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Gilberto Teixeira Magalhães Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria Faculdade Ciências da Saúde Universidade Fernando Pessoa Porto 2021 Gilberto Teixeira Magalhães Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria Faculdade Ciências da Saúde Universidade Fernando Pessoa Porto 2021 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria Gilberto Teixeira Magalhães Trabalho apresentado à Universidade Fernando Pessoa como parte dos requisitos para obtenção do grau de Mestre em Ciências Farmacêuticas Orientadora Professora Doutora Carla Moutinho Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria V Sumário As intoxicações por medicamentos de forma intencional ou não intencional são um fator de mortalidade e morbilidade entre as crianças sendo necessário muitas das vezes a hospitalização A identificação do agente tóxico através do conjunto de sinais e sintomas bem como o historial de exposição é fundamental para que seja iniciado o tratamentodescontaminação o mais rápido possível de modo a diminuir o tempo de internamento e complicações de saúde O tratamento da intoxicação é diferente mediante o composto em causa e passa pelo tratamento sintomático medidas de descontaminação e aumento da eliminação do tóxico Esta dissertação tem como objetivo efetuar uma revisão narrativa dos fármacos ou grupos farmacoterapêuticos mais relatados em casos de intoxicações na idade pediátrica destacandose em cada caso as novas abordagens terapêuticas algumas das quais ainda se encontram em fase de desenvolvimento clínico Palavraschave intoxicação aguda pediatria tratamento diagnóstico analgésicos e antipiréticos antihistamínicos e descongestionantes broncodilatadores anticonvulsivantes Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria VI Abstract Drug poisoning whether internationally or not internationally is an important factor of mortality and morbidity among children often requiring hospitalization The identification of the toxic agent through the set of signs and symptoms as well as the exposure history is essential to start the treatmentdecontamination as soon as possible in order to reduce hospitalization time and health complications The treatment of intoxication is different according the compound and involves symptomatic treatment decontamination measures and increased elimination of the toxicant This dissertation aims to carry out a narrative review of the drugs or pharmacotherapeutic groups most reported poisoning cases in pediatric age highlighting in each case the new therapeutic approaches some of which still in the clinical phases Keywords acute intoxication pediatric drugs treatment diagnosis analgesics and antipyretics antihistamines and decongestants bronchodilators anticonvulsants Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria VII Agradecimentos A presente dissertação não seria possível sem a ajuda e o apoio de diversas pessoas que me acompanharam durante estes anos Agradeço o apoio e organização da minha orientadora Professora Doutora Carla Moutinho que desde cedo me apontou a direção e objetivos traçados para este trabalho A sua sempre rápida resposta e disponibilidade facilitaram em muito o meu trabalho A toda a minha família pelo apoio e motivação mesmo nas alturas mais cansativas em especial aos meus pais avós e tio José Ao meu irmão que me acompanhou de perto nesta caminhada Obrigado por ouvires os meus conselhos e por partilhares os teus comigo Sabes que a tua ajuda foi fundamental A ti Diana por mais estes anos de esforço e sacrifício mas que de certeza nos serão compensadores Não embarcaria nesta aventura se não estivesses ao meu lado O meu MUITO OBRIGADO a todos vocês Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria VIII Índice Índice de figuras X Índice de tabelas XI Abreviaturas XII I Introdução 1 1 Materiais e Métodos 2 II Atendimento inicial das intoxicações agudas 4 1 Avaliação inicial 4 2 Diagnóstico da intoxicação 5 i História da exposição 5 ii Exame físico 5 iii Exames complementares 7 3 Tratamento 8 i Descontaminação 8 a Indução do vómito 9 b Lavagem gástrica 9 c Adsorção química 10 ii Antídotos 12 iii Aumento da taxa de excreção 12 III Analgésicos e Antipiréticos 12 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria IX 1 Paracetamol acetaminofeno 13 2 Ibuprofeno 20 3 Ácido acetilsalicílico 24 IV Antihistamínicos e descongestionantes 30 1 Antihistamínicos H1 1ª e 2ª geração 31 2 Descongestionantes simpaticomiméticos 36 3 Descongestionantes imidazólicos 39 V Broncodilatadores 43 1 Agonistas β2adrenérgicos 43 VI Anticonvulsivantes 48 1 Carbamazepina 48 2 Ácido valproico 52 VII Conclusão 57 VIII Bibliografia 58 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria X Índice de figuras Figura 1 Exames complementares de diagnóstico toxicológico adaptado de Zucoloto et al 2017 8 Figura 2 Metabolização do acetaminofeno adaptado de Barros and Stasi 2012 14 Figura 3 Monograma de RumackMatthew retirado de Saccomano 2019 16 Figura 4 Mecanismo de ação da COX retirado de Samuelsson 2012 21 Figura 5 Metabolização do AAS retirado de Nelson 2019 26 Figura 6 Relação entre pH e clearance urinário do AAS retirado de Proudfoot et al 2003 28 Figura 7 Metabolização da carbamazepina retirado de Djordjevic et al 2017 49 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria XI Índice de tabelas Tabela 1Principais síndromes tóxicas adaptado de Rasimas and Sinclair 2017 7 Tabela 2Volume de xarope de ipecacuanha para diferentes faixas etárias adaptado de Goodman et al 2001 9 Tabela 3Volume de infusãofaixa etária de lavagem gástrica adaptado de Zucoloto et al 2017 10 Tabela 4 Administração de carvão ativado por via oral adaptado de Silberman et al 2021 11 Tabela 5 Dose referência de acetaminofeno adaptado de Infarmed 2020b 14 Tabela 6 Fases da intoxicação por acetaminofeno adaptado de Saccomano 2019 15 Tabela 7 Benzodiazepinas usadas no tratamento de convulsões adaptado de Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 23 Tabela 8 Propriedades farmacocinéticas antihistamínicos H1 adaptado de Nelson 2019 33 Tabela 9 Duração de ação dos descongestionantes simpaticomiméticos adaptado de Nelson 2019 37 Tabela 10 Funções dos recetores β2adrenérgicos adaptado de Williams and Rubin 2018 45 Tabela 11 Dose tóxica dos agonistas β2adrenérgicos adaptado de Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 46 Tabela 12 Doseamento sérico de carbamazepina adaptado de Acikgoz et al 2016 50 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria XII Abreviaturas AAS Ácido acetilsalicílico ADME Absorção distribuição metabolização excreção AINE Antiinflamatório não esteroide ALP Fosfatase alcalina ALT Alanina aminotransferase AMPc Adenosina monofosfato cíclico AST Aspartato aminotransferase ATP Adenosina trifosfato BHE Barreira hematoencefálica CK18 Citoqueratina 18 CoA Coenzima A COX Cicloxigenase CPK Creatinofosfoquinase ECG Eletrocardiograma GABA Ácido gamaaminobutírico do inglês gamma aminobutyric acid GpP Glicoproteína P GSH Glutationa IV Intravenosa JNK Do inglês cjun Nterminal kinase Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria XIII LABA Do inglês Longacting βagonists MDA Malondialdeído miR122 microRNA122 NAC Nacetilcisteína NanoMOF Estruturas nanométricas metálicoorgânicas do inglês nano metalorganic frameworks NAPQI Nacetilpbenzoquinoneimina PGE2 Prostaglandina E2 SABA Do inglês Shortacting βagonist SNC Sistema nervoso central SOD Superóxido dismutase TC Tomografia computorizada TGI Trato gastrointestinal TP Tempo de protrombina TXA2 Tromboxano A2 T12 Tempo de semivida Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 1 I Introdução Uma intoxicação corresponde a uma exposição indevida ou em quantidade suficiente por ingestão inalação injeção contacto da pele ou ocular a uma substância ou produto que pode provocar alterações no organismo ou mesmo levar à morte SNS 2019 Pode ser definida como a manifestação do efeito tóxico e corresponde ao conjunto de sinais e sintomas que revelam o desequilíbrio produzido pela interação do agente tóxico com o organismo WHO 2015 A intoxicação aguda é consequência da administração ou contacto com o tóxico de uma só vez ou por múltiplos contactos e os efeitos adversos surgem de imediato ou no decorrer de alguns dias Goodman et al 2001 Zucoloto et al 2017 A intoxicação aguda constitui um importante problema de saúde pública particularmente na faixa etária pediátrica sendo os medicamentos um dos principais agentes responsáveis cerca de 479 dos casos Lin et al 2011 O conceito de idade pediátrica é algo que até ao momento não é consensual não existindo uma norma global Uma criança é todo o ser humano menor de 18 anos salvo se nos termos da lei que lhe for aplicável atingir a maioridade mais cedo ONU 2019 As mudanças no desenvolvimento em crianças podem afetar a disposição e os efeitos clínicos de um fármaco não devendo por isso ser aplicada a escala linear de adulto ao peso da criança pois pode potencialmente levar a uma sobredosagem Verscheijden et al 2020 Os fatores que influenciam as concentrações de fármacos nos tecidos ao longo do tempo incluem os processos de absorção distribuição metabolização e excreção ADME Na população pediátrica estes processos de ADME diferem em comparação com os adultos originando consequentemente diferenças no perfil farmacocinético de um fármaco É importante por isso perceber estas diferenças para garantir uma terapia eficaz em populações pediátricas Batchelor and Marriott 2015 Segundo o relatório de 2019 da Associação Americana de Controlo de Intoxicações foram reportados casos de exposição a substâncias em que 5755 dos casos ocorreram Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 2 em indivíduos com menos de 20 anos sendo que destes 71 resultou em fatalidade Relativamente aos fármacos e no caso das fatalidades podese observar a presença de alguns grupos farmacoterapêuticos mais relevantes como os casos de analgésicos anti histamínicos e anticonvulsivantes Gummin et al 2020 O diagnóstico de intoxicação em situações de emergência pode ser algo difícil de obter especialmente quando não é conhecido o agente causador a quantidade a duração do contacto e o tempo entre o contacto e a hospitalização Lin et al 2011 Pianca et al 2017 O atendimento do paciente intoxicado segue uma série de etapas geralmente mas não necessariamente sequenciais como a avaliação clínica inicial e estabilização reconhecimento da síndrome tóxica e identificação do agente causal descontaminaçãoadministração de antídotos aumento da eliminação do tóxico absorvido e tratamento sintomático Zucoloto et al 2017 Este trabalho de conclusão de curso tem como objetivo efetuar uma revisão narrativa e de apresentar de forma clara e prática a abordagem terapêutica da criança vítima de intoxicação aguda por medicamentos de uso comum nas mesmas 1 Materiais e Métodos A pesquisa bibliográfica para a concretização desta monografia foi efetuada num período compreendido entre os meses de dezembro de 2020 e de julho de 2021 Foram revistos artigos da literatura selecionandose aqueles que tratam das questões envolvendo o tratamento da intoxicação aguda em idade pediátrica e dos últimos 10 anos Para isso realizouse a pesquisa através das bases de dados PubMed e BOn e também entidades reguladoras do medicamento como Infarmed com as seguintes palavraschave intoxicação aguda pediatria tratamento diagnóstico analgésicos e antipiréticos anti histamínicos e descongestionantes broncodilatadores anticonvulsivantes Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 3 Os critérios utilizados para inclusão foram a presença dos descritores utilizados no título ou no resumo b artigos publicados em língua portuguesa ou inglesa Os critérios de exclusão foram a duplicidade de artigos b artigos que não atendiam ao tema proposto c artigos com textos não disponibilizados na íntegra d dissertações e teses Posteriormente e depois de analisar quais os grupos terapêuticos de fármacos que com mais frequência são relatadas intoxicações eou os mais usados em pediatria foram escolhidos grupos terapêuticos e respetivos fármacos para abordar o tema proposto Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 4 II Atendimento inicial das intoxicações agudas A suspeita de intoxicação existe quando se observa uma doença inexplicada numa criança previamente saudável OMS 2005 Em situação de urgência toda a suspeita de intoxicação deve ser tratada como uma situação clínica grave pois pode não haver sintomatologia associada e a evolução do paciente ser negativa num curto espaço de tempo Por isto a abordagem ao utente suspeito de intoxicação deve ser rápida e criteriosa Zucoloto et al 2017 2 Avaliação inicial Aquando da admissão do paciente intoxicado ou suspeito devese realizar um breve exame físico de modo a iniciaremse as primeiras medidas para estabilização do paciente sempre com o objetivo de evitar a piora clínica do mesmo Segundo Zucoloto et al 2017 avaliase os parâmetros seguintes sinais vitais nível e estado de consciência diâmetro e reatividade à luz das pupilas temperatura e humidade da pele oximetria de pulso medição de glicemia capilar e procura de sinais de trauma infeção marcas de agulha ou edema de extremidades Caso seja necessário há uma série de outros procedimentos como monotorização eletrocardiográfica manutenção das vias aéreas abertas e realização de intubação obtenção de acesso venoso para facilitar colheita de amostra de sangue para posterior análise laboratorial em caso de alteração do estado de consciência administração de tiamina e glicose intravenosa IV só em caso de suspeita de intoxicação alcoólica e hipoglicemia consequente e em caso de suspeita de intoxicação por opioide administração de naloxona Zucoloto et al 2017 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 5 3 Diagnóstico da intoxicação i História da exposição Segundo Zucoloto et al 2017 para se perceber a história da exposição ao possível agente causador devese proceder ao levantamento dos seguintes dados do paciente percebendo o histórico clínico medicação em uso e o acesso a substâncias da substância causadora identificando a substância utilizada e respetiva quantidade do tempo decorrido entre a exposição e a duração da mesma do local onde ocorreu a exposição verificando a presença de frascos ou embalagens próximas ao paciente que possam facilitar a determinação do agente causador do motivo podendo ser intencional tentativa de suicídio abuso de drogas ou não intencional acidente ii Exame físico Neste tipo exame verificase os principais sinais e sintomas sempre com o objetivo de determinar o possível agente causador Segundo Zucoloto et al 2017 os parâmetros a serem observados são os seguintes odores característicos como hálito etílico característico do uso de álcool ou odor de alho característico dos organofosforados alterações cutâneas como sudorese secura de mucosas vermelhidão palidez cianose desidratação e edema temperatura corporal podendo ser hipotermia ou hipertermia alterações de pupilas como miose midríase anisocoria alterações do reflexo pupilar Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 6 alterações de consciência agitação sedação confusão mental alucinação delírio desorientação anormalidades neurológicas como convulsão síncope alteração de reflexos alteração do tónus muscular fasciculações movimentos anormais alterações cardiovasculares bradicardia taquicardia hipertensão hipotensão arritmias anormalidades respiratórias bradipneia ou taquipneia presença de ruídos adventícios pulmonares alterações do sistema digestivo sialorreia vómitos diarreia rigidez abdominal aumento ou diminuição de ruídos hidroaéreos Após esta análise e agrupando os sinais e sintomas de um determinado paciente pode ser caracterizado uma síndrome tóxica toxidrome do inglês toxic syndrome Rasimas and Sinclair 2017 Uma síndrome toxica é uma série de sinais e sintomas provenientes do exame físico ou de testes auxiliares que permitem determinar qual o agente causador ou o grupo farmacoterapêutico a que pertence É útil para que o clínico tenha uma previsão do agente em causa antes mesmo do exame de diagnóstico laboratorial específico tal como evidenciado na Tabela 1 Rasimas and Sinclair 2017 As síndromes tóxicas são divididas em 5 classes anticolinérgica colinérgica hipnótica sedativanarcótica simpaticomimética e extrapiramidal Zucoloto et al 2017 Apesar destes síndromes tóxicos poderem ajudar a definir o diagnóstico diferencial deve terse em atenção as exceções e limitações associadas a cada um dos casos Um exemplo destas exceções é a meperidina analgésico opioide mas que não apresenta como sintomatologia de toxicidade a miose Holstege and Borek 2012 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 7 Tabela 1Principais síndromes tóxicas adaptado de Rasimas and Sinclair 2017 Síndrome Sintomas Fármacos Sinais Vitais Pupilas SNC Outros sintomas Anticolinérgica Hipertermia Taquicardia Hipertensão Taquipneia Midríase Agitação Alucinação Delírio Convulsões Retenção urinária Mioclonias Convulsões Mucosas secas Antihistamínicos Atropina Escopolamina Antidepressivos tricíclicos Colinérgica Hipotermia Bradicardia Hipotensão Bradipneia Miose Confusão mental Convulsões Coma Sialorreia Sudorese Lacrimejo Náusea Dispneia Bronco constrição Fasciculações Organofosforados Carbamatos Nicotina Hipnótica sedativa narcótica Hipotermia Bradicardia Hipotensão Bradipneia Miose Depressão do SNC Depressão respiratória Hiporreflexia Edema pulmonar Barbitúricos Benzodiazepinas Opioides Simpatico mimética Hipertermia Hipertensão Taquicardia Hiperpneia Midríase Agitação Alucinações Paranoia Convulsões Diaforese Tremores Hiperreflexia Cocaína Anfetamina Teofilina Efredina Cafeína Extrapira midal Não característicos Midríase Sonolência Crise oculogírica Tremores Hipertonia muscular Opistótomo Trismo Haloperidol Fenotiazínicos Metoclopramida Bromopidra iii Exames complementares Dependendo da análise dos exames físicos e da história do paciente são solicitados exames complementares Estes podem ser gerais eletrocardiograma ECG exames de imagiologia como raioX ou tomografia computorizada TC endoscopia digestiva alta ou podem ser exames toxicológicos específicos Relativamente a estes últimos podem ainda ser agrupados dentro de 2 grupos os testes de triagem e os testes de confirmação Os testes de triagem são testes de rápido resultado e fornecem informação acerca da classe a que pertence o agente tóxico como por exemplo o teste para deteção da presença de benzodiazepinas Estes testes toxicológicos de triagem são realizados quando há suspeita através do diagnostico inicial e dos sintomas evidenciados de uma intoxicação com determinado tipo de fármaco Os testes toxicológicos de confirmação identificam o Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 8 composto em causa São testes em que o resultado não é imediato sendo por isso uma grande desvantagem visto que o tratamentoantídoto deve ser administrado assim que possível de modo a reverter os efeitos causados pelo tóxico Zucoloto et al 2017 Figura 1 Exames complementares de diagnóstico toxicológico adaptado de Zucoloto et al 2017 4 Tratamento Depois da identificação de intoxicação por determinado tóxico e da estabilização do paciente e dos sinais vitais importa perceber o tratamento adequando ao caso em análise Para isso e segundo Goodman et al 2001 os agentes tóxicos podem ser divididos em dois grupos aqueles para os quais existem antídotos para o tratamento específico e aqueles para os quais não existe tratamento específico sendo que estes últimos são os mais comuns em que a intervenção passa pelos cuidados no contexto do controlo sintomático manutenção dos sinais vitais prevenção da absorção adicional do tóxico e aumento da excreção do mesmo i Descontaminação O objetivo deste passo é a diminuição da absorção do tóxico removendo o mesmo do trato gastrointestinal caso a absorção seja oral Nem sempre é possível a indicação deste procedimento pois requer avaliação criteriosa do nível de consciência do paciente do tempo decorrido desde a ingestão e dos sintomas apresentados Zucoloto et al 2017 Exames complementares Gerais ECG Imagiologia Endoscopia Toxicológios especificos Triagem Confirmação Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 9 a Indução do vómito Este procedimento está indicado nas intoxicações ocorridas pela via oral sendo contraindicada em algumas situações particulares tais como ingestão de um tóxico corrosivo ingestão de um estimulante do SNC pode desencadear convulsões ou estado de consciência do paciente alterado pode provocar aspiração do conteúdo gástrico Zucoloto et al 2017 A indução do vómito pode ser realizada pela estimulação física da faringe posterior ou pela administração de uma substância emética como o xarope de ipecacuanha O xarope de ipecacuanha pode ser administrado por via oral e o efeito é obtido cerca de 30 minutos a 1 hora após a sua administração Goodman et al 2001 A quantidade do mesmo para as diferentes faixas etárias é evidenciada na Tabela 2 Tabela 2Volume de xarope de ipecacuanha para diferentes faixas etárias adaptado de Goodman et al 2001 Crianças 6 12 meses 12 meses Volume de xarope de ipecacuanha mL 15 30 A sua administração nos dias de hoje é algo controverso eou em desuso pois para garantir eficácia o tempo entre a ingestão do tóxico e a administração da substância emética é relativamente curto até 90 minutos e ainda a administração de carvão ativado apresenta vantagens em relação a este método como será analisado mais adiante Hojer et al 2013 b Lavagem gástrica Consiste na infusão e posterior aspiração de soro fisiológico a 09 através de sonda nasogástrica até perfazer a quantidade padronizada para cada faixa etária como evidenciado na Tabela 3 Zucoloto et al 2017 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 10 Tabela 3Volume de infusãofaixa etária de lavagem gástrica adaptado de Zucoloto et al 2017 Crianças Recémnascidos Lactentes Idade escolar Volume de infusão mLkg 10 10 10 Volume total de infusão L 050 2 a 3 4 a 5 As contraindicações deste procedimento são as mesmas do anterior sendo que adicionalmente pode causar lesão mecânica da faringe laringe e estômago No caso da lavagem gástrica esta deve ser efetuada até 60 minutos após a ingestão do tóxico Goodman et al 2001 Ornillo and Harbord 2020 É igualmente uma técnica não muito utilizada dada a possibilidade de administração de carvão ativado Benson et al 2013 c Adsorção química O carvão ativado é uma substância com alto poder adsorvente do agente tóxico impedindo a absorção deste pelo organismo diminuindo os efeitos tóxicos O carvão ativado administrado por via oral não é absorvido pelo lúmen gastrointestinal e age no trato gastrointestinal na sua forma inalterada Zucoloto et al 2017 Silberman et al 2021 Nem todos os compostos químicos são adsorvidos pelo carvão ativado tais como álcoois hidrocarbonetos metais e cianeto Zellner et al 2019 A maioria das toxinas ingeridas terá absorção sistémica diminuída na presença de carvão ativado incluindo fármacos como o acetaminofeno aspirina barbitúricos antidepressivos tricíclicos teofilina fenitoína e uma maioria de materiais inorgânicos e orgânicos Silberman et al 2021 A adsorção química está contraindicada em pacientes i com nível de consciência alterado devido ao risco de aspiração ii quando a ameaça de perfuração gastrointestinal ou hemorragia é alta devido a condições médicas ou cirurgia recente iii quando é provável que a endoscopia seja realizada pois o carvão ativado pode obscurecer a Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 11 visualização endoscópica na presença de uma obstrução intestinal ou iv quando o agente tóxico é conhecido por não ser adsorvido por este Silberman et al 2021 Este método pode ser utilizado após a lavagem gástrica ou de forma isolada podendo a administração ser por via oral Pode ser utilizado em dose única ou em doses múltiplas quando os agentes têm ação prolongada ou circulação enterohepática como alguns fármacos antiepiléticos Zucoloto et al 2017 A sua máxima eficácia observase até 1 hora após a ingestão do agente tóxico embora pode ser benéfica se administrada até 6 horas após grandes ingestões tomas de fármacos de libertação retardada e para a ingestão de substâncias com propriedades anticolinérgicas ou opioides que diminuem a motilidade intestinal Silberman et al 2021 Apesar desta evidência há alguns casos particulares como o paracetamol em que a administração pode ocorrer até 16 horas após a ingestão do tóxico Zellner et al 2019 A dosagem ideal de carvão ativado é desconhecida Contudo quando a dose da toxina ingerida é conhecida os especialistas recomendam o carvão ativado numa proporção de 101 de carvão ativado para a toxina ingerida Quando a quantidade de toxina ingerida é desconhecida ou é impraticável atingir uma proporção de 101 por exemplo aquando da ingestão de grandes quantidades deve ser administrado 1g de carvão ativado por cada quilograma de peso corporal em suspensão com água ou soro fisiológico na proporção de 48mLg de carvão ativado ou usado um esquema simplificado Tabela 4 com base na idade Silberman et al 2021 Tabela 4 Administração de carvão ativado por via oral adaptado de Silberman et al 2021 1 ano 2 a 12 anos 12 anos Carvão ativado g 10 a 25 25 a 50 50 a 100 Os principais efeitos adversos provenientes da utilização deste método são apenas de origem gastrointestinal como vómitos e obstipação sendo por isso um dos métodos de descontaminação mais usado Zucoloto et al 2017 Silberman et al 2021 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 12 ii Antídotos Os antídotos são substâncias que agem no organismo atenuando ou inativando ações ou efeitos de determinadas substâncias químicas Hon et al 2021 Como referido anteriormente a maior parte das substâncias potencialmente tóxicas não tem antídoto sendo o tratamento nesses casos sintomático de estabilização do utente e de diminuição da absorção do tóxico Para aquelas que existe antídoto este pode ou não ser administrado mediante alguns fatores como a quantidade e tóxico em causa e o tempo entre a intoxicação e hospitalização Zucoloto et al 2017 iii Aumento da taxa de excreção Estes tipos de procedimentos são utilizados para potenciar a eliminação do agente tóxico podendo ser realizada alcalinização urinária caso dos compostos ácidos fracos como salicilatos e remoção extracorporal Ornillo and Harbord 2020 A remoção extracorporal tem uma posição chave no aprimoramento da remoção de uma variedade de fármacos e venenos Os métodos