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Ciência Política

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IV. A Política como Vocação (111) Esta conferência, que pronuncio por solicitação vossa, irá necessariamente decepcionar, sob vários aspectos. Esperais, naturalmente, que eu tome uma posição em relação aos problemas concretos do momento. Mas isto só ocorrerá de modo formal e no fim, quando apresentarei certas questões relacionadas com a significação da ação política na totalidade do modo de vida. Na conferência de hoje, todas as questões relacionadas com a diretriz e o conteúdo que devemos dar à nossa atividade política devem ser eliminadas, pois nada têm a ver com a questão geral do que significa a política como vocação e o que ela pode significar. Passemos, agora, ao nosso tema. O que entendemos por política? O conceito é extremamente amplo e compreende qualquer tipo de liderança independente em ação. Fala-se da política financeira dos bancos, da política de descontos do Reichsbank, da política grevista de um sindicato; pode-se falar da política educacional de uma municipalidade, da política do presidente de uma associação voluntária e, finalmente, até mesmo da política de uma esposa prudente que busca orientar o modo de vida. Nossas reflexões não se baseiam, decerto, num conceito tão amplo. Queremos compreender como política apenas a liderança, ou a influência sobre a liderança, de uma associação política, e, daí hoje, de um Estado. "Mas o que é uma associação política, do ponto de vista sociológico? O que é um "Estado"? Sociologicamente, o Estado não pode ser definido em termos dos seus fins. Dificilmente haverá qualquer tarefa que uma associação política não tenha tomado em suas mãos, e não há tarefa que se possa dizer que tenha sido sempre, exclusivamente e peculiarmente, das associações designadas como políticas: hoje o Estado, ou, historicamente, as associações que foram predecessoras do Estado moderno. Em última análise, só podemos definir o Estado moderno sociologicamente em termos dos meios específicos peculiares a ele, como peculiares a toda associação política, ou seja, o uso da força física. "Todo Estado se fundamenta na força", disse Trotski em Brest-Litovsk. Isso é realmente certo. Se não existissem instituições sociais que conhecessem o uso da violência, então o conceito de "Estado" seria eliminado, e surgiria uma situação que poderíamos designar como "anarquia", no sentido específico da palavra. É claro que a força não é, certamente, o meio normal, nem o único, do Estado – ninguém o afirma – mas um meio específico ao Estado. Hoje, as 55 ENSAIOS DE SOCIOLOGIA relações entre o Estado e a violência são especialmente íntimas. No passado, as instituições mais variadas – a partir do dia – conhecem o uso da força física como perfeitamente normal. Hoje, porém, temos de dizer que o Estado é uma comunidade humana que pretende, com êxito, o monopólio do uso legítimo da força física dentro de um determinado território. Este que o “território” é uma das características do Estado. Especificamente, no momento presente, o direito de usar a força física é atribuído a outras instituições e pessoas apenas na medida em que o Estado o permite. O Estado é considerado como a única fonte do “direito” de usar a violência. Daí “política”, para nós, significa a participação no poder ou a luta para influir na distribuição de poder, seja entre Estados ou entre grupos dentro de um Estado. Isso corresponde essencialmente ao seu uso comum. Quando se afirma que uma questão é “política”, quando um ministro do Gabinete ou uma autoridade é considerado como “político", ou quando uma decisão é tida como “politicamente” determinada, o que se está querendo dizer, sempre, é que os interesses na distribuição, manutenção ou transferência do poder são decisivos para a resposta às questões e para se determinar a decisão ou a esfera de atividade, da autoridade. Quem participa ativamente da política luta pelo poder, ou como um meio de servir a outros objetivos, ideais ou egoístas, quer como o “poder pelo poder” em si, quer que ele desfrutar a sensação de prestígio atribuído pelo poder. Como as instituições políticas que o precederam historicamente, o Estado é uma relação de homens dominando homens, relação mantida por meio da violência legítima. Para que o Estado exista, os dominados devem obedecer à autoridade alegada pelos detentores do poder. Quando e por que os homens obedecem? Sobre que justificação íntima e sobre que meios exteriores repousa esse domínio? Para começar, em princípio, há três justiças interiores, e portanto legitimações básicas do domínio. 