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Texto de pré-visualização
Gustavo Henrique Barroso Franco REFORMA MONETÁRIA E INSTABILIDADE DURANTE A TRANSIÇÃO REPUBLICANA 7º PRÊMIO BNDES DE ECONOMIA BNDES BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL Gustavo Henrique Barroso Franco REFORMA MONETÁRIA E INSTABILIDADE DURANTE A TRANSIÇÃO REPUBLICANA Dissertação de Mestrado apresentada ao Departamento de Economia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro como parte dos requisitos para obtenção do grau de Mestre em Economia do Setor Público Professororientador WINSTON FRITSCH Rio de Janeiro 1987 7º PRÊMIO BNDES DE ECONOMIA FICHA CATALOGRÁFICA FRANCO Gustavo Henrique Barroso F825r Reforma monetária e instabilidade durante a transição republicana Gustavo Henrique Barroso Franco Rio de Janeiro BNDES 1983 189 p Tese M Sc PUCRJ Departamento de Economia e Vencedora do 7o Prêmio BNDES de Economia 1 Brasil Política econômica 18841890 2 História econômica 3 Política monetária I Título 338981 CDD Para Vera Bela e Arinos Apresentação O trabalho Reforma monetária e instabilidade durante a transição republicana de autoria de Gustavo Henrique Barroso Franco foi o vencedor do 7º Prêmio BNDES de Economia referente ao ano de 1983 A escolha do trabalho coube a uma Comissão Examinadora presidida pelo professor Isaac Kerstenetzky e formada pelos professores Andrea Sandro Calabi Charles Mueller Fábio Stefano Erber Fernando Holanda Barbosa José Marcelino Monteiro da Costa Osmundo Rebouças Pérsio Arida e Wilson Cano O Prêmio BNDES de Economia instituído em 1977 tem o objetivo de estimular a pesquisa no campo da Ciência Econômica pura e da Ciência Econômica aplicada segundo a perspectiva nacional regional e setorial Agradecimentos Este trabalho foi realizado durante os meses de maio de 1981 a julho de 1982 e diversas pessoas contribuíram de forma essencial para a sua realização Devo agradecer em primeiro lugar ao professor Winston Fritsch pela dedicação e pelo rigor acadêmico com que conduziu o esplêndido trabalho de orientação sem o qual este trabalho jamais poderia ter sido feito Agradeço também de forma especial ao professor Luiz Aranha Corrêa do Lago tanto pela leitura atenta e minuciosa desta tese quanto por terme permitido utilizar parte do meu tempo com os problemas monetários do século XIX quando eu deveria ocuparme com os da atualidade Meu débito com Edmar Lisboa Bacha extravas de muito a ajuda que me prestou nas primeiras fases de elaboração deste trabalho pois compreende as mais variadas lições que aprendi com esse grande economista e professor durante o Curso de Mestrado em Economia na PUCRJ A dois grandes amigos que como eu se iniciam na profissão pela história do país Marco Antonio Reis Guarita e Pedro Aranha Corrêa do Lago sou grato pelo estímulo e colaboração durante esses 14 meses de trabalho Aos amigos professores e alunos do Departamento de Economia da PUCRJ agradeço pelo irrestrito apoio resultado inequívoco do elevado espírito de colaboração acadêmica existente nessa escola Agradeço também e de forma muito especial a Maria Mirtes Figueiredo pelo paciente e competente trabalho de datilografia Todas essas pessoas contribuíram fundamentalmente para que se reduzissem os erros e imprecisões que o trabalho trazia originalmente sendo que evidentemente os remanescentes se devem exclusivamente à minha própria teimosia A todas essas pessoas ele é expressamente dedicado com a esperança de que possa estar à altura Trabalhar em história econômica especialmente na pesquisa de um passado remoto e esquecido é uma experiência gratificante em todos os sentidos sobretudo no que se refere ao prazer da descoberta mas é também um trabalho solitário que nos abstrai de nossa própria época e afeta a convivência com as pessoas Por isso o contínuo encorajamento e companheirismo de meus pais e especialmente de minha mulher Vera foram absolutamente fundamentais A eles devo muito mais do que este trabalho Introdução 17 1 Antecedentes da Reforma Monetária 21 11 Transformações no Regime de Trabalho e a Instabilidade do Crédito 21 12 Política Monetária nos Anos Oitenta 30 13 O Balanço de Pagamentos e a Taxa