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10 O horizonte lógicoformal na geografia moderna Durante o período do entreguerras as correntes do pensamento científico se desenvolveram de forma bastante segmentada geograficamente Esta segmentação é talvez devida ao espírito pouco cosmopolita de uma época que conheceu grandes tensões nacionais grandes crises econômicas e grandes fraturas ideológicas As dificuldades de diálogo e de comunicação são aparentemente as causas da dispersão geográfica das escolas e círculos organizados nesta época Os círculos de Viena de Praga a escola de Frankfurt de Cambridge entre outras marcaram definitivamente a identidade científica desses anos Paradoxalmente foram estas mesmas dificuldades e as perseguições que precederam à Segunda Guerra que plantaram as sementes de um novo cosmopolitismo Com efeito nesta época uma verdadeira diáspora de pensadores esteve na base das múltiplas trocas entre as escolas que tinham permanecido até então voltadas para si mesmas 249 Assim se explica a influência tardia do positivismo lógico Este movimento tinha começado verdadeiramente no início do séc XX a partir de uma ampla discussão nos círculos filosóficos Contudo foi apenas por volta da metade do séc XX que o positivismo lógico estendeu sua influência sobre as outras disciplinas Esta orientação também conhecida como filosofia analítica estabeleceuse primeiro sobre os domínios da matemática e da física e em seguida às outras ciências à psicologia sociologia biologia e economia Na geografia este movimento é geralmente conhecido sob o nome de Nova Geografia ou Geografia Quantitativa A quantificação é efetivamente um de seus aspectos mais familiares Contudo essa corrente corresponde a uma orientação muito mais complexa do que a simples matematização A origem da filosofia analítica se situa na crítica das correntes neohegelianas correntes bastante em voga sobretudo na Inglaterra no início deste século De fato apesar da diversidade das tendências no interior do movimento analítico há nele um elemento fundamental que reencontramos sistematicamente a recusa geral a toda metafísica Para os neohegelianos o universo é espiritual e a existência se confunde com a percepção Em outros termos não há um objeto sem sujeito e todo conhecimento provém de uma relação interna O julgamento criticista de Kant não é aceito pois ele pressupõe a adequação de uma noção à coisa isto é uma relação externa ao sujeito Toda relação externa espacial temporal ou de causalidade do ponto de vista deste idealismo é ilusória Há apenas uma única relação possível entre fenômenos a que relaciona o todo às partes Desta forma o neohegelianismo privilegia as relações de identidade e de diferença que reenviam à distinção tradicional entre realidade e aparências Segundo a interpretação de Wittgenstein o erro desta concepção é confundir o valor de uma variável com a própria variável A identidade de um obje 250 to deve ser expressa pela identidade do signo e jamais por um signo de identidade As primeiras críticas deste gênero de raciocínio aparecem no entanto na obra de Moore que denuncia a falsa identidade entre um objeto e a sensação desse objeto como um todo fenomenal Segundo Moore a atitude idealista é contraditória pois ela afirma ao mesmo tempo que o objeto e sua sensação são distintos e que eles não o são A abstração da lógica hegeliana situada na base deste raciocínio é vista por Moore como sendo ilegítima Efetivamente segundo Hegel o entendimento pensa os dois termos de uma relação como unidades em oposição uma em relação à outra e é a razão que os unifica dialeticamente O ser e o nada por exemplo devem ser vistos enquanto dois momentos inseparáveis de um devir unificado e não como quer o entendimento como dois pólos irredutíveis da realidade A possível exterioridade de uma relação cognitiva e a definição de um objeto de conhecimento sem o recurso a um universo espiritual em comunhão com o objeto são as duas diferenças fundamentais entre esta nova forma de realismo e o neohegelianismo Neste realismo a afirmação de um sujeito do conhecimento independente do objeto abre a possibilidade de uma experiência sintética que permite a utilização de um modelo matemático para o conhecimento O recurso utilizado por Moore em seu percurso crítico consistia na análise das proposições do discurso dos neohegelianos A Bertrand Russell cabe o mérito de ter aperfeiçoado este procedimento e de ter feito dele um método Após a crítica das posições neohegelianas Russell nos conta que a etapa seguinte foi a de revelar as verdadeiras significações do discurso científico por intermédio da lógica Este 1 WITTGENSTEIN L Tractatus logicophilosophicus Paris Gallimard 1961 proposição 553 pp 8082 2 HEGEL G W G Science de la logique livro primeiro trad Jankélévitch Paris Gallimard 1949 p 86 251 procedimento analítico associado ao método lógico funda o movimento da filosofia analítica A proposição de base de Bertrand Russell é a de substituir na lógica tradicional de Aristóteles a relação entre sujeito e predicado por uma função que une duas variáveis Esta nova forma de lógica recebeu a denominação de moderna pois tem como pressupostos ser mais objetiva geral e precisa do que a lógica tradicional Segundo Russell as proposições atômicas isto é as formas mais simples de proposições e os quantificadores quantificador universal para todo x e quantificador existencial há pelo menos um x constituem a base das proposições que estruturam todo pensamento É necessário distinguir a busca de rigor lógico pela linguagem da procura de uma precisão metodológica a partir da definição de conceitos e categorias como era o caso na conduta de Hartshorne e de Sauer A filosofia analítica não se caracteriza pela busca de conceitos gerais para estruturar a reflexão Esta filosofia concebe a linguagem como sendo o fundamento do pensamento lógico Desta maneira a linguagem revela por sua estrutura o valor de verdade e é ao mesmo tempo o meio de reflexão e a garantia de legitimidade desta última A associação entre estrutura da linguagem e verdade é deduzida da tese do paralelismo lógicofísico Segundo esta tese há uma correspondência entre linguagem e realidade ou seja a estrutura da linguagem é a mesma do mundo A variedade e a forma do real figuram na variedade e na forma da linguagem e as estruturas que podem ser conhecidas são sempre lógicas A partir daí deduzse que o conhecimento consiste na figuração lógica dos fatos Assim segundo Russell o problema epistemológico de se conhecer as coisas como elas são e as garantias que podemos ter a respeito da verdade desse conhecimento se remete de fato a determinar como falar logicamente das coisas O conhecimento científico estabelece assim as relações e os graus de significação entre os fatos seguindo as regras da lógica moderna 252 Para a filosofia analítica somente a linguagem matemática pode ser legítima como instrumento de conhecimento pois só ela sabe restringir sua importância aos limites impostos pela lógica Esta linguagem é a garantia de uma relação lógica com a realidade e define o campo possível do conhecimento segundo a última e mais conhecida das proposições do Tractatus logicophilosophicus Aquilo do qual não se pode falar é preciso calar3 A consequência imediata desta corrente foi a valorização das ciências matemáticas como o novo paradigma metodológico As outras disciplinas deveriam buscar no modelo da matemática sua coerência rigor e objetividade A outra consequência importante é a universalização dos procedimentos para a ciência e a unificação do método que se referem sempre aos princípios lógicos os quais são o fundamento da matemática Segundo Wittgenstein existem três tipos de proposições que correspondem aos três modelos do conhecimento O primeiro é composto de proposições dotadas de sentido elas provêm de um saber empírico e demandam uma prova experimental para serem aceitas mais tarde estas proposições serão chamadas verificáveis O segundo modelo concerne às proposições vazias de sentido deduzidas de uma concepção formal onde o valor de verdade dos enunciados analíticos está inscrito em sua forma lógica Finalmente o terceiro tipo corresponde às proposições destituídas de sentido sustentadas por uma metafísica Essas últimas proposições se caracterizam por uma impossibilidade de avaliação de seu valor de verdade pois não possuem significação ao nível lógico Na terceira e na quarta seção do Tractatus Wittgenstein nos apresenta dois outros aspectos importantes da filosofia analítica Em primeiro lugar o conhecimento do mundo é feito a partir da construção de quadros de fatos Esses quadros nos 3 WITTGENSTEIN L op cit proposição nº 7 p 107 253 indicam uma forma lógica e estável dos objetos sem no entanto reproduzir suas propriedades materiais Em segundo lugar existe uma correspondência biunívoca entre os fatos destes quadros e a realidade correspondência expressa pela relação lógica Desta maneira chegase ao conhecimento pela construção de modelos lógicos que restituem o comportamento dos fatos no mundo real Os modelos lógicos foram utilizados na ciência notadamente em razão do prestígio da física quântica que obteve resultados a partir de uma conduta matemática não proveniente de dados experimentais Um exemplo é o do cálculo matricial desenvolvido em 1843 por Cayley e que continuou sem aplicações práticas até a emergência da nova física quântica no início deste século O outro aspecto importante da física analítica é a noção de sistemas substituindo a noção de objeto Nesta perspectiva as moléculas são consideradas como sistemas de átomos estes últimos são eles mesmos sistemas compostos de um núcleo e de elétrons os núcleos são também sistemas de outras partículas e assim sucessivamente A concepção sistêmica foi adaptada para as outras ciências nos anos trinta primeiro na biologia e em seguida na economia Ela apresenta a vantagem de ligar os fenômenos às suas estruturas e de poder simultaneamente vêlos em diversos níveis graças à utilização de subsistemas Assim a teoria geral dos sistemas foi um modelo poderoso entre todas as ciências inclusive para a geografia O discurso analítico funda uma geografia moderna A visão sistêmica a utilização de modelos e a submissão à lógica matemática penetraram fortemente nas ciências naturais e sociais a partir dos anos cinqüenta É neste contexto que se faz a passagem de uma geografia clássica para uma geografia dita moderna Aliás os novos adeptos deste modelo sempre subli 254 nharam o caráter de ruptura de revolução desta passagem do clássico ao moderno Uma das primeiras manifestações desta nova maneira de conceber a geografia como vimos precedentemente se encontra no artigo de Schaefer de 1953 A crítica que ele faz a propósito da geografia anteriormente estabelecida foi desenvolvida e chegou ao que hoje se conhece como revolução quantitativa De fato a revolução metodológica na geografia tinha começado muito mais cedo nos anos trinta através da obra de Christaller sobre os lugares centrais4 O contexto da época no entanto limitou a difusão deste trabalho que passou quase despercebido O principal objetivo de Christaller era demonstrar que a distribuição e o tamanho das cidades no sul da Alemanha não eram aleatórios Segundo sua concepção estes fenômenos estavam ligados entre si e mantinham uma certa regularidade em sua expressão Assim os mercados de produtos e de serviços de tamanhos diferentes estão articulados de maneira a formar uma rede urbana funcional regular e hierarquizada A partir destas proposições Christaller estava em condições de construir um modelo coerente da dispersão espacial destas cidades Pelo alcance geral de tais proposições este modelo podia ser também aplicado a outras regiões e assim era possível pela correlação lógica resgatar uma explicação geral dos fenômenos ligados à estrutura e ao tamanho de uma rede urbana Segundo Claval o desenvolvimento de uma metodologia analítica na geografia deve muito à economia espacial e foi efetivamente por intermédio de Lösch um economista que a obra de Christaller se fez conhecer5 A partir dos anos cinqüenta sob inspiração do trabalho de Christaller outros modelos foram aplicados à geografia tais como os de von Thünen Weber e 4 CHRISTALLER W Die zentralen Orte in Süddeutschland Iena 1933 trad ing Central Palaces in Southern Germany 1966 5 CLAVAL Paul Essai sur lévolution de la géographie humaine Les Belles Lettres Paris 1976 p 140 255 identidade própria em relação à geografia anterior A refutação das tradições geográficas serviu portanto como um primeiro elemento de justificação e de imposição do novo Em segundo lugar sublinharemos o caráter de ruptura vivido por esta Nova Geografia em relação à outra dita clássica Finalmente o terceiro ponto procura o sentido da releitura da história da geografia efetuada por esta nova corrente Nesta releitura é possível observar que a Nova Geografia sublinha a filiação da ciência à uma posição racionalista e portanto que ela busca negar qualquer outra tradição e valorizar exclusivamente as que poderiam se aproximar do procedimento racionalista A análise guiada por estes três pontos encontra uma estrutura semelhante em todos os textos desta época que examinaremos É tal estrutura que apresentaremos agora Uma refutação fundamental as tradições O que há em comum entre os textos que difundem a Nova Geografia é o fato de que todos eles começam invariavelmente pela crítica do projeto dito clássico ou tradicional da geografia W Bunge I Burton D Harvey e P Haggett por exemplo estão todos de acordo em reconhecer que a dita singularidade dos fatos geográficos é incompatível com a visão científica moderna7 A concepção de fenômenos únicos segundo eles impede qualquer esforço em direção à explicação teórica A geografia tal como é concebida classicamente estaria portanto condenada a ser apenas uma tediosa descrição de acontecimentos sem poder jamais ligálos através de uma relação geral e teórica 7 Estes textos são respectivamente BUNGE William Theoretical Geography in Lund Studies in Geography The Royal University of Lund Gleerup pbs 1962 pp113 BURTON Ian The Quantitative Revolution and Theoretical Geography in The Canadian Geographer VII 4 1963 pp151162 HARVEY David Explanation in Geography E Arnold Londres 1969 HAGGETT Peter Locational Analysis in Human Geography E Arnold Londres 1965 257 Reilly Pesquisadores pioneiros como E Ullman e W Isard começavam a formar grupos de geógrafos que se interessavam por estes novos parâmetros A abordagem por modelização rapidamente estendeu seu campo de estudos aos problemas intraurbanos aos transportes aos sistemas regionais e à cartografia temática Sua verdadeira difusão no entanto data do início dos anos sessenta e a primeira obra de síntese em geografia humana só foi publicada em 19656 A estrutura do movimento da Nova Geografia Nosso interesse fundamental não é escrever uma história factual desta corrente A análise proposta aqui tem como objeto unicamente a dinâmica de transformação das orientações metodológicas Apoiarnosemos sobretudo no discurso daqueles que estiveram na origem desta transformação e na forma pela qual este discurso afetou a perspectiva geral da geografia A influência da teoria analítica sobre os geógrafos engajados nesta corrente de pensamento é um dos elementoschave para compreender esta dinâmica A posse deste novo método a ruptura que ele ocasionou em relação à geografia clássica e a convicção de ter encontrado a conduta verdadeiramente científica para a geografia são algumas das consequências mais importantes da associação entre a geografia e a teoria analítica A hipótese retida é a de que a estrutura da revolução quantitativa na geografia é análoga ao próprio movimento da modernidade Em outros termos a dinâmica pela qual este movimento se impõe na geografia se reporta à dinâmica da modernidade ao mito do novo tal como o descrevemos anteriormente Os elementos que compõem nossa análise são portanto bem definidos e limitados Primeiro procuraremos mostrar que estes geógrafos engajados ao novo paradigma buscaram uma 6 HAGGETT Peter Locational Analysis in Human Geography E Arnold Londres 4ª ed 1968 256 A realidade é efetivamente única e todas as coisas são diferentes desde que as olhemos em seus mínimos detalhes A perspectiva científica no entanto compensa a perda do detalhe pela generalização A diferença fundamental entre o único e o individual segundo Bunge por exemplo consiste no fato de que o individual é capaz de ser apreendido dentro de uma perspectiva geral ou por uma construção teórica sem no entanto perder suas especificidades Bunge critica firmemente a concepção adotada por Hartshorne segundo a qual a unicidade e a generalidade são qualidades intrínsecas aos fatos O ponto de vista de Bunge é de que se as interrelações entre os fenômenos geográficos aparecem de forma caótica isto se deve unicamente à falta de um método científico O problema é antes de tudo um problema de método e não um problema intrínseco ao fato geográficocontrariamente ao que Hartshorne segundo Bunge queria demonstrar No mesmo sentido Burton afirma que em um mundo sem teorias todos os fenômenos são únicos Se a geografia deseja verdadeiramente ser considerada como uma ciência deve recorrer à observação das regularidades em seu campo de conhecimentos As regularidades são segundo Burton o primeiro passo para se estabelecer teorias e estas últimas fundam a condição necessária do saber científico moderno A resistência da comunidade geográfica frente à ciência moderna é interpretada por ele como estando ligada à tradição possibilista Na medida em que o possibilismo afirmava o livre arbítrio e a impossibilidade de se prever cientificamente os fenômenos contrariava diretamente os fundamentos da ciência moderna Quando Haggett evoca as tradições excepcionalistas em geografia faz apelo também à identificação entre a idéia de unicidade fenomenal e a geografia regional tradicionalista Aliás desde o início de seu texto ele marca sua discordância em relação à escola francesa de geografia dizendo que sua abordagem se afasta sensivelmente da conduta tradicional da geografia 258 humana Brunhes 1925 Vidal de La Blache 1922 preocupada em colocar questões de natureza biográfica sobre os fenômenos observados e acrescenta que quando nos interessamos pelo único não podemos mais do que contemplar sua unicidade Donde a situação atual pouco satisfatória as pesquisas sistemáticas gerais e a geografia regional fundada sobre a idéia de unicidade dificilmente colaboram8 Para D Harvey o peso da tradição se situa na herança kantiana de um espaço considerado de maneira absoluta Este tipo de raciocínio segundo Harvey repousa na hipótese segundo a qual todas as localizações são únicas A concepção que apreende as regiões como realidades objetivas verdadeiras individualidades geográficas deriva deste mesmo raciocínio de um espaço tomado absolutamente A pesquisa dos geógrafos em busca da natureza intrínseca das regiões característica da geografia clássica deve segundo Harvey ser vista como uma questão metafísica sem nenhuma relação com a idéia de ciência moderna Esta última concebe um espaço relativo no qual a localização depende do gênero de coordenadas escolhidas A escolha é também relativa aos objetivos de cada pesquisa e não há em princípio um sistema de coordenadas melhor do que os outros tudo depende da finalidade do trabalho Todos estes autores são unânimes em afirmar que existe uma tradição na geografia dos estudos qualitativos ou monográficos que deve ser descartada Esta renúncia é justificada em nome da geografia moderna que necessita se alinhar metodologicamente às disciplinas científicas para merecer ser considerada como parte deste conjunto De fato o argumento mais freqüentemente invocado no discurso destes autores é a necessidade de se fazer da geografia uma ciência ou seja um conhecimento moderno do mundo No discurso destes autores a ciên 8 HAGGETT Peter Locational Analysis in Human Geography trad francesa de FRECHOU A Colin Paris 1973 op cit pp 1213 259 cia nada tem em comum com a geografia que tinha sido produzida até então Há aí efetivamente uma firme vontade de estabelecer bem a fronteira entre o antigo a tradição e o novo a ciência moderna Segundo Bunge o objetivo da pesquisa é a integração entre o conhecimento geográfico e a metodologia científica Uma filosofia geral da ciência orienta a reflexão sobre o lugar da teoria Desta forma a geografia então definida recebe o nome de teórica teorética As teorias se estruturam em dois planos por sua relação com os fatos ou seja no caso da geografia pela descrição e por sua relação com a lógica seguindo um modelo matemático O único meio de estabelecer um conhecimento científico é segundo Bunge pela ligação entre os fatos a lógica e a teoria Para ele a geografia tradicional teria privilegiado somente a primeira parte descartando completamente a segunda a que diz respeito ao conhecimento analítico Todavia mesmo a descrição da geografia tradicional é criticada pois uma descrição para obter um verdadeiro interesse científico necessita de um caráter de generalização metódico que estava ausente na maior parte dos casos anteriores De acordo com Bunge os geógrafos científicos se distinguem dos descritivos por sua maneira de conceber o papel da descrição para os primeiros ela é um meio para os outros um fim em si A propósito da descrição Harvey acreditava também que é necessário que ela seja realista e racional e acrescenta que a análise moderna sugere de fato que a descrição cognitiva e a explicação são diferentes meramente em grau não em gênero Aliás para Harvey a descrição científica formal está na base da explicação9 Se a geografia tradicional jamais chegou à explicação foi em parte porque adotou um modelo de descrição que não correspondia aos critérios da ciência moderna e teórica 9 HARVEY David Explanation in Geography op cit pp 5 e 10 260 A geografia teórica uma revolução O estabelecimento de uma geografia verdadeiramente científica e teórica deve preencher certas condições Segundo Bunge a clareza a simplicidade a generalidade e a exatidão são as condições mais importantes Estas qualidades decorrem diretamente do método O uso de uma linguagem matemática nos impõe segundo Bunge uma estrutura lógica que é a única capaz de produzir uma transparência e uma objetividade necessária a todo trabalho científico Na medida em que a utilização desta linguagem e desta lógica só aparece com a geografia teórica só ela pode pretender fundar a ciência geográfica moderna Burton concebe a revolução quantitativa como o momentochave que transformou a natureza do conhecimento geográfico Esta revolução significou a construção de um verdadeiro campo teórico de investigação A partir da lógica e da matemática a geografia pôde desenvolver métodos de verificação e de previsão e esta possibilidade transforma a natureza profunda da geografia Sempre segundo Burton o caminho a cumprir para se tornar uma disciplina científica passa pelo desenvolvimento de teorias e modelos em todos os ramos da investigação geográfica A obra de Harvey The Explanation in Geography foi sem dúvida alguma uma referência fundamental para o desenvolvimento da teoria analítica na geografia Estando a revolução concluída o objetivo geral de Harvey era o de apreciar neste processo as tendências gerais da ciência e suas aplicações na geografia Do ponto de vista metodológico Harvey adota a opinião sustentada por Hempel que descreveu todo o procedimento geral recomendável à ciência para chegar a uma concepção objetiva e analítica A argumentação de Hempel é inspirada fundamentalmente nas ciências da natureza e seus exemplos das etapas da ciência a observação a experimentação a modeliza ção a verificação e a concepção das teorias são freqüentemente tiradas da física da química e da biologia A filiação racionalista do pensamento de Harvey aparece também claramente no fato de que ele justifica seus pontos de vista sobre a importância da lógica matemática referindose freqüentemente à obra de Russell e de Carnap O sentido da explicação científica os tipos de teoria as formas da linguagem são portanto diretamente inspirados pela corrente da teoria analítica que dá corpo àquilo que é conhecido como positivismo lógico ou neopositivismo A estrutura do livro de Harvey apresenta um procedimento similar ao dos outros exemplos citados precedentemente A geografia anterior é julgada insuficiente ou inapta a responder às questões colocadas pelos tempos modernos A tradição dos estudos geográficos é também vista como um obstáculo ao advento de uma geografia objetiva e positiva Os campos tradicionais na pesquisa geográfica singularizam e afastam o discurso geográfico das outras disciplinas Estes campos são portanto a causa principal do atraso relativo da geografia e qualquer vontade de mantêlos afasta um pouco mais a geografia do domínio das disciplinas científicas Harvey também está em total desacordo com Hartshorne a respeito da especificidade da geografia pois os limites da geografia são os mesmos que os das outras ciências A concepção de Hartshorne inspirada de Windelband Dilthey e Rickert que procuravam distinguir as ciências nomotéticas das ciências idiográficas parece a Harvey inaceitável para uma ciência que quer repousar sobre fundamentos metodológicos sólidos Da mesma forma a aceitação das teses kantianas que vêm sendo usadas muito mais como suporte para a tradição da pesquisa do particular isto é pelo método idiográfico contra o desafio de uma nova geração que trabalha em um estilo mais nomotético10 Este conflito de gerações antagônicas caracteriza a passa gem de uma perspectiva clássica para uma perspectiva moderna A geografia moderna deve responder ao desafio dos novos tempos através da construção de novas perspectivas técnicas e justificações Temos sido obrigados a insistir sobre a complexidade dos sistemas axiomáticos sobre construção de modelos teóricos sobre a linguagem matemática entre outras coisas Esta abordagem não tem sido provavelmente do gosto de muitos geógrafos acostumados às abordagens mais tradicionais para desvelar os mistérios que os cercam Sem dúvida isto pode horrorrificar estes que procuram compreender examinando detalhadamente mapas peregrinando pensativos e atentos por ruas e campos revendo dados sepultados em arquivos poeirentos remexendo reportagens de velhos jornais escavando com sondas pedológicas e mergulhando em cavernas calcárias observando e esperando formar sua própria experiência perceptiva treinandose a apreciar11 O caráter revolucionário da geografia analítica se manifesta assim pelo esforço em expulsar qualquer traço tradicional do campo de pesquisas geográficas o que traduz bem a vontade de ruptura em relação à tradição Por intermédio de novas técnicas e perspectivas a geografia abre caminho para o reconhecimento e o prestígio dos novos tempos O moderno movimento na direção de uma universalidade metodológica pode ser visto como uma tentativa de ser mais explícito no estabelecimento de leis freqüentemente reprimidas nos esboços explicativos que os geógrafos costumam oferecer12 A revolução reescreve a história da geografia Nos textos analisados há uma clara redefinição do sentido do determinismo na geografia Uma espécie de consenso é forjado em torno da idéia de que a geografia a partir do início do século após a refutação do determinismo ambientalista teria perdido o caminho do conhecimento científico A atitude de Ratzel é freqüentemente apresentada com elogios como sendo aquela de um geógrafo que pretendia estabelecer um conhecimento objetivo geral e científico As premissas do discurso ratzeliano são discutíveis mas seu processo de buscar leis generalizações sustentadas por hipóteses teóricas é freqüentemente considerado como a atitude correta para a ciência em oposição às outras tradições As reações contra o excesso do determinismo geográfico foram ao mesmo tempo negativas e positivas Aspecto negativo o seu abandono conduziu à recusa quase sistemática de qualquer teoria em seguida aquilo que os geógrafos publicaram tornouse mais preciso mas também infinitamente menos interessante A descrição substituiu a hipótese a repetição o debate Aspecto positivo os geógrafos procuraram resolver as complicações dos sistemas regionais sem jamais se fiar nestas chaves simples que fornecem as relações de causa e efeito 13 Esta reinterpretação da história da geografia tem a intenção fundamental de conferir um lugar de honra ao determinismo visto como o verdadeiro predecessor da conduta científica moderna Neste sentido o determinismo é a única tradição verdadeira da ciência geográfica Burton por exemplo nos indica que tudo se passou como se após o intermédio da idiografia a geografia tivesse retomado o caminho da ciência Segundo ele há mais do que uma simples coincidência no fato de que a nova geografia seja também conhecida como neodeterminismo A diferença mais importante se situa ao nível do conteúdo pois o determinismo ratzeliano se apresenta sob relações ingênuas Grosseiras tentativas sistemáticas de explicação foram feitas por deterministas mas nos anos 20 elas estavam em desgraça14 A geografia analítica por possuir instrumentos eficientes linguagem métodos e técnicas teria a possibilidade de apresentar a face verdadeiramente científica do determinismo moderno Algumas vezes a literatura