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Economia Monetária

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Juros e conservadorismo intelectual\n\nPor André Lara Resende\n\nDesde a estabilização da inflação crônica, com o Real - e já se vão mais de 20 anos -, a taxa básica de juros no Brasil causa perplexidade entre os analistas. Por que tão alta? Inúmeras explicações foram ensaiadas, como distorções, psicológicas e institucionais, associadas ao longo período de inflação crônica com indexação; baixa poupança e alta propensão ao consumo, tanto pública como privada; ineficácia da política monetária, entre outras. Embora todas façam sentido e possam, no seu conjunto, ajudar a entender por que os juros são tão altos, nenhuma delas foi capaz de dar uma resposta convincente e definitiva para a questão. \n\nAs altíssimas taxas brasileiras ficaram ainda mais difíceis de serem explicadas diante da profunda recessão dos últimos anos. Como é possível que depois de dois anos seguidos de queda do PIB, de aumento do desemprego, de uma taxa de 12% da força de trabalho, a taxa de juro no Brasil continue tão alta, enquanto no mundo desenvolvido os juros estão excepcionalmente baixos? Há quase uma década, nos Estados Unidos e na Europa, e há três décadas no Japão, os juros estão muito próximos de zero, ou até mesmo negativos, mas no Brasil a taxa nominal é de dois dígitos e a taxa real continua acima de 7% ao ano.\n\nA taxa cobrada pelo Banco Central por um dia - de \"overnight\" - pelas reservas bancárias INFLUENCIA toda a estrutura de taxas do sistema financeiro. Por isso é considerada a taxa básica, ou de referência, da economia. É também o principal instrumento da política monetária. Juros mais altos reduzem a demanda agregada, destacam a economia e modernam a inflação; juros mais baixos elevam a economia e pressionam a inflação. Esta é a essência do mecanismo de funcionamento da política monetária. Há muitas interpretações sobre os chamados \"canais de transmissão\" da política monetária, inércia, sofisticações analíticas, mas, em síntese, juros mais altos reduzem a demanda agregada e modernam a inflação. A macroeconomia moderna tem sua origem nas discussões sobre a Grande Depressão dos anos 30 e no século XX. É essencialmente baseada na Teoria Geral de Keynes, embora tenha evoluído muito desde então.\n\nQuanto à inflação, sempre houve controvérsia. Diferentes versões dos modelos macroeconômicos tinham diferentes interpretações sobre as causas e a melhor forma para controlar a inflação. O debate entre monetaristas e keynesianos, ao longo da segunda metade do século XX, deu lugar a um consenso pós-keynesiano. Como o reconhecimento de que instrumento usado pelos bancos centrais não são agregados monetários, mas sim a taxa de juros, e a ação dos bancos centrais para a inflação, chegou-se ao atual relativo consenso sobre a política monetária. A teoria monetária, mais ainda do que outras áreas da economia, sempre esteve associada a um contexto histórico e institucional específico. Como estudada nas escolas de economia, a teoria monetária estabelecida tem sua origem nas discussões sobre moeda e crédito na Inglaterra. Duas grandes vertentes se formaram, a partir do debate das primeiras décadas do século XVIII, quando a convertibilidade da moeda foi interrompida pelo Banco da Inglaterra. O debate entre os defensores da convertibilidade e os que não viam a necessidade de uma moeda lastreada define, até hoje, as duas grandes linhas teóricas sobre moeda e crédito.\n\nOs bullionistas, defensoras da convertibilidade, foram os primeiros quantitativistas, que pensaram a moeda diretamente a nível de preços. A vitória intelectual dos bullionistas trocou a chamada Teoria Quantitativa da Moeda (TQM) e hipótese dominante na macroeconomia. Os anti-bullionistas, para quem a relação causal poderia ser inversa, ou seja, são os preços que determinariam a quantidade de moeda, foram relegados a um segundo plano, quando não ao completo ostracismo.