11
Direito do Trabalho 2
UNIPAC
3
Direito do Trabalho 2
UNIPAC
13
Direito do Trabalho 2
UNIPAC
1
Direito do Trabalho 2
UNIPAC
Texto de pré-visualização
doi 105102rbppv8i15100 A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil The restorative justice as an instrument of peace culture a new perspective for the implementation of socioeducational measures in Brazil Charlise Paula Colet Gimenez Fabiana Marion Spengler Resumo O objetivo do presente estudo é abordar a Justiça Restaurativa como instrumento de humanização da execução das medidas socioeducativas no Brasil Para realizálo adotase o método de abordagem dedutivo Aborda se inicialmente o conflito na sociedade contemporânea a fragilidade das relações sociais e a inclusão de métodos de tratamento de conflitos cujo escopo é atender as necessidades das pessoas envolvidas no conflito Em um segundo momento discorrese acerca da Justiça Restaurativa como quebra da justiça retributiva ao propor por meio do diálogo e consenso o res peito absoluto aos direitos humanos e à dignidade da pessoa humana Na sequência a fim de consolidar o objetivo do artigo abordamse as práti cas restaurativas na execução de medidas socioeducativas A importância da proposta se verifica pela Justiça Restaurativa considerar o delito como um dano às pessoas envolvidas e às relações pessoais razão pela qual propõe que vítima e ofensor assumam a resolução do conflito no tocante à respon sabilidade à reparação do dano ao reconhecimento dos traumas causados e à restauração das relações rompidas Inseremse nesse contexto as medidas socioeducativas as quais são orientadas pela Doutrina da Proteção Integral garantindose ao adolescente o seu desenvolvimento físico mental moral espiritual e social em condições de liberdade e de dignidade o que é possibi litado pela Justiça Restaurativa cumprindose desse modo o fim do Direito Penal qual seja a convivência pacífica entre os seres humanos Palavraschave Justiça Restaurativa Cultura de Paz Medida Socioeducati va Doutrina da Proteção Integral AbstRAct The objective of this study is to approach the Restorative Justice as an instrument to humanize the implementation of socioeducational measures in Brazil To achieve this it is adopted the deductive method of approa Recebido em 22022018 Aprovado em 19032018 Doutora e Mestre em Direito em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul Espe cialista em Direito Penal e Processo Penal pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul Unijuí Professora dos Cursos de Doutorado Mestrado e Graduação em Direito da URI Santo Ângelo Coordena dora do Curso de Graduação em Direito da mesma instituição Líder do Grupo Conflito Direitos Humanos e Cidadania vinculado ao CNPQ Email charlisegsantoangelouribr Pósdoutora em Direito pela Università degli Studi di Roma Tre em Roma na Itália com bolsa CNPq PDE Doutora em Direito pelo programa de PósGraduação stricto sensu da Universidade do Vale do Rio dos Sinos UNISINOS RS com bolsa Capes mestre em Desenvolvimento Regional com concentração na área Político Institucional da Universidade de Santa Cruz do Sul UNISC RS docente dos cursos de Graduação e Pós Graduação lato e stricto sensu da UNISC Coordenadora do Grupo de Pesquisa Políticas Públicas no Tratamento dos Conflitos vinculado ao CNPq coordenadora e mediadora do projeto de extensão A crise da jurisdição e a cultura da paz a mediação como meio democrático autônomo e consensuado de tratar conflitos financiado pela Universidade de Santa Cruz do Sul UNISC autora de diversos livros e artigos científicos Email fabianauniscbr GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 245 ch Initially it is studied the conflict in the contemporary society the fragility of social relations and the inclusion of conflictmanagement methods which aim to satisfy the needs of the people involved in the conflict In a second moment it is analyzed the Restorative Justice as a breakdown of retributive justice by proposing through dialogue and consensus absolute respect for human rights and the dignity of the human person Following in order to consolidate the objective of the article it is verified the restorative practices in the execution of socioeducational measures The importance of the proposal is verified in the fact that Restorative Justice considers the crime as an injury to the people involved in the conflict and personal rela tionships which is why it proposes that victim and offender should resolve the conflict through responsi bility reparation of damage recognition of trauma caused and the restoration of broken relations In this context socioeducational measures are guided which are based on the Doctrine of Integral Protection guaranteeing the adolescent his physical mental moral spiritual and social development in conditions of freedom and dignity which is possible by the Restorative Justice thus fulfilling the objective of Criminal Law that is peaceful coexistence among human beings Keywords Restorative Justice Peace Culture Socioeducational Measure Doctrine of Integral Protection 1 Aspectos intRodutóRios Como alternativa à demonização incutida nos ideais do senso comum punitivo em que aquele que não presta uma segurança cognitiva suficiente de um comportamento pessoal não deve e não pode ser tratado como pessoa pois caso receba tal tratamento tornaria vulnerável a segurança das demais pessoas os cidadãos1 Nesse sentido inserese a mediação penal ou justiça de proximidade na França justiça comuni tária em Quebeque restorative justice nos países anglosaxônicos Diritto fraterno na Itália como propostas de alteridade e humanidade para os seres humanos A ideia central é comum a todos os modelos atribuise aos principais interessadosenvolvidos vítima ofensor família de ambos e comunidades de apoio os recursos internos para reagir à infração2 Nessa ótica a Justiça Restaurativa assume relevância na condição de matriz teórica a partir da qual é pos sível um novo modelo de justiça bem como de uma filosofia e de uma cultura cada um é capaz de captar a mesma imagem sob ângulos e perspectivas diferentes e produzir resultados completamente diferentes opondose ao etiquetamento social visto que a seletividade somente reproduz o senso comum majoritário punindose as condutas desviantes sob uma perspectiva apenas a dominante Portanto há a necessidade de mudança de paradigmas a partir da construção de uma Justiça Restaurativa fundada no diálogo e consenso pois se verifica o atual sistema penal punitivo como propagador das dimen sões da seletividade social Assim não devem ser os mecanismos restaurativos interpretados como novos métodos de tratamento de conflitos ao contrário consistem em um novo paradigma de justiça penal que muda o foco do pensar e agir com relação ao crime em si A adoção das práticas restaurativas para a execução das medidas socioeducativas atende ao artigo 3o do Estatuto da Criança e do Adolescente Lei nº 906990 pois permite que todo adolescente goze de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana sendolhe asseguradas todas as oportunidades e faci lidades a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico mental moral espiritual e social em condições de liberdade e de dignidade Assim a partir da importância do tema o presente artigo tem por objetivo abordar a Justiça Restaurati va como instrumento de humanização da execução de medidas socioeducativas no Brasil a qual encontra 1 JACKOBS Günter MELIÁ Manuel Cancio Direito penal do inimigo noções e críticas Porto Alegre 2007 2 GARAPON Antoine Punir em democracia Lisboa Instituto Piaget 2001 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 246 guarida na legislação pátria bem como cumpre com o fundamento do Estado Democrático de Direito qual seja a dignidade da pessoa humana A Justiça Restaurativa por estar fundamentada na cultura de paz e na comunicação não violenta atende à Doutrina da Proteção Integral e apresentase como instrumento ao Estado Sociedade e Família para a garantia do desenvolvimento pleno dos adolescentes em conflito com a lei 2 A tRAnsfoRmAção dA ReAlidAde sociAl pelA Adoção de métodos de tRAtAmento de conflitos A sociedade moderna se apresenta complexa pela diversificação do aparelho produtivo em três setores monopólio concorrencial e estatal pela segmentação do mercado de trabalho bem como pela multipli cação de necessidades e comportamentos dos indivíduos3 Dessa forma entendese necessária a sua análise para compreenderse a evolução do Direito e por conseguinte do homem visto que se caracteriza pela frag mentação do tecido social cujo resultado é o aumento dos conflitos sociais nesses grupos A existência da sociedade pressupõe a existência do homem e por conseguinte do direito para regulamentar a convivência daqueles a partir da legitimidade do Estado No entanto a sociedade atual revelase muito mais como um espaço no qual os homens tendem a avan çar sobre os outros em uma luta desigual pela sobrevivência razão pela qual a justiça penal atua para garan tir uma coexistência pacífica entre aqueles que vivem em uma sociedade tendo como escopo o controle da vingança privada e racionalizar a resposta aos fatos considerados criminosos Nesse rumo compreendese que ao mesmo tempo em que a justiça penal se caracteriza como o último estágio para onde são remetidas as situaçõeslimites aquelas consideradas problemáticas à convivência so cial é nesse mesmo espaço em que são cometidas as mais sérias supressões de garantias individuais e direitos civis4 Destarte visualizase um Direito Penal moderno guiado por códigos corrompidos e por metas além de seus limites operativos buscando perpetuar sentimentos vingativos e rotuladores entre aqueles que vivem em uma mesma sociedade disseminando assim um direito penal diferenciado para alguns os inimigos Abandonouse portanto a utilização dos mecanismos penais quando absolutamente necessários isto é quando os demais meios não se apresentassem eficazes O Direito Penal moderno protege os bens jurídicos ao extremo trazendo para a sua tutela interesses que nela não encontram solução adequada Assim torna se medida prima ratio adotando conceitos desestruturadores e anômalos reproduzindo um Direito Penal simbólico ao mesmo tempo em que punitivistarepressivista O Direito Penal se torna igualmente um novo meio de a sociedade moderna exorcizar as suas dificul dades Ou seja mais do que os seus resultados concretos entre os quais a detenção de determinados indi víduos o crescimento da população prisional ou a entrada em cena de novos atores a penalização indica o palco pelo qual as sociedades olham para si mesmas Por isso afirmase que sendo o direito a nova formali zação da coexistência humana o direito penal será a sua última encenação5 Diante da expansão do Direito Penal verificase a sua atuação abrangida por novas demandas e interesses penais produzindo incessantemente legislações infraconstitucionais pautadas pelo objetivo de criminalizar 3 BOBBIO Norberto MATTEUCI Nicola PASQUINO Gianfranco Dicionário de política Trad de Carmen C Varriale et al 4 ed Brasília UnB 1992 4 SICA Leonardo Justiça restaurativa e mediação penal Rio de Janeiro Lúmen Júris 2007a 5 GARAPON Antoine Bem julgar ensaio sobre o ritual do judiciário Trad de Pedro Filipe Henriques Lisboa Instituto Piaget 1997 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 247 e prevenir a criminalidade Assim os riscos modernos aliados ao crescente avanço econômico e tecnológico geram uma reação irracional por parte daqueles que se sentem atingidos razão pela qual mantêm discursos de uma maior tutela da segurança pública em detrimento de interesses individuais e garantias mínimas de dignidade do ser humano Nesse cenário qualquer ação inconsciente ou não pode dar ensejo a uma ação judicial Abrese o jornal e lêse sobre uma bomba que mata dezenas de pessoas inocentes ligase a televisão e o noticiário informa que uma bala perdida atingiu uma criança enquanto estava na escola conectase à internet e surgem notícias de atos bárbaros cometidos por funcionários contra patrões ligase o rádio e ouvese que pais disputam acirradamente a guarda dos seus filhos Estas e outras situações diárias com que se depara espelham várias formas de conflitos social político psicanalítico familiar interno externo entre pessoas ou nações étnico religioso ou de valores e princípios morais6 O conflito rompe com a resistência do outro consiste em confrontar duas vontades quando o desejo é de uma dominar a outra impondolhe a sua solução Por isso afirmase que o conflito é uma forma de ter razão in dependentemente dos argumentos racionais no qual as partes se tratam como adversários e inimigos Exemplo dessa cultura de conflito e beligerância ocorre nos Estados Unidos quando qualquer ato dá motivo para litigar O litígio judicial pode se tornar uma etapa previsível no ciclo de vida dos americanos Agora que os filhos processam seus pais e cônjuges ainda não divorciados processamse mutuamente as possibilidades são ilimitadas Membros de paróquias já processaram seus pastores e apropriadamente procuradores processaram juízes Não faz muito tempo que um grupo de pais processou um juiz de futebol por um erro cometido em um jogo entre escolas de segundo grau7 Assim verificase que no século XX a justiça é vendida por um determinado preço E assim um cartunista bem coloca a situação um advogado tranquiliza seu cliente que está ansioso sobre os méritos de seu caso mas pergunta quanta justiça o senhor pode pagar8 Ademais percebese que esforços para simplificar procedimentos e facilitar a indenização por danos causados fazem advogados batalhar por seus honorários Nesse rumo referese que o litígio judicial é somente uma opção entre um leque de alternativas viáveis para tratar conflitos Entretanto devese salientar que as sanções culturalmente aceitas por uma sociedade expressam os ideais das pessoas que as defendem suas percepções sobre si mesmas e a qualidade de seus relacionamentos Ou seja indicam se as pessoas estão predispostas a evitar ou encorajar o conflito reprimi lo ou tratálo de forma pacífica As sociedades modernas ainda encontramse envoltas de uma fumaça jurídica como os antepassados encontravamse apegados à religião medieval direito é nossa religião nacional os advogados formam nos so clero e o tribunal é nossa catedral onde as paixões contemporâneas são encenadas9 Dessa forma percebese a existência de um Direito com elevado grau de institucionalização da função jurídica a qual se mostra especializada autônoma burocrática e sistematizada orientada para atividades ri gidamente definidas e hierarquizadas Assim a crescente demanda dá espaço à padronização e impessoaliza ção dos procedimentos marcados pela morosidade e ineficácia da aplicação da lei em determinados litígios apenas exalando segurança jurídica aparente 6 SPENGLER Fabiana Marion O estadojurisdição em crise e a instituição do consenso por uma outra cultura no tratamento de conflitos 2007 453 f Tese Doutorado Programa de PósGraduação em Direito Universidade do Vale do Rio Sinos UNISINOS São Leopoldo 2007 7 AUERBACH Jerold S Justiça sem direito In AZEVEDO André Gomma de Org Estudos em arbitragem mediação e negociação Brasília Grupos de Pesquisa 2004 v 3 p 54 8 AUERBACH Jerold S Justiça sem direito In AZEVEDO André Gomma de Org Estudos em arbitragem mediação e negociação Brasília Grupos de Pesquisa 2004 v 3 p 49 9 AUERBACH Jerold S Justiça sem direito In AZEVEDO André Gomma de Org Estudos em arbitragem mediação e negociação Brasília Grupos de Pesquisa 2004 v 3 p 48 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 248 À medida que o Estado e o grande número de legislação esparsa perdem espaço diante de sua ineficiên cia inaplicabilidade e lentidão o direito não oficial tornase mais visível como alternativa no tratamento de conflitos Por isso o novo espaço oportuniza um estado de exceção personalizado10 o qual se direciona às categorias sociais mais pobres vindo estas a abrir mão do uso da força para submeterse ao tratamento do conflito O Estado por sua vez oferece um instrumento de coerção revelado como o conjunto dos meios de violência que podem ser legitimamente accionados para impor e fazer cumprir as determinações jurídicas obriga tórias11 Esses instrumentos podem ser mais ou menos poderosos quer pelo tipo de ações violen tasque podem gerar quer pelo tipo de condicionalismos a que tal acionamento está sujeito ou ainda quer pelo efeito de neutralização que resulta das ações paralelas ou opostas a outros instrumentos de coerção existentes no mesmo espaço sóciojurídico12 Por isso referese que o Estado atual tem o monopólio da violência legítima servindo a seu favor No entanto a força estatal não mais se consolida diante da dificuldade que encontra em produzir a ordem pois antes tal tarefa lhe é atribuída justamente porque para seu desempenho se faz necessário um aparelho burocrático hierárquico capaz de reunir e concentrar esforços13 Ademais é notório o crescente número de direitos inoficiais que surgem diante da falta de atenção do Estado para com os direitos funda mentais de cada um adquirindo legitimidade a partir de sua ação libertadora a qual edifica uma nova cultura societária cujos direitos insurgentes são a expressão mais autêntica da satisfação das carências e das neces sidades humanas fundamentais14 Nessa ótica importa destacar que não são poucas vezes nas quais vige a lei do mais forte em que se usa da violência moral e física para fazer valer seu código e suas regras sendo exemplos o crime organizado narcotráfico terrrorismo corrupção e criminalidade econômica Na análise da realidade brasileira podese concluir que o direito marginal é a normatividade autoproduzida em guetos quartomundializados como a hoje vigente nos morros do Rio de Janeiro e nas gigantescas favelas de São Paulo 15 Em adição verificase que a crise de legitimidade do Estado derivada da fragmentação e diversificação dos interesses sociais possibilita a visualização de dois cenários múltiplas identidades que recorrem ao Es tado para ver suas reinvidicações atendidas enquanto as demais demandas e necessidades legitimam formas alternativas de atender as exigências diante da incapacidade estatal Por isso o Estado descentraliza seus poderes para instituições políticas locais e regionais possibilitando que as identidades das minorais consigam ser manifestadas com maior desenvoltura em níveis locais e regio nais contrariando a tendência de