de volta para o caatingal por não morrerem suas reses todas de pastar o capim novo dos Gerais que cresce cheio de areia Mas esses não sabiam de nada coisíssima A gente contornou por se chegar primeiro no Nestor na VeredaMeã e no Coliorano depois do Mujo VãozinhodoMujo esse acho que era certo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 779 também o nome Mas o Coliorano morava num buritizal de lagoa e fazia chapéusdepalha fabricados dos melhores Nele e no Nestor carecia de se chegar em antes do Hermógenes que lá se tinha coito de munição Contornamos Muito brejo e sapal já estavam de volta Os rios andando sujos e umbuzeiros dando flor Mas a cheia de todo rio carregava muito cuspe de espuma por cima sinal de que ela ia aumentando com maiores chuvas nas nascentes Assim mesmo assim não perdemos de breve chegar e de arrecadar munição que se queria total toda Arredondamos Agora em hora Que era que faltava Comigo redor de mim quem quisesse guerra Todos E todos tinha vez eu achava que queriabem o meu pessoal feito fossem irmãos meus da semente dum pai e na madre de uma mãe gerados num tempo Meus filhos Para que relembrar divulgar dum e dum dar resenhas Do Dimas Doido que xingava nomes até a galho de árvore que em cara dele espanejasse ou até algum mosquitinho chupador Do Diodolfo mexendo os beiços num bisbis que era que sem preguiça nenhuma rezava baixo ou repetia coisas de mal da vida alheia conversando com simesmo Do Suzarte tomando olhos de tudo chão árvores poeiras e estilos de vento para guardar em sua memória aqueles lugares em léu Do Salústio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 780 João em ancas de seu burro e do Araruta de toda confiança esse homem já tinha para mais de umas cem mortes Do Jiribi be que a recorrer da guia à culatra por necessidade de cada coisa ouvir recontar e saber Ou do Feliciano que abria muito o olho são para melhor entender o que a gente dizia Tuscaninho Caramé que cantava bonita voz algúa cantiga sentimental João Concliz dobrando um assovio comprido sem fim como esses que são dos tropeiros dos campos goianos Ou o José do Ponto com o jacaré tocando os cargueiros com sua tralha de cozinhar Mas refiro miúdos passos Coisinhas que a gente vislumbra em ocasião de momento e que quase não esquecem com pena Pois eu pensasse a breve na responsabilidade que a minha era quando via um homem idosamente respeitável como Marcelino Pampa e que já tinha sido chefe seguindo por seu próprio gosto no meio do andamento dos outros ou esbarrar o cavalo nos freios e esbarrado assim mesmo sem virar a cara para mim mas abaixar um pouco a cabeça e ficar escutando e meditando o meu conselho Ou quando um daqueles jagunços mais velhos recomendava a qualquer rapaz como era que deviam de ter cautela no lidar com as armas de conjunto e com a munição nas canastras pois de tudo calados cuidavam porque João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 781 então em sentir era como se fosse coisa de paz arranjos miúdos em casa da gente Ou mesmo quando eu avistava um daqueles catrumanos gente toda trazida deportados por mim da terra deles Esses me davam estima Ah acho que me achavam Antes teriam um admirado receio o medo maior E tinha uns como digo ao senhor que relembro tudo esse Assunciano quando se falava em fogo ele já ficava com o corpo para diante meio entortado e que ele era magro mas ovante barrigudo mediamente e de um qualquer um chapéu simples mas um pouco mais enfeitado ou novo ele já demonstrava mirar de boba inveja Meus filhos Mas não durava dai menosmente eu esquentava outra vez meus altos planos mais forte eu refervesse Eu era assim Sou Não creia o senhor Fui o chefe UrutuBranco depois de ser Tatarana e de ter sido o jagunço Riobaldo Essas coisas larguei largaram de mim na remotidão Hoje eu quero é a fé mais a bondade Só que não entendo quem se praz com nada ou pouco eu não me serve cheirar a poeira do cogulo mais quero mexer com minhas mãos e ir ver recrescer a massa Outra sazão outros tempos Eu ia para sofrer sem saber E veja se vinha eu comandei É guerra mudar guerra até quando onça João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 782 e couro É guerra Todos me aprovavam Ainda mesmo que com o cantar Olererê Baiana Eu ia e não vou mais Eu faço que vou lá dentro ó Baiana e volto do meio pra trás Assim aquela outra que o senhor disse canção de Siruiz só eu mesmo meu silêncio cantava Sofreado de minha soberba e o amor afirmante eu senti o que queria conforme declarado que no fim eu casava desposado com Otacília sol dos rios Casava mas que nem um rei Queria quis E Diadorim o senhor cuida Ingratidão é o defeito que a gente menos reconhece em si Diadorim ele ia para uma banda eu para outra diferente que nem dos brejos dos Gerais sai uma vereda para o nascente e outra para o poente riachinhos que se apartam de vez mas correndo claramente na sombra de seus buritizais Outras horas eu renovava a idéia que essa lembrança de Otacília era muito legal e intrujã e que de Diadorim eu gostava com amor que era impossível É Mire e veja o senhor se entende Deixe João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 783 avante conto Mesmo nos dias o que era era ir vir corrijo Até sem ter aviso nenhum eu me havia do Hermógenes Pressentidos todos os ventos eu farejava O Hermógenes com seu pessoal dele que nem em curvas colombinhando rastejassem comprido grosso mas sem bulha por debaixo das folhas secas Mas eu estava fora de minha bainha Às vezes eu acordava na metade certa da noite e estava descansado como se fosse alto dia Vão da noite quando o mato pega a adquirir rumores de sossegação Ou quando luava como nos Gerais dá com estrelas Luava para sobressair em azul de luz assim só mesmo estrela muito forte E chegamos Aonde A gente chega é onde o inimigo também quer O diabo vige diabo quer é ver A pois Sincero senhor os campos do Tamanduátão o inimigo vinha num trote de todos muito sacudido Se espandongaram Campos do Tamanduátão o senhor aí escreva vinte páginas Nos campos do Tamanduátão Foi grande batalha Não se instruiu que Nem não houve aviso Dei guerra Como se quis lei a lei e fogo a fogo Era na força da lua Tamanduátão é o varjaz que dum topo de ladeira se avistava e para lá descemos por encanado de cava quase grota João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 784 que a vertente entalha Mas mais de mil bois ou cavalos e éguas uns oitocentos se carecesse cabiam de bom pastar ali naquele baixadão de raso em raso Ao muito escuro duma banda existia um travessão de mato Outro braço de mata da outra banda Com que contornada essa mata a gente estava sempre naquilo que Tamanduátão é a enorme vargem Porque para tudo quanto havia o nome era aquele só que MataGrande do Tamanduátão e MataPequena do Tamanduátão e tudo Por mesmo do Tamanduátão era a casadefazenda de muitos antigos tempos quando tinha tido senzalas e um engenhode pauempé Mas já estava esquecida arruinada em esteios e com restos de parede fechando matagalzinho em cima de montes de terra e pedras em fim de taperada Bem sim que por perto assistia alguma pobre gente vinda cultivando o quanto se via roça milharais feijoal faceiro Gente mal se viu E do Tamanduátão era a Vereda com seus buritis altos e a água ida lambida donzela de branca sem um celamim de barro Dizse que lá se pesca e gordas piabas Por cima dela sei é de muito tiro Tinha um cocho no chão no campo o gado ouvia e se fugia bravo Às beiras daquela minha gente galopou a vereda toda susãjusã feito estivessem sendo surucuiú sem fêmea João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 785 percorrente doidada E o inimigo dava para trás Não achavam esconso Assim é que se principiou A bem como é que vou dar letral os lados do lugar definir para o senhor Só se a uso de papel com grande debuxo O senhor forme uma cruz traceje Que tenha os quatro braços e a ponta de cada braço cada uma é uma Pois na de cima era donde a gente vinha e a cava A da banda da mãodireita nossa isto é do poente era a MataGrande do Tamanduátão Rumo a rumo a da banda da mãoesquerda a MataPequena do Tamanduátão A de baixo o fim do varjaz que era em bruto de repente a parede da Serra do Tamanduátão feia com barrancos escalavrados Os barrancos cinzentos divulgando uns rebolos e relombos barrancos muito esquisitos como as costas de fila de muitos animais Mas agora o senhor assinale aqui por entremeio de onde é a Serra do Tamanduátão e a MataGrande do Tamanduátão mais ou menos os troços ve lhos da casadefazenda que tanto se desmantelou toda e rumoarumo no caminho da Serra para a MataPequena essas rocinhas de pobres sitiantes Aí o senhor tem temos A Vereda recruza reparte o plaino de esguelha da cabeceiradomato da MataPequena para a casadefazenda e é alegrante verde mas em curtas curvas como no sucinto caminhar qualquer cobra faz João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 786 E tudo O resto céu e campo Tão grandes como quando vi quando no fim que ouvi só no estradalhal gritos e os relinchos a muita poeira de fugida e os cavalos se azulando Mas primeiro antes teve o começo E aí teve o antesdo começo que o que era a gente vindo vindo E vindo bem Mal ao justo que para tão cedo assim aquilo não se esperava A gente vinha acabando a serra Serra da Chapada Somente para dali descer e traduzir essas campinas a grandeza de vargem Deles inimigos não se tinha aviso nenhum nem espiação Eu podia saber Eu era uma terrível inocência E de tudo miúdo eu dava de comer à minha alegria Assim o por exemplo quando eu quis experimentar a valia de meus catrumanos Um o Dos Anjos Esse degozava de mostrar que tinha tomado entendimentos presto manejava Achei graça no tirintim ligeiro como ele recarregou a comblém Mas era uma arma sem trocha e muito envelhecida abaixo de todas as menos até com cano já gasto Xeu cá ver o arcabuz manovelho eu arrecadei Ele nem queria entregar conforme que disse triste É a méa combléia e excogitava na arma Esse merecia Que fossem arranjar para ele uma outra consentã rifle chapeado ou winchester mão 27 ou carabina qualquer bala de chumbo E aí o DosAnjos me desofereceu o trabuco dele velho mais que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 787 avexado e meninomanso me olhava Mas Marcelino Pampa acho que foi quando a gente acabou de rir pagou boa lem brança disse que num brugo a meio indo para o pique do morro Medeiro Vaz tinha deixado guardado uma vez um feixe de armamento de soldados Que eram cinco fuzis máuser oleados bem num caixote escondidos no fundo dum grande solapo no paredão Se dizia Tanto que lá nem bicho mateiro não ia tirante macaco e que por tudo por certo deviam de estar de uso Por que é que Medeiro Vaz escondeu Por no tempo não ter servível munição E agora se tem que dê A pois Eu disse ao senhor eu não sabia do inimigo nem o inimigo de mim e nós vínhamos para seencontrar Então Ah mas eu parei mais alto estive muito mais alto mesmo e foi assim a sol Pois logo a gente quebrou caminho trepando encosta lá para aquelas burguéias Os nenhuns fuzis não achamos adentro do cavernal que era muito espaçoso só com uns morcegos que habitavam E eu por um querer disse que ia subir mais até no cume Poucos foram os que comigo vieram As alturas Poucos me lembro do Alaripe Posto pois foi porque foi Que estávamos já voltando descendo do ponto do alto o vento João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 788 bobeando na cara da gente e belavista adiante muito descrita Caminhando mesmo a gente tinha enrolado cigarros que não estava sendo azado de acender por via do encano do ar que ventainhava Esbarramos Àlaripe bateu binga Mas repronto ele mesmo encolheu o corpo e apontou exclamando surdo Há lá no quembembe o que quembembe na linguagem da terra dele vinha a ser na virada na tombada Como com efeito acolá na Serra do Tamanduátão vertente abaixo vinha um cavaleiro E eram muitos outros Esses eles Mas nós já tínhamos tomado recato Maximé eu disse E o que eu senti ah não foi receio nem estupor nem arrocho O que eu senti foi nada coisa nenhuma coisanenhuma em branco ao redor da minha movimentação Quantos com que assim viessem se guerreava mas sempre um chefe é uma decisão Falei E quando mesmo dei tento já tinha determinado as ordens justas carecidas tudo atinado o senhor veja e tal Primeiro que uns três homens fossem levar para aquela dita solapa do morro os que não eram mãosdarmas que o menino Guirigó o cego Borromeu e a mulher do Hermógenes que lá esperassem o final de tudo E para isso escolhi também o catrumano DosAnjos que logo vi que bem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 789 escolhi por tanto que ele na primeira coisa que pensou foi na quantia de comida que para eles se deixasse Daí o da guerra exato muito singelo repartir a gente em três drongos que íamos descer a serra em diversas bocainas diferentes Eu com o meu normal rente João Goanhá da banda da mão direita Marcelino Pampa da banda da mão esquerda eles fossem para ladear e revir e cometer dando todas retaguardas Num átimo Discutido assim o pessoal se arrumou para ir já indo jagunço nunca dilata Mas os de João Goanhá e os de Marcelino Pampa primeiramente que deviam de longe Eu com os meus tinha mais tempo convinha mesmo retardar Estive contando os cavalos Te arma bem Diadorim eu disse Te arma bem mano meu mano Por que foi que eu disse Então o senhor me confere que eu ingrato não era e que nos cuidados de meu amor Diadorim sempre estava E amor é isso o que bemquer e mal faz Apalpei meu selim que minhas pernas esquentavam Empunhei o parabelo Alguns dos homens ainda aproveitavam a espera para comer o que tivessem e um quis me obsequiar com a metade duma broa de brote de se roer e outro que trazia um embornaldecouro cheio com cajus vermelhos e amarelos Rejeitei Por mesmo que naquele dia eu estava de jejum quebrado só com uma jacuba Nem quis pitar Não por nervoso João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 790 Mas eu sabia que era o minuto e não era a hora E o do embornal com os cajus sendo um João Nonato diamantinense decidido agradável me disse Hoje Chefe depois que se ganhar com o bom gol se festeja Oi sim E de repente eu disse dizer Tu menino meu filho tu vem adiante manovelho emparelhado comigo Tu me dá sorte Deixamos de esporas Descendo na cava por feliz a gente vinha em oculto E justo já embaixo no principiar da várzea era um capim com mais viço capinzal do fresco de pédeserra Capim mais alto do que eu nele à gente se tapava Coincidido que permeio o verde dos talos a gente via algumas borboletas presas num lavarinto batendo suas asas como por ser Caiu o açúcar no mel Porque igual também convim que podíamos ladear um tanto e daí separei de cabeça um grupo de homens que iam ir com o Fafafa esses avançarem primeiramente como a certa isca perturbando o cálculo do inimigo ao dar o dar Respiramos tempo naqueles transitórios De rechego coçando as caras no capim em pontas que dava vontade de se espirrar Só o rumor que se ouvia era o dos cavalos abocanhando Eu tinha pressa de um final mas o que ia mor em mim era um lavorar de paciência talento com que eu podia ficar retardando lá a toda a vida Safas que eu podia dar também um pulo enorme sustirado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 791 repentemente Vi o que guerreia é o bicho não é o homem O capinzal repartia tudo diverso o abafo do ar e o fresco de lugar de grota frio e calor lado dum doutro nas finas folhas mesmo da folhagem Mas o calor vinha subindo era pernas acima no meu corpo o que os meus pés de tão quentes suavam E eu não enxergava o chão mas o cheiro do lugar ali era de barro amarelo massal Suspensos no parar mesmo a gente se embalançava na sela banda para banda na suavidade essa conforme temperação de que o espírito necessitava Sendo o mundo quieto para não assustar os pássaros que comem sementes no capim porque o revôo deles havia de dar ao inimigo alto aviso no ar Sobre isto eu tirei um pé do estribo e ajoelhei no coxim da sela Porque era a hora de olhar mirei e vi Como o inimigo vinha as listras de homens récua deles passante de uns cem Tive mão em tudo eles ainda estando longe Fafafa encostou dois dedos no meu joelho como se até às mudas quisesse poder receber a ordem Ele esperava um instante certo de meu respirar Eu brinquei com a mão no arção Vez de um vez todos e todos Falo o dito de jagunço que eles mesmos não conseguiam saber se tinham algum medo mas em morte João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 792 nenhum deles pensava O senhor xinga e jura é por sangue alheio Daí reolhei Avistei que vinham e tinham destacado em galope festinho adiante uns tais que se enviassem de vigiar a cava e a passagem de sobeserra como cautela Fechei os olhos e contei Até dez agüentei não que me deu um deciso já em sete Tu é tu Fafafa eu disse E ele gritou Xé do campo e correu as esporas E eu vi o virar dos cavalos partindo rompendo amassando cama no capinzal Seja que os homens para acompanharem o Fafafa eu medi em número e soltei feito em porteira de gado e pouco passaram de vinte E eu retinha a duro os outros que queriam também ir E Diadorim desses Eu que Diadorim disse Eu disse Não como agarrei embaixo a rédea do cavalo dele Por que foi que fiz Bastava o meu mando Aquilo não tinha significado Só fiz querer Diadorim comigo e a gente se cabia entre riscos do verde capim assim eu Diadorim enxergava feito ele estivesse enfeitado Se escutando os grandes gritos e tiros que eram os de Fafafa destruindo a anteguarda dos contrários Amontado no instante mas eu mesmo assim tive prazo para João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 793 me envergonhar de mim e para sentir que Diadorim não era mortal E que a presença dele não me obedecia Eu sei quem ama é sempre muito escravo mas não obedece nunca de verdade Aí me alteei e tive que era o começo da grande batalha Sobre o soprar o Fafafa indo em frente mais os dele gritando alardes No que os outros os Hermógenes também que primeiro formavam mó depressa alargaram espaço se abrindo uns dos outros mato de gente Eles tresfuriavam assim aos urros zurros quantidade que eram eh sabiam vir à cossa E tiros mesmo pouco ouvi mas no liso seco estradai do meio do campo deu um pano de poeira empenachada Eu bebi gotas digo isto é que ainda esperei mais Como o Fafafa de proposital porque aqueles outros podiam recachar retardava a ida avante num meiogalope somente muito enganador A avistar melhor quase trepei de todo na sela meu animal cumprindo de não bulir porque era cavalo consciencioso Mas enquanto isso saiba o senhor o que foi que fiz Que fiz o sinal dacruz em respeito E isso era de pactário Era de filho do demo Tanto que não renego E mesmo me alembro do que se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 794 deu por mim que eu estava crente forte que do demo do Cão sem açamo quem era era ele o Hermógenes Mas com o arrojo de Deus eu queria estar eu não estava Foi o instante de tempo que era o momento Só chamei João Concliz Agora é agora E joguei a rumo Lá vai obra Meu cavalo saiu às cabeçadas Todos atrás de mim no arranque e era o mundo mesmo Gritei de sussus Vale seis e toma nove nas grimpas da voz E eles meus gritando tão feroz que semelhavam sobrevindos sobre o ar Menos vi Mas todo o todo do Tamanduátão se alastrou em fogo de guerra Suspenso ouviu escapei à de banda com meu bom cavalo repuxei as rédeas Só assim permaneci eu estava debaixo duma árvore muito galhosa canjoão Que pensei E rompeu tiro romperam na polvorada Até o capim dava assovio E por tudo se desejar de ver tantamente demorava e ficava custoso para em alguma justa coisa se afirmar os olhos O que era feito grande mesa posta cujos luxos motivos por dizer alguém puxa a toalha e vai derruba Quem era que ia poder botar naquilo uma ordem para um fim com vitória E estralou bala Repisei em minhas estribeiras apertei as pernas nas espendas Eu tinha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 795 de comandar Eu estava sozinho Eu mesmo mim não guerreei Sou Zé Bebelo Permaneci Eu podia tudo ver com friezas escorrido de todo medo Nem ira eu tinha A minha raiva já estava abalada E mesmo ver tão em embaralhado de que é que me servia Conservei em punho meu revólver mas cruzei os braços Fechei os olhos Só com o constante poder de minhas pernas eu ensinava a quietidão a Siruiz meu cavalo E tudo perpassante perpassou O que eu tinha que era a minha parte era isso eu comandar Talmente eu podia lá ir com todos me misturar enviar por Não Só comandei Comandei o mundo que desmanchando todo estavam Que comandar é só assim ficar quieto e ter mais coragem Mais coragem que todos Alguém foi que me ensinou aquilo nessa minha hora Me vissem Caso que coragem um sempre tem poder de mais sorver e arcar um excesso igual ao jeito do ar que dele se pode puxar sempre mais para dentro do peito por cheio que cheio emendando respiração À fé que fiz Se não vivei Deus ah também com o demo não me peguei refiro mas um nome só eu falava fortemente falado baixo e que pensado com mais força ainda E que era Urutu Branco Urutu Branco Urutu Branco Cujo era eu mesmo Eu sabia eu queria João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 796 E quando a guerra para o meu lado relambeu feito repentina labareda dum fogo Uns vieram E os tiros deles bala batia e rebatia Cortavam capim do chão que riscavam com punhado de terra Tchavam partes de ramos da árvore por cima de mim e vagens do angico que então reconheci por isso Como quieto fiquei Eu não era o chefe Mesmo que uma carga de rifle se passou em meu chapéudecourodevaca e que outra zoante em meu jaleco raspou A mil que não movi mão mas dei desprezo Mas eu tivesse alargado braço e movido mão para com tiros de meu revólver ripostar e eu mal morto estava ponto que enquadrado de passantes balas que rentes até quentes Urutu Branco eu só relembrei sussurrado ditoso como quando com mocinha meiga se namora Cachaças que em minha alegria Em vento E balas mais só num enorme num minuto Mas bem que aluir dali eu não aluía Morresse tive preguiça de pensar mas morresse então morria trêsempé de valente como o homem maior valente no mundo todo e na hora mais alta de sua maior valentia À fé que foi Dei em lagoa de tão filho tranqüilo E de arrepelo tudo demudou Aqueles torceram os cavalos revertendo para se espraiarem por longe Que era porque os de João Goanhá tinham se avindo de contornar no cabo do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 797 mato e cometiam urrando o grosso do inimigo por detrás FuFiau que se diz Que tínhamos de percalçar e de vencer E aqueles dianteiros Hermógenes que tinham vindo campavam fuga de batida E um do cavalo preto que bobeou o Paspe o Sesfredo e o Suzarte foram nele galopando num embolo reformaram feia nuvem E o corpo dele no retém foi jogado morto se tangeu duro no ar ressaltou feito uma tábua Assim um outro se desatinando João Vaqueiro apeado acertou nele diversas vezes Esse recurvou tatu e tal Ele veio cair perto exato de mim ferido muito grave conforme gemia Desarma mas não acaba de matar manovelho a João Vaqueiro eu disse Aquele homem inimigo derrubado jeremiava cris querendo enterrar as unhas na casca dum pau O queixume que ele exprimia que tinham mesmo de perder por terem vindo com os cavalos deles tão sovados e avante em surpresa tão contrária De tudo se espiolhava suave praguejante aí com três costelas derrotadas Mas água ele pedia cristão Sede é a situação que é uma só mesmo humana de todos Rebaixei o corpo e dei nas mãos dele a minha cabaça quase cheia e que era boa como um cantil Rústico fechei os olhos para não me abrandar com pena das desgraças Nem não escutei que ouvido também se fecha No cavalo eu estava levantado Campo que me competia João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 798 comandar dito Tudo em mim minha coragem minha pessoa a sombra de meu corpo no chão meu vulto O que eu pensei forte as mil vezes que eu queria que se vencesse e queria quieto feito uma árvore de toda altura Tiroteio fechava E o pessoal de Marcelino Pampa apareceu também surgindo para maior mal dos Hermógenes Matamos neles Pegamos pelos lados Confiro o que foi O senhor só se ouvia era carabina repetindo Fogo do Tamanduátão o senhor saiba E pá ainda no pior do meio eu adivinhei sabendo que meu comando tinha dado certo e que dali a vau tudo estava já ganho desfecho do fim desse final Somente para colher o maduro eu podia sobreviver Sei que risquei joguei de galope em cima Ao que vim aonde que tudo se estardalhava Dei gritos Arte que abria no rifle e matava Donde era que estava o Hermógenes A uivos atrás duns rompemos em linha na vereda Todo buriti levou bala A mais o inimigo não tinha o recurso de se apostar por tanto que perdiam os cavalos Advindo que o baixadão dali não dava esconderijos de mato para tocaia à jagunça E os poucos foram os que pegar as distantes brenhas conseguiam ou o cheio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 799 do capinzal aonde não íamos desentocar ninguém Aqueles deviam de estar de faca em fúria na mão cobrejando somente por meio de cachorrosmestres afirmados em caça de gente era que podiam ser pegos o que não se tinha Os mais em desrédea meteram doida fuga enquanto mal pudessem de debaixo de balaços Menos de poucos passaram Ao rascampo em viemos soprando a perseguição Tinha um valo varamos um mato de lobeiras Aí era para a banda das roças novas Uns morrinhos demos fogo Uma tapera outra tapera Demos fogo Poucos dos poucos deles escaparam Os que desladeavam caíam por nossos esteiras Era um relanço bem fatal Mas um homem grande que como pulou abaixo do cavalo grande que baleado fora alcançou jeito de correr e encontrou uma cafua em frente Entrou De lá decerto ia mandar bala E então nós a gente todos desistindo de mais longe perseguir os sobrantes cercamos por completo aquela choupana de regular distância caçando jeito de entrincheiramen to Ia ser o terrível Que quem era aquele homem Ah o Ricardão se gritava E eu mesmo sabia Determinei uma descarga Cafua de buriti que estremeceu como que se entortando de lugar arreganhada em partes A gente atirando atirando com pouco ela ia desaparecer desmanchada Mas eu dei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 800 ordem de paz E adonde estará o Hermógenes próprio eu indaguei Alguém soubesse De se ter ouvido algum deles ferido ou agarrado preso que o Hermógenes não fazia parte atual daquele bando mais acontecia de andar com outros muito adiantado dali vinte léguas avanço no poente Mas então E quase nossa gente toda já estava vinda para apreciarem o derradeiro aprumo do Ricardão Eu dei comando Seô Ricardão o senhor saia para fora eu gritei do protegido donde estava Ele não deu resposta Daí Pau de fogo minha gente eu procedi Pipocaram Durante o que a cafua começava nas últimas Mas de dentro ninguém não ripostou nem um tiro nem Ele estivesse morto Não tinha munição Esperei o engolir em seco três vezes Daí regritei Seô Ricardão o senhor se saia E ele no esquisito respondeu Vou sair com um grito natural Enérgico para o meu povo eu ordenei muita paz E o todo silêncio Espiei Lá acolá o homem abriu devagar os cacos de porta Saiu deu uns passos Como vinha alto chapéu na cabeça até meio sorridente Não se esbugalhava Assim estivesse pensando que ia ter julgamento Achei que E ele não estava ferido Caminhou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 801 mais Sendo que e aí foi minha idéia ah não mas vi que Diadorim de ódio ia pular nele puxar faca Só fiz fim num tirteguarte atirei só um tiro O Ricardão arriou os braços deu o meio do corpo em bala varado Como no cair jogou uma sua perna para lá e para lá Como caiu se deitou Se deitou conforme quase não estivesse sabendo que morria mas nós estávamos vendo que ele já morto já estava Acho deveras que todo o mundo respirou com suspiro Digo que esta minha mão direita quase por si era que tinha atirado Segundo sei ele devolveu Adão à lama Só estas minhas artes de dizer as fantasias Não enterrem este homem eu disse A justiça Mas mesmo como é que se ia poder enterrar a quantidade deles mortos naquele dia Ao quando retornávamos para a Serra eu ia olhava o céu vez em quando Primeiro urubu que passou foi vindo dos lados do SungadodoA esse se serenou bem que me parecia uma amizade de aceno Avoeje Mas o que ia suceder por diante João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 802 Somenos sei e conto mal certo o que os três dias foram no seguinte Se soalerte o senhor que estamos descambando o senhor mesmo se prepare que para fim terrível terrivelmente Eu podia Como é que vou saber se é com alegria ou lágrimas que eu lá estou encaixado morando no futuro Homem anda como anta viver vida Anta é o bicho mais boçal E eu soberbo exato de minha vitória Conforme prazia o dito do cego Borromeu que não se entristecia Ah eu nunca botei em antes o nariz nestes campos Soscrevo Mas ele o que carecia de querer saber às vezes perguntava Desses lugares o divulgado natural pedia pergunta Aí glosava Macambira das estrelas quem te deu tantos espinhos Tibes Eu não Ia demandar de outros o que eu mesmo não soubesse a ser nestes meus Gerais onde eu era o sumo tenente Não me respondiam Ninguém mesmo ninguém A gente vive não é caminhando de costas Rezo O que é o que é existível como fundo dágua Agora eu cismo que o cego Borromeu também só do que já sabia era que indagava Se não se não o senhor verse como bula santa a cita não é revelável Macambira das estrelas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 803 xiquexique resolveu Quixabeira bem me queira quem te ama Bem sou eu Soletrei tudo Assim ele cantava Atrás o menino Guirigó se envelhecendo sobre outro cavalo E a mulher do Hermógenes montada também magra malvaz como podia estar indo em cima duma nuvem Ela desenrolava a cara daquele xale verde sem vexame nenhum e o que espiava da gente era por riba do queixo Quem sabe do orgulho quem sabe da loucura alheia Ela comia ela bebia em um tempo prazida e moça tinha se casado Só com desgosto dos prazos da vida foi que enxerguei aquela mulher Coisa dita não disse A pois O dia estava por dado Sol rachava os barros A mulher o menino e o cego aqueles saíram tocaram Estavam por ordem minha trazidos do brugo do morro mas sendo levados sempre de guarda para o arraial do Paredão estipados com conduta de dez homens Esta é que era a razão que o Hermógenes da banda do poente podia vir Viesse feito Como que estavam engrossados com quantidade de bandidos jagunços se soube e alguns daqueles escapes com vida do Tamanduátão já devia de ter ido João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 804 a ele levasse aviso Soltei a faro meus vigiadores para ter as distâncias vindo medidas Ah mas demeio a partedopoente e o Paredão a passagem certa era um lugar muito plausível no morro e que se chamava o CererêVelho Aonde fomos Estugados em boa marcha Até que o mormaço bateu as asas Deu trovão com ventos trapes Dizendo todos disso que ia breve chover para minha desvantagem Em beira do mato no CererêVelho se trabalhou com facão em ramagem e cipó armando tipóias e latadas Como que melhorou a experiência do tempo adiando esbarrou o vento rufado Mas aquele trabalho nosso era carecido folgar não se pôde nem para palavra minha com Diadorim que era de todo dia conforme bem alembro Noitou Conforme fui dormir recansado de falfa Dormir por pouco Conforme foi e que o meu espírito não queria Que de repente acordei Madrugada de meianoite A lua já estava muito deduzida o morro e o mato misturados Relanceei em volta Todo o mundo dormindo Só o chochorro mateiro que sai de debaixo dos silêncios e um ôôô de urutau muito triste e muito alto Depois ouvi o uivado inteiro dum cão Os companheiros todos dormindo acordado só eu alevantado de noite Pesou por diante João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 805 de meu coração Devi àquele cão maluivante Idéia tristezinha que me veio Por que era que só eu tinha acordado desoras tão antes de todos Mas eu mesmo queria prosperar de olhos abertos carecia O que produzia era eu agüentar até passar o arrocho no coração Deus que me punia que hora tem ou o demo pegou a regatear E entendi que podia escolher de largar ido meu sentimento no rumo da tristeza ou da alegria longe longe até ao fim como o sertão é grande Arte que espiei arriba levei os olhos Aquelas estrelas sem cair As TrêsMarias o Carretão o Cruzeiro o RabodeTatu o CarreirodeSãoTiago Aquilo me criou desejos Eu tinha de ficar acordado firme Depois daí vi o escuro tapar de nuvens Eu ia esperar fazendo uma coisa ou outra até o definitivo do amanhecer para o sol de todos Ao menos achei de tirar do tôo da noite esse defim canto de cantiga Remanso de rio largo Deus ou o demo no sertão Amanheceu com chuva Mundo branco rajava Deu raio deu trovão escorremos água e tudo que se pensou ou se fez foi em montes de lama Diz o senhor sim assim é diadevéspera João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 806 Receio meu era só pela fuga de cavalos Escapulissem eles sabem como o Gerais é espaçoso como no Gerais tem disso que passando noite tão serena desse de manhã o desabe de re pente daquela chuva E igual de feito que antes do meiodia estiou calibre que ventava Sol saído e é ligeiro a gente vendo que essa areia seca seus estados Medi horas Só o cruzo de meus cavaleiros amontados todos enchendo e povoando o sacodecampo como abelhas na umburana Surjo que sabiam o que não sabiam eles estavam desinquietos em modos E os vigieiros chegando conforme voltavam da espiação mesmo molhados ensopados Um disse Por longe não estando viajando para cá Só se com retardo Adonde estava o Hermógenes O céu botava mais nuvens Daí outro Deles nada E eu expedi ainda outros que saíssem e fossem e vissem mais mestres batessem aquelas beiradas de maior mundo Que modo que senseei do vazio do tempo em redor e que eu entredisse O Sertão vem Vinha Trinquei os dentes Mordi mão de sina Porque era dia de antevéspera mire e veja Mas isso tão empé tão perto ainda nuveava nos ocultos do futuro Quem sabe o que essas pedras em redor estão aquecendo e que em uma hora vão transformar de dentro da dureza delas como pássaro nascido Só vejo segredos Mas que o inimigo já estava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 807 aproximado eu pressenti se sabe pela aperreação do corpo como que se querendo ter mais olhos e até no queé do arraigado do peito nas cavas nas tripas O Hermógenes estava para arremeter de rancor se mexendo nos escuros A guerra estava aprazada em batalha ali no CererêVelho Mas meus homens os troados brabos jagunços por uma palavra minha desatribulados agora ao ar que esperavam por mim E aí foi quando veio o Suzarte que desde depois do Tamanduátão tinha saído enviado até mais longe para espreitar e espiar como cachorro correndo os ventos Chegou parecia galopando num cavalo já morto Esbarrou O cavalo baio como desmanchado que arqueava triste as pernas dianteiras descansou tudo no chão que da boca e das ventas ajorrava sangue rebentado dos estômagos e dos peitos Mas o Suzarte que antes do rangersela já tinha escapado os pés das estribeiras e pulado solerte no chão tomou um átimo e relatou Eles estão E para o resto ele apontou com o dedo O Hermógenes mor maldito Ele vinha errado de mim os Hermógenes eles Davam arte de contornar da banda do norte às tantas O Suzarte tinha avistado no dia antes o movimento dos vigias costaneiros e definido de remoto o corpo do bando João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 808 poeira duns oitenta Era o Hermógenes Contornava feito gavião vonje como comigo não tinha nenhuma lei de combinação e esse era o direito dele de àsavessas de guerra A um mal o mal mas o perigo de astúcia aquela hora mudava maior de lugar Porque eles podiam vir e sobrevir Ou menos retos ou mesmo enquanto a gente parava ali oferecidos em camadecaça também eles dispunham de revirarde supeto no Paredão por outra banda e arrebatar a Mulher contra meus só dez homens fazer o que quisessem e para depois emendarem caminho para o CererêVelho em nós com toda retaguarda Revesti isso num relance Arvorei a minha chefia Meus jagunços esperavam a certa decisão aí eles nem me olhavam Maximé eu disse Resumi Apre o que eu ia dizendo no meio do som de minha voz era o que o umbigo de minha idéia aos ligeiros pouquinhos manso me ensinava E era o traçado Tanto que dei ordem Repartição de gente se carecia determinei assim Metade metade Os com João Goanhá e João Concliz ficavam altos no CererêVelho cumprindo espera afoita E chamei os outros e Marcelino Pampa de sotocomando rompemos para o Paredão Tudo se quatreou num pronto no volvervoltear dos cavalos Já um giro dava nos campos já a gente se esquipava E Diadorim que vinha atrás de mim uns João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 809 metros quando virei o rosto vi meu sorriso nos lábios dele Íamos redeando resolutamente dando as costas para o sol entrando Dividi idéia da guerra que ia ser no brutalhal Vindo a cavalo assim era que eu pensava melhor nas menos margens Do CererêVelho até no Paredão seis léguas e eu tinha de deixar ao menos um homem em cada meialégua em estação para em caso serem capazes de traspassar recado de tudo por tudo com a rapidez da guerra Eu fiz só ia sendo Todo o resto que viesse todo o igual E meus homens cumpriam capitalmente Alegria do jagunço é o movimento galopado Alegria Eu disse Ah não eu não O senhor de repente rebata essa palavra devolvida de volta para os portos da minha boca Que foi o dito Novas novidades Conforme vínhamos a sério tocar e já a bem uma légua do Paredão se estava quando apareceu o Trigoso Esse retornava de traquejar as beiras da banda do sul e estivesse jejuno virgem de toda nossa ciência derradeira Do Hermógenes nem nada sabia pois justo Mas queria por força relatar Disse coisas sem proveito Disse Carecia de impor no meu espírito o rebuliço de esfriar em mim o sangue nas veias João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 810 No Saz uma veredinha três léguas abaixo Chefe Vaqueiro que achei que me disse remendando mensagem que é um homem chamado Abrão com uma moça bem arrumada Que vêm vindo beiradeando o rio e a tralha deles trazem em dois burros cargueiros e condução de dois camaradas Ele falou E foi a coisa mais de repente na minha vida Otacília Como tudo neste mundo podia ser e como a minha mente tinha logo puxado de arranco das palavras do Trigoso todo verdadeiro significado Inteirei comigo Seô Habão Vigia se ele não traz consigo uma donzela formosíssima ou se traz emapenas desilusão E o Trigoso disse estava dizendo comple to Ela era Otacília Otacília Eu tinha de escutar outra vez o Trigoso da verdade das coisas menos sabia Imaginar eu imaginava Otacília a vinda dela sertão a dentro por me encontrar e me rever por minha causa Mas achava a guerraria de todos os jagunços deste mundo raivando nos Campos Gerais Terríveis desordens em volta dela longe saída de casa de seu pai sem garantias nenhumas Que proteção ia poder dar a ela esse seô Habão com dois pobres camaradas perrengues tudo tão malaventurado como se estavam Engoli amargos Me rodeavam meus homens o silêncio deles me entendia como João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 811 bem cientes Reperguntei quem sabe se assim paravam na beira do rio se então não deviam de ter retrocedido caminho se encaminhando também para o Paredão Ah que não Chefe Vaqueiro me disse de lá para lá iam indo Fugindo do perigo para o perigoso E no Paredão mesmo dito já não tem mais pessoas de sede As famílias todas e os moradores camparam no pé desgarrados assim que o medo chegou lá O medo é demais de grande Estremeci mor Eram as horas Só de ouvirem falar no vago do Paredão meu povo afastava os cavalos já querendo regalopar Entendi e mais entendi rodei mão na cara Incerteza de chefe não tem poder de ser eu soubesse bem Mas era eu ali em sobregoverno meus homens me esperando e lá Otacília carecendo do meu amparo E a guerra que podia dar de recomeçar na boca dum momento ou antes Que de mim Que diversas honras diferentes homem tem umas às outras contrárias Na estreitura sem tempo meu eu podia desdeixar meus homens E tinha de ir Não por bonsebelos ah Mas minha Otacília vinha em hora tão despertencida de todas a vez pior Eu podia requerer amor Me dê primavera Vi tudo indeciso de mim estarrecido as pedras pretas no meio do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 812 capim o campo esticado Só fiz que no forte do sentir eu pudesse era este ameaço de reza Me dê o meu só e que é o que quero e quero ao Demo ou a Deus A lá eu ia Otacília não era minha noiva que eu tinha de prezar como quase minha mulher Meio do mundo Vai e eu disse lá ia no vou e volto e já mesmo Se diz era um pulo Para revir e dar guerra tempo havia de ter Os outros fossem para o Paredão tocassem Já estava escurecendo Só mais que nesse propósito muitos acharam de me acompanhar alegando que à tal coisa como chefe eu carecia de não querer sozinho ir Abanei cabeça Em assim aceitei dois Alaripe e o Quipes companhia que me bastava Eu não ia desarrumar negócio afracar o forte de minha gente com mais homens arrecadados E sendo o de ser Arremessei ordens joguei meu cavalo Porém porém e esbarrei em saída Esbarrei para repontar Diadorim que vinha vindo A lá que é eu disse aspro Diadorim quisesse me acompanhar eu duvidava de que motivos Não me respondeu Li nele a forma duma ira como apertou os olhos em direitura do campo Tu não vai para o Paredão tu teme eu ainda buli Diadorim me empaliava a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 813 certas O ódio luzente nele era por conta de Otacília Ele me ouviu e não disse ladeando o cavalo Mirou meio o chão vergonha que envermelhou Agora ele me servia dávdiva damizade e eu repelia repelia Mas fora de minha razão eu precisei com urgência de ser ruim mais duro ainda ingrato de dureza Invocava minha teima a balda de Diadorim ser assim Tu volta mano Eu sou o Chefe pronunciei E ele falando de um bemquerer que tinha a inocência enorme respondeu assaz Riobaldo você sempre foi o meu chefe sempre Ainda vi como ele com a mão que era tão suave em paz e tão firme em guerra amimava o arção do selim Repostei um feio xingo Bramei isso porque o azo de Diadorim me transtornava Dei de rédea Com um raspo de galope peguei junto com Alaripe e o Quipes que mais adiantados me aguardavam Nem espiei para trás não ver que Diadorim obedecia mas como devia de parar estacado lá té que o meu vulto desaparecesse Desjustiça Mas como a obrigação do dia me arrolava E em tudo não pensei tocando para ir fazere acontecer aos baques do coração O senhor diria dirá como naquela hora Diadorim e eu desapartávamos um do outro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 814 feito numa água só um torrãozinho de sal e um torrãozinho de açúcar Fui com desejos repartidos Tropear cavalgada nós três o Quipes Alaripe e eu meio a esmo isso é que se tinha Refiz o frio da idéia Mas nos primeiros ares nem consegui Eu despropositava Diadorim é doido eu disse Todo me surripiei instanteante tanto porque Diadorim era nome só de segredo nosso que nunca nenhum outro tinha ouvido Alaripe só fez que susteve cara de não entender e disse somente Hem Mas aí eu desmanchei o encoberto dado dando o do passado me desimportava consoante expliquei Diadorim é o Reinaldo Alaripe ficou em silêncio para melhor me entender Mas o Quipes se riu Dindurinh Boa apelidação Falava feito fosse o nome de um pássaro Me franzi O Reinaldo é valente como mais valente sertanejo supro E danado jagunço Falei mais alto Danado repeti Alaripe por respeito confirmou Ah danado é Por que era que não dava outro jeito dele comigo conversar que não fosse com essas reverências E a noite já tinha completado escuro sem lua ainda aparecida eu não podia avistar a cara dele como formava opinião as palavras que eu falei ficaram sendo sem dono João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 815 Otacília é minha noiva Alaripe Se alembra dela Antes de outros silêncios ele me respondeu Alembro Lá é um fazendão bom Até me desgostava o modo zeloso do Alaripe sempre guiar o caminho cuidados com que separava os galhos e ramagens de árvore para o meu cômodo de seguir E a gente estava quase a passo em passo Donde de conversar desisti muito A que a qual a escuridão tapava toda boca Aonde para que eu ia e carecia de ir conforme meu dever Mas minha Otacília não devia de ter escolhido justa essa ocasião tão destacada de propósitos para vir aventurar entre homens de morte essa delicadeza sem proteção nenhuma filha defamília Alaripe e o Quipes não descuidavam de tomar tento em tudo nos lados no arredor figurável que era tempo de guerra em brenhas de noite e algum inimigo menosseespera podia surgir para o mal Aonde se ia Rumo dado reto em cima da Vereda do Saz ou seguir seguido rio Paracatu arriba Tudo como que tudo se me dava à raiva tanto por causa desse vaqueiro trazedor de relatos Nem eu soubesse certo se era o seô Habão se era Otacília A quase metade do céu tinha suas estrelas descobertas entre os enuveados para chuva O setestrelo no poente a uma João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 816 braça devia de regular umas nove horas Nesse ponto deu de se ouvir um rumor grande para dentro do cerrado removendo nas galharias Só fizemos que esbarramos rifles em mãos É anta o Quipes disse conhecedor alertamente Alguma onça à espera de lua Otacília a tudo estava exposta por culpa de maus conselhos O seô Habão entregou a ela a pedra de ametista eu falei Alto falei e não queria que o Alaripe ressoasse entregou a ela a pedra Isto é a pedra era de topázio só no bocal da idéia de contar é que erro e troco o confuso assim Diadorim sofria mais de tudo quem sabe por conta da dádiva daquela pedra Otacília não devia de ter vindo Eu Essas andanças Agora aonde era que se ia encontrar viajor ou aquele beidamãe de vaqueiro para obrigar a definir notícia Mas o vaqueiro aquele não teria o certo pouso Só atrás de seu gado urucuiano Todo o mundo se fugia do Paredão e de toda parte suas trouxas nas costas A quando se divisou um foguinho adiante no campo seja que pensei gente arranchada no ar em caminho para lugar nenhum Não era Somente foguinhozinho avoável assim azulmente que em leve vento se espalhava fogofá jandlafoz O que não se achava o que eu pensava Eu era diferente de todos Era Susto disso como me divulguei Alaripe o Quipes mesmo o calado deles sem visagens devia de ser diverso do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 817 meu com menos pensamentos Era Sei que eles deviam de sentir por outra forma o aperto dos cheiros do cerradão ouvir desparelhos comigo o comprido ir de tantos mil grilos campais Isso me dava ojeriza mas também com certo consolo misturado Como quando viajando assim no escuro da noite a idéia da gente cheia de atormentamentos e de repente o cavalo bufa batendo o vulto da cabeça branquenta e chamando atenção para o cheiro do suor dele que vale por uma persistência com paciência de responsabilidade Aquela noite estava podendo mais do que a minha decisão Soubesse não sei Noite lembrada em mim de sereno a orvalho Revi madrugar quando esbarramos na beira duma vereda pagã por repouso Aurora é o sol assurgente e os passarinhos arrozeiros Cá o céu tomou as tintas Aí retoquei muita lembrança madraça como se estivesse no antigamente Fez falta foi um café mas comemos farofa bebemos gole dágua O Quipes apanhou araticum maduro ele vivia cuidando de achar as frutas em árvores e moitas E Àlaripe ajuntou gravetos e acendeu um fogo só por calor e costume só que não se tinha o que quentar nem assar Medito como aos poucos e poucos um passarinho maior ia cantando esperto e chamando outros e outros para a lida deles que se semelha trabalho Me passavam João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 818 inveja de como devia de ser o ninho que fizessemtão reduzido em artinha mas modo mandado cabido com o aosfinsefatos E o que pensei que aquela água de vereda sempre tinha permanecido ali permeio às touças de sassafrás e os buritis dos ventos e eu em esse dia só em esse dia justo tinha carecido de vir lá para avistar com eles por que que era Bobéia Eu estava cansado com uma dor na ilharga Por desenfastiar conversei A veja Alaripe que nome será que esta vereda havia de ter o que merecesse denominado Alaripe agachado ali mesmo se virou para mim esbarrando de assoprar o fogo Figuro que ela algum nome já tem só que não se saiba A modo que pegando algum morador de por perto se indaga ele melhor me respondeu Mas eu contradisse que não se precisava Forrei chão para um cochilo De qualquer jeito a paragem ali tinha de ter demora carecia de se dar um lombo aos cavalos Para o que o dia ia ser eles requeriam um descanso e pastar cavalo são desdenha de dormir o senhor sabe bicho que só come come come O sono me conseguiu Ferrei em mais de umas duas horas Por que tudo refiro ao senhor de tantas passagens Ah pelo que quando acordei retenha o seguinte Acordei sentido e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 819 mal à parte Amargava Devia de ir ter cólicas As ânsias essas mesmo com outro cansaço Feito sem repouso nenhum daquelas horas Assim eu sem segurança nenhuma só as dúvidas e nem soubesse o que tinha de fazer Acordei foi com o vozeio de Alaripe e o Quipes que já esperavam por mim e estavam naquela pauteação trivial deles coisas sem nenhum fundamento Depois Alaripe tirou da capanga um vidro que tinha cachaça dentro me ofereceu o primeiro gole Era um vidro meão claro feito remédio de frasco Com alívio tomei Mas era um alívio mesmo assim triste e eu descri eu quis discorrer qualquer noção O que é que tu acha do que acha Alaripe Ele não me conheceu principiou a definir o Paredão do Cererê Velho do Hermógenes Atalhei que não isso que da vida vagada em si no resumo A pois isto Homem sei Como que já vivi tanto grossamente que degastei a capacidade de querer me entender em coisa nenhuma Ele disse disse bem Mas eu entiquei Não podendo entender a razão da vida é só assim que se pode ser vero bom jagunço Alaripe esbarrou como ia quebrar em duas uma palma seca de buritirana Me olhou me falou Se só de entender é comigo eu entendo Entendo as coisas e as pessoas Respondeu disse bem De mim então entendia Desjuízo que me veio Eu ia formar em roda ali mesmo com o Alaripe e o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 820 Quipes relatar a eles dois todo tintim de minha vida cada desarte de pensamento e sentimento meu cada caso mais ignorável ventos e tardes Eu narrava tudo eles tinham de prestar atenção em me ouvir Daí ah de rifle na mão eu mandava eu impunha eles tinham de baixar meu julgamento Fosse bom fosse ruim meu julgamento era Assim Desde depois eu me estava rogava para a minha vida um remir da outra banda de um outro sossego Pensei quase disse Aquilo durou o de um pingo no ar Eu havia de Ah não meu senhor Deu um momento me tirou disso e tanto bastou Doidice tontura de espírito eu repensei reposto em pé Xô O ypsilone dum jegue eu era zote do que arrenego cabeça orelhalmente Ali eu era era o Chefe estava para reger e sentenciar eu era quem passava julgamentos Então falei Vão sozinhos vocês dois beirario procurando Eu não posso ir mais por meu dever Retorno já para o Paredão Alaripe ainda cruzcruzou A gente pode ser que lá a gente faz falta João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 821 Mas eu fechei Sendo o que eu mesmo não podia ao menos esses eu mandava Fossem já fossem Eles tinham de encontrar a minha Otacília a ela render boa proteção Amontamos os três Ainda esperei a saída deles Até me lembro de que escabreado na hora de saudar e tocar Alaripe ainda apontou para a linha de mato veredaacima achando Como que avisto por detrás dárvores passar a marcha dum cavaleiro Não era Não era porque o Quipes não viu conforme confirmou que não viu e o Quipes tinha olho de gaviãogrande Aí pensei será o Alaripe estava sendo um homem se envelhecendo Amigo meu e meu estranho Até me lembro pensei assim Retornei enquanto eles dois iam para a outra banda Agora eu mudava para motivos chega estremeci de influência aos aos ares de guerra Deixei de parte a cisma do mesmo jeito com que ainda fazia pouquinho eu tinha afrouxado ânimo ah a gente larga urgente o real desses estados Agora minha alegria era mais minha por outro destino Otacília ia ter boa guarda E então por uma vez eu peguei o pensamento em Diadorim com certo susto na liberdade Constante o que relembrei Diadorim no CererêVelho no meio da chuva ele igual como sempre como João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 822 antes no seco do invernodefrio A chuva água se lambia a brilhos tão tanto riachos abaixo escorrendo no gibão de couro Só esses pressentimentos sozinho eu senti O sertão se abalava Desfechei Naquela corrida meu cavalo teve as dez pernas E cheguei no Paredão na derradeira boaluz da tarde Diadorim me esperava demais Ainda vi a alegria no rosto dele O Paredão O senhor ponha Como esvoaça mosca gorda de donde se matou boi Tudo estava perfeito tranqüilo Diadorim com chapéu xíspeto alteado Nele o nenhum negar no firme do nuto nas curvas da boca em o rir dos olhos na fina cintura e em peito a tortacruz das cartucheiras Os mais zelando nas armas corriam os dedos apalpavam por afago Conversei com todos Aqui a guerra que queriam guerra Assim os meus catrumanos quais as caras deles iam ficando de demônios mais feio no demônio é o nariz e os beiços Conferi as sentinelas Fui ver onde tinham botado a Mulher ela fechada num quarto no sobrado Ficasse remetida lá sobpé de guarda O sobrado marcava o meio quase da rua Mas para a gente em armas de que é que valia aquele arraial inteiro tão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 823 vazio Determinei deixar lá memo só uns poucos como vigias Tanto o resto todo para um ponto viemos circunstância de umas duzentas braças aonde um lugar mais alto desenhado que seria para porta dos caminhos e apropriado para ali se resistir Formamos bons preparos Minha mãe vivesse e viesse ela mesma por nenhum descuido mero não havia de poder me reprovar Assim apreciei a gente às mansas e às bravas a minha jagunçada Agora eles estavam arrumando o mundo de outra maneira Tudo se media munição e era fuzil e rifle se experimentando A guerra erade todos A juízo eu não devia de mestrear demais tudo prescrevendo porque eles também tinham melindre para se desgostar ou ofender como jagunço sabe honra de profissão Dos modos deles próprios era que eu podia me saber certificado ver a preço se eu estava para ser e sendo exato chefe Com modos eu falasse Olh vigia fulano aí está bom mas lá acolá não é melhor e receava que ele respondesse me explicando por que não era não Eu questionava comigo que eles deviam de lavorar maior raiva Raiva tampa o espaço do medo assim como do medo a raiva vem Reparei isto como nenhum não citava o nome do Hermógenes Aí estava direito que no imigo em véspera não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 824 se proseia Mal que um disse Ele não é laço é argola Ou outro que Ele adoida Mas os mais não glosavam Com o que prazi Gastura que eu tinha era só de que a ventos vai um fosse acrescentar Ele é pactário Ah E que fosse Menção não era de se afirmar regalia nenhuma Pois o demo não é de todos Altarte abri o meu maior sentir que eu havia de ter a vitória Dali o Hermógenes não saía com vida maneira nenhuma testamental Tive ódio dele Muitos ódios Só não sabia por quê Acho que tirava um ódio por causa de outro cosidamente assim seguido de diante para trás o revento todo A modo que o resumo da minha vida em desde menino era para dar cabo definitivo do Hermógenes naquele dia naquele lugar Pelejei para recordar as feições dele e o que figurei como visão foi a de um homem sem cara Preto possuindo a cara nenhuma feito se eu mesmo antes tivesse esbagaçado aquele oco a poder de balas E tudo me deu um enjôo Tinha medo não Tinha era cansaço de esperança Também eu queria que tudo tivesse logo um razoável fim em tanto para eu então largar a jagunçagem Minha Otacília horas dessas graças a Deus havia de parar longe dali João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 825 resguardada protegida O tudo conseguisse fim eu batia para lá topava com ela conduzia Aí eu aí desprezava o ofício de jagunço impostura de chefe Sei quem é chefe Só o gatilho de armadefogo e os ponteiros do relógio Sensato somente eu saísse do meio do sertão ia morar residido em fazenda perto da cidade O que eu pensei rio Urucuia é o meu rio sempre querendo fugir às voltas do sertão quando e quando mas ele vira e recai claro no São Francisco Agora Alaripe e o Quipes regulando deviam de já ter achado a minha Otacília demais pelo Paracatuacima tão longe e até semelhasse invenção isto que na madrugada eu mesmo também tinha estado em caminho de lá em tão precipitados surtos Artezinha Sei o grande sertão Sertão quem sabe dele é urubu gavião gaivota esses pássaros eles estão sempre no alto apalpando ares com pendurado pé com o olhar remedindo a alegria e as misérias todas Nessas e noutras muito extremadas coisas eu tornava a pensar o espírito em meiamão por diante permeio os outros meus entretimentos deverdade Agora tudo estava pronto das obrigações afora a de esperar que é a que regasta e se recoze A noite foi se esquentando assaz Ali também por avisante não se acendia fogueira Mas o campo esparramava muito vaga João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 826 lume Os homens formando grupos acocorados assim eles conversavam O quase que o legal agora era de se caçoarem uns dos outros desafiando quem fosse ser medroso ou duvidado na coragem Razão disso meava uma confiança a mais eu escutando satisfeito aquelas bobices com que eles porfiavam Caranguejinho sem cachaça tu vai Eh não tu Vai saudar o gado Pelos risos e debiques que divertissem de todos eu percebia a forte certeza Cada cadaum dali a pouco ia ser perigoso de nele se encostar feito um sapo que espirra Que te falo amarra o burro que a carga é sua Minha a carga está salva Mal a bem oxente quero é ver o que vou verAssim se zézombavam Aos ditos ditados feito estivessem jogando um truque sem baralhos nenhuns Por que é que aquilo me comprazia E Diadorim parava calado próximo de mim e eu concebia o verter da presença dele quando os nossos dois pensamentos se encontravam Que nem um amor no aoescuro um carinho que se ameaçava Tiroteio fervo se será Aí é que vou ver um mais menino que o Jbibe Se tu não sabe você vai saber que eu já fiz minha fama Jiribibe Pois aquele eh ele pede esmola ao rei E reproduziam muitas essas gaitagens Agora estavam acostumados com a hora do lugar e para qualquer repente refrescados Igual a um gado que vem num João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 827 pasto novo e anda e fareja reconhecendo tudo mas depois tudo aceita e então começa a resfeição Agora agora sim meus homens estavam em ponto de fogo Melhor mesmo não irem dormir antes de forte sono por se evitar espertina de criatura sozinha em espera de possível má morte Tive pena deles Disser isto o senhor podia se rir de mim declarável Ninguém nunca foi jagunço obrigado Sertanejos mire veja o sertão é uma espera enorme Vai vai uma hora eu perguntei a Diadorim A Mulher dissesse alguma coisa Isto eu não sabia por que era que estava indagando Aí eu não queria ciência de se a Mulher tivesse falado alguma coisa trivial Eu quisesse achar de saber era se ela alguma doidice de profecias havia de ter pronunciado Diadorim disse Não Mas ele devia de estar curtindo outro instar de outro assunto Sustido eu sabia o que era dele sempre pensar o imaginável de Otacília Depois de remedir o tamanho de um silêncio ele mesmo veio E o Alaripe mais o Quipes aonde foi que ficaram Esse ciúme de Diadorim não sei porque daquela vez não me deu prazer de vantagem E eu desdenhei na meiaresposta Por aí que eu disse Aí era o cão da noite que meu beiço indicava Vagalumes mais de milhar Mas o céu estava encoberto ensombrado Sofismei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 828 Meio arrependido do dito puxei outra conversa com Diadorim e ele me contrariou com derresposta com o pique de muita solércia Me lembro de tudo O que me deu raiva Mas aos poucos essa raiva minou num gosto concedido Deixei em mim Digo ao senhor se deixei sem pejo nenhum era por causa da hora a menos sobra de tempo sem possibilidades a espera de guerra Ao que alforriado me achei Deixei meu corpo querer Diadorim minha alma Eu tinha recordação do cheiro dele Mesmo no escuro assim eu tinha aquele fino das feições que eu não podia divulgar mas lembrava referido na fantasia da idéia Diadorim mesmo o bravo guerreiro ele era para tanto carinho minha repentina vontade era beijar aquele perfume no pescoço a lá aonde se acabava e remansava a dureza do queixo do rosto Beleza o que é E o senhor me jure Beleza o formato do rosto de um e que para outro pode ser decreto é para destino destinar E eu tinha de gostar tramadamente assim de Diadorim e calar qualquer palavra Ela fosse uma mulher e à alta e desprezadora que sendo eu me encorajava no dizer paixão e no fazer pegava diminuía ela no meio de meus braços Mas dois guerreiros como é como iam poder se gostar mesmo em singela conversação por detrás de tantos brios e armas Mais em antes se matar em luta um o outro E tudo impossível Três João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 829 tantos impossível que eu descuidei e falei Meu bem estivesse dia claro e eu pudesse espiar a cor de seus olhos o disse vagável num esquecimento assim como estivesse pensando somente modo se diz um verso Diadorim se pôs pra trás só assustado O senhor não fala sério ele rompeu e disse se desprazendo O senhor que ele disse Riu mamente Arrepio como recaí em mim furioso com meu patetear Não te ofendo Mano Sei que tu é corajoso eu disfarcei afetando que tinha sido brinca de zombarias recompondo o significado Aí e levantei convidei para se andar Eu queria airar um tanto Diadorim me acompanhou Era uma noite de toda fundura Estava dando um vento esquisito para aquele tempo por ser um vento emhora do lado suão emhora do norte conforme se riscando um fósforo ou jogando punhado de areia fina clara para cima se conhecia Andamos Mas agora eu já tinha demudado o meu sentir que era por Diadorim uma amizade somente reireal exata de forte mesmo mais do que amizade Essa simpatia que em mim me au mentava De tanto que eu podia honestamente dizer a ele o meu bemquerer constância da minha estimação João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 830 Não disse Por que que não disse foi porque o perigo da ocasião me invocou achei que podia ser agouro em véspera de guerra a conversa afeiçoada assim Diadorim em que era que ele devia de estar pensando é o que eu não soube não sei à minha morte esta pergunta faço Como certo é que só do sem mais de coisas falamos sem nenhuma expedição Até que o vento revirou mudando inteiro que vinha era só do norte conforme neste lado da minha cara ele só se fez quente refrescando O sertão ventou rouco Com formas que logo se ajuizou de poder supravir chuva forte e carecido foi que determinamos de retornar com tudo para se ir dormir mesmo nas casas do arraial só uns poucos homens de vigia se deixando naquele alto a padrasto E isso era o exato mas me aborreceu demais e me cansou mais do que as outras peripécias Consabido que na noite antes eu tinha viajado em todo regime das estrelas e mais ainda no dia afora as duas ou três horinhas de sono de madrugada Foi eu ver um catre e me trespassei Ainda disse uma recomendação que tirante caso resoluto em hora qualquer não me chamassem Dormi mortalmente Essa foi noite que eu dormi sendo o chefe UrutuBranco mesmo dizer o jagunço Riobaldo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 831 Acordei último Alteado se podia nadar no sol Aí quase que não se passavam mais os bandos de pássaros Mesmo perfiz que o dia ia dever ser bonito firme O calor fortalecia e logo ia se secando o chão umas poças de lama e as árvores com gotejos porque de noite tinha caído uma bruega Bebi café comi um naco de carne gorda repassada na farinha mastiguei um taco de rapadura Enquanto vi meu pessoal discorria na mesma dispo sição influentes como antes Tornamos para o ponto demonstrado de espera cada um caçando seu atrincheirado Chegou o Cavalcânti vindo do CererêVelho com recado nenhumas novidades Para o CererêVelho recambiei aviso nenhumas novidades minhas também O que positivo era e do que os meus vigiadores do rededor davam confirmação Antes mesmo por mais que eu quisesse ficar prevenido o dia era de paz Todos percebessem Era uma paz gritável Será que não vão vir algum maldisse no rifle se escorando Vez vendo duvidei Chegou a me dar desânimo fato que não viessem e a gente ter de adiar fim recomeço rodando por esse mundo a fora em vã caçada Ah não retemperei Homem nenhum podia deixar a mulher sojugada presa em mão de outros e demorar desistido de ataque Vinha que vinha mais hora menos hora Todos espe rassem E eu mesmo de todas minhas armas não larguei quando João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 832 desci para momento de lavar o corpo no rio Que tão perto era E de lá todo movimento dos meus eu avistava Duvido Desavistei foi na mente não foi dos olhos Como que o avio de descangar as armas de sobre mim e as cartucheiras e o vagar de tirar a roupa e remolhar os pulsos e fazer menção para entrar na água com conforto essas ações tiravam conta do meu estar como um alívio de sossego Eu tinha a certeza de paz por horas E o demo me disse Disse mas foi assim tiros Choque que levei foi feito um trovão Começou a se bradar Os gritos tiros Que foi mesmo que eu primeiro ouvi Primeiro dum pulo bruto eu já estava lá pegando minhas roupas armado prestes E vi o mundo fantasmo A minha gente bramando e avisando e descarregando e também se desabalando de lá xamenxame de abelhas bravas Mas por quê eu desentendi e tornei a entender depressa demais que o ini migo dera de se estourar todo derepentemente da banda outra lugar donde não devia de vir nem ali possível de ser esperado Eles eram quantidade Cru e cru que avançavam avançando como que já iam tomar o Paredão as casas na ponta do arraial Estarreci Que na prema da minha ausência o muito mundo se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 833 acabava Tudo diferente da cartada E eu sei o que é estupor que eu tinha pegado calça e camisa em mão e esbarrei num demorado sem termo no meio de me revestir e eu num latejo frouxo pensando Não chego em tempo Não adianta Não chego em tempo nenhum Sei lá o tanto que isso durou E eu via o meu pessoal avançar também com brabura e diligência na outra ponta a modo de impedir que o arraial fosse tomado Porque o Paredão era uma rua só e aquilo ficou de enfiada um cano de balas Mas no mesmo ar de ar em que eu via aquilo lavorei pensando que eu era tonto e burro e idiota as mil vezes porque agora estava perdida irremediavelmente minha ocasião e a guerra descambava fora do meu poder E eu acabei de me enroupar mal mal e escutava essas vozes Tu não vai lá tu é doido Não adianta Não vai e deixa que eles mesmos uns e outros resolvam porque agora eles começaram tudo errado e diferente sem perfeição nenhuma e tu não tem mais nada com isso por causa que eles estragaram a guerra Assim ouvi sussurro muito suave vozinha mentindo de muito amiga minha O meu medo Não Ah não Mas meus pêlos crescendo em todo o corpo Mas essa horrorizância Daquela doçura nojenta de voz E senti meu corpo muito grande Me xinguei Um sujeito vinha correndo nele eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 834 quase atirei Desertor Ah não esse o Sidurino era correndo por um cavalo Ah e bem fosse ia voltear para o CererêVelho chamar trazer reforço para darem retaguarda E eu casei com meu rifle vim vim vim Desconheci temor nenhum Vivo em vida me ajuntei com os companheiros Meus homens dei ordens As balas estralejavam Foi fogo posto Arrasar que vem de para onde não se olha feito forte sol e vem como sol nascendo Rachavam lascas espatifavam Aí podiam descascar os arvoredos de uma dessas floresta toda inteira Apraz que os ares Ah esses meus jagunços apragatados pebas formavam trincheira em chão e em tudo Eles sabiam a guerra por si feito já tivessem sabido na mãe e no pai Só se aos uivos urros se zurrava Aí como tomei chegada e peguei postura Valia ver comandar Gritei Chagas de Cristo Os meus davam ainda outros gritos A carabina em mãos coisa mexedora A gente disparava dentro dos quintais avançávamos E de detrás das casas E guardávamos o emboque da rua Diz que lê dizque escreve Tiro ali era máquina Aos tantos juntos relando cinco deles cinco dedos cinco mãos A gente tinha de caber em buracos escavacados A cabeça da gente é que dá voltas mesmo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 835 no esconderijo como para se desviar Mas não se tem medo a gasto Eu dizia fré e botava bililica na agulha Amanso Eu queria que Diadorim não se descuidasse Diadorim disse Toma cautela Riobaldo Diadorim se descabelou bonitamente o rosto dele se principiava dos olhos Eu comandava Um comanda é com o hoje não é com o ontem Aí eu era UrutuBranco mas tinha de ser o cerzidor Tatarana o que em ponto melhor alvejava Medo não me conheceu vaca Ca rabina Quem mirou em mim e eu nele e escapou milagre e eu não ter morrido milagremente A morte de cada um já está em edital Dia de minha sorte O que digo e desdigo o senhor escute Mas o inimigo fuzuavatiroteio total Tudo ali era à maldição as sementes de matar De ouvir o renje uimuim dessas perto de nossos cabelos eles sobem de si e chega a doer de nervoso mas dói real como se umas daquelas atravessassem até buracal do olho da gente mas feito dor que vara do céudaboca por dentro dos ossos pontudamente igual quando às vezes se come sorvete de gelo Era a cara pura da morte Avave Marcelino Pampa logo esse Nem olhou ninguém Curvou o corpo quase se quebrando em dois ia encostar testa no chão e largou tudo espaireceu as mãos e bofou da boca diversos dois feixes de sangue Sangue dele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 836 Semelhava que um boi nele tivesse pisado E eu desfechei dez para a frente vingando fosse Daí vigiei Um homem morre mais que vive sem susto de instantaneamente e está ainda com re mela nos olhos ranho moco no nariz cuspes na boca e obra e urina e restos de decomer nas barrigas Mas Marcelino Pampa era ouro merecia lágrimas dalguma mulher perto mão tremente que lhe fechasse bem os olhos Porque não se vê outro assim com tão legítimo valor capaz de ser e valer sem querer parecer E uma vela acesa uma que fosse ali ao pé a fim de que o fogo alumiar a primeira indicação para a alma dele que se diz que o fogo somente é que vige das duas bandas da morte da de lá e da de cá E eu peguei puxei o corpo para não ficar em cima dum vestígio de lama porque ali de noite tinha chovido e Diadorim panhou o chapéudecouro com qual tapou o rosto do dono A paz no Céu ainda hojeemdia para esse companheiro Marcelino Pampa que de certo dava para grande homemdebem caso se tivesse nascido em grande cidade Ah pápá falei fogo Aquilo em volta se arrebentava balalhava Mas a gente tinha conseguido de firmar possessão agarramos mais da metade do arraial do arruado O sobrado restou nosso Com anseio olhei para muito ver o sobrado rico da banda da mão direita da rua com suas portas e janelas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 837 pintadas de azul tão bem esquadriadas Aquela era a residência alta do Paredão soberana das outras Dentro dela estava sobre guardada a Mulher de custódia E o menino Guirigó e o cego Borromeu a salvos Da parte de cima das janelas e das portas no rés vez a vez meus homens descarregavam Aquele sobrado sobradão parava lá sobre sereno me prazia tudo comandando Ir lá Atual em riba estão dois um é o José Gervásio Embaixo na venda uns quatro quem me informou disso foi o Jiribibe em meu ouvido carecendo de altear voz tanto que espingardaria estrondava Pouco é para ações Tu vai lá Riobaldo quem me disse foi Diadorim em tanto Surriada zuniu O tutuco das balas e as que batiam no chão as raivosas tirando terra Atirei seco Umas três ou quatro vezes Carreguei em novamente Aqui é que é meu dever Diadorim Por o mais perigoso eu falei muito alerta Tudo que Diadorim aconselhasse eu punha de remissa a modo de que com pressentimentos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 838 Tu vai Riobaldo Acolá no alto é que o lugar de chefe Com teu dever pela pontaria mestra que lá em riba de lá tu mais alcança Constante que aqui o negócio está garantido ele disse mansinho de me persuadir Troquei o riflepapo pelo máuser movi mão fogo Nesse ato nem sei se matei Às artes lá o sobrado que torna mirei e admirei Meu posto O quanto também olhei Diadorim ele firme se mostrando feito veadamãe que vem aparecer e refugir de propósito em chamariz de finta para a gente não dar com o veadinho filhote onde é que está amoitado Aquele sobrado era a torre Assumido superior nas alturas dele é que era para um chefe comandar reger o todo cantão de guerra Eu vou fui Deixado João Curiol no meu lugar e esse tinha muita valia Rastejei tomei saída conforme tinha de ir pelos quintais das casas Ainda virei relanceando Sempre queria ver Diadorim O quererbem da gente se despedindo feito um riso e soluço nesse meio de vida Avancei furando os terreiros e as hortas das casas eu debaixo de armas nos arreios Toda a parte ali tinha gente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 839 nossa que com brados me saudavam conforme vale quando um chefe mostra mor valentia Gente com o Jõe Bexiguento sobrechamado o Alpercatas E estava lá o João Nonato que dava boasorte com o bom ar Avancei rompi uma cerquinha de taquara contornei um pano de muro onde o Paspe tinha furado os adobes cavando torneiras E dei fé que o Jiribibe vinha me acompanhando O menino bom Os olhinhos dele a gente só via era porque eram inventados de pretos Será da banda de lá estão bem governando os clavinoteiros ele me disse Aí por que me dizia Soubesse não que o brinquedo agora era mortal Sobre o que se riu me apresentando o que era no fofo da terra debaixo duma roseira um gatinho pretoe branco dormindo seu completo sossego fosse surdo refestelado ele estava até de mãos postas Mas perto de mim veio grão daço que varou cheiamente um pé de mamoeiro Vigia te abaixa eu ralhei com o Jiribibe A gente ouvia a urração ou cita seja destemperada dos inimigos e um desentoar de cantiga que toda pessoa era filhoda segundo a qual Aos canalhas Mas mais xingava o Jiribibe ripostando Daí depressa ganhamos trincheiras atrás dum forno de assar biscoitos e berraram punhadão de disparos para nosso lado chega semelhava rajada de chuvadepedra Lugar danoso João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 840 Aguardamos deitados Te foge Jiribibe que figuro eles têm gente atirando de cima de árvores eu total aconselhei Assim rastejávamos E pouco faltava para o quintal do sobrado só uma cerca miúda com um chuchuzeiro dependurado com chuchus grandes eram uns chuchus enormes Vam boro Chefe que o Jiribibe gritou E caiu morto para pra cá acertado na testa Não gritei e rastejei Ao quando dar o derradeiro lance na porta da cozinha do sobrado derrubei uma bacia grande que lá empé encostada estava Aí entrei Aquela bacia atrás de mim levou uma carga de tirázios com a qual retiniu toda lata velha No eu entrar os que ali vi me saudaram Epa Chefe Respondi Eh epa E naquele instante pensei aquela guerra já estava ficando adoidada E medo não tive Subi a escada O senhor escute meu coração pegue no meu pulso O senhor avista meus cabelos brancos Viver não é é muito perigoso Porque ainda não se sabe Porque aprenderaviver é que é o viver mesmo O sertão me produz depois me engoliu depois me cuspiu do quente da boca O senhor crê minha narração João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 841 Subi aquela escadaderedor escutando a madeira nos meus passos e avisando Quem evém sou eu minha gente repetido Aquilo meio sombrio o ar que dava era como de ser antigo diadedomingo Aí notei que eu mesmo arfava um pouco e estava com uma sede Por lá devia de ter algum pote fresco imaginei É eu minha gente eu disse mesmo assim eles se assustaram primeiro depois tomaram satisfação por me ver Os que na sala que dava para a frente da rua estavam os quais eram que o Araruta e o José Gervásio nas armas e o menino Guirigó e o cego Borromeu assentados no banco encostado na parede para o interno Esses dois muito juntos como que tremiam um tanto deviam de estar rezando Que e a mulher eu indaguei O menino Guirigó queria mostrar ela estava presa num quarto Ela também estivesse rezando Corredor velho para ele davam tantas portas por detrás duma delas tinham fechado a mulher num cômodo A chave estava na mão do cego Borromeu Era uma chave de todotamanho ele fez menção de me entregar rejeitei Tem talha dágua por aqui eu disse eu tinha uma pressa desordenada de certo Diz que lá embaixo tem foi o que o menino Guirigó me deu resposta Entendi que ele curtia sede igualmente e querendo comigo ir João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 842 por seguro temia descer sozinho a escada E o cego Borromeu também que não respondeu mas que mexeu a boca mole mole fazendo desse rumor de quem termina de mastigar rapadura Me enjoou Mas ele não tinha comido alguma coisa Não tive comigo Tu me ouve xixilado tu me ouve Assim tu me dá respeito e agradece interesses de ter tomado conta de você e trazido em companhia minha por todas as partes Eu disse Ele disse Deus vos proteja Chefe dê ademão por nós todos E de tudo peço perdão Ele se ajoelhou Ouvir e ver isso me embaraçasse eu já pegava ponto de remorso Porque esse homem sem visão carnal de valia nenhuma maldade minha era que tinha sido a trazida dele de em desde o começo de lugar onde ele cumpria sua vida E agora ele devia de padecer o redobrado medo concebendo que vai ou vai a gente fugisse dali e ele para trás parasse para as unhas dos outros Mas a cena desses todos pensamentos em mim foi ligeira demais conforme não tinham geração A meio me lembro e conto é só para firmar minha capacidade Como o reslumbre que no tento da hora eu prezei em Otacília juízo vago Como para a janela eu fui quase que na imaginação de botar meu olhar e haver de ver no longe tal o lugar aonde ela andava Conto para o senhor conhecer quanta espécie de causa no mover da João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 843 mente no mero da tragagem de guerra E o José Gervásio e o Araruta cada um em beira duma janela agachados carabinas em mão as cheias cartucheiras Para mim era que olhavam estudados querendo algum qualquer sinal E aí uma bala alta abelhou se seguindo sozinha muito rente com cujo barulho de música que fez eu conheci que era de comblém Eu tinha de dar mais espertação ainda àqueles dois Tenência Para uma janela me cheguei E endureci no rifle Em volta relanceei Eu o bedegas Saiba o senhor eu estava ali assim em padastro de todos de do ar de rechego feito que em jiraudeespera para castigar onça assassinã Vi ou não vi Só espreitei Dono do que lucrei de espreitar Uns deles num terreiro acolá manobravam a gosto nas más armas Assestei Um era um sujeitão muito baiano nos trajes Do gatilho do rifle no triz me mandei nele Aquele caiu torto o outro completou Assim eram três o derradeiro percebeu que tinha céu e correu dando gambetas Zumba levou não sei quantas esburacadoras na tampa de suas costas Ah ali valia donde que eu estava Ao mesmo quando revingaram com umas descargas despejadas Dei atrás mas sobranceei de talaia Fazia bem duas horas que aquela batalha tinha principiado Se estava no poder do meiodia João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 844 De graça berra é o boi tirante a vaca Dessa daquela vez tudo não acabava sem um fim ferrado que o Hermógenes não era cão de desmorder os dentes e ele vinha de cinqüenta léguas Toada tinha de ter um prazo E há um vero jeito de tudo se contar uma vivença dessas Os tiros gritos eco baque boléu urros nos tiros e coisas rebentáveis Dava até silêncio Pois porque variava naquele compasso que bater papocar lascar estralar e trovejar truxe cerrando fogo e daí marasmar o calado de repente ou vindo aos tantos se esmorecendo de devagar Tempo que me mediu Tempo Se as pessoas esbarrassem para pensar tem uma coisa eu vejo é o puro tempo vindo de baixo quieto mole como a enchente duma água Tempo é a vida da morte imperfeição Bobices minhas o senhor em mim não medite Mas sobre uns assuntos assim reponho era que eu almejava ter perguntado a Diadorim na véspera de noite conforme quando com ele passeei Naquela hora eu cismasse de perguntar a Diadorim Tu não acha que todo o mundo é doido Que um só deixa de doido ser é em horas de sentir a completa coragem ou o amor Ou em horas em que consegue rezar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 845 Não indaguei Mas eu sabia que Diadorim havia de me dar resposta Doca Ramiro não era doido nenhum Riobaldo e ele mataram Então eu podia revia Mas porém quando isto tudo findar Diá Di então quando eu casar tu deve de vir viver em companhia com a gente numa fazenda em boa beira do Urucuia O Urucuia perto da barra também tem belas troas de areia e ilhas que forma com verdes árvores debruçadas E a lá se dão os pássaros de todos os mesmos prazentes pássaros do Rio das Velhas da saudade jaburu e galinhol e garçabranca a garça rosada que repassa em extensos no ar feito vestido de mulher E o manuelzinhodatroa que pisa e se desempenha tão catita o manuelzinho não é mesmo de todos o passarinho lindo de mais amor Podia ser Impossivelmente Eu não tinha sido capaz de perguntar aqueles ensalmos a Diadorim de fato só em coisa àtoa se conversou trivial a respeito de munição e meus armamentos e avio de guerra Véspera As horas é que formam o longe Mas agora ali em ocasiões de morte eu repisei e mesmo amontado no momento que era que eu ia dizer a Diadorim se perto de mim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 846 ele parasse Hoje não sei Não soubesse naqueles adiantes Ali por onde eu estava eu marcava muito suave a mão da morte feito um boiadeiro que em janela ou porta ou tábua de curral ou parede de casa por todas as partes por onde anda carimba remarcada a amostra do ferro dele de seu gado para se conhecer Assim Como lembro que eu tinha uma dorde cabeça era uma dordecabeça forte fincada num ai só furante de verrumas Agüentei Devia de ser da sede Dá deu bala beijaflorou Zuos ao que rachavam ombreiras das janelas estraçalhavam esfarelavam fasquia Umas que caíam quase como colhidas no assoalho do chão tinham dançado de ricochete e ficavam para lá amolgadas feito pedaço de cano ou aveladas de maduras Essas podiam se esfriar de vagarinho Perdiam sem valia aquele feio calor que podia ter sido a vida de uma pessoa O José Gervásio e o Araruta recuaram para o meio da sala me recomendaram me acautelasse Mas eu permaneci Disse que não não não Minhas duas mãos tinham tomado um tremer que não era de medo fatal Minhas pernas não tremiam Mas os dedos se estremecitavam esfiapado sacudindo curvos que eu tocasse sanfona Aí gritei Estrumes Deram fuzilada Fogo fechado as cargas de pólvora e o despejar e assoviar como o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 847 vento ronda no final das águas Mesmo assim eu queria e visava dali não saí do vão aberto não dando de meu poder Desfechei bem Por mim meu desprezo como essas assoviantes deles varejavam Eu não estava caçando a morte o senhor bem me entenda Eu queria era a coragem maior Macho com meu fuzil reiúno dei salvas Tive fechado o corpo Quero que não não pergunto Não morri e matei E vi Sem perigo de minha pessoa Aí quando foi monumental peguei susto lá embaixo muito estava demudando Só se fez que inesperadamente parte do povo do Hermógenes que tantos eram a rascorja tinham alcançado de rodear por trás da minha gente na ponta da rua tomando retaguarda Iam vencer fosse possível Temi por todos Ah não que não regiam Dindhoje o amigo meu João Vaqueiro eu estou vendo mais homem mais moreno arrenegando de todos os macacos nem suor ele não desperdiçava o que ele vestiu vestiu couro é e vai embora dando muito as costas lá adiante acometendo contra outros outros Morreu que mataram Em obra de umas cem braças Ah não Os nossos agüentavam o relance arre disparando a mastro de balas foi um fogo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 848 E eu hesitado nos meus pés refiz fé teve o instante eu sabia meu dever de fazer Descer para lá me ajuntar com os meus para ajudar Não podia não devia de daí conheci Ali um homem um chefe carecia de ficar naquele meu lugar no sobrado Mas resoluto mandei ao Araruta e ao José Gervásio que fossem mas fossem Eles mesmos queriam ir Eles desceram a escada Estado daquele fogo era um pipoco malacreditado Tudo não sendo guerra entendi Um panelão na trempe o que se cozinhava Sobrestive Surgindo o fim eu restava desandado ao para trás sozinho só com os dois O menino Guirigó uma mão apertando as costas da outra seguidos esses estremecimentos repuxava a cara mas com os beiços abertos em dor tudo uma careta Ele era um menino E o cego Borromeu fechava os olhos Tive pena Não ouvi nada eu disse Deveras Eu disse Vocês têm paciência meus filhos O mundo é meu mas é demorado A arte que prometi que mais baque mais retumbo a gente ganhava a gente ganhava a gente ganhava Antes bati uma palmada firme no liso da minha coronha A vitória Ah a vitória eu no meio dela que com os ventos arrastado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 849 E não era Durou dali a meiahora nem bem e vislumbrei outro alvoroço mas da ponta da outra banda e festivo para mim me dando milagre Eli do ar Eh dunga Ao que era que tal era que repentemente o pessoal meu do CererêVelho sequazes de João Goanhá suprachegavam também enfrentando os Hermógenes pelas costas davam a toda retaguarda De alegre ser destampei tiro sobre tiro A guerra agora tinha ficado enorme O senhor supute lado a lado somando derramavam de ser os trezentos e tantos reinando ao estral de ser jagunços Teria restado mais algum trabuco simples nos Gerais Não tinha E ali era para se confirmar coragem contra coragem à rasga de se destruir a toda munição Dessa guisa enrolada como que lavrar uma guerra de dentro e outra de fora cada um cercado e cercando Recompor aquilo no final Só com a vitória Duvidei não Nasci para ser Esbarrando aquele momento era eu sobre vez por todos eu enorme que era o que mais alto se realçava E conheci oficio de destino meu real era o de não ter medo Ter medo nenhum Não tive Não tivesse e tudo se desmanchava delicado para distante de mim pelo meu vencer ilha em águas claras Conheci Enchi minha história Até João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 850 que nisso alguém se riu de mim como que escutei O que era um riso escondido tão exato em mim como o meu mesmo atabafado Donde desconfiei Não pensei no que não queria pensar e certifiquei que isso era idéia falsa próxima e então eu ia denunciar nome dar a cita Satanão Sujo e dele disse somentes S Sertão Sertão Na meiadetença ouvi um limpado de garganta Virei para trás Só era o cego Borromeu que moveu os braços e as mãos feio feito negro que embala clavinote Sem nem sei por que mal que perguntei Você é o Sertão Ossenhor perfeitamém ossenhor perfeitamém Que sou é o cego Borromeu Ossenhor meussenhor ele retorquiu Voxe uai Não entendo tartamelei Gago não gagaz Conforme que quando ia principiar a falar pressenti que a língua estremecia para trás e igual assim todas as partes de minha cara que tremiam dos beiços nas faces até na ponta do nariz e do queixo Mas me fiz Que o ato do medo não tive Mandei o cego se sentar e ele obedeceu ele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 851 estava no aparvoado mas não se abancando no banco que melhor se agachou ficou agachado Riu de me dar nojo Mas nojo medo é é não Destemor maior Deus não me desse segundo retornei para a praça da janela donde eu dava e mandava Sobreolhava Ah máuser e winchester que assoviamzinho sutil E chio de espingardão velho antigo Chum beou Háde varavam Como refiro que também eu não persistia ali aparte de tudo desperdício mais antes quem se avultasse baqueava Carabina Sucinto que se passou horas tantas estalos e estrondos estouros sotrançando no chicotear das balasbalas sempre disso Sempremente Ao constante que eu estive copiando o meu destino Mas como vou contar ao senhor Ao que narro assim refrio e esvaziado luísesilva O senhor não sabe o senhor não vê Conto o que fiz O que adjaz Que eu manejava na mira Dava dava E que não pronunciei insultos e gritos mesmo porque minha boca a modo que naquele preciso tremor me malobedecia Sapateei em vez bati pé de pilão nas tábuas do assoalho tão surdo o senhor é capaz que escute como eu escutei E o que o furor da guerra lá fora lá embaixo tomava certa conta de mim que a quase eu deixava de dar fé da dorde cabeça que forte me doía que doesse vindo do céudaboca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 852 conforme desde aos poucos que o fogo tinha começado E que água não provei bebida nem cigarro pitei Esperançando meu destino desgraça de mim Eu Eu Como vou contar e o senhor sentir em meu estado O senhor sobrenasceu lá O senhor mordeu aquilo O senhor conheceu Diadorim meu senhor Ah o senhor pensa que morte é choro e sofismaterra funda e ossos quietos O senhor havia de conceber alguém aurorear de todo amor e morrer como só para um O senhor devia de ver homens à mãotente se matando a crer com babas raivas Ou a arte de um tátá tiro e o outro vir na fumaça de àfaca de repelo quando o que já defunto era quem mais matava O senhor Me dê um silêncio Eu vou contar Tudo estava tão pendurado para o fim Derradeiro ainda foi que eu virei para trás para repreender o cego Borromeu e que eu estava com dormente dor nos braços Semordem daquele cego estúrdio agachado lá cocoral Só fez que disse bronco Quem me dê um decomer Respondi ralhei Ah hádeo singular ficasse mesmo ali mascando fumo grosso e cuspindo amarelo e preto Dei num suor Vozeiro dele então João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 853 de repente que principiou a cantar ele estava cantando um louvado Como os braços me testemunhavam um peso Mesmo estranhei quando fui notando que o tiroteio da rua tinha pousado termo achei que fazia um certo minuto que o fogo teria sopitado Cessaram sim Mas gritavam vuvu vavava de conversa ruim uns para os outros de rondaroda Haviam de ter desautorizado toda munição Olhando desentendi Atirar eu pudesse Acho que quis gritar e esperei para depoismente mais tarde Mesmo o que vi aquele mexinflol E que quem saía duma porta para ir se juntar com o bando de todos armou segurando frente de si engatilhada uma garrucha de dois canos pôs a mira que era o catrumano Teofrásio como se fosse braçodarmas E vi chefiando os dele o Hermógenes Chapéu na cabeça era um bandejão redondo Homem que se desata Entendi O senhor me socorre Conheci o que estava para ser que os dele e os meus tinham cruzado grande e doido desafio conforme para cumprir se arrumavam uns e outros nas duas pontas da rua debaixo de forma e a frio desembainhavam O que vendo vi Diadorim movimentos dele Querer mil gritar e não pude desmim de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 854 mimmesmo me tonteava numas ânsias E tinha o inferno daquela rua para encurralar comprido Tiraram minha voz Como vinham de lá e de lá em contraranchos a tomar armas as cartucheiras de tiracol Atirar eu pude A breca torceu e lesou meus braços estorvados Pela espinha abaixo eu suei em fio vertiginoso Quem era que me desbraçava e me peava supilando minhas forças Tua honra Minha honra de homem valente eu me em mim gemi alma que perdeu o corpo O fuzil caiu de minhas mãos que nem pude segurar com o queixo e com os peitos Eu vi minhas agarras não valerem Até que trespassei de horror precipício branco Diadorim a vir do topo da rua punhal em mão avançar correndo amouco Ai eles se vinham cometer Os trezentos passos Como eu estava depravado a vivo quedando Eles todos na fúria tão animosamente Menos eu Arrepele que não prestava para tramandar uma ordem gritar um conselho Nem cochichar comigo pude Boca se encheu de cuspes Babei Mas eles vinham se avinham num pédevento no desadoro bramavam se investiram Ao que fechou o fim e se fizeram E eu arrevessei na ânsia por um livramento Quando quis rezar e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 855 só um pensamento como raio e raio que em mim Que o senhor sabe Qual o Diabo na rua no meio do redemunho O senhor soubesse Diadorim eu queria versegurar com os olhos Escutei o medo claro nos meus dentes O Hermó genes desumano dronho nos cabelões da barba Diadorim foi nele Negaceou com uma quebra de corpo gambetou E eles sanharam e baralharam terçaram De supetão e só E eu estando vendo Trecheio aquilo rodou encarniçados roldão de tal dobravam para fora e para dentro com braços e pernas rodejando como quem corre nas entortações O diabo na rua no meio do redemunho Sangue Cortavam toucinho debaixo de couro humano esfaqueavam carnes Vi camisa de baetilha e vi as costas de homem remando no caminho para o chão como corpo de porco sapecado e rapado Sofri rezar e não podia num cambaleio Ao ferreio as facas vermelhas no embrulhável A faca a faca eles se cortaram até os suspensórios O diabo na rua no meio do redemunho Assim ah mirei e vi o claro claramente ai Diadorim cravar e sangrar o Hermógenes Ah cravou no vão e ressurtiu o alto esguicho de sangue porfiou para bem matar Soluço que não pude mar que eu queria um socorro de rezar uma palavra que fosse bradada ou em muda e secou e só orvalhou em mim por prestígios do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 856 arrebatado no momento foi poder imaginar a minha Nossa Senhora assentada no meio da igreja Gole de consolo Como lá embaixo era fel de morte sem perdão nenhum Que engoli vivo Gemidos de todo ódio Os urros Como de repente não vi mais Diadorim No céu um pano de nuvens Diadorim Naquilo eu então pude no corte da dor me mexi mordi minha mão de redoer com ira de tudo Subi os abismos De mais longe agora davam uns tiros esses tiros vinham de profundas profundezas Trespassei Eu estou depois das tempestades O senhor nonada conhece de mim sabe o muito ou o pouco O Urucuia é ázigo Vida vencida de um caminhos todos para trás é história que instrui vida do senhor algum O senhor enche uma caderneta O senhor vê aonde é o sertão Beira dele meio dele Tudo sai é mesmo de escuros buracos tirante o que vem do Céu Eu sei Conforme conto Como retornei tarde depois mal sabendo de mim e querendo emendar nó no tempo tateando com meus olhos que ainda restavam fechados Ouvi os rogos do menino Guirigó e do cego Borromeu esfregando meu peito e meus braços reconstituindo no dizer que eu tinha estado sem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 857 acordo dado ataque mas que não tivesse espumado nem babado Sobrenadei E daí não sei bem eu estava recebendo socorro de outros o Jacaré PacamãdePresas João Curiol e o Acauã que molhavam minhas faces e minha boca lambi a água Eu despertei de todo como no instante em que o trovão não acabou de rolar até o fundo e se sabe que caiu o raio Diadorim tinha morrido milvezesmente para sempre de mim e eu sabia e não queria saber meus olhos marejavam E a guerra eu disse Chefe Chefe ganhamos que acabamos com eles João Goanhá e o Fafafa com uns dos nossos ainda seguiram perseguindo os restos derradeira demão João Concliz deu resposta O Hermógenes está morto remorto matado quem falou foi o João Curiol Morto Remorto O do Demo Havia nenhum Hermógenes mais Assim de certo resumido do jeito de quem cravado com um rombo esfaqueante se sangra todo no vãodopescoço já ficou amarelo completo oca de terra semblante puxado escarnecente como quem da gente se quer rir cara sepultada Um Hermógenes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 858 Nas vozes nos fatos que agora todos estavam explicando por tanto que assim tristonhamente a gente vencia Sobresseguida à doideira de mãodeguerra na rua João Goanhá tinha carregado em cima dos bandidos deles que estavam dando retaguarda e com eles rebentado Aquilo não fazia razão Suspendi minhas mãos Vi que podia Só o corpo me estivesse meio duro as pernas teimando em se entesar num emperro que às vezes me empalhava Sendo que me levantei sustentando e caminhei os passos as costas para a janela eu dava Nesse ponto foi que o Alaripe e o Quipes vinham chegando Notícia de Otacília me dessem eu custava a me lembrar de tantas coisas Aqueles dois vinham alheios do que vinham desiludidos da viagem deles Era a vossa noiva não Chefe o que Alaripe relatava O homem se chamava só Adão Lemes indo conduzindo a irmã dele fazendeira cujo nome é Aesmeralda Iam de volta para suas casas Os que então no PortodoCi deixamos na barra do Caatinga Tanta gente tinha o mundo eu pensei Tanta vida para a discórdia Agradeci ao Alaripe mas virei para os outros nossos perguntei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 859 Mortos muitos Demais Isto o João Curiol me respondeu prestativamente sistema de amigo Solucei em seco debaixo de nada Agora um me dizendo que com as ferramentas uns estavam trabalhando de abrir covas para enterro revezados Alaripe fez um cigarro queria dar para mim que rejeitei E o Hermógenes aí foi o que o Alaripe perguntou Como estavam indo abrir aquele quarto trazendo do corredor a mulher do Hermógenes Ela visse A senhora chegue na janela dona espia para a rua o que João Concliz falou Aquela Mulher não era malina A senhora conheça dona um homem demõiado que foi mas que já começou a feder retalhado na virtude do ferro Aquela Mulher ia sofrer Mas ela disse que não sacudindo só de leve a cabeça com respeito de seriedade Eu tinha ódio dele ela disse me estremecendo Ou eu ainda não estava bem de mim da dor que me nublou tive de sentar no banco da parede Como no perdido mal ouvi partes do vozeio de todos eu em malmolência Tomaram as roupas da mulher nua Era a Mulher que falava Ah e a Mulher rogava Que trouxessem o corpo daquele rapaz moço vistoso o dos olhos muito verdes Eu desguisei Eu deixei minhas lágrimas virem e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 860 ordenando Traz Diadorim conforme era Gente vamos trazer Esse é o Reinaldo o que o Alaripe disse E eu parava ali permeio o menino Guirigó e o cego Borromeu Ai Jesus foi o que eu ouvi dessas vozes deles Aquela Mulher não era má de todo Pelas lágrimas fortes que esquentavam meu rosto e salgavam minha boca mas que já frias já rolavam Diadorim Diadorim oh ah meusburitizais levados de verdes Buriti do ouro da flor E subiram as escadas com ele em cima de mesa foi posto Diadorim Diadorim será que amereci só por metade Com meus molhados olhos não olhei bem como que garças voavam E que fossem campear velas ou tocha de cera e acender altas fogueiras de boa lenha em volta do escuro do arraial Sufoquei numa estrangulação de dó Constante o que a Mulher disse carecia de se lavar e vestir o corpo Piedade como que ela mesma embebendo toalha limpou as faces de Diadorim casca de tão grosso sangue repisado E a beleza dele permanecia só permanecia mais impossivelmente Mesmo como jazendo assim nesse pó de palidez feito a coisa e máscara sem gota nenhuma Os olhos dele ficados para a gente ver A cara economizada a boca secada Os cabelos com marca de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 861 duráveis Não escrevo não falo para assim não ser não foi não é não fica sendo Diadorim Eu dizendo que a Mulher ia lavar o corpo dele Ela rezava rezas da Bahia Mandou todo o mundo sair Eu fiquei E a Mulher abanou brandamente a cabeça consoante deu um suspiro simples Ela me malentendia Não me mostrou de propósito o corpo E disse Diadorim nu de tudo E ela disse A Deus dada Pobrezinha E disse Eu conheci Como em todo o tempo antes eu não contei ao senhor e mercê peço mas para o senhor divulgar comigo a par justo o travo de tanto segredo sabendo somente no átimo em que eu também só soube Que Diadorim era o corpo de uma mulher moça perfeita Estarreci A dor não pode mais do que a surpresa A coice darma de coronha Ela era Tal que assim se desencantava num encanto tão terrível e levantei mão para me benzer mas com ela tapei foi um soluçar e enxuguei as lágrimas maiores Uivei Diadorim Diadorim era uma mulher Diadorim era mulher como o sol não acende a água do rio Urucuia como eu solucei meu desespero João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 862 O senhor não repare Demore que eu conto A vida da gente nunca tem termo real Eu estendi as mãos para tocar naquele corpo e estremeci retirando as mãos para trás incendiável abaixei meus olhos E a Mulher estendeu a toalha recobrindo as partes Mas aqueles olhos eu beijei e as faces a boca Adivinhava os cabelos Cabelos que cortou com tesoura de prata Cabelos que no só ser haviam de dar para baixo da cintura E eu não sabia por que nome chamar eu exclamei me doendo Meu amor Foi assim Eu tinha me debruçado na janela para poder não presenciar o mundo A Mulher lavou o corpo que revestiu com a melhor peça de roupa que ela tirou da trouxa dela mesma No peito entre as mãos postas ainda depositou o cordão com o escapulário que tinha sido meu e um rosário de coquinhos de ouricuri e contas de lágrimasdenossasenhora Só faltou ah a pedrade ametista tanto trazida O Quipes veio com as velas que acendemos em quadral Essas coisas se passavam perto de mim Como tinham ido abrir a cova cristamente Pelo repugnar e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 863 revoltar primeiro eu quis Enterrem separado dos outros num aliso de vereda adonde ninguém ache nunca se saiba Tal que disse doidava Recaí no marcar do sofrer Em real me vi que com a Mulher junto abraçado nós dois chorávamos extenso E todos meus jagunços decididos choravam Daí fomos e em sepultura deixamos no cemitério do Paredão enterrada em campo do sertão Ela tinha amor em mim E aquela era a hora do mais tarde O céu vem abaixando Narrei ao senhor No que narrei o senhor talvez até ache mais do que eu a minha verdade Fim que foi Aqui a estória se acabou Aqui a estória acabada Aqui a estória acaba Resoluto saí de lá em galope doidável Mas antes reparti o dinheiro que tinha retirei o cinturãocartucheiras aí ultimei o jagunço Riobaldo Disse adeus para todos sempremente Ao que eu ia levar comigo era só o menino o cego e os dos catrumanos vivos sobrados esses eu carecia de repor de volta na terra deles nos lugares E a Mulher também dela me despedi háde ver que esturdiamente sem continuação de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 864 continuação Ainda encomendei a João Curiol que era um baiano bom na palavra e no caráter que providenciasse o retorno daquela para onde quisesse ir outra vez Desapoderei Aonde ia eu retinha bem mesmo na doidagem A um lugar só às VeredasMortas De volta de volta Como se tudo revendo refazendo eu pudesse receber outra vez o que não tinha tido repor Diadorim em vida O que eu pensei o pobre de mim Eu queria me abraçar com uma serrania Mas nessa parte de muito mal me lembro pelo revés em minha saúde Ao que eu ia de repente me vinha um assombramento de espírito muita vez tonteei de ter de me segurar de cair e depois durante muitos espaços eu restava esquecido de tudo de quem eu era de meu nome Mas o Alaripe PacamãdePresas o Quipes o Triol Jesualdo o Acauã João Concliz e o Paspe me cuidavam esses tinham por toda a lei forçado de me acompa nharem vinham comigo e o Fafafa mais João Nonato e Compadre Ciril que vieram depois Amigos meus Aí eu vinha Chapadão Morreu o mar que foi João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 865 Eu vim Pelejei Ao deusdar Como é que eu sabia destornar contra a minha tristeza O dito vim consoante traçado Num lugar o Tuim me alembro eu tive de mudar para outro cavalo E um sitiante no LambeMel explicou que o trecho dos marimbus aonde íamos se chamava mais certo não era VeredasMortas mas VeredasAltas Coisa que compadre meu Quelemém mais tarde me confirmou Daí mais para adiante dei para tremer com uma febre Terçã Mas o sentido do tempo o senhor entende resenha duma viagem Cantar que o senhor fosse De ai de mim Namorei uma palmeira na quadra do entardecer Na morna baqueei não podendo mais Me levaram por primeiro de revexo Depois me botaram para dentro duma casa muito pobre Desembestei doente Por último como perdi meu conhecimento estavam me deitando num catre Que foi febretifo se diz mas trelada com sezão mas sezão forte especial nas altíssimas Que a febre que eu tinha era tamanha tanta como nunca se viu o Alaripe depois me disse que no decorrer dos acessos eu tresvariava Do que no ouvir contado recordei a estória dum fazendeiro o mais maldoso que o demônio por fim salteou por suas ruindades e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 866 que endemoninhado no quarto de sua casa uivando lobum suplicava alivio do calorão e carecia mesmo que os escravos despejassem nele latas e baldes dágua ao constantemente até para evitar que de tudo devorante tão quente não viesse e desse de pegar fogo no cômodo de incêndios Doidice Em dança de demônios que nem não existem Pois então só a doença não bastasse O tempo que fiquei deslembrado detido O quanto foi Mas quando dei acordo de mim sarando e conferindo o juízo a luz sem sol mire e veja meu senhor que eu não estava mais no asilo daquela casinha pobre mas em outra numa grande fazenda para onde sem eu saber tinham me levado Eu estava na Barbaranha no PédaPedra hóspede de seo Josafá Ornelas Tomei caldodegalinha deitado em lençóis alvos recostado E já parava meio longe aquele pesar que me quebrantava Lembro de todos do dia da hora A primeira coisa que eu queria ver e que me deu prazer foi a marca dos tempos numa folhinha de parede Sosseguei de meu ser Era feito eu me esperasse debaixo de uma árvore tão fresca Só que uma coisa a alguma coisa faltava em mim Eu estava um saco cheio de pedras João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 867 Mas aquele seo Ornelas era homem de muita bondade muita honra Ele me tratou com categoria fui príncipe naquela casa Todos a senhora dele as filhas as parentas me cuidavam Mas o que mormente me fortaleceu foi o repetido saber que eles pelo sincero me prezavam como talentoso homemdebem e louvavam meus feitos eu tivesse vindo corajoso para derrubar o Hermógenes e limpar estes Gerais da jagunçagem Fui indo melhor Até que um dia eu estava repousando no claro estar em rede de algodão rendada Alegria me espertou um pressentimento Quando eu olhei vinha vindo uma moça Otacília Meu coração rebateu estava dizendo que o velho era sempre novo Afirmo ao senhor minha Otacília ainda se orçava mais linda me saudou com o salvável carinho adianto de amor Ela tinha vindo com a mãe E a mãe dela os parentes todos se praziam me davam Otacília como minha pretendida Mas eu disse tudo Declarei muito verdadeiro e grande o amor que eu tinha a ela mas que por destino anterior outro amor necessário também fazia pouco eu tinha perdido O que confessei E eu para nojo e emenda carecia de uns tempos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 868 Otacília me entendeu aprovou o que eu quisesse Uns dias ela ainda passou lá me pagando companhia formosamente Ela tinha certeza de que eu ia retornar à Santa Catarina renovar e trajar terno de sarjão flor no peito sendo o da festa de casamento Eu fui com o coração feliz por Otacília eu estava apaixonado Conforme me casei não podia ter feito coisa melhor como até hoje ela é minha muito companheira o senhor conhece o senhor sabe Mas isto foi tantos meses depois quando deu o verde nos campos Eu já estava de todo bom firme para as arremessadas quando ali na Barbaranha se surgiu para mim igualmente a visita de seô Habão ele com o seo Ornelas se tivessem entre tempos pacificado Homem baseado Demonstrou que tinha muita satisfação em me ver assim como para mim vinha trazendo outro cavalo de presente o qual era ruçorodado ordem de valor e estampa Ali agraciado aceitei meu sinceramente Mas ele portava causa maior a que tinha ido confirmar e saber e agenciar por seus bons préstimos E era que meu padrinho Selorico Mendes acabara falecido me abençoando e se honrando orgulhoso de meus atos e as duas maiores fazendas ele tinha deixado para mim em cédula de testamento Seô Habão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 869 queria logo me levar lá no Curralim no Corinto para eu entrar em paz de posses Rejeitei adiei isto é Porquanto de fato fui e tudo recebi em limpo sem precisão de tocar demandas por falta de outros mais legítimos herdeiros e o que também devido dou ao advogado meu que zelou a sucessão Dr Meigo de Lima Só que isso foi mais tarde Pois primeiro eu tinha outra andada que cumprir conforme a ordem que meu coração mandava Tudo agradeci dei a despedida ao seo Ornelas e os dele gentedoevangelho Saí somente com o Alaripe e o Quipes os outros deixei à espera de minha volta que por muita companhia numerosa de nós não cobrassem duvidado Mas antes de sair pedi à dona Brazilina uma tira de pano preto que pus de funo no meu braço Aonde fui a um lugar nos gerais de Lassance OsPorcos Assim lá estivemos A todos eu perguntei em toda porta bati triste pouco foi o que me resultaram O que pensei encontrar alguma velha ou um velho que da história soubessem dela lembrados quando tinha sido menina e então a razão rastraz de muitas coisas haviam de poder me expor muito mundo Isso não achamos Rumamos daí então para bem longe reato Juramento o PeixeCru TerraBranca e Capela a CapelinhadoChumbo Só João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 870 um letreiro achei Este papel que eu trouxe batistério Da matriz de Itacambira onde tem tantos mortos enterrados Lá ela foi levada à pia Lá registrada assim Em um 11 de setembro da era de 1800 e tantos O senhor lê De Maria Deodorina da Fé Bettancourt Marins que nasceu para o dever de guerrear e nunca ter medo e mais para muito amar sem gozo de amor Reze o senhor por essa minha alma O senhor acha que a vida é tristonha Mas ninguém não pode me impedir de rezar pode algum O existir da alma é a reza Quando estou rezando estou fora de sujidade à parte de toda loucura Ou o acordar da alma é que é E o pobre de mim minha tristeza me atrasava consumido Eu não tinha competência de querer viver tão acabadiço até o cumprimento de respirar me sacava E Diadorim às vezes conheci que a saudade dele não me desse repouso nem o nele imaginar Porque eu em tanto viver de tempo tinha negado em mim aquele amor e a amizade desde agora estava amarga falseada e o amor e a pessoa dela mesma ela tinha me negado Para que eu ia conseguir viver Mas o amor de minha Otacília também se aumentava aos berços primeiro esboço de devagar Era João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 871 Passado esse tempo conforme foi pouca tardança Mas então quando se estava de volta membora vindo peguei uma inesperada informação na Barra do Abaeté De Zé Bebelo Tinha mesmo de ser Não sei por que foi que com aquilo me renasci Que Zé Bebelo estava demorando léguas para cima perto do São Gonçalo do Abaeté no PortoPassarinho Me fiz para lá E como era que antes e antes eu não tivesse pensado em Zé Bebelo Trote tocamos viemos beirando aquele rio O senhor sabe o rio Abaeté que é entristecedor audaz de belo largo tanto de morro a morro E em minha vida eu já pensava Zé Bebelo gritou Safa Safas e me abraçou como amigo cordial contente de muito me ver constante se nada tivesse destruído o nosso costume Conto que estava o mesmo aposto e condizente Tudo viva Riobaldo Tatarana Professor ele concisou Tu quis paz Sagaz assim me olhava chega me cheirar só faltasse de tornados a encontrar no curral como boi a boi Disse que eu estava feliz mas emagrecido e que encovava mais os olhos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 872 Estais pra trás Sabe Negociei um gado Mudei meus termos A ganhar o muito dinheiro é o que vale Pó douro em pó o que ele me disse E era a pura mentira Mas podia ser verdade Porque ele para se viver carecia daquela bazófia forte mestreava Como logo me pregou Háte Acabou com o Hermógenes A bem Tu foi o meu discípulo Foi não foi Deixei ele dizer como essas glórias não me invocavam Mas então ele não me entendendo esbarrou e se pôs Cujo A bom eu não te ensinei mas bem te aprendi a saber certa a vida Eu ri de nós dois Três dias falhei com ele lá no PortoPassarinho E Zé Bebelo corrigiu para eu ouvir os projetos que tinha Aí ai fanfarrices Não queria saber do sertão agora ia para capital grande cidade Mover com comércio estudar para advogado Lá eu quero deduzir meus feitos em jornal com retratos A gente descreve as passagens de nossas guerras fama devida Da minha não senhor eu fechei Distrair gente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 873 com o meu nome Então ele desconversou Mas naqueles três dias não descansou de querer me aliviar e de formar outros planejamentos para encaminhar minha vida Nem indenizar completa a minha dor maior ele não pudesse Só que Zé Bebelo não era homem de não prosseguir Do que a Deus dou graças Porque por fim ele exigiu minha atenção toda e disse Riobaldo eu sei a amizade de que agora tu precisa Vai lá Mas me promete não adia não desdenha Daqui e reto tu sai e vai lá Diz que é de minha parte Ele é diverso de todo o mundo Mesmo escreveu um bilhete que eu levasse Ao quando despedi e ele me abraçou senti o afeto em ser de pensar Será que ainda tinha aquele apito na algibeira E gritou Safas maximé Tinha de ser Zé Bebelo para isso Só Zé Bebelo mesmo para meu destino começar de salvar Porque o bilhete era para o Compadre meu Quelemém de Góis na Jijujã Vereda do Buriti Pardo Mais digo O senhor vá lá No tempo de maio quando o algodão lãla Tudo o branquinho Algodão é o que ele mais planta de todas as modernas qualidades o rasgaletras bibol e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 874 mussulim O senhor vai ver pessoa de tal rareza como perto dele todoomundo pára sossegado e sorridente bondoso Até com o Vupes lá topei Compadre meu Quelemém me hospedou deixou meu contar minha história inteira Como vi que ele me olhava com aquela enorme paciência calma de que minha dor passasse e que podia esperar muito longo tempo O que vendo tive vergonha assaz Mas por fim eu tomei coragem e tudo perguntei O senhor acha que a minha alma eu vendi pactário Então ele sorriu o pronto sincero e me vale me respondeu Tem cisma não Pensa para diante Comprar ou vender às vezes são as ações que são as quase iguais E me cerro aqui mire e veja Isto não é o de um relatar passagens de sua vida em toda admiração Conto o que fui e vi no levantar do dia Auroras Cerro O senhor vê Contei tudo Agora estou aqui quase barranqueiro Para a velhice vou com ordem e trabalho Sei de mim Cumpro O Rio de São Francisco que de tão grande se comparece parece é um pau grosso em pé enorme Amável o senhor me ouviu minha idéia confirmou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 875 que o Diabo não existe Pois não O senhor é um homem soberano circunspecto Amigos somos Nonada O diabo não há É o que eu digo se for Existe é homem humano Travessia FIM DE GRANDE SERTÃO VEREDAS
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JOÃO GUIMARÃES ROSA COMPANHIA DAS LETRAS GRANDE SERTÃO VEREDAS GUIMARÃES ROSA GRANDE SERTÃO VEREDAS EDITORA NOVA AGUILAR 1994 João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 2 PRIMEIRA EDIÇÃO 1994 BIBLIOTECA LUSOBRASILEIRA SÉRIE BRASILEIRA JOÃO GUIMARÃES ROSA FICÇÃO COMPLETA EM DOIS VOLUMES VOLUME II João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 3 NONADA TIROS QUE O SENHOR ouviu foram de briga de homem não Deus esteja Alvejei mira em árvores no quintal no baixo do córrego Por meu acerto Todo dia isso faço gosto desde mal em minha mocidade Daí vieram me chamar Causa dum bezerro um bezerro branco erroso os olhos de nem ser se viu e com máscara de cachorro Me disseram eu não quis avistar Mesmo que por defeito como nasceu arrebitado de beiços esse figurava rindo feito pessoa Cara de gente cara de cão determinaram era o demo Povo prascóvio Mataram Dono dele nem sei quem for Vieram emprestar minhas armas cedi Não tenho abusões O senhor ri certas risadas Olhe quando é tiro de verdade primeiro a cachorrada pega a latir instantaneamente depois então se vai ver se deu mortos O senhor tolere isto é o sertão Uns querem que não seja que situado sertão é por os camposgerais a fora a dentro eles dizem fim de rumo terras altas demais do Urucuia Toleima Para os de Corinto e do Curvelo então o aqui não é dito sertão Ah que tem maior Lugar sertão se divulga é onde os pastos carecem de fechos onde um pode torar dez quinze léguas sem topar com casa de morador e onde criminoso vive seu cristojesus arredado do arrocho de autoridade O Urucuia vem dos montões oestes Mas hoje que na beira dele tudo dá fazendões de fazendas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 4 almargem de vargens de bom render as vazantes culturas que vão de mata em mata madeiras de grossura até ainda virgens dessas lá há O gerais corre em volta Esses gerais são sem tamanho Enfim cada um o que quer aprova o senhor sabe pão ou pães é questão de opiniães O sertão está em toda a parte Do demo Não gloso Senhor pergunte aos moradores Em falso receio desfalam no nome dele dizem só o QueDiga Vote não Quem muito se evita se convive Sentença num Aristides o que existe no buritizal primeiro desta minha mão direita chamado a VeredadaVacaMansadeSantaRita todo o mundo crê ele não pode passar em três lugares designados porque então a gente escuta um chorinho atrás e uma vozinha que avisando Eu já vou Eu já vou que é o capiroto o quediga E um José Simpilício quem qualquer daqui jura ele tem um capeta em casa miúdo satanazim preso obrigado a ajudar em toda ganância que executa razão que o Simpilício se empresa em vias de completar de rico Apre por isso dizem também que a besta pra ele rupeia nega de banda não deixando quando ele quer amontar Superstição José Simpilício e Aristides mesmo estão se engordando de assim nãoouvir ou ouvir Ainda o senhor estude agora mesmo nestes dias de época tem gente porfalando que o Diabo próprio parou de passagem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 5 no Andrequicé Um Moço de fora teria aparecido e lá se louvou que para aqui vir normal a cavalo dum diaemeio ele era capaz que só com uns vinte minutos bastava porque costeava o Rio do Chico pelas cabeceiras Ou também quem sabe sem ofensas não terá sido por um exemplo até mesmo o senhor quem se anunciou assim quando passou por lá por prazido divertimento engraçado Háde não me dê crime sei que não foi E mal eu não quis Só que uma pergunta em hora às vezes clareia razão de paz Mas o senhor entenda o tal moço se há quis mangar Pois hem que despontar o Rio pelas nascentes será a mesma coisa que um se redobrar nos internos deste nosso Estado nosso custante viagem de uns três meses Então Que Diga Doideira A fantasiação E o respeito de dar a ele assim esses nomes de rebuço é que é mesmo um querer invocar que ele forme forma com as presenças Não seja Eu pessoalmente quase que já perdi nele a crença mercês a Deus é o que ao senhor lhe digo à puridade Sei que é bem estabelecido que grassa nos SantosEvangelhos Em ocasião conversei com um rapaz seminarista muito condizente conferindo no livro de rezas e revestido de paramenta com uma vara de mariapreta na mão proseou que ia adjutorar o padre para extraírem o Cujo do corpo vivo de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 6 uma velha na CachoeiradosBois ele ia com o vigário do CampoRedondo Me concebo O senhor não é como eu Não acreditei patavim Compadre meu Quelemém descreve que o que revela efeito são os baixos espíritos descarnados de terceira fuzuando nas piores trevas e com ânsias de se travarem com os viventes dão encosto Compadre meu Quelemém é quem muito me consola Quelemém de Góis Mas ele tem de morar longe daqui na Jijujã Vereda do Buriti Pardo Arres me deixe lá que em endemoninhamento ou com encosto o senhor mesmo deverá de ter conhecido diversos homens mulheres Pois não sim Por mim tantos vi que aprendi RinchaMãe Sangue dOutro o MuitosBeiços o RasgaemBaixo FacaFria o FanchoBode um Treciziano o Azinhavre o Hermógenes Deles punhadão Se eu pudesse esquecer tantos nomes Não sou amansador de cavalos E mesmo quem de si de ser jagunço se entrete já é por alguma competência entrante do demônio Será não Será De primeiro eu fazia e mexia e pensar não pensava Não possuía os prazos Vivi puxando difícil de dificel peixe vivo no moquém quem mói no aspro não fantaseia Mas agora feita a folga que me vem e sem pequenos dessossegos estou de range rede E me inventei neste gosto de especular idéia O diabo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 7 existe e não existe Dou o dito Abrenúncio Essas melancolias O senhor vê existe cachoeira e pois Mas cachoeira é barranco de chão e água se caindo por ele retombando o senhor consome essa água ou desfaz o barranco sobra cachoeira alguma Viver é negócio muito perigoso Explico ao senhor o diabo vige dentro do homem os crespos do homem ou é o homem arruinado ou o homem dos avessos Solto por si cidadão é que não tem diabo nenhum Nenhum é o que digo O senhor aprova Me declare tudo franco é alta mercê que me faz e pedir posso encarecido Este caso por estúrdio que me vejam é de minha certa importância Tomara não fosse Mas não diga que o senhor assisado e instruído que acredita na pessoa dele Não Lhe agradeço Sua alta opinião compõe minha valia Já sabia esperava por elajá o campo Ah a gente na velhice carece de ter sua aragem de descanso Lhe agradeço Tem diabo nenhum Nem espírito Nunca vi Alguém devia de ver então era eu mesmo este vosso servidor Fosse lhe contar Bem o diabo regula seu estado preto nas criaturas nas mulheres nos homens Até nas crianças eu digo Pois não é ditado menino trem do diabo E nos usos nas plantas nas águas na terra no vento Estrumes O diabo na rua no meio do redemunho João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 8 Hem Hem Ah Figuração minha de pior pra trás as certas lembranças Mal hajame Sofro pena de contar não Melhor se arrepare pois num chão e com igual formato de ramos e folhas não dá a mandioca mansa que se come comum e a mandiocabrava que mata Agora o senhor já viu uma estranhez A mandiocadoce pode de repente virar azangada motivos não sei às vezes se diz que é por replantada no terreno sempre com mudas seguidas de manaíbas vai em amargando de tanto em tanto de si mesma toma peçonhas E ora veja a outra a mandiocabrava também é que às vezes pode ficar mansa a esmo de se comer sem nenhum mal E que isso é Eh o senhor já viu por ver a feiúra de ódio franzido carantonho nas faces duma cobra cascavel Observou o porco gordo cada dia mais feliz bruto capaz de pudesse roncar e engolir por sua suja comodidade o mundo todo E gavião corvo alguns as feições deles já representam a precisão de talhar para adiante rasgar e estraçalhar a bico parece uma quicé muito afiada por ruim desejo Tudo Tem até tortas raças de pedras horrorosas venenosas que estragam mortal a água se estão jazendo em fundo de poço o diabo dentro delas dorme são o demo Se sabe E o demo que é só assim o significado dum azougue maligno tem ordem de seguir o caminho dele tem licença para campear Arre ele está misturado em tudo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 9 Que o que gasta vai gastando o diabo de dentro da gente aos pouquinhos é o razoável sofrer E a alegria de amor compadre meu Quelemém diz Família Deveras É e não é O senhor ache e não ache Tudo é e não é Quase todo mais grave criminoso feroz sempre é muito bom marido bom filho bom pai e é bom amigodeseusamigos Sei desses Só que tem os depois e Deus junto Vi muitas nuvens Mas em verdade filho também abranda Olhe um chamado Aleixo residente a légua do Passo do Pubo no da Areia era o homem de maiores ruindades calmas que já se viu Me agradou que perto da casa dele tinha um açudinho entre as palmeiras com traíras praalmas de enormes desenormes ao real que receberam fama o Aleixo dava de comer a elas em horas justas elas se acostumaram a se assim das locas para papar semelhavam ser peixes ensinados Um dia só por graça rústica ele matou um velhinho que por lá passou desvalido rogando esmola O senhor não duvide tem gente neste aborrecido mundo que matam só para ver alguém fazer careta Eh pois empós o resto o senhor prove vem o pão vem a mão vem o são vem o cão Esse Aleixo era homem afamilhado tinha filhos pequenos aqueles eram o amor dele todo despropósito Dê bem que não nem um ano estava passado de se matar o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 10 velhinho pobre e os meninos do Aleixo aí adoeceram Andaço de sarampão se disse mas complicado eles nunca saravam Quando então sararam Mas os olhos deles vermelhavam altos numa inflama de sapiranga à rebelde e susseguinte o que não sei é se foram todos duma vez ou um logo e logo outro e outro eles restaram cegos Cegos sem remissão dum favinho de luz dessa nossa O senhor imagine uma escadinha três meninos e uma menina todos cegados Sem remediável O Aleixo não perdeu o juizo mas mudou ah demudou completo agora vive da banda de Deus suando para ser bom e caridoso em todas suas horas da noite e do dia Parece até que ficou o feliz que antes não era Ele mesmo diz que foi um homem de sorte porque Deus quis ter pena dele transformar para lá o rumo de sua alma Isso eu ouvi e me deu raiva Razão das crianças Se sendo castigo que culpa das hajas do Aleixo aqueles meninozinhos tinham Compadre meu Quelemém reprovou minhas incertezas Que por certo noutra vida revirada os meninos também tinham sido os mais malvados da massa e peça do pai demônios do mesmo caldeirão de lugar Senhor o que acha E o velhinho assassinado eu sei que o senhor vai discutir Pois também Em ordem que ele tinha um pecado de crime no João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 11 corpo por pagar Se a gente conforme compadre meu Quelemém é quem diz se a gente torna a encarnar renovado eu cismo até que inimigo de morte pode vir como filho do inimigo Mire veja se me digo tem um sujeito Pedro Pindó vizinho daqui mais seis léguas homem de bem por tudo em tudo ele e a mulher dele sempre sidos bons de bem Eles têm um filho duns dez anos chamado Valtei nome moderno é o que o povo daqui agora apreceia o senhor sabe Pois essezinho essezim desde que algum entendimento alumiou nele feito mostrou o que é pedido madrasto azedo queimador gostoso de ruim de dentro do fundo das espécies de sua natureza Em qual que judia ao devagar de todo bicho ou criaçãozinha pequena que pega uma vez encontrou uma crioula benta bêbada dormindo arranjou um caco de garrafa lanhou em três pontos a popa da perna dela O que esse menino babeja vendo é sangrarem galinha ou esfaquear porco Eu gosto de matar uma ocasião ele pequenino me disse Abriu em mim um susto porque passarinho que se debruça o vôo já está pronto Pois o senhor vigie o pai Pedro Pindó modo de corri gir isso e a mãe dão nele de miséria e mastro botam o menino sem comer amarram em árvores no terreiro ele nu nuelo mesmo em junho frio lavram o corpinho dele na peia e na taca depois limpam a pele do sangue com cuia de salmoura João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 12 A gente sabe espia fica gasturado O menino já rebaixou de magreza os olhos entrando carinha de ossos encaveirada e entisicou o tempo todo tosse tossura da que puxa secos peitos Arre que agora visível o Pindó e a mulher se habituaram de nele bater de pouquinho em pouquim foram criando nisso um prazer feio de diversão como regulam as sovas em horas certas confortáveis até chamam gente para ver o exemplo bom Acho que esse menino não dura já está no blimbilim não chega para a quaresma que vem Uêuê então Não sendo como compadre meu Quelemém quer que explicação é que o senhor dava Aquele menino tinha sido homem Devia em balanço terríveis perversidades Alma dele estava no breu Mostrava E agora pagava Ah mas acontece quando está chorando e penando ele sofre igual que se fosse um menino bonzinho Ave vi de tudo neste mundo lá vi até cavalo com soluço o que é a coisa mais custosa que há Bem mas o senhor dirá deve de e no começo para pecados e artes as pessoas como por que foi que tanto emendado se começou Ei ei aí todos esbarram Compadre meu Quelemém também Sou só um sertanejo nessas altas idéias navego mal Sou muito pobre coitado Inveja minha pura é de uns conforme o senhor com toda leitura e suma João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 13 doutoração Não é que eu esteja analfabeto Soletrei anos e meio meante cartilha memória e palmatória Tive mestre Mestre Lucas no Curralinho decorei gramática as operações regradetrês até geografia e estudo pátrio Em folhas grandes de papel com capricho tracei bonitos mapas Ah não é por falar mas desde o começo me achavam sofismado de ladino E que eu merecia de ir para cursar latim em Aula Régia que também diziam Tempo saudoso Inda hoje apreceio um bom livro despaçado Na fazenda O Limãozinho de um meu amigo Vito Soziano se assina desse almanaque grosso de logogrifos e charadas e outras divididas matérias todo ano vem Em tanto ponho primazia é na leitura proveitosa vida de santo virtudes e exemplos missionário esperto engambelando os índios ou São Francisco de Assis Santo Antônio São Geraldo Eu gosto muito de moral Raciocinar exortar os outros para o bom caminho aconselhar a justo Minha mulher que o senhor sabe zela por mim muito reza Ela é uma abençoável Compadre meu Quelemém sempre diz que eu posso aquietar meu temer de consciência que sendo bemassistido terríveis bonsespíritos me protegem Ipe Com gosto Como é de são efeito ajudo com meu querer acreditar Mas nem sempre posso O senhor saiba eu toda a minha vida pensei por mim forro sou nascido diferente Eu sou é eu mesmo Diverjo de todo o mundo Eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 14 quase que nada não sei Mas desconfio de muita coisa O senhor concedendo eu digo para pensar longe sou cão mestre o senhor solte em minha frente uma idéia ligeira e eu rastreio essa por fundo de todos os matos amém Olhe o que devia de haver era de se reuniremse os sábios políticos constituições gradas fecharem o definitivo a noção proclamar por uma vez artes assembléias que não tem diabo nenhum não existe não pode Valor de lei Só assim davam tranqüilidade boa à gente Por que o Governo não cuida Ah eu sei que não é possível Não me assente o senhor por beócio Uma coisa é pôr idéias arranjadas outra é lidar com país de pessoas de carne e sangue de miletantas misérias Tanta gente dá susto de saber e nenhum se sossega todos nascendo crescendo se casando querendo colocação de emprego comida saúde riqueza ser importante querendo chuva e negócios bons De sorte que carece de se escolher ou a gente se tece de viver no safado comum ou cuida só de religião só Eu podia ser padre sacerdote se não chefe de jagunços para outras coisas não fui parido Mas minha velhice já principiou errei de toda conta E o reumatismo Lá como quem diz nas escorvas Ahã João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 15 Hem Hem O que mais penso testo e explico todoo mundo é louco O senhor eu nós as pessoas todas Por isso é que se carece principalmente de religião para se desendoidecer desdoidar Reza é que sara da loucura No geral Isso é que é a salvaçãodaalma Muita religião seu moço Eu cá não perco ocasião de religião Aproveito de todas Bebo água de todo rio Uma só para mim é pouca talvez não me chegue Rezo cristão católico embrenho a certo e aceito as preces de compadre meu Quelemém doutrina dele de Cardéque Mas quando posso vou no Mindubim onde um Matias é crente metodista a gente se acusa de pecador lê alto a Bíblia e ora cantando hinos belos deles Tudo me quieta me suspende Qualquer sombrinha me refresca Mas é só muito provisório Eu queria rezar o tempo todo Muita gente não me aprova acham que lei de Deus é privilégios invariável E eu Bofe Detesto O que sou o que faço que quero muito curial E em cara de todos faço executado Eu não tresmalho Olhe tem uma preta Maria Leôncia longe daqui não mora as rezas dela afamam muita virtude de poder Pois a ela pago todo mês encomenda de rezar por mim um terço todo santo dia e nos domingos um rosário Vale se vale Minha mulher não vê mal nisso E estou já mandei recado para uma João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 16 outra do VauVau uma Izina Calanga para vir aqui ouvi de que reza também com grandes meremerências vou efetuar com ela trato igual Quero punhado dessas me defendendo em Deus reunidas de mim em volta Chagas de Cristo Viver é muito perigoso Querer o bem com demais força de incerto jeito pode já estar sendo se querendo o mal por principiar Esses homens Todos puxavam o mundo para si para o concertar consertado Mas cada um só vê e entende as coisas dum seu modo Montante o mais supro mais sério foi Medeiro Vaz Que um homem antigo Seu Joãozinho Bem Bem o mais bravo de todos ninguém nunca pôde decifrar como ele por dentro consistia Joca Ramiro grande homem príncipe era político ZéBebelo quis ser político mas teve e não teve sorte raposa que demorou Só Candelário se endiabrou por pensar que estava com doença má Titão Passos era o pelo preço de amigos só por via deles de suas mesmas amizades foi que tão alto se ajagunçou Antônio Dó severo bandido Mas por metade grande maior metade que seja Andalécio no fundo um bom homemdebem estouvado raivoso em sua toda justiça Ricardão mesmo queria era ser rico em paz para isso guerreava Só o Hermógenes foi que nasceu formado tigre e assassim E o UrutuBranco Ah não me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 17 fale Ah esse tristonho levado que foi que era um pobre menino do destino Tão bem conforme O senhor ouvia eu lhe dizia o ruim com o ruim terminam por as espinheiras se quebrar Deus espera essa gastança Moço Deus é paciência O contrário é o diabo Se gasteja O senhor rela faca em faca e afia que se raspam Até as pedras do fundo uma dá na outra vãose arredondinhando lisas que o riachinho rola Por enquanto que eu penso tudo quanto há neste mundo é porque se merece e carece Antesmente preciso Deus não se comparece com refe não arrocha o regulamento Pra quê Deixa bobo com bobo um dia algum estala e aprende esperta Só que às vezes por mais auxiliar Deus espalha no meio um pingado de pimenta Haja Pois por um exemplo faz tempo fui de trem lá em SeteLagoas para partes de consultar um médico de nome me indicado Fui vestido bem e em carro de primeira por via das dúvidas não me sombrearem por jagunço antigo Vai e acontece que perto mesmo de mim defronte tomou assento voltando deste brabo Norte um moço Jazevedão delegado profissional Vinha com um capanga dele um secreta e eu bem sabia os dois de que tanto um era ruim como o outro ruim era A verdade que diga primeiro tive o estrito de me desbancar para João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 18 um longe dali mudar de meu lugar Juízo me disse melhor ficasse Pois ficando olhei E lhe falo nunca vi cara de homem fornecida de bruteza e maldade mais do que nesse Como que era urco trouxo de atarracado reluzia um cru nos olhos pequenos e armava um queixo de pedra sobrancelhonas não demedia nem testa Não ria não se riu nem uma vez mas falando ou calado a gente via sempre dele algum dente presa pontuda de guará Arre e bufava um poucadinho Só rosneava curto baixo as meiaspalavras encrespadas Vinha reolhando historiando a papelada uma a uma as folhas com retratos e com os pretos dos dedos de jagunços ladrões de cavalos e criminosos de morte Aquela aplicação de trabalho numa coisa dessas gerava a ira na gente O secreta xereta todo perto sentado junto atendendo caprichando de ser cão Me fez um receio mas só no bobo do corpo não no interno das coragens Uma hora uma daquelas laudas caiu e eu me abaixei depressa sei lá mesmo por que não quis não pensei até hoje crio vergonha disso apanhei o papel do chão e entreguei a ele Daí digo eu tive mais raiva porque fiz aquilo mas aí já estava feito O homem nem me olhou nem disse nenhum agradecimento Até as solas dos sapatos dele só vendo que solas duras grossas dobradas de enormes parecendo ferro bronze Porque eu sabia esse Jazevedão quando prendia alguém a primeira quieta coisa que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 19 procedia era que vinha entrando sem ter que dizer fingia umas pressas e ia pisava em cima dos pés descalços dos coitados E que nessas ocasiões dava gargalhadas dava Pois osga Entreguei a ele a folha de papel e fui saindo de lá por ter mão em mim de não destruir a tiros aquele sujeito Carnes que muito pesavam E ele umbigava um princípio de barriga barriguda que me criou desejos Com minha brandura alegre que eu matava Mas as barbaridades que esse delegado fez e aconteceu o senhor nem tem calo em coração para poder me escutar Conseguiu de muito homem e mulher chorar sangue por este simples universozinho nosso aqui Sertão O senhor sabe sertão é onde manda quem é forte com as astúcias Deus mesmo quando vier que venha armado E bala é um pedacinhozinho de metal Tanto digo Jazevedão um assim devia de ter precisava Ah precisa Couro ruim é que chama ferrão de ponta Haja que depois negócio particular dele nesta vida ou na outra cada Jazevedão cumprido o que tinha descamba em seu tempo de penar também até pagar o que deveu compadre meu Quelemém está aí para fiscalizar O senhor sabe o perigo que é viver Mas só do modo desses por feio instrumento foi que a jagunçada se findou Senhor pensa que Antônio Dó ou Olivino Oliviano iam ficar bonzinhos por pura soletração de si ou por João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 20 rogo dos infelizes ou por sempre ouvir sermão de padre Te acho Nos visos De jagunço comportado ativo para se arrepender no meio de suas jagunçadas só deponho de um chamado Joé Cazuzo foi em arraso de um tirotei pra cima do lugar SerraNova distrito de RioPardo no ribeirão Traçadal A gente fazia má minoria pequena e fechavam para riba de nós o pessoal dum Coronel Adalvino forte político com muitos soldados fardados no meio centro comando do Tenente Reis Leme que depois ficou capitão Agüentamos hora mais hora e já dávamos quase de cercados Aí de bote aquele Joé Cazuzo homem muito valente se ajoelhou giro no chão do cerrado levantava os braços que nem esgalho de jatobá seco e só gritava urro claro e urro surdo Eu vi a Virgem Nossa no resplandor do Céu com seus filhos de Anjos Gritava não esbarrava Eu vi a Virgem Ele almou Nós desigualamos Trape por meu cavalo que achei pulei em meu assento nem sei em que rompetempo desatei o cabresto de amarrado em pé de pau Voei vindo Bala vinha O cerrado estrondava No mato o medo da gente se sai ao inteiro um medo propositado Eu podia escoicear feito burro bruto dáque dáque Umas duas ou três balas se cravaram na borraina da minha sela perfuraram de arrancar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 21 quase muita a paina do encheio Cavalo estremece em pró em meio de galope sei pensa no dono Eu não cabia de estar mais bem encolhido Baleado veio também o surrão que eu tinha nas costas com poucas minhas coisas E outra de fuzil em ricochete decerto esquentou minha coxa sem me ferir o senhor veja bala faz o que quer se enfiou imprensada entre em mim e a aba da jereba Tempos loucos Burumbum o cavalo se ajoelhou em queda morto quiçá e eu já caindo para diante abraçado em folhagens grossas ramada e cipós que me balançaram e espetavam feito eu estava pendurado em teião de aranha Aonde Atravessei aquilo vida toda De medo em ânsia rompi por rasgar com meu corpo aquele mato fui sei lá e me despenquei mundo abaixo rolava para o oco de um grotão fechado de moitas sempre me agarrava rolava mesmo assim depois depois quando olhei minhas mãos tudo nelas que não era tirado sangue era um amasso verde nos dedos de folhas vivas que puxei e masgalhei Pousei no capim do fundo e um bicho escuro deu um repulão com um espirro também doido de susto que era um papamel que eu vislumbrei para fugir esse está somente Maior sendo eu me molhou meu cansaço espichei tudo E um pedacinho de pensamento se aquele bicho irara tinha jazido lá então ali não tinha cobra Tomei o lugar dele Existia cobra nenhuma Eu podia me largar Eu era só João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 22 mole moleza mas que não amortecia os trancos dentro do coração Arfei Concebi que vinham me matavam Nem fazia mal me importei não Assim uns momentos ao menos eu guardava a licença de prazo para me descansar Conforme pensei em Diadorim Só pensava era nele Um joãodebarro cantou Eu queria morrer pensando em meu amigo Diadorim manoohmão que estava na Serra do PaudArco quase na divisa baiana com nossa outra metade dos sócandelários Com meu amigo Diadorim me abraçava sentimento meu iavoava reto para ele Ai arre mas que esta minha boca não tem ordem nenhuma Estou contando fora coisas divagadas No senhor me fio Atéque atéque Diga o anjodaguarda Mas conforme eu vinha depois se soube que mesmo os soldados do Tenente e os cabras do Coronel Adalvino remitiram de respeitar o assopro daquele Joé Cazuzo E que esse acabou sendo o homem mais pacificioso do mundo fabricador de azeite e sacristão no São Domingos Branco Tempos Por tudo réiscoado fico pensando Gosto Melhor para a idéia se bem abrir é viajando em tremdeferro Pudesse vivia para cima e para baixo dentro dele Informação que pergunto mesmo no Céu fim de fim como é que a alma vence se esquecer de tantos sofrimentos e maldades no recebido e no dado A João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 23 como O senhor sabe há coisas de medonhas demais tem Dor do corpo e dor da idéia marcam forte tão forte como o todo amor e raiva de ódio Vai mar De sorte que então olhe o Firmiano por apelidado PiolhodeCobra se lazarou com a perna desconforme engrossada dessa doença que não se cura e não enxergava quase mais constante o branquiço nos olhos das cataratas De antes anos teve de se desarrear da jagunçagem Pois uma ocasião algum esteve no rancho dele no Alto Jequitaí depois contou que vira tempo vem assunto ele dissesse Me dá saudade é de pegar um soldado e tal pra uma boa esfola com faca cega Mas primeiro castrar O senhor concebe Quem tem mais dose de demo em si é índio qualquer raça de bugre Gente vê nação desses para lá fundo dos gerais de Goiás adonde tem vagarosos grandes rios de água sempre tão clara aprazível correndo em deita de cristal roseado PiolhodeCobra se dava de sangue de gentio Senhor me dirá mas que ele pro nunceia aquilo fora boca maneira de representar que ainda não estava velho decadente Obra de opor por medo de ser manso e causa para se ver respeitado Todos tretam por tal regra proseiam de ruins para mais se valerem porque a gente ao redor é duro dura O pior mas é que acabam pelo mesmo vau tendo de um dia executar o declarado no real Vi tanta cruez Pena não paga contar se vou não esbarro E me desgosta três que me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 24 enjoa isso tudo Me apraz é que o pessoal hoje em dia é bom de coração Isto é bom no trivial Malícias maluqueiras e perversidades sempre tem alguma mas escasseadas Geração minha verdadeira ainda não eram assim Ah vai vir um tempo em que não se usa mais matar gente Eu já estou velho Bom ia falando questão isso que me sovaca Ah formei aquela pergunta para compadre meu Quelemém Que me respondeu que por perto do Céu a gente se alimpou tanto que todos os feios passados se exalaram de não ser feito sem modez de tempo de criança másartes Como a gente não carece de ter remorso do que divulgou no latejo de seus pesadelos de uma noite Assim que tosouse floreouse Ahã Por isso dito é que a ida para o Céu é demorada Eu confiro com compadre meu Quelemém o senhor sabe razão da crença mesma que tem que por todo o mal que se faz um dia se repaga o exato Sujeito assim madruga três vezes em antes de querer facilitar em qualquer minudência repreensível Compadre meu Quelemém nunca fala vazio não subtrata Só que isto a ele não vou expor A gente nunca deve de declarar que aceita inteiro o alheio essa é que é a regra do rei O senhor Mire veja o mais importante e bonito do mundo é isto que as pessoas não estão sempre iguais ainda não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 25 foram terminadas mas que elas vão sempre mudando Afinam ou desafinam Verdade maior É o que a vida me ensinou Isso que me alegra montão E outra coisa o diabo é às brutas mas Deus é traiçoeiro Ah uma beleza de traiçoeiro dá gosto A força dele quando quer moço me dá o medo pavor Deus vem vindo ninguém não vê Ele faz é na lei do mansinho assim é o milagre E Deus ataca bonito se divertindo se economiza A pois um dia num curtume a faquinha minha que eu tinha caiu dentro dum tanque só caldo de casca de curtir barbatimão angico lá sei Amanhã eu tiro falei comigo Porque era de noite luz nenhuma eu não disputava Ah então saiba no outro dia cedo a faca o ferro dela estava sido roído quase por metade por aquela agüinha escura toda quieta Deixei para mais ver Estala espoleta Sabe o que foi Pois nessa mesma da tarde aí da faquinha só se achava o cabo O cabo por não ser de frio metal mas de chifre de galheiro Aí está Deus Bem o senhor ouviu o que ouviu sabe o que sabe me entende Somenos não ache que religião afraca Senhor ache o contrário Visível que aqueles outros tempos eu pintava cré que o caroá levanta a flor Eli bom meu pasto Mocidade Mas mocidade é tarefa para mais tarde se desmentir Também eu desse de pensar em vago em tanto perdia minha mãode João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 26 homem para o manejo quente no meio de todos Mas hoje que raciocinei e penso a eito não nem por isso não dou por baixa minha competência num fogoeferro A ver Chegassem viessem aqui com guerra em mim com más partes com outras leis ou com sobejos olhares e eu ainda sorteio de acender esta zona ai se se É na boca do trabuco é no téretêretém E sozinhozinho não estou hádeo Pra não isso hei coloquei re dor meu minha gente Olhe o senhor aqui pegado vereda abaixo o Paspe meeiro meu é meu Mais légua se tanto tem o Acauã e tem o Compadre Ciril ele e três filhos sei que servem Banda desta mão o Alaripe soubesse o senhor o que é que se preza em rifleio e à faca um cearense feito esse Depois mais o João Nonato o Quipes o PacamãdePresas E o Fafafa este deu lances altos todo lado comigo no combate velho do Tamanduátão limpamos o vento de quem não tinha ordem de respirar e antes esses desrodeamos O Fafafa tem uma eguada Ele cria cavalos bons Até um pouco mais longe no pédeserra de bando meu foram o Sesfredo Jesualdo o Nélson e João Concliz Uns outros O Triol E não vou valendo Deixo terra com eles deles o que é meu é fechamos que nem irmãos Para que eu quero ajuntar riqueza Estão aí de armas areiadas Inimigo vier a gente cruza chamado ajuntamos é hora dum bom tiroteiamento em paz exprimentem ver Digo isto ao João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 27 senhor de fidúcia Também não vá pensar em dobro Queremos é trabalhar propor sossego De mim pessoa vivo para minha mulher que tudo modomelhor merece e para a devoção Bemquerer de minha mulher foi que me auxiliou rezas dela graças Amor vem de amor Digo Em Diadorim penso também mas Diadorim é a minha neblina Agora bem não queria tocar nisso mais de o Tinhoso chega Mas tem um porém pergunto o senhor acredita acha fio de verdade nessa parlanda de com o demônio se poder tratar pacto Não não é não Sei que não há Falava das favas Mas gosto de toda boa confirmação Vender sua própria alma invencionice falsa E alma o que é Alma tem de ser coisa interna supremada muito mais do de dentro e é só do que um se pensa ah alma absoluta Decisão de vender alma é afoitez vadia fantasiado de momento não tem a obediência legal Posso vender essas boas terras daí de entre as VeredasQuatro que são dum senhor Almirante que reside na capital federal Posso algum Então se um menino menino é e por isso não se autoriza de negociar E a gente isso sei às vezes é só feito menino Mal que em minha vida aprontei foi numa certa meninice em sonhos tudo corre e chega tão ligeiro será que se há lume de responsabilidades Se sonha já se fez Dei rapadura ao jumento Ahã Pois Se tem alma e tem ela é de Deus estabelecida nem que a pessoa queira ou não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 28 queira Não é vendível O senhor não acha Me declare franco peço Ah lhe agradeço Se vê que o senhor sabe muito em idéia firme além de ter carta de doutor Lhe agradeço por tanto Sua companhia me dá altos prazeres Em termos gostava que morasse aqui ou perto era uma ajuda Aqui não se tem convívio que instruir Sertão Sabe o senhor sertão é onde o pensamento da gente se forma mais forte do que o poder do lugar Viver é muito perigoso Eh que se vai Jajá É que não Hoje não Amanhã não Não consinto O senhor me desculpe mas em empenho de minha amizade aceite o senhor fica Depois quinta demanhã cedo o senhor querendo ir então vai mesmo me deixa sentindo sua falta Mas hoje ou amanhã não Visita aqui em casa comigo é por três dias Mas o senhor sério tenciona devassar a raso este mar de territórios para sortimento de conferir o que existe Tem seus motivos Agora digo por mim o senhor vem veio