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Texto de pré-visualização
Direção ANDRÉIA CUSTÓDIO Capa e diagramação TELMA CUSTÓDIO Revisão KARINA MOTA Ilustração de capa TELMA CUSTÓDIO CIPBRASIL CATALOGAÇÃO NA FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS RJ P873 Por que a escola não ensina gramática assim recurso eletrônico organização Stella Maris BortoniRicardo et al 1 ed São Paulo Parábola 2020 recurso digital Estratégias de ensino 47 Formato epub Requisitos do sistema adobe digital editions Modo de acesso world wide web Inclui bibliografia e índice ISBN 9786586250466 recurso eletrônico 1 Língua portuguesa Estudo e ensino 2 Língua portuguesa Gramática Estudo e ensino 3 Prática de ensino 4 Livros eletrônicos I BortoniRicardo Stella Maris II Série 2066229 CDD 4695 CDU 811134336 CAPÍTULO 5 O FENÔMENO DA HIPERCORREÇÃO Marcia Elizabeth Bortone Scheyla Brito Alves 1 Palavras iniciais Diógenes da Cunha Lima em seu livro Câmara Cascudo um brasileiro feliz contanos que certa vez Luís da Câmara Cascudo estudioso do nosso folclore foi convidado por um amigo velho mestre de fandango para assistir a um ensaio de marujos ao som de instrumentos de corda Os marinheiros e oficiais começaram então a cantar 1 Nas ôndias do mar Para para ordenou o mestre Respeitem o professor Cascudo Eu já disse mais de mil vezes que a palavra não é ôndias A palavra certa é ôndegas 2 Vanderlei Luxemburgo conhecido técnico de futebol foi criticado ao escrever na internet Não sou mais técnico do Palmeiras Fui demitido por descordar das atitudes do Keirrison Vejam texto em meu blog luxemburgobloguolcombr Estes exemplos demonstram ocorrências de hipercorreção muito presentes na fala e por conseguinte na escrita de pessoas que no afã de falarem bem equivocamse e acabam fazendo uma correção para além do uso padrão ou seja corrigem o que não estava errado Geralmente as pessoas que cometem erros de hipercorreção têm algum conhecimento da normapadrão e estão preocupadas com o correto uso do idioma São pessoas inseridas em um processo de mobilidade social pois os indivíduos quando aspiram mudar de classe social deparam com uma modalidade nova de fala e isso acarreta insegurança Como as regras da normapadrão foram tardiamente interiorizadas pelo indivíduo em processo de mobilidade social ascendente sua competência no domínio dessas regras é menor cf BortoniRicardo 2011 213 para maiores esclarecimentos sobre mobilidade social ascendente e hipercorreções Os exemplos acima embora muito engraçados devem ser vistos com muita seriedade pelos professores de língua portuguesa A frequência com que inadequações dessa natureza ocorrem nos textos dos alunos mostra que a escola paralelamente a sua ação de ensinar a normapadrão precisa desconstruir um possível sentimento de insegurança linguística nos aprendizes Se esses alunos pertencerem às camadas sociais mais pobres onde os indivíduos usam um dialeto desprestigiado a insegurança já existente na oralidade agravase mais ainda na escrita Por exemplo qual de nós professores nunca encontrou nas produções de nossos alunos fragmentos de texto como este 3 ele dar comida aos peixinhos Esse aluno que já percebeu o significado social de uma forma linguística inexistente em seu dialeto tentará adequarse aos padrões ensinados na escola adotando modelos de prestígio como o uso do r em final verbal ou seja ele se monitora para produzir cantar ao invés de cantá Se a escola desse aluno não lançou mão de uma metodologia eficiente para interiorizar a regra ele irá transferila para sua escrita até em contextos que não exigem o uso do r tentando corrigir na fala ou escrita tudo o que se assemelhe ao que é considerado errado pela escola Ora se não percebermos a ocorrência desse fenômeno como poderemos trabalhar com nossos alunos quando do ensino da normapadrão o conveniente manejo das interferências no contínuo de monitoramento da norma A introdução de novos padrões linguísticos deve ser feita com uma metodologia que contemple as diferenças de usos nesse contínuo linguístico a fim de evitar hipercorreções na fala e na escrita do aluno para evitar que ele se torne linguisticamente inseguro Por ser um fenômeno frequente nas produções orais e escritas dos alunos e por interferir na adequada aprendizagem da normapadrão é que nos propusemos refletir sobre a hipercorreção neste capítulo 2 O que é hipercorreção A hipercorreção é um fenômeno de linguagem muito comum entre pessoas que se deram conta da existência de outro falar muito mais prestigiado do que o seu Essas pessoas também desejam ser usuárias dessa forma prestigiada do falar mais correto Para tal esforçamse em corrigir sua fala e acabam incorrendo no erro de corrigila demasiadamente Casos como falar pilha no lugar de pia é próprio de falantes em cuja variedade linguística o fonema ʎ representado ortograficamente pelo dígrafo lh não é pronunciado Ao aprenderem a variante padrão esses falantes ao mesmo tempo em que aprendem a pronunciar filha no lugar de fia ou palha no lugar de paia formulam a hipótese de que lh é o equivalente de i no contexto dessa vogal seguida de outra formando um hiato produzindo assim a hipercorreção Quando as pessoas se referem ao falar mais correto referemse à normapadrão do português a variedade linguística mais prestigiada no país e que é a base das gramáticas normativas As condições que fazem uma variedade ou dialeto chegar à situação de padrão são de natureza social histórica e política Assim determinada variedade da língua geralmente aquela que já tem uma tradição escrita passa por um processo de codificação e legitimação conduzido pelos grupos que detêm o poder nacional ao longo da formação histórica do país No Brasil a legitimação de uma variedade como padrão seguiu paralelamente ao processo de urbanização A variedade padrão e as demais variedades de uma língua são funcionais pois todas elas cumprem as funções que lhes são alocadas na própria organização sociocultural na comunidade de fala BortoniRicardo 2008 O Dicionário de linguística e fonética de David Crystal 2000 138 utilizando a teoria de Gumperz e Hymes de 1972 define hipercorreção como uma forma linguística que vai além do ponto estabelecido pela VARIANTE de LÍNGUA que o falante tem como meta O fenômeno geralmente acontece quando os falantes de um DIALETO que não é o padrão tentam usar o dialeto padrão e vão longe demais produzindo uma versão que não existe no padrão Joaquim Mattoso Câmara Jr o pai da linguística no Brasil apresenta esse fenômeno por meio de dois termos ULTRACORREÇÃO e HIPERURBANISMO em seu Dicionário de linguística e gramática 1992 de 1977 ULTRACORREÇÃO equivocação no desejo de falar bem Pidal 1944194 quando se modifica num indevido intento de correção o que é da norma espontânea linguística Pode resultar a de um raciocínio gramatical em falso b de um esforço confuso de resistência a certas tendências para mudanças no qual se impõe uma solução única a fatos linguísticos diversos Câmara Jr 1992 237 HIPERURBANISMO nome especial que se dá à ultracorreção no âmbito fonológico Resulta de um esforço excessivo para a correção na pronúncia O nome hiperurbanismo provém de ser comum esse erro entre a gente do campo ao procurar cingirse à pronúncia urbana No português atual notamse principalmente os seguintes tipos de hiperurbanismo no uso que quer ser elegante da língua a esforço para articular o s mudo em verbos como crescer nascer b supressão de uma vogal considerada erroneamente como anaptítica ex pronunciar e escrever adivinhar com o grupo dv à maneira de advogado c troca de acentuação como sutil feito paroxítono rubrica feito proparoxítono por causa dos sufixos il e ico átonos de fácil fatídico etc Câmara Jr 1992 138139 Já o Dicionário eletrônico Houaiss apresenta os termos hipercorreção hiperurbanismo e ultracorreção como sinônimos Vejamos ULTRACORREÇÃO fenômeno que se produz quando o falante estranha e interpreta como incorreta uma forma correta da língua e em consequência acaba trocandoa por uma outra forma que ele considera culta nessa busca excessiva de correção notase em geral o temor do falante de revelar uma classe de origem socialmente discriminada hipercorreção hiperurbanismo Houaiss 2001 Para efeitos de simplificação didática elegeremos o termo HIPERCORREÇÃO para nos referir ao fenômeno Aliás este tem sido o termo preferido pelos pesquisadores O fenômeno da hipercorreção ocorre na tentativa de uma utilização adequada da normapadrão que dá prestígio social Para LouisJean Calvet 2002 69 a presença dessa norma na sociedade pode provocar dois tipos de comportamento linguístico o primeiro se refere ao modo como os falantes encaram sua própria fala reconhecendo o seu jeito de falar como uso certo ou uso errado Dessa forma são levados a valorizar sua prática linguística ou ao contrário são levados a tentar modificála para conformála a um modelo prestigioso O segundo comportamento linguístico se refere às reações dos falantes ao comentarem a fala dos outros ou seja aponta que as pessoas julgarão o modo de falar dos outros estigmatizando uns e valorizando outros Quando os falantes consideram sua variante linguística como sendo a variante prestigiada revelam segurança linguística Porém quando por razões sociais diversas consideram o próprio modo de falar como uma norma desprestigiada na sociedade e reconhecem outra norma de mais prestígio como modelo apresentam insegurança linguística Calvet 2002 Crer que há um modo prestigioso de falar a própria língua implica quando alguém pensa não possuir esse modo de falar tentar adquirilo e essa tentativa pode gerar uma restituição exagerada das formas prestigiosas a hipercorreção Ou seja por causa da insegurança linguística esse falante tenta imitar de forma exagerada a norma modelo por razões diferentes Fazer crer que se domina a língua legítima ou fazer esquecer a própria origem Calvet 2002 7778 Porém apesar de ser um genuíno fenômeno linguístico a hipercorreção só ocorre por causa da suposta função social de conferir prestígio a um falante desprestigiado na sociedade Ela ocorre por motivações mais sociais do que propriamente linguísticas Em relação a esse fato Bagno enfatiza o caráter social da hipercorreção caracterizandoa como uma prática de higiene verbal cf Cameron 1995 apud Bagno 2012 A hipercorreção também se enquadra nas práticas de higiene verbal Tratase do interessante fenômeno sociolinguístico que se observa quando uma falante ou uma comunidade de falantes ao tentar se aproximar de um padrão ideal imaginário de língua boa acaba acertando demais e se desviando tanto da gramática intuitiva da língua quanto da gramática normativa Bagno 2012 83 O jogo linguístico e o jogo social andam juntos Quando o falante decide adquirir uma nova norma além da competência linguística manifesta refletese aí também a competência social pois se for bemsucedido nessa aquisição sabe que obterá muitos benefícios sociais O problema maior ocorre quando a hipercorreção é percebida como ridícula por aqueles que dominam a forma legítima Normalmente esse usuário da forma legítima julgará de maneira negativa aquele que tenta imitar a pronúncia valorizada Calvet 2002 79 gerando uma situação de grande constrangimento para o que não domina a norma Um falante que sofre esse tipo de estigma pode desenvolver sérios problemas sociais emocionais e linguísticos pode começar a se considerar incapaz de aprender a normapadrão A intervenção da escola é crucial pois quanto maior o distanciamento entre o material didático usado nas aulas de língua portuguesa e a realidade do educando maiores serão as bar reiras de acesso à normapadrão Bortone 1989 Se no entanto o professor de língua portuguesa estiver preparado para detectar e sanar o problema poderá ajudar o aluno a reconstruir pelo sucesso no aprendizado sua autoestima linguística e pessoal É necessário que o professor rompa com o processo de recíproca ignorância dialetal mencionado por Labov 1972 em que tanto os professores desconhecem o dialeto do aluno quanto os alunos desconhecem o do professor resultando em ignorância mútua das regras necessárias para tradução de um sistema para outro e comece a trabalhar com as duas normas sanando as dúvidas quando da passagem de uma norma para outra 3 Quando o falante erra querendo acertar Temonos perguntado por que a hipercorreção ocorre com tanta frequência nos textos dos alunos principalmente daqueles que são usuários de uma norma diferente da padrão Segundo Labov 1972 isso ocorre pelo fato de a escola paralelamente a sua ação de ensinar a normapadrão incutir um grave sentimento de insegurança linguística nos alunos Segundo Labov 1972 a hipercorreção resultará de dois fatores i A insegurança linguística do aluno frente às pressões do ensino quando o estudante não conseguiu ainda interiorizar as regras da normapadrão Ao produzir uma redação que exija um estilo cuidado o aluno tenta ser o mais correto possível o que o leva muitas vezes a cometer hipercorreção ii Uma tendência a imitar os padrões de prestígio da classe média adotados pela escola uma hipercorreção de cima como denominou Labov 1972 que representa um processo claro de correção e coerção social aplicado às formas linguísticas Sendo assim o aluno enfrenta na escola duas desvantagens a diferença linguística em seu repertório e uma forte dose de insegurança linguística Como dito essa insegurança ocorre devido às pressões linguísticas como a de obrigar o aluno em nossas escolas a usar somente a normapadrão e não explicar a ele que em suas interações familiares pode usar uma variedade não monitorada nem mostrar a ele que nós usamos uma ou outra variedade de acordo com o contexto em que estamos inseridos 31 Hipercorreção na fala Quando o aluno diz 4 Professora o seu visto no nosso caderno é a sua rúbrica verificase que ao rejeitar a pronúncia da palavra como rubrica ele manifesta crer que o uso da proparoxítona no caso rúbrica é mais culto do que o da paroxítona Esse equívoco tem uma razão histórica As proparoxítonas consideradas pelos gramáticos como eruditas foram introduzidas na língua já na consolidação do português moderno Bortone 2004 195 Esse é um minievento de oralidade BortoniRicardo 2004 em que o professor pode intervir por meio da simples apresentação da pronúncia correta respondendo à pergunta Sim querido a minha rubrica no seu caderno já é o meu visto Por isso guardeo bem Precisamos estar atentos a esses eventos de oralidade em que nosso aluno manifesta um grau maior ou menor de desconhecimento