\n\nPartes das teses dos anti-bullionistas foram resgatadas, no fim do século XIX, pelo economista sueco Knut Wicksell, mas nunca chegaram a ser incorporadas à teoria dominante. Só ressurgiram quando Michael Woodford, já no início deste século, deu um impulso neokeynesiano aos direitos wicksellianos. Tanto Keynes como seus seguidores, apesar das enormes controvérsias, dos anos 60 e 70 do século XX, com os monetaristas liderados por Milton Friedman, eram essencialmente quantitativistas. Você esquecendo a razão em Cambridge inglesa como na América Latina, nunca chegaram a ser levadas a sério ora ortodoxa. Porém neste espaço eram utilizados pelos analistas e pelos economistas práticos, dos neokeynesianos, tanto o keynesiano como o monetarista, são não considerados ultrapassados. Na fronteira teórica, formavam modelos neokeynesianos, com expectativas racionais, que envisavam a moeda de lado e focavam exclusivamente na taxa de juros como instrumento de controle da inflação.\n\nA experiência revolucionária dos bancos centrais do mundo desenvolvido, desde a crise financeira de 2008, não deixou mais dúvida: todos os modelos neoclassicos se tornaram obsoletos que deram alguma versão da Teoria Quantitativa da Moeda (TQM) e as novas explorações da Teoria Quantitativa. Os bancos centrais aumentaram a oferta de moeda numa escala nunca vista. O Fed, por exemplo, aumentou as reservas bancárias de US$ 50 trilhões para US$ 3 trilhões, ou seja, multiplicou a base monetária por 60, num período inferior a dois anos. A inflação não explodiu, ao contrário, continuou excepcionalmente baixa. Ao mesmo aconteceu no Japão, na Inglaterra e nas economias da zona do euro. Diante do aumento, verdadeiramente extraordinário, da oferta de moeda, a inflação mantém-se excepcionalmente baixa e ainda menos volátil do que no passado.\n\nNas ciências sociais, o teste em pílulas de hipóteses teóricas é mais complicado do que nas ciências exatas. Nestes a possível fazer experiências em laboratórios, com controle das variáveis envolvidas. Embora a economia seja uma ciência social com pretensão de se equiparar às ciências exatas, o teste em pílulas de modelos teóricos - especialmente na macroeconomia, onde muitos fatores estão simultaneamente em jogo - é um arte. A obrigação da formalização matemática só mascaras os graves problemas de identificação estatística. Esta é a essência da recrita crítica de Paul Romer, atual economista-chefe do Banco Mundial, a todo a teoria macroeconômica contemporânea. Com a experiência radical dos bancos centrais avançadas, tem-se, entretanto, uma oportunidade única. O chamado Quantitative Easing (QE) praticamente replicou o que seria uma expectativa mais direta sobre o que seria a relação entre a quantidade de moeda e a inflação; a maior resistência e todos os problemas relacionados frente ao desempenho da teoria monetária quantitativa e estabelecida. surpreendentemente quanto controverso, pois há forte evidência de que, no curto prazo, juros mais altos reduzem a inflação. É preciso, portanto, compreender como é possível que a alta dos juros, no curto prazo reduza, mas no longo prazo aumenta a inflação.\n\nCochrane utiliza todo o arsenal das chamadas \"distorções\" em relação ao modelo de referência, para as quais os economistas apelam quando precisam compatibilizar o modelo analítico de referência com a realidade, para tentar encontrar uma relação inversa entre a taxa de juros e a inflação, no curto prazo. Não teve sucesso. A única hipótese capaz de explicar a tradicional relação inversa entre a juros e a inflação, no curto prazo, é a chamada Teoria Fiscal do Nível de Preços (TFNP).