de Câmbio 37 Anexo Metodologia para a Construção da Estimativa do Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 43 2 A Reforma Imperial 51 21 A Crise de 1887 e o Projeto Original 51 22 A Expansão de 1888 e a Reforma 57 23 A Lei de 24 de Novembro de 1888 62 24 A Regulamentação 66 3 A Gestão Ouro Preto 73 31 Condições Políticas 73 32 Os Auxílios à Lavoura 77 33 A Circulação Metálica Conversível 91 34 A República e o Colapso do Sistema 95 4 A Gestão Rui Barbosa 101 41 A Nova Lei Bancária 101 42 A Crise no Ministério e as Modificações no Decreto 109 43 A Conjuntura e a Evolução da Legislação em 1890 115 44 O Grande Banco 128 5 Epílogo As Reformas Monetárias em Perspectiva Histórica 135 Notas 143 Sumário Bibliografia Utilizada 177 Índice de Tabelas 1 Distribuição Geográfica Aproximada e Exportações de Café da Região Cafeeira 18691900 22 2 Imigração Bruta Anual para o Brasil e para São Paulo 18761893 24 3 Entradas Trimestrais de Açúcar na Praça do Rio de Janeiro 18871890 26 4 Comércio Exterior e Comércio Interno do Rio de Janeiro e de São Paulo 18801888 27 5 Rede Bancária em 30 de Junho de 1888 28 6 Notas do Tesouro e do Banco do Brasil 18721889 31 7 Cunhagem de Moedas de Ouro e Prata no Brasil 18101887 31 8 Execução Orçamentária do Tesouro Nacional 18801888 32 9 Taxas de Câmbio Valores Mensais 18801888 35 10 Estimativa para o Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 38 11 Investimentos Ingleses no Exterior e Investimentos Estrangeiros no Brasil 18761897 41 A1 Balança Comercial do Brasil 18761897 44 A2 Movimentos de Metal Amoedado entre Brasil e Inglaterra 18821896 45 A3 Contas de Serviço do Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 47 A4 Contas de Capital no Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 48 A5 Saldos do Tesouro Nacional na sua Delegacia de Londres 18761897 50 A6 Estimativa para o Balanço de Pagamentos do Brasil Série Anual 18761897 50 12 Nível de Atividade e Preços 18801888 51 13 Remessas de Valores do Rio de Janeiro Caixa dos Bancos e Relação EncaixeDepósitos Julho de 1887 a Dezembro de 1888 59 14 Remessas de Valores Através de Ferrovias para a Região Cafeira do Vale do Paraíba e Entradas de Café no Porto do Rio de Janeiro 1888 60 15 Preços Extremos Mensais das Apólices de 5 no Rio de Janeiro 18871889 70 16 Contratos de Auxílio à Lavoura 84 17 Mapa Demonstrativo do Empréstimo Nacional de 109694000000 85 18 Liquidez Bancária no Rio de Janeiro em 1889 86 19 Repasses do Tesouro aos Bancos para Auxílios à Lavoura e as Operações por Eles Efetuadas até 31 de Agosto de 1890 87 20 Aplicação dos Fundos Recebidos do Tesouro Através dos Contratos de Auxílios à Lavoura 89 21 Bancos Emissores sobre Base Metálica 1889 95 22 Taxas de Câmbio Bancos que Afixaram Cotações Abaixo do Mercado Emissão em Circulação e Caixa do Banco Nacional em Dezembro de 1889 99 23 Regiões Bancárias Estabelecidas pelo Decreto de 17 de Janeiro de 1890 106 24 Preços Extremos e Vendas Mensais das Apólices de 5 em Fins de 1889 e em 1890 107 25 Notas do Tesouro em Circulação em Fins de 1889 e em 1890 120 26 Movimento da Bolsa de Valores 1889 e 1890 121 27 Número e Valor do Capital das Companhias que Registraram Estatutos na Junta Commercial em 1890 121 28 Oferta Monetária em 30 de Setembro de 1890 125 29 Variação nas Emissões Autorizadas em Conseqüência do Decreto de 7 de Dezembro de 1890 130 30 Estrutura da Moeda 18151913 136 31 Investimentos Ingleses de Portfolio na América do Sul e na Argentina Investimento Direto e Empréstimos Externos no Brasil 18851892 141 Para simplificar a apresentação de citações utilizamos algumas abreviaturas para indicar fontes bastante citadas FPR Finanças e Política na República Discursos e Escripts de Rui Barbosa 1892 Inclui os discursos O Papel e a Baixa do Câmbio Senado 3 de novembro de 1891 p 1132 Os Bancos Emissores O Projecto Official Senado 12 de janeiro de 1892 p 133218 e A Reforma em Projecto Senado 13 de janeiro de 1892 p 21998 O volume inclui também o Manifesto à Nação p 30199 que é uma coletânea de artigos publicados em vários jornais da época no período de 20 de janeiro a 1º de fevereiro de 1892 O volume além disso contém apêndices com informações