tarde Tempos foram os costumes demudaram Quase que de legítimo leal pouco sobra nem não sobra mais nada Os bandos bons de valentões repartiram seu fim muito que foi jagunço por aí pena pede esmola Mesmo que os vaqueiros duvidam de vir no João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 29 comércio vestidos de roupa inteira de couro acham que traje de gibão é feio e capiau E até o gado no grameal vai minguando menos bravo mais educado casteado de zebu desvém com o resto de curraleiro e de crioulo Sempre no gerais é à pobreza à tristeza Uma tristeza que até alegra Mas então para uma safra razoável de bizarrices reconselho de o senhor entestar viagem mais dilatada Não fosse meu despoder por azias e reumatismo aí eu ia Eu guiava o senhor até tudo Lhe mostrar os altos claros das Almas rio despenha de lá num afã espuma próspero gruge cada cachoeira só tombos O cio da tigre preta na Serra do Tatu já ouviu o senhor gargaragem de onça A garoa rebrilhante da dosConfins madrugada quando o céu embranquece neblim que chamam de xererém Quem me ensinou a apreciar essas as belezas sem dono foi Diadorim A daRaizama onde até os pássaros calculam o giro da lua se diz e canguçu monstra pisa em volta Lua de com ela se cunhar dinheiro Quando o senhor sonhar sonhe com aquilo Cheiro de campos com flores forte em abril a ciganinha roxa e a nhiíca e a escova amarelinhas Isto no Saririnhém Cigarras dão bando Debaixo de um tamarindo sombroso Eh frio Lá geia até em costas de boi até nos telhados das casas Ou no Meãomeão depois dali tem uma João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 30 terra quase azul Que não que o céu esse é céuazul vivoso igual um ovo de macuco Ventos de não deixar se formar orvalho Um punhado quente de vento passante entre duas palmas de palmeira Lembro deslembro Ou o senhor vai no soposo de chuvachuva Vê um córrego com má passagem ou um rio em turvação No BuritiMirim Angical Extremade SantaMaria Senhor caça Tem lá mais perdiz do que no Chapadão das Vertentes Caçar anta no CabeçadeNegro ou no BuritiComprido aquelas que comem um capim diferente e roem cascas de muitas outras árvores a carne de gostosa diverseia Por esses longes todos eu passei com pessoa minha no meu lado a gente se querendo bem O senhor sabe Já tenteou sofrido o ar que é saudade Dizse que tem saudade de idéia e saudade de coração Ah Dizse que o Governo está mandando abrir boa estrada rodageira de Pirapora a Paracatu por aí Na Serra do Cafundó ouvir trovão de lá e retrovão o senhor tapa os ouvidos pode ser até que chore de medo mau em ilusão como quando foi menino O senhor vê vaca parindo na tempestade De em de sempre Urucuia acima o Urucuia tão a brabas vai Tanta serra esconde a lua A serra ali corre torta A serra faz ponta Em um lugar na encosta brota do chão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 31 um vapor de enxofre com estúrdio barulhão o gado foge de lá por pavor Semelha com as serras do Estrondo e do Roncador donde dão retumbos vez em quando Hem O senhor Olhe o rio Carinhanha é preto o Paracatu moreno meu em belo é o Urucuia paz das águas É vida Passado o Porto das Onças tem um fazendol Ficamos lá umas semanas se descansou Carecia Porque a gente vinha no caminhar a pé para não acabar os cavalos mazelados Medeiro Vaz em lugares assim fora de guerra prazer dele era dormir com camisolão e barrete antes de se deitar ajoelhava e rezava o terço Aqueles foram meus dias Se caçava cada um esquecia o que queria de decomer não faltava pescar peixe nas veredas O senhor vá lá verá Os lugares sempre estão aí em si para confirmar Muito deleitável Claráguas fontes sombreado e sol Fazenda BoiPreto dum Eleutério Lopes mais antes do CampoAzulado rumo a rumo com o Queimadão Aí foi em fevereiro ou janeiro no tempo do pendão do milho Tresmente que com o capitãodocampo de prateadas pontas viçoso no cerrado o anis enfeitando suas moitas e com florzinhas as dejaniras Aquele capimmarmelada é muito restível redobra logo na brotação tão verdemar filho do menor chuvisco De qualquer pano de mato de deentre quase cada encostar de duas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 32 folhas saíam em giro as todas as cores de borboletas Como não se viu aqui se vê Porque nos gerais a mesma raça de borboletas que em outras partes é trivial regular cá cresce vira muito maior e com mais brilho se sabe acho que é do seco do ar do limpo desta luz enorme Beiras nascentes do Urucuia ali o povi canta altinho E tinha o xenxém que tintipiava de manhã no revoredo o sacidobrejo a doidinha a gangorrinha o tempo quente a rolavaqueira e o bemtevi que dizia e araras enrouquecidas Bom era ouvir o mom das vacas devendo seu leite Mas passarinho de bilo no desvéu da madrugada para toda tristeza que o pensamento da gente quer ele repergunta e finge resposta Tal de tarde o bentovieira tresvoava em vai sobre vem sob rebicando de vôo todo bichinhozinho de finas asas pássaro esperto Ia dechover mais em mais Tardinha que enche as árvores de cigarras então não chove Assovios que fechavam o dia o papabanana o azulejo a garrichadobrejo o suiriri o sabiáponga o grunhatádocoqueiro Eu estava todo o tempo quase com Diadorim Diadorim e eu nós dois A gente dava passeios Com assim a gente se diferenciava dos outros porque jagunço não é muito de conversa continuada nem de amizades estreitas a bem eles se misturam e desmisturam de acaso mas cada um é João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 33 feito um por si De nós dois juntos ninguém nada não falava Tinham a boa prudência Dissesse um caçoasse digo podia morrer Se acostumavam de ver a gente parmente Que nem mais maldavam E estávamos conversando perto do rego bicame de velha fazenda onde o agrião dá flor Desse lusfús ia escurecendo Diadorim acendeu um foguinho eu fui buscar sabugos Mariposas passavam muitas por entre as nossas caras e besouros graúdos esbarravam Puxava uma brisbisa O ianso do vento revinha com o cheiro de alguma chuva perto E o chiim dos grilos ajuntava o campo aos quadrados Por mim só de tantas minúcias não era o capaz de me alembrar não sou de à parada pouca coisa mas a saudade me alembra Que se hoje fosse Diadorim me pôs o rastro dele para sempre em todas essas quisquilhas da natureza Sei como sei Som como os sapos sorumbavam Diadorim duro sério tão bonito no relume das brasas Quase que a gente não abria boca mas era um delém que me tirava para ele o irremediável extenso da vida Por mim não sei que tontura de vexame com ele calado eu a ele estava obedecendo quieto Quase que sem menos era assim a gente chegava num lugar ele falava para eu sentar eu sentava Não gosto de ficar em pé Então depois ele vinha sentava sua vez Sempre mediante mais longe Eu não tinha coragem de mudar para mais perto Só de mim era que Diadorim às vezes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 34 parecia ter um espevito de desconfiança de mim que era o amigo Mas essa ocasião ele estava ali mais vindo a meiamão de mim E eu mal de não me consentir em nenhum afirmar das docemente coisas que são feias eu me esquecia de tudo num espairecer de contentamento deixava de pensar Mas suce dia uma duvidação ranço de desgosto eu versava aquilo em redondos e quadrados Só que coração meu podia mais O corpo não traslada mas muito sabe adivinha se não entende Perto de muita água tudo é feliz Se escutou banda do rio uma lontra por outra o issilvo de plim chupante Ta que mas eu quero que esse dia chegue Diadorim dizia Não posso ter alegria nenhuma nem minha mera vida mesma enquanto aqueles dois monstros não forem bem acabados E ele suspirava de ódio como se fosse por amor mas no mais não se alterava De tão grande o dele não podia mais ter aumento parava sendo um ódio sossegado Odio com paciência o senhor sabe E aquilo forte que ele sentia ia se pegando em mim mas não como ódio mais em mim virando tristeza Enquanto os dois monstros vivessem simples Diadorim tanto não vivia Até que viesse a poder vingar o histórico de seu pai ele tresvariava Durante que estávamos assim fora de marcha em rota tempo de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 35 descanso em que eu mais amizade queria Diadorim só falava nos extremos do assunto Matar matar sangue manda sangue Assim nós dois esperávamos ali nas cabeceiras da noite junto em junto Calados Me alembro ah Os sapos Sapo tirava saco de sua voz vozes de osga idosas Eu olhava para a beira do rego A ramagem toda do agrião o senhor conhece às horas dá de si uma luz nessas escuridões folha a folha um fosforém agrião acende de si feito eletricidade E eu tinha medo Medo em alma Não respondi Não adiantava Diadorim queria o fim Para isso a gente estava indo Com o comando de Medeiro Vaz dali depois daquele carecido repouso a gente revirava caminho ia em cima dos outros deles procurando combate Munição não faltava Nós estávamos em sessenta homens mas todos cabras dos melhores Chefe nosso Medeiro Vaz nunca perdia guerreiro Medeiro Vaz era homem sobre o sisudo nos usos formado não gastava as palavras Nunca relatava antes o projeto que tivesse que marchas se ia amanhecer para dar Também tudo nele decidia a confiança de obediência Ossoso com a nuca enorme cabeçona meia baixa ele era dono do dia e da noite que quase não dormia mais sempre se levantava no meio das estrelas percorria o arredor vagaroso em passos calçado com suas boas botas de caititu tão antigas Se ele em honrado juízo achasse que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 36 estava certo Medeiro Vaz era solene de guardar o rosário na algibeira se traçar o sinaldacruz e dar firme ordem para se matar uma a uma as mil pessoas Desde o começo eu apreciei aquela fortaleza de outro homem O segredo dele era de pedra Ah eu estou vivido repassado Eu me lembro das coisas antes delas acontecerem Com isso minha fama clareia Remei vida solta Sertão estes seus vazios O senhor vá Alguma coisa ainda encontra Vaqueiros Ao antes a um ao Chapadão do Urucuia aonde tanto boi berra Ou o mais longe vaqueiros do BrejoVerde e do Córrego do QuebraQuinaus cavalo deles conversa cochicho que se diz para dar sisado conselho ao cavaleiro quando não tem mais ninguém perto capaz de escutar Creio e não creio Tem coisa e cousa e o ó da raposa Dali para cá o senhor vem começos do Carinhanha e do Piratinga filho do Urucuia que os dois de dois se dão as costas Saem dos mesmos brejos buritizais enormes Por lá sucuri geme Cada surucuiú do grosso voa corpo no veado e se enrosca nele abofa trinta palmos Tudo em volta é um barro colador que segura até casco de mula arranca ferradura por ferradura Com medo de mãecobra se vê muito bicho retardar ponderado paz de hora de poder água beber esses escondidos atrás das touceiras de buritirana Mas o sassafrás dá mato João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 37 guardando o poço o que cheira um bom perfume Jacaré grita uma duas as três vezes rouco roncado Jacaré choca olhalhão crespido do lamal feio mirando na gente Eh ele sabe se engordar Nas lagoas aonde nem um de asas não pousa por causa da fome de jacaré e da piranha serrafina Ou outra lagoa que nem não abre o olho de tanto junco Daí longe em longe os brejos vão virando rios Buritizal vem com eles buriti se segue segue Para trocar de bacia o senhor sobe por ladeiras de beirademesa entra de bruto na chapada chapadão que não se devolve mais Água ali nenhuma não tem só a que o senhor leva Aquelas chapadas compridas cheias de mutucas ferroando a gente Mutucas Dá o sol de onda forte dá que dá a luz tanta machuca Os cavalos suavam sal e espuma Muita vez a gente cumpria por picadas no mato caminho de anta a ida da vinda De noite se é de ser o céu embola um brilho Cabeça da gente quase esbarra nelas Bonito em muito comparecer como o céu de estrelas por meados de fevereiro Mas em deslua no escuro feito é um escurão que peia e pega É noite de muito volume Treva toda do sertão sempre me fez mal Diadorim não ele não largava o fogo de gelo daquela idéia e nunca se cismava Mas eu queria que a madrugada viesse Dia quente noite fria Arrancávamos caneladeema para acender fogueira Se a gente tinha o que comer e beber eu dormia logo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 38 Sonhava Só sonho mal ou bem livrado Eu tinha uma lua recolhida Quando o dia quebrava as barras eu escutava outros pássaros Tiriri graúna a fariscadeira juritidopeitobranco ou a pombavermelhadomatovirgem Mas mais o bemtevi Atrás e adiante de mim por toda a parte parecia que era um bemtevi só Gente Não se acha até que ele é sempre um em mesmo perguntei a Diadorim Ele não aprovou e estava incerto de feições Quando meu amigo ficava assim eu perdia meu bom sentir E permaneci duvidando que seria que era um bemteviexato perseguindo minha vida em vez me acusando de máshoras que eu ainda não tinha procedido Até hoje é assim Dali vindo visitar convém ao senhor o povoado dos pretos esses bateavam em faisqueiras no recesso brenho do VargemdaCria donde ouro já se tirou Acho de baixo quilate Uns pretos que ainda sabem cantar gabos em sua língua da Costa E em andemos jagunço era que perpassava ligeiro no chapadão os legítimos coitados todos vivem é demais devagar pasmacez A tanta miséria O chapadão no pardo é igual igual a muita gente ele entristece mas eu já nasci gostando dele As chuvas se temperaram João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 39 Digo outro mês outro longe na Aroeirinha fizemos paragem Ao que num portal vi uma mulher moça vestida de vermelho se ria Ô moço da barba feita ela falou Na frente da boca ela quando ria tinha os todos dentes mostrava em fio Tão bonita só Eu apeei e amarrei o animal num pau da cerca Pelo dentro minhas pernas doíam por tanto que desses três dias a gente se sustava de custoso varar circunstância de trinta léguas Diadorim não estava perto para me reprovar De repente passaram aos galopes e gritos uns companheiros que tocavam um boi preto que iam sangrar e carnear em beira dágua Eu nem tinha começado a conversar com aquela moça e a poeira forte que deu no ar ajuntou nós dois num grosso rojo avermelhado Então eu entrei tomei um café coado por mão de mulher tomei refresco limonada de pêradocampo Se cha mava Nhorinhá Recebeu meu carinho no cetim do pêlo alegria que foi feito casamento esponsal Ah a mangaba boa só se colhe já caída no chão de baixo Nhorinhá Depois ela me deu de presente uma presa de jacaré para traspassar no chapéu com talento contra mordida de cobra e me mostrou para beijar uma estampa de santa dita meia milagrosa Muito foi Mãe dela chegou uma velha arregalada por nome de Ana Duzuza falada de ser filha de ciganos e dona adivinhadora da João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 40 boa ou má sorte da gente naquele sertão essa dispôs de muita virtude Ela sabia que a filha era meretriz e até contanto que fosse para os homens de fora do lugarejo jagunços ou tropeiros não se importava mesmo dava sua placença Comemos farinha com rapadura E a Ana Duzuza me disse vendendo forte segredo que Medeiro Vaz ia experimentar passar de banda a banda o liso do Suçuarão Ela estava chegando do arranchado de Medeiro Vaz que por ele mandada buscar ele querendo suas profecias Loucura duma Para quê Eu nem não acreditei Eu sabia que estávamos entortando era para a Serra das Araras revinhar aquelas corujeiras nos bravios de ali além aonde tudo quanto era bandido em folga se escondia lá se podia azo de combinar mais outros variáveis companheiros Depois de arte que o Liso do Suçuarão não concedia passagem a gente viva era o raso pior havente era um escampo dos infernos Se é se Ah existe meu Eh Que nem o VãodoBuraco Ah não isto é coisa diversa por diante da contravertência do Preto e do Pardo Também onde se forma calor de morte mas em outras condições A gente ali rói rampa Ah o Tabuleiro Se nhor então conhece Não esse ocupa é desde a Veredada VacaPreta até Córrego Catolé cá embaixo e de em desde a nascença do Peruaçu até o rio Cochá que tira da Várzea da Ema Depois dos cerradões das mangabeiras João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 41 Nada nada vezes e o demo esse Liso do Suçuarão é o mais longe pra lá pra lá nos ermos Se emenda com si mesmo Água não tem Crer que quando a gente entesta com aquilo o mundo se acaba carece de se dar volta sempre Um é que dali não avança espia só o começo só Ver o luar alumiando mãe e escutar como quantos gritos o vento se sabe sozinho na cama daqueles desertos Não tem excrementos Não tem pássaros Com isso apertei aquela Ana Duzuza e ela não agüentou a raiva em meus olhos Seô Medeiro Vaz pois foi ele mesmo próprio quem me contou ela teve de falar Soturnos Não era possível Diadorim estava me esperando Ele tinha lavado minha roupa duas camisas e um paletó e uma calça e outra camisa nova de bulgariana Às vezes eu lavava a roupa nossa mas quase mais quem fazia isso era Diadorim Porque eu achava tal serviço o pior de todos e também Diadorim praticava com mais jeito mão melhor Ele não indagou donde eu tinha estado e eu menti que só tinha entrado lá por causa da velha Ana Duzuza a fim de requerer o significado do meu futuro Diadorim também disso não disse ele gostava de silêncios Se ele estava com as mangas arregaçadas eu olhava para os João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 42 braços dele tão bonitos braços alvos em bem feitos e a cara e as mãos avermelhadas e empoladas de picadas das mutucas No momento foi que eu caí em mim que podia ter perguntado à Ana Duzuza alguma passagem de minha sina por vir Também uma coisa de minha fechada eu devia de perguntar Coisa que nem eu comigo não estudava não tinha a coragem E se a Duzuza adivinhasse mesmo conhecesse por detrás o pano do destino Não perguntei não tinha perguntado Quem sabe podia ser eu estava enfeitiçado Me arrependi de não ter pedido o resumo à Ana Duzuza Ah tem uma repetição que sempre outras vezes em minha vida acontece Eu atravesso as coisas e no meio da travessia não vejo só estava era entretido na idéia dos lugares de saída e de chegada Assaz o senhor sabe a gente quer passar um rio a nado e passa mas vai dar na outra banda é num ponto muito mais embaixo bem diverso do em que primeiro se pensou Viver nem não é muito perigoso Redisse a Diadorim o que eu tinha surripiado que o projeto de Medeiro Vaz só era o de conduzir a gente para o Liso do Suçuarão a dentro adiante até ao fim E certo é É certo Diadorim respondeu me afrontando com a surpresa de que ele já sabia daquilo e a mim não tinha antecipado nem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 43 miúda palavra E veja eu vinha tanto tempo me relutando contra o querer gostar de Diadorim mais do que a claro de um amigo se pertence gostar e agora aquela hora eu não apurava vergonha de se me entender um ciúme amargoso Sendo sabendo que Medeiro Vaz depunha em Diadorim uma confiança muito maior do que em nós outros todos de formas que com ele externava os assuntos Essa diferença de regra agora me turvava Mas Medeiro Vaz era homem de outras idades andava por este mundo com mão leal não variava nunca não fraquejava Eu sabia que ele a bem dizer só guardava memória de um amigo Joca Ramiro loca Ramiro tinha sido a admiração grave da vida dele Deus no Céu e Joca Ramiro na outra banda do Rio Tudo o justo Mas ciúme é mais custoso de se sopitar do que o amor Coração da gente o escuro escuros Então Diadorim o resto me descreveu Pra por lá do Suçuarão já em tantos terrenos da Bahia um dos dois Judas possuía sua maior fazenda com os muitos gados lavouras e lá morava sua família dele legítima de raça mulher e filhos A gente suprisse de varar o Liso em boas farsas se chegava lá sem ser esperados arrastava aquele pessoal por dura surpresa acabouse com aquilo Mesmo quem havia de deduzir que o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 44 Liso do Suçuarão prestasse para nele caminho se impor Ah eles prosperavam em sua fazenda feito num quartel de bronze com que por outros cantos não se podia remeter pois de arredor decerto tinham vigias reforço de munição e récua de camaradas pelos pontos de passagem dificultosa que eles governavam em cada grota e cada ipueira Truco que de repente do lado mais impossível a gente fosse surgir de sobrevento soflagrar aqueles desprevenidos Eu escutei e perfiz até um arrepio Mas Diadorim de vez mais sério temperou Essa velha Ana Duzuza é que inferna e não se serve Das perguntas que Medeiro Vaz fez ela tirou por tino a tenção dele e não devia de ter falado as pausas Essa carece de morrer para não ser leleira Ouvi mal ouvi Me vim dáguas frias Diadorim era assim matar se matava era para ser um preparo O judas algum na faca Tinha de ser nosso costume Eu não sabia Não sou homem de meiodia com orvalhos não tenho a fraca natureza Mas me venceu pena daquela Ana Duzuza ela com os olhos para fora a gente podia pegar nos dedos Coisa que me contou tantas lorotas Trem caco de velha boca que se fechava aboborosa de sem dentes Raspava a rapadura com a quicé ia ajuntando na palma da mão o farelo peguento preto João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 45 ou se não segurava o naco rechupando lambendo A gente engrossava nojo salivava Por que é então que ela merecia tanto dó Eu não tive solércia de contradizer As vontades de minha pessoa estavam entregues a Diadorim A razão dele era do estilo acinte Só previ medo foi de que ele falasse para eu mesmo ir voltar lá por minhas próprias acabar a Ana Duzuza Eu não sojigava tudo por sentir Fazia tempo que eu não olhava Diadorim nos olhos Mas de seguinte eu pensei se matarem a velha Duzuza pelo resguardar o segredo então é capaz que matem a filha também Nhorinhá então é assassinar Ah que se puxou de mim uma decisão e eu abri sete janelas Disso que você disse desconvenho Bulir com a vida dessa mulher para a gente dá atraso eu o quanto falei Diadorim me adivinhava Já sei que você esteve com a moça filha dela ele respondeu seco quase num chio Dente de cobra Aí entendi o que pra verdade que Diadorim me queria tanto bem que o ciúme dele por mim também se alteava Depois dum rebate contente se atrapalhou em mim aquela outra vergonha um estúrdio asco E eu quase gritei Aí é a intimação Pois fizerem eu saio do meio de vós pra todo o nunca Mais tu há de não me ver Diadorim pôs mão em meu braço Do que me estremeci de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 46 dentro mas repeli esses alvoroços de doçura Me deu a mão e eu Mas era como tivesse uma pedra pontuda entre as duas palmas Você já paga tão escasso então por Joca Ramiro Por conta duma bruxa feiticeira e a mávida da filha dela aqui neste confim de gerais ele baixo exclamou E tive ira Dou falei Todo o mundo então todos tinham de viver honrando a figura daquele de Joca Ramiro feito fosse Cristo Nosso Senhor o exato E por aí eu já tinha pitado dois cigarros Ser dono definito de mim era o que eu queria queria Mas Diadorim sabia disso parece que não deixava Riobaldo escuta pois então Joca Ramiro era o meu pai ele disse não sei se estava pálido muito e depois foi que se avermelhou Devido o que abaixou o rosto para mais perto de mim Acalmou meu fôlego Me cerrou aquela surpresa Sentei em cima de nada E eu cri tão certo depressa que foi como sempre eu tivesse sabido aquilo Menos disse Espiei Diadorim a dura cabeça levantada tão bonito tão sério E corri lembrança em Joca Ramiro porte luzido passo ligeiro as botas russianas a risada os bigodes o olhar bom e mandante a testa muita o topete de cabelos anelados pretos brilhando Como que brilhava ele todo Porque Joca Ramiro era mesmo assim sobre os homens ele tinha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 47 uma luz rei da natureza Que Diadorim fosse o filho agora de vez me alegrava me assustava Vontade minha foi declarar Redigo Diadorim estou com você assente em todo sistema e com a memória de seu pai Mas foi o que eu não disse Será por quê Criatura gente é não e questão corda de três tentos três tranços Pois para mim pra quem ouvir no fato essa Ana Duzuza fica sendo minha mãe foi o que eu disse E fe chando quase gritei Por mim pode cheirar que chegue o manacá não vou Reajo dessas barbaridades Tudo turbulindo Esperei o que vinha dele De um aceso de mim eu sabia o que compunha minha opinião era que eu às loucas gostasse de Diadorim e também recesso dum modo a raiva incerta por ponto de não ser possível dele gostar como queria no honrado e no final Ouvido meu retorcia a voz dele Que mesmo no fim de tanta exaltação meu amor inchou de empapar todas as folhagens e eu ambicionando de pegar em Diadorim carregar Diadorim nos meus braços beijar as muitas demais vezes sempre E tinha nojo maior daquela Ana Duzuza que vinha talvez separar a amizade da gente Em mesmo eu quase reconheci um surdo prestígio de sendo preciso ir lá por mim reduzir a velha só não podia maltratar era Nhorinhá que ao tanto afeto eu eu bemqueria Háde que eu certo não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 48 regulasse ôxe Não sei não sei Não devia de estar relembrando isto contando assim o sombrio das coisas Lengalenga Não devia de O senhor é de fora meu amigo mas meu estranho Mas talvez por isto mesmo Falar com o estranho assim que bem ouve e logo longe se vai embora é um segundo proveito faz do jeito que eu falasse mais mesmo comigo Mire veja o que e ruim dentro da gente a gente perverte sempre por arredar mais de si Para isso é que o muito se fala E as idéias instruídas do senhor me fornecem paz Principalmente a confirmação que me deu de que o Tal não existe pois é não O Arrenegado o Cão o Cramulhão o Indivíduo o Galhardo o PédePato o Sujo o Homem o Tisnado o Coxo o Temba o Azarape o CoisaRuim o Mafarro o PéPreto o Canho o DubaDubá o Rapaz o Tristonho o Nãoseiquediga Oquenuncaseri o SemGracejos Pois não existe E se não existe como é que se pode se contratar pacto com ele E a idéia me retorna Dum mau imaginado o senhor me dê o lícito que ou então será que pode também ser que tudo é mais passado revolvido remoto no profundo mais crônico que quando um tem noção de resolver a vender a alma sua que é porque ela já estava dada vendida sem se saber e a pessoa sujeita está só é certificando o regular dalgum velho trato João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 49 que já se vendeu aos poucos faz tempo Deus não queira Deus que roda tudo Diga o senhor sobre mim diga Até podendo ser de alguém algum dia ouvir e entender assim quem sabe a gente criatura ainda é tão ruim tão que Deus só pode às vezes manobrar com os homens é mandando por intermédio do diá Ou que Deus quando o projeto que ele começa é para muito adiante a ruindade nativa do homem só é capaz de ver o aproximo de Deus é em figura do Outro Que é que de verdade a gente pressente Dúvido dez anos Os pobres ventos no burro da noite Deixa o mundo dar seus giros Estou de costas guardadas a poder de minhas rezas Ahã Deamar deamo Relembro Diadorim Minha mulher que não me ouça Moço toda saudade é uma espécie de velhice Mas aí eu estava contando quando eu gritei aquele desafio raivoso Diadorim respondeu o que eu não esperava Tem discórdia não Riobaldo amigo se acalme Não é preciso se haver cautela de morte com essa Ana Duzuza Nem nós vamos com Medeiro Vaz para fazer barbaridade com a mulher e filhos pequenos daquele pior dos dois Judas tão bem que mereciam porque ele e os da laia dele têm costumes de proceder assim Mas o que a gente quer é só pegar a família conosco prisioneira então ele vem se vem E vem obrigado pra João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 50 combates Mas se você algum dia deixar de vir junto como juro o seguinte hei de ter a tristeza mortal Disse Tinha tornado a pôr a mão na minha mão no começo de falar e que depois tirou e se espaçou de mim Mas nunca eu senti que ele estivesse melhor e perto pelo quanto da voz duma voz mesmo repassada Coração isto é estes pormenores todos Foi um esclaro O amor já de si é algum arrependimento Abracei Diadorim como as asas de todos os pássaros Pelo nome de seu pai Joca Ramiro eu agora matava e morria se bem Mas Diadorim mais não supriu o que mais não explicava E quem sabe para deduzir da conversa me perguntou Riobaldo se lembra certo da senhora sua mãe Me conta o jeito de bondade que era a dela Na ação de ouvir digo ao senhor tive um menos gosto na ação da pergunta Só faço que refugo sempre quando outro quer direto saber o que é próprio o meu no meu ah Mas desci disso o minuto vendo que só mesmo Diadorim era que podia acertar esse tento em sua amizade delicadeza Ao que entendi Assim devia de ser Toda mãe vive de boa mas cada uma cumpre sua paga prenda singular que é a dela e dela diversa bondade E eu nunca tinha pensado nessa ordem Para mim minha mãe era a minha mãe essas coisas Agora eu achava A bondade especial João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 51 de minha mãe tinha sido a de amor constando com a justiça que eu menino precisava E a de mesmo no punir meus demaseios quererbem às minhas alegrias A lembrança dela me fantasiou fraseou só face dum momento feito grandeza cantável feito entre madrugar e manhecer Pois a minha eu não conheci Diadorim prosseguiu no dizer E disse com curteza simples igual quisesse falar barra beiras cabeceiras Fosse cego de nascença Por mim o que pensei foi que eu não tive pai quer dizer isso pois nem eu nunca soube autorizado o nome dele Não me envergonho por ser de escuro nascimento Orfão de conhecença e de papéis legais é o que a gente vê mais nestes sertões Homem viaja arrancha passa muda de lugar e de mulher algum filho é o perdurado Quem é pobre pouco se apega é um giroo giro no vago dos gerais que nem os pássaros de rios e lagoas O senhor vê o ZéZim o melhor meeiro meu aqui risonho e habilidoso Pergunto ZéZim por que é que você não cria galinhasdangola como todo o mundo faz Quero criar nada não me deu resposta Eu gosto muito de mudar Está aí está com uma mocinha cabocla em casa dois filhos dela já tem Belo um dia ele tora É assim Ninguém discrepa Eu tantas mesmo digo Eu dou proteção Eu isto é Deus por João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 52 baixos permeios Essa não faltou também à minha mãe quando eu era menino no sertãozinho de minha terra baixo da ponta da Serra das Maravilhas no entre essa e a Serra dos Alegres tapera dum sítio dito do Caramujo atrás das fontes do Verde o Verde que verte no Paracatu Perto de lá tem vila grande que se chamou Alegres o senhor vá ver Hoje mudou de nome mudaram Todos os nomes eles vão alterando É em senhas São Romão todo não se chamou de primeiro Vila Risonha O Cedro e o Bagre não perderam o ser O TabuleiroGrande Como é que podem remover uns nomes assim O senhor concorda Nome de lugar onde alguém já nasceu devia de estar sagrado Lá como quem diz então alguém havia de renegar o nome de Belém de NossoSenhorJesusCristo no presépio com Nossa Senhora e São José Precisava de se ter mais travação Senhor sabe Deus é definitivamente o demo é o contrário Dele Assim é que digo eu que o senhor já viu que tenho retentiva que não falta recordo tudo da minha meninice Boa foi Me lembro dela com agrado mas sem saudade Porque logo sufusa uma aragem dos acasos Para trás não há paz O senhor sabe a coisa mais alonjada de minha primeira meninice que eu acho na memória foi o ódio que eu tive de um homem chamado Gramacedo Gente melhor do lugar eram todos dessa família Guedes Jidião Guedes quando saíram de lá nos trouxeram junto minha mãe e eu Fica João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 53 mos existindo em território baixio da Sirga da outra banda ali onde o deJaneiro vai no São Francisco o senhor sabe Eu estava com uns treze ou quatorze anos De sorte que do que eu estava contando ao senhor uma noite se passou todo o mundo sonhado satisfeito Declaro que era em abril em entrar Medeiro Vaz para o que traçava tinha querido se adiar das restadas chuvas de março dia de São José e sua enchente temposa para pegar céu perfeito com os campos ainda subindo verdes pois visto a gente ia baixar primeiro por campinas de brejais e daí avançar aquilo que se disse depo depois Porque era extraordinária verdade logo conheci não achei terrível Tangemos esbarrando dois dias no Vespê lá se tinha boa cavalaria descansada outros cavalos sob guarda dum sitiante amigo Jõe Engrácio por nome Nos caminhos ainda se lambuzava muita lama de ontem Versar viagem a cavalo sem ter estradas só doido é quem faz isso ou jagunz aquele Jõe Engrácio falou esse era homem sério trabalhador mas demais de simplório e do que ele falava ele mesmo logo se ria fortemente Mas erro era porquanto Medeiro Vaz sempre soube rumo prático pelo firme Modo mesmo assim ele Jõe Engrácio reparou na quantidade de comidas e mantimentos que a gente tinha reunido em tantos burros cargueiros e que era João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 54 despropósito por amor daquela fartura as carnes e farinhas e rapadura nem faltava sal nem café De tudo E ele vendo o que via perguntou aonde se ia dando dizendo de querer ir junto Bobou foi só o que Medeiro Vaz indeferiu Bobei chefe Perdão peço Jõe Engrácio reverenciou Medeiro Vaz não era carrancista Somente de mais sisudez a praxe homem baseado Às vezes vinha falando surdo de resmão Com ele ninguém vereava De estado calado ele sempre aceitava todo bom e justo conselho Mas não louvava cantoria Estavam falando todos juntos Então Medeiro Vaz não estava lá O que tinha sido antanha a história mesma dele o senhor sabe Quando moço de antepassados de posses ele recebera grande fazenda Podia gerir e ficar estadonho Mas vieram as guerras é os desmandos de jagunços tudo era morte e roubo e desrespeito carnal das mulheres casadas e donzelas foi impossível qualquer sossego desde em quando aquele imundo de loucura subiu as serras e se espraiou nos gerais Então Medeiro Vaz ao fim de forte pensar reconheceu o dever dele largou tudo se desfez do que abarcava em terras e gados se livrou leve como que quisesse voltar a seu só nascimento Não tinha bocas de pessoa não sustinha herdeiros forçados No derradeiro fez o fezpor suas mãos pôs fogo na distinta casade João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 55 fazenda fazendão sido de pai avô bisavô espiou até o voejo das cinzas lá hoje é arvoredos Ao que aí foi aonde a mãe estava enterrada um cemiteriozinho em beira do cerrado então desmanchou cerca espalhou as pedras pronto de alívios agora se testava ninguém podia descobrir para remexer com desonra o lugar onde se conseguiam os ossos dos parentes Daí relimpo de tudo escorrido dono de si ele montou em ginete com cachos darmas reuniu chusma de gente corajada rapaziagem dos campos e saiu por esse rumo em roda para impor a justiça De anos andava Dizem que foi ficando cada vez mais esquisito Quando conheceu Joca Ramiro então achou outra esperança maior para ele loca Ramiro era único homem pardefrança capaz de tomar conta deste sertão nosso mandando por lei de sobregoverno Fato que Joca Ramiro também igualmente saía por justiça e alta política mas só em favor de amigos perseguidos e sempre conservava seus bons haveres Mas Medeiro Vaz era duma raça de homem que o senhor mais não vê eu ainda vi Ele tinha conspeito tão forte que perto dele até o doutor o padre e o rico se compunham Podia abençoar ou amaldiçoar e homem mais moço por valente que fosse de beijar a mão dele não se vexava Por isso nós todos obedecíamos Cumpríamos choro e riso doideira em juízo Tenente nos gerais ele era A gente era os medeirovazes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 56 Razão dita de boacara se aceitou quando conforme Medeiro Vaz com as poucas palavras que íamos cruzar o Liso do Suçuarão e cutucar de guerrear nos fundões da Bahia Até o tanto houve prezando um rebuliço de festejo O que ninguém ainda não tinha feito a gente se sentia no poder fazer Como fomos dali do Vespê tocamos descendo esbarrancados e es corregador Depois subimos A parte de mais árvores dos cerrados cresce no se caminhar para as cabeceiras Boi brabeza pode surgir do caatingal tresfuriado com o que de gente nunca soube vem feio pior que onça Se viam bandos tão compridos de araras no ar que pareciam um pano azul ou vermelho desenrolado esfiapado nos lombos do vento quente Daí se desceu mais e de repente chegamos numa baixada toda avistada felizinha de aprazível com uma lagoa muito correta rodeada de buritizal dos mais altos buriti verde que afina e esveste belimbeleza E tinha os restos de uma casa que o tempo viera destruindo e um bambual por antigos plantado e um ranchinho Ali se chamava o Bambual do Boi Lá a gente seria de pernoitar e arrumar os finais preparos Eu estava de sentinela afastado um quartodelégua num alto retuso Dali eu via aquele movimento os homens enxergados tamanhinho de meninos numa alegria feito nuvem de abelhas em flor de araçá esse alvoroço como tirando roupa e correndo para aproveitarem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 57 de se banhar no redondo azul da lagoa de donde fugiam espantados todos os pássaros as garças os jaburus os marrecos e uns bandos de patospretos Semelhava que por saberem que no outro dia principiava o peso da vida os com panheiros agora queriam só pular rir e gozar seu exato Mas uns dez tinham de sempre ficar formando prontidão com seus rifles e granadeiras que Medeiro Vaz assim mandava E de tardinha quando voltou o vento era um fino soprado seguido nas palmas dos buritis roladas uma por uma E o bambual quase igualmente Som bom de chuvas Então Diadorim veio me fazer companhia Eu estava meio dúbito Talvez quem tivesse mais receio daquilo que ia acontecer fosse eu mesmo Confesso Eu cá não madruguei em ser corajoso isto é coragem em mim era variável Ah naqueles tempos eu não sabia hoje é que sei que para a gente se transformar em ruim ou em valentão ah basta se olhar um minutinho no espelho caprichando de fazer cara de valentia ou cara de ruindade Mas minha competência foi comprada a todos custos caminhou com os pés da idade E digo ao senhor aquilo mesmo que a gente receia de fazer quando Deus manda depois quando o diabo pede se perfaz O Danador Mas Diadorim estava a suaves Olha Riobaldo me disse nossa destinação é de glória Em hora de desânimo você lembra de sua mãe eu lembro de meu pai Não fale nesses João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 58 Diadorim Ficar calado é que é falar nos mortos Me faltou certeza para responder a ele o que eu estava achando Que von tade era de pôr meus dedos de leve o leve nos meigos olhos dele ocultando para não ter de tolerar de ver assim o chamado até que ponto esses olhos sempre havendo aquela beleza verde me adoecido tão impossível Dormiuse bem De manhãzim moal de aves e pássaros em revôo e pios e cantos a gente toda discorria se esparramava atarefados ajudando para o derradeiro Os bogós de couro foram enchidos nas nascentes da lagoa e enqueridos nas costas dos burrinhos Também tínhamos trazido jumentos só modo para carregar Os cavalos ainda pastavam um pouco do capimgrama que tapava os pés deles Se dizia muita alegria Cada um pegava também sua cabaça dágua e na capanga o diário de se valer com o que comer paçoca Medeiro Vaz depois de não dizer nada deu ordem de seguida Primeiro para adiante foi uma turma de cinco homens a patrulhazinha Constante que com a gente estavam três bons rastreadores Suzarte Joaquim Beiju e Tipote esse Tipote sabia meios de descobrir cacimbas e grotas com o bebível o Suzarte desempenhava um faro de cachorromestre e Joaquim Beiju conhecia cada recanto dos gerais de dia e de noite referido João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 59 deletreado quisesse podia mapear planta Saímos semoventes Seis novilhos gordos a gente repontava serviam para se carnear em rota De repente com a gente se afastando os pássaros todos voltavam do céu que desciam para seus lugares em ponto nas frescas beiras da lagoa ah a papeagem no buritizal que lequelequeia A ver e o sol em pulo de avanço longe na banda de trás por cima de matos rebentava aquela grandidade Dia desdobrado Em o que afundamos num cerrado de mangabal indo sem volvência até perto de hora do almoço Mas o terreno aumentava de soltado E as árvores iam se abaixando menorzinhas arregaçavam saia no chão De vir lá só algum tatu por mel e mangaba Depois se acabavam as mangabaranas e mangabeirinhas Ali onde o campo largueia Os urubus em vasto espaceavam Se acabou o capinzal de capimredondo e paspalho e paus espinhosos que mesmo as moitas daquele de prateados feixes capins assins Acabava o grameal naquelas paragens pardas Aquilo vindo aos poucos dava um peso extrato o mundo se envelhecendo no descampante Acabou o sapé brabo do chapadão A gente olhava para trás Daí o sol não deixava olhar rumo nenhum Vi a luz castigo Um gaviãoandorim foi o fim de pássaro que a gente divulgou Achante pois se estava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 60 naquela coisa taperão de tudo fofo ocado arrevesso Era uma terra diferente louca e lagoa de areia Onde é que seria o sobejo dela confinante O sol vertia no chão com sal esfaiscava De longe vez capins mortos e uns tufos de seca planta feito cabeleira sem cabeça Asexalastrava a distância adiante um amarelo vapor E fogo começou a entrar com o ar nos pobres peitos da gente Expondo ao senhor que o sucedido sofrimento sobrefoi já inteirado no começo daí só mais aumentava E o que era para ser O que é pra ser são as palavras Ah porque Por quê Juro que pontual nos instantes de o raso se pisar um sujeito dos companheiros um João Bugre me disse ou disse a outro do meu lado O Hermógenes tem pauta Ele se quis com o Capiroto Eu ouvi aquilo demais O pacto Se diz o senhor sabe Bobéia Ao que a pessoa vai em meianoite a uma encruzilhada e chama fortemente o Cujo e espera Se sendo háde que vem um pédevento sem razão e arre se comparece uma porca com ninhada de pintos se não for uma galinha puxando barrigada de leitões Tudo errado remedante sem completação O senhor João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 61 imaginalmente percebe O crespo a gente se retém então dá um cheiro de breu queimado E o dito o Coxo toma espécie se forma Carece de se conservar coragem Se assina o pacto Se assina com sangue de pessoa O pagar é a alma Muito mais depois O senhor vê superstição parva Estornadas O Hermógenes tem pautas Provei Introduzi Com ele ninguém podia O Hermógenes demônio Sim só isto Era ele mesmo A gente viemos do inferno nós todos compadre meu Quelemém instrui Duns lugares inferiores tão monstro medonhos que Cristo mesmo lá só conseguiu aprofundar por um relance a graça de sua sustância alumiável em as trevas de véspera para o Terceiro Dia Senhor quer crer Que lá o prazer trivial de cada um é judiar dos outros bom atormentar e o calor e o frio mais perseguem e para digerir o que se come é preciso de esforçar no meio com fortes dores e até respirar custa dor e nenhum sossego não se tem Se creio Acho proseável Repenso no acampo da Macaúba da Jaíba soante que mesmo vi e assaz me contaram e outros as ruin dades de regra que executavam em tantos pobrezinhos arraiais baleando esfaqueando estripando furando os olhos cortando línguas e orelhas não economizando as crianças pequenas atirando na inocência do gado queimando pessoas ainda meio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 62 vivas na beira de estrago de sangues Esses não vieram do inferno Saudações Se vê que subiram de lá antes dos prazos figuro que por empreitada de punir os outros exemplação de nunca se esquecer do que está reinando por debaixo Em tanto que muitos retombam para lá constante que morrem Viver é muito perigoso Mas mor o infernal a gente também media Digo A igual igualmente As chuvas já estavam esquecidas e o miolo mal do sertão residia ali era um sol em vazios A gente progredia dumas poucas braças e calcava o reafundo do areião areia que escapulia sem firmeza puxando os cascos dos cavalos para trás Depois se repraçava um entranço de viceversa com espinhos e restolho de graviá de áspera raça verdepreto cor de cobra Ca minho não se havendo Daí trasla um duro chão rosado ou cinzento gretoso e escabro no desentender aquilo os cavalos arupanavam Diadorim sempre em prumo a cabeça o sorriso dele me dobrava o ansiar Como que falasse Hê valentes somos corruscubas sobre ninguém que vamos padecer e morrer por aqui Os medeirovazes Medeiro Vaz se estugasse adiante junto com os que rastreavam Será que de lá ainda se podia receder De devagar vi visagens Os companheiros se prosseguindo só prosseguindo receei de ter João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 63 um vágado como tonteira de truaca Havia eu de saber por quê Acho que provinha de excessos de idéia pois caminhadas piores eu já tinha feito a cavalo ou a pé no tostasol Medo meu medo Agüentei Tanto tudo o que eu carregava comigo me pesava eu ressentia as correias dos correames os formatos A com léguaemeia de andada bebi meu primeiro chupo dágua da cabaça eu tinha avarezas dela Alguma justa noção não emendei eu pensava desconjuntado Até que esbarramos Até que no mesmo padrão de lugar sem mudança nenhuma nenhuma árvore nem barranco nem nada se viu o sol de um lado deslizar e a noite armar do outro Nem auxiliei a tomar conta dos bois nem a destravar os burros de albarda Onde era que os animais iam poder pastar Noite redondeou noite sem boca Desarreei peei o animal caí e dormi Mas no extremo de adormecer ainda intruji duas coisas em cruz que Medeiro Vaz estava insensato e que o Hermógenes era pactário Tomo que essas traves fecharam meus olhos De Diadorim aí jaz que descansando do meu lado assim ouvi Pois dorme Riobaldo tudo háde resultar bem Antes palavras que picaram em mim uma gastura cansada mas a voz dele era o tantotanto para o embalo de meu corpo Noite essa astúcia que tive uma sonhice Diadorim passando por debaixo de um arcoíris Ah eu pudesse mesmo gostar dele os gostares João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 64 Como vou achar ordem para dizer ao senhor a continuação do martírio em desde que as barras quebraram no seguinte na brumalva daquele falecido amanhecer sem esperança em uma sem o simples de passarinhos faltantes Fomos Eu abaixava os olhos para não reter os horizontes que trancados não alteravam circunstavam Do sol e tudo o senhor pode completar imaginado o que não pode para o senhor é ter sido vivido Só saiba o Liso do Suçuarão concebia silêncio e produzia uma maldade feito pessoa Não destruí aqueles pensamentos ir e ir vir e só e que Medeiro Vaz estava demente sempre existido doidante só agora pior se destapava era o que eu tinha rompência de gritar E os outros companheiros que é que os outros pensavam Sei De certo nadas e noves iam como o costume sertanejos tão sofridos Jagunço é homem já meio de sistido por si A calamidade de quente E o esbraseado o estufo a dor do calor em todos os corpos que a gente tem Os cavalos venteando só se ouvia o resfol deles cavalanços e o trabalho custoso de suas passadas Nem menos sinal de sombra Água não havia Capim não havia A debeber os cavalos em cocho armado de couro e dosar a meio eles esticando os pescoços para pedir eles olhavam como para seus cascos mostrando tudo o que cangavam de esforço e cada restar de bebida carecia de ser poupado Se ia o pesadelo Pesadelo mesmo de delírios Os João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 65 cavalos gemiam descrença Já pouco forneciam E nós estávamos perdidos Nenhum poço não se achava Aquela gente toda sapirava de olhos vermelhos arroxeavam as caras A luz assassinava demais E a gente dava voltas os rastreadores fare jando procurando Já tinha quem beijava os bentinhos se rezava De mim entreguei alma no corpo debruçado para a sela numa quebreira Até minhas testas formaram de chumbo Valentia vale em todas horas Repensei coisas de cabeçabranca Ou eu variava A saudade que me dependeu foi de Otacília Moça que dava amor por mim existia nas Serras dos Gerais Buritis Altos cabeceira de vereda na Fazenda Santa Catarina Me airei nela como a diguice duma música outra água eu provava Otacília ela queria viver ou morrer comigo que a gente se casasse Saudade se susteve curta Desde uns versos Buriti minha palmeira lá na vereda de lá casinha da banda esquerda olhos de onda do mar Mas os olhos verdes sendo os de Diadorim Meu amor de prata e meu amor de ouro De doer minhas vistas bestavam se embaçavam de renuvem e não achei acabar para olhar para o céu Tive pena do pescoço do meu cavalo pedação tábua João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 66 suante padecente Voltar para trás para as boas serras Eu via queria ver antes de dar à casca um pássaro voando sem movimento o chão fresco remexido pela fossura duma anta o cabecear das árvores o riso do ar e o fogo feito duma arara O senhor sabe o que é o frege dum vento sem uma moita um pé de parede pra ele se retrasar Diadorim não se apartou do meu lado Caso que arredondava a testa pensando Adivinhou que eu roçava longe dele em meus pensamentos Riobaldo não se matou a Ana Duzuza Nada de reprovável não se fez falou E eu não respondendo Agora o que era que aquilo me importava de malfeitos e castigos Eu ambicionava o suíxo manso dum córrego nas lajes o bom sumiço dum riacho mato a fundo E adverti memória dos derradeiros pássaros do Bambual do Boi Aqueles pássaros faziam arejo Gritavam contra a gente cada um asia sua sombra num palmo vivo dágua O melhor de tudo é a água No escaldado Saio daqui com vida deserteio de jaguncismo vou e me caso com Otacília eu jurei do proposto de meus todos sofrimentos Mas mesmo depois naquela hora eu não gostava mais de ninguém só gostava de mim de mim Novo que eu estava no velho do inferno Dia da gente desexistir é um certo decreto por isso que ainda hoje o senhor aqui me vê Ah e os poços não se achavam Alguém já tinha declarado de morto O Miquim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 67 um rapaz sério sincero que muito valia em guerreio esbarrou e se riu Será que não é sorte Depois se sofreu o grito de um adiante Estou cego Mais aquele o do pior caiu total virado torto embaraçando os passos das montadas De repente um rosnou reclamou baixo Outro também Os cavalos bobejavam Vi uma roda de caras de homens Suas as caras Credo como algum até as orelhas dele estavam cinzentas E outro todo empretecido e sangrava das capelas e paposdos olhos Medeiro Vaz a nada não atendia Ouvi minhas veias Aí a rumo eu pude pegar a rédea do animal de Diadorim aquelas peças doeram na minha mão tive que fiquei um instante no inclinado Daqui deste mesmo de lugar mais não vou Só desarrastado vencido mas falei Diadorim pareceu em pedra cão que olha Contanto me mirou a firme com aquela beleza que nada mudava Pois vamos retornar Riobaldo Que vejo que nada campou viável Tal tempo truquei mais forte rouco como um guariba Foi aí que o cavalo de Diadorim afundou aberto espalhado no chão e se agoniou Eu apeei do meu Medeiro Vaz estava ali num aspeito repartido Pessoal companheiro em redor se engasgavam pelo o resultado Nós temos de voltar chefe Diadorim solicitou Acabou de falar e parou um gesto para nós a gente sofreasse Tom bom mas se via que Medeiro Vaz não podia outro querer João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 68 a não ser o que Diadorim perguntava Medeiro Vaz então por primeira vez abriu dos lados as mãos de nada não poder fazer e ele esteve de ombros rebaixados Mais não vi e entendi Peguei minha cabaça bebi gole amargo de felém Mas era mesmo o final de se voltar Deus me disse E o senhor mais saiba de supeto já eu estava remoçado são disposto Todos influídos assim Pra trás sempre dá o prazer Diadorim apalpou meu braço Vi os olhos dele marejados Mor que depois eu soube que a idéia de se atravessar o Liso do Suçuarão ele Diadorim era que a Medeiro Vaz tinha aconselhado Mas para que contar ao senhor no tinte o mais que se mereceu Basta o vulto ligeiro de tudo Como Deus foi servido de lá do estralal do sol pudemos sair sem maiores estragos Isto é uns homens mortos e mais muitos dos cavalos Mesmo o mais grave sido que restamos sem os burros fugidos por infelizes e a carga quase toda toda com os mantimentos a gente perdemos Só não acabamos sumidos dextraviados por meio do regular das estrelas E foi Saímos dali num pintar de aurora E em lugares deerrados Mais não se podia Céu alto e o adiado da lua Com outros nossos padecimentos os homens tramavam zuretados de fome caça não achávamos até que tombaram à bala um macaco vultoso destrincharam quartearam e estavam comendo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 69 Provei Diadorim não chegou a provar Por quanto juro ao senhor enquanto estavam ainda mais assando e manducando se soube o corpudo não era bugio não não achavam o rabo Era homem humano morador um chamado José dos Alves Mãe dele veio de aviso chorando e explicando era criaturo de Deus que nu por falta de roupa Isto é tanto não pois ela mesma ainda estava vestida com uns trapos mas o filho também escapulia assim pelos matos por da cabeça prejudicado Foi assombro A mulher fincada de joelhos invocava Algum disse Agora que está bem falecido se come o que alma não é modo de não morrermos todos Não se achou graça Não mais não comeram não puderam Para acompanhar nem farinha não tinham E eu lancei Outros também vomitavam A mulher rogava Medeiro Vaz se prostrou com febre diversos perrengavam Aí então é a fome uns xingavam Mas outros conseguiram da mulher informação que tinha obra de quartodelégua de lá um mandioca sobrado Arre que não ouvi gritarem que de certo por vingança a mulher ensinasse aquilo de ser mandiocabrava Esses olhavam com terrível raiva Nesse tempo o Jacaré pegou de uma terra qualidade que dizem que é de bom aproveitar e gostosa Me deu comi sem achar sabor só o pepego esquisito e enganava o estômago Melhor engolir capins e folhas Mas uns já enchiam até capanga com tor João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 70 rão daquela terra Diadorim comeu A mulher também aceitou a coitada Depois Medeiro Vaz passou mal outros tinham dores pensaram que carne de gente envenenava Muitos estavam doentes sangrando nas gengivas e com manchas vermelhas no corpo e danado doer nas pernas inchadas Eu cumpria uma disenteria garrava a ter nojo de mim no meio dos outros Mas pudemos chegar até na beira do dosBois e na Lagoa Suçuarana ali se pescou Nós trouxemos aquela mulher o tempo todo ela temia de que faltasse outro decomer e ela servisse Quem quiser bulir com ela que me venha Diadorim garantiu Que só venha eu secundei do lado dele Matouse capivara gorda por fim Dum geralista roto ganhamos farinhadeburiti sempre ajudava E seguimos o corgo que tira da Lagoa Su çuarana e que recebe o do Jenipapo e a Vereda doVitorino e que verte no Rio Pandeiros esse tem cachoeiras que cantam e é dágua tão tinto que papagaio voa por cima e gritam sem acordo É verde É azul É verde É verde E longe pedra velha remeleja vi Santas águas de vizinhas E era bonito no correr do baixo campo as flores do capitãodasalatodas vermelhas e alaranjadas rebrilhando estremecidas de reflexo É o cava lheirodasala Diadorim falou entusiasmado Mas o Alaripe perto de nós sacudiu a cabeça Em minha terra o nome dessa ele disseé donajoana Mas o leite dela é venenoso João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 71 Esbandalhados nós estávamos escatimados naquela esfrega Esmorecidos é que não Nenhum se lastimava filhos do dia acho mesmo que ninguém se dizia de dar por assim Jagunço é isso Jagunço não se escabreia com perda nem derrota quase que tudo para ele é o igual Nunca vi Pra ele a vida já está assentada comer beber apreciar mulher brigar e o fim final E todo o mundo não presume assim Fazendeiro também Querem é trovão em outubro e a tulha cheia de arroz Tudo que eu mesmo do que mal houve me esquecia Tornava a ter fé na clareza de Medeiro Vaz não desfazia mais nele digo Confiança o senhor sabe não se tira das coisas feitas ou perfeitas ela rodeia é o quente da pessoa E despaireci meu espírito de ir procurar Otacília pedir em casamento mandado de virtude Fui fogo depois de ser cinza Ah algum isto é que é a gente tem devassalar Olhe Deus come escondido e o diabo sai por toda parte lambendo o prato Mas eu gostava de Diadorim para poder saber que estes gerais são formosos Talmente também se carecia de tomar repouso e aguardo Por meios e modos sortimos arranjados animais de montada arranchamos dias numa fazenda hospitaleira na Vereda do Alegre e viemos vindo atravessando o Pardo e o Acari em toda a parte a gente era recebida a bem Tardou foi para se ter sinal João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 72 dos bandos dos Judas Mas a vantagem nossa era que todos os moradores pertenciam do nosso lado Medeiro Vaz não maltratava ninguém sem necessidade justa não tomava nada à força nem consentia em desatinos de seus homens Esbarrávamos em lugar as pessoas vinham davam o que podiam em comidas outros presentes Mas os Hermógenes e os cardões roubavam defloravam demais determinavam sebaça em qualquer povoa àtoa renitiam feito peste Na ocasião o Hermógenes beirava a Bahia de lá se soube e eram um mundo enorme de má gente E o Ricardão Estivesse esperasse Dando meias andadas nós chegamos num pontoverdadeiro num BuritidoZé Dono de lá Sebastião Vieira tinha curral e casa E guardava munição da gente mais de dez mil tiros de bala Por que foi que não se fez combate depois naqueles meses todos A verdade digo ao senhor os soldados do Governo perseguiam a gente Major Oliveira Tenente Ramiz e Capitão Melo Franco esses não davam espaço E Medeiro Vaz pensava era um pensamento a gente mamparreasse de com eles não guerrear não se esperdiçar porque as nossas armas guardavam um destino só de dever Escapulíamos esquipávamos Vereda em vereda como os buritis ensinam a gente varava para após Se passava o Piratinga que é fundo se passava ou no Vau da Mata João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 73 ou no Vau da Boiada ou então pegando mais por baixo o São Domingos no Vau do José Pedro Se não subíamos beira desse até às nascentes no São Dominguinhos A ser o importante que se tinha de estudar era avançar depressa nas boas passagens nas divisas quando militar vinha cismado empurrando É preciso de saber os trechos de se descer para Goiás em debruçar para Goiás o chapadão por lá vai terminando despenha Tem quebra cangalhas e ladeiras terríveis vermelhas Olhe muito em além vi lugares de terra queimada e chão que dá som um estranho Mundo esquisito Brejo do Jatobazinho de medo de nós um homem se enforcou Por aí extremando se chegava até no Jalapão quem conhece aquilo tabuleiro chapadoso proporema Pois lá um geralista me pediu para ser padrinho de filho O menino recebeu nome de Diadorim também Ah quem oficiou foi o padre dos baianos saiba o senhor população de um arraial baiano inteira que marchava de mudadahomens mulheres as crias os velhos o padre com seus petrechos e cruz e a imagem da igreja tendo até bandinhademúsica como vieram com todos parecendo nação de maracatu Iam para os diamantes tão longe eles mesmo dizendo nos rios Uns tocavam jumentos de almocreve outros carregavam suas coisas sacos de mantimentos trouxas de roupa rede de caroá a tiracol O padre com chapéudecouro pràtrasado Só era uma João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 74 procissão sensata enchendo estrada às poeiras com o plequeio das alpercatas as velhas tiravam ladainha gente cantável Rezavam indo da miséria para a riqueza E pelo prazer de tomar parte no conforto de religião acompanhamos esses até à Vila da PedradeAmolar Lá venta é da banda do poente no tempodas águas na seca o vento vem deste rumo daqui O cortejo dos baianos dava parecença com uma festa No sertão até enterro simples é festa Às vezes eu penso seria o caso de pessoas de fé e posição se reunirem em algum apropriado lugar no meio dos gerais para se viver só em altas rezas fortíssimas louvando a Deus e pedindo glória do perdão do mundo Todos vinham comparecendo lá se levantava enorme igreja não havia mais crimes nem ambição e todo sofrimento se espraiava em Deus dado logo até à hora de cada uma morte cantar Raciocinei isso com compadre meu Quelemém e ele duvidou com a cabeça Riobaldo a colheita é comum mas o capinar é sozinho ciente me respondeu Compadre meu Quelemém é um homem fora de projetos O senhor vá lá na Jijujã Vai agora mês de junho A estrela dalva sai às três horas madrugada boa gelada É tempo da cana Senhor vê no escuro um quebrapeito e é ele mesmo já João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 75 risonho e suado engenhando o seu moer O senhor bebe uma cuia de garapa e dá a ele lembranças minhas Homem de mansa lei coração tão branco e grosso de bom que mesmo pessoa muito alegre ou muito triste gosta de poder conversar com ele Todo assim o que minha vocação pedia era um fazendão de Deus colocado no mais tope se braseando incenso nas cabeceiras das roças o povo entoando hinos até os pássaros e bichos vinham bisar Senhor imagina Gente sã valente querendo só o Céu finalizando Mas diverso do que se vê ora cá ora ali lá Como deu uma moça no BarreiroNovo essa desistiu um dia de comer e só bebendo por dia três gotas de água de pia benta em redor dela começaram milagres Mas o delegado regional chegou trouxe os praças determinou o desbando do povo baldearam a moça para o hospício de doidos na capital dizse que lá ela foi cativa de comer por armagem de sonda Tinham o direito Estava certo Meio modo acho que foi bom Aquilo não era o que em minha crença eu prezava Porque num estalo de tempo já tinham surgido vindo milhares desses para pedir cura os doentes condenados lázaros de lepra aleijados por horríveis formas feridentos os cegos mais sem gestos loucos acorrentados idiotas héticos e hidrópicos de tudo criaturas que fediam Senhor enxergasse aquilo o senhor desanimava Se tinha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 76 um grande nojo Eu sei nojo é invenção do QueNãoHá para estorvar que se tenha dó E aquela gente gritava exigiam saúde expedita rezavam alto discutiam uns com outros desesperavam de fé sem virtude requeriam era sarar não desejavam Céu nenhum Vendo assaz se espantava da seriedade do mundo para caber o que não se quer Será acerto que os aleijões e feiezas estejam bem convenientemente repartidos nos recantos dos lugares Se não se perdia qualquer coragem O sertão está cheio desses Só quando se jornadeia de jagunço no teso das marchas praxe de ir em movimento não se nota tanto o estatuto de misérias e enfermidades Guerra diverte o demo acha Mire veja um casal no Rio do Borá daqui longe só porque marido e mulher eram primos carnais os quatro meninos deles vieram nascendo com a pior transformação que há sem braços e sem pernas só os tocos Arre nem posso figurar minha idéia nisso Refiro ao senhor um outro doutor doutor rapaz que explorava as pedras turmalinas no vale do Araçuaí discorreu me dizendo que a vida da gente encarna e reencama por progresso próprio mas que Deus não há Estremeço Como não ter Deus Com Deus existindo tudo dá esperança sempre um milagre é possível o mundo se resolve Mas se não tem Deus háde a gente perdidos no vaivem e a vida é burra É o aberto perigo das João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 77 grandes e pequenas horas não se podendo facilitar é todos contra os acasos Tendo Deus é menos grave se descuidar um pouquinho pois no fim dá certo Mas se não tem Deus então a gente não tem licença de coisa nenhuma Porque existe dor E a vida do homem está presa encantoada erra rumo dá em aleijões como esses dos meninos sem pernas e braços Dor não dói até em criancinhas e bichos e nos doidos não dói sem precisar de se ter razão nem conhecimento E as pessoas não nascem sempre Ah medo tenho não é de ver morte mas de ver nascimento Medo mistério O senhor não vê O que não é Deus é estado do demônio Deus existe mesmo quando não há Mas o demônio não precisa de existir para haver a gente sabendo que ele não existe aí é que ele toma conta de tudo O inferno é um semfim que nem não se pode ver Mas a gente quer Céu é porque quer um fim mas um fim com depois dele a gente tudo vendo Se eu estou falando às flautas o senhor me corte Meu modo é este Nasci para não ter homem igual em meus gostos O que eu invejo é sua instrução do senhor De Araçuaí eu trouxe uma pedra de topázio Isto sabe o senhor por que eu tinha ido lá daqueles lados De mim conto Como é que se pode gostar do verdadeiro no falso Amizade com ilusão de desilusão Vida muito esponjosa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 78 Eu passava fácil mas tinha sonhos que me afadigavam Dos de que a gente acorda devagar O amor Pássaro que põe ovos de ferro Pior foi quando peguei a levar cruas minhas noites sem poder sono Diadorim era aquela estreita pessoa não dava de transparecer o que cismava profundo nem o que presumia Acho que eu também era assim Dele eu queria saber Só se queria e não queria Nem para se definir calado em si um assunto contrário absurdo não concede seguimento Voltei para os frios da razão Agora destino da gente o senhor veja eu trouxe a pedra de topázio para dar a Diadorim ficou sendo para Otacília por mimo e hoje ela se possui é em mão de minha mulher Ou conto mal Reconto Ao que nós acampados em pé duns brejos brejal cabo de várzea Até lá era favorável de defender que os cavalos se espairassem por ter manga natural onde se encostar e currais falsos de pegar gado brabeza Natureza bonita o capim macio Me revejo de tudo daquele diaadia Diadorim restava um tempo com uma cabaça nas duas mãos eu olhava para ele Seja por ser Riobaldo que em breve rompemos adiante Desta vez a gente tange guerra pronunciou a prazer como sempre quando assim em véspera Mas balançou a cabaça tinha um trem dentro um ferro o que me deu desgosto taco de ferro sem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 79 serventia só para produzir gastura na gente Bota isso fora Diadorim eu disse Ele não contestou e me olhou de um hesitado jeito que se eu tivesse falado causa impossível Em tal guardou o pedaço de ferro na algibeira E ficava todaavida com a cabaça nas mãos era uma cabaça baiana fabricada desenhada de capricho mas que agora sendo para nojo E como me deu sede eu peguei meu copo de corno lavrado que não quebra nunca e fomos apanhar água num poço que ele me disse Era por esconso por uma palmeira duma de nome que não sei de curta altura mas regrossa e com cheias palmas reviradas para cima e depois para baixo até pousar no chão com as pontas Todas as palmas tão lisas tão juntas fechavam um coberto remedando choupã de índio Assino que foi de avistarem umas assim que os bugres acharam idéia de formar suas tocas Aí a gente se curvar suspendia uma folhagem lá entrava O poço abria redondo quase ou ovalado Como no recesso do mato ali intrim toda luz verdeja Mas a água mesma azul dum azul que haja que roxo logo mudava A vai coração meu foi forte Sofismei se Diadorim segurasse em mim com os olhos me declarasse as todas as palavras Reajo que repelia Eu Asco Diadorim parava normal estacado observando tudo sem importância Nem provia segredo E eu tive decepção de logro por conta desse sensato silêncio Debrucei ia catar água Mas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 80 qual se viu um bicho rã brusca feiosa botando bolhas que à lisa cacheavam Resumo que nós dois sob num tempo demos para trás discordes Diadorim desconversou e se sumiu por lá por aí consoante a esquisitice dele de sempre às vezes desaparecer e tornar a aparecer sem menos Ah quem faz isso não é por ser e se saber pessoa culpada No que vim para um grupo de companheiros esses estavam jogando buzo enchendo folga Por simples que a companheirada naqueles derradeiros tempos me caceteava com um enjôo todos eu achava muito ignorantes grosseiros cabras Somente que na hora eu queria a frouxa presença deles fulão e sicrão e beltrão e romão pessoal ordinário A tanto mesmo sem fome providenciei para mim uma jacuba no comecalado E quis que até me perguntei pensar na vida Penso Mas foi no instante em que todos levantaram as caras só sendo um rebuliço acolá na virada que principiava a vertente onde é que estavam uns outros que chamavam muito acenando especial Pois fomos ligeiro ver o que subindo pelo resfriado Passava era uma tropa os diversos lotes de burros que vinham de São Romão levavam sal para Goiás E o arrieiro mestre relatando uma infeliz notícia dessas da vida Ele era alto feições compridas dentuço Medeiro Vaz exigiu certeza João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 81 Olhe pois era o arrieiro respondeu e antes de morrer deu o nome que era SantosReis Mais não propôs dizer porque aí se exalou Comandante o senhor creia nós tivemos grande pena A gente em volta se consternava Aqueles tropeiros no Cururu tinham achado o SantosReis que morria urgente tinham acendido vela e enterrado Febres Ao menos mais a alma descansasse A gente tirou chapéus em voto todos se benzendo E o SantosReis era o homem que vivo fazia mais falta ele estava viajando para trazer recado e combinação da parte de Só Candelário e Titão Passos chefes em nosso favor na outra grande banda do Rio Agora alguém carece de ir Medeiro Vaz decidiu olhando salteado amém nós apreciávamos Eu espiei caçando Diadorim que ali que era a mocinha de cabelos louros Sesfredo me conta me fala nesse acontecer nem bem cem braças andadas eu já pedia a ele Era como se eu tivesse de caçar emprestada uma sombra de um amor E você não volta para lá Sesfredo Você agüenta o existir perguntei Guardo isso para às vezes ter saudade Berimbau Saudade só e ele alargou as ventas de tanto riso Vi que a estória da moça era falsa De inventar ouco se ganha Regra do mundo é João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 82 muito dividida O Sesfredo comia muito E sabia assoviar seguido copiando o de muitos pássaros Ao viável eu tinha de atravessar as tantas terras e municipios jogamos uma viagem por este Norte meia geral Assim conheço as províncias do Estado não há onde eu não tenha aparecido A que viemos por Extrema de Santa Maria Barreiro Claro Cabeça de Negro Córrego Pedra do Gervásio Acari Vieira e Fundo buscando jeito de encostar no de São Francisco Novidade não houve Passamos numa barca Só sempre bater para o nascente direitamente em cima de Tremedal chamada hoje MonteAzul Sabíamos um pessoal nosso perpassava por lá na Jaíba até à Serra Branca brabas terras vazias do Rio VerdeGrande De madrugada acordamos em sua janela um velhozinho dono de um bananal O velho zinho era amigo executou o recado Daí a cinco madrugadas retornamos Era para vir alguém quem veio foi João Goanhá próprio E as descrições que deu foram de todas as piores Só Candelário Morto em tiroteio de combate metralhadoras tinham serrado o corpo dele de esguelha por riba da cintura O Alípio preso levado para a cadeia de algum lugar Titão Passos Ah perseguido por uma soldadesca tivera de se escapar para a Bahia pela proteção do Coronel Horácio de Matos Só mesmo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 83 João Goanhá era quem ainda estava Comandava saldo de uns homens os poucos Mas coragem e munição não faltavam E os Judas perguntei com triste raciocínio por que era que os soldados não deixavam a gente em paz mas com aqueles não terçavam Se diz que eles têm uma proteção preta João Goanhá me esclareceu O Hermógenes fez o pauto É o demônio rabudo quem pune por ele Nisso todos acreditavam Pela fraqueza do meu medo e pela força do meu ódio acho que eu fui o primeiro que cri Ainda disse João Goanhá que estávamos em brevidade Porque ele sabia que os Judas reforçados tinham resolvido passar o Rio em dois lugares e marcharem em cima de Medeiro Vaz para acabar com ele de uma vez no país de lá Onde era que o perigo Medeiro Vaz precisava de nós Mas não pudemos Mal a gente se tocou para a Cachoeira do Salto e esbarramos com tropa de soldados tenente Plínio Foi fogo Fugimos Fogo no Jacaré Grande tenente Rosalvo Fogo no Jatobá Torto sargento Leandro Volteamos Sobre aí me senti pior de sorte que uma pulga entre dois dedos No formato da forma eu não era o valente nem mencionado medroso Eu era um homem restante trivial A verdade que diga eu bem defronte de mim se portava mesmo segurava uma vara João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 84 deferrão considerei nele certo propósito de despique gandaiado Apartei minhas vistas Requeri dei passo Se sendo ordens Chefe eu gostava era de ir Medeiro Vaz limpou a goela A meio eu estava me lançando mas mais negaceando prosápia duvidoso dele consentir pelo bom atirador que eu era o melhor e mor necessitavam de mim haviam de querer me mandar escoteiro dizedor de mensagem E aí se deu o que se deu o isto é Medeiro Vaz concordou Mas carece de levar um companheiro ele propôs Aí em tanto eu não devia de me calar deixar alheia a escolha do segundo que não me competia Ah ânsia que eu não queria o que de certo queria e que podia se surtir de repente E a vontade de fim que me ora vinha ranger na boca me levou num avanço Sendo suas ordens Chefe o Sesfredo comigo vai falei Nem olhei Diadorim Medeiro Vaz aprouve Me encarou demais e despachou em duríssimo Vai então e no caminho não morre A ser que Medeiro Vaz por esse tempo já acusava doença a quase acabada no peso do fôlego e no desmancho dos traços Estava amarelo almecegado se curvava sem querer e diziam que no verter água ele gemia Ah mas outro igual eu não conheci Quero ver o homem deste homem Medeiro Vaz o Rei dos Gerais João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 85 Por que era que eu estava procedendo àtoa assim Senhor sei O senhor vá pondo seu perceber A gente vive repetido o repetido e escorregável num mim minuto já está empurrado noutro galho Acertasse eu com o que depois sabendo fiquei para de lá de tantos assombros Um está sempre no escuro só no último derradeiro é que clareiam a sala Digo o real não está na saída nem na chegada ele se dispõe para a gente é no meio da travessia Mesmo fui muito tolo Hoje em dia não me queixo de nenhuma coisa Não tiro sombras dos buracos Mas também não há jeito de me baixar em remorso Sim que só duma coisa E dessa mesma o que tenho é medo Enquanto se tem medo eu acho até que o bom remorso não se pode criar não é possível Minha vida não deixa benfeitorias Mas me confessei com sete padres acertei sete absolvições No meio da noite eu acordo e pelejo para rezar Posso Constante eu puder meu suor não esfria O senhor me releve tanto dizer Mire veja o que a gente é mal dali a um átimo eu selando meu cavalo e arrumando meus dobros e já me muito entristecia Diadorim me espreitava de longe afetando a espécie duma vagueza No me despedir tive precisão de dizer a ele baixinho Por teu pai vou amigo manoohmano Vingar Joca Ramiro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 86 A fraqueza minha adulatória Mas ele respondeu Viagem boa Riobaldo E boasorte Despedir dá febre Galopando junto com Sesfredo larguei aquele lugar do Buriti das Três Fileiras Pesares que me desenrolavam E então eu decifrei meu arranque de ter querido vir com o Sesfredo Que ele se sabia tinha deixado fazia muitos anos em terras do Jequitinhonha uma moça que apaixonava e achava que não tinha nascido para aquilo de ser sempre jagunço não gostava Como é então que um se repinta e se sarrafa Tudo sobrevém Acho acho é do influimento comum e do tempo de todos Tanto um prazo de travessia marcada sazão como os meses de seca e os de chuva Será Medida de muitos outros igualasse com a minha esses também não sentindo e não pensando Se não por que era que eram aqueles aprontados versos que a gente cantava tanto todaavida indo em bando por estradas jornadas à alegria fingida no coração Olererê baiana eu ia e não vou mais eu faço que vou lá dentro oh baiana e volto do meio pra trás João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 87 João Goanhá por valentão e verdadeiro nem carecia de estadear orgulho Pessoa muito leal e briosa Ele me disse Agora da gente não sei o que vai ser Para guerra grande eu acho que só Joca Ramiro é que era capaz Ah mas João Goanhá também tinha suas cartas altas Homem de grito grosso E mesmo ignorante analfabeto de repente ele tirava sei não de onde terríveis mindinhas idéias mortes diversas Assim a gente experimentava cá e cá falseando fuga Os camposgerais ali também tem Tombadores Arre os tremedais já viu algum O chão deles consiste duro enxuto normal que engana quem não sabe o resto vem pisa vai avançando tropa com cavalos cavalama Seja sem espera quando já estão meio no meio aquilo sucrepa pega a se abalar ronca treme escapulindo feito gema de ovo na frigideira Ei Porque debaixo da crosta seca rebole ocultado um semifundo de brejão engolidor Pois em roda dali João Goanhá dispôs que a gente se amoitasse três golpes de homens tocaiando Ao de manhã primeiro passaram os do sargento Leandro esses eram os menos e um guia pagavam por conhecer o caminho firme Mas fomos lá às pressas espalhamos de lugar os ramos verdes de árvore que eles tinham botado para a certa informação No depois vinham os do tenente Tenente tenente tu quer Seguidos por ali entraram ah Dos nossos uns acolá deram tiros por disfarçação Iscas Cavalaria dos praças se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 88 avexou Ave e pronto de repente foi a casca de terra sacudia se rachou em cruzes estalando em muitos metros balofou Os cavalos entornados era como despejar prateleiras cheias e os soldados aiando gritos se abraçavam com os animais caintes ou com o ar uns a esmo desfechavam mosquetão Mas encalcados se afundando pra não mais A gente se queria mirava ainda acertava neles Coisas que vi vi vi oi Eu não atirei Não tive braçagem Talvez tive pena Tanto por tanto daí se encachorraram mais em nós por beber vinganças De campos e matas vargens e grotas em cada ponto para trás dos lados e adiante da gente ei eram só soldados montão se gerando FuradodoMeio Serra do DeusMe Livre Passagem da Limeira Chapada do Covão Solón Nélson morreu Arduininho morreu Morreram o Figueiró BatataRoxa Dávila Manhoso o Campelo o Clange Deovídio Pescoço Preto Toquim o Sucivre Elisiano Pedro Bernardo acho que foram esses todos Chapada do Sumidouro Córrego do Poldro Mortos mais uns seis Corrijo com outros que pegos presos se disse que foram acabados Doideamos A Bahia estava cercada nas portas Achavam de tomar regalia de desforra na gente até qualquer molambo de sujeito paisano morador Ah às vezes perdiam ligeiro essa graça Gerais da Pedra Lá o Eleutério se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 89 apartou da gente umas cem braças e foi a pé bateu em porta duma cafua por esclarecer O capiau surgiu ensinou alguma coisa errada Eleutério agradeceu deu as costas veio andando uns passos O capiau então chamou Eleutério virou para trás para ouvir o que havia e levou na cara e nos peitos o cheio duma carga de chumbo fino Cegou rodou entrupicado arreganhava os braços todo se sarapintando das manchas vermelhas que cresciam O cabelo dele aumentou em pé E a soldadesca atirava de emboscados no mato do córrego e na beira do cerrado da outra banda O capiau se encobriu detrás do forno de assar biscoito de lá fazia pontaria com a espingarda e balas nossas levantavam terra ao redor dali feito um ciscado de cachorro grande Dentro da cafua também restavam outros soldados que deram contas a Deus Ataliba com o facão pregou o capiau na taipa da cafua ele morreu mansinho parecia um santo Ficou lá espetado Nós eh bom Conseguimos aragem Até em um ponto de a salvo conversarmos Serra Escura Nem munição nem decomer não sobravam De forma que a gente carecia de se separar cada um por seu risco como pudesse caçar escape Se esparramavam os goanhás De si por si quem vivesse viesse para cá do Rio para reunião na juntura da Vereda Saco dos Bois com o Ribeirão Santa Fé Ou ir João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 90 de direto para onde estivesse Medeiro Vaz Ou caso o inimigo rondasse perto demais então no BuritidaVida São Simão do Bá ou mais em riba ali onde o Ribeirão Gado Bravo é vadeável Ao que João Goanhá mandou A pressa era pressa O ar todo do campo cheirava a pólvora e a soldados Diante de mim nunca terminava de atar as correias do gibão um Cunha Branco sarado cabra velho guerreiro ele boiava língua em boca aberta E medo meu medi muito maior Se despedimos Escorregando sem rumo eu fui vim o Sesfredo comigo também viemos Com a graça de Deus saímos fora da roda do perigo Chegamos no Córrego Cansanção não longe do Araçuaí Por durante um tempo carecíamos de ter algum serviço reconhecido no viver tudo cabe Nossas armas com parte das roupas campeamos um seguro lugar deixamos escondidas Aí a gente se ajustou no meio do pessoal daquele doutor que estava na mineração que eu já disse e o senhor sabe Por que não ficamos lá Sei e não sei Sesfredo esperava de mim toda decisão Algum remorso de não se cumprir de ir de desertados Não vê que não desafasto Gente sendo dois garante mais para se engambelar etcétera de traição não sopra escrúpulos como nem de crime nenhum não agasta igual lobisomem verte a pele Só se companheiros sobrantes a gente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 91 amiúda no ajuizar o desonroso assunto isto sim rança o descrédito de se ser tornadiço covarde Mas eu podia rever proveito caçar de voltar dali para a casagrande de Selorico Mendes exigir meu estado devido na Fazenda São Gregório Temeriam Assim e silva como em outro tempo adiante podia flauteado comparecer no Buritis Altos por conta de Otacília continuação de amor Quis não Suasse saudade de Diadorim A ponto no dizer menos Ou nem não tinha Só como o céu e as nuvens lá atrás de uma andorinha que passou Talvez eu acho também que foi juvenescendo em mim uma inclinação de abelhudice assaz eu queria me estar misturado lá com os medeirovazes ver o fim de tudo Em mês de agosto buriti vinhoso Araçuaí não eram os meus campos Viver é um descuido prosseguido Aí as noites cambando para o entrar das chuvas os dias mal Desengoli Tempo de ir Vamos eu disse para Sesfredo Vamos demais o Sesfredo me respondeu Ah eh e não altolá comigo que assim falseio o mesmo é Pois ia me esquecendo o Vupes Não digo o que digo se o do Vupes não orço que teve tãomente Esse um era estranja alemão o senhor sabe clareado constituído forte com os olhos azuis esporte de alto leandrado rosalgar indivíduo mesmo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 92 Pessoa boa Homem sistemático salutar na alegria séria Hê hê com toda a confusão de política e brigas por aí e ele não somava com nenhuma coisa viajava sensato e ia desempenhando seu negócio dele no sertão que era o de trazer e vender de tudo para os fazendeiros arados enxadas debulhadora facão de aço ferramentas rógers e roscofes latas de formicida arsênico e creolinas e até papavento desses moinhosdevento de sungar água com torre ele tomava empreitada de armar Conservava em si um estatuto tão diverso de proceder que todos a ele respeitavam Dizse que vive até hoje mas abastado na capital e que é dono de venda grande loja conforme prosperou Ah o senhor conheceu ele Õ titiquinha de mundo E como é mesmo que o senhor fraseia Wusp É Seo Emílio Wuspes Wupsis Vupses Pois esse Vupes apareceu lá logo vai me reconheceu como me conhecia do Curralinho Me reconheceu devagar exatão Sujeito escovado Me olhou me disse Folgo Senhor estar bom Folgo E eu gostei daquela saudação Sempre gosto de tornar a encontrar em paz qualquer velha conhecença consoante a pessoa se ri a gente se acha de voltar aos passados mas parece que escolhidas só as peripécias avaliáveis as que agradáveis foram Alemão Vupes ali e eu recordei lembrança daquelas mocinhas a Miosótis e a Rosauarda as que no Curralinho João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 93 eu pensava que tinham sido as minhas namoradas Seo Vupes eu também folgo Senhor também estar bom Folgo que eu respondi civilizadamente Ele pitava era charutos Mais me disse Sei senhor homem valente muito valente Eu precisar de homem valente assim viajar meu quinze dias sertão agora aqui muito atrapalhado gente braba tudo Destampei ri que ri de ouvir Mas o mais garboso fiquei prezei a minha profissão Ah o bom costume de jagunço Assim que é vida assoprada vivida por cima Um jagunceando nem vê nem repara na pobreza de todos cisco O senhor sabe tanta pobreza geral gente no duro ou no desânimo Pobre tem de ter um triste amor à honestidade São árvores que pegam poeira A gente às vezes ia por aí os cem duzentos companheiros a cavalo tinindo e musicando de tão armadose vai um sujeito magro amarelado saía da algum canto e vinha espremendo seu medo farraposo com um vintém azinhavrado no conco da mão o homem queria comprar um punhado de mantimento aquele era casado pai de família faminta Coisas sem continuação Tanto pensei perguntei Para que banda o senhor tora E o Vupes respondeu Eu direto cidade São Francisco vou forte Para falar nem com uma pontinha de dedo ele não bulia gesticulado Então era João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 94 mesmo meu rumo aceitei o destinar Daí falei com o Sesfredo que quis também o Sesfredo não presumia nada ele naquilo não tinha próprio destaque Mas os caminhos não acabam Tal por essas demarcas de GrãoMogol Brejo das Almas e Brasília sem confrontos de perturbação trouxemos o seu Vupes Com as graças dele aprendi muito O Vupes vivia o regulado miúdo e para tudo tinha sanguefrio O senhor imagine parecia que não se mealhava nada mas ele pegava uma coisa aqui outra coisinha ali outra acolá uma moranga uns ovos grelos de bambu umas ervas e depois quando se topava com uma casa mais melhorzinha ele encomendava pago um jantar ou almoço pratos diversos farto real ele mesmo ensinava o guisar tudo virava iguarias Assim no sertão e ele formava conforto o que queria Saibase Deixamos o homem no final e eu cuidei bem dele que tinha demonstrado a confiança minha Demos no Rio passamos E aí a saudade de Diadorim voltou em mim depois de tanto tempo me custando seiscentos já andava acoroçoado de afogo de chegar chegar e perto estar Cavalo que ama o dono até respira do mesmo jeito Bela é a lua lualã que torna a se sair das nuvens mais redondada recortada Viemos pelo Urucuia Meu rio de amor é o Urucuia O João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 95 chapadão onde tanto boi berra Daí os gerais com o capim verdeado Ali é que vaqueiro brama com suas boiadas espatifadas Ar que dá açoite de movimento o tempodaságuas de chegada trovoada trovoando Vaqueiros todos vaquejando O gado esbravaçava A mal que as notícias referiam demais a cambada dos Judas aumentável a corja A tantos quantos eu pondo meu perguntar Os muitos Uma monarquia deles os vaqueiros respondendo Mas Medeiro Vaz não se achava os nossos deles ninguém não sabia bem Tocamos fim que o mundo tivesse Só deerrávamos Assim como o senhor que quer tirar é instantâneo das coisas aproximar a natureza Estou entendido Esbarramos num varjeado esconso lugar por entre o daGarapa e o daJibóia ali tem três lagoas numa com quatro cores se diz que a água é venenosa E isso de que me serve Águas águas O senhor verá um ribeirão que verte no Canabrava o que verte no Taboca que verte no Rio Preto o primeiro Preto do Rio Paracatu pois a daquele é sal só vige salgada grossa azula muito quem conhece fala que é a do mar descritamente nem boi não gosta não traga eh não E tanta explicação dou porque muito ribeirão e vereda nos contornados por aí redobra nome Quando um ainda não aprendeu se atrapalha faz raiva Só Preto já molhei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 96 mão nuns dez Verde uns dez Do Pacari uns cinco Da Ponte muitos Do Boi ou da Vaca também E uns sete por nome de Formoso São Pedro Tamboril Santa Catarina uma porção O sertão é do tamanho do mundo Agora por aqui o senhor já viu Rio é só o São Francisco o Rio do Chico O resto pequeno é vereda E algum ribeirão E agora me lembro no Ribeirão EntreRibeiros o senhor vá ver a fazenda velha onde tinha um cômodo quase do tamanho da casa por debaixo dela socavado no antro do chão lá judiaram com escravos e pessoas até aos pouquinhos matar Mas para não mentir lhe digo eu nisso não acredito Reconditório de se ocultar ouro tesouro e armas munição ou dinheiro falso moedado isto sim O senhor deve de ficar prevenido esse povo diverte por demais com a baboseira dum traque de jumento formam tufão de ventania Por gosto de rebuliço Querem porquequerem inventar maravilhas glorionhas depois eles mesmos acabam crendo e temendo Parece que todo o mundo carece disso Eu acho que Assim olhe tem um marimbu um brejo matador no Riacho Cizlá se afundou uma boiada quase inteira que apodreceu em noites depois deu para se ver deitado a fora se deslambendo em vento do cafofo e perseguindo tudo um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 97 milhão de lavareda azul de jãdelãfo fogofá Gente que não sabia avistaram e endoideceram de correr fuga Pois essa estória foi espalhada por toda a parte viajou mais se duvidar do que eu ou o senhor falavam que era sinal de castigo que o mundo ia se acabar naquele ponto causa de em épocas terem castrado um padre ali perto umas vinte léguas por via do padre não ter consentido de casar um filho com sua própria mãe A que até cantigas rimaram do FogoAzuldoFimdoMundo Hê hê Agora a forca eu vi forca moderna esquadriada arvorada bem erguida no elevado em madeira de boa lei parda sucupira Ela foi num morrote depois do São Simão do Bá perto da banda da mãodireita do Pripitinga A estúrdia forca de enforcar construída aprovada ali particularmente porque não tinham recurso de cadeia e pajear criminoso por viagens era dificultoso tirava as pessoas de seus serviços Aí então usavam Às vezes da redondeza vinham até trazendo o condenado a cavalo para a forca pública Só que um pobre veio morar próximo quase debaixo dela cobrava sua esmola em cada útil caso dando seguida cavava a cova e enterrava o corpo com cruz No mais nada Semelhante não foi quando um homem Rudugério de Freitas dos Freitas ruivos da ÁguaAlimpada mandou obrigado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 98 um filho dele ir matar outro buscar para matarem esse outro que roubou sacrário de ouro da igreja da Abadia Aí então em vez de cumprir o estrito o irmão combinou com o irmão os dois vieram e mataram mesmo foi o velho pai deles distribuído de foiçadas Mas primeiro enfeitaram as foices urdindo com cordões de embira e várias flores E enqueriram o cadáver paterno em riba da casa casinha boa de telhas a melhor naquele trecho Daí reuniram o gado que iam levando para distante vender Mas foram logo pegos A pegar a gente ajudou Assim prisioneiros nossos Demos julgamento Ao que fosse Medeiro Vaz enviava imediato os dois para tão razoável forca Mas porém o chefe nosso naquele tempo já era o senhor saiba Zé Bebelo Com Zé Bebelo oi o rumo das coisas nascia inconstante diferente conforme cada vez A papo Coah Por que foi que vocês enfeitaram premeditado as foices ele interrogou Os dois irmãos responderam que tinham executado aquilo em padroeiragem à Virgem para a Nossa Senhora em adiantado remitir o pecado que iam obrar e obraram dito e feito Tudo que Zé Bebelo se entesou sério em pufo empolo mas sem rugas em testa eu prestes vi que ele estava se rindo por de dentro Tal tal disse Santíssima Virgem E o pessoal todo tirou os João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 99 chapéus em alto respeito Pois se ela perdoa ou não eu não sei Mas eu perdôo em nome dela a Puríssima Nossa Mãe Zé Bebelo decretou O pai não queria matar Pois então morreu dá na mesma Absolvo Tenho a honra de resumir circunstância desta decisão sem admitir apelo nem revogo legal e lealdado conformemente Aí mais Zé Bebelo disse como apreciava Perdoar é sempre o justo e certo pirlimpim pimpão Mas como os dois irmãos careciam de algum castigo ele requisitou para o nosso bando aquela gorda boiada a qual pronto revendemos embolsamos E desse caso derivaram também uma boa cantiga violeira Mas deponho que Zé Bebelo somente determinou assim naquela ocasião pelo exemplo pela decência Normal quando a gente encontrava alguma boiada tangida ele cobrava só imposto de uma ou umas duas reses para o nosso sustento nos dias Autorizava que era preciso se respeitar o trabalho dos outros e entusiasmar o afinco e a ordem no meio do triste sertão Zé Bebelo ah Se o senhor não conheceu esse homem deixou de certificar que qualidade de cabeça de gente a natureza dá raro de vez em quando Aquele queria saber tudo dispor de tudo poder tudo tudo alterar Não esbarrava quieto Seguro já nasceu assim zureta arvoado criatura de confusão Trepava de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 100 ser o mais honesto de todos ou o mais danado no tremeluz conforme as quantas Soava no que falava artes que falava diferente na autoridade mas com uma autoridade muito veloz Desarmado uma vez caminhou para o Leôncio Du que tinha afastado todo o mundo e meneava um facãozão Como gritou Você quer vermelho Te racho fré Ao de que o Leôncio Du decidiu deixou o facão cair e se entregou Senhor ouve e sabe Zé Bebelo era inteligente e valente Um homem consegue intrujar de tudo só de ser inteligente e valente é que muito não pode E Zé Bebelo pegava no ar as pessoas Chegou um brabo cabra da Zagaia recomendado Tua sombra me espinha juazeiro Zé Bebelo a faro saudou E mandou amarrar o sujeito sentar nele uma surra de peia Atual o cabra confessou que tinha querido vir drede para trair em empreita encobertada Zé Bebelo apontou nos cachos dele a máuser estampido que espatifa as miolagens foram se grudar longe e perto A gente pegou cantando a ModadoBoi No regular Zé Bebelo pescava caçava dançava as danças exortava a gente indagava de cada coisa laçava rês ou topava à vara entendia dos cavalos tocava violão assoviava musical só não praticava de buzo nem baralho declarando ter receios por atreito demais a vício e riscos de jogo Sem menos se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 101 entusiasmava com qualmequer o que houvesse choveu louvava a chuva trapo de minuto depois prezava o sol Gostava com despropósito de dar conselhos Considerava o progresso de todos como se mais esse todo Brasil territórios e falava horas horas Vim de vez disse quando retornou de Goiás O passado para ele era mesmo passado não vogava E de si parte de fraco não dava nenhão nunca Certo dia se achando trotando por um caminho completo novo exclamou Ei que as serras estas às vezes até mudam muito de lugar sério E era E era mas que ele estava perdido deerrado de rota há há Ah mas com ele até o feio da guerra podia alguma alegria tecia seu divertimento Acabando um combate saía esgalopado revólver ainda em mão perseguir quem achasse só aos brados Viva a lei Viva a lei e era o pipocopaco Ou Paz Paz gritava também e bala se entregaram mais dois Viva a lei Viva a lei Hádeo que quilate que lei alguém soubesse Tanto aquilo sucinto a fama correu Doulhe qual que uma vez ele corria a cavalo por exercício e um veredeiro que isto viu se assustou pulou de joelhos na estrada requerendo Não faz vivalei em mim não môrdeDeus seu Zebebel por perdão E Zé Bebelo jogou para o pobre uma cédula de dinheiro gritou Amonta aqui irmão na garupa trouxe o outro para com a gente jantar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 102 Esse era ele Esse era um homem Para Zé Bebelo melhor minha recordação está sempre quente pronta Amigo foi uma das pessoas nesta vida que eu mais prezei e apreciei Pois porém ao fim retomo emendo o que vinha contando A ser que de campinas a campos por morros areiões e varjas o Sesfredo e eu chegamos no Marcavão Antes de lá inchou o tempo para chover Chuva de desenraizar todo pau tromba chuvão que come terra a gente vendo Quem mede e pesa esses demais dágua Rios foram se enchendo Apeamos no Marcavão beira do doSono Medeiro Vaz morreu naquele país fechado Nós chegamos em tempo Ao quando encontramos o bando foi ali Medeiro Vaz já estava mal talvez por isso a alegria comum não pôde se dizer nem Diadorim me abraçou nem demonstrou um salves por minha volta Fiquei sincero A tristeza e a espera má tomavam conta da gente O mais é o pior é que tem inimigo próximo tocaiando Alaripe me disse Muito chovido de noiteas árvores esponjadas Mesmo dava um frio vento com umidades Para agasalhar Medeiro Vaz tinham levantado um boi o senhor sabe um couro só espetado numa estaca por resguardar a pessoa do rumo donde vem o vento o bafebafe Acampávamos debaixo de grandes árvores O barulhim do rio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 103 era de bicho em bicheira Medeiro Vaz jazente numa manta de pele de bode branco aberto na roupa o peito cheio de cabelos grisalhados A barriga dele tinha inflamado muito mas não era de hidropisia Era de dores Quando vislumbrou de mim aí armou no se aprumar pelejando para me ver Os olhos o alvor como miolo de formigueiro Mas se abriu arriou os braços e mediu o chão com suas costas Está no bilimbilim eu pensei Ah a cara arre de amarela o amarelamento de palha Assim desse jeito ele levou o dia quase a termo A tarde foi escurecendo Ao menos Diadorim me chamou adeparte ele tramava as lágrimas Amizade Riobaldo que eu imaginei em você esse prazo inteiro e apertou minha mão Avesso fiquei meio sem jeito Aí chamaram Acode que o chefe está no fatal Medeiro Vaz arquejando cumprindo tudo E o queixo dele não parava de mexer grandes momentos Demorava E deu a panca troztroz forte como de propósito Uma chuva de arrobas de peso Era quase sonoite Reunidos em volta ajoelhados a gente segurava uns couros abertos para proteger a morte dele Medeiro Vaz o rei dos gerais como era que um daquele podia se acabar A água caía às despejadas escorria nas caras da gente em fios pingos Debruçando por debaixo dos couros podiase ver o fim que a alma obtém do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 104 corpo E Medeiro Vaz se governando mesmo no remar a agonia travou com esforço o ronco que puxava gosma de sua goela e gaguejou Quem vai ficar em meu lugar Quem capitaneia Com a estrampeação da chuva os poucos ouviram Ele só falava por pedacinhos de palavras Mas eu vi que o olhar dele esbarrava em mim e me escolhia Ele averme lhava os olhos Mas com o cirro e o vidrento Coração me apertou estreito Eu não queria ser chefe Quem capitaneia Vi meu nome no lume dele E ele quis levantar a mão para me apontar As veias da mão Com que luz eu via Mas não pôde A morte pôde mais Rolou os olhos que ralava no sarrido Foi dormir em rede branca Deu a venta Era seu dia de alta tarefa Quando estiou a chuva procuramos o que acender Só se trouxe uma vela de carnaúba o toco e um brandão de tocha Eu tinha passado por um susto Agora a meio a vertigem me dava desnorteado na vontade de falar aqueles versos como quem cantasse um coreto Meu boi preto mocangueiro árvore para te apresilhar Palmeira que não debruça João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 105 buriti sem entortar Deviam de tocar os sinos de todas as igrejas Cobrimos o corpo com palmas de buriti novo cortadas molhadas Fizemos quarto todos até ao quebrar da barra Os sapos gritavam latejado O sapocachorro arranhou seu rouco Alguma anta assoviava assovio mais fino que o relinchorincho dum poldrinho De aurora cavacamos uma funda cova A terra dos gerais é boa Tomouse café e Diadorim me disse firme Riobaldo tu comanda Medeiro Vaz te sinalou com as derradeiras ordens Todos estavam lá os brabos me olhantes tantas meninasdosolhos escuras repulavam às duras grão e grão era como levando eu de milhares uma carga de chumbo grosso ou chuvasdepedra Aprovavam Me queriam governando Assim estremeci por interno me gelei de não poder palavra Eu não queria não queria Aquilo revi muito por cima de minhas capacidades A desgraça de João Goanhá não ter vindo Rente mente que eu não desejava arreglórias mão de mando Engoli cuspes Avante por fim como que respondi às gagas isto disse Não posso Não sirvo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 106 Mano velho Riobaldo tu pode Tive testa Pensei um nome feio O que achassem achassem mas ninguém ia manusear meu ser para brincadeiras Mano velho Riobaldo tu crê que não merece mas nós sabemos a tua valia Diadorim retornou Assim instava mão erguida Onde é que os outros rodaaroda denotavam assentimento Tatarana Tatarana uns pronunciaram sendo Tatarana um apelido meu que eu tinha Temi Terçava o grave Assim Diadorim dispunha do direito de fazer aquilo comigo Eu que sou eu bati o pé Não posso não quero Digo definitivo Sou de ser e executar não me ajusto de produzir ordens Tudo parava por átimo Todos esperando com suspensão Senhor conheceu por dedentro um bando empé de jagunços quando um perigo poja sabe os quantos lobos Mas eh não o pior é que é a calma uma sisudez das escuras Não que matem uns aos outros ver mas a pique de coisinha o senhor pode entornar seu respeito sobrar desmoralizado para sempre neste vale de lágrimas Tudo rosna Entremeio Diadorim se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 107 maisfez avançando passo Deixou de me medir vigiou o ar de todos Aí ele era mestre nisso de astuto se certificar só com um rabeio ligeiro de mirada tinha gateza para contador de gado E muito disse A pois então eu tomo a chefia O melhor não sou oxente mas porfio no que quero e prezo conforme vocês todos também A regra de Medeiro Vaz tem de prosseguir com tenção Mas se algum achar que não acha o justo a gente isto decide a ponta darmas Hê mandacaru Oi Diadorim belo feroz Ah ele conhecia os caminhares Em jagunço com jagunço o poder seco da pessoa é que vale Muitos ali haviam de querer morrer por ser chefes mas não tinham conseguido nem tempo de se firmar quente nas idéias E os outros estimaram e louvaram Reinaldo O Reinaldo foi o aprovo deles Ah Num nu nisto nesse repente desinterno de mim um nego forte se saltou Não Diadorim não Nunca que eu podia consentir Nanje pelo tanto que eu dele era louco amigo e concebia por ele a vexável afeição que me estragava feito um mau amor oculto por mesmo isso nimpes nada era que eu não podia aceitar aquela transformação negócio de para sempre João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 108 receber mando dele doendo de Diadorim ser meu chefe nhem hem Nulo que eu ia estuchar Não hem clamei que como um sino desbadala Discordo Todos me olhassem Não vi não tremi Visivo só vi Diadorim resumo do aspecto e esboço dele para movimentos as mãos e os olhos de reguarda Como em relance corri cálculo de quantos tiros eu tinha para à queimabucha dar e uma balazinha primeira botada na agulha da automática ah eu estava com milho no surrão De devagar os companheiros os outros não se buliram tanto esperavam decerto que saldavam antipatia de mim repugnados por eu estar seguidamente atrapalhando as decisões achassem que eu agora não tinha mais direito de parecer pois a chefia própria eu enjeitara Quem sabe será se praziam no poder ver nós dois Diadorim comigo que antes como irmãos até ali a gente se estraçalhar nas facas Torci vontade de matar alguém para pacificar minha aflição alguém algum Diadorim não digo Decerto isso em mim eles perceberam Os calados Só o Sesfredo inesperado assim disse um também Discordo Por me estimar ele me secundava E o Alaripe séria pessoa Tem de que Deixa o Riobaldo razoar Endireitei os chifres Chapei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 109 Vejo Marcelino Pampa é quem tem de comandar Mediante que é o mais velho e demais de mais velho valente e consabido de ajuizado Cara de Marcelino Pampa ficou enorme Do que constei dos outros concordantes estabeleci que eu tinha acertado solerte dei na barra Mas Diadorim De olhos os olhos agarrados nós dois Asneira eu naquela hora supria suscitar alto meu maior bemquerer por Diadorim mesmo mesmo assim mesmo eu arcava em cru com o desafio desde que ele brabasse desde que ele puxasse Tempo instante que empurrou morros para passar Afinal aí Diadorim abaixou as vistas Pude mais do que ele Se riu depois de mim Sempre sendo que falou firme Com gosto Melhor do que Marcelino Pampa não tem nenhum Não ambicionei poderes Falou como corajoso E Tresdito que é a vez de se estar contornados unidos sem porfiar o Alaripe inteirou Amém todos voz a voz aprovavam Marcelino Pampa então principiou falou assim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 110 Aceito por precisão nossa o que obrigação minha é Até enquanto não vem algum dos certos de realce maior João Goanhá Alípio Mota Titão Passos A tanto careço do bom conselho de todos que tiverem segura fiança Assentes que vamos Sobre mais disse sem importância sem noção pois Marcelino Pampa possuía talentos minguados Somente pensei que ele estava pondo um peso no lombo por sacrifício Ao que em melhores tempos aprazia bem capitanear mas agora aquela ocasião a gente por baixos e essas misérias qualquer um não havia de desgostar de responsabilidade à aí observei como Marcelino Pampa desde o instante expunha outro ar de ser a sisuda extravagância soberbo satisfeito Ser chefe por fora um pouquinho amarga mas por dentro é rosinhas flores Meu era um alívio Mesmo não duvidei de meu menos valer alguém lá tem a feição do rosto igualzinha à minha Eh de primeiro meu coração sabia bater copiando tudo Hoje eu desconheço o arruído rumor das pancadas dele Diadorim veio para perto de mim falou coisas de admiração muito de afeto leal Ouvi ouvi aquilo copos a fora mel de melhor Eu precisava Tem horas em que penso que a gente carecia de repente de acordar de alguma espécie de encanto As pessoas e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 111 as coisas não são de verdade E de que é que a miúde a gente adverte incertas saudades Será que nós todos as nossas almas já vendemos Bobéia minha E como é que havia de ser possível Hem Olhe conto ao senhor Se diz que no bando de Antônio Dó tinha um grado jagunço bem remediado de posses Davidão era o nome dele Vai um dia coisas dessas que às vezes acontecem esse Davidão pegou a ter medo de morrer Safado pensou propôs este trato a um outro pobre dos mais pobres chamado Faustino o Davidão dava a ele dez contos de réis mas em lei de caborje invisível no sobrenatural chegasse primeiro o destino do Davidão morrer em combate então era o Faustino quem morria em vez dele E o Faustino aceitou recebeu fechou Parece que com efeito no poder de feitiço do contrato ele muito não acreditava Então pelo seguinte deram um grande fogo contra os soldados do Major Alcides do Amaral sitiado forte em São Francisco Combate quando findou todos os dois estavam vivos o Davidão e o Faustino A de ver Para nenhum deles não tinha chegado a horaedia Ah e assim e assim foram durante os meses escapos alteração nenhuma não havendo nem feridos eles não saíam Que tal o que o senhor acha Pois mire e veja isto João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 112 mesmo narrei a um rapaz de cidade grande muito inteligente vindo com outros num caminhão para pescarem no Rio Sabe o que o moço me disse Que era assunto de valor para se compor uma estória em livro Mas que precisava de um final sustante caprichado O final que ele daí imaginou foi um que um dia o Faustino pegava também a ter medo queria revogar o ajuste Devolvia o dinheiro Mas o Davidão não aceitava não queria por forma nenhuma Do discutir ferveram nisso ferravam numa luta corporal A fino o Faustino se provia na faca investia os dois rolavam no chão embolados Mas no confuso por sua própria mão dele a faca cravava no coração do Faustino que falecia Apreciei demais essa continuação inventada A quanta coisa limpa verdadeira uma pessoa de alta instrução não concebe Aí podem encher este mundo de outros movimentos sem os erros e volteios da vida em sua lerdeza de sarrafaçar A vida disfarça Por exemplo Disse isso ao rapaz pescador a quem sincero louvei E ele me indagou qual tinha sido o fim na verdade de realidade de Davidão e Faustino O fim Quem sei Soube so mente só que o Davidão resolveu deixar a jagunçagem deu baixa do bando e com certas promessas de ceder uns alqueires de terra e outras vantagens de mais pagar conseguiu do Faustino João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 113 dar baixa também e viesse morar perto dele sempre Mais deles ignoro No real da vida as coisas acabam com menos formato nem acabam Melhor assim Pelejar por exato dá erro contra a gente Não se queira Viver é muito perigoso A que o que logo vi que Marcelino Pampa por bem de seu dispor não dava altura A tento de se acertar nos primeiros rumos de se mexer ele me chamou mais João Concliz Os Judas estão aqui mesmo de nós a umas quinze léguas e sabem da gente Deveras atacar não atacam com este tempo de todas chuvas e ribeirões cheios Mas vão fechando modo de rodear a gente de menos longe porque a quantidade deles é à farta Re curso que eu acho é dois ou se fugir para o chapadão enquanto tempo mas é perder toda esperança e diminuir da vergonha Ou então forçar tudo e experimentar um caminho por entremeio deles se vai para a outra banda do Rio caçar João Goanhá e os outros companheiros Mais ainda não sei quero toda razoável opinião Assim ele Marcelino Pampa disse Mas se souberem a notícia que Medeiro Vaz morreu hoje mesmo é capaz que sejam de vir em riba de nós foi o que João Concliz achou e estava muito certo Eu não atinava com o que dizer as confusões dessas horas me encostavam O que era na situação que Medeiro Vaz havia de fazer E Joca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 114 Ramiro E Só Candelário Ao esmo esses pensamentos em mim Ai de foi que reconheci como súcia de homens carece de uma completa cabeça Comandante é preciso para aliviar os aflitos para salvar a idéia da gente de perturbações desconformes Não sabia hoje será que sei a regra de nenhum meiotermo Sem ação eu podia gastar ali minha vida inteira debulhando Também logo depois depois de muitos silêncios e poucas palavras Marcelino Pampa resolveu que de tarde nossa conversa ia ter repetição Atontados três Dali fui para perto de Diadorim Riobaldo ele mal disse você está vendo que não temos remédio Aí esbarrou pensou um tempo com uma mão por cima da outra E vocês que foi que determinaram de se fazer me perguntou Respondi Hoje de tarde é que se toma decisão Diadorim Você está mal satisfeito Ele endireitou o corpo Foi falou Sei o meu Cá por mim isso tudo pouco adianta Quente quero poder chegar junto dum dos Judas para terminar Eu sabia que ele falava coisas de pelejar por cumprir Eu tinha mais cansaço mais tristeza Quem sabe se Para ter jeito de chegar perto deles até se não era melhor assim ele desabafou em trago e recolhido num estado de segredo Por seus grandes olhos onde aquilo redondeou cri que armasse João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 115 agarrar o comando por meio de acender o bando todo em revolta Qualquer loucura semelhante era a dele Mas não mais disse Foi você mesmo Riobaldo quem governou tudo hoje Você escolheu Marcelino Pampa você decidiu e fez Era Gostei em cheio de escutar isso soprante Ah porém estaquei na ponta dum pensamento e agudo temi temi Cada hora de cada dia a gente aprende uma qualidade nova de medo Mas depois de janta quando estávamos outra vez reunidos Marcelino Pampa eu e João Concliz não se teve nem o tempo de principiar Pelo que ouvimos um galope o chegar o riscar o desapeio o xaxaxo de alpercatas Sendo assim o Feliciano e o Quipes que traziam um vaqueirinho escoltado Que vieram quase correndo O vaqueirinho não devia de ter mais de uns quinze anos e as feições dele mudavamde mestre pavor Arte que este tal passou às fugas meio arupa Pegamos Aí ele tem grande coisa pra contar e empurraram um pouco o vaqueirinho De medo a gente olhava para ele e de nossos olhos ele se desencostava Afe por fim bebeu gole de ar e soluceou É um homem Só sei É um homem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 116 Te acerta mocinho Aqui você está livre e salvo Aonde é que está indo Marcelino Pampa regrou É briga enorme É um homem Vou indo pra longe para a casa de meu pai Ah é um homem Ele desceu o Rio Paracatu numa balsa de buriti Que foi mais que o homem fez então João Concliz perguntou Deu fogo O homem com mais cinco homens Avançaram do mato deram fogo contra os outros Os outros eram montão mais duns trinta Mas fugiram Largaram três mortos uns feridos Escaramuçados Ei E estavam a cavalo O homem e os cinco dele estão a pé Homem terrível Falou que vai reformar isto tudo Vieram pedir sal e farinha no rancho Emprestei Tinham matado um veadinho campeiro me deram naca de carne Qual é que é o nome dele Fala Como é que os outros dizem Aí e que jeito que semelhança de figura é que ele tem Ele O jeito que é o dele que ele tem Em é mais baixo do que alto não é velho não é moço Homem branco Veio de Goiás O que os outros falam e tratam Deputado Desceu o Rio Paracatu numa balsa de buriti Estávamos em jejum de briga ele mesmo disse Ele e seus cinco deram fogo feito João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 117 feras Gritavam de onça e de uivado Disse vai remexer o mundo Desceu o Rio Paracatu numa balsa de buriti Desce ram Nem cavalo eles não têm É ele Mas é ele Só pode ser aí alguém lembrou E é E então está do nosso lado outro completou Temos de mandar por ele foi a palavra de Marcelino Pampa Onde é que estará Na Pavoã Alguém tem de ir lá É ele É ver a vida quem pensava E é homem danado zuretado Está a favor da gente E ele sabe guerrear E era Repegava a chuva trozante mas mesmo assim o Quipes e Cavalcânti montaram e saíram por ele da Pavoã no rumo De certo não acharam fácil pois até à hora de escurecer não tinham aparecido Mas aquele homem para que o senhor saiba aquele homem era Zé Bebelo E na noite ninguém não dormiu direito em nosso campo De manhã com uma braça de sol ele chegou Dia da abelha branca De chapéu desabado avantes passos veio vindo acompanhado de seus cinco cabras Pelos modos pelas roupas aqueles eram gente do Alto Urucuia Catrumanos dos gerais Pobres mas atravessados de armas e com cheias cartucheiras Marcelino Pampa caminhou ao encontro dele seguinte de nosso comandante nós formávamos Valia ver Essas cerimônias João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 118 Paz e saúde chefe Como passou Como passou mano Os dois grandes se saudavam Aí Zé Bebelo reparou em mim Professor ara viva Sempre a gente tem de se avistar De nomes e caras de pessoas ele em tempo nenhum se esquecia Vi que me prezava cordial não me dando por traidor nem falso Riu redobrado De repente desriu Refez pé para trás Vim de vez ele disse disse desafiando quase Em boa veio chefe É o que todos aqui representamos Marcelino Pampa respondeu A pois Salve Medeiro Vaz Deus com ele amigo Medeiro Vaz ganhou repouso Aqui soube Lux eterna e Zé Bebelo tirou o chapéu e se persignou parando um instante sério num ar de exemplo que a gente até se comoveu Depois disse Vim cobrar pela vida de meu amigo Joca Ramiro que a vida em outro tempo me salvou de morte E liquidar com esses dois bandidos que desonram o nome da Pátria e este sertão nacional Filhos da égua e ele estava com a raiva tanta que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 119 tudo quanto falava ficava sendo verdade Pois então estamos irmãos E esses homens Os urucuianos não abriram boca Mas Zé Bebelo rodeou todos num mando de mão e declarou forte o seguinte Vim por ordem e por desordem Este cá é meus exércitos Prazer que foi ouvir o estabelecido A gente quisesse brigar aquele homem era em frente crescia sozinho nas armas Vez de Marcelino Pampa dizer Pois assim amigo por que é que não combinamos nosso destino Juntos estamos juntos vamos Amizade e combinação aceito mano velho Já ajuntar não Só obro o que muito mando nasci assim Só sei ser chefe Sobre curto Marcelino Pampa cobrou de si suas contas Repuxou testa demorou dentro dum momento Circulou os olhos em nós todos seus companheiros seus brabos Nada não se disse Mas ele entendeu o que cada vontade pedia Depressa deu o consumado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 120 E chefe será Baixamos nossas armas esperamos vossas ordens Com coragem falou como olhou para a gente outra vez Acordo eu disse Diadorim disse João Concliz disse todos falaram Acordo Aí Zé Bebelo não discrepou pim de surpresa parecia até que esperava mesmo aquele voto De todo poder Todo o mundo lealda ainda perguntou ringindo seriedade Confirmamos Então ele quase se aprumou nas pontas dos pés e nos chamou Ao redor de mim meus filhos Tomo posse Podiase rir Ninguém ria A gente em redor dele misturando em meio nosso os cinco homens do Urucuia Adiante Pois estamos É o duro diverso meu povo Mas os assassinos de Joca Ramiro vão pagar com seiscentossetecentos ele definiu apanhando um por um de nós no olhar Assassinos els são os Judas Desse nome agora que é o deles explicou João Concliz Arre vote dois judas podemos romper as aleluias Aleluia Aleluia Carne no prato farinha na cuia ele aprovou deu aquilo feito um viva Nós respondemos E assim era que Zé Bebelo era Como quando trovejou desse trovôo de alto e rasto dos gerais entrementes antes dos gotejos de chuva esquentada o trovão afunda largo pé da gente apalpa a terra Conforme foi João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 121 trovejou de calaaboca e Zé Bebelo tocou um gesto de costas da mão respeitoso disse Isto é comigo Do que se tratava retorno e conto ele o seguinte revelou Tudo eu não tinha com os meus munição para nem meiahora A gente reconheceu mais a coragem dele Isto é qualquer um de nós sabia que aquilo podia ser mentira Mesmo por isso somenos por detrás de tanta papagaiagem um homem carecia de ter a valentia muito grande A cômodo ele começou nesse dia nessa hora não esbarrou mais Achou de ir ver o lugar da cova e as armas e trens que Medeiro Vaz deixava essas determinou que o morto não tendo parentes então para os melhores mais chegados como lembrança ficassem as carabinas e revólveres a automática de rompida e ronco punhal facão o capote o cantil revestido as capangas e alforjes as cartucheiras de trespassar Alguém disse que o cavalo grande murzelomancho devia de ficar sendo dele mesmo Não quis Chamou Marcelino Pampa a ele fez donativo grave Este animal é vosso Marcelino merecido Porque eu ainda estou para ver outro com igual siso e caráter Apertou a mão dele num toques Marcelino Pampa dobrou de ar perturbado Desse fato em diante era capaz de se morrer por Zé Bebelo Mas para si mesmo Zé Bebelo guardou somente o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 122 pelego berbezim de forrar sela e um bentinho milagroso em três baetas confeccionado Daí levou a eito vendo examinando disquirindo Aprendeu os nomes de um em um e em que lugar nascido resumo da vida quantos combates e que gostos tinha qualquer oficio de habilidade Olhou e contou as pencas de munição e as armas Repassou os cavalos prezando os mais bem ferrados e os de agüentada firmeza Ferraduras ferraduras Isto é que é importante vivia dizendo Repartiu os homens em quatro pelotões três drongos de quinze e um de vinte em cada um ao menos um bom rastreador Carecemos de quatro buzinas de caçador para os avisos reclamou Ele mesmo tinha um apito pendurado do pescoço que de muito longe se atendia Para capitanear os drongos escolheu Marcelino Pampa João Concliz e o Fafafa Pessoalmente ficou com o maior o de vinte nesse figuravam os cinco urucuianos e eu Diadorim Sesfredo o Quipes Joaquim Beiju Coscorão Dimas Doido o Acauã MãodeLixa Marruaz o Credo Marimbondo Rasga emBaixo Jiribibe e Jõe Bexiguento dito Alparcatas Só que tidos todos repartidos ainda sobravam nove serviram para esquadrão adeparte tomar conta dos burros cargueiros com petrechos e mantimentos O testa deles foi Alaripe por bom João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 123 que fosse para tudo ser Aos esses mesmo se comediu obrigação Quim Queiroz zelava os volumes de balas o jacaré exercia de cozinheiro todo tempo devia de dizer o de comer que precisava ou faltava Doristino ferrador dos animais tratador deles e os outros ajudavam mas Raimundo Lê que entendia de curas e meizinhas teve cargo de guardar sempre um surrão com remédios O que remédio por ora não havia nenhum Mas Zé Bebelo não se atontava Aí em qualquer parte depois se compra se acha meu filho Mas vai apanhando folha e raiz vai tendo vai enchendo O que eu quero é ver o surrão à mão O acampamento da gente parecia uma cidade Assuntos principais Zé Bebelo fazia lição e deduzia ordens Trabucar duro para dormir bem publicava Gostadamente Morrendo eu depois vocês descansam e ria Mas eu não morro Sujeito muito lógico o senhor sabe cega qualquer nó E engraçado dizer a gente apreciava aquilo Dava uma esperança forte Ao um modo melhor que tudo é se cuidar miudamente trabalhos de paz em tempo de guerra O mais eram traquejos a cavalo para lá e para cá ou esbarrados firmes em formatura então Zé Bebelo perequitava assoviando manobrava as patrulhas vaite voltate Somente Arre temos nenhum tempo gente Capricha Sempre no fim por animar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 124 levantava demais o braço Ainda quero passar a cavalos levando vocês em grandes cidades Aqui o que me faz falta é uma bandeira e tambor e cornetas metais mais Mas heide Ah que vamos em Carinhanha e Montes Claros ali no haja vinho Arranchar no mercado da Diamantina Eli vamos no Paracatu doPríncipe Que boca que o apito apitava A sério ele me chamava para o lado dele e ia mandando vir outros Marcelino Pampa João Concliz Diadorim o urucuiano Pantaleão e o Fafafa vicemandantes Todos tinham de expor o que sabiam daquele gerais território as distâncias em léguas e braças os vaus o grau de fundo dos marimbus e dos poços os mandembes onde se esconder os mais fartos pastos Como Zé Bebelo simplificava os olhos e perguntando e ouvindo avante Às vezes riscava com ponta duma vara no chão tudo representado Ia organizando aquilo na cabeça Estava aprendido Com pouco sabia mais do que nós juntos todos Bem eu conhecia Zé Bebelo de outros currais Bem eu desejasse ter nascido como ele Aí saía por caçar Sucinto que gostava de caçar mas estava era sujeitando a exame o morro discriminando O mato e o campo como dois é um par Veio e foi figurava tomava a opinião da gente Com dez homens naquela altura e outros dez espalhados na vertente se podia impedir a passagem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 125 de duzentos cavaleiros pelo resfriado Com outros alguns dando a retaguarda então Nesfartes só nisso ele pensava quase que Sendo que expedia sobre hora alguém adiante se informar do meximento dos Judas trazer notícias vivas E homem feliz feito Zé Bebelo naquele tempo afirmo ao senhor nunca não vi Diadorim também que dos claros rumos me dividia Vinha a boa vingança alegrias dele se calando Vingar digo ao senhor é lamber frio o que outro cozinhou quente demais O demônio diz mil Esse Vige mas não rege Qual é o caminho certo da gente Nem para a frente nem para trás só para cima Ou parar curto quieto Feito os bichos fazem Os bichos estão só é muito esperando Mas quem é que sabe como Viver O senhor já sabe viver é etcétera Diadorím alegre e eu não Transato no meio da lua Eu peguei aquela escuridão E de manhã os pássaros que bemmeviam todo tal tempo Gostava de Diadorim dum jeito condenado nem pensava mais que gostava mas aí sabia que já gostava em sempre Oi suindara linda cor Dando o dia de repente Zé Bebelo determinou que tudo e tudo fosse pronto para uma remarcha em exercícios como geral Só por festa Ao que os burrinhos comiam amadrinhados em bom pasto Menininhos responsabilidade de cangalhas em vocês carregando a nossa munição Zé Bebelo mandou Mas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 126 montado declarou Meu nome dora por diante vai ser ahoh ah o de Zé Bebelo Vaz Ramiro Como confiança só tenho em vocês companheiros meus amigos zébebelos A vez chegou vamos em guerra Vamos vamos rebentar com aquela cambada de patifes Saímos solertes entes Para isso a lua não era boa Quem põe praça de cavalhadas por desbarranco de estradas lamentas desmancho empapado de chão a chuva ainda enxaguando Convinha esperar regras dágua O Rio Paracatu está cbeio alguém disse Mas Zé Bebelo atalhou O São Francisco é maior Com ele tudo era assim extravagável e não queria conversas de cutilquê Rompemos Melava de chover baixo mimelava Até o derradeiro do momento parecia que íamos atravessar o Paracatu Não atravessamos Tudo aquele homem retinha estudado Daí distribuiu as patrulhas O drongo dele viemos pela beira sempre o Paracatu à mão esquerda Trovejou de perturbar Ele disse Melhor dou surpresa Só uma boa surpresa é que rende Quero é atacar A gente ia para o Buriti Pintado A lá consta de dez léguas doze Na hora cada um deve de ver só um algum judas de cada vez mirar bem e atirar O resto maior é com Deus já vai que falava Para um trabalho que se quer sempre a ferramenta se tem Só com estes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 127 cavalos só à ligeireza de lugar para lugar para a frente e para trás Sei mas o principal dos combates vamos dar é bem a pé Na beira do rio Soninho descansamos Animais de carga a ponta de mulas ficaram botados escondidos numa bocaina na balsa Só três homens tomavam conta Eu é que escolho a hora e o lugar de investir Zé Bebelo disse E num lugar de remanso passamos o rio Soninho no escuro sem ensolvar bala em boca De manhã de três lados demos fogo Aí Zé Bebelo tinha meditado tudo como um ato de desenho Primeiro João Concliz avançou com seus quinze iam fazendo de conta que desprevenidos Quando os outros vieram nós todos já estávamos bem amoitados em pontos bons Duma banda então o Fafafa recruzou seus cavaleiros que estavam muito juntos embolados do modo por que um bando de cavaleiros ou cavalos dá ar de ser muito maior do que no real é Todos cavalos ruços ou baios cor clara também aumenta muito a visão do tamanho deles Ah e gritavam Assaz os judas atiravam mal discordados nadinha nem Aí de poleiro pego prévio abrimos nossa calamidade neles Pessoal do Hermógenes Não se disse guavai Supetume Só bala de aço Dou duelo Ei tibes Só o quanto de se quebrar galho e rasgar roupagem Um judas correu errado do lado onde o Jiribibe estava triste daquele Ouh foi o que ele fez de contrição perfeita Outro levantou o corpo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 128 um pouco demais Tu Tu pensa que tem Deusemeio Zé Bebelo disse depois de derrubar o tal com um tiro de nhambu baixo Outro fugia esperto Tem talento nos pés Os que enviei deixei de numerar por causa de caridade Ai deles Vitória é isto Ou o senhor pensa que é em alegre mal feito numa caçada Descansar Quem disse não foi ouvido Vou lá deixar essa cambada birbar por aí em sossego Bis minha gente Vamos neles Zé Bebelo se frigia Mas o próprio pessoal de João Concliz tinha segurado mão nos cavalos daqueles Toquemos na mão do norte lá a cara do chão é minha mais Não o caminho era da banda contrária Tínhamos de cair em riba do grosso da judadas Por resfriados e atalhos mesmo com aquela cavalhada adestra tocamos tocamos Estrada capaz de quatro lado a lado No OiMãe Lá tem um lajeiro largo onde grandes pedras do fundo do chão vêm à flor Chegamos de sobremão vagarosinho Zé Bebelo recomendava feito rondando quarto de doente Ele cheirava até o ar Sonso parecia um gato Se vendo que no inteiro mesmo de sua cabeça ele antes tudo traçava e guerreava Seja por um exemplo havia uma cava grande o inimigo estava emboscado dos dois lados nos socavões nas paredes Como era que Zé Bebelo já sabia João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 129 Orçando longe volta João Concliz levou seus homens muito adiante de lá na borda do campo de recacha Dado tempo então nosso pelotão rastejou para os altos até chega estávamos por cima dos beiços da cava Ah e aí o Fafafa veio vindo descuidado à mostra com seus cavaleiros surgiam inocentemente feito veados para se matar Mas há então por de riba da cava desfechamos demos urros e o rifleio transcruzando nos inferiores Lá vai obra Hêhê Deu de abelhas de pau oco os das socavas entornaram o sanguefrio demais se assustaram correndo em fuga maior debaixo de tiros xingos às pragas João Condiz pois é o senhor sabe Urubus puderam voar cererém uns urubus declarados Mas daí voltamos desatravessando outra vez o Soninho até onde estava a nossa mulada com munição e o mais Mesmo viemos negaceando de recuar Assim era pena mas carecíamos de flautear desse jeito sustância nossa não dava para se acabar com aqueles judas de uma vez Sempre sempre para enganar no que vissem Zé Bebelo variava de se viajar uma hora quase todos juntos outra hora despedidos espalhados Ainda por suma vantagem disso demos um tiroteio ganho na fazenda São Serafim dos diabos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 130 Rumo a rumo de lá mas muito para baixo é um lugar Tem uma encruzilhada Estradas vão para as Veredas Tortasveredas mortas Eu disse o senhor não ouviu Nem torne a falar nesse nome não É o que ao senhor lhe peço Lugar não onde Lugares assim são simples dão nenhum aviso Agora quando passei por lá minha mãe não tinha rezado por mim naquele momento Assim feito no Paredão Mas a água só é limpa é nas cabeceiras O mal ou o bem estão é em quem faz não é no efeito que dão O senhor ouvindo seguinte me entende O Paredão existe lá Senhor vá senhor veja É um arraial Hoje ninguém mora mais As casas vazias Tem até sobrado Deu capim no telhado da igreja a gente escuta a qualquer entrar o borbolo rasgado dos morcegos Bicho que guarda muitos frios no corpo Boi vem do campo se esfrega naquelas paredes Deitam Malham De noitinha os morcegos pegam a recobrir os bois com lencinhos pretos Rendas pretas defunteiras Quando se dá um tiro os cachorros latem forte tempo Em toda a parte é desse jeito Mas aqueles cachorros hoje são do mato têm de caçar seu decomer Cachorros que já lamberam muito sangue Mesmo o espaço é tão calado que ali passa o sussurro de meia noite às nove horas Escutei um barulho Tocha de carnaúba estava alumiando Não tinha ninguém restado Só vi um papagaio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 131 manso falante que esbagaçava com o bico algum trem Esse vez em quando para dormir ali voltava E eu não revi Diadorim Aquele arraial tem um arruado só é a rua da guerra O demônio na rua no meio do redemunho O senhor não me pergunte nada Coisas dessas não se perguntam bem Sei que estou contando errado pelos altos Desemendo Mas não é por disfarçar não pense De grave na lei do comum disse ao senhor quase tudo Não crio receio O senhor é homem de pensar o dos outros como sendo o seu não é criatura de pôr denúncia E meus feitos já revogaram prescrição dita Tenho meu respeito firmado Agora sou anta empoçada ninguém me caça Da vida pouco me resta só o deogratias e o troco Bobéia Na feira de São João Branco um homem andava falando A pátria não pode nada com a velhice Discordo A pátria é dos velhos mais Era um homem maluco os dedos cheios de anéis velhos sem valor as pedras retiradas ele dizia aqueles todos anéis davam até choque elétrico Não Eu estou contando assim porque é o meu jeito de contar Guerras e batalhas Isso é como jogo de baralho verte reverte Os revoltosos depois passaram por aqui soldados de Prestes vinham de Goiás reclamavam posse de todos animais de sela Sei que deram fogo na barra do Urucuia em São Romão aonde João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 132 aportou um vapor do Governo cheio de tropas da Bahia Muitos anos adiante um roceiro vai lavrar um pau encontra balas cravadas O que vale são outras coisas A lembrança da vida da gente se guarda em trechos diversos cada um com seu signo e sentimento uns com os outros acho que nem não misturam Contar seguido alinhavado só mesmo sendo as coisas de rasa importância De cada vivimento que eu real tive de alegria forte ou pesar cada vez daquela hoje vejo que eu era como se fosse diferente pessoa Sucedido desgovernado Assim eu acho assim é que eu conto O senhor é bondoso de me ouvir Tem horas anti gas que ficaram muito mais perto da gente do que outras de recente data O senhor mesmo sabe Mire veja aquela moça meretriz por lindo nome Nhorinhá filha de Ana Duzuza um dia eu recebi dela uma carta carta simples pedindo notícias e dando lembranças escrita acho que por outra alheia mão Essa Nhorinhá tinha lenço curto na cabeça feito crista de anubranco Escreveu mandou a carta Mas a carta gastou uns oito anos para me chegar quando eu recebi eu já estava casado Carta que se zanzou para um lado longe e para o outro nesses sertões nesses gerais por tantos bons préstimos em tantas algibeiras e capangas Ela tinha botado por fora só Riobaldo que está com João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 133 Medeiro Vaz E veio trazida por tropeiros e viajores recruzou tudo Quase não podia mais se ler de tão suja dobrada se rasgando Mesmo tinham enrolado noutro papel em canudo com linha preta de carretel Uns não sabiam mais de quem tinham recebido aquilo Ultimo que me veio com ela quase por engano de acaso era um homem que por medo da doença do toque ia levando seu gado de volta dos gerais para a caatinga logo que chuva chovida Eu já estava casado Gosto de minha mulher sempre gostei e hoje mais Quando conheci de olhos e mãos essa Nhorinhá gostei dela só o trivial do momento Quando ela escreveu a carta ela estava gostando de mim de certo e aí já estivesse morando mais longe magoal no São Josezinho da Serra no indo para o RiachodasAlmas e vindo do Morro dos Ofícios Quando recebi a carta vi que estava gostando dela de grande amor em lavaredas mas gostando de todo tempo até daquele tempo pequeno em que com ela estive na Aroeirinha e conheci concernente amor Nhorinhá gosto bom ficado em meus olhos e minha boca De lá para lá os oito anos se baldavam Nem estavam Senhor subentende o que isso é A verdade que em minha memória mesmo ela tinha aumentado de ser mais linda De certo agora não gostasse mais de mim quem sabe até tivesse morrido Eu sei que isto que estou dizendo é dificultoso muito entrançado Mas o senhor vai João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 134 avante Invejo é a instrução que o senhor tem Eu queria decifrar as coisas que são importantes E estou contando não é uma vida de sertanejo seja se for jagunço mas a matéria vertente Queria entender do medo e da coragem e da gã que empurra a gente para fazer tantos atos dar corpo ao suceder O que induz a gente para más ações estranhas é que a gente está pertinho do que é nosso por direito e não sabe não sabe não sabe Sendo isto Ao doido doideiras digo Mas o senhor é homem sobrevindo sensato fiel como papel o senhor me ouve pensa e repensa e rediz então me ajuda Assim é como conto Antes conto as coisas que formaram passado para mim com mais pertença Vou lhe falar Lhe falo do sertão Do que não sei Um grande sertão Não sei Ninguém ainda não sabe Só umas raríssimas pessoas e só essas poucas veredas veredazinhas O que muito lhe agradeço é a sua fineza de atenção Foi um fato que se deu um dia se abriu O primeiro Depois o senhor verá por quê me devolvendo minha razão Se deu há tanto faz tanto imagine eu devia de estar com uns quatorze anos se Tínhamos vindo para aqui circunstância de cinco léguas minha mãe e eu No porto do RiodeJaneiro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 135 nosso o senhor viu Hoje lá é o porto do seo Josozinho o negociante Porto lá como quem diz porque outro nome não há Assim sendo verdade que se chama no sertão é uma beira de barranco com uma venda uma casa um curral e um paiol de depósito Cereais Tinha até um pé de roseira Rosmes Depois o senhor vá verá Pois naquela ocasião já era quase do jeito O deJaneiro dali abaixo meialégua entra no São Francisco bem reto ele vai formam uma esquadria Quem carece passa o de Janeiro em canoa ele é estreito não estende de largura as trinta braças Quem quer bandear a cômodo o São Francisco também principia ali a viagem O porto tem de ser naquele ponto mais alto onde não dá febre de maresia A descida do barranco é indo por apique melhoramento não se pode pôr porque a cheia vem e tudo escavaca O São Francisco represa o deJaneiro alto em grosso às vezes já em suas primeiras águas de novembro Dezembro dando é certo Todo o tempo as canoas ficam esperando com as correntes presas na raiz descoberta dum pau dóleo que tem Tinha também umas duas ou três gameleiras de outrora tanto recordo Dá dó ver as pessoas descerem na lama aquele barranco carregando sacos pesados muita vez A vida aqui é muito repagada o senhor concorde Outro meu tempo então o que é que não havia de ser João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 136 Pois tinha sido que eu acabava de sarar duma doença e minha mãe feito promessa para eu cumprir quando ficasse bom eu carecia de tirar esmola até perfazer um tanto metade para se pagar uma missa em alguma igreja metade para se pôr dentro duma cabaça bem tapada e breada que se jogava no São Francisco a fim de ir Bahia abaixo até esbarrar no Santuário do Santo Senhor BomJesus da Lapa que na beira do rio tudo pode Ora lugar de tirar esmola era no porto Mãe me deu uma sacola Eu ia todos os dias E esperava por lá naquele parado raro que alguém vinha Mas eu gostava queria novidade quieta para meus olhos De descer o barranco me dava receio Mas espiava as cabaças para bóia de anzol sempre dependuradas na parede do rancho Terceiro ou quarto dia que lá fui apareceu mais gente Dois ou três homens de fora comprando alqueires de arroz Cada saco amarrado com broto de buriti a folha nova verde e amarela pelo comprido meio a meio Arcavam com aqueles sacos e passavam nas canoas para o outro lado do deJaneiro Lá era como ainda hoje é mata alta Mas por entre as árvores se podia ver um carrodebois parado os bois que mastigavam com escassa baba indicando vinda de grandes distâncias Daí o senhor veja tanto trabalho ainda por causa de uns metros de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 137 água mansinha só por falta duma ponte Ao que mais no carrodebois levam muitos dias para vencer o que em horas o senhor em seu jipe resolve Até hoje é assim por borco Aí pois de repente vi um menino encostado numa árvore pitando cigarro Menino mocinho pouco menos do que eu ou devia de regular minha idade Ali estava com um chapéu decouro de sujigola baixada e se ria para mim Não se mexeu Antes fui eu que vim para perto dele Então ele foi me dizendo com voz muito natural que aquele comprador era o tio dele e que moravam num lugar chamado OsPorcos meiomundo diverso onde não tinha nascido Aquilo ia dizendo e era um menino bonito claro com a testa alta e os olhos aosgrandes verdes Muito tempo mais tarde foi que eu soube que esse lugarim OsPorcos existe de se ver menos longe daqui nos gerais de Lassance Lá é bom perguntei Demais ele me respondeu e continuou explicando Meu tio planta de tudo Mas arroz este ano não plantou porque enviuvou de morte de minha tia Assim parecesse que tinha vergonha de estarem comprando aquele arroz o senhor veja João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 138 Mas eu olhava esse menino com um prazer de companhia como nunca por ninguém eu não tinha sentido Achava que ele era muito diferente gostei daquelas finas feições a voz mesma muito leve muito aprazível Porque ele falava sem mudança nem intenção sem sobejo de esforço fazia de conversar uma conversinha adulta e antiga Fui recebendo em mim um desejo de que ele não fosse mais embora mas ficasse sobre as horas e assim como estava sendo sem parolagem miúda sem brincadeira só meu companheiro amigo desconhecido Escondido enrolei minha sacola aí tanto mesmo em fé de promessa tive vergonha de estar esmolando Mas ele apreciava o trabalho dos homens chamando para eles meu olhar com um jeito de siso Senti modo meu de menino que ele também se simpatizava a já comigo A ser que tinha dinheiro de seu comprou um quarto de queijo e um pedaço de rapadura Disse que ia passear em canoa Não pediu licença ao tio dele Me perguntou se eu vinha Tudo fazia com um realce de simplicidade tanto desmentindo pressa que a gente só podia responder que sim Ele me deu a mão para me ajudar a descer o barranco As canoas eram algumas elas todas compridas como as de hoje escavacadas cada qual em tronco de pau de árvore Uma João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 139 estava ocupada apipada passando as sacas de arroz e nós escolhemos a melhor das outras quase sem água nem lama nenhuma no fundo Sentei lá dentro de pinto em ovo Ele se sentou em minha frente estávamos virados um para o outro Notei que a canoa se equilibrava mal balançando no estado do rio O menino tinha me dado a mão para descer o barranco Era uma mão bonita macia e quente agora eu estava vergonhoso perturbado O vacilo da canoa me dava um aumentante receio Olhei aqueles esmerados esmartes olhos botados verdes de folhudas pestanas luziam um efeito de calma que até me repassasse Eu não sabia nadar O remador um menino tam bém da laia da gente foi remando Bom aquilo não era tão pouca firmeza Resolvi ter brio Só era bom por estar perto do menino Nem em minha mãe eu não pensava Eu estava indo a meu esmo Saiba o senhor o dejaneiro é de águas claras E é rio cheio de bichos cágados Se olhava a lado se via um vivente desses em cima de pedra quentando sol ou nadando descoberto exato Foi o menino quem me mostrou E chamou minha atenção para o mato da beira em pé paredão feito à régua regulado As flores ele prezou No alto eram muitas flores subitamente vermelhas de olhodeboi e de outras João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 140 trepadeiras e as roxas do mucunã que é um feijão bravo porque se estava no mês de maio digo tempo de comprar arroz quem não pôde plantar Um pássaro cantou Nhambu E periquitos bandos passavam voando por cima de nós Não me esqueci de nada o senhor vê Aquele menino como eu ia poder deslembrar Um papagaio vermelho Arara for ele me disse E quêquêquê o araçari perguntava Ele o menino era dessemelhante já disse não dava minúcia de pessoa outra nenhuma Comparável um suave de ser mas asseado e forte assim se fosse um cheiro bom sem cheiro nenhum sensível o senhor represente As roupas mesmas não tinham nódoa nem amarrotado nenhum não fuxicavam A bem dizer ele pouco falasse Se via que estava apreciando o ar do tempo calado e sabido e tudo nele era segurança em si Eu queria que ele gostasse de mim Mas com pouco chegávamos no doChico O senhor surja é de repentemente aquela terrível água de largura imensidade Medo maior que se tem é de vir canoando num ribeirãozinho e dar sem espera no corpo dum rio grande Até pelo mudar A feiúra com que o São Francisco puxa se moendo todo barrento vermelho recebe para si o dejaneiro quase só um rego verde só Daqui vamos voltar eu pedi ansiado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 141 O menino não me olhou porque já tinha estado me olhando como estava Para quê ele simples perguntou em descanso de paz O canoeiro que remava em pé foi quem se riu decerto de mim Aí o menino mesmo avançação enorme rodaaroda o que até hoje minha vida avistei de maior foi aquele rio Aquele daquele dia As remadas que se escutavam do canoeiro a gente podia contar por duvidar se não satisfaziam termo Ah tu tem medo não nenhum ao canoeiro o menino perguntou com tom Sou barranqueiro o canoeirinho tresdisse repontando de seu orgulho De tal o menino gostou porque com a cabeça aprovava Eu também O chapéudecouro que ele tinha era quase novo Os olhos eu sabia e hoje ainda mais sei pegavam um escurecimento duro Mesmo com a pouca idade que era a minha percebi que de me ver tremido todo assim o menino tirava aumento para sua coragem Mas eu agüentei o aque do olhar dele Aqueles olhos então foram ficando bons retomando brilho E o menino pôs a mão na minha Encostava e ficava fazendo parte melhor da minha pele no profundo desse a minhas carnes alguma coisa Era uma mão branca com os dedos dela delicados Você também é animoso me disse Amanheci minha aurora Mas a vergonha que eu sentia agora era de outra qualidade Arre vai o canoeiro cantou feio moda de copla que gente barranqueira João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 142 usa Meu Rio de São Francisco nessa maior turvação vim te dar um gole dágua mas pedir tua benção Aí o desejado arribamos na outra beira a de lá Ao ver o menino mandou encostar só descemos Você não arreda daqui fica tomando conta ele falou para o canoeiro que seguiu de cumprir aquela autoridade desde que amarrou a corrente num paupombo Aonde o menino queria ir Sofismei mas fui andando fomos na vargem no meio avermelhado do capimpubo Sentamos por fim num lugar mais salientado com pedras rodeado por áspero bamburral Sendo de permanecer assim sem prazo isto é o quase calados somente Sempre os mosquitinhos era que arreliavam o vulgar Amigo quer de comer Está com fome ele me perguntou E me deu a rapadura e o queijo Ele mesmo só tocou em miga Estava pitando Acabou de pitar apanhava talos de capimcapivara e mastigava tinha gosto de milhoverde é dele que a capivara come Assim quando me veio vontade de urinar e eu disse ele determinou Háte vai ali atrás longe de mim isso faz Mais não conversasse e eu reparei me acanhava comparando como eram pobres as minhas roupas junto das dele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 143 Antojo então por detrás de nós sem avisos apareceu a cara de um homem As duas mãos dele afastavam os ramos do mato me deu um susto somente Por certo algum trilho passava perto por ali o homem escutara nossa conversa À fé era um rapaz mulato regular uns dezoito ou vinte anos mas altado forte com as feições muito brutas Debochado ele disse isto Vocês dois uê hem Que é que estão fazendo Aduzido fungou e mão no fechado da outra bateu um figurado indecente Olhei para o menino Esse não semelhava ter tomado nenhum espanto surdo sentado ficou social com seu prático sorriso Hem hem E eu Também que se sorriu sem malícia e sem bondade Não piscava os olhos O canoeiro sem seguir resolução varejava ali na barra entre duas águas menos fundas brincando de rodar mansinho com a canoa passeada Depois foi entrando no doChico na beirada para o rumo de acima Eu me apeguei de olhar o mato da margem Beiras sem praia tristes tudo parecendo meio podre a deixa lameada ainda da cheia derradeira o senhor sabe quando o doChico sobe os seis ou os onze metros E se deu que o remador encostou quase a canoa nas canaranas e se curvou queria quebrar um galho de maracujádomato Com o mau jeito a canoa desconversou o menino também tinha se levantado Eu disse um grito Tem nada não ele falou até meigo muito Mas então vocês João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 144 fiquem sentados eu me queixei Ele se sentou Mas sério naquela sua formosa simpatia deu ordem ao canoeiro com uma palavra só firme mas sem vexame Atravessa O canoeiro obedeceu Tive medo Sabe Tudo foi isso tive medo Enxerguei os confins do rio do outro lado Longe longe com que prazo se ir até lá Medo e vergonha A aguagem bruta traiçoeira o rio é cheio de baques modos moles de esfrio e uns sussurros de desamparo Apertei os dedos no pau da canoa Não me lembrei do CaboclodÁgua não me lembrei do perigo que é a onça dágua se diz a ariranha essas desmergulham em bando e becam a gente rodeando e então fazendo a canoa virar de estudo Não pensei nada Eu tinha o medo imediato E tanta claridade do dia O arrojo do rio e só aquele estrape e o risco extenso dágua de parte a parte Alto rio fechei os olhos Mas eu tinha até ali agarrado uma esperança Tinha ouvido dizer que quando canoa vira fica boiando e é bastante a gente se apoiar nela encostar um dedo que seja para se ter tenência a constância de não afundar e aí ir seguindo até sobre se sair no seco Eu disse isso E o canoeiro me contradisse Esta é das que afundam inteiras É canoa de peroba Canoa de peroba e de paudóleo não sobrenadam Me deu uma tontura O ódio que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 145 eu quis ah tantas canoas no porto boas canoas boiantes de faveira ou tamboril de imburana vinhático ou cedro e a gente tinha escolhido aquela Até fosse crime fabricar dessas de madeira burra A mentira fosse mas eu devo de ter arregalado doidos olhos Quieto composto confronte o menino me via Carece de ter coragem ele me disse Visse que vinham minhas lágrimas Dói de responder Eu não sei nadar O menino sorriu bonito Afiançou Eu também não sei Sereno sereno Eu vi o rio Via os olhos dele produziam uma luz Que é que a gente sente quando se tem medo ele indagou mas não estava remoqueando não pude ter raiva Você nunca teve medo foi o que me veio de dizer Ele respondeu Costumo não e passado o tempo dum meu suspiro Meu pai disse que não se deve de ter Ao que meio pasmei Ainda ele terminou Meu pai é o homem mais valente deste mundo Aí o bambalango das águas aro o mulato veio insistindo E por aí eu consegui falar alto contes tando que não estávamos fazendo sujice nenhuma estávamos era espreitando as distâncias do rio e o parado das coisas Mas o que eu menos esperava ouvi a bonita voz do menino dizer Você meu nego Está certo chega aqui A fala o jeito dele imitavam de mulher Então era aquilo E o mulato satisfeito caminhou para se sentar juntinho dele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 146 Ah tem lances esses se riscam tão depressa olhar da gente não acompanha Urutu dá e já deu o bote Só foi assim Mulato pulou para trás ô de um grito gemido urro Varou o mato em fuga se ouvia aquela corredoura O menino abanava a faquinha