extracorpóreos comuns incluem hemodiálise hemofiltração e hemodiafiltração hemoperfusão terapia de substituição renal contínua diálise peritoneal e diálise com albumina Lu and Xue 2019 III Analgésicos e Antipiréticos Segundo Gummin et al 2020 os analgésicos e antipiréticos são os grupos farmacoterapêuticos que mais estão envolvidos em situações de exposição indevida cerca de 1102 tornandose por isso importante a análise dos mesmos durante este trabalho Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 13 1 Paracetamol acetaminofeno O paracetamol é o fármaco responsável por mais situações de sobredosagem entre crianças Dayasiri et al 2020 O seu fácil acesso e disponibilidade levam a ocorrências mais frequentes de sobredosagem intencional ou não intencional Saccomano 2019 i Farmacodinâmica O paracetamol ou acetaminofeno N4hidroxifeniletanamida é um analgésico e antipirético sendo o seu mecanismo de ação a inibição de uma variante da enzima cicloxigenase1 COX3 É igualmente um agonista das vias canabinoides e agonista dos recetores de serotonina muito usado e eficaz para uma variedade de dores podendo ser tomado de forma individualizada ou em associação com outros compostos Raffa et al 2014 National Center for Biotechnology Information 2021 Inibe ainda o efeito dos pirogénios endógenos sobre o centro de termorregulação do hipotálamo Infarmed 2020b ii Farmacocinética Quando ingerido o acetaminofeno é rápido e completamente absorvido pelo TGI atingindo o pico de concentração 30 a 60 minutos após a ingestão com tempo de semivida t12 entre 2 a 3 horas Este fármaco não se liga fortemente às proteínas plasmáticas sendo esta associação entre 10 a 25 Zucoloto et al 2017 Saccomano 2019 Em doses terapêuticas 90 do composto é metabolizado no fígado e convertido em compostos atóxicos por via da glucuronidação e a sulfonação Cerca de 5 da dose terapêutica é metabolizada pelas enzimas do citocromo P450 com formação de Nacetil pbenzoquinoneimina NAPQI responsável pela toxicidade hepática associada ao fármaco Em doses terapêuticas o composto NAPQI é rapidamente neutralizado pela conjugação com a glutationa GSH e cisteína formando ácidos mercaptúricos O metabolito NAPQI tem semivida curta cerca de 1525 horas Os restantes 5 do Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 14 composto são excretados pela urina na sua forma inalterada Ramachandran and Jaeschke 2018 Saccomano 2019 Em doses tóxicas as vias de glucuronidação e sulfonação tornamse saturadas aumentando assim o metabolismo via citocromo P450 o que origina uma maior formação de NAPQI Quando cerca de 70 da GSH está esgotada o metabolito hepatotóxico NAPQI ligase através de ligações covalentes aos grupos tióis das proteínas celulares levando a lesão do hepatócito e morte celular Nichols and Shaffner 2016 Zucoloto et al 2017 iii Dose terapêutica dose tóxica Para crianças saudáveis a dose terapêutica e a dose tóxica estão representadas na Tabela 5 Em caso de insuficiência renal ou hepática estas doses podem ser mais baixas Zucoloto et al 2017 Infarmed 2020b Tabela 5 Dose referência de acetaminofeno adaptado de Infarmed 2020b Idade 6 anos 6 anos Dose terapêutica mgkg 10 20 10 20 Dose tóxica mgkg 200 150 O valor da dose tóxica numa idade mais precoce é mais alto comparativamente a idades mais avançadas facto este que pode ser devido à menor contribuição do citocromo P450 Figura 2 Metabolização do acetaminofeno adaptado de Barros and Stasi 2012 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 15 devido à imaturidade metabólica diminuindo assim a metabolização por esta via e consequentemente menor formação de NAPQI Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 iv Quadro clínico na intoxicação De acordo com Saccomano 2019 as manifestações clínicas de intoxicação por acetaminofeno podem ser descritas em 4 fases distintas sendo o fator tempo de ingestão da substância o que separa cada uma delas como apresentado na Tabela 6 Para cada uma das fases pode ser observada a evolução dos parâmetros analíticos importantes na determinação do tipo de intervenção clínica na intoxicação Tabela 6 Fases da intoxicação por acetaminofeno adaptado de Saccomano 2019 Manifestações clínicas Parâmetros analíticos Fase I 0 24 horas Assintomática ou sintomas não específicos tais como náuseas vómitos dor abdominal anorexia palidez e hipersudorese Normais Fase II 24 72 horas Assintomática ou dor no quadrante superior direito hepatomegalia e sensibilidade hepática Aumento das transaminases AST ALT Elevação do tempo de protrombina TP e níveis de bilirrubina Fase III 72 96 horas Coma hipoglicemia hipotensão sonolência edema cerebral confusão mental falência hepática e morte Valores elevados de AST entre 1 00030 000 UL Níveis séricos de TP 22 vezes o normal Valores de bilirrubina total superior a 4 mgdL Fase IV 4 dias a 2 semanas Recuperação Danos permanentes ou valores retomam ao normal Valores normais de AST 10 a 40 UL Valores normais de TP 110 a 130 segundos Valores normais de bilirrubina total 03 a 10 mgdL v ExamesDiagnóstico laboratorial No caso de suspeita de intoxicação por acetaminofeno mediante avaliação da história de exposição e sintomatologia associada se for o caso procedese à confirmação da mesma Para isso é realizado um exame de doseamento sérico do composto pelo menos 4 horas Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 16 após a ingestão É importante referir este tempo pois exames obtidos anteriormente podem não refletir a absorção completa logo podem não prever a toxicidade e o tipo de tratamento adequado para a mesma Zucoloto et al 2017 Depois desta confirmação a decisão para o tratamento desta intoxicação é baseada no monograma de RumackMatthew Figura 3 que correlaciona a concentração de paracetamol livre com o tempo em que este foi administrado e a probabilidade de lesão hepática Zucoloto et al 2017 Saccomano 2019 Este monograma apenas deve ser utilizado aquando de uma única administração de paracetamol de forma de libertação convencional Através desta avaliação verificase se a probabilidade de toxicidade hepática esperada determinandose assim o tipo de tratamento a iniciar Saccomano 2019 Relativamente à interpretação do gráfico observase a presença de 2 linhas diagonais que representam uma probabilidade de hepatotoxicidade de 25 ou seja uma possível toxicidade Acima das retas avaliase a hepatotoxicidade como provável tendo indicação para iniciação do tratamento com o antídoto e abaixo das mesmas representa uma ingestão sem hepatotoxicidade provável Saccomano 2019 Para além do doseamento sérico do paracetamol e como descrito no quadro clínico da intoxicação alguns parâmetros analíticos sofrem alterações significativas e por isso devem ser monitorizados tais como função renal transaminases hepáticas glicose Figura 3 Monograma de RumackMatthew retirado de Saccomano 2019 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 17 bilirrubina total TP e eletrólitos Zucoloto et al 2017 Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 vi Tratamento Os objetivos do tratamento passam por garantir a viabilidade das vias aéreas respiração e circulação prevenir a absorção do composto do trato gastrointestinal e administração do antídoto Nacetilcisteína NAC A NAC é um precursor da GSH que como referido anteriormente se liga ao metabolito NAPQI formando um conjugado isento de toxicidade Além desta característica a NAC previne a ligação direta de NAPQI com os hepatócitos reduz o NAPQI novamente a acetaminofeno e é um precursor do sulfato que como apresentado na Figura 2 é uma das vias de destoxificação O tratamento da intoxicação deve ser iniciado o mais prontamente possível para garantir o máximo de eficácia do antídoto limitada a 24 horas após a ingestão Saccomano 2019 Para a escolha do tratamento mais eficaz recorrese à avaliação dos critérios do monograma de RumackMatthew Quando através da avaliação do monograma não se verifica hepatotoxicidade o tratamento é apenas sintomático através da administração de fármacos antieméticos para controlo das náuseas e vómitos fármacos protetores da mucosa e manutenção dos níveis de hidratação Saccomano 2019 Zucoloto et al 2017 No caso de uma provável hepatotoxicidade o tipo de tratamento realizado é dependente do tempo decorrido entre a ingestão do acetaminofeno e a iniciação do mesmo Se decorreu até 1 hora após a ingestão de uma quantidade provável tóxica devese realizar lavagem gástrica eou indução do vómito Estes procedimentos só são realizados neste espaço de tempo pois ainda é provável existir conteúdo no TGI Entre 1 a 4 horas após a ingestão administrar carvão ativado Caso tenha decorrido mais de 4 horas após a ingestão administrar NAC sendo que até 8 horas a eficácia desta é máxima mas pode ser administrado até 24 horas após mantendo alguma eficácia hepatoprotetora Zucoloto et al 2017 Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 18 A dosagem oral de NAC começa com uma dose de 140 mgkg seguida por uma dose de manutenção de 70 mgkg a cada 4 horas completando 17 doses Fisher and Curry 2019 A via de tratamento preferencial é IV sendo a dose inicial é 150 mgkg ao longo de 15 minutos seguido de 50 mgkg durante 4 horas e depois 100 mgkg ao longo de 16 horas perfazendo assim o protocolo de 20 horas Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 vii Novas abordagens terapêuticas Um estudo recente de Kang et al 2020 pretendeu reduzir a hepatotoxicidade associada à sobredose de acetaminofeno com a administração de 4metilpirazol Uma das funções deste composto passa pela inibição da isoenzima CYP2E1 uma das enzimas que integram o citocromo P450 Este estudo teve por objetivo avaliar se esta inibição resultava numa menor formação do metabolito tóxico NAPQI através da inibição da metabolização via citocromo P450 Esta administração mostrou ser eficaz na redução da formação do metabolito tóxico em pacientes após a ingestão de uma dose única de 80 mgkg Ainda relativamente ao fármaco 4metilpirazol Akakpo et al 2018 realizaram um estudo em ratos de modo a perceber o possível efeito hepatoprotetor deste fármaco Para este efeito foi administrada uma solução com 4metilpirazol simultaneamente a uma dose tóxica de acetaminofeno Com este tratamento os autores obtiveram 6 horas após a administração baixos níveis de ALT ausência de necrose hepática e de dano celular Além da avaliação em ratos realizouse um ensaio em células hepáticas humanas isoladas no qual se verificou que no grupo tratado com 4metilpirazol a morte celular foi completamente evitada e os valores de ALT obtidos foram semelhantes aos do grupo controlo Num outro estudo Morrison et al 2019 avaliaram a segurança e tolerabilidade da coadministração de antídoto NAC com calmangafodipir que mimetiza a ação da enzima superóxido dismutase SOD reduzindo o stress oxidativo e prevenindo a lesão celular Numa primeira fase os autores pretenderam verificar se a administração de calmangafodipir não aumentava o número de reações adversas comparativamente ao tratamento convencional com NAC tendo sido demonstrado que não houve aumento Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 19 destas com o tratamento Numa segunda fase os autores exploraram os biomarcadores de lesão hepática No grupo de pacientes que foi utilizada a NAC de forma isolada foi necessário prolongar a administração da mesma devido a um aumento da ALT quando comparado com o tratamento de associação entre a NAC e o calmangafodipir Além deste parâmetro bioquímico foram avaliados biomarcadores de previsão de lesão hepática aguda que são usados para estimar o aumento da atividade de ALT como a proteína citoqueratina 18 CK18 e o microRNA122 miR122 Os resultados obtidos para estes demonstraram que no tratamento isolado os valores dos biomarcadores de lesão hepática são mais elevados quando comparados com o tratamento combinado Os autores concluíram que além de exibir segurança e tolerabilidade a coadministração de calmangafodinir resulta na redução dos parâmetros de toxicidade do acetaminofeno Numa abordagem diferente Kim et al 2015 já tinham demostrado que em ratos um prétratamento oral de 30 minutos ou póstratamento de 60 minutos com metformina atenuou a lesão hepática através da inibição de cjun Nterminal kinase JNK As cinases JNK são um conjunto de proteínas que desempenham um papel de sinalização de stress oxidativo implicadas na morte e regeneração celular Os autores concluíam que o único problema na utilização da metformina para reduzir a toxicidade associada à intoxicação por acetaminofeno era a dose utilizada em animais correspondente a 4 vezes superior à dose terapêutica em humanos No seguimento da avaliação de eficácia da metformina Saeedi Saravi et al 2016 compararam os resultados da administração de metformina com a administração de NAC 100 mgkg Concluíram que a metformina na dosagem de 100 e de 200 mgkg possui atividade hepatoprotetora pois os valores de AST e ALT sofreram uma redução significativa sendo que na dosagem de 200 mgkg a metformina não apresenta diferença significativa com a administração de NAC Avaliaram também a atividade da SOD e da GSH e do malondialdeído MDA sendo este último um produto final da peroxidação lipídica Concluíram que a metformina a 200 mgkg por si só não demonstra alteração significativa nestes parâmetros e além disso no grupo em que foi administrado acetaminofeno em dose tóxica resulta numa diminuição significativa da concentração de MDA Demonstraram ainda não haver diferenças significativas nas concentrações de Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 20 GSH e SOD entre o grupo em que foi administrado NAC e o grupo de metformina a 200 mgkg confirmando assim o efeito hepatoprotetor da metformina nos casos de intoxicação por acetaminofeno A utilização de metformina nestas doses pode resultar num aumento de efeitos adversos sendo por isso necessário avaliar a reprodução destes dados em humanos e inclusive em doses pediátricas Jaeschke et al 2020 2 Ibuprofeno i Farmacodinâmica O ibuprofeno é antiinflamatório não esteroide AINE vulgarmente usado como anti inflamatório analgésico e antipirético que atua por inibição da enzima COX levando a uma redução na produção de prostaglandinas Infarmed 2020a Os alvos farmacológicos do ibuprofeno COX1 e COX2 são enzimaschave na formação de uma classe de mediadores lipídicos as prostaglandinas envolvidas nos processos de inflamação dor e febre A COX1 denominada enzima constitutiva está presente em quase todos os tecidos estando associada à produção de prostaglandinas e consequentemente a diversos efeitos fisiológicos como proteção gástrica função plaquetária e homeostasia renal Por outro lado a COX2 está presente nos locais de inflamação sendo expressa primariamente por células envolvidas no processo inflamatório como macrófagos e monócitos e por isso é denominada de enzima indutiva Esta isoforma encontrase noutros tecidos e órgãos tais como rins cérebro ovários útero cartilagem ossos e endotélio vascular A sua expressão no sistema nervoso central permite a mediação central da dor e da febre e contribuem para a perceção da dor Grosser et al 2017 O efeito antipirético é obtido pela inibição da formação da prostaglandina E2 PGE2 mediador que atua no hipotálamo tendo como consequência o aumento da temperatura corporal e também pela inibição da resposta inflamatória diminuindo a quantidade de Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 21 citocinas produzidas pelos leucócitos O efeito analgésico é devido à inibição da produção local de PG aquando da inflamação O efeito antiinflamatório é obtido pela inibição da COX2 e consequentemente da produção de mediadores prostanóides Infarmed 2020a Os efeitos obtidos pela inibição da COX podem ser resumidos pela Figura 4 Samuelsson 2012 ii Farmacocinética Quando ingerido o ibuprofeno é rapidamente absorvido no TGI tendo um início de ação entre 30 a 60 minutos sendo alcançado a concentração máxima 1 a 2 horas após a sua administração Cerca de 80 da dose é absorvida no TGI e a taxa de ligação proteica é alta 99 O tempo de semivida é de 2 horas A biotransformação é hepática e a excreção é praticamente completa em 24 horas na qual menos de 1 é na forma inalterada Ershad et al 2021 iii Dose terapêuticaDose tóxica O ibuprofeno não está recomendado em crianças com menos de 3 meses de idade ou com peso inferior a 5 kg estando a sua utilização nestas idades dependentes da avaliação médica entre o risco e o benefício Infarmed 2020a Figura 4 Mecanismo de ação da COX retirado de Samuelsson 2012 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 22 A dose recomendada é de 2030 mgkgdia dividida em 3 ou 4 administrações em que o intervalo entre estas não deve ser inferior a 6 horas Infarmed 2020a Doses inferiores a 100 mgkg raramente causam toxicidade A dose tóxica foi observada em crianças após a ingestão de 400 mgkg de ibuprofeno em crianças está associada a situações graves ou mesmo risco de vida Ershad et al 2021 iv Quadro clínico na intoxicação Os sintomas associados a intoxicação usualmente aparecem 4 a 6 horas após a ingestão e desaparecem em 24 horas Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Devido à inibição das prostaglandinas e ao seu envolvimento na manutenção da integridade da mucosa gástrica e na regulação da circulação renal tanto a intoxicação aguda como a crónica podem causar danos nestes órgãos Segundo Zucoloto et al 2017 as intoxicações por ibuprofeno podem ser divididas em leves ou graves sendo as últimas raras Geralmente numa intoxicação leve os pacientes são assintomáticos ou apresentam um quadro gastrointestinal leve com náuseas vómitos e dor ou desconforto abdominal sonolência cefaleia letargia e desorientação Em alguns casos pode ocorrer um prolongamento do tempo necessário para estancar uma hemorragia devido à inibição do tromboxano como visto na farmacodinâmica Após uma ingestão acima de 400 mgkg é considerada uma intoxicação grave na qual os pacientes podem apresentar alteração sensorial acidose metabólica disfunção hepática insuficiência renal raramente depressão respiratória convulsões coma e morte Zucoloto et al 2017 Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 v ExamesDiagnóstico laboratorial O diagnóstico é baseado na história da exposição ao fármaco e no exame físico Deve ser complementado com o nível sérico do composto exame este moroso e que deve ser Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 23 apenas de confirmação da suspeita iniciandose previamente as medidas de suporte Além deste exame específico podem ser realizados outros para vigilância de alguns parâmetros como função hepática e renal e prova de coagulação Zucoloto et al 2017 vi Tratamento Como para este fármaco não existe antídoto o tratamento envolve fundamentalmente medidas de suporte e de descontaminação Lavagem gástrica eou administração de carvão ativado só devem usados em caso de uma ingestão de dose equivalente a uma intoxicação grave e no máximo até 2 horas após a ingestão Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Para os casos mais graves as convulsões podem ser tratadas recorrendo a benzodiazepinas IV como o lorazepam midazolam ou o diazepam que pode ser repetido conforme necessário tal como evidenciado na Tabela 7 Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Nelson 2019 Ershad et al 2021 Tabela 7 Benzodiazepinas usadas no tratamento de convulsões adaptado de Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Lorazepam Midazolam Diazepam Dosagem mgkg 005 01 002 02 05 Como o ibuprofeno se liga fortemente às proteínas plasmáticas excluise a hemodiálise para remoção do tóxico Ershad et al 2021 Considerase que o paciente se encontra livre do medicamento quando estão assintomáticos após 4 a 6 horas da ingestão do mesmo Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 24 vii Novas abordagens terapêuticas Dada a ineficácia da hemodiálise para a remoção do composto Wolff et al 2020 para tratar a intoxicação por ibuprofeno em dois cães realizaram a técnica de hemoperfusão através de carvão ativado na qual o sangue foi continuadamente passado através de um filtro com carvão ativado promovendo a adsorção dos compostos a remover Com esta técnica os autores obtiveram uma diminuição da concentração do tóxico em circulação Como fatores negativos a hemoperfusão mostrase ser uma técnica cara e caso haja necessidade de um tratamento longo existe a dificuldade em mudar a coluna de carvão ativado sem que seja introduzido ar no sistema Num outro trabalho Rosenthal and Labato 2019 utilizaram a plasmaferese para tratar a sobredosagem de AINEs em cães A plasmaferese é uma técnica em que o sangue do paciente é processado para separar os componentes celulares do plasma sendo este último descartado reintroduzindo os componentes celulares com reposição de plasma Bobati and Naik 2017 Neste estudo os autores não realizaram o doseamento sérico para acompanhar a evolução da concentração do tóxico mas apesar disso todos os animais intoxicados reverteram a sintomatologia As complicações decorrentes da técnica foram observadas em 545 dos casos incluindo hemorragia ou hipotensão não tendo efeito significativo no resultado final 3 Ácido acetilsalicílico Do ponto de vista histórico o ácido acetilsalicílico AAS é um composto que deve ser revisto quer por ser um dos mais antigos e mais utilizados quer pelos eventos associados à síndrome de Reye Esta é uma doença muito rara que causa inflamação e edema do cérebro e degeneração e perda da função hepática Não há causa conhecida para esta síndrome mas sabese que pode ser desencadeada por uma infeção viral ou pelo uso do AAS Este é um medicamento contraindicado em crianças com menos de 12 anos Magrum and Pickworth 2020 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 25 i Farmacodinâmica O AAS pertence ao grupo dos AINEs inibindo irreversivelmente a tanto a COX1 como a COX2 e por isso inibindo a biossíntese de prostaglandinas tal como descrito anteriormente Possui efeito antipirético analgésico antiinflamatório Em doses mais baixas atua como antiagregante plaquetário Nelson 2019 Neste caso particular o efeito antiagregante plaquetário resulta da inibição irreversível da COX que impede a síntese de tromboxano A2 TXA2 cuja função é ativação das plaquetas sanguíneas e agregação das mesmas como demonstrado na Figura 4 Lavie et al 2017 ii Farmacocinética O AAS é rapidamente absorvido por via oral atingindo o pico plasmático entre 30 a 60 minutos após a sua ingestão Distribuise praticamente por todos os tecidos atravessando as barreiras hematoencefálica BHE e placentária e aparece no leite materno Nelson 2019 A taxa de ligação às proteínas plasmáticas é cerca de 80 a 90 em doses terapêuticas e 50 a 75 em doses tóxicas O tempo de semivida é de 15 a 30 minutos Papacostas et al 2016 O AAS sofre hidrólise por ação das esterases formando ácido salicílico o metabolito ativo cujo tempo de semivida é variável consoante a dose administrada 2 a 3 horas em doses baixas e pode ir até 30 horas em doses altas ou doses múltiplas pois ocorre saturação das vias de metabolização Soleimani et al 2019 A excreção destes compostos é pela via urinária através da passagem pelos glomérulos renais e sofrem filtração glomerular na qual 75 é sob a forma de ácido salicilúrico 10 na forma de glucoronídeo fenólico e 10 de forma inalterada 5 como acilglucuronídeos e 1 como ácido gentísico Nelson 2019 Este metabolismo encontrase esquematizado na Figura 5 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 26 À medida que a concentração de ácido salicílico aumenta as duas principais vias de metabolização tornamse saturadas e exibem cinética de ordem zero Como resultado dessa saturação a eliminação geral de salicilato muda de cinética de primeira ordem em que a eliminação é proporcional à concentração para a cinética de ordem zero em que a quantidade eliminada por unidade de tempo é constante Nelson 2019 O AAS tem pKa de 35 mas como mencionado anteriormente é rapidamente hidrolisado para ácido salicílico que tem um pKa de 297 Sepulveda et al 2018 A pH fisiológico este encontrase predominantemente na sua forma ionizada mas em situações de dose tóxica o pH sérico diminui originando uma maior quantidade de composto na forma não ionizada que permeia facilmente as bicamadas lipídicas e as membranas celulares Este é um efeito importante pois permite que o ácido salicílico entre nas células exercendo os seus efeitos tóxicos numa ampla variedade de órgãos iii Dose tóxica Para uma concentração de salicilatos inferior a 300 µgmL o paciente é geralmente assintomático entre 300 a 500 µgmL considerase uma intoxicação moderada entre 500 Figura 5 Metabolização do AAS retirado de Nelson 2019 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 27 a 700 µgmL é uma intoxicação grave e acima deste valor estão associados os prognósticos mais graves de evolução ou mesmo morte Soleimani et al 2019 iv Quadro clínico na intoxicação Segundo Tintinalli et al 2019 a intoxicação por AAS ou salicilismo pode ser dividida em três tipos designadamente leve moderada e severa em que varia a dose de fármaco administrada e consequentemente os sintomas e parâmetros analíticos Os sinais e sintomas aparecem nas duas primeiras horas após a ingestão mas pode ser atrasado até 24 horas em caso de ingestão concomitante com outros compostos comorbidades ou comprometimento renal eou hepático Numa intoxicação leve inferior a 150 mgkg o paciente pode manifestar distúrbios gastrointestinais como náuseas vómitos rubor e hiperpneia leve a moderada não apresentando qualquer variação de parâmetros analíticos Numa intoxicação moderada 150 mgkg a 300 mgkg já apresenta hiperpneia grave hipersudorese desidratação surdez tremores letargia ou agitação Analiticamente verificase alcalose respiratória seguida de acidose metabólica Na situação mais crítica uma intoxicação severa aquando de uma ingestão superior a 300 mgkg o utente apresenta hiperpneia severa hipertermia confusão cansaço sonolência delírio convulsões coma ou mesmo morte Em geral quando a duração da intoxicação por salicilato é entre 12 a 24 horas a acidose metabólica e acidemia pH 735 ocorrem principalmente em crianças com idade inferior a 4 anos e quase todas as crianças com idade inferior a 1 ano têm acidose Crianças pequenas podem ter alcalose respiratória mas geralmente é transitória ou não detetada devido a uma menor reserva respiratória Em crianças mais velhas 4 anos o distúrbio ácidobase é geralmente um distúrbio misto com alcalose respiratória e acidose metabólica Tintinalli et al 2019 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 28 