ulterior busca diminuir a filiação entre estes dois determinismos o do meio ambiente e aquele produzido pela perspectiva analítica Um dos argumentos é o de que a geografia teórica possui antes uma aproximação probabilista e portanto escapa ao mecanismo simples do determinismo Contudo Harvey nos mostra que a adoção de modelos probabilistas supõe em princípio e numa certa medida a aceitação do determinismo como premissa A diferença introduzida se situa no grau de positividade das respostas15 Em outros termos o determinismo moderno é do tipo relativo isto é afirma um fato e ao mesmo tempo anuncia a possibilidade de erro tudo isso a partir de proporções bem medidas matematicamente Ao lado de Ratzel o outro autor freqüentemente mencionado pela Nova Geografia é Schaefer considerado como uma espécie de padrinho desta corrente teórica Morto em 1953 Schaefer não pôde assistir ao desenvolvimento da revolução quantitativa mas seu nome era sempre lembrado no combate que conduziu contra a geografia tradicional personificada na figura de Hartshorne O verdadeiro culto a Schaefer chegou a desenvolver uma lenda segundo a qual ele teria sido objeto de investigações por parte da CIA denunciado por geógrafos tradicionalistas que se sentiam ameaçados por suas posições científicas16 Assim a geografia analítica encontrou um meio de criar um mártir da nova ciência uma espécie de Galileu da New Geography Um novo modelo para a geografia David Harvey afirma que a geografia desenvolveu cinco principais temas de pesquisa a diferenciação regional a paisagem a relação homemmeio a distribuição espacial e o tema geométrico A história da geografia segundo ele pode ser vista como a tentativa de explicar e de teorizar estes temas Os fenômenos relativos à distribuição espacial a partir das teorias locacionais assim como as análises geométricas foram entre todos estes temas os mais sensíveis à formalização na geografia os outros permanecendo sempre no nível da simples descrição David Harvey também identificou os gêneros possíveis de explicação na geografia descrição cognitiva análise morfométrica análise de causaefeito explicação temporal análise funcional e ecológica e finalmente a análise sistemática A ligação entre os temas apresentados mais acima e os gêneros de explicação parece imediata Do raciocínio de Harvey é possível deduzir que a análise sistemática é a forma mais poderosa e apropriada à explicação na geografia Aliás os temas que apresentam segundo ele bons resultados teóricos são justamente aqueles que foram tratados através desta metodologia a diferenciação espacial e as análises geométricas Sempre segundo Harvey a forma de explicação descritiva é primitiva as relações de causaefeito bem como a explicação pela dimensão histórica arriscamse sempre a se deixar influenciar por questões metafísicas A análise funcional por sua vez é parcial por privilegiar somente uma relação entre os fenômenos a da função entre todas as outras existentes Desta forma a apresentação do problema da explicação em geografia para D Harvey acentua a primazia da análise sistêmica como o meio mais adaptado e mais de acordo com a revolução metodológica na geografia A geografia moderna sob a influência desta corrente teórica produz então uma nova síntese Nesta versão a análise espacial constitui o objeto fundamental da geografia e o método sistêmico é aquele com que se pode explicar cientificamente os fenômenos em suma a concepção sistêmica deve ser o instrumento da nova cosmovisão geográfica A teoria geral dos sistemas retoma os mesmos termos definidos pela racionalidade analítica Ela faz parte como a lógica matemática dos novos instrumentos que definem uma abordagem moderna da ciência O que constitui a força desta teoria é a uniformidade lógica de todo processo de conhecimento Segundo seus defensores todos os fenômenos podem ser vistos como sistemas independentemente do caráter particular ou da natureza dos elementos que os compõem e das relações que os unem A idéia geral de sistema é inspirada nas concepções da termodinâmica sobretudo no segundo princípio conhecido pelo nome de CarnotClaudius que define a noção de entropia Esta noção corresponde à probabilidade de mudança dentro de um sistema em função de seu grau de organização A variação entre estes dois elementos obedece à seguinte regra quanto maior o valor da entropia maior o grau de desorganização do sistema isomorfismo Desta maneira os baixos níveis de entropia correspondem aos altos níveis de ordem interna em um sistema A estas duas noções fundamentais se associa aquela da informação Ela pode ser definida como sendo o valor estatístico da incerteza provável A informação é então o contrário da entropia e por isso é conhecida também como negentropia Os sistemas são portanto poderosos instrumentos do cálculo de probabilidade Eles podem ser analisados segundo seus estados de organização sucessivos Através dos modelos e variando o valor da entropia é possível estimar o comportamento provável de um sistema Este gênero de experimentação foi 267 feito em diversos campos da ciência A economia e a psicologia entre as ciências sociais foram as mais sensíveis a este método David Harvey observa a aplicabilidade destas noções na geografia e nos cita alguns exemplos e tentativas já realizados Seria injusto não mencionar uma certa hesitação de Harvey em relação ao otimismo excessivo com o qual a teoria geral dos sistemas foi acolhida na geografia De fato ele propõe uma distinção entre dois níveis diferentes para a utilização desta teoria Ao nível metodológico acredita que se trata de um instrumento fundamental que fornece uma grande capacidade explicativa para a geografia Ao nível filosófico identifica dois grandes perigos primeiro a tentação de considerar a teoria dos sistemas como uma metateoria uma espécie de teoria das teorias Em segundo lugar Harvey vê também a possibilidade de que se desenvolva uma metafísica perigosa a partir de uma idéia de necessidade lógica universal Este último ponto de vista já tinha sido suspeitado por Bergson que via no segundo princípio da termodinâmica a mais metafísica das leis físicas Assim para Harvey a geografia moderna deve sempre prestar atenção à tentação finalista limitando a importância dos instrumentos analíticos a seu papel metodológico e a partir daí ele faz suas as preocupações do racionalismo mais moderno O elemento mais sedutor da concepção sistêmica é a possibilidade de prever ou de antecipar fatos através do conhecimento científico sem o recurso a uma lógica mecânica de causaefeito Segundo Bunge esta capacidade de avançar resultados é a característica distintiva da geografia moderna Para a maior parte dos geógrafos ligados a esta corrente o prestígio da geografia dependeria da aplicação deste conhecimento científico ao terreno prático da intervenção 268 De fato a participação dos cientistas na planificação era cada vez mais requisitada Os anos 5060 foram efetivamente marcados por esta participação que passava também por contatos interdisciplinares mais estreitos A geografia por intermédio da visão sistêmica aproximouse sobretudo da economia espacial Alguns modelos inspirados na concepção neoclássica incluindo a hipótese de um comportamento racional e da maximização de lucros e oportunidades foram retomados nas pesquisas geográficas Contudo a cooperação interdisciplinar limitavase aos domínios científicos engajados nas mesmas vias de transformações metodológicas como a sociologia formalista a psicologia behaviorista e a economia de inspiração neoclássica A cooperação interdisciplinar aliada ao interesse pelas aplicações práticas e pela renovação metodológica levou a Nova Geografia a produzir uma redefinição dos conceitos tradicionais da geografia clássica A região por exemplo tornouse um modelo para a análise espacial como uma estrutura lógica e hierarquizada Nesta perspectiva Grigg se esforçou em caracterizar os sistemas de regiões que definiu recorrendo a uma classificação analítica O sistema regional serve portanto para explicar certas dinâmicas e o recorte territorial depende dos parâmetros do observador que são eles mesmos relativos à finalidade da pesquisa Segundo Grigg a região enquanto entidade real está morta e a regionalização deve ser a partir de então considerada unicamente como um simples meio de análise Este gênero de abordagem é conhecido na geografia como análise regional e tornouse um dos temas preferenciais da visão sistêmica aplicada à geografia Foi em grande parte segundo esta 269 inspiração que os geógrafos participaram dos trabalhos práticos de planificação A concepção sistêmica renovou portanto completamente a análise geográfica A região não é mais vista como uma unidade territorial ela é concebida como uma classe espacial que faz parte de um sistema hierarquizado Como propunha Schaefer a geografia abandona a noção de lugar pela concepção de espaço Desta maneira a singularidade pode ser substituída pela generalização O exemplo da regiáo é eloquente mas em todos os domínios da geografia mudanças significativas foram efetuadas para se trabalhar de acordo com as novas perspectivas teóricas e técnicas Na mesma época uma outra corrente nascia nas ciências sociais o estruturalismo Esta corrente desenvolveuse primeiro no domínio da lingüística mas rapidamente começou a exercer uma influência fundamental sobre as outras ciências sociais A geografia aparentemente não foi sensível a esta tendência A razão fundamental da preferência da geografia pela teoria geral dos sistemas em detrimento do estruturalismo é devida segundo Dosse à filiação da primeira às ciências da natureza enquanto que o estruturalismo nasceu no quadro das ciências humanas Esta ausência é tanto mais surpreendente que pudemos medir a que ponto o estruturalismo privilegiou as noções de relações em termos de espaços em detrimento de uma análise em termos de gênese A diacronia foi substituída pela sincronia Esta escolha explicase talvez pela preocupação de rigor positivo e pela tradição de um modelo hipotéticodedutivo que caracterizam as ciências da natureza Talvez seja preciso também ver aí o traço da tradição temática do objeto homemmeio advinda da geografia clássica e que conseguiu perdurar para além da revolução que pretendia tudo renovar De toda forma a adoção do modelo sistêmico podia finalmente fazer a geografia passar de uma posição analítica retrospectiva para uma aproximação prospectiva pois se trata de um modelo nascido do racionalismo positivista Os elementos recorrentes desta orientação metodológica são mutatis mutandis os mesmos para todas as correntes afiliadas ao racionalismo Tratase de um modelo de ciência que reclama para si a objetividade e a precisão por intermédio de um método científico rigoroso e o recurso a este método significa também a perspectiva de respostas e verificações positivas isto é afirmativas e gerais que permitiriam ao mesmo tempo reforçar o prestígio da disciplina e convidála a agir no campo direto da sociedade A Nova Geografia e a modernidade O que retorna mais freqüentemente no discurso dos autores ligados a esta corrente da Nova Geografia é sem dúvida a evocação de uma geografia científica e moderna Construir uma perspectiva geográfica moderna sustentada por um método lógicomatemático parecia ser o caminho incontornável dos novos tempos O comentário de Burton que em 1963 dizia que a revolução teórica havia acabado na geografia nos dá uma idéia do pretenso sucesso destas aspirações Se olharmos estes textos no quadro do combate da modernidade combate perpétuo entre o tradicional e o novo eles aparecem como cartas de intenções que anunciam a chegada definitiva da geografia aos novos tempos Da mesma forma que os momentos de grandes convulsões sociais as revoluções científicas são seguidas de períodos de estabelecimento da nova ordem Podese portanto considerar que a simples denúncia de um comportamento tradicional defasado e antiquado foi a base da eclosão da Nova Geografia e que após esta eclosão tal corrente procurou estabelecer ao longo dos anos 60 e 70 sua legitimidade avançando os resultados obtidos Estes resultados foram justamente o alvo da maior parte das críticas dirigidas contra este modelo As hesitações e contestações não podiam mais ser interpretadas como simplesmente a reação tradicionalista e os limites do novo método começaram a se tornar objeto de debates Alguns anos mais tarde os geógrafos que tiveram o papel de portavozes deste movimento no início tornaramse eles mesmos seus críticos Desta maneira a metade da década de setenta viu o poder inexorável da revolução quantitativa sucumbir ao peso de outros horizontes críticos de outras revoluções De qualquer forma a discussão entre antigos e modernos na geografia claramente exposta durante a revolução quantitativa deixou marcas fundamentais A partir deste movimento o debate epistemológico passou a ocupar um dos primeiros lugares no leque das questões geográficas Não queremos absolutamente dizer que este debate esteve ausente até então A geografia clássica conheceu também este gênero de controvérsia como vimos anteriormente A diferença é que no curso destes últimos anos o debate se tornou mais claro divulgando suas filiações filosóficas e aceitando o fato de que esta é uma discussão em torno da legitimidade metodológica De uma certa maneira o que mudou foi que a natureza da geografia não pode mais ser caracterizada unicamente pela especificidade de seu objeto pelo olhar do geógrafo ou por seu papel sintético em relação às outras disciplinas A identidade geográfica a partir dos anos sessenta definiuse como o reflexo do pertencimento a um pólo epistemológico preciso Foi também por esta referência clara à metodologia como fundamento da discussão científica moderna que se fez a passagem de uma geografia clássica para uma geografia moderna David Harvey nota também esta mudança de perspectiva afirmando que o metodólogo está de agora em diante mais comprometido com a lógica da justificação do que com a ligação filosófica de suas crenças em relação à natureza da geografia22 A lógica da justificação científica é no entanto a que está mais sujeita a controvérsias e os anos ulteriores expressarão através das diversas orientações da pesquisa geográfica seus pontos de vista contraditórios 22 HARVEY David Explanation in Geography op cit p 6 273 11 O horizonte da crítica radical O entusiasmo e o vigor da geografia analítica foram progressivamente perdendo o fôlego em face das múltiplas críticas e das dificuldades impostas sobretudo pelas considerações do caráter político do espaço feitas à geografia O progresso do início dos anos sessenta perdia seu impacto e as numerosas promessas contidas no discurso da Nova Geografia começavam a mostrar seus limites Estas críticas podem ser reunidas em dois grandes grupos as de caráter teóricometodológico e as que consideram o domínio prático e ideológico da Nova Geografia O primeiro grupo diz respeito à utilização de modelos econômicos de inspiração neoclássica ou neoliberal1 Estes modelos pressupõem um com 1 Este tema aliás gerou uma longa e viva polêmica entre Brian Berry e David Harvey Ver BERRY B Revolutionary and Counterrevolutionary Theory in Geography A ghetto commentary Antipode nº 4 1972 pp 3133 Review of H M Rose ed Perspectives on Geography Geography of the Ghetto Perception Problems and Alternatives AAAG nº 64 1974 pp 342345 274 portamento social perfeitamente racional isto é uma conduta que em geral busca a satisfação máxima de suas necessidades a partir de uma via analítica racional e objetiva A maioria destes modelos supõe também uma concorrência perfeita uma difusão igualitária da informação e um espaço isomórfico O primeiro ponto da controvérsia é o da motivação racional Ao longo de toda a década de 60 a antropologia cultural e uma parte da sociologia consagraramse a pesquisas que punham em relevo a complexidade dos comportamentos sociais Esses estudos mostram que as atitudes sociais se reportam em geral ao contexto de cada comunidade estabelecendo valores e atitudes que têm pouca relação ou quase nenhuma com um comportamento estritamente racional e utilitário Em outros termos o indivíduo não pode ser comparado a um agente econômico perfeito e a análise racional das oportunidades deve passar pelo estudo de outros elementos igualmente determinantes na ação social Desta maneira a corrente da crítica radical tem a tendência a considerar o comportamento social como o resultado de um conjunto de elementos alguns gerais e determinantes outros particulares ou contingentes Os resultados são portanto bastante diferentes daqueles que podem ser antecipados por uma análise racional que se baseie tão somente na idéia de maximização das vantagens O mesmo pode ser dito em relação à concorrência Se teoricamente no sentido da modelização a concorrência pode ser considerada como perfeita isto é todos os agentes supostamente disporiam dos mesmos níveis de oportunidades e de independência para decidir na prática esta concorrência não existe A força dos grandes grupos econômicos os efeitos dos monopó Review of Social Justice and the City of David Harvey Antipode nº 6 1974 pp142145 e HARVEY D A commentary on the comments Antipode nº 4 1972 pp 3641 Discussion with Brian Berry Antipode nº 6 1974 pp 145148 Review of B J Berry The Human Consequences of Urbanisation AAAG nº 65 1975 pp 99103 275 lios os favores políticos são elementos muito mais importantes a despeito de seu caráter contextual e particular para a localização e o desenvolvimento da atividade econômica do que a pretensa concorrência perfeita e geral A informação da mesma forma não pode ser vista sob a perspectiva de uma pretendida eqüidade A informação figura entre os elementos que são controlados socialmente no jogo pelo poder e pelo prestígio social Por fim o espaço isomórfico dos modelos não se assemelha em nada à imagem da realidade de um espaço carregado de valores tradições hábitos etc Os obstáculos espaciais não são exclusivamente de natureza física ao contrário são majoritariamente da ordem da percepção social resultado de um complexo jogo de agentes diversos Os princípios que sustentaram os modelos teóricos mais prestigiados da geografia moderna foram então vistos com desconfiança As condições de abstração teórica da Nova Geografia eram assim acusadas de se apoiarem em bases falsas Estas críticas não recomendavam no entanto um retorno à concepção dos fenômenos como individualidades Tratavase antes da exigência de um modelo que pudesse verdadeiramente levar em conta as condições existentes sem se deixar influenciar por realidades desejadas Esta crítica teóricometodológica acrescentava ainda que a sofisticação da descrição e das técnicas não estava de acordo com a simplicidade explicativa empregada pela Nova Geografia O conjunto dos instrumentos quantitativos seria apenas uma roupagem renovada das velhas questões da geografia clássica Para esta visão crítica a corrente teórica tentava fazer avançar a geografia somente pela consideração formal mantendo intocáveis os eixos explicativos da velha geografia Tratavase portanto segundo a opinião destes críticos radicais de uma falsa revolução O outro ponto de vista consistia em apreciar os resultados práticos e sobretudo o papel político da Revolução Quantita 276 tiva Aí também as críticas eram definitivas A idéia de uma geografia que deveria intervir na realidade capaz de dar respostas objetivas neutras e justas aos problemas sociais foi então firmemente contestada e a ação dos geógrafos nos planos de gestão do território foi interpretada como sendo tãosomente uma tentativa de preservar o status quo A pretensa objetividade segundo estes críticos traduzia em verdade um compromisso com um ponto de vista ideológico da classe dominante Sem proceder a uma verdadeira crítica dos modelos gerais de interpretação a objetividade proclamada limitavase somente ao tratamento de dados evitando assim qualquer questionamento da ordem social Para estes críticos a ciência só pode ser interpretada segundo um ponto de vista político e a pressuposição de neutralidade já é em si mesma uma premissa ideológica A ciência é o produto de uma sociedade desigual na qual o poder é exercido por grupos minoritários que controlam também a produção do saber seus objetivos e aplicações O discurso da objetividade é portanto construído sobre aparências e tem como objetivo fundamental reproduzir e justificar cientificamente as estruturas do poder e os prestígios sociais já constituídos Destes dois grupos de críticas teóricometodológica e ideológicoprática decorrem duas associações que vão marcar profundamente a perspectiva radical A primeira associação relaciona o modelo da ciência teórica e o idealismo O comportamento racional como princípio de análise é a conseqüência de uma falsa idéia segundo a qual o homem é essencialmente racional Esta idéia generaliza a racionalidade independente dos contextos históricos e da situação particular da inscrição dos indivíduos nas classes sociais criando uma noção abstrata sem nenhuma correspondência com o real Um conceito não pode partir de uma idéia abstrata para serem válidos os conceitos devem se referir a situações historicamente definidas Marcase assim a diferença entre um procedimento que parte de uma idealização para compreender a realidade e outro que 277 parte da realidade material para construir conceitos explicativos isto é opõese uma ciência idealista e ideológica a um verdadeiro conhecimento históricomaterialista Outra associação efetuada é aquela do positivismo como sendo a forma da ciência burguesa por excelência Esta forma da ciência é fundamentalmente um discurso de legitimação do exercício desigual do poder e do controle social Os modelos de desenvolvimento estudados pela geografia sob esta perspectiva buscam assim dar apenas uma aparência de naturalidade ao desenvolvimento do capitalismo pois as correlações e leis enunciadas de um ponto de vista positivista consideram as formas desiguais da produção do espaço como as únicas possíveis O positivismo confere um sentido eterno e irrefutável ao desenvolvimento do capitalismo que é contudo carregado de circunstâncias históricas e de relatividade social A ciência que se proclama absolutamente objetiva cai portanto na armadilha do historicismo que ao estabelecer leis e regras que se pretendem válidas para todos os tempos impõe ao olhar retrospectivo a certeza contemporânea Se o positivismo se apresenta como o único método rigoroso é justamente para neutralizar um saber crítico construído sob parâmetros que valorizam a existência de classes sociais O discurso crítico considera portanto a ciência em sua forma dominante como um instrumento de alienação social e os métodos positivistas como procedimentos eficazes para reproduzir os modelos de desigualdade social e espacial Esta crítica é uma das mais difundidas nos textos dos geógrafos radicais que queriam demonstrar assim a grande ruptura a verdadeira revolução efetuada pelo horizonte crítico em oposição à ciência tradicional positivista Este discurso enfatizava a concepção de que a verdadeira revolução na metodologia da geografia moderna só chega a partir da crítica radical Surge destas contradições societais desigualdades ação do capitalismo monopolista segregação espa 278 cial uma ciência radical que procura explicar não somente o que está acontecendo mas também prescreve uma mudança revolucionária2 Posicionandose simultaneamente contra a geografia tradicional e a geografia dita quantitativa os radicais pretendiam fundar uma nova ciência que devia estar de acordo com as bases de uma nova sociedade A ciência radical é pois o agente consciente da mudança política revolucionária3 Os argumentos a exemplo do que havia feito a corrente analítica utilizavam também a idéia de defasagem e de insuficiência Para os radicais no entanto a idéia principal era a de crise Crise do capitalismo crise política crise da ciência política do positivismo Como vimos anteriormente a idéia de crise tornouse uma imagemforça da modernidade que em seu nome legitima a adoção do novo para substituir o que é então considerado como superado e em choque com os novos tempos Encontrase aqui uma estrutura similar àquela do discurso dos quantitativistas Há de imediato uma crítica à velha geografia ou geografia tradicional seguida da crítica à geografia analítica para enfim introduzir o projeto de uma nova ciência que irá finalmente dissolver toda a inadequação a defasagem e as dicotomias para fundar uma nova geografia Sob esta nova forma a objetividade possui uma natureza diferente daquela estabelecida pela ciência positivista e só através dela se poderá por assim dizer revelar a estrutura da realidade última Neste sentido a revolução radical assim como a precedente pensou em produzir um método de análise infalível rigoroso e preciso Ela também reclamava uma posição científica fundada sobre um conhecimento objetivo sem os obstáculos ideológicos conser 2 PEET R Introduction Radical Geography Alternative viewpoints on contemporary social issues op cit p 1 3 PEET R Introduction Radical Geography Alternative viewpoints on contemporary social issues op cit p 7 279 vados pela geografia analítica Tratavase portanto de um saber a serviço de uma transformação social e não mais de um saber visando manter as estruturas sociais As categorias de análise utilizadas eram igualmente formais e abstratas à diferença de que partiam de situações históricas concretas e não de premissas e pressupostos ideais Enfim tal corrente acredita estar fundada sobre o conhecimento da essência dos fatos e não das suas aparências As ligações deste horizonte crítico com o materialismo histórico e dialético seja pela utilização direta de suas categorias analíticas seja pela valorização de um discurso político engajado na ciência são razões para que se examinem algumas características desta doutrina para melhor perceber o desenvolvimento da crítica radical na geografia O discurso científico do marxismo A obra de Marx examinada com o distanciamento necessário é sem dúvida inspirada pela idéia de ciência que caracterizou o séc XIX e por isso considerada por muitos como o último grande sistema filosófico do Iluminismo Segundo por exemplo Domenbach na medida em que ele o capitalismo necessita de uma doutrina ousarei dizer que foi Marx que o forneceu otimismo racionalista mística da produção confiança nos dons inesgotáveis da natureza Tudo isto coroado pela utopia do fim da história este momento maravilhoso no qual o pleno emprego das forças humanas colocará fim às condições limitadas das formas precárias de produção4 Este sistema global de explicação da realidade deveria ser capaz de compreender a totalidade dos problemas sociais Seus elementos essenciais estão ligados à produção da vida material ou ao plano econômico lato sensu pois as con 4 DOMENBACH JeanMarie Enquête sur les idées contemporaines Seuil Paris 1987 p 29 280 dições desta produção são a base de toda estrutura social e organização humana A perspectiva de Marx é produzir um saber objetivo e racional objetivo pois representa a observação do realhistórico racional pois é guiado por demonstrações e deduções lógicas rigorosas e necessárias A produção em geral é uma abstração mas uma abstração racional na medida em que sublinha e precisa efetivamente os traços comuns evitando assim para nós a repetição No entanto este universal ou este caráter comum isolado por comparação é ele mesmo um conjunto articulado complexo no qual os membros divergem para se revestir de determinações diferentes Alguns destes elementos pertencem a todas as épocas outros são comuns somente a algumas Algumas determinações serão comuns à época mais moderna e à mais antiga Mas se é verdade que as línguas mais evoluídas têm em comum com as menos evoluídas certas leis e determinações é precisamente o que constitui sua evolução o que as diferencia destes caracteres gerais e comuns5 O materialismo histórico e dialético é o método que permite a passagem da imagem caótica do real para uma estrutura racional organizada e operacionalizada em um sistema de pensamento A primeira etapa deste método é pois a busca dos elementos essenciais comuns que estruturam o real O leitor que quiser me seguir deverá se decidir a elevarse do singular ao geral6 A tradição da filosofia alemã costumava na observação do real centrar seu interesse no domínio do fenomenológico 5 MARX Karl Contribution à la critique de léconomie politique Paris ed Sociales 1977 p 151 6 MARX Karl Prefácio à Contribution à la critique de léconomie politique Paris ed Sociales 1977 p 1 281 ou seja daquilo que aparece A perspectiva marxista encontra no método materialistahistórico o instrumento capaz de projetar a percepção para além do fenomenológico fazendo sobressair as verdadeiras essências escondidas atrás das aparências A realidade última é portanto revelada por intermédio da razão que reconhece no movimento caótico da sociedade os fatores fundamentais de sua organização e de seu desenvolvimento ou nas palavras do próprio Marx Reconhecer para além das aparências a essência e a estrutura internas Marx introduz a noção de uma razão histórica materialmente determinada em oposição à concepção do idealismo que definia o real como um produto da razão absoluta Desta maneira o marxismo afirma que o sujeito do conhecimento historicamente