nua na mão e nem se ria Tinha embebido ferro na coxa do mulato a ponta rasgando fundo A lâmina estava escorrida de sangue ruim Mas o menino não se aluía do lugar E limpou a faca no capim com todo capricho Quicé que corta foi só o que disse a si dizendo Tornou a pôr na bainha Meu receio não passava O mulato podia voltar ter ido buscar uma foice garrucha a reunir companheiros de nós o que seria daí a mais um pouco Ao menino ponderei isso encarecendo que a gente fosse logo embora Carece de ter coragem Carece de ter muita coragem ele me moderou tão gentil Me alembrei do que antes ele tinha falado de seu pai Indaguei Mas então você mora é com seu tio Aí ele se levantou me chamando para voltarmos Mas veio demorão vagarosinho até aonde a canoa E não olhava para trás Não medo do mulato nem de ninguém ele não conhecia Tem de tudo neste mundo pessoas engraçadas o remadorzinho estava dormindo espichado dentro da canoa com João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 147 os seus mosquitos por cima e a camisa empapada de suor de sol Se alegrou com o resto da rapadura e do queijo nos trouxe remando no meio do rio até mais cantava Dessa volta não lhe dou desenho tudo igual igual Menos que por vez me pareceu depressa demais Você é valente sempre em hora eu perguntei O menino estava molhando as mãos na água vermelha esteve tempo pensando Dando fim sem me encarar declarou assim Sou diferente de todo o mundo Meu pai disse que eu careço de ser diferente muito diferente E eu não tinha medo mais Eu O sério pontual é isto o senhor escute me escute mais do que eu estou dizendo e escute desarmado O sério é isto da estória toda por isto foi que a estória eu lhe contei eu não sentia nada Só uma transformação pesável Muita coisa importante falta nome Minha mãe estava lá no porto por mim Tive de ir com ela nem pude me despedir direito do Menino De longe virei ele acenou com a mão eu respondi Nem sabia o nome dele Mas não carecia Dele nunca me esqueci depois tantos anos todos Agora que o senhor ouviu perguntas faço Por que foi que eu precisei de encontrar aquele Menino Toleima eu sei Dou de O senhor não me responda Mais que coragem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 148 inteirada em peça era aquela a dele De Deus do demo Por duas por uma isto que eu vivo pergunta de saber nem o compadre meu Quelemém não me ensina E o que era que o pai dele tencionava Na ocasião idade minha sendo aquela não dei de mim esse indagado Mire veja um rapazinho no Nazaré foi desfeiteado e matou um homem Matou correu em casa Sabe o que o pai dele temperou Filho isso é a tua maioridade Na velhice já tenho defesa de quem me vingue Bolas ora Senhor vê o senhor sabe Sertão é o penal criminal Sertão é onde homem tem de ter a dura nuca e mão quadrada Mas onde é bobice a qualquer resposta é aí que a pergunta se pergunta Por que foi que eu conheci aquele Menino O senhor não conheceu compadre meu Quelemém não conheceu milhões de milhares de pessoas não conheceram O senhor pense outra vez repense o bem pensado para que foi que eu tive de atravessar o rio defronte com o Menino O São Francisco cabe sempre aí capaz passa O Chapadão é em sobre longe beira até Goiás extrema Os gerais desentendem de tempo Sonhação acho que eu tinha de aprender a estar alegre e triste juntamente depois nas vezes em que no Menino pensava eu acho que Mas para quê por quê Eu estava no porto do deJaneiro com minha capanguinha na mão ajuntando esmolas para o Senhor BomJesus no dever de pagar promessa feita por minha mãe João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 149 para me sarar de uma doença grave Deveras se vê que o viver da gente não é tão cerzidinho assim Artes que foi que fico pensando por aí Zé Bebelo um tanto sabia disso mas sabia sem saber e saber não queria como Medeiro Vaz como Joca Ramiro como compadre meu Quelemém que viaja diverso caminhar Ao quê Não me dê dês Mais hoje mais amanhã quer ver que o senhor põe uma resposta Assim o senhor já me compraz Agora pelo jeito de ficar calado alto eu vejo que o senhor me divulga Adiante Conto O seguinte é simples Minha mãe morreu apenas a Bigri era como ela se chamava Morreu num dezembro chovedor aí foi grande a minha tristeza Mas uma tristeza que todos sabiam uma tristeza do meu direito De desde até hoje em dia a lembrança de minha mãe às vezes me exporta Ela morreu como a minha vida mudou para uma se gunda parte Amanheci mais De herdado fiquei com aquelas miserinhas miséria quase inocente que não podia fazer questão lá larguei a outros o pote a bacia as esteiras panela chocolateira uma caçarola bicuda e um alguidar somente peguei minha rede uma imagem de santo de pau um canecodeasa pintado de flores uma fivela grande com ornados um cobertor de baeta e minha muda de roupa Puseram para mim tudo em João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 150 trouxa como coube na metade dum saco Até que um vizinho caridoso cumpriu de me levar por causa das chuvas numa viagem durada de seis dias para a Fazenda São Gregório de meu padrinho Selorico Mendes na beira da estrada boiadeira entre o rumo do Curralinho e o do Bagre onde as serras vão descendo Tanto que cheguei lá meu padrinho Selorico Mendes me aceitou com grandes bondades Ele era rico e somítico possuía três fazendasdegado Aqui também dele foi a maior de todas De não ter conhecido você estes anos todos purgo meus arrependimentos foi a sincera primeira palavra que ele me disse me olhando antes Levei dias pensando que ele não fosse de juizo regulado Nunca falou em minha mãe Nas coisas de negócio e uso no lidante também quase não falava Mas gostava de conversar contava casos Altas artes de jagunçosisso ele amava constante histórias Ah a vida vera é outra do cidadão do sertão Política Tudo política e potentes chefias A pena que aqui já é terra avinda concorde roncice de paz e sou homem particular Mas adiante por aí arriba ainda fazendeiro graúdo se reina mandador todos donos de agregados valentes turmas de cabras do trabuco e na carabina escopetada João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 151 Domingos Touro no Alambiques Major Urbano na Macaçá os Silva Salles na Crondeúba no VauVau dona Próspera Blaziana Dona Adelaide no CampoRedondo Simão Avelino na BarradaVaca Mozar Vieira no São João do Canastrão o Coronel Camucim nos Arcanjos comarca de Rio Pardo e tantos tantos Nisto que na extrema de cada fazenda some e surge um camarada de sentinela que sobraça o paudefogo e vigia feito onça que come carcaça Ei Mesma coisa no barranco do rio e se descer esse São Francisco que aprova cada lugar é só de um grande senhor com sua família geral seus jagunços mil ordeiros ver São Francisco da Arrelia Januária Carinhanha Urubu Pilão Arcado Xiquexique e SentoSé Demais falasse tendo conhecido o Neco se lembrava de quando Neco forçou Januária e Carinhanha nas eras do ano de 79 tomou todos os portos Jatobá Malhada e Manga fez como quis e pôs sede de suas fortes armas no arraial do jacaré que era a terra dele Estive lá com carta firmada pelo Capitão Severiano Francisco de Magalhães que era companheiro combinado do Neco O pessoal que eles numeravam em guerra comprazia uma babilônia Botavam até barcas cheias de homens com bacamartes cruzando para João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 152 baixo e para cima o rio de parte a parte Dia e noite a gente ouvia gritos e tiros Cavalaria de jagunços galopando saindo para distâncias marcadas Abriam festa de bombareal e foguetório quando entravam numa cidade Mandavam tocar o sino da igreja Arrombavam a cadeia soltando os presos arrancavam o dinheiro em coletoria e ceiavam em Casada Câmara Meu padrinho Selorico Mendes era muito medroso Contava que em tempos tinha sido valente se gabava goga Queria que eu aprendesse a atirar bem e manejar porrete e faca Me deu logo um punhal me deu uma garrucha e uma granadeira Mais tarde me deu até um facão enterçado que tinha mandado forjar para próprio quase do tamanho de espada e em formato de folha de gravata Sentei em mesa com o Neco bebi vinho almocei Debaixo da chefia dele paravam uns oitocentos brabos só obedeciam e rendiam respeito Meu padrinho hóspede do Neco de recontar isso ele sempre se engrandecia Naquela dita ocasião todas as pessoas importantes tinham fugido da Januária desamparadas de poderdelei foram esperar melhor sorte em Pedrasde MariadaCruz Neco Ah Mandou mais que Renovato ou o Lióbas estrepoliu mais do que João Brandão e os João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 153 Filgueiras E meu padrinho me mostrou um papel com escrita de Neco era recibo de seis ancorotes com pólvora e uma remessa de iodureto a assinatura rezava assim Manoel Tavares de Sá Mas eu não sabia ler Então meu padrinho teve uma decisão me enviou para o Curralinho para ter escola e morar em casa de um amigo dele Nhô Maroto cujo Gervásio Lê de Ataíde era o verdadeiro nome social Bom homem Lá eu não carecia de trabalhar de forma nenhuma porque padrinho Selorico Mendes acertava com Nhô Maroto de pagar todo fim de ano o assentamento da tença e impêndio até de botina e roupa que eu precisasse Eu comia muito a despesa não era pequena e sempre gostei do bom e do melhor A ser que alguma vez Nhô Maroto me pedia um ou outro serviço usando muito bico de palavreado me agradando e dizendo que estimava como um favor Nunca neguei a ele meus pés e mãos e mesmo não era o nenhum trabalho notável Vai acontece ele me disse Baldo você carecia mesmo de estudar e tirar cartadedoutor porque para cuidar do trivial você jeito não tem Você não é habilidoso Isso que ele me disse me impressionou que de seguida formei em pergunta ao Mestre Lucas Ele me olhou um tempo era homem de tão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 154 justa regra e de tão visível correto parecer que não poupava ninguém às vezes teve dia de dar em todos os meninos com a palmatória e mesmo assim nenhum de nós não tinha raiva dele Assim Mestre Lucas me respondeu É certo Mas o mais certo de tudo é que um professor de mãocheia você da va E desde o começo do segundo ano ele me determinou de ajudar no corrido da instrução eu explicava aos meninos menores as letras e a tabuada Curralinho era lugar muito bom de vida contentada Com os rapazinhos de minha idade arranjei companheirice Passei lá esses anos não separei saudade nenhuma nem com o passado não somava Aí namorei falso asnaz ah essas meninas por nomes de flores A não ser a Rosauarda moça feita mais velha do que eu filha de negociante forte seo Assis Wababa dono da venda O Primeiro Barateiro da Primavera de São José ela era estranja turca eles todos turcos armazém grande casa grande seo Assis Wababa de tudo comerciava Tanto sendo bizarro atencioso e muito ladino ele me agradava dizia que meu padrinho Selorico Mendes era um freguesão diversas vezes me convidou para almoçar em mesa O que apreciei carne moída com semente de trigo outros guisados recheio bom em abobrinha ou em folha de uva e aquela moda de azedar o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 155 quiabo supimpas iguarias Os doces também Estimei seo Assis Wababa a mulher dele dona Abadia e até os meninos irmãozinhos de Rosauarda mas com tamanha diferença de idade Só o que me invocava era a linguagem garganteada que falavam uns com uns a aravia Assim mesmo afirmo que a Rosauarda gostou de mim me ensinou as primeiras bandalheiras e as completas que juntos fizemos no fundo do quintal num esconso fiz com muito anseio e deleite Sempre me dizia uns carinhos turcos e me chamava de Meus olhos Mas os dela era que brilhavam exaltados e extraordinários pretos duma formosura mesmo singular Toda a vida gostei demais de estrangeiro Hoje é que reconheço a forma do que meu padrinho muito fez por mim ele que criara amparado amor ao seu dinheiro e que tanto avarava Pois várias viagens ele veio ao Curralinho me ver na verdade também ele aproveitava para tratar de vender bois e mais outros negócios e trazia para mim caixetas de doce de buriti ou de araticum requeijão e marmela das Cada mês de novembro mandava me buscar Nunca ralhou comigo e me dava de tudo Mas eu nunca pedi coisa nenhuma a ele Dez vezes mais me desse e não se valia Eu não gostava dele nem desgostava Mais certo era que com ele eu não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 156 soubesse me acostumar Acabei por razão outra fugindo do São Gregório o senhor vai ver Nunca mais vi meu padrinho Mas por isso ele não me desejou mal nem entendo Decerto ficou entusiasmado quando teve notícias de que eu era o jagunço E me deixou por herdeiro em folha de testamento das três fazendas duas peguei Só o São Gregório foi que ele testou para uma mulata com que no fim de sua velhice se ajuntou Disso não fiz conta Mesmo o que recebi eu menos merecia Agora derradeiramente destaco quando velho ele penou remorso por mim eu velho a curtir arrependimento por ele Acho que nós dois éramos mesmo pertencentes Depois pouco que voltei do Curralinho definitivo grande fato se deu que ao senhor não escondo Certa madrugada os cachorros todos latiram no São Gregório alguém estava batendo Era mês de maio em má lua o frio fiava E quando tão moço eu custava muito para me levantar não por fraca saúde mas por preguiça mal corrigida Assim que saí da cama e fui ver se era de se abrir meu padrinho Selorico Mendes com a lamparina na mão já estava pondo para dentro da sala uns homens que eram seis todos de chapéugrande e trajados de capotes e capas arrastavam esporas Ali entraram com uma aragem que me deu susto de possível reboldosa Admirei tantas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 157 armas Mas eles não eram caçadores Ao que farejei pé de guerra Meu padrinho mandou eu ir lá dentro chamar alguma das mulheres que coasse café quente Quando voltei um dos homens Alarico Totõe estava expondo explicando Todos continuavam sem tomar assentos Alarico Totõe sendo um fazendeiro do GrãoMogol conhecido de meu padrinho Ele com seu irmão Aluiz Totõe pessoas finas gente de bem Tinham encomendado o auxílio amigo dos jagunços por uma questão política logo entendi Meu padrinho escutava aprovando com a cabeça Mas para quem ele sempre estava olhando com uma admiração toda perturbosa era para o chefe dos jagunços o principal E o senhor sabe quem era esse Joca Ramiro Só de ouvir o nome eu parei na maior suspensão Adrede Joca Ramiro estava de braços cruzados o chapéu dele se desabava muito largo Dele até a sombra que a lamparina arriava na parede se trespunha diversa na imponência pojava volume E vi que era um homem bonito caprichado em tudo Vi que era homem gentil Dos lados ombreavam com ele dois jagunões depois eu soube que seus segundos Um se chamava Ricardão corpulento e quieto com João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 158 um modo simpático de sorriso compunha o ar de um fazendeiro abastado O outro Hermógenes homem sem anjodaguarda Na hora não notei de uma vez Pouco pouco fui receando O Hermógenes ele estava de costas mas umas costas desconformes a cacunda amontoava com o chapéu raso em cima mas chapéu redondo de couro que se que uma cabaça na cabeça Aquele homem se arrepanhava de não ter pescoço As calças dele como que se enrugavam demais da conta enfolipavam em dobrados As pernas muito abertas mas quando ele caminhou uns passos se arrastava me pareceu que nem queria levantar os pés do chão Reproduzo isto e fico pensando será que a vida socorre à gente certos avisos Sempre me lembro dele me lembro mal mas atrás de muitas fumaças Naquela hora eu estava querendo que ele não virasse a cara Virou A sombra do chapéu dava até em quase na boca enegrecendo No terminar Alarico Totõe pediu que precisavam de um recanto oculto onde a tropa dos homens passasse o dia que vinha pois que viajavam de noite dando surpresa e desmanchando rastro Tem ótimo reconditório meu padrinho consentiu E mandou que eu fosse guiar aquela gente até aonde o poço do Cambaubal num fechado mato caapuão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 159 Primeiro tomouse café Assim Joca Ramiro corria pronto os olhos em tudo ali sorrindo franco a cara muito galharda e pôs as mãos nos bolsos Ricardão ria grosso E aquele Hermógenes veio para sair comigo mais o outro homem um cabeçachata alvaço com muita viveza no olhar desse gostei Alaripe se chamava até hoje se chama Em que eles dois a cavalo eu a pé viemos até onde estavam esperando os outros dois passos no baixo da estrada Aí mês de maio falei com a estreladalva O orvalho pripingando baciadas E os grilos no chirilim De repente de certa distância enchia espaço aquela massa forte antes de poder ver eu já pressentia Um estado de cavalos Os cavaleiros Nenhum não tinha desapeado E deviam de ser perto duns cem Respirei a gente sorvia o bafejo o cheiro de crinas e rabos sacudidos o pêlo deles de suor velho semeado das poeiras do sertão Adonde o movimento esbarrado que se sussurra duma tropa assim feito de uma porção de barulhinhos pequenos que nem o dum grande rio do aflor A bem dizer aquela gente estava toda calada Mas uma sela range de seu tine um arreaz estribo e estribeira ou o coscós quando o animal lambe o freio e mastiga Couro raspa em couro os cavalos dão de orelha ou batem com o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 160 pé Daqui dali um sopro um meioarquejo E um cavaleiro ou outro tocava manso sua montada avançando naquele bolo mudando de lugar bridava Eu não sentia os homens sabia só dos cavalos Mas os cavalos mantidos montados É diferente Grandeúdo E aos poucos divulgava os vultos muitos feito árvores crescidas lado a lado E os chapéus rebuçados as pontas dos rifles subindo das costas Porque eles não falavam e restavam esperando assim a gente tinha medo Ali deviam de estar alguns dos homens mais terríveis sertanejos em cima dos cavalos teúdos parados contrapassantes Soubesse sonhasse eu Decerto de guarda apartado dos mais se via um cavaleiro inteiro Veio vindo para cá o cavalo dele era escuro era um alazão de bom pisar Capixum é eu mais o siô Hermógenes o cabeça chata falou aviso A bom Alaripe o de lá respondeu A gente se encostava no frio escutava o orvalho o mato cheio de cheiroso estalinho de estrelas o deduzir dos grilos e a cavalhada a peso Dava o raiar entreluz da aurora quando o céu branquece Ao o ar indo ficando cinzento o formar daqueles cavaleiros escorrido se divisava E o senhor me desculpe de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 161 estar retrasando em tantas minudências Mas até hoje eu represento em meus olhos aquela hora tudo tão bom e o que é é saudade De junto com o Capixum se aproximou outro um também de sotochefe que o Hermógenes tratou de siéMarques O Hermógenes tinha voz que não era fanhosa nem rouca mas assim desgovernada desigual voz que se safava Assim fantasia de dizer o ser de uma irara com seu cheiro fedorento Aoh uê alguém irmão aquele siéMarques perguntou tratando de minha pessoa De paz mano velho Amigo que veio mostrar à gente o arrancho o Hermógenes contestou Deu ainda um barulho de boca e goela qual um rosno Sem mais delongas nenhumas saí caminhando ao lado do cavalo do Hermógenes puxando todos para o Cambaubal Atrás de nós eu ouvia os passos postos da grande cavalaria o regular esse empurro continuado Eu não queria virar e espiar achassem que eu era abelhudo Mas agora eles conversavam alguns riam diziam graças Presumi que estavam muito contentes de ganhar o repouso de horas pois tinham navegado na sela a noite toda Um falou mais alto aquilo era bonito e sem tino Siruiz cadê a moça virgem Largamos a estrada no capim molhado meus pés João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 162 se lavavam Algum aquele Siruiz cantou palavras diversas para mim a toada toda estranha Urubu é vila alta mais idosa do sertão padroeira minha vida vim de lá volto mais não Vim de lá volto mais não Corro os dias nesses verdes meu boi mocho baetão buriti água azulada carnaúba sal do chão Remanso de rio largo viola da solidão quando vou pra dar batalha convido meu coração Vinham quebrando as barras Dia de maio com orvalho eu disse Lembrança da gente é assim Me emprestaram um cavalo e eu fui com o Alaripe esperar a chegada da tropa de burros adiante na boca da ponte Não tardava já vinham aparecendo Um lote de dez mulas com os cargueiros Mas vinham com os cincerros tapados tafulhados João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 163 com rama de algodão afora o gemegeme das cangalhas não faziam nenhum rumor Guiamos os tropeiros também para o Cambaubal Mas aí meu padrinho chegou com Joca Ramiro Ri cardão e os Totões Meu padrinho insistiu me trouxe outra vez para casa O dia já estava clareando completo Meu coração restava cheio de coisas movimentadas Não vi mais o acampo deles as esporas tilintim Não pude Padrinho Selorico Mendes mandou que eu fosse no OCocho buscar um homem chamado Rozendo Pio esse homem meu padrinho me disse rastreava E era para ele vir debaixo de todos os segredos tapejar o bando de Joca Ramiro por bons trilhos e atalhos na Serra das Trinta Voltas modo de caber em duas noites sem perigo maior o que se não durasse seis ou sete Sendo assim só eu mesmo merecia confiança de ir Fui com desgosto Três léguas três léguas e meia longe Mas eu tinha de levar um cavalo adestro para o homem E esse Rozendo Pio era tratantaz e tolo Demorou muito com desculpa de arranjos No caminho na vinda ele nem sabia de nada de jagunços quase não conversava não quis dar demonstração Nem fazia prazer naquilo Quando chegamos era o anoitecido o bando estava pronto para sair Se separavam em pequenos golpes Meu padrinho tinha mandado amarrar os cachorros todos da fazenda João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 164 Se foram Achei mesmo que tudo tinha perdido a graça o de se ver Semanas seguintes meu padrinho só falou nos jagunços Dito que Joca Ramiro era um chefe cursado muitos iguais não nascem assim dono de glórias Aquela turma de cabras tivesse sorte podia impor caráter ao Governo Meu padrinho levara aquele dia todo no meio deles Contava o cuidado nos arranjos as coisas todas regradas aquele dormir de ordem aquela autoridade enorme no entremeamento Nem nada faltava As sacas de farinha tantas e tantas arrobas de carnedesol a munição bem zelada caixote com pães de sabão para cada um lavar a roupa e o corpo Até tinham um mestreferrador com sua tendinha e os pertences uma bigorna e as tenazes fole de mão ferramenta exata e capanga de alveitar com vários sortidos flames de sangrar cavalos adoecidos E as mais coisas meu padrinho descrevia com muito agrado de que tinha ouvido sincera narração As lutas dos jocaramiros os barulhos as manhas traçadas para se ganhar em combate maço de estórias de toda raça de artes e estratagemas De ouvir meu padrinho contar aquilo se comprazendo sem singeleza começava a dar em mim um enjôo Parecia que ele queria se emprestar a si as façanhas dos jagunços e que Joca Ramiro estava ali junto de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 165 nós obedecendo mandados e que a total valentia pertencia a ele Selorico Mendes Meu padrinho era antipático Ficava mais sendo Eu achava Num lugar parado assim na roça carece de a gente de vez em quando ir alterando os assuntos Não estou caçando desculpa para meus errados não o senhor reflita O que me agradava era recordar aquela cantiga estúrdia que reinou para mim no meio da madrugada ah sim Simples digo ao senhor aquilo molhou minha idéia Aire me adoçou tanto que dei para inventar de espírito versos naquela qualidade Fiz muitos montão Eu mesmo por mim não cantava porque nunca tive entôo de voz e meus beiços não dão para saber assoviar Mas reproduzia para as pessoas e todo o mundo admirava muito recitados repetidos Agora tiro sua atenção para um ponto e ouvindo o senhor concordará com o que por mesmo eu não saber não digo Pois foi que eu escrevi os outros versos que eu achava dos verdadeiros assun tos meus e meus todos sentidos por mim de minha saudade e tristezas Então Mas esses que na ocasião prezei estão goros remidos em mim bem morreram não deram cinza Não me lembro de nenhum deles nenhum O que eu guardo no giro da memória é aquela madrugada dobrada inteira os cavaleiros no sombrio amontoados feito bichos e árvores o refinfim do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 166 orvalho a estreladalva os grilinhos do campo o pisar dos cavalos e a canção de Siruiz Algum significado isso tem Meu padrinho Selorico Mendes me deixava viver na lordeza No São Gregório do razoável de tudo eu dispunha querer querendo E de trabalhar seguido eu nem carecia Fizesse ou não fizesse meu padrinho me apreciava mas não me louvava Uma coisa ele não tolerava e era só que alguém indagasse justo quanto era o dinheiro que ele tinha Com isso eu nunca somei não sou especula Eu vivia com o meu bom corpo Alguém há de achar algum regime melhor Mas um dia de tanto querer não pensar no princípio disso acabei me esquecendo quem me disseram que não era à toa que minhas feições copiavam retrato de Selorico Mendes Que ele tinha sido meu pai Afianço que no escutar em roda de mim o tonto houve o mundo todo me desproduzia numa grande desonra Pareceu até que de algum encoberto jeito eu daquilo já sabia Assim já tinha ouvido de outros aos peda cinhos ditos e indiretas que eu desouvia Perguntar a ele fosse Ah eu não podia não Perguntar a mais pessoa nenhuma chegava Não desesquentei a cabeça Ajuntei meus trens minhas armas selei um cavalo fugi de lá Fui até na cozinha conduzi um naco de carne dois punhados de farinha no bornal Achasse João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 167 algum dinheiro à mão pegava disso eu não tinha nenhum escrúpulo Virei bem fugido Toquei direto para o Curralim Razão por que fiz Sei ou não sei De as eu pensava claro acho que de bês não pensei não Eu queria o ferver Quase mesmo aquilo me engrossava desarrazoado feito o vicio dum ruim prazer Eu fazia minha raiva Raiva bem não era isto é só uma espécie de despique a dentro o vexame que me inçava não me dava rumo para continuação Único reger era me empinar e assoprar em esta minha cabeça aí a confusão e desordem e altos desesperos Arremessei o cavalo galopei demais Não ia para a casa de Nhô Maroto Ante antes ia para o seo Assis Wababa aquela hora eu queria só gente estranha muito estrangeira estrangeira inteira Só fosse um pouco para ver a Rosauarda essa assim eu amava Ah não Gostasse da Rosa uarda mais aí nas delícias dela minha idéia não podendo se firmar porque aumentava o desamparo de minha vergonha Ia para a escola de Mestre Lucas A lá perto da casa de Mestre Lucas morava um senhor chamado Dodó Meireles que tinha uma filha chamada Miosótis Assim à parva às tantices essa mocinha Miosótis também tinha sido minha namorada agora por muitos momentos eu achava consolo em que ela me visse que soubesse eu com minhas armas matadeiras tinha dado revolta João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 168 contra meu padrinho saíra de casa aos gritos danado no animal pelo cerrado a fora capaz de capaz Daí a Mestre Lucas eu tinha de dar uma explicação Eu não gostava daquela Miosótis ela era uma bobinhã no São Gregório nunca tinha pensado nela gostava era de Rosauarda Mas Nhô Maroto havia de logo saber que eu tivesse chegado no Curralim e meu padrinho ia ter o pronto aviso Mandava alguém me buscar Vinha ele Não me importava De repente eu sabia o que eu estava querendo era isso mesmo Ele viesse me pedisse para voltar me prometendo tudo ah até nos meus pés se ajoelhava E não viesse Se demorasse a vir Aí o que era que eu ia fazer caçar meio de vida aturar remoque sei lá de todos me repartir no miudinho de cada dia tão penoso aborrecido A bis então cresceu minha raiva Tive outras lágrimas nos bobos olhos Adramado pensei em minha mãe com todo querer e afirmei alto que seria só por conta dela que eu estava procedendo pelo avesso gritei Mas aquilo se fingia mal espécie de minha vergonha esteve sendo maior Como o cavalo em rogo de misericórdia escureceu o pêlo de todo suor Sosseguei as espo ras Viemos a passo de marcha Eu tinha medo por causa de minha vida quando entramos no Curralinho João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 169 Em casa de seo Assis Wababa me deram trato regozijante No que jantei ri conversei Só a praga duma surpresa me declararam a de que a Rosauarda agora estava sendo noiva para se casar com um Salino Cúri outro turco negociante nos derradeiros meses para lá vindo Assumi em trela tristeza e alívio aquele amor não seria mesmo para mim pelos motivos pessoais Nublo em que me vi mas me governei trancei as pernas comecei cara de falar pouco senhornão senhorsim acautelado sisudo e indagando dos grandes preços assim fossem cuidar que essa minha viagem era por tramar importante encargo para o meu padrinho Selorico Mendes Seo Assis Wababa oxente se prazia aquela noite com o que o Vupes noticiava que em breves tempos os trilhos do tremdeferro se armavam de chegar até lá o Curralinho então se destinava ser lugar comercial de todo valor Seo Assis Wababa se engordava concordando trouxe canjirão de vinho Me alembro eu entrei no que imaginei na ilusãozinha de que para mim também estava tudo assim resolvido o progresso moderno e que eu me representava ali rico estabelecido Mesmo vi como seria bom se fosse verdade Mas estava lá o Vupes Alemão Vupes que eu disse seo Emílio Wusp que o senhor diz Das vezes que viera a passar pelo Curralinho ele já era meu conhecido Tresdobrado homem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 170 Sendo que entendia tudo de manejar com armas mas viajava sem cano nenhum dizia Níquites Desarmado eu completo eu assim eles todos mesmo vão muito mais me respeitar oh no sertão Ele me viu afinar mira uma vez e me louvou por eu de nascença saber tão bem na horinha segurar de não respirar Mesmo dizia Senhor atira bem porque atira com espírito Sempre o espírito é que acerta Soante que dissesse sempre o espírito é que mata Mas a bem agora aquela hora estava lá o Vupes assim foi Porque num desastre de instante eu tinha pegado a pensar o que resolvia minha situação era trabalhar para ele se viajar vendendo ferramentas por aí descaroçador de algodão Nem ponderei mas disse Seo Vupes o senhor não quererá me ajustar em seu serviço Minha bestice Níquites conforme que o Vupes constante exclamava Ali nem acabei de falar e em mim eu já estava arrependido com toda a velocidade Idéia nova que imaginei que mesmo pessoa amiga e cortês virando patrão da gente vira mais rude e reprovante Mordi boca já tinha falado Ainda quis emendar garantindo que era por gracejo mas seo Assis Wababa e o Vupes me olhavam a menos com desconfianças me senti rebaixado demais A contra mim tudo contra o só ensejo das coisas me sisava Dali logo saí me despedindo bem Aonde Só se fosse ver o Mestre Lucas Assim vim andando mediante desespero Me alembro vinha andando e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 171 agora era que eu pegava a pensar livre e solto na Rosauarda lindas pernas as lindas grossas ela no vestido de nanzuque nunca havia de ser para meu regalo Dum modo senti como me recordei depois tempos quando foi arte se cantar uma cantiga Seu pai fosse rico tivesse negócio eu casava contigo e o prazer era nosso Isso mas totalmente às vezes Ao que digo ao senhor pergunto em sua vida é assim Na minha agora é que vejo as coisas importantes todas em caso curto de acaso foi que se conseguiram pelo pulo fino de sem ver se dar a sorte momenteira por cabelo por um fio um clim de clina de cavalo Ah e se não fosse cada acaso não tivesse sido qual é então que teria sido o meu destino seguinte Coisa vã que não conforma respostas As vezes essa idéia me põe susto Mas o senhor veja cheguei em casa do Mestre Lucas ele me saudou tão natural Achei também tudo o natural eu estava era cansado E quando Mestre Lucas me perguntou se eu vinha era de passeata ou de recado da fazenda expliquei que não que eu tinha merecido licença de meu padrinho para começar vida João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 172 própria em Curralinho ou adiante a fito de desenvolver mais estudos e apuramento só de cidade Dizendo o que disse eu mesmo jurava que Mestre Lucas não ia acreditar Mas acreditou até melhor Sabe o senhor por quê Porque naquele dia justo ele estava remexido no meio de um assunto que preparava o desejo dele para aí me acreditar Digo ele me ouviu e disse Riobaldo pois você chega em feita ocasião Aí me explicou um senhor no Palhão na fazenda Nhanva altas beiras do Jequitaí para o ensino de todas as matérias estava encomendando um professor Com urgência era homem de sua situação garantia boa paga Assim queria que Mestre Lucas fosse que deixasse alguém dando escola no lugar dele no Curralim por uns tempos isso claro não podia Eu queria ir O senhor acha que eu posso perguntei para principiar qualquer tarefa quase que eu sozinho nunca tive coragem Ei pode o Mestre Lucas declarou Já que estava acondicionando numa bruaca os livros todos geografia arimética cartilha e gramática e borracha lápis régua tinteiro tudo o que pudesse ter serventia Aceitei Um entusiasmo nosso me botava brioso Melhor que era para logo para o seguinte dois camaradas do dito fazendeiro estavam ali no Curralinho esperando decisão agora me levavam Dona Dindinha mulher João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 173 de Mestre Lucas no despedir me abraçou me deu umas lágrimas de bondade Tem tanta gente ruim neste mundo meu filho E você assim tão moço tão bonito Aí nem cheguei a ver aquela menina Miosótis A Rosauarda vi de longes olhares Os dois camaradas em tanto percebi eram capangas Mas sujeitos de seu trato sem altosebaixos nem as maiores asperezas me deram toda consideração Viajamos juntos quatro dias quase trinta léguas bom tempo beirando o Riachão e enxergando à mão esquerda os vultos da SerradoCabral Meus companheiros quase que não me informavam de nada ou nada Tinham outras ordens Mas mesmo antes da gente entrar em ter ras do Palhão fui vendo coisas calculosas dei meio para duvidar Patrulhas de cavaleiros em armas troco de conversa de vigiação e uma tropa de burros cargueiros mas no meio dos tocadores vinham três soldados Mais perto em maiores me vi Chegar lá declamava surpresa A Nhanva enxameava de gente homem pralaprá de feira em praça E era vistosa fazenda assobradada com grandes currais e um terreirão Vi logo o dono Ele era imediatamente estúrdio vestido de brim azul e calçando botas amareladas Era nervoso magro um pouco mais para baixo do que o tamanho mediano e com braços que pareciam demais de compridos de tanto que podiam gesticular João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 174 Fui indo ele veio vindo o grande revólver na cintura um lenço no pescoço dele esvoaçava E aquele cabelo bom despenteado alto topete arrepiadinho Apressei o passo e ele esbarrou com as mãos nas cadeiras Me olhou frenteante deu risada de certo nem estava sabendo quem eu era E gritou caçoando Me vem com o andar de sapo me vem Ahohah o destempo de estar sendo debochado se irou de mim Esbarrei também Me fiz mouco Mas ele veio para mim então saudou com um modo sensato de simpatia Adiado eu disse Sou o moço professor A alegria dele me ouvindo foi estupefacta Me ferrou do braço com porção de falas e agrados subiu a escada comigo me levou para um quarto lá dentro ligeiro parecia até que querendo me esconder de todos Uma doidice de quê Ah mas ah esse quem era o homem Zé Bebelo A fixe de fato tudo nele para mim tirava mais para fora uma real novidade Disse ao senhor eu estava pensando que ia dar escola para os filhos dum fazendeiro Engano O comum com Zé Bebelo virava diferente adiante aprazava engano Estudante sendo ele mesmo Me avisou Quis antever os cadernos livros pegar com as mãos Assim ler e escrever e as quatro contas ele já soubesse consumia jornais Remexeu tarabuz e tudo foi João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 175 arrumando na mesa grande do quarto senhorjesuscristo que assoviava o cantarolado Mas e aí comigo falou sério naquilo se tinha de sungar segredo eu visse Vamos constar é que estou assentando os planos Você fica sendo meu secretário Nesse mesmo ido dia a gente começou Aquele homem me exercitou tonto eh ô me fino fiz Ânsia assim e anfa e poder de entender demais nunca achei quem outro O que ele queria era botar na cabeça duma vez o que os livros dão e não Ele era a inteligência Vorava Corrido passava de lição em lição e perguntava reperguntava parecia ter até raiva de eu saber e não ele despeitos de ainda carecer de aprender contrafim Queimava por noite duas três velas Ele mesmo falava Relógio não vou olhar Aí estudo estudo até que estico um cochilão Cochilão me vem então espairo o livro e me deito que me durmo Pela sua vontade dele simples De dia estávamos debulhando páginas e de repente se levantava ele chegava na janela apitava num apito ministrava aquela brama de ordens dez vinte executações duma vez O pessoal corria cumpriam aquilo semelhava um circo bom teatro Mas com menos de mês Zé Bebelo se tinha senhoreado de reter tudo sabia muito mais do que eu mesmo soubesse Aí a alegria dele ficou demasiadamente Sobrevinha com o livro me fazia de queimacara um punhado de perguntas Ao tanto eu demorava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 176 treteava no explicar errando a esmo caloteava Aiaiai dele atalhar as minhas palavras mostrar no livro que eu estava falso corrigir o dito me dar quinau Se espocava às gargalhadas espalmava mão expendia outras normas próprias de sua idéia lá dele e sendo feliz de nessas dificuldades me ver eu a ignorante esmorecido e escabreado Só aí digo foi que ele ficou gostando de mim Certo Me deu um abraço me gratificou em dinheiro me fez firmes elogios Siô Baldo já tomei os altos de tudo Mas carece de você não ir sembora não mas antes prosseguir sendo o secretário meu Aponto que vamos por esse Norte por grandes fatos que você não se arrependerá me disse Norte más bandas Soprou só enche que ventava Porque ele tinha me estatutado os todos projetos Como estava reunindo e pervalendo aquela gente para sair pelo Estado acima em comando de grande guerra O fim de tudo que seria romper em peito de bando e bando acabar com eles liquidar com os jagunços até o último relimpar o mundo da jagunçada braba Somente que eu tiver feito siô Baldo estou todo entro direito na política Antes me confessou essa única sina que ambicionava de muito coração e era de ser deputado Pediu segredo e eu não gostei Porque eu estava sabendo que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 177 todos já aventavam aquela toleima por detrás dele até antecipavam alcunha o Deputado O mundo é assim Mas mesmo desse jeito o pessoal todo não regateava a ele a maior dedicação de respeito Por via de sua macheza Ah Zé Bebelo era o do duro sete punhais de sete aços trouxados numa bainha só Atirava e tanto com qualquer quilate de arma sempre certeira a pontaria laçava e campeava feito um todo vaqueiro amansava animal de maior brabeza burro grande ou cavalo duelava de faca nos espíritos solertes de onça acuada sem parar de pôr e medo ou cada parente de medo ele cuspia em riba e desconhecia Contavam ele entrava de cheio pessoalmente e botava paz em qualquer rutuba Ô homem couronágua enfrentador Dava os urros E mesmo para ele parecia não ter nada impossível Com tanta bobéia assim desfrutável e escurril e ai de quem pensasse em poitar olho de chacotas morria vertiginoso O único homemjagunço que eu podia acatar siô Baldo já está falecido Agora temos de render este serviço à pátria tudo é nacional Esse que já tinha morrido que ele falava era Joãozinho BemBem das Aroeiras de redondeante fama Se dizia tinha estudado a vida dele nos pormenores com tanta devoção especial que até um apelido em si se apôs Zé Bebelo causa que de nome em verdade era José Rebelo Adro Antunes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 178 Sei seja de se anuir que sempre haja vergonheira de jagunços a sobrecorja Deixa que daqui a uns meses neste nosso Norte não se vai ver mais um qualquer chefe encomendar para as eleições as turmas de sacripantes desentrando da justiça só para tudo destruírem do civilizado e legal Assim dizendo na verdade sentava o dizer com ira razoável A gente devia mesmo de reprovar os usos de bando em armas invadir cidades arrasar o comércio saquear na sebaça barrear com estrumes humanos as paredes da casa do juizdedireito escramuçar o promotor amontado à força numa má égua de cara para trás com lata amarrada na cauda e ainda a cambada dando morras e aí soltando os foguetes Até não arrombavam pipas de cachaça diante de igreja ou isso de se expor padre sacerdote nu no olho da rua e ofender as donzelas e as famílias gozar senhoras casadas por muitos homens o marido obrigado a ver Ao quando falava com fogo que puxava de si Zé Bebelo tinha de se esbarrar ia até na varanda ou na janela a apitar o apito ditar as boas ordens Daí mais renovado voltava para perto de mim repunha Ah cujo vou siô Baldo vou Só eu que sou capaz de fazer e acontecer Sendo porque fui eu só que nasci para tanto Dizendo que depois estável que abolisse o jaguncismo e deputado fosse então reluzia perfeito o Norte botando pontes baseando fábricas remediando a saúde de todos preenchendo a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 179 pobreza estreando mil escolas Começava por aí durava um tempo crescendo voz na fraseação o muito instruído no jornal Ia me enjoando Porque completava sempre a mesma coisa Mas minha vida na fazenda era ruim ou era boa Se melhor era Arre eu estava feito um inhampas Aí lordeei Me acostumei com o fácil movimento entrei de amizade com os capangas Sempre chegavam pessoas de fora que conversavam em sozinhos com Zé Bebelo gente de cidade De um eu soube que era delegado em missão E ele me apresentava com a honra de Professor Riobaldo secretário sendo Nas folgas vagas eu ia com os companheiros obra de légua dali no Leva aonde estavam arranchadas as mulheres mais de cinqüenta Elas vinham vindo tantas que quase todo dia mais tinham de baratear Não faltava esse bom divertir Zé Bebelo aprovava Onde é que já se viu homem valer se não tem à mão estadas raparigas Ondé Mesmo cachaça ele fornecia com regra Melhor se não eles por si providenceiam dão logo em abusos patuléias isto explicava Demais de tudo ali se prazia fartura confortável Abastada comida armamento de primeira monte de munição roupas e calçados para os melhores E o cobre para semanal de pagamento pois nenhum daqueles João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 180 homens estava ali por amordedeus mas ajeitando seu meio de viver Diziam que era dinheiro do cofre do Governo Parecia A tal que enfim veio o dia de se sair guerreiramente por vales e montes a gente toda Oi o alarido Aos quantos gritos um araral revôo avante de pássaros o senhor mesmo nunca viu coisa assim só em romance descrito De glória e avio de própria soldadesca e cavalos que davam até medo de não se achar pasto que chegasse e o pessoal perto por uns mil Acompanhado dos chefesdeturma que ele dava patente de serem seus sotenentes e oficiais de seu terço Zé Bebelo montado num formudo ruço pombo e com um chapéu distintíssimo na cabeça repassava daqui prali eguando bem vistoriava Me chamou para junto eu tinha de ter à mão um caderno grosso para por ordem dele assentar nomes números e diversos amanuense Com eles eu estava vindo então o senhor vê Vinha para conhecer esse destinomeudeus O que me animou foi ele predizer que quando eu mais não quisesse era só opor um aceno e ele dava baixa e alta de me ir membora Digo que fui digo que gostei A passeata forte pronta comida bons repousos companheiragem O teor da gente se distraía bem Eu avistava as novas estradas diversidade de terras Se amanhecia num lugar se ia à noite noutro tudo o que podia João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 181 ser ranço ou discórdia consigo restava para trás Era o enfim Era Mais mais háde dará é para diante quando se formar combate uns proseavam Zé Bebelo querendo Sabia o que queria homem de muita raposice Já no sair da Nhanva tinha composto seu povo em avulsos cada grupo cada rumo Um pelo São Lamberto da mão direita outro pegou o Riacho Fundo e o Córrego do Sanhar outro se separou da gente no SóAqui indo o Ribeirão da Barra outro tomou sempre à mão esquerda encostando ombro no São Francisco mas nós que vínhamos mais Zé Bebelo mesmo em capitania rompemos no meio se guindo o traço do Córrego Felicidade Passamos perto de Vila Inconfidência viemos acampar no arraial PedraBranca beira do ÁguaBranca E tudo correndo bem Dum batalhão para outro se expedia gente com ordens e recados Arrastávamos uma rede grande peixe grande por pegar E foi Eu não vi essa célebre batalha eu tinha ficado na PedraBranca Não por medo não Mas Zé Bebelo me mandou Tem paciência você espera para reunir os municipais do lugar e fazer discurso logo que um estafeta vier relatar qual foi nossa primeira vitória Se deu o que se disse Só que em vez de estafeta a galope veio Zé Bebelo mesmo Eu tinha ficado com ruma de foguetes para soltar e foi festa Zé Bebelo mandou dispor uma tábua por João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 182 cima de um canto de cerca conforme ele ali subiu e muito falou Referiu Para lá do Rio Pacu no município de Brasília tinham volteado um bando de jagunços o com o valentão Hermógenes à testa e derrotado total Mais de dez mortos mais de dez cabras agarrados presos infelizmente só foi que aquele Hermógenes conseguira de fugir Mas não podia ir a longe Ao que Zé Bebelo elogiou a lei deu viva ao governo para perto futuro prometeu muita coisa republicana Depois enxeriu que eu falasse discurso também Tive de Você deve de citar mais é em meu nome o que por meu recato não versei E falar muito nacional se me se soprou Cumpri O que um homem assim devia de ser deputado eu disse encalquei Acabei ele me abraçou O povo eu acho que apreciava Daí quando se estava no depois do almoço vieram cavaleiros nossos tangendo o troço de presos Senti pena daqueles pobres cansados azombados quase todos sujos de sangues secos se via que não tinham esperança nenhuma decente Iam de leva para a cadeia de Extrema e de lá para outras cadeias de certo até para a da Capital Zé Bebelo olhando me olhou notou moleza Tem dó não São os danados de façanhosos Ah era Disso eu sabia Mas como ia não ter pena O que demasia na gente é a força feia do sofrimento própria não é a qualidade do sofrente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 183 Pensei que agora podíamos merece maior descanso Ah sim Montar e galopar Tem mais Tem Zé Bebelo chamou Tocamos Conversando no caminho eu perguntei não sei E Joca Ramiro Zé Bebelo tiscou de ombros parece que não queria falar naquele Daí me deu um gosto de menor maldade de explicar como era fabuloso o estado de Joca Ramiro como tudo ele sabia e provia e até que trazia um homem só para o oficio de ferrador com a tendinha e as ferramentas e o tudo mais versante aos animais O que ouvindo Zé Bebelo esbarrou Ah é uma idéia que vale ora veja Isso a gente tem de conceber também é o bom exemplo para se aproveitar ele atinou E eu que já ia contar mais do diverso das peripécias que meu padrinho dizia que Joca Ramiro inventava no dar batalha então eu como me concertei em mim e calei a boca Mire veja o senhor tudo o que na vida se estorva razão de pressentimentos Porque eu estava achando que se contasse perfazia ato de traição Traição mas por quê Dei um tunco A gente não sabe a gente sabe Calei a boca toda Desencurtamos os cavalos No entre o Condado e a Lontra se foi a fogo Aí vi aprendi A metade dos nossos que se apeavam no avanço entremeados disfarçantes suas armas em arte escamoteados pelas árvores e de repente ligeiros se jazendo para o rastejo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 184 com as cabeças farejavam toda a vida Aqueles sabiam brigar desde de nascença Só avistei isso um instante Sendo que seguindo Zé Bebelo reviramos volta para o Gameleiras onde houve o pior O que era era o bando do Ricardão que quase próximo que cercamos Para acuar só faltando cães E demos inferno Se travou Tiro estronda muito no meio do cerrado se diz que é estampido que é rimbombo Tive noção de que morreram bastantes Vencemos Não desci de meu animal Nem prestei nem estive no fim como o galope se desabriu os ho mens perseguindo uns que com o mesmo Ricardão se escapavam Mas mais não se aproveitou o Ricardão já tinha tido fuga Então os nossos de jeriza com os oito prisioneiros feitos queriam se concluir Eh de jeito nenhum epa Não consinto covardias de perversidade Zé Bebelo se danou Apreciei a excelência dele no sistema de não se matar Assim eu quis que o ar de paz logo revertesse o alimpado o povo gritando menos Aquele dia tinha sido forte coisa De longe e sossego eu careci demais Se teve pouco Arranjado o preciso só se tomou prazo breve porque recombinaram por diante os projetos e desarrancamos para a Terra Fofa quase na demarca com o Grão Mogol Mas lá não cheguei Em certo ponto do caminho eu resolvi melhor minha vida João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 185 Fugi De repente eu vi que não podia mais me governou um desgosto Não sei se era porque eu reprovava aquilo de se ir com tanta maioria e largueza matando e prendendo gente na constante brutalidade Debelei que descuidassem de mim restei escondido retardado Vimme Isso que pelo ajustado eu não carecia de fazer assim Podia chegar perto de Zé Bebelo desdizer Desanimei declaro de retornar para o Curralim Não podia Mas na hora mesma em que eu a decisão tomei logo me deu um enfaro de Zé Bebelo em trosgas a conversação Nem eu não estava para ter confiança nenhuma em ninguém A bem me fugi e mais não pensei exato Só isso O senhor sabe se desprocede a ação escorregada e aflita mas sem sustância narrável Meu cavalo era bom eu tinha dinheiro na algibeira eu estava bem armado Virei vagaroso Meu rumo mesmo era o do mais incerto Viajei vim acho que eu não tinha vontade de chegar em nenhuma parte Com vinte dias de remanchear e sem as trapalhadas maiores foi que me encostei para o Rio das Velhas à vista da barra do Córrego Batistério Dormi com uma mulher que muito me agradou o marido dela estava fora na redondeza Ali não dava maleita De manhã cedo a mulher me disse Meu pai existe daqui a quartodelégua Vai lá tu almoça João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 186 e janta De noite se meu marido não tiver voltado eu te chamo dando avisos Eu falei Você acende uma fogueira naquele alto eu enxergo eu cá venho Ela falou Ao que não posso alguém mais avistando havia de poder desconfiar Eu falei Assim mesmo eu quero Fogueira uma fogueirinha de nada Ela falou Quem sabe eu acendo A gente sérios nem se sorrindo Aí eu fui Mas o pai dessa mulher era um homem finório de esperto com o jeito de tirar da gente a conversa que ele constituía A casa dele espaçosa casadetelha e caiada era na beira ali onde o rio tem mais troas Se chamava Manoel Inácio Malinácio dito e geria uns bons pastos com cavalhada pastando e os bois Me deu almoço me pôs em fala Eu estava querendo ser sincero E notei que ele no falar me encarava e no ouvir piscava os olhos e quem encara no falar mas pisca os olhos para ouvir não gosta muito de soldados Aos poucos então contei que dos zébebelos não tinha querido fazer parte o que era a valente verdade E Joca Ramiro ele me perguntou Eu disse um pouco por me engrandecer e pôr minha prosa que já tinha servido Joca Ramiro e com ele conversado Que mesmo por isso é que eu não podia ficar com Zé Bebelo porque meu seguimento era por loca Ramiro em João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 187 coração em devoção E falei no méu padrinho Selorico Mendes e em Aluiz e Alarico Totõe e de como foi que Joca Ramiro pernoitou em nossa fazenda do São Gregório Mais coisas de certo eu disse e aquele homem Malinácio me ouvia só se fazendo de sossegado Mas eu percebi que ele não estava Deu jeito de aconselhar que eu fosse embora Que ali miasmava braba maleita Não acertei Eu queria esperar para ver se a fogueira por minha sorte se acendia eu tinha gostado muito da filha dele casada Por um instante o sabido do homem se tardou no que fazer Mas eu requerendo um lugar para armar minha rede na sombra e descansar eu disse que não andava bem de saúde isso pareceu ser de seu agrado Me levou para um quarto onde tinha um jirau com enxergão me botou lá à Ia vontade fechou a porta Ferrei abraçado com minhas armas Acordei só no aquele Malinácio me chamando para jantar Cheguei na sala e dei com outros três homens Disseram de si que tropeiros eram e estavam assim vestidos e parecidos Mas o Malinácio começou a glosar e reproduzir minha conversa tida com ele disso desgostei segredos frescos contados não são para todos E o arrieiro dono da tropa que era o de cara redonda e pra clara me fez muita interrogação Não estive em boas cócoras Construí de desconfiar Não do fato dele tal João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 188 encarecer pois todo tropeiro sempre muito pergunta mas do jeito como os outros dois ajudavam aquele a me ver de tudo perseverado tomando conta Ele queria saber para onde eu mesmo me ia além Queria saber por que se eu punia por loca Ramiro e estava em armas por que então eu não tinha caçado jeito de trotar para o Norte a fito de com o pessoal ramiros me juntar Quem desconfia fica sábio dizendo como pude muito confirmei mas confirmei acrescentando que chegara até ali por dar volta cautelosa e mesmo para sobre ter a calma de resolver os projetos em meu espírito Ah mas ah enquanto que me ouviam mais um homem tropeiro também vinha entrando na soleira da porta Agüentei aquele nos meus olhos e recebi um estremecer em susto desfechado Mas era um susto de coração alto parecia a maior alegria Soflagrante conheci O moço tão variado e vistoso era pois sabe o senhor quem mas quem mesmo Era o Menino O Menino senhor sim aquele do porto do deJaneiro daquilo que lhe contei o que atavessou o rio comigo numa bamba canoa toda a vida E ele se chegou eu do banco me levantei Os olhos verdes semelhantes grandes o lembrável das compridas pestanas a boca melhor bonita o nariz fino afiladinho Arvoamento desses a gente estatela e não entende que dirá o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 189 senhor eu contando só assim Eu queria ir para ele para abraço mas minhas coragens não deram Porque ele faltou com o passo num rejeito de acanhamento Mas me reconheceu visual Os olhos nossos donos de nós dois Sei que deve de ter sido um estabelecimento forte porque as outras pessoas o novo notaram isso no estado de tudo percebi O Menino me deu a mão e o que mão a mão diz é o curto às vezes pode ser o mais adivinhado e conteúdo isto também E ele como sorriu Digo ao senhor até hoje para mim está sorrindo Digo Ele se chamava o Reinaldo Para que referir tudo no narrar por menos e menor Aquele encontro nosso se deu sem o razoável comum sobrefalseado como do que só em jornal e livro é que se lê Mesmo o que estou contando depois é que eu pude reunir relembrado e verdadeiramente entendido porque enquanto coisa assim se ata a gente sente mais é o que o corpo a próprio é coração bem batendo Do que o que o real roda e põe diante Essas são as horas da gente As outras de todo tempo são as horas de todos me explicou o compadre meu Quelemém Que fosse como sendo o trivial do viver feito uma água dentro dela se esteja e que tudo ajunta e amortece só rara vez se consegue subir com a cabeça fora dela feito um milagre João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 190 peixinho pediu Por quê Dizquedirei ao senhor o que nem tanto é sabido sempre que se começa a ter amor a alguém no ramerrão o amor pega e cresce é porque de certo jeito a gente quer que isso seja e vai na idéia querendo e ajudando mas quando é destino dado maior que o miúdo a gente ama inteiriço fatal carecendo de querer e é um só facear com as surpresas Amor desse cresce primeiro brota é depois Muito falo sei caceteio Mas porém é preciso Pois então Então o senhor me responda o amor assim pode vir do demo Poderá Pode vir de umquenãoexiste Mas o senhor calado convenha Peço não ter resposta que se não minha confusão aumenta Sabe uma vez no Tamanduátão no barulho da guerra eu ven cendo aí estremeci num relance claro de medo medo só de mim que eu mais não me reconhecia Eu era alto maior do que eu mesmo e de mim mesmo eu rindo gargalhadas dava Que eu de repente me perguntei para não me responder Você é o reidoshomens Falei e ri Rinchei feito um cavalão bravo Desfechei Ventava em todas as árvores Mas meus olhos viam só o alto tremer da poeira E mais não digo chus Nem o se nhor nem eu ninguém não sabe Conto Reinaldo ele se chamava Era o Menino do Porto já expliquei E desde que ele apareceu moço e igual no portal João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 191 da porta eu não podia mais por meu próprio querer ir me separar da companhia dele por lei nenhuma podia O que entendi em mim direito como se no reencontrando aquela hora aquele MeninoMoço eu tivesse acertado de encontrar para o todo sempre as regências de uma alguma a minha família Se sem peso e sem paz sei sim Mas assim como sendo o amor podia vir mandado do Dê Desminto Ah e Otacília Otacília o senhor verá quando eu lhe contar ela eu conheci em conjuntos suaves tudo dado e clareado suspendendo se diz quando os anjos e o vôo em volta quase quase A Fazenda Santa Catarina nos BuritisAltos cabeceira de vereda Otacília estilo dela era toda exata criatura de belezas Depois lhe conto tudo tem o tempo Mas o mal de mim doendo e vindo é que eu tive de compesar numa mão e noutra amor com amor Se pode Vem horas digo se um aquele amor veio de Deus como veio então o outro Todo tormento Comigo as coisas não têm hoje e anfontem amanhã é sempre Tormentos Sei que tenho culpas em aberto Mas quando foi que minha culpa começou O senhor por ora mal me entende se é que no fim me entenderá Mas a vida não é entendível Digo afora esses dois e aquela mocinha Nhorinhá da Aroeirinha filha de Ana Duzuza eu nunca supri outro amor nenhum E Nhorinhá eu deamei no passado com um retardo custoso No passado eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 192 digo e sei sou assim relembrando minha vida para trás eu gosto de todos só curtindo desprezo e desgosto é por minha mesma antiga pessoa Medeiro Vaz antes de sair pelos Gerais com mão de justiça botou fogo em sua casa nem das cinzas carecia a possessão Casas por ordem minha aos bradados eu incendiei eu ficava escutando o barulho de coisas rompendo e caindo e estralando surdo desamparadas lá dentro Sertão Logo que o Reinaldo me conheceu e me saudou não tive mais dificuldade em dar certeza aos outros de minha situação Ao quase sem sobejar palavras ele afiançou o meu valimento para aquele mestre de cara redonda e bom parecer que passava por arrieiro da tropa e se chamava Titão Passos De fato tropeiros não eram eu soube mas pessoal brigal de Joca Ramiro E a tropa Essa que se estava para seguir porquanto pra o Norte com os três lotes de bons animais era para levar munição Nem tiveram mais prevenimento de esconder isso de mim Aquele Malinácio era o guardador com as munições bem encobertadas Defronte da casa dele mesmo e para cima e para baixo o rio possuía as croas de areia cada qual com seu nome que os remadores do dasVelhas botavam e que todos tanto conheciam Três croas e uma ilha Mas uma delas três maior também sendo meio ilha isto é ilha de terra na parte de baixo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 193 com grandes pedras e árvores e suja de matinho capim o alecrim viçoso remolhando suas folhagens nágua e o bundade negro verde vivente e croa só de areia na parte de cima Uma croacomilha que é conforme se diz A CroacomIlha do Malinácio dita A lá que aonde estava o oculto a gente ia em canoa baldear a munição Os outros companheiros afetados de tropeiros sendo ó Triol e João Vaqueiro e mais Acrísio e Assunção de sentinelas e Vove Jenolim e Admeto que acabavam de enquerir a carga na mulada A gente jantouse já se estava de saída para toda viagem Eu ia com eles Pois fomos Nem tive pesar nenhum de não esperar o sinal da fogueira da mulher casada filha do Malínácio E ela era bonita sacudida Mulher assim de ser que nem braçada de cana da bica para os cochos dos cochos para os tachos Menos pensei A andada de noite principiava como sobre algodão produzida cuidadosa Aquilo era munição de contos e contos de réis a gente prezava grandes responsabilidades Se vinha sem beiradear mas sabendo o rio Titão Passos comandava De seguir assim sem a dura decisão feito cachorro magro que espera viajantes em ponto de rancho o senhor quem sabe vá achar que eu seja homem sem caráter Eu mesmo pensei Conheci que estava chocho dado no mundo vazio de um meu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 194 dever honesto Tudo naquele tempo e de cada banda que eu fosse eram pessoas matando e morrendo vivendo numa fúria firme numa certeza e eu não pertencia a razão nenhuma não guardava fé e nem fazia parte Abalado desse tanto transtornei um imaginar Só não quis arrependimento porque aquilo sempre era começo e descoroçoamento era mododematéria que eu já tinha aprendido a protelar Mas o Reinaldo vinha comigo no mesmo lote e não caçava minha companhia não se chegou para perto de mim nem vez não dava sinal de prosse guir amizade A gente descarecia de cuidar dos burros um por um enfileirados naquela paciência na escuridão da noite eles tudo enxergavam Se eu não tivesse passado por um lugar uma mulher a combinação daquela mulher acender a fogueira eu nunca mais nesta vida tinha topado com o Menino era o que eu pensava Veja o senhor eu puxava essa idéia e com ela em vez de me alegre ficar por ter tido tanta sorte eu sofria o meu Sorte O que Deus sabe Deus sabe Eu vi a neblina encher o vulto do rio e se estralar da outra banda a barra da madrugada Assaz as seriemas para trás cantaram Ao que esbarramos num sitiozinho se avistou um preto o preto já levantado para o trabalho descampando mato O preto era nosso fizemos paragem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 195 Dali rezei minha avemariazinha de demanhã enquanto se desalbardava e amilhava Outros escovavam os burros e mulas ou a cangalhada iam arrumando a carga toda se pôde resguardar quase que ocupou inteira a casinha do pretoO qual era tão pobre desprevenido tivemos até de dar comida a ele e à mulher e seus filhinhos deles quantidade E notícia nenhuma de nada não se achava A gente ia ao menos dormir o dia mas três tinham de sobreficar de vigias O Reinaldo se dizendo ser um deles eu tive coragem de oferecer também que ficava não tinha sono tudo em mim era nervosía O rio objeto assim a gente observou com uma croa de areia amarela e uma praia larga manhãzando ali estava recheio em instância de pássaros O Reinaldo mesmo chamou minha atenção O comum essas garças enfileirantes de toda brancura o jaburu o patoverde o patopreto topetudo marrequinhos dançantes martim pescador mergulhão e até uns urubus com aquele triste preto que mancha Mas melhor de todos conforme o Reinaldo disseo que é o passarim mais bonito e engraçadinho de rio abaixo e rioacima o que se chama o manuelzinhodacroa Até aquela ocasião eu nunca tinha ouvido dizer de se parar apreciando por prazer de enfeite a vida mera deles pássaros em seu começar e descomeçar dos vôos e pousação Aquilo era João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 196 para se pegar a espingarda e caçar Mas o Reinaldo gostava É formoso próprio ele me ensinou Do outro lado tinha vargem e lagoas Pra e pra os bandos de patos se cruzavam Vigia como são esses Eu olhava e me sossegava mais O sol dava dentro do rio as ilhas estando claras É aquele lá lindo Era o manuelzinhodacroa sempre em casal indo por cima da areia lisa eles altas perninhas vermelhas esteiadas muito atrás traseiras desempinadinhos peitudos escrupulosos catando suas coisinhas para comer alimentação Machozinho e fêmea às vezes davam beijos de biquinquim a galinholagem deles É preciso olhar para esses com um todo carinho o Reinaldo disse Era Mas o dito assim botava surpresa E a macieza da voz o bemquerer sem propósito o caprichado ser e tudo num homemdarmas brabo bem jagunço eu não entendia Dum outro que eu ouvisse eu pensava frouxo está aqui um que empulha e não culha Mas do Reinaldo não O que houve foi um contente meu maior de escutar aquelas palavras Achando que eu podia gostar mais dele Sempre me lembro De todos o pássaro mais bonito gentil que existe é mesmo o Manuelzinhodacroa Depois conversamos de coisas miúdas sem valor alheio e eu tive uma influência para contar artes de minha vida falar a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 197 esmo leve me abrir em amáveis bom Tudo me comprazia por diante eu não necessitava de prolongares Riobaldo Reinaldo de repente ele deixou isto em dizer Dão par os nomes de nós dois A de dar palavras essas que se repartiram para mim pincho no em que já estava de alegria para ele um viceversa de tristeza Que por quê Assim eu ainda não sabia O Reinaldo pitava muito não acerto como podia conservar os dentes tão asseados tão brancos Ao em tanto que também de pitar se carecia porque voltaemeia abespinhavam a gente os mosquitinhos chupadores donos da vazante uns mosquitinhos dançadinhos tantos de se despertar Eu fui contando minha existência Não escondi nada não Relatei como tinha acompanhado Zé Bebelo o foguetório que soltei e o discurso falado na PedraBranca o combate dado na beira do Gameleiras os pobres presos passando com as camisas e as caras sujadas de secos sangues Riobaldo você é valente Você é um homem pelo homem ele no fim falou Sopesei meu coração povoado enchido se diz me cri capaz de altos para toda seriedade certa proporcionado E aí desde aquela hora conheci que o Reinaldo qualquer coisa que ele falasse para mim virava sete vezes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 198 Desculpa me dê o senhor sei que estou falando demais dos lados Resvalo Assim é que a velhice faz Também o que é que vale e o que é que não vale Tudo Mire veja sabe por que é que eu não purgo remorso Acho que o que não deixa é a minha boa memória A luzinha dos santosarrependidos se acende é no escuro Mas eu lembro de tudo Teve grandes ocasiões em que eu não podia proceder mal ainda que quisesse Por quê Deus vem guia a gente por uma légua depois larga Então tudo resta pior do que era antes Esta vida é de cabeçaparabaixo ninguém pode medir suas perdas e colheitas Mas conto Conto para mim conto para o senhor Ao quando bem não me entender me espere Aí nesse mesmo meiodia rendidos na vigiação o Reinaldo e eu não estávamos com sono ele foi buscar uma capanga bonita que tinha com lavores e três botóezinhos de abotoar O que nela guardava era tesoura tesourinha pente espelho sabão verde pincel e navalha Dependurou o espelho num galho de marmelodomato acertou seu cabelo que já estava cortado baixo Depois quis cortar o meu Me emprestou a navalha mandou eu fazer a barba que estava bem grandeúda Acontecendo tudo com risadas e ditos amigos como quando com seu arreleque porescuro uma nhaúma devoou ou quando João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 199 eu pulei para apanhar um raminho de flores e quase caí comprido no chão ou quando ouvimos um him de mula que perto pastava De estar folgando assim e com o cabelo de cidadão e a cara raspada lisa era uma felicidadezinha que eu principiava Desde esse dia por animação nunca deixei de cuidar de meu estar O Reinaldo mesmo no mais tempo comprou de alguém uma outra navalha e pincel me deu naquela dita capanga Às vezes eu tinha vergonha de que me vissem com peça bordada e historienta mas guardei aquilo com muita estima E o Reinaldo doutras viagens me deu outros presentes camisa de riscado fino lenço e par de meia essas coisas todas Seja o senhor vê até hoje sou homem tratado Pessoa limpa pensa limpo Eu acho Depois o Reinaldo disse eu fosse lavar corpo no rio Ele não ia Só por acostumação ele tomava banho era sozinho no escuro me disse no sinal da madrugada Sempre eu sabia de tal crendice como alguns procediam assim esquisito os caborjudos sujeitos de corpofechado No que era verdade Não me espantei Somente o senhor tenha tanto sacrifício des conforto de esbarrar nos garranchos às tatas na ceguez da noite não se diferenciando um ai dum ei e pelos barrancos lajes escorregadas e lama atolante mais o receio de aranhas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 200 caranguejeiras e de cobras Não eu não Mas o Reinaldo me instruiu aquilo e me deixou na beira da praia alegrias do ar em meu pensamento Cheguei a encarar a água o Rio das Velhas passando seu muito um rio é sempre sem antiguidade Cheguei a tirar a roupa Mas então notei que estava contente demais de lavar meu corpo porque o Reinaldo mandasse e era um prazer fofo e perturbado Agançagem eu pensei Destapei raivas Tornei a me vestir e voltei para a casa do preto devia de ser hora de se comer a janta e arriar a tropa para as estradas Agora o que eu queria era ímpeto de se viajar às altas e ir muito longe A ponto que nem queria avistar o Reinaldo Estou contando ao senhor que carece de um explicado Pensar mal é fácil porque esta vida é embrejada A gente vive eu acho é mesmo para se desiludir e desmisturar A senvergonhice reina tão leve e leve pertencidamente que por primeiro não se crê no sincero sem maldade Está certo sei Mas ponho minha fiança homem muito homem que fui e homem por mulheres nunca tive inclinação pra aos vícios desencontrados Repilo o que o sem preceito Então o senhor me perguntará o que era aquilo Ah lei ladra o poder da vida Direitinho declaro o que durando todo tempo sempre mais às vezes menos comigo se passou Aquela mandante amizade Eu não pensava em adiação João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 201 nenhuma de pior propósito Mas eu gostava dele dia mais dia mais gostava Diga o senhor como um feitiço Isso Feito coisa feita Era ele estar perto de mim e nada me faltava Era ele fechar a cara e estar tristonho e eu perdia meu sossego Era ele estar por longe e eu só nele pensava E eu mesmo não entendia então o que aquilo era Sei que sim Mas não E eu mesmo entender não queria Acho que Aquela meiguice desigual que ele sabia esconder o mais de sempre E em mim a vontade de chegar todo próximo quase uma ânsia de sentir o cheiro do corpo dele dos braços que às vezes adivinhei insensatamente tentação dessa eu espairecia aí rijo comigo renegava Muitos momentos Conforme por exemplo quando eu me lembrava daquelas mãos do jeito como se encostavam em meu rosto quando ele cortou meu cabelo Sempre Do demo digo Com que entendimento eu entendia com que olhos era que eu olhava Eu conto O senhor vá ouvindo Outras artes vieram depois Assim mesmo naquele estado exaltado em que andei concebi fundamento para um conselho na jornada por diante a gente tinha de deixar duma bando o rio ir passar a Serrada Onça e entestar com a travessia do Jequitaí por onde podia ter tropa de soldados mais ajuizado não seria se enviar só um até lá espiar o que se desse e colher outras informações João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 202 Titão Passos era homem ponderado em simples achou boa a minha razão Todos acharam Aquela munição era de ida urgente mas também valia mais que ouro que sangue se carecia de todo cuidado Fui louvado e dito valedor certo nas idéias Ao senhor confesso desmedi satisfação no ouvir aquilo que a assoprada na vaidade é a alegria que dá chama mais depressa e mais a ar Mas logo me reduzi atinando que minha opinião era só pelo desejo encoberto de que a gente pudesse ficar mais tempo ali naquele lugar que me concedia tantos regalos Assim um rôo de remorso tantos perigos ameaçando e a vida tão séria em cima e eu mexendo e virando por via de pequenos prazeres Sempre fui assim descabido desamarrado Mas meu querer surtiu efeito novas ordens Para assuntar e ver com ver o Jenolim saiu em rumo do Jequitaí de sua LagoaGrande e com a mesma tenção rebuçado viajou o Acrísio até Porteiras e o Pontal da Barra com todos os ouvidos bem abertos E nós ficamos esperando a volta deles cinco dias lá com grande regozijo e repouso na casa do preto Pedro Segundo de Rezende que era posteiro em terras da Fazenda São Joãozinho de um coronel Juca Sá Até hoje não me arrependo retratando Os dias que passamos ali foram diferentes do resto de minha vida Em horas andávamos pelos matos vendo o fim do sol nas palmas dos tantos coqueiros macaúbas e caçando cortando palmito e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 203 tirando mel da abelhadepoucasflores que arma sua cera corde rosa Tinha a quantidade de pássaros felizes pousados nas croas e nas ilhas E até peixe do rio se pescou Nunca mais até o derradeiro final nunca mais eu vi o Reinaldo tão sereno tão alegre E foi ele mesmo no cabo de três dias quem me perguntou Riobaldo nós somos amigos de destino fiel amigos Reinaldo pois eu morro e vivo sendo amigo seu eu respondi Os afetos Doçura do olhar dele me transformou para os olhos de velhice da minha mãe Então eu vi as cores do mundo Como no tempo em que tudo era falante ai sei De manhã o rio alto branco de neblim e o ouricuri retorce as palmas Só um bom tocado de viola é que podia remir a vivez de tudo aquilo Dos outros companheiros conosco deixo de dizer Desmexi deles Bons homens no trivial cacundeiros simplórios desse Norte pobre uns assim Não por orgulho meu mas antes por me faltar o raso de paciência acho que sempre desgostei de criaturas que com pouco e fácil se contentam Sou deste jeito Mas Titão Passos digo apreciei porque o que salvava a feição dele era ter o coração nascido grande cabedor de grandes amizades Ele achava o Norte natural Quando que conversamos perguntei a ele se Joca Ramiro era homem bom João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 204 Titão Passos regulou um espanto uma pergunta dessa decerto que nunca esperou de ninguém Acho que nem nunca pensou que Joca Ramiro pudesse ser bom ou ruim ele era o amigo de Joca Ramiro e isso bastava Mas o preto deRezende que estava perto foi quem disse risonho bobeento Bom Um messias O senhor sabe preto quando é dos que encaram de frente é a gente que existe que sabe ser mais agradecida Ao que em tanto no ouvir falar de Joca Ramiro o Reinaldo se aproximou Parecia que ele não gostava de me ver em comprida conversa amiga com os outros ficava quasezinho amuado Com o tempo dos dias fui conhecendo também que ele não era sempre tranqüilo igual feito antes eu tinha pensado Ah ele gostava de mandar primeiro mandava suave depois visto que não fosse obedecido com as setepedras Aquela força de opinião dele mais me prazia Aposto que não Mas eu con cordava quem sabe por essa moleza que às vezes a gente tem sem tal nem razão moleza no diário coisa que até me parece ser parente da preguiça E ele o Reinaldo era tão galhardo garboso tão governandor assim no sistema pelintra que preenchia em mim uma vaidade de ter me escolhido para seu amigo todo leal Talvez também seja Anta entra nágua se rupeia Mas não Era não Era era que eu gostava dele Gostava dele quando eu fechava os olhos Um bemquerer que vinha do ar de meu nariz e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 205 do sonho de minhas noites O senhor entenderá agora ainda não me entende E o mais que eu estava criticando era me a mim contando logro jigajogas Você vai conhecer em breve Joca Ramiro Riobaldo o Reinaldo veio dizendo Vai ver que ele é o homem que existe mais valente Me olhou com aqueles olhos quando doces E perfez Não sabe que quem é mesmo inteirado valente no coração esse também não pode deixar de ser bom Isto ele falou Guardei Pensei Repensei Para mim o indicado dito não era sempre completa verdade Minha vida Não podia ser Mais eu pensando nisso uma hora outra hora Perguntei ao compadre meu Quelemém Do que o valor dessas palavras tem dentro ele me respondeu não pode haver verdade maior Compadre meu Quelemém está certo sempre Repenso E o senhor no fim vai ver que a verdade referida serve para aumentar meu pejo de tribulação Fim do bom logo vem mas O Acrísio retornou pasmaceira na barra do rio a nenhuma novidade Retornou o Jenolim o Jequitaí estava passável E saímos simples com a tropa sem menos dessossego nem mais receio serra para cima pelos caminhos tencionados Daí hora grave me veio com três João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 206 léguas de marcha Mazelas de mais pesares E donde menos temi no pior me vi Titão Passos começou a me perguntar Titão Passos era homem liso bom me fazia as perguntas com natureza tão honrosa que eu não tinha ânimo de mentir nem de me caber calado Nem podia De lá mais adiante atravessando o Jequitaí tudo ia se abrir a ser para nós todos campo de fogo e aos perigos de mortes As turmas de cavaleiros de Zé Bebelo campeavam naquele país caçando gente sopitan do vigiando Do povo morador não faltava quem desconfiando de nós mandasse a eles envio de denúncia pois todos queriam aproveitar a ocasião para se acabar com os jagunços para sempre Morrer morrer a gente sem luxo se cede o Reinaldo disse Mas a munição tem de chegar em poder de loca Ramiro Eu podia pensar tranqüilo na minha morte por ali Podia pensar no Reinaldo morrendo E o que Titão Passos queria saber era tudo que eu soubesse a respeito de Zé Bebelo das malasartes que ele usava em guerra de seus aprovados costumes suas forças e armamentos Tudo o que eu falasse podia ajudar O saber de uns a morte de outros Para melhor pensar fui malrespondendo me calando falando o que era vasto Como eu ia depor Podia Tudo o que eu mesmo quisesse Mas traição não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 207 Não Nem era por retente de dever por lei honesta nenhuma ou floreado de noção Mas eu não podia Tudo dentro de mim não podia Dou vendido em pecas riquezas o que eu cansei naquela hora minhas caras deviam de estar pegando fogo Que se eu contasse não contasse essas ânsias Eu não podia como um bicho não pode deixar de comer a avistada comida como uma bichafêmea não pode fugir deixando suas criazinhas em frente da morte Eu devia Não devia Vi vago o adiante da noite com sombras mais apresentadas Eu quem é que eu era De que lado eu era Zé Bebelo ou Joca Ramiro Titão Passos o Reinaldo De ninguém eu era Eu era de mim Eu Riobaldo Eu não queria querer contar Falei e refalei inútil consoante e quer ver que Titão Passos aceitava aquilo assim Me acreditava Lembrei que ainda tinha guardada estreito comigo aquela lista de nomes e coisas de Zé Bebelo num caderno Alguma valia aquilo tinha Não sei sabia não Andando peguei oculto rasguei em pedacinhos taquei tudo no arrojo dum riacho Aquelas águas me lavavam E de tudo que a respeito do resto eu sabia cacei em mim um esforço de me completo me esquecer Depois Titão Passos disse Você pode ser de muita ajuda Se a gente topar com a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 208 zebelância você entra de bico fala que é um deles que esta tropa você está levando Com isso me conformei Aos poucos mesmo compunha uma alegria de ser capaz de auxiliar e pôr efeito como o justo companheiro A que no bando de loca Ramiro eu havia de prestar toda a minha diligência e coragem E nem fazia mal que eu não relatasse a respeito de Zé Bebelo mais porquanto o prejuízo que disso se tivesse por ele eu também padecia e pagava No caso em vista de que agora eu estava também sendo um ramiro fazia parte De pensar isso eu desfrutei um orgulho de alegria de glória Mas ela durou curta Oi barros de água do Jequitaí que passaram diante de minha fraqueza Foi que Titão Passos pensando mais me disse Tudo temos de ter cautela Se eles já souberam notícia de que você fugiu e te encontram são sujeitos para quererem logo te matar imediato por culpas de desertor Ouvi retardado não pude dar resposta Me amargou no cabo da língua Medo Medo que maneia Em esquina que me veio Bananeira dá em vento de todo lado Homem É coisa que treme O cavalo ia me levando sem data Burros e mulas do lote de tropa eu tinha inveja deles Tem diversas invenções de medo eu sei o senhor sabe Pior de todas é essa que tonteia primeiro depois esvazia Medo que já João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 209 principia com um grande cansaço Em minhas fontes cocei o aviso de que um suor meu se esfriava Medo do que pode haver sempre e ainda não há O senhor me entende costas do mundo Em tanto eu devia de pensar tantas coisas que de repente podia cursar por ali gente zebebela armada me pegavam por al por mal eu estava soflagrante encostado rendido sem salves atirado para morrer com o chão na mão Devia de me lembrar de outros apertos e dar relembro do que eu sabia de ódios daqueles homens querentes de ver sangues e carnes das maldades deles capazes demorando vingança com toda judiação Não pude não pensava demarcado Medo não deixava Eu estando com um vapor na cabeça o miolo volteado Mudei meu coração de posto E a viagem em nossa noite seguia Purguei a passagem do medo grande vão eu atravessava A tristeza Aí o Reinaldo na paragem veio para perto de mim Por causa da minha tristeza sei que de mim ele mais gostava Sempre que estou entristecido é que os outros gostam mais de mim de minha companhia Por quê Nunca falo queixa de nada Minha tristeza é uma volta em medida mas minha alegria é forte demais Eu atravessava no meio da tristeza o Reinaldo veio Ele bemmequis aconselhou brincando Riobaldo puxa as orelhas do teu jumento Mas amuado eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 210 não estava Respondi somente Amigo e não disse nem mais Com toda minha cordura Mas de feito eu carecia de sozinho ficar Nem a pessoa especial do Reinaldo não me ajudava Sozinho sou sendo de sozinho careço sempre nas estreitas horas isso procuro O Reinaldo comigo par a par e a tristeza do medo me eivava de a ele não dar valor Homem como eu tristeza perto de pessoa amiga afraca Eu queria mesmo algum desespero Desespero quieto às vezes é o melhor remédio que há Que alarga o mundo e põe a criatura solta Medo agarra a gente é pelo enraizado Fui indo De repente de repente tomei em mim o gole de um pensamento estralo de ouro pedrinha de ouro E conheci o que é socorro Com o senhor me ouvindo eu deponho Conto Mas primeiro tenho de relatar um importante ensino que recebi do compadre meu Quelemém E o senhor depois verá que naquela minha noite eu estava adivinhando coisas grandes idéias Compadre meu Quelemém muitos anos depois me ensinou que todo desejo a gente realizar alcança se tiver ânimo para cumprir sete dias seguidos a energia e paciência forte de só fazer o que dá desgosto nojo gastura e cansaço e de rejeitar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 211 toda qualidade de prazer Diz ele eu creio Mas ensinou que maior e melhor ainda é no fim se rejeitar até mesmo aquele desejo principal que serviu para animar a gente na penitência de glória E dar tudo a Deus que de repente vem com novas coisas mais altas e paga e repaga os juros dele não obedecem medida nenhuma Isso é do compadre meu Quelemém Espécie de reza Bem rezar aquela noite eu não conseguia Nisso nem pensei Até para a gente se lembrar de Deus carece de se ter algum costume Mas foi aquele grão de idéia que me acuculou me argumentou todo Ideiazinha Só um começo Aos pouquinhos é que a gente abre os olhos achei de per mim E foi que no dia que amanhecia eu não ia pitar por forte que fosse o vício de minha vontade E não ia dormir nem descansar sentado nem deitado E não ia caçar a companhia do Reinaldo nem conversa o que de tudo mais prezava Resolvi aquilo e me alegrei O medo se largava de meus peitos de minhas pernas O medo já amolecia as unhas Íamos chegando numa tapera nas Lagoas do Córrego Mucambo Lá nós tínhamos pastos bons O que resolvi cumpri Fiz Ah aquele dia me carregou abreviei o poder de outras aragens Cabeça alta digo Esta vida está cheia de ocultos caminhos Se o senhor souber sabe não sabendo não me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 212 entenderá Ao que por outra ainda um exemplo lhe dou O que há que se diz e se faz que qualquer um vira brabo corajoso se puder comer cru o coração de uma onçapintada É mas a onça a pessoa mesma é quem carece de matar mas matar à mão curta a ponta de faca Pois então por aí se vê eu já vi um sujeito medroso que tem muito medo natural de onça mas que tanto quer se transformar em jagunço valentão e esse homem afia sua faca e vai em soroca capaz que mate a onça com muita inimizade o coração come se enche das coragens terríveis O senhor não é bom entendedor Conto De não pitar me vinham uns rangidos repentes feito eu tivesse ira de todo o mundo Agüentei Sobejante saí caminhando com firmes passos bis tris ia e voltava Me deu vontade de beber a da garrafa Rosnei que não Andei mais Nem não tinha sono nenhum desmenti fadiga Reproduzi de mim outro fôlego Deus governa grandeza Medo mais Nenhum algum Agora viesse corja de zebebelos ou tropa de meganhas e me achavam Me achavam ah bas tantemente Eu aceitava qualquer vuvu de guerra e ia em cima enorme sangue ferro por ferro Até queria que viessem duma vez pelo definitivo Aí quando os passos escutei vi era o Reinaldo que vindo Ele queria direto comigo se conferir João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 213 Eu não podia tão depressa fechar meu coração a ele Sabia disso E ele curtia um engano pensou que eu estava amofinado e eu não estava O que era sisudez de meu fogo de pessoa ele tomou por mãmolência Queria me trazer consolo Riobaldo amigo me disse Eu estava respirando muito forte com pouca paciência para o trivial pelo tanto respondi alguma palavra só Ele em hora comum com muito menos que isso a gente marfava Na vez não se ofendeu Riobaldo não calculei que você era genista ainda gracejou Dei a nenhuma resposta Momento calados ficamos se ouvia o corrute dos animais que pastavam à bruta no capim alto O Reinaldo se chegou para perto de mim Quanto mais eu tinha mostrado a ele a minha dureza mais amistoso ele parecia maldando isso pensei Acho que olhei para ele com que olhos Isso ele não via não notava Ah ele me queriabem digo ao senhor Mas graçasadeus o que ele falou foi com a sucinta voz Riobaldo pois tem um particular que eu careço de contar a você e que esconder mais não posso Escuta eu não me chamo Reinaldo de verdade Este é nome apelativo inventado por necessidade minha carece de você não me perguntar por quê Tenho meus fados A vida da gente faz sete voltas se diz A vida nem é da gente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 214 Ele falava aquilo sem rompante e sem entonos mais antes com pressa quem sabe se com tico de pesar e vergonhosa suspensão Você era menino eu era menino Atravessamos o rio na canoa Nos topamos naquele porto Desde aquele dia é que somos amigos Que era eu confirmei E ouvi Pois então o meu nome verdadeiro é Diadorim Guarda este meu segredo Sempre quando sozinhos a gente estiver é de Diadorim que você deve de me chamar digo e peço Riobaldo Assim eu ouvi era tão singular Muito fiquei repetindo em minha mente as palavras modo de me acostumar com aquilo E ele me deu a mão Daquela mão eu recebia certezas Dos olhos Os olhos que ele punha em mim tão externos quase tristes de grandeza Deu alma em cara Adivinhei o que nós dois queríamos logo eu disse Diadorim Diadorimcom uma força de afeição Ele sério sorriu E eu gostava dele gostava gostava Aí tive o fervor de que ele carecesse de minha proteção toda a vida eu terçando garantindo punindo por ele Ao mais os olhos me perturbavam mas sendo que não me enfraqueciam Diadorim Solsepôr saímos e tocamos dali para o Canabrava e o Barra João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 215 Aquele dia fora meu me pertencia Íamos por um plaino de varjas lua lá vinha Alimpo de lua Vizinhança do sertão esse AltoNorte brabo começava Estes rios têm de correr bem eu de mim dei Sertão é isto o senhor sabe tudo incerto tudo certo Dia da lua O luar que põe a noite inchada Reinaldo Diadorim me dizendo que este era real o nome dele foi como dissesse notícia do que em terras longes se passava Era um nome ver o quê Que é que é um nome Nome não dá nome recebe Da razão desse encoberto nem resumi curiosidades Caso de algum crime arrependido fosse fuga de alguma outra parte ou devoção a um santoforte Mas havendo o ele querer que só eu soubesse e que só eu esse nome verdadeiro pronunciasse Entendi aquele valor Amizade nossa ele não queria acontecida simples no comum sem encalço A amizade dele ele me dava E amizade dada é amor Eu vinha pensando feito toda alegria em brados pede pensando por prolongar Como toda alegria no mesmo do momento abre saudade Até aquelaalegria sem licença nascida esbarrada Passarinho cai de voar mas bate suas asinhas no chão Hoje em dia verso isso emendo e comparo Todo amor não é uma espécie de comparação E como é que o amor desponta Minha Otacília vou dizer Bem que eu conheci João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 216 Otacília foi tempos depois depois se deu a selvagem desgraça conforme o senhor ainda vai ouvir Depois após Mas o primeiro encontro meu com ela desde já conto ainda que esteja contando antes da ocasião Agora não é que tudo está me subindo mais forte na lembrança Pois foi Assim que desta banda de cá a gente tinha padecido toda resma de reveses e que soubemos que os judas também tinham atravessado o São Francisco então nós passamos viemos procurar o poder de Medeiro Vaz única esperança que restava Nos gerais Ah buriti cresce e merece é nos gerais Eu vinha com Diadorim com Alaripe e com João Va queiro mas Jesualdo e o Fafafa Aos BuritisAltos digo ao senhor vereda acima até numa Fazenda Santa Catarina se chegar A gente tinha ciência de que o dono era favorável do nosso lado lá se devia de esperar por um recado Fomos chegando de tardinha noitinha já era noite noite fechada Mas o dono não estava não só ia vir no seguinte e sor Amadeu o graça dele era Quem acudiu e falou foi um velhozinho já santificado de velho só se apareceu no parapeito da varanda parece que estava receoso de nossa forma não solicitou de se subir nem mandou dar nada de comer mas disse licença da gente dormir na rebaixa do engenho Avô de Otacília esse velhinho era se chamava Nhô Vô Anselmo Mas em tanto que ele falava e mesmo com a confusão e os latidos de muitos cachorros eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 217 divulguei qual que uma luz de candeia mal deixava a doçura de uma moça no enquadro da janela lá dentro Moça de carinha redonda entre compridos cabelos E o que mais foi foi um sorriso Isso chegasse Às vezes chega às vezes Artes que morte e amor têm paragens demarcadas No escuro Mas senti me senti Águas para fazerem minha sede Que jurei em mim a Nos sa Senhora um dia em sonho ou sombra me aparecesse podia ser assim aquela cabecinha figurinha de rosto em cima de alguma curva no ar que não se via Ah a mocidade da gente reverte em pé o impossível de qualquer coisa Otacília O prêmio feito esse eu merecia Diadorimdirá o senhor então eu não notei viciice no modo dele me falar me olhar me quererbem Não que não fio e digo Hádeo outras coisas O senhor duvida Ara mitilhas o senhor é pessoa feliz vou me rir Era que ele gostava de mim com a alma me entende O Reinaldo Diadorim digo Eli ele sabia ser homem terrível Suspa O senhor viu onça boca de lado e lado raivável pelos filhos Viu rusgo de touro no alto do campo brabejando cobra jararacuçu emendando sete botes estalados bando doido de queixadas se passantes dando febre no mato E o senhor não viu o Reinaldo guerrear Essas coisas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 218 se acreditam O demônio na rua no meio do redemunho Falo Quem é que me pega de falar quantas vezes quero Assim ao feito quando logo que desapeamos no acampo do Hermógenes e quando Ah lá era um cafarnaum Moxinife de más gentes tudo na deslei da jagunçagem bargada Se estavam entre o FuradodeSãoRoque e o FuradodoSapo rebeira do Ribeirão da Macaúba por fim da Mata da Jaíba A lá chegamos num detardinha Às primeiras horas conferi que era o inferno Aí com três dias me acostumei O que eu estava meio trans tornado da viagem A ver o que eu contava quem não conhecia o Reinaldo ficou pronto conhecendo Digo Diadorim Nós tínhamos em fim chegado sem soberba nenhuma contentes por topar com tanto número de companheiros em armas de todos todos eram garantia Entramos no meio deles misturados para acocorar e prosear caçamos um pé de fogo Novidade nenhuma o senhor sabe em roda de fogueira toda conversa é miudinhos tempos Algum explicava os combates com Zé Bebelo nós o nosso roteiro todo da viagem aos poucos para se historiar Mas Diadorim sendo tão galante moço as feições finas caprichadas Um ou dois dos homens não achavam nele jeito de macheza ainda mais que pensavam que ele era novato Assim loguinho João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 219 começaram aí gandaiados Desses dois um se chamava de alcu nha o FanchoBode tratantaz O outro um tribufu se dizia Fulorêncio veja o senhor Mau par A fumaça dos tições deu para a cara de Diadorim Fumacinha é do lado do delicado o FanchoBode teatrou Consoante falou soez com soltura com propósito na voz A gente quietos Se vai lá aceitar rixa assim de graça Mas o sujeito não queria pazear Se levantou e se mexeu de modo fazendo xetas mengando e castanhetando numa dança de furtapasso Diadorim se esteve em pé se arredou de perto da fogueira vi e mais vi ele apropriar espaços Mas esse FanchoBode era abusado vinha querer dar umbigada E o outro muito comparsa lambuzante preto estumou assim como fingiu falsete cantarolando pelo nariz Pra gauder Gaudêncio E aqui pra o Fulorêncio Aquilo lufou De rempe tudo foi um ão e um cão mas o que havia de haver eu já sabia Oap o assoprado de um refugão e Diadorim entrava de encontro no FanchoBode arrumou mão nele meteu um sopapo um safado nas queixadas e uma sobarbada e calçou com o pé se fez em fúria Deu com o FanchoBode todo no chão e já se curvou em cima e o punhal João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 220 parou ponta diantinho da goela do dito bem encostado no gogó da parte de riba para se cravar deslizado com bom apoio e o pico em pele de belisco para avisar do gosto de uma boamorte era só se soltar que pelo peso um fato se dava O fechabrir de olhos e eu também tinha agarrado meu revólver Arre eu não queria presumir de prevenir ninguém mais queria mesmo era matar se carecesse Acho que notaram Ao que em hora justa e certa nunca tive medo Notaram Farejaram pressentindo como cachorro sabe Ninguém não se meteu pois desapartar assim é perigoso Aquele Fulorêncio instantâneo esbarrou com os acionados indecentes me menos olhou uma vez daí não quis me encarar mais Coca bronco Diadorim mandou o Fancho se levantasse que puxasse também a faca viesse melhor se desempenhar Mas o FanchoBode se riu amistoso safado como tudo tivesse constado só duma brincadeira Oxente Homem tu é manovelho patrício Estava escabreado Dava nojo ele com a cara suja de maus cabelos que cresciam por todo lado Guardei meu revólver respeitosamente Aqueles dois homens não eram medrosos só que não tinham os interesses de morrer tão cedo assim Homem é rosto a rosto jagunço também é no quemcomquem E eles dois não estavam ali muito estimados Comprazendo conosco outros companheiros deram ar de amizade E mesmo por gracejo cordial o Fulorêncio me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 221 perguntou Mano Velho me compra o que eu sonhei hoje Divertindo também para o ar dei resposta Só se for com dinheiro da mãe do jacaré Todos riram De mim não riram O Fulorêncio riu também mas riso de velho Cá pensei silencioso silenciosinho Um dia um de nós dois agora tem de comer o outro Ou se não fica o assunto para os nossos netos ou para os netos dos nossos filhos Tudo em mais paz me ofereceram bebi da januária azulosa um gole me foi cachaça muito nomeada Aquela noite dormi conseguintemente Sempre disse ao senhor eu atiro bem E esses dois homens FanchoBode e Fulorêncio bateram a bota no primeiro fogo que se teve com uma patrulha de Zé Bebelo Por aquilo e isso alguém falou que eu mesmo tinha atirado nos dois no ferver do tiroteio Assim por exemplo no circundar da confusão o senhor sabe quando bala raciocina Adiante falaram que eu aquilo providenciei motivo de evitar que mais tarde eles quisessem vir com alguma tranquibérnia ou embusteria em fito de tirarem desforra Nego isso não é verdade Nem quis nem fiz nem praga roguei Morreram porque era seu dia deles de boa questão Até o que morreu foi só um O outro foi pego preso eu acho deve de ter acabado com dez anos em alguma boa cadeia A cadeia de Montes Claros João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 222 quem sabe Não sou assassino Inventaram em mim aquele falso o senhor sabe como é esse povo Agora com uma coisa eu concordo se eles não tivessem morrido no começo iam passar o resto do tempo todo me tocaiando mais Diadorim para com a gente aprontarem em ocasião alguma traição ou maldade Nas estórias nos livros não é desse jeito A ver em surpresas constantes e peripécias para se contar é capaz que ficasse muito e mais engraçado Mas qual quando é a gente que está vivendo no costumeiro real esses floreados não servem o melhor mesmo completo é o inimigo traiçoeiro terminar logo bem alvejado antes que alguma tramóia perfaça Também sei o que digo em toda a parte por onde andei e mesmo sendo de ordem e paz conforme sou sempre houve muitas pessoas que tinham medo de mim Achavam que eu era esquisito Só o que mesmo devo de dizer como atiro bem que vivo ainda por encontrar quem comigo se iguale em pontaria e gatilho Por meu bom de desde mocinho Alemão Vupes pouco me ensinou Naquele tempo já eu era Dono de qualquer cano de fogo revólver clavina espingarda fuzil reiúno trabuco clavinote ou rifle Honras não conto alto porque acho que acerto natural assim é de Deus dom dado Pelo que compadre meu Quelemém me explicou que eu devo de noutra vida por certo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 223 em encarnação ter trabalhado muito em mira em arma Seja Pontaria o senhor concorde é um talento todo na idéia O menos é no olho compasso Aquele Vupes era profeta Certa vez entrei num salão os companheiros careciam que eu jogasse mor de inteirar a parceiragem Bilhar quero dizer Eu não sabia total Tinha nunca botado a mão naquilo Faz mal nenhum o Advindo disse Você forma comigo que sou tão no taco João Nonato com o Escopil jogam de contralado Aceitei Combinado ficou que o Advindo pudesse me superintender e pronunciar cada toque com palavras e noção de conselhos mas sem licença de apoiar mão em minha mão ou braço nem encostar dedo no taco É de ver que mesmo do jeito não bobeei um ceitil o Advindo me lecionava o rumo medido da vantagem e eu encurvava o corpo amolecia barriga e taqueava o meu chofre querendo aquilo no verde era o justo repique umas carambolas de todos estalos retruque e recompletas com recuanço ladeio perfeito efeito produzido e reproduzido por fim eu me reprazia mais escutando rebrilhar o concoco daquelas bolas umas nas outras deslizadas E pois conforme dizia por meu tiro me respeitavam quiseram pôr apelido em mim primeiro Cerzidor depois Tatarana lagartadefogo Mas firme não pegou Em mim apelido quase que não pegava Será eu nunca esbarro pelo quieto num feitio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 224 No que foi no que me vi no acampo do Hermógenes Cabralhada Tiba De boa entrada ao que me gasturei no vendo Aqueles eram mais de cento e meio sofreúdos que todos curtidos no jagunçar rafaméia mera gente Azombado que primeiro até fiquei mas daí quis assuntação achei a meu cômodo Assim isto é me acostumei com meiosó meu coração naquele arranchamento Propriamente pessoal do Hermógenes Digo bons e maus uns pelos outros como neste mundo se per tence Por um que ruim seja logo mais para adiante se encontra outro pior E a situação nossa era de guerra Mesmo com isso a peito pronto ninguém se perturbou com perigos de tanta gravidade Se vivia numa jóvia medindo mãos em vavavá e conversa de festa tomando tempo Aqueles não desamotinavam A ajunta ali assim de tantos atrás do ar na va gagem manga de homens por zanzar ou estar àtoa ou parar formando rodas ou uns dormindo como boi malha ou deitados no chão sem dormir só aboboravam Assaz toda espécie de roupa divulguei até sujeito com cinta larga de lã vermelha outro com chapéu de lebre e colete preto de fino pano cidadão outros com coroça e bedém mesmo sem chuva nenhuma só que de branco vestido não se tinha que com terno claro não se guerreia Mas jamais ninguém ficasse nudeDeus João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 225 ou indecente descomposto no meio dos outros isso não e não Andando que sentados jogando jogos ferrando queda de braço assoando o nariz mascando fumo forte e cuspindo longe e pitando picando ou dedilhando fumo no covo da mão com muita demora o mais sempre no proseio Aventes baldrocavam suas pequenas coisas trem objeto que um tivesse e menos quisesse que custou barato E ninguém furtava Furtasse era perigar morte Cantavam cantarol uns aboiavam sem bois Ou cuidavam do espírito da barriga O serviço que cumpriam era alimpar as armas bem marcadas as cruzes nas feições das coronhas E tudo o mais que faziam que fosse coisa de semo quefazer Por isso se dizia que ali corresse muita besouragem de falação mal de rapatachos Tinham lá até cachorros vadiando geral mas o dono de cada um se sabia convinha não judiar com cão por conta do dono Ao àstantas me aceitaram mas meio atalhados Se o que fossem mesmo de constância assim por tempero de propensão ou então por me arrediarem porquanto me achando deles diverso Somente isto nos princípios Sendo que eu soube que eu era mesmo de outras extrações Semelhante por este exemplo como logo entendi eles queriam completo ser jagunços por alcanço gala mestra conforme o que avistei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 226 seguinte Pois não era que num canto estavam uns permanecidos todos se ocupando num manejo caprichoso e isto que eles executavam que estavam desbastando os dentes deles mesmos aperfeiçoando os dentes em pontas Se me entende Senhor ver essa atarefação o tratear dava alojo e apresso dava até aflição em aflito abobante Os que lavravam desse jeito o Jesualdo mocinho novo com sua simpatia o Araruta e o Nestor os que ensinavam a eles eram o Simião e o Acauã Assim um uso correntio apontar os dentes de diante a poder de gume de ferramenta por amor de remedar o aguçoso de dentes de peixe feroz do rio de São Francisco piranha redoleira a cabeçadeburro Nem o senhor não pense que para esse gasto tinham instrumentos próprios alguma liminha ou ferro lixador Não aí era à faca O Jesualdo mesmo se fazia fazia aquilo sentado num calcanhar Aviava de encalcar o corte da faca nas beiras do dente rela releixo e batia no cabo da faca com uma pedra medidas pancadas Sem espelho sem ver ao tanto que era uma faca de cabo de niquelado Ah no abreboca comum que babando às vezes sangue babava Ao mais gemesse repuxando a cara pelo que verdadeiro muito doía Agüentava Assim esquentasse demais para refrescar então ele bochechava a breve com um caneco de água com pinga Os outros dois também O Araruta procedia sozinho igual batendo na faca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 227 com a prancha de outra O Nestor não para ele o Simião com um martelinho para os golpes era quem raspava mas decerto o Nestor ao outro para isso algum tanto pagasse Abrenunciei Arrenego eu disse Deveras Então manovelho pois tu não quer o Simão em gracejo me perguntou Me fez careta e acredite o senhor ele que exercia lâmina nos do outro ele não possuía próprio dente mais nenhum nas gengivas conforme aquela vermelha boca banguela toda abriu e me mostrou Repontei Eu acho que para se ser valente não carece de figurativos O Acauã que já era bom conhecido meu assim mesmo achou de se reagir São gostos Mas um outro que chegando veio falou o mais seco Tudo na vida são gostos companheiro Mas não será o meu Olhei para esse que me deu o apoio E era um Luís Pajeú com a faca punhal do mesmo nome e ele sendo de sertão do mesmo nome das comarcas de Pernambuco Sujeito despachado moreno bem queimado mas de anelados cabelos e com uma coragem terrivelmente Ah mas o que faltava lá nele que ele mais não tinha era uma orelha que rente cortada fora pelo sinal Onde era que o Luís Pajeú havia de ter deixado aquela orelha Será gosto meu não de descasear dentaduras conciso declarou falava meio cantado mole fino Alto e forte foi outro falar de outro que no instante também ouvi Uê em minha terra se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 228 afia guampa é touro ixi E esse um trolado demais franco e desempenado cavaleiro era o Fafafa Fiz conhecença Dele tenho para mais depois Ao que lá não faltava a farta comida pelo que logo vi Gêneros e bebidas boas De donde vinha tudo em redondezas tão pobrezinhas a gente parando assim quase num deserto E a munição tanta que nem precisaram da que tínhamos trazido e que foi levada mais adiante para os escondidos de Joca Ramiro perto do arraial do Bró E a jorna para satisfazer àquela cabroeira vivente que estavam ali em seu emprego de cargo Ah tinham roubado saqueado muito grassavam A sebaça era a lavoura deles falavam até em atacar grandes cidades Foi ou não foi Mas mire e veja o senhor nas eras de 96 quando os serranos cismaram e avançaram tomaram conta de São Francisco sem prazo nem pena Mas nestes derradeiros anos quando Andalécio e Antônio Dó forcejaram por entrar lá quase com homens mil e meiomil a cavalo o povo de São Francisco soube se reuniram e deram fogo de defesa dizque durou combate por tempo de três horas tinham armado tranquias na boca das ruas com tapigos montes de areia e pedra e árvores cortadas de través brigaram como boa população Daí aqueles João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 229 retornaram arremeteram mesmo senhores da cidade quase toda conforme guerrearam contra o Major Alcides Amaral e uns soldados cercados numas duas ou três casas e um quintal guerrearam noites e dias A ver por vingar porque antes o Major Amaral tinha prendido o Andalécio cortado os bigodes dele Andalécio o que de nome real Indalécio Gomes Pereira homem de grandes bigodes Sei de quem ouviu se recordava sempre com tremores de quando no tiroteio de inteira noite Andalécio comandava e esbarrava para gritar feroz Sai pra fora cão Vem ver Bigode de homem não se corta Tudo gelava de só se escutar Aí quem trouxe socorro para salvar o Major foi o delegado Doutor Cantuária Guimarães vindo às pressas de Januária com punhadão de outros jagunços de fazendeiros da política do Governo Assim que salvaram mandaram desenterrar para contar bem mais de sessenta mortos uns quatorze juntos numa cova só Essas coisas já não aconteceram mais no meu tempo pois por aí eu já estava retirado para ser criador e lavrador de algodão e cana Mas o mais foi ainda atual agora recentemente quase isto é foi logo de se emendar depois do barulhão em Carinhanha mortandades quando se espirrou sangue por toda banda o senhor sabe Carinhanha é bonitinha uma verdade que barranqueiro canta remador Carinhanha é que sempre foi de um homem de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 230 valor e poder o coronel João Duque o pai da coragem Antônio Dó eu conheci certa vez na Vargem Bonita tinha uma feirinha lá ele se chegou com uns seus cabras formaram grupo calados arredados Andalécio foi meu bom amigo Ah tempo de jagunço tinha mesmo de acabar cidade acaba com o sertão Acaba Atinei mal no começo com quem era que mandava em nós todos O Hermógenes Mas perto duns cinqüenta nesse meio o Acauã Simão Luís Pajeú Jesualdo e o Fafafa obedeciam a João Goanhá eram dele E tinha um grupo de brabos do Ricardão Onde era que estava o Ricardão Reunindo mais braçosdearmas beira da Bahia Se esperava também a vinda de Só Candelário com os seus Se esperava o chefe grande acima de todos Joca Ramiro falado aquela hora em Palmas Mas eu achava aquilo tudo dando confuso Titão Passos cabodeturma com poucos homens à mão era nãostante muito respeitado E o sistema diversiava demais do regime com Zé Bebelo Olhe jagunço se rege por um modo encoberto muito custoso de eu poder explicar ao senhor Assim sendo uma sabedoria sutil mas mesmo sem juízo nenhum falável o quando no meio deles se trança um ajuste calado e certo com semelho mal comparando com o governo de bando João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 231 de bichos caititu boi boiada exemplo E de coisas faziam todo segredo Um dia foi ordem ajuntar todos os animais de sela e de carga iam ser levados para amoitamento e pasto entre serras no Ribeirão Poço Triste num varjal Para mim até o endereço que diziam do lugar devia de ser mentira Mas tive de entregar meu cavalo completo no contragosto Me senti a pé como sem segurança nenhuma E tem as pequenas coisas que aperreiam enquanto estava com meu animal eu tinha a capoteira a bolsa da sela os alforjes podia guardar meus trecos De noite dependurava a sela num galho de árvore botava por debaixo dela o dobro com as roupas dormia ali perto em paz Agora eu ficava num descômodo Carregar os trens não podia chegava o peso das armas e das balas e cartuchame Perguntei a um onde era que tudo se depositava Eh bereu Bota em algum lugar Joga fora Oxe tu carrega ouro nesses dobros Quê que se importavam Por tudo eram fogueiras de se cozinhar fumaça de alecrim panela em gancho de mariquita e cheiro bom de carne no espeto torrada se assando e batatas e mandiocas sempre quentes no soborralho A farinha e rapadura quantidades As mantas de carneceará Ao tanto que a carnedesol não faltasse mesmo amiúde ainda saíam alguns e retornavam tocando uma rês que repartiam Muitos misturavam a jacuba pingando no coité um dedo de aguardente eu nunca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 232 tinha avistado ninguém provar jacuba assim feita Os usares A ver como o Fafafa abria uma cova quadrada no chão ajuntava ali brasas grandes direto no brasal malassasse pedação de carne escorrendo sangue pouco e pouco revirava com a ponta do facão só pelo chiar Disso definitivo não gostei A saudade minha maior era de uma comidinha guisada um frango com quiabo e abóboradágua e caldo um refogado de caruru com ofa de angu Senti padecida falta do São Gregório bem que a minha vidinha lá era mestra Diadorim notou meus males Me disse consolo Riobaldo tem tempos melhores Por ora estamos acuados em buraco Assistir com Diadorim e ouvir uma palavrinha dele me abastava aninhado Mas mesmo achei que ali convinhável não era se ficar muito tempo juntos apartados dos outros Cismei que maldavam desconfiassem de ser feio pegadio Aquele povo estava sempre misturado todo o mundo Tudo era falado a todos do comum às mostras às vistas Diferente melhor foi quando estivemos com Medeiro Vaz o maior número lá era de pessoal dos gerais gente mais calada em si e sozinha moradores das grandes distâncias Mas por fim um se acostuma isto é eu me acostumei Sem receio de ser tirado de meu dinheiro que eu empacotava ainda boa quantia que Zé Bebelo sempre me pagou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 233 no pontual e gastar eu não tinha onde Recontei Aí quis que soubessem logo como era que eu atirava Até gostavam de ver Tatarana põe o dez no onze me pediam por festar De duzentas braças bala no olho de um castiçal eu acertava Num aquele alvo só as todas todas Assim então esbarrei aquilo com que me aperreavam os coscuvilhos Se alguém falou mal de mim não me importo Mas não quero que me venham me contar Quem vier contar e der notícias é esse mesmo que não presta e leva o puto nomedamãe e de que é filho eu informei O senhor sabe nomedamãe e o depois quer dizer meu pinguelo Sobre o fato para de mim não desaprenderem não se esquecerem eu pegava o rifle tive rifle de winchester até de quatorze tiros e dava gala de entremez Corta aquele risco Tatarana me aprovavam Se eu cortasse Nunca errei Para rebater reproduzia tudo a revólver Vem um cismo de fio de cabelo no ar que eu acerto Sobrefiz Social eu andava com minhas cartucheiras triplas só que atochadas sempre Ao que me gabavam e louvavam então eu esbarrava sossegado Surgidamente aí principiou um desejo que tive que era o de destruir alguém a certa pessoa O senhor pode rir seu riso tem siso Eu sei Eu quero é que o senhor repense as minhas tolas palavras E olhe tudo quanto há é aviso Matar a aranha em teia Se não por que era que já me vinha a idéia desejável que joliz João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 234 havia de ser era se meter um balaço no baixo da testa do Hermógenes A bronzes O ódio pousa na gente por umas criaturas Já vai que o Hermógenes era ruim ruim Eu não queria ter medo dele Digo ao senhor que aquele povo era jagunços eu queria bondade neles Desminto Eu não era criança nunca bobo fui Entendi o estado de jagunço mesmo assim sendo eu marinheiro de primeira viagem Um dia agarraram um homem que tinha vindo à traição espreitar a gente por conta dos bebelos Assassinaram Me entristeceu aquilo até ao vago do ar O senhor vigie esses comem o cru de cobras Carecem Só por isso para o pessoal não se abrandar nem esmorecer até Só Candelário que se prezava de bondoso mandava mesmo em tempo de paz que seus homens saíssem fossem para estropelias prática da vida Ser ruim sempre às vezes é custoso carece de perversos exercícios de experiência Mas com o tempo todo o mundo envenenava do juízo Eu tinha receio de que me achassem de coração mole soubessem que eu não era feito para aquela influição que tinha pena de toda cria de Jesus E Deus Diadorim uma hora eu perguntei Ele me olhou com silenciozinho todo natural daí disse em resposta Doca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 235 Ramiro deu cinco contos de réis para o padre vigário de Espinosa Mas o Hermógenes era fel dormido flagelo com frieza Ele gostava de matar por seu miúdo regozijo Nem contava valentias vivia dizendo que não era mau Mas outra vez quando um inimigo foi pego ele mandou Guardem este Sei o que foi Levaram aquele homem entre as árvores duma capoeirinha o pobre ficou lá nhento amarrado na estaca O Hermógenes não tinha pressa nenhuma estava sentado recostado A gente podia caçar a alegria pior nos olhos dele Depois dum tempo ia lá sozinho calmoso Consumia horas afiando a faca Eu ficava vendo o Hermógenes passado aquilo ele estava contente de si com muita saúde Dizia gracejos Mas mesmo para comer ou falar ou rir ele deixava a boca própria se abrir alta no meio como sem vontade boca de dor Eu não queria olhar para ele encarar aquele carangonço me perturbava Então olhava o pé dele um pé enorme descalço cheio de coceiras frieiras de remeiro do rio pépubo Olhava as mãos Eu acabava achando que tanta ruindade só conseguia estar naquelas mãos olhava para elas mais com asco Com aquela mão ele comia aquela mão ele dava à gente Entremeando eu comparava com Zé Bebelo aquele homem Nessa hora eu gostava de Zé Bebelo quase como um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 236 filho deve de gostar do pai As tantas coisas me tonteavam eu em claro De repente eu via que estava desejando que Zé Bebelo vencesse porque era ele quem estava com a razão Zé Bebelo devia de vir forte viesse liquidar mesmo a rãs com o inferno da jagunçada E eu estava ali cumprindo meu ajuste por fora com todo rigor mas estava tudo traindo traidor no cabo do meu coração Alheio ao que encostei minhas costas numa árvore Aí eu não queria ficar doido no nem mesmo Puxei conversa com Diadorim Por que era que Joca Ramiro sendo chefe tão subido de nobres costumes consentia em ter como seu alferes um su jeito feito esse Hermógenes remarcado no mal Diadorim me escutou depressa tal duvidou de meu juízo Riobaldo onde é que você está vivendo com a cabeça O Hermógenes é duro mas leal de toda confiança Você acha que a gente corta carne é com quicé ou é com colherdepau Você queria homens bem comportados bonzinhos para com eles a gente dar combate a Zé Bebelo e aos cachorros do Governo A espichado nesse dia calei Assim uma coisa eu estava escondendo mesmo de Diadorim que eu já parava fundo no falso dormia com a traição Um nublo Tinha perdido meu bom conselho E entrei em máquinas de tristeza João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 237 Então eu era diferente de todos ali Era Por meu bom Aquele povo da malfa no dia e noite de relaxação brigar beber constante comer Comeu loboE vozear tantas asneiras mesmo de Diadorim e de mim já pensavam Um dia um disse Eh esse Reinaldo gosta de ser bom amigo Ao quando o Leopoldo morreu ele quase morreu também dos demorados pesares Desentendi mediante meu querer Mas não me adiantou Dai persistentemente essa história me remoía esse nome de um Leopoldo Tomava por ofensa a mim que Diadorim tivesse tido mesmo tão antes um amigo companheiro Até que vai cresci naquela idéia que o que estava fazendo falta era uma mulher E eu era igual àqueles homens Era Com não terem mulher nenhuma lá eles sacolejavam bestidades Saindo por aí dizia um qualquer uma que seja não me escapole Ao que contavam casos de mocinhas ensinadas por eles aproveitavelmente de seguida em horas safadas Mulher é gente tão infeliz me disse Diadorim uma vez depois que tinha ouvido as estórias Aqueles homens quando estavam precisando eles tinham aca almiscravam Achavam manejavam Deus me livrou de endurecer nesses costumes perpétuos A primeira que foi bonita moça eu estava com ela João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 238 somente Tanto gritava que xingava tanto me mordia e as unhas tinha Ao cabo que pude a moça fechados os olhos não bulia não fosse o coração dela rebater no meu peito eu entrevia medo Mas eu não podia esbarrar Assim tanto de repente vindo ela estremeceuzinha Daí abriu os olhos aceitou minha ação arfou seus prazeres constituído milagre Para mim era como eu tivesse os mais amores Pudesse levava essa moça comigo fiel Mas depois num sítio perto da Serra Nova foi uma outra a moreninha miúda e essa se sujeitou fria estendida para mim ficou de pedras e terra Ah era que nem eu nos medonhos fosse e o senhor crê a mocinha me agüentava era num rezar tempos além Às almas fugi de lá larguei com ela o dinheiro meu eu mesmo roguei pragas Contanto que nunca mais abusei de mulher Pelas ocasiões que tive e de lado deixei ofereço que Deus me dê alguma minha recompensa O que eu queria era ver a satisfação para aquelas pelo meu ser Feito com a Rosa uarda sempre formosa a filha de Assis Wababa sonhos meus turcamente e que a qual não lhe disse o pai dela que era forte negociante em todo tempo nanja que não desconfiou Feito com aquela moça Nhorinhá filha de Ana Duzuza Digo ao senhor Mas o senhor releve eu estar glosando assim a seco essas coisas de se calar no preceito devido Agora o tudo que eu conto é porque acho que é sério preciso João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 239 Permeio com quantos removido no estatuto deles com uns poucos me acompanheirei daqueles jagunços conforme que os anjosdaguarda Só quase a boa gente Sendo que são por todos estes Capixum caboclo sereno viajado filho dos gerais de São Felipe Fonfredo que cantava todas as rezas de padre e comia carne de qualidade nenhuma e que nunca dizia de onde era e viera o que rimava verso com ele Sesfredo desse já lhe contei o TestaemPé baiano ladino chupava muito o Paspe vaqueiro jaibano o homem mais habilidoso e serviçal que já topei nesta minha vida Dadá SantaCruz dito o Caridoso queria sempre que se desse resto de comida à gente pobre com vergonha de vir pedir o CarrodeBoi gago gago O Catocho mulato claro era curado de bala Lindorífico chapadeiro minas novense com mania de aforrar dinheiro O Diolo preto de beiço maior Juvenato Adalgizo o SanguedeOutro Ei tantos para que que eu fui querer começar a descrever Dagobé o Eleutério PescoçoPreto José Amigo Amigo Homem desses alguém dizendo a um que ele é demônio de ruim ele ria de não querer ser capaz até de nessa raiva matar o outro Afirmo ao senhor do que vivi o mais difícil não é um ser bom e proceder honesto dificultoso mesmo é um saber definido o que quer e ter o poder de ir até João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 240 no rabo da palavra Ezirino matou um companheiro que Ba tatinha se chamava o pobre dum cafuz magrelo só que tinha o danado defeito de contrariar qualquer coisa que a gente falava Ezirino caiu no mundo Daí começou voz que ele tinha fugido para se bandear com os zébebelos pago por sua traição e que Batatinha somente morreu porque disso sabia Todo o mundo andava encrespo forjicavam muita cilada e enredos de desconfianças Mudamos para outros lugares mais a coberto em distância obra de sete léguas para a parte do poente Muito vi que não estávamos fazendo isso por escapulir mas que o Hermógenes Titão Passos e João Goanhá antes acharam de combinar aquilo em suas conversas era o arrumo para melhores combates com Zé Bebelo Ah e aí lá chegaram com satisfação de todos dez homens a Só Candelário pertencidos Traziam cargueiros com mais sal bom café e uma barrica de bacalhau Delfim era um daqueles tocava E o Luzié alagoano de Alagoas Nesse dia eu saí com esquadra fomos rondar os caminhos de porventura dos bebelos andamos mais de três léguas e tanto no meio da noite retornamos De manhã cedo eu soube tinham até dançado aquela véspera Diadorim você dança logo perguntei Dança Aquilo é pé de salão quem respondeu foi o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 241 Garanço o de olhos de porco Ouvindo o que me sobrou um enjôo O Garanço era um mocorongo mermado com estúrdias feições e pessoa muito agradável de seu natural Ele tinha idéias às vezes parecia criança pequena Punha nome em suas armas o facão era torturum o revólver rouxinol a clavina era berrabode Com ele a gente ria sempremente Mais o Garanço dava de procurar a companhia nossa minha e de Diadorim aquele tempo ele vinha costumeiro para perto Às vezes como naquilo ele me produzia jeriza verdadeira Diadorim não dizia nada estava deitado de costas num pelego com a cabeça num feixe de capim cortado Ali naquele lugar ele contumaz dormia Dia dorim menos gostava de rede O Garanço era sanfranciscano dum lugar chamado Morpará Hásde queria que a gente escutasse ele recontar compridas passagens de sua vida Aquilo aborrecia Eu queria estarestâncias dos violeiros que tocavam sentimento geral Depois Diadorim se levantou ia em alguma parte Guardei os olhos meio momento na beleza dele guapo tão aposto surgido sempre com o jaleco que ele tirava nunca e com as calças de vaqueiro em couro de veado macho curtido com aroeirabrava e campestre De repente uma coisa eu necessitei de fazer Fiz fui e me deitei no mesmo dito pelego na cama que ele Diadorim marcava no capim minha cara posta no próprio lugar Nem me fiz caso do Garanço só com o violeiro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 242 somei A zangarra daquela viola Por não querer meu pensamento somente em Diadorim forcejei Eu já não presenciava nada nem escutava possuído fiquei sonhejando o ir do ar meus confins Aí pensei no São Gregório A bem no São Gregório não mas peguei saudade dos passarinhos de lá do poço no córrego do batido do monjolo dia e noite da cozinha grande com fornalha acesa dos cômodos sombrios da casa dos currais adiante da varanda de ver nuvens O senhor sabe não acerto no contar porque estou remexendo o vivido longe alto com pouco caroço querendo esquentar demear de feito meu coração naquelas lembranças Ou quero enfiar a idéia achar o rumozinho forte das coisas caminho do que houve e do que não houve As vezes não é fácil Fé que não é Mire veja naqueles dias na ocasião devem de ter acontecido coisas meio importantes que eu não notava não surpreendi em mim Mesmo hoje não atino com o que foram Mas no justo momento me lembrei em madrugada daquele nome de Siruiz Refiro que perguntei ao Garanço por aquele rapaz Siruiz que cantava cousas que a sombra delas em meu coração decerto já estava O que eu queria saber não era próprio do Siruiz mas da moça virgem moça branca perguntada e dos pésdeverso como eu nunca tive poder de formar um igual Mas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 243 o Garanço já tinha respondido Eh eh ô O Siruiz já morreu Morreu morto no tiroteio entre o Morcego e o Suaçuapara passado para cá o Pacuí Do choque com que ouvi essa confirmação de notícia fui arriando para um desânimo Como se assim ele tivesse falado Siruiz Mas não foram vocês mesmos que mataram Eu não Nessa vez eu tinha restado longe por fora na PedraBranca não vi combate Como era que eu podia O Garanço tomava rapé Era um sujeito de intenções muito parvas Perguntou se o Siruiz não seria meu amigo meu parente Quem sabe se era eu respondi de toleima O Garanço vi que não gostou Viver perto das pessoas é sempre dificultoso na face dos olhos Nem eu quis indagar o mais certo estava de que ele Garanço não sabia nada do que tivesse valor Mas eu guardava triste de cor a canção recantada E Siruiz tinha morrido Então me instruíram na outra que era cantiga de se viajar e cantar guerrear e cantar nosso bando toda a vida Olererêêê baiana Eu ia e não vou mais Eu faço que vou lá dentro oh baiana e volto do meio pra trás O senhor aprende Eu entôo mal Não por boca de ruindade lá como quem diz Sou ruim não sou homem de gostar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 244 dos outros quando não me aperreiam sou de tolerar Não tenho a caixeta da raiva aberta Rixava com nenhum ali aceitava o regime na miudez das normas Vai daí comigo erraram Um errou Um paijagunço chamado Antenor acho que era coração dejesusense começou a temperar conversa sagaz de fiúza notei Ele era homem chegado ao Hermógenes se sabia dessa parte De diz em diz rodeava a questão Queria saber que apreço eu tinha por loca Ramiro por Titão Passos os outros todos Se eu conhecia Só Candelário que estava por chegar O giro dos assuntos ele me tenteava a fala Notei E devagar vinha querendo deixar em mim uma má vazante me largar em dúvida Não era Aquilo eu inteligenciava Esse Antenor sempre louvando e vivando Joca Ramiro acabou por me dar a entender curtamente o em conseguinte que Joca Ramiro talvez fazia mal em estar tanto tempo por longe alguns de bofe ruim já calculavam que ele estivesse abandonando seu pessoal em horas de tanta guerra que Joca Ramiro era rico dono de muitas posses em terras e se arranchava passando bem em casas de grandes fazendeiros e políticos deles recebia dinheiro de munição e paga seô Sul de Oliveira coronel Caetano Cordeiro doutor Mirabô de Melo Que era que eu achava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 245 Eu escutei Respondi Ah ah Sou lá para achar nenhuma coisa Não tinha nascido no ontem cedo tomei experiência de homens por homens Disse só que decerto Joca Ramiro estava formando gente e meios para vir em ajuda de nós jagunços em lei e nesse meiotempo punha toda confiança no Hermógenes em Titão Passos João Goanhá fortes no fato valor e na lealdade Gabei o Hermógenes principal bispei Com isso aquele Antenor concordou A bem dizer aprovou o quanto eu disse Mas realçou mais altamente a fama do Hermógenes e do Ricardão também esses dois seriam os chefes de encher a mão em paz regalada mas por igual nos combates Esse sujeito Antenor sabia coçar queixo de cobra e semear sal em roças verdes Vulto perigoso nas ações o Garanço me preveniu com a boa noção vinda de sua redondice de atinar Ações O que eu vi sempre é que toda ação principia mesmo é por uma palavra pensada Palavra pegante dada ou guardada que vai rompendo rumo Aquele Antenor já tinha depositado em mim o anúvio de uma má idéia disidéia a que por minhas costas logo escorreu traiçoeirinha como um rabo de gota de orvalho Que explicação dou ao senhor Acreditar no que ele tinha suso dito não acreditei Mas em mim para mim aquilo tudo era era assim como um lugar com maucheiro no campo uma árvore lugar fedido onde é que alguma jaratataca acuou por se defender João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 246 do latido dos cachorros E grande aviso naquele dia eu tinha recebido mas menos do que ouvi real do que do que eu tinha de certo modo adivinhado De que valeu Aviso Eu acho que quase toda a vez que ele vem não é para se evitar o castigo mas só para se ter consolo legal depois que o castigo passou e veio Aviso Rompe ferro Cacei Diadorim Mas eu estreava umas ânsias Como fosse falei do novo e do velho mal foi que falei em zanga desrazoadamente e de primeira entrada Acho que por via disso Diadorim não deu a devida estimação às minhas palavras Alheio eh Só ojerizado em estilos ele esteve um raio de momento foi de ouvir que alguém pudesse duvidar do proceder de loca Ramiro loca Ramiro era um imperador em três alturas loca Ramiro sabia o se ser governava nem o nome dele não podia à toa se babujar E aqueles outros o Hermógenes Ricardão Sem Joca Ramiro eles num átimo se desaprumavam deste mundo desapareciam valiam o que pulga pula O Hermógenes Certo um bom jagunço cabodeturma mas desmerecido de situação política sem tino nem prosápia E o Ricardão rico dono de fazendas somente vivia pensando em lucros querendo dinheiro e ajuntando Diadorim do Ricardão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 247 era que ele gostava menos Ele é bruto comercial disse e fechou a boca forte feito fosse cuspir Eu então disse pelo conseguinte A bom e bem Diadorim Mas se é ou se não é por que é que não vamos levar informação sutil a loca Ramiro para o enfim Aí refalei muito ao tanto que escondi minha raiva Quem sabe Joca Ramiro na lei da caminhação não estava esquecido de conhecer os homens deixando de farear o mudar do tempo Viesse Joca Ramiro podia detalhar o podre do são recontar seus brabos entre as mãos e os dedos Podia devia de mandar embora aquele monstro do Hermógenes Se sendo etcétera se carecesse eh uai se matava Diadorim pôs muito os olhos em mim vi que com um espanto reprovador não me achasse capaz de estipular tanta maldade sem escrúpulo Mau não sou Cobra ele disse Nem cobra serepente malina não é Nasci devagar Sou é muito cauteloso Mais em paz comigo mais Diadorim foi me desinfluindo Ao que eu ainda não tinha prazo para entender o uso que eu desconfiava de minha boca e da água e do copo e que não sei em que mundodelua eu entrava minhas idéias O Hermógenes tinha seus defeitos mas puxava por Joca Ramiro fiel punia e terçava Que eu mais uns dias esperasse e ia ver o ganho do sol João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 248 nascer Que eu não entendia de amizades no sistema de ja gunços Amigo era o braço e o aço Amigo Aí foi isso que eu entendi Ah não amigo para mim é diferente Não é um ajuste de um dar serviço ao outro e receber e saírem por este mundo barganhando ajudas ainda que sendo com o fazer a injustiça aos demais Amigo para mim é só isto é a pessoa com quem a gente gosta de conversar do igual o igual desarmado O de que um tira prazer de estar próximo Só isto quase e os todos sacrifícios Ou amigo é que a gente seja mas sem precisar de saber o por que é que é Amigo meu era Diadorim era o Fafafa o Alaripe Sesfredo Ele não quis me escutar Voltei da raiva Digo ao senhor nem em Diadorim mesmo eu não firmava o pensar Naqueles dias então eu não gostava dele Em pardo Gostava e não gostava Sei sei que no meu eu gostava permanecente Mas a natureza da gente é muito segundase sábados Tem dia e tem noite versáveis em amizade de amor Antes o que me atazanava a mor disso crio razoável lembrança era o significado que eu não achava lá no meio onde eu estava obrigado naquele grau de gente Mesmo repensando as palavras de Diadorim eu apurava só este resto João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 249 que tudo era falso viver deslealdades Traição Traição minha fosse no que fosse Quase tudo o que a gente faz ou deixa de fazer não é no fim traição Hádeo a alguém a alguma coisa E eu não tardei no meu querer lá eu não podia mais ficar Donde eu tinha vindo para ali e por que causa e sem paga de preço me sujeitava àquilo Eu iame embora Tinha de ir embora Estava arriscando minha vida estragando minha mocidade Sem rumo Só Diadorim Quem era assim para mim Diadorim Não era aquela ocasião pelo próprio dito de estar perto dele de conversar e mais ver Mas era por não agüentar o ser se de repente tivesse de ficar separado dele pelo nunca mais E mesmo forte era a minha gastura por via do Hermógenes Malagourado de ódio que sempre surge mais cedo e às vezes dá certo igual palpite de amor Esse Hermógenes belzebu Ele estava caranguejando lá Nos soturnos Eu sabia Nunca mesmo depois eu nunca soube tanto disso como naquele tempo O Hermógenes homem que tirava seu prazer do medo dos outros do sofrimento dos outros Aí arre foi que de verdade eu acreditei que o inferno é mesmo possível Só é possível o que em homem se vê o que por homem passa Longe é o Semolho E aquele inferno estava próximo de mim vinha por sobre mim Em escuro vi sonhei coisas muito duras Nas larguezas do sono da gente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 250 A já que ia membora fugia Onde é que estava Diadorim Nem eu não imaginava que pudesse largar Diadorim ali Ele era meu companheiro comigo tinha de ir Ah naquela hora eu gostava dele na alma dos olhos gostava da banda de fora de mim Diadorim não me entendeu Se engrotou Assaz também acho que me acuso que não tive um ânimo de franco falar Se fosse eu falasse total Diadorim me esbarrava no tolher não me entendia A vivo o arisco do ar o pássaro aquele poder dele Decerto vinha com o nome de Joca Ramiro Joca Ramiro Esse nem a gente conseguia exato real era um nome só aquela graça sem autoridade nenhuma avistável andava por longe se era que andava Teve um instante bambeei bem Foi mesmo aquela vez Foi outra Alguma foi me alembro Meu corpo gostava de Diadorim Estendi a mão para suas formas mas quando ia bobamente ele me olhou os olhos dele não me deixaram Diadorim sério testalto Tive um gelo Só os olhos negavam Vi ele mesmo não percebeu nada Mas nem eu eu tinha percebido Eu estava me sabendo Meu corpo gostava do corpo dele na sala do teatro Maiormente As tristezas ao redor de nós como quando carrega para toda chuva Eu podia pôr os braços na testa ficar assim lorpa sem encaminhamento nenhum Que é que queria Não quis o que estava no ar para isso mandei vir uma idéia de mais longe Falei sonhando Diadorim você não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 251 tem não terá alguma irmã Diadorim voz minha eu perguntei Sei lá se ele riu O que disse que resposta Sei quando a amargura finca o que é o cão e a criatura De tristeza tristes águas coração posto na beira Irmã nem irmão ele não tinha Só tenho Deus Joca Ramiro e você Riobaldo ele declarou Hê de medo coração bate solto no peito mas de alegria ele bate inteiro e duro que até dói rompe para diante na parede Diadorim então quem foi esse moço Leopoldo que morreu seu amigo eu indaguei de semtempo nem sei porquê eu não estava pensando naquilo Antes já eu estava para trás de ter perguntado palavras fora da boca Leopoldo Um amigo meu Riobaldo de correta amizade e Diadorim desfez assoprado um suspiro o que muda melhor Até te falaram nele Riobaldo Leopoldo era o irmão mais novo de loca Rami ro Aquilo eu já soubesse demais que Joca Ramiro se realçasse por riba de tudo reinante Mas pude ter a língua sofreada Vamos embora daqui juntos Diadorim Vamos para longe para o porto do deJaneiro para o sertão do baixio para o Curralim SãoGregório ou para aquele lugar nos gerais chamado OsPorcos onde seu tio morava De arrancar de meu falar de uma sede Aos tantos fui abaixando os olhos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 252 constando que Diadorim me agarrava com o olhar corre que um silêncio de ferro Assombrei de mim de desprezo desdenhado de duvidar da minha razão O que eu tinha falado era umas doideiras Diadorim esperou Ele era irrevogável Então eu saí dali querendo esquecer ligeiro o atual Minha cara estava pegando fogo Andei em dei até que lembrei o Garanço Bom o Garanço esse ia comigo me seguia em tudo era pobre homem à espera de qualquer ordem cordial Isto ele mesmo nem sabia mas era que carecia era de alguma amizade Estava lá curvado cabeçudo como uma cigarra Estava cozinhando pequis numa lata Eh eh nós ele assim dizia Ladeei conversa Ele me ouvia com anuídos e fazendo uma cara de entender Não conseguia Só conseguia demonstrar os tamanhos de sua cabeça Ao que bastava um meu maior cochicho e o Garanço vinha servia de companheiro para fugirmos O mais que pudesse haver era ele primeiro perguntar E o Reinaldo porque já estava acostumado com eu e Diadorim sermos dois e ele querer ser o três Então eu respondi Segredo eh Garanço Segredo eh e vamos e que Diadorim era para vir depois O Garanço tinha alguma diferença por alguma banda de sua natureza ele se desapartava da jagunçagem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 253 Mas eu não cheguei a falar não quis não expliquei nada Que era que eu ia fazer às fugas com aquele prascóvio pelo sul e pelo norte nos sertões da Jaíba Ele só sabia cumprir obediência no que eu riscasse governado por meu querer e por minha idéia um companheiro assim não aumentava segurança minha nenhuma Quero sombra Quero eco Quero cão Não com ele eu não me fazia melhor esperar eu ia ficando Desse no que desse mais um tempo Algum dia podia Diadorim mudar de tenção Em Diadorim era que eu pensava de fugir junto com ele era que eu carecia como o rio redobra O Garanço se regalava com os pequis relando devagar nos dentes aquela polpa amarela enjoada Aceitei não daquilo não provo por demais distraído que sou sempre receei dar nos espinhos craváveis em língua Eh eh nós o Garanço reproduzia tão satisfeito Minha amizade sobrou um pouco para ele que era criatura de simples coração Digo ao senhor naquele dia eu tardava no meio de sozinha travessia Ah mas falo falso O senhor sente Desmente Eu desminto Contar é muito muito dificultoso Não pelos anos que se já passaram Mas pela astúcia que têm certas coisas passadas de fazer balancê de se remexerem dos lugares O que eu falei foi exato Foi Mas teria sido Agora acho que nem não São tantas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 254 horas de pessoas tantas coisas em tantos tempos tudo miúdo recruzado Se eu fosse filho de mais ação e menos idéia isso sim tinha escapulido calado no estar da noite varava dez léguas madrugada me escondia do largo do sol varava mais dez passava o São Felipe as serras as VinteeUmaLagoas encostava no São Francisco bem de frente da Januária passava chegava em terra cidadã estava no pique Ou me pegassem no caminho bebelos ou Hermógenes me matassem Morria com um bé de carneiro ou um au de cão mas tinha sido um mais destino e uma mor coragem Não valia Não fiz Quem sabe nem pensei sério em Dia dorim ou pensei algum foi em vezo de desculpa Desculpa para meu preceito mesmo Quanto pior mais baixo se caiu maismente um carece próprio de se respeitar De mim toda mentira aceito O senhor não é igual Nós todos Mas eu fui sempre um fugidor Ao que fugi até da precisão de fuga As razões de não ser O que foi que eu pensei Nas terríveis dificuldades certamente meiamente Como ia poder me distanciar dali daquele ermo jaibão em enormes voltas e caminhadas aventurando aventurando Acho que eu não tinha conciso medo dos perigos o que eu descosturava era medo de errar de ir cair na boca dos perigos por minha culpa Hoje sei medo meditado foi isto Medo de errar Sempre tive Medo de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 255 errar é que é a minha paciência Mal O senhor fia Pudesse tirar de si esse medodeerrar a gente estava salva O senhor tece Entenda meu figurado Conforme lhe conto será que eu mesmo já estava pegado do costume conjunto de ajagunçado Será sei Gostar ou não gostar isso é coisa diferente O sinal é outro Um ainda não é um quando ainda faz parte com todos Eu nem sabia Assim que o Paspe tinha agulhas grandes fio e sovela consertou minhas alpercatas Lindorífico me cedeu por troco de espórtula um bentinho com virtudes fortes dito de sãossalavá e cruzcomsangue E o Elisiano caprichava de cortar e descascar um ramo reto de goiabeira ele que assava a carne mais gostosa as beiras tostadas a gordura chiando cheio E o Fonfredo cantava loas de não se entender o Duvino de tudo armava risada e graça o Delfim tocando a viola Leocádio dançava um valsar com o Diodolfo e Geraldo Pedro e o Ventarol que queriam ficar espichados dormindo o tempo todo o Ventarol roncasse ele possuía uma rede de casamento de bom algodão com chuva de rendas rendadas Aí e o Jenolim e o Acrísio e João Vaqueiro que depunham por mim com uma estima diferente só porque se tinha viajado juntos vindo do das Velhas Viva companheiro tropeiro saudavam Ao que se jogava truque e douradinha e douradão por cima de couros de rês Aí a troça em beirada de fogueiras o vuvo de falinhas e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 256 falas no encorpar da noite Artes que havia uma alegria Alegria é o justo Com os casos que todos iam contando de combates e tiroteios perigos tantos vencidos escapulas milagrosas altas coragens Aquilo era uma gente Ali eu estava no entremeio deles esse negócio Não carecia de calcular o avante de minha vida a qual era aquela Saísse dali tudo virava obrigação minha trançada estreita de cor para a morte Homem foi feito para o sozinho Foi Mas eu não sabia Saísse de lá eu não tinha contrafim Com tantos com eles gente vivendo sorte se cumpria o grosso de uma regra por termo havia de vir um ganho como não havia de ter desfecho geral Por que era que todos ficavam ali por paz e por guerra e não se desmanchava o bando não queriam ir embora Reflita o senhor nisso que foi o que depois entendi vasto Desistir de Diadorim foi o que eu falei Digo desdigo Pode até ser por meu desmazelo de contar o senhor esteja crendo que no arrancho do acampo eu pouco visse Diadorim amizade nossa padecesse de descuido ou míngua O engano Tudo em contra Diadorim e eu a gente parava em som de voz e alcance dos olhos constante um não muito longe do outro De manhã à noite a afeição nossa era duma cor e duma peça Diadorim sempre atencioso esmarte correto em seu bom João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 257 proceder Tão certo de si ele repousava qualquer mau ânimo Por que é então que eu salto isso em resumo como não devia de nesta conversa minha abreviã Veja o senhor o que é muito e mil estou errando Estivesse contando ao senhor por tudo somente o que Diadorim viveu presente mim o tempo em repetido igual trivial assim era que eu explicava ao senhor aquela verdadeira situação de minha vida Por que é então que deixo de lado Acho que o espírito da gente é cavalo que escolhe estrada quando ruma para tristeza e morte vai não vendo o que é bonito e bom Seja E aquele Garanço olhe o que eu dele disse de bondade e amizade não foi estrito Sei que naquela vez não senti Só senti e achei foi em recordação que descobri depois muitos anos Coitado do Garanço ele queria relatar me falava Fui almocreve no Serem Tive três filhos Mas que sorte de jagunço recluta era ele assim meninoso jalofo e bom Eta e você já matou seus muitos homens Garanço pois perguntei O riso dele ficava querendo ser mais grosso Eh eh nós Sou algum medroso E mecê encomenda o que no rifle que está em minha mão mano velho Eh não desprevino não lhe envergonho o desse O Garanço mesmo afirmo acho que nunca duvidou de coisa nenhuma Toda tardeza dele não deixava E só Comum de benquistar e malquistar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 258 O senhor entenderá Eu não entendo Aquele Hermógenes me fazia agradados demo que ele gostava de mim Sempre me saudando com estimação condizia um gracejo amistoso ou umas boas palavras nem parecia ser o bedegueba Por cortesia e por estatuto eu tinha de responder Mas em mal Me irava Eu criava nojo dele já disse ao senhor Aversão que revém de locas profundas Nem olhei nunca nos olhos dele Nojo pelos eternos razão de mais distâncias Aquele homem para mim não estava definitivo E arre que ele não desconfiava não percebia Queria conversa me chamava eu tinha de ir ele era o chefe Fiquei de ensombro Diadorim notou me deu conselho Modera esse gênio que você tem Riobaldo As pessoas não são tão ruins agrestes Dele não me temo eu respondi Eu podia xingar com os olhos Aí o Hermógenes me presenteou com um nagã e caixas de balas Estive para nem aceitar Eu já possuía revólver meu carecia algum daquele de tanto só cano tão enorme Por insistências dele mesmo com aquilo fiquei Cuspi depois Dado que eu nunca ia retribuir Queria eu lá viver perto de chefes Careço é de pousar longe das pessoas de mando mesmo de muita gente conhecida Sou peixe de grotão Quando gosto é sem razão descoberta quando desgosto também Ninguém com dádivas e gabos não me transforma Aquele Hermógenes era matador o de judiar de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 259 criaturas filhosdedeus felão de mau Meus ouvidos expulsavam para fora a fala dele Minha mão não tinha sido feita para encostar na dele Ah esse Hermógenes eu padecia que ele assistisse neste mundo Quando ele vinha conversar comigo no silêncio da minha raiva eu pedia até ao demônio para vir ficar de permeio entre nós dois para dele me apartar Eu podia rechear de balas aquele nagã próprio e descarregar nele tiros entre os todos olhos O senhor tolere e releve estas palavras minhas de fúria mas disto sei era assim que eu sentia sofria Eu era assim Hoje em dia nem sei se sou assim mais Do ódio sendo Acho que às vezes é até com ajuda do ódio que se tem a uma pessoa que o amor tido a outra aumenta mais forte Coração cresce de todo lado Coração vige feito riacho colominhando por entre serras e varjas matas e campinas Coração mistura amores Tudo cabe Conforme contei ao senhor quando Otacília comecei a conhecer nas serras dos ge rais Buritis Altos nascente de vereda Fazenda Santa Catarina Que quando só vislumbrei graça de carinha de riso e boca e os compridos cabelos num enquadro de janela por o mal aceso de uma lamparina Mas logo fomos para acomodar numa rebaixa de engenhodepilões lá pernoitamos Eu com Diadorim Alaripe João Vaqueiro e Jesualdo e o Fafafa No que repontávamos de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 260 dura viagem tudo o que era corpo era bom cansaço Mas eu dormi com dois anjosdaguarda O que lembro tenho Venho vindo de velhas alegrias A Fazenda Santa Catarina era perto do céu um céu azul no repintado com as nuvens que não se removem A gente estava em maio Quero bem a esses maios o sol bom o frio de saúde as flores no campo os finos ventos maiozinhos A frente da fazenda num tombado respeitava para o espigão para o céu Entre os currais e o céu tinha só um gramado limpo e uma restinga de cerrado de donde descem borboletas brancas que passam entre as réguas da cerca Ali a gente não vê o virar das horas E a fogoapagou sempre cantava sempre Para mim até hoje o canto da fogoapagou tem um cheiro de folhas de assa peixe Depois de tantas guerras eu achava um valor viável em tudo que era cordato e correntio na tiração de leite num papudo que ia carregando lata de lavagem para o chiqueiro nas galinhas dangola ciscando às carreiras no fedegosobravo com florezinhas amarelas e no vassoural comido baixo pelo gado e pelos porcos Figuro que naquela ocasião tive curta saudade do São Gregório com uma vontade vã de ser dono de meu chão meu por posse e continuados trabalhos trabalho de segurar a alma e endurecer as mãos Estas coisas eu pensava repassadas E João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 261 estava lá outra vez nos gerais O ar dos gerais o senhor sabe Tomamos farto leite Trouxeram café para nós em xicrinhas Ao que ficamos por ali àtoa depois de uma conversa com o velhozinho avô Otacília eu revi já foi na sobremanhã Ela apareceu Ela era risonha e descritiva de bonita mas hojeemdia o senhor bem entenderá nem ficava bem conveniente me dava pejo de muito dizer Minha Otacília fina de recanto em seu realce de mocidade mimo de alecrim a firme presença Fui eu que primeiro encaminhei a ela os olhos Molhei mão em mel regrei minha língua Aí falei dos pássaros que tratavam de seu voar antes do mormaço Aquela visão dos pássaros aquele assunto de Deus Dioadorim era quem tinha me ensinado Mas Diadorim agora estava afastado amuado longe num emperreio Principal que eu via eram as pombas No bebedouro pombas bando E as verdadeiras altas cruzando do mato Ah já passaram mais de vinte verdadeiras palavras de Otacília que contava Essa principiou a nossa conversa Salvo uns risos e silêncios a tão Toda moça é mansa é branca e delicada Otacília era a mais Mas na beira da alpendrada tinha um canteirozinho de jardim com escolha de poucas flores Das que sobressaíam era João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 262 uma flor branca que fosse caeté pensei e parecia um lírio alteada e muito perfumosa E essa flor é figurada o senhor sabe Morada em que tem moças plantam dela em porta da casade fazenda De propósito plantam para resposta e pergunta Eu nem sabia Indaguei o nome da flor Casacomigo Otacília baixinho me atendeu E no dizer tirou de mim os olhos mas o tiritozinho de sua voz eu guardei e recebi porque era de