v Examesdiagnóstico laboratorial Para confirmar o diagnóstico de intoxicação por AAS deve procederse à determinação de salicilatos através de uma amostra de sangue ou urina importante para prever o grau de toxicidade esperado Devese avaliar a presença de cetonas séricas ou urinárias e concentração de lactato Além destes são realizados exames de modo a avaliar a função renal e hepática pois são determinantes no processo de metabolização e excreção dos metabolitos resultantes Nelson 2019 vi Tratamento Este composto não possui antídoto sendo o tratamento da intoxicação baseado nos sintomas apresentados Procedese à lavagem gástrica até 1 hora após a ingestão eou administração de carvão ativado e administração de xarope de ipecacuanha como medidas de diminuição da absorção do composto Administração IV de glucosesoro glicosado para correção de hipoglicemia correção da perda de fluidos manutenção da função renal e controlo de hipertermia devido ao aumento da taxa metabólica A medida mais específica para o tratamento da intoxicação por AAS não sendo considerada antídoto é a alcalinização urinaria através da administração de bicarbonato de sódio Esta medida favorece a excreção urinária do AAS e dos seus metabolitos evidenciado na Figura 6 pois com o aumento do pH aumenta a conversão do ácido fraco para a forma ionizada impedindo a sua reabsorção pelo túbulo renal Não está indicada em casos de insuficiência renal edema pulmonar ou cerebral Soleimani et al 2019 Figura 6 Relação entre pH e clearance urinário do AAS retirado de Proudfoot et al 2003 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 29 Em casos muito graves pode ser necessário realizar hemodiálise que corrige as anormalidades ácidobase e eletrolíticas e reduz rapidamente a quantidade de salicilato em circulação Papacostas et al 2016 vii Novas abordagens terapêuticas Nos seus estudos Zhang et al 2013 utilizaram uma emulsão água em óleo AO ativa para reverter os efeitos tóxicos da sobredosagem de AAS Para esta emulsão foi utilizado trioctilamina como carrier agente extrator o dodecano como fase oleosa Abil EM90 como surfactante NaOH a 01 molL como fase aquosa interna tendose usada uma proporção fase oleosafase aquosa de 05 em volume Este método baseiase como descrito anteriormente na ionização de um ácido fraco em contacto com uma solução aquosa básica em meio ácido o AAS encontrase na forma não ionizada contacta com a emulsão e complexase com o agente extrator o qual transporta o AAS para na fase aquosa interna aqui o complexo decompõese sendo a trioctilamina regenerada voltando desta forma para a interface externa por seu lado o ácido fraco ionizase resultando no seu aprisionamento no meio interno da emulsão Os autores concluíram que a utilização desta técnica resulta em eficácia máxima de remoção do composto em menos de 15 minutos O tratamento padronizado para intoxicações muito graves passa como referido previamente por hemodiálise pois atinge uma maior clearance do tóxico Em doses tóxicas a porção de fármaco ligada a proteínas plasmáticas reduz para cerca de 50 a 75 Na hemodiálise é a porção de fármaco não ligada às proteínas plasmáticas que é removido logo assim que esta técnica é interrompida há uma redistribuição do composto dos tecidos para o plasma até atingir novo equilíbrio resultando num aumento da concentração de salicilatos efeito rebound Papacostas et al 2016 avaliaram a utilização de hemodiafiltração venovenosa contínua depois do tratamento inicial com hemodiálise resultando numa diminuição do efeito rebound e desta forma diminuindo a toxicidade do AAS Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 30 Rojas et al 2019 propuseram a utilização de estruturas nanométricas metálicoorgânicas nanoMOF usando o titânio Ti como agente metálico capaz de reverter situações de intoxicações por salicilatos O TinanoMOF demonstrou ser seguro e capaz de adsorver o AAS em todo o TGI com maior eficácia relativamente aos tratamentos de descontaminação atualmente usados Este material apresenta diversas vantagens como uma elevada dose letal sendo mesmo considerado biocompatível muito baixa absorção oral e elevada porosidade O agente em causa revelou capacidade de reduzir em 2 vezes o pico de salicilatos no sangue e comparativamente ao carvão ativado demonstrou uma maior capacidade de adsorção em condições intestinais Nos dias de hoje as nanopartículas já são usadas como sistemas de libertação modificada de fármacos mas com este estudo os autores demonstraram que as suas utilizações podem ser ainda mais diversificadas Rojas et al 2019 IV Antihistamínicos e descongestionantes De acordo com Gummin et al 2020 os antihistamínicos são o segundo grupo farmacoterapêutico com maior taxa de aumento de exposições dos últimos 10 anos aliandose ao facto de juntamente com os descongestionantes serem dos fármacos mais usados em pediatria A histamina exerce efeitos sobre os músculos liso e cardíaco sobre determinadas células endoteliais e nervosas sobre as células secretoras do estômago e sobre células inflamatórias quando através de algum estímulo se liberta dos mastócitos ligandose a recetores específicos localizados na membrana celular Até ao momento estão identificados quatro recetores de histamina diferentes designados de H1 a H4 Katzung 2017 Para este trabalho apenas irão ser abordados os recetores H1 pela relevância de toxicidade Estes recetores estão associados à mediação da inflamação As outras funções da histamina e do recetor H1 incluem o controle do ciclo sonovigília cognição memória e homeostase endócrina A estimulação do recetor H1 também causa vasodilatação aumento da permeabilidade vascular e da broncoconstrição A estimulação do recetor H1 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 31 da histamina cardíaca aumenta igualmente o tempo de condução nodal atrioventricular Nelson 2019 1 Antihistamínicos H1 1ª e 2ª geração Os antihistamínicos são fármacos que em grande parte não requerem receita médica para a sua aquisição Possuem ampla aplicação no tratamento de condições como anafilaxia doença do refluxo gastroesofágico gastrite de stress e outros distúrbios mediados pela histamina Além disto são usados para o alívio sintomático dos sintomas de alergia como na rinite alérgica urticária e estão incluídos em muitas preparações combinadas para tosse eou constipações Alguns são ainda usados como hipnóticos Nelson 2019 Relativamente ao efeito terapêutico eficácia e segurança os antihistamínicos H1 podem ser divididos em dois grupos os de primeira geração ou sedantes como difenidramina hidroxizina e os de segunda geração ou não sedantes como loratadina desloratadina cetirizina azelastina rupatadina bilastina Church 2017 i Farmacodinâmica Todos os fármacos denominados antagonistas da histamina H1 conhecidos funcionam como agonistas inversos e não são simplesmente antagonistas competitivos reversíveis pois em vez de impedir a ligação da histamina ao seu recetor característico de um antagonista competitivo clássico estabilizam a forma inativa do recetor de histamina e mudam o equilíbrio para esta conformação inativa Para uniformizar a denominação destes grupos de fármacos o termo mais usado é antihistamínico Os antihistamínicos H1 reduzem ou bloqueiam a ação da histamina através da ligação competitiva aos recetores H1 apresentando pouca afinidade para os recetores H2 e H3 Para além desta inibição da ação da histamina os antagonistas dos recetores H1 exercem outras como resultado da semelhança estrutural com os fármacos que exercem os seus efeitos nos Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 32 recetores colinérgicos muscarínicos αadrenérgicos serotoninérgicos e os recetores dos anestésicos locais podendo ter ou não ações benéficas Nelson 2019 Os antihistamínicos H1 de 1ª geração penetram prontamente na BHE resultante da sua lipofilicidade ou pela falta de reconhecimento da glicoproteína P gpP nas superfícies luminais das células endoteliais vasculares no SNC produzindo efeitos centrais incluindo sedação Os de 2ª geração são seletivos perifericamente e têm um índice terapêutico mais alto Não penetram bem no SNC devido à sua hidrofilicidade ao peso molecular relativamente alto e reconhecimento pela bomba de efluxo da gpP na superfície luminal do endotélio dos capilares cerebrais Têm afinidades de ligação mais baixas para os locais dos recetores colinérgicos α e βadrenérgicos comparativamente aos de 1ª geração Muitos são prófármacos que precisam ser convertidos no fígado em metabolitos hidrossolúveis Nelson 2019 ii Farmacocinética Os antihistamínicos H1 geralmente são bem absorvidos por via oral atingindo o pico plasmático entre 1 hora caso da difenidramina e cetirizina e 2 a 4 horas após a administração ocorrendo o seu efeito máximo algumas horas após este pico Em doses altas a absorção é prolongada pelo efeito antimuscarínico no TGI Nelson 2019 Distribuemse amplamente por todo o corpo tendo os de 2ª geração fraca distribuição no SNC exercendo menos efeitos sedativos comparativamente aos de 1ª geração que se distribuem facilmente pelo SNC e ligamse fortemente às proteínas plasmáticas Nelson 2019 A biotransformação é hepática com exceção da cetirizina fexofenidramina e a levocetirizina e a eliminação renal com exceção da fexofenadina que apresenta maior excreção biliar Segundo Nelson 2019 o tempo de semivida e a duração de ação para este grupo farmacoterapêutico é variável tal como observado na Tabela 8 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 33 Tabela 8 Propriedades farmacocinéticas antihistamínicos H1 adaptado de Nelson 2019 Antihistamínico H1 Tempo ½ vida horas Duração de ação horas 1ª geração Clorfeniramina 12 43 24 Difenidramina 3 14 12 Doxilamina 10 11 Hidroxizina 13 27 24 Prometazina 9 16 4 6 2ª geração Fexofenadina 9 20 12 24 Cetirizina 65 10 12 24 Desloratadina 21 27 24 Levocetirizina 24 Loratadina 3 20 24 iii Dose tóxica As doses potencialmente fatais são relatadas com grande variabilidade na literatura Em geral é observada toxicidade quando é ingerida a quantidade 3 a 5 vezes superior à dose terapêutica Sabese se que as crianças são mais sensíveis aos efeitos tóxicos quando comparadas com os adultos Tal como esperado o quadro clínico da intoxicação aguda por antihistamínicos H1 de 1ª geração é mais grave do que os de 2ª geração Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 iv Quadro clínico na intoxicação Como visto anteriormente os tempos de semividas dos antihistamínicos são altamente variáveis originando em casos de intoxicação duração dos quadros clínicos incertos Os efeitos anticolinérgicos como redução do TGI podem levar ao prolongamento da duração do quadro pelo atraso na absorção e eliminação do fármaco A fisiopatologia da intoxicação aguda deste grupo farmacoterapêutico é uma extensão dos efeitos terapêuticos e adversos esperados Em caso de sobredosagem a maioria dos pacientes apresenta sintomas entre 1 a 4 horas Nelson 2019 Relativamente aos de 1ª geração uma intoxicação leve pode conduzir a alterações a nível neurológico como sonolência que pode evoluir até convulsão em caso de intoxicação Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 34 grave e nas primeiras horas após exposição especialmente na idade pediátrica Podem apresentar ainda excitação irritabilidade ou ataxia alucinações e uma série de sintomatologia associado ao síndrome anticolinérgico ver Tabela 1 Varney et al 2016 Quadros graves podem apresentar psicose rabdomiólise síndrome neuroléptica maligna coma prolongado e íleo paralítico Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Nelson 2019 Já nos de 2ª geração como já foi sendo abordado os pacientes evoluem com quadros clínicos leves na maior parte das vezes ou com sonolência ou agitação cefaleia e distúrbios gastrintestinais Há relatos raros de alterações a nível cardíaco como arritmias ou aumento do tempo QT com a loratadina e cetirizina Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 v ExamesDiagnóstico laboratorial Tal como para os fármacos analisados até ao momento o diagnóstico da intoxicação por antihistamínicos H1 tem por base o historial clínico de exposição e sintomatologia associada A determinação por análise de amostras de sangue ou urina através de cromatografia eou espetroscopia fornece concentrações de antihistamínicos mas são mais úteis em situações médicolegais ou forenses É improvável que o tempo de resposta geralmente necessário forneça resultados no momento da avaliação inicial Além disso os testes quantitativos não contribuem para a indicação de medidas terapêuticas ou previsão quanto à gravidade e prognóstico e o tratamento é baseado no alívio ou correção de sinais ou sintomas tóxicos e não deve depender de um resultado de concentração que não se correlaciona com a toxicidade Nos casos mais graves a gasometria arterial a glicemia os eletrólitos monitorização cardíaca oximetria e a determinação dos níveis de creatinofosfoquinase CPK são úteis no acompanhamento da evolução Nelson 2019 Deve ser realizada a avaliação da concentração sérica de acetaminofeno pois estes são utilizados concomitantemente em produtos para tosse e constipações Nelson 2019 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 35 vi Tratamento Para este grupo farmacoterapêutico não existe antídoto específico logo o tratamento da intoxicação visa a descontaminação gastrointestinal se a janela de tempo assim o permitir e alívio de sintomas decorrentes da intoxicação logo a triagem deve ser realizada o mais breve possível Complicações graves são inicialmente indistinguíveis daqueles que terão uma evolução leve Nelson 2019 A descontaminação gastrointestinal é recomendada em pacientes com ingestão de doses potencialmente toxicas de antihistamínicos H1 com a utilização de carvão ativado por via oral sendo mais eficaz até 1 hora após ingestão Nelson 2019 Pacientes com hipotensão devem receber fluidos isotónicos como solução de cloreto de sódio a 09 ou solução de Ringer lactato Caso não seja suficiente para normalizar o valor recorrer a uma solução hipertónica de bicarbonato de sódio Varney et al 2016 A hipertermia deve ser tratada por métodos físicos com remoção de camadas de roupa abaixamento da temperatura ambiente uso de esponjas ou compressas frias Nelson 2019 Em caso de agitação e delírio estes devem inicialmente ser tratadas num ambiente calmo e apaziguador Caso não seja suficiente tratar com fisostigmina que reverte eficazmente o quadro anticolinérgico Em crianças deve ser administrada uma dose de carga de 05mg de fisostigmina IV durante 5 a 10 minutos e repetida em intervalos de 10 minutos até restabelecer normalidade Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 A utilização deste fármaco por parte dos clínicos conduz a algumas discrepâncias pois não é concordante quanto aos riscos da sua utilização podendo ocorrer vómitos bradicardia e convulsões Segundo Boley and Stellpflug 2019 o seu uso está associado a uma diminuição da necessidade de intubação quando comparado com o grupo que não recebeu tratamento Além deste fator verificouse que a sua utilização não resultou num aumento dos efeitos adversos Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 36 Se o quadro evoluir para convulsões eou os casos de agitação e delírio podem ser revertidos pela ação de uma benzodiazepínico IV tal como evidenciado Tabela 7 Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Nelson 2019 No caso de ocorrerem complicações cardíacas como anormalidades na condução cardíaca pode ser administrada uma dose de carga de bicarbonato de sódio intravenosamente Varney et al 2016 A nefrotoxicidade associada à rabdomiólise pode ser evitada com o uso precoce de NaCl a 09 de modo a obter um débito urinário de 13 mLkgh Uma vez estabelecida a rabdomiólise induzida por antihistamínicos o tratamento passa por administração de fluidos por via IV A alcalinização urinária não está indicada sendo apenas reservada quando o pH urinário é inferior a 65 Nelson 2019 vii Novas abordagens terapêuticas Varney et al 2016 avaliaram em porcos o tratamento da hipotensão causada por difenidramina com emulsão lipídica IV comparativamente ao uso de bicarbonato de sódio A emulsão lipídica intravenosa composta por dois tipos de lípidos designadamente por triglicerídeos e por fosfolípidos mostrouse um eficaz agente para tratamento de sobredosagem de fármacos lipofílicos Neste estudo concluiuse que para a maior parte dos parâmetros cardíacos como a pressão arterial e a pulsação os resultados foram semelhantes variando apenas a pressão arterial média e a pressão sistólica nas quais os valores nos casos tratados com emulsão lipídica intravenosa eram comparativamente aos de bicarbonato de sódio mais favoráveis 2 Descongestionantes simpaticomiméticos São exemplos de descongestionantes nasais simpaticomiméticos a efedrina pseudoefedrina fenilefrina adrenalina Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 37 i Farmacodinâmica Os descongestionantes simpaticomiméticos reduzem a congestão nasal através do estímulo dos recetores αadrenérgicos no músculo liso promovendo a constrição dos vasos sanguíneos levando a uma diminuição da resistência do fluxo de ar Ambos os subtipos de recetores adrenérgicos α1 e α2 estão ligados a uma proteína Gq que ativa a contração do músculo liso A administração tópica prolongada produz congestão nasal medicamentosa após a descontinuação Nelson 2019 A fenilefrina é um agonista direto do recetor α1adrenérgico com muito pouca atividade agonista βadrenérgica em doses terapêuticas A pseudoefedrina e efedrina são agonistas dos recetores α12adrenérgicos e β12adrenérgicos de ação mista direta e indireta não específica sendo a pseudoefedrina o isómero da efedrina com apenas 25 da atividade Nelson 2019 ii Farmacocinética Os descongestionantes simpaticomiméticos são farmacologicamente ativos após administração oral ou tópica sendo absorvidos rapidamente pelo TGI e o pico máximo ocorre 2 a 4 horas após ingestão A sua metabolização é hepática através da enzima monoamina oxidase e a sua eliminação é renal No caso da pseudoefedrina o tempo de semivida é mais curto em crianças a sua eliminação é dependente do pH urinário e existe eliminação através do leite materno não impossibilitando contudo a sua administração durante a amamentação Nelson 2019 O tempo de semivida da efedrina em doses terapêuticas é de 6 horas A duração de ação de cada um destes compostos está evidenciada na Tabela 9 Tabela 9 Duração de ação dos descongestionantes simpaticomiméticos adaptado de Nelson 2019 Descongestionante simpaticomimético Duração de ação horas Efedrina 3 5 Pseudoefedrina 3 4 Fenilefedrina 1 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 38 iii Dose tóxica A dose tóxica varia de acordo com o fármaco A efedrina e pseudoefedrina podem apresentar toxicidade a partir do dobro da dose terapêutica Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 iv Quadro clínico na intoxicação Após uma sobredose de descongestionante desta classe a sintomatologia apresentada é associada à estimulação simpaticomimética com envolvimento do SNC devido a ação direta nos recetores α e β levando a hipertensão taquicardia ou bradicardia reflexa ver Tabela 1 Psicose agitação e comportamento maníaco são também relatados com ingestão aguda Casos graves são incomuns mas podem originar convulsões alucinações e arritmias cardíacas Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 v ExamesDiagnóstico laboratorial O diagnóstico de toxicidade por descongestionantes simpaticomiméticos é clínico e pode resultar do histórico de exposição A pesquisa no sangue ou na urina pode ser obtida para fins de investigação em abuso infantil ou em estudos forenses para determinar a causa da morte pois a determinação destes agentes não é fundamental no tratamento da intoxicação Nelson 2019 O ECG deve ser realizado para a determinação de arritmias cardíacas nos casos graves e pode ser considerado realizar uma TC em pacientes com alterações neurológicas Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 39 vi Tratamento Os descongestionantes simpaticomiméticos não têm antidoto logo o tratamento da intoxicação envolve medidas de descontaminação e tratamento sintomático A descontaminação do TGI com carvão ativado é recomendada em pacientes com ingestões potencialmente tóxicas e se esta for até 1 hora dada a rápida absorção dos compostos A administração de carvão ativado pode ser realizada algumas horas após a ingestão em casos de preparações de libertação modificada Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Nelson 2019 As técnicas de aumento da taxa de excreção renal eou lavagem intestinal não são indicadas Nelson 2019 Sintomatologia de agitação extrema convulsões e psicose devem ser tratadas inicialmente com administração de oxigénio e fármacos benzodiazepínicos por via IV ver Tabela 7 ou fármacos antipsicóticos Cakmak et al 2020 Em caso de persistência da hipertensão recomendase a utilização de fentolamina um antagonista αadrenérgico não seletivo Nelson 2019 3 Descongestionantes imidazólicos Os descongestionantes imidazólicos mais usados são oximetazolina xilometazolina nafazolina e tramazolina i Farmacodinâmica Os descongestionantes imidazólicos têm afinidade seletiva para os recetores α2 adrenérgicos centrais e periféricos nos vasos sanguíneos e fixamse a outros locais independentes dos recetores os locais imidazolínicos Até ao momento são reconhecidas três classes de recetores imidazolínicos Os recetores de imidazolina I1 medeiam a ação inibitória dos xenobióticos de imidazolina para reduzir a pressão arterial o recetor de imidazolina I2 é um importante local de ligação para monoamina oxidase e o recetor Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 40 imidazolina I3 regula a secreção de insulina das células pancreáticas Lowry and Brown 2014 O mecanismo de toxicidade é através do agonismo α2 central na qual ocorre uma depleção das catecolaminas levando à depressão do sistema nervoso central juntamente com bradicardia e hipotensão Na sobredosagem ocorre também estimulação transitória dos recetores α1 periféricos e α2 póssinápticos causando uma breve libertação de catecolaminas o que leva a uma hipertensão transitória precoce Norman and Nappe 2021 ii Farmacocinética Os descongestionantes imidazólicos são rapidamente absorvidos por via oral eou nasal O tempo de semivida destes fármacos é de 2 a 4 horas produzindo um rápido efeito terapêutico com 60 da eficácia 20 minutos após administração A oximetazolina é o único composto deste grupo com uma duração de ação superior a 8 horas tendo os restantes uma duração de ação de aproximadamente 4 horas Nelson 2019 Distribuem se por todos os tecidos tendo tropismo para a musculatura lisa O seu metabolismo é hepático e a eliminação é por via renal Zucoloto et al 2017 iii Dose tóxica A dose tóxica por via oral não está estabelecida Em crianças entre 3 a 6 anos quantidades de 1 a 2 ml de soluções para uso nasal utilizadas por via oral podem causar toxicidade severa Em crianças menores de 3 anos 1 a 2 gotas destas mesmas substâncias por via oral nasal ou ocular podem causar toxicidade Uso superior a 5 dias pode produzir efeitos adversos como tonturas náuseas cefaleias e congestão nasal medicamentosa efeito rebound Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 41 iv Quadro clínico na intoxicação A sintomatologia da intoxicação é iniciada em 30 a 60 minutos após a ingestão ou aplicação tópica e geralmente desaparece até 36 horas Norman and Nappe 2021 Uma intoxicação leve é caracterizada por sintomas como taquicardia agitação palidez diaforese sonolência e ataxia Lowry and Brown 2014 Já no caso de intoxicações graves desenvolvese hipotensão ou hipertensão bradicardia hipotermia hiporreflexia podendo evoluir para coma e apneia Zucoloto et al 2017 As crianças são particularmente sensíveis aos efeitos dos descongestionantes imidazólicos Nelson 2019 v ExamesDiagnóstico laboratorial O diagnóstico de intoxicação por descongestionantes imidazólicos passa pelas mesmas etapas dos descongestionantes simpaticomiméticos analisados no ponto anterior vi Tratamento Como a absorção é muito rápida o esvaziamento gástrico e administração de carvão ativado não estão indicados O tratamento passa pelas medidas de suporte e alívio sintomático Zucoloto et al 2017 A bradicardia é normalmente revertida sem necessidade de intervenção farmacológica mas se resultar em instabilidade hemodinâmica administrase atropina IV na dose de 002 mgkg Zucoloto et al 2017 A hipertensão arterial é passageira e normalmente melhora espontaneamente podendo ser seguida de hipotensão No caso de hipertensão sintomática pode ser administrado um antagonista αadrenérgico de ação curta como a fentolamina A terapia antihipertensiva inicial pode exacerbar a toxicidade e só deve ser reservada para os casos em que a hipertensão grave representa um risco ou perigo de dano ao órgãoalvo Nelson 2019 Em casos de hipotensão grave pode administrarse uma Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 42 solução salina a 09 IV na dose de 10 a 20 mLkg Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Se houver suspeita de ingestão de quantidades potencialmente tóxicas mesmo assintomáticos devese manter observação clínica nas primeiras 6 horas Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 vii Novas abordagens terapêuticas Nadeau et al 2019 sugerem a administração de naloxona em pediatria um antidoto largamente utilizado para reverter os sintomas depressores do SNC tendo como efeito adverso a possibilidade de hipertensão Os relatos de eficácia não são concordantes entre os investigadores mas a dose administrada foi diferente entre estudos Lowry and Brown 2014 Para Seger and Loden 2018 há variabilidade na resposta cardiovascular e do SNC à naloxona em crianças com toxicidade por clonidina derivado imidazólico A reversão dos sintomas depende do tónus simpático basal dose de clonidina ingerida e dose de naloxona administrada Os autores concluíram que uma dose alta de naloxona 10 mg IV deve ser administrada em todas as crianças com toxicidade resultante de clonidina pois não se verificou aumento de reações adversas Para os estudos que demonstraram ineficácia a reverter a toxicidade deste composto os autores defendem que a dose administrada era muito baixa Alguns trabalhos avaliaram a utilização de agentes antagonistas α2adrenérgicos como atipamezol tolazolina idazoxano e ioimbina para reverter os efeitos sedativos e analgésicos em animais Estes fármacos estão aprovados apenas em uso veterinário e além do mecanismo anterior os estudos indicaram que o