determinado e contextualizado socialmente é capaz de ser apreendido pela ciência a partir das categorias essenciais que o envolvem a produção a reprodução o consumo a troca a propriedade o Estado o mercado e as classes sociais Estas categorias são concebidas a partir de um raciocínio que desenvolve uma cadeia de determinações entre elas Desta maneira a produção determina a troca que por sua vez é determinada pelo mercado este último é o princípio de determinação da divisão do trabalho que dá a base à produção Uma produção determinada determina portanto um consumo uma distribuição uma troca determinada as relações determinadas que estes diferentes momentos possuem entre si Estas categorias abstratas realizam portanto um percurso de determinações que torna possível o estabelecimento de relações necessárias entre os diversos fenômenos recolocados dentro de um verdadeiro sistema A finalidade desta conduta é compreender a sociedade em seus aspectos fundamentais suas determinações leis e regras de 7 MONLEON Jacques de Marx et Aristote Perspectives sur lhomme FAC ed Paris 1984 p 20 8 MARX Karl Contribution à la critique de léconomie politique op cit p 165 282 evolução Para chegar aí é preciso reconhecer historicamente o desenvolvimento destas categorias em diversos momentos e estabelecer o sentido e a direção de sua evolução É manifestamente este último método que é correto do ponto de vista científico No plano teórico a ciência inspirada no marxismo busca as determinações atuantes sobre os elementos ou em outras palavras as regras do movimento geral do sistema social a lei da acumulação a lei da composição orgânica do capital a lei dos rendimentos decrescentes as leis da renda diferencial etc e através delas podem ser gerados modelos abstratos prospectivos A base do sistema materialistahistórico é dada pelas regras que determinam o tipo de relação de produção frente ao desenvolvimento das forças produtivas estes dois elementos são os termos fundamentais que definem um modo de produção e ao mesmo tempo constituem a causa da transformação dialética Desta maneira a concepção do progresso social na teoria marxista reforça a idéia do mito da modernidade A sociedade se transforma segundo o marxismo por momentos de crise de lapso entre as relações de produção antigas em concorrência com novas forças produtivas Tratase também de uma dinâmica que acentua as rupturas e a progressão inexorável do novo sobre o antigo O marxismo é essencialmente moderno também na medida em que faz apelo a um método moderno base da legitimidade de seu sistema explicativo um sistema lógico racional fundado em determinações objetivas No plano prático a perspectiva marxista define uma nova atitude do cientista em sua relação com a sociedade sempre crítico e pronto a denunciar as armadilhas ideológicas montadas pelo saber comprometido com o status quo A prática científica deve favorecer a ligação entre o saber e a transformação social 9 MARX Karl Contribution à la critique de léconomie politique op cit p 166 283 Contudo exatamente como em A Comte a ciência para Marx se torna o único meio positivo de instituir a verdade e deve servir àqueles que querem agir na sociedade A denominação socialismo científico reivindicada pelo próprio Marx exprime aliás a diferença fundamental entre sua concepção racional lógica e metódica e as outras utopias socialistas que são apenas fruto da pura imaginação Em suma o modelo epistemológico do marxismo obedece sem dúvida aos princípios normativos advindos de uma racionalidade estrita e pretende intervir na realidade ungido da legitimidade conferida por seu método objetivo e geral No fim dos anos sessenta e durante toda a década de setenta o marxismo exerceu uma forte influência sobre as ciências sociais De fato esta influência se fez em dois níveis De um lado impôs uma retificação do trabalho acadêmico para enquadrálo em uma visão mais ampla e consciente do contexto político da ciência e da sociedade O marxismo foi assim o instrumento de discussões sobre a responsabilidade social dos pesquisadores e a apropriação do trabalho científico De outro lado a doutrina marxista deu a possibilidade às ciências sociais de desenvolverem modelos teóricos deterministas inteiramente concebidos na esfera do domínio social isto é independentes dos modelos das ciências naturais que até então eram os únicos a propor modelos verdadeiramente racionalistas e objetivos Estas duas características a definição de um novo papel político do saber e a formulação de um modelo nomotético para as ciências sociais são os traços mais fortes do discurso de todos os críticos radicais da geografia Todavia ainda que a geografia radical se distinga por uma perspectiva efetivamente geral comum notase em seu interior uma diferenciação importante De um lado um grupo de geógrafos sobretudo franceses trabalhou para reavaliar o peso das tradições geográficas e impor um novo ponto de vista sobre o uso político do espaço De outro lado a crítica radical abertamente inspirada do marxismo 284 muito desenvolvida nos Estados Unidos se conferiu como tarefa fundamental adaptar os instrumentos desta doutrina à análise espacial A geografia radical e o uso político do espaço A revista Hérodote lançada por Yves Lacoste em 1976 constitui o símbolo e o instrumento da difusão do pensamento crítico na França10 Desde o seu primeiro número um artigo central apontava a crise da geografia tradicional enquanto simultaneamente Lacoste publicava seu livrochave que se tornou uma pedra angular na constituição da corrente radical11 Não é nossa proposta nos demorarmos aqui na obra de Yves Lacoste reteremos dela apenas alguns pontos O primeiro diz respeito à estrutura da exposição de seus argumentos que segue uma via similar à utilizada nos textos que apresentavam a Nova Geografia O segundo se reporta à busca de uma nova legitimidade para a pesquisa geográfica a partir de novos parâmetros definidos no projeto científico desta tendência radical Lacoste inicia seu texto pela crítica à geografia tradicional aquela que ele identifica como sendo a geografia dos professores Seu caráter ultrapassado e deficiente já sublinhado pelos geógrafos da Nova Geografia é interpretado por Lacoste como a face ideológica oculta deste saber tradicional Em outros termos onde a Nova Geografia denunciava apenas uma defasagem histórica e uma incompetência científica a geografia radical acrescentou uma nova dimensão que ressalta sua operacionalidade política sua incontestável funcionalidade A geografia tradicional deixa de ser compreendida como uma etapa ultrapassada do progresso da geografia para ser vista segundo sua utilida 10 A revista Hérodote é descendente da publicação Antipode que apareceu em 1969 e fez nascer a corrente radical nos Estados Unidos 11 Attention géographie in Hérodote Editorial nº 1 jan 1976 e LACOSTE Yves La géographie ça sert dabord à faire la guerre Maspero Paris 1976 de ideológica12 A passagem para o moderno segundo Yves Lacoste não se reduz ao caráter teóricometodológico mas integra um novo elemento fundamental a natureza política inerente à reflexão espacial O argumento da utilidade ideológica é também utilizado por Lacoste para criticar a Nova Geografia que se apresenta ideologicamente como um discurso científico puro e neutro tecnocrático A crítica desta escola não ocupa no entanto um lugar de destaque na reflexão de Yves Lacoste pois a influência da corrente analítica no meio universitário francês foi bastante reduzida Assim o essencial da crítica de Lacoste diz respeito à escola francesa de geografia Vidal de la Blache foi um dos alvos favoritos da revista Hérodote pois era acusado de haver imposto uma despolitização da geografia em nome de uma falsa cientificidade A escola vidaliana segundo Lacoste privilegiava os fatos imutáveis excluindo de sua análise as mudanças mais recentes e mais ainda as relações sociais e de produção A geografia regional vista pela escola vidaliana como a geografia por excelência tornase segundo Lacoste um obstáculo no sentido epistemológico de Bachelard O conceito de região limita a extensão da reflexão a uma única escala apagando o papel do capitalismo como a força fundamental da organização do espaço A crítica de Lacoste a geografia tradicional é neste sentido muito mais radical do que a da corrente analítica A geografia da escola francesa é acusada de ser um saber essencialmente ideológico e deveria por este motivo ser rejeitada em bloco Por que e para que serve a geografia Tal era a questão fundamental da geografia crítica na França A resposta gira em 12 A crítica que eu fazia do discurso tradicional dos geógrafos era de fato o meio de mostrar a utilidade fundamental de verdadeiros raciocínios geográficos não somente para os militares mas também para o conjunto dos cidadãos sobretudo quando eles devem se defender LACOSTE Yves La géographie ça sert dabord à faire la guerre prefácio à segunda edição 1982 torno de duplos termos aparência e essência ideologia e prática geografia dos professores e dos estadosmaiores De fato a partir dos anos setenta a preocupação com o viés político começa a se inscrever mais profundamente no campo de pesquisas geográfico após um relativo domínio da economia A geografia radical anglosaxã talvez pela aceitação quase irrestrita do marxismo valoriza num primeiro momento a questão econômica antes de verdadeiramente penetrar no terreno da análise política enquanto os geógrafos franceses talvez por influência do movimento de maio de 68 se lançam neste terreno desde o começo Assim em relação ao marxismo Lacoste mantém uma posição fortemente ambígua Ele afirma textualmente que a dimensão espacial nunca foi central na reflexão marxista clássica tendendo mesmo a desaparecer nos textos mais tardios de Marx Ele afirma também que a análise marxista na geografia corre o risco de supervalorizar a História ou a economia política A geografia perde assim sua capacidade explicativa quando apela para o marxismo podendo somente trabalhar com uma causalidade histórica e econômica Da mesma forma a incapacidade explicativa da geografia a obriga a recorrer ao instrumento marxista o que tende paradoxalmente a reforçar a conduta metodológica tradicional vidaliana Desta maneira ela não é mais capaz de questionar os bloqueios específicos do discurso geográfico tradicional mantendo silêncio sobre as questões políticasespaciais fundamentais Este comentário se dirigia especialmente ao grupo de geógrafos franceses capitaneados por Pierre Georges que embora fossem politicamente filiados ao marxismo não teriam obtido êxito em renovar metodologicamente a geografia tradicional segundo Lacoste Contudo a ambigüidade do discurso de Lacoste aparece na medida em que ele também apela para certas categorias e clivagens clássicas da análise marxista É o caso por exemplo do conceito de ideologia definido como falsa consciência que está na base da crítica de Lacoste à escola francesa de geografia Inúmeros outros exemplos podem ser também encontrados em sua obra como por exemplo lutas sociais crise do sistema capitalista crise dialética do desenvolvimento histórico práxis libertária etc De fato parece que Lacoste sem se afastar completamente da grade de análise marxista tenta revalorizar a preocupação espacial Quando se refere ao imperialismo ou às táticas de guerrilhas ele destaca a importância da análise espacial como um elemento fundamental para a compreensão destes fatos Saber pensar e combater no espaço segundo os termos do próprio Lacoste corresponde ao que parece a reconhecer a veracidade das proposições marxistas Em suma se o marxismo está tradicionalmente ligado a uma perspectiva explicativa política e histórica a geografia deve por sua parte possuir seu próprio modelo de interpretação sem no entanto romper com o sistema explicativo do marxismo Uma das formas explicativas mais importantes da geografia segundo esta orientação é a geopolítica Segundo ele a disciplina geográfica constituiuse fundamentalmente em torno da temática geopolítica e durante todo o séc XIX a orientação militar foi predominante como testemunham os engenheirosgeógrafos de Napoleão I A geopolítica já estava presente em Humboldt que tinha até mesmo escrito um tratado a este respeito da mesma forma que nas obras de Ratzel e Reclus O radicalismo francês tal qual a corrente analítica foi buscar no passado da geografia as raízes que pudessem corroborar seu ponto de vista atual A obra de Eliséé Reclus foi reapropriada pelos geógrafos radicais como sendo um exemplo de ciência geográfica militante e consciente de seu papel social Numerosos artigos abordaram a obra porém muito mais a ação política de Reclus e a ele foram consagrados alguns livros13 13 Ver número especial da revista Hérodote consagrado a Eliséé Reclus Un géographe libertaire n 22 julset 1981 GIBLIN Béatrice Eliséé Reclus Pour une géographie tese apresentada na Universidade de ParisVincennes Desta forma uma vez mais a legitimidade foi buscada no passado mostrando que as tradições esquecidas são o símbolo da permanência de uma luta epistemológica A dinâmica renovada destes padrinhos nos faz sem dúvida alguma pensar na estrutura de todas as revoluções políticas que criam seus mártires e que em seu nome exigem reparação Aliás a crítica definitiva do pai fundador da geografia clássica Vidal de La Blache impunha sem dúvida a busca de uma paternidade alternativa Em seu posfácio à edição de 1982 Lacoste reexamina suas posições críticas em relação a Vidal de La Blache Ele afirma que a supervalorização do autor do Tableau o fez esquecer que o mesmo homem havia escrito La France de lEst verdadeiro tratado de geopolítica De fato segundo esta nova versão de Lacoste o bloqueio do viés político na geografia foi obra nefasta dos historiadores e principalmente de Lucien Fèbvre Este último após a morte de Vidal encerrou a pesquisa geográfica em seu quadro mais estreito constituindose no intérprete da metodologia vidaliana Seu objetivo era reservar as preocupações políticas e econômicas para a História que neste momento alargava seu campo de pesquisa14 Assim a reaparição da geopolítica que sobretudo desde a Segunda Guerra mundial havia sido banida pelos geógrafos significaria uma reabilitação do campo original da geografia e através dela os geógrafos alcançariam de novo a dimensão esquecida da análise política Enfim convém examinar o novo patamar de cientificidade buscado por esta corrente de pensamento Um primeiro ponto importante é reconhecer que a despeito de toda a carga crítica em relação à ciência positivista os geógrafos radicais não re 1971 e Eliséé Reclus géographie anarchisme Hérodote n 2 1976 pp 3049 e DUNBAR G S Eliséé Reclus historian of nature Hamden Connecticut 1978 SARRAZIN H Eliséé Reclus ou la passion du monde La Découverte Paris 1985 14 Este ponto de vista se encontra também em DOSSE F LHistoire en miettes La Découverte Paris 1987 nunciaram aos preceitos racionalistas de um saber afirmativo e metódico15 Ao contrário ao denunciar a ciência burguesa como ideológica o radicalismo pretendia justamente oferecer a possibilidade de um saber mais objetivo justo e sem máscaras Em diversas ocasiões Lacoste acusa a geografia de ter negligenciado todas as discussões epistemológicas mas o que ele identifica como uma questão epistemológica assemelhase mais freqüentemente a uma preocupação deontológica que destaca a finalidade e o uso do saber geográfico É neste sentido por exemplo que ele critica a dificuldade de divulgar um saber advindo dos estudos de grupos sociais os quais servem antes de mais nada ao exercício do poder daqueles que encomendam estes estudos Os geógrafos têm o dever de ensinar a pensar o espaço da mesma maneira que os geopolíticostecnocratas o fazem Esta questão se inscreve diretamente na esfera da ética profissional pois não se trata aí de um desconhecimento ou de uma verdadeira carência epistemológica mas sim de uma cortina de fumaça lançada sobre a virtualidade política da análise espacial Esta análise do espaço quando não encontra uma rede de comunicação efetiva tornase um poder principalmente para os poderosos preservando as estruturas existentes A única solução segundo Yves Lacoste é inscrever a atitude analítica da geografia em uma prática militante Uma nova ciência não pode ser definida somente em termos teóricos na concepção de Lacoste a prática geográfica é também um elemento primeiro do problema epistemológico Poderseia dizer que uma revolução científica não se configura somente pela substituição de parâmetros uma revolução epistemológica deve se desenvolver em consonância com a sociedade A nova geografia proposta por Lacoste é ao mesmo tempo um saber sem disfarce e uma pedagogia militante 15 Lacoste reconhece no posfácio à edição de 1982 seu ponto de vista cientificista fundamental na época da redação de seu livro LACOSTE Yves posfácio à edição de 1982 La géographie ça sert dabord à faire la guerre op cit p 1 Em resumo o esforço epistemológico de Lacoste repousa sobre uma relação estreita entre espaço e poder político através de elementos didáticos como a análise de mapas e a consideração dos fenômenos em diferentes escalas O valor de verdade segundo a proposição de Lacoste é função da interação entre a prática científica e a transformação social A corrente radical marxista Esta corrente possui características análogas à precedente Os geógrafos radicais marxistas em grande parte de origem anglosaxã também fizeram a dupla crítica da geografia tradicional e da Nova Geografia Eles consideraram igualmente que o saber geográfico produzido anteriormente era fortemente influenciado pela ideologia dominante e se tratava de um saber estratégico manipulado pelos detentores do poder Assim como o radicalismo francês a corrente anglosaxã acreditava que uma revolução científica deveria ser definida por uma nova prática dos geógrafos resultado de um compromisso social do saber A grande diferença é a aceitação pela maior parte dos geógrafos desta corrente do marxismo como base do estabelecimento desta nova ciência Esta aceitação introduz elementos sensivelmente diferentes daqueles que constituíam a crítica francesa O discurso de Marx e o de seus mais próximos colaboradores são tomados como os textos fundadores desta Nova Geografia Um bom número de geógrafos investigou minuciosamente 16 O percurso de W Bunge é neste sentido exemplar Ver RACINE J B De la géographie théorique à la révolution Willian Bunge Lhistoire des tribulations dun explorateur des continents et des îles durbanité devenu taxi driver Hérodote n 4 1976 pp 7990 17 Neste ponto Bunge figura como exceção pois acredita que o marxismo produz também uma redução ideológica prejudicial à ciência radical BUNGE W Perspectives on theoretical Geography AAAG 1979 n 69 pp 169174 p 171 291 O capital A crítica da economia política e A ideologia alemã para daí retirar a matéria fundamental da pesquisa geográfica De um lado este procedimento conduziu a uma certa redefinição do vocabulário geográfico à luz do discurso marxista de outro induziu uma nova abordagem dos problemas tradicionais da geografia que devia seguir os cortes e o tratamento apresentados nos textos fundamentais do marxismo A geografia radical sob a influência direta do marxismo propõe um novo modelo de análise espacial que pretende ao mesmo tempo ser rigorosamente científico e revolucionário A construção desta nova geografia segue um caminho semelhante àquele da geografia quantitativa isto é em um primeiro momento singularizase ao lançar um olhar crítico sobre as correntes que a precederam e depois em um segundo momento estabelece as bases do que deve ser o verdadeiro conhecimento geográfico fundado sobre uma superioridade metodológica Para os geógrafos marxistas a combinação da perspectiva materialista e do método dialético permite o desenvolvimento de uma teoria nãoideológica isto é o materialismo dialético a base filosófica de uma ciência social verdadeiramente científica Novamente a geografia clássica é revisitada criticamente Segundo Rodolphe De Koninck o modelo descritivo inspirado por Vidal de La Blache supõe noções de harmonia de equilíbrio e de evolução estável que servem para dissolver toda explicação em uma espécie de naturalização dos processos sociais As críticas são também dirigidas contra a concepção de Hartshorne da geografia como sendo uma ciênciamétodo defini18 PEET R Introduction Radical Geography Alternative viewpoints on contemporary social issues op cit p 19 19 DE KONINCK R Contre lidéalisme en géographie Cahiers de géographie du Québec XXII 56 pp 123145 292 da por um ponto de vista particular Este método segundo De Koninck era concebido pela maioria dos geógrafos como uma arte a arte da descrição e as monografias eram os objetos onde os geógrafos exerciam seus talentos artísticos literários Esta perspectiva empobrecedora teria se imposto como a dominante até o advento das críticas modernas nos anos sessenta Mesmo Jean Brunhes e Maximilien Sorre que estavam no entanto entre os mais objetivos geógrafos da escola francesa foram objeto de críticas severas que os acusavam de praticar um idealismo primário em oposição à superioridade da perspectiva marxista No mesmo sentido Damette e Schleibling consideram que foi esta tradição ateórica e empirista da geografia clássica que conseguiu impedir a difusão progressiva do marxismo na geografia no curso dos anos sessenta A geografia tradicional era assim vista como uma ciência reacionária que pretendia afirmar a natureza imutável das relações entre o homem e a Terra Ela as reduzia aos aspectos naturais mais primários tentando construir uma ordem ideal sem nenhuma relação com as condições históricas e materiais da sociedade Por este procedimento a geografia teria se afastado da busca de leis capazes de transcender o nível da pesquisa preliminar O simples estudo de casos ocupou um lugar central na pesquisa tradicional sem colocar jamais em dúvida o caráter reacionário e limitado deste tipo de saber Todos estes aspectos definem o saber geográfico tradicional no mesmo sentido em que Gramsci define a cultura tradicional em oposição à cultura orgânica Ainda segundo De Koninck a crítica moderna pela via da Nova Geografia investiu contra o tradicionalismo sem no entanto alcançar os pontos fundamentais o que teria contribuído para o seu envelhecimento precoce Ela pretendia ir além da descrição rumo a uma verdadeira explicação científica mas 20 DAMETTE F e SCHEIBLING J Vingt ans après La géographie et sa crise ont la vie dure op cit p 25 293 Segundo Lévy Seria no mínimo prematuro pretender que a velha dama seja emancipada de repente da tradição e que se ponha a marchar com um só movimento O empirismo o naturalismo não estão mortos e as legiões de concursados continuam a encher e a esvaziar as sutis mas fossilizadas gavetas da explicação de mapa Em suma se a geografia tradicional assim como a geografia quantitativa sofriam dos mesmos males e limites a verdadeira revolução do conhecimento geográfico só poderia vir da corrente radical Quando a geografia começou a se observar com o mínimo de distanciamento percebeu que as funções que legitimavam sua existência eram extremamente frágeis Este foi o ponto de partida de uma conduta crítica tão radical quanto nova O combate e a defasagem entre a geografia dita tradicional e a modernidade são sempre enfatizados nos textos que apresentam a perspectiva radical Perguntase por exemplo se a geografia está pronta para intervir no mundo atual utilizando um instrumental clássico ultrapassado e tradicional A resposta é que a condição de realização de uma geografia científica moderna técnica e socialmente e ideologicamente justa é o recurso à utilização de categorias e conceitos inspirados diretamente no marxismo Segundo Lévy por exemplo a evolução da geografia 22 LÉVY J Des lieux et des hommes un nouveau départ pour la géographie op cit p 43 grifo nosso 23 LÉVY J Des lieux et des hommes un nouveau départ pour la géographie op cit p 30 24 PEET R The Development of Radical Geography in the United States in Radical Geography Alternative viewpoints on contemporary social issues op cit pp 1617 e SMITH N Geography Science and PostPositivism Modes of Explanation Progress in Human Geography nº 33 1979 pp 356383 295 clássica em direção à Nova Geografia se fez sem grandes rupturas A crise da geografia atual só será portanto superada quando uma nova delimitação das exigências de uma racionalidade moderna na abordagem científica da sociedade for elaborada Ele acrescenta em seguida que a menos que se dê provas de um antimarxismo dogmático reconhecerseá de bom grado a partir de então as contribuições fundamentais dos trabalhos de Marx e de Engels sobre um certo número de pontoschave Seguindo uma conduta que nos parece ainda hoje bastante moderna eles produziram modelos suficientemente simples para serem enriquecidos corrigidos e criticados A utilização do conceito de modo de produção aparece então como o meio que permitiria afastar todo idealismo da análise geográfica A geografia contribuiria para a compreensão das condições materiais da existência social e portanto da constituição de um modo de produção levando em consideração a divisão territorial do trabalho Finalmente o reconhecimento da função ideológica e estratégica inerente ao saber geográfico criaria uma nova prática social e epistemológica Tendo em conta estes três pontos o marxismo aparecia como o único campo teórico capaz de dar respostas satisfatórias às novas demandas científicas e sociais Em oposição à ciência nomotética que buscava leis de tendência reducionista e à geografia tradicional clássica sempre ligada ao estudo do único a geografia radical propõe uma rede analítica capaz de tecer uma verdadeira aproximação global Assim a nova modernidade da geografia inspirada pelo marxismo era apresentada como um terceiro termo que ultrapassaria as dualidades fundamentais da ciência na modernidade O idiográfico contra o nomotético o hermenêutico contra o explicativo o literário contra o exato e 25 LÉVY J Des lieux et des hommes un nouveau départ pour la géographie op cit pp 3738 grifo nosso 296 segundo estes geógrafos radicais caiu na mesma armadilha de um saber não suficientemente crítico que é objeto da manipulação pelo poder hegemônico O sucesso dos instrumentos quantitativos não foi acompanhado de uma explicação satisfatória e segundo a já célebre fórmula a geografia media parcialmente ou com parcialidade os fatos sociais Os geógrafos da Nova Geografia teriam com efeito avançado muito em relação à perspectiva tradicional quando comparados com os artistas das monografias segundo os críticos radicais Todavia a natureza da explicação permaneceu simplista e fatalista como na corrente clássica Simplista pois a explicação sempre apela para idéias mecanicistas como a da difusão espacial e fatalista pois os resultados da pesquisa são sempre apresentados como advindos de um inevitável processo social Ainda que estes geógrafos ditos modernos se interesssem efetivamente por temas contemporâneos eles são contudo incapazes de refletir sobre as questões de base dos problemas sociais dos novos tempos Desta maneira em lugar de buscar a origem da diferenciação espacial estes geógrafos através de seus trabalhos cooperavam na manutenção das desigualdades e contribuíam simultaneamente para a manutenção de uma ciência defasada e distante dos reais problemas da sociedade A Nova Geografia que se apresentou como uma corrente pragmática e objetiva possuía para os críticos radicais por seu caráter ideológico fortes analogias com a geografia colonial do início do século Estas abordagens privilegiaram uma descrição minuciosa e uma explicação naturalista sem que houvesse uma verdadeira preocupação de explicação das estruturas sociais e em que as relações de produção estão sempre ausentes 21 DE KONINCK R Contre lidéalisme en géographie Cahiers de géographie du Québec op cit p 129 Para Peet eles são os novos liberais PEET R The Devent of Radical Geography in the United States in Radical Geography Alternative viewpoints on contemporary social issues op cit pp 2021 294 finalmente presente envenenado a liberdade contra a necessidade toda esta filosofia das ciências humanas envelheceu26 No quadro da análise marxista o espaço deve ser considerado como um produto social isto é ele só pode ser explicado recorrendo aos aspectos fundamentais que organizam a sociedade Para o marxismo estes aspectos são como vimos precedentemente as relações de produção e as forças produtivas que compõem o modo de produção A primeira questão que se impõe aos geógrafos que trabalham sob esta influência é saber se o espaço enquanto produto social possui uma verdadeira influência mais ainda se é um termo fundador do desenvolvimento da sociedade A aceitação de um materialismo dialético supõe que o espaço tem um papel tão ativo quanto os outros elementos das esferas da produção e da reprodução social A geografia radical apela assim para o conceito de espaço social a fim de traduzir aí a idéia de dinâmica social inscrita em um espaço que é ao mesmo tempo reprodutor de desigualdades e a condição de sua superação o reflexo de uma ordem e um dos meios possíveis para transformar esta mesma ordem enfim o espaço faz parte da dialética social que o funda27 O que é no entanto fundamental para a geografia é o estatuto de independência