sentimento Ou não era Daquele curto lisim de dúvidas foi que minou meu maisquerer E o nome da flor era o dito tal se chamava mas para os namorados respondido somente Consoante outras as mulheres livres dadas respondem Dormecomigo Assim era que devia de haver de ter de me dizer aquela linda moça Nhorinhá filha de Ana Duzuza nos Gerais confins e que também gostou de mim e eu dela gostei Ah a flor do amor tem muitos nomes Nhorinhá prostituta pimentabranca boca cheirosa o bafo de menino pequeno Confusa é a vida da gente como esse rio meu Urucuia vai se levar no mar Porque no meio do momento me virei para onde lá estava Diadorim e eu urgido quase aflito Chamei Diadorim e era um chamado com remorso e ele veio se chegou Aí por alguma coisa dizer eu disse que estávamos falando daquela flor Não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 263 estávamos E Diadorim reparou e perguntou também que flor era essa qual sendo perguntou inocente Ela se chama é liroliro Otacília respondeu O que informou altaneira disse vi que ela não gostava de Diadorim Digo ao senhor que alegria que me deu Ela não gostava de Diadorim e ele tão bonito moço tão esmerado e prezável Aquilo para mim semelhava um milagre Não gostava Nos olhos dela o que vi foi asco antipatias quando em olhar eles dois não se encontraram E Diadorim Me fez medo Ele estava com meia raiva O que é dose de ódio que vai buscar outros ódios Diadorim era mais do ódio do que do amor Me lembro lembro dele nessa hora nesse dia tão remarcado Como foi que não tive um pressentimento O senhor mesmo o senhor pode imaginar de ver um corpo claro e virgem de moça morto à mão esfaqueado tinto todo de seu sangue e os lábios da boca descorados no branquiço os olhos dum terminado estilo meio abertos meio fechados E essa moça de quem o senhor gostou que era um destino e uma surda esperança em sua vida Ah Diadorim E tantos anos já se passaram Desde esse primeiro dia Diadorim guardou raiva de Otacília E mesmo eu podia ver que era açoite de ciúme O senhor espere o meu contado Não convém a gente levantar escândalo de começo só aos poucos é que o escuro é claro Que Diadorim tinha ciúme de mim com qualquer mulher eu já sabia fazia tempo até Quase desde o princípio E naqueles meses todos a gente vivendo em par a par por altos e baixos amarguras e perigos o roer daquilo ele não conseguia esconder bem que se esforçava Vai e vem me intimou a um trato que enquanto a gente estivesse em oficio de bando que nenhum de nós dois não botasse mão em nenhuma mulher Afiançado falou Promete que temos de cumprir isso Riobaldo feito jurado nos SantosEvangelhos Severgonhice e airado aveio servem só para tirar da gente o poder da coragem Você cruza e jura Jurei Se nem toda a vez cumpri ressalvo é as poesias do corpo malandragem Mas Diadorim dava como exemplo a regra de ferro de Joãozinho BemBem o sempre sem mulher mas valente em qualquer praça Prometi Por um prazo jejuei de nem não ver mulher nenhuma Mesmo Tive penitência O senhor sabe o que isso é Desdeixei duma roxa a que me suplicou os carinhos vantajosos E outra e tantas E uma rapariga das de luxo que passou de viagem e serviu aos companheiros quase todos e era perfumada proseava gentil sobre as sérias João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 265 imoralidades tinha beleza Não acreditei em juramento nem naquilo de seo Joãozinho BemBem mas Diadorim me vigiava De meus sacrifícios ele me pagava com seu respeito e com mais amizade Um dia no não poder ele soube ele quase viu eu tinha gozado hora de amores com uma mocinha formosa e dianteira morena cor de docedeburiti Diadorim soube o que soube me disse nada menos nada Um modo eu mesmo foi que uns dias calado passei na asperidão sem tristeza De déu em demos falseando sempre tive fogo bandoleiro Diadorim não me acu sava mas padecia Ao que me acostumei não me importava Que direito um amigo tinha de querer de mim um resguardo de tamanha qualidade Às vezes Diadorim me olhasse com um desdém fosse eu caso perdido de lei descorrigido em bandalho Me dava raiva Desabafei disse a ele coisas pesadas Não sou o nenhum não sou frio não Tenho minha força de homem Gritei disse mesmo ofendendo Ele saiu para longe de mim desconfio que com mais até ele chorasse E era para eu ter pena Homem não chora eu pensei para formas Então eu ia deixar para a boca dos outros aquela menina que se agradou de mim e que tinha cor de docedeburiti e os seios tão grandes Ah essa agora não estava a meu dispor tínhamos viajado muito para longe de onde ela morava Mas entramos num arraial maior João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 266 com progresso de bordel no hospedado daquilo usufruí muito sou senhor Diadorim firme triste apartado da gente naquele ar raial me lembro Saí alegre do bordel acinte Depois o Fafafa numa venda perguntou se não tinham chá de mate seco comercial e um homem tirou instantâneo nosso retrato Se chamava o lugar São João das Altas Mulher esperta cinturinhazinha que me fez bem O senhor releve e não reprove Demasias de dizer sobem com as lembranças da mocidade Não estou contando Pois minha vida em amizade com Diadorim correu por muito tempo desse jeito Foi melhorando foi Ele gostava destinado de mim E eu como é que posso explicar ao senhor o poder de amor que eu criei Minha vida o diga Se amor Era aquele latifúndio Eu ia com ele até o rio Jordão Diadorim tomou conta de mim E ainda falhamos dois dias na Fazenda Santa Catarina Naquele primeiro dia eu pude conversar outras vezes com Otacília que para mim hora em mais hora embelezava Minha alma que eu tive e minha idéia esbarrada Conheci que Otacília era moça direta e opiniosa sensata mas de muita ação Ela não tinha irmão nem irmã Sor Amadeu chefiava largo grandes gados em léguas de alqueires Otacília não estava noiva de ninguém E João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 267 ia gostar de mim De moçadefamília eu pouco entendesse A ser a Rosauarda Assim igual eu Otacília não queria querer salvante assente que da Rosauarda nunca me lembrei com desprezo não vê não cuspo no prato em que o bom já comi Sete voltas sete dei pensamentos eu pensava Revirei meu fraseado Quis falar em coração fiel e sentidas coisas Poetagem Mas era o que eu sincero queria como em fala de livros o senhor sabe de belver belfazer e belamar O que uma mocinha assim governa sem precisão de armas e golpes guardada macia e fina em sua casagrande sorrindo santinha no alto da alpendrada E ela queria saber tudo de mim mais ainda me perguntava Donde é mesmo que o senhor é donde Se sorria E eu não medi meus alforjes fui contando que era filho de Seô Selorico Mendes dono de três possosas fazendas assistindo na São Gregório E que não tinha em minhas costas crime nenhum nem estropelias mas que somente por cálculos de razoável política era que eu vinha conduzindo aqueles jagunços para Medeiro Vaz o bom foro e patente fiel de todos estes Gerais Aqueles Diadorim e os outros Eu era diferente deles João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 268 Fiquei esperando o que ela desse em resposta Nem nada não acreditava Mas Otacília mudou para séria a feição do rosto não queria mais de minha vida só assim meiamente indagar Os de todos lindos olhos dela estavam me assinalando o céu com essas nuvens Eu tinha renegado Diadorim travei o que tive vergonha Já era para entardecendo Vindo na vertente tinha o quintal e o mato com o garrulho de grandes maracanãs pousadas numa embaúba enorme e nas mangueiras que o sol dourejava Da banda do serro se pegava no céu azul com aquelas peças nuvens sem movimento Mas de parte do poente algum vento suspendia e levava rabosdegalo como que com eles fossem fazer um seu branco ninho muito longe ermo dos Gerais nas beiras matas escuras e águas todas do Urucuia e nesse céu sertanejo azulverde que mais daí a pouco principiava a tomar raias feito de ferro quente e sangues Digo porque até hoje tenho isso tudo do momento riscado em mim como a mente vigia atrás dos olhos Por que meu senhor Lhe ensino porque eu tinha negado renegado Diadorim e por isso mesmo logo depois era de Diadorim que eu mais gostava A espécie do que senti O sol entrado Daí sendo a noite aos pardos gatos Outra nossa noite na rebaixa do engenho deitados em couros e esteiras nem se tinha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 269 o espaço de lugar onde rede armar Diadorim perto de mim Eu não queria conversa as idéias que já estavam se acontecendo eram maiores Assim eu ouvindo o ciciri dos grilos Na beira da rebaixa a fogueira feita sarrava se acabando Alaripe ainda esteve lá mexendo em tição pitou um cigarro O Jesualdo Fafafa e João Vaqueiro não esbarravam de falar mais o Alaripe também repesavam as vantagens da Santa Catarina No que eu pensava Em Otacília Eu parava sempre naquela meiaincerteza sem saber se ela simse Ao que nós todos pensávamos as mesmas coisas o que cada um sonhava quem é que sabia Aquilo é poço que promete peixe o Jesualdo disse Dela devia de ser Amigo não toque no nome dessa moça amigo eu falei Ninguém deu resposta eles viam que era a sério fatal deviam de estar agora desqueixelados no escuro Por longe a mãodalua suspirou o grito Floriano foi foi foi que gemia nas almas Então era que em alguma parte a lua estava se saindo a mãedalua pousada num cupim fica mirando apaixonada abobada Deitado quase encostado em mim Diadorim formava um silêncio pesaroso Daí escutei um entredizer percebi que ele ansiava raiva De repente Riobaldo você está gostando dessa moça João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 270 Aí era Diadorim meio deitado meio levantado o assopro do rosto dele me procurando Deu para eu ver que ele estava branco de transtornado A voz dele vinha pelos dentes Não Diadorim Estou gostando não eu disse neguei que reneguei minha alma obedecia Você sabe do seu destino Riobaldo Não respondi Deu para eu ver o punhal na mão dele meio ocultado Não tive medo de morrer Só não queria que os outros percebessem a má loucura de tudo aquilo Tremi não Você sabe do seu destino Riobaldo ele reperguntou Aí estava ajoelhado na beira de mim Se nanja sei não O demônio sabe eu respondi Pergunta Me diga o senhor por que naquela extrema hora eu não disse o nome de Deus Ah não sei Não me lembrei do poder da cruz não fiz esconjuro Cumpri como se deu Como o diabo obedece vivo no momento Diadorim encolheu o braço com o punhal se defastou e deitou de corpo outra vez Os olhos dele dançar produziam de estar brilhando E ele devia de estar mordendo o correiame de couro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 271 Assisado me enrolei bem no cobertor mas não adormeci Eu tinha dó de Diadorim eu ia com meu pensamento para Otacília Me balanceei assim adiantado na noite em tanto gaio em tanto piongo com todas as novas dúvidas e idéias e esperanças no claro de uma espertina Com muito me levantei Saí Tomei a altura do seteestrelo Mas a lua subia estada abençoando redondo o friinho de maio Era da bordadocampo que a mãedalua sofria seu cujo de canto do vulto de árvores da mata cercã Quando a lua subisse mais as estrelas se sumiam para dentro e até as seriemas podiam se atontar de gritar Ao que fiquei bom tempo encostado no cajueiro da beira do curral Só olhava para a frente da casadafazenda imaginando Otacília deitada rezada feito uma gatazinha branca no cavo dos lençóis lavados e soltos ela devia de sonhar assim E de repente pres senti que alguém tinha vindo por detrás de mim me vigiava Diadorim fosse Não virei a cara para ver Não tive receio Nunca posso ter medo das pessoas de quem eu gosto Digo Esperei mais outro tempo Daí vim voltando Mas lá não estava pessoa nenhuma entre claridade e sombras Ilusão minha a fantasiação Bebi água do rego com o frio da noite ela corria morna Tornei a entrar na rebaixa Diadorim permanecia lá jogado de dormir De perto senti a respiração dele remissa e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 272 delicada Eu aí gostava dele Não fosse um como eu disse a Deus que esse ente eu abraçava e beijava E com o vago devo de ter adormecido porque acordei quando Diadorim no mexe leve se levantou saiu sem rumor levando a capanga ia tomar seu banho em poço de córrego das barras no clarear Desde o que depressa eu tornei a me dormir Mas cedo no amanhecer o sor Amadeu tinha chegado e com notícia urgente que o grosso do bando de Medeiro Vaz recruzava de lá a quinze léguas da VeredaFunda para a Ratragagem e nós tínhamos de seguir sem folga supraditamente No que Nhô Vô Anselmo me deu um dito afeiçoado e diferente entendi que o velhozinho sabia de alguma coisa e que não desgostava que eu viesse a ficar neto dele Nós almoçamos e montamos Diadorim Alaripe Jesualdo e João Vaqueiro se retiraram em adiantando e o Fafafa Mas eu cacei melhor coragem e pedi meu destino a Otacília E ela por alegria minha disse que havia de gostar era só de mim e que o tempo que carecesse me esperava até que para o trato de nosso casa mento eu pudesse vir com jus Saí de lá aos grandes cantos tempodoverde no coração Por breve pensei era que eu me despedia daquela abençoada fazenda Santa Catarina excelentes produções Não que eu acendesse em mim ambição de teres e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 273 haveres queria era só mesma Otacília minha vontade de amor Mas com um significado de paz de amizade de todos de sossegadas boas regras eu pensava nas rezas nas roupagens na festa na mesa grande com comedorias e doces e no meio do solene o sor Amadeu pai dela que apartasse destinado para nós dois um buritizal em dote conforme o uso dos antigos Vim Diadorim nada não me disse A poeira das estradas pegava pesada de orvalho O birro e o jesusmeudeus cantavam O melosal maduro alto com toda sua roxidão roxura Mas o mais e do que sei eram mesmo meus fortes pensamentos Sentimento preso Otacília Por que eu não podia ficar lá desde vez Por que era que eu precisava de ir por adiante com Diadorim e os companheiros atrás de sorte e morte nestes Gerais meus Destino preso Diadorim e eu viemos vim de rota abatida Mas desse dia desde sempre uma parte de mim ficou lá com Otacília Destino Pensava nela Às vezes menos às vezes mais consoante é da vida Às vezes me esquecia às vezes me lembrava Foram esses meses foram anos Mas Diadorim por onde queria me levava Tenho que quando eu pensava em Otacília Diadorim adivinhava sabia sofria João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 274 Essas coisas todas se passaram tempos depois Talhei de avanço em minha história O senhor tolere minhas más devassas no contar É ignorância Eu não converso com ninguém de fora quase Não sei contar direito Aprendi um pouco foi com o compadre meu Quelemém mas ele quer saber tudo diverso quer não é o caso inteirado em si mas a sobrecoisa a outracoisa Agora neste dia nosso com o senhor mesmo me escutando com devoção assim é que aos poucos vou indo aprendendo a contar corrigido E para o dito volto Como eu estava com o senhor no meio dos Hermógenes Destaque feito Zé Bebelo vinha vindo Vinham por nós E tivemos notícia a légua dali eles estavam chegando no meio do dia patrulhão de cavaleiros Légua não era verdade mas obra de seis léguas o sim E eram só uns sessenta por aí Todo o tempo eu vinha sabendo que nosso fim era esse mas mesmo assim foi feito surpresa Eu não podia imaginar que ia entrar em fogo contra os bebelos De certo modo eu prezava Zé Bebelo como amigo Respeitava a finura dele Zé Bebelo sempre entendidamente E uma coisa me esmoreceu a torto Medo não mas perdi a vontade de ter coragem Mudamos de acampo para perto para perto É agora É hoje O Hermógenes reunia o pessoal todos A gente carecia de levar o préstimo maior de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 275 munição que se pudesse Aonde Diadorim por um gesto me cortou de fazer mais perguntas Às armas Diadorim ia para aquilo prezável de passeata Ah uma coisa não referi ao senhor Que era que aquele tempo no arranchamento do Hermógenes minha amizade com Diadorim estava sendo feito água que corre em pedra sem pepa de barro nem pó de turvação Da voz de homens e do tinir de armas em má véspera não se podia deixar de receber um lufo de dureza de mais próprio respeito e muita coisinha se empequenava Zé Bebelo é arisco de aviso Diadorim Ele joga seguro por aí perto em esconso deve de ter outra tropa de guerra prontos para virem dar retaguarda Eu sei bem essa a norma dele Carece de prevenir o Hermógenes João Goanhá Titão Passos eu não retive e disse Eles sabem Riobaldo Toda guerra é essa Diadorim me respondeu E eu estava sabendo que eu já dizer aquilp era traição Era Hoje eu sei que não que eu tinha de zelar por vida e pela dos companheiros Mas era traição isto também sim era porque eu pensava que era Agora depois mais do tudo que houve não foi Agarrei minha mochila comi fria a minha jacuba Tudo estava sendo determinado decidido até o que a gente tinha de fazer depois Aí João Goanhá apartava o pessoal em punhados João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 276 de quinze ou vinte cada um desses acabado o fogo devia de se reunir em lugar certo comum Daquela hora em diante íamos ter de brigar em pequenas quantidades Pelas caras dos homens eu via que estavam satisfeitos parecia muito e pouco Com regozijo um golinho se bebeu Toma este breve Riobaldo Foi minha mãedecriação quem costurou para mim Mas eu carrego dois Era o Feijó um sacudido oitavão ele manobrava rifle de três canos Que simpatia demonstrada era essa eu nunca tinha dado fé daquele Feijó A vamos Hoje se faz o que não se faz um se exaltava assim tive medo de castigo de Deus Quem quisesse rezar podia tinha praça outros contritos acompanhavam Outros ainda comiam zampando limpavam a boca com as duas mãos Não é medo não amigos é o trivial do corpo explicavam alguns que ainda careciam de ir por suas necessidades Restantes risadas davam Ao que faltava nem meiahora para o sol ir entrando Daquele lugar vazio de moradas e de terras lavradias a gente ouvia o gugo da juriti como um chamado acabado junto com lobo guará já dando gritos de penitência Presta uma demão aqui Ajudei Era um mon tesclarense acho que o cujo nome esqueci que queria passar tiras de pano por sola das alpercatas e peito dos pés reforçando Terminou e fez os passos de dança maneiro nas juntas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 277 assobiava Aquele rapaz pensava alguma coisa Riobaldo Diadorim me disse arruma jeito de mudar de lugar na hora sempre que puder E põe cautela homem rasteja por entre as moitas e vem pular nas costas da gente relampeando faca Diadorim sorria sério Um outro me esbarrou quando passava Era o Delfim violeiro Onde era que a viola ele ia poder guardar Eu apertei a mão de Diadorim e queria sair andar gastar Conto que chegou o Hermógenes A voz do Hermógenes dando ordens de guerra já disse ao senhor ficava clara e correta um podia dizer que até ficava Ao menos ele sabia aonde ia levar a gente e o que queria Deu resumo do traço Que todos cumprissem que todos soubessem A partida dos zebebelos estava com posição no Alto dos Angicos tabuleirinho de chã Podiam ter espalhado sentinelas muito longe até na beira do córrego Dinho ou para lá em volta nas contravertentes Mas disso logo se ia saber porqual os espias nossos rondavam O que se tinha era de chegar já como o escuro e engatinhar às ladeiras no durado da noite na arte vagarosa Só íamos abrir fogo de surpresa no clarearzinho da madrugada Cada um de seu Ponto melhor Tudo tinha de valer Pm cnnsagato e finice até se carecia de respirar só por metade Se algum topasse com inimigos por másorte antes ele que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 278 escorresse como pudesse ou dependesse na faca atirar com arma é que não podendo Sendo que podendo mas só depois do Hermógenes que era quem era o dono o primeiro tiro ele dava Como cada qual tinha de atirar com sanguefrio de matar exato Porque nosso prazo seria acabar com todos com brevidade mais antes que outros deles pudessem vir para um reforço Mesmo assim Titão Passos ia com uns trinta companheiros reguardar o caminho de vinda à emboscada num tombador de pedra Já vai que o Hermógenes explicava devagar e tudo repetia com paciência o dever absoluto era que até o mais tonto aprendesse e estava definido o rumo de tarefa por onde cada um devia de se pôr no chão e começar a engatinhar virada arriba Mas eu catei o sentido de tudo já na primeira razão e de cada vez que ele repetia eu reproduzia em minha idéia os acontecimentos se passando eu já estava lá e rastejava me aprontava Peguei a sentir Me fiz fácil nas armas Por jeito Com o que se deu que eu não contava O Hermógenes me chamou Aí as cintas e cartucheiras mochilão rede passada e um cobertor por tudo cobrir ele estava parecendo até um homem gordo Riobaldo Tatarana tu vem Lugar nosso vai ser o mais perigoso Careço de três homens bons no próximo de meu cochicho Para que vou mentir ao João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 279 senhor Com ele me apartar assim me conferindo valia um certo aprazimento me deu Natureza da gente bebe de águas pretas agarra gosma Quem sabe Eu gostei Mesmo com aversão que digo que foi que forte era como um escrúpulo A gente o que vida é é para se envergonhar Mas aí eu fiquei inteiriço Com a dureza de querer que espremi de minha sustância vexada fui sendo outro eu mesmo senti eu Riobaldo jagunço homem de matar e morrer com a minha valentia Riobaldo homem eu sem pai sem mãe sem apego nenhum sem pertencências Pesei o pé no chão acheguei meus dentes Eu estava fechado fechado na idéia fechado no couro A pessoa daquele monstro Hermógenes não encostava amizade em mim E nem ele naquela hora não era Era um nome sem índole nem gana só uma obrigação de chefia E por cima de mim e dele estava Joca Ramiro Pensei em Joca Ramiro Eu era feito um soldado obedecia a uma regra alta não obedecia àquele Hermógenes Dentro de mim falei Eu Riobaldo eu Joca Ramiro é que era a obrigação de chefia Mas Joca Ramiro parava por longe era feito uma lei uma lei determinada Pensei nele só forte Pensando Joca Ramiro Joca Ramiro Joca Ramiro A arga que em mim roncou era um despropósito uma pancada de mar Nem precisava mais de ter ódio nem receio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 280 nenhum E fui desertando da cobiça de mimar o revólver e desfechar em fígados Refiro ao senhor mas tudo isso no bater de ser Só Dessas boas fúrias da vida Aí ele tinha que eu escolhesse os para vir juntos Eu Ele estava me experimentando E não tardei O Garanço eu disse e este aqui completei para aquele montesclarense apontando Bem que eu queria também o Feijó mas deviam de ser só dois a conta já estava E Diadorim o senhor perguntará Ah por Diadorim era que eu não dizia o pensamento nele me repassava O tempozinho todo naquele soflagrante E estúrdio eu principalmente não queria Diadorim perto de mim para as horas Por quê Por que é o que eu mesmo não sabia Seria que me desvalesse a presença dele comigo pelos perigos que eu visse virem a ele no meio do combate ou seria que a lembrança de ter Diadorim junto naqui lo me desgostasse por me enfraquecer agora eu assim duro ferro diante do Hermógenes leão coração Se sei sei Porque era como eu estava E assim respondi que então o Garanço e o Montesclarense iam com a gente Como saímos viemos vindo desfeitos aos dois aos três aos sozinhos Já a já era noite Noite da Jaíba dá de uma asada João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 281 uma pancada só Háde que se acostumar com o escuro nos olhos Conto tudo ao senhor O caminhar da gente se media em silencioso nem o das alpercatas não se ouvia De tantos matos baixos carrascal o chio dos bichinhos era um milhão só Por lá a coruja grande avoa que sabe bem aonde vai sabe sem barulho A quando o vulto dela assombrava em frente da gente no ar eu fechava os olhos três vezes O Hermógenes rompia adiante não dizia palavra Nem o Garanço também nem o Montesclarense Isso em meu sentir eu a eles agradecia Quem vai morrer e matar pode ter conversa Só esses pássaros de pena mole gerados da noite tantos bacuraus insensatos o sebastião que chamava a fêmea com grandes risadas pedindo tabacobom Digo ao senhor o que eu ia pensando em nada Só esforçava tenção numa coisa que era que devia de guardar tenência simples e constância miúda esperando a novidade de cada momento Minha pessoa tomava para mim um valor enorme Aquele pássaro medeléguas erguia vôo de pousado no meio da estrada toda vez ia se abaixar dez braças mais adiante do jeito mesmo conforme de comum esses fazem Bobice dele não via que o perigo torna a vir sempre Digo tudo disse mataremorrer Toleima Nisso mesmo era que eu não pensava Descarecia Era assim eu ia indo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 282 cumprindo ordens tinha de chegar num lugar aperrar as armas acontecia o seguinte o que viesse vinha tudo não é sina Nanja não queria me alembrar de nenhum nenhuma Com meialégua andada por um trilho É preciso não roçar forte nas ramagens não partir galhos Caminhar de noite no breu se jura sabença o que preza o chão o pé que adivinha A gente imagina uns bu racões disformes A gente espera vozes Eh Pouquinhas estrelas dando céu a noite barrava bruta Digo ao senhor a noite é da morte Nada pega significado em certas horas Saiba o que eu mais pensei No seguinte como é que curiango canta Que o curiango canta é Curíangú A obra de umas cem braças do riacho o Hermógenes esbarrou Con chegamos E com as mãos apalpávamos uns os outros Dali em diante era junto a junto O Hermógenes puxando enxergava por nós Que olhos que esse descascavam de dentro do escuro qualquer coisa olhar assim que nem o de suindara Cada um com punhal a ponto atravessamos o córrego pulando pelas alpondras mais para baixo sabíamos de uma estiva mas lá se temia que tivessem botado sentinelas Ali era o lugar pior um estremecimento me desceu senti o espaço da minha nuca Do escurão tudo é mesmo possível No outro lado o Hermógenes sussurrou ordens Deitamos Eu estava atrás João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 283 duma árvore uma almêcega Mais atrás de mim o riacho passante por suas pedras Naquela espera carecíamos de persistir horas dando tempo Assim a água perto os mosquitos vêm eles acordam com o cheiro da cara da gente não concedem sossego Acender cigarro e pitar não se podia A noite é uma grande demora Ah o que os mosquitos infernizavam Por isso mesmo direi era que Hermógenes tinha escolhido ali que ninguém pegasse no sono que a mosquitada não deixava Mas não seria de mim que pudesse ferrar no sono assim perto daquele homem príncipe das tantas maldades O que eu queria era que tudo sucedesse mal ou bem aquela noite tivesse termo de terminada Tá aqui toma ouvi Era o Hermógenes um taco de fumo me dando que em forte cachaça ele tinha acabado de empapar Era para se esfregar na cara e nas mãos Aceitei Fosse coisa de comer não aceitava Nada não disse não agradeci Aquilo era do serviço de armas fazia parte E esfreguei bem Ao que os mosquitos deixaram de me ferroar Desde fiquei pois então me divertindo de beliscar a casca da almêcega aquela resina de icií Daí os pensamentos que tive foram os que nem merecem e eu não sou capaz de dar narração retrato de pessoas diversas ressalte de conversas tolas coisas em vago das viagens que eu tinha feito A noite durava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 284 Haja de contar o que foi o todo de se escorregar para cima a encosta até ao ponto donde a espera de tocaia devia de ser Aquilo o igual sempre sendo Um homem se arraiga em terra no capim no chão e vai vai sendo serepente de gato emcaça Carece de repartir frouxo o peso do corpo semelhante fosse nadando cotovelo e joelho é que transpõem Tudo um ai de vagar que chega aporreia tem que ser Não vale arranco de pressa o senhor tem de ficar o comprido que pode por mais de As juntas da gente estalam o senhor mesmo escuta Se coça a canela com o calcanhar estando com polaina não adianta De cada vez o senhor vira o corpo num lado e olha escuta Qualquer barulho sem tento que se faz verte perigo Pássaro pousado em moita que se assusta forte a vôo dá aviso ao inimigo Pior são os que têm ninho feito às vezes esvoaçam aos gritos no mesmo lugar dão muito aviso Aí quando é tempo de vagalume esses são mil demais sobre toda a parte a gente mal chega eles vão se esparramando de acender na grama em redor é uma esteira de luz de fogo verde que tudo alastra é o pior aviso O que nós estávamos fazendo era uma razão de loucura muita coisa que só mesmo em guerra é que se quer O punhal travessado na boca sabe sem querer a gente rosna Às guardas qualquer mato ameaçava que ia bulir com o inimigo vindo dele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 285 Árvores branquiçadas traiçoeiramente A gente amassa com a barriga espinhos e gravetos é preciso de saber quando é que é melhor se calcar no estrepe firme com gosto que é o que mais defende dele não se cravar O inimigo pode estar engatinhando também versa por detrás nunca se tem certeza O cheiro de terra agoura mal Capim de beira em fio que corta a cara E uns gafanhotos pulam têm um estourinho tlique eu figurava que era das estrelas remexidas titique delas caindo por minhas costas Trabalhos de unha O capim escorria do sereno da noite lagrimado Ah e cobra Pensar que num corisco de momento se pode premer mão numa rodilha grossa de cascavel numa certa morte dessas Pior é a surucucu que passeia longe noturnazã monstro essa é o que há com mais doida ligeireza neste mundo Rezei a jaculatória de São Bento A água do sereno me molhava da macega das folhas é o que digo ao senhor me desgostava Raio de um repente afastaram a erva alta minha cabeça eu encolhi Era um tatu que ia entrando no buraco fungou e escutei o esfrego de suas muxibas Tatupeba e eu no rés dele Que modo quê Rastejando de minha banda da direita o Hermógenes rompia eu sentia o bafo duma boca e aquele avultar deitado de bicho duro braço por braço O Garanço e o Montesclarense espigavam vez mais adiante vez mais atrás Quando de sem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 286 menos o Hermógenes me esbarrou Ele falou um murmo me cochichou de mão em concha É aqui mesmo ele redisse Onde era que estavam as estrelas dianteiras e os macios pássaros da noite pensei Eu tinha fechado os olhos O cheiro dum araçábranco formava bolas Quietei Até que o dia deu que é que foi do meu tempo que horas que se passaram Aí eu podia medir pelas estrelas que vão em movimento descendo no rumo de seu poente elas viravam Mas digo ao senhor eu não olhei para o céu Não queria Não podia Assim espichado no escabro um sofre o festo da noite o chão esfriava Pensei será se eu fosse adoecer um longe de dorde dente já me indispondo Aquilo que cochilei dormir eu em firme rejeitava O Hermógenes um homem existente encostado no senhor calado curto o pensamento dele assanha feito um berreiro Aquelas mortes que eram para daí a pouco já estavam na cabeça do Hermógenes Eu não tinha nada com aquilo próprio eu não estava só obedecendo Pois não era Ao que o meu primeiro fogo tocaieiro Danado desuso disso é o antes tanto antes ror O senhor acha que é natural Osgas que a gente tem de enxotar da idéia eu parava ali para matar os outros e não era pecado Não era não era eu resumi Osgas Cochilei tenho Por descuido de querer Dormi mesmo Eu não era o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 287 chefe loca Ramiro queria aquilo E o Hermógenes mandante perto em sua capatazia Dito por uns no céu coisa como uma careta preta É erro Não nada oi Nada Eu ia matar gente humana Dali a pouco o madrugar clareava eu tinha de ver o dia vindo Como era o Hermógenes Como vou dizer ao senhor Bem em bró de fantasia ele grosso misturado dum cavalo e duma jibóia Ou um cachorro grande Eu tinha de obedecer a ele fazer o que mandasse Mandava matar Meu querer não correspondia ali por conta nenhuma Eu nem conhecia aqueles inimigos tinha raiva nenhuma deles Pessoal de Zé Bebelo povo reunido na beira do Jequitaí por ganhar seu dinheirinho fiel feito tropa de soldo Quantos não iam morrer por minha mão Andante que perpassou um vento entre ele o crico de grilos e tantos bichinhos divagados Assaz a noite com sombras vermelhas O exemplar da morte dessa é que é num átimo tão ligeira tão direitinha As coisas que eu nem queria pensar mas pensava mais elas vinham Vezo de falar do Geraldo Pedro que disse Aquele Hoje ele não existe mais virou sombração Matei E o Catocho contando doutro Lá tem uns órfãos meus lá Tive de matar o pai deles Por que era que falavam essas perversidades Por que é que falavam Por que era que eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 288 tinha de obedecer ao Hermógenes Ainda estava em tempo se eu quisesse sacanhava meu revólver gastava nele um breve tiro bem certo e corria ladeira abaixo às voltas caçava de meu sumir nesse vaitemundo Ah nada então aí mesmo era que o fogo feio começava por todas as partes de todo jeito morresse muita gente primeiro de todos morria eu Mesmo estava sem remédio O Hermógenes mandava em mim Que que quer ele era mais forte Pensei em Diadorim O que eu tinha de querer era que nós dois saissemos sobrados com vida desses todos combates acabasse a guerra nós dois largávamos a jagunçada íamos embora para os altos Gerais tão ditos viver em grande persistência Agora aqueles outros os contrários não estavam também com poder de me matar À asneira E eu ia numa madrugadinha a cavalo por uma estrada de areia branca no BuritidoÁ beira de vereda emparelhado com um capiauzinho bondoso companheiro qualquer a gente ria conversava de tantas miúdas coisas sem maldade se pitava eu ia levando meio saco de milho na garupa ia para um moinho para uma fazenda para berganhar o milho por fubá sonhos que pensava À fé aqueles zebebelos também não tinham varado o Norte para des truir gente E pois O que tivesse de ser somente sendo Não era nem o Hermógenes era um estado de lei nem dele não era João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 289 eu cumpria todos cumpriam Vou para os Gerais Vou para os Gerais eu dizia me dizia Numa minha perna então torci o de dar cãibra Depois tirei a dureza dos dedos A ver Diadorim a gente ia indo nós dois a cavalo o campo cheirava dez metros de chão de flor Por que que eu ia ter pena dos outros Algum tinha pena de mim Cabeça de homem é fraca repensava O que se carecia justo de fazer era acabar logo com a guerra acabar com aqueles zebebelos Pensar em Diadorim era o que me dava cordura de paz Ah digo ao senhor dessa noite não me esqueço Posso Aos poucos fui ficando soporado nem bom nem ruim Matar matar que que me importava Dessa noite esquecer não posso Garoou para a aurora Como clareia é aos golpes no céu a escuridão puxada aos movimentos A gente estava de costas para as barras do dia Me lembro do que me lembro o Hermógenes cruzou adiante chato no chão relando barriga em macio Aquele homem era danado de tigre estava cochichando na cabeça do Garanço depois com o Montesclarense mostrava a eles os lugares em que deviamde Arre voltou para perto de mim agora veio da outra banda Disse Tento Riobaldo Eu vi quando o Garanço rojou indo indo pegou postura na proteção dum cupim grande obra de cinco metros para a minha frente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 290 pouquinho para esta banda da esquerda No não longe rumo a rumo divulguei o Montesclarense Eu ainda mudei distância de uns passos aproveitei tapação duma árvore de boa grossura um araçádepomba fechado De sovigia o Hermógenes não me largava Doesse na gente mesmo aquele principiozinho de madrugada Apertava a necessidade Por que não se avançava de uma vez para tudo vir às brabas Ah não se podia Só logo no primeiro entremear com os bebelos nós quatro havíamos de restar mortos cosidos nas parnaíbas E dos companheiros outros não se sabia Sendo somente que o acampamento dos bebelos devia de estar a uma hora dessas cercado exato em boa distância à roda toda Tudo era paciência Vinha um ventozinho folheando Tantos homens amoitados que só espiavam na obrigação refleti Até achei bonito agora Aí passarinhos que já vão voando com o menorzinho ralo de luz eles se contentam para seu só isso de caçar o de comer Triste triste um tiriri cantou Alegre para mim a peitica Olhei adiante curto lá era que eles estavam por entre umas árvores pequenas dava réstia de claridade e um formato de homem contravisto Ele ia acender fogo E apareceram vultos de outros levantantes Com pouco alguns podiam vir descendo buscar mais água no corguinho se carecessem Asneiras que pensei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 291 será que eles gastaram muita água Será que um esmorece por medo ter Eu não campeava a morte Seguro nasci sou feito Do Hermógenes ali junto estar naquela hora digo ao senhor gostei Riobaldo Tatarana É o é ele me governou de repente Aceitei Desamarrei mão de vez pronta eu já tinha resumido pontaria eu tive consolo duma coisa que era que aquele homem alto não podia ser Zé Bebelo Não tremi e escutei meu tiro e o do Hermógenes e o homem alto caiu certo morto rolou na má poeira Me deu uma raiva dele deles todos E em toda a parte a sobre o tiroteio tinha começado Estrondou Falavam os rifles e outros manlixa granadeira e comblém Festa de guerra Mais digo ao senhor Atirei minhas vezes Aí tomei ar O senhor já viu guerra A mesmo sem pensar a gente esbarra e espera espera o que vão responder A gente quer porções Demais é que se está muito no meio de nada A morte A coisa que o que era xô e bala Que qual agora não se podia mais ter outros lados Agora era só gritar ódio caso quisesse e o ar se estragou trançado de assovios de ferro metal O senhor ali não tem mãe não vê que a vida é só brabeza Revém ramo cortado de árvore aí e o comum que cavacam poeiras e terras Digo ao João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 292 senhor dou conversa Aquilo era Artes que carreguei o rifle escorei repetente Aquele povo inimigo nosso esperdiçava muita munição atiravam com nervosia Não queriam morrer por nossa mão não queriam Ri me ri e o Hermógenes me chamou com assombro Em isso ele me crendo endoidado Mas eu estava era de repente pensando em meu padrinho Selorico Mendes Agora tu mesmo vai lá vai Tu não quer foi o que arranjei vontade de gritar com o Hermógenes Cão que ele Ri mais Homem sozinho com sua carabina em mãos o Hermógenes era um como eu igual igual até pior atirava E aqueles bebelos tinham feito madrugada para levar fogo Fiquei meu Se todos passam mão em arma e fecham volta de tiroteio uns contra os outros então o mundo se acaba acho que pensei Eram só tolicezinhas que por minha mente marinhavam Os tiros peguei a querer contar Aquilo como durou demorava um oco O dia tinha clareado saído eu todo podendo descrever o Montesclarense atrás dum toro de pau e moitas de anduzinho Para que conto isto ao senhor Vou longe Se o senhor já viu disso sabe se não sabe como vai saber São coisas que não cabem em fazer idéia João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 293 Combate quanto combate grande Ser menos que a gente não rastejava alterando de lugar que não era o caso Quase que só quando se pega no defendimento é que isso é de se fazer para pensarem que se vai em número maior que a verdade Como não mais valia garantir o bom do posto sem desguar Tiro de lá chama tiro de cá e vira em vira Disparo que eu dava era catando mover alheio cujo descuido como malandro malandreia Nem cento ecinqüenta braças era o eito jaculação minha Aquilo servia até para carga de bocamorte E mais de um eu etcétera aí pelo que sei pelo que vejo Mas só aqueles que para morrer estavam com dia marcado Minto O senhor releve idéias Era assim Deu vez de os muitos tiros se assanhavam de prão em riba dum trecho só Queriam costurar Aí e as horas não acabavam O sol encostava na nuca da gente Sol solão debaixo eu suava transpirava dos cabelos e pelo dentro das roupas de sentir as cócegas grossas no meio do lombo e essas dormências numas partes do corpo Então eu atirava Não se ia avançar Não nem Os outros picavam forte o fogo deles não desmerecia Cachorrada Xingar mesmo ia servir só para mostrar mais alvo Ao que eu descansava meus olhos nas costas do Garanço ali quase em minha frente O Garanço tinha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 294 arrumado no chão o bissaco e o cobertor estava sem jaleco só com a camisa de xadrezim Eu vi o suor minar em mancha na camisa no meio das costas dele Garanço aquela nódoa escura ia crescendo arredondada alargada O Garanço disparava sacudia o corpo ele era amigo meu com minúcia de valentia Rapaz de como se querer homem de leal qualidade Então eu atirava também Bala e chumbo eu peguei a dizer Bala e chumbo Bala e chumbo O lugar do coração me apertando eu era carne muita e calor bravo O que foi Que é o Hermógenes me perguntou Nada não respondi Bala e chumbo Chumbo e bala Estrumes Pelo que foi de repente bem apartado da banda esquerda de nós uns homens dos nossos deram figura se pulando para diante aos gritos investiram contra o contra Ao que eram dois Três Diá o Hermógenes rosnou Deu a fúria nesses bute Raspa que eles por lá entraram iam de coronhada e faca Não se atirou suspendemos fôlego E vai o Hermógenes me segurou tente que o Montesclarense coitado também tinha crescido para avante no igual e de lá nele balearam Caiu catando cacos Pobre Deu doidice Antes aí os outros nossos que se danando no vespeiro dos bebelos roncavam em poeira deles decerto se acabavam João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 295 estraçalhados que nem coelho com a cainça Tomara tivessem aprontado seus alguns Assim aquilo sossegou povo nosso demos raiva de fogo aí é que foi atirar O Hermógenes me resignou os ímpetos Tatarana te trava não dá de esquentar arma gasta munição não Só os tiros bons poucos Só cobrar o dizmo Aquele homem fazia frio feito caramujo de sombra A ver que tive sede mas minha cabaça não dava gota mais Guardei meu cuspe Aquilo não ia ter pique de ponto guerra que não se sabe terminar Assunto que apostaram os mil tiros para cima de nossa redondez de lugar esses assoviaços Triplavam No ferrenho tive um tempo de coisa espécie de mais medo o que um não confessa vara verde ver Mas morresse eu descansava Descansava de todo desânimo Andando que aquele ataque nosso não servia para resultado nenhum e eu carecia de avistar os outros saber de qualquer contagem de balanço de quantos tinham morrido ou estavam mal Eu queria saber dos deles e dos nossos Combate sem cabimento Só o tiroteio repetido reproduzido Meio peguei um pensamento se o Hermógenes sungasse raiva se o Ele desse nele por um vir Que mandasse avançasse a fino de faca nós todos tínhamos de avançar Então eu estava ali era feito um escravo de morte sem querer meu no João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 296 puto de homem no danadório E eu não podia virar só o corpo um pouco abocar minha arma nele Hermógenes desfechar Podia não logo senti Tem um ponto de marca que dele não se pode mais voltar para trás Tudo tinha me torcido para um rumo só minha coragem regulada somente para diante somente para diante e o Hermógenes estava deitado ali em mim encostado era feito fosse eu mesmo Ah e toda hora ele estavas sempre estava Que me disse Tatarana toma come e agradece ao corpo um poucado Háde que estava me oferecendo a capanga paçoca de carnes Tanto que os tiros tinham esbarrado quase em completo em partes Eu tendo comida minha de matula no bornal Aí e munição minha de balas no surrão Eu carecia lá do Hermógenes Mas por que foi então que aceitei que mastiguei daquela carne nem fome acho que não tinha direito engoli daquela farinha E pedi água Mano velho bebe que esta é competente ele riu O que estava me dando na cabacinha era água com cachaça Bebi Limpei os beiços Escorei o cano do rifle num duro de moita Eu olhava aquele bom suor nas costas do Garanço Ele atirava Eu atirava A vida era assim mesmo coração quejando Até me caceteou uma lombeira João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 297 E daí deuse Da banda de longe lá pelo tombador de pedra onde nossa gente com Titão Passos estavam escondidos para a esparrela foi um tirotear forte fogo por salvas Ah então era outra partida de zébebelos que deviam de estar chegando drongo deles cavaleiros O Hermógenes esticou o pescoço rijo ouvindo Soante que atiravam sucedidos o tiroteio foi mudando de feição Tou gostando não o que o Hermógenes disse Mais disse O diabo deu em erro Homem atilado cachorral Seja que sabidos vieram eh pressentiram Sei se por ora o trabalho está desandado Aí eu estava escutando Eu olhei Olhava para as costas do Garanço ela a mancha estava ficando de outra cor O suor vermelho Era sangue Sangue que empapava as costas do Garanço e eu entendi demais aquilo O Garanço parado quieto sempre empinado com a frente do corpo semelhando que o cupim ele tivesse abraçado A morte é corisco que sempre já veio Ânsias ao em que bola me vinha goela arriba do arrocho grosso imposto que às vezes em lágrimas nos olhos se transforma A bobagem Tu Tatarana Riobaldo agora é a má hora era o Hermógenes prevenindo Demo eu repontei Mas ele não entendeu minha soltura Soprou A muita cautela Temos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 298 que se foge em boa ordem os que estão chegando vêm rodear a gente vão dar retaguarda E era Como que esse maldito tudo sabia adivinhava o seguinte vivo das coisas esse Hermógenes trapaças Mas ainda me prezei quem é que me segurava de ir rastejei de esquinado os metros em afogo carecia de ver se o Garanço podia ter ajuda A pa trás mano Te cuida ouvi o rispe do Hermógenes que eu não me desgraçasse Mas não se deixa um cristão amigo deitar seu sangue no capim das moitas feito um traste roto caititu caçado Peguei com meus braços não adiantava era corpo Ele estava defunto de não fechar boca aí defunto airado Todo vejo o sangue dele a mofos cheirasse Anda que vinham vôo os mosquitos chupadores e moscaverde que se ousou sem o zumbo frisso perto no ar Porque os tiros E nem um momento de vela acesa o Garanço não ia poder ter Vem tu vem que estamos no amém estreitos que enfezado o Hermógenes chamou Dei para trás O perigo saca toda tristeza E a vez era esta que o Hermógenes encheu os peitos e soltou um rinchado zurro dos de jumento velho em beira de campo Três tantos Ele estava dando a retirada Por outros lados mais longe outros o mesmo oncoerincho copiavam Arre fogo agora forte fogo o Hermógenes me mandou Atirei Atiramos teúdo Ao que os João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 299 companheiros todos atiravam Assaz à retirada se estava rinchando mas os inimigos não sabiam carecia que eles pensassem que a gente ia dar um ataque final Acharam E sei A bala com bala ripostavam Mas nós nesse entrequanto rompemos o arvoredo aqui e ali rojamos para baixo embora mesmo Desunir assim verga pior do que avançar A lanço a lanço fui pulei nos abertos entre árvores acompanhei o Hermógenes Aí eu já estava para lá dele mas virei e esperei Porque na desordem de mente do alvoroço aquela hora era só no Hermógenes que eu via salvamento para meu cão de corpo Quem que diz que na vida tudo se escolhe O que castiga cumpre também Vim Ainda divulguei nas sofraldas descentes homens que corriam meus iguais às vezes se subiam do bamburral baixo feito acãoada codorniz Viemos Repassamos o corguinho do Dinho beiramos uma ipueira Entramos no cerrado Tu tem tudo Tatarana Munição as armas o Hermógenes me indagou Tenho se tenho eu respondi bem E ele para mim Então está certo Agora ele falasse grosseado com modo de chefe e mando era assim E fomos para cinco léguas entre o norte e o poente no Cansanção lugar aonde um punhado dos da gente devia de se engrupar Para lá fomos de rastros apagados Caminhamos prazo dentro de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 300 riacho depois escolhemos para pisar pedras de nosso pisado com ramos as marcas desmanchamos e o mais do caminho se seguiu por muitos diversos rodeios De tudo não falo Não tenciono relatar ao senhor minha vida em dobrados passos servia para quê Quero é armar o ponto dum fato para depois lhe pedir um conselho Por daí então careço de que o senhor escute bem essas passagens da vida de Riobaldo o jagunço Narrei miúdo desse dia dessa noite que dela nunca posso achar o esquecimento O jagunço Riobaldo Fui eu Fui e não fui Não fui porque não sou não quero ser Deus esteja E dizendo vou No mais que quando se alcançou o nosso bom esconder num boqueirãozinho já achamos companheiros outros diversos vindos de armas e que chegavam separadamente naquela satisfação de vida salva Um era o Feijó Será se tinha avistado o Reinaldo sem perigo A meio perguntei Por causa que só em Diadorim era que eu pensava O Feijó em tanto tinha notado Diadorim na retirada bem conseguido depois se retrasou por uma cacimba de grota Estava com sangue numa perna de calça Para mim foi nada arranho àtoa O que me ensombreceu então Diadorim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 301 estava ferido Aí eu mesmo esbarrei beirávamos o riachinho do Jio eu quis lavar os pés que muito me doíam Acho que de cansado estava também com dores redondas de cabeça molhei minhas fontes Cansaço faz tristeza em quem dela carece Diadorim estivesse ali somentemente espaço disso me alegrava eu não havia de querer conversar reportório de tiros e combates eu queria calado a conseqüência dele Ao modo que eu nem conhecia bem o estorvo que eu sentia Pena Dos homens que incerto matei ou do sujeito altão e madrugador quem sabe era o pobre do cozinheiro deles na primeira mão de hora varado retombado Em tenho que não Dó que me dava era do Garanço e o Montesclarense Quase com um peso por minha culpa dos dois eles eu era quem tinha escolhido para conduzir e depois tudo Logo esses o senhor sabe o senhor segue comigo Remorso Por mim digo e nego Olhe légua e outra daqui vereda abaixo tigre canguçu estragou e arruinou a perna do Sizino Ló um que foi desse rio de São Francisco foguista de vapor depois cá herdou uns alqueires Comprouse para ele então uma boa pernadepau Mas assim talvez por se ter sacolejado um pouco do juizo ele nunca mais quer sair de casa nem se levanta quase do catre vive repetindo e dizendo Ai quem tem dois tem um quem tem um não tem nenhum Todo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 302 o mundo ri E isso é remorso Desgraça a mando era que eu cumpria azo de que tivesse perdido alguma coisa Porque dó de amizade é num sofrerzinho simples e o meu não era E cheguei no CansançãoVelho chamado também o Jio dito Lá com pouco a gente era doze Os alguns faltavam dos que eram para se reunir ali mas decerto ainda vinham vir Num ponto me agradei então em guerra quase não se morre E mesmo nas más horas é que vem bom consolo para o Jio tinha tocado de antevéspera o Braz nessa antecedência em dois jumentos ele tinha trazido mantimento de feijão e arroz e tou cinho para torresmos e pratos e panela se cozinhou um jantar Tanto que comi deitei Dormi impado Que caso que eu carecia de pensar que não fosse que na morte do Garanço e do Montesclarense eu não devia nenhum dolo e que Diadorim ia chegar a vir também aonde estávamos mais tardar no romper da aurora Dormi Mas daí a logo acordei mão no rifle como se vez fosse E não havia a coisa nenhuma nem vulto nem barulho Os outros no estar pesados no sono cada um em seu recanto estufando suas redes penduradas de árvore em árvore Só vi um o Jõe Bexiguento sobrechamado o Alpercatas esse era homem de estranhez em muitos seus costumes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 303 conforme se dizia e era notado Jõe Bexiguento parecia não estar querendo ir dormir tinha ficado na beira do fogo remexendo as brasas num fusco em vermelho dava para a cara dele se divulgar E ele pitava Meigo repus o rifle virei para o outro lado Adormecer pude mas com outros minutos tornei naquele mau susto de acordar Isso aconteceu três vezes reformadas Jõe Bexiguento reparou em meu dessossego veio para o pé de minha rede sentou no chão Horas destas tem galo já cantando noutros lugares ele falou Não sei se dei alguma resposta Agora eu estava cismado Ou se fosse que algum perigo se produzia por ali e eu colhia o aviso Não é que com muitos dose disso sucedesse Eu sabia tinha ouvido falar jagunços que pegam esse condão adivinham o invento de qualquer sobrevir por isso em boa hora escapam O Hermógenes João Goanhá mais do que todos era atreito a esses palpites de fino ar coraçãoados Atual isso comigo Que os bebelos rodeavam para ali quem sabe perto já rastejavam Zé Bebelo mandava neles Em todos o momentos em Zé Bebelo sempre pensei e em como a vida é cheia de passagens emendadas Eu na Nhanva ensinando lição a ele ditado e leitura as contas de juros depois de noite na sala grande na mesa grande se comia canjica temperada com leite João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 304 queijo cocodabaía amendoim açúcar canela e manteigade vaca Fofo faço e em prazo siô Baldo acabar para uma vez com essa cambada canalha de jagunços ele referia com rompante e festa no dizer bebendo seu coité de cháde congonha que de tão quente pelava Então agora era eu também Zé Bebelo vinha de lá comandando armas de esqua drões e o que ele tinha jurado naquela ocasião ficava sendo também de acabar comigo com minha vida Mas eu prezava Zé Bebelo minha simpatia é uma só dada definitiva às altas sempre fui assim Sendo que não fosse ele em sua pessoa se ele no meio não estivesse tudo tinha outra ordem eu podia pôr meu afinco o farto destravado no querer combater Mas brigar cruzando morte com Zé Bebelo eu vi que era isso que me dava uma re pugnância em minha inteligência Levantei da rede e convidei Jõe Bexiguento para se botar mais lenha no fogo Ele disse Convém não Ocasiões assim convém acender nem vela de cera preta Enrolei um cigarro Contei ao Jõe o que eu estava sentindo estúrdio se não era agouramento E ele me apaziguou que anjo aviso não vinha desse jeito antes era uma certeza que minava fininha de dentro da idéia da gente sem razoado nem discussão O que eu purgava era ranço nervoso sobra da esquentação curtida nas horas de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 305 tiroteio Comigo assim depois de cada forte fogo me dá esse porém É uma coceira na mente comparando mal Faz regular uns seis anos que estou na jagunçagem medo de guerra não conheço mas na noite passado cada fogo não me livro disso essa desinquietação me vem Pela causa me disse era que ele não vencia dormir nem um pisco naquela comprida noite e nem experimentava Jõe Bexiguento achava que não tinha mais sustância para ser jagunço duns meses disse andava padecendo da saúde erisipelava e asmava Cedo aprendi a viver sozinho Pra o Riachão vou derrubo lá um bom mato Era o projeto em tal que ele formava vez em quando Trabalhar de amassar as mãos Que isso é que sertanejo pode mesmo na barra da velhice Você era amigo do Garanço Jõe em manso perguntei Assim o dito pela rama Que foi com ele Deu o fim mesmo legal Acho que esse sempre se esteve meio caipora Ele mesmo sabia que era Ainda ouvindo as palavras conheci que tinha perguntado pelo Garanço só para depois perguntar por Diadorim digo o Reinaldo Mas outra coragem não tive Faltou razão para mim Que desconversei Caipora se cura Jõe Você sabe rezas fortes por aí devo que indaguei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 306 bobéia minha assunto A que cujo se caipora não curasse Todo o mundo dela tem nos tempos ele me repositou Mas desses ensalmos quis aprender não Memória que Deus me deu não foi para palavrear avesso nele com feitas ofensas Pecados vagância de pecados Mas a gente estava com Deus Jagunço podia Jagunço criatura paga para crimes impondo o sofrer no quieto arruado dos outros matando e roupilhando Que podia Esmo disso disso queri por pura toleima que sensata resposta podia me assentar o Jõe broeiro peludo do Riachão do Jequitinhonha Que podia A gente nós assim jagunços se estava em permissão de fé para esperar de Deus perdão de proteção Perguntei quente Uai Nós vive foi o respondido que ele me deu Mas eu não quis aquilo Não aceitei Questionei com ele duvidando rejeitando Porque eu estava sem sono sem sede sem fome sem querer nenhum sem paciência de estimar um bom companheiro Nem o ouro do corpo eu não quisesse aquela hora não merecia brancura rosada de uma moça depois do antes da luademel Discuti alto Um que estava com sua rede ali a próximo de certo acordou com meu vozeio e xingou xiu Baixei mas fui ponteando opostos Que isso foi o que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 307 sempre me invocou o senhor sabe eu careço de que o bom seja bom e o rúim ruim que dum lado esteja o preto e do outro o branco que o feio fique bem apartado do bonito e a alegria longe da tristeza Quero os todos pastos demarcados Como é que posso com este mundo A vida é ingrata no macio de si mas transtraz a esperança mesmo do meio do fel do desespero Ao que este mundo é muito misturado Mas Jõe Bexiguento não se importava Duro homem jagunço como ele no cerne era a idéia dele era curta não variava Nasci aqui Meu pai me deu minha sina Vivo jagunceio ele falasse Tudo poitava simples Então eu pensei por que era que eu também não podia ser assim como o Jõe Porque veja o senhor o que eu vi para o Jõe Bexiguento no sentir da natureza dele não reinava mistura nenhuma neste mundo as coisas eram bem divididas separadas De Deus Do demo foi o respondido por ele Deus a gente respeita do demônio se esconjura e aparta Quem é que pode ir divulgar o corisco de raio do borro da chuva no grosso das nuvens altas E por aí eu mesmo mais acalmado ri me ri ele era engraçado Naquele tempo também eu não tinha tanto o estrito e precisão nestes assuntos E o Jõe contava casos Contou Caso que se passou no sertão jequitinhão no arraial de São João Leão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 308 perto da terra dele Jõe Caso de Maria Mutema e do Padre Ponte Naquele lugar existia uma mulher por nome Maria Mutema pessoa igual às outras sem nenhuma diversidade Uma noite o marido dela morreu amanheceu morto de madrugada Maria Mutema chamou por socorro reuniu todos os mais vizinhos O arraial era pequeno todos vieram certificar Sinal nenhum não se viu e ele tinha estado nos dias antes em saúde apreciável por isso se disse que só de acesso do coração era que podia ter querido morrer E naquela tarde mesma do dia dessa manhã o marido foi bem enterrado Maria Mutema era senhora vivida mulher em preceito sertanejo Se sentiu foi em si se sofreu muito não disse guardou a dor sem demonstração Mas isso lá é regra entre gente que se diga pelo visto a ninguém chamou atenção O que deu em nota foi outra coisa foi a religião da Mutema que daí pegou a ir à igreja todo santo dia afora que de três em três agora se confessava Dera em carola se dizia só constante na salvação de sua alma Ela sempre de preto conforme os costumes mulher que não ria esse lenho seco E estando na igreja não tirava os olhos do padre João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 309 O padre Padre Ponte era um sacerdote bomhomem de meiaidade meio gordo muito descansado nos modos e de todos bem estimado Sem desrespeito só por verdade no dizer uma pecha ele tinha ele relaxava Gerara três filhos com uma mulher simplória e sacudida que governava a casa e cozinhava para ele e também acudia pelo nome de Maria dita por aceita alcunha a Maria do Padre Mas não vá maldar o senhor maior escândalo nessa situação com a ignorância dos tempos antigamente essas coisas podiam todo o mundo achava trivial Os filhos bem criados e bonitinhos eram os meninos da Maria do Padre E em tudo mais o Padre Ponte era um vigário de mãocheia cumpridor e caridoso pregando cora muita virtude seu sermão e atendendo em qualquer hora do dia ou da noite para levar aos roceiros o conforto da santa hóstia do Senhor ou dos santos óleos Mas o que logo se soube e disso se falou era em duas partes que a Maria Mutema tivesse tantos pecados para de três em três dias necessitar de penitência de coração e boca e que o Padre Ponte visível tirasse desgosto de prestar a ela paiouvido naquele sacramento que entre dois só dois se passa e tem de ser por ferro de tanto segredo resguardado Contavam mesmo que das primeiras vezes povo percebia que o padre ralhava com ela João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 310 terrível no confessionário Mas a Maria Mutema se desajoelhava de lá de olhos baixos com tanta humildade serena que uma santa padecedora mais parecia Daí aos três dias retornava E se viu bem que Padre Ponte todas as vezes fazia uma cara de verdadeiro sofrimento e temor no ter de ir a junjo escutar a Mutema Ia porque confissão clamada não se nega Mas ia a poder de ser padre e não de ser só homem como nós E daí mais que passando o tempo como se diz no decorrido Padre Ponte foi adoecido ficando de doença para morrer se viu logo De dia em dia ele emagrecia amofinava o modo tinha dores e em fim encaveirou duma cor amarela de palha de milho velho dava pena Morreu triste E desde por diante mesmo quando veio outro padre para o São João Leão aquela mulher Maria Mutema nunca mais voltou na igreja nem por rezar nem por entrar Coisas que são E ela dado que viúva soturna assim que não se cedia em conversas ninguém não alcançou de saber por que lei ela procedia e pensava Por fim no porém passados anos foi tempo de missão e chegaram no arraial os missionários Esses eram dois padres estrangeiros pra fortes e de caras coradas bradando sermão forte com forte voz com fé braba De manhã à noite durado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 311 de três dias eles estavam sempre na igreja pregando confessando tirando rezas e aconselhando com entusiasmados exemplos que enfileiravam o povo no bom rumo A religião deles era alimpada e enérgica com tanta saúde como virtude e com eles não se brincava pois tinham de Deus algum encoberto poder conforme o senhor vai ver por minha continuação Só que no arraial foi grassando aquela boa bemaventurança Aconteceu foi no derradeiro dia isto é véspera pois no seguinte que dava em domingo ia ser festa de comunhão geral e glória santa E foi de noite acabada a benção quando um dos missionários subiu no púlpito para a prédica e tascava de começar de joelhos rezando a salverainha E foi nessa hora que a Maria Mutema entrou Fazia tanto tempo que não comparecia em igreja por que foi então que deu de vir Mas aquele missionário governava com luzes outras Maria Mutema veio entrando e ele esbarrou Todo o mundo levou um susto porque a salverainha é oração que não se pode partir em meio em desde que de joelhos começada tem de ter suas palavras seguidas até ao tresfim Mas o missionário retomou a fraseação só que com a voz demudada isso se viu E mal no amém ele se levantou cresceu na beira do púlpito em brasa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 312 vermelho debruçado deu um soco no pau do peitoril parecia um touro tigre E foi de grito A pessoa que por derradeiro entrou tem de sair A pra fora já já essa mulher Todos no estarrecente caçavam de ver a Maria Mutema Que saia com seus maus segredos em nome de Jesus e da Cruz Se ainda for capaz de um arrependimento então pode ir me esperar agora mesmo que vou ouvir sua confissão Mas confissão esta ela tem de fazer é na porta do cemitério Que vá me esperar lá na porta do cemitério onde estão dois defuntos enterrados Isso o missionário comandou e os que estavam dentro da igreja sentiram o rojo dos exércitos de Deus que lavoram em fundura e sumidade Horror deu Mulheres soltaram gritos e meninos outras despencavam no chão ninguém ficou sem se ajoelhar Muitos muitos daquela gente choravam E Maria Mutema sozinha em pé torta magra de preto deu um gemido de lágrimas e exclamação berro de corpo que faca estraçalha Pediu perdão Perdão forte perdão de fogo que da dura bondade de Deus baixasse nela em dores de urgência João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 313 antes de qualquer hora de nossa morte E rompeu fala por entre prantos ali mesmo a fim de perdão de todos também se confessava Confissão edital consoantemente para tremer exemplo raio em pesadelo de quem ouvia público que rasgava gastura como porque avessava a ordem das coisas e o quieto comum do viver transtornava Ao que ela onça monstra tinha matado o marido e que ela era cobra bicho imundo sobrado do podre de todos os estercos Que tinha matado o marido aquela noite sem motivo nenhum sem malfeito dele nenhum causa nenhuma por que nem sabia Matou enquanto ele estava dormindo assim despejou no buraquinho do ouvido dele por um funil um terrível escorrer de chumbo derretido O marido passou lá o que diz do oco para o ocão do sono para a morte e lesão no buraco do ouvido dele ninguém não foi ver não se notou E depois por enjoar do Padre Ponte também sem ter queixa nem razão amargável mentiu no confessionário disse afirmou que tinha matado o marido por causa dele Padre Ponte porque dele gostava em fogo de amores e queria ser concubina amásia Tudo era mentira ela não queria nem gostava Mas com ver o padre em justa zanga ela disso tomou gosto e era um prazer de cão que aumentava de cada vez pelo que ele não estava em poder de se defender de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 314 modo nenhum era um homem manso pobre coitado e padre Todo o tempo ela vinha em igreja confirmava o falso mais declarava edificar o mal E daí até que o Padre Ponte de desgosto adoeceu e morreu em desespero calado Tudo crime e ela tinha feito E agora implorava o perdão de Deus aos uivos se esguedelhando torcendo as mãos depois as mãos no alto ela levantava Mas o missionário no púlpito entoou grande o Bendito louvado seja e enquanto cantando mesmo fazia os gestos para as mulheres todas saírem da igreja deixando lá só os homens porque a derradeira pregação de cada noite era mesmo sempre para os ouvintes senhores homens como conforme E no outro dia domingo do Senhor o arraial ilustrado com arcos e cordas de bandeirolas e espoco de festa foguetes muitos missa cantada procissão mas todo o mundo só pensava naquilo Maria Mutema recolhida provisória presa na casadeescola não comia não sossegava sempre de joelhos clamando seu remorso pedia perdão e castigo e que todos vies sem para cuspir em sua cara e dar bordoadas Que ela exclamava tudo isso merecia No meiotempo desenterraram da cova os ossos do marido se conta que a gente sacolejava a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 315 caveira e a bola de chumbo sacudia lá dentro até tinia Tanto por obra de Maria Mutema Mas ela ficou no São João Leão ainda por mais de semana os missionários tinham ido embora Veio autoridade delegado e praças levaram a Mutema para culpa e júri na cadeia de Araçuaí Só que nos dias em que ainda esteve o povo perdoou vinham dar a ela palavras de consolo e juntos rezarem Trouxeram a Maria do Padre e os meninos da Maria do Padre para perdoarem também tantos surtos produziam bem estar e edificação Mesmo pela arrependida humildade que ela principiou em tão pronunciado sofrer alguns diziam que Maria Mutema estava ficando santa E foi isso que Jõe Bexiguento a mim contou e que de certo modo me divagasse Mas foi ele acabar de contar e escutamos o assovio combinado dos nossos e demos resposta era um que chegava o Paspe se aparecendo macio dos escuros com alpercatas sem barulho e o rifle em bandoleira Ele tinha formado para a esparrela com Titão Passos agora vinha trazer notícia dos dele seguidos para se ajuntarem ao covo do Capão e pedir ordens Rio de homem esse Paspe que não temia nem se cansava Contou que aquilo que era para estratagemas deu foi em por águaabaixo porque os bebelos tinham botado espiação ou tomado o faro Assim o inimigo contornando em vez de vir João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 316 simples e tochando resposta antes de pergunta fogo feio dois mortos dos titãopassos companheiros bons mais três muito feridos Guerra tinha disso também Ah e Zé Bebelo mesmo estava lá no comando daqueles em sua dita pessoa perguntei Decerto que estava A cujo o Paspe falou e pediu logo quem tivesse um golinho de cachaça Devo então que perguntei por Diadorim Puro por perguntar sem esperanças de informação E mesmo más notícias eu ainda tinha o receio de ouvir Serviço que me foi o Paspe me respondeu Vi esse por mim passou até me deu um recado uail e para você mesmo Vai diz por mim ao Riobaldo Tatarana que eu tenho um quefazer ao que vou por dias poucos com breve estou de volta foi o que falou Assim passou a cavalo onde terá sido que arrumou montada Decerto conseguiu algum animal dos bebelos mesmo que restou no meio de tirotei Ouvi e não cri Ele Diadorim Aonde ia sem mim então não podia ser ele foras de norma E ao Paspe reperguntei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 317 pedindo o exato Era Mas não seria então que ele estivesse ferido numa perna Ao que nem não nem sim mais pelo não que pelo sim o Paspe completou Não tinha reparado no relance de tempo Só viu que o arreio era um socadinho quase novo e o cavalo alto desbarrigado mas pronto de si riscando com todas as ferraduras murzeloandrino Aí ai oi espécie de dor em meus cantos o senhor sabe Agora eu pateteava Que que era ser fiel donde estava o amigo Diadorim na pior hora tinha desertado de minha companhia Às certas fuga fugida ele tinha ido para perto de Joca Ramiro Ah ele que de tudo sabia em tudo agora assim de tenção me largava lá sem uma palavra própria da boca sem um abraço sabendo que eu tinha vindo para jagunço só mesmo por conta da amizade Acho que me escabreei De sorte que tantos pensamentos tive duma viragem que senti foi esfriar as pontas do corpo e me vir o peso de um sono enorme sono de doença de malaventurança Que dormi Dormi tão morto sem estatuto que de manhã cedo por me acordarem tiveram de molhar com água meus pés e minha cabeça pensando que eu tinha pegado febre de estupor Foi assim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 318 Vou reduzir o contar o vão que os outros dias para mim foram enquanto Desde que da rede levantei com aquele peso anoitecido amanhecido nos olhos Tempo de minha vazante A ver como veja tem sofrimento legal padecido e mordido e remordido sofrimento assim do mesmo que tem roubo sucedido e roubo roubado Me entende Dias que marquei fo ram onze Certo que a guerra ia indo Demos um tiroteio mediano uma escaramucinha e um meiocombate Que isso merece que se conte Miúdo e miúdo caso o senhor quiser dou descrição Mas não anuncio valor Vida e guerra é o que é esses tontos movimentos só o contrário do que assim não seja Mas para mim o que vale é o que está por baixo ou por cima o que parece longe e está perto ou o que está perto e parece longe Conto ao senhor é o que eu sei e o senhor não sabe mas principal quero contar é o que eu não sei se sei e que pode ser que o senhor saiba Agora o senhor exigindo querendo está aqui que eu sirvo forte narração dou o tampante e o que for de trinta combates Tenho lembrança Pelo tempo durado de cada fogo se é capaz até do cálculo da quantidade de balas Contar Do que se agüentou de arvoados tiros e a gente atirando a truz no meio de pobre roça alheia canavial cortante eito de verde feliz ou palhada de milho morto que se pisava e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 319 quebrava De vez em que rifle trauteava tanto e eram os estalos passando repassando que vai se aconchava mão em orelha sem saber por que feita uma esperança de se conseguir milagre de algum barulhinho diverso outro qualquer que aquele não fosse na ensurdescência E quando toró de chuva deu bomba desmanchando a função de briga e empapando todos ensolvando as armas De se olhar em frente o morro sem desconfiança e de repente do nu do morro despejarem descarga De um entrar em poço atravessando e mesmo com água quase até pelos peitos ter de se virar em direção e desfechar De como no prazo duma hora só careci de ir me vendo escorando rifle e alvejando em quentes em beira de mato e campo em virada de espigão descendo e subindo ramal de ladeirinhas pequenas e atrás de cerca debaixo de cocho trepado em jatobá e pequizeiro deitado no azul duma laje grande e rolando no bagaço doce de cana e rebentando por dentro de uma casa E de companheiro em sopas de sangue mais sujeira de suas tripas lá dele se abraçando com a gente de mandado da dor para morrer só mesmo seja que amaldiçoando em lei toda mãe e todo pai E como quando no refervo combatendo no dano da mormaceira a raiva de fúria de repente igualava todos nos mesmos urros e urros uns e uns contras e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 320 contrários chega se queria combinar de botar fora as armasde fogo para o aproximaço de se avir em mãos às duras brancas para se oferecer fim oferecer faca Isso é isto Sobejidão O senhor mais queria saber Não Eu sabia que não Menos mortandades Aprecio uns assim feito o senhorhomem sagaz solerte Vir voltemos Aqueles dias eu empurrei mudando em raiva falsa a falta que Diadorim me fazia Aí curti amargos Por me ver casca em chão que é o figurado de desprezo e mais tudo o que em ocasiões dessas se sente conforme o senhor decerto conhece e sabe Mas o pior era o que eu mesmo mais sentia feito se do íntimo meu tivessem tirado o esteiomor pédecasa E conforme sempre se dá segundo se está assim em calibre de cão e malquerente repuxei idéias Me alembrei do que tinha soprado em intriga o Antenor e dei razão à cisma dele quem sabe mesmo Joca Ramiro estava no propósito de deixar a gente se acabar ali na má guerra em sertão plano E então Diadorim disso sabia estava no enredo agora tinha ido para junto de loca Ramiro que era a única pessoa que ele bastantemente prezava Fiquei em mim desiludido caí numa lazeira Mas cuspi três vezes forte no chão e risquei de mim Diadorim Homem como eu não é todo capaz de guardar a parte de amor em desde que recebe João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 321 muitas ofensas de desdém Só que depois o que há é a alma assim meio adoecida Digo fiquei lazo Me veio de pensar em falar com o Antenor Não fiz Dúvidas dessas eu não ia repartir com estranhas pessoas E não gostei nunca de homem intrujão com esses não começo conversa não hio e não chio Tanto que mesmo foi o Hermógenes que um dia me chamou veio caçoando Eh valente tu é Tatarana Gosto dessa sua bizarria Sas ordens sor eu só falei Porque ele pelo jeito logo entendi que ia me fazer algum espontâneo obséquio ou me dar alguma boa notícia todo que um assim nessas horinhas logo muda de modo antes aproveita um tico para falar de cima jeitoso de dono bom ou de pai que cede E foi que não errei O que o Hermógenes queria me prometer era que em breve iam estar acabados aqueles riscos de trabalho e combate com liquidados os bebelos e então a gente ficava livre para lidar melhormente atacando bons lugares em serviço para chefes políticos E que nessa ocasião ele queria me escolher para comandar uma parte dos seus por ser isso de minha rija competência cabodeturma João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 322 Tanto gabado elogio que não me mudou não me fez Descarei Experimentando o homem só aproveitei foi para uma deixa Joca Ramiro eu disse com uma risadazinha minha velhaca que entre dois podia pegar qualquer incerto significado E me esperei Mas o Hermógenes se saiu em só dizer sério confioso que Joca Ramiro era maludo capitão vero no real Sonsice de Hermógenes Não senhor Sei e vi que o sincero Por que era que todos davam assim tantas honras a Joca Ramiro esse louvo sereno com doado Isso meio me turvava Mas do Hermógenes então me atormentou sempre aquele meu receio que eu carecia de pôr em raiva Assim por isso falei em mim comigo A ele nego água na boca do pote Esconjurar desse jeito leve me trouxe sossego Ao que eu carecia Tanto mesmo que eu não queria ter de pensar naquele Hermógenes e o pensa mento nele sempre me vinha ele figurando eu cativo Ser que pensava amiúde em ele ser carrasco como tanto se dizia senhor de todas as crueldades No começo aquilo me corria só os calafrios de horror a idéia minha refugava Mas a pouco peguei às vezes uma ponta de querer saber como tudo podia ser eu imaginava Digo ao senhor se o demônio existisse e o senhor visse ah o senhor não devia de não convém espiar para esse João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 323 nem mi de minuto não pode não devede São se só as coisas se sendo por pretas e a gente de olhos fechados Ao tanto com o esforço meu em esquecer Diadorim digo que me dava entrante uma tristeza no geral um prazo de cansado Mas eu não meditava para trás não esbarrava Aquilo era a tristonha travessia pois então era preciso Água de rio que arrasta Dias que durasse durasse até meses Agora eu não me importava Hoje eu penso o senhor sabe acho que o sentir da gente volteia mas em certos modos rodando em si mas por regras O prazer muito vira medo o medo vai vira ódio o ódio vira esses desesperos desespero é bom que vire a maior tristeza constante então para o um amor quanta saudade aí outra esperança já vem Mas a brasinha de tudo é só o mesmo carvão só Invenção minha que tiro por tino Ah o que eu prezava de ter era essa instrução do senhor que dá rumo para se estudar dessas matérias Daí eu caçava o jeito de me espairecer junto com todos Conversas com o Catocho com Jõe Bexiguento com o Vove com o Feijó de mais sisudez ou com Umbelino o de cara de gato Se ria fora de aperreio de combate muito se vadiava Assimassei naquela influição Vinha ordem então a gente se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 324 reunia em bando grande depois tornava a em grupozinhos se apartar A guerra era a igual E ali dava de se sentir o faltoso e o imperfeito como no mais acontece em quantidade maior O São Francisco não é turvo sempre E o que se falava mais era em mulher Isso fazia muito boa falta Cada um queria delas no que só pensava As mocinhas próprias de se provar ou rua alegre cheia de alegria o bom sempre melhor o bom Amigo meu o Umbelino esse que dizia que por não ter mulher ali se tinha de muito lembrar Ele era do Rio Sirubim de um lugar para trás das cachoeiras Valia como companheiro capaz darmas Que que pequeno era bom Relembrava Já tive uma mulher amigável só minha na RuadoAlecrim em São Romão e outra mais na RuadoFogo Essas conversas com o calor Calor em que cão pendura a língua o senhor sabe Já viu por aí Em Januária ou São Francisco tinha estação de tempo em que não se podia deixar um ovo guardado com umas duas ou três horas já se estragava Todos contavam estórias de raparigas que tinham sido simples somente essas senvergonhagens Mas de noite é de crer a gente sabia dos que queriam qualquer reles suficiente consolo E eram brabos sarados guerreiros que nunca noutro ar Coisas Canta que cantavam de dia nenhum sabia pédeverso direito ou não queriam ensinar era só aquela João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 325 invenção e cantando fanhoso no nariz Ou ficavam dizendo graças e ditérios Nem feito meninos não sendo Por esse sem quefazer a gente ainda mais comia quase que por divertimento Os uns iam torar palmito colher mandioca em mandiocalzinho sem dono dono tinha fugido longe Gostei de favas do mato muito murici quixaba e jaca O Fonfredo tinha um blilbloquê a gente brincava de jogar Tudo jogado a dinheiro baixo Os espertos teve quem pôs a jogo até bentinho de pescoço sem dizer desrespeito E faziam negócio desses breves contado que alguns arrumavam até escapulários falsos Deus perdoa O senhor podia perguntar Deus para qualquer um jagunço sendo um inconstante patrão que às vezes regia ajuda mas outras horas sem espécie nenhuma desandava de lá proteção se acabou e pronto marretava Que rezavam Jõe Bexiguento mesmo quis que diversos tomassem parte em novena numa mal rezada novena a santo de sua redobrada tenção e a qual ele nem teve persistência para nos dias medidos completar E mas o Hermógenes Sobreveja o senhor o meu descrever ele vinha por ali à refalsa socapa de se rir e se divertir no meio dos outros sem a soberba sendo em sendo o raposo meco Naqueles dias ele andava de pénochão mais com uma calça apertada nas canelas e encurtada e mesmo muito João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 326 esmolambado na camisa Até que de barba grande parecia um pedidor E caminhava com os largos passos mais o muito nas pontas vinha e ia com um sorrizinho besteante rodeava por toda a parte Nem eu no achar mais que ele era o ferrabrás O que parecia era que assim estivesse o tempo todo produzindo alguma tramóia Estudei uma dúvida Ao que será que seria o ser daquele homem tudo Algum tinha referido que ele era casado com mulher e filhos Como podia Aide vai meu pensamento constante querendo entender a natureza dele virada diferente de todas a inocência daquela maldade A qual que me aluava O Hermógenes numa casa em certo lugar com sua mulher ele fazia festas em suas crianças pequenas dava conselho dava ensino Daí saía Feito lobisomem Adiante de quem atrás do quê A cruz o senhor faça meu senhor Aí eu acreditei que tivesse de haver mesmo o inferno um inferno precisava E o demônio seria o inteiro louco o doido completo assim irremediável Ah me aluei O Hermógenes esquipático diverso Comigo eu começava numa espécie o ror vontade de ir para perto reparar em tudo que fazia dele escutar suas causas Aos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 327 poucos o incutido do incerto me acostumando eu não tirava isso da cabeça O Hermógenes ele dava a pena dava medo Mas ora vez eu pressentia que do demônio não se pode ter pena nenhuma e a razão está aí O demônio esbarra manso mansinho se fazendo de apeado tanto tristonho e o senhor pára próximo aí então ele desanda em pulos e prezares de dança falando grosso querendo abraçar e grossas caretas boca alargada Porque ele é é doido sem cura Todo perigo E naqueles dias eu estava também muito confuso Será o Hermógenes também gosta de mulheres eu careci de saber perguntei Eh Apreceia não Só se não gosta um disse Quá Acho que ele gosta demais é só nem dele mesmo demais demais algum outro atalhou Que ele era assim eu fiquei em pausas e os companheiros todos sabiam do ser e achavam então que ato assim era possível natural Como que não achavam Até por eu ter o assunto já um vinha Daqui a seis léguas é a baixada do Brejinho lá tem logradouro Tem fêmeas Esse que disse era o Dute me parece ou foi outro Mas o Catocho desafirmou que tinha estado lá não viu ar de mulherdavida nenhuma só uma vendinha de roça e uma velha pitando cachimbo no batente duma porta pitando cachimbo e trançando peneiras Que que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 328 riam mulheres principalmente a fim estava certo eu também Eu queria com as faces do corpo mas também com entender um carinho e melhorrespeito sempre a essas do mel eu dei louvor de meu agradecimento Renego não o que me é de doces usos graças a Deus toda a vida tive estima a toda meretriz mulheres que são as mais nossas irmãs a gente precisa melhor delas dessas belas bondades Mas o Lindorífico lembrava um pagode em algum ao lugarejo para baixo de lá do que batucavam o pro puxado das sanfonas cachaça muita as mulheres vinham dar umbigadas tiravam a roupa cavalheiros levavam damas nas moitas no escuro do sebo outros desafiavam outros para brigar Para quê Por que não gozar o geral mas com educação sem as desordens Saber aquilo me entristecia Tem coisas que não são de ruindade em si mas danam porque é ao caso de virarem feito o que não é feito Feito a garapa que se azeda Viver é muito perigoso já disse ao senhor No mais mal me lembro mas sei que naqueles dias eu estive muito maltrapilho Em que era que eu podia achar graça De manhã quando eu acordava sempre supria raiva Um me disse que eu estava estando verde má cara de doença e que devia de ser de figado Pode que seja tenha sido O Paspe que cozinhava cozinhou para mim os chás o de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 329 macela o de ervadoce o de losna Oi Dor mesmo nenhuma eu não tinha Somente perrengueava Do que de uma feita por me valer eu entendi o casco de uma coisa Que quando eu estava assim cada demanhã com raiva de uma pessoa bastava eu mudar querendo pensar em outra para passar a ter raiva dessa outra também igualzinho soflagrante E todas as pessoas seguidas que meu pensamento ia pegando eu ia sentindo ódio delas uma por uma do mesmo jeito ainda que fossem muito mais minhas amigas e eu em outras horas delas nunca tivesse tido quizília nem queixa Mas o sarro do pensamento alterava as lembranças e eu ficava achando que o que um dia tivessem falado seria por me ofender e punha significado de culpa em todas as conversas e ações O senhor me crê E foi então que eu acertei com a verdade fiel que aquela raiva estava em mim produzida era minha sem outro dono como coisa solta e cega As pessoas não tinham culpa de naquela hora eu estar passeando pensar nelas Hoje que enfim eu medito mais nessa agenciação encoberta da vida fico me indagando será que é a mesma coisa com a bebedice de amor Toleima O senhor ainda me releve Mas na ocasião me lembrei dum conselho que Zé Bebelo na Nhanva um dia me tinha dado Que era que a gente carece de fingir às vezes que raiva tem mas raiva João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 330 mesma nunca se deve de tolerar de ter Porque quando se curte raiva de alguém é a mesma coisa que se autorizar que essa própria pessoa passe durante o tempo governando a idéia e o sentir da gente o que isso era falta de soberania e farta bobice e fato é Zé Bebelo falava sempre com a máquina de acerto inteligência só Entendi Cumpri Digo reniti fazendo fincapé em força para não esparramar raivas Lembro que naquela manhã também o calor era menos e o ar era bondoso Aí eu à paz com vontade de alegria como se estimasse recebendo um aviso Demorei bom estado sozinho em beira dágua escutei o fife dum pássaro sabiá ou saci De repente dei fé e avistei era Diadorim que chegando ele já parava perto de mim Ele mesmo me disse com o sorriso sentido Como passou Riobaldo Não está contente por me ver A boa surpresa Diadorim vindo feito um milagre alvo Ao que pela pancada do meu coração Aí mas um resto de dúvida a inteira dúvida que me embaraçava real em a minha satisfação Eu era o que tinha ele o que devia Retente então permaneci não fiz mostra nenhuma Esperei as primeiras palavras dele Mais falasse retardei limpei a goela João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 331 A pois Por onde andou se mal pergunto aí falei Aquela amizade pontual escolhida para toda a vida dita a minha nos grandes olhos ele pronunciando Você também não está bom de saúde Riobaldo estou vendo Você derradeiramente não tem passado bem Vivendo minha sorte com lutas e guerras Ao que Diadorim me deu a mão que malamal aceitei E ele disse de contar Segundo tinha procurado aqueles dias sozinho recolhido nas brenhas para se tratar dum ferimento tiro que pegara na perna dele perto do joelho sido só de raspão Menos entendi A real que estando ofendido por que era que não havia de vir para o meio da gente para receber ajuda e ter melhor cura Doente não foge para um recanto ou mato solitário consigo feito bicho faz Aquilo podia não ser verdade Afiguro aí bem que criei suspeitas aonde Diadorim não teria andado ido e que feia ação para aprontar com parte na fingida estória As incertezas que tive que não tive Assaz ele falava assim afetuoso tão sem outras asas e os olhos de ver e de mostrar de querer bem não consentiam de quadrar nenhum disfarce Magro ele estava quasso empalidecido muito até ainda um pouco man João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 332 cava Que vida penosa não era capaz de ter levado tantos dias sem o auxílio de ninguém tratando o machucado com emplastros de raízes e folhas comendo o quê Assunto de fome e toda sorte de míngua devia de ter penado E de repente eu estava gostando dele num descomum gostando ainda mais do que antes com meu coração nos pés por pisável e dele o tempo todo eu tinha gostado Amor que amei daí então acreditei A pois o que sempre não é assim Além do que era sazão de sentimento sereno arte que a vida mais regateia A vida não dá demora em nada Nos seguintes logo tornamos para tornar em guerra com assanhamentos De formas que perdi o semelhar de tantos manejos e movimentos e a certa razão das ordens que a gente cumpria Mas fui me endurecendo às pressas no fazer meu particípio de jagunço fiquei caminhadiço Agora eu tinha Diadorim assim perto de afeto o que ainda valia mais no meio desses perigos de fato Sendo que a sorte também prevalecia do nosso lado aí vi a morte é para os que morrem Será Ao que com João Goanhá de testachefe saímos uns cinqüenta pegar uma tropa de cargueiros dos bebelos que vinham ao descuidado de noite no BentoPedro lugar num João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 333 braço de brejo arrozal Surpreender custou barato bobearam as sentinelas sem se haver um gritodearmas foi só pôr em fugida Aquela carga era enorme maior em dobro uma riqueza tinha de tudo até cachaça de pago imposto as caixas de quarentae oito garrafas cada Ao tanto levamos os lotes de burros para esconder no Capão dos Ossos onde tem carrascais e caminhos de caatinga pobre com lagoas secando as ipueiras verdolengas Daí tivemos mando no PoçoTriste de tornar a amontar nos animais Aquilo era uma alegria Minha alma estava o troteio a poeirada que levantavam os cavalos que rinchavam bem Acinte bebi água de dedentro dum gravatá em flor Aquelas aranhas grandes armavam de árvore para árvore velhices de teia Parecia que a guerra já tinha se terminado bem Berimbau um disse Agora é gozar gozo Mas Ah e Zé Bebelo perguntei Um Federico Xexéu que vinha de recado botava o fácil desânimo Ih Zé Bebel Evém ele com gentes de nuvens gentes A desléguas se guerreava A gente recebia a no ticia Aí cavalaria chusma arruá que chegando aos estropes terras arribavam Eta é Sendo que era não Só era Só Candèlário de repente Apareceu com aqueles muitos homens Sus esbarrou o cavalo tão de repente que o corpo dele se encurtou pela metade Só Candelário Esse era alto trigueiro azul João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 334 quase preto com bigode amarelecido Homem forçoso homem de fúria Mandou que mandava Em hora de fogo pulava à frente de todos bramava o burro Tomou a chefia geral debaixo dele o Hermógenes parecia um diabo coitado Só Candelário era o para enfrentar Zé Bebelo Salvante que seria para tudo Se apeou ficou um demorado tempo de costas para a gente Saudei o Fafafa que era homem também dele com os de Só Candelário o Alaripe e o Fafafa tinham outra vez aparecido O Fafafa o que ele pois então me falou numa ocasião terrível Ah mas o que eu antes não contei o do preso Antes como foi que se passou como estávamos em bons escondidos em volta da casa dum sitiante no TimbaTuvaca casa caiada casade telhas Uns em grota uns em altos de árvores tinha gente até dentro de chiqueiro na lama dos porcos Aí chegaram os bebelos uns trinta Tiroteamos na suspensão deles os quantos que matamos matamos os mais fugiram sem após Um ficou preso Nem tinha nenhum ferimento Que é que vão fazer com ele eu perguntei Será que iam matar É verdade acho que sim Pois amigo a gente tem lá meios para guardar prisioneiro vivo Se degola é da banda da direita para a esquerda o que o Fafafa me respondendo No que dizia ele tinha razão Mas quem seria que ia cumprir de dar o fim naquele pobre moço O João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 335 Hermógenes Decerto era ele Cocei os olhos eu queria saber e não saber Sabia nem o nome como se chamava o rapaz que ia morrer assim no meio de toda boa ordem por necessidade nossa porque se solto ele tornava a se juntar com os outros dar relatórios Vim para a beira do córrego Vendo como levavam o rapaz como ele caminhava normal seguindo para aquilo com seus dois pés Essa injustiça não podia ser Assim os que passavam depois que decerto iam para matar eram outros não vi o Hermógenes Um um Adílcio com vaidade de ser capaz da maldade qualquer pavão de penas O outro Luís Pajeú Imaginado a que iam matar o homem lá nas primeiras árvores da capoeira assim Ânsia de dó apalpei o nó na goela ardi Aquilo fosse sonho mero então só sonho ou não fosse então eu carecia de uma realidade no real sem divago Ajoelhei na beirada debrucei bebi água com encostando a boca com a cara feito um cachorro um cavalo A sede não passava minha barriga devia de estar inchada igual a de um sapo igual um saco de todo tamanho A umas cem braças para cima onde o córrego atravessava a capoeira estavam esfaqueando o rapaz e eu espiava para a água esperando ver vir misturado o sangue vermelho dele e que eu não era capaz de deixar de beber Acho que eu estava com uma febre João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 336 Aquele grande gritar de se estremecer Diadorim me puxou Só Candelário subido em sela aforçurado regendo a pronto ele queria o punhadão de homens se ia para o ÉJá pra lá do Bró em todo o seguir Vamos Riobaldo É para se esperar Joca Ramiro Assim Diadorim me empurrou Montei Sem tento pisei um estribo o outro o meu pé não achava Tocar ligeiro Riobaldo Diadorim me atanazando Aquilo que lavorava em minha cabeça ah mas aí quem é que eu vi O rapaz aquele o preso vivo e exato Também montado num cavalo Assim o que me contaram que não ia morrer não iam matar não Só Candelário tinha favorecido perdão a ele por causa de sua mocidade Ele é baiano para a Bahia volta vamos levar mais adiante para se soltar para lá Me alegrei de estrelas Conforme mais me deram explicação aquele não oferecia perigo mais de tornar a se juntar com os outros bebelos e vir outra vez de armas contra a gente porque se tinha providenciado de rezar nele uma reza de tirar a coragem de guerra feito ato mandraca de se abobar Tudo tinha graça Mas e o Luís Pajeú e o Adílcio então do modo que vi Pois esses passaram com as facasdearrasto mas porque iam ajudar a retalhar o porco porção que se levava dali em carne e toucinhos Ah eu tinha bebido àtoa gorgol dágua Se deu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 337 galope Me pareceu que daí adiante a partir disso o tudo era para só ser a desatinada doidice Só Candelário galopava em frente de todos Se ia feito o rei dos ventos O lugar onde esbarramos no ÉJá era logo depois da ponte de pau que estando esburacada atravessamos mais embaixo mau vau por espirro de águas e escorrego em lisas pedras soltadas no ribeirão lajeal Ter lá ainda não tinha ninguém até me deu desengano Mas tudo no redor era verde capim em beira fresca aguada e pastos bons Atrevi que quis E Joca Ramiro Mas Diadorim se compôs Agora aqui Riobaldo é o ponto inimigo vindo morremos mas nem um bebelo não tem licença quieta de passar Diadorim a tanto impante eu debiquei Ah me importa Não é o que é se ver Joca Ramiro Pois eu estou vendo Rezinga não Riobaldo A horas destas Joca Ramiro deve de estar investindo aqueles e tudo destralhado vencendo foi o que ele perfez Atrás disso eu em ojeriza Você sabe hem sabe Os grandes segredos fui falei Mas em passos desses Diadorim sempre me apeava Como o que reprovou Sei de nada Sei o que você pode saber também Riobaldo Mas conheço Joca Ramiro sozinho que pensa as partes Conheço Só Candelário que só comparece é em fecho de forte decisão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 338 Ao que era Nos dias em que tivemos de montar guarda nos lajeiros e lajeados aprendi os rasgos daquele homem Só Candelário como vou explicar ao senhor Ele era um Acho que nem dormia comia o nada nada às pressas pitava o tempo todo E olhava para os horizontes sem paciência neles parecia querer mesmo guerra a guerra muita guerra Donde ele era donde vindo Me disseram desses desertos da Bahia Passava não me olhava Ocasião então Diadorim a ele me mostrou Este é o meu amigo Riobaldo chefe Aí Só Candelário me divisou sempre me viu Rir sorrir ele não sabia mas sossegava um modo nos olhos que tomavam um sério bom por um seu instante apagando de serem aqueles olhos encarniçados e isso figurava de ser um riso Que conhecia Diadorim e prezando muito desde vi Riobaldo Tatarana eu sei ele falou Tu atira bem tem o adestro darmas E foi andando acho que dele ainda ouvi amizade nas festas Conseguia nem ficar parado E por um ponto ou outro que eu não divulguei bem ele tinha algum estilo de ar de parecença com o próprio Zé Bebelo Mas o Alaripe foi que me contou uma coisa que todos sabiam e nela falavam Que Só Candelário caçava era a morte E bebia quase constantemente sua forte cachaça Por quê Digo ao senhor ele tinha medo de estar com o maldelázaro Pai dele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 339 tinha adoecido disso e os irmãos dele também depois e depois os que eram mais velhos Lepra mais não se diz ai é que o homem lambe a maldição de castigo Castigo de quê Disso é que decerto sucedia um ódio em Só Candelário Vivia em fogo de idéia Lepra demora tempos retardada no corpo de repente é que se brota em qualquer hora aquilo podia variar de aparecer Só Candelário tinha um sestro não esbarrava de arregaçar a camisa espiar seus braços a ponta do cotovelo coçava a pele de em sangue se arranhar E carregava espelhinho na algibeira nele furtava sempre uma olhada Danado de tudo A gente sabia que ele tomava certos remédios acordava com o propor da aurora o primeiro bebia a triaga e saía para lavar o corpo em poço para a beira do córrego ia indo nu nu feito perna de jaburu Aos dava Hoje que penso de todas as pessoas Só Candelário é o que mais entendo As favas fora ele perseguia o morrer por conta futura da lepra e no mesmo do tempo do mesmo jeito forcejava por se sarar Sendo que queria morrer só dava re sultado que mandava mortes e matava Doido era Quem não é mesmo eu ou o senhor Mas aquele homem eu estimava Porque ao menos ele possuía o sabido motivo Tanto que o inimigo não dava de vir pois bem a gente ficava em nervosias Alguns não Feito aquele Luzié que cantava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 340 sem mágoas cigarra de entrechuvas Às vezes pedi que ele cantasse para mim os versos os que eu não esqueci nunca formal a canção de Siruiz Adiantes versos E quando ouvindo eu tinha vontade de brincar com eles Minha mãe ela era que podia ter cantado para mim aquilo A brandura de botar para se esquecer uma porção de coisas as bestas coisas em que a gente no fazer e no nem pensar vive preso só por precisão mas sem fidalguia Diadorim quando cuidava que sozinho estivesse cantarolava fio que com boa voz Mas próximo da gente nunca que ele queria A ver que também fiquei sabendo que os outros não consideravam naqueles versos de Siruiz a beleza que eu achava Nem Diadorim mesmo Você tem saudade de seu tempo de menino Riobaldo ele me perguntou quando eu estava explicando o que era o meu sentir Nem não Tinha saudade nenhuma O que eu queria era ser menino mas agora naquela hora se eu pudesse possível Por certo que eu já estava crespo da confusão de todos Em desde aquele tempo eu já achava que a vida da gente vai em erros como um relato sem pés nem cabeça por falta de sisudez e alegria Vida devia de ser como na sala do teatro cada um inteiro fazendo com forte gosto seu papel desempenho Era o que eu acho é o que eu achava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 341 Ao do jeito de Só Candelário Esse variava raja Arre que vê estamos sem noticias não sei A notícia a gente tem de ir por ela mesmo entrar no mundo para se buscar isso Só Candelário quase exclamava Mandou três homens que saíssem a cavalo estrada avante até a uma légua colher do que houvesse espiar os espias Me mandou também Mas a bem dizer fui eu quem quis na hora à frente dei o passo olhei muito para ele encarado Tu Tatarana vai Quando ele falava Tatarana eu assumia que ele estava sério prezando minha valia de atirador Montei fui trotando travado Diadorim e o Caçanje iam já mais longe regulado umas duzentas braças Arte que perceberam que eu vinha se viraram nas selas Diadorim levantou o braço bateu mão Eu ia estugar esporeei queria um meiogalope para logo alcançar os dois Mas aí meu cavalo filosofou refugou baixo e refugou alto se puxando para a beira da mão esquerda da estrada por pouco não deu comigo no chão E o que era que estava assombrando o animal era uma folha seca esvoaçada que sobre se viu quase nos olhos e nas orelhas dele Do vento Do vento que vinha rodopiado Redemoinho o senhor sabe a briga de ventos O quando um esbarra com outro e se enrolam o doido espetáculo A poeira subia a dar que dava escuro no alto o ponto às voltas folharada e ramaredo quebrado no João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 342 estalar de pios assovios se torcendo turvo esgarabulhando Senti meu cavalo como meu corpo Aquilo passou embora o róró A gente dava graças a Deus Mas Diadorim e o Caçanje se estavam lá adiante por me esperar chegar Redemonho o Caçanje falou esconjurando Vento que enviesa que vinga da banda do mar Diadorim disse Mas o Caçanje não entendia que fosse redemunho era dEle do diabo O demônio se vertia ali dentro viajava Estive dando risada O demo Digo ao senhor Na hora não ri Pensei O que pensei o diabo na rua rio meio do redemunho Acho o mais terrível da minha vida ditado nessas palavras que o senhor nunca deve de renovar Mas me escute A gente vamos chegar lá E até o Caçanje e Diadorim se riram também Aí tocamos Até à barra dos dois riachos onde tem a cachoeira de escadinhas Nem pensei mais no redemoinho de vento nem no dono dele que se diz morador dentro que viaja o Sujo o que aceita as más palavras e pensamentos da gente e que completa tudo em obra o que a gente pode ver em folha dum espelho preto o Ocultador Ao então chegamos na barra dos riachinhos na cachoeira ficamos lá até o sol entrar Como é que se podia trazer notícias para Só Candelário Notícia é coisa que se tira a desejo do fim do sol Lá tinha um capãodemato Ou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 343 era mata muito velha Os coatis desciam espirrando de sua sesta deles nas árvores e os jacus voavam para outras árvores se empoleirando para o sono da noite com um escarcéu de galinheiro Tristeza é notícia Tanto eu tinha um aperto de de sânimo de sina vontade de morar em cidade grande Mas que cidade mesma grande nenhuma eu não conhecia digo Assim eu aproveitei para olhar para a banda de donde ainda se praz qualquer luz da tarde Me lembro do espaço pensamentos em minha cabeça O riacho cão lambendo o que viesse O coqueiro se mesmando A fantasia minha agora nesta conversa o senhor me atalhe Se não o senhor me diga preto é preto branco é branco Ou quando é que a velhice começa surgindo de dentro da mocidade Noitezinha viemos Primeira coruja que a ãoar eu era capaz de acertar nela um tiro Mas Só Candelário não era tolo nas meças No outro dia notícias tivemos E que Dali a lá as notícias todas andaram de vir em lote e réstia Um Sucivre que fino chegou esgalopado Disse Nhô Ricardão deu fogo no Ribeirão do Veado Titão Passos pegou trinta e tantos deles num bom combate no esporão da serra Os bebelos se desabelhavam zuretas de baixo de fatos machos e zuo de balas A tanto a gente em festa se alegrava Só Candelário subiu no jirau de varasque tinha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 344 mandado fazer nele era que dormia sem repousar e assim espiou esquecido tempo espiava as paradas distâncias feito um gavião querendo partir em vôo Agora era a guerra mesmo estariam rompendo as aleluias lá por lá Donde daí veio o Adalgizo Seô Hermógenes passou obra de seis léguas vai dar combate Nossa hora de fogo estava perto Assim os bebelos tinham de passar de fugida por ali no ÉJá resvés Só Candelário chega exclamava chorava dizia que nunca tinha chefiado pessoal tão valente feito nós com tantas capacidades E queria logo logo o inimigo vindo Todas as horas tocaiadas e de noite com um olho só se ia dormir que das armas não se largava A redobrar as sentinelas em avemarias e alvorada Combate vem é feito raio cai Tudo era alarme dado cuquiada um pontapé em tição o punhado de terra jogado para apagar as fogueiras de repente e se assobiava cruzado Vez deram até tiros mas nada não era só um boi loango com muita fome e pouco sono que veio sozinho pastando e deu a cara comprida ali foras dhora no capinzal bom Tudo que é estúrdio comparece em tempo de guerra Vote vais algum disse E teve gente que se riu disso até à beira da madrugada Daquilo tudo eu gostei gostava cada dia mais Fui aprendendo a achar graça no dessossego Aprendi a medir a noite em meus dedos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 345 Achei que em qualquer hora eu podia ter coragem Isso que vem de mansinho com uma risada boa cachaça aos goles dormida com a gente encostado em coronha de sua arma O que carece é acompanheiragem de todos no simples assim irmãos Diadorim e eu a sombra da gente uma só uma formava Amizade na lei dela Como a gente estava estava bem Só Candelário era o chefe ao meu gosto como eu imaginava Ah e Joca Ramiro Antes foi uma coisa acontecida repentina aquele alvoroço na cavalhada geral Aí o mundo de homens anunciando de si e sobre o vasto chegando da banda do Norte Joca Ramiro Doca Ramiro se gritava Só Candelário pulou em sela assim como ele sempre era mola de aço Deu um galope em encontro Nós todos de começo ficamos atarantados Vi um sol de alegria tanta nos olhos de Diadorim até me apoquentou Eu tinha ciúme Riobaldo tu vai ver como ele é Diadorim exclamou se abraçou comigo Parecia uma criança pequena naquela bela resumida satisfação Como era que eu ia poder raivar com aquilo E no abrevento a toda cavaleirama chegando empiquetados com ferragem de cascos no pedregulho Eram de ser uns duzentos quase tudo manos velhos baianos gente nova trazida Gritavam vivas para a gente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 346 saudavam E Joca Ramiro A figura dele Era ele num cavalo branco cavalo que me olha de todos os altos Numa sela bordada de Jequié em lavores de pretoebranco As rédeas bonitas grossas não sei de que trançado E ele era um homem de largos ombros a cara grande corada muito aqueles olhos Como é que vou dizer ao senhor Os cabelos pretos anelados O chapéu bonito Ele era um homem Liso bonito Nem tinha mais outra coisa em que se reparar A gente olhava sem pousar os olhos A gente tinha até medo de que com tanta aspereza da vida do serão machucasse aquele homem maior ferisse cortasse E quando ele saía o que ficava mais na gente como agrado em lembrança era a voz Uma voz sem pingo de dúvida nem tristeza Uma voz que continuava Sobre o no meio daquele rebuliço menos colhi de ver e de escutar Os chefes tinham apeado dos cavalos e os homens todos em balbúrdia com sensatez Só Candelário não arredava pé de Joca Ramiro e explicava as diversas coisas com grandes gestos quase ele não dava conta de se falar A demora era pouca Aí o forte bando tinha de se aluir para adiante em re dobro de marcha iam para ferrar fogo em lugar e hora determinados semelhante se soube Tempo de beberem um café Mas Joca Ramiro veio de lá em alargados vagarosos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 347 passos queria correr o acampamento saudar um e outro a palavrinha que fosse um dito de apreço e apraz O andar delevi certo alteado e imponente como o de ninguém Diadorim olha va e também tinha lágrimas vindo por caso Decidido deu um àfrente pegou a mão de Joca Ramiro beijou Joca Ramiro que firme contemplando só um instante seja mas o docemente achável com um calor diferente de amizade A quantia que ele gostava de Diadorim e pousou nas costas dele um abraço Ao que se virou para nós que estávamos E eu fiz como Diadorim nem sei porquê peguei a mão daquele homem beijei também Todos os que eram mais moços beijavam Os mais velhos tinham vergonha de beijar Este aqui é o Riobaldo o senhor sabe Meu amigo A alcunha que alguns dizem é Tatarana Isto Diadorim disse A tento Joca Ramiro tornando a me ver fraseou Tatarana pêlos bravos Meu filho você tem as marcas de conciso valente Riobaldo Riobaldo Disse mais Espera Acho que tenho um trem para você Mandou vir o dito e um cabra chamado João Frio foi lá nos cargueiros e trouxe Era um rifle reiúno peguei mosquetão de cavalaria Com aquilo Joca Ramiro me obsequiava Digo ao senhor minha satisfação não teve beiras Pudessem afiar inveja em mim pudessem Diadorim me olhava com um contentamento Me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 348 chamou de lado Vi que mesmo sendo assim querido e escolhi do de Joca Ramiro ele procedia mais de ficar de longe por ninguém se queixar não acharem que ali havia afilhadagem Não é que ele é mesmo o chefe de todos Não é que é mandante Diadorim me perguntava Era Mas eu não percebi o vivo do tempo que passava Eles já estavam indo de saída Montado no cavale branco Joca Ramiro deu uma despedida Vi que ele com os olhos caçou Diadorim Só Candelário gritou Viva Jesus em rotas e vantagens E num bufúrdio todos esporaram andaram ao assaz A alta poeira que demorava Aquilo parecia uma música tocando Desde ver a figura dele tinha parado no meio da gente noutra coisa não se falava Aí em festa feita a gente tramava nas armas Joca Ramiro entrava direto em combate então ia ser o fim da guerra Só Candelário queria ir também mas teve de aceitar ordem de ficar Diadorim me explicou Segundo disse que Só Candelário por aquela ânsia e soência de avançar a avançar agora podia desequilibrar a boa regra de tudo Seria para ficar de espera tapando o mundo aos que aqui o mundo quisessem Assim mais Joca Ramiro tinha mandado que nosso grupo se repartisse em aos três ou quatro piquetes para valer de vigiar bem os vaus e suas estradas Diadorim e eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 349 fizemos parte duma turma dessas duns quinze homens chefia de João Curiol fomos para a baixa dos Umbuzeiros lugar feio com os gravatás poeirentos e uns levantados de pedra Partindo desse vau a gente pega uma chapadinha a Chapadada SeriemaCorrendo A que parecia mesmo de propósito Porque foi lá com todo o efeito que a cara da caça se apareceu Aquilo terrível Conto já ao senhor duma vez Terrível tido por causa da ligeireza com que aquilo veio Surpresa a gente sempre tem o senhor sabe mesmo em espera dá a vez e não se vê à parva Não se crê que é Tão de repente O vento vinha bom da parte deles chegarem de formas que o galope pronto se ouviu Escoramos as armas Assim que eles eram uns vinte Passaram o ribeirão com tanta pressa que a água se esguichou farta vero bonito aquilo no sol Demos fogo Do que podia suceder Vi homem despencado demais os cavalos patatrás Dada a desordem Só cavalo sozinho podia fugir mas os homens no chão no cata cata Ao que a gente atirava Se morria se matava matava Os cavalos não Mas teve um veio à de se doidar se espinoteava o cavaleiro não agüentava na rédea chegaram até perto de nós aí todos os dois morreram de repente Meu senhor tudo numa estraga João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 350 extraordinária Mas aqueles eram homens Trampe logo que puderam os sobrantes deles se desapearam e rastejaram respondendo ao fogo Ah puderam tomar oculto atrás de outras fragas de pedra nisso a gente não conseguiu ter mão Ainda deviam de ser uns dez ou uns oito Afa que gritavam em febre de ódio xingando todo nome A gente também Anhãnhãe berrávamos fogo quando sinal de homem tremeluzia As balas rachavam as pedras só partiam escalhas Um se mostrou caiu logo Munição deles era pouca Fugir mesmo não podiam A gente atirava Aí deviam de ser uns seis que é a meiadúzia Aoê sabe quem está lá comandando o rastejador Roque me disse Sabe quem Ah eu sabia Eu tinha sabido o em desde o primeiro momento Era quem eu não queria para ser Era Zé Bebelo Assim eu condenado para matar Aqui eu não sei o que o senhor não sabe A fogo A crevo isto João Curiol gritava Antes do depois neles a gente ia ir a pano de facão Tralha Lá vai obra cão carujo Roncolho isto era a voz de Zé Bebelo gritava Eu não gritei Diadorim também atirava calado Munição deles quase nenhuma Eles deviam de ser uns quatro ou três O cano do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 351 meu rifle esquentava demais Roncolho Toma Um Freitas nosso gritou caiu muito ferido A bala era de Zé Bebelo Atiramos grosso Eles respondendo Respondiam pouco Deviam de ser os quantos Digo ao senhor eu gostava de Zé Bebelo Redigo que eu menos atirava do que pensava Como era possível assim com minha ajuda a morte dele Um homem daquela qualidade o corpo dele a idéia dele tudo que eu sabia e conhecia Nessas coisas eu pensei Sempre Zé Bebelo a gente tinha que pensar Um homem coisa fraca em si macia mesmo aos pulos de vida e morte no meio das duras pedras Senti em minha goela Aquela culpa eu carregava Arresto gritei Joca Ramiro quer esse homem vivo loca Ra miro quer este homem vivo Joca Ramiro faz questão A que nem não sei como tive o repente de isso dizer falso verdadeiro inventado Gritei firme repeti Os outros companheiros aceitavam aquilo diziam também até João Curiol loca Ramiro quer este homem vivo É ordem de Joca Ramiro De lá não atiravam mais Só bala ou outra só Arre à unha chefe o SanguedeOutro perguntou João Curiol respondeu que não Eles deviam de estar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 352 reservando balas para um final Ordem de loca Ramiro é pegar o homem vivo ainda eu disse Ali Zé Bebelo eu sal vasse Todos aprovaram Eu sei eu sei O senhor agora vai não me entendes O como são as coisas Todos me aprovaram e aí extraordinariamente eu dei um salto de espírito O que Mas então eu não tinha pensado tudo o real O que era que eu estava fazendo que era que eu estava querendo que pegassem vivo Zé Bebelo em carnes e ossos para depois judiarem com ele matarem de outro pior jeito a fácil Minha raiva deu em mim Me mordi me abri meamargo Tanto tudo ia sendo sempre por minha culpa E daí pedi tudo ao rifle é às cartucheiras Eu atirava atirava queria por toda a lei alcançar um tiro em Zé Bebelo para acabar com ele de uma vez sem martírio de sofrimentos Tu está louco Riobaldo Diadorim gritou rastejando para perto de mim travando em meu braço Joca Ramiroquer o homem vivo Joca Ramiro quer deu ordem todos agora me gritavam Assim contra mim assim todos O que eu havia de desmentir E não vi direito o fato O que vi foi Zé Bebelo aparecendo de repente garnisé O que ele tinha numa mão era o punhal na outra uma garrucha grande fogocentral Mas descarregou a garrucha atirando no chão perto dos pés dele mesmo Arrancou poeira João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 353 Por trás daquela poeira ele reapareceu dava pensamento assim aprumado teso de briga Lampejou com o punhal e esperou Ele mesmo estava querendo morrer à brava depressamente Olhei olhei De atirar nele de todo jeito não tive coragem Ah não tinha E um dos nossos não sei quem jogou o laço Zé Bebelo mal ainda bateu com um pé por se firmar e caiu arrastado voz que gritou Canalha Canalha Mas todos foram nele desarmaram do punhal Eu parei quieto vago se me estranho Não queria ah não queria que ele me reconhecesse Sobrevinha o tropel grande de cavaleiros Aos quais era Joca Ramiro com sua gente total Subiu pó e pó por ouros poeira de entupir o narii e os olhos Agarrei de mim sentado lá no mesmo meu lugar atrás do pedação de pedra O que eu estava era envergonhado O fuzuê se fez um enorme Sendo que chegavam também os outros grupos nossos escutei os brados de Só Candelário A roda de cavaleiros tantos no raso sempre maior Algum soprou o buzo do corno de boi Tocavam para o acampamento Mas Diadorim estava me caçando e mais João Curiol pelos mortos e feridos que também tínhamos e também ali ele devia de ter perdido algum trem seu objeto Homem danado ouvi o que um dizia Meus olhos firmavam no chão agora eu via que tremia Ipa Zé Bebelo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 354 oxém ganhou patente É estragador Eu falei É e neste entretanto Ao menos Diadorim raiava o todo alegre às quase danças Vencemos Riobaldo Acabouse a guerra A mais Joca Ramiro apreciou bem que a gente tivesse pegado o homem vivo Aquilo me rendia pouco sossego E depois Para que Diadorim Agora matam Vão matar Mal perguntei Mas o João Curiol virou e disse Matar não Vão dar julga mento Julgamento não ri não entendi Aposto que sei Aí foi ele mesmo quem quis O homem estúrdio Foi defrontar com Joca Ramiro e assim agarrado preso do jeito como desgraçado estava brabo gritou Assaca Ou me matam logo aqui ou então eu exijo julgamento correto legal e foi Aí Joca Ramiroconsentiu aprazme prometeu julgamento já isto o que falou João Curiol para me dar a explicação Agradeci mesmo isso a cisma não era para pôr peso em meus peitos Saímos ainda com João Concliz a ir em longe arredor prevenir os que faltavam A vinda geral A gente de Titão Passos e do Hermógenes mandava aviso de estarem em caminho Os do Ricardão já aos tantos chegavam Saí com esses de João Concliz Fui Fiz questão Eu não queria retornar logo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 355 com os outros não enxergar Zé Bebelo eu achava melhor Montamos e sumimos por aqueles campos essa estrada esses pequizeiros Homem engraçado homem doido Diadorim ainda achava Sabe o que ele falou como foi E me deu notícia Tinha sido aquilo Joca Ramirochegando real em seu alto cavalo branco e defrontando Zé Bebelo a pé rasgado e sujo sem chapéu nenhum com as mãos amarradas atrás e seguro por dois homens Mas mesmo assim Zé Bebelo empinou o queixo inteirou de olhar aquele cima a baixo Daí disse Dê respeito chefe O senhor está diante de mim o grande cavaleiro mas eu sou seu igual Dê respeito O senhor se acalme O senhor está preso Joca Ramiro respondeu sem levantar a voz Mas com surpresa de todos Zé Bebelo também mudou de toada para debicar com um engraçado atrevimento Preso Ah preso Estou pois sei que estou Mas então o que o senhor vê não é o que o senhor vê compadre é o que o senhor vai ver João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 356 Vejo um homem valente preso aí o que disse Joca Ramiro disse com consideração Isso Certo Se estou preso é outra coisa O que mano velho É é o mundo à revelia isso foi o fecho do que Zé Bebelo falou E todos que ouviram deram risadas Assim isso Toleimas todas Não por não Também o que eu não entendia possível era Zé Bebelo preso Ele não era criatura que se prende pessoa coisa de se haver às mãos Azougue vapor E ia ter o julgamento Tanto que voltamos manhã cedinho estávamos lá no acampo debaixo de forma Arte o julgamento O que isso tinha de ser achei logo que ninguém ao certo não sabia O Hermógenes me ouviu e gostou É e é Vamos ver vamos ver o que não sendo dos usos foi o que ele citou Ei agora é julgamento os muitos caçoavam em festa fona Cacei de escutar os outros Está certo está direito Joca Ramirosabe o que faz foi o que disse Titão Passos Melhor mesmo Carece de se terminar o mais definitivo com João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 357 essa cambada falou Ricardão E só Candelário que agora não se apeava vinha exclamando Julgamento É isto Têm de saber quem é que manda quem é que pode Ao espraia as margens Agora estavam todos mais todos reunidos estávamos no acampamento do ÉJá onde ali mal tanto povo cabia e lotes e pontas de burros a cavalhada pastando jagunços de toda raça e qualidade que iam e vinham co miam bebiam bafafavam Só Candelário tinha remetido dois homens longe no São José Preto só para comprarem foguetes que no fim teriarA de pipocar E onde estava Zé Bebelo Apartado recolhido de toda vista numa tenda de lona essa única que se tinha porque Joca Ramiro mesmo se desacostumava de dormir em barraca por o abafo do calor Não se podia ver o prisioneiro que ficava lá dentro feito guardado Contaram que ele aceitava comida e água e estivesse deitado num couro de vaca pitando e pensando Gostei O de que eu carecia era de que ele não botasse olhos em mim Eu apreciava tanto aquele homem e agora ele não havia de ser meu pesadelo Aonde é que vamos Onde é que esse julgamento vai ser perguntei a Diadorim quando surpreendi os suspensos de se ter saída Homem não sei Diadorim disso não sabia Só depois se espalhou voz Ao que se ia para a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 358 Fazenda SempreVerde depois da Fazenda BrejinhodoBrejo aquela a do doutor Mirabô de Melo Mas por que causa iam dar com aquele homem tamanha passeata Carecia algum Diadorim não me respondeu Mas pelo que não disse e disso tirei por tino Assim que Joca Ramiro fazia questã de navegar três léguas a longe com acompanhamento de todos os jagunços e capatazes e chefes e g prisioneiro levado em riba dum cavalo preto e todas as tropas com munição coisas tomadas e mantimentos de comida rumo do Norte tudo por glória O julgamento também Estava certo Saímos de trabuz No naquele a gente podia ver resenho de toda geração de montadas Zé Bebelo lá ia rodeado por cavaleiros de guarda pessoal de Titão Passos logo na cabeça do cortejo Ia com as mãos amarradas como de uso Amarrar as mãos não adiantava Eu não quis ver Me dava travo me ensombrecia Fui ficando para trás Zé Bebelo lá preso demais em conduzido Aquilo com aquilo aí a minha idéia diminuía Tanto o antes que fiz a viagem toda na rabeira ladeando o bando bonzinho de jegues orelhudos que fechavam a marcha A pobreza primeira deles me consolava os jumentinhos feito meninos Mas ainda pensei ele bom ou ele ruim podiam acabar com Zé Bebelo Quem tinha capacidade de pôr Zé Bebelo em julgamento Então ressenti um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 359 fundo desânimo Sem mais Zé Bebelo então o restado consolo só mesmo podia ser aqueles jericos baianos que de nascença sabiam todas as estradas Assim passamos pelo BrejinhodoBrejo assim chegamos na Sempre Verde Aí fomos chegando Que me deu de repente Esporeei e galopeis para dianteira fomentado repinchando dessas angústias Vim Eu queriá sobressalto de estar ali perto catar tudo nos olhos o que acontecia maior Nem não importei mais que Zé Bebelo me visse Passei quase para a frente de todos Estavam pensando que eu viesse com um recado Que foi Riobaldo que foi gritou para mim Diadorim Dei nenhuma resposta pessoa ali não me entendia Só mesmo Zé Bebelo era quem pudesse me entender A Fazenda SempreVerde era a casa enorme viemos saindo da estrada e entrando nas cheganças os curraisdeajuntamento Aquele mundo de gente que fazia vulto Parecia um mortório Antes passei afanhou a porteira aí fomos enchendo os currais com tantos os nossos cavalos A casadefazenda estava fechada Não carece de se abrir Não carece de se abrir era uma ordem que todos repetiam de voz em voz Ave não arrombassem aquilo era de amigos o doutor Mirabô de Melo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 360 mesmo ausente Esbarramos no eirado liso grande de tanto tamanho Aí tinham apeado Zé Bebelo do cavalo ele estava com as mão amarradas sim mas adiante do corpo feito algemas Ata amarra os pés também algum enfezado gritou Outro se chegou com uma boa peia de couro de capivara Que era que aquela gente pensavam Que era que queriam Doideira de todos Daí Joca Ramiro Só Candelário o Hermógenes o Ricardão Titão Passos João Goanhá eles todos reunidos no meio do eirado numa confa Mas Zé Bebelo não estava aperreado Tomou corpo num alteamento feito quando o peru estufa e estoura e caminhou em direitura Que que pequeno era bom homem às graças Caminhou mesmo Oxente Para diante de Joca Ramiro no meio do eirado tinham trazido um mocho deixado botado lá era um tamborete de tripés o assento de couro Zé Bebelo ligeiro nele se sentou Oxente se dizia A jagunçama veio avançando feito um rodear de gado fecharam tudo só deixando aquele centro com Zé Bebelo sentado simples e Joca Ramiro em pé Ricardão em pé Só Candelário em pé o Hermógenes João Goanhá Titão Passos todos Aquilo sim que sendo um atrevimento caso não o que maluqueira só Só ele sentado no mocho no meio de tudo Ao que cruzou as pernas E João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 361 Se abanquem Se abanquem senhores Não se vexem ainda falou de papeata com vênias e acionados e aqueles gestos de cotovelo querendo mostrar o chão em roda o dele Arte em esturdice nunca vista O que vendo os outros se franziram faiscando Acho que iam matar não podiam ser assim desfeiteados não iam aturar aquela zombaria Foi um silêncio todo Mandaram a gente abrir muito mais a roda para o espaço ficar sendo todo maior Se fez Mas de repente Joca Ramiro astuto natural aceitou o louco oferecimento de se abancar risonho ligeiro se sentou no chão defronte de Zé Bebelo Os dois mesmos se olharam Aquilo tudo tinha sido tão depressa e correu por todos um arruído entusiasmado dando aprovação Ah Joca Ramiro para tudo tinha resposta Joca Ramiro era lorde homem acreditado pelo seu valor A modo que Zé Bebelo sabe o senhor então o que ele fez Se levantou jogou para um lado o tamborete com pontapé e a esforço se sentou no chão também diante de Joca Ramiro Foi aquele falatório geral contente De coisas de tarasco assim a gente não gostava E até os outros chefes todos um por um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 362 mudaram de jeito não se sentaram também mas foram ficando moleados ou agachados por nivelar e não diferir Ao que o povaréu jagunço com ansiedade de ver e ouvir o que se desse se espremendo em volta sem remangar das armas Aquele povo rio que se enche com intervalo dos estremecimentos regular como o piscar de olho dum papagaio Vigiei o Hermógenes Eu sabia dele havia de vir o pior Com o que todo o mundo parado formaram uns silêncios Menos no mais Joca Ramiro ia falar as palavras consagradas O senhor pediu julgamento ele perguntou com voz cheia em beleza de calma Toda hora eu estou em julgamento Assim Zé Bebelo respondeu Aquilo fazia sentido Mas ele não estava lorpa nem desfeliz bom para a forca Que até capivara se senta é para pensar não é para se entristecer E rodou aprumada a cara vistoriando as caras de tantos homens Ar que inchou o peito e o queixo levantou valendo se valendo Criatura assim sente tudo adivinhado de relâmpago na ponta dos olhos da gente Eu tinha confiança nele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 363 Lhe aviso o senhor pode ser fuzilado duma vez Perdeu a guerra está prisioneiro nosso Joca Ramiro fraseou Com efeito Se era para isso então para que tanto requifife Zé Bebelo repostou com toda a ligeireza De ouvir dividi o riso do siso A pois Ele mesmo tinha inventado exigido esse julgamento e agora torcia o motivo como se em fim de um julgamento ninguém competisse de ser fuzilado Saranga ele não era Mas estava brincando com a morte que para cada hora livrava Ao que bastava Joca Ramiro perder um ponto da paciência um pouco Só que por sorte pa ciência Joca Ramiro nunca perdia motejou não mais Adianta querer saber muita coisa O senhor sabia lá para cima me disseram Mas de repente chegou neste sertão viu tudo diverso diferente o que nunca tinha visto Sabença aprendida não adiantou para nada Serviu algum Sempre serve chefe perdi conheço que perdi Vocês ganharam Sabem lá Que foi que tiveram de ganho O puro lorotal E atrevimento muito Os jagunços em roda não entendiam o escutado e uns indicavam por gestos que Zé Bebelo estava gira da idéia outros quadrando um calado de mau João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 364 sinal Até o que disse De lá não sai barca Assim se diz Joca Ramiro não reveio logo Mexeu com as sobrancelhas Só daí O senhor veio querendo desnortear desencaminhar os sertanejos de seu costume velho de lei Velho é o que já está de si desencaminhado O velho valeu enquanto foi novo O senhor não é do sertão Não é da terra Sou do fogo Sou do ar Da terra é é a minhoca que galinha come e cata esgaravata Que visse o senhor os homens o prospeito Aqueles muitos homens completamente os de cá e os de lá cercando o oco em raia da roda com as coronhas no chão e as tantas caras como sacudiam as cabeças com os chapéus rebuçantes Joca Ramiro tinha poder sobre eles Joca Ramiro era quem dispunha Bastava vozear curto e mandar Ou fazer aquele bom sorriso debaixo dos bigodes e falar como falava constante com um modo manso muito proveitoso Meus meninos Meus filhos Agora advai que aquietavam no estatuto Nanja o senhor nessa sossegação que se fie O que fosse eles podiam referver em imediatidade o banguelê num zunir que vespassem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 365 Estavam escutando sem entender estavam ouvindo missa Um por si de nada não sabia mas a montoeira deles exata soubesse tudo Estudei foi os chefes Naquela hora o senhor reparasse que é que notava Nada mesmo O senhor mal conhece esta gente sertaneja Em tudo eles gostam de alguma demora Por mim vi assim serenados assim os cabras estavam desejando querendo o sério divertimento Mas os chefes cabecilhas esses ao que menos expunham um certo se aborrecer segundo seja Cada um conspirava suas idéias a respeito do prosseguir e cumpriam seus manejos no geral esses com suas responsabilidades Uns descombinavam dos outros no sutil Eles pensavam Conforme vi Só Candelário duma banda de Joca Ramiro com Titão Passos e João Goanhá o Ricardão da outra com o Hermógenes Atual Zé Bebelo foi começando a conversar comprido na taramelagem como de seu gosto aí o Ricardão armou um bocejo e Titão Passos se desacocorou com a mão num ombro que devia de ter algum machucado O Hermógenes fez beiço João Goanhá aquele ar sonsado quase de tolo no grosso do semblante O Hermógenes botava pontas de olhar some escuro nuns visos Só Candelário ficado em pé sacudia o moroso das pernas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 366 Joca Ramiro deve de ter percebido aquele repiquete Porque ele sobre se virou para Só Candelário ao de indagar Meu compadre que é que se acha Sô Candelário fungou e logo abriu naqueles sestros que tinha movimental Sendo por ele querer se desengonçar e não podendo como era alto e magro duro aquele homem Sarre os onhos olhos amarelos de gavião dele hem Não achou as palavras para dizer disse Ao que a ver Ao que estou compadre chefe meu A lesto que Joca Ramiro assentiu com cabeça conforme se Só Candelário tivesse afirmado coisas de sincera importância Zé Bebelo abriu muito a boca tirando um ronco como que de propósito Alguns mais riram dele Em menos Joca Ramiro esperou um instante A gente pode principiar a acusação Aprovaram os todos todos Até Zé Bebelo mesmo Assim Joca Ramiro refalou normal seguro de sua estança por mais se impor uma fala que ele drede avagarava Dito disse que ali sumetido diante só estava um inimigo vencido em combates e que agora ia receber continuação de seu destino João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 367 Julgamento já Ele mesmo Joca Ramiro como de lei deixava para dar opinião no fim baixar sentença Agora quem quisesse podia referir acusação dos crimes que houvesse de todas as ações de Zé Bebelo seus motivos e propor condena Rés o que começasse quem O Hermógenes limpou a goela De primeira entrada eu vinha sabendo esse Hermógenes precisava de muitas vinganças Ele era sujeito vindo saindo de brejos pedras e cachoeiras homem toda cruzado De uns assim tudo o que escapa vai em retinge de medo ou de ódio Observei digo ao senhor Carece de não se perder sempre o vezo da cara do outro os olhos Advertido que pensei e se eu puxasse meu revól ver berrasse fogo nele Se acabava um Hermógenes estava ali são no vão e num átimo se via era papas de sangue ele voltava para o inferno Que era que me acontecia Eu tomava castigo mortal de mão de todos Deixasse que tomasse Medo não tive Só que a idéia boa passou muito fraca por mim entrada por saída Fiquei foi querendo ouvir e ver o que vinha mais Demarcava que iam acontecendo grandes fatos Desde Diadorim conseguindo caminho por entre o povo aí chegou se encostou em mim tão junto mesmo sem conversar mas respirava como João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 368 era com a boca tão cheirosa Háde haja o Hermógenes tinha levantado para falar Acusação que a gente acha é que se devia de amarrar este cujo feito porco O sangrante Ou então botar atravessado no chão a gente todos passava a cavalo por riba dele a ver se vida sobrava para não sobrar Quá Zé Bebelo debicou esticando o pescoço e batendo com a cabeça para diante diversas vezes feito picapau em seu oficio em árvore Mas o Hermógenes com aquilo não somou foi pondo Cachorro que é bom para a forca O tanto que ninguém não provocou não era inimigo nosso não se buliu com ele Assaz que veio por si para matar para arrasar com sobejidão de cacundeiros Dele é este Norte Veio a pago do Governo Mais cachorro que os soldados mesmos Merece ter vida não Acuso é isto acusação de morte O diacho cão Ih Arre foi o que Zé Bebelo ponteou Assim contracenando todo o tempo medo do Hermógenes remedou de feias caretas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 369 É o que eu acho É o que eu acho O Hermógenes então quase gritou por terminar Sujeito que é um tralha Posso dar uma resposta Chefe Zé Bebelo perguntou sério a joca Ramiro Joca Ramiro concedeu Mas para falar careço que não me deixem com as mãos amarradas Nisso não havendo razão ou dúvida E Joca Ramiro deu ordem João Frio que de perto dele não se apartava veio de lá cortou e desatou a manupeia nas juntas dos pulsos Que era que Zé Bebelo ia poder fazer Isto Pr aqui mais pr aqui por este mais este cotovelo disse batendo mão e mão com o acionado de desplante E riu chiou feito um sõim o caretejo Parecia mesmo querer fazer raiva no outro em vez de tomar cautela Vi que tudo era enfinta mas podia dar em mal O Hermógenes pulou passo fez menção de reluzir faca Se teve mão em si foi por forte costume E Joca Ramiro também tinha atalhado com uma aspação Tento e paz compadre manovelho Não vê que ele ainda está é azuretado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 370 Ei Com seu respeito discordo Chefe maximé Zé Bebelo falou Retenho que estou frio em juízo legal raciocínios Reajo é com protesto Rompo embargos Porque acusação tem de ser em sensatas palavras não é com afrontas de ofensa de insulto Encarou o Hermógenes Homem não abusa homem Não alarga a voz Mas o Hermógenes arriçado crível que estivesse todo no poder bravo de uma coceira falou para Joca Ramiro e para todos que estávamos lá falou numa voz rachada em duas voz torta entortada Tibes trapo o desgraçado desse canalha que me agravou Me agravou mesmo estando assim vencido nosso e preso Meu direito é acabar com ele Chefe Vi a mão do perigo Muitos homens resmungaram em aprovo ali rodeando os tantos dez ou vinte círculos anéis de gente Rentes os do bando do Hermógenes chegaram a dar altas palavras de calca pá Questionouse a respeito disso Tinham barulhos na voz Mesmo os chefes entre si cochicharam Mas Joca Ramiro sabia represar os excessos Joca Ramiro era mesmo o tutumumbuca grande maioral Temperou somente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 371 Mas ele não falou o nomedamãe amigo E era verdade Todo o mundo concordou pelo que vi de todos Só para o nomedamãe ou de ladrão era que não havia remédio por ser a ofensa grave Com Joca Ramiro explicar assim não havia jagunço que não aceitasse o razoável da ponderação o relembrado O Hermógenes mesmo se melou na atrapalhação das ligeirezas e aí tinha de condizer Nada ele não disse mas abriu quadrada a boca em careta de quem provou pedra de sal E Zé Bebelo mesmo aproveitou para mudar o aspecto para uma certa circunspecção Se via que ele pensava a curto ganho no estreito por detrás daquele sonsar Trabalho de idéia em aperto pelo pão de salvar sua vida da estrosca Imediato Joca Ramiro deu a vez a Só Candelário não deixando frouxura de tempo para mais motim Hê e você compadre Qual é a acu sação que se tem Sobre o que sobreveio Só Candelário arre avante aos priscos a figura muita o gibão desombrado Sobrava fala Com efeito Com efeito falou Vai vai forteou mais a voz Só quero pergunta se ele convérn em nós dois resolvermos isto à faca Pergunto para briga de duelo É o que acho Carece mais de discussão não Zé Bebelo e eu nós dois na faca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 372 Só Candelário mais longe não conseguia de dizer só repetia aquilo desafio e no mais se mexer feito com sãoguido ou escaravelho Sem raiva quase nenhuma notei mas também sem nenhuma paciência Só Candelário sendo assim Mas aí Joca Ramiro remediou dizendo resistencioso e escondeu o de que ria Resultado e condena a gente deixa para o fim compadre Demore que logo vai ver Agora é a acusação das culpas Que crimes o compadre indica neste homem Crime Crime não vejo É o que acho por mim é o que declaró com a opinião dos outros não me assopro Que crime Veio guerrear como nós também Perdeu pronto A gente não é jagunços A pois jagunço com jagunço aos peitos papos Isso é crime Perdeu rachou feito umbuzeiro que boi comeu por metade Mas brigou valente mereceu Crime que sei é fazer traição ser ladrão de cavalos ou de gado não cumprir a palavra Sempre eu cumpro a palavra dada gritou de lá Zé Bebelo Só Candelário olhou encarado para ele rente repente como se nos instantes antes não soubesse que ele estava ali a três passos Só assim mesmo prosseguiu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 373 Pois sendo assim o que acho é que se deve de tornar a soltar este homem com o compromisso de ir ajuntar outra vez seu pessoal dele e voltar aqui no Norte para a guerra poder continuar mais perfeita diversificada Ressaltados os homens ouvindo isso rosnaram de bem cá e lá coragem sempre agradava Diadorim apertou meu braço como sussurrou Doideira dele Riobaldo Só Candelário está doido varrido Aí podia ser Mas eu tinha relanceado um afio de onde ódio que ele mirou no Her mógenes enquanto falando e entendi Só Candelário não gostava do Hermógenes Sendo que ele podia até nem saber disso não ter noção firme de que não gostava mas era a maior verdade Sucinto só por conta disso eu apreciei demais aquele rompante Só Candelário esbarrou de falar secado Só aos bufos surdo de se ver que ele tinha feito o grande esforço todo sopitante Se afundava para os altos Apraz ao senhor compadre Ricardão Joca Ramiro solicitou passando a vez Aquele retardou tanto para começar a dizer que pensei fosse ficar para sempre calado Ele era o famoso Ricardão o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 374 homem das beiras do Verde Pequeno Amigo acorçoado de importantes políticos e dono de muitas posses Composto homem volumoso de meças Se gordo próprio não era isso só por no sertão não se ver nenhum homem gordo Mas um não podia deixar de se admirar do peso de tanta corpulência a coisa de zebu guzerate As carnes socadas em si parecia que ele comesse muito mais do que todo o mundo mais feijão fubá de milho mais arroz e farofa tudo imprensado calcado sacas e sacas Afinal ele falou fosse o Almirante Balão Compadre Joca Ramiro o senhor é o chefe O que a gente viu o senhor vê o que a gente sabe o senhor sabe Nem carecia que cada um desse opinião mas o senhor quer ceder alar de prezar a palavra de todos e a gente recebe essa boa prova Ao que agradecemos como devido Agora eu sirvo a razão de meu compadre Hermógenes que este homem Zé Bebelo veio caçar a gente no Norte sertão como mandadeiro de políticos e do Governo se diz até que a soldo A que perdeu perdeu mas deu muita lida prejuízos Sérios perigos em que estivemos o senhor sabe bem compadre Chefe Dou a conta dos companheiros nossos que ele matou que eles mataram Isso se pode repor E os que ficaram inutilizados feridos tantos e tantos Sangue e os sofrimentos desses clamam Agora que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 375 vencemos chegou a hora dessa vingança de desforra A ver fosse ele que vencesse e nós não onde era que uma hora destas a gente estava Tristes mortos todos ou presos mandados em ferros para o quartel da Diamantina para muitas cadeias para a capital do Estado Nós todos até o senhor mesmo sei lá Encareço chefe A gente não tem cadeia tem outro despacho não que dar a este só um é a misericórdia duma boa bala de metebucha e a arte está acabada e acertada Assim que veio não sabia que o fim mais fácil é esse Com os outros não se fez Lei de jagunço é o momento o menos luxos Relembro também que a responsabilidade nossa está valendo respeitante ao seo Sul de Oliveira doutor Mirabô de Melo o velho Nico Estácio compadre Nhô Lajes e coronel Caetano Cordeiro Esses estão agüentando acossamento do Governo tiveram de sair de suas terras e fazendas no que produziram uma grande quebra vai tudo na mesma desordem A pois em nome deles mesmo eu sou deste parecer A condena seja sem tardança Zé Bebelo mesmo zureta sem responsabilidade nenhuma verte pemba perigoso A condena que vale legal é um tiro de arma Aqui chefe eu voto A babas do que ele vinha falando o povaréu jagunço movia que louvava confirmava Aí nhães pelos que davam mais João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 376 demonstração medi quantidade dos que eram do Ricardão próprio Zé Bebelo estava definito eu pensei qualquer rumorzinho de salvação para ele se mermando se no mel no pra passar Mire e veja o senhor e o pior de tudo era que eu mesmo tinha de achar correto o razoado do Ricardão reconhecer a verdade daquelas palavras relatadas Isso achei meio me entristeci Por quê O justo que era aquilo estava certo Mas de outros modos que bem não sei não estava Assim por curta idéia que eu queira dividir certo no que Zé Bebelo tinha feito mas errado no que Zé Bebelo era e não era Quem sabe direito o que uma pessoa é Antes sendo julgamento é sempre defeituoso porque o que a gente julga é o passado Eh bê Mas para o escriturado da vida o julgar não se dispensa carece Só que uns peixes tem que nadam rioarriba da barra às cabeceiras Lei é lei Loas Quem julga já morreu Viver é muito perigoso mesmo Nisso Joca Ramiro já tinha transferido a mão de fala a Titão Passos esse era como um filho de Joca Ramiro estava com ele nos segredos simples da amizade Abri ouvidos Idéia me veio que ia valer vivo o que ele falasse Aí foi João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 377 Ao que aprecio também Chefe a distinção minha desta ocasião de dar meu voto Não estou contra a razão de companheiro nenhum nem por contestar Mas eu cá sei de toda consciência que tenho a responsabilidade Sei que estou como debaixo de juramento sei porque de jurado já servi uma vez no júri da Januária Sem querer ofender ninguém vou afiançando O que eu acho é que é o seguinte que este homem não tem crime constável Pode ter crime para o Governo para delegado e juizdedireito para tenente de soldados Mas a gente é sertanejos ou não é sertanejos Ele quis vir guerrear veio achou guerreiros Nós não somos gente de guerra Agora ele escopou e perdeu está aqui debaixo de julgamento A bem se na hora a quente a gente tivesse falado fogo nele e matado aí estava certo estava feito Mas o refrego de tudo já se passou Então isto aqui é matadouro ou talho Ah eu não Matar não Suas licenças Coração meu recomprei com as palavras de Titão Passos Homem em regra capaz de mim Cacei jeito de sorrir para ele aprovei com a cabeça não sei se ele me viu E mais não houve rebuliço Só que notei estopim os homens ficando diferentes Agora tomavam mais ânsia de saber o que era que iam decidir os manantas O pessoal próprio de Titão Passos era que formavam João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 378 o bando menor de todos Mas gente muito valente Valentes como aquele bom chefe De que bando eu sou comigo pensei Vi que de nenhum Mas dali por diante eu queria encostar direto com as ordens de Titão Passos Ele é meu amigo Diadorim no meu ouvido falou Ele é bisneto de Pedro Cardoso trasneto de Maria da Cruz Mas eu nem tive surto de perguntar a Diadorim o resumo do que ele pensasse loca Ramiro agora queria o voto de João Goanhá o derradeiro falante que rente dificultava João Goanhá fez que ia levantar mas permaneceu agachado mesmo Resto que retardou um pouco no dizer e o que disse que digo Eu cá ché eu estou plo qu o ché pro fim expedir Mas não é bem o caso compadre João Vocês dão o voto cada um Carece de dar foi o que Joca Ramiro explicou mais A tanto João Goanhá se levantou espanou com os dedos no nariz Daí pegou e repuxou seu canhão de cada manga Arrumou a cintura com as armas num propósito de decisão Que ouvi um tlim moveu meus olhos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 379 Antão pois antão ele referiu forte meu voto é com o compadre Só Candelário e com meu amigo Titão Passos cada com cada Tem crime não Matar não Eh diá Rezo que ele falou aquilo aquele capiau peludo renasceu minha alegria Rezo que falou grosso como se fosse por um destaque de guerra De ripipe espiei o Hermógenes esse preteou de raiva O Ricardão não acabava de cochilar cara grande de sapo O Ricardão no exatamente era quem mandava no Hermógenes Cochilava fingido eu sabia E agora Que é que tinha mais de ter Não estava tudo por bem em bem terminado Ah não o senhor mire e veja Assim Joca Ramiro era homem de nenhuma pressa Se abanava com o chapéu Ao em uma soberania sem manha de arrocho perpasseou os olhos na roda do povo Antante disse alto Que tenha algum dos meus filhos com necessidade de palavra para defesa ou acusação que pode depor Tinha Não tinha Todo o mundo se olhava num desconcerto como quem diz lá cada um com a cara atrás da sela Para falar ali não estavam Por isso nem ninguém tinha esperado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 380 Com tanto uns fatos extraordinários Haja veja que Joca Ramiro repetiu o perguntar Que por aí no meio de meus cabras valentes se terá algum que queira falar por acusação ou para defesa de Zé Bebelo dar alguma palavra em favor dele Que pode abrir a boca sem vexame nenhum Artes o advogo aí é que vi Alguém quisesse Duvidei foi o que foi Digo ao senhor estando por ali para mais de uns quinhentos homens se não minto Surgiu o silêncio deles todos Aquele silêncio que pior que uma alarida Mas por que não davam brados não falavam todos total de torna vez para Zé Bebelo ser botado solto me enfezei Sus pensei com um empurrão de força em mim Ali naquelhorinha meu senhor foi que eu lambi idéia de como às vezes devia de ser bom ter grande poder de mandar em todos fazer a massa do mundo rodar e cumprir os desejos bons da gente De sim sim pingo Acho que eu tinha suor nas beiras da testa Ou então eu quis ou então que se armasse ali mesmo rixa feia metade do povo para lá metade para cá uns punindo pelo bem da justiça os outros nas voltas da cauda do demo Mas que facae fogo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 381 houvesse e braços de homens até resultar em montes de mortos e pureza de paz Sal que eu comi só Abre que ah outra vez Joca Ramiro reproduziu a pergunta Que se tiver algum e isto e aquilo tudo o mais Me armei dum repente Me o meu Eu agora ia falar por que era que não falava Aprumei corpo Ah mas não acertei em primeiro um outro começou Um Gu certo papaabóbora beiradeiro tarraco mas da cara comprida esse discorreu Com vossas licenças chefe cedo minha rasa opinião Que é se vossas ordens forem de se soltar esse Zé Bebelo isso produz bem Oséquio feito que se faz vem a servir à gente mais tarde em alguma necessidade que o caso for Não ajunto por mim observo é pelos chefes mesmo com esta vênia A gente é braço darmas para o risco de todo dia para tudo o miúdo do que vem no ar Mas se alguma outra ocasião depois que Deus nem consinta algum chefe nosso cair preso em mão de tenente de meganhas então também hão de ser tratados com maior compostura sem sofrer vergonhas e maldades A guerra fica sendo de bemcriação bom estatuto Aquilo era razoável A ver tinha saído tão fácil até Joca Ramiro em passagens animou o Gu com acenos Tomei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 382 coragem mais comum Abri a minha boca AI mas um outro campou ligeiro tomou a mão para falar Era um denominado Dosno ou Dosmo groteiro de terras do Cateriangongo entre o Ribeirão Formoso e a Serra Escura e ele tinha olhos muito incertos e vesgava Que era que podia guardar para dizer um ho mem desses capiau medido por todos os capiaus do meu Norte Escutei Tomém pego licença sós chefes Em que pior não veja destorcendo meu desatino Éque éque Que eu acho que seja melhor em antes de se remitir ou de se cumprir esse homem pois bem indagar de fazer ele dizer ondé que estão a fortuna dele em cobre A mó que se diz que ele possederá o bom dinheiro em quantia amoitado por aí É só por mim é só com vosso perdão Com vosso perdão Riram uns por que é que riram rissem Dei como um passo adiante levantei mão e estalei dedo feito menino em escola Comecei a falar Diadorim ainda experimentou de me reter decerto assustado Espera Riobaldo tive o siso da voz dele no ouvido Aí eu já tinha principiado O que eu acho disse supri neste mais menos fraseado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 383 Dê licença grande chefe nosso Joca Ramiro que licença eu peço O que tenho é uma verdade forte para dizer que calado não posso ficar Digo ao senhor que eu mesmo notei que estava falando alto demais mas de me abrandar não tinha prazo nem jeito eu já tinha começado Coração bruto batente por debaixo de tudo Senti outro fogo no meu rosto o salteio de que todos a finque me olhavam Então eu não aceitei niw guém o que eu não queria era ver o Hermógenes Não pôr as capas dos olhos nem a idéia no Hermógenes