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Cursos Gerais ·
Psicologia Social
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Ribeiro et al 2016 Ser adolescente no século XXI In Levenfus R S org 2016 Orientação vocacional e de carreira em contextos clínicos e educativos Porto Alegre Artmed SER ADOLESCENTE NO SÉCULO XXI MARCELO AFONSO RIBEIRO MARIA DA CONCEIÇÃO COROPOS UVALDO GUILHERME FONÇATTI DÉBORA AMARAL AUDI MARCELO LÁBAKI AGOSTINHO YARA MALKI Globalização desenvolvimento de tecnologias de comunicação e de armazenamento de informações mudanças sociais marcantes e flexibilização laboral geraram uma fragilização das estruturas sociais vigentes com consequências diretas e profundas sobre as pessoas e seus projetos de vida A orientação profissional e de carreira como área de pesquisa e atuação defrontase nesse cenário com a premência de repensar suas teorias e práticas Guichard 2012 partindo necessariamente do entendimento não apenas dessas mudanças mas principalmente do impacto delas nas pessoas Neste capítulo centraremos nossa atenção no adolescente principal alvo de nossas práticas Ser adolescente no século XXI tem se mostrado um desafio importante para todos para o mundo adulto no qual é necessário lidar com padrões de referência e modelos de ação no mundo muito distintos dos seus para o Estado que tem no adolescente um problema central em termos de formação inserção no mercado de trabalho sexualidade saúde segurança consumo e família e para o próprio adolescente que tem de lidar com um mundo adulto que lhe dá poucas referências e modelos que muitas vezes são confusos ambíguos e contraditórios e se vê compelido a praticamente criar referências e construir formas de ser em um mundo contemporâneo caracterizado como complexo heterogêneo e flexibilizado Quem são esses adolescentes de hoje O que as pesquisas nos mostram sobre eles Lançado o desafio este capítulo longe de oferecer uma resposta única e conclusiva tem como objetivo refletir sobre essa questão apresentando se possível questões que possam auxiliar nas pesquisas e discussões dos profissionais da área de orientação profissional e de carreira EM BUSCA DO CONCEITO DE ADOLESCÊNCIA Vários campos do saber por motivos distintos dedicaramse a compreender a adolescência e produzir teorias e conceituações visando a elaborar definições que abrangessem a temática adolescente Entre as quais citamos a ordenação jurídica e legal como o ECA Estatuto da Criança e do Adolescente no direito o estudo do desenvolvimento biológico e psicológico individual na medicina e na psicologia do desenvolvimento a tipificação dos jovens em grandes grupos homogêneos como são as propostas da Geração Y 1980 a 2000 e da Geração Z 2000 em diante oriundas da administração a compreensão da juventude como grupo ou condição social na sociologia ou como identidade e papel psicossocial na psicologia social Segundo Matheus 2007 etimologicamente adolescência vem de adolescere que significa desenvolverse ou crescer entretanto também guarda relação com addolescere que significa adoecer É devido a isso que se tem a ideia de crise para definir a adolescência Na tradição mais biológica e psicológica individual a adolescência tem início com a puberdade e se encerra com a possibilidade de assumir papéis sociais adultos Além disso ela é caracterizada pela universalidade das transformações biológicas e psicológicas Erikson 1976 define adolescência como a transição da infância à vida adulta basicamente marcada por uma moratória psicossocial ou seja pela liberdade para experimentar livremente papéis sexuais sociais e ocupacionais até definirse Constitui se como uma crise normativa que ocorreria entre os 12 e 18 anos em que a pessoa em desenvolvimento teria de resolver o dilema central entre construir uma identidade e viver uma difusão de papéis sendo o modelo de construção identitária marcado pela escolha e a reprodução de referências sociais identidade como reprodução Knobel 1981 postulou a existência de uma Síndrome da adolescência normal na qual alguns padrões e comportamentos psicopatológicos são esperados e considerados normais para a vivência da adolescência e para a sua estabilização em um momento de busca identitária carga emocional intensa autocentramento angústia extrema e criatividade Já Aberastury 1981 centra sua compreensão da adolescência como um período marcado pela vivência de perdas e lutos gerados pelo desamparo da desidealização das figuras parentais e da ruptura da onipotência Carvajal 1998 concebe a adolescência como um grupo de fenômenos que eclode em um dado momento da vida até a consolidação da vida adulta definida pelo trabalho pela independência e pela intimidade Caracterizada pelo enlace entre mudanças biológicas psíquicas e sociais a adolescência é uma etapa importante do desenvolvimento e fundamental para os processos de escolha profissional Para esses autores portanto esse período envolve uma grande crise com desestruturações e reestruturações de personalidade principalmente no tocante à crise de identidade necessidade de ser ele mesmo à crise de autoridade enfrentamento de normas ou imposição de modelos e à crise sexual posicionamento sexual e de gênero sem estabelecer faixas etárias determinadas As ciências sociais têm abandonado a ideia de adolescência e utilizado o termo juventudes no plural para indicar que não se trata de uma fase normativa do ciclo vital nem estaria psicológica e biologicamente determinada Contudo a fase se configuraria como condições psicossociais de vida fortemente marcadas pelos backgrounds socioeconômicos e culturais da pessoa em desenvolvimento e não obedeceria obrigatoriamente a uma cronologia de vida nem existiriam posições e conquistas sociais claras como anteriormente eram a formação educacional e profissional a inserção no mercado de trabalho e a constituição da família tornando a separação entre juventude e vida adulta mais complexa Camarano 2006 Coimbra Bocco Nascimento 2005 Dayrrel 2003 Guimarães 2004 Organização Internacional do Trabalho OIT 2009 A psicologia social por sua vez busca relacionar a psicologia mais individual com a sociologia e compreender como se processa a construção de si mesmo e a construção identitária nas variadas relações que cada jovem produz com o mundo Tais relações se dão a partir das referências legitimadas que o mundo disponibiliza para cada um e que sofrem restrições e possibilidades sociais econômicas e culturais Dessa maneira é possível afirmar que a adolescência é mais construída do que psicológica ou biologicamente determinada ou seja o adolescente cria sentido sobre si e constrói um lugar para si no mundo de referências sociais Bock Liebesny 2003 Bohoslavsky 1983 Dubet 1998 Lehman Uvaldo Silva 2006 Ribeiro 2011 Por último a administração e parte da psicologia organizacional e do consumidor têm produzido tipificações dos jovens em grandes grupos homogêneos como estratégia de compreensão de suas vivências Isso resultou nas propostas da Geração Y relativa aos nascidos entre 1980 e 2000 e a atual Geração Z relativa aos nascidos depois de 2000 que em sua grande maioria ainda não chegaram às universidades e ao mundo do trabalho Ramos Casa Nova Carvalho 2012 Diante de um mundo flexibilizado complexo e heterogêneo conforme anteriormente descrito partilhamos da noção de que independentemente de definirmos como adolescência ou juventudes o fenômeno sobre o qual nos propusemos a fazer uma reflexão o adolescente ou o jovem vive um momento marcado pela transição de modelos no qual velhos modelos ainda existem e novos modelos ainda não se consolidaram Essa transição relega o sujeito a experienciar desafios sociolaborais e culturais ambíguos e contraditórios que não guardam relação direta com os modelos adultos consolidados gerando mais dúvidas e incertezas do que garantias Salientamos que ao entender a adolescência ou a juventude como um processo necessariamente atravessado pelas condições sociais econômicas e culturais não podemos negar que parte da população não passa pelos processos ou apresenta as características descritas sendo que em alguns casos a passagem da infância para o mundo adulto ocorre diretamente adolescência amputada como denomina Carvajal 1998 Contudo as mudanças sociais e o mundo do trabalho afetam a todos direta ou indiretamente de formas possivelmente diferentes e com menor ou maior intensidade ADOLESCÊNCIA NO SÉCULO XXI Atualmente ser adolescente é viver em um mundo em transição com variados modelos sociolaborais de referência para guiar a construção da vida tanto aqueles mais tradicionalmente constituídos quanto os mais contemporâneos Birman 2006 Lehman et al 2006 Por exemplo trabalhar em boa