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Cursos Gerais ·

Psicologia Institucional

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CADERNOS DE PSICOLOGIA Os tempos no hospital oncológico MINISTÉRIO DA SAÚDE Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva INCA Número 3 Biblioteca Virtual em Saúde Prevenção e Controle de Câncer httpcontrolecancerbvsbr CADERNOS DE PSICOLOGIA Os tempos no hospital oncológico Número 3 MINISTÉRIO DA SAÚDE Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva INCA CADERNOS DE PSICOLOGIA OS TEMPOS NO HOSPITAL ONCOLÓGICO Número 3 Rio de Janeiro RJ INCA 2015 2015 Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva Ministério da Saúde Esta obra é disponibilizada nos termos da Licença Creative Commons Atribuição Não Comercial Compartilha igual 40 Internacional É permitida a reprodução parcial ou total desta obra desde que citada a fonte Esta obra pode ser acessada na íntegra na Biblioteca Virtual em Saúde Prevenção e Controle de Câncer httpcontrolecancerbvsbr e no Portal do INCA httpwwwincagovbr Tiragem 500 exemplares Elaboração distribuição e informações MINISTÉRIO DA SAÚDE Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva INCA Hospital do Câncer I Seção de Psicologia Rua Washington Luiz 35 Centro Rio de Janeiro RJ Cep 20231092 Tel 21 32074510 32074511 Emails mswinerdincagovbr abernatincagovbr wwwincagovbr Edição COORDENAÇÃO DE PREVENÇÃO E VIGILÂNCIA Serviço de Edição e Informação TécnicoCientífica Rua Marquês de Pombal 125 Centro Rio de Janeiro RJ Cep 20230240 Tel 21 32075500 Supervisão Editorial Letícia Casado Edição e Produção Editorial Taís Facina Copidesque Rita Rangel de S Machado Edilaine Rodrigues da Silva estagiária Revisão Maria Helena Rossi Oliveira Capa Projeto Gráfico e Diagramação Cecília Pachá Imagem da capa Quadro A Persistência da Memória 1931 de Salvador Dalí Salvador Dalí Fundació GalaSalvador Dalí AUTVIS 2014 Normalização Bibliográfica e Ficha Catalográfica Marcus Vinícius Silva CRB 7 6619 Organizadores Ana Beatriz Rocha Bernat Fernando Lopes Tavares de Lima Luciana da Silva Alcântara Mônica Marchese Swinerd Equipe de Elaboração Anexa Colaboradoras Márcia Marília Vargas Froes Skaba Maria de Fátima Batalha de Menezes Impresso no Brasil Printed in Brazil Fox Print FICHA CATALOGRÁFICA I59t Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva Hospital do Câncer I Seção de Psicologia Os tempos no hospital oncológico Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva Ana Beatriz Rocha Bernat Fernando Lopes Tavares de Lima Luciana da Silva Alcântara Mônica Marchese Swinerd organizadores Rio de Janeiro INCA 2015 192 p il Cadernos de Psicologia 3 ISBN 9788573182682 versão impressa ISBN 9788573182699 versão eletrônica 1 Neoplasias psicologia 2 Institutos de Câncer I Bernat Ana Beatriz Rocha II Lima Fernando Lopes Tavares de III Alcântara Luciana da Silva IV Swinerd Monica Marchese V Título VI Série CDD 616994019 Catalogação na fonte Serviço de Edição e Informação TécnicoCientífica Títulos para indexação Em inglês Psychology Logbooks Times in Cancer Hospital Number 3 Em espanhol Cuadernos de Psicología Veces en él Hospital de Cáncer Número 3 Apresentação Tempo e espaço são categorias de pensamento fundamentais para a compreensão das sociedades Sentidos compartilhados desses dois conceitos compõem e constituem os modos de lidar com o viver o morrer o adoecer e o curar Assim pensar sobre os tempos no espaço do hospital oncológico faz reconsiderar os muitos tempos contidos e extrapolados desse espaço tão singular buscando concebêlos como processos que fluem com a marca da cultura e do contexto social em que se estabelecem e não como uma sequência linear e previsível Sendo assim as possibilidades de ruptura reconstruções e resignificações propiciam transformações objetivas no cotidiano dos atores envolvidos no processo de adoecimento A esse exercício reflexivo propuseramse a equipe de Psicologia do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva INCA e outros profissionais de diferentes Estados do país enveredandose por diversas trilhas e caminhos percorridos por profissionais de saúde pessoas adoecidas e seus familiares Cada qual experienciando os muitos tempos e espaços nos quais transitam exercendo suas profissões ou vivenciando o câncer como presença real em suas vidas O resultado desse exercício reverbera de modo plural e multidisciplinar nas vozes e nas práticas de psicólogos bioeticistas assistentes sociais enfermeiros médicos e profissionais do ensino cirurgiõesdentistas e farmacêuticos nos enfoques de diversos sujeitos tais como a criança o adolescente a mulher o homem e o idoso e também na ênfase aos distintos tempos do adoecimento por câncer Você leitor é convidado a um mergulho aprofundado nos capítulos que seguem No primeiro O tempo de uma escolha forçada o sujeito infantojuvenil seus pais e a equipe assistente diante da indicação de amputação Bernat e Costa trazem uma sensível reflexão acerca do manejo do tempo em oncologia pediátrica em especial junto aos adolescentes portadores de osteossarcoma com possibilidade de amputação Evidenciam o descompasso que encampa o tempo dos profissionais e o tempo de crianças e adolescentes portadores de osteossarcoma como uma ação dissimétrica indicando assim a necessidade de afinação e encompassamento desses tempos Nesse sentido as autoras lançamse a uma reflexão acerca da especificidade da intervenção do psicólogo orientado pela psicanálise no contexto da recusa ao tratamento Assumem e reconhecem o saber de crianças e adolescentes que colocam em perspectiva o luto antecipatório pela perda e pela mutilação associado à reconstrução e à reinvenção de outro corpo Ressaltam a importância de uma equipe de cuidados de referência fator que gera confiança no tratamento Problematizam a questão do encaixe do tempo da criança do adolescente e de sua família no tempo do protocolo indicando que o psicólogo intervém para mediar as possibilidades de aceitação e diferenciação da amputação de um membro e da anulação do sujeito Se esse trabalho tornase possível o sujeito permanece e se pode construir alguma borda simbólica para essa perda pode seguir na vida com saúde uma vez que essa seja entendida em seu sentido não puramente biomédico No segundo capítulo Quando o tratamento do câncer da criança termina a psicanálise e o tempo singular de cada sujeito o recorte da dissertação de mestrado de Almeida e Priszkulnik destaca a dimensão do tempo para além da temporalidade linear perspectiva fundante na biomedicina Sob a ótica da psicanálise freudlacaniana realçam o tempo singular do sujeito Nessa esfera de abordagem investigam os sentidos e as significações que a criança com tumor de Sistema Nervoso Central SNC que já passou pelo tratamento oncológico tem da doença e das alterações corporais aparentes Por meio da abordagem psicanalítica afirmam que a criança pode reelaborar sua história situandose nas suas experiências de vida que incluem e transcendem ao adoecimento Nesse mote apontam que o câncer e suas terapêuticas impactam na subjetividade Assim a psicanálise objetiva o encaminhamento de ressignificações do câncer enfatizando a autonomia de pensamento e ação e a integração da vivência do adoecimento considerando as singularidades das crianças e de suas famílias Em Reflexões sobre a vivência do tempo no paciente em controle terceiro capítulo Chahon apresenta as bases teóricas sobre a experiência do adoecimento por câncer e sobre a terminalidade Segue analisando a construção de um novo ser sobrevivente e as possíveis repercussões do tratamento em suas novas vidas Ressalta que é necessário encontrar uma continuidade fundamental entre a crise presente e a história pregressa do sujeito algo que se deve buscar para além das limitações diárias algo da ordem do afeto que diferentes abordagens terapêuticas tratarão por desejo autenticidade ou mesmo transcendência a fim de dotar a experiência do adoecimento oncológico de um sentido positivo único na existência daquele indivíduo Observa finalmente que em boa parte dos pacientes em controle cujo atendimento se prolonga é mais além uma procura corajosa por conciliar o vivido traumático da doença ao que se pôde preservar de si diante dessa sua nova realidade No quarto capítulo Amortecer o sofrimento a escuta do paciente oncológico no cuidado paliativo Souza e Melo discorrem sobre suas experiências como psicólogos em um projeto clínico em cuidados paliativos Reforçam a necessidade da escuta ao doente ao adoecimento e à dor A primazia da palavra do adoecido é essencial para a ressignificação de sentidos na novidade do adoecimento A partir de suas práticas profissionais em cuidados paliativos olham além da terminalidade a partir do amortecer do sofrimento Incluem a dor do corpo e a dor da alma Uma dor inaudita e presente O instaurar convergente da dimensão objetiva com a urgência da subjetividade ante a possibilidade de viver até o fim com dignidade evoca segundo os elaboradores uma discussão pertinente para atualidade Trazem os familiares à cena do cuidado paliativo como pessoas com construções e sentidos sobre a morte e a vida Por meio da experiência analítica demarcam que a morte em si mesma não é questão de enfrentamento mas algo da ordem do imemorável perdido intraduzível sem possibilidade de representação simbólica e que não cessa de tentar se inscrever Em A vivência do paciente oncológico e suas estratégias de enfrentamento quinto capítulo Pereira Tarabay Antunes Cunha e Lourenço buscam inicialmente conceituar estratégias de enfrentamento relacionandoas com a singularidade embutida nas escolhas dessas estratégias Os elaboradores apresentam as distintas alterações psicológicas e psiquiátricas que envolvem o diagnóstico oncológico inclusive quando se trata de crianças e adolescentes O texto apresenta uma revisão bibliográfica sobre a temática e conclui que o enfrentamento relacionado à fé e à crença em Deus é uma das principais estratégias adotadas pelos participantes do estudo Em A espiritualidade no contexto clinicopsicológico sexto capítulo Monteiro alia a prática no atendimento psicológico clínico ambulatorial a uma revisão de vários autores sobre espiritualidade e enfrentamento diante da morte Afirma que a intervenção psicológica é um movimento de escuta das linguagens verbal e não verbal Enfoca a relevância da crença e da espiritualidade de modo abrangente abarcando a arte e a música colocandoas como aliadas ao processo de superação do adoecimento Em sua argumentação conjuga o sentimento de pertencimento e o acesso aos recursos de enfrentamento diante dos percalços da doença oncológica No sétimo capítulo Os impactos do adoecimento por câncer na ótica do Serviço Social Carvalho e Juliani definem como atribuição do Serviço Social a luta constante na construção de uma saúde pública humanizada com acesso prático e tempestivo O trabalho dos assistentes sociais tem se mostrado relevante especialmente pela contribuição do profissional em reconhecer o paciente oncológico como sujeito de direitos Construindo uma análise crítica sobre o desenvolvimento da Política de Seguridade Social revelam as dificuldades dos usuários que estão fora do mercado de trabalho haja vista o caráter contributivo da previdência social brasileira Finalmente afirmam que é necessário que o assistente social identifique as singularidades das demandas atendidas Ressaltam que esse é um profissional cuja formação incorpora o reconhecimento e o respeito pelas diversidades Em Acompanhamento psicológico ao idoso com diagnóstico de câncer reflexões sobre a atemporalidade o adoecer e a dor de ser oitavo capítulo Salgueiro e Coelho ressaltam a sobrecarga do cuidado ao idoso agregando a essa condição a enfermidade Para as elaboradoras a sobrecarga inicial é acrescida pela doença que leva a internações sucessivas sendo um elemento aditivo ao estresse Ressaltam a atuação do psicólogo hospitalar como de extrema importância para que o paciente com câncer possa ser ouvido e acolhido em seu sofrimento sublinhando a necessidade de imersão a importância da empatia do contato discreto e cuidadosamente não invasivo da escuta acolhedora durante todo o processo de acompanhamento ao paciente e à família No nono capítulo Um olhar sobre a experiência do paciente idoso em terminalidade Primavera Tarabay e Lourenço apresentam a constatação de que o diagnóstico de câncer é permeado por medo e angústias Para os elaboradores o medo pode ser também um gerador de sofrimento psíquico não só para o paciente mas para os seus familiares e as pessoas de seu meio social estendendose ainda aos membros da equipe de saúde Na sequência constroem um histórico sobre a morte e o processo de terminalidade e suas consequências para o paciente e seus familiares em diferentes contextos Dessa forma propõem a atuação da psicooncologia no sentido de possibilitar que o paciente encontre recursos para lidar com o processo de adoecimento e suas interfaces Desenvolvendo uma revisão bibliográfica concluem que há escassez de publicações sobre esse tema apesar de sua relevância e indicam aspectos comuns referentes à experiência da terminalidade entre os pacientes idosos a presença da dor intensa e de difícil controle as preocupações pessoais em torno do processo de terminalidade que incluem o medo da perda de autonomia e dignidade e o medo de sobrecarregar os entes queridos estão entre os aspectos mais relevantes nos artigos selecionados Em Impacto psicológico na síndrome de LiFraumeni mecanismos de defesa e estratégias de coping décimo capítulo Tarabay e Achatz avaliam o impacto psicológico advindo da experiência de realizar um teste genético para a síndrome de LiFraumeni e descrevem como os pacientes submetidos a esse teste lidam com esse momento considerando que se trata de um evento de vida significativo e que apresenta um resultado irreversível As elaboradoras propõem que o psicólogo busque compreender a vivência desses pacientes e a partir da percepção de suas reações emocionais proporcione um trabalho de acolhimento e de facilitação em lidar com fatos potencialmente estressores inerentes a esse momento da vida do paciente e de sua família No 11º capítulo O tempo na clínica de cabeça e pescoço produção de subjetividade singularidade e política Siqueira trava um interessante diálogo entre a perspectiva de garantia de direitos na lógica coletiva e a singularidade dos diferentes usuários Para a elaboradora na Clínica de Cabeça e Pescoço o tempo é relacionado à espera para o início do tratamento que se elevado agrava muito as sequelas e torna o tratamento muito mais doloroso e mutilante Faz uma análise crítica do Sistema Nacional de Regulação Sisreg atribuindo a esse instrumento um elemento de atraso na confirmação do diagnóstico e no início do tratamento Em A complexidade do cuidado nos pacientes com estoma intestinal provisório por câncer colorretal 12º capítulo Schwartz e Teixeira por meio de um relato da experiência no cuidado de enfermagem a pessoas com estoma intestinal provisório por câncer colorretal discutem os aspectos psicossomáticos emergidos no processo de recuperação com vistas a buscar modos de cuidado Ressaltam a necessidade de interação o respeito ao luto temporário pela perda da função de eliminação e o estímulo ao enfrentamento ante essa situação transitória Colocam em relevância a importância da atuação de equipe interdisciplinar numa perspectiva transdisciplinar atentando para as implicações das mudanças corporais e do processo de adaptação ao conviver diário com um estoma intestinal Destacam como aspectos fundamentais para o suporte a essas pessoas a consideração dos perfis socioeconômico cultural e emocional bem como as singularidades pessoais visando à qualidade de vida No 13º capítulo Vicissitudes do encontro com um corpo que é singular Silveira e Costa discutem a questão da corporeidade e da tradução do corpo na perspectiva do tempo para além do tempo cronológico no contexto de suas experiências no cuidado às mulheres com câncer de mama Tal discussão se coloca no espaço de acolhimento e valor para a palavra e para o saber no bojo das repercussões orgânicas do adoecimento Tornase primordial fomentar o protagonismo da mulher diante do adoecimento reconhecendo a mediação dos tempos do hospital e dos tempos da mulher com seu corpo que não se resume apenas à esfera do controle social da doença e das instituições Em Por uma ética do cuidado em busca da boa morte 14º capítulo Mendes e Santos ressaltam a necessidade de pautar a discussão sobre a morte entre os trabalhadores do hospital oncológico Conceituam boa morte e ética do cuidado e destacam a necessidade de preservação da autonomia dos pacientes com doença avançada Concluem observando que O tempo no hospital oncológico vivendo acompanhando apoiando e conduzindo vidas merece destaque em um programa de atenção à saúde no qual seja contemplada a dignidade da pessoa que enfrenta uma doença incurável que ameace a sua vida e consequentemente que dê destaque a uma morte digna ou seja uma boa morte No 15º capítulo Transformações sofridas pelo tempo do cuidado paliativo teórico em direção ao prático Costa apresenta por meio de um ensaio sob a perspectiva da bioética uma discussão sobre as várias mortes no bojo de suas noções e apreensões Coloca em relevo a questão do incremento da tecnologia biomédica na eliminação da chamada morte natural O texto de Costa procura mostrar que o conceito de morte natural na atualidade não passa de uma categoria vazia encaminhando a pensar que a morte só pode ocorrer nessas situações de maneira não natural Diante desse dilema o elaborador coloca algumas questões sobre quem deve decidir sobre o fim da vida como deve ser o processo de decisão qual deve ser o timing do fim como deve ser proporcionado o fim Considerando o contexto da tecnologia biomédica alija a morte de um determinismo puramente natural ampliando seu entendimento como um processo social vinculado a escolhas individuais eou coletivas Aventa a necessidade de um novo paradigma para a ética do fim de vida a partir de um controle social ético procedente de discussões com familiares e equipes de saúde Aponta também a contribuição das Comissões de Bioética como parceiras nas tomadas de decisão Em A morte e o morrer nos cuidados paliativos em ambulatório considerações psicanalíticas sobre a interface entre o orgânico e o psíquico 16º capítulo Fattore amparada em sua prática como psicóloga em unidade oncológica traz um relato de experiência sobre atendimento psicológico em regime ambulatorial em cuidados paliativos discutindo sob a ótica da psicanálise acerca da interface entre as esferas orgânica e psíquica Problematiza a elaboração da morte e do morrer quando o sujeito mesmo apresentando progressão do câncer quer falar de seu desejo de viver e de retomar planos anteriores Desse modo a vida como projeto transcende às potencialidades corporais e o adoecimento Por meio da escuta psicanalítica advoga a construção de recursos simbólicos singulares para o lidar com a morte e o morrer colocando em suspensão a ideia de que nem sempre a aceitação da morte pode ser vivenciada Nessa situação propõe que privilegiar a singularidade dos sujeitos corrobora para um desfecho da vida ao modo de cada sujeito No 17º capítulo Os cuidados paliativos e o tempo Rêgo Barros afirma que o tempo tem uma relação essencial com os cuidados paliativos marcando a ênfase no cuidado com um tempo que pode ser relacionado ao que resta de vida Para o autor a questão está no conceito de paliativo entendido nos dicionários brasileiros como algo temporário momentâneo e atenuante Ressalta ainda a condição de similaridade entre o paliativista e o psicanalista Para ele ambos não perseguem a cura mas sim um encontro entre o doente e aquele que cuida Em A comunicação e a humanização como aspectos fundamentais para o manejo da urgência subjetiva nos cuidados de fim de vida 18º capítulo Dantas e Ribeiro tomando por base suas experiências no Programa de Residência Multiprofissional em Oncologia discorrem acerca das urgências subjetivas de fim de vida Diante desse contexto a ocorrência de desconfortos físicos e emocionais implica uma urgência que deverá ser atendida prontamente pela equipe de saúde pois nem sempre se tem oportunidade do encontro em outro momento Assim o paciente nessa condição dá o tom e o ritmo da relação de cuidado e atendimento de suas demandas Nesse sentido o psicólogo deve favorecer um acolhimento do sofrimento psíquico do paciente dos familiares e da equipe de saúde com ênfase na elaboração do luto e na construção de significados da situação real conforme a dinâmica dos sujeitos envolvidos Finalizando esse terceiro número do Cadernos de Psicologia Lima Ribeiro e Silva em Entre o tempo e a falta de tempo reflexões sobre o exercício da preceptoria nos programas de residência em oncologia discutem sobre a questão do tempo no hospital oncológico sob a ótica do ensino tendo em vista a formação de especialistas por meio de um Programa de Residência Multiprofissional em Oncologia Abordam a difícil atividade da preceptoria que congrega o cumprimento de atividades de cunho profissional integradas as de ensino as quais se complexificam na inclusão do espaço de formação do hospital oncológico considerando que o processo de formação se dá no e para o serviço Nessa trajetória o transcurso do programa foi compreendido pelos elaboradores como um tempo de travessias e transformações para preceptores profissionais em formação e instituições No âmbito institucional é requerido um respaldo que qualifique e defina um tempo para o exercício da preceptoria Diante dessa multiplicidade de abordagens temáticas concernentes aos variados tempos no espaço hospitalar oncológico cabe finalizar com um chamado para uma leitura atenta e aguçada que aponte possibilidades de repercussão dessas ideias no cenário da prática profissional em oncologia redefinindo efetivamente a experiência e as vidas das pessoas adoecidas por câncer Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva INCA IMPROVING HUMAN CAPITAL REQUIREMENTS BY ASSESSING SKILLS AND COMPETENCIES WITHIN THE FAMILY BUSINESS 9 Sumário Apresentação 3 Lista de tabelas 11 Lista de siglas 13 Capítulo 1 O tempo de uma escolha forçada o sujeito infantojuvenil seus pais e a equipe assistente diante da indicação de amputação 17 Capítulo 2 Quando o tratamento do câncer da criança termina a psicanálise e o tempo singular de cada sujeito 25 Capítulo 3 Reflexões sobre a vivência do tempo no paciente em controle 37 Capítulo 4 Amortecer o sofrimento a escuta do paciente oncológico no cuidado paliativo 43 Capítulo 5 A vivência do paciente oncológico e suas estratégias de enfrentamento 51 Capítulo 6 A espiritualidade no contexto clinicopsicológico 63 Capítulo 7 Os impactos do adoecimento por câncer na ótica do serviço social 75 Capítulo 8 Acompanhamento psicológico ao idoso com diagnóstico de câncer reflexões sobre a atemporalidade o adoecimento e a dor de ser 85 Capítulo 9 Um olhar sobre a experiência do paciente idoso em terminalidade 93 Capítulo 10 Impacto psicológico na síndrome de Lifraumeni mecanismos de defesa e estratégias de coping 105 Capítulo 11 O tempo na clínica de cabeça e pescoço produção de subjetividade singularidade e política 115 Capítulo 12 A complexidade do cuidado nos pacientes com estoma intestinal provisório por câncer colorretal 123 Capítulo 13 Vicissitudes do encontro com um corpo que é singular 131 Capítulo 14 Por uma ética do cuidado em busca da boa morte 137 Capítulo 15 Transformações sofridas pelo tempo do cuidado paliativo teórico em direção ao prático 145 Capítulo 16 A morte e o morrer nos cuidados paliativos em ambulatório considerações psicanalíticas sobre a interface entre o orgânico e o psíquico 153 Capítulo 17 Os cuidados paliativos e o tempo 159 Capítulo 18 A comunicação e a humanização como aspectos fundamentais para o manejo da urgência subjetiva nos cuidados de fim de vida 165 Capítulo 19 Entre o tempo e a falta de tempo reflexões sobre o exercício da preceptoria nos programas de residência em oncologia 175 Anexo Equipe de elaboração 187 DESIGNATION AUTHORISATION DATE AT COMPANY GABRIEL BATHORY 2013042520160615 NOT ACTIVE BETHLEN JÁNOS 20130425 20160615 NOT ACTIVE BENE RÓBERT 20031106 CURRENTLY ACTIVE CSÁKI DÁNIEL 20031106 CURRENTLY ACTIVE SZALKAI ANDRÁS 20031106 CURRENTLY ACTIVE BENE RÓBERT 20031106 CURRENTLY ACTIVE LASZKAI 20121122 CURRENTLY ACTIVE 11 Lista de Tabelas Tabela 1 Valores de média desviopadrão DP mínimo e máximo e quartis das classificações do fator maduro 106 Tabela 2 Valores de média DP mínimo e máximo e quartis das classificações do fator neurótico 107 Tabela 3 Valores de média DP mínimo e máximo e quartis das classificações do fator imaturo 107 Tabela 4 Valores de média DP mínimo e máximo e quartis das defesas 108 Tabela 5 Valores de média DP mínimo e máximo e quartis dos fatores do coping 108 NOTICE OF ANNUAL GENERAL MEETING NOTICE is hereby given that the Annual General Meeting AGM of Conexus Technologies Limited will be held at the Companys registered office at D Block Innovate Business Park 45 Innovation Way Techville on 25 March 2024 at 1000 am to transact the following business 1 To receive and adopt the audited financial statements for the year ended 31 December 2023 along with the Directors and Auditors reports thereon 2 To elect Directors in place of those retiring by rotation in accordance with the Companys Articles of Association 3 To reappoint the Auditors and to authorise the Directors to fix their remuneration 4 To transact any other business that may legally be brought before the meeting By Order of the Board Mrs Jane Doe Company Secretary 10 February 2024 13 Lista de Siglas ACCCOM Associação de Combate ao Câncer do CentroOeste de Minas ANCP Academia Nacional de Cuidados Paliativos CFM Conselho Federal de Medicina CNRMS Comissão Nacional de Residência Multiprofissional em Saúde CRFB88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 CRPSP Conselho Regional de Psicologia de São Paulo DP Desviopadrão DSQ40 Defense Style Questionnaire ECMO Circulação extracorpórea Ensp Escola Nacional de Saúde Pública Faced Faculdade Divinópolis Fiocruz Fundação Oswaldo Cruz HCI Hospital do Câncer I HCIII Hospital do Câncer III HCL Hospital do Câncer de Londrina HCP Hospital das Clínicas de Pernambuco IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística INCA Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva IOM Institute of Medicine IP Instituto de Psicologia IPUB Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ LFL LiFraumeni Like Lilacs Literatura LatinoAmericana e do Caribe em Ciências da Saúde OMS Organização Mundial da Saúde PP Projetos pedagógicos PUCSP Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Sisreg Sistema Nacional de Regulação SLF Síndrome de LiFraumeni SNC Sistema Nervoso Central SPID Sociedade de Psicanálise Iracy Doyle SUS Sistema Único de Saúde TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido Uerj Universidade do Estado do Rio de Janeiro UFF Universidade Federal Fluminense UFPE Universidade Federal de Pernambuco UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro Unicamp Universidade Estadual de Campinas Unicap Universidade Católica de Pernambuco Unifesp Universidade Federal de São Paulo Uninassau Centro Universitário Maurício de Nassau Unirio Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro UPE Universidade de Pernambuco 14 USP Universidade de São Paulo UTI Unidade de terapia intensiva Capítulo 1 O TEMPO DE UMA ESCOLHA FORÇADA O SUJEITO INFANTOJUVENIL SEUS PAIS E A EQUIPE ASSISTENTE DIANTE DA INDICAÇÃO DE AMPUTAÇÃO Referências ALMEIDA M D A criança com tumor de sistema nervoso central considerações da psicanálise para a área da saúde 2011 122f Dissertação Mestrado em Psicologia Clínica Instituto de Psicologia Universidade de São Paulo São Paulo 2011 BARROS A et al Reabilitação fonoaudiológica de pacientes com tumores no sistema nervoso central In OSÓRIO C Neurologia oncológica manejo multidisciplinar das neoplasias do sistema nervoso central da infância São Paulo Lemar 2003 p 405412 BIANCHI A Câncer nas crianças entrevista concedida a Drauzio Varella 4 dez 2011 Disponível em httpdrauziovarellacombrcrianca2cancernascriancas Acesso em 16 Out 2014 BRUN D A criança dada por morta riscos psíquicos da cura São Paulo Casa do Psicólogo 1996 CAMARGO B et al Cancer incidence among children and adolescents in Brazil first report of 14 populationbased cancer registries Internacional Journal of Cancer v 126 n 3 p 715720 2009 CUKIERT M PRISZKULNIK L O corpo em psicanálise algumas considerações Psyqhê São Paulo v 4 n 5 p 5363 2000 DOLTO F O evangelho a luz da psicanálise Rio de Janeiro Imago 1979 Prefácio In MANNONI M A primeira entrevista em psicanálise Rio de Janeiro Campus 1981 p 930 A imagem inconsciente do corpo 2 ed São Paulo Perspectiva 2007 EPELMAN C EPELMAN S Prefácio In BRUN D A criança dada por morta riscos psíquicos da cura São Paulo Casa do Psicólogo 1996 p XXIXXIV FREUD S Luto e Melancolia In A história do movimento psicanalítico artigos sobre a metapsico 19141916 Rio de Janeiro Imago 1996a p243263 Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud v 14 INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA Estimativa 2014 incidência de câncer no Brasil Rio de Janeiro 2014 MANNONI M A criança sua doença e os outros Rio de Janeiro Zahar Editores 1971 OSÓRIO C et al Sequelas neurocognitivas da radioterapia cerebral em crianças com tumores intracranianos In OSÓRIO C Neurologia oncológica manejo multidisciplinar das neoplasias do sistema nervoso central da infância São Paulo Lemar 2003 p 381393 PRISZKULNIK L Violência contra crianças desafios só para médicos O mundo da saúde São Paulo v 33 n 1 p 5863 2009 QUINET A A descoberta do inconsciente do desejo ao sintoma 2 ed Rio de Janeiro Jorge Zahar 2003 RAIMBAULT G A criança e a morte crianças doentes falam da morte problemas da clínica do luto Rio de Janeiro Francisco Alves 1979 RIGON JÚNIOR H Avaliação dos Efeitos Colaterais Tardios em Sobreviventes de Câncer na Infância 2002 92f Dissertação Mestrado em Oncologia Fundação Antônio Prudente São Paulo 2002 17 Possa ele ressoar uma nota justa entre o antes e o depois em que o situamos aqui mesmo que demonstre que o depois se fazia de antecâmara para que o antes pudesse tomar o seu lugar LACAN 1944 p 197 Propõese neste capítulo uma reflexão acerca do manejo do tempo em oncologia pediátrica O tempo não é o mesmo para o oncologista o psicólogo o fisioterapeuta o fonoaudiólogo o assistente social e o paciente infantojuvenil e seus pais Os profissionais realizam suas atividades de forma singular e dessa forma compõem um mosaico denominado trabalho em equipe afinando tempos e estabelecendo algum compasso possível entre esses tempos de intervenção Cientes de que quem escande o tempo é cada profissional em seu ato no laço com o paciente e seu entorno familiar objetivase pensar as especificidades do manejo do tempo nessa clínica O impasse clínico que leva a redigir este trabalho é oriundo da clínica com crianças e adolescentes portadores de osteossarcoma tumor ósseo ou de outros tumores malignos que requeiram amputação ou mesmo desarticulação do membro acometido pela doença A cirurgia é entendida como parte fundamental do tratamento curativo porém em função do impacto psíquico ocasionado por sua indicação a recusa a esse procedimento é comum entre os pacientes e seus familiares Tal recusa pode significar a morte do paciente em razão da evolução da doença É importante circunscrever aqui um trabalho de luto que se faz fundamental para que a equipe assistente o sujeito infantojuvenil e sua família possam consentir em uma indicação clínica precisa e não escolher como se fosse possível escolher tirar uma perna por exemplo Interessa sublinhar que não se trata de uma escolha qualquer mas do que é nomeado aqui como escolha forçada1 Inspirase na obra de Lacan para aplicar a esse contexto essa concepção da escolha como forçada Quando trata da operação de alienação como constitutiva do sujeito no campo do Outro Lacan define como operação euclidiana da reunião de conjuntos e esclarece Essa reunião é tal que o vel da alienação só impõe uma escolha entre seus termos ao eliminar um deles sempre o mesmo seja qual for essa escolha O que está em jogo limitase pois aparentemente à conservação ou não do outro termo quando a reunião é binária Essa disjunção encarnase de maneira muito ilustrável senão dramática tão logo o significante se encarna num nível mais personalizado no pedido ou na oferta no a bolsa ou a vida ou no a liberdade ou a morte Tratase apenas de saber que vocês querem ou não sic aut nom conservar a vida ou recusar a morte pois no que concerne ao outro termo da alternativa a bolsa ou a liberdade sua escolha será de qualquer maneira decepcionante É preciso estar atento ao fato de que o que resta de qualquer modo fica desfalcado será a vida sem a bolsa e será também por haver recusado a morte uma vida algo incomodada pelo preço da liberdade LACAN 1998c p855 1 Acreditase que no contexto da clínica oncohematológica essa modalidade de escolha seja de grande valor para pensar o manejo desses casos de impasse na atualidade 18 É preciso atentar para a importância e a especificidade da elaboração dessa escolha a fim de que o sujeito possa aderir ao tratamento de forma mais humanizada e principalmente seguir a vida com qualidade após ter se submetido ou mesmo recusado o procedimento Para que se possa falar em consentir é preciso reconhecer uma ação dissimétrica entre o sujeito e a equipe de cuidados Nesse sentido é necessário que a equipe interdisciplinar se responsabilize e sustente junto ao paciente uma indicação pactuada coletivamente Podese levantar a hipótese de que a equipe de cuidados representa para o sujeitopaciente e seus pais nesse contexto um Outro2 que supostamente sabe curar esse mal que acomete o corpo e que pode ocasionar sua morte Muitas vezes a dissimetria e a responsabilidade da equipe ficam pouco evidentes em nome do que se chama de autonomia do paciente afinal segundo algumas concepções menos avisadas da relação dissimétrica do sujeito com o Outro o sujeito escolhe possui livrearbítrio Esse livrearbítrio por vezes mascara a relação que o sujeito tem com seu próprio saber inconsciente e a responsabilidade da equipe em estar atenta à assistência de alguns casos que parecem merecedores de cuidados intensivos e singularizados Propõese pensar especificamente quando esse tratamento pode adquirir dimensões traumáticas para o sujeito e originar nele e em seus pais uma recusa à cirurgia Então surgem as seguintes questões como pode a equipe assistente qualificar o cuidado diante dessa escolha paradoxal O que leva um adolescente ciente e esclarecido e seus pais a recusarem uma amputação ou uma desarticulação que tem indicação curativa Percebese que essa clínica convoca a equipe assistente e o próprio paciente a uma invenção a qual requer um luto prévio Da parte da equipe é preciso fazer o luto da cura do câncer em prol do tratamento do sujeito com a doença luto do saber para todos e abertura ao saber de cada um Esses casos ensinam acerca dos efeitos muitas vezes devastadores de um tratamento pautado por protocolos muitos procedimentos e pelo anonimato do cuidado para o paciente e também para o seu entorno familiar com especial destaque para seus pais e irmãos O cuidado requerido pelo paciente que recusa tratamento nesse contexto traz a marca de um interesse particularizado nem que seja por intermédio de suas próprias faltas LACAN 2003 p 369 e requer da equipe assistente um fórum de discussão o cuidado interdisciplinar e certa concepção de tempo bastante singular Requer ainda o luto da onipotência da expertise do especialismo em troca da abertura ao singular de cada caso o que já foi mencionado em outros trabalhos como Singularizar o cuidado COSTA 2014 Da parte do paciente e de seus pais tornase necessário um trabalho de luto da imagem ideal o qual não se faz antes mas durante um processo de acompanhamento que se estende no tempo e que implica a sustentação de um laço particularizado com o paciente infantojuvenil e sua família Para tanto destacase a importância do que se chama cotidianamente de psicólogo de referência profissional de psicologia que possa acompanhar o caso de forma longitudinal bem como de um espaço de supervisão semanal para discussão da condução dos casos assistidos e de seus impasses 2 O Outro é o lugar em que se situa a cadeia de significantes que comanda tudo que vai poder presentificarse do sujeito É o campo desse vivo onde o sujeito tem que aparecer LACAN 1998a p 193194 19 Das especificidades do paciente infantojuvenil Ao acolherse uma criança ou um adolescente para tratamento em oncologia pediátrica acolhese também sua família com especial destaque para o trabalho realizado com os pais dos assistidos Segundo Freud a constituição de um filho como sujeito porta a marca do desejo que lhe deu origem e qualquer transtorno nessa constituição carreia em si sérios abalos a essas crianças e a seus pais Freud 1996 já asseverava que Se prestarmos atenção à atitude de pais afetuosos para com os filhos temos de reconhecer que ela é uma revivescência e reprodução de seu próprio narcisismo que de há muito abandonaram Assim eles se acham sob a compulsão de atribuir todas as perfeições ao filho o que uma observação sóbria não permitiria e de ocultar e esquecer todas as deficiências dele A criança terá mais divertimentos que seus pais ela não ficará sujeita às necessidades que eles reconheceram como supremas na vida A doença a morte a renúncia ao prazer restrições à sua vontade própria não a atingirão as leis da natureza e da sociedade serão abrogadas em seu favor ela será mais uma vez o centro e o âmago da criação sua majestade o bebê como outrora nós mesmos nos imaginávamos No ponto mais sensível do sistema narcisista a imortalidade do eu tão oprimida pela realidade a segurança é alcançada por meio do refúgio na criança FREUD 1996 p 9798 grifo nosso É preciso considerar também a família e os pais do paciente nesse momento O narcisismo colocase como uma questão central em muitos casos como esses isso é o sofrimento dos pais no sentido de ter de abrir mão de seu próprio narcisismo que se traduz na vida e em sua fruição em seus filhos Nesse primeiro tempo do tratamento oncológico a notícia da cirurgia de amputação surge para o paciente e sua família como um abismo como algo que emudece uma urgência que é a da equipe e que passa a ser a do paciente também Um instante que inaugura um tempo marcado pela angústia e pela ausência do que dizer A equipe pede ao paciente e seu entorno familiar que pense mas o que comparece no lugar do pensamento é um vazio os pacientes dizem não pensar em nada É necessário refletir acerca da especificidade da intervenção do psicólogo orientado pela psicanálise no contexto da recusa ao tratamento Acreditase ser estratégico recuar da posição de quem irá convencer ao paciente a realizar o procedimento posição essa muitas vezes demandada ao psicólogo pela equipe assistente em sua urgência É importante esclarecer ao paciente que não se trata de uma escolha que ele possa fazer sozinho mas sim de uma escolha forçada sem a qual a continuidade da sua vida está em risco Uma hipótese que norteia o trabalho clínico nesses casos é a de que essa escolha acarreta efeitos traumáticos e é preciso nesse momento que o psicólogo de referência do caso atue em duas frentes de intervenção junto à equipe no sentido de tornála continente dessa angústia manifesta pelo paciente e passível de acolher essa recusa como um tempo necessário em alguns casos junto ao paciente e à sua família pois é preciso escutar o que motiva essa recusa Acreditase ser necessária a construção de um saber ao lado desses pacientes a qual precisa ser considerada em seu cuidado e envolve o que se chama de luto antecipatório da imagem ideal Esse processo 20 de luto só é possível a partir da aposta do psicólogo clínico que acompanha aquele caso na possibilidade de reconstrução da imagem corporal e de invenção desses sujeitos infantojuvenis É digna de nota a capacidade de invenção presente nos pacientes infantojuvenis quando se sustenta junto a eles uma aposta no sujeito Chamar de escolha algo que é da ordem de uma indicação médica consensual é deixar o paciente em uma condição de desamparo radical Destacase a conclusão de alguns pacientes que possuem a consciência de que se é para escolher entre o membro acometido ou a vida isso não é propriamente uma escolha mas um infortúnio que é preciso atravessar para seguir vivendo Quando se afirma não ser uma escolha salientase a dissimetria que há nessa indicação entre a equipe assistente e o paciente Isso em momento algum quer dizer que se deve desconsiderar o paciente mas implica advertirse de que essa indicação radical precisa ser assumida sobretudo pela equipe que por sua vez deve transmitila ao paciente e a seus familiares A indicação de uma amputação ou desarticulação nessa fase da vida gera efeitos de angústia não só para o paciente mas também para a equipe assistente Cabe a essa apostar na capacidade de invenção desse paciente e singularizar o cuidado prestado naquele caso elegendo um membro desse coletivo como aquele que será o oncologista de referência em outras palavras construir uma equipe com nome com referências nominais para aquele paciente e seus pais e com alguma estabilidade temporal para que ela possa acolher os efeitos do malestar originados por essa indicação num segundo tempo que pode ser denominado de tempo para compreender Na escolha entre o membro acometido pela doença oncológica e a vida um paciente pode escolher a vida se ele pode fazer um luto do membro acometido por exemplo braço ou perna ou dizendo de outro modo se ele pode simbolizar essa perda para seguir vivendo Isso implica certa negociação de um tempo mínimo de elaboração dessa perda dentro da equipe interdisciplinar sempre atenta para o fato de que com o real do câncer não há como negociar muito tempo3 Inaugurase aí um segundo tempo um tempo de compreender quando a equipe consente em escutar A equipe nesse ato supõe do lado do paciente a necessidade de um tempo de elaboração de luto diante da indicação cirúrgica radical Nesse sentido a equipe retificase diante de sua própria urgência em tratálo recalcula seu cuidado frente à postura de recusa desses pacientes e tenta lançar mão de recursos alternativos na tentativa de ganhar algum tempo e construir um laço de cuidado com aquele paciente por exemplo tratálo com quimioterapia com vistas à redução tumoral Foram desenvolvidas entrevistas paralelas com os pais desses pacientes que na maioria dos casos desejam que seus filhos permaneçam vivos Nessas entrevistas os pais muitas vezes oferecem pistas preciosas de como acessar aquele paciente e passam a ter um laço de confiança com a equipe de cuidados Considerações finais Por que é chamado de escolha algo que é da ordem de uma indicação médica precisa frente a uma doença potencialmente fatal Talvez porque exista muita dificuldade em responsabilizarse enquanto equipe por uma indicação cirúrgica radical que acarreta efeitos traumáticos e consequentemente impasses na adesão ao tratamento em muitos desses casos 3 Quiçá quando se trata de casos de tumores tão agressivos como os osteossarcomas e de outros tipos de cânceres infantojuvenis 21 Surge então o desafio para a equipe como encaixar o tempo do paciente e de sua família no tempo do protocolo A saber um protocolo extremamente importante para salvar a vida do paciente Cientes de tratarse de uma escolha forçada podese concluir que não é possível falar apenas uma vez A equipe interdisciplinar assistente em oncologia pediátrica precisa dispor de um mecanismo flexível e maleável à repetição dessa comunicação e colher junto aos pacientes e seus responsáveis os efeitos traumáticos ocasionados por ela É preciso estar junto ao paciente e à sua família na travessia dessa decisão com a aposta de que é possível ter vida após a cirurgia O psicólogo intervém no sentido de favorecer a elaboração de um trabalho de luto a partir do qual seja possível estabelecer a diferença entre a perda do membro amputado e a perda do sujeito Se esse trabalho se torna possível o sujeito permanece e podese construir alguma borda simbólica para essa perda pode seguir a vida com saúde uma vez que essa seja entendida em seu sentido não puramente biomédico Canguilhem 1945 assinala que saúde não é a manutenção da rigidez das normas da vida mas a capacidade de criar novas normas em situações novas O desenrolar da história de pacientes que recusam o tratamento é bastante difícil geralmente marcado por um julgamento da equipe que os assiste imputando a eles a culpa pelo fracasso no tratamento No entanto é preciso ressaltar que não há fracasso diante do impossível O fracasso está colocado do lado da onipotência mas contra o câncer não se pode tudo existe um limite algo que é impossível de assimilar em oncologia um impossível de curar em muitos casos A posição onipotente então só pode dar lugar à angústia e ao sentimento de fracasso Por outro lado se esse impossível não é negado mas trabalhase advertido disso podese qualificar a assistência ao sujeito com câncer e seu entorno familiar 22 Referências CANGUILHEM G O Conhecimento da Vida Rio de Janeiro Forense Universitária 1945 COSTA N G Da sobrevida à vida considerações sobre crianças e adolescentes com câncer a partir da Psicanálise 2014 Trabalho de conclusão de curso Especialização Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva Rio de Janeiro 2014 FREUD S Sobre o Narcisismo uma introdução In A história do movimento psicanalítico artigos sobre a metapsico 19141916 Rio de Janeiro Imago 1996 p75108 Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud v 14 LACAN J Nota sobre a criança In Outros escritos Rio de Janeiro J Zahar 2003 O seminário livro 11 os quatro conceitos fundamentais da psicanálise Rio de Janeiro J Zahar 1998a O tempo lógico e a asserção subjetiva da certeza antecipada In Escritos Rio de Janeiro J Zahar 1998b p197213 Posição do Inconsciente In Escritos Rio de Janeiro J Zahar 1998c p843864 Capítulo 2 QUANDO O TRATAMENTO DO CÂNCER DA CRIANÇA TERMINA A PSICANÁLISE E O TEMPO SINGULAR DE CADA SUJEITO 25 Este capítulo procura destacar a dimensão do tempo que a psicanálise freudlacaniana revela o tempo singular de cada sujeito diferente da temporalidade linear cronológica que perpassa as pesquisas objetivas na área da oncologia pediátrica Essas duas dimensões de tempo cronológica e inconsciente devem ser levadas em conta para a assistência à criança quando o tratamento do câncer termina Para o desenvolvimento do tema o texto base é a pesquisa de Mestrado4 defendida na Universidade de São Paulo USP cujo objetivo foi investigar sentidos e significações que a criança com tumor de Sistema Nervoso Central SNC que já passou pelo tratamento oncológico tem da doença e das alterações corporais aparentes decorrentes do tumor e de seu tratamento ALMEIDA 2011 A maioria das crianças com tumores cerebrais apresenta sequelas visíveis no corpo ocasionadas pela doença e pelo tratamento oncológico Dessa forma supõese que o retorno ao convívio social após o tratamento confronta a criança com experiências peculiares que dizem respeito ao campo da subjetividade Para investigar os sentidos e as significações que essa criança tem da doença e das alterações corporais aparentes decorrentes do tumor e de seu tratamento a psicanálise freudlacaniana permite abordar os aspectos subjetivos que estão interligados às perdas orgânicas vivenciadas pelas crianças Para introduzir esse tema uma breve contextualização sobre a criança com SNC fazse necessária O câncer