1. Primeira, a autoridade do “ontem eterno”, isto é, dos mores santificados pelo reconhecimento imemoriavelmente antigo e da orientação habitual para o conformismo. É o domínio “tradicional” exercido pelo patriarca e o príncipe primariamente ou o autoritário. 2. Há a autoridade do dom da graça (carisma) extraordinário e pessoal, a dedicação absoluta à revelação, heróismo ou outras qualidades de liderança individual. É o domínio “carismático”, exercido pelo profeta ou, no campo da política, pelo senhor de guerra eleito, pelo governante plebiscitário, o grande demagogo ou o líder do partido político. 3. Finalmente, há o domínio em virtude da “legalidade”, em virtude de fé na validade do estatuto legal e da “competência” funcional, baseada em regras racionalmente criadas. Nesse caso, espera-se obediência no cumprimento das obrigações estatutárias. É o domínio exercido pelo moderno “servidor do Estado” e por todos os portadores do poder que, sob esse aspecto, e dele se assemelham. Compreende-se que, na realidade, a obediência é determinada pelos motivos bastante fortes do medo e esperança – medo da vingança dos poderes mágicos do detentor do poder, esperança de recompensas neste mundo ou no outro – e, além de tudo isso, pelos mais variados interesses. Vamos falar disso. Mas ao procurar as “legitimações” dessa obediência, encontramos esses três tipos “puros”: “tradicional”, “carismático” e “legal”. Essas concepções de legitimidade e suas justificações íntimas são de grande significação para a estrutura do domínio. Na verdade, os tipos puros raramente se encontram, na realidade. Mas hoje não podemos tratar de variantes, transições e combinações altamente complexas desses tipos puros, cujos problemas pertencem à “ciência política”. Interessamo-nos, aqui, principalmente pelo segundo desses tipos: domínio em virtude da dedicação, dos que obedecem, ao “carisma” exclusivamente pessoal do “líder”. Pois essa é a raiz de uma vocação em sua expressão mais elevada. A dedicação ao carisma do profeta, ou ao líder na guerra, ou ao grande demagogo na ceiação ou na profanação, significa reconhecer que o líder é pessoalmente reconhecido como o líder, interessentemente chamado dos homens. Os homens não obedecem em virtude de tradição que eles, tem que acreditar nele. Quando é mais do que um oportunista limitado com presunçoso, e líder vive para sua causa e “luta pela sua obra”! A dedicação de seus discípulos, seus seguidores, seus amigos pessoais do partido é orientada para a sua pessoa e para suas qualidades. A liderança carismática surgiu em todos os lugares e em todas as épocas históricas. Mais destacadamente no passado, surgiu nas duas figuras do mágico e profeta, de um lado, e do senhor de guerra eleito, o líder de grupo e condottière, do outro. A liderança política, na forma do “demagogo” livre que nasceu no solo da cidade-Estado, é de maior interesse para nós. Como a cidade-Estado, o demagogo é peculiar ao Oriente, especialmente a cultura mediterrânea. Além disso, a liderança política na forma do “líder partidário” parlamentário cresceu no solo do Estado constitucional, que também só é indigno da Ocidente. Esses políticos de “vocação”, no sentido mais autêntico da palavra, são em toda parte as principais figura desativas nas correntes cruzadas da luta política pelo poder. Os meios auxiliares a suas disposição também são altamente decisivos. Como os poderes – politicamente dominantes, costumam sentem-se dominá? A questão é válida para qualquer tipo de domínio, portanto também para o domínio político em todas as suas formas, tradicionais, legais e carismáticas. O domínio organizado, de uma administração contínua, exige que a conduta humana seja condicionada à obediência para com os senhores que pretenderem ser os portadores do poder legítimo. Por outro lado, em virtude da obediência, o domínio organizado exige o controle dos bens materiais que em determinado caso são necessários para o uso da violência física. Assim, o domínio organizado exige o controle do quadro de pessoal executivo e instrumentos materiais de administração. O quadro administrativo, que representa diretamente a organização do domínio político, e, entretanto, por causa da relação