concentração dos governos nacionais da riqueza e do poder atendendo apenas interesses em seus próprios benefícios Portanto ao permitirse uma maior participação no poder permitese que escalões inferiores do governo assumam a responsabilidade pelas relações com a sociedade tratando das questões do dia a dia com o objetivo de reconstruir sua legitimidade por meio da descentrali zação do poder16 10 CAPELLA Juan Ramón Fruto proibido uma aproximação históricoteórica ao estudo do direito e do Estado Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p 277 11 SANTOS Boaventura de Sousa O discurso e o poder ensaios sobre a sociologia da retórica jurídica Porto Alegre S A Fabris 1988 p 53 12 SANTOS Boaventura de Sousa O discurso e o poder ensaios sobre a sociologia da retórica jurídica Porto Alegre S A Fabris 1988 p 53 13 SPENGLER Fabiana Marion O estadojurisdição em crise e a instituição do consenso por uma outra cultura no tratamento de con flitos 2007 453 f Tese Doutorado Programa de PósGraduação em Direito Universidade do Vale do Rio Sinos UNISINOS São Leopoldo 2007 14 WOLKMER Antônio Carlos Pluralismo jurídico fundamentos de uma nova cultura no direito 3 ed São Paulo Alfa Omega 2001 p 323 15 FARIA José Eduardo KUNTZ Rolf Estado sociedade e direito qual o futuro dos direitos Estado mercado e justiça na reestru turação capitalista São Paulo Max Limonada 2002 p 71120 16 CASTELLS Manuel O poder da identidade a era da informação economia sociedade e cultura Trad de Klauss Brandini Ger GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 249 Nessa ótica percebese que a abertura de espaços fomenta o surgimento de entidades focadas na satis fação do cidadão diante da ineficiência do Estado Dessa forma o Estado ao ceder espaço torna legítima a ação dessas entidades oriundas de forças sociais as quais assumem o controle estatal a fim de tornálo sua expressão exclusiva A ineficiência estatal também pode ser verificada quando os cidadãos buscam formas alternativas de tratamento de conflitos visto que o Estado revela uma demora excessiva para tratar os conflitos ou para entregar a prestação jurisdicional demandada pelo seu cidadão Conforme manifestado anteriormente a crescente demanda de exigências por parte dos cidadãos as quais se pautam na Constituição Federal de 1988 ampliaram o rol de direitos fundamentais e garantias geraram expectativas de efetivação e satisfação das necessidades e diante da ineficiência estatal estas direcionaramse ao Judiciário porém depararamse com um sistema incapaz de responder com efetividade a cada exigência inserida em um litígio judicial Nesse rumo compreendese que a busca por meios alternativos de tratamento de conflitos surgiu com base na disparidade entre o discurso jurídico e os interesses econômicos crescente produção legislativa muitas vezes baseada no clientelismo político e ineficácia de políticas públicas de efetivação dos direitos fundamentais assegurados pela Carta Magna Diante do não cumprimento dos referidos direitos observa se processos de angústia revolta descrédito e insegurança nos cidadãos para com o Judiciário e entre os mesmos Dessa forma em vez de satisfazer as relações conflituosas incendiouse a disputa e o desejo pela vitória em face da derrota do outro Destarte verificase que meios alternativos de tratamento de conflitos permitem que as partes transfor mam o modo de perceber o conflito e desenvolvam formas autônomas para lidar com as tensões inerentes ao seu relacionamento sem que para isso seja necessário buscar uma resposta do Judiciário o que poderia trazer consequências muito mais danosas à relação humana Compreendese portanto que a diminuição da presença estatal em determinados espaços sociais permi te maior organização e aplicação de regras criadas pelo cidadão como alternativas para tratar conflitos uma vez que é preciso reduzir o exercício do poder do sistema penal para substituílo por formas alternativas que visam o tratamento do conflito17 Assim a elaboração de um novo paradigma de justiça criminal como alternativa à prisão e à pena pos sibilita a o garantismo positivo b a redução da violência punitiva c a neutralização das funções reais do cárcere d a não expansão da rede de controle social penal Devese ainda compreender que a justiça penal requer mínima força e sempre que possível abdica do uso da violência legal reconhecendo que o conflito o desvio às regras de convivência constituem elementos impossíveis de serem eliminados os quais devem ser geridos dentro de um projeto humanista que condiza com o estágio cultural e tecnológico da atual so ciedade Afirmase que a justiça penal deve priorizar mecanismos de intervenção que tenham por objetivo o fortalecimento dos valores de convívio comunitário e que considerem o caráter relacional do conflito resul tando em um sistema que ofereça modelos de comportamento agregadores do consenso ao redor das regras do ordenamento É possível atribuir às decisões penais um papel positivo de solucionar os conflitos sem ter que necessariamente recorrer à punição aflitiva18 Portanto trazse ao presente estudo a Justiça Restaurativa como proposta para promover entre os ver dadeiros protagonistas do conflito traduzido em um fato típico iniciativas de solidariedade diálogo e pro gramas de reconciliação Essa alternativa viabiliza o tratamento do conflito de forma coletiva para lidar com suas consequências e implicações futuras pois envolve a vítima o réu a comunidade na busca de soluções hardt 3 ed São Paulo Paz e Terra 1999 v 2 p 317 17 ZAFFARONI Eugenio Raul Em busca das penas perdidas Rio de Janeiro Renavan 2001 18 SICA Leonardo Justiça restaurativa e mediação penal Rio de Janeiro Lúmen Júris 2007a p 6 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 250 para o conflito com o objetivo de promover a reparação a reconciliação e o reforço do sentimento de segurança19 Observase que a Justiça Restaurativa no Estado Democrática de Direito se revela em algo mais intelegível e mais humano que o Direito Penal atual 3 o empodeRAmento do seR humAno A pARtiR dA JustiçA RestAuRAtivA A justiça penal conforme já referido anteriormente mostrase ineficiente seletiva custosa e agrava os pro blemas que deveria resolver No entanto ainda é resistente a ideia de movimentos de reforma mais profundas absorvendo até o presente momento pequenas modificações A preocupação reside na necessidade de constru ção de um discurso que constate as mazelas do atual sistema punitivoretributivo o qual se direciona exclusiva mente ao acusado coloca à margem a vítima e sua comunidade e propõe práticas comunitárias de tratamento de conflitos em que há a redescoberta da vítima e o restabelecimento do equilíbrio rompido entre as partes20 Nessa senda a Justiça Restaurativa encoraja a vítima e seu ofensor a assumir papeis mais ativos ao tratar o conflito mediante discussão e negociação reservandose aos agentes públicos o papel de facilitadores os quais utilizam a linguagem que os coloca no mesmo nível de poder das partes Ademais intensifica a participação da comunidade cujo papel é ser destinatária de políticas de reparação e reforço do sentimento de segurança coletivo bem como ser ator social de uma cultura de paz baseada em ações reparadoras concretas das consequências de um crime Por isso afirmase que o modelo em estudo destaca a necessidade de um empowerment21 como base fundamental da nova subjetividade atribuída aos indivíduos um papel ativo um papel de redefinição dos problemas de reafirmação da própria esfera de autonomia e poder seja em termos culturais políticos psicológicos22 Todo ser humano requer um grau de autodeterminação e autonomia em suas vidas O crime rouba este poder das vítimas já que outra pessoa exerceu controle sobre elas sem seu consentimento A Justiça Restaurativa devolve os poderes a estas vítimas dandolhes um papel ativo para determinar quais são as suas necessidades e como estas devem ser satisfeitas Isso também dá poder aos infratores de responsabilizarse por suas ofensas fazer o possível para remediar o dano que causaram e iniciar um processo de reabilitação e reintegração 23 Destarte afirmase que as práticas restaurativas representam uma mudança de linguagem e orientação ao passo em que criam a oportunidade de revigorar o debate sobre as causas do crime e não respondem às demandas por severidade e punição Por isso oportunizase a inclusão das vítimas e uma abordagem deter minada sob um novo olhar dos fatos sociais um olhar mais direcionado aos sujeitos da relação em conflito e à satisfação de suas necessidades e sentimentos Nessa senda verificase que os mecanismos restaurativos se caracterizam como um processo colabora tivo que envolve as pessoas diretamente afetadas mais diretamente por um crime as quais são chamadas de partes interessadas principais e auxiliam na melhor forma de reparação do dano causado pela transgres são No entanto questionamse quem são as principais partes interessadas na Justiça Restaurativa e de que forma devem se comprometer em relação à realização da justiça Por isso importa elucidar a teoria proposta por McCold e Watchel cuja composição se dá por três estruturas as quais embora sejam relacionadas são distintas conceitualmente24 19 SICA Leonardo Justiça restaurativa e mediação penal Rio de Janeiro Lúmen Júris 2007a p 13 20 SICA Leonardo Justiça restaurativa e mediação penal Rio de Janeiro Lúmen Júris 2007a 21 O termo referese ao empoderamento 22 SICA Leonardo Justiça restaurativa e mediação penal Rio de Janeiro Lúmen Júris 2007a p 19 23 MARSHAL BOYACK BOWEN 2005 apud SICA Leonardo Justiça restaurativa e mediação penal Rio de Janeiro Lúmen Júris 2007a p 273 24 MCCOLD Paul WACHTEL Ted Em busca de um paradigma uma teoria de justiça restaurativa In CONGRESSO MUNDI AL DE CRIMINOLOGIA 13 2003 Rio de Janeiro Disponível em httpwwwrealjusticeorglibraryparadigmporthtml GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 251 A Janela de Disciplina Social contrapõese à prática retributiva Esta tenciona a rotular as pessoas de forma negativa ou ainda a proteger as pessoas das consequências de suas ações erradas revelando o escopo da Justiça Restaurativa no tocante à resolução de problemas com base na desaprovação das transgressões ao mesmo tempo em que valoriza o interior do indivíduo transgressor Assim permite que aquele que foi prejudicado tenha a oportunidade de expressar seus sentimentos de forma a descrever como foi afetado e a desenvolver uma forma de reparação do dano que venha a evitar a sua reincidência Em complemento devido ao perfil de reintegração supre as necessidades emocionais e materiais das vítimas enquanto faz com que o ofensor assuma as consequências de seus atos para que com a reparação dos danos não seja mais visto como tal Afirmam os autores em estudo que a estrutura em comento determina quatro abordagens à regulamen tação do comportamento punitiva permissiva negligente e restaurativa elucidando quatro palavras que as resu mem NADA PELO AO e COM conforme se depreende da imagem abaixo Figura 1 Fonte MCCOLD WATCHEL 2003 Se negligente NADA faz em resposta a uma transgressão Se permissiva tudo faz PELO por o transgressor pedindo pouco em troca e criando desculpas para as transgressões Se punitiva as respostas são reações AO transgressor punindo e reprovando mas permitindo pouco envolvimento ponderado e ativo do mesmo Se restaurativa o transgressor encontrase envolvido COM o transgressor e outras pessoas prejudicadas encorajando um envolvimento consciente e ativo do transgressor convidando outros lesados pela transgressão a participarem diretamente do processo de reparação e prestação de contas O engajamento cooperativo é elemento essencial da justiça restaurativa25 A seu turno a segunda estrutura denominada de Papel das Partes Interessadas enfatiza a relação entre o dano causado pela prática transgressora com as necessidades específicas de cada parte interessada na solu ção desta e respostas restaurativas necessárias ao seu atendimento possibilitando dessa forma a distinção entre partes interessadas principais maiores afetados dos indiretamente interessados Verificamse nesse contexto as principais partes como sendo vítima e transgressor bem como aqueles que têm relação significativa com estes são considerados diretamente afetados ao passo que constituem a comunidade de apoio e assistência à vítima e ao transgressor Por outro lado as demais pessoas integrantes Acesso em 10 out 2007 25 MCCOLD Paul WACHTEL Ted Em busca de um paradigma uma teoria de justiça restaurativa In CONGRESSO MUNDI AL DE CRIMINOLOGIA 13 2003 Rio de Janeiro Disponível em httpwwwrealjusticeorglibraryparadigmporthtml Acesso em 10 out 2007 p 2 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 252 da sociedade representantes do Estado e organizações religiosas educacionais sociais sofrem um dano indireto e impessoal esperandose que estes venham a apoiar os processos restaurativos razões pelas quais se enquadram como indiretamente afetados conforme ilustração abaixo Ademais constatase que as vítimas são prejudicadas diante da falta de controle que evidenciam com a transgressão razão pela qual precisam readquirir seu sentimento de poder pessoal o que se dá a partir da transformação de vítima em sobrevivente Já o ofensor prejudica seu relacionamento com suas comunidades de assistência no momento em que trai a confiança destas somente vislumbrando o restabelecimento da confiança perdida ao assumir a responsabilidade por suas más ações As comunidades de assistência têm suas necessidades preenchidas com a garantia da responsabilização do ofensor e da sua reintegração e da vítima às suas comunidades As partes secundárias não são direta mente ligadas à vítima e ao ofensor motivo pelo qual não devem tomar para si o conflito e interferir na oportunidade de reconciliação e reparação A sua resposta deve residir no apoio e facilitação dos processos de restauração os quais reintegrarão vítima e ofensor fortalecendo a comunidade aumentando a coesão e ampliando a capacidade dos cidadãos de tratar seus próprios conflitos como forma de garantia de seus direitos fundamentais26 Como último elemento estrutural encontrase a Tipologia das Práticas Restaurativas a qual consiste em chamar todas as partes interessadas sejam diretas ou indiretas para a partir de um processo de conciliação vislumbrar uma solução efetiva ao conflito de modo a suprir as necessidades emocionais de cada um Dessa forma a plena realização do conceito de Justiça Restaurativa somente será verificada com a participação ativa de todos os grupos envolvidos como em conferências ou círculos consoante demonstra a ilustração abaixo Figura 2 Tipos e graus de práticas de justiça restaurativa Fonte MCCOLD WATCHEL 2003 Para compreenderse a forma como atua a Justiça Restaurativa e como visualiza a conduta do ofensor o papel da vítima bem como das partes de apoio importa refletir acerca da prática de um crime e suas conse quências às partes envolvidas no conflito relacionando tais dados à teoria supracitada Consoante manifesta Zehr a prática de um crime e a sua experiência não são tarefas fáceis de serem compreendidas bem como enfrentar o significado de ser uma vítima ou fazer alguém de vítima desencadeia emoções intensas as quais 26 MCCOLD Paul WACHTEL Ted Em busca de um paradigma uma teoria de justiça restaurativa In CONGRESSO MUNDI AL DE CRIMINOLOGIA 13 2003 Rio de Janeiro Disponível em httpwwwrealjusticeorglibraryparadigmporthtml Acesso em 10 out 2007 p 2 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 253 assustam e fazem recuar27 No entanto é preciso compreender o que se faz e por que se faz razão pela qual esse processo será iniciado no presente estudo O modelo restaurativo integra o mediador a vítima o agressor a família deste amigos vizinhos colegas de escola ou de trabalho membros de agremiações desportivas e de congregações religiosas bem como profissionais de área representantes de comunidade ou seja pessoas ou entidades que tenham sido afetadas pela prática do crime e que tenham como desejo a restauração dos valores de segurança justiça solidarismo responsabilidade comunitarismo e civismo28 O caso em estudo tratase de um assalto à mão armada praticado por Anderson um adolescente o qual vitimou uma idosa Na ocasião o adolescente infrator necessitando de dinheiro deparouse com a senhora idosa aproximouse dela e mostroulhe a arma arrancandolhe a bolsa e empregando fuga posteriormente Após o fato delituoso a vítima não saiu mais de casa ficou sem dinheiro por um bom tempo e permanecia com medo de sair à rua receando que outra pessoa igual ao adolescente fosse atacála novamente para agredila e roubála Diante do acontecido submeteramse ao procedimento da câmara restaurativa o ofen sor e a vítima sendo igualmente convidados a participar um professor do adolescente sua irmã e seu tio além de uma filha da vítima Importa salientar que as câmaras restaurativas se caracterizam por reunir pessoas afetadas por uma conduta que causou um grave dano físico psicológico moral objetivando encontrar meios de reparar os prejuízos e evitar a repetição da conduta negativa Nessa oportunidade além da vítima e do infrator partici pam seus respectivos apoios e as autoridades que investigam o fato sendo os trabalhos conduzidos por um mediador devidamente treinado29 A importância do procedimento adotado não reside no escopo de negação da natureza trágica do ocor rido mas em desmistificálo com base no desembaraçamento dos meandros dessa vivência enxergandoa como uma tragédia humana que envolve duas pessoas pessoas que em muitos aspectos se assemelham bastante a nós mesmos30 Ao oportunizar a participação da vítima no processo mostrandolhe um rosto e não apenas uma figura abstrata que deu ensejo ao procedimento criminal dáse a oportunidade de diálogo em um foro seguro para dizer como foram afetadas pois somente elas podem dizer sobre a melhor maneira de reparar o dano sofrido e minimizar consequências futuras31 A vítima ao ser atacada inicialmente vive um processo de choque e negação ao não compreender a razão daquele fato danoso estar acontecendo consigo Algumas vítimas ficam paralisadas incapazes de agir enquanto outras reagem gritam na esperança de serem socorridas e acordadas do pesadelo em que se encontram Por isso são tomadas por sentimentos de confusão impotência pavor e vulnerabilidade Tais emoções e sentimentos acompanham a vítima por algumas semanas posteriores porém surgem a raiva a