parte do século XX se resumia basicamente a ter uma boa formação conseguir um bom emprego e mantêlo até o final da vida em uma situação que possibilitava certa previsão do futuro No entanto hoje além desses aspectos trabalhar também é não ter clareza se a formação é suficiente é mudar constantemente de emprego trabalho cidade e muitas vezes de profissão e nunca ter segurança estabilidade e continuidade definitivas como nos modelos anteriormente predominantes constituídos ao longo do século XX Castel 2009 Sennett 1998 2006 Touraine 2006 Além disso não é somente na dimensão do trabalho que mudanças aconteceram pois as referências de família gênero sexualidade formação cronologia da vida e modelo de vida adulta estão igualmente flexibilizadas o que coloca desafios enormes tanto para os adolescentes quanto para os adultos Isso ocorre porque os primeiros não têm mais referências adultas seguras e predominantes às quais se basear na construção de suas vidas ao mesmo tempo em que os últimos não conseguem oferecer modelos aos adolescentes ou seja a estrutura social oriunda da tradição não responde mais totalmente à organização e normatização da vida sociolaboral Birman 2006 Duarte 2009 Lipovetsky Serroy 2011 Essa situação promove por um lado uma situação de sofrimento e angústia pela falta de referências mas por outro lado propicia um espaço maior de abertura e criação em termos psicossociais principalmente para os adolescentes subjetivos identitários e sociais Isso tudo é muito distinto da tradicional reprodução de modelos adultos configurada basicamente ao longo do século XX Giddens 2002 Ribeiro 2014 Silva 2005 George Mead importante pensador do campo da psicologia social postulou nos anos 1950 que a base para a construção de si em termos da subjetividade das identidades construídas e dos papéis sociais incorporados seria o outro generalizado Esse conceito pode ser entendido como o modelo de referência adulto ao qual a pessoa em desenvolvimento deveria se basear para a construção de si e de suas ações no mundo marcado pela ordem social vigente e que demandava uma reprodução de modelos para o reconhecimento de si Mead 1953 sendo que tudo que não obedecia claramente a esses modelos era considerado desviante Becker 2008 O reconhecimento de si como adulto por exemplo se dava a partir da conquista de realizações e posições sociais cronologicamente determinadas ou seja a passagem da adolescência para a vida adulta acontecia progressivamente pela finalização da formação educacional e profissional pela obtenção de um emprego e pela constituição da própria família conferindo ao sujeito independência e lugar social próprios Calligaris 2000 OIT 2009 Malo 2007 atualizando Mead 1953 aponta que o mundo contemporâneo tem oferecido múltiplas referências significativas e legitimadas psicossocialmente para guiar a vida das pessoas constituindose em verdadeiros outros generalizados ou referências múltiplas e plurais Dessa forma não existe plenamente uma única referência a seguir devido ao reconhecimento social de mais de uma referência como legítima e aceita o que torna a tarefa de transição para a vida adulta mais complexa No campo do trabalho por exemplo a tarefa básica para o adolescente era escolher um curso de formação técnico ou superior dependendo de suas condições socioeconômicas e conseguir e manter um emprego na sua área de atuação Atualmente esse modelo ainda é vigente entretanto não se configura como modelo predominante nem como o mais valorizado socialmente pois concorre com outros modelos que falam sobre a insuficiência da formação para a atuação no mercado de trabalho a necessidade de aprendizagem contínua e a mudança constante a relativa descartabilidade das pessoas a existência e a consolidação de outras formas de vínculo ao mercado de trabalho terceirização teletrabalho microempreendedorismo individual e a demanda pelo desempenho de várias funções em vários locais de trabalho simultaneamente polivalência e multifuncionalidade É esse contexto sociolaboral que o adulto não compreende plenamente nem consegue contribuir como modelo para o adolescente OIT 2009 Ribeiro 2014 Sennett 2006 Assim diante desse breve quadro apresentado a própria compreensão da adolescência se torna complexa e conceitos e teorias têm sido problematizados entre eles a questão de devermos ou não pensar em adolescência da forma como é classicamente postulada na psicologia A adolescência para a psicologia é uma fase normativa do ciclo vital psicológica e biologicamente determinada marcada por crises principalmente sexuais e identitárias entre elas a crise vocacional e ocupacional Bohoslavsky 1977 Esta última teria como principal função a preparação para a vida adulta como definiram autores clássicos da temática adolescente Aberastury 1981 Erikson 1976 Knobel 1981 O QUE É SER ADOLESCENTE NO SÉCULO XXI Para responder a essa pergunta apresentaremos e discutiremos o pensamento e propostas de alguns autores contemporâneos acerca da experiência de ser adolescente no século XXI sintetizados em cinco eixos 1crise do mundo adulto 2impulsividade e falta de limites 3individualização da vida 4multiplicidade de referências legitimadas 5dificuldade de se projetar no futuro CRISE DO MUNDO ADULTO COMO MODELO INDEFINIÇÃO DO QUE É SER ADOLESCENTE E DO QUE É SER ADULTO Um aspecto a ser considerado nesta reflexão é a supervalorização da chamada juventude nas sociedades capitalistas atuais Juventude hoje é um bem a ser mantido e cultuado e portanto a ser prolongado com o auxílio das conquistas da medicina que aumentaram significativamente o tempo e a qualidade de vida Birman 2006 p 25 aponta que a temporalidade da juventude modificouse de forma significativa então seja na transformação da infância que a precede seja na vida adulta que a sucede gerando um alongamento da adolescência por seu início antecipado e sua finalização estendida e indefinida As consequências diretas disso são a desvalorização da maturidade e da velhice entendidas como diminuição da produtividade ou estagnação e o encurtamento da infância e da velhice A luta contra a passagem do tempo é uma das características marcantes em nossa sociedade o corpo moldado em academias cirurgias rejuvenescedoras padronização da forma de se vestir as crianças sendo vestidas como adolescentes precocemente e a ausência quase absoluta de roupas desenvolvidas para a chamada terceira idade A consequência disso para o mundo do trabalho é clara O tempo cronológico e as marcas da maturidade e da velhice devem ser apagados e o desenvolvimento parado Em contrapartida o desenvolvimento tecnológico propõe um tempo presente absoluto não é necessária a espera pois a informação é instantânea As relações podem ser mediadas pelo computador pelas redes sociais as informações e as relações são virtualizadas ou seja se tornam não presentes submetendo a narrativa à prova de uma unidade de tempo sem unidade de lugar Dessa maneira essa nova configuração de tempoespaço produz uma nova construção da subjetividade Nesses moldes para Calligaris 2000 a adolescência deve ser concebida como tempo de suspensão na tentativa de tornar o adolescente independente que tem condições de ser adulto mas não está autorizado psicossocialmente a sêlo ou seja um tempo de transição com duração desconhecida gerador de frustação pela moratória e a imposição de uma felicidade pela idealização da adolescência No entanto a questão central não é quando começa a adolescência e sim quando se sai dela pela resposta à pergunta dirigida aos adultos O que eles esperam de mim Calligaris 2000 p 23 As dúvidas quanto à resposta certa para essa questão trazem insegurança tentativa de interpretação do mundo adulto e contradição pois os adultos querem que o adolescente seja autônomo exigência de ter uma posição social de destaque mas lhe recusam a autonomia querem que tenha sucesso social exigências de performance mas postergam essa situação para que ele possa se preparar melhor Além disso não fica claro se desejam que o adolescente aceite ou desafie a moratória imposta o que traz outra questão importante como conseguir ser reconhecido e admitido como adulto Afinal o principal objetivo da adolescência ainda se configura como o desejo de ser adulto O problema atual já postulado é que os adultos oferecem referências e modelos ambíguos imprecisos múltiplos difusos heterogêneos e contraditórios dificultando muito a resposta à pergunta colocada por Calligaris 2000 p 23 O que eles esperam de mim Ao mesmo tempo uma parte dos adolescentes vive uma falta de limites com o declínio da autoridade parental e dos interditos próprios desta e dos representantes paternos e uma cobrança para seguirem as normas