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Capítulo III TEORIAS As ciências empíricas são sistemas de teorias A lógica do conhecimento científico pode portanto ser apresentada como uma teoria de teorias As teorias científicas são enunciados universais Como todas as representações lingüísticas são sistemas de signos ou símbolos Não me parece conveniente expressar a diferença entre teorias universais e enunciados singulares dizendo que estes últimos são concretos ao passo que as teorias são simplesmente fórmulas simbólicas ou esquemas simbólicos pois podese dizer exatamente o mesmo inclusive dos enunciados mais concretos 1 As teorias são redes lançadas para capturar aquilo que denominamos o mundo para racionalizálo explicálo dominálo Nossos 1 Tratase de um comentário crítico a uma concepção que eu mais tarde chamaria de instrumentalismo cujos defensores em Viena eram Mach Wittgenstein e Schlick cf notas 4 e 7 na seção 4 e nota 5 na seção 27 Tratase da concepção para a qual a teoria nada mais é que um instrumento ou ferramenta para a predição Critiquei essa concepção ao analisála em meus artigos A Note on Berkeley as a Precursor of Mach British Journal for the Philosophy of Science v 6 1953 pp 26 e ss Three Views Concerning Human Knowledge in Contemporary British Philosophy iii 1956 obra organizada por H D Lewis pp 355 e ss crítica mais desenvolvida achase em meu Postscript seções 11 a 15 e 19 a 26 Em poucas palavras entendo que nossa linguagem comum está cheia de teorias que a observação é sempre uma observação à luz de teorias que só o preconceito indutivista leva as pessoas a pensarem em uma possível linguagem fenomenica livre de teorias distinguível de uma linguagem teórica e enfim que o estudioso está interessado em explicações ou seja em teorias passíveis de prova dotadas de poder explicativo aplicações e predições interessamno apenas por motivos teóricos porque podem ser utilizadas como provas de teorias Vejase ainda o novo apêndice x 61 esforços são no sentido de tornar as malhas da rede cada vez mais estreitas 12 CAUSALIDADE EXPLICAÇÃO E DEDUÇÃO DE PREDIÇÕES Oferecer uma explicação causal de certo acontecimento significa deduzir um enunciado que o descreva utilizando como premissas da dedução uma ou mais leis universais combinadas com certos enunciados singulares as condições iniciais Podemos por exemplo dizer que damos explicação causal do rompimento de um fio se asseverarmos que o fio tem uma resistência à ruptura igual a um quilo e que se prendeu nele um peso de dois quilos Se analisarmos essa explicação causal poderemos distinguir várias partes constitutivas De um lado colocase a hipótese sempre que um fio é levado a suportar um peso que excede aquele que caracteriza a sua resistência à ruptura ele se romperá Esse enunciado apresenta o caráter de uma lei universal da natureza De outro lado deparamos com enunciados singulares no caso dois desses enunciados que se aplicam apenas ao evento específico em pauta o peso característico deste fio é de um quilo e o peso preso a este fio foi de dois quilos 1 Temos assim duas diferentes espécies de enunciados colocandose ambas como ingredientes necessários de uma explicação causal completa Tratase de 1 enunciados universais isto é hipóteses com o caráter de leis naturais e 2 de enunciados singulares que se aplicam ao evento específico em pauta e que chamarei de condições iniciais Da conjunção de enunciados universais e condições iniciais deduzimos o enunciado singular este fio se romperá A esse enunciado denominamos predição específica ou singular 2 As condições iniciais descrevem aquilo que habitualmente é chamado de causa do evento em questão O fato de um peso de dois quilos ter sido preso a um fio que apresentava resistência à ruptura igual a um quilo foi a causa de seu rompimento A predição descreve aquilo que é normalmente chamado de efeito Evitarei ambos os termos Em Física o emprego da expressão explicação causal é via de regra feito apenas no caso especial em que as leis universais assumem a forma de leis de ação por contato ou mais precisamente a forma de leis de ação a uma distância que tende a zero expressada por meio de equações diferenciais Essa restrição não será levada em conta neste contexto Além disso não farei qualquer asseveração geral quanto à aplicabilidade universal desse método dedutivo de explicação teórica Não afirmarei pois qualquer princípio de causalidade ou princípio de causação universal O princípio da causalidade é a asseveração de que todo e qualquer evento pode ser causalmente explicado de que pode ser dedutivamente previsto De acordo com a maneira como se interprete a palavra pode na asserção acima esta será tautológica analítica ou uma asserção acerca da realidade sintética Se pode quiser dizer que é sempre logicamente possível elaborar uma explicação causal a asserção será tautológica pois para toda e qualquer predição poderemos sempre indicar enunciados universais e condições iniciais de que a predição é deduzível Se esses enunciados universais foram ou não submetidos a prova e confirmados em outros casos isso naturalmente é um problema diferente Se entretanto pode quiser dizer que o mundo é governado por leis rígidas que ele é construído de tal forma que todo evento específico é exemplo de uma regularidade universal ou lei a asserção será reconhecidamente sintética Em tal caso porém ela será não falsável como veremos adiante na seção 78 Conseqüentemente não adoto nem rejeito o princípio da causalidade contentome simplesmente com excluílo da esfera da ciência dandoo por metafísico Proporei contudo uma regra metodológica que corresponde tão proximamente ao princípio da causalidade que este pode ser encarado como sua versão metafísica Tratase da regra simples de que não devemos abandonar a busca de leis universais e de um coerente sistema teórico nem abandonar jamais nossas tentativas de explicar causalmente qualquer tipo de evento que possamos descrever Essa regra orienta o investigador em seu trabalho A concepção segundo a qual os mais recentes desenvolvimentos no campo da Física exigem 1 Análise mais clara do exemplo em que comparecem duas leis e duas condições iniciais seria esta A cada fio de determinada estrutura S determinada pelo tipo de material de espessura etc corresponde um peso característico w tal que o fio se rompe se um peso maior do que w é preso a ele A cada fio de estrutura S1 corresponde um peso característico w1 de um quilo Estas seriam as duas leis universais As condições iniciais seriam Este é um fio de estrutura S1 e O peso colocado no fio é igual a 2 quilos 2 O termo predição tal como é aqui empregado abrange enunciados a respeito do passado retrodicções e mesmo enunciados dados que se procura explicar explicanda cf meu Poverty of Historicism 1945 p 133 da edição de 1957 bem como a seção 15 do meu Postscript 62 renúncia a essa regra ou de que a Física pelo menos em determinado setor considera inútil continuar a busca de leis não é acolhida neste contexto 2 A questão será examinada na seção 78 3 13 UNIVERSALIDADE ESTRITA E NUMÉRICA Cabe distinguir duas espécies de enunciados sintéticos universais o estritamente universal e o numericamente universal Foram os enunciados estritamente universais que tive em mente até agora ao falar de enunciados universais de teorias ou leis naturais A outra espécie os enunciados numericamente universais são em verdade equivalentes a certos enunciados singulares ou a conjunções de enunciados singulares e como enunciados singulares serão aqui classificados Comparese por exemplo os dois enunciados seguintes a É verdade acerca de todos os osciladores harmônicos que sua energia nunca desce abaixo de certo nível mínimo a saber h v 2 e b É verdade acerca de todos os seres humanos que habitam atualmente a Terra que eles nunca ultrapassam certa altura máxima digamos 250 m A lógica formal inclusive a lógica simbólica que se preocupa tãosomente com a teoria da dedução trata esses dois enunciados de modo semelhante como enunciados universais implicações formais ou gerais 1 Julgo porém necessário sublinhar a diferença que existe entre eles O enunciado a pretende ser verdadeiro para qualquer tempo e qualquer local O enunciado b referese apenas a uma classe finita de elementos específicos dentro de uma finita região individual ou particular do espaçotempo Enunciados desta última espécie podem em princípio ser substituídos por uma conjunção de enunciados singulares com efeito concedido tempo suficiente é possível enumerar todos os elementos da classe finita em pauta Esta a razão por que nesses casos falamos em universalidade numérica Em contraste o enunciado a a propósito dos osciladores não pode ser substituído por uma conjunção de número finito de enunciados singulares acerca de uma definida região do espaçotempo ou antes só poderia admitir semelhante substituição presumindo que o mundo é limitado no tempo não existindo nele mais que um número finito de osciladores Não formulamos entretanto esse pressuposto em particular não formulamos esse pressuposto ao definir os conceitos da Física Ao contrário encaramos um enunciado de tipo a como um enunciadotodos isto é uma asserção universal acerca de ilimitado número de indivíduos Interpretado dessa forma ele não pode é claro ser substituído por uma conjunção de número finito de enunciados singulares O uso que faço do conceito de enunciado estritamente universal ou enunciadotodos opõese à concepção de que todo enunciado universal sintético deve em princípio admitir tradução numa conjunção de número finito de enunciados singulares Aqueles que adotam essa concepção 2 insistem em que os por mim chamados enunciados estri1 A lógica tradicional e analogamente a lógica simbólica ou logística estabelece uma tricotomia enunciados universais particulares e singulares Um enunciado universal faz alusão a todos os elementos de uma classe um enunciado particular alude a alguns desses elementos um enunciado singular se refere a apenas um objeto um indivíduo Essa classificação dos enunciados não tem base em motivos que importem para a teoria do conhecimento foi criada com vistas voltadas para a técnica da inferência Conseqüentemente nossos enunciados universais não podem ser identificados nem aos enunciados universais da Lógica tradicional nem às implicações gerais ou formais da logística cf nota 6 da seção 14 Ver agora também o apêndice x e no meu Postscript a seção 15 2 Ver por exemplo F Kaufmann Bemerkungen zum Grundlagenstreit in Logik und Mathematik in Erkenntnis v 2 1931 p 274 64 65 tamente universais nunca podem ser verificados e em consequência rejeitamnos com base ou no critério de significado por eles acolhido e que reclama verificabilidade ou com base em alguma consideração similar É claro que admitida uma concepção de leis naturais que ignora a distinção entre enunciados singulares e universais o problema da indução poderá parecer resolvido pois obviamente tornamse perfeitamente admissíveis inferências que levam a enunciados apenas numericamente universais a partir de enunciados singulares Contudo é igualmente claro que o problema da indução sob seu ângulo metodológico não é tocado por esta solução Em verdade a verificação de uma lei natural só pode ser levada a efeito se se estabelecer empiricamente cada um dos eventos singulares a que a lei poderia aplicarse e se verificar que cada um desses eventos se conforma efetivamente com a lei tarefa evidentemente impossível De qualquer forma a questão de saber se as leis da Ciência são estritamente ou numericamente universais não pode ser resolvida através de argumentação Tratase de uma dessas questões que só podem ser resolvida por acordo ou convenção Tendo em vista a situação metodológica referida considero útil e frutífero encarar as leis naturais como enunciados sintéticos e estritamente universais enunciadostodos Isso equivale a encarálos como enunciados não verificáveis que podem ser apresentados sob a forma seguinte de todos os pontos do espaço e do tempo ou em todas as regiões do espaço e do tempo é verdadeiro que Em contraste chamo de enunciados específicos ou singulares os enunciados que dizem respeito apenas a certas regiões finitas do espaço e do tempo A distinção entre enunciados estritamente universais e enunciados apenas numericamente universais que são realmente uma espécie de enunciado singular será aplicada tãosomente a enunciados sintéticos Devo entretanto mencionar a possibilidade de aplicar essa distinção também a enunciados analíticos a certos enunciados matemáticos por exemplo 3 3 Exemplos a Todo número natural tem um sucessor b Excetuando os números 11 13 17 e 19 todos os números situados entre 10 e 20 são divisíveis N T entendase são divisíveis por números diversos da unidade e do próprio número isto é não são números primos 66 14 CONCEITOS UNIVERSAIS E CONCEITOS INDIVIDUAIS A distinção entre enunciados universais e singulares prendese estreitamente à distinção entre conceitos ou nomes universais e individuais É comum elucidar essa distinção recorrendo a exemplo do tipo seguinte ditador planeta H2O são nomes ou conceitos universais Napoleão Terra o Atlântico são conceitos ou nomes singulares ou individuais Nesses exemplos os conceitos ou nomes individuais parecem caracterizarse ou por serem nomes próprios ou por terem de ser definidos por meio de nomes próprios ao passo que os conceitos ou nomes universais podem ser definidos sem o uso de nomes próprios Considero de fundamental importância a distinção entre conceitos ou nomes universais e individuais Toda aplicação da Ciência assentase numa inferência de casos singulares a partir de hipóteses científicas que são universais isto é baseiase na dedução de predições singulares Em todo enunciado singular devem ocorrer conceitos ou nomes individuais Os nomes individuais que ocorrem nos enunciados singulares da ciência aparecem freqüentemente sob feição de coordenadas espaçotemporais Isso se compreende facilmente bastando considerar que a aplicação de um sistema espaçotemporal de coordenadas sempre envolve referência a nomes individuais Temos com efeito de fixarlhe os pontos de origem e só podemos fazêlo empregando nomes próprios ou seus equivalentes O uso dos nomes Greenwich e o ano de nascimento de Cristo ilustra o que pretendo dizer Por esse método um número arbitrariamente grande de nomes individuais pode ser reduzido a uns poucos 1 Expressões vagas e gerais tais como esta coisa aquela coisa e assim por diante podem por vezes ser empregadas como nomes individuais talvez acompanhadas de algum tipo de gesto Em resumo podemos utilizar signos que não são nomes próprios mas que em determinada medida são passíveis de substituição por nomes próprios ou coordenadas individuais Todavia 1 As unidades de medida do sistema de coordenadas antes estabelecidas por meio de nomes individuais a rotação da Terra o metropadrão localizado em Paris podem ser definidas em princípio através de nomes universais por meio digamos do comprimento de onda ou da frequência de uma luz monocromática emitida por certos tipos de átomos submetidos a determinado tratamento 67 também os conceitos universais podem ser indicados mesmo que apenas vagamente com o auxílio de gestos Assim podemos apontar para certas coisas ou eventos individuais e então enunciar por uma frase como e outras semelhantes ou e assim por diante nossa intenção de encarar tais indivíduos apenas como representantes de alguma classe que em termos próprios deveria receber um nome universal Não há dúvida de que aprendemos o uso de palavras universais ou seja sua aplicação a indivíduos por meio de gestos e recursos similares A base lógica de aplicações desse tipo está em que os conceitos individuais podem ser conceitos não apenas de elementos mas também de classes e está em que podem representar conceitos universais não apenas numa relação correspondente à de um elemento para uma classe mas ainda numa relação correspondente à de uma subclasse para uma classe Exemplificando meu cão Lux não é apenas um elemento da classe dos cães vienenses o que é um conceito individual mas é ainda um elemento da classe universal dos mamíferos o que é um conceito universal Os cães vienenses por sua vez não são apenas uma subclasse da classe individual dos cães austríacos mas também uma subclasse da classe universal dos mamíferos O emprego da palavra mamíferos como exemplo de um nome universal pode levar a malentendidos Palavras como mamífero cão etc não estão em seu uso ordinário livres de ambigüidade O serem essas palavras encaradas como nomes de classes individuais ou como nomes de classes universais depende das intenções que temos depende de desejarmos falar de uma raça de animais que vive em nosso planeta um conceito individual ou de uma espécie de corpos físicos dotados de propriedades que podem ser descritas em termos universais Ambigüidades análogas surgem com respeito ao uso de conceitos como pasteurizado e latinismo na medida em que se torna possível eliminar os nomes próprios a que esses conceitos aludem ou em que se torna possível definir esses conceitos com auxílio desses nomes próprios 1 Os exemplos e explicações acima devem ter deixado claro o que significará neste livro conceitos universais e conceitos individuais Se nos pedissem definições teríamos provavelmente de dizer como antes um conceito individual é um conceito para cuja definição fazemse indispensáveis nomes próprios ou signos equivalentes se for possível eliminar completamente qualquer alusäoa nomes próprios o conceito será um conceito universal Una definição desse gênero contudo seria de pequeno interesse pois tudo o que a definição permite é reduzir a idéia de um conceito ou nome individual à de um nome próprio no sentido de nome de uma coisa física individual Creio que o uso por mim proposto corresponde muito proximamente ao uso costumeiro que se faz das expressões universal e individual Seja ou não assim considero a distinção aqui traçada indispensável a fim de que não se prejudique a correspondente distinção entre enunciados universais e singulares há total analogia entre o problema dos universais e o problema da indução A tentativa de identificar uma coisa individual simplesmente por suas propriedades e relações universais que pareçam pertencer a ela apenas e a nada mais está condenada ao fracasso Esse procedimento descreveria não uma coisa individual única mas a classe universal de todos os indivíduos a que essas propriedades e relações se aplicam Nem mesmo o uso de um sistema espaçotemporal de coordenadas traria qualquer alteração2 Permanecerá sempre como questão aberta saber se há coisas individuais que correspondam a uma descrição por meio do uso de nomes universais e no caso afirmativo saber quantas são essas coisas Do mesmo modo está condenada a falhar qualquer tentativa de definir nomes universais com o auxílio de nomes individuais Esse fato tem sido ignorado com certa freqüência e de modo geral acreditase ser possível passar de conceitos individuais para conceitos universais através de um processo denominado abstração Essa concepção lembra a Lógica Indutiva e a passagem de enunciados singulares para enunciados universais Logicamente esses processos são também impraticáveis 3 É certo que dessa maneira se pode chegar a classes de indivíduos mas tais classes continuarão a ser conceitos individuais conceitos definidos com o auxílio de nomes próprios 1 Pasteurizado se define por Tratado segundo as indicações de Louis Pasteur ou algo semelhante ou por Aquecido até 80 graus centígrados e conservado nessa temperatura durante dez minutos A primeira definição torna pasteurizado um conceito individual a segunda um conceito universal Mas vejase ainda a nota 4 logo a seguir 2 Não espaço e tempo em geral mas determinações individuais espaciais temporais ou outras assentadas em nomes próprios é que são princípios de individuação 3 De modo análogo o método da abstração utilizado na Lógica Simbólica também é incapaz de passar dos nomes individuais para os nomes universais Se a classe definida por meio de abstração é definida extensionalmente com o auxílio de nomes individuais ela se torna por sua vez um conceito individual 68 mais importantes dentre eles são os enunciados estritamente universais que já apresentei Além deles estou especialmente interessado em enunciados da forma Há corvos negros que podem ser tomados como significando o mesmo que Há pelo menos um corvo negro Esses enunciados serão denominados enunciados estritamente ou puramente existenciais ou enunciadoshá A negação de um enunciado estritamente universal equivale sempre a um enunciado estritamente existencial e viceversa Exemplificando Nem todos os corvos são negros expressa o mesmo que Existe um corvo que não é negro ou Há corvos não negros As teorias da Ciência Natural e em particular aquilo que denominamos leis naturais têm a forma lógica de enunciados estritamente universais podem assim ser expressas sob forma de negações de enunciados estritamente existenciais ou caberia dizer sob a forma de enunciados de nãoexistência ou enunciadosnãohá A lei da conservação da energia por exemplo admite ser expressa sob a forma Não há máquina de movimento perpétuo a hipótese da carga elétrica elementar pode ser traduzida dizendose Não há carga elétrica diversa de um múltiplo da carga elétrica elementar Em consonância com essa formulação vemos que as leis naturais poderiam ser comparadas a proscrições ou proibições Elas não asseveram que algo exista ou ocorra negamno Insistem na nãoexistência de certas coisas ou estados de coisas proscrevendo ou proibindo por assim dizer essas coisas ou estados de coisas afastamnos Precisamente por agirem nesse sentido é que são falseáveis Se aceitarmos como verdadeiro um enunciado singular que infringe a proibição asseverando a existência de uma coisa ou a ocorrência de um evento não admitido por uma lei essa lei está refutada Um exemplo seria Em tal e tal lugar há um aparelho que é uma máquina de movimento perpétuo Os enunciados estritamente existenciais em oposição a esses não podem ser falseados Nenhum enunciado singular quer dizer nenhum enunciado básico nenhum enunciado de evento observado pode contradizer o enunciado existencial Há corvos brancos Só um enunciado universal poderia fazêlo Com base no critério de demarcação aqui adotado terei portanto de tratar os enunciados estritamente existenciais como não empíricos ou metafísicos Essa caracterização parecerá talvez dúbia a um primeiro olhar e não muito de acordo com a prática da ciência empírica Como objeção caberia asseverar com justiça que no campo da Física inclusive há teorias que se apresentam sob a forma de enunciados estritamente existenciais Um exemplo seria um enunciado deduzível do sistema periódico dos elementos químicos asseverando a existência de elementos de certos números atômicos Todavia se a hipótese de que um elemento de certo número atômico existe vier a ser formulada de maneira a tornarse suscetível de prova nesse caso se requererá muito mais do que um enunciado puramente existencial Por exemplo o elemento com número atômico 72 Hafnio não foi descoberto com base apenas num enunciado isolado puramente existencial Pelo contrário todas as tentativas no sentido de identificálo foram vãs até que Bohr alcançou êxito no predizer várias de suas propriedades deduzindoas da teoria por ele construída Contudo a teoria de Bohr e as conclusões dela tiradas importantes para o elemento Hafnio e ocasionadoras de sua descoberta estão longe de ser enunciados isolados puramente existenciais1 São enunciados estritamente universais Minha decisão de encarar os enunciados estritamente existenciais como não empíricos por não serem falseáveis é útil e se coloca de acordo com o uso comum tal como se verá de sua aplicação a enunciados de probabilidade e ao problema de comproválos empiricamente cf seções 6668 Enunciados estritos ou puros sejam universais sejam existenciais não sofrem restrições quanto a espaço e tempo Não se referem a uma região individual limitada espaçotemporal Essa a razão por que enunciados estritamente existenciais não são falseáveis Não podemos investigar o mundo inteiro a fim de determinar que algo não existe nunca existiu e nunca existirá Precisamente pela mesma razão os enunciados estritamente universais não são verificáveis Não podemos investigar o mundo inteiro para ter a certeza de que nada existe proibido pela lei Contudo ambas as espécies de enunciados estritos estritamente existenciais e estritamente universais são em princípio empiricamente decisíveis Decisíveis porém num sentido apenas são