que Hermógenes nenhum neste mundo não tivesse nenhum para mim nenhum de si Por isso prendi minhas vistas só num homem um que foi o qualquer sem nem escolha minha e porque estava bem por minha frente um pardo Pobre esse notando que recebia tanto olhar abaixou a cara amassado de não poder outra coisa No eu falando Eu conheço este homem bem Zé Bebelo Estive do lado dele nunca menti que não estive todos aqui sabem Saí de lá meio fugido Saí porque quis e vim guerrear aqui com as ordens destes famosos chefes vós Da banda de cá foi que briguei e dei mão leal com meu cano e meu gatilho Mas agora eu afirmo Zé Bebelo é homem valente de bem e inteiro que honra o raio da palavra que dá Aí E é chefe jagunço de primei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 384 ra sem ter ruindades em cabimento nem matar os inimigos que prende nem consentir de com eles se judiar Isto afirmo Vi Testemunhei Por tanto que digo ele merece um absolvido escorreito mesmo não merece de morrer matado àtoa E isto digo porque de dizer eu tinha como dever que sei e cumprindo a licença dada por meu grande chefe nosso Joca Ramiro e por meu cabochefe Titão Passos Tirei fôlego de fôlego latejei Sei que me desconheci Suspendi do que estava A guerra foi grande durou tempo que durou encheu este sertão Nela todo o mundo vai falar pelo Norte dos Nortes em Minas e na Bahia toda constantes anos até em outras partes Vão fazer cantigas relatando as tantas façanhas Pois então xente hão de se dizer que aqui na SempreVerde vieram se reunir os chefes todos de bandos com seu cabras valentes montoeira completa e com o sobregoverno de Joca Ramiro só para no fim fim se acabar com um homenzinho sozinho se condenar de matar Zé Bebelo o quanto fosse um boi de corte Um fato assim é honra Ou é vergonha Para mim é vergonha o que em brilhos ouvi e quem falou assim foi Titão Passos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 385 Vergonha Raios diabos que vergonha é Estrumes A vergonha danada raios danados que seja assim e quem gritou isto a mais foi Só Candelário Tudo tão aos traques derepente não sei eu nem acabei o relance que me arrepiou minha idéia que eu tinha feito grande toleima que decerto ia ser para piorar o que foi no eu dizer que Zé Bebelo não matava os presos porque se do nosso lado se matava então não iam gostar de escutar aquilo de mim que podia parecer forte reprovação Aos brados bramados de Sô Candelário temi perder a vez de tudo falar Aí nem olhei para Joca Ramiro eu achasse ligeiro demais que Joca Ramiro não estava aprovando meu saimento Aí porque nem não tive tempo porque imediato senti que tinha de completar o meu assim A ver Mas se a gente der condena de absolvido soltar este homem Zé Bebelo a mãvazias punido só pela derrota que levou então eu acho é fama grande Fama de glória que primeiro vencemos e depois soltamos em tanto terminei de pensar que meu receio era tolo que jagunço pelo que é quase que nunca pensa em reto eles podiam achar normal que da banda de cá os inimigos presos a gente matasse João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 386 mas apreciavam também que Zé Bebelo como contrário tivesse deixado em vida os companheiros nossos presos Gente airada Seja fama de glória Só o que sei Chagas de Cristo eta Só Candelário tornou a atalhar Desadorouse Senhor de bofe bruto sapateou de arrompe os de perto se afastando depressa por a ele darem espaço Agora o Hermógenes havia de alguma coisa dizer O Hermógenes experimentava os dentes nos beiços Ricardão fazia que cochilava Só Candelário era de se temer inteiro Somente que em vez do trestampo que a gente esperasse e que ninguém bridava ele Só Candelário espiou para cima às pasmas consoante sossegado estúrdio recitou assim em tom a bonita voz de espírito Seja a fama de glória Todo o mundo vai falar nisso por muitos anos louvando a honra da gente por muitas partes e lugares Hão de botar verso em feira assunto de sair até divulgado em jornal de cidade Ele estava mandarino mesmo Aí eu pensei eu achei Não Eu disse Disse o verdadeiro o ligeiro o de não se esperar para dizer E que perigo que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 387 tem Se ele der a palavra de nunca mais tornar a vir guerrear com a gente decerto cumpre Ele mesmo não há de querer tornar a vir É o justo Melhor é se ele der a palavra de que vaisembora do Estado para bem longe em desde que não fique em terras daqui nem da Bahia eu disse disse mansinho mãe mansice caminhos de cobra Tenho uns parentes meus em Goiás Zé Bebelo falou avindado de repente E falou quando não se aguardava e também assim com tanta vontade de falar que alguns muito se riram Eu não ri Tomei uma respiração e aí vi que eu tinha terminado Isto é que comecei a temer Num esfrio num átimo me vesti de pavor O que olhei Joca Ramiro teria estado a gestos Joca Ramiro fazendo um gesto então queria que eu calasse absolutamente a boca eu não possuía vênia para discorrer no que para mim não era de minha alta conta Eu quis de repentemente tornar a ficar nenhum ninguém safado humildezinho Mas Titão Passos trucou senhormoço Titão Passos levantava a testa Ele que no normal falava tão pouco pudesse dar capacidade de tantas constâncias João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 388 Titão Passos disse Então ele indo para bem longe está punido desterrado É o que eu voto por justo Crime maior ele teve Pelos companheiros nossos que morreram ou estão ofendidos passando mal tenho muito dó Só Candelário disse Mas morrer em combate é coisa trivial nossa para que é que a gente é jagunço Quem vai em caça perde o que não acha Titão Passos disse E mortes tantas isso não é culpa de chefe nenhum Digo E mais que esses grandes de nossa amizade doutor Mirabô de Melo coronel Caetano e os outros hão de concordar com a resolução que a gente tome em desde que seja boa e de bom proveito geral É o que eu acho Chefe Às ordens Titão Passos terminou O silêncio todo era de Joca Ramiro Era de Zé Bebelo e de Joca Ramiro Ninguém não reparava mais em mim não apontavam o eu ter falado o forte solene o terrivelmente e então agora para todos os de lá eu não existisse mais existido Só Diadorim que quase me abraçava Riobaldo tu disse bem Tu é homem de todas valentas Mas os outros perto de mim por que era que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 389 não me davam louvor com as palavras Gostei de ver Tatarana Assim é que é assim Só que eu tinha pronunciado bem Diadorim mais me disse e que tinha sido menos por minhas tantas palavras do que pelo rompante brabo com que falei acendido exportando uma espécie de autoridade que em mim veio E para Zé Bebelo eu não tinha olhado Que era que ele de mim devia de estar pensando E Joca Ramiro Esses se fronteavam um ao outro e o em meio se mediam Rente que nesse resto de tempo decerto cruzaram palavras que não deram para eu ouvir Pois porque Zé Bebelo teve ordem de falar devia de ter tido A licença Principiou Foi discorrendo vagaroso de entremeado coisa sem coisa Vi e vi ele estava só apalpando o vau Sujeito finório Aí o qualquer zunzo que houvesse ele colhia e entendia no ar estava com as orelhas por isso aquela cabeça sobrenadando Já um pouco descabelado Mas serenou sota para diante Altas artes que agradeço senhor chefe Joca Ramiro este sincero julgamento esta bizarria Agradeço sem tremor de medo nenhum nem agências de adulação Eu José Zé Bebelo é meu nome José Rebelo Adro Antunes Tataravô meu Francisco Vizeu Antunes foi capitãodecavalos Demarco idade de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 390 quarentaeum anos sou filho legitimado de José Ribamar Pacheco Antunes e Maria Deolinda Rebelo e nasci na bondosa vila mateira do Carmo da Confusão Oragos Para que a tanta sensaboria toda essas filosofias Mas porém ele pronunciava com brio sem as papeatas de em antes sem o remonstrar nem os reviretes Agradeço os que por mim bem falaram e puniram Vou depor Vim para o Norte pois vim com guerra e gastos à frente de meus homens minha guerra Sou crescido valente contra homens valentes quis dar o combate Não está certo Meu exemplo em nomes foram estes Joca Ramiro Joãozinho Bem Bem Só Candelário e tantos outros afamados chefes uns aqui presentes outros que não estão Briguei muito mediano não obrei injustiça nem ruindades nenhumas nunca disso me reprovam Desfaço de covardes e de biltragem Tenho nada ou pouco com o Governo não nasci gostando de soldados Coisa que eu queria era proclamar outro governo mas com a ajuda depois de vós também Estou vendo que a gente só brigou por um malentendido maximé Não obedeço ordens de chefes políticos Se eu alcançasse entrava para a política mas pedia ao grande Joca Ramiro que encaminhasse seus brabos cabras para João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 391 votarem em mim para deputado Ah este Norte em remanência progresso forte fartura para todos a alegria nacional Mas no em mesmo o afã de política eu tive e não tenho mais A gente tem de sair do sertão Mas só se sai do sertão é tomando conta dele a dentro Agora perdi Estou preso Mudei para adiante Perdi isto é por culpa de máhora de sorte o que não creio Altos descuidos alheios De ter sido guardado prisioneiro vivo e estar defronte de julgamento isto é que eu louvo e que me praz Prova de que vós nossos jagunços do Norte são civilizados de calibre que não matam com o distrair de mão um qualquer inimigo pegado Isto aqui não são essas estrebarias Estou a cobro de desordens malinas Estimei Dou viva Joca Ramiro seus outros chefes comandantes de seus terços E viva sua valente jagunçada Mas homem sou Sou de altas cortesias Só que medo não tenho nunca tive no travável Anda que fez um gesto bonito Assaz aí se espiritou Ao que de vez foi grandeúdo Uê vim guerrear de peito aberto com estrondos Não vim socolor de disfarces com escondidos e logro Perdi por um desguardo Não por má chefia minha Não devia de ter querido contra Joca Ramiro dar combate não deviade Não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 392 confesso culpa nem retrauta porque minha regra é tudo que fiz valeu por bem feito É meu consueto Mas hoje sei não devia de Isto é depende da sentença que vou ter neste nobre julga mento Julgamento digo que com arma ainda na mão pedi e que deste grande Joca Ramiro mereci de sua alta fidalguia Julgamento isto é o que a gente tem de sempre pedir Para quê Para não se ter medo É o que comigo é Careci deste julgamento só por verem que não tenho medo Se a condena for às ásperas com a minha coragem me amparo Agora se eu receber sentença salva com minha coragem vos agradeço Perdão pedir não peço que eu acho que quem pede para escapar com vida merece é meiavida e dobro de morte Mas agradeço fortemente Também não posso me oferecer de servir debaixo darmas de Joca Ramiro porque tanto era honra mas não condizia bem Mas minha palavra dando minha palavra as mil vezes cumpro Zé Bebelo nunca roeu nem torceu E sem mais por dizer espero vossa distinta sentença Chefe Chefes Digo ao senhor foi um momento movimentado Zé Bebelo acabando nas palavras ali sentadinho ficou repequeno pequenininho encolhido ao mais Já um pouco descabelado Era uma bolinha de gente Fechouse um homem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 393 Olhei olhei Só a gente mal ouvisse o sussurro de todos lá que foi bom conheci que era O sujeito machacá Assopres Arre maluco é mas frege Capaz que castra garrote com as unhas dos dedos Não o que Diadorim não disse mas ele estava assim por pálido Vai vi os chefes Eles conversaram um circuitozinho ligeiro O Hermógenes e o Ricardão e Joca Ramiro para eles sorriu seus compadres O Ricardão e o Hermógenes eles dois eram chouriço e morcela Só Candelário conforme seus conformes avançanteJoca Ramirosorriu para Só Candelário O jeito de João Goanhá richarte Só Titão Passos espiava desolhadamente ele tão aposto homem tão bom tão sério com as mãos ajuntadas baixo em frente da barriga só esperava o nada virar coisas Acontecesse o que Joca Ramiro ia decidir Sobre o simples o Hermógenes ainda ia se debruçar para um dizer em orelha Mas Joca Ramiro encurtou tudo num gesto Era a hora O poder dele veio distribuído endireito em Zé Bebelo O quando falou O julgamento é meu sentença que dou vale em todo este norte Meu povo me honra Sou amigo dos meus amigos políticos mas não sou criado deles nem cacundeiro A sentença vale A decisão O senhor reconhece João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 394 Reconheço Zé Bebelo aprovou com firmeza de voz ele já descabelado demais Se fez que as três vezes até Reconheço Reconheço Reconheço estreques estalos de gatilho e pinguelo o que se diz essas detonações Bem Se eu consentir o senhor irse embora para Goiás o senhor põe a palavra e vai Zé Bebelo demorou resposta Mas foi só minutozinho E pois A palavra e vou Chefe Só solicito que o senhor determine minha ida em modo correto como compertence A falando Que se ainda tiver homens meus vivos presos também por aí que tenham ordem de soltura ou licença de vir comigo igualmente Ao que Joca Ramiro disse Topo Topo E que tendo nenhum eu viaje daqui sem vigia nenhuma nem guarda mas o senhor me fornecendo animalde sela arreado e as minhas armas ou boas outras com alguma munição mais o decomer para os três dias legal João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 395 Ao que aí Joca Ramiro assim três vezes Topo Topo Então honrado vou Mas agora com sua licença a pergunta faço pelo quanto tempo eu tenho de estipular sem voltar neste Estado nem na Bahia Por uns dois três anos Até enquanto eu vivo for ou não der contraordem Joca Ramiro ai disse em final E se levantou num de repente Ah quando ele levantava puxava as coisas consigo parecia as pessoas o chão as árvores desencontradas E todos também ao em um tempo feito um boi só ou um gado em círculos ou um relincho de cavalo Levantaram campo Reinou zoeira de alegria todo o mundo já estava com cansaço de dar julgamento e se tinha alguma certa fome Diadorim me chamou fomos caminhando no meio da queleléia do povo Mesmo eu vi o Hermógenes ele se amargou engolindo de boca fechada Diadorim eu disse esse Hermógenes está em verde nas portas da inveja Mas Diadorim por certo não me ouviu bem pelo que começou dizendo Deus é servido Não sosseguei Aquele pessoal tribuzava O encarregado da SempreVerde abriu cozinha panelas grandes e caldeirões cozinhando de tudo o que vale a valer Tinha sempre algum batendo mãodepilão Digo não por João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 396 nada não mas pelo exato ser eu tinha estalando nos meus olhos a lembrança do Hermógenes na hora do julgamento De como primeiro ele soturno não se sobressaía só escancarava muito as pernas facãozão na mão mas depois ficou artimanhado com uma tristeza fechada aos cantos como cão que consome raivas E o Ricardão Esse uma pesadureza na cara toda mas quando esbarrou de cochilar aqueles olhos grossos rebolando que nem apostemados sem bom preceito Assente enfim tudo estava passado terminado Estava Pois pedi espera a Diadorim na beira do rego eu queria cuidar do meu cavalo dissesse desarrear e escovar Dei com o Hermógenes Dito a bem eu cacei onde estava o Hermógenes tempo parei perto dele Virando que eu quis ir lá e escutar quase quis Um dizer ouvi Mamãezada Ao que seria O Hermógenes não era nenhum toleimado para desfazer na decisão de Joca Ramiro MamãezadaMais não ouvi relembro que não sei direito Com pouco Zé Bebelo estava dando as despedidas Se viu montado num bom cavalo de duas cores arreado com sela boa de Minas Velhas Deram que levasse carabina suas outras armas e cruz cruz cartucheiras Aí já tinha jantado E o bornal com matlotagem Sobre o cavalo se houve se upou na sela Se foi Saiu em marcha de estrada sem olhar para trás o sol na beira João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 397 Só o Triol devia de prestar acompanhamento a ele por o uso de resguardado território de uma légua Me deu certa tristeza Mas a minha satisfação ainda era maior Daí estávamos todos pegando o que comer que eram essas grandes abundâncias Angu e couve abóboramoranga cozida torresmos e em toda fogueira assavam mantas de carnes Quem quisesse sopa era só ir se aquinhoar na portada cozinha A quantidade de pratos era que faltava E assaz muita cachaça se tomou que Joca Ramiro mandou satisfazer goles a todos extraordinária de boa O senhor havia de gostar de ver aquela ajuntação de povo as coisas que falavam e faziam o jeito como podiam se rir na vadiação todos bem comidos entalagados Daí escureceu Homens deitados no chão escornados até quase debaixo do mijo dos cavalos pastantes Eu estava que impava queria um bom sono A ver fui com Dia dorim para o rumo dos pés de fruta seguindo o rego Com a entrada da noite o passar da água canta friinho permeio engrossa e a gente aprecia o cheiro do musguz das árvores Zé Bebelo tinha ido embora para sempre no cavalo de duas cores fez pouca poeira Nós estávamos no jaz ali repimpados enfunando as redes Disso não esqueço Não esqueço A gente estava desagasalhados na alegria feito meninos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 398 Eu tinha vindo para ali para o sertão do Norte como todos uma hora vêm Eu tinha vindo quase sem mesmo notar que vinha mas presado precisão de agenciar um resto melhor para a minha vida Agora me expulsassem Do jeito isto é tinham repelido para trás Zé Bebelo Não me esqueci daquelas palavras dele que agora era o mundo à revelia Disse a Diadorim Mas Diadorim menos me respondeu Ao dar que falou Riobaldo você prezava de ir viver nOsPorcos que lá é bonito sempre com as estrelas tão reluzidas Dei que sim Como ia querer dizer diferente pois lá nOsPorcos não era a terra de Diadorim própria lugar dele de crescimento Mas mesmo enquanto que essas palavras eu pensasse que Diadorim podia ter me respondido assim nestas fações Mundo à revelia Mas Riobaldo desse jeito mesmo é que o mundo sempre esteve Toleima sei bobéia disso a basba do basbaque Que eu dizia e pensava numa coisa mas Diadorim recruzava com outras Zé Bebelo Diadorim que é que você achou daquele homem ainda indaguei Para ele de agora não tem dia nem noite vai seu rumo fazendo a viagem Teve sorte Entestou foi com Joca Ramiro com sua alta bondade foi o que Diadorim me respondeu E ficou pensando ficamos Aí quando eu acabei até à pontinha meu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 399 cigarro ainda perguntei A ver quem salvou Zé Bebelo da morte Diadorim o que quis me dizer foi em tanto segredo que ele puxou a beira da minha rede para a gente falar quase cara a cara Ah quem salvou Zé Bebelo de morte Pois abaixo de Joca Ramiro por começar foi ele Zé Bebelo mesmo Depois numa ponta do dito de Zé Bebelo tomou figura Só Candelário homem esquipático e enorme de si mas fiel e que põe mais de trezentas armas Cabras que por um gesto dele avançam e matam e matam Eu queria que ele tivesse explica do o fato de outro jeito Mas Diadorim estava prosseguindo A ser que você viu o Hermógenes e o Ricardão gente estarrecida de iras frias Agora esses me dão receio meu medo Deus não queira Depois ele terminou assim Ao enquanto Joca Ramiro pode precisar da gente você mesmo me prometeu Riobaldo a gente persiste por aqui Prometi outra vez confirmei Desde no sereno da noite não se conversou mais não me recordo Diadorim estava triste na voz Eu também estive Por quê háde o senhor querer saber Por causa de Zé Bebelo ter ido embora e aquilo era motivo Depois de Paracatu é o mundo Zé Bebelo ido sei lá bem porque tirava meu poder de pensar com a idéia em ordem e eu sentia minha barriga demais João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 400 cheia demais de tantas comidas e bebidas Só o que me consolava era ter havido aquele julgamento com a vida e a fama de Zé Bebelo autorizadas O julgamento Digo aquilo para mim foi coisa séria de importante Por isso mesmo é que fiz questão de relatar tudo ao senhor com tanta despesa de tempo e miúcias de palavras O que nem foi julgamento legítimo nenhum só uma extração estúrdia e destrambelhada doideira acontecida sem senso neste meio do sertão o senhor dirá Pois por isso mesmo Zé Bebelo não era réu no real Ah mas no centro do sertão o que é doideira às vezes pode ser a razão mais certa e de mais juizo Daquela hora em diante eu cri em Joca Ramiro Por causa de Zé Bebelo Porque Zé Bebelo na hora naquela ocasião estava sendo maior do que pessoa Eu gostava dele do jeito que agora gosto de compadre meu Quelemém gostava por entender no ar Por isso o julgamento tinha dado paz à minha idéia por dizer bem meu coração Dormi adeus disso Como é que eu ia poder ter pressentimento das coisas terríveis que vieram depois conforme o senhor vai ver que já lhe conto Curtamente dali da SempreVerde com um dia mais desapartamos O bando muito grande de jagunços não tem composição de proveito em ocasião normal só serve para chamar soldados e dar atrásamento e desrazoada despesa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 401 Constava que João Goanhá torasse para a Bahia e que o Antenor seguindo rumo em beira do Ramalhada com um punhado dos Hermógenes Novas ordens muitas ordens Alaripe ia vir com Titão Passos Titão Passos chamou a gente Diadorim e eu Se tinha um roteiro sendo para ser o mais encostado possível no São Francisco até para lá do Jequitaí e mais Aquilo por quê A gente não ia junto com Joca Ramiro em caso de lhe a ele podermos valer em caso com maior ajuda mão a mão Ah mas nossa tarefa era de muito encoberto empenho e valor pelo que tínhamos de estanciar em certos lugares com o fito de receber remessas e em acontecer de vigiar algum rompimento de soldados que para o Norte entrassem Arreamos montamos saímos Naquela mesma da hora Joca Ramiro dava partida também de volta para o São João do Paraíso Lá ia ele deveras em seu cavalão branco ginete ladeado por Só Candelário e o Ricardão igual iguais galopavam Saíam os chefes todos assim o desenrolar dos bandos em caracol aos gritos de vozear Ao que reluzia o bem belo Diadorim olhou e fez o sinaldacruz cordial Assim ele me botou a benção foi o que disse Dá sempre tristezas algumas um destravo de grande povo se desmanchar Mas nesse dia mesmo em nossos cavalos tão bons dobramos nove léguas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 402 As nove Com mais dez até à Lagoa do Amargoso E sete para chegar numa cachoeira no Gorutuba E dez arranchando entre QuemQuem e Solidão e muitas idas marchas sertão sempre Sertão é isto o senhor empurra para trás mas de repente ele volta a rodear o senhor dos lados Sertão é quando menos se espera digo Mas saímos saímos Subimos Ao quando um belo dia a gente parava em macias terras agradáveis As muitas águas Os verdes já estavam se gastando Eu tornei a me lembrar daqueles pássaros O marrequim a garrixadobrejo frangosdágua gaivotas O manuelzinhoda croa Diadorim comigo As garças elas em asas O rio des mazelado livre rolador E aí esbarramos parada para demora num campo solteiro em varjaria descoberta pasto de muito gado Lugar perto da Guararavacã do Guaicuí Tapera Nhã nome que chamavase Ali era bom Sossegava Mas tem horas em que me pergunto se melhor não seja a gente tivesse de sair nunca do sertão Ali era bonito sim senhor Não se tinha perigos em vista não se carecia de fazer nada Nós estávamos em vinte e três homens Titão Passos determinou uma esquadrazinha deles com Alaripe em testa fossem para a outra banda do morro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 403 baixada própria da Guararavacã esperar o que não acontecesse Nós ficamos O que por começo corria destino para a gente ali era bondosos dias Madrugar vagaroso vadiado se escutando o grito a mil do pássaro rexenxão que vinham voando aquelas chusmas pretas até brilhantes amanheciam duma restinga de mato e passavam sem necessidade nenhuma a sobre E as malocas de bois e vacas que se levantavam das malhadas de acabar de dormir suspendendo corpo sem rumor nenhum no meioescuro como um açúcar se derretendo no campo Quando não ventava o sol vinha todo forte Todo dia se comia bom peixe novo pescado fácil curimatã ou dourado cozinheiro era o Paspe fazia pirão com fartura e dividia a cachaça alta Também razoável se caçava A vigiação era revezada de irmãos e irmãos nunca faltava tempo para àtoa se permanecer Dormi sestas inteiras por minha vida Gavião dava gritos até o dia muito se esquentar Aí então aquelas fileiras de reses caminhavam para a beira do rio enchiam a praia parados ou refrescavam dentro dágua Às vezes chegavam a nado até em cima duma ilha comprida onde o capim era lindo verdejo O que é de paz cresce por si de ouvir boi berrando à forra me vinha idéia de tudo só ser o passado no futuro Imaginei esses sonhos Me lembrei do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 404 nãosaber E eu não tinha notícia de ninguém de coisa nenhuma deste mundo o senhor pode raciocinar Eu queria uma mulher qualquer Tem trechos em que a vida amolece a gente tanto que até um referver de mau desejo no meio da quebreira serve como beneficio Um dia sem dizer o que a quem montei a cavalo e saí a vão escapado Arte que eu caçava outra gente diferente E marchei duas léguas O mundo estava vazio Boi e boi Boi e boi e campo Eu tocava seguindo por trilhos de vacas Atravessei um ribeirão verde com os umbuzeiros e ingazeiros debruçados e ali era vau de gado Quanto mais ando querendo pessoas parece que entro mais no sozinho do vago foi o que pensei na ocasião De pensar assim me desvalendo Eu tinha culpa de tudo na minha vida e não sabia como não ter Apertou em mim aquela tristeza da pior de todas que é a sem razão de motivo que quando notei que estava com dordecabeça e achei que por certo a tristeza vinha era daquilo isso até me serviu de bom consolo E eu nem sabia mais o montante que queria nem aonde eu extenso ia O tanto assim que até um corguinho que defrontei um riachim àtoa de branquinho olhou para mim e me disse Não e eu tive que obedecer a ele Era para eu não ir mais para diante O riachinho me tomava a benção Apeei O João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 405 bom da vida é para o cavalo que vê capim e come Então deitei baixei o chapéu de tapacara Eu vinha tão afogado Dormi deitado num pelego Quando a gente dorme vira de tudo vira pedras vira flor O que sinto e esforço em dizer ao senhor repondo minhas lembranças não consigo por tanto é que refiro tudo nestas fantasias Mas eu estava dormindo era para reconfirmar minha sorte Hoje sei E sei que em cada virada de campo e debaixo de sombra de cada árvore está dia e noite um diabo que não dá movimento tomando conta Um que é o romãozinho é um diabo menino que corre adiante da gente alumiando com lanterninha em o meio certo do sono Dormi nos ventos Quando acordei não cri tudo o que é bonito é absurdo Deus estável Ouro e prata que Diadorim aparecia ali a uns dois passos de mim me vigiava Sério quieto feito ele mesmo só igual a ele mesmo nesta vida Tinha notado minha idéia de fugir tinha me rastreado me encontrado Não sorriu não falou nada Eu também não falei O calor do dia abrandava Naqueles olhos e tanto de Diadorim o verde mudava sempre como a água de todos os rios em seus lugares ensombrados Aquele verde arenoso mas tão moço tinha muita velhice muita velhice querendo me contar coisas que a idéia da gente não dá para se entender e acho que é por João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 406 isso que a gente morre De Diadorim ter vindo e ficar esbarrado ali esperando meu acordar e me vendo meu dormir era engraçado era para se dar feliz risada Não dei Nem pude nem quis Apanhei foi o silêncio dum sentimento feito um decreto Que você em sua vida toda toda por diante tem de ficar para mim Riobaldo pegado em mim sempre que era como se Diadorim estivesse dizendo Montamos viemos voltando E digo ao senhor como foi que eu gostava de Diadorim que foi que em hora nenhuma vez nenhuma eu nunca tive vontade de rir dele A Guararavacã do Guaicuí o senhor tome nota deste nome Mas não tem mais não encontra de derradeiro ali se chama é Caixeirópolis e dizem que lá agora dá febres Naquele tempo não dava Não me alembro Mas foi nesse lugar no tempo dito que meus destinos foram fechados Será que tem um ponto certo dele a gente não podendo mais voltar para trás Travessia de minha vida Guararavacã o senhor veja o senhor escreva As grandes coisas antes de acontecerem Agora o mundo quer ficar sem sertão Caixeirópolis ouvi dizer Acho qqe nem coisas assim não acontecem mais Se um dia acontecer o mundo se acaba Guararavacã O senhor vá escutando João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 407 Aquele lugar o ar Primeiro fiquei sabendo que gostava de Diadorim de amor mesmo amor mal encoberto em amizade Me a mim foi de repente que aquilo se esclareceu falei comigo Não tive assombro não achei ruim não me reprovei na hora Melhor alembro Eu estava sozinho num repartimento dum rancho rancho velho de tropeiro eu estava deitado numa esteira de taquara Ao perto de mim minhas armas Com aquelas reluzentes nos canos de cuidadas tão bem eu mandava a morte em outros com a distância de tantas braças Como é que dum mesmo jeito se podia mandar o amor O rancho era na borda damata De tarde como estava sendo esfriava um pouco por pejo de vento o que vem da Serra do Espinhaço um vento com todas almas Arrepio que fuxicava as folhagens ali e ia lá adiante longe na baixada do rio balançar esfiapado o pendão branco das canabravas Por lá nas beiras cantava era o joãopo bre pardo banhador Me deu saudade de algum buritizal na ida duma vereda em capim temte que verde termo da chapada Saudades dessas que respondem ao vento saudade dos Gerais O senhor vê o remôo do vento nas palmas dos buritis todos quando é ameaço de tempestade Alguém esquece isso O vento é verde Aí no intervalo o senhor pega o silêncio põe no colo Eu sou donde eu nasci Sou de outros lugares Mas lá na João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 408 Guararavacã eu estava bem O gado ainda pastava meu vizinho cheiro de boi sempre alegria faz Os quemquem aos casais corriam catavam permeio às reses no liso do campo claro Mas nas árvores picapau bate e grita E escutei o barulho vindo do dentro do mato de um macuco sempre solerte Era mês de macuco ainda passear solitário macho e fémea desemparelhados cada um por si E o macuco vinha andando sarandando macucando aquilo ele ciscava no chão feito galinha de casa Eu ri Vigia este Diadorim eu disse pensei que Diadorim estivesse em voz de alcance Ele não estava O macuco me olhou de cabecinha alta Ele tinha vindo quase endireito em mim por pouco entrou no rancho Me olhou rolou os olhos Aquele pássaro procurava o quê Vinha me pôr quebrantos Eu podia dar nele um tiro certeiro Mas retardei Não dei Peguei só num pé de espora joguei no lado donde ele Ele deu um susto trazendo as asas para diante feito quisesse esconder a cabeça cambalhota fosse virar Daí caminhou primeiro até de costas fugiuse entrou outra vez no mato vero foi caçar poleiro para o bom adormecer O nome de Diadorim que eu tinha falado permaneceu em mim Me abracei com ele Mel se sente é todo lambente Diadorim meu amor Como era que eu podia dizer aquilo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 409 Explico ao senhor como se drede fosse para eu não ter vergonha maior o pensamento dele que em mim escorreu figurava diferente um Diadorim assim meio singular por fantasma apartado completo do viver comum desmisturado de todos de todas as outras pessoas como quando a chuva entre ondeoscampos Um Diadorim só para mim Tudo tem seus mistérios Eu não sabia Mas com minha mente eu abraçava com meu corpo aquele Diadorimque não era de verdade Não era A ver que a gente não pode explicar essas coisas Eu devia de ter principiado a pensar nele do jeito de que decerto cobra pensa quando maisolha para um passarinho pegar Mas de dentro de mim uma serepente Aquilo me transformava me fazia crescer dum modo que doía e prazia Aquela hora eu pudesse morrer não me importava O que sei tinha sido o que foi no durar daqueles antes meses de estropelias e guerras no meio de tantos jagunços e quase sem espairecimento nenhum o sentir tinha estado sempre em mim mas amortecido rebuçado Eu tinha gostado em dormência de Diadorim sem mais perceber no fofo dum costume Mas agora manava em hora o claro que rompia re bentava Era e era Sobrestive um momento fechados os olhos sufruía aquilo com outras minhas forças Daí levantei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 410 Levantei por uma precisão de certificar de saber se era firme exato Só o que a gente pode pensar em pé isso é que vale Aí fui até lá na beira dum fogo onde Diadorim estava com o Drumõo o Paspe e Jesualdo Olhei bem para ele de carne e osso eu carecia de olhar até gastar a imagem falsa do outro Diadorim que eu tinha inventado Hê Riobaldo eh uê você carece de alguma coisa ele me perguntou quem mevê com o certo espanto Eu pedi um tição acendi um cigarro Daí voltei para o rancho devagar passos que dava Se é o que é eu pensei eu estou meio perdido Acertei minha idéia eu não podia por lei de rei admitir o extrato daquilo Ia por paz de honra e tenência sacar esquecimento daquilo de mim Se não pudesse não ah mas então eu devia de quebrar o morro acabar comigo com uma bala no lado de minha cabeça eu num átimo punha barra em tudo Ou eu fugia virava longe no mundo pisava nos espaços fazia todas as estradas Rangi nisso consolo que me determinou Ah então eu estava meio salvo Aperrei o nagã precisei de dar um tiro no mato um tiraço que ribombou Ao que foi me gritaram pergunta sempre riam do tiro tolo dado Acho que um macaquinho miúdo que acho que errei eu expendi Tanto também fiz de conta estivesse olhando Diadorim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 411 encarando para duro calado comigo me dizer Nego que gosto de você no mal Gosto mas só como amigo Assaz mesmo me disse De por diante acostumei a me dizer isso sempres vezes quando perto de Diadorim eu estava E eu mes mo acreditei Ah meu senhor como se o obedecer do amor não fosse sempre ao contrário O senhor vê nos Gerais longe nuns lugares encostando o ouvido no chão se escuta barulho de fortes águas que vão rolando debaixo da terra O senhor dorme em sobre um rio Segundo digo o tempo que paramos na Guararavacã do Guaicuí regulou em dois meses Bom ermo De lá a gente cruzou as vizinhanças todas fizemos grande redondeza Todo dia trocávamos recado de avisos com o pessoal do Alaripe Notícia nenhumas Nada não chegava em envio do que fosse para chegar Da outra banda do rio se sucedeu a queima dos campos quando o vento dava para trás trazia as tristes fumaças De noite o morro se esclarecia vermelho asgrava em labaredas e brasas Da banda de cá num rumo daí a obra de duas léguas tinha uma lavourinha de um sujeito ainda moço que era amigo nosso Ah se ele quisesse alugar a mulherzinha dele para a gente bem caros preços que eu pagava assim o que dizia o Paspe suspiroso Mas quem vinha eram os meninos do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 412 lavrador montados num cavalo magro traziam feixes de cana para vender para a gente Às vezes vinham em dois cavalos magros e eram cinco ou seis meninos amontados agarrados uns nos outros uns mesmo não se sabia como podiam de tão mindinhos Esses meninozinhos todos queriam todo o tempo ver nossas armas pediam que a gente desse tiros Diadorim gostava deles pegava um por cada mão até carregava os menor zinhos levava para mostrar a eles os pássaros das ilhas do rio Olha vigia o manuelzinhodatroa já acabou de fazer a muda Um dia em que tínhamos caçado uma paca bem gorda o Paspe pitou de sal um quarto dela enrolou em folhas e deu ao menino mais velho Pra tu leva de presente dá à tua mãe fala que quem mandou fui eu ele recomendou A gente ria Os meninos receavam o gado ali no meio tinha reses muito bravas um dia uma vaca deu corrida em alguém querendo bater Mas depois com o secar de magros e fracos os bois se atolavam no embrejado até morreram alguns Os urubus espaceavam quando o céu empoeirado Pousavam no pindaibal do brejo João Vaqueiro chamava a gente ia desatolar os bois que podia Uns eram mansos por um punhado de sal se chegavam lambiam o chão nos pés da gente João Vaqueiro sabia tudo Chega passava a mão nas tetas de uma vaca capins João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 413 tão bons o senhor crê algumas ainda guardavam leite naqueles peitos A gente carecia era de dar um fogo de sair por aí por combate sensato se dizia Que jagunço amolece quando não padece A quase meiorumo de norte e nascente a quatro léguas de demorado andamento tinha uma venda de roça no começo do cerradão Vendiam licor de banana e de pequi muito forte geléia de mocotó fumo bom marmelada toucinho Sempre só um de nós era que ia lá para não desconfiarem Ia o Jesualdo A gente outorgava a ele o dinheiro cada um encomendava o que queria Diadorim mandou comprar um quilo grande de sabão de coco de macaúba para sé lavar corpo O dono da venda tinha duas filhas o Jesualdo cada vez que voltava carecia de explicar à gente de dia é de noite como elas eram formosuramente Ei que quando vier o tempo que de guerra se tiver licença ah e se esse vendeiro for contra nós ah eu vou lá pego uma das duas de mocinha faço ela virar mulher o Vove disse O que tu não faz Porque o que eu quero é o exato que eu vou lá prezado peço em casamento e nóivo o Triol contestou E o Liduvino e o Admeto cantavam coisas de sentimento cantavam pelo nariz João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 414 Ao que perguntei e aquela canção de Siruiz Mas eles não sabiam Sei não gosto não Cantigas muito velhas eles desqueriam Daí deu um sutil trovão Trovejouse outro As tanajuras revoavam Bateu o primeiro toró de chuva Cortamos paus folhagem de coqueiros aumentamos o rancho E vieram uns campeiros rever o gado da Tapera Nhã no renovame levaram as novilhas em quadra de produzir Esses eram homens tão simples pensaram que a gente estava garimpando ouro Os dias de chover cheio foram se emendando Tudo igual às vezes é uma semgracez Mas não se deve de tentar o tempo As garças é que praziam de gritar o garcejo delas e o socóboi range cincerros e o socó latindo sucinto Aí pelo mato das pindaíbas avante tudo era um sapal Coquexavam De tão bobas tristezas a gente se ria no friinho de entrechuvas Dada a primeira estiada voltou aquele vaqueiro Bernabé em seu cavalinho castanho e vinha trazer requeijão que se tinha incumbido a ele e que por dinheirinho bom se pagou A vida tem de mudar um dia para melhor a gente dizia Requeijão é com café bem quente que é mais gostoso Aquele vaqueiro Bernabé voltou outras diversas vezes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 415 Ah e vai um feio dia lá ele apontou na boca da estrada que saía do mato o cavalinho castanho dava toda pressa de vinda nem cabeceava Achamos que fosse mesmo ele Aí não era Era um brabo nosso um cafuz pardo de sonome o Gavião Cujo que de mais norte chegava Ele tinha tomado muitas chuvas que tudo era lamas dos copos do freio à boca da bota e pelos vazios do cavalo Esbarrou e desapeou num pronto ser se via que estava ancho com muitas plenipotências O que era O GaviãoCujo abriu os queixos mas palavra logo não saiu ele gaguejou ar e demorou decerto porque a notícia era urgente ou enorme Aruê então Titão Passos quis Te rogaram alguma praga O GaviãoCujo levantou um braço pedindo prazo À fé quase gritou Mataram Joca Ramiro Aí estralasse tudo no meio ouvi um uivo doido de Diadorim todos os homens se encostavam nas armas Aí ei feras Que no céu só vi tudo quieto só um moído de nuvens Se gritava o araral As vertentes verdes do pindaibal avançassem feito gente pessoas Titão Passos bramou as ordens Diadorim tinha caído quase no chão meio amparado a tempo por João Vaqueiro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 416 Caiu tão pálido como cera do reino feito um morto estava Ele todo apertado em seus couros e roupas eu corri para ajudar A vez de ser um desespero O Paspe pegou uma cuia dágua que com os dedos espriçou nas faces do meu amigo Mas eu nem pude dar auxílio mal ia pondo a mão para desamarrar o coletejaleco e Diadorim voltou a seu si num alerta e me repeliu muito feroz Não quis apoio de ninguém sozinho se sentou se levantou Recobrou as cores e em mais vermelho o rosto numa fúria de pancada Assaz que os belos olhos dele formavam lágrimas Titão Passos mandava o GaviãoCujo falava Assim os companheiros num estupor Ao que não havia mais chão nem razão o mundo nas juntas se desgovernava Repete Gavião Ai chefe ai chefe que mataram Joca Ramiro Quem Adonde Conta Arre eu surpreendi eriço de tremor nos meus braços Secou todo cuspe dentro do estreito de minha boca Até atravessado na barriga me doeu Antes mais o pobre Diadorim Alheio ele dava um bufo e soluço orço que outros João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 417 olhos se suspendia nas sussurrosas ameaças Tudo tinha vindo por cima de nós feito um relâmpago em fato Matou foi o Hermógenes Arraso cão Caracães O cabrobó de cão Demônio Traição Que me paga constante não havendo quem não exclamasse O ódio da gente ali em verdade armava um pojar para estouros Joca Ramiro podia morrer Como podiam ter matado Aquilo era como fosse um touro preto sozinho surdo nos ermos da Guararavacã urrando no meio da tempestade Assim Joca Ramiro tinha morrido E a gente raivava alto para retardar o surgir do medo e a tristeza em cru sem se saber por que mas que era de todos unidos malaventurados O Hermógenes Os homens do Ricardão O Antenor Muitos Mas adonde onde A desgraça foi num lugar na Jerara terras do Xanxerê beira da Jerara lá onde o córrego da Jerara desce do morro do Vôo e cai barra no Riachão Riachão da Lapa Dizse que foi sido de repente não se esperava Aquilo foi à traição toda Morreram os muitos que estavam persistindo lealmente Aí João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 418 mortos João Frio o Bicalho Leôncio Fino Luís Pajeú o Cambó LeitedeSapo Zé Inocêncio uns quinze Até se deu um tiroteio terrível mas o pessoal do Hermógenes e do Ricardão era demais numeroso Dos bons quem pôde fugiram corretamente Silvino Silva conseguiu fuga com vinte e tantos companheiros Mas Titão Passos de arrompe atalhou a narração ele agarrou o GaviãoCujo pelos braços Hem diá Mas quem é que está pronto em armas para rachar Ricardão e Hermógenes e ajudar a gente na vingança agora nas desafrontas Se tem e ondé então que estão Ah sim chefe Os todos os outros João Goanhá Só Candelário Clorindo Campelo João Goanhá pára com porçanheira de homens na Serra dos Quatis Aí foi ele quem me mandou trazer este aviso Só Candelário ainda está para o Norte mas o grosso dos bandos dele se acha nos pertos da LagoadoBoi em juramento Já foi portador para lá Sendo que se despachou um positivo também para dar parte a Medeiro Vaz nos Gerais no de lado de lá do Rio Sei que o sertão pega em armas mas Deus é grande João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 419 Louvado Ah então graças a Deus Ao que então está bem Titão Passos se cerrou E estava Era a outra guerra A gente ficávamos aliviados Aquilo dava um sutil enorme Teremos de ir Teremos de ir falou Titão Passos e todos responderam reluzentemente Tínhamos de tocar sem atraso para a Serra dos Quatis a um lugar dito o Amoipira que é perto de Grão Mogol Artes que o GaviãoCujo ainda contava mais as miúcias parecia que tinha medo de esbarrar de contar Que o Hermógenes e o Ricardão de muito haviam ajustado entre si aquele crime se sabia O Hermógenes distanciou Joca Ramiro de Só Candelário com falsos propósitos conduziu Joca Ramiro no meio de quase só gente dele Hermógenes mais o pessoal do Ricardão Aí atiraram em Joca Ramiro pelas costas carga de balas de três revólveres Joca Ramiro morreu sem sofrer E enterraram o corpo Diadorim perguntou numa voz de mais dor como saía ansiada Que não sabiao Gavião Cujo respondeu mas que decerto teriam enterrado conforme cristão lá mesmo na Jerara por certo Diadorim tanto empa lidecesse ele pediu cachaça Tomou Todos tomamos Titão Passos não queria ter as lágrimas nos olhos Um homem de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 420 tão alta bondade tinha mesmo de correr perigo de morte mais cedo mais tarde vivendo no meio de gente tão ruim ele me disse dizendo num modo que parecia ele não fosse também jagunço como era de se ser Mas agora tudo principiava terminado só restava a guerra Mão do homem e suas armas A gente ia com elas buscar doçura de vingança como o rominhol no panelão de calda Joca Ramiro morreu como o decreto de uma lei nova A daí carecia fosse alguém do lado de lá do morro pela gente do Alaripe Pois vamos Riobaldo Diadorim se pôs Vi que ele fervia ali assim no pego do parado Selamos os cavalos Serra acima fomos Ao no galope cada um engolia suas palavras A mesmo estava o céu encoberto e um mormaço Mas na descambada Diadorim me reteve me entregou á ponta do cabresto para segurar De tudo nesta vida a gente esquece Riobaldo Você acha então que vão logo olvidar a honra dele me perguntou Devo que retardei muito em responder com cara de não compreensão Porque Diadorim completou dele a glória do finado Do que se finou E dizia aquilo com uma misturação de carinho e raiva tanto desespero que nunca vi Desamontou foi andando sem governar os passos tapado pelas moitas e árvores Eu restei ficando tomando conta do ca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 421 valo Pensei que ele tivesse ido a lá por necessitar Mas demorou tanto a volta que eu resolvi tocar atrás para o que havia ver esporei e vim puxando o cavalo dele adestro E aí o que vi foi Diadorim no chão deitado debruços Soluçava e mordia o capim do campo A doideira Me amargou no cabo da língua Diadorim chamei Ele sem se aprumar virou o rosto apertou os olhos no choro Falei falei meus consolos e ele atendia em querelenga me pedindo que sozinho fosse deixasse ele ali até minha volta Joca Ramiro era seu parente Diadorim eu indaguei com muita cordura Ah era sim ele me respondeu com uma voz de pouco corpo Seu tio será Que era ele deu em gesto Entreguei a ele o cabresto do cavalo e continuei ida Em certa distância para prevenir os alaripes e evitar atraso esbarrei e disparei tiros para o ar umas vezes Cheguei lá estavam todos reunidos por meu feliz E estava chovendo de acordo com o mormaço Trago notícia de grande morte sem desapear eu declarei Eles todos tiraram os chapéus para me escutar Então eu gritei Viva a fama do nosso Chefe Joca Ramiro E pela tristeza que estabeleceu minha voz muito me entenderam Ao que quase todos choraram Mas agora temos de vingar a morte do falecido eu ainda pronunciei Se aprontaram num átimo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 422 para comigo vir Mano velho Tatarana você sabe Você tem sustância para ser um chefe tem a bizarria no caminho o Alarípe me disse Desmenti De ser chefe mesmo era o que eu tinha menos vontade Mas assim se deu que no seguinte dia no romper das barras saímos tocando Diadorim do meu lado mudado triste muito branco os olhos pisados a boca vencida Deixamos para trás aquele lugar que disse ao senhor para mim tão célebre a Guararavacã do Guaicuí do nunca mais Redeando rumamos em tralha e torto por aquele afora a gente ia investir o sertão os mares de calor Os córregos estavam sujos Aí depois cada rio roncava cheio as várzeas embrejavam e tantas cordas de chuva esfriavam a cacunda daquelas serras A terrível notícia tinha se espalhado assaz em todas as partes o povo fazia questão de obsequiar à gente e fala vam muito bem do falecido Mas nós passávamos feito flecha feito faca feito fogo Varamos todos esses distritos de gado Assomando de dia por dentro de vilórios e arraiais e ocupando a cheio todas as estradas sem nenhum escondimento a gente queria que todo o mundo visse a vingança Alto do Amoipira quando terminamos lá os cavalos já afracavam João Goanhá João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 423 em toda economizada estatura foi ver a gente vindo e abriu seus bons braços Ele estava com próprios trezentos guerreiros E sempre outros chegavam Meu irmão Titão Passos Meu irmão Titão Passos ele falou crescente E vocês todos valentes cabras Agora é que vai ser a grande briga Disse que com três dias se saía em armas João Goanhá ia na vaca e no boi não estava com pororas E Só Candelário onde era que estava Só Candelário piorado doente devia de estar um tempo desses nos Lençóis para onde portador seguira com pressa de chamado Mesmo assim João Goanhá desnecessitava de esperar por ele para aos dois judas traidores dar batalha No que achamos bom conselho E outros vinham chegando oferecendo peito de ajuda com prestança em ponta Veio até quem não se imaginou como aquele Nhão Virassaia com seus trinta e cinco cacundeiros o que carregava nome de fama por todo o Rio VerdeGrande E o velho Ludujo Filgueiras montesclarense com vinte e dois atiradores E o grande fazendeiro coronel Digno de Abreu que mandou seus trinta e tantos capangas também por Luís de Abreuzinho comandados que era dele filhonatural E o gado em pé que se provia para se abater e se comer chegava a ser uma boiada Com sacas de farinha surrão de sal e açúcar preto e café até em carrodebois os mantimentos de fubá e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 424 arroz e feijão entregados Só em quantidades de munição era que a gente não produzia luxo e Titão Passos se entristeceu de não poder ter trazido a nossa na Guararavacã tão em vão esperada Mas a lei de homem não é seus instrumentos Saímos em guerra Ãhã do norte da LagoadoBoi com troca de avisos sobrevinha também o bastante da rapaziada dos baianos debaixo do comando de Alípio Mota cunhado de Só Candelário A simples íamos cercar bonito os Judas não tinham escape Aindas que se escapassem para o poente atravessassem o rio ah encontravam ferro e fogo lá estava Medeiro Vaz o rei dos Gerais Saímos sobre fomos Mas descemos no canudo das desgraças ei saiba o senhor Desarma do tempo hora de paga e perdas e o mais que a gente tinha de purgar segundo se diz Tudo o melhor fizemos e tudo no fim desandava Deus não devia de ajudar a quem vai por santas vinganças Devia Nós não estávamos forte em frente com a coragem esporeada Es távamos Mas então Ah então mas tem o Outro o figura o morcegão o tunes o cramulhão o debo o carocho do péde pato o malencarado aquele oquenãoexiste Que não existe que não que não é o que minha alma soletra E da existência desse me defendo em pedras pontudas ajoelhado beijando a barra do manto de minha Nossa Senhora da Abadia Ah só Ela João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 425 me vale mas vale por um mar sem fim Sertão Se a Santa puser em mim os olhos como é que ele pode me ver Digo isto ao senhor e digo paz Mas naquele tempo eu não sabia Como é que podia saber E foram esses monstros o sobredito Ele vem no maior e no menor se diz o grãotinhoso e o cãomiúdo Não é mas finge de ser E esse trabalha sem escrúpulo nenhum por causa que só tem um curto prazo Quando protege vem protege com sua pessoa Montado mole nas costas do Hermógenes indicando todo rumo Do tamanho dum bago de aívim dentro do ouvido do Hermógenes por tudo ouvir Redondinho no lume dos olhos do Hermógenes para espiar o primeiro das coisas O Hermógenes que por valente e valentão para demais até ao fim deste mundo e do juízofinal se danara oco de alma Contra ele a gente ia Contra o demo se podia Quem a quem Milagres tristes desses também se dão Como eles conseguiram fugir das unhas da gente se escaparam o Ricardão e o Hermógenes os Judas Pois eles escapuliram passaram perto légua quartode légua com toda sua jagunçama e não vimos não ouvimos não soubemos tivemos jeito nenhum para cercar e impedir Avançaram calados escorregando pelos matos ganhando o mais poente para o São Francisco Atravessaram por nós sem a gente perceber como a noite atravessa o dia da manhã à tarde seu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 426 pretume dela escondido no brancor do dia se presume Quando pudemos saber a distância deles já era impossível Nós estávamos pegando o ar Duro de desanimável hem E pois demore o senhor para o pior o que veio em sobre os soldados do Governo Os soldados soldadesca tantas tropas Surgiram de todos os lados de supetão e agatanhavam naquela sanha é ver cachorrada caçante Soldados do Tenente Plínio companhia de guerra Tenente Reis Leme outra E veio depois com muitos mais outros um capitão Carvalhais maior da marca esse bebia café em cuité e cuspia pimenta com pólvora Sofremos rolamos por aí aqui se rolou vida é vez de injustiças assim quando o demo leva o estandarte Pois aquela soldadama viera para o Norte era por vingar Zé Bebelo e Zé Bebelo já andava por longes desterrado e nisso eles se viravam contra a gente que éramos de Joca Ramiro que tinha livrado a vida de Zé Bebelo das facas do Hermógenes e Ricardão e agora por sua ação o que eles estavam era ajudando indireto àqueles sebaceiros Mas quem era que podia explicar isso tudo a eles que vinham em máquina enorme de cumprir o grosso e o esmo tendo as garras para o pescoço nosso mas o pensante da cabeça longe só geringonciável na capital do Estado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 427 De contar tudo o que foi me retiro o senhor está cansado de ouvir narração e isso de guerra é mesmice mesmagem Combatemos o quanto mais pudemos está aí Consoante começou no Curral de Vacas perto do Morro do Cocuruto onde nos pegaram num relaxo Fugimos depois de grande fogo Fogo demos daí no Cutica na Chapada Simão Guedes mas rodaram com a gente de retruz Serra da Saudade a gente se desarranjou fugimos bem Ah e Córrego Estrelinhas Córrego da Malhada Grande Ribeirão Traçadal tudo foram as feiezas Recito frente ao senhor e é rol de nomes Para mim ficaram em assento de sustos e sofrimento Nunca me queixei Sofrimento passado é glória é sal em cinza De tanta maneira Diadorim assistia comigo como um gravatá se fechou Semeei minha pre sença dele o que da vida é bom eu dele entendia Tomando o tempo da gente os soldados remexiam este mundo todo Milho crescia em roças sabiá deu cria gameleira pingou frutinhas o pequi amadurecia no pequizeiro e a cair no chão veio veranico pitanga e caju nos campos Ato que voltaram as tempestades mas entre aquelas noites de estrelaria se encostando Daí depois o vento principiou a entortar rumo mais forte porque o tempo todo das águas estava no se acabar Tenente Reis Leme nos escaramuçando queria correr com a gente a pano de sabre João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 428 Matouse montanha de bons soldados Estávamos em terras que entestam com a Bahia Em Bahia entramos e saímos cinco vezes sem render as armas Isto que digo sei de cor brigar no espinho da caatinga pobre onde o cãcã canta Chão que queima branco E aqueles cristais pedracristal quase de sangue Chegamos até no cabo do mundo Quadrante o que havia me esconjuro Parecia que a gente ia ter de passar o resto da vida guerreando com os praças Mas nosso constar era outro com sangue de urgência aquela luta de morte contra os Judas e que era briga nossa particular Não se tendo recurso competente Ah Diadorim mascava Para ódio e amor que dói amanhã não é consolo Eu mesmeava Mas dando um dia a gente teve certas notícias os do Hermógenes estando senhores arranchados conforme retouçavam da banda de lá do Rio do Chico nas vertentes da beira da mão direita do Carinhanha no Chapadão de Antônio Pereira Questionouse nisso Se pensou e falou em tudo por fazer e não fazer Resultado foi este que o principal era a gente mandar reforço para Medeiro Vaz uns cinqüenta ou cem homens repartidos em miúdos grupos caçando jeito de safança por entre os lugares perigáveis Enquanto tanto João Goanhá Alípio Mota e Titão Passos cada qual de lado seu deviam de ir desmanchar os rastos na caatinga João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 429 e depois se esconderem por uns tempos em fazendas de donos amigos até que a soldadesca se espairecesse E era bom e era justo Era certo Deus em armas nos guardava De mim vim com Diadorim Alaripe Jesualdo e João Vaqueiro e o Fafafa Era para o outro lado era para os meus Gerais eu vinha alegre contente E saímos com o seguinte risco o Imbiruçu a Serra do PaudArco o Mingu a Lagoa dos Marruás o DôminusVobíscum o CruzeirodasEmbaúbas o DetrásdasDuasSerras O Brejo dos Mártires a Cachoeirinha Roxa o Mocó a Fazenda RiachoAbaixo a Santa Polônia a Lagoa da Jabuticaba E daí por uns atalhos o Córrego Assombrado o Sassapo o Poço dAnjo o Barreiro do Muquém Nesse meu caminho fazendo tirei minha desforra faceirei Severgonhei Estive com o melhor de mulheres Na Malhada comprei roupas O vau do mundo é a alegria Mas Diadorim não se fornecia com mulher nenhuma sempre sério só se em sonhos Dele eu ainda mais gostava E então se deu que tínhamos esbarrado em frente da Lagoa Clara Já era o do Chico o poder dele largas águas seu destino A ver o portode balsa que distava pouco Travessia ali podia ser perigosa com tantos soldados vizinhantes A gente se apartar Ah mas o que bastava o balseiro se chamar Hô passador Hô passador João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 430 ele viesse Assim para uma invenção que se teve O balseiro só avistando João Vaqueiro e o Fafafa estes ele então podia passar com cinco dos cavalos falavam que era para uns caçadores Da outra banda João Vaqueiro e o Fafafa fossem levando os cavalos para um lugar para cima da barra no Urucuia chamado o OlhodAguadasOutras Lá a gente se encontrava Somente ficados com um cavalinho só Alaripe e eu Diadorim e Jesualdo andamos beirario no vagarosamente A gente esperava o que acontecesse Ali mais adiante era um porto delenha Você tem receio Riobaldo Diadorim me perguntou Eu Com ele em qualquer parte eu embarcava até na prancha de Pirapora Vau do mundo é a coragem eu disse E com os rifles escorados acenamos para uma grande barca aquela a caradepau que tinha no bico da frente era uma cabeça de touro boasorte nos dava O barqueiro tocou um berro no buzo encostaram A gente os quatro com o cavalo era nada as arrobazinhas E nós entramos depois que o patrão nos saudou em nome de Nosso Senhor CristoJesus e disse Eu cá sou amigo de todos segundo a minha condição E o Alaripe aceitou dele um gole de cachaça aceitamos Jesualdo disse re postando Amigo de todos Rioabaixo na canoa quem governa é o remador Bem que rioacima é que era mas com João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 431 remeiros muito bons esforçados Aí constante o velejo vento em pano nem remeiro com o varejão não carecia de fazer talento Pediram notícias do sertão Essa gente estava tão devolvida de tudo que eu não pude adivinhar a honestidade deles O sertão nunca dá notícia Eles serviram à gente farta jacuba Por onde os senhores vieram o patrão indagou Viemos da Serra RompeDia respondemos Mentiras dágua Tanto fazia dizer que tínhamos vindo da de São Felipe O barqueiro não acreditou deu o zé de ombros Mas levou a gente travessia fácil frenteando a boca do Urucuia Ah o meu Urucuia as águas dele são claras certas E ainda por ele entramos subindo légua e meia por isso pagamos uma gratificação Rios bonitos são os que correm para o Norte e os que vêm do poente em caminho para se encontrar com o sol E descemos num pojo num ponto sem praia onde essas altas árvores a caraíbadeflor roxa tão urucuiana E o folhalarga o adernopreto o paude sangue o pauparaíba sombroso O Urucuia suas abas E vi meus Gerais Aquilo nem era só mata era até florestas Montamos direito no OlhodAguadasOutras andamos e demos com a primeira vereda dividindo as chapadas o flaflo de vento agarrado nos buritis franzido no gradeai de suas folhas altas e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 432 sassafrazal como o da alfazema um cheiro que refresca e aguadas que molham sempre Vento que vem de toda parte Dando no meu corpo aquele ar me falou em gritos de liberdade Mas liberdade aposto ainda é só alegria de um pobre caminhozinho no dentro do ferro de grandes prisões Tem uma verdade que se carece de aprender do encoberto e que ninguém não ensina o beco para a liberdade se fazer Sou um homem ignorante Mas me diga o senhor a vida não é cousa terrível Lengalenga Fomos fomos Assim pois foi como conforme que avançamos rompidas marchas duramente no varo das chapadas calcando o sapê brabão ou areias de cor em cimento formadas e cruzando somente com gado transeunte ou com algum boi sozinho caminhador E como cada vereda quando beirávamos por seu resfriado acenava para a gente um fino sossego sem notícia todo buritizal e florestal ramagem e amar em água E que com nosso cansaço em seguir sem eu nem saber o roteiro de Deus nas serras dos Gerais viemos subindo até chegar de repente na Fazenda Santa Catarina nos BuritisAltos cabeceira de vereda Ques borboletas E era em maio pousamos lá dois dias flor de tudo como sutil suave no conhecimento meu com Otacília O senhor me ouviu Em como Otacília e eu ficamos gostando um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 433 do outro conversamos combinados no noivável e na sobremanhã eu me despedi ela com sua cabecinha de gata alva no topo da alpendrada me dando a luz de seus olhos e de lá me fui com Diadorim e os outros E de como viemos em cata do grosso do bando de Medeiro Vaz que dali a quinze léguas recruzava da Ratragagem para a VeredaFunda e com eles nos ajuntamos economizando rumo num lugar chamado o Bom Buriti Me alembro meu é Ver belo o céu poente de sol de tardinha a roséia daquela cor E lá é cimo alto pintassilgo gosta daquelas friagens Cantam que sim Na Santa Catarina Revejo Flores pelo vento desfeitas Quando rezo penso nisso tudo Em nome da Santíssima Trindade O que o seguinte foi este o encontro da gente com Medeiro Vaz no BomBuriti num ressaco conforme já disse ele no meio de seus fortes homens exatos naquela bocaina de campo Medeiro Vaz retrata barbaça com grande chapéu rebuçado aquela pessoa sisuda circunspecto com todas as velhices sem nem velho ser Cujo eu me disse É bom ho mem E ele beijou a testa de Diadorim e Diadorim beijou aquela mão A um assim a gente podia pedir a benção se prezar Medeiro Vaz tomava rapé Medeiro Vaz mandando passar as ordens E tinha quartelmestre Subindo em esperança de lá João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 434 saímos para chão e sertão Sertão bravo as araras O só que Medeiro Vaz comandou foi isto Aleluia Diadorim tinha comprado um grande lenço preto que era para ter luto manejável funo guardado em sobre seu coração Chapadão de duro Daí passamos um rio vadoso rio de beira baixinha só buriti ali os buritis calados E a flor de caraíba urucuiã roxo astrazado um roxo que sobe no céu Naquele trecho também me lembro Diadorim se virou para mim com um ar quase de meninozinho em suas miúdas feições Riobaldo eu estou feliz ele me disse Dei um sim completo E foi assim que a gente principiou a tristonha história de tantas caminhadas e vagos combates e sofrimentos que já relatei ao senhor se não me engano até ao ponto em que Zé Bebelo voltou com cinco homens descendo o Rio Paracatu numa balsa de talos de buriti e herdou brioso comando e o que debaixo de Zé Bebelo fomos fazendo bimbando vitórias acho que eu disse até um fogo que demos bem dado e bem ganho na Fazenda São Serafim Mas isso o senhor então já sabe Só sim Ah meu senhor mas o que eu acho é que o senhor já sabe mesmo tudo que tudo lhe fiei Aqui eu podia pôr ponto Para tirar o final para conhecer o resto que falta o que lhe basta que menos mais é pôr atenção no que contei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 435 remexer vivo o que vim dizendo Porque não narrei nada àtoa só apontação principal ao que crer posso Não esperdiço pala vras Macaco meu veste roupa O senhor pense o senhor ache O senhor ponha enredo Vai assim vem outro café se pita um bom cigarro Do jeito é que retorço meus dias repensando Assentado nesta boa cadeira grandalhona de espreguiçar que é das de Carinhanha Tenho saquinho de relíquias Sou um homem ignorante Gosto de ser Não é só no escuro que a gente percebe a luzinha dividida Eu quero ver essas águas a lume de lua Urubu Um lugar um baiano lugar com as ruas e as igrejas antiqüíssimo para morarem famílias de gente Serve meus pensamentos Serve para o que digo eu queria ter remorso por isso não tenho Mas o demônio não existe real Deus é que deixa se afinar à vontade o instrumento até que chegue a hora de se dançar Travessia Deus no meio Quando foi que eu tive minha culpa Aqui é Minas lá já é a Bahia Estive nessas vilas velhas altas cidades Sertão é o sozinho Compadre meu Quelemém diz que eu sou muito do sertão Sertão é dentro da gente O senhor me acusa Defini o alvará do Hermógenes referi minha má cedência Mas minha pa droeira é a Virgem por orvalho Minha vida teve meiodo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 436 caminho Os morcegos não escolheram de ser tão feios tão frios bastou só que tivessem escolhido de esvoaçar na sombra da noite e chupar sangue Deus nunca desmente O diabo é sem parar Saí vim destes meus Gerais voltei com Diadorim Não voltei Travessias Diadorim os rios verdes A lua o luar vejo esses vaqueiros que viajam a boiada mediante o madrugar com lua no céu dia depois de dia Pergunto coisas ao buriti e o que ele responde é a coragem minha Buriti quer todo azul e não se aparta de sua água carece de espelho Mestre não é quem sempre ensina mas quem de repente aprende Por que é que todos não se reúnem para sofrer e vencer juntos de uma vez Eu queria formar uma cidade da religião Lá nos confins do Chapadão nas pontas do Urucuia O meu Urucuia vem claro entre escuros Vem cair no São Francisco rio capital O São Francisco partiu minha vida em duas partes A Bigri minha mãe fez uma promessa meu padrinho Selorico Mendes tivesse de ir comprar arroz nalgum lugar por morte de minha mãe Medeiro Vaz reinou depois de queimar sua casadefazenda Medeiro Vaz morreu em pedra como o touro sozinho berra feio conforme já comparei uma vez touro preto todo urrando no meio da tempestade Zé Bebelo me alumiou Zé Bebelo ia e voltava como um vivo demais de fogo e vento zás de raio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 437 veloz como o pensamento da idéia mas a água e o chão não queriam saber dele Compadre meu Quelemém outrotanto é homem sem parentes provindo de distante terra da Serra do Urubu do Indaiá Assim era Joca Ramiro tão diverso e reinante que mesmo em quando ainda parava vivo era como se já estivesse constando de falecido Só Candelário Só Candelário se desesperou por forma Meu coração é que entende ajuda minha idéia a requerer e traçar Ao que Joca Ramiro pousou que se desfez enterrado lá no meio dos carnaubais em chão arenoso salgado Só Candelário não era de certo modo parente do compadre meu Quelemém o senhor sabe Diadorim me veio de meu nãosaber e querer Diadorim eu adivinhava Sonhei mal E em Otacília eu sempre muito pensei tanto que eu via as baronesas amarasmeando no rio em vidro jericó e os lírios todos os líriosdobrejo coposdeleite lágrimasdemoça são josés Mas Otacília era como se para mim ela estivesse no ca marim do Santíssimo A Nhorinhá nas Aroeirinhas filha de Ana Duzuza Ah não era rejeitã Ela quis me salvar De dentro das águas mais clareadas aí tem um sapo roncador Nonada A mais com aquela grandeza a singeleza Nhorinhá puta e bela E ela rebrilhava para mim feito itamotinga Uns talismãs A mocinha Miosótis Não A Rosauarda Me alembrei dela todas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 438 as minhas lembranças eu queria comigo Os dias que são passados vão indo em fila para o sertão Voltam como os cavalos os cavaleiros na madrugada como os cavalos se arraçoam O senhor se alembra da canção de Siruiz Ao que aquelas troas de areia e as ilhas do rio que a gente avista e vai guardando para trás Diadorim vivia só um sentimento de cada vez Mistério que a vida me emprestou tonteei de alturas Antes eu percebi a beleza daqueles pássaros no Rio das Velhas percebi para sempre O manuelzinhodatroa Tudo isso posso vender Se vendo minha alma estou vendendo também os outros Os cavalos relincham sem causa os homens sabem alguma coisa da guerra Jagunço é o sertão O senhor pergunte quem foi que foi que foi o jagunço Riobaldo Mas aquele menino o Valtei na hora em que o pai e a mãe judiavam dele por lei ele pedia socorro aos estranhos Até o Jazevedão estivesse ali vinha com brutalidade de socorro capaz Todos estão loucos neste mundo Porque a cabeça da gente é uma só e as coisas que há e que estão para haver são demais de muitas muito maiores diferentes e a gente tem de necessitar de aumen tar a cabeça para o total Todos os sucedidos acontecendo o sentir forte da gente o que produz os ventos Só se pode viver perto de outro e conhecer outra pessoa sem perigo de ódio se a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 439 gente tem amor Qualquer amor já é um pouquinho de saúde um descanso na loucura Deus é que me sabe O Reinaldo era Diadorim mas Diadorim era um sentimento meu Diadorim e Otacília Otacília sendo forte como a paz feito aqueles largos remansos do Urucuia mas que é rio de braveza Ele está sempre longe Sozinho Ouvindo uma violinha tocar o senhor se lembra dele Uma musiquinha até que não podia ser mais dançada só o debulhadinho de purezas de virarvirar Deus está em tudo conforme a crença Mas tudo vai vivendo demais se remexendo Deus estava mesmo vislumbrante era se tudo esbarrasse por uma vez Como é que se pode pensar toda hora nos novíssimos a gente estando ocupado com estes negócios gerais Tudo o que já foi é o começo do que vai vir toda a hora a gente está num cômpito Eu penso é assim na paridade O demônio na rua Viver é muito perigoso e não é não Nem sei explicar estas coisas Um sentir é o do sentente mas outro é o do sentidor O que eu quero é na palma da minha mão Igual aquela pedra que eu trouxe do Jequitinhonha Ah pacto não houve Pacto Imagine o senhor que eu fosse sacerdote e um dia tivesse de ouvir os horrores do Hermógenes em confissão O pacto de um morrer em vez do outro e o de um viver em vez do outro então Arrenego E se eu quiser fazer outro pacto com Deus João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 440 mesmo posso então não desmancha na rãs tudo o que em antes se passou Digo ao senhor remorso Como no homem que a onça comeu cuja perna Que culpa tem a onça e que culpa tem o homem Às vezes não aceito nem a explicação do Compadre meu Quelemém que acho que alguma coisa falta Mas medo tenho mediano Medo tenho é porém por todos É preciso de Deus existir a gente mais e do diabo divertir a gente com sua dele nenhuma existência O que há é uma certa coisa uma só diversa para cada um que Deus está esperando que esse faça Neste mundo tem maus e bons todo grau de pessoa Mas então todos são maus Mas mais então todos não serão bons Ah para o prazer e para ser feliz é que é preciso a gente saber tudo formar alma naconsciência para penar não se carece bicho tem dor e sofre sem saber mais porquê Digo ao senhor tudo é pacto Todo caminho da gente é resvaloso Mas também cair não prejudica demais a gente levanta a gente sobe a gente volta Deus resvala Mire e veja Tenho medo Não Estou dando batalha É preciso negar que o QueDiga existe Que é que diz o farfal das folhas Estes gerais enormes em ventos danando em raios e fúria o armar do trovão as feias onças O sertão tem medo de tudo Mas eu hoje em dia acho que Deus é alegria e coragem que Ele é bondade adiante quero João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 441 dizer O senhor escute o buritizal E meu coração vem comigo Agora no que eu tive culpa e errei o senhor vai me ouvir Vemos voltemos O BuritiPintado o OiMãe o rio Soninho a Fazenda São Serafim com outros mal esquecidos seja Ao pé das chapadas no entremeio do se encher de rios tantos ou aí subindo e descendo solaus recebendo o empapo de chuva e mais chuva a gente se fervia debaixo desses extraordinários de Zé Bebelo a gente lambia guerra Zé Bebelo Vaz Ramiroviva o nome A gente vinha sobre o rastro deles dos Hermógenes por matar por acabar com eles por perseguir No borrusco o Hermógenes corria longes de nós sempre Às artes que fugiam Mas eu com aquilo já tinha inteirado costume Era ruim e era bom Aí quando muito vento abriu o céu e o tempo deu melhora a gente estava na erva alta no quase liso de altas terras Se ia aos vintes e trintas com Zé Bebelo de botafogo Assim expresso chapadão voante O chapadão é sozinho a largueza O sol O céu de não se querer ver O verde carteado do grameal As duras areias As arvorezinhas ruiminhas de minhas A diversos que passavam abandoados de araras araral conver santes Aviavam vir os periquitos cota o cantoclim Ali chovia João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 442 Chove e não encharca poça não rola enxurrada não produz lama a chuva inteira se soverse em minuto terra a fundo feito um azeitezinho entrador O chão endurecia cedo esse rareamento de águas O fevereiro feito Chapadão chapadãochapadão De dia é um horror de quente mas para a noitinha refresca e de madrugada se escorropicha o frio o senhor isto sabe Para extraviar as mutucas a gente queimava folhas de arapavaca Aquilo bonito quando tição aceso estala seu fim em faíscas e labareda dalalala Alegria minha era Diadorim Soprávamos o fogo juntos ajoelhados um frenteante o ao outro A fumaça vinha engasgava e enlagrimava A gente ria Assim que fevereiro é o mês mindinho mas é quando todos os cocos do buritizal maduram e no céu quando estia a gente acha reunidas as todas estrelas do ano todo Mesmas vezes eu ria Homem dorme com a cabeça para trás dois dedos no queixo Era o Pitolô Um Pitolô sei lá cabra destemido com crimes nos maniçobais perto para cima de Januária mas era nascido no barranco No Carinhanha rio quase preto muito imponente comprido e povooso Ademais que ele contava casos de muito amor Diadorim às vezes gostava Mas Diadorim sabia era a guerra Eu no gozo de minha idéia era que o amor virava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 443 senvergonhagemTurvei tanto Andorinha que vem e que vai quer é ir bem pousar nas duas torres da matriz de Carinhanha o Pitolô falava Eu tinha súbitas outras minhas vontades de passar devagar a mão na pele branca do corpo de Diadorim que era um escondido E em Otacília eu não pensava No escasso pensei Nela para ser minha mulher aqueles usosfrutos Um dia eu voltasse para a Santa Catarina com ela passeava no laranjal de lá Otacília mel do alecrim Se ela por mim rezava Rezava Hoje sei E era nessas boas horas que eu virava para a banda da direita por dormir meu sensato sono por cima de estados escuros Mas levei minha sina Mundo o em que se estava não era para gente era um espaço para os de meiarazão Para ouvir gavião guinchar ou as tantas seriemas que chungavam e avistar as grandes emas e os veados correndo entrando e saindo até dos velhos currais de ajuntar gado em rancharias sem morador Isso quando o ermo melhorava de ser só ermo A chapada é para aqueles casais de antas que toram trilhas largas no cerradão por aonde e sem saber de ninguém assopram sua bruta força Aqui e aqui os tucanos senhoreantes enchendo as árvores de mim a um tiro de pistola isto resumo mal Ou o zabelê choco chamando seus pintos para esgaravatar terra e com eles os bichinhos comíveis catar A fim o birro e o garrixo sigritando João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 444 Ah e o sabiápreto canta bem Veredas No mais nem mortalma Dias inteiros nada tudo o nada nem caça nem pássaro nem codorniz O senhor sabe o mais que é de se navegar sertão num rumo sem termo amanhecendo cada manhã num pouso diferente sem juízo de raiz Não se tem onde se acostumar os olhos toda firmeza se dissolve Isto é assim Desde o raiar da aurora o sertão tonteia Os tamanhos A alma deles Mas Zé Bebelo andante estava esperdiçando o consistir E que o Hermógenes só fizesse por se fugir toda a vida isso ele não entendia Vai cavacando buraco vai que tu vê oco da paciência ele resmungou Ainda que nesses dias ele menos falasse ou quando falava eu não queria ouvir Digo que no cível trivial Zé Bebelo me indispunha com algum enjôo A antes uma conversa com Alaripe somente simples ou com o Fafafa que estimava irmãmente os cavalos deles tudo entendia mestre em doma e em criação Zé Bebelo só tinha graça para mim era na beira dos acontecimentos em decisões de necessidade forte e vida virada horas de se fazer O traquejar Se não aquela mente de prosa já me aborrecia A monte andante ao adiável aí assim e assaz eu airei meu pensamento Amor eu pensasse Amormente Otacília era a bemdizer minha noiva Mas eu carecia era de mulher João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 445 ministrada da vaca e do leite De Diadorim eu devia de conservar um nojo De mim ou dele As prisões que estão re fincadas no vago na gente Mas eu aos poucos macio pensava desses acordados em sonho e via o reparado como ele principiava a rir quente nos olhos antes de expor o riso daquela boca como ele falava meu nome com um agrado sincero como ele segurava a rédea e o rifle naquelas mãos tão finas brancamente Esses Gerais em serras planas beleza por ser tudo tão grande repondo a gente pequenino Como se eu estivesse calçando par de chinelo muito flote e eu queria um sinapismo botim reiúno duro redomão Agora e os outros o senhor dirá Ah meu senhor homens guerreiros também têm suas francas horas homem sozinho sem par supre seus recursos também Surpreendi um o Conceiço que jazia vadio deitado se ocultando atrás de fechadas moitas momento que raro se vê feito o cagar dum bicho bravo É essa natureza da gente ele disse eu não tinha perguntado explicação O que eu queria era um divertimento de alívio Ali com a gente nenhum cantava ninguém não tinha viola nem nenhum instrumento No peso ruim do meu corpo eu ia aos poucos perdendo o bom tremor daqueles versos de Siruiz João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 446 Então eu forcejei por variar de mim que eu estava no não acontecido nos passados O senhor me entende De Diadorim não me apartava Cobiçasse de comer e beber os sobejos dele queria pôr a mão onde ele tinha pegado Pois por quê Eu estava calado eu estava quieto Eu estremecia sem tremer Porque eu desconfiava mesmo de mim não queria existir em tenção soez Eu não dizia nada não tinha coragem O que tinha era uma esperança Mesmo parava tempos no pensar numa mulher achada Nhorinhá a minha moça Rosauarda aquela mocinha Miosótis Mas o mundo falava e em mim tonto sonho se desmanchando que se esfiapa com o subir do sol feito neblina noruega movente no frio de agosto A noite que houve em que eu deitado confesso não dormia com dura mão sofreei meus ímpetos minha força esperdiçada de tudo me prostrei Ao que me veio uma ânsia Agora eu queria lavar meu corpo debaixo da cachoeira branca dum riacho vestir terno novo sair de tudo o que eu era para entrar num destino melhor Anda que levantei a pé caminhei em redor do arrancho antes do romper das horas dalva Saí no grande orvalho Só os pássaros pássaro de se ouvir sem se ver Ali se madruga com céu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 447 esverdeado Zé Bebelo podia pautear explicação de tudo de como a gente ia alcançar os Hermógenes e dar neles grave derrota podia referir tudo que fosse de bem se guerrear e reger essa política com suas futuras benfeitorias De que é que aquilo me servisse Me cansava E vim vindo para a beira da vereda Consegui com o frio esperei a escuridão se afastar Mas quando o dia clareou de todo eu estava diante do buritizal Um buriti tetéia enorme Aí sendo que eu completei outros versos para ajuntar com os antigos porque num homem que eu nem conheci aquele Siruiz eu estava pensando Versos ditos que foram estes conforme na memória ainda guardo descontente de que sejam sem razoável valor Trouxe tanto este dinheiro o quanto no meu surrão pra comprar o fim do mundo no meio do Chapadão Urucuia rio bravo cantando à minha feição é o dizer das claras águas que turvam na perdição Vida é sorte perigosa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 448 passada na obrigação toda noite é rioabaixo todo dia é escuridão Mas estes versos não cantei para ninguém ouvir não valesse a pena Nem eles me deram refrigério Acho que porque eu mesmo tinha inventado o inteiro deles A virtude que tivessem de ter deu de se recolher de novo em mim a modo que o truso dum gado mal saído que em sustos se revolta para o curral e na estreitez da porteira embola e rela Sentimento que não espairo pois eu mesmo nem acerto com o mote disso o que queria e o que não queria estória sem final O correr da vida embrulha tudo a vida é assim esquenta e esfria aperta e daí afrouxa sossega e depois desinquieta O que ela quer da gente é coragem O que Deus quer é ver a gente aprendendo a ser capaz de ficar alegre a mais no meio da alegria e inda mais alegre ainda no meio da tristeza Só assim de repente na horinha em que se quer de propósito por coragem Será Era o que eu às vezes achava Ao clarear do dia Aí o senhor via os companheiros um por um prazidos em beira do café Assim também por que se agüentava aquilo era por causa da boa camaradagem e dessa movimentação João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 449 sempre Com todos quase todos eu bem combinava não tive questões Gente certa E no entre esses que eram o senhor me ouça bem Zé Bebelo nosso chefe indo à frente e que não se diava folga nem cansaço o Reinaldoque era Diadorim sabendo deste o senhor sabe minha vida o Alaripe que era de ferro e de ouro e de carne e osso e de minha melhor estimação Marcelino Pampa segundo em chefe cumpridor de tudo e senhor de muito respeito João Concliz que com o Sesfredo porfiava assoviando imitado de toda qualidade de pássaros este nunca se esquecia de nada o Quipes sujeito ligeiro capaz de abrir num dia suas quinze léguas cavalos que haja Joaquim Beiju rastreador de todos esses sertões dos Gerais sabente o Tipote que achava os lugares dágua feito boi geralista ou buriti em broto de semente o Suzarte outro rastreador feito cão cachorro ensinado boa pessoa o Queque que sempre tinha sau dade de sua rocinha antiga desejo dele era tornar a ter um pedacinho de terra plantadeira o Marimbondo faquista perigoso nos repentes quando bebia um tanto de mais o Acauã um roxo esquipático só de se olhar para ele se via o vulto da guerra o MãodeLixa porreteiro nunca largava um bom cacete que nas mãos dele era a pior arma Freitas Macho grãomogolense contava ao senhor qualquer patranha que prouvesse e assim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 450 descrevia o senhor acabava acreditando que fosse verdade o Conceiço guardava numa sacola todo retrato de mulher que ia achando até recortado de folhinha ou de jornal José Gervásio caçador muito bom José itirana filho dum lugar que se chamava a CapelinhadoChumbo esse sempre dizia que eu era muito parecido com um tio dele Timóteo chamado o Preto Mangaba da CachoeiradoChoro diziase que entendia de toda mandraca João Vaqueiro amigo em tanto o senhor já sabe o Coscorão que tinha sido carreiro de muito ofício mas constante que era canhoto o jacaré cozinheiro nosso Cavalcânti competente sujeito só que muito soberbose ofendia com qualquer brincadeira ou palavra o Feliciano caolho o Marruaz homem desmarcado de forçoso capaz de segurar as duas pernas dum poldro Guima que ganhava em todo jogo de baralho era do sertão do Abaeté Jiribibe quase menino filho de todos no afetual paternal o Moçambicão um negro enorme pai e mãe dele tinham sido escravos nas lavras Jesualdo rapaz cordato a ele fiquei devendo sem me lembrar de pagar quantia de dezoito milréis o Jequitinhão antigo capataz arrieiro que só se dizia por ditados o Nélson que me pedia para escrever carta para ele mandar para a mãe em não sei onde moradora Dimas Doido que doido mesmo não era só valente e esquentado o Sidurino João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 451 tudo o que ele falava divertia a gente PacamãdePresas que queria qualquer dia ir cumprir promessa de acender velas e ajoelhar adiante no São Bom Jesus da Lapa RasgaemBaixo caolho também com movimentos desencontrados dizia que nunca tinha conhecido mãe nem pai o Fafafa sempre cheirando a suor de cavalo se deitava no chão e o cavalo vinha cheirar a cara dele Jõe Bexiguento sobrenomeado Alparcatas deste qual o senhor recital já sabe um José Quitério comia de tudo até calango gafanhoto cobra um infeliz Treciziano o irmão de um José Félix o Liberato o Osmundo E os urucuianos que Zé Bebelo tinha trazido aquele Pantaleão um Salústio João os outros E que ia me esquecendo Raimundo Lê puçanguara entendido de curar qualquer doença e Quim Queiroz que da munição dava conta e o Justino ferrador e alveitar A mais que nos dedos conto o Pitolô José Micuim Zé Onça Zé Paquera Pedro Pintado Pedro Afonso Zé Vital João Bugre Pereirão o Jalapa Zé Beiçudo Nestor E Diodolfo o Duzentos João Vereda Felisberto o Testaem Pé Remigildo o Jósio Domingos Trançado Leocádio PaunaCobra Simião Zé Geralista o Trigoso o Cajueiro Nhô Faísca o Araruta Durval Foguista Chico Vosso Acrísio e o Tuscaninho Caramé Amostro para o senhor ver que eu me alembro Afora algum de que eu me esqueci isto é mais muitos Todos juntos aquilo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 452 tranqüilizava os ares A liberdade é assim movimentação E bastantes morreram no final Esse sertão esta terra A verdade que com Diadorim eu ia ambos e todos Além de que Zé Bebelo comandava Ao que vamos vamos meu filho Professor arrumar esses bodes na barranca do rio e impor ao Hermógenes o combate Zé Bebelo preluzia comedindo pompa com sua grande cabeça Assim de loguinho não aprovei então ele imaginou que eu estava descrendo Agora coage tua cisma que eu estou senhor dos meus projetos Tudo já pensei e repensei guardo dentro daqui o resumo bem traçado e ele pontoava com dedo na testa Acreditar eu acreditasse não duvidei O que eu podia não saber era se eu mesmo estava em ocasiões de boasorte A ser porque numa volta do RibeirãodoGalhodaVida a gente tinha topado com turma de inimigos retornados para lá por espiação Aí foi curto fogo mas eu levei uma bala de raspaz na carne do braço perdi muito sangue Raimundo Lê banhou com casca de angico na hora melhorei Diadorim amarrou bem com pano duma camisa rasgada Apreciei a delicadeza dele Atual todos prestaram em mim amizade de atenção aquilo vinha a ser até um consolo Só que depois de dois dias o braço me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 453 doía inteiro e inchava sei que a inchação me cansasse muito sempre eu queria esbarrar pra água beber Se eu tiver de atirar então como é que faço Não posso era outro meu receio Admirei porque o José Félix também tinha tido ferimento na coxa e na perna mas a natureza dele era limpa o ofendido secava por si nem parecendo ser Assim a primeira vez que me sucedia um amal isso me perturbasse O que me sofria até nas margens do peito e nos dedos da mão não me concedendo movimentos Muito temi por meu corpo Ah minha Otacília eu gemi em mim Pode que nunca mais você me veja e então nem viúva minha você não vai ser Uns recomendavam arnicadocampo outros aconselhavam emplastro de bálsamo com isso rente se sarava Aí Raimundo Lê garantiu cura com ervaboa Mas onde era que ervaboa se ia achar À Fazenda dos Tucanos chegamos lá esbarramos é na beira da Lagoa Raposa passada a Vereda do Enxu Visitamos o fazendão vazio não tinha almaviva de se ver E do RiodoChico longe não se estava Assim então por que era que não se avançar logo às duras marchas para atacar Sei de mim sei Zé Bebelo menos disse sem explicação Desconheci Cacei um catre camadevento num quarto meio escuro com coisa nenhuma não me importei Retém as forças Riobaldo Vou campear o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 454 remédio nesses matos Diadorim falou A gente nos Tucanos ia falhar dois dias ali ficamos comendo palmito e secando em sol a carne de dois bois No primeiro dia de tardinha apareceu um boiadeiro que com seus camaradas viajando Vinham de CampoCapão Redondo em caminhada para Morrinhos Por que tinham riscado aquela grande volta O senhor dá paz à gente Chefe o boiadeiro perguntou Dou paz damos amigos Zé Bebelo respondeu A quieto o boiadeiro então achou que devia de as novidades relatar Que se estava em meio de perigos Sim Os soldados Os que soldados esses mano velho Soldadesca pronta do Governo mais de uns cinqüenta Assim onde era que estavam Ao que estão em São Francisco e em Vila Risonha e mais outros deles vão vindo chegando Chefe é o que eu ouvi dizer Zé Bebelo escutando redondamente Só quis mais saber Se isso se aquilo Se o boiadeiro sabia o nome do Promotor de Vila Risonha e do juiz de Direito do Delegado do Coletor do Vigário O do Oficial comandante da tropa o boiadeiro não acertava dizer Aquele boiadeiro era homem sério com palavra merecida e vontade de estar bem com todos Tinha uma garrafa de vinho depurativo na bagagem me presenteou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 455 com um gole me fez bem Pousou lá no outro dia se foram muito cedo Nesse entremear eu senti meu braço melhor e estive mais disposto Andei andando vi aquela fazenda Essa era enorme o corredor de muitos grandes passos Tinha as senzalas na raia do pátio de dentro e na do de fora em redor o engenho a casadosarreios muitas moradas de agregados e os depósitos esse pátio de fora sendo largo lajeado e com um cruzeiro bem no meio Mas o capim crescia regular enfeite de abandono Não de todo Pois tinham desamparado um gato ali esquecido o qual veio para perto do jacaré cozinheiro suplicar comida Até por dentro do eirado mansejavam uns bois e vacas gado reboleiro Aí João Vaqueiro viu um berrante bom pendurado na parede da salagrande pegou nele chegou na varanda e tocou as reses entendiam uma ou outra respondendo e entraram no curral para a beira dos cochos na esperança de sal Não faz mês que o povo daqui aqui ainda estava João Vaqueiro declarou E era verdade com efeito pois na despensa muita coisa se encontrando aproveitável Nos Tucanos valia a pena Os dois dias ficaram três que tão depressa passaram João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 456 Madrugada no em que se ia partir dali eu acordei ainda com o escuro no amiudar Só assim acordei por um rumor seria o Simião que estava dormindo no mesmo cômodo e tacteando se levantava Mas me chamou A gente vai pegar a cavalhada Vamos ele disse Não gostei Estou enfermo Então vou Quem é que rala a minha mandioca repontei áspero Virei para o canto assim eu estava apreciando aquele catre de couro O Simião decerto ia mais o Fafafa e Doristino estavam bons para o orvalho dos pastos Diadorim que dormia num colchão encostado na outra banda já tinha se levantado antes e desaparecido do quarto Ainda persisti numa madorna Aquela moradia hospedava tanto assim sem donos só para nós Aquele mundo de fazenda sumido nos sussurros os trastes grandes o conforto das arcas de roupa a cal nas paredes idosas o bolor Aí o que pasmava era a paz Pensei por que seria tudo alheio demais um sujo velho respeitável e a picumã nos altos Pensei bobagens Até que escutei assoviação e gritos tropear de cavalaria Ah os cavalos na madrugada os cavalos de repente me lembrei antiqüíssimo aquilo eu carecia de rever Afoito corri compareci numa janela era o dia clareando as barras quebradas O pessoal chegava com os cavalos Os cavalos enchiam o curralão prazentes Respirar é que era bom tomar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 457 todos os cheiros Respirar a alma daqueles campos e lugares E deram um tiro Deram um tiro de rifle mais longe O que eu soube Sempre sei quando um tiro é tiro isto é quando outros vão ser Deram muitos tiros Apertei minha correia na cintura Apertei minha correia na cintura o seguinte emendando que nem sei como foi Antes de saber o que foi me fiz nas minhas armas O que eu tinha era fome O que eu tinha era fome e já estava embalado aprontado Às tantas o senhor assistisse àquilo uma confusão sem confusão Saí da janela um homem esbarrou em mim em carreira outros bramaram Outros Só Zé Bebelo as ordens de sobrevoz Aonde o quê Todos eram mais ligeiros do que eu Mas ouvi Mataram o Simião Simião Perguntei E o Doristino Ãã Homem não sei alguém me respondendo Mataram o Simião e o Aduvaldo E eu ralhei Basta Mas sobre o instante virei Ah e o Fafafa O que ouvi Fafafa não Fafafa está é matando Assim era real verdadeiramente de repente caído como chuva o rasgo de guerra inimigos terríveis investindo São eles Riobaldo os Hermógenes Diadorim aparecido ali em minha frente isto João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 458 falou Atiraram um horror duma vez tiros e tiros que estavam contra nós desfechando Atiravam nas construções da casa Dia dorim sacripante se riu encolheu um ombro só Para ele olhei o tanto o tanto até ele anoitecer em meus olhos Eu não era eu Respirei os pesos Agora agora estamos perdidos sem socorro inventei na mente E raciocinei a velocidade disto Ser pego na tocaia é diverso de tudo e é tolo Assim enquanto eu escutando na folha da orelha as minúcias recontadas as passadas dos companheiros no corredor o assoviar e o dar das balas que nem um saco de bagos de milho despejado Feito cuspissem o pôr e pôr Senti como que em mim as balas que vinham estragar aquela morada alheia de fazenda Medo nem tive não deu para ter foi outra noção diferente Me salvei por um espetar de pensamento que Diadorim cenho franzindo fosse mandar eu ter coragem Ele nem disse Mas eu me inteirei ligeiro demais num só destorcer Eh pois vamos É a hora eu declarei pus a mão no ombro dele Respirei depressa demais Aquele me apatetar saiba o senhor não deve de ter durado nem os menos minutos No átimo supri a claridade completa de idéia o sanguefrio maior essas comuns tranqüilidades E por aí eu sabia mesmo exato a gente já estava debaixo de cerco João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 459 Achei especial o jeito de João Concliz vir ansiado cauteloso Ação em que qualquer um anda nessas semelhantes ocasiões só encostado nas paredes Você fica aqui mais você e você Você dessa banda Você ali vocêaí acolá arrumação ele ordenava Riobaldo Tatarana tu toma conta desta janela Daqui não sai nem relaxa por via nenhuma Arredado lá embaixo avistei Marcelino Pampa indo para as senzalas com uns cinco ou seis companheiros Com outros Freitas Macho corria para a tulha e para o engenho uns junto com Jõe Bexiguento dito Alparcatas Meus peitos batendo tresdobro forte eu dividido naquela alarida A grave escorei meu rifle limpo arma minha amásia Ainda reconheci o Dimas Doido e o Acauã deitados atrás do cruzeiro do pátio Um daqueles urucuianos apareceu mais outro traziam balaio grande com algodão em rama Mais homens com sacos de sabugos foram buscar outros sacos carregavam um caixote também Tudo eles estavam transportando por entranqueirar o pátio de fora tábuas tamboretes cangalhas e arreios uma mesa de carapina retombada Arranjos de guerra esses são engenhados sempre com uma graça variada diversa dos aspectos de trabalho de paz isto vi o senhor vê homens e homens repulam no afã tão unidamente sujeitos maneiros feito João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 460 o meigo do demo assoprasse neles ou até mesmo os espíritos Suspirei de bestagem Ao menos alguém fungou e me cutucou era o Preto Mangaba mandado guarnecer ali comigo junto Preto Mangaba me oferecia dum pão de docedeburiti repartia amistoso Eu então me alembrei de que estava com fome Mas Quim Queiroz trazia mais munição ele ajudado por alguns arrastavam um couro o couro esse cheio repleto de munição arrastavam no assoalho do corredor Da janela da outra banda pus o olhar espiei o desdém do mundo distâncias Abalavam fogo contra a gente outra vez contra o espaço da casa Ixe de inimigo que não se avistava Somente eu queria saber era se agüentava manejar como era que estava sentindo meu braço Aí ergui mão para coçar minha testa aí me cismei e fiz com todo o respeito o pelosinal Sei que o cristão não se concerta pela má vida levável mas sim porém sucinto pela boa morte ao que a morte é o sobrevir de Deus entornadamente Atirei Atiravam Isso não é isto Nonada A aragem Diadorim onde estivesse Soube que ele parava em outro ponto em seu posto em praça Sustentava picando João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 461 alvos a para a frente junto com o Fafafa o Marruaz Guima e Cavalcânti na barra da varanda Todo lugar não era lugar Não se podendo esbarrar de jeito nenhum no arrebentar nas manivelas da guerra Aprendi os momentos Assim assazmente João Concliz tornava a vir zelante com Alaripe José Quitério e RasgaemBaixo Espera ele mandou Pelo que vinham também o Pitolô e o Moçambicão puxando uns couros de boi Esses couros inteiros eram para a gente pregar lá em riba nas padieiras ficarem dependurados de cortinado bambo nos vãos das janelas Depois o PacamãdePresas mais o Conceiço socavando com ferramenta a fito de abrir torneiras nas paredes por onde buraco de se atirar Aquela guerra ia durar a vida in teira O que eu atirava ouvia menos Mas o dos outros assovios bravos o achispe isto de ferro as balas apedrejadas Eu e eu Até meus estalos que a cada no próprio do coração À mira de enviar um grão de morte acertado naquelas raras fumaças dançáveis Assim é que é assim Ah E então aí no súbito aparecer Zé Bebelo chegou se encostou quase em mim Riobaldo Tatarana vem cá ele falou mais baixo meio grosso com o que era uma voz de combinação não era a voz de autoridade A de ver o que ele quisesse de mim Para eu passar avante na posição me transpor João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 462 para um lugar onde se matar e morrer sem beiras de maior marca Andei e segui presente que com Zé Bebelo tudo carecia mais era de ser depressa Mesmo me levou Mas me levou foi para um outro cômodo Ali era um quarto pequeno sem cama nenhuma o que se via era uma mesa Mesa de madeira vermelha respeitável cheirosa Desentendi Dentro daquele quarto como que não entrava a guerra Mas o pensar de Zé Bebelo ansiado eu sabia era coisa que estralejava inventaste e forte Mais antes larga o rifle aí deposita ele falou O depor meu rifle Pois botei em cima da mesa esquinado de través botei com o todo cuidado Ali se tinha lápis e papel Senta mano ele pois ele Ofereceu a cadeira cadeira alta de pau com recosto Se era para sentar assentei em beira de mesa Zé Bebelo de revólver pronto na mão mas que não contra mim o revólver era o comando o constante revirar e remexer da guerra E ele nem me olhou e me disse Escreve Caí num pasmo Escrever numa hora daquelas O que ele explicado mandou eu fui e principiei que obedecer é mais fácil do que entender Era Não sou cão não sou coisa Antes isto que sei para se ter ódio da vida que força a gente a ser filho João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 463 pequeno de estranhos Ah o que eu não entendo isso é que é capaz de me matar me lembrei dessas palavras Mas palavras que em outra ocasião quem tinha falado era Zé Bebelo mesmo Escreve O zunzum da guerra acontecendo era que me estorvava de direito pensar E Zé Bebelo não estava ali não era para isso para pensar por todos Como que fosse o papel para o que carecia era pouco Tinham de caçar mais papel qualquer por ali devia de ter Enquanto isso eu cumprisse de escrever na seca mão da necessidade E ouvimos praga de dor Ao que foi Uns gemidos despautados de sorrogo Companheiro ofendido O Leocádio ouvimos Semmodos se precipitado Zé Bebelo avançou para ali para ver Sem determinação tomada de ir eu também já estava lá atrás dele O homem o primeiro ferido caído sentado as pernas estendidas para diante as costas amparadas na parede com a mão esquerda era que ele suportava sua testa mas com a direita ainda segurava o rifle que o asno rifle ele não tinha largado Conforme Raimundo Lê já tinha exigido alguns vinham da cozinha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 464 trazendo as latas dágua Raimundo Lê lavava a cara do homem ensangüentada do Leocádio Esse estava atirado pelas queixadas má bala que lhe partira o osso o vermelho brabotava e pingava Meu filho tu agüenta ainda brigar Zé Bebelo quis saber O Leocádio que fez careta garantiu que podia O que posso Em nome de Deus e de meu São Sebastião guerreiro o que posso Sempre sendo a careta sem gracejo pois falar era o que para ele custava e maltratava E da Lei E da lei também Ah então vamos faz vingança menino faz vingança Zé Bebelo aforçurou Semelhante só botasse apreço nos fatos por resultar Zé Bebelo se endemoninhava Segurou meu braço suscitado de se voltar para a mesa para se escrever amanuense Pelo discorrer revólver na mão às vezes achei em minha fantasia que ele estava me ameaçando Ei ai vamos ver Que tenho esquadrão reiúno esses é que vão vir me dar retaguarda ele falasse Eu escrevesse com mais urgência Os bilhetes missiva para o senhor oficial comandante das forças militares outro para o excelentíssimo juiz da comarca de São Francisco outro para o presidenteda câmara de Vila Risonha outro para o promotor Apresta A massa do volume deles também dá valor ele regendo Acertei Escrevi O teor era aquilo mesmo o simples que se os João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 465 soldados no soflagrante viessem de rota abatida sem esperdiçar minuto então aqui na Fazenda dos Tucanos pegavam caça grossa reunida de lobo jaguatirica e onça de toda a jagunçada maior reinante no vezvez desses gerais sertões A rasa à justa e cerrar com fecho formal Ordem e Progresso viva a Paz e a Constituição da Lei Assinado José Rebelo Adro Antunes cidadão e candidato No pique dum momento perdi e achei minha idéia e esbarrei A em pé agora formada eu conseguia a alumiação daquela desconfiança Assim Em que maldei foi aquilo não seria traição Rasteiro tive que olhei Zé Bebelo no grude dos olhos Daí tão claro e aligeirado pensei os prefácios Aquele tinha sido homem pago estipendiado pelo Governo agora os soldados do Governo com ele se encontravam E nós todos Diadorim e eu os tristes e alegres sofrimentos da gente a célebre morte de Medeiro Vaz a vingança em nome de Joca Ramiro Nem eu sabia ao certo depois no correr de tantos meses o extrato da vida de Zé Bebelo o que ele tinha realmente feito somenos se cumprida a viagem de ida até em Goiás Soubesse o pior era que ele por oficio e por espécie não podia esbarrar de pensar não podia esbarrar de pensar inventado para adiante sem repouso sempre mais A gente estava por conta dele e sem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 466 repouso nenhum também nenhum o portanto E ele tinha trazido o bando cá para perto do São Francisco tinha querido falhar os três dias naquela fazenda atacável Quem sabe então o recado para os soldados virem ele mesmo já não teria enviado desde tempos Idéia essa Arre de espanto ah como quando onça delado pula quando a canoa revira quando cobra chicoteia Desse de ser Ao caminho dos infernos para prazo Aí careci de querer a calma O tiroteio já redobrava Ouvi a guerra Decerto eu estava exagerado Antes Zé Bebelo havendo de ser mesmo o chefe para a hora safado capaz Nem se desprazia Oi xô Pra esses munição não falta ele escarnecendo disse quando as descargas vieram em salva mais forte o fiufiu e os papocos Ah as balas que partiam telhas e que as paredes todas recebiam Cacos caindo do alto Te apressa Tatarana que nós dois temos também de atirar Alegre dito Na janela ali tinham pendurado igualmente um daqueles couros de boi bala dava zaquezaque empurrando o couro daí perdia a força e baldava no chão A cada bala o couro se fastava brando no ter o choque balangava e voltava no lugar só com mossa feita sem se rasgar Assim ele amortecia as todas para isso era que o couro servia Traição eu não queria pensar Eu já tinha preenchido João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 467 três cartas Não é do tutuco nem do zumbiz das balas o que daquele dia em minha cabeça não me esqueço mas do bater do couro preto adejante que sempre duro e mole no ar se repetia Advindo que algum me trouxe mais papel achado por ali nos quartos em remexidas gavetas Só coisa escrita já de tinta firme mas a gente podendo aproveitar o espaço embaixo ou a banda de trás reverso dita Que era que estava escrito nos papéis tão velhos Um favor de carta de tempos idos num vigente fevereiro 11 quando ainda se tinha Imperador no no me dele com respeito se falava E noticiando chegada em poder de remessa de ferramenta remédios algodão trançado tinto A fatura de negócios com escravos compra os recibos por Nicolau Serapião da Rocha Outras cartas Escreve filho escreve ligeiro A traição então Altamente eu escutava os gritos dos companheiros xingatório no meio da desbraga do quanto combate na torração Aqui mesmo esgueirados para a janela o Duzentos e o RasgaemBaixo agora ombreavam armas seu vezemquando a ponto atiravam Assim como não pude eu esbarrei outra vez e encarei Zé Bebelo sem final João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 468 Que é Que é lá ele me perguntou Devia ter me deduzido dos meus olhos mesmo melhor do que o que eu sabia de mim A pois Por que é que o senhor não se assina ao pé Zé Bebelo Vaz Ramiro como o senhor outrora mesmo declarou eu cacei contra reperguntando Ato visível que ele esteve pego no usual de seu modo assim de se espantar no ar Conheci Às vezes também um atraiçoa sem nem saber o que é que está produzindoàs falsas hajas Mas ele não tinha surpreendido a verdade do meu indagar a expedição de minha dúvida Conforme prazido consigo recachou e me disse me engambelando Ah hãan Também pensei Tanto que pensei mas não se pode Muito alta e sincera é a devoção mas o exato das praxes impõe é outras coisas impõe é o duro legal Aí fui escrevendo Simples fui porque fui ah porque a vida é miserável A letra saía tremida no demoroso Meu outro braço também recomeçava a doer quaseque Traição sem querer eu fui lançando no papel a palavra mas risquei Uma bala no couro assoviou soco outra entrou atrás entrou com o couro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 469 levantado deu na parede defronte ricocheteou e veio cair quente perto da gente Ali na parede tinha um chifre de boi de se dependurar roupa até armador de rede era de chifre de boi naquela Casa Sumamente eu esperei o pispissiu de alguma outra bala eu queria Soubesse por quê O pensar caladíssimo de Zé Bebelo me perturbava Mas ele disse Que é que é se debruçando Que erro que foi Não viu porque eu já tinha riscado Mas então ele muito falou Ia explicando De noite no escuro feito ia mandar dois cabras dos mais espertos viajeiros para rastejarem por ali furando o cerco cada um levava ruma igual daquelas cartas Assim Deus azado ajudasse e eles ou ao menos um deles conseguisse então era resumo certo que a soldadesca se mo vimentava de vir Apareciam os trapezavam apropositavam arrebentavam com os Hermógenes E a gente eu perguntei Ãe A gente A ver que você não me entendeu A gente obra jeito de se escapar no cererê da confusão Antes tanto que era muito difícil eu repostei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 470 Ah sim dificultoso é meu filho Mas pego é o nosso recurso Se não se outra que saldo é que temos e Zé Bebelo do dito sagaz se rigozijava Então com respeito eu disse que a gente podia experimentar de fazer isso mesmo agora furar uma saída por entre os Hermógenes brigando e matando Eu disse isso Mas tinha esquecido que estava era encostado em Zé Bebelo no questionar Aí quem era que podia com a idéia daquele homem quem era que se sustentava A foro pois assim ele me respondeu Pois era Tatarana Olhe escuta pensa esses Hermógenes não são mais valentes do que nós nem estão em quantidade maior mas fato é que eles chegaram a surdas e nos cercaram tomaram tudo quanto há de melhor nessas posições Asseados é que estão Agora nesta hora a gente forçar um escape pode ser que se tenha sorte mas mesmo assim sofrendo muitas mortes e sem meios para descontar essas sem alcance nenhum para se matar um bom poucado desses inimigos Tu entende Mas se os soldados chegarem têm de dar o forte fogo primeiro contra os Hermógenes fazendo neles muito estrago Aí se foge com tenção só na escapula Ao menos algum lucro se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 471 teve Ah tu vê o que se quer Ah o que tu também quer pois não quer Não nas artes que produzia mas no armar de falar assim ele era razoável Se riu qual Riu Eu sendo água me bebeu eu sendo capim me pisou e me ressoprou eu sendo cinza Ah não Então eu estava ali em chão em acu atôo de acuado Um ror de meu sangue me esquentou as caras o redor dos ouvidos cachoeira que cantava pancada Eu apertei o pé na alpercata espremi as tábuas do assoalho Desconheci antes e depois uma decisão firme me transtornava E eu vi fiquei sabendo me queimassem em fogo eu dava muitas labaredas muito altas Ah dava O senhor acha que menos acho Mais digo Mais fiz Antes veja o que eu pensei o que seguinte ia ser e ficou formado um decreto de pedra pensada que na hora de os soldados sobrechegarem eu parava perto de Zé Bebelo e que ele fizesse feição de trair eu abocava nele o rifle efetuava Matava só uma vez E daí Daí eu tomava o comandamento o competentemente eu mesmo e represava a chefia e forçando os companheiros para a impossível salvação Aquilo por amor do rijo leal eu fazia era capaz pelo certo que a vida deve de ser Mesmo não gostando de ser chefe descrendo do enfado de responsabilidades Mas fazia Aí pego a facapunhal e o facão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 472 grande tornei a pensar Até chegar a hora eu não ia falar disso com pessoa nenhuma nem com Diadorim Mas fazia procedia E eu mesmo senti a verdade duma coisa forte com a alegria que me supriu eu era Riobaldo Riobaldo Riobaldo A quase que gritei aquele este nome meu coração alto gritou Arre então quando eu experimentei os gumes dos meus dentes e terminei de escrever o derradeiro bilhete eu estive todo tranqüilizado e um só e insensato resolvido tanto que mesmo acho que aquele na minha vida foi o ponto e ponto e ponto E entreguei o escrito a Zé Bebelo minha mão não espargiu nenhum tremor O que regeu em mim foi uma coragem precisada um desprezo de dizer o que disse O senhor chefe o senhor é amigo dos soldados do Governo E eu ri ah riso de escárnio direitinho ri para me constar assim que de homem ou de chefe nenhum eu não tinha medo E ele se sustou fez espantos Ele disse Tenho amigo nenhum e soldado não tem amigo Eu disse Estou ouvindo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 473 Ele disse Eu tenho é a Lei E soldado tem é a lei Eu disse Então estão juntos Ele disse Mas agora minha lei e a deles são às diversas uma contra a outra Eu disse Pois nós a gente pobres jagunços não temos nada disso a coisa nenhuma Ele disse Minha lei sabe qual é que é Tatarana É a sorte dos homens valentes que estou comandando Eu disse É Mas se o senhor se reengraçar com os soldados o Governo lhe repraz e lhe premeia O senhor é da política Pois não é Õ gente deputado Ah e feio ri porque estava com vontade Aí pensei que ele fosse logo querer o a gente se matar A sorte do dia eu cutucava Mas ruim não foi Zé Bebelo só encurtou o cenho no carregoso Fechou a boca pensou bem Ele disse Escuta Riobaldo Tatarana você por amigo eu tenho e te apreceio porque vislumbrei tua boa marca Agora se eu achasse o presumido com certeza de que você está desconcordando de minha lealdade por malícias ou de que você quer me aconselhar canalhagem separada velhaca para vantagem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 474 minha e sua Se eu soubesse disso certo olhe Eu disse Chefe morte de homem é uma só Eu tossi Ele tossiu Diodolfo correndo vindo disse O Jósio está morrendo com um tiro no pescoço lá dele Alaripe entrou disse Eles estão querendo pôr mãos e pés no chiqueiro e na tulha Se assanham Eu disse Dê as ordens Chefe Eu disse gerido eu não disse copiável Sei que Zé Bebelo sorriu aliviado Zé Bebelo botou a mão no meu ombro era o da banda do braço que doía A vamos a vamos com macacos e bananas A cá na saladejantar meu filho ele instou À janela Agachei e escorei meu rifle arma capital Agora era obrar E aqueles sujeitos estavam loucos Cabeça de um se bolou redondante feito um coco por cima da palha de buriti que cobria uma casa de vaqueiro Adesfechei e vi arrebentar em pedaços o casco daquilo Daí a dor me doeu no ferimento do braço mordi meus beiços por essa causa Mas cacei Outro afundei logo cujo varei os peitos com outra bala certeira duas balas Ave que afoitos Ao tanto eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 475 gemia e apontava Eles em um e um caíam aceitavam o poder da morte que eu mandava Fiz conta uns seis sei até a hora do almoço meiadúzia Essas coisas não gosto de relatar não são para que eu alembre não se deve de Ao senhor só agora sim é de declaração é até ao desamargado dos sonhos Que eu ali jajão Conheço quando homem só disfarça quando se encolhe somente ferido ou mas quando retomba mesmo por desmanchado Mortes diferentes mortes iguais Pena se tive Vá se ter dó de canguçu dever finezas a escorpião Pena de errar algum eu ter podia ah mas não errava Deixa que deixavam só uns dois dedos de corpo em descoberto lateral e minha bala se comportava Como aquele meu braço me doendo ai dor doía de arrancado parecendo que um fogo desenraizava tudo dos ocos respondia até na barriga A cada que eu dava um tiro forcejava minha careta chorejava Ria despois Aperta esta minha parte de natureza com um cabresto com um pano companheiro eu supliquei Alaripe servente rasgou uma colcha de cama me passou dobras daquelas tiras arrochadas Também doesse que doesse que me importava arrasos em redor de mim Trastanto derrubei mais um mais vizinho Os outros uns Esse urubu já bicou Esse ia pulando em lanço para um canto da cerca esse repulou no ar esse deu um grito soltado Menos veja João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 476 e mire eu catasse de querer espécies de homens para alvejar feito se por cabeça ganhasse prêmio de contoderéis Mas mais de muitos a vida salvei pelo medo que de mim tomavam para não avançar nos lugares pelos tirázios Ainda demos um tiroteio varredor ainda batemos Aí eles desistiram para trás desandavam Assim pararam o balançar da guerra parou até para o almoço em boa hora E então conto o do que ri que se riu uma borboleta vistosa veio voando antes entrada janelas a dentro quando junto com as balas que o couro de boi levantavam assim repicava o espairar o vôo de reverências não achasse o que achasse e era uma borboleta dessas de cor azul esverdeada afora as pintas e de asas de andor Ara viva maria boasorte o Jiribibe gritou Alto ela entendesse Ela era quase a paz A comida para mim ali mesmo me trouxeram todos em minha pontaria punham prezado valor O imaginar o senhor não pode como foi que eu achei gosto naquela comida às ganas que era de feijão carneseca arroz mariagomes e angu Ao que bebi água muita bebi restilo O café que chupo E Zé Bebelo revindo me gabou Tu é tudo Riobaldo Tatarana Cobra voadeira Antes Zé Bebelo me ofereceu mais restilo o tanto também bebeu às saúdes Seria só por desconto de um começo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 477 de remorso por me temer em consciências A gente sabe mais de um homem é o que ele esconde Ah o Urutu Branco assim é que você devia se chamar E amigos somos A ver um dia a gente vai entrar juntos no triunfal na forte cidade de Januária aprontado ele falou Ao que resposta não dei Amigo Eu ali do lado de Zé Bebelo mas Zé Bebelo não estava do lado de ninguém Zé Bebelo cortador de caminhos Amigo Eu era sim senhor Aquele homem me sabia entendia meu sentimento A ser que entendia meu sentimento mas só até uma parte não entendia o depoisdofim o confrontante Assemelhado a ele pensei Pensei eu visse que traindo ele estivesse ele morria Morria da mão de um amigo Jurei calado E desde naquela hora a minha idéia se avançou por lá na grande cidade de Januária onde eu queria comparecer mas sem glórias de guerra nenhuma nem acompanhamentos Alembrado de que no hotel e nas casas de família na Januária se usa toalha pequena de se enxugar os pés e se conversa bem Desejei foi conhecer o pessoal sensato eu no meio uns em seus pagáveis trabalhos outros em descanso comedido o povo morador A passeata das bonitas moças morenas tão socialmente alguma delas com os cabelos mais pretos rebrilhados cheirando a óleo de umbuzeiro uma flor João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 478 airada enfeitando o espírito daqueles cabelos certos À Januária eu ia mais Diadorim ver o vapor chegar com apito a gente esperando toda no porto Ali o tempo a rapaziada suava cuidando nos alambiques como perfeito se faz Assim essas cachaças a vinteeseis cheirosa tomando gosto e cor queimada nas grandes dornas de umburana Ao menos daí desajoelhei e vim para a alpendrada avistar o que se passava com Diadorim e eu estipulava meu direito de reverter por onde que eu quisesse porque meu rifle certeiro era que tinha defendido de tomação o chiqueiro e a tulha nos assaltos e então até a Casa Diadorim guerreava a seu comprazer sem deszelar sem querer ser estorvado Datado que Deus que me livrou livrava também meu amigo de todo comezinho perigo As raivas naquela varanda vinham e caíam demasiadas vi Tiros altos revoantes eram os bandos de balas Assunto de um homem que estava deitado mal atravessado pensei que assim em pouco descanso Vamos levar para a capela Zé Bebelo mandou Assunto que era o Acrísio morto no meio torto Devia de ter se passado sem tribulação Agora não caçavam uma vela para em provisão dele se acender Quem tem um rosário Mas no sobrevento o Cavalcânti se exclamou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 479 A que estão matando os cavalos Arre e era Aí lá cheio o curralão com a boa animalada nossa os pobres dos cavalos ali presos tão sadios todos que não tinham culpa de nada e eles cães aqueles sem temor de Deus nem justiça de coração se viravam para judiar e estragar o rasgável da alma da gente no vivo dos cavalos a torto e direito fazendo fogo Ânsias ver aquilo Altebaixos entendendo sem saber que era o destapar do demônio os cavalos desesperaram em roda sacolejados esgalopeando uns saltavam erguidos em chaça as mãos cascantes se deitando uns nos outros retombados no enrolar dum rolo que reboldeou batendo com uma porção de cabeças no ar os pescoços e as crinas sacudidas esticadas espinhosas eles eram só umas curvas retorcidas Consoante o agarre do rincho fino e curtinho de raiva rinchado e o relincho de medo curto também o grave e rouco como urro de onça soprado das ventas todas abertas Curro que giraram trompando nas cercas escouceantes no esparrame no desembesto naquilo tudo a gente viu um não haver de doidas asas Tiravam poeira de qualquer pedra Iam caindo achatavam no chão abrindo as mãos só os queixos ou os topetes para cima numa tremura Iam caindo quase todos e todos agora os de tardar no morrer rinchavam de dor o que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 480 era um gemido alto roncado de uns como se estivessem quase falando de outros zunido estrito nos dentes ou saído com custo aquele rincho não respirava o bicho largando as forças vinha de apertos de sufocados Os mais malditos Os desgraçados O Fafafa chorava João Vaqueiro chorava Como a gente toda tirava lágrimas Não se podia ter mão naquela malvadez não havia remédio À tala eles os Hermógenes matavam conforme queriam a matança por arruinar Atiravam até no gado alheio nos bois e vacas tão mansos que desde o começo tinham querido vir por se proteger mais perto da casa Onde se via os animais iam amontoando mal morridos os nossos cavalos Agora começávamos a tremer Onde olhar e ouvir a coisa inventada mais triste e terrível por no escasso do tempo não caber A cerca era alta eles não tiveram fuga Só um um cavalão claro que era o de MãodeLixa e se chamava Safirento Se aprumou nas alças ficou suspenso cochilasse debruçado na régua que nem que sendo pesado em balança um ponto as nádegas ancas mostrava para cá grossas carnes depois tombou para fora se afundou para lá nem a gente podia ver como terminava A pura maldade A gente jurava vinganças E aí não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 481 se divulgava mais cavalo correndo todos tinham sido distribuídos derrubados Aquilo pedia que Deus mesmo viesse carnal em seus avessos os olhos formados Nós rogávamos as pragas Ah mas a fé nem vê a desordem ao redor Acho que Deus não quer consertar nada a não ser pelo completo contrato Deus é uma plantação A gente e as areias Aturado o que se pegou a ouvir eram aqueles assombrados rinchos de corposo sofrimento aquele rinchado medonho dos cavalos em meiamorte que era a espada de aflição e carecia de alguém ir para com pontaria caridosa em um e um com a dramada deles acabar apagar o centro daquela dor Mas não podíamos O senhor escutar e saber os cavalos em sangue e espuma vermelha esbarrando uns nos outros para morrer e não morrer e o rinchar era um choro alargado despregado uma voz deles que levantava os couros mesmo uma voz de coisas da gente os cavalos estavam sofrendo com urgência eles não entendiam a dor também Antes estavam perguntando por piedade Arre eu vou lá eu vou lá livrar da vida os pobrezinhos foi o que o Fafafa bramou Mas não deixamos porque isso consumava loucura Não dava dois passos no eirado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 482 e ele morria fuzilamento em balas se varava ah Agarramos segurado o Fafafa A gente tinha de parar presa dentro de casa combatendo no possível enquanto a ruindade enorme acontecia O senhor não sabe rincho de cavalo padecente assim de repente engrossa e acusa buracões profundos e às vezes dão ronco quase de porco ou que desafina esfregante traz a dana deles no senhor as dores e se pensa que eles viraram outra qualidade de bichos excomungadamente O senhor abre a boca o pêlo da gente se arrupeia de total gastura o sobregelo E quando a gente ouve uma porção de animais se ser em grande martírio a menção na idéia é a de que o mundo pode se acabar Ah que é que o bicho fez que é que o bicho paga Ficamos naquelas solidões Alembrar que tão bonitos tão bons inda ora há pouco esses eram cavalinhos nossos sertanejos e que agora estraçalhados daquela maneira não tinham nosso socorro Não podíamos E que era que queriam esses Hermógenes De certo seria tenção deles deixar aqueles relinchos infelizes em roda da gente diaenoite noiteedia diaenoite para não se agüentar no fim de alguma hora e se entrar no inferno Senhor então visse Zé Bebelo ele terrivelmente todo pensava feito o carro e os bois se desarrancando num atoleiro Mesmo mestremente ele comandava Apuremos fogo Abaixado fogo daqui João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 483 dali em ira de compaixão Adiantava nada Com pranchas de munição que a gente gastasse não alcançávamos de valer aos animais com o curral naquela distância Atirar de salva no inimigo amoitado não rendia No que se estava se estava o despoder da gente O duro do dia A pois então me subi para fora do real rezei Sabe o senhor como rezei Assim foi que Deus era fortíssimo exato mas só na segunda parte e que eu esperava esperava esperava como até as pedras esperam A faz mal não faz mal não tem cavalo rinchando nenhum não são os cavalos todos que estão rinchando quem está rinchando desgraçado é o Hermógenes nas peles de dentro no sombrio do corpo no arranhar dos órgãos como um dia vai ser por meu conforme Assim dhojeemdiante doravante sempre temos de ser ele o Hermógenes meu de morte eu militão ele guer reiro Assim o relincho em restos trescortado Aqueles cavalos suavam de derradeira dor Agarrávamos o Fafafa segurado disse ao senhor Mas mais de repente o Marruaz disse A bom vigia olha lá O que era Que eles quem havia de não crer que eles mesmos agora estavam atirando por misericórdia nos cavalos sobreferidos para a eles dar paz Ao que estavam As graças a Deus exclamou Zé Bebelo alumiado com um alívio de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 484 homem bom Ah é marmo o Alaripe exclamou também Mas o Fafafa nem nada não disse não conseguia o quanto pôde se assentou no chão com as duas mãos apertando os lados da cara e cheio chorou feito criança com todo o nosso respeito com a valentia ele agora se chorava Aí então se esperou Durado de um certo tempo descansamos os rifles nem um tirozinho não se deu O intervalo para deixar a eles folga de matarem em definitivo nossos pobres cavalos Mesmo quando o arraso do último rincho no ar se desfez de vez a gente ainda se estarrecia quietos um tempo grande mais prazo até que o som e o silêncio e a lembrança daquele sofrer pudessem se enralecer embora para algum longe Daí depois tudo recomeçou de novo em mais bravo E nisto que conto ao senhor se vê o sertão do mundo Que Deus existe sim devagarinho depressa Ele existe mas quase só por intermédio da ação das pessoas de bons e maus Coisas imensas no mundo O grandesertão é a forte arma Deus é um gatilho Mas conto menos do que foi a meio por em dobro não contar Assim seja que o senhor uma idéia se faça Altas misérias nossas Mesmo eu que o senhor já viu reviro retentiva com espelho cemdobro de lumes e tudo graúdo e miúdo guardo mesmo eu não acerto no descrever o que se passou assim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 485 passamos cercados guerreantes dentro da Casa dos Tucanos pelas balas dos capangas do Hermógenes por causa Vá de retro nanje os dias e as noites não recordo Digo os seis e acho que minto se der por os cinco ou quatro não minto mais Só foi um tempo Só que alargou demora de anos às vezes achei ou às vezes também por diverso sentir acho que se perpassou no zuo de um minuto mito briga de beijaflor Agora que mais idoso me vejo e quanto mais remoto aquilo reside a lembrança demuda de valor se transforma se compõe em uma espécie de decorrido formoso Consegui o pensar direito penso como um rio tanto anda que as árvores das beiradas mal nem vejo Quem me entende O que eu queira Os fatos passados obedecem à gente os em vir também Só o poder do presente é que é furiável Não Esse obedece igual e é o que é Isto já aprendi A bobéia Pois de mim isto o que é o senhor saiba é lavar ouro Então onde é que está a verdadeira lâmpada de Deus a lisa e real verdade A ser que aqueles dias e noites se entupiram emendados num ataranto servindo para a terrível coisa só Aí era um tempo no tempo A gente povoava um alvo encoberto confinado O senhor sabe o que é se caber estabelecido dessa constante maneira Se deram não sei os quantos mil tiros isso nas minhas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 486 orelhas aumentou o que azoava sempre e zinia pipocava proprial estralejava Assentes o reboco e os vedos as linhas e telhas da antiga casarona alheia era o que para a gente antepunha defesa Um pudesse narrar falo para o senhor crer que a casa grande toda ressentia rangendo queixumes e em seus escuros paços se esquentava Ao por mim hora em que pensei eles iam acabar arriando tudo aquela fazenda em quadradão Não foi Não foi como logo o senhor vai ver Porque o que o senhor vai é ouvir toda a estória contada Morreu mais o Berósio Morreu o Cajueiro O Moçambicão e Quim Queiroz para a gente se sortir traziam as quantidades de balas Rente Zé Bebelo andava em toda a parte mandando se atirar economizado e certeiro Ah oé meus filhos não vão desperdiçar Matem só gente viva ele trestampava É coragem e quépete que o morto morrido e matado não agride mais Aí cada um gritava para os outros valentia de ex clamação para que o medo não houvesse Aí os judas xingávamos Para não se ter medo Ah para não se ter medo é que se vai à raiva A sebo De dor do calor de inchação aquele meu braço sempre piorava Alaripe me cedeu de bondoso uma vasilha com água fria carreou para mim em entremeio de atirar eu molhava bem um pano torcia por cima do braço o gotejado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 487 frescor de alívio Um companheiro sempre me ajudando confor me agradeci Um urucuiano daqueles cinco urucuianos de Zé Bebelo Isso no instante estranhei Notei de repente aquele homem fazia tempo que não se arredava de mim sempre me seguindo por perto Solevei uma desconfiança Sempre o vulto presente daquele homem seria só por acasos O urucuiano deles que o Salústio se chamava O que tinha os olhos miudinhos em cara redonda boca mole e sete fios de barba compridos no queixo Arreliado falei Que que é Tu amigou comigo Tatu tua casa para ele Semisério ele se riu Comparsa urucuiano dos olhos verdes homem muito feioso Ainda nada não disse coçou a bar riga com as costas dobradas da mão gesto de urucuiano Eu bati com a minha mão direita por cima da canhota que pegava o rifle e deixei deixada gesto de jagunço Apertei com ele Ao que me quer Me deu resposta Ao assistir o senhor sua bizarrice O senhor é atirador É no junto do que sabe bem que a gente aprende o melhor A verdade com que ele me louvava Se riu muito sincero Não desgostei da companhia dele para os bastantes silêncios Assim é o que digo que quando o tiroteio batia forte de lá e daí de repente estiava aquilo servia um pesado salteação Surdo pensei aqueles Hermógenes eram gente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 488 em tal como nós até pouquinho tempo reunidos companheiros se diz irmãos e agora se atravavam naquela vontade de desigualar Mas por quê Então o mundo era muita doideira e pouca razão De perto a doideira não se figurava transcrita Pois o urucuiano Salústio João mais olhei Ali ajoelhado ele mirava e atirava Atirava e fechava os olhos Quando abria outra vez que ria ver alguém vivo Sosseguei Aí eu não devia de pensar tantas idéias O pensar assim produzia mal já era invocar o receio Porque então eu sobrava fora da roda havia de ir esfriar sozinho Agora por me valer eu tinha de me ser como os outros a força unida da gente mamava era no suscenso da ira O ódio quase sem rumo sem porteira Do Hermógenes e do Ricardão Neles eu nem pensava Antes pensei outra vez foi no embuste do urucuiano Atual ele se ajoelhava dobroso com a perna muito para trás a outra muito para diante Aquele homem achei estava mandado por Zé Bebelo para espreitar meus atos A prova que era de que Zé Bebelo despachava traição As espumas dele me espirravam Será que fosse para o urucuiano Salústio no primeiro descuido meu me amortizar Tanto não apostei Zé Bebelo me queria vigiado para eu não contar aos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 489 outros a verdade Ora bem que uns companheiros tinham avistado os bilhetes eu escrever o fato esquisito assim em hora de começo de fogo mas por certo pensavam que era para fazen deiros amigos nossos chefes de homens rogando que viessem com retaguarda e reforço Agora Zé Bebelo temia que eu candongasse Aí mandou o urucuiano fazer a minha sombra Mas Zé Bebelo carecia de mim enquanto o cerco de combate desse de durar Traidor mesmo traidor e eu também não precisava dele da cabeça de pensar exato Ao que naquele tempo eu não sabia pensar com poder Aprendendo eu estava Não sabia pensar com poder por isso matava Eu aqui os de lá do lado de lá A anhanga que em riba da gente despejavam balaços de tantos rifles balas que quebram tetos e portas Ah isso era desgraça sem mão mandante ofensa sem nenhum fazedor quase feito uma chuvadepedra acontecer de trovões e raios tempestade parecesse Eu ia ter raiva dos homens que não enxergava Podia ter Tinha toda era dos que eu matava bem Mas nem bem não era mesmo raiva era só confirmação Desse jeito foi que entardeceu o sol piscou a gente tendo perdido a certeza dos horários do dia Afã de dessossego era só Daí pegava um cansaço Fechasse a noite o perigo podia vir a ser maior Os Hermógenes não iam investir mediante trevas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 490 para um fim ali dentro de coronha e faca Morreu mais o Quiabo Outros atestavam uns ferimentos Por se necessitar da capela os defuntos a gente foi levando para um cômodo pequeno e sem janela que era pegado na escadinha do corredor Alaripe apareceu com uma vela acendeu enfiada numa garrafa Vela sozinha para eles todos Aí as lamparinas e candeias não bastavam Debaixo dum alumiar de candeia Zé Bebelo estava me convidando Arte que logo entendi Ele tinha mandado vir Joaquim Beiju e o Quipes para um segredado Agora aqueles dois era para surtirem saindo rastejando conforme o quiçá e cada um levava seu punhado de bilhetes enviados Por uma banda um o outro da outra o que Deus aprovasse chegava Assim eles aceitaram de cumprir e motivos não perguntaram Tudo em encoberto Então se Zé Bebelo guardava uma tenção honesta por que dito e feito era que não punha todo o mundo ciente do tramado Ainda esperei Mas dirá o senhor por que era que eu também não delatava aquilo os efeitos e projetos ao menos a Diadorim e Alaripe eu não contava Deponho que não sei Aos perigos os perigos Só duma coisa eu forte sabia Só que eu ia vigiar sempre Zé Bebelo Ele trair vivo eu não deixava Zé Bebelo tinha sua espécie de natureza que servia ou atraiçoava Ah depois eu ia ver João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 491 Ah eu ia ver se no engasgo da hora ele ia querer se estrapafar Joaquim Beiju e o Quipes ainda foram na cozinha cortar um decomer arranjar matula Por essa volta o jacaré mesmo combatia também às vezes em que não estava cozinhando e vinha atirar da beira duma janela com o Mijafogo A noite breava própria o mais escuro ia ser regulando em antes das dez horas que quando depois podia subir um caco de lua Aos poucos foi dando um tão respeitável silêncio não se atirava de parte nem de outra a gente mesma ficava na cautela de não se fabricar rumor nenhum de não se pautear sem necessidade De noite o clarão das pólvoras marca denúncia do lugar do atirador Noite é pra surpresas de estratagemas noite é de bicho no usável o Alaripe baixo falou O cearense bom esse per manecia em tudo igual com ele a gente desproduzia qualquer remorso o brigar parava sendo obrigação de vivente conciso dever de homem Por uns assim eu punia Por uns assim eu devia de ser inteiro leal eu mesmo Mas então eu carecia de encostar Zé Bebelo o espremer na franca fala A que ele soubesse de minha lei a que ele sem um aviso não se desgraçasse Mesmo por causa da gente porque Zé Bebelo era a perdição mas também só ele podia ser a salvação nossa Então João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 492 com ele eu ia falar o quieto desafio Adiantava Aí não adiantasse Mas então eu carecia de armar um poder carecia de subir para cima daquele homem Eu tinha de encher de medo as algibeiras de Zé Bebelo Só isso era o que valia Contra o quanto ele lavorava em firmes pelo mais pensável não descumpria de praxe nenhuma Determinou o pessoal para sono e sentinela revezados Onde perto de cada um dormindo um parava acordado Outros rondavam Zé Bebelo mesmo ele não dormia Sendo esse o segredo dele Dava o ar de querer saber o mundo universo administrava Ao quase que A água para a serventia da casa vinha num rego que beirava a cozi nha encostado no lateral descia e passava ainda por baixo da coberta A gente podia encher as latas sem arrisco O que eles hãode é de demover o rego lá em riba botar fácil a gente a seco Zé Bebelo ponderou Mandou reservar quantia repleta as vasilhas achadas e procuradas Fizemos Mas de destorcerem o veio do rego nunca que sucedeu aquilo Até o derradeiro final correu água bastante todo o tempo fresca abarulhava Ao se fossem também empeçonhar o de beber Toleima Aonde iam ter sortimento de veneno para águas correntes corromper João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 493 Deus escritura só os livrosmestres Na noite Zé Bebelo saiu engatinhando por mais escuro e revestido com as roupas bem pretas que arranjou dum e doutro Ele devia de ter ido até longe como rato em beira de paiol que coruja come Queria era farejar com os olhos o reprofundo Voltou aí deu ordem de outra coisa que todos aproveitassem o semlua para suas necessidades boçais aquelas tapadas estâncias A gente ia num vão de buracos da banda das senzalas Assim Zé Bebelo instruiu e se virou para mim Inimigo que faz igual numeração ou menor do que a nossa Por via disso é que não tomam coragem de dar assalto e é também que eles não conhecem o interior desta boa casa Falou o tanto comigo Por que era que ele me escolhia para os sussurros segredar Me achava comparsa Os beócios sem idéias Não chegam a ser contrários para mim ele muxoxou até desapontado A modo que eu em Zé Bebelo quase que tinha perdido toda minha fiança A amizade dele eu para longe de mim já encostava porquanto que por mão minha no incerto ele podia ainda vir a precisar de ser matado Eu estava em claro Eu tinha preenchido aqueles bilhetes e cartas amanuense os linguados de papel eu compartia as culpas A invencionice de ambicioneiro Riobaldo Tatarana tu vem comigo porque tu é João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 494 ponteiro bom fica de estadomaior meu ele avolumou Me inteirei Ali era a vez Ali era a alçada para eu fazer e falar o que já disse que eu estava com essa razão na cabeça Se tanto pensei É a minha viveza Pelo que repontei É Eu vou com o senhor e o urucuiano Salústio vem comigo Vou com o senhor e esse urucuiano Salústio vem comigo mas é na hora da situação Aí na hora horinha estou junto perto para ver A para ver como é que será vai ser O que será vai ser ou vai não ser alastrei no mau falar no gaguejável Senhor sabe por quê Só porque ele me mirou ainda mais mor arrepentinamente e eu a meio me estarreci apeado goro Apatetado Nem não sei Tive medo não Só que abaixaram meus excessos de coragem só como um fogo se sopita Todo fiquei outra vez normal demais o que eu não queria Tive medo não Tive moleza melindre Agüentei não falar adiante Zé Bebelo luziu ele foi de rajada Ao silêncio Riobaldo Tatarana Eh eu sou o Chefe João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 495 Saiba o senhor lá como se diz no vertiginosamente avistei meus perigos Avistei como os olhos fechei desvislumbrado Aí como as pernas queriam estremecer para amolecer Aí eu não me formava pessoa para enfrentar a chefia de Zé Bebelo Agora pois Mas agora não tinha outro jeito Ah Mas aí nem sei eu não estava mais aceitando os olhos de Zé Bebelo me olhar No mundo não tem Zé Bebelo nenhum Existiu mas não existe Nem nunca existiu Tem esse chefe nenhum Tem criatura nem visagem nenhuma com essa parecença presente nem com esse nome eu estabeleci em mansas idéias Aceitei os olhos dele não agarrei de olhar só para um lugarzinho naquele peito pinta de lugar titiquinha de lugar aonde se podia cravar certeira bala de arma na veia grossa do coração Imaginar isso no curto Nada mais nada Tive medo não Só aquele lugarzinho mortal Teso olhei tão docemente Sentei em cima de um morro de grandes calmas Eu estava estando Até quando minha tosse ouvi depois ouvi minha voz que falando a dável resposta Pois é Chefe E eu sou nada não sou nada não sou nada Não sou mesmo nada nadinha de nada de nada Sou a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 496 coisinha nenhuma o senhor sabe Sou o nada coisinha mesma nenhuma de nada o menorzinho de todos O senhor sabe De nada De nada De nada Ao dito falei por quê Mas Zé Bebelo me ouviu inteiramente As surpresas Ele expôs uma desconfiança perturbada Esticou o beiço Bateu três vezes com a cabeça Ele não tinha medo Tinha as inquietações Sei disso soube logo Assim eu tinha acertado Zé Bebelo então se riu modo generoso Adiantava Ainda falou Ah qual Tatarana Tu vale o melhor Tu é meu homem para alargamentos Murmurei o sosso de coisa o que nem era palavras A bem vamos animar esses rapazes amém ele disse espetaculava Daí desapartamos eu para a cozinha ele para a varanda O que eu tinha feito Não por saber mas somente pelo querer eu tinha marcado Agora ele ia pensar em mim mas meditado muito Achei Agora ele ia não poder trair simples mas havia de raciocinar as vezes dar de rédea para trás do avançado para traição A certa graça a situação dele aparvada Eu estava com o bom jogo Aquela noite meu quinhão dormi no amiudardogalo o tiroteio já principiava renovado Mas só os tiros espaços para não esperdiçar e render porque eles estavam procedendo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 497 como nós o igual imediato A guerra fina caprichada bordada em bastidor Fui ver o madrugar a manhã uma brancura O senhor sabe no levante clareou o céu com o sol das barras Mas o curralão já estava pendurado de urubus os usos como eles viajam de todas as partes urubu passarão dos distúrbios E quando dava que rondava o vento o curral fedia Mas perdoando Deus tresandava mais era dentro da casa mesmo sendo enorme os companheiros falecidos Se taramelou o quarto por tapar a soleira da porta se forrava com algodão em rama e aniagens O fedor revinha surgindo sempre traspassava A tanto depois a gente ouviu miados Sape O gato está lá algum gritou Ah era o gato que sim Saiu soltado surripiadamente foi tornar a se ocultar debaixo dum catre noutro cômodo Carecia de se oferecer a ele de comer que quem bemtrata gato consegue boasorte No menos na salade fora ocupei meu oficio de mosquetear A ganho conforme as vazas mais de um homem derrubei que rolou em réu sei que defini Avistante que os urubus já destemiam o se combater dos tiros assaz eles baixavam para o chão do curral rebicavam grosso depois paravam às filas na cerca acomodados acucados Quando pulavam de asas abanassem aquele fedor O dia andando a catinga no ar aumenta Aí eu não queria provar de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 498 sal roi farinha seca com punhado de rapadura Na casa toda como que não se achava um litro de cal um caneco de creolina por vil remédio Morreu o Quim Pidão se botou o corpo por cima dum banco na sala provisório ninguém não queria mais coragem de ir abrir com presteza o quarto dos defuntos O dia envelhecia A roubo estive perto de Diadorim quase só para espiar quase sem a conversação De ver Diadorim com agrado minha tenência pegava a se enfraquecer Outros receios eu concebendo O prazo que ali assim íamos ter de tolerar no carrego da guerra A gente até carecesse no derradeiro durar de comer somente os couros assados conforme o caso terrível de Dutra Cunha de um diabo que em sua fazenda do Canindé resistiu ao cerco de Cosme de Andrade e Olivino Oliviano Esse Dutra Cunha era o homem de um olho só Zé Bebelo bem sabia a história dele Agora de Zé Bebelo eu risse Montante de outras coisas ainda podiam suceder de desde a madrugadinha até à viração da tarde Mas ninguém falava em Joaquim Beiju e no Quipes A uma hora dessas ou eles já estavam arriados pelo inimigo ou então traquejando nos caminhos a rumo de cidades Assim entardecer anoitecer galopassem em algum cavalo arranjado nos campos e o tempo da gente eles estendiam Será que haviam de vir os soldados Aquele outro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 499 dia morreu mais o Acerejo A tudo o cheiro de morte velha O maufétido que vai terminar mazelando a gente sempre um dizer A dita morrinha até a água que se bebia pegava na boca da gente e rançava A Casa dos Tucanos agüentava as batalhas aquela casa tão vasta em grande com dez janelas por banda e aprofundada até em pedras de piçarrão a cava dos alicerces A Casa acho que falava um falar resposta ao assovioso a quando um tiro estrala em dois dois De embiricica entrantes as balas vinham puxavam um fio de ar Eh lascassem Mas os companheiros por conta àtoa riam não acrescentavam cangalha aos pesares Mesmo quando se sobrecarregava um rir os que estavam mais longe mandavam saber o porquê ou gritavam por perguntar em empenho de combate A resto um Zé Vital deu ataque o qual era um acesso sacramentado de feioso principiando depois que ele se queixava de sentir o nariz quente ele mesmo já sabia a data e daí proclamava um grito de porco com frio e caía estatelado no chão duro como um cano de arma mas atazanava batendo com os braços e pernas querendo às ânsias coisa ou criatura em que se agarrar o onde esbugalhava os olhos a boca aspumada escumando Se disse Isto é doença velha pertencida isto não é fato de guerra Acesso que passava a estado meio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 500 semimorto num vago pois deitaram o Zé Vital numa canastra de couro Ao para a tarde para a noite Aí tudo navegava A Casa estava se enchendo de moscas dessas de enterro as produzidas A cada que cada elas presumiam o sujo em penca maior pretejavam Para as coisas que há de pior a gente não alcança fechar as portas Desdenhei Diadorim De ver Diadorim que em febre de acertar e executar não tomava consigo muita cautela só forcejava por vingança punições maravilhosas Diadorim mesmo a cara muito branca de da alma não se reconhecer os olhos rajados de vermelho o encovo Aquilo era o crer da guerra Por que causa Porque Joca Ramiro constava de assassinado morrido A razão normal de coisa nenhuma não é verdadeira não maneja Arreneguei do que é a força e que a gente não sabe assombros da noite A minha terra era longe dali no restante do mundo O sertão é sem lugar A Bigri mulher minha mãe não tinha me rogado praga Alta manhã em tudo repetido o igual o cantar do rifleio afora o feder ruim dos mortos e cavalos e a moscaria que se esparramava Mesmo com a minha vontade toda de paz e descanso eu estava trazido ali no extrato no meio daquela diversidade despropósitos com a morte da banda da mão esquerda e da banda da mão direita com a morte nova em João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 501 minha frente eu senhor de certeza nenhuma Sem Otacília minha noiva que era para ser dona de tantos territórios agrícolas e adadas pastagens com tantas vertentes e veredas formosura dos buritizais O que era isso que a desordem da vida podia sempre mais do que a gente Adjaz que me aconformar com aquilo eu não queria descido na inferneira Carecia de que tudo esbarrasse momental meu para se ter um recomeço E isso era Pela última vez pelas últimas Eu queria minha vida própria por meu querer governada A tristeza por Diadorim que o ódio dele no fatal por uma desforra parecia até ódio de gente velha sem a pele do olho Diadorim carecia do sangue do Hermógenes e do Ricardão por via Dois rios diferentes era o que nós dois atravessávamos Do lado de Diadorim restei um tanto no afã de escopetear O inimigo nunca se via nem bem o malmal na fumacinha expelida de cada uma pólvora Arte artimanha que agora eles decerto andavam disfarçados de mbaiá o senhor sabe isto é revestidos com moitas verdes e folhagens Adequado que embaiados assim sempre escapavam muito de nosso ver e mirar Ah mas deles tiros vinham bala estripitriz e o trapuz de nossas telhas se despencando A mãe morte Quem devia mais esse morria Õ xente Não é que pegaram em mim e eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 502 estou passando estou ficando cegado exclamou o Evaristo Caitité quando descuidou a meiabanda e levou em si uma carga total Ele já estava sem jogo nenhum no corpo as partes das pernas se esfriavam Antes quase rindo se acabou ficou tão de olhos O que é que ele vê Vê a vitória Zé Bebelo se cresceu no dizer A vitória e os urubus que a farto comiam e o ManuelzinhodaCroa meu cavalinho pedrês que eu nele não ia poder nunca mais amontar Assustava era o alopro dos companheiros que não se sujeitavam mais de dormir estavam pertencidos perturbados A caso de se ter mão na nervosia deles que queriam dar saída e lanços avançar no ar Doidagem desses comuns repentes o desfazer do ajuntado A firmeza meus filhos Fôlego e paciência a gente sempre tem é só requerer e repuxar mais um dedo e outro dedo dobrado Zé Bebelo media os modos de valer Assim sendo agora só o remedeio com as esperanças extraordinárias A um jeito de se escapar dali a gente a salvos Zé Bebelo era a única possibilidade para isso como constante pensava e repensava obrava E eu cri Zé Bebelo que gostava sempre de deixar primeiro tudo piorar bem no complicado Um gole de cachaça me deu bom conselho Sem a vinda dos soldados se viessem a gente não estava perdidos Zé Bebelo não era quem tinha chamado os soldados Ah mas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 503 agora Zé Bebelo não ia mais trair não ia e isso só por minha causa Zé Bebelo carecia de rédeas de um outro diverso poder e forte sentir que tomasse conta desse rumo a ele Assim eu estava sendo Eu sabia Zé Bebelo mesmo nos relances de me olhar fingia não conhecer minha vigiação afetava Mas ele se estreitava em meus palpos conscienciado Agora ele tinha de especular de afinar a cabeça para o trabalho de imaginar maior achar alguma outra invenção para resolver o final com acerto para a vitória de nós todos sem traição nem airagem A tanto cri acreditado Sabia que Zé Bebelo era muito capaz Só não ri Ao menos outro deles dos Hermógenes quero ver se resgato de abater até vir o sereno do anoitecido eu meditei Não deu Não pude O que houve o conseguinte foi que Zé Bebelo pegou em meu ombro Ele mudou de lugar e pôs a cara no meio da luz Aí está ouvindo Tatarana Riobaldo está ouvindo ele disse com um sorriso de tão grandes brilhos que não era de ruindade e nem de bondade Aquilo foi num dia devia de estar sendo por volta de umas três da tarde pelo rumo do sol Ouvi Mas então a soldadesca tinha vindo alcançada estavam chegando Era Era Remexendo um rebuliço de nós todos mesmo porque os mais não conheciam