culpa a suspeita a depressão a ausência de sentido as dúvidas e o arrependimento No caso de uma vítima de roubo perpetrado por um adolescente portando uma faca em que como consequência do ato delitivo teve a perda de seu olho ela lutou constantemente contra os sentimentos 27 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 28 FERREIRA Francisco Amado Justiça restaurativa natureza finalidades e instrumentos Coimbra Coimbra 2006 29 BRANCHER Leoberto Narciso Justiça responsabilidade e coesão social reflexões sobre a implementação na justiça da infân cia e da juventude em Porto Alegre In SLAKMON C MACHADO M BOTTINI P Org Novas direções na governança da justiça e da segurança Brasília Ministério da Justiça 2006 30 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 p 18 31 BRANCHER Leoberto Narciso Justiça responsabilidade e coesão social reflexões sobre a implementação na justiça da infância e da juventude em Porto Alegre In SLAKMON C MACHADO M BOTTINI P Org Novas direções na governança da justiça e da segurança Brasília Ministério da Justiça 2006 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 254 de vergonha e culpa repetidamente se perguntava a razão daquilo ter acontecido com ela o modo da sua reação e se poderia ter agido de outra forma concluindo que o fato decorreu de algum modo de culpa sua Ela sempre lutará com o medo e com a sensação de vulnerabilidade e impotência Alguém assumiu o controle deixandoa impotente e vulnerável e será difícil reconquistar a confiança de sentirse segura e no controle da situação Juto com essa luta interior ela estará tentando recobrar a confiança nos outros no mundo Ela e seu mundo foram violados por alguém e a sensação de estar à vontade com as pessoas com sua casa sua vizinhança e com seu mundo será difícil de resgatar32 A experiência de ser vítima de um crime pode ser muito forte e refletir em todas as áreas da vida Como no caso da senhora que teve sua bolsa subtraída ela não conseguiu mais ficar em casa sozinha ou sair na rua por estar sempre acompanhada pelo medo e pelas lembranças dolorosas sofridas que a levam a pensar no vamente no ocorrido Para as vítimas de crimes os efeitos colaterais são muitas vezes bastante traumáticos e de longo alcance33 Nessa ótica a ideia do procedimento restaurativo realiza a restauração da paz pública e da normalização das relações sociais e recuperação do status quo econômico da vítima quando possível passando para a sua reabilitação psicoativa Salientase igualmente que a reparação em tela não somente referese à indenização por danos físicos materiais psicológicos e sociais da vítima como também possui uma dimensão emocional e simbólica plena de significado e esperança podendo caracterizarse por um pedido de desculpas até por gestos simbólicos de aperto de mão ou abraço entre ofensor e vítima34 O crime tornase traumático por consistir em uma violação do ser uma dessacralização daquilo que é o indivíduo daquilo que acredita e do seu espaço privado Assim o crime revelase como aniquilador porque destrói ou fragiliza dois pressupostos fundamentais sobre os quais a vida é calcada a crença de que o mun do é um lugar ordenado e dotado de significado e a crença na autonomia pessoal Esses dois pressupostos são essenciais para a inteireza do nosso ser35 Por isso compreendese que se o indivíduo conseguir responder aos questionamentos a respeito do por quê e como o fato ocorreu o mundo pode voltar a ser seguro novamente Então as vítimas precisam deixar de ser vítimas e consideraremse sobreviventes progredindo até o ponto onde a agressão e aquele que a fez não mais tenham domínio sobre ela Entretanto além de indenização e respostas as vítimas requerem a oportunidade de expressar e validar suas emoções sua raiva seu medo e sua dor O sofrimento e a dor referemse à violação razão pela qual precisam ser ventilados e ouvidos Ademais elas necessitam de um espaço que seja capaz de ouvilas e não calar a sua história e o seu sofrimento como ocorre no atual sistema judiciário Nesse sentido verificase que o empoderamento restitui a autonomia e o controle sobre seu ambiente isto é revelase como fechaduras novas para as portas ou como uma oportunidade de produzir um novo olhar do sentido de sua vida A seu turno o ofensor ilustrado no presente estudo pelo adolescente Anderson que praticou o roubo sob a justificativa se estar sem dinheiro Na experiência da câmara restaurativa seu tio mostrouse indignado seu professor decepcionado e sua irmã calouse diante do descaso e deboche que o adolescente mostrava No entanto ao relatar os detalhes da vida de ambos na casa dos pais Anderson começou a chorar disse estar arrependido e que sentia muito o que fez à mulher Manifestou o desejo de restituir o valor subtraído porém não possuía meios mas afirmou veemente que não perseguiria sua vítima quando fosse liberado insistindo que não tivesse mais medo 32 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 p 21 33 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 p 23 34 FERREIRA Francisco Amado Justiça restaurativa natureza finalidades e instrumentos Coimbra Coimbra 2006 35 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 p 24 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 255 Nessa oportunidade a senhora idosa após envolverse com o relato e chorar mostrouse mais confiante em voltar para casa e sair à rua confirmando o desejo de receber seu dinheiro de volta mas priorizou um emprego e um lugar decente para o adolescente morar Ao final da reunião Anderson e a vítima abraçaram se ela desejoulhe boa sorte enquanto ele desculpouse novamente A experiência acima relatada revela que as práticas restaurativas estão preocupadas em apoiar os infrato res de forma que eles sejam estimulados a entender aceitar e cumprir com as suas obrigações reconhecen do que não são tarefas impossíveis nem impostas para causarlhes prejuízo ou sofrimento36 No entanto ocorre o inverso Esquecendose que o ofensor já tem pouca autoestima autonomia e poder pessoal razão pela qual recorre a tais práticas ele é tratado de forma a despirse completamente do pouco que tinha deixandoo ainda mais privado de recursos para conseguir autoestima e autonomia de forma legítima Conforme o relato de um homem que passou 17 anos na prisão compreendese que crimes e violências são muitas vezes correlatos e constituem uma forma de afirmar a identidade e o poder pessoal daquele que o comente Bobby foi um menino negro e pobre cujo pai era alcoólatra Diante dos caminhos que a vida apresentou a ele o crime revelouse uma esperança de sair da prisão da nulidade pessoal37 Sua violência não é um fantasma ou doença que os aflige sem motivo nem tampouco um veículo conveniente para paixões hediondas Pelo contrário sua violência é uma adaptação a vidas vazias e muitas vezes brutais A violência de boa parte dos homens violentos é em última análise gerada pela hostilidade e abusos de outros e alimentada pela falta de confiança em si e baixa autoestima Paradoxalmente sua violência é um tipo deformado de autodefesa e serve somente para confirmar os sentimentos de fraqueza e vulnerabilidade que foram a origem primeira dessa mesma violência Quando sua violência atinge vítimas inocentes assinala não um triunfo da coragem mas uma perda de controle38 Portanto verificase a necessidade de o ofensor aprender que é alguém de valor que possui poder e responsabilidades suficientes para tomar boas decisões Compreender ainda o respeito aos outros e seus bens bem como saber lidar pacificamente com situações de frustração e conflito Em vez disso a reação punitivistarepressivista o ensinará a recorrer à violência para obter validação pessoal para conseguir lidar com o mundo e solucionar seus problemas O processo judicial costuma sedimentar estereótipos sobre as vítimas e a sociedade focalizando os erros cometidos pelo ofensor e não ao dano causado à vítima Nesse rumo a responsabilização deve ser encarada mediante a compreensão das consequências humanas advindas dos seus atos ou seja encarar aquilo que faz e a pessoa contra quem atuou fazendo com que o ofensor seja estimulado a ajudar a decidir o que será feito para corrigir a situação bem como as medidas para reparar os danos O grande problema reside no fato de que as sentenças punem os infratores não os tornam responsáveis o que se entende como a causa que os leva a transgredir novamente pois quando uma punição é imposta a uma pessoa responsável esta reage com responsabilidade Mas se ela for considerada irresponsável tal ato a tornará mais irresponsável39 Destarte os mecanismos restaurativos implicam responsabilidade e compromissos concretos do ofen sor fazendoo compreender as consequências dos seus atos e a considerar o mal causado a suas vítimas No entanto o ofensor vê a Justiça como um jogo no qual todos são seus adversários não tendo qualquer 36 BRANCHER Leoberto Narciso Justiça responsabilidade e coesão social reflexões sobre a implementação na justiça da infân cia e da juventude em Porto Alegre In SLAKMON C MACHADO M BOTTINI P Org Novas direções na governança da justiça e da segurança Brasília Ministério da Justiça 2006 37 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 p 36 38 JOHNSON Robert A Life for a Life Justice Quarterly Sl v 1 n 4 p 571 dez 1984 39 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 256 motivação para reconhecer sua responsabilidade e nenhuma chance para expressar seu sentido de respon sabilidade Por isso compreendese que a sensação de alienação em relação à sociedade que a maioria dos infratores sente o sentimento de que eles próprios são vítimas é maximizado pelo processo legal e pela experiência da prisão40 A ofensa foi cometida por uma pessoa que por sua vez também foi violada Embora isto não seja desculpa para seus atos eles de fato nasceram de um histórico de abusos Criança ele sofreu violência física Depois de crescido sofreu violência psicológica e espiritual que feriram seu sentido de ser e relacionarse com o mundo Nenhum aspecto do processo levará estas coisas em consideração Provavelmente nada o conduzirá ao caminho da inteireza41 Vislumbrase portanto que o crime se revela como a forma de afirmação pessoal e valor enquanto pessoa por parte do ofensor Por outro lado tira de alguém o seu sentido de poder pessoal Para reverter tal cenário de forma que a vítima tenha sua inteireza recobrado deve ser devolvida a sua autonomia Para o ofensor recobrar sua inteireza deve desenvolver sua autonomia alheia à ideia de dominação do outro No caso relatado a autonomia das partes foi restaurada a partir da criação de um espaço de diálogo que oportunizou a fala de cada uma das partes diretamente envolvidas sendo expostos sentimentos emoções dores angústias e perspectivas a partir do fato delitivo No entanto o processo restaurativo somente se completou pela participação ativa das partes indiretamente envolvidas quais sejam familiares e comunidade de apoio Após o relato de Anderson e da vítima a irmã dele comprometeuse a conversar com o marido para que ele ficasse em sua residência bem como o professor indicou um trabalho para Anderson conseguir restituir o valor subtraído à idosa Ao trabalhar de forma correta conseguiria um emprego permanente Por sua vez o tio se ofereceu para ajudar nas despesas de Anderson enquanto ficasse na casa de sua irmã colocandose à disposição para o que fosse preciso42 Conforme visto a proposta restaurativa é reavivar as relações comunitárias aproveitandose para fomen tar ideias de encontro e inclusão o que de fato ocorreu no exemplo ora trabalhado O adolescente após reincidir pelo furto de uma bicicleta tornouse responsável possui emprego fixo não apresenta problemas de comportamento sempre visita a irmã e o tio às vezes Já a senhora idosa recuperou seu dinheiro e saiu de casa sempre que deseja sem medo de ser vítima novamente43 A Lei nº 806990 denominada de Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 112 estabelece que uma vez verificada a prática do ato infracional a autoridade competente poderá aplicar uma das seguin tes medidas as quais são denominadas de medidas socioeducativas I advertência II obrigação de reparar o dano III prestação de serviços à comunidade IV liberdade assistida V inserção em regime de semi liberdade VI internação em estabelecimento educacional VII qualquer medidas prevista no artigo 101 Compreendese que a medida socioeducativa será aplicada de acordo com a capacidade do adolescente de cumprila as circunstâncias e a gravidade da infração Para a execução das medidas adotase a Lei nº 125942012 que institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo SINASE e regulamenta a execução das medidas socioeducativas destinadas a adolescente que pratique ato infracional Compreende se nesse contexto que O SINASE parece ser um passo fundamental para unificação e efetivação de prá 40 BRANCHER Leoberto Narciso Justiça responsabilidade e coesão social reflexões sobre a implementação na justiça da infân cia e da juventude em Porto Alegre In SLAKMON C MACHADO M BOTTINI P Org Novas direções na governança da justiça e da segurança Brasília Ministério da Justiça 2006 p 217 41 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 p 44 42 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 43 BRANCHER Leoberto Narciso Justiça responsabilidade e coesão social reflexões sobre a implementação na justiça da infân cia e da juventude em Porto Alegre In SLAKMON C MACHADO M BOTTINI P Org Novas direções na governança da justiça e da segurança Brasília Ministério da Justiça 2006 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 257 ticas no sistema socioeducativo uma vez que se propõe a acompanhar todos os passos desde apuração do ato infracional até a execução e cumprimento das MSE44 No artigo 35 da referida lei estabelecemse os princípios que regem a execução das medidas socioedu cativas Destacase nesse rumo o inciso III pois refere que deve ser dada prioridade a práticas ou medidas que sejam restaurativas e sempre que possível atendam às necessidades das vítimas No Brasil importa destacar que a prática restaurativa é incentivada pelo Conselho Nacional de Justiça revelandose em uma cooperação com a Associação dos Magistrados Brasileiros No entanto as experiên cias ainda são recentes as quais foram iniciadas por meio de três projetospilotos financiados pelo Ministé rio da Justiça Esses projetos tiveram seu início no ano de 2005 nas cidades de Porto Alegre São Caetano do Sul e Brasília com sua execução em escolas no Judiciário na Fundação de Atendimento Socioeducativo FASE e nas comunidades45 A adoção de práticas restaurativas para a execução de medidas socioeducativas decorre a dos inúmeros casos de experiências negativas no contexto do ato infracional e sua responsabilização b da reincidência do adolescente infrator De acordo com o Conselho Nacional de Justiça 43 dos jovens internados em cum primento de medida socioeducativa são reincidentes Temse portanto a necessidade de novos modelos que superem as dificuldades encontradas no sistema socioeducativo qualificando o atendimento ao adolescente à vítima e suas comunidades de apoio46 Para Brancher as reflexões decorrentes da experiência com a Justiça Restaurativa revelam que as princi pais falhas do sistema de justiça residem em a não promover uma escuta qualificada dos conflitos b não atender às necessidades a eles subjacentes e c não promover responsabilização47 A adoção das práticas restaurativas na execução das medidas socioeducativas conforme verificado aci ma contribui para a construção de um novo modelo de justiça criminal o qual busca a partir do diálogo a participação de todos os envolvidos no ato infracional inclusive a vítima a auxiliar na reparação do dano e na restauração das relações atingidas pela prática delitiva Podese afirmar então que a Justiça Restaurativa introduz uma nova maneira de encarar conflitos vio lência e criminalidade não os considerando como desgraças porém como oportunidades de mudanças positivas em benefício de todos Constituise em um modelo de reparação de danos e reconstrução das relações humanas ao passo que compreende os componentes emocionais do conflito e a dinâmica de sua transformação48 4 consideRAções finAis As práticas restaurativas enfraquecem o processo de exclusão dos indivíduos ao possibilitar a huma nização e a pacificação das relações envolvidas em um conflito eis que ao contrário da justiça penal não busca a mera resposta punitiva aos transgressores fato gerador das desigualdades sociais mas propõe um 44 FERRAO Iara da Silva SANTOS Samara Silva dos DIAS Ana Cristina GarciaPsicologia e práticas restaurativas na socioedu cação relato de experiênciaPsicol cienc prof Sl v 36 n 2 p 354363 abrjun 2016 p 357 45 KONZEN Afonso Armando Justiça restaurativa e ato infracional desvelando sentidos no itinerário da alteridade Porto Alegre Livraria do Advogado 2007 46 FERRAO Iara da Silva SANTOS Samara Silva dos DIAS Ana Cristina GarciaPsicologia e práticas restaurativas na socioedu cação relato de experiênciaPsicol cienc prof Sl v 36 n 2 p 354363 abrjun 2016 47 BRANCHER Leoberto A implementação de práticas de justiça restaurativa através do Projeto Justiça para o Século 21 Disponível em wwwjustica21orgbrarquivosbib264doc Acesso em 15 maio 2015 48 BRANCHER Leoberto Narciso Justiça responsabilidade e coesão social Reflexões sobre a implementação na justiça da infância e da juventude em Porto Alegre In SLAKMON C MACHADO M BOTTINI P Org Novas direções na governança da justiça e da segurança Brasília Ministério da Justiça 2006 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 258 processo colaborativo entre todas as partes envolvidas no fato delituoso Promove assim a pacificação dos conflitos e a interrupção das cadeias de reverberação da violência e dos processos de criminalização Nesse sentido os mecanismos restaurativos adotados pela Justiça Criminal brasileira em especial pelo Estatuto da Criança e do Adolescente para a execução das medidas socioeducativas permitem a efetivação de uma gestão de conflitos participativa democrática e descentralizada baseada nas relações sociais entre a comunidade e o poder público sendo que o resultado desta interação mobiliza o capital social e constitui a rede de cooperação construindo por conseguinte uma ação coletiva de redução das desigualdades sociais e de solidificação do sentimento de pertencimento a uma comunidade atendendo à Doutrina da Proteção Integral