unilateralmente decisíveis Comprovado que algo existe aqui ou ali um enunciado existencial pode por esse meio ser verificado do mesmo modo que um enunciado universal pode ser falseado 1 A palavra isolados foi inserida para evitar má interpretação do trecho embora seu propósito penso eu esteja suficientemente claro um enunciado existencial isolado nunca é falseável contudo se tomado no contexto de outros enunciados um enunciado existencial pode em certos casos contribuir para o conteúdo empírico de todo o contexto pode enriquecer a teoria a que ele integra e pode elevar seu grau de falseabilidade ou de suscetibilidade a prova Nesse caso o sistema teórico que inclui o enunciado existencial em pauta deve ser apresentado como científico e não como um sistema de cunho metafísico 72 73 A assimetria aqui descrita e sua consequência a falseabilidade unilateral dos enunciados universais da Ciência empírica talvez possa agora parecer menos dúbia do que anteriormente na seção 6 Vemos agora que não está envolvida nenhuma assimetria de qualquer relação puramente lógica Pelo contrário as relações lógicas mostram simetria Enunciados universais e existenciais são construídos simetricamente Só 2 a linha traçada por nosso critério de demarcação produz uma assimetria 16 SISTEMAS TEÓRICOS As teorias científicas estão em perpétua mutação Não se deve isso ao mero acaso mas isso seria de esperar tendo em conta nossa caracterização da Ciência empírica Talvez seja essa a razão pela qual geralmente apenas ramos da Ciência e estes apenas em caráter temporário chegam a adquirir a forma de um sistema de teorias elaborado e logicamente bem construído A despeito disso um sistema apresentado em termos de tentativa pode normalmente ser examinado em seu todo com todas as suas importantes consequências Isto se impõe como uma necessidade pois o teste severo de um sistema pressupõe que ele esteja na ocasião suficientemente definido e acabado sob aspectos formais de modo a tornar impossível que novos pressupostos sejam clandestinamente introduzidos nele Em outras palavras o sistema deve ser formulado de maneira suficientemente clara e completa de sorte a tornar qualquer novo pressuposto prontamente reconhecido pelo que ele é uma modificação e portanto uma revisão do sistema Tal entendo eu é o motivo por que objetivase conseguir a forma de um sistema rigoroso Essa é a forma do chamado sistema axiomatizado a forma que Hilbert por exemplo pôde dar a certos setores da Física teórica Tentase reunir todos os pressupostos necessários e não mais para formar o ápice do sistema Os pressupostos são normalmente chamados axiomas ou postulados ou proposições primitivas nenhuma pretensão de verdade está implícita no termo axioma tal como aqui usado Os axiomas são selecionados de maneira tal que todos os outros enunciados pertencentes ao sistema teórico possam ser derivados desses axiomas por meio de transformações puramente lógicas ou matemáticas Podese dizer que um sistema teórico foi axiomatizado caso se tenha formulado um conjunto de enunciados os axiomas que satisfaça os quatro requisitos fundamentais seguintes a o sistema de axiomas deve estar livre de contradição seja a autcontradição seja a mútua contradição Isso equivale a exigir que não seja possível deduzir dos axiomas todos os enunciados arbitrariamente escolhidos 1 b o sistema deve ser independente isto é não conter qualquer axioma deduzível dos demais axiomas Em outras palavras um enunciado só será denominado axioma se não for deduzível junto com o resto do sistema Essas duas condições dizem respeito ao sistema axiomático como tais no que concerne à relação do sistema axiomático para com o todo da teoria os axiomas devem ser c suficientes para a dedução de todos os enunciados pertencentes à teoria a ser axiomatizada e d necessários para o mesmo propósito o que significa que eles não devem incluir pressupostos supérfluos 2 Numa teoria assim axiomatizada é possível investigar a mútua dependência das várias partes do sistema Podemos por exemplo investigar se determinada parte da teoria é derivável de alguma parte dos axiomas Investigações desse gênero e a esse respeito mais se dirá nas seções 63 e 64 e nas seções de 75 a 77 têm importante reflexo sobre o problema da falseabilidade Elas tornam clara por que a falsificação de um enunciado logicamente deduzido pode por vezes não afetar todo o sistema porém apenas parte dele que será dada como falseada Isso é possível porque embora as teorias da física não sejam em geral inteiramente axiomatizadas as conexões entre suas várias partes podem revelarse suficientemente claras para habilitarnos a decidir quais de seus subsistemas se encontram afetados por alguma particular observação falseadora 1 1 Cf seção 24 2 Com respeito a essas quatro condições e também à seção seguinte ver por exemplo a versão algo diferente em Abriss der Logistik de R Carnap 1927 pp 70 e ss 1 Este ponto é mais amplamente examinado em meu Postscript particularmente na seção 22 74 75 17 ALGUMAS POSSIBILIDADES DE INTERPRETAÇÃO DE UM SISTEMA DE AXIOMAS A concepção do racionalismo clássico segundo a qual os axiomas de certos sistemas como por exemplo os da geometria euclidiana devem ser encarados como imediata ou intuitivamente certos ou autoevidentes não será aqui examinada Direi apenas que não partilho dessa concepção Considero admissíveis duas diferentes interpretações de qualquer sistema de axiomas Os axiomas podem ser tidos 1 como convenções ou ser encarados ii como hipóteses empíricas ou científicas i Se os axiomas forem vistos como convenções restringirão o uso ou significado das idéias fundamentais ou termos primitivos ou conceitos que os axiomas introduzem determinarão o que pode e o que não pode ser dito acerca dessas idéias fundamentais Os axiomas por vezes são apresentados como definições implícitas das idéias que introduzem Essa concepção se elucidará talvez se recorrermos a uma analogia entre um sistema axiomático e um sistema de equações compatíveis e solúveis Os valores admissíveis para as incógnitas ou variáveis que aparecem num sistema de equações de um ou de outro modo são determinados pelo sistema Ainda que o sistema de equações admita mais de uma solução não admitirá que as incógnitas variáveis sejam substituídas por qualquer combinação de valores concebível Pelo contrário o sistema de equações caracteriza como admissíveis certas combinações de valores ou sistemas de valores e dá outras combinações por inadmissíveis O sistema distingue a classe dos sistemas de valores admissíveis da classe dos sistemas de valores inadmissíveis De maneira análoga sistemas de conceitos podem ser classificados em admissíveis ou inadmissíveis por meio do que procederia chamar de equaçãoenunciado Uma equaçãoenunciado surge a partir de uma função proposicional ou funçãoenunciado cf nota 6 da seção 14 este é um enunciado incompleto no qual se apresentam um ou mais claros Dois exemplos dessas funções proposicionais ou funçõesenunciado são Um isótopo do elemento x tem o peso atômico 65 ou x y 12 Toda funçãoenunciado transformase em enunciado preenchidos os claros por certos valores x e y O enunciado resultante será verdadeiro ou falso na dependência dos valores ou combinação de valores introduzidos Assim no primeiro exemplo a substituição de x pela palavra cobre ou zinco leva a um enunciado verdadeiro enquanto outras substituições conduziriam a enunciados falsos Ora aquilo que eu chamo de equaçãoenunciado se obtém se decidirmos com respeito a alguma funçãoenunciado admitir apenas os valores que introduzidos tornam essa função um enunciado verdadeiro Por meio dessa equaçãoenunciado definese uma classe determinada de sistemas de valor admissíveis ou seja a classe dos que a satisfazem A analogia com uma equação matemática é clara Se nosso segundo exemplo for interpretado não como uma funçãoenunciado mas como uma equaçãoenunciado tornarseá uma equação no sentido comum matemático Como suas idéias fundamentais não definidas ou termos primitivos podem ser consideradas como claros um sistema axiomático em primeiro lugar pode ser tratado como um sistema de funçõesenunciado Contudo se deliberarmos que nele só podem ser introduzidos os sistemas ou combinações de valores que o satisfaçam então ele se tornará um sistema de equaçõesenunciados Como tal ele define implicitamente uma classe de admissíveis sistemas de conceitos Todo sistema de conceitos que satisfaz um sistema de axiomas pode ser chamado de modelo desse sistema de axiomas 1 A interpretação de um sistema axiomático na condição de sistema de convenções ou definições implícitas pode também ser expressa dizendose que ela equivale à decisão só modelos podem ser admitidos como substitutos 2 Entretanto introduzido um modelo o resultado será um sistema de enunciados analíticos pois o sistema se tornará verdadeiro por convenção Interpretado dessa maneira um sistema axiomático não pode portanto ser visto como um sistema de hipóteses empíricas ou científicas no sentido que lhes damos porque não pode ser refutado por falsificação de suas consequências estas terão também o caráter de analíticas ii Cabe perguntar como pode um sistema axiomático ser interpretado em termos de sistema de hipóteses empíricas ou cientí 1 Ver nota 2 2 Hoje devo distinguir claramente entre os sistemas de objetos que satisfazem um sistema axiomático e o sistema de nomes desses objetos que podem ser incluídos nos axiomas tornandoos verdadeiros só ao primeiro sistema chamo de modelo Assim devo agora escrever só nomes de objetos que constituem um modelo podem ser considerados para efeito de substituição nos claros dos axiomas 76 77 ficas Usualmente se diz que os termos primitivos presentes num sistema axiomático não devem ser encarados como implicitamente definidos mas como constantes extralógicas Exemplificando conceitos como linha reta e ponto que ocorrem em todo sistema axiomático de geometria podem ser interpretados entendendose que equivalem a raio luminoso e interseção de raios luminosos Dessa maneira admitese os enunciados do sistema axiomático se transformam em enunciados acerca de objetos empíricos ou seja em enunciados sintéticos À primeira vista essa maneira de focalizar o assunto pode parecer perfeitamente satisfatória Ela porém leva a dificuldades que se relacionam com o problema da base empírica Pois de maneira alguma é claro o que seria um modo empírico de definir um conceito Costumase falar de definições ostensivas Isso quer dizer que um significado empírico definido é atribuído a um conceito correlacionandoo com certos objetos que pertencem ao mundo real Passa ele então a ser visto como símbolo desses objetos Importa deixar claro porém que somente nomes ou conceitos individuais podem ser fixados por ostensiva referência a objetos reais apontandose digamos para certa coisa e enunciando um nome ou apondolhe um rótulo com o respectivo nome Contudo os conceitos a serem usados no sistema axiomático devem corresponder a nomes universais que não podem ser definidos por indicações empíricas como a de apontar etc Eles só podem ser definidos se puderem sêlo explicitamente com o auxílio de outros nomes universais do contrário hão de permanecer indefinidos É inevitável portanto que alguns nomes universais devam permanecer indefinidos e aqui está a dificuldade pois esses conceitos indefinidos sempre podem ser usados em sentido não empírico i isto é como se fossem conceitos implicitamente definidos Esse uso não obstante leva inevitavelmente à destruição do caráter empírico do sistema Entendo que essa dificuldade só pode ser contornada se nos valermos de uma decisão metodológica Nessas condições adotarei a regra de não usar conceitos indefinidos como se fossem implicitamente definidos esse ponto será tratado adiante na seção 20 A esta altura convid talvez acrescentar que em geral tornase possível correlacionar os conceitos primitivos de um sistema axiomático tal como a Geometria a conceitos de outro sistema eg a Física ou interpretálos à luz destes Essa possibilidade mostrase particularmente importante quando no curso da evolução de uma ciência um sistema de enunciados está sendo explicado através de recurso a um sistema novo e mais geral de hipóteses que permite a dedução não apenas dos enunciados que integram o primeiro sistema como ainda de enunciados que se incluem em outros sistemas Em casos assim pode haver possibilidade de definir os conceitos fundamentais do novo sistema com auxílio de conceitos originalmente usados em alguns dos sistemas anteriores 18 NÍVEIS DE UNIVERSALIDADE O MODUS TOLLENS Dentro de um sistema teórico é possível distinguir enunciados que pertencem a vários níveis de universalidade Os enunciados de mais alto nível de universalidade são os axiomas deles podem ser deduzidos enunciados de níveis mais baixos Enunciados empíricos de nível mais alto revestem sempre o caráter de hipóteses relativamente aos enunciados de nível mais baixo deles deduzíveis eles podem ser falseados pela falsificação desses enunciados menos universais Contudo em qualquer sistema dedutivo hipotético estes enunciados menos universais continuam a ser enunciados estritamente universais no sentido aquí fixado Assim também eles devem revestir o caráter de hipóteses fato que tem sido freqüentemente ignorado quando se trata de enunciados universais de nível mais baixo Mach por exemplo chamá ¹ a teoria de condução do calor elaborada por Fourier uma teoria física modelo pela curiosa razão de que essa teoria se baseia não em uma hipótese mas num fato observável Todavia o fato observável a que Mach se refere é por ele descrito através de um enunciado A velocidade com que se igualam as diferenças de temperatura contanto que essas diferenças sejam reduzidas é proporcional às mesmas diferenças um enunciadotodos cujo caráter hipotético deveria ser suficientemente claro Mesmo a propósito de alguns enunciados singulares direi que eles são hipotéticos uma vez que deles com auxílio de um sistema teórico possam ser deduzidas conclusões tais que a falsificação dessas conclusões poderia falsear os enunciados singulares em pauta O modo falseador de inferência aqui referido a maneira como o falseamento de uma conclusão acarreta o falseamento do sistema de ¹ Mach Principien der Wärmelehre 1896 p 115 79 que ela deriva corresponde ao modus tollens da Lógica tradicional Ele pode ser descrito da maneira seguinte 1 Seja p a conclusão de um sistemat de enunciados que pode consistir de teorias e condições iniciais por amor à simplicidade não distinguirei entre umas e outras Simbolizaremos a relação de deduzibilidade implicação analítica de p a partir de t usando t p que podese ler p decorre de t Admitamos que p seja falsa o que se pode expressar escrevendo p que se lê nãop Dada a relação de deduzibilidade t p e o pressuposto p podemos inferir t leiase nãot ou seja encaramos t como falseado Se denotarmos a conjunção asserção simultânea de dois enunciados pela colocação de um ponto entre os símbolos que os representam poderemos também escrever a inferência falseadora da seguinte maneira t p p t ou em palavras Se p é deduzível de t e se p é falsa então t também é falso Por esse modo de inferência falseamos todo o sistema teoria e condições iniciais que se fazia necessário para deduzir o enunciado p isto é o enunciado falseado Assim não se pode asseverar de qualquer enunciado do sistema que ele seja ou não especificamente atingido pelo falseamento Só no caso de p ser independente de alguma parte do sistema é que poderemos dizer que essa parte não está envolvida no falseamento ² A essa possibilidade prendese a seguinte podemos em alguns casos talvez considerando os níveis de universalidade atribuir o falseamento a alguma hipótese definida por exemplo a uma hipótese recentemente introduzida Isso poderá ocorrer se uma teoria bem corroborada e que continua a receber corroboração adicional foi dedutivamente explicada por uma hipótese nova de nível mais alto Deverá ser feita uma tentativa de submeter a prova essa nova hipótese considerando algumas de suas consequências que não foram ainda objeto de comprovação Se algumas dessas consequências chegarem a ser falseadas poderemos atribuir o falseamento apenas à nova hipótese Procuraremos então para substituíla outras generalizações de nívelalto mas não deveremos nos sentir obrigados a encarar o sistema anterior e de menor generalidade como tendo sido falseado Cf ainda as observações a respeito da quase indução na seção 85 ¹ Tendo em vista a presente passagem e dois trechos posteriores cf notas 1 da seção 35 e 1 da seção 36 nos quais faço uso do símbolo desejo registrar que ao escrever o livro eu me encontrava ainda em estado de confusão acerca da forma de distinguir um enunciado condicional enunciadose então por vezes denominado de maneira talvez enganadora implicação material de um enunciado acerca da deduzibilidade ou enunciado asseverador de que algum enunciado condicional é logicamente verdadeiro ou analítico ou de que seu antecedente acarreta seu conseqüente distinção que me foi ensinada por Alfred Tarski alguns meses após a publicação do livro A questão não é de maior relevo no contexto deste volume sem embargo a confusão deve ser assinalada Esses problemas são mais extensamente examinados por exemplo em meu trabalho publicado em Mind v 56 1947 pp 193 e ss 2 Assim não podemos saber de início qual dentre os vários enunciados do subsistema remanescente t do qual p não é independente cabe responsabilizar pela falsidade de p qual desses enunciados devemos alterar e quais deles devemos manter Não estou aqui discutindo enunciados intercambiáveis Com freqüência é apenas o instinto científico do investigador influenciado naturalmente pelos resultados do testar e repetir os testes que o leva a fazer 80 conjecturas a respeito de quais os enunciados de t deve ele considerar inócuos e quais deve encarar como reclamando modificações Contudo convém lembrar que freqüentes vezes é a modificação daquilo que nos sentimos inclinados a encarar como obviamente inócuo porque em completa concordância com nossos hábitos normais de pensamento o fator capaz de levar a avanços decisivos Notável ilustração desse ponto é a modificação do conceito de simultaneidade feita por Einstein A fonte da Filosofia convencionalista parece residir no espanto diante da simplicidade austeramente bela do mundo tal como se revela nas leis da Física Os convencionalistas parecem achar que esta simplicidade seria incompreensível e em verdade mirac ulosa se nos inclinaçãosemos a crer com os realistas que as leis da natureza nos revelam uma simplicidade interior estrutural do mundo sob sua aparência exterior de exuberante multiplicidade O idealismo de Kant procurou explicar esta simplicidade afirmando que nosso intelecto é que impõe suas leis sobre a natureza De maneira análoga porém ainda mais arrojadamente o convencionalista vê a simplicidade como nossa própria criação Para ele entretanto não se trata do efeito de leis que nosso intelecto imponha à natureza tornandoa simples ele não acredita em verdade que a natureza seja simples Simples são apenas as leis da natureza e estas sustenta o convencionalista são nossas livres criações nossas invenções nossas decisões e convenções arbitrárias Para o convencionalista a ciência teórica natural não é um retrato da natureza mas apenas uma construção lógica Não são as propriedades do mundo que determinam essa construção pelo contrário é essa construção que determina as propriedades de um mundo artificial um mundo de conceitos implicitamente definidos por leis naturais escolhidas por nós É desse mundo apenas que fala a ciência Segundo esse modo de ver convencionalista as leis da natureza não sio falseáveis por observação com efeito são elas que se tornam necessárias para determinar o que sejam a observação e mais especialmente a mensuração científica São essas leis por nós estabelecidas que formam a base indispensável para o acerto de nossos relógios é a correção das chamadas escalas de medida exatas Só dizemos que um relógio está certo ou que uma escala de medida é exata se os movimentos medidos com auxílio desses instrumentos satisfizerem os axiomas da mecânica que decidimos adotar ² é Eddington Procede mencionar que Duhem nega trad ingl p 188 a possibilidade de experimentos cruciais porque consideraos como verificações ao passo que eu afirmo a possibilidade de experimentos cruciais falseadores Cf ainda meu artigo Three views concerning human knowledge em Contemporary British Philosophy iii 1956 e meu Conjectures and Refutations 1959 2 Essa concepção também pode ser encarada como tentativa de resolver o problema da indução Com efeito o problema desapareceria se as leis naturais fossem definições e portanto tautologias Assim de acordo com a maneira de ver de Cornelius cf Zur Kritik der wissenschaftlichen Grundbegriffe Erkenntnis v 2 1931 n 4 o enunciado O ponto de fusão do chumbo está em torno de 335 graus C é parte da definição do conceito chumbo sugerido por experiência indutiva não podendo conseqüentemente ser refutado Uma 81 CAPÍTULO IV FALSEABILIDADE A questão de saber se existe um enunciado singular ou enunciado básico falseável será examinada adiante Aqui admitirei resposta afirmativa para essa questão e examinarei até que ponto meu critério de demarcação é aplicável a sistemas teóricos se o for Uma discussão crítica de uma posição habitualmente denominada convencionalismo fará surgir de início alguns problemas de método a serem enfrentados mediante a tomada de certas decisões metodológicas Tentarei em seguida caracterizar as propriedades lógicas desses sistemas de teorias que sejam falseáveis isto é falseáveis se nossas propostas metodológicas forem acolhidas 19 ALGUMAS OBJEÇÕES DOS CONVENCIONALISTAS É de esperar sejam levantadas objeções contra minha proposta de adotar a falseabilidade como critério para decidir se um sistema teórico pertence ou não ao campo da Ciência empírica Essas objeções serão levantadas por exemplo por aqueles que se encontram sob a influência da escola de pensamento conhecida como convencionalismo ¹ Algumas destas objeções já foram mencionadas nas seções 6 11 e 17 elas serão agora examinadas mais de perto ¹ Os principais representantes da escola são Poincaré e Duhem cf La théorie physique son objet et sa structure 1906 trad ingl de P P Wiener The Aim and Structure of Physical Theory Princeton 1954 Adepto recente é H Dingier entre suas numerosas obras podem ser mencionadas Das Experiment ed Der Zusammenhang der Wissenschaft und das Primat der Philosophie 1926 O alemão Hugo Dingier não deve ser confundido com o inglês Herbert Dingle O principal representante do convencionalismo no mundo de fala inglesa A fonte da Filosofia convencionalista parece residir no espanto diante da simplicidade austeramente bela do mundo tal como se revela nas leis da Física Os convencionalistas parecem achar que esta simplicidade seria incompreensível e em verdade mirac ulosa se nos inclinaçãosemos a crer com os realistas que as leis da natureza nos revelam uma simplicidade interior estrutural do mundo sob sua aparência exterior de exuberante multiplicidade O idealismo de Kant procurou explicar esta simplicidade afirmando que nosso intelecto é que impõe suas leis sobre a natureza De maneira análoga porém ainda mais arrojadamente o convencionalista vê a simplicidade como nossa própria criação Para ele entretanto não se trata do efeito de leis que nosso intelecto imponha à natureza tornandoa simples ele não acredita em verdade que a natureza seja simples Simples são apenas as leis da natureza e estas sustenta o convencionalista são nossas livres criações nossas invenções nossas decisões e convenções arbitrárias Para o convencionalista a ciência teórica natural não é um retrato da natureza mas apenas uma construção lógica Não são as propriedades do mundo que determinam essa construção pelo contrário é essa construção que determina as propriedades de um mundo artificial um mundo de conceitos implicitamente definidos por leis naturais escolhidas por nós É desse mundo apenas que fala a ciência Segundo esse modo de ver convencionalista as leis da natureza não sio falseáveis por observação com efeito são elas que se tornam necessárias para determinar o que sejam a observação e mais especialmente a mensuração científica São essas leis por nós estabelecidas que formam a base indispensável para o acerto de nossos relógios é a correção das chamadas escalas de medida exatas Só dizemos que um relógio está certo ou que uma escala de medida é exata se os movimentos medidos com auxílio desses instrumentos satisfizerem os axiomas