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22102020 Favela é comunidade artigo Dicionario de Favelas Marielle Franco httpswikifavelascombrindexphptitleFavelaécomunidade3Fartigo 110 Favela é comunidade artigo Autora Patrícia Birman Artigo originalmente publicado como capítulo de livro em Vida sob cerco violência e rotina nas favelas do Rio de Janeiro organizado por Luiz Antonio Machado da Silva e publicado pela editora Nova Fronteira em 2008 Texto gentilmente cedido para divulgação neste Dicionário pela autora Favela é comunidade Um lugar comum o eufemismo Samba respeito e tradição Relações face a face histórias em comum Contrapor identidades à identificação Se uma favela não é uma comunidade o que seriam então os favelados A comunidade e suas práticas reflexivas Favela é comunidade Em 25 de outubro de 2007 o governador Sérgio Cabral afirmou no curso de uma entrevista1 que o aborto pode funcionar como forma de controle da violência nas favelas Estas segundo ele seriam verdadeiras fábricas de marginais Vale a pena citálo mais longamente A questão da interrupção da gravidez tem tudo a ver com a violência pública Quem diz isso não sou eu são os autores do livro Freakonomics Steven Levitt e Stephen J Dubner Eles mostram que a redução da violência nos EUA na década de 90 está intrinsecamente ligada à legalização do aborto em 1975 pela suprema corte americana Porque uma filha da classe média se quiser interromper a gravidez tem dinheiro e estrutura familiar todo mundo sabe onde fica Não sei por que não é fechado Leva na Barra da Tijuca não sei onde Agora a filha do favelado vai levar para onde se o Miguel Couto não atende Se o Rocha Faria não atende Aí tenta desesperadamente uma interrupção o que provoca situação gravíssima Sou favorável ao direito da mulher de interromper uma gravidez indesejada Sou cristão católico mas que visão é essa Esses atrasos são muito graves Não vejo a classe política discutir isso Fico muito aflito Tem tudo a ver com violência Você pega o número de filhos por mãe na Lagoa Rodrigo de Freitas Tijuca Méier e Copacabana é padrão sueco Agora pega na Rocinha É padrão Zâmbia Gabão Isso é uma fábrica de produzir marginal Estado não dá conta Não tem oferta da rede pública para que essas meninas possam interromper a gravidez Isso é uma maluquice só As declarações do governador se fizeram no curso de um período particularmente difícil para os que nesse momento viviam em Vila Cruzeiro ou em suas redondezas onde durante sessenta dias armouse um campo de batalha com uma ocupação militar e uma movimentação de tropas do Bope e da Guarda Nacional que buscavam derrotar os chefes do tráfico local lá entricheirados As mortes que ocorreram e as inúmeras pessoas feridas foram consideradas acidentes de percurso que não retiraram na esfera pública a legitimidade da operação policialmilitar No mesmo mês sob o impacto dessas últimas ações do governo realizouse o Seminário Favela é cidade violência e ordem pública2 do qual participei integrando a mesaredonda Favela é comunidade que deu origem ao presente texto A mesaredonda convidou os participantes do Seminário a debater as questões que associam as identidades atribuídas Índice 22102020 Favela é comunidade artigo Dicionario de Favelas Marielle Franco httpswikifavelascombrindexphptitleFavelaécomunidade3Fartigo 210 às favelas e seus moradores à criminalização de que estes são objeto Os argumentos desenvolvidos neste texto buscam refletir a respeito dessas questões identitárias que envolvem múltiplos atores na cidade do Rio de Janeiro sejam estes das favelas de agências estatais ou ainda de outros grupos sociais Podemos perceber nas entrelinhas da fala do governador uma defesa velada nem tão velada assim aliás de uma política de eugenia diminuindo o número de nascidos nestas fábricas de marginais que seriam as favelas com vistas a purificar a cidade Sua opinião tornada pública juntamente com a ocupação policial e o cerco militar de favelas demonstram cabalmente o quanto a forma de identificar pessoas e grupos não é uma atividade inócua principalmente quando quem produz identificações deste teor é o responsável maior pelo governo aquele que tem a princípio maior poder de conformar a administração do Estado aos seus julgamentos Não basta portanto apontar a relação entre o discurso sobre as fábricas de marginais e a política de repressão ao crime que governo do estado do Rio realiza Creio que é preciso refletir mais claramente sobre os nexos existentes entre as identificações promovidas por este discurso e as políticas governamentais que são praticadas e que possuem as favelas como alvo O que o governador destaca é essencialmente uma proposta de tratamento epidemiológico da população favelada que é coerente com o atributo através do qual ele a identifica uma fábrica de marginais Para esta característica maior que ele aponta haveria técnicas de governo que poderiam ser adequadas para eliminar o problema No caso aventado ele sugere como outros aliás já o fizeram medidas de planejamento familiar O que parece estar em causa é objeto de uma de reflexão do historiador póscolonial Partha Chatterjee3 Passemos a citálo Diferentemente do conceito de cidadão que carrega uma conotação