Os mecanismos restaurativos não somente se constituem em um novo paradigma de justiça mais con sensual participativa e preocupada com as consequências materiais e emocionais da ofensa nas pessoas atingidas mas apresenta respostas às dificuldades do sistema judicial em cumprir a dignidade humana e cidadania de cada pessoa atingida pela prática de um ato delituoso Tratase portanto de uma boa prática para o sistema penal Verificamse que as experiências da Justiça Restaurativa têm contribuído para a organização e o desenvol vimento da justiça social na construção de um espaço mais solidário e fraterno o que corrobora o compro misso firmado pelo Conselho Nacional de Justiça pelo desenvolvimento das práticas restaurativas as quais se revelam como forma da valorização do ser humano como instrumentos para tratamento de conflito sem violência incentivando a paz e o restabelecimento das relações entre as pessoas RefeRênciAs AUERBACH Jerold S Justiça sem direito In AZEVEDO André Gomma de Org Estudos em arbitragem mediação e negociação Brasília Grupos de Pesquisa 2004 v 3 BOBBIO Norberto MATTEUCI Nicola PASQUINO Gianfranco Dicionário de política Trad De Carmen C Varriale et al 4 ed Brasília UnB 1992 BRANCHER Leoberto Narciso Justiça responsabilidade e coesão social reflexões sobre a implementação na justiça da infância e da juventude em Porto Alegre In SLAKMON C MACHADO M BOTTINI P Org Novas direções na governança da justiça e da segurança Brasília Ministério da Justiça 2006 BRANCHER Leoberto A implementação de práticas de justiça restaurativa através do Projeto Justiça para o Século 21 Disponível em wwwjustica21orgbrarquivosbib264doc Acesso em 15 maio 2015 CAPELLA Juan Ramón Fruto proibido uma aproximação históricoteórica ao estudo do direito e do Estado Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 CASTELLS Manuel O poder da identidade a era da informação economia sociedade e cultura Trad de Klauss Brandini Gerhardt 3 ed São Paulo Paz e Terra 1999 v 2 COLET Charlise Paula A promoção dos direitos mínimos do cidadão realizada pelas práticas restaurado ras a quebra da cultura excludente e seletiva do sistema penal In CALLEGARI André Luís Org Direito penal e globalização sociedade de risco imigração irregular e justiça restaurativa Porto Alegre Livraria do Advogado 2011 FARIA José Eduardo KUNTZ Rolf Estado sociedade e direito qual o futuro dos direitos Estado mercado e justiça na reestruturação capitalista São Paulo Max Limonada 2002 FERRAO Iara da Silva SANTOS Samara Silva dos DIAS Ana Cristina Garcia Psicologia e práticas re staurativas na socioeducação relato de experiência Psicol cienc prof Sl v 36 n 2 p 354363 abrjun GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 259 2016 FERREIRA Francisco Amado Justiça restaurativa natureza finalidades e instrumentos Coimbra Coimbra 2006 GARAPON Antoine Bem julgar ensaio sobre o ritual do judiciário Trad de Pedro Filipe Henriques Li sboa Instituto Piaget 1997 GARAPON Antoine Punir em democracia Lisboa Instituto Piaget 2001 JACKOBS Günter MELIÁ Manuel Cancio Direito penal do inimigo noções e críticas Porto Alegre 2007 KONZEN Afonso Armando Justiça restaurativa e ato infracional desvelando sentidos no itinerário da alteri dade Porto Alegre Livraria do Advogado 2007 MCCOLD Paul WACHTEL Ted Em busca de um paradigma uma teoria de Justiça Restaurativa In CONGRESSO MUNDIAL DE CRIMINOLOGIA 13 2003 Rio de Janeiro Disponível em http wwwrealjusticeorglibraryparadigmporthtml Acesso em 10 out 2007 SANTOS Boaventura de Sousa O discurso e o poder ensaios sobre a sociologia da retórica jurídica Porto Alegre S A Fabris 1988 SICA Leonardo Justiça restaurativa e mediação penal Rio de Janeiro Lúmen Júris 2007 SPENGLER Fabiana Marion O estadojurisdição em crise e a instituição do consenso por uma outra cultura no tratamento de conflitos 2007 453 f Tese Doutorado Programa de PósGraduação em Direito Univer sidade do Vale do Rio Sinos UNISINOS São Leopoldo 2007 WOLKMER Antônio Carlos Pluralismo jurídico fundamentos de uma nova cultura no direito 3 ed São Paulo Alfa Omega 2001 ZAFFARONI Eugenio Raul Em busca das penas perdidas Rio de Janeiro Renavan 2001 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 RESUMO DE ARTIGO Seu nome O artigo intitulado A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil escrito por Charlise Paula Colet Gimenez e Fabiana Marion Spengler traz em sua pesquisa um estudo relacionado a Justiça restaurativa caracterizada como um veículo de humanização dentro da execução das medidas das socioeducativas utilizada portando como um instrumento de restruturação da paz Inicialmente o estudo de Colet e Marion destaca maneiras como essas medidas socioeducativas podem se tornar mais humanizadas apresentando como o senso punitivo é aplicado na sociedade desde os seus primórdios A mediação penal é dada no artigo como um comportamento que vem como uma segurança cognitiva a mediação penal da França é atribuída como uma proposta alternativa para os humanos Neste sentido entendese que as penas são aplicadas para proporcionar a todos os envolvidos meios integrais e eficientes de atribuir aos interessados dos casos desfechos que atendam suas necessidades como vítima ofensor e comunidade Desse modo é enfatizado dentro do artigo como é necessário aplicar métodos de tratamento para conflitos Adiante o artigo também traz o conceito de Justiça Restaurativa também é abordado e como está assume um papel de matriz teórica dentro do emprego da justiça como um todo Nessa ótica as adoções de práticas dentro da execução de medidas socioeducativas são fundamentadas através do artigo 3º do Estatuto da Criança e do Adolesceste ECA pois traz concepções e diretrizes sobre os direitos dos jovens e como estes devem ser extremamente respeitados assegurando que todos tenham chances de gozar de oportunidades e possam ter sua integridade física e moral preservadas A Justiça Restaurativa pode ser distinguida da Justiça Retributiva devido sua aplicabilidade uma vez que esse tipo de justiça visa principalmente o dialógico e o consenso para proporcionar o respeito e dignidade dentro das penas e para todos os envolvidos Nesse sentido a Justiça Restaurativa entende que o ofensor e vítima devem participar da busca consensual na resolução dos conflitos devendo sempre cada um assumir sua responsabilidade e reparar os danos causados a outra além de reconhecer os impactos emocionais e psicológicos causados O artigo também traz questões sobre a aplicação dessas práticas para restabelecer as relações sociais e também dentro das execuções das medidas socioeducativas onde é atribuído uma importância necessária para garantir o desenvolvimento dos jovens que violaram os ordenamentos legais O Estado também faz parte do tema uma vez que cabe a ele a manutenção da ordem pública e da resolução de conflitos os autores argumentam que em situações de crises o Estado deve fornecer meios essenciais para atender as demandas da sociedade inclusive a aplicabilidade de meios que regulamentem as demandas regionais descentralizadas do poder estatal Os autores apresentam alternativas para a mitigação dos efeitos negativos de medidas socioeducativas são tomadas desconsiderando o bemestar dos envolvidos Uma das medidas da Justiça Restaurativa abordada dentro da construção do artigo é de que a promoção da reconciliação entre as partes envolvidas deve ser um dos meios principais de reparar danos assim os envolvidos podem priorizar a paz social e reparar os danos causados de maneira equivalente por meio de valores da comunidade assim somente a punição ao infrator não gera o arrependimento necessário tão pouco proporciona educação e restabelece seus valores éticos e morais se faz necessário uma aplicação de elementos práticos que tragam ao infrator o reconhecimento do seu delito e de seus impactos Nesse modelo de justiça o foco é lidar com as problemáticas questões que envolvem a execução das medidas socioeducativas também é restaurar as relações familiares sociais e do indivíduo com a comunidade ao seu redor incluindo as famílias afetadas pelo crime como os familiares da vítima do infrator e profissionais que lidam com os casos Os autores também trouxeram dentro da obra exemplificações práticas como um caso de assalto a mão armada praticado por um adolescente chamado Anderson o desfecho do crime foi agressão a uma vítima idosa que após o ocorrido não saiu mais de casa nesse caso foram aplicadas as metodologias da Justiça Restaurativa entre vítima e agressor também participaram a irmã do agressor e seu professor além da filha da vítima idosa Ao apresentar esse tipo de ilustração os autores proporcionam aos leitores uma narrativa mais abrangente de sua pesquisa demonstrando com clareza na prática como a Justiça Restaurativa pode ser exercida contribuindo para o melhoramento dos jovens e para restaurar seu convívio na sociedade Além disso os procedimentos adotados durante a Justiça Restaurativa são classificados como de suma importância para que as vítimas possam superar seus traumas Colet e Marion também apresentam as legislações envolvidas na Justiça Restaurativa como o ECA e o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo que são responsáveis por promover a aplicação de tais métodos para lidar com infratores de forma mais humanizada durante a execução das medidas socioeducativas desse modo é possível identificar atos normativos e ordenamentos jurídicos a serem seguidos durante o processo de punibilidade e das medidas socioeducativas para os jovens infratores respeitando sempre a dignidade da pessoa humana De fato é possível observar que o processo de restauração proporciona para as partes a possibilidade de participarem ativamente na busca por soluções para seus conflitos também são incentivadas a expressar como realmente foram afetadas se sentiram em relação ao fato ocorrido sem medo de expressar seus sentimentos medos e traumas isso permite que todos entendam as consequências e os danos causados A leitura também destaca que por meio da Justiça Restaurativa vítima e agressor podem expor suas emoções e traumas após os crimes buscando proporcionar principalmente um ambiente seguro que estimule as emoções e compreensões de ambos os envolvidos Para os autores também é importante se aprofundar no comportamento do criminoso analisando desde sua infância até o ato praticado uma vez que que muitas vezes esses indivíduos passaram por situações traumáticas e de abuso que despertam gatilhos e contribuem para a sua vida criminosa Dado o exposto o artigo de Charlise Paula Colet Gimenez e Fabiana Marion Spengler traz as perspectivas dos autores sobre a Justiça Restaurativa e sua contribuição positiva na humanização das medidas socioeducativas Neste sentido os mecanismos utilizados para tal fato não exercem somente um novo paradigma para a justiça criminal brasileira como também oferecem meios para restaurar as relações sociais questões emocionais e danosas atribuídas a conduta dos infratores além de proporcionar as vítimas meios para superar seus traumas A Justiça Restaurativa oferece meios para encontrar respostas para as ocorrências dentro do sistema judicial promovendo desenvolvimento da justiça social e contribuindo para restaurar a cultura da paz na sociedade Além de contribuir para que os jovens infratores sejam tratados de forma humanizada para que a participação na gestão dos conflitos contribua para restaurar os valores morais e éticos destes REFERÊNCIAS COLET Charlise Paula MARION Spengler Fabiana A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Revista Brasileira de Políticas Públicas v 8 n 1 22 maio 2018 Apr 30 2024 Plagiarism Scan Report Excluded URL None Content Checked for Plagiarism escrito por Charlise Paula Colet Gimenez e Fabiana Marion Spengler traz em sua pesquisa um estudo relacionado a Justiça restaurativa caracterizada como um veículo de humanização dentro da execução das medidas das socioeducativas utilizada portando como um instrumento de restruturação da paz Inicialmente o estudo de Colet e Marion destaca maneiras como essas medidas socioeducativas podem se tornar mais humanizadas apresentando como o senso punitivo é aplicado na sociedade desde os seus primórdios A mediação penal é dada no artigo como um comportamento que vem como uma segurança cognitiva a mediação penal da França é atribuída como uma proposta alternativa para os humanos Neste sentido entendese que as penas são aplicadas para proporcionar a todos os envolvidos meios integrais e ecientes de atribuir aos interessados dos casos desfechos que atendam suas necessidades como vítima ofensor e comunidade Desse modo é enfatizado dentro do artigo como é necessário aplicar métodos de tratamento para conitos Adiante o artigo também traz o conceito de Justiça Restaurativa também é abordado e como está assume um papel de matriz teórica dentro do emprego da justiça como um todo Nessa ótica as adoções de práticas dentro da execução de medidas socioeducativas são fundamentadas através do artigo 3º do Estatuto da Criança e do Adolesceste ECA pois traz concepções e diretrizes sobre os direitos dos jovens e como estes devem ser extremamente respeitados assegurando que todos tenham chances de gozar de oportunidades e possam ter sua integridade física e moral preservadas A Justiça Restaurativa pode ser distinguida da Justiça Retributiva devido sua aplicabilidade uma vez que esse tipo de justiça visa principalmente o dialógico e o consenso para proporcionar o respeito e dignidade dentro das penas e para todos os envolvidos Nesse sentido a Justiça Restaurativa entende que o ofensor e vítima devem participar da busca consensual na resolução dos conitos devendo sempre cada um assumir sua responsabilidade e reparar os danos causados a outra além de reconhecer os impactos emocionais e psicológicos causados O artigo também traz questões sobre a aplicação dessas práticas para restabelecer as relações sociais e também dentro das execuções das medidas socioeducativas onde é atribuído uma importância necessária para garantir o desenvolvimento dos jovens que violaram os ordenamentos legais O Estado também faz parte do tema uma vez que cabe a ele a manutenção da ordem pública e da resolução de conitos os autores argumentam que em 0 Plagiarized 100 Unique Characters6490 Words994 Sentences39 Speak Time 8 Min Page 1 of 3 situações de crises o Estado deve fornecer meios essenciais para atender as demandas da sociedade inclusive a aplicabilidade de meios que regulamentem as demandas regionais descentralizadas do poder estatal Os autores apresentam alternativas para a mitigação dos efeitos negativos de medidas socioeducativas são tomadas desconsiderando o bemestar dos envolvidos Uma das medidas da Justiça Restaurativa abordada dentro da construção do artigo é de que a promoção da reconciliação entre as partes envolvidas deve ser um dos meios principais de reparar danos assim os envolvidos podem priorizar a paz social e reparar os danos causados de maneira equivalente por meio de valores da comunidade assim somente a punição ao infrator não gera o arrependimento necessário tão pouco proporciona educação e restabelece seus valores éticos e morais se faz necessário uma aplicação de elementos práticos que tragam ao infrator o reconhecimento do seu delito e de seus impactos Nesse modelo de justiça o foco é lidar com as problemáticas questões que envolvem a execução das medidas socioeducativas também é restaurar as relações familiares sociais e do indivíduo com a comunidade ao seu redor incluindo as famílias afetadas pelo crime como os familiares da vítima do infrator e prossionais que lidam com os casos Os autores também trouxeram dentro da obra exemplicações práticas como um caso de assalto a mão armada praticado por um adolescente chamado Anderson o desfecho do crime foi agressão a uma vítima idosa que após o ocorrido não saiu mais de casa nesse caso foram aplicadas as metodologias da Justiça Restaurativa entre vítima e agressor também participaram a irmã do agressor e seu professor além da lha da vítima idosa Ao apresentar esse tipo de ilustração os autores proporcionam aos leitores uma narrativa mais abrangente de sua pesquisa demonstrando com clareza na prática como a Justiça Restaurativa pode ser exercida contribuindo para o melhoramento dos jovens e para restaurar seu convívio na sociedade Além disso os procedimentos adotados são de suma importância para que a vítima possa desmembrar os traumas do ocorrido de seu psicológico Durante o processo de restauração as partes são incentivadas a expressar como se sentiram em relação ao fato ocorrido isso permite que todos entendam as consequências e os danos causados ajudando a vítima a trabalhar seu trauma e o infrator a entender o impacto de suas ações além de proporcionar um trabalho em conjunto para encontrar soluções que possam ajudar ambos os envolvidos e encontrar soluções ecientes A leitura também destaca que por meio da Justiça Restaurativa vítima e agressor podem expor suas emoções e traumas após os crimes buscando proporcionar principalmente um ambiente seguro que estimule as emoções e compreensões de ambos os envolvidos Além disso os autores ressaltam como é importante conhecer e se aprofundar no comportamento do criminoso analisando desde sua infância até o ato praticado tendo em vista que muitas vezes esses passam por situações de ab O artigo traz ainda as legislações envolvidas na Justiça Restaurativa como o ECA e o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo responsáveis por promover a aplicação de tais métodos para lidar com infratores de modo a humanizar ecientemente a execução das medidas socioeducativas Dado o exposto o Page 2 of 3 artigo de Charlise Paula Colet Gimenez e Fabiana Marion Spengler traz as perspectivas dos autores sobre a Justiça Restaurativa e sua contribuição positiva na humanização das medidas socioeducativas Neste sentido os mecanismos utilizados para tal fato não exercem somente um novo paradigma para a justiça criminal brasileira como também oferecem meios para restaurar as relações sociais questões emocionais e danosas atribuídas a conduta dos infratores além de proporcionar as vítimas meios para superar seus traumas Sources Home Blog Testimonials About Us Privacy Policy Copyright 2024 Plagiarism Detector All right reserved Page 3 of 3
11
Direito do Trabalho 2
UNIPAC
3
Direito do Trabalho 2
UNIPAC
13
Direito do Trabalho 2
UNIPAC
1
Direito do Trabalho 2
UNIPAC