ou de especificidade dos fenômenos espaciais em relação à análise da sociedade tal como é concebida no sistema marxista Em outros termos a questão é saber se a geografia pode existir como ciência do espaço com autonomia ou se ela deverá se curvar às determinações sociológicas e à causalidade histórica Esta questão suscitou grandes debates na geografia no fim dos anos setenta28 Aqueles 26 LÉVY J Des lieux et des hommes un nouveau départ pour la géographie op cit p 37 27 A revista Espace Temps criada em 1975 foi uma das portavozes desta concepção do espaço social Ver por exemplo PFERTZEL J P Marx et lespace De lexégèse à la théorie Espace Temps 1981 nº 181920 pp 6577 p 70 28 Ver CLAVAL P Le marxisme et lespace e COLLECTIF DES CHERCHEURS DE BORDEAUX A propos de larticle de P Claval Le marxisme et lespace Lespace Géographique nº 3 1977 pp 145164 e 165177 297 que pretendiam ver na utilização do instrumental marxista o abandono da análise espacial foram chamados de espaciologistas Os argumentos que defendiam a pertinência da análise marxista para a geografia retornavam sempre à demonstração da dependência do espaço pois se julgava que o espaço recebia a cada momento sua significação concreta a partir dos elementos da produção de um grupo social dado Assim destacase a preocupação espacial na produção mercantil na divisão do trabalho nos preços da produção ou nas taxas de lucro sem no entanto retirar daí uma verdadeira teoria espacial capaz de dar uma autonomia epistemológica à geografia De fato a geografia radical marxista trouxe uma verdadeira contribuição para a análise espacial acentuando problemas que tinham permanecido estranhos até então mas sem chegar a recolocar o objeto da geografia dentro de uma teoria de fato a crítica radical foi se voltando gradualmente para o tratamento de questões relativas à economia espacial e à geopolítica As novas perspectivas da análise marxista A partir dos anos oitenta a influência do marxismo na geografia principalmente anglosaxã apresentou novos aspectos e a crítica radical tomou outras direções Podemos identificar dois períodos principais neste percurso O primeiro toma o marxismo ipsis litteris e tende a ver uma predominância dos fatores econômicos na organização da vida social e do espaço A categoria modo de produção e as formas concretas que estão associadas a ela as formacões sócioeconômicas foram freqüentemente assimiladas às formas de organização espacial O agente que utiliza constitui organiza e transforma o território é a formação social Uma formação social só pode se constituir em relação a um território e há um processo histórico único de composição da 298 formação social e de seu território29 A geografia radical recorreu freqüentemente a este conceito notadamente para redefinir a noção de região30 No capitalismo avançado no entanto segundo a análise clássica do marxismo haveria uma generalização das relações de produção tipicamente capitalista desencadeando uma perda de rugosidade do espaço que tenderia então a homogeneizarse Como se trata de uma análise que confere a primazia aos fatores econômicos todas as diferenças possíveis do espaço físico se diluem na análise econômicosocial Esta última tornase a tal ponto predominante no processo explicativo que o próprio objeto da geografia o espaço tornase um elemento secundário As análises urbanas voltamse resolutamente para uma concepção que dá prioridade aos conflitos cidadecampo nos quais o urbano tem um papel dominante Este modelo não se aplica todavia muito bem à realidade de diversos países onde o controle do aparelho do Estado e das principais atividades econômicas é exercido por oligarquias rurais dentro de uma estrutura totalmente capitalista Além disso na teoria marxista clássica a predominância urbana resulta da hegemonia do capital industrial no processo de acumulação Contudo a partir dos anos setenta a hegemonia é antes exercida pelo capital financeiro que induz a uma nova dinâmica espacial com uma flexibilidade uma rapidez e uma mobilidade espacial desconhecidas da teoria marxista tradicional O período que se seguiu tentou ultrapassar estas insuficiências analíticas Compreendeuse que a teoria marxista clássica se aplicava ao desenvolvimento do capitalismo do séc XIX 29 DAMETTE F e SCHEIBLING J Vingt ans après La géographie et sa crise ont la vie dure La Pensée nº 239 1984 pp 2129 p 27 30 Ver por exemplo MASSEY Doreen Regionalism some current issues in Capital and Class Review nº 6 London 1978 trad port Regionalismo alguns problemas atuais Espaço e Debates São Paulo nº 4 1981 pp 5083 e LIPIETZ A Le capital et son espace Paris Maspero 1977 pp 1011 299 na Inglaterra tornando impossível a mesma análise cem anos depois dentro de contextos muito diferentes31 Problemas como a composição orgânica do capital e a renda diferencial alimentavam numerosas controvérsias sem que se chegasse a um consenso a propósito das novas formas do capitalismo Em segundo lugar os geógrafos sentiram que era absolutamente necessário acrescentar uma verdadeira dimensão espacial à análise marxista dimensão freqüentemente esquecida em favor de uma explicação histórica ou econômica A influência de Henri Lefèbvre foi fundamental para a constituição desta transformação na análise geográfica marxista Ele distinguiu uma dimensão essencial da construção social da realidade a produção do espaço através de um novo modelo definido por uma análise fundada sobre a dinâmica própria à espacialidade32 Este modelo restituía ao espaço um papelchave na interpretação da sociedade Simultaneamente outros autores marxistas fizeram notar as diferenças entre o fenômenos considerados por Marx na escala de uma unidade de produção e os novos tempos em que a acumulação a maisvalia e o desenvolvimento das forças produtivas só podem ser apreendidos em escala mundial Para a geografia estas redefinições do campo de análise marxista introduziram numerosas mudanças A região por exemplo alguns anos antes declarada morta pelos geógrafos em sua forma tradicional ou simplesmente associada ao conceito de formação sócioeconômica reencontrou sua importânci graça ao conceito de desenvolvimento espacial desigual O abuso relativo do modelo centroperiferia foi criticado em razão da fetichização espacial que produziu os grupos sociais concretos ressurgiram nas análises para substituir as abstrações muito gerais centradas nos primeiros tempos nas classes sociais Enfim os geógrafos definiram o estudo do capitalismo como sendo uma análise da sociedade dentro de um espaço preciso tentando assim encontrar um lugar para a análise geográfica Outra importante mudança consistiu na relativização do peso do cientificismo na teoria marxista limitando a importância do rigor metodológico da referência às leis e do finalismo profético dos textos fundadores O importante deste modo não é mais chegar a observações gerais fundadas em leis que regulam a organização do espaço O fato fundamental que esta tendência acentua é a concepção pela qual o marxismo distingue os oprimidos dos opressores os dominados dos dominantes os trabalhadores dos proprietários e assim por diante Tratase aí de um humanismo moral centrado sobretudo na idéia de justiça e de direito A geografia desta concepção valoriza os temas próximos à cultura e à cidadania33 Por este aspecto o materialismo histórico e o humanismo moderno partem de uma mesma crítica a recusa da ciência positivista e podem sob alguns aspectos ser considerados como perspectivas complementares O materialismo histórico redescobriu a reflexividade de toda ação social e por conseguinte a importância de uma análise que leve em conta o valor e o antropocentrismo da vida social Ao mesmo tempo o humanismo se desembaraçou do idealismo e do subjetivismo que caracterizaram as primeiras análises e recolocou a importância da existên cia material no centro das interpretações Segundo Sayer por exemplo as possibilidades de diálogo entre estes dois pontos de vista já eram concebidas há muito tempo pela teoria crítica Habermas Giddens Para realizar este debate basta superar a subjetividade que confunde dois níveis de interpretação o social com o individual e afastar o excesso de cientificismo do materialismo histórico pois a explicação científica por princípio não se opõe à busca do sentido34 No mesmo sentido D Ley parte da fragmentação do saber considerada como característica da modernidade para identificar os signos de uma nova cooperação que anuncia novas direções para a pesquisa em geografia Os caminhos da arte e da arquitetura demonstram as possibilidades de uma nova integração do saber sob o impulso de um pensamento que ultrapassaria a fragmentação moderna É aí mesmo que ele vê desenharse a origem da pósmodernidade É preciso notar que a nova integração proposta neste momento por Ley é apresentada como um exame rigoroso do método bem como o desenvolvimento de conceitos analíticos que transcendem às rígidas categorias estabelecidas nas abordagens mais estreitas e recentes35 O percurso intelectual de David Harvey é neste sentido exemplar Ele abandona uma visão ortodoxa do marxismo e qualquer pretensão de chegar a uma geografia absolutamente teórica e objetiva Ao mesmo tempo os temas de suas preocupações atuais estão mais próximos da história das idéias a despeito do fato de que as categorias do marxismo estejam ainda fortemente presentes em seu discurso Foi exatamente este percurso que o conduziu do marxismo ao pósmodernismo Este parece ser também o itinerário de Racine que nos explica como enquanto ainda estava próximo dos termos analíticos do marxismo já desenvolvia preocupações humanistas A geografia abandonou o projeto de construir por intermédio direto do marxismo uma ciência total Hoje os geógrafos que invocam o marxismo o fazem a partir de uma perspectiva muito mais limitada como uma filiação ideológica ou como uma inspiração de ordem geral De qualquer forma não existe mais a crença em uma via metodológica única que será aquela da verdadeira geografia e se reconhece a importância e a riqueza de outras condutas possíveis para a geografia Assim a pretensa revolução do saber geográfico pela teoria e a prática marxista mostra claramente sinais de esgotamento Tratase portanto uma vez mais de uma revolução científica da modernidade geográfica Como as outras esta revolução quis em seus primórdios apresentarse como a ruptura definitiva e final sucumbindo em seguida sob o peso das expectativas e acabando como as outras por ser substituída por uma outra novidade 36 Pensando melhor tenho a impressão de que os germes destas preocupações são de fato bastante antigos em meus ensinamentos bem antes que a eles se impusesse o rótulo humanista É verdade que eu já tinha desde 1976 pelo menos procurado deriválos não do referencial filosófico humanista mas da representação marxista da sociedade e do processo de produção do espaço Como evitar se tal fosse o caso se a sociedade que produz seu espaço nele se projeta tanto através de séria base infraestrutural as condições de sua vida material meios e relações de produção como diriam os marxistas quanto através de tudo o que forma sua superestrutura na qual Marx nos ensinou a identificar diferentes esferas religiosa jurídica política ideológica de se afirmar que uma das chaves de interpretação da organização espacial passava pela leitura no espaço da ideologia da sociedade que a produziu da ideologia ou mais genericamente de suas representações mentais de seus valores RACINE JeanBernard Valeurs et valorisation dans la pratique et linterpretation humaniste de la géographie in LHumanisme en Géographie Bailly A e Scariatti R org Anthropos Paris 1990 pp 7374 303 INTRODUÇÃO à GEOGRAFIA Geografia e Ideologia NELSON WERNECK SODRÉ 2a edição VOZES PETRÓPOLIS 1977 UNICAMP BIBLIOTECA CENTRAL Sumário Prefácio 7 Formação da Geografia 13 O Determinismo Geográfico 37 A Geopolítica 54 O Homem e a Natureza 72 Problemas da Geografia 85 Geografia e História 107 As Falsidades Ideológicas 119 Bibliografia 130 1976 Editora Vozes Ltda Rua Frei Luís 100 25600 Petrópolis RJ Brasil Prefácio Que é Geografia De que trata São perguntas aparentemente descabidas tal a facilidade aparente das respostas A proporção que se atribui a elas não é falsa as teses mais estranhas vivem e rivalizam por longos períodos como verdades últimas Acrediteou não a Geografia há décadas tem sua unidade condenada pela observação verificação e a íntima solidariedade que une as coisas conjuntamente caracterizadas com a economia e a moral Vidal em la Blanco Do ponto de vista geográfico o fato da coabitação em e do mesmo homem elementos perfeitamente conjugados e com assentamento contraditório não é somente um facto mas o fundamental da Geografia Não foi por acaso que surgiram então algumas noções como a de meio que na ciência inundou o pensamento de cientistas especialistas organizadores da ciência da terra Esperase que a coleção simbolótique os elementos necessários a relação entre clima e vegetação apareça nitidamente Berrien em 1836 em que a amplitude do campo de observação e a amplitude do levantamento de dados foram a características algumas matemáticas zo ease Restou antes ao campo surgiram as especia e de arrombado as limitações ambiente ar lizações o que se refletiu no sentido descritivo de que todas os elementos informativos são ataques não só compreendidas que o que é para a ciência A acumulação constitui ciência não são conhecimento só e não relato a continuidade também os mapas instrumentos na extensão do conhecimento é a sua prova Essa entre a diferentes bem os mapas os astros cometavam suas possíveis e os os observatórios radioastronômicos Berr precebeu mesmo o efeito de algumas fenômenos ligados e é sob que viviam nadados à área geográfica e que seu extingüem e cedê ás espécies botânicas da evolução Vertiico suficiente por ainda Henri Berr quem observou e em que isto compreender e que toda ciência constitui quando descobre como 7 as suas leis devem ser pesquisadas isto quando passa do conhe cimento primário às generalizações teóricas quando em suma define e cria contra o acaso a grande ordem dos fenômenos que o seu campo encerra O conhecimento é estável apenas no fim da natureza esta etapa do empirismo a essa altura as ciên cias demonstram o avanço do movimento histórico A Geografia no século XX corresponde claramente a que se sus tam estranhamente a obra que expõe simples amada e aceita assente no campo da descoberta da descrição amável dos fenômenos naturais que hoje ainda interessa geográfico Ela sinaliza na realidade a divisão do trabalho dos resis contínuos que clebra relação entre os elementos da natureza e a terra sobre uma ciência É uma porção limitada do todo a parte E não geográfica apenas rasa O que importa não é porém estudar os fenômenos isolados sem ser ser geólogos os estuda geográficos e unicidos estejam mas sim considerálos interligados Muitos os químicos e outros pesquisadores que pretendem ser especialistas e conhecedores são ferrenhos adversários dos geográficos Para o geógrafo as relações que se estabelecem estão ligadas não só ao estudo da natureza mas também à observação do que se dá na camaraderia social e nas relações de produção O geógrafo é o mais realista dos pesquisadores especializados Ele procura não situarse entre os técnicos os artitícios mas querer dominar os fenômenos sobre os quais estuda no todo que lhe permita verificar claramente os elementos da aplicação a toda ou parte dos sistemas de um ente qualquer Assim o geógrafo fórmula uma aplicação da rede geográfica ou dos seus componentes no todo que lhe permita definir o fenômeno como elemento em uma ordem que o resolva que o explique que por isso consta a da vida do homem Não até aqui apareceram informações necessárias para o desenvolvimento do geogra Disseramno em vão mas dia a dia os trabalhos de campo apareceram informações necessárias para o desenvolvimento do geogra Disseramno em vão mas dia a dia os trabalhos de campo apareceram informações necessárias para o desenvolvimento do geogra Santos mas não se precise explicar Para isso na geografia utilizar instru mentos métodos variadíssimos trabalhos Além da analíticá da paisagem análise lógica dos aspectos diversos sua infantâcia na organização observação pode marcarse ao longo da história desde os trabalhos de iniciativa das classes emergentes da idade média ligados aos mais rudimentares e deficientes sistemas ob jetivos que se encontram em Heródoto por exemplo até a pretensa obje tividade dos estudiosos da era da insepção A crise geral do capitalismo Um dos momentos fundamentais da Geografia reside em seu hi stórico resumo da Geografia Humana está ligado a uma conceituação estática da Geografia das ciências da natureza postulando a dependência expli cativa das atividades dialética inerente a oito processo e fenôme nos outros Desconhecer a dialética inerente a tais processos e fenômenos confere à ciência da natureza uma concepção mecanicista limite do está dio e pesquisa empírica mas no nível empírico por outro lado tem a sua importância que jamais oculta É sempre possível na explora ção material e presença de elementos naturais que ainda vivemos nos em uti predatória que dizemos naturais muitas vezes vivemos na exploração até que vivam Quem que possuí os meios de produção Quem os uti liza A quem pertencem e a existirão técnicas Verificouse e pre cisamos a quem aproveitam os resultados do trabalho Uma Geografia 9 oficial denunciando como ideológico mas não científico muitas vezes ligada às classes à idade à profissão relapsa daquilo que está de fendido A sociedade é como disse Montaigne doente e apenas a representação pósiça ideológica que imvanlida suas classes humanas e sociais e recusá aceita a dialética das contradições sociais a recusa em aceitar a dialética é um pensamento metafísico que ultrapassou de conhecimento as explicações correspondentes a nível da ultrapassada ciência positivista A fatalidade das ações do clima ou como é nação e ação da separa ão da causa e a ação da poluição da atmosfera nas grandes cidades de em termos é suscetível de quedarça particular 60m causa em nosso tempo Não é de suas menores deficiências em consequência o divórcio estabelecido entre o conceito de natureza e o da Geografia Não se pode esquecer que o período maior de desenvolvimento da Geografia Humana foi como o tempo colonialista e que o desenvolvimento preliminares do domínio Imperialismo através de outras explorações Sociológicas aliás aparentemente inexplicáveis acolonheu a vigência que o outra teoria das relações ocultas e acalentou Que não sejam abandonadas apenas as culpas do capitalismo na exploração predatória dos re ursos naturais A Geografia de nosso tempo impulso e de sua dupla espe cialidadé deve ligar o homem e natureza para melhor explorar os processos progressivos da natureza a objetivação dos recursos naturais contribuir para desvendar cidadão comum ou o aprovei tamento racional dos recursos Assim da natureza as razões imediatas dos citados recursos da mineração aquellas da iniciativa econômica físico do meio natural ora estima as pesquisas meteorológicas geológi cas agrícolas conserja a apreciação dos recursos na natureza mesmo as razões da miséria que convive com a produção de recursos minerai téricos da precipitação e a pureza de recursos minerais ajudam ao suíto de técnicas que permitem as falisidades que pos 8tam a pesquisa e outas de inovações técnicas para melhorar a ex ploração do meio natural retardoa A Geografia Humana que misturas voam a Geografia Física 9 RESENHA CRÍTICA TEXTO O HORIZONTE DA CRITICA RADICAL A geografia passou por diversas críticas ao longo de sua formação como disciplina no campo acadêmico As críticas eram dividias em dois grandes grupos as críticas de caráter teóricometodológico e entre os que consideravam o domínio prático e ideológico na Nova Geografia Com isso sempre foram surgindo diversas críticas dentro da geografia A corrente da crítica radical irá considerar o comportamento social e suas relações com a geografia Com o passar dos anos e com estudos mais elevados e aprofundamentos definições clássicas do passado foram vistas com desconfiança Com a melhoria das práticas de estudos e pesquisas novas teorias foram confrontadas com definições clássicas A revolução quantitativa foi um dos elementos que contribuíram para estas críticas uma vez que essa forma de estudo chegava a melhores conclusões do que teses e estudos do passado A perspectiva radical crítica que o comportamento racional como princípio de análise conduzindo a uma falsidade de ideias generalizando assim a racionalidade Outra concepção é uma associação com o Positivismo buscando uma espécie de naturalidade nos estudos sobre o capitalismo Buscase compreender os ideais do capitalismo de forma favorável a classe burguesa dominante no período Os radicais pretendiam fundar uma nova ciência referente a geografia com ideias contrarias a geografia tradicional e quantitativa buscando um tipo de política revolucionaria Segundo os radicais tudo estava em crise naquela época seja o capitalismo a política a economia todo um sistema e que as mudanças seriam necessárias para o melhor entendimento da sociedade buscando novas soluções para os problemas que o mundo enfrentava Existia uma ligação deste horizonte critico com o materialismo histórico e dialético Karl Marx com seus estudos científicos contribui bastante pra o avanço cientifico da sociedade e claramente impactou na geografia Seu objetivo era produzir um saber objetivo e racional se escorando na ciência para embasamento de suas ideias e pesquisas tanto no ramo cientifico quando no ramo social Em outras palavras Marx passou a desenvolver métodos científicos para comprovar que o conhecimento deve ser apreendido pela ciência e influenciar toda a sociedade Considerado extremamente moderno na época o marxismo apresentava um sistema explicativo lógico e racional Lacoste critica a geografia tradicional afirmando que a geografia clássica estaria ultrapassada e baseada em diversas teorias falsas devido à falta de conhecimento e estrutura para veracidade das informações na época Sendo assim a Nova Geografia seria a chave para o progresso contribuindo para o crescimento da sociedade em sua totalidade Por fim o texto aponta para uma Nova Geografia baseada no conhecimento técnicocientifico sendo objetiva e pragmática A geografia tradicional e quantitativa estariam ultrapassas e precisaria de reformulações em seus conceitos Com a Nova Geografia a sociedade poderia ter novos métodos para conclusões mais de caráter cientifico do que empírico em questões como por exemplo de Estado território fenômenos e naturais e influencia com o meio social RESENHA CRÍTICA TEXTO INTRODUÇÃO A GEOGRAFIA AUTOR NELSON WERNECK SODRE Segue abaixo uma resenha crítica do texto Introdução a Geografia de Nelson Werneck 2ª edição 1977 O texto aborda conceitos básicos de Geografia abrangendo toda sua formação teórica contextualizando a formação da geografia o determinismo geográfico a geopolítica a relação do homem com a natureza os problemas da geografia a relação da geografia com a história e as falsidades ideológicas no sentido dos estudos da geografia Será desenvolvido um breve apontamento sobre estas questões com algumas críticas questionamentos e conformidade com as ideias apresentadas As primeiras observações do uso da geografia na história da humanidade são dos períodos da préhistória e história antiga com os deslocamentos do homem pelos territórios com impactos na sociedade da época Além disso fatores da geografia física também são verificados nestes deslocamentos visto que as superfícies da terra e a sua costa marítima são diferentes a cada região que o homem frequentava ou descobria em suas aventuras de descobrimento do mundo Posteriormente a fase medieval o mundo passou por mudanças em sua economia e política O feudalismo abre passagem para o capitalismo e atividades mercantilistas Iniciouse uma grande exploração no mundo e colonialismo nas regiões descobertas Essas mudanças e transformações assim como a necessidade de entender a sociedade e os aspectos físicos dos novos locais serviram de base para a formação da geografia O Determinismo surge de acordo com a necessidade de compreensão dos aspectos e fenômenos naturais Inicialmente era interpretado como campo de atuação apenas nos fatores climáticos Porém com o passar do tempo o Determinismo passou a ter uma concepção mais ampla abordando que o meio ambiente como um todo irá influenciar o comportamento das pessoas que ali vivem No que diz respeito a Geopolítica aparece como estudos num período marcado pelo Imperialismo de algumas nações e o com o surgimento de diversos conflitos catastróficos para a humanidade Destaque as Guerras Mundiais o fascismo e nazismo Esses fatores contribuíram diretamente para que a Geopolítica fosse considerada uma espécie de ciência do Estado visto que através dos seus estudos e pesquisas iriam procurar explicar e entender as conquistas dos novos territórios a organização do Estado no cenário de conflitos e as novas divisões políticas do mundo Com o aprimoramento dos estudos passou a haver uma divisão entre o homem e a natureza Estudar a natureza não seria apenas estudar o meio ambiente Questões de desenvolvimento também estão ligadas a natureza Produtividade recursos minerais agronegócios e comportamento social também são de interesse da geografia estudar a natureza uma vez que está diretamente ligada ao homem no seu meio social Alguns questionamentos foram apresentados ao logo da história da geografia Problemas referente a conceitos e análises diferentes sobre o a geografia marcou diversos conflitos ideológicos Muitas críticas eram feitas a novas teorias principalmente se estas fossem contrarias as tradicionais ou que o resultado do estudo fosse contrário aos interesses da classe dominante Por muito tempo a história e a geografia andaram juntas muitas vezes não se sabia que determinado estudo pertencia a história ou a geografia Com o passar dos anos apesar de estarem completamente ligadas houve uma separação no campo acadêmico Seria uma falsidade como diziam os estudiosos da época considerar a geografia física apenas como descritiva pois haveria que ter uma interação com o homem e o com os fatores sociais Em suma chegamos à conclusão que o livro Introdução a Geografia é uma obra muito bem explorada amparada com várias referências de estudos e pesquisas para validar suas ideias Explica a formação da geografia de forma clara mostrando o determinismo e a geopolítica como centro das novas definições que temos hoje no que diz respeito a Geografia como ciência RESENHA CRÍTICA TEXTO O HORIZONTE LÓGICOFORMAL NA GEOGRAFIA MODERNA Com o mundo um verdadeiro caos devido aos conflitos das guerras mundiais houve uma verdadeira dispersão nos estudos da geografia neste período Quanto mais dispersão mais divergências tende a acontecer visto que a sociedade que cada estudioso vivia influenciava de forma direta suas análises e conclusões O ambiente e os fatores sociais determinam o pensamento e comportamento das teorias que surgiram ao longo do tempo Sendo assim as críticas as teorias contrárias a determinada visão eram constantes A geografia moderna surge com a necessidade de uma nova geografia para compreensão da sociedade Baseada em um discurso analítico com uma visão sistêmica envolvendo as ciências naturais e sociais fazendo uma interação do homem com a natureza influenciando assim o seu meio social Esses novos geógrafos buscam uma identidade própria em relação as escolas anteriores buscando uma ideologia nova baseada no racionalismo Esse movimento surgiu baseado nas diversas críticas simultânea que a geografia clássica sofria naquele período Era evidente uma mudança nas suas concepções e métodos de pesquisa Não havia mais espaço para achismo e conhecimento empírico A ciência cada dia mais tomava força buscando de forma objetiva e racional buscar soluções para os problemas da sociedade Para ser considerada inovadora teria que preencher certas condições para se tornar concentrada na ciência como fonte de resultado Uma linguagem matemática e logica nos estudos norteia para conclusões mais próximas da realidade Unir os dados com os conhecimentos teóricos chegaria a união perfeita para a formação de uma nova geografia A geografia moderna deve acompanhar as necessidades da sociedade O mundo em constante mudança com uma sociedade passando por transformações exige que a geografia também acompanhe neste contexto Sendo assim a geografia tradicional estava obsoleta para tratar e estudar os novos temas que surgiam na sociedade Era preciso que a geografia também se inovasse Por isso a geografia moderna surgiu para melhorar suas teorias clássicas e acrescentar novas propostas novas análises e novos métodos para acompanhar o progresso social Em suma destacamos a necessidade de uma Geografia nova e moderna para os dias atuais sendo sustentando pela ciência e por métodos matemáticoslógicos Esses métodos são fundamentais para o desenvolvimento e crescimento da sociedade em sua generalidade Surge apenas uma indagação Cada dia a sociedade se transforma A globalização associada a tecnologia muda constantemente a sociedade Será que em algumas décadas será necessária uma nova reformulação na geografia Infelizmente ainda não se tem a resposta Teremos que esperar