ética de participação na soberania do Estado o conceito de população torna accessível aos funcionários governamentais um conjunto de instrumentos racionalmente manipuláveis para alcançar largos setores de habitantes de um país enquanto alvos de suas políticas políticas econômicas políticas administrativas justiça e mesmo mobilização política Chatterjee 2004107 As tecnologias do governamental afirma ele cresceram em detrimento de políticas cidadãs nas sociedades avançadas que se constituíram como EstadosNação no século XIX através de orientações liberais que prevaleceram nas últimas décadas Este diagnóstico no entanto não cabe para sociedades que foram colonizadas como a nossa Para estas sociedades africanas asiáticas e americanas as tecnologias do governamental precederam largamente à questão da cidadania e continuam a prevalecer enquanto orientação do Estado sem que grande parte dos indivíduos membros das sociedades nacionais tenha acesso à condição de cidadãos O mencionado autor cita exemplos retirados de antigas colônias No sul da Ásia por exemplo a classificação descrição e enumeração de grupos populacionais como objetos de políticas públicas relacionadas à demarcação de terras impostos recrutamento para o exército prevenção ao crime saúde pública administração das penúrias e secas regulamentação dos locais religiosos moralidade pública educação e uma multidão de funções governamentais têm uma história pelo menos um século e meio anterior ao nascimento dos EstadosNação independentes da Índia Paquistão e Sri Lanka Ali as populações tinham o status de sujeitos e não de cidadãos Obviamente a dominação colonial não reconhecia a soberania popular Chatterjee 2004110 A intenção não é de estabelecer mais uma vez para as sociedades com um passado colonial um regime de falta em relação ao modelo europeu dos Estadosnação O autor busca analisar a presença de um outro modelo que conectaria estas populações ao Estado por intermédio de agências governamentais A maior parte dos habitantes da India são apenas vagamente e ainda assim de forma ambígua e contextual cidadãos portadores de direitos no sentido imaginado pela constituição Não são propriamente portanto membros da sociedade civil e não são reconhecidos enquanto tal pelas instituições do Estado Mas não é como se estivessem 22102020 Favela é comunidade artigo Dicionario de Favelas Marielle Franco httpswikifavelascombrindexphptitleFavelaécomunidade3Fartigo 310 fora do alcance do Estado ou mesmo excluídos do domínio do político Enquanto populações dentro da jurisdição territorial do Estado tanto são visados como controlados por várias agências governamentais Chatterjee 2004 112 O tratamento epidemiológico sugerido pelo governador do estado do Rio de Janeiro cabe perfeitamente neste modelo diz respeito a um conjunto de técnicas governamentais que operam buscando identificar e caracterizar as populações com vistas a buscar soluções para os problemas engendrados no quadro destas identificações Os processos de identificação dos grupos favelados em curso não é difícil supor não os reconhecem como portadores de direitos civis por um lado e por outro qualificamnos negativamente o que tem dado lugar ao longo da história a políticas territoriais específicas como forma de controle de seus comportamentos e do seu acesso à cidade O trabalho pioneiro de Valadares 2005 é precioso por descrever o que foi a invenção da favela isto é o processo histórico que envolvendo uma multiplicidade de atores governamentais e não governamentais deu lugar à identificação de certos territórios como favela Os trabalhos de Machado da Silva e Leite nesta coletânea analisam a centralidade da política de criminalização desses territórios atualmente em curso4 A pergunta da mesaredonda Favela é Comunidade é pois do maior interesse pela importância social e política que possuem as formas de identificação da população favelada A noção de comunidade ganha relevo posto que é acionada em muitas circunstâncias inclusive pelos agentes do Estado Mas o seu maior interesse devese em parte ao fato que é através dela que se aciona formas de autoidentificação dos moradores destes territórios em oposição à identificações vindas de fora Um dos usos mais generalizados do termo comunidade tem sido pois aquele de um contradiscurso que argumenta a favor dos habitantes das favelas destacando as boas qualidades morais que estes teriam passíveis de serem comprovadas pelos seus modos de vida e pela cultura que possuem Estes contradiscursos buscam responder no mesmo diapasão àqueles que produzem enunciados segregadores como esse que citamos que identificam entre outras coisas a favela como fábrica de marginais Os jogos identitários que há muito tempo ocupam a cena pública em torno das favelas sugerem pois tanto uma presença constante de um tratamento dessas populações através de medidas segregadoras como de resistência dessas populações a estas políticas e as formas variadas de serem identificadas em acordo com estas Favelado como há muito tempo estamos cientesé uma das designações mais segregadoras de uso corrente na cidade5 Este termo participa freqüentemente das formas de se criar e se reproduzir como enclaves na cidade as favelas6 