da mecânica que decidimos adotar ² é Eddington Procede mencionar que Duhem nega trad ingl p 188 a possibilidade de experimentos cruciais porque consideraos como verificações ao passo que eu afirmo a possibilidade de experimentos cruciais falseadores Cf ainda meu artigo Three views concerning human knowledge em Contemporary British Philosophy iii 1956 e meu Conjectures and Refutations 1959 2 Essa concepção também pode ser encarada como tentativa de resolver o problema da indução Com efeito o problema desapareceria se as leis naturais fossem definições e portanto tautologias Assim de acordo com a maneira de ver de Cornelius cf Zur Kritik der wissenschaftlichen Grundbegriffe Erkenntnis v 2 1931 n 4 o enunciado O ponto de fusão do chumbo está em torno de 335 graus C é parte da definição do conceito chumbo sugerido por experiência indutiva não podendo conseqüentemente ser refutado Uma 83 A filosofia do convencionalismo é digna de grande crédito pela maneira como ajudou a esclarecer as relações existentes entre teoria e experimento Ela reconheceu a importância tão pouco notada pelos indutivistas da parte desempenhada pelas nossas ações e operações planejadas de acordo com raciocínios dedutivos e convenções na condução e interpretação de nossos descobrimentos científicos Eu vejo o convencionalismo como um sistema autosuficiente e defensável Não é de supor tenham êxito as tentativas de nele apontar incoerências Contudo e apesar disso consideroo um sistema positivamene inaceitável Apóiase ele numa ideia de Ciência de seus objetivos e propósitos inteiramente diversa da minha Enquanto da Ciência não peço qualquer certeza final e conseqüentemente não chego a ela o convencionalista procura na Ciência um sistema de conhecimento alicerçado em bases definitivas para usar a frase de Dingler Essa meta pode ser atingida pois é possível interpretar qualquer dado sistema científico como um sistema de definições implícitas E períodos em que a Ciência se desenvolve lentamente proporcionarão pouca oportunidade para o surgimento de conflito a não ser que este seja puramente acadêmico entre cientistas adeptos do Convencionalismo e outros que possam favorecer visão semelhante à que advogo Coisa muito diversa ocorrerá numa época de crise Sempre que o sistema clássico do dia for ameaçado pelos resultados de experimentos novos passíveis de serem interpretados como falseamentos segundo meu ponto de vista o sistema permanecerá inabalado aos olhos do convencionalista Ele afastará as incoerências que possam ter surgido aludindo talvez ao fato de não dominarmos suficientemente o sistema Ou eliminará as incoerências sugerindo a adoção de certas hipóteses auxiliares ad hoc ou talvez de certas correções nos instrumentos de medida Nestes tempos de crise esse conflito a propósito dos objetivos da Ciência se tornará agudo Nós e aqueles que partilham de nossa posição esperamos efetuar descobertas novas e esperamos ser auxiliados nesse trabalho por um sistema científico que acaba de aparecer Teremos por isso o maior interesse pelo experimento falseador Saudáloemos como um êxito por ele ter aberto horizontes novos num mundo de experiências novas Saudáloemos ainda que essas novas experiências nos forneçam argumentos novos contra as nossas mais recentes teorias Mas esta estrutura que surge cuja audácia de concepção admiramos é vista pelo convencionalismo como um monumento ao total colapso da ciência na expressão de Dingler Segundo o convencionalista só um princípio nos pode auxiliar a selecionar um sistema que se torna o eleito dentre todos os sistemas possíveis é o princípio de seleção do sistema mais simples o mais simples sistema de definições implícitas o que na prática significa o sistema clássico em voga Quanto à questão da simplicidade ver seções 4145 e especialmente a 46 Nos termos expostos meu conflito com os convencionalistas não é um conflito que possa ser dirimido em última instância por uma discussão teórica É possível contudo segundo penso extrair do estilo de pensamento convencionalista alguns argumentos interessantes contra o critério de demarcação por mim proposto entre esses argumentos estaria o seguinte admito poderia dizer um convencionalista que os sistemas teóricos das ciências naturais não são verificáveis mas assevero que também não são falseáveis Com efeito sempre existe a possibilidade de atingir através de algum sistema axiomático escolhido aquilo que é chamado sua correspondência com a realidade 3 e isso pode ser feito de numerosas maneiras algumas das quais sugerimos acima Podemos por exemplo introduzir hipóteses ad hoc ou modificar as chamadas definições ostensivas ou as definições explícitas que podem substituílas tal como foi mostrado na seção 17 Ou adotar atitude cética no que se refere à confiabilidade do experimentador cujas observações que ameaçam nosso sistema podemos excluir da Ciência dizendoas insuficientemente alicerçadas não científicas não objetivas ou mesmo pela afirmativa de que o experimentador adulterava os dados Essa é a espécie de atitude que o físico pode tomar algumas vezes muito corretamente em relação a supostos fenômenos ocultos Como último recurso é sempre possível lançar dúvida sobre a perspicácia do investigador por exemplo se ele não acredita como Dingler que dia virá em que a teoria da eletricidade seja deduzida da teoria da gravitação de Newton 3 Carnap Über die Aufgabe der Physik in Kantstudien v 28 1923 p 100 85 13 Assim de acordo com a concepção convencionalista não é possível dividir os sistemas e teorias em falseáveis e não falseáveis melhor dizendo essa distinção será ambígua Como conseqüência o critério de falseabilidade por nós proposto tornarseá inútil como critério de demarcação 20 REGRAS METODOLÓGICAS Essas objeções de um convencionalista imaginário parecemme incontestáveis tal como a própria Filosofia convencionalista Admito que meu critério de falseabilidade não conduza a uma classificação isenta de ambigüidade Contudo é impossível decidir por análise de sua forma lógica se um sistema de enunciados é um sistema convencional de definições implícitas irrefutáveis ou se é um sistema empírico no sentido que empresto a essa palavra ou seja um sistema refutável Isso mostra apenas que meu critério de demarcação não pode ser de imediato aplicado a um sistema de enunciados fato a que já aludi nas seções 9 e 11 É portanto mal posta a questão de saber se determinado sistema deve ser encarado como sistema convencionalista ou como sistema empírico Somente com respeito a métodos aplicados a um sistema teórico tornase possível indagar se estamos diante de uma teoria convencionalista ou empírica O único meio de evitar o convencionalismo é tomar uma decisão a decisão de não aplicarlhe o método Decidimos que se nosso sistema sofrer ameaça nunca procuraremos preserváIo recorrendo a qualquer espécie de estratagema convencionalista Assim evitaremos explorar a sempre aberta possibilidade há pouco referida de atingir através de algum sistema escolhido aquilo que é chamado sua correspondência com a realidade Uma visão clara daquilo que pode ser ganho e perdido por métodos convencionalistas foi expressa cem anos antes de Poincaré por Black que registrou Uma conveniente adaptação de condições fará com que praticamente qualquer hipótese concorde com os fenômenos Isso agradará a imaginação mas não fará avançar nosso conhecimento 1 Para formular as regras metodológicas que nos impeçam de adotar estratagemas convencionalistas devemos familiarizarnos com as várias 1 J Black Lectures on the Elements of Chemistry vol I Edinburgh 1803 p 193 86 formas de que esses estratagemas podem se revestir de modo a enfrentar cada qual delas com o adequado contramovimento anticonvencionalista Quando verificarmos que um sistema foi salvo graças ao uso de um estratagema convencionalista devemos dispornos a submetêIo a novas provas e rejeitáIo se as circunstâncias assim o exigirem Os quatro estratagemas convencionalistas principais já foram relacionados ao fim da seção anterior A lista não pretende ser completa Caberá ao investigador especialmente nos campos da Sociologia e da Psicologia o físico dificilmente necessitaria dessa advertência prevenirse constantemente contra a tentação de empregar novos estratagemas convencionalistas tentação a que os psicanalistas por exemplo sucumbem com freqüência Com respeito às hipóteses auxiliares propomos assentar a regra de que somente serão aceitáveis aquelas cuja introdução não reduza o grau de falseabilidade ou testabilidade do sistema em causa mas que ao contrário o eleve Nas seções de número 31 a 40 explicaremos como apreciar os graus de falseabilidade Se o grau de falseabilidade aumenta a introdução da hipótese corresponde em verdade a um reforço da teoria o sistema agora rejeita mais do que rejeitava anteriormente ele prolifera mais Podemos apresentar o mesmo ponto sob esta forma a introdução de uma hipótese auxiliar deve sempre ser encarada como uma tentativa de construir um sistema novo e esse sistema novo deve sempre ser julgado sob o prisma de saber se adotado corresponde a um real avanço do conhecimento acerca do mundo Um exemplo de uma hipótese auxiliar claramente aceitável é neste sentido o princípio da exclusão de Pauli cf seção 38 Um exemplo de hipótese auxiliar insatisfatória seria a hipótese de contração de Fitzgerald e Lorentz que não apresentava conseqüências falseáveis mas que simplesmente1 servia para restaurar a concordância entre teoria e experimento sobretudo considerando as descobertas de Michelson e Morley Um avanço quanto a essa questão só foi conseguido pela teoria da relatividade que previu conseqüências novas novos efeitos físicos e assim abriu possibilidades insuspeitadas para a comprovação e para o falseamento da teoria Nossa regra metodológica pode ser ressalvada pela observação de que não é preciso rejeitar como convencionalista qualquer hipótese auxiliar que deixe de satis 1 Isso é um engano como bem ressaltou A Grünbaum B J P S v 10 1959 pp 48 e ss Todavia como a hipótese é menos passível de prova do que a relatividade especial ela pode ilustrar um grau de caráter ad hoc 87 14 fazer os padrões colocados Há em particular enunciados singulares que realmente não se integram ao sistema teórico São por vezes denominados hipóteses auxiliares e embora introduzidos para auxiliar a teoria são inofensivos Um exemplo seria a admissão de que certa observação ou medida que não podem ser repetidas terseiam devido a erro Cf nota 6 da seção 8 e seções 27 e 68 Na seção 17 mencionei as definições explícitas por via das quais os conceitos de um sistema axiomático recebem significado em termos de um sistema de nível menor de universalidade Alterações dessas definições são permissíveis caso se mostrem úteis mas devem ser vistas como alterações do sistema que em seguida há de ser reexaminado como se fosse novo No que respeita aos nomes universais não definidos importa distinguir duas possibilidades 1 existem alguns conceitos não definidos que só aparecem em enunciados do mais alto nível de universalidade e cujo emprego se fixa por sabermos quais os tipos de relações lógicas são estabelecidos entre eles e outros conceitos É possível elimináIos ao longo da dedução um exemplo seria a energia 2 2 Existem outros conceitos não definidos que ocorrem também em enunciados de menores níveis de universalidade e cujo significado se estabelece por força do uso eg movimento pontomassa posição Com respeito a estes proibiremos alterações subreptícias de uso e no que se refere ao mais procederemos de conformidade com nossas decisões metodológicas tal como antes ficou assentado Quanto aos dois pontos remanescentes concernentes à competência do experimentador ou estudioso teórico adotaremos regras semelhantes experimentos intersubjetivamente suscetíveis de prova serão aceitos ou rejeitados à luz de contraexperimento O apelo simples às deduções lógicas a serem descobertas no futuro pode não merecer consideração 21 INVESTIGAÇÃO LÓGICA DA FALSEABILIDADE Só há necessidade de prevenirnos contra estratagemas convencionalistas quando for o caso de sistemas que seriam falseáveis se tratados de acordo com nossas regras de método empírico Admitamos ter conseguido afastar com êxito graças a nossas regras esses estratagemas cabe agora pedir uma caracterização lógica desses sistemas falseáveis Procuraremos caracterizar a falseabilidade de uma teoria recorrendo às relações lógicas vigentes entre a teoria e a classe de enunciados básicos O caráter dos enunciados singulares que denomino enunciados básicos será examinado mais amplamente no próximo capítulo onde estudaremos ainda a questão de saber se eles por sua vez são falseáveis A esta altura admitirei que existem enunciados básicos falseáveis Devese ter em mente que falando em enunciados básicos não me estou referindo a um sistema de enunciados aceitos O sistema de enunciados básicos tal como uso a expressão inclui antes todos os enunciados singulares autocompativeis de certa forma lógica por assim dizer todos os enunciados de fato concebíveis e singulares Assim o sistema de todos os enunciados básicos incluirá muitos enunciados mutuamente incompatíveis Como primeira tentativa poderseia chamar de empírica uma teoria sempre que dela coubesse deduzir enunciados singulares Essa tentativa falha porém porque para deduzir enunciados singulares de uma teoria sempre se fazem necessários outros enunciados singulares as condições iniciais que nos informam acerca de como substituir as variáveis da teoria Como segunda tentativa poderseia procurar chamar de empírica uma teoria caso dela sejam deriváveis enunciados singulares através de recurso a outros enunciados singulares que atuem como condições iniciais Entretanto isso também não satisfaz com efeito mesmo uma teoria não empírica como por exemplo uma teoria tautológica permite que derivemos alguns enunciados singulares de outros enunciados singulares Segundo as regras da Lógica podemos por exemplo dizer da conjunção de dois vezes dois são quatro e aqui está um corvo negro seguese entre outras coisas aqui está um corvo Não bastaria inclusive exigir que da conjunção da teoria com algumas condições iniciais pudéssemos deduzir mais do que poderíamos deduzir apenas das condições iniciais Essa exigência excluiria sem dúvida as teorias tautológicas mas não excluiria os enunciados metafísicos sintéticos Por exemplo de toda ocorrência tem uma causa e aqui ocorreu uma catástrofe podemos de duzir esta catástrofe tem uma causa Ao longo dessa linhas somos levados a requerer que a teoria nos permita deduzir grosseiramente falando mais enunciados singu 89 lares empíricos do que poderíamos deduzir apenas a partir das condições iniciais 1 Isso quer dizer que devemos alicerçar nossa definição numa classe especial de enunciados singulares e esse é o propósito para o qual necessitamos de enunciados básicos Confessando que não seria muito fácil expor em pormenor a maneira como um complexo sistema teórico auxilia na dedução de enunciados singulares ou básicos proponho a seguinte definição uma teoria será chamada de empírica ou falseável sempre que sem ambiguidade dividir a classe de todos os possíveis enunciados básicos nas seguintes duas subclasses não vazias primeiro a classe de todos os enunciados básicos com os quais é incompatível ou que rejeita ou proíbe a essa classe chamamos de classe dos falseadores potenciais da teoria e segundo a classe de enunciados básicos que ela não contradiz ou que ela permite 1 Formulações equivalentes à apresentada aqui têm sido sugeridas como critérios de significatividade de sentenças mais do que como critérios de demarcação aplicáveis a sistemas teóricos após a publicação de meu livro até mesmo por críticos que ridicularizaram meu critério de falseabilidade Contudo facilmente se vê que se usada como critério de demarcação a formulação presente equivale à falseabilidade Com efeito se o enunciado básico b2 não defluí de b1 mas de b em conjunção com a teoria t tal é a presente formulação isso corresponde a dizer que a conjunção de b1 com a negação de b2 contradiz a teoria t Ocorre porém que a conjunção de b1 com a negação de b2 é um enunciado básico cf seção 28 Assim nosso critério requer a existência de um enunciado básico falseador isto é exige precisamente no mesmo sentido a falseabilidade ver ainda nota 1 da seção 82 Como critério de significado ou de verificabilidade fraca ele deixa de satisfazer entretanto por várias razões Em primeiro lugar porque as negações de alguns enunciados significativos se destituiriam de significado nos termos desse critério Em segundo lugar porque a conjunção de um enunciado significativo com uma pseudosentença sem significado tornarseia significativa o que é igualmente absurdo Se agora tentarmos aplicar essas duas críticas a nosso critério de demarcação ambas se revelarão inofensivas Quanto à primeira ver seção 15 acima especialmente a nota 2 e seção 22 de meu Postscript Quanto à segunda teorias empíricas tal como a de Newton podem incluir elementos metafísicos Estes porém não são suscetíveis de eliminação por uma regra rígida e imediata contudo se houver um meio de apresentarmos a teoria de forma a ela colocarse como combinação de uma parte suscetível de prova e uma parte não suscetível de prova saberemos naturalmente ser então possível eliminar um de seus componentes metafísicos O parágrafo anterior desta nota pode ser tomado como ilustração de outra regra de método cf fim da nota 5 da seção 80 depois de haver feito alguma crítica a uma teoria rival devemos empenharnos numa séria tentativa de aplicar a mesma crítica ou crítica similar à nossa própria teoria Admitimos que isso quer dizer o mesmo que a classe Pk de enunciados singulares equivalentes à pk é um elemento do evento P Apliquemos agora essa terminologia 2 ao problema de que nos estamos ocupando Procede dizer a propósito de uma teoria contanto que ela se mostre falseável que ela rejeita ou proibe não apenas uma ocorrência mas sempre pelo menos um evento Assim a classe dos enunciados básicos proibidos isto é dos potenciais falseadores da teoria conterá sempre se não for vazia um número ilimitado de enunciados básicos pois uma teoria não se refere a indivíduos como tais Podemos denominar homotípicos os enunciados básicos singulares que pertencem a um evento Desse modo assinalase a analogia entre enunciados equivalentes que descrevem uma ocorrência de um lado e enunciados homotípicos que descrevem um evento típico de outro lado Cabe então dizer que toda classe não vazia de falseadores potenciais de uma teoria inclui pelo menos uma classe não vazia de enunciados básicos homotípicos Imaginemos agora que a classe de todos os enunciados básicos possíveis seja representada por uma área circular A área do círculo pode ser encarada como representando algo semelhante à totalidade dos possíveis mundos de experiência ou dos possíveis mundos empíricos Imaginemos ainda que cada evento é representado por um dos raios ou mais precisamente por uma estreita área ou estreito setor ao longo de um dos raios e que quaisquer duas ocorrências envolvendo as mesmas coordenadas ou indivíduos se localizam à mesma distância do centro e assim no mesmo círculo concêntrico Poderemos agora ilustrar o postulado da falseabilidade exigindo que para cada teoria empírica exista pelo menos um raio ou um setor extremamente estreito em nosso diagrama que seja proibido pela teoria Essa ilustração pode mostrarse útil no exame de vários de nossos problemas 1 tal como o do caráter metafísico de enunciados pura Mais resumidamente poderíamos apresentar o ponto dizendo uma teoria é falseável se não estiver vazia a classe de seus falseadores potenciais Cabe acrescentar que uma teoria só faz asserções acerca de seus falseadores potenciais Asseveralhes a falsidade Acerca dos enunciados básicos permitidos nada diz a teoria Em particular não afirma que eles sejam verdadeiros 2 22 FALSEABILIDADE E FALSIFICAÇÃO Importa distinguir claramente entre falseabilidade e falsificação Introduzimos a falseabilidade apenas como um critério aplicável ao caráter empírico de um sistema de enunciados Quanto à falsificação deveremos introduzir regras especiais que determinarão em que condições um sistema há de ser visto como falseado Dizemos que uma teoria está falseada somente quando dispomos de enunciados básicos aceitos que a contradigam cf seção 11 regra 2 Essa condição é necessária porém não suficiente com efeito vimos que ocorrências particulares não suscetíveis de reprodução carecem de significado para a Ciência Assim uns poucos enunciados básicos dispersos e que contradigam uma teoria dificilmente nos induzirão a rejeitála como falseada Só a diremos falseada se descobrirmos um efeito suscetível de reprodução que refute a teoria Em outras palavras somente aceitaremos o falseamento se uma hipótese empírica de baixo nível que descreva esse efeito for proposta e corroborada A essa espécie de hipótese cabe chamar de hipótese falseadora 1 A exigência de que a hipótese falseadora seja empírica e portanto falseável signi 2 Em verdade muitos dos enunciados básicos permitidos se contradirão mutuamente em presença da teoria cf seção 38 Por exemplo a lei universal todos os planetas movemse em círculos isto é qualquer conjunto de posições de qualquer planeta é cocircular é exemplificada trivialmente por qualquer conjunto de não mais que três posições de um planeta contudo duas dessas exemplificações em conjunto contradirão a lei na maioria dos casos 1 A hipótese falseadora pode ser de nível de universalidade bem baixo obtida por assim dizer através da generalização das coordenadas individuais de um resultado de observação como exemplo eu poderia citar o assim chamado fato de Mach a que aludi na seção 18 Ainda que a hipótese falseadora deva ser intersubjetivamente suscetível de teste não é preciso que se constitua em enunciado estritamente universal Assim para falsear o enunciado todos os corvos são negros bastaria o enunciado intersubjetivamente suscetível de teste de que no jardim zoológico de Nova Iorque existe uma família de corvos brancos fica apenas que ela deve colocarse em certa relação lógica para com possíveis enunciados básicos contudo essa exigência apenas diz respeito à forma lógica da hipótese O requisito de que a hipótese deva ser corroborada referese a testes a que ela tenha sido submetida testes que a confrontam com enunciados básicos aceitos 1 Dessa maneira os enunciados básicos desempenham dois papéis diferentes De uma parte utilizamos o sistema de todos os enunciados básicos logicamente possíveis para com o auxílio deles conseguir a caracterização lógica por nós procurada a da forma dos enunciados empíricos De outra parte os enunciados básicos aceitos constituem o fundamento da corroboracão de hipóteses Se os enunciados básicos aceitos contradisserem uma teoria só os tomaremos como propiciadores de apoio suficiente para o falseamento da teoria caso eles concomitantemente corroborem uma hipótese falseadora Tudo isso mostra a urgência de substituir uma hipótese falseada por outra melhor Na maioria dos casos antes de falsear uma hipótese dispomos de outra pois o experimento falseador é normalmente um experimento crucial destinado a decidir entre as duas Em outras palavras ele é sugerido pela circunstância de as duas hipóteses diferirem sob algum aspecto e recorre a essa diferença para refutar pelo menos uma delas 1 Essa referência a enunciados básicos aceitos pode parecer incluir os germes de uma regressão infinita Com efeito nosso problema atual é o seguinte desde que uma hipótese seja falseada pela aceitação de um enunciado básico tornamse necessárias regras metodológicas para a aceitação de enunciados básicos Ora como essas regras se referem por sua vez a enunciados básicos aceitos podemos vernos envolvidos em uma regressão infinita A essa observação respondendo dizendo que as regras de que precisamos são simples regras de aceitação dos enunciados básicos que falseiam uma hipótese submetida a teste e que se mostra até o momento satisfatória e não é necessário que os enunciados básicos aceitos a que a regra recorre tenham esse caráter Além disso a regra apresentada no texto está longe de ser exaustiva ela menciona apenas um importante aspecto relacionado com a aceitação de enunciados básicos que falseiam uma hipótese sob outros aspectos satisfatória A questão será aprofundada no capítulo v especialmente na seção 29 O professor J H Woodger em comunicação pessoal levantou a questão com que freqüência um efeito deve ser realmente reproduzido para que seja um efeito reproduzível ou uma descoberta