sociais por exemplo ter sucesso profissional ou os jovens são supercuidados e ao mesmo tempo deixados à deriva em uma economia dos cuidados igualmente ambígua segundo Birman 2006 Para Calligaris 2000 no contexto difuso atual haveria duas qualidades subjacentes importantes postas ao adolescente pelo mundo adulto ser desejável e ser invejável Em outras palavras um adolescente deve enfrentar dois pontos centrais na sua vivência atual o sucesso nas relações amorosas e sexuais e a conquista do poder o que o levaria às crises contemporâneas intensificadas pela enorme exposição a que estão submetidos nas redes sociais virtuais Vale salientar que esses também são dois objetivos centrais para os adultos que igualmente enfrentam dificuldades para compreender e alcançar tais ideais sociais que são redirecionados aos jovens Dessa maneira é trazida então uma das questões já postuladas o que diferenciaria o adolescente do adulto na atualidade As diferenças estão cada vez mais difusas mas há uma característica que parece aproximar os dois momentos de vida com impactos distintos para ambos uma dificuldade enorme de compreender o que o mundo deseja e consequentemente como agir no mundo a partir de escolhas e projetos e como se projetar no futuro No jovem a falta de parâmetros claros gera a busca mais individualizada da construção identitária e do lugar no mundo marcando uma dificuldade de fortalecimento identitário pela falta de reconhecimento do outro significativo Além disso a ação sobre o mundo por meio da estratégia impulsiva de tentativa e erro redunda em falta de limites No adulto há a emergência de crises mais frequentes pela dificuldade de compreensão dos critérios para ser desejável e invejável e por movimentos complicados como a tentativa de voltar concretamente a ser jovem Isso configura um dos grandes problemas atuais se o dever dos adultos é envelhecer o que acontece quando o ideal dos adultos é rejuvenescer Assim a ação no presente e a projeção para o futuro tornamse uma ação complexa e enigmática para o jovem pois não há referências claramente colocadas como predominantes embora coexistam no mundo atual desde modelos tradicionais que garantem segurança estabilidade e uma referência clara a seguir até modelos mais abertos e flexíveis Ribeiro Uvaldo 2011 O adolescente então vêse diante da impossibilidade de definir o que é ser adulto pois há várias formas socialmente legitimadas de ser adulto hoje em dia muitas delas não conhecidas ou reconhecidas pelos próprios adultos que são referência presente direta para esses adolescentes O que nos traz novamente a questão O que é ser adulto na contemporaneidade Reações comuns a essa situação por parte dos adultos corporificamse na restrição e no engaiolamento espacial dos filhos como estratégia de proteção o que ocasiona ausência de convívio com outras pessoas nos espaços públicos a fim de evitar contato com modelos sociais não reconhecidos Exemplo disso é a autorização dos pais para que os filhos permaneçam na casa paterna com a devida proteção mas com a ativa vida sexual de adultos Impulsividade Ramos e colaboradores 2012 referem que a impulsividade e a baixa tolerância à frustração seriam características entre os jovens nascidos de 1980 a 2000 nomeados de Geração Y características analisadas por Outeiral 2003 O autor afirma que ao longo do século XX o modelo de ação sobre o mundo era marcado pela lógica de IMPULSOPENSAMENTOAÇÃO ou seja havia uma intermediação social das referências incorporadas pelos adolescentes que os levavam a agir a partir de parâmetros socialmente configurados que nem sempre garantiam sucesso ou desejo atendidos de forma imediata Por exemplo no mercado de trabalho as promoções eram conquistas que demandavam muito tempo e investimento e poderiam não acontecer O tempo ou na verdade a percepção subjetiva do tempo sempre foi uma das questões importantes a serem consideradas em qualquer orientação profissional e de carreira ou mesmo em qualquer trabalho com adolescentes pois como pondera Bohoslavsky 1977 p 99 embora como observadores externos possamos analisar a dimensão temporal em três momentos passado presente e futuro do ponto de vista do sujeito o tempo não é uma sucessão ordenada mas uma dimensão de certo modo construída a partir de cada presente A percepção subjetiva do tempo como vem ocorrendo desde o início do século XXI tem sua forma pautada pela urgência é necessário assimilar a novidade de forma rápida mesmo que esta venha incessantemente pois há uma promessa de que aí haveria formas instantâneas de satisfação A mediação tecnológica das relações está cada vez mais presente nesse processo o que por um lado acelera oportunidades de contato e facilidade de acesso mas por outro toma o lugar outras formas de relacionamento entre pessoas e ideias pessoas e seus sonhos e projetos e pessoas entre si Essa temporalidade marcada pela urgência notória entre os jovens e adolescentes torna essas outras formas de experiência que não são caracterizadas pela pressa nem pela velocidade desvalorizadas São cada vez mais raras as oportunidades que os jovens têm de vivenciar outras formas de se relacionar com o corpo com as ideias e com os outros que não sejam as das sensações momentâneas e das percepções e decisões instantâneas Kehl 2009 Essa forma de estar no mundo e nas relações valoriza cada vez mais o produto em detrimento do processo em uma tentativa de antecipar os resultados É como se o viver fosse um presente absoluto pois se o sujeito não passar pelo processo o passado tornase descartável uma vez que se tem a sensação de que ele não está exatamente direcionado ao resultado Portanto o futuro que seria o produto do processo esgotase no instante seguinte convocado a se tornar presente o quanto antes Sem alguma experiência de processo o envolvimento subjetivo e o trabalho psíquico dos jovens fundamentais para a orientação profissional e de carreira ficam empobrecidos Desligado o fio que ata o presente à experiência passada como se voltar ao futuro Kehl 2009 p 168 Outeiral 2003 aponta que a configuração contemporânea de ação sobre o mundo se dá pelo modelo IMPULSOAÇÃO ou seja a tolerância à frustração e a postergação ou compensação dos desejos parecem não ser possibilidades aos adolescentes que buscam recarga imediata dos impulsos para novos investimentos O tempo de espera para as realizações mostrase curto e diante de impossibilidades o sujeito decidese mais por mudar do que por investir fortemente no desejo que demorará a se realizar No mesmo exemplo antes colocado no mercado de trabalho as promoções precisam ser conquistas rápidas caso contrário o adolescente pode mudar de trabalho em busca dessa rapidez na conquista sem muito tempo e investimento para que isso aconteça Outeiral 2003 e Tapscott 2010 complementam que a velocidade dos games e das comunicações virtuais proporcionadas pela tecnologia desponta como a forma predominante de ação sobre o mundo ou seja os adolescentes agem com impulsividade e dessa forma têm como principal estratégia de ação o modelo da tentativa e erro em vez de investir tempo e dinheiro em espaços de aprendizagem formal para essas situações Esse processo deixaos muitas vezes sozinhos para tomar decisões e fazer escolhas redundando em uma individualização da vida não por opção mas por falta dela Isso é o que Castel 2009 chamou de individualismo negativo definido como um individualismo pela desagregação das referências coletivas e não por uma afirmação de si sobre a sociedade ou seja um individualismo em função do enfraquecimento ou da perda das referências sociolaborais Individualização da vida Esse modelo da tentativa e erro de ação sobre o mundo bem como a falta de referências claras sobre o que é ser adulto faz com que o adolescente muitas vezes se veja sozinho diante dos desafios e das tarefas impostas pelo mundo Somamse a isso segundo Birman 2006 uma vivência de maior solidão na família pela diminuição da quantidade de irmãos por ter pais separados e pela agenda intensa de todos Além disso o autor ressalta que os pais passaram a se dar o direito de ter projetos existenciais próprios independentes do projeto familiar Tudo isso contribui para a vivência do individualismo negativo no qual há uma priorização de valores e projetos individuais sobre os coletivos pela falta ou ambiguidade das referências sociais o que pode gerar as características comumente atribuídas à Geração Y de desejo de liberdade em tudo que se faz afirmação das vontades e a customização do mundo obtendo dos meios o que deseja Ramos et al 2012 Essa situação acontece também em função da perenidade das conquistas tornando tudo muito transitório sendo essa a característica