da norma de prestígio Por exemplo é muito comum ouvir de um ou outro aluno algo como 5 São douze prêmios ao final do concurso 6 Eu levei falta mas já tinha chego quando a professora fez a chamada Bagno 2010 informa que a hipercorreção pode ser um indicador de mudança na língua Também ocorre hipercorreção com os chamados verbos abundantes que têm mais de um particípio Muita gente acha que só existem as formas ganho entregue pago etc e que é errado dizer ou escrever eu tinha ganhado tinha entregado tinha pagado etc Por analogia e hipercorreção surgiram novos particípios irregulares que só porque são novos sofrem o combate sistemático dos patrulheiros gramaticais de plantão Estou falando dos particípios trago Ele tinha trago os livros e chego Ela tinha chego atrasada que a julgar pelo combate violento que sofrem já devem estar muito bem instalados na gramática intuitiva da maioria dos brasileiros Você acha certo ou errado dizer o corrupto foi pego em flagrante Acha certo Pois veja o que dizia o conhecido dicionário Caldas Aulete na 5ª ed 1964 no verbete pego Só os incultos empregam este termo E agora veja o que diz o dicionário Houaïss 2001 Pegar apresenta duplo particípio pegado pego ê ou é Como as coisas mudaram em 35 anos não De uma análise preconceituosa para uma apresentação neutra sem nenhum juízo de valor Ensinar os alunos a resolverem esse tipo de problema deve tomar um tempo em nosso planejamento Em primeiro lugar será muito útil desconstruir o mito de que o professor conhece a conjugação de todos os verbos da língua de acordo com os manuais prescritivos Em segundo lugar o professor mostrará ao aluno o que faz para solucionar dúvidas como essa Uma aula de análise de livros que trazem prescrição sobre a conjugação de verbos poderá ser bem útil Essa aula poderia acontecer na biblioteca por exemplo O professor poderia pedir que os alunos pegassem dicionários e gramáticas e localizassem a parte de conjugação de verbos Os alunos teriam a tarefa de sistematizar anotações e explicar num momento posterior como a conjugação verbal é apresentada atentos aos modos verbais e mais especificamente às formas nominais onde localizariam o particípio O professor poderia propor uma quantidade específica de verbos regulares e irregulares distribuindo a tarefa em grupos A técnica de consulta a manuais desmistifica o saber linguístico da norma de prestígio no seu uso mais monitorado e formal O aluno começa a entender que serão as muitas consultas e as muitas leituras que construirão nele esse arcabouço Ele reconhecerá o caminho da construção e decidirá se deseja ou não fazer essa empreitada E mesmo que opte por não fazêla ficará mais socialmente seguro por entender que não há pessoas mais especiais ou superiores em termos de gramática normativa há sim pessoas que possuem por um ou outro motivo mais contato com essa norma Esse tipo de atividade também ajuda o aluno a perceber a funcionalidade da gramática normativa 32 Hipercorreção na transposição dos hábitos da fala na escrita Um fenômeno frequente na oralidade de diversas regiões do Brasil é o da elevação das vogais médias Exemplos disfile no lugar de desfile bolu no lugar de bolo leiti no lugar de leite O fenômeno ocorre sempre nas sílabas átonas elevando o fone e para i e o fone o para u Estudantes são constantemente alertados pelos professores a escreverem corretamente evitando na escrita a mesma elevação da oralidade Sofrem pressão da escola para usarem a forma de prestígio Por isso as vogais médias e e o são vistas por eles como mais corretas do que as variantes altas i e u Daí a recuperação delas nos estilos cuidados Não é raro encontrar nas produções textuais de nossos alunos do ensino fundamental hipercorreções de ordem fonológica como estas 7 As autoridades tiveram todo o coidado de retirar os habitantes 8 É encrível o número de mortos nas últimas tragédias do mundo 9 Ninguém sabe bem o que aconteceu mas todos esperam respostas Os exemplos 7 8 e 9 apresentam hipercorreção das palavras respectivamente cuidado incrível e aconteceu Na tentativa de utilização da forma de prestígio dáse nelas o abaixamento de vogal onde não se faz necessário No exemplo 7 a vogal u é abaixada para o hipercorrigindo a palavra cuidado para coidado ou seja houve o abaixamento da vogal pretônica No exemplo 8 a vogal i é abaixada para e hipercorrigindo a palavra incrível para encrível ou seja houve o abaixamento da sílaba nasal em início de palavra Já no exemplo 9 o ditongo eu é abaixado para eo hipercorrigindo a palavra aconteceu para aconteceo ou seja houve o abaixamento da sílaba tônica com ditongo em final verbal6 Mattoso Câmara 1972 41 que na década de 1970 já observava erros de hipercorreção informanos São curiosas aí as ultracorreções provenientes da preocupação de manter uma distinção inexistente na língua coloquial como em Depois de falar com os parentes romou para o campo onde nem a associação espontânea com rumo conseguiu firmar a forma rumou O exemplo do Vanderlei Luxemburgo dado no início do capítulo já nos mostra esse tipo de erro Ele hipercorrige a palavra discordar rebaixando a vogal i para e construindo a forma descordar Para BortoniRicardo 1981 o fenômeno da hipercorreção é característico da fala de grupos sociais integrados na ideologia da mobilidade social Este parece ser o caso dos alunos da amostra que além de estarem engajados em um processo de integração na cultura urbana sofrem pressão na escola para usarem a forma de prestígio Vejamos 10 Para que o resgate fousse efetuado seria necessário mais tempo Em 10 percebemos que se acrescentou um ditongo à grafia da palavra fosse Como explicar isso É que há em nossa fala descuidada uma forte tendência à redução de ditongos decrescentes Esse fenômeno ocorre com frequência na fala de qualquer brasileiro inclusive dos que têm domínio da normapadrão como é o caso da palavra roubo que se pronuncia comumente robo Na escola no primeiro segmento dos anos finais do ensino fundamental esse tipo de hipercorreção aparece em muitas produções textuais de alunos pelo fato de eles serem constantemente advertidos a manter o ditongo segundo a norma Por analogia aplicam a ditongação a outros vocábulos como espousa Pensando nesses tipos de hipercorreção propomos uma atividade parecida com um jogo de cartas Coletamos as palavras hipercorrigidas dessa natureza e fazemos uma lista composta por elas e seus pares correspondentes à normapadrão figuras 1 e 2 Imprimimos a lista com um tamanho de letra grande e com espaço entrelinhas também Cortamos cada uma das palavras e a seguir as colamos em pedaços retangulares de papel cartão Vejamos exemplos de palavras que podem ser incluídas em tal lista Bujões Bojões Curtir Cortir Dormir Dizer Dezer Beber Disparar Descolar Discordar Descordar Incrível Encrível Inflamado Enflamado Enganado Encrenca Infalível Enfalível Enfezado Emprestado Impressão Empressão Importa Emporta Inventado Enventado Envenenado Aconteceu Aconteceo Róseo Farináceo Arrependeu Arrependeo Seguiu Seguio Respondeu Respondeo Surgiu Surgio Contágio Fosse Fouse Esposa Espousa Figura 1 Lista de palavras para jogo de cartas em dupla Figura 2 Jogo de cartas A atividade pode se dar de diversas formas Vejamos um exemplo do jogo em duplas as cartas devem ser embaralhadas e dispostas sobre a mesa em um bloco só A palavra deve estar voltada para baixo para que ao ser pega pelo jogador somente ele possa lêla Cada jogador tem direito a pegar uma carta sempre a que estiver em cima de todas as outras e tomála para si se ela estiver de acordo com a normapadrão Caso ele olhe a palavra e a considere hipercorrigida poderá devolvêla para baixo de todas tendo direito a pegar uma nova carta O processo poderá se repetir até que ele decida reter uma carta Após a retenção de uma é a vez do próximo jogador que fará o mesmo procedimento O jogo termina quando não houver mais cartas a serem retiradas Os jogadores devem então pegar a lista de conferência e contar quantas palavras adequadas à normapadrão pegaram Podemos aumentar o baralho à medida que coletarmos mais palavras e podemos pensar em jogos grupais envolvendo escrita ou formulação oral de frases utilizando a palavra da carta se o grupo julgála adequada à normapadrão O professor também pode propor um quadro a ser completado no quadro branco de um lado palavras com escrita errada do outro palavras com escrita correta Depois de as duplas jogarem o professor pode pedir que cada dupla escreva no quadro da sala uma palavra errada e uma correta Dessa forma poderá refletir com a turma sobre a aparente regularidade entre as palavras que gerou a hipercorreção Então É só colocarmos a criatividade em ação Que tal esse tipo de atividade lúdica Atividades assim sempre se constituem em boa saída para desenvolver algumas aulas no fim do turno ou aulas próximas do fim de semana quando o aluno já está bem cansado Elas acabam sendo mais descontraídas e têm aparência de brincadeira Normalmente o aluno aprecia sair da rotina do livro didático e do caderno Vejamos alguns outros casos de hipercorreção 11 porque é muito importante ter informações do altor e dos acontecimentos 12 Todos escultam o programa com atenção até o fim 13 Todo fim de aula passamos na cantina para tomar solvete No exemplo 11 o aluno recuperou uma consoante velar l vocalizada ou seja ele lembrou que a palavra alto é escrita com l apesar de ser pronunciado um u na primeira sílaba Por isso ele realiza o raciocínio contrário se ele pronuncia a palavra autor com o som de u então ela deve ser escrita com l tal qual a palavra alto Há uma tendência a recuperar na língua escrita a letra l para transcrever um possível fone velar pósvocálico l som do l em final de palavra como produzido por alguns sulistas substituído em muitas variantes pela vocalização do l pronunciando a semivogal w na língua oral som da letra u átona No intuito de escreverem corretamente palavras que terminam com este som os alunos ficam inseguros quanto a sua grafia Como já existe a tendência de considerarem a letra u errada optam pela letra l e assim incorrem na hipercorreção como pode ocorrer com as palavras altoridade altomóveis e partil Já no exemplo 12 vemos um caso de inserção do l no interior de palavras A perda do l no interior das palavras é um fenômeno frequente na fala de muitas pessoas pelo fato de essas mesmas palavras terem o l vocalizado para w É o caso de colchão para coxão Observase por outro lado a inserção do l por hipercorreção no interior de palavras para que elas soem mais corretas despultando no lugar de disputando Em 13 houve a troca de r por l porque o aluno não queria cometer a usual troca de l por r característica de falares rurais e portanto bastante estigmatizada Enquanto as variedades mais urbanas tendem a vocalizar o l final nos falares rurais ele desaparece ou transformase em r como é o caso de qual para quar Na hipercorreção dáse justamente o contrário pelo medo de ser estigmatizado o falante tenta recuperar esse l de prestígio em contextos em que ele não existe Retomemos o exemplo 3 3 Ele dar comida aos peixinhos Aqui temos a recuperação do r em final de palavra Ocorre com frequência no Brasil a supressão do r final em praticamente todo o contínuo de variedades linguísticas faladas Lemle 1978 esclarece que essa supressão é um fenômeno verificado numa extensão geográfica ampla em se tratando de infinitivos verbais e de registro coloquial Como a frequência da queda do r é grande nos verbos seu uso hipercorreto também é expressivo O aluno procura se adequar aos padrões ensinados na escola adotando modelos de prestígio ele reconhece como erro de normapadrão a retirada do r no final de palavra passando a compensálo pelo acréscimo de r final em qualquer palavra que reconheça como verbo Por isso passa a escrever ele estar no lugar de ele está Porém apesar de encontrarmos esse tipo de problema de escrita das séries iniciais do ensino fundamental até o ensino superior não temos utilizado métodos eficientes para familiarizar o aluno com a regra Ele acaba por utilizála indiscriminadamente em qualquer contexto verbal Mattoso Câmara 1972 contribui com alguns exemplos quando diz que do esvaziamento do r resulta a frequente hipercorreção estar no lugar de está como em ele estar olhando os belos patinhos Mas essa recuperação pode ocorrer também nas outras classes gramaticais como em ater no lugar de até ou sofar no lugar de sofá Há ainda uma tendência à hipercorreção recuperandose o r no interior de palavras como em comerçava por começava Propomos outra atividade Bingo ortográfico o Elaborando as cartelas imprima tabelas diferentes com certo número de palavras ou expressões Todas elas devem possuir o mesmo número de palavras a serem encontradas No nosso exemplo figura 3 cada cartela possui 15 opções de palavrasalvo É recomendável o professor colar cada ficha em papel cartão garantindolhe maior durabilidade o Jogando podemos separar a turma em trios ou em duplas dependendo de quantas cartelas diferentes tivermos feito Entregar uma cartela e alguns grãos de feijão ou milho para que o grupo de alunos a marque O professor cantará a palavra expressão ou frase de duas formas algumas vezes falando naturalmente a palavra em voz alta em outras vezes mostrando uma imagem relativa à palavra A imagem em alguns casos é importante ALTORIDADE AUTORIDADE ele RlU BRASIL SAL ESCUTAM ESCULTAM ele DÁ esmola ele DAR esmola DEMOLIR eu LIR um livro ontem eu LI um livro ontem ATÉ ATÉR BATER Cartela 4 FALIR TERÇA eu SAÍ MOÇO CADARÇO SERGUNDA SEGUNDA PATAMAR CADÁVER Para eu ASSISTI ao filme preciso de dinheiro Se você CAIR levantese DAÍ PARTIR SAIR Para eu ASSISTI ao filme preciso de dinheiro Cartela 5 eu VI o menino ontem Se eu VIR o menino eu aviso você ele ESTÁ bem ele ESTAR bem para ele FICAR bem precisa da mãe AÍ AIR COMEÇAVA COMERÇAVA COMÉRCIO SOFÁ SOFAR MARÇO MORÇO MOÇO Cartela 6 COMEÇAVA COMERÇAVA GARFO BRASIL SAL SORVETE SOLVETE GALFO Ele DAR esmola DEMOLIR Para eu ASSISTIR ao filme preciso de dinheiro Para eu ASSISTI ao filme preciso de dinheiro MALDADE MAUDADE SAUDADE Vejamos agora alguns casos de hipercorreção relacionados a aspectos sintáticos 14 A praga que alastravase pelo pomar 15 Eu não lhe vi ontem 16 Esses foram os alunos que a diretora os entrevistou ontem Percebemos a hipercorreção na colocação pronominal sintaxe de colocação nas três frases apresentadas Em 14 vemos o seguinte na norma de maior prestígio a preferência de colocação pronominal é enclítica mas o português falado no Brasil rejeita