A resposta é em alguns casos nem mesmo uma vez Se afirmo que há uma família de corvos brancos no zoológico de Nova Iorque assevero algo que em princípio pode ser objeto de prova Se alguém quiser efetuar a prova e for informado de que a família de corvos percebeu ou que dela jamais se ouviu falar cabe a essa pessoa aceitar ou rejeitar meu enunciado básico falseador Em geral ela terá meios de formar uma opinião através do exame de testemunhas documentos etc ou seja apelando para outros fatos reproduzíveis e intersubjetivamente comprováveis cf seções 2730 23 OCORRÊNCIAS EVENTOS O requisito de falseabilidade que de início mostravase um tanto vago dividiuse agora em duas porções A primeira o postulado metodológico cf seção 20 dificilmente poderá assumir feição precisa A segunda o critério lógico tornase definido tão logo se torna claro a que enunciados denominar básicos cf seção 28 Esse critério lógico foi até agora apresentado de maneira algo formal como uma relação lógica entre enunciados entre a teoria e os enunciados básicos Talvez as questões se esclareçam e se tornem mais intuitivas caso eu expresse agora meu critério em linguagem mais realista Embora exprimilo nessa linguagem seja equivalente a exprimilo de maneira formal talvez esteja mais perto da linguagem comum Segundo esse ângulo realista podemos dizer que um enunciado singular um enunciado básico descreve uma ocorrência Em vez de falar de enunciados básicos que são rejeitados ou proibidos por uma teoria podemos dizer que a teoria rejeita certas ocorrências possíveis e que ela se falseará caso essas possíveis ocorrências de fato se manifestarem O uso dessa expressão vaga ocorrência talvez exponhase a crítica Temse dito algumas vezes 1 que expressões tais como ocorrência ou evento deveriam ser completamente banidas do discurso epistemológico e que não deveríamos falar de ocorrências ou nãoocorrências ou da manifestação de eventos mas falar da verdade ou falsidade de enunciados Prefiro contudo conservar a expressão ocorrência É fácil definirlhe o uso de modo a não se levantarem objeções pois usála de maneira tal que ao referir uma ocorrência poderíamos em vez disso estar referindo alguns dos enunciados singulares a ela correspondentes Ao definir ocorrência podemos lembrar o fato de ser natural afirmar que dois enunciados singulares logicamente equivalentes isto 1 Especialmente em obras de autores que escreveram acerca da probabilidade cf Keynes A Treatise on Probability 1921 p 5 Keynes referese a Ancillon como o primeiro a propor o modo formal de expressão referese também a Boole Czuber e Stumpf Conquanto eu continue a encarar minhas definições sintáticas de ocorrência e evento atrás referidas como adequadas para o proposito que tenho em vista não acredito mais que elas sejam intuitivamente adequadas ou seja não acredito que representem apropriadamente nosso uso ou nossas intenções Foi Alfred Tarski quem me levou à reconhecer em Paris 1935 que se fazia necessária uma definição semântica em substituição à definição sintática mente existenciais brevemente mencionado na seção 15 É claro que a cada um desses enunciados corresponderá um evento um raio tal que os vários enunciados básicos pertencentes a esse evento comprovarão cada qual o enunciado puramente existencial Contudo a classe de seus falseadores potenciais está vazia portanto de enunciados existenciais nada se segue que diga respeito aos possíveis mundos de experiência Os enunciados existenciais não excluem ou proíbem quaisquer dos raios O fato de reciprocamente um enunciado puramente existencial poder ser deduzido a partir de cada enunciado básico não serve de ponto de apoio para emprestar caráter empírico aos enunciados existenciais Com efeito cada tautologia também decorre de cada enunciado básico pois as tautologias são deduzíveis de quaisquer enunciados Neste momento é oportuno dizer alguma coisa acerca dos enunciados autocontraditórios Enquanto as tautologias os enunciados puramente existenciais e outros enunciados não falseáveis não afirmam quase nada por assim dizer a respeito da classe dos possíveis enunciados básicos os enunciados autocontraditórios afirmam demais Qualquer enunciado pode ser legitimamente deduzido de um enunciado autocontraditório 2 Conseqüentemente a classe de seus falseadores potenciais é idêntica à classe de todos os possíveis enunciados básicos o enunciado autocontraditório é falseado por qualquer enunciado Talvez se pudesse dizer que esse fato ilustra a vantagem de nosso método isto é nossa insistência em falseadores potenciais e não em possíveis verificadores Com efeito se pudéssemos verificar um enunciado por meio da verificação de suas consequências lógicas ou se pudéssemos tornálo provável através dessa verificação das consequências então seria cabível esperar que mediante aceitação de qualquer enunciado básico se confirmasse ou verificasse ou pelo menos se tornasse provável qualquer enunciado autocontraditório 24 FALSEABILIDADE E COMPATIBILIDADE A condição da compatibilidade desempenha papel especial entre as várias condições que devem ser satisfeitas por um sistema teórico ou um sistema axiomático Tratase da condição primeira condição que deve ser satisfeita por quaisquer sistemas empíricos ou não empíricos A fim de pôr em evidência a importância fundamental dessa condição não basta mencionar o fato óbvio de que um sistema autocontraditório deve ser rejeitado porque é falso Com frequência manipulamos enunciados que embora efetivamente falsos propiciam resultados convenientes para certos propósitos 1 Um exemplo disso é a aproximação de Nernst para a equação do equilíbrio dos gases Contudo a importância da condição de compatibilidade tornarseá patente se nos dermos conta de que um sistema autocontraditório é não informativo E assim ocorre porque dele podemos deduzir qualquer conclusão que desejemos Dessa maneira nenhum enunciado é particularizado como incompatível ou como derivável pois todos são deriváveis Um sistema compatível por outro lado divide em dois o conjunto de todos os enunciados possíveis os que ele contradiz e aqueles com os quais é compatível Dentre estes últimos colocamse as conclusões que podem ser deduzidas do sistema Esse o motivo por que a compatibilidade se coloca na condição de o mais geral requisito a ser surpreendentemente porém Russell contestou esse fato em sua réplica a Wiener pp 695 e s da mesma obra falando porém de proposições falsas onde Wiener falava de premissas incompatíveis Cf minha Conjectures and refutations 1963 1965 pp 317 e ss 1 Cf meu Postscript seção 3 minha réplica à segunda proposta e seção 12 ponto 2 preenchido por um sistema seja ele empírico ou não empírico se esse sistema pretender alguma utilidade Além de ser compatível um sistema empírico deve satisfazer uma condição adicional deve ser falseável As duas condições em larga medida são análogas 1 Os enunciados que não satisfazem a condição de compatibilidade não podem permitir o estabelecimento de diferença entre dois enunciados quaisquer dentro da totalidade dos enunciados possíveis Os enunciados que não satisfazem a condição de falseabilidade não podem permitir o estabelecimento de diferença entre dois enunciados quaisquer dentro da totalidade dos possíveis enunciados básicos empíricos 1 Cf minha nota em Erkenntnis v 3 1933 p 426 Faz agora parte do apêndice i adiante CAPÍTULO V O PROBLEMA DA BASE EMPÍRICA A questão da falseabilidade das teorias está agora reduzida à da falseabilidade dos enunciados singulares a que chamei de enunciados básicos Que espécie de enunciados singulares são entretanto esses enunciados básicos Como podem eles ser falseados Para quem se dedica à pesquisa prática esses assuntos podem ser de pequeno interesse Contudo as obscuridades e malentendidos que rodeiam o problema tornam conveniente examinálo com algum pormenor 25 EXPERIÊNCIAS PERCEPTUAIS COMO BASE EMPÍRICA PSICOLOGISMO A doutrina segundo a qual as ciências empíricas são reduzíveis a percepções sensórias e conseqüentemente a nossas experiências é por muitos aceita como óbvia Todavia essa doutrina é acolhida ou rejeitada na dependência de aceitarmos ou não a Lógica Indutiva aqui a rejeitamos porque rejeitamos a Lógica Indutiva Não desejo negar a existência de um grão de verdade na concepção de que a Matemática e a Lógica se alicerçam no pensamento ao passo que as ciências factuais se fundamentam em percepções sensórias O que há de verdadeiro nessa concepção tem não obstante pouca relação com o problema epistemológico E sem dúvida seria difícil encontrar no terreno da epistemologia um problema que se tenha ressentido mais severamente da confusão entre Psicologia e Lógica do que esse problema da base dos enunciados da experiência Poucos pensadores se perturbam tão profundamente com o problema da base da experiência quanto Fries 1 Ensinou ele que se 1 J F Fries Neue oder anthropologische Kritik der Vernunft 1828 a 1831 CAPÍTULO III TEORIAS As teorias científicas são sistemas de signos ou símbolos de enunciados universais decorrentes das ciências empíricas visando assim a racionalização do mundo 12 CAUSALIDADE EXPLICAÇÃO E DEDUÇÃO DE PREDIÇÕES Dar uma explicação causal a certo acontecimento parte de um processo de dedução de uma explicação que descreva o ocorrido a partir das leis universais unido as condições singulares do acontecimento Nesse viés há duas tipologias de enunciados primeiro o enunciado universal ligado às leis naturais e enunciado singulares que darão características subjetivas ao evento em questão chamados de condições iniciais A partir da integração desses enunciados é possível formular uma predição específica As condições iniciais que irão descrever o evento em questão são chamados de causa a predição está relacionada com o efeito Nesse âmbito o princípio da causalidade ratifica que todo e qualquer evento pode ser explicado a parte da sua causalidade entretanto esse princípio pode ser excluído da esfera científica dandolhe caráter metafísico 13 UNIVERSALIDADE ESTRITA E NUMÉRICA Ambas são espécies de enunciados sintéticos universais onde os enunciados estritamente universais estão relacionados às leis naturais Essa tipologia visa ser verdadeiro para qualquer tempo ou local a cerca de um ilimitado número de indivíduos como um enunciado todos Enquanto os enunciados numericamente universais são equivalentes a determinados enunciados singulares Logo está relacionada com uma classe finita de elementos específicos dentro de um determinado contexto geográfico e temporal A distinção entre esses dois tipos de enunciados está estreitamente ligado à distinção entre conceitos ou nomes universais e individuais respectivamente onde no caso dos nomes individuais onde se faz indispensável a presença de nomes próprios representações de signos no último caso signos equivalentes 14 CONCEITOS UNIVERSAIS E CONCEITOS INDIVIDUAIS Vale ainda pontuar que a tentativa de definir nomes universais a partir de nomes individuais está fadado ao fracasso Entretanto é possível passar de conceitos individuais para conceitos universais processo esse denominado de abstração 15 ENUNCIADOS ESTRITAMENTE UNIVERSAIS E ENUNCIADOS EXISTENCIAIS Os enunciados que só ocorrem nomes universais sem o uso de individuais serão denominados estritos ou puros universais Sendo que esses não sofrem restrições quanto a espaço e tempo Sendo esse passíveis de se tornar enunciados falseáveis isto é são leis naturais comparadas a negação negando que algo exista ou ocorra É impreterível pontuar que uma mesma palavra pode atuar como universal bem como individual Além disso há os enunciados estritamente ou puramente existencial sendo essa uma negação do enunciado estritamente existente As teorias da Ciência Natural têm a forma de enunciados universais onde esses não podem ser falseáveis Essas são passíveis de verificação Ambos espécies de enunciados escritos são empiricamente decisivos 16 SISTEMA TEÓRICOS Uma vez que as teorias científicas estão em perpétua mutação por isso apenas ramos da ciência chegam a adquirir a forma de um sistema de teóricas verdadeiramente elaborado formulado de maneira suficientemente clara e completa a fim de tornar novos pressuposto reconhecido pelo que ele é uma revisão do sistema Nesse viés o chamado sistema axiomatizado tenta reunir todos os pressupostos para compor o ápice do sistema sendo esses chamados de axiomas proposições primitivas Podese dizer que um sistema teórico sofre o processo de axiomatização a partir da satisfação dos quatros requisitos fundamentais o sistema deve estar livre de contradições ele deve ser independente deve ser suficiente para a dedução de todos e por fim necessários para o mesmo propósito Nas teorias axiomatizadas é possível investigar a interdependência de várias partes do sistema inclusive é possível investigar se determinada parte da teoria é derivada de alguma parte dos axiomas 17 ALGUMAS POSSIBILIDADES DE INTERPRETAÇÃO DOS SISTEMAS AXIOMAS Nesse ínterim os axiomas podem ter duas diferentes interpretações podem ser tidos como convenções em outras palavras eles restringem o uso ou significado de ideias fundamentais que são introduzidas pelos axiomas É como se fossem implicitamente definidos Já na interpretação por meio do sistema de hipóteses empíricas ou científicas nesse processo um significado empírico é definido e atribuído a um conceito seja esse processo de correlação com objetos que pertencem ao mundo real 18 NÍVEIS DE UNIVERSALIDADE O MODUS TOLLENS A partir de um sistema teórico é possível distinguir enunciados que pertencem aos níveis de universalidade sendo esses os axiomas O caráter de hipótese está vinculado com a conclusão de deduções com um auxílio de um sistema teórico CAPÍTULO IV FALSEABILIDADE 19 ALGUMAS OBJEÇÕES DOS CONVENCIONALISTAS O autor propõe adotar a falseabilidade como critério para decidir se um sistema teorético pertence ou não ao campo das ciências empíricas O estudo filosófico a partir dos convencionalistas a simplicidade seria incompreensível como se fosse uma criação nossa rejeitando a ideia de que a natureza seria simples sendo simples apenas as leis da natureza enquanto os realistas as leis naturais nos revelam uma simplicidade interior estrutural do mundo Logo para o convencionalista a ciência teorética natural é uma construção lógica e essa construção determina a funcionalidade de um mundo de conceitos definidos por leis naturais escolhidas por nós É sobre esse mundo que se trata a ciência Com isso as leis da natureza não são falseáveis por observação são elas que se tornam necessárias para determinar o que é estudado pela ciência 20 REGRAS METODOLÓGICAS A filosofia convencionalista e suas objeções de uma convencionalista imaginário parecem ser incontestáveis com tudo é impossível decidir por análise lógica se um sistema de enunciados é um sistema convencional de definições implícitas irrefutáveis Somente com respeito aos métodos aplicados isso é possível Por isso não podemos utilizar essa filosofia se o nosso sistema sofre ameaças Para isso ser possível e necessário da adoção de estratagemas que podem se revestir com o movimento anticonvencionalismo Com respeito às hipóteses auxiliares se o grau de falseabilidade aumenta a introdução da hipótese corresponde a um reforço da teoria uma vez que proíbe mais 21 INVESTIGAÇÃO LÓGICA DA FALSEABILIDADE Para caracterizar a falseabilidade de uma teoria é necessário recorrer às relações lógicas vigentes entre a teoria e a classe de enunciados básicos O caráter desse último enunciado um sistema que inclui todos os enunciados singulares autocompatíveis de certa forma lógica Empírica são teorias que sempre busca deduzir enunciados singulares bem como uma teoria que possa derivar enunciado singulares atraves de recursos a outros enunciados singulares que atuem como condições iniciais 22 FALSEABILIDADE E FALSIFICAÇÃO Falseabilidade é um critério aplicável ao caráter empírico de um sistema enquanto a falsificação exigirá regras especiais que definiram um sistema como falseado Dizemos que uma teoria está falseada quando os enunciados básicos se contradizem e quando há um efeito suscetível de reprodução que refute a teoria 24 FALSEABILIDADE E COMPATIBILIDADE A condição da compatibilidade é uma das várias condições associadas a um sistema axiomático sendo essa uma condição primeira Um sistema compatível divide em dois o conjunto de todos os enunciados possíveis os que ele contradiz e os quais ele é compatível Além de ser compatível um sistema empírico deve satisfazer a condição de ser falseável Logo os enunciados que nas satisfazem a compatibilidade não permite o estabelecimento de diferenças entre dois enunciados e se não satisfazem a condição de falseabilidade não podem permitir o estabelecimento de diferenças entre dois enunciados CAPÍTULO III TEORIAS As teorias científicas são sistemas de signos ou símbolos de enunciados universais decorrentes das ciências empíricas visando assim a racionalização do mundo 12 CAUSALIDADE EXPLICAÇÃO E DEDUÇÃO DE PREDIÇÕES Dar uma explicação causal a certo acontecimento parte de um processo de dedução de uma explicação que descreva o ocorrido a partir das leis universais unido as condições singulares do acontecimento Nesse viés há duas tipologias de enunciados primeiro o enunciado universal ligado às leis naturais e enunciado singulares que darão características subjetivas ao evento em questão chamados de condições iniciais A partir da integração desses enunciados é possível formular uma predição específica As condições iniciais que irão descrever o evento em questão são chamados de causa a predição está relacionada com o efeito Nesse âmbito o princípio da causalidade ratifica que todo e qualquer evento pode ser explicado a parte da sua causalidade entretanto esse princípio pode ser excluído da esfera científica dandolhe caráter metafísico 13 UNIVERSALIDADE ESTRITA E NUMÉRICA Ambas são espécies de enunciados sintéticos universais onde os enunciados estritamente universais estão relacionados às leis naturais Essa tipologia visa ser verdadeiro para qualquer tempo ou local a cerca de um ilimitado número de indivíduos como um enunciado todos Enquanto os enunciados numericamente universais são equivalentes a determinados enunciados singulares Logo está relacionada com uma classe finita de elementos específicos dentro de um determinado contexto geográfico e temporal A distinção entre esses dois tipos de enunciados está estreitamente ligado à distinção entre conceitos ou nomes universais e individuais respectivamente onde no caso dos nomes individuais onde se faz indispensável a presença de nomes próprios representações de signos no último caso signos equivalentes 14 CONCEITOS UNIVERSAIS E CONCEITOS INDIVIDUAIS Vale ainda pontuar que a tentativa de definir nomes universais a partir de nomes individuais está fadado ao fracasso Entretanto é possível passar de conceitos individuais para conceitos universais processo esse denominado de abstração 15 ENUNCIADOS ESTRITAMENTE UNIVERSAIS E ENUNCIADOS EXISTENCIAIS Os enunciados que só ocorrem nomes universais sem o uso de individuais serão denominados estritos ou puros universais Sendo que esses não sofrem restrições quanto a espaço e tempo Sendo esse passíveis de se tornar enunciados falseáveis isto é são leis naturais comparadas a negação negando que algo exista ou ocorra É impreterível pontuar que uma mesma palavra pode atuar como universal bem como individual Além disso há os enunciados estritamente ou puramente existencial sendo essa uma negação do enunciado estritamente existente As teorias da Ciência Natural têm a forma de enunciados universais onde esses não podem ser falseáveis Essas são passíveis de verificação Ambos espécies de enunciados escritos são empiricamente decisivos 16 SISTEMA TEÓRICOS Uma vez que as teorias científicas estão em perpétua mutação por isso apenas ramos da ciência chegam a adquirir a forma de um sistema de teóricas verdadeiramente elaborado formulado de maneira suficientemente clara e completa a fim de tornar novos pressuposto reconhecido pelo que ele é uma revisão do sistema Nesse viés o chamado sistema axiomatizado tenta reunir todos os pressupostos para compor o ápice do sistema sendo esses chamados de axiomas proposições primitivas Podese dizer que um sistema teórico sofre o processo de axiomatização a partir da satisfação dos quatros requisitos fundamentais o sistema deve estar livre de contradições ele deve ser independente deve ser suficiente para a dedução de todos e por fim necessários para o mesmo propósito Nas teorias axiomatizadas é possível investigar a interdependência de várias partes do sistema inclusive é possível investigar se determinada parte da teoria é derivada de alguma parte dos axiomas 17 ALGUMAS POSSIBILIDADES DE INTERPRETAÇÃO DOS SISTEMAS AXIOMAS Nesse ínterim os axiomas podem ter duas diferentes interpretações podem ser tidos como convenções em outras palavras eles restringem o uso ou significado de ideias fundamentais que são introduzidas pelos axiomas É como se fossem implicitamente definidos Já na interpretação por meio do sistema de hipóteses empíricas ou científicas nesse processo um significado empírico é definido e atribuído a um conceito seja esse processo de correlação com objetos que pertencem ao mundo real 18 NÍVEIS DE UNIVERSALIDADE O MODUS TOLLENS A partir de um sistema teórico é possível distinguir enunciados que pertencem aos níveis de universalidade sendo esses os axiomas O caráter de hipótese está vinculado com a conclusão de deduções com um auxílio de um sistema teórico CAPÍTULO IV FALSEABILIDADE 19 ALGUMAS OBJEÇÕES DOS CONVENCIONALISTAS O autor propõe adotar a falseabilidade como critério para decidir se um sistema teorético pertence ou não ao campo das ciências empíricas O estudo filosófico a partir dos convencionalistas a simplicidade seria incompreensível como se fosse uma criação nossa rejeitando a ideia de que a natureza seria simples sendo simples apenas as leis da natureza enquanto os realistas as leis naturais nos revelam uma simplicidade interior estrutural do mundo Logo para o convencionalista a ciência teorética natural é uma construção lógica e essa construção determina a funcionalidade de um mundo de conceitos definidos por leis naturais escolhidas por nós É sobre esse mundo que se trata a ciência Com isso as leis da natureza não são falseáveis por observação são elas que se tornam necessárias para determinar o que é estudado pela ciência 20 REGRAS METODOLÓGICAS A filosofia convencionalista e suas objeções de uma convencionalista imaginário parecem ser incontestáveis com tudo é impossível decidir por análise lógica se um sistema de enunciados é um sistema convencional de definições implícitas irrefutáveis Somente com respeito aos métodos aplicados isso é possível Por isso não podemos utilizar essa filosofia se o nosso sistema sofre ameaças Para isso ser possível e necessário da adoção de estratagemas que podem se revestir com o movimento anticonvencionalismo Com respeito às hipóteses auxiliares se o grau de falseabilidade aumenta a introdução da hipótese corresponde a um reforço da teoria uma vez que proíbe mais 21 INVESTIGAÇÃO LÓGICA DA FALSEABILIDADE Para caracterizar a falseabilidade de uma teoria é necessário recorrer às relações lógicas vigentes entre a teoria e a classe de enunciados básicos O caráter desse último enunciado um sistema que inclui todos os enunciados singulares autocompatíveis de certa forma lógica Empírica são teorias que sempre busca deduzir enunciados singulares bem como uma teoria que possa derivar enunciado singulares atraves de recursos a outros enunciados singulares que atuem como condições iniciais 22 FALSEABILIDADE E FALSIFICAÇÃO Falseabilidade é um critério aplicável ao caráter empírico de um sistema enquanto a falsificação exigirá regras especiais que definiram um sistema como falseado Dizemos que uma teoria está falseada quando os enunciados básicos se contradizem e quando há um efeito suscetível de reprodução que refute a teoria 24 FALSEABILIDADE E COMPATIBILIDADE A condição da compatibilidade é uma das várias condições associadas a um sistema axiomático sendo essa uma condição primeira Um sistema compatível divide em dois o conjunto de todos os enunciados possíveis os que ele contradiz e os quais ele é compatível Além de ser compatível um sistema empírico deve satisfazer a condição de ser falseável Logo os enunciados que nas satisfazem a compatibilidade não permite o estabelecimento de diferenças entre dois enunciados e se não satisfazem a condição de falseabilidade não podem permitir o estabelecimento de diferenças entre dois enunciados