central da vida mas como fica a necessidade de segurança e constância que a psicologia sempre colocou como importante para a manutenção da vida Isso traz novamente a questão o que é ser adulto Esse movimento de individualização da vida e de desejo de liberdade preconizado como característico da Geração Y seria mesmo emblemático dos adolescentes contemporâneos ou seria a possibilidade de existir diante da falta de referências claras Multiplicidade de referências legitimadas A multiplicidade de referências legitimadas traz uma possibilidade de abertura e criação para o adolescente sendo a criatividade e a inovação também colocadas como características comumente atribuídas à Geração Y Ramos et al 2012 Entretanto isso deixa o adolescente como discutido na seção anterior perdido no mundo sem referências o que tem trazido impactos sociolaborais importantes na carreira e na trajetória de formação Guimarães 2004 aponta que há uma mudança no sentido do trabalho para o adolescente passando de um valor ético central como foi para o mundo adulto ao longo de quase todo o século XX para uma preocupação e uma demanda importante mas não central pois sua centralidade não advém de seu valor ético e sim de sua urgência como problema ou seja o sentido do trabalho seria antes o de uma demanda a satisfazer que o de um valor a cultivar Ribeiro 2011 p 62 O trabalho seria basicamente uma atividade para resolver necessidades de sobrevivência e uma possibilidade de fazer vínculos sociais característica mais importante Além disso há uma mudança no sentido da educação que para muitos seria apenas uma autorização para pleitear uma vaga no mercado de trabalho mesmo porque os principais requisitos apontados para o sucesso no trabalho estariam relacionados mais às características pessoais do que à formação educacional que é um dos atuais discursos sociais ambíguos pois a qualificação formal ainda é condição básica para ingresso e ascensão no mercado de trabalho Essas duas características da construção de si no mundo também impactam a projeção de si no futuro como veremos a seguir Projetos de futuro Lipovetsky e Serroy 2011 dizem que a projeção da vida em direção ao futuro teve uma mudança radical na contemporaneidade pois de forma contrária ao projeto social configurado ao longo do século XX a supervalorização do futuro tem cedido lugar ao superinvestimento no presente e em curto prazo há uma preocupação precoce com o futuro conforme aponta Birman 2006 Além disso há uma vivência no presente com grande dificuldade de projetar o futuro devido à ambiguidade das referências e dos modelos adultos disponíveis Dessa maneira pensar a adolescência do século XX era concebêla como projeção da vida adulta futura mas agora também devemos olhar para a experiência de vida adolescente presente pois antes seu investimento era concretizado no futuro mas agora ele também precisa realizarse no presente para poder ter algum futuro em função por exemplo da impulsividade adolescente e da cobrança precoce por parte dos adultos Se a adolescência era a preparação para os papéis sociais adultos parece que agora as coisas têm acontecido simultaneamente Proposta de orientação profissional e de carreira Diante desse cenário de falta de referências e de uma realidade efêmera e instantânea como a orientação profissional e de carreira pode auxiliar esses adolescentesjovens em suas escolhas e trajetórias profissionais Um desafio que se coloca para a orientação profissional e de carreira e para os orientadores profissionais do século XXI é o de não formatar a sua prática à temporalidade contemporânea apressada e atropelada que desvaloriza a duração do tempo de compreender em nome de uma busca por resultados que sem as condições que uma experiência de processo produz não se sustentam Assim o objetivo de uma orientação profissional e de carreira deve ser auxiliar o jovem na construção de si no mundo por meio de um projeto O projeto é composto por uma articulação das escolhas que a pessoa faz um processo que demanda uma estratégia ou seja uma intencionalidade em sua vida profissional o que implica uma antecipação do futuro O projeto tem dupla dimensionalidade dimensão subjetiva e identitária de construção do projeto de vida profissional visando à busca de sentido na vida e uma dimensão operativa instrumental de construção de um plano de ação profissional visando à criação de um conjunto de ações para atingir um fim Ribeiro 2014 Ora esse tipo de abordagem implica a exploração de si mesmo e das questões sociais e econômicas mas também a elaboração de ação sobre o mundo por meio da realização de escolhas no processo de construção de um projeto de vida de trabalho Dessa maneira propiciase ao jovem uma experiência significativa e própria em que o processo é em si mais importante do que a escolha porque nele reside a possibilidade de apropriação e construção de algo próprio Lacan 1998 fragmenta essa experiência mais significativa em três tempos o instante de ver o tempo para compreender e o momento de concluir O primeiro e o terceiro são tempos mais instantâneos daí advêm as palavras instante e momento que duram tanto quanto um relance perceptivo Já o tempo de compreender seria aquele em que realmente precisase de tempo de processo de duração de construção É uma experiência não precipitada ao resultado ou a uma conclusão que se daria somente no terceiro momento A pura sequência de instantes de impulsos à ação não sustentados por uma experiência de compreender é uma temporalidade vazia na qual nada se cria e da qual não se conserva nenhuma lembrança significativa capaz de conferir valor ao vivido Kehl 2009 p 116 É isso que precisamos evitar no nosso trabalho de orientadores REFERÊNCIAS Aberastury A 1981 O adolescente e a liberdade In A Aberastury M Knobel Orgs Adolescência normal Um enfoque psicanalítico pp 1323 Porto Alegre Artmed Becker H 2008 Outsiders Estudos de sociologia do desvio Rio de Janeiro Zahar Birman J 2006 Tatuando o desamparo A juventude na atualidade In M R Cardoso Org Adolescente pp 2544 São Paulo Escuta Bock A M B Liebesny B 2003 Quem eu quero ser quando crescer Um estudo sobre o projeto de vida de jovens em São Paulo In S Ozella Org Adolescências construídas A visão da psicologia sóciohistórica pp 203222 São Paulo Cortez Bohoslavsky R 1977 Orientação vocacional A estratégia clínica São Paulo Martins Fontes Bohoslavsky R 1983 Vocacional Teoria técnica e ideologia São Paulo Cortez Calligaris C 2000 A adolescência São Paulo Publifolha Camarano A A 2006 Transição para a vida adulta ou vida adulta em transição Rio de Janeiro IPEA Carvajal G 1998 Tornarse adolescente A aventura de uma metamorfose Uma visão psicanalítica da adolescência São Paulo Cortez Castel R 2009 La montée des incertitudes Travail protections statut de lindividu Paris Seuil Coimbra C C Bocco F Nascimento M L 2005 Subvertendo o conceito de adolescência Arquivos Brasileiros de Psicologia 571 211 Dayrrel J 2003 O jovem como sujeito social Revista Brasileira de Educação 24 4052 Duarte M E 2009 Um século depois de Frank Parsons Escolher uma profissão ou apostar na psicologia da construção da vida Revista Brasileira de Orientação Profissional 102 514 Dubet F 1998 A formação dos indivíduos Contemporaneidade e Educação 33 27 33 Erikson E 1976 Identidade juventude e crise 2 ed Rio de Janeiro Zahar Giddens A 2002 Modernidade e identidade Rio de Janeiro Zahar Guichard J 2012 Quais os desafios para o aconselhamento em orientação no início do século 21 Revista Brasileira de Orientação Profissional 132 139159 Guimarães N A 2004 Trabalho Uma categoriachave no imaginário juvenil In H W Abramo P P M Branco Orgs Retratos da juventude brasileira São Paulo Perseu Abramo Kehl M R 2009 O tempo e o cão A atualidade das depressões São Paulo Boitempo Knobel M 1981 A síndrome da adolescência normal In A Aberastury M Knobel Orgs Adolescência normal Um enfoque psicanalítico pp 2462 Porto Alegre Artmed Lacan J 1998 Escritos Rio de Janeiro Jorge Zahar Lehman Y P Uvaldo M C C Silva F F 2006 O jovem e o mundo do trabalho Consultas terapêuticas e orientação profissional Imaginário 1212 18 Lipovetsky G Serroy J 2011 A culturamundo Resposta a uma sociedade desorientada São Paulo Cia da Letras Malo E M 2007 Las dimensiones fragmentaria y performativa de las subjetividades de clase Universitas Psychologica 61 1125 Matheus T C 2007 Adolescência História e política do conceito na psicanálise São Paulo Casa do Psicólogo Mead G H 1953 Espiritu persona y sociedad Buenos Aires Paidós Organização Internacional do Trabalho OIT 2009 Trabalho decente e juventude no Brasil Brasília OIT Outeiral J 2003 Adolescer Estudos revisados sobre adolescência 2 ed rev e ampl Rio de Janeiro Revinter Ramos D N Casa Nova S P C Carvalho R C O 2012 O bom professor na perspectiva da geração Y Uma análise sob a percepção dos discentes de Ciências Contábeis Enfoque Reflexão Contábil 313 3752 Ribeiro M A 2011 Juventude e trabalho Construindo a carreira em situação de vulnerabilidade Arquivos Brasileiros de Psicologia 63no spe 5870 Ribeiro M A 2014 Carreiras Novo olhar socioconstrucionista para um mundo flexibilizado Curitiba Juruá Ribeiro M A Uvaldo M C C 2011 Possibilidades identitárias contemporâneas em um mundo do trabalho flexibilizado Polis e Psique 11 5579 Sennett R 1998 A corrosão do caráter As consequências pessoais do trabalho no novo capitalismo Rio de Janeiro Record Sennett R 2006 A cultura do novo capitalismo Rio de Janeiro Record Silva L B C 2005 Três questões sobre as psicoses Mental 24 113131 Tapscott D 2010 La era digital Cómo la generación NET está transformando al mundo Mexico McGrawHill Touraine A 2006 Novo paradigma para compreender o mundo Petrópolis Vozes