juntamente com dispositivos de submissão de seus moradores às políticas de segregação em curso Favelização podemos sugerir é o nome que podemos dar a este conjunto de mecanismos relacionados às formas específicas de elaborar fronteiras para administrar esses enclaves A favelização parece gerar efeitos circulares que se perdem num emaranhado de relações de causa e efeito as quais terminam no seu conjunto por negar os nexos históricos com os dispositivos postos em ação pelo Estado Como se por exemplo a precariedade dos serviços públicos nestes territórios não fizesse parte da elaboração das identificações negativas de sua população tal como exemplarmente enunciada pelo governador do Rio de Janeiro As tentativas de contrapor o termo comunidadeao termo favelafazem parte de esforços sob um prisma cultural de oposição a estas políticas São estas tentativas que irei discutir aqui7 Vou então apresentar rapidamente alguns de seus usos para tentar responder à questão que provocativamente os organizadores do colóquio nos sugeriram como matéria de reflexão O mais interessante nesta pergunta não reside certamente numa resposta cabal positiva ou negativa à pergunta favela é comunidade o que nos levaria a indagar o impossível quais seriam os bons critérios para reconhecer uma verdadeira comunidadeou definir um território como favela O que de fato interessa é saber por quecomunidade virou um termo pauparatodaobra um grande vagão no qual tudo pode se acomodar no quadro dessas relações discriminatórias intensas e situações tão conflitivas Em outras palavras meu interesse reside em compreender de que formas as referências que hoje se fazem às favelas 22102020 Favela é comunidade artigo Dicionario de Favelas Marielle Franco httpswikifavelascombrindexphptitleFavelaécomunidade3Fartigo 410 quaisquer que sejam os termos empregados se associam a esta situação larvar envolvendo fundamentalmente práticas criminalizantes e tentativas de descriminalização Os atores destas identificações não são somente aqueles que participam diretamente do governo mas também as várias agências e associações que lá se encontram igrejas clubes de futebol ongs associações culturais diversas Contudo não encontramos unanimidade em relação a estas identificações De certo modo todos os atores participam contra ou a favor das controvérsias relativas às políticas de governo e aos fundamentos identitários que permitem a sua efetivação O que prevalece nos discursos governamentais é a suposição muitas vezes sequer explicitamente enunciada que a população desses territórios possui um perfil próprio inconfundível que faria dela um grupo com uma cultura específica no interior da cidade Do meu ponto de vista como estou tentando deixar claro o mais importante aqui não é dizer que tal ou qual especificidade cultural atribuída à favela é falsa ou não foi ainda cientificamente comprovada não se trata de responder ao governador e aos que pensam como ele que a favelanão éum reduto de marginais mas éuma comunidade de trabalhadores ou de afirmar que ela éuma comunidade cristã ou ainda que ela atualmente estaria perdendo os seus valores e práticas tradicionais como o samba e a capoeira A meu ver é mais interessante abandonar toda e qualquer tentativa de discutir as identidades para em seu lugar discutir as políticas de identificação e seus efeitos Busco aqui desenvolver o argumento sustentado por Gérard Noiriel que defende a necessidade de realização de estudos sobre formas e políticas de identificação em lugar de privilegiar o estudo de identidades8 O problema não é mais então de se interrogar infinitamente sobre a definição de identidade nas diferentes culturas mas de estudar as práticas concretas e as técnicas de identificação à distância encarandoas como relações de poder colocando em contato os indivíduos que possuem os meios de definir a identidade dos outros e aqueles que são objeto de seus empreendimentos Noiriel 2007 5 Assim o termocomunidadevai ser analisado sem que busquemos a sua maior ou menor correspondência à suposta identidade destes lugares O que me interessa é perceber como e com quais intenções este termo é acionado nesse quadro de criminalização dos territórios favelados O uso generalizado do termocomunidadequando se quer referir a favelas ou a outros espaços estigmatizados relacionase até onde posso distinguir a quatro intenções maiores que eu gostaria de destacar Dentro dos meus limites vou procurar mencionar quais atores sociais se encontram envolvidos com os seus usos e propor um alargamento das discussões sobre este tema Um lugar comum o eufemismo A primeira intenção seria pois evitar mencionar a identificação supostamente verdadeira ou ao menos reconhecida como vigente por aquele que fala sobre um lugar a favela e sobre ou com pessoas os ditos favelados através de uma categoria que reconhecidamente seria estigmatizante Uma valorização do eufemismo parece importante na dinâmica das relações sociais Seu emprego permitiria em parte contornar o valor negativo que certas expressões espelham O eufemismo no entanto não afronta o estigma Seu uso indica uma relação de cortesia necessária no curso das trocas sociais que se passam com aqueles que não podem se desfazer de suas marcas