organizativa, limitado pela obediência ao portador do poder executivo no pleno conceito de legitimidade, do qual falamos acima. Há dois estados sociais: os feudais e os interesses pessoais: a mediação material e a horárias social. Os feudos de um vassalo, as presenças das autoridades prometida, os das modernos servidores públicos, a honra dos cavaleiros, os privilégios dos estados e a honra do serviço público compreendem seus respectivos proventos. O temor de perdê-los é a base final e decisiva para a solidariedade existente entre o quadro executivo e o detentor do poder. Há honra e pilhagem para os seguidores, na guerra; para o séquito do demagogo, há os “despojos” – ou seja, a exploração dos dominados, através do monopólio dos cargos – e há lucros e prêmios a viabilidade, politicamente determinados. Todas essa recompensas também derivadas do domínio exercido pelo líder carismático. Para manter um domínio pela força são necessários certos bens materiais, tal como ocorre com uma organização econômica. Todos os Estados podem ser classificados segundo o estado de se basearem no princípio de que os próprios quadros são donos dos meios admí- administrativos, ou de que os quadros são “separados” desses meios de administração. Essa distinção é válida no mesmo sentido em que dizemos hoje que o empregado assalariado e o proletário na empresa capitalista estão “separados” dos meios materiais de produção. O detentor do poder deve ser capaz de contar com a obediência dos membros do quadro, autoridades, ou quem quer que seja. Os meios administrativos podem consistir em dinheiro, edifícios, material bélico, veículos, cavalos e muitas outras coisas. Tudo depende de o detentor do poder dirigir e organizar, ou não, a administração, embora delegando poder executivo a serviços pessoais, autoridades contratadas, ou favoritos e pessoas de confiança. 58 ENSAIOS DE SOCIOLOGIA ça, que não são os donos, isto é, que não usam os meios materiais de administração ao seu ... 59 A POLÍTICA COMO VOCAÇÃO Não tomamos posição, aqui, sobre essa questão. Descrevo apenas o aspecto puramente ... 60 ENSAIOS DE SOCIOLOGIA Eram “livres” não no sentido moderno de liberdade em relação ao domínio pela força, ... um recrutamento "plutocrático" dos principais camadas políticas. Na verdade, isso não quer dizer que essa liderança plutocrática signifique, ao mesmo tempo, que as camadas politicamente dominantes não buscaram também viver "da" política e portanto que a camada dominante não explorará, habitualmente, seu domínio político em favor de seu próprio interesse econômico. Tudo isso é indiscutível, naturalmente. Jamais houve uma camada que não tivesse se, de alguma forma, vivído "da" política. Queremos dizer apenas que o político profissional não precisa buscar uma remuneração direta pelo trabalho político, ao passo que todo político sem meios deve, absolutamente, pretender essa remuneração. Por outro lado, não pretendemos dizer que o político sem propriedades buscará vantagens econômicas privadas através da política, exclusivamente, ou mesmo predominantemente. Nem pretendemos dizer que ele não pensará, em primeiro lugar, "no problema". Nada seria mais incorreto. Segundo toda a experiência, o zelo pela "segurança" econômica de sua existência é consciente, ou inconscientemente, um ponto capital em toda a orientação de vida do homem rico. O idealismo político descuidado e sem reservas só se encontra, e não exclusivamente pelo menos predominantemente, entre as camadas que, em virtude de sua carência de propriedades, estão completamente fora dos círculos interessados na manutenção da ordem econômica de liderança sócioeconômica. Isso é válido especialmente para as épocas extraordinárias e, portanto, revolucionárias. Um recrutamento não-plutocrático de políticos interessados, de energia e segurança, está conjugado com a precondição subentendida de que uma renda regular e suficiente será proporcionada aos que se ocupam da política. A política pode ser conduzida "honorificamente" e portanto — como se diz habitualmente por homens "independentes", isto é, ricos, e especialmente pelos que vivem de rendas. Ou a liderança política pode ser acessível aos homens sem propriedades, que necessitam de uma remuneração. O político profissional que vive "da" política pode ser um "funcionário" exclusivamente, dependêndo só "a" política. Nesse caso, o político recebe uma renda seja de taxas e tributos sobre serviços