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Ribeiro et al 2016 Ser adolescente no século XXI In Levenfus R S org 2016 Orientação vocacional e de carreira em contextos clínicos e educativos Porto Alegre Artmed SER ADOLESCENTE NO SÉCULO XXI MARCELO AFONSO RIBEIRO MARIA DA CONCEIÇÃO COROPOS UVALDO GUILHERME FONÇATTI DÉBORA AMARAL AUDI MARCELO LÁBAKI AGOSTINHO YARA MALKI Globalização desenvolvimento de tecnologias de comunicação e de armazenamento de informações mudanças sociais marcantes e flexibilização laboral geraram uma fragilização das estruturas sociais vigentes com consequências diretas e profundas sobre as pessoas e seus projetos de vida A orientação profissional e de carreira como área de pesquisa e atuação defrontase nesse cenário com a premência de repensar suas teorias e práticas Guichard 2012 partindo necessariamente do entendimento não apenas dessas mudanças mas principalmente do impacto delas nas pessoas Neste capítulo centraremos nossa atenção no adolescente principal alvo de nossas práticas Ser adolescente no século XXI tem se mostrado um desafio importante para todos para o mundo adulto no qual é necessário lidar com padrões de referência e modelos de ação no mundo muito distintos dos seus para o Estado que tem no adolescente um problema central em termos de formação inserção no mercado de trabalho sexualidade saúde segurança consumo e família e para o próprio adolescente que tem de lidar com um mundo adulto que lhe dá poucas referências e modelos que muitas vezes são confusos ambíguos e contraditórios e se vê compelido a praticamente criar referências e construir formas de ser em um mundo contemporâneo caracterizado como complexo heterogêneo e flexibilizado Quem são esses adolescentes de hoje O que as pesquisas nos mostram sobre eles Lançado o desafio este capítulo longe de oferecer uma resposta única e conclusiva tem como objetivo refletir sobre essa questão apresentando se possível questões que possam auxiliar nas pesquisas e discussões dos profissionais da área de orientação profissional e de carreira EM BUSCA DO CONCEITO DE ADOLESCÊNCIA Vários campos do saber por motivos distintos dedicaramse a compreender a adolescência e produzir teorias e conceituações visando a elaborar definições que abrangessem a temática adolescente Entre as quais citamos a ordenação jurídica e legal como o ECA Estatuto da Criança e do Adolescente no direito o estudo do desenvolvimento biológico e psicológico individual na medicina e na psicologia do desenvolvimento a tipificação dos jovens em grandes grupos homogêneos como são as propostas da Geração Y 1980 a 2000 e da Geração Z 2000 em diante oriundas da administração a compreensão da juventude como grupo ou condição social na sociologia ou como identidade e papel psicossocial na psicologia social Segundo Matheus 2007 etimologicamente adolescência vem de adolescere que significa desenvolverse ou crescer entretanto também guarda relação com addolescere que significa adoecer É devido a isso que se tem a ideia de crise para definir a adolescência Na tradição mais biológica e psicológica individual a adolescência tem início com a puberdade e se encerra com a possibilidade de assumir papéis sociais adultos Além disso ela é caracterizada pela universalidade das transformações biológicas e psicológicas Erikson 1976 define adolescência como a transição da infância à vida adulta basicamente marcada por uma moratória psicossocial ou seja pela liberdade para experimentar livremente papéis sexuais sociais e ocupacionais até definirse Constitui se como uma crise normativa que ocorreria entre os 12 e 18 anos em que a pessoa em desenvolvimento teria de resolver o dilema central entre construir uma identidade e viver uma difusão de papéis sendo o modelo de construção identitária marcado pela escolha e a reprodução de referências sociais identidade como reprodução Knobel 1981 postulou a existência de uma Síndrome da adolescência normal na qual alguns padrões e comportamentos psicopatológicos são esperados e considerados normais para a vivência da adolescência e para a sua estabilização em um momento de busca identitária carga emocional intensa autocentramento angústia extrema e criatividade Já Aberastury 1981 centra sua compreensão da adolescência como um período marcado pela vivência de perdas e lutos gerados pelo desamparo da desidealização das figuras parentais e da ruptura da onipotência Carvajal 1998 concebe a adolescência como um grupo de fenômenos que eclode em um dado momento da vida até a consolidação da vida adulta definida pelo trabalho pela independência e pela intimidade Caracterizada pelo enlace entre mudanças biológicas psíquicas e sociais a adolescência é uma etapa importante do desenvolvimento e fundamental para os processos de escolha profissional Para esses autores portanto esse período envolve uma grande crise com desestruturações e reestruturações de personalidade principalmente no tocante à crise de identidade necessidade de ser ele mesmo à crise de autoridade enfrentamento de normas ou imposição de modelos e à crise sexual posicionamento sexual e de gênero sem estabelecer faixas etárias determinadas As ciências sociais têm abandonado a ideia de adolescência e utilizado o termo juventudes no plural para indicar que não se trata de uma fase normativa do ciclo vital nem estaria psicológica e biologicamente determinada Contudo a fase se configuraria como condições psicossociais de vida fortemente marcadas pelos backgrounds socioeconômicos e culturais da pessoa em desenvolvimento e não obedeceria obrigatoriamente a uma cronologia de vida nem existiriam posições e conquistas sociais claras como anteriormente eram a formação educacional e profissional a inserção no mercado de trabalho e a constituição da família tornando a separação entre juventude e vida adulta mais complexa Camarano 2006 Coimbra Bocco Nascimento 2005 Dayrrel 2003 Guimarães 2004 Organização Internacional do Trabalho OIT 2009 A psicologia social por sua vez busca relacionar a psicologia mais individual com a sociologia e compreender como se processa a construção de si mesmo e a construção identitária nas variadas relações que cada jovem produz com o mundo Tais relações se dão a partir das referências legitimadas que o mundo disponibiliza para cada um e que sofrem restrições e possibilidades sociais econômicas e culturais Dessa maneira é possível afirmar que a adolescência é mais construída do que psicológica ou biologicamente determinada ou seja o adolescente cria sentido sobre si e constrói um lugar para si no mundo de referências sociais Bock Liebesny 2003 Bohoslavsky 1983 Dubet 1998 Lehman Uvaldo Silva 2006 Ribeiro 2011 Por último a administração e parte da psicologia organizacional e do consumidor têm produzido tipificações dos jovens em grandes grupos homogêneos como estratégia de compreensão de suas vivências Isso resultou nas propostas da Geração Y relativa aos nascidos entre 1980 e 2000 e a atual Geração Z relativa aos nascidos depois de 2000 que em sua grande maioria ainda não chegaram às universidades e ao mundo do trabalho Ramos Casa Nova Carvalho 2012 Diante de um mundo flexibilizado complexo e heterogêneo conforme anteriormente descrito partilhamos da noção de que independentemente de definirmos como adolescência ou juventudes o fenômeno sobre o qual nos propusemos a fazer uma reflexão o adolescente ou o jovem vive um momento marcado pela transição de modelos no qual velhos modelos ainda existem e novos modelos ainda não se consolidaram Essa transição relega o sujeito a experienciar desafios sociolaborais e culturais ambíguos e contraditórios que não guardam relação direta com os modelos