Uma delicadeza portanto ligada às circunstâncias penosas que a vida imporia e também às muitas modalidades de relações que envolvem os moradores e as pessoas de fora Observamos que este uso é generalizado entre diferentes grupos sociais a mesma preocupação pode levar a substituir o termo comunidade por outro equivalente como morro ou bairro Como o emprego do primeiro termo não é reservado a um uso eufemístico e é também muitas vezes associado a situações de discriminação a intenção de evitar ferir ou de trazer à tona esta ferida social não está garantida a priori Contudo sabemos todos que nas trocas sociais o mais importante é o sentido que se elabora no interior das suas dinâmicas O esforço continuado para não ferir as pessoas que acompanha as trocas sociais correntes motiva o uso do 22102020 Favela é comunidade artigo Dicionario de Favelas Marielle Franco httpswikifavelascombrindexphptitleFavelaécomunidade3Fartigo 510 termo comunidade em muitos momentos inclusive por aqueles diretamente concernidos as pessoas que moram em favelas quando se referem a seus locais de moradia Empregado pela mídia pelo governo pelas associações locais pelas ongs o termo comunidade muitas vezes explicita a dificuldade dessa operação de levar em conta o que pensam os que se vêm nomeados de uma forma negativa Pareceme recorrente o uso de eufemismos quando aqueles que produzem as identificações e participam dos mecanismos de sua aplicação precisam negociar com as populações por eles identificadas Em circunstâncias de negociação como em contatos eleitorais e políticos em inaugurações de obras públicas entre outras atividades favelas são tratadas como comunidades e seus moradores como cidadãos capazes de exercer os seus direitos como por exemplo aquele do voto Se este uso eufemístico é recorrente vale observar que em muitas circunstâncias do ponto de vista dos moradores o que é mais reivindicado é a nãoidentificação ou seja preferencialmente a anulação de qualquer referência à identidade territorial em trocas sociais diversas Neste movimento ao contrário dos usos eufemísticos o que parece estar presente é uma recusa de se ver reduzido às especificidades negativas que esta identificação comunidade busca com pouco sucesso ultrapassar O termo comunidade em seus usos eufemísticos não é capaz de impedir a associação da pessoa com os traços negativos provenientes desta identificação somente indica a suspensão destes pelo uso momentâneo de aspas que podem ser retiradas quando preciso for Samba respeito e tradição A segunda intenção freqüentemente associada à primeira é aquela que visa explorar em contraponto certos sentidos positivos associados à tradicionalidade que seria própria à cultura da população favelada Na história do país a tradição católica orienta uma das percepções mais difundidas da noção de comunidade entre nós9 A harmonia seria um dos seus traços mais importantes Prevalece como um viés católico dessa harmonia comunitária a valorização de um princípio hierárquico estruturando as relações entre os desiguais As relações de poder investidas pelo valor da hierarquia dariam lugar a uma complementaridade dos papéis sociais cujo ordenamento faria num certo sentido parte da sacralidade de uma vida comunitária da qual o modelo já estaria presente desde os primeiros cristãos A Teologia da Libertação corrente da igreja que como sabemos defendeu uma versão política e igualitária da comunidade cristã espalhou pelo Brasil afora um ideal comunitário que se realizaria pela solidariedade política entre os pobres A comunidade neste caso seria a coletividade dos pobres organizados10 Em quaisquer das versões mais ou menos conservadoras do catolicismo a comunidade possui um caráter substantivo e um sentido intrinsecamente positivo dela emanariam valores morais que teriam sua fonte nos pobres naqueles situados nos últimos lugares da escala social A complementaridade entre ricos e pobres pelas suas qualidades diferenciais garantiria assim a harmonia das comunidades internamente diferenciadas mas estruturadas segundo um mesmo e único eixo aquele da hierarquia A pobreza no catolicismo lembremos possui um diferencial moral positivo que ao longo dos séculos sacralizou a hierarquia social mundana Um eixo hierárquico informa também a associação entre esta noção de comunidade e o emprego de uma certa percepção da cidadania fundada na idéia de uma pessoa civilizada que aceita agir em acordo com a ordem social na qual se integra em contraste com outras que de fato não mereceriam ser reconhecidas como plenamente humanas11 A noção de comunidade baseada em valores católicos não precisa ser explicitamente religiosa como aliás freqüentemente não é as referências a comunidade como lugar de realização da hierarquia e da complementaridade entre os diferentes se encontra ancorada num catolicismo difuso que se confunde em algumas circunstâncias com o que seria próprio do patrimônio nacional Ela ganhou para certas agências governamentais e não governamentais um valor emblemático como lugar de realização de valores tradicionais A imagem que resulta desta concepção identitária é positiva e fartamente acionada tanto por moradores de favelas quanto pela sociedade mais ampla em