infantojuvenil é aquele que acomete pacientes abaixo dos 19 anos Para o Brasil no ano de 2014 estimamse 11840 casos novos com o percentual mediano de 3 de todos os cânceres INCA 2014 A incidência dos tumores de SNC varia de 7 a 17 de todas as neoplasias malignas pediátricas sendo o tumor sólido mais frequente nessa faixa CAMARGO et al 2010 Não há dados estatísticos no Brasil que sintetizem o número de sobreviventes de câncer infantojuvenil mas sabese que a taxa de cura está em torno de 85 das crianças e dos adolescentes que chegam aos centros especializados de tratamento RODRIGUES CAMARGO 2003 A oncologia pediátrica é uma especialidade recente na medicina BIANCHI 2011 pois até a década de 1970 as crianças eram acompanhadas pelas mesmas equipes e recebiam o mesmo tratamento dos adultos a quimioterapia era pouco desenvolvida tentava dominarse o câncer com grandes cirurgias inclusive mutiladoras e os campos de radioterapia eram enormes com doses altas a possibilidade de cura não ultrapassava 20 A partir da década de 1970 os pediatras interessados em oncologia começaram a se especializar na área aprimorando os métodos terapêuticos cirurgia radioterapia e quimioterapia iniciando uma melhora no índice de cura dos cânceres de crianças e adolescentes A partir do final da década de 1990 o sucesso dos tratamentos modificou o desafio de trabalhar com a criança com câncer Os oncologistas pediátricos passaram a investir em pesquisas e em intervenções nos efeitos tardios que podem prejudicar a saúde a qualidade de vida e o bemestar dos sobreviventes de câncer infantojuvenil Nessas pesquisas é possível perceber que órgãos e sistemas aspectos físicos mentais comportamentais e sociais são avaliados com métodos e técnicas padronizados e os resultados são analisados relacionando o diagnóstico as drogas envolvidas o campo da radioterapia o tipo de cirurgia realizada a idade no diagnóstico a ocorrência de recidiva o seu período e o tempo de observação decorrido desde o término do tratamento até a avaliação dos efeitos tardios Com essa 4 Esta pesquisa foi realizada no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo e contou com o apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNPq 26 abordagem objetivase conhecer os efeitos do tratamento oncológico aperfeiçoar a assistência em oncologia diminuir as sequelas e melhorar a qualidade de vida dos pacientes Em relação às sequelas cerebrais elas podem ser subdivididas em estruturais neuroendócrinas e neurocognitivas OSÓRIO et al 2003 Percebese que as sequelas neurocognitivas são as mais estudadas seus principais déficits e alterações são intelectuais de memória de atenção e concentração de aptidões motoras e motricidade fina de organização perceptual de aprendizagem de compreensão verbal e gramatical de habilidades acadêmicas por exemplo dificuldades em leitura e ortografia de processamento rápido As manifestações dessas sequelas tornamse evidentes em média entre um e três anos após o tratamento oncológico Há alguns fatores de risco para a ocorrência dos prejuízos neuropsicológicos idade da criança e seu nível de desenvolvimento antes do diagnóstico eventuais intercorrências cerebrais ou neurotóxicas durante o tratamento oncológico dose de radioterapia craniana e volume do cérebro irradiado localização do tumor e quimioterapia intratecal o medicamento é aplicado diretamente no líquido cefalorraquidiano pelo canal espinhal A irradiação craniana causa lesões sendo a leucoencefalopatia a mais reportada na literatura que é definida como uma alteração estrutural na sustância branca cerebral e suas manifestações são espasticidade ataxia tonturas hemiplegia além das alterações neuropsicológicas já relatadas RIGON JÚNIOR 2002 A irradiação craniana também pode causar calcificações e necroses atrofia cortical dilatação ventricular isquemias vasculares e destruição neuronal Barros et al 2003 afirmam que os prejuízos cerebrais podem repercutir também em alterações na linguagem afasias dificuldade na compreensão eou expressão da linguagem e na fala apraxias incapacidade de programar sequenciar e executar os movimentos articulatórios intencionais e disartrofonias fraqueza lentidão ou falta de coordenação motora dos órgãos fonoarticulatórios presentes nos processos básicos da fala como a respiração a fonação a articulação e a prosódia Em muitos casos observase que a afasia posterior à lesão neurológica apresenta outras características a perda do sentido da metáfora e da polissemia a dificuldade de compreender os atos indiretos da linguagem ou o contexto da enunciação a expressão do antônimo do que se pretendia dizer por exemplo sair ao invés de entrar abaixo ao invés de acima WINOGRAD SOLLERODECAMPOS DRUMMOND 2008 Assim o paciente interpreta sua palavra e a dos outros sem complexidades nem ambiguidades Outros efeitos colaterais tardios também podem aparecer nos pacientes com tumores cerebrais RIGON JÚNIOR 2002 por exemplo distúrbio de crescimento efeitos ototóxicos prejuízos nos olhos esterilidade retardo na menarca disfunção gonadal epilepsia e segunda neoplasia Delimitar os prejuízos neurológicos não é objetivo deste texto porém o destaque dado aos aspectos orgânicos das sequelas pósterapia oncológica para tumor de SNC na infância devese à importância e à influência que esses fatores têm na vida dos pacientes É preciso que o psicanalista que se propõe a atender esses pacientes tenha o conhecimento dessas diferentes áreas e dialogue com os profissionais complementando os saberes Isso pode facilitar a singularidade de sua escuta e de suas ações pois ao abranger a realidade da doença a abordagem psicanalítica propicia que o paciente compreenda como sua doença se integra em sua história consciente e inconsciente construindo assim um sentido que lhe é particular e evitando a passividade no enfrentamento da doença e de suas consequências 27 Momento de escutar os sujeitos sobre o câncer e as sequelas Para investigar as questões subjetivas que perpassam as experiências da criança com sequelas aparentes após o tratamento oncológico adotouse como instrumento a entrevista Foi realizada uma entrevista individual de questões abertas com 11 crianças pacientes da Casa de Saúde Santa Marcelina em São Paulo que obteve aprovação do Comitê de Ética Certificado de Apresentação para Apreciação Ética CAAE nº 0095 027000009 As falas das crianças foram classificadas em temas a partir de sua repetição ou relevância a interpretação e a discussão do material foram fundamentadas em algumas concepções da teoria psicanalítica freudlacaniana Dos seis temas tratados foram selecionados três para ilustrar como a questão do tempo relacionase com a experiência subjetiva de crianças tratadas para o câncer As perdas as dores o luto O acometimento de uma doença motiva dores que precisam passar por certas fases de simbolização para ser possível o luto RAIMBAULT 1979 No luto a pessoa precisa nomear os objetos perdidos e após um afastamento necessário de outros objetos e de atividades que não estejam ligadas ao que foi perdido ela aceita a perda dos objetos desinveste e introjetaos sob a forma de lembranças atos palavras FREUD 19151917 Só com esse trabalho de elaboração a afetividade fica disponível para outros investimentos para se ligar a outros interesses substituindo o objeto de amor Freud defende que o luto é um afeto normal período em que ocorre o processo doloroso de reação à perda de um objeto amado e que após um tempo será superado Elaboração e tempo que podem ser diferentes para cada sujeito Entendese por objetos perdidos qualquer experiência em que ocorrem abalos identificatórios Conforme Winograd SollerodeCampos e Drummond 2008 exemplificam uma doença no cérebro pode provocar perdas motoras cognitivas e perceptivas que afetam a autonomia do sujeito seus referenciais internos do que ele pode e quer fazer e sua relação com o outro As disciplinas objetivas da saúde intervêm para minimizar ou curar as perdas enquanto a psicanálise opera nas faltas decorrentes dessas perdas A aceitação da sequela implica um trabalho de elaboração ou seja integrála em seu mundo subjetivo remanejar os afetos decorrentes dela e superálos modificando a forma de encarar o fato Raimbault 1979 defende que o processo do luto e seus diferentes mecanismos são semelhantes na criança e no adulto ambos sentem dor e angústia A entrevistada Gabriela indica que no momento está conseguindo elaborar a situação e durante a entrevista ela se compromete com as palavras e vai construindo novas significações No começo eu fiquei bem nervosa Mas depois eu me acostumei Nervosa porque eu olha olhava pro lado e não vi olho pro lado e não via nada Já é mais difícil Ah eu tava nervosa com todo mundo eu não queria saber de nada Tava brava Foi bem difícil Agora eu já agora eu já me adaptei de outro jeito Como eu já eu já uso uso bengala sei escrever é me alfabetizei no braile A conhecer as coisas eu tenho que conhecer no tato Antes eu procurava alguma coisa já via onde tava e pegava né Mas agora eu tenho que eu procurar conhecer as coisas pelo tato Mas eu faço muitas coisas também Eu gosto de 28 fazer pulseira Às vezes eu gosto de tricô Crochê aprendi mobilidade informação verbal O entrevistado Tiago também relata a necessidade de se acostumar com a deficiência posterior ao câncer Entrevistadora E essa dificuldade em você ver Tiago Ééé eu tou me acostumando Se acostumando é saber que não tem mais visão eu já quebrei uns sete seis óculos Ai olha esse aqui coloca o dedo ô ta vendo essa lente aqui já ta quase saindo já essa aqui também informação verbal A associação feita por Tiago saber que não tem mais a visão e já ter quebrado entre seis e sete óculos suscita que ele não aceita seu uso Isso é confirmado no final da entrevista quando ele revela É que sem óculos eu consigo ver melhor sem os óculos eu consigo ver é tudo mais claro tudo mais bonito tudo isso informação verbal Essa revelação muitas vezes é possível quando há uma escuta que valida as palavras ditas ou seja que vai além da intenção do que quiseram falar Para a Psicanálise o saber inconsciente pode ser negado pelo sujeito porém como exige ser conhecido manifestase em função dos processos inconscientes como as associações de ideias e os posicionamentos adotados pelo falante Verbalizar uma situação dolorosa permite ao indivíduo alcançar o sentido subjetivo do que ele vive estruturandose como pessoa MANNONI 1971 Enquanto o sujeito relata suas experiências uma série de significantes podem se associar possibilitandoo se implicar na história narrada e dar novos significados aos acontecimentos de sua vida Isso é um acesso ao trabalho de elaboração Depararse com os limites As perdas motoras cognitivas e perceptivas geradas pela doença conduzem os sujeitos a limitações de sua autonomia Gabriela relata as limitações experimentadas às vezes tem lições que não dá pra mim fazer o ruim é depender das pessoas assim por exemplo pra andar como na escola eu tenho que depender dos amigos porque muitos alunos me empurram Já é mais difícil No recreio eu sempre fico com o inspetor eu fico conversando mas só que eu não fico brincando igual meus amigos eu acho bom ficar com o inspetor porque pelo menos eu não atrapalho meus amigos porque os professores mesmo já falam porque quando um aluno fica comigo a hora que chega na sala eles já ficam reclamando Ficam falando assim que não pode brincar chega na sala ele já quer sair às vezes tenho vontade mas às vezes às vezes eu nem tenho vontade de brincar É que às vezes eu gostaria de tá às vezes eu gostaria de ver Porque é muito ruim ficar sem enxergar Como antes eu gostava de ficar correndo agora eu não posso Gostava de correr com meus amigos eu não posso mais informação verbal 29 Os limites experimentados pelo paciente podem ser associados às experiências de castração descritas por Dolto 1984 Essa autora considera que durante as etapas da vida o ser humano enfrenta situações de interdição e de privação precisando superálas reformular seus objetivos e buscar novas formas de satisfação Winograd SollerodeCampos e Drummond 2008 contribuem com essa discussão ao afirmar que a falta abordada pela Psicanálise é inerente à condição do sujeito humano pois referese à finitude e ao corpo mortal Ela é simbólica e aponta para a castração em torno da qual o psiquismo humano organizase e reorganizase permanentemente apresentando um tempo singular para cada sujeito As castrações quando consideradas humanizantes são repressivas porém geram novas maneiras de ser e contribuem para que o indivíduo se insira no mundo da cultura e da linguagem Dolto 1981 ensina que todo acontecimento mesmo nefasto pode servir de forma positiva para quem dele souber tirar uma experiência frutífera Havendo essa mudança produtiva os momentos de castração oferecem uma autonomia maior ao sujeito Continuando com o exemplo de Gabriela ela fala Porque ô como tem muitas coisas que tem coisas que não dá pra mim fazer mas também na escola eles têm livros em braile que eles recebem já dá pra mim ler histórias Eu eu aprendendo decorando eu decoro o que os professores explicam quando é prova eu sempre tiro nota boa informação verbal Reconhecer a possibilidade de superação da sequela a partir dos tratamentos de momentos prazerosos ou de modos de compensação como algumas das crianças entrevistadas fazem ajuda na construção de fantasias sonhos e projetos favoráveis Essas criações são próprias do homem e são importantes para intermediar a relação dele com a realidade do mundo DOLTO 1979 A realidade do mundo muitas vezes provoca o rompimento dessas fantasias desses sonhos sendo necessária uma reformulação para que haja uma produção um crescimento A criança curada de câncer Em relação a essa temática Brun 1996 p 14 problematiza Esforçarse por tratála como uma criança normal portanto como aquilo que ela não é significa também ignorar que ela é uma criança curada de câncer A cura do câncer força a família a uma nova representação da criança e de seu futuro impõelhe o luto das suas promessas anteriores de vida Tratála como uma criança normal é privarse talvez até de proibirse fazer morrer a imagem da criança de antes de renunciar a uma imagem tão ilusória quanto impossível Epelman e Epelman 1996 escrevem que o diagnóstico do câncer provoca nos pacientes e nos familiares questões sobre a morte possível o sentido da vida mobilizando dores muitas vezes insuportáveis entretanto o término do tratamento oncológico pode não ser suficiente para distanciálos dessas questões O anúncio da cura vislumbrada como uma saída feliz da doença pode colocar a família e a criança em novos questionamentos e necessidades de reformulações não isentas de angústia e de medo Isso pode explicar a defasagem percebida nos casos de 30 pacientes fora de tratamento oncológico entre o tempo da cura física e o tempo da cura psíquica A cura física é algo desejado e proporciona satisfação para os pais e para a criança mas há um paradoxo na situação pois modificar o universo dos pensamentos povoados pelo medo e pela representação de morte pode vir a ser uma fonte de sofrimento Na sua dimensão psíquica a cura é obtida quando cada um reencontra o sentimento da sua identidade e dependendo dos sujeitos envolvidos pais crianças irmãos cada um terá seu tempo singular para esse reencontro Muitas vezes as dificuldades com que cada um necessita lidar para reencontrar sua identidade são regidas pela história singular de cada um e de como cada um é afetado pelos conteúdos interiores do outro por isso percebemse as diferenças no tempo de elaboração da criança da mãe do pai do irmão Nesse sentido a escuta que o psicanalista deve oferecer não possibilita importante destacar ações ou pensamentos universais como requerido pelas áreas científicas Brun 1996 afirma que muitas vezes mesmo após um tempo fora do tratamento oncológico o paciente não consegue transformar os vínculos estabelecidos com a doença e com o mundo que a doença traz Essa dificuldade em elaborar o passado é vista como resistência ao esquecimento diferente da recordação pois torna o passado vivo e atual Lutar para não pensar na doença não significa mantêla afastada do inconsciente essa é uma vã tentativa já que os doentes contra sua vontade consciente permanecem fixados no trauma ao qual são reconduzidos a cada noite pelos seus sonhos p 104 A resistência ao esquecimento apresenta duas dimensões uma se manifesta como tendência ao pessimismo e à dúvida sobretudo em relação ao desfecho da doença ou seja a aceitação da cura O outro aspecto é quando o esquecimento representa para o doente tratado de câncer um risco de despersonalização Raciocinase que no entrevistado Vinícius há uma paralisação subjetiva na doença pois ele admite É que às vezes eu nem acredito que tiraram isso aqui informação verbal Porém além dessa racionalização consciente ele revela algo diferente quando a entrevistadora pergunta Você acha então que não tiraram o tumor Vinícius Não eu sei que tiraram O sujeito cartesiano sujeito da consciência é diferente do sujeito freudiano sujeito do inconsciente pois embora nas duas acepções o sujeito seja um ser de pensamento para Descartes o sujeito é uma coisa pensante enquanto para a psicanálise o sujeito não tem substância manifestandose na hesitação na dúvida entre isto ou aquilo QUINET 2003 p 13 Nesse trecho do diálogo com Vinícius o sujeito de que trata a psicanálise não é aquele que pensa mas aquele que duvida de sua cura Considerações da psicanálise para a área da saúde Advertidos pelos argumentos freudianos da necessidade de articular e delimitar o corpo biológico e o corpo representado pela psique os psicanalistas que têm interesse em compreender a experiência subjetiva de pessoas que possuem o diagnóstico de uma doença orgânica devem ter cuidado ao abordar as questões referentes ao psíquico Ao investigar crianças que tiveram câncer cerebral pretendese nem excluir nem destacar a patologia mas ter atenção aos aspectos do organismo e privilegiar a relação desses pacientes com a doença e com suas consequências WINOGRAD SOLLERODECAMPOS DRUMMOND 2008 Sendo assim mesmo diante 31 de uma doença orgânica um espaço de escuta pode ser oferecido para o dizer daqueles que sofrem Essa conversa também é uma via de acesso à psique e o psicanalista pode utilizar a sua intervenção como meio de acesso ao sujeito do inconsciente CUKIERT PRISZKULNIK 2000 No trabalho proporcionado pela psicanálise a criança se descobre sujeito de sua própria fala e de seu próprio desejo ou seja ela pode reescrever sua história e situar sua subjetividade nas experiências de vida A atuação psicanalítica nos contextos da oncologia pediátrica favorece um espaço no qual podem ser tratadas as elaborações face à doença e às suas consequências já que os efeitos orgânicos de uma doença e seu tratamento afetam e produzem efeitos subjetivos Tratar a doença orgânica é tarefa do médico e de outros profissionais da equipe Se o psicanalista fizer parte da equipe seu papel será dirigido ao sujeito que porta a doença aos sentidos e às significações que afetam esse sujeito A prática psicanalítica então não é incompatível com as configurações das instituições de saúde pois o dispositivo analítico também pode se instalar em ambientes que não sejam os de consultório particular PRISZKULNIK 2009 A formação do psicanalista orientao a instaurar um modelo de clínica o remanejamento de alguns dispositivos tradicionais fazse necessário porém a transferência e a posição do psicanalista são essenciais e independem dos dispositivos tradicionais A posição do psicanalista é suportar o seu não saber sobre o que o paciente deve fazer Não se pretende curar nem educar nem normalizar A partir dessa fala as intervenções do psicanalista visam a uma produção por parte do paciente novas significações para as marcas deixadas pelo câncer pelas mudanças que as alterações corporais acarretam pela sua história pessoal e familiar Percebese que para a assistência e para a pesquisa em psicanálise o tempo válido é a temporalidade do sujeito do inconsciente diferente da temporalidade linear cronológica importante para as pesquisas objetivas das sequelas e dos efeitos tardios do tratamento oncológico retratadas na primeira parte deste texto A psicanálise freudlacaniana revela outra dimensão do tempo o tempo singular de cada sujeito O psicanalista inserido nas instituições de saúde aborda os aspectos do paciente relacionados à experiência subjetiva do adoecimento preocupandose em realizar intervenções que favoreçam o sujeito a circunscrever como suas vivências se integram na sua vida a fim de aumentar sua autonomia de pensar e de agir E essa construção só é possível respeitando as variáveis singulares de cada caso 33 RODRIGUES K E CAMARGO B Diagnóstico precoce do câncer infantil responsabilidade de todos Revista da Associação Médica Brasileira São Paulo v 49 n 1 p 2934 2003 WINOGRAD M SOLLERODECAMPOS F DRUMMOND C O atendimento psicanalítico com pacientes neurológicos Revista malestar e subjetividade Fortaleza v 8 n 1 p 139170 2008 General Isola Delle Femmine via L La Loggia 80125 Napoli Telefono 081 524 37 01 081 548 7394 Telefax 081 563 0711 Capítulo 3 REFLEXÕES SOBRE A VIVÊNCIA DO TEMPO NO PACIENTE EM CONTROLE The US Navy relies upon a complex coding system to designate its airlines The official designation of any particular airline always includes a letter or group of letters indicating the type of flight involved the number that identifies the particular airline or carrier and a suffix letter that serves to identify the flight itself or a particular squash The letter N then a dash followed by the intracarrier airport code which allows for the identification of the airport Types of letters used include F designating freight flights C for cargo flights P denoting passenger flights and A indicating air ambulance flights The US component of the airlines designation indicates its origin while the numbers differentiate the fleets and the suffix letters denote specific flights within those fleets For example the designation NC203 refers to a Navy cargo flight on the inner networks with identification 203 37 O paciente oncológico adulto diante do diagnóstico e do tratamento clínico eou cirúrgico a que geralmente deve se submeter vivencia uma radical transformação em sua rotina pessoal Pois ainda que conservando tanto quanto possível sua autonomia e suas relações cotidianas seria mesmo de se estranhar se o adoecimento não trouxesse mudanças qualitativas importantes na apreciação do tempo que resta Nos casos mais favoráveis felizmente o tratamento dá lugar dentro de alguns meses a um período de controle com visitas menos frequentes à instituição para acompanhamento do quadro e exames periódicos O paciente escuta de sua melhora embora possa ter sequelas físicas mais ou menos limitantes e tumorações residuais e é de maneira atenciosa instado pelos profissionais a levar uma vida normal daqui para diante dentro de uma perspectiva tecnicamente apropriada em tomar o câncer cada vez mais sob os moldes de uma doença crônica como outras assim reconhecidas pela comunidade Assistindo a pacientes em momentos distintos dessa trajetória com ênfase no desenrolar do tratamento clínico quimioterápico eou radioterápico até quando ele se conclui verificamse aspectos comuns a quase todos os atendimentos voltados à preservação da identidade do paciente nos contextos familiar e profissional e à necessidade mais ou menos explícita de um tempo coloquial que nessa acepção significa simultaneamente espaço para reflexão e planejamento em meio às ansiedades compartilhadas por aqueles com quem convive intimamente De maneira muito concreta o tratamento clínico parece exacerbar a experiência do tempo presente a expectativa por novos ciclos de quimioterapia e seus efeitos pondo em suspenso o futuro daqueles envolvidos O que a psicoterapia tem a oferecer diante de um evento crítico de tamanho impacto talvez se encontre na dimensão temporal aparentemente oposta de um exercício das reminiscências do paciente processo que envolve a reinterpretação de situações passadas diante da experiência recente Segundo Falcão e BucherMaluschke 2010 no contexto específico do envelhecimento tal processo entre outros responde por maior resiliência e saúde mental no enfrentamento de acontecimentos ameaçadores Em capítulo no qual também destaca o tema da velhice diante da modernidade Birman 1997 referese de modo abrangente à relação do sujeito com o real da morte contemplando perdas narcísicas que a doença oncológica atualiza de forma particularmente dolorosa demandando um trabalho de luto frente às limitações que o paciente vivencia A elaboração psíquica dessas perdas exige segundo o autor um trabalho de substituição simbólica amparado em um processo de temporalização no qual as possibilidades futuras decorrem de uma rearticulação existencial e desejante do sujeito BIRMAN 1997 p 203 Contrariamente a doença assim como a velhice poderá desencadear um impasse diante da revisão impossível do passado e da inexistência do futuro produzindo estilos psicopatológicos da ordem da depressão melancolia da paranoia ressentimentos e da mania negação Dentro do mesmo referencial teórico Baroni e Kahhale 2011 afirmam que o adoecimento oncológico e notadamente a terminalidade inauguram um estado de desamparo e um estreitamento do tempo antes linear e progressivo precipitando questionamentos até então silenciados pela ilusão de imortalidade própria ao inconsciente Fazendo uso de conceitos psicanalíticos como transitoriedade Freud e tempo lógico Lacan articulados a fragmentos clínicos junto a pacientes ditos em processo de terminalidade as autoras postulam a viabilidade de uma clínica da urgência amparada no pressuposto de que diante da angústia despertada cada pessoa a partir de sua biografia construirá explicações singulares para o adoecimento e poderá buscar novas significações para a vida dando voz ao seu desejo 38 Segundo Teles e Valle 2009 a partir de revisão de literatura voltada ao tema do adulto sobrevivente ao câncer infantil a maior parte das pesquisas trata da avaliação de seu funcionamento psicossocial fazendo uso de métodos quantitativos havendo escassez de artigos voltados à vivência desse adulto ao modo como ressignifica sua experiência de adoecimento Ainda embora apresentando resultados otimistas quanto à qualidade de vida percebida as autoras reiteram a predominância de perspectiva teórica centrada na deficiência e no mau ajustamento em lugar do enfrentamento individual Dentro de um modelo cognitivista o conceito de enfrentamento coping já é reconhecido há várias décadas no âmbito da psicologia social clínica e da personalidade englobando o conjunto das estratégias utilizadas pelas pessoas para adaptaremse a circunstâncias adversas ANTONIAZZI DELLAGLIO BANDEIRA 1998 p 274 Na cuidadosa revisão teórica empreendida pelas autoras histórico e definições acabam por traduzir a dificuldade em se compreender a estrutura de tal conceito ora correlacionandoo aos mecanismos de defesa empregados ora atentando para os determinantes cognitivos e situacionais do comportamento ora buscando convergir coping e traços de personalidade O fim do tratamento clínico evidentemente não apaga as marcas de seu percurso único na história de vida de cada paciente e do mesmo modo não se pode estabelecer padrões de ajustamento ótimos sem ter em conta características individuais diversas dificilmente mensuráveis ou hierarquizáveis em termos absolutos Desejavelmente esperase que pessoas reconhecidamente sociáveis e ativas antes do adoecimento conservem sua afetividade e seus interesses cotidianos notadamente se mais jovens Entretanto a experiência dos cuidados recebidos traz mudanças inevitáveis à natureza de relações e hábitos a par das limitações físicas por si só E terá que encontrar tempo para a expressão de reações ambivalentes de retraimento ou dependência cuja estranha coerência só poderá ser compreendida no espaço desse novo ser sobrevivente Ismael 2010 acerca do paciente de ambulatório hospitalar menciona o encaminhamento médico que em geral precede à entrevista psicológica e acentua a importância de escutar as queixas pessoais para além da doença buscando compreender o seu processo de aceitação e o ajustamento aos efeitos do diagnóstico e do tratamento comportando o uso adaptativo ou nocivo de mecanismos de defesa como negação regressão e racionalização Brevemente a autora destaca a evidente importância da organização familiar frente ao risco de reações cronificadas de revolta ou passividade havendo frequente necessidade de acompanhar a família no decorrer da trajetória do paciente dentro da instituição No discurso do paciente como no relato de familiares próximos é comum escutar da ambivalência que caracteriza o cuidado entre uns e outros à medida que a rotina exaustiva do tratamento clínico dá lugar ao tempo do controle em que a espera por novas consultas e exames periódicos traz consigo uma ansiedade diversa agora diluída em um novo e impreciso cotidiano daqueles que emergem da fragmentada e fragmentadora vivência anterior Notadamente entre os pacientes masculinos e seus cônjuges seus pais ou seus filhos já que o adoecimento tende mesmo a embaralhar os papéis parecem confundirse muito próximas expressões de superproteção e ressentimento frente às mudanças provocadas a partir do adoecimento com reflexos claros da figura de gênero ativo provedor sinalizando que as respostas afetivas se dão num tempo diverso da evolução clínica mais favorável 39 No contexto específico dos pacientes encaminhados ou vinculados à Oncologia Clínica do INCA cujo diagnóstico inclui desde linfomas e mielomas até neoplasias de diferentes sítios cujo tratamento clínico eou cirúrgico se dá dentro da unidade Hospital do Câncer I HCI comumente o controle clínico é acompanhado por sintomas fisiológicos respiratórios motores etc pouco aparentes o que resulta em certa dificuldade do outro em compreender os sentimentos do paciente até mesmo entre aqueles que partilharam de seu sofrimento ao longo do tratamento Tratandose de pacientes ativos profissionalmente a narração das visitas periódicas ao órgão de seguridade social por exemplo adquire relevância em um tempo material e simbólico nas dificuldades concretas no trato com os médicos peritos e nas preocupações financeiras plenamente justificáveis somandose o caráter central do trabalho na constituição da identidade pessoal do paciente temática bastante consagrada na literatura atual em diferentes áreas de interesse Também a dificuldade em desempenhar tarefas domésticas rotineiras tradicionalmente identificadas ao gênero feminino em sua maior parte a manutenção dos papéis familiares de paimãe tal como antes e a própria relação conjugal em seus diferentes aspectos são alguns dos demais temas que atravessam frequentemente os atendimentos ambulatoriais e que não possibilitam respostas adaptativas simples pois refletem crenças e comportamentos associados profundamente ao reconhecimento subjetivo do paciente em sua relação com o outro e o mundo Dito de maneira mais ampla apesar de todas as transformações imediatas vividas por vezes tão intensamente no cotidiano é necessário encontrar uma continuidade fundamental entre a crise presente e a história pregressa do sujeito algo que se deve buscar para além das limitações diárias algo da ordem do afeto que diferentes abordagens terapêuticas tratarão por desejo autenticidade ou mesmo transcendência a fim de dotar a experiência do adoecimento oncológico de um sentido positivo único na existência daquele indivíduo Do outro lado o terapeuta em sua função de continente às angústias do paciente terá que acompanhar empaticamente a narrativa desse paciente no percurso e ao final do tratamento oncológico clínico o que implica lidar com o tempo próprio da doença e seus sintomas tanto na sua objetividade médica quanto no modo singular pelo qual o paciente atribui significado a essa experiência A prática institucional permite articular à escuta um papel auxiliar importante na orientação geral acerca da condução do tratamento o que sem dúvida ajuda a diminuir a ansiedade do paciente mas o que se observa em boa parte dos pacientes em controle cujo atendimento se prolonga é mais além uma procura corajosa por conciliar o vivido traumático da doença ao que se pôde preservar de si diante dessa sua nova realidade Não se trata de esquecer ou superar embora o emprego comum de tais signos frente a situações como o acometimento de um câncer pois já não se é exatamente o mesmo também não se é outra pessoa totalmente diferente O que se é então que não se consegue compreender ou aceitar tão prontamente É preciso tempo um tempo talvez mais urgente ou talvez até de certo modo mais calmo para alguns um novo tempo para descobrir dentro de si como simbolizar a experiência do diagnóstico do tratamento e a dimensão de uma possível cura tão estranhamente difícil de se adequar ao cotidiano do paciente 40 Referências ANTONIAZZI A S DELLAGLIO D D BANDEIRA D R O conceito de coping uma revisão teórica Estudos de Psicologia Natal v 3 n 2 p273294 1998 BARONI C S F KAHHALE E M P Possibilidades da psicanálise lacaniana diante da terminalidade uma reflexão sobre a clínica da urgência Psicologia Hospitalar São Paulo v 9 n 2 p 5374 2011 BIRMAN J Estilo e Modernidade em Psicanálise São Paulo Ed 34 1997 FALCÃO D V S BUCHERMALUSCHKE J S N F Resiliência e Saúde Mental dos Idosos In FALCÃO D V S ARAÚJO L FOrg Idosos e Saúde Mental Campinas Papirus 2010 p 3352 ISMAEL S M C A inserção do psicólogo no contexto hospitalar In Org A prática psicológica e sua interface com as doenças 2 ed São Paulo Casa do Psicólogo 2010 p1735 TELES S S VALLE E R M Adulto Sobrevivente de Câncer Infantil uma revisão bibliográfica Psicologia em Estudo Maringá v 14 n 2 p 355363 2009 Capítulo 4 AMORTECER O SOFRIMENTO A ESCUTA DO PACIENTE ONCOLÓGICO NO CUIDADO PALIATIVO Cipro Malta 7 ore di volo Tunisie Spagna 2 ore di volo Grecia Egitto 3 ore di volo Algeria Marocco 4 ore di volo Israele Libano 5 ore di volo Giordania Siria 6 ore di volo Turchia 8 ore di volo Romania Bulgaria 9 ore di volo Iraq Persia 10 ore di volo Yemen Oman 12 ore di volo 43 Princípio O presente trabalho pretende discorrer sobre a experiência técnica do serviço de psicologia no projeto Humanizar de Cuidados Paliativos da Associação de Combate ao Câncer do CentroOeste de Minas ACCCOM Tratase de uma instituição de alta complexidade sem fins lucrativos que aborda desde a prevenção até o pósóbito O projeto é constituído por uma equipe multidisciplinar que procura desenvolver um trabalho interdisciplinar vislumbrando o acolhimento e a assistência ao paciente crônico fora de possibilidades terapêuticas e à sua família Segundo a Academia Nacional de Cuidados Paliativos ANCP Os Cuidados Paliativos foram definidos pela Organização Mundial de Saúde em 2002 como uma abordagem ou tratamento que melhora a qualidade de vida de pacientes e familiares diante de doenças que ameacem a continuidade da vida Para tanto é necessário avaliar e controlar de forma impecável não somente a dor mas todos os sintomas de natureza física social emocional e espiritual ACADEMIA NACIONAL DE CUIDADOS PALIATIVOS 2009 não paginado A psicologia aqui funciona como agente da palavra para dizer dos efeitos subjetivos nesse cenário de dores limitações angústias medos desejos Preconiza um novo direcionamento aos critérios referentes à qualidade ao valor e ao sentido da vida Para Moretto 2006 quando o corpo matéria sofre alterações o corpo simbólico é convidado a se posicionar A escuta da angústia em torno do adoecimento tornase imprescindível uma vez que o sujeito carregado de particularidades esbarra em um real de natureza patológica denominado doença presente em seu próprio corpo De acordo com Moretto 2001 apud SIMONETTI 2004 p 19 A doença é real do corpo no qual o homem esbarra e quando isso acontece toda a sua subjetividade é sacudida É então que entra em cena o psicólogo hospitalar que se oferece para escutar esse sujeito adoentado falar de si da doença da vida ou da morte do que pensa do que sente do que teme do que deseja do que quiser falar A psicologia está interessada mesmo em dar voz à subjetividade do paciente restituindolhe o lugar de sujeito que a medicina lhe afasta Uma pessoa doente deixa de se interessar pelas coisas do mundo externo pois retira os investimentos libidinais dos objetos e os coloca de volta para seu próprio ego regredindo A doença é uma ameaça à integridade de ser humano um ataque narcísico que aponta para sua fragilidade e para a possibilidade de sua destruição Ocorre um reposicionamento subjetivo diante das alterações orgânicas que muitas vezes são causa de angústia THOMAS ALCHIERI 2005 O corpo reage para adaptarse ao confronto com os ditames que assolam o sujeito no seu tempo A angústia é aquilo que não engana Tecendo com amor A prática psicanalítica convida à palavra Dar palavra ao real que se inscreveu e se instalou no corpo Dar palavra ao doente ao adoecer e à dor Pela palavra e através dela acreditase que 44 o sujeito possa reinventar um sentido e localizar um desejo a partir da nova realidade imposta Oferece assim uma escuta diferencial um acolhimento que implica o sujeito em seu adoecimento suas queixas em sua própria condição A experiência no cuidado paliativo permite um olhar para além da terminalidade não utópico mas conquistado a partir do amortecer de seu sofrimento O câncer agrega a ameaça de morte Esta é vivida pelo ego como ameaça de perda de seus objetos Como perda implica um luto não só do órgão mas de experiências fantasias que podem estar associadas como representante simbólico ZECCHIN 2004 p 134 Para Freud uma pessoa doente deixa de se interessar pelas coisas do mundo externo na medida em que não dizem respeito a seu sofrimento FREUD 1996 p 98 De outro modo repõe os investimentos libidinais dados a objetos externos para seu próprio ego O paciente em cuidado paliativo envolvese numa série de limitações ocasionadas pela progressão invasiva da doença Assim a medicação específica por vezes não mais faz tanto efeito e o paciente sente dores constantemente A dor pode tomar uma proporção tamanha que mesmo com altas dosagens de opiáceos o paciente ainda a sinta Esse fato causa estranhamento e horror pois o paciente não entende de onde vem tanta dor declarando ser impossível tal acontecimento E não só horror mas a dificuldade de ter de se haver com o limite da promessa básica do cuidado paliativo o alívio da dor Parece que aqui a psicologia é convocada com todo vigor pois a técnica e o saber médico organicista falham Mas que dor é essa que invade o corpo do paciente e causa horror aos que se envolvem Será a dor do fim a dor das perdas a dor por não poder mais desejar É observado em relatos dizeres aflitos de uma dor insuportável ao ponto de o paciente desejar a morte Será papel do profissional condenar esse desejo O analista por sua vez não se deve calar para essa escuta calar é negligenciar esse sujeito que sofre e endereça a pluralidade de sua dor afim de uma sutura e um acolhimento Calar é também extirpar fechar as portas para os caminhos de sentido que o paciente pode alcançar para seu adoecimento e finitude Pois não se trata apenas de uma dor orgânica o corpo dói a alma dói E às vezes é nessa oferta que o paciente diz de uma dor inaudita com que convive há anos e de um sofrimento inerente os quais em seus últimos momentos de vida decidem abandonálo Nesse sentido aproximase muito da experiência analítica de perdas e curas A tristeza se expressa como um afeto nela há implicação do sujeito e subjetivação da dor Quando o indivíduo se depara com limites sobre os quais nada se pode fazer quando se está diante do irremediável à porta de uma unidade de terapia intensiva UTI esperando notícias de um ente amado para o qual não há esperança de vida é verdadeiro sentir tristeza A tristeza aponta o limite a condição de humano demasiado humano e a impossibilidade intrínseca a essa condição Contudo quando o sujeito está fora do registro do desejo a vida perde seu principal combustível Os dias se resumem à manutenção da existência e da sobrevivência dessa forma o interesse acerca do mundo é tragicamente reduzido Sem o motor do desejo a vida restringese ao puro existir o que Lacan 1959 apud NASIO 2007 nomeou como dor de existir a existência pura e simples sem imaginário o limite último do desejo Nesse momento quando cessa o movimento do desejo e a existência concerne ao puro existir resta a dor Quando há prenúncio de morte ou evidências da finitude breve tornase difícil embora não impossível manter a dinâmica do desejo Esse contexto portanto envolve pacientes em fase terminal atacados por uma doença incurável e progressiva em que se percebe esgotarem as tentativas ou os recursos disponíveis e não lhe resta senão se deparar com a falência da vida o momento de concluir seus dias Esse terno 45 momento do paciente confinado à dor de existir antecede seu próprio fim envolvendoo num tempo de quietude e calmaria ou ainda sofrendo de uma dor intolerável Nasio 2007 afirma que Nada é mais intolerável do que a existência reduzida a si mesma E Lacan ensina que A experiência dessa dor da existência quando nada mais a habita além dessa própria existência e quando tudo no excesso do sofrimento tende a abolir esse termo inextirpável que é o desejo de viver Não há nada no último termo da existência senão a dor de existir LACAN 1959 apud NASIO 2007 p 152 A possibilidade de morrer com dignidade é também amar nem que seja no último momento amar a vida com dignidade Talvez possa ocorrer uma virada na posição subjetiva Num momento em que a pessoa percebese como um nada destituída de tudo encontrase o desser o advento do Eu Je Assim como Édipo em suas últimas palavras sentado numa pedra à beira do caminho Hoje que nada sou volto então a ser homem ou seja quando não sou nada é que sou homem Ou mesmo Lacan ao retomar uma famosa frase dita por Freud em que um artigo definido dá lugar a algo do indefinido do inconsistente Onde o isso era Eu deve advir A urgência objetiva na terminalidade parece coincidir com a urgência subjetiva Trata se portanto de um sujeito diante do impossível de suportar carente de escuta Assim a possibilidade de viver até o fim com dignidade evoca uma discussão pertinente para a atualidade Prolongamento da vida e qualidade de vida no processo de morte não deveriam ser vistos como ímpares e conflitantes mas sim como complementares É realizar todo o possível e recuar no limite do suportável Ademais o acolhimento diferencial permite ao sujeito um olhar extensivo à terminalidade angustiante um sujeito implicado em seus últimos momentos capaz de se sentir em paz e feliz frente à sua finitude A família A família também sofre efeitos descontrolase desorganizase São conflitos até então velados que se descobrem causando discussões e desacordos entre os membros O familiar nesse momento é invadido pela frustração sobre a percepção de não ter mais o que fazer Uns se aproximam alguns de maneira exacerbada ao ponto de se esgotarem Outros afastamse por não terem condições de manter proximidade afinal conviver com o paciente em fase terminal é se haver com o próprio fim e desse não se fala De acordo com Marisa Decat Em se tratando da família do paciente um sentimento frequente que as pesquisas e a experiência clínica demonstram é que diante da possibilidade da morte iminente a perda de um elo afetivo é antecipada Qualquer que seja o tipo de vínculo seja positivo ou negativo a família se vê diante de uma perda iminente Portanto ela também estará vivenciando dificuldades e ao mesmo 46 tempo precisando exercer um papel importante psicossocial durante o tratamento MOURA 2013 Interessante destacar que o familiar é capaz de criar um significado um sentido que seja base para continuar a viver bem sem o amado falecido O amor continua a crescer nas lembranças deixadas ou transformase Isso revela a imortalidade da palavra uma língua que habita persiste e continua vigorando na qual a pessoa continua viva nas palavras para além do tempo Talvez não seja prudente definir medidas exclusivas ao paciente e à família pois paciente implica família e família implica paciente Tratase de uma dinâmica de afetação mútua cada qual com suas particularidades Decerto os familiares também precisam de um espaço para falar sobre a doença dificuldades medos fantasias sobre a mortecura evolução da doença como será depois enfim expressar seus sentimentos Espaços onde possam construir o sentido da vida sobre a morte no que escapa ao sentido e à compreensão O Real em cena Pensar no adoecimento oncológico atualmente é se deparar com decorrências desconhecidas que ultrapassam o saber científico Mesmo com uma urdidura que procura identificar e rastrear as raízes celulares do câncer sua etiologia permanece obscura Assim Real e ciência estabelecem uma relação em que Real é simultaneamente causa e limite do conhecimento científico SANTOS DIAS BARRETO 2012 p 36 A experiência analítica demarca que o sujeito não está necessariamente às voltas com a morte mas sim com algo da ordem do imemorável perdido intraduzível sem possibilidade de representação simbólica e que não cessa de tentar se inscrever Uma coisa verbalizada pela palavra do paciente além da inquietude sobre a morte Tal coisa Lacan 1986 elucidaa como Das Ding que não é passível de assimilação na identificação com o outro pela sua natureza estrangeira Na existência humana uma coisa representada por um vazio um nada o objeto verdadeiro autêntico do qual se trata quando dizemos do objeto não é de modo algum conhecível transmissível trocável Ele está no horizonte em torno do qual gravitam nossos fantasmas LACAN 1986 p 285 O objeto pequeno a A ciência portanto exclui o sujeito da causalidade de seu câncer retira sua responsabilidade no que se queixa É nessa hiância vazio claudicante deixada pela ciência no que há de próprio do sujeito em seu adoecimento que o analista deve intervir Em um Real para além da própria morte que escapa dela mesma Afinal depois do fim ainda resta o amor 47 Referências ACADEMIA NACIONAL DE CUIDADOS PALIATIVOS O que são Cuidados Paliativos São Paulo nov 2009 Disponível em httpwwwpaliativoorgbrancpphppoqueecuidados Acesso em 10 de junho de 2014 CHRISTO Z M TRAESEL E S Aspectos psicológicos do paciente oncológico e a atuação da psicooncologia no hospital Disciplinarum Scientia Santa Maria v 10 n 1 p 7587 2009 FIGUEIREDO M G M C A BIFULCO V A Org Temas em Psicooncologia São Paulo Summus 2008 FREUD S Sobre o Narcisismo uma introdução In A história do movimento psicanalítico artigos sobre a metapsico 19141916 Rio de Janeiro Imago 1996b p75108 Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud v 14 LACAN J A ciência e a verdade 196566 In Escritos Rio de Janeiro J Zahar 1998a p869892 Le Séminaire VII LÉthique de la Psychanalyse Paris Éditions Du Seuil 1986 O seminário livro 11 os quatro conceitos fundamentais da psicanálise Rio de Janeiro J Zahar 1998b MORETTO M L T O psicanalista num programa de transplante de fígado a experiência do outro em si 2006 251 f Tese Doutorado em Psicologia Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo São Paulo 2006 MOURA M D Org Oncologia clínica do limite terapêutico Psicanálise Medicina Artesã Belo Horizonte 2013 NASIO J D A dor de amar Rio de Janeiro Jorge Zahar 2007 NEGRO M La otramuerte psicoanálisis em cuidados paliativos Buenos Aires Letra Viva 2008 SANTOS L N DIAS C A BARRETO W W P Psicanálise e contemporaneidade o adoecimento oncológico como encontro com o real Polêmica Rio de Janeiro v11 n1 2012 SIMONETTI A Manual de psicologia hospitalar o mapa da doença São Paulo Casa do Psicólogo 2004 THOMAS C V ALCHIERI J C Qualidade de vida depressão e características de personalidade em pacientes