essa tendência preferindo a próclise Na hipercorreção o falante ou o redator faz ao contrário coloca o pronome em posição de ênclise justamente nos casos em que a gramática normativa instrui uma colocação proclítica A hipercorreção de 15 é baseada no uso comum de Eu não vi ele ontem O brasileiro tem preferência na oralidade por usar os pronomes do caso reto em função de complementos verbais Como o uso dos pronomes oblíquos é raro na oralidade eles acabam sendo motivo de muita insegurança e por conseguinte de hipercorreção Assim outro uso hiper correto do pronome seria o de usar o pronome oblíquo lhe usado para substituir o complemento de um verbo transitivo indireto com verbo transitivo direto Quero lhe abraçar O exemplo 16 é outro caso parecido com o anterior e ocorre quando os pronomes oblíquos exercem a função de dar elegância e conhecimento à pessoa que os utiliza Assim encontramos tanto na oralidade como na escrita a repetição do complemento para que a frase se torne mais erudita A hipercorreção na concordância verbal e nominal sintaxe de concordância constitui outro grupo de hipercorreção que chama a nossa atenção por ser bem frequente nas produções dos nossos para não condicionar a resposta do aluno por exemplo numa palavra do tipo sorvete Numa região em que não se produz o r caipira o aluno logo identificará a ortografia correta Ao ouvir a ou ver a imagem da palavra ou expressão cantada os alunos devem verificar se a possuem em sua cartela e se a possuírem devem escolher a forma ortograficamente correta colocando o grão sobre o item escolhido Abaixo apresentamos algumas sugestões de cartelas Uma dificuldade interessante talvez seja não agrupar todas as palavras com aquelas que possivelmente contrastarão com a inadequação da hipercorreção Por isso insira algumas palavras que se assemelham à palavra hiper correta ou de contraste e que são corretas Apresentamos algumas sugestões de cartelas a seguir Cartela 1 exemplo de ficha com os grãos representados por X Para eu ASSISTIR ao filme preciso de dinheiro Semana passada eu ASSISTI ao filme ALTOR AUTOR X ALTO X AUTOMÓVEIS X ALTOMÓVEIS MALDADE X MAUDADE SAUDADE X ELE PARTIU X ELE PARTIL MOÇO MORÇO MARÇO Cartela 2 DESPULTANDO DISPUTANDO COMEÇAVA COMERÇAVA GARFO eu ASSISTI ao filme ontem eu ASSISTIR ao filme ontem SORVETE SOLVETE GALFO COMÉRCIO DESCULPANDO QUARTA SERGUNDA TERÇA Cartela 3 17 nós nos saímos bens 18 No meio do ano é época de comer pés de moleques todo dia 19 Eu comprei uns pães de sais na padaria 20 A gente já sabemos que os problemas mundiais 21 O casal não tinham a menor possibilidade de continuarem juntos 22 Haviam muitas pessoas na festa 23 Muitas coisas de importantes ocorreram em minha vida 24 Devemos ter amor em todas as pessoas Pensando nessas ocorrências precisamos reforçar ao ensinar a normapadrão os regimes dos verbos e nomes que aparecem nos textos que analisamos com os alunos ou naqueles que revisamos coletivamente Precisamos lembrar que informações muito óbvias básicas para nós talvez não o sejam para nossos alunos Além dessas atividades é interessante propor exercícios de reconhecimento de adequação à normapadrão Apresentamos uma proposta Treine seus conhecimentos linguísticos A normapadrão da língua portuguesa requer o conhecimento de usos gerais e específicos Por exemplo é necessário saber como concordar tanto nos casos de regra geral como nos casos especiais um verbo com o sujeito concordância verbal ou um nome com outro nome concordância nominal Também é necessário saber se há exigência ou não de uma preposição após um verbo regência verbal ou após um nome regência nominal Pensando nisso julgue as frases a seguir anotando um X dentro dos parênteses se a frase estiver escrita conforme os usos da língua padrão Nós nos saímos bem Nós nos saímos bens Eles têm que ser muito rápidos Eles têm que ser muitos rápidos Elas eram muito bonitas Elas eram muitos bonitas A gente perde tudo quando não valoriza o que ganha A gente perde tudo quando não valoriza o que ganhamos A gente perde tudo quando não valorizamos o que ganhamos A gente perdemos tudo quando não valorizamos o que ganhamos A gente sabe muitas coisas A gente sabemos muitas coisas O casal não tinha a menor possibilidade de continuar junto O casal não tinham a menor possibilidade de continuarem juntos É necessário que hajam provas É necessário que haja provas Havia muitas pessoas na festa Haviam muitas pessoas na festa Muitas coisas importantes ocorreram em minha vida Muitas coisas de importantes ocorreram em minha vida As razões são sempre diferentes uma das outras As razões são sempre diferentes de uma das outras Devemos ter amor por todas as pessoas Devemos ter amor em todas as pessoas Estava ligado na tv na expectativa de ver um bom programa Estava ligado na tv de expectativa de ver um bom programa Nesse tipo de atividade levamos os alunos à utilização da gramática como fonte de resolução dos problemas linguísticos relacionados à normapadrão bem como do dicionário Se for possível pegue os dicionários da biblioteca escolar e leveos para consulta em sala durante a atividade Temos que ter o cuidado de apresentar exemplos semelhantes inseridos em textos até porque o aluno não escreve frases isoladas e sim textos 4 Como traçar novos caminhos no ensino de língua materna Na medida em que os professores de língua materna têm conhecimentos linguísticos sobre as diferenças existentes no contínuo das variedades da mais padrão à menos padrão reconhecem as variantes manifestas nos textos produzidos pelos alunos A percepção das variantes caracterizadas por aspectos ora de cunho fonológico morfológico sintático ou de outra natureza possibilitará ao professor graduar as dificuldades a serem trabalhadas na aprendizagem da normapadrão no decorrer de toda a escolarização A hipercorreção deve ser cuidadosamente trabalhada e diagnosticada para minimizar a distância entre a variedade mais padrão e a variedade menos padrão sem demonstrar desprezo pelo registro do aluno a fim de não impedilo de se expressar oralmente ou por escrito em sua variedade materna A aprendizagem da normapadrão deve ser implementada de forma segura e contextualizada para não criar insegurança linguística no educando principalmente naqueles vindos das classes sociais menos escolarizadas Para que o aluno aprenda a normapadrão de maneira segura é necessário que algumas medidas sejam tomadas É sobre algumas dessas medidas que refletiremos agora 41 Apresentar os dois modelos que geram dúvidas 25 Eu fui corajoso e entrei na casa abandonada A casa estava coberta de teia de aranha e quase todas as telhas estavam quebradas Quando for apresentar algum texto ou exercício de hipercorreção aos alunos o professor deve ter o cuidado de incluir palavra expressão ou frase que apresente o fone a sílaba ou o conjunto de palavras sintagma que desencadeia o fenômeno Dessa forma os possíveis usuários da hipercorreção perceberão que há um duplo uso daquele ente linguístico do qual ele julgava haver apenas um único uso Por exemplo a presença das expressões telha de barro e teia de aranha num mesmo texto pode suscitar um ótimo aprendizado para um usuário de hipercorreção O professor pode incluir essas expressões num texto a ser revisado pela turma com a mediação do professor ou pode incluílas num texto de leitura cuja escrita é pressuposta como padrão Tanto no primeiro caso como no segundo o aluno que comete esse tipo de hipercorreção desconfiará de que a expressão teia de aranha está errada Se nem ele nem outro aluno manifestar a dúvida em voz alta o professor deve apresentála à turma Telha de barro e teia de aranha Será que uma das duas escritas está errada A palavra telha existe A palavra teia existe Existe outra maneira de pronunciar a palavra telha Existe outra maneira de pronunciar a palavra teia Quais outras palavras são parecidas com essas E assim por diante até que fique bem claro para o aluno que as duas formas ocorrem na escrita e designam palavras diferentes mas na fala as duas pronúncias se igualam caso o falante use uma norma não padrão na qual não haja a presença do fone representado pelo dígrafo lh em palavras como muiémulher cuiécolher teiatelhateiateia etc 42 Estimular os alunos a produzirem textos orais e escritos Uma das atividades que o professor pode realizar para intensificar a segurança linguística do aluno pode ser a gravação de conversas seguida de sua análise linguística A escuta de textos gravados em situações autênticas de interlocução pode ajudar o aluno a entender o caráter social do discurso Sempre que essas conversas apresentarem erros de hipercorreção devemse salientar os acertos comunicativos que o produtor do texto analisado realizou a adequação do texto à situação por exemplo Em qualquer língua podemos escolher entre usos mais formais ou menos formais Mas essa escolha não é totalmente livre Ela é condicionada pelas normas que definem quando e onde é adequado usar linguagem informal não monitorada e quando e onde se espera que os participantes da interação usem linguagem formal monitorada Outros aspectos devem ser igualmente analisados como o gênero e tipo textuais requeridos a argumentação utilizada entre outros O importante é que a turma identifique também os acertos do texto e não somente os erros pois assim o produtor do texto não será estigmatizado e sendo o texto produzido ou não por alguém da sala não haverá constrangimento Após a escuta e análise do texto gravado o professor poderá realizar uma atividade de escrita com os alunos como transcrição e retextualização de partes do texto Sempre que promover uma atividade de escuta de leitura ou de análise linguística é interessante que ela culmine na produção de um texto cujo gênero deve corresponder àquele trabalhado Por isso é interessante propor aos alunos situações reais ou imaginárias levandoos a produzirem gêneros orais e escritos tanto em contextos monitorados quanto em contextos não monitorados Entretanto é importante atentar para a recomendação de só pedir a produção de determinado gênero depois de ler e analisar com a turma um texto exemplar daquele gênero Ao longo do ano os alunos devem produzir vários textos orais e escritos devendo também ter um feedback do professor Toda produção de texto oral ou escrita deve ser previamente preparada ou seja o aluno deve ter sido exposto a um gênero semelhante ao que lhe será pedido Por exemplo o professor só deve pedir uma carta de leitor se já tiver apresentado o gênero aos alunos só deve solicitar um jornal falado se eles já tiverem analisado algum anteriormente Em se tratando de textos orais devemos levar nossos alunos a planejarem a fala de acordo com a situação comunicativa a utilizarem a variedade linguística adequada à situação de interlocução valorizando seu próprio repertório linguístico a monitorarem seu desempenho oral e quando necessário reformularem o planejamento prévio Brasil 1998 Ou seja o professor deve estar sempre atento para desenvolver a flexibilidade comunicativa e a segurança linguística do aluno Já no processo de produção de textos escritos é urgente levar os alunos a redigirem diferentes tipos de textos estruturandoos adequadamente quanto ao tema à progressão temática aos propósitos do texto explicitaram as informações indispensáveis à interpretação utilizarem recursos coesivos adequados bem como elementos lexicais sintáticos figurativos e ilustrativos ajustandoos às circunstâncias formalidade e propósitos da interação utilizarem de acordo com o gênero e com as condições de produção os padrões da escrita de forma proficiente analisarem e revisarem o próprio texto segundo a finalidade do texto e o destinatário Brasil 1998 A produção contínua de texto e sua reescrita corrigirá não apenas os problemas de hipercorreção dos alunos mas aumentará significativamente o letramento deles Muitos são os gêneros que poderemos pedir em sala de aula canção textos dramáticos notícia entrevista debate depoimento exposição seminário crônica conto poema notícia artigo carta do leitor entrevista relatório resumo esquema etc Os Parâmetros Curriculares Nacionais de 1998 recomendam que o professor trabalhe com dois eixos básicos no ensino de língua portuguesa o uso da língua oral e escrita e a reflexão sobre a língua e a linguagem O aluno sempre deverá ser levado a produzir leitura e escrita após analisar a língua em uso Essa análise deve ser mediada pelo professor e é por meio dela que o aluno se confrontará com os mais diferentes modos de falar e escrever Devemos selecionar estrategicamente textos compreensíveis aos alunos e pertencentes aos mais diversos gêneros de preferência os mais presentes e necessários à realidade deles Nesse processo de análise linguística devemos planejar as aulas objetivando que o aluno o constitua um conjunto de conhecimentos sobre o funcionamento da linguagem e sobre o sistema linguístico relevantes para as práticas de escuta leitura e produção de textos o se aproprie dos instrumentos de natureza procedimental e conceitual necessários para a análise e reflexão linguística delimitação e identificação de unidades compreensão das relações estabelecidas entre as unidades e das funções discursivas associadas a elas no contexto o seja capaz de verificar as regularidades das diferentes variedades do português reconhecendo os valores sociais nelas implicados e consequentemente o preconceito contra as formas populares em oposição às formas dos grupos socialmente favorecidos Brasil 1998 52 43 Ensinar os alunos a usarem o dicionário e a gramática em sala de aula Nas aulas iniciais de prática de recepção de texto devemos incluir a prática de leitura de dicionários e gramáticas Essa é uma prática imprescindível não só para aqueles que cometem hipercorreção mas para todos os alunos Saber ler esse tipo de texto faz parte das competências de um leitor proficiente Por meio dessa atividade o aluno deve ser levado a compreender que a leitura de uma notícia é diferente da leitura de um romance que também é diferente da consulta a um dicionário ou a uma gramática Cada gênero textual possui características específicas por isso é importante considerar suas especificidades tendo como ponto de referência suas condições de produção seu uso social e seu funcionamento A gramática e o dicionário são gêneros que requerem a leitura tópica que leva a identificar informações pontuais no texto É esse tipo de leitura que fazemos quando consultamos um verbete no dicionário ou enciclopédia ou uma informação específica na