aquele motivo de nada não soubessem o tencionado Os praças O tiroteio deles João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 504 pegando os Hermógenes de supetão surpresa bruta de retaguarda Os tiros que eram a bala bala bala bala bala ba la a bala bá desfechavam com metralhadora Aí arrejarrajava feito um capitão de vento Até destroçavam também nas custas da Casa Apre meninos faz mal não A vantagem do valente é o silêncio do rumor Zé Bebelo sentenciava Zé Bebelo trepava em altas serras Duvidava de nada Que vencia Quem vence é custoso não ficar com a cara de demônio Dele de perto não saí a atenção e ordem ele recomendava O cano de meu rifle era tutor dele Antes de minha hora no que ele mandasse opor e falasse eu não podia basear dúvidas Mas desde vez aquilo a vir gastava as minhas forças Ali sem a vontade mas por mais do que todos saber eu estava sendo o segundo Andando que Zé Bebelo falecesse ou trastejasse eu tinha de tomar assumida a chefia e mandar e comandar Outro fosse eu não Jesus e guia É baixo os homens não iam me obedecer nem de me entender eles não eram capazes Capaz de me entender e de me obedecer nos casos só mesmo Zé Bebelo A jus pensei Zé Bebelo somente era que podia ser o meu segundo Estúrdio isso nem eu não sabendo bem por que mas era preciso Era eu o motivo não sabendo Se fiz de saber foi João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 505 pior O que é que uma pessoa é assim por detrás dos buracos dos ouvidos e dos olhos Mas as pernas não estavam Ah fiquei de angústias O medo resiste por si em muitas formas Só o que restava para mim para me espiritar era eu ser tudo o que fosse para eu ser no tempo da quelas horas Minha mão meu rifle As coisas que eu tinha de ensinar à minha inteligência Agora o que era que se esperava Só Zé Bebelo decerto podia responder mas ele não dava senha de mudança Onde o normal Aí já se via o dia quase em fim com as cores do sol Voavam uns guaxes Dos soldados e dos judas quase que não se ouvia empipoco de arma só os tiros salteados a cá e lá como se escasso quisessem briga A gente sobrossosa nesse ensino de onça traiçoeiros todos Astúcias que manobrando em esconso deviam de estar para trás e para os lados pelo jeito melhor de pegarem o encoberto dos lugares querendo enrolar os outros para o remate de dar bote Soldado pede é cautela e o dobro soldo acho que um disse Aquela era a ocasião mais arriscada Ao que jagunço é isto o senhor ponha letreiro Ao encosto no rifle e apreparo nas patronas isso era o que bastava Nenhum dos companheiros estava desinquieto nem ralava apreensão Nenhum conversava precisando de saber a maneira de escapulir vivos dali da Fazenda dos Tucanos Com a chegada João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 506 da soldadesca o que parecia moagem era para eles era festa Assim uns gritaram feito araras machas Gente Feito meninos Disso eu fiz um pensamento que eu era muito diverso deles todos que sim Então eu não era jagunço completo estava ali no meio executando um erro Tudo receei Eles não pensavam Zé Bebelo esse raciocinava o tempo inteiro mas na regra do prático E eu Vi a morte com muitas caras Sozinho estive o senhor saiba Mas nisso conforme o acontecido exato uma coisa muito inesperada se deu Da banda do mato de repente por cima das moitas de lobolobo alguém levantou um pano branco na ponta de uma vara A gente não tinha licença de abrir fogo no alvo daquele trapo Apraz que a gente ia consentir em negócio com os judas Aqueles para mim guardavama definitiva marca e só o que podiam trazer era a maldição Mas Zé Bebelo maneiro em presteza já tinha amarrado um grande lenço branco na ponta de um rifle e mandou que o MãodeLixa aquilo erguesse e sacudisse no ar A regra que é regra Zé Bebelo disse A solenidade de embaixador sempre se tem de consentir até para herege até para bugre Aprovavam os outros deram razão Achei que estavam com a vontade de saber que notícias eram o que vir vinha Com o que mais admirei a mensagem daqueles João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 507 panos brancos de lá e de cá durou um certo tempo Como tudo nesta vida carece de se acertar direito Depois um sujeito apareceu do capim e veio devia de ter passado por um rombo feito na cerca A certa distância estava no eirado e um dos nossos disse reconhecendo Ah é o Rodrigues Peludo homem devoto do Ricardão Que era que era os outros companheiros concordaram Atrás desse meio engatinhando também surgiu mais um É o Lacrau E o Rodrigues Peludo virava para trás falava qualquer coisa parecia que estava mandando o Lacrau ir sembora Mas o Lacrau teimava seguia acompanhando o outro Xente dond é que está se comparecendo esse Lacrau Faz tempo que não se tinha ciência nenhuma dele O qual era dos Gerais do Bolor terra jequitinhonha e homem de certa valia Caboclo claro E que ele sendo réu tinha esfaqueado na sala de júri um promotor em outroras De ver os dois perto assim pessoas escada acima e presentes em pé diante da gente nas decididas condições achei muita esquisitice Rodrigues Peludo levantou os olhos feito se a gente estivesse no céu e saudou normal Daí disse Seô Chefe Homem te vira de costas Zé Bebelo regrou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 508 No assim simples eles obedeceram tanto um tanto o outro Mas estavam muito armados Momentos que foram eu louvei a coragem calma daqueles dois que de qualquer longe recanto um soldado talvez estivesse em poder de derrubar por belprazer Porque os soldados não pertenciam nessa cerimônia Afiguro o que pensei E Zé Bebelo perguntou impondo ordem de resposta que mandatela eles traziam Do lado meu o Diodolfo chiava boca num dente conforme sestro dele e o José Gervásio sussurrou Tramóia Mas Zé Bebelo regia tudo mão em revólver Um homem falar seu recado de costas no meio dos contrários na boca de tantas armas o senhor já presenciou essas circunstâncias Assim o Rodrigues Peludo deu conta sem rasgo de tremor na voz Com sua licença dada e nos usos estou trazendo estas palavras Seô Chefe que para repetir ao senhor fui mandado Que em vistas desses soldados e do mais que é contra todos se não era mais aproveitável para uma parte e outra de se fazer trato de paz por uns tempos E por essa oferta é que venho por ordens Que se serve ou valor tem o dito pergunta faço João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 509 e se o senhor há de estar ou não de acordo me dando a resposta que queira dar para eu levar para os meus chefes Que chefes Zé Bebelo indagou sem tom de nenhuma malícia Rodrigues Peludo demorou um ponto fazendo menção de virar o rosto mas o que deixou em tempo de fazer E contestou Nhô Ricardão E seô Hermógenes E eles então estão querendo paz Estão propondo um acordo correto Em boa distância do mato do grotal estralejou um tiro que era de fuzil E uns outros muito estampidos O que aquilo me constou era que era falta de respeito Tiros que não beiravam por aqui Mas mesmo assim Zé Bebelo disse Homem vocês podem abaixar o corpo Rodrigues Peludo sempre de costas se agachou depositou o rifle no chão o Lacrau meio ajoelhado ficou Agora eles estavam entre trincheiras Agora a roda nossa ajuntados os muitos companheiros brabos com a bafagem da boa cachaça o Marruaz que representou a dedo o sinosalomão no peito no rumo do coração o Preto Mangaba que mudando de estar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 510 esbarrou em mim do que me lembro e sei porque doeu em meu braço e Diodolfo cuspiu forte soluçou dos estômagos E o Fafáfa repontante Em paz quem é que devolve vida em nossos cavalos Aí o Moçambicão atrás de mim me ressoprou como um boi reconhecendo minhas costas Mas minha mão por si pegou a mão de Diadorim eu nem virei a cara aquela mão é que merecia todo entendimento Mão assim apartada de tudo nela um suave de ser era que me pertencia um calor a coisa macia somente São as palavras Mas aí espiei para Diadorim e ele despertou do que tinha se esquecido deixado de sua mão que ele retirou da minha outra vez quase num repelão de repugno E ele estava sombrio os olhos riscados sombrio em sarro de velhas raivas descabelado de vento Demediu minha idéia o ódio é a gente se lembrar do que não devede amor é a gente querendo achar o que é da gente O palavreado destes Diadorim chiou por detrás dos dentes Diadorim queria sangues fora de veias E eu não concordava com nenhuma tristeza Só remontei um pasmo e um consolo expedito porque a guerra era o constante mexer do sertão e como com o vento da seca é que as árvores se entortam mais Mas pensar na pessoa que se ama é como querer ficar à beira dágua esperando que o riacho alguma hora pousoso esbarre João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 511 de correr E Alaripe buliu no bissaco estava recheando de novo as suas cartucheiras Mas isto tudo que conto ao senhor se compartiu de caber em pouquinhos minutos instantes E do modo de um prosseguir sem partes Porque Zé Bebelo as mãos na cinta se encurtava frio em siso feito uma a cobra O que disse o quanto Homem e o que mais Era tudo o que eu já falei Chefe seô Ao que peço vossa resposta para conduzir E em caso de algum acordo que é de bom respeito as ordens tenho para com meu juramento fechar trato foi a resposta de Rodrigues Peludo com a clara voz de quem está mais cumprindo do que querendo Até inveja eu tive dele porque para viver um punhado completo só mesmo em instâncias assim Antes bem Zé Bebelo glosou quem é que está rodeando e vexando os outros e atacando O em usos é a gente Isto é o Rodrigues Peludo compôs o confessar Ah Isto era Ah e então Ao que vim ajustar é propostas Ao para salvo e lucro das nulas partes As ambas Caso se Ossa Seoria se concorde João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 512 Somenos aprumo nem o tom Mas de tudo seja também o que gravei aí desse Rodrigues Peludo foi um tertem de existidas lealdades Assim que inimigo persistia só inimigo surunganga mas enxuto e comparado contrahomem sem o desleixo de si E que podia conceber sua outra razão também Assim que então os de lá os judas não deviam de ser so mente os cachorros endoidecidos mas em tanto pessoas feito nós jagunços em situação Revés que por resgate da morte de J oca Ramiro a terrível que fosse agora se ia gastar o tempo inteiro em guerras e guerras morrendo se matando aos cinco aos seis aos dez os homens todos mais valentes do sertão Uma poeira dessa dúvida empoou minha idéia como a areia que a mais fininha há que é a que o rio Urucuia rola dentro de suas largas águas quando as chuvaradas do inverno Ali dos meus companheiros tantos mortos Acaso que companheiros eram e agora o que se depositava deles era o assunto de lembranças e aquele amassado e envelhecido feder que às horas repontava Constado que produziam isso mesmo estando amontoados no cômodo soturno entrapadas as frestas da porta e cá fora se torrando couros com folhas polvreadas Mediante os estoques desse maucheiro por certo Rodrigues Peludo e o Lacrau iam orçar a boa conta de nossos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 513 mortos afora os feridos leves e graves Mas Zé Bebelo ante teve de mandar chamar Marcelino Pampa João Concliz e muitos diversos outros e o apinho e apessoar nosso ombros em ombros aprazava efeito de bando significado numeroso Com os vivos é que a gente esconde os mortos Aqueles mortos o Jósio entortado prestes com pedaços de sangue pendurados do nariz e dos ouvidos o Acrísio repousado numa agência quieta que ele não havia de em vida o Quim Pidão no pormiúdo de honesto que nunca nem tinha enxergado tremdeferro voltaeoutra a perguntar como seria e Evaristo Caitité com os altos olhos afirmados esse sempre sido prazenteiro no meio de todos Tudo por culpa de quem Dos malguardos do sertão Ali ninguém não tinha mãe Redigo ao senhor quando o raio quando arraso o Gerais res ponde com esses urros A culpa daquele Rodrigues Peludo por um exemplo Desmenti O ódio de Diadorim forjava as formas do falso Odio a se mexer em certo e justo para ser era o meu mas na dita ocasião eu daquilo sabia só a ignorância Àtoa até que estava relembrando o Hermógenes Assim pensando no Hermógenes só por precisão de com alguém me comparar E com Zé Bebelo eu me comparar mais eu não podia Agora Zé Bebelo eu eu mesmo eu era João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 514 quem estava botando debaixo de julgamento Isso ele soubesse Ah naquela cabeça grande o que Zé Bebelo pensava era o útil o seco e a pressa De curto ponto ele disse concedendo um foral Resolvo Sendo em séria fiança eu aceito o intervalo de armas com o prazo demarcado de três dias De três dias digo Agora homem tu vai remete isto ao que estiver o seu chefe seja lá quem A vou o Rodrigues Peludo se prometeu Se sendo em séria fiança então de lá um dê três tiros pra o trato fechado Assim assente para esta noite no instinto em que a primeirinha estrela se frisar A vou O Rodrigues Peludo repuxava bandoleira do rifle e salvava saudação Às vozes do ruído reponho que nenhum de nós não sabendo se a decisão de Zé Bebelo era justa e convinhável ninguém disse mote de dúvida nem de aprovo Nisso no olho do silêncio ainda era só o que me prevalecia Rodrigues Peludo botou o rifle no sovaco já no jeito de que ia engatinhar descendo a escada Mandava a vontade de um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 515 sabente de si Zé Bebelo mandava ele tinha os feios olhos de todo pensar A gente preenchia Menos eu isto é eu resguardava meu talvez Mas aí de abalo o Lacrau que tinha persistido quieto feito ouvindo santamissa perto do altar ele surge se vira virou pelo repente a traque disse Aqui eu eu fico no meio de vós meu Chefe a que vim para isto Sou homem que sempre fui do estado de Joca Ramiro ele é o das próprias cores Agora meu braço ofereço Chefe A por tudo quanto se sepreponha o senhor de me aceitar A acarra daquilo tão exclamaste a forte palavra Assomo assim de frechar surpresa a gente capistrou grossamente e sem fala Tudo o que ele disse o Lacrau se empinou empé Onde mais deixou o silêncio se perfazer da questão anterior a suplicação o concitado O que era fato imponente digo ao senhor mire veja mire veja Ânimo nos ânimos A quanto semelhavelmente esse Lacrau não se comportava sem consciência sisuda no amor mais àmão para se segurar com trincheiras mas assim mesmo a gente em aperto de cerco ele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 516 tinha querido vir para sócio Alguém ficou como pasmado Zé Bebelo não Aqui me praz que te aceito rapaz Zé Bebelo deferiu A guerra tem destas coisas contar é que não é plausível Mas mente pouco quem a verdade toda diz Trás isso o Rodrigues Peludo esbarrou o instante mas endurecendo a cabeça para não se virar para espiar para o Lacrau Em tanto que o Lacrau meio mostrando o rifle pronunciou Estou na regra tio mano que na regra estou como senhor de minhas ações contra quem eu seja E a carabina porque sempre foi minha de posse arma que de patrão não ganhei Estou inteiro Ninguém respondeu palavra Sendo que o Rodrigues Peludo deixou de contravir e puxando pelo sair assim escorregou adiante o corpo se foi Numa rodamorta se esperou ré que de lá da dobrada duma ladeirinha os três tiros eles deram somando o aprovado A tanto tresmente também se respondeu desfechando Aí para a gente Zé Bebelo disse Sou lá o maluco Aqueles outros não têm a constância de observar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 517 não merecem a palavra dada O que fiz foi encaminhar o que vamos pôr em obra E aceitei nossa vitória Seja ou não se aquele negócio entendessem os companheiros aprovavam Até Diadorim Seja Zé Bebelo levantava a idéia maior os prezados ditos uma idéia tão comprida O teatral do mundo um de estadela os outros ensinados calados Sempre sendo em todo o caso que Zé Bebelo me semiolhava espreitado avulso sob receios e respeito Só eu afora ele ali misturava as matérias Só eu era que guardava minha exata esperaçao o que me engraçava O que era que Zé Bebelo ia proceder nas horas vespertinas no postoque Do que ele tinha pensado e principiado as tramóias de trair ia poder largar e achar feição para outro salvamento agora nessa con junção Mas porém não nego que eu mesmo por estima queria que ele bem acertasse na tarefa de meter seu siso de remerecer O raciocínio que dele eu gostava constante de admiração e pela necessidade Medonho e esquisito achei que fosse para ter de matar completo Zé Bebelo Como é que Mas ele abria lugar demais o perto demais sobre papel que não era o pra ele a meu parecer Pelo que eu tinha precisão de me livrar daquele movi mento sem termo nem nenhumas outras ociosidades O senhor João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 518 me organiza Saiba essas coisas eu pouco pensei no lazer de um momento Amigos agora eu louvo e a todos gabo cada um qual melhor E então vamos voltados papocar fogo pra paga até a noitinha se ilustrar Zé Bebelo determinou tão versado A este ponto que por se possuir basta munição a gente se prezasse de atirar por sustos e estragos primeiramente para o aviável do matinho dos pastos e da baixada e dos morrotes cerradeiros onde existiam uns valos Com o que no ablativo do mandado Marcelino Pampa ia retornar para as senzalas o Freitas Macho para a tulha e para o engenho o Jõe Bexiguento sobrenomeado Alparcatas Mas Zé Bebelo reservou que eu estivesse com ele e mais Alaripe por se pôr o Lacrau em conversa deposta Onde o que o Lacrau teve para relatar era pouco pouco Deu razão das coisas perguntadas Dizendo que o inimigo se formava em tanto de uns cem mas a quanta parte deles de jagunços mal assentados sem quilates ainda aguardavam outra gente por vir de refrescos que decerto em pronto não viessem por estorvo dos soldados Nisso não sabia contar das pessoas nem dos maiores motivos do Hermógenes e do Ricardão nem acerca da morte de loca Ramiro aumentava passagens mais do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 519 que as de todos já entendidas Daí no que Zé Bebelo e Alaripe se afastaram no corredor ele Lacrau aliviado se gracejou de rosto como falou O esmarte homem que é este chefe nosso Zebebéo Outro não vi para espiritar na gente o pavor e a ação de acerto As agudezas A vez da má verdade Fomos Fui Para o recanto duma janela nesse comenos A pra efetuar fogo A ordem não erade Desígnios esses de Zé Bebelo Sucinto em cada puxada de gatilho relembrei o dito do Lacrau que Zé Bebelo o que era Sendo que uma criatura só a presença tira o leite do medo de outra Aí Diadorim mesmo que era o mais corajoso sabia tanto O que o medo é um produzido dentro da gente um depositado e que às horas se mexe sacoleja a gente pensa que é por causas por isto ou por aquilo coisas que só estão é fornecendo espelho A vida é para esse sarro de medo se destruir agunço sabe Outros contam de outra maneira A ordem de se jantar o jacaré veio avisando Comi a pura farinha Tomei mais Os soldados era o que mais se perguntava Tinham esbarrado tiroteio a gente não escutava o costurar Medido nas suas partes o dia estava gastado beirava o prazo da decisão Excogitei Diadorim esta noite no começo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 520 da hora você vem para perto me assiste comigo Mas Diadorim contradisse de querer saber que modos meus que eram as tantas espécies Ainda pensei no Alaripe A ele me fiz A de paga amigo Ora veja o Alaripe divertido me achou De qual deles agora eu ia cobrar e arrecadar Acauã ou o Mão deLixa ou Diodolfo Todos seguiam caminho de seus costumes no novo não conseguiam de se nortear Três tristes de mim Ali eu era o indez Noção eu nem acertava de reger eu não tinha o tato mestre nem a confiança dos outros nem o cabedal de um poder os poderes normais para mover nos homens a minha vontade Mesmo meu braço do ferimento que já estava muito melhorado por si aí tornou a doer no injusto em tanto que isto se passava Adrede no retorcer do vento apurei o ruto de nossos cavalos os ossos de feder só a lástima Será que eu tivesse por dever de peitar pessoas Ah nos curtos momentos eu não ia explicar a eles coisas tão divagadas e que podiam mesmo não vir a ter fundamento nenhum Porque eu digo ao senhor eu mesmo duvidava Tivesse de vigiar no estreito Zé Bebelo atravessar o projeto dele se o caso fosse que modo que eu ia enfrentar um homem assim Ah o julgamento no SempreVerde tinha sido relaxado em brando para valer preços Zé Bebelo sozinho por si em outro sobrecalor de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 521 regimento servisse para governar os arrancos do sertão Não me importo Não me importo eu quis com outras palavras tais Ali eu não tinha risco Ali alguém ia me chamar de Senhor meumuitorei Ali nada eu não era só a quietação Conto os extremos Só esperei por Zé Bebelo o que ele ia achar de fazer ufano de si de suas proezas malazarte Deu comigo Riobaldo Tatarana Anda que me encarava os sagazes olhos piscados Aquele me entendia me temesse Riobaldo Tatarana vem comigo quero ver a opinião sem sinal nem prova Ali me levou para uma janela da cozinha de lá a grande espaço se tinha vista para o morro com seus matos Zé Bebelo pegou o caneco que encheu no pote dágua Também bebi Assim escutei ele falava comigo com o efeito de uma amizade Rapaz você é um que aceita o matar ou morrer simples igualmente eu sei você é desabusado na coragem melhor que é a da valentia produzida Só mostrei meus ombros seja que eu secundei A tão bom que é que eles agora vão fazer os da banda contrária aí ele indagou de mim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 522 Ora O que não sei e saber quero é a gente o que é que a gente agora vai fazer perguntei para cima Outro tal repontei Estou em claro E estou em dúvida Todo tempo me gasta isto assim dito Só que Zé Bebelo queria não ouvir a seu seguro Te põe no lugar Hem O que eles fazem é que a estas horas estão no desembargar para aquele morro que é aonde soldados não apertam cerco De lá foram por esse sul abaixo via torta de madruga já por lá no BuritiAlegre que foram surgir escrevo Agora hem maximé e os soldados Andam tomando contas daí que são lugares rededores salvante a sapata do morro e dela os pertos a cava porque lá conforme a boa regra de razão paravam com os tiros sobre si Oh se sabe Noves e nada eu não dissesse A bem à e nós Zé Bebelo tornou a indagar A resposta não dei Aquilo tudo eu estava pondo de remissa Ah tempo de partida A gente nós vamos é rente por essa cava Riobaldo meu filho Sem tardadaporque daqui a pois sai é a lua declaradamente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 523 Ao que já se estava no ponto Anoitecido A uma estrela se repicava nos pretos altos o que vi em virtude A estrelinha lume lume Assim quem era que tinha podido mais Zé Bebelo ou eu Será quem era que tinha vencido Quite com isso no cumprir entreguei os destinos O truztruz Com pouco nesse passo os todos homens se apessoando no corpo daquele corredor as fileiras em mexe mexe desde a saladefora até à cozinha sobre mais entre os conspirados silêncios os movimentos com energias Arte e tanto Zé Bebelo expunha o que recomendava Sempre uma ou outra lamparina se acendeu para os companheiros empalidecidos Agora a gente ia romper a pé sem os recursos dava dó era a quantia de munição de se largar ali no se pôr em salvo Assaz então tudo o que possível se encheu de balas e caixas os bornais e capangas patronas e cartucheiras Mas não bastava A ser que daí um inventou uma fronha de cama a que presada com correia ou corda para tiracol concabia tiros em boa dose e muitos assim aproveitavam logo não restou fronha a dispor Mesmo a alguma matula também se devia por garantir Desde aí no concorrer se saía por uma porta O quanto a noite se atravava de bom grosso Adiante primeiro foram mandados João João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 524 Concliz Moçambicão e Suzarte para reconhecerem se estava limpo o caminho rumo de fuga sem o estorvável Ponto que os poucos feridos que havendo se queixavam em condições mesmo o Nicolau que se escorava no rifle e às vezes se retarda va Só ficando na Casa os mortos que não careciam de se rezar a eles adeus os soldados amanhã que viessem que enterrassem Soformamos diversos golpes acho que cinco Diadorim e eu entramos no derradeiro com o comando do próprio Zé Bebelo e com o Acauã o Fafafa Alaripe e Sesfredo que acompanhavam comigo Saíram os de primeiramente iam um ante outro como um rio a buscar baixo ou um cão cão A gente demorava Aquela cozinha grande no cabo do negócio muito aprisionava de sobreleve e contei os companheiros as respirações Saíram outros e outros Dos dianteiros nem se percebia rumor Toda a hora eu esperava um tiro e um grito de altoláorei Mas era só o tremer daquela paz em proporção Admirei Zé Bebelo A vez nossa chegada ali o acostumar os olhos com o outro mudar Abaixamos e saímos também Semoveuse Livrados No escuso o tudo ajudando fizemos passagem avante mais Tempo que andamos contracalados soprando o sangue para se esfriar até que se cobrou veras de perigo não haver no regozijo de poupados de qualquer espreita ou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 525 agredimento Se esbarrou para ar um sueto de uns momentos Não é que o gato ficou lá um risonho falou Ah demais A lá é a Casa outro se pôs Aquela àmorte fazenda grande dos Tucanos Vai eu o cheiro fartado bom de folhas folhagens e do capim do campo enunciou em meu lembrar o maucheiro dos defuntos que agora próprio no meu nariz eu nem não aventava mais E Zé Bebelo segredando comigo espiou para trás observou assim pegando na minha mão Riobaldo escuta botei fora minha ocasião última de engordar com o Governo e ganhar galardão na política Era verdade e eu limpei o haver ele estava pegando na mão do meu caráter Aí aclarava era o fornido crescente o azeite da lua Andávamos Saiba o senhor pois saiba no meio daquele luar me lembrei de Nossa Senhora A de entre entramos pela esquerda e rumo do norte Desde o depois o do poente mesmo Com foras e auroras estávamos outra vez no público do campo Antes da manhã agora se passava a VeredaGrande no VaudosMacacos Ao que em rompendo a luz toda da manhã se chegou no sítio dum Dodó Ferreira onde a gente bebeu leite e os meus olhos pulavam nas árvores Aquilo de verdade e eu em mim como um boi que se sai da canga e estrema o corpo por se prazer João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 526 Assim foi que nesse arraiar de instantes eu tornei a me exaltar de Diadorim com esta alegria que de amor achei Alforria é isso Sobre mesmo a pé e com o peso completo caminhar pelos Gerais parecia que pouquinho me cansava Diadorim o nome perpetual Mas os caminhos é que estão se jazendo em tudo no chão sempre uns contra os outros retorce que os falsíssimos do demo se reproduzem O senhor vá me ouvindo vá mais me entendendo No sítio desse Dodó Ferreira o Nicolau e o Leocádio iam ficar acoitados lá até que pudessem sarar de todo somenos Nós não De que desde dali rifles nas costas riscamos de rota abatida para o CurraisdoPadre para renovame porque lá se tinha resguardada uma boa cavalaria À força de inchar pé e esmorecer pernas pelo que aquilo nem foi viagem era rojão de escabrear menção de cativeiros Desgraça de estrada as pedras do mundo minhas léguas arrependidas De que serve eu lhe contar minuciado o senhor não padeceu feliz comigo Saber as revezadas do capim Ah então que foram mimoso sempre verde marmelada agrestes e gramadeburro A caminhada é assim é ser despesa grossa o abalo Contra a mera vontade que meio me lembro aquelas ladeiras de chapadas Subindo para terreno concertado cada tabuleiro que o fim dele é dificultoso João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 527 pior do que batoqueira de caatingal Os muitos campos com tristeza agora bota valesse menos que alpercata O vento endureceu Aí passa gavião apanha guincho de todas as estirpes deles o que gaviãozinho quiriquitou E lá era que o senhor podia estudar o juízo dos bandos de papagaios O quanto em toda vereda em que se baixava a gente saudava o buritizal e se bebia estável Assim que a madotagem desmereceu em acabar mesmo fome não curtimos por um bem se caçou boi A mais ainda tinha araticum maduro no cerrado Mas para balear uma rês da solta era o mister de toda sorte e diligência por ser um gado estruso estranhador O fumo de pitar se acabando repentino na algibeira de uns e outros bondade dos companheiros era que acudia E deu daquele vento trazedor chegou chuva A gente se escondendo divididos embaixo dos pequizeiros que tempesteava Dormir remolhado se dormia com a lama da friagem De madrugar depois se achava era pé de onça circulando as marcas E a gente ia recomeçado se andava no desânimo nas campinas altas Tão território que não foi feito para isso por lá a esperança não acompanha Sabia sei O pobre sozinho sem um cavalo fica no seu permanece feito numa croa ou ilha em sua beira de vereda Homem a pé esses Gerais comem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 528 Diadorim vinha constante comigo Que viesse sentido soturno Não era não isso eu é que estava crendo e quase dois dias enganoso cri Depois somente entendi que o emburro era mesmo meu Saudade de amizade Diadorim caminhava correto com aquele passo curto que ó dele era e que a brio pelejava por espertar Assumi que ele estava cansado sofrido também Aí mesmo assim escasso no sorrir ele não me negava estima nem o valor de seus olhos Por um sentir às vezes eu tinha a cisma de que só de calcar o pé em terra alguma coisa nele doesse Mas essa idéia que me dava era do carinho meu Tanto que me vinha a vontade se pudesse nessa caminhada eu carregava Diadorim livre de tudo nas minhas costas Até o que me alegrava era uma fantasia assim como se ele por não sei que modo percebesse meus cuidados e no próprio sentir me agradecendo O que brotava em mim e rebrotava essas demasias do coração Conti nuando feito um bem que sutil e nem me perturbava porque a gente guardasse cada um consigo sua tenção de bemquerer com esquivança de qualquer pensar do que a consciência escuta e se espanta e também em razão de que a gente mesmo deixava de excogitar e conhecer o vulto verdadeiro daquele afeto com seu poder e seus segredos assim é que hoje eu penso Mas então num determinado eu disse João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 529 Diadorim um mimo eu tenho para você destinado e de que nunca fiz menção o qual era a pedra de safira que do Araçuaí eu tinha trazido e que à espera de uma ocasião sensata eu vinha com cautela guardando enrolada numa pouca de algodão dentro dum saquitel igual ao de um breve costurado no forro da bolsa menorzinha da minha mochila De desde que falei Diadorim quis muito saber o presente qual era assim apertando comigo com perguntas que sem aperreio deixei de responder até de tarde quando fizemos estância A parança que foi conforme estou vivo lembrado numa vereda sem nome nem fama corguinho deitado demais de água muito simplificada Aí quando ninguém não viu eu saquei a mochila desfiz a ponta de faca as costuras e entreguei a ele o mi mo com estilo de silêncio para palavras Diadorim entrefez o pratrás de uma boa surpresa e sem querer parou aberto com os lábios da boca enquanto que os olhos e olhos remiravam a pedradesafira no covo de suas mãos Ao que se sofreou no bridado se transteve sério apertou os beiços e sem razão sensível nem mais tornou a me dar a pedrinha só dizendo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 530 Deste coração te agradeço Riobaldo mas não acho de aceitar um presente assim agora Aí guarda outra vez por um tempo Até em quando se tenha terminado de cumprir a vingança por Joca Ramiro Nesse dia então eu recebo Isso de arrevés eu li com hagá e mesmo antes quando apontou no rosto dele para o avermelhar de cor a palidez de espécie Delongando ainda restei com a pedradesafira na mão aquilo dadoetomado Donde declarei Escuta Diadorim vamos embora da jagunçagem que já é o depoisdevéspera que os vivos também têm de viver por só si e vingança não é promessa a Deus nem sermão de sacramento Não chegam os nossos que morremos e os judas que matamos para documento do fim de loca Ramiro Ah foi ele me ouvir e se encurtar em duro que revi que nem ossos Ao crespo de um com a afronta a meiagoela e os olhos davam o que deitavam O que durou só um átimo tanto que ele teve mão em seu gênio conciso com um suspiro mas mesmo me retrouxe remoque Riobaldo você teme João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 531 Tomei sem ofensa Mas muita era minha decisão que eu já tinha aperfeiçoado lá na Fazenda dos Tucanos e que só vinha esperando para executar com mais regimento de ordem quando se tivesse chegado no CurraisdoPadre conforme meu sistema nesses procedimentos Tem que temerei Você aí faz o que em seu querer esteja Eu viro minha boa volta Dar o mal por mal assim Eu tinha a quanta razão Eu guardei a pedrinha na algibeira depois melhor botei no bolso do cinto contei minhas favas refavas Diadorim respirava muito Dele foi o relance Riobaldo você pensa bem você jurou vinga você é leal E eu nunca imaginei um desenlace assim de nossa amizade ele botouse adiante Riobaldo põe tento no que estou pedindo tu fica E tem o que eu ainda não te disse mas que de uns tempos é meu pressentir que você pode mas encobre que quando você mesmo quiser calcar firme as es tribeiras a guerra varia de figura Arredei Tu diz missa Diadorim Isso comigo não me toca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 532 Da maneira ele me tentava Com baboseira a prosável diguice queria abrandar minha opinião Então eu ia crer Então eu não me conhecia Um com o meu retraimento de nascença deserdado de qualquer lábia ou possança nos outros eu era o contrário de um mandador A pra agora achar de levantar em sanha todas as armas contra o Hermógenes e o Ricardão aos instigares Rebulir com o sertão como dono Mas o sertão era para aos poucos e poucos se ir obedecendo a ele não era para à força se compor Todos que malmontam no sertão só alcançam de reger em rédea por uns trechos que sorrateiro o sertão vai virando tigre debaixo da sela Eu sabia eu via Eu disse nãozão Me desinduzi Talento meu era só o aviável de uma boa pontaria ótima em arma qualquer Ninguém nem mal me ouvia achavam que eu era zureta ou impostor ou vago em aluado Mesmo eu não era capaz de falar a ponto A conversa dos assuntos para mim mais importantes amolava o juizo dos outros caceteava Eu nunca tinha certeza de coisa nenhuma Diadorim disse Ei retenteia Coragem faz coragem Demais eu disse Sou CapitãoGeneral Antes tantas astúcias em empalhar que eu não fosse embora que eu ficasse preso naquele urjo de guerra sem cabo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 533 nem ponta sem costas nem frente e que maçava Recachei A mão dele doçura de dada de leve na minha Temi afracar E em duro repostei com outra ombrada Vou e vou Só inda acompanho é até o Curraisdo Padre Lá eu requeiro para mim um cavalo bom E trovejo no mundo Verdadeiro meu propósito era esse como está dito Eu não caturrava Eu sou assim amorcomamor e ingratidão não E bem por isso Diadorim não persistiu com palavras cordatas mas por fim disse de motejo zombariazinha Então que quer mesmo ir vai Riobaldo eu sei que você vai para onde relembrado de rever a moça clara da cara larga filha do dono daquela grande fazenda nos gerais da Serra na Santa Catarina Com ela tu casa Cês dois assentam bem como se combinam Nonde nada eu não disse Se menos pensei em Otacília Nem maldisse Diadorim de que não se calava A mais pirraçou Vaite pega essa prenda jóia leva dá para ela de presente de noivado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 534 Demorei no fazer um cigarro Nós estávamos na beira do cerrado cimo donde a ladeirinha do resfriado principia a gente parava debaixo dum paratudo pau como diz o goiano que é a caraíba mesma árvore que respondia à saudade de suas irmãs dela crescidas em lontão nas boas beiras do Urucuia Acolá era a vereda Com o tempo se refrescando e o desabafo do ar buriti revira altas palmas A por perto se ouvia a algazarra dos companheiros De ver eu tinha dó minha pena sincera de Diadorim nessas jornadas De verdade entardecia Derradeira arara já revoava Ou quem sabe você resolve melhor mandar de dádiva para aquela mulherzinha especial a da RamadeOuro filha da feiticeira Arte que essa mais serve Riobaldo ela faz o gozo do mundo dá açúcar e sal a todo passante Não era na RamadeOuro era na Aroeirinha Mas por que era que ele falava no nome de Nhorinhá com tão cravável lembrança Ao crer que soubesse mais do que eu mesmo o que eu produzia no coração o encoberto e o esquecido Nhorinhá florzinha amarela do chão que diz Eu sou bonita E tudo neste mundo podia ser beleza mas Diadorim escolhia era o ódio Por isso era que eu gostava dele em paz No não gostava por João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 535 destino fosse do antigo do ser donde vem a conta dos prazeres e sofrimentos Igual gostava de Nhorinhá a semmesquinhice para todos formosa de saia cordelimão prostitutriz Só que de que gostava de Nhorinhá eu ainda não sabia filha de Ana Duzuza O senhor estude o buriti é das margens ele cai seus cocos na vereda as águas levam em beiras o coquinho as águas mesmas replantam dai o buritizal de um lado e do outro se alinhando acompanhando que nem que por um cálculo Você se casa Riobaldo com a moça da Santa Catarina Vocês vão casar sei de mim se sei ela é bonita reconheço gentil moça paçã peço a Deus que ela te tenha sempre muito amor Estou vendo vocês dois juntos tão juntos prendido nos cabelos dela um botão de bogari Ah o que as mulheres tanto se vestem camisa de cassa branca com muitas rendas A noiva com o alvo véu de filó Diadorim mesmo repassava carinho naquela fala Melar mel de flor E me embebia o que estava me ensinando a gostar da minha Otacília Era Agora falava devagarinho de sonsom feito se imaginasse sempre a si mesmo uma estória recontasse Altas borboletas num desvoejar Como se eu nem estivesse ali ao pé Ele falava de Otacília Dela vivendo o razoável de cada João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 536 dia no estar Otacília penteando compridos cabelos e perfumando com óleo de seteamores para que minhas mãos gostassem deles mais E Otacília tomando conta da casa de nossos filhos que decerto íamos ter Otacília no quarto rezando ajoelhada diante de imagem e já aprontada para a noite em camisola fina de ló Otacília indo por meu braço às festas da cidade vaidosa de se feliz e de tudo em seu vestido novo de molmol Ao tanto deusdadamente ele discorresse De meu juízo eu perdi o que tinha sido o começo da nossa discussão agora só ficava ouvinte descambava numa sonhice Com o coração que batia ligeiro como o de um passarinho pombo Mas me lembro que no desamparo repentino de Diadorim sucedia uma estranhez alguma causa que ele até de si guardava e que eu não podia inteligir Uma tristeza meiga muito definitiva No tempo não apareci no meio daquilo Assim foi que foi Até que vieram uns companheiros com João Concliz Sidurino e João Vaqueiro que ajuntaram lenhas e armaram um fogo bem debaixo do paratudo Ao relançar das labaredas e o refreixo das cores dando lá acima nos galhos e folhas essas trocavam tantos brilhos e rebrilhos de dourado vermelhos e alaranjado às brasas essas esplendências com mais realce que todas as pedras de Araçuaí do Jequi tinhonha e da Diamantina Era diadeanos daquela árvore Ao João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 537 quando bem anoiteceu foi assim A gente só sabe bem aquilo que não entende O senhor veja eu de Diadorim hoje em dia eu queria recordar muito mais coisas que valessem do esquisito e do trivial mas não posso Coisas que se deitaram esqueci fora do rendimento O que renovar e ter eu não consigo modo nenhum Acho que é porque ele estava sempre tão perto demais de mim e eu gostava demais dele Na surgida manhã saímos para a parte final da caminhada Zé Bebelo certa hora me chamou Inda que avante Zé Bebelo mesmo devia de estar curtindo más e piores fio que ele amargava a vitória que tinha inventado Noção dos inimigos nossos que seja lá por onde puxavam posse de sua munição e de suas montadas e cargas socorridos de tudo quanto careciam Um Hermógenes quer tomar conta do sertão dos Gerais eu tirei liberdade para dizer Mesmo mais indiretas disse e isso me realiviou no dizer pouco somente que era só por picardia Direto disso Zé Bebelo não me respondeu ele pensava as mil coisas Em tanto nesses cálculos de meditação ele ligeiro sobrezumbia com os beiços e balangava às esquerdasedireitas as abas enfunadas do chapéu e às vezes assoprava sem ser por can João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 538 saço de marcha O que das idéias sobrava era que ele referia Ainda não entendo Ainda não entendo Até agora reconheço ele tem tido uma sorte Sapo semcolarinho rei gordo Mas deixa a gente ir e vir que os ovos e dúzias ele paga Do Hermógenes discursava orçamento do Hermógenes E de ouvir que a sorte do Hermógenes existia alta isso me penou tanto me certificava Aí fiquei a menos Nem eu não queria arreliar Zé Bebelo Mas para mim ele estava muito errado pelos passos e movimentos porque gostava prático da guerra do que provava um muito forte prazer e por isso não tinha boa razão para um resultado final Assim achei espiando o alto céu que é com as nuvens e os urubus repartido Deponho de que é que aquilo me adiantava E chuvas dadas derramadas Aí vai chegamos no CurraisdoPadre O lugar que não tinha curral nenhum nem padre só o buritizal com um morador Mas o ao em redor em grandes pastos era o capim melhor milagroso que o que deixava de ser provisório rico era o meloso de muito óleo a não ver uns fios de santaluzia azul e do durodobrejo nas baixadas e nos altos com pedregal o jasmimdaserra De lá vinham saindo renascidos engordados os nossos cavalos isto é os que tinham sido de Medeiro Vaz e que agora herdávamos Regozijei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 539 Escolhi um animal vistoso celheado acastanhado murzelo que bem me pareceu e dei em erro porque ele era meio sendeiro e historiento Daqui veio que o nome que teve foi de Padrim Selorico Mas o dono do sítio que não sabia ler nem escrever assim mesmo possuía um livro capeado em couro que se chamava o Senclér das Ilhas e que pedi para deletrear nos meus descansos Foi o primeiro desses que encontrei de romance porque antes eu só tinha conhecido livros de estudo Nele achei outras verdades muito extraordinárias Além de que tudo o que eu tivesse de resolver de minha vida fui deixando para os seguintes Dia de ser de chuva que madrugou tarde boi nos cinzentos E os pássaros de passagem precisavam de gritar muito uns para os outros Diadorim moderava o falar comigo e me ver recolhido em certo vexame receoso eu achei Já disse ao senhor dia a dia ele raiava em formosura E chuva alta que envinha estava mandando urubu voar para casa Os cavalos pastavam com mais pressa Nunca em todos meus tempos eu vi inverno tamanho demorado Era para espera Mesmo assim Zé Bebelo pôs ordem de se ir Porque estávamos quase todos montados em pêlo carecíamos de tocar para o Curral Caetano onde se tinha quantidade grande de arreios guardados Depois daí para buscar munição na Virgem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 540 Mãe Prazo não se perdia Aos caminhos barrancosos de sopega feito torrão de açúcar preto se derretendo empapados Aos barros fomos como perdidas criaturas de se rir se chorar E mas o senhor sabe o que isso é aqueles nossos cavalos não tinham ferraduras Pra mais onde Ah aonde os altos bons o Chapadão do Urucuia em que tanto boi berra Mas nunca chegamos nem na VirgemMãe Afiguro desde o começo desconfiei de que estávamos em engano Rumos que eu menos sabia no viável Como a serra que vinha vindo enquanto para ela eu ia indo em tantos dias longe lá de repente os olhos da gente percebem um fio de tremor se vê é um risquinho preto que com léguas andadas vira cinzento e vira azul daí depois parede de morro se faz No arquear dali foi que se pegou o primeiro caminho achado para se passar Bem baixamos Os rios estavam sujos em espumas Não havendo a ajuda de Joaquim Beiju que estava dando para dela se sentir falta Zé Bebelo em assarapanto até os dedos da mão dele não deixavam de se perpassar contando rosário nas tiras da rédea Que andávamos desconhecidos no errado Disso tarde se soube quem que guiava tinha enredado nomes em vez da VirgemMãe creu de se levar tudo para a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 541 VirgemdaLaje logo lugar outro vereda muito longe para o sul no sítio que tem engenhodepilões Mas já era tarde Trovoou truz dava vento E chuvas que minha língua lambeu Nelas mais não falo Mas quando estiou o tempo de vez não sei se foi melhor porque bateu de começo a fim dos Gerais um calor terrível Aí quem sofreu e não morreu ainda se lembra dele Esses meses do ar como que estavam desencontrados Doenças e doenças Nosso pessoal montão deles pegou a mazelar Mas isto eu refiro depois O senhor já que me ouviu até aqui vá ouvindo Porque está chegando hora deu ter que lhe contar a coisas muito estranhas Quadrante que assim viemos por esses lugares que o nome não se soubesse Até até A estrada de todos os cotovelos Sertão se diz o senhor querendo procurar nunca não encontra De repente por si quando a gente não espera o sertão vem Mas aonde lá era o sertão churroo próprio mesmo Ia fazendo receios perfazendo indagação Descemos por umas grotas no meio de serras de partevento e suas mães árvores O pongo de um ribeirão o boqueirão de um rio O Abaeté não era se bem fosse que parecia largo rio Abaete no escalavrado beiras amarelas Aquele rio fazia uma grande volta acolá clareado com João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 542 a vista de uns coqueiros Ali era um lugar longe e bonito como que me acenava Mas não endireitamos para ele porque o rumo determinado era outro torando desviado muito consoante E mais maninhava Topar um vivente é que era mesmo grande raridade Um homenzinho distante roçando lenhando ou uma mulher zinha fiando a estriga na roca ou tecendo em seu tear de pau na porta de uma choça de buriti toda Outro homem quis me vender uma arara mansa que a qual falava toda palavra que tem á Outra velha que estava fumando o pito de barro Mas ela enrolou a cara no xale não se ajuizaram os olhos dela E o gado mesmo vasqueava só por pouco acaso um boi ou vaca de solidão bicho passeado sem dono Veado sim vi muitos tinha vez que pulavam num sonhoso correndo de corta campo tanto tantos uns dois uns três uns vinte em grupos mateiros e campeiros Faltava era o sossego em todo silêncio faltava rastro de fala humana Aquilo perturbava me sombreava já depois com andada de três dias não se percebeu mais ninguém Isso foi até onde o morro quebrou Nós estávamos em fundos fundos Isto é nos arrampadouros Tinha uma estrada aí na subida dela houvesse coisas Uns galhos de árvores colocados ramalhos e jaribaras forma de sinal para não se passar Mas esse aviso havia de ser particular para o uso de outros não para João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 543 o nosso destino Não respeitamos de jeito nenhum Fomos indo No entrar numa guapira se redobrou o achado daquelas ramas verdes que não obedecemos Eu vinha adiante com o Acauã e o Nélson instruindo o caminho Já estávamos pelas rédeas para outra subida de ladeira mas aí escutamos o latir de cachorros E enxergamos um homem no alto da virada uns homens Esses estavam com espineardas Os quantos homens de estranhoso aspecto que agitavam manejos para voltarmos de donde estávamos Por certo não sabiam quem a gente era e pensavam que três cavaleiros menos valessem Mas entendendo que do caminho não desgarrávamos começaram a ficar estramontados Um eu vi que dava ordens um roceiro brabo arrastando as calças e as esporas Mas os outros chusmote deles eram só molambos de miséria quase que não possuíam o respeito de roupas de vestir Um aos menos trapos nem bem só o esporte de uma tanga esfarrapada e em lugar de camisa a ver a espécie de colete de couro de jaguacacaca Eram uns dez a quinze Não consegui sentido no que eles ameaçavam e vi que estavam aperrando as armas Queriam cobrar portagem Andavam arrumando alguma jerimbamba Não convinha avançar assim por cima deles logo mas também dar recuada podia ser uma vergonha Esbarramos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 544 neles quase encostados Íamos esperar o resto do pessoal E eles ali confrontes não explicavam razão nenhuma Só um disse Pode não Pode não E renuía com a cabeça o banglafumém mesmo quando falava com uma voz de qualidade diversa costumada daquela terra de lugar e os outros renuindo também Ah pode não Pode não com o vozeio soturno Nos tempos antigos devia de ter sido assim Gente tão em célebres conforme eu nunca tinha divulgado nem ouvido dizer na vida O das esporas foi se amontar num jumento esse era o único animaldesela que ali tinham Acho que montou para oferecer à gente maior vulto de respeito tocava batendo palma de mão na anca do jegue veio vindo para primeiro se presenciar Olhei para todos Um tinha a barba muito preta e aqueles seus olhos permeando Um mesmo em dia de horas tão calorosas ele estava trajado com uma baeta vermelha comprida acho que por falta de outra vestimenta prestável Ver a ver o sacerdote Ih Essa gente tem piolho e muquiranas o Nélson disse contrabaixo Todos estavam com alguma garantia que eram lazarinas bo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 545 cudas baludas garruchas e bacamartes escopetas e trabucão peças de armas de outras idades Quase que cada um era escuro de feições curtidos muito mas um escuro com sarro ravo amarelos de tanto comer só polpa de buriti e fio que estavam bêbados de beber tanta saeta Um zambo troncudo segurava somente um calaboca mas devia de ser de braço terrível no manobrar aquele cacete O quanto feioso de dar pena constado chato o formo do nariz estragada a boca grande demais em três Outro que tinha uma foice encabada muito comprido e um porongo pendurado a tiracol por uma embira cochichava com os restantes uma séria falação a qual uma espécie de pajelança Artes vezes ele guinchava feito o demônio gemedeiro Esse que por nome de Constantino acudia Todos eles com seus saquinhos chumbeiros e surrões e polvorinhos de corno e armamento tão desgraçado mesmo assim não tomavam bastante receio de nossos rifles Para o nosso juízo eles eram doidos Como é que desvalimento de gente assim podiam escolher ofício de salteador Ah mas não eram Que o que acontecia era de serem só esses homens reperdidos sem salvação naquele recanto lontão de mundo groteiros dum sertão os catrumanos daquelas brenhas O Acauã que explicou o Acauã sabia deles Que viviam tapados de Deus assim nos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 546 ocos Nem não saíam dos solapos segundo refleti dando cria feito bichos em socavas Mas por ali deviam de ter suas casas e suas mulheres seus meninos pequenos Cafuas levantadas nas burguéias em dobras de serra ou no chão das baixadas beira de brejo às vezes formando mesmo arruados Aí plantavam suas rocinhas às vezes não tinham gordura nem sal Tanteei pena deles grande pena Como era que podiam parecer homens de exata valentia Eles mesmos faziam preparo da pólvora de que tinham uso ralado salitre das lapas manipulando em panelas Que era uma pólvora preta fedorenta que estrondava com espalhafato enchendo os lugares de fumaceira E às vezes essa pólvora bruta fazia as armas rebentarem queimando e matando o atirador Como era que eles podiam brigar Conforme podiam viver E enfim os companheiros apontaram em vinda e subiram a primeira ladeira aquele tropeado de guerreiros em tão grande número numeroso Quase eu queria me rir do susto então dos catrumanos Mas foi não porque eles não se aluíram do ponto onde estavam só que olhavam para o chão calados acho que porque essa é a forma de declararem seus espantos O do jegue Teofrásio que era quem capitaneava deu alguma intimação para o da foice esse que o DosAnjos se chamava era o falador e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 547 que foi quem veio adiante saudar Zé Bebelo e render explicação Ossenhor uturje mestre a gente vinhemos no graminhá Ossenhor uturje Ossos e queixos e aquela voz que o homem guardava nos baixos peitos era tôo que nem de se responder em ladainha dos santos encomendação de mortos responsório Ossenhor uturje mestre Não temos costume Não temos costume Que estamos resguardando essas estradas De não vir ninguém daquela banda povo do Sucruiú que estão com a doença que pega em todos Ossenhor é grande chefe dando sua placença Ossenhor é Vossensenhoria Peste de bexiga preta Mas povoado da gente é o Pubo que traslada do brejão ossenhor com os seus passaram perto de lá valor dis tante meialégua As mulheres ficaram cuidando cuidando A gente vinhemos no graminhá Faz três dias Cercar os caminhos O povo de Sucruiú estão dizendo nem não estão enterrando mais os defuntos deles Pode querer vir algum com recado trazendo a doença e esta é a razão Veio um querendo pedir auxílios relatar bobagens essas mogúncias e brogúncias Mas teve de voltar deveras retornou não demos passa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 548 gem Estão com a maldição a urros Castigo de Deus Jesus Povo do Sucruiú gente dura de rúim Ossenhor uturje mestre convém desemendar deste lado não passar no Sucruiú respraz Bexiga da preta E aquele homem o DosAnjos tinha largado a foice no chão botou o pé em riba e abria os braços depois ficou de mãos postas acho que estava produzindo algum feitiço com os olhos todos fechados Ele era magro magro da vista da gente não se ter Os outros deles devagarosamente tinham vindo se chegando também Zé Bebelo seguro que por não se rir sem caridade armou rosto reverso aquele semblante serioso e eles desconfiaram Porque um que era velhusco e estava com o chapéudepalha corroído nas todas beiras apareceu com um dinheiro na palma da mão oferecendo a Zé Bebelo como em paga por perdoamento A que era um dobrão de prata antigo do Imperador desses de novecentos esessenta réis em cunho mas que na Januária por ele dão dois milréis ainda com senhoriagem de valer até os dez na capital Mas Zé Bebelo com alta cortesia rejeitou aquele dado dinheiro e o catrumano velho não bem entendeu pelo que permaneceu um tempo com ele ofertado na mão Assim os outros não entrediziam palavras que só arregalados espiavam para Zé Bebelo e para a moeda João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 549 olhavam como se estivessem prestando conta de suas fortes invejas O jeito de estremecer deles às vezes era todo era de banda mas aquilo sendo da natureza constante do corpo e não temor pois quando pegavam receio iam ficando era mais escuros e respiravam com roncado rumor quietos ali Que aqueles homens eu pensei que nem mansas feras isto é que no comum tinham medo pessoal de tudo neste mundo Como que o senhor visse os catrumanos rir O da foice tornou a apanhar a foice o no jegue ficou segurando o chapéu em respeito o velho beobobo sumiu seu dobrão de prata em alguma algibeira A mais eles todos riram as tantas grandes bocas e não tinham quase nenhum dente Riam sem motivo justo agora mas para nos agradar Cônscio o da foice criou ânimo mesmo indagou O que mal não pergunto mas donde será que ossenhor está servido de estando vindo chefe cidadão com tantos agregados e pertences Ei do Brasil amigo Zé Bebelo cantou resposta alta graça Vim departir alçada e foro outra lei em cada esconso nas toesas deste sertão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 550 O velho agiu o pelosinal Ia remenicar alguma outra coisa Mas Zé Bebelo completo de escutar e ver deu não com a mão e abriu a marcha Tocamos Ora vi as derradeiras caras daqueles catrumanos que mostravam por nossa causa muitos pasmos de admiração e a cobiça que tinham de fazer centoedobro de perguntas que por receio de atrevimento nunca perguntavam Só dos rifles Úixete isto é lazarinha moderna Donde um deles o montado no jegue ainda gritou um conselho que a gente então principiasse volta no buritizal duma lagoazinha da banda da mão direita por via de se evitar de passar por dentro do Sucruiú e que retomada a estrada no quebrar da mão esquerda num vau perto da mata virgem era só se andar as sete léguas num sítio se chegava de um tal de seor Abrão que era hospitaleiro Isso aquele homem recomendou não por serviço de préstimo eu pelo tom e jeito bem entendi gritou no fim assim a fito somente de que os seus outros vissem que ele bem possuía coragem também de dar voz perante presença nossa de tantos grandes jagunços donos de arejo darmas Mas Zé Bebelo descrendo de temer o que eles anunciavam do arraial onde estava alastrando a varíola reinante deu ordem de seguirmos em reto em diante em frente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 551 Rir o que se ria De mesmo com as penúrias e descômodos a gente carecia de achar os ases naquele povo de sujeitos que viviam só por paciência de remendar coisas que nem conheciam As criaturas Mas eu não ri Ah daí não ri honesto nunca mais em minha vida Como que marquei que a gente ter encontrado aqueles catrumanos e conversado com eles desobedecido a eles isso podia não dar sorte A hora tinha de ser o começo de muita aflição eu pressentia Raça daqueles homens era diverseada distante cujos modos e usos mal ensinada Esses mesmo no trivial tinham capacidade para um ódio tão grosso de muito alcance que não custava quase que esforço nenhum deles e isso com os poderes da pobreza inteira e apartada e de como assim estavam menos arredados dos bichos do que nós mesmos estamos porque nenhumas más artes do demônio regedor eles nem divulgavam Só o mau fato de se topar com eles dava soloturno sombrio Apunha algum quebranto Mas mais que por conosco não avirem medida haviam de ter rogado praga De pensar nisso eu até estremecia o que estremecia em mim terreno do corpo onde está a raiz da alma Aqueles homens eram orelhudos que a regra da lua tomava conta deles e dormiam farejando E para obra e malefícios ti João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 552 nham muito governo Aprendi dos antigos Capatazia de soprar quente qualquer ódio nas folhas e secar a árvore ou de rosnar palavras em buraco pequeno que abriam no chão tapando depois para o caminho esperar a passagem de alguém e a ele fazer mal ou guardavam um punhado de terra no fechado da mão no prazo de três noites e três dias sem abrir sem largar e quando jogavam fora aquela terra em algum lugar nele com data de três meses ficava sendo uma sepultura De homem que não possui nenhum poder nenhum dinheiro nenhum o senhor tenha todo medo O que mais digo convém nunca a gente entrar no meio de pessoas muito diferentes da gente Mesmo que maldade própria não tenham eles estão com vida cerrada no costume de si o senhor é de externos no sutil o senhor sofre perigos Tem muitos recantos de muita pele de gente Aprendi dos antigos O que assenta justo é cada um fugir do que bem não se pertence Parar o bom longe do ruim o são longe do doente o vivo longe do morto o frio longe do quente o rico longe do pobre O senhor não descuide desse regulamento e com as suas duas mãos o senhor puxe a rédea Numa o senhor põe ouro na outra prata depois para ninguém não ver elas o senhor fecha bem E foi o que eu pensei Aqueles catrumanos pedindo por maldição como era que eu podia deixar de pensar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 553 neles Háde que se eles tivessem me pegado sozinho eu apeado e precisado decerto me matavam para roubar minhas armas as coisas e minhas roupas Amargo que acabavam comigo sem escrúpulos homessa que nem tinham porquanto eu era desconhecido e forasteiro De doente ou ferido perdendo meu sangue que eu estivesse algum deles ia ser capaz de me ceder gole duma cuia dágua Draste eu duvidava deles Duvidava dos fojos do mundo E por que era que há de haver no mundo tantas qualidades de pessoas uns já finos de sentir e proceder acomodados na vida tão perto de outros que nem sabem de seu querer nem da razão bruta do que por necessi dades fazem e desfazem Por quê Por sustos para vigiação sem descanso por castigos E de repente aqueles homens podiam ser montão montoeira aos milhares mis e centos milhentos vinham se desentocando e formando do brenhal enchiam os caminhos todos tomavam conta das cidades Como é que iam saber ter poder de serem bons com regra e conformidade mesmo que quisessem ser Nem achavam capacidade disso Haviam de querer usufruir depressa de todas as coisas boas que vissem haviam de uivar e desatinar Ah e bebiam seguro que bebiam as cachaças inteirinhas da Januária E pegavam as mulheres e puxavam para as ruas com pouco nem se tinha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 554 mais ruas nem roupinhas de meninos nem casas Era preciso de mandar tocar depressa os sinos das igrejas urgência implorando de Deus o socorro E adiantava Onde é que os moradores iam achar grotas e fundões para se esconderem Deus me diga Nem me diga o senhor que não aí foi que eu pensei o inferno feio deste mundo que nele não se pode ver a força carregando nas costas a justiça e o alto poder existindo só para os braços da maior bondade Isso foi o que eu pensei muito redoído no estufo do calor vingante E foi por durante quase uma hora montado no meu cavalo ruim chamado PadrimSelorico a passo por aqueles ruins campos até se chegar perto do povoado do Sucruiú onde que estava arranchada a horrorosa doença por cima da pior miséria Bobéia minha Porque os companheiros indo cuidando de seu ramerrão comum nenhum não punha tento em dessas idéias Então era só eu Era Eu que estava malinvocado por aqueles catrumanos do sertão Do fundo do sertão O sertão o senhor sabe Mas em tanto então levantei o meu entender para Zé Bebelo dele emprestei uma esperança apreciei uma luz Dei tino Zé Bebelo em testa chefe como chefe como executava nossa ida Da marca de um homem solidado assim que era João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 555 sempre alvissareiro Por ele eu crescia admiração e que era estima e fiança respeito era Da pessoa dele da grande cabeça dele era só que podia se repor nossa guarda de amparo e completa proteção eu via Porque Zé Bebelo previa de vir cá embaixo no escuro sertão e o que ele pensava queria e mandava tal a guerra por confrontação e para o sertão retroceder feito pusesse o sertão para trás E era o que íamos realizar de fazer Para mim ele estava sendo feito o canoeiro mestre com o remo na mão no atravessar o rebelo dum rio cheio Carece de ter coragem Carece de ter muita coragem eu relembrei Eu tinha Diadorim vindo do meu lado rosável mocinho antigo sofrido de tudo mas firme duro de temporal naquelas constâncias Sei que amava não amava Os outros os companheiros outros semelhavam no rigor umas pobres infâncias na relega que deles a gente precisasse de tomar conta Com Zé Bebelo da minha mão direita e Diadorim da minha banda esquerda mas eu o que é que eu era Eu ainda não era ainda Se ia se ia O cavalo pombo de Zé Bebelo era o de mais armada vista o maior de todos Cavalo selado montado e muito chão adiante Viajar mas de outras maneiras transportar o sim desses horizontes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 556 Desde porém como já entrávamos no perto do Sucruiú conforme as léguas que os cascos de nossos cavalos contando era de ver que voz Zé Bebelo dava se queria em reto ou atalho Ah em reto foi Mas nenhum de nós teve sobrosso O que era era Aquele desgraçado lugar devia de estar lá acolá no pião alto do campo em seu sempre Obra de um tiro de carabina E como deviam de estar cozinhando com tanto fogão porque subia para o pedaço de céu um povôo de fumaças feito andassem por lá renovando pastos desfora de tempo Fazia fole de calor Mas entre as vertentes no corguinho rabo serelepe que passamos de beiras de terra preta só os animais foram que beberam a toda sede que nós mesmo da água corrente a gente se receava Donde é que decorre a peste Até o ver o ar A poeira e miséria Azul desbotado puído sem os realces O sol carregando de envelhecer antesmente as folhagens o começo do mês de junho já dava parecença de alto fim de agosto Aquele ano declarava de não se ter nem frio pelo legal De que valeram as tantas chuvas Aí este mundo de sertão tinha se perdido eu mesmo me disse Como que íamos atravessar o Sucruiú lá se chegava O qual eram as cafuas em suas construções no entremeio da fumaça Essas choupanas Gente Não se divulgava E certo que não se tinha medo maior Antes todos queriam avistar de perto de passagem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 557 o que aquilo de verdade fosse Só que se tinha confiança nos bentinhos e verônicas E de repente correu aviso que Jõe Bexiguento e o PacamãdePresas sabiam reza para São Sebastião e São Camilo de Lélis que livram de todo mal vago Como se ter Como se aprender também Tempo não dava Mas o que vieram dizendo de um em um se virando para trás nos cavalos que não se carecia Assim aqueles dois iam praticar resumida a oração e cada um da gente consigo reproduzisse constantemente as fortes ave orarias e padrenossos que isso bastava Assim foi que fizemos Avante eu rezei Algum dia depois de hoje hei de esquecer aquilo Arruado que era até bem largo mas mal se enxergavam aquelas casas Ao demais rezando ao real vendo eu vim Casas coisa humana Em frente delas todas o que estavam era queimando pilhas de bosta seca de vaca O que subia enchia a fumaça acinzentada e esverdeada no vagaroso E a poeira que demos fez corpo com aquele fumegar levantante tanto tapava nos soturnos Aí tossi cuspi no entrecho de minhas rezas Voz nem choro não se ouviu nem outro rumor nenhum feito fosse decreto de todas as pessoas mortas e até os cachorros cada morador Mas pessoas mor que houvesse por trás da poeira para lá da fumaça verdolenga se vislumbravam os vultos e as tristes caras deles que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 558 branqueavam tantas máscaras Aos homens e mulheres apartados tão estranhos caladamente seriam os que estavam jogando todo o tempo mais rodelas de bosta seca nas fogueiras isso que deviam de ter por todo remédio Nem davam fé de nossa vinda de seus lugares não saíam não saudavam Do perigo mesmo que estava maldito na grande doença eles sabiam ter quanta cláusula Sofriam a esperança de não morrer Soubesse eu onde era que estavam gemendo os enfermos Onde os mortos Os mortos ficavam sendo os maus que condenavam A reza re ganhei com um fervor Aquela travessia durou só um instantezinho enorme Mesmo que os cavalos nossos indo iam devagar que é como se vai quando todos rezando sozinhos em cima deles devagar duma procissão Não se perturbou palavra E foi que dali acabamos de surgir da arrepoeira e fumaça de estrume e o corusco de labareda alguma e a mormaceira Deus que tornasse a tomar conta deles do Sucruiú daquele transfor mado povo Olhei o ilustre do céu Dado dava de um estar sotolivre conseguido se soltar das possibilidades horrorosas Revi todos e Diadorim que era uma cortesia de bondade Não espiei para trás não ver de enxergar o fim daquelas casas no vaporoso pardoazulado no exalante E o que rogava eram coisas de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 559 salvação urgente tão grande eu queria poder sair depressa dali para terras que não sei aonde não houvesse sufocação em incerteza terras que não fossem aqueles campos tristonhos Eu levava Diadorim Mas de começo não vi não fui sentindo que queria poder levar também Otacília e aquela moça Nhorinhá filha de Ana Duzuza e mesmo a velha Ana Duzuza e Zé Bebelo Alaripe os companheiros todos Depois todas as demais pessoas de meu conhecimento e as que mal tinha visto além de que a agradecida formosura da boa moça Rosauarda a mocinha Miosótis meu mestre Lucas dona Dindinha o comerciante Assis Wababa o Vupes Vusps Todos e meu padrinho Selorico Mendes Todos que em minha lembrança eu carecia de muitas horas para repassar Igual levava ah o povo do Sucruiú e agora o do Pubo os catrumanos escuros E que para o outro lugar levava restantes os cavalos os bois os cachorros os pássaros os lugares acabei que levasse até mesmo esses lugares de campos tão tristes onde era que então se estava Todos Não Só um era que eu não levava não podia e esse um era o Hermógenes Aí dele me lembrei na hora e esse Hermógenes eu odiasse Só o denunciar dum rancor mas como lei minha entranhada costume quieto definitivo dos cavos do continuado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 560 que tem na gente Era feito um nojo por ser Nem no meu juízo para essa aversão não carecia de compor explicação e causa mas era assim eu era assim Que ódio é aquele que não carece de nenhuma razão Do que acho para responder ao senhor a ofensa passada se perdoa mas como é que a gente pode remitir inimizade ou agravo que ainda é já por vir e nem se sabe Isso eu pressentia Juro de ser Ah eu Tivesse medo O medo da confusão das coisas no mover desses futuros que tudo é desordem E enquanto houver no mundo um vivente medroso um menino tremor todos perigam o contagioso Mas ninguém tem a licença de fazer medo nos outros ninguém tenha O maior direito que é meu o que quero e sobrequero é que ninguém tem o direito de fazer medo em mim São os momentos se sei Senti um cansaço Adiantamos ligeiro depois que passado o vau da matavirgem e tenteávamos pelo encontrável O sol ia entrando vi o céu nos roxos nos vermelhos Misturamos numa baixada no capim cacheado Umas lavourinhas Daí lá se estava no retiro do Abrão onde o campo largueia Era uma boa casa Mas de dentro saíram de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 561 repente por suas portas uns homens que fugiam corridos feito ratos se escapulindo do toucinho de um jacá Sendo que Zé Bebelo assim na dianteira sempre cavalhava vente superintendeu que não perseguíssemos aqueles tais nem neles se atirasse por comprazimento O que estavam era em mão de roubando se soube como que tinham até sacos para carregar dentro as coisas Num átimo eu reluzi quem que eles podiam ser Só acertei Pois não foi que um deles errando no abrir da fuga demorou e perdeu as facilidades então veio do nosso lado embrafustado quase debaixo dos cavalos Era um pretinho Um rapazola retinto mal aperfeiçoado por dizer um menino Nu da cintura para os queixos As calças rotas em todas as partes andavam caicaindo ele apertou perna em perna Arfava chiado como quem por todo engano de pressa tivesse chupado na boca um gole quente de café demais Bezerro doente de maldeano às vezes faz assim Cuido que por não perder de todo as calças como vestimenta ele se ajoelhou chato no chão mais deitado do que ajoelhado A benção pois disse E a idéia dele rodou ligeira pois quando se notou tinha tirado do bojo do saco o que estava lá que era um pé de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 562 alpercata de homem um candieirozinho pequeno desses que vinham da Bahia uma escumadeira de cozinha e um arranjado envernizado de couro preto que nem boldrié que tudo jogou fora para uma banda o longe que pôde Seguinte o que mos trou à gente o saco vazio e com isto dizendo arquejado Tirei não nada não Tenho nada Tenho nada Isso tudo se deu curto que nem o mijar dum sapo e dum modo tal inocente de quem visse risse E em coisa tão tola declarada assim a gente até crê razão por ser tão afã de absurdo Donde é que vocês vieram dondé Zé Bebelo indarguiu A gente quer voltar para casa Semos sim é do Sucruiú nhor sim Arte que a aproveitar ele tornou a atar melhor o resumo de embira que cinturava aqueles molambos de calças E se encolhia temia e se ria Que nome era capaz de ter Guirigó Minha graça é essa Sou filho de Zé Câncio seu criado sim senhor João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 563 Tão magro trestriste tão descriado aquele menino já devia de ter prática de todos os sofrimentos Olhos dele eram externados o preto no meio dum enorme branco de mandioca descascada O couro escuro dele era que tremia constante e tremia pelo miúdo como que receando em si o que não podia ser bom E quando espiava para a gente era de beiços mostran do a língua à grossa colada no assoalho da boca mas como se fosse uma língua demasiada demais que ali dentro não pudesse caber em bezerro pesteado às vezes se vê assim Menino muito especial Jagunço distraído vendo um desses do jeito à primeira era capaz da bondade de desfechar nele um tiro certo pensando que padecia agonia e que carecesse dessa ajuda por livração Guirigó qué que vieram caçar aqui Fala O que qu a gente veio caçar sim senhor Eles vieram eu também vim Buscar de comer Ih ques menino Quem te vê comer essa tralha que você amoitou aí no saco O pretinho espichado no chão sacudia a cabeça que não que não que parecia ter gosto de poder negar assim Mas o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 564 de comer todo se acabou Havia de negar tudo renegava até que tivesse tido mãe nascido dela até que a doença brava estivesse matando o povo do Sucruiú os parentes todos dele A gente queria que aquele traste de menino sentisse em si e se entristecesse por tantas suas desditas chorasse uma lágrima a lagrimazinha só por um momento que fosse Ah ele fizesse logo isso a gente ficava desconsolado e legítimo no triste a gente ficava tranqüilizados Qual o menino preto negava O que ele afirmava no descaramento firme de seu gesto era que nem era ninguém nem aceitava regra nenhuma devida do mundo nem estava ali defronte dos cascos dos cavalos da gente Ah queria salvar seu corpo queria escape Se abraçava com qualquer poeira De mais não queria saber Que podia que fosse logo embora Zé Bebelo consentiu ordem E ainda jogou um pedaço de rapadura que ele aparou fácil como numa abocada Pra tu adoçar essa tua tripinha preta foi o que Zé Bebelo gritou E aquele menino sem fungar sem olhar para trás pulou em rumo maneiro e leviano se sumiu por onde carecia de ir Não pensei que fosse tão pequeno conforme mesmo era Coitadinho os dentes dele estavam alumiando de brancos Diadorim disse João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 565 Hem Hem Zé Bebelo falou O que imponho é se educar e socorrer as infâncias deste sertão Eu ia fazer o sinaldacruz mas com a mão não cheguei a bulir porque isso me pareceu falta de caridade pensando no menino pretinho E com o determinado costumeiro de se espalhar os de vigia por todas as quatro bandas mais o movimento de procura dum pasto bem fechado e conveniente tomamos conta de tudo e entramos naquela casa para ver o visível e se fazer fogo de aprontar nosso jantar na fornalha de sua grande cozinha Virgem digo ao senhor o interior dela dava pena nunca vi nada tão remexido e roubado Total o que era de jeito de se carregar o em arcas e em trouxas e que no comum duma casa remediada se acha faltava Não se encontrou uma peça de roupa uma lamparina de folha uma folhinha na parede um gancho de rede uma raspadeira um cabresto pendurado uma esteira uma vasilha uma coisa alguma em que se pegar Eram só as mesas os catres os bancos Tinham limpado a carne daquele costelame Por onde andaria o dono Mas se ficou sabendo que o nome dele não era em verdade Abrão mas Habão que assim se chamava Consoante o diploma de patente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 566 que no chão num canto avistei lavrado preenchido cerimonial de que esse Habão era Capitão da GuardaNacional em válidos títulos Aquele retiro se chamava o Valado Com pouco mais uns dias que se passassem o pessoal do Sucruiú era capaz de desmanchar até o prédio da casa por seus esteios e caibros Para não falar que de gado galinhas e porcos e cachorros e o mais nem sinal se divulgava Sobravam só os passarinhos soltos como de toda parte no igual que piaram uns momentos pelo acabar da tardinha alegres assim no empobrecido Vai dentro de lá num quarto muito recanto sediava no escuro que já fazia um oratório em armariozinho construido pregado na parede que estava com suas poucas imagens e um toco para se acender de velabenta Nisso não tinham desrespeitado de mexer E nós então cada um depois dum viemos ao quartodooratório beijar a santa maior que era no seu manto como uma boneca muito perfeita que era a Minha Nossa Senhora MãedeTodos Se comeu se dormiu Se acordou bem o digo Cada dia é um dia E o tempo estava alisado Triste é a vida do jagunço dirá o senhor Ah fico me rindo O senhor nem não diga nada Vida é noção que a gente completa seguida assim mas só por lei duma idéia João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 567 falsa Cada dia é um dia Ora mais ordens já para antes do vir da aurora se cumprir dali Zé Bebelo já tinha dado E foi se saber o Suzarte e o Tipote e outros com o João Vaqueiro rastreavam redobrados onde em redor remediando o mundo a alho e faro Tudo eles achavam tudo sabiam em pouquinhas horas tudo tradiziam O chão em lugares guardava molde marcado dos cascos de muitíssimas reses calcados para um rumo só um caminho eito Aqueles rastros tinham vigorado por cima da derradeira lama da derradeira chuva E de quantidade e de quanto tinha chovido eles liam no capim e nos regos de enxurradas e na altura da cheia já rebaixada a deixa beiradas do ribeirão Pelo comido pastado das reses também muito se reconhecia Aos passos dos cavaleiros e cachorros As pessoas da casa tinham viajado para a banda de oestes Mas o gado escolhendo por si e sem tocada mas depois de solto por boa regra pegara ida espaçada mais virante acima aonde devia haver para se lamber salinas de barreiro E bastantes outras coisas eles decifravam assim vendo espiado o que de graça no geral não se vê Capaz de divulgarem até os usos e costumes das criaturas ausentes dizer ao senhor se aquele seô Habão era magro ou gordo seria forreta ou mãoaberta canalha inteirado ou razoável homemdebem Porque dos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 568 centos milhares de assuntos certos que parecem mágica de rastreador só com o Tipote e o Suzarte o senhor podia rechear livro E ainda antes do meiodia subir desemalocaram duas gordas novilhas carneadas fartas para a nossa refeição Um bom entendedor num bando faz muita necessidade E aquele lugar o Valado eu aceitei o senhor preste atenção para ficar uns meus tempos ali ainda me valia Senti assim meu destino Dormindo com um pano molhado em cima dos olhos e com a nuca repousada numa folha de faca de noite o destino da gente às vezes conversa sussurra explica até pede para não se atrapalhar o devido mas ajudar Crendice Mas coração não é meio destino Permanecer ao menos ali eu quis Mas Zé Bebelo duvidou de ficar Zé Bebelo suscitado determinou que a gente fosse mais para adiante Ele concebia medo Conheci Estava Zé Bebelo pegou a principiar medo Por quê Chega um dia se tem Medo dele era da bexiga do risco de doença e morte achando que o povo do Sucruiú podiam ter trazido o mauar e que mesmo o Sucruiú ainda demeava vizinho justo demais Tanto ri Mas ri por de dentro e procedi sério feito um pau do campo Assim mesmo em errei disso não sabia Mas o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 569 cabedal é um só do misturado viver de todos que mal vareia e as coisas cumprem norma Alguém estiver com medo por exemplo próximo o medo dele quer logo passar para o senhor mas se o senhor firme agüentar de não temer de jeito nenhum a coragem sua redobra e tresdobra que até espanta Pois Zé Bebelo que sempre se suprira certo de si tendo tudo por seguro agora bambeava Eu comecei a tremeluzir em mim Pelo que umas cinco léguas andamos De modo meio conforme decerto aquele algum seô Habão também tinha se ido Carecíamos Merecer logo ao menos uma semana de quieto é que era justo pois nenhum não estava mais em sua saúde Esses homens do Sucruiú cercados da banda outra pelos catrumanos ei que só podiam achar espaço por estes lados eles sim Nós no nosso Eu sei que um se mexer a esmo é sempre fácil e que com o cansaço é que se tapa o desânimo Mas o que eu queria real era estar sarado de alguma demorada doença comendo aos poucos o meu caldo com angu e em invernia de chuva fria esfriada me esquentando perto do borralho de um fogão e galo de manhã cantando em algum terreiro Era para ir Fôssemos Disso deslavava Descemos a Vereda do PorcoEs pim que não tinha nome verdadeiro anterior e assim chamamos porque um bicho daqueles por lá cruzou Chapadas de ladeira João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 570 pouca Depois uma lomba com o cerradão E por fim viemos esbarrar em lugar de algum cômodo mas feio como feio não se vê Tudo é gerais eu pensei por consolo Um homem que com a machadinha na mão e sua cabaça a tiracol tratava de desmelar cortiço num pau do mato esse indicou tudo necessário e deu a menção de onde é que estávamos Na Coruja um retiro taperado E ali redizendo o que foi meu primeiro pressentimento eu ponho que era por minha sina o lugar demarcado começo de um grande penar em grandes pecados terríveis Ali eu não devia nunca de me ter vindo lá eu não devia de ter ficado Foi o que assim de leve eu mesmo me disse no avistar o redondo daquilo e a velhice da casa Que mesmo como coruja era mas da orelhuda mais mor de tristes gargalhadas porque a suindara é tão linda nela tudo é cor que nem tem comparação nenhuma por cima de riscas sedas de brancura E aquele situado lugar não desmentia nenhuma tristeza A vereda dele demorava uma agüinha chorada demais Até os buritis mesmo estavam presos O que é que buriti diz É Eu sei e não sei Que é que o boi diz Me ensina o que eu sabia Bobice de todos Só esta coisa o senhor guarde meialégua dali um outro corgovereda parado sua água semcor por sobre de barro preto Essas veredas eram João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 571 duas uma perto da outra e logo depois alargadas formavam um tristonho brejão tão fechado de moitas de plantas tão apodrecido que em escuro marimbus que não davam salvação Elas tinham um nome conjunto que eram as VeredasMortas O senhor guarde bem No meio do cerrado ah no meio do cerrado para a gente dividir de lá ir por uma ou por outra se via uma encruzilhada Agouro Eu creio no temor de certos pontos Tem onde o senhor encosta a palmadamão em terra e sua mão treme pra trás ou é a terra que treme se abaixando A gente joga um punhado dela nas costas e ela esquenta aquele chão gostaria de comer o senhor e ele cheira a outroras Uma encruzilhada e pois o senhor vá guardando Aí mire e veja as Veredas Mortas Ali eu tive limite certo Os ruins dias o castigo do tempo todo ficado em que falhamos na Coruja conto malmente A qualquer narração dessas depõe em falso porque o extenso de todo sofrido se escapole da memória E o senhor não esteve lá O senhor não escutou em cada anoitecer a lugugem do canto da mãedalua O senhor não pode estabelecer em sua idéia a minha tristeza quinhoã Até os pássaros consoante os lugares vão sendo muito diferentes Ou são os tempos travessia da gente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 572 Daí despropositou o frio vezmente E quase que todos os companheiros já estavam adoecidos Refiro ao senhor que da bexigabrava não Mas de outras enfermidades Febres Em algum trecho por falta de sinal a gente devia de ter arranchado no sezonático Agora a maior parte dos companheiros tremiam em prazos com a intermitente Remédio que valesse de todo faltava Aquilo afracava no diário os homens perdiam a natureza E um andaço de defluxo que também me baqueou Pior não estive mas eu de mim sei Todos de em antes me davam por normal conforme eu era e agora instantantemente de dia em dia eu ia ficando demudado Com uma raiva espalhada em tudo frouxa nervosia É do fígado me diziam Dormia pouco com esforços Nessas horas da noite em que eu restava acordado minha cabeça estava cheia de idéias Eu pensava como pensava como o quemquem remexe no esterco das vacas Tudo o que me vinha era só entreter um planejado Feito num traslo copiado de sonho eu preparava os distritos daquilo que no começo achei que era fantasia mas que com o seguido dos dias se encorpava e ia tomando conta do meu juízo aquele projeto queria ser e ação E o que era eu ainda não digo mais retardo de relatar Coisa cravada Nela eu pensava ansiado ou em brando como a água João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 573 das beiras do rio finge que volta para trás como a baba do boi cai em tantos sete fios Ah mas aquilo por terrível que fosse eu tinha de levantar mas tinha Em tal já sabia do modo completo o que eu tinha de proceder sistema que tinha aprendido as astúcias muito sérias Como é Aos poucos pouquinhos perguntando em conversa a uns escutando de outros me lembrando de estórias antigo contadas A maneira que quase sem saber o que eu estava fazendo e querendo De em desde muito tempo Custoso pior não sendo no arrevesso Só o que demandava era uma fúria de quente frieza dura nos dentes um rompante de grande coragem Ao que era por tanto negrume e carregume a mais medonha responsabilidade possível ato que só raro mas raro um homem acha o querer para executar nesses sertões todos Vai um dia eu quis Antes o que eu vinha era adiando aquilo adiando Quis assim meio às tantas mesmo desfazendo de esclarecer no exato meus passos e motivos Ao que na moleza eu tateava Digo comecei Tinha preceito O que seja primeiro não se coma não se beba e é se bebe cachaça Um gole que era fogo solto na goela e nos internos Não quebrava o jejum do demo No que eu confiei que estava pronto para ir João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 574 avante no que eram obras de chão e escuridão Engano meu A aguardar até à hora eu carecia de não deixar que nem um fiozinho de idéia comum em mim esvoaçasse Deixei Aí foi um instante Diadorim estava perto de mim vivo como pessoa com aquela forte meiguice que ele denotava Diadorim conversou aceitei a companhia dele Logo larguei meu começo de mão relaxei aqueles propósitos Cacei comida Comi tanto zampei e meu corpo agradecia Diadorim com as pestanas compridas os moços olhos Desde aí naquelas outras coisas não queria pensar e ri pauteei dormi A vida era muito normal mesma e certa bem que estava Tanto o engano Os três dias passados eu reproduzi tudo com uma qualidade de remorsos aquelas decisões Sonhei coisas muito duras O porque era pior agora que eu tomei sombra vergonhosa por ter começado e não ter tido firmeza para levar a acabado E a herança de minhas queixas antigas Conforme eu pensava tanta coisa já passada e que é que eu era Um raso jagunço atirador cachorrando por este sertão O mais que eu podia ter sido capaz de pelejar certo de ser e de fazer e no real eu não conseguia Só a continuação de airagem trastejo trançar o vazio Mas por quê eu pensava Ah então sempre achei por causa de minha costumação e por causa dos outros Os outros João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 575 os companheiros que viviam àtoa desestribados e viviam perto da gente demais desgovernavam todaahora a atenção a certeza de se ser a segurança destemida e o alto destino possível da gente De que é que adiantava se não estatuto de jagunço Ah era Por isso eu tinha grande desprezo de mim e tinha cisma de todo o mundo Apartado De Zé Bebelo mais do que de todos Zé Bebelo doente não estava Doença com ele Sendo o que a um assim não podia permitido só se perdesse de todo o siso A não ser por essa malacafa Ei pois ele estava caipora Logo vi Daí tinha conta a nossa reles perdição aquele atrasamento geral Zé Bebelo para mim tinha gastado as vantagens Zé Bebelo murchava muda na cor não existia mais em viço para desatinos nada que falava era mais de se reproduzir aqueles exageros bonitos e tamanhos rasgos Só dizendo que tínhamos de esperar mesmo ali até que os adoecidos sarassem Assim em impossibilidades Tudo o que acontecia era a másorte Não digo por um Zé Vital que tornava a dar ataque dos de entortar boca escumante e se esbracejar e espernear com madeira de braçosepernas que de quem eram Mas uma jararaca picou o Gregoriano era aquela a rastejo no capim e nas folhas caídas nem chegava a quatro palmos e com poder de acabar e o Gregoriano morreu em pobres horas E João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 576 mais conto o que com um Felisberto se dava Assaz em aparências de saúde mas tendo sido baleado na cabeça fazia já alguns anos uma bala de garrucha a bala de cobre se dizia que estava encravada na vida de seus encaixes e carnes em ponto onde ferramenta de doutor nenhum não alcançava de escrafunchar Aí com o intervalo dos meses e de repente sem razão entendível nenhuma a cara desse Felisberto se esverdeava até os dentes de azinhavres ficava mal Ao que os olhos incha vam tudo fuscado em verde uma mancha só o muito grande O nariz entupia inchado Ele tossia E horror de se ver o metal do esverdeio Daí feito flor de joaninhasilva em muito sol do meiodia para a tarde virava era azul Aquilo era para poder sarar Quando que A tosse dum garrote entisicado Dizia naquelas horas que estava sem visiva nada não enxergava A maior felicidade era ele não saber quem tinha acertado nele aquela bala não carecer de imaginar onde era que tal pessoa estava nem de ódio constante de repensar nela Mas que em desregra a gente se comportava então de parar ali envelhecendo os dias na Coruja como fosse menose mais para aproveitar a carne fresca e desol que na campeação se conseguia as boiadas daqueles sertões Sempre Zé Bebelo não desistia de palavrear a raleza de projetos como fazdeconta A João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 577 mó de moinho que nela não caindo o que moer mói assim mesmo si mesma mói mói As doenças se curassem Minhas dúvidas Aí quem não pegara a maleita padecia por outros modos maldeinchar carregaçãodopeito meiasdores teve até agravado de estupor Adiantemente me desvali O que me coçava que nem se eu tivesse provado lombo de capivara no cio A ser o fígado que me doía mas não me certifiquei apalpar lugar de meu corpo por doença me dava um desalento pior Raimundo Lê cozinhou para mim um chá de urumbeba Era um recurso para aliviar meu achaque e era dado com bondade Isso mesmo foi o que eu disse a Raimundo Lê agradecido É um recurso para aliviar meu achaque e estou vendo que é dado com bondade Alaripe pegou a gabar a virtude mezinheira das mais raízes e folhas Até estas aqui duvidar devem de poder servir em doses de remédio para al gum carecer só que não se sabe ele disse por uma moita rosmunda de freijorge esfiada em tantos espetos e a pavoã por perto crescida Ali naquela hora eu conferi como era usual a gente estimar os companheiros em ajuntado Diadorim que graçasaDeus estava de todo são com os cuidados todos depunha assisado por mim E o Sidurino disse A gente carecia agora era de um vero tiroteio para exercício de não se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 578 minguar A alguma vila sertaneja dessas e se pandegar depois vadiando Ao assaz confirmamos todos estávamos de acordo com o sistema Aprovei também Mas mal acabei de pronunciar eu despertei em mim um estar de susto entendi uma dúvida de arpejo e o que me picou foi uma cobra bibra Aqueles ali eram com efeito os amigos bondosos se ajudando uns aos outros com sinceridade nos obséquios e arriscadas garantias mesmo não refugando a sacrifícios para socorros Mas no fato por alguma ordem política de se dar fogo contra o desamparo de um arraial de outra gente gente como nós com madrinhas e mães eles achavam questão natural que podiam ir salientemente cumprir por obediência saudável e regra de se espreguiçar bem O horror que me deu o senhor me entende Eu tinha medo de homem humano A verdade dessa menção num instante eu achei e completei e quantas outras doideiras assim haviam de estar regendo o costume da vida da gente e eu não era capaz de acertar com elas todas de uma vez Aí para mim que não tenho rebuço em declarar isto ao senhor parecia que era só eu quem tinha responsabilidade séria neste mundo confiança eu mais não depositava em ninguém Ah o que eu agradecia a Deus era ter me emprestado essas vantagens de ser atirador João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 579 por isso me respeitavam Mas eu ficava imaginando se fosse eu tivesse tido sina outra sendo só um coitado morador em povoado qualquer sujeito à instância dessa jagunçada A ver então aqueles que agorinha eram meus companheiros podiam chegar lá façanhosos avançar em mim cometer ruindades Então Mas se isso sendo assim possível como era pois que agora eles podiam estar meus amigos O senhor releve o tanto dizer mas assim foi que eu pensei e pensei ligeiro Ah eu só queria era ter nascido em cidades feito o senhor para poder ser instruído e inteligente E tudo conto como está dito Não gosto de me esquecer de coisa nenhuma Esquecer para mim é quase igual a perder dinheiro Ateado no que pensei eu sem querer disse alto Só o demo E Uém um deles espantado me indagou Aí teimei e inteirei Só o QueNãoFala o QueNãoRi o MuitoSério o cão extremo Eles acharam divertido Algum fez o pelosinal Eu também Mas Diadorim que quando ferrava não largava falou O inimigo é o Hermógenes Disse me olhou Seja fosse para agradar o meu espírito Arte de docemente o que eu não pensei o que eu reproduzi firme João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 580 Que sim certo O inimigo é o Hermógenes Vigiei Diadorim ele levantou a cara Vi como é que olhos podem Diadorim tinha uma luz Reponho em tanto já estava noitinha escurecendo aquela escuridão queria mandar os outros embora O que Diadorim reslumbrava me lembro de heide me lembrar enquanto Deus dura Mas entre nós dois sem ninguém saber nem nós mesmos no exato o que a gente acabava de fazer entestando nos fundos definitivamente por morte era o julgamento do Hermógenes Hermógenes Saranhó Rodrigue Felipes como ele se chamava hoje neste sertão todo o mundo sabe até em escritos no jornal já saiu o nome dele Mas quem me instruiu disso na ocasião foi o Lacrau aquele que à custa de riscos conseguira nos Tucanos se baldear para o meio de nós consoante relatei A ele dei de perguntar ao mau respeito muitas coisas Assaz de contente ele me respondia Se era verdade o que se contava Pois era o Lacrau me confirmou o Hermógenes era positivo pactário Desde todo o tempo se tinha sabido daquilo A terra dele não se tinha noção qual era mas redito que possuía gados e fazendas para lá do Alto Carinhanha e no Rio do Borá e no Rio das Fêmeas nos gerais da Bahia E veja por que sinais se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 581 conhecia em favor dele a arte do CoisaMá com tamanha proteção Ah pois porque ele não sofria nem se cansava nunca perdia nem adoecia e o que queria arrumava tudo sendo que no fim de qualquer aperto sempre sobrevinha para corrigimento alguma revirada no instinto derradeiro E como era a razão desse segredo Ah que essas coisas são por um prazo Assinou a alma em pagamento Ora o que é que vale Que é que a gente faz com alma O Lacrau se ria só por acento Ele me dizia que a natureza do Hermógenes demudava não favorecendo que ele tivesse pena de ninguém nem respeitasse honestidade neste mundo Pra matar ele foi sempre muito pontual Se diz O que é porque o Cujo rebatizou a cabeça dele com sangue certo que foi o de um homem são e justo sangrado sem razão Mas a valência que ele achava era despropositada de enorme medonha mais forte que a de rezabrava muito mais própria do que a de fechamentodecorpo Pactário ele era se avezando por cima de todos Você que não cede nenhum valor à alma você Lacrau era capaz de fechar desse pacto eu indaguei Ah não mano quero lá não navegar por detrás das coisas Coragem minha é para se remedir contra homem levado feito eu não é para marcar a meianoite nessas encruzilhadas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 582 enfrentar a Figura Calado considerei comigo Esse Lacrau tirava a sensatez da insensatez Outras informações ele disse O senhor não é como eu Sem crer cri Às parlendas bobéia O medo que todos acabavam tendo do Hermógenes era que gerava essas estórias o quanto famanava O fato fazia fato Mas no existir dessa gente do sertão então não houvesse por bem dizer um homem mais homem Os outros o resto essas criaturas Só o Hermógenes arrenegado senhoraço destemido Rúim mas inteirado legíti mo para toda certeza a maldade pura Ele de tudo tinha sido capaz até de acabar com Joca Ramiro em tantas alturas Assim eu discerni sorrateiro muito estudantemente Nem birra nem agarre eu não estava acautelando Em tudo reconheci que o Hermógenes era grande destacado daquele porte igual ao pico do serro do Itambé quando se vê quando se vem da banda da MãedosHomens surgido alto nas nuvens nos horizontes Até amigo meu pudesse mesmo ser um homem que havia Mas Diadorim era quem estava certo o acontecimento que se carecia era de terminar com um Diadorim o Reinaldo me lembrei dele como menino com a roupinha nova e o chapéu novo de couro guiando meu ânimo para se aventurar a travessia do Rio do Chico na canoa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 583 afundadeira Esse menino e eu é que éramos destinados para dar cabo do Filho do Demo do Pactário O que era o direito que se tinha O que eu pensei deu de ser assim Mas em tanto com as mudanças e peripécias no afinco de tudo lhe referir ditas conforme digo não toco no nome de Otacília Nela eu queria pensar na ocasião mas mal que cada vez achava mais custoso A ser que se nublando a sustância da recordação a esquecida formosura Assim a nossa conversação de amor lá na Santa Catarina não consistisse mais do que em uma estória alheia escutada de outra pessoa contar Sei que eu queria uma saudade Para isso rezei a todas as minhas Nossas Senhoras Sertanejas Mas rebotei de lado aquelas orações na água fina e no ar dos ventos Elas era feito eu lavrasse falso não me davam nenhuma cortesia Só um vexame de minha extração e da minha pessoa a certeza de que o pai dela nunca havia de conceder o casamento nem tolerar meu remarcado de jagunço entalado na perdição sem honradez costumeira As quantias por paga O senhor entende o que conto assim é resumo pois no estado do viver as coisas vão enqueridas com muita astúcia um dia é todo para a esperança o seguinte para a desconsolação Mas eu achei aí a possibilidade capaz a razão A razão maior era uma O senhor não quer o senhor não está querendo saber João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 584 Aquilo que eu ainda não tinha sido capaz de executar Aquilo para satisfazer honra de minha opinião somente que fosse Ah qualquer dia destes qualquer hora era como eu me aprazava O dum dia duma noite Duma meianoite Só para confirmar constância da minha decisão pois digo acertar aquela fraqueza Ao que alguma espécie aquilo continha Na verdade real do Arrenegado a célebre aparição eu não cria Nem E agora com isto que falei já está ciente o senhor Aquilo o resto Aquilo era eu ir à meianoite na encruzilhada esperar o Maligno fechar o trato fazer o pacto Vejo que o senhor não riu mesmo em tendo vontade Também tive Ah hoje ah tomara eu ter Rir antes da hora engasga E eu me enviava pelo sério Uma precisão eu encarecia aí de sopesar minhas seguidas forças como quem pula a largura dum barranco como quem saca sua faca para relumiar E veio mesmo outra manhã sem assunto eu decidi comigo É hoje Mas dessa vez eu ainda remudei Sem motivo para sim sem motivo para não Delonguei deveras Não é que não foi de medo Nem eu cria que no passo daquilo pudesse se dar alguma visão O que eu tinha por mim só a invenção de coragem Alguma coisice por principiar O que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 585 algum tivesse feito por que era que eu não ia poder E o mais é peta nonada Do Tristonho vir negociar nas trevas de encruzilhadas na morte das horas soforma dalgum bicho de pêlo escuro por entre chorinhos e estados austeros e daí erguido sujeito diante de homem e se representando canhim beiçudo manquinho por cima dos pés de bode balançando chapéu vermelho emplumado medonho como exigia documento com sangue vivo assinado e como se despedia depois no estrondo e forte enxofre Eu não acreditava mesmo quando estremecia Tarreneguei Com isso o tempo mais parava Também fazia mais de mês que a gente estava naquela tapera de retiro cujo a Coruja era que era o nome por um desses impossíveis de Zé Bebelo Ao que mais foi que aconteceu ali Bem passa um bando de papagaios o senhor pensa que eles levaram de sua pessoa alguma diversão Mas os papagaios estão voando já longe e o rumor deles conforme o vento faz que nem estivessem retornando Diadorim esse nunca teve instante desiludido Sempre eu gostava muito dele Só que não falasse por aquele tempo eu quase não abria boca para conversação João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 586 E se deu que chegaram lá dois homens quando não se esperava um deles se vendo que sendo patrão e o outro algum vaqueiro de seu serviço Aí logo se soube era o dono daqueles lugares do retiro do Valado principalmente e ele conforme já disse seô Habão se chamava Ali quando dei fé ele já tinha se apeado estava curvado para o chão mas seguro com a mão esquerda na rédea de seu cavalo Era um homem de boa idade vestido com brim azul encorpado escuro e calçando pretas botas joelhudas Quando levantou o olhar outra vez notei que tinha boa catadura Mas o cavalo esse me entusiasmou era um animal gateado grande com imponência e todo brio de rabejo vasto e mais tarde o senhor verá o que ele era cavalo de cara alta de beiço mole cavalo que debruça bem e que em poço bebia remolhando a testa Ele sabia olhar redormirado a gente com simpatias ou com desprezos e respirava para dentro dos peitos a maior quantidade de ar que desejava por quantas ventas tão largas ele tinha Bem dele depois lhe conto Seô Habão estava conversando com Zé Bebelo Admirei a noção dele que era uma calma muito sensata e firmada junto com um miúdo comportamento E vigiava os traços simples do arredor não perdendo azo de reparar em todas as coisas como era que estavam em que pé Olhares de dono o senhor sabe E João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 587 assim foi que ele declarou a Zé Bebelo que na ocasião estava desprevenido não transportava consigo o dinheiro razoável Mas que se a gente desse a ele o gosto de seguirmos até à verdadeira sua fazendagrande que possuía na vertente do Resplandor dali a umas vinte léguas de lonjura ele havia de fornecer ademais um auxílio em espórtulas E ele falou aquilo com tantas sinceras medidas a gente se capacitando do profundo que o dinheiro para ele devia de ter valor Por aí vi que ele era adiantado e sagaz Porque ema no chapadão é a primeira que ouve e se sacode e corre e mesmo em quando tenha razão Mas com seus modos guerreiros Zé Bebelo abriu um gesto à fidalgamente nem deixando o outro estipular Ah isso não patrício meu amigo he mas absolutamente A gente não é gente da desordem E favor de sobra nós já devemos ao senhorpela pousada em suas terras e pelas cabeças de gado de sua posse que temos carneado por precisão de sustento O homem depressa pronunciou que tinha prazer naquilo que sua boiada toda estava às ordens mas como por uma regra perguntou assim mesmo quantas cabeças mais ou menos a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 588 gente já tinha consumido Assim ele dava balanço inquiria e espiava gerente para tudo como se até do céu e do vento suão homem carecesse de cuidar comercial Eu pensei enquanto aquele homem vivesse a gente sabia que o mundo não se acabava E ele era sertanejo Sobre minha surpresa que era Serras que se vão saindo para destapar outras serras Tem de todas as coisas Vivendo se aprende mas o que se aprende mais é só a fazer outras maiores perguntas Fiquei notando Em como Zé Bebelo aos poucos mais proseava com ensejos de ir mostrando a valia declarada que tinha de jagunço chefe famoso e daí sutil se reconhecia da parte dele um certo desejo de agradar ao outro Por causa que o outro era diferido composto em outra séria qualidade de preocupações E seô Habão que escutava com respeito devagar zinho pegava a fazer perguntas com a idéia na lavoura nos trabalhos perdidos daquele ano por desando das chuvas temporãs e do sol grave e das doenças sucedidas O que me dava a qual inquietação que era de ver conheci que fazendeiromor é sujeito da terra definitivo mas que jagunço não passa de ser homem muito provisório João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 589 E Zé Bebelo mesmo se cansava de falar demonstrado Porque seô Hahão mansoso e manso sem glória nenhuma era um toco de pau que não se destorce fincado sempre para o seu arrumo Ele só entendia de assuntos triviais mas cuidava deles com uma força vagarosa verdadeira de boidecoice E no mais nem ouvia apesar de toda a cortesia de respeito quando se falava em loca Ramiro no Hermógenes e no Ricardão em tiroteios com os praças e na grande tomada por quinhentos cavaleiros da formosa cidade de São Francisco que é a que o Rio olha com melhor amor Daí assim ia sendo que mesmo sem sentir o próprio Zé Bebelo se via principiando a ter de falar com ele em todas as pestes de gado e nas boas leiras de vazante no feijão daseca e nos arrozais cacheando em que os passarinhos de Deus viram em a má praga Com efeito nos intervalos daquela dividida conversa não sei o que Zé Bebelo sentia nem achava Eu digo me disse que um homem assim seô Habão era para se querer longe da gente ou pois então que logo se exigisse e deportasse Do contrário não tinha sincero jeito possível porque ele era de raça tão persistente no diverso da nossa que somente a estância dele em frente já media conferia e reprovava Mas sei lá só por um doente desejo de necessidade de ver bem se aquilo era o certo foi que não sosseguei até poder me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 590 presenciar com ele perto a perto e inventar conversação E nem custoso não me foi porque ele passou ali com a gente muitas horas quase que o dia todo Dei um jeito fazendo como se menos quisesse e vim em fala Seô Habão me olhou com tantã norma desusada que eu senti minhas falsidades E esqueci as palavras primeiras que tinha aprontado para declarar Seô Capitão Habão eu disse e num relance eu conheci que estava também tendo de falar o pr agradar Assim o que dissertei foi que eu sabia do título de capitão que ele usufruía por ter relido o diploma na casa do Valado que de roubos a furtos a gente do Sucruiú tinha devastado E contei a ele que a referida patente eu tinha por cautela apanhado do chão e guardado dentro do oratório por detrás das imagens dos santos Ele nem deu ar de interesse no fato não me agradeceu por isso perguntou nada Disse A bexiga do Sucruiú já terminou Estou ciente dos que morreram foram só dezoito pessoas E o que indagou foi se eu soubesse se tinham feito muitos estragos nos canaviais O que eles deixaram em pé e que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 591 lobo ou mãopelada não roeram sempre háde dar uns carros se move moagem Agora ele conservava os olhos sem olhar num vagar vago circunspecto pensava aqueles capítulos Disse que ia botar os do Sucruiú para o corte da cana e fazeção de rapadura Ao que a rapadura havia de ser para vender para eles do Sucruiú mesmo que depois pagavam com trabalhos redobrados De ouvir ele acrescentar assim com a mesma voz sem calor nenhum deu em mim de repente foram umas nervosias Ao que aqueles do Sucruiú fossem juntasdebois em canga criaturas de toda proteção apartadas Mas eu não tinha raiva desse seô Habão juro ao senhor que ele não era antipático Eu tinha era um começo de certo desgosto que seria meditável Para o ano se Deus quiser boto grandes roças no Valado e aqui O feijão milho muito arroz Ele repisava que o que se podia estender em lavoura lá era um desadoro E espiou para mim com aqueles olhos baçosos aí eu entendi a gana dele que nós Zé Bebelo eu Diadorim e todos os companheiros que a gente pudesse dar os braços para capinar e roçar e colher feito jornaleiros dele Até enjoei Os jagunços destemidos arriscando a vida que nós éramos e aquele seô Habão olhava feito o jacaré no juncal cobiçava a gente para escravos Nem sei se ele sabia que queria Acho que a idéia dele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 592 não arrumava o assunto assim à certa Mas a natureza dele queria precisava de todos como escravos Ainda confesso declarado ao senhor eu não tivesse raiva daquele seô Habão Porque ele era um homem que estava de mim em tão grandes distâncias A raiva não se tem duma jibóia porque jibóia constraga mas não tem veneno E ele cumpria sua sina de reduzir tudo a conteúdo Pudesse economizava até com o sol com a chuva Estava picando fumo no covo da mão garanto ao senhor que não esperdiçava nem o átomo dumas felpas A alegria dele era uma recontada repetição um condescendido vinte trinta carros de milho ah os mil alqueires de arroz Zé Bebelo que esses projetos ouvisse ligeiro logo era capaz de ficar cheio de influência exclamar que assim era assim mesmo para se transformar aquele sertão inteiro do interior com benfeitorias para um bom Governo para esse ôBrasil Em peta que um seô Habão esse não se entusiasmava Era só os carrosdebois carreando a cana E ele dava ordens Ordem que dava havia de ser costumeira e surda muito diferente da de jagunço Cada pessoa cada bicho cada coisa obedecia Nós íamos virando enxadeiros Nós Nunca Mas então eu antes queria ver chegar duma vez os do Hermógenes em galopadas e gritos berrando rifles em todo fogo e ai para se ouvir e sangue João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 593 para quem ver pudesse Aí era que iam saber o que sebaceiro é E por um despique foi que acertei meu correão com as armas e pronunciei Duvidar seô Habão o senhor conhece meu pai fazendeiro Senhor Coronel Selorico Mendes do São Gregório Pensei que ele nem fosse acreditar Mas juro ao senhor ele me olhou com muitos outros olhos Aquele olhar eu agüentei facilitado Seô Habão sacudia em sim a cabeçona surpreendido mas circunstante Dou notícia Dou notícia ele quase que se lastimou Nem sei se ele sabia que meu Padrinho Selorico Mendes fosse como era muito mais fornecido de renome e avultado em posses conforme até por estes sertões do gerais se contava Regozijei devagar mas não regozijei completo Do que destapei que um desses com a estirpe daquele seô Habão tirassem dele tomassem de repente tudo aquilo de que era dono e ele havia de choramingar que nem criancinha sem mãe e tatear toda a vida feito ceguinho catando no chão o cajado feito quem esquenta mãos por cima dum fogo fumacento A misericórdia também eu quase tive Natureza da gente não cabe em nenhuma certeza De ver o homem em pé diante de mim recrescer e tornar a minguar isto tudo no meu juízo nem sei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 594 de que estimas me esquecia e de que outras me lembrava E com pouco no rebaixar do sol ele tornou a amontar no seu cavalo gateado belo e se foi de rompido no rumo torto do Valado Sobre assim aí corria no meio dos nossos um conchavo de animação fato que ao senhor retardei devido que mesmo um contador habilidoso não ajeita de relatar as peripécias todas de uma vez Pois foi que o vaqueiro tal que acompanhava o seô Habão em conversa distraída com algum ou com outro por acasos mencionou que um bando de uns dez homens jagunços também pelo dito e visto andavam parapassando como que à espera de destino em entre o Fazendão Felício que é na beira da estradamor para esse poente todo e o Porto velho da Remeira no rio Paracatu aonde menos dia mais dia todo o mundo acaba vindo chegando Depressa então falaram o assunto ciente para Zé Bebelo que reconheceu pela descrição Chagas de Cristo É eles ei egüei Só pode que pode ser é mesmo o João Goanhá com uns outros E instantâneo expediu para lá dois próprios que tocassem ligeiro como sem senões e voltassem trazendo os comparsas amigos Isso com a certa alegria se ouviu porque eram novidades acontecendo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 595 Afora eu Achado eu estava A resolução final que tomei em consciência O aquilo Ah que agora eu ia Um tinha de estar por mim o Pai do Mal o Tendeiro o Manfarro Quem que não existe o SoltoEu o Ele Agora por quê Tem alguma ocasião diversa das outras Declaro ao senhor hora chegada Eu ia Porque eu estava sabendo se não é que fosse naquela noite nunca mais eu ia receber coragem de decisão Senti esse intimado E tanto mesmo nas idéias pequenas que já me aborrecendo e por causa de tantos fatos que estavam para suceder dia contra dia Eu pensava na vinda de João Goanhá e que a gente carecia de sair de novamente por ali por terras e guerras Pensei naquele seô Habão que nem num transtorno Mais não sei E essas coisas desconvinham em mim em espécie de necessidade A não me apartar àtoa dali das Veredas Mortas Sombra de sombra foi entardecendo fuscava Ao que eu estivesse destemido soberbo Da mão peluda eu firme estava Fazia muito tempo que eu não descabia de tão em arrojo Dou que nunca feito naquela hora e em aquele dia Somente com a alegria é que a gente realiza bem mesmo até as tristes ações Retrocedi de todos De Zé Bebelo demais que ele havia de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 596 desconfiar dizer o que era desordens que cabeça de homem não cogita De Diadorim refugi Ah deixa a agüinha das grotas gruguejar sozinha E no singular de meu coração dou dito o que eu gostava tanto de Diadorim tinha um escrúpulo queria que ele permanecesse longe de toda confusão e perigos Háde essa lembrança branda de minha ação minha Nossa Senhora ainda marque em meu favor Deus me tenha Adjaz o campo então eu subi de lá noitinha hora em que capivara acorda sai de seu escondido e vem pastar Deus é muito contrariado Deus deixou que eu fosse em pé por meu querer como fui Eu caminhei para as VeredasMortas Varei a quissassa depois tinha um lance de capoeira Um caminho cavado Depois era o cerrado mato fui surgindo Ali esvoaçavam as estopas eram uns caborés E eu ia estudando tudo Lugar meu tinha de ser a concruz dos caminhos A noite viesse rodeando Aí friazinha E escolher onde ficar O que tinha de ser melhor debaixo dum pauCardoso que na campina é verde e preto fortemente e de ramos muito voantes conforme o senhor sabe como nenhuma outra árvore nomeada Ainda melhor era a caparosa porque no chão bem debaixo dela é que o Careca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 597 dança e por isso ali fica um círculo de terra limpa em que não cresce nem um fio de capim e que por isso de caparosado judeu nome toma Não havia A encruzilhada era pobre de qualidades dessas Cheguei lá a escuridão deu Talentos de lua escondida Medo Bananeira treme de todo lado Mas eu tirei de dentro de meu tremor as espantosas palavras Eu fosse um homem novo em folha Eu não queria escutar meus dentes Desengasguei outras perguntas Minha opinião não era de ferro Eu podia cortar um cipó e me enforcar pelo pescoço pendu rado morrendo daqueles galhos queméque quem que me impedia Eu não ia temer O que eu estava tendo era o medo que ele estava tendo de mim Quem é que era o Demo o SempreSério o Pai da Mentira Ele não tinha carnes de comida da terra não possuía sangue derramável Viesse viesse vinha para me obedecer Trato Mas trato de iguais com iguais Pri meiro eu era que dava a ordem E ele vinha para supilar o ázimo do espírito da gente Como podia Eu era eu mais mil vezes que estava ali querendo próprio para afrontar relance tão desmarcado Destes meus olhos esbarrarem num ror de nada Esperar era o poder meu do que eu vinha em cata E eu não percebia nada Isto é que mesmo com o escuro e as coisas do escuro tudo devia de parar por lá com o estado e aspecto O João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 598 chirilil dos bichos Arre quem copia o riso da coruja o gritado Arrepia os cabelos das carnes E não conheci arriação nem cansaço Ele tinha que vir se existisse Naquela hora existia Tinha de vir demorão ou jajão Mas em que formas Chão de encruzilhada é posse dele espojeiro de bestas na poeira rolarem De repente com um catrapuz de sinal ou momenteiro com o silêncio das astúcias ele podia se surgir para mim Feito o Bode Preto O Morcegão O Xu E de um lugar tão longe e perto de mim das reformas do Inferno ele já devia de estar me vigiando o cão que me fareja Como é possível se estar desarmado de si entregue ao que outro queira fazer no se desmedir de tapados buracos e tomar pessoa Tudo era para sobrosso para mais medo ah aí é que bate o ponto E por isso eu não tinha licença de não me ser não tinha os descansos do ar A minha idéia não fraquejasse Nem eu pensava em outras noções Nem eu queria me lembrar de pertencências e mesmo de quase tudo quanto fosse diverso eu já estava perdido provisório de lembrança e da primeira razão por qual era que eu tinha comparecido ali E o que era que eu queria Ah acho que não queria mesmo nada de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 599 tanto que eu queria só tudo Uma coisa a coisa esta coisa eu somente queria era ficar sendo E foi assim que as horas reviraram A meianoite vai correndo eu quis falar O cote que o frio me apertava por baixo Tossi até Estou rouco Pouco eu mesmo sozinho conversei Ser forte é parar quieto permanecer Decidi o tempo espiando para cima para esse céu nem o setestrelo nem as trêsmarias já tinham afundado mas o cruzeiro ainda rebrilhava a dois palmos até que descendo A vulto quase encos tada em mim uma árvore mal vestida o surro dos ramos E qualquer coisa que não vinha Não vendo estranha coisa de se ver Ao que não vinha a lufa de um vendaval grande com Ele em trono contravisto sentado de estadela bem no centro O que eu agora queria Ah acho que o que era meu mas que o desconhecido era duvidável Eu queria ser mais do que eu Ah eu queria eu podia Carecia Deus ou o demo sofri um velho pensar Mas como era que eu queria de que jeito que Feito o arfo de meu ar feito tudo que eu então havia de achar melhor morrer duma vez caso que aquilo agora para mim não fosse constituído E em troca eu cedia às arras tudo meu tudo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 600 o mais alma e palma e desalma Deus e o Demo Acabar com o Hermógenes Reduzir aquele homem e isso figurei mais por precisar de firmar o espírito em formalidade de alguma razão Do Hermógenes mesmo existido eu mero me lembrava feito ele fosse para mim uma criancinha moliçosa e mijona em seus despropósitos a formiguinha passeando por diante da gente entre o pé e o pisado Eu muxoxava Espremia pr ali amassava Mas Ele o Dado o Danado sim para se entestar comigo eu mais forte do que o Ele do que o pavor dEle e lamber o chão e aceitar minhas ordens Somei sensatez Cobra antes de picar tem ódio algum Não sobra momento Cobra desfecha desferido dá bote se deu A já que eu estava ali eu queria eu podia eu ali ficava Feito Ele Nós dois e tornopio do pédevento o róró girado mundo a fora no dobar funil de final desses redemoinhos o Diabo na rua no meio do redemunho Ah ri ele não Aheu eu eu Deus ou o Demo para o jagunço Riobaldo A pé firmado Eu esperava eh De dentro do resumo e do mundo em maior aquela crista eu repuxei toda aquela firmeza me revestiu fôlego de fôlego de fôlego da maisforça de maiorcoragem A que vem tirada a mando de setenta e setentas distâncias do profundo mesmo da gente Como era que isso se passou Naquela estação eu nem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 601 sabia maiores havenças eu assim eu espantava qualquer pássaro Sapateei então me assustando de que nem gota de nada sucedia e a hora em vão passava Então ele não queria existir Existisse Viesse Chegasse para o desenlace desse passo Digo direi de verdade eu estava bêbado de meu Ah esta vida às não vezes é terrível bonita horrorosamente esta vida é grande Remordi o ar Lúcifer Lúcifer aí eu bramei desengolindo Não Nada O que a noite tem é o vozeio dum sersó que principia feito grilos e estalinhos e o sapocachorro tão arranhão E que termina num queixume borbulhado tremido de passarinho ninhante malacordado dum totalzinho sono Lúcifer Satanás Só outro silêncio O senhor sabe o que o silêncio é É a gente mesmo demais Ei Lúcifer Satanás dos meus Infernos Voz minha se estragasse em mim tudo era cordas e cobras E foi aí Foi Ele não existe e não apareceu nem respondeu que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 602 é um falso imaginado Mas eu supri que ele tinha me ouvido Me ouviu a conforme a ciência da noite e o envir de espaços que medeia Como que adquirisse minhas palavras todas fechou o arrocho do assunto Ao que eu recebi de volta um adejo um gozo de agarro daí umas tranqüilidadesde pancada Lembrei dum rio que viesse adentro a casa de meu pai Vi as asas Arquei o puxo do poder meu naquele átimo Aí podia ser mais A peta eu querer saldar que isso não é falável As coisas assim a gente mesmo não pega nem abarca Cabem é no brilho da noite Aragem do sagrado Absolutas estrelas Pois ainda tardei esbarrado lá no burro do lugar Mas como que já estivesse rendido de avesso de meus íntimos esvaziado E a noite não descamba Assim parava eu por reles desânimo de me aluir dali com efeito nem firmava em nada minha tenção As quantas horas E aquele frio me reduzindo Porque a noite tinha de fazer para mim um corpo de mãe que mais não fala pronto de parir ou quando o que fala a gente não entende Despresenciei Aquilo foi um buracão de tempo A mor bem na descida avante branquejavam aqueles grossos de ar que lubrinam que corrubiam Dos marimbus das João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 603 VeredasMortas Garoa da madrugada E a bem dizer por um caminho sem expedição saí fui vindo membora Eu tinha tanto friúme assim mesmo me requeimava forte sede Desci de retorno para a beira dos buritis aonde o pano dágua A clarida dezinha das estrelas indicava a raso a lisura daquilo Ali era bebedouro de veados e onças Curvei bebi bebi E a água até nem não estava de frio geral não apalpei nela a mornidão que deviade nos casos de frio real o tempo estar fazendo Meu corpo era que sentia um frio de si frior de dentro e de fora no me rigir Nunca em minha vida eu não tinha sentido a solidão duma friagem assim E se aquele gelado inteiriço não me largasse mais Foi orvalhando O ermo do lugar ia virando visível com o esboço no céu no mermar da dalva As barras quebrando Eu encostei na boca o chão tinha derreado as forças comuns do meu corpo Ao perto dágua piorava aquele desleixo de frio Abracei com uma árvore um pé de breubranco Anta por ali tinha rebentado galhos e estrumado Posso me esconder de mim Soporado fiquei permanecendo O não sei quanto tempo foi que estive Desentendi os cantos com que piam os passarinhos na madrugança Eu jazi mole no chato no folhiço feito se um morcegãocaiaria me tivesse chupado Só levantei de lá João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 604 foi com fome Ao alembrável ainda avistei uma meleira de abelha aratim no baixo do paudevaca o mel sumoso se escorria como uma mina dágua pelo chão no meio das folhas secas e verdes Aquilo se arruinava desperdiçado Senhor senhor o senhor não puxa o céu antes da hora Ao que digo não digo Cheguei no meio dos outros quando o jacaré estava terminando de coar café Tu treme friúra pegou da maleita algum me perguntou Que os carregue eu arrespondi E mesmo com o sol saindo bom cacei um cobertor e uma rede Arte o enfim que nada não tinha me acontecido e eu queria aliviar da recordação ligeiro o desatino daquela noite Assim eu estava desdormido cisado Aí mesmo no momento fui ecogitando que a função do jagunço não tem seu que nem pra que Assaz a gente vive assaz alguma vez raciocina Sonhar só não O demônio é o DosFins o Austero o SeveroMor Aporro Sabendo que de lá em diante jamais nunca eu não sonhei mais nem pudesse aquele jogo fácil de costume que de primeiro antecipava meus dias e noites perdi pago Isso era um sinal Porque os prazos principiavam E o que eu fazia era que eu pensava sem querer o pensar de novidades Tudo agora João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 605 reluzia com clareza ocupando minhas idéias e de tantas coisas passadas diversas eu inventava lembrança de fatos esquecidos em muito remoto neles eu topava outra razão sem nem que fosse por minha própria vontade Até eu não puxava por isso e pensava o qual assim mesmo quase sem esbarrar o todo tempo Nos começos aquilo bem que achei esquipático Mas com o seguinte vim aceitando esse regime por justo normal assim E fui vendo que aos poucos eu entrava numa alegria estrita contente com o viver mas apressadamente A dizer eu não me afoitei logo de crer nessa alegria direito como que o trivial da tristeza pudesse retornar Ah voltou não por oras não voltava Uai tão falante Tatarana Quem te veja me perguntaram o Alaripe perguntou Será que de mim debicavam Eu estava com efeito relatando mediante certos floreados umas passagens de meus tempos e depois descrevendo por diversão os benefícios que os grados do Governo podiam desempenhar remediando o sertão do desdeixo E nesse falar eu repetia os ditos vezeiros de Zé Bebelo em tantos discursos Mas o que eu pelejava era para afetar por imitação de troça os sestros de Zé Bebelo E eles os companheiros não me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 606 entendiam Tanto que foi só entenderem e logo pegaram a rir Aí riam de miséria melhorada Os mestres que está certo amigo o Àlaripe dissesse Deveras está certo manovelho outro o Rasga emBaixo inteirou Aquilo não tolerei Esse vesgueiro RasgaemBaixo o qual entornava de lado a cabeça gastando ar demais o que respirava três vezes forte e fuxicando o nariz numa fungação Desentendi e impliquei Certo de que nesta vida Pois eu nem costumo nunca xingar ninguém de filho daquela ou dessa por receio de que seja mesmo verdade Assim a eles eu disse Tanto enquanto riam apreciando me ouvir eu contei a estória de um rapaz enlouquecido devagar nos Aiáis não longezinho da Veredada Aldeia o qual não queria adormecer por um súbito medo que nele deu de que de alguma noite pudesse não saber mais como se acordar outra vez e no inteiro de seu sono restasse preso Mais me acudiam dessas fantasias E eu relanceei de repente e falei o que era que a gente precisava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 607 Urgentemente é se mandar portador a lugar de farmácia comprar adquirido remédio forte que há para se terminar com a maleita em definitividade Disse e daí todos aprovaram mais Zé Bebelo com aquilo concordou de imediato Portador foi Eu tinha enjôo de toda pasmacez Com Zé Bebelo falei Chefe o que se tem de obrar enviar algum comparsa esperto que cace de entrar para o bando dos Judas para no meio deles observar o serviço que se passa e remeter para a gente as notícias e deixar traço nos lugares Ou que mesmo dê jeito de liquidar mãomente o Hermógenes proporcionando venenos por um exemplo A maluqueira Tatarana isso que você está definindo Zé Bebelo me contestou Maluqueiras é o que não dá certo Mas só é maluqueira depois que se sabe que não acertou eu atalhei curto porque eu naquela hora achava Zé Bebelo inferior e porque que alguém falasse contra por cima das minhas palavras me dava raiva Zé Bebelo retardou em me rever Do fim o dizer João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 608 Um homem para a façanha assim só mesmo se Sol procura é as pontas dos aços eu cortei sem meio medir o razoado Ao tanto que Zé Bebelo completava Só eu ou você mesmo Tatarana Mas a gente somos garrotes remarcados Mas daí me entendendo bem ele fechou assim Riobaldo tu é um homem de estúrdia valia A dado sincero eu senti Ao perante diante de minhas presenças todos tinham mesmo de ser sinceros Só nos olhos das pessoas é que eu procurava o macio interno delas só nos onde os olhos O José Vereda cachimbava sentado perto de seus pertences O Balsamão estava ali junto Esse era maneiras grossas homem de muito sobrecenho Derradeiramente eles estavam muito amigos mesmo porque os dois eram da mesma terra geralistas das campinas Má vontade me veio de dizer eu disse Assunto aí não é capaz que haja Torto torto nasceu morto Olh lá caso se um de vocês tem mulher bonita e nova quando retornarem para casa Isso podia ser razão de desguisado Eu queria rixar Figuro de cientificar ao João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 609 senhor o costume meu nunca tinha sido esse Agora era que eu me espiritava só para arrelias e inconveniências E aí quando uns estavam querendo tirar oração por ser dia de domingo não estive que não falasse Reza é começo de quaresma Os que riram riram Foram deixando de lado aquela mexida igrejeira Apondo em balança que é que isso me representava Tudo eu palpava com os pés nisso eu respingava um tardar Daqui veio que Diadorim mesmo estranhou aqueles meus modos A entender me deu e eu reminiquei com soltura de palavras como é que ia tolerar conselho ou contradição Agravei o branco em preto Mas Diadorim perseverou com os olhos tão abertos sem resguardo eu mesmo um instante no encantado daquilo num vemvem de amor Amor é assim o rato que sai dum buraquinho é um ratazão é um tigre leão Conferindo que nem vergonha eu tive Não ter vergonha como homem é fácil dificultoso e bom era poder não se ter vergonha feito os bichos animais O que não digo o senhor verá como é que Diadorim podia ser assim em minha vida o maior segredo De manhã naquele mesmo dia ele tinha conversado de me dizer João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 610 Riobaldo eu gostava que você pudesse ter nascido parente meu Isso dava para alegria dava para tristeza O parente dele Querer o certo do incerto coisa que significava Parente não é o escolhido é o demarcado Mas por cativa em seu destinozinho de chão é que árvore abre tantos braços Diadorim pertencia a sina diferente Eu vim eu tinha esco lhido para o meu amor o amor de Otacília Otacília quando eu pensava nela era mesmo como estivesse escrevendo uma carta Diadorim esse o senhor sabe como um rio é bravo É toda a vida de longe a longe rolando essas braças águas de outra parte de outra parte de fugida no sertão E uma vez ele mesmo tinha falado Nós dois Riobaldo a gente você e eu Por que é que separação é dever tão forte Aquilo de chumbo era Mas Diadorim pensava em amor mas Diadorim sentia ódio Um nome rodeante Joca Ramiro José Otávio Ramiro Bettancourt Marins o Chefe o pai dele Um mandado de ódio No que eu sabia Não venci as ácidas picuinhas no relembrar Aquele hora destas deve de andar lá por entre o Urucuia e o Pardo O Hermógenes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 611 Ele acinzentou a cara Tremeu aos pingos no centrozinho dos olhos Revi que era o Reinaldo que guerreava delicado e terrível nas batalhas Diadorim semelhasse maninel mas diabrável sempre assim como eu agora eu estava contente de ver Como era que era o único homem que a coragem dele nunca piscava e que por isso foi o único cuja toda coragem às vezes eu invejei Aquilo era de chumbo e ferro E em relance em mais eu já estava carecendo de declarar aos companheiros todos os erros que vínhamos pagando por motivo do ultimamente conforme agora eu ladino deduzia Disse com modos ao próprio Zé Bebelo que isto de mim escutou Sem tenção de descrédito ou ofensa Chefe mas duvido de que bem fizemos em restar todos aqui comprando cura de doenças Mais ajuizado certo não seria se ter remetido meiadúzia de cabras dos sãos que tivessem ido buscar a munição nesse lugar a VirgemMãe e trazer Munição já estava aqui e a gente estava mais garantidos Zé Bebelo em mal amargo ele espinoteou com a cabeça arejou os queijos Desde depressinha me explicou a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 612 maior razão com palavras baixas Porque ele de tudo já soubesse foi então que me disse que o extravio nosso tinha sido mais completo porque a gente tinha vindo em má rota em vez da VirgemMãe para a VirgemdaLaje Eu escutei tei Em outras ocasiões uma notícia dessas era capaz de me perturbar Mas dessa viagem eu achava até divertido Figuro explicando ao senhor desde por aí tudo o que vinha a suceder era engraçado e novo servia para maiores movimen tos Com essas levezas eu seguia a vida Quando então trouxeram reunidos todos os animais estavam ajuntando a cavalhada Regulava subida manhã orçado o sol e eles redondeavam no aprazível tropilha grande pondo poeira dado o alvoroço de muitos cascos Fiz um rebuliz Dou confesso o que foi era de mim que eles estavam espantados Aí porque a cavalaria me viu chegar e se estrepoliu O que é que cavalo sabe Uns deles rinchavam de medo cavalo sempre relincha exagerado Ardido aquele nitrinte riso fininho e como não podiam se escapulir para longe que uns suavam e já escumavam e retremiam que com as orelhas apontavam Assim ficaram mas murchando e obedecendo quando com uma raiva tão repentina eu pulei para o meio deles Barzabu Aquieta cambada que eu gritei Me avaliaram Mesmo pus a mão no João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 613 lombo dum que emagreceu à vista encurtando e baixando a cabeça arrufava a crina conforme terminou o bufo de bufor Notei que os companheiros reparavam a estranhez daquilo dos cavalos e as minhas maneiras Só que se riam formados no costume de jagunços que é de frouxas essas leviandades Barzabu ô gente feito fosse minha certeza o DasTrevas E eu parava rente no meio de todos que de volta aceitavam minha presença esses cavalos Tu sendo peão amansador domador que o Ragásio caçoou comigo Mas eu me virei e já se ouvia outro tropel era aquele seô Habão que chegava Vinha com três homens estroteantes gentinha trabalhosa E o animal dele o gateado formoso deu que veio se esbarrar ante mim Foi o seô Habão saltando em apeio e ele se empinou de dobrar os jarretes e o rabo no chão o cabresto solto da mão do dono chicoteou alto no ar Barzabu xinguei E o cavalão lão lão pôs pernas para adiante e o corpo para trás como onça fêmea no cio mor Me obedecia Isto juro ao senhor é fato de verdade O seô Habão estava ali me desentendeu nos olhos Ele ficou a vermelho Mas eu acho que homem só vendido ao dinheiro e ao ganho às vezes são os que percebem primeiro o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 614 atiço real das coisas com a ligeireza mais sutil Ele não gaguejou Melhor me disse Se este praz ao senhor Se ele praz ao senhor Lhe dou amigavelmente com bom agrado assim como ele está moço ele é seu Não acreditei Reafirmo ao senhor meu coração não pulsou dúvidas Agradeci com meu brio peguei a ponta do cabresto Agora daquela hora era meu o cavalo grande com suas manchas e riscas ah como ele pisava peso no chão e como ocupava tão grande lugar Até passeei um carinho nas faces dele e pela tábuadopescoço a fora Meu o bicho era por posse e assim revestido conforme estava que era com um Bocadinho bom com caçambas de pau Mas sendo que dividido o instante eu já ali pensei por que seria que o seô Habão se engraçava de me presentear de repente com uma prenda dum valor desse eu que não era amigo nem parente dele que não me devia obrigação quase que nem me conhecia Aos que projetos ele engenhava em sua mente que possança minha ele adivinhava A pois fosse Aquele homem me temia Da admiração de meu povo todo dei fé borborinho com que me rodeavam Certo deviam de estar com invejas Fosse E a mãe A primeira coisa que um para ser alto nesta vida tem de aprender é topar firme as invejas dos outros restantes Me rejo me calejo Só por causa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 615 daquele cavalo até eu fui ficando mais e mais enfrentava Não me riram É deveras Animal de riqueza graúdo farto e manteúdo Sorte é isto Merecer e ter Ainda bem que foi bem empregado Só dissessem Disfarcei meu regozijo Disse logo foi a tenção de maiores idéias em desejos segundo a como apeirado aquele eu já queria que arreado à gaúcha com peitoral com pratas em meialua e as peças dos arreios chapeadas de belo metal Ara que assim ouvi Tatarana o nome que ele vai se chamar é mesmo Barzabu algum caçoou de me perguntar A não meu compadre torto Sossega a velha Nome que dou a ele dora em diante conferido é este quem que aprender aprende que é o cavalo SiruizL assim foi que eu respondi sem tempo nenhum para pensamento Montei Ah as coisas influentes da vida chegam assim sorrateiras ladroalmente Pois Zé Bebelo estava aparecendo ali e eu atinei ligeiro com o que não tinha refletido Ao que oferecer e receber um presente daquele naquelas condições era a mesma coisa que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 616 forte ofender Zé Bebelo Um dom de tanto quilate tinha de ser para o Chefe Reconheci aí Mas não tirei para trás Não desapeei É de ver que conforme em mim nesses enquantos eu já devia de estar fitando Zé Bebelo com um certo desprezo Ia haver o que ia haver e eu não me importei Um qualquer chefe de jagunço havia de ter ímpeto de resolver aquilo fatal Aí esperei Teria sido uma tenção dessas de arder a desordem no meio nosso a razão do seô Habão Pensei o dito num ínterim E pensei pontudo em minhas armas Mas Zé Bebelo acabando de saber o acontecido mirou em mim somente poupado risonho Tal te fica bem Professor amontado nesse estampo queremos havemos de te ver garboso guerreando as boas batalhas Em hora foi o que ele disse se me seja que gostou pouco Choveu para o meu arrozal Ah mesmo só inteligência só era que que era aquele homem Desapeei Como por um rasgo para solércias dei o cabresto ao Fafafa Disse Tu desarreia amilha e escova tu trata dele e isso fiz porque o Fafafa que tanto gostava simples de cavalos era o prestante para cuidar dum animal em mesmo que dele não sendo Mas eu tinha dado uma ordem Assim me refiz E o seô João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 617 Habão tinha trazido também boa quantidade de remédio para se tomar pela maleita das pastilhas mais amargosas Todo o mundo recebia Saí uns passos Eu estava dando as costas a Zé Bebelo Ele podia num relance me agredir de morte me atirar por detrás atentei Esbarrei em meu caminhar fiquei assim parado assim mesmo O medo nenhum eu estava forro glorial assegurado quem ia conseguir audácias para atirar em mim As deles haviam de amolecer e retombar com emortecidos braços eu podia dar as costas para todos O que o Drão o demonião me disse disse seria só Olhei para cima pegaram nas nuvens do céu com mãos de azul Aquela firme possança assim permaneci outro tempo acendido Eu leve leve feito de poder correr o mundo ao redor Ao senhor eu conto direto isto como foi num dia tão natural Será que de cousas tão forçosas eu ia poder me esquecer Aquele dia era uma véspera Em tanto o seô Habão jantou com a gente Raimundo Lê repartiu com os carecidos as pastilhas de remédio Diadorim meu amigo estava Zé Bebelo me chamou adeparte me expondo especializado diversas coisas que pretendia reformar de fazer Alaripe conversou comigo E dessa derradeira conversa quero João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 618 referir ao senhor Foi que eu puxando eu desejando saber se falou muito nessas orações de curar a gente contra bala de morte e em breves que fecham o corpo Alaripe então contou uma estória caso sucedido fazia tempos no giro do sertão O qual era o seguinte Um José Misuso uma vez estava ensinando a um Etelvininho a troco de quarenta milréis como é que se faz a arte de um inimigo ter de errar o tiro que é destinado na gente Do que deu o preceito Só o sanguefrio de fé é que se carece pra na horinha se encarar o outro e um grito pensar somente Tu erra esse tiro tu erra tu erra a bala sai vindo de lado não acerta em mim tu erra tu erra filho de uma cã Assim ele ensinou ao Etelvininho o Misuso Mas aí o Etelvininho reclamou Ara pois se é só isso só issozinho pois então eu já sabia mesmo por mim sem ninguém me ensinar já fiz executei assim umas muitas vezes E fez igualzinho conforme o que eu defini indagou o José Misuso duvidando Igualzinho justo Só que no fim eu pensava insultado era seu filho duma cuia o Etelvininho respondeu Ah pois então o José Misuso cortou a questão pois então basta que tu me pague só uns vinte milréis João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 619 A gente muito rimos todos A hora a ser de satisfa alegrias sobejavam Se caçoou se bebeu um cantou o sebastião Mansinho mãe chegaram as voltas da noite Dormi com a cara na lua Acordei A madrugada com luar me lembro acordei com o rumor de cavaleiros que vinham chegando no esquipado e que travavam repentino com áspero estremecimento os cavalos brrruuu Calculei uns dez Ao que eram Levantei pulando de minha rede quem podiam esses ser Todos os companheiros nos rifles e eu não tinha escutado aviso de sentinelas Madrugada essa boa claridade Luar que só o sertão viu Vim dele Aí é o nosso João Goanhá com os cabras disse Diadorim que tinha a rede dele armada da minha a uns três passos Assim era João Goanhá o Paspe Drumõo o compadre Ciril o Bobadela o Isidoro Tornar a encontrar companheiros desses aí é que se põe significado na vida se encompridando se encurtando O João Goanhá gordo forte barbudo Era a dele uma barba muito fechada muito preta Veio do luar chegou bom Todo o mundo falava a gente se abraçava Com pouco o fogo se acendia para o café para algum almoço Enquanto isso João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 620 Zé Bebelo formado em pé o mais rompante que pudesse pedia notícias por interrogação Antes as verdades essas as coisas comuns conforme foi que se passaram Mais não sei Mesmo não tinha botado idéia na cabeça acabando de despertar de meu sono Diadorim era o que estava alegrinho especial só se ele tinha bebido Diadorim de meu amor põe o pezinho em cera branca que eu rastreio a flor de tuas passadas Me recordo de que as balas em meu revólver verifiquei Eu queria a muita movimentação horas novas Como os rios não dormem O rio não quer ir a nenhuma parte ele quer é chegar a ser mais grosso mais fundo O Urucuia é um rio o rio das montanhas Rebebe o encharcar dos brejos verde a verde veredas marimbus a sombra separada dos buritizais ele Recolhe e semeia areias Fui cativo para ser solto Um buraquinho dágua mata minha sede uma palmeira só me dá minha casa Casinha que eu fiz pequena ô gente para o sereno remolhar O Urucuia o chapadão derredor dele Estas árvores essas árvores Conversa Zé Bebelo conversa com as marrecas chocas no meio das varas do juncal Mesmo na hora em que eu for morrer eu sei que o Urucuia está sempre ele corre O que eu fui o que eu fui E esses velhos chapadões dele dos Couros de Antônio Pereira dos Arrepiados do Couto João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 621 do Arrenegado Um homem é escuro no meio do luar da lua lasca de breu Dentro de mim eu tenho um sono e mas fora de mim eu vejo um sonho um sonho eu tive O fim de fomes Ei boto machado em toda árvore Eu caminhei para diante Em ô gente eu dei mais um passo à frente tudo agora era possível Não era de propósito o senhor não julgue Nem não fizeram espantos Não exclamei não pronunciei só disse Ah agora quem aqui é que é o Chefe Só perguntei Sei por quê Só por saber e quemsabe por excessos daquela minha mania derradeira de me comparecer com as doidivãs bestagens parlapatal De forma nenhuma eu não queria afrontar ninguém Até com preguiça eu estava A verdade porém que um tinha de ser o chefe Zé Bebelo ou João Goanhá Um para o outro olharam Agora quem é que é o Chefe Somente eu estava por cima da surpresa deles Zé Bebelo o pensante soberbo e opinioso João Goanhá duro homem tão simples vindo por meio de dificuldades e distâncias desde a outra banda do rio caçar a lei da companhia da gente como um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 622 costume necessário que sem isso ele não conseguia direito se pertencer Com meus olhos tomei conta Quem é que é o Chefe repeti Me olharam Saber não soubessem não podiam como responder porque nenhum deles não era Zé Bebelo ainda fosse Esse pardejou E o João Goanhá eu vi aquele mestre quieto se mexer em quente e frio diante das minhas vistasnem não tinha ossos tudo nele foi encurtando medidagesto fala olhar e estar Nenhum deles E eu ah eu era quem menos sabia porque o Chefe já era eu O Chefe era eu mesmo Olharam para mim Quem é qu E Ao que o pessoal os companheiros todos convocados fechavam roda Eu felão Não me entendessem Foi que alguns dos homens rosnaram E foi esse RasgaemBaixo o principal deles esse pelo que era pelo visto oculto inimigo meu que buliu em suas armas Sanha aos crespos luziu faca no agolpe Meu revólver falou bala justa o RasgaemBaixo se fartou no chão semeado já sem ação e sem alma nenhuma dentro E aí o irmão dele José Félix ele tremeu muito lateral livrou o ar de sua pessoa outro tiro eu também tinha dado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 623 é o Chefe Ato de todos quietos permanecidos esbarrados com tanta singelez de choques Ah eu meu nome era Tatarana E Diadorim jaguarado mais em pé que um outro qualquer se asava e abava de repor o medo mor Ele veio marechal Se viram se sentiram decerto que acertaram pelos altos de nós dois e porque logo aí Alaripe o Acauã o Fafafa o Nélson Sidurino Compadre Ciril PacamãdePresas e outros e outros já formavam do lado da gente Tenho de chefiar eu queria eu pensava Isso eu exigia Assim João Goanhá se riu para mim Zé Bebelo sacudiu uns ombros Ali era a hora E eu frentemente endireitei com Zé Bebelo com ele de barba a barba Zé Bebelo não conhecia medo Ao então era um sangue ou sangues o etcétera que fosse Eu não aceitava muita parlagem Quem é que é o Chefe eu quis Se quis foi com muita serenidade Zé Bebelo retardou Eu social encostado Conheci que ele tardava e pensava para ver o que fazer mais vagarosamente Quem éque eu brando apertei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 624 Eu sabia do respirar de todos Durasse mais aquilo eu já largava por me cansar por estar achando cacete Minha vontade estroina de paliar Seu Zé Bebelo velho tu me desculpe eu calei Zé Bebelo se encolheu um pouco só Aí ele não tremeu no sucinto dos olhos A rente Riobaldo Tu o chefe chefe é tu o Chefe fica sendo Ao que vale ele dissezinho fortemente mesmo mudado em festivo glo riando um fervor Mas eu temi que ele chorasse Antes em rosto de homem e de jagunço eu nunca tinha avistado tantas tristezas Sendo vós companheiros eu falei para em volta Tantos tantos homens os nos rifles e eles me aceitavam Assim aprovaram O Chefe Riobaldo Aos gritos todos aprovavam Rejuravam a pois A esses resultados No que eram com solenidade sinceridade Tudo dado em paz Só aqueles dois amaldiçoados irmãos baldeados mortos na ponta de unha Ali enterrar aqueles dois seria faltar a meu respeito Amém Tudo me dado O senhor mire e veja o senhor a verdade instantânea dum fato a gente vai departir e ninguém crê Acham que é um falso narrar Agora eu eu sei como tudo é as coisas que acontecem é porque já estavam ficadas prontas noutro ar no sabugo da unha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 625 e com efeito tudo é grátis quando sucede no reles do momento Assim Arte que virei chefe Assim exato é que foi juro ao senhor Outros é que contam de outra maneira Ao fim depois que João Goanhá me aprovou revi os aspectos de Zé Bebelo Acertar com ele O senhor agora eu quis dizer Não Riobaldo ele me atalhou Tenho de tanger urubu no membora Sei não ser terceiro nem segundo Minha fama de jagunço deu o final Daí riu e disse mesmo cortês Mas você é o outro homem você revira o sertão Tu é terrível que nem um urutu branco O nome que ele me dava era um nome rebatismo desse nome meu Os todos ouviram romperam em risos Contanto que logo gritavam entusiasmados O UrutuBranco Ei o UrutuBranco Assim era que na rudeza deles eles tinham muita compreensão Até porque mais não seria que eu chefe agora ainda me viessem e dissessem Riobaldo somente ou aquele apelido apodo conome que era de Tatarana Achei achava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 626 Vai e eu por um raio de momento eu tinha concebido que carecesse de tirar a vida a Zé Bebelo por maior sossego de meu reger no futuramente e agora eu estava quase triste com pena de ver que ele iasembora O divertido havia de ser sim isso de levar Zé Bebelo comigo de sotenente através desse através Ah homem como aquele não se matava Homem como aquele pouco obedecia A ele mandei fornecer mais um cavalo e um cargueiro com mantimento coisas munição melhor Dali a hora mesmo ele pegou caminho Para o sul Vi quando ele se despediu e tocou com o bom respeito de todos e fiquei me alembrando daquela vez de quando ele tinha seguido sozinho para Goiás expulso por julgamento deste sertão Tudo estava sendo repetido Mas da vez dessa o julgamento era ele ele mesmo quem tinha dado e baixado Zé Bebelo ia sembora conseguintemente Agora o tempo de todas as doideiras estava bicho livre para principiar De seguida parado persisti para um prazo de fôlego Aí vendo que o pessoal meu já me obedecia prático mesmo antes da hora Como que corriam e mexiam se aprontando para saída sacudiam no ar os baixeiros selavam os cavalos Tantos e tantos eu sabia o nome e o defeito maior de cada um daqueles homens e tantos seus braços e tantos rifles e coragens Aí eu mandava Aí João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 627 eu estava livre a limpo de meus tristes passados Aí eu desfechava Sinal como que me dessem essas terras todas dos Gerais pertencentes Por perigos que por diante estivessem eu aumentava os quilates de meu regozijo À fé quando eu mandasse uma coisa ah então tinha de se cumprir de qualquer jeito Tenho resoluto que e montei com a vontade muito confiada Dali a gente tinha logo de