adultos consolidados gerando mais dúvidas e incertezas do que garantias Salientamos que ao entender a adolescência ou a juventude como um processo necessariamente atravessado pelas condições sociais econômicas e culturais não podemos negar que parte da população não passa pelos processos ou apresenta as características descritas sendo que em alguns casos a passagem da infância para o mundo adulto ocorre diretamente adolescência amputada como denomina Carvajal 1998 Contudo as mudanças sociais e o mundo do trabalho afetam a todos direta ou indiretamente de formas possivelmente diferentes e com menor ou maior intensidade ADOLESCÊNCIA NO SÉCULO XXI Atualmente ser adolescente é viver em um mundo em transição com variados modelos sociolaborais de referência para guiar a construção da vida tanto aqueles mais tradicionalmente constituídos quanto os mais contemporâneos Birman 2006 Lehman et al 2006 Por exemplo trabalhar em boa parte do século XX se resumia basicamente a ter uma boa formação conseguir um bom emprego e mantêlo até o final da vida em uma situação que possibilitava certa previsão do futuro No entanto hoje além desses aspectos trabalhar também é não ter clareza se a formação é suficiente é mudar constantemente de emprego trabalho cidade e muitas vezes de profissão e nunca ter segurança estabilidade e continuidade definitivas como nos modelos anteriormente predominantes constituídos ao longo do século XX Castel 2009 Sennett 1998 2006 Touraine 2006 Além disso não é somente na dimensão do trabalho que mudanças aconteceram pois as referências de família gênero sexualidade formação cronologia da vida e modelo de vida adulta estão igualmente flexibilizadas o que coloca desafios enormes tanto para os adolescentes quanto para os adultos Isso ocorre porque os primeiros não têm mais referências adultas seguras e predominantes às quais se basear na construção de suas vidas ao mesmo tempo em que os últimos não conseguem oferecer modelos aos adolescentes ou seja a estrutura social oriunda da tradição não responde mais totalmente à organização e normatização da vida sociolaboral Birman 2006 Duarte 2009 Lipovetsky Serroy 2011 Essa situação promove por um lado uma situação de sofrimento e angústia pela falta de referências mas por outro lado propicia um espaço maior de abertura e criação em termos psicossociais principalmente para os adolescentes subjetivos identitários e sociais Isso tudo é muito distinto da tradicional reprodução de modelos adultos configurada basicamente ao longo do século XX Giddens 2002 Ribeiro 2014 Silva 2005 George Mead importante pensador do campo da psicologia social postulou nos anos 1950 que a base para a construção de si em termos da subjetividade das identidades construídas e dos papéis sociais incorporados seria o outro generalizado Esse conceito pode ser entendido como o modelo de referência adulto ao qual a pessoa em desenvolvimento deveria se basear para a construção de si e de suas ações no mundo marcado pela ordem social vigente e que demandava uma reprodução de modelos para o reconhecimento de si Mead 1953 sendo que tudo que não obedecia claramente a esses modelos era considerado desviante Becker 2008 O reconhecimento de si como adulto por exemplo se dava a partir da conquista de realizações e posições sociais cronologicamente determinadas ou seja a passagem da adolescência para a vida adulta acontecia progressivamente pela finalização da formação educacional e profissional pela obtenção de um emprego e pela constituição da própria família conferindo ao sujeito independência e lugar social próprios Calligaris 2000 OIT 2009 Malo 2007 atualizando Mead 1953 aponta que o mundo contemporâneo tem oferecido múltiplas referências significativas e legitimadas psicossocialmente para guiar a vida das pessoas constituindose em verdadeiros outros generalizados ou referências múltiplas e plurais Dessa forma não existe plenamente uma única referência a seguir devido ao reconhecimento social de mais de uma referência como legítima e aceita o que torna a tarefa de transição para a vida adulta mais complexa No campo do trabalho por exemplo a tarefa básica para o adolescente era escolher um curso de formação técnico ou superior dependendo de suas condições socioeconômicas e conseguir e manter um emprego na sua área de atuação Atualmente esse modelo ainda é vigente entretanto não se configura como modelo predominante nem como o mais valorizado socialmente pois concorre com outros modelos que falam sobre a insuficiência da formação para a atuação no mercado de trabalho a necessidade de aprendizagem contínua e a mudança constante a relativa descartabilidade das pessoas a existência e a consolidação de outras formas de vínculo ao mercado de trabalho terceirização teletrabalho microempreendedorismo individual e a demanda pelo desempenho de várias funções em vários locais de trabalho simultaneamente polivalência e multifuncionalidade É esse contexto sociolaboral que o adulto não compreende plenamente nem consegue contribuir como modelo para o adolescente OIT 2009 Ribeiro 2014 Sennett 2006 Assim diante desse breve quadro apresentado a própria compreensão da adolescência se torna complexa e conceitos e teorias têm sido problematizados entre eles a questão de devermos ou não pensar em adolescência da forma como é classicamente postulada na psicologia A adolescência para a psicologia é uma fase normativa do ciclo vital psicológica e biologicamente determinada marcada por crises principalmente sexuais e identitárias entre elas a crise vocacional e ocupacional Bohoslavsky 1977 Esta última teria como principal função a preparação para a vida adulta como definiram autores clássicos da temática adolescente Aberastury 1981 Erikson 1976 Knobel 1981 O QUE É SER ADOLESCENTE NO SÉCULO XXI Para responder a essa pergunta apresentaremos e discutiremos o pensamento e propostas de alguns autores contemporâneos acerca da experiência de ser adolescente no século XXI sintetizados em cinco eixos 1crise do mundo adulto 2impulsividade e falta de limites 3individualização da vida 4multiplicidade de referências legitimadas 5dificuldade de se projetar no futuro CRISE DO MUNDO ADULTO COMO MODELO INDEFINIÇÃO DO QUE É SER ADOLESCENTE E DO QUE É SER ADULTO Um aspecto a ser considerado nesta reflexão é a supervalorização da chamada juventude nas sociedades capitalistas atuais Juventude hoje é um bem a ser mantido e cultuado e portanto a ser prolongado com o auxílio das conquistas da medicina que aumentaram significativamente o tempo e a qualidade de vida Birman 2006 p 25 aponta que a temporalidade da juventude modificouse de forma significativa então seja na transformação da infância que a precede seja na vida adulta que a sucede gerando um alongamento da adolescência por seu início antecipado e sua finalização estendida e indefinida As consequências diretas disso são a desvalorização da maturidade e da velhice entendidas como diminuição da produtividade ou estagnação e o encurtamento da infância e da velhice A luta contra a passagem do tempo é uma das características marcantes em nossa sociedade o corpo moldado em academias cirurgias rejuvenescedoras padronização da forma de se vestir as crianças sendo vestidas como adolescentes precocemente e a ausência quase absoluta de roupas desenvolvidas para a chamada terceira idade A consequência disso para o mundo do trabalho é clara O tempo cronológico e as marcas da maturidade e da velhice devem ser apagados e o desenvolvimento parado Em contrapartida o desenvolvimento tecnológico propõe um tempo presente absoluto não é necessária a espera pois a informação é instantânea As relações podem ser mediadas pelo computador pelas redes sociais as informações e as relações são virtualizadas ou seja se tornam não presentes submetendo a narrativa à prova de uma unidade de tempo sem unidade de lugar Dessa maneira essa nova configuração de tempoespaço produz uma nova construção da subjetividade Nesses moldes para Calligaris 2000 a adolescência deve ser concebida como tempo de suspensão na tentativa de tornar o adolescente independente que tem condições de ser adulto mas não está autorizado psicossocialmente a sêlo ou seja um tempo de transição com duração desconhecida gerador de frustação pela moratória e a imposição de uma felicidade pela idealização da adolescência No entanto a questão central não é quando começa a adolescência e sim quando se sai dela pela resposta à pergunta dirigida aos adultos O que eles esperam de mim Calligaris 2000 p 23 As dúvidas quanto à resposta certa para essa questão trazem insegurança tentativa de interpretação do mundo adulto e contradição pois os adultos querem que o adolescente seja autônomo