momentos em que se quer valorizar os elos dos primeiros com a segunda Assim as lideranças locais de favelas podem 22102020 Favela é comunidade artigo Dicionario de Favelas Marielle Franco httpswikifavelascombrindexphptitleFavelaécomunidade3Fartigo 610 se dirigir a agentes do Estado para falar da nossa comunidade e de seus problemas No mesmo diapasão as autoridades políticas podem mencionar seu compromisso com alguns projetos que pretendem desenvolver na comunidade Os mesmos procedimentos são acionados por associações locais e ongs Não é preciso mencionar o quanto este termo é empregado em momentos de congraçamento como o carnaval no qual as comunidades desfilam aplaudidas pelas autoridades e pela boa sociedade carioca Não é difícil reconhecer certos movimentos de patrimonialização de manifestações culturais que ocorrem em favelas como maneiras de preservar o que nestas seria mais autêntico Gonçalves 1996 Políticas de tombamento de preservação cultural por meio de incentivos fiscais entre outras fazem parte das políticas públicas e envolvem comunidades de favela em certos casos Algumas festas da comunidade reafirmam a existência de um território guiado por valores dessa catolicidade difusa onde se ancorariam as raízes nacionais Um viés romântico mantémse nas tentativas de revalorizar as tradições comunitárias que aliam moradores com movimentos voltados para o incentivo à cultura local à recuperação de atividades tradicionais como formas também afirmam alguns de salvar a comunidade da destruição em curso A cultura seja esta material ou imaterial como se diz hoje em dia é recorrentemente acionada como modo de contrapor a favela lugar disruptivo e violento à comunidade lugar da harmonia e de projetos civilizacionais associados às raízes culturais e étnicas da nação a capoeira o samba o forró a festa do santo padroeiro a arte de origem africana A imagem da favelacomunidade traz um forte apelo seria através dos muitos meios do seu emprego o lugar de encontro da favela com o ideal de harmonia e de tradição Esta imagem da favelacomunidade cria espaços de negociação pontes entre grupos de dentro e de fora e estrutura também uma certa presença do Estado que busca realizar seus projetos de intervenção Assinalemos que o crescimento do pentecostalismo nas periferias urbanas tem dificultado a percepção totalizante que esta noção de comunidade possui Birman 2007 Birman e Leite 2000 Seu caráter conflituoso e em antagonismo permanente com a herança católica e afrobrasileira desfaz constantemente esta imagem comunitária chamando atenção para a fragmentação que acompanha a heterogeneidade social e cultural de seus habitantes Preteceille e Valladares 1999 Mas os pentecostais propõem também um modelo civilizacional que tem sido apoiado pelo Estado Muitas lideranças pentecostais têm buscado falar em nome da comunidade enfatizando a dominância evangélica nesses territórios A imagem da favelacomunidade é pois constantemente acionada para desfazer os discursos que englobam seus moradores pela identificação destes com os traficantes e seus crimes As tentativas de se distinguir desses grupos por intermédio da noção de comunidade têm se mostrado difíceis não somente pelo fato do discurso criminalizador ser dominante mas também porque este tem uma eficácia que se apóia na mídia e em um certo consenso social na cidade A razão mais relevante no entanto reside no fato de o discurso de valorização da favela como comunidade não questionar os fundamentos segregadores da política de criminalização Antes busca afirmar primordialmente que tal política de identificação seria inadequada em relação a esta população específica Esta teria bons motivos para garantir aos que os identificam assim que ao contrário do que pensam eles são moralmente confiáveis e culturalmente adequados para serem aceitos como cidadãos na cidade12 As políticas de governo em curso freqüentemente justificam seus projetos como intervenções de caráter civilizatório que teriam o objetivo de promover uma integração à cidadania Enfatizase assim a necessidade de uma mudança de valores para garantir aos favelados o acesso à cidadania13 Neste caso temos claramente um deslizamento de uma concepção política que compreende a cidadania como direitos civis para uma concepção culturalista que subordina a demanda por direitos à aquisição de um passaporte cultural a ser obtido progressivamente pela transformação de uma população vista como incivilizada em indivíduos reeducados através do reaprendizado de uma boa identidade Farias 2007 Relações face a face histórias em comum 22102020 Favela é comunidade artigo Dicionario de Favelas Marielle Franco httpswikifavelascombrindexphptitleFavelaécomunidade3Fartigo 710 Visto de dentro e empregado pelos próprios moradores o termo comunidade pode também ganhar uma importância particular quando associado às relações face a face entre os habitantes do lugar14 Não imunes a preconceitos nem ao uso dos estereótipos correntes os habitantes das favelas nem por isso aceitam sem ambigüidade e desgosto estas identificações negativas Sob o prisma das relações de proximidade os moradores podem descrever os acontecimentos que ali vivem enfatizando que seus lugares de moradia teriam