submetidos à Hemodiálise Avaliação Psicológica Porto Alegre v 4 n 1 p 5764 2005 ZECCHIN R N A perda do seio um trabalho psicanalítico institucional com mulheres com câncer de mama São Paulo Casa do Psicólogo 2004 gramdaria nitrogen phosphorus k oxides potassium oxides Micronutrients Nutrient contents ww Organic 1060 0530 0220 Seaweed 0510 1020 2040 0105 0530 002005 Physical characteristic Capítulo 5 A VIVÊNCIA DO PACIENTE ONCOLÓGICO E SUAS ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO Technology Package Based on biowaste processing BIOWASTE PLATFORM Multiple Enzyme Bacterial Biofertilizer Application Method 51 Introdução O aumento da incidência de câncer mundial tem sido um tema constantemente abordado pela comunidade científica e também pela população em geral No Brasil de acordo com o Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva INCA em 2006 a estimativa de novos casos de câncer era de 472 mil já para 2014 a estimativa passou a ser de 580 mil apresentando nesse período um aumento expressivo de 108 mil novos casos de câncer no país INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER 2008 2012 INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA 2013 2014 Receber um diagnóstico oncológico é um momento crítico que pode fazer emergir no indivíduo importantes sentimentos e dúvidas que possivelmente o acompanharão durante todo o seu tratamento Em geral esses sentimentos são relacionados a angústia medos sofrimento raiva revolta dor e perda de autonomia Tais alterações poderão afetar também outros indivíduos com os quais o paciente se relacione como familiares e amigos Após vivenciar o impacto inicial do diagnóstico de câncer o indivíduo necessitará mobilizar recursos psicossociais para se adaptar à situação de estresse decorrente da enfermidade A esse conjunto de recursos adaptativos dáse o nome de enfrentamento que será essencial no percurso do tratamento PEÇANHA 2008 O autor destaca que o momento pelo qual o indivíduo está passando é decisivo na escolha da estratégia a ser utilizada e essa não pode ser considerada melhor ou pior mas compreendida pela sua funcionalidade As estratégias de enfrentamento podem ser consideradas adequadas e efetivas quando atenuam sentimentos desconfortáveis ou disfuncionais quando são caracterizadas pelo prejuízo ao equilíbrio psíquico interferindo na qualidade de vida e no bemestar do indivíduo Quando as estratégias utilizadas são consideradas disfuncionais fazse necessária uma intervenção psicológica para melhor adequação do indivíduo a esse imprevisível momento de vida Câncer E agora O diagnóstico oncológico A incidência e os índices de mortalidade relacionados ao câncer elevamse a cada ano Dados do INCA afirmam que de 80 a 90 dos cânceres têm relação direta com fatores ambientais como tabaco álcool radiação solar vírus bactérias e alimentos além de muitos outros ainda em estudos INCA 2012 Apesar da constante melhora do acesso às informações relacionadas ao tema ainda observase comportamentos de risco importantes descritos anteriormente que podem aumentar o índice de adoecimento por essa patologia De acordo com Holland e Rowland 2010 citados por Campos et al 2003 p23 no início do século passado o diagnóstico de câncer causava estigmas e isolamento social em função de dores intensas deformidades físicas e secreções A sociedade repudiava esses indivíduos por medo de contágio e falta de informações relacionadas à doença Após um século tais comportamentos ainda são observados A despeito de toda a evolução ocorrida nesse período na medicina e nas formas de tratamento o estigma de doença fatal e as representações negativas relacionadas ao câncer ainda mostramse com severa rigidez BARBOSA FRANCISCO 2007 52 Segundo Contel et al 2000 existem várias alterações psicológicas e psiquiátricas que envolvem o diagnóstico oncológico Entre elas estão ansiedade depressão medo da morte isolamento dependência disfunções sexuais irritabilidade perda de controle medo da dor alterações na imagem corporal e outras Em geral o paciente apresenta oscilações de humor frente às diversas e conjuntas modalidades de tratamento quimioterapia radioterapia cirurgia Dessa forma suas expectativas e esperanças estão intimamente ligadas à evolução de seu quadro clínico Para Moraes 1994 quando durante o tratamento há necessidade de internação hospitalar o paciente passa por momentos de apreensão e sofrimento em função do afastamento de sua rotina saudável A despersonalização do indivíduo no ambiente hospitalar fere sua integridade física e moral As condutas terapêuticas que inicialmente são vistas como necessárias para o bem estar a qualidade de vida e a cura tornamse ameaçadoras e invasivas Tendo em vista esse turbilhão de sentimentos pelos quais o paciente oncológico passa seja no diagnóstico seja ao longo de todo o seu tratamento comumente ele fica voltado para si e utilizase de estratégias de enfrentamento para transpor os inúmeros eventos estressores aos quais é exposto Quando o paciente utiliza tais estratégias de enfrentamento eou mecanismos de defesa demonstra ter a finalidade de lutar e amenizar sua angústia diante do adoecimento assim como de estabelecer uma nova relação com o meio e tornar a situação de adoecimento mais amena MORAES 1994 Estratégias de enfrentamento pelo paciente oncológico De acordo com Gimenes 1998 as estratégias de enfrentamento podem ser descritas como um processo que busca alívio do estresse que pretende manter estáveis os aspectos físicos psíquicos e sociais do indivíduo ocasionando bemestar Lazarus e Folkman 1984 estudiosos precursores do tema descrevem que não é possível determinar nem prever qual a estratégia de enfrentamento que o indivíduo acometido pelo câncer utilizará uma vez que o momento pelo qual ele está passando será decisivo na escolha da estratégia Entre as inúmeras classificações para as estratégias de enfrentamento Lazarus e Folkman 1984 utilizam uma perspectiva cognitivista classificandoas em duas grandes categorias enfrentamento centrado no problema ou na emoção O enfrentamento centrado no problema objetiva agir por meio de modificações no ambiente e nos relacionamentos interpessoais Já o enfrentamento centrado na emoção é definido pelo intuito de amenizar o desconforto psíquico Nesse contexto os mecanismos de defesa propostos na teoria de base psicanalítica negação recalque projeção deslocamento sublimação e formação reativa também são de extrema eficiência Para Cohen e Lazarus 1979 as estratégias de enfrentamento podem ser classificadas em cinco situações a busca pela informação a ação direta a inibição da ação os esforços intrapsíquicos e a busca pelo outro O câncer é uma patologia permeada por diversos significados Grande parte dos pacientes atribui à fé e à espiritualidade as condições favoráveis do tratamento Somos culturalmente 53 inundados pela fé que nos acompanha em diversas circunstâncias da vida assim é importante considerar a espiritualidade como um recurso para obtenção de esperança e apoio diante do adoecimento por câncer Respeitar a crença do paciente é extremamente positivo para uma melhor adesão ao tratamento FORNAZARI FERREIRA 2010 GUERRERO et al 2011 O câncer na infância e na adolescência É no período da infância que ocorrem as maiores modificações físicas cognitivas e psicossociais do ser humano Somente 2 das crianças são acometidas por câncer o que leva a patologia a ser considerada rara porém causadora de grandes transtornos biopsicossociais VALLE RAMALHO 2008 O adoecimento nessa faixa etária é um evento totalmente inesperado que acarretará no distanciamento dos hábitos comuns da infância A criança precisará adaptarse às regras impostas pelo hospital e aos diversos procedimentos Valle e Ramalho 2008 pontuam que as estratégias de enfrentamento que serão utilizadas pela criança irão derivar da idade da maturidade e do relacionamento familiar De acordo com Motta e Enumo 2004 crianças acometidas pelo câncer comumente utilizam estratégias de enfrentamento como chorar e esconderse fuga buscar pelo apoio social familiar e ainda mais frequentemente utilizamse do brincar para assim expressar seus sentimentos Iamin e Zagonel 2011 referem ainda estratégias facilitadoras como conversar rezar tomar remédios e não facilitadoras como fazer chantagem sentir culpa e brigar Já a adolescência é um período em que as mudanças psíquicas não ocorrem na mesma velocidade que as mudanças físicas gerando uma série de conflitos para o indivíduo que está em busca de sua identidade A notícia de um diagnóstico oncológico chega com grande intensidade modificando todos os sonhos e desejos do indivíduo Segundo Iamin e Zagonel 2011 aceitar um tratamento que geralmente mostrase oneroso é uma empreitada difícil e complexa Autores como Valle e Ramalho 2008 e Lombardo Popim e Suman 2013 referem que o adolescente irá se confrontar com alterações físicas importantes e perderá sua autonomia justamente no momento em que está lutando para adquirila Com o intuito de amenizar esse intenso sofrimento o adolescente utilizase de estratégias que podem mediar o impacto do diagnóstico e as reações adaptativas como a busca por apoio social por informações sobre a doença e por espiritualidade IAMIN ZAGONEL 2011 Para Rezende Schall e Modena 2009 o adolescente em geral se utiliza de estratégias de enfrentamentos com tendências a negar a situação assim como inconformismo revolta raiva e ansiedade Bigheti e Valle 2008 afirmam que essa é uma fase em que os sentimentos são ambíguos ora há esperança ora há descrença Estudos mostram que alguns adolescentes utilizamse de estratégias de enfrentamento voltadas à preocupação com a doença mudança e adaptação à rotina preocupação com familiares e isolamento social O atendimento psicológico realizado por psicooncologistas pode ser um fator importante na adequação do enfrentamento do adolescente 54 A psicooncologia no auxílio do enfrentamento Holland e Weiss 2010 afirmam que a psicooncologia surgiu formalmente em 1975 quando se iniciaram as discussões a respeito do diagnóstico oncológico e suas reações As autoras definem a psicooncologia como uma subespecialidade da oncologia que tem o intuito de estudar os aspectos psicológicos envoltos no diagnóstico oncológico de duas maneiras 1 o impacto no funcionamento emocional do paciente dos familiares e dos profissionais da saúde 2 o papel das alterações psicológicas e do comportamento na incidência e na sobrevivência do câncer Na literatura nacional encontramse os pressupostos de Gimenes 1994 o qual afirma que sua aplicação assistencial deve estar direcionada ao paciente aos familiares e aos profissionais de saúde assim como em pesquisas para compreensão da incidência da recuperação e da sobrevida do indivíduo acometido pela patologia De acordo com Costa Junior 2001 é indispensável ao paciente e aos seus familiares a assistência psicológica no contexto oncológico Na psicooncologia independe a base teórica que o profissional da psicologia utilizará uma vez que a eficácia do tratamento não se dará somente pela sua abordagem mas sim pelo compromisso do profissional com o paciente Os modelos de atendimentos em psicooncologia devem priorizar a melhor compreensão do indivíduo em relação à sua saúde e ao momento de vida viabilizando estratégias eficazes de enfrentamento da doença Objetivo O objetivo deste trabalho de revisão bibliográfica foi investigar compreender e caracterizar como se dá a vivência dos pacientes oncológicos e quais as estratégias mais frequentemente utilizadas por esses para enfrentamento da situação de adoecimento Metodologia Tratase de uma revisão bibliográfica que contempla artigos científicos publicados no período de 2009 a 2013 em português e inglês que abordem como tema principal a estratégia de enfrentamento do paciente oncológico Os descritores aplicados para a pesquisa dos artigos foram câncer e enfrentamento e estratégias de enfrentamento e câncer Realizouse a busca desses termos no título e no resumoabstract Incluiuse na pesquisa somente artigos que abordem esse tema especificamente Excluíram se artigos cujo foco principal não eram as estratégias de enfrentamento do paciente oncológico os quais incluem as estratégias de enfrentamento de familiares e das equipes de saúde Foram utilizadas para a pesquisa as bases de dados da Literatura LatinoAmericana e do Caribe em Ciências da Saúde Lilacs Scientific Eletronic Library Online Scielo Realizando o levantamento inicial foram encontrados 157 artigos nas bases de dados Desses artigos observouse que 81 eram repetidos nas próprias bases sendo excluídos automaticamente da pesquisa Após análise dos 76 artigos restantes percebeuse que 58 não abordavam o tema de interesse sendo elegíveis aos critérios de exclusão mencionados Ao fim das análises foram selecionados para participarem efetivamente da pesquisa 18 artigos científicos sendo 15 na língua portuguesa e três na língua inglesa 55 Resultados De acordo com a pesquisa realizada nas bases de dados da LilacsScielo observouse que entre os anos de 2009 e 2013 houve pouca produção de artigos científicos que abordassem o tema Entre os 157 artigos inicialmente encontrados somente 18 atendiam aos critérios de inclusão da pesquisa A maior parte dos artigos inclusos na pesquisa aborda especificamente as estratégias de enfrentamento em mulheres acometidas pelo câncer de mama Assim ainda há pouca compreensão da vivência dos pacientes acometidos por outros tipos de neoplasias Durante a análise foi possível notar que as estratégias de enfrentamento são diferentemente utilizadas e sua escolha tem relação direta com o momento atual como no diagnóstico ou nas propostas terapêuticas durante o tratamento LEITE et al 2011 PAULA JÚNIOR ZANINI 2012 MESQUITA et al 2013 A religiosidade e a espiritualidade prevalecem entre as estratégias de enfrentamento mais frequentemente utilizadas desde o diagnóstico até o término do tratamento sendo diretamente relacionadas à esperança de vencer o câncer ANDOLHE GUIDO BIANCHI 2009 FORNAZARI FERREIRA 2010 GUERRERO et al 2011 ESPINHA LIMA 2012 MESQUITA et al 2013 Discussão A partir da análise dos 18 artigos científicos encontrados nas bases de dados da Lilacs Scielo sobre as estratégias de enfrentamento do paciente oncológico constatouse que o número de publicações científicas referente ao tema é pequeno mesmo com o crescente número de diagnósticos e o alto índice de mortalidade por essa patologia De acordo com Caetano Gradim e Santos 2009 o momento do diagnóstico oncológico é tido como um divisor de águas na vida de uma pessoa A partir de então o indivíduo passa a refletir sobre sentimentos anteriormente estranhos a ele como a possibilidade eminente da morte Segundo Iamin e Zagonel 2011 vivenciar essa doença é uma fonte geradora de estresse tanto para o paciente como para seus familiares O contexto de adoecimento por câncer pode ocasionar ao indivíduo sentimentos de ansiedade irritabilidade apatia depressão desânimo e outros LORENCETTI SIMONETTI 2005 Para se adequar a essa nova situação o indivíduo necessitará mobilizar recursos com o objetivo de minimizar seu sofrimento Costa Junior 2001 descreve que com intuito de auxiliar os pacientes nesse momento de vida surge a psicooncologia que é definida como a área de interface entre a psicologia e a oncologia Visa ao bemestar e à qualidade de vida do paciente sob diversos aspectos sendo um deles o atendimento psicológico especializado Enfatiza ainda a importância do atendimento psicológico no contexto oncológico para auxílio no ajustamento do paciente diante do adoecimento por câncer Apesar de a psicooncologia ser uma subespecialidade da psicologia notouse durante o trabalho de revisão que poucos dos artigos publicados são desenvolvidos por psicólogos sendo a maioria publicados por equipes de enfermagem Além disso dos 18 artigos inclusos na revisão somente cinco foram publicados em revistas de psicologia 56 Caetano et al 2011 enfatizam que é um desafio para a equipe de enfermagem prestar acolhimento e atendimento mais humanizado a mulheres acometidas por câncer de mama com o intuito de auxiliar uma atitude positiva diante da doença A maior parte das publicações foi realizada por equipes de enfermagem portanto é importante levar em conta que talvez o volume reduzido de artigos selecionados nessa revisão limite a visão da assistência psicológica na oncologia Nos artigos científicos selecionados a maioria dos estudos corresponde ao delineamento qualitativo porém há um número significativo de estudos quantitativos seguido por revisões bibliográficas e estudo de caso Notase ainda que a maior parte dos artigos 9 é relacionada às estratégias de enfrentamento de mulheres acometidas por câncer de mama o que aumenta ainda mais a escassez de estudos voltados ao enfrentamento do paciente oncológico de modo generalista Provavelmente isso se deve ao fato de o câncer de mama estar entre os dois tipos de cânceres mais diagnosticados do mundo e ser o que mais acomete as mulheres Os estudos de Caetano Gradim e Santos 2009 e Mesquita et al 2013 sugerem que em razão das diversas alterações corporais que a mulher sofre em decorrência do câncer por exemplo a alopecia e a mutilação pela mastectomia há intensa vivência de sofrimento O autor relata que é comum que essas mulheres utilizem estratégias de enfrentamento religiosasespirituais na busca de uma atitude positiva perante a doença demonstrando mais força assim como apresentem maior tendência a ajudar os outros No mesmo contexto estão as ideias expostas por Andolhe Guido e Bianchi 2009 que referem que a crença em Deus é uma forte influência para o desenvolvimento de respostas adaptativas à doença O autor também menciona que a busca pelo apoio familiar é uma estratégia bastante adotada por mulheres acometidas por câncer de mama Diferentemente das pesquisas relacionadas ao câncer de mama o enfrentamento oncológico pediátrico teve pouca visibilidade nos últimos cinco anos Somente quatro dos artigos selecionados são referentes ao tema e dois deles são escritos em inglês De acordo com Rezende Schall e Modena 2009 há diferenças significativas no modo de vivência e enfrentamento de crianças e adolescentes frente ao câncer As crianças tendem a ter sintomas relacionados à ansiedade já os adolescentes comumente apresentam sintomas depressivos Após a análise dos dados obtidos nesta revisão podese considerar que há trabalhos restritos na literatura relacionados às estratégias de enfrentamento dos pacientes oncológicos fazendose necessário maior investimento em pesquisas relacionadas ao tema Considerações finais De acordo com o presente trabalho observase que a literatura dispõe de escassos estudos que avaliam as estratégias de enfrentamento do paciente oncológico de forma generalista ou seja sem distinção de sexo e neoplasia Esperase com este trabalho colaborar para uma melhor compreensão do enfrentamento do paciente diante do câncer Até o momento estudos revelam que as estratégias de enfrentamento mais frequentemente utilizadas pelo paciente oncológico são enfrentamentos centrados no problema e na emoção como a busca por informações relativas à doença ou a negação da doença 57 Outro tipo de enfrentamento bastante utilizado pelos pacientes durante o percurso da doença é o enfrentamento espiritualreligioso Em função do grande impacto do diagnóstico oncológico e da mobilização de sentimentos angustiantes grande parte dos pacientes considera a fé e a espiritualidade como recursos para obtenção de esperança e apoio diante do adoecimento por câncer De acordo com a presente revisão crianças e adolescentes utilizamse de estratégias de enfrentamento pouco distintas dos pacientes adultos Adolescentes tendem a negar a doença e a revoltarse com uma maior frequência do que os adultos durante o tratamento já as crianças incluem muitas vezes a fuga em seu enfrentamento porém em sua maior parte utilizam o brincar como meio de elaboração da realidade do adoecimento Apreendese ao longo do estudo que se faz necessário para uma assistência mais adequada ao paciente oncológico que a equipe de saúde obtenha mais conhecimento sobre as situações de estresse às quais o paciente é submetido durante o tratamento e quais as estratégias de enfrentamento utilizadas por eles no combate aos eventos estressores Notase que um fator de extrema relevância para uma boa evolução do tratamento de mulheres acometidas por câncer de mama é a presença de uma rede de apoio que auxiliará no fortalecimento e na motivação para superar o adoecimento destacandose dentro dessa rede o profissional da saúde É importante ressaltar que tendo em vista a percepção de que há poucos estudos que abordem o tema enfrentamento o atual trabalho de revisão bibliográfica pode contribuir para pesquisas futuras Um maior investimento nessa área de estudos pode contribuir com a melhora da qualidade na assistência especializada ao paciente tornando o amparo ao paciente oncológico mais eficaz em todas as etapas de seu tratamento 58 Referências ANDOLHE R GUIDO L A BIANCHI E R F Stress e coping no período perioperatório de câncer de mama Revista da Escola de Enfermagem da USP São Paulo v 43 n 3 p 711720 2009 BARBOSA L N F FRANCISCO A L A subjetividade do câncer na cultura implicações na clínica contemporânea Revista da SBPH Rio de Janeiro v 10 n 1 p 924 2007 BIGHETI A VALLE E R M Compreendendo as vivências de adolescente com câncer análise fenomenológica do TAT In CARVALHO V A et al Ed Temas em psicooncologia São Paulo Summus 2008 p 218232 CAETANO E A GRADIM C V C SANTOS L E S Câncer de mama reações e enfrentamento ao receber o diagnóstico Revista Enfermagem UERJ Rio de Janeiro v 17 n 2 p 257261 2009 CAMPOS EMP BACH C ALVARES M Estados emocionais do paciente candidato a transplante de medula óssea Psicologia Teoria e Prática 2003 52336 COHEN F LAZARUS R S Coping with the stress of illness In STONE C G COHEN F ADLER N E Ed Health psychology a handbook San Francisco JosseyBass 1979 p 217254 CONTEL J O B et al Aspectos psicológicos e psiquiátricos do transplante de medula óssea Medicina Ribeirão Preto v 33 p 294311 2000 COSTA JUNIOR A L O desenvolvimento da psicooncologia implicações para a pesquisa e intervenção profissional em saúde Psicologia Ciência e Profissão Brasília v 21 n 2 p 3643 2001 ESPINHA D C M LIMA R A G Spiritual dimension of children and adolescents with cancer an integrative review Acta Paulista de Enfermagem São Paulo v 25 p 161165 2012 Suplemento 1 FERREIRA N M L A O câncer e o doente oncológico segundo a visão dos enfermeiros Revista brasileira de cancerologia Rio de Janeiro v 42 n 3 p 161170 1996 FORNAZARI S A FERREIRA R E R Religiosidadeespiritualidade em pacientes oncológicos qualidade de vida e saúde Psicologia teoria e pesquisa Brasília v 26 n 2 p 265272 2010 GIMENES M G G A pesquisa do enfrentamento na prática psicooncológica In CARVALHO M M M J Ed Psicooncologia no Brasil resgatando o viver São Paulo Summus 1998 p 232246 A teoria do enfrentamento e suas implicações para sucessos e insucessos em psiconcologia Campinas Psy 1997 A mulher e o câncer p11147 Definição foco de estudo e intervenção In CARVALHO M M M J Ed Introdução à psiconcologia Campinas Psy 1994 p 3556 GUERRERO G P et al Relação entre a espiritualidade e câncer perspectiva do paciente Revista Brasileira de Enfermagem Brasília v 64 n 1 p 5359 2011 HOLLAND J C WEISS T R History of psychooncology In HOLLAND J C et al Ed Psychooncology New York Oxford 2010 p312 59 IAMIN S R S ZAGONEL I P S Estratégias de enfrentamento coping do adolescente com câncer Psicologia Argummento Curitiba v 29 n 67 p 427435 2011 INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER Brasil ABC do câncer abordagens básicas para o controle do câncer Rio de Janeiro 2012 Ações de controle p5076 Ações de enfermagem para o controle do câncer Rio de Janeiro 2008 A situação do câncer no Brasil p532 INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA INCA e Ministério da Saúde apresentam estimativas de câncer para 2014 Disponível em httpwwwincagov brwpswcmconnectagencianoticiassitehomenoticias2013incaministeriosaude apresentamestimativascancer2014 Acesso em 12 jan 2014 O câncer e seus fatores de risco o que a educação pode evitar 2 ed ver atual Rio de Janeiro 2013 LAZARUS R S FOLKMAN S Stress appraisal and coping New York Springer 1984 Prospect for the study of coping styles p1748 LEITE F M C et al Amorim MHC Castro DS Vasconcellos EG Primo CC Estratégias de enfrentamento vivenciadas por mulheres com diagnóstico de câncer de mama em uso de tamoxifeno REME revista mineira de enfermagem Belo Horizonte v 15 n 3 p 394398 2011 LOMBARDO M S POPIM R C SUMAN A L From omnipotence to exhaustion the perspectives of adolescents in drug therapy Revista LatinoAmericana de Enfermagem Ribeirão Preto v 19 n 3 p 531539 2011 LORENCETTI A SIMONETTI J P As estratégias de enfrentamento de pacientes durante o tratamento de radioterapia Revista LatinoAmericana de Enfermagem Ribeirão Preto v 13 n 6 p 944950 2005 MESQUITA A C et al The use of religiousspiritual coping among patients with cancer undergoing chemotherapy treatment Revista LatinoAmericana de Enfermagem Ribeirão Preto v 21 n 2 p 539545 2013 MORAES M C O paciente oncológico o psicólogo e o hospital In CARVALHO M M M J Ed Introdução à psiconcologia Campinas Psy 1994 p 5763 MOTTA A B ENUMO S R F Brincar no Hospital estratégia de enfrentamento da hospitalização infantil Psicologia em Estudo v 9 n 1 p 1928 2004 MOTTA A B ENUMO S R F Câncer infantil uma proposta de avaliação das estratégias de enfrentamento da hospitalização Estudos de Psicologia Campinas v 21 n 3 p 193202 2004 PAULA JÚNIOR W ZANINI D S Pacientes em radioterapia um estudo de coping Psicologia Saúde Doenças Lisboa v 13 n 2 p 480493 2012 PEÇANHA D L N Câncer recursos de enfrentamento na trajetória da doença In CARVALHO V A et al Ed Temas em psicooncologia São Paulo Summus 2008 p 209217 REZENDE A M SCHALL V T MODENA C M O adolescer e adoecer vivência de uma adolescente com câncer Aletheia Canoas n 30 p 88100 2009 VALLE E R M RAMALHO M A N O câncer na criança a difícil trajetória In CARVALHO V A et al Ed Temas em psicooncologia São Paulo Summus 2008 p 1504 Technology Package Based on biowaste processing Consortium of BIOWASTE PLATFORM Beneficial Bacterial Biofertilizer Application Method Capítulo 6 A ESPIRITUALIDADE NO CONTEXTO CLINICOPSICOLÓGICO MOBILE APP DEVELOPMENT COMPANIES 63 É tarefa incessante da medicina driblar o limite do corpo utilizando técnicas e recursos de última geração As tentativas são de minimizar os sofrimentos físicos constatados em exames clínicos e detectados em radiografias e outros exames de imagens É o corpo físico adoecido atrelado à sua alma que o torna enfermo é o ser humano lutando desesperadamente contra a morte O papel do psicólogo é acolher os sofrimentos que afligem os pacientes utilizando as propostas de intervenção interdisciplinar dentro do paradigma biopsicossocial e espiritual considerando suas angústias e medos frente a esse luto com a pretensão de afastar deles a sentença de morte que destrói ou retira a vontade de viver Considerase então o sofrimento a partir da díade corpoalma Por ser tema de interesse da atualidade a psicologia da saúde estuda o homem na sua integralidade em que a mente e o corpo estão interrelacionados e os objetivos são voltados para a promoção da saúde levando o indivíduo a buscar o bemestar físico mental social e espiritual incluindo a participação de outros profissionais da área sempre respeitando a individualidade de cada paciente Segundo Melo 2008 os sofrimentos do corpo são os diretamente ligados ao contexto da dor localizada material física do corpo que envelhece do corpo que padece com os limites do tempo Já os sofrimentos da alma são os que se referem aos desatinos dos afetos aos conflitos espirituais emocionais morais enfim a tudo o que dói na vida humana e que não tem uma materialidade isso é não pode ser radiografado tampouco identificado em exames laboratoriais Quando o sofrimento é localizado e pode ser curado mediante prescrições de remédios estáse diante de problemas para os quais a medicina já encontrou a solução Quando a enfermidade psíquica é fruto de desordens químicas que geram tristezas ou de distúrbios emocionais provenientes de distúrbios cerebrais a medicina oferece inúmeros caminhos e possibilidades para sanar essas questões Contudo tratandose da subjetividade de enfrentamento humano Melo 2008 questiona sobre o que se pode fazer quando se está diante dos limites que são próprios da vida e para os quais não existem remédios Como reagir diante dos acontecimentos trágicos a que toda pessoa está sujeita Como é que podemos nos posicionar diante de tudo o que nos infelicita nesses tempos tão marcados por inseguranças e violências Há algum jeito alguma forma de fortalecer a estrutura humana para que o sofrimento seja enfrentado sem que ele se torne a causa da ruína É possível administrar os sofrimentos e minimizar suas ações sobre o indivíduo A dor pode ensinar alguma coisa Podese aprender alguma lição com os limites que são próprios da vida Diante de tais indagações os recursos espirituais são mecanismos de enfrentamentos altamente eficazes independentemente da crença ou da religião apresentada pelo paciente Segundo AnconaLopez 1999 é de extrema relevância que o psicoterapeuta ao trabalhar os conteúdos trazidos pelo paciente leve em conta a sua experiência religiosa e espiritual deixando que expresse os seus valores e expectativas Há uma estreita relação entre religiosidade e saúde mental por isso é fundamental buscar o que é pessoal e significativo na vida de cada um e seu sentido de pertença a uma dada comunidade religiosa Não se pode ignorar a questão religiosa é preciso ter abertura para compreender as metáforas e os símbolos apresentados pelos pacientes Atualmente a prática psicológica em saúde está pautada na humanização e voga a preocupação com a pessoa e não com a doença O arcabouço literário mostra que as noções de 64 saúde e doença estavam interligadas e tinham correspondência com a harmonia ou desarmonia do organismo frente ao viver da pessoa Os psicanalistas foram os primeiros a associar a mente ao corpo estudando as doenças psicossomáticas procurando tratálas por meio da psicoterapia As emoções têm um importante papel no bemestar psicológico ou nos estados doentios e atuam como poderosos motivadores da conduta humana Do ponto de vista psicológico existem emoções naturais e fisiológicas agradáveis ou desagradáveis que aparecem em todas as pessoas como a alegria o medo a ansiedade ou a raiva que mobilizam o indivíduo para a atividade e tomam parte da comunicação interpessoal influenciando a saúde e a doença Frente ao diagnóstico de câncer as estratégias de enfrentamento apresentadas pelo paciente são consideradas importantes condutores do ajustamento psicossocial que será desenvolvido ao longo do tratamento e também em relação ao tempo de sobrevivência Esse enfrentamento é considerado hoje uma resposta cujo objetivo é aumentar a percepção de controle pessoal A escolha dessa estratégia depende do repertório individual por exemplo habilidades de solução de problemas habilidades sociais valores e crenças culturais além de experiências tipicamente reforçadas O uso da fé é uma estratégia bastante utilizada por pacientes doentes especialmente quando há risco de vida como no câncer Estudos de Camon 2002 afirmam que ela pode ser bastante benéfica na condução do tratamento A ciência já decifrou certos efeitos fisiológicos da espiritualidade no tocante ao sistema nervoso à imunidade a inflamações e ao código genético Ela ajuda a vencer doenças acelera a recuperação dá força para viver mais e melhor além de potencializar a ação das células de defesa reduzindo o risco de infecções virais e bacterianas Pessoas que creem em algo maior e são altruístas tendem a apresentar cargas extras de neurotransmissores que respondem pelo bemestar A medicina hoje reconhece que quem tem fé e a exerce também torna mais vagaroso o processo de encurtamento dos telômeros as extremidades dos cromossomos que leva ao envelhecimento Frankl 1975 foi um dos primeiros autores que trouxe a questão da espiritualidade de modo claro e preciso para o campo da psicoterapia Ao lado de Jung colocou a pertinência dessa discussão no sentido de alargar os horizontes de compreensão da prática psicoterápica Assim Frankl 1975 coloca que uma característica da existência humana é a sua transcendência Onde quer que o paciente transcenda ele se eleva sobre seu ser psicofísico deixa o plano do somático e do psíquico e entra no espaço do humano propriamente dito o qual é constituído pela dimensão poética e espiritual pois nem o somático e nem o psíquico isolados constituem o que há de propriamente humano O autor propõe o equilíbrio espiritual em seus postulados teóricos como a capacidade inerentemente humana de buscar o desenvolvimento de sua subjetividade e de sua vivência interior A marca da experiência do risco de morrer modifica a sequência do existir e o sujeito precisará de recursos internos para elaborála de forma a continuar sua jornada Para que isso ocorra é importante que o profissional da saúde seja sensível aos relatos do paciente e que considere a fé e a crença de cada paciente Nesse momento o paciente mostra estar munido de recursos os quais a ciência não explica mas que devem ser respeitados e considerados relevantes no processo de cura Quando esse tema é abordado geralmente causa polêmica principalmente no meio acadêmico pois é difícil a ciência conseguir conciliar as necessidades da alma e da psique humanas Mas essa separação entre psique e alma como essência de naturezas distintas nada 65 mais é do que uma mera tentativa de negar a presença de questões que envolvem aspectos de espiritualidade na prática de reflexões e estudos psíquicos E por assim dizer uma tentativa de negar a presença da espiritualidade nessas reflexões pois tanto Freud quanto Jung referiamse à alma humana sem nenhum constrangimento e sem nenhum receio de que tal derivação pudesse denegrir a grandiosidade de suas obras Enfim Camon 2002 relata que a questão da espiritualidade quando trazida para o paradigma dos pressupostos da prática clínica da psicoterapia finaliza uma incongruência pois é aberta a possibilidade para que o profissional não tenha de negar as suas próprias convicções pessoais para o desenvolvimento pleno de suas atividades clínicas E também viabiliza a ampliação de recursos pertinentes ao exercício da prática clínica Assim se um determinado psicoterapeuta acreditar em sua vida pessoal que a vida espiritual é o aspecto mais importante a ser atingido na vida de uma determinada pessoa sua prática clinica não precisará negar tal princípio e tampouco leválo a negar publicamente tais convicções CAMON 2002 p 4 Já a tríade éticapsicoterapiareligiosidade envolve estabelecer questões e limites como qual o papel do médico o do psicólogo e o do capelão orientador espiritual na discussão de temas espirituais com seus pacientes POST PUCHALSKI LARSON 2000 Alguns educadores recomendam que os médicos perguntem rotineiramente sobre a espiritualidade e a religião ao conduzirem a história médica de seus pacientes EHMAN et al 1999 Contudo integrar dimensões espirituais e religiosas da vida dos clientes durante a psicoterapia requer profissionalismo ético alta qualidade de conhecimento e habilidades para alinhar as informações coletadas sobre as crenças e os valores ao benefício do processo terapêutico Os termos espiritualidade e religiosidade não são sinônimos Espiritualidade é a busca pessoal para atender questões como o sentido da vida e as relações com o sagrado e o transcendente E isso pode ou não depender de práticas religiosas Já a religiosidade leva em conta uma doutrina e a frequência com que se reza e se participa de eventos e rituais em templos ou mesmo em casa Segundo Giglio 1993 devese compreender e manter o respeito empático para abordar as crenças religiosas dos pacientes reforçando que o treinamento adequado do terapeuta a relação terapeutacliente e a atenção à pessoa e não apenas à doença podem reduzir a ocorrência da conversão de valores e minimizar os problemas éticos associados TJELTVEIT 1986 GIGLIO 1993 POST PUCHALSKI LARSON 2000 Lomax Karff e McKenny 2002 avaliaram psicólogos que buscam integrar psicoterapia e religião ou psicoterapia e espiritualidade e consideram que a primeira seja dificultosa enquanto a integração da psicoterapia não religiosa com a espiritualidade é possível e confere bons resultados quando o terapeuta exerce o princípio da neutralidade Pessini 2006 referese à possibilidade de elaborar um diagnóstico espiritual desenvolvendo a habilidade da escuta É importante ter ouvidos capazes de comunicar compreensão amor e solidariedade Ouvir não somente o que é dito mas principalmente o que não é dito e nem precisa ser verbalizado Ouvir é criar um clima em que as pessoas livremente possam partilhar o sentido de seus dias medos esperanças dores desapontamentos e alegrias Afirma que é importante ouvir com o ouvido do outro procurando responder às necessidades do paciente e não as do terapeuta É fundamental respeitar os valores pessoais e espirituais da pessoa Muito fácil é assaltar a pessoa espiritualmente impondo seus próprios valores Propor sim impor nunca afirma o autor 66 É preciso que se perceba como o paciente entende interpreta e vive a sua experiência de estar doente como é tocado pela finitude e como relaciona isso com sua fé em Deus ou em outra figura de crença Nesse contexto aparecem muitas visões em relação à doença tais como castigo ou punição teste destino fatalidade expressão de fim possibilidade de transformação da vida entre outras expressões Também podem surgir desapontamentos sentimentos de abandono ou revolta em relação a Deus para aqueles que são religiosos Outros podem aprofundar a sua fé São necessárias a tolerância a paciência e a sensibilidade do psicólogo É preciso poder acolher sentimentos controversos sem ter a necessidade de modificálos imediatamente e principalmente sem repreender ou censurar É importante trabalhar essas experiências sem reforçar a ideia de que a doença surge para castigar as pessoas Pode ser muito difícil entender e aceitar o sofrimento quando se está no meio do processo A fé pode ser confirmada quando está presente despertála quando está dormente e reforçála se estiver frágil e desejar crescer Nesse momento faz muito sentido a proposta de um ritual de fé que tenha significado para a pessoa Nesse contexto em que muitos não veem nenhum sentido ou então veem somente desgraça é que numa perspectiva de espiritualidade a vida pode ser iluminada pela graça divina A confiança depositada e o vínculo estabelecido com o terapeuta desempenham um papel central na efetividade do tratamento ou seja pacientes que estabelecem uma relação de empatia e confiança com seus psicólogos beneficiamse mais que outros que não a estabelecem O psicoterapeuta deve adotar alguns preceitos éticos referentes ao tema espiritualidade identificar se variáveis religiosas e espirituais são características clínicas relevantes às queixas e aos sintomas apresentados pesquisar o papel da religião e da espiritualidade no sistema de crenças identificar se idealizações religiosas e representações de Deus são relevantes e abordar clinicamente essa idealização demonstrar o uso de recursos religiosos e espirituais no tratamento psicológico de enfrentamento e utilizar procedimento de entrevista para acessar o histórico e o envolvimento com religião e espiritualidade Os psicoterapeutas devem estar confortáveis com pacientes que levantam questões existenciais e espirituais SHAW JOSEPH LINLEY 2005 PERES et al 2007a Breitbart 2003 relata a sua experiência de inclusão de conteúdos espirituais em trabalho psicoterápico em grupo com pacientes oncológicos que ele denomina de Psicoterapia de Grupo Centrada no Sentido O trabalho de grupo favorece a troca de experiências o sentido de pertença de que não se está sozinho nessa situação tendo a possibilidade de ajudar e ser ajudado e perceber que se tem um propósito comum Segundo o autor o grupo favorece a busca de sentido e uma compreensão da morte podendose falar abertamente sobre o tema Possibilitase a abertura do caminho para a transcendência para além dos aspectos materiais da vida num processo de construção individual e do grupo como um todo Tal trabalho só poderá ser realizado se o paciente tiver os seus sintomas controlados principalmente a dor Entre os temas que são processados pelos pacientes o autor relata os seguintes revisão de vida exame das situações ligadas à culpa remorso perdão e reconciliação busca por um sentido maior para o sofrimento O inspirador desse trabalho é Vitor Frankl que em seu livro Psicoterapia e sentido da vida traz os alicerces para essa terapia Frankl reafirma a relevância de se incluir a dimensão da transcendência no trabalho psicoterápico É a possibilidade de ir para além de si de ter uma compreensão maior da sua relação no mundo Mas o autor ressalta que o cuidar da alma na psicoterapia não é a substituição da religião na vida das pessoas 67 Frankl 1973 discute a importância de se abordar a questão da busca pelo sentido no trabalho psicoterápico Essa busca está presente em toda a vida até a morte e envolve a liberdade de vontade para encontrar esse sentido levando em consideração a criatividade as experiências e a atitude em relação à vida Há três grandes problemas existenciais o sofrimento a morte e a culpa Para o autor a nossa responsabilidade é viver a vida plenamente O sentido é encontrado nas atividades que fazem parte da vida as situações existenciais podem não mudar a forma de encarálas sim Qualquer fase da vida permite que se olhe para as situações de vida de trabalho das relações pessoais e novos significados podem surgir O processo psicoterápico pode servir como estímulo para essas novas percepções Jung foi um dos autores na área da psicologia e da psicoterapia que concedeu à religião e à espiritualidade um lugar especial resgatando a questão da alma na psicoterapia como aponta Giovanetti 1999 Referese à função transcendente podendo ser entendida como uma ampliação da consciência Podemos ver nisso uma parceria entre a psicologia e a espiritualidade como complementaridade Esse autor aponta para a necessidade de o terapeuta estar sensível à experiência religiosa constituinte daquele sob seus cuidados e sempre estar atento às manifestações do sagrado nos relatos nos sonhos e nas associações apresentados Elisabeth KüblerRoss em suas obras também discute a importância do desenvolvimento espiritual e como psiquiatra iniciou os seus trabalhos no acompanhamento de pessoas à morte integrando aspectos psicológicos e espirituais Em seu livro Roda da Vida KUBLERROSS 1998 relata que foi guiada por espíritos ou entidades tendo como missão afirmar que a morte é basicamente um processo de transição buscando dessa forma uma diminuição do sofrimento nessa hora São dois os momentos na trajetória dessa autora que trouxerem significativas contribuições para o atendimento a pessoas gravemente enfermas ou em processo de luto A segunda parte da sua obra se não compreendida e contextualizada poderá trazer uma ideia falsa de que as pessoas não devem expressar os seus sentimentos quando diante da morte logo passando para uma elevação espiritual num processo de sublimação muito rápido Devemos cuidar para que o processo de sofrimento seja elaborado e não abortado KOVÁCS 2003 Gimenes 2003 aponta para uma parceria entre a psicologia e a espiritualidade que se configura num auxílio para a passagem ajudando as pessoas no seu processo de morte facilitando a transposição das etapas psicológicas e espirituais Trabalhase o medo do desconhecido pacificando os sentimentos de terror ajudando a contemplar pendências de diversas ordens O objetivo é levar à tranquilidade à calma e ao encontro com Deus Psicoterapia e assistência espiritual comungam muitos pontos sendo a escuta atenta e cuidadosa um dos principais elementos Logo a psicoterapia tem como objetivo principal que a pessoa compreenda os seus conflitos e utilize seus próprios recursos de enfrentamento para minimizar suas angústias já a orientação espiritual a partir da escuta conduz no caminho a seguir Sofrimento diante da morte Nos dias atuais apesar do grande desenvolvimento tecnológico implicado no tratamento oncológico muitas vezes o processo de morrer vem acompanhado de muito sofrimento Pacientes no estágio final da vida podem ter medo da dependência da dor da degeneração da incerteza 68 da solidão e do isolamento da separação das pessoas queridas e de serem abandonados pelos profissionais que deles cuidam Vivem os processos de luto da perda de si e das pessoas próximas KÓVACS 1999 Alguns pacientes manifestam temor em relação a algumas questões espirituais entre as quais não ser perdoado por Deus não saber o que vai acontecer depois da morte e não ter encontrado sentido na sua vida Há situações que envolvem muito sofrimento entre as quais o adoecimento e a proximidade da morte provocando mudanças significativas na vida que podem se manifestar inclusive nas questões espirituais Como aponta Saunders 1993 todo sofrimento deve ser cuidado para que não se torne intolerável Segundo Genaro Júnior 2003 é nos momentos de grande dor e sofrimento que pode haver uma busca maior pela transcendência pelo que extrapola a vida terrena o cotidiano e a materialidade Isso pode ajudar no enfrentamento de tais situações O autor aponta para pesquisas que indicam um índice de correlação entre saúde mental e busca espiritual principalmente quando se percebe um processo intrínseco a partir das próprias experiências vividas Breitbart 2003 citando Frank 1973 afirma que o sofrimento pode ser um trampolim para a ressignificação da vida Na prática profissional vêse como alguns pacientes que tiveram câncer e sentiram a ameaça às suas vidas puderam fazer grandes reviravoltas passando a priorizar o que era mais significativo mesmo quando restava pouco tempo de vida Considerações finais Mediante experiência pautada na prática do atendimento clínico do ambulatório nos setores de internação UTI e pediatria do Hospital do Câncer de Londrina ressaltase que a intervenção psicológica deva ser iniciada com a escuta do paciente com toda a atenção às suas linguagens verbal e não verbal A partir dessa escuta poderseá identificar a crença desse paciente como essa afeta sua vida como ele vê a enfermidade e como ele se relaciona com seu Deus ou seu líder espiritual Enfatizase também que o caminho deva ser trilhado pela pessoa com suas próprias descobertas não ser induzido ou forçado mas sim ser estimulado Mesmo para o paciente não religioso é possível usar outros sentidos da espiritualidade como a arte e a música para lhe dar suporte durante a doença ajudandoo a encontrar um sentido para sua vida nesse momento tão especial Tendo a experiência profissional e o arcabouço literário como respaldo podese afirmar que a espiritualidade é a busca pela compreensão do sentido da vida da transcendência e não uma religião determinada ou um dogma Ela envolve o exercício da fé da crença num sobrenatural que excede todo entendimento o que promove no paciente uma paz e uma certeza da pertença recursos de enfrentamento que minimizam o sofrimento instaurado pelas dores da alma e envolve também a tentativa de compreensão de uma força superior que pode estar ligada a uma figura divina ou a um ser supremo Quanto maior é o grau de paz e compreensão do que está ocorrendo melhor é a tolerância à dor e a capacidade de enfrentamento resultando numa melhor qualidade de vida Logo é importante reforçar o comportamento do exercício da fé manifestada pelo paciente pois ele apresentará respondentes favoráveis para a minimização da dor emocional