Texto de pré-visualização
doi 105102rbppv8i15100 A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil The restorative justice as an instrument of peace culture a new perspective for the implementation of socioeducational measures in Brazil Charlise Paula Colet Gimenez Fabiana Marion Spengler Resumo O objetivo do presente estudo é abordar a Justiça Restaurativa como instrumento de humanização da execução das medidas socioeducativas no Brasil Para realizálo adotase o método de abordagem dedutivo Aborda se inicialmente o conflito na sociedade contemporânea a fragilidade das relações sociais e a inclusão de métodos de tratamento de conflitos cujo escopo é atender as necessidades das pessoas envolvidas no conflito Em um segundo momento discorrese acerca da Justiça Restaurativa como quebra da justiça retributiva ao propor por meio do diálogo e consenso o res peito absoluto aos direitos humanos e à dignidade da pessoa humana Na sequência a fim de consolidar o objetivo do artigo abordamse as práti cas restaurativas na execução de medidas socioeducativas A importância da proposta se verifica pela Justiça Restaurativa considerar o delito como um dano às pessoas envolvidas e às relações pessoais razão pela qual propõe que vítima e ofensor assumam a resolução do conflito no tocante à respon sabilidade à reparação do dano ao reconhecimento dos traumas causados e à restauração das relações rompidas Inseremse nesse contexto as medidas socioeducativas as quais são orientadas pela Doutrina da Proteção Integral garantindose ao adolescente o seu desenvolvimento físico mental moral espiritual e social em condições de liberdade e de dignidade o que é possibi litado pela Justiça Restaurativa cumprindose desse modo o fim do Direito Penal qual seja a convivência pacífica entre os seres humanos Palavraschave Justiça Restaurativa Cultura de Paz Medida Socioeducati va Doutrina da Proteção Integral AbstRAct The objective of this study is to approach the Restorative Justice as an instrument to humanize the implementation of socioeducational measures in Brazil To achieve this it is adopted the deductive method of approa Recebido em 22022018 Aprovado em 19032018 Doutora e Mestre em Direito em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul Espe cialista em Direito Penal e Processo Penal pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul Unijuí Professora dos Cursos de Doutorado Mestrado e Graduação em Direito da URI Santo Ângelo Coordena dora do Curso de Graduação em Direito da mesma instituição Líder do Grupo Conflito Direitos Humanos e Cidadania vinculado ao CNPQ Email charlisegsantoangelouribr Pósdoutora em Direito pela Università degli Studi di Roma Tre em Roma na Itália com bolsa CNPq PDE Doutora em Direito pelo programa de PósGraduação stricto sensu da Universidade do Vale do Rio dos Sinos UNISINOS RS com bolsa Capes mestre em Desenvolvimento Regional com concentração na área Político Institucional da Universidade de Santa Cruz do Sul UNISC RS docente dos cursos de Graduação e Pós Graduação lato e stricto sensu da UNISC Coordenadora do Grupo de Pesquisa Políticas Públicas no Tratamento dos Conflitos vinculado ao CNPq coordenadora e mediadora do projeto de extensão A crise da jurisdição e a cultura da paz a mediação como meio democrático autônomo e consensuado de tratar conflitos financiado pela Universidade de Santa Cruz do Sul UNISC autora de diversos livros e artigos científicos Email fabianauniscbr GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 245 ch Initially it is studied the conflict in the contemporary society the fragility of social relations and the inclusion of conflictmanagement methods which aim to satisfy the needs of the people involved in the conflict In a second moment it is analyzed the Restorative Justice as a breakdown of retributive justice by proposing through dialogue and consensus absolute respect for human rights and the dignity of the human person Following in order to consolidate the objective of the article it is verified the restorative practices in the execution of socioeducational measures The importance of the proposal is verified in the fact that Restorative Justice considers the crime as an injury to the people involved in the conflict and personal rela tionships which is why it proposes that victim and offender should resolve the conflict through responsi bility reparation of damage recognition of trauma caused and the restoration of broken relations In this context socioeducational measures are guided which are based on the Doctrine of Integral Protection guaranteeing the adolescent his physical mental moral spiritual and social development in conditions of freedom and dignity which is possible by the Restorative Justice thus fulfilling the objective of Criminal Law that is peaceful coexistence among human beings Keywords Restorative Justice Peace Culture Socioeducational Measure Doctrine of Integral Protection 1 Aspectos intRodutóRios Como alternativa à demonização incutida nos ideais do senso comum punitivo em que aquele que não presta uma segurança cognitiva suficiente de um comportamento pessoal não deve e não pode ser tratado como pessoa pois caso receba tal tratamento tornaria vulnerável a segurança das demais pessoas os cidadãos1 Nesse sentido inserese a mediação penal ou justiça de proximidade na França justiça comuni tária em Quebeque restorative justice nos países anglosaxônicos Diritto fraterno na Itália como propostas de alteridade e humanidade para os seres humanos A ideia central é comum a todos os modelos atribuise aos principais interessadosenvolvidos vítima ofensor família de ambos e comunidades de apoio os recursos internos para reagir à infração2 Nessa ótica a Justiça Restaurativa assume relevância na condição de matriz teórica a partir da qual é pos sível um novo modelo de justiça bem como de uma filosofia e de uma cultura cada um é capaz de captar a mesma imagem sob ângulos e perspectivas diferentes e produzir resultados completamente diferentes opondose ao etiquetamento social visto que a seletividade somente reproduz o senso comum majoritário punindose as condutas desviantes sob uma perspectiva apenas a dominante Portanto há a necessidade de mudança de paradigmas a partir da construção de uma Justiça Restaurativa fundada no diálogo e consenso pois se verifica o atual sistema penal punitivo como propagador das dimen sões da seletividade social Assim não devem ser os mecanismos restaurativos interpretados como novos métodos de tratamento de conflitos ao contrário consistem em um novo paradigma de justiça penal que muda o foco do pensar e agir com relação ao crime em si A adoção das práticas restaurativas para a execução das medidas socioeducativas atende ao artigo 3o do Estatuto da Criança e do Adolescente Lei nº 906990 pois permite que todo adolescente goze de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana sendolhe asseguradas todas as oportunidades e faci lidades a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico mental moral espiritual e social em condições de liberdade e de dignidade Assim a partir da importância do tema o presente artigo tem por objetivo abordar a Justiça Restaurati va como instrumento de humanização da execução de medidas socioeducativas no Brasil a qual encontra 1 JACKOBS Günter MELIÁ Manuel Cancio Direito penal do inimigo noções e críticas Porto Alegre 2007 2 GARAPON Antoine Punir em democracia Lisboa Instituto Piaget 2001 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 246 guarida na legislação pátria bem como cumpre com o fundamento do Estado Democrático de Direito qual seja a dignidade da pessoa humana A Justiça Restaurativa por estar fundamentada na cultura de paz e na comunicação não violenta atende à Doutrina da Proteção Integral e apresentase como instrumento ao Estado Sociedade e Família para a garantia do desenvolvimento pleno dos adolescentes em conflito com a lei 2 A tRAnsfoRmAção dA ReAlidAde sociAl pelA Adoção de métodos de tRAtAmento de conflitos A sociedade moderna se apresenta complexa pela diversificação do aparelho produtivo em três setores monopólio concorrencial e estatal pela segmentação do mercado de trabalho bem como pela multipli cação de necessidades e comportamentos dos indivíduos3 Dessa forma entendese necessária a sua análise para compreenderse a evolução do Direito e por conseguinte do homem visto que se caracteriza pela frag mentação do tecido social cujo resultado é o aumento dos conflitos sociais nesses grupos A existência da sociedade pressupõe a existência do homem e por conseguinte do direito para regulamentar a convivência daqueles a partir da legitimidade do Estado No entanto a sociedade atual revelase muito mais como um espaço no qual os homens tendem a avan çar sobre os outros em uma luta desigual pela sobrevivência razão pela qual a justiça penal atua para garan tir uma coexistência pacífica entre aqueles que vivem em uma sociedade tendo como escopo o controle da vingança privada e racionalizar a resposta aos fatos considerados criminosos Nesse rumo compreendese que ao mesmo tempo em que a justiça penal se caracteriza como o último estágio para onde são remetidas as situaçõeslimites aquelas consideradas problemáticas à convivência so cial é nesse mesmo espaço em que são cometidas as mais sérias supressões de garantias individuais e direitos civis4 Destarte visualizase um Direito Penal moderno guiado por códigos corrompidos e por metas além de seus limites operativos buscando perpetuar sentimentos vingativos e rotuladores entre aqueles que vivem em uma mesma sociedade disseminando assim um direito penal diferenciado para alguns os inimigos Abandonouse portanto a utilização dos mecanismos penais quando absolutamente necessários isto é quando os demais meios não se apresentassem eficazes O Direito Penal moderno protege os bens jurídicos ao extremo trazendo para a sua tutela interesses que nela não encontram solução adequada Assim torna se medida prima ratio adotando conceitos desestruturadores e anômalos reproduzindo um Direito Penal simbólico ao mesmo tempo em que punitivistarepressivista O Direito Penal se torna igualmente um novo meio de a sociedade moderna exorcizar as suas dificul dades Ou seja mais do que os seus resultados concretos entre os quais a detenção de determinados indi víduos o crescimento da população prisional ou a entrada em cena de novos atores a penalização indica o palco pelo qual as sociedades olham para si mesmas Por isso afirmase que sendo o direito a nova formali zação da coexistência humana o direito penal será a sua última encenação5 Diante da expansão do Direito Penal verificase a sua atuação abrangida por novas demandas e interesses penais produzindo incessantemente legislações infraconstitucionais pautadas pelo objetivo de criminalizar 3 BOBBIO Norberto MATTEUCI Nicola PASQUINO Gianfranco Dicionário de política Trad de Carmen C Varriale et al 4 ed Brasília UnB 1992 4 SICA Leonardo Justiça restaurativa e mediação penal Rio de Janeiro Lúmen Júris 2007a 5 GARAPON Antoine Bem julgar ensaio sobre o ritual do judiciário Trad de Pedro Filipe Henriques Lisboa Instituto Piaget 1997 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 247 e prevenir a criminalidade Assim os riscos modernos aliados ao crescente avanço econômico e tecnológico geram uma reação irracional por parte daqueles que se sentem atingidos razão pela qual mantêm discursos de uma maior tutela da segurança pública em detrimento de interesses individuais e garantias mínimas de dignidade do ser humano Nesse cenário qualquer ação inconsciente ou não pode dar ensejo a uma ação judicial Abrese o jornal e lêse sobre uma bomba que mata dezenas de pessoas inocentes ligase a televisão e o noticiário informa que uma bala perdida atingiu uma criança enquanto estava na escola conectase à internet e surgem notícias de atos bárbaros cometidos por funcionários contra patrões ligase o rádio e ouvese que pais disputam acirradamente a guarda dos seus filhos Estas e outras situações diárias com que se depara espelham várias formas de conflitos social político psicanalítico familiar interno externo entre pessoas ou nações étnico religioso ou de valores e princípios morais6 O conflito rompe com a resistência do outro consiste em confrontar duas vontades quando o desejo é de uma dominar a outra impondolhe a sua solução Por isso afirmase que o conflito é uma forma de ter razão in dependentemente dos argumentos racionais no qual as partes se tratam como adversários e inimigos Exemplo dessa cultura de conflito e beligerância ocorre nos Estados Unidos quando qualquer ato dá motivo para litigar O litígio judicial pode se tornar uma etapa previsível no ciclo de vida dos americanos Agora que os filhos processam seus pais e cônjuges ainda não divorciados processamse mutuamente as possibilidades são ilimitadas Membros de paróquias já processaram seus pastores e apropriadamente procuradores processaram juízes Não faz muito tempo que um grupo de pais processou um juiz de futebol por um erro cometido em um jogo entre escolas de segundo grau7 Assim verificase que no século XX a justiça é vendida por um determinado preço E assim um cartunista bem coloca a situação um advogado tranquiliza seu cliente que está ansioso sobre os méritos de seu caso mas pergunta quanta justiça o senhor pode pagar8 Ademais percebese que esforços para simplificar procedimentos e facilitar a indenização por danos causados fazem advogados batalhar por seus honorários Nesse rumo referese que o litígio judicial é somente uma opção entre um leque de alternativas viáveis para tratar conflitos Entretanto devese salientar que as sanções culturalmente aceitas por uma sociedade expressam os ideais das pessoas que as defendem suas percepções sobre si mesmas e a qualidade de seus relacionamentos Ou seja indicam se as pessoas estão predispostas a evitar ou encorajar o conflito reprimi lo ou tratálo de forma pacífica As sociedades modernas ainda encontramse envoltas de uma fumaça jurídica como os antepassados encontravamse apegados à religião medieval direito é nossa religião nacional os advogados formam nos so clero e o tribunal é nossa catedral onde as paixões contemporâneas são encenadas9 Dessa forma percebese a existência de um Direito com elevado grau de institucionalização da função jurídica a qual se mostra especializada autônoma burocrática e sistematizada orientada para atividades ri gidamente definidas e hierarquizadas Assim a crescente demanda dá espaço à padronização e impessoaliza ção dos procedimentos marcados pela morosidade e ineficácia da aplicação da lei em determinados litígios apenas exalando segurança jurídica aparente 6 SPENGLER Fabiana Marion O estadojurisdição em crise e a instituição do consenso por uma outra cultura no tratamento de conflitos 2007 453 f Tese Doutorado Programa de PósGraduação em Direito Universidade do Vale do Rio Sinos UNISINOS São Leopoldo 2007 7 AUERBACH Jerold S Justiça sem direito In AZEVEDO André Gomma de Org Estudos em arbitragem mediação e negociação Brasília Grupos de Pesquisa 2004 v 3 p 54 8 AUERBACH Jerold S Justiça sem direito In AZEVEDO André Gomma de Org Estudos em arbitragem mediação e negociação Brasília Grupos de Pesquisa 2004 v 3 p 49 9 AUERBACH Jerold S Justiça sem direito In AZEVEDO André Gomma de Org Estudos em arbitragem mediação e negociação Brasília Grupos de Pesquisa 2004 v 3 p 48 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 248 À medida que o Estado e o grande número de legislação esparsa perdem espaço diante de sua ineficiên cia inaplicabilidade e lentidão o direito não oficial tornase mais visível como alternativa no tratamento de conflitos Por isso o novo espaço oportuniza um estado de exceção personalizado10 o qual se direciona às categorias sociais mais pobres vindo estas a abrir mão do uso da força para submeterse ao tratamento do conflito O Estado por sua vez oferece um instrumento de coerção revelado como o conjunto dos meios de violência que podem ser legitimamente accionados para impor e fazer cumprir as determinações jurídicas obriga tórias11 Esses instrumentos podem ser mais ou menos poderosos quer pelo tipo de ações violen tasque podem gerar quer pelo tipo de condicionalismos a que tal acionamento está sujeito ou ainda quer pelo efeito de neutralização que resulta das ações paralelas ou opostas a outros instrumentos de coerção existentes no mesmo espaço sóciojurídico12 Por isso referese que o Estado atual tem o monopólio da violência legítima servindo a seu favor No entanto a força estatal não mais se consolida diante da dificuldade que encontra em produzir a ordem pois antes tal tarefa lhe é atribuída justamente porque para seu desempenho se faz necessário um aparelho burocrático hierárquico capaz de reunir e concentrar esforços13 Ademais é notório o crescente número de direitos inoficiais que surgem diante da falta de atenção do Estado para com os direitos funda mentais de cada um adquirindo legitimidade a partir de sua ação libertadora a qual edifica uma nova cultura societária cujos direitos insurgentes são a expressão mais autêntica da satisfação das carências e das neces sidades humanas fundamentais14 Nessa ótica importa destacar que não são poucas vezes nas quais vige a lei do mais forte em que se usa da violência moral e física para fazer valer seu código e suas regras sendo exemplos o crime organizado narcotráfico terrrorismo corrupção e criminalidade econômica Na análise da realidade brasileira podese concluir que o direito marginal é a normatividade autoproduzida em guetos quartomundializados como a hoje vigente nos morros do Rio de Janeiro e nas gigantescas favelas de São Paulo 15 Em adição verificase que a crise de legitimidade do Estado derivada da fragmentação e diversificação dos interesses sociais possibilita a visualização de dois cenários múltiplas identidades que recorrem ao Es tado para ver suas reinvidicações atendidas enquanto as demais demandas e necessidades legitimam formas alternativas de atender as exigências diante da incapacidade estatal Por isso o Estado descentraliza seus poderes para instituições políticas locais e regionais possibilitando que as identidades das minorais consigam ser manifestadas com maior desenvoltura em níveis locais e regio nais contrariando a tendência de concentração dos governos nacionais da riqueza e do poder atendendo apenas interesses em seus próprios benefícios Portanto ao permitirse