específicos — gorjetas e subornos são apenas uma forma — seja de uma parte fixa do rendimento dessa categoria de renda — ou uma renda fixa em natureza, em valor monetário, ou ambas. Pode assumir o caráter de um "empresário", como o condottiero ou podesta de outrora que serviam por tempo imposto ou uma determinada campanha. Quando o político atuante não considera seus serviços como um investimento de capital que ele faz render através da exploração de sua influência. Pode também receber um salário fixo, como um jornalista, secretário de partido ou ministro de um Gabinete moderno, ou autoridade política. As concessões feudais, as concessões de terras e prebendas de todos os tipos foram clássicos, no passado. Com o desenvolvimento da economia monetária, os requisitos preliminares e prebendas tornam-se, especialmente, as recompensas típicas para o apoio aos príncipes, conquistadores vitoriosos ou chefes partidários bem-sucedidos. Em troca de serviços reais, hoje, os líderes partidários distribuem cargos de todos os tipos — nos partidos, jornais, sociedades cooperativas, companhias de seguros, municipalidades, bem como no Estado. Todas as lutas partidárias são lutas para o controle de cargos, bem como lutas para metas objetivas. Na Alemanha, todas as lutas entre os proponentes do Governo central e local se centralizam na questão dos poderes que controlarão os cargos, quer em Berlim, Munique, Karlsruhe ou Dresden. As restrições na participação da distribuição de cargos são mais sérias para os partidos do que qualquer ação contra suas metas objetivas. Na França, a substituição de prefeito em consequência da política partidária sempre foi considerada como uma transformação maior e sempre causou maiores protestos do que a modificação do programa governamental — que tem quase que a significação de um mero palavrório. Alguns partidos, especialmente na América, desde o desaparecimento dos velhos conflitos sobre a interpretação da constituição, transformaram-se em simples partidos para o controle de cargos, distribuindo empregos e modificando seu programa material segundo as oportunidades de conseguir votos. Na Espanha, até recentemente, os dois grandes partidos, de uma forma convencionalmente feia, substituíam no poder através de "eleições" fabricadas na cúpula, a fim de proporcionar cargos aos seus seguidores. Nos territórios coloniais espanhóis, nas chamadas "eleições", bem como nas chamadas "revoluções", o que estava em jogo era sempre o cesto de pão do Governo do qual os vencedores se queriam alimentar. Na Suíça, os partidos dividiam pacificamente os cargos entre si, proporcionalmente, e alguns das nossos esboços constitucionais "revolucionários", por exemplo o primeiro esboço da constituição badeniana, tentaram estender esse sistema até os postos ministeriais. Assim, o Estado e os cargos estatais eram considerados como simples instituições para a divisão de espólios. O Partido Católico do Centro foi quem se mostrou mais entusiasticado com esse projeto. Na Badenia, o partido, como elemento de sua plataforma política, tomou a distribuição de cargos proporcional às crenças religiosas e, portanto, sem qualquer relação com o mérito. Essa tendência torna-se mais forte para todos os partidos quando o número de cargos aumenta em consequência da burocratização geral e quando a exigência de cargos aumenta porque representam um meio de vida especificamente seguro. Para seus adeptos, os partidos se tornam cada vez mais um meio para alcançar o fim de ser beneficiados dessa maneira. A evolução do funcionalismo moderno no sentido de se tornar uma força de trabalho profissional e altamente especializada, através de longos anos de treinamento preparatório, opõe-se a essa situação. A burocracia moderna, no interesse da integridade, desenvolveu um elevado senso de honra extremamente, sem o qual haveria fatalmente o perigo de uma corrupção fervente e de um vulgar espírito interesseiro. E, sem essa integridade, até mesmo as funções puramente técnicas do aparato estatal seriam postas em risco. A significação do aparato estatal cresceu em volume e se tornou um elemento, especialmente com o crescente socialização, e sua significação aumentará ainda mais. Nos Estados Unidos, a administração amadotrisca, através de políticos rapaces, de acordo com o resultado das eleições presidenciais, teve como consequência a substituição de centenas de milhares de funcionários, incluindo até