sair segundo ã regra exata Estradeei Nem olhei para trás Os outros me viessem Cantava o trincaferro Uma arara chiou cheio levou bala quase Atrás de mim os cabras deram vivas Eles vinham em vinham Eu contava prazido o tôo dos cascos Dei galope No Valado chegamos conforme íamos retornar por assim De galope como está dito Gente gentinha nos rodeou roceiros em seu serviço Aquele seô Habão incluso muito estarrecido Esbarramos parada O que eu carecia era de uns instantes sempre meus para estribar meu uso Era primeira viagem saída de nova jagunçagem e as extraordinárias cousas para que todos admirassem e vissem eu estava em precisão de fazer E vi um itambé de pedra muito lisa subi lá Mandei os homens ficassem embaixo eles outros esperavam Minha influência de afã alegria em artes não padecesse de se estorvar em monte de pessoas nenhumas De despiço olhei eles nem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 628 careciam de ter nomes por um querer meu para viver e para morrer era que valiam Tinham me dado em mão o brinquedo do mundo Fiquei lá em cima um tempo Quando desci umas coisas eu resolvia Aonde se ia em cata do Hermógenes Ah não Antes primeiro para o Chapadão do Urucuia onde tanto boi berra Ao que me seguissem Ah mas assim não O que foi o que eu pensei mas que não disse Assim não E veio perante minha presença o seô Habão mais antecipado que todos macio atarefadinho ele já me sussurrava Homem esse Ele queria me oferecer dinheiro com seus meios queria me facilitar Ah não de mim ele é que tinha de receber tinha de tomar Agarrei o cordão de meu pescoço rebentei com todas aquelas verônicas As medalhas umas delas que eu tinha de em desde menino Fiz gesto entreguei na mão dele O senhor havia de gostar de ver o ar daquele seô Habão forçado de aceitar pagamento do que nem eram correntias moedas de tesouro do rei mas costumeiras prendas de louvor aos santos Ele estava em todos tremores conforme esses homens que não têm vergonha de mostrar medo em desde que possam pedir à gente perdão com muita seriedade Digo ao senhor ele beijou minha mão Ele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 629 devia de estar imaginando que eu tinha perdido o siso Assim mesmo me agradeceu bem e guardou com muito apreço as medalhas na algibeira até porque não podia obrar de outra forma Matar aquele homem não adiantava Para o começo de concerto deste mundo que é que adiantava Só se a gente tomasse tudo o que era dele e fosse largar o cujo bem longe de lá em estranhas terras adonde ele fosse pretaebrancamente desconhecido de todos então ele havia de ter de pedir esmolas Isso naquela hora pensei Ah não E nem não adiantava mendigo mesmo duro tristonho ele havia ainda de obedecer de só ajuntar ajuntar até à data de morrer de migas a migalhas As verônicas e os breves ele vendesse ou avarasse para os infernos Comigo só o escapulário ainda ficou Aquele escapulário dito que conservava pétalas de flor em pedaço de toalha de altar recosturadas e que consagrava um pedido de benção à minha Nossa Senhora da Abadia Que mesmo mais tarde tornei a pendurar num fio oleado e retrançado Esse eu fora não botava ah agora podia desdeixar não inda que ele me reprovasse em hora e hora tantos meus malfeitos indas que assim requeimasse a pele de minhas carnes que debaixo dele meu peito todo torcesse que nem pedaço quebrado de má cobra João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 630 E num reverter de mão eu já estava pensando o que eu ia fazer com ele com o seô Habão por alguma alvíssara de mercê Porque em fato ele merecia e eu a ele devia Porque ele tinha vesprado em reconhecer meu poder antes de outro qualquer e mesmo um barão de presente dele tinha sido e era aquele meu formoso cavalo Siruiz em qual eu estava amontado Aí me lembrei de uma coisa e isso era próprio encargo para ele cabendo em sua marca de qualidade Me lembrei da pedra a pedra de valor tão bonita que do Araçuaí eu tinha trazido fazia tanto tempo Tirei o embrulhinho da bolsa do cinto Apresentei a ele Eu falei Seô Habão o senhor escute o senhor cumpra pega este mimo zelando com os dedos todos de suas mãos já e já o senhor viaje num bom animal siga rumo dos Buritis Altos cabeceira de vereda para a Fazenda Santa Catarina E mais disse que era para entregar de minha parte à moça da casa que Otacília se chamava a qual era minha sempre noiva Mas não dando razão de nomear minha pessoa pelos altos títulos nem citando chefia de jagunços Mas somente prezar que eu era Riobaldo com meus homens trazendo glória e justiça em território dos Gerais de todos esses grandes rios que do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 631 poente para o nascente vão desde que o mundo mundo é enquanto Deus dura Ah não em Deus não falasse Seô Habão pôs atenção perturbado mas sisudo ele cogitava O que ele dizia carecia de ser repetido esfiando o as sunto nas pontas dos dedos tostões Ser rico é um diverso dissabor Que um pudesse se acautelar assim me atanazava Quem era O que por primeira vez reparei que ele tinha as orelhas muito grandes tão grandonas até sem querer eu tive de experimentar com a mão o tamanho medido das minhas Melhor trazer esse sujeito comigo perto mais perto para poder vigiar por todas as partes Melhor não o melhor seria desmanchar a presença dele em definitivas distâncias Não vou comer teus peitos teu nariz teus duros olhos moles eu pensei Mas ele também tinha alguma espécie de chefia Eu virei a cara andei três passos dando com Diadorim O que eu tolero e desentendo esse homem que é porque dele não se consegue ter raiva nem ter pena falei Mas vi um adejo sombrio no meu amigo condenado que era de tristeza que não quer ceder suas lágrimas O quanto por causa da pedra de topázio eu reconheci Eu não tinha tido dó de Diadorim Deistá tem tempo Diadorim tem tempo pensei a meio Da amizade de Diadorim eu possuía completa certeza E mais João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 632 não me amofinei De manhã cedo o senhor esbarra para pensar que a noite já vem vindo O amor de alguém à gente muito forte espanta e rebate como coisa sempre inesperada E eu estava naquelas impaciências Trasmente que em Otacília mesmo verdadeiro eu quase nem cuidava de sentir de ter saudade Otacília estava sendo uma incerteza assunto longe começado Visse o que desse viesse O seô Habão ia levava a pedra de topázio a vida do mundo ia vivendo coração dá tantas mudanças meus dízimos eu pagava O pássaro que se separa de outro vai voando adeus o tempo todo Ah não eu não rio riachos não me amofinava Aquela tristeza de Diadorim eu não aceitei nem ceitil não recebi Ingratidão para o maistarde Mas o seô Habão não queria ter terminado negócio que carecia ainda de algum ponto Dei licença Ele perguntou sonseante se eu não prazia de enviar por ele algum recado também para o senhor meu pai Selorico Mendes dono do São Gregório e de outras boas e ricas fazendas Eu achei graça acenei que sim disse que fosse reproduzisse a minha saudação E então foi que o seô Habão levantou a cara aquietado até mediante sorriso De sorte que para corrigir em siso a tranqüilidade daquilo eu determinei O senhor vá logo logo de rota abatida E de lá não quero nenhuma resposta João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 633 enquanto ri de ver como ele me obedecia expresso sem necessidade de caráter Onde que mal dele livre me vi gritei despachado pelos demais Dand ordens A rodar por aí me trazerem os homens Ques homens Os todos que fossem e houvesse Quem tiver instrumento a toque Quem gostar de dançar arre melhor Pr apreparo trazer as mulheres também Com que as músicas de lá lá lá Tudo tinha de semelhar um social Ao pois quem era que ordenava se prazia e mandava Eu senhor eu por meu renome o UrutuBranco Ah não Festa Eu já estava resolvendo o contrário Mas reunir aquela porção de homens e formar todos de guerreiros A com a gente a que viessem Aquilo valia Os outros não falaram decerto não acharam ou acharam Ou quanto mais que eles os meus só mesmo o mover por me agradar só era o que de si desejavam e aquela minha lei era divertida Saíram espalhados sendo em caçar em boa alarida Mas trouxeram Me trouxeram rebanhal os todos possíveis Do Sucruiú uns pouquinhos alguns com as caras João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 634 secando os brotes das bexigas más marcas feito mijo na areia outros um ou outro de semblante liso fresco esses escapos de não terem tido a doença Os que fingiam não me temer achavam mais favorável querer ter vindo por próprio conselho mal abriam boca em risos Dei que pronto todos provassem gol dalguma cachaça Aquela gente depunha que tão aturada de todas as pobrezas e desgraças Haviam de vir junto à mansa força Isso era perversidades Mais longe de mimque eu pretendia era retirar aqueles todos destorcidos de suas misérias Até que fiz Ah mas mire e veja a quantidade maior eram aqueles catrumanos os do Pubo Eles em vozes Ou o senhor não pode refigurar que estúrdia confusão calada eles paravam acho que de ser chamados e reunidos eles estavam alertando em si o sair de um pavor Ao depois quando dei brado queriam se alinhalinhar mesmo solertes como se por soldados reconhecidos Seriam eles assim bons no ruim para guerra serviam para meter em formatura Tanto todo o mundo achava graça meus jagunços queriam pagode Ah os catrumanos iam de ser de refrescos Iam que nem onças comedeiras Não entendiam nada assim atarantados com temor ouviam minha decisão Filhosdamãe eu declarei Tive de repente fé naqueles desgraçados com suas desvalidas armas de toda João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 635 antiguidade e cabaças na bandola e panelas de pólvora escura e fedor de fumaça ceguenta Adivinhei a valia de maldade deles soube que eles me respeitavam entendiam em mim uma visão gloriã Não queriam ter cobiças Homens sujos de suas peles e trabalhos Eles não arcavam feito criminosos O mundo meus filhos é longe daqui eu defini Se queriam também vir perguntei Ao vavar o que era um dizer desseguido conjunto em que mal se entendia nada Ah esses melhor se sabiam se mudos sendo Dei brado Indaguei dum Tomou um esforço de beira de coragem para me responder Esse aquele era o do chapéu encartuchado rapaz moço Respondeu que Sinfrônio se chamava e indicou outro que era o pai Aquele outro o pai era um homem sem pescoço Respondeu que se chamava Assunciano E indicou outro Mais adiante não deixei Deixasse iam de dedo em dedo me passando para o daquelas pernas de fora que Osirino era as pernas forradas de lama seca ou para o que coçava suas costas em pau de árvore feito um bezerro ou um porco Visli a sorrateira malícia nos jeitos deles E mais o do jegue no jegue amontado permanecendo de perfil aquele bronzeado jumento que tinha o ho mam por nome Teofrásio e só não desamontava do jegue por ordem minha que em antes eu tinhadado Ele me disse Dou louvor Em tudo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 636 chefe vos obedecemos ele disse e de lá se virou o focinho branco do jumento O homem Teofrásio limpou a goela mas com respeito Assim vós prazido chefe Pedimos vossa benção E eu concedi que o Teofrásio meio chefim deles o do jegue que o jegue pudesse trazer Daí houve porém Que um o sem pescoço baixinho descoroçoou na desengraça observou Quem é que vai tomar conta das famílias da gente nesse mundão de ausências Quem cuida das rocinhas nossas em trabalhar pra o sustento das pessoas de obrigação O que falou tinha falado por todos Pra os roçados Pra os plantios E mesmo um outro de mãos postas como que para rezar choramingou Dou de comer à mea mulé e treis fio em debaixo de meu sapé e era um homem alto espingolado com todos os remendos em todos os molambos Como é a tua graça seô indaguei Se chamava Pedro Comprido Mas aí eu já tinha pensado Pois vamos As famílias capinam e colhem completo enquanto vocês estiverem em glórias por fora guerreando para impor paz inteira neste sertão e para obrar vingança pela morte atraiçoada de loca Ramiro eu determinei I j Maria é ver nós de Cristo jagunceando escutei dum Daí declarei mais Vamos sair pelo mundo tomando dinheiro dos que têm e objetos e as vantagens de toda João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 637 valia E só vamos sossegar quando cada um já estiver farto e já tiver recebido umas duas ou três mulheres moças sacudidas pra o renovame de sua cama ou rede Ah ô gente oh e eles que todos quase todos geral reluzindo aprovação Mesmo os meus homens Fiz gesto com meu contentamento Queria o que só me faltou que foi que o jumento do homem zurrasse Eu ia transformar os regimentos desses foros Convoquei todos nas armas E o Borromeu E o Borromeu ainda perguntavam Quem era que esse Borromeu Mandei vir Um cego ele era muito amarelo escreiento transformado Responde tu velho Borromeu que é que tu faz Estou no meu canto cá meu senhor Estou me acostumando com o momentozinho de minha morte Cego por ser cego ele tinha direito de não tremer Tu é devoto Pecador pior Pecador sem o que fazer pede preto pede padre Apontou com o dedo Levei os olhos Não vi nada É assim a esmo que os cegos fazem Aquele era o bom rumo do Norte Ah meu senhor eu sei é pedir muitas esmolas Pois então que viesse também o Borromeu viesse Mandei que montassem o dito num cavalo manso que da banda da minha mão direita devia sempre de se emparelhar Alguns riram E pelo que riram de certo não sabiam que um desses viajando parceiro com a gente adivinha a vinda das João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 638 pragas que outros rogam e vão defastando o mau poder delas conforme aprendi dos antigos E por nada mais me lembrei de repentinamente do menino pretozinho que na casa do Valado a gente tinha surpreendido que furtando num saco o que achava fácil de carregar E tiveram de campear esse menino Ele estava amoitado o tempo todo com a boca no chão no meio do mandiocal Quando foi pego xingava mordia e perneava Ele se chamava Guirigó com olhares demais muito espertos Guirigó tu vem vestido ou nu Como que não vinha Aprontaram um cavalo para ele só que devia de se emparelhar com o meu da banda de minha mão esquerda Háde há meu povo Todos tocamos Cavalos que chegassem bastados tinha não mas por diante animais alheios a gente topasse para se assenhorear a laço e mãos Os muitos vinham a pé aqueles catrumanos ainda meio vigiados Ver o seguinte Eu queria esses campos Pernoitamos com marcha de dez léguas assim mesmo Terçando um total de projetos com os entusiasmos no topo da cabeça minha poder não pude dormir mesmo com o cansaço em que estava na noite não preguei os olhos Mas conversei surgidamente com os que paravam espalhados de sentinelas e mandei acender foguinhos de assar mandioca e fogueiras de iluminar Ah a gente ia encher os espaços deste mundo adiante João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 639 Aonde é que jagunço ia À vã à vã Tinha minha vontade de estar em toda a parte Mas quadrando que primeiro mais para o norte para o Chapadão do Urucuia aonde tanto boi berra Que eu recordava de ver o rio meu beber em beira dele uma demão dágua Ah e essas estradas de chão branco que dão mais assunto à luz das estrelas Eu pensei eu quis E o Hermógenes os Judas Ara inimigo o senhor dê um passo em que rumo qualquer lá em sua frente o senhor encontra o mau Eu não tinha todo tempo Safra em cima eu em minha lordeza Mesmo deitado eu sentia que estava caminhando galopando Quando a madrugada bateu as asas eu já estava abotoando a espora Outra vez eu digo tem botim novo flote e chinelo velho redomão O dia ia ser lindo de leveza pelas beiradas do céu Forramos o estômago e saímos deslizando com a manhã com o merujo do orvalho O que eu via altos de mata e além As coisas todas eu pensava e nada nenhuma não me sombreasse Algum medo não palpitava frio por detrás de meus olhos e por via disso eu de todos era o chefe mesmo em silêncio singular Conforme assim chegamos no PédaPedra fazenda da Barbaranha Em perto de sete léguas E o que aí foi lhe conto Ao entrementes eu achei graça em que o Alaripe João Goanhá Marcelino Pampa João Concliz e mesmo Diadorim e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 640 outros mais velhos não carecessem de formar conselho As lérias Meu direito era contrariar as regras todas do chefe que antes fora para mim só mesmo o que servia era à solta a lei da acostumando Aí não viessem me dizer que a gente estava só com três dias de farinha e carneseca Toleima Todo boi enquanto vivo pasta Razão e feijão todo dia dão de renovar A coragem que não faltasse para engolir a polpa de buriti e carnes de rês brava Às léguas eu indo eles me seguindo Tu está vendo o tamanho do mundo Guirigó Que é que tu acha de maior boniteza Assim eu perguntei àquele sacizinho de duas pernas que preto reluzente afora os graúdos olhos brancos me remedando da banda de minha mão canhota sempre viesse encarapitado sobre seu alto cavalo E ele a cuja senvergonhice De todas as coisas boniteza melhor é dessa faquinha enterçada de metal que o senhor travessa na cintura Segundo tinha botado desejo no meu punhal puxável de cabo de prata o dioguim A pois no primeiro fogo que se der se tu não abrir boca e choro bué por medos a dita faca tu ganha presenteada eu prometi A falta de mantimentos por isso eu ia encurtar rédeas travar o passo A toleima A outra receita que descumpri era a de repartir o pessoal em turmas Cautelas Que não Eu fosse ter cautela pegava medo mesmo só no começar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 641 Coragem é matéria doutras praxes Aí o crer nos impossíveis só Seo Borromeu está gostando destes Gerais hem seo Borromeu ao cego da minha outra banda perguntei por desfrute Ah Chefe é sempre amanhecendo manhã e aqui a gente merece tudo vento que não vareia de ser Mas vento que vem dos amáveis ele me respondeu O que não vejo não devo não consumo continuou respondendo Ele gostava de conversar mas também preparava no silêncio Ia sacolejando em cima da sela do animal noutra quietação diversa Podia dar conselho Arte de jagunço meu Chefe Isto é ofício bonito para o vivo O ditado desses só somente para rir eu aceitava Mas dividir minha gente por oras eu detestava de obrar Por causa que o que me prazia mais era contemplar o volume profundo da ida deles de esquadrão De a de lado Todos eles passarem tropeando nós todos o rumor constante dos cascos Cavalo cavalaria Cortejo que fazia suas voltas pelos ermos pelos ocos pelos altos a forma duma mistura de gente amontada uma continuação grande solevando para adiante o aprumo de meus homens os chapéus deles quase todos bem engraxados com sebo de boi e nata de leite em ponta os canos dos rifles de guerra a tiracol Com qual seguimento Só o que esperava a gente era o pouso para jantar passeata para a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 642 estreladatarde Mas do que um falava outro mal ouvia e ria do que esses se riam outros ainda falavam Prosapeavam Me prazia Me prazia o ranger o couro das jerebas aquele chio de carne em asso A poeira avermelhava e branqueava poeiras que punham o vento mais áspero Uns homens em cavalos e armas Quem visse fuga fugia corria tinham de temer vigiando com seus olhos escondidos no mato em beiras de estrada Até os bichos do cerradão que escutam o começo de tudo de seu longe e de seu perto e logo sabem esperar ocultos no rareamento assim não se viam nenhuns não se achavam os pássaros sempre já tinham revoado Ah não eu bem que tinha nascido para jagunço Aquilo para mim que se passou e ainda hoje é forte como por um futuro meu Eu estou galhardo Naquilo eu tinha amanhecido Comi carne de onça Esquipando eu queria que a gente entrasse daquele jeito era em alguma grande verdadeira cidade Só às vezes em repente de receio eu ainda olhei em vão com as presenças de Zé Bebelo me cismava Se o que sei Com um arranco de freio raciocinado Mas dando de rédeas sem descanso derrubei dos ombros aquele meu costume Zé Bebelo terminara Só os meus homens Escutava olhava e eram aqueles que muitas estrepolias ainda iam decerto agir e muita má gente matar Aos dez e dezes digo afirmo que me lembro de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 643 todos Esses passam e transpassam na minha recordação vou destacando a contagem Nem é por me gabar de retentiva cabedora nome por nome mas para alimpar o seguimento de tudo o mais que vou narrar ao senhor nesta minha conversa nossa de relato O senhor me entende A mesmice dos cabras jagunços no contemplar a cavalhada no passo os animais dando dos quartos comuns assim que não fazem penachos que não tiram arredondamentos da magreza Os filhos nascidos de distritos de lugares diversos mas agora debaixo da minha estima completa dever de coração enérgico Até os capiaus e os catrumanos copiavam o comportamento uns amontados outros restantes apressados mesmo a pé e iam pegando o exato Até o catrumano Teofrásio em seu jegue que como prestável jumento cumpria bem seu ir desde que tinha companhia de outros animais E o Guirigó e o Borromeu eu meando os dois ao alcance de qualquer minha mão Sempre mesmo como sempre Mas um era Diadorim montado à baiana gineta com estribos curtos e rédea muito ponderada bridando bem em seu argel travado às upas cavalo bulideiro cavalo de olhos pretos conforme como a noite Diadorim que era o Menino que era o Reinaldo E eu Eu Nos estribos de ferro freio de ferro silha forte e silha mestra e o par de coldres Assaz então cantaram João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 644 Olererê Baiana eu ia e não vou mais Eu faço que vou lá dentro oh Baiana e volto do meio pra trás Ao demais eu ouvi soturno sorridente Ora vez que desse jeito fomos entortando entre as duas chapadas encalço da estrada do rio e se chegou na fazenda cercã que era por lá a Barbaranha dita em um lugar redondo e simples no PédaPedra O que eu já disse ao senhor respeitante Mas acrescento que o dono no atual era um seo Ornelas Josafá Jumiro Ornelas por nome todo De uns três dias foi o São João então amanhã é o São Pedro alguém disse de voz Soubessem que esse seo Ornelas era homem bom descendente posseiro de sesmaria Antes tinha valido com muitos passados por causa de políti ca e ainda valesse compadre que era do Coronel Rotílio Manduca em sua Fazenda Baluarte João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 645 Ao que ele tem mas tem mesmo muita coragem eu me fiz Aí falam em sessenta ou oitenta mortes contáveis o Marcelino Pampa afiançou e ainda não esmoreceu os ânimos Chegamos com proceder seguro e o céu por cima dali estava muito sereno Na fazenda tinfiam levantado um mastro na frente do pátio vi movimentos de gente As mulheres na boca do forno fumaçando mexiam com feixes verdes de mariana e vassourinha e carregavam as latas pretas de assar biscoitos Só aqueles formosos cheiros das quitandas e do forno quente varrido já confortavam meu estômago No mastro que era arvorado para honra de bandeira do santo eu amarrei o cabresto do meu cavalo Mas não desordeei nem coagi não dei em nenhuma desbraga Eu não estava com gosto de aperrear ninguém E o fazendeiro senhor dali de dentro saiu veio saudar convidar para a hospedagem me deu grandes recebi mentos Apreciei a soberania dele os cabelos brancos os modos calmos Bom homem abalável Para ele por nobreza tirei meu chapéu e conversei com pausas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 646 Amigo em paz Meu chefe entre a valer a casa velha é sua vossa ele pronunciou Eu disse que sim Mas para evitar algum acanhamento e desajeito mais tarde também falei Dou todo respeito meu senhor Mas a gente vamos carecer de uns cavalos Assim logo eu disse em antes de vir a amolecer as situações e estorvar o expediente negócio a boa conversação cordial O homem não treteou Sem se franzir nem sorrir me respondeu O senhor meu chefe requer e merece e com gosto eu cedo Acho que tenho para coisa de uns cinco ou sete em estado regular E eu entrei com ele na casa da fazenda para ela pedindo em voz alta a proteção de Jesus Onde tive os usuais agrados com regalias de comida em mesa Sendo que galinha e carnes de porco farofas bons quitutes ceamos sentados lá na sala Diadorim eu João Goanhá Marcelino Pampa João Concliz Alaripe e uns outros e o menino pretinho Guirigó mais o cego Borromeu em cujas presenças todos achavam muita graça e recreação A dona fazendeira era mulher já em idade fora de galas mas tinham três ou quatro filhas e outras parentas casadas ou moças bem orvalhosas Aquietei o susto delas e nenhuma falta de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 647 consideração eu não proporcionei nem consenti mesmo porque meu prazer era estar vendo senhoras e donzelas navegarem assim no meio nosso garantidas em suas honras e prendas e com toda cortesia social A ceia indo principiando somente falei também de sérios assuntos que eram a política e os negócios da lavoura e cria Só faltava lá uma boa cerveja e alguém com jornal na mão para alto se ler e a respeito disso tudo se falar Seo Ornelas me intimou a sentar em posição na cabeceira para principal Aqui é que se abancava Medeiro Vaz quando passou essas palavras Medeiro Vaz tinha regido nessas terras Verdade era Aquele velho fazendeiro possuía tudo Conforme jagunço de meiooficio tinha sido e amigo hospedador abastado em suas propriedades De ser de linhagem de família ele conseguia as ponderadas maneiras cidadão que se representava que isso ainda que eu pelejasse constante tarde seria para bem aprender Na verdade Aquela hora eu pelo que disse assumi incertezas Espécie de medo Como que o medo então era um sentido sorrateiro fino que outros e outros caminhos logo tomava Aos poucos essas coisas tiravam minha vontade de comer farto João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 648 O sertão é bom Tudo aqui é perdido tudo aqui é achado ele seo Ornelas dizia O sertão é confusão em grande demasiado sossego Essa conversa até que me agradou Mas eu dei de ombros Para encorpar minha vantagem às vezes eu fazia de conta que não estava ouvindo Ou então rompia fala de outras diversas coisas E joguei os ossinhos de galinha para os cachorros que ali nas margens esperavam perto da mesa com toda atenção Cada cachorro sungava a cabeça que sacudia chega estalavam as orelhas e aparava certeiro seu osso bem abocava E todos com a maior devoção por mim e simpatias iam passando os ossos para eu presentear aos cachorros Assim eu mesmo ria assim riam todos consentidos O menino Guirigó comeu demais cochilava afundado em seu lugar despertava com as risadas Aquele menino já tinha pedido que um dia se mandasse costurar para ele uma roupa e prover um chapéude couro para o tamanho de sua cabeça dele que até não era pequena e umas cartucheiras apropositadas Tu é existível Guirigó Vai pelos proveitos e preceitos eu caçoava Aí caçoei Duvidar é só dar um saco vastoso na mão dele e janela para pular para dentro e para fora capaz de supilar os recheios e pertences todos duma casagrande de fazenda feito esta salvo que seja E eu bem que já estava tomando afeição João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 649 àquele diabrim Pois com o Guirigó as senhoras e moças conversavam e brejeiravam como que só com ele por criança elas perdessem o acanhamento de falar Mas o seo Ornelas permanecia sisudo faço que ele afetava de propósito não reparar no menino Pelo tudo era como se ele reprovasse minha decisão de trazer para a mesa semelhantes companhias O menino e o cego Borromeu aqueles olhos perguntados As colheitas seo Ornelas supracitava Homem sistemático sestronho O moderativo de ser o apertado ensino em doutrinar os cachorros ele obrava tudo por um estilo velhoso de outras mais arredadas terras sei se sei E quase não comia Só vez outra jogava na boca um punhado seco de farinha Oxalá o senhor vai o senhor venha O sertão carece Isto é um homem forte ambulante se carece dele O senhor retorne consoante que quiser a esta casa Deus o traga Solei um vexame por não saber a resposta concernente nuns casos como esse resposta que eu achava que devia de ser uma só e a justa como em teatral em circo em pantomima bem levada O que é igual quase um calar À puridade eu sentia assim feito se estivesse pego numa ignorância mas que não era de falta de estudo ou inteligência mais uma minha falta de certos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 650 estados O que são bobéias limpei goela mudei de cara Amigo meu Medeiro Vaz a outra ocasião travou combates no ContaBoi daqui a duas léguas Contra os de um Tolomeu Guilherme Defunto amigo Medeiro Vaz que a alma dele Deus haja Adiante comandava em frente para o exemplo Enterramos os melhores mortos o homem descrevia Eu sei eu disse mesmo nada tencionando dizer A ver e que é que achava de mim aquele surdo velho Ah ele expunha os cabelos brancos mas faltava em barba que cofiasse Senhor saiba ao que Medeiro Vaz mesmo foi que entre todos me escolheu nos olhos da morte me determinou para capitanear e dar governo Tolomeu Guilherme que conheço é um que deve de estar presentemente embarcando cargas no porto em Pirapora Mas sou de mim o UrutuBranco Riobaldo que Tatarana já fui o senhor terá ouvido Aí o mais esse sertão tem de ver quem mais abre e mais acha assim eu disse um pouco enfurecido Pois maior honra é a minha meu Chefe que em posto de dono na pobreza desta mesa somente homens de alta valentia e valia de caráter se sentaram ele glosou sem sobrosso de perturbação Dobrei de costas castanheteei para os cachorros Assim ele havia de sentir o perigo de meu desprazer João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 651 havia de recear de mim aquilo como o outro diz quando o burro dá as ancas Aí no rever do instante percebi os olhos de Diadorim que me juntavam com uma das mocinhas de lá das que estavam servindo a mais vistosa de todas A mocinha essa de saia preta e blusinha branca um lenço vermelho na cabeça que para mim é a forma mais assentante de uma mulher se trajar Ela estava parada em pé no meio das outras quase encostada na parede O olhar de Diadorim era que estava me indicando que para aquela mocinha ia meu admirar Administrado chamei A senhora meninazinha chega aqui mais perto me faça obséquio da bondade E ela avermelhou as faces mas veio reparei que tinha as mãos aperfeiçoadas bonitas mãos para tecer minha rede A ela perguntei a graça É minha neta foi seo Ornelas quem disse E mal nem ouvi o nome com que ela me respondeu Assussurrada só gostei de ver como ela se mexia por ficar quieta vergonhosa como uma coalhada no prato Mas nos tons do velho Ornelas eu tinha divulgado um extravago de susto recuante o leve medo de tremor Isso foi o que me satisfez Aquele homem visconde e portoso em tudo ah João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 652 pelo mulheriozinho de sua casa ele não encobria o comprado eh sua família dele A avaliar o de Diadorim por igual como mostrava outros olhos o arregalo de ciúmes Aqui digo que se teme por amor mas que por amor também é que a coragem se faz Deu silêncio Aquilo tardou assim feito o tamanduá a língua põe feito quem quer comungar A mocinha me tentando com seu parado de águas a boniteza dela esteve em minhas carnes Ela perigou Não perigou no instante achei em minha idéia adiada uma razão maior que é o sutil estatuto do homem valente Aquela formosura aquela delicadezazinha então podiam mesmo ser assim em toda segurança feito ela fosse por um exemplo filha minha A mocinha eu de repente queria eu gostava de dar a ela muito forte proteção Diadorim não imaginasse isso Os olhos de Diadorim não me reprovavam os olhos de Diadorim me pediam muito socorro Seo Ornelas empalidecido Certo que num rebimbo de raio eu pronto o Ornelas estava caído muito a morto com uma bala entrolheolho antes de notar sequer que eu tinha pensado em arisco de mover nas armas Diadorim caso fosse ele eu desarmava e meus homens estariam ali todos de pé fechando praia de mar A meninamocinha que eu agarrava nos braços era uma quanta João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 653 coisa primorosa que se esperneia Mas eu não quis Ah hádeo quanto e qual não quis digo ao senhor e Deus mesmo baixa a cabeça que sim ah era um homem danado diverso era eu aquele jagunço Riobaldo Donde o que eu quis foi oferecer garantia a ela por sempre Ao que debati no ar os altos da cabeça Segurei meus cornos Assim retido sosseguei e melhor Como que depois do fogo de ferver no azeite em corpo de meu sangue todo agora sochupei aquele vapor fresco fortíssimo de vantagens de bondades Menina tu há de ter noivo correto bem apessoado e trabalhador quando for hora conforme tu merece e eu rendo praça que votos faço Não vou estar por aqui no dia para festejar Mas em todo tempo vocês carecendo podem mandar chamar minha proteção que está prometida igual eu fosse padrinho legítimo em bodas Alto estive atrás do que falei Ela se assustou outra vez sem capacidade nenhuma ainda mais ao avermelhar E eu também mercês colhi da alegria veraz nos meus olhos de Diadorim Será que será que por contentar profundo Diadorim eu tinha feito aquilo resoluto Ou por outra por aquele próprio velho homem seo Ornelas que nesse intervalo de instantes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 654 dizendo estava Agradece minha filha as todas palavras deste grande Chefe que é declarado sagrado nosso amigo perante as voltas todas que o mundo dá e der Realmente então eu virei para ele E daí deveras foi afoito que eu quis com ele outras conversas e prezei a amizade daquele homem dos sertões transatos O quanto fiz perguntas Aceitei o chá de laranjeira com que sempre dei bem numa tigela grande com capricho desenhada Minha gente junto comigo escutava O senhor tem noção de quem Zé Bebelo é eu indaguei uma hora por me confirmar Zé Bebelo Pode ser não digo Mas figuro que esse nome nunca ouvi não meu senhor foi o que ele respondeu Ao que isso era um fato possível Ele não sabia De Zé Bebelo nem do Ricardão nem do Hermógenes ele não sabia nem a preposição Mas então tudo naquela parte dos Gerais era ilusão de haver e não se saber O mundo ali tinha de ser de se recomeçar Sou de pouca política me desfiz de ser ele externou O chefe próprio dele ele não citou feito se eu ignorasse o qual era Célebre esse também e que o senhor pode ter conhecido igualmente pois era um que viajava amiúde João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 655 até no Rio de janeiro se bem que famanado homem de cabras em armamentos na política de jagunçagem Aquele sequinho espigadinho vestido cidadão com mãozinhas pequenas pezinhos e do ar sempre assustado constantemente Dele sozinho o que se diz umas duzentas mortes Conheceu o senhor No barranco do São Francisco o Coronel Rotílio Manduca em sua Fazenda Baluarte Agora paz Mas aí eu perguntei a respeito daquele seô Habão só mais para variação de conversa mudando o propósito Em resposta assim ouvi Esse um vem a ser até parente de minha mulher e longe meu aparentado Mas de desde mais de uns dez anos que cortamos conhecimento E como eu atalhei o assunto por convinhável nas boas normas pois a lembrança dum inimigo deixa qualquer homem agastado o seo Ornelas relatou à gente diversos casos E o que em mente guardei por esquipático mesmo no simples foi o seguinte conforme vou reproduzir para o senhor O qual se deu da parte da banda de fora da cidade da Januária Seo Ornelas nessa ocasião tinha amizade com o delegado dr Hilário rapaz instruído social de muita civilidade mas variado em sabedoria de inventiva e capaz duma conversação tão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 656 singela que era uma simpatia com ele se tratar Me ensinou um meiomil de coisas A coragem dele era muito gentil e preguiçosa Sempre só depois do final acontecido era que a gente reconhecia como ele tinha sido homem no acontecer Ao que numa tarde seo Ornelas segundo seu contar proseava nas entradas da cidade em roda com o dr Hilário mais outros dois ou três senhores e o soldado ordenança que à paisana estava De repente veio vindo um homem viajor Um capiau a pé sem assinalamento nenhum e que tinha um pau comprido num ombro com um saco quase vazio pendurado da ponta do pau Semelhasse que esse homem devia de estar chegando da Queimada Grande ou da Sambaíba Nele não se via fama de crime nem vontade de proezas Sendo que mesmo a miseriazinha dele era trivial no bemcomposta Seo Ornelas departia pouco em descrições Aí pois apareceu aquele homenzém com o saco malcheio estabeleci do na ponta do pau do ombro e se aproximou para os da roda suplicou informação O qual é que é aqui mó que pergunte por osséquio o senhor doutor delegadoele extorquiu Mas antes que um outro desse resposta o dr Hilário mesmo indicou um Aduarte Antoniano que estava lá o sujeito mau agarrado na ganância e falado de ser muito traiçoeiro O doutor é este amigo o dr Hilário João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 657 para se rir falsificou Apre ei e nisso já o homem com insensata rapidez desempecilhou o pau do saco e desceu o dito na cabeça do Aduarte Antoniano que nem fizesse questão de aleijar ou matar A trapalhada o homenzinho logo sojigado preso e o Aduarte Antoniano socorrido com o melor e sangue num quebrado na cabeça mas sem a gravidade maior Ante o que o dr Hilário apreciador dos exemplos só me disse Pouco se vive e muito se vê Reperguntei qual era o mote Um outro pode ser a gente mas a gente não pode ser um outro nem convém o dr Hilário completou Acho que esta foi uma das passagens mais instrutivas e divertidas que em até hoje eu presenciei Tal e outras contou o seo Ornelas senhor de prosa muito renovada Pelo que por todo o seroar deixei com ele a mão ainda que às vezes eu ficasse em dúvida se competia sendo eu um chefe aturar que um outro fiasse e tecesse guiando a fala E também com o tardio da noite veio a hora de se desapear da mesa e eu teimei em rejeitar oferta de cama em catre em quarto ou sala mas fui fora caçar o meio da minha gente por sinal que armei rede por entre cajueiro e jenipapeiro perto dos currais e para o segundo sono mudei de rearmar de faveira para faveira lá para dentro duma cerca Mas na mesa aquele menino Guirigó João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 658 na senvergonhice inocente de sua pouca geração tinha adormecido completo antecipadamente e eu consenti que as mulheres carregassem o coitadinho diabinho pesado como um de maioridade e levassem para dormir sei lá onde por entre colchão e lençol A vida inventa A gente principia as coisas no não saber por que e desde aí perde o poder de continuação porque a vida é mutirão de todos por todos remexida e temperada Assim eu tinha trazido o pretinho Guirigó do Sucruiú e agora ele estava indo para se deitar no limpo e fofo nos braços das jovens e donzelas carregado Somente que inteirado no sono ele mesmo disso não soubesse nem aproveitasse do que em sua existência dele era que estava se sucedendo A pois boa noite o senhor tenha Chefe com um aprazível amanhecer assim seo Ornelas me saudou Ao que eu regozijado e bem servido retribuí a ele quase com aquelas mesmas palavras As partes que se deram ou não se deram ali na Barbaranha eu aplico não por vezo meu de dar delongas e empalhar o tempo maior do senhor como meu ouvinte Mas só porque o compadre meu Quelemém deduziu que os fatos daquela era faziam significado de muita importância em minha vida verdadeira e entradamente o caso relatado pelo seo Ornelas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 659 que com a lição solerte do dr Hilário se tinha formado Aí narro O senhor me releve e suponha No outro dia acordei com a boca amarga e doce e o través de baixar alguma ordem comandando esse dia com essa noite não se pertencia Achamos de recrutagem os cavalos que pudemos o que foram os dez os burros e mulas também contados O seo Ornelas honrava os atos Além do que quis que eu falhasse para a festa com o meu povo mas achei mais sobressaído ir mesmo embora exato Semeei para trás de mim o bom ensejo para poder ser de vir a colher mais para diante outros assim tão bons e melhores Sincero o dito a gente agradeceu subindo todos em selas e a limpo seguimos a manhã ainda com diversas claridades Seo Ornelas externou as despedidas com o xtotó de foguetes conforme se lembrou de mandar começar a soltação cujos por bem uma meiadúzia O pessoal deu vivas gloriando o mastro com a bandeira do santo Ao que pelo mais puxei em frente pondo meu cavalo com espora rédea e pernas Deciso Rompemos umas duas léguas em estradas de muita areia Mas eu já estava agastado O que nesta vida muda com mais presteza é lufo de noruega caminhos de anta em setembro e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 660 outubro e negócios dos sentimentos da gente Assim de repente eu achei que a conversa com aquele seo Ornelas tinha me rebaixado Aos poucos eu tivesse perdido a vigiação de minha alçada no acaso da presença dele debaixo daqueles telhados A opinião das outras pessoas vai se escorrendo delas sorrateira e se mescla aos tantos mesmo sem a gente saber com a maneira da idéia da gente Se sério então um tinha de apertar os dentes drede em amouco opor seus olhos A cuspir para diante Alguma instância das outras pessoas pegava na gente assim feito doença com retardo Apartado de todos era a norma que me servia no sutil e no trivial A culpa minha maior era meu costume de curiosidades de coração Isso de estimar os outros muito ligeiro defeito esse que me entorpecia O tanto que daí depois essas pessoas andavam em minha desilusão de repente todos estavam endoidecendo Do agravo como ia em pensar achei asperezas até na goela e o cuspe não cabia em minha boca salgado como um suadouro de cangalha Aí então estou lembrado vendo como vi o Alaripe de mim a curta distância e que em tudo comedido guardava o balanceio brando no coxim da sela de vaqueiro de gado tangedor Chamei para ele vir Ah o velho entregou os cavalos hem Alaripe Coração dele aguou blasonei Deu por paz Alaripe ei essa paz João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 661 não te enjoa Ah é deveras A uns é o que sucede Mas a paz não é boa Então como é que ela enjoa assim mesmo Natureza da gente mal completada Tudo tu vê Alaripe eu acho que o enjôo da paz será também algum outro medo da guerra Pode que seja E mas só o medo da guerra é que vira valentia Mal bem não entendo meu chefe mas deve de ser Pois não é Só quando se tem rio fundo ou cava de buraco é que a gente por riba põe ponte Assaz essas coisas eu inventava em fala para ter meus eixos meus aços A boca do boi quer sal o sal do barro vermelho Eu estava chamando umas bizarrias Força dessa minha maneira eu estava pelo calor de tudo E a gente ia indo aquela comprida cavalhada Um ribeirão raso e estreito se passou nem bem seis braças Riacho desses que os que vão morrer chamam de rioJordão Todo o mundo passou por tanto diante de mim eu esbarrado em pé isto é a cavalo A virar o ar viemos em caminho não se descansou um dia Agora eram os brejos da beira do Paracatu Mas eu tinha conseguido encher em mim causas enormes Dispor do ror daquilo eu não conciliava conforme perseguia custoso vermelho meu Somente quis nem podia dizer aos outros o que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 662 queria somente então uns versos dei que se puxaram os meus seguintes Heide às armas fechei trato nas Veredas com o Cão Heide amor em seus destinos conforme o sim pelo não Em tempo de vaquejada todo gado é barbatão deu doideira na boiada soltaram o Rei do Sertão Travessia dos Gerais tudo com armas na mão O Sertão é a sombra minha e o rei dele é Capitão Arte que cantei e todas as cachaças Depois os outros à fanfa entoaram mesmo sem me entender só por bazófias mas rogando no estatuto daquela letra e retornando meu rompante cantavam melhor cantando De todos menos vi Diadorim ele era o em silêncios Ao de que triste e como eu ia poder levar em altos aquela tristeza Aí eu quis feito a correnteza Daí não quis não de repentemente Desde que eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 663 era o chefe assim eu via Diadorim de mim mais apartado Quieto muito quieto é que a gente chama o amor como em quieto as coisas chamam a gente E já se estava antefrente do Paracatu que também recovava o pouco e escasso Esbarrei não nem examinei o adiante Demiti meu cavalo nágua Os outros me acompanharam Assim atravessamos Vai viemos viemos Esses dias em ondas Sei só as encostas que subi a festo O Chapadão céu de ferro E era a lua nova Aquelas pedras brancas que de noite tanto esfriam As caraíbas estavam dando flor Por ponto de meu corpo medi o enrolar dos longes ventos Aí se viu em seus couros um vaqueiro pessoalmente A esse perfiz Amigo o amigo aqui é aqui Ao que ele confirmou Aqui o senhor meu senhor os senhores estão nos andares do rio Urucuia Aos campos Sentei que estava Estrela gosta de brilhar é por cima do Chapadão Tanta doideira fiz A prazo Como aquela vista reta vai longe longe nunca esbarra Assim eu entrei dentro da minha liberdade Oi grita arara araraúna para a tua voz desenrouquecer O Chapadão é uma estada estando Somente eu sabia respirar Sumo bebi de mim e do que eu não me tonteava Só estive em meus dias E ainda hoje o suceder deste meu coração copia é o eco daquele tempo e qualquer fio de meu cabelo branco que o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 664 senhor arranque declara o real daquilo daquilo sem traslado Ali eu diante de portas abertas por livre ir às larguras de claridade Acho que foi assim Assim Mas alguém me impediu Ou era que mesmo desse jeito tinha de ser Urubus perpassaram extremamente e para o poente vinham Diadorim me chamou pegando em meu braço Diadorim vigiou aquelas diferenças ele temeu temeu por minha salvação a minha perdição Ou foi que minha Nossa Senhora da Abadia mandou que assim tivesse de ser Mas Diadorim tirou o açoite de minha ação ele me puxou eu segurado o propósito para trás Nas grimpas naquelas o significado duma coisa tive que depois lhe relato Ah só no azul do anoitecer é que o Chapadão tem fim Foi na descida de algumas ladeiras no se costear um barrocão Diadorim disse Estou aqui te vejo mesmo Riobaldo Eu disse Ah não Ah paz Ele disse A uma coisa eu te digo Riobaldo Eu disse Pois fala João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 665 Diadorim disse a voz dele se paliava Por querer bem é que eu falo Riobaldo feito o sussurro nessas veredas mão mansa de tardinha descabelando o buritizal Eu disse Vai dizendo falei uma segunda palavra A testa dele merujava coisas grossas gotas mesmo me temesse aquele suor devia de se gelar Aí era um aviso que ele queria me fornecer Aí eu não queria ouvir o que fosse de repente eu não queria eu não queria fiz de ficar indignado No eu no meu não tivessem de me dar a toda aprovação Ao redor de mim assim obedecessem A chefia sabe chefiar Por certo que para a jagunçagem os Gerais mal serviam A pobreza daquelas terras só pobreza a sina tristezinha do pouco povo Aonde o povo no rareado pelo que faltava de água naquelas chapadas e a brabeza do gado que caminhava em triste achar Desejar de minha gente seria que se atravessasse o doChico ir em cata de vilas e grandes arraiais adonde se ajustar pagas e alugar muitos divertimentos Conforme no renovável servisse ir aonde houvesse política e eleição Sabia disso Eu não era pascácio Um chefe carece de saber é aquilo que ele não pergunta E mesmo eu sempre tive diversas saudades João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 666 Reprazia para mim um dia reverter para o rio das Velhas cujos campais de gado com coqueiral de macaúbas meio do mato sobre morro e o grande revôo baixo da nhaúma e o mimoso pássaro que ensina carinhos o manuelzinhodatroa Diadorim eu gostava dele Tem muitas épocas de amor Amor em perto às vezes sossega em muitos adiamentos ao homem da branca barba Tempo de guerrear eu disse para Alaripe o PacamãdePresas o Acauã e o Fafafa meus contraguias Em qualquer parte eu não podia arvorar bem fincado meu mastrode guerra Primeiro então por ali mesmo na areia roxa para tomar o instinto do ar a gente recruzava Mas dirá o senhor e o Hermógenes A guerra não era para ser contra o Hermógenes os Judas Sim sei Mas eles no meu ir eles iam vir haviamde Sabia isso era eu no coxim da sela suor nosso Seguindo no raso e no monte das areias tirando brilhos A mal o mundo serenava de tardinha quando os jaós cantavam Ou silêncio tão devassado completo que nos extremos dele a gente pode esperar o lãolalão de um sino Diadorim não me entendesse Ele entendia Assim eu tivesse muito ódio Diadorim havia de me entender Mas eu estava acontecido Por exemplo vinha uma boiada que passou no bombalanceio Aqueles vaqueiros esses com os laços enrodilhados nas garupas e que por prazer João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 667 aboiavam Apreciei de ver como todos souberam jeito de esconder o medo que de mim deviam de ter Boiada com rumo na barra do Paracatu salvante que mudassem de roteiro Mas a gente ia por lados contrários Deles até carneamos duas reses Se assou carne na moda do povo dos Gerais que era com espeto de vara de folhamiúda tanto tempo se esbrazeando para estorricar o naco de carne se torrava como um fumo e o gosto daquele cheiro se supria forte só por si punha a boca da gente aguando Dada a mais cachaça ao menino Guirigó e ao cego Borromeu para eles falarem coisas diferentes do que certas por em si desencontradas diversas de tudo Conselhos me davam Mesmo só o igual ao que pudesse dar o cajueiroanão e o araticum que consoante o senhor escrito apontará sobejam nesses campos Mas a minha sina formava o rebrilhar em tudo digo ao senhor Conforme fatos houve Da mulher que me chamaram ela não estava conseguindo botar seu filho no mundo E era noite de luar essa mulher assistindo num pobre rancho Nem rancho só um papiri àtoa Eu fui Abri destapei a porta que era simples encostada pois que tinha porta só não alembro se era um couro de boi ou um tranço de buriti Entrei no olho da casa lua me esperou lá fora Mulher tão precisada pobre que não teria o com que para João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 668 uma caixadefósforo E ali era um povoado só de papudos e pernósticos A mulher me viu da esteira em que estava se jazendo no pouco chão olhos dela alumiaram de pavores Eu tirei da algibeira uma cédula de dinheiro e falei Toma filha de Cristo senhora dona compra um agasalho para esse que vai nascer defendido e são e que deve de se chamar Riobaldo Digo ao senhor e foi menino nascendo Com as lágrimas nos olhos aquela mulher rebeijou minha mão Alto eu disse no me despedir Minha Senhora Dona um menino nasceu o mundo tornou a começar e saí para as luas Aquelas obras então Diadorim não visse Ah conselho de amigo só merece por ser leve feito aragem de tardinha palmeando em lumedágua O amor dá as costas a toda reprovação E era o que Diadorim agora desfazia em mim no amargoso Repuno que você está diferente de toda pessoa Riobaldo Você quer dansação e desordem Mexi meu cuspe dentro da boca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 669 A bem é que falo Riobaldo não se agaste mais E o que está demudando em você é o cômpito da alma não é razão de autoridade de chefias Diadorim disse e a voz dele ecosa me rodeou as certas sinceridades Amizade de amor surpreende uns sinais da alma da gente a qual é arraial escondido por detrás de sete serras Aí demorei Eu ia aceitar essa repreensão Ah nunca E desaguardadamente eu atinei com outro motivo para opor a extratada conversa que Diadorim tinha tido adeparte com o arrieiro de uma tropa Perguntei contra O segredo com o velho arrieiro da tropa Diadorim que se falaram era de minha pessoa Essa tropa que passara por nós dias antes rumava para o Abaeté com carga de fumo mantas de borracha couros de onça e de lontra e cera de palmeiral pouca coisa Fossem atravessar o rio num porto iam passar por terras minhas conhecidas nos sertões menores Agora eu queria saber Aquele levou um recado meu Instruí o homem que levasse um recado Um recado de mim Aí hei que Malfiz João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 670 Um recado Mais tu não pergunte Riobaldo que o que fiz foi Dizendo Diadorim se arredou de mim com uma decisão de silêncio Não vê que nem precisava Eu tinha guardado meus ouvidos Eu não queria escutar o reto naquela ocasião por desânimo de ser Diadorim tinha citado alma O que ele soubesse não soubesse não tinha ciência de coisa nenhuma da arte em que eu tinha ido estipular o Oculto nas Veredas Mortas no ermo da encruzilhada Aquilo não formava meu segredo E mesmo na dita madrugada de noite não tinha sucedido tão pois O pacto nenhum negócio não feito A prova minha era que o Demônio mesmo sabe que ele não há só por só que carece de existência E eu estava livre limpo de contrato de culpa podia carregar nômina rezo o bendito Trastempo mais outras coisas sobrevinham mas por roda normal do mundo ninguém podia afiançar o contrário Apus pedra por sobre pedra não guardo lembrança Eu era o chefe Vez minha de dar comando e estar por mais alto Zé Bebelo tinha de todo desaparecido Agora o que se carecia era de se pegar mais munição Todos deviam de me obedecer completamente Só eu não queria abusar Por que não queria Ah então eu estava em dúvidas Até por isso era que eu estremecia fino no ouvir certas menções A haver a coisa que de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 671 longe me ameaçasse feito o vemvem das nuvens de chuva O demo mesmo assim podia me marcar Se não fosse como era que Diadorim viesse vir com aquelas palavras Acho que eu não era capaz de ser uma coisa só o tempo todo Do que Diadorim se estranhava era do seguinte tinha sido o que aconteci com um sujeito senhor um que disse se chamar nhô Constâncio Alves que topamos no ChapéudoBoi E também do desgraçado do homenzinhonaégua com o cachorro dele que vieram vindo três léguas depois daquele As coisas vãs esparramáveis De que tivesse neste mundo um tal nhô Constâncio Alves o que era que eu ponderava com isso Mas ele mesmo ali loguinho falou que era nado no pé da serra de Alegres e sendo da minha primeira terra também Foi bem tratado Mas disse que podia ser de ter me conhecido quando eu menino Isso me disse aquele nhô Constâncio Alves Queria recompensas Aos princípios não desgostei de prosear com um antigo assim compatrício asseado em suas roupas e bemvindo Aí ele tomou café com a gente A dar que o homem foi se avontadeando encompridando as respostas eu mesmo dava jeito para que ele tomasse coragem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 672 Até que um certo momento o pretinho Guirigó se chegou sorrateiro e emitiu em minha orelha Iô chefe arenga do menino Guirigó que às vezes bem não regulava O capeta ele falou no capeta Ou então só de olhar para ele e escutar eu pensei no capeta mas que era do capeta eu entendi Daí de repente quem mandava em mim já eram os meus avessos Aquele homem tinha quantia consigo tinha consciência ruim e dinheiro em caixa assim eu defini Aquele homem merecia punições de morte eu vislumbrei adivinhado Com o poder de quê luz de Lúcifer E era somente sei A porque sem prazo se esquentou em mim o doido afã de matar aquele homem tresmatado O desejo em si que nem era por conta do tal dinheiro que bastava eu exigir e ele civilmente me entregava Mas matar matar assassinado por má lei Pois não era Aí esfreguei bem minhas mãos ia apalpar as armas Aí tive até um pronto de rir nhô Constâncio Alves não sabia que a vida era do tamanhinho só menos de que um minuto Ah mas então do sobredentro de minhas idéias do que nem certo sei se seja meu uma minhavoz vozinha forte demais de tão fraca suministrou um cochicho Foi Em tão curta ocasião que teve essa vozinha me deu aviso Ah um recanto tem miúdos remansos aonde o demônio não consegue espaço João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 673 de entrar então em meus grandes palácios No coração da gente é o que estou figurando Meu sertão meu regozijo Que isto era o que a vozinha dizia Tento cautela toma tento Riobaldo que o diabo fincou pé de governar tua decisão A anteguarda que ouvi e ouvi seteado e estribei minhas forças energias Que como Tem então freio possível Teve que teve Aí resisti o primeiramente Só orçava O instante que é é o senhor nele se segure Só eu sei Mas aquilo de ruimquerer carecia de dividimento e não tinha o demo então era eu mesmo Desordenei quase de minhas idéias Eu matava um tiquinho só Em nome de mim eu não matava Só forcejei por sobrenadar alto em mente o mando daquela vozinha Ru eh masquei meus beiços eu arrebentasse Vi que acabava tendo de matar e era o que eu mesmo queria Como que tivessem espalhado ombro com ombro pelos inteiros cabíveis do Chapadão os diabinhos mil e mil tocando lindas violas para acabar com o que eu mesmo me falasse e de mim quisesse por valia me entender contra o que o demôniomestre tinha determinado Sendo que mal resisti nas últimas saiba o senhor Ah mas E é preciso por aí o senhor ver quem é que era e que foi aquele jagunço Riobaldo Pois em instantâneo eu achei a doçura de Deus eu clamei pela Virgem Agarrei tudo em João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 674 escuros mas sabendo de minha Nossa Senhora O perfume do nome da Virgem perdura muito às vezes dá saldos para uma vida inteira Súbito sendo pois pois que um recurso eu tive e por uma greta me saí levando a salvo comigo o desgraçado nhô Constâncio Alves O conforme foi que isto eu espiritei que fazia a ele uma pergunta Respondesse a mal morresse mas de outro jeito recebia perdão Aí a pergunta seguinte Se sendo que o senhor é de minha terra a pois conheceu um homem que se chamava Gramacedo Será o senhor é parente dele Só esperei Ele dissesse que tinha conhecido o outro e aí morria por eu não poder nãomatar por quanto a salvação dele mermava que nem morrão de candeia E assim com obrigação minha mesma eu tinha para sempre combinado Mas nhô Constâncio Alves era para ganhar no azo daquilo pelo que deu de resposta Gramacedo Sinto dizer mas esse eu nunca vi nem dele ouvi falar Tenho parentescos com ninguém de tal nome A minha mão já tinha estado para o revólver brandamente Nhô Constâncio Alves percebeu o malamém Confuso como se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 675 rebaixou um pouquinho no tamanho ele devia de estar abrindo os joelhos por tremor de medo nas pernas Aí ele mesmo então achasse que carecia de muito morrer num pingo eu pensei traiçoeiro O medo mostrado chama castigo de ira e só para isso é que serve Ah mas ah não eu tinha decidido Tinha ou não tinha Eu Assim noutro repingo arejei que toda criatura merecia tarefa de viver que aquele homem merecia viver por causa de uma grande beleza no mundo à repentina Um anjo voou dali Eu tinha resistido a terceira vez Agora nhô Constâncio Alves estava delivrado de perigo Só que eu gritei O senhor tem seu dinheiro Ligeiro novo o homem caçou com suas mãos o surrãozinho que abriu estava cheio de notas bem enroladas e embrulhadas num pano e assim me dava me presenteava Mirei aquele triste pescoço O que em seco ele foi engolindo que podiam ser as contas todas dum terço Aproximei o cobre O ele nhô Constâncio Alves deixei que fosse embora Nem espiei para dele não ver as costas Mas aí então para me pacificar e enterter o Outro eu tive de falar alto Perdoei este mas o primeiro que se surgir destas estradas paga Eu disse Eu ia cumprir João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 676 De seguida o primeiro veio logo mais adiante quase no se inteirarem três léguas Conforme houve fatos coisa que se passou E foi numa várzea com uns boizinhos ali bem pastando Demos com um sujeito aparecido viajor Ele vinha numa égua Essa égua era acastanhada com alguma altura Aqueles arreios de velhos era que desfaziam Um cabo da rédea estava sendo de couro mas o outro de sedenho A égua também cambaiava O homem tinha cara de focinho avançando o formato dos ossos da boca não tinha queixo Desgraçado desse homem pelo que em sua vida ia ser pelo que seus aspectos indicavam Nem merecia dó assim achei Mas na companhia dele atrás vinha também um cachorrinho Eles esbarraram O cachorrinho pegou a latir nesse ofício que quase todo cão tem de ser presumido valente O homem bambeou de si em cima da égua ele estava pecando de pavor Como que num só relance ele transformou três caras E para o pretinho Guirigó me virei por perguntar Aqui este deveras eu mato Senhor mata Senhor vai matar o pretinho só se saiu pelos olhos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 677 Ao que escutei queixos e dentes do homem bater Súdito indivíduo assim não tinha ação de voz nem tirava um suplicar Tudo o que não sabia ele adivinhava Previsse que ia morrer só para indenizar do perdão dum outro só por preencher o lugar que devia de ser o do nhô Constâncio Alves Ah não Agora a vontade de matar tinha se acabado Sei e soube por certo que o demo agora escondia sua intenção por desconfiar de que eu não fosse querer cumprir Com ele meu senhor assim é sempre escolhe seus estilos Ao mais dessa vez ele sabia que não carecesse de me azuretar Sabia que eu estava até com enjôo da situação daquele homem da égua meu gosto era permitir que ele fosse sembora forro de qualquer castigo Mas sabia igual que eu estava na estrita obrigação de matar porque eu não podia voltar atrás na promessa da minha palavra declarada que os meus cabras tinham escutado e glosado Ah o demo bem me conhecia Devia de estar no astuto ali por perto feitor se pagodeando de mim querendo ver bem boa execução do meu dever de crime E o homem da égua o nada de tudo espiava por mais inteiriço não se ser se forcejava e um espírito de silêncio ele gemia Aí onde era que estava o anjodaguarda dele Aí tinha de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 678 morrer Carecia de morrer porque o diabo por novas voltas no nó de compromisso tinha me pegado e porque outro aomenos remédio não havia O cachorrinho por sua vez entendia isso e latiu cainhava ganiz mais conseguido do que o dono ele sabia dar de gemer Mas eu estava pensando redobrado Como era que eu ia matar aquele sujeito anunciado de pobre e matar em vez de um outro sadio em bojo e rico Aquilo era justiça Vai ver ele nem conhecesse o nhô Constâncio Alves nem soubesse quem fosse Era justiça Era possível Eu pensei O que era que Zé Bebelo numa urgência assim no arco inventava de fazer Eu tinha a preguiça de falar perguntas Os outros parados em volta esperavam por apreciar Ninguém não tinha pena do homem da égua mirei e vi Consideravam de espreitar meu procedimento A afleima de assim loguinho ter de botar e ouvir minhas palavras no ar me agravou E foi então para retardar os momentos que ao cego Borromeu eu indaguei Seja o que companheiro velho E eh lá isso Atabafado Até porque de pedir avisos a um cego assim em públicas varas eu tivesse de me vexar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 679 Se é se é Chefe Ahem Se é o que mecê sumeteu enhém Senhor quer que seja que se mate um tal semtermo do cego me respondeu semrazão Ao que eu tinha trazido aquele comigo para a nenhuma utilidade Senhor mesmo é que vai matar o menino Guirigó suputou o diabo falou como uma flauta Te acanha dioguim nãoseiquediga Vai sebo eu ralhei Onde os outros riram rabo Mas entre isso o homem condenável em cima da égua amontado sempre chorava por si mesmo sensato sério chorava decerto o ter crescido de sua longe meninice Nem perguntei o nome dele nem donde era que era Um naqueles casos de nada carecia nem necessitava A cara dele pelo malaventurar se quebrava das formas e cor e perpassava ele era um ser com a cara desmanchada Aí o Acauã por um gesto de aviso meu assestava nele sobrestante porque mesmo no magoar do terror por vez um se assopra de adoido dá bote dá nas armas Agarrado todo na égua só encolhido encarapitado o pobre Vai sebo eu tornei a xingar o meninodeinfância Adforma que eu tinha de resolver Antes ligeiro para os meus homens não me acharem aparvo Ou o demo O demo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 680 Ainda que muito eu sei Agora esse se prespiritava por lá sabível mas invisível e ele estava se rindo de mim meu próximo Ah não Somei que tive pena do homem A cachorrinha se latia Mas como era que eu podia atirar numa triste pessoa daquelas que semelhava com os ombros debaixo de todas ventanias A cachorrinha perturbava os cavalos Aperto do dever que eu tinha de cumprir de editada palavra Ou eu temi também o Tranjão o Tibes o Cujo que eu mesmo ajustara por meu vigiador Seja o que hoje mais rezo O homem nas costas da égua desinquieta que agora dava debate Decerto porque animal de montada no que percebe aquele humano pavor alheio o todo desprezo ao cavaleiro está obrigado a demonstrar Conseguinte que sobre assim todos riram mais Oé eh ele já está se deixando algum reparou Se via Se o homem dera de obrar mesmo permeando para a sela que se sujava Às caçoadas constavam de querer ver aquilo Daí o cachorro por resguardo de seu dono agrediu os cavaleiros com qual a latição dele e os arreganhos os cavalos de uns desgostavam e se empinavam por reboliz O homem mesmo era que se franzia no não dizer não desbobeava Ah e Zé Bebelo repentino relembrei as remotas vezes Os cavalos saltando assim os cavaleiros bramando recordação de Zé Bebelo Só Zé Bebelo servia para apurar um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 681 impedimento desses no deslindar Onde ele Ah Ah e foi aí então que estouradamente achei fortes idéias Rapatrás fazendo meu cavalo também se arquear e empinar às patas eu disse Disse que bradei num entusiasmamento daqueles mesmos de Zé Bebelo a fala igual à de Zé Bebelo na baralhada em pompa dos animais arre crinas na arroubagem de arruaça Eu pronunciei Raiaputapô Não tenho que matar este desgraçado porque minha palavra prenhada não foi com ele quem eu vi primeiro e avistei foi esse cachorrinho Só um assarapanto de silêncio Daí me vivavam Todos entenderam me admiraram A tanto que sei Agora eu digo ao senhor dele do Demo naquele instante agora era eu quem ria Eiei gente segura o cão dei ordem Num três tempo a cachorrinha estava pega se esbrabejava No que uma peia um laço ou um cabresto eram desconformes para isso então o PacamãdePresas e o Jiribibe arrumaram uma jarda de fina corda com ela se amarrou o bichinho num pé de assaleitão Não deixem ela uivar Não deixem ela uivar foi o que o cego Borromeu disse pelo modo ele tinha medo de uivado de cachorro A bom cachorro a gente enforca o menino João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 682 Guirigó deu atrevimento de ensinar Mandei que esse menino fosse para mais longe perder as influências Deram uma palmada na anca do cavalo dele que o João Vaqueiro puxou para ir exilar os dois em boa conveniente distância Um cachorro quando se enforca chora lágrimas os olhos dele regulam com os de gente foi o que o Alaripe disse com simples voz A tudo pensei Agora matar aquela cachorrinha O que menos eu pudesse só mesmo por pragas Pelo tanto que a cachorrinha se prezava correta latindo tão relatado Ah não Ah não não matava Mais por aí eu também já tinha aprendido das sutilezas Tornei a transdizer Adoude E nem não foi essa cadela A égua essa é que foi a que primeiro deu nas minhas vistas Real mudando o propósito e para que isto bem se entenda Fio que me aprovaram Divertidos todos quem é que ia me contrariar Eu era senhor dali e daqui eu falando ficava sendo Do Demo mesmo não tirei noção Agora eu estava com outra pressa Desapeiem o homem mandemos embora que se vá em ato ordenei Até porque ele se cessava sem entendimento das coisas sem ação Transes que em instante temi aquele homem morresse roqueado no medo rebaixado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 683 dessa forma então ah aí então o destino de lugar para mim estava definitivo só sendo nas extremas do fim do Inferno Com jeito com asco uns dos meus cumpriram meu mandado desamontaram o homem e o homem quase nem se impunha de ficar em pé Tu foge fora daqui tu te vai embora eu disse tive de gritar Aí ele entendeu e saiu Por um momento pensei que fosse correr Mas esbarrou sem espiar para trás Agora era que achava pranto com bem de choro estava chorando soluços fortes igual se fosse criança pequena Aquilo não tinha nenhuma sensatez e me dava gastura astúcia que remexia com minhas resistências Aborrecidos os do meu pessoal gritaram com ele que tornou a pegar a correr ao tom dos brados Ainda esbarrou outra vez devia de estar chorando conforme os ombros dele se sacudiam Arrochei Assim foi em arrebrusco sobreveio em mim a estúrdia arfagem de chorar também eu nas margens do mar Não quis e nem pude Ânsia que meus olhos para dentro davam em escuro As graças darte sabe o senhor na escuridão não se chora por não se ver como não se pita cigarro Com isso desgostei de mim Ah no final da vez o que ria o riso principal era ele o demo O Tisnado Assim por causa da judiação que eu mesmo por querer salvar a vida dele eu tinha procedido de demorar assim com aquele homem Antes tivesse logo matado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 684 Como é que se podia desrespeitar tudo desse jeito numa desgraçada pessoa roupeada Como é E o homem não tinha vislumbrado de espiar para trás para saber de sua cachorrinha E a cachorrinha estava ali bem amarrada na dignidade Tanto ela não latia mais que todos tinham se esquecido dela Agora eu colhi em mim um estado de desânimo A ser que por conta daquele homem por meus desmandos quem sabe eu ia ter mais para adiante de pagar com graves castigos Algum tempo estava se passando daí já tinham desarreado a égua e o lombilho e os baixeiros botaram dependurados num galho de árvore de beira estrada Ali estava aquele magro animal preso somentemente no cabresto que o Fafafa segurava assim esperavam que eu desse cabo dela eu mesmo ou que mandasse outro fazer segundo tinha sido a minha decisão A cachorrinha essa eu pensei eu dava para Diadorim que perto todo o tempo tinha ficado calado durante tudo E pois era a hora de minha acertação mesmo com a contrariedade Ao dito porque eu tinha começado a desastrada estória que um final razoável carecia de ter Suficiente sacar garrucha e mirar o tiro na testa da égua que se debruçava de pernas abertas se acabando A tanto pois João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 685 Ao que o Fafafa que não teve poder em si de se consentir silêncio virou para mim e disse Nosso Chefe com vênia eu peço o senhor aceite de eu pagar em dinheiro o preço deste inocente animal que seja poupado A egüinha não é de todo ruim Aonde que ele disse outros secundaram eu deixasse Repente meu foi meio irado porque até o Fafafa me atravessava Os demais a ver que reprovavam minha decisão de que a égua se matasse A gente revoltosa Ah não que em seguida gostei eu mesmo Instante em que me prazia ouvir o meu pessoal discordar daquilo com a égua a frio e por fria razão Do demo era que eles discordavam Rapaziada boa solerte Só que assim como eles queriam não estava em meu regulamento resolver Vender não vendia a vida da égua ao Fafafa Ah não Resumi um recurso por aí alerta O que foi como pronunciei Delibero o certo o primeiro que eu vi foi essa égua Ela tinha de receber a morte Ah mas égua não é gente não é pessoa que existe E que Ah então não é cabível que se mate a égua por tanto que a minha palavra decidida era de se matar um homem Não executo A alçada da palavra se perdeu por si e se gastou pois não está dito Acho e dou que o negócio veio ao terminado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 686 Verdadeiramente com alegria foi que todos me aprovaram Ou seja que me admiravam em real pela esperteza de toda solução que eu achava e mesmo nem sabiam que essas minhas espertezas eram cobradas da manha do Tentador Contente tanto e descontente comigo era que eu estava Porque essas coisas de certo modo me tiravam o poder do chão Mas uma na outra eu limpei o seco de minhas mãos Aí correr alguém em tempo de campear outra vez esse homem eu disse Trazer a modo de se dar a ele dinheiro se dar de comer e um café e tornar a entregar a ele o que é dele Eu falava era por devolver a égua E o Suzarte José Gervásio e Jiribibe torcendo em galope foram pelo homem A égua que se soltou caçava moitas de capim para pastar Com o que já que se estava por descanso e espera e se tinha boa aguada na vereda perto o jacaré armou a trempe e coou café Sentei na sombra dum paudoce fiquei ouvindo os gabos que os em redor de mim me dessem como arras de procedimentos maiores Tal a tal o Chefe tira mais finíssimas artimanhas do que o Zé Bebelo próprio um disse João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 687 À fé que determina com a mesma justiça queMedeiro Vaz outro falou mais aduloso Isso bom louvo sossegava a minha perturbação Aquela hora eu estimava meus homens que vivessem que falassem Mas para afirmar idéia e respeito de que eu estava em minha chefia independente mandei que aquietassem pelo que eu ia aproveitar para uma sesta de soneques Aprazia escutar o ventinho do chapadão com o suave rumor que assopra e faz nas folhas do batecaixa A cachorrinha amarrada mesmo se sujeitava de não latir figuro que alguém estava dando a ela pedaços de carneseca Alembro que eu ainda podia caber nesse domingozinho de tranqüilidade O melhor ah pensei o melhor de tudo era que o Anhangão não aparecesse não se visse porfiando no meio de todos e que mesmo o mais certo era dele demo não competir por não ter nenhuma existência Tirei minha madorna a pouco Suzarte Jiribibe e José Gervásio já retornavam com o vazio tido sem o resultado algum Sujeito se sumiu nesse mundo carregando com o rastro medo dele era medonho Só achamos o nada dele assim rendiam explicação Que é que se podia remediar Seguir nossa marcha sem mais tardanças A gente largava a égua ali João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 688 acaso algum dia o homem voltava ou dela por boca de outros tinha notícia Amontamos E a cachorrinha Reinaldo essa tu quer perguntei a Diadorim Meante o que ele melhor respondeu Só convém se soltar a coitadinha de seguro ela vai se encontrar com onde estiver o dono E ele mesmo desatou Valia o senhor ver o raio de amor que tangeu a cachorrinhazinha que latiu suas alegrias e airada correu sem nenhuma demora feito fosse para um pronto destino háde asas Foi ela em longe desaparecer e nós tocamos no caminho contrário A égua ficou lá pastando e o arreio do homem como um espantalho pendurado no ramo de árvore até as moscas do campo já se ajuntassem nele Do que acontecido me senti muito livre Trotei adiante Eu ia à meia rédea não me instava não pensava Será mal pergunto eu ao senhor que viajei este sertão com o Outro sendo meu sócio Vá retro Mas não tenho modo de entender como Diadorim estranhou meus semblantes E por via disso é que tinha sido a nossa conversação por causa do de que agora lhe dei conta miudamente Do que discuti com Diadorim do que derradeiro ele me disse me ficou um retardo Aquele passo me envergonhava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 689 Como ser Eu queria e não queria ouvir não queria e queria Resto de toda resposta que tivesse tinha de ser acusação E eu quis Deu o que me deu e eu vim perguntar forçado sentido perguntei O recado mandado Diadorim tu diz Teu falar no exato dever de toda lealdade é que eu a duras exijo o que me reverte Sou teu amigo O recado aquele Riobaldo pedi ao arrieiro para dar a uma mulher Ah então foi para uma moça para a filha do fazendeiro da Santa Catarina que Otacília é e que é minha noiva será Riobaldo pois foi Em que é que você malda Ao que por praga eu relutei no freio Até o campolino meu cavalo assumiu um espanto Porque surpreendi o mundo desequilibrado rústico o que me pertencia e o que não me pertencia Se a vida coisas assim às horas arranja então que segurança de si é que a gente tem Diadorim me olhava Diadorim esperou sempre com serenidade O amor dele por mim era de todo quilate ele não tartameava mais de ciúme nem de medo Disse assim Pedi a ela que rezasse por você João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 690 Riobaldo Assim pela esperança de saudade que ela tivesse que não esbarrasse de rezar o todo tempo por costume antigo No argame no esquisito desgosto de meu espírito vi que mesmo antes dele falar eu já sabia que aquilo era o que ele não evitava de me dizer Rude que ainda reperguntei mesmo assim Ah não Ah você acha que eu careço de suas rezas orações por minha ajuda Diadorim Acho de manhã à noite Riobaldo Demais Nem sei mesmo se alguém te botou o malefício Tua mãe mesma que estivesse viva achava Mor mor aí recebi surto de meu sangue forte no corpo da cara e na beira das orelhas e logo doeu no meu beiço o que eu estava me mordendo assim para não insultar Diadorim com nomes que fossem da maior ofensa Com um tapa na rédea eu tirei de perto dele a cara de meu cavalo Acha tua vida rapaz Careço é de menos amizades ainda eu maldisse me apartando Ao que bem pensei Hásde Rezas essas o contra Atira tu em anta com chumbo fino e ri mamente O que era que me transtornava do meio para o fim por essa fraseação João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 691 Sendo que depois logo quando esbarramos a caminhada do dia eu fiz questão de não querer prosa nem presenças de ninguém para que vissem que eu estava pensativo de projetos e raivoso Tristonho A gente parava no findar do Chapadão longe no poente segundo se ia indo por meu comando As muitas sérias coisas referi comigo quando eu estava provando a fresca da tarde Por curto minto se não conto que estava duvidoso E o senhor sabe no que era que eu estava imaginando em quem Ele é Ele pode Ainda hoje eu conheço tormentos por saber isso trastempo que agora quando as idades me sossegam E o demo existe Só se existe o estilo dele solto sem um ente próprio feito remanchas nágua A saúde da gente entra no perigo daquilo feito num calor num frio Eu então Ao que fui na encruzilhada à meianoite nas Veredas Mortas Atravessei meus fantasmas Assim mais eu pensei esse sistema assim eu menos penso O que era para haver se houvesse mas que não houve esse negócio Se pois o Cujo nem não me apareceu quando esperei chamei por ele Vendi minha alma algum Vendi minha alma a quem não existe Não será o pior Ah não não declaro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 692 Desgarrei da estrada mas retomei meus passos O senhor segurado não acha Ao que tropecei e o chão não quis minha queda De hoje em dia eu penso eu purgo Eu tive pena de minhas velhas roupas E rezo Para a minha reza Deus dá as costas mas abaixa meio ouvido Rezo Queria ver ainda uma igreja grande brancas torres reinando de alto sino no estado do Chapadão Como que algum santo ainda não há de vir das beiras deste meu Urucuia E o diabo não há Nenhum É o que tanto digo Eu não vendi minha alma Não assinei finco Diadorim não sabia de nada Diadorim só desconfiava de meus mesmos ares Escuto o claro riso dele que era raramente quer dizer me alembro Compadre meu Quelemém me dá conselhos de tranqüilidade O que ele renova é Em presente e futuros Eu sei Sempre sei realmente Só o que eu quis todo o tempo o que eu pelejei para achar era uma só coisa a inteira cujo significado e vislumbrado dela eu vejo que sempre tive A que era que existe uma receita a norma dum caminho certo estreito de cada uma pessoa viver e essa pauta cada um tem mas a gente mesmo no comum não sabe encontrar como é que sozinho por si alguém ia poder encontrar e saber Mas esse norteado tem Tem que ter Se não a vida de todos ficava sendo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 693 sempre o confuso dessa doideira que é E que para cada dia e cada hora só uma ação possível da gente é que consegue ser a certa Aquilo está no encoberto mas fora dessa conseqüência tudo o que eu fizer o que o senhor fizer o que o beltrano fizer o que todoomundo fizer ou deixar de fazer fica sendo falso e é o errado Ah porque aquela outra é a lei escondida e vivivel mas não achável do verdadeiro viver que para cada pessoa sua continuação já foi projetada como o que se põe em teatro para cada representador sua parte que antes já foi inventada num papel Ora veja Remedeio peco com pecado Me torço Com essa sonhação minha compadre meu Quelemém concorda eu acho E procurar encontrar aquele caminho certo eu quis forcejei só que fui demais ou que cacei errado Miséria em minha mão Mas minha alma tem de ser de Deus se não como é que ela podia ser minha O senhor reza comigo A qualquer oração Olhe tudo o que não é oração é maluqueira Então não sei se vendi Digo ao senhor meu medo é esse Todos não vendem Digo ao senhor o diabo não existe não há e a ele eu vendi a alma Meu medo é este A quem vendi Medo meu é este meu senhor então a alma a gente vende só é sem nenhum comprador João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 694 Divulgo o meu Essas coisas que pensei assim mas pensei abreviado O que era como eu tivesse de furtar uma folga nos centros de minha confusão por amor de ter algum claro juizo espaço de três credos E o resto já vinha O senhor verá pois Porém mais além Na Serra do Tatu o frio ali é tal que em madrugadas a gente necessita de uns três cobertores Na Serra dos Confins meados de julho lá já está sovertendo o laçaço dos ventos desencontrados de agosto como que venta árvores caídas Aonde eu ia todos achavam natural Chefe é chefe Será que eles não sabiam que eu não sabia aonde ia Isto é digo isto é Não soubessem os começos e os finais Dalgum modo eu estava indo e sabendo Sobre como é que a coruja conseguiu modo de poder voar sem se escutar o rumor do vôo Ao que eu estava sofismado Menos que não guardei raiva de Diadorim nem sentimentos O desar que ele tinha falado e feito aquela ruim conversa nossa não deixou nem nublo melhor fugiu de todo de minha lembrança O palpite meu primeiro era de chegar até na Serra do Meio cruzar na CachoeiradoUrucuia Daí desisti De repente torci direto para o norte foi no Lagamar a travessia Mas fujo de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 695 dizer que antes no LugardoTouro se arrecadou a exata munição Ainda antes se dando dias que a gente tinha recebido uma boa surpresa O Quipes Assim o Quipes que retornava depois de tantos meses De desde que tinha cumprido a ordem de sair por travesso socorro de lá ondonde estávamos cercados em combates na Fazenda dos Tucanos o senhor se alembrará Ele vinha certo e alegre E de ver um companheiro assim se aparecer de ausências a gente ganhava mais mocidade Lampeiro o Quipes entrado em boas roupas montado num bom cavalo amarelo pitando maço de cigarros de fábrica rico feito um Mascarenhas Arte que puxava um burro e uma burra adestros e tinha comprado coisas até trempe e caçarolas e açúcar real e chocolate em pó Ao fagueiro pujante mesmo Ara veja como passou E dond é que soube de nós eu em atiço perguntei Ao que pois Tatarana em faltas de notícia formei meu pião por aí Já estive em Ingazeiras na BarradaVaca no Oi Mãe em Morrinhos O Urucuia não é o meio do mundo assim ele se temperou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 696 O que não era toda a verdade O que ele estava era recém chegando E me tratou de Tatarana O seja que tivesse vivido esses tempos tangendo urubu adformas que vinha agora na ignorância de que eu é que era o Chefe Indagou por Zé Bebelo e pois de Zé Bebelo mesmo ele tudo não sabia Nem o parar do Hermógenes Nem não tinha nenhum sinal do Joaquim Beiju assim como aviso de outras novidades do mundo não deu Só por terminar se gabou de ter tido duas ofertas para servir de jagunço de Dona Adelaide no Capão Redondo e do Coronel Rotílio Manduca em sua Fazenda Baluarte Ah entrei gozando de minha pessoa de paz até nas cidades de Januária e SãoFrancisco ainda proseou Devia deser verdade Assim como verdade completa que a burra e o burro e a tralha ou o dinheiro para tudo adquirir ele devia de ter roubado tomado em terra de riquezas Tal que disse Isto eu bem comprei na venda do José Vassalo Desajuizado gastador esse o Quipes Tanto ouvi muito macambúzio Onde que então eu varava mundo em comando e ainda não prezava o meu nome Eu o UrutuBranco Ser Chefe de jagunço era isso Ser o que não dava realce qualquer um podia fazendeiro com posses mão em João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 697 políticas O sertão tudo não aceita A minha pessoa era nada glória de Zé Bebelo era nada O que dá fama dá desdém O menos de me importar O que eu carecia era de dar primeiras batalhas Suspender a alta coragem adiante de meus cabras Ou será que já estavam mas era se aplicando no vagavagar Cigano sou eu pensei enraivecido Tinha o norte para a gente Dei ordem Aí torcemos caminho numa poeira danã A reto viemos beirando o Ribeirão da Areia de rota abatida O que era que eu tencionava fazer O senhor espere Narro que não rendi melindres do feito de Diadorim digo o recado enviado Mas à vez balancei uma inquietação daquilo que era para eu bem estranhar a decisão dele de tanto absurdo Essas desordenadas da vida da gente tudo o que estoura manso e guampa quieto e que só tem a razoável explicação para quem está mesmo longe dos motivos Ao meio do meio duma coisa eu tinha certeza que Diadorim não ia me mentir O amor só mente para dizer maior verdade Diadorim me compassava por força Mas para mandar à minha Otacília assim aquela embaixada era porque ele soubesse no zelo de seu coração que então Otacília me tinha amor E tanto igual sabia também de mim Naqueles dias era Abrandei minha lembrança em Otacília que sincera me aguardasse em sua casa em seu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 698 meigo estar Agora eu ia indo às avessas de lá da Santa Catarina mas de arribada minha intenção de saudade vinha voltando Tudo nesta vida é muito cantável Até a seguir por um afino de momento eu me arrepiei por trás da testa Ato do que meio confuso imaginei por um vão imaginar que me querendobem a mais de meu merecimento e crendo que eu enfrentava os duros riscos ela Otacília pudesse praticar o estouvamento gentil de se fugir de casa e vir aventurada em minha cata por todos os pousos deste sertão Ah ela vinha montada num bom cavalo corcel aparecia de repente por meu nome perguntando E eu declarava a grandeza real dela definida bem do meu lado na frente do grande bando de meus homens Assim de jeito tão desigual do comum minha vida granjeava outros fortes significados E isso variou em meu pensamento inesperado de ligeiro supor que a bem notado nem foi um pensar Arremedo de sonho também não seria de ser Então emendando de novo o vero juízo tive um receio por causa que aquilo podia ser aviso do que estivesse por vir rumo de profecias Otacília me alembrei da luzinha de meio mel no demorar dos olhares dela Aquelas mãos que ninguém tinha me contado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 699 que assim eram assim para gozo e sentimento O corpo em lei dos seios e da cintura todo formoso que era de se ver e logo decorar exato E a doidice da voz que a gente depois viajasse viajasse e não faltava frescura dágua em nenhumas todas as léguas e chapadas Isso tudo então não era amor Por força que era E pelo sim receei será tivesse Diadorim falseado fala e o recado na verdade fosse outro o para ela vir afoitamente que eu dela muito carecia Divulgo o desuso disso que era extravagâncias Mas o senhor acreditando que alguma coisa humana é de todo impossível então é que o senhor não pode mesmo ser chefe de jagunço nem na menor metade só de um diazinho nem somente nos vastos imaginados Ora essas digo Se Otacília viesse aparecesse lá em no meio de nós que seguimento de coisas havia de suceder A bobéia toleima Otacília estava guardada protegida na casa alta da Fazenda Santa Catarina junto com o pai e a mãe com a família lá naquele lugar para mim melhor mais longe neste mundo E eu sem ser por motivo ou razão cada dia tocava com a minha gente por contrárias bandas para mais apartado de donde ela assistia Ao cada dia mais distante eu mais Diadorim mire veja O senhor saiba Diadorim que bastava ele me olhar com os olhos verdes tão em sonhos e por mesmo de minha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 700 vergonha escondido de mim mesmo eu gostava do cheiro dele do existir dele do morno que a mão dele passava para a minha mão O senhor vai ver Eu era dois diversos O que não entendo hoje naquele tempo eu não sabia Máximo me lembro é de que na minguante se estava no veredal das cabeceiras de um córrego lugar de desmedidas pastagens adonde os cavalos usufruírem descanso A lá esbarramos e paramos por uns dias Me lembro eu quis escrever uma carta Essa minha carta eu podia destacar um homem dos ligeiros ele ia levava em mão à Otacília minha noiva trazia a resposta O que eu cogitei de escrever era muito singelo as notícias de minha saúde pergunta de como era que ela e os parentes iam passando saudações de lembranças Admiro que achei natural de não falar coisa de minha glória de chefia por oras Por quê Pois E tive vontade de traçar uns versos também mas que a aragem não ajudava a deduzir Era uma sinceridade muito dificultosa Escrevi metade Isto é como é que podia saber que era metade se eu não tinha ainda ela toda pronta para medir Ah viu Pois isto eu digo por riso por graça mas também para lhe indicar importante João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 701 fato que a carta aquela eu somente terminei de escrever e remeti quase em data dum ano muito depois Digo o porquê Próprio porque não pude Guarde o senhor não pude completo Mas guarde por outra o dia vindo depois da noiteesse é o motivo dos passarinhos Falo por palavras tortas Conto minha vida que não entendi O senhor é homem muito ladino de instruída sensatez Mas não se avexe não queira chuva em mês de agosto Já conto já venho falar no assunto que o senhor está de mim esperando E escute Tinha o Maligno Às vezes penso Um boneco de capim vestido com um paletó velho e um chapéu roto e com os braços de pau abertos em cruz no arrozal não é mamolengo O passopreto vê e não vem os passarinhos se piam de distância Homem é O senhor nunca pense em cheio no demo O mato é dos porcosdomato O sertão aceita todos os nomes aqui é o Gerais lá é o Chapadão lá acolá é a caatinga Quem entende a espécie do demo Ele não fura rascrava Demorar comigo ele podia E o que não existe de se ver tem força completa demais em certas ocasiões A ele vazio assim como é que eu ia dizer Te arreda desta minha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 702 conversa Ao que pois o que eu ia pondo na carta era quase que uma ordenada lembrança a igualzinha repetição daquilo de Diadorim que ela rezasse por mim Otacília orações rezasse Ia Ah mas aí houve Amoleci mão antes de coração não pude Não pude diabralmente desarrazoado por outras fortes ordens e então de repente tive vergonha desgostei de estar querendo escrever aquela carta Desisti guardei na mochila aquela metade Um homem é um homem no que não vê e no que consome Ah não Otacília eu não merecia Diadorim era um impossível Demiti de tudo O demo tive raiva dele Pensei nele Em vezes O que era em mim valentia não pensava e o que pensava produzia era dúvidas de meenleios Repensava no esfriar do dia A quando é o do sol entrar que então até é o dia mesmo por seu remorso Ou então ainda melhor no madrugal logo no instante em que eu acordava e ainda não abria os olhos eram só os minutos e ali durante em minha rede eu preluzia tudo claro e explicado Assim Tu vigia Riobaldo não deixa o diabo te pôr selaisto eu divulgava Aí eu queria fazer um projeto como havia de escapulir dele do Temba que eu tinha mal chamado Ele rondava por me governar Mas então governar pudesse eu não era o UrutuBranco não vinha a ser chefe de nada coisa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 703 nenhuma Ah eu carecia dum jeito dum esperto socorro para tentear com o Sujo em suas próprias portas e mediante me pôr livre de fim fatal De que modo Mas acontece que o instante entre o sono e o acordado era assaz curto só perpassava não dava pé Eu não podia me firmar em coisa nenhuma a clareza logo cessava Daqueles avisos e propósitos o montante movimento do mundo me delia igual a um secar E eu mesmo estava contra mim o resto do tempo Não estava Todo o mundo cada dia me obedecia mais e mais me exaltavam Com o que peguei aos poucos o costume de pular num átimo da rede feito fosse para evitar aquela inteligencinha benfazeja que parecia se me dizer era mesmo do meio do meu coração Num arranco desfazia aquilo faísca de folga presença de beijaflor que vai começa e já se apaga e daí já estava inteirado no comum nas meiasalegrias a meiabondade misturada com maldade a meio Agora levantava puxava e arreava meu Siruiz cavalo para alvoradas Saía sozinho Sair na escuridão o senhor sabe aqueles galhos de árvores batendo na cabeça da gente Sempre eu ia até longe quando voltava encontrava o pessoal se aprontando café já coado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 704 cavalaria em fila para a viagem Uma vez inda mais longe fui do que nas outras E dei com o lázaro Ele se achava como que tocaiando no alto duma árvore por se esconder feito uma cobra ararambóia Quase levei o susto E era um homem em chagas nojentas leproso mesmo um terminado Para não ver coisas assim jogo meus olhos fora Promovi meu revólver Aquele de repente se encolheu tremido e tremeu tanto depressa que as ramagens da árvore enroscaram um rumor de vento forte Não gritou não disse nada Será que possuía sobra dalguma voz Eu tinha de esmagalhar aquela coisa desumana Dum fato na hora me lembrei do que tinham me contado da vez em que Medeiro Vaz avistou um enfermo desses num goiabal O homem tinha vindo lamber de língua as goiabas maduras por uma e uma no pé com o fito de transpassar o mal para outras pessoas que depois comessem delas Uns assim fazem Medeiro Vaz que era justo e prestimoso acabou com a vida dele Isso contavam já de dentro do meu ouvido A quizília que em mim ânsia forte o lázaro devia de feder onde estivesse adonde fosse lambuzava pior do que lesma grande e tudo empestava da doença amaldita Arte de que as goiabas de todo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 705 goiabal viravam fruta peçonhenta e deu dar no gatilho lei leal essa de Medeiro Vaz Ô guaimoré xinguei E gritei pulhas Acho que insultava era por de certo modo retardar meu dever Ele não respondeu Em ante mim assim ninguém não respondesse Mas fincava de me olhar ah ele tinha dois olhos no meio das folhas da folhagem Muito coitado ele era o senhor esteja de acordo Mas aí foi que vi e repeli o que que é ódio de leproso Na cabeça daqueles olhos eu armei minha pontaria E ouvi o vir dum cavaleiro Esperei Não dissessem que eu tinha baleado à traição o maldelazento com escondidos de não ter testemunhas Quem vinha Em já madrugamanhã tudo clareado reconheci Diadorim Embolsei a arma sem razão Diadorim me perseguia Vigia Diadorim tu pune por este eu havia de indagar apontando o esconso do leproso Estou aqui te vejo é você mesmo Riobaldo ele ia dizer Riobaldo tem tento A imaginação dessa conversa eu pensei de relance como uma brasa chia em dentro de vasilha dágua Assim estremeci eu ente Porque do bafo mesmo de minha idéia vã eu estava catando tal anúncio de acusação Tu traz o Arrenegado Eu e ele o Dê Então num sutil podia mesmo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 706 ser que ele quisesse estar tomando conta de mim Aí nem nunca nem eu rosnei riso Espinoteei na sela feito acordado dum cochilo de cão E Diadorim tropeava chegando Mas eu virei rédea e roseteei com brado meu animal cumprindo rompemos em galope que era um abismo Eh diogo dianho Eh diogo eh dião Retos fomos desabalando que um quartodelégua quase por doidejo Nós três Que eu pensei E esbarrei por tanto meu cavalo sacudiu o pescoço todo Espiei em roda até com a mão Não vi o demo Meu espírito era uma coceira enorme Como eu ia poder contra esse vapor de mal que parecia entrado dentro de mim pesando em meu estômago e apertando minha largura de respirar Aí eu carecia de negar pouso a ele A nega Eu quis Eu quis Como olhei Diadorim estava acolá estacado parado no lugar perto da árvore do homem Por certo ele tinha enxergado a coisa viva e estava desentendendo meu espaço esses desatinos Contemplei Diadorim daquela distância Montado sempre teso de consciência ele me parecia mais alto de ser e não bulia por mim avistado E o lázaro Ah esse que se espertasse que fugisse para não falecer Que é que adiantava que àquela hora João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 707 os passarinhos cantassem acabando de amanhecer o campo sertão A enquanto sobejasse de viver um lázaro assim mesmo muito longe neste mundo tudo restava em doente e perigoso conforme homem tem nojo é do humano Condenado de maldito por toda lei aquele estrago de homem estava remarcado seu corpo sua culpa Se não então por que era que ele não dava cabo do mal ou não deixava o mal dar logo cabo dele Homem ele já estava era morto Que o que Diadorim dissesse que dissesse Que aquele homem leproso era meu irmão igual criatura de si Eu desmentia Como era que sabendo de um lázaro assim eu ia poder prezar meu amor por Diadorim por Otacília E eu não era o UrutuBranco Chefe não era para arrecadar vantagens mas para emendar o defeituoso Esporeei voltando Não sou do demo e não sou de Deus pensei bruto que nem se exclamasse mas exclamação que havia de ser em duas vozes uma muito diferente da outra Vim feito Tornei a empunhar o revólver Mas completei eu mesmo aquilo que Diadorim decerto ia me responder Riobaldo tu mata o pobre mas ao menos por não desprezar mata com tua mão cravando facatu vê que por trás do podre o sangue do coração dele é são e quente Encostar nele a ponta de minha franqueira de cabo prateante Toma Tu cai no João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 708 chão Agalopando assim joguei fora meu revólver Joguei ou foi um ramo de rompegibão que relou arrancando a arma de meu pulso Cheguei esbarrei Meu cavalo tão airoso batia mão rapava ele deu um bufo de burro Vi Diadorim Mas o leprento tinha ganhado para se ir graças que não assisti à arriação dele decerto descendo às pressas se escapando de gatas nas moitas de feijãobravo Desse tive um cansaço enorme pode que seja por não saber se matava ou não matava caso ele ainda estivesse lá Do leproso Mas Diadorim conforme diante de mim estava parado reluzia no rosto com uma beleza ainda maior fora de todo comum Os olhosvislumbre meu que cresciam sem beira dum verde dos outros verdes como o de nenhum pasto E tudo meio se sombreava mas só de boa doçura Sobre o que juro ao senhor Diadorim nas asas do instante na pessoa dele vi foi a imagem tão formosa da minha Nossa Senhora da Abadia A santa Reforço o dizer que era belezas e amor com inteiro respeito e mais o realce de alguma coisa que o entender da gente por si não alcança Mas repeli aquilo Visão arvoada Como que eu estava separado dele por um fogueirão por alta cerca de achas por João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 709 profundo valo por larguez enorme dum rio em enchente De que jeito eu podia amar um homem meu de natureza igual macho em suas roupas e suas armas espalhado rústico em suas ações Me franzi Ele tinha a culpa Eu tinha a culpa Eu era o chefe O sertão não tem janelas nem portas E a regra é assim ou o senhor bendito governa o sertão ou o sertão maldito vos governa Aquilo eu repeli Antes que Diadorim mesmo abrisse boca para me sorrir me falar eu tive de fazer uma coisa A meio em ânsia meio em astúcia meio em raiva Como foi que peguei o vivo de tal idéia em gesto como se deu de que me alembrei daquilo Homem não sei Mas enfiei mão por entre armas e cartucheiras e correias de mochilas abri à berra meu jaleco e a minha camisa Aí peguei o cordão o fio do escapulário da Virgem que em tanto cortei por não poder arrebentar e joguei para Diadorim que aparou na mão Ia me fazer alguma pergunta que eu não consenti a voz dele era que mais significava Isto é porque eu primeiro falei como resumo Heiá voltar que o povoão está de minha espera eu enfim disse eu ainda estava respirando muito ligeiro demais João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 710 Assim eu dava era ordem como convinha Eu não estava de francamentes Para mim um palmo àquela hora podia medir três braças Apertei Nem meu cavalo carecia disso era eu encolher um pé e ele já via vôo À paz Mas Diadorim vez de logo vir tocou em contrário Sustentei em esbarro meu Siruiz a ver querendo as curiosidades Diadorim estava indo lá modo de caçar e recolher o revólver que de minha mão tinha caído Num repousozinho de coração calado eu agradeci à amizade dele essa fineza Daí vim Sempre longe em frente portanto que meu cavalo soberbo não dava alcance para ele se emparelhar Daí cantei Mesmo mal me canteipor causa que via que medeando tão grandes silêncios era que Diadorim tomava mais sorrateiro poder em meu afeto que não era possível concernente Entre isso chegamos de volta no arranchamento Mas cheguei lá foi para ter ocupação de uma estúrdia novidade Com os urucuianos O senhor estando lembrado aqueles cinco soturnos homens catrumanos também dos Gerais cabras do Alto Urucuia Os primeiros que com Zé Bebelo tinham vindo surgidos e que com ele desceram o Rio Paracatu numa balsa de talos de buriti Esses sempre mereceram pouca história da gente por quietos e certos bem procedidos sujeitos de furtadas palavras Agora eles comigo queriam um entendimento Um João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 711 Diodato esse era o cabo deles Formou em frente dos outros puxando a parlagem Queriam conversa comigo em só apartada Eu apreciasse aqueles homens A valentia deles estava por dentro de muita seriedade Urucuiano conversa com o peixe para vir no anzol o povo diz As lérias Como contam também que nos Gerais goianos se salga o decomer com suor de cavalo Sei lá sei Um lugar conhece outro é por calúnias e falsos levantados as pessoas também nesta vida Mas aqueles cinco me condiziam Admirei de ver que eles todos ainda estavam a pé mas com dobros e bissacos nas costas feito prontos para pedestre viagem Sisudez deles ainda semelhava maior Então constituí meus ouvidos para o cabecilho Diodato Praz vosso respeito Chefe a gente decidiram A gente vamosembora Praz vossas ordens o homem me disse assim mesmo casmurro com serenidade Tive de ver bem suas feições uma cara assim se examinava aos poucos Entendi mas reperguntei O homem não coçou a cabeça Olhos de santo de madeira O nariz dele era bem grande nariz que não se empinava Só tinha a barbazinha que tem um queixo de cavalo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 712 O homem não coçou a cabeça Firme disse Queriam ir sembora duma vez careciam Ah eles bem que conheciam a regra que um jagunço sai do bando quando quer só tem que definir a ida e devolver o que ao chefe ou ao patrão pertence As armas eles não devolviam porque eram deles mas como tinham de primeiro vindo a pé largavam bem agora os cavalos Pegavam era um tanto de matula trivial de farinha e carneseca e rapadura para uns três dias mal Mesmo assim era doideira achei Doideira tencionarem vagar reto dali donde estávamos alto ermo distantes brenhas Por que é que iam nem esperando eu desse minha primeira ganhada A isso meio acontecidos Chefe A conforme a gente carece praz vosso respeito senhor sim o homem meio respondeu bastante sincero Reparei no chapéu na cabeça dele que era de couro de veado suaçuapara com macias abas e formato muito composto A cara dele mesmo dava um ar honrável circunspecto por mal que com manchas sarro de alguma velha moléstia semelhando nódoas de caldo de caju Sua graça toda é Diodato de quê indaguei Diodato Nariz por alcunha ele disse disse de brancura Conheci como eu nunca tinha dado tento datenção naqueles homens cuja valia Assim que eles eram de batismo e o Pantaleão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 713 Salústio João João Tatu e OBispo Naquela hora era que eu punha tino Nunca mais tive notícia desses Hoje repenso Naquela hora eu cogitava jeito de conservar todos em companhia Remei minhas perguntas Donde que eram Desses córregos Do BuritiComprido Tamboril Cambaúba Virgens MataCachorro das Cobras Para cima da BazradaVaca Ari nos Em sertão são Isso que são lugares E que é que me adiantava saber que tinham suas ocas por lá O que eu inventei de conhecer era donde tinham estado quando Zé Bebelo deu com eles que vinha voltando de Goiás Ah senhor sim nas beiras Roças do rio São Marcos senhor sim no Esparramado Fazenda duma Dona Mogiana Cabras dessa Dona Mogiana Eram Tinham sido Mas com sua labuta de plantações Que qualidades de crimes eles tinham feito para principiar crimes de boa inerência E por que era que tinham querido vir com Zé Bebelo Isso eu quis perguntar O que de repente perguntei Por via de que é que vocês desespiritaram de seguir vinda com a gente Falei e refuguei para não ter falado que gabo e questão não são regra de se negociar Mas o homem Diodato distanciado duma minha pergunta dessas esbarrou vez demorão mesmo num desajeito ele fungava E ele comigo não tinha ajuste mas não queria me ofender sem a razão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 714 Chega olhou para os companheiros que acenavam devagar com as cabeças mas numa maneira brandazinha de sonsa fora de tudo o mais para não se entender se é sestro ou anuído que é do jeito comum como essa gente costuma Ara senhor sim por fim ele falou resposta que a influência esmoreceu A gente gastou o entendido e estava quase meio envergonhado Eu disse A pois Não vê Chefe praz vosso respeito as coisas demudaram Que viemos com siu Zé Bebel Vai a gente gastou o entendido ele disse O que Zé Bebelo falou quando chamou vocês A foi Quando chamou senhor sim Ele prometeu vantagens Não se diz Chamou Falou misturado A gente viemos E o que é que falou Agora a gente não sabe mais Falou muito razoável Falou muito razoável Agora com perdão vosso a gente esquecemos a gente gastou o entendido Mas muito razoável falou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 715 De irritado de afleima dei o discutir Pois por que é então que não foram logo com Zé Bebelo quando Zé Bebelo se foi Deixamos o tempo dos outros passar Não temos questão Não temos questão Mirei e vi o que desde de antes me invocava Aquele homem por uns astutos indícios se apartando ele desconfiasse de mim Aqueles outros homens os do todo sertão das brenhas os com as ventas largas para baixo cadaum um cão o que era que eles achavam em meu ser Repensei ah Ah então para avaliar em prova a dúvida deles tive um recurso A manha como de inesperadamente de repente eu muito disse Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo Senhor vendo como foi o supetão de susto que ele teve arregalado conforme me olhava e naquilo ouvido não acreditava o tanto que retardou para responsar todo baixo o Para sempre Ah Despedidos estavam podiam ir Ah Ah não A bobéia Se ele em fato estranhou foi somente por causa do tom de minha voz Se foi por minha voz foi João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 716 porque no afã de querer pronunciar sincero demais o santíssimo nome eu mesmo tinha desarranjado fala essas nervosias E eles iam sembora conforme desisti de sobreguardar esses homens Do jeito de que é que me valiam O contrato de coragem de guerreiros não se faz com vara de meirinho não é com dares e tomares Fino que me abespinhei por conta Ao que aqueles homens não eram meus de lei eram de Zé Bebelo E Zé Bebelo era assim instruído e inteligente em salão de fazenda Desisti dado Não baboseio E o mais Era como alguém dizendo Vai declarar seca por esse Norte e homem e mulher vão vir A vida é um vago variado O senhor escreva no caderno sete páginas Aqueles urucuianos não iam em cata de Zé Bebelo conforme sem nem satisfação fiquei sabendo Voltavam de volta para os seus recantos Quartel de mandioca em qualquer parte se planta e o senhor derruba um mato faz um chão bom roça também se semeia Eles foram embora deixei levarem os cavalos Reparti com eles alguma quantia e com alegria se arregalaram dinheiro é sempre amigoseja Estúrdio é o que digo nesta verdade que eu livre longe deles desaluídos é que eles estavam comigo mas eu quisesse com gana o préstimo deles então só me serviam era na falsidade O senhor me entende E digo que eles eram homens tão diversos de mim tão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 717 suportados nas coisas deles que por contar o que achei que devia de ter pedido a eles a lembrança de muito rezarem por meu destino Mas de desertarem de mim então será que era um agouro Não sei Que sei Tive fé em mim sozinho O que juro e que sei é que tucano tem papo Achava Adiante dias de caminho achei de querer e não querer em contrários instantes que rezassem por mim a rogo e paga Reza boa de outros singela que mais me valesseessas avemariazinhas novenas Assim conforme Diadorim tinha expedido o recado para minha Otacília mediante o arrieiro de uma tropa Pelejei por afirmar a idéia nisso que próprio depois eu enxotava Às vezes as melhores haviam de ser as rezas de mais longe desconhecidamente Me lembrei de um homem de minha meninice Um do outro lado do rio O sujeito que escondia uma oração tão entremunhada desguisada que duvido mesmo um padre aquilo entendesse e desse licença Pois ora me servia Ou a mulher que teve seu meninozinho parido no chão do rancho no povoado dos papudos ela me devia mercês então não podia encaminhar a Deus por miM nem um louvamém Só será que o arrieiro passa e vai na Santa Catarina João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 718 Isso perguntei a Diadorim O que perguntei era por uma opinião Eu queria pensar nisso de tarde nos repontos De assento Mas logo esse sossego manso me largava nuvenzinha dele Vaqueiro pode laçar o lugar do ar Às voltas e revoltas eu pelejava contra o meu socorro Hoje eu sei pois sei porquê Mas eu não falava sozinho Figuro que estava em meu são juízo Só que andava às tortas num lavarinto Tarde foi que entendi mais do que meus olhos depois das horrorosas peripécias que o senhor vai me ouvir Só depois quando tudo encurtou Dei decreto de fim em essas esquisitices No que não perguntei Diadorim me respondeu A muita coragem Riobaldo Se carece de ter muita coragem Ah eu sabia A coragem eu Aí quem era que me vencesse nesse dever alirolé quem podia afrontar minha presença feito morro padastro Tinha mãos e ações que davam para lavar meus trajes Mas o que Diadorim disse não me fez mossa Dou exemplo Do que houve e se passou uma vez no Carujo um arraial triste em antigos tempos O povo dali fugiu por alguma guerra ou pressa fecharam a igrejinha com um morto lá dentro entre as velas Eu gostava de Diadorim corretamente gostava aumentado por demais separado de meus sobejos Aquilo davandito ele tinha falado solto e sem serviço era só uma João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 719 recordação assim um fraseado verdadeiro ditado da vida O que não fosse destinado para ele nem para mim mas que era para todos Ou então sendo para mim mas em outros passados de primeiro Ali naquele lugar o Carujo no reabrirem depois de uns meses a igreja o defunto tinha se secado sozinho Ao por tanto que se ia conjuntamente Diadorim e eu nós dois como já disse Homem com homem de mãos dadas só se a valentia deles for enorme Aparecia que nós dois já estávamos cavalhando lado a lado par a par a vaiavida inteira Que coragem é o que o coração bate se não bate falso Travessia do sertão a toda travessia Só aquele sol a assaz claridade o mundo limpava que nem um tremer dágua Sertão foi feito é para ser sempre assim alegrias E fomos Terras muito deserdadas desdoadas de donos avermelhadas campinas Lá tinha um caminho novo Caminho de gado Arte que eu achei o meu projeto Só digo como foi do prazer mesmo sai a estonteação como que um perde o bom tino Porque viver é muito perigoso Diadorim o rosto dele era fresco a boca de amor mas o orgulho dele condescendia uma tristeza Matéria daquilo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 720 que me desencontrava motivo esse que me entristeceu A nenhum Eu já estava chefe de glórias Nem Diadorim não duvidava do meu roteiro que fosse para encontrar o Hermógenes Desse jeito a gente ia descendo ladeiras Ladeiras areentas e com pedras com os abismos dos lados e tão a pique que podiam rebentar os rabichos dos arreios no despenhado no ali descer os cavalos muito se agachavam de ancas feito se os pescoços deles se encompridassem e montões de pedras para baixo rola vam Até ri Diadorim ainda cria mais no meu fervor em se ir perseguir o Hermógenes Essas ladeiras era que me atrasavam Depois dali eu ia ter muita pressa demais Agora o senhor saiba qual era esse o meu projeto eu ia traspassar o Liso do Suçuarão Senhor crê sem estar esperando Tal que disse Ainda hoje eu mesmo disso para mim eu peço espantos Qu é que me acuava Agora eu velho vejo quando cogito quando relembro conheço que naquele tempo eu girava leve demais e assoprado Deus deixou Deus é urgente sem pressa O sertão é dele Eh o que o senhor quer indagar eu sei Porque o senhor está pensando alto em quantidades Eh Do demo Se é como corujão que se voa de silêncio em silêncio pegando ratomestre João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 721 o qual carrega em mão curva No nada disso não pensei como é que pudesse A invenção minha era uma os minutos todos tivesse um relógio A atravessar o Liso do Suçuarão Ia Indo fui ficando airoso Por forma como a gente rodeou outra volta não se passando no Vespê e no BambualdoBoi nenhum de meus homens não tirou palpite desse propósito Pasmo deles ia ser Daí uns desconfiavam de se estar onde estávamos Donde a perto dele umas poucas cinco léguas o desmenso o raso enorme por detrás dos morros E a gente dava a banda da mão esquerda ao VãodoOco e ao VãodoCuio esses buracões precipícios grotão onde cabe o mar e com tantos enormes degraus de florestas o rio passa lá no mais meio oculto no fundo do fundo só sob o bolo de árvores pretas de tão velhas que formam mato muito matagal Isto é um vão E num vão desses o senhor fuja de descer e ir ver aindas que não faltem as boas trilhas de descida no barranco matoso escalavrado entre as moitarias de xaxim Ao certo que lá embaixo dá onças que elas vão parir e amamentar filhos nas sorocas e anta velhusca moradora livre de arma de caçador Mas o que eu falo é por causa da maleita da pior febre ali no oco é coisa é grossa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 722 mesma Terçã maligna pega o senhor a terçã brava que pode matar perfeito o senhor antes do prazo de uma semana No que eu no meu destino não pensei Diadorim em sombra de amor foi que me perguntou aquilo Riobaldo tu achasses que uma coisa mal principiada algum dia pode que terá bom fim feliz Ao que eu abirado reagi Mano meu mano te desconheço Me chamo não é UrutuBranco Isto que heide já maximé Diadorim persistiu calado guardou o fino de sua pessoa Se escondeu e eu não soubesse Não sabia que nós dois estávamos desencontrados por meu castigo Hoje eu sei isto é padeci O que era uma estúrdia queixa e que fosse sobrosso eu pensei Assim ele acudia por me avisar de tudo e eu em quentes me regendo não dei tino Homem sei A vida é muito discor dada Tem partes Tem artes Tem as neblinas de Siruiz Tem as caras todas do Cão e as vertentes do viver O que na hora achei foi que Diadorim estivesse me relembrando de Medeiro Vaz não ter conseguido cruzar a travessia do raso Mas Diadorim também não adivinhou meu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 723 espírito Pois por aquela conta mesma era que eu queria Sobre o que eu era um homem em sim fantasia forra tendo em nada aqueles perigos capaz do caso Para vencer vitória aonde nenhum outro antes de mim tivesse Respinguei dessas faíscas constantes Eu não o cujo do orgulho de mim do impossível Descia e subia a fumaça da noite Esbarramos Era numa curta vereda duns brejos buritizalzinho Acendemos fogo Aí mal dormi fortíssimo no meu segredo Um meu primeiro sono sim O resto foi ondas Reprazer cru dessa espiritação eu ardia em mim e em satisfa contente feito fosse véspera duma patusqueira As forças me amanheceram acordado Adiante da gente o mangabeiral Depois o raso Aí o Liso do Suçuarão em fundo e largo as cinqüenta léguas e as quase trinta léguas das mais Ninguém me fazia voltar a seco de lá Aquela hora eu só não me desconheci porque bebi de mim esses mares Também eu não ia naquilo sem alguma razão mas movido merecido Por conta do Hermógenes Nossos dois bandos viajavam em guerra e contraguerra e desenrolando caminhos por esses Gerais cães se caçando Só que o sertão é grande ocultado demais Então eu ia varava o Liso ia atacar a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 724 Fazenda dele com família Ovo é coisa esmigalhável E a bem Para vencer justo o senhor não olhe e nem veja o inimigo volte para a sua obrigação Mas eu dava as costas à cobra e achava o ninho dela para melhor acerto Ao que esse não tinha sido o arrojo de Medeiro Vaz O dia parava formoso suando sol mesmo o vento suspendido Vi o chão mudar com a cor de velho e as lagartixas que percorriam de leve por debaixo das moitas de caculucage O pessoal meu não devia de estar com inquietação Vi uma coruja mas corujinha entortadeira e coruja só agoura mesmo é em centro de noite quando dá para risã E cuspi no branco leite duma mariabrava que toda às sãs cheirosa florescia Era a hora Repuxei os freios bem esbarrando Equei os meus homens Aqui gente Guerreiros em minha presença Com certo rebuliço como todos vieram para saber daquela novidade Declarei a eles Todos me entenderam Em fila as caras todas ficando iguais Me seguissem Ah nenhum não tinha ar do que ia ser e que fazia tantos dias eu tencionava Nem João Goanhá Marcelino Pampa João Concliz nem o Alaripe Nem Diadorim Diadorim me olhou tremeluzentemente de coragem de disposto Ele sim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 725 Mas os outros Seria que medissem meu mor atrevimento Era feito se eu estivesse aloucado extenso Porque o que eu estava mandando nem Medeiro Vaz mesmo não teria sido capaz de crer eu queria tudo sem nada Aprofundar naquele raso perverso o chão esturricado solidão chão aventesma mas sem preparativos nenhuns nem cargueiros repletos de bom mantimento nem bois tangidos para carneação nem bogós de courocru derramando de cheios nem tropa de jegues para carregar água Para que eu carecia de tantos embaraços Pois os próprios antigos não sabiam que um dia virá quando a gente pode permanecer deitada em rede ou cama e as enxadas saindo sozinhas para capinar roça e as foices para colherem por si e o carro indo por sua lei buscar a colheita e tudo o que não é o homem é sua dele obediência Isso não pensei mas meu coração pensava Eu não era o do certo eu era era o da sina E nem enviei adiante nenhuma patrulha de farejadores nem Suzarte Nélson ou o Quipes que tapejassem nem o Tipote para trilhar e entender ver se divulgava os socorros alguma grota duvidável dágua Se o cada um que se valesse cada um que me seguisse Agora vamos entrar para pernoitar lá dentro eu determinei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 726 Só era se aviar Mas o menino Guirigó mal me ouvindo falou A gente A gente Esse era um menino eu não devia de mandar alguém conduzir o Guirigó de volta para que em lugar seguro deixassem No ar não fiz Se não por que era então que ele para tudo tinha vindo Os outros não me cumprissem eu havia de voltar de lá dar de mão de minha tenção Nuncas Só melhor sozinho eu ia Ia por meus brancos ossos Transe tempo que esperei a resposta deles Dei a palavra Meus homens Ah jagunço não despreza quem dá ordens diabradas Se amanhã meu dia for em depoisdamanhã não me vejo Antes de menino nascer hora de sua morte está marcada Teu destino dando em data da meianoite tu vivente não passa Os que diziam assim eram todos eles secundando os cabecilhas Valentes que eram e como foram se animando Ao que me obedeciam ao meu melhor em redor A gente andou no comum até ao fim do grameal Aí se estava se esbarrava frente a frente com o Liso Rédeas às ordens A gente se moveu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 727 Sol em glória Eu pensei em Otacilia pensei como se um beijo mandasse Soltando rédeas entrei nos horizontes Aonde entrei na areia cinzenta todos me acompanhando E os cavalos vagarosos viajavam como dentro dum mar O senhor vê e vê Alguém a alto me levou alguém salvo a um seguinte Águas não desmanchavam meu torrão de sal Ah nem eu não tive incerteza em mente Assim fomos Aí eu em frente adiante A fortes braços de anjos sojigado O digo Os outros a em passo em passo usufruíam quinhão da minha andraja coragem Rasgamos sertão Só o real Se passou como se passou nem refiro que fosse difícilah essa vez não podia ser Sobrelégios Tudo ajudou a gente o caminho mesmo se economizava As estrelas pareciam muito quentes Nos nove dias atravessamos Todos bem todos tirante um Que conto O que era que o raso não era tão terrível Ou foi por graças que achamos todo o carecido nãostante no ir em rumos incertos sem mesmo se percurar De melhor em bom sem os maiores notáveis sofrimentos sem emerrar ponto O que era no cujo interior o Liso do Suçuarão era um feio mundo por si exagerado O chão sem se vestir que quase sem seus tufos de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 728 capim seco em apraz e apraz e que se ia e ia até nãoonde a vista não se achava e se perdia Com tudo que tinha de tudo Os trechos de plano calçado rijo casco que fere faíscas cavalo repisa em pedra azul Depois o frouxo palmo de areia de cinza emsobre pedras E até barrancos e morretes A gente estava encostada no sol Mas com a sorte nos mandada o céu enuveou o que deu pronto mormaço e refresco Tudo de bom socorro em az A uns lugares estranhos Ali tinha carrapato Que é que chupavam por seu miudinho viver Eh achamos reses bravas gado escorraçado fugido que se acostumaram por lá ou que de lá não sabiam sair um gado que assiste por aqueles fins e que como veados se matava Mas também dois veados a gente caçou e tinham achado jeito de estarem gordos Ali então tinha de tudo Afiguro que tinha Sempre ouvi zum de abelha O dar de aranhas formigas abelhas do mato que indicavam flores Todo o tanto que de sede não se penou demais Porque solerte subitamente pra um mistério do ar sobrechegamos assim em paragens No que nem o senhor nem ninguém não crê em paragens com plantas De justiça digo também uma regra se teve sem se saber de quem foi que veio a idéia dessa combinação Qual foi que a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 729 gente se apartou em grupos de poucos jornadeando com a maior distância aberta Mas que assim quando um avistasse qualquer coisa diversa podia dar sinal chamando os outros para novidade boa Eu que digo Mesmo não era só capim áspero ou planta peluda como um gambá morto o cabeçadefrade pintarroxa um mandacaru que assustava Ou o xiquexique espinharol cobrejando com suas lagartonas aquilo que em chuvas de flor dói em branco Ou cacto preto cacto azul bicho luíscacheiro Ah não Cavalos iam pisando no quipá que até rebaixado esgarço no chão e começavam as folhagens que eram urtigão e assapeixe e o neves mas depois a tintadosgentios de flor belazul que é o aniltrepador e até essas sertanejaassim e a mariazipe amarelas pespingue de orvalhosas e a sinhazinha muito melindrosa flor que também guarda muito orvalho orvalho pesa tanto parece que as folhas vão murchar E erva curraleira E a quixabeira que dava quixabas Digo se achava água O que não emapenas água de touceira de gra vatá conservada Mas em lugar onde foi córrego morto cacimba dágua viável para os cavalos Então alegria E tinha até uns embrejados onde só faltava o buriti palmeira alalã João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 730 pelas veredas E buracopoço água que dava prazer em se olhar Devido que nas beiras o senhor crê se via a coragem de árvores árvores de mata indas que pouco altaneiras simaruba o anis caneladobrejo pauamarante o pombo e gameleira A gameleira branca Como outrotempo se cantava Sombra só de gameleira na beira do riachão Assim achado tudo e o mais sem sobranço nem desgosto eu apalpei os cheios O respeito que tinham por mim ia crescendo no bom entendido dos meus homens Os jagunços meus os riobaldos raça de UrutuBranco Além Mas daí um pensamento que raro já era que ainda me vinha de fugida esse pensamento então tive O senhor sabe O que me mortifica de tanto nele falar o senhor sabe O demo Que tanto me ajudasse que quanto de mim ia tirar cobro Deixa no fim me ajeito que eu disse comigo Triste engano Do que não lembrei ou não conhecesse que a bula dele é esta aos poucos o senhor vai crescendo e se esquecendo Daí mesmo que certa hora Diadorim se chegou com uma avença Para meu sofrer muito me lembro Diadorim todo formosura João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 731 Riobaldo escuta vamos na estreitez deste passo ele disse e de medo não tremia que era de amor hoje sei Riobaldo o cumprir de nossa vingança vem perto Daí quando tudo estiver repago e refeito um segredo uma coisa vou contar a você Ele disse com o amor no fato das palavras Eu ouvi Ouvi mas mentido Eu estava longe de mim e dele Do que Diadorim mais me disse desentendi metade Só sei que no meio reino do sol era feito parássemos numa noite demais clareada Assim figuro Dentro de muito sol eu estava reparando uma cena que era um jumentinho um jegue já selvagem caatingano no limpo do campo caçando o que roer assaz pelos cardos Eu não tinha de tomar tento em coisas mais graves Mire veja o senhor Picapau voa é duvidando do ar Que tal Zé Bebelo na hora me lembrei quando mal irado ou quando conforme querendo impor medo a todos Norte de Minas Norte de Minaso que bramava E ele estava com a razão Mas Zé Bebelo era projetista Eu eu ia por meu constante palpite Usando de toda ajuda que me vinha mas prevenido sempre contra o Maligno que o que rança o que azeda As traças dele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 732 são novas sempre e povoadas tantas são que nem os tins de areia grãoindo em areal Então eu não sabia Ah quase que eu estava cogitando nisso quando o homem rosnou Quem ele era digo em qualidade um troncudo pardaz genista filho não sei de que terra Assim casta de gente Ah não Por meu bem eu estava em todo o meu siso Até mais Não faço caso eu disse isto é pensei dizendo Eu não queria somar com aquilo nenhum porque cheirava ao Cujo esses estratagemas Era do demo eu tirei um enredo Pois então paz eu falei me falei Não faço conta me prometi Eu estava em manhas Estive que estive no embalançar em equilibrável Tico tanto pensei Mas tudo era frisado ligeiro ligeiro feito cavalo que pressente fúria de boi Aí escutei a voz a voz dele tremia nervosa como de cabrito da maneira que gritou à briga Um desfeliz Levei os olhos Ah quem o homem era eu já sabia ele se chamava Treciziano O bruto para falar com ele só a cajado Eu sabia Rebém que desconfiei do demo Ali esse Treciziano era fraco de paciências ou será que estivesse curtindo mais sede do que os João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 733 outros segundo esse tremor das ventas e pegou a malucar Diziam que ele criava dordecabeça e padecia de erupções e dartros Estava falando contra comigo reclamando gritou uma ofensa Homem zuretado esbraseia os olhos Eu senhor de minhas inteligências como fica dito Eu estava podendo refletir em passo de jumento Siô deixa o padre of recer missa falei para mim mesmo Eu queria tolerar primeiro porque o demo não era homem para mandar em mim e me pôr em raiva Aí era só eu forçar calma tenteador depois com palavras de energia boa eu acautelava evitando a jerimbamba e daí repreendia esse Treciziano revoltoso próprio por autoridade minha mas sem pau nem pedra Que dessa chefe eu o O não me pilhava Mas ah quem diga um faz mas não estipula O que houve que se deu Que vi Com a sede sofrida um incha padece nas vistas chega fica cego Mas vi Foi num átimo Como que por distraído num dividido de minuto a gente perde o tino por dez anos Vi ele o chapéu que não quebrava bem o punhal que sobressaía muito na cintura o monho o mudar das caras Ele era o demo de mim diante O Demo Fez uma careta que sei que brilhava Era o Demo por escarnir próprio pessoa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 734 E ele endireitou pontudo para sobre mim jogou o cavalo O demo Em mim danouse Como vinha terrível naquele agredimento de boi bravo Levantei nos estribos Ehê Esse luzluziu a faca afiafe e urrou de ódio de enfiar e cravar se debruçando para diante todo Tirou uma estocada Cerrei com ele A ponta daquela pegou por um mau movimento nas coisas e trens que eu tinha na cintura e a tiracol se prendeu ali um mero Às asas que eu com a minha quicé a lambe leal pajeuzeira em dura mão peguei por baixo o outro encortei recortei desde o princípio da nuca ferro ringiu rodeando em ossos deu o assovião esguichado no se lesar o canodoar e mijou alto o sangue dele Cortei por cima do adão Ele Outro caiu do cavalo já veio antes do chão com os olhos duros apagados Morreu maldito morreu com a goela roncando na garganta E o que olhei Sangue na minha faca bonito brilho feito um verniz veludo E ele estava rente aos espinhos dum mandacaruquadrado Conforme tinha sido Ahoh Aoh mas ninguém não vê o demônio morto O defunto que estava ali era mesmo o do Treciziano João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 735 A morte dele deu certo E era segundo tinha de ser E tinha de ser por tanto que o demo não existe As tramóias armadilhas Nem nunca mais daí por diante eu queria pensar nele Nem no pobre do Treciziano que estava ali degolal que eu tinha Um frio profundíssimo me tremeu Sofri os pavores disso da mão da gente ser capaz de ato sem o pensamento ter tempo Somente todos me gabaram com elogios e palavras prezáveis porque a minha chefia era com presteza Fosse de tiro tanto não admiravam a tanto porque a minha fama no gatilho já era a qual à faca eh fiz E do outro grupo longe mas que era o mais perto da banda da mão esquerda um escutou ou viu e veio Era o Jiribibe mocinho Jiribibe num cavalo preto galopeiro Diadorim tinha disparado tiro só esmo de nervosia Dentro de pouco todos iam ficar cientes da proeza daquele homem tão morto das beiras do corte lá nele a pele subia repuxada a outra para baixo tinha descaído tamanhamente quase nas maminhas até deixavam formado o buraco medonho horrendo se aparecendo a toda carnança Aí Alaripe esclareceu Ao que sei este era da Serra dUmã O de tão longe o sapo leiteiro Uns estavam remexendo nele não tinha um pêlo nos peitos Assim queriam desaliviar aquele corpo das coisas de valor João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 736 principais Do que alguém disse que ele guardava um dixe joiazinha de prata e as esporas eram as excelentes de bom metal Não turveei Morte daquele cabra era em ramo de suicídios A modo que morreu Ele foi para os infernosindagou em verdade o menino Guirigó Antes o que era que eu tinha com isso como todos me louvaram Sendo minha a culpa a morte isso sei mas o senhor me diga meussenhor a horinha em que foi a horinha Como que o cego Borromeu garrou um fanhoso recitar pelos terços e responsos Medo de cego não é o medo real Diadorim me olhava eu estivesse para trás da lua Só aí revi o sangue Aquele em minha roupa a plasta vermelha fétida Do sangue alheio que grosso me breava mal me alimpei o queixo eu desgostoso de sangue mas deixava de sinal Ah não pois ali me salteou o horror maior Sangue Sangue é a coisa para restar sempre em entranhas escondida a espécie para nunca se ver Será por isso também que imensa mais é a oculta glória de grandeza da hóstia de Deus no ouro do sacrário toda alvíssima e que mais venero com meus joelhos no duro chão Por mais o corpo ali ficava para o ar do raso Sumimos de lá háse que tocávamos adiante À viajadamente eu ia desconversei meu espírito Até às aleluias João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 737 Que como conto Aquele Treciziano tinha redobrado destino de tristefim de louco Pois nem bem três léguas andadas daí depois a gente saía do Liso como que a ponto dávamos com uma varzeazinha e um esporão da serra chapadas digo Apeei na terra cristã Se estava no para ver esses campos crondeubais da Bahia Adiante vim para pedir gole dágua todo pacífico no rancho de um solteiro esse deu informação de que dez léguas em volta o povoal ia existindo sem questão Somente seguimos Dali antes a gente tinha passado o AltoCarinhanha lá é que o ReiDiabo pinta a cara de preto Onde chegados na aproximação do lugar que se cobiçava Dado dia e meio descrevendo no rumo que certo achamos logo se havia de ter a casa da raça do Hermógenes Lei de que íamos dar lá madrugando madrugada pegando todos desprevenidos em movível supetão Pois o Hermógenes parava longe em hora recruzando meus antigos rastros estes rasgos ele não adivinhava Aí era o meu contrabalanço Ah choca mal quem sai do ninho Ao que por isso não tardamos não tivessem a primeira notícia da gente Não se tomou nem um dia de fôlego A trote e a chouto vencemos uma grande noite e demos lá no luzir dalva João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 738 Abarcamos as condições do lugar em cerco entendidos uns com uns por meio de avisos que eram canto de acauã e assovio de macaco Porque sempre eles deviam de ter alguns curimbabas na defesa capangas e carabinas Daí só se esperou o listrar da primeira barra e a ponta da manhã estremecente Segundo nosso uso Demos fogo Digo franco feio o acontecido feio o narrado Sei Por via disso mesmo resumo não gloso No fim o senhor me completa Mas fazia tempo que não se dava combate e o propor da gente era tribuzana essas ferocidades assim A casa da fazenda aquele reto claro caiado mas era um casarão acabando o tope do morrete enganando até parecia torta Varejamos o total a tiro Aí e o que se gritava azurradamente Aqueles que estavam lá eram homens ordinários derreteram debaixo do pé de meus exércitos O que foi um desbarate Como que já estavam de asas quebradas nem provaram resistências deles mal ouvi uns tiros E a gente nós estouramos para o centro a surto sugre destrambelhando na polvorada feito rodeio de vento Assaz Do que fiz desisto Todos não fizeram Volvido receei que Diadorim não me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 739 aprovasse mas Diadorim concordou com os fatos em armas em frente O que se matou e estragou de gente humana e bichos até boi manso que lambia orvalhos até porco magro em beira de chiqueiro O mal regeu Deus que de mim tire Deus que me negocie À vez De seguida tochamos fogo na casa pelos quinze cantos mortos Armou incendião queimou de uma vez como um pau de umburana branca E de lá saímos quando o fogo rareou tardezinha E na manhã que veio acampouse em beiradágua de sossego A gente traspassava de cansaços e sobra de sono Mas trazida presa já em muito nosso poder estava a merecida que se queria tanto a mulher legal do Hermógenes Aquela mulher sabia dureza riscava Ela discordava de todo destino Assim estava com um vestido preto surrado muito desbotado caiu o pano preto que tinha enlaçado na cabeça e ela não se importou de ficar descabelada Deixaram ela sentar sentou Nunca encurtou a respiração Devia de ter sido bonita nos festejos da mocidade ainda era Deram a ela de comer comeu De beber bebeu A curto respondeu a algumas duas ou três coisas e logo depois de falar apertava demais a boca fechada estreitos finos beiços Mas falava quase assoviado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 740 Figuro que não mascava fumo nem cachimbava mas mesmo assim cuspia em roda mas não passava a sola do pé por cima para alimpar o chão como é costume de se fazer nessas condições Adverti que estava descalça e assim devia de ser fora do uso decerto por causa da hora e confusão em que tinha sido pega Se arranjou para ela par de alpercatas Ela soubesse que não se pertencia com a gente Aceitou meu olhar seca seca com resignação em quieto ódio pudesse até com as unhas dos pés me matava Enrolou a cara num xale verde verde muito consolado Mas eu já estava com ela com os olhos dela para a minha memória Magreza na cara fina de palidez mas os olhos diferiam de tudo eram pretos repentinos e duráveis escuros secados de toda boa água E a boca marcava velhos sofrimentos Para mim ela nunca teve nome Não me disse palavra nenhuma e eu não disse a ela Tive um receio de vir a gostar dela como fêmea Meio receei ter um escrúpulo de pena certo não temi abrir razão de praga Muito melhor que ela não carecesse de vir Ser chefe às vezes é isso que se tem de carregar cobras na sacola sem concessão de se matar E ela ficava assim embiocada sem semblantes com as mãos abertas de palmas para cima como se para sempre demonstrar que não escondia arma de navalha ou porque pedisse esmola a Deus Lembro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 741 dessa mulher como me lembro de meus idos sofrimentos Essa que fomos buscar na Bahia É de ver que não esquentamos lugar na redondez mas viemos contornando só extorquindo vantagens de dinheiro mas sem devastar nem matar sistema jagunço E duro capitaneei animado de espírito O Jalapão me viu os todos Gerais me viram demais Aqueles distritos que em outros tempos foram do valentão VoltaGrande Depois mesmo Goiás a baixo a vago A esses muito desertos com gentinha pobrejando Mas o sertão está movimentante todotempo salvo que o senhor não vê é que nem braços de balança para enormes efeitos de leves pesos Rodeando por terras tão longes mas eu tinha raiva surda das grandes cidades que há que eu desconhecia Raivaporque eu não era delas produzido E nave guei salaz Tem as telhas e tem as nuvens Eu podia lá torcer o azul do céu por minhas mãos Virei os tigres mas mesmo virei sendo o UrutuBranco por demais Somente que me valessem indas que só em breves e poucos na idéia do sentir uns lembrares e sustâncias Os que por exemplo os seguintes eram a cantiga de Siruiz a Bigri minha mãe me ralhando os buritis dos buritis assim aos cachos o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 742 existir de Diadorim a bizarrice daquele pássaro galante o manuelzinhodacroa a imagem de minha Nossa Senhora da Abadia muito salvadora os meninos pequenos nuzinhos como os anjos não são atrás das mulheres mães deles que iam apanhar água na praia do Rio de São Francisco com bilhas na rodilha na cabeça sem tempo para grandes tristezas e a minha Otacília No sirgo fio dessas recordações acho que eu bateava outra espécie de bondade Devo que devia também de ter querido outra vez os carinhos daquela moça Nhorinhá nessas ocasiões Por que será que aí eu não formei a clareza disso de a propósito Por lá adiante na vastança era rumo de onde ela agora morava Isso sim andadamente Mas não conheci e demos volta Tempos escurecidos O que meus olhos não estão vendo hoje pode ser o que vou ter de sofrer no dia depois damanhã Ao que inventei enquanto assim se vinha por pobres lugares aos poucos eu estive amaestrando os catrumanos o senhor está lembrado deles ensinando aqueles catrumanos para as coisas de armas do que houvesse de pior Eles já prometiam puxo eh burro só não gosta é de principiar viagens Aprovei de ver o Teofrásio principal deles apontando em homem malandro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 743 inocente com a velha garrucha que era a dele com os dois canos encavalados Mas que atirasse não consenti Zé Bebelo havia de admitir assim de se fazer excessos Ali quem se lembrava de Zé Bebelo eram minhas horas de muita inteligência Assim ele ainda vivesse certo havia de ter algum dia notícia do que eu estava executando que a gente trazia a Mulher com ela agarrada em mãos se ia necessitar o Hermógenes a dar combate Essa mulher conforme vinha num definitivo mau silêncio a cara desaparecida pelo xale verde escanchada em seu cavalo Tinham dado a ela um chapéudepalha de ouricuri por se tapar do forte sol baiano A mais dela não se ouviu queixa ou reclamação nem mesmo palavra O que eu desentendia nela era aquela suave calma tão feroz que seria aferrada em esperar essa capacidade Se o ódio só era que dava a ela certeza de si o ódio então era bom na razão desse sentido que às vezes é feito uma esperança já completada Deus que dele me livrasse Mas o homem em quem o catrumano Teofrásio com sua garrucha antiqüíssima apontou era um velho Desse eu digo salvei a vida Socorrido assim pelo fato deu não conseguir conhecer a intenção da existência dele sua razão de sua consciência Ele morava numa burguéia em choça muito de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 744 solidão entre as touças da semprevivaserrã e lustro das folhagens de palmeirapindoba Eu com outros tinha subido no tope do morro que era de espalhaventos De lá do alto a mente minha era poder verificar muitos horizontes E mire veja em quinze léguas para uma banda era o São Josezinho da Serra terra florescida onde agora estava assistindo Nhorinhá a filha de Ana Duzuza Assunto que na ocasião meu espírito me negou digo o dito Além além Dela eu ainda não tinha podido receber a carta enviada Para mim era só uma saudade a se guardar Hoje é que penso Nhorinhá namorã que recebia todos ficava lá era bonita era a que era clara com os olhos tão dela mesma E os homens porfiados gostavam de gozar com essa melhora de inocência Então se ela não tinha valia como é que era de tantos homens Mas no vir de cimas desse morro do Tebá quero dizer Morro dos Oficios redescendo demos com o velho na porta da choupã dele mesmo Homem no sistema de quasedoido que falava no tempo do Bom Imperador Baiano barba de piaçava goianobaiano O pobre que não tinha as três espigas de milho em seu paiol Meio sarará A barba de capinzal sujo e os cabelos dele eram uma ventania Perguntei uma coisa que ele não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 745 caprichou de entender e o catrumano Teofrásio que já queria se mostrar jagunço decisivo o catrumano Teofrásio bramou abocou a garruchona em seus peitos dele Mas que não deu tujo Esse era o velho da paciência Paciência de velho tem muito valor Comigo conversou Com tudo que em tão dilatado viver ele tinha aprendido Deus pai como aquele homem sabia todas as coisas práticas da labuta da lavoura e do mato de tanto tudo Mas agora que tanto aforrava de saber o derrengue da velhice tirava dele toda possança de trabalhar e mesmo o que tinha aprendido ficava fora dos costumes de usos Velhinho que apertava muito os olhos Seria velhacal Não fio E isto que retrato é devido à estúrdia opinião que divulgou em mim esse velho homem Que por armas de sua personalidade só possuía ali era uma faquinha e um facão cego e um calaboca Porrete esse que em parte ocado e recheio de chumbo por valer até para mortes E ele mancava estragado por tanto que a metade do pé esquerdo faltava cortado produção por picada de cobra urutu geladora se supõe Animado comigo em fim me pediu um punhado de sal grande regular e aceitou um naco de carnedesol Porque no comer de comum ele aproveitava era qualquer calango sinimbu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 746 ou gambás que jogando neles certeiramente o calaboca sempre conseguia de caçar Me chamou de Chefão cangaceiro Acabando que para me render beneficio de agradecimento ele me indicou muito conselhante que num certo resto de tapera de fazenda sabia seguro de um dinheirão enterrado fundo quantia desproposital Eu fosse lá ele disse eu escavasse tal fortuna que merecida para meus companheiros e para mim Aonde rumo indaguei por comprazer Ele piscou para o mato Por lá trinta e cinco léguas num Riacho dasAlmas Toleima Eu ia navegar assim para acolá passar matos furar a caatinga por batoqueiras por louvar loucura alheia Minha guerra nem não me dava tempo E mesmo se ele sabia assim e verdade fosse por que era que não ia muito pessoalmente cavacar o ouro para si Derri dele brando Por que é que se dá conselho aos outros Galinhas gostam de poeira de areia suas asas E o velho homem cujo Ele entendia de meus dissabores Eu mesmo era de empréstimo Demos o demo E possuía era meu caminho nos peitos de meu cavalo Siruiz Aleluia só E o velho no esquipático de olhar e ser qualquer coisa em mim ele duvidava dela Mas que é que era que é que era Eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 747 carecia de indagar E mesmo porque a chefe não convém deixar os outros repararem que ele está ansiando preocupação incerta tive de indagar leixo remediando com gracejo diversificado Mano velho tu é nado aqui ou de donde Acha mesmo assim que o sertão é bom Bestiaga que ele me respondeu e respondeu bem e digo ao senhor Sertão não é malino nem caridoso mano oh mano ele tira ou dá ou agrada ou amarga ao senhor conforme o senhor mesmo Respondeu com uma insensatez ar de ir me ferir por tanto jacaré já Respondeu apontando com o dedo para o meu peito Desgostou de meu debique Dele o dito eu não decifrava Sertanejo sem remanso Mas desabandonamos aquilo às pressas porque o velho assoava o nariz com todos os dedos de uma mão em modo que me deu nojo Descemos flauteando o resto do morro Quando chegamos cá no acampo as ramas dárvores já iam pegando o pó da noite Ermo meu Do que hoje sei tiro passadas valias Eli fome de bacurau é noitezinha Porque o tesouro do velho era minha razão Tivesse querido ir lá ver nesse RiachodasAlmas em trinta e cinco léguas e o caminho passava pelo São Josezinho da Serra onde assistia Nhorinhá lugarejo ditoso Segunda vez João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 748 com Nhorinhá sabível sei então minha vida virava por entre outros morros seguindo para diverso desemboque Sinto que sei Eu havia de me casar feliz com Nhorinhá como o belo do azul vir aquémde Maiores vezes ainda fico pensando Em certo momento se o caminho demudasse se o que aconteceu não tivesse acontecido Como havia de ter sido a ser Memórias que não me dão fundamento O passado é ossos em redor de ninho de coruja E do que digo o senhor não me mal creia que eu estou bem casado de matrimônio amizade de afeto por minha bondosa mulher em mim é ouro toqueado Mas se eu tivesse permanecido no São Josezinho e deixado por feliz a chefia em que eu era o UrutuBranco quantas coisas terríveis o ventodas nuvens havia de desmanchar para não sucederem Possível o que é possível o que foi O sertão não chama ninguém às claras mais porém se esconde e acena Mas o sertão de repen te se estremece debaixo da gente E mesmo possível o que não foi O senhor talvez não acha Mas e o que eu estava dizendo mas mesmo pensando em Nhorinhá por causa Dói sempre na gente alguma vez todo amor achável que algum dia se desprezou Mas como jagunços que se era a gente rompeu adiante com bons cavalos novos para retroco Sobre os gerais João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 749 planos de areia cheios de nada Sobre o pardo nas areias que morreram sem serras de quebravento Com a campina roxa brandamente vagarosa por onde fomos tocamos querendo o poente e tateando tudo chapada sem lugar de fim Só os punhados daquele capim de lá com sua magra dureza O para bem valer era que agora quando alguém com o nosso brabo cortejo deparava seriam gente já distante desconhecida dela e que não diziam mais Aquela é a dona de um seô Hermógenes que estão remetendo para as enxovias Essa mesma não dava trabalhos a mulher ocultada no xale verde como dizer A mulher sem resgate isto é dizer que ia para morte de outro homem à sina sorte Eu tinha era receio de que ela adoecesse Dei as todas ordens de bom tratamento Tanto a tanto decidi disposto que não se entrasse com bruteza nos povoados nem se amolasse ninguém sem a razoável necessidade Também pelo que aquilo não me dava glória e eu ia para um grande fim Até estive nervoso Desde as crondeúbas nascidas em extraordinárias quantidades e os montes de areia quase alvos com as seriemas por cima perpassando e o mais tudo eu tinha avistado Que vi córrego que corta e salga e comi coco de ouricuri Desordens João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 750 não me tentavam o assaltar e o rixar Agora para essas e outras jagunçagens assim mesmo como para pautear àtoa de abocabaque eu não tinha interesse de tempo Não por moleza ou falta de hombridade ah não tanto em que durou minha chefia e acho mesmo que de dantes eu agüentei tudo o que é cão e leão Corrijo e digo só o frio é que mal tolerei Quando geava dormi deveras estreito entre diversas fogueiras O frio desdiz com jagunço A gente indo ali mesmo nos altos tabuleiros enchemos surrões com talos de caneladeema boa acendedora de fogo A caneladeema de qualidade crescida mais de metro acertante Depois da madrugada de guardado eu bebia um chá de jurema me restabelecesse todos os ânimos Daí diante melhor foi desamainando a friagem das madrugadas E já fazia tempo que eu não passava navalha na cara contrário de Diadorim Minha barba luzia grande e preta conferindo conspeito isto eu mesmo podia fácil ver mirando na folha da água quando meu cavalo Siruiz se debruçava para beber em qualquer riachinho da largura de duas braças Estórias Consabido que meus homens por sincera precisão de mulher armavam querer de trazer umas delas pegadas pelas beiras de estradas me vinham com lelê disso O que eu enérgico debelei e reprovei não se estava ainda em ponto para esse João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 751 desmazelo de bempassar Pelo mal de que essas mulheres não