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10 O horizonte lógicoformal na geografia moderna Durante o período do entreguerras as correntes do pensamento científico se desenvolveram de forma bastante segmentada geograficamente Esta segmentação é talvez devida ao espírito pouco cosmopolita de uma época que conheceu grandes tensões nacionais grandes crises econômicas e grandes fraturas ideológicas As dificuldades de diálogo e de comunicação são aparentemente as causas da dispersão geográfica das escolas e círculos organizados nesta época Os círculos de Viena de Praga a escola de Frankfurt de Cambridge entre outras marcaram definitivamente a identidade científica desses anos Paradoxalmente foram estas mesmas dificuldades e as perseguições que precederam à Segunda Guerra que plantaram as sementes de um novo cosmopolitismo Com efeito nesta época uma verdadeira diáspora de pensadores esteve na base das múltiplas trocas entre as escolas que tinham permanecido até então voltadas para si mesmas 249 Assim se explica a influência tardia do positivismo lógico Este movimento tinha começado verdadeiramente no início do séc XX a partir de uma ampla discussão nos círculos filosóficos Contudo foi apenas por volta da metade do séc XX que o positivismo lógico estendeu sua influência sobre as outras disciplinas Esta orientação também conhecida como filosofia analítica estabeleceuse primeiro sobre os domínios da matemática e da física e em seguida às outras ciências à psicologia sociologia biologia e economia Na geografia este movimento é geralmente conhecido sob o nome de Nova Geografia ou Geografia Quantitativa A quantificação é efetivamente um de seus aspectos mais familiares Contudo essa corrente corresponde a uma orientação muito mais complexa do que a simples matematização A origem da filosofia analítica se situa na crítica das correntes neohegelianas correntes bastante em voga sobretudo na Inglaterra no início deste século De fato apesar da diversidade das tendências no interior do movimento analítico há nele um elemento fundamental que reencontramos sistematicamente a recusa geral a toda metafísica Para os neohegelianos o universo é espiritual e a existência se confunde com a percepção Em outros termos não há um objeto sem sujeito e todo conhecimento provém de uma relação interna O julgamento criticista de Kant não é aceito pois ele pressupõe a adequação de uma noção à coisa isto é uma relação externa ao sujeito Toda relação externa espacial temporal ou de causalidade do ponto de vista deste idealismo é ilusória Há apenas uma única relação possível entre fenômenos a que relaciona o todo às partes Desta forma o neohegelianismo privilegia as relações de identidade e de diferença que reenviam à distinção tradicional entre realidade e aparências Segundo a interpretação de Wittgenstein o erro desta concepção é confundir o valor de uma variável com a própria variável A identidade de um obje 250 to deve ser expressa pela identidade do signo e jamais por um signo de identidade As primeiras críticas deste gênero de raciocínio aparecem no entanto na obra de Moore que denuncia a falsa identidade entre um objeto e a sensação desse objeto como um todo fenomenal Segundo Moore a atitude idealista é contraditória pois ela afirma ao mesmo tempo que o objeto e sua sensação são distintos e que eles não o são A abstração da lógica hegeliana situada na base deste raciocínio é vista por Moore como sendo ilegítima Efetivamente segundo Hegel o entendimento pensa os dois termos de uma relação como unidades em oposição uma em relação à outra e é a razão que os unifica dialeticamente O ser e o nada por exemplo devem ser vistos enquanto dois momentos inseparáveis de um devir unificado e não como quer o entendimento como dois pólos irredutíveis da realidade A possível exterioridade de uma relação cognitiva e a definição de um objeto de conhecimento sem o recurso a um universo espiritual em comunhão com o objeto são as duas diferenças fundamentais entre esta nova forma de realismo e o neohegelianismo Neste realismo a afirmação de um sujeito do conhecimento independente do objeto abre a possibilidade de uma experiência sintética que permite a utilização de um modelo matemático para o conhecimento O recurso utilizado por Moore em seu percurso crítico consistia na análise das proposições do discurso dos neohegelianos A Bertrand Russell cabe o mérito de ter aperfeiçoado este procedimento e de ter feito dele um método Após a crítica das posições neohegelianas Russell nos conta que a etapa seguinte foi a de revelar as verdadeiras significações do discurso científico por intermédio da lógica Este 1 WITTGENSTEIN L Tractatus logicophilosophicus Paris Gallimard 1961 proposição 553 pp 8082 2 HEGEL G W G Science de la logique livro primeiro trad Jankélévitch Paris Gallimard 1949 p 86 251 procedimento analítico associado ao método lógico funda o movimento da filosofia analítica A proposição de base de Bertrand Russell é a de substituir na lógica tradicional de Aristóteles a relação entre sujeito e predicado por uma função que une duas variáveis Esta nova forma de lógica recebeu a denominação de moderna pois tem como pressupostos ser mais objetiva geral e precisa do que a lógica tradicional Segundo Russell as proposições atômicas isto é as formas mais simples de proposições e os quantificadores quantificador universal para todo x e quantificador existencial há pelo menos um x constituem a base das proposições que estruturam todo pensamento É necessário distinguir a busca de rigor lógico pela linguagem da procura de uma precisão metodológica a partir da definição de conceitos e categorias como era o caso na conduta de Hartshorne e de Sauer A filosofia analítica não se caracteriza pela busca de conceitos gerais para estruturar a reflexão Esta filosofia concebe a linguagem como sendo o fundamento do pensamento lógico Desta maneira a linguagem revela por sua estrutura o valor de verdade e é ao mesmo tempo o meio de reflexão e a garantia de legitimidade desta última A associação entre estrutura da linguagem e verdade é deduzida da tese do paralelismo lógicofísico Segundo esta tese há uma correspondência entre linguagem e realidade ou seja a estrutura da linguagem é a mesma do mundo A variedade e a forma do real figuram na variedade e na forma da linguagem e as estruturas que podem ser conhecidas são sempre lógicas A partir daí deduzse que o conhecimento consiste na figuração lógica dos fatos Assim segundo Russell o problema epistemológico de se conhecer as coisas como elas são e as garantias que podemos ter a respeito da verdade desse conhecimento se remete de fato a determinar como falar logicamente das coisas O conhecimento científico estabelece assim as relações e os graus de significação entre os fatos seguindo as regras da lógica moderna 252 Para a filosofia analítica somente a linguagem matemática pode ser legítima como instrumento de conhecimento pois só ela sabe restringir sua importância aos limites impostos pela lógica Esta linguagem é a garantia de uma relação lógica com a realidade e define o campo possível do conhecimento segundo a última e mais conhecida das proposições do Tractatus logicophilosophicus Aquilo do qual não se pode falar é preciso calar3 A consequência imediata desta corrente foi a valorização das ciências matemáticas como o novo paradigma metodológico As outras disciplinas deveriam buscar no modelo da matemática sua coerência rigor e objetividade A outra consequência importante é a universalização dos procedimentos para a ciência e a unificação do método que se referem sempre aos princípios lógicos os quais são o fundamento da matemática Segundo Wittgenstein existem três tipos de proposições que correspondem aos três modelos do conhecimento O primeiro é composto de proposições dotadas de sentido elas provêm de um saber empírico e demandam uma prova experimental para serem aceitas mais tarde estas proposições serão chamadas verificáveis O segundo modelo concerne às proposições vazias de sentido deduzidas de uma concepção formal onde o valor de verdade dos enunciados analíticos está inscrito em sua forma lógica Finalmente o terceiro tipo corresponde às proposições destituídas de sentido sustentadas por uma metafísica Essas últimas proposições se caracterizam por uma impossibilidade de avaliação de seu valor de verdade pois não possuem significação ao nível lógico Na terceira e na quarta seção do Tractatus Wittgenstein nos apresenta dois outros aspectos importantes da filosofia analítica Em primeiro lugar o conhecimento do mundo é feito a partir da construção de quadros de fatos Esses quadros nos 3 WITTGENSTEIN L op cit proposição nº 7 p 107 253 indicam uma forma lógica e estável dos objetos sem no entanto reproduzir suas propriedades materiais Em segundo lugar existe uma correspondência biunívoca entre os fatos destes quadros e a realidade correspondência expressa pela relação lógica Desta maneira chegase ao conhecimento pela construção de modelos lógicos que restituem o comportamento dos fatos no mundo real Os modelos lógicos foram utilizados na ciência notadamente em razão do prestígio da física quântica que obteve resultados a partir de uma conduta matemática não proveniente de dados experimentais Um exemplo é o do cálculo matricial desenvolvido em 1843 por Cayley e que continuou sem aplicações práticas até a emergência da nova física quântica no início deste século O outro aspecto importante da física analítica é a noção de sistemas substituindo a noção de objeto Nesta perspectiva as moléculas são consideradas como sistemas de átomos estes últimos são eles mesmos sistemas compostos de um núcleo e de elétrons os núcleos são também sistemas de outras partículas e assim sucessivamente A concepção sistêmica foi adaptada para as outras ciências nos anos trinta primeiro na biologia e em seguida na economia Ela apresenta a vantagem de ligar os fenômenos às suas estruturas e de poder simultaneamente vêlos em diversos níveis graças à utilização de subsistemas Assim a teoria geral dos sistemas foi um modelo poderoso entre todas as ciências inclusive para a geografia O discurso analítico funda uma geografia moderna A visão sistêmica a utilização de modelos e a submissão à lógica matemática penetraram fortemente nas ciências naturais e sociais a partir dos anos cinqüenta É neste contexto que se faz a passagem de uma geografia clássica para uma geografia dita moderna Aliás os novos adeptos deste modelo sempre subli 254 nharam o caráter de ruptura de revolução desta passagem do clássico ao moderno Uma das primeiras manifestações desta nova maneira de conceber a geografia como vimos precedentemente se encontra no artigo de Schaefer de 1953 A crítica que ele faz a propósito da geografia anteriormente estabelecida foi desenvolvida e chegou ao que hoje se conhece como revolução quantitativa De fato a revolução metodológica na geografia tinha começado muito mais cedo nos anos trinta através da obra de Christaller sobre os lugares centrais4 O contexto da época no entanto limitou a difusão deste trabalho que passou quase despercebido O principal objetivo de Christaller era demonstrar que a distribuição e o tamanho das cidades no sul da Alemanha não eram aleatórios Segundo sua concepção estes fenômenos estavam ligados entre si e mantinham uma certa regularidade em sua expressão Assim os mercados de produtos e de serviços de tamanhos diferentes estão articulados de maneira a formar uma rede urbana funcional regular e hierarquizada A partir destas proposições Christaller estava em condições de construir um modelo coerente da dispersão espacial destas cidades Pelo alcance geral de tais proposições este modelo podia ser também aplicado a outras regiões e assim era possível pela correlação lógica resgatar uma explicação geral dos fenômenos ligados à estrutura e ao tamanho de uma rede urbana Segundo Claval o desenvolvimento de uma metodologia analítica na geografia deve muito à economia espacial e foi efetivamente por intermédio de Lösch um economista que a obra de Christaller se fez conhecer5 A partir dos anos cinqüenta sob inspiração do trabalho de Christaller outros modelos foram aplicados à geografia tais como os de von Thünen Weber e 4 CHRISTALLER W Die zentralen Orte in Süddeutschland Iena 1933 trad ing Central Palaces in Southern Germany 1966 5 CLAVAL Paul Essai sur lévolution de la géographie humaine Les Belles Lettres Paris 1976 p 140 255 identidade própria em relação à geografia anterior A refutação das tradições geográficas serviu portanto como um primeiro elemento de justificação e de imposição do novo Em segundo lugar sublinharemos o caráter de ruptura vivido por esta Nova Geografia em relação à outra dita clássica Finalmente o terceiro ponto procura o sentido da releitura da história da geografia efetuada por esta nova corrente Nesta releitura é possível observar que a Nova Geografia sublinha a filiação da ciência à uma posição racionalista e portanto que ela busca negar qualquer outra tradição e valorizar exclusivamente as que poderiam se aproximar do procedimento racionalista A análise guiada por estes três pontos encontra uma estrutura semelhante em todos os textos desta época que examinaremos É tal estrutura que apresentaremos agora Uma refutação fundamental as tradições O que há em comum entre os textos que difundem a Nova Geografia é o fato de que todos eles começam invariavelmente pela crítica do projeto dito clássico ou tradicional da geografia W Bunge I Burton D Harvey e P Haggett por exemplo estão todos de acordo em reconhecer que a dita singularidade dos fatos geográficos é incompatível com a visão científica moderna7 A concepção de fenômenos únicos segundo eles impede qualquer esforço em direção à explicação teórica A geografia tal como é concebida classicamente estaria portanto condenada a ser apenas uma tediosa descrição de acontecimentos sem poder jamais ligálos através de uma relação geral e teórica 7 Estes textos são respectivamente BUNGE William Theoretical Geography in Lund Studies in Geography The Royal University of Lund Gleerup pbs 1962 pp113 BURTON Ian The Quantitative Revolution and Theoretical Geography in The Canadian Geographer VII 4 1963 pp151162 HARVEY David Explanation in Geography E Arnold Londres 1969 HAGGETT Peter Locational Analysis in Human Geography E Arnold Londres 1965 257 Reilly Pesquisadores pioneiros como E Ullman e W Isard começavam a formar grupos de geógrafos que se interessavam por estes novos parâmetros A abordagem por modelização rapidamente estendeu seu campo de estudos aos problemas intraurbanos aos transportes aos sistemas regionais e à cartografia temática Sua verdadeira difusão no entanto data do início dos anos sessenta e a primeira obra de síntese em geografia humana só foi publicada em 19656 A estrutura do movimento da Nova Geografia Nosso interesse fundamental não é escrever uma história factual desta corrente A análise proposta aqui tem como objeto unicamente a dinâmica de transformação das orientações metodológicas Apoiarnosemos sobretudo no discurso daqueles que estiveram na origem desta transformação e na forma pela qual este discurso afetou a perspectiva geral da geografia A influência da teoria analítica sobre os geógrafos engajados nesta corrente de pensamento é um dos elementoschave para compreender esta dinâmica A posse deste novo método a ruptura que ele ocasionou em relação à geografia clássica e a convicção de ter encontrado a conduta verdadeiramente científica para a geografia são algumas das consequências mais importantes da associação entre a geografia e a teoria analítica A hipótese retida é a de que a estrutura da revolução quantitativa na geografia é análoga ao próprio movimento da modernidade Em outros termos a dinâmica pela qual este movimento se impõe na geografia se reporta à dinâmica da modernidade ao mito do novo tal como o descrevemos anteriormente Os elementos que compõem nossa análise são portanto bem definidos e limitados Primeiro procuraremos mostrar que estes geógrafos engajados ao novo paradigma buscaram uma 6 HAGGETT Peter Locational Analysis in Human Geography E Arnold Londres 4ª ed 1968 256 A realidade é efetivamente única e todas as coisas são diferentes desde que as olhemos em seus mínimos detalhes A perspectiva científica no entanto compensa a perda do detalhe pela generalização A diferença fundamental entre o único e o individual segundo Bunge por exemplo consiste no fato de que o individual é capaz de ser apreendido dentro de uma perspectiva geral ou por uma construção teórica sem no entanto perder suas especificidades Bunge critica firmemente a concepção adotada por Hartshorne segundo a qual a unicidade e a generalidade são qualidades intrínsecas aos fatos O ponto de vista de Bunge é de que se as interrelações entre os fenômenos geográficos aparecem de forma caótica isto se deve unicamente à falta de um método científico O problema é antes de tudo um problema de método e não um problema intrínseco ao fato geográficocontrariamente ao que Hartshorne segundo Bunge queria demonstrar No mesmo sentido Burton afirma que em um mundo sem teorias todos os fenômenos são únicos Se a geografia deseja verdadeiramente ser considerada como uma ciência deve recorrer à observação das regularidades em seu campo de conhecimentos As regularidades são segundo Burton o primeiro passo para se estabelecer teorias e estas últimas fundam a condição necessária do saber científico moderno A resistência da comunidade geográfica frente à ciência moderna é interpretada por ele como estando ligada à tradição possibilista Na medida em que o possibilismo afirmava o livre arbítrio e a impossibilidade de se prever cientificamente os fenômenos contrariava diretamente os fundamentos da ciência moderna Quando Haggett evoca as tradições excepcionalistas em geografia faz apelo também à identificação entre a idéia de unicidade fenomenal e a geografia regional tradicionalista Aliás desde o início de seu texto ele marca sua discordância em relação à escola francesa de geografia dizendo que sua abordagem se afasta sensivelmente da conduta tradicional da geografia 258 humana Brunhes 1925 Vidal de La Blache 1922 preocupada em colocar questões de natureza biográfica sobre os fenômenos observados e acrescenta que quando nos interessamos pelo único não podemos mais do que contemplar sua unicidade Donde a situação atual pouco satisfatória as pesquisas sistemáticas gerais e a geografia regional fundada sobre a idéia de unicidade dificilmente colaboram8 Para D Harvey o peso da tradição se situa na herança kantiana de um espaço considerado de maneira absoluta Este tipo de raciocínio segundo Harvey repousa na hipótese segundo a qual todas as localizações são únicas A concepção que apreende as regiões como realidades objetivas verdadeiras individualidades geográficas deriva deste mesmo raciocínio de um espaço tomado absolutamente A pesquisa dos geógrafos em busca da natureza intrínseca das regiões característica da geografia clássica deve segundo Harvey ser vista como uma questão metafísica sem nenhuma relação com a idéia de ciência moderna Esta última concebe um espaço relativo no qual a localização depende do gênero de coordenadas escolhidas A escolha é também relativa aos objetivos de cada pesquisa e não há em princípio um sistema de coordenadas melhor do que os outros tudo depende da finalidade do trabalho Todos estes autores são unânimes em afirmar que existe uma tradição na geografia dos estudos qualitativos ou monográficos que deve ser descartada Esta renúncia é justificada em nome da geografia moderna que necessita se alinhar metodologicamente às disciplinas científicas para merecer ser considerada como parte deste conjunto De fato o argumento mais freqüentemente invocado no discurso destes autores é a necessidade de se fazer da geografia uma ciência ou seja um conhecimento moderno do mundo No discurso destes autores a ciên 8 HAGGETT Peter Locational Analysis in Human Geography trad francesa de FRECHOU A Colin Paris 1973 op cit pp 1213 259 cia nada tem em comum com a geografia que tinha sido produzida até então Há aí efetivamente uma firme vontade de estabelecer bem a fronteira entre o antigo a tradição e o novo a ciência moderna Segundo Bunge o objetivo da pesquisa é a integração entre o conhecimento geográfico e a metodologia científica Uma filosofia geral da ciência orienta a reflexão sobre o lugar da teoria Desta forma a geografia então definida recebe o nome de teórica teorética As teorias se estruturam em dois planos por sua relação com os fatos ou seja no caso da geografia pela descrição e por sua relação com a lógica seguindo um modelo matemático O único meio de estabelecer um conhecimento científico é segundo Bunge pela ligação entre os fatos a lógica e a teoria Para ele a geografia tradicional teria privilegiado somente a primeira parte descartando completamente a segunda a que diz respeito ao conhecimento analítico Todavia mesmo a descrição da geografia tradicional é criticada pois uma descrição para obter um verdadeiro interesse científico necessita de um caráter de generalização metódico que estava ausente na maior parte dos casos anteriores De acordo com Bunge os geógrafos científicos se distinguem dos descritivos por sua maneira de conceber o papel da descrição para os primeiros ela é um meio para os outros um fim em si A propósito da descrição Harvey acreditava também que é necessário que ela seja realista e racional e acrescenta que a análise moderna sugere de fato que a descrição cognitiva e a explicação são diferentes meramente em grau não em gênero Aliás para Harvey a descrição científica formal está na base da explicação9 Se a geografia tradicional jamais chegou à explicação foi em parte porque adotou um modelo de descrição que não correspondia aos critérios da ciência moderna e teórica 9 HARVEY David Explanation in Geography op cit pp 5 e 10 260 A geografia teórica uma revolução O estabelecimento de uma geografia verdadeiramente científica e teórica deve preencher certas condições Segundo Bunge a clareza a simplicidade a generalidade e a exatidão são as condições mais importantes Estas qualidades decorrem diretamente do método O uso de uma linguagem matemática nos impõe segundo Bunge uma estrutura lógica que é a única capaz de produzir uma transparência e uma objetividade necessária a todo trabalho científico Na medida em que a utilização desta linguagem e desta lógica só aparece com a geografia teórica só ela pode pretender fundar a ciência geográfica moderna Burton concebe a revolução quantitativa como o momentochave que transformou a natureza do conhecimento geográfico Esta revolução significou a construção de um verdadeiro campo teórico de investigação A partir da lógica e da matemática a geografia pôde desenvolver métodos de verificação e de previsão e esta possibilidade transforma a natureza profunda da geografia Sempre segundo Burton o caminho a cumprir para se tornar uma disciplina científica passa pelo desenvolvimento de teorias e modelos em todos os ramos da investigação geográfica A obra de Harvey The Explanation in Geography foi sem dúvida alguma uma referência fundamental para o desenvolvimento da teoria analítica na geografia Estando a revolução concluída o objetivo geral de Harvey era o de apreciar neste processo as tendências gerais da ciência e suas aplicações na geografia Do ponto de vista metodológico Harvey adota a opinião sustentada por Hempel que descreveu todo o procedimento geral recomendável à ciência para chegar a uma concepção objetiva e analítica A argumentação de Hempel é inspirada fundamentalmente nas ciências da natureza e seus exemplos das etapas da ciência a observação a experimentação a modeliza ção a verificação e a concepção das teorias são freqüentemente tiradas da física da química e da biologia A filiação racionalista do pensamento de Harvey aparece também claramente no fato de que ele justifica seus pontos de vista sobre a importância da lógica matemática referindose freqüentemente à obra de Russell e de Carnap O sentido da explicação científica os tipos de teoria as formas da linguagem são portanto diretamente inspirados pela corrente da teoria analítica que dá corpo àquilo que é conhecido como positivismo lógico ou neopositivismo A estrutura do livro de Harvey apresenta um procedimento similar ao dos outros exemplos citados precedentemente A geografia anterior é julgada insuficiente ou inapta a responder às questões colocadas pelos tempos modernos A tradição dos estudos geográficos é também vista como um obstáculo ao advento de uma geografia objetiva e positiva Os campos tradicionais na pesquisa geográfica singularizam e afastam o discurso geográfico das outras disciplinas Estes campos são portanto a causa principal do atraso relativo da geografia e qualquer vontade de mantêlos afasta um pouco mais a geografia do domínio das disciplinas científicas Harvey também está em total desacordo com Hartshorne a respeito da especificidade da geografia pois os limites da geografia são os mesmos que os das outras ciências A concepção de Hartshorne inspirada de Windelband Dilthey e Rickert que procuravam distinguir as ciências nomotéticas das ciências idiográficas parece a Harvey inaceitável para uma ciência que quer repousar sobre fundamentos metodológicos sólidos Da mesma forma a aceitação das teses kantianas que vêm sendo usadas muito mais como suporte para a tradição da pesquisa do particular isto é pelo método idiográfico contra o desafio de uma nova geração que trabalha em um estilo mais nomotético10 Este conflito de gerações antagônicas caracteriza a passa gem de uma perspectiva clássica para uma perspectiva moderna A geografia moderna deve responder ao desafio dos novos tempos através da construção de novas perspectivas técnicas e justificações Temos sido obrigados a insistir sobre a complexidade dos sistemas axiomáticos sobre construção de modelos teóricos sobre a linguagem matemática entre outras coisas Esta abordagem não tem sido provavelmente do gosto de muitos geógrafos acostumados às abordagens mais tradicionais para desvelar os mistérios que os cercam Sem dúvida isto pode horrorrificar estes que procuram compreender examinando detalhadamente mapas peregrinando pensativos e atentos por ruas e campos revendo dados sepultados em arquivos poeirentos remexendo reportagens de velhos jornais escavando com sondas pedológicas e mergulhando em cavernas calcárias observando e esperando formar sua própria experiência perceptiva treinandose a apreciar11 O caráter revolucionário da geografia analítica se manifesta assim pelo esforço em expulsar qualquer traço tradicional do campo de pesquisas geográficas o que traduz bem a vontade de ruptura em relação à tradição Por intermédio de novas técnicas e perspectivas a geografia abre caminho para o reconhecimento e o prestígio dos novos tempos O moderno movimento na direção de uma universalidade metodológica pode ser visto como uma tentativa de ser mais explícito no estabelecimento de leis freqüentemente reprimidas nos esboços explicativos que os geógrafos costumam oferecer12 A revolução reescreve a história da geografia Nos textos analisados há uma clara redefinição do sentido do determinismo na geografia Uma espécie de consenso é forjado em torno da idéia de que a geografia a partir do início do século após a refutação do determinismo ambientalista teria perdido o caminho do conhecimento científico A atitude de Ratzel é freqüentemente apresentada com elogios como sendo aquela de um geógrafo que pretendia estabelecer um conhecimento objetivo geral e científico As premissas do discurso ratzeliano são discutíveis mas seu processo de buscar leis generalizações sustentadas por hipóteses teóricas é freqüentemente considerado como a atitude correta para a ciência em oposição às outras tradições As reações contra o excesso do determinismo geográfico foram ao mesmo tempo negativas e positivas Aspecto negativo o seu abandono conduziu à recusa quase sistemática de qualquer teoria em seguida aquilo que os geógrafos publicaram tornouse mais preciso mas também infinitamente menos interessante A descrição substituiu a hipótese a repetição o debate Aspecto positivo os geógrafos procuraram resolver as complicações dos sistemas regionais sem jamais se fiar nestas chaves simples que fornecem as relações de causa e efeito 13 Esta reinterpretação da história da geografia tem a intenção fundamental de conferir um lugar de honra ao determinismo visto como o verdadeiro predecessor da conduta científica moderna Neste sentido o determinismo é a única tradição verdadeira da ciência geográfica Burton por exemplo nos indica que tudo se passou como se após o intermédio da idiografia a geografia tivesse retomado o caminho da ciência Segundo ele há mais do que uma simples coincidência no fato de que a nova geografia seja também conhecida como neodeterminismo A diferença mais importante se situa ao nível do conteúdo pois o determinismo ratzeliano se apresenta sob relações ingênuas Grosseiras tentativas sistemáticas de explicação foram feitas por deterministas mas nos anos 20 elas estavam em desgraça14 A geografia analítica por possuir instrumentos eficientes linguagem métodos e técnicas teria a possibilidade de apresentar a face verdadeiramente científica do determinismo moderno Algumas vezes a literatura