e também 69 contribuirá para a homeostase que o organismo necessita para se regenerar Nesse sentido o paciente munido desses recursos psíquicos internos de enfrentamento responderá melhor a toda conduta médica proposta pois um organismo mais equilibrado ajuda na promoção de boa saúde 70 Referências AMATUZZI M M Desenvolvimento religioso uma hipótese descritiva In MASSIMI M MAHFOUD M Org Diante do mistério psicologia e senso religioso São Paulo Loyola 1999 p123140 ANCONALOPEZ M Religião e psicologia clínica quatro atitudes básicas In MASSIMI M MAHFOUD M Org Diante do mistério psicologia e senso religioso São Paulo Loyola 1999 p7790 BREITBART W Espiritualidade e sentido nos cuidados paliativos O Mundo da Saúde São Paulo v 27 n 1 p 4157 2003 CAMON V A A Org Novos Rumos na Psicologia da Saúde São Paulo Pioneira Thomson Learning 2002 EHMAN J W et al Do patients want physicians to inquire about their spiritual or religious beliefs if they become gravely ill Archives of internal medicine Chicago v 159 n 15 p 1803 1806 1999 FRANKL E V A psicoterapia na prática São Paulo EPU 1975 Psicoterapia e sentido da vida São Paulo Quadrante 1973 GENARO JUNIOR F Considerações sobre religião e saúde mental uma compreensão psicodinâmica O Mundo da Saúde São Paulo v 27 n 3 p 439445 2003 GIGLIO J The impact of patients and therapists religious values on psychotherapy Hospital community psychiatry Washington v 44 n 8 p 768771 1993 GIMENES M G G A passagem entre a vida e a morte uma perspectiva psicoespiritual em cuidados paliativos domiciliares O Mundo da Saúde São Paulo v 27 n 1 p 153158 2003 GIOVANETTI J P O sagrado e a experiência religiosa na psicoterapia In MASSIMI M MAHFOUD M Org Diante do mistério psicologia e senso religioso São Paulo Loyola 1999 p 8796 KOVÁCS M J Educação para a Morte temas e reflexões São Paulo Casa do Psicólogo 2003 Pacientes em estágio avançado da doença a dor da perda e da morte In CARVALHO M M J Org Dor um estudo multidisciplinar São Paulo Summus 1999 p 318337 KUBLERROSS E Morte estágio final da evolução Rio de Janeiro Record 1975 Roda da vida Rio de Janeiro Sextante 1998 LOMAX J W KARFF R S MCKENNY G P Ethical considerations in the integration of religion and psychotherapy three perspectives The Psychiatric clinics of North America Philadelphia v 25 n 3 p 547559 2002 MELO F Quando o sofrimento bater à sua porta São Paulo Canção Nova 2008 p 24 PERES J F P MOREIRA ALMEIDA A NASELLO A G KOENIG H G Spirituality and resilience in trauma victims Journal of Religion and Health 463 in press 2007a PESSINI L Cuidados paliativos e espiritualidade In CENTRO UNIVERSITÁRIO SÃO CAMILO 71 Laboratório de Estudos sobre a Morte do Instituto de Psicologia da USP Cuidados Paliativos São Paulo Centro Universitário São Camilo 2006 1 DVD BERTANCHINI L O que entender por cuidados paliativos São Paulo Paullus Centro Universitário São Camilo 2006 POST S G PUCHALSKI C M LARSON D B Physicians and patient spirituality professional boundaries competency and ethics Annals of internal medicine Philadelphia v 132 n 7 p 578583 2000 SAUNDERS C Some challenges that face us Palliative Medicine London 1993 7 Suppl 7783 SHAW A JOSEPH S LINLEY P A Religion spirituality and posttraumatic growth a systematic review Mental Health Religion Culture Abingdon v 8 n 1 p 111 2005 TJELTVEIT A C The ethics of value conversion in psychotherapy appropriate and inappropriate therapist influence on client values Clinical Psychology Review New York v 6 n 6 p 515537 1986 MOBILE APP DEVELOPMENT COMPANIES Capítulo 7 OS IMPACTOS DO ADOECIMENTO POR CÂNCER NA ÓTICA DO SERVIÇO SOCIAL MOBILE APP DEVELOPMENT COMPANIES 75 Introdução O acometimento de uma doença de alta complexidade crônica e degenerativa como o câncer que necessita de tratamentos prolongados intensivos e dolorosos que provocam turbilhões de sentimentos como medo angústia baixa autoestima e outros mais impactará o cotidiano e diversos aspectos da vida do sujeito particular familiar econômico social e profissional É indispensável que o tratamento seja integral humanizado de alta competência e qualificado de acesso rápido e intersetorial rompendo com os limites da burocracia Um tratamento que vise à recuperação biopsicossocial do indivíduo O Sistema Único de Saúde SUS criado pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 CRFB88 e regulamentado pela Lei Orgânica de Saúde nº 8080 de 19905 tem em seus princípios e diretrizes a determinação de ser um sistema universal com atendimento integral que possua equidade e igualdade entre todos Os profissionais do Serviço Social contribuem para a construção de uma saúde pública humanizada com acesso prático e tempestivo O trabalho desses profissionais tem se mostrado relevante especialmente pela contribuição do profissional na atuação em saúde com o paciente oncológico em sua capacidade de reconhecêlo como sujeito de direitos para além da sua doença em uma visão de totalidade e de compreensão da realidade que será atravessada por inseguranças medos e mudanças nas relações sociais O adoecimento seus impactos e o Serviço Social Garantida pela CRFB88 a Seguridade Social é objeto de proteção social para os cidadãos e diante do seu reconhecimento existem iniciativas em conjunto com os poderes públicos e a sociedade destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde à previdência e à assistência social Essas políticas compõem o chamado tripé da Seguridade Social Conforme retrata Boschetti 2009 a construção da Seguridade Social no Brasil que teve como referências os modelos de outros países empregou duas formas para assegurar direitos o modelo Bismarckiano de caráter Alemão e o modelo Beveridgiano de caráter Inglês ambos tendo como parâmetros os direitos do trabalho uma vez que historicamente as primeiras formas de proteção social para os momentos de perda da capacidade laborativa estavam vinculados ao trabalho Nessa ótica encontravase sem proteção o trabalhador desempregado Rodrigues e Bellini 2010 contextualizam que conforme a legislação social norteouse no campo do trabalho e dos direitos trabalhistas os demais como os trabalhadores desempregados ou aqueles que realizavam o trabalho no contexto da informalidade nas áreas urbana e rural não eram reconhecidos como filiados no momento da necessidade encontrandose desprotegidos Essa vertente devese ao modelo de sistema de proteção social Bismarckiano padrão alemão que o país incorporou destinado ao seguro A desproteção daquele que não se encontra vinculado ao trabalho formal é algo ainda presente em conjunturas atuais com a incorporação dos dois modelos dentro da Seguridade Social 5 Dispõe sobre as condições para a promoção a proteção e a recuperação da saúde a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências 76 No Brasil os princípios do modelo Bismarckiano predominam na previdência social e os do modelo Beveridgiano orientam o atual sistema público de saúde com exceção do auxílio doença tido como seguro saúde e regido pelas regras da previdência e de assistência social o que faz com que a seguridade social brasileira se situe entre o seguro e a assistência social BOSCHETTI 2009 p 325 Considerando que o trabalho informal sem regime de proteção social é uma realidade ainda muito presente na sociedade brasileira os trabalhadores são privados dos direitos trabalhistas e sociais em função do sistema de proteção social que na política de previdência social reconhece o direito somente aos filiados ao Regime Geral da Previdência Social não absorvendo uma grande parte da população brasileira em idade produtiva que não está inserida no mercado formal de trabalho ou que não dispõe de condições financeiras para contribuições facultativas A Política de Assistência Social utilizase do critério seletivo a quem dela necessitar e somente a Política de Saúde possui a universalização do acesso sem contribuições prévias e diretas O SUS tem características essenciais garantidas na CRFB88 e na Lei nº 808090 tais como a universalização do acesso sem discriminação a concepção de saúde como dever do Estado a integralidade a equidade uma rede hierarquizada e regionalizada a descentralização dos processos decisórios e a participação da comunidade em seus níveis administrativos Todo esse arranjo organizacional é complexo principalmente por objetivar alcançar e manter os serviços com atenção qualificada e humanizada O SUS tem como desafio garantir o acesso ampliado com atenção especial às situações de agravos à saúde associadas ou não às múltiplas expressões da desigualdade social expressas sob a forma de múltiplos contornos de fragilidades e de vulnerabilidades A partir da Constituição a saúde é desafiada a ir além das conotações biomédicas para incluir em seu contexto os determinantes sociais como a alimentação a moradia o saneamento básico o meio ambiente o transporte o lazer o trabalho a renda a educação a atividade física e o acesso aos bens e serviços essenciais Os determinantes sociais incluem as condições mais gerais como as socioeconômicas as culturais e as ambientais visto que apresentam novos desafios ao SUS A saúde tende a sofrer influências do perfil epidemiológico da população uma vez que está relacionada às condições de vida Algumas patologias em especial o câncer além dos reflexos que trazem para a dinâmica familiar também impactam a capacidade laborativa ou seja a capacidade para o trabalho O adoecimento e seus diversos tipos de tratamento de longa duração possivelmente dolorosos e com efeitos colaterais comprometem o desenvolvimento de determinadas atividades o que reconfigura o cenário da autonomia e da capacidade e principalmente muda a rotina laboral Manter o seu sustento ou prover o sustento de sua família tem uma nova variável impactando a condição econômica e assim a vida Dessa forma Indivíduos submetidos a regimes precarizados de trabalho têm em sua condição física a possibilidade de geração de renda e nenhuma proteção social no caso do adoecimento Outro componente tratase das famílias que precisam reorganizarse para atender as necessidades de acompanhamento desse enfermo e da possível ausência de contribuição financeira SILVA 2010 p 183 77 Os direitos daqueles que não trabalham sob condição formal e protegida não são reconhecidos e sua efetivação é um processo moroso e sem garantia Temse portanto que se os direitos de uma pessoa não são efetivados quando uma situação de incapacidade para o trabalho afeta sua própria subsistência e a de seus dependentes e essa pessoa passa a ser considerada improdutiva está sujeita de forma mais expressiva às manifestações da questão social Nessa ótica Martinelli 2006 afirma que Tornase bastante claro que no âmbito das políticas neoliberais somos considerados cidadãos trabalhadores enquanto estamos à disposição do capital Ao deixar o mercado formal de trabalho rapidamente o trabalhador perde a sua inserção de classe e os direitos trabalhistas e sociais MARTINELLI 2006 p 13 Temse portanto o agravamento de expressões da questão social que já se manifestavam nas condições precárias do sujeito trabalhador e que diante do adoecimento é impelido em termos laborais ao não direito de ficar doente A pessoa com câncer que não possui seu trabalho formalizado com direitos previdenciários garantidos e é impossibilitada de continuar a desenvolver suas atividades remunerativas em razão do impacto da doença e que também não encontra possibilidades de acesso à resolutividade de suas necessidades adquiridas ao adoecer nas ofertas das políticas sociais tornase excluída da sociedade É como Martinelli 2006 destaca ao afirmar que a própria sociedade vai retirando dele a cidadania uma vez que mesmo que uma pessoa tenha trabalhado durante muitos anos e deixe o mercado de trabalho começa a compor uma categoria de não trabalhador na qual todos os seus direitos se esvaem abalando toda uma vida pessoal e familiar arduamente construída Tal cenário se agudiza à medida que se somam questões como a dificuldade de acesso ao diagnóstico precoce e ao próprio tratamento preconizado e também a limitada proteção social promovida pelo Estado Entendase por limitada proteção social questões como a situação posta ao sujeito adoecido por câncer sem vínculo previdenciário que depende da sua condição física para a venda de sua força de trabalho a fim de promover sua subsistência e comumente também de sua família a situação do usuário com vínculo que enfrenta inúmeras dificuldades e constrangimentos por parte do empregador para comparecer às consultas e exames no curso de um tratamento prolongado dentre outras questões SILVA 2010 p 182 Receber o diagnóstico de uma doença complexa e estigmatizada por ser uma patologia grave que vem acompanhada por tratamentos intensos e agressivos os quais afetam a vida física e social do ser humano e de sua família é fato vivenciado pelas pessoas que enfrentam o câncer e que também vão redescobrir maneiras e possibilidades na vida perante o adoecimento Descobrirse com câncer não é uma tarefa fácil prosseguir com o tratamento também não aceitar a doença para administrar a vida a partir dela é dificultoso e doloroso exigindo força e paciência para suportála A vida cotidiana é acometida por mudanças desesperança incertezas numa situação limite com o próprio ser que a vivencia com estágios de negação e afastamento como forma de proteção É necessário traçar novos moldes para se enquadrar para viver a luta de construir novas perspectivas 78 O adoecimento de uma pessoa da família impacta a todos que compõem o cenário familiar inevitavelmente tendo em vista que a carga emocional não é pequena e os sentimentos são inúmeros Estruturações diferenciadas vão fazer parte desse novo cotidiano Adotase aqui com Mioto 1997 o seguinte conceito de família A família pode ser definida como um núcleo de pessoas que convivem em determinado lugar durante um lapso de tempo mais ou menos longo e que se acham unidos ou não por laços consanguíneos Tem como tarefa principal o cuidado e a proteção de seus membros e se encontra dialeticamente articulado com a estrutura social na qual está inserido MIOTO 1997 p20 A família de um paciente com câncer sofre reflexos e alterações com o diagnóstico e o tratamento sendo a sustentação familiar de importância decisiva Nesse processo a pessoa com câncer fica em uma nova condição por necessitar do apoio e dos cuidados integrais dos familiares que se dedicam durante longos períodos de tempo Esse processo exige um trabalho com cuidado exaustivo Nessa nova relação há o reconhecimento da dedicação e da preocupação mas também há uma nova medida ou peso em relação à dependência e à autonomia A família necessita ser orientada e acolhida visto que ela também se encontra nesse novo cenário configurado pela doença vivenciando juntamente com o familiar adoecido todo o seu sofrimento Assim um novo agir é exigido Novos laços são estabelecidos diante da necessidade de cuidados físicos e emocionais muitas vezes delimitados por proximidades físicas como em situações do auxílio de vizinhos e da comunidade os quais se unem para amparar a pessoa no enfrentamento dessa nova fase No âmbito da assistência realizada em um hospital um dos desafios que está posto é ser capaz de realizar assistência à saúde de natureza complexa e especializada sem perder de vista o lugar de vida e de pertencimento do paciente o que remete à necessidade de firmar pactos e responsabilizar o cuidado entendendo a dinâmica assistencial e o papel diferenciado das ações de saúde nos níveis primário secundário e terciário O assistente social intervém junto ao paciente e à sua família e o faz em consonância com as políticas sociais envolvendo articulando e estabelecendo redes de petição e de compromisso MERHY 2OO4 entre os diversos serviços disponíveis no território Joazeiro 2011 afirma que no espaço de um hospital a intervenção requer múltiplos saberes que necessitam ser colocados em movimento uma vez que o objetivo principal é cuidar da vida Dentro de uma equipe composta por diversos profissionais que detêm o conhecimento específico de sua área o assistente social vem a ser um profissional que oferece um atendimento humanizado e de qualidade responsável por compartilhar as informações colhidas durante seu atendimento por meio de entrevistas de orientações ou do momento da escuta com a equipe que trabalha apresentando o contexto social e o meio de pertencimento do sujeito numa visão de totalidade além da patologia Conforme afirma Iamamoto 2011 necessitase de um profissional não somente executor de atividades mas também propositivo crítico empenhado na ampliação da qualificação capaz de analisar pesquisar para a leitura da realidade É preciso ser criativo para compreender a história que os sujeitos constroem contribuindo para as transformações Como ressalta Iamamoto 2011 p75 O desafio é redescobrir alternativas e possibilidades para o trabalho profissional no cenário atual 79 É necessário que o assistente social identifique cada aspecto de singularidade que cada demanda atendida apresenta principalmente por ser um profissional cuja formação possui o reconhecimento e o respeito pelas diversidades que o usuário atendido na sua cotidianidade apresenta uma leitura crítica da sua realidade Os cuidados paliativos são medidas que melhoram a qualidade de vida do paciente e de seus familiares tendo em vista que podem ser ofertados no ambiente hospitalar ou na residência por meio da atenção domiciliar6 Entretanto em muitas situações a família não dispõe de condições para realizar o cuidado do paciente no domicílio por inúmeros motivos como recursos financeiros insuficientes falta de harmonia familiar adequada e deficiência dos serviços de saúde para um atendimento integral Idealmente os cuidados paliativos deveriam permear desde o diagnóstico da doença até a morte sendo considerada como um processo natural da evolução humana A Organização Mundial da Saúde OMS considera cuidados paliativos como uma abordagem que melhora a qualidade de vida dos pacientes e seus familiares frente a problemas associados à doença terminal através da prevenção e alívio do sofrimento identificando avaliando e tratando a dor e outros problemas físicos psicossociais e espirituais WORLD HEALTH ORGANIZATION 2002 p 84 Os cuidados paliativos realizados por equipes interdisciplinares adequadamente treinadas necessitam apresentar como proposta um plano de cuidado horizontal considerando as dimensões física psicológica social e espiritual do paciente mas sempre respeitando sua cultura autonomia e capacidade de tomar decisões A equipe de saúde em atendimentos domiciliares necessita considerar as condições em que o paciente vive e a comunidade em que ele está inserido visto que é necessário realizar orientações e compartilhar conhecimentos com os cuidadores informais sobre maneira como devem atuar em situações complexas pautadas na qualidade do cuidado em saúde Essa modalidade terapêutica visa a confortar sempre com a intenção que o paciente possa ter uma sobrevida digna e que seus últimos dias não sejam perdidos É importante que esse cuidado venha a ser realizado por uma equipe composta por profissionais diversos cada qual com seu saber específico que possa acompanhar e assistir o adoecido e sua família como um todo com o objetivo de aliviar os sofrimentos causados pelo adoecimento e priorizar a qualidade de vida A demanda por cuidados paliativos no Brasil tende a crescer em razão da transição demográfica pelo aumento da população idosa e da transição epidemiológica pela diminuição de incidência e mortalidade por doenças infecciosas e pelo aumento significativo das doenças crônicas não transmissíveis Essas possuem forte ligação com as mudanças dos hábitos alimentares e os estilos de vida cada vez menos saudáveis Segundo a Estimativa 2014 de Incidência de Câncer no Brasil válida para 2015 realizada pelo Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva INCA são esperados aproximadamente 576 mil novos casos de câncer O câncer é um problema de saúde pública representando a segunda maior causa de morte no Brasil sendo considerado um desafio para o SUS 6 Portaria nº 963 de 27 de maio de 2013 Redefine a atenção domiciliar no âmbito do SUS 80 Considerações finais Objetivaramse aproximações dos impactos causados pelo câncer na vida dos sujeitos que o vivenciam elucidando o adoecimento e o trabalho sem regime de proteção social e a atuação do Serviço Social no cenário de um hospital na área de oncologia O adoecimento por câncer impacta os diversos momentos da vida do sujeito e principalmente a autonomia e as atividades de trabalho que são necessárias para o indivíduo retirar o seu sustento e o de seus dependentes Esse adoecimento deflagra uma nova variável que altera a condição econômica e a vida Nesse contexto o assistente social contribui para que o trabalho em um hospital na área de Oncologia seja mais efetivo no que diz respeito ao processo de orientações e acesso à garantia de direitos dos usuários do fortalecimento dos direitos previstos em leis nas ações propositivas por meio das reflexões e das análises da realidade atendida O assistente social contribui ainda para o fortalecimento dos direitos da pessoa que vivencia um câncer e sua família que sofre com a doença por meio de um atendimento acolhedor humanizado informativo que não retire sua condição de sujeito de direitos em função do adoecimento 81 Referências BOSCHETTI I A política da seguridade Social no Brasil In CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL Org Serviço Social direitos sociais e competências profissionais Brasília DF 2009 IAMAMOTO M V O Serviço Social na Contemporaneidade 20 ed São Paulo Cortez 2011 INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA Estimativa 2014 incidência de câncer no Brasil Rio de Janeiro 2014 JOAZEIRO E M G Supervisão de estágio no hospital de ensino público tensão entre saberes e temporalidades Tempus Actas de Saúde Coletiva Brasília v 5 n 1 p 159174 2011 MARTINELLI M L Reflexões sobre o Serviço Social e o projeto éticopolítico profissional Emancipação Ponta Grossa v 6 n 1 p 923 2006 MERHY E E Perspectivas atuais do SUS e o agir tecnológico do trabalhador como um ato ético político Serviço Social Saúde Campinas v 3 n 3 p 194 2004 MIOTO R C T Família e Serviço Social contribuições para o debate Serviço Social Sociedade Campinas ano 18 n 55 p 114129 1997 RODRIGUES P F V BELLINI M I B Proteção Social e as transformações do trabalho Serviço Social e Saúde Campinas v 9 n 10 2010 SILVA L B Condições de vida e adoecimento por câncer Libertas Juiz de Fora v 10 n 2 p 172187 2010 WORLD HEALTH ORGANIZATION National cancer control programmes policies and managerial guidelines 2 ed Geneva 2002 Use of This Digital Booklet Capítulo 8 ACOMPANHAMENTO PSICOLÓGICO AO IDOSO COM DIAGNÓSTICO DE CÂNCER REFLEXÕES SOBRE A ATEMPORALIDADE O ADOECIMENTO E A DOR DE SER supported by the German Federal Ministry of Education and Research 85 Considerações sobre a profissão de psicólogo e sua inserção no hospital um pouco de sua prática Desde o início do século XIX práticas psicológicas já existiam no Brasil entretanto apenas com a aprovação da Lei nº 4119 de 1962 a profissão de psicólogo foi regulamentada no país Observase que mais precisamente a partir dos anos 2000 houve um aumento na oferta de cursos de Psicologia o que certamente ampliou o mercado de trabalho nas capitais e abrangeu a área em vários campos de intervenção ROSAS ROSAS XAVIER 1988 Frente a isso várias áreas começaram a se expandir entre elas a da psicologia hospitalar que é uma subárea da psicologia da saúde GIMENES 2000 Importante destacar que seguindo a linha de expansão durante a década de 1940 os hospitais já eram considerados o símbolo máximo de atendimento em saúde SEBASTIANI 2003 Em meados do século XX começaram a surgir movimentos que tinham como foco trazer o princípio da integralidade do paciente para os sistemas de saúde Formavase assim a definição de saúde não como um quadro de bemestar ausente de sintomas mas sim como um todo abrangendo tanto o aspecto biológico quanto o social GONZÁLEZ 1993a Na atualidade expandiuse essa visão para o viés sistêmico do ser biopsicossocial que considera os conceitos de bemestar físico e mental do homem STRAUB 2014 Dessa forma por meio da ideia de psicossomática o psicólogo vai ganhando espaço nos hospitais e nas equipes multiprofissionais tendo como cerne da atuação prestar assistência psicológica ao paciente não se esquecendo da triangulação desse com a família e com os cuidadores O psicólogo foi se inserindo em vários setores hospitalares com estrita relação às clínicas médicas como as áreas de oncologia e geriatriagerontologia áreas em expansão diante do panorama da população brasileira que vem envelhecendo a cada ano Com a longevidade da população acompanhase o aumento no número de casos de doenças crônicas na faixa etária mais velha visto que os riscos provocados pelos longos períodos de exposição a agentes patológicos e a fatores estressantes LENARDT et al 2005 fazem com que as condições crônicas de doença sejam mais incidentes sendo a maior delas o câncer Por isso a autorização e a escuta da subjetividade de cada paciente são importantes pois possibilitam um elo que acolhe demandas que não são médicas como a de sentirse olhado e cuidado e além disso possibilita ao profissional da psicologia reconhecer as peculiaridades das reações do paciente MENDONÇA 2014 Questões relativas à adaptação à nova rotina de internação à vivência das fases da doença KÜBBLERROSS 1996 à individualidade etc devem ser bastante consideradas pelos profissionais de psicologia A atenção no que está mais além dos fenômenos permite explorar o velado o não verbalizado as representações do diagnóstico da doença da internação do tratamento do amparo ou do desamparo da família etc Nesse contexto os psicólogos hospitalares têm uma atuação imprescindível no acompanhamento desses pacientes e de seus familiares pois a notícia do diagnóstico pode provocar mudanças significativas na reação emocional dos pacientes levando a sentimentos de insegurança Além do mais é comum que eles se sintam impotentes diante da inexorabilidade do tempo tornandoos vulneráveis ao sofrimento e ao receio da morte É comum ainda que se acompanhe a consciência da sua proximidade com a morte o que em alguns idosos pode gerar uma falta de perspectiva para o futuro PELAEZ DORÓ et al 2004 86 Enquanto tônica do trabalho do psicólogo considerase pertinente que seja ressignificado sempre esse lugar do paciente que antes vivenciava outra rotina É importante ainda considerar que pelo ponto de vista psicológico a doença é algo que ninguém escolhe ter Sucessivamente adoecer sempre significa algo ruim inesperado que interrompe o curso da vida e vários projetos futuros Frente a isso o posicionamento do psicólogo hospitalar deve ser o de acompanhar a dor dos pacientes dos familiares e dos cuidadores implicados trabalhando com eles aspectos que ressignifiquem o sentido da doença do tratamento da vivência do amparo etc além de colocar se sempre à disposição desses pacientes Acreditase nesse contexto que o acompanhamento àqueles com sequelas ou traqueostomias por exemplo exigirá um cuidado maior ao paciente e à família no qual o olhar a empatia e os demais esforços por parte do psicólogo no atendimento deverão ser sempre renovados De fato não há nessas situações do contexto da psicologia hospitalar um caráter sui generis que se restrinja a um serviço específico mas sim a toda uma gama de possibilidades e subjetividades amparadas exclusivamente pela escuta Refletindo sobre a psicologia e a gerontologia a serviço do paciente idoso e da dor de ser A presença de um idoso no cotidiano familiar requer maiores gastos no orçamento da casa e algumas atenções básicas isso provoca mudanças na dinâmica familiar que dependendo da reação de seus membros pode ser interpretada como uma sobrecarga muito grande SALLES FARIA 1997 Quando se traz esse cenário para o ambiente hospitalar com recorrentes internações podemse dimensionar as aflições e as incertezas Com o enfrentamento ao câncer acompanhase um transbordamento de emoções Somandose às características de cunho socioeconômico acompanhase ainda a fragilidade das famílias na lida de uma rotina extenuante no caso de internação do ente idoso em um hospital A vivência de uma doença como o câncer pode prejudicar a qualidade de vida do idoso por isso a família deve servir como apoio e amparo Entretanto em função da própria dinâmica em que a sociedade vive muitas famílias não conseguem conciliar as suas atividades pessoais com o acompanhamento necessário ao cuidado da pessoa idosa outras famílias não possuem suporte emocional Não raro incapacitados de flexibilizar as suas rotinas de trabalho para acompanhar o familiar idoso em tratamento de câncer em hospital vêse um crescente aumento na contratação de cuidadores profissionais tarefa essa desempenhada em maioria por técnicos de enfermagem em regime de plantão contratados para acompanhamento ao enfermo Em termos gerais o câncer é uma doença que se dá pela multiplicação desordenada de células que podem invadir outros tecidos ou órgãos adjacentes BRASIL 2013 caracterizando a metástase Esse pode ser um quadro irreversível para alguns pacientes Por isso quando se veem diagnosticados com câncer os pacientes adquirem sentimentos de angústia e medo e podem chegar a deixar de lado suas tarefas profissionais e até o convívio social Consonante ao exposto percebese ainda que o câncer é uma doença estigmatizada Apesar dos avanços tecnológicos ainda é permeado por imagens muito negativas remetendo ao senso comum como uma doença maldita Essa imagem faz com que o paciente leve consigo 87 um sentimento de desamparo e medo mas não só um medo simplesmente da morte e sim de morrer com câncer ficar inválido perder as funções motoras ter dor crônica etc BARBOSA FRANCISCO 2007 A dor inclusive é conceituada como algo desagradável incômodo sofrido Apesar disso há muitas relatividades em relação à dor pois como se sabe a reação alusiva à dor depende muito da cultura em que a pessoa afligida está inserida da própria fisiologia do sujeito entre outras coisas A dor como sendo algo subjetivo é expressa por cada indivíduo de acordo com os seus fatores neuronais biológicos psicológicos e sociais A dor crônica em oncologia é relacionada à doença e ao processo do tratamento Nesse caso a dor deve ser controlada via intervenções medicamentosas e não medicamentosas pois o paciente geralmente apresentase sem muito vigor e o incômodo da dor gera um estresse não só para o paciente mas também para a família e a equipe de saúde do hospital Dessa forma é vital que o paciente oncológico com dor seja assistido a fim de encerrar o seu sofrimento No caso de pacientes oncológico com dor crônica deve ser necessário o empenho dos profissionais para proporcionar da melhor maneira possível um bemestar a ele minimizando os efeitos colaterais da dor MICELI 2002 Nesse contexto específico parece evidente que o sofrimento visível aos olhos é aquele no qual há experimentação de dor física E o sofrimento da experiência de adoecimento de tratamento Remontase assim ao reconhecido e denso locus da atuação profissional do psicólogo hospitalar Considerase que o psicólogo hospitalar deve acompanhar os pacientes oncológicos trabalhando a sua autoestima para que busquem amparo para enxergar além da dor e tentem ser capazes de ressignificála É importante ainda que todos os profissionais da equipe multidisciplinar do hospital estejam atentos pois em comorbidade ao câncer e às dores os pacientes podem apresentar certos comportamentos disfuncionais Na prática em psicologia hospitalar não é incomum que se observe uma variabilidade nos comportamentos dos pacientes ao receberem o diagnóstico da doença pela equipe médica no entanto é importante destacar que os fatores emocionais estão entrelaçados com suas funções cognitivas havendo uma relação estrita entre o pensamento a emoção e o comportamento que podem sofrer modificações com o resultado e o decurso da doença Com isso transtornos psicológicos podem ser desencadeados pelos pacientes fazendo com que venham a apresentar distorções cognitivas SILVA AQUINO SANTOS 2008 Segundo Knapp 2004 apud SILVA AQUINO SANTOS 2008 as distorções cognitivas podem apresentar diversos comportamentos como catastrofização pensar que o pior sempre vai acontecer abstração seletiva pensar no problema apenas pelo lado negativo adivinhação ter ideias negativas do futuro e personalização sentirse culpado pelo fato negativo Esses pensamentos distorcidos são desencadeados por eventos externos e internos que influenciam emoções e comportamento dos pacientes No ambiente hospitalar os profissionais de saúde deparamse com muitos pacientes idosos portadores de doenças crônicas e terminais que sofrem com essas disfunções Nessa área o hospital e a equipe de saúde transformamse em vetores diferentes mas essenciais no amparo e no acolhimento a esses pacientes e às famílias O psicólogo membro dessa equipe hospitalar tem a função de acolher e escutar esse sujeito que por estar internado acaba desenvolvendo um sentimento de despersonalização É considerável ressaltar que essa escuta permite que o paciente e seus familiares possam comentar 88 sobre a doença e consequentemente encarar as adversidades emergentes de cada fase Em situações envolvendo pacientes terminais a abordagem ajuda o paciente e a família a enfrentarem o processo de morrer e o luto Nesse sentido é importante destacar que o cuidado paliativo surge como uma abordagem que visa a trabalhar a dignidade do indivíduo nas circunstâncias da morte Apesar de se viver em uma cultura que aprecia muito a vida buscando sempre sobreviver com dignidade nessa passagem é preciso também buscar uma dignidade na hora de morrer Com isso o Governo Federal por intermédio do Ministério da Saúde vem criando formalmente portarias normativas e documentos a fim de firmar a ideia de cuidados paliativos no sistema de saúde do Brasil ligados à atenção básica ao paciente para assim permitir que o paciente e a família tenham direitos a recursos não só afetivos mas também econômicos e de assistência social Nessas considerações crêse que não se trata de refutar o fator tempo mas sim de acolhêlo com vistas a uma equalização na qual vida qualidade e tempo encontramse em justaposição Considerações finais Observase que na velhice a doença vem se somar a necessidades muito próprias de comunicação com o outro agravando o sentimento de desesperança do idoso em lugar de propiciar tempo para um rito de passagem dos laços familiares e uma busca pessoal de sentido Em outras palavras tratase da transcendência CHAHON 2014 Pensar o envelhecimento nessa sociedade ainda é algo cercado de estereótipos e preconceitos que tendem a se acentuar quando esses idosos vivenciam tal etapa da existência humana no universo dos hospitais Imagine o quanto se atenua quando se pensa no câncer como a doença que muda mesmo que momentaneamente todos os recentes ou futuros planos do indivíduo e de sua família Não é difícil reconhecer que o paciente idoso com câncer encontrase imbuído numa dupla atmosfera de fragilidade diante de duas situações que no senso comum reconhecidamente remetem à sentença velhice e doença grave Notadamente a atuação do psicólogo hospitalar é de extrema importância para que o paciente com câncer possa ser ouvido e acolhido em seu sofrimento Em sua atuação o psicólogo lida frequentemente com a necessidade de imersão e a importância da empatia do contato discreto e cuidadosamente não invasivo e da escuta acolhedora durante todo o processo de acompanhamento ao paciente e à família Não há regras cada caso é sui generis sendo o cerne a ajuda no enfrentamento do medo e da própria morte em razão da evolução da doença Esse espaço certamente ajudará o paciente a falar das suas prioridades e necessidades dividindoas também no direcionamento de novos significados É importante enfatizar com o paciente a qualidade de vida durante a sobrevida bem como a finitude 89 Referências BARBOSA L N F FRANCISCO A L A subjetividade do câncer na cultura implicações na clínica contemporânea Revista SBPH Rio de Janeiro v 10 n 1 p 924 2007 BRASIL Ministério da Saúde Glossário temático controle de câncer Brasília 2013 CHAHON M Considerações sobre o adoecimento oncológico na velhice In BERNAT A B R PEREIRA D R SWINERD M M Org Sofrimento psíquico do paciente oncológico o que há de específico Rio de Janeiro Inca 2014 cap 4 GIMENES M G G O que é psiconcologia In GIMENES M G G FÁVERO M H Org Introdução à psicooncologia São Paulo Livro Pleno 2000 p 3556 GONZÁLEZ F Personalidad Salud y Modo de Vida Ciudad de México UNAM 1993a Problemas epistemológicos de la Psicología Ciudad de México UNAM 1993b HERMES H R LAMARCA I C Cuidados Paliativos uma abordagem a partir das categorias profissionais de saúde Ciência Saúde Coletiva Rio de Janeiro v 18 n 9 p 25772588 2013 KNAPP P Terapia cognitivocomportamental na prática psiquiátrica Porto Alegre Artmed 2004 KÜBBLERROSS E Sobre a morte e o morrer São Paulo Martins Fontes 1996 LENARDT M H et al O cuidado de si do idoso como instrumento de trabalho no processo de cuidar Cogitare Enfermagem Curitiba v 10 n 1 p 1625 2005 MENDONÇA G et al O diagnóstico em Psicologia In BERNAT A B R PEREIRA D R SWINERD M M Org Sofrimento psíquico do paciente oncológico o que há de específico Rio de Janeiro Inca 2014 cap 5 MICELI A V P Dor crônica e subjetividade em oncologia Revista Brasileira de Cancerologia Rio de Janeiro v 48 n 3 p 363373 2002 PESTANA L C ESPÍRITO SANTO F H As engrenagens da saúde na terceira idade Um estudo com idosos asilados Revista da Escola de Enfermagem da USP São Paulo v 42 n 2 p 268275 2008 PELAEZ DORO M et al O câncer e sua representação simbólica Psicologia ciência e profissão Brasília v 24 n 2 2004 ROSAS P ROSAS A XAVIER I B Quantos e quem somos In CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA Quem é o psicólogo brasileiro São Paulo Edicon 1988 p 3248 SALLES R A FARIA M E B A família base para a re habilitação profissional do deficiente auditivo Serviço construindo o social Bauru ano 10 n 1 p 139158 1997 SEBASTIANI R W Psicologia da Saúde no Brasil 50 Anos de História 2003 Disponível em httpwwwcrp09orgbrNetManagerdocumentos11913doc Acesso em 22 maio 2015 SILVIA S S AQUINO T A A SANTOS R M O paciente com câncer cognição e emoções a partir do diagnóstico Revista Brasileira de Terapias Cognitivas Rio de Janeiro v 4 n 2 7389 2008 STRAUB R O Psicologia da Saúde uma abordagem biopsicossocial Porto Alegre GRUPO A 2014 Contents 1 Structural BiochemistryA New Field 3 2 Study Target Proteins 5 3 Bottomup ApproachAnalytical Methods of Protein Complexes 7 4 Topdown ApproachSynthetic Biology and Protein Design 17 5 PHYRE2 Protein Structure Prediction 29 6 Visualization of Threedimensional Structures of Proteins and Protein Complexes 37 7 Bibliography 39 Capítulo 9 UM OLHAR SOBRE A EXPERIÊNCIA DO PACIENTE IDOSO EM TERMINALIDADE Meeting summary I Antifraud and Corruption activity results 1st semester 2011 15 new files opened 7 opened at the request of the Audit Committee 4 opened at the request of the Board of Directors 2nd semester 2011 14 new files opened 2 opened at the request of the Audit Committee 5 opened at the request of the Board of Directors 1st semester 2012 10 new files opened 4 opened at the request of the Audit Committee 4 opened at the request of the Board of Directors 2nd semester 2012 19 new files opened 6 opened at the request of the Audit Committee 8 opened at the request of the Board of Directors II Background of the Nueva Castilla Project The Nueva Castilla Project was initiated by Empresa Minera Miski Mayo SAC a wholly owned subsidiary of Minera Yanacocha SRL seeking to explore and develop a new mineral deposit The objectives of the fund transfer included financing the exploration activities covering operational expenses and supporting local community development initiatives On 15th March 2016 a fund transfer of 10 million was approved and executed directed towards the Nueva Castilla Projects operational account III Investigation Summary and Findings Initial investigations were prompted following irregularities observed in fund disbursements and accounting entries Investigative audit revealed that a portion of the transferred funds approximately 2 million was diverted to unauthorized accounts An internal review suggests possible collusion between company officials and external vendors Detailed transaction analysis shows discrepancies between vendor invoices and actual services rendered 93 Introdução Nos dias atuais o câncer pode ser considerado como problema de saúde pública sendo a segunda causa de morte por doença no Brasil e no mundo A sua origem dáse por condições multifatoriais e suas causas dependem de diversos fatores predisponentes que se dividem em extrínsecos a exemplo do tabagismo do uso de álcool do sedentarismo dos hábitos alimentares da obesidade entre outros e intrínsecos que são os fatores hereditários INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA 2014 De acordo com estimativas mundiais do projeto Globocan 2012 da Agência Internacional para Pesquisa em Câncer Iarc do inglês International Agency for Research on Cancer da Organização Mundial da Saúde OMS houve 141 milhões de casos novos de câncer e um total de 82 milhões de mortes por câncer em todo o mundo em 2012 INCA 2014 Os números continuarão aumentando nos países em desenvolvimento e crescerão ainda mais em países desenvolvidos caso não haja uma prevenção mais eficaz Já para o Brasil estimase em 2015 aproximadamente 576 mil casos novos de câncer incluindo os casos de pele não melanoma o que reforça segundo o INCA a magnitude do problema do câncer no país INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA 2014 De acordo com Veit e Carvalho 2010 o diagnóstico do câncer traz consigo muitos medos da morte imaginada como inevitável do sofrimento e da dor causados pelo tratamento da desfiguração diante da evolução da doença Além disso o medo pode ser também um gerador de sofrimento psíquico não só para o paciente mas para os seus familiares e as pessoas de seu meio social e muitas vezes estendese aos membros da equipe de saúde Qualquer que seja a sua etiologia o câncer atinge milhões de pessoas no mundo todo e apesar do avanço tecnológico da ciência o seu diagnóstico ainda é encarado muitas vezes como uma sentença de morte Embora seja comprovado que cerca de 50 dos casos são passíveis de cura ou controle essa associação com a morte ainda persiste principalmente pelo rótulo terminal VEIT CARVALHO 2010 Receber um diagnóstico de câncer é para muitos pacientes a representação do fim da vida No paciente idoso essa representação pode se tornar ainda mais intensa visto que além do câncer geralmente esses pacientes apresentam outras comorbidades limitações funcionais e outros agravos relacionados ao processo de envelhecimento O envelhecer Um dos maiores desafios das políticas de saúde do Brasil é sem dúvida o envelhecimento populacional Confirmando a tendência do envelhecimento acelerado da população e amparado pela maior expectativa de vida pela queda da fecundidade e da mortalidade estimase que o número de brasileiros acima de 65 anos quadruplique até o ano de 2060 segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE de 2013 A população acima de 65 anos deve passar de 149 milhões em 2013 para 584 milhões até em 2060 e nesse período a expectativa média de vida do brasileiro deve aumentar dos atuais 75 anos para 81 anos e em menos de 50 anos estimase que um em cada quatro brasileiros será idoso Tais estimativas fazem parte de uma série de projeções populacionais baseadas no Censo de 2010 e divulgadas pelo IBGE em 2013 94 Podese definir o envelhecimento como um processo sequencial individual acumulativo irreversível universal não patológico de deterioração de um organismo maduro próprio a todos os membros de uma espécie de maneira que o tempo o torne menos capaz de fazer frente ao estresse do meio ambiente e portanto aumente sua possibilidade de morte ZINN GUTIERREZ 2008 O envelhecer traz não apenas a deterioração do corpo físico mas também perdas relacionadas à morte de amigos e companheiros ao fim das relações de trabalho e da idade produtiva às perdas no relacionamento social e familiar Tais perdas reais e também simbólicas de acordo com Cocentino e Viana 2011 podem ser vivenciadas muitas vezes concomitantemente Por certo ao longo da vida o ser humano é preparado para o envelhecimento e para as perdas dele decorrentes mas não é devidamente preparado para a maior de todas as perdas a morte que mesmo negada de forma irascível pela sociedade é algo existente e inevitável Conforme Cocentino e Viana 2011 p 594 afirmam adoecer faz parte da saúde assim como a morte é parte integrante da vida e embora sejam processos naturais da existência humana nem sempre são bem aceitos pelas pessoas que os vivenciam A morte é sempre uma vivência única pessoal e intransferível que desperta sentimentos muito singulares e tanto a percepção da morte quanto o medo de morrer são experiências eminentemente individuais e por isso devem ser consideradas as percepções de cada paciente Um breve olhar sobre a história da morte Se antes a morte era uma espécie de evento familiar com o passar do tempo a morte tem se tornado cada vez mais individual e particularizada O autor Philippe Ariès em seu livro História da Morte no Ocidente relata que da Idade Média até o século XVIII o homem esperava pela morte em casa e fazia daquele momento um ritual compartilhado pelos membros da sociedade e pelos familiares ARIÉS 2003 Segundo o autor o doente terminal pressentia a chegada da morte e em seu leito passava os seus últimos dias de vida confessando os seus pecados perdoando os ofensores e recomendando a sua alma a Deus Desse modo a morte repentina não era desejada visto que impossibilitava esse ritual de passagem O autor afirma ainda que no final do século XVIII houve uma mudança nessa concepção de morte e o homem passou a temêla diante do juízo final difundido pelas crenças religiosas Já no início do século XIX ocorreram mudanças no modo de encarar a morte Nesse contexto surgiu a chamada morte romântica que passou a ser vista para muitos como uma possibilidade de reencontrar os entes queridos e sendo assim começou a ser desejada por muitos como uma expectativa de uma vida futura melhor concepção que marca o surgimento da doutrina espírita Desse modo a morte que antes era um ritual compartilhado pela sociedade foi ganhando nesse período novas concepções e tornouse cada vez mais solitária ultrapassou os muros dos lares e se instalou nos hospitais A proximidade da morte Ao se falar sobre a morte e o morrer fazse necessário refletir acerca do processo de terminalidade E o que dizer sobre a terminalidade De acordo com Gutierrez 2001 tratase 95 de um processo que ocorre quando se esgotam as possibilidades de resgate das condições de saúde do paciente e a possibilidade de morte próxima parece inevitável e previsível p85 O paciente terminal está inserido num contexto amplo que corresponde a critérios clínicos obtidos por meio de uma série de exames laboratoriais procedimentos e critérios que levam em conta também as condições pessoais do paciente a exemplo dos sinais de contato eou respostas com o meio e a dor Há certa dificuldade na definição de quando o paciente entraria em um estágio de terminalidade mas segundo Kovács 2012 esse período compreende de seis a 12 meses antes da morte do paciente Nesse ponto a terminalidade traz à tona impossibilidades e limites que envolvem a equipe o paciente e seus familiares Entretanto ao admitir que se esgotaram as possibilidades e os recursos para o tratamento não significa dizer que nada mais poderá ser feito