diversas OCRB Indica as Obras Completas de Rui Barbosa editadas em vários volumes pela Fundação Casa de Rui Barbosa A referência sempre indica o volume e o tomo a que diz respeito RCJC Indica o Retrospecto Commercial do Jornal do Commercio que era publicado em base anual a referência sempre indica o ano a que diz respeito RMF Relatórios de Ministros da Fazenda publicados por ocasião da proposta orçamentária para o próximo exercício fiscal A referência indica o ano para o qual é proposto o orçamento Notese também que as referências ao relatório de 1891 correspondem à edição em três volumes da Fundação Casa de Rui Barbosa e não aos originais A referência ao RMF1891 indica sempre o volume a que se refere Abreviaturas Utilizadas O ouro inicialmente pairando no céu com sua consorte a prata tal como o Sol e a Lua tendo em seguida despido seus sagrados atributos e vindo à Terra como um autocrata pode agora ser rebaixado à sóbria posição de monarca constitucional assessorado por um gabinete de bancos e ainda é possível que nunca seja necessário proclamar uma república Mas isto ainda não ocorreu a evolução poderá ser bem diferente Os amigos do ouro terão de ser extremamente sábios e moderados se quiserem evitar uma revolução J M Keynes A Treatise on Money Resumo Este trabalho discute os motivos e as consequências das reformas monetárias implementadas por sucessivos governos no período 18881890 Começa com a análise dos efeitos da difusão do trabalho assalariado da expansão do nível de atividade econômica e da excepcional posição do balanço de pagamentos ao final dos anos 80 sobre a demanda de moeda e a liquidez doméstica que explicam o clamor contemporâneo por reformas institucionais nos sistemas bancário e monetário A dissertação se desenvolve com a discussão crítica dos vários projetos de reforma e termina com a interpretação das causas dos desequilíbrios monetários e de balanço de pagamentos que se seguem às reformas de Rui Barbosa em 1890 avaliando a experiência à luz da tendência mundial por uma maior intervenção na gestão monetária Introdução O período que este trabalho se propõe a estudar engloba os últimos anos da década de oitenta do século passado e em especial o ano de 1890 Por referirse a um período de tempo bastante reduzido este trabalho difere de grande parte dos estudos recentes sobre a história econômica do Brasil que trata de construir grandes sínteses interpretativas ou periodizações de várias décadas freqüentemente sem o apoio de monografias de escopo temporal mais reduzido e baseadas em algum trabalho de pesquisa em fontes primárias que forneceriam a indispensável sustentação empírica a estudos dessa natureza Durante esses poucos anos verificaramse os momentos críticos da transição do regime de trabalho servil para o assalariado em conseqüência do notável crescimento da imigração estrangeira a partir de meados dos anos oitenta e da extinção da escravatura Ao mesmo tempo a economia brasileira atravessava um período de grande prosperidade em vista das condições extremamente favoráveis do balanço de pagamentos e do grande crescimento do nível de atividade Durante ese período e em função dessas mesmas circunstâncias verificaramse bruscas e radicais mudanças de orientação na política econômica e uma inusitada concentração de importantes reformas institucionais no sistema monetário através das quais tomariam feição característica tanto o boom industrial e financeiro quanto a realocação regional de recursos na agricultura A evolução das reformas e também da política monetária verificada nesses anos constitui o objeto principal deste trabalho A evolução das reformas monetárias é abordada segundo dois ângulos Por um lado procurase estudar as reformas em si procurando mostrar sua funcionalidade o sentido de sua evolução e as suas consequências examinandoas com a perspectiva da evolução de longo prazo do sistema monetário brasileiro Por outro lado o estudo das reformas monetárias serve como fio condutor de uma interpretação mais ampla do período e que toma como base a idéia de que se trata de um período de grande instabilidade sobretudo do ponto de vista macroeconômico Este trabalho não trata de um