davam para ser ao menos uma para cada um e por via de jus dessas condições a companhia delas podia estragar a lei do viver da gente com arrelias de vuvu e rusgas O que ajuntávamos trazendo era cada bom cavalo que se pegasse E tocamos conosco cinqüentaetantas reses de gado baiano àtoa Por campos gramados quando havendo isso ia mais sem estorvo em conformes Depois piorou Mas outras coisas melhoraram O senhor tenha na ordem seu quinhão de boa alegria que até o sertão ermo satisfaz Digo mesmo de meu expor falante de mulheres Quando se viaja varado avante sentado no quente acaba o coxim da sela fala de amores E eu surgia em sossego assim passo compasso o chapadão tão alargante Lá o ar é repousos Os Hermógenes andavam por bem longe E nunca que pelotão de soldados havia de ali vir por cima de nossas batidas Sossego traz desejos Eu não lerdeava mas queria festa simples achar um arraial bom em feiradegado Queria ouvir uma bela viola de Queluz e o sapateado de pés dançando Mas por lei eu carecia de nudezes de mulher Nesses dias moderei minha inclinação Baixei ordens severianas que todos pudessem se divertir saudavelmente com as mulheres bem dispostas não deixando no vaivigário mas não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 752 obrassem brutalidades com os pais e irmãos e maridos delas consoante que eles ficassem cordatos Estatuto meu era esse Por que destruir vida àtoa àtoa de homem são trabalhador Zé Bebelo não teria outro reger E vejo pergunto donde era que estava então o demo perseguição Devo redizer eu queria delícias de mulher isto para embelezar horas de vida Mas eu escolhia luxo de corpo e cara festiva O que via com um desprezo era moça toda donzela leiga do sãogonçalodo amarante e mulher feiosa muito mãedefamília Essas as bisonhas eu repelia Mas daí então me deram notícia do Verde Alecrim Joguei de galope Torei o cavalo para lá Guia era um exato rapaz vaqueiro goiano do Uruú Esse me discriminou o VerdeAlecrim formava somente um povoado sete casas por entre os pés de piteiras beirando um claro riozinho Meiadúzia de cafuas coitadas sapé e taipade sebe Mas tinha uma casa grande com alpendre as vidraças de janelas de malacacheta casa caiada e de telhas de verdade essa era a das mulheresdamas Que eram duas raparigas bonitas que mandavam no lugar aindas que os moradores restantes fossem santas famílias legais com suas honestidades Cheguei e logo achei que lugar tal devia era de ter nome de Paraíso João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 753 Antes primeiro pensei em todos para o justo quinhão porque eu era chefe Reparti o pessoal em grupos determinando que saíssem indo adiante com via por trechos remarcados Pois mesmo a poucas léguas de lá aonde eu eles iam achar por um exemplo dois arraiais o Adroado e o São Pedro e até o BarroBranco que era um vilório Entanto que Diadorim conforme conveniente enviei também expresso ele comandasse os guias tenteadores Tudo pronto vim acompanhado só com uma guarda de dez homens O que eu não disse que o VerdeAlecrim ficava em aprazível fundo no centro de uma serra enrodilhada Dum alto se via duma olhada e olhar Esporeei desci de batida Aí cheguei bem de mão Meus homens deixei que fossem para as casas domésticas conversar casadas e suas crias Eu apeei na das duas Escolhi assim Bom quando há leal é amor de militriz Essas entendem de tudo práticas da belavida Que guardam prazer e alegria para o passante e gostar exato das pessoas a gente só gosta mesmo puro é sem se conhecer demais socialmente Eu chegasse de noite e elas estavam com casa alumiada para me admitir Como que o amor geral conserva a mocidade digo de Nhorinhá casada com muitos e que sempre amanheceu flor E isto a torto digo porque as duas não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 754 se comparavam com Nhorinhá não davam nem para lavar os pés dela Mas que porém beleza a elas também não faltava isto sim Uma MariadaLuz era morena só uma oitava de canela Os cabelos enormes pretos como por si a grossura dum bicho quase tapavam o rosto dela mesma aquela nhazinhamoura Mas a boquinha era gomo ponguda e tão carnuda vermelha se demonstrava Ela sorria para cima e tinha o queixo fino e afinado E os olhos águamel com verdolências que me esqueciam em Goiás Ela tinha muito traquejo Logo me envotou Não era siguilgaita simples A outra Hortência meã muito dindinha era a Ageala conome assim porque o corpo dela era tão branquinho formoso como frio para de madrugada se abraçar Ela era ela até no recenso dos sovacos E o fiodolombo mexidos em curvos de riacho serrano desabusava Comprimento exato dele assim o senhor medir nunca conseguia No meio delas duas juntamente eu descobri que até mesmo meu corpo tinha duros e macios Aí eu era jacaré fui seja o que sei No meio daquela noite andei com fome não quis cachaça Me descansei comi uma coalhada muito fria Comi bolo com João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 755 cidrão Bebi bom café adoçado com um açúcar de primeira branco igual Porque as duas minhasdamas eram ricas dizer deviam de ter muito dinheiro de prata aforrado Por lá na casa delas era ponto de pernoite de lavradores de posses feito estalagem com altas pagas Mas as duas mesmas provinham de muito boas famílias a Ageala Hortência era filha de grande fazendeiro paranãnista falecido Eram donas de terras possuíam aquelas roças de milho e feijão nas vertentes da serra nos dependurados Ali mesmo no VerdeAlecrim delas era toda a terra plantável Por isso os moradores e suas famílias serviam a elas com muita harmonia de ser e todos os préstimos obsequiando e respeitando conforme eu mesmo achei bem um sistema que em toda a parte devia de sempre se usar Como se deu que enquanto se bebia o café escutamos uma tosse da banda de fora E era do homem que eu tinha deixado de vigia O qual tinha acontecido de ser o Felisberto o que por ter uma bala de cobre introduzida na cabeça vez em quando todo verdeava verdejante como já foi dito E então elas duas pensaram em se mandar o Felisberto entrar para provar do café também dando que não é justo ficar um desconfortado no sereno enquanto os outros se acontecem Sendo as duas o senhor vê pessoas muito bondosas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 756 Assenti boamente nisso em que elas estavam com a razão Só que pelo respeito eu sendo Chefe não ia poder deixar o Felisberto me avistar assim perfeito descomposto nu como eu estava MariadaLuz aí trouxe uma roupagem velha dela que era para eu amarrar na cintura tapando as partes Experimentei Daí entendi o desplante me brabeei com um repelão arredei a mulher e desatei aquilo joguei longe Tornei a vestir minhas roupas botei até jaleco Elas melhor me riam Eu era algum saranga Eu podia dar bofetadas não fosse a só beleza e a denguice delas e a estroina alegria mesma que meio me encantava O Felisberto entrou saudou comeu e bebeu Naquela ocasião ele estava passando bem normal Só assim ao silenciosamente Entendo que mais fosse para o galhardo que para o semgraça rapaz desses de que as mulheres se arregalam Em ver seria mais moço do que eu mais calmo Não quisesse ardores com damas quisesse os poucos recantos para devagar se resignar Não cobiçou a qual ou agrados Nem na hora reparei que a MariadaLuz com ele se olhasse Só bem o que ela refletiu quando o Felisberto comido e bebido tornou a sair ela me disse que se eu no caso dúvida não pusesse o Felisberto podia com ela se introduzir no outro cômodo por variação João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 757 dumas duas horas constante que nesse breve prazo eu ainda restava felizardo com a Ageala Hortência Danado eu disse que não e ela Tu achou a gente casual aqui no afrutado Tu veio e vai fortunosamente Tu não repartindo tu tem assim ela me modificou A doidivã era uma afiançada mulher No sertão tem de tudo E eu tinha falado meu não era mais somente porque não se pode falhar na regra de só se pandegar com sentinela posta Eu era o chefe O Felisberto era sentinela Aquela casa de lugar as delícias que estavam eu melhores neste mundo não achasse pensei Eu quisesse reinar lá pelos meus prazeres O senhor sabe eu chefe o outro sentinela Esse Felisberto pelo jeito ia viver tão escasso tempo podia bem que nem fizesse mais conta do ofício Sendo o mais que pensei eu sentinela O senhor sabe Ah ainda que no nocivo desses andares eu conseguia meditar minhamente ah eu não tive os chifreschavelhos nem os pés de cabra Ali pelos meus prazeres eu quisesse me reinar descambava para fecho de termo A morte estava com esse Felisberto coitado desgraçado A coisa estranha que uma bala de arma tinha entrado nos centros da cabeça mesma dele recessos da idéia dele de lá de vezes em vezes perturbava com excessos daí um dia em curto era a morte fatal Agora podia João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 758 bem ser que ele quisesse largar de mão de ser jagunço Aquele fato daquela bala entrada depositada no dentro de um e que não se podia tirar de nenhum jeito nem não matava de uma vez mas não perdoava na data me enticava Aquele homem mes mo com a valia e bizarria dele eu pudesse querer mais no meu bando As duas mulheres belezas assins dando delícias bilistrocas Outra idéia eu tive Só eu sei eu sentinela Só não posso dar uma descrição ao senhor do estado que eu pensei achei só sei em bases Amanheceu claro Mas MariadaLuz não era logrã isso conheci no ver como ela olhou para o Felisberto com modos mimosos Quem sabe ele havia de gostar de ficar para sempre permanecido ali Perguntei O Felisberto se riu tão incerto feliz que eu logo vi que tinha justo pensado E elas demais Deixa o moço que nós prometemos Tomamos bom cuidado nele e tudo regalado sustento Que de nada ele háde nunca sentir falta Tanto elas disseram que tudo transformavam Mulheres E o Felisberto ia permanecer a siso arrecadado na sujeição desses deleites podia ter um remédio de fim de vida melhor Em tal abracei o companheiro e abracei as duas dando para sempre a minha despedida e fazendo mostra de falar de farto Mulheres sagazes Até mesmo que nas horas vagas no lambarar as duas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 759 viviam amigadas uma com a outra se soube O que quando eu já ia saindo acharam de me dizer Isto Mas você já vai mesmo nego Visitademédico Como não pude sofrear meu rir Reuni meus outros meus homens Abalei de lá Bem que eu sentia eu exalava uma certa inveja do Felisberto Mas aí eu estimei o Felisberto como se ele fosse um meu irmão Como Céu há com esplendor e aqui beleza de mulher que é sede Deus que abençoe muito aquelas duas A pois me ia e elas ficavam as flores naquele povoadozinho como se para mim ficassem na beira dum mar Ah eu sentinela o senhor sabe Assim eu queria me esquecer de tudo terminada aquela folga O dever de minha hombridade Aí mais quando tornei a rever Diadorim constante vi que andava à minha espera com os companheiros num papuã matando perdizes E encaminhei para Diadorim com a meiadúvida Eu não tinha razão Porque Diadorim já sabia de tudo Como sabia Ah o que era meu logo perdia o encoberto para ele real no amor Riobaldo você vadiou com as do VerdeAlecrim Você está comprazido ele de franca frente me perguntou Eu tibes Corri mão por meu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 760 peito Mas admirei que Diadorim não estivesse jeriza Mesmo ele ao leve se riu e o modo era de malina satisfação Você já está desistido dela em fim ele indagou Hem Hem Dela quem dela Tu significa essas velhacas palavras eu só fiz que respondi redatado Mediante porque aí logo entendi no instante E ele cerrou a conversa Porque eu entendi que a referida era Otacília Minha noiva Otacília tão distante o belo branco rosto dela aos poucos formava nata dos escuros Tudo isto para o senhor meu senhor não faz razão nem adianta Mas eu estou repetindo muito miudamente vivendo o que me faltava Tão minhas coisas eu sei Morreu a lua Mas eu sou do sentido e reperdido Sou do deslembrado Como vago vou E muitos fatos miúdos aconteceram Conforme foi Eu conto o senhor me ponha ponto Pelo que do trecho voltamos Para mais poente do que lá só uruburetamas E o caminho nosso era retornar por essas gerais de Goiás como lá alguns falam O retornar para estes gerais de Minas Gerais Para trás deixamos várzeas cafundão deixamos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 761 fechadas matas O joãocongo piava cânticos triste lá e ali em mim Isto é minto hoje é triste naquele tempo eram as alegrias Suaçuapara corria da gente com a cabeça empinada quase nas costas protegendo para não prender nas árvores sua galhadura dele Galheiro suaçupucu com sua fêmea suaçuapara Um dia vez se matou uma sucuri de trintaeseis palmos que de ar engravidava Dava lugares em que de noite se estava de repente no cabo do revólver ou em carabinas mesmo e carecia de se acender maiores fogueiras porque no cheio oco do escuro podia vir cruzar permeio à gente algum bicho estranhão formas de grandes onças que rodeando esturravam ou a mãedalua de vôo não ouvido corujante ou de supetão às brutas com forte assovio vindo do lado do vento algum macho danta cavalorão E foi aí que o Veraldo que era do SerroFrio reconheceu uma planta que se chamasse guiatorto se certo suponho mas que se chamava candeia na terra dele a qual se acendia e prendia em forquilha de qualquer árvore ela aí ia ardendo luminosa clara feito uma tocha Atravessamos campos Dias tão claros céu de toda altura Assaz voavam eram os gaviões E Goiás estava pondo fogo nos seus pastos Arte que fumaçava fumaceava o tisne O sol roxo requeimão Tive uma saudade de outras audácias Morreu o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 762 Pitolô por bala de arma que disparou sem ser por querer de ninguém caso muito acontecível Num sítio PadrePeixoto morreu o Freitas Macho também de uma dor forte no vão da barriga bandadamãodireita remédio de chá nele não produziu o vero efeito Alaripe teve uma carregaçãodosolhos O Conceiço destroncou o braço deu trabalho e dores para se repor no lugar Advertido que antes dessas passagens assim não lhe vinha minuciando e que elas corretamente sempre se dão mas que eram somente as mortes sérias serenas doutras desgraças diversas ou doenças para molestar E dos fazendeiros remediados e ricos se cobrava avença em bom e bom dinheiro aos cinco dez doze contos todos tinham mesmo pressa de dar Com o que enchi a caixa E abriam para a gente pipotes de cachaça a qual escanceavam Se jantava banquete depois um coreto se cantava As vezes não sei porque eu pensava em Zé Bebelo perguntava por ele em outros tempos e ninguém conhecia aquele homem lá ali O de que alguns tives sem notícia era da fama antiga de Medeiro Vaz Daí me dava raiva de ter pensado refletido em Zé Bebelo Bobéias E andantemente só me engracei foi duma mulher casada essa que com tremor enorme me desgostou neste responder Ai querendo Deus que o meu marido quiser Ao que eu atalhei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 763 Ah pois nem eu não quero mais não minha senhora dona Não estou de maneira E sem ser de propósito até botei mau olhado num menino pequeno que estava perto Que assim viemos Mas conto ao senhor as coisas não conto o tempo vazio que se gastou E glose manter firme uma opinião na vontade do homem em mundo transviável tão grande é dificultoso Vai viagens imensas O senhor faça o que queira ou o que não queira o senhor todaavida não pode tirar os pés que háde estar sempre em cima do sertão O senhor não creia na quietação do ar Porque o sertão se sabe só por alto Mas ou ele ajuda com enorme poder ou é traiçoeiro muito desastroso O senhor Tomei mais certeza da minha chefia Quer ver que eu tinha deixado de parte todas as minhas dúvidas de viver e que apreciava o sóestar do corpo no balanço daqueles dias temperados tão bem quando o céu varreu Dias tão claros Tanto que as cigarras chiavam em grosas e de que talarte valessem por um atraso das chuvas do ano alguns já queriam desejar Não foi Mas eu cria por mim nas melhores profecias E sempre dei um trato respeitável amistoso aos homens de valia mais idosa vigentes no sério de uma responsabilidade mais costumeira João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 764 Esses eram João Goanhá Marcelino Pampa João Concliz Alaripe e outros uns restantes que mereciam de si e não me esqueci das praxes Tirante que não pedi conselhos Mas não houvesse mas pedir conselho é não ter paciência com a gente mesmo mal hajante Nem não contei meus projetados O Rio Urucuia sai duns matos e não berra desliza o sol nele é que se palpita no que apalpa Minha vida toda E refiro que fui em altos minha chefia Diadorim mesmo mal me entendeu Qual que recordo foi num durante de tarde a incertas horas quando se vinha por um selado estirão escampante Nós dois em dianteira par de homens um diabo de calor e os cavalos pisavam légua destinada de cristal e malacachetas Céu e céu em azul ao deusdar O senhor vá ver em Goiás como no mundo cabe mundo E o que Diadorim me disse principiou deste jeito assim que perguntou esconso se eu queria aquela guerra completamente Tal achei áspero que ele me condenava o vir dando tantas voltas em vez de reto para topar o inimigo ir Remeniquei Uai Diadorim pois você mesmo não é que é o dono da empreita e mais meio debiquei com estas Que eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 765 vencendo vou é menos feito GuydeBorgonha Acho que as palavras que eu disse agora não estou trastejando Mas Diadorim repuxou freio e esbarrou e com os olhos limpos limpos ele me olhou muito contemplado Vagaroso que dizendo Riobaldo hojeemdia eu nem sei o que sei e o que soubesse deixei de saber o que sabia Demorei que ele mesmo por si pudesse pôr explicação E foi ele disse Por vingar a morte de Joca Ramiro vou e vou e faço consoante devo Só e Deus que me passe por esta que indo vou não com meu coração que bate agora presente mas com o coração de tempo passado E digo Afirmo que não colhi a grã do que ele disse porque naquela hora as idéias nossas estavam descompassadas surdas um do outro a gente desregulava E o tom mesmo de sério que ele impunha rumou meu pensamento para outros pontos o Urucuia lá onde houve matas sem sol nem idade A MatadeSãoMiguel é enorme sombreia o mundo E Diadorim podia ter medo duvidei Eu sempre sabia um dia o medo consegue subir faz João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 766 oco no ânimo do mais valente qualquer Com tanto eu fui e disse Tudo na vida cumpre essa regra Duvidei pouco Diadorim não temia O que ele não se vexou de me dizer Menos vou também punindo por meu pai Joca Ramiro que é meu dever do que por rumo de servir você Riobaldo no querer e cumprir Nem considerei É o Hermógenes tem de acabar eu disse Diadorim ia ter certas lágrimas nos olhos de esperança empobrecida Me mirava e não atinei Será que até eu achasse uma devoção dele merecida trivial Certo seja Não dividi as finuras Mas também afiguro que responder mais não pude por motivos de divertência Qual que na hora deu de dar diante um desvôo de tanajuras que pelas grandes quantidades delas desabelhadas foi coisa muito valente para mim foi o visto nunca visto em riscos zunindo como enchiam o ar caintes então porque a lei delas é essa como porque o corpo traseiro pesa tão bojudo ovado bichão maduro elas não agüentam o arco de voar iam semeando palmos de chão de preto em acobreadas e tudo mesmo cheirava à natureza delas cheiro cujo que de limão ruivo que se assasse na chapa João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 767 Bagos dessas muito mundialmente Caso que os cavalos se espantavam uns na só cisma até refugando E o menino Guirigó de ver mais que todos tocou cá para adiante com gritos e arteirices tão entusiasmável como tanto aprovei porque o menino Guirigó do Sucruiú eu tinha botado viajante comigo era mesmo para ele saber do mundo Mas o esbagoar estirante das tanajuras vinha para toda parte mesmo no meio da gente chumechume fantasiado duma chuva de pedras e elas em tudo caíam e perturbavam nos ombros dos homens e no pêlo dos animais Como digo que eu mesmo a tapas enxotei muitas e ou tras que depois tive de sacudir fora da croa de meu chapéu por asseio Içá savitu já ouvi dizer que homem faminto come frita com farinhas essa imundície E os pássaros eles sim gaviãozinho que no campo esmeirinhavam havendo com o que encher os papos Mas bem porém que cada tanajura mal ia dando com o chão no desabe sabia que tinha de furar um buraco ligeirinho e se sumir desaparecida na terra sem escolha de sorte privas de suas asas que elas mesmas já de si picavam desfolhadas feito papelzinho Isso é dos bichos do mundo uso Mas então quando mirei e não vi Diadorim se desaportou de meus olhos Afundou no grosso dos outros Aide hei e eu tinha mal entendido João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 768 E o senhor tenha bons estribos que informo que o que disse se deu bem em antes dele Diadorim ter tido a conversa com a mulher do Hermógenes Que agora do que sei vou tosquejar Como de fato desamarrou o tempo Formou muita chuva Com assim emendados chovidos três dias então certificamos de permanecer esse tempo em prédio e enchemos a Fazenda Carimã que era de um denominado Timóteo Regimildiano da Silva do Zabudo no vulgar Esse constituía parentesco proximado com os Silvalves paracatuanos cujos tiveram sesmarias na confrontação das divisas das duas bandas iguais Do Zabudo o senhor preste atenção no homem para ver o que é um ser esperto Primeiro encontramos de repente com ele quando se ia por um assente chapadazinha dessas de capim fraco Conciso já principiava a chuviscar e eu estava pensando que por ali menos longe algum rancho ou alguma casa de sitiante havia de vagar Nessa mesma horinha o tal se apareceu Conforme vinha num cavalo baio com uma daquelas engraçadas selas cutucas que eles usam e introduzido em botasdemontar muito boas dessas de couro de sucuriju de que eles faziam antigamente No natural que foi ele ver a gente e levou choque João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 769 Instantezinho porém se converteu Isto que se desapeou ligeiro e tirou o chapéu com cortesia mor com gesto de braço e manifestou Senhores meus cavaleiros podem passar sem susto e com gosto que aqui está é um amigo Amigo de quem eu revidei Vosso meussenhor cavaleiro Amigo e criado Esperança dele era ver a gente pelas costas Com ele apertei aonde que morasse Lá daquela banda meussenhor Sitiozinho raso outrarte ele respondeu nhento pasmado Atalhei A pois pra lá vamos adonde menos chova O senhor mostre Aí ele remudou os modos falando em muito aprazimento em honras de sinceridade A fazenda era ali só a uns passos Assim ele já se astuciava Do Zabudo homem somítico muito enjoativo e sensato Requeri dele o prêmio que marquei em arras de sete contos e ele se desesperou conforme caretas e suas costas das mãos mesmas uma e depois a outra diversas vezes ele beijava Sempre gemendo que não e que sim pediu vênia de me noticiar como os negócios da lavoura para ele nos derradeiros três anos andavam João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 770 desandando com peste que no gado deu e redeu e praga no canavial por via dela nem fervia mais safra E tudo que falava explicava e redizia mesmo se fiou de querer me levar debaixo de temporal para exemplificar minhas vistas com o pejorativo de suas posses Por causa da caceteação concedi rebates acabei deixando o estipulado em trêscontosquinhentos e também por receio de se pegar em mim a nhaca daquele atraso Se bem que no repleto de dinheiro ganho goiano como já se estando eu descarecia de sistema de bruteza com ninguém E mesmo se traçou que o sustento nosso ele por metade fornecia gracioso sem estipêndio escatimava mas dava Ao tanto que o resto eu pagava caro e os percebidos certas dúzias de ferraduras o milho para os animais umas mantas de toicinho e dez quartilhos de cachaça que em justo dizer nem prestava Bom lá era o fumo de rolo E já dava de ser como desemboque eu pagasse a ele só para se comportar calado Por fim penso a falha nossa lá para aquele doZabudo ficou quase de graça E dito e referido que chovia em Goiás todo assistimos dentro de casa só saindo no quintal para chupar jabuticabas A gente tinha baralhos se jogou roubamonte e escopa porque truque eu não consentia por achar que me faltava floreado rompante para os motes e gritos que nesse endiabrado jogo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 771 compertencem e mesmo por achar vadiado para a minha chefia Então bem enquanto a gente formava essa distração o do Zabudo ia e vinha flauteando excogitando decerto para ratinhar e sisar a gente com mangonhas outras velhaquices choradas E foi de repente ele se chegou com esta que não se esperava por barato nem caro Que a nhã senhora aquela suplicava o favor dum particular com o moço chamado Reinaldo Essa nhã refiro era a mulher do Hermógenes que em reserva fechada se tinha no quartodooratório E Diadorim saber o senhor tem era o conhecido por Reinaldo Que me invocou o senhor vai dizer me causou espantos Haviade Eu estava na saladejantar jogando com João Goanhá João Concliz e Marcelino Pampa Alaripe com a baciinha de lixívia em areia e com estopa na soleira da porta para o quintal acendrava as armas Ele falou Deus que olh lá que se o Reinaldo não dá cabo da criatura Descontamos Eh ela será que faz mandraca João Goanhá alvitrou com essas risadas Ara para obrar bom feitiço que valha dizse que só mesmo negra ou negro Isto que Marcelino Pampa deu de opinião enquanto pegava o setebelo com o setedepaus Eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 772 joguei e João Goanhá somou seis e três na mesa conforme pegou com um valete e escopou Diadorim se tinha encaminhado para onde estava a mulher para ir ouvir o que ela queria que ele ouvisse Tocou minha vez de baralhar e repartir cartas Ou seria algum pedido que ela tivesse de fazer a ele bem Daí João Goanhá esteve dizendo que a mulher rogava era por sua liberdade E eu desconversei observando casual primeiro a respeito do luxo de tantos anéis que João Goanhá gostava de botar em cheios dedos e depois chamei atenção para as goteiras abertas na telhavã daquele grande cômodo que se carecia de dispor umas latas em diversos pontos e até uma gamela no meio da mesa fim de se aparar águas da chuva Mas mesmo por mim eu já tinha perdido a simpatia no divertimento do jogo e me ergui de lá fui ver a coisa nenhuma no alpendre onde até homens dormiam madraços aborrecidos com um chover tão constante Diadorim não vinha não dava de sair do quartodo oratório E quando foi que veio não me contou nada O que disse comum Ah ela só chorou mágoas Não perguntei passo Devido que não perguntei logo à primeira depois foi não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 773 ficando bem para o meu brio o perguntar Diadorim se atarantava quieto nem não era correto o que ele estava fazendo escondendo fatos Palavras que vieram a gume em minha boca foram estas Que eu não gostava de hipocrisias Pensei e não disse Eu podia duvidar das ações de Diadorim Lá ele alguma criatura para traição Rosmes Idéia essa não aceitei por plausível nenhum Mas de motivo como me desgostei assim resolvi a saída da gente dali da Carimã no instante mesmo e dei ordem Fossem trazer os cavalos e arrear atrás do tempo que fizesse enxurradas tais nuvens grossas céu nubloso e trovão em ronco Chuvas com que os caminhos se afundavam E assim cumpriram Mas aí nem bem os cavalos vieram no curral se deu uma estiada muito repentina por um montão de vento O céu firmou e sol com todos os bons sinais Ante o que por isso e por tanto a admiração do pessoal foi de grandes mostras E eu vi que menos me entendiam mais me davam os maiores poderes de chefia maior Só o doZabudo saiba o senhor parava fora da roda sem influência nenhuma feito um tratante Saiba o senhor que assim ele ainda me veio com visagens e embaraços por amortecer a paga pedindo ágios de calote e prazos mercantis Agora mais João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 774 que tudo saiba o senhor uma coisa a que ele para os fins executou na hora da confusão da saída no zafamar Pois de repente trouxe e ofertou a Diadorim de regalo uma caixeta da boa e melhor marmelada goiana dada a valores Ademais o senhor prove o de que demais gostará A de Santa Luzia perto desta perde por famosa Dando aquilo a Diadorim ele não queria disfarçado me agradar por vantagens Se sei O que é que estivesse adedentro das idéias daquele homem O jeito estúrdio e ladino de olhar a gente outrolhos e que na hora não me fez explicação Sendo que mediado esse obséquio a Diadorim ele conseguiu mesmo me adular Saranga fui contracontas contra aquele paranãnista lordaço Ele se saiu quite por pouco não pegou até dinheiro meu emprestado Mesmo pelos cavalos e burros que cedeu recebeu igual quantidade dos nossos bem melhores somente que estavam cansados Teve até permissão de conservar o dele próprio o baio que disse ser de venerada estimação por herdado pessoal do pai Nele amontado prazido naquela dita cutuca pandegamente pois ainda veio por quarto delégua fazendo companhia à gente Coisa assim não se vê Tanto ambicionava que nem temia Sempre me olhava finório com as curiosidades E assim Agora o senhor prestou toda a atenção nesse homem doZabudo O diabo dele O senhor me João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 775 diga o senhor desconfiou de alguma arte concebeu alguma coisa Sumimos de lá Em cinco léguas vi o barro se secar O campo reviçava Mas concedi que a viagem viesse à branda serenada Queria quis O burrinho de Nosso Senhor Jesus Cristo também não levava freio de metal Isso na ocasião emendo que não refleti Razão minha era assim de ter prazos para que meu projeto formasse em todos pormenores Mas isto afianço ao senhor também eu não sentia açoite de malefício herege ne nhum nem tinha asco de ver cruz ou ouvir reza e religião Mesmo me sobrasse tempo algum de interesse para reparar nesses assuntos Eu vinha entretido em mim constante para uma coisa que ia ser Queria ver ema correndo num pé só Acabar com o Hermógenes Assim eu figurava o Hermógenes feito um boi que bate Mas por estúrdio que resuma eu a bem dizer dele não poitava raiva Mire veja ele fosse que nem uma parte de tarefa para minhas proezas um destaque entre minha boa frente e o Chapadão Assim neblimneblim mal vislumbrado que que um fantasma E ele ele mesmo não era que era o realce meu eu carecendo de derrubar a dobradura dele para remediar minha grandeza façanha E perigo não vi como não estava cismando incerteza Tempo do verde Êpa eu ia erguer mão e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 776 gritar um grito mandante e o Hermógenes retombava Onde era que estava ele Sabia não sem nenhuma razoável notícia mas notícia que se vai ter amanhã hoje mesmo ela já se serve Sabia sei Como cachorro sabe Assim o que nada não me dizia isto é me dizia meu coração que o Hermógenes e eu sem dilato a gente ia se frentear em algum trecho nos Gerais de Minas Gerais Eu conhecia A pressa para quê Ao ir ao que ir aí contra a Serra das Divisões ou sobre o Rio São Marcos Estradareal estrada do mal Como de fato aquilo estava impossível breado de barro alto num reafundo num desmancho que comia com engolo as ferraduras mesmo cravadas novas e assujeitava a gente a escorregão e tombos teve animal que rachou canela quebrou pescoço Este caminho tem tripas se dizia bem Às loucuras E a jorna não rendia não se podia deszelar o pisar Retardamos Retardar mesmo se me dava de agradável Eu ia numa caçada com o grande gosto ah Pois não era Mais tempo se gastou esbarrados em casasdefazendas ou em povoados Melhor por lá também haviam de aprender a referir meu nome De em desde bem que já cumpriam de me recompensar e me favorecer pela vantagem porque eu ia livrar o mundo do Hermógenes O Hermógenes pelejei para relembrar as feições João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 777 dele Achei não Antes devia de ser como o pior odiado com mira na gente Diadorim pensei assopra na mão a tua boa vingança O Hermógenes mal sem razão Para poder matar o Hermógenes era que eu tinha conhecido Diadorim e gostado dele e seguido essas malaventuranças por toda a parte Retardamos Até que tomando sazão boa no veranico seguimos em fim estrotejando Parávamos léguas perto das divisas mandei ir vigias e dianteiros Conferi meu povo nas armas Tudo prazia O barranco mineiro ou o barranco goiano Da beira de Minas Gerais vinha um mato vagaroso E piorou um tico o tempo em Minas entramos serra acima com os cavalos esticados Aí o truvisco e buzegava O ladeirão ruim rampa mas pegamos a ponta da chapada Foi ver que com o vento nas orelhas o vento que não vareia de músicas Tudo consabia bem isto sim digo no remedido do trivial espaço de chuva a gente em avanço por esses tabuleiros fazia rio por debaixo entre as pernas de meu cavalo Sertão velho de idades Porque serra pede serra e dessas altas é que o senhor vê bem como é que o sertão vem e volta Não adianta se dar as costas Ele beira aqui e vai beirar outros lugares tão distantes Rumor dele se escuta Sertão sendo do sol João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 778 e os pássaros urubu gavião que sempre voam às imensidões por sobre Travessia perigosa mas é a da vida Sertão que se alteia e se abaixa Mas que as curvas dos campos estendem sempre para mais longe Ali envelhece vento E os brabos bichos do fundo dele Com trovôo Trovoadão nos Gerais a ror a rodo Dali de lá eu podia voltar não podia Ou será que não podia não Bambas asas me não sei Bambas asas Sei ou o senhor sabe Lei é asada é para as estrelas Quem sabe tudo o que já está escrito tem constante reforma mas que a gente não sabe em que rumo está em bem ou mal todootempo reformando Meus homens adianteiros retornaram que vindos com uma notícia os Hermógenes bando enorme tocavam meio para cá decerto também já cientes de meu caminhar Era o devido Se estremeceu de pressas Vim Viemos Trastopamos com uns campeiros e outros que vaquejavam ou que levando gado de volta para o caatingal por não morrerem suas reses todas de pastar o capim novo dos Gerais que cresce cheio de areia Mas esses não sabiam de nada coisíssima A gente contornou por se chegar primeiro no Nestor na VeredaMeã e no Coliorano depois do Mujo VãozinhodoMujo esse acho que era certo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 779 também o nome Mas o Coliorano morava num buritizal de lagoa e fazia chapéusdepalha fabricados dos melhores Nele e no Nestor carecia de se chegar em antes do Hermógenes que lá se tinha coito de munição Contornamos Muito brejo e sapal já estavam de volta Os rios andando sujos e umbuzeiros dando flor Mas a cheia de todo rio carregava muito cuspe de espuma por cima sinal de que ela ia aumentando com maiores chuvas nas nascentes Assim mesmo assim não perdemos de breve chegar e de arrecadar munição que se queria total toda Arredondamos Agora em hora Que era que faltava Comigo redor de mim quem quisesse guerra Todos E todos tinha vez eu achava que queriabem o meu pessoal feito fossem irmãos meus da semente dum pai e na madre de uma mãe gerados num tempo Meus filhos Para que relembrar divulgar dum e dum dar resenhas Do Dimas Doido que xingava nomes até a galho de árvore que em cara dele espanejasse ou até algum mosquitinho chupador Do Diodolfo mexendo os beiços num bisbis que era que sem preguiça nenhuma rezava baixo ou repetia coisas de mal da vida alheia conversando com simesmo Do Suzarte tomando olhos de tudo chão árvores poeiras e estilos de vento para guardar em sua memória aqueles lugares em léu Do Salústio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 780 João em ancas de seu burro e do Araruta de toda confiança esse homem já tinha para mais de umas cem mortes Do Jiribi be que a recorrer da guia à culatra por necessidade de cada coisa ouvir recontar e saber Ou do Feliciano que abria muito o olho são para melhor entender o que a gente dizia Tuscaninho Caramé que cantava bonita voz algúa cantiga sentimental João Concliz dobrando um assovio comprido sem fim como esses que são dos tropeiros dos campos goianos Ou o José do Ponto com o jacaré tocando os cargueiros com sua tralha de cozinhar Mas refiro miúdos passos Coisinhas que a gente vislumbra em ocasião de momento e que quase não esquecem com pena Pois eu pensasse a breve na responsabilidade que a minha era quando via um homem idosamente respeitável como Marcelino Pampa e que já tinha sido chefe seguindo por seu próprio gosto no meio do andamento dos outros ou esbarrar o cavalo nos freios e esbarrado assim mesmo sem virar a cara para mim mas abaixar um pouco a cabeça e ficar escutando e meditando o meu conselho Ou quando um daqueles jagunços mais velhos recomendava a qualquer rapaz como era que deviam de ter cautela no lidar com as armas de conjunto e com a munição nas canastras pois de tudo calados cuidavam porque João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 781 então em sentir era como se fosse coisa de paz arranjos miúdos em casa da gente Ou mesmo quando eu avistava um daqueles catrumanos gente toda trazida deportados por mim da terra deles Esses me davam estima Ah acho que me achavam Antes teriam um admirado receio o medo maior E tinha uns como digo ao senhor que relembro tudo esse Assunciano quando se falava em fogo ele já ficava com o corpo para diante meio entortado e que ele era magro mas ovante barrigudo mediamente e de um qualquer um chapéu simples mas um pouco mais enfeitado ou novo ele já demonstrava mirar de boba inveja Meus filhos Mas não durava dai menosmente eu esquentava outra vez meus altos planos mais forte eu refervesse Eu era assim Sou Não creia o senhor Fui o chefe UrutuBranco depois de ser Tatarana e de ter sido o jagunço Riobaldo Essas coisas larguei largaram de mim na remotidão Hoje eu quero é a fé mais a bondade Só que não entendo quem se praz com nada ou pouco eu não me serve cheirar a poeira do cogulo mais quero mexer com minhas mãos e ir ver recrescer a massa Outra sazão outros tempos Eu ia para sofrer sem saber E veja se vinha eu comandei É guerra mudar guerra até quando onça João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 782 e couro É guerra Todos me aprovavam Ainda mesmo que com o cantar Olererê Baiana Eu ia e não vou mais Eu faço que vou lá dentro ó Baiana e volto do meio pra trás Assim aquela outra que o senhor disse canção de Siruiz só eu mesmo meu silêncio cantava Sofreado de minha soberba e o amor afirmante eu senti o que queria conforme declarado que no fim eu casava desposado com Otacília sol dos rios Casava mas que nem um rei Queria quis E Diadorim o senhor cuida Ingratidão é o defeito que a gente menos reconhece em si Diadorim ele ia para uma banda eu para outra diferente que nem dos brejos dos Gerais sai uma vereda para o nascente e outra para o poente riachinhos que se apartam de vez mas correndo claramente na sombra de seus buritizais Outras horas eu renovava a idéia que essa lembrança de Otacília era muito legal e intrujã e que de Diadorim eu gostava com amor que era impossível É Mire e veja o senhor se entende Deixe João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 783 avante conto Mesmo nos dias o que era era ir vir corrijo Até sem ter aviso nenhum eu me havia do Hermógenes Pressentidos todos os ventos eu farejava O Hermógenes com seu pessoal dele que nem em curvas colombinhando rastejassem comprido grosso mas sem bulha por debaixo das folhas secas Mas eu estava fora de minha bainha Às vezes eu acordava na metade certa da noite e estava descansado como se fosse alto dia Vão da noite quando o mato pega a adquirir rumores de sossegação Ou quando luava como nos Gerais dá com estrelas Luava para sobressair em azul de luz assim só mesmo estrela muito forte E chegamos Aonde A gente chega é onde o inimigo também quer O diabo vige diabo quer é ver A pois Sincero senhor os campos do Tamanduátão o inimigo vinha num trote de todos muito sacudido Se espandongaram Campos do Tamanduátão o senhor aí escreva vinte páginas Nos campos do Tamanduátão Foi grande batalha Não se instruiu que Nem não houve aviso Dei guerra Como se quis lei a lei e fogo a fogo Era na força da lua Tamanduátão é o varjaz que dum topo de ladeira se avistava e para lá descemos por encanado de cava quase grota João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 784 que a vertente entalha Mas mais de mil bois ou cavalos e éguas uns oitocentos se carecesse cabiam de bom pastar ali naquele baixadão de raso em raso Ao muito escuro duma banda existia um travessão de mato Outro braço de mata da outra banda Com que contornada essa mata a gente estava sempre naquilo que Tamanduátão é a enorme vargem Porque para tudo quanto havia o nome era aquele só que MataGrande do Tamanduátão e MataPequena do Tamanduátão e tudo Por mesmo do Tamanduátão era a casadefazenda de muitos antigos tempos quando tinha tido senzalas e um engenhode pauempé Mas já estava esquecida arruinada em esteios e com restos de parede fechando matagalzinho em cima de montes de terra e pedras em fim de taperada Bem sim que por perto assistia alguma pobre gente vinda cultivando o quanto se via roça milharais feijoal faceiro Gente mal se viu E do Tamanduátão era a Vereda com seus buritis altos e a água ida lambida donzela de branca sem um celamim de barro Dizse que lá se pesca e gordas piabas Por cima dela sei é de muito tiro Tinha um cocho no chão no campo o gado ouvia e se fugia bravo Às beiras daquela minha gente galopou a vereda toda susãjusã feito estivessem sendo surucuiú sem fêmea João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 785 percorrente doidada E o inimigo dava para trás Não achavam esconso Assim é que se principiou A bem como é que vou dar letral os lados do lugar definir para o senhor Só se a uso de papel com grande debuxo O senhor forme uma cruz traceje Que tenha os quatro braços e a ponta de cada braço cada uma é uma Pois na de cima era donde a gente vinha e a cava A da banda da mãodireita nossa isto é do poente era a MataGrande do Tamanduátão Rumo a rumo a da banda da mãoesquerda a MataPequena do Tamanduátão A de baixo o fim do varjaz que era em bruto de repente a parede da Serra do Tamanduátão feia com barrancos escalavrados Os barrancos cinzentos divulgando uns rebolos e relombos barrancos muito esquisitos como as costas de fila de muitos animais Mas agora o senhor assinale aqui por entremeio de onde é a Serra do Tamanduátão e a MataGrande do Tamanduátão mais ou menos os troços ve lhos da casadefazenda que tanto se desmantelou toda e rumoarumo no caminho da Serra para a MataPequena essas rocinhas de pobres sitiantes Aí o senhor tem temos A Vereda recruza reparte o plaino de esguelha da cabeceiradomato da MataPequena para a casadefazenda e é alegrante verde mas em curtas curvas como no sucinto caminhar qualquer cobra faz João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 786 E tudo O resto céu e campo Tão grandes como quando vi quando no fim que ouvi só no estradalhal gritos e os relinchos a muita poeira de fugida e os cavalos se azulando Mas primeiro antes teve o começo E aí teve o antesdo começo que o que era a gente vindo vindo E vindo bem Mal ao justo que para tão cedo assim aquilo não se esperava A gente vinha acabando a serra Serra da Chapada Somente para dali descer e traduzir essas campinas a grandeza de vargem Deles inimigos não se tinha aviso nenhum nem espiação Eu podia saber Eu era uma terrível inocência E de tudo miúdo eu dava de comer à minha alegria Assim o por exemplo quando eu quis experimentar a valia de meus catrumanos Um o Dos Anjos Esse degozava de mostrar que tinha tomado entendimentos presto manejava Achei graça no tirintim ligeiro como ele recarregou a comblém Mas era uma arma sem trocha e muito envelhecida abaixo de todas as menos até com cano já gasto Xeu cá ver o arcabuz manovelho eu arrecadei Ele nem queria entregar conforme que disse triste É a méa combléia e excogitava na arma Esse merecia Que fossem arranjar para ele uma outra consentã rifle chapeado ou winchester mão 27 ou carabina qualquer bala de chumbo E aí o DosAnjos me desofereceu o trabuco dele velho mais que João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 787 avexado e meninomanso me olhava Mas Marcelino Pampa acho que foi quando a gente acabou de rir pagou boa lem brança disse que num brugo a meio indo para o pique do morro Medeiro Vaz tinha deixado guardado uma vez um feixe de armamento de soldados Que eram cinco fuzis máuser oleados bem num caixote escondidos no fundo dum grande solapo no paredão Se dizia Tanto que lá nem bicho mateiro não ia tirante macaco e que por tudo por certo deviam de estar de uso Por que é que Medeiro Vaz escondeu Por no tempo não ter servível munição E agora se tem que dê A pois Eu disse ao senhor eu não sabia do inimigo nem o inimigo de mim e nós vínhamos para seencontrar Então Ah mas eu parei mais alto estive muito mais alto mesmo e foi assim a sol Pois logo a gente quebrou caminho trepando encosta lá para aquelas burguéias Os nenhuns fuzis não achamos adentro do cavernal que era muito espaçoso só com uns morcegos que habitavam E eu por um querer disse que ia subir mais até no cume Poucos foram os que comigo vieram As alturas Poucos me lembro do Alaripe Posto pois foi porque foi Que estávamos já voltando descendo do ponto do alto o vento João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 788 bobeando na cara da gente e belavista adiante muito descrita Caminhando mesmo a gente tinha enrolado cigarros que não estava sendo azado de acender por via do encano do ar que ventainhava Esbarramos Àlaripe bateu binga Mas repronto ele mesmo encolheu o corpo e apontou exclamando surdo Há lá no quembembe o que quembembe na linguagem da terra dele vinha a ser na virada na tombada Como com efeito acolá na Serra do Tamanduátão vertente abaixo vinha um cavaleiro E eram muitos outros Esses eles Mas nós já tínhamos tomado recato Maximé eu disse E o que eu senti ah não foi receio nem estupor nem arrocho O que eu senti foi nada coisa nenhuma coisanenhuma em branco ao redor da minha movimentação Quantos com que assim viessem se guerreava mas sempre um chefe é uma decisão Falei E quando mesmo dei tento já tinha determinado as ordens justas carecidas tudo atinado o senhor veja e tal Primeiro que uns três homens fossem levar para aquela dita solapa do morro os que não eram mãosdarmas que o menino Guirigó o cego Borromeu e a mulher do Hermógenes que lá esperassem o final de tudo E para isso escolhi também o catrumano DosAnjos que logo vi que bem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 789 escolhi por tanto que ele na primeira coisa que pensou foi na quantia de comida que para eles se deixasse Daí o da guerra exato muito singelo repartir a gente em três drongos que íamos descer a serra em diversas bocainas diferentes Eu com o meu normal rente João Goanhá da banda da mão direita Marcelino Pampa da banda da mão esquerda eles fossem para ladear e revir e cometer dando todas retaguardas Num átimo Discutido assim o pessoal se arrumou para ir já indo jagunço nunca dilata Mas os de João Goanhá e os de Marcelino Pampa primeiramente que deviam de longe Eu com os meus tinha mais tempo convinha mesmo retardar Estive contando os cavalos Te arma bem Diadorim eu disse Te arma bem mano meu mano Por que foi que eu disse Então o senhor me confere que eu ingrato não era e que nos cuidados de meu amor Diadorim sempre estava E amor é isso o que bemquer e mal faz Apalpei meu selim que minhas pernas esquentavam Empunhei o parabelo Alguns dos homens ainda aproveitavam a espera para comer o que tivessem e um quis me obsequiar com a metade duma broa de brote de se roer e outro que trazia um embornaldecouro cheio com cajus vermelhos e amarelos Rejeitei Por mesmo que naquele dia eu estava de jejum quebrado só com uma jacuba Nem quis pitar Não por nervoso João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 790 Mas eu sabia que era o minuto e não era a hora E o do embornal com os cajus sendo um João Nonato diamantinense decidido agradável me disse Hoje Chefe depois que se ganhar com o bom gol se festeja Oi sim E de repente eu disse dizer Tu menino meu filho tu vem adiante manovelho emparelhado comigo Tu me dá sorte Deixamos de esporas Descendo na cava por feliz a gente vinha em oculto E justo já embaixo no principiar da várzea era um capim com mais viço capinzal do fresco de pédeserra Capim mais alto do que eu nele à gente se tapava Coincidido que permeio o verde dos talos a gente via algumas borboletas presas num lavarinto batendo suas asas como por ser Caiu o açúcar no mel Porque igual também convim que podíamos ladear um tanto e daí separei de cabeça um grupo de homens que iam ir com o Fafafa esses avançarem primeiramente como a certa isca perturbando o cálculo do inimigo ao dar o dar Respiramos tempo naqueles transitórios De rechego coçando as caras no capim em pontas que dava vontade de se espirrar Só o rumor que se ouvia era o dos cavalos abocanhando Eu tinha pressa de um final mas o que ia mor em mim era um lavorar de paciência talento com que eu podia ficar retardando lá a toda a vida Safas que eu podia dar também um pulo enorme sustirado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 791 repentemente Vi o que guerreia é o bicho não é o homem O capinzal repartia tudo diverso o abafo do ar e o fresco de lugar de grota frio e calor lado dum doutro nas finas folhas mesmo da folhagem Mas o calor vinha subindo era pernas acima no meu corpo o que os meus pés de tão quentes suavam E eu não enxergava o chão mas o cheiro do lugar ali era de barro amarelo massal Suspensos no parar mesmo a gente se embalançava na sela banda para banda na suavidade essa conforme temperação de que o espírito necessitava Sendo o mundo quieto para não assustar os pássaros que comem sementes no capim porque o revôo deles havia de dar ao inimigo alto aviso no ar Sobre isto eu tirei um pé do estribo e ajoelhei no coxim da sela Porque era a hora de olhar mirei e vi Como o inimigo vinha as listras de homens récua deles passante de uns cem Tive mão em tudo eles ainda estando longe Fafafa encostou dois dedos no meu joelho como se até às mudas quisesse poder receber a ordem Ele esperava um instante certo de meu respirar Eu brinquei com a mão no arção Vez de um vez todos e todos Falo o dito de jagunço que eles mesmos não conseguiam saber se tinham algum medo mas em morte João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 792 nenhum deles pensava O senhor xinga e jura é por sangue alheio Daí reolhei Avistei que vinham e tinham destacado em galope festinho adiante uns tais que se enviassem de vigiar a cava e a passagem de sobeserra como cautela Fechei os olhos e contei Até dez agüentei não que me deu um deciso já em sete Tu é tu Fafafa eu disse E ele gritou Xé do campo e correu as esporas E eu vi o virar dos cavalos partindo rompendo amassando cama no capinzal Seja que os homens para acompanharem o Fafafa eu medi em número e soltei feito em porteira de gado e pouco passaram de vinte E eu retinha a duro os outros que queriam também ir E Diadorim desses Eu que Diadorim disse Eu disse Não como agarrei embaixo a rédea do cavalo dele Por que foi que fiz Bastava o meu mando Aquilo não tinha significado Só fiz querer Diadorim comigo e a gente se cabia entre riscos do verde capim assim eu Diadorim enxergava feito ele estivesse enfeitado Se escutando os grandes gritos e tiros que eram os de Fafafa destruindo a anteguarda dos contrários Amontado no instante mas eu mesmo assim tive prazo para João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 793 me envergonhar de mim e para sentir que Diadorim não era mortal E que a presença dele não me obedecia Eu sei quem ama é sempre muito escravo mas não obedece nunca de verdade Aí me alteei e tive que era o começo da grande batalha Sobre o soprar o Fafafa indo em frente mais os dele gritando alardes No que os outros os Hermógenes também que primeiro formavam mó depressa alargaram espaço se abrindo uns dos outros mato de gente Eles tresfuriavam assim aos urros zurros quantidade que eram eh sabiam vir à cossa E tiros mesmo pouco ouvi mas no liso seco estradai do meio do campo deu um pano de poeira empenachada Eu bebi gotas digo isto é que ainda esperei mais Como o Fafafa de proposital porque aqueles outros podiam recachar retardava a ida avante num meiogalope somente muito enganador A avistar melhor quase trepei de todo na sela meu animal cumprindo de não bulir porque era cavalo consciencioso Mas enquanto isso saiba o senhor o que foi que fiz Que fiz o sinal dacruz em respeito E isso era de pactário Era de filho do demo Tanto que não renego E mesmo me alembro do que se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 794 deu por mim que eu estava crente forte que do demo do Cão sem açamo quem era era ele o Hermógenes Mas com o arrojo de Deus eu queria estar eu não estava Foi o instante de tempo que era o momento Só chamei João Concliz Agora é agora E joguei a rumo Lá vai obra Meu cavalo saiu às cabeçadas Todos atrás de mim no arranque e era o mundo mesmo Gritei de sussus Vale seis e toma nove nas grimpas da voz E eles meus gritando tão feroz que semelhavam sobrevindos sobre o ar Menos vi Mas todo o todo do Tamanduátão se alastrou em fogo de guerra Suspenso ouviu escapei à de banda com meu bom cavalo repuxei as rédeas Só assim permaneci eu estava debaixo duma árvore muito galhosa canjoão Que pensei E rompeu tiro romperam na polvorada Até o capim dava assovio E por tudo se desejar de ver tantamente demorava e ficava custoso para em alguma justa coisa se afirmar os olhos O que era feito grande mesa posta cujos luxos motivos por dizer alguém puxa a toalha e vai derruba Quem era que ia poder botar naquilo uma ordem para um fim com vitória E estralou bala Repisei em minhas estribeiras apertei as pernas nas espendas Eu tinha João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 795 de comandar Eu estava sozinho Eu mesmo mim não guerreei Sou Zé Bebelo Permaneci Eu podia tudo ver com friezas escorrido de todo medo Nem ira eu tinha A minha raiva já estava abalada E mesmo ver tão em embaralhado de que é que me servia Conservei em punho meu revólver mas cruzei os braços Fechei os olhos Só com o constante poder de minhas pernas eu ensinava a quietidão a Siruiz meu cavalo E tudo perpassante perpassou O que eu tinha que era a minha parte era isso eu comandar Talmente eu podia lá ir com todos me misturar enviar por Não Só comandei Comandei o mundo que desmanchando todo estavam Que comandar é só assim ficar quieto e ter mais coragem Mais coragem que todos Alguém foi que me ensinou aquilo nessa minha hora Me vissem Caso que coragem um sempre tem poder de mais sorver e arcar um excesso igual ao jeito do ar que dele se pode puxar sempre mais para dentro do peito por cheio que cheio emendando respiração À fé que fiz Se não vivei Deus ah também com o demo não me peguei refiro mas um nome só eu falava fortemente falado baixo e que pensado com mais força ainda E que era Urutu Branco Urutu Branco Urutu Branco Cujo era eu mesmo Eu sabia eu queria João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 796 E quando a guerra para o meu lado relambeu feito repentina labareda dum fogo Uns vieram E os tiros deles bala batia e rebatia Cortavam capim do chão que riscavam com punhado de terra Tchavam partes de ramos da árvore por cima de mim e vagens do angico que então reconheci por isso Como quieto fiquei Eu não era o chefe Mesmo que uma carga de rifle se passou em meu chapéudecourodevaca e que outra zoante em meu jaleco raspou A mil que não movi mão mas dei desprezo Mas eu tivesse alargado braço e movido mão para com tiros de meu revólver ripostar e eu mal morto estava ponto que enquadrado de passantes balas que rentes até quentes Urutu Branco eu só relembrei sussurrado ditoso como quando com mocinha meiga se namora Cachaças que em minha alegria Em vento E balas mais só num enorme num minuto Mas bem que aluir dali eu não aluía Morresse tive preguiça de pensar mas morresse então morria trêsempé de valente como o homem maior valente no mundo todo e na hora mais alta de sua maior valentia À fé que foi Dei em lagoa de tão filho tranqüilo E de arrepelo tudo demudou Aqueles torceram os cavalos revertendo para se espraiarem por longe Que era porque os de João Goanhá tinham se avindo de contornar no cabo do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 797 mato e cometiam urrando o grosso do inimigo por detrás FuFiau que se diz Que tínhamos de percalçar e de vencer E aqueles dianteiros Hermógenes que tinham vindo campavam fuga de batida E um do cavalo preto que bobeou o Paspe o Sesfredo e o Suzarte foram nele galopando num embolo reformaram feia nuvem E o corpo dele no retém foi jogado morto se tangeu duro no ar ressaltou feito uma tábua Assim um outro se desatinando João Vaqueiro apeado acertou nele diversas vezes Esse recurvou tatu e tal Ele veio cair perto exato de mim ferido muito grave conforme gemia Desarma mas não acaba de matar manovelho a João Vaqueiro eu disse Aquele homem inimigo derrubado jeremiava cris querendo enterrar as unhas na casca dum pau O queixume que ele exprimia que tinham mesmo de perder por terem vindo com os cavalos deles tão sovados e avante em surpresa tão contrária De tudo se espiolhava suave praguejante aí com três costelas derrotadas Mas água ele pedia cristão Sede é a situação que é uma só mesmo humana de todos Rebaixei o corpo e dei nas mãos dele a minha cabaça quase cheia e que era boa como um cantil Rústico fechei os olhos para não me abrandar com pena das desgraças Nem não escutei que ouvido também se fecha No cavalo eu estava levantado Campo que me competia João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 798 comandar dito Tudo em mim minha coragem minha pessoa a sombra de meu corpo no chão meu vulto O que eu pensei forte as mil vezes que eu queria que se vencesse e queria quieto feito uma árvore de toda altura Tiroteio fechava E o pessoal de Marcelino Pampa apareceu também surgindo para maior mal dos Hermógenes Matamos neles Pegamos pelos lados Confiro o que foi O senhor só se ouvia era carabina repetindo Fogo do Tamanduátão o senhor saiba E pá ainda no pior do meio eu adivinhei sabendo que meu comando tinha dado certo e que dali a vau tudo estava já ganho desfecho do fim desse final Somente para colher o maduro eu podia sobreviver Sei que risquei joguei de galope em cima Ao que vim aonde que tudo se estardalhava Dei gritos Arte que abria no rifle e matava Donde era que estava o Hermógenes A uivos atrás duns rompemos em linha na vereda Todo buriti levou bala A mais o inimigo não tinha o recurso de se apostar por tanto que perdiam os cavalos Advindo que o baixadão dali não dava esconderijos de mato para tocaia à jagunça E os poucos foram os que pegar as distantes brenhas conseguiam ou o cheio João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 799 do capinzal aonde não íamos desentocar ninguém Aqueles deviam de estar de faca em fúria na mão cobrejando somente por meio de cachorrosmestres afirmados em caça de gente era que podiam ser pegos o que não se tinha Os mais em desrédea meteram doida fuga enquanto mal pudessem de debaixo de balaços Menos de poucos passaram Ao rascampo em viemos soprando a perseguição Tinha um valo varamos um mato de lobeiras Aí era para a banda das roças novas Uns morrinhos demos fogo Uma tapera outra tapera Demos fogo Poucos dos poucos deles escaparam Os que desladeavam caíam por nossos esteiras Era um relanço bem fatal Mas um homem grande que como pulou abaixo do cavalo grande que baleado fora alcançou jeito de correr e encontrou uma cafua em frente Entrou De lá decerto ia mandar bala E então nós a gente todos desistindo de mais longe perseguir os sobrantes cercamos por completo aquela choupana de regular distância caçando jeito de entrincheiramen to Ia ser o terrível Que quem era aquele homem Ah o Ricardão se gritava E eu mesmo sabia Determinei uma descarga Cafua de buriti que estremeceu como que se entortando de lugar arreganhada em partes A gente atirando atirando com pouco ela ia desaparecer desmanchada Mas eu dei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 800 ordem de paz E adonde estará o Hermógenes próprio eu indaguei Alguém soubesse De se ter ouvido algum deles ferido ou agarrado preso que o Hermógenes não fazia parte atual daquele bando mais acontecia de andar com outros muito adiantado dali vinte léguas avanço no poente Mas então E quase nossa gente toda já estava vinda para apreciarem o derradeiro aprumo do Ricardão Eu dei comando Seô Ricardão o senhor saia para fora eu gritei do protegido donde estava Ele não deu resposta Daí Pau de fogo minha gente eu procedi Pipocaram Durante o que a cafua começava nas últimas Mas de dentro ninguém não ripostou nem um tiro nem Ele estivesse morto Não tinha munição Esperei o engolir em seco três vezes Daí regritei Seô Ricardão o senhor se saia E ele no esquisito respondeu Vou sair com um grito natural Enérgico para o meu povo eu ordenei muita paz E o todo silêncio Espiei Lá acolá o homem abriu devagar os cacos de porta Saiu deu uns passos Como vinha alto chapéu na cabeça até meio sorridente Não se esbugalhava Assim estivesse pensando que ia ter julgamento Achei que E ele não estava ferido Caminhou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 801 mais Sendo que e aí foi minha idéia ah não mas vi que Diadorim de ódio ia pular nele puxar faca Só fiz fim num tirteguarte atirei só um tiro O Ricardão arriou os braços deu o meio do corpo em bala varado Como no cair jogou uma sua perna para lá e para lá Como caiu se deitou Se deitou conforme quase não estivesse sabendo que morria mas nós estávamos vendo que ele já morto já estava Acho deveras que todo o mundo respirou com suspiro Digo que esta minha mão direita quase por si era que tinha atirado Segundo sei ele devolveu Adão à lama Só estas minhas artes de dizer as fantasias Não enterrem este homem eu disse A justiça Mas mesmo como é que se ia poder enterrar a quantidade deles mortos naquele dia Ao quando retornávamos para a Serra eu ia olhava o céu vez em quando Primeiro urubu que passou foi vindo dos lados do SungadodoA esse se serenou bem que me parecia uma amizade de aceno Avoeje Mas o que ia suceder por diante João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 802 Somenos sei e conto mal certo o que os três dias foram no seguinte Se soalerte o senhor que estamos descambando o senhor mesmo se prepare que para fim terrível terrivelmente Eu podia Como é que vou saber se é com alegria ou lágrimas que eu lá estou encaixado morando no futuro Homem anda como anta viver vida Anta é o bicho mais boçal E eu soberbo exato de minha vitória Conforme prazia o dito do cego Borromeu que não se entristecia Ah eu nunca botei em antes o nariz nestes campos Soscrevo Mas ele o que carecia de querer saber às vezes perguntava Desses lugares o divulgado natural pedia pergunta Aí glosava Macambira das estrelas quem te deu tantos espinhos Tibes Eu não Ia demandar de outros o que eu mesmo não soubesse a ser nestes meus Gerais onde eu era o sumo tenente Não me respondiam Ninguém mesmo ninguém A gente vive não é caminhando de costas Rezo O que é o que é existível como fundo dágua Agora eu cismo que o cego Borromeu também só do que já sabia era que indagava Se não se não o senhor verse como bula santa a cita não é revelável Macambira das estrelas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 803 xiquexique resolveu Quixabeira bem me queira quem te ama Bem sou eu Soletrei tudo Assim ele cantava Atrás o menino Guirigó se envelhecendo sobre outro cavalo E a mulher do Hermógenes montada também magra malvaz como podia estar indo em cima duma nuvem Ela desenrolava a cara daquele xale verde sem vexame nenhum e o que espiava da gente era por riba do queixo Quem sabe do orgulho quem sabe da loucura alheia Ela comia ela bebia em um tempo prazida e moça tinha se casado Só com desgosto dos prazos da vida foi que enxerguei aquela mulher Coisa dita não disse A pois O dia estava por dado Sol rachava os barros A mulher o menino e o cego aqueles saíram tocaram Estavam por ordem minha trazidos do brugo do morro mas sendo levados sempre de guarda para o arraial do Paredão estipados com conduta de dez homens Esta é que era a razão que o Hermógenes da banda do poente podia vir Viesse feito Como que estavam engrossados com quantidade de bandidos jagunços se soube e alguns daqueles escapes com vida do Tamanduátão já devia de ter ido João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 804 a ele levasse aviso Soltei a faro meus vigiadores para ter as distâncias vindo medidas Ah mas demeio a partedopoente e o Paredão a passagem certa era um lugar muito plausível no morro e que se chamava o CererêVelho Aonde fomos Estugados em boa marcha Até que o mormaço bateu as asas Deu trovão com ventos trapes Dizendo todos disso que ia breve chover para minha desvantagem Em beira do mato no CererêVelho se trabalhou com facão em ramagem e cipó armando tipóias e latadas Como que melhorou a experiência do tempo adiando esbarrou o vento rufado Mas aquele trabalho nosso era carecido folgar não se pôde nem para palavra minha com Diadorim que era de todo dia conforme bem alembro Noitou Conforme fui dormir recansado de falfa Dormir por pouco Conforme foi e que o meu espírito não queria Que de repente acordei Madrugada de meianoite A lua já estava muito deduzida o morro e o mato misturados Relanceei em volta Todo o mundo dormindo Só o chochorro mateiro que sai de debaixo dos silêncios e um ôôô de urutau muito triste e muito alto Depois ouvi o uivado inteiro dum cão Os companheiros todos dormindo acordado só eu alevantado de noite Pesou por diante João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 805 de meu coração Devi àquele cão maluivante Idéia tristezinha que me veio Por que era que só eu tinha acordado desoras tão antes de todos Mas eu mesmo queria prosperar de olhos abertos carecia O que produzia era eu agüentar até passar o arrocho no coração Deus que me punia que hora tem ou o demo pegou a regatear E entendi que podia escolher de largar ido meu sentimento no rumo da tristeza ou da alegria longe longe até ao fim como o sertão é grande Arte que espiei arriba levei os olhos Aquelas estrelas sem cair As TrêsMarias o Carretão o Cruzeiro o RabodeTatu o CarreirodeSãoTiago Aquilo me criou desejos Eu tinha de ficar acordado firme Depois daí vi o escuro tapar de nuvens Eu ia esperar fazendo uma coisa ou outra até o definitivo do amanhecer para o sol de todos Ao menos achei de tirar do tôo da noite esse defim canto de cantiga Remanso de rio largo Deus ou o demo no sertão Amanheceu com chuva Mundo branco rajava Deu raio deu trovão escorremos água e tudo que se pensou ou se fez foi em montes de lama Diz o senhor sim assim é diadevéspera João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 806 Receio meu era só pela fuga de cavalos Escapulissem eles sabem como o Gerais é espaçoso como no Gerais tem disso que passando noite tão serena desse de manhã o desabe de re pente daquela chuva E igual de feito que antes do meiodia estiou calibre que ventava Sol saído e é ligeiro a gente vendo que essa areia seca seus estados Medi horas Só o cruzo de meus cavaleiros amontados todos enchendo e povoando o sacodecampo como abelhas na umburana Surjo que sabiam o que não sabiam eles estavam desinquietos em modos E os vigieiros chegando conforme voltavam da espiação mesmo molhados ensopados Um disse Por longe não estando viajando para cá Só se com retardo Adonde estava o Hermógenes O céu botava mais nuvens Daí outro Deles nada E eu expedi ainda outros que saíssem e fossem e vissem mais mestres batessem aquelas beiradas de maior mundo Que modo que senseei do vazio do tempo em redor e que eu entredisse O Sertão vem Vinha Trinquei os dentes Mordi mão de sina Porque era dia de antevéspera mire e veja Mas isso tão empé tão perto ainda nuveava nos ocultos do futuro Quem sabe o que essas pedras em redor estão aquecendo e que em uma hora vão transformar de dentro da dureza delas como pássaro nascido Só vejo segredos Mas que o inimigo já estava João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 807 aproximado eu pressenti se sabe pela aperreação do corpo como que se querendo ter mais olhos e até no queé do arraigado do peito nas cavas nas tripas O Hermógenes estava para arremeter de rancor se mexendo nos escuros A guerra estava aprazada em batalha ali no CererêVelho Mas meus homens os troados brabos jagunços por uma palavra minha desatribulados agora ao ar que esperavam por mim E aí foi quando veio o Suzarte que desde depois do Tamanduátão tinha saído enviado até mais longe para espreitar e espiar como cachorro correndo os ventos Chegou parecia galopando num cavalo já morto Esbarrou O cavalo baio como desmanchado que arqueava triste as pernas dianteiras descansou tudo no chão que da boca e das ventas ajorrava sangue rebentado dos estômagos e dos peitos Mas o Suzarte que antes do rangersela já tinha escapado os pés das estribeiras e pulado solerte no chão tomou um átimo e relatou Eles estão E para o resto ele apontou com o dedo O Hermógenes mor maldito Ele vinha errado de mim os Hermógenes eles Davam arte de contornar da banda do norte às tantas O Suzarte tinha avistado no dia antes o movimento dos vigias costaneiros e definido de remoto o corpo do bando João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 808 poeira duns oitenta Era o Hermógenes Contornava feito gavião vonje como comigo não tinha nenhuma lei de combinação e esse era o direito dele de àsavessas de guerra A um mal o mal mas o perigo de astúcia aquela hora mudava maior de lugar Porque eles podiam vir e sobrevir Ou menos retos ou mesmo enquanto a gente parava ali oferecidos em camadecaça também eles dispunham de revirarde supeto no Paredão por outra banda e arrebatar a Mulher contra meus só dez homens fazer o que quisessem e para depois emendarem caminho para o CererêVelho em nós com toda retaguarda Revesti isso num relance Arvorei a minha chefia Meus jagunços esperavam a certa decisão aí eles nem me olhavam Maximé eu disse Resumi Apre o que eu ia dizendo no meio do som de minha voz era o que o umbigo de minha idéia aos ligeiros pouquinhos manso me ensinava E era o traçado Tanto que dei ordem Repartição de gente se carecia determinei assim Metade metade Os com João Goanhá e João Concliz ficavam altos no CererêVelho cumprindo espera afoita E chamei os outros e Marcelino Pampa de sotocomando rompemos para o Paredão Tudo se quatreou num pronto no volvervoltear dos cavalos Já um giro dava nos campos já a gente se esquipava E Diadorim que vinha atrás de mim uns João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 809 metros quando virei o rosto vi meu sorriso nos lábios dele Íamos redeando resolutamente dando as costas para o sol entrando Dividi idéia da guerra que ia ser no brutalhal Vindo a cavalo assim era que eu pensava melhor nas menos margens Do CererêVelho até no Paredão seis léguas e eu tinha de deixar ao menos um homem em cada meialégua em estação para em caso serem capazes de traspassar recado de tudo por tudo com a rapidez da guerra Eu fiz só ia sendo Todo o resto que viesse todo o igual E meus homens cumpriam capitalmente Alegria do jagunço é o movimento galopado Alegria Eu disse Ah não eu não O senhor de repente rebata essa palavra devolvida de volta para os portos da minha boca Que foi o dito Novas novidades Conforme vínhamos a sério tocar e já a bem uma légua do Paredão se estava quando apareceu o Trigoso Esse retornava de traquejar as beiras da banda do sul e estivesse jejuno virgem de toda nossa ciência derradeira Do Hermógenes nem nada sabia pois justo Mas queria por força relatar Disse coisas sem proveito Disse Carecia de impor no meu espírito o rebuliço de esfriar em mim o sangue nas veias João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 810 No Saz uma veredinha três léguas abaixo Chefe Vaqueiro que achei que me disse remendando mensagem que é um homem chamado Abrão com uma moça bem arrumada Que vêm vindo beiradeando o rio e a tralha deles trazem em dois burros cargueiros e condução de dois camaradas Ele falou E foi a coisa mais de repente na minha vida Otacília Como tudo neste mundo podia ser e como a minha mente tinha logo puxado de arranco das palavras do Trigoso todo verdadeiro significado Inteirei comigo Seô Habão Vigia se ele não traz consigo uma donzela formosíssima ou se traz emapenas desilusão E o Trigoso disse estava dizendo comple to Ela era Otacília Otacília Eu tinha de escutar outra vez o Trigoso da verdade das coisas menos sabia Imaginar eu imaginava Otacília a vinda dela sertão a dentro por me encontrar e me rever por minha causa Mas achava a guerraria de todos os jagunços deste mundo raivando nos Campos Gerais Terríveis desordens em volta dela longe saída de casa de seu pai sem garantias nenhumas Que proteção ia poder dar a ela esse seô Habão com dois pobres camaradas perrengues tudo tão malaventurado como se estavam Engoli amargos Me rodeavam meus homens o silêncio deles me entendia como João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 811 bem cientes Reperguntei quem sabe se assim paravam na beira do rio se então não deviam de ter retrocedido caminho se encaminhando também para o Paredão Ah que não Chefe Vaqueiro me disse de lá para lá iam indo Fugindo do perigo para o perigoso E no Paredão mesmo dito já não tem mais pessoas de sede As famílias todas e os moradores camparam no pé desgarrados assim que o medo chegou lá O medo é demais de grande Estremeci mor Eram as horas Só de ouvirem falar no vago do Paredão meu povo afastava os cavalos já querendo regalopar Entendi e mais entendi rodei mão na cara Incerteza de chefe não tem poder de ser eu soubesse bem Mas era eu ali em sobregoverno meus homens me esperando e lá Otacília carecendo do meu amparo E a guerra que podia dar de recomeçar na boca dum momento ou antes Que de mim Que diversas honras diferentes homem tem umas às outras contrárias Na estreitura sem tempo meu eu podia desdeixar meus homens E tinha de ir Não por bonsebelos ah Mas minha Otacília vinha em hora tão despertencida de todas a vez pior Eu podia requerer amor Me dê primavera Vi tudo indeciso de mim estarrecido as pedras pretas no meio do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 812 capim o campo esticado Só fiz que no forte do sentir eu pudesse era este ameaço de reza Me dê o meu só e que é o que quero e quero ao Demo ou a Deus A lá eu ia Otacília não era minha noiva que eu tinha de prezar como quase minha mulher Meio do mundo Vai e eu disse lá ia no vou e volto e já mesmo Se diz era um pulo Para revir e dar guerra tempo havia de ter Os outros fossem para o Paredão tocassem Já estava escurecendo Só mais que nesse propósito muitos acharam de me acompanhar alegando que à tal coisa como chefe eu carecia de não querer sozinho ir Abanei cabeça Em assim aceitei dois Alaripe e o Quipes companhia que me bastava Eu não ia desarrumar negócio afracar o forte de minha gente com mais homens arrecadados E sendo o de ser Arremessei ordens joguei meu cavalo Porém porém e esbarrei em saída Esbarrei para repontar Diadorim que vinha vindo A lá que é eu disse aspro Diadorim quisesse me acompanhar eu duvidava de que motivos Não me respondeu Li nele a forma duma ira como apertou os olhos em direitura do campo Tu não vai para o Paredão tu teme eu ainda buli Diadorim me empaliava a João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 813 certas O ódio luzente nele era por conta de Otacília Ele me ouviu e não disse ladeando o cavalo Mirou meio o chão vergonha que envermelhou Agora ele me servia dávdiva damizade e eu repelia repelia Mas fora de minha razão eu precisei com urgência de ser ruim mais duro ainda ingrato de dureza Invocava minha teima a balda de Diadorim ser assim Tu volta mano Eu sou o Chefe pronunciei E ele falando de um bemquerer que tinha a inocência enorme respondeu assaz Riobaldo você sempre foi o meu chefe sempre Ainda vi como ele com a mão que era tão suave em paz e tão firme em guerra amimava o arção do selim Repostei um feio xingo Bramei isso porque o azo de Diadorim me transtornava Dei de rédea Com um raspo de galope peguei junto com Alaripe e o Quipes que mais adiantados me aguardavam Nem espiei para trás não ver que Diadorim obedecia mas como devia de parar estacado lá té que o meu vulto desaparecesse Desjustiça Mas como a obrigação do dia me arrolava E em tudo não pensei tocando para ir fazere acontecer aos baques do coração O senhor diria dirá como naquela hora Diadorim e eu desapartávamos um do outro João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 814 feito numa água só um torrãozinho de sal e um torrãozinho de açúcar Fui com desejos repartidos Tropear cavalgada nós três o Quipes Alaripe e eu meio a esmo isso é que se tinha Refiz o frio da idéia Mas nos primeiros ares nem consegui Eu despropositava Diadorim é doido eu disse Todo me surripiei instanteante tanto porque Diadorim era nome só de segredo nosso que nunca nenhum outro tinha ouvido Alaripe só fez que susteve cara de não entender e disse somente Hem Mas aí eu desmanchei o encoberto dado dando o do passado me desimportava consoante expliquei Diadorim é o Reinaldo Alaripe ficou em silêncio para melhor me entender Mas o Quipes se riu Dindurinh Boa apelidação Falava feito fosse o nome de um pássaro Me franzi O Reinaldo é valente como mais valente sertanejo supro E danado jagunço Falei mais alto Danado repeti Alaripe por respeito confirmou Ah danado é Por que era que não dava outro jeito dele comigo conversar que não fosse com essas reverências E a noite já tinha completado escuro sem lua ainda aparecida eu não podia avistar a cara dele como formava opinião as palavras que eu falei ficaram sendo sem dono João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 815 Otacília é minha noiva Alaripe Se alembra dela Antes de outros silêncios ele me respondeu Alembro Lá é um fazendão bom Até me desgostava o modo zeloso do Alaripe sempre guiar o caminho cuidados com que separava os galhos e ramagens de árvore para o meu cômodo de seguir E a gente estava quase a passo em passo Donde de conversar desisti muito A que a qual a escuridão tapava toda boca Aonde para que eu ia e carecia de ir conforme meu dever Mas minha Otacília não devia de ter escolhido justa essa ocasião tão destacada de propósitos para vir aventurar entre homens de morte essa delicadeza sem proteção nenhuma filha defamília Alaripe e o Quipes não descuidavam de tomar tento em tudo nos lados no arredor figurável que era tempo de guerra em brenhas de noite e algum inimigo menosseespera podia surgir para o mal Aonde se ia Rumo dado reto em cima da Vereda do Saz ou seguir seguido rio Paracatu arriba Tudo como que tudo se me dava à raiva tanto por causa desse vaqueiro trazedor de relatos Nem eu soubesse certo se era o seô Habão se era Otacília A quase metade do céu tinha suas estrelas descobertas entre os enuveados para chuva O setestrelo no poente a uma João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 816 braça devia de regular umas nove horas Nesse ponto deu de se ouvir um rumor grande para dentro do cerrado removendo nas galharias Só fizemos que esbarramos rifles em mãos É anta o Quipes disse conhecedor alertamente Alguma onça à espera de lua Otacília a tudo estava exposta por culpa de maus conselhos O seô Habão entregou a ela a pedra de ametista eu falei Alto falei e não queria que o Alaripe ressoasse entregou a ela a pedra Isto é a pedra era de topázio só no bocal da idéia de contar é que erro e troco o confuso assim Diadorim sofria mais de tudo quem sabe por conta da dádiva daquela pedra Otacília não devia de ter vindo Eu Essas andanças Agora aonde era que se ia encontrar viajor ou aquele beidamãe de vaqueiro para obrigar a definir notícia Mas o vaqueiro aquele não teria o certo pouso Só atrás de seu gado urucuiano Todo o mundo se fugia do Paredão e de toda parte suas trouxas nas costas A quando se divisou um foguinho adiante no campo seja que pensei gente arranchada no ar em caminho para lugar nenhum Não era Somente foguinhozinho avoável assim azulmente que em leve vento se espalhava fogofá jandlafoz O que não se achava o que eu pensava Eu era diferente de todos Era Susto disso como me divulguei Alaripe o Quipes mesmo o calado deles sem visagens devia de ser diverso do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 817 meu com menos pensamentos Era Sei que eles deviam de sentir por outra forma o aperto dos cheiros do cerradão ouvir desparelhos comigo o comprido ir de tantos mil grilos campais Isso me dava ojeriza mas também com certo consolo misturado Como quando viajando assim no escuro da noite a idéia da gente cheia de atormentamentos e de repente o cavalo bufa batendo o vulto da cabeça branquenta e chamando atenção para o cheiro do suor dele que vale por uma persistência com paciência de responsabilidade Aquela noite estava podendo mais do que a minha decisão Soubesse não sei Noite lembrada em mim de sereno a orvalho Revi madrugar quando esbarramos na beira duma vereda pagã por repouso Aurora é o sol assurgente e os passarinhos arrozeiros Cá o céu tomou as tintas Aí retoquei muita lembrança madraça como se estivesse no antigamente Fez falta foi um café mas comemos farofa bebemos gole dágua O Quipes apanhou araticum maduro ele vivia cuidando de achar as frutas em árvores e moitas E Àlaripe ajuntou gravetos e acendeu um fogo só por calor e costume só que não se tinha o que quentar nem assar Medito como aos poucos e poucos um passarinho maior ia cantando esperto e chamando outros e outros para a lida deles que se semelha trabalho Me passavam João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 818 inveja de como devia de ser o ninho que fizessemtão reduzido em artinha mas modo mandado cabido com o aosfinsefatos E o que pensei que aquela água de vereda sempre tinha permanecido ali permeio às touças de sassafrás e os buritis dos ventos e eu em esse dia só em esse dia justo tinha carecido de vir lá para avistar com eles por que que era Bobéia Eu estava cansado com uma dor na ilharga Por desenfastiar conversei A veja Alaripe que nome será que esta vereda havia de ter o que merecesse denominado Alaripe agachado ali mesmo se virou para mim esbarrando de assoprar o fogo Figuro que ela algum nome já tem só que não se saiba A modo que pegando algum morador de por perto se indaga ele melhor me respondeu Mas eu contradisse que não se precisava Forrei chão para um cochilo De qualquer jeito a paragem ali tinha de ter demora carecia de se dar um lombo aos cavalos Para o que o dia ia ser eles requeriam um descanso e pastar cavalo são desdenha de dormir o senhor sabe bicho que só come come come O sono me conseguiu Ferrei em mais de umas duas horas Por que tudo refiro ao senhor de tantas passagens Ah pelo que quando acordei retenha o seguinte Acordei sentido e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 819 mal à parte Amargava Devia de ir ter cólicas As ânsias essas mesmo com outro cansaço Feito sem repouso nenhum daquelas horas Assim eu sem segurança nenhuma só as dúvidas e nem soubesse o que tinha de fazer Acordei foi com o vozeio de Alaripe e o Quipes que já esperavam por mim e estavam naquela pauteação trivial deles coisas sem nenhum fundamento Depois Alaripe tirou da capanga um vidro que tinha cachaça dentro me ofereceu o primeiro gole Era um vidro meão claro feito remédio de frasco Com alívio tomei Mas era um alívio mesmo assim triste e eu descri eu quis discorrer qualquer noção O que é que tu acha do que acha Alaripe Ele não me conheceu principiou a definir o Paredão do Cererê Velho do Hermógenes Atalhei que não isso que da vida vagada em si no resumo A pois isto Homem sei Como que já vivi tanto grossamente que degastei a capacidade de querer me entender em coisa nenhuma Ele disse disse bem Mas eu entiquei Não podendo entender a razão da vida é só assim que se pode ser vero bom jagunço Alaripe esbarrou como ia quebrar em duas uma palma seca de buritirana Me olhou me falou Se só de entender é comigo eu entendo Entendo as coisas e as pessoas Respondeu disse bem De mim então entendia Desjuízo que me veio Eu ia formar em roda ali mesmo com o Alaripe e o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 820 Quipes relatar a eles dois todo tintim de minha vida cada desarte de pensamento e sentimento meu cada caso mais ignorável ventos e tardes Eu narrava tudo eles tinham de prestar atenção em me ouvir Daí ah de rifle na mão eu mandava eu impunha eles tinham de baixar meu julgamento Fosse bom fosse ruim meu julgamento era Assim Desde depois eu me estava rogava para a minha vida um remir da outra banda de um outro sossego Pensei quase disse Aquilo durou o de um pingo no ar Eu havia de Ah não meu senhor Deu um momento me tirou disso e tanto bastou Doidice tontura de espírito eu repensei reposto em pé Xô O ypsilone dum jegue eu era zote do que arrenego cabeça orelhalmente Ali eu era era o Chefe estava para reger e sentenciar eu era quem passava julgamentos Então falei Vão sozinhos vocês dois beirario procurando Eu não posso ir mais por meu dever Retorno já para o Paredão Alaripe ainda cruzcruzou A gente pode ser que lá a gente faz falta João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 821 Mas eu fechei Sendo o que eu mesmo não podia ao menos esses eu mandava Fossem já fossem Eles tinham de encontrar a minha Otacília a ela render boa proteção Amontamos os três Ainda esperei a saída deles Até me lembro de que escabreado na hora de saudar e tocar Alaripe ainda apontou para a linha de mato veredaacima achando Como que avisto por detrás dárvores passar a marcha dum cavaleiro Não era Não era porque o Quipes não viu conforme confirmou que não viu e o Quipes tinha olho de gaviãogrande Aí pensei será o Alaripe estava sendo um homem se envelhecendo Amigo meu e meu estranho Até me lembro pensei assim Retornei enquanto eles dois iam para a outra banda Agora eu mudava para motivos chega estremeci de influência aos aos ares de guerra Deixei de parte a cisma do mesmo jeito com que ainda fazia pouquinho eu tinha afrouxado ânimo ah a gente larga urgente o real desses estados Agora minha alegria era mais minha por outro destino Otacília ia ter boa guarda E então por uma vez eu peguei o pensamento em Diadorim com certo susto na liberdade Constante o que relembrei Diadorim no CererêVelho no meio da chuva ele igual como sempre como João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 822 antes no seco do invernodefrio A chuva água se lambia a brilhos tão tanto riachos abaixo escorrendo no gibão de couro Só esses pressentimentos sozinho eu senti O sertão se abalava Desfechei Naquela corrida meu cavalo teve as dez pernas E cheguei no Paredão na derradeira boaluz da tarde Diadorim me esperava demais Ainda vi a alegria no rosto dele O Paredão O senhor ponha Como esvoaça mosca gorda de donde se matou boi Tudo estava perfeito tranqüilo Diadorim com chapéu xíspeto alteado Nele o nenhum negar no firme do nuto nas curvas da boca em o rir dos olhos na fina cintura e em peito a tortacruz das cartucheiras Os mais zelando nas armas corriam os dedos apalpavam por afago Conversei com todos Aqui a guerra que queriam guerra Assim os meus catrumanos quais as caras deles iam ficando de demônios mais feio no demônio é o nariz e os beiços Conferi as sentinelas Fui ver onde tinham botado a Mulher ela fechada num quarto no sobrado Ficasse remetida lá sobpé de guarda O sobrado marcava o meio quase da rua Mas para a gente em armas de que é que valia aquele arraial inteiro tão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 823 vazio Determinei deixar lá memo só uns poucos como vigias Tanto o resto todo para um ponto viemos circunstância de umas duzentas braças aonde um lugar mais alto desenhado que seria para porta dos caminhos e apropriado para ali se resistir Formamos bons preparos Minha mãe vivesse e viesse ela mesma por nenhum descuido mero não havia de poder me reprovar Assim apreciei a gente às mansas e às bravas a minha jagunçada Agora eles estavam arrumando o mundo de outra maneira Tudo se media munição e era fuzil e rifle se experimentando A guerra erade todos A juízo eu não devia de mestrear demais tudo prescrevendo porque eles também tinham melindre para se desgostar ou ofender como jagunço sabe honra de profissão Dos modos deles próprios era que eu podia me saber certificado ver a preço se eu estava para ser e sendo exato chefe Com modos eu falasse Olh vigia fulano aí está bom mas lá acolá não é melhor e receava que ele respondesse me explicando por que não era não Eu questionava comigo que eles deviam de lavorar maior raiva Raiva tampa o espaço do medo assim como do medo a raiva vem Reparei isto como nenhum não citava o nome do Hermógenes Aí estava direito que no imigo em véspera não João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 824 se proseia Mal que um disse Ele não é laço é argola Ou outro que Ele adoida Mas os mais não glosavam Com o que prazi Gastura que eu tinha era só de que a ventos vai um fosse acrescentar Ele é pactário Ah E que fosse Menção não era de se afirmar regalia nenhuma Pois o demo não é de todos Altarte abri o meu maior sentir que eu havia de ter a vitória Dali o Hermógenes não saía com vida maneira nenhuma testamental Tive ódio dele Muitos ódios Só não sabia por quê Acho que tirava um ódio por causa de outro cosidamente assim seguido de diante para trás o revento todo A modo que o resumo da minha vida em desde menino era para dar cabo definitivo do Hermógenes naquele dia naquele lugar Pelejei para recordar as feições dele e o que figurei como visão foi a de um homem sem cara Preto possuindo a cara nenhuma feito se eu mesmo antes tivesse esbagaçado aquele oco a poder de balas E tudo me deu um enjôo Tinha medo não Tinha era cansaço de esperança Também eu queria que tudo tivesse logo um razoável fim em tanto para eu então largar a jagunçagem Minha Otacília horas dessas graças a Deus havia de parar longe dali João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 825 resguardada protegida O tudo conseguisse fim eu batia para lá topava com ela conduzia Aí eu aí desprezava o ofício de jagunço impostura de chefe Sei quem é chefe Só o gatilho de armadefogo e os ponteiros do relógio Sensato somente eu saísse do meio do sertão ia morar residido em fazenda perto da cidade O que eu pensei rio Urucuia é o meu rio sempre querendo fugir às voltas do sertão quando e quando mas ele vira e recai claro no São Francisco Agora Alaripe e o Quipes regulando deviam de já ter achado a minha Otacília demais pelo Paracatuacima tão longe e até semelhasse invenção isto que na madrugada eu mesmo também tinha estado em caminho de lá em tão precipitados surtos Artezinha Sei o grande sertão Sertão quem sabe dele é urubu gavião gaivota esses pássaros eles estão sempre no alto apalpando ares com pendurado pé com o olhar remedindo a alegria e as misérias todas Nessas e noutras muito extremadas coisas eu tornava a pensar o espírito em meiamão por diante permeio os outros meus entretimentos deverdade Agora tudo estava pronto das obrigações afora a de esperar que é a que regasta e se recoze A noite foi se esquentando assaz Ali também por avisante não se acendia fogueira Mas o campo esparramava muito vaga João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 826 lume Os homens formando grupos acocorados assim eles conversavam O quase que o legal agora era de se caçoarem uns dos outros desafiando quem fosse ser medroso ou duvidado na coragem Razão disso meava uma confiança a mais eu escutando satisfeito aquelas bobices com que eles porfiavam Caranguejinho sem cachaça tu vai Eh não tu Vai saudar o gado Pelos risos e debiques que divertissem de todos eu percebia a forte certeza Cada cadaum dali a pouco ia ser perigoso de nele se encostar feito um sapo que espirra Que te falo amarra o burro que a carga é sua Minha a carga está salva Mal a bem oxente quero é ver o que vou verAssim se zézombavam Aos ditos ditados feito estivessem jogando um truque sem baralhos nenhuns Por que é que aquilo me comprazia E Diadorim parava calado próximo de mim e eu concebia o verter da presença dele quando os nossos dois pensamentos se encontravam Que nem um amor no aoescuro um carinho que se ameaçava Tiroteio fervo se será Aí é que vou ver um mais menino que o Jbibe Se tu não sabe você vai saber que eu já fiz minha fama Jiribibe Pois aquele eh ele pede esmola ao rei E reproduziam muitas essas gaitagens Agora estavam acostumados com a hora do lugar e para qualquer repente refrescados Igual a um gado que vem num João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 827 pasto novo e anda e fareja reconhecendo tudo mas depois tudo aceita e então começa a resfeição Agora agora sim meus homens estavam em ponto de fogo Melhor mesmo não irem dormir antes de forte sono por se evitar espertina de criatura sozinha em espera de possível má morte Tive pena deles Disser isto o senhor podia se rir de mim declarável Ninguém nunca foi jagunço obrigado Sertanejos mire veja o sertão é uma espera enorme Vai vai uma hora eu perguntei a Diadorim A Mulher dissesse alguma coisa Isto eu não sabia por que era que estava indagando Aí eu não queria ciência de se a Mulher tivesse falado alguma coisa trivial Eu quisesse achar de saber era se ela alguma doidice de profecias havia de ter pronunciado Diadorim disse Não Mas ele devia de estar curtindo outro instar de outro assunto Sustido eu sabia o que era dele sempre pensar o imaginável de Otacília Depois de remedir o tamanho de um silêncio ele mesmo veio E o Alaripe mais o Quipes aonde foi que ficaram Esse ciúme de Diadorim não sei porque daquela vez não me deu prazer de vantagem E eu desdenhei na meiaresposta Por aí que eu disse Aí era o cão da noite que meu beiço indicava Vagalumes mais de milhar Mas o céu estava encoberto ensombrado Sofismei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 828 Meio arrependido do dito puxei outra conversa com Diadorim e ele me contrariou com derresposta com o pique de muita solércia Me lembro de tudo O que me deu raiva Mas aos poucos essa raiva minou num gosto concedido Deixei em mim Digo ao senhor se deixei sem pejo nenhum era por causa da hora a menos sobra de tempo sem possibilidades a espera de guerra Ao que alforriado me achei Deixei meu corpo querer Diadorim minha alma Eu tinha recordação do cheiro dele Mesmo no escuro assim eu tinha aquele fino das feições que eu não podia divulgar mas lembrava referido na fantasia da idéia Diadorim mesmo o bravo guerreiro ele era para tanto carinho minha repentina vontade era beijar aquele perfume no pescoço a lá aonde se acabava e remansava a dureza do queixo do rosto Beleza o que é E o senhor me jure Beleza o formato do rosto de um e que para outro pode ser decreto é para destino destinar E eu tinha de gostar tramadamente assim de Diadorim e calar qualquer palavra Ela fosse uma mulher e à alta e desprezadora que sendo eu me encorajava no dizer paixão e no fazer pegava diminuía ela no meio de meus braços Mas dois guerreiros como é como iam poder se gostar mesmo em singela conversação por detrás de tantos brios e armas Mais em antes se matar em luta um o outro E tudo impossível Três João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 829 tantos impossível que eu descuidei e falei Meu bem estivesse dia claro e eu pudesse espiar a cor de seus olhos o disse vagável num esquecimento assim como estivesse pensando somente modo se diz um verso Diadorim se pôs pra trás só assustado O senhor não fala sério ele rompeu e disse se desprazendo O senhor que ele disse Riu mamente Arrepio como recaí em mim furioso com meu patetear Não te ofendo Mano Sei que tu é corajoso eu disfarcei afetando que tinha sido brinca de zombarias recompondo o significado Aí e levantei convidei para se andar Eu queria airar um tanto Diadorim me acompanhou Era uma noite de toda fundura Estava dando um vento esquisito para aquele tempo por ser um vento emhora do lado suão emhora do norte conforme se riscando um fósforo ou jogando punhado de areia fina clara para cima se conhecia Andamos Mas agora eu já tinha demudado o meu sentir que era por Diadorim uma amizade somente reireal exata de forte mesmo mais do que amizade Essa simpatia que em mim me au mentava De tanto que eu podia honestamente dizer a ele o meu bemquerer constância da minha estimação João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 830 Não disse Por que que não disse foi porque o perigo da ocasião me invocou achei que podia ser agouro em véspera de guerra a conversa afeiçoada assim Diadorim em que era que ele devia de estar pensando é o que eu não soube não sei à minha morte esta pergunta faço Como certo é que só do sem mais de coisas falamos sem nenhuma expedição Até que o vento revirou mudando inteiro que vinha era só do norte conforme neste lado da minha cara ele só se fez quente refrescando O sertão ventou rouco Com formas que logo se ajuizou de poder supravir chuva forte e carecido foi que determinamos de retornar com tudo para se ir dormir mesmo nas casas do arraial só uns poucos homens de vigia se deixando naquele alto a padrasto E isso era o exato mas me aborreceu demais e me cansou mais do que as outras peripécias Consabido que na noite antes eu tinha viajado em todo regime das estrelas e mais ainda no dia afora as duas ou três horinhas de sono de madrugada Foi eu ver um catre e me trespassei Ainda disse uma recomendação que tirante caso resoluto em hora qualquer não me chamassem Dormi mortalmente Essa foi noite que eu dormi sendo o chefe UrutuBranco mesmo dizer o jagunço Riobaldo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 831 Acordei último Alteado se podia nadar no sol Aí quase que não se passavam mais os bandos de pássaros Mesmo perfiz que o dia ia dever ser bonito firme O calor fortalecia e logo ia se secando o chão umas poças de lama e as árvores com gotejos porque de noite tinha caído uma bruega Bebi café comi um naco de carne gorda repassada na farinha mastiguei um taco de rapadura Enquanto vi meu pessoal discorria na mesma dispo sição influentes como antes Tornamos para o ponto demonstrado de espera cada um caçando seu atrincheirado Chegou o Cavalcânti vindo do CererêVelho com recado nenhumas novidades Para o CererêVelho recambiei aviso nenhumas novidades minhas também O que positivo era e do que os meus vigiadores do rededor davam confirmação Antes mesmo por mais que eu quisesse ficar prevenido o dia era de paz Todos percebessem Era uma paz gritável Será que não vão vir algum maldisse no rifle se escorando Vez vendo duvidei Chegou a me dar desânimo fato que não viessem e a gente ter de adiar fim recomeço rodando por esse mundo a fora em vã caçada Ah não retemperei Homem nenhum podia deixar a mulher sojugada presa em mão de outros e demorar desistido de ataque Vinha que vinha mais hora menos hora Todos espe rassem E eu mesmo de todas minhas armas não larguei quando João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 832 desci para momento de lavar o corpo no rio Que tão perto era E de lá todo movimento dos meus eu avistava Duvido Desavistei foi na mente não foi dos olhos Como que o avio de descangar as armas de sobre mim e as cartucheiras e o vagar de tirar a roupa e remolhar os pulsos e fazer menção para entrar na água com conforto essas ações tiravam conta do meu estar como um alívio de sossego Eu tinha a certeza de paz por horas E o demo me disse Disse mas foi assim tiros Choque que levei foi feito um trovão Começou a se bradar Os gritos tiros Que foi mesmo que eu primeiro ouvi Primeiro dum pulo bruto eu já estava lá pegando minhas roupas armado prestes E vi o mundo fantasmo A minha gente bramando e avisando e descarregando e também se desabalando de lá xamenxame de abelhas bravas Mas por quê eu desentendi e tornei a entender depressa demais que o ini migo dera de se estourar todo derepentemente da banda outra lugar donde não devia de vir nem ali possível de ser esperado Eles eram quantidade Cru e cru que avançavam avançando como que já iam tomar o Paredão as casas na ponta do arraial Estarreci Que na prema da minha ausência o muito mundo se João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 833 acabava Tudo diferente da cartada E eu sei o que é estupor que eu tinha pegado calça e camisa em mão e esbarrei num demorado sem termo no meio de me revestir e eu num latejo frouxo pensando Não chego em tempo Não adianta Não chego em tempo nenhum Sei lá o tanto que isso durou E eu via o meu pessoal avançar também com brabura e diligência na outra ponta a modo de impedir que o arraial fosse tomado Porque o Paredão era uma rua só e aquilo ficou de enfiada um cano de balas Mas no mesmo ar de ar em que eu via aquilo lavorei pensando que eu era tonto e burro e idiota as mil vezes porque agora estava perdida irremediavelmente minha ocasião e a guerra descambava fora do meu poder E eu acabei de me enroupar mal mal e escutava essas vozes Tu não vai lá tu é doido Não adianta Não vai e deixa que eles mesmos uns e outros resolvam porque agora eles começaram tudo errado e diferente sem perfeição nenhuma e tu não tem mais nada com isso por causa que eles estragaram a guerra Assim ouvi sussurro muito suave vozinha mentindo de muito amiga minha O meu medo Não Ah não Mas meus pêlos crescendo em todo o corpo Mas essa horrorizância Daquela doçura nojenta de voz E senti meu corpo muito grande Me xinguei Um sujeito vinha correndo nele eu João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 834 quase atirei Desertor Ah não esse o Sidurino era correndo por um cavalo Ah e bem fosse ia voltear para o CererêVelho chamar trazer reforço para darem retaguarda E eu casei com meu rifle vim vim vim Desconheci temor nenhum Vivo em vida me ajuntei com os companheiros Meus homens dei ordens As balas estralejavam Foi fogo posto Arrasar que vem de para onde não se olha feito forte sol e vem como sol nascendo Rachavam lascas espatifavam Aí podiam descascar os arvoredos de uma dessas floresta toda inteira Apraz que os ares Ah esses meus jagunços apragatados pebas formavam trincheira em chão e em tudo Eles sabiam a guerra por si feito já tivessem sabido na mãe e no pai Só se aos uivos urros se zurrava Aí como tomei chegada e peguei postura Valia ver comandar Gritei Chagas de Cristo Os meus davam ainda outros gritos A carabina em mãos coisa mexedora A gente disparava dentro dos quintais avançávamos E de detrás das casas E guardávamos o emboque da rua Diz que lê dizque escreve Tiro ali era máquina Aos tantos juntos relando cinco deles cinco dedos cinco mãos A gente tinha de caber em buracos escavacados A cabeça da gente é que dá voltas mesmo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 835 no esconderijo como para se desviar Mas não se tem medo a gasto Eu dizia fré e botava bililica na agulha Amanso Eu queria que Diadorim não se descuidasse Diadorim disse Toma cautela Riobaldo Diadorim se descabelou bonitamente o rosto dele se principiava dos olhos Eu comandava Um comanda é com o hoje não é com o ontem Aí eu era UrutuBranco mas tinha de ser o cerzidor Tatarana o que em ponto melhor alvejava Medo não me conheceu vaca Ca rabina Quem mirou em mim e eu nele e escapou milagre e eu não ter morrido milagremente A morte de cada um já está em edital Dia de minha sorte O que digo e desdigo o senhor escute Mas o inimigo fuzuavatiroteio total Tudo ali era à maldição as sementes de matar De ouvir o renje uimuim dessas perto de nossos cabelos eles sobem de si e chega a doer de nervoso mas dói real como se umas daquelas atravessassem até buracal do olho da gente mas feito dor que vara do céudaboca por dentro dos ossos pontudamente igual quando às vezes se come sorvete de gelo Era a cara pura da morte Avave Marcelino Pampa logo esse Nem olhou ninguém Curvou o corpo quase se quebrando em dois ia encostar testa no chão e largou tudo espaireceu as mãos e bofou da boca diversos dois feixes de sangue Sangue dele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 836 Semelhava que um boi nele tivesse pisado E eu desfechei dez para a frente vingando fosse Daí vigiei Um homem morre mais que vive sem susto de instantaneamente e está ainda com re mela nos olhos ranho moco no nariz cuspes na boca e obra e urina e restos de decomer nas barrigas Mas Marcelino Pampa era ouro merecia lágrimas dalguma mulher perto mão tremente que lhe fechasse bem os olhos Porque não se vê outro assim com tão legítimo valor capaz de ser e valer sem querer parecer E uma vela acesa uma que fosse ali ao pé a fim de que o fogo alumiar a primeira indicação para a alma dele que se diz que o fogo somente é que vige das duas bandas da morte da de lá e da de cá E eu peguei puxei o corpo para não ficar em cima dum vestígio de lama porque ali de noite tinha chovido e Diadorim panhou o chapéudecouro com qual tapou o rosto do dono A paz no Céu ainda hojeemdia para esse companheiro Marcelino Pampa que de certo dava para grande homemdebem caso se tivesse nascido em grande cidade Ah pápá falei fogo Aquilo em volta se arrebentava balalhava Mas a gente tinha conseguido de firmar possessão agarramos mais da metade do arraial do arruado O sobrado restou nosso Com anseio olhei para muito ver o sobrado rico da banda da mão direita da rua com suas portas e janelas João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 837 pintadas de azul tão bem esquadriadas Aquela era a residência alta do Paredão soberana das outras Dentro dela estava sobre guardada a Mulher de custódia E o menino Guirigó e o cego Borromeu a salvos Da parte de cima das janelas e das portas no rés vez a vez meus homens descarregavam Aquele sobrado sobradão parava lá sobre sereno me prazia tudo comandando Ir lá Atual em riba estão dois um é o José Gervásio Embaixo na venda uns quatro quem me informou disso foi o Jiribibe em meu ouvido carecendo de altear voz tanto que espingardaria estrondava Pouco é para ações Tu vai lá Riobaldo quem me disse foi Diadorim em tanto Surriada zuniu O tutuco das balas e as que batiam no chão as raivosas tirando terra Atirei seco Umas três ou quatro vezes Carreguei em novamente Aqui é que é meu dever Diadorim Por o mais perigoso eu falei muito alerta Tudo que Diadorim aconselhasse eu punha de remissa a modo de que com pressentimentos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 838 Tu vai Riobaldo Acolá no alto é que o lugar de chefe Com teu dever pela pontaria mestra que lá em riba de lá tu mais alcança Constante que aqui o negócio está garantido ele disse mansinho de me persuadir Troquei o riflepapo pelo máuser movi mão fogo Nesse ato nem sei se matei Às artes lá o sobrado que torna mirei e admirei Meu posto O quanto também olhei Diadorim ele firme se mostrando feito veadamãe que vem aparecer e refugir de propósito em chamariz de finta para a gente não dar com o veadinho filhote onde é que está amoitado Aquele sobrado era a torre Assumido superior nas alturas dele é que era para um chefe comandar reger o todo cantão de guerra Eu vou fui Deixado João Curiol no meu lugar e esse tinha muita valia Rastejei tomei saída conforme tinha de ir pelos quintais das casas Ainda virei relanceando Sempre queria ver Diadorim O quererbem da gente se despedindo feito um riso e soluço nesse meio de vida Avancei furando os terreiros e as hortas das casas eu debaixo de armas nos arreios Toda a parte ali tinha gente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 839 nossa que com brados me saudavam conforme vale quando um chefe mostra mor valentia Gente com o Jõe Bexiguento sobrechamado o Alpercatas E estava lá o João Nonato que dava boasorte com o bom ar Avancei rompi uma cerquinha de taquara contornei um pano de muro onde o Paspe tinha furado os adobes cavando torneiras E dei fé que o Jiribibe vinha me acompanhando O menino bom Os olhinhos dele a gente só via era porque eram inventados de pretos Será da banda de lá estão bem governando os clavinoteiros ele me disse Aí por que me dizia Soubesse não que o brinquedo agora era mortal Sobre o que se riu me apresentando o que era no fofo da terra debaixo duma roseira um gatinho pretoe branco dormindo seu completo sossego fosse surdo refestelado ele estava até de mãos postas Mas perto de mim veio grão daço que varou cheiamente um pé de mamoeiro Vigia te abaixa eu ralhei com o Jiribibe A gente ouvia a urração ou cita seja destemperada dos inimigos e um desentoar de cantiga que toda pessoa era filhoda segundo a qual Aos canalhas Mas mais xingava o Jiribibe ripostando Daí depressa ganhamos trincheiras atrás dum forno de assar biscoitos e berraram punhadão de disparos para nosso lado chega semelhava rajada de chuvadepedra Lugar danoso João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 840 Aguardamos deitados Te foge Jiribibe que figuro eles têm gente atirando de cima de árvores eu total aconselhei Assim rastejávamos E pouco faltava para o quintal do sobrado só uma cerca miúda com um chuchuzeiro dependurado com chuchus grandes eram uns chuchus enormes Vam boro Chefe que o Jiribibe gritou E caiu morto para pra cá acertado na testa Não gritei e rastejei Ao quando dar o derradeiro lance na porta da cozinha do sobrado derrubei uma bacia grande que lá empé encostada estava Aí entrei Aquela bacia atrás de mim levou uma carga de tirázios com a qual retiniu toda lata velha No eu entrar os que ali vi me saudaram Epa Chefe Respondi Eh epa E naquele instante pensei aquela guerra já estava ficando adoidada E medo não tive Subi a escada O senhor escute meu coração pegue no meu pulso O senhor avista meus cabelos brancos Viver não é é muito perigoso Porque ainda não se sabe Porque aprenderaviver é que é o viver mesmo O sertão me produz depois me engoliu depois me cuspiu do quente da boca O senhor crê minha narração João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 841 Subi aquela escadaderedor escutando a madeira nos meus passos e avisando Quem evém sou eu minha gente repetido Aquilo meio sombrio o ar que dava era como de ser antigo diadedomingo Aí notei que eu mesmo arfava um pouco e estava com uma sede Por lá devia de ter algum pote fresco imaginei É eu minha gente eu disse mesmo assim eles se assustaram primeiro depois tomaram satisfação por me ver Os que na sala que dava para a frente da rua estavam os quais eram que o Araruta e o José Gervásio nas armas e o menino Guirigó e o cego Borromeu assentados no banco encostado na parede para o interno Esses dois muito juntos como que tremiam um tanto deviam de estar rezando Que e a mulher eu indaguei O menino Guirigó queria mostrar ela estava presa num quarto Ela também estivesse rezando Corredor velho para ele davam tantas portas por detrás duma delas tinham fechado a mulher num cômodo A chave estava na mão do cego Borromeu Era uma chave de todotamanho ele fez menção de me entregar rejeitei Tem talha dágua por aqui eu disse eu tinha uma pressa desordenada de certo Diz que lá embaixo tem foi o que o menino Guirigó me deu resposta Entendi que ele curtia sede igualmente e querendo comigo ir João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 842 por seguro temia descer sozinho a escada E o cego Borromeu também que não respondeu mas que mexeu a boca mole mole fazendo desse rumor de quem termina de mastigar rapadura Me enjoou Mas ele não tinha comido alguma coisa Não tive comigo Tu me ouve xixilado tu me ouve Assim tu me dá respeito e agradece interesses de ter tomado conta de você e trazido em companhia minha por todas as partes Eu disse Ele disse Deus vos proteja Chefe dê ademão por nós todos E de tudo peço perdão Ele se ajoelhou Ouvir e ver isso me embaraçasse eu já pegava ponto de remorso Porque esse homem sem visão carnal de valia nenhuma maldade minha era que tinha sido a trazida dele de em desde o começo de lugar onde ele cumpria sua vida E agora ele devia de padecer o redobrado medo concebendo que vai ou vai a gente fugisse dali e ele para trás parasse para as unhas dos outros Mas a cena desses todos pensamentos em mim foi ligeira demais conforme não tinham geração A meio me lembro e conto é só para firmar minha capacidade Como o reslumbre que no tento da hora eu prezei em Otacília juízo vago Como para a janela eu fui quase que na imaginação de botar meu olhar e haver de ver no longe tal o lugar aonde ela andava Conto para o senhor conhecer quanta espécie de causa no mover da João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 843 mente no mero da tragagem de guerra E o José Gervásio e o Araruta cada um em beira duma janela agachados carabinas em mão as cheias cartucheiras Para mim era que olhavam estudados querendo algum qualquer sinal E aí uma bala alta abelhou se seguindo sozinha muito rente com cujo barulho de música que fez eu conheci que era de comblém Eu tinha de dar mais espertação ainda àqueles dois Tenência Para uma janela me cheguei E endureci no rifle Em volta relanceei Eu o bedegas Saiba o senhor eu estava ali assim em padastro de todos de do ar de rechego feito que em jiraudeespera para castigar onça assassinã Vi ou não vi Só espreitei Dono do que lucrei de espreitar Uns deles num terreiro acolá manobravam a gosto nas más armas Assestei Um era um sujeitão muito baiano nos trajes Do gatilho do rifle no triz me mandei nele Aquele caiu torto o outro completou Assim eram três o derradeiro percebeu que tinha céu e correu dando gambetas Zumba levou não sei quantas esburacadoras na tampa de suas costas Ah ali valia donde que eu estava Ao mesmo quando revingaram com umas descargas despejadas Dei atrás mas sobranceei de talaia Fazia bem duas horas que aquela batalha tinha principiado Se estava no poder do meiodia João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 844 De graça berra é o boi tirante a vaca Dessa daquela vez tudo não acabava sem um fim ferrado que o Hermógenes não era cão de desmorder os dentes e ele vinha de cinqüenta léguas Toada tinha de ter um prazo E há um vero jeito de tudo se contar uma vivença dessas Os tiros gritos eco baque boléu urros nos tiros e coisas rebentáveis Dava até silêncio Pois porque variava naquele compasso que bater papocar lascar estralar e trovejar truxe cerrando fogo e daí marasmar o calado de repente ou vindo aos tantos se esmorecendo de devagar Tempo que me mediu Tempo Se as pessoas esbarrassem para pensar tem uma coisa eu vejo é o puro tempo vindo de baixo quieto mole como a enchente duma água Tempo é a vida da morte imperfeição Bobices minhas o senhor em mim não medite Mas sobre uns assuntos assim reponho era que eu almejava ter perguntado a Diadorim na véspera de noite conforme quando com ele passeei Naquela hora eu cismasse de perguntar a Diadorim Tu não acha que todo o mundo é doido Que um só deixa de doido ser é em horas de sentir a completa coragem ou o amor Ou em horas em que consegue rezar João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 845 Não indaguei Mas eu sabia que Diadorim havia de me dar resposta Doca Ramiro não era doido nenhum Riobaldo e ele mataram Então eu podia revia Mas porém quando isto tudo findar Diá Di então quando eu casar tu deve de vir viver em companhia com a gente numa fazenda em boa beira do Urucuia O Urucuia perto da barra também tem belas troas de areia e ilhas que forma com verdes árvores debruçadas E a lá se dão os pássaros de todos os mesmos prazentes pássaros do Rio das Velhas da saudade jaburu e galinhol e garçabranca a garça rosada que repassa em extensos no ar feito vestido de mulher E o manuelzinhodatroa que pisa e se desempenha tão catita o manuelzinho não é mesmo de todos o passarinho lindo de mais amor Podia ser Impossivelmente Eu não tinha sido capaz de perguntar aqueles ensalmos a Diadorim de fato só em coisa àtoa se conversou trivial a respeito de munição e meus armamentos e avio de guerra Véspera As horas é que formam o longe Mas agora ali em ocasiões de morte eu repisei e mesmo amontado no momento que era que eu ia dizer a Diadorim se perto de mim João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 846 ele parasse Hoje não sei Não soubesse naqueles adiantes Ali por onde eu estava eu marcava muito suave a mão da morte feito um boiadeiro que em janela ou porta ou tábua de curral ou parede de casa por todas as partes por onde anda carimba remarcada a amostra do ferro dele de seu gado para se conhecer Assim Como lembro que eu tinha uma dorde cabeça era uma dordecabeça forte fincada num ai só furante de verrumas Agüentei Devia de ser da sede Dá deu bala beijaflorou Zuos ao que rachavam ombreiras das janelas estraçalhavam esfarelavam fasquia Umas que caíam quase como colhidas no assoalho do chão tinham dançado de ricochete e ficavam para lá amolgadas feito pedaço de cano ou aveladas de maduras Essas podiam se esfriar de vagarinho Perdiam sem valia aquele feio calor que podia ter sido a vida de uma pessoa O José Gervásio e o Araruta recuaram para o meio da sala me recomendaram me acautelasse Mas eu permaneci Disse que não não não Minhas duas mãos tinham tomado um tremer que não era de medo fatal Minhas pernas não tremiam Mas os dedos se estremecitavam esfiapado sacudindo curvos que eu tocasse sanfona Aí gritei Estrumes Deram fuzilada Fogo fechado as cargas de pólvora e o despejar e assoviar como o João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 847 vento ronda no final das águas Mesmo assim eu queria e visava dali não saí do vão aberto não dando de meu poder Desfechei bem Por mim meu desprezo como essas assoviantes deles varejavam Eu não estava caçando a morte o senhor bem me entenda Eu queria era a coragem maior Macho com meu fuzil reiúno dei salvas Tive fechado o corpo Quero que não não pergunto Não morri e matei E vi Sem perigo de minha pessoa Aí quando foi monumental peguei susto lá embaixo muito estava demudando Só se fez que inesperadamente parte do povo do Hermógenes que tantos eram a rascorja tinham alcançado de rodear por trás da minha gente na ponta da rua tomando retaguarda Iam vencer fosse possível Temi por todos Ah não que não regiam Dindhoje o amigo meu João Vaqueiro eu estou vendo mais homem mais moreno arrenegando de todos os macacos nem suor ele não desperdiçava o que ele vestiu vestiu couro é e vai embora dando muito as costas lá adiante acometendo contra outros outros Morreu que mataram Em obra de umas cem braças Ah não Os nossos agüentavam o relance arre disparando a mastro de balas foi um fogo João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 848 E eu hesitado nos meus pés refiz fé teve o instante eu sabia meu dever de fazer Descer para lá me ajuntar com os meus para ajudar Não podia não devia de daí conheci Ali um homem um chefe carecia de ficar naquele meu lugar no sobrado Mas resoluto mandei ao Araruta e ao José Gervásio que fossem mas fossem Eles mesmos queriam ir Eles desceram a escada Estado daquele fogo era um pipoco malacreditado Tudo não sendo guerra entendi Um panelão na trempe o que se cozinhava Sobrestive Surgindo o fim eu restava desandado ao para trás sozinho só com os dois O menino Guirigó uma mão apertando as costas da outra seguidos esses estremecimentos repuxava a cara mas com os beiços abertos em dor tudo uma careta Ele era um menino E o cego Borromeu fechava os olhos Tive pena Não ouvi nada eu disse Deveras Eu disse Vocês têm paciência meus filhos O mundo é meu mas é demorado A arte que prometi que mais baque mais retumbo a gente ganhava a gente ganhava a gente ganhava Antes bati uma palmada firme no liso da minha coronha A vitória Ah a vitória eu no meio dela que com os ventos arrastado João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 849 E não era Durou dali a meiahora nem bem e vislumbrei outro alvoroço mas da ponta da outra banda e festivo para mim me dando milagre Eli do ar Eh dunga Ao que era que tal era que repentemente o pessoal meu do CererêVelho sequazes de João Goanhá suprachegavam também enfrentando os Hermógenes pelas costas davam a toda retaguarda De alegre ser destampei tiro sobre tiro A guerra agora tinha ficado enorme O senhor supute lado a lado somando derramavam de ser os trezentos e tantos reinando ao estral de ser jagunços Teria restado mais algum trabuco simples nos Gerais Não tinha E ali era para se confirmar coragem contra coragem à rasga de se destruir a toda munição Dessa guisa enrolada como que lavrar uma guerra de dentro e outra de fora cada um cercado e cercando Recompor aquilo no final Só com a vitória Duvidei não Nasci para ser Esbarrando aquele momento era eu sobre vez por todos eu enorme que era o que mais alto se realçava E conheci oficio de destino meu real era o de não ter medo Ter medo nenhum Não tive Não tivesse e tudo se desmanchava delicado para distante de mim pelo meu vencer ilha em águas claras Conheci Enchi minha história Até João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 850 que nisso alguém se riu de mim como que escutei O que era um riso escondido tão exato em mim como o meu mesmo atabafado Donde desconfiei Não pensei no que não queria pensar e certifiquei que isso era idéia falsa próxima e então eu ia denunciar nome dar a cita Satanão Sujo e dele disse somentes S Sertão Sertão Na meiadetença ouvi um limpado de garganta Virei para trás Só era o cego Borromeu que moveu os braços e as mãos feio feito negro que embala clavinote Sem nem sei por que mal que perguntei Você é o Sertão Ossenhor perfeitamém ossenhor perfeitamém Que sou é o cego Borromeu Ossenhor meussenhor ele retorquiu Voxe uai Não entendo tartamelei Gago não gagaz Conforme que quando ia principiar a falar pressenti que a língua estremecia para trás e igual assim todas as partes de minha cara que tremiam dos beiços nas faces até na ponta do nariz e do queixo Mas me fiz Que o ato do medo não tive Mandei o cego se sentar e ele obedeceu ele João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 851 estava no aparvoado mas não se abancando no banco que melhor se agachou ficou agachado Riu de me dar nojo Mas nojo medo é é não Destemor maior Deus não me desse segundo retornei para a praça da janela donde eu dava e mandava Sobreolhava Ah máuser e winchester que assoviamzinho sutil E chio de espingardão velho antigo Chum beou Háde varavam Como refiro que também eu não persistia ali aparte de tudo desperdício mais antes quem se avultasse baqueava Carabina Sucinto que se passou horas tantas estalos e estrondos estouros sotrançando no chicotear das balasbalas sempre disso Sempremente Ao constante que eu estive copiando o meu destino Mas como vou contar ao senhor Ao que narro assim refrio e esvaziado luísesilva O senhor não sabe o senhor não vê Conto o que fiz O que adjaz Que eu manejava na mira Dava dava E que não pronunciei insultos e gritos mesmo porque minha boca a modo que naquele preciso tremor me malobedecia Sapateei em vez bati pé de pilão nas tábuas do assoalho tão surdo o senhor é capaz que escute como eu escutei E o que o furor da guerra lá fora lá embaixo tomava certa conta de mim que a quase eu deixava de dar fé da dorde cabeça que forte me doía que doesse vindo do céudaboca João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 852 conforme desde aos poucos que o fogo tinha começado E que água não provei bebida nem cigarro pitei Esperançando meu destino desgraça de mim Eu Eu Como vou contar e o senhor sentir em meu estado O senhor sobrenasceu lá O senhor mordeu aquilo O senhor conheceu Diadorim meu senhor Ah o senhor pensa que morte é choro e sofismaterra funda e ossos quietos O senhor havia de conceber alguém aurorear de todo amor e morrer como só para um O senhor devia de ver homens à mãotente se matando a crer com babas raivas Ou a arte de um tátá tiro e o outro vir na fumaça de àfaca de repelo quando o que já defunto era quem mais matava O senhor Me dê um silêncio Eu vou contar Tudo estava tão pendurado para o fim Derradeiro ainda foi que eu virei para trás para repreender o cego Borromeu e que eu estava com dormente dor nos braços Semordem daquele cego estúrdio agachado lá cocoral Só fez que disse bronco Quem me dê um decomer Respondi ralhei Ah hádeo singular ficasse mesmo ali mascando fumo grosso e cuspindo amarelo e preto Dei num suor Vozeiro dele então João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 853 de repente que principiou a cantar ele estava cantando um louvado Como os braços me testemunhavam um peso Mesmo estranhei quando fui notando que o tiroteio da rua tinha pousado termo achei que fazia um certo minuto que o fogo teria sopitado Cessaram sim Mas gritavam vuvu vavava de conversa ruim uns para os outros de rondaroda Haviam de ter desautorizado toda munição Olhando desentendi Atirar eu pudesse Acho que quis gritar e esperei para depoismente mais tarde Mesmo o que vi aquele mexinflol E que quem saía duma porta para ir se juntar com o bando de todos armou segurando frente de si engatilhada uma garrucha de dois canos pôs a mira que era o catrumano Teofrásio como se fosse braçodarmas E vi chefiando os dele o Hermógenes Chapéu na cabeça era um bandejão redondo Homem que se desata Entendi O senhor me socorre Conheci o que estava para ser que os dele e os meus tinham cruzado grande e doido desafio conforme para cumprir se arrumavam uns e outros nas duas pontas da rua debaixo de forma e a frio desembainhavam O que vendo vi Diadorim movimentos dele Querer mil gritar e não pude desmim de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 854 mimmesmo me tonteava numas ânsias E tinha o inferno daquela rua para encurralar comprido Tiraram minha voz Como vinham de lá e de lá em contraranchos a tomar armas as cartucheiras de tiracol Atirar eu pude A breca torceu e lesou meus braços estorvados Pela espinha abaixo eu suei em fio vertiginoso Quem era que me desbraçava e me peava supilando minhas forças Tua honra Minha honra de homem valente eu me em mim gemi alma que perdeu o corpo O fuzil caiu de minhas mãos que nem pude segurar com o queixo e com os peitos Eu vi minhas agarras não valerem Até que trespassei de horror precipício branco Diadorim a vir do topo da rua punhal em mão avançar correndo amouco Ai eles se vinham cometer Os trezentos passos Como eu estava depravado a vivo quedando Eles todos na fúria tão animosamente Menos eu Arrepele que não prestava para tramandar uma ordem gritar um conselho Nem cochichar comigo pude Boca se encheu de cuspes Babei Mas eles vinham se avinham num pédevento no desadoro bramavam se investiram Ao que fechou o fim e se fizeram E eu arrevessei na ânsia por um livramento Quando quis rezar e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 855 só um pensamento como raio e raio que em mim Que o senhor sabe Qual o Diabo na rua no meio do redemunho O senhor soubesse Diadorim eu queria versegurar com os olhos Escutei o medo claro nos meus dentes O Hermó genes desumano dronho nos cabelões da barba Diadorim foi nele Negaceou com uma quebra de corpo gambetou E eles sanharam e baralharam terçaram De supetão e só E eu estando vendo Trecheio aquilo rodou encarniçados roldão de tal dobravam para fora e para dentro com braços e pernas rodejando como quem corre nas entortações O diabo na rua no meio do redemunho Sangue Cortavam toucinho debaixo de couro humano esfaqueavam carnes Vi camisa de baetilha e vi as costas de homem remando no caminho para o chão como corpo de porco sapecado e rapado Sofri rezar e não podia num cambaleio Ao ferreio as facas vermelhas no embrulhável A faca a faca eles se cortaram até os suspensórios O diabo na rua no meio do redemunho Assim ah mirei e vi o claro claramente ai Diadorim cravar e sangrar o Hermógenes Ah cravou no vão e ressurtiu o alto esguicho de sangue porfiou para bem matar Soluço que não pude mar que eu queria um socorro de rezar uma palavra que fosse bradada ou em muda e secou e só orvalhou em mim por prestígios do João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 856 arrebatado no momento foi poder imaginar a minha Nossa Senhora assentada no meio da igreja Gole de consolo Como lá embaixo era fel de morte sem perdão nenhum Que engoli vivo Gemidos de todo ódio Os urros Como de repente não vi mais Diadorim No céu um pano de nuvens Diadorim Naquilo eu então pude no corte da dor me mexi mordi minha mão de redoer com ira de tudo Subi os abismos De mais longe agora davam uns tiros esses tiros vinham de profundas profundezas Trespassei Eu estou depois das tempestades O senhor nonada conhece de mim sabe o muito ou o pouco O Urucuia é ázigo Vida vencida de um caminhos todos para trás é história que instrui vida do senhor algum O senhor enche uma caderneta O senhor vê aonde é o sertão Beira dele meio dele Tudo sai é mesmo de escuros buracos tirante o que vem do Céu Eu sei Conforme conto Como retornei tarde depois mal sabendo de mim e querendo emendar nó no tempo tateando com meus olhos que ainda restavam fechados Ouvi os rogos do menino Guirigó e do cego Borromeu esfregando meu peito e meus braços reconstituindo no dizer que eu tinha estado sem João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 857 acordo dado ataque mas que não tivesse espumado nem babado Sobrenadei E daí não sei bem eu estava recebendo socorro de outros o Jacaré PacamãdePresas João Curiol e o Acauã que molhavam minhas faces e minha boca lambi a água Eu despertei de todo como no instante em que o trovão não acabou de rolar até o fundo e se sabe que caiu o raio Diadorim tinha morrido milvezesmente para sempre de mim e eu sabia e não queria saber meus olhos marejavam E a guerra eu disse Chefe Chefe ganhamos que acabamos com eles João Goanhá e o Fafafa com uns dos nossos ainda seguiram perseguindo os restos derradeira demão João Concliz deu resposta O Hermógenes está morto remorto matado quem falou foi o João Curiol Morto Remorto O do Demo Havia nenhum Hermógenes mais Assim de certo resumido do jeito de quem cravado com um rombo esfaqueante se sangra todo no vãodopescoço já ficou amarelo completo oca de terra semblante puxado escarnecente como quem da gente se quer rir cara sepultada Um Hermógenes João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 858 Nas vozes nos fatos que agora todos estavam explicando por tanto que assim tristonhamente a gente vencia Sobresseguida à doideira de mãodeguerra na rua João Goanhá tinha carregado em cima dos bandidos deles que estavam dando retaguarda e com eles rebentado Aquilo não fazia razão Suspendi minhas mãos Vi que podia Só o corpo me estivesse meio duro as pernas teimando em se entesar num emperro que às vezes me empalhava Sendo que me levantei sustentando e caminhei os passos as costas para a janela eu dava Nesse ponto foi que o Alaripe e o Quipes vinham chegando Notícia de Otacília me dessem eu custava a me lembrar de tantas coisas Aqueles dois vinham alheios do que vinham desiludidos da viagem deles Era a vossa noiva não Chefe o que Alaripe relatava O homem se chamava só Adão Lemes indo conduzindo a irmã dele fazendeira cujo nome é Aesmeralda Iam de volta para suas casas Os que então no PortodoCi deixamos na barra do Caatinga Tanta gente tinha o mundo eu pensei Tanta vida para a discórdia Agradeci ao Alaripe mas virei para os outros nossos perguntei João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 859 Mortos muitos Demais Isto o João Curiol me respondeu prestativamente sistema de amigo Solucei em seco debaixo de nada Agora um me dizendo que com as ferramentas uns estavam trabalhando de abrir covas para enterro revezados Alaripe fez um cigarro queria dar para mim que rejeitei E o Hermógenes aí foi o que o Alaripe perguntou Como estavam indo abrir aquele quarto trazendo do corredor a mulher do Hermógenes Ela visse A senhora chegue na janela dona espia para a rua o que João Concliz falou Aquela Mulher não era malina A senhora conheça dona um homem demõiado que foi mas que já começou a feder retalhado na virtude do ferro Aquela Mulher ia sofrer Mas ela disse que não sacudindo só de leve a cabeça com respeito de seriedade Eu tinha ódio dele ela disse me estremecendo Ou eu ainda não estava bem de mim da dor que me nublou tive de sentar no banco da parede Como no perdido mal ouvi partes do vozeio de todos eu em malmolência Tomaram as roupas da mulher nua Era a Mulher que falava Ah e a Mulher rogava Que trouxessem o corpo daquele rapaz moço vistoso o dos olhos muito verdes Eu desguisei Eu deixei minhas lágrimas virem e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 860 ordenando Traz Diadorim conforme era Gente vamos trazer Esse é o Reinaldo o que o Alaripe disse E eu parava ali permeio o menino Guirigó e o cego Borromeu Ai Jesus foi o que eu ouvi dessas vozes deles Aquela Mulher não era má de todo Pelas lágrimas fortes que esquentavam meu rosto e salgavam minha boca mas que já frias já rolavam Diadorim Diadorim oh ah meusburitizais levados de verdes Buriti do ouro da flor E subiram as escadas com ele em cima de mesa foi posto Diadorim Diadorim será que amereci só por metade Com meus molhados olhos não olhei bem como que garças voavam E que fossem campear velas ou tocha de cera e acender altas fogueiras de boa lenha em volta do escuro do arraial Sufoquei numa estrangulação de dó Constante o que a Mulher disse carecia de se lavar e vestir o corpo Piedade como que ela mesma embebendo toalha limpou as faces de Diadorim casca de tão grosso sangue repisado E a beleza dele permanecia só permanecia mais impossivelmente Mesmo como jazendo assim nesse pó de palidez feito a coisa e máscara sem gota nenhuma Os olhos dele ficados para a gente ver A cara economizada a boca secada Os cabelos com marca de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 861 duráveis Não escrevo não falo para assim não ser não foi não é não fica sendo Diadorim Eu dizendo que a Mulher ia lavar o corpo dele Ela rezava rezas da Bahia Mandou todo o mundo sair Eu fiquei E a Mulher abanou brandamente a cabeça consoante deu um suspiro simples Ela me malentendia Não me mostrou de propósito o corpo E disse Diadorim nu de tudo E ela disse A Deus dada Pobrezinha E disse Eu conheci Como em todo o tempo antes eu não contei ao senhor e mercê peço mas para o senhor divulgar comigo a par justo o travo de tanto segredo sabendo somente no átimo em que eu também só soube Que Diadorim era o corpo de uma mulher moça perfeita Estarreci A dor não pode mais do que a surpresa A coice darma de coronha Ela era Tal que assim se desencantava num encanto tão terrível e levantei mão para me benzer mas com ela tapei foi um soluçar e enxuguei as lágrimas maiores Uivei Diadorim Diadorim era uma mulher Diadorim era mulher como o sol não acende a água do rio Urucuia como eu solucei meu desespero João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 862 O senhor não repare Demore que eu conto A vida da gente nunca tem termo real Eu estendi as mãos para tocar naquele corpo e estremeci retirando as mãos para trás incendiável abaixei meus olhos E a Mulher estendeu a toalha recobrindo as partes Mas aqueles olhos eu beijei e as faces a boca Adivinhava os cabelos Cabelos que cortou com tesoura de prata Cabelos que no só ser haviam de dar para baixo da cintura E eu não sabia por que nome chamar eu exclamei me doendo Meu amor Foi assim Eu tinha me debruçado na janela para poder não presenciar o mundo A Mulher lavou o corpo que revestiu com a melhor peça de roupa que ela tirou da trouxa dela mesma No peito entre as mãos postas ainda depositou o cordão com o escapulário que tinha sido meu e um rosário de coquinhos de ouricuri e contas de lágrimasdenossasenhora Só faltou ah a pedrade ametista tanto trazida O Quipes veio com as velas que acendemos em quadral Essas coisas se passavam perto de mim Como tinham ido abrir a cova cristamente Pelo repugnar e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 863 revoltar primeiro eu quis Enterrem separado dos outros num aliso de vereda adonde ninguém ache nunca se saiba Tal que disse doidava Recaí no marcar do sofrer Em real me vi que com a Mulher junto abraçado nós dois chorávamos extenso E todos meus jagunços decididos choravam Daí fomos e em sepultura deixamos no cemitério do Paredão enterrada em campo do sertão Ela tinha amor em mim E aquela era a hora do mais tarde O céu vem abaixando Narrei ao senhor No que narrei o senhor talvez até ache mais do que eu a minha verdade Fim que foi Aqui a estória se acabou Aqui a estória acabada Aqui a estória acaba Resoluto saí de lá em galope doidável Mas antes reparti o dinheiro que tinha retirei o cinturãocartucheiras aí ultimei o jagunço Riobaldo Disse adeus para todos sempremente Ao que eu ia levar comigo era só o menino o cego e os dos catrumanos vivos sobrados esses eu carecia de repor de volta na terra deles nos lugares E a Mulher também dela me despedi háde ver que esturdiamente sem continuação de João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 864 continuação Ainda encomendei a João Curiol que era um baiano bom na palavra e no caráter que providenciasse o retorno daquela para onde quisesse ir outra vez Desapoderei Aonde ia eu retinha bem mesmo na doidagem A um lugar só às VeredasMortas De volta de volta Como se tudo revendo refazendo eu pudesse receber outra vez o que não tinha tido repor Diadorim em vida O que eu pensei o pobre de mim Eu queria me abraçar com uma serrania Mas nessa parte de muito mal me lembro pelo revés em minha saúde Ao que eu ia de repente me vinha um assombramento de espírito muita vez tonteei de ter de me segurar de cair e depois durante muitos espaços eu restava esquecido de tudo de quem eu era de meu nome Mas o Alaripe PacamãdePresas o Quipes o Triol Jesualdo o Acauã João Concliz e o Paspe me cuidavam esses tinham por toda a lei forçado de me acompa nharem vinham comigo e o Fafafa mais João Nonato e Compadre Ciril que vieram depois Amigos meus Aí eu vinha Chapadão Morreu o mar que foi João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 865 Eu vim Pelejei Ao deusdar Como é que eu sabia destornar contra a minha tristeza O dito vim consoante traçado Num lugar o Tuim me alembro eu tive de mudar para outro cavalo E um sitiante no LambeMel explicou que o trecho dos marimbus aonde íamos se chamava mais certo não era VeredasMortas mas VeredasAltas Coisa que compadre meu Quelemém mais tarde me confirmou Daí mais para adiante dei para tremer com uma febre Terçã Mas o sentido do tempo o senhor entende resenha duma viagem Cantar que o senhor fosse De ai de mim Namorei uma palmeira na quadra do entardecer Na morna baqueei não podendo mais Me levaram por primeiro de revexo Depois me botaram para dentro duma casa muito pobre Desembestei doente Por último como perdi meu conhecimento estavam me deitando num catre Que foi febretifo se diz mas trelada com sezão mas sezão forte especial nas altíssimas Que a febre que eu tinha era tamanha tanta como nunca se viu o Alaripe depois me disse que no decorrer dos acessos eu tresvariava Do que no ouvir contado recordei a estória dum fazendeiro o mais maldoso que o demônio por fim salteou por suas ruindades e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 866 que endemoninhado no quarto de sua casa uivando lobum suplicava alivio do calorão e carecia mesmo que os escravos despejassem nele latas e baldes dágua ao constantemente até para evitar que de tudo devorante tão quente não viesse e desse de pegar fogo no cômodo de incêndios Doidice Em dança de demônios que nem não existem Pois então só a doença não bastasse O tempo que fiquei deslembrado detido O quanto foi Mas quando dei acordo de mim sarando e conferindo o juízo a luz sem sol mire e veja meu senhor que eu não estava mais no asilo daquela casinha pobre mas em outra numa grande fazenda para onde sem eu saber tinham me levado Eu estava na Barbaranha no PédaPedra hóspede de seo Josafá Ornelas Tomei caldodegalinha deitado em lençóis alvos recostado E já parava meio longe aquele pesar que me quebrantava Lembro de todos do dia da hora A primeira coisa que eu queria ver e que me deu prazer foi a marca dos tempos numa folhinha de parede Sosseguei de meu ser Era feito eu me esperasse debaixo de uma árvore tão fresca Só que uma coisa a alguma coisa faltava em mim Eu estava um saco cheio de pedras João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 867 Mas aquele seo Ornelas era homem de muita bondade muita honra Ele me tratou com categoria fui príncipe naquela casa Todos a senhora dele as filhas as parentas me cuidavam Mas o que mormente me fortaleceu foi o repetido saber que eles pelo sincero me prezavam como talentoso homemdebem e louvavam meus feitos eu tivesse vindo corajoso para derrubar o Hermógenes e limpar estes Gerais da jagunçagem Fui indo melhor Até que um dia eu estava repousando no claro estar em rede de algodão rendada Alegria me espertou um pressentimento Quando eu olhei vinha vindo uma moça Otacília Meu coração rebateu estava dizendo que o velho era sempre novo Afirmo ao senhor minha Otacília ainda se orçava mais linda me saudou com o salvável carinho adianto de amor Ela tinha vindo com a mãe E a mãe dela os parentes todos se praziam me davam Otacília como minha pretendida Mas eu disse tudo Declarei muito verdadeiro e grande o amor que eu tinha a ela mas que por destino anterior outro amor necessário também fazia pouco eu tinha perdido O que confessei E eu para nojo e emenda carecia de uns tempos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 868 Otacília me entendeu aprovou o que eu quisesse Uns dias ela ainda passou lá me pagando companhia formosamente Ela tinha certeza de que eu ia retornar à Santa Catarina renovar e trajar terno de sarjão flor no peito sendo o da festa de casamento Eu fui com o coração feliz por Otacília eu estava apaixonado Conforme me casei não podia ter feito coisa melhor como até hoje ela é minha muito companheira o senhor conhece o senhor sabe Mas isto foi tantos meses depois quando deu o verde nos campos Eu já estava de todo bom firme para as arremessadas quando ali na Barbaranha se surgiu para mim igualmente a visita de seô Habão ele com o seo Ornelas se tivessem entre tempos pacificado Homem baseado Demonstrou que tinha muita satisfação em me ver assim como para mim vinha trazendo outro cavalo de presente o qual era ruçorodado ordem de valor e estampa Ali agraciado aceitei meu sinceramente Mas ele portava causa maior a que tinha ido confirmar e saber e agenciar por seus bons préstimos E era que meu padrinho Selorico Mendes acabara falecido me abençoando e se honrando orgulhoso de meus atos e as duas maiores fazendas ele tinha deixado para mim em cédula de testamento Seô Habão João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 869 queria logo me levar lá no Curralim no Corinto para eu entrar em paz de posses Rejeitei adiei isto é Porquanto de fato fui e tudo recebi em limpo sem precisão de tocar demandas por falta de outros mais legítimos herdeiros e o que também devido dou ao advogado meu que zelou a sucessão Dr Meigo de Lima Só que isso foi mais tarde Pois primeiro eu tinha outra andada que cumprir conforme a ordem que meu coração mandava Tudo agradeci dei a despedida ao seo Ornelas e os dele gentedoevangelho Saí somente com o Alaripe e o Quipes os outros deixei à espera de minha volta que por muita companhia numerosa de nós não cobrassem duvidado Mas antes de sair pedi à dona Brazilina uma tira de pano preto que pus de funo no meu braço Aonde fui a um lugar nos gerais de Lassance OsPorcos Assim lá estivemos A todos eu perguntei em toda porta bati triste pouco foi o que me resultaram O que pensei encontrar alguma velha ou um velho que da história soubessem dela lembrados quando tinha sido menina e então a razão rastraz de muitas coisas haviam de poder me expor muito mundo Isso não achamos Rumamos daí então para bem longe reato Juramento o PeixeCru TerraBranca e Capela a CapelinhadoChumbo Só João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 870 um letreiro achei Este papel que eu trouxe batistério Da matriz de Itacambira onde tem tantos mortos enterrados Lá ela foi levada à pia Lá registrada assim Em um 11 de setembro da era de 1800 e tantos O senhor lê De Maria Deodorina da Fé Bettancourt Marins que nasceu para o dever de guerrear e nunca ter medo e mais para muito amar sem gozo de amor Reze o senhor por essa minha alma O senhor acha que a vida é tristonha Mas ninguém não pode me impedir de rezar pode algum O existir da alma é a reza Quando estou rezando estou fora de sujidade à parte de toda loucura Ou o acordar da alma é que é E o pobre de mim minha tristeza me atrasava consumido Eu não tinha competência de querer viver tão acabadiço até o cumprimento de respirar me sacava E Diadorim às vezes conheci que a saudade dele não me desse repouso nem o nele imaginar Porque eu em tanto viver de tempo tinha negado em mim aquele amor e a amizade desde agora estava amarga falseada e o amor e a pessoa dela mesma ela tinha me negado Para que eu ia conseguir viver Mas o amor de minha Otacília também se aumentava aos berços primeiro esboço de devagar Era João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 871 Passado esse tempo conforme foi pouca tardança Mas então quando se estava de volta membora vindo peguei uma inesperada informação na Barra do Abaeté De Zé Bebelo Tinha mesmo de ser Não sei por que foi que com aquilo me renasci Que Zé Bebelo estava demorando léguas para cima perto do São Gonçalo do Abaeté no PortoPassarinho Me fiz para lá E como era que antes e antes eu não tivesse pensado em Zé Bebelo Trote tocamos viemos beirando aquele rio O senhor sabe o rio Abaeté que é entristecedor audaz de belo largo tanto de morro a morro E em minha vida eu já pensava Zé Bebelo gritou Safa Safas e me abraçou como amigo cordial contente de muito me ver constante se nada tivesse destruído o nosso costume Conto que estava o mesmo aposto e condizente Tudo viva Riobaldo Tatarana Professor ele concisou Tu quis paz Sagaz assim me olhava chega me cheirar só faltasse de tornados a encontrar no curral como boi a boi Disse que eu estava feliz mas emagrecido e que encovava mais os olhos João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 872 Estais pra trás Sabe Negociei um gado Mudei meus termos A ganhar o muito dinheiro é o que vale Pó douro em pó o que ele me disse E era a pura mentira Mas podia ser verdade Porque ele para se viver carecia daquela bazófia forte mestreava Como logo me pregou Háte Acabou com o Hermógenes A bem Tu foi o meu discípulo Foi não foi Deixei ele dizer como essas glórias não me invocavam Mas então ele não me entendendo esbarrou e se pôs Cujo A bom eu não te ensinei mas bem te aprendi a saber certa a vida Eu ri de nós dois Três dias falhei com ele lá no PortoPassarinho E Zé Bebelo corrigiu para eu ouvir os projetos que tinha Aí ai fanfarrices Não queria saber do sertão agora ia para capital grande cidade Mover com comércio estudar para advogado Lá eu quero deduzir meus feitos em jornal com retratos A gente descreve as passagens de nossas guerras fama devida Da minha não senhor eu fechei Distrair gente João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 873 com o meu nome Então ele desconversou Mas naqueles três dias não descansou de querer me aliviar e de formar outros planejamentos para encaminhar minha vida Nem indenizar completa a minha dor maior ele não pudesse Só que Zé Bebelo não era homem de não prosseguir Do que a Deus dou graças Porque por fim ele exigiu minha atenção toda e disse Riobaldo eu sei a amizade de que agora tu precisa Vai lá Mas me promete não adia não desdenha Daqui e reto tu sai e vai lá Diz que é de minha parte Ele é diverso de todo o mundo Mesmo escreveu um bilhete que eu levasse Ao quando despedi e ele me abraçou senti o afeto em ser de pensar Será que ainda tinha aquele apito na algibeira E gritou Safas maximé Tinha de ser Zé Bebelo para isso Só Zé Bebelo mesmo para meu destino começar de salvar Porque o bilhete era para o Compadre meu Quelemém de Góis na Jijujã Vereda do Buriti Pardo Mais digo O senhor vá lá No tempo de maio quando o algodão lãla Tudo o branquinho Algodão é o que ele mais planta de todas as modernas qualidades o rasgaletras bibol e João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 874 mussulim O senhor vai ver pessoa de tal rareza como perto dele todoomundo pára sossegado e sorridente bondoso Até com o Vupes lá topei Compadre meu Quelemém me hospedou deixou meu contar minha história inteira Como vi que ele me olhava com aquela enorme paciência calma de que minha dor passasse e que podia esperar muito longo tempo O que vendo tive vergonha assaz Mas por fim eu tomei coragem e tudo perguntei O senhor acha que a minha alma eu vendi pactário Então ele sorriu o pronto sincero e me vale me respondeu Tem cisma não Pensa para diante Comprar ou vender às vezes são as ações que são as quase iguais E me cerro aqui mire e veja Isto não é o de um relatar passagens de sua vida em toda admiração Conto o que fui e vi no levantar do dia Auroras Cerro O senhor vê Contei tudo Agora estou aqui quase barranqueiro Para a velhice vou com ordem e trabalho Sei de mim Cumpro O Rio de São Francisco que de tão grande se comparece parece é um pau grosso em pé enorme Amável o senhor me ouviu minha idéia confirmou João Guimarães Rosa Grande Sertão Veredas 875 que o Diabo não existe Pois não O senhor é um homem soberano circunspecto Amigos somos Nonada O diabo não há É o que eu digo se for Existe é homem humano Travessia FIM DE GRANDE SERTÃO VEREDAS