para eles uma densidade afetiva própria ligada a suas experiências de vida Por exemplo o acúmulo de experiências que certas pessoas tiveram através do partilhamento de um mesmo espaço de lazer como uma quadra de futebol uma pracinha uma creche uma birosca um curso noturno um prévestibular comunitário um culto dominical entre outros lugares é subjetivamente importante e é apresentado também por muitos como uma busca por reconhecimento Podese indicar assim por meio do termo comunidade que experiências pessoais significativas se encontram profundamente associadas aos seus lugares de ocorrência a ambientes cujas características físicas geográficas e sociais contribuem para a sua importância Afinal os acontecimentos se passam sempre em lugares e as suas ocorrências implicam um conjunto de percepções do lugar que se imbricam com os acontecimentos nas trajetórias das pessoas15 A referência à comunidade neste caso associa as experiências locais ligadas ao cotidiano à condição de pessoas reivindicada pelos seus habitantes Vizinhos aqui ou na China colegas de escola no Borel ou em Copacabana indivíduos fazem de certas relações de proximidade algo subjetivamente relevante em suas vidas mesmo que estas práticas não se ancorem todas em valores culturais partilhados com seus vizinhos e parentes Os espaços pois voltemos a reconhecer aqui com as suas características sensíveis participam da construção das pessoas das relações interpessoais das formas de sociabilidade e dos acontecimentos que as envolvem Uma identificação com o lugar a favela assim é construída e reclamada em contraposição aos argumentos que só valorizam os crimes que ali ocorrem Assistese no Rio de Janeiro a inúmeras manifestações de moradores de favelas que reclamam dos focos que cineastas e intelectuais utilizam para criar imagens sobre a favela Ao invés de valorizarem a comunidade dizem valorizam o que no seu interior mais orienta as políticas governamentais postas em prática isto é a sua identificação com o crime e com a suposta incivilidade de seus habitantes No entanto se é verdade que o espaço pode ser fundamental para estabelecer certos sentidos compartilhados relativos a acontecimentos que fazem parte da memória de um grupo dificilmente seria possível a partir disto estabelecer uma identidade positiva comum A experiência deste sentido de comunidade que se entrelaça com lugares e trajetórias não é suficiente para exorcizar as identificações negativas generalizantes que ignoram o valor positivo dessas relações de proximidade na construção da vida social de seus habitantes Embora seja possível para os moradores contraporem estas experiências aos traços estigmatizantes aos quais eles são reduzidos este contraponto se faz em uma micro escala que não é levada em conta nos grandes debates da cena política reconhecida Os processos de identificação criam tipos e a tipificação é imune à diversidade de modos de vida de escolhas morais sexuais e religiosas O seu movimento por definição é o de provocar generalizações Um milhão de pessoas como contraexemplo pouco serve contra uma única identificação negativa que elevada à condição de emblema pode legitimar e participar dessas políticas reafirmando o que seria a verdadeira e autêntica identidade do grupo a ser considerada em termos de interesse público Basta um único caso um único acontecimento para reiterar a especificidade negativa de um grande conjunto populacional Procedimento curioso este que nos questiona a respeito das formas pelas quais certos enunciados geram seus efeitos de verdade Suas formas de convencimento não são simples já sabemos Envolvem a história da cidade da formação de suas divisões internas de seus guetos de seus conflitos e de suas formas de poder cristalizadas e largamente dominantes Contrapor identidades à identificação Ao colocar em relevo as formas de sociabilidade positivas que os ligam entre si através de uma experiência do lugar os habitantes das favelas buscam mostrar o outro lado destes territórios um lado social positivo que se mostra contrário e mesmo antagônico à visão totalizante que os identifica de fora Este movimento como dissemos não 22102020 Favela é comunidade artigo Dicionario de Favelas Marielle Franco httpswikifavelascombrindexphptitleFavelaécomunidade3Fartigo 810 parece ser muito eficaz Como acionar estes planos cuja escala menor parece desaparecer diante dos traços largos das identificações estereotipadas que pretendem tudo incluir Como tornar visíveis as muitas comunidades no sentido de muitos grupos que existem localmente e que dão densidade à vida das pessoas Com efeito o Estado e os setores dominantes da sociedade não se interessam em reconhecer as dinâmicas sociais nesta microescala mas se interessam sobretudo em fornecer identificações que reiteram suas políticas de governo nestes territórios O caráter dominante dessa política não chega a ser ameaçado pelas tentativas dispersas de valorizar estes microuniversos que seriam facilmente postos em equivalência com demandas presentes em outras localidades em muitos outros lugares O movimento que gera estas identificações totalizantes parece deter um sentido político relacionado às intenções práticas de administração das populações