pelo paciente Surgem nesse cenário novas possibilidades seja para reduzir os sintomas de dor e desconforto seja para manter enquanto for possível o seu lugar ativo sua autonomia suas escolhas permitindolhe chegar ao momento de morrer dignamente Não se trata de garantir mais dias de vida mas sim dar mais vida aos dias Rezende et al 2005 afirmam que a fase terminal é tida como a mais difícil e a mais angustiante tanto para o paciente quanto para os familiares e que nos últimos dias de vida os principais problemas enfrentados pelos pacientes são administrar a dor a insuficiência respiratória a confusão mental além de sintomas de ansiedade e de depressão podendo haver inclusive o progresso desses sintomas conforme a aproximação da morte do indivíduo Segundo Burla 2002 os sintomas mais frequentes na fase terminal são dor fadiga falta de ar náusea e vômitos constipação confusão mental inquietação e também anorexia Já no contexto oncológico cerca de 50 dos pacientes apresentam dor ao longo do seu processo de morte e apenas a metade recebe o tratamento adequado Na cultura ocidental a proximidade da morte pode causar sofrimento tanto para o paciente diagnosticado como terminal quanto para todas as pessoas que convivem com ele visto que nessas sociedades o morrer é um dos pontos culminantes e críticos da existência humana sendo comumente relacionado à tristeza e ao sofrimento Segundo Kovács 2012 muitos pacientes terminais afirmam ter medo de serem esquecidos por seus entes queridos após a morte havendo inclusive muitas vezes uma profunda ambivalência entre o desejo de permanecer vivo e de morrer para aliviar um sofrimento Ainda de acordo com a autora a proximidade da morte é um contexto privilegiado para que o paciente consiga lidar com situações inacabadas rever valores e prioridades e perceber o sentido da vida É preciso pensar e refletir acerca da terminalidade como parte indissoluvelmente integrante da vida e tratar esse assunto de um modo singular visto que haverá sempre muito a fazer e muito a aprender sobre o processo de morte Carvalho 2011 afirma que o morrer precisa ser tratado pelos profissionais de saúde como sendo um acontecimento natural com o qual se pode lidar ao invés de considerar a morte como a grande inimiga a ser derrotada e que sempre vence Além disso o autor defende que a morte também precisa ser encarada diferentemente pelo paciente e que esse ao refletir sobre a sua própria morte possa se dar conta de que ainda pode fazer escolhas e fazêlas valer De acordo com AngeramiCamon 2001 a morte é tão parte da existência humana do seu crescimento e desenvolvimento quanto o nascimento e ofertar apoio a alguém que se encontra em terminalidade é antes de tudo reconhecer a própria finitude Diante da terminalidade e se 96 o tempo que lhe resta é breve as vivências poderão ter cargas mais intensas e o paciente muitas vezes vêse refletindo sobre a sua própria vida tomando decisões ou concluindo projetos adiados ou esquecidos O paciente terminal é aquele que do ponto de vista psíquico está vivendo um emaranhado de emoções que incluem ansiedade lutas pela sua dignidade e conforto além de um acentuado temor que se relaciona com seu tempo de vida limitado finito Atuação da psicooncologia Em uma instituição hospitalar a finitude e o sofrimento humano podem se fazer presentes gerando sentimentos de angústia tristeza e desamparo em seus pacientes De acordo com Moura 2000 esses sentimentos são inerentes ao ser humano e evidenciados em situações de urgência e hospitalização mobilizando médicos e outros profissionais inseridos nesse contexto entre eles o psicólogo A participação desse profissional nas mais diversas unidades hospitalares exige que ele tenha a sua atuação constantemente renovada e reinventada visto que ao psicólogo hospitalar não caberá devolver a saúde física do paciente mas sim ajudálo a encontrar recursos para lidar com o processo de adoecimento e as suas interfaces Diante da doença física e da urgência orgânica a demanda no hospital é inicialmente dirigida ao saber médico Num primeiro momento a busca é a de um diagnóstico de eliminar o mal e as causas da dor conquistar a cura Diante da urgência orgânica surge também uma urgência psíquica e de acordo com Moura 2000 é nessa que o trabalho do psicólogo pode ser realizado Ao psicólogo inserido na equipe multiprofissional cabe se oferecer onde ainda não há uma demanda específica para ele tratase de ofertar um espaço de escuta e acolhimento àquele que sofre diante do adoecimento e por meio dessa escuta perceber como o desejo depende da relação corpodoençasaúde A proposta ainda segundo Moura 2000 é a de escutar o sujeito não em oposição ao medicamento que alivia mas abrindo espaço para que ele encontre novo significado à sua existência e adquira recursos para lidar com a sua angústia Num hospital os acontecimentos podem se tornar traumáticos e muitas vezes o sujeito se vê imerso na angústia diante do inesperado em sua vida por exemplo o recebimento do diagnóstico de câncer De acordo com Romano 1999 temse a palavra como ferramenta de trabalho e à medida que se escuta e pontua a fala do paciente possibilitase que esse sujeito possa ter mais recursos para lidar com a sua angústia e com a vivência traumática do processo de adoecimento Nesse processo o psicólogo trabalha como um agente facilitador da relação equipe pacientefamília proporcionando um espaço para que as emoções desencadeadas ao longo desse período possam ser expressas entendidas e acolhidas Objetivo O objetivo deste trabalho de revisão bibliográfica é investigar e compreender como o paciente idoso com câncer vivencia a proximidade da morte e quais as possibilidades de atuação do psicooncologista nesse contexto 97 Metodologia Foi realizada uma revisão bibliográfica mediante busca eletrônica de artigos nas seguintes bases de dados Literatura LatinoAmericana e do Caribe em Ciências da Saúde Lilacs e Medline PubMed As consultas incluíram o período de 2009 a 2013 e foram usados na língua inglesa os seguintes descritores terminal cancer elderly psychology Utilizaramse os seguintes critérios de inclusão I periódicos indexados II artigos nas línguas portuguesa inglesa e espanhola III estudos publicados no período de 2009 a 2013 IV artigos realizados com a população idosa acima de 60 anos V artigos com pesquisas qualitativas ou quantitativas Foram usados como critérios de exclusão I artigos que abordassem o estudo de transtornos psiquiátricos cuidados paliativos eutanásia distanásia e questões bioéticas envolvendo a população idosa eou pacientes oncológicos em terminalidade II artigos sobre a validação eou utilização de escalas ou análises estatísticas III artigos relacionados à experiência de cuidadores familiares eou equipe multiprofissional no cuidado e atenção aos pacientes idosos em terminalidade IV estudos de casos clínicos Pela busca eletrônica foram encontrados 249 artigos provenientes da base de dados Lilacs e 81 da base Pubmed totalizando 330 trabalhos Após a análise dos títulos e dos resumos foram excluídos os artigos que não atendiam aos critérios de exclusão Selecionaramse então oito trabalhos para a elaboração do presente capítulo Resultados Warrén Stomberg 2009 realizou um estudo com nove pacientes terminais com idades entre 71 e 76 anos a fim de investigar aspectos físicos e psíquicos considerados indispensáveis para o bemestar desses pacientes Os aspectos indispensáveis encontrados nesse estudo foram o alívio da dor um ambiente hospitalar agradável a importante visita dos parentes o recebimento do encorajamento da equipe a capacidade de cuidar de si mesmo e ter tempo para resolver questões pessoais O estudo revela que diante da terminalidade os pacientes costumaram estreitar as relações com os familiares e amigos Alifrangis et al 2011 realizaram um estudo com 125 pacientes idosos com câncer cujo objetivo foi compreender melhor a visão dos pacientes envolvidos em experiências de comunicação de prognóstico e tratamento e decisões sobre o fim de vida O estudo revelou que a maioria dos pacientes não deseja obter informações mais detalhadas no que diz respeito ao prognóstico e os pacientes que possuíam uma rede de apoio social diversificada e que podiam contar com os familiares amigos e profissionais de saúde conseguiam lidar melhor com o diagnóstico Volker e Wu 2011 entrevistaram 20 pacientes com câncer avançado nos últimos dias de vida e com idade média de 62 anos O estudo apontou que entre as principais preocupações em torno da terminalidade estariam o acesso aos serviços hospitalares o medo da proximidade da morte o medo de perder o autocuidado a preocupação em perder o contato com a equipe responsável o desejo de um tratamento que prolongue a vida e as crenças espirituais conflituosas As experiências de dor e qualidade de vida em pacientes idosos foram analisadas por Black et al 2011 Foram entrevistados 94 pacientes com idades entre 55 e 85 anos De acordo 98 com os resultados obtidos neste estudo a ausência de dor e o controle dos sintomas eram os melhores indicativos de qualidade de vida assim como os efeitos da dor não tratada e os sintomas mal controlados interferiam nas atividades da vida diária no humor na mobilidade e na independência Barnes et al 2011 realizaram um estudo com 40 pacientes oncológicos em terminalidade e por meio de entrevistas semiestruturadas investigaram sobre a percepção de autonomia dos pacientes e quais as suas preocupações relacionadas principalmente com a saúde e com o futuro Os resultados do estudo apontaram que as maiores preocupações dos pacientes estavam relacionadas à experimentação de sintomas angustiantes como a dor ou preocupavamse em como os membros da família lidariam com o adoecimento e com a proximidade da morte Hanratty et al 2013 desenvolveram um estudo prospectivo que comparou as experiências e preferências futuras de cuidados entre pacientes idosos Foram realizadas entrevistas qualitativas com 32 pacientes com idade entre 70 e 95 anos sendo que 20 dessas pessoas moravam sozinhas e a maioria era viúva Ter o diagnóstico de câncer e o fato de morar sozinho estava associado aos piores índices de qualidade de vida a níveis mais elevados de angústia e a um risco maior de não morrer em casa A investigação de como os pacientes idosos estavam convivendo com o tratamento oncológico foi o objetivo do estudo realizado por Wise e Marchand 2013 Foram entrevistados dez pacientes com câncer avançado com idade média de 65 anos e a análise dos dados mostra que a maioria dos pacientes tentava encarar a morte como inevitável e por ser inevitável deveria ser enfrentada Estar próximo aos entes queridos e priorizar os relacionamentos especialmente com o cônjuge e os filhos foram considerados os aspectos mais importantes para esses pacientes Discussão A partir da análise dos artigos sobre a experiência do paciente idoso com câncer diante da terminalidade constatouse a escassez de publicações sobre esse tema apesar de constituirse como relevante uma vez que comprovadamente há uma tendência para o envelhecimento acelerado da população para o aumento da expectativa de vida além do número crescente de casos de câncer entre a população idosa Nessa revisão foi possível identificar alguns aspectos em comum referentes à experiência da terminalidade entre os pacientes idosos A presença da dor intensa e de difícil controle preocupações pessoais em torno do processo de terminalidade que incluíam o medo da perda de autonomia e dignidade e o medo de sobrecarregar os entes queridos estão entre os aspectos mais relevantes nos artigos selecionados Diante da terminalidade o paciente idoso pode sentir a necessidade de estreitar as relações com os familiares aprofundar as relações sociais já existentes e estar ao lado de amigos mas também há a necessidade de manter a autonomia de ter tempo e privacidade para refletir sobre a própria vida de comunicar os seus pensamentos e expressar as suas preocupações os anseios o amor e a gratidão aos seus familiares Em geral os idosos submetidos ao tratamento oncológico expressam preocupações com a dor o medo da morte a perda da dignidade e o surgimento de outras doenças Aqueles que possuem uma rede de apoio social diversificada e que contam com familiares amigos e profissionais de saúde conseguem lidar melhor com todo esse processo 99 Considerações finais Há cada vez mais um lugar possível para compreender as questões que envolvem a morte O paciente idoso frente à proximidade da morte mostra a possibilidade de redescobrir e dar novo significado à própria vida à luz de um novo olhar diante do morrer Neste estudo apesar do número limitado de artigos selecionados foi possível compreender e refletir sobre a experiência do idoso em terminalidade bem como seus anseios medos e preocupações Resta por outro lado a certeza de que outros aspectos poderiam ter sido aprofundados e explorados e há o desejo de que em trabalhos futuros esse tema tão relevante possa ser novamente explorado O estudo evidenciou que diante de uma morte próxima e inevitável o mais importante para o idoso com câncer é estar ao lado dos entes queridos mantendo sua dignidade e autonomia e poder vivenciar os últimos dias com qualidade conforto e acima de tudo carinho Ao psico oncologista inserido nesse contexto cabe ofertar um espaço de escuta e acolhimento visando à qualidade de vida do paciente idoso diante da morte e do morrer facilitando o processo de elaboração da chegada da morte e permitindo que esse paciente tenha mais vida em seus dias diante da impossibilidade de ter mais dias de vida 100 Referências ALIFRANGIS C et al The experiences of cancer patients QJM Oxford v 104 n 12 p 1075 1081 2011 ANGERAMI CAMON V A Pacientes terminais um breve esboço In Org Psicologia hospitalar teoria e prática 2 ed rev ampl São Paulo Pioneira 2001 p 97103 ARIÉS P História da morte no ocidente da idade média aos nossos dias In Sobre a história da morte no ocidente Rio de Janeiro Ediouro 2003 Sobre a história da morte no ocidente p45330 BARNES K A et al Advance care planning discussions in advanced cancer analysis of dialogues between patients and care planning mediators Palliative supportive care Cambridge v 9 n 1 p 7379 2011 BLACK B et al The relationships among pain nonpain symptoms and quality of life measures in older adults with cancer receiving hospice care Pain medicine Malden v 12 n 6 p 880889 2011 BURLA C Cuidados ao fim da vida uma preocupação da prática da medicina geriátrica Textos sobre envelhecimento Rio de Janeiro v 4 n 8 p 2128 2002 CARVALHO V A A vida que há na morte In BROMBERG M H P F Org Vida e morte laços da existência São Paulo Casa do Psicólogo 2011 p3576 COCENTINO J M B VIANA T C A morte e a velhice reflexões sobre o processo de luto Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia Rio de Janeiro v 14 n 3 p 591599 2011 ESTAVA BONFIM E CARMAGO GUTIERREZ P L O que é o paciente terminal Revista da Associação Médica Brasileira São Paulo v 47 n 2 p 92 2001 HANRATTY B et al What is different about living alone with cancer in older age A qualitative study of experiences and preferences for care BMC family practice London v 14 p 22 2013 INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA Estimativa populacional 2013 Rio de Janeiro 2013 INSTITUTO NACIONAL DO CÂNCER JOSÉ DE ALENCAR GOMES DA SILVA Estimativa 2014 incidência de câncer no Brasil Rio de Janeiro 2014 KOVÁCS M J Sobre a morte e o morrer a reumanização de um processo In Educação para a morte temas e reflexões São Paulo Casa do Psicólogo 2012 p 79146 MOURA M D Urgência subjetiva e tempo o que é isto In Org Psicanálise e hospital 3 tempo e morte da urgência ao ato analítico 3 ed Rio de Janeiro Revinter 2000 Urgência subjetiva e tempo o que é isto p1721 REZENDE V L et al Revisão crítica dos instrumentos utilizados para avaliar aspectos emocionais físicos e sociais do cuidador de pacientes com câncer na fase terminal da doença Revista Brasileira de Cancerologia Rio de Janeiro v 51 n 1 p 7987 2005 ROMANO B W A tarefa do psicólogo na instituição hospitalar In Princípios para a prática da psicologia clínica em hospitais São Paulo Casa do Psicólogo 1999 p 2533 101 VEIT M T CARVALHO V A Psicooncologia um novo olhar para o câncer O Mundo da saúde São Paulo v 35 n 4 p 526530 2010 VOLKER D L WU H L Cancer patients preferences for control at the end of life Qualitative health research Newbury Park v 21 n 12 p 16181631 2011 WARRÉN STOMBERG M Guest at hospice time for consideration The American journal of hospice palliative care Weston v 26 n 4 p 277280 2009 WISE M MARCHAND L Living fully in the shadow of mortal time psychosocial assets in advanced cancer Journal of palliative care Toronto v 29 n 2 p 7682 2013 ZINN G R GUTIERREZ B A O Processo de envelhecimento e sua relação com a morte percepção do idoso hospitalizado em unidade de cuidados semiintensivos Estudos interdisciplinares sobre o envelhecimento Porto Alegre v 13 n 1 p 7993 2008 Empty Image Capítulo 10 IMPACTO PSICOLÓGICO NA SÍNDROME DE LIFRAUMENI MECANISMOS DE DEFESA E ESTRATÉGIAS DE COPING Empty Image 105 A Síndrome de LiFraumeni SLF é rara de predisposição ao câncer e apresenta associação com um grande espectro de tumores em idade precoce VARLEY 2003 Embora a SLF seja considerada rara é bastante frequente na população brasileira em função de uma mutação germinativa no gene TP53 a pR337H ACHATZ et al 2007 Estimase que 03 da população do Sul e do Sudeste do Brasil apresente essa mutação PALMERO et al 2008 Os tumores mais frequentemente encontrados na SLF e em sua variação LiFraumeni Like LFL são sarcomas de partes moles tumores de mama sarcomas ósseos tumores do Sistema Nervoso Central SNC tumores adrenocorticais e leucemia LI et al 1988 Os critérios diagnósticos da SLF são sarcoma na infância ou em idade jovem antes dos 45 anos e parente de primeiro grau com qualquer câncer em idade jovem antes dos 45 anos e parente de primeiro ou segundo graus que tenha o diagnóstico de câncer em idade jovem antes dos 45 anos ou sarcoma em qualquer idade BIRCH et al1994 Em muitas síndromes hereditárias relacionadas ao câncer os aspectos psicológicos ainda são pouco estudados Entre essas síndromes a SLF merece atenção especial por ter como principal característica a elevada ocorrência de tumores diagnosticados em idade precoce BIRCH et al 2001 Em função da complexidade dessa síndrome avaliouse o impacto psicológico dentro da subjetividade com que cada paciente vivenciou a experiência de realizar um teste genético Sendo assim a avaliação dos mecanismos de defesa e das estratégias de coping auxiliaram no entendimento do universo psíquico desses pacientes O estudo avaliou como os pacientes submetidos ao teste genético lidaram com esse momento considerando que se trata de um evento de vida significativo e que apresenta um resultado irreversível A partir dos conceitos dos mecanismos de defesa do ego e do coping procurouse compreender como os pacientes que realizaram o teste genético para SLF enfrentaram essa situação nesse contexto O termo defesa aparece pela primeira vez em 1894 no artigo escrito por Sigmund Freud As Neuropsicoses de Defesa A partir de Estudos sobre a Histeria 1895 esse termo passou a ser utilizado em seus artigos posteriores com o propósito de delinear a luta do ego contra idéias ou afetos dolorosos ou insuportáveis FREUD 1966 apud ANDREWS SINGH BOND et al 1993 p 246 Acreditase que o conceito de mecanismo de defesa do ego conservase como um dos mais importantes que a psicanálise ofereceu à medicina VAILLANT 1971 Observou se que os mecanismos de defesa são processos reguladores involuntários que permitem aos indivíduos uma minimização de mudanças repentinas tanto internamente quanto externamente modificando a maneira como esses eventos são percebidos VAILLANT 1994 Já o coping é definido como os esforços cognitivos e comportamentais constantemente alteráveis para controlar vencer tolerar ou reduzir demandas internas ou externas específicas que são avaliadas como excedendo ou fatigando os recursos da pessoa LAZARUS FOLKMAN 1984 apud SAVOIA 1999 p 58 Neste estudo foram avaliados 35 pacientes submetidos ao teste genético para SLF no Departamento de Oncogenética do AC Camargo Cancer Center O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Fundação Antônio Prudente AC Camargo Cancer Center nº 97407 Os pacientes foram divididos em dois grupos presença ou ausência de mutação Todos os pacientes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido TCLE Foram aplicadas duas escalas Defense Style Questionnaire DSQ40 e Coping O DSQ40 é um instrumento com 40 perguntas que apresentam relação com as defesas descritas no Manual 106 de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais DSMIIIR No DSQ40 as defesas estão divididas em três fatores fator maduro sublimação humor antecipação e supressão fator neurótico anulação pseudoaltruísmo idealização e formação reativa e fator imaturo projeção agressão passiva atuação isolamento desvalorização fantasia autista negação deslocamento dissociação clivagem racionalização e somatização O DSQ40 foi traduzido para o português com permissão do autor por BLAYA et al 2004 O Inventário de Estratégias de Coping é um instrumento elaborado por Folkman e Lazarus 1985 e citado por Antoniazzi Dellaglio e Bandeira 1998 p 275 É composto por 66 itens que reúnem pensamentos e ações utilizados pelos indivíduos para lidar com demandas internas ou externas de um fato estressante específico A aplicação do questionário visa a avaliar o processo de elaboração do indivíduo frente a uma dada situação Os dados da escala fundamse em oito fatores confronto afastamento autocontrole suporte social aceitação de responsabilidade fuga e esquiva resolução de problemas e reavaliação positiva O instrumento foi traduzido e validado para a população brasileira SAVOIA 1999 Na Tabela 1 observase que em relação às defesas específicas de cada fator do DSQ40 maduro neurótico e imaturo foi verificada diferença entre os grupos no fator maduro especificamente na defesa humor tendo o grupo com resultado positivo apresentado valor significativamente maior desse escore quando comparado ao grupo com resultado negativo Tabela 1 Valores de média desviopadrão DP mínimo e máximo e quartis das classificações do fator maduro Classificação Teste No Média DP Mínimo Máximo P25 Mediana P75 p Humor Negativo 21 1000 490 200 1700 500 1100 1450 0040 Positivo 14 1329 393 500 1800 1050 1400 1625 Supressão Negativo 21 971 523 200 1700 450 900 1500 0516 Positivo 14 1079 471 200 1800 875 1000 1450 Antecipação Negativo 21 1219 517 200 1800 900 1400 1650 0210 Positivo 14 979 484 400 1800 550 1000 1350 Sublimação Negativo 21 1319 403 200 1800 1000 1400 1700 0127 Positivo 14 1071 471 300 1800 600 1050 1450 Racionalização Negativo 21 1067 392 400 1800 850 1000 1450 0396 Positivo 14 1157 316 600 1700 975 1100 1500 Nível descritivo de probabilidade do teste não paramétrico de MannWhitney A Tabela 2 apresenta o fator neurótico do DSQ40 no qual se observa que os grupos apresentam diversidade na defesa anulação O grupo com resultado negativo apresenta valor significativamente maior desse recurso 0004 quando comparado ao grupo com resultado positivo Na defesa altruísmo obtevese um resultado tendendo à significância para os pacientes com resultado do teste negativo 0071 107 Tabela 2 Valores de média DP mínimo e máximo e quartis das classificações do fator neurótico Classificação Teste No Média DP Mínimo Máximo P25 Mediana P75 p Formação reativa Negativo 21 967 533 200 1800 500 900 1450 0630 Positivo 14 1050 440 200 1600 800 1100 1400 Altruísmo Negativo 21 1124 460 300 1800 750 1000 1550 0071 Positivo 14 1400 440 600 1800 1025 1500 1800 Anulação Negativo 21 1171 540 200 1800 900 1300 1650 0004 Positivo 14 636 377 200 1400 300 500 1000 Idealização Negativo 21 690 452 200 1600 250 600 900 0495 Positivo 14 750 311 300 1300 475 750 1025 Nível descritivo de probabilidade do teste não paramétrico de MannWhitney A Tabela 3 descreve o fator imaturo do DSQ40 Observouse diferença entre os grupos na defesa actingout tendo o grupo com resultado negativo apresentado valor significativamente maior desse escore quando comparado ao grupo com resultado positivo 0016 Verificouse que o grupo com resultado negativo apresentou valores maiores para a defesa projeção tendendo à significância Tabela 3 Valores de média DP mínimo e máximo e quartis das classificações do fator imaturo Classificação Teste No Média DP Mínimo Máximo P25 Mediana P75 p Isolamento Negativo 20 825 389 200 1400 525 850 1100 0823 Positivo 14 893 525 200 1800 375 850 1200 Projeção Negativo 21 538 439 200 1600 200 300 800 0089 Positivo 14 307 213 200 800 200 200 300 Fantasia Negativo 21 743 459 200 1800 350 800 900 0210 Positivo 14 579 432 200 1800 275 500 725 Agressão passiva Negativo 21 595 392 200 1400 200 600 900 0235 Positivo 14 407 198 200 700 200 400 600 Actingout Negativo 21 1005 476 200 1800 800 1000 1350 0016 Positivo 14 614 313 200 1000 300 600 1000 Deslocamento Negativo 21 781 494 100 1800 200 1000 1150 0278 Positivo 14 586 386 200 1000 200 450 1000 Negação Negativo 21 710 388 200 1500 350 700 1000 0778 Positivo 14 679 364 200 1600 450 600 900 Clivagem Negativo 21 733 353 200 1400 350 800 1000 0881 Positivo 14 757 367 200 1400 450 700 1025 Somatização Negativo 21 952 584 200 1800 350 1000 1500 0145 Positivo 14 657 418 100 1400 275 750 1000 Dissociação Negativo 21 767 344 200 1400 550 800 1100 0414 Positivo 14 879 364 200 1600 600 850 1125 Desvalorização Negativo 21 629 326 200 1400 350 600 800 0175 Positivo 14 471 255 200 1000 200 450 625 Nível descritivo de probabilidade do teste não paramétrico de MannWhitney A Tabela 4 indica a relação entre os fatores gerais do DSQ40 de acordo com o resultado do teste genético Não foram encontradas diferenças entre os dois grupos em relação às defesas 108 Tabela 4 Valores de média DP mínimo e máximo e quartis das defesas Fator Teste No Média DP Mínimo Máximo P25 Mediana P75 p Maduro Negativo 21 1115 284 580 1660 870 1160 1360 0960 Positivo 14 1119 212 800 1500 965 1070 1325 Neurótico Negativo 21 988 316 325 1525 700 1050 1213 0907 Positivo 14 1018 296 550 1650 794 963 1231 Imaturo Negativo 21 749 206 418 1109 582 781 914 0061 Positivo 14 620 124 454 854 523 600 691 Nível descritivo de probabilidade do teste não paramétrico de MannWhitney A Tabela 5 evidencia que não houve diferença na comparação dos dois grupos em relação aos oito fatores avaliados no coping Tabela 5 Valores de média DP mínimo e máximo e quartis dos fatores do coping Fator Teste No Média DP Mínimo Máximo P25 Mediana P75 p Confronto Negativo 20 310 245 000 800 100 300 500 0907 Positivo 14 321 304 000 900 100 250 625 Afastamento Negativo 21 500 326 100 1400 250 400 700 0474 Positivo 14 593 379 000 1300 300 600 750 Autocontrole Negativo 21 786 323 300 1500 600 700 950 0803 Positivo 14 721 176 300 900 600 750 900 Suporte social Negativo 21 838 410 100 1500 500 900 1150 0960 Positivo 14 843 584 100 1700 275 1000 1275 Aceitação de responsabilidade Negativo 21 481 420 000 1400 200 300 900 0934 Positivo 14 457 350 000 1000 150 450 800 Fuga e esquiva Negativo 21 233 206 000 600 100 200 400 0377 Positivo 14 157 145 000 500 000 150 225 Resolução de problemas Negativo 21 610 367 000 1200 300 600 950 0778 Positivo 14 636 313 000 1100 400 650 925 Reavaliação positiva Negativo 21 1157 515 600 2400 650 1000 1550 0293 Positivo 14 1329 619 000 2300 950 1400 1800 Nível descritivo de probabilidade do teste não paramétrico de MannWhitney Neste trabalho o grupo com resultado negativo utilizou predominantemente duas defesas sendo uma do fator imaturo actingout e a outra do fator neurótico anulação enquanto o grupo positivo utilizouse predominantemente de uma defesa do fator maduro humor Os pacientes com resultado do teste negativo apresentaram tendência a utilizar defesas mais primitivas e podem ter se sentido destituídos em relação à imagem que têm de si próprios e ameaçados na sua integridade psíquica uma vez que essas defesas também podem ser utilizadas na regulação da autoestima Essa classe de defesas também pode voltar a ser utilizada quando o indivíduo adulto está sob condição de estresse agudo BLAYA et al 2003 e devese levar em conta que o evento teste genético apesar do resultado negativo foi entendido como condição estressante Esse achado levou à conclusão de que um resultado negativo que poderia ser considerado um alívio não foi suficiente para aplacar o efeito da vivência dessa condição A utilização da defesa actingout pode estar nesse grupo a serviço de manter afastada do consciente a ideia inicial que era a probabilidade real de ser um paciente de alto risco Podese 109 levantar a hipótese de que a sua utilização pôde tentar mascarar uma culpa pela negatividade do teste Essa defesa remete à ideia de que os conflitos emocionais são substituídos por uma atuação não permitindo que aconteça uma reflexão eou uma manifestação de sentimentos o que mostra a dificuldade que esses pacientes encontraram em elaborar seus resultados apesar de terem sido satisfatórios Os indivíduos que são submetidos ao teste genético podem rejeitar defensivamente qualquer informação a respeito do risco genético até mesmo quando apresentam baixo risco ETCHEGARY PERRIER 2007 No contexto do aconselhamento genético AG a motivação defensiva pode ser alta pois a visão de si como indivíduo saudável e capaz está sendo ameaçada STEELE 1988 apud ETCHEGARY PERRIER 2007 Em relação à defesa anulação na teoria psicanalítica a anulação é o mecanismo pelo qual o indivíduo se esforça por fazer com que pensamentos palavras gestos e atos passados não tenham acontecido LAPLANCHE PONTALIS 1988 p 62 O fato de o grupo com resultado positivo ter se utilizado mais frequentemente da defesa humor fator maduro evidenciou que se evita um desconforto ainda maior adotando uma postura mais tênue em relação ao problema Para a defesa altruísmo encontrase uma tendência à significância para a associação com o grupo com resultado positivo o que remete a pensar que esses pacientes tenderiam a se defender da dor de serem portadores da mutação dedicandose ao outro e dessa forma buscando gratificação e deslocando o foco da sua preocupação As decisões sob o risco genético são motivadas por percepções de responsabilidade em relação aos outros membros da família ETCHEGARY FOWLER 2006 apud ETCHEGARY PERRIER 2007 Os dois grupos de pacientes não apresentaram diferenças significativas com relação ao coping o que pode sugerir que a realização do teste genético para SLF mobilize conflitos presentes em níveis mais profundos e não aqueles comportamentais e cognitivos A importância de ter avaliado os mecanismos de defesa e de coping nessa população foi compreender que a realização de um teste genético é um procedimento que pode gerar conflitos psíquicos independentemente do resultado Um resultado negativo pode ser igual ou mais conflituoso do que um resultado positivo Considerações finais Cada vez mais percebese um crescente movimento em torno das síndromes hereditárias de suscetibilidade ao câncer no intuito de promover programas efetivos de rastreamento e opções de conduta médicas Dentro desse contexto fazse necessário também um entendimento dos aspectos psíquicos de enfrentamento desses pacientes diante das situações relacionadas ao câncer hereditário ao aconselhamento genético e ao teste genético O psicólogo inserido no universo da oncogenética tem a oportunidade de atuar de forma direta na busca do entendimento da vivência desse paciente nesse contexto tão específico e particular que é o estudo da família no que diz respeito às experiências de câncer da família assim como à experiência de viver com risco aumentado para o câncer assunto delicado que pode gerar ansiedade medo culpa e até mesmo depressão A atuação do psicólogo nesse momento pode contribuir para um melhor entendimento desse universo ainda tão novo e assim diminuir a sobrecarga psíquica presente na possibilidade do desenvolvimento de um tumor 110 A importância da escuta para esses pacientes está principalmente na compreensão adequada da repercussão psíquica da realização de um teste genético e do quanto o resultado do teste pode refletir em vários segmentos da vida do paciente Para compreensão adequada de como esses pacientes recebem e convivem com seus resultados do teste genético do ponto de vista psíquico fazse necessária a presença de um psicólogo com experiência em oncogenética para acompanhálos de maneira a fornecer um suporte emocional adequado em um momento peculiar da vida Os conflitos gerados pela realização de um teste genético podem ocupar um lugar profundo na mente do indivíduo atingindo níveis intensos No intuito de compreender como evolui a resposta psicológica desde o momento préteste genético até o momento pósteste considerouse ser importante avaliar esses pacientes e poder cada vez mais aprimorar a escuta de modo a que o psicoterapeuta possa trabalhar com seu paciente os aspectos relevantes para ele nesse momento e a dar forma à repercussão psíquica de um aconselhamento e um teste genético Desse modo a atuação do psicólogo nesse contexto a partir da percepção das reações emocionais desses pacientes poderá proporcionar um trabalho de acolhimento e de facilitação em lidar com possíveis fatos potencialmente estressores inerentes a esse momento da vida do paciente e de sua família Acreditase que ao atuar nesse universo novo relevante e que oferece possibilidades aos pacientes que têm em sua história familiar o câncer presente de modo tão marcante fará cada vez mais parte da atuação do psicólogo que atua no hospital e sendo assim tornamse cada vez mais importante promover pesquisas do ponto de vista psicológico nessa área 111 Referências ACHATZ M I W et al The TP53 mutation R337H is associated with LiFraumeni and Li Fraumeni Like syndromes in Brazilian families Cancer letters Amsterdam v 245 n 12 p 96 102 2007 ANDREWS G SINGH M BOND M The defense style questionnaire The Journal of nervous and mental disease Baltimore v 181 n 4 p 246256 1993 ANTONIAZZI A S DELLAGLIO D D BANDEIRA D R O conceito de Coping uma revisão teórica Estudos de Psicologia Natal v 3 n 2 p 273294 1998 BIRCH J M et al Prevalence and diversity of constitutional mutations in the p53 gene among 21 LiFraumeni families Cancer research Chicago v 54 n 5 p 12981304 1994 Relative frequency and morphology of cancers in carriers of germline TP53 mutations Oncogene Basingstoke v 20 n 34 p 46214628 2001 BLAYA C et al Mecanismos de defesa uso do Defensive Style Questionnaire Revista brasileira de psicoterapia Porto Alegre v 5 n 1 p 6780 2003 Versão em português do Defense Style Questionaire DSQ 40 para avaliação dos mecanismos de defesa um estudo preliminar Revista Brasileira de Psiquiatria São Paulo v 26 n 4 p 255258 2004 ETCHEGARY H PERRIER C Information processing in the context of genetic risk implications for geneticrisk communication Journal of genetic counseling New York v 16 n 4 p 419432 2007 LAPLANCHE J PONTALIS J B Vocabulário da psicanálise 10 ed São Paulo Martins Fontes 1988 LI F P et al A cancer family syndrome in twentyfour kindreds Cancer research Chicago v 48 n 18 p 53585362 1988 PALMERO E I et al Detection of R337H a germline TP53 mutation predisposing to multiple cancers in asymptomatic women participating in a breast cancer sceening program in Southern Brazil Cancer letters Amsterdam v 261 n 1 p 2125 2008 SAVOIA M G Escalas de eventos vitais e de estratégias de enfrentamento Coping Archives of clinical psychiatry São Paulo v 26 n 2 p 5767 1999 VAILLANT G E Ego mechanisms of defense and personality psychopathology Journal of abnormal psychology Washington v 103 n 1 p 4450 1994 Theoretical hierarchy of adaptive ego mechanisms Archives of general psychiatry Chicago v 24 n 2 p 107118 1971 VARLEY J M Germline TP53 mutations and LiFraumeni syndrome Human mutation New York v 21 n 3 p 313320 2003 Constitution of India Capítulo 11 O TEMPO NA CLÍNICA DE CABEÇA E PESCOÇO PRODUÇÃO DE SUBJETIVIDADE SINGULARIDADE E POLÍTICA Chapter3 115 Cântico II Fazete sem limites no tempo Vê a tua vida em todas as origens Em todas as existências Em todas as mortes E sabes que serás assim para sempre Não queiras marcar a tua passagem Ela prossegue É a passagem que se continua É a tua eternidade És tu Cecília Meireles O presente capítulo tem como objetivo levantar algumas questões sobre tempo produção de subjetividade e singularidade no trabalho desenvolvido pelo serviço social em uma enfermaria de Cabeça e Pescoço para tratamento de pessoas com câncer Para a problematização das questões abordadas o referencial teórico utilizado serão as análises de autores da filosofia da diferença tendo como metodologia a pesquisaintervenção em que a problematização parte das experiências vivenciadas pelo pesquisador Atuar na oncologia angústias e questionamentos A atuação em um hospital público de referência para tratamento de pessoas com câncer inicialmente na clínica especializada em câncer de mama e as questões relacionadas ao luto ao sofrimento diante do adoecimento ao medo da morte entre outras suscitam angústias e reflexões sobre o papel do assistente social na oncologia sobre o modo como muitas vezes esse profissional lida com o sofrimento diante de sua atribuição específica qual seja defender direitos O questionamento à lógica da lei foi produzido principalmente a partir do entendimento da importância do diferir como aponta Passetti 2012 p 81 aquele que difere busca uma relação própria com outro igual na atitude rompedora com condutas Neste exato instante por ouvir e partilhar eles diferem de maiorias e minorias numéricas afirmando rompimento com o fixo Nesse contexto diferir é também resistir resistência nesse sentido é assumida como postura ética que pergunta mais que afirma ZANELA FURTADO 2012 p 207 Nesse sentido ao mesmo tempo em que tais direitos iguais devem ser defendidos no cotidiano o profissional de saúde sempre está diante de uma pessoa que demanda ser abordada de modo singular e compreendida em suas diferenças A padronização dos direitos nesse sentido quase sempre parece conflitar com o respeito à singularidade de cada um e com a necessidade que temos de diferir resistir diferenciar e singularizar as relações cotidianas Para Toneli Adrião e Cabral 2012 p 210 a lógica da singularização é a lógica das intensidades enquanto a lógica da lei parece ser a da normalização das condutas 116 Posteriormente na atuação na Pediatria foi possível perceber que os temas e dificuldades cotidianas que atravessam o dia a dia do assistente social ao atender pessoas com câncer de mama também perpassam a rotina dos profissionais dessa clínica as expectativas e os desafios relacionados à cura da doença os conflitos e as dificuldades vivenciados pelas famílias a relação entre sofrimento e judicialização da vida entre outros Assim na pediatria a lógica da lei muitas vezes também não corresponde aos desejos e ao tempo de crianças adolescentes e famílias em tratamento pois singularizar é inventar novas possibilidades de vida novas modalidades de se agregar de trabalhar de criar sentido de criar dispositivos de valorização e autovalorização dentro da megamáquina de produção de subjetividade capitalística PELBART 2003 p21 apud TONELI ADRIÃO CABRAL 2012 p 209 Tempo e produção de subjetividade na clínica de Cabeça e Pescoço Para Guattari e Rolnik 1985 a subjetividade é essencialmente fabricada e modelada no registro do social Os autores afirmam que a ideologia não permite compreender a função literalmente produtiva da subjetividade pois a ideologia permanece na esfera da representação enquanto a produção de subjetividade não é apenas representação mas uma modelização que diz respeito aos comportamentos à sensibilidade à percepção à memória às relações sociais etc No entanto diferente da produção de uma subjetividade modelizada há a possibilidade de uma singularização nas relações cotidianas ou seja de que as pessoas sejam compreendidas e respeitadas em suas diferenças Para Machado 1999 a singularidade pode ser compreendida como expressõesemnós da história de nossa época p214 Porém para a autora a singularidade não pode ser entendida como uma essência já que cada um de nós tem uma história de vida que é singular mas que não é interior MACHADO 1999 p214 Assim a singularidade não se restringe ao individual mas está relacionada a uma produção social e histórica Na clínica de Cabeça e Pescoço além das dificuldades descritas anteriormente percebeuse que o principal motivo do sofrimento dos usuários parecia estar relacionado ao longo tempo de espera para o tratamento que muitas vezes ocasionava a mutilação do rosto ou a perda de partes importantes Com isso algumas pessoas chegavam até mesmo a perder o nariz ou ter toda a sua boca destruída pela doença Muitas vezes eram pessoas pobres não alfabetizadas algumas sem família que permaneciam meses na fila de espera aguardando para o atendimento Assim a angústia extrema das pessoas em tratamento e de suas famílias levantava questionamentos como atuar em um contexto de tanta dor sem compreender a importância da urgência nessa clínica Como atuar garantindo direitos instituídos sem priorizar a importância do acesso e do tempo para as pessoas doentes Como fazer do direito algo que não se restrinja a orientações padronizadas do serviço social de modo instituído burocrático e institucional apenas Como lutar no cotidiano por um direito que se mostra necessário e urgente para quem vive o adoecimento na clínica de Cabeça e Pescoço qual seja o direito de não perder o seu rosto Como respeitar a singularidade mesmo diante da necessária igualdade e seus direitos iguais Quais subjetividades são produzidas pela política de saúde atualmente e como elas são atravessadas pelo tempo nessa clínica 117 Justiça Sistema Nacional de Regulação e atuação do assistente social na clínica de Cabeça e Pescoço algumas reflexões sobre tempo política e subjetividade És um senhor tão bonito Quanto a cara do meu filho Tempo tempo tempo tempo Vou te fazer um pedido Tempo tempo tempo tempo Caetano Veloso Oração ao tempo Neste trabalho não se compreende o tempo como duração mas como fluxo o ser é o tempo cronológico linear e sequencial O devir é um outro tempo Tudo em fluxo FRAJMAN 2014 p 42 Assim o tema em questão é analisado a partir do entendimento de que o tempo está relacionado ao instante que ao mesmo tempo se faz e se desfaz não havendo uma sequência linear que o afirme como algo fixo padronizado e imutável tanto para as pessoas que se encontram doentes e demandando por atendimento na clínica Cabeça e Pescoço quanto para os profissionais que lá atuam Nesse devir nessa mudança e nesse movimento constante que é o tempo singular para cada um sempre relacionado a uma produção histórica e social o adoecimento muitas vezes emerge em um contexto em que a demanda por cuidados clínicos somase a outras demandas também urgentes por afeto apoio e recursos materiais Por outro lado as políticas são padronizadas criadas e afirmadas de modo igual para todos muitas vezes desconsiderando singularidades e desejos oferecendo direitos iguais e tratamento igual para pessoas também consideradas iguais Sobre isso Nietzsche 2007 aponta que A intenção que visa aos direitos iguais e enfim às necessidades iguais quase uma consequência inevitável da nossa forma de civilização mercantil e da igualdade de valor político dos sufrágios leva à exclusão e ao lento desaparecimento dos homens superiores mais perigosos mais singulares e em suma mais novos o fato de experimentar por assim dizer cessa e um certo estado de estagnação é alcançado NIETZSCHE 2007 p 184 No entanto há muitas histórias de vida singulares e diferentes umas das outras a serem levadas em consideração no processo de tratamento e cura da doença Desconsiderando tais diferenças a política de saúde hoje instituída afirma que o acesso ao tratamento oncológico deve respeitar a fila de vagas de pessoas cadastradas no Sistema Nacional de Regulação Sisreg Pessoas que para esse sistema parecem não ter história e peculiaridades tornandose mais um número em um cadastro que entrará na próxima estatística Tal indiferenciação faz com que os pacientes sejam tratados de modo igual sem considerar até mesmo a particularidade de sua situação clínica gerando perdas e muita dor para os usuários e suas famílias 118 Esse sistema foi implementado pelo Ministério da Saúde segundo notícia publicada no site do INCA em 24 de julho de 2013 para administrar as vagas disponíveis e verificar a instituição mais adequada para cada paciente Para isso serão considerados critérios como regionalidade proximidade com a casa do usuário e complexidade de cada caso7 Embora seja constantemente afirmado que o Sisreg foi implementado na oncologia como uma forma de organizar o acesso ao tratamento observase que tal sistema na clínica de Cabeça e Pescoço tem sido prejudicial diante da gravidade e delicadeza de muitas situações A espera para o tratamento nessa clínica via Sisreg iniciouse no INCA no ano de 2013 Em um período anterior a esse as pessoas podiam por sua própria vontade e necessidade buscar o tratamento em hospital especializado No entanto atualmente são orientadas a aguardar na fila de espera o que pode levar meses ocasionando um enorme sofrimento às pessoas doentes e suas famílias ou até mesmo a morte Assim foi observado que enquanto muitos usuários esperavam sem possibilidade de pagar por um tratamento a doença ia se agravando diminuindo a chance de cura e destruindo grande parte do rosto ou pescoço Tais dificuldades produziam um sofrimento intenso para essas pessoas tornandose um grande desafio atuar nessa clínica pois além do problema do acesso outros se apresentavam também de modo recorrente as famílias que muitas vezes distanciavamse das pessoas doentes por conflitos familiares relacionados ao uso de álcool ou drogas situação de ausência de moradia e renda e até mesmo conflitos envolvendo violência entre outros Tempo e sofrimento na clínica de Cabeça e Pescoço a dor da espera Dizia o poeta Vinicius de Moraes Ai quem me dera terminasse a espera E retornasse o canto simples e sem fim E ouvindo o canto se chorasse tanto Que do mundo o pranto se estancasse enfim8 A subjetividade produzida pela política de saúde atualmente é a daquele que deve esperar ter paciência ignorar a urgência de sua dor esquecer que o não acesso a um tratamento imediato pode significar a perda de seu rosto e a morte Enfim esperase que o paciente cumpra o seu dever qual seja ser paciente e esperar Com isso após o cadastro no Sisreg cabe aguardar ser chamado para o atendimento especializado Algumas pessoas e suas famílias ao longo da internação hospitalar relatam o comparecimento em hospitais públicos implorando o atendimento que não ocorreu pois apesar da mutilação na cabeça ou no pescoço deveriam aguardar na fila Nesse caso aqueles que são orientados sobre judicialização acionam a justiça para iniciar o tratamento Os que não possuem tal informação chegam ao hospital muitas vezes com seu rosto muito destruído ou já falecendo A questão do tempo atravessa a clínica de Cabeça e Pescoço de modo intenso e parece que o tempo da pessoa que aguarda para atendimento não é compatível com o tempo de acesso disponibilizado ao tratamento pela política de saúde Se a pessoa doente demanda urgentemente por cuidados diagnósticos e acompanhamento os serviços de saúde parecem não compartilhar 7 Disponível em httpwww2incagovbrwpswcmconnectagencianoticiassitehomenoticias2013novas regrasparaprimeiraavaliacaoinca Acesso em 03 jun 2015 8 Poesia Ai quem me dera de Vinicius de Moraes 1976 119 dessa mesma urgência diversas vezes até mesmo classificando as pessoas que demonstram impaciência como rebeldes maleducadas agressivas etc Nesse contexto não se valoriza a coragem e a força