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Capítulo III TEORIAS As ciências empíricas são sistemas de teorias A lógica do conhecimento científico pode portanto ser apresentada como uma teoria de teorias As teorias científicas são enunciados universais Como todas as representações lingüísticas são sistemas de signos ou símbolos Não me parece conveniente expressar a diferença entre teorias universais e enunciados singulares dizendo que estes últimos são concretos ao passo que as teorias são simplesmente fórmulas simbólicas ou esquemas simbólicos pois podese dizer exatamente o mesmo inclusive dos enunciados mais concretos 1 As teorias são redes lançadas para capturar aquilo que denominamos o mundo para racionalizálo explicálo dominálo Nossos 1 Tratase de um comentário crítico a uma concepção que eu mais tarde chamaria de instrumentalismo cujos defensores em Viena eram Mach Wittgenstein e Schlick cf notas 4 e 7 na seção 4 e nota 5 na seção 27 Tratase da concepção para a qual a teoria nada mais é que um instrumento ou ferramenta para a predição Critiquei essa concepção ao analisála em meus artigos A Note on Berkeley as a Precursor of Mach British Journal for the Philosophy of Science v 6 1953 pp 26 e ss Three Views Concerning Human Knowledge in Contemporary British Philosophy iii 1956 obra organizada por H D Lewis pp 355 e ss crítica mais desenvolvida achase em meu Postscript seções 11 a 15 e 19 a 26 Em poucas palavras entendo que nossa linguagem comum está cheia de teorias que a observação é sempre uma observação à luz de teorias que só o preconceito indutivista leva as pessoas a pensarem em uma possível linguagem fenomenica livre de teorias distinguível de uma linguagem teórica e enfim que o estudioso está interessado em explicações ou seja em teorias passíveis de prova dotadas de poder explicativo aplicações e predições interessamno apenas por motivos teóricos porque podem ser utilizadas como provas de teorias Vejase ainda o novo apêndice x 61 esforços são no sentido de tornar as malhas da rede cada vez mais estreitas 12 CAUSALIDADE EXPLICAÇÃO E DEDUÇÃO DE PREDIÇÕES Oferecer uma explicação causal de certo acontecimento significa deduzir um enunciado que o descreva utilizando como premissas da dedução uma ou mais leis universais combinadas com certos enunciados singulares as condições iniciais Podemos por exemplo dizer que damos explicação causal do rompimento de um fio se asseverarmos que o fio tem uma resistência à ruptura igual a um quilo e que se prendeu nele um peso de dois quilos Se analisarmos essa explicação causal poderemos distinguir várias partes constitutivas De um lado colocase a hipótese sempre que um fio é levado a suportar um peso que excede aquele que caracteriza a sua resistência à ruptura ele se romperá Esse enunciado apresenta o caráter de uma lei universal da natureza De outro lado deparamos com enunciados singulares no caso dois desses enunciados que se aplicam apenas ao evento específico em pauta o peso característico deste fio é de um quilo e o peso preso a este fio foi de dois quilos 1 Temos assim duas diferentes espécies de enunciados colocandose ambas como ingredientes necessários de uma explicação causal completa Tratase de 1 enunciados universais isto é hipóteses com o caráter de leis naturais e 2 de enunciados singulares que se aplicam ao evento específico em pauta e que chamarei de condições iniciais Da conjunção de enunciados universais e condições iniciais deduzimos o enunciado singular este fio se romperá A esse enunciado denominamos predição específica ou singular 2 As condições iniciais descrevem aquilo que habitualmente é chamado de causa do evento em questão O fato de um peso de dois quilos ter sido preso a um fio que apresentava resistência à ruptura igual a um quilo foi a causa de seu rompimento A predição descreve aquilo que é normalmente chamado de efeito Evitarei ambos os termos Em Física o emprego da expressão explicação causal é via de regra feito apenas no caso especial em que as leis universais assumem a forma de leis de ação por contato ou mais precisamente a forma de leis de ação a uma distância que tende a zero expressada por meio de equações diferenciais Essa restrição não será levada em conta neste contexto Além disso não farei qualquer asseveração geral quanto à aplicabilidade universal desse método dedutivo de explicação teórica Não afirmarei pois qualquer princípio de causalidade ou princípio de causação universal O princípio da causalidade é a asseveração de que todo e qualquer evento pode ser causalmente explicado de que pode ser dedutivamente previsto De acordo com a maneira como se interprete a palavra pode na asserção acima esta será tautológica analítica ou uma asserção acerca da realidade sintética Se pode quiser dizer que é sempre logicamente possível elaborar uma explicação causal a asserção será tautológica pois para toda e qualquer predição poderemos sempre indicar enunciados universais e condições iniciais de que a predição é deduzível Se esses enunciados universais foram ou não submetidos a prova e confirmados em outros casos isso naturalmente é um problema diferente Se entretanto pode quiser dizer que o mundo é governado por leis rígidas que ele é construído de tal forma que todo evento específico é exemplo de uma regularidade universal ou lei a asserção será reconhecidamente sintética Em tal caso porém ela será não falsável como veremos adiante na seção 78 Conseqüentemente não adoto nem rejeito o princípio da causalidade contentome simplesmente com excluílo da esfera da ciência dandoo por metafísico Proporei contudo uma regra metodológica que corresponde tão proximamente ao princípio da causalidade que este pode ser encarado como sua versão metafísica Tratase da regra simples de que não devemos abandonar a busca de leis universais e de um coerente sistema teórico nem abandonar jamais nossas tentativas de explicar causalmente qualquer tipo de evento que possamos descrever Essa regra orienta o investigador em seu trabalho A concepção segundo a qual os mais recentes desenvolvimentos no campo da Física exigem 1 Análise mais clara do exemplo em que comparecem duas leis e duas condições iniciais seria esta A cada fio de determinada estrutura S determinada pelo tipo de material de espessura etc corresponde um peso característico w tal que o fio se rompe se um peso maior do que w é preso a ele A cada fio de estrutura S1 corresponde um peso característico w1 de um quilo Estas seriam as duas leis universais As condições iniciais seriam Este é um fio de estrutura S1 e O peso colocado no fio é igual a 2 quilos 2 O termo predição tal como é aqui empregado abrange enunciados a respeito do passado retrodicções e mesmo enunciados dados que se procura explicar explicanda cf meu Poverty of Historicism 1945 p 133 da edição de 1957 bem como a seção 15 do meu Postscript 62 renúncia a essa regra ou de que a Física pelo menos em determinado setor considera inútil continuar a busca de leis não é acolhida neste contexto 2 A questão será examinada na seção 78 3 13 UNIVERSALIDADE ESTRITA E NUMÉRICA Cabe distinguir duas espécies de enunciados sintéticos universais o estritamente universal e o numericamente universal Foram os enunciados estritamente universais que tive em mente até agora ao falar de enunciados universais de teorias ou leis naturais A outra espécie os enunciados numericamente universais são em verdade equivalentes a certos enunciados singulares ou a conjunções de enunciados singulares e como enunciados singulares serão aqui classificados Comparese por exemplo os dois enunciados seguintes a É verdade acerca de todos os osciladores harmônicos que sua energia nunca desce abaixo de certo nível mínimo a saber h v 2 e b É verdade acerca de todos os seres humanos que habitam atualmente a Terra que eles nunca ultrapassam certa altura máxima digamos 250 m A lógica formal inclusive a lógica simbólica que se preocupa tãosomente com a teoria da dedução trata esses dois enunciados de modo semelhante como enunciados universais implicações formais ou gerais 1 Julgo porém necessário sublinhar a diferença que existe entre eles O enunciado a pretende ser verdadeiro para qualquer tempo e qualquer local O enunciado b referese apenas a uma classe finita de elementos específicos dentro de uma finita região individual ou particular do espaçotempo Enunciados desta última espécie podem em princípio ser substituídos por uma conjunção de enunciados singulares com efeito concedido tempo suficiente é possível enumerar todos os elementos da classe finita em pauta Esta a razão por que nesses casos falamos em universalidade numérica Em contraste o enunciado a a propósito dos osciladores não pode ser substituído por uma conjunção de número finito de enunciados singulares acerca de uma definida região do espaçotempo ou antes só poderia admitir semelhante substituição presumindo que o mundo é limitado no tempo não existindo nele mais que um número finito de osciladores Não formulamos entretanto esse pressuposto em particular não formulamos esse pressuposto ao definir os conceitos da Física Ao contrário encaramos um enunciado de tipo a como um enunciadotodos isto é uma asserção universal acerca de ilimitado número de indivíduos Interpretado dessa forma ele não pode é claro ser substituído por uma conjunção de número finito de enunciados singulares O uso que faço do conceito de enunciado estritamente universal ou enunciadotodos opõese à concepção de que todo enunciado universal sintético deve em princípio admitir tradução numa conjunção de número finito de enunciados singulares Aqueles que adotam essa concepção 2 insistem em que os por mim chamados enunciados estri1 A lógica tradicional e analogamente a lógica simbólica ou logística estabelece uma tricotomia enunciados universais particulares e singulares Um enunciado universal faz alusão a todos os elementos de uma classe um enunciado particular alude a alguns desses elementos um enunciado singular se refere a apenas um objeto um indivíduo Essa classificação dos enunciados não tem base em motivos que importem para a teoria do conhecimento foi criada com vistas voltadas para a técnica da inferência Conseqüentemente nossos enunciados universais não podem ser identificados nem aos enunciados universais da Lógica tradicional nem às implicações gerais ou formais da logística cf nota 6 da seção 14 Ver agora também o apêndice x e no meu Postscript a seção 15 2 Ver por exemplo F Kaufmann Bemerkungen zum Grundlagenstreit in Logik und Mathematik in Erkenntnis v 2 1931 p 274 64 65 tamente universais nunca podem ser verificados e em consequência rejeitamnos com base ou no critério de significado por eles acolhido e que reclama verificabilidade ou com base em alguma consideração similar É claro que admitida uma concepção de leis naturais que ignora a distinção entre enunciados singulares e universais o problema da indução poderá parecer resolvido pois obviamente tornamse perfeitamente admissíveis inferências que levam a enunciados apenas numericamente universais a partir de enunciados singulares Contudo é igualmente claro que o problema da indução sob seu ângulo metodológico não é tocado por esta solução Em verdade a verificação de uma lei natural só pode ser levada a efeito se se estabelecer empiricamente cada um dos eventos singulares a que a lei poderia aplicarse e se verificar que cada um desses eventos se conforma efetivamente com a lei tarefa evidentemente impossível De qualquer forma a questão de saber se as leis da Ciência são estritamente ou numericamente universais não pode ser resolvida através de argumentação Tratase de uma dessas questões que só podem ser resolvida por acordo ou convenção Tendo em vista a situação metodológica referida considero útil e frutífero encarar as leis naturais como enunciados sintéticos e estritamente universais enunciadostodos Isso equivale a encarálos como enunciados não verificáveis que podem ser apresentados sob a forma seguinte de todos os pontos do espaço e do tempo ou em todas as regiões do espaço e do tempo é verdadeiro que Em contraste chamo de enunciados específicos ou singulares os enunciados que dizem respeito apenas a certas regiões finitas do espaço e do tempo A distinção entre enunciados estritamente universais e enunciados apenas numericamente universais que são realmente uma espécie de enunciado singular será aplicada tãosomente a enunciados sintéticos Devo entretanto mencionar a possibilidade de aplicar essa distinção também a enunciados analíticos a certos enunciados matemáticos por exemplo 3 3 Exemplos a Todo número natural tem um sucessor b Excetuando os números 11 13 17 e 19 todos os números situados entre 10 e 20 são divisíveis N T entendase são divisíveis por números diversos da unidade e do próprio número isto é não são números primos 66 14 CONCEITOS UNIVERSAIS E CONCEITOS INDIVIDUAIS A distinção entre enunciados universais e singulares prendese estreitamente à distinção entre conceitos ou nomes universais e individuais É comum elucidar essa distinção recorrendo a exemplo do tipo seguinte ditador planeta H2O são nomes ou conceitos universais Napoleão Terra o Atlântico são conceitos ou nomes singulares ou individuais Nesses exemplos os conceitos ou nomes individuais parecem caracterizarse ou por serem nomes próprios ou por terem de ser definidos por meio de nomes próprios ao passo que os conceitos ou nomes universais podem ser definidos sem o uso de nomes próprios Considero de fundamental importância a distinção entre conceitos ou nomes universais e individuais Toda aplicação da Ciência assentase numa inferência de casos singulares a partir de hipóteses científicas que são universais isto é baseiase na dedução de predições singulares Em todo enunciado singular devem ocorrer conceitos ou nomes individuais Os nomes individuais que ocorrem nos enunciados singulares da ciência aparecem freqüentemente sob feição de coordenadas espaçotemporais Isso se compreende facilmente bastando considerar que a aplicação de um sistema espaçotemporal de coordenadas sempre envolve referência a nomes individuais Temos com efeito de fixarlhe os pontos de origem e só podemos fazêlo empregando nomes próprios ou seus equivalentes O uso dos nomes Greenwich e o ano de nascimento de Cristo ilustra o que pretendo dizer Por esse método um número arbitrariamente grande de nomes individuais pode ser reduzido a uns poucos 1 Expressões vagas e gerais tais como esta coisa aquela coisa e assim por diante podem por vezes ser empregadas como nomes individuais talvez acompanhadas de algum tipo de gesto Em resumo podemos utilizar signos que não são nomes próprios mas que em determinada medida são passíveis de substituição por nomes próprios ou coordenadas individuais Todavia 1 As unidades de medida do sistema de coordenadas antes estabelecidas por meio de nomes individuais a rotação da Terra o metropadrão localizado em Paris podem ser definidas em princípio através de nomes universais por meio digamos do comprimento de onda ou da frequência de uma luz monocromática emitida por certos tipos de átomos submetidos a determinado tratamento 67 também os conceitos universais podem ser indicados mesmo que apenas vagamente com o auxílio de gestos Assim podemos apontar para certas coisas ou eventos individuais e então enunciar por uma frase como e outras semelhantes ou e assim por diante nossa intenção de encarar tais indivíduos apenas como representantes de alguma classe que em termos próprios deveria receber um nome universal Não há dúvida de que aprendemos o uso de palavras universais ou seja sua aplicação a indivíduos por meio de gestos e recursos similares A base lógica de aplicações desse tipo está em que os conceitos individuais podem ser conceitos não apenas de elementos mas também de classes e está em que podem representar conceitos universais não apenas numa relação correspondente à de um elemento para uma classe mas ainda numa relação correspondente à de uma subclasse para uma classe Exemplificando meu cão Lux não é apenas um elemento da classe dos cães vienenses o que é um conceito individual mas é ainda um elemento da classe universal dos mamíferos o que é um conceito universal Os cães vienenses por sua vez não são apenas uma subclasse da classe individual dos cães austríacos mas também uma subclasse da classe universal dos mamíferos O emprego da palavra mamíferos como exemplo de um nome universal pode levar a malentendidos Palavras como mamífero cão etc não estão em seu uso ordinário livres de ambigüidade O serem essas palavras encaradas como nomes de classes individuais ou como nomes de classes universais depende das intenções que temos depende de desejarmos falar de uma raça de animais que vive em nosso planeta um conceito individual ou de uma espécie de corpos físicos dotados de propriedades que podem ser descritas em termos universais Ambigüidades análogas surgem com respeito ao uso de conceitos como pasteurizado e latinismo na medida em que se torna possível eliminar os nomes próprios a que esses conceitos aludem ou em que se torna possível definir esses conceitos com auxílio desses nomes próprios 1 Os exemplos e explicações acima devem ter deixado claro o que significará neste livro conceitos universais e conceitos individuais Se nos pedissem definições teríamos provavelmente de dizer como antes um conceito individual é um conceito para cuja definição fazemse indispensáveis nomes próprios ou signos equivalentes se for possível eliminar completamente qualquer alusäoa nomes próprios o conceito será um conceito universal Una definição desse gênero contudo seria de pequeno interesse pois tudo o que a definição permite é reduzir a idéia de um conceito ou nome individual à de um nome próprio no sentido de nome de uma coisa física individual Creio que o uso por mim proposto corresponde muito proximamente ao uso costumeiro que se faz das expressões universal e individual Seja ou não assim considero a distinção aqui traçada indispensável a fim de que não se prejudique a correspondente distinção entre enunciados universais e singulares há total analogia entre o problema dos universais e o problema da indução A tentativa de identificar uma coisa individual simplesmente por suas propriedades e relações universais que pareçam pertencer a ela apenas e a nada mais está condenada ao fracasso Esse procedimento descreveria não uma coisa individual única mas a classe universal de todos os indivíduos a que essas propriedades e relações se aplicam Nem mesmo o uso de um sistema espaçotemporal de coordenadas traria qualquer alteração2 Permanecerá sempre como questão aberta saber se há coisas individuais que correspondam a uma descrição por meio do uso de nomes universais e no caso afirmativo saber quantas são essas coisas Do mesmo modo está condenada a falhar qualquer tentativa de definir nomes universais com o auxílio de nomes individuais Esse fato tem sido ignorado com certa freqüência e de modo geral acreditase ser possível passar de conceitos individuais para conceitos universais através de um processo denominado abstração Essa concepção lembra a Lógica Indutiva e a passagem de enunciados singulares para enunciados universais Logicamente esses processos são também impraticáveis 3 É certo que dessa maneira se pode chegar a classes de indivíduos mas tais classes continuarão a ser conceitos individuais conceitos definidos com o auxílio de nomes próprios 1 Pasteurizado se define por Tratado segundo as indicações de Louis Pasteur ou algo semelhante ou por Aquecido até 80 graus centígrados e conservado nessa temperatura durante dez minutos A primeira definição torna pasteurizado um conceito individual a segunda um conceito universal Mas vejase ainda a nota 4 logo a seguir 2 Não espaço e tempo em geral mas determinações individuais espaciais temporais ou outras assentadas em nomes próprios é que são princípios de individuação 3 De modo análogo o método da abstração utilizado na Lógica Simbólica também é incapaz de passar dos nomes individuais para os nomes universais Se a classe definida por meio de abstração é definida extensionalmente com o auxílio de nomes individuais ela se torna por sua vez um conceito individual 68 mais importantes dentre eles são os enunciados estritamente universais que já apresentei Além deles estou especialmente interessado em enunciados da forma Há corvos negros que podem ser tomados como significando o mesmo que Há pelo menos um corvo negro Esses enunciados serão denominados enunciados estritamente ou puramente existenciais ou enunciadoshá A negação de um enunciado estritamente universal equivale sempre a um enunciado estritamente existencial e viceversa Exemplificando Nem todos os corvos são negros expressa o mesmo que Existe um corvo que não é negro ou Há corvos não negros As teorias da Ciência Natural e em particular aquilo que denominamos leis naturais têm a forma lógica de enunciados estritamente universais podem assim ser expressas sob forma de negações de enunciados estritamente existenciais ou caberia dizer sob a forma de enunciados de nãoexistência ou enunciadosnãohá A lei da conservação da energia por exemplo admite ser expressa sob a forma Não há máquina de movimento perpétuo a hipótese da carga elétrica elementar pode ser traduzida dizendose Não há carga elétrica diversa de um múltiplo da carga elétrica elementar Em consonância com essa formulação vemos que as leis naturais poderiam ser comparadas a proscrições ou proibições Elas não asseveram que algo exista ou ocorra negamno Insistem na nãoexistência de certas coisas ou estados de coisas proscrevendo ou proibindo por assim dizer essas coisas ou estados de coisas afastamnos Precisamente por agirem nesse sentido é que são falseáveis Se aceitarmos como verdadeiro um enunciado singular que infringe a proibição asseverando a existência de uma coisa ou a ocorrência de um evento não admitido por uma lei essa lei está refutada Um exemplo seria Em tal e tal lugar há um aparelho que é uma máquina de movimento perpétuo Os enunciados estritamente existenciais em oposição a esses não podem ser falseados Nenhum enunciado singular quer dizer nenhum enunciado básico nenhum enunciado de evento observado pode contradizer o enunciado existencial Há corvos brancos Só um enunciado universal poderia fazêlo Com base no critério de demarcação aqui adotado terei portanto de tratar os enunciados estritamente existenciais como não empíricos ou metafísicos Essa caracterização parecerá talvez dúbia a um primeiro olhar e não muito de acordo com a prática da ciência empírica Como objeção caberia asseverar com justiça que no campo da Física inclusive há teorias que se apresentam sob a forma de enunciados estritamente existenciais Um exemplo seria um enunciado deduzível do sistema periódico dos elementos químicos asseverando a existência de elementos de certos números atômicos Todavia se a hipótese de que um elemento de certo número atômico existe vier a ser formulada de maneira a tornarse suscetível de prova nesse caso se requererá muito mais do que um enunciado puramente existencial Por exemplo o elemento com número atômico 72 Hafnio não foi descoberto com base apenas num enunciado isolado puramente existencial Pelo contrário todas as tentativas no sentido de identificálo foram vãs até que Bohr alcançou êxito no predizer várias de suas propriedades deduzindoas da teoria por ele construída Contudo a teoria de Bohr e as conclusões dela tiradas importantes para o elemento Hafnio e ocasionadoras de sua descoberta estão longe de ser enunciados isolados puramente existenciais1 São enunciados estritamente universais Minha decisão de encarar os enunciados estritamente existenciais como não empíricos por não serem falseáveis é útil e se coloca de acordo com o uso comum tal como se verá de sua aplicação a enunciados de probabilidade e ao problema de comproválos empiricamente cf seções 6668 Enunciados estritos ou puros sejam universais sejam existenciais não sofrem restrições quanto a espaço e tempo Não se referem a uma região individual limitada espaçotemporal Essa a razão por que enunciados estritamente existenciais não são falseáveis Não podemos investigar o mundo inteiro a fim de determinar que algo não existe nunca existiu e nunca existirá Precisamente pela mesma razão os enunciados estritamente universais não são verificáveis Não podemos investigar o mundo inteiro para ter a certeza de que nada existe proibido pela lei Contudo ambas as espécies de enunciados estritos estritamente existenciais e estritamente universais são em princípio empiricamente decisíveis Decisíveis porém num sentido apenas são