período pouco estudado mas em relação aos trabalhos existentes sobre esses anos tem características essencialmente diversas Os estudos recentes sobre a política econômica neste período1 reproduzem em maior ou menor grau o viés característico dos trabalhos de Taunay Calógeras e Antônio Carlos2 de considerarse a política econômica desses anos como contagiada pelo inflacionismo e pelo delírio especulador Tais estudos têm como objeto principal o fenômeno do Encilhamento e portanto tendem a colocar a Bolsa de Valores no centro dos acontecimentos como elemento que articula e determina as idas e vindas da política econômica numa clara superestimação da influência da especulação bursátil que em 17 consequência obscurece a influência de alguns outros fenômenos econômicos de muito maior importância Em vista disso parece perdurar a tradição segundo a qual a Bolsa seria como na superlativa descrição de Taunay uma espécie de redemoinho fatal de Maelstrom oceânico abismo insondável vórtice de indômita possança e invencível empuxo a que iam convergir em desapoderada carreira as forças vivas do Brasil Quanto ao governo contagiado pelo delírio inflacionista promulgava decretos sobre decretos expedia avisos e mais avisos concessões de todas as espécies garantias de juros subvenções favores sem fim sem conta sem nexo sem plano E de acordo com o severo veredito de Taunay tratavase a responsabilidade do País em somas pavorosas e brincavase com o crédito o nome e o porvir da Nação3 Creditasse algum exagero ao relato de Taunay velho monarquista execrado pela República mas as finanças conservadoras que praticamente dominaram a Primeira República e da qual Calógeras e Antônio Carlos foram destacados expoentes4 cuidaram de preservar a visão de que nos primeiros anos da República houve inimaginável descalabro e irresponsabilidade para cuja expiação nem a violenta deflação de 18981901 teria sido suficiente Recentemente contudo essa visão tradicional começou a ser questionada quando se verificou que os primeiros anos da República registraram importantes e autênticos avanços em termos de crescimento industrial5 Esta descoberta na medida em que coloca em questão a suposta primazia da especulação e do inflacionismo sobre a política econômica abre espaço para uma investigação minuciosa sobre a política monetária e principalmente sobre as reformas que são comumente consideradas as causadoras da anarquia monetária dos anos noventa Este trabalho contém cinco capítulos O primeiro trata dos fatores determinantes das reformas monetárias os três seguintes da evolução cronológica das reformas de 1884 e 1890 e o último traz um ensaio interpretativo que serve como conclusão do trabalho No primeiro capítulo procuramos estudar os antecedentes das reformas monetárias discutindo especialmente alguns pontos mais estruturais Fazemos na primeira seção uma análise do sistema bancário do final dos anos oitenta de suas relações com a lavoura e das possíveis consequências da transformação do regime de trabalho no que diz respeito à procura agregada por moeda e à estabilidade do crédito Na segunda seção tratamos de discutir alguns aspectos quantitativos relacionados à política monetária e procuramos apontar as concepções e as metas que determinavam a sua condução E na seção 13 procuramos alinhar e interpretar nossas estimativas para o balanço de pagamentos do Brasil atentando para a influência das contas externas sobre a taxa de câmbio e para a importância dos movimentos de capital estrangeiro dirigidos para o Brasil nos anos oitenta e noventa O segundo capítulo estuda a evolução da conjuntura e das reformas partindo da crise de 1884 até a primeira grande reforma posta em vigor em janeiro de 1889 Procurase af identificar a ocorrência de crises de liquidez que denotavam a difusão do trabalho assalariado no campo e que punham em perigo a continuação do boom no nível de atividade Procuramos mostrar como essas circunstâncias acirraram o debate em torno da reforma monetária e produziramna afinal em 24 de novembro de 1888 O capítulo também trata da discussão doutrinária em torno da aprovação da lei de 1888 salientando as incompatibilidades entre as concepções