atipamezol e ioimbina podem ter afinidade para os recetores imidazólicos Lowry and Brown 2014 Penttila et al 2004 demonstraram em humanos que o atipamezol é capaz de reverter rapidamente e com segurança os efeitos dos agonistas α2 No entanto devido às diferenças Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 43 farmacocinéticas e farmacodinâmicas entre agonistas e antagonistas altas doses de atipamezol podem causar hipertensão ou taquicardia Os estudos clínicos destes agentes em animais encontraram terapia antidotal eficaz sendo necessário mais pesquisa acerca da segurança da utilização em humanos quando ocorrem sobredosagens de imidazolinas e agonistas α2 Ahmad et al 2015 V Broncodilatadores Os broncodilatadores são fármacos simpaticomiméticos que atuam através da interação com recetores adrenérgicos do tipo β2 Existem recetores β2adrenérgicos em diversos órgãos do corpo desempenhando por isso diferentes papeis Importa perceber a localização destes recetores e respetiva função desempenhada de modo a relacionar os sinais da intoxicação com a sintomatologia apresentada evidenciada na Tabela 10 Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Nelson 2019 Segundo Dayasiri et al 2020 este grupo farmacoterapêutico é o terceiro com mais relatos de intoxicações em crianças Os fármacos escolhidos para serem abordados neste trabalho foram o formoterol salbutamol e a terbutalina 1 Agonistas β2adrenérgicos i Farmacodinâmica A ação broncodilatadora imediata dos agonistas β2adrenérgicos passa pelos mecanismos que induzem o relaxamento do musculo liso nos brônquios evitando o broncospasmo Almadhoun and Sharma 2021 Os agonistas β2adrenérgicos ativam a enzima adenilciclase que transforma ATP em monofosfato de adenosina cíclico AMPc O AMPc tem como funções a redução de Ca2 no citosol necessário para que haja contração da musculatura brônquica ativa a fosforilase que favorece o relaxamento das proteínas contráteis e ativa a bomba de Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 44 NaK ATPase promovendo o influxo de potássio para dentro da célula consumindo ATP Doymaz and Schneider 2018 Para exercerem a sua função os agonistas β2adrenérgicos podem i ativar diretamente os recetores βagonistas de curta duração SABA do inglês shortacting βagonist exemplo do salbutamol ii permanecer como depósito na membrana e promover o seu efeito de forma sustentada como o formoterol ou iii interagir com um local auxiliar do recetorespecífico como o salmeterol também denominados de βagonistas de longa duração LABA do inglês longacting βagonists O efeito prolongado destes últimos pode ser atribuído às cadeias longas na estrutura molecular que aumentam a lipofilidade permitindo a sua retenção na bicamada fosfolipídica das membranas celulares Williams and Rubin 2018 Os recetores β2 adrenérgicos também estão presentes no endotélio dos vasos sanguíneos mastócitos e glóbulos brancos envolvidos em respostas inflamatórias incluindo eosinófilos e linfócitos Isso explica os vários efeitos além da broncodilatação que são exibidos como antiinflamatório pela inibição da libertação de leucotrienos e histamina dos mastócitos pulmonares redução do edema e exsudação de plasma por redução da síntese de prostaglandinas e leucotrienos aumento da secreção de muco diminuição da transmissão parassimpática antitússico pela inibição da libertação da acetilcolina Williams and Rubin 2018 Em doses altas estes fármacos podem ter efeitos sobre os recetores β1adrenérgicos Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 45 Tabela 10 Funções dos recetores β2adrenérgicos adaptado de Williams and Rubin 2018 ii Farmacocinética Apesar do mecanismo da farmacodinâmica ser semelhante entre os diversos fármacos os parâmetros farmacocinéticos são variáveis e desta forma serão abordados de forma individual Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Os agonistas β2adrenérgicos são bem absorvidos quer por via oral quer via inalatória Relativamente ao salbutamol quando administrado por via inalatória cerca de 30 da dose atinge as vias respiratórias inferiores onde o restante fica retido no inalador ou na orofaringe onde é posteriormente deglutido As concentrações plasmáticas máximas ocorrem 2 a 5 horas após a inalação e 2 a 25 horas após ingestão A ligação a proteínas plasmáticas é de 10 A semivida é entre 4 a 6 horas O seu metabolismo é hepático e é excretado maioritariamente na urina sob a forma inalterada ou sob a forma de éster 4 Osulfato salbutamol 4Osulfato Pode ocorrer também eliminação através das fezes Ammari et al 2020 Quando administrado por via inalatória a terbutalina tem uma absorção inferior a 10 e por via oral de cerca de 10 a 15 A metabolização é hepática formandose conjugados inativos e o tempo de semivida varia entre 16 a 20 horas Com a administração parenteral 60 da dose é excretada na urina na forma inalterada Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 O formoterol é um fármaco com boa absorção cerca de 90 da dose inalada é rapidamente absorvida A ligação às proteínas plasmáticas não é muito extensa entre 61 Recetor β2 adrenérgico LocalÓrgão Função Coração Aumento da frequência cardíaca Aumento da contratilidade Fígado Aumento da glicogenólise Aumento da glicogénese Musculo esquelético Aumento da glicogenólise Vasodilatação Músculo liso brônquios bronquíolos TGI útero Relaxamento Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 46 a 64 É inicialmente metabolizado por via da glucuronidação e totalmente eliminado pela urina e através das fezes na qual 6 a 9 na forma inalterada Tashkin 2020 iii Dose tóxica De acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 as doses tóxicas para os agonistas β2adrenérgicos são as descritas na Tabela 11 Tabela 11 Dose tóxica dos agonistas β2adrenérgicos adaptado de Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Fármaco Dose tóxica Salbutamol 07 mgkg Terbutalina 1 mgkg Formoterol 15 µgkg iv Quadro clínico na intoxicação Nas intoxicações agudas por agonistas β2adrenérgicos os sintomas mais comuns são taquicardia sinusal tremores agitação hipertensão arterial taquipneia náuseas e vómitos Analiticamente é comum ocorrer hiperglicemia devido ao estímulo de glicogénese e glicogenólise mas em intoxicações prolongadas pode resultar apenas em hipoglicemia e hipocalemia devido ao aumento do AMPc que promove o influxo de potássio para o meio intracelular originando alterações de condução no tecido cardíaco e muscular Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Nos casos de intoxicações graves é manifestada hipotensão arterial e arritmias nível de consciência alterado redução do volume de diurese e convulsões Analiticamente pode detetarse acidose hipomagnesemia e hipofosfatemia devido ao deslocamento de magnésio e fosfato para o compartimento intracelular durante o período de hiperglicemia Pode ocorrer elevação da troponina e creatina fosfoquinase muscular e cardíaca Casos raros de isquemia miocárdica e enfarte também foram relatados Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 47 v ExamesDiagnóstico laboratorial O diagnóstico de intoxicação por agonistas β2adrenérgicos é realizado com base na história de exposição e mediante a sintomatologia apresentada Os testes quantitativos não contribuem para o prognóstico da gravidade esperada Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Na suspeita de ingestão de uma dose potencialmente tóxica é importante realizar ECG pois como visto anteriormente a estimulação dos recetores β2adrenérgicos no coração pode provocar complicações cardíacas Em caso de alterações cardíacas compatíveis com isquemia deve realizarse o doseamento de troponina e creatina fosfoquinase muscular e cardíaca Doseamento de eletrólitos séricos nomeadamente fósforo magnésio e potássio e da glicemia devem ser monitorizados de modo a identificar precocemente alterações e proceder à correção das mesmas Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 vi Tratamento Não existe antidoto para este grupo farmacoterapêutico por isso o tratamento da intoxicação por agonistas β2adrenérgicos passa pelas medidas de descontaminação e alívio de sintomas No caso dos agonistas β2adrenérgicos as medidas de descontaminação não devem ser consideradas de forma rotineira devido ao risco aumentado de broncoaspiração Indução do vómito não é aconselhada em crianças pelo mesmo risco Para isso é avaliado se a dose potencialmente ingerida é capaz de provocar uma intoxicação grave com risco de vida se o paciente não apresenta alteração do nível de consciência e se o tempo decorrido entre exposição e hospitalização é inferior a 1 hora Caso se verifiquem estas situações administrar carvão ativado por via oral ou sonda nasogástrica Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 A hipotensão deve ser tratada com administração de fluidos isotónicos como NaCl a 09 em volumes de 20 mLkg Se esta persistir e como é resultado da ação Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 48 vasodilatadora dos recetores β2adrenérgicos deve administrarse um fármaco com efeito αadrenérgico como a adrenalina A sintomatologia associada ao SNC como agitação eou convulsões deve ser tratada com recurso a benzodiazepinas ver Tabela 7 A hiperglicemia normalmente não requer tratamento pois é transitória A hipocalemia também é revertida espontaneamente mas se estiver associada a alterações cardíacas deve ser tratada com reposição de potássio Esta reposição deve ter em conta a redistribuição de potássio quando os efeitos βadrenérgicos terminarem Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 VI Anticonvulsivantes Em idade pediátrica os anticonvulsivantes apresentamse como o segundo maior grupo farmacoterapêutico envolvido em intoxicações Dayasiri et al 2020 De acordo com Gummin et al 2020 os anticonvulsivantes são dos grupos farmacoterapêuticos com maior taxa de crescimento de intoxicações nos últimos 10 anos 1 Carbamazepina i Farmacodinâmica A carbamazepina é um agente antiepilético utilizada para as crises parciais simples e complexas com e sem generalização secundária crises tónicoclónicas generalizadas bem como formas mistas destes tipos de crises Alrashood 2016 O seu principal mecanismo de ação passa pela prevenção da descarga repetitiva dos potenciais de ação dependentes do sódio em neurónios despolarizados via bloqueio dos canais de sódio dependentes do uso e da voltagem Sills and Rogawski 2020 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 49 ii Farmacocinética A carbamazepina é absorvida pelo TGI de forma lenta e irregular obtendo o pico plasmático entre 6 a 24 horas após a exposição sendo possível de em caso de formas farmacêuticas de libertação prolongada a absorção ser estendida até 96 horas Djordjevic et al 2017 A carbamazepina é metabolizada no fígado pela ação da isoenzima CYP3A4 formando um metabolito que é farmacologicamente tão ativo quanto o fármaco original a carbamazepina1011epóxido O metabolito é depois convertido quase na sua totalidade num metabolito inativo trans1011diolcarbamazepina através da enzima epóxido hidrolase antes de ser excretado na urina sob a forma de um glucuronídeo biologicamente inativo Outro caminho de metabolização é a hidroxilação da carbamazepina e formação de compostos inativos Os mecanismos aqui abordados são representados na Figura 7 Djordjevic et al 2017 O tempo de semivida é variável inicialmente de 18 a 55 horas e de 5 a 26 horas com o uso prolongado Tem uma ligação a proteínas plasmáticas de 75 a 85 A eliminação do composto é maioritariamente pela via urinária cerca de 70 e 28 nas fezes Cerca de 1 a 3 é eliminado como fármaco inalterado e 1 na forma de epóxido Djordjevic et al 2017 Figura 7 Metabolização da carbamazepina retirado de Djordjevic et al 2017 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 50 iii Dose terapêuticadose tóxica Para crianças com menos de 6 anos a dose terapêutica é de 10 a 35 mgkgdia enquanto para crianças entre 6 a 12 anos é de 200 a 1000 mgdia Relativamente às concentrações séricas de fármaco estas variam entre 4 a 12 mgL Acikgoz et al 2016 Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 A dose tóxica ao qual correspondem os sintomas leves é de 12 a 20 mgL enquanto que níveis entre 20 a 30 mgL são considerados quadros moderados de intoxicação e acima de 30 mgL são considerados intoxicações com manifestações graves Acikgoz et al 2016 Tabela 12 Doseamento sérico de carbamazepina adaptado de Acikgoz et al 2016 iv Quadro clínico na intoxicação A maior parte das manifestações tóxicas pode estar relacionada com os efeitos anticolinérgicos e depressores do SNC Acikgoz et al 2016 Uma intoxicação leve a moderada é caraterizada por ataxia nistagmo oftalmoplegia distúrbios do movimento midríase e taquicardia Nas intoxicações graves pode ocorrer mioclonia choque hipertermia coma e paragem respiratória Karaman et al 2017 Como visto anteriormente a absorção do fármaco não é regular e por isso as manifestações de toxicidade podem aparecer várias horas após a exposição Karaman et al 2017 v ExamesDiagnóstico laboratorial O diagnóstico de intoxicação por carbamazepina é realizado com base na história de exposição e na sintomatologia associada Para isso deve procederse à avaliação sérica da carbamazepina e do se metabolito ativo a carbamazepina1011epóxido Como a sua Dose Terapêutica Intoxicação leve Intoxicação moderada Intoxicação grave 4 a 12 mgL 12 a 20 mgL 20 a 30 mgL 30 mgL Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 51 absorção é irregular e pode ser prolongada este doseamento deve ser repetido a cada 46 horas de modo a melhor prever a toxicidade associada Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Para avaliação da toxidade esperada devem além da avaliação sérica do composto realizarse a avaliação do grau de depressão do SNC determinação de parâmetros analíticos como glicose pH e lactato e avaliação da temperatura corporal Acikgoz et al 2016 vi Tratamento Para este fármaco não existe antídoto sendo o tratamento da intoxicação sintomático associado a medidas de descontaminação Zucoloto et al 2017 Se decorridas até duas horas após a exposição pode realizarse lavagem gástrica eou administração de carvão ativado em doses repetidas Zucoloto et al 2017 No caso de sintomatologia associada realizase tratamento de suporte As benzodiazepinas estão indicadas para reverter os sintomas anticolinérgicos e no controlo de convulsões ver Tabela 7 Nos casos mais graves pode realizarse hemodiálise pois demonstra elevada eficácia na depuração do fármaco e metabolitos Zucoloto et al 2017 Mesmo sem sintomatologia aparente os pacientes devem ser observados por um período de 6 horas após ingestão e até 12 horas no caso de formas farmacêuticas de libertação modificada Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 vii Novas abordagens terapêuticas Mochizuki et al 2016 reportaram a utilização de lavagem gástrica decorridas mais de 2 horas após a ingestão de grandes quantidades de carbamazepina e simultaneamente de sumo de uva Este sumo parece ter um efeito inibitório do citocromo P450 o que leva a um aumento da biodisponibilidade do fármaco aliado à diminuição dos movimentos Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 52 peristálticos causados pelo composto podendo resultar num aumento do período de concentrações tóxicas do composto Nesta situação os autores demonstraram que a lavagem gástrica pode ser uma técnica viável mesmo quando o tempo que decorreu desde a administração é superior a 2 horas pois ainda existe conteúdo gástrico que pode ser absorvido Mais tarde Osuntokun et al 2020 estudaram os efeitos da administração concomitante de carbamazepina e estratos de semente de uva na toxicidade hepática de ratos Esta semente é constituída por proantocianidinas que são compostos fenólicos da família dos flavonoides Esta natureza polifenólica permite uma libertação facilitada de protões exibindo assim uma substancial atividade antioxidante Obtiveram como resultados a redução significativa na concentração de MDA e de fosfatase alcalina ALP aumento das atividades de SOD e catalase e diminuição significativa da atividade de ALP Com estes resultados os autores concluíram que a utilização destes extratos de semente de uva pode servir como um potencial agente terapêutico na hepatotoxicidade induzida pela carbamazepina Já Akorede et al 2020 avaliaram a toxicidade dos parâmetros reprodutores de um outro antioxidante a vitamina C em ratos A administração concomitante de vitamina C e carbamazepina revelou uma contagem superior maior motilidade e menor anormalidade na cauda dos espermatozoides quando comparado com a administração de carbamazepina A concentração de MDA foi significativamente mais baixa no grupo com administração de vitamina C As enzimas SOD e catalase demonstraram maior atividade Perante estes resultados os autores concluíram que a administração crónica de carbamazepina pode trazer complicações a nível reprodutor em ratos podendo a vitamina C ser útil na proteção destes mesmos efeitos adversos pela sua atividade antioxidante 2 Ácido valproico O ácido valproico é uma substância conhecida pelas suas propriedades anticonvulsivas sendo eficaz em monoterapia ou terapêutica adjuvante no tratamento de crises parciais complexas ausências ou crises de tipo misto Sills and Rogawski 2020 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 53 i Farmacodinâmica O mecanismo de ação do ácido valproico ainda não esta totalmente estabelecido mas julgase que está relacionado com o aumento dos níveis do ácido gamaaminobutírico GABA resultantes da inibição da enzima GABAtransaminase O seu mecanismo pode também estar a associado à inibição dos canais de sódio e cálcio voltagemdependentes estabilizando a membrana e inibindo a condutividade responsável pelas crises epiléticas Sills and Rogawski 2020 ii Farmacocinética O ácido valproico é rápida e completamente absorvido no TGI ocorrendo o pico plasmático 3 a 4 horas após administração Apesar deste pico rápido o efeito terapêutico só é obtido ao fim de alguns dias de tratamento facto justificado pelo aumento gradual dos níveis de GABA no cérebro Atravessa a BHE e a barreira placentária A sua metabolização é exclusivamente hepática sendo a excreção maioritariamente renal na qual menos de 3 é de forma inalterada mas podendo ser hepática e pulmonar Nelson 2019 As suas reações de metabolização são glucuronidação βoxidação e em menor escala a oxidação As reações adversas mais graves que podem levar à morte estão associadas a uma disfunção mitocondrial que leva à acumulação do metabolito tóxico 4 eneácido valproico que causa dano hepático CollinsYoder and Lowell 2017 Ligase de forma extensa às proteínas plasmáticas cerca de 90 O tempo de semivida pode variar entre 6 a 16 horas consoante a monoterapia ou terapia combinada com outros antiepiléticos Nelson 2019 iii Dose terapêuticatóxica A eficácia terapêutica do ácido valproico verificase com uma concentração plasmática entre os 40 e os 100 mgL A dose diária recomendada é 30 mgkg nos lactentes e nas crianças até 3 anos 30 40 mgkg nas crianças com mais de 3 anos e 20 30 mgkg nos Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 54 adolescentes e adultos A dose terapêutica máxima pediátrica é 60 mgkgdia Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Uma intoxicação leve é considerada uma ingestão entre 200 a 400 mgkg uma intoxicação moderada acima de 400 mgkg e uma ingestão superior a 750 mgkg é potencialmente fatal Zucoloto et al 2017 Relativamente às concentrações séricas 450 mgL corresponde a uma intoxicação moderada a grave e acima de 850 mgL origina acidose metabólica e coma Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 iv Quadro clínico na intoxicação A sintomatologia associada à intoxicação é resultado da potenciação dos efeitos farmacológicos resultando em depressão do SNC e desarranjos metabólicos Mekonnen 2019 O quadro clínico de toxicidade aguda apresenta normalmente desconforto gastrointestinal sintomas neurológicos como confusão ataxia letargia desorientação e coma miose distúrbios metabólicos e ocasionalmente hipotensão com taquicardia e intervalo QT prolongado Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 As disfunções hepáticas são comuns dado a sua extensa metabolização hepática podendo haver aumento das transaminases e encefalopatia Pode ocorrer hipernatremia e hipocalcemia O metabolismo do ácido valproico pode causar hiperamonemia pois este leva à deficiente em Lcarnitina necessária para metabolizar os ácidos gordos Este metabolismo esgota também a coenzimaA CoA necessária para incorporar amónia no ciclo da ureia contribuindo assim para a hiperamonemia Mekonnen 2019 Em intoxicações muito graves com concentração sérica acima de 850 mgL manifestase coma depressão respiratória e hipotensão Nelson 2019 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 55 v ExamesDiagnóstico laboratorial O diagnóstico é realizado de intoxicação por ácido valproico é realizado com base na história de exposição e na sintomatologia associada Para esta confirmação pode ser realizado o doseamento sérico da substância ativa Este doseamento deve ter em conta a existência de preparações de libertação modificada e por isso deve ser feito de forma continua a cada 4 a 6 horas Os eletrólitos devem ser monitorizados devido ao risco de hipernatremia hipocalcemia lactato sérico elevado e hiperamonemia É importante determinar os parâmetros hepáticos e renais para avaliar a possível toxidade dos mesmos dada a sua metabolização e excreção Mekonnen 2019 vi Tratamento O ácido valproico não possui antidoto específico logo o tratamento da intoxicação inclui medidas de descontaminação e tratamento de suporte Pode ser administrado carvão ativado se o tempo entre ingestão e a hospitalização for inferior a 2 horas Mekonnen 2019 Se apresentar convulsões administrar benzodiazepina ver Tabela 7 Em casos de hipotensão recorrer a hidratação inicialmente e compostos vasoativos se necessário Zucoloto et al 2017 A Lcarnitina está indicada em situações de hiperamonemia de modo a reverter a acumulação de amónia Mekonnen 2019 Nos casos mais graves com coma administrar naloxona fármaco este com capacidade de reverter os efeitos depressores do SNC A sua administração deve ter em conta que além de reverter este efeito pode inverter os efeitos antiepiléticos do ácido valproico Zucoloto et al 2017 Os pacientes devem ser monitorizados entre 6 a 12 horas depois de não manifestarem sinais e sintomas da intoxicação dado ao tempo de semivida da substância Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 56 vii Novas abordagens terapêuticas Ghannoum et al 2015 propuseram a remoção extracorporal do tóxico sempre que se verificava uma das seguintes situações convulsões coma instabilidade hemodinâmica disfunção hepática edema cerebral ingestões de 1 gkg ou concentrações séricas superiores a 850 mgkg As complicações que podem resultar desta intervenção podem ser hipotensão trombocitopenia associada a hemoperfusão e caso a concentração sérica de acido valproico seja subterapêutica ocorrência de convulsões Em casos muito graves pode ser necessário a utilização de diuréticos ou remoção extracorporal do composto através de hemodiálise ou hemoperfusão Alhagamhmad et al 2021 Thomas et al 2020 no seu estudo utilizaram o meropenemo numa paciente com suspeita de pneumonia por aspiração e intoxicação por ácido valproico Está descrita interação medicamentosa entre os carbapenemos e o ácido valproico resultando numa diminuição do seu efeito terapêutico O mecanismo exato envolvido é desconhecido mas suspeitase de inibição enzimática Esta interação demonstrou alguma eficácia no uso de carbapenemos como um antídoto para intoxicações por ácido valproico mostrando ser uma opção viável quando é necessário tratamento concomitante para uma infeção bacteriana Esta opção permite evitar o uso de procedimentos mais invasivos como remoção extracorporal do tóxico Num estudo semelhante Khobrani et al 2018 demonstraram que a administração de meropenem num paciente com intoxicação com acido valproico resulta na redução do tempo de semivida do tóxico em cerca de 50 a 80 acelerando assim a recuperação neurológica minimizando a toxicidade associada e encurtando o tempo de internamento Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 57 VII Conclusão Os sintomas da intoxicação não são muitas das vezes específicos de um só composto o que dificulta o diagnóstico e atrasa o início do tratamento Como a deteção do composto tóxico através de técnicas de análise pode ser moroso inviabiliza a intervenção médica A história da exposição ao fármaco e a análise dos sinais e sintomas tornase por isso fundamental O tempo entre a intoxicação e a hospitalização é um fator importante pois determina o tipo de tratamento realizar Algumas medidas de descontaminação como administração de carvão ativado indução do vómito ou administração de antídoto podem não ser viáveis pouco tempo depois da intoxicação Como visto durante este trabalho a maior parte dos fármacos não possui antidoto tendo como consequência um tratamento que passa apelo alívio sintomático Apesar de para a maioria dos compostos haver um tratamento padronizado novas abordagens terapêuticas têm sido relatadas algumas delas com resultados bastante positivos É por isso necessária uma maior pesquisa nesta área de modo a disponibilizar mais alternativas aos clínicos na intervenção ao doente pediátrico intoxicado Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 58 VIII Bibliografia Acikgoz M Paksu M S Guzel A et al 2016 Severe Carbamazepine Intoxication in Children Analysis of a 40Case Series Med Sci Monit 22pp 47294735 Ahmad S A Scolnik D Snehal V et al 2015 Use of naloxone for clonidine intoxication in the pediatric age group case report and review of the literature Am J Ther 221 pp e1416 Akakpo J Y Ramachandran A Kandel S E et al 2018 4Methylpyrazole protects against acetaminophen hepatotoxicity in mice and in primary human hepatocytes Hum Exp Toxicol 3712 pp 13101322 Akorede G J Ambalia S F Hudub M l G et al 2020 Protective effect of vitamin C on chronic carbamazepineinduced reproductive toxicity in male wistar rats Toxicol Rep 7pp 269276 Alhagamhmad M Elarwah A Alhassony A et al 2021 ValproateInduced Hyperammonemic Encephalopathy Following Accidental Ingestion in a Toddler J Pediatr Pharmacol Ther 262 pp 210212 Almadhoun K and Sharma S 2021 Bronchodilators StatPearls Treasure Island FL Alrashood S T 2016 Carbamazepine Profiles Drug Subst 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Paulo SMS Secretaria Municipal da Saúde