faveladas Os atores desses movimentos de identificação não estabelecem diálogos não perguntam pelos critérios empregados pelas pessoas concernidas para dizerem quem são Ao contrário geram formas próprias de identificação que são propostas como se fossem um mero reconhecimento de identidades que já existiam desde o início dos tempos Se uma favela não é uma comunidade o que seriam então os favelados As formas de identificação que mencionamos bem como os termos utilizados podem ser associados a bem dizer a todas as qualidades positivas e negativas que seriam pertinentes aos lugares previamente definidos como aqueles aonde os segmentos menos favorecidos da população vivem e convivem entre si Podese tanto acionar imagens que associam estes territórios à violência e à barbárie quanto a aspectos de uma cultura tradicional que lá residiria A noção proveniente da tradição católica de comunidade é assim ao mesmo tempo um contraponto a identificações negativas e uma faceta de um lugar que também pode ser olhado por outro prisma Os usos positivos do termo comunidade para se contrapor a outros como favela terminam por contribuir apesar dos intuitos e desejos dos indivíduos que os empregam para reiterar um sentido prévio a todas estas definições quer dizer uma diferença substantiva que pode ser negativa no essencial mas também positiva em certos momentos acionando diferenças culturaiscivilizacionais que distinguiriam os bairros da cidade das ditas favelasperiferiasmorroscomunidades Mostrase assim possível conjugar de forma não contraditória identificações negativas e positivas lugar da tradição e também lugar da violência Lugar de relações harmônicas entre vizinhos mas também lugar da incivilidade da barbárie e da morte associados ao tráfico de drogas e às balas perdidas Lugar da família mas também lugar de uma juventude desregrada das igrejas pentecostais dos bailes funk e das metralhadoras Em suma territórios que parecem destilar uma especificidade inconfundível ligada ao caráter moral e cultural de sua população Suas diferenças internas não apagariam o princípio maior dessa classificação dualista que constrói dois blocos identitários na cidade Para as pessoas contudo que são constantemente objeto de identificações territoriais destacar os pontos e contrapontos enfileirar os estereótipos nas suas oposições e contradições aparentes não me parece evitar o essencial o caráter totalizante deste vínculo não reclamado como forma de inclusãoexclusão do morador de comunidadefavelaperiferia como habitante da cidade A comunidade e suas práticas reflexivas Antes de terminar gostaria de me referir a um último sentido de comunidade que também encontramos entre os que vivem nos territórios favelizados Talvez em função do seu caráter pouco cristalizado seja melhor falar de reflexão comunitária Refirome aqui ao reconhecimento que os habitantes das comunidadesfavelasperiferias fazem de sua condição comum como alvos que são dessas políticas que mencionamos Não raramente parece aflorar através de certas atitudes de moradores o que podemos entender como uma resistência crítica a estas formas de designação e a suas conseqüências 22102020 Favela é comunidade artigo Dicionario de Favelas Marielle Franco httpswikifavelascombrindexphptitleFavelaécomunidade3Fartigo 910 Em outros termos um reconhecimento coletivo quase uma evidência partilhada de que todos ali são objetos de uma política discursiva que os aloca numa posição subalterna e estigmatizada independente de e contra as suas vontades Li uma vez uma descrição de uma antropóloga Goldstein 2003 a respeito de atitudes assumidas pelos moradores de uma favela no cotidiano de suas vidas Ela coloca em relevo o uso constante da paródia do riso e da brincadeira como forma de crítica permanente a estas identificações negativas A autora destacou uma prática de autodepreciação irônica por parte dos moradores que empregavam todos ou quase todos os estereótipos correntes A troca de insultos bem como o uso de xingamentos daria lugar a um distanciamento crítico que assim se reafirmaria frente às identificações negativas Como se este sentido de comunidade se desse pelo reconhecimento de que existe um nós cujo sentido é dado essencialmente pelo fato de serem em conjunto alvo dessa política que os governa Podemos nos perguntar sobre o alcance dessas práticas de derrisão que se somam às vezes a protestos agudos em relação a excessos policiais e a demandas por direitos civis16 Esta pergunta e também a pergunta inicial do texto favela é uma comunidade podem ser respondidas talvez através de uma outra atitude que quero que acompanhe a minha reflexão a de apoio às resistências possíveis 1G1 Política NOTÍCIASCabraldefende aborto contra violência httpg1globocomNoticiasPolitica0MUL155 710560100CABRALDEFENDEABORTOCONTRAVIOLENCIANORIODEJANEIROhtml g1globocomPolitica0MUL155710560100 2 Favela é cidade violência e ordem pública seminário organizado pelo IUPERJIBASE em novembro de 2007 no Rio de Janeiro Gostaria aqui de registrar o meu sincero agradecimento aos organizadores do seminário principalmente a Luiz Antonio Machado da Silva e a Márcia Leite que me convidaram também para integrar esta publicação 3Os argumentos desenvolvidos