exigência de ter uma posição social de destaque mas lhe recusam a autonomia querem que tenha sucesso social exigências de performance mas postergam essa situação para que ele possa se preparar melhor Além disso não fica claro se desejam que o adolescente aceite ou desafie a moratória imposta o que traz outra questão importante como conseguir ser reconhecido e admitido como adulto Afinal o principal objetivo da adolescência ainda se configura como o desejo de ser adulto O problema atual já postulado é que os adultos oferecem referências e modelos ambíguos imprecisos múltiplos difusos heterogêneos e contraditórios dificultando muito a resposta à pergunta colocada por Calligaris 2000 p 23 O que eles esperam de mim Ao mesmo tempo uma parte dos adolescentes vive uma falta de limites com o declínio da autoridade parental e dos interditos próprios desta e dos representantes paternos e uma cobrança para seguirem as normas sociais por exemplo ter sucesso profissional ou os jovens são supercuidados e ao mesmo tempo deixados à deriva em uma economia dos cuidados igualmente ambígua segundo Birman 2006 Para Calligaris 2000 no contexto difuso atual haveria duas qualidades subjacentes importantes postas ao adolescente pelo mundo adulto ser desejável e ser invejável Em outras palavras um adolescente deve enfrentar dois pontos centrais na sua vivência atual o sucesso nas relações amorosas e sexuais e a conquista do poder o que o levaria às crises contemporâneas intensificadas pela enorme exposição a que estão submetidos nas redes sociais virtuais Vale salientar que esses também são dois objetivos centrais para os adultos que igualmente enfrentam dificuldades para compreender e alcançar tais ideais sociais que são redirecionados aos jovens Dessa maneira é trazida então uma das questões já postuladas o que diferenciaria o adolescente do adulto na atualidade As diferenças estão cada vez mais difusas mas há uma característica que parece aproximar os dois momentos de vida com impactos distintos para ambos uma dificuldade enorme de compreender o que o mundo deseja e consequentemente como agir no mundo a partir de escolhas e projetos e como se projetar no futuro No jovem a falta de parâmetros claros gera a busca mais individualizada da construção identitária e do lugar no mundo marcando uma dificuldade de fortalecimento identitário pela falta de reconhecimento do outro significativo Além disso a ação sobre o mundo por meio da estratégia impulsiva de tentativa e erro redunda em falta de limites No adulto há a emergência de crises mais frequentes pela dificuldade de compreensão dos critérios para ser desejável e invejável e por movimentos complicados como a tentativa de voltar concretamente a ser jovem Isso configura um dos grandes problemas atuais se o dever dos adultos é envelhecer o que acontece quando o ideal dos adultos é rejuvenescer Assim a ação no presente e a projeção para o futuro tornamse uma ação complexa e enigmática para o jovem pois não há referências claramente colocadas como predominantes embora coexistam no mundo atual desde modelos tradicionais que garantem segurança estabilidade e uma referência clara a seguir até modelos mais abertos e flexíveis Ribeiro Uvaldo 2011 O adolescente então vêse diante da impossibilidade de definir o que é ser adulto pois há várias formas socialmente legitimadas de ser adulto hoje em dia muitas delas não conhecidas ou reconhecidas pelos próprios adultos que são referência presente direta para esses adolescentes O que nos traz novamente a questão O que é ser adulto na contemporaneidade Reações comuns a essa situação por parte dos adultos corporificamse na restrição e no engaiolamento espacial dos filhos como estratégia de proteção o que ocasiona ausência de convívio com outras pessoas nos espaços públicos a fim de evitar contato com modelos sociais não reconhecidos Exemplo disso é a autorização dos pais para que os filhos permaneçam na casa paterna com a devida proteção mas com a ativa vida sexual de adultos Impulsividade Ramos e colaboradores 2012 referem que a impulsividade e a baixa tolerância à frustração seriam características entre os jovens nascidos de 1980 a 2000 nomeados de Geração Y características analisadas por Outeiral 2003 O autor afirma que ao longo do século XX o modelo de ação sobre o mundo era marcado pela lógica de IMPULSOPENSAMENTOAÇÃO ou seja havia uma intermediação social das referências incorporadas pelos adolescentes que os levavam a agir a partir de parâmetros socialmente configurados que nem sempre garantiam sucesso ou desejo atendidos de forma imediata Por exemplo no mercado de trabalho as promoções eram conquistas que demandavam muito tempo e investimento e poderiam não acontecer O tempo ou na verdade a percepção subjetiva do tempo sempre foi uma das questões importantes a serem consideradas em qualquer orientação profissional e de carreira ou mesmo em qualquer trabalho com adolescentes pois como pondera Bohoslavsky 1977 p 99 embora como observadores externos possamos analisar a dimensão temporal em três momentos passado presente e futuro do ponto de vista do sujeito o tempo não é uma sucessão ordenada mas uma dimensão de certo modo construída a partir de cada presente A percepção subjetiva do tempo como vem ocorrendo desde o início do século XXI tem sua forma pautada pela urgência é necessário assimilar a novidade de forma rápida mesmo que esta venha incessantemente pois há uma promessa de que aí haveria formas instantâneas de satisfação A mediação tecnológica das relações está cada vez mais presente nesse processo o que por um lado acelera oportunidades de contato e facilidade de acesso mas por outro toma o lugar outras formas de relacionamento entre pessoas e ideias pessoas e seus sonhos e projetos e pessoas entre si Essa temporalidade marcada pela urgência notória entre os jovens e adolescentes torna essas outras formas de experiência que não são caracterizadas pela pressa nem pela velocidade desvalorizadas São cada vez mais raras as oportunidades que os jovens têm de vivenciar outras formas de se relacionar com o corpo com as ideias e com os outros que não sejam as das sensações momentâneas e das percepções e decisões instantâneas Kehl 2009 Essa forma de estar no mundo e nas relações valoriza cada vez mais o produto em detrimento do processo em uma tentativa de antecipar os resultados É como se o viver fosse um presente absoluto pois se o sujeito não passar pelo processo o passado tornase descartável uma vez que se tem a sensação de que ele não está exatamente direcionado ao resultado Portanto o futuro que seria o produto do processo esgotase no instante seguinte convocado a se tornar presente o quanto antes Sem alguma experiência de processo o envolvimento subjetivo e o trabalho psíquico dos jovens fundamentais para a orientação profissional e de carreira ficam empobrecidos Desligado o fio que ata o presente à experiência passada como se voltar ao futuro Kehl 2009 p 168 Outeiral 2003 aponta que a configuração contemporânea de ação sobre o mundo se dá pelo modelo IMPULSOAÇÃO ou seja a tolerância à frustração e a postergação ou compensação dos desejos parecem não ser possibilidades aos adolescentes que buscam recarga imediata dos impulsos para novos investimentos O tempo de espera para as realizações mostrase curto e diante de impossibilidades o sujeito decidese mais por mudar do que por investir fortemente no desejo que demorará a se realizar No mesmo exemplo antes colocado no mercado de trabalho as promoções precisam ser conquistas rápidas caso contrário o adolescente pode mudar de trabalho em busca dessa rapidez na conquista sem muito tempo e investimento para que isso aconteça Outeiral 2003 e Tapscott 2010 complementam que a velocidade dos games e das comunicações virtuais proporcionadas pela tecnologia desponta como a forma predominante de ação sobre o mundo ou seja os adolescentes agem com impulsividade e dessa forma têm como principal estratégia de ação o modelo da tentativa e erro em vez de investir tempo e dinheiro em espaços de aprendizagem formal para essas situações Esse processo deixaos muitas vezes sozinhos para tomar decisões e fazer escolhas redundando em uma individualização da vida não por opção mas por falta dela Isso é o que Castel 2009 chamou de individualismo negativo definido como um individualismo pela desagregação das referências coletivas e não por uma afirmação de si sobre a sociedade ou seja um individualismo em função do enfraquecimento ou da perda das referências sociolaborais Individualização da vida Esse modelo da tentativa e erro de ação sobre o mundo bem como a falta de referências claras sobre o que é ser adulto faz com que o