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Gilberto Teixeira Magalhães Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria Faculdade Ciências da Saúde Universidade Fernando Pessoa Porto 2021 Gilberto Teixeira Magalhães Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria Faculdade Ciências da Saúde Universidade Fernando Pessoa Porto 2021 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria Gilberto Teixeira Magalhães Trabalho apresentado à Universidade Fernando Pessoa como parte dos requisitos para obtenção do grau de Mestre em Ciências Farmacêuticas Orientadora Professora Doutora Carla Moutinho Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria V Sumário As intoxicações por medicamentos de forma intencional ou não intencional são um fator de mortalidade e morbilidade entre as crianças sendo necessário muitas das vezes a hospitalização A identificação do agente tóxico através do conjunto de sinais e sintomas bem como o historial de exposição é fundamental para que seja iniciado o tratamentodescontaminação o mais rápido possível de modo a diminuir o tempo de internamento e complicações de saúde O tratamento da intoxicação é diferente mediante o composto em causa e passa pelo tratamento sintomático medidas de descontaminação e aumento da eliminação do tóxico Esta dissertação tem como objetivo efetuar uma revisão narrativa dos fármacos ou grupos farmacoterapêuticos mais relatados em casos de intoxicações na idade pediátrica destacandose em cada caso as novas abordagens terapêuticas algumas das quais ainda se encontram em fase de desenvolvimento clínico Palavraschave intoxicação aguda pediatria tratamento diagnóstico analgésicos e antipiréticos antihistamínicos e descongestionantes broncodilatadores anticonvulsivantes Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria VI Abstract Drug poisoning whether internationally or not internationally is an important factor of mortality and morbidity among children often requiring hospitalization The identification of the toxic agent through the set of signs and symptoms as well as the exposure history is essential to start the treatmentdecontamination as soon as possible in order to reduce hospitalization time and health complications The treatment of intoxication is different according the compound and involves symptomatic treatment decontamination measures and increased elimination of the toxicant This dissertation aims to carry out a narrative review of the drugs or pharmacotherapeutic groups most reported poisoning cases in pediatric age highlighting in each case the new therapeutic approaches some of which still in the clinical phases Keywords acute intoxication pediatric drugs treatment diagnosis analgesics and antipyretics antihistamines and decongestants bronchodilators anticonvulsants Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria VII Agradecimentos A presente dissertação não seria possível sem a ajuda e o apoio de diversas pessoas que me acompanharam durante estes anos Agradeço o apoio e organização da minha orientadora Professora Doutora Carla Moutinho que desde cedo me apontou a direção e objetivos traçados para este trabalho A sua sempre rápida resposta e disponibilidade facilitaram em muito o meu trabalho A toda a minha família pelo apoio e motivação mesmo nas alturas mais cansativas em especial aos meus pais avós e tio José Ao meu irmão que me acompanhou de perto nesta caminhada Obrigado por ouvires os meus conselhos e por partilhares os teus comigo Sabes que a tua ajuda foi fundamental A ti Diana por mais estes anos de esforço e sacrifício mas que de certeza nos serão compensadores Não embarcaria nesta aventura se não estivesses ao meu lado O meu MUITO OBRIGADO a todos vocês Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria VIII Índice Índice de figuras X Índice de tabelas XI Abreviaturas XII I Introdução 1 1 Materiais e Métodos 2 II Atendimento inicial das intoxicações agudas 4 1 Avaliação inicial 4 2 Diagnóstico da intoxicação 5 i História da exposição 5 ii Exame físico 5 iii Exames complementares 7 3 Tratamento 8 i Descontaminação 8 a Indução do vómito 9 b Lavagem gástrica 9 c Adsorção química 10 ii Antídotos 12 iii Aumento da taxa de excreção 12 III Analgésicos e Antipiréticos 12 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria IX 1 Paracetamol acetaminofeno 13 2 Ibuprofeno 20 3 Ácido acetilsalicílico 24 IV Antihistamínicos e descongestionantes 30 1 Antihistamínicos H1 1ª e 2ª geração 31 2 Descongestionantes simpaticomiméticos 36 3 Descongestionantes imidazólicos 39 V Broncodilatadores 43 1 Agonistas β2adrenérgicos 43 VI Anticonvulsivantes 48 1 Carbamazepina 48 2 Ácido valproico 52 VII Conclusão 57 VIII Bibliografia 58 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria X Índice de figuras Figura 1 Exames complementares de diagnóstico toxicológico adaptado de Zucoloto et al 2017 8 Figura 2 Metabolização do acetaminofeno adaptado de Barros and Stasi 2012 14 Figura 3 Monograma de RumackMatthew retirado de Saccomano 2019 16 Figura 4 Mecanismo de ação da COX retirado de Samuelsson 2012 21 Figura 5 Metabolização do AAS retirado de Nelson 2019 26 Figura 6 Relação entre pH e clearance urinário do AAS retirado de Proudfoot et al 2003 28 Figura 7 Metabolização da carbamazepina retirado de Djordjevic et al 2017 49 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria XI Índice de tabelas Tabela 1Principais síndromes tóxicas adaptado de Rasimas and Sinclair 2017 7 Tabela 2Volume de xarope de ipecacuanha para diferentes faixas etárias adaptado de Goodman et al 2001 9 Tabela 3Volume de infusãofaixa etária de lavagem gástrica adaptado de Zucoloto et al 2017 10 Tabela 4 Administração de carvão ativado por via oral adaptado de Silberman et al 2021 11 Tabela 5 Dose referência de acetaminofeno adaptado de Infarmed 2020b 14 Tabela 6 Fases da intoxicação por acetaminofeno adaptado de Saccomano 2019 15 Tabela 7 Benzodiazepinas usadas no tratamento de convulsões adaptado de Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 23 Tabela 8 Propriedades farmacocinéticas antihistamínicos H1 adaptado de Nelson 2019 33 Tabela 9 Duração de ação dos descongestionantes simpaticomiméticos adaptado de Nelson 2019 37 Tabela 10 Funções dos recetores β2adrenérgicos adaptado de Williams and Rubin 2018 45 Tabela 11 Dose tóxica dos agonistas β2adrenérgicos adaptado de Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 46 Tabela 12 Doseamento sérico de carbamazepina adaptado de Acikgoz et al 2016 50 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria XII Abreviaturas AAS Ácido acetilsalicílico ADME Absorção distribuição metabolização excreção AINE Antiinflamatório não esteroide ALP Fosfatase alcalina ALT Alanina aminotransferase AMPc Adenosina monofosfato cíclico AST Aspartato aminotransferase ATP Adenosina trifosfato BHE Barreira hematoencefálica CK18 Citoqueratina 18 CoA Coenzima A COX Cicloxigenase CPK Creatinofosfoquinase ECG Eletrocardiograma GABA Ácido gamaaminobutírico do inglês gamma aminobutyric acid GpP Glicoproteína P GSH Glutationa IV Intravenosa JNK Do inglês cjun Nterminal kinase Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria XIII LABA Do inglês Longacting βagonists MDA Malondialdeído miR122 microRNA122 NAC Nacetilcisteína NanoMOF Estruturas nanométricas metálicoorgânicas do inglês nano metalorganic frameworks NAPQI Nacetilpbenzoquinoneimina PGE2 Prostaglandina E2 SABA Do inglês Shortacting βagonist SNC Sistema nervoso central SOD Superóxido dismutase TC Tomografia computorizada TGI Trato gastrointestinal TP Tempo de protrombina TXA2 Tromboxano A2 T12 Tempo de semivida Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 1 I Introdução Uma intoxicação corresponde a uma exposição indevida ou em quantidade suficiente por ingestão inalação injeção contacto da pele ou ocular a uma substância ou produto que pode provocar alterações no organismo ou mesmo levar à morte SNS 2019 Pode ser definida como a manifestação do efeito tóxico e corresponde ao conjunto de sinais e sintomas que revelam o desequilíbrio produzido pela interação do agente tóxico com o organismo WHO 2015 A intoxicação aguda é consequência da administração ou contacto com o tóxico de uma só vez ou por múltiplos contactos e os efeitos adversos surgem de imediato ou no decorrer de alguns dias Goodman et al 2001 Zucoloto et al 2017 A intoxicação aguda constitui um importante problema de saúde pública particularmente na faixa etária pediátrica sendo os medicamentos um dos principais agentes responsáveis cerca de 479 dos casos Lin et al 2011 O conceito de idade pediátrica é algo que até ao momento não é consensual não existindo uma norma global Uma criança é todo o ser humano menor de 18 anos salvo se nos termos da lei que lhe for aplicável atingir a maioridade mais cedo ONU 2019 As mudanças no desenvolvimento em crianças podem afetar a disposição e os efeitos clínicos de um fármaco não devendo por isso ser aplicada a escala linear de adulto ao peso da criança pois pode potencialmente levar a uma sobredosagem Verscheijden et al 2020 Os fatores que influenciam as concentrações de fármacos nos tecidos ao longo do tempo incluem os processos de absorção distribuição metabolização e excreção ADME Na população pediátrica estes processos de ADME diferem em comparação com os adultos originando consequentemente diferenças no perfil farmacocinético de um fármaco É importante por isso perceber estas diferenças para garantir uma terapia eficaz em populações pediátricas Batchelor and Marriott 2015 Segundo o relatório de 2019 da Associação Americana de Controlo de Intoxicações foram reportados casos de exposição a substâncias em que 5755 dos casos ocorreram Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 2 em indivíduos com menos de 20 anos sendo que destes 71 resultou em fatalidade Relativamente aos fármacos e no caso das fatalidades podese observar a presença de alguns grupos farmacoterapêuticos mais relevantes como os casos de analgésicos anti histamínicos e anticonvulsivantes Gummin et al 2020 O diagnóstico de intoxicação em situações de emergência pode ser algo difícil de obter especialmente quando não é conhecido o agente causador a quantidade a duração do contacto e o tempo entre o contacto e a hospitalização Lin et al 2011 Pianca et al 2017 O atendimento do paciente intoxicado segue uma série de etapas geralmente mas não necessariamente sequenciais como a avaliação clínica inicial e estabilização reconhecimento da síndrome tóxica e identificação do agente causal descontaminaçãoadministração de antídotos aumento da eliminação do tóxico absorvido e tratamento sintomático Zucoloto et al 2017 Este trabalho de conclusão de curso tem como objetivo efetuar uma revisão narrativa e de apresentar de forma clara e prática a abordagem terapêutica da criança vítima de intoxicação aguda por medicamentos de uso comum nas mesmas 1 Materiais e Métodos A pesquisa bibliográfica para a concretização desta monografia foi efetuada num período compreendido entre os meses de dezembro de 2020 e de julho de 2021 Foram revistos artigos da literatura selecionandose aqueles que tratam das questões envolvendo o tratamento da intoxicação aguda em idade pediátrica e dos últimos 10 anos Para isso realizouse a pesquisa através das bases de dados PubMed e BOn e também entidades reguladoras do medicamento como Infarmed com as seguintes palavraschave intoxicação aguda pediatria tratamento diagnóstico analgésicos e antipiréticos anti histamínicos e descongestionantes broncodilatadores anticonvulsivantes Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 3 Os critérios utilizados para inclusão foram a presença dos descritores utilizados no título ou no resumo b artigos publicados em língua portuguesa ou inglesa Os critérios de exclusão foram a duplicidade de artigos b artigos que não atendiam ao tema proposto c artigos com textos não disponibilizados na íntegra d dissertações e teses Posteriormente e depois de analisar quais os grupos terapêuticos de fármacos que com mais frequência são relatadas intoxicações eou os mais usados em pediatria foram escolhidos grupos terapêuticos e respetivos fármacos para abordar o tema proposto Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 4 II Atendimento inicial das intoxicações agudas A suspeita de intoxicação existe quando se observa uma doença inexplicada numa criança previamente saudável OMS 2005 Em situação de urgência toda a suspeita de intoxicação deve ser tratada como uma situação clínica grave pois pode não haver sintomatologia associada e a evolução do paciente ser negativa num curto espaço de tempo Por isto a abordagem ao utente suspeito de intoxicação deve ser rápida e criteriosa Zucoloto et al 2017 2 Avaliação inicial Aquando da admissão do paciente intoxicado ou suspeito devese realizar um breve exame físico de modo a iniciaremse as primeiras medidas para estabilização do paciente sempre com o objetivo de evitar a piora clínica do mesmo Segundo Zucoloto et al 2017 avaliase os parâmetros seguintes sinais vitais nível e estado de consciência diâmetro e reatividade à luz das pupilas temperatura e humidade da pele oximetria de pulso medição de glicemia capilar e procura de sinais de trauma infeção marcas de agulha ou edema de extremidades Caso seja necessário há uma série de outros procedimentos como monotorização eletrocardiográfica manutenção das vias aéreas abertas e realização de intubação obtenção de acesso venoso para facilitar colheita de amostra de sangue para posterior análise laboratorial em caso de alteração do estado de consciência administração de tiamina e glicose intravenosa IV só em caso de suspeita de intoxicação alcoólica e hipoglicemia consequente e em caso de suspeita de intoxicação por opioide administração de naloxona Zucoloto et al 2017 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 5 3 Diagnóstico da intoxicação i História da exposição Segundo Zucoloto et al 2017 para se perceber a história da exposição ao possível agente causador devese proceder ao levantamento dos seguintes dados do paciente percebendo o histórico clínico medicação em uso e o acesso a substâncias da substância causadora identificando a substância utilizada e respetiva quantidade do tempo decorrido entre a exposição e a duração da mesma do local onde ocorreu a exposição verificando a presença de frascos ou embalagens próximas ao paciente que possam facilitar a determinação do agente causador do motivo podendo ser intencional tentativa de suicídio abuso de drogas ou não intencional acidente ii Exame físico Neste tipo exame verificase os principais sinais e sintomas sempre com o objetivo de determinar o possível agente causador Segundo Zucoloto et al 2017 os parâmetros a serem observados são os seguintes odores característicos como hálito etílico característico do uso de álcool ou odor de alho característico dos organofosforados alterações cutâneas como sudorese secura de mucosas vermelhidão palidez cianose desidratação e edema temperatura corporal podendo ser hipotermia ou hipertermia alterações de pupilas como miose midríase anisocoria alterações do reflexo pupilar Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 6 alterações de consciência agitação sedação confusão mental alucinação delírio desorientação anormalidades neurológicas como convulsão síncope alteração de reflexos alteração do tónus muscular fasciculações movimentos anormais alterações cardiovasculares bradicardia taquicardia hipertensão hipotensão arritmias anormalidades respiratórias bradipneia ou taquipneia presença de ruídos adventícios pulmonares alterações do sistema digestivo sialorreia vómitos diarreia rigidez abdominal aumento ou diminuição de ruídos hidroaéreos Após esta análise e agrupando os sinais e sintomas de um determinado paciente pode ser caracterizado uma síndrome tóxica toxidrome do inglês toxic syndrome Rasimas and Sinclair 2017 Uma síndrome toxica é uma série de sinais e sintomas provenientes do exame físico ou de testes auxiliares que permitem determinar qual o agente causador ou o grupo farmacoterapêutico a que pertence É útil para que o clínico tenha uma previsão do agente em causa antes mesmo do exame de diagnóstico laboratorial específico tal como evidenciado na Tabela 1 Rasimas and Sinclair 2017 As síndromes tóxicas são divididas em 5 classes anticolinérgica colinérgica hipnótica sedativanarcótica simpaticomimética e extrapiramidal Zucoloto et al 2017 Apesar destes síndromes tóxicos poderem ajudar a definir o diagnóstico diferencial deve terse em atenção as exceções e limitações associadas a cada um dos casos Um exemplo destas exceções é a meperidina analgésico opioide mas que não apresenta como sintomatologia de toxicidade a miose Holstege and Borek 2012 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 7 Tabela 1Principais síndromes tóxicas adaptado de Rasimas and Sinclair 2017 Síndrome Sintomas Fármacos Sinais Vitais Pupilas SNC Outros sintomas Anticolinérgica Hipertermia Taquicardia Hipertensão Taquipneia Midríase Agitação Alucinação Delírio Convulsões Retenção urinária Mioclonias Convulsões Mucosas secas Antihistamínicos Atropina Escopolamina Antidepressivos tricíclicos Colinérgica Hipotermia Bradicardia Hipotensão Bradipneia Miose Confusão mental Convulsões Coma Sialorreia Sudorese Lacrimejo Náusea Dispneia Bronco constrição Fasciculações Organofosforados Carbamatos Nicotina Hipnótica sedativa narcótica Hipotermia Bradicardia Hipotensão Bradipneia Miose Depressão do SNC Depressão respiratória Hiporreflexia Edema pulmonar Barbitúricos Benzodiazepinas Opioides Simpatico mimética Hipertermia Hipertensão Taquicardia Hiperpneia Midríase Agitação Alucinações Paranoia Convulsões Diaforese Tremores Hiperreflexia Cocaína Anfetamina Teofilina Efredina Cafeína Extrapira midal Não característicos Midríase Sonolência Crise oculogírica Tremores Hipertonia muscular Opistótomo Trismo Haloperidol Fenotiazínicos Metoclopramida Bromopidra iii Exames complementares Dependendo da análise dos exames físicos e da história do paciente são solicitados exames complementares Estes podem ser gerais eletrocardiograma ECG exames de imagiologia como raioX ou tomografia computorizada TC endoscopia digestiva alta ou podem ser exames toxicológicos específicos Relativamente a estes últimos podem ainda ser agrupados dentro de 2 grupos os testes de triagem e os testes de confirmação Os testes de triagem são testes de rápido resultado e fornecem informação acerca da classe a que pertence o agente tóxico como por exemplo o teste para deteção da presença de benzodiazepinas Estes testes toxicológicos de triagem são realizados quando há suspeita através do diagnostico inicial e dos sintomas evidenciados de uma intoxicação com determinado tipo de fármaco Os testes toxicológicos de confirmação identificam o Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 8 composto em causa São testes em que o resultado não é imediato sendo por isso uma grande desvantagem visto que o tratamentoantídoto deve ser administrado assim que possível de modo a reverter os efeitos causados pelo tóxico Zucoloto et al 2017 Figura 1 Exames complementares de diagnóstico toxicológico adaptado de Zucoloto et al 2017 4 Tratamento Depois da identificação de intoxicação por determinado tóxico e da estabilização do paciente e dos sinais vitais importa perceber o tratamento adequando ao caso em análise Para isso e segundo Goodman et al 2001 os agentes tóxicos podem ser divididos em dois grupos aqueles para os quais existem antídotos para o tratamento específico e aqueles para os quais não existe tratamento específico sendo que estes últimos são os mais comuns em que a intervenção passa pelos cuidados no contexto do controlo sintomático manutenção dos sinais vitais prevenção da absorção adicional do tóxico e aumento da excreção do mesmo i Descontaminação O objetivo deste passo é a diminuição da absorção do tóxico removendo o mesmo do trato gastrointestinal caso a absorção seja oral Nem sempre é possível a indicação deste procedimento pois requer avaliação criteriosa do nível de consciência do paciente do tempo decorrido desde a ingestão e dos sintomas apresentados Zucoloto et al 2017 Exames complementares Gerais ECG Imagiologia Endoscopia Toxicológios especificos Triagem Confirmação Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 9 a Indução do vómito Este procedimento está indicado nas intoxicações ocorridas pela via oral sendo contraindicada em algumas situações particulares tais como ingestão de um tóxico corrosivo ingestão de um estimulante do SNC pode desencadear convulsões ou estado de consciência do paciente alterado pode provocar aspiração do conteúdo gástrico Zucoloto et al 2017 A indução do vómito pode ser realizada pela estimulação física da faringe posterior ou pela administração de uma substância emética como o xarope de ipecacuanha O xarope de ipecacuanha pode ser administrado por via oral e o efeito é obtido cerca de 30 minutos a 1 hora após a sua administração Goodman et al 2001 A quantidade do mesmo para as diferentes faixas etárias é evidenciada na Tabela 2 Tabela 2Volume de xarope de ipecacuanha para diferentes faixas etárias adaptado de Goodman et al 2001 Crianças 6 12 meses 12 meses Volume de xarope de ipecacuanha mL 15 30 A sua administração nos dias de hoje é algo controverso eou em desuso pois para garantir eficácia o tempo entre a ingestão do tóxico e a administração da substância emética é relativamente curto até 90 minutos e ainda a administração de carvão ativado apresenta vantagens em relação a este método como será analisado mais adiante Hojer et al 2013 b Lavagem gástrica Consiste na infusão e posterior aspiração de soro fisiológico a 09 através de sonda nasogástrica até perfazer a quantidade padronizada para cada faixa etária como evidenciado na Tabela 3 Zucoloto et al 2017 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 10 Tabela 3Volume de infusãofaixa etária de lavagem gástrica adaptado de Zucoloto et al 2017 Crianças Recémnascidos Lactentes Idade escolar Volume de infusão mLkg 10 10 10 Volume total de infusão L 050 2 a 3 4 a 5 As contraindicações deste procedimento são as mesmas do anterior sendo que adicionalmente pode causar lesão mecânica da faringe laringe e estômago No caso da lavagem gástrica esta deve ser efetuada até 60 minutos após a ingestão do tóxico Goodman et al 2001 Ornillo and Harbord 2020 É igualmente uma técnica não muito utilizada dada a possibilidade de administração de carvão ativado Benson et al 2013 c Adsorção química O carvão ativado é uma substância com alto poder adsorvente do agente tóxico impedindo a absorção deste pelo organismo diminuindo os efeitos tóxicos O carvão ativado administrado por via oral não é absorvido pelo lúmen gastrointestinal e age no trato gastrointestinal na sua forma inalterada Zucoloto et al 2017 Silberman et al 2021 Nem todos os compostos químicos são adsorvidos pelo carvão ativado tais como álcoois hidrocarbonetos metais e cianeto Zellner et al 2019 A maioria das toxinas ingeridas terá absorção sistémica diminuída na presença de carvão ativado incluindo fármacos como o acetaminofeno aspirina barbitúricos antidepressivos tricíclicos teofilina fenitoína e uma maioria de materiais inorgânicos e orgânicos Silberman et al 2021 A adsorção química está contraindicada em pacientes i com nível de consciência alterado devido ao risco de aspiração ii quando a ameaça de perfuração gastrointestinal ou hemorragia é alta devido a condições médicas ou cirurgia recente iii quando é provável que a endoscopia seja realizada pois o carvão ativado pode obscurecer a Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 11 visualização endoscópica na presença de uma obstrução intestinal ou iv quando o agente tóxico é conhecido por não ser adsorvido por este Silberman et al 2021 Este método pode ser utilizado após a lavagem gástrica ou de forma isolada podendo a administração ser por via oral Pode ser utilizado em dose única ou em doses múltiplas quando os agentes têm ação prolongada ou circulação enterohepática como alguns fármacos antiepiléticos Zucoloto et al 2017 A sua máxima eficácia observase até 1 hora após a ingestão do agente tóxico embora pode ser benéfica se administrada até 6 horas após grandes ingestões tomas de fármacos de libertação retardada e para a ingestão de substâncias com propriedades anticolinérgicas ou opioides que diminuem a motilidade intestinal Silberman et al 2021 Apesar desta evidência há alguns casos particulares como o paracetamol em que a administração pode ocorrer até 16 horas após a ingestão do tóxico Zellner et al 2019 A dosagem ideal de carvão ativado é desconhecida Contudo quando a dose da toxina ingerida é conhecida os especialistas recomendam o carvão ativado numa proporção de 101 de carvão ativado para a toxina ingerida Quando a quantidade de toxina ingerida é desconhecida ou é impraticável atingir uma proporção de 101 por exemplo aquando da ingestão de grandes quantidades deve ser administrado 1g de carvão ativado por cada quilograma de peso corporal em suspensão com água ou soro fisiológico na proporção de 48mLg de carvão ativado ou usado um esquema simplificado Tabela 4 com base na idade Silberman et al 2021 Tabela 4 Administração de carvão ativado por via oral adaptado de Silberman et al 2021 1 ano 2 a 12 anos 12 anos Carvão ativado g 10 a 25 25 a 50 50 a 100 Os principais efeitos adversos provenientes da utilização deste método são apenas de origem gastrointestinal como vómitos e obstipação sendo por isso um dos métodos de descontaminação mais usado Zucoloto et al 2017 Silberman et al 2021 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 12 ii Antídotos Os antídotos são substâncias que agem no organismo atenuando ou inativando ações ou efeitos de determinadas substâncias químicas Hon et al 2021 Como referido anteriormente a maior parte das substâncias potencialmente tóxicas não tem antídoto sendo o tratamento nesses casos sintomático de estabilização do utente e de diminuição da absorção do tóxico Para aquelas que existe antídoto este pode ou não ser administrado mediante alguns fatores como a quantidade e tóxico em causa e o tempo entre a intoxicação e hospitalização Zucoloto et al 2017 iii Aumento da taxa de excreção Estes tipos de procedimentos são utilizados para potenciar a eliminação do agente tóxico podendo ser realizada alcalinização urinária caso dos compostos ácidos fracos como salicilatos e remoção extracorporal Ornillo and Harbord 2020 A remoção extracorporal tem uma posição chave no aprimoramento da remoção de uma variedade de fármacos e venenos Os métodos