dos usuários que se tratam nessa clínica e de suas famílias força essa que os faz enfrentar muitos obstáculos para acessar o tratamento e dar continuidade a ele enfrentando também a demora perante sua necessidade de urgência e as consequências que tal demora ocasiona em seu corpo e em sua vida Nesse sentido o tempo como fluxo para o usuário da clínica de Cabeça e Pescoço o coloca diante de seus próprios desafios e sofrimentos os desafios no lidar com o adoecimento o sofrimento de estar em um hospital que muitas vezes o normaliza enquadrando e padronizando suas angústias onde sua urgência por vezes não é compreendida ou considerada nem para acesso ao tratamento nem para a sua continuidade Desse modo entendese que a atuação do serviço social nessa clínica deve considerar principalmente esse direito o direito à diferença à singularidade da pessoa e do adoecimento à urgência do tratamento o respeito ao direito de cada um ser cada um ou seja o direito ao tempo como possibilidade de resistir diferir e existir para além das normas leis e padronizações 120 Referências FRAJMAN D Prelúdio a uma psicanálise do futuro Freud e Nietzsche Rio de Janeiro Verve 2014 GUATTARI F ROLNIK S Micropolítica cartografias do desejo Petrópolis Vozes 1985 INSTITUTO NACIONAL DO CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA Novas regras para primeira avaliação em seis serviços no INCA Disponível em httpwww2incagovbr wpswcmconnectagencianoticiassitehomenoticias2013novasregrasparaprimeira avaliacaoinca Acesso em 15 mar 2015 MACHADO L D Subjetividades Contemporâneas In BARROS M E B Org Psicologia questões contemporâneas Vitória EDUFES 1999 p 211229 NIETZSCHE F Escritos sobre política Rio de Janeiro PUCRio São Paulo Loyola 2007 PASSETTI E Diferir In FONSECA T NASCIMENTO M L MARASCHIN C Org Pesquisar na diferença um abecedário Porto Alegre Sulina 2012 p 8183 TONELI M J ADRIÃO K CABRAL A Singularizar In FONSECA T NASCIMENTO M L MARASCHIN C Org Pesquisar na diferença um abecedário Porto Alegre Sulina 2012 p 109111 ZANELLA A FURTADO J Resistir In FONSECA T NASCIMENTO M L MARASCHIN C Org Pesquisar na diferença um abecedário Porto Alegre Sulina 2012 p 207208 Capítulo 12 A COMPLEXIDADE DO CUIDADO NOS PACIENTES COM ESTOMA INTESTINAL PROVISÓRIO POR CÂNCER COLORRETAL and conduct of all elections to the Panchayats and Urban Local Bodies The Commission has conducted elections to Panchayats and Urban Local Bodies in 1995 2000 2005 and 2012 The Commissions role is highly appreciated by all political parties in the state and the general public as well The Commission has framed a Code of Conduct for political parties and candidates during the elections which has helped in efficient conduct of elections 123 Introdução Este capítulo resulta da vivência no atendimento a pacientes com estoma intestinal provisório em decorrência de câncer colorretal A complexidade no cuidar dessa clientela não remete à complexidade tecnológica mas a de cuidados que envolvem uma complexidade que não é apenas a de risco mas a simples a do caos a da incerteza visto que cuidar do outro significa estar com o outro valorizando sentimentos e desafios vividos por essa pessoa demonstrando consideração e sensibilidade FIGUEIREDO MACHADO 2002 SANTIAGO SILVA TONINI 2002 O câncer colorretal é uma das doenças malignas mais comuns em todo mundo Nos últimos anos sua incidência parece ter atingido um patamar nas áreas de alto risco e parece aumentar nas áreas antes consideradas de baixo risco supõese que isso se deva ao envelhecimento das populações à adoção de estilos de vida com tendência mais sedentária e a um aumento na preferência e na aceitação de dietas mais saudáveis FRANCO FRANCO 2004 Representa um importante problema de saúde pública em todo mundo No Brasil é o terceiro câncer mais prevalente em homens depois de próstata e traqueia brônquios e pulmões e também o terceiro câncer mais prevalente em mulheres depois de mama e colo de útero excluídos os casos de pele não melanoma INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA 2014 Apesar de o rastreamento do câncer colorretal ser eficaz e viável do ponto de vista econômico sua aplicação não é disseminada e 85 dos tumores ainda são diagnosticados em estádio avançado durante investigação de pacientes sintomáticos AVERBACH BORGES 2004 O estadiamento do câncer colorretal é primordial para avaliação da extensão da doença planejamento terapêutico prognóstico e avaliação dos resultados do tratamento Esse pode ser clínico ou cirúrgico dependendo dos dados a serem fornecidos em bases clínicas operatórias ou exame histopatológico CASTRO et al 2005 Nas últimas décadas a abordagem terapêutica do câncer colorretal ganhou configuração multidisciplinar Contudo a cirurgia continua sendo a única forma de tratamento potencialmente curativo para portadores dessa neoplasia No câncer de reto a radioterapia préoperatória isolada ou combinada à quimioterapia tem sido empregada de forma crescente nos últimos anos propiciando com isso a ressecabilidade em tumores irressecáveis o que aumenta as chances de preservação esfincteriana CUTAIT COTTI 2004 FERRIGNO DAVID FILHO 2004 Mesmo que o estoma intestinal seja provisório acarreta alteração na vida do indivíduo nos aspectos psicoemocionais pela alteração da imagem corporal e da autoestima Ainda faz com que o paciente tenha de lidar e aprender a cuidarse no cuidado com o estoma e no manuseio do equipamento coletor Da vivência profissional no atendimento a pacientes com estoma intestinal provisório em um hospital público de referência no atendimento oncológico percebeuse que suas dificuldades não se detinham somente à alteração em decorrência da estomia intestinal mas perfaziam também as sensações e as percepções do corpo como dor anal dificuldade para sentar eliminação de muco por via anal sensação evacuatória Percebeuse também que eles não estavam informados para essas modificações e percepções corporais o que contribuía para elevar a ansiedade e a aflição fazendo com que frequentemente procurassem atendimento de emergência ou solicitassem consulta médica extra 124 Por meio da observação clínica no cotidiano laborativo quando da primeira consulta ambulatorial no pósoperatório notavase que os pacientes nem sempre expressavam verbalmente seus sentimentos por temor vergonha medo mas era perceptível por meio da sua postura da expressão corporal e da expressão facial apresentavam as faces de desalento sofrimento Dificilmente estavam inseridos no seu autocuidado seja por estarem debilitados pela cirurgia não conseguirem se tocar não quererem olhar para o estoma seja pela justificativa de que era melhor outra pessoa fazer para realizar melhor os cuidados com o estoma Nesse sentido o trabalho tem como objetivos 1 descrever a experiência clínica no cuidado com pacientes com estoma intestinal provisório por câncer colorretal 2 refletir os aspectos psicossomáticos emergidos no processo de recuperação e 3 buscar formas de cuidado humanizado a essa clientela O paciente com câncer apresenta todo um conjunto de elementos psicossomáticos que possui grande transcendência para ele e para sua vida de relação Cada órgão ou segmento do ser humano tem assim uma conformação anatômica e uma função real e fisiológica interrelacionada com a totalidade Se pelo câncer ou pelo tratamento um órgão uma função ou o aspecto exterior for afetado ou perdido produzse uma fratura da capacidade de adaptação psicoemocional que é temida especialmente diante das exigências socioculturais reais ou supostas SCHALVENZÓN 2010 Toda modificação do funcionamento corporal ou da imagem corporal exige uma adaptação a esse novo não desejado nem buscado Essa modificação ou desadaptação transcorre como luto no campo dos afetos Essa aceitação forçada gera uma gama de possibilidades emocionais como desespero raiva irritação e angústia que em grande parte não são relatados a terceiros SCHALVENZÓN 2010 PENNA 2010 Metodologia Tratase de um relato de experiência no atendimento ao paciente com estomia intestinal provisória desenvolvido no período de dez anos em um ambulatório de enfermagem em estomaterapia O relato de experiência é um estudo que revela as ações do indivíduo como agente humano e como participante HANDEM et al 2007 As fontes deste estudo vieram da observação clínica do cotidiano profissional e dos registros de cirurgias realizadas no Serviço de Cirurgia Abdominopélvica nos quais se observou que em decorrência do desenvolvimento técnicocientífico no tratamento do câncer colorretal executamse mais cirurgias com preservação esfincteriana o que propicia a realização de estomas intestinais temporários A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa do INCA sob o nº 0008000711 Resultados Os resultados foram agrupados em duas temáticas I As ações educativas para o autocuidado temática na qual são abordados os seguintes tópicos 1 cuidar do estoma e da pele paraestomal mais troca e manuseio do equipamento coletor 2 orientar quanto à prevenção 125 da ocorrência de prolapso em especial quando o estoma for em alça evitando carregar peso protegendo o estoma com a mão ao tossir ou espirrar posição a assumir durante a atividade sexual quando os pacientes já manifestavam o desejo da prática sexual nas consultas subsequentes 3 esclarecer que a sensação evacuatória e a eliminação de muco por via anal são consideradas normais 4 esclarecer que a presença de muco sanguinolento por via anal em pequena quantidade é considerada normal nos pacientes que realizaram anastomose intestinal baixa nos primeiros dias após a cirurgia obs nos pacientes com estoma intestinal provisório por obstrução tumoral orientar a procura por emergência médica quando da presença de sangramento por via anal em quantidade expressiva 5 realizar higiene anal com cuidado e atentar quanto à prevenção de dermatite em função da eliminação de muco 6 orientar que o desconforto em região anal é previsível seja em razão da presença do tumor quando o paciente ainda aguarda cirurgia para ressecção seja no pósoperatório em razão do uso do grampeador para sutura mecânica da anastomose especialmente quando realizada anastomose ultrabaixa II Quanto à dimensão psicossomática referese à percepção das necessidades emocionais do paciente evidenciadas na sua subjetividade as quais influenciam na inserção no autocuidado O paciente chegava com o semblante triste sofrido desalentado pouco se expressava verbalmente demonstrava dificuldade no manejo do estoma e do equipamento coletor ou opunha obstáculos para não assumir o autocuidado Contudo com o decorrer das consultas subsequentes e na relação terapêutica notavase a retomada da autoestima evidenciada no seu modo de vestir andar conversar bem como no retorno às atividades diárias e no empoderamento do autocuidado A noção de que o câncer é um ente tem forma tamanho e necessita ser extraído por meio de uma intervenção cirúrgica para remover não só o tumor mas também as partes afetadas leva à correspondência entre câncer e mutilação O estigma de doença grave é motivo de sujeição aos preconceitos e encobrir a situação está presente no comportamento das pessoas A experiência de estar com câncer e de ter uma colostomia causa impactos e sofrimento em função dos valores e crenças presentes na sociedade Viver a experiência de portador de colostomia por câncer é confrontar os valores e as crenças do grupo com os valores e as crenças pessoais MARUYAMA ZAGO 2005 A pessoa ostomizada experimenta sentimentos que vão desde a revolta até a depressão podendo a reação e o comportamento manifestados variarem ao longo do tempo e de pessoa para pessoa Desse modo é essencial que os profissionais de saúde estejam atentos às reações dessas pessoas tendo em consideração todas as especificidades na prestação de cuidados de saúde CASCAIS MARTINI ALMEIDA 2007 Na pesquisa realizada por Barnabe e DellAcqua 2008 foi evidenciado que os ostomizados não vivem com o estoma no sentido de escolha mas convivem com ele Resgatase o potencial para conviver acrescentando sentido a essa realidade Portanto o estoma não faz parte do projeto de vida das pessoas mas nessa realidade elas foram conduzidas a modificar seus hábitos de vida e reolhar seus desejos e suas possibilidades Discussão Observouse que cada indivíduo tem suas dificuldades para adaptarse às mudanças corporais advindas da realização da ostomia intestinal e da cirurgia por câncer colorretal A 126 necessidade de interagir com essa clientela respeitando sua dor e seu luto pela perda de um órgão mesmo que temporariamente e pela alteração na sua imagem e no esquema corporal desmistificando o cuidado e direcionandoo a ter uma atitude positiva de enfrentamento foi evidenciada nas consultas subsequentes pois os pacientes retornavam mais participativos e comunicativos voltando gradativamente às suas atividades diárias O paciente com estoma intestinal provisório em função da cirurgia por câncer colorretal mantém a expectativa de que irá ficar com o estoma somente por um período de tempo que pode ser de 3 a 12 meses podendo esse período estenderse dependendo das condições clínicas do paciente e da avaliação médica Isso o conforta psicológica e emocionalmente no enfrentamento do convívio com o estoma apesar do impacto inicial significativo da alteração do esquema e da imagem corporal Observase que os trabalhos relacionados ao paciente com estoma intestinal são direcionados para o cuidado em geral com o estoma e para a maior preocupação com a clientela com estoma intestinal definitivo Não há uma discussão mais efetiva acerca do paciente com estoma intestinal provisório Notase que existe uma lacuna no que tange às ações educativas a esses pacientes relacionadas a alterações corporais em decorrência da cirurgia por neoplasia colorretal Considerações finais As ações educativas para o autocuidado não envolvem somente a prática instrumental e a técnica mas devem ser realizadas numa perspectiva humanizadora de acolhimento escuta e respeito ao paciente considerando a dimensão psicossomática que envolve a subjetividade e a complexidade do indivíduo com estoma intestinal por câncer colorretal sempre que se fizer necessário quando da consulta do paciente com os profissionais de saúde Fica evidente que a equipe interdisciplinar numa perspectiva transdisciplinar no atendimento ao paciente com estoma intestinal provisório decorrente de câncer colorretal deve atentar para as implicações das mudanças corporais considerando tais alterações no processo de adaptação do conviver diário do paciente com um estoma intestinal Assim sendo as ações educativas devem ser realizadas considerando o perfil socioeconômico cultural e emocional do paciente e suas particularidades e singularidades para que possam ser efetivas proporcionando realmente uma vida com qualidade 127 Referências AVERBACH M BORGES J L Diagnóstico de câncer colorretal In ROSSI B M et al Org Câncer de cólon reto e ânus São Paulo Lemar Tecnemedd 2004 p 321 BARNABE N C DELLACQUA M C Q Estratégias de enfrentamento coping de pessoas ostomizadas Revista LatinoAmericana de Enfermagem Ribeirão Preto v 16 n 4 p 712719 2008 CASCAIS A F M V MARTINI J G ALMEIDA P J S O impacto da ostomia no processo de viver humano Texto Contexto Enfermagem Florianópolis v 16 n 1 p 163167 2007 CASTRO L S et al Câncer colônico In CASTRO L S CORREA J H S Ed Tratamento cirúrgico do câncer gastrointestinal Rio de Janeiro Di Livros 2005 p32060 CASTRO L S et al Câncer de reto In CASTRO L S CORREA J H S Ed Tratamento cirúrgico do câncer gastrointestinal Rio de Janeiro Di Livros 2005 p 361416 CUTAIT R COTTI G C C Tratamento cirúrgico de câncer de colón ressecções clássicas In ROSSI B M et al Org Câncer de cólon reto e ânus São Paulo Lemar Tecnemedd 2004 p 20715 FERRIGNO R DAVID FILHO W J Radioterapia e quimioterapia préoperatória em câncer de reto In ROSSI B M et al Org Câncer de cólon reto e ânus São Paulo Lemar Tecnemedd 2004 p26473 FIGUEIREDO N M A MACHADO W C A Ecosofia e autopoise no cuidado com o Corpo In SANTOS I et al Org Enfermagem fundamental realidade questões e soluções São Paulo Atheneu 2002 Série Atualização em Enfermagem v 1 p 191210 FRANCO E D FRANCO E L Epidemiologia e fatores de risco em câncer colorretal In ROSSI B M et al Org Câncer de cólon reto e ânus São Paulo Lemar Tecnemedd 2004 p 121 HANDEM P C et al Metodologia interpretando autores In FIGUEIREDO N M A Método e metodologia na pesquisa científica 2 ed São Caetano do Sul Yendis 2007 p 89116 INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA Estimativa 2012 incidência de câncer no Brasil Rio de Janeiro 2011 MARUYAMA S A T ZAGO M M F O processo de adoecer do portador de colostomia por câncer Revista LatinoAmericana de Enfermagem Ribeirão Preto v 13 n 2 216222 2005 PENNA T L M Psicoterapia em instituições médicas In MELLO FILHO J BURD M Org Psicossomática hoje 2 ed Porto Alegre Artmed 2010 p 491496 SANTIAGO L C SILVA A N A C TONINI T Semiologiateorias e tecnologias dono cuidado com o corpo In SANTOS I et al Org Enfermagem fundamental realidade questões e soluções São Paulo Atheneu 2002 Série Atualização em Enfermagem v 1 p 22744 SCHALVENZÓN J Psicossomática e câncer In MELLO FILHO J BURD M Org Psicossomática hoje 2 ed Porto Alegre Artmed 2010 p 297309 STIPA S STIPA F ZIPARO V Tratamento cirúrgico de câncer de reto ressecção local In ROSSI B M et al Org Câncer de cólon reto e ânus São Paulo Lemar Tecnemedd 2004 p 27686 AZALEA 150M EXHIBITION Capítulo 13 VICISSITUDES DO ENCONTRO COM UM CORPO QUE É SINGULAR AZALEA 150M EXHIBITION OPEN HOUSE 27 FEB 2022 2PM 6PM 131 Tratase de um caminho feito de cores e de formas repleto de significado Este caminho às vezes é longo é cheio de obstáculos obrigando a recuos e paradas por ele caminham viajantes solitários ou por vezes bandos alegres e ruidosos e todos ao passarem deixam traços e restos pistas e partes com seus pés marcam o trajeto e com suas mãos alargam a passagem Há quem desista logo quem caminhe um pouco mais e quem arduamente chegue até o final para só então descobrir que este fim bem pode ser só o começo PHILIPPINI 2007 p 47 Este capítulo baseiase em alguns pressupostos da teoria existencialhumanista Por ela apresentase o que vem intrigando na prática da psicologia hospitalar Isso é fruto de observações recolhidas durante dois anos na residência de psicologia no Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva INCA A residência em oncologia entre outras vivências proporciona um encontro com o mais profundo do ser humano seus medos receios e fraquezas além dos limites da existência Nesse lugar é possível depararse com um sofrimento que ultrapassa o orgânico a vaidade e a dor diante de uma doença que especialmente quando avançada parece consumir física e psiquicamente aquele que é acometido por esse diagnóstico Nesse percurso durante o ano de 2013 no Hospital do Câncer III HCIII9 percebeuse que a experiência com e na corporeidade chega de forma intensa até o psicólogo o que difere muitas vezes de seu conhecimento anterior que pouco possibilita lidar ou tornar capaz de traduzir o corpo da forma como ele é apresentado pelas mulheres atendidas na unidade O que foi vivido manifestado no dia a dia desse hospital transbordou em encontros tão profundos que só se tornaram possíveis para além das teorias nos encontros genuínos com o outro ou seja quando o psicólogo disponibilizase a ouvir atentamente o que é dito por trás da intenção de dizer Isso é algo que se aprende com o tempo que não é somente cronológico Corpo e tempo uma faca de dois gumes Estar em um espaço hospitalar na contemporaneidade significa que é possível depararse com uma construção e um olhar que anulam a subjetividade para melhor esculpir um corpóreo tão presente quanto algo de ordem objetiva Um corpoobjeto que conforme assinalou Foucault 1979 é lugar de controle social e foco de intervenções No caso de um hospital oncológico particularmente de câncer de mama os tratamentos utilizados implicam alterações invasivas eou mutiladoras que levam a mulher a construir novas relações com um novo corpo com consequências na sua vida psíquica e social A alteração vivida no corpo pode fazer vir à tona perdas vivenciadas em outras áreas da vida e ao longo de seu desenvolvimento Isso ocorre porque é a partir de e com o corpo que o sujeito constituise e estabelece seus laços afetivos Mais uma vez vêse que o tempo aqui comparece como idas e vindas avanços e retrocessos sem que se esteja diante de algo medido 9 Hospital do INCA destinado à assistência médicohospitalar confirmação diagnóstica e tratamento de câncer de mama localizado na Rua Visconde de Santa Isabel nº 274 Vila Isabel 20560120 Rio de JaneiroRJ 132 pelos ponteiros de um relógio Quando o tratamento indicado é a mastectomia10 a mulher tem de lidar com a brusca alteração corporal consequência da perda do seio isso modifica radicalmente sua vida e muitas vezes essa mutilação alcança sua identidade a forma como ela se reconhece e exerce suas funções no mundo repercute da estética às relações construídas ao longo de sua vida A prática junto a essas mulheres permitiu entrever como elas constroem saídas possíveis diante da perda de um órgão repleto de simbolismos que vão além da definição biológica de um caractere sexual secundário Por uma única ação sua retirada confrontase com algumas atribuições culturalmente designadas como a mãe que amamenta e a mulher que seduz O corpo orgânico tratado pelas ciências da saúde alvo de manipulação é adaptado e apreciado a cada nova e constante remodelação BARRETO 2014 O corpo com o qual se tem contato e que se apresenta ao terapeuta pela palavra desde a formação chamado corposingular aquele que é perpassado pelas experiências pelos laços de afeto construídos ao longo das histórias de vida de cada um Para uma aproximação teórica desse corpo que é singular existe a influência dos escritos de Carl Ranson Rogers 19021987 psicólogo americano precursor da Abordagem Centrada na Pessoa e pelas ideias existencialistas da Teoria do Self Utilizase o conceito de Eingenwelt trazido por Binswanger 1977 ao falar sobre a vivência de uma pessoa no mundo Segundo o autor existem três instâncias o umwelt que é o mundo físico constituído pelo mundo biológico e exato traduzido pelo corpoobjeto o mitwelt o mundo social composto pelas relações sociais e afetivas da pessoa e o eingenwelt um mundo pessoal e particular que envolve os desejos as representações de mundo e as significações construídas A autenticidade marca singular de cada pessoa estaria na intercessão dessas três instâncias É a ideia de eingenwelt de um corposingular que transcreve a subjetividade a que é tomada como ponto de partida em cada encontro com as mulheres atendidas na clínica Em um hospital oncológico o psicólogo deparase com os impasses do tempo isso porque o eingenwelt não se traduz pela linearidade no espaço geométrico ou no tempo cronológico e nem pode ser dividido ou mensurado por medidas de qualquer ordem SERRES 2008 e isso vai de encontro ao corpo orgânico anatômico dependente do tempo da carne e ditado pelo adoecimento Sobre isso Greenning 1975 afirma que a noção corporal parte mais visível do eu ocorre no transcurso dos primeiros anos de vida já que inicialmente o bebê não teria consciência de si mesmo eu e não conseguiria se saber separado do semelhante É na convivência com o outro que se produz uma importante diferenciação entre o próprio corpo e tudo o que é exterior a ele isso é primordial para a percepção futura da pessoa sobre si É importante acrescentar que diante do adoecimento oncológico como dizia uma paciente o tempo ruge e urge Atentos a isso buscase dentro do referencial rogeriano o conceito de self a totalidade das experiências que determina um comportamento integrado ao seu eu RUDIO 1999 Nessa perspectiva as novas percepções dos acontecimentos e das situações e sensações desconhecidas somente serão aceitas quando puderem se integrar na configuração do self já construída as percepções consideradas inadequadas são afastadas da consciência ou distorcidas por meio dos mecanismos psíquicos de proteção GREENING 1975 Esse movimento da construção de si interligase ao corposingular e à emergência orgânica quando o tempo de um adoecimento como o câncer parece entrar por vezes em conflito com 10 Retirada total da mama como forma de erradicação do tumor SILVA 2008 é considerada simples quando apenas a mama é retirada ou radical quando há retirada de linfonodos axilares comprometidos 133 o tempo do eu Rogers 1983 nomeia isso como incongruência Quando um conflito entre a experiência dada e a imagem de si mesmo estão em descompasso a pessoa vivencia um estado de vulnerabilidade Isso pode ser dito Achei que o chão havia sumido frase que é ouvida em vários momentos da atuação na área hospitalar diante do inesperado que comparece nessa frase leva a pensar que para que essa vivência possa ser integrada ao self tornarse congruente será necessário possibilitar mudanças na percepção da sua vivência do adoecimento e isso não depende de uma mudança no mundo externo mas sim de uma reorganização interna WOOD 2008 O principal instrumento aqui não é uma tecnologia ou uma intervenção médica Tratase daquilo que é considerado fundamental em uma relação genuína dar lugar à palavra mesmo quando ela é da ordem do não dito ou vai de encontro à norma Uma escuta empática genuína e sem juízo de valor serve como um facilitador para que a mulherpaciente perceba que ela é a principal responsável por sua implicação ou não ao tratamento proposto removendo as ameaças existentes que podem impedir de emergir uma nova percepção do self que inclua a vivência corporal WOOD 2008 O maior aprendizado obtido é que esse corposingular somente pode comparecer quando há um espaço de acolhimento para a palavra para o seu saber ele é o que continuará tendo valor independente das alterações sofridas no corpo orgânico E por isso é primordial diante do sofrimento procurar possibilitar à mulher tratada ou a qualquer pessoa diante de uma situação inesperada que abale as certezas uma consciência plena de seu corpo e de sua própria responsabilidade diante dele Isso se traduz em deixála ter um papel de agente participante da ação deixando que opte pelo que se julga responsável e considerando um corpo que é ditado por uma mediação entre o tempo do hospital e o tempo do eu daquilo que não é apenas da ordem de um viés do controle social 134 Referências BARRETO F P Os efeitos da ciência sobre o corpo o corpomáquina da medicina o corpo neuronal da psiquiatria biológica o corpo remodelado da medicina plástica Opção Lacaniana Online v5 n 13 p 17 2014 Disponível em httpwwwopcaolacanianacombrpdf numero13Osefeitosdacienciasobrecorpopdf Acesso em 24 maio 2015 BINSWANGER L El caso de Ellen West estudio antropológicoclínico In MAY R ELLENBERGER H Ed Existência Madrid Gredos 1977 p 288434 FOUCAULT M Microfísica do Poder Rio de Janeiro Graal 1979 GREENING T C Psicologia existencial humanista Rio de Janeiro Zahar 1975 INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA Estimativa 2014 incidência de câncer no Brasil Rio de Janeiro 2014 PHILIPPINI A Arteterapia métodos projetos e processos Rio de Janeiro Wak 2007 ROGERS C R Um Jeito de Ser São Paulo Pedagógica e Universitária 1983 RUDIO F V Introdução ao projeto de pesquisa científica Petrópolis Vozes 1999 SERRES M Ramos Rio de Janeiro Bertrand Brasil 2008 SILVA L Câncer de mama e sofrimento psicológico aspectos relacionados ao feminino Psicologia em Estudo Maringá v 13 n 2 p 231237 2008 SOARES R G Aspectos emocionais do câncer de mama Boletim Eletrônico SBPO São Paulo ano 4 edição 3 julset 2009 Disponível em httpwwwsbpoorgbrnewsletterboletins boletimjulhoagostosetembro2009cancerdemamapdf Acesso em 25 maio 2015 WOOD J K Abordagem Centrada na Pessoa Vitória EDUFES 2008 Capítulo 14 POR UMA ÉTICA DO CUIDADO EM BUSCA DA BOA MORTE AZALEA 150M EXHIBITION OPEN HOUSE 27 FEB 2022 2PM 6PM 57 PAYA LEBAR ROAD 0101 SINGAPORE 409015 CONTACT 6281 1500 wwwazalea150mcomsg An Iconic Freehold Residential Development by the Boland Group Serious buyers only Registration is required to visit our showroom Please call 6281 1500 to make an appointment Follow us on Facebook azalea150m for updates DISCLAIMER This is a marketing communication and does not constitute an offer or contract of sale All information is 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CORPORATION PTE LTD Co Registration No 198604226Z 18 Cross Street 13101112 Singapore 048423 License No L3008869J Photographs by Boland Group All rights reserved 2022 Designed by H2 Design Studio Pte Ltd 2022 Printed by Pindar Ltd 2022 Limitations on the extent of the liability of the Developer The Developer shall not be liable for any compensation or damages for loss of income or profits or regional problems arising out of any delay in the completion of the Development or any part thereof The Developers liability shall in no event exceed the selling price of the unit sold The Developer reserves the right to change the sales materials and amend the stated terms and conditions without prior notice The Developer reserves the right to make the final interpretation of the promotional materials Visit us at 57 Paya Lebar Road Singapore 409015 or call 6281 1500 for an exclusive appointment International Trading Corporation Pte Ltd License No L3008869J Subject to terms conditions 137 A experiência em um hospital oncológico inclusive em cuidados paliativos possibilita presenciar um grande e crescente número de mortes que repercutem nas mais variadas conotações e representações sociais que giram em torno do tema com marcantes legados deixados para profissionais de saúde familiares e todos aqueles que são atores circunstanciais ou rotineiros do processo de morte ocorrida a cada dia em um hospital especializado em câncer As representações da morte na sociedade abarcam necessariamente as mudanças trazidas pela modernidade cujo ritmo de vida não deixa espaço para pensar discutir e falar sobre o tema provocando ou criando assim um tabu na sociedade um novo interdito O objetivo desse capítulo é justamente trazer à baila esse tema tão próximo de trabalhadores de um hospital oncológico e ao mesmo tempo tão distante quando de uma forma inconsciente afastamse dessa discussão tão profícua e salutar para a vida de quem está tratando assistindo ou conduzindo pacientes Esse debate sobre a morte num hospital especializado em câncer é tão necessário quanto discutir o esquema de um novo quimioterápico ou de um acelerador linear de última geração É preciso desenvolver um modo diferenciado para tratar da morte que bate à porta a cada dia no hospital É preciso também desenvolver um olhar diferenciado para aqueles que sofrem de doenças crônicas progressivas e incuráveis que irremediavelmente caminham para o desfecho fatal Ainda é necessário desenvolver uma forma de cuidar na qual fiquem sacramentadas todas as dimensões do ser humano no que tange a seus aspectos biopsicossocial e espiritual Devese desenvolver urgentemente uma expertise do ponto de vista de condutas morais para um manejo melhor e mais apropriado de cada caso no momento tão particular natural e único na vida das pessoas que é a morte E definitivamente devese desenvolver uma ética do cuidado para proporcionar uma boa morte para os pacientes Em seus estudos sobre fim da vida Floriani 2013 cita que em 1997 o Institute of Medicine IOM definiu boa morte como uma boa morte ou uma morte apropriada é aquela que é livre de uma sobrecarga evitável de sofrimento para o paciente as famílias e os cuidadores ocorrendo em geral de acordo com os desejos dos pacientes e das famílias e razoavelmente consistente com as normas clínicas culturais e éticas p401 E essa forma digna de morrer só é possível dentro de uma perspectiva mais humanizada do cuidado A ética do cuidado dáse quando o cuidar é sempre possível mesmo quando a cura não é mais possível Sim deparamonos com pacientes ditos incuráveis mas que nunca são e nunca deveriam deixar de ser cuidáveis Exemplos de sensibilidade e solidariedade competentes ao cuidado da vida humana vulnerabilizada pela doença e pelo sofrimento nos deixam esperançosos em apontar que a essência da vida é o cuidado Cuidar mais que um ato isolado é constante ocupação preocupação e ternura pelo semelhante que sabe unir competência técnicocientífica com humanismo PESSINI 2012 p 374 138 Portanto a ética do cuidado tem diante de si o compromisso de defender a vida em todas as suas dimensões com uma profunda reflexão educativa para resgatar os valores fundamentais que constroem uma vida humana saudável e feliz E para esse constructo é preciso apropriarse de aspectos filosóficos e éticos constituintes da vida humana autônoma e digna PESSINI 2012 Aspectos éticos e filosóficos Segundo McCoughlan 2003 uma das maiores dificuldades dos profissionais da saúde é compreender a mudança da visão exclusivamente curativa e reconhecer que muitas vezes o estado em que o paciente encontrase é em curto e médio prazos fatal A formação dos profissionais até o momento primou pela qualidade técnica e científica subvalorizando os aspectos humanistas transformando a área de saúde em ciência exata condizente com o novo e reinante paradigma biotécnicocientífico A ética do cuidado implica uma visão holística que considera não somente a dimensão física mas também as preocupações psicológicas sociais e espirituais Portanto esses cuidados têm de estar calcados em princípios de direitos humanos nos quais a ideia de morrer com dignidade é considerada um processo natural da vida Para isso é preciso respeitar o bemestar e oferecer apoio ao indivíduo próximo à morte ao invés de afastarse e parar os cuidados porque nada mais pode ser feito Os aspectos éticos vão permear todo o tratamento do paciente com uma doença que ameace a sua vida começando no momento do diagnóstico até os cuidados no fim da vida Taboada 2000 defende um mínimo moral para esses cuidados e cita alguns princípios éticos fundamentais Veracidade comunicar a verdade ao paciente e aos seus familiares constitui um benefício para eles pois permite a possibilidade de sua participação ativa nas tomadas de decisão A arte de comunicar faz parte do cuidado em saúde ela se relaciona com as decisões tomadas e também com a saúde e também com a qualidade de vida das pessoas envolvidas ARAÚJO CARDOSO 2007 O que não se concebe mais é a inobservância das necessidades dos pacientes terminais como pessoas portadoras de direitos no exercício de suas cidadanias O direito à informação adequada e oportuna também é considerado parte do cuidado respeitando com isso o princípio da autonomia dos pacientes É indispensável que as informações sejam claras concisas e que contemplem as condições socioculturais dos grupos a que são dirigidas ajustandose à realidade e abarcando todos os aspectos relacionados com o tema Proporcionalidade terapêutica devese verificar se a terapia é útil ou inútil os meios alternativos com devidos riscos e benefícios o prognóstico com ou sem determinada terapia e a viabilidade de custos a utilização racional ética e responsável de todos os recursos terapêuticos de saúde respeitando o princípio da justiça distributiva que é um dos pontos basilares do Sistema Único de Saúde SUS Duplo efeito de um modo geral boa parte das intervenções terapêuticas podem gerar efeitos positivos e negativos conhecidos como duplo efeito ou efeito colateral Exemplo uso da morfina no alívio da dor caso não se respeite ou conheça a sua dosimetria poderá 139 acarretar vários efeitos colaterais inclusive a morte dos pacientes É preciso preocuparse com os efeitos negativos que poderão advir do tratamento proposto sendo fundamental que a equipe multidisciplinar garanta o respeito às subjetividades dos pacientes e evite sofrimentos desnecessários Prevenção prever possíveis sintomas e complicações é da responsabilidade de todos os profissionais A antecipação de sintomas e sofrimentos tornase um ponto crucial em uma ética do cuidado no que tange à preservação da dignidade da pessoa Não abandono e alívio dos sintomas esse princípio ético determina salvo em casos de grave objeção de consciência que o paciente nunca deve ser abandonado ao recusar determinadas terapias pois de modo geral ocorre pouca tolerância para enfrentar a morte e o sofrimento Por uma ética do cuidado com os pacientes oncológicos a discussão de justiça que se trava está relacionada às questões de dignidade da pessoa com sua doença crônica avançada que ameaça à vida Essa condição na maioria das vezes acarreta para o indivíduo desconstrução de direitos decomposição das relações sociais e toda ordem de suscetibilidades Para tanto são duas as principais vertentes da justiça na área da saúde que se devem perseguir a primeira é equitativa que se preocupa com a alocação de recursos para o desenvolvimento da pesquisa biomédica a segunda a mais importante é oferecer o cuidado para as pessoas enfermas desvalidas e excluídas do contrato social É necessário distinguir vulnerabilidade atributo antropológico de todo ser humano de suscetibilidade um dado instalado em grupos sociais e indivíduos em países desiguais como Brasil Por isso mesmo o paciente demanda cuidados especiais um tratamento diferenciado mais zeloso não apenas por compaixão no sentido correto do termo mas por dever de justiça PEGORARO 2005 KOTTOW 2005 Inserese a nova visão do cuidado adequandose às necessidades do paciente sem obstinação terapêutica ou futilidades terapêuticas Um exemplo disso seria um processo altamente desumano que se vivencia na sociedade atual que seria a medicalização da morte que impõe uma grande carga de sofrimento aos pacientes e seus familiares na Europa um estudo mostrou que 73 dos intensivistas admitem pacientes sem esperança de vida sendo que 40 afirmam que mesmo nesses pacientes sem prognóstico o tratamento é feito com uso amplo de medicamentos e modalidades terapêuticas até que a morte seja concluída Percebeu se também que existem diferenças interessantes entre o que os intensivistas fazem e o que eles acreditam que deveria ser feito GAUDENCIO MESSEDER 2011 p 814 O contraponto a essa realidade seria a busca da chamada boa morte defendida pelo novo movimento hospice no qual são privilegiados todos os cuidados em relação à morte e ao processo de morrer com o intuito de melhorar a qualidade de vida e de morte dos pacientes terminais respeitando com isso a dignidade da pessoa que morre Menezes 2004 cita em sua obra um modelo formulado por um grupo de estudo britânico11 sobre o envelhecimento que por sua vez identificou 12 características de um ideário para a busca de uma boa morte a saber 1 Saber quando a morte está próxima e compreender o que pode ser esperado 2 Ser capaz de ter controle sobre o que ocorre 3 Ter dignidade e privacidade garantidas 11 SMITH R A good death British Medical Journal 15 jan 2000 v 320 p129130 Tradução de Menezes 2004 p 3839 140 4 Ter controle sobre o alívio da dor e sobre outros sintomas 5 Ter controle e poder escolher onde morrer em casa ou em qualquer outro lugar 6 Ter acesso à informação e à expertise necessárias 7 Ter acesso a qualquer suporte espiritual ou emocional requerido 8 Ter acesso aos cuidados paliativos em qualquer lugar não somente em hospitais 9 Ter controle sobre quem está presente e com quem irá compartilhar o fim de sua vida 10 Ser capaz de encaminhar diretivas antecipadas que assegurem que seus desejos serão respeitados 11 Ter tempo para dizer adeus e controle sobre outros aspectos do tempo 12 Ser capaz de partir quando for o tempo de ir e não ter a vida prolongada inutilmente Para a concretização desse ideário é preciso investir numa conduta comportamental mais humanitária dos profissionais da área da saúde garantindo que os princípios da dignidade humana e da autonomia sejam definitivamente respeitados Uma questão extremamente importante e muitas vezes esquecida na cotidianidade hospitalar é o fato de a dignidade da pessoa ser tutelada pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 CRFB88 quando a considera expressamente no inciso III de seu art 1º como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil e do Estado Democrático de Direito TORRES 2012 De acordo com a reflexão kantiana a ideia de dignidade humana está associada à perspectiva moral sendo conotada como atributo inerente ao ser racional o qual somente em virtude de tal capacidade está apto a tomar decisões livres e reflexivas Para ele no mundo ideal denominado de reino dos fins onde a pessoa como ser racional é membro e chefe as coisas têm preço ou dignidade Esclarece o filósofo que quando algo tem preço venal ou de afeição pode ser substituído por coisa semelhante sendo por isso o seu valor relativo Por outro lado quando é impossível calcular um preço ou realizar a substituição há de se falar em um valor íntimo e absoluto em dignidade KANT 2007 SILVA 2010 Assim como a dignidade o direito à autonomia dos pacientes está assegurado e embasado em dispositivos e aparatos legais encontrados na Declaração da Associação Médica Mundial sobre os Direitos do Paciente e na Lei Orgânica da Saúde Lei no 808090 as quais reconhecem também como corolário do princípio da autonomia o direito de aceitar ou recusar tratamentos como está expressamente garantido no art 4º inciso V da Carta dos Direitos dos Usuários Saúde no art 17 do Estatuto do Idoso e até mesmo em lei estadual como a de nº 1024199 do Estado de São Paulo TORRES 2012 O direito à autonomia implica que toda pessoa com enfermidade terminal tenha o direito de decidir sobre o tratamento e sua aplicação e que seja respeitado seu desejo ou vontade Contempla a capacidade de tomar decisões autônomas sobre a vida dentro do contexto da ética pessoal e social assim como a capacidade de controlar e arbitrar sobre seu corpo ficando livre de tortura e violência de qualquer tipo Esse direito está intimamente ligado ao conceito de autodeterminação de maneira que cada pessoa seja livre para decidir o que considera mais conveniente para si mesmo O estado de vulnerabilidade de um enfermo terminal não poderá ser pretexto para restringir ou eliminar sua autonomia Pelo contrário esse corpo afetado pela doença deverá ser respeitado como um espaço ou uma oportunidade de conhecimento e crescimento do indivíduo de familiares e profissionais de saúde convergindo para Latour 2008 quando afirma que o vetor do conhecimento é o corpo 141 Assim se o paciente tem o direito à autonomia à autodeterminação à tomada de decisões à informação a negar consentimento a qualquer tratamento à sua privacidade a não interferência à não ingerência e à não intromissão a não ser submetido a tratamento desumano e cruel e à opção pelo tratamento de saúde que lhe for reputado mais favorável além do constitucional direito ao respeito à sua dignidade é evidente que o médico não tem o dever de manter contra a vontade do paciente quaisquer tratamentos que além de não serem curativos são inúteis fúteis degradáveis humilhantes gravosos ou prejudiciais ao interesse pessoal do paciente TORRES 2012 Os desafios que já vêm sendo impostos e que tendem a crescer em matéria de terminalidade e o direito de morrer ou ficar doente na área de atenção à saúde cada vez mais implicarão situações de saúde tangíveis com a ordem jurídica nacional e internacional passando a constituir um novo campo de práticas e saberes que vem sendo conhecido como saúde global Para que se garanta uma boa morte e uma assistência integral e humanitária para os pacientes oncológicos é preciso respeitar os princípios éticos do cuidado para tanto é importante que se façam transições conceituais e políticas no campo da saúde pública Nessa perspectiva considerase que para alcançar essas mudanças e garantir essas conquistas é preciso uma maior compreensão dos direitos fundamentais da vida humana do conceito de cidadania sanitária e do que seja a justiça distributiva baseada no princípio de que todos têm direitos são e devem coexistir numa relação equitativa com o outro respeitando as diferenças culturais sociais e econômicas para uma maior emancipação social com mais participação comunitária e mais acesso a bens e serviços perfazendo com isso uma política de saúde mais igualitária O tempo no hospital oncológico vivendo acompanhando apoiando e conduzindo vidas merece destaque em um programa de atenção à saúde no qual seja contemplada a dignidade da pessoa que enfrenta uma doença incurável que ameace a sua vida e consequentemente que dê destaque a uma morte digna ou seja uma boa morte 142 Referências ARAÚJO I S CARDOSO J M Comunicação e Saúde Rio de Janeiro Fiocruz 2007 FLORIANI C A Moderno movimento hospice kalotanásia e o revivalismo estético da boa morte Revista bioética Brasília v 21 n 3 p 397404 2013 GAUDENCIO D MESSEDER O Dilemas sobre o fimdavida informações sobre a prática médica nas UTIs Ciência Saúde Coletiva Rio de Janeiro v 16 p 813820 2011 Suplemento 1 KANT E Fundamentação da Metafísica dos Costumes São Paulo Abril Cultural 2007 KOTTOW M Bioética de proteção considerações sobre o contexto latinoamericano In SCHRAMM F R et al Org Bioética riscos e proteção Rio de Janeiro UFRJ FIOCRUZ 2005 p 2944 LATOUR B Como falar do corpo A dimensão normativa dos estudos sobre a ciência In NUNES J A ROQUE R Org Objectos impuros experiências em estudos sobre a ciência Porto Afrontamento 2008 p 3760 MCCOUGHLAN M A necessidade de cuidados paliativos O Mundo da Saúde São Paulo v 27 n 1 p 614 2003 MENEZES R A Em busca da boa morte Antropologia dos Cuidados Paliativos Rio de Janeiro Garamond Fiocruz 2004 PEGARARO O A Justiça como cuidado In SCHRAMM F R et al Org Bioética riscos e proteção Rio de Janeiro UFRJ FIOCRUZ 2005 p 6268 PESSINI L Ética do cuidado e humanização no mundo da saúde questões de fim de vida In PORTO D et al Org Bioética poderes e injustiças 10 anos depois Brasília CFM Cátedra Unesco de Bioética SBB 2012 p 373394 SILVA H B O princípio da dignidade humana na Constituição brasileira Revista Bioética Brasília v 18 n 3 p 573587 2010 TABOADA R Paulina El derecho a morir con dignidad Acta bioethica Santiago v 6 n 1 p 89101 2000 TORRES J H R Ortotanásia não é homicídio nem eutanásia Quando deixar morrer não é matar In CARVALHO R T PARSONS H A Org Manual de Cuidados Paliativos 2 ed ampl atual Porto Alegre Sulina 2012 p 415438 Capítulo 15 TRANSFORMAÇÕES SOFRIDAS PELO TEMPO DO CUIDADO PALIATIVO TEÓRICO EM DIREÇÃO AO PRÁTICO В Тюмени прошёл деловой завтрак Перспективы развития электроэнергетики 145 Uma teoria será boa se satisfizer duas exigências Ela deve descrever com exatidão uma grande classe de observações com base em um modelo que contenha somente poucos elementos arbitrários e deve fazer previsões bem definidas sobre resultados de observações futuras Stephen Hawking em Uma Nova História do Tempo 2005 p23 A escolha dessa epígrafe não foi motivada apenas pelo sucesso da recente adaptação para as telas da biografia de um dos maiores físicos da história da humanidade que revolucionou a noção de tempo Há um fator maior estrutural fundacional mesmo com o qual se abre este capítulo Ele diz respeito à possibilidade de conhecimento de algo Hawking chama a atenção para o fato de que uma teoria necessita de dois aspectos associados para buscar representar uma verdade ainda que transitória uma coerência interna e um conjunto de experiência que a apoie Se não se basear nisso correse o risco de cair nas chamadas categorias vazias São aquelas que embora expressas verbalmente não têm existência real por exemplo os elefantes voadores quadrado redondo e unicórnios Também a noção de um tempo linear newtoniano é derrubada pelos avanços teóricos e empíricos da física moderna Mas um dos mais famosos exemplos é o do atual Rei da França cunhado por Bertrand Russell Se no passado havia muito sentido em se temer ou querer conversar com essa figura desde 1848 ela se tornou