gramática Esse tipo de leitura só deve ser feita quando o leitor precisa agregar mais referencialidade ao texto que está lendo por não possuir conhecimento discursivo linguístico ou informação essencial para a recuperação dos sentidos do texto Esperase que com o constante uso de dicionário e gramática o aluno consiga discernir os momentos em que precisa ou não consultálos tanto para a recepção quanto para a produção de textos Assim ampliará seu repertório lexical produzindo textos ortograficamente corretos e resolvendo dúvidas relacionadas a diversas irregularidades na língua inclusive relacionadas à hipercorreção Porém como afirma Irandé Antunes 2007 não se deve confundir o estudo da nomenclatura gramatical com o estudo da gramática Saber gramática vai além de ser competente em nomear as suas unidades e categorias O professor deve atribuir à nomenclatura gramatical uma função apenas suplementar A nomenclatura gramatical um saber metalinguístico nomeia as unidades da língua mas não tem um fim em si mesma No entanto é importante chamar as unidades da língua por seus nomes técnicos nas atividades de reflexão linguística Gradativamente o professor deve acostumar seus alunos com alguns termos mais técnicos nas aulas de análise linguística A utilização constante de uma tabela de correção de textos com acréscimos gradativos de nomeação mais técnica é uma boa ideia 44 Tornar os alunos proficientes na leitura Quanto mais o aluno ler mais seguro ficará diante da normapadrão Devemos selecionar no nosso planejamento anual textos representativos dos mais diversos gêneros textuais trabalhar com textos que façam sentido para os alunos que despertem interesse e que tenham funcionalidade É bastante desejável que nos empenhemos em encontrar textos que possibilitem trabalhar com os temas transversais ética pluralidade cultural meio ambiente saúde orientação sexual trabalho e consumo Há uma probabilidade ínfima de um leitor proficiente cometer hipercorreções Por isso a leitura deve ter o maior espaço possível na aprendizagem da língua Devem ser realizadas aulas específicas de leitura em que o professor apresentará determinado gênero textual uma carta de leitor por exemplo Para levar o aluno a perceber o contexto desse tipo de gênero textual podemse fazer perguntas como quem escreveu esse texto para quem e com qual finalidade Qual texto anterior motivou a escrita deste Qual tipologia textual predomina no gênero carta de leitor narração exposição argumentação injunção Como o escritor organizou seus argumentos Qual a posição dele em relação ao assunto Se forem duas opiniões elas são concordantes ou não O texto está escrito em linguagem formal ou informal Por quê O texto está escrito de acordo com a normapadrão ou está parecido com a fala do dia a dia português vernacular A linguagem está adequada para o público que vai ler este texto E assim por diante até que os alunos percebam que há uma estreita relação entre a linguagem a situação os interlocutores e o lugar em que o texto circula O professor deve realizar aulas de leitura sempre que possível variando o gênero a tipologia textual e o grau de formalidade apresentando desde textos formais até textos de extrema informalidade como por exemplo a leitura de artigos da Constituição Brasileira e uma conversa na internet entre dois amigos Os alunos devem ser capazes de identificar o contexto de produção textual reconhecendo a estrutura padrão ou o tipo do gênero textual Recomendamos a leitura das páginas 49 a 65 dos Parâmetros Curriculares Nacionais nas quais estão elencados os objetivos e conteúdos do ensino de língua portuguesa com sugestões de gêneros que poderão ser utilizados Quando o professor propuser gêneros informais pode enxertar algumas hipercorreções caso não haja textos genuínos e durante a análise linguística quando os alunos apontarem o problema o fenômeno deve ser comentado salientandose que essa forma de fala ou de escrita é muito comum e é resultado do conhecimento insuficiente da normapadrão Quanto mais leitura o aluno tiver mais familiarizado ficará com a língua inclusive com sua variedade padronizada o que o tornará mais seguro linguisticamente 45 Trabalhar com o processo de reescrita dos textos Os alunos precisam produzir e reescrever muitos textos ora coletiva ora individualmente mas sempre em atividade mediada pelo professor O processo de produção de textos escritos precisa estar claro tanto para o docente quanto para os discentes afinal a boa escrita é processual ela não surge pronta O professor deve acostumar seu aluno a prever os seguintes passos sempre que for produzir um texto primeiro ele vai estabelecer o tema de acordo com a situação proposta depois começará a levantar ideias e dados por meio de leitura ou de outro tipo de pesquisa depois que obtiver material informativo fará um planejamento de escrita conforme a estrutura do gênero solicitado Só então começará a escrever de fato Porém esse primeiro escrito será apenas o rascunho a primeira versão de muitas Além de já estar revisando a própria escrita enquanto produz o rascunho o aluno sabe que o professor fará uma intervenção apontando os problemas de ordem discursiva textual gramatical e convencional Quando receber o rascunho com os apontamentos do professor escreverá a segunda versão do texto que será entregue novamente ao professor para outra revisão Estando apta a segunda versão poderá ser considerada final caso contrário o aluno fará uma terceira versão de acordo com os novos apontamentos do professor E assim o processo seguirá até que o professor considere o texto a versão final Os alunos devem se acostumar a redigir seus textos quantas vezes forem necessárias até que possam ser considerados textos bem escritos No que tange à hipercorreção o professor deve estar alerta a todo desvio acompanhando atentamente a reescrita do aluno Se possível deve preparar uma ficha de acompanhamento para esse aluno e registrar as hipercorreções produzidas por ele tanto em textos orais quanto escritos Se o aluno for um caso particular na turma deve ser destinado a ele um tempo maior para ajudálo na reescrita do texto ou para alertálo sobre a hipercorreção na fala Se vários alunos manifestam o problema deve ser feito um registro das ocorrências a fim de enxertálas em textos para análise ou exercícios coletivos No trabalho de reescrita podese conduzir a turma para a construção de uma tabela com critérios que serão utilizados na correção dos textos estabelecendose códigos para os principais problemas textuais e linguísticodiscursivos Os alunos precisam perceber o texto como um todo mas também precisam perceber as questões linguísticas e discursivas que serão estudadas durante o processo de análise do próprio texto Com a mediação do professor eles aprenderão não só um conjunto de instrumentos linguísticodiscursivos como também as técnicas de revisão que envolvem rasuras substituições e exclusões Progressivamente essa prática tornará os alunos hábeis na autocorreção Junto a isso também pode ser negociada com os alunos a possibilidade de textos ou excertos produzidos por eles para serem corrigidos coletivamente mediados pelo professor Dessa maneira serão trabalhados tanto os aspectos relacionados às características estruturais dos diversos tipos eou gêneros textuais como os aspectos gramaticais necessários para instrumentalizar o aluno no domínio da modalidade escrita da língua Além disso poderão ser focalizados nas atividades os desvios linguísticos apresentados pelos alunos ajustandose os conteúdos previstos à necessidade da turma No entanto em toda e qualquer atividade de análise ou revisão coletiva devemos ter o cuidado de nunca expor o aluno a constrangimentos O melhor é sempre descaracterizar o texto do aluno a fim de que ele mesmo duvide de que o texto apresentado para a turma seja o seu Podemse também mesclar partes dos textos e construir um texto com características específicas para uma aula um texto com mais casos de hipercorreção outro com mais casos de concordância verbal inadequada etc Vejamos a seguir alguns procedimentos sugeridos pelos PCN Brasil 1998 80 para a realização dessa tarefa Seleção de um dos textos produzidos pelos alunos que seja representativo das dificuldades coletivas e apresente possibilidades para discussão dos aspectos priorizados e encaminhamento de soluções Apresentação do texto para leitura transcrevendoo na lousa reproduzindoo usando papel transparências ou o computador Análise e discussão de problemas selecionados Em função da complexidade da tarefa não é possível explorar todos os aspectos a cada vez Para que o aluno possa aprender com a experiência é importante selecionar alguns propondo questões que orientem o trabalho A revisão exaustiva deve ser reservada para situações em que a produção do texto esteja articulada a algum projeto que implique sua circulação Registro das respostas apresentadas pelos alunos às questões propostas e discussão das diferentes possibilidades em função de critérios de legitimidade e de eficácia comunicativa Nesta etapa é importante assegurar que os alunos possam ter acesso a materiais de consulta dicionários gramáticas e outros textos para aprofundamento dos temas tratados Reelaboração do texto incorporando as alterações propostas 5 Palavras finais Cabe a nós professores ensinar nossos alunos de uma maneira clara e cooperativa de forma a lhes propiciar maior segurança linguística eliminando a hipercorreção Temos que leválos a perceber que os conhecimentos da gramática normativa não devem ser decorados nem vistos como fins em si mesmos mas como uma fonte de consulta que vai ajudálos a tirar suas dúvidas de língua quando for requerida a normapadrão Mais do que propor regras temos que mostrar como uma palavra verbo conjunção adjetivo etc tem uma função e cria determinados efeitos de sentido no texto temos de mostrar que os recursos coesivos devem ser utilizados para garantir a coerência do texto oral ou escrito Trabalhar com textos implica também considerar a genericidade além da variação para a adequação à situação e mostrar sempre como esse processo ocorre em situações reais de interação e com uma função social É igualmente importante a escola favorecer a produção e a utilização das múltiplas linguagens das expressões e dos conhecimentos históricos sociais científicos e tecnológicos sem perder de vista a autonomia intelectual do aluno e sem esquecer que a leitura é a responsável por familiarizar o aluno com a língua e com as diversas estruturas coesivas do texto É fundamental a leitura ter um lugar de destaque em nossa prática pedagógica uma vez que o texto escrito constitui principalmente em comunidades de tradição oral como o Brasil o maior obstáculo ao sucesso escolar Um aspecto essencial para tornar o aluno linguisticamente seguro é respeitálo em sua diversidade linguística e cultural O aluno não deve ter vergonha de seu jeito de falar O professor deve trabalhar em perspectiva cultural e usar o conceito de competência comunicativa propondo a adequação da linguagem às diversas ocasiões e situações É assim que ensinará o educando a reconhecer características contextuais e a desempenhar papéis verbais de acordo com estas É necessário levantar o perfil sociolinguístico do educando pois ele servirá de base para a formulação de uma política pedagógica que ao garantir o acesso do aluno à normapadrão respeite suas peculiaridades culturais e lhe garanta a segurança necessária para usar sua língua materna 1 Exemplo retirado do site Sua Língua por Cláudio Moreno Disponível em httpwpclicrbscombrsualingua20090511hipercorrecaotopo Acesso 01092014 2 Exemplo retirado do blogue do Berned Disponível em httpblogdobernedblogspotcom200906hipercorrecaohtml Acesso 01092014 3 Exemplo retirado de M E Bortone Análise da produção textual de alunos do ensino fundamental do Distrito Federal in BortoniRicardo et al 2009 4 Disponível em httpwwwportuguesegramaticacombrmediabagno34tragoutrazidotempodirapdf Acesso em 01092014 5 Com relação aos verbos abundantes como regra variável em processo de mudança ver Evani Viotti Mudança linguística in José Luiz Fiorin org Linguística Que é isso São Paulo Contexto 2013 p 137179 6 Foram analisadas hipercorreções decorrentes da transposição dos hábitos da fala para a escrita As inadequações cometidas na língua oral são transpostas nessa etapa de escolarização para a língua escrita Os dados foram retirados do artigo de Marcia Elizabeth Bortone 2010 e adaptados Predicados complexos são aqueles formados por um verbo auxiliar e o verbo principal Padlet Marina Lima 1m O FENÔMENO DA HIPERCORREÇÃO Marcia Elizabeth Bortone e Scheyla BritoAlves s Marcia Elizabeth Bortone e Scheyla BritoAlves DOC O fen meno da hipercorre o Bortone Alves 2 converted docx Share your ideas and comment on others O fenômeno da hipercorreção algo muito frequente na fala das pessoas que se preocupam de forma demasiada com o uso na norma considerada padrão Adicionar comentário Os principais casos de hipercorreção ocorrem em relação ao uso dos verbos e suas conjugações em tempos verbais como também em relação ao uso do plural em substantivos ou seja na concordância verbal e nominal Adicionar comentário Uma das propostas utilizadas para solucionar esse problema dos alunos é a atividade de bingo ortográfico além do estímulo à produção de textos escritos e orais como também sua reescrita e estimulando o gosto pela leitura mas sempre respeitando as diferenças linguísticas de cada um dos alunos Adicionar comentário As autoras afirmam que a hipercorreção é um fenômeno comum em falantes que estão em processo de ascensão social ou cultural Esses falantes ao entrarem em contato com a norma padrão passam a ter consciência da existência de outras formas de falar que são vistas como mais prestigiadas Adicionar comentário Senhora nós vamos estar enviando Adicionar comentário Hoje meu filho de 3 anos falou que estava com dor de braço Soou engraçado claro porque não falamos assim Falamos dor de cabeça dor de barriga dor de dente mas dor NO braço Por quê Adicionar comentário hipercorreção nome feminino 1 LINGUÍSTICA Fenômeno que consiste na procura excessiva de correção que leva o falante de uma língua à substituição de uma forma correta por uma forma incorreta que o falante supõe ser a mais cul Adicionar comentário Ele veio cobrar uma conta que eu já tinha pagado pago Adicionar comentário VOCÊ SOFRE DE INADEQUAÇÃO DA LINGUAGEM E NÃO VOU ESTAR TENDO CURA DOUTORA Adicionar comentário