extracorpóreos comuns incluem hemodiálise hemofiltração e hemodiafiltração hemoperfusão terapia de substituição renal contínua diálise peritoneal e diálise com albumina Lu and Xue 2019 III Analgésicos e Antipiréticos Segundo Gummin et al 2020 os analgésicos e antipiréticos são os grupos farmacoterapêuticos que mais estão envolvidos em situações de exposição indevida cerca de 1102 tornandose por isso importante a análise dos mesmos durante este trabalho Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 13 1 Paracetamol acetaminofeno O paracetamol é o fármaco responsável por mais situações de sobredosagem entre crianças Dayasiri et al 2020 O seu fácil acesso e disponibilidade levam a ocorrências mais frequentes de sobredosagem intencional ou não intencional Saccomano 2019 i Farmacodinâmica O paracetamol ou acetaminofeno N4hidroxifeniletanamida é um analgésico e antipirético sendo o seu mecanismo de ação a inibição de uma variante da enzima cicloxigenase1 COX3 É igualmente um agonista das vias canabinoides e agonista dos recetores de serotonina muito usado e eficaz para uma variedade de dores podendo ser tomado de forma individualizada ou em associação com outros compostos Raffa et al 2014 National Center for Biotechnology Information 2021 Inibe ainda o efeito dos pirogénios endógenos sobre o centro de termorregulação do hipotálamo Infarmed 2020b ii Farmacocinética Quando ingerido o acetaminofeno é rápido e completamente absorvido pelo TGI atingindo o pico de concentração 30 a 60 minutos após a ingestão com tempo de semivida t12 entre 2 a 3 horas Este fármaco não se liga fortemente às proteínas plasmáticas sendo esta associação entre 10 a 25 Zucoloto et al 2017 Saccomano 2019 Em doses terapêuticas 90 do composto é metabolizado no fígado e convertido em compostos atóxicos por via da glucuronidação e a sulfonação Cerca de 5 da dose terapêutica é metabolizada pelas enzimas do citocromo P450 com formação de Nacetil pbenzoquinoneimina NAPQI responsável pela toxicidade hepática associada ao fármaco Em doses terapêuticas o composto NAPQI é rapidamente neutralizado pela conjugação com a glutationa GSH e cisteína formando ácidos mercaptúricos O metabolito NAPQI tem semivida curta cerca de 1525 horas Os restantes 5 do Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 14 composto são excretados pela urina na sua forma inalterada Ramachandran and Jaeschke 2018 Saccomano 2019 Em doses tóxicas as vias de glucuronidação e sulfonação tornamse saturadas aumentando assim o metabolismo via citocromo P450 o que origina uma maior formação de NAPQI Quando cerca de 70 da GSH está esgotada o metabolito hepatotóxico NAPQI ligase através de ligações covalentes aos grupos tióis das proteínas celulares levando a lesão do hepatócito e morte celular Nichols and Shaffner 2016 Zucoloto et al 2017 iii Dose terapêutica dose tóxica Para crianças saudáveis a dose terapêutica e a dose tóxica estão representadas na Tabela 5 Em caso de insuficiência renal ou hepática estas doses podem ser mais baixas Zucoloto et al 2017 Infarmed 2020b Tabela 5 Dose referência de acetaminofeno adaptado de Infarmed 2020b Idade 6 anos 6 anos Dose terapêutica mgkg 10 20 10 20 Dose tóxica mgkg 200 150 O valor da dose tóxica numa idade mais precoce é mais alto comparativamente a idades mais avançadas facto este que pode ser devido à menor contribuição do citocromo P450 Figura 2 Metabolização do acetaminofeno adaptado de Barros and Stasi 2012 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 15 devido à imaturidade metabólica diminuindo assim a metabolização por esta via e consequentemente menor formação de NAPQI Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 iv Quadro clínico na intoxicação De acordo com Saccomano 2019 as manifestações clínicas de intoxicação por acetaminofeno podem ser descritas em 4 fases distintas sendo o fator tempo de ingestão da substância o que separa cada uma delas como apresentado na Tabela 6 Para cada uma das fases pode ser observada a evolução dos parâmetros analíticos importantes na determinação do tipo de intervenção clínica na intoxicação Tabela 6 Fases da intoxicação por acetaminofeno adaptado de Saccomano 2019 Manifestações clínicas Parâmetros analíticos Fase I 0 24 horas Assintomática ou sintomas não específicos tais como náuseas vómitos dor abdominal anorexia palidez e hipersudorese Normais Fase II 24 72 horas Assintomática ou dor no quadrante superior direito hepatomegalia e sensibilidade hepática Aumento das transaminases AST ALT Elevação do tempo de protrombina TP e níveis de bilirrubina Fase III 72 96 horas Coma hipoglicemia hipotensão sonolência edema cerebral confusão mental falência hepática e morte Valores elevados de AST entre 1 00030 000 UL Níveis séricos de TP 22 vezes o normal Valores de bilirrubina total superior a 4 mgdL Fase IV 4 dias a 2 semanas Recuperação Danos permanentes ou valores retomam ao normal Valores normais de AST 10 a 40 UL Valores normais de TP 110 a 130 segundos Valores normais de bilirrubina total 03 a 10 mgdL v ExamesDiagnóstico laboratorial No caso de suspeita de intoxicação por acetaminofeno mediante avaliação da história de exposição e sintomatologia associada se for o caso procedese à confirmação da mesma Para isso é realizado um exame de doseamento sérico do composto pelo menos 4 horas Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 16 após a ingestão É importante referir este tempo pois exames obtidos anteriormente podem não refletir a absorção completa logo podem não prever a toxicidade e o tipo de tratamento adequado para a mesma Zucoloto et al 2017 Depois desta confirmação a decisão para o tratamento desta intoxicação é baseada no monograma de RumackMatthew Figura 3 que correlaciona a concentração de paracetamol livre com o tempo em que este foi administrado e a probabilidade de lesão hepática Zucoloto et al 2017 Saccomano 2019 Este monograma apenas deve ser utilizado aquando de uma única administração de paracetamol de forma de libertação convencional Através desta avaliação verificase se a probabilidade de toxicidade hepática esperada determinandose assim o tipo de tratamento a iniciar Saccomano 2019 Relativamente à interpretação do gráfico observase a presença de 2 linhas diagonais que representam uma probabilidade de hepatotoxicidade de 25 ou seja uma possível toxicidade Acima das retas avaliase a hepatotoxicidade como provável tendo indicação para iniciação do tratamento com o antídoto e abaixo das mesmas representa uma ingestão sem hepatotoxicidade provável Saccomano 2019 Para além do doseamento sérico do paracetamol e como descrito no quadro clínico da intoxicação alguns parâmetros analíticos sofrem alterações significativas e por isso devem ser monitorizados tais como função renal transaminases hepáticas glicose Figura 3 Monograma de RumackMatthew retirado de Saccomano 2019 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 17 bilirrubina total TP e eletrólitos Zucoloto et al 2017 Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 vi Tratamento Os objetivos do tratamento passam por garantir a viabilidade das vias aéreas respiração e circulação prevenir a absorção do composto do trato gastrointestinal e administração do antídoto Nacetilcisteína NAC A NAC é um precursor da GSH que como referido anteriormente se liga ao metabolito NAPQI formando um conjugado isento de toxicidade Além desta característica a NAC previne a ligação direta de NAPQI com os hepatócitos reduz o NAPQI novamente a acetaminofeno e é um precursor do sulfato que como apresentado na Figura 2 é uma das vias de destoxificação O tratamento da intoxicação deve ser iniciado o mais prontamente possível para garantir o máximo de eficácia do antídoto limitada a 24 horas após a ingestão Saccomano 2019 Para a escolha do tratamento mais eficaz recorrese à avaliação dos critérios do monograma de RumackMatthew Quando através da avaliação do monograma não se verifica hepatotoxicidade o tratamento é apenas sintomático através da administração de fármacos antieméticos para controlo das náuseas e vómitos fármacos protetores da mucosa e manutenção dos níveis de hidratação Saccomano 2019 Zucoloto et al 2017 No caso de uma provável hepatotoxicidade o tipo de tratamento realizado é dependente do tempo decorrido entre a ingestão do acetaminofeno e a iniciação do mesmo Se decorreu até 1 hora após a ingestão de uma quantidade provável tóxica devese realizar lavagem gástrica eou indução do vómito Estes procedimentos só são realizados neste espaço de tempo pois ainda é provável existir conteúdo no TGI Entre 1 a 4 horas após a ingestão administrar carvão ativado Caso tenha decorrido mais de 4 horas após a ingestão administrar NAC sendo que até 8 horas a eficácia desta é máxima mas pode ser administrado até 24 horas após mantendo alguma eficácia hepatoprotetora Zucoloto et al 2017 Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 18 A dosagem oral de NAC começa com uma dose de 140 mgkg seguida por uma dose de manutenção de 70 mgkg a cada 4 horas completando 17 doses Fisher and Curry 2019 A via de tratamento preferencial é IV sendo a dose inicial é 150 mgkg ao longo de 15 minutos seguido de 50 mgkg durante 4 horas e depois 100 mgkg ao longo de 16 horas perfazendo assim o protocolo de 20 horas Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 vii Novas abordagens terapêuticas Um estudo recente de Kang et al 2020 pretendeu reduzir a hepatotoxicidade associada à sobredose de acetaminofeno com a administração de 4metilpirazol Uma das funções deste composto passa pela inibição da isoenzima CYP2E1 uma das enzimas que integram o citocromo P450 Este estudo teve por objetivo avaliar se esta inibição resultava numa menor formação do metabolito tóxico NAPQI através da inibição da metabolização via citocromo P450 Esta administração mostrou ser eficaz na redução da formação do metabolito tóxico em pacientes após a ingestão de uma dose única de 80 mgkg Ainda relativamente ao fármaco 4metilpirazol Akakpo et al 2018 realizaram um estudo em ratos de modo a perceber o possível efeito hepatoprotetor deste fármaco Para este efeito foi administrada uma solução com 4metilpirazol simultaneamente a uma dose tóxica de acetaminofeno Com este tratamento os autores obtiveram 6 horas após a administração baixos níveis de ALT ausência de necrose hepática e de dano celular Além da avaliação em ratos realizouse um ensaio em células hepáticas humanas isoladas no qual se verificou que no grupo tratado com 4metilpirazol a morte celular foi completamente evitada e os valores de ALT obtidos foram semelhantes aos do grupo controlo Num outro estudo Morrison et al 2019 avaliaram a segurança e tolerabilidade da coadministração de antídoto NAC com calmangafodipir que mimetiza a ação da enzima superóxido dismutase SOD reduzindo o stress oxidativo e prevenindo a lesão celular Numa primeira fase os autores pretenderam verificar se a administração de calmangafodipir não aumentava o número de reações adversas comparativamente ao tratamento convencional com NAC tendo sido demonstrado que não houve aumento Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 19 destas com o tratamento Numa segunda fase os autores exploraram os biomarcadores de lesão hepática No grupo de pacientes que foi utilizada a NAC de forma isolada foi necessário prolongar a administração da mesma devido a um aumento da ALT quando comparado com o tratamento de associação entre a NAC e o calmangafodipir Além deste parâmetro bioquímico foram avaliados biomarcadores de previsão de lesão hepática aguda que são usados para estimar o aumento da atividade de ALT como a proteína citoqueratina 18 CK18 e o microRNA122 miR122 Os resultados obtidos para estes demonstraram que no tratamento isolado os valores dos biomarcadores de lesão hepática são mais elevados quando comparados com o tratamento combinado Os autores concluíram que além de exibir segurança e tolerabilidade a coadministração de calmangafodinir resulta na redução dos parâmetros de toxicidade do acetaminofeno Numa abordagem diferente Kim et al 2015 já tinham demostrado que em ratos um prétratamento oral de 30 minutos ou póstratamento de 60 minutos com metformina atenuou a lesão hepática através da inibição de cjun Nterminal kinase JNK As cinases JNK são um conjunto de proteínas que desempenham um papel de sinalização de stress oxidativo implicadas na morte e regeneração celular Os autores concluíam que o único problema na utilização da metformina para reduzir a toxicidade associada à intoxicação por acetaminofeno era a dose utilizada em animais correspondente a 4 vezes superior à dose terapêutica em humanos No seguimento da avaliação de eficácia da metformina Saeedi Saravi et al 2016 compararam os resultados da administração de metformina com a administração de NAC 100 mgkg Concluíram que a metformina na dosagem de 100 e de 200 mgkg possui atividade hepatoprotetora pois os valores de AST e ALT sofreram uma redução significativa sendo que na dosagem de 200 mgkg a metformina não apresenta diferença significativa com a administração de NAC Avaliaram também a atividade da SOD e da GSH e do malondialdeído MDA sendo este último um produto final da peroxidação lipídica Concluíram que a metformina a 200 mgkg por si só não demonstra alteração significativa nestes parâmetros e além disso no grupo em que foi administrado acetaminofeno em dose tóxica resulta numa diminuição significativa da concentração de MDA Demonstraram ainda não haver diferenças significativas nas concentrações de Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 20 GSH e SOD entre o grupo em que foi administrado NAC e o grupo de metformina a 200 mgkg confirmando assim o efeito hepatoprotetor da metformina nos casos de intoxicação por acetaminofeno A utilização de metformina nestas doses pode resultar num aumento de efeitos adversos sendo por isso necessário avaliar a reprodução destes dados em humanos e inclusive em doses pediátricas Jaeschke et al 2020 2 Ibuprofeno i Farmacodinâmica O ibuprofeno é antiinflamatório não esteroide AINE vulgarmente usado como anti inflamatório analgésico e antipirético que atua por inibição da enzima COX levando a uma redução na produção de prostaglandinas Infarmed 2020a Os alvos farmacológicos do ibuprofeno COX1 e COX2 são enzimaschave na formação de uma classe de mediadores lipídicos as prostaglandinas envolvidas nos processos de inflamação dor e febre A COX1 denominada enzima constitutiva está presente em quase todos os tecidos estando associada à produção de prostaglandinas e consequentemente a diversos efeitos fisiológicos como proteção gástrica função plaquetária e homeostasia renal Por outro lado a COX2 está presente nos locais de inflamação sendo expressa primariamente por células envolvidas no processo inflamatório como macrófagos e monócitos e por isso é denominada de enzima indutiva Esta isoforma encontrase noutros tecidos e órgãos tais como rins cérebro ovários útero cartilagem ossos e endotélio vascular A sua expressão no sistema nervoso central permite a mediação central da dor e da febre e contribuem para a perceção da dor Grosser et al 2017 O efeito antipirético é obtido pela inibição da formação da prostaglandina E2 PGE2 mediador que atua no hipotálamo tendo como consequência o aumento da temperatura corporal e também pela inibição da resposta inflamatória diminuindo a quantidade de Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 21 citocinas produzidas pelos leucócitos O efeito analgésico é devido à inibição da produção local de PG aquando da inflamação O efeito antiinflamatório é obtido pela inibição da COX2 e consequentemente da produção de mediadores prostanóides Infarmed 2020a Os efeitos obtidos pela inibição da COX podem ser resumidos pela Figura 4 Samuelsson 2012 ii Farmacocinética Quando ingerido o ibuprofeno é rapidamente absorvido no TGI tendo um início de ação entre 30 a 60 minutos sendo alcançado a concentração máxima 1 a 2 horas após a sua administração Cerca de 80 da dose é absorvida no TGI e a taxa de ligação proteica é alta 99 O tempo de semivida é de 2 horas A biotransformação é hepática e a excreção é praticamente completa em 24 horas na qual menos de 1 é na forma inalterada Ershad et al 2021 iii Dose terapêuticaDose tóxica O ibuprofeno não está recomendado em crianças com menos de 3 meses de idade ou com peso inferior a 5 kg estando a sua utilização nestas idades dependentes da avaliação médica entre o risco e o benefício Infarmed 2020a Figura 4 Mecanismo de ação da COX retirado de Samuelsson 2012 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 22 A dose recomendada é de 2030 mgkgdia dividida em 3 ou 4 administrações em que o intervalo entre estas não deve ser inferior a 6 horas Infarmed 2020a Doses inferiores a 100 mgkg raramente causam toxicidade A dose tóxica foi observada em crianças após a ingestão de 400 mgkg de ibuprofeno em crianças está associada a situações graves ou mesmo risco de vida Ershad et al 2021 iv Quadro clínico na intoxicação Os sintomas associados a intoxicação usualmente aparecem 4 a 6 horas após a ingestão e desaparecem em 24 horas Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Devido à inibição das prostaglandinas e ao seu envolvimento na manutenção da integridade da mucosa gástrica e na regulação da circulação renal tanto a intoxicação aguda como a crónica podem causar danos nestes órgãos Segundo Zucoloto et al 2017 as intoxicações por ibuprofeno podem ser divididas em leves ou graves sendo as últimas raras Geralmente numa intoxicação leve os pacientes são assintomáticos ou apresentam um quadro gastrointestinal leve com náuseas vómitos e dor ou desconforto abdominal sonolência cefaleia letargia e desorientação Em alguns casos pode ocorrer um prolongamento do tempo necessário para estancar uma hemorragia devido à inibição do tromboxano como visto na farmacodinâmica Após uma ingestão acima de 400 mgkg é considerada uma intoxicação grave na qual os pacientes podem apresentar alteração sensorial acidose metabólica disfunção hepática insuficiência renal raramente depressão respiratória convulsões coma e morte Zucoloto et al 2017 Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 v ExamesDiagnóstico laboratorial O diagnóstico é baseado na história da exposição ao fármaco e no exame físico Deve ser complementado com o nível sérico do composto exame este moroso e que deve ser Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 23 apenas de confirmação da suspeita iniciandose previamente as medidas de suporte Além deste exame específico podem ser realizados outros para vigilância de alguns parâmetros como função hepática e renal e prova de coagulação Zucoloto et al 2017 vi Tratamento Como para este fármaco não existe antídoto o tratamento envolve fundamentalmente medidas de suporte e de descontaminação Lavagem gástrica eou administração de carvão ativado só devem usados em caso de uma ingestão de dose equivalente a uma intoxicação grave e no máximo até 2 horas após a ingestão Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Para os casos mais graves as convulsões podem ser tratadas recorrendo a benzodiazepinas IV como o lorazepam midazolam ou o diazepam que pode ser repetido conforme necessário tal como evidenciado na Tabela 7 Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Nelson 2019 Ershad et al 2021 Tabela 7 Benzodiazepinas usadas no tratamento de convulsões adaptado de Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Lorazepam Midazolam Diazepam Dosagem mgkg 005 01 002 02 05 Como o ibuprofeno se liga fortemente às proteínas plasmáticas excluise a hemodiálise para remoção do tóxico Ershad et al 2021 Considerase que o paciente se encontra livre do medicamento quando estão assintomáticos após 4 a 6 horas da ingestão do mesmo Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 24 vii Novas abordagens terapêuticas Dada a ineficácia da hemodiálise para a remoção do composto Wolff et al 2020 para tratar a intoxicação por ibuprofeno em dois cães realizaram a técnica de hemoperfusão através de carvão ativado na qual o sangue foi continuadamente passado através de um filtro com carvão ativado promovendo a adsorção dos compostos a remover Com esta técnica os autores obtiveram uma diminuição da concentração do tóxico em circulação Como fatores negativos a hemoperfusão mostrase ser uma técnica cara e caso haja necessidade de um tratamento longo existe a dificuldade em mudar a coluna de carvão ativado sem que seja introduzido ar no sistema Num outro trabalho Rosenthal and Labato 2019 utilizaram a plasmaferese para tratar a sobredosagem de AINEs em cães A plasmaferese é uma técnica em que o sangue do paciente é processado para separar os componentes celulares do plasma sendo este último descartado reintroduzindo os componentes celulares com reposição de plasma Bobati and Naik 2017 Neste estudo os autores não realizaram o doseamento sérico para acompanhar a evolução da concentração do tóxico mas apesar disso todos os animais intoxicados reverteram a sintomatologia As complicações decorrentes da técnica foram observadas em 545 dos casos incluindo hemorragia ou hipotensão não tendo efeito significativo no resultado final 3 Ácido acetilsalicílico Do ponto de vista histórico o ácido acetilsalicílico AAS é um composto que deve ser revisto quer por ser um dos mais antigos e mais utilizados quer pelos eventos associados à síndrome de Reye Esta é uma doença muito rara que causa inflamação e edema do cérebro e degeneração e perda da função hepática Não há causa conhecida para esta síndrome mas sabese que pode ser desencadeada por uma infeção viral ou pelo uso do AAS Este é um medicamento contraindicado em crianças com menos de 12 anos Magrum and Pickworth 2020 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 25 i Farmacodinâmica O AAS pertence ao grupo dos AINEs inibindo irreversivelmente a tanto a COX1 como a COX2 e por isso inibindo a biossíntese de prostaglandinas tal como descrito anteriormente Possui efeito antipirético analgésico antiinflamatório Em doses mais baixas atua como antiagregante plaquetário Nelson 2019 Neste caso particular o efeito antiagregante plaquetário resulta da inibição irreversível da COX que impede a síntese de tromboxano A2 TXA2 cuja função é ativação das plaquetas sanguíneas e agregação das mesmas como demonstrado na Figura 4 Lavie et al 2017 ii Farmacocinética O AAS é rapidamente absorvido por via oral atingindo o pico plasmático entre 30 a 60 minutos após a sua ingestão Distribuise praticamente por todos os tecidos atravessando as barreiras hematoencefálica BHE e placentária e aparece no leite materno Nelson 2019 A taxa de ligação às proteínas plasmáticas é cerca de 80 a 90 em doses terapêuticas e 50 a 75 em doses tóxicas O tempo de semivida é de 15 a 30 minutos Papacostas et al 2016 O AAS sofre hidrólise por ação das esterases formando ácido salicílico o metabolito ativo cujo tempo de semivida é variável consoante a dose administrada 2 a 3 horas em doses baixas e pode ir até 30 horas em doses altas ou doses múltiplas pois ocorre saturação das vias de metabolização Soleimani et al 2019 A excreção destes compostos é pela via urinária através da passagem pelos glomérulos renais e sofrem filtração glomerular na qual 75 é sob a forma de ácido salicilúrico 10 na forma de glucoronídeo fenólico e 10 de forma inalterada 5 como acilglucuronídeos e 1 como ácido gentísico Nelson 2019 Este metabolismo encontrase esquematizado na Figura 5 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 26 À medida que a concentração de ácido salicílico aumenta as duas principais vias de metabolização tornamse saturadas e exibem cinética de ordem zero Como resultado dessa saturação a eliminação geral de salicilato muda de cinética de primeira ordem em que a eliminação é proporcional à concentração para a cinética de ordem zero em que a quantidade eliminada por unidade de tempo é constante Nelson 2019 O AAS tem pKa de 35 mas como mencionado anteriormente é rapidamente hidrolisado para ácido salicílico que tem um pKa de 297 Sepulveda et al 2018 A pH fisiológico este encontrase predominantemente na sua forma ionizada mas em situações de dose tóxica o pH sérico diminui originando uma maior quantidade de composto na forma não ionizada que permeia facilmente as bicamadas lipídicas e as membranas celulares Este é um efeito importante pois permite que o ácido salicílico entre nas células exercendo os seus efeitos tóxicos numa ampla variedade de órgãos iii Dose tóxica Para uma concentração de salicilatos inferior a 300 µgmL o paciente é geralmente assintomático entre 300 a 500 µgmL considerase uma intoxicação moderada entre 500 Figura 5 Metabolização do AAS retirado de Nelson 2019 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 27 a 700 µgmL é uma intoxicação grave e acima deste valor estão associados os prognósticos mais graves de evolução ou mesmo morte Soleimani et al 2019 iv Quadro clínico na intoxicação Segundo Tintinalli et al 2019 a intoxicação por AAS ou salicilismo pode ser dividida em três tipos designadamente leve moderada e severa em que varia a dose de fármaco administrada e consequentemente os sintomas e parâmetros analíticos Os sinais e sintomas aparecem nas duas primeiras horas após a ingestão mas pode ser atrasado até 24 horas em caso de ingestão concomitante com outros compostos comorbidades ou comprometimento renal eou hepático Numa intoxicação leve inferior a 150 mgkg o paciente pode manifestar distúrbios gastrointestinais como náuseas vómitos rubor e hiperpneia leve a moderada não apresentando qualquer variação de parâmetros analíticos Numa intoxicação moderada 150 mgkg a 300 mgkg já apresenta hiperpneia grave hipersudorese desidratação surdez tremores letargia ou agitação Analiticamente verificase alcalose respiratória seguida de acidose metabólica Na situação mais crítica uma intoxicação severa aquando de uma ingestão superior a 300 mgkg o utente apresenta hiperpneia severa hipertermia confusão cansaço sonolência delírio convulsões coma ou mesmo morte Em geral quando a duração da intoxicação por salicilato é entre 12 a 24 horas a acidose metabólica e acidemia pH 735 ocorrem principalmente em crianças com idade inferior a 4 anos e quase todas as crianças com idade inferior a 1 ano têm acidose Crianças pequenas podem ter alcalose respiratória mas geralmente é transitória ou não detetada devido a uma menor reserva respiratória Em crianças mais velhas 4 anos o distúrbio ácidobase é geralmente um distúrbio misto com alcalose respiratória e acidose metabólica Tintinalli et al 2019 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 28 v