um simples carteiro. A administração nada sabia do verdadeiro servidor público profissional, que a isso dedicava a sua vida; não obstante, essa administração amadorística foi, há muito, limitada pela Reforma do Serviço Público. As necessidades puramente técnicas, incontestáveis, da administração determiraram tal evolução. Na Europa, o funcionalismo especializado, baseado na divisão do trabalho, surgiu numa evolução gradativa de meio milhar de anos. As cidades italianas e senhorias foram o início, entre as monarquias, e os estamentos dos conquistadores normandos. O passo decisivo, porém, foi dado em relação à administração das finanças do príncipe. Com as reformas administrativas do Imperador Max, podemos ver como foi difícil para os servidores depor com êxito o príncipe, nesse setor, mesmo sob a pressão da emergência extrema e do domínio turco. A esfera das finanças era a que menos podia tolerar o dilettantismo de um governante – que, naquela época, era acima de tudo um cavaleiro. O desenvolvimento da técnica guerreira exigiu o perito e o oficial especializado. Nessas três áreas – finanças, guerra e direito – os servidores especializados nos Estados mais adiantados triunfaram claramente durante o século XVI. Com a ascendência do absolutismo do príncipe sobre os estamentos, houve simultaneamente uma abdicação gradativa do seu Governo autocrático em favor de um corpo de servidores especializados. Esses funcionários apenas facilitaram a vitória do príncipe sobre os estamentos. O aparecimento dos "políticos destacados" se fez juntamente com a ascensão de um funcionalismo especializado, embora em transições muito menos perceptíveis. É claro que esses conselheiros realmente decisivos dos príncipes existiram em todas as épocas e em todo o mundo. No Oriente, a necessidade de afastar do Sultão a responsabilidade pessoal pelo destino do Governo criou a figura típica do "Grão-Vizir". No Ocidente, influenciada principalmente pelos relatórios dos legados venezianos, a diplomacia tornou-se a princípio uma arte cultivada conscientemente na época de Carlos V, no tempo de Maquiavel. Os relatos dos legados venezianos têm como zêlo apoiando nos círculos diplomáticos especializados. Os adeptos dessa arte, que eram em geral educados humanisticamente, tratavam-se como iniciados treinados, semelhantes aos estadistas humanistas chineses no último período dos estamentos belicosos. A necessidade de uma direção formalmente unificada de toda a política, inclusive dos assuntos internos, por um estadista principal, só surgiu de forma final e vigorosa com a evolução constitucional. É claro que personalidades individuais, como os conselheiros dos príncipes, ou antes, na verdade, os líderes, haviam existido repetidamente antes disso. Mas a organização de agências administrativas mesmo nos Estados mais adiantados seguiu primariamente outros caminhos. Surgiram as agências administrativas colegiadas de Quiboa. Em teoria, e em proporções gradativamente decrescentes, na verdade, elas se reuniam sob a presidência pessoal do príncipe, que tomava as decisões. Essa sistema colegiado levou às exposições de motivos, contra-exposições e ao voto racional da colegia. O monarca, por sua vez, interessava-se em poder nomear os ministros entre os servidores dedicados, a sua discrição. Ambos os grupos, porém, queriam ver a liderança política enfrentar o parlamento de modo unido e solidário, e daí, ver o sistema colegiado substituído por um único chefe do Gabinete. Além disso, a fim de ser afastado, de modo exclusivamente formal, da luta dos partidos e dos ataques partidários, o monarca necessitava de uma pessoa que o protegesse e assumisse a responsabilidade, ou seja, que respondesse ao parlamento e negociasse com os partidos. Todos esses interesses funcionaram juntos e na mesma direção: surgiu um ministro para dirigir a esfera oficial do modo unificado. Quando o parlamento predominou sobre o monarca – como na Inglaterra – o desenvolvimento do poder parlamentar agiu ainda mais fortemente na direção de uma unificação do aparato estatal. Na Inglaterra, o "Gabinete", tendo como "líder" o chefe do parlamento, desenvolveu-se como um comitê do partido, que controla a maioria. Esse poder partidário era ignorado oficialmente, mas na verdade somente ele era politicamente decisivo. Os órgãos colegiados oficiais, como tal, não eram órgãos do poder dominante, o partido, e portanto não poderiam ser os