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Texto de pré-visualização
Direção ANDRÉIA CUSTÓDIO Capa e diagramação TELMA CUSTÓDIO Revisão KARINA MOTA Ilustração de capa TELMA CUSTÓDIO CIPBRASIL CATALOGAÇÃO NA FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS RJ P873 Por que a escola não ensina gramática assim recurso eletrônico organização Stella Maris BortoniRicardo et al 1 ed São Paulo Parábola 2020 recurso digital Estratégias de ensino 47 Formato epub Requisitos do sistema adobe digital editions Modo de acesso world wide web Inclui bibliografia e índice ISBN 9786586250466 recurso eletrônico 1 Língua portuguesa Estudo e ensino 2 Língua portuguesa Gramática Estudo e ensino 3 Prática de ensino 4 Livros eletrônicos I BortoniRicardo Stella Maris II Série 2066229 CDD 4695 CDU 811134336 CAPÍTULO 5 O FENÔMENO DA HIPERCORREÇÃO Marcia Elizabeth Bortone Scheyla Brito Alves 1 Palavras iniciais Diógenes da Cunha Lima em seu livro Câmara Cascudo um brasileiro feliz contanos que certa vez Luís da Câmara Cascudo estudioso do nosso folclore foi convidado por um amigo velho mestre de fandango para assistir a um ensaio de marujos ao som de instrumentos de corda Os marinheiros e oficiais começaram então a cantar 1 Nas ôndias do mar Para para ordenou o mestre Respeitem o professor Cascudo Eu já disse mais de mil vezes que a palavra não é ôndias A palavra certa é ôndegas 2 Vanderlei Luxemburgo conhecido técnico de futebol foi criticado ao escrever na internet Não sou mais técnico do Palmeiras Fui demitido por descordar das atitudes do Keirrison Vejam texto em meu blog luxemburgobloguolcombr Estes exemplos demonstram ocorrências de hipercorreção muito presentes na fala e por conseguinte na escrita de pessoas que no afã de falarem bem equivocamse e acabam fazendo uma correção para além do uso padrão ou seja corrigem o que não estava errado Geralmente as pessoas que cometem erros de hipercorreção têm algum conhecimento da normapadrão e estão preocupadas com o correto uso do idioma São pessoas inseridas em um processo de mobilidade social pois os indivíduos quando aspiram mudar de classe social deparam com uma modalidade nova de fala e isso acarreta insegurança Como as regras da normapadrão foram tardiamente interiorizadas pelo indivíduo em processo de mobilidade social ascendente sua competência no domínio dessas regras é menor cf BortoniRicardo 2011 213 para maiores esclarecimentos sobre mobilidade social ascendente e hipercorreções Os exemplos acima embora muito engraçados devem ser vistos com muita seriedade pelos professores de língua portuguesa A frequência com que inadequações dessa natureza ocorrem nos textos dos alunos mostra que a escola paralelamente a sua ação de ensinar a normapadrão precisa desconstruir um possível sentimento de insegurança linguística nos aprendizes Se esses alunos pertencerem às camadas sociais mais pobres onde os indivíduos usam um dialeto desprestigiado a insegurança já existente na oralidade agravase mais ainda na escrita Por exemplo qual de nós professores nunca encontrou nas produções de nossos alunos fragmentos de texto como este 3 ele dar comida aos peixinhos Esse aluno que já percebeu o significado social de uma forma linguística inexistente em seu dialeto tentará adequarse aos padrões ensinados na escola adotando modelos de prestígio como o uso do r em final verbal ou seja ele se monitora para produzir cantar ao invés de cantá Se a escola desse aluno não lançou mão de uma metodologia eficiente para interiorizar a regra ele irá transferila para sua escrita até em contextos que não exigem o uso do r tentando corrigir na fala ou escrita tudo o que se assemelhe ao que é considerado errado pela escola Ora se não percebermos a ocorrência desse fenômeno como poderemos trabalhar com nossos alunos quando do ensino da normapadrão o conveniente manejo das interferências no contínuo de monitoramento da norma A introdução de novos padrões linguísticos deve ser feita com uma metodologia que contemple as diferenças de usos nesse contínuo linguístico a fim de evitar hipercorreções na fala e na escrita do aluno para evitar que ele se torne linguisticamente inseguro Por ser um fenômeno frequente nas produções orais e escritas dos alunos e por interferir na adequada aprendizagem da normapadrão é que nos propusemos refletir sobre a hipercorreção neste capítulo 2 O que é hipercorreção A hipercorreção é um fenômeno de linguagem muito comum entre pessoas que se deram conta da existência de outro falar muito mais prestigiado do que o seu Essas pessoas também desejam ser usuárias dessa forma prestigiada do falar mais correto Para tal esforçamse em corrigir sua fala e acabam incorrendo no erro de corrigila demasiadamente Casos como falar pilha no lugar de pia é próprio de falantes em cuja variedade linguística o fonema ʎ representado ortograficamente pelo dígrafo lh não é pronunciado Ao aprenderem a variante padrão esses falantes ao mesmo tempo em que aprendem a pronunciar filha no lugar de fia ou palha no lugar de paia formulam a hipótese de que lh é o equivalente de i no contexto dessa vogal seguida de outra formando um hiato produzindo assim a hipercorreção Quando as pessoas se referem ao falar mais correto referemse à normapadrão do português a variedade linguística mais prestigiada no país e que é a base das gramáticas normativas As condições que fazem uma variedade ou dialeto chegar à situação de padrão são de natureza social histórica e política Assim determinada variedade da língua geralmente aquela que já tem uma tradição escrita passa por um processo de codificação e legitimação conduzido pelos grupos que detêm o poder nacional ao longo da formação histórica do país No Brasil a legitimação de uma variedade como padrão seguiu paralelamente ao processo de urbanização A variedade padrão e as demais variedades de uma língua são funcionais pois todas elas cumprem as funções que lhes são alocadas na própria organização sociocultural na comunidade de fala BortoniRicardo 2008 O Dicionário de linguística e fonética de David Crystal 2000 138 utilizando a teoria de Gumperz e Hymes de 1972 define hipercorreção como uma forma linguística que vai além do ponto estabelecido pela VARIANTE de LÍNGUA que o falante tem como meta O fenômeno geralmente acontece quando os falantes de um DIALETO que não é o padrão tentam usar o dialeto padrão e vão longe demais produzindo uma versão que não existe no padrão Joaquim Mattoso Câmara Jr o pai da linguística no Brasil apresenta esse fenômeno por meio de dois termos ULTRACORREÇÃO e HIPERURBANISMO em seu Dicionário de linguística e gramática 1992 de 1977 ULTRACORREÇÃO equivocação no desejo de falar bem Pidal 1944194 quando se modifica num indevido intento de correção o que é da norma espontânea linguística Pode resultar a de um raciocínio gramatical em falso b de um esforço confuso de resistência a certas tendências para mudanças no qual se impõe uma solução única a fatos linguísticos diversos Câmara Jr 1992 237 HIPERURBANISMO nome especial que se dá à ultracorreção no âmbito fonológico Resulta de um esforço excessivo para a correção na pronúncia O nome hiperurbanismo provém de ser comum esse erro entre a gente do campo ao procurar cingirse à pronúncia urbana No português atual notamse principalmente os seguintes tipos de hiperurbanismo no uso que quer ser elegante da língua a esforço para articular o s mudo em verbos como crescer nascer b supressão de uma vogal considerada erroneamente como anaptítica ex pronunciar e escrever adivinhar com o grupo dv à maneira de advogado c troca de acentuação como sutil feito paroxítono rubrica feito proparoxítono por causa dos sufixos il e ico átonos de fácil fatídico etc Câmara Jr 1992 138139 Já o Dicionário eletrônico Houaiss apresenta os termos hipercorreção hiperurbanismo e ultracorreção como sinônimos Vejamos ULTRACORREÇÃO fenômeno que se produz quando o falante estranha e interpreta como incorreta uma forma correta da língua e em consequência acaba trocandoa por uma outra forma que ele considera culta nessa busca excessiva de correção notase em geral o temor do falante de revelar uma classe de origem socialmente discriminada hipercorreção hiperurbanismo Houaiss 2001 Para efeitos de simplificação didática elegeremos o termo HIPERCORREÇÃO para nos referir ao fenômeno Aliás este tem sido o termo preferido pelos pesquisadores O fenômeno da hipercorreção ocorre na tentativa de uma utilização adequada da normapadrão que dá prestígio social Para LouisJean Calvet 2002 69 a presença dessa norma na sociedade pode provocar dois tipos de comportamento linguístico o primeiro se refere ao modo como os falantes encaram sua própria fala reconhecendo o seu jeito de falar como uso certo ou uso errado Dessa forma são levados a valorizar sua prática linguística ou ao contrário são levados a tentar modificála para conformála a um modelo prestigioso O segundo comportamento linguístico se refere às reações dos falantes ao comentarem a fala dos outros ou seja aponta que as pessoas julgarão o modo de falar dos outros estigmatizando uns e valorizando outros Quando os falantes consideram sua variante linguística como sendo a variante prestigiada revelam segurança linguística Porém quando por razões sociais diversas consideram o próprio modo de falar como uma norma desprestigiada na sociedade e reconhecem outra norma de mais prestígio como modelo apresentam insegurança linguística Calvet 2002 Crer que há um modo prestigioso de falar a própria língua implica quando alguém pensa não possuir esse modo de falar tentar adquirilo e essa tentativa pode gerar uma restituição exagerada das formas prestigiosas a hipercorreção Ou seja por causa da insegurança linguística esse falante tenta imitar de forma exagerada a norma modelo por razões diferentes Fazer crer que se domina a língua legítima ou fazer esquecer a própria origem Calvet 2002 7778 Porém apesar de ser um genuíno fenômeno linguístico a hipercorreção só ocorre por causa da suposta função social de conferir prestígio a um falante desprestigiado na sociedade Ela ocorre por motivações mais sociais do que propriamente linguísticas Em relação a esse fato Bagno enfatiza o caráter social da hipercorreção caracterizandoa como uma prática de higiene verbal cf Cameron 1995 apud Bagno 2012 A hipercorreção também se enquadra nas práticas de higiene verbal Tratase do interessante fenômeno sociolinguístico que se observa quando uma falante ou uma comunidade de falantes ao tentar se aproximar de um padrão ideal imaginário de língua boa acaba acertando demais e se desviando tanto da gramática intuitiva da língua quanto da gramática normativa Bagno 2012 83 O jogo linguístico e o jogo social andam juntos Quando o falante decide adquirir uma nova norma além da competência linguística manifesta refletese aí também a competência social pois se for bemsucedido nessa aquisição sabe que obterá muitos benefícios sociais O problema maior ocorre quando a hipercorreção é percebida como ridícula por aqueles que dominam a forma legítima Normalmente esse usuário da forma legítima julgará de maneira negativa aquele que tenta imitar a pronúncia valorizada Calvet 2002 79 gerando uma situação de grande constrangimento para o que não domina a norma Um falante que sofre esse tipo de estigma pode desenvolver sérios problemas sociais emocionais e linguísticos pode começar a se considerar incapaz de aprender a normapadrão A intervenção da escola é crucial pois quanto maior o distanciamento entre o material didático usado nas aulas de língua portuguesa e a realidade do educando maiores serão as bar reiras de acesso à normapadrão Bortone 1989 Se no entanto o professor de língua portuguesa estiver preparado para detectar e sanar o problema poderá ajudar o aluno a reconstruir pelo sucesso no aprendizado sua autoestima linguística e pessoal É necessário que o professor rompa com o processo de recíproca ignorância dialetal mencionado por Labov 1972 em que tanto os professores desconhecem o dialeto do aluno quanto os alunos desconhecem o do professor resultando em ignorância mútua das regras necessárias para tradução de um sistema para outro e comece a trabalhar com as duas normas sanando as dúvidas quando da passagem de uma norma para outra 3 Quando o falante erra querendo acertar Temonos perguntado por que a hipercorreção ocorre com tanta frequência nos textos dos alunos principalmente daqueles que são usuários de uma norma diferente da padrão Segundo Labov 1972 isso ocorre pelo fato de a escola paralelamente a sua ação de ensinar a normapadrão incutir um grave sentimento de insegurança linguística nos alunos Segundo Labov 1972 a hipercorreção resultará de dois fatores i A insegurança linguística do aluno frente às pressões do ensino quando o estudante não conseguiu ainda interiorizar as regras da normapadrão Ao produzir uma redação que exija um estilo cuidado o aluno tenta ser o mais correto possível o que o leva muitas vezes a cometer hipercorreção ii Uma tendência a imitar os padrões de prestígio da classe média adotados pela escola uma hipercorreção de cima como denominou Labov 1972 que representa um processo claro de correção e coerção social aplicado às formas linguísticas Sendo assim o aluno enfrenta na escola duas desvantagens a diferença linguística em seu repertório e uma forte dose de insegurança linguística Como dito essa insegurança ocorre devido às pressões linguísticas como a de obrigar o aluno em nossas escolas a usar somente a normapadrão e não explicar a ele que em suas interações familiares pode usar uma variedade não monitorada nem mostrar a ele que nós usamos uma ou outra variedade de acordo com o contexto em que estamos inseridos 31 Hipercorreção na fala Quando o aluno diz 4 Professora o seu visto no nosso caderno é a sua rúbrica verificase que ao rejeitar a pronúncia da palavra como rubrica ele manifesta crer que o uso da proparoxítona no caso rúbrica é mais culto do que o da paroxítona Esse equívoco tem uma razão histórica As proparoxítonas consideradas pelos gramáticos como eruditas foram introduzidas na língua já na consolidação do português moderno Bortone 2004 195 Esse é um minievento de oralidade BortoniRicardo 2004 em que o professor pode intervir por meio da simples apresentação da pronúncia correta respondendo à pergunta Sim querido a minha rubrica no seu caderno já é o meu visto Por isso guardeo bem Precisamos estar atentos a esses eventos de oralidade em que nosso aluno manifesta um grau maior ou menor de desconhecimento da norma de prestígio