\n\nSegundo o modelo neokeynesiano contemporâneo, com expectativas racionais, a inflação é indeterminada, ao sabor das expectativas. A TFNP sustenta que, em última instância, ao considerar as expectativas, determina a taxa de inflação e a política fiscal.5 É, portanto, a política fiscal, o equilíbrio sustentável de inflação a não dividir pública, que tem uma instância determinada taxa de inflação.\n\nCochrane demonstra que, ao combinar a TFPL com o modelo neokeynesiano de expectativas racionais, é possível propor uma explicação simples e logicamente robusta para o fato de que o efeito do juros sobre a inflação se inverte no longo prazo. Ou seja, que um aumento do juro reduz a inflação no curto prazo, ainda aumenta a inflação no longo prazo.\n\nA lógica do modelo funciona retroativamente, mas o mecanismo através do qual o juro mais alto reduz a inflação no curto prazo - pode menor valor presente da dívida - seja uma consequência lógica, mas pouco intuitiva. O Profundo Cochrane afirma que se trata de \"um mecanismo dramaticamente novo\" em relação a questões da teoria monetária do nível de preços econômicas.\n\nA teoria monetária dominante nunca conseguira compreender de forma soluções para as taxas de inflação elevada. Sua perscrição - cortar a inflação ao valor presente da dívida - só provocou crises bancárias e recessões. Manteve-se numa Armadilha da Liquidez, agora inconsistentemente confirmada pela experiência do QE, também não tem resposta para a deflação. A teoria macroeconômica contemporânea está em polvorosa. A inflação é indeterminada, resultado exclusivo das expectativas. A teoria monetária, que até hoje balizou as políticas dos bancos centrais, pode estar equivocada. A macroeconomia contemporânea, das versões mais recentes dos modelos neokeynesiano, sustenta que os juros altos balizam as expectativas de inflação mais alta, o que resulta efetivamente em mais inflação no longo prazo. Segundo a TFNP, as expectativas são, em última instância, determinadas pela credibilidade do equilíbrio fiscal de longo prazo, pois a inflação compatibiliza, no longo prazo, a dívida pública com o seu nível sustentado. A mirabolante reviravolta da teoria macroeconômica sugere uma separação entre as políticas monetária e fiscal é mais artificial do que se acreditava.\n\nVoltamos então às suas altíssimas taxas de juros. Vencedora a inflação crônica, com o mecanismo engendrado na URV, a taxa de juros no Brasil foi nominal alta. Objetivo inicial era estabelecer do câmbio flutuante e impedir novos surtos de inflação, como o equilíbrio fiscal sempre foi precário, a juro continua, até extraordinariamente alto, devido à grande necessidade de financiamento do público. A experiência do QE deixou claro que financiamento monetário - através da expansão de reservas remuneradas em banco central - não é inflação. Logo, maior necessidade de juros exig necessitará juros alto. O único modelo analítico compatível com a evidência empírica do QE leva à conclusão de que o juros nominal é alavanca inflação alta, também assim as outras elevam a inflação alta. Ou seja, o juro alto, não só agrava o desequilíbrio fiscal, como no longo prazo mantém a inflação alta.\n\nA possibilidade de que o juro alto agrave de tal forma o desequilíbrio fiscal se torne contraproducente, foi primeiro ventilada para o caso brasileiro, em 2004, por Olivier Blanchard. A chamada hipótese da \"dominância fiscal\" foi inicialmentetratada como uma mera conjectura teórica, logicamente possível, mas. praticamente irrelevante.7 Reaparece, mais recentemente, com o agravamento da situação fiscal durante os últimos anos dos governos do PT.8 Foi ainda tema de artigo de Eduardo Loyo, citado por Chris Sims no encontro dos presidentes de bancos centrais em Jackson Hole de agosto do ano passado.9 Com o recente desenvolvimento analítico da macroeconomia, percebe-se que a dominância fiscal deveria ter merecido mais atenção e suas consequências, para a formulação das políticas monetária e fiscal, levadas mais a sério.