metalista e antimetalista das quais teria resultado o fracasso da própria reforma O capítulo 3 trata da administração do Visconde de Ouro Preto Ministro da Fazenda e chefe do último Gabinete Imperial A primeira seção explora as circunstâncias políticas que permitiram a ascensão de Ouro Preto e sugere a existência de conexões entre a sua política econômica e o seu projeto político de preservação da ordem monárquica A seção 32 trata dos problemas ligados ao crédito rural e discute a importância dos chamados Auxílios à Lavoura para a realocação de recursos que se operava na agricultura Nas duas seções que se seguem analisamos o efêmero experimento da conversibilidade metálica em fins de 1889 apontando as condições que permitiram o seu estabelecimento e determinaram em seguida o seu colapso O quarto capítulo é dedicado à gestão de Rui Barbosa no Ministério da Fazenda As duas primeiras seções tratam da famosa reforma bancária de 17 de janeiro de 1890 Na primeira analisamos a reforma em si e discutimos as justificativas de Rui Barbosa para a mesma Na segunda documentamos a crise ministerial de fins de janeiro resultante da reforma e que determinou as primeiras modificações no decreto original Nas seções 43 e 44 examinamos a evolução da conjuntura ao longo do ano de 1890 e as alterações no decreto de janeiro que terminaram em dezembro de 1890 por estabelecer um grande banco emissor destinado a ser o agente financeiro do governo e o responsável pela política monetária e cambial A marcha das reformas monetárias parecia levar o País a constituir um sistema monetário que melhor utilizasse os instrumentos monetários e creditícios para o desenvolvimento industrial e melhor promovesse a estabilidade cambial Mas progressos seriam posteriormente destruídos com o crescimento da influência de homens ligados às finanças conservadoras a partir de 1891 Esses temas e algumas outras observações gerais sobre a evolução das reformas monetárias no Brasil de 1887 a 1890 compõem o ensaio conclusivo relativo ao capítulo 5 1 Os Antecedentes da Reforma Monetária 11 As transformações no regime de trabalho e a instabilidade do crédito A partir de meados da década de oitenta começava a intensificarse uma discussão acerca de reforma monetária Era esse um tema que há muito não era objeto de atenção do Parlamento ou dos círculos financeiros ainda que se possa dizer que o interesse sobre a matéria tenha se tornado crescente após a crise bancária de 1875 Desde 1866 quando foi suprimida a faculdade emissora do Banco do Brasil6 o sistema monetário não havia sofrido modificações institucionais de grande importância7 pelo menos em relação às numerosas reformas concentradas nos anos de 1888 a 1890 Assim sendo o renascimento da questão monetária depois de algum tempo de reticência era fato de interesse Como acontece em geral com reformas institucionais o ressurgimento do interesse público pelo desenho das instituições monetárias estava ligado às novas condições que impunham novas exigências ao sistema monetário Estas novas circunstâncias eram o produto de um conjunto de transformações importantes que vinham se desdobrando há algum tempo e teriam maior intensidade na segunda metade dos anos oitenta Tais fatos permitiriam que se referisse o sistema monetário vigente ao final do Império como inadequado ou destituído de elasticidade8 e serviriam em consequência como justificativa para a necessidade de uma reforma monetária O esforço de compreender as causas do renascimento da discussão sobre o sistema monetário assim como a necessidade de sua recomposição deve se articular em torno de três eixos principais a difusão do trabalho assalariado e a realocação de recursos provocada pela maciça entrada de imigrantes e posteriormente pela Abolição a notável expansão no nível de atividade verificada a partir de meados de 1885 e a sucessão de anos excepcionalmente favoráveis para o balanço de pagamentos começada em 1886 Esses três fatores viriam a criar necessidades de numerário para as quais o sistema monetário de então não estava aparelhado e seriam em última análise os determinantes da reforma As últimas décadas do século XIX marcam os momentos