Por exemplo é muito comum ouvir de um ou outro aluno algo como 5 São douze prêmios ao final do concurso 6 Eu levei falta mas já tinha chego quando a professora fez a chamada Bagno 2010 informa que a hipercorreção pode ser um indicador de mudança na língua Também ocorre hipercorreção com os chamados verbos abundantes que têm mais de um particípio Muita gente acha que só existem as formas ganho entregue pago etc e que é errado dizer ou escrever eu tinha ganhado tinha entregado tinha pagado etc Por analogia e hipercorreção surgiram novos particípios irregulares que só porque são novos sofrem o combate sistemático dos patrulheiros gramaticais de plantão Estou falando dos particípios trago Ele tinha trago os livros e chego Ela tinha chego atrasada que a julgar pelo combate violento que sofrem já devem estar muito bem instalados na gramática intuitiva da maioria dos brasileiros Você acha certo ou errado dizer o corrupto foi pego em flagrante Acha certo Pois veja o que dizia o conhecido dicionário Caldas Aulete na 5ª ed 1964 no verbete pego Só os incultos empregam este termo E agora veja o que diz o dicionário Houaïss 2001 Pegar apresenta duplo particípio pegado pego ê ou é Como as coisas mudaram em 35 anos não De uma análise preconceituosa para uma apresentação neutra sem nenhum juízo de valor Ensinar os alunos a resolverem esse tipo de problema deve tomar um tempo em nosso planejamento Em primeiro lugar será muito útil desconstruir o mito de que o professor conhece a conjugação de todos os verbos da língua de acordo com os manuais prescritivos Em segundo lugar o professor mostrará ao aluno o que faz para solucionar dúvidas como essa Uma aula de análise de livros que trazem prescrição sobre a conjugação de verbos poderá ser bem útil Essa aula poderia acontecer na biblioteca por exemplo O professor poderia pedir que os alunos pegassem dicionários e gramáticas e localizassem a parte de conjugação de verbos Os alunos teriam a tarefa de sistematizar anotações e explicar num momento posterior como a conjugação verbal é apresentada atentos aos modos verbais e mais especificamente às formas nominais onde localizariam o particípio O professor poderia propor uma quantidade específica de verbos regulares e irregulares distribuindo a tarefa em grupos A técnica de consulta a manuais desmistifica o saber linguístico da norma de prestígio no seu uso mais monitorado e formal O aluno começa a entender que serão as muitas consultas e as muitas leituras que construirão nele esse arcabouço Ele reconhecerá o caminho da construção e decidirá se deseja ou não fazer essa empreitada E mesmo que opte por não fazêla ficará mais socialmente seguro por entender que não há pessoas mais especiais ou superiores em termos de gramática normativa há sim pessoas que possuem por um ou outro motivo mais contato com essa norma Esse tipo de atividade também ajuda o aluno a perceber a funcionalidade da gramática normativa 32 Hipercorreção na transposição dos hábitos da fala na escrita Um fenômeno frequente na oralidade de diversas regiões do Brasil é o da elevação das vogais médias Exemplos disfile no lugar de desfile bolu no lugar de bolo leiti no lugar de leite O fenômeno ocorre sempre nas sílabas átonas elevando o fone e para i e o fone o para u Estudantes são constantemente alertados pelos professores a escreverem corretamente evitando na escrita a mesma elevação da oralidade Sofrem pressão da escola para usarem a forma de prestígio Por isso as vogais médias e e o são vistas por eles como mais corretas do que as variantes altas i e u Daí a recuperação delas nos estilos cuidados Não é raro encontrar nas produções textuais de nossos alunos do ensino fundamental hipercorreções de ordem fonológica como estas 7 As autoridades tiveram todo o coidado de retirar os habitantes 8 É encrível o número de mortos nas últimas tragédias do mundo 9 Ninguém sabe bem o que aconteceu mas todos esperam respostas Os exemplos 7 8 e 9 apresentam hipercorreção das palavras respectivamente cuidado incrível e aconteceu Na tentativa de utilização da forma de prestígio dáse nelas o abaixamento de vogal onde não se faz necessário No exemplo 7 a vogal u é abaixada para o hipercorrigindo a palavra cuidado para coidado ou seja houve o abaixamento da vogal pretônica No exemplo 8 a vogal i é abaixada para e hipercorrigindo a palavra incrível para encrível ou seja houve o abaixamento da sílaba nasal em início de palavra Já no exemplo 9 o ditongo eu é abaixado para eo hipercorrigindo a palavra aconteceu para aconteceo ou seja houve o abaixamento da sílaba tônica com ditongo em final verbal6 Mattoso Câmara 1972 41 que na década de 1970 já observava erros de hipercorreção informanos São curiosas aí as ultracorreções provenientes da preocupação de manter uma distinção inexistente na língua coloquial como em Depois de falar com os parentes romou para o campo onde nem a associação espontânea com rumo conseguiu firmar a forma rumou O exemplo do Vanderlei Luxemburgo dado no início do capítulo já nos mostra esse tipo de erro Ele hipercorrige a palavra discordar rebaixando a vogal i para e construindo a forma descordar Para BortoniRicardo 1981 o fenômeno da hipercorreção é característico da fala de grupos sociais integrados na ideologia da mobilidade social Este parece ser o caso dos alunos da amostra que além de estarem engajados em um processo de integração na cultura urbana sofrem pressão na escola para usarem a forma de prestígio Vejamos 10 Para que o resgate fousse efetuado seria necessário mais tempo Em 10 percebemos que se acrescentou um ditongo à grafia da palavra fosse Como explicar isso É que há em nossa fala descuidada uma forte tendência à redução de ditongos decrescentes Esse fenômeno ocorre com frequência na fala de qualquer brasileiro inclusive dos que têm domínio da normapadrão como é o caso da palavra roubo que se pronuncia comumente robo Na escola no primeiro segmento dos anos finais do ensino fundamental esse tipo de hipercorreção aparece em muitas produções textuais de alunos pelo fato de eles serem constantemente advertidos a manter o ditongo segundo a norma Por analogia aplicam a ditongação a outros vocábulos como espousa Pensando nesses tipos de hipercorreção propomos uma atividade parecida com um jogo de cartas Coletamos as palavras hipercorrigidas dessa natureza e fazemos uma lista composta por elas e seus pares correspondentes à normapadrão figuras 1 e 2 Imprimimos a lista com um tamanho de letra grande e com espaço entrelinhas também Cortamos cada uma das palavras e a seguir as colamos em pedaços retangulares de papel cartão Vejamos exemplos de palavras que podem ser incluídas em tal lista Bujões Bojões Curtir Cortir Dormir Dizer Dezer Beber Disparar Descolar Discordar Descordar Incrível Encrível Inflamado Enflamado Enganado Encrenca Infalível Enfalível Enfezado Emprestado Impressão Empressão Importa Emporta Inventado Enventado Envenenado Aconteceu Aconteceo Róseo Farináceo Arrependeu Arrependeo Seguiu Seguio Respondeu Respondeo Surgiu Surgio Contágio Fosse Fouse Esposa Espousa Figura 1 Lista de palavras para jogo de cartas em dupla Figura 2 Jogo de cartas A atividade pode se dar de diversas formas Vejamos um exemplo do jogo em duplas as cartas devem ser embaralhadas e dispostas sobre a mesa em um bloco só A palavra deve estar voltada para baixo para que ao ser pega pelo jogador somente ele possa lêla Cada jogador tem direito a pegar uma carta sempre a que estiver em cima de todas as outras e tomála para si se ela estiver de acordo com a normapadrão Caso ele olhe a palavra e a considere hipercorrigida poderá devolvêla para baixo de todas tendo direito a pegar uma nova carta O processo poderá se repetir até que ele decida reter uma carta Após a retenção de uma é a vez do próximo jogador que fará o mesmo procedimento O jogo termina quando não houver mais cartas a serem retiradas Os jogadores devem então pegar a lista de conferência e contar quantas palavras adequadas à normapadrão pegaram Podemos aumentar o baralho à medida que coletarmos mais palavras e podemos pensar em jogos grupais envolvendo escrita ou formulação oral de frases utilizando a palavra da carta se o grupo julgála adequada à normapadrão O professor também pode propor um quadro a ser completado no quadro branco de um lado palavras com escrita errada do outro palavras com escrita correta Depois de as duplas jogarem o professor pode pedir que cada dupla escreva no quadro da sala uma palavra errada e uma correta Dessa forma poderá refletir com a turma sobre a aparente regularidade entre as palavras que gerou a hipercorreção Então É só colocarmos a criatividade em ação Que tal esse tipo de atividade lúdica Atividades assim sempre se constituem em boa saída para desenvolver algumas aulas no fim do turno ou aulas próximas do fim de semana quando o aluno já está bem cansado Elas acabam sendo mais descontraídas e têm aparência de brincadeira Normalmente o aluno aprecia sair da rotina do livro didático e do caderno Vejamos alguns outros casos de hipercorreção 11 porque é muito importante ter informações do altor e dos acontecimentos 12 Todos escultam o programa com atenção até o fim 13 Todo fim de aula passamos na cantina para tomar solvete No exemplo 11 o aluno recuperou uma consoante velar l vocalizada ou seja ele lembrou que a palavra alto é escrita com l apesar de ser pronunciado um u na primeira sílaba Por isso ele realiza o raciocínio contrário se ele pronuncia a palavra autor com o som de u então ela deve ser escrita com l tal qual a palavra alto Há uma tendência a recuperar na língua escrita a letra l para transcrever um possível fone velar pósvocálico l som do l em final de palavra como produzido por alguns sulistas substituído em muitas variantes pela vocalização do l pronunciando a semivogal w na língua oral som da letra u átona No intuito de escreverem corretamente palavras que terminam com este som os alunos ficam inseguros quanto a sua grafia Como já existe a tendência de considerarem a letra u errada optam pela letra l e assim incorrem na hipercorreção como pode ocorrer com as palavras altoridade altomóveis e partil Já no exemplo 12 vemos um caso de inserção do l no interior de palavras A perda do l no interior das palavras é um fenômeno frequente na fala de muitas pessoas pelo fato de essas mesmas palavras terem o l vocalizado para w É o caso de colchão para coxão Observase por outro lado a inserção do l por hipercorreção no interior de palavras para que elas soem mais corretas despultando no lugar de disputando Em 13 houve a troca de r por l porque o aluno não queria cometer a usual troca de l por r característica de falares rurais e portanto bastante estigmatizada Enquanto as variedades mais urbanas tendem a vocalizar o l final nos falares rurais ele desaparece ou transformase em r como é o caso de qual para quar Na hipercorreção dáse justamente o contrário pelo medo de ser estigmatizado o falante tenta recuperar esse l de prestígio em contextos em que ele não existe Retomemos o exemplo 3 3 Ele dar comida aos peixinhos Aqui temos a recuperação do r em final de palavra Ocorre com frequência no Brasil a supressão do r final em praticamente todo o contínuo de variedades linguísticas faladas Lemle 1978 esclarece que essa supressão é um fenômeno verificado numa extensão geográfica ampla em se tratando de infinitivos verbais e de registro coloquial Como a frequência da queda do r é grande nos verbos seu uso hipercorreto também é expressivo O aluno procura se adequar aos padrões ensinados na escola adotando modelos de prestígio ele reconhece como erro de normapadrão a retirada do r no final de palavra passando a compensálo pelo acréscimo de r final em qualquer palavra que reconheça como verbo Por isso passa a escrever ele estar no lugar de ele está Porém apesar de encontrarmos esse tipo de problema de escrita das séries iniciais do ensino fundamental até o ensino superior não temos utilizado métodos eficientes para familiarizar o aluno com a regra Ele acaba por utilizála indiscriminadamente em qualquer contexto verbal Mattoso Câmara 1972 contribui com alguns exemplos quando diz que do esvaziamento do r resulta a frequente hipercorreção estar no lugar de está como em ele estar olhando os belos patinhos Mas essa recuperação pode ocorrer também nas outras classes gramaticais como em ater no lugar de até ou sofar no lugar de sofá Há ainda uma tendência à hipercorreção recuperandose o r no interior de palavras como em comerçava por começava Propomos outra atividade Bingo ortográfico o Elaborando as cartelas imprima tabelas diferentes com certo número de palavras ou expressões Todas elas devem possuir o mesmo número de palavras a serem encontradas No nosso exemplo figura 3 cada cartela possui 15 opções de palavrasalvo É recomendável o professor colar cada ficha em papel cartão garantindolhe maior durabilidade o Jogando podemos separar a turma em trios ou em duplas dependendo de quantas cartelas diferentes tivermos feito Entregar uma cartela e alguns grãos de feijão ou milho para que o grupo de alunos a marque O professor cantará a palavra expressão ou frase de duas formas algumas vezes falando naturalmente a palavra em voz alta em outras vezes mostrando uma imagem relativa à palavra A imagem em alguns casos é importante ALTORIDADE AUTORIDADE ele RlU BRASIL SAL ESCUTAM ESCULTAM ele DÁ esmola ele DAR esmola DEMOLIR eu LIR um livro ontem eu LI um livro ontem ATÉ ATÉR BATER Cartela 4 FALIR TERÇA eu SAÍ MOÇO CADARÇO SERGUNDA SEGUNDA PATAMAR CADÁVER Para eu ASSISTI ao filme preciso de dinheiro Se você CAIR levantese DAÍ PARTIR SAIR Para eu ASSISTI ao filme preciso de dinheiro Cartela 5 eu VI o menino ontem Se eu VIR o menino eu aviso você ele ESTÁ bem ele ESTAR bem para ele FICAR bem precisa da mãe AÍ AIR COMEÇAVA COMERÇAVA COMÉRCIO SOFÁ SOFAR MARÇO MORÇO MOÇO Cartela 6 COMEÇAVA COMERÇAVA GARFO BRASIL SAL SORVETE SOLVETE GALFO Ele DAR esmola DEMOLIR Para eu ASSISTIR ao filme preciso de dinheiro Para eu ASSISTI ao filme preciso de dinheiro MALDADE MAUDADE SAUDADE Vejamos agora alguns casos de hipercorreção relacionados a aspectos sintáticos 14 A praga que alastravase pelo pomar 15 Eu não lhe vi ontem 16 Esses foram os alunos que a diretora os entrevistou ontem Percebemos a hipercorreção na colocação pronominal sintaxe de colocação nas três frases apresentadas Em 14 vemos o seguinte na norma de maior prestígio a preferência de colocação pronominal é enclítica mas o português falado no Brasil rejeita essa tendência preferindo