sobre as tecnologias do governamental foram originalmente publicados em Birman 2006 4Citemos um trecho em que estes autores trabalham a mudança que ocorreu nas formas de identificação das favelas e dos favelados mais recentemente Essa construção das favelas como uma espécie de subcultura inclusive pela ciência social nada tem de recente Valladares 2005 O que parece novo é que agora não se trata de basear este entendimento como antes na desorganização social dessas localidades mas de associálas diretamente ao crime violento Os moradores de favelas são tomados como cúmplices dos bandos de traficantes porque a convivência com eles no mesmo território produziria aproximações de diversas ordens relações de vizinhança parentesco econômicas relativas à política local etc e assim um tecido social homogêneo que sustentaria uma subcultura desviante e perigosa Esta por sua vez fundamentaria a aceitação e a banalização do recurso à força o que terminaria por legitimar a chamada lei do tráfico Em conseqüência os moradores de favelas estariam recusando a lei do país ao optarem por um estilo de vida que negaria as normas e valores intrínsecos à ordem institucional Uma forte conivência marcaria portanto as relações dos moradores de favelas com as redes criminosas sediadas nessas localidades levandoos a buscar sua proteção e apoio bem como a protegêlas da polícia Machado da Silva e Leite nesta coletânea 5Cf Leite 2008a Valladares 2005 e Machado da Silva e Leite nesta coletânea A política de segregação tal como eu a entendo corresponde à principal forma pela qual o Estado se apresenta nas margens entendidas aqui na acepção desenvolvida pelo trabalho de Das e Poole 2004 isto é não como um lugar onde o Estado se ausenta mas como lugares onde o Estado exerce uma política voltada para estas populações periféricas 6Consultar a respeito Machado da Silva 1967 7Não pretendo discutir a imensa e rica bibliografia a respeito das relações entre as favelas e os moradores do asfalto eou com o governo e diferentes segmentos do Estado Gostaria no entanto de assinalar que este texto é devedor das reflexões desenvolvidas nesta coletânea e também dos trabalhos hoje clássicos sobre favelas de Valadares 22102020 Favela é comunidade artigo Dicionario de Favelas Marielle Franco httpswikifavelascombrindexphptitleFavelaécomunidade3Fartigo 1010 2005 e de Zaluar 2004 1994 1985 8Ver também Noiriel 2005 9 Ver neste sentido a discussão a respeito das comunidades e seus valores católicos em Boyer 2007 Consultar também Brandão 1980 para a discussão da hierarquia religiosa no cotidiano de comunidades e Sanchis 1994 para o paradigma católico estruturando a nação brasileira 10Ver Burdick 1993 e Oliveira 1992 para o caso da Teologia da Libertação Sobre a ruptura com o paradigma católico cfr Birman 2007 e Pierucci 2004 11Encontramos esta reflexão na excelente descrição que Vidal 1998 faz do uso da noção de cidadão entre os moradores de Brasília Teimosa território favelado em Recife Segundo eleO estatuto de cidadão não é no entanto de forma alguma desvalorizado Ele atesta o reconhecimento do pertencimento social pleno ao qual os habitantes de Brasília Teimosa atribuem uma grande importância Encontrase aliás na noção de cidadão certos elementos que estão no coração da noção de respeito entendendo que o cidadão é aquele que concorre à harmonia da ordem social pelo seu trabalho e pelo seu comportamento exemplar O cidadão tal como é concebido em Brasília Teimosa é de fato essencialmente orientado em direção à civilidade elemento no coração da construção do conceito de cidadania nas democracias modernas A civilidade implica o sentimento de pertencimento à ordem social e a sua preservação a despeito das diferenças sociais Vidal 1998136 e 147 tradução minha 12 Consultar sobre o tema o capítulo de Machado da Silva e Leite nesta coletânea 13Vale observar que como assinalamos ver nota 48 os moradores de favela também associam comunidade à civilidade Ao contrário das agências governamentais no entanto consideramse cidadãos exatamente por se verem moralmente adequados e perfeitamente dignos de se integrarem à cidade e à nação De certo modo ninguém se identifica com este lugar que é o alvo da ação governamental incivilizados são sempre os outros 14Cf As análises pioneiras do cotidiano nas favelas de Zaluar 1985 15Mafra chama a atenção para o valor subestimado pelos cientistas sociais da paisagem Diz a autora a definição de paisagem utilizada aqui referese ao entorno como o testemunho de vidas e trabalhos executados por gerações passadas que se chocaram uns com os outros constituindo camadas de um mesmo lugar A paisagem nesse sentido se parece menos com cenário de fundo e mais com um sítio arqueológico pois diz respeito a camadas de processos e de materiais que tanto ocultam como revelam significados Mafra 2007 2 16Cf O movimento das mães de vítimas de violência policial em favelas analisado por Leite 2004 e Farias 2007 Disponível em httpswikifavelascombrindexphptitleFavelaécomunidade3Fartigooldid7472 Esta página foi modificada pela última vez em 1 de junho de 2020 às 12h06min Conteúdo disponível sob Creative Commons Atribuição Compartilhamento pela mesma Licença salvo indicação em contrário