unilateralmente decisíveis Comprovado que algo existe aqui ou ali um enunciado existencial pode por esse meio ser verificado do mesmo modo que um enunciado universal pode ser falseado 1 A palavra isolados foi inserida para evitar má interpretação do trecho embora seu propósito penso eu esteja suficientemente claro um enunciado existencial isolado nunca é falseável contudo se tomado no contexto de outros enunciados um enunciado existencial pode em certos casos contribuir para o conteúdo empírico de todo o contexto pode enriquecer a teoria a que ele integra e pode elevar seu grau de falseabilidade ou de suscetibilidade a prova Nesse caso o sistema teórico que inclui o enunciado existencial em pauta deve ser apresentado como científico e não como um sistema de cunho metafísico 72 73 A assimetria aqui descrita e sua consequência a falseabilidade unilateral dos enunciados universais da Ciência empírica talvez possa agora parecer menos dúbia do que anteriormente na seção 6 Vemos agora que não está envolvida nenhuma assimetria de qualquer relação puramente lógica Pelo contrário as relações lógicas mostram simetria Enunciados universais e existenciais são construídos simetricamente Só 2 a linha traçada por nosso critério de demarcação produz uma assimetria 16 SISTEMAS TEÓRICOS As teorias científicas estão em perpétua mutação Não se deve isso ao mero acaso mas isso seria de esperar tendo em conta nossa caracterização da Ciência empírica Talvez seja essa a razão pela qual geralmente apenas ramos da Ciência e estes apenas em caráter temporário chegam a adquirir a forma de um sistema de teorias elaborado e logicamente bem construído A despeito disso um sistema apresentado em termos de tentativa pode normalmente ser examinado em seu todo com todas as suas importantes consequências Isto se impõe como uma necessidade pois o teste severo de um sistema pressupõe que ele esteja na ocasião suficientemente definido e acabado sob aspectos formais de modo a tornar impossível que novos pressupostos sejam clandestinamente introduzidos nele Em outras palavras o sistema deve ser formulado de maneira suficientemente clara e completa de sorte a tornar qualquer novo pressuposto prontamente reconhecido pelo que ele é uma modificação e portanto uma revisão do sistema Tal entendo eu é o motivo por que objetivase conseguir a forma de um sistema rigoroso Essa é a forma do chamado sistema axiomatizado a forma que Hilbert por exemplo pôde dar a certos setores da Física teórica Tentase reunir todos os pressupostos necessários e não mais para formar o ápice do sistema Os pressupostos são normalmente chamados axiomas ou postulados ou proposições primitivas nenhuma pretensão de verdade está implícita no termo axioma tal como aqui usado Os axiomas são selecionados de maneira tal que todos os outros enunciados pertencentes ao sistema teórico possam ser derivados desses axiomas por meio de transformações puramente lógicas ou matemáticas Podese dizer que um sistema teórico foi axiomatizado caso se tenha formulado um conjunto de enunciados os axiomas que satisfaça os quatro requisitos fundamentais seguintes a o sistema de axiomas deve estar livre de contradição seja a autcontradição seja a mútua contradição Isso equivale a exigir que não seja possível deduzir dos axiomas todos os enunciados arbitrariamente escolhidos 1 b o sistema deve ser independente isto é não conter qualquer axioma deduzível dos demais axiomas Em outras palavras um enunciado só será denominado axioma se não for deduzível junto com o resto do sistema Essas duas condições dizem respeito ao sistema axiomático como tais no que concerne à relação do sistema axiomático para com o todo da teoria os axiomas devem ser c suficientes para a dedução de todos os enunciados pertencentes à teoria a ser axiomatizada e d necessários para o mesmo propósito o que significa que eles não devem incluir pressupostos supérfluos 2 Numa teoria assim axiomatizada é possível investigar a mútua dependência das várias partes do sistema Podemos por exemplo investigar se determinada parte da teoria é derivável de alguma parte dos axiomas Investigações desse gênero e a esse respeito mais se dirá nas seções 63 e 64 e nas seções de 75 a 77 têm importante reflexo sobre o problema da falseabilidade Elas tornam clara por que a falsificação de um enunciado logicamente deduzido pode por vezes não afetar todo o sistema porém apenas parte dele que será dada como falseada Isso é possível porque embora as teorias da física não sejam em geral inteiramente axiomatizadas as conexões entre suas várias partes podem revelarse suficientemente claras para habilitarnos a decidir quais de seus subsistemas se encontram afetados por alguma particular observação falseadora 1 1 Cf seção 24 2 Com respeito a essas quatro condições e também à seção seguinte ver por exemplo a versão algo diferente em Abriss der Logistik de R Carnap 1927 pp 70 e ss 1 Este ponto é mais amplamente examinado em meu Postscript particularmente na seção 22 74 75 17 ALGUMAS POSSIBILIDADES DE INTERPRETAÇÃO DE UM SISTEMA DE AXIOMAS A concepção do racionalismo clássico segundo a qual os axiomas de certos sistemas como por exemplo os da geometria euclidiana devem ser encarados como imediata ou intuitivamente certos ou autoevidentes não será aqui examinada Direi apenas que não partilho dessa concepção Considero admissíveis duas diferentes interpretações de qualquer sistema de axiomas Os axiomas podem ser tidos 1 como convenções ou ser encarados ii como hipóteses empíricas ou científicas i Se os axiomas forem vistos como convenções restringirão o uso ou significado das idéias fundamentais ou termos primitivos ou conceitos que os axiomas introduzem determinarão o que pode e o que não pode ser dito acerca dessas idéias fundamentais Os axiomas por vezes são apresentados como definições implícitas das idéias que introduzem Essa concepção se elucidará talvez se recorrermos a uma analogia entre um sistema axiomático e um sistema de equações compatíveis e solúveis Os valores admissíveis para as incógnitas ou variáveis que aparecem num sistema de equações de um ou de outro modo são determinados pelo sistema Ainda que o sistema de equações admita mais de uma solução não admitirá que as incógnitas variáveis sejam substituídas por qualquer combinação de valores concebível Pelo contrário o sistema de equações caracteriza como admissíveis certas combinações de valores ou sistemas de valores e dá outras combinações por inadmissíveis O sistema distingue a classe dos sistemas de valores admissíveis da classe dos sistemas de valores inadmissíveis De maneira análoga sistemas de conceitos podem ser classificados em admissíveis ou inadmissíveis por meio do que procederia chamar de equaçãoenunciado Uma equaçãoenunciado surge a partir de uma função proposicional ou funçãoenunciado cf nota 6 da seção 14 este é um enunciado incompleto no qual se apresentam um ou mais claros Dois exemplos dessas funções proposicionais ou funçõesenunciado são Um isótopo do elemento x tem o peso atômico 65 ou x y 12 Toda funçãoenunciado transformase em enunciado preenchidos os claros por certos valores x e y O enunciado resultante será verdadeiro ou falso na dependência dos valores ou combinação de valores introduzidos Assim no primeiro exemplo a substituição de x pela palavra cobre ou zinco leva a um enunciado verdadeiro enquanto outras substituições conduziriam a enunciados falsos Ora aquilo que eu chamo de equaçãoenunciado se obtém se decidirmos com respeito a alguma funçãoenunciado admitir apenas os valores que introduzidos tornam essa função um enunciado verdadeiro Por meio dessa equaçãoenunciado definese uma classe determinada de sistemas de valor admissíveis ou seja a classe dos que a satisfazem A analogia com uma equação matemática é clara Se nosso segundo exemplo for interpretado não como uma funçãoenunciado mas como uma equaçãoenunciado tornarseá uma equação no sentido comum matemático Como suas idéias fundamentais não definidas ou termos primitivos podem ser consideradas como claros um sistema axiomático em primeiro lugar pode ser tratado como um sistema de funçõesenunciado Contudo se deliberarmos que nele só podem ser introduzidos os sistemas ou combinações de valores que o satisfaçam então ele se tornará um sistema de equaçõesenunciados Como tal ele define implicitamente uma classe de admissíveis sistemas de conceitos Todo sistema de conceitos que satisfaz um sistema de axiomas pode ser chamado de modelo desse sistema de axiomas 1 A interpretação de um sistema axiomático na condição de sistema de convenções ou definições implícitas pode também ser expressa dizendose que ela equivale à decisão só modelos podem ser admitidos como substitutos 2 Entretanto introduzido um modelo o resultado será um sistema de enunciados analíticos pois o sistema se tornará verdadeiro por convenção Interpretado dessa maneira um sistema axiomático não pode portanto ser visto como um sistema de hipóteses empíricas ou científicas no sentido que lhes damos porque não pode ser refutado por falsificação de suas consequências estas terão também o caráter de analíticas ii Cabe perguntar como pode um sistema axiomático ser interpretado em termos de sistema de hipóteses empíricas ou cientí 1 Ver nota 2 2 Hoje devo distinguir claramente entre os sistemas de objetos que satisfazem um sistema axiomático e o sistema de nomes desses objetos que podem ser incluídos nos axiomas tornandoos verdadeiros só ao primeiro sistema chamo de modelo Assim devo agora escrever só nomes de objetos que constituem um modelo podem ser considerados para efeito de substituição nos claros dos axiomas 76 77 ficas Usualmente se diz que os termos primitivos presentes num sistema axiomático não devem ser encarados como implicitamente definidos mas como constantes extralógicas Exemplificando conceitos como linha reta e ponto que ocorrem em todo sistema axiomático de geometria podem ser interpretados entendendose que equivalem a raio luminoso e interseção de raios luminosos Dessa maneira admitese os enunciados do sistema axiomático se transformam em enunciados acerca de objetos empíricos ou seja em enunciados sintéticos À primeira vista essa maneira de focalizar o assunto pode parecer perfeitamente satisfatória Ela porém leva a dificuldades que se relacionam com o problema da base empírica Pois de maneira alguma é claro o que seria um modo empírico de definir um conceito Costumase falar de definições ostensivas Isso quer dizer que um significado empírico definido é atribuído a um conceito correlacionandoo com certos objetos que pertencem ao mundo real Passa ele então a ser visto como símbolo desses objetos Importa deixar claro porém que somente nomes ou conceitos individuais podem ser fixados por ostensiva referência a objetos reais apontandose digamos para certa coisa e enunciando um nome ou apondolhe um rótulo com o respectivo nome Contudo os conceitos a serem usados no sistema axiomático devem corresponder a nomes universais que não podem ser definidos por indicações empíricas como a de apontar etc Eles só podem ser definidos se puderem sêlo explicitamente com o auxílio de outros nomes universais do contrário hão de permanecer indefinidos É inevitável portanto que alguns nomes universais devam permanecer indefinidos e aqui está a dificuldade pois esses conceitos indefinidos sempre podem ser usados em sentido não empírico i isto é como se fossem conceitos implicitamente definidos Esse uso não obstante leva inevitavelmente à destruição do caráter empírico do sistema Entendo que essa dificuldade só pode ser contornada se nos valermos de uma decisão metodológica Nessas condições adotarei a regra de não usar conceitos indefinidos como se fossem implicitamente definidos esse ponto será tratado adiante na seção 20 A esta altura convid talvez acrescentar que em geral tornase possível correlacionar os conceitos primitivos de um sistema axiomático tal como a Geometria a conceitos de outro sistema eg a Física ou interpretálos à luz destes Essa possibilidade mostrase particularmente importante quando no curso da evolução de uma ciência um sistema de enunciados está sendo explicado através de recurso a um sistema novo e mais geral de hipóteses que permite a dedução não apenas dos enunciados que integram o primeiro sistema como ainda de enunciados que se incluem em outros sistemas Em casos assim pode haver possibilidade de definir os conceitos fundamentais do novo sistema com auxílio de conceitos originalmente usados em alguns dos sistemas anteriores 18 NÍVEIS DE UNIVERSALIDADE O MODUS TOLLENS Dentro de um sistema teórico é possível distinguir enunciados que pertencem a vários níveis de universalidade Os enunciados de mais alto nível de universalidade são os axiomas deles podem ser deduzidos enunciados de níveis mais baixos Enunciados empíricos de nível mais alto revestem sempre o caráter de hipóteses relativamente aos enunciados de nível mais baixo deles deduzíveis eles podem ser falseados pela falsificação desses enunciados menos universais Contudo em qualquer sistema dedutivo hipotético estes enunciados menos universais continuam a ser enunciados estritamente universais no sentido aquí fixado Assim também eles devem revestir o caráter de hipóteses fato que tem sido freqüentemente ignorado quando se trata de enunciados universais de nível mais baixo Mach por exemplo chamá ¹ a teoria de condução do calor elaborada por Fourier uma teoria física modelo pela curiosa razão de que essa teoria se baseia não em uma hipótese mas num fato observável Todavia o fato observável a que Mach se refere é por ele descrito através de um enunciado A velocidade com que se igualam as diferenças de temperatura contanto que essas diferenças sejam reduzidas é proporcional às mesmas diferenças um enunciadotodos cujo caráter hipotético deveria ser suficientemente claro Mesmo a propósito de alguns enunciados singulares direi que eles são hipotéticos uma vez que deles com auxílio de um sistema teórico possam ser deduzidas conclusões tais que a falsificação dessas conclusões poderia falsear os enunciados singulares em pauta O modo falseador de inferência aqui referido a maneira como o falseamento de uma conclusão acarreta o falseamento do sistema de ¹ Mach Principien der Wärmelehre 1896 p 115 79 que ela deriva corresponde ao modus tollens da Lógica tradicional Ele pode ser descrito da maneira seguinte 1 Seja p a conclusão de um sistemat de enunciados que pode consistir de teorias e condições iniciais por amor à simplicidade não distinguirei entre umas e outras Simbolizaremos a relação de deduzibilidade implicação analítica de p a partir de t usando t p que podese ler p decorre de t Admitamos que p seja falsa o que se pode expressar escrevendo p que se lê nãop Dada a relação de deduzibilidade t p e o pressuposto p podemos inferir t leiase nãot ou seja encaramos t como falseado Se denotarmos a conjunção asserção simultânea de dois enunciados pela colocação de um ponto entre os símbolos que os representam poderemos também escrever a inferência falseadora da seguinte maneira t p p t ou em palavras Se p é deduzível de t e se p é falsa então t também é falso Por esse modo de inferência falseamos todo o sistema teoria e condições iniciais que se fazia necessário para deduzir o enunciado p isto é o enunciado falseado Assim não se pode asseverar de qualquer enunciado do sistema que ele seja ou não especificamente atingido pelo falseamento Só no caso de p ser independente de alguma parte do sistema é que poderemos dizer que essa parte não está envolvida no falseamento ² A essa possibilidade prendese a seguinte podemos em alguns casos talvez considerando os níveis de universalidade atribuir o falseamento a alguma hipótese definida por exemplo a uma hipótese recentemente introduzida Isso poderá ocorrer se uma teoria bem corroborada e que continua a receber corroboração adicional foi dedutivamente explicada por uma hipótese nova de nível mais alto Deverá ser feita uma tentativa de submeter a prova essa nova hipótese considerando algumas de suas consequências que não foram ainda objeto de comprovação Se algumas dessas consequências chegarem a ser falseadas poderemos atribuir o falseamento apenas à nova hipótese Procuraremos então para substituíla outras generalizações de nívelalto mas não deveremos nos sentir obrigados a encarar o sistema anterior e de menor generalidade como tendo sido falseado Cf ainda as observações a respeito da quase indução na seção 85 ¹ Tendo em vista a presente passagem e dois trechos posteriores cf notas 1 da seção 35 e 1 da seção 36 nos quais faço uso do símbolo desejo registrar que ao escrever o livro eu me encontrava ainda em estado de confusão acerca da forma de distinguir um enunciado condicional enunciadose então por vezes denominado de maneira talvez enganadora implicação material de um enunciado acerca da deduzibilidade ou enunciado asseverador de que algum enunciado condicional é logicamente verdadeiro ou analítico ou de que seu antecedente acarreta seu conseqüente distinção que me foi ensinada por Alfred Tarski alguns meses após a publicação do livro A questão não é de maior relevo no contexto deste volume sem embargo a confusão deve ser assinalada Esses problemas são mais extensamente examinados por exemplo em meu trabalho publicado em Mind v 56 1947 pp 193 e ss 2 Assim não podemos saber de início qual dentre os vários enunciados do subsistema remanescente t do qual p não é independente cabe responsabilizar pela falsidade de p qual desses enunciados devemos alterar e quais deles devemos manter Não estou aqui discutindo enunciados intercambiáveis Com freqüência é apenas o instinto científico do investigador influenciado naturalmente pelos resultados do testar e repetir os testes que o leva a fazer 80 conjecturas a respeito de quais os enunciados de t deve ele considerar inócuos e quais deve encarar como reclamando modificações Contudo convém lembrar que freqüentes vezes é a modificação daquilo que nos sentimos inclinados a encarar como obviamente inócuo porque em completa concordância com nossos hábitos normais de pensamento o fator capaz de levar a avanços decisivos Notável ilustração desse ponto é a modificação do conceito de simultaneidade feita por Einstein A fonte da Filosofia convencionalista parece residir no espanto diante da simplicidade austeramente bela do mundo tal como se revela nas leis da Física Os convencionalistas parecem achar que esta simplicidade seria incompreensível e em verdade mirac ulosa se nos inclinaçãosemos a crer com os realistas que as leis da natureza nos revelam uma simplicidade interior estrutural do mundo sob sua aparência exterior de exuberante multiplicidade O idealismo de Kant procurou explicar esta simplicidade afirmando que nosso intelecto é que impõe suas leis sobre a natureza De maneira análoga porém ainda mais arrojadamente o convencionalista vê a simplicidade como nossa própria criação Para ele entretanto não se trata do efeito de leis que nosso intelecto imponha à natureza tornandoa simples ele não acredita em verdade que a natureza seja simples Simples são apenas as leis da natureza e estas sustenta o convencionalista são nossas livres criações nossas invenções nossas decisões e convenções arbitrárias Para o convencionalista a ciência teórica natural não é um retrato da natureza mas apenas uma construção lógica Não são as propriedades do mundo que determinam essa construção pelo contrário é essa construção que determina as propriedades de um mundo artificial um mundo de conceitos implicitamente definidos por leis naturais escolhidas por nós É desse mundo apenas que fala a ciência Segundo esse modo de ver convencionalista as leis da natureza não sio falseáveis por observação com efeito são elas que se tornam necessárias para determinar o que sejam a observação e mais especialmente a mensuração científica São essas leis por nós estabelecidas que formam a base indispensável para o acerto de nossos relógios é a correção das chamadas escalas de medida exatas Só dizemos que um relógio está certo ou que uma escala de medida é exata se os movimentos medidos com auxílio desses instrumentos satisfizerem os axiomas da mecânica que decidimos adotar ² é Eddington Procede mencionar que Duhem nega trad ingl p 188 a possibilidade de experimentos cruciais porque consideraos como verificações ao passo que eu afirmo a possibilidade de experimentos cruciais falseadores Cf ainda meu artigo Three views concerning human knowledge em Contemporary British Philosophy iii 1956 e meu Conjectures and Refutations 1959 2 Essa concepção também pode ser encarada como tentativa de resolver o problema da indução Com efeito o problema desapareceria se as leis naturais fossem definições e portanto tautologias Assim de acordo com a maneira de ver de Cornelius cf Zur Kritik der wissenschaftlichen Grundbegriffe Erkenntnis v 2 1931 n 4 o enunciado O ponto de fusão do chumbo está em torno de 335 graus C é parte da definição do conceito chumbo sugerido por experiência indutiva não podendo conseqüentemente ser refutado Uma 81 CAPÍTULO IV FALSEABILIDADE A questão de saber se existe um enunciado singular ou enunciado básico falseável será examinada adiante Aqui admitirei resposta afirmativa para essa questão e examinarei até que ponto meu critério de demarcação é aplicável a sistemas teóricos se o for Uma discussão crítica de uma posição habitualmente denominada convencionalismo fará surgir de início alguns problemas de método a serem enfrentados mediante a tomada de certas decisões metodológicas Tentarei em seguida caracterizar as propriedades lógicas desses sistemas de teorias que sejam falseáveis isto é falseáveis se nossas propostas metodológicas forem acolhidas 19 ALGUMAS OBJEÇÕES DOS CONVENCIONALISTAS É de esperar sejam levantadas objeções contra minha proposta de adotar a falseabilidade como critério para decidir se um sistema teórico pertence ou não ao campo da Ciência empírica Essas objeções serão levantadas por exemplo por aqueles que se encontram sob a influência da escola de pensamento conhecida como convencionalismo ¹ Algumas destas objeções já foram mencionadas nas seções 6 11 e 17 elas serão agora examinadas mais de perto ¹ Os principais representantes da escola são Poincaré e Duhem cf La théorie physique son objet et sa structure 1906 trad ingl de P P Wiener The Aim and Structure of Physical Theory Princeton 1954 Adepto recente é H Dingier entre suas numerosas obras podem ser mencionadas Das Experiment ed Der Zusammenhang der Wissenschaft und das Primat der Philosophie 1926 O alemão Hugo Dingier não deve ser confundido com o inglês Herbert Dingle O principal representante do convencionalismo no mundo de fala inglesa A fonte da Filosofia convencionalista parece residir no espanto diante da simplicidade austeramente bela do mundo tal como se revela nas leis da Física Os convencionalistas parecem achar que esta simplicidade seria incompreensível e em verdade mirac ulosa se nos inclinaçãosemos a crer com os realistas que as leis da natureza nos revelam uma simplicidade interior estrutural do mundo sob sua aparência exterior de exuberante multiplicidade O idealismo de Kant procurou explicar esta simplicidade afirmando que nosso intelecto é que impõe suas leis sobre a natureza De maneira análoga porém ainda mais arrojadamente o convencionalista vê a simplicidade como nossa própria criação Para ele entretanto não se trata do efeito de leis que nosso intelecto imponha à natureza tornandoa simples ele não acredita em verdade que a natureza seja simples Simples são apenas as leis da natureza e estas sustenta o convencionalista são nossas livres criações nossas invenções nossas decisões e convenções arbitrárias Para o convencionalista a ciência teórica natural não é um retrato da natureza mas apenas uma construção lógica Não são as propriedades do mundo que determinam essa construção pelo contrário é essa construção que determina as propriedades de um mundo artificial um mundo de conceitos implicitamente definidos por leis naturais escolhidas por nós É desse mundo apenas que fala a ciência Segundo esse modo de ver convencionalista as leis da natureza não sio falseáveis por observação com efeito são elas que se tornam necessárias para determinar o que sejam a observação e mais especialmente a mensuração científica São essas leis por nós estabelecidas que formam a base indispensável para o acerto de nossos relógios é a correção das chamadas escalas de medida exatas Só dizemos que um relógio está certo ou que uma escala de medida é exata se os movimentos medidos com auxílio desses instrumentos satisfizerem os axiomas