uma maior participação no poder permitese que escalões inferiores do governo assumam a responsabilidade pelas relações com a sociedade tratando das questões do dia a dia com o objetivo de reconstruir sua legitimidade por meio da descentrali zação do poder16 10 CAPELLA Juan Ramón Fruto proibido uma aproximação históricoteórica ao estudo do direito e do Estado Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 p 277 11 SANTOS Boaventura de Sousa O discurso e o poder ensaios sobre a sociologia da retórica jurídica Porto Alegre S A Fabris 1988 p 53 12 SANTOS Boaventura de Sousa O discurso e o poder ensaios sobre a sociologia da retórica jurídica Porto Alegre S A Fabris 1988 p 53 13 SPENGLER Fabiana Marion O estadojurisdição em crise e a instituição do consenso por uma outra cultura no tratamento de con flitos 2007 453 f Tese Doutorado Programa de PósGraduação em Direito Universidade do Vale do Rio Sinos UNISINOS São Leopoldo 2007 14 WOLKMER Antônio Carlos Pluralismo jurídico fundamentos de uma nova cultura no direito 3 ed São Paulo Alfa Omega 2001 p 323 15 FARIA José Eduardo KUNTZ Rolf Estado sociedade e direito qual o futuro dos direitos Estado mercado e justiça na reestru turação capitalista São Paulo Max Limonada 2002 p 71120 16 CASTELLS Manuel O poder da identidade a era da informação economia sociedade e cultura Trad de Klauss Brandini Ger GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 249 Nessa ótica percebese que a abertura de espaços fomenta o surgimento de entidades focadas na satis fação do cidadão diante da ineficiência do Estado Dessa forma o Estado ao ceder espaço torna legítima a ação dessas entidades oriundas de forças sociais as quais assumem o controle estatal a fim de tornálo sua expressão exclusiva A ineficiência estatal também pode ser verificada quando os cidadãos buscam formas alternativas de tratamento de conflitos visto que o Estado revela uma demora excessiva para tratar os conflitos ou para entregar a prestação jurisdicional demandada pelo seu cidadão Conforme manifestado anteriormente a crescente demanda de exigências por parte dos cidadãos as quais se pautam na Constituição Federal de 1988 ampliaram o rol de direitos fundamentais e garantias geraram expectativas de efetivação e satisfação das necessidades e diante da ineficiência estatal estas direcionaramse ao Judiciário porém depararamse com um sistema incapaz de responder com efetividade a cada exigência inserida em um litígio judicial Nesse rumo compreendese que a busca por meios alternativos de tratamento de conflitos surgiu com base na disparidade entre o discurso jurídico e os interesses econômicos crescente produção legislativa muitas vezes baseada no clientelismo político e ineficácia de políticas públicas de efetivação dos direitos fundamentais assegurados pela Carta Magna Diante do não cumprimento dos referidos direitos observa se processos de angústia revolta descrédito e insegurança nos cidadãos para com o Judiciário e entre os mesmos Dessa forma em vez de satisfazer as relações conflituosas incendiouse a disputa e o desejo pela vitória em face da derrota do outro Destarte verificase que meios alternativos de tratamento de conflitos permitem que as partes transfor mam o modo de perceber o conflito e desenvolvam formas autônomas para lidar com as tensões inerentes ao seu relacionamento sem que para isso seja necessário buscar uma resposta do Judiciário o que poderia trazer consequências muito mais danosas à relação humana Compreendese portanto que a diminuição da presença estatal em determinados espaços sociais permi te maior organização e aplicação de regras criadas pelo cidadão como alternativas para tratar conflitos uma vez que é preciso reduzir o exercício do poder do sistema penal para substituílo por formas alternativas que visam o tratamento do conflito17 Assim a elaboração de um novo paradigma de justiça criminal como alternativa à prisão e à pena pos sibilita a o garantismo positivo b a redução da violência punitiva c a neutralização das funções reais do cárcere d a não expansão da rede de controle social penal Devese ainda compreender que a justiça penal requer mínima força e sempre que possível abdica do uso da violência legal reconhecendo que o conflito o desvio às regras de convivência constituem elementos impossíveis de serem eliminados os quais devem ser geridos dentro de um projeto humanista que condiza com o estágio cultural e tecnológico da atual so ciedade Afirmase que a justiça penal deve priorizar mecanismos de intervenção que tenham por objetivo o fortalecimento dos valores de convívio comunitário e que considerem o caráter relacional do conflito resul tando em um sistema que ofereça modelos de comportamento agregadores do consenso ao redor das regras do ordenamento É possível atribuir às decisões penais um papel positivo de solucionar os conflitos sem ter que necessariamente recorrer à punição aflitiva18 Portanto trazse ao presente estudo a Justiça Restaurativa como proposta para promover entre os ver dadeiros protagonistas do conflito traduzido em um fato típico iniciativas de solidariedade diálogo e pro gramas de reconciliação Essa alternativa viabiliza o tratamento do conflito de forma coletiva para lidar com suas consequências e implicações futuras pois envolve a vítima o réu a comunidade na busca de soluções hardt 3 ed São Paulo Paz e Terra 1999 v 2 p 317 17 ZAFFARONI Eugenio Raul Em busca das penas perdidas Rio de Janeiro Renavan 2001 18 SICA Leonardo Justiça restaurativa e mediação penal Rio de Janeiro Lúmen Júris 2007a p 6 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 250 para o conflito com o objetivo de promover a reparação a reconciliação e o reforço do sentimento de segurança19 Observase que a Justiça Restaurativa no Estado Democrática de Direito se revela em algo mais intelegível e mais humano que o Direito Penal atual 3 o empodeRAmento do seR humAno A pARtiR dA JustiçA RestAuRAtivA A justiça penal conforme já referido anteriormente mostrase ineficiente seletiva custosa e agrava os pro blemas que deveria resolver No entanto ainda é resistente a ideia de movimentos de reforma mais profundas absorvendo até o presente momento pequenas modificações A preocupação reside na necessidade de constru ção de um discurso que constate as mazelas do atual sistema punitivoretributivo o qual se direciona exclusiva mente ao acusado coloca à margem a vítima e sua comunidade e propõe práticas comunitárias de tratamento de conflitos em que há a redescoberta da vítima e o restabelecimento do equilíbrio rompido entre as partes20 Nessa senda a Justiça Restaurativa encoraja a vítima e seu ofensor a assumir papeis mais ativos ao tratar o conflito mediante discussão e negociação reservandose aos agentes públicos o papel de facilitadores os quais utilizam a linguagem que os coloca no mesmo nível de poder das partes Ademais intensifica a participação da comunidade cujo papel é ser destinatária de políticas de reparação e reforço do sentimento de segurança coletivo bem como ser ator social de uma cultura de paz baseada em ações reparadoras concretas das consequências de um crime Por isso afirmase que o modelo em estudo destaca a necessidade de um empowerment21 como base fundamental da nova subjetividade atribuída aos indivíduos um papel ativo um papel de redefinição dos problemas de reafirmação da própria esfera de autonomia e poder seja em termos culturais políticos psicológicos22 Todo ser humano requer um grau de autodeterminação e autonomia em suas vidas O crime rouba este poder das vítimas já que outra pessoa exerceu controle sobre elas sem seu consentimento A Justiça Restaurativa devolve os poderes a estas vítimas dandolhes um papel ativo para determinar quais são as suas necessidades e como estas devem ser satisfeitas Isso também dá poder aos infratores de responsabilizarse por suas ofensas fazer o possível para remediar o dano que causaram e iniciar um processo de reabilitação e reintegração 23 Destarte afirmase que as práticas restaurativas representam uma mudança de linguagem e orientação ao passo em que criam a oportunidade de revigorar o debate sobre as causas do crime e não respondem às demandas por severidade e punição Por isso oportunizase a inclusão das vítimas e uma abordagem deter minada sob um novo olhar dos fatos sociais um olhar mais direcionado aos sujeitos da relação em conflito e à satisfação de suas necessidades e sentimentos Nessa senda verificase que os mecanismos restaurativos se caracterizam como um processo colabora tivo que envolve as pessoas diretamente afetadas mais diretamente por um crime as quais são chamadas de partes interessadas principais e auxiliam na melhor forma de reparação do dano causado pela transgres são No entanto questionamse quem são as principais partes interessadas na Justiça Restaurativa e de que forma devem se comprometer em relação à realização da justiça Por isso importa elucidar a teoria proposta por McCold e Watchel cuja composição se dá por três estruturas as quais embora sejam relacionadas são distintas conceitualmente24 19 SICA Leonardo Justiça restaurativa e mediação penal Rio de Janeiro Lúmen Júris 2007a p 13 20 SICA Leonardo Justiça restaurativa e mediação penal Rio de Janeiro Lúmen Júris 2007a 21 O termo referese ao empoderamento 22 SICA Leonardo Justiça restaurativa e mediação penal Rio de Janeiro Lúmen Júris 2007a p 19 23 MARSHAL BOYACK BOWEN 2005 apud SICA Leonardo Justiça restaurativa e mediação penal Rio de Janeiro Lúmen Júris 2007a p 273 24 MCCOLD Paul WACHTEL Ted Em busca de um paradigma uma teoria de justiça restaurativa In CONGRESSO MUNDI AL DE CRIMINOLOGIA 13 2003 Rio de Janeiro Disponível em httpwwwrealjusticeorglibraryparadigmporthtml GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 251 A Janela de Disciplina Social contrapõese à prática retributiva Esta tenciona a rotular as pessoas de forma negativa ou ainda a proteger as pessoas das consequências de suas ações erradas revelando o escopo da Justiça Restaurativa no tocante à resolução de problemas com base na desaprovação das transgressões ao mesmo tempo em que valoriza o interior do indivíduo transgressor Assim permite que aquele que foi prejudicado tenha a oportunidade de expressar seus sentimentos de forma a descrever como foi afetado e a desenvolver uma forma de reparação do dano que venha a evitar a sua reincidência Em complemento devido ao perfil de reintegração supre as necessidades emocionais e materiais das vítimas enquanto faz com que o ofensor assuma as consequências de seus atos para que com a reparação dos danos não seja mais visto como tal Afirmam os autores em estudo que a estrutura em comento determina quatro abordagens à regulamen tação do comportamento punitiva permissiva negligente e restaurativa elucidando quatro palavras que as resu mem NADA PELO AO e COM conforme se depreende da imagem abaixo Figura 1 Fonte MCCOLD WATCHEL 2003 Se negligente NADA faz em resposta a uma transgressão Se permissiva tudo faz PELO por o transgressor pedindo pouco em troca e criando desculpas para as transgressões Se punitiva as respostas são reações AO transgressor punindo e reprovando mas permitindo pouco envolvimento ponderado e ativo do mesmo Se restaurativa o transgressor encontrase envolvido COM o transgressor e outras pessoas prejudicadas encorajando um envolvimento consciente e ativo do transgressor convidando outros lesados pela transgressão a participarem diretamente do processo de reparação e prestação de contas O engajamento cooperativo é elemento essencial da justiça restaurativa25 A seu turno a segunda estrutura denominada de Papel das Partes Interessadas enfatiza a relação entre o dano causado pela prática transgressora com as necessidades específicas de cada parte interessada na solu ção desta e respostas restaurativas necessárias ao seu atendimento possibilitando dessa forma a distinção entre partes interessadas principais maiores afetados dos indiretamente interessados Verificamse nesse contexto as principais partes como sendo vítima e transgressor bem como aqueles que têm relação significativa com estes são considerados diretamente afetados ao passo que constituem a comunidade de apoio e assistência à vítima e ao transgressor Por outro lado as demais pessoas integrantes Acesso em 10 out 2007 25 MCCOLD Paul WACHTEL Ted Em busca de um paradigma uma teoria de justiça restaurativa In CONGRESSO MUNDI AL DE CRIMINOLOGIA 13 2003 Rio de Janeiro Disponível em httpwwwrealjusticeorglibraryparadigmporthtml Acesso em 10 out 2007 p 2 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 252 da sociedade representantes do Estado e organizações religiosas educacionais sociais sofrem um dano indireto e impessoal esperandose que estes venham a apoiar os processos restaurativos razões pelas quais se enquadram como indiretamente afetados conforme ilustração abaixo Ademais constatase que as vítimas são prejudicadas diante da falta de controle que evidenciam com a transgressão razão pela qual precisam readquirir seu sentimento de poder pessoal o que se dá a partir da transformação de vítima em sobrevivente Já o ofensor prejudica seu relacionamento com suas comunidades de assistência no momento em que trai a confiança destas somente vislumbrando o restabelecimento da confiança perdida ao assumir a responsabilidade por suas más ações As comunidades de assistência têm suas necessidades preenchidas com a garantia da responsabilização do ofensor e da sua reintegração e da vítima às suas comunidades As partes secundárias não são direta mente ligadas à vítima e ao ofensor motivo pelo qual não devem tomar para si o conflito e interferir na oportunidade de reconciliação e reparação A sua resposta deve residir no apoio e facilitação dos processos de restauração os quais reintegrarão vítima e ofensor fortalecendo a comunidade aumentando a coesão e ampliando a capacidade dos cidadãos de tratar seus próprios conflitos como forma de garantia de seus direitos fundamentais26 Como último elemento estrutural encontrase a Tipologia das Práticas Restaurativas a qual consiste em chamar todas as partes interessadas sejam diretas ou indiretas para a partir de um processo de conciliação vislumbrar uma solução efetiva ao conflito de modo a suprir as necessidades emocionais de cada um Dessa forma a plena realização do conceito de Justiça Restaurativa somente será verificada com a participação ativa de todos os grupos envolvidos como em conferências ou círculos consoante demonstra a ilustração abaixo Figura 2 Tipos e graus de práticas de justiça restaurativa Fonte MCCOLD WATCHEL 2003 Para compreenderse a forma como atua a Justiça Restaurativa e como visualiza a conduta do ofensor o papel da vítima bem como das partes de apoio importa refletir acerca da prática de um crime e suas conse quências às partes envolvidas no conflito relacionando tais dados à teoria supracitada Consoante manifesta Zehr a prática de um crime e a sua experiência não são tarefas fáceis de serem compreendidas bem como enfrentar o significado de ser uma vítima ou fazer alguém de vítima desencadeia emoções intensas as quais 26 MCCOLD Paul WACHTEL Ted Em busca de um paradigma uma teoria de justiça restaurativa In CONGRESSO MUNDI AL DE CRIMINOLOGIA 13 2003 Rio de Janeiro Disponível em httpwwwrealjusticeorglibraryparadigmporthtml Acesso em 10 out 2007 p 2 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 253 assustam e fazem recuar27 No entanto é preciso compreender o que se faz e por que se faz razão pela qual esse processo será iniciado no presente estudo O modelo restaurativo integra o mediador a vítima o agressor a família deste amigos vizinhos colegas de escola ou de trabalho membros de agremiações desportivas e de congregações religiosas bem como profissionais de área representantes de comunidade ou seja pessoas ou entidades que tenham sido afetadas pela prática do crime e que tenham como desejo a restauração dos valores de segurança justiça solidarismo responsabilidade comunitarismo e civismo28 O caso em estudo tratase de um assalto à mão armada praticado por Anderson um adolescente o qual vitimou uma idosa Na ocasião o adolescente infrator necessitando de dinheiro deparouse com a senhora idosa aproximouse dela e mostroulhe a arma arrancandolhe a bolsa e empregando fuga posteriormente Após o fato delituoso a vítima não saiu mais de casa ficou sem dinheiro por um bom tempo e permanecia com medo de sair à rua receando que outra pessoa igual ao adolescente fosse atacála novamente para agredila e roubála Diante do acontecido submeteramse ao procedimento da câmara restaurativa o ofen sor e a vítima sendo igualmente convidados a participar um professor do adolescente sua irmã e seu tio além de uma filha da vítima Importa salientar que as câmaras restaurativas se caracterizam por reunir pessoas afetadas por uma conduta que causou um grave dano físico psicológico moral objetivando encontrar meios de reparar os prejuízos e evitar a repetição da conduta negativa Nessa oportunidade além da vítima e do infrator partici pam seus respectivos apoios e as autoridades que investigam o fato sendo os trabalhos conduzidos por um mediador devidamente treinado29 A importância do procedimento adotado não reside no escopo de negação da natureza trágica do ocor rido mas em desmistificálo com base no desembaraçamento dos meandros dessa vivência enxergandoa como uma tragédia humana que envolve duas pessoas pessoas que em muitos aspectos se assemelham bastante a nós mesmos30 Ao oportunizar a participação da vítima no processo mostrandolhe um rosto e não apenas uma figura abstrata que deu ensejo ao procedimento criminal dáse a oportunidade de diálogo em um foro seguro para dizer como foram afetadas pois somente elas podem dizer sobre a melhor maneira de reparar o dano sofrido e minimizar consequências futuras31 A vítima ao ser atacada inicialmente vive um processo de choque e negação ao não compreender a razão daquele fato danoso estar acontecendo consigo Algumas vítimas ficam paralisadas incapazes de agir enquanto outras reagem gritam na esperança de serem socorridas e acordadas do pesadelo em que se encontram Por isso são tomadas por sentimentos de confusão impotência pavor e vulnerabilidade Tais emoções e sentimentos acompanham a vítima por algumas semanas posteriores porém surgem a raiva a culpa a suspeita a depressão a ausência de sentido as dúvidas e o arrependimento No caso de uma vítima de roubo perpetrado por um