a próclise Na hipercorreção o falante ou o redator faz ao contrário coloca o pronome em posição de ênclise justamente nos casos em que a gramática normativa instrui uma colocação proclítica A hipercorreção de 15 é baseada no uso comum de Eu não vi ele ontem O brasileiro tem preferência na oralidade por usar os pronomes do caso reto em função de complementos verbais Como o uso dos pronomes oblíquos é raro na oralidade eles acabam sendo motivo de muita insegurança e por conseguinte de hipercorreção Assim outro uso hiper correto do pronome seria o de usar o pronome oblíquo lhe usado para substituir o complemento de um verbo transitivo indireto com verbo transitivo direto Quero lhe abraçar O exemplo 16 é outro caso parecido com o anterior e ocorre quando os pronomes oblíquos exercem a função de dar elegância e conhecimento à pessoa que os utiliza Assim encontramos tanto na oralidade como na escrita a repetição do complemento para que a frase se torne mais erudita A hipercorreção na concordância verbal e nominal sintaxe de concordância constitui outro grupo de hipercorreção que chama a nossa atenção por ser bem frequente nas produções dos nossos para não condicionar a resposta do aluno por exemplo numa palavra do tipo sorvete Numa região em que não se produz o r caipira o aluno logo identificará a ortografia correta Ao ouvir a ou ver a imagem da palavra ou expressão cantada os alunos devem verificar se a possuem em sua cartela e se a possuírem devem escolher a forma ortograficamente correta colocando o grão sobre o item escolhido Abaixo apresentamos algumas sugestões de cartelas Uma dificuldade interessante talvez seja não agrupar todas as palavras com aquelas que possivelmente contrastarão com a inadequação da hipercorreção Por isso insira algumas palavras que se assemelham à palavra hiper correta ou de contraste e que são corretas Apresentamos algumas sugestões de cartelas a seguir Cartela 1 exemplo de ficha com os grãos representados por X Para eu ASSISTIR ao filme preciso de dinheiro Semana passada eu ASSISTI ao filme ALTOR AUTOR X ALTO X AUTOMÓVEIS X ALTOMÓVEIS MALDADE X MAUDADE SAUDADE X ELE PARTIU X ELE PARTIL MOÇO MORÇO MARÇO Cartela 2 DESPULTANDO DISPUTANDO COMEÇAVA COMERÇAVA GARFO eu ASSISTI ao filme ontem eu ASSISTIR ao filme ontem SORVETE SOLVETE GALFO COMÉRCIO DESCULPANDO QUARTA SERGUNDA TERÇA Cartela 3 17 nós nos saímos bens 18 No meio do ano é época de comer pés de moleques todo dia 19 Eu comprei uns pães de sais na padaria 20 A gente já sabemos que os problemas mundiais 21 O casal não tinham a menor possibilidade de continuarem juntos 22 Haviam muitas pessoas na festa 23 Muitas coisas de importantes ocorreram em minha vida 24 Devemos ter amor em todas as pessoas Pensando nessas ocorrências precisamos reforçar ao ensinar a normapadrão os regimes dos verbos e nomes que aparecem nos textos que analisamos com os alunos ou naqueles que revisamos coletivamente Precisamos lembrar que informações muito óbvias básicas para nós talvez não o sejam para nossos alunos Além dessas atividades é interessante propor exercícios de reconhecimento de adequação à normapadrão Apresentamos uma proposta Treine seus conhecimentos linguísticos A normapadrão da língua portuguesa requer o conhecimento de usos gerais e específicos Por exemplo é necessário saber como concordar tanto nos casos de regra geral como nos casos especiais um verbo com o sujeito concordância verbal ou um nome com outro nome concordância nominal Também é necessário saber se há exigência ou não de uma preposição após um verbo regência verbal ou após um nome regência nominal Pensando nisso julgue as frases a seguir anotando um X dentro dos parênteses se a frase estiver escrita conforme os usos da língua padrão Nós nos saímos bem Nós nos saímos bens Eles têm que ser muito rápidos Eles têm que ser muitos rápidos Elas eram muito bonitas Elas eram muitos bonitas A gente perde tudo quando não valoriza o que ganha A gente perde tudo quando não valoriza o que ganhamos A gente perde tudo quando não valorizamos o que ganhamos A gente perdemos tudo quando não valorizamos o que ganhamos A gente sabe muitas coisas A gente sabemos muitas coisas O casal não tinha a menor possibilidade de continuar junto O casal não tinham a menor possibilidade de continuarem juntos É necessário que hajam provas É necessário que haja provas Havia muitas pessoas na festa Haviam muitas pessoas na festa Muitas coisas importantes ocorreram em minha vida Muitas coisas de importantes ocorreram em minha vida As razões são sempre diferentes uma das outras As razões são sempre diferentes de uma das outras Devemos ter amor por todas as pessoas Devemos ter amor em todas as pessoas Estava ligado na tv na expectativa de ver um bom programa Estava ligado na tv de expectativa de ver um bom programa Nesse tipo de atividade levamos os alunos à utilização da gramática como fonte de resolução dos problemas linguísticos relacionados à normapadrão bem como do dicionário Se for possível pegue os dicionários da biblioteca escolar e leveos para consulta em sala durante a atividade Temos que ter o cuidado de apresentar exemplos semelhantes inseridos em textos até porque o aluno não escreve frases isoladas e sim textos 4 Como traçar novos caminhos no ensino de língua materna Na medida em que os professores de língua materna têm conhecimentos linguísticos sobre as diferenças existentes no contínuo das variedades da mais padrão à menos padrão reconhecem as variantes manifestas nos textos produzidos pelos alunos A percepção das variantes caracterizadas por aspectos ora de cunho fonológico morfológico sintático ou de outra natureza possibilitará ao professor graduar as dificuldades a serem trabalhadas na aprendizagem da normapadrão no decorrer de toda a escolarização A hipercorreção deve ser cuidadosamente trabalhada e diagnosticada para minimizar a distância entre a variedade mais padrão e a variedade menos padrão sem demonstrar desprezo pelo registro do aluno a fim de não impedilo de se expressar oralmente ou por escrito em sua variedade materna A aprendizagem da normapadrão deve ser implementada de forma segura e contextualizada para não criar insegurança linguística no educando principalmente naqueles vindos das classes sociais menos escolarizadas Para que o aluno aprenda a normapadrão de maneira segura é necessário que algumas medidas sejam tomadas É sobre algumas dessas medidas que refletiremos agora 41 Apresentar os dois modelos que geram dúvidas 25 Eu fui corajoso e entrei na casa abandonada A casa estava coberta de teia de aranha e quase todas as telhas estavam quebradas Quando for apresentar algum texto ou exercício de hipercorreção aos alunos o professor deve ter o cuidado de incluir palavra expressão ou frase que apresente o fone a sílaba ou o conjunto de palavras sintagma que desencadeia o fenômeno Dessa forma os possíveis usuários da hipercorreção perceberão que há um duplo uso daquele ente linguístico do qual ele julgava haver apenas um único uso Por exemplo a presença das expressões telha de barro e teia de aranha num mesmo texto pode suscitar um ótimo aprendizado para um usuário de hipercorreção O professor pode incluir essas expressões num texto a ser revisado pela turma com a mediação do professor ou pode incluílas num texto de leitura cuja escrita é pressuposta como padrão Tanto no primeiro caso como no segundo o aluno que comete esse tipo de hipercorreção desconfiará de que a expressão teia de aranha está errada Se nem ele nem outro aluno manifestar a dúvida em voz alta o professor deve apresentála à turma Telha de barro e teia de aranha Será que uma das duas escritas está errada A palavra telha existe A palavra teia existe Existe outra maneira de pronunciar a palavra telha Existe outra maneira de pronunciar a palavra teia Quais outras palavras são parecidas com essas E assim por diante até que fique bem claro para o aluno que as duas formas ocorrem na escrita e designam palavras diferentes mas na fala as duas pronúncias se igualam caso o falante use uma norma não padrão na qual não haja a presença do fone representado pelo dígrafo lh em palavras como muiémulher cuiécolher teiatelhateiateia etc 42 Estimular os alunos a produzirem textos orais e escritos Uma das atividades que o professor pode realizar para intensificar a segurança linguística do aluno pode ser a gravação de conversas seguida de sua análise linguística A escuta de textos gravados em situações autênticas de interlocução pode ajudar o aluno a entender o caráter social do discurso Sempre que essas conversas apresentarem erros de hipercorreção devemse salientar os acertos comunicativos que o produtor do texto analisado realizou a adequação do texto à situação por exemplo Em qualquer língua podemos escolher entre usos mais formais ou menos formais Mas essa escolha não é totalmente livre Ela é condicionada pelas normas que definem quando e onde é adequado usar linguagem informal não monitorada e quando e onde se espera que os participantes da interação usem linguagem formal monitorada Outros aspectos devem ser igualmente analisados como o gênero e tipo textuais requeridos a argumentação utilizada entre outros O importante é que a turma identifique também os acertos do texto e não somente os erros pois assim o produtor do texto não será estigmatizado e sendo o texto produzido ou não por alguém da sala não haverá constrangimento Após a escuta e análise do texto gravado o professor poderá realizar uma atividade de escrita com os alunos como transcrição e retextualização de partes do texto Sempre que promover uma atividade de escuta de leitura ou de análise linguística é interessante que ela culmine na produção de um texto cujo gênero deve corresponder àquele trabalhado Por isso é interessante propor aos alunos situações reais ou imaginárias levandoos a produzirem gêneros orais e escritos tanto em contextos monitorados quanto em contextos não monitorados Entretanto é importante atentar para a recomendação de só pedir a produção de determinado gênero depois de ler e analisar com a turma um texto exemplar daquele gênero Ao longo do ano os alunos devem produzir vários textos orais e escritos devendo também ter um feedback do professor Toda produção de texto oral ou escrita deve ser previamente preparada ou seja o aluno deve ter sido exposto a um gênero semelhante ao que lhe será pedido Por exemplo o professor só deve pedir uma carta de leitor se já tiver apresentado o gênero aos alunos só deve solicitar um jornal falado se eles já tiverem analisado algum anteriormente Em se tratando de textos orais devemos levar nossos alunos a planejarem a fala de acordo com a situação comunicativa a utilizarem a variedade linguística adequada à situação de interlocução valorizando seu próprio repertório linguístico a monitorarem seu desempenho oral e quando necessário reformularem o planejamento prévio Brasil 1998 Ou seja o professor deve estar sempre atento para desenvolver a flexibilidade comunicativa e a segurança linguística do aluno Já no processo de produção de textos escritos é urgente levar os alunos a redigirem diferentes tipos de textos estruturandoos adequadamente quanto ao tema à progressão temática aos propósitos do texto explicitaram as informações indispensáveis à interpretação utilizarem recursos coesivos adequados bem como elementos lexicais sintáticos figurativos e ilustrativos ajustandoos às circunstâncias formalidade e propósitos da interação utilizarem de acordo com o gênero e com as condições de produção os padrões da escrita de forma proficiente analisarem e revisarem o próprio texto segundo a finalidade do texto e o destinatário Brasil 1998 A produção contínua de texto e sua reescrita corrigirá não apenas os problemas de hipercorreção dos alunos mas aumentará significativamente o letramento deles Muitos são os gêneros que poderemos pedir em sala de aula canção textos dramáticos notícia entrevista debate depoimento exposição seminário crônica conto poema notícia artigo carta do leitor entrevista relatório resumo esquema etc Os Parâmetros Curriculares Nacionais de 1998 recomendam que o professor trabalhe com dois eixos básicos no ensino de língua portuguesa o uso da língua oral e escrita e a reflexão sobre a língua e a linguagem O aluno sempre deverá ser levado a produzir leitura e escrita após analisar a língua em uso Essa análise deve ser mediada pelo professor e é por meio dela que o aluno se confrontará com os mais diferentes modos de falar e escrever Devemos selecionar estrategicamente textos compreensíveis aos alunos e pertencentes aos mais diversos gêneros de preferência os mais presentes e necessários à realidade deles Nesse processo de análise linguística devemos planejar as aulas objetivando que o aluno o constitua um conjunto de conhecimentos sobre o funcionamento da linguagem e sobre o sistema linguístico relevantes para as práticas de escuta leitura e produção de textos o se aproprie dos instrumentos de natureza procedimental e conceitual necessários para a análise e reflexão linguística delimitação e identificação de unidades compreensão das relações estabelecidas entre as unidades e das funções discursivas associadas a elas no contexto o seja capaz de verificar as regularidades das diferentes variedades do português reconhecendo os valores sociais nelas implicados e consequentemente o preconceito contra as formas populares em oposição às formas dos grupos socialmente favorecidos Brasil 1998 52 43 Ensinar os alunos a usarem o dicionário e a gramática em sala de aula Nas aulas iniciais de prática de recepção de texto devemos incluir a prática de leitura de dicionários e gramáticas Essa é uma prática imprescindível não só para aqueles que cometem hipercorreção mas para todos os alunos Saber ler esse tipo de texto faz parte das competências de um leitor proficiente Por meio dessa atividade o aluno deve ser levado a compreender que a leitura de uma notícia é diferente da leitura de um romance que também é diferente da consulta a um dicionário ou a uma gramática Cada gênero textual possui características específicas por isso é importante considerar suas especificidades tendo como ponto de referência suas condições de produção seu uso social e seu funcionamento A gramática e o dicionário são gêneros que requerem a leitura tópica que leva a identificar informações pontuais no texto É esse tipo de leitura que fazemos quando consultamos um verbete no dicionário ou enciclopédia ou uma informação específica na gramática Esse tipo de