ulterior busca diminuir a filiação entre estes dois determinismos o do meio ambiente e aquele produzido pela perspectiva analítica Um dos argumentos é o de que a geografia teórica possui antes uma aproximação probabilista e portanto escapa ao mecanismo simples do determinismo Contudo Harvey nos mostra que a adoção de modelos probabilistas supõe em princípio e numa certa medida a aceitação do determinismo como premissa A diferença introduzida se situa no grau de positividade das respostas15 Em outros termos o determinismo moderno é do tipo relativo isto é afirma um fato e ao mesmo tempo anuncia a possibilidade de erro tudo isso a partir de proporções bem medidas matematicamente Ao lado de Ratzel o outro autor freqüentemente mencionado pela Nova Geografia é Schaefer considerado como uma espécie de padrinho desta corrente teórica Morto em 1953 Schaefer não pôde assistir ao desenvolvimento da revolução quantitativa mas seu nome era sempre lembrado no combate que conduziu contra a geografia tradicional personificada na figura de Hartshorne O verdadeiro culto a Schaefer chegou a desenvolver uma lenda segundo a qual ele teria sido objeto de investigações por parte da CIA denunciado por geógrafos tradicionalistas que se sentiam ameaçados por suas posições científicas16 Assim a geografia analítica encontrou um meio de criar um mártir da nova ciência uma espécie de Galileu da New Geography Um novo modelo para a geografia David Harvey afirma que a geografia desenvolveu cinco principais temas de pesquisa a diferenciação regional a paisagem a relação homemmeio a distribuição espacial e o tema geométrico A história da geografia segundo ele pode ser vista como a tentativa de explicar e de teorizar estes temas Os fenômenos relativos à distribuição espacial a partir das teorias locacionais assim como as análises geométricas foram entre todos estes temas os mais sensíveis à formalização na geografia os outros permanecendo sempre no nível da simples descrição David Harvey também identificou os gêneros possíveis de explicação na geografia descrição cognitiva análise morfométrica análise de causaefeito explicação temporal análise funcional e ecológica e finalmente a análise sistemática A ligação entre os temas apresentados mais acima e os gêneros de explicação parece imediata Do raciocínio de Harvey é possível deduzir que a análise sistemática é a forma mais poderosa e apropriada à explicação na geografia Aliás os temas que apresentam segundo ele bons resultados teóricos são justamente aqueles que foram tratados através desta metodologia a diferenciação espacial e as análises geométricas Sempre segundo Harvey a forma de explicação descritiva é primitiva as relações de causaefeito bem como a explicação pela dimensão histórica arriscamse sempre a se deixar influenciar por questões metafísicas A análise funcional por sua vez é parcial por privilegiar somente uma relação entre os fenômenos a da função entre todas as outras existentes Desta forma a apresentação do problema da explicação em geografia para D Harvey acentua a primazia da análise sistêmica como o meio mais adaptado e mais de acordo com a revolução metodológica na geografia A geografia moderna sob a influência desta corrente teórica produz então uma nova síntese Nesta versão a análise espacial constitui o objeto fundamental da geografia e o método sistêmico é aquele com que se pode explicar cientificamente os fenômenos em suma a concepção sistêmica deve ser o instrumento da nova cosmovisão geográfica A teoria geral dos sistemas retoma os mesmos termos definidos pela racionalidade analítica Ela faz parte como a lógica matemática dos novos instrumentos que definem uma abordagem moderna da ciência O que constitui a força desta teoria é a uniformidade lógica de todo processo de conhecimento Segundo seus defensores todos os fenômenos podem ser vistos como sistemas independentemente do caráter particular ou da natureza dos elementos que os compõem e das relações que os unem A idéia geral de sistema é inspirada nas concepções da termodinâmica sobretudo no segundo princípio conhecido pelo nome de CarnotClaudius que define a noção de entropia Esta noção corresponde à probabilidade de mudança dentro de um sistema em função de seu grau de organização A variação entre estes dois elementos obedece à seguinte regra quanto maior o valor da entropia maior o grau de desorganização do sistema isomorfismo Desta maneira os baixos níveis de entropia correspondem aos altos níveis de ordem interna em um sistema A estas duas noções fundamentais se associa aquela da informação Ela pode ser definida como sendo o valor estatístico da incerteza provável A informação é então o contrário da entropia e por isso é conhecida também como negentropia Os sistemas são portanto poderosos instrumentos do cálculo de probabilidade Eles podem ser analisados segundo seus estados de organização sucessivos Através dos modelos e variando o valor da entropia é possível estimar o comportamento provável de um sistema Este gênero de experimentação foi 267 feito em diversos campos da ciência A economia e a psicologia entre as ciências sociais foram as mais sensíveis a este método David Harvey observa a aplicabilidade destas noções na geografia e nos cita alguns exemplos e tentativas já realizados Seria injusto não mencionar uma certa hesitação de Harvey em relação ao otimismo excessivo com o qual a teoria geral dos sistemas foi acolhida na geografia De fato ele propõe uma distinção entre dois níveis diferentes para a utilização desta teoria Ao nível metodológico acredita que se trata de um instrumento fundamental que fornece uma grande capacidade explicativa para a geografia Ao nível filosófico identifica dois grandes perigos primeiro a tentação de considerar a teoria dos sistemas como uma metateoria uma espécie de teoria das teorias Em segundo lugar Harvey vê também a possibilidade de que se desenvolva uma metafísica perigosa a partir de uma idéia de necessidade lógica universal Este último ponto de vista já tinha sido suspeitado por Bergson que via no segundo princípio da termodinâmica a mais metafísica das leis físicas Assim para Harvey a geografia moderna deve sempre prestar atenção à tentação finalista limitando a importância dos instrumentos analíticos a seu papel metodológico e a partir daí ele faz suas as preocupações do racionalismo mais moderno O elemento mais sedutor da concepção sistêmica é a possibilidade de prever ou de antecipar fatos através do conhecimento científico sem o recurso a uma lógica mecânica de causaefeito Segundo Bunge esta capacidade de avançar resultados é a característica distintiva da geografia moderna Para a maior parte dos geógrafos ligados a esta corrente o prestígio da geografia dependeria da aplicação deste conhecimento científico ao terreno prático da intervenção 268 De fato a participação dos cientistas na planificação era cada vez mais requisitada Os anos 5060 foram efetivamente marcados por esta participação que passava também por contatos interdisciplinares mais estreitos A geografia por intermédio da visão sistêmica aproximouse sobretudo da economia espacial Alguns modelos inspirados na concepção neoclássica incluindo a hipótese de um comportamento racional e da maximização de lucros e oportunidades foram retomados nas pesquisas geográficas Contudo a cooperação interdisciplinar limitavase aos domínios científicos engajados nas mesmas vias de transformações metodológicas como a sociologia formalista a psicologia behaviorista e a economia de inspiração neoclássica A cooperação interdisciplinar aliada ao interesse pelas aplicações práticas e pela renovação metodológica levou a Nova Geografia a produzir uma redefinição dos conceitos tradicionais da geografia clássica A região por exemplo tornouse um modelo para a análise espacial como uma estrutura lógica e hierarquizada Nesta perspectiva Grigg se esforçou em caracterizar os sistemas de regiões que definiu recorrendo a uma classificação analítica O sistema regional serve portanto para explicar certas dinâmicas e o recorte territorial depende dos parâmetros do observador que são eles mesmos relativos à finalidade da pesquisa Segundo Grigg a região enquanto entidade real está morta e a regionalização deve ser a partir de então considerada unicamente como um simples meio de análise Este gênero de abordagem é conhecido na geografia como análise regional e tornouse um dos temas preferenciais da visão sistêmica aplicada à geografia Foi em grande parte segundo esta 269 inspiração que os geógrafos participaram dos trabalhos práticos de planificação A concepção sistêmica renovou portanto completamente a análise geográfica A região não é mais vista como uma unidade territorial ela é concebida como uma classe espacial que faz parte de um sistema hierarquizado Como propunha Schaefer a geografia abandona a noção de lugar pela concepção de espaço Desta maneira a singularidade pode ser substituída pela generalização O exemplo da regiáo é eloquente mas em todos os domínios da geografia mudanças significativas foram efetuadas para se trabalhar de acordo com as novas perspectivas teóricas e técnicas Na mesma época uma outra corrente nascia nas ciências sociais o estruturalismo Esta corrente desenvolveuse primeiro no domínio da lingüística mas rapidamente começou a exercer uma influência fundamental sobre as outras ciências sociais A geografia aparentemente não foi sensível a esta tendência A razão fundamental da preferência da geografia pela teoria geral dos sistemas em detrimento do estruturalismo é devida segundo Dosse à filiação da primeira às ciências da natureza enquanto que o estruturalismo nasceu no quadro das ciências humanas Esta ausência é tanto mais surpreendente que pudemos medir a que ponto o estruturalismo privilegiou as noções de relações em termos de espaços em detrimento de uma análise em termos de gênese A diacronia foi substituída pela sincronia Esta escolha explicase talvez pela preocupação de rigor positivo e pela tradição de um modelo hipotéticodedutivo que caracterizam as ciências da natureza Talvez seja preciso também ver aí o traço da tradição temática do objeto homemmeio advinda da geografia clássica e que conseguiu perdurar para além da revolução que pretendia tudo renovar De toda forma a adoção do modelo sistêmico podia finalmente fazer a geografia passar de uma posição analítica retrospectiva para uma aproximação prospectiva pois se trata de um modelo nascido do racionalismo positivista Os elementos recorrentes desta orientação metodológica são mutatis mutandis os mesmos para todas as correntes afiliadas ao racionalismo Tratase de um modelo de ciência que reclama para si a objetividade e a precisão por intermédio de um método científico rigoroso e o recurso a este método significa também a perspectiva de respostas e verificações positivas isto é afirmativas e gerais que permitiriam ao mesmo tempo reforçar o prestígio da disciplina e convidála a agir no campo direto da sociedade A Nova Geografia e a modernidade O que retorna mais freqüentemente no discurso dos autores ligados a esta corrente da Nova Geografia é sem dúvida a evocação de uma geografia científica e moderna Construir uma perspectiva geográfica moderna sustentada por um método lógicomatemático parecia ser o caminho incontornável dos novos tempos O comentário de Burton que em 1963 dizia que a revolução teórica havia acabado na geografia nos dá uma idéia do pretenso sucesso destas aspirações Se olharmos estes textos no quadro do combate da modernidade combate perpétuo entre o tradicional e o novo eles aparecem como cartas de intenções que anunciam a chegada definitiva da geografia aos novos tempos Da mesma forma que os momentos de grandes convulsões sociais as revoluções científicas são seguidas de períodos de estabelecimento da nova ordem Podese portanto considerar que a simples denúncia de um comportamento tradicional defasado e antiquado foi a base da eclosão da Nova Geografia e que após esta eclosão tal corrente procurou estabelecer ao longo dos anos 60 e 70 sua legitimidade avançando os resultados obtidos Estes resultados foram justamente o alvo da maior parte das críticas dirigidas contra este modelo As hesitações e contestações não podiam mais ser interpretadas como simplesmente a reação tradicionalista e os limites do novo método começaram a se tornar objeto de debates Alguns anos mais tarde os geógrafos que tiveram o papel de portavozes deste movimento no início tornaramse eles mesmos seus críticos Desta maneira a metade da década de setenta viu o poder inexorável da revolução quantitativa sucumbir ao peso de outros horizontes críticos de outras revoluções De qualquer forma a discussão entre antigos e modernos na geografia claramente exposta durante a revolução quantitativa deixou marcas fundamentais A partir deste movimento o debate epistemológico passou a ocupar um dos primeiros lugares no leque das questões geográficas Não queremos absolutamente dizer que este debate esteve ausente até então A geografia clássica conheceu também este gênero de controvérsia como vimos anteriormente A diferença é que no curso destes últimos anos o debate se tornou mais claro divulgando suas filiações filosóficas e aceitando o fato de que esta é uma discussão em torno da legitimidade metodológica De uma certa maneira o que mudou foi que a natureza da geografia não pode mais ser caracterizada unicamente pela especificidade de seu objeto pelo olhar do geógrafo ou por seu papel sintético em relação às outras disciplinas A identidade geográfica a partir dos anos sessenta definiuse como o reflexo do pertencimento a um pólo epistemológico preciso Foi também por esta referência clara à metodologia como fundamento da discussão científica moderna que se fez a passagem de uma geografia clássica para uma geografia moderna David Harvey nota também esta mudança de perspectiva afirmando que o metodólogo está de agora em diante mais comprometido com a lógica da justificação do que com a ligação filosófica de suas crenças em relação à natureza da geografia22 A lógica da justificação científica é no entanto a que está mais sujeita a controvérsias e os anos ulteriores expressarão através das diversas orientações da pesquisa geográfica seus pontos de vista contraditórios 22 HARVEY David Explanation in Geography op cit p 6 273 11 O horizonte da crítica radical O entusiasmo e o vigor da geografia analítica foram progressivamente perdendo o fôlego em face das múltiplas críticas e das dificuldades impostas sobretudo pelas considerações do caráter político do espaço feitas à geografia O progresso do início dos anos sessenta perdia seu impacto e as numerosas promessas contidas no discurso da Nova Geografia começavam a mostrar seus limites Estas críticas podem ser reunidas em dois grandes grupos as de caráter teóricometodológico e as que consideram o domínio prático e ideológico da Nova Geografia O primeiro grupo diz respeito à utilização de modelos econômicos de inspiração neoclássica ou neoliberal1 Estes modelos pressupõem um com 1 Este tema aliás gerou uma longa e viva polêmica entre Brian Berry e David Harvey Ver BERRY B Revolutionary and Counterrevolutionary Theory in Geography A ghetto commentary Antipode nº 4 1972 pp 3133 Review of H M Rose ed Perspectives on Geography Geography of the Ghetto Perception Problems and Alternatives AAAG nº 64 1974 pp 342345 274 portamento social perfeitamente racional isto é uma conduta que em geral busca a satisfação máxima de suas necessidades a partir de uma via analítica racional e objetiva A maioria destes modelos supõe também uma concorrência perfeita uma difusão igualitária da informação e um espaço isomórfico O primeiro ponto da controvérsia é o da motivação racional Ao longo de toda a década de 60 a antropologia cultural e uma parte da sociologia consagraramse a pesquisas que punham em relevo a complexidade dos comportamentos sociais Esses estudos mostram que as atitudes sociais se reportam em geral ao contexto de cada comunidade estabelecendo valores e atitudes que têm pouca relação ou quase nenhuma com um comportamento estritamente racional e utilitário Em outros termos o indivíduo não pode ser comparado a um agente econômico perfeito e a análise racional das oportunidades deve passar pelo estudo de outros elementos igualmente determinantes na ação social Desta maneira a corrente da crítica radical tem a tendência a considerar o comportamento social como o resultado de um conjunto de elementos alguns gerais e determinantes outros particulares ou contingentes Os resultados são portanto bastante diferentes daqueles que podem ser antecipados por uma análise racional que se baseie tão somente na idéia de maximização das vantagens O mesmo pode ser dito em relação à concorrência Se teoricamente no sentido da modelização a concorrência pode ser considerada como perfeita isto é todos os agentes supostamente disporiam dos mesmos níveis de oportunidades e de independência para decidir na prática esta concorrência não existe A força dos grandes grupos econômicos os efeitos dos monopó Review of Social Justice and the City of David Harvey Antipode nº 6 1974 pp142145 e HARVEY D A commentary on the comments Antipode nº 4 1972 pp 3641 Discussion with Brian Berry Antipode nº 6 1974 pp 145148 Review of B J Berry The Human Consequences of Urbanisation AAAG nº 65 1975 pp 99103 275 lios os favores políticos são elementos muito mais importantes a despeito de seu caráter contextual e particular para a localização e o desenvolvimento da atividade econômica do que a pretensa concorrência perfeita e geral A informação da mesma forma não pode ser vista sob a perspectiva de uma pretendida eqüidade A informação figura entre os elementos que são controlados socialmente no jogo pelo poder e pelo prestígio social Por fim o espaço isomórfico dos modelos não se assemelha em nada à imagem da realidade de um espaço carregado de valores tradições hábitos etc Os obstáculos espaciais não são exclusivamente de natureza física ao contrário são majoritariamente da ordem da percepção social resultado de um complexo jogo de agentes diversos Os princípios que sustentaram os modelos teóricos mais prestigiados da geografia moderna foram então vistos com desconfiança As condições de abstração teórica da Nova Geografia eram assim acusadas de se apoiarem em bases falsas Estas críticas não recomendavam no entanto um retorno à concepção dos fenômenos como individualidades Tratavase antes da exigência de um modelo que pudesse verdadeiramente levar em conta as condições existentes sem se deixar influenciar por realidades desejadas Esta crítica teóricometodológica acrescentava ainda que a sofisticação da descrição e das técnicas não estava de acordo com a simplicidade explicativa empregada pela Nova Geografia O conjunto dos instrumentos quantitativos seria apenas uma roupagem renovada das velhas questões da geografia clássica Para esta visão crítica a corrente teórica tentava fazer avançar a geografia somente pela consideração formal mantendo intocáveis os eixos explicativos da velha geografia Tratavase portanto segundo a opinião destes críticos radicais de uma falsa revolução O outro ponto de vista consistia em apreciar os resultados práticos e sobretudo o papel político da Revolução Quantita 276 tiva Aí também as críticas eram definitivas A idéia de uma geografia que deveria intervir na realidade capaz de dar respostas objetivas neutras e justas aos problemas sociais foi então firmemente contestada e a ação dos geógrafos nos planos de gestão do território foi interpretada como sendo tãosomente uma tentativa de preservar o status quo A pretensa objetividade segundo estes críticos traduzia em verdade um compromisso com um ponto de vista ideológico da classe dominante Sem proceder a uma verdadeira crítica dos modelos gerais de interpretação a objetividade proclamada limitavase somente ao tratamento de dados evitando assim qualquer questionamento da ordem social Para estes críticos a ciência só pode ser interpretada segundo um ponto de vista político e a pressuposição de neutralidade já é em si mesma uma premissa ideológica A ciência é o produto de uma sociedade desigual na qual o poder é exercido por grupos minoritários que controlam também a produção do saber seus objetivos e aplicações O discurso da objetividade é portanto construído sobre aparências e tem como objetivo fundamental reproduzir e justificar cientificamente as estruturas do poder e os prestígios sociais já constituídos Destes dois grupos de críticas teóricometodológica e ideológicoprática decorrem duas associações que vão marcar profundamente a perspectiva radical A primeira associação relaciona o modelo da ciência teórica e o idealismo O comportamento racional como princípio de análise é a conseqüência de uma falsa idéia segundo a qual o homem é essencialmente racional Esta idéia generaliza a racionalidade independente dos contextos históricos e da situação particular da inscrição dos indivíduos nas classes sociais criando uma noção abstrata sem nenhuma correspondência com o real Um conceito não pode partir de uma idéia abstrata para serem válidos os conceitos devem se referir a situações historicamente definidas Marcase assim a diferença entre um procedimento que parte de uma idealização para compreender a realidade e outro que 277 parte da realidade material para construir conceitos explicativos isto é opõese uma ciência idealista e ideológica a um verdadeiro conhecimento históricomaterialista Outra associação efetuada é aquela do positivismo como sendo a forma da ciência burguesa por excelência Esta forma da ciência é fundamentalmente um discurso de legitimação do exercício desigual do poder e do controle social Os modelos de desenvolvimento estudados pela geografia sob esta perspectiva buscam assim dar apenas uma aparência de naturalidade ao desenvolvimento do capitalismo pois as correlações e leis enunciadas de um ponto de vista positivista consideram as formas desiguais da produção do espaço como as únicas possíveis O positivismo confere um sentido eterno e irrefutável ao desenvolvimento do capitalismo que é contudo carregado de circunstâncias históricas e de relatividade social A ciência que se proclama absolutamente objetiva cai portanto na armadilha do historicismo que ao estabelecer leis e regras que se pretendem válidas para todos os tempos impõe ao olhar retrospectivo a certeza contemporânea Se o positivismo se apresenta como o único método rigoroso é justamente para neutralizar um saber crítico construído sob parâmetros que valorizam a existência de classes sociais O discurso crítico considera portanto a ciência em sua forma dominante como um instrumento de alienação social e os métodos positivistas como procedimentos eficazes para reproduzir os modelos de desigualdade social e espacial Esta crítica é uma das mais difundidas nos textos dos geógrafos radicais que queriam demonstrar assim a grande ruptura a verdadeira revolução efetuada pelo horizonte crítico em oposição à ciência tradicional positivista Este discurso enfatizava a concepção de que a verdadeira revolução na metodologia da geografia moderna só chega a partir da crítica radical Surge destas contradições societais desigualdades ação do capitalismo monopolista segregação espa 278 cial uma ciência radical que procura explicar não somente o que está acontecendo mas também prescreve uma mudança revolucionária2 Posicionandose simultaneamente contra a geografia tradicional e a geografia dita quantitativa os radicais pretendiam fundar uma nova ciência que devia estar de acordo com as bases de uma nova sociedade A ciência radical é pois o agente consciente da mudança política revolucionária3 Os argumentos a exemplo do que havia feito a corrente analítica utilizavam também a idéia de defasagem e de insuficiência Para os radicais no entanto a idéia principal era a de crise Crise do capitalismo crise política crise da ciência política do positivismo Como vimos anteriormente a idéia de crise tornouse uma imagemforça da modernidade que em seu nome legitima a adoção do novo para substituir o que é então considerado como superado e em choque com os novos tempos Encontrase aqui uma estrutura similar àquela do discurso dos quantitativistas Há de imediato uma crítica à velha geografia ou geografia tradicional seguida da crítica à geografia analítica para enfim introduzir o projeto de uma nova ciência que irá finalmente dissolver toda a inadequação a defasagem e as dicotomias para fundar uma nova geografia Sob esta nova forma a objetividade possui uma natureza diferente daquela estabelecida pela ciência positivista e só através dela se poderá por assim dizer revelar a estrutura da realidade última Neste sentido a revolução radical assim como a precedente pensou em produzir um método de análise infalível rigoroso e preciso Ela também reclamava uma posição científica fundada sobre um conhecimento objetivo sem os obstáculos ideológicos conser 2 PEET R Introduction Radical Geography Alternative viewpoints on contemporary social issues op cit p 1 3 PEET R Introduction Radical Geography Alternative viewpoints on contemporary social issues op cit p 7 279 vados pela geografia analítica Tratavase portanto de um saber a serviço de uma transformação social e não mais de um saber visando manter as estruturas sociais As categorias de análise utilizadas eram igualmente formais e abstratas à diferença de que partiam de situações históricas concretas e não de premissas e pressupostos ideais Enfim tal corrente acredita estar fundada sobre o conhecimento da essência dos fatos e não das suas aparências As ligações deste horizonte crítico com o materialismo histórico e dialético seja pela utilização direta de suas categorias analíticas seja pela valorização de um discurso político engajado na ciência são razões para que se examinem algumas características desta doutrina para melhor perceber o desenvolvimento da crítica radical na geografia O discurso científico do marxismo A obra de Marx examinada com o distanciamento necessário é sem dúvida inspirada pela idéia de ciência que caracterizou o séc XIX e por isso considerada por muitos como o último grande sistema filosófico do Iluminismo Segundo por exemplo Domenbach na medida em que ele o capitalismo necessita de uma doutrina ousarei dizer que foi Marx que o forneceu otimismo racionalista mística da produção confiança nos dons inesgotáveis da natureza Tudo isto coroado pela utopia do fim da história este momento maravilhoso no qual o pleno emprego das forças humanas colocará fim às condições limitadas das formas precárias de produção4 Este sistema global de explicação da realidade deveria ser capaz de compreender a totalidade dos problemas sociais Seus elementos essenciais estão ligados à produção da vida material ou ao plano econômico lato sensu pois as con 4 DOMENBACH JeanMarie Enquête sur les idées contemporaines Seuil Paris 1987 p 29 280 dições desta produção são a base de toda estrutura social e organização humana A perspectiva de Marx é produzir um saber objetivo e racional objetivo pois representa a observação do realhistórico racional pois é guiado por demonstrações e deduções lógicas rigorosas e necessárias A produção em geral é uma abstração mas uma abstração racional na medida em que sublinha e precisa efetivamente os traços comuns evitando assim para nós a repetição No entanto este universal ou este caráter comum isolado por comparação é ele mesmo um conjunto articulado complexo no qual os membros divergem para se revestir de determinações diferentes Alguns destes elementos pertencem a todas as épocas outros são comuns somente a algumas Algumas determinações serão comuns à época mais moderna e à mais antiga Mas se é verdade que as línguas mais evoluídas têm em comum com as menos evoluídas certas leis e determinações é precisamente o que constitui sua evolução o que as diferencia destes caracteres gerais e comuns5 O materialismo histórico e dialético é o método que permite a passagem da imagem caótica do real para uma estrutura racional organizada e operacionalizada em um sistema de pensamento A primeira etapa deste método é pois a busca dos elementos essenciais comuns que estruturam o real O leitor que quiser me seguir deverá se decidir a elevarse do singular ao geral6 A tradição da filosofia alemã costumava na observação do real centrar seu interesse no domínio do fenomenológico 5 MARX Karl Contribution à la critique de léconomie politique Paris ed Sociales 1977 p 151 6 MARX Karl Prefácio à Contribution à la critique de léconomie politique Paris ed Sociales 1977 p 1 281 ou seja daquilo que aparece A perspectiva marxista encontra no método materialistahistórico o instrumento capaz de projetar a percepção para além do fenomenológico fazendo sobressair as verdadeiras essências escondidas atrás das aparências A realidade última é portanto revelada por intermédio da razão que reconhece no movimento caótico da sociedade os fatores fundamentais de sua organização e de seu desenvolvimento ou nas palavras do próprio Marx Reconhecer para além das aparências a essência e a estrutura internas Marx introduz a noção de uma razão histórica materialmente determinada em oposição à concepção do idealismo que definia o real como um produto da razão absoluta Desta maneira o marxismo afirma que o sujeito do conhecimento historicamente