Examesdiagnóstico laboratorial Para confirmar o diagnóstico de intoxicação por AAS deve procederse à determinação de salicilatos através de uma amostra de sangue ou urina importante para prever o grau de toxicidade esperado Devese avaliar a presença de cetonas séricas ou urinárias e concentração de lactato Além destes são realizados exames de modo a avaliar a função renal e hepática pois são determinantes no processo de metabolização e excreção dos metabolitos resultantes Nelson 2019 vi Tratamento Este composto não possui antídoto sendo o tratamento da intoxicação baseado nos sintomas apresentados Procedese à lavagem gástrica até 1 hora após a ingestão eou administração de carvão ativado e administração de xarope de ipecacuanha como medidas de diminuição da absorção do composto Administração IV de glucosesoro glicosado para correção de hipoglicemia correção da perda de fluidos manutenção da função renal e controlo de hipertermia devido ao aumento da taxa metabólica A medida mais específica para o tratamento da intoxicação por AAS não sendo considerada antídoto é a alcalinização urinaria através da administração de bicarbonato de sódio Esta medida favorece a excreção urinária do AAS e dos seus metabolitos evidenciado na Figura 6 pois com o aumento do pH aumenta a conversão do ácido fraco para a forma ionizada impedindo a sua reabsorção pelo túbulo renal Não está indicada em casos de insuficiência renal edema pulmonar ou cerebral Soleimani et al 2019 Figura 6 Relação entre pH e clearance urinário do AAS retirado de Proudfoot et al 2003 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 29 Em casos muito graves pode ser necessário realizar hemodiálise que corrige as anormalidades ácidobase e eletrolíticas e reduz rapidamente a quantidade de salicilato em circulação Papacostas et al 2016 vii Novas abordagens terapêuticas Nos seus estudos Zhang et al 2013 utilizaram uma emulsão água em óleo AO ativa para reverter os efeitos tóxicos da sobredosagem de AAS Para esta emulsão foi utilizado trioctilamina como carrier agente extrator o dodecano como fase oleosa Abil EM90 como surfactante NaOH a 01 molL como fase aquosa interna tendose usada uma proporção fase oleosafase aquosa de 05 em volume Este método baseiase como descrito anteriormente na ionização de um ácido fraco em contacto com uma solução aquosa básica em meio ácido o AAS encontrase na forma não ionizada contacta com a emulsão e complexase com o agente extrator o qual transporta o AAS para na fase aquosa interna aqui o complexo decompõese sendo a trioctilamina regenerada voltando desta forma para a interface externa por seu lado o ácido fraco ionizase resultando no seu aprisionamento no meio interno da emulsão Os autores concluíram que a utilização desta técnica resulta em eficácia máxima de remoção do composto em menos de 15 minutos O tratamento padronizado para intoxicações muito graves passa como referido previamente por hemodiálise pois atinge uma maior clearance do tóxico Em doses tóxicas a porção de fármaco ligada a proteínas plasmáticas reduz para cerca de 50 a 75 Na hemodiálise é a porção de fármaco não ligada às proteínas plasmáticas que é removido logo assim que esta técnica é interrompida há uma redistribuição do composto dos tecidos para o plasma até atingir novo equilíbrio resultando num aumento da concentração de salicilatos efeito rebound Papacostas et al 2016 avaliaram a utilização de hemodiafiltração venovenosa contínua depois do tratamento inicial com hemodiálise resultando numa diminuição do efeito rebound e desta forma diminuindo a toxicidade do AAS Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 30 Rojas et al 2019 propuseram a utilização de estruturas nanométricas metálicoorgânicas nanoMOF usando o titânio Ti como agente metálico capaz de reverter situações de intoxicações por salicilatos O TinanoMOF demonstrou ser seguro e capaz de adsorver o AAS em todo o TGI com maior eficácia relativamente aos tratamentos de descontaminação atualmente usados Este material apresenta diversas vantagens como uma elevada dose letal sendo mesmo considerado biocompatível muito baixa absorção oral e elevada porosidade O agente em causa revelou capacidade de reduzir em 2 vezes o pico de salicilatos no sangue e comparativamente ao carvão ativado demonstrou uma maior capacidade de adsorção em condições intestinais Nos dias de hoje as nanopartículas já são usadas como sistemas de libertação modificada de fármacos mas com este estudo os autores demonstraram que as suas utilizações podem ser ainda mais diversificadas Rojas et al 2019 IV Antihistamínicos e descongestionantes De acordo com Gummin et al 2020 os antihistamínicos são o segundo grupo farmacoterapêutico com maior taxa de aumento de exposições dos últimos 10 anos aliandose ao facto de juntamente com os descongestionantes serem dos fármacos mais usados em pediatria A histamina exerce efeitos sobre os músculos liso e cardíaco sobre determinadas células endoteliais e nervosas sobre as células secretoras do estômago e sobre células inflamatórias quando através de algum estímulo se liberta dos mastócitos ligandose a recetores específicos localizados na membrana celular Até ao momento estão identificados quatro recetores de histamina diferentes designados de H1 a H4 Katzung 2017 Para este trabalho apenas irão ser abordados os recetores H1 pela relevância de toxicidade Estes recetores estão associados à mediação da inflamação As outras funções da histamina e do recetor H1 incluem o controle do ciclo sonovigília cognição memória e homeostase endócrina A estimulação do recetor H1 também causa vasodilatação aumento da permeabilidade vascular e da broncoconstrição A estimulação do recetor H1 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 31 da histamina cardíaca aumenta igualmente o tempo de condução nodal atrioventricular Nelson 2019 1 Antihistamínicos H1 1ª e 2ª geração Os antihistamínicos são fármacos que em grande parte não requerem receita médica para a sua aquisição Possuem ampla aplicação no tratamento de condições como anafilaxia doença do refluxo gastroesofágico gastrite de stress e outros distúrbios mediados pela histamina Além disto são usados para o alívio sintomático dos sintomas de alergia como na rinite alérgica urticária e estão incluídos em muitas preparações combinadas para tosse eou constipações Alguns são ainda usados como hipnóticos Nelson 2019 Relativamente ao efeito terapêutico eficácia e segurança os antihistamínicos H1 podem ser divididos em dois grupos os de primeira geração ou sedantes como difenidramina hidroxizina e os de segunda geração ou não sedantes como loratadina desloratadina cetirizina azelastina rupatadina bilastina Church 2017 i Farmacodinâmica Todos os fármacos denominados antagonistas da histamina H1 conhecidos funcionam como agonistas inversos e não são simplesmente antagonistas competitivos reversíveis pois em vez de impedir a ligação da histamina ao seu recetor característico de um antagonista competitivo clássico estabilizam a forma inativa do recetor de histamina e mudam o equilíbrio para esta conformação inativa Para uniformizar a denominação destes grupos de fármacos o termo mais usado é antihistamínico Os antihistamínicos H1 reduzem ou bloqueiam a ação da histamina através da ligação competitiva aos recetores H1 apresentando pouca afinidade para os recetores H2 e H3 Para além desta inibição da ação da histamina os antagonistas dos recetores H1 exercem outras como resultado da semelhança estrutural com os fármacos que exercem os seus efeitos nos Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 32 recetores colinérgicos muscarínicos αadrenérgicos serotoninérgicos e os recetores dos anestésicos locais podendo ter ou não ações benéficas Nelson 2019 Os antihistamínicos H1 de 1ª geração penetram prontamente na BHE resultante da sua lipofilicidade ou pela falta de reconhecimento da glicoproteína P gpP nas superfícies luminais das células endoteliais vasculares no SNC produzindo efeitos centrais incluindo sedação Os de 2ª geração são seletivos perifericamente e têm um índice terapêutico mais alto Não penetram bem no SNC devido à sua hidrofilicidade ao peso molecular relativamente alto e reconhecimento pela bomba de efluxo da gpP na superfície luminal do endotélio dos capilares cerebrais Têm afinidades de ligação mais baixas para os locais dos recetores colinérgicos α e βadrenérgicos comparativamente aos de 1ª geração Muitos são prófármacos que precisam ser convertidos no fígado em metabolitos hidrossolúveis Nelson 2019 ii Farmacocinética Os antihistamínicos H1 geralmente são bem absorvidos por via oral atingindo o pico plasmático entre 1 hora caso da difenidramina e cetirizina e 2 a 4 horas após a administração ocorrendo o seu efeito máximo algumas horas após este pico Em doses altas a absorção é prolongada pelo efeito antimuscarínico no TGI Nelson 2019 Distribuemse amplamente por todo o corpo tendo os de 2ª geração fraca distribuição no SNC exercendo menos efeitos sedativos comparativamente aos de 1ª geração que se distribuem facilmente pelo SNC e ligamse fortemente às proteínas plasmáticas Nelson 2019 A biotransformação é hepática com exceção da cetirizina fexofenidramina e a levocetirizina e a eliminação renal com exceção da fexofenadina que apresenta maior excreção biliar Segundo Nelson 2019 o tempo de semivida e a duração de ação para este grupo farmacoterapêutico é variável tal como observado na Tabela 8 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 33 Tabela 8 Propriedades farmacocinéticas antihistamínicos H1 adaptado de Nelson 2019 Antihistamínico H1 Tempo ½ vida horas Duração de ação horas 1ª geração Clorfeniramina 12 43 24 Difenidramina 3 14 12 Doxilamina 10 11 Hidroxizina 13 27 24 Prometazina 9 16 4 6 2ª geração Fexofenadina 9 20 12 24 Cetirizina 65 10 12 24 Desloratadina 21 27 24 Levocetirizina 24 Loratadina 3 20 24 iii Dose tóxica As doses potencialmente fatais são relatadas com grande variabilidade na literatura Em geral é observada toxicidade quando é ingerida a quantidade 3 a 5 vezes superior à dose terapêutica Sabese se que as crianças são mais sensíveis aos efeitos tóxicos quando comparadas com os adultos Tal como esperado o quadro clínico da intoxicação aguda por antihistamínicos H1 de 1ª geração é mais grave do que os de 2ª geração Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 iv Quadro clínico na intoxicação Como visto anteriormente os tempos de semividas dos antihistamínicos são altamente variáveis originando em casos de intoxicação duração dos quadros clínicos incertos Os efeitos anticolinérgicos como redução do TGI podem levar ao prolongamento da duração do quadro pelo atraso na absorção e eliminação do fármaco A fisiopatologia da intoxicação aguda deste grupo farmacoterapêutico é uma extensão dos efeitos terapêuticos e adversos esperados Em caso de sobredosagem a maioria dos pacientes apresenta sintomas entre 1 a 4 horas Nelson 2019 Relativamente aos de 1ª geração uma intoxicação leve pode conduzir a alterações a nível neurológico como sonolência que pode evoluir até convulsão em caso de intoxicação Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 34 grave e nas primeiras horas após exposição especialmente na idade pediátrica Podem apresentar ainda excitação irritabilidade ou ataxia alucinações e uma série de sintomatologia associado ao síndrome anticolinérgico ver Tabela 1 Varney et al 2016 Quadros graves podem apresentar psicose rabdomiólise síndrome neuroléptica maligna coma prolongado e íleo paralítico Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Nelson 2019 Já nos de 2ª geração como já foi sendo abordado os pacientes evoluem com quadros clínicos leves na maior parte das vezes ou com sonolência ou agitação cefaleia e distúrbios gastrintestinais Há relatos raros de alterações a nível cardíaco como arritmias ou aumento do tempo QT com a loratadina e cetirizina Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 v ExamesDiagnóstico laboratorial Tal como para os fármacos analisados até ao momento o diagnóstico da intoxicação por antihistamínicos H1 tem por base o historial clínico de exposição e sintomatologia associada A determinação por análise de amostras de sangue ou urina através de cromatografia eou espetroscopia fornece concentrações de antihistamínicos mas são mais úteis em situações médicolegais ou forenses É improvável que o tempo de resposta geralmente necessário forneça resultados no momento da avaliação inicial Além disso os testes quantitativos não contribuem para a indicação de medidas terapêuticas ou previsão quanto à gravidade e prognóstico e o tratamento é baseado no alívio ou correção de sinais ou sintomas tóxicos e não deve depender de um resultado de concentração que não se correlaciona com a toxicidade Nos casos mais graves a gasometria arterial a glicemia os eletrólitos monitorização cardíaca oximetria e a determinação dos níveis de creatinofosfoquinase CPK são úteis no acompanhamento da evolução Nelson 2019 Deve ser realizada a avaliação da concentração sérica de acetaminofeno pois estes são utilizados concomitantemente em produtos para tosse e constipações Nelson 2019 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 35 vi Tratamento Para este grupo farmacoterapêutico não existe antídoto específico logo o tratamento da intoxicação visa a descontaminação gastrointestinal se a janela de tempo assim o permitir e alívio de sintomas decorrentes da intoxicação logo a triagem deve ser realizada o mais breve possível Complicações graves são inicialmente indistinguíveis daqueles que terão uma evolução leve Nelson 2019 A descontaminação gastrointestinal é recomendada em pacientes com ingestão de doses potencialmente toxicas de antihistamínicos H1 com a utilização de carvão ativado por via oral sendo mais eficaz até 1 hora após ingestão Nelson 2019 Pacientes com hipotensão devem receber fluidos isotónicos como solução de cloreto de sódio a 09 ou solução de Ringer lactato Caso não seja suficiente para normalizar o valor recorrer a uma solução hipertónica de bicarbonato de sódio Varney et al 2016 A hipertermia deve ser tratada por métodos físicos com remoção de camadas de roupa abaixamento da temperatura ambiente uso de esponjas ou compressas frias Nelson 2019 Em caso de agitação e delírio estes devem inicialmente ser tratadas num ambiente calmo e apaziguador Caso não seja suficiente tratar com fisostigmina que reverte eficazmente o quadro anticolinérgico Em crianças deve ser administrada uma dose de carga de 05mg de fisostigmina IV durante 5 a 10 minutos e repetida em intervalos de 10 minutos até restabelecer normalidade Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 A utilização deste fármaco por parte dos clínicos conduz a algumas discrepâncias pois não é concordante quanto aos riscos da sua utilização podendo ocorrer vómitos bradicardia e convulsões Segundo Boley and Stellpflug 2019 o seu uso está associado a uma diminuição da necessidade de intubação quando comparado com o grupo que não recebeu tratamento Além deste fator verificouse que a sua utilização não resultou num aumento dos efeitos adversos Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 36 Se o quadro evoluir para convulsões eou os casos de agitação e delírio podem ser revertidos pela ação de uma benzodiazepínico IV tal como evidenciado Tabela 7 Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Nelson 2019 No caso de ocorrerem complicações cardíacas como anormalidades na condução cardíaca pode ser administrada uma dose de carga de bicarbonato de sódio intravenosamente Varney et al 2016 A nefrotoxicidade associada à rabdomiólise pode ser evitada com o uso precoce de NaCl a 09 de modo a obter um débito urinário de 13 mLkgh Uma vez estabelecida a rabdomiólise induzida por antihistamínicos o tratamento passa por administração de fluidos por via IV A alcalinização urinária não está indicada sendo apenas reservada quando o pH urinário é inferior a 65 Nelson 2019 vii Novas abordagens terapêuticas Varney et al 2016 avaliaram em porcos o tratamento da hipotensão causada por difenidramina com emulsão lipídica IV comparativamente ao uso de bicarbonato de sódio A emulsão lipídica intravenosa composta por dois tipos de lípidos designadamente por triglicerídeos e por fosfolípidos mostrouse um eficaz agente para tratamento de sobredosagem de fármacos lipofílicos Neste estudo concluiuse que para a maior parte dos parâmetros cardíacos como a pressão arterial e a pulsação os resultados foram semelhantes variando apenas a pressão arterial média e a pressão sistólica nas quais os valores nos casos tratados com emulsão lipídica intravenosa eram comparativamente aos de bicarbonato de sódio mais favoráveis 2 Descongestionantes simpaticomiméticos São exemplos de descongestionantes nasais simpaticomiméticos a efedrina pseudoefedrina fenilefrina adrenalina Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 37 i Farmacodinâmica Os descongestionantes simpaticomiméticos reduzem a congestão nasal através do estímulo dos recetores αadrenérgicos no músculo liso promovendo a constrição dos vasos sanguíneos levando a uma diminuição da resistência do fluxo de ar Ambos os subtipos de recetores adrenérgicos α1 e α2 estão ligados a uma proteína Gq que ativa a contração do músculo liso A administração tópica prolongada produz congestão nasal medicamentosa após a descontinuação Nelson 2019 A fenilefrina é um agonista direto do recetor α1adrenérgico com muito pouca atividade agonista βadrenérgica em doses terapêuticas A pseudoefedrina e efedrina são agonistas dos recetores α12adrenérgicos e β12adrenérgicos de ação mista direta e indireta não específica sendo a pseudoefedrina o isómero da efedrina com apenas 25 da atividade Nelson 2019 ii Farmacocinética Os descongestionantes simpaticomiméticos são farmacologicamente ativos após administração oral ou tópica sendo absorvidos rapidamente pelo TGI e o pico máximo ocorre 2 a 4 horas após ingestão A sua metabolização é hepática através da enzima monoamina oxidase e a sua eliminação é renal No caso da pseudoefedrina o tempo de semivida é mais curto em crianças a sua eliminação é dependente do pH urinário e existe eliminação através do leite materno não impossibilitando contudo a sua administração durante a amamentação Nelson 2019 O tempo de semivida da efedrina em doses terapêuticas é de 6 horas A duração de ação de cada um destes compostos está evidenciada na Tabela 9 Tabela 9 Duração de ação dos descongestionantes simpaticomiméticos adaptado de Nelson 2019 Descongestionante simpaticomimético Duração de ação horas Efedrina 3 5 Pseudoefedrina 3 4 Fenilefedrina 1 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 38 iii Dose tóxica A dose tóxica varia de acordo com o fármaco A efedrina e pseudoefedrina podem apresentar toxicidade a partir do dobro da dose terapêutica Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 iv Quadro clínico na intoxicação Após uma sobredose de descongestionante desta classe a sintomatologia apresentada é associada à estimulação simpaticomimética com envolvimento do SNC devido a ação direta nos recetores α e β levando a hipertensão taquicardia ou bradicardia reflexa ver Tabela 1 Psicose agitação e comportamento maníaco são também relatados com ingestão aguda Casos graves são incomuns mas podem originar convulsões alucinações e arritmias cardíacas Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 v ExamesDiagnóstico laboratorial O diagnóstico de toxicidade por descongestionantes simpaticomiméticos é clínico e pode resultar do histórico de exposição A pesquisa no sangue ou na urina pode ser obtida para fins de investigação em abuso infantil ou em estudos forenses para determinar a causa da morte pois a determinação destes agentes não é fundamental no tratamento da intoxicação Nelson 2019 O ECG deve ser realizado para a determinação de arritmias cardíacas nos casos graves e pode ser considerado realizar uma TC em pacientes com alterações neurológicas Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 39 vi Tratamento Os descongestionantes simpaticomiméticos não têm antidoto logo o tratamento da intoxicação envolve medidas de descontaminação e tratamento sintomático A descontaminação do TGI com carvão ativado é recomendada em pacientes com ingestões potencialmente tóxicas e se esta for até 1 hora dada a rápida absorção dos compostos A administração de carvão ativado pode ser realizada algumas horas após a ingestão em casos de preparações de libertação modificada Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Nelson 2019 As técnicas de aumento da taxa de excreção renal eou lavagem intestinal não são indicadas Nelson 2019 Sintomatologia de agitação extrema convulsões e psicose devem ser tratadas inicialmente com administração de oxigénio e fármacos benzodiazepínicos por via IV ver Tabela 7 ou fármacos antipsicóticos Cakmak et al 2020 Em caso de persistência da hipertensão recomendase a utilização de fentolamina um antagonista αadrenérgico não seletivo Nelson 2019 3 Descongestionantes imidazólicos Os descongestionantes imidazólicos mais usados são oximetazolina xilometazolina nafazolina e tramazolina i Farmacodinâmica Os descongestionantes imidazólicos têm afinidade seletiva para os recetores α2 adrenérgicos centrais e periféricos nos vasos sanguíneos e fixamse a outros locais independentes dos recetores os locais imidazolínicos Até ao momento são reconhecidas três classes de recetores imidazolínicos Os recetores de imidazolina I1 medeiam a ação inibitória dos xenobióticos de imidazolina para reduzir a pressão arterial o recetor de imidazolina I2 é um importante local de ligação para monoamina oxidase e o recetor Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 40 imidazolina I3 regula a secreção de insulina das células pancreáticas Lowry and Brown 2014 O mecanismo de toxicidade é através do agonismo α2 central na qual ocorre uma depleção das catecolaminas levando à depressão do sistema nervoso central juntamente com bradicardia e hipotensão Na sobredosagem ocorre também estimulação transitória dos recetores α1 periféricos e α2 póssinápticos causando uma breve libertação de catecolaminas o que leva a uma hipertensão transitória precoce Norman and Nappe 2021 ii Farmacocinética Os descongestionantes imidazólicos são rapidamente absorvidos por via oral eou nasal O tempo de semivida destes fármacos é de 2 a 4 horas produzindo um rápido efeito terapêutico com 60 da eficácia 20 minutos após administração A oximetazolina é o único composto deste grupo com uma duração de ação superior a 8 horas tendo os restantes uma duração de ação de aproximadamente 4 horas Nelson 2019 Distribuem se por todos os tecidos tendo tropismo para a musculatura lisa O seu metabolismo é hepático e a eliminação é por via renal Zucoloto et al 2017 iii Dose tóxica A dose tóxica por via oral não está estabelecida Em crianças entre 3 a 6 anos quantidades de 1 a 2 ml de soluções para uso nasal utilizadas por via oral podem causar toxicidade severa Em crianças menores de 3 anos 1 a 2 gotas destas mesmas substâncias por via oral nasal ou ocular podem causar toxicidade Uso superior a 5 dias pode produzir efeitos adversos como tonturas náuseas cefaleias e congestão nasal medicamentosa efeito rebound Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 41 iv Quadro clínico na intoxicação A sintomatologia da intoxicação é iniciada em 30 a 60 minutos após a ingestão ou aplicação tópica e geralmente desaparece até 36 horas Norman and Nappe 2021 Uma intoxicação leve é caracterizada por sintomas como taquicardia agitação palidez diaforese sonolência e ataxia Lowry and Brown 2014 Já no caso de intoxicações graves desenvolvese hipotensão ou hipertensão bradicardia hipotermia hiporreflexia podendo evoluir para coma e apneia Zucoloto et al 2017 As crianças são particularmente sensíveis aos efeitos dos descongestionantes imidazólicos Nelson 2019 v ExamesDiagnóstico laboratorial O diagnóstico de intoxicação por descongestionantes imidazólicos passa pelas mesmas etapas dos descongestionantes simpaticomiméticos analisados no ponto anterior vi Tratamento Como a absorção é muito rápida o esvaziamento gástrico e administração de carvão ativado não estão indicados O tratamento passa pelas medidas de suporte e alívio sintomático Zucoloto et al 2017 A bradicardia é normalmente revertida sem necessidade de intervenção farmacológica mas se resultar em instabilidade hemodinâmica administrase atropina IV na dose de 002 mgkg Zucoloto et al 2017 A hipertensão arterial é passageira e normalmente melhora espontaneamente podendo ser seguida de hipotensão No caso de hipertensão sintomática pode ser administrado um antagonista αadrenérgico de ação curta como a fentolamina A terapia antihipertensiva inicial pode exacerbar a toxicidade e só deve ser reservada para os casos em que a hipertensão grave representa um risco ou perigo de dano ao órgãoalvo Nelson 2019 Em casos de hipotensão grave pode administrarse uma Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 42 solução salina a 09 IV na dose de 10 a 20 mLkg Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Se houver suspeita de ingestão de quantidades potencialmente tóxicas mesmo assintomáticos devese manter observação clínica nas primeiras 6 horas Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 vii Novas abordagens terapêuticas Nadeau et al 2019 sugerem a administração de naloxona em pediatria um antidoto largamente utilizado para reverter os sintomas depressores do SNC tendo como efeito adverso a possibilidade de hipertensão Os relatos de eficácia não são concordantes entre os investigadores mas a dose administrada foi diferente entre estudos Lowry and Brown 2014 Para Seger and Loden 2018 há variabilidade na resposta cardiovascular e do SNC à naloxona em crianças com toxicidade por clonidina derivado imidazólico A reversão dos sintomas depende do tónus simpático basal dose de clonidina ingerida e dose de naloxona administrada Os autores concluíram que uma dose alta de naloxona 10 mg IV deve ser administrada em todas as crianças com toxicidade resultante de clonidina pois não se verificou aumento de reações adversas Para os estudos que demonstraram ineficácia a reverter a toxicidade deste composto os autores defendem que a dose administrada era muito baixa Alguns trabalhos avaliaram a utilização de agentes antagonistas α2adrenérgicos como atipamezol tolazolina idazoxano e ioimbina para reverter os efeitos sedativos e analgésicos em animais Estes fármacos estão aprovados apenas em uso veterinário e além do mecanismo anterior os estudos indicaram que o atipamezol