decisivos de uma importante transformação na economia brasileira o fato de maior relevância ocorrido na economia brasileira no último quartel do século XIX foi sem lugar à dúvida o aumento da importância relativa do setor assalariado9 Esse fenômeno estava relacionado em grande medida ao fim da escravidão e à entrada maciça de imigrantes a partir do final dos anos oitenta A atividade agrícola principal atividade econômica do País sofreria em consequência uma violenta realocação de recursos que se estenderia também para a atividade urbana Sem dúvida o principal problema que se colocava para a agricultura nos anos oitenta era o da eliminação do trabalho escravo Esse era contudo um problema que se apresentava de modo diverso nas várias regiões do País uma vez que existiam diferenças significativas em natureza e dinamismo entre as principais atividades econômicas regionais Na região cafeeira por exemplo havia profundas diferenças entre as várias áreas produtoras diferenças cujos efeitos podem ser avaliados pelas alterações na distribuição geográfica das exportações nas últimas décadas do século mostradas na tabela 1 TABELA 1 Distribuição Geográfica Aproximada e Exportações de Café da Região Cafeeira 18691900 Em milhares de arrobas 186970 188081 188889 189697 a a a a 187172 188283 189091a 18991900b Exportações do Rio de Janeiro 7398 9271 5530 5383 pelo Porto do Rio 552 407 240 141 Exportações de São Paulo 1314 1778 1109 c pelo Porto do Rio 98 78 48 nd Exportações de São Paulo 2278 6155a 10178 22294 pelo Porto de Santos 170 270 441 582 Exportações Totais de 3592 7933 11287 São Paulo 268 348 489 nd Exportações de Minas Gerais 1919 4828 4948 8743 pelo Porto do Rio 143 212 215 228 Exportações do 499 726 1297d 1894 Espírito Santo 37 32 56 49 Total da Região 13408 22758 23062 38304e Cafeeira 100 100 100 100 a Depois de 187172 os dados de exportações através de Santos somente se referem a exportações totais de modo que a adição desse total ao do correspondente ao café de São Paulo exportado pelo porto do Rio não é estritamente correto b As exportações através de Santos foram as verificadas no ano fiscal de julho a junho ao passo que para os outros portos os dados registram as exportações de janeiro a dezembro CA média exclui 1891 d Referese somente a 1891 e às exportações totais Os dados anteriores referemse somente à produção exportada pelo porto do Rio e Não inclui as exportações de café paulista pelo porto do Rio de Janeiro Em 1895 essas exportações eram aproximadamente de 213 mil arrobas Obs Os números entre parênteses correspondem às participações percentuais sobre o total da exportação da região Fonte L A Corrêa do Lago 1978 p 412 A tabela 1 revela não só a notável expansão10 da caficultura paulista como também a estagnação da produção do Vale do Paraíba O declínio da caficultura do Vale se devia a um amplo complexo de causas dentre as quais podemos resumidamente apontar o esgotamento do solo a dificuldade de expansão do plantio por incorporação de nova terra escassez e conseqüente elevação dos preços de mãodeobra escrava falta de sensibilidade para o problema da transição para o trabalho livre além do grave endividamento dos fazendeiros do Vale na década de oitenta junto a alguns bancos da praça do Rio Tais fatores concorreram para deprimir decisivamente a rentabilidade da empresa e dificultar o reinvestimento e portanto provocaram estagnação e o declínio da caficultura do Vale do Paraíba11 A situação da caficultura do oeste paulista era completamente diversa A expansão do plantio se dava em ritmo acelerado12 contando com o apoio de uma rede ferroviária igualmente em expansão13 As taxas de rentabilidade da empresa eram elevadas e a utilização do trabalho livre se já não era algo razoavelmente disseminado na província nos anos oitenta não era estranha à mentalidade local Em função de condições essencialmente diversas no Vale e no oeste de São Paulo o problema da transição para o trabalho livre nas duas regiões assumia caráter diverso Entretanto esse caráter diverso se devia menos à disposição humanitária dos fazendeiros em extinguir a escravatura do que às possibilidades econômicas de cada região em suplantar