adolescente portando uma faca em que como consequência do ato delitivo teve a perda de seu olho ela lutou constantemente contra os sentimentos 27 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 28 FERREIRA Francisco Amado Justiça restaurativa natureza finalidades e instrumentos Coimbra Coimbra 2006 29 BRANCHER Leoberto Narciso Justiça responsabilidade e coesão social reflexões sobre a implementação na justiça da infân cia e da juventude em Porto Alegre In SLAKMON C MACHADO M BOTTINI P Org Novas direções na governança da justiça e da segurança Brasília Ministério da Justiça 2006 30 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 p 18 31 BRANCHER Leoberto Narciso Justiça responsabilidade e coesão social reflexões sobre a implementação na justiça da infância e da juventude em Porto Alegre In SLAKMON C MACHADO M BOTTINI P Org Novas direções na governança da justiça e da segurança Brasília Ministério da Justiça 2006 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 254 de vergonha e culpa repetidamente se perguntava a razão daquilo ter acontecido com ela o modo da sua reação e se poderia ter agido de outra forma concluindo que o fato decorreu de algum modo de culpa sua Ela sempre lutará com o medo e com a sensação de vulnerabilidade e impotência Alguém assumiu o controle deixandoa impotente e vulnerável e será difícil reconquistar a confiança de sentirse segura e no controle da situação Juto com essa luta interior ela estará tentando recobrar a confiança nos outros no mundo Ela e seu mundo foram violados por alguém e a sensação de estar à vontade com as pessoas com sua casa sua vizinhança e com seu mundo será difícil de resgatar32 A experiência de ser vítima de um crime pode ser muito forte e refletir em todas as áreas da vida Como no caso da senhora que teve sua bolsa subtraída ela não conseguiu mais ficar em casa sozinha ou sair na rua por estar sempre acompanhada pelo medo e pelas lembranças dolorosas sofridas que a levam a pensar no vamente no ocorrido Para as vítimas de crimes os efeitos colaterais são muitas vezes bastante traumáticos e de longo alcance33 Nessa ótica a ideia do procedimento restaurativo realiza a restauração da paz pública e da normalização das relações sociais e recuperação do status quo econômico da vítima quando possível passando para a sua reabilitação psicoativa Salientase igualmente que a reparação em tela não somente referese à indenização por danos físicos materiais psicológicos e sociais da vítima como também possui uma dimensão emocional e simbólica plena de significado e esperança podendo caracterizarse por um pedido de desculpas até por gestos simbólicos de aperto de mão ou abraço entre ofensor e vítima34 O crime tornase traumático por consistir em uma violação do ser uma dessacralização daquilo que é o indivíduo daquilo que acredita e do seu espaço privado Assim o crime revelase como aniquilador porque destrói ou fragiliza dois pressupostos fundamentais sobre os quais a vida é calcada a crença de que o mun do é um lugar ordenado e dotado de significado e a crença na autonomia pessoal Esses dois pressupostos são essenciais para a inteireza do nosso ser35 Por isso compreendese que se o indivíduo conseguir responder aos questionamentos a respeito do por quê e como o fato ocorreu o mundo pode voltar a ser seguro novamente Então as vítimas precisam deixar de ser vítimas e consideraremse sobreviventes progredindo até o ponto onde a agressão e aquele que a fez não mais tenham domínio sobre ela Entretanto além de indenização e respostas as vítimas requerem a oportunidade de expressar e validar suas emoções sua raiva seu medo e sua dor O sofrimento e a dor referemse à violação razão pela qual precisam ser ventilados e ouvidos Ademais elas necessitam de um espaço que seja capaz de ouvilas e não calar a sua história e o seu sofrimento como ocorre no atual sistema judiciário Nesse sentido verificase que o empoderamento restitui a autonomia e o controle sobre seu ambiente isto é revelase como fechaduras novas para as portas ou como uma oportunidade de produzir um novo olhar do sentido de sua vida A seu turno o ofensor ilustrado no presente estudo pelo adolescente Anderson que praticou o roubo sob a justificativa se estar sem dinheiro Na experiência da câmara restaurativa seu tio mostrouse indignado seu professor decepcionado e sua irmã calouse diante do descaso e deboche que o adolescente mostrava No entanto ao relatar os detalhes da vida de ambos na casa dos pais Anderson começou a chorar disse estar arrependido e que sentia muito o que fez à mulher Manifestou o desejo de restituir o valor subtraído porém não possuía meios mas afirmou veemente que não perseguiria sua vítima quando fosse liberado insistindo que não tivesse mais medo 32 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 p 21 33 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 p 23 34 FERREIRA Francisco Amado Justiça restaurativa natureza finalidades e instrumentos Coimbra Coimbra 2006 35 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 p 24 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 255 Nessa oportunidade a senhora idosa após envolverse com o relato e chorar mostrouse mais confiante em voltar para casa e sair à rua confirmando o desejo de receber seu dinheiro de volta mas priorizou um emprego e um lugar decente para o adolescente morar Ao final da reunião Anderson e a vítima abraçaram se ela desejoulhe boa sorte enquanto ele desculpouse novamente A experiência acima relatada revela que as práticas restaurativas estão preocupadas em apoiar os infrato res de forma que eles sejam estimulados a entender aceitar e cumprir com as suas obrigações reconhecen do que não são tarefas impossíveis nem impostas para causarlhes prejuízo ou sofrimento36 No entanto ocorre o inverso Esquecendose que o ofensor já tem pouca autoestima autonomia e poder pessoal razão pela qual recorre a tais práticas ele é tratado de forma a despirse completamente do pouco que tinha deixandoo ainda mais privado de recursos para conseguir autoestima e autonomia de forma legítima Conforme o relato de um homem que passou 17 anos na prisão compreendese que crimes e violências são muitas vezes correlatos e constituem uma forma de afirmar a identidade e o poder pessoal daquele que o comente Bobby foi um menino negro e pobre cujo pai era alcoólatra Diante dos caminhos que a vida apresentou a ele o crime revelouse uma esperança de sair da prisão da nulidade pessoal37 Sua violência não é um fantasma ou doença que os aflige sem motivo nem tampouco um veículo conveniente para paixões hediondas Pelo contrário sua violência é uma adaptação a vidas vazias e muitas vezes brutais A violência de boa parte dos homens violentos é em última análise gerada pela hostilidade e abusos de outros e alimentada pela falta de confiança em si e baixa autoestima Paradoxalmente sua violência é um tipo deformado de autodefesa e serve somente para confirmar os sentimentos de fraqueza e vulnerabilidade que foram a origem primeira dessa mesma violência Quando sua violência atinge vítimas inocentes assinala não um triunfo da coragem mas uma perda de controle38 Portanto verificase a necessidade de o ofensor aprender que é alguém de valor que possui poder e responsabilidades suficientes para tomar boas decisões Compreender ainda o respeito aos outros e seus bens bem como saber lidar pacificamente com situações de frustração e conflito Em vez disso a reação punitivistarepressivista o ensinará a recorrer à violência para obter validação pessoal para conseguir lidar com o mundo e solucionar seus problemas O processo judicial costuma sedimentar estereótipos sobre as vítimas e a sociedade focalizando os erros cometidos pelo ofensor e não ao dano causado à vítima Nesse rumo a responsabilização deve ser encarada mediante a compreensão das consequências humanas advindas dos seus atos ou seja encarar aquilo que faz e a pessoa contra quem atuou fazendo com que o ofensor seja estimulado a ajudar a decidir o que será feito para corrigir a situação bem como as medidas para reparar os danos O grande problema reside no fato de que as sentenças punem os infratores não os tornam responsáveis o que se entende como a causa que os leva a transgredir novamente pois quando uma punição é imposta a uma pessoa responsável esta reage com responsabilidade Mas se ela for considerada irresponsável tal ato a tornará mais irresponsável39 Destarte os mecanismos restaurativos implicam responsabilidade e compromissos concretos do ofen sor fazendoo compreender as consequências dos seus atos e a considerar o mal causado a suas vítimas No entanto o ofensor vê a Justiça como um jogo no qual todos são seus adversários não tendo qualquer 36 BRANCHER Leoberto Narciso Justiça responsabilidade e coesão social reflexões sobre a implementação na justiça da infân cia e da juventude em Porto Alegre In SLAKMON C MACHADO M BOTTINI P Org Novas direções na governança da justiça e da segurança Brasília Ministério da Justiça 2006 37 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 p 36 38 JOHNSON Robert A Life for a Life Justice Quarterly Sl v 1 n 4 p 571 dez 1984 39 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 256 motivação para reconhecer sua responsabilidade e nenhuma chance para expressar seu sentido de respon sabilidade Por isso compreendese que a sensação de alienação em relação à sociedade que a maioria dos infratores sente o sentimento de que eles próprios são vítimas é maximizado pelo processo legal e pela experiência da prisão40 A ofensa foi cometida por uma pessoa que por sua vez também foi violada Embora isto não seja desculpa para seus atos eles de fato nasceram de um histórico de abusos Criança ele sofreu violência física Depois de crescido sofreu violência psicológica e espiritual que feriram seu sentido de ser e relacionarse com o mundo Nenhum aspecto do processo levará estas coisas em consideração Provavelmente nada o conduzirá ao caminho da inteireza41 Vislumbrase portanto que o crime se revela como a forma de afirmação pessoal e valor enquanto pessoa por parte do ofensor Por outro lado tira de alguém o seu sentido de poder pessoal Para reverter tal cenário de forma que a vítima tenha sua inteireza recobrado deve ser devolvida a sua autonomia Para o ofensor recobrar sua inteireza deve desenvolver sua autonomia alheia à ideia de dominação do outro No caso relatado a autonomia das partes foi restaurada a partir da criação de um espaço de diálogo que oportunizou a fala de cada uma das partes diretamente envolvidas sendo expostos sentimentos emoções dores angústias e perspectivas a partir do fato delitivo No entanto o processo restaurativo somente se completou pela participação ativa das partes indiretamente envolvidas quais sejam familiares e comunidade de apoio Após o relato de Anderson e da vítima a irmã dele comprometeuse a conversar com o marido para que ele ficasse em sua residência bem como o professor indicou um trabalho para Anderson conseguir restituir o valor subtraído à idosa Ao trabalhar de forma correta conseguiria um emprego permanente Por sua vez o tio se ofereceu para ajudar nas despesas de Anderson enquanto ficasse na casa de sua irmã colocandose à disposição para o que fosse preciso42 Conforme visto a proposta restaurativa é reavivar as relações comunitárias aproveitandose para fomen tar ideias de encontro e inclusão o que de fato ocorreu no exemplo ora trabalhado O adolescente após reincidir pelo furto de uma bicicleta tornouse responsável possui emprego fixo não apresenta problemas de comportamento sempre visita a irmã e o tio às vezes Já a senhora idosa recuperou seu dinheiro e saiu de casa sempre que deseja sem medo de ser vítima novamente43 A Lei nº 806990 denominada de Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 112 estabelece que uma vez verificada a prática do ato infracional a autoridade competente poderá aplicar uma das seguin tes medidas as quais são denominadas de medidas socioeducativas I advertência II obrigação de reparar o dano III prestação de serviços à comunidade IV liberdade assistida V inserção em regime de semi liberdade VI internação em estabelecimento educacional VII qualquer medidas prevista no artigo 101 Compreendese que a medida socioeducativa será aplicada de acordo com a capacidade do adolescente de cumprila as circunstâncias e a gravidade da infração Para a execução das medidas adotase a Lei nº 125942012 que institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo SINASE e regulamenta a execução das medidas socioeducativas destinadas a adolescente que pratique ato infracional Compreende se nesse contexto que O SINASE parece ser um passo fundamental para unificação e efetivação de prá 40 BRANCHER Leoberto Narciso Justiça responsabilidade e coesão social reflexões sobre a implementação na justiça da infân cia e da juventude em Porto Alegre In SLAKMON C MACHADO M BOTTINI P Org Novas direções na governança da justiça e da segurança Brasília Ministério da Justiça 2006 p 217 41 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 p 44 42 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 43 BRANCHER Leoberto Narciso Justiça responsabilidade e coesão social reflexões sobre a implementação na justiça da infân cia e da juventude em Porto Alegre In SLAKMON C MACHADO M BOTTINI P Org Novas direções na governança da justiça e da segurança Brasília Ministério da Justiça 2006 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 257 ticas no sistema socioeducativo uma vez que se propõe a acompanhar todos os passos desde apuração do ato infracional até a execução e cumprimento das MSE44 No artigo 35 da referida lei estabelecemse os princípios que regem a execução das medidas socioedu cativas Destacase nesse rumo o inciso III pois refere que deve ser dada prioridade a práticas ou medidas que sejam restaurativas e sempre que possível atendam às necessidades das vítimas No Brasil importa destacar que a prática restaurativa é incentivada pelo Conselho Nacional de Justiça revelandose em uma cooperação com a Associação dos Magistrados Brasileiros No entanto as experiên cias ainda são recentes as quais foram iniciadas por meio de três projetospilotos financiados pelo Ministé rio da Justiça Esses projetos tiveram seu início no ano de 2005 nas cidades de Porto Alegre São Caetano do Sul e Brasília com sua execução em escolas no Judiciário na Fundação de Atendimento Socioeducativo FASE e nas comunidades45 A adoção de práticas restaurativas para a execução de medidas socioeducativas decorre a dos inúmeros casos de experiências negativas no contexto do ato infracional e sua responsabilização b da reincidência do adolescente infrator De acordo com o Conselho Nacional de Justiça 43 dos jovens internados em cum primento de medida socioeducativa são reincidentes Temse portanto a necessidade de novos modelos que superem as dificuldades encontradas no sistema socioeducativo qualificando o atendimento ao adolescente à vítima e suas comunidades de apoio46 Para Brancher as reflexões decorrentes da experiência com a Justiça Restaurativa revelam que as princi pais falhas do sistema de justiça residem em a não promover uma escuta qualificada dos conflitos b não atender às necessidades a eles subjacentes e c não promover responsabilização47 A adoção das práticas restaurativas na execução das medidas socioeducativas conforme verificado aci ma contribui para a construção de um novo modelo de justiça criminal o qual busca a partir do diálogo a participação de todos os envolvidos no ato infracional inclusive a vítima a auxiliar na reparação do dano e na restauração das relações atingidas pela prática delitiva Podese afirmar então que a Justiça Restaurativa introduz uma nova maneira de encarar conflitos vio lência e criminalidade não os considerando como desgraças porém como oportunidades de mudanças positivas em benefício de todos Constituise em um modelo de reparação de danos e reconstrução das relações humanas ao passo que compreende os componentes emocionais do conflito e a dinâmica de sua transformação48 4 consideRAções finAis As práticas restaurativas enfraquecem o processo de exclusão dos indivíduos ao possibilitar a huma nização e a pacificação das relações envolvidas em um conflito eis que ao contrário da justiça penal não busca a mera resposta punitiva aos transgressores fato gerador das desigualdades sociais mas propõe um 44 FERRAO Iara da Silva SANTOS Samara Silva dos DIAS Ana Cristina GarciaPsicologia e práticas restaurativas na socioedu cação relato de experiênciaPsicol cienc prof Sl v 36 n 2 p 354363 abrjun 2016 p 357 45 KONZEN Afonso Armando Justiça restaurativa e ato infracional desvelando sentidos no itinerário da alteridade Porto Alegre Livraria do Advogado 2007 46 FERRAO Iara da Silva SANTOS Samara Silva dos DIAS Ana Cristina GarciaPsicologia e práticas restaurativas na socioedu cação relato de experiênciaPsicol cienc prof Sl v 36 n 2 p 354363 abrjun 2016 47 BRANCHER Leoberto A implementação de práticas de justiça restaurativa através do Projeto Justiça para o Século 21 Disponível em wwwjustica21orgbrarquivosbib264doc Acesso em 15 maio 2015 48 BRANCHER Leoberto Narciso Justiça responsabilidade e coesão social Reflexões sobre a implementação na justiça da infância e da juventude em Porto Alegre In SLAKMON C MACHADO M BOTTINI P Org Novas direções na governança da justiça e da segurança Brasília Ministério da Justiça 2006 GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 258 processo colaborativo entre todas as partes envolvidas no fato delituoso Promove assim a pacificação dos conflitos e a interrupção das cadeias de reverberação da violência e dos processos de criminalização Nesse sentido os mecanismos restaurativos adotados pela Justiça Criminal brasileira em especial pelo Estatuto da Criança e do Adolescente para a execução das medidas socioeducativas permitem a efetivação de uma gestão de conflitos participativa democrática e descentralizada baseada nas relações sociais entre a comunidade e o poder público sendo que o resultado desta interação mobiliza o capital social e constitui a rede de cooperação construindo por conseguinte uma ação coletiva de redução das desigualdades sociais e de solidificação do sentimento de pertencimento a uma comunidade atendendo à Doutrina da Proteção Integral Os mecanismos restaurativos não somente se constituem em um novo paradigma de justiça mais con sensual participativa e preocupada