determinado e contextualizado socialmente é capaz de ser apreendido pela ciência a partir das categorias essenciais que o envolvem a produção a reprodução o consumo a troca a propriedade o Estado o mercado e as classes sociais Estas categorias são concebidas a partir de um raciocínio que desenvolve uma cadeia de determinações entre elas Desta maneira a produção determina a troca que por sua vez é determinada pelo mercado este último é o princípio de determinação da divisão do trabalho que dá a base à produção Uma produção determinada determina portanto um consumo uma distribuição uma troca determinada as relações determinadas que estes diferentes momentos possuem entre si Estas categorias abstratas realizam portanto um percurso de determinações que torna possível o estabelecimento de relações necessárias entre os diversos fenômenos recolocados dentro de um verdadeiro sistema A finalidade desta conduta é compreender a sociedade em seus aspectos fundamentais suas determinações leis e regras de 7 MONLEON Jacques de Marx et Aristote Perspectives sur lhomme FAC ed Paris 1984 p 20 8 MARX Karl Contribution à la critique de léconomie politique op cit p 165 282 evolução Para chegar aí é preciso reconhecer historicamente o desenvolvimento destas categorias em diversos momentos e estabelecer o sentido e a direção de sua evolução É manifestamente este último método que é correto do ponto de vista científico No plano teórico a ciência inspirada no marxismo busca as determinações atuantes sobre os elementos ou em outras palavras as regras do movimento geral do sistema social a lei da acumulação a lei da composição orgânica do capital a lei dos rendimentos decrescentes as leis da renda diferencial etc e através delas podem ser gerados modelos abstratos prospectivos A base do sistema materialistahistórico é dada pelas regras que determinam o tipo de relação de produção frente ao desenvolvimento das forças produtivas estes dois elementos são os termos fundamentais que definem um modo de produção e ao mesmo tempo constituem a causa da transformação dialética Desta maneira a concepção do progresso social na teoria marxista reforça a idéia do mito da modernidade A sociedade se transforma segundo o marxismo por momentos de crise de lapso entre as relações de produção antigas em concorrência com novas forças produtivas Tratase também de uma dinâmica que acentua as rupturas e a progressão inexorável do novo sobre o antigo O marxismo é essencialmente moderno também na medida em que faz apelo a um método moderno base da legitimidade de seu sistema explicativo um sistema lógico racional fundado em determinações objetivas No plano prático a perspectiva marxista define uma nova atitude do cientista em sua relação com a sociedade sempre crítico e pronto a denunciar as armadilhas ideológicas montadas pelo saber comprometido com o status quo A prática científica deve favorecer a ligação entre o saber e a transformação social 9 MARX Karl Contribution à la critique de léconomie politique op cit p 166 283 Contudo exatamente como em A Comte a ciência para Marx se torna o único meio positivo de instituir a verdade e deve servir àqueles que querem agir na sociedade A denominação socialismo científico reivindicada pelo próprio Marx exprime aliás a diferença fundamental entre sua concepção racional lógica e metódica e as outras utopias socialistas que são apenas fruto da pura imaginação Em suma o modelo epistemológico do marxismo obedece sem dúvida aos princípios normativos advindos de uma racionalidade estrita e pretende intervir na realidade ungido da legitimidade conferida por seu método objetivo e geral No fim dos anos sessenta e durante toda a década de setenta o marxismo exerceu uma forte influência sobre as ciências sociais De fato esta influência se fez em dois níveis De um lado impôs uma retificação do trabalho acadêmico para enquadrálo em uma visão mais ampla e consciente do contexto político da ciência e da sociedade O marxismo foi assim o instrumento de discussões sobre a responsabilidade social dos pesquisadores e a apropriação do trabalho científico De outro lado a doutrina marxista deu a possibilidade às ciências sociais de desenvolverem modelos teóricos deterministas inteiramente concebidos na esfera do domínio social isto é independentes dos modelos das ciências naturais que até então eram os únicos a propor modelos verdadeiramente racionalistas e objetivos Estas duas características a definição de um novo papel político do saber e a formulação de um modelo nomotético para as ciências sociais são os traços mais fortes do discurso de todos os críticos radicais da geografia Todavia ainda que a geografia radical se distinga por uma perspectiva efetivamente geral comum notase em seu interior uma diferenciação importante De um lado um grupo de geógrafos sobretudo franceses trabalhou para reavaliar o peso das tradições geográficas e impor um novo ponto de vista sobre o uso político do espaço De outro lado a crítica radical abertamente inspirada do marxismo 284 muito desenvolvida nos Estados Unidos se conferiu como tarefa fundamental adaptar os instrumentos desta doutrina à análise espacial A geografia radical e o uso político do espaço A revista Hérodote lançada por Yves Lacoste em 1976 constitui o símbolo e o instrumento da difusão do pensamento crítico na França10 Desde o seu primeiro número um artigo central apontava a crise da geografia tradicional enquanto simultaneamente Lacoste publicava seu livrochave que se tornou uma pedra angular na constituição da corrente radical11 Não é nossa proposta nos demorarmos aqui na obra de Yves Lacoste reteremos dela apenas alguns pontos O primeiro diz respeito à estrutura da exposição de seus argumentos que segue uma via similar à utilizada nos textos que apresentavam a Nova Geografia O segundo se reporta à busca de uma nova legitimidade para a pesquisa geográfica a partir de novos parâmetros definidos no projeto científico desta tendência radical Lacoste inicia seu texto pela crítica à geografia tradicional aquela que ele identifica como sendo a geografia dos professores Seu caráter ultrapassado e deficiente já sublinhado pelos geógrafos da Nova Geografia é interpretado por Lacoste como a face ideológica oculta deste saber tradicional Em outros termos onde a Nova Geografia denunciava apenas uma defasagem histórica e uma incompetência científica a geografia radical acrescentou uma nova dimensão que ressalta sua operacionalidade política sua incontestável funcionalidade A geografia tradicional deixa de ser compreendida como uma etapa ultrapassada do progresso da geografia para ser vista segundo sua utilida 10 A revista Hérodote é descendente da publicação Antipode que apareceu em 1969 e fez nascer a corrente radical nos Estados Unidos 11 Attention géographie in Hérodote Editorial nº 1 jan 1976 e LACOSTE Yves La géographie ça sert dabord à faire la guerre Maspero Paris 1976 de ideológica12 A passagem para o moderno segundo Yves Lacoste não se reduz ao caráter teóricometodológico mas integra um novo elemento fundamental a natureza política inerente à reflexão espacial O argumento da utilidade ideológica é também utilizado por Lacoste para criticar a Nova Geografia que se apresenta ideologicamente como um discurso científico puro e neutro tecnocrático A crítica desta escola não ocupa no entanto um lugar de destaque na reflexão de Yves Lacoste pois a influência da corrente analítica no meio universitário francês foi bastante reduzida Assim o essencial da crítica de Lacoste diz respeito à escola francesa de geografia Vidal de la Blache foi um dos alvos favoritos da revista Hérodote pois era acusado de haver imposto uma despolitização da geografia em nome de uma falsa cientificidade A escola vidaliana segundo Lacoste privilegiava os fatos imutáveis excluindo de sua análise as mudanças mais recentes e mais ainda as relações sociais e de produção A geografia regional vista pela escola vidaliana como a geografia por excelência tornase segundo Lacoste um obstáculo no sentido epistemológico de Bachelard O conceito de região limita a extensão da reflexão a uma única escala apagando o papel do capitalismo como a força fundamental da organização do espaço A crítica de Lacoste a geografia tradicional é neste sentido muito mais radical do que a da corrente analítica A geografia da escola francesa é acusada de ser um saber essencialmente ideológico e deveria por este motivo ser rejeitada em bloco Por que e para que serve a geografia Tal era a questão fundamental da geografia crítica na França A resposta gira em 12 A crítica que eu fazia do discurso tradicional dos geógrafos era de fato o meio de mostrar a utilidade fundamental de verdadeiros raciocínios geográficos não somente para os militares mas também para o conjunto dos cidadãos sobretudo quando eles devem se defender LACOSTE Yves La géographie ça sert dabord à faire la guerre prefácio à segunda edição 1982 torno de duplos termos aparência e essência ideologia e prática geografia dos professores e dos estadosmaiores De fato a partir dos anos setenta a preocupação com o viés político começa a se inscrever mais profundamente no campo de pesquisas geográfico após um relativo domínio da economia A geografia radical anglosaxã talvez pela aceitação quase irrestrita do marxismo valoriza num primeiro momento a questão econômica antes de verdadeiramente penetrar no terreno da análise política enquanto os geógrafos franceses talvez por influência do movimento de maio de 68 se lançam neste terreno desde o começo Assim em relação ao marxismo Lacoste mantém uma posição fortemente ambígua Ele afirma textualmente que a dimensão espacial nunca foi central na reflexão marxista clássica tendendo mesmo a desaparecer nos textos mais tardios de Marx Ele afirma também que a análise marxista na geografia corre o risco de supervalorizar a História ou a economia política A geografia perde assim sua capacidade explicativa quando apela para o marxismo podendo somente trabalhar com uma causalidade histórica e econômica Da mesma forma a incapacidade explicativa da geografia a obriga a recorrer ao instrumento marxista o que tende paradoxalmente a reforçar a conduta metodológica tradicional vidaliana Desta maneira ela não é mais capaz de questionar os bloqueios específicos do discurso geográfico tradicional mantendo silêncio sobre as questões políticasespaciais fundamentais Este comentário se dirigia especialmente ao grupo de geógrafos franceses capitaneados por Pierre Georges que embora fossem politicamente filiados ao marxismo não teriam obtido êxito em renovar metodologicamente a geografia tradicional segundo Lacoste Contudo a ambigüidade do discurso de Lacoste aparece na medida em que ele também apela para certas categorias e clivagens clássicas da análise marxista É o caso por exemplo do conceito de ideologia definido como falsa consciência que está na base da crítica de Lacoste à escola francesa de geografia Inúmeros outros exemplos podem ser também encontrados em sua obra como por exemplo lutas sociais crise do sistema capitalista crise dialética do desenvolvimento histórico práxis libertária etc De fato parece que Lacoste sem se afastar completamente da grade de análise marxista tenta revalorizar a preocupação espacial Quando se refere ao imperialismo ou às táticas de guerrilhas ele destaca a importância da análise espacial como um elemento fundamental para a compreensão destes fatos Saber pensar e combater no espaço segundo os termos do próprio Lacoste corresponde ao que parece a reconhecer a veracidade das proposições marxistas Em suma se o marxismo está tradicionalmente ligado a uma perspectiva explicativa política e histórica a geografia deve por sua parte possuir seu próprio modelo de interpretação sem no entanto romper com o sistema explicativo do marxismo Uma das formas explicativas mais importantes da geografia segundo esta orientação é a geopolítica Segundo ele a disciplina geográfica constituiuse fundamentalmente em torno da temática geopolítica e durante todo o séc XIX a orientação militar foi predominante como testemunham os engenheirosgeógrafos de Napoleão I A geopolítica já estava presente em Humboldt que tinha até mesmo escrito um tratado a este respeito da mesma forma que nas obras de Ratzel e Reclus O radicalismo francês tal qual a corrente analítica foi buscar no passado da geografia as raízes que pudessem corroborar seu ponto de vista atual A obra de Eliséé Reclus foi reapropriada pelos geógrafos radicais como sendo um exemplo de ciência geográfica militante e consciente de seu papel social Numerosos artigos abordaram a obra porém muito mais a ação política de Reclus e a ele foram consagrados alguns livros13 13 Ver número especial da revista Hérodote consagrado a Eliséé Reclus Un géographe libertaire n 22 julset 1981 GIBLIN Béatrice Eliséé Reclus Pour une géographie tese apresentada na Universidade de ParisVincennes Desta forma uma vez mais a legitimidade foi buscada no passado mostrando que as tradições esquecidas são o símbolo da permanência de uma luta epistemológica A dinâmica renovada destes padrinhos nos faz sem dúvida alguma pensar na estrutura de todas as revoluções políticas que criam seus mártires e que em seu nome exigem reparação Aliás a crítica definitiva do pai fundador da geografia clássica Vidal de La Blache impunha sem dúvida a busca de uma paternidade alternativa Em seu posfácio à edição de 1982 Lacoste reexamina suas posições críticas em relação a Vidal de La Blache Ele afirma que a supervalorização do autor do Tableau o fez esquecer que o mesmo homem havia escrito La France de lEst verdadeiro tratado de geopolítica De fato segundo esta nova versão de Lacoste o bloqueio do viés político na geografia foi obra nefasta dos historiadores e principalmente de Lucien Fèbvre Este último após a morte de Vidal encerrou a pesquisa geográfica em seu quadro mais estreito constituindose no intérprete da metodologia vidaliana Seu objetivo era reservar as preocupações políticas e econômicas para a História que neste momento alargava seu campo de pesquisa14 Assim a reaparição da geopolítica que sobretudo desde a Segunda Guerra mundial havia sido banida pelos geógrafos significaria uma reabilitação do campo original da geografia e através dela os geógrafos alcançariam de novo a dimensão esquecida da análise política Enfim convém examinar o novo patamar de cientificidade buscado por esta corrente de pensamento Um primeiro ponto importante é reconhecer que a despeito de toda a carga crítica em relação à ciência positivista os geógrafos radicais não re 1971 e Eliséé Reclus géographie anarchisme Hérodote n 2 1976 pp 3049 e DUNBAR G S Eliséé Reclus historian of nature Hamden Connecticut 1978 SARRAZIN H Eliséé Reclus ou la passion du monde La Découverte Paris 1985 14 Este ponto de vista se encontra também em DOSSE F LHistoire en miettes La Découverte Paris 1987 nunciaram aos preceitos racionalistas de um saber afirmativo e metódico15 Ao contrário ao denunciar a ciência burguesa como ideológica o radicalismo pretendia justamente oferecer a possibilidade de um saber mais objetivo justo e sem máscaras Em diversas ocasiões Lacoste acusa a geografia de ter negligenciado todas as discussões epistemológicas mas o que ele identifica como uma questão epistemológica assemelhase mais freqüentemente a uma preocupação deontológica que destaca a finalidade e o uso do saber geográfico É neste sentido por exemplo que ele critica a dificuldade de divulgar um saber advindo dos estudos de grupos sociais os quais servem antes de mais nada ao exercício do poder daqueles que encomendam estes estudos Os geógrafos têm o dever de ensinar a pensar o espaço da mesma maneira que os geopolíticostecnocratas o fazem Esta questão se inscreve diretamente na esfera da ética profissional pois não se trata aí de um desconhecimento ou de uma verdadeira carência epistemológica mas sim de uma cortina de fumaça lançada sobre a virtualidade política da análise espacial Esta análise do espaço quando não encontra uma rede de comunicação efetiva tornase um poder principalmente para os poderosos preservando as estruturas existentes A única solução segundo Yves Lacoste é inscrever a atitude analítica da geografia em uma prática militante Uma nova ciência não pode ser definida somente em termos teóricos na concepção de Lacoste a prática geográfica é também um elemento primeiro do problema epistemológico Poderseia dizer que uma revolução científica não se configura somente pela substituição de parâmetros uma revolução epistemológica deve se desenvolver em consonância com a sociedade A nova geografia proposta por Lacoste é ao mesmo tempo um saber sem disfarce e uma pedagogia militante 15 Lacoste reconhece no posfácio à edição de 1982 seu ponto de vista cientificista fundamental na época da redação de seu livro LACOSTE Yves posfácio à edição de 1982 La géographie ça sert dabord à faire la guerre op cit p 1 Em resumo o esforço epistemológico de Lacoste repousa sobre uma relação estreita entre espaço e poder político através de elementos didáticos como a análise de mapas e a consideração dos fenômenos em diferentes escalas O valor de verdade segundo a proposição de Lacoste é função da interação entre a prática científica e a transformação social A corrente radical marxista Esta corrente possui características análogas à precedente Os geógrafos radicais marxistas em grande parte de origem anglosaxã também fizeram a dupla crítica da geografia tradicional e da Nova Geografia Eles consideraram igualmente que o saber geográfico produzido anteriormente era fortemente influenciado pela ideologia dominante e se tratava de um saber estratégico manipulado pelos detentores do poder Assim como o radicalismo francês a corrente anglosaxã acreditava que uma revolução científica deveria ser definida por uma nova prática dos geógrafos resultado de um compromisso social do saber A grande diferença é a aceitação pela maior parte dos geógrafos desta corrente do marxismo como base do estabelecimento desta nova ciência Esta aceitação introduz elementos sensivelmente diferentes daqueles que constituíam a crítica francesa O discurso de Marx e o de seus mais próximos colaboradores são tomados como os textos fundadores desta Nova Geografia Um bom número de geógrafos investigou minuciosamente 16 O percurso de W Bunge é neste sentido exemplar Ver RACINE J B De la géographie théorique à la révolution Willian Bunge Lhistoire des tribulations dun explorateur des continents et des îles durbanité devenu taxi driver Hérodote n 4 1976 pp 7990 17 Neste ponto Bunge figura como exceção pois acredita que o marxismo produz também uma redução ideológica prejudicial à ciência radical BUNGE W Perspectives on theoretical Geography AAAG 1979 n 69 pp 169174 p 171 291 O capital A crítica da economia política e A ideologia alemã para daí retirar a matéria fundamental da pesquisa geográfica De um lado este procedimento conduziu a uma certa redefinição do vocabulário geográfico à luz do discurso marxista de outro induziu uma nova abordagem dos problemas tradicionais da geografia que devia seguir os cortes e o tratamento apresentados nos textos fundamentais do marxismo A geografia radical sob a influência direta do marxismo propõe um novo modelo de análise espacial que pretende ao mesmo tempo ser rigorosamente científico e revolucionário A construção desta nova geografia segue um caminho semelhante àquele da geografia quantitativa isto é em um primeiro momento singularizase ao lançar um olhar crítico sobre as correntes que a precederam e depois em um segundo momento estabelece as bases do que deve ser o verdadeiro conhecimento geográfico fundado sobre uma superioridade metodológica Para os geógrafos marxistas a combinação da perspectiva materialista e do método dialético permite o desenvolvimento de uma teoria nãoideológica isto é o materialismo dialético a base filosófica de uma ciência social verdadeiramente científica Novamente a geografia clássica é revisitada criticamente Segundo Rodolphe De Koninck o modelo descritivo inspirado por Vidal de La Blache supõe noções de harmonia de equilíbrio e de evolução estável que servem para dissolver toda explicação em uma espécie de naturalização dos processos sociais As críticas são também dirigidas contra a concepção de Hartshorne da geografia como sendo uma ciênciamétodo defini18 PEET R Introduction Radical Geography Alternative viewpoints on contemporary social issues op cit p 19 19 DE KONINCK R Contre lidéalisme en géographie Cahiers de géographie du Québec XXII 56 pp 123145 292 da por um ponto de vista particular Este método segundo De Koninck era concebido pela maioria dos geógrafos como uma arte a arte da descrição e as monografias eram os objetos onde os geógrafos exerciam seus talentos artísticos literários Esta perspectiva empobrecedora teria se imposto como a dominante até o advento das críticas modernas nos anos sessenta Mesmo Jean Brunhes e Maximilien Sorre que estavam no entanto entre os mais objetivos geógrafos da escola francesa foram objeto de críticas severas que os acusavam de praticar um idealismo primário em oposição à superioridade da perspectiva marxista No mesmo sentido Damette e Schleibling consideram que foi esta tradição ateórica e empirista da geografia clássica que conseguiu impedir a difusão progressiva do marxismo na geografia no curso dos anos sessenta A geografia tradicional era assim vista como uma ciência reacionária que pretendia afirmar a natureza imutável das relações entre o homem e a Terra Ela as reduzia aos aspectos naturais mais primários tentando construir uma ordem ideal sem nenhuma relação com as condições históricas e materiais da sociedade Por este procedimento a geografia teria se afastado da busca de leis capazes de transcender o nível da pesquisa preliminar O simples estudo de casos ocupou um lugar central na pesquisa tradicional sem colocar jamais em dúvida o caráter reacionário e limitado deste tipo de saber Todos estes aspectos definem o saber geográfico tradicional no mesmo sentido em que Gramsci define a cultura tradicional em oposição à cultura orgânica Ainda segundo De Koninck a crítica moderna pela via da Nova Geografia investiu contra o tradicionalismo sem no entanto alcançar os pontos fundamentais o que teria contribuído para o seu envelhecimento precoce Ela pretendia ir além da descrição rumo a uma verdadeira explicação científica mas 20 DAMETTE F e SCHEIBLING J Vingt ans après La géographie et sa crise ont la vie dure op cit p 25 293 Segundo Lévy Seria no mínimo prematuro pretender que a velha dama seja emancipada de repente da tradição e que se ponha a marchar com um só movimento O empirismo o naturalismo não estão mortos e as legiões de concursados continuam a encher e a esvaziar as sutis mas fossilizadas gavetas da explicação de mapa Em suma se a geografia tradicional assim como a geografia quantitativa sofriam dos mesmos males e limites a verdadeira revolução do conhecimento geográfico só poderia vir da corrente radical Quando a geografia começou a se observar com o mínimo de distanciamento percebeu que as funções que legitimavam sua existência eram extremamente frágeis Este foi o ponto de partida de uma conduta crítica tão radical quanto nova O combate e a defasagem entre a geografia dita tradicional e a modernidade são sempre enfatizados nos textos que apresentam a perspectiva radical Perguntase por exemplo se a geografia está pronta para intervir no mundo atual utilizando um instrumental clássico ultrapassado e tradicional A resposta é que a condição de realização de uma geografia científica moderna técnica e socialmente e ideologicamente justa é o recurso à utilização de categorias e conceitos inspirados diretamente no marxismo Segundo Lévy por exemplo a evolução da geografia 22 LÉVY J Des lieux et des hommes un nouveau départ pour la géographie op cit p 43 grifo nosso 23 LÉVY J Des lieux et des hommes un nouveau départ pour la géographie op cit p 30 24 PEET R The Development of Radical Geography in the United States in Radical Geography Alternative viewpoints on contemporary social issues op cit pp 1617 e SMITH N Geography Science and PostPositivism Modes of Explanation Progress in Human Geography nº 33 1979 pp 356383 295 clássica em direção à Nova Geografia se fez sem grandes rupturas A crise da geografia atual só será portanto superada quando uma nova delimitação das exigências de uma racionalidade moderna na abordagem científica da sociedade for elaborada Ele acrescenta em seguida que a menos que se dê provas de um antimarxismo dogmático reconhecerseá de bom grado a partir de então as contribuições fundamentais dos trabalhos de Marx e de Engels sobre um certo número de pontoschave Seguindo uma conduta que nos parece ainda hoje bastante moderna eles produziram modelos suficientemente simples para serem enriquecidos corrigidos e criticados A utilização do conceito de modo de produção aparece então como o meio que permitiria afastar todo idealismo da análise geográfica A geografia contribuiria para a compreensão das condições materiais da existência social e portanto da constituição de um modo de produção levando em consideração a divisão territorial do trabalho Finalmente o reconhecimento da função ideológica e estratégica inerente ao saber geográfico criaria uma nova prática social e epistemológica Tendo em conta estes três pontos o marxismo aparecia como o único campo teórico capaz de dar respostas satisfatórias às novas demandas científicas e sociais Em oposição à ciência nomotética que buscava leis de tendência reducionista e à geografia tradicional clássica sempre ligada ao estudo do único a geografia radical propõe uma rede analítica capaz de tecer uma verdadeira aproximação global Assim a nova modernidade da geografia inspirada pelo marxismo era apresentada como um terceiro termo que ultrapassaria as dualidades fundamentais da ciência na modernidade O idiográfico contra o nomotético o hermenêutico contra o explicativo o literário contra o exato e 25 LÉVY J Des lieux et des hommes un nouveau départ pour la géographie op cit pp 3738 grifo nosso 296 segundo estes geógrafos radicais caiu na mesma armadilha de um saber não suficientemente crítico que é objeto da manipulação pelo poder hegemônico O sucesso dos instrumentos quantitativos não foi acompanhado de uma explicação satisfatória e segundo a já célebre fórmula a geografia media parcialmente ou com parcialidade os fatos sociais Os geógrafos da Nova Geografia teriam com efeito avançado muito em relação à perspectiva tradicional quando comparados com os artistas das monografias segundo os críticos radicais Todavia a natureza da explicação permaneceu simplista e fatalista como na corrente clássica Simplista pois a explicação sempre apela para idéias mecanicistas como a da difusão espacial e fatalista pois os resultados da pesquisa são sempre apresentados como advindos de um inevitável processo social Ainda que estes geógrafos ditos modernos se interesssem efetivamente por temas contemporâneos eles são contudo incapazes de refletir sobre as questões de base dos problemas sociais dos novos tempos Desta maneira em lugar de buscar a origem da diferenciação espacial estes geógrafos através de seus trabalhos cooperavam na manutenção das desigualdades e contribuíam simultaneamente para a manutenção de uma ciência defasada e distante dos reais problemas da sociedade A Nova Geografia que se apresentou como uma corrente pragmática e objetiva possuía para os críticos radicais por seu caráter ideológico fortes analogias com a geografia colonial do início do século Estas abordagens privilegiaram uma descrição minuciosa e uma explicação naturalista sem que houvesse uma verdadeira preocupação de explicação das estruturas sociais e em que as relações de produção estão sempre ausentes 21 DE KONINCK R Contre lidéalisme en géographie Cahiers de géographie du Québec op cit p 129 Para Peet eles são os novos liberais PEET R The Devent of Radical Geography in the United States in Radical Geography Alternative viewpoints on contemporary social issues op cit pp 2021 294 finalmente presente envenenado a liberdade contra a necessidade toda esta filosofia das ciências humanas envelheceu26 No quadro da análise marxista o espaço deve ser considerado como um produto social isto é ele só pode ser explicado recorrendo aos aspectos fundamentais que organizam a sociedade Para o marxismo estes aspectos são como vimos precedentemente as relações de produção e as forças produtivas que compõem o modo de produção A primeira questão que se impõe aos geógrafos que trabalham sob esta influência é saber se o espaço enquanto produto social possui uma verdadeira influência mais ainda se é um termo fundador do desenvolvimento da sociedade A aceitação de um materialismo dialético supõe que o espaço tem um papel tão ativo quanto os outros elementos das esferas da produção e da reprodução social A geografia radical apela assim para o conceito de espaço social a fim de traduzir aí a idéia de dinâmica social inscrita em um espaço que é ao mesmo tempo reprodutor de desigualdades e a condição de sua superação o reflexo de uma ordem e um dos meios possíveis para transformar esta mesma ordem enfim o espaço faz parte da dialética social que o funda27 O que é no entanto fundamental para a geografia é o estatuto de independência