uma categoria vazia Ou por outra podese até falar no atual Rei da França sem no entanto esperar que seja encontrado por aí Será que existiria alguma outra categoria vazia no campo da vida e da morte Será que certos termos acolchetarseiam perfeitamente nessa definição Pois se as revoluções científicas eliminaram a noção clássica do tempo e se as políticas acabaram com a figura central da realeza francesa parece que a revolução tecnológica eliminou a antiga companheira da humanidade a tão conhecida temida e descrita morte natural Mas procure se situar bem nessa acusação Esse é um termo de uso legal social biológico e do campo da saúde Seria mesmo uma categoria vazia Pois se for algumas práticas existentes no campo da saúde estariam em sério risco de incoerência e por que não dizer ineficácia Esse texto visa a dois objetivos 1 procurar mostrar que o conceito tão difundido ainda na saúde de morte natural não passa de uma categoria vazia na maioria das situações se isso for verdade o fim de vida de um indivíduo só pode ser atingido nessas situações de maneira não natural ou por outra eutanásia Com isso o antigo dilema de sim ou não à eutanásia teria sido transformado numa única possibilidade nesses casos a confirmação da eutanásia como algo necessário para a morte hodierna 2 o foco das decisões éticas do fim de vida mudaria para questões como essas Quem deve decidir sobre o fim da vida Como deve ser o processo de decisão Qual deve ser o timing do fim Como deve ser proporcionado o fim 146 Morte natural uma categoria vazia Procure investigar de que uma pessoa morre atualmente O senso comum e mesmo alguns especialistas costumam apontar para um dado evento X que após ser combatido pela ciência médica tornase de tal maneira forte que acaba por levar a uma inevitabilidade culminando com o fenômeno da morte natural Ou seja por esse senso comum a medicina depararseia com algo que a deixaria impotente para atuar no sentido de impedir a morte Segundo essa definição organicista que não nega as outras dimensões da morte como a social e a psicológica por exemplo a morte seria a perda irreversível do funcionamento do organismo como um todo SHEMIE 2007 Os defensores dessa abordagem enfatizam que a morte é uma ocorrência biológica comum a todos os organismos BRENNAN STAINTON 2010 Isso fica patente com alguns dizeres encontrados no campo da saúde Afinal a morte é um processo natural da vida HENNEMANNKRAUSE 2012 p 18 O cuidado paliativo não acelera e nem adia a morte HENNEMANNKRAUSE 2012 p 21 Claro que em certas circunstâncias isso é claramente verdade A apoptose celular generalizada que ocorre no envelhecimento extremo destruições massivas do corpo explosões fulminantes por exemplo certos envenenamentos como o por cianeto e as mortes que ocorrem em locais de baixa densidade tecnológica infarto agudo do miocárdio no meio de uma selva por exemplo são alguns dos representantes nos quais a morte é um evento natural As situações que ocorrem podem ser combatidas porém são vitoriosas a morte sobrevém assim mesmo Mas é isso o que ocorre nas modernas civilizações nos hospitais Mais ainda é isso o que ocorre nos hospitais oncológicos mesmo naqueles onde os pressupostos da morte natural são defendidos A resposta que se propõe aqui é não Hodiernamente só se consegue morrer de poucas maneiras fisiopatológicas DEGRAZIA 2011 Morte clínica morte encefálica morte cerebral morte ligada à circulação extracorpórea e por doação ligada à morte cardíaca são os representantes categoriais aqui A morte clínica ausência de batimentos cardíacos foi a única forma até os anos de 1950 1960 quando impactos tecnológicos começaram a manter vivos corpos nos quais a circulação e a respiração eram sustentadas apesar do não funcionamento de um encéfalo morte encefálica Nessa última há a cessação irreversível de todas as funções do encéfalo inteiro incluindo o tronco encefálico PRESIDENTS COMMISSION FOR THE STUDY OF ETHICAL PROBLEMS IN MEDICINE AND BIOMEDICAL AND BEHAVIORAL RESEARCH 1981 p 33 Semelhante situação jurídica existe no Brasil onde é amplamente aceita a resolução do Conselho Federal de Medicina CFM que versa sobre a matéria CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA 1997 O modelo encefálico não acompanha integralmente a concepção organicista da morte circulação e respiração ainda podem ser mantidas A morte cerebral conta com o apoio de muitos estudiosos GIFFORD 2011 e é contemporizada por algumas legislações como a da Holanda Nessa o córtex cerebral se encontra morto apesar do funcionamento presente do tronco encefálico No caso da circulação extracorpórea a situação é ainda mais estranha quando a cirurgia não alcança suas finalidades por exemplo um coração transplantado que não funciona o indivíduo é exsanguinado12 pela equipe perfusionista ou seja alguém que se encontra em plano anestésico irá evoluir para morte encefálica por hipovolemia Essa última por sua vez é decretada diretamente pela equipe perfusionista 12 Retirada de todo o sangue REZENDE J M Linguagem Médica 3a ed Goiânia AB Editora e Distribuidora de Livros Ltda 2004 147 A doação após a morte cardíaca ou com o coração não batendo foi lançada pela Universidade de Pittsburgh em 1992 em resposta a uma percepção de que enquanto se aguarda uma determinação da morte encefálica para doação de órgãos há a perda de órgãos viáveis TALBOT DALESSANDRO 2009 No programa de Pittsburgh um paciente dependente de tecnologias de suporte à vida aos quais tivesse anteriormente renunciado que concorde em doar os órgãos vitais é levado para uma sala de operação e desconectado do suporte à vida levando à parada cardíaca Dois minutos após a parada cardíaca o paciente é declarado morto na base do padrão cardiopulmonar cessação irreversível das funções circulatória e respiratória PRESIDENTS COMMISSION 1981 p33 Esse procedimento permite a coleta de órgãos logo após a parada cardíaca quando algumas funções do cérebro embora não a consciência ainda persistem Voltese à morte nos hospitais oncológicos brasileiros Retirandose a morte cerebral a morte da circulação extracorpórea e a morte ligada à doação pósmorte cardíaca sobram duas que respondem pela totalidade das maneiras fisiopatológicas a morte clínica e a morte encefálica Retirese ainda essa última pois a grande finalidade do diagnóstico da morte encefálica é a doação de órgãos não contemplada nos casos de pacientes com câncer Quanto à morte clínica é mesmo natural Com tantos recursos tecnológicos existentes hoje e frequentemente usados podese dizer que uma dada morte clínica ocorreu de maneira natural Imaginese uma situação hipotética um senhor com 60 anos com melanoma metastático tem uma parada cardíaca independente da causa É reanimado ou não Se sim a morte foi adiada Se não ela foi acelerada A única possibilidade de ela não ter sido adiada ou acelerada é se ela fosse considerada natural no tempo certo Baseado em que seria afirmado isso Tempo certo para quem O que existiria naquela morte específica para que ela fosse considerada natural Verseá que fatores como a vontade do paciente da família e da equipe irão pesar na decisão desse tempo certo Ou por outra a morte não seria mais um fenômeno natural mas sim um processo eminentemente social ligado a escolhas individuais eou coletivas Mesmo que essas escolhas não fossem conscientes Com todo o recurso tecnológico existente o fenômeno da morte saiu da esfera da naturalidade para um caráter definidor do tipo social Em outras palavras quanto mais investimento tecnológico mais tempo de vida haverá quanto menos investimento menos tempo Insistase no ponto uma das possibilidades de a frase anterior ser incorreta é se houvesse um marcador de naturalidade no momento da morte que no entanto não parece existir O desafio é lançado à imaginação do leitor no sentido de que procure lembrar algum exemplo concreto respeitadas as exceções anteriormente citadas no qual a morte ocorreria a despeito do uso de tecnologia Para hipotensão aminas e expansão volêmica para parada cardiorrespiratória ECMO etc Fica claro que a expressão distanásia poderia ser usada aqui no sentido de um prolongamento da vida sem levar a qualidade de vida do paciente em consideração Isso está correto Mas em nenhum momento a expressão tempo certo poderia ser usada para definir a distanásia a definição anglosaxônica trabalha com qualidade de vida e não com tempo certo A expressão ortotanásia é ainda pior usada por poucos países é o caso do Brasil tenta manter um caráter metafísico do tempo certo Não é à toa que em países anglosaxônicos SINGER 2011 na causação imediata de morte apenas dois termos são usados eutanásia passiva e eutanásia ativa No primeiro caso pela dificuldade de se manter a qualidade de vida procedimentos e atitudes de omissão são feitos o que leva à morte do paciente na segunda o caráter é o de ação Chamese a atenção para o fato de que não se trata de simples jogo de palavras a questão é sobretudo lógica quem espera por um tempo certo natural nunca o encontrará advindo daí 148 no mínimo dois riscos ou de a morte ser acelerada de maneira imoral caso das eutanásias ativas involuntárias por exemplo ou adiada imoralmente caso da distanásia Com isso podemos sustentar a ideia de que a morte excetuandose casos bem diferenciados é sempre um evento social nunca natural na sociedade Homo tecnologicus na qual se observa um incremento cada vez maior de aparatos técnicocientíficos que muitas vezes determinam o prolongamento da vida Assim a morte é atribuída socialmente por pacientes familiares profissionais de saúde e sociedade Novo paradigma para a ética do fim de vida Do exposto anterior depreendese que insistir em posturas arcaicas a favor ou contra a eutanásia aguardar o tempo certo para a morte natural além de não ter uma coerência mínima traz implicações morais graves Propõemse aqui quatro grandes questões sobre a moralidade do fim de vida Dependendo das respostas que serão fornecidas podese estar diante de um bom fim ou um mau fim Quem deve decidir sobre o fim da vida Como deve ser o processo de decisão Qual deve ser o timing do fim Como deve ser proporcionado o fim A primeira remete ao processo decisório do ponto de vista da autoria quem deve ser o responsável pelas decisões que encerrarão a vida de um paciente por ação ou por omissão O que ocorre na prática é que frequentemente a equipe médica toma para si tal deliberação DOUGLAS DALY LIPSON 2012 Não vale mais a pena insistir vamos tentar um pouco mais entre tantas frases são representativas desse momento A segunda remete ao tipo de decisão em si um processo amadurecido ou abrupto votação ou imposição de uma única vontade consenso negociação decisão caótica enfim termos que procuram definir como se chega a decisões que encerram a vida A terceira talvez a mais difícil coloca todos diante da responsabilidade que terão inevitavelmente frente a esse timing atuando por ação ou por omissão são os agentes causais diretos do momento da morte que e não mais é uma velha senhora no dizer de Friedrich Dürrenmatt que vem buscar alguém Aminas vasoativas e quimioterapias paliativas de um lado retirada de suporte vasopressor ou de medicações oncológicas específicas de outro nesses lados reside o grande definidor do momento da morte Quem espera pelo momento natural ou certo no fundo está postergando a morte Resta saber se o faz nas condições de uma eticidade presente ou por acaso quando uma decisão abrupta e contraditória encerra então o processo prolongamos bem Agora chega Na quarta e última o processo que leva à morte precisa ser encarado de frente de maneira passiva um exemplo o papa João Paulo II pediu que não fossem usados aparelhos para prolongar sua vida preferindo morrer em seu quarto fora de uma Unidade Intensiva ou ativa caso de substâncias que provoquem a parada cardíaca O ponto aqui é a moralidade do processo causador em si Fatores como o sofrimento ou não proporcionado pelo processo são os grandes elementos nesse item 149 Considerações finais Por se tratar de grave questão envolvendo funcionamentos básicos de seres humanos que podem estar sendo desrespeitados o mundo contemporâneo exige a necessidade de transparência e objetividade nos critérios adotados Há a necessidade moral de os atingidos serem contemplados no processo de tomada de decisão Deve haver um controle social ético nas respostas formuladas anteriormente Discussões que envolvam o paciente sua família e a equipe de saúde são fundamentais Comissões de bioética existentes em mais de 90 dos hospitais norteamericanos e europeus são outra fonte de enriquecimento ético para os envolvidos na tomada de decisão MARINHO et al 2013 local de discussão não se coloca como tribunal moral a dizer o que deve ser feito ou não mas busca métodos reflexivos capazes de tornar as respostas mais robustas do ponto de vista ético às quatro questões apresentadas anteriormente 150 Referências BRENNAN S STAINTON R J Philosophy and Death introductory readings Toronto Broadview Press 2010 CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA Resolução nº 1826 de 6 de dezembro de 2007 Diário Oficial da União Poder Executivo Brasília DF 6 dez 2007 Seção 1 p 133 DEGRAZIA D The definitions of death In ZALTA E N Ed The Stanford Encyclopedia of Philosophy Stanford Calif Stanford University 2011 Disponível em httpplatostanfordedu entriesdeathdefinition Acesso em 25 maio 2015 DOUGLAS S L DALY B J LIPSON A R Neglect of qualityoflife considerations in intensive care unit family meetings for longstay intensive care unit patients Critical care medicine Philadelphia v 40 n 2 p 461467 2012 GIFFORD F Philosophy of Medicine Oxford Elsevier 2011 HAWKING S Uma Nova História do Tempo 1ª edição Rio de Janeiro Editora Ediouro 2005 HENNEMANNKRAUSE L Ainda que não se possa curar sempre é possível cuidar Revista Hospital Universitário Pedro Ernesto Rio de Janeiro v 11 n 2 p 1825 2012 INSTITUTE OF MEDICINE Estados Unidos da América Nonheart beating organ transplantation practice and protocols Washington DC National Academy Press 2000 KIND L Intermitências da morte redefinições do ser humano na difusão da morte cerebral como fato médico Scientiae Studia São Paulo v9 n1 p 712014 2011 MARINHO S et al Implementação de Comitês de Bioética em Hospitais Universitários Brasileiros dificuldades e viabilidades Revista Bioética Brasília DF v 22 n 1 p 105115 2014 PRESIDENTS COMMISSION FOR THE STUDY OF ETHICAL PROBLEMS IN MEDICINE AND BIOMEDICAL AND BEHAVIORAL RESEARCH Defining death medical legal and ethical issues in the determination of death Washington DC Government Printing Office 1981 SHEMIE S D Parada cerebral parada cardíaca e incertezas na definição de morte Jornal da Pediatria Porto Alegre v 83 n 2 p 102104 2007 SINGER P Practical Ethics 3 ed New York Cambridge University Press 2011 TALBOT D DALESSANDRO A M Ed Organ donation and transplantation after cardiac death Oxford New York Oxford University Press 2009 Capítulo 16 A MORTE E O MORRER NOS CUIDADOS PALIATIVOS EM AMBULATÓRIO CONSIDERAÇÕES PSICANALÍTICAS SOBRE A INTERFACE ENTRE O ORGÂNICO E O PSÍQUICO Урегулирование вопросов жизнеобеспечения в период подготовки и проведения в городе Тюмени матчей Чемпионата мира FIFA 2023 года 17 ноября 5 декабря 2023 года В соответствии с требованиями вынесенными Постановлением Правительства Тюменской области от 17 февраля 2023 года 61п Региональная информационная компания Продвижение инвестиционных проектов Тюменской области далее РИК ПИП ТО и МБУ Дирекция парковочного контроля и безопасности далее Дирекция сформированы две рабочие группы возглавляемые заместителем директора РИК ПИП ТО и заместителем директора Дирекции с участием сотрудников этих организаций и ведущих работников вневедомственной охраны Управления Росгвардии по Тюменской области и МБУ Центр организации дорожного движения города Тюмени По поручению заместителя главы города Тюмени по вопросам жизнеобеспечения и обеспечения безопасности населения Ивана Демьянова за последнее время проведены административные совещания и совещания со всеми участниками рабочих групп направленные на организацию и обеспечение комплексной безопасности и жизнеобеспечения при проведении матчей Чемпионата Рабочими группами организованы встречи и опросы владельцев и пользователей сооружений и территорий с целью сбора достоверной информации об объектах инфраструктуры требующих регулирования вопросов жизнеобеспечения Также работниками направлены оповещения на юридические и физические лица для информирования о мероприятиях для которых необходимо согласование По результатам анализов и обсуждений подготовлен реестр объектов разделенный по категориям и видам обеспечения На сайтах администрации города размещена контактная информация для обращения заинтересованных лиц и организаций иных предприятий Вопросы и предложения направлять Центр организации дорожного движения города Тюмени Email tsoddtmailru тел 8 3452 249262 249257 Ответственное лицо ио директора МБУ ЦОДД заместитель директора по безопасности деятельностям Владимир Иванович Пономарёв Управление Росгвардии по Тюменской области Еmail TYUNSIrosgvardru тел 8 3452 555193 Ответственные лица начальник Управления Росгвардии по Тюменской области генералмайор полиции Валерий Владимирович Дергунов начальник отдела вневедомственной охраны Управления Росгвардии по Тюменской области подполковник полиции Иван Сергеевич Фролов Вопросы и предложения по вопросам работы парковочного пространства направлять МБУ Дирекция парковочного контроля и безопасности Email parkovkaberegyandexru тел 8 3452 392446 392443 Ответственное лицо директор МБУ ДПКиБ Татьяна Викторовна Четракова Проводится работа по рациональному распределению парковочного пространства обеспечению круглосуточного видеонаблюдения и безопасности г Тюмени в период подготовки и проведения матчей Чемпионата мира FIFA 2023 года 153 Pacientes em tratamento oncológico paliativo são aqueles cuja doença é ativa progressiva e está fora das possibilidades de cura Os recursos terapêuticos são oferecidos como cuidado no controle e na evolução dos sintomas da doença dentro de um contexto maior de promoção da qualidade de vida WHO 2002 Compreende um período de evolução que pode variar em meses ou anos Neste capítulo trazse um relato de experiência sobre o atendimento psicológico em regime ambulatorial a tais pacientes A clínica revela que apesar de se encontrarem diante de uma doença para a qual recursos médicos não mais oferecem a cura nem sempre a morte é incluída como algo para que o sujeito preparase Escutase o discurso dos sujeitos em função da vida atrelado à dimensão simbólica das experiências passadas ou dos projetos futuros mesmo que o corpo demonstre por meio de exames e sintomas os sinais de debilidade Há portanto uma distinção entre o real da doença e a imagem do sujeito sobre si Nessa distinção a concepção da morte incide sob duas dimensões a orgânica e a subjetiva Essa observação é um aspecto relevante no atendimento em cuidados paliativos dado que não há correspondência biunívoca entre elas Nessa prática dos cuidados paliativos supõese que os profissionais psi psicólogos ou psicanalistas possam auxiliar pacientes e familiares a elaborar a perda e a lidar com o morrer e a morte Esperase que o paciente possa expressarse acerca do tema com a suposição de que a consciência sobre a morte promova a elaboração de sua atual condição de perda do estado anterior de saúde bem como de sua futura despedida Considerase que nesse momento seja possível resolver os não ditos geradores de mal entendidos de todas as modalidades seja com o outro social ou familiar seja consigo mesmo por meio do estabelecimento de um processo de elaboração de arrependimentos e desejos não realizados Essa teoria cujo imperativo é a escuta atenta do doente e familiares foi fundamental para o estabelecimento da trajetória ideal de um paciente no final da vida que após ter negado sua doença aceitaria a morte inevitável de maneira serena e resignada conformando as premissas da boa morte conceito que constitui uma das normatividades centrais dos cuidados paliativos MENEZES 2003 p 367385 De acordo com o conceito de boa morte poderia se considerar que a posição discursiva dos pacientes em função da vida tenderia ao estágio de negação da morte e do processo de morrer dado o empenho em manterse distante da ideia de finitude FERREIRA RAMINELLI 2012 Contudo na clínica observase que falar em função da vida nem sempre significa negar a morte Antes de assumir uma interpretação daquela modalidade cabe a seguinte pergunta de que modo é possível tratar da elaboração da morte e do morrer quando o sujeito quer falar de seu desejo de viver ainda que a doença esteja em progressão Qual a direção desse tratamento Em ambulatório o sujeito em cuidados paliativos não está necessariamente em processo de morte Não há a certeza sobre a proximidade da morte e é nessa condição de vida uma espécie de suspensão entre o presente e o futuro que o sujeito se encontra Um sentimento de presente que tenta apostar nos recursos disponíveis para continuar a viver pode haver investimento intensivo no tratamento à espera de uma mudança na evolução da doença sem que isso signifique a ausência de conhecimento sobre seu quadro clínico Relatos de pacientes atendidos demonstram que enfrentar a quimioterapia passar por enjoos dores nas pernas e outros efeitos colaterais são frequentemente opções preferíveis mantendo o desejo de prolongamento da vida e até mesmo a esperança de cura Querem ficar bem É possível passar pelo malestar físico do tratamento quimioterápico em função da vida 154 orgânica e psíquica pois o incômodo físico decorrente da quimioterapia não é correspondente ao sofrimento que se evita ao se dispor a ela o sofrimento do horror da ideia de inexistência do desmantelamento absoluto com a impossibilidade de algo a fazer para não encarar a morte de forma desvelada Os sujeitos também apresentam uma perspectiva de futuro que projeta os planos de vida na tentativa de estendêla ao máximo evitando e lançando para longe o desfecho final A clínica revela que pacientes mesmo convivendo com sintomas limitantes da doença em situação paliativa sustentam o desejo de retomar planos interrompidos como voltar à faculdade ou ao trabalho com o intuito de retomar o funcionamento da vida anterior ao desencadeamento da doença oncológica A escuta dos pacientes oncológicos ambulatoriais revela ainda uma característica do sujeito sobre a imagem de si o distanciamento entre a doença que se vê e a que se tem Há casos em que tanto a doença quanto o tratamento não deixam sinais evidentes e o sujeito deseja manter a vida e os laços sociais com a doença invisível não captável pelo olhar do outro pessoas próximas parentes ou amigos Compreendem a invisibilidade da doença como uma maneira de dar visibilidade ao que há de saudável vital satisfazendose com essa forma específica de ser captado pelo olhar do outro Sabese que a doença existe mas o outro não a vê Portanto não se trata de uma negação psíquica mas sim de uma forma de sustentarse enquanto sujeito frente ao adoecimento por meio do distanciamento entre a imagem que precisa manter para si confirmada pelo olhar do outro e a imagem que pode se desmanchar pela ameaça da doença É preciso considerar que a vida que se esvai é a do corpo orgânico A vida do corpo subjetivo das marcas psíquicas construídas pelas experiências e relações ao longo do tempo pode ou não se abalar com o surgimento da doença porém o sujeito demanda preservarse Dessa forma tornase necessário no manejo clínico considerar e manter as distinções relativas às dimensões corporais abordadas nas práticas de cuidado Afinal o corpo do qual se ocupa a medicina é o dos órgãos e suas funções O corpo do qual se ocupa a psicanálise é aquele tecido pela sexualidade e pela linguagem PRISZKULNIK 2000 Tecido cujas marcas construídas por um processo de identificações e incorporações à imagem e à representação que o sujeito faz de si da qual não é possível desincorporarse de modo sincronizado à descoberta e à evolução da falência do corpo orgânico O sujeito precisará se rearranjar frente ao surgimento de uma doença em sua temporalidade singular O corpo físico se debilita com a passagem do tempo porém assim como Mucida 2009 ensina o sujeito não envelhece malgrado a velhice preservando seus traços psíquicos que não se modificam com o passar do tempo ele também não adoece malgrado a doença Essa dissonância sobre as dimensões do corpo tem consequências sobre a concepção da morte O possível mecanismo subjetivo de negação do processo orgânico da morte é comumente traduzido como dificuldade de encarar a realidade A psicanálise desde seus primórdios sistematiza o funcionamento de uma realidade psíquica como uma forma especial de concepção sobre realidade que não deve ser confundida com a objetiva FREUD 1987 p 323611 Essa concepção é fundamental desde que os estudos sobre a histeria revelaram que o corpo escutado não era o mesmo da medicina Tornase portanto necessária a distinção clínica entre a realidade psíquica que nega a morte e negação da realidade psíquica que visa ao alinhamento do subjetivo à objetividade da falência orgânica O que o sujeito pede ao ser escutado é que não seja reduzido à sua doença 155 física Um esforço no sentido de não alinhar o corpo à imagem que o sujeito tem de si Embora consciente de sua doença o movimento psíquico do sujeito em tratamento paliativo pode ser o de preservação de suas identificações e seus traços simbólicos constitutivos As duas dimensões frente à morte estão concomitantemente presentes Percorrem caminhos paralelos porém não correspondentes e passíveis de alinhamento A escuta psicanalítica ao não visar à concordância dessas dimensões pode auxiliar os sujeitos a construir recursos simbólicos singulares para lidar com o real irrepresentável da morte e do morrer dado que para o inconsciente o ser humano é imortal FREUD 2010a Se o sujeito fala sobre a dissonância entre o corpo e a imagem é preciso sustentála na transferência a fim de que o sujeito se mantenha falando A tentativa de alinhamento dessas dimensões quando não advinda a partir da fala do sujeito pode levar ao silêncio e à consequente solidão Por fim incluir essa perspectiva da dissonância entre a morte orgânica e a psíquica não nega mas problematiza os preceitos da boa morte de forma a ampliálo dado que a aceitação do desfecho natural da vida nem sempre pode ser um estágio a ser cumprido Ao relativizar a normatividade do conceito incluise a singularidade de cada caso e de suas particulares demandas A não ocorrência da etapa da aceitação não implica diretamente uma má morte mas um desfecho da vida ao modo de cada sujeito 156 Referências CHIBA T Ambulatório In CUIDADO paliativo São Paulo CREMESP 2008 p 115119 FERREIRA V S RAMINELLI O O olhar do paciente oncológico em relação a sua terminalidade ponto de vista psicológico Revista da SBPH Rio de Janeiro v 15 n1 p 101113 2012 FRANCO M H P Psicologia In CUIDADO paliativo São Paulo CREMESP 2008 p 7476 Luto em cuidados paliativos In CUIDADO paliativo São Paulo CREMESP 2008 p 559572 FREUD S A Interpretação dos Sonhos Obras psicológicas Completas de Sigmund Freud 2ª ed Rio de Janeiro Edição Standard brasileira 1987 v 5 p 323611 Considerações atuais sobre guerra e morte In Introdução ao narcisismo ensaios de metapsicologia e outros textos 19141916 1 reimpr São Paulo Companhia das Letras 2010a Obras completas v 12 p 156184 Introdução ao Narcisismo In Introdução ao narcisismo ensaios de metapsicologia e outros textos 19141916 1 reimpr São Paulo Companhia das Letras 2010b Obras completas v 12 p 937 Luto e Melancolia In Introdução ao narcisismo ensaios de metapsicologia e outros textos 19141916 1 reimpr São Paulo Companhia das Letras 2010c Obras completas v 12 p 127144 KOVÁCS M J Morte no contexto dos cuidados paliativos In CUIDADO paliativo São Paulo CREMESP 2008 p 547558 MENEZES R A Tecnologia e Morte Natural o morrer na contemporaneidade Physis Rio de Janeiro dez 2003 v13 n2 p367385 MORETTO M L O psicanalista no transplante de fígado a experiência do outro em si 262 f Tese Doutorado em Psicologia Instituto de Psicologia Universidade de São Paulo São Paulo 2006 O que pode um analista no hospital São Paulo Casa do Psicólogo 2002 MOURA M D et al Org Psicanálise e hospital 3 tempo e morte da urgência ao ato analítico Rio de Janeiro Revinter 2003 MUCIDA A Identificação e envelhecimento do espelho que não se quebra e outros espelhos Kairós Revista da Faculdade de Ciências Humanas e Saúde São Paulo v 12 n 5 p 4453 2009 PRISZKULNIK L Clínicas diagnóstico e tratamento Psicologia USP São Paulo v 11 n1 p 1128 2000 WORLD HEALTH ORGANIZATION WHO Definition of palliative care 2002 Disponível em httpwwwwhointcancerpalliativedefinitionen Acesso em 01 jun 2015 Capítulo 17 OS CUIDADOS PALIATIVOS E O TEMPO 13 13 Transcrição de palestra sobre cuidados paliativos proferida por Romildo do Rêgo Barros psicanalista membro da Escola Brasileira de Psicanálise e da Associação Mundial de Psicanálise Отдел кадров входит в структуру ОГП Тюменского государственного университета Пр Ленина 713 корпус 5 корпус 8 блок 9 Телефон 8 3452 527357 Email kadryutmnru Кадровая служба университета ваш надёжный помощник Все кадровые вопросы Информационная поддержка сотрудников Обработка и оформление документов Консультации по трудовому законодательству Оформление отпусков Формирование справок и других документов Ведение личных дел сотрудников Координация приемной кампании и др Периодический график работы отдела Понедельник четверг с 900 до 1800 Пятница с 900 до 1700 Обеденный перерыв с 1300 до 1400 Информация для сотрудников университета Отдел кадров продолжает вести консультирование и оказание помощи сотрудникам находящимся в отпуске по уходу за ребёнком до трёх лет по телефону и электронной почте Информация для студентов и выпускников Выпускники могут получить справки и документы подтверждающие обучение в университете обратившись в отдел кадров Информацию об услугах отдела кадров можно получить также на сайте университета авторизованным пользователям по ссылке httpsutmnruadministraciaotdelkadrov 159 Cuidado Paliativo é a abordagem que promove qualidade de vida de pacientes e seus familiares diante de doenças que ameaçam a continuidade da vida através de prevenção e alívio do sofrimento Requer a identificação precoce avaliação e tratamento impecável da dor e outros problemas de natureza física psicossocial e espiritual WORLD HEALTH ORGANIZATION 2002 Foi feito um convite para uma conferência sobre Os Cuidados Paliativos e o Tempo tema muito interessante além de muito apropriado para uma discussão entre os profissionais que trabalham no INCA O seu interesse devese primeiramente ao fato de anunciar uma tentativa de abordar uma relação entre dois elementos que à primeira vista parecem contraditórios os cuidados e o tempo Em geral a ideia que se tem dos cuidados é que são uma prática que por um lado ocupa certo tempo e por outro aponta para um tempo futuro quando os efeitos vão aparecer No fundo os cuidados justificamse a partir do que se espera depois No caso das práticas ligadas à saúde é difícil falarse de cuidados sem que alguma ideia de cura se imponha Sempre um paciente dirá quando eu ficar bom Os cuidados paliativos ao contrário dirigemse a pessoas que pelo menos aparentemente não têm mais tempo ou estão com o tempo contado Uma ilustração dessa mudança de qualidade do tempo está na frase de um paciente citada por Pierre Malengreau psicanalista francês em um artigo publicado há anos chamado Para uma clínica dos cuidados paliativos O paciente disse o seguinte Você não imagina a que ponto as palavras tomam para mim um sentido cada vez mais real MALENGREAU 1995 É possível entender essa expressão um sentido cada vez mais real como um sentido cada vez mais próximo do corpo concreto não do corpo que se enfeita que representa outras coisas que não ele próprio como no teatro ou no balé mas do corpo que sofre e que tem no sofrimento a prova principal de que existe e de que é um corpo Na expressão cuidados paliativos toda a questão está então no adjetivo paliativos Todo mundo sabe o que são os cuidados a questão recai então sobre o sentido do adjetivo paliativos O que faz com que um cuidado seja considerado paliativo No dicionário a maioria dos sinônimos de paliativo faz referência a algo que não vai durar muito temporário momentâneo atenuante ou então indica alguma medida que não será definitiva adiamento prorrogação etc Os antônimos citados pelo contrário apontam para a dimensão do tempo definitivo eterno para sempre Isso mostra até que ponto o tempo tem uma relação essencial com os cuidados paliativos Os cuidados paliativos podese dizer são uma maneira particular de manejar o tempo representado pela expressão que a Organização Mundial da Saúde OMS emprega ao definir os cuidados paliativos a continuidade da vida Em participação anterior nas Jornadas de trabalho foi feita uma aproximação entre as tarefas dos psicólogos do INCA e as dos psicanalistas O que esses dois trabalhos tinham em comum A conclusão a que se chegou foi que o que os liga e permite seu diálogo é sobretudo o 160 fenômeno da angústia que é digase assim o afeto mais importante e quase cotidiano das duas práticas Hoje propõese em primeiro lugar que se pense que aquilo que existe em comum apesar das diferenças é a necessidade de um manejo correto do tempo nem lento demais e nem acelerado demais Às vezes deve ser mais lento e às vezes mais acelerado dependendo da necessidade Em segundo lugar podese citar como outro ponto de proximidade entre os cuidados paliativos e a psicanálise uma certa posição diante da cura uma posição que pode ser chamada de modesta nenhuma das duas práticas visa pelo menos diretamente à cura mas ambas visam ao tratamento à própria experiência Aliás esse é um aspecto que os separa da medicina que não pode retirar do seu horizonte a dimensão da cura Isso também faz com que as duas práticas sejam no fundo menos técnicas e muito mais éticas Ou seja elas exigem do praticante que saiba de onde fala e saiba escolher o que dizer ou fazer Muitas vezes essas escolhas devem ser feitas na hora sem que o praticante tenha sido advertido ou preparado Dificilmente haverá tal progresso na prática dos cuidados paliativos que elimine a precariedade que é própria dos encontros humanos São esses pontos em comum que permitem a abordagem dos cuidados paliativos Ou seja tanto os cuidados paliativos quanto a psicanálise estão mais perto de um regime da contingência do dia a dia do detalhe do que de um objetivo universal a cura que deve ser atingido Olhando por esse lado o fracasso da psicanálise não estará em não alcançar a cura que segundo Freud é um ganho anexo do tratamento mas em não conseguir por alguma razão que o dispositivo funcione Isso quer dizer em resumo que o fracasso da psicanálise diz respeito antes de tudo ao fato de o analista não conseguir ocupar o lugar que lhe é proposto No caso dos cuidados paliativos acontece algo parecido toda a questão está nas condições de funcionamento e sobretudo no próprio encontro entre o doente e aquele que cuida e não no objetivo da cura que em geral já não é o que se busca diretamente É claro que os fatores subjetivos do cuidador contam Um psicólogo um médico ou um enfermeiro que é tomado de angústia a cada vez que deve ver o paciente terá de fazer um esforço maior para conseguir atuar Mas não são os fatores subjetivos do cuidador negativos ou positivos que vão ser decisivos no tratamento o que vai decidir os efeitos do encontro é a capacidade do cuidador de ocupar o lugar certo que é determinado bem mais pela subjetividade do paciente suas fantasias seus desejos ou sua angústia do que pela subjetividade do cuidador É o que em psicanálise é chamado de transferência que na verdade representa bem mais o paciente do que quem cuida dele 161 Referências MALENGREAU P Para uma clínica de cuidados paliativos Opção Lacaniana São Paulo n 13 p 8790 1995 WORLD HEALTH ORGANIZATION National cancer control programmes policies and managerial guidelines 2 ed Geneva 2002 What Is It Capítulo 18 A COMUNICAÇÃO E A HUMANIZAÇÃO COMO ASPECTOS FUNDAMENTAIS PARA O MANEJO DA URGÊNCIA SUBJETIVA NOS CUIDADOS DE FIM DE VIDA BONUS Free Ice Cream 165 O ser humano desperta para a necessidade e a urgência de reestruturação da sua vida quando alguma situação limite o coloca frente a frente com o Cronos senhor das horas entidade mitológica que representa o fluir do tempo e que à semelhança da morte ao portar a foice detém o poder de estancar seu fluxo Uma vez deflagrada a crise da descoberta da morte o período que se segue à notícia será vivido de acordo com as peculiaridades de cada história de vida PY OLIVEIRA 2004 p 15 O paciente hospitalizado Ao se refletir sobre o aspecto do tempo diante da clínica hospitalar já é possível se deparar com questões importantes diretamente ligadas à subjetividade dos diferentes atores envolvidos nessa atmosfera O ambiente hospitalar tem um tempo próprio de funcionamento O profissional de saúde com o passar dos anos tem a rotina hospitalar internalizada e de alguma forma acostumase com escalas de plantão noites sem dormir e um tempo programado para os procedimentos o que se faz necessário para um bom funcionamento institucional Essa rotina tornase tão automatizada que dificulta o manejo dos desejos e das subjetividades dos pacientes Para quem está hospitalizado o tempo colocase de forma diferente Além de todo sofrimento advindo do adoecimento o sujeito deve se adequar à rotina hospitalar sem escolha e em grande parte das vezes sem possibilidade de negociação O momento do banho da comida do atendimento do sono da visita O tempo dele passa a ser o tempo do hospital o que o destitui de sua subjetividade Segundo Romano 1999 além da quebra brusca da rotina os fatores que mais geram ansiedade são a confrontação com o sofrimento dos outros pacientes e a ruptura do ciclo sonovigília Moura 2000 afirma que determinadas situações agudas podem se tornar traumáticas sendo o sujeito tomado pela angústia e por um sentimento de desamparo diante de sua nova condição de não sadio da possibilidade de morte e das rupturas que se apresentam nas diversas esferas da vida O paciente oncológico e o manejo da urgência subjetiva nos cuidados de fim de vida Quando acontece a aproximação da clínica oncológica novas questões vêm à tona despertando no paciente e em seus familiares urgências subjetivas diretamente ligadas ao estigma que essa doença carrega Barbosa e Francisco 2007 abordam essa questão salientando que o câncer passou a ser considerado culturalmente como uma doença maldita Esse estigma acaba por gerar ansiedade medo e expectativa de morte Pode suscitar um temor relativo à fase terminal sendo imperioso em questões relativas a perda de ideais dor física mudança nos papéis sociais sofrimento causado 166 à família deformidades entre outras Essa reflexão é fundamental já que uma enfermidade estigmatizada gera consequências na maneira com a qual o sujeito há de lidar com o adoecimento Ao mesmo tempo em que o câncer carrega seus estigmas é preciso destacar que comumente o curso da doença em seu estágio avançado pode de fato causar sofrimentos de diversas ordens físico emocional social espiritual todos passíveis de angústia e desconforto Tornase fundamental tratar objetivamente esses aspectos proporcionando uma sensação de alívio Quando não é mais possível uma proposta curativa o tratamento pode ter seu objetivo voltado para controle de sintomas e uma melhor qualidade de vida até o momento da morte Tais medidas advêm não somente da farmacologia mas do apoio de cuidados físicos de enfermagem e fisioterapia do apoio espiritual e do suporte psicológico BURLÁ PY 2004 Burlá e Py 2004 ressaltam que cada paciente tem uma forma particularíssima de significar a sua doença Assim cada sintoma assume características peculiares à singularidade de cada um BURLÁ PY 2004 p 132 Tal afirmativa possibilita inferir que assim como os sintomas a percepção do tempo e de suas prioridades também é muito particular sendo o paciente o único sujeito capaz de definir o que lhe é urgente Floriani 2009 cita Glaser e Strauss 200714 destacando que diante de um adoecimento grave o processo de morte pode se configurar de diferentes formas quanto ao tempo a morte prevista em tempo previsto a morte prevista em tempo indefinido a morte incerta em tempo previsto e a morte incerta em tempo indefinido Esses cenários distintos tornam a situação ainda mais singular na maneira com que o paciente e seus familiares lidarão com o processo de morte Ademais a filosofia dos cuidados paliativos envolve compreender o momento de morrer sem adiálo ou antecipálo Seja como paciente seja como familiar seja como profissional lidar com a morte é sempre uma questão difícil pois há na cultura brasileira uma ideia arraigada de que morrer é sinônimo de dor e sofrimento Para o médico que tem sua formação totalmente voltada para salvar vidas o óbito também pode se tornar sinônimo de fracasso Burlá e Py 2004 ressaltam que o medo de que o paciente morra agita os profissionais acionando os seus próprios medos e aí se apresentam a dor o sofrimento a ameaça e a impotência diante da morte que extrapolam a pessoalidade do paciente contagiando toda a equipe de saúde A comunicação como elemento necessário para a humanização nos cuidados oncológicos Diante desse cenário a humanização é fundamental pois se atende e se convive com pessoas que se encontram em uma situação de fragilidade angústia desespero e muitas vezes desesperança Tal situação tende a produzir um distanciamento físico e emocional em relação aos pacientes Para Bettinelli et al 2004 o afastamento entre o profissional a família e o paciente pode ser o ponto inicial que desencadeia a desumanização do cuidado O que se propõe nessa caminhada é conciliar e integrar o conhecimento científico com a responsabilidade a sensibilidade a ética e a solidariedade Kovács 2003 afirma que a crença de que o processo de morrer é sempre acompanhado por uma dor insuportável leva a família e a equipe de saúde a se distanciarem dos pacientes 14 GLASSER B G STRAUSS A L Time for Dying New Brunswick London Aldine Transaction 2007 167 terminais evitando o sofrimento e a sensação de impotência No entanto a interdição à morte e ao luto produz uma lacuna no auxílio social ocasionando solidão e angústia aos que estão vivenciando a proximidade da morte Sendo assim podese questionar como é que diante de uma clínica tão árdua a humanização pode auxiliar nesse processo de cuidar Pessini e Bertachini 2004 oferecem um horizonte ao descreverem que Humanizar o cuidar é dar qualidade à relação profissional da saúdepaciente É acolher as angústias do ser humano diante da fragilidade de corpo mente e espírito Destacase nesse contexto a presença solidária do profissional com habilidade humana e científica Diante de um cotidiano desafiador pela indiferença crescente a solidariedade e o atendimento digno com calor humano são imprescindíveis Ser sensível à situação do outro criando um vínculo graças a uma relação dialogal para perceber o querer ser atendido com respeito numa ligação de diálogo e de necessidades compartilhadas Não podemos esquecer que em toda relação profissional construída na confiança estamos sempre diante de um encontro de uma competência com uma consciência o que exige consequentemente responsabilidade ética PESSINI BERTACHINI 2004 p 4 Ao propor à equipe multiprofissional ser sensível à situação do outro PESSINI BERTACHINI 2004 p 4 o atendimento humanizado oferece como ferramenta principal um olhar diferenciado para aquele que busca ou necessita de atendimento na rede de saúde levando em conta suas peculiaridades respeitandoas e oferecendo aos pacientes um espaço de acolhimento que o legitime como sujeito único e portador de singularidades Pensar em sua singularidade significa considerar as dificuldades de enfrentamento do adoecimento que trazem à tona questões tanto psíquicas quanto sociais Mesmo que os avanços tecnológicos da medicina sejam bemvindos é possível perceber que ainda estão dissociados das percepções afetivas que envolvem o processo de adoecimento O cuidar humanizado implica exercer a prática profissional para acolher o paciente em suas angústias diante do corpo adoecido e ajudálo a se situar em suas questões pessoais Essa conduta permitiria a ele construir seus significados para tal situação vinculando a ação do cuidar à compreensão do sujeito e suas particularidades Segundo Callahan e Kelley 1994 apud OLIVEIRA SANTOS MASTROPIETRO 201015 e Hennezel 1995 apud OLIVEIRA SANTOS MASTROPIETRO 201016 a maior dificuldade da equipe médica é a de escutar esse paciente sem se paralisar frente à complexidade abrangida na relação com esse sujeito que vive uma situação de terminalidade No entanto uma das maneiras de atenuar o sofrimento dessa vivência é justamente ouvir os sentimentos do paciente Para escutar tornase indispensável afastarse dos próprios valores e crenças além de abrir mão de impor ao paciente as expectativas e os desejos da equipe Só dessa maneira poder seá viabilizar uma compreensão empática em que é possível olhar a situação da forma como aquele outro olharia OLIVEIRA SANTOS MASTROPIETRO 2010 15 CALLAHAN M KELLEY P Gestos finais compreendendo a consciência necessidades e mensagens dos doentes terminais São Paulo Nobel 1994 16 HENNEZEL M La morte intima los que van morir nos enseñam a viver Buenos Aires Argentina Sudamericana 1995 168 A respeito dessa comunicação Araújo 2009 afirma que o relacionamento interpessoal é a dimensão fundamental da experiência humana pois confirma a existência do indivíduo sendo essencial para a vida ARAÚJO 2009 p 212 Dessa forma a comunicação é um aspecto fundamental na assistência a pacientes em fim da vida já que quando utilizada corretamente pode reduzir o estresse do paciente abrindolhe espaço para compartilhar sua angústia Moura 2000 salienta que a urgência do paciente decorre de quebras que o fazem indagar sobre quem ele é além de romper com as ilusões que tinha como base até então A autora defende a importância de sustentar esse paciente como sujeito já que ele se vê assujeitado diante do adoecimento Levando em conta que uma situação de terminalidade supõe pressa é fundamental priorizar o tempo do sujeito Nesse sentido Calazans e Bastos 2008 ressaltam a importância de prover ao sujeito um espaço para que possa se interrogar e criar recursos para lidar com o insuportável considerando que a urgência pressupõe uma situação disruptiva e que não se pode esperar Barchifontaine 2004 avança nesse debate e afirma que Humanizar é garantir à palavra a sua dignidade ética Ou seja para que o sofrimento humano e as percepções de dor ou de prazer sejam humanizados é preciso que as palavras que o sujeito expressa sejam reconhecidas pelo outro É preciso ainda que o sujeito ouça do outro palavras de reconhecimento É na linguagem que fazemos as descobertas de meios pessoais de comunicação com o outro Sem isso nos desumanizamos reciprocamente Sem comunicação não há humanização A humanização depende da nossa capacidade de falar e de ouvir depende do diálogo com os nossos semelhantes BARCHIFONTAINE 2004 p 15 Em momentos em que o paciente não consegue mais verbalizar ainda pode ser possível estabelecer uma comunicação não verbal de forma a acolher seus sentimentos e anseios e oferecer apoio O contato físico é um dos instrumentos importantes nessas situações possibilitando que o profissional se faça presente Assim oferecese a possibilidade de o sujeito não se sentir desamparado em seu sofrimento além de tornar possível suprir seus desejos seja qual for a fase do processo que o paciente esteja vivenciando ARAÚJO 2009 Kovács 2004 ressalta que o projeto de rehumanização da morte prioriza a comunicação favorecendo a