e ioimbina podem ter afinidade para os recetores imidazólicos Lowry and Brown 2014 Penttila et al 2004 demonstraram em humanos que o atipamezol é capaz de reverter rapidamente e com segurança os efeitos dos agonistas α2 No entanto devido às diferenças Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 43 farmacocinéticas e farmacodinâmicas entre agonistas e antagonistas altas doses de atipamezol podem causar hipertensão ou taquicardia Os estudos clínicos destes agentes em animais encontraram terapia antidotal eficaz sendo necessário mais pesquisa acerca da segurança da utilização em humanos quando ocorrem sobredosagens de imidazolinas e agonistas α2 Ahmad et al 2015 V Broncodilatadores Os broncodilatadores são fármacos simpaticomiméticos que atuam através da interação com recetores adrenérgicos do tipo β2 Existem recetores β2adrenérgicos em diversos órgãos do corpo desempenhando por isso diferentes papeis Importa perceber a localização destes recetores e respetiva função desempenhada de modo a relacionar os sinais da intoxicação com a sintomatologia apresentada evidenciada na Tabela 10 Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Nelson 2019 Segundo Dayasiri et al 2020 este grupo farmacoterapêutico é o terceiro com mais relatos de intoxicações em crianças Os fármacos escolhidos para serem abordados neste trabalho foram o formoterol salbutamol e a terbutalina 1 Agonistas β2adrenérgicos i Farmacodinâmica A ação broncodilatadora imediata dos agonistas β2adrenérgicos passa pelos mecanismos que induzem o relaxamento do musculo liso nos brônquios evitando o broncospasmo Almadhoun and Sharma 2021 Os agonistas β2adrenérgicos ativam a enzima adenilciclase que transforma ATP em monofosfato de adenosina cíclico AMPc O AMPc tem como funções a redução de Ca2 no citosol necessário para que haja contração da musculatura brônquica ativa a fosforilase que favorece o relaxamento das proteínas contráteis e ativa a bomba de Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 44 NaK ATPase promovendo o influxo de potássio para dentro da célula consumindo ATP Doymaz and Schneider 2018 Para exercerem a sua função os agonistas β2adrenérgicos podem i ativar diretamente os recetores βagonistas de curta duração SABA do inglês shortacting βagonist exemplo do salbutamol ii permanecer como depósito na membrana e promover o seu efeito de forma sustentada como o formoterol ou iii interagir com um local auxiliar do recetorespecífico como o salmeterol também denominados de βagonistas de longa duração LABA do inglês longacting βagonists O efeito prolongado destes últimos pode ser atribuído às cadeias longas na estrutura molecular que aumentam a lipofilidade permitindo a sua retenção na bicamada fosfolipídica das membranas celulares Williams and Rubin 2018 Os recetores β2 adrenérgicos também estão presentes no endotélio dos vasos sanguíneos mastócitos e glóbulos brancos envolvidos em respostas inflamatórias incluindo eosinófilos e linfócitos Isso explica os vários efeitos além da broncodilatação que são exibidos como antiinflamatório pela inibição da libertação de leucotrienos e histamina dos mastócitos pulmonares redução do edema e exsudação de plasma por redução da síntese de prostaglandinas e leucotrienos aumento da secreção de muco diminuição da transmissão parassimpática antitússico pela inibição da libertação da acetilcolina Williams and Rubin 2018 Em doses altas estes fármacos podem ter efeitos sobre os recetores β1adrenérgicos Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 45 Tabela 10 Funções dos recetores β2adrenérgicos adaptado de Williams and Rubin 2018 ii Farmacocinética Apesar do mecanismo da farmacodinâmica ser semelhante entre os diversos fármacos os parâmetros farmacocinéticos são variáveis e desta forma serão abordados de forma individual Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Os agonistas β2adrenérgicos são bem absorvidos quer por via oral quer via inalatória Relativamente ao salbutamol quando administrado por via inalatória cerca de 30 da dose atinge as vias respiratórias inferiores onde o restante fica retido no inalador ou na orofaringe onde é posteriormente deglutido As concentrações plasmáticas máximas ocorrem 2 a 5 horas após a inalação e 2 a 25 horas após ingestão A ligação a proteínas plasmáticas é de 10 A semivida é entre 4 a 6 horas O seu metabolismo é hepático e é excretado maioritariamente na urina sob a forma inalterada ou sob a forma de éster 4 Osulfato salbutamol 4Osulfato Pode ocorrer também eliminação através das fezes Ammari et al 2020 Quando administrado por via inalatória a terbutalina tem uma absorção inferior a 10 e por via oral de cerca de 10 a 15 A metabolização é hepática formandose conjugados inativos e o tempo de semivida varia entre 16 a 20 horas Com a administração parenteral 60 da dose é excretada na urina na forma inalterada Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 O formoterol é um fármaco com boa absorção cerca de 90 da dose inalada é rapidamente absorvida A ligação às proteínas plasmáticas não é muito extensa entre 61 Recetor β2 adrenérgico LocalÓrgão Função Coração Aumento da frequência cardíaca Aumento da contratilidade Fígado Aumento da glicogenólise Aumento da glicogénese Musculo esquelético Aumento da glicogenólise Vasodilatação Músculo liso brônquios bronquíolos TGI útero Relaxamento Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 46 a 64 É inicialmente metabolizado por via da glucuronidação e totalmente eliminado pela urina e através das fezes na qual 6 a 9 na forma inalterada Tashkin 2020 iii Dose tóxica De acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 as doses tóxicas para os agonistas β2adrenérgicos são as descritas na Tabela 11 Tabela 11 Dose tóxica dos agonistas β2adrenérgicos adaptado de Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Fármaco Dose tóxica Salbutamol 07 mgkg Terbutalina 1 mgkg Formoterol 15 µgkg iv Quadro clínico na intoxicação Nas intoxicações agudas por agonistas β2adrenérgicos os sintomas mais comuns são taquicardia sinusal tremores agitação hipertensão arterial taquipneia náuseas e vómitos Analiticamente é comum ocorrer hiperglicemia devido ao estímulo de glicogénese e glicogenólise mas em intoxicações prolongadas pode resultar apenas em hipoglicemia e hipocalemia devido ao aumento do AMPc que promove o influxo de potássio para o meio intracelular originando alterações de condução no tecido cardíaco e muscular Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Nos casos de intoxicações graves é manifestada hipotensão arterial e arritmias nível de consciência alterado redução do volume de diurese e convulsões Analiticamente pode detetarse acidose hipomagnesemia e hipofosfatemia devido ao deslocamento de magnésio e fosfato para o compartimento intracelular durante o período de hiperglicemia Pode ocorrer elevação da troponina e creatina fosfoquinase muscular e cardíaca Casos raros de isquemia miocárdica e enfarte também foram relatados Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 47 v ExamesDiagnóstico laboratorial O diagnóstico de intoxicação por agonistas β2adrenérgicos é realizado com base na história de exposição e mediante a sintomatologia apresentada Os testes quantitativos não contribuem para o prognóstico da gravidade esperada Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Na suspeita de ingestão de uma dose potencialmente tóxica é importante realizar ECG pois como visto anteriormente a estimulação dos recetores β2adrenérgicos no coração pode provocar complicações cardíacas Em caso de alterações cardíacas compatíveis com isquemia deve realizarse o doseamento de troponina e creatina fosfoquinase muscular e cardíaca Doseamento de eletrólitos séricos nomeadamente fósforo magnésio e potássio e da glicemia devem ser monitorizados de modo a identificar precocemente alterações e proceder à correção das mesmas Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 vi Tratamento Não existe antidoto para este grupo farmacoterapêutico por isso o tratamento da intoxicação por agonistas β2adrenérgicos passa pelas medidas de descontaminação e alívio de sintomas No caso dos agonistas β2adrenérgicos as medidas de descontaminação não devem ser consideradas de forma rotineira devido ao risco aumentado de broncoaspiração Indução do vómito não é aconselhada em crianças pelo mesmo risco Para isso é avaliado se a dose potencialmente ingerida é capaz de provocar uma intoxicação grave com risco de vida se o paciente não apresenta alteração do nível de consciência e se o tempo decorrido entre exposição e hospitalização é inferior a 1 hora Caso se verifiquem estas situações administrar carvão ativado por via oral ou sonda nasogástrica Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 A hipotensão deve ser tratada com administração de fluidos isotónicos como NaCl a 09 em volumes de 20 mLkg Se esta persistir e como é resultado da ação Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 48 vasodilatadora dos recetores β2adrenérgicos deve administrarse um fármaco com efeito αadrenérgico como a adrenalina A sintomatologia associada ao SNC como agitação eou convulsões deve ser tratada com recurso a benzodiazepinas ver Tabela 7 A hiperglicemia normalmente não requer tratamento pois é transitória A hipocalemia também é revertida espontaneamente mas se estiver associada a alterações cardíacas deve ser tratada com reposição de potássio Esta reposição deve ter em conta a redistribuição de potássio quando os efeitos βadrenérgicos terminarem Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 VI Anticonvulsivantes Em idade pediátrica os anticonvulsivantes apresentamse como o segundo maior grupo farmacoterapêutico envolvido em intoxicações Dayasiri et al 2020 De acordo com Gummin et al 2020 os anticonvulsivantes são dos grupos farmacoterapêuticos com maior taxa de crescimento de intoxicações nos últimos 10 anos 1 Carbamazepina i Farmacodinâmica A carbamazepina é um agente antiepilético utilizada para as crises parciais simples e complexas com e sem generalização secundária crises tónicoclónicas generalizadas bem como formas mistas destes tipos de crises Alrashood 2016 O seu principal mecanismo de ação passa pela prevenção da descarga repetitiva dos potenciais de ação dependentes do sódio em neurónios despolarizados via bloqueio dos canais de sódio dependentes do uso e da voltagem Sills and Rogawski 2020 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 49 ii Farmacocinética A carbamazepina é absorvida pelo TGI de forma lenta e irregular obtendo o pico plasmático entre 6 a 24 horas após a exposição sendo possível de em caso de formas farmacêuticas de libertação prolongada a absorção ser estendida até 96 horas Djordjevic et al 2017 A carbamazepina é metabolizada no fígado pela ação da isoenzima CYP3A4 formando um metabolito que é farmacologicamente tão ativo quanto o fármaco original a carbamazepina1011epóxido O metabolito é depois convertido quase na sua totalidade num metabolito inativo trans1011diolcarbamazepina através da enzima epóxido hidrolase antes de ser excretado na urina sob a forma de um glucuronídeo biologicamente inativo Outro caminho de metabolização é a hidroxilação da carbamazepina e formação de compostos inativos Os mecanismos aqui abordados são representados na Figura 7 Djordjevic et al 2017 O tempo de semivida é variável inicialmente de 18 a 55 horas e de 5 a 26 horas com o uso prolongado Tem uma ligação a proteínas plasmáticas de 75 a 85 A eliminação do composto é maioritariamente pela via urinária cerca de 70 e 28 nas fezes Cerca de 1 a 3 é eliminado como fármaco inalterado e 1 na forma de epóxido Djordjevic et al 2017 Figura 7 Metabolização da carbamazepina retirado de Djordjevic et al 2017 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 50 iii Dose terapêuticadose tóxica Para crianças com menos de 6 anos a dose terapêutica é de 10 a 35 mgkgdia enquanto para crianças entre 6 a 12 anos é de 200 a 1000 mgdia Relativamente às concentrações séricas de fármaco estas variam entre 4 a 12 mgL Acikgoz et al 2016 Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 A dose tóxica ao qual correspondem os sintomas leves é de 12 a 20 mgL enquanto que níveis entre 20 a 30 mgL são considerados quadros moderados de intoxicação e acima de 30 mgL são considerados intoxicações com manifestações graves Acikgoz et al 2016 Tabela 12 Doseamento sérico de carbamazepina adaptado de Acikgoz et al 2016 iv Quadro clínico na intoxicação A maior parte das manifestações tóxicas pode estar relacionada com os efeitos anticolinérgicos e depressores do SNC Acikgoz et al 2016 Uma intoxicação leve a moderada é caraterizada por ataxia nistagmo oftalmoplegia distúrbios do movimento midríase e taquicardia Nas intoxicações graves pode ocorrer mioclonia choque hipertermia coma e paragem respiratória Karaman et al 2017 Como visto anteriormente a absorção do fármaco não é regular e por isso as manifestações de toxicidade podem aparecer várias horas após a exposição Karaman et al 2017 v ExamesDiagnóstico laboratorial O diagnóstico de intoxicação por carbamazepina é realizado com base na história de exposição e na sintomatologia associada Para isso deve procederse à avaliação sérica da carbamazepina e do se metabolito ativo a carbamazepina1011epóxido Como a sua Dose Terapêutica Intoxicação leve Intoxicação moderada Intoxicação grave 4 a 12 mgL 12 a 20 mgL 20 a 30 mgL 30 mgL Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 51 absorção é irregular e pode ser prolongada este doseamento deve ser repetido a cada 46 horas de modo a melhor prever a toxicidade associada Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Para avaliação da toxidade esperada devem além da avaliação sérica do composto realizarse a avaliação do grau de depressão do SNC determinação de parâmetros analíticos como glicose pH e lactato e avaliação da temperatura corporal Acikgoz et al 2016 vi Tratamento Para este fármaco não existe antídoto sendo o tratamento da intoxicação sintomático associado a medidas de descontaminação Zucoloto et al 2017 Se decorridas até duas horas após a exposição pode realizarse lavagem gástrica eou administração de carvão ativado em doses repetidas Zucoloto et al 2017 No caso de sintomatologia associada realizase tratamento de suporte As benzodiazepinas estão indicadas para reverter os sintomas anticolinérgicos e no controlo de convulsões ver Tabela 7 Nos casos mais graves pode realizarse hemodiálise pois demonstra elevada eficácia na depuração do fármaco e metabolitos Zucoloto et al 2017 Mesmo sem sintomatologia aparente os pacientes devem ser observados por um período de 6 horas após ingestão e até 12 horas no caso de formas farmacêuticas de libertação modificada Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 vii Novas abordagens terapêuticas Mochizuki et al 2016 reportaram a utilização de lavagem gástrica decorridas mais de 2 horas após a ingestão de grandes quantidades de carbamazepina e simultaneamente de sumo de uva Este sumo parece ter um efeito inibitório do citocromo P450 o que leva a um aumento da biodisponibilidade do fármaco aliado à diminuição dos movimentos Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 52 peristálticos causados pelo composto podendo resultar num aumento do período de concentrações tóxicas do composto Nesta situação os autores demonstraram que a lavagem gástrica pode ser uma técnica viável mesmo quando o tempo que decorreu desde a administração é superior a 2 horas pois ainda existe conteúdo gástrico que pode ser absorvido Mais tarde Osuntokun et al 2020 estudaram os efeitos da administração concomitante de carbamazepina e estratos de semente de uva na toxicidade hepática de ratos Esta semente é constituída por proantocianidinas que são compostos fenólicos da família dos flavonoides Esta natureza polifenólica permite uma libertação facilitada de protões exibindo assim uma substancial atividade antioxidante Obtiveram como resultados a redução significativa na concentração de MDA e de fosfatase alcalina ALP aumento das atividades de SOD e catalase e diminuição significativa da atividade de ALP Com estes resultados os autores concluíram que a utilização destes extratos de semente de uva pode servir como um potencial agente terapêutico na hepatotoxicidade induzida pela carbamazepina Já Akorede et al 2020 avaliaram a toxicidade dos parâmetros reprodutores de um outro antioxidante a vitamina C em ratos A administração concomitante de vitamina C e carbamazepina revelou uma contagem superior maior motilidade e menor anormalidade na cauda dos espermatozoides quando comparado com a administração de carbamazepina A concentração de MDA foi significativamente mais baixa no grupo com administração de vitamina C As enzimas SOD e catalase demonstraram maior atividade Perante estes resultados os autores concluíram que a administração crónica de carbamazepina pode trazer complicações a nível reprodutor em ratos podendo a vitamina C ser útil na proteção destes mesmos efeitos adversos pela sua atividade antioxidante 2 Ácido valproico O ácido valproico é uma substância conhecida pelas suas propriedades anticonvulsivas sendo eficaz em monoterapia ou terapêutica adjuvante no tratamento de crises parciais complexas ausências ou crises de tipo misto Sills and Rogawski 2020 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 53 i Farmacodinâmica O mecanismo de ação do ácido valproico ainda não esta totalmente estabelecido mas julgase que está relacionado com o aumento dos níveis do ácido gamaaminobutírico GABA resultantes da inibição da enzima GABAtransaminase O seu mecanismo pode também estar a associado à inibição dos canais de sódio e cálcio voltagemdependentes estabilizando a membrana e inibindo a condutividade responsável pelas crises epiléticas Sills and Rogawski 2020 ii Farmacocinética O ácido valproico é rápida e completamente absorvido no TGI ocorrendo o pico plasmático 3 a 4 horas após administração Apesar deste pico rápido o efeito terapêutico só é obtido ao fim de alguns dias de tratamento facto justificado pelo aumento gradual dos níveis de GABA no cérebro Atravessa a BHE e a barreira placentária A sua metabolização é exclusivamente hepática sendo a excreção maioritariamente renal na qual menos de 3 é de forma inalterada mas podendo ser hepática e pulmonar Nelson 2019 As suas reações de metabolização são glucuronidação βoxidação e em menor escala a oxidação As reações adversas mais graves que podem levar à morte estão associadas a uma disfunção mitocondrial que leva à acumulação do metabolito tóxico 4 eneácido valproico que causa dano hepático CollinsYoder and Lowell 2017 Ligase de forma extensa às proteínas plasmáticas cerca de 90 O tempo de semivida pode variar entre 6 a 16 horas consoante a monoterapia ou terapia combinada com outros antiepiléticos Nelson 2019 iii Dose terapêuticatóxica A eficácia terapêutica do ácido valproico verificase com uma concentração plasmática entre os 40 e os 100 mgL A dose diária recomendada é 30 mgkg nos lactentes e nas crianças até 3 anos 30 40 mgkg nas crianças com mais de 3 anos e 20 30 mgkg nos Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 54 adolescentes e adultos A dose terapêutica máxima pediátrica é 60 mgkgdia Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Uma intoxicação leve é considerada uma ingestão entre 200 a 400 mgkg uma intoxicação moderada acima de 400 mgkg e uma ingestão superior a 750 mgkg é potencialmente fatal Zucoloto et al 2017 Relativamente às concentrações séricas 450 mgL corresponde a uma intoxicação moderada a grave e acima de 850 mgL origina acidose metabólica e coma Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 iv Quadro clínico na intoxicação A sintomatologia associada à intoxicação é resultado da potenciação dos efeitos farmacológicos resultando em depressão do SNC e desarranjos metabólicos Mekonnen 2019 O quadro clínico de toxicidade aguda apresenta normalmente desconforto gastrointestinal sintomas neurológicos como confusão ataxia letargia desorientação e coma miose distúrbios metabólicos e ocasionalmente hipotensão com taquicardia e intervalo QT prolongado Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 As disfunções hepáticas são comuns dado a sua extensa metabolização hepática podendo haver aumento das transaminases e encefalopatia Pode ocorrer hipernatremia e hipocalcemia O metabolismo do ácido valproico pode causar hiperamonemia pois este leva à deficiente em Lcarnitina necessária para metabolizar os ácidos gordos Este metabolismo esgota também a coenzimaA CoA necessária para incorporar amónia no ciclo da ureia contribuindo assim para a hiperamonemia Mekonnen 2019 Em intoxicações muito graves com concentração sérica acima de 850 mgL manifestase coma depressão respiratória e hipotensão Nelson 2019 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 55 v ExamesDiagnóstico laboratorial O diagnóstico é realizado de intoxicação por ácido valproico é realizado com base na história de exposição e na sintomatologia associada Para esta confirmação pode ser realizado o doseamento sérico da substância ativa Este doseamento deve ter em conta a existência de preparações de libertação modificada e por isso deve ser feito de forma continua a cada 4 a 6 horas Os eletrólitos devem ser monitorizados devido ao risco de hipernatremia hipocalcemia lactato sérico elevado e hiperamonemia É importante determinar os parâmetros hepáticos e renais para avaliar a possível toxidade dos mesmos dada a sua metabolização e excreção Mekonnen 2019 vi Tratamento O ácido valproico não possui antidoto específico logo o tratamento da intoxicação inclui medidas de descontaminação e tratamento de suporte Pode ser administrado carvão ativado se o tempo entre ingestão e a hospitalização for inferior a 2 horas Mekonnen 2019 Se apresentar convulsões administrar benzodiazepina ver Tabela 7 Em casos de hipotensão recorrer a hidratação inicialmente e compostos vasoativos se necessário Zucoloto et al 2017 A Lcarnitina está indicada em situações de hiperamonemia de modo a reverter a acumulação de amónia Mekonnen 2019 Nos casos mais graves com coma administrar naloxona fármaco este com capacidade de reverter os efeitos depressores do SNC A sua administração deve ter em conta que além de reverter este efeito pode inverter os efeitos antiepiléticos do ácido valproico Zucoloto et al 2017 Os pacientes devem ser monitorizados entre 6 a 12 horas depois de não manifestarem sinais e sintomas da intoxicação dado ao tempo de semivida da substância Sociedade Brasileira de Pediatria 2018 Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 56 vii Novas abordagens terapêuticas Ghannoum et al 2015 propuseram a remoção extracorporal do tóxico sempre que se verificava uma das seguintes situações convulsões coma instabilidade hemodinâmica disfunção hepática edema cerebral ingestões de 1 gkg ou concentrações séricas superiores a 850 mgkg As complicações que podem resultar desta intervenção podem ser hipotensão trombocitopenia associada a hemoperfusão e caso a concentração sérica de acido valproico seja subterapêutica ocorrência de convulsões Em casos muito graves pode ser necessário a utilização de diuréticos ou remoção extracorporal do composto através de hemodiálise ou hemoperfusão Alhagamhmad et al 2021 Thomas et al 2020 no seu estudo utilizaram o meropenemo numa paciente com suspeita de pneumonia por aspiração e intoxicação por ácido valproico Está descrita interação medicamentosa entre os carbapenemos e o ácido valproico resultando numa diminuição do seu efeito terapêutico O mecanismo exato envolvido é desconhecido mas suspeitase de inibição enzimática Esta interação demonstrou alguma eficácia no uso de carbapenemos como um antídoto para intoxicações por ácido valproico mostrando ser uma opção viável quando é necessário tratamento concomitante para uma infeção bacteriana Esta opção permite evitar o uso de procedimentos mais invasivos como remoção extracorporal do tóxico Num estudo semelhante Khobrani et al 2018 demonstraram que a administração de meropenem num paciente com intoxicação com acido valproico resulta na redução do tempo de semivida do tóxico em cerca de 50 a 80 acelerando assim a recuperação neurológica minimizando a toxicidade associada e encurtando o tempo de internamento Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 57 VII Conclusão Os sintomas da intoxicação não são muitas das vezes específicos de um só composto o que dificulta o diagnóstico e atrasa o início do tratamento Como a deteção do composto tóxico através de técnicas de análise pode ser moroso inviabiliza a intervenção médica A história da exposição ao fármaco e a análise dos sinais e sintomas tornase por isso fundamental O tempo entre a intoxicação e a hospitalização é um fator importante pois determina o tipo de tratamento realizar Algumas medidas de descontaminação como administração de carvão ativado indução do vómito ou administração de antídoto podem não ser viáveis pouco tempo depois da intoxicação Como visto durante este trabalho a maior parte dos fármacos não possui antidoto tendo como consequência um tratamento que passa apelo alívio sintomático Apesar de para a maioria dos compostos haver um tratamento padronizado novas abordagens terapêuticas têm sido relatadas algumas delas com resultados bastante positivos É por isso necessária uma maior pesquisa nesta área de modo a disponibilizar mais alternativas aos clínicos na intervenção ao doente pediátrico intoxicado Intoxicações agudas por medicamentos de uso comum em pediatria 58 VIII Bibliografia Acikgoz M Paksu M S Guzel A et al 2016 Severe Carbamazepine Intoxication in Children Analysis of a 40Case Series Med Sci Monit 22pp 47294735 Ahmad S A Scolnik D Snehal V et al 2015 Use of naloxone for clonidine intoxication in the pediatric age group case report and review of the literature Am J Ther 221 pp e1416 Akakpo J Y Ramachandran A Kandel S E et al 2018 4Methylpyrazole protects against acetaminophen hepatotoxicity in mice and in primary human hepatocytes Hum Exp Toxicol 3712 pp 13101322 Akorede G J Ambalia S F Hudub M l G et al 2020 Protective effect of vitamin C on chronic carbamazepineinduced reproductive toxicity in male wistar rats Toxicol Rep 7pp 269276 Alhagamhmad M Elarwah A Alhassony A et al 2021 ValproateInduced Hyperammonemic Encephalopathy Following Accidental Ingestion in a Toddler J Pediatr Pharmacol Ther 262 pp 210212 Almadhoun K and Sharma S 2021 Bronchodilators StatPearls Treasure Island FL Alrashood S T 2016 Carbamazepine Profiles Drug Subst 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