ou de especificidade dos fenômenos espaciais em relação à análise da sociedade tal como é concebida no sistema marxista Em outros termos a questão é saber se a geografia pode existir como ciência do espaço com autonomia ou se ela deverá se curvar às determinações sociológicas e à causalidade histórica Esta questão suscitou grandes debates na geografia no fim dos anos setenta28 Aqueles 26 LÉVY J Des lieux et des hommes un nouveau départ pour la géographie op cit p 37 27 A revista Espace Temps criada em 1975 foi uma das portavozes desta concepção do espaço social Ver por exemplo PFERTZEL J P Marx et lespace De lexégèse à la théorie Espace Temps 1981 nº 181920 pp 6577 p 70 28 Ver CLAVAL P Le marxisme et lespace e COLLECTIF DES CHERCHEURS DE BORDEAUX A propos de larticle de P Claval Le marxisme et lespace Lespace Géographique nº 3 1977 pp 145164 e 165177 297 que pretendiam ver na utilização do instrumental marxista o abandono da análise espacial foram chamados de espaciologistas Os argumentos que defendiam a pertinência da análise marxista para a geografia retornavam sempre à demonstração da dependência do espaço pois se julgava que o espaço recebia a cada momento sua significação concreta a partir dos elementos da produção de um grupo social dado Assim destacase a preocupação espacial na produção mercantil na divisão do trabalho nos preços da produção ou nas taxas de lucro sem no entanto retirar daí uma verdadeira teoria espacial capaz de dar uma autonomia epistemológica à geografia De fato a geografia radical marxista trouxe uma verdadeira contribuição para a análise espacial acentuando problemas que tinham permanecido estranhos até então mas sem chegar a recolocar o objeto da geografia dentro de uma teoria de fato a crítica radical foi se voltando gradualmente para o tratamento de questões relativas à economia espacial e à geopolítica As novas perspectivas da análise marxista A partir dos anos oitenta a influência do marxismo na geografia principalmente anglosaxã apresentou novos aspectos e a crítica radical tomou outras direções Podemos identificar dois períodos principais neste percurso O primeiro toma o marxismo ipsis litteris e tende a ver uma predominância dos fatores econômicos na organização da vida social e do espaço A categoria modo de produção e as formas concretas que estão associadas a ela as formacões sócioeconômicas foram freqüentemente assimiladas às formas de organização espacial O agente que utiliza constitui organiza e transforma o território é a formação social Uma formação social só pode se constituir em relação a um território e há um processo histórico único de composição da 298 formação social e de seu território29 A geografia radical recorreu freqüentemente a este conceito notadamente para redefinir a noção de região30 No capitalismo avançado no entanto segundo a análise clássica do marxismo haveria uma generalização das relações de produção tipicamente capitalista desencadeando uma perda de rugosidade do espaço que tenderia então a homogeneizarse Como se trata de uma análise que confere a primazia aos fatores econômicos todas as diferenças possíveis do espaço físico se diluem na análise econômicosocial Esta última tornase a tal ponto predominante no processo explicativo que o próprio objeto da geografia o espaço tornase um elemento secundário As análises urbanas voltamse resolutamente para uma concepção que dá prioridade aos conflitos cidadecampo nos quais o urbano tem um papel dominante Este modelo não se aplica todavia muito bem à realidade de diversos países onde o controle do aparelho do Estado e das principais atividades econômicas é exercido por oligarquias rurais dentro de uma estrutura totalmente capitalista Além disso na teoria marxista clássica a predominância urbana resulta da hegemonia do capital industrial no processo de acumulação Contudo a partir dos anos setenta a hegemonia é antes exercida pelo capital financeiro que induz a uma nova dinâmica espacial com uma flexibilidade uma rapidez e uma mobilidade espacial desconhecidas da teoria marxista tradicional O período que se seguiu tentou ultrapassar estas insuficiências analíticas Compreendeuse que a teoria marxista clássica se aplicava ao desenvolvimento do capitalismo do séc XIX 29 DAMETTE F e SCHEIBLING J Vingt ans après La géographie et sa crise ont la vie dure La Pensée nº 239 1984 pp 2129 p 27 30 Ver por exemplo MASSEY Doreen Regionalism some current issues in Capital and Class Review nº 6 London 1978 trad port Regionalismo alguns problemas atuais Espaço e Debates São Paulo nº 4 1981 pp 5083 e LIPIETZ A Le capital et son espace Paris Maspero 1977 pp 1011 299 na Inglaterra tornando impossível a mesma análise cem anos depois dentro de contextos muito diferentes31 Problemas como a composição orgânica do capital e a renda diferencial alimentavam numerosas controvérsias sem que se chegasse a um consenso a propósito das novas formas do capitalismo Em segundo lugar os geógrafos sentiram que era absolutamente necessário acrescentar uma verdadeira dimensão espacial à análise marxista dimensão freqüentemente esquecida em favor de uma explicação histórica ou econômica A influência de Henri Lefèbvre foi fundamental para a constituição desta transformação na análise geográfica marxista Ele distinguiu uma dimensão essencial da construção social da realidade a produção do espaço através de um novo modelo definido por uma análise fundada sobre a dinâmica própria à espacialidade32 Este modelo restituía ao espaço um papelchave na interpretação da sociedade Simultaneamente outros autores marxistas fizeram notar as diferenças entre o fenômenos considerados por Marx na escala de uma unidade de produção e os novos tempos em que a acumulação a maisvalia e o desenvolvimento das forças produtivas só podem ser apreendidos em escala mundial Para a geografia estas redefinições do campo de análise marxista introduziram numerosas mudanças A região por exemplo alguns anos antes declarada morta pelos geógrafos em sua forma tradicional ou simplesmente associada ao conceito de formação sócioeconômica reencontrou sua importânci graça ao conceito de desenvolvimento espacial desigual O abuso relativo do modelo centroperiferia foi criticado em razão da fetichização espacial que produziu os grupos sociais concretos ressurgiram nas análises para substituir as abstrações muito gerais centradas nos primeiros tempos nas classes sociais Enfim os geógrafos definiram o estudo do capitalismo como sendo uma análise da sociedade dentro de um espaço preciso tentando assim encontrar um lugar para a análise geográfica Outra importante mudança consistiu na relativização do peso do cientificismo na teoria marxista limitando a importância do rigor metodológico da referência às leis e do finalismo profético dos textos fundadores O importante deste modo não é mais chegar a observações gerais fundadas em leis que regulam a organização do espaço O fato fundamental que esta tendência acentua é a concepção pela qual o marxismo distingue os oprimidos dos opressores os dominados dos dominantes os trabalhadores dos proprietários e assim por diante Tratase aí de um humanismo moral centrado sobretudo na idéia de justiça e de direito A geografia desta concepção valoriza os temas próximos à cultura e à cidadania33 Por este aspecto o materialismo histórico e o humanismo moderno partem de uma mesma crítica a recusa da ciência positivista e podem sob alguns aspectos ser considerados como perspectivas complementares O materialismo histórico redescobriu a reflexividade de toda ação social e por conseguinte a importância de uma análise que leve em conta o valor e o antropocentrismo da vida social Ao mesmo tempo o humanismo se desembaraçou do idealismo e do subjetivismo que caracterizaram as primeiras análises e recolocou a importância da existên cia material no centro das interpretações Segundo Sayer por exemplo as possibilidades de diálogo entre estes dois pontos de vista já eram concebidas há muito tempo pela teoria crítica Habermas Giddens Para realizar este debate basta superar a subjetividade que confunde dois níveis de interpretação o social com o individual e afastar o excesso de cientificismo do materialismo histórico pois a explicação científica por princípio não se opõe à busca do sentido34 No mesmo sentido D Ley parte da fragmentação do saber considerada como característica da modernidade para identificar os signos de uma nova cooperação que anuncia novas direções para a pesquisa em geografia Os caminhos da arte e da arquitetura demonstram as possibilidades de uma nova integração do saber sob o impulso de um pensamento que ultrapassaria a fragmentação moderna É aí mesmo que ele vê desenharse a origem da pósmodernidade É preciso notar que a nova integração proposta neste momento por Ley é apresentada como um exame rigoroso do método bem como o desenvolvimento de conceitos analíticos que transcendem às rígidas categorias estabelecidas nas abordagens mais estreitas e recentes35 O percurso intelectual de David Harvey é neste sentido exemplar Ele abandona uma visão ortodoxa do marxismo e qualquer pretensão de chegar a uma geografia absolutamente teórica e objetiva Ao mesmo tempo os temas de suas preocupações atuais estão mais próximos da história das idéias a despeito do fato de que as categorias do marxismo estejam ainda fortemente presentes em seu discurso Foi exatamente este percurso que o conduziu do marxismo ao pósmodernismo Este parece ser também o itinerário de Racine que nos explica como enquanto ainda estava próximo dos termos analíticos do marxismo já desenvolvia preocupações humanistas A geografia abandonou o projeto de construir por intermédio direto do marxismo uma ciência total Hoje os geógrafos que invocam o marxismo o fazem a partir de uma perspectiva muito mais limitada como uma filiação ideológica ou como uma inspiração de ordem geral De qualquer forma não existe mais a crença em uma via metodológica única que será aquela da verdadeira geografia e se reconhece a importância e a riqueza de outras condutas possíveis para a geografia Assim a pretensa revolução do saber geográfico pela teoria e a prática marxista mostra claramente sinais de esgotamento Tratase portanto uma vez mais de uma revolução científica da modernidade geográfica Como as outras esta revolução quis em seus primórdios apresentarse como a ruptura definitiva e final sucumbindo em seguida sob o peso das expectativas e acabando como as outras por ser substituída por uma outra novidade 36 Pensando melhor tenho a impressão de que os germes destas preocupações são de fato bastante antigos em meus ensinamentos bem antes que a eles se impusesse o rótulo humanista É verdade que eu já tinha desde 1976 pelo menos procurado deriválos não do referencial filosófico humanista mas da representação marxista da sociedade e do processo de produção do espaço Como evitar se tal fosse o caso se a sociedade que produz seu espaço nele se projeta tanto através de séria base infraestrutural as condições de sua vida material meios e relações de produção como diriam os marxistas quanto através de tudo o que forma sua superestrutura na qual Marx nos ensinou a identificar diferentes esferas religiosa jurídica política ideológica de se afirmar que uma das chaves de interpretação da organização espacial passava pela leitura no espaço da ideologia da sociedade que a produziu da ideologia ou mais genericamente de suas representações mentais de seus valores RACINE JeanBernard Valeurs et valorisation dans la pratique et linterpretation humaniste de la géographie in LHumanisme en Géographie Bailly A e Scariatti R org Anthropos Paris 1990 pp 7374 303 INTRODUÇÃO à GEOGRAFIA Geografia e Ideologia NELSON WERNECK SODRÉ 2a edição VOZES PETRÓPOLIS 1977 UNICAMP BIBLIOTECA CENTRAL Sumário Prefácio 7 Formação da Geografia 13 O Determinismo Geográfico 37 A Geopolítica 54 O Homem e a Natureza 72 Problemas da Geografia 85 Geografia e História 107 As Falsidades Ideológicas 119 Bibliografia 130 1976 Editora Vozes Ltda Rua Frei Luís 100 25600 Petrópolis RJ Brasil Prefácio Que é Geografia De que trata São perguntas aparentemente descabidas tal a facilidade aparente das respostas A proporção que se atribui a elas não é falsa as teses mais estranhas vivem e rivalizam por longos períodos como verdades últimas Acrediteou não a Geografia há décadas tem sua unidade condenada pela observação verificação e a íntima solidariedade que une as coisas conjuntamente caracterizadas com a economia e a moral Vidal em la Blanco Do ponto de vista geográfico o fato da coabitação em e do mesmo homem elementos perfeitamente conjugados e com assentamento contraditório não é somente um facto mas o fundamental da Geografia Não foi por acaso que surgiram então algumas noções como a de meio que na ciência inundou o pensamento de cientistas especialistas organizadores da ciência da terra Esperase que a coleção simbolótique os elementos necessários a relação entre clima e vegetação apareça nitidamente Berrien em 1836 em que a amplitude do campo de observação e a amplitude do levantamento de dados foram a características algumas matemáticas zo ease Restou antes ao campo surgiram as especia e de arrombado as limitações ambiente ar lizações o que se refletiu no sentido descritivo de que todas os elementos informativos são ataques não só compreendidas que o que é para a ciência A acumulação constitui ciência não são conhecimento só e não relato a continuidade também os mapas instrumentos na extensão do conhecimento é a sua prova Essa entre a diferentes bem os mapas os astros cometavam suas possíveis e os os observatórios radioastronômicos Berr precebeu mesmo o efeito de algumas fenômenos ligados e é sob que viviam nadados à área geográfica e que seu extingüem e cedê ás espécies botânicas da evolução Vertiico suficiente por ainda Henri Berr quem observou e em que isto compreender e que toda ciência constitui quando descobre como 7 as suas leis devem ser pesquisadas isto quando passa do conhe cimento primário às generalizações teóricas quando em suma define e cria contra o acaso a grande ordem dos fenômenos que o seu campo encerra O conhecimento é estável apenas no fim da natureza esta etapa do empirismo a essa altura as ciên cias demonstram o avanço do movimento histórico A Geografia no século XX corresponde claramente a que se sus tam estranhamente a obra que expõe simples amada e aceita assente no campo da descoberta da descrição amável dos fenômenos naturais que hoje ainda interessa geográfico Ela sinaliza na realidade a divisão do trabalho dos resis contínuos que clebra relação entre os elementos da natureza e a terra sobre uma ciência É uma porção limitada do todo a parte E não geográfica apenas rasa O que importa não é porém estudar os fenômenos isolados sem ser ser geólogos os estuda geográficos e unicidos estejam mas sim considerálos interligados Muitos os químicos e outros pesquisadores que pretendem ser especialistas e conhecedores são ferrenhos adversários dos geográficos Para o geógrafo as relações que se estabelecem estão ligadas não só ao estudo da natureza mas também à observação do que se dá na camaraderia social e nas relações de produção O geógrafo é o mais realista dos pesquisadores especializados Ele procura não situarse entre os técnicos os artitícios mas querer dominar os fenômenos sobre os quais estuda no todo que lhe permita verificar claramente os elementos da aplicação a toda ou parte dos sistemas de um ente qualquer Assim o geógrafo fórmula uma aplicação da rede geográfica ou dos seus componentes no todo que lhe permita definir o fenômeno como elemento em uma ordem que o resolva que o explique que por isso consta a da vida do homem Não até aqui apareceram informações necessárias para o desenvolvimento do geogra Disseramno em vão mas dia a dia os trabalhos de campo apareceram informações necessárias para o desenvolvimento do geogra Disseramno em vão mas dia a dia os trabalhos de campo apareceram informações necessárias para o desenvolvimento do geogra Santos mas não se precise explicar Para isso na geografia utilizar instru mentos métodos variadíssimos trabalhos Além da analíticá da paisagem análise lógica dos aspectos diversos sua infantâcia na organização observação pode marcarse ao longo da história desde os trabalhos de iniciativa das classes emergentes da idade média ligados aos mais rudimentares e deficientes sistemas ob jetivos que se encontram em Heródoto por exemplo até a pretensa obje tividade dos estudiosos da era da insepção A crise geral do capitalismo Um dos momentos fundamentais da Geografia reside em seu hi stórico resumo da Geografia Humana está ligado a uma conceituação estática da Geografia das ciências da natureza postulando a dependência expli cativa das atividades dialética inerente a oito processo e fenôme nos outros Desconhecer a dialética inerente a tais processos e fenômenos confere à ciência da natureza uma concepção mecanicista limite do está dio e pesquisa empírica mas no nível empírico por outro lado tem a sua importância que jamais oculta É sempre possível na explora ção material e presença de elementos naturais que ainda vivemos nos em uti predatória que dizemos naturais muitas vezes vivemos na exploração até que vivam Quem que possuí os meios de produção Quem os uti liza A quem pertencem e a existirão técnicas Verificouse e pre cisamos a quem aproveitam os resultados do trabalho Uma Geografia 9 oficial denunciando como ideológico mas não científico muitas vezes ligada às classes à idade à profissão relapsa daquilo que está de fendido A sociedade é como disse Montaigne doente e apenas a representação pósiça ideológica que imvanlida suas classes humanas e sociais e recusá aceita a dialética das contradições sociais a recusa em aceitar a dialética é um pensamento metafísico que ultrapassou de conhecimento as explicações correspondentes a nível da ultrapassada ciência positivista A fatalidade das ações do clima ou como é nação e ação da separa ão da causa e a ação da poluição da atmosfera nas grandes cidades de em termos é suscetível de quedarça particular 60m causa em nosso tempo Não é de suas menores deficiências em consequência o divórcio estabelecido entre o conceito de natureza e o da Geografia Não se pode esquecer que o período maior de desenvolvimento da Geografia Humana foi como o tempo colonialista e que o desenvolvimento preliminares do domínio Imperialismo através de outras explorações Sociológicas aliás aparentemente inexplicáveis acolonheu a vigência que o outra teoria das relações ocultas e acalentou Que não sejam abandonadas apenas as culpas do capitalismo na exploração predatória dos re ursos naturais A Geografia de nosso tempo impulso e de sua dupla espe cialidadé deve ligar o homem e natureza para melhor explorar os processos progressivos da natureza a objetivação dos recursos naturais contribuir para desvendar cidadão comum ou o aprovei tamento racional dos recursos Assim da natureza as razões imediatas dos citados recursos da mineração aquellas da iniciativa econômica físico do meio natural ora estima as pesquisas meteorológicas geológi cas agrícolas conserja a apreciação dos recursos na natureza mesmo as razões da miséria que convive com a produção de recursos minerai téricos da precipitação e a pureza de recursos minerais ajudam ao suíto de técnicas que permitem as falisidades que pos 8tam a pesquisa e outas de inovações técnicas para melhorar a ex ploração do meio natural retardoa A Geografia Humana que misturas voam a Geografia Física 9 RESENHA CRÍTICA TEXTO O HORIZONTE DA CRITICA RADICAL A geografia passou por diversas críticas ao longo de sua formação como disciplina no campo acadêmico As críticas eram dividias em dois grandes grupos as críticas de caráter teóricometodológico e entre os que consideravam o domínio prático e ideológico na Nova Geografia Com isso sempre foram surgindo diversas críticas dentro da geografia A corrente da crítica radical irá considerar o comportamento social e suas relações com a geografia Com o passar dos anos e com estudos mais elevados e aprofundamentos definições clássicas do passado foram vistas com desconfiança Com a melhoria das práticas de estudos e pesquisas novas teorias foram confrontadas com definições clássicas A revolução quantitativa foi um dos elementos que contribuíram para estas críticas uma vez que essa forma de estudo chegava a melhores conclusões do que teses e estudos do passado A perspectiva radical crítica que o comportamento racional como princípio de análise conduzindo a uma falsidade de ideias generalizando assim a racionalidade Outra concepção é uma associação com o Positivismo buscando uma espécie de naturalidade nos estudos sobre o capitalismo Buscase compreender os ideais do capitalismo de forma favorável a classe burguesa dominante no período Os radicais pretendiam fundar uma nova ciência referente a geografia com ideias contrarias a geografia tradicional e quantitativa buscando um tipo de política revolucionaria Segundo os radicais tudo estava em crise naquela época seja o capitalismo a política a economia todo um sistema e que as mudanças seriam necessárias para o melhor entendimento da sociedade buscando novas soluções para os problemas que o mundo enfrentava Existia uma ligação deste horizonte critico com o materialismo histórico e dialético Karl Marx com seus estudos científicos contribui bastante pra o avanço cientifico da sociedade e claramente impactou na geografia Seu objetivo era produzir um saber objetivo e racional se escorando na ciência para embasamento de suas ideias e pesquisas tanto no ramo cientifico quando no ramo social Em outras palavras Marx passou a desenvolver métodos científicos para comprovar que o conhecimento deve ser apreendido pela ciência e influenciar toda a sociedade Considerado extremamente moderno na época o marxismo apresentava um sistema explicativo lógico e racional Lacoste critica a geografia tradicional afirmando que a geografia clássica estaria ultrapassada e baseada em diversas teorias falsas devido à falta de conhecimento e estrutura para veracidade das informações na época Sendo assim a Nova Geografia seria a chave para o progresso contribuindo para o crescimento da sociedade em sua totalidade Por fim o texto aponta para uma Nova Geografia baseada no conhecimento técnicocientifico sendo objetiva e pragmática A geografia tradicional e quantitativa estariam ultrapassas e precisaria de reformulações em seus conceitos Com a Nova Geografia a sociedade poderia ter novos métodos para conclusões mais de caráter cientifico do que empírico em questões como por exemplo de Estado território fenômenos e naturais e influencia com o meio social RESENHA CRÍTICA TEXTO INTRODUÇÃO A GEOGRAFIA AUTOR NELSON WERNECK SODRE Segue abaixo uma resenha crítica do texto Introdução a Geografia de Nelson Werneck 2ª edição 1977 O texto aborda conceitos básicos de Geografia abrangendo toda sua formação teórica contextualizando a formação da geografia o determinismo geográfico a geopolítica a relação do homem com a natureza os problemas da geografia a relação da geografia com a história e as falsidades ideológicas no sentido dos estudos da geografia Será desenvolvido um breve apontamento sobre estas questões com algumas críticas questionamentos e conformidade com as ideias apresentadas As primeiras observações do uso da geografia na história da humanidade são dos períodos da préhistória e história antiga com os deslocamentos do homem pelos territórios com impactos na sociedade da época Além disso fatores da geografia física também são verificados nestes deslocamentos visto que as superfícies da terra e a sua costa marítima são diferentes a cada região que o homem frequentava ou descobria em suas aventuras de descobrimento do mundo Posteriormente a fase medieval o mundo passou por mudanças em sua economia e política O feudalismo abre passagem para o capitalismo e atividades mercantilistas Iniciouse uma grande exploração no mundo e colonialismo nas regiões descobertas Essas mudanças e transformações assim como a necessidade de entender a sociedade e os aspectos físicos dos novos locais serviram de base para a formação da geografia O Determinismo surge de acordo com a necessidade de compreensão dos aspectos e fenômenos naturais Inicialmente era interpretado como campo de atuação apenas nos fatores climáticos Porém com o passar do tempo o Determinismo passou a ter uma concepção mais ampla abordando que o meio ambiente como um todo irá influenciar o comportamento das pessoas que ali vivem No que diz respeito a Geopolítica aparece como estudos num período marcado pelo Imperialismo de algumas nações e o com o surgimento de diversos conflitos catastróficos para a humanidade Destaque as Guerras Mundiais o fascismo e nazismo Esses fatores contribuíram diretamente para que a Geopolítica fosse considerada uma espécie de ciência do Estado visto que através dos seus estudos e pesquisas iriam procurar explicar e entender as conquistas dos novos territórios a organização do Estado no cenário de conflitos e as novas divisões políticas do mundo Com o aprimoramento dos estudos passou a haver uma divisão entre o homem e a natureza Estudar a natureza não seria apenas estudar o meio ambiente Questões de desenvolvimento também estão ligadas a natureza Produtividade recursos minerais agronegócios e comportamento social também são de interesse da geografia estudar a natureza uma vez que está diretamente ligada ao homem no seu meio social Alguns questionamentos foram apresentados ao logo da história da geografia Problemas referente a conceitos e análises diferentes sobre o a geografia marcou diversos conflitos ideológicos Muitas críticas eram feitas a novas teorias principalmente se estas fossem contrarias as tradicionais ou que o resultado do estudo fosse contrário aos interesses da classe dominante Por muito tempo a história e a geografia andaram juntas muitas vezes não se sabia que determinado estudo pertencia a história ou a geografia Com o passar dos anos apesar de estarem completamente ligadas houve uma separação no campo acadêmico Seria uma falsidade como diziam os estudiosos da época considerar a geografia física apenas como descritiva pois haveria que ter uma interação com o homem e o com os fatores sociais Em suma chegamos à conclusão que o livro Introdução a Geografia é uma obra muito bem explorada amparada com várias referências de estudos e pesquisas para validar suas ideias Explica a formação da geografia de forma clara mostrando o determinismo e a geopolítica como centro das novas definições que temos hoje no que diz respeito a Geografia como ciência RESENHA CRÍTICA TEXTO O HORIZONTE LÓGICOFORMAL NA GEOGRAFIA MODERNA Com o mundo um verdadeiro caos devido aos conflitos das guerras mundiais houve uma verdadeira dispersão nos estudos da geografia neste período Quanto mais dispersão mais divergências tende a acontecer visto que a sociedade que cada estudioso vivia influenciava de forma direta suas análises e conclusões O ambiente e os fatores sociais determinam o pensamento e comportamento das teorias que surgiram ao longo do tempo Sendo assim as críticas as teorias contrárias a determinada visão eram constantes A geografia moderna surge com a necessidade de uma nova geografia para compreensão da sociedade Baseada em um discurso analítico com uma visão sistêmica envolvendo as ciências naturais e sociais fazendo uma interação do homem com a natureza influenciando assim o seu meio social Esses novos geógrafos buscam uma identidade própria em relação as escolas anteriores buscando uma ideologia nova baseada no racionalismo Esse movimento surgiu baseado nas diversas críticas simultânea que a geografia clássica sofria naquele período Era evidente uma mudança nas suas concepções e métodos de pesquisa Não havia mais espaço para achismo e conhecimento empírico A ciência cada dia mais tomava força buscando de forma objetiva e racional buscar soluções para os problemas da sociedade Para ser considerada inovadora teria que preencher certas condições para se tornar concentrada na ciência como fonte de resultado Uma linguagem matemática e logica nos estudos norteia para conclusões mais próximas da realidade Unir os dados com os conhecimentos teóricos chegaria a união perfeita para a formação de uma nova geografia A geografia moderna deve acompanhar as necessidades da sociedade O mundo em constante mudança com uma sociedade passando por transformações exige que a geografia também acompanhe neste contexto Sendo assim a geografia tradicional estava obsoleta para tratar e estudar os novos temas que surgiam na sociedade Era preciso que a geografia também se inovasse Por isso a geografia moderna surgiu para melhorar suas teorias clássicas e acrescentar novas propostas novas análises e novos métodos para acompanhar o progresso social Em suma destacamos a necessidade de uma Geografia nova e moderna para os dias atuais sendo sustentando pela ciência e por métodos matemáticoslógicos Esses métodos são fundamentais para o desenvolvimento e crescimento da sociedade em sua generalidade Surge apenas uma indagação Cada dia a sociedade se transforma A globalização associada a tecnologia muda constantemente a sociedade Será que em algumas décadas será necessária uma nova reformulação na geografia Infelizmente ainda não se tem a resposta Teremos que esperar