da mecânica que decidimos adotar ² é Eddington Procede mencionar que Duhem nega trad ingl p 188 a possibilidade de experimentos cruciais porque consideraos como verificações ao passo que eu afirmo a possibilidade de experimentos cruciais falseadores Cf ainda meu artigo Three views concerning human knowledge em Contemporary British Philosophy iii 1956 e meu Conjectures and Refutations 1959 2 Essa concepção também pode ser encarada como tentativa de resolver o problema da indução Com efeito o problema desapareceria se as leis naturais fossem definições e portanto tautologias Assim de acordo com a maneira de ver de Cornelius cf Zur Kritik der wissenschaftlichen Grundbegriffe Erkenntnis v 2 1931 n 4 o enunciado O ponto de fusão do chumbo está em torno de 335 graus C é parte da definição do conceito chumbo sugerido por experiência indutiva não podendo conseqüentemente ser refutado Uma 83 A filosofia do convencionalismo é digna de grande crédito pela maneira como ajudou a esclarecer as relações existentes entre teoria e experimento Ela reconheceu a importância tão pouco notada pelos indutivistas da parte desempenhada pelas nossas ações e operações planejadas de acordo com raciocínios dedutivos e convenções na condução e interpretação de nossos descobrimentos científicos Eu vejo o convencionalismo como um sistema autosuficiente e defensável Não é de supor tenham êxito as tentativas de nele apontar incoerências Contudo e apesar disso consideroo um sistema positivamene inaceitável Apóiase ele numa ideia de Ciência de seus objetivos e propósitos inteiramente diversa da minha Enquanto da Ciência não peço qualquer certeza final e conseqüentemente não chego a ela o convencionalista procura na Ciência um sistema de conhecimento alicerçado em bases definitivas para usar a frase de Dingler Essa meta pode ser atingida pois é possível interpretar qualquer dado sistema científico como um sistema de definições implícitas E períodos em que a Ciência se desenvolve lentamente proporcionarão pouca oportunidade para o surgimento de conflito a não ser que este seja puramente acadêmico entre cientistas adeptos do Convencionalismo e outros que possam favorecer visão semelhante à que advogo Coisa muito diversa ocorrerá numa época de crise Sempre que o sistema clássico do dia for ameaçado pelos resultados de experimentos novos passíveis de serem interpretados como falseamentos segundo meu ponto de vista o sistema permanecerá inabalado aos olhos do convencionalista Ele afastará as incoerências que possam ter surgido aludindo talvez ao fato de não dominarmos suficientemente o sistema Ou eliminará as incoerências sugerindo a adoção de certas hipóteses auxiliares ad hoc ou talvez de certas correções nos instrumentos de medida Nestes tempos de crise esse conflito a propósito dos objetivos da Ciência se tornará agudo Nós e aqueles que partilham de nossa posição esperamos efetuar descobertas novas e esperamos ser auxiliados nesse trabalho por um sistema científico que acaba de aparecer Teremos por isso o maior interesse pelo experimento falseador Saudáloemos como um êxito por ele ter aberto horizontes novos num mundo de experiências novas Saudáloemos ainda que essas novas experiências nos forneçam argumentos novos contra as nossas mais recentes teorias Mas esta estrutura que surge cuja audácia de concepção admiramos é vista pelo convencionalismo como um monumento ao total colapso da ciência na expressão de Dingler Segundo o convencionalista só um princípio nos pode auxiliar a selecionar um sistema que se torna o eleito dentre todos os sistemas possíveis é o princípio de seleção do sistema mais simples o mais simples sistema de definições implícitas o que na prática significa o sistema clássico em voga Quanto à questão da simplicidade ver seções 4145 e especialmente a 46 Nos termos expostos meu conflito com os convencionalistas não é um conflito que possa ser dirimido em última instância por uma discussão teórica É possível contudo segundo penso extrair do estilo de pensamento convencionalista alguns argumentos interessantes contra o critério de demarcação por mim proposto entre esses argumentos estaria o seguinte admito poderia dizer um convencionalista que os sistemas teóricos das ciências naturais não são verificáveis mas assevero que também não são falseáveis Com efeito sempre existe a possibilidade de atingir através de algum sistema axiomático escolhido aquilo que é chamado sua correspondência com a realidade 3 e isso pode ser feito de numerosas maneiras algumas das quais sugerimos acima Podemos por exemplo introduzir hipóteses ad hoc ou modificar as chamadas definições ostensivas ou as definições explícitas que podem substituílas tal como foi mostrado na seção 17 Ou adotar atitude cética no que se refere à confiabilidade do experimentador cujas observações que ameaçam nosso sistema podemos excluir da Ciência dizendoas insuficientemente alicerçadas não científicas não objetivas ou mesmo pela afirmativa de que o experimentador adulterava os dados Essa é a espécie de atitude que o físico pode tomar algumas vezes muito corretamente em relação a supostos fenômenos ocultos Como último recurso é sempre possível lançar dúvida sobre a perspicácia do investigador por exemplo se ele não acredita como Dingler que dia virá em que a teoria da eletricidade seja deduzida da teoria da gravitação de Newton 3 Carnap Über die Aufgabe der Physik in Kantstudien v 28 1923 p 100 85 13 Assim de acordo com a concepção convencionalista não é possível dividir os sistemas e teorias em falseáveis e não falseáveis melhor dizendo essa distinção será ambígua Como conseqüência o critério de falseabilidade por nós proposto tornarseá inútil como critério de demarcação 20 REGRAS METODOLÓGICAS Essas objeções de um convencionalista imaginário parecemme incontestáveis tal como a própria Filosofia convencionalista Admito que meu critério de falseabilidade não conduza a uma classificação isenta de ambigüidade Contudo é impossível decidir por análise de sua forma lógica se um sistema de enunciados é um sistema convencional de definições implícitas irrefutáveis ou se é um sistema empírico no sentido que empresto a essa palavra ou seja um sistema refutável Isso mostra apenas que meu critério de demarcação não pode ser de imediato aplicado a um sistema de enunciados fato a que já aludi nas seções 9 e 11 É portanto mal posta a questão de saber se determinado sistema deve ser encarado como sistema convencionalista ou como sistema empírico Somente com respeito a métodos aplicados a um sistema teórico tornase possível indagar se estamos diante de uma teoria convencionalista ou empírica O único meio de evitar o convencionalismo é tomar uma decisão a decisão de não aplicarlhe o método Decidimos que se nosso sistema sofrer ameaça nunca procuraremos preserváIo recorrendo a qualquer espécie de estratagema convencionalista Assim evitaremos explorar a sempre aberta possibilidade há pouco referida de atingir através de algum sistema escolhido aquilo que é chamado sua correspondência com a realidade Uma visão clara daquilo que pode ser ganho e perdido por métodos convencionalistas foi expressa cem anos antes de Poincaré por Black que registrou Uma conveniente adaptação de condições fará com que praticamente qualquer hipótese concorde com os fenômenos Isso agradará a imaginação mas não fará avançar nosso conhecimento 1 Para formular as regras metodológicas que nos impeçam de adotar estratagemas convencionalistas devemos familiarizarnos com as várias 1 J Black Lectures on the Elements of Chemistry vol I Edinburgh 1803 p 193 86 formas de que esses estratagemas podem se revestir de modo a enfrentar cada qual delas com o adequado contramovimento anticonvencionalista Quando verificarmos que um sistema foi salvo graças ao uso de um estratagema convencionalista devemos dispornos a submetêIo a novas provas e rejeitáIo se as circunstâncias assim o exigirem Os quatro estratagemas convencionalistas principais já foram relacionados ao fim da seção anterior A lista não pretende ser completa Caberá ao investigador especialmente nos campos da Sociologia e da Psicologia o físico dificilmente necessitaria dessa advertência prevenirse constantemente contra a tentação de empregar novos estratagemas convencionalistas tentação a que os psicanalistas por exemplo sucumbem com freqüência Com respeito às hipóteses auxiliares propomos assentar a regra de que somente serão aceitáveis aquelas cuja introdução não reduza o grau de falseabilidade ou testabilidade do sistema em causa mas que ao contrário o eleve Nas seções de número 31 a 40 explicaremos como apreciar os graus de falseabilidade Se o grau de falseabilidade aumenta a introdução da hipótese corresponde em verdade a um reforço da teoria o sistema agora rejeita mais do que rejeitava anteriormente ele prolifera mais Podemos apresentar o mesmo ponto sob esta forma a introdução de uma hipótese auxiliar deve sempre ser encarada como uma tentativa de construir um sistema novo e esse sistema novo deve sempre ser julgado sob o prisma de saber se adotado corresponde a um real avanço do conhecimento acerca do mundo Um exemplo de uma hipótese auxiliar claramente aceitável é neste sentido o princípio da exclusão de Pauli cf seção 38 Um exemplo de hipótese auxiliar insatisfatória seria a hipótese de contração de Fitzgerald e Lorentz que não apresentava conseqüências falseáveis mas que simplesmente1 servia para restaurar a concordância entre teoria e experimento sobretudo considerando as descobertas de Michelson e Morley Um avanço quanto a essa questão só foi conseguido pela teoria da relatividade que previu conseqüências novas novos efeitos físicos e assim abriu possibilidades insuspeitadas para a comprovação e para o falseamento da teoria Nossa regra metodológica pode ser ressalvada pela observação de que não é preciso rejeitar como convencionalista qualquer hipótese auxiliar que deixe de satis 1 Isso é um engano como bem ressaltou A Grünbaum B J P S v 10 1959 pp 48 e ss Todavia como a hipótese é menos passível de prova do que a relatividade especial ela pode ilustrar um grau de caráter ad hoc 87 14 fazer os padrões colocados Há em particular enunciados singulares que realmente não se integram ao sistema teórico São por vezes denominados hipóteses auxiliares e embora introduzidos para auxiliar a teoria são inofensivos Um exemplo seria a admissão de que certa observação ou medida que não podem ser repetidas terseiam devido a erro Cf nota 6 da seção 8 e seções 27 e 68 Na seção 17 mencionei as definições explícitas por via das quais os conceitos de um sistema axiomático recebem significado em termos de um sistema de nível menor de universalidade Alterações dessas definições são permissíveis caso se mostrem úteis mas devem ser vistas como alterações do sistema que em seguida há de ser reexaminado como se fosse novo No que respeita aos nomes universais não definidos importa distinguir duas possibilidades 1 existem alguns conceitos não definidos que só aparecem em enunciados do mais alto nível de universalidade e cujo emprego se fixa por sabermos quais os tipos de relações lógicas são estabelecidos entre eles e outros conceitos É possível elimináIos ao longo da dedução um exemplo seria a energia 2 2 Existem outros conceitos não definidos que ocorrem também em enunciados de menores níveis de universalidade e cujo significado se estabelece por força do uso eg movimento pontomassa posição Com respeito a estes proibiremos alterações subreptícias de uso e no que se refere ao mais procederemos de conformidade com nossas decisões metodológicas tal como antes ficou assentado Quanto aos dois pontos remanescentes concernentes à competência do experimentador ou estudioso teórico adotaremos regras semelhantes experimentos intersubjetivamente suscetíveis de prova serão aceitos ou rejeitados à luz de contraexperimento O apelo simples às deduções lógicas a serem descobertas no futuro pode não merecer consideração 21 INVESTIGAÇÃO LÓGICA DA FALSEABILIDADE Só há necessidade de prevenirnos contra estratagemas convencionalistas quando for o caso de sistemas que seriam falseáveis se tratados de acordo com nossas regras de método empírico Admitamos ter conseguido afastar com êxito graças a nossas regras esses estratagemas cabe agora pedir uma caracterização lógica desses sistemas falseáveis Procuraremos caracterizar a falseabilidade de uma teoria recorrendo às relações lógicas vigentes entre a teoria e a classe de enunciados básicos O caráter dos enunciados singulares que denomino enunciados básicos será examinado mais amplamente no próximo capítulo onde estudaremos ainda a questão de saber se eles por sua vez são falseáveis A esta altura admitirei que existem enunciados básicos falseáveis Devese ter em mente que falando em enunciados básicos não me estou referindo a um sistema de enunciados aceitos O sistema de enunciados básicos tal como uso a expressão inclui antes todos os enunciados singulares autocompativeis de certa forma lógica por assim dizer todos os enunciados de fato concebíveis e singulares Assim o sistema de todos os enunciados básicos incluirá muitos enunciados mutuamente incompatíveis Como primeira tentativa poderseia chamar de empírica uma teoria sempre que dela coubesse deduzir enunciados singulares Essa tentativa falha porém porque para deduzir enunciados singulares de uma teoria sempre se fazem necessários outros enunciados singulares as condições iniciais que nos informam acerca de como substituir as variáveis da teoria Como segunda tentativa poderseia procurar chamar de empírica uma teoria caso dela sejam deriváveis enunciados singulares através de recurso a outros enunciados singulares que atuem como condições iniciais Entretanto isso também não satisfaz com efeito mesmo uma teoria não empírica como por exemplo uma teoria tautológica permite que derivemos alguns enunciados singulares de outros enunciados singulares Segundo as regras da Lógica podemos por exemplo dizer da conjunção de dois vezes dois são quatro e aqui está um corvo negro seguese entre outras coisas aqui está um corvo Não bastaria inclusive exigir que da conjunção da teoria com algumas condições iniciais pudéssemos deduzir mais do que poderíamos deduzir apenas das condições iniciais Essa exigência excluiria sem dúvida as teorias tautológicas mas não excluiria os enunciados metafísicos sintéticos Por exemplo de toda ocorrência tem uma causa e aqui ocorreu uma catástrofe podemos de duzir esta catástrofe tem uma causa Ao longo dessa linhas somos levados a requerer que a teoria nos permita deduzir grosseiramente falando mais enunciados singu 89 lares empíricos do que poderíamos deduzir apenas a partir das condições iniciais 1 Isso quer dizer que devemos alicerçar nossa definição numa classe especial de enunciados singulares e esse é o propósito para o qual necessitamos de enunciados básicos Confessando que não seria muito fácil expor em pormenor a maneira como um complexo sistema teórico auxilia na dedução de enunciados singulares ou básicos proponho a seguinte definição uma teoria será chamada de empírica ou falseável sempre que sem ambiguidade dividir a classe de todos os possíveis enunciados básicos nas seguintes duas subclasses não vazias primeiro a classe de todos os enunciados básicos com os quais é incompatível ou que rejeita ou proíbe a essa classe chamamos de classe dos falseadores potenciais da teoria e segundo a classe de enunciados básicos que ela não contradiz ou que ela permite 1 Formulações equivalentes à apresentada aqui têm sido sugeridas como critérios de significatividade de sentenças mais do que como critérios de demarcação aplicáveis a sistemas teóricos após a publicação de meu livro até mesmo por críticos que ridicularizaram meu critério de falseabilidade Contudo facilmente se vê que se usada como critério de demarcação a formulação presente equivale à falseabilidade Com efeito se o enunciado básico b2 não defluí de b1 mas de b em conjunção com a teoria t tal é a presente formulação isso corresponde a dizer que a conjunção de b1 com a negação de b2 contradiz a teoria t Ocorre porém que a conjunção de b1 com a negação de b2 é um enunciado básico cf seção 28 Assim nosso critério requer a existência de um enunciado básico falseador isto é exige precisamente no mesmo sentido a falseabilidade ver ainda nota 1 da seção 82 Como critério de significado ou de verificabilidade fraca ele deixa de satisfazer entretanto por várias razões Em primeiro lugar porque as negações de alguns enunciados significativos se destituiriam de significado nos termos desse critério Em segundo lugar porque a conjunção de um enunciado significativo com uma pseudosentença sem significado tornarseia significativa o que é igualmente absurdo Se agora tentarmos aplicar essas duas críticas a nosso critério de demarcação ambas se revelarão inofensivas Quanto à primeira ver seção 15 acima especialmente a nota 2 e seção 22 de meu Postscript Quanto à segunda teorias empíricas tal como a de Newton podem incluir elementos metafísicos Estes porém não são suscetíveis de eliminação por uma regra rígida e imediata contudo se houver um meio de apresentarmos a teoria de forma a ela colocarse como combinação de uma parte suscetível de prova e uma parte não suscetível de prova saberemos naturalmente ser então possível eliminar um de seus componentes metafísicos O parágrafo anterior desta nota pode ser tomado como ilustração de outra regra de método cf fim da nota 5 da seção 80 depois de haver feito alguma crítica a uma teoria rival devemos empenharnos numa séria tentativa de aplicar a mesma crítica ou crítica similar à nossa própria teoria Admitimos que isso quer dizer o mesmo que a classe Pk de enunciados singulares equivalentes à pk é um elemento do evento P Apliquemos agora essa terminologia 2 ao problema de que nos estamos ocupando Procede dizer a propósito de uma teoria contanto que ela se mostre falseável que ela rejeita ou proibe não apenas uma ocorrência mas sempre pelo menos um evento Assim a classe dos enunciados básicos proibidos isto é dos potenciais falseadores da teoria conterá sempre se não for vazia um número ilimitado de enunciados básicos pois uma teoria não se refere a indivíduos como tais Podemos denominar homotípicos os enunciados básicos singulares que pertencem a um evento Desse modo assinalase a analogia entre enunciados equivalentes que descrevem uma ocorrência de um lado e enunciados homotípicos que descrevem um evento típico de outro lado Cabe então dizer que toda classe não vazia de falseadores potenciais de uma teoria inclui pelo menos uma classe não vazia de enunciados básicos homotípicos Imaginemos agora que a classe de todos os enunciados básicos possíveis seja representada por uma área circular A área do círculo pode ser encarada como representando algo semelhante à totalidade dos possíveis mundos de experiência ou dos possíveis mundos empíricos Imaginemos ainda que cada evento é representado por um dos raios ou mais precisamente por uma estreita área ou estreito setor ao longo de um dos raios e que quaisquer duas ocorrências envolvendo as mesmas coordenadas ou indivíduos se localizam à mesma distância do centro e assim no mesmo círculo concêntrico Poderemos agora ilustrar o postulado da falseabilidade exigindo que para cada teoria empírica exista pelo menos um raio ou um setor extremamente estreito em nosso diagrama que seja proibido pela teoria Essa ilustração pode mostrarse útil no exame de vários de nossos problemas 1 tal como o do caráter metafísico de enunciados pura Mais resumidamente poderíamos apresentar o ponto dizendo uma teoria é falseável se não estiver vazia a classe de seus falseadores potenciais Cabe acrescentar que uma teoria só faz asserções acerca de seus falseadores potenciais Asseveralhes a falsidade Acerca dos enunciados básicos permitidos nada diz a teoria Em particular não afirma que eles sejam verdadeiros 2 22 FALSEABILIDADE E FALSIFICAÇÃO Importa distinguir claramente entre falseabilidade e falsificação Introduzimos a falseabilidade apenas como um critério aplicável ao caráter empírico de um sistema de enunciados Quanto à falsificação deveremos introduzir regras especiais que determinarão em que condições um sistema há de ser visto como falseado Dizemos que uma teoria está falseada somente quando dispomos de enunciados básicos aceitos que a contradigam cf seção 11 regra 2 Essa condição é necessária porém não suficiente com efeito vimos que ocorrências particulares não suscetíveis de reprodução carecem de significado para a Ciência Assim uns poucos enunciados básicos dispersos e que contradigam uma teoria dificilmente nos induzirão a rejeitála como falseada Só a diremos falseada se descobrirmos um efeito suscetível de reprodução que refute a teoria Em outras palavras somente aceitaremos o falseamento se uma hipótese empírica de baixo nível que descreva esse efeito for proposta e corroborada A essa espécie de hipótese cabe chamar de hipótese falseadora 1 A exigência de que a hipótese falseadora seja empírica e portanto falseável signi 2 Em verdade muitos dos enunciados básicos permitidos se contradirão mutuamente em presença da teoria cf seção 38 Por exemplo a lei universal todos os planetas movemse em círculos isto é qualquer conjunto de posições de qualquer planeta é cocircular é exemplificada trivialmente por qualquer conjunto de não mais que três posições de um planeta contudo duas dessas exemplificações em conjunto contradirão a lei na maioria dos casos 1 A hipótese falseadora pode ser de nível de universalidade bem baixo obtida por assim dizer através da generalização das coordenadas individuais de um resultado de observação como exemplo eu poderia citar o assim chamado fato de Mach a que aludi na seção 18 Ainda que a hipótese falseadora deva ser intersubjetivamente suscetível de teste não é preciso que se constitua em enunciado estritamente universal Assim para falsear o enunciado todos os corvos são negros bastaria o enunciado intersubjetivamente suscetível de teste de que no jardim zoológico de Nova Iorque existe uma família de corvos brancos fica apenas que ela deve colocarse em certa relação lógica para com possíveis enunciados básicos contudo essa exigência apenas diz respeito à forma lógica da hipótese O requisito de que a hipótese deva ser corroborada referese a testes a que ela tenha sido submetida testes que a confrontam com enunciados básicos aceitos 1 Dessa maneira os enunciados básicos desempenham dois papéis diferentes De uma parte utilizamos o sistema de todos os enunciados básicos logicamente possíveis para com o auxílio deles conseguir a caracterização lógica por nós procurada a da forma dos enunciados empíricos De outra parte os enunciados básicos aceitos constituem o fundamento da corroboracão de hipóteses Se os enunciados básicos aceitos contradisserem uma teoria só os tomaremos como propiciadores de apoio suficiente para o falseamento da teoria caso eles concomitantemente corroborem uma hipótese falseadora Tudo isso mostra a urgência de substituir uma hipótese falseada por outra melhor Na maioria dos casos antes de falsear uma hipótese dispomos de outra pois o experimento falseador é normalmente um experimento crucial destinado a decidir entre as duas Em outras palavras ele é sugerido pela circunstância de as duas hipóteses diferirem sob algum aspecto e recorre a essa diferença para refutar pelo menos uma delas 1 Essa referência a enunciados básicos aceitos pode parecer incluir os germes de uma regressão infinita Com efeito nosso problema atual é o seguinte desde que uma hipótese seja falseada pela aceitação de um enunciado básico tornamse necessárias regras metodológicas para a aceitação de enunciados básicos Ora como essas regras se referem por sua vez a enunciados básicos aceitos podemos vernos envolvidos em uma regressão infinita A essa observação respondendo dizendo que as regras de que precisamos são simples regras de aceitação dos enunciados básicos que falseiam uma hipótese submetida a teste e que se mostra até o momento satisfatória e não é necessário que os enunciados básicos aceitos a que a regra recorre tenham esse caráter Além disso a regra apresentada no texto está longe de ser exaustiva ela menciona apenas um importante aspecto relacionado com a aceitação de enunciados básicos que falseiam uma hipótese sob outros aspectos satisfatória A questão será aprofundada no capítulo v especialmente na seção 29 O professor J H Woodger em comunicação pessoal levantou a questão com que freqüência um efeito deve ser realmente reproduzido para que seja um efeito reproduzível ou uma descoberta