com as consequências materiais e emocionais da ofensa nas pessoas atingidas mas apresenta respostas às dificuldades do sistema judicial em cumprir a dignidade humana e cidadania de cada pessoa atingida pela prática de um ato delituoso Tratase portanto de uma boa prática para o sistema penal Verificamse que as experiências da Justiça Restaurativa têm contribuído para a organização e o desenvol vimento da justiça social na construção de um espaço mais solidário e fraterno o que corrobora o compro misso firmado pelo Conselho Nacional de Justiça pelo desenvolvimento das práticas restaurativas as quais se revelam como forma da valorização do ser humano como instrumentos para tratamento de conflito sem violência incentivando a paz e o restabelecimento das relações entre as pessoas RefeRênciAs AUERBACH Jerold S Justiça sem direito In AZEVEDO André Gomma de Org Estudos em arbitragem mediação e negociação Brasília Grupos de Pesquisa 2004 v 3 BOBBIO Norberto MATTEUCI Nicola PASQUINO Gianfranco Dicionário de política Trad De Carmen C Varriale et al 4 ed Brasília UnB 1992 BRANCHER Leoberto Narciso Justiça responsabilidade e coesão social reflexões sobre a implementação na justiça da infância e da juventude em Porto Alegre In SLAKMON C MACHADO M BOTTINI P Org Novas direções na governança da justiça e da segurança Brasília Ministério da Justiça 2006 BRANCHER Leoberto A implementação de práticas de justiça restaurativa através do Projeto Justiça para o Século 21 Disponível em wwwjustica21orgbrarquivosbib264doc Acesso em 15 maio 2015 CAPELLA Juan Ramón Fruto proibido uma aproximação históricoteórica ao estudo do direito e do Estado Porto Alegre Livraria do Advogado 2002 CASTELLS Manuel O poder da identidade a era da informação economia sociedade e cultura Trad de Klauss Brandini Gerhardt 3 ed São Paulo Paz e Terra 1999 v 2 COLET Charlise Paula A promoção dos direitos mínimos do cidadão realizada pelas práticas restaurado ras a quebra da cultura excludente e seletiva do sistema penal In CALLEGARI André Luís Org Direito penal e globalização sociedade de risco imigração irregular e justiça restaurativa Porto Alegre Livraria do Advogado 2011 FARIA José Eduardo KUNTZ Rolf Estado sociedade e direito qual o futuro dos direitos Estado mercado e justiça na reestruturação capitalista São Paulo Max Limonada 2002 FERRAO Iara da Silva SANTOS Samara Silva dos DIAS Ana Cristina Garcia Psicologia e práticas re staurativas na socioeducação relato de experiência Psicol cienc prof Sl v 36 n 2 p 354363 abrjun GIMENEZ Charlise Paula Colet SPENGLER Fabiana Marion A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Rev Bras Polít Públicas Brasília v 8 nº 1 2018 p243259 259 2016 FERREIRA Francisco Amado Justiça restaurativa natureza finalidades e instrumentos Coimbra Coimbra 2006 GARAPON Antoine Bem julgar ensaio sobre o ritual do judiciário Trad de Pedro Filipe Henriques Li sboa Instituto Piaget 1997 GARAPON Antoine Punir em democracia Lisboa Instituto Piaget 2001 JACKOBS Günter MELIÁ Manuel Cancio Direito penal do inimigo noções e críticas Porto Alegre 2007 KONZEN Afonso Armando Justiça restaurativa e ato infracional desvelando sentidos no itinerário da alteri dade Porto Alegre Livraria do Advogado 2007 MCCOLD Paul WACHTEL Ted Em busca de um paradigma uma teoria de Justiça Restaurativa In CONGRESSO MUNDIAL DE CRIMINOLOGIA 13 2003 Rio de Janeiro Disponível em http wwwrealjusticeorglibraryparadigmporthtml Acesso em 10 out 2007 SANTOS Boaventura de Sousa O discurso e o poder ensaios sobre a sociologia da retórica jurídica Porto Alegre S A Fabris 1988 SICA Leonardo Justiça restaurativa e mediação penal Rio de Janeiro Lúmen Júris 2007 SPENGLER Fabiana Marion O estadojurisdição em crise e a instituição do consenso por uma outra cultura no tratamento de conflitos 2007 453 f Tese Doutorado Programa de PósGraduação em Direito Univer sidade do Vale do Rio Sinos UNISINOS São Leopoldo 2007 WOLKMER Antônio Carlos Pluralismo jurídico fundamentos de uma nova cultura no direito 3 ed São Paulo Alfa Omega 2001 ZAFFARONI Eugenio Raul Em busca das penas perdidas Rio de Janeiro Renavan 2001 ZEHR Howard Trocando as lentes um novo foco sobre o crime e a justiça Trad de Tônia Van Acker São Paulo Palas Athena 2008 RESUMO DE ARTIGO Seu nome O artigo intitulado A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil escrito por Charlise Paula Colet Gimenez e Fabiana Marion Spengler traz em sua pesquisa um estudo relacionado a Justiça restaurativa caracterizada como um veículo de humanização dentro da execução das medidas das socioeducativas utilizada portando como um instrumento de restruturação da paz Inicialmente o estudo de Colet e Marion destaca maneiras como essas medidas socioeducativas podem se tornar mais humanizadas apresentando como o senso punitivo é aplicado na sociedade desde os seus primórdios A mediação penal é dada no artigo como um comportamento que vem como uma segurança cognitiva a mediação penal da França é atribuída como uma proposta alternativa para os humanos Neste sentido entendese que as penas são aplicadas para proporcionar a todos os envolvidos meios integrais e eficientes de atribuir aos interessados dos casos desfechos que atendam suas necessidades como vítima ofensor e comunidade Desse modo é enfatizado dentro do artigo como é necessário aplicar métodos de tratamento para conflitos Adiante o artigo também traz o conceito de Justiça Restaurativa também é abordado e como está assume um papel de matriz teórica dentro do emprego da justiça como um todo Nessa ótica as adoções de práticas dentro da execução de medidas socioeducativas são fundamentadas através do artigo 3º do Estatuto da Criança e do Adolesceste ECA pois traz concepções e diretrizes sobre os direitos dos jovens e como estes devem ser extremamente respeitados assegurando que todos tenham chances de gozar de oportunidades e possam ter sua integridade física e moral preservadas A Justiça Restaurativa pode ser distinguida da Justiça Retributiva devido sua aplicabilidade uma vez que esse tipo de justiça visa principalmente o dialógico e o consenso para proporcionar o respeito e dignidade dentro das penas e para todos os envolvidos Nesse sentido a Justiça Restaurativa entende que o ofensor e vítima devem participar da busca consensual na resolução dos conflitos devendo sempre cada um assumir sua responsabilidade e reparar os danos causados a outra além de reconhecer os impactos emocionais e psicológicos causados O artigo também traz questões sobre a aplicação dessas práticas para restabelecer as relações sociais e também dentro das execuções das medidas socioeducativas onde é atribuído uma importância necessária para garantir o desenvolvimento dos jovens que violaram os ordenamentos legais O Estado também faz parte do tema uma vez que cabe a ele a manutenção da ordem pública e da resolução de conflitos os autores argumentam que em situações de crises o Estado deve fornecer meios essenciais para atender as demandas da sociedade inclusive a aplicabilidade de meios que regulamentem as demandas regionais descentralizadas do poder estatal Os autores apresentam alternativas para a mitigação dos efeitos negativos de medidas socioeducativas são tomadas desconsiderando o bemestar dos envolvidos Uma das medidas da Justiça Restaurativa abordada dentro da construção do artigo é de que a promoção da reconciliação entre as partes envolvidas deve ser um dos meios principais de reparar danos assim os envolvidos podem priorizar a paz social e reparar os danos causados de maneira equivalente por meio de valores da comunidade assim somente a punição ao infrator não gera o arrependimento necessário tão pouco proporciona educação e restabelece seus valores éticos e morais se faz necessário uma aplicação de elementos práticos que tragam ao infrator o reconhecimento do seu delito e de seus impactos Nesse modelo de justiça o foco é lidar com as problemáticas questões que envolvem a execução das medidas socioeducativas também é restaurar as relações familiares sociais e do indivíduo com a comunidade ao seu redor incluindo as famílias afetadas pelo crime como os familiares da vítima do infrator e profissionais que lidam com os casos Os autores também trouxeram dentro da obra exemplificações práticas como um caso de assalto a mão armada praticado por um adolescente chamado Anderson o desfecho do crime foi agressão a uma vítima idosa que após o ocorrido não saiu mais de casa nesse caso foram aplicadas as metodologias da Justiça Restaurativa entre vítima e agressor também participaram a irmã do agressor e seu professor além da filha da vítima idosa Ao apresentar esse tipo de ilustração os autores proporcionam aos leitores uma narrativa mais abrangente de sua pesquisa demonstrando com clareza na prática como a Justiça Restaurativa pode ser exercida contribuindo para o melhoramento dos jovens e para restaurar seu convívio na sociedade Além disso os procedimentos adotados durante a Justiça Restaurativa são classificados como de suma importância para que as vítimas possam superar seus traumas Colet e Marion também apresentam as legislações envolvidas na Justiça Restaurativa como o ECA e o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo que são responsáveis por promover a aplicação de tais métodos para lidar com infratores de forma mais humanizada durante a execução das medidas socioeducativas desse modo é possível identificar atos normativos e ordenamentos jurídicos a serem seguidos durante o processo de punibilidade e das medidas socioeducativas para os jovens infratores respeitando sempre a dignidade da pessoa humana De fato é possível observar que o processo de restauração proporciona para as partes a possibilidade de participarem ativamente na busca por soluções para seus conflitos também são incentivadas a expressar como realmente foram afetadas se sentiram em relação ao fato ocorrido sem medo de expressar seus sentimentos medos e traumas isso permite que todos entendam as consequências e os danos causados A leitura também destaca que por meio da Justiça Restaurativa vítima e agressor podem expor suas emoções e traumas após os crimes buscando proporcionar principalmente um ambiente seguro que estimule as emoções e compreensões de ambos os envolvidos Para os autores também é importante se aprofundar no comportamento do criminoso analisando desde sua infância até o ato praticado uma vez que que muitas vezes esses indivíduos passaram por situações traumáticas e de abuso que despertam gatilhos e contribuem para a sua vida criminosa Dado o exposto o artigo de Charlise Paula Colet Gimenez e Fabiana Marion Spengler traz as perspectivas dos autores sobre a Justiça Restaurativa e sua contribuição positiva na humanização das medidas socioeducativas Neste sentido os mecanismos utilizados para tal fato não exercem somente um novo paradigma para a justiça criminal brasileira como também oferecem meios para restaurar as relações sociais questões emocionais e danosas atribuídas a conduta dos infratores além de proporcionar as vítimas meios para superar seus traumas A Justiça Restaurativa oferece meios para encontrar respostas para as ocorrências dentro do sistema judicial promovendo desenvolvimento da justiça social e contribuindo para restaurar a cultura da paz na sociedade Além de contribuir para que os jovens infratores sejam tratados de forma humanizada para que a participação na gestão dos conflitos contribua para restaurar os valores morais e éticos destes REFERÊNCIAS COLET Charlise Paula MARION Spengler Fabiana A justiça restaurativa como instrumento de fortalecimento da cultura de paz uma nova perspectiva para a execução das medidas socioeducativas no Brasil Revista Brasileira de Políticas Públicas v 8 n 1 22 maio 2018 Apr 30 2024 Plagiarism Scan Report Excluded URL None Content Checked for Plagiarism escrito por Charlise Paula Colet Gimenez e Fabiana Marion Spengler traz em sua pesquisa um estudo relacionado a Justiça restaurativa caracterizada como um veículo de humanização dentro da execução das medidas das socioeducativas utilizada portando como um instrumento de restruturação da paz Inicialmente o estudo de Colet e Marion destaca maneiras como essas medidas socioeducativas podem se tornar mais humanizadas apresentando como o senso punitivo é aplicado na sociedade desde os seus primórdios A mediação penal é dada no artigo como um comportamento que vem como uma segurança cognitiva a mediação penal da França é atribuída como uma proposta alternativa para os humanos Neste sentido entendese que as penas são aplicadas para proporcionar a todos os envolvidos meios integrais e ecientes de atribuir aos interessados dos casos desfechos que atendam suas necessidades como vítima ofensor e comunidade Desse modo é enfatizado dentro do artigo como é necessário aplicar métodos de tratamento para conitos Adiante o artigo também traz o conceito de Justiça Restaurativa também é abordado e como está assume um papel de matriz teórica dentro do emprego da justiça como um todo Nessa ótica as adoções de práticas dentro da execução de medidas socioeducativas são fundamentadas através do artigo 3º do Estatuto da Criança e do Adolesceste ECA pois traz concepções e diretrizes sobre os direitos dos jovens e como estes devem ser extremamente respeitados assegurando que todos tenham chances de gozar de oportunidades e possam ter sua integridade física e moral preservadas A Justiça Restaurativa pode ser distinguida da Justiça Retributiva devido sua aplicabilidade uma vez que esse tipo de justiça visa principalmente o dialógico e o consenso para proporcionar o respeito e dignidade dentro das penas e para todos os envolvidos Nesse sentido a Justiça Restaurativa entende que o ofensor e vítima devem participar da busca consensual na resolução dos conitos devendo sempre cada um assumir sua responsabilidade e reparar os danos causados a outra além de reconhecer os impactos emocionais e psicológicos causados O artigo também traz questões sobre a aplicação dessas práticas para restabelecer as relações sociais e também dentro das execuções das medidas socioeducativas onde é atribuído uma importância necessária para garantir o desenvolvimento dos jovens que violaram os ordenamentos legais O Estado também faz parte do tema uma vez que cabe a ele a manutenção da ordem pública e da resolução de conitos os autores argumentam que em 0 Plagiarized 100 Unique Characters6490 Words994 Sentences39 Speak Time 8 Min Page 1 of 3 situações de crises o Estado deve fornecer meios essenciais para atender as demandas da sociedade inclusive a aplicabilidade de meios que regulamentem as demandas regionais descentralizadas do poder estatal Os autores apresentam alternativas para a mitigação dos efeitos negativos de medidas socioeducativas são tomadas desconsiderando o bemestar dos envolvidos Uma das medidas da Justiça Restaurativa abordada dentro da construção do artigo é de que a promoção da reconciliação entre as partes envolvidas deve ser um dos meios principais de reparar danos assim os envolvidos podem priorizar a paz social e reparar os danos causados de maneira equivalente por meio de valores da comunidade assim somente a punição ao infrator não gera o arrependimento necessário tão pouco proporciona educação e restabelece seus valores éticos e morais se faz necessário uma aplicação de elementos práticos que tragam ao infrator o reconhecimento do seu delito e de seus impactos Nesse modelo de justiça o foco é lidar com as problemáticas questões que envolvem a execução das medidas socioeducativas também é restaurar as relações familiares sociais e do indivíduo com a comunidade ao seu redor incluindo as famílias afetadas pelo crime como os familiares da vítima do infrator e prossionais que lidam com os casos Os autores também trouxeram dentro da obra exemplicações práticas como um caso de assalto a mão armada praticado por um adolescente chamado Anderson o desfecho do crime foi agressão a uma vítima idosa que após o ocorrido não saiu mais de casa nesse caso foram aplicadas as metodologias da Justiça Restaurativa entre vítima e agressor também participaram a irmã do agressor e seu professor além da lha da vítima idosa Ao apresentar esse tipo de ilustração os autores proporcionam aos leitores uma narrativa mais abrangente de sua pesquisa demonstrando com clareza na prática como a Justiça Restaurativa pode ser exercida contribuindo para o melhoramento dos jovens e para restaurar seu convívio na sociedade Além disso os procedimentos adotados são de suma importância para que a vítima possa desmembrar os traumas do ocorrido de seu psicológico Durante o processo de restauração as partes são incentivadas a expressar como se sentiram em relação ao fato ocorrido isso permite que todos entendam as consequências e os danos causados ajudando a vítima a trabalhar seu trauma e o infrator a entender o impacto de suas ações além de proporcionar um trabalho em conjunto para encontrar soluções que possam ajudar ambos os envolvidos e encontrar soluções ecientes A leitura também destaca que por meio da Justiça Restaurativa vítima e agressor podem expor suas emoções e traumas após os crimes buscando proporcionar principalmente um ambiente seguro que estimule as emoções e compreensões de ambos os envolvidos Além disso os autores ressaltam como é importante conhecer e se aprofundar no comportamento do criminoso analisando desde sua infância até o ato praticado tendo em vista que muitas vezes esses passam por situações de ab O artigo traz ainda as legislações envolvidas na Justiça Restaurativa como o ECA e o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo responsáveis por promover a aplicação de tais métodos para lidar com infratores de modo a humanizar ecientemente a execução das medidas socioeducativas Dado o exposto o Page 2 of 3 artigo de Charlise Paula Colet Gimenez e Fabiana Marion Spengler traz as perspectivas dos autores sobre a Justiça Restaurativa e sua contribuição positiva na humanização das medidas socioeducativas Neste sentido os mecanismos utilizados para tal fato não exercem somente um novo paradigma para a justiça criminal brasileira como também oferecem meios para restaurar as relações sociais questões emocionais e danosas atribuídas a conduta dos infratores além de proporcionar as vítimas meios para superar seus traumas Sources Home Blog Testimonials About Us Privacy Policy Copyright 2024 Plagiarism Detector All right reserved Page 3 of 3