depositários do verdadeiro Governo. O partido dominante exigia uma organização sempre pronta, composta apenas de seus homens principais, que 64 ENSAIOS DE SOCIOLOGIA discutiriam confidencialmente as questões a fim de manterem o poder entre si e serem capazes de se dedicar à grande política, fora do grupo. O Gabinete é simplesmente essa organização. Em sua relação com o público, porém, especialmente o público parlamentar, o partido precisava de um líder responsável por todas as decisões – o chefe do Gabinete. O mesmo princípio foi levado para o continente europeu na forma de ministérios parlamentares. Somente na América e nas democracias por ela influenciadas, um sistema basicamente hetero- gêneo foi contraposto a este. O sistema americano coloca o líder do partido vitorioso, eleito diretamente e popularmente, na chefia do aparato de servidores por ele nomeados e só o torna dependente do consentimento do “parlamento” em questões orçamentárias e legislativas. O desenvolvimento da política numa organização que exigia o treinamento na luta pelo poder, e nos métodos dessa luta, tal como o desenvolveram os modernos partidos políti- cos, determinou a separação dos funcionários públicos em duas categorias que, porém, não são rigidamente separadas, embora sejam distintas. Essas categorias são os funcio- nários “administrativos”, de um lado, e os funcionários “políticos”, de outro. Estes, no verda- deiro sentido da palavra, “políticos”, podem ser reconhecidos regulares e extremamente pelo fato de poderem ser transferidos a qualquer momento, de serem demissíveis ou pelo menos afastados temporariamente. São como os prefeitos franceses e funcionários equiva- lentes de outros países, e isso contrasta agudamente com a “independência” dos funcio- nários com atribuições judiciais. Na Inglaterra, os funcionários que, segundo convenção fixa, estão sempre do cargo para uma modificação na maioria parlamentar, e a uma modi- ficação no Gabinete, pertencem a esta categoria. Há entre eles, habitualmente, alguns cuja competência inclui o controle da “administração interna” geral. O elempúblico político consis- te, acima de tudo, na tarefa de manter a “lei e a ordem” no país, e, portanto, da manuten- ção das relações de poder existentes. Na Prússia esses funcionários, de acordo com o decreto de Puttkamer e na época da censura, eram obrigados a “representar a política do Governo”. E como os prefeitos da França, eles eram usados como um aparato oficia do rei nas eleições. A maioria dos funcionários “políticos” do sistema alemão – em contraste com outros países – eram igualmente limitados no que se refere ao acesso aos postos que exigiam uma decisão universitária, exames especiais e serviço preparatório especial. Na Alemanha, somente os chefes do aparato político, os ministros, carecem dessa característica específica do serviço público moderno. Mesmo sob o regime antigo, era pos- sível ser Ministro da Educação da Prússia sem ter frequentado jamais qualquer instituição de ensino superior, mas só se podia ser Vortragender Rat’ a base de um exame determi- nado. Os Dezement e Vortragender Rat especializados e treinados eram, é claro, muito melhor informados sobre os verdadeiros problemas técnicos da divisão do que seu chefe – por exemplo, Althoff, no Ministério da Educação prussiano. Não era diferente na Inglaterra. Assim, em todas as exigências rotineiras o chefe de divisão era mais poderoso do que o ministro, o que se justificava. O ministro era simplesmente o representante da constelação de poder político; tinha de representar os poderosos quadros políticos e tinha de analisar as propostas de seus funcionários especializados, subordinados, ou dar-lhes a orientação de natureza política. Afinal de contas, as coisas são muito semelhantes numa empresa econômica privada: o verdadeiro “soberano”, as assembléias de acionistas, influi tão pouco na administração quan- to um “povo” governado pelos funcionários especializados. E as pessoas que decidem a política da empresa, a “diretoria” controlada pelo banco, dão apenas a orientação econômica e selecionam as pessoas para a administração, sem serem, elas mesmas, capazes de dirigir tecnicamente a empresa. Assim, a presente estrutura do Estado revolucionário não encera nada de novo, em princípio. Coloca o controle da administração nas mãos de diletantes absolutos que, em virtude de seu controle das metralhadoras, preferem usar os funcionários