\n\nA hipótese neo-fisheriana, que não vejo atuo a causa da alta inflação no longo prazo, aparece ainda mais difícil de digerir, assim como a tese da dominância fiscal, tem sólidas credencials analíticas. Ambas surgem que não só pede para di política monetária e dos bancos centrais mais do que andar a inflação no curto prazo. Exigir que a política monetária faça, mais do que circunstancialmente, o trabalho de controlar da inflação, aqui estabilidade depende, primeiro instância, do equilíbrio fiscal no longo prazo, por se contrapondo. Sem equilíbrio fiscal não há saída. Quando a saída passar por um equilíbrio fiscal político e pela sua mais serei sensacional adequadas, vale a pena esclarecer, sem indecisões, a redução na fronteira da teoria macroeconômica. O custo da atenção inicial às questões monetárias, claramente, está dizendo a redução de césulo, possibilidade a, de tudo mais.\n\n1 - Veja Arida, Persio, Edmar Bacha and Andre Lara Resende, 2004, \"High Interest Rates in Brazil: Uncertainties on the Jurisdictional Uncertainty\" Nível de Estudos de Política Econômica, Casos de Garxas (Nude) UCG), March, Gustavo, André Lara Resende, Samuel Pessoa e Márcio Nakane: \"Porque os juros são altos no Brasil?\" Centro de Liderança Política, CLP, Paper N.º 6, Setembro 2011; Alex Segura- Ibarrar, February 2012, \"The Puzzle of Brazil's High Interest Rates,\" IMF Working Paper; Franciso Lafiat Lopes, Jan/2014 \"On High Interest Rates in Brazil,\" Revista de Economia Política, vol.34 n.1. São Paulo; Lara Resende, A. \"A Armadilha Brasileira\", em Os Limites do Possível: a economia diante do conjuntura, Portfolio/Penguin, 2014\n\n2 - Ver Lareande, A. \"Towards a Wicksellian Pure Credit Economy\" - mimeo Columbia University, December, 2016.\n\n3 - Ver Romer, P. \"The Trouble With Macroeconomics\", Sept. 2016, Stern School of Business, New York University\n\n4 - Ver Cochrane, John H. \"Michelson-Morley, Occam and Fisher: The Radical Implications of Stable Inflation at Near-Zero Interest Rates\" Dec.2016 - http://faculty.chicagobooth.edu/john.cochrane\n\n5 - O principal nome associado a TFNP e Christopher Sims, professor da universidade de Princeton, premiado como o Nobel de Economia em 2011. Os interessados devem ler, Sims, Christopher A. \"A Simple Model for the Study of the Determination of the Price Level and the Interaction of Monetary and Fiscal Policy\", Economic Theory 4, 1994\n\n6 - Ponto originalmente formulado por Sargent, T. e Wallace, N. em \"Some Unpleasant Monetarist Arithmetics\", Federal Reserve Bank of Minneapolis, 1986\n\n7 - Ver Arida, P. Bacha, E. e Lara Resende, A. \"Credit, Interest and Jurisdictional Uncertainty\" in Inflation Targeting, Debt, and the Brazilian Experience,1999 to 2003, Giavazzi, F et al. 2004\n\n8 - Ver Blanchard, O. \"Fiscal Dominance and Inflation Targeting: Lessons from Brazil\", in Inflation Targeting, Debt, and the Brazilian Experience,1999 to 2003, Giavazzi, F et al. 2004\n\n9 - Ver Sims, C. \"Fiscal Policy, Monetary Policy and Central Bank Independence\" Loyo, E. \"Tight Money Paradox on the Loose: A Fiscalist Hyperinflation\", Discussion paper, John F. Kennedy School of Government, www.sims.princeton.edu/yft/Loyo/LoyoTightLoose.pdf. André Lara Resende é senior research fellow na Columbia University e está escrevendo livro, a ser publicado pela Companhia das Letras, sobre o debate que pautou a política monetária no Brasil desde o pós-Guerra.