adolescente muitas vezes se veja sozinho diante dos desafios e das tarefas impostas pelo mundo Somamse a isso segundo Birman 2006 uma vivência de maior solidão na família pela diminuição da quantidade de irmãos por ter pais separados e pela agenda intensa de todos Além disso o autor ressalta que os pais passaram a se dar o direito de ter projetos existenciais próprios independentes do projeto familiar Tudo isso contribui para a vivência do individualismo negativo no qual há uma priorização de valores e projetos individuais sobre os coletivos pela falta ou ambiguidade das referências sociais o que pode gerar as características comumente atribuídas à Geração Y de desejo de liberdade em tudo que se faz afirmação das vontades e a customização do mundo obtendo dos meios o que deseja Ramos et al 2012 Essa situação acontece também em função da perenidade das conquistas tornando tudo muito transitório sendo essa a característica central da vida mas como fica a necessidade de segurança e constância que a psicologia sempre colocou como importante para a manutenção da vida Isso traz novamente a questão o que é ser adulto Esse movimento de individualização da vida e de desejo de liberdade preconizado como característico da Geração Y seria mesmo emblemático dos adolescentes contemporâneos ou seria a possibilidade de existir diante da falta de referências claras Multiplicidade de referências legitimadas A multiplicidade de referências legitimadas traz uma possibilidade de abertura e criação para o adolescente sendo a criatividade e a inovação também colocadas como características comumente atribuídas à Geração Y Ramos et al 2012 Entretanto isso deixa o adolescente como discutido na seção anterior perdido no mundo sem referências o que tem trazido impactos sociolaborais importantes na carreira e na trajetória de formação Guimarães 2004 aponta que há uma mudança no sentido do trabalho para o adolescente passando de um valor ético central como foi para o mundo adulto ao longo de quase todo o século XX para uma preocupação e uma demanda importante mas não central pois sua centralidade não advém de seu valor ético e sim de sua urgência como problema ou seja o sentido do trabalho seria antes o de uma demanda a satisfazer que o de um valor a cultivar Ribeiro 2011 p 62 O trabalho seria basicamente uma atividade para resolver necessidades de sobrevivência e uma possibilidade de fazer vínculos sociais característica mais importante Além disso há uma mudança no sentido da educação que para muitos seria apenas uma autorização para pleitear uma vaga no mercado de trabalho mesmo porque os principais requisitos apontados para o sucesso no trabalho estariam relacionados mais às características pessoais do que à formação educacional que é um dos atuais discursos sociais ambíguos pois a qualificação formal ainda é condição básica para ingresso e ascensão no mercado de trabalho Essas duas características da construção de si no mundo também impactam a projeção de si no futuro como veremos a seguir Projetos de futuro Lipovetsky e Serroy 2011 dizem que a projeção da vida em direção ao futuro teve uma mudança radical na contemporaneidade pois de forma contrária ao projeto social configurado ao longo do século XX a supervalorização do futuro tem cedido lugar ao superinvestimento no presente e em curto prazo há uma preocupação precoce com o futuro conforme aponta Birman 2006 Além disso há uma vivência no presente com grande dificuldade de projetar o futuro devido à ambiguidade das referências e dos modelos adultos disponíveis Dessa maneira pensar a adolescência do século XX era concebêla como projeção da vida adulta futura mas agora também devemos olhar para a experiência de vida adolescente presente pois antes seu investimento era concretizado no futuro mas agora ele também precisa realizarse no presente para poder ter algum futuro em função por exemplo da impulsividade adolescente e da cobrança precoce por parte dos adultos Se a adolescência era a preparação para os papéis sociais adultos parece que agora as coisas têm acontecido simultaneamente Proposta de orientação profissional e de carreira Diante desse cenário de falta de referências e de uma realidade efêmera e instantânea como a orientação profissional e de carreira pode auxiliar esses adolescentesjovens em suas escolhas e trajetórias profissionais Um desafio que se coloca para a orientação profissional e de carreira e para os orientadores profissionais do século XXI é o de não formatar a sua prática à temporalidade contemporânea apressada e atropelada que desvaloriza a duração do tempo de compreender em nome de uma busca por resultados que sem as condições que uma experiência de processo produz não se sustentam Assim o objetivo de uma orientação profissional e de carreira deve ser auxiliar o jovem na construção de si no mundo por meio de um projeto O projeto é composto por uma articulação das escolhas que a pessoa faz um processo que demanda uma estratégia ou seja uma intencionalidade em sua vida profissional o que implica uma antecipação do futuro O projeto tem dupla dimensionalidade dimensão subjetiva e identitária de construção do projeto de vida profissional visando à busca de sentido na vida e uma dimensão operativa instrumental de construção de um plano de ação profissional visando à criação de um conjunto de ações para atingir um fim Ribeiro 2014 Ora esse tipo de abordagem implica a exploração de si mesmo e das questões sociais e econômicas mas também a elaboração de ação sobre o mundo por meio da realização de escolhas no processo de construção de um projeto de vida de trabalho Dessa maneira propiciase ao jovem uma experiência significativa e própria em que o processo é em si mais importante do que a escolha porque nele reside a possibilidade de apropriação e construção de algo próprio Lacan 1998 fragmenta essa experiência mais significativa em três tempos o instante de ver o tempo para compreender e o momento de concluir O primeiro e o terceiro são tempos mais instantâneos daí advêm as palavras instante e momento que duram tanto quanto um relance perceptivo Já o tempo de compreender seria aquele em que realmente precisase de tempo de processo de duração de construção É uma experiência não precipitada ao resultado ou a uma conclusão que se daria somente no terceiro momento A pura sequência de instantes de impulsos à ação não sustentados por uma experiência de compreender é uma temporalidade vazia na qual nada se cria e da qual não se conserva nenhuma lembrança significativa capaz de conferir valor ao vivido Kehl 2009 p 116 É isso que precisamos evitar no nosso trabalho de orientadores REFERÊNCIAS Aberastury A 1981 O adolescente e a liberdade In A Aberastury M Knobel Orgs Adolescência normal Um enfoque psicanalítico pp 1323 Porto Alegre Artmed Becker H 2008 Outsiders Estudos de sociologia do desvio Rio de Janeiro Zahar Birman J 2006 Tatuando o desamparo A juventude na atualidade In M R Cardoso Org Adolescente pp 2544 São Paulo Escuta Bock A M B Liebesny B 2003 Quem eu quero ser quando crescer Um estudo sobre o projeto de vida de jovens em São Paulo In S Ozella Org Adolescências construídas A visão da psicologia sóciohistórica pp 203222 São Paulo Cortez Bohoslavsky R 1977 Orientação vocacional A estratégia clínica São Paulo Martins Fontes Bohoslavsky R 1983 Vocacional Teoria técnica e ideologia São Paulo Cortez Calligaris C 2000 A adolescência São Paulo Publifolha Camarano A A 2006 Transição para a vida adulta ou vida adulta em transição Rio de Janeiro IPEA Carvajal G 1998 Tornarse adolescente A aventura de uma metamorfose Uma visão psicanalítica da adolescência São Paulo Cortez Castel R 2009 La montée des incertitudes Travail protections statut de lindividu Paris Seuil Coimbra C C Bocco F Nascimento M L 2005 Subvertendo o conceito de adolescência Arquivos Brasileiros de Psicologia 571 211 Dayrrel J 2003 O jovem 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carreira em situação de vulnerabilidade Arquivos Brasileiros de Psicologia 63no spe 5870 Ribeiro M A 2014 Carreiras Novo olhar socioconstrucionista para um mundo flexibilizado Curitiba Juruá Ribeiro M A Uvaldo M C C 2011 Possibilidades identitárias contemporâneas em um mundo do trabalho flexibilizado Polis e Psique 11 5579 Sennett R 1998 A corrosão do caráter As consequências pessoais do trabalho no novo capitalismo Rio de Janeiro Record Sennett R 2006 A cultura do novo capitalismo Rio de Janeiro Record Silva L B C 2005 Três questões sobre as psicoses Mental 24 113131 Tapscott D 2010 La era digital Cómo la generación NET está transformando al mundo Mexico McGrawHill Touraine A 2006 Novo paradigma para compreender o mundo Petrópolis Vozes