A resposta é em alguns casos nem mesmo uma vez Se afirmo que há uma família de corvos brancos no zoológico de Nova Iorque assevero algo que em princípio pode ser objeto de prova Se alguém quiser efetuar a prova e for informado de que a família de corvos percebeu ou que dela jamais se ouviu falar cabe a essa pessoa aceitar ou rejeitar meu enunciado básico falseador Em geral ela terá meios de formar uma opinião através do exame de testemunhas documentos etc ou seja apelando para outros fatos reproduzíveis e intersubjetivamente comprováveis cf seções 2730 23 OCORRÊNCIAS EVENTOS O requisito de falseabilidade que de início mostravase um tanto vago dividiuse agora em duas porções A primeira o postulado metodológico cf seção 20 dificilmente poderá assumir feição precisa A segunda o critério lógico tornase definido tão logo se torna claro a que enunciados denominar básicos cf seção 28 Esse critério lógico foi até agora apresentado de maneira algo formal como uma relação lógica entre enunciados entre a teoria e os enunciados básicos Talvez as questões se esclareçam e se tornem mais intuitivas caso eu expresse agora meu critério em linguagem mais realista Embora exprimilo nessa linguagem seja equivalente a exprimilo de maneira formal talvez esteja mais perto da linguagem comum Segundo esse ângulo realista podemos dizer que um enunciado singular um enunciado básico descreve uma ocorrência Em vez de falar de enunciados básicos que são rejeitados ou proibidos por uma teoria podemos dizer que a teoria rejeita certas ocorrências possíveis e que ela se falseará caso essas possíveis ocorrências de fato se manifestarem O uso dessa expressão vaga ocorrência talvez exponhase a crítica Temse dito algumas vezes 1 que expressões tais como ocorrência ou evento deveriam ser completamente banidas do discurso epistemológico e que não deveríamos falar de ocorrências ou nãoocorrências ou da manifestação de eventos mas falar da verdade ou falsidade de enunciados Prefiro contudo conservar a expressão ocorrência É fácil definirlhe o uso de modo a não se levantarem objeções pois usála de maneira tal que ao referir uma ocorrência poderíamos em vez disso estar referindo alguns dos enunciados singulares a ela correspondentes Ao definir ocorrência podemos lembrar o fato de ser natural afirmar que dois enunciados singulares logicamente equivalentes isto 1 Especialmente em obras de autores que escreveram acerca da probabilidade cf Keynes A Treatise on Probability 1921 p 5 Keynes referese a Ancillon como o primeiro a propor o modo formal de expressão referese também a Boole Czuber e Stumpf Conquanto eu continue a encarar minhas definições sintáticas de ocorrência e evento atrás referidas como adequadas para o proposito que tenho em vista não acredito mais que elas sejam intuitivamente adequadas ou seja não acredito que representem apropriadamente nosso uso ou nossas intenções Foi Alfred Tarski quem me levou à reconhecer em Paris 1935 que se fazia necessária uma definição semântica em substituição à definição sintática mente existenciais brevemente mencionado na seção 15 É claro que a cada um desses enunciados corresponderá um evento um raio tal que os vários enunciados básicos pertencentes a esse evento comprovarão cada qual o enunciado puramente existencial Contudo a classe de seus falseadores potenciais está vazia portanto de enunciados existenciais nada se segue que diga respeito aos possíveis mundos de experiência Os enunciados existenciais não excluem ou proíbem quaisquer dos raios O fato de reciprocamente um enunciado puramente existencial poder ser deduzido a partir de cada enunciado básico não serve de ponto de apoio para emprestar caráter empírico aos enunciados existenciais Com efeito cada tautologia também decorre de cada enunciado básico pois as tautologias são deduzíveis de quaisquer enunciados Neste momento é oportuno dizer alguma coisa acerca dos enunciados autocontraditórios Enquanto as tautologias os enunciados puramente existenciais e outros enunciados não falseáveis não afirmam quase nada por assim dizer a respeito da classe dos possíveis enunciados básicos os enunciados autocontraditórios afirmam demais Qualquer enunciado pode ser legitimamente deduzido de um enunciado autocontraditório 2 Conseqüentemente a classe de seus falseadores potenciais é idêntica à classe de todos os possíveis enunciados básicos o enunciado autocontraditório é falseado por qualquer enunciado Talvez se pudesse dizer que esse fato ilustra a vantagem de nosso método isto é nossa insistência em falseadores potenciais e não em possíveis verificadores Com efeito se pudéssemos verificar um enunciado por meio da verificação de suas consequências lógicas ou se pudéssemos tornálo provável através dessa verificação das consequências então seria cabível esperar que mediante aceitação de qualquer enunciado básico se confirmasse ou verificasse ou pelo menos se tornasse provável qualquer enunciado autocontraditório 24 FALSEABILIDADE E COMPATIBILIDADE A condição da compatibilidade desempenha papel especial entre as várias condições que devem ser satisfeitas por um sistema teórico ou um sistema axiomático Tratase da condição primeira condição que deve ser satisfeita por quaisquer sistemas empíricos ou não empíricos A fim de pôr em evidência a importância fundamental dessa condição não basta mencionar o fato óbvio de que um sistema autocontraditório deve ser rejeitado porque é falso Com frequência manipulamos enunciados que embora efetivamente falsos propiciam resultados convenientes para certos propósitos 1 Um exemplo disso é a aproximação de Nernst para a equação do equilíbrio dos gases Contudo a importância da condição de compatibilidade tornarseá patente se nos dermos conta de que um sistema autocontraditório é não informativo E assim ocorre porque dele podemos deduzir qualquer conclusão que desejemos Dessa maneira nenhum enunciado é particularizado como incompatível ou como derivável pois todos são deriváveis Um sistema compatível por outro lado divide em dois o conjunto de todos os enunciados possíveis os que ele contradiz e aqueles com os quais é compatível Dentre estes últimos colocamse as conclusões que podem ser deduzidas do sistema Esse o motivo por que a compatibilidade se coloca na condição de o mais geral requisito a ser surpreendentemente porém Russell contestou esse fato em sua réplica a Wiener pp 695 e s da mesma obra falando porém de proposições falsas onde Wiener falava de premissas incompatíveis Cf minha Conjectures and refutations 1963 1965 pp 317 e ss 1 Cf meu Postscript seção 3 minha réplica à segunda proposta e seção 12 ponto 2 preenchido por um sistema seja ele empírico ou não empírico se esse sistema pretender alguma utilidade Além de ser compatível um sistema empírico deve satisfazer uma condição adicional deve ser falseável As duas condições em larga medida são análogas 1 Os enunciados que não satisfazem a condição de compatibilidade não podem permitir o estabelecimento de diferença entre dois enunciados quaisquer dentro da totalidade dos enunciados possíveis Os enunciados que não satisfazem a condição de falseabilidade não podem permitir o estabelecimento de diferença entre dois enunciados quaisquer dentro da totalidade dos possíveis enunciados básicos empíricos 1 Cf minha nota em Erkenntnis v 3 1933 p 426 Faz agora parte do apêndice i adiante CAPÍTULO V O PROBLEMA DA BASE EMPÍRICA A questão da falseabilidade das teorias está agora reduzida à da falseabilidade dos enunciados singulares a que chamei de enunciados básicos Que espécie de enunciados singulares são entretanto esses enunciados básicos Como podem eles ser falseados Para quem se dedica à pesquisa prática esses assuntos podem ser de pequeno interesse Contudo as obscuridades e malentendidos que rodeiam o problema tornam conveniente examinálo com algum pormenor 25 EXPERIÊNCIAS PERCEPTUAIS COMO BASE EMPÍRICA PSICOLOGISMO A doutrina segundo a qual as ciências empíricas são reduzíveis a percepções sensórias e conseqüentemente a nossas experiências é por muitos aceita como óbvia Todavia essa doutrina é acolhida ou rejeitada na dependência de aceitarmos ou não a Lógica Indutiva aqui a rejeitamos porque rejeitamos a Lógica Indutiva Não desejo negar a existência de um grão de verdade na concepção de que a Matemática e a Lógica se alicerçam no pensamento ao passo que as ciências factuais se fundamentam em percepções sensórias O que há de verdadeiro nessa concepção tem não obstante pouca relação com o problema epistemológico E sem dúvida seria difícil encontrar no terreno da epistemologia um problema que se tenha ressentido mais severamente da confusão entre Psicologia e Lógica do que esse problema da base dos enunciados da experiência Poucos pensadores se perturbam tão profundamente com o problema da base da experiência quanto Fries 1 Ensinou ele que se 1 J F Fries Neue oder anthropologische Kritik der Vernunft 1828 a 1831 CAPÍTULO III TEORIAS As teorias científicas são sistemas de signos ou símbolos de enunciados universais decorrentes das ciências empíricas visando assim a racionalização do mundo 12 CAUSALIDADE EXPLICAÇÃO E DEDUÇÃO DE PREDIÇÕES Dar uma explicação causal a certo acontecimento parte de um processo de dedução de uma explicação que descreva o ocorrido a partir das leis universais unido as condições singulares do acontecimento Nesse viés há duas tipologias de enunciados primeiro o enunciado universal ligado às leis naturais e enunciado singulares que darão características subjetivas ao evento em questão chamados de condições iniciais A partir da integração desses enunciados é possível formular uma predição específica As condições iniciais que irão descrever o evento em questão são chamados de causa a predição está relacionada com o efeito Nesse âmbito o princípio da causalidade ratifica que todo e qualquer evento pode ser explicado a parte da sua causalidade entretanto esse princípio pode ser excluído da esfera científica dandolhe caráter metafísico 13 UNIVERSALIDADE ESTRITA E NUMÉRICA Ambas são espécies de enunciados sintéticos universais onde os enunciados estritamente universais estão relacionados às leis naturais Essa tipologia visa ser verdadeiro para qualquer tempo ou local a cerca de um ilimitado número de indivíduos como um enunciado todos Enquanto os enunciados numericamente universais são equivalentes a determinados enunciados singulares Logo está relacionada com uma classe finita de elementos específicos dentro de um determinado contexto geográfico e temporal A distinção entre esses dois tipos de enunciados está estreitamente ligado à distinção entre conceitos ou nomes universais e individuais respectivamente onde no caso dos nomes individuais onde se faz indispensável a presença de nomes próprios representações de signos no último caso signos equivalentes 14 CONCEITOS UNIVERSAIS E CONCEITOS INDIVIDUAIS Vale ainda pontuar que a tentativa de definir nomes universais a partir de nomes individuais está fadado ao fracasso Entretanto é possível passar de conceitos individuais para conceitos universais processo esse denominado de abstração 15 ENUNCIADOS ESTRITAMENTE UNIVERSAIS E ENUNCIADOS EXISTENCIAIS Os enunciados que só ocorrem nomes universais sem o uso de individuais serão denominados estritos ou puros universais Sendo que esses não sofrem restrições quanto a espaço e tempo Sendo esse passíveis de se tornar enunciados falseáveis isto é são leis naturais comparadas a negação negando que algo exista ou ocorra É impreterível pontuar que uma mesma palavra pode atuar como universal bem como individual Além disso há os enunciados estritamente ou puramente existencial sendo essa uma negação do enunciado estritamente existente As teorias da Ciência Natural têm a forma de enunciados universais onde esses não podem ser falseáveis Essas são passíveis de verificação Ambos espécies de enunciados escritos são empiricamente decisivos 16 SISTEMA TEÓRICOS Uma vez que as teorias científicas estão em perpétua mutação por isso apenas ramos da ciência chegam a adquirir a forma de um sistema de teóricas verdadeiramente elaborado formulado de maneira suficientemente clara e completa a fim de tornar novos pressuposto reconhecido pelo que ele é uma revisão do sistema Nesse viés o chamado sistema axiomatizado tenta reunir todos os pressupostos para compor o ápice do sistema sendo esses chamados de axiomas proposições primitivas Podese dizer que um sistema teórico sofre o processo de axiomatização a partir da satisfação dos quatros requisitos fundamentais o sistema deve estar livre de contradições ele deve ser independente deve ser suficiente para a dedução de todos e por fim necessários para o mesmo propósito Nas teorias axiomatizadas é possível investigar a interdependência de várias partes do sistema inclusive é possível investigar se determinada parte da teoria é derivada de alguma parte dos axiomas 17 ALGUMAS POSSIBILIDADES DE INTERPRETAÇÃO DOS SISTEMAS AXIOMAS Nesse ínterim os axiomas podem ter duas diferentes interpretações podem ser tidos como convenções em outras palavras eles restringem o uso ou significado de ideias fundamentais que são introduzidas pelos axiomas É como se fossem implicitamente definidos Já na interpretação por meio do sistema de hipóteses empíricas ou científicas nesse processo um significado empírico é definido e atribuído a um conceito seja esse processo de correlação com objetos que pertencem ao mundo real 18 NÍVEIS DE UNIVERSALIDADE O MODUS TOLLENS A partir de um sistema teórico é possível distinguir enunciados que pertencem aos níveis de universalidade sendo esses os axiomas O caráter de hipótese está vinculado com a conclusão de deduções com um auxílio de um sistema teórico CAPÍTULO IV FALSEABILIDADE 19 ALGUMAS OBJEÇÕES DOS CONVENCIONALISTAS O autor propõe adotar a falseabilidade como critério para decidir se um sistema teorético pertence ou não ao campo das ciências empíricas O estudo filosófico a partir dos convencionalistas a simplicidade seria incompreensível como se fosse uma criação nossa rejeitando a ideia de que a natureza seria simples sendo simples apenas as leis da natureza enquanto os realistas as leis naturais nos revelam uma simplicidade interior estrutural do mundo Logo para o convencionalista a ciência teorética natural é uma construção lógica e essa construção determina a funcionalidade de um mundo de conceitos definidos por leis naturais escolhidas por nós É sobre esse mundo que se trata a ciência Com isso as leis da natureza não são falseáveis por observação são elas que se tornam necessárias para determinar o que é estudado pela ciência 20 REGRAS METODOLÓGICAS A filosofia convencionalista e suas objeções de uma convencionalista imaginário parecem ser incontestáveis com tudo é impossível decidir por análise lógica se um sistema de enunciados é um sistema convencional de definições implícitas irrefutáveis Somente com respeito aos métodos aplicados isso é possível Por isso não podemos utilizar essa filosofia se o nosso sistema sofre ameaças Para isso ser possível e necessário da adoção de estratagemas que podem se revestir com o movimento anticonvencionalismo Com respeito às hipóteses auxiliares se o grau de falseabilidade aumenta a introdução da hipótese corresponde a um reforço da teoria uma vez que proíbe mais 21 INVESTIGAÇÃO LÓGICA DA FALSEABILIDADE Para caracterizar a falseabilidade de uma teoria é necessário recorrer às relações lógicas vigentes entre a teoria e a classe de enunciados básicos O caráter desse último enunciado um sistema que inclui todos os enunciados singulares autocompatíveis de certa forma lógica Empírica são teorias que sempre busca deduzir enunciados singulares bem como uma teoria que possa derivar enunciado singulares atraves de recursos a outros enunciados singulares que atuem como condições iniciais 22 FALSEABILIDADE E FALSIFICAÇÃO Falseabilidade é um critério aplicável ao caráter empírico de um sistema enquanto a falsificação exigirá regras especiais que definiram um sistema como falseado Dizemos que uma teoria está falseada quando os enunciados básicos se contradizem e quando há um efeito suscetível de reprodução que refute a teoria 24 FALSEABILIDADE E COMPATIBILIDADE A condição da compatibilidade é uma das várias condições associadas a um sistema axiomático sendo essa uma condição primeira Um sistema compatível divide em dois o conjunto de todos os enunciados possíveis os que ele contradiz e os quais ele é compatível Além de ser compatível um sistema empírico deve satisfazer a condição de ser falseável Logo os enunciados que nas satisfazem a compatibilidade não permite o estabelecimento de diferenças entre dois enunciados e se não satisfazem a condição de falseabilidade não podem permitir o estabelecimento de diferenças entre dois enunciados CAPÍTULO III TEORIAS As teorias científicas são sistemas de signos ou símbolos de enunciados universais decorrentes das ciências empíricas visando assim a racionalização do mundo 12 CAUSALIDADE EXPLICAÇÃO E DEDUÇÃO DE PREDIÇÕES Dar uma explicação causal a certo acontecimento parte de um processo de dedução de uma explicação que descreva o ocorrido a partir das leis universais unido as condições singulares do acontecimento Nesse viés há duas tipologias de enunciados primeiro o enunciado universal ligado às leis naturais e enunciado singulares que darão características subjetivas ao evento em questão chamados de condições iniciais A partir da integração desses enunciados é possível formular uma predição específica As condições iniciais que irão descrever o evento em questão são chamados de causa a predição está relacionada com o efeito Nesse âmbito o princípio da causalidade ratifica que todo e qualquer evento pode ser explicado a parte da sua causalidade entretanto esse princípio pode ser excluído da esfera científica dandolhe caráter metafísico 13 UNIVERSALIDADE ESTRITA E NUMÉRICA Ambas são espécies de enunciados sintéticos universais onde os enunciados estritamente universais estão relacionados às leis naturais Essa tipologia visa ser verdadeiro para qualquer tempo ou local a cerca de um ilimitado número de indivíduos como um enunciado todos Enquanto os enunciados numericamente universais são equivalentes a determinados enunciados singulares Logo está relacionada com uma classe finita de elementos específicos dentro de um determinado contexto geográfico e temporal A distinção entre esses dois tipos de enunciados está estreitamente ligado à distinção entre conceitos ou nomes universais e individuais respectivamente onde no caso dos nomes individuais onde se faz indispensável a presença de nomes próprios representações de signos no último caso signos equivalentes 14 CONCEITOS UNIVERSAIS E CONCEITOS INDIVIDUAIS Vale ainda pontuar que a tentativa de definir nomes universais a partir de nomes individuais está fadado ao fracasso Entretanto é possível passar de conceitos individuais para conceitos universais processo esse denominado de abstração 15 ENUNCIADOS ESTRITAMENTE UNIVERSAIS E ENUNCIADOS EXISTENCIAIS Os enunciados que só ocorrem nomes universais sem o uso de individuais serão denominados estritos ou puros universais Sendo que esses não sofrem restrições quanto a espaço e tempo Sendo esse passíveis de se tornar enunciados falseáveis isto é são leis naturais comparadas a negação negando que algo exista ou ocorra É impreterível pontuar que uma mesma palavra pode atuar como universal bem como individual Além disso há os enunciados estritamente ou puramente existencial sendo essa uma negação do enunciado estritamente existente As teorias da Ciência Natural têm a forma de enunciados universais onde esses não podem ser falseáveis Essas são passíveis de verificação Ambos espécies de enunciados escritos são empiricamente decisivos 16 SISTEMA TEÓRICOS Uma vez que as teorias científicas estão em perpétua mutação por isso apenas ramos da ciência chegam a adquirir a forma de um sistema de teóricas verdadeiramente elaborado formulado de maneira suficientemente clara e completa a fim de tornar novos pressuposto reconhecido pelo que ele é uma revisão do sistema Nesse viés o chamado sistema axiomatizado tenta reunir todos os pressupostos para compor o ápice do sistema sendo esses chamados de axiomas proposições primitivas Podese dizer que um sistema teórico sofre o processo de axiomatização a partir da satisfação dos quatros requisitos fundamentais o sistema deve estar livre de contradições ele deve ser independente deve ser suficiente para a dedução de todos e por fim necessários para o mesmo propósito Nas teorias axiomatizadas é possível investigar a interdependência de várias partes do sistema inclusive é possível investigar se determinada parte da teoria é derivada de alguma parte dos axiomas 17 ALGUMAS POSSIBILIDADES DE INTERPRETAÇÃO DOS SISTEMAS AXIOMAS Nesse ínterim os axiomas podem ter duas diferentes interpretações podem ser tidos como convenções em outras palavras eles restringem o uso ou significado de ideias fundamentais que são introduzidas pelos axiomas É como se fossem implicitamente definidos Já na interpretação por meio do sistema de hipóteses empíricas ou científicas nesse processo um significado empírico é definido e atribuído a um conceito seja esse processo de correlação com objetos que pertencem ao mundo real 18 NÍVEIS DE UNIVERSALIDADE O MODUS TOLLENS A partir de um sistema teórico é possível distinguir enunciados que pertencem aos níveis de universalidade sendo esses os axiomas O caráter de hipótese está vinculado com a conclusão de deduções com um auxílio de um sistema teórico CAPÍTULO IV FALSEABILIDADE 19 ALGUMAS OBJEÇÕES DOS CONVENCIONALISTAS O autor propõe adotar a falseabilidade como critério para decidir se um sistema teorético pertence ou não ao campo das ciências empíricas O estudo filosófico a partir dos convencionalistas a simplicidade seria incompreensível como se fosse uma criação nossa rejeitando a ideia de que a natureza seria simples sendo simples apenas as leis da natureza enquanto os realistas as leis naturais nos revelam uma simplicidade interior estrutural do mundo Logo para o convencionalista a ciência teorética natural é uma construção lógica e essa construção determina a funcionalidade de um mundo de conceitos definidos por leis naturais escolhidas por nós É sobre esse mundo que se trata a ciência Com isso as leis da natureza não são falseáveis por observação são elas que se tornam necessárias para determinar o que é estudado pela ciência 20 REGRAS METODOLÓGICAS A filosofia convencionalista e suas objeções de uma convencionalista imaginário parecem ser incontestáveis com tudo é impossível decidir por análise lógica se um sistema de enunciados é um sistema convencional de definições implícitas irrefutáveis Somente com respeito aos métodos aplicados isso é possível Por isso não podemos utilizar essa filosofia se o nosso sistema sofre ameaças Para isso ser possível e necessário da adoção de estratagemas que podem se revestir com o movimento anticonvencionalismo Com respeito às hipóteses auxiliares se o grau de falseabilidade aumenta a introdução da hipótese corresponde a um reforço da teoria uma vez que proíbe mais 21 INVESTIGAÇÃO LÓGICA DA FALSEABILIDADE Para caracterizar a falseabilidade de uma teoria é necessário recorrer às relações lógicas vigentes entre a teoria e a classe de enunciados básicos O caráter desse último enunciado um sistema que inclui todos os enunciados singulares autocompatíveis de certa forma lógica Empírica são teorias que sempre busca deduzir enunciados singulares bem como uma teoria que possa derivar enunciado singulares atraves de recursos a outros enunciados singulares que atuem como condições iniciais 22 FALSEABILIDADE E FALSIFICAÇÃO Falseabilidade é um critério aplicável ao caráter empírico de um sistema enquanto a falsificação exigirá regras especiais que definiram um sistema como falseado Dizemos que uma teoria está falseada quando os enunciados básicos se contradizem e quando há um efeito suscetível de reprodução que refute a teoria 24 FALSEABILIDADE E COMPATIBILIDADE A condição da compatibilidade é uma das várias condições associadas a um sistema axiomático sendo essa uma condição primeira Um sistema compatível divide em dois o conjunto de todos os enunciados possíveis os que ele contradiz e os quais ele é compatível Além de ser compatível um sistema empírico deve satisfazer a condição de ser falseável Logo os enunciados que nas satisfazem a compatibilidade não permite o estabelecimento de diferenças entre dois enunciados e se não satisfazem a condição de falseabilidade não podem permitir o estabelecimento de diferenças entre dois enunciados