leitura só deve ser feita quando o leitor precisa agregar mais referencialidade ao texto que está lendo por não possuir conhecimento discursivo linguístico ou informação essencial para a recuperação dos sentidos do texto Esperase que com o constante uso de dicionário e gramática o aluno consiga discernir os momentos em que precisa ou não consultálos tanto para a recepção quanto para a produção de textos Assim ampliará seu repertório lexical produzindo textos ortograficamente corretos e resolvendo dúvidas relacionadas a diversas irregularidades na língua inclusive relacionadas à hipercorreção Porém como afirma Irandé Antunes 2007 não se deve confundir o estudo da nomenclatura gramatical com o estudo da gramática Saber gramática vai além de ser competente em nomear as suas unidades e categorias O professor deve atribuir à nomenclatura gramatical uma função apenas suplementar A nomenclatura gramatical um saber metalinguístico nomeia as unidades da língua mas não tem um fim em si mesma No entanto é importante chamar as unidades da língua por seus nomes técnicos nas atividades de reflexão linguística Gradativamente o professor deve acostumar seus alunos com alguns termos mais técnicos nas aulas de análise linguística A utilização constante de uma tabela de correção de textos com acréscimos gradativos de nomeação mais técnica é uma boa ideia 44 Tornar os alunos proficientes na leitura Quanto mais o aluno ler mais seguro ficará diante da normapadrão Devemos selecionar no nosso planejamento anual textos representativos dos mais diversos gêneros textuais trabalhar com textos que façam sentido para os alunos que despertem interesse e que tenham funcionalidade É bastante desejável que nos empenhemos em encontrar textos que possibilitem trabalhar com os temas transversais ética pluralidade cultural meio ambiente saúde orientação sexual trabalho e consumo Há uma probabilidade ínfima de um leitor proficiente cometer hipercorreções Por isso a leitura deve ter o maior espaço possível na aprendizagem da língua Devem ser realizadas aulas específicas de leitura em que o professor apresentará determinado gênero textual uma carta de leitor por exemplo Para levar o aluno a perceber o contexto desse tipo de gênero textual podemse fazer perguntas como quem escreveu esse texto para quem e com qual finalidade Qual texto anterior motivou a escrita deste Qual tipologia textual predomina no gênero carta de leitor narração exposição argumentação injunção Como o escritor organizou seus argumentos Qual a posição dele em relação ao assunto Se forem duas opiniões elas são concordantes ou não O texto está escrito em linguagem formal ou informal Por quê O texto está escrito de acordo com a normapadrão ou está parecido com a fala do dia a dia português vernacular A linguagem está adequada para o público que vai ler este texto E assim por diante até que os alunos percebam que há uma estreita relação entre a linguagem a situação os interlocutores e o lugar em que o texto circula O professor deve realizar aulas de leitura sempre que possível variando o gênero a tipologia textual e o grau de formalidade apresentando desde textos formais até textos de extrema informalidade como por exemplo a leitura de artigos da Constituição Brasileira e uma conversa na internet entre dois amigos Os alunos devem ser capazes de identificar o contexto de produção textual reconhecendo a estrutura padrão ou o tipo do gênero textual Recomendamos a leitura das páginas 49 a 65 dos Parâmetros Curriculares Nacionais nas quais estão elencados os objetivos e conteúdos do ensino de língua portuguesa com sugestões de gêneros que poderão ser utilizados Quando o professor propuser gêneros informais pode enxertar algumas hipercorreções caso não haja textos genuínos e durante a análise linguística quando os alunos apontarem o problema o fenômeno deve ser comentado salientandose que essa forma de fala ou de escrita é muito comum e é resultado do conhecimento insuficiente da normapadrão Quanto mais leitura o aluno tiver mais familiarizado ficará com a língua inclusive com sua variedade padronizada o que o tornará mais seguro linguisticamente 45 Trabalhar com o processo de reescrita dos textos Os alunos precisam produzir e reescrever muitos textos ora coletiva ora individualmente mas sempre em atividade mediada pelo professor O processo de produção de textos escritos precisa estar claro tanto para o docente quanto para os discentes afinal a boa escrita é processual ela não surge pronta O professor deve acostumar seu aluno a prever os seguintes passos sempre que for produzir um texto primeiro ele vai estabelecer o tema de acordo com a situação proposta depois começará a levantar ideias e dados por meio de leitura ou de outro tipo de pesquisa depois que obtiver material informativo fará um planejamento de escrita conforme a estrutura do gênero solicitado Só então começará a escrever de fato Porém esse primeiro escrito será apenas o rascunho a primeira versão de muitas Além de já estar revisando a própria escrita enquanto produz o rascunho o aluno sabe que o professor fará uma intervenção apontando os problemas de ordem discursiva textual gramatical e convencional Quando receber o rascunho com os apontamentos do professor escreverá a segunda versão do texto que será entregue novamente ao professor para outra revisão Estando apta a segunda versão poderá ser considerada final caso contrário o aluno fará uma terceira versão de acordo com os novos apontamentos do professor E assim o processo seguirá até que o professor considere o texto a versão final Os alunos devem se acostumar a redigir seus textos quantas vezes forem necessárias até que possam ser considerados textos bem escritos No que tange à hipercorreção o professor deve estar alerta a todo desvio acompanhando atentamente a reescrita do aluno Se possível deve preparar uma ficha de acompanhamento para esse aluno e registrar as hipercorreções produzidas por ele tanto em textos orais quanto escritos Se o aluno for um caso particular na turma deve ser destinado a ele um tempo maior para ajudálo na reescrita do texto ou para alertálo sobre a hipercorreção na fala Se vários alunos manifestam o problema deve ser feito um registro das ocorrências a fim de enxertálas em textos para análise ou exercícios coletivos No trabalho de reescrita podese conduzir a turma para a construção de uma tabela com critérios que serão utilizados na correção dos textos estabelecendose códigos para os principais problemas textuais e linguísticodiscursivos Os alunos precisam perceber o texto como um todo mas também precisam perceber as questões linguísticas e discursivas que serão estudadas durante o processo de análise do próprio texto Com a mediação do professor eles aprenderão não só um conjunto de instrumentos linguísticodiscursivos como também as técnicas de revisão que envolvem rasuras substituições e exclusões Progressivamente essa prática tornará os alunos hábeis na autocorreção Junto a isso também pode ser negociada com os alunos a possibilidade de textos ou excertos produzidos por eles para serem corrigidos coletivamente mediados pelo professor Dessa maneira serão trabalhados tanto os aspectos relacionados às características estruturais dos diversos tipos eou gêneros textuais como os aspectos gramaticais necessários para instrumentalizar o aluno no domínio da modalidade escrita da língua Além disso poderão ser focalizados nas atividades os desvios linguísticos apresentados pelos alunos ajustandose os conteúdos previstos à necessidade da turma No entanto em toda e qualquer atividade de análise ou revisão coletiva devemos ter o cuidado de nunca expor o aluno a constrangimentos O melhor é sempre descaracterizar o texto do aluno a fim de que ele mesmo duvide de que o texto apresentado para a turma seja o seu Podemse também mesclar partes dos textos e construir um texto com características específicas para uma aula um texto com mais casos de hipercorreção outro com mais casos de concordância verbal inadequada etc Vejamos a seguir alguns procedimentos sugeridos pelos PCN Brasil 1998 80 para a realização dessa tarefa Seleção de um dos textos produzidos pelos alunos que seja representativo das dificuldades coletivas e apresente possibilidades para discussão dos aspectos priorizados e encaminhamento de soluções Apresentação do texto para leitura transcrevendoo na lousa reproduzindoo usando papel transparências ou o computador Análise e discussão de problemas selecionados Em função da complexidade da tarefa não é possível explorar todos os aspectos a cada vez Para que o aluno possa aprender com a experiência é importante selecionar alguns propondo questões que orientem o trabalho A revisão exaustiva deve ser reservada para situações em que a produção do texto esteja articulada a algum projeto que implique sua circulação Registro das respostas apresentadas pelos alunos às questões propostas e discussão das diferentes possibilidades em função de critérios de legitimidade e de eficácia comunicativa Nesta etapa é importante assegurar que os alunos possam ter acesso a materiais de consulta dicionários gramáticas e outros textos para aprofundamento dos temas tratados Reelaboração do texto incorporando as alterações propostas 5 Palavras finais Cabe a nós professores ensinar nossos alunos de uma maneira clara e cooperativa de forma a lhes propiciar maior segurança linguística eliminando a hipercorreção Temos que leválos a perceber que os conhecimentos da gramática normativa não devem ser decorados nem vistos como fins em si mesmos mas como uma fonte de consulta que vai ajudálos a tirar suas dúvidas de língua quando for requerida a normapadrão Mais do que propor regras temos que mostrar como uma palavra verbo conjunção adjetivo etc tem uma função e cria determinados efeitos de sentido no texto temos de mostrar que os recursos coesivos devem ser utilizados para garantir a coerência do texto oral ou escrito Trabalhar com textos implica também considerar a genericidade além da variação para a adequação à situação e mostrar sempre como esse processo ocorre em situações reais de interação e com uma função social É igualmente importante a escola favorecer a produção e a utilização das múltiplas linguagens das expressões e dos conhecimentos históricos sociais científicos e tecnológicos sem perder de vista a autonomia intelectual do aluno e sem esquecer que a leitura é a responsável por familiarizar o aluno com a língua e com as diversas estruturas coesivas do texto É fundamental a leitura ter um lugar de destaque em nossa prática pedagógica uma vez que o texto escrito constitui principalmente em comunidades de tradição oral como o Brasil o maior obstáculo ao sucesso escolar Um aspecto essencial para tornar o aluno linguisticamente seguro é respeitálo em sua diversidade linguística e cultural O aluno não deve ter vergonha de seu jeito de falar O professor deve trabalhar em perspectiva cultural e usar o conceito de competência comunicativa propondo a adequação da linguagem às diversas ocasiões e situações É assim que ensinará o educando a reconhecer características contextuais e a desempenhar papéis verbais de acordo com estas É necessário levantar o perfil sociolinguístico do educando pois ele servirá de base para a formulação de uma política pedagógica que ao garantir o acesso do aluno à normapadrão respeite suas peculiaridades culturais e lhe garanta a segurança necessária para usar sua língua materna 1 Exemplo retirado do site Sua Língua por Cláudio Moreno Disponível em httpwpclicrbscombrsualingua20090511hipercorrecaotopo Acesso 01092014 2 Exemplo retirado do blogue do Berned Disponível em httpblogdobernedblogspotcom200906hipercorrecaohtml Acesso 01092014 3 Exemplo retirado de M E Bortone Análise da produção textual de alunos do ensino fundamental do Distrito Federal in BortoniRicardo et al 2009 4 Disponível em httpwwwportuguesegramaticacombrmediabagno34tragoutrazidotempodirapdf Acesso em 01092014 5 Com relação aos verbos abundantes como regra variável em processo de mudança ver Evani Viotti Mudança linguística in José Luiz Fiorin org Linguística Que é isso São Paulo Contexto 2013 p 137179 6 Foram analisadas hipercorreções decorrentes da transposição dos hábitos da fala para a escrita As inadequações cometidas na língua oral são transpostas nessa etapa de escolarização para a língua escrita Os dados foram retirados do artigo de Marcia Elizabeth Bortone 2010 e adaptados Predicados complexos são aqueles formados por um verbo auxiliar e o verbo principal Padlet Marina Lima 1m O FENÔMENO DA HIPERCORREÇÃO Marcia Elizabeth Bortone e Scheyla BritoAlves s Marcia Elizabeth Bortone e Scheyla BritoAlves DOC O fen meno da hipercorre o Bortone Alves 2 converted docx Share your ideas and comment on others O fenômeno da hipercorreção algo muito frequente na fala das pessoas que se preocupam de forma demasiada com o uso na norma considerada padrão Adicionar comentário Os principais casos de hipercorreção ocorrem em relação ao uso dos verbos e suas conjugações em tempos verbais como também em relação ao uso do plural em substantivos ou seja na concordância verbal e nominal Adicionar comentário Uma das propostas utilizadas para solucionar esse problema dos alunos é a atividade de bingo ortográfico além do estímulo à produção de textos escritos e orais como também sua reescrita e estimulando o gosto pela leitura mas sempre respeitando as diferenças linguísticas de cada um dos alunos Adicionar comentário As autoras afirmam que a hipercorreção é um fenômeno comum em falantes que estão em processo de ascensão social ou cultural Esses falantes ao entrarem em contato com a norma padrão passam a ter consciência da existência de outras formas de falar que são vistas como mais prestigiadas Adicionar comentário Senhora nós vamos estar enviando Adicionar comentário Hoje meu filho de 3 anos falou que estava com dor de braço Soou engraçado claro porque não falamos assim Falamos dor de cabeça dor de barriga dor de dente mas dor NO braço Por quê Adicionar comentário hipercorreção nome feminino 1 LINGUÍSTICA Fenômeno que consiste na procura excessiva de correção que leva o falante de uma língua à substituição de uma forma correta por uma forma incorreta que o falante supõe ser a mais cul Adicionar comentário Ele veio cobrar uma conta que eu já tinha pagado pago Adicionar comentário VOCÊ SOFRE DE INADEQUAÇÃO DA LINGUAGEM E NÃO VOU ESTAR TENDO CURA DOUTORA Adicionar 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