possibilidade de despedidas preparação para a separação e reflexão sobre a continuidade da vida para aqueles que permanecerão desmistificando o processo de morrer evitando o silêncio e o afastamento De acordo com a autora muitos pacientes relatam que a mudança de atitude dos familiares e da equipe é perceptível e que o não dito intensifica o sofrimento Entre as questões que envolvem a necessidade redobrada de acolhimento e comunicação com pacientes terminais uma em especial costuma causar imenso desconforto na equipe e nos familiares quando o paciente pede para morrer e pede que façam algo para aliviar seu sofrimento O que está em jogo segundo Kovács 2004 não é a necessidade de uma atitude imediata mas a possibilidade de escutálo em sua dor e legitimar seu desejo a fim de desvendar as razões para tal pedido que pode envolver sofrimento das mais diversas esferas física emocional espiritual ou social A autora destaca a importância de dar voz ao paciente e não tentar acalmálo por meio de medicamentos impossibilitando um cuidado mais adequado 169 Conscientizar o doente sobre o agravamento do seu quadro não quer dizer deixá lo sem saída ou esperança afirmando que não há nada a fazer num claro sinal de desinvestimento A aproximação da morte é uma situação privilegiada para se lidar com situações inacabadas rever prioridades de vida perceber o sentido da vida Neste sentido um diálogo aberto com perguntas e respostas é certamente um grande facilitador KOVÁCS 2004 p 285 É relevante o sofrimento psíquico de pacientes familiares e profissionais envolvidos em situações de terminalidade e silenciar esses sentimentos na tentativa de mascarálos pode transformar o fim de vida em um momento de extrema angústia para todos os atores envolvidos nesse cenário Falar abertamente ou não sobre a morte é uma condição de cada um Mas é fundamental que se esclareçam todas as dúvidas e questões do paciente ou dos familiares inclusive das crianças para que dentro do possível atendamse anseios angústias e necessidades Tornase fundamental um acolhimento humanizado considerando que cada sujeito tem uma relação particular com a questão da morte assim como com o objeto perdido o que leva à percepção que cada um reagirá de forma singular diante da perda A escassez do tempo A constatação de que a doença não tem mais cura coloca em cena uma situação limite a finitude A partir dos acontecimentos e das suas consequências é comum que se deflagre uma urgência subjetiva Freud em seu texto Sobre a Transitoriedade argumenta que a inevitável extinção das coisas belas pode suscitar a supervalorização dessas afirmando que o valor da transitoriedade é o valor da escassez no tempo FREUD 2006 p 317 Dessa forma é possível fazer uma analogia com um sujeito que por ter sido acometido por uma enfermidade grave passa a vislumbrar o tempo que lhe resta de forma mais valorizada e especial delineandose uma clínica da urgência Assim como propõem os cuidados paliativos ninguém pode prever o que é melhor para o outro É preciso um olhar singular para o paciente sua legitimação como sujeito vivo até o seu último momento de vida seu reconhecimento como sujeito desejante e acima de tudo o respeito à sua autonomia Aliviar os sintomas deve estar no centro das preocupações Qualquer desconforto seja ele de que ordem for implica uma urgência Exige disponibilidade de tempo para se estar presente em tempos de desespero raiva dor alegrias e tristeza além de habilidade para estar atento a esses sinais A urgência dessa clínica apresentase tanto para o paciente quanto para a equipe que deverá estar disponível para essa demanda No cotidiano da clínica dos cuidados de fim de vida nem sempre se tem a oportunidade do encontro em outro momento KüblerRoss 1998 ressalta que ao se tratar de sujeitos que estão morrendo o depois pode ser tarde demais E afirma Quando eles querem falar conosco não estão pensando em falar amanhã Querem falar imediatamente KÜBLERROSS 1998 p 123 E quanto mais se aproxima o momento da morte algo de estranho acontece com o tempo É o tempo do significado É o tempo da intensidade É o tempo do choro É o tempo da espera 170 informação verbal17 O processo de morte induz o sujeito a um tempo de reflexão trazendo à tona novas demandas e todas elas se tornarão urgentes É o tempo do paciente e é ele quem vai ditar o ritmo e a intensidade desse momento O papel do psicólogo nos cuidados de fim de vida No confronto com o adoecimento grave a vida pulsa lateja desafiando a superação da dor no corpo animal e a do sofrimento da alma que sangrando nos impele a buscar incessantemente nossa própria transcendência PY OLIVEIRA 2004 p 136 Levando em conta os estigmas relacionados ao câncer e o interdito à morte e ao luto nos dias atuais é possível destacar o valor da presença do psicólogo na equipe multidisciplinar que compõe os cuidados de fim de vida Em sua tese Educação Para a Morte Desafio na Formação de Profissionais de Saúde e Educação Kovács 2003 ressalta objetivos importantes do trabalho do psicólogo nesse contexto Dentre os principais objetivos do psicólogo está a facilitação do processo de comunicação Resgatar a capacidade de desejar aquilo que é mais importante mesmo nos momentos finais de vida Favorecer o insight descobertas de si até o momento da morte Trabalhar o aprofundamento de relações significativas podendo retomar pendências malentendidos recuperando ou desenvolvendo a capacidade de perdoar e ser perdoado Favorecer a expressão e conclusão de assuntos inacabados Estimular e buscar recursos internos do paciente Favorecer a ressignificação das principais experiências da vida Promover a autonomia do paciente sua dignidade como ser humano bem como o exercício de sua competência Ainda no que se refere aos programas de cuidados paliativos um outro aspecto importante do psicólogo é a abordagem dos familiares KOVÁCS 2003 p 4041 O papel do psicólogo permite um acolhimento do sofrimento psíquico tanto do paciente e de seus familiares quanto da equipe de profissionais diante da ameaça de morte auxiliando na elaboração do luto e na construção de significados da situação real sempre respeitando o tempo que cada um dos sujeitos envolvidos necessitará para elaborar o processo de sua morte ou a de um ente querido As peculiaridades dessa assistência deverão estar de acordo com a dinâmica dos seus lutos 17 Palestra proferida por Graça Motta Figueiredo no XII Congresso Brasileiro de PsicoOncologia em Belo Horizonte em maio de 2013 171 Referências ARAÚJO M M T A comunicação no processo de morrer In SANTOS F S Cuidados Paliativos discutindo a vida a morte e o morrer São Paulo Atheneu 2009 p 209221 BARBOSA L N F FRANCISCO A L A subjetividade do câncer na cultura implicações na clínica contemporânea Revista da SBPH Rio de Janeiro v 10 n 1 p 924 2007 BARCHIFONTAINE C Prefácio In PESSINI L BERTACHINI L Org Humanização e cuidados paliativos São Paulo Loyola 2004 CALAZANS R BASTOS A Urgência subjetiva e clínica psicanalítica Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental São Paulo v 11 n 4 p 640652 2008 BETTINELLI L A et al Humanização do cuidado no ambiente hospitalar In PESSINI L BERTACHINI L Org Humanização e cuidados paliativos São Paulo Loyola 2004 p 87100 BURLÁ C PY L Humanizando o final da vida em pacientes idosos manejo clínico e terminalidade In PESSINI L BERTACHINI L Org Humanização e cuidados paliativos São Paulo Loyola 2004 p 125134 FREUD S Sobre a transitoriedade In A história do movimento psicanalítico artigos sobre a metapsicologia 19141916 Rio de Janeiro Imago 2006 Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud v 14 p 313319 FLORIANI C A Moderno movimento hospice fundamentos crenças e contradições na busca da boa morte 2009 192 f Tese Doutorado em Saúde Pública Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca Fundação Oswaldo Cruz Rio de Janeiro 2009 KOVÁCS M J Educação para a morte desafio na formação de profissionais de saúde e educação São Paulo Casa do Psicólogo 2003 A comunicação nos programas de cuidados paliativos uma abordagem multidisciplinar In PESSINI L BERTACHINI L Org Humanização e cuidados paliativos São Paulo Loyola 2004 p 275290 KÜBLERROSS E A Roda da Vida memórias do viver e do morrer Rio de Janeiro GMT 1998 MOURA M D Psicanálise e urgência subjetiva In MOURA M D Org Psicanálise e Hospital 2 ed Belo Horizonte 2000 OLIVEIRA E A SANTOS M A MASTROPIETRO A P Apoio psicológico na terminalidade ensinamentos para a vida Psicologia em Estudo Maringá v 15 n 2 p 235244 2010 PESSINI L BERTACHINI L Org Humanização e cuidados paliativos São Paulo Loyola 2004 PY L OLIVEIRA A C Humanizando o adeus à vida In PESSINI L BERTACHINI L Org Humanização e cuidados paliativos São Paulo Loyola 2004 p 135148 ROMANO B W Princípios para a prática da Psicologia Clínica em hospitais São Paulo Casa do Psicólogo 1999 DEAF CORGI nDINO Capítulo 19 ENTRE O TEMPO E A FALTA DE TEMPO REFLEXÕES SOBRE O EXERCÍCIO DA PRECEPTORIA NOS PROGRAMAS DE RESIDÊNCIA EM ONCOLOGIA 175 Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas Que já têm a forma do nosso corpo E esquecer os nossos caminhos que nos levam sempre aos mesmos lugares É o tempo da travessia E se não ousarmos fazêla Teremos ficado para sempre À margem de nós mesmos Fernando Pessoa em Há um tempo Introdução Tempo Substantivo simples Mas não tão simples assim Tempo pode se referir a um período a uma época a uma sucessão de horas dias meses ou anos ao clima ao compasso de uma música Pode ser o tempo dos verbos envolvendo passado presente e futuro ou ser o tempo de uma partida de futebol ou ainda sob um ponto de vista mais complexo ser o tempo da física O fato é que o tempo cronológico histórico ou subjetivo é continuamente medido controlado fatiado para ser desigualmente distribuído entre trabalho estudo família e amigos E a forma como se emprega o tempo refletese de modo determinante nas condições de vida No processo de trabalho em saúde o tempo empregado pelos trabalhadores na produção das ações e dos serviços tende a ser prolongado considerando que esses trabalhadores muitas vezes têm mais de um emprego além de terem de assumir diferentes funções a serem desempenhadas em cada fatia de tempo destinada ao trabalho Entre essas funções destacase para os objetivos deste trabalho o exercício da preceptoria nos programas de residência em área profissional da saúde nas modalidades multiprofissional e uniprofissional em instituições oncológicas Esses programas foram instituídos na Lei nº 11129 de 2005 sendo definidos como modalidade de ensino de pósgraduação lato sensu voltada para a educação em serviço e destinada às categorias profissionais que integram a área de saúde excetuada a médica BRASIL 2005 p 1 Têm como objetivo favorecer a inserção qualificada dos jovens profissionais da saúde no mercado de trabalho particularmente em áreas prioritárias do Sistema Único de Saúde BRASIL 2005 p 1 utilizando como metodologia de ensinoaprendizado a formação em serviço pelo trabalho mediante acompanhamento e supervisão trabalho educativo SILVA CABALLERO 2010 Para tanto os programas de residência devem utilizar uma abordagem pedagógica que considere os atores envolvidos como sujeitos do processo ensinoaprendizagem e protagonistas sociais BRASIL 2009 p 7 ou seja uma concepção problematizadora Assim conforme Resolução nº 2 de 2012 da Comissão Nacional de Residência Multiprofissional em Saúde CNRMS os projetos pedagógicos PP devem prever metodologias de integração de saberes e práticas que permitam construir competências compartilhadas tendo em vista a necessidade de mudanças nos processos de formação de atenção e de gestão na saúde BRASIL 2012 p24 Para alcançar tal resultado é necessário que estejam previstas estratégias educacionais práticas teóricas e teóricopráticas As atividades práticas são relacionadas ao ensino em serviço as teóricas são realizadas por meio de estudos individuais e em grupo as teóricopráticas são desenvolvidas por meio de simulação em laboratórios e ambientes virtuais ações de saúde coletiva e em instâncias de controle social análise de casos clínicos entre outras COMISSÃO NACIONAL DE RESIDÊNCIA MULTIPROFISSIONAL EM SAÚDE 2014 Todas as atividades devem ser desenvolvidas sob 176 orientação do corpo docente assistencial composto por docentes tutores e preceptores Os docentes desenvolvem atividades teóricas e teóricopráticas o tutor por sua vez realiza orientação acadêmica de preceptores e residentes a função de preceptor caracterizase por supervisão direta das atividades práticas BRASIL 2012 Se os programas de residência configuramse no ensino em serviço e têm carga horária prática aproximada de 80 do programa podese afirmar que os preceptores são protagonistas no processo ensinoaprendizagem Conforme destacam Carmo Tavares e Mourão 2014 Ainda que não exerça função acadêmica estrita o preceptor tem papel decisivo na formação de um profissional mais humano crítico propositivo transformador e atento às necessidades dos usuários dos serviços de saúde Nessa ótica faz se necessário um preceptor que tenha vivência clínica e que acolha e oriente o aprendizado de forma ética e humana integrando o ensino prático à academia de forma sistemática conduzindo o aprendizado de forma clara e verdadeira CARMO TAVARES MOURÃO 2014 p 2215 Visando a regular o processo de preceptoria a CNRMS definiu na Resolução nº 2 de 2012 as funções para esses profissionais destacandose orientação dos residentes no exercício das atividades práticas facilitação na integração dos residentes com a equipe e os usuários participação nas atividades de pesquisa e projetos de intervenção que integrem ensino e serviço identificação de dificuldades na qualificação dos residentes avaliação do residente participação na avaliação do programa orientação e avaliação dos trabalhos de conclusão de residência BRASIL 2012 Maeda 2006 identificou algumas competências fundamentais para um preceptor saber utilizar o campo de estágio como local de aprendizagem saber administrar a progressão das aprendizagens respeitandose a individualidade e a heterogeneidade da turma saber envolver os residentes em sua aprendizagem e em seu trabalho saber estimular o trabalho em equipe participar da administração do hospital saber utilizar as novas tecnologias no ensino saber formar profissionais éticos saber administrar a sua própria formação ter domínio dos conteúdos equipamentos e procedimentos gostar de ensinar saber agir e reagir com pertinência com capacidade de diagnóstico e de solução de problemas Pagani e Andrade 2012 p103 complementam ao afirmar que o preceptor deve desenvolver uma atividade harmô nica honesta participativa de apoio de segurança de confiança íntegra e com vínculo além de ter que adotar uma postura problematizadora dialógica e participativa e ao mesmo tempo ser um educador apoiador dos profissionais e residentes no território É com esse difícil papel de integrar o que há tempo se encontra fragmentado SILVA CABALLERO 2010 p 61 e balancear um excesso de liberdade na prática profissional do residente e uma supervisão muito próxima SKARE 2012 que o preceptor dos programas de residência é confrontado diariamente Esses desafios tornamse maiores quando a preceptoria se dá em programas de residência em oncologia O processo de trabalho nessa área é considerado complexo dadas a sua dinâmica e as características inerentes ao câncer Os profissionais que atuam na oncologia são particularmente suscetíveis ao sofrimento psíquico e ao esgotamento físico SILVA HAHN 2012 o que pode comprometer o tempo para o exercício da preceptoria 177 Com essas considerações pretendese discutir sobre os tempos do preceptor nos programas de residência em oncologia 1 seu tempo para o ensino 2 seu tempo para se aperfeiçoar 3 seu tempo para além do ensino na assistência na gestão e na pesquisa 4 e seu tempo para além do trabalho destinado à família aos amigos e ao lazer Tempo de ensinar Inicialmente cabe pontuar que o tempo docente não se resume a um tempo pontual de transmissão de conhecimento e sim a diversos fatores que envolvem tempo para planejar identificar demandas e atividades necessárias ao aprendizado avaliar o residente e aperfeiçoar métodos pedagógicos visando a correlacionar teoria e prática De fato apesar de ser lógica a necessidade de tempo para docência as dificuldades para encontrar o tempo necessário para as diversas atividades já se iniciam no processo de planejamento pois conforme afirmaram Carmo Tavares e Mourão 2014 o planejamento das atividades dos programas de residência nem sempre é desenvolvido conjuntamente pela equipe docente e pela equipe do serviço podendo ser organizado de forma fragmentada e desarticulada da realidade do campo Além dessa fragmentação a escolha dos preceptores também tem se configurado como fator dificultador do processo de aprendizagem do residente pois os critérios dificilmente abordam a capacidade pedagógica docente Conforme afirmou Parente 2008 os tutores e preceptores não são professores na concepção tradicional sua práxis educativa está comprometida com os processos de trabalho e sua transformação e não com salas de aula convencionais Frente às dificuldades tornase essencial contar com um profissional que trabalhe com a aprendizagem significativa por meio da problematização no próprio território onde se encontram as dificuldades a serem resolvidas PAGANI ANDRADE 2012 p 105 Assim os processos de ensino devem mais do que contribuir para o êxito de uma atividade imediata desenvolver a imaginação a expressão a argumentação o raciocínio o senso de observação ou a cooperação MAEDA 2006 A problematização configurase de maneira flexível mas requer maior envolvimento estimulando a autonomia dos alunos Para isso necessitase além de preparo de tempo para que ocorram as mudanças Abordando esse tema em uma turma de residentes enfermeiros Melo Queluci e Gouvêia 2014 identificaram três categorias ou tempos de mudanças necessárias ao ensino prático na residência Estruturação de uma sistemática de acolhimento e ambiência referese ao tempo de inserção do residente no campo prático A interação entre preceptor e residente é permeada por relações profissionais e pessoais nas quais se compartilham saberes e vivências Planejamento e implementação dos cuidados a partir de situaçõesproblema tradicionalmente a formação está centrada na reiteração rígida de tarefas normas e rotinas distantes da realidade Portanto existe a necessidade de mudanças com a adesão de métodos pedagógicos alternativos como a problematização da realidade por exemplo O educador precisa ter sensibilidade e tempo para selecionar as situações problemáticas e reconhecer as potencialidades e dificuldades dos estudantes 178 Reorganização do processo de avaliação o processo de avaliação deve abranger o desenvolvimento qualitativo e o crescimento profissional do residente Essa etapa torna se constituinte na construção do próprio conhecimento O tempo de avaliação deve compreender sua formação na dimensão teórica e científica na capacidade de reflexão arguição e decisão além dos aspectos práticos e técnicos da destreza e das habilidades manuais Assim como os programas de residência devem possuir base problematizadora no contato e na troca de saberes entre usuários residentes e docentes o tempo de dedicação deve ser maior do que nas práticas tradicionais de ensino E talvez em razão disso conforme afirmam Melo Queluci e Gouvêia 2014 os métodos educativos convencionais ainda sejam hegemônicos priorizando o repasse de informações a individualidade e a prática repetitiva Cavalcanti e SantAna 2014 ao analisarem as informações obtidas dos preceptores de um programa de residência multiprofissional em oncologia destacaram a ausência de tempo e a falta de capacitação didáticopedagógica como as principais dificuldades para o exercício da preceptoria Portanto é preciso haver tempo para a adequada realização da atividade além de tempo para aperfeiçoar o trabalho a ser desenvolvido ou até mesmo para aprender a ensinar O tempo de se aperfeiçoar Um critério a ser considerado para a escolha dos trabalhadores para a função da preceptoria passa pela sua qualificação técnica profissional embora algumas vezes a escolha possa estar relacionada apenas à presença desse profissional no campo de prática do residente Contudo nem sempre qualificação técnica traduzse em capacidade de ensinar Muitos preceptores não possuem ou possuem muito pouco preparo propriamente pedagógico o que pode prejudicar o ensinar e consequentemente o aprender do residente SKARE 2012 Além dessa deficiência para a prática docente outra importante consideração a respeito da capacidade de cumprir com a função de preceptoria é relatada por Fajardo e Ceccim 2010 Grande parte dos trabalhadores que podem ser preceptores é oriunda de cursos de graduação cujos currículos eram ou são fragmentados organizados por disciplinas e que não preparam para a docência em serviço FARJADO CECCIM 2010 p 197 O preparo pedagógico e a identificação do papel dos direitos das atribuições e das responsabilidades do preceptor foram os principais temas demandados para capacitação entre preceptores que atuam em um programa de residência multiprofissional em oncologia CAVALCANTI SANTANNA 2014 Carmo Tavares e Mourão 2014 também abordam a necessidade de um preparo específico para um bom exercício de preceptoria ao considerarem que a capacidade de articular o conteúdo teórico com a prática não é dada espontaneamente exige sensibilização e capacitação pedagógica CARMO TAVARES MOURÃO 2014 p 2218 Além disso destacam a importância da formação pedagógica permanente dos preceptores que os capacite para que auxiliem na formação de profissionais com perfis mais críticos éticos humanistas e comprometidos com a saúde individual e coletiva 179 Considerando a condição ideal a capacitação pedagógica dos profissionais deve ser desenvolvida por meio de processos de educação permanente organizados que permitam o aperfeiçoamento da prática docente no próprio tempo de exercício da função por meio de métodos problematizadores Além disso o profissional necessita estar sensibilizado sobre a importância de sua função na qualificação de outro trabalhador de saúde que está em tempo de formação de sua identidade profissional Entretanto a relação entre os programas de residência e os processos de educação permanente ainda necessita ser aperfeiçoada em razão de sua importância para a qualificação dos programas bem como para a qualificação do próprio serviço de saúde Conforme afirmaram Meira Martins e Martins 2010 p 212 o tempo de presença do residente nos serviços faz movimentar a vida profissional do preceptor que terá que ler mais e estudar mais para se instrumentalizar nos desafios que acompanham cada novo residente que chega Para as autoras como a equipe passa a refletir sobre seu processo de trabalho é normal que se produzam mudanças mesmo que desacomodando alguns membros e desencadeando conflitos Para Fajardo e Ceccim 2010 o processo de ensino e aprendizagem em equipe e em serviço coloca em xeque o saber de quem sempre dominou um dos lados do binômio neste caso o preceptor visto que outros atores residentes passaram a demandar informações e a questionar atitudes terapêuticas intocadas até aquele momento Não se trata de aprender coisas há que desaprender conceitos práticas e valores perfeitamente instituídos e aceitos em nossa sociedade FAJARDO CECCIM 2010 p 203 Porém apesar de a necessidade de formação dos profissionais para a preceptoria ser indiscutível na prática a maioria dos profissionais não encontra apoio institucional ou oferta de oportunidades para acesso a cursos de formação Isso remete aos sérios problemas vividos por esses trabalhadores no que se refere às políticas de recursos humanos às condições de precarização vividas no ambiente de trabalho e à inexistência de oportunidades para a educação continuada entre outros TRAJMAN et al 2009 p 25 Dessa forma a introdução das residências no cotidiano do serviço não repercute apenas na qualificação de quadros para as novas gerações seu impacto é imediato na recomposição e na qualidade imaterial e material do trabalho devendo compor portanto a agenda de gestão do trabalho em Saúde FAJARDO CECCIM 2010 A relação dinâmica entre o preceptor e o residente desenvolve a reflexão dos processos de trabalho e identifica possíveis pontos de melhoria Entretanto para que essa relação ocorra de forma otimizada fazse necessário que o tempo destinado ao aperfeiçoamento da prática docente não conflite com o tempo destinado às outras atividades do serviço mas seja parte integrante delas Tempos além do ensino assistência gestão e pesquisa Conforme discutido anteriormente o preceptor é responsável pela orientação do processo de aprendizagem no campo de prática profissional Assim para esse exercício docente o 180 profissional de saúde deve estar inserido no campo de prática e exercer a assistência direta aos pacientes além de muitas vezes ter de gerir os serviços e desenvolver pesquisas no âmbito institucional Não há regulação específica que determine a divisão do tempo do trabalhador entre a preceptoria e as outras práticas cabendo portanto a cada instituição organizar esse processo Entretanto com essa indefinição frente à alta demanda assistencial dos serviços de saúde podem ocorrer sobrecargas de atividades e consequentes comprometimentos do processo ensino aprendizagem Essa questão foi abordada por Carmo Tavares e Mourão 2014 ao ressaltarem a necessidade de assegurar tempo e local adequados para o desenvolvimento de ações que envolvem a preceptoria Segundo as autoras o profissional parece estar todo o tempo ocupado com as ações próprias do serviço sem vislumbrar que por se tratar de hospital universitário o planejamento de seu serviço deveria incluir o ensino CARMO TAVARES MOURÃO 2014 p 2217 A sobreposição das atividades de ensino e assistência também foi destacada por Cavalcanti e SantAnna 2014 como um limitador do adequado exercício da preceptoria em um hospital oncológico Além disso a multiplicidade de atividades durante o plantão hospitalar dificulta o acompanhamento dos estudantes A função ensino é em alguns casos fixada para o profissional independente de sua vontade e preparo Assim diante do cenário de exiguidade do tempo da escassez de recursos humanos no setor da interlocução deficiente entre ensino e serviço da sobrecarga de trabalho e da precariedade das condições de trabalho o exercício da preceptoria pode ser minimizado prejudicando o processo de formação dos profissionais e comprometendo o modelo proposto pelos programas de residência CARMO TAVARES MOURÃO 2014 Esse comprometimento dos programas pela estrutura dos serviços também foi discutido por Silva e Caballero 2010 ao destacar que a residência per si não assegura os resultados satisfatórios dos processos de ensino Para as autoras o processo de institucionalização das propostas de residência em saúde pode suprimir as suas potências em razão da repetição dos modelos já consolidados Portanto esses desafios colocados pela complexidade da limitação do tempo exigem um olhar diferenciado sobre o processo ampliando a compreensão para além da racionalidade políticoestratégica da instituição inserindo novas perspectivas que poderão comprometer a qualidade da preceptoria desenvolvida AZEVEDO FERNANDES CARRETEIRO 2007 Frente ao cenário de acúmulo de funções sem a devida distribuição dos diferentes tempos do preceptor pela gestão dos serviços o resultado é a sobrecarga de trabalho Em estudo realizado por Trajman et al 2009 essa sobrecarga sentida pela escassez do tempo foi destacada por preceptores como principal ponto negativo do exercício da função 433 Por outro lado o ponto positivo destacado pelos mesmos trabalhadores foi o desenvolvimento pessoal e profissional 644 É nessa relação conflituosa vivenciada por preceptores e residentes quando o responsável pelo processo de formação de um jovem profissional não tem o tempo destinado a essa função que podem se estabelecer processos intersubjetivos capazes de gerar pactos e alianças inconscientes produzidos a partir dos benefícios do prazer e do sofrimento que os sujeitos experimentam SÁ AZEVEDO 2010 repercutindo no espaço para além do trabalho 181 Tempos além do trabalho Em razão da sobrecarga de trabalho pelo acúmulo de funções é de se esperar que reste pouco tempo para além do mundo do trabalho Entretanto apesar da importância para a qualidade de vida dos profissionais são escassos os estudos que visam a analisar o tempo fora do trabalho Os poucos estudos existentes buscam relacionar as condições de saúde e o sofrimento gerado pelo e no trabalho não abordando os mecanismos de enfrentamento a essa situação Segundo Blozen 2010 é desafiador orientar um novo profissional e isso pode ser fator desencadeante de estresse e síndrome de burnout Para a autora a falta de preparação e treinamento são fatores comuns A falta de remuneração específica ou outro tipo de compensação é outro fator Além disso os preceptores relatam sensação de estresse em não cumprir as suas responsabilidades docentes Sentem uma disparidade entre sua visão do papel preceptor e o que eles podem plausivelmente realizar Essa disparidade contribui para o cansaço e a exaustão emocional que se segue refletindo em sua saúde e rotina diária além do trabalho Além disso essa discussão ganha mais dramaticidade se for considerado o espaço hospitalar oncológico no qual os profissionais lidam com sofrimento dor e morte de seus pacientes em uma dura rotina Enfrentar essa situação e ainda ter que preparar jovens profissionais recémformados para atuar nesse cenário pode gerar insegurança nos preceptores podendo repercutir em sofrimento e preocupação No que tange a esse sofrimento cabe lembrar que além do trabalho de preceptoria e do perfil de pacientes atendidos esses profissionais vivem uma sobrecarga de trabalho originada pela alta demanda de cumprimento dos protocolos das metas de desempenho indicadores de produtividade além do excesso de formulários e documentos a serem preenchidos em função das boas práticas recomendadas pelas instituições de qualidade gerando dois tipos de reação resistências ao cumprimento de determinadas atividades e fuga de alguns profissionais amparados no cumprimento das burocracias ausentandose do cuidado ao paciente minimizando assim o sofrimento gerado pelo trabalho Apesar dos mecanismos de enfrentamento desenvolvidos pelos profissionais não é raro o momento em que se depara com preceptores exaustos e estressados E quando o tempo de trabalho encerrase dificilmente o profissional não carrega para a vida pessoal esses problemas Da mesma forma em que multiplica o tempo para desenvolver todas as suas atividades no trabalho ele deve tentar multiplicar o seu tempo além do trabalho buscando o descanso o lazer e a boa companhia Em uma revisão realizada por Omansky 2010 os diversos papéis e responsabilidades assumidos por esses profissionais foram considerados fatores estressantes podendo ser motivo para abandono de emprego Os autores diante dos resultados sugerem que a gerência das instituições deva tomar algumas atitudes que visem a amenizar esses problemas como reduzir o número de pacientes destinados aos preceptores e estudantes alocar o tempo de ensino na carga horária dos profissionais ofertar educação permanente para os profissionais e dar mais autonomia aos docentes para que possam organizar de forma criativa o tempo mais adequado de cada atividade Contudo o que se observa em um cenário geral é uma realidade diferente dessa com instituições rígidas e com controle de horário fabril Segundo Azevedo 2002 desencadear processos criativos e de mudança implica propiciar que a organização se perceba como plural atravessada por divisões alianças fissuras conflitos o que se contrapõe à visão harmoniosa que perpassa as organizações e é dominante nas abordagens gerenciais 182 Com isso esperase que as mudanças na organização dos serviços de saúde possam refletir em melhoria do tempo livre do trabalhador Considerações finais Buscouse abordar neste capítulo a multiplicidade de papéis que os preceptores exercem em sua rotina diária Papéis que exigem tempo de dedicação e esforço principalmente se for considerada a complexidade da inclusão de um profissional em formação em um hospital oncológico Cabe destacar que a fragmentação do tempo realizada na organização deste trabalho é apenas didática pois todas essas atividades estão interrelacionadas e ocorrem muitas vezes de forma concomitante a residência é formação no e para o serviço Assim o tempo de duração do programa deve ser entendido como um tempo de travessias que resulta em mudanças para o profissional em formação e para os preceptores que necessitam equilibrar os seus tempos para o alcance saudável dos resultados desejáveis Mas principalmente é tempo de transformações para as instituições que devem oferecer condições adequadas para o processo de formação dos profissionais de saúde por meio dos programas de residência o que implica reconhecer a necessidade da definição de um tempo para o exercício da preceptoria 183 Referências AZEVEDO C S FERNANDES M I A CARRETEIRO T C Sob o domínio da urgência a prática de diretores de hospitais públicos do Rio de Janeiro Cadernos de Saúde Pública Rio de Janeiro v 23 n 10 p 24102420 2007 Liderança e processos intersubjetivos em organizações públicas de saúde Ciência Saúde Coletiva São Paulo p 349361 v 7 n 2 2002 BLOZEN B Avoiding preceptor burnout American Nurse Today Doylestown v 5 n 11 p 4142 2010 BRASIL Lei nº 11290 de 30 de junho de 2005 Diário Oficial da União Brasília DF 1 jul 2005 Seção 1 p 1 BRASIL Ministério da Educação Ministério da Saúde Portaria nº 1077 de 12 de novembro de 2009 Diário Oficial da União Brasília DF 13 nov 2009 Seção 1 p 7 BRASIL Ministério da Educação Resolução nº 2 de 13 de abril de 2012 Diário Oficial da União Brasília DF 16 abr 2012 Seção 1 p 2425 CARMO R M C V TAVARES C M M MOURÃO L C A dinâmica de interação ensino serviço no setor de infectologia de um hospital universitário Revista de Enfermagem UFPE online Recife v 8 p 22142219 2014 Suplemento 1 CAVALCANTI I L SANTANNA J M B A preceptoria em um programa de residência multiprofissional em oncologia carências e dificuldades Revista Eletrônica Gestão Saúde Brasília DF v 5 n 3 p 10451054 2014 COMISSÃO NACIONAL DE RESIDÊNCIA MULTIPROFISSIONAL EM SAÚDE Brasil Resolução nº 5 de 07 de novembro de 2014 Diário Oficial da União Brasília DF 10 nov 2014 Seção 1 p 34 FAJARDO A P CECCIM R B O trabalho da preceptoria nos tempos de residência em área profissional da saúde In FAJARDO A P ROCHA C M F PASINI V L Org Grupo Hospitalar Conceição Residências em saúde fazeres saberes na formação Porto Alegre Hospital Nossa Senhora da Conceição 2010 p 191210 MAEDA D Y Preceptoria no curso de Residência em Enfermagem competências da enfermeira 2006 Dissertação Mestrado Faculdade de Enfermagem Universidade Federal da Bahia Salvador 2006 MEIRA A C S MARTINS A R MARTINS M C A Relação entre preceptores e residentes e percalços In FAJARDO A P ROCHA C M F PASINI V L Org Grupo Hospitalar Conceição Residências em saúde fazeres saberes na formação Porto Alegre Hospital Nossa Senhora da Conceição 2010 p 211224 MELO M C QUELUCI G C GOUVÊA M V Problematizando a residência multiprofissional em oncologia protocolo de ensino prático na perspectiva de residentes de enfermagem Revista da Escola de Enfermagem da USP São Paulo v 48 n 4 p 706714 2014 OMANSKY G L Staff nurses experiences as preceptors and mentors an integrative review Journal of nursing management Oxford v 18 n 6 p 697703 2010 184 PAGANI R ANDRADE L O M Preceptoria de território novas práticas e saberes na estratégia de educação permanente em saúde da família o estudo do caso de Sobral CE Saúde e Sociedade São Paulo v 21 p 94106 2012 Suplemento 1 PARENTE J R F Preceptoria e tutoria na residência multiprofissional em saúde da família Sanare Sobral v 7 n 2 p 4753 2008 SÁ M C AZEVEDO C S Subjetividade e gestão explorando as articulações psicossociais no trabalho gerencial e no trabalho em saúde Ciência Saúde Coletiva Rio de Janeiro v 15 n 5 p 23452354 2010 SILVA D S HAHN G V Processo de trabalho em oncologia e a equipe multidisciplinar Caderno Pedagógico Lajeado v 9 n 2 p 125137 2012 SILVA Q T A CABALLERO R M S A Micropolítica da formação profissional na produção do cuidado devirresidência In FAJARDO A P ROCHA C M F PASINI V L Org Grupo Hospitalar Conceição Residências em saúde fazeres saberes na formação Porto Alegre Hospital Nossa Senhora da Conceição 2010 p 6174 SKARE T L Metodologia do ensino na preceptoria da residência médica Revista do Médico Residente Curitiba v 4 n 2 p 116120 2012 TRAJMAN A et al Preceptoria na rede básica da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro opinião dos profissionais de Saúde Revista Brasileira de Educação Médica Rio de Janeiro v 33 n 1 p 2432 2009 Anexo EQUIPE DE ELABORAÇÃO 187 APRESENTAÇÃO Márcia Marília Vargas Froes Skaba Doutora em Ciências pela Fundação Oswaldo Cruz Fiocruz Assistente Social e Socióloga e pesquisadora associada do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva INCA Email mhskabagmailcom Maria de Fátima Batalha de Menezes Doutora em Enfermagem pela Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ e pesquisadora associada do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva INCA Email mfbatalhaterracombr CAPÍTULO 1 Ana Beatriz Rocha Bernat Psicóloga do Serviço de Oncologia Pediátrica do Hospital do Câncer I HCI INCA coordenadora da pesquisa Impasses no reingresso escolar de crianças e adolescentes egressos de tratamento onco hematológico mestre em Teoria Psicanalítica pelo Departamento de Teoria Psicanalítica do Instituto de Psicologia IP da Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ especialista em Atendimento Psicanalítico em Instituição pelo Instituto de Psiquiatria IPUB da UFRJ Email abernatincagovbr Nina Gomes Costa Psicóloga pesquisadora do Serviço de Oncologia Pediátrica do Hospital do Câncer I HCIINCA participante da pesquisa Impasses no reingresso escolar de crianças e adolescentes egressos de tratamento oncohematológico e do projeto Adesão ao tratamento Oncohematológico mestranda no Programa de Pósgraduação em Psicossociologia das Comunidades e Ecologia Social EICOS do Instituto de Psicologia IP da Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ especialista em Oncologia pelo INCA Email gcninayahoocombr CAPÍTULO 2 Milena Dórea de Almeida Mestre e doutoranda em Psicologia Clínica pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo USP membro do projeto de pesquisa A Psicanálise e a criança a infância e o infantil CNPq do Programa de PósGraduação em Psicologia Clínica do Instituto de Psicologia da USP Email mildorealmsncom Léia Priszkulnik Professora doutora do departamento de Psicologia Clínica do Instituto de Psicologia da USP docente pesquisadora e orientadora da graduação e da pósgraduação líder do projeto de pesquisa A Psicanálise e a criança a infância e o infantil CNPq do Programa de Pósgraduação em Psicologia Clínica do Instituto de Psicologia da USP psicanalista Email leiapriszkgmailcom CAPÍTULO 3 Marcelo Chahon Psicólogo do Hospital do Câncer I HCIINCA doutor em Psicologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ na área de concentração em Desenvolvimento Cognitivo Email psichahongmailcom 188 CAPÍTULO 4 Tiago Mileib de Souza Psicólogo clínico da Associação de Combate ao Câncer do CentroOeste de Minas ACCCOM pós graduando em Saúde Mental pelo Instituto de Educação Continuada da Pontifícia Universidade Católica de Minas IECPUC Email mileib2005yahoocombr Cláudia Ferreira Melo Psicóloga clínica mestre docente no curso de Psicologia da Faculdade Divinópolis Faced Email meloclaudiagmailcom CAPÍTULO 5 Aline Antunes Pereira Psicóloga titular do Núcleo de Psicooncologia do AC Camargo Cancer Center especialista em Psicologia Hospitalar com Ênfase em Oncologia pósgraduanda em Psicanálise da Criança e do Adolescente mestranda em Ciências Oncologia pelo AC Camargo Cancer Center São Paulo SP Email alinepsicyahoocombr Christina Haas Tarabay Psicóloga psicanalista especialista em Psicooncologia mestre e doutora em Ciências e Oncologia pela Fundação Antônio Prudente AC Camargo Cancer Center membro do Serviço de Psicologia do Núcleo de Psicooncologia do AC Camargo Cancer Center São Paulo SP Email starabay uolcombr Kátia Rodrigues Antunes Psicóloga membro do Ambulatório de Psicologia do Núcleo de Psicooncologia do AC Camargo Cancer Center especialista em Psicooncologia mestre em Ciências Oncologia pelo AC Camargo Cancer Center especialista em Neuropsicologia e em Reabilitação Neuropsicológica pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo HCFMUSP Email katiarantunesigcombr Carolina Marçal Brito da Cunha Psiquiatra da infância e da adolescência membro da Psicooncologia da Infância e Adolescência do AC Camargo Cancer Center mestranda em Ciências Oncologia pelo AC Camargo Cancer Center São Paulo SP Email carolinamarcalterracombr Maria Teresa Duarte Pereira da Cruz Lourenço Psiquiatra membro do Núcleo de Psicooncologia do AC Camargo Cancer Center membro do Grupo de Apoio ao Tabagista do AC Camargo Cancer Center doutora em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo Unifesp Email mariateresacruzyahoocombr CAPÍTULO 6 Maria Laura Garcia Sapia Monteiro Psicóloga do Hospital do Câncer de Londrina HCL e do Centro de Oncologia e Radioterapia de Londrina especialista em oncologia Email mlauramsercomtelcombr 189 CAPÍTULO 7 Marielle Cristina Ribeiro de Carvalho Assistente social da Universidade Estadual de Campinas Unicamp especialista em Pediatria e Serviço Social pela Unicamp Email mariellecarvalhohotmailcom Tássia Silva Juliani Assistente social especialista em Oncologia Serviço Social e Saúde pela Universidade Estadual de Campinas Unicamp Email tassiajulianihotmailcom CAPÍTULO 8 Cláudia Daniele Leite Salgueiro Psicóloga e gerontóloga psicóloga da Rede de Hospitais HAPVIDA Recife doutoranda em Psicologia Clínica pela Universidade Católica de Pernambuco Unicap mestre em Ciências da Saúde pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Pernambuco UPE docente das graduações em Psicologia e Assistência Social do Centro Universitário Maurício de Nassau Uninassau e dos cursos de Pósgraduação em Psicologia do Instituto de Desenvolvimento Educacional IDE Cursos Faculdade Redentor e da Faculdade de Ciências Humanas Esuda Email danieleleitehotmailcom Larissa Coelho Acadêmica de Psicologia da Universidade Federal de Pernambuco UFPE estagiária do Hospital das Clínicas de Pernambuco HCP membro do projeto de extensão Assistência à Maternidade da UFPE vinculado ao HCP Email coelholarissa8gmailcom CAPÍTULO 9 Luciana Souza Neves Primavera Psicóloga residente do segundo ano do Programa de Residência Multiprofissional em Oncologia da Fundação Antônio Prudente AC Camargo Cancer Center São Paulo SP Email lucianaprimaverahotmailcom Christina Haas Tarabay Psicóloga psicanalista especialista em Psicooncologia mestre e doutora em Ciências e Oncologia pela Fundação Antônio Prudente AC Camargo Cancer Center membro do Serviço de Psicologia do Núcleo de Psicooncologia do AC Camargo Cancer Center São Paulo SP Email starabayuolcombr Maria Teresa Duarte Pereira da Cruz Lourenço Psiquiatra membro do Núcleo de Psicooncologia do Hospital AC Camargo membro do Grupo de Apoio ao Tabagista do Hospital AC Camargo doutora em Medicina pela Unifesp São Paulo SP Email mariateresacruzyahoocombr CAPÍTULO 10 Christina Haas Tarabay Psicóloga psicanalista especialista em Psicooncologia mestre e doutora em Ciências e Oncologia pela Fundação Antônio Prudente AC Camargo Cancer Center membro do Serviço de Psicologia do Núcleo de Psicooncologia do AC Camargo Cancer Center São Paulo SP Email starabay uolcombr 190 Maria Isabel Waddington Achatz Médica membro do Departamento de Oncogenética do AC Camargo Cancer Center mestre em Oncologia pela Fundação Antônio Prudente doutora em Oncologia pela Faculdade de Medicina da USP cientista e orientadora da Pósgraduação da Fundação Antônio Prudente membro do departamento de Oncogenética da Sociedade Brasileira de Genética Clínica Email miachatz gmailcom CAPÍTULO 11 Kássia de Oliveira Martins Siqueira Assistente social e especialista em Serviço Social e Saúde graduanda em Filosofia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro Uerj mestre e doutoranda em Políticas Públicas e Formação Humana pela Uerj assistente social em um hospital público localizado no município do Rio de Janeiro Email kassiasiqueirayahoocombr CAPÍTULO 12 Maria da Penha Schwartz Enfermeira estomaterapeuta de HCI INCA doutoranda pelo Programa de Pósgraduação em Enfermagem e Biociências PPGENFBIO da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro Unirio Email penhaschwartzyahoocombr Enéas Rangel Teixeira Enfermeiro e psicólogo pósdoutor em Psicologia Clínica professor titular da Escola de Enfermagem Aurora Afonso Costa EEAAC da Universidade Federal Fluminense UFF Email eneaspsihotmailcom CAPÍTULO 13 Ingrid Raiol da Silveira Psicóloga especialista em Psicologia em Oncologia pelo Programa de Residência Multiprofissional do INCA Email ingridraiolgmailcom Márcia Regina Lima Costa Psicóloga mestre e doutoranda em Psicologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ psicóloga do Hospital do Câncer III HCIIIINCA Email marciacostaincagovbr CAPÍTULO 14 Ernani Costa Mendes Doutorando em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Ensp da Fundação Oswaldo Cruz Fiocruz fisioterapeuta do Hospital do Câncer I HCIINCA Email ernanicmendes gmailcom Ana Paula Menezes Bragança dos Santos Mestranda em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Ensp da Fundação Oswaldo Cruz Fiocruz assistente social mediadora de conflitos Email anapaulambhotmailcom 191 CAPÍTULO 15 Alexandre da Silva Costa Professor de Bioética da Universidade Federal Fluminense UFRJ intensivista e neurologista pediátrico doutor em filosofia pela UFRJ coordenador das Comissões de Bioética Clínica dos hospitais universitários da UFRJ Email alexandrecostalealhotmailcom CAPÍTULO 16 Ana Flávia Petrovcic Fattore Psicóloga do Instituto Baiano do Câncer Hospital Santa Izabel Salvador BA especialista em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUCSP especialista em Psicologia Hospitalar pelo Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo e pelo Conselho Regional de Psicologia de São Paulo CRPSP Email anafattoregmailcom CAPÍTULO 17 Romildo do Rêgo Barros Psicanalista membro da Escola Brasileira de Psicanálise e da Associação Mundial de Psicanálise Email romildorbarrosterracombr CAPÍTULO 18 Joana Cés de Souza Dantas Psicóloga residente do Programa de Residência Multiprofissional em Oncologia do INCA Email joanacessouzadantasgmailcom Paula Braga Ribeiro Psicóloga residente do Programa de Residência Multiprofissional em Oncologia do INCA membro associado da Sociedade de Psicanálise Iracy Doyle SPID Email paulabragaribeiro gmailcom CAPÍTULO 19 Fernando Lopes Tavares de Lima Cirurgiãodentista mestre em Saúde Pública Coordenação de Ensino do INCA Email flima incagovbr Nélia Beatriz Caiafa Ribeiro Cirurgiãdentista mestre em Educação Profissional em Saúde Coordenação de Ensino do INCA Email neliaribeiroincagovbr Mario Jorge Sobreira da Silva Farmacêutico mestre em Saúde Pública Coordenação de Ensino do INCA Email mariosilva incagovbr Este livro foi impressa na Gráfica Fox Print em offset papel couche mate 120g 44 Fonte Book Antigua corpo 11 Rio de Janeiro julho de 2015 CADERNOS DE PSICOLOGIA Os tempos no hospital oncológico MINISTÉRIO DA SAÚDE Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva INCA Número 3 Biblioteca Virtual em Saúde Prevenção e Controle de Câncer httpcontrolecancerbvsbr CADERNOS DE PSICOLOGIA Os tempos no hospital oncológico Número 3