os problemas de mãodeobra criados pela disseminação do trabalho livre14 A extinção do trabalho servil gerava apreensões generalizadas não apenas quanto ao problema da existência de braços para o trabalho mas também quanto às dificuldades que surgiriam com a introdução de pagamentos de salários monetários Quanto ao primeiro problema a introdução em larga escala do imigrante mostrada na tabela 2 parece têlo em grande medida superado Boa parte dos imigrantes localizavase nas imediações da zona cafeeira de São Paulo15 o que sem dúvida sugere um grande avanço do trabalho assalariado no campo no final da década de oitenta e início dos anos noventa É discutível no entanto que tenha se dado nos anos de que este trabalho se ocupa a transição para um sistema de assalariamento em que as remunerações ao trabalhador se fizessem exclusivamente sob a forma de salários monetários Há evidência de que logo após a Abolição foram utilizados diversos regimes de trabalho tais como parcerias e empreitadas tanto no Vale quanto em São Paulo cujos pagamentos se faziam sem que se utilizasse dinheiro16 No entanto é certamente admissível que as remunerações monetárias tornaramse muito mais disseminadas no final dos anos oitenta e as causas desse fenômeno são sem dúvida a introdução do imigrante e a eliminação do trabalho escravo Não resta dúvida de que a disseminação do trabalho assalariado no campo deuse de forma súbita mas possivelmente não tanto quanto poderia à primeira vista parecer O trabalho assalariado vinha sendo crescentemente utilizado na agricultura paulista nos anos anteriores à Abolição ao mesmo tempo que a imigração crescia e a multiplicação de fugas e alforrias reduzia a mãodeobra servil efetivamente empregada17 Para as províncias do Norte que de longa data eram exportadoras de escravos é possível afirmar que o trabalho livre já se encontrasse razoavelmente disseminado por ocasião da Abolição18 Essas considerações contudo não alteram o fato de que o 23 TABELA 2 Imigração Bruta Anual para o Brasil e para São Paulo 18761893 Médias móveis de cinco anos Ano Total São Paulo 1876 22594 1877 23044 1878 26789 1879 22887 1880 28520 1881 23766 1882 24306 1883 25448 1884 29935 1885 35688 230 1886 56606 370 1887 64818 500 1888 79224 540 1889 115879 580 1890 121927 660 1891 122238 660 189 2 121245 750 1893 133274 810 Fonte Douglas Graham 1973 p 11 e os dados para São Paulo são de Thomas Holloway 1972 apêndice II p 179 Os dados para São Paulo se encontram arredondados para o milhar mais próximo assalariamento no campo teve um avanço abrupto durante a passagem para os anos noventa No caso de São Paulo por exemplo alguns algarismos podem nos dar uma idéia aproximada do choque da eliminação do trabalho escravo Em março de 1887 havia 67966 escravos registrados nas áreas rurais de São Paulo tributárias do porto de Santos incluindo mulheres crianças e escravos de idade avançada Holloway estimou em 77 mil trabalhadores o total da força de trabalho necessária para mover a safra de 1887 o que nos sugere que pelo menos 20 da força de trabalho constituíamse no início de 1887 de trabalhadores livres Durante o ano de 1887 entraram 32112 imigrantes em São Paulo e em 1888 92086 o que sugere também que havia substituição de mãodeobra escrava por mãodeobra estrangeira19 A disseminação dos pagamentos de salários por certo alterava as necessidades de capital de giro das fazendas de café uma vez que antes de 1888 os recursos financeiros necessários para o custeio da fazenda eram relativamente pequenos pois a parte mais importante desse custeio que era o pagamento da mãodeobra praticamente não existia20 São comuns as referências ao fato de que os fazendeiros mantinham contas correntes com seus comissários nos portos e liquidavam seus compromissos através de um jogo de lançamentos contábeis sem que se utilizasse dinheiro em volu 24 mes significativos21 A difusão do trabalho assalariado no campo no entanto viria a modificar drasticamente essa praxe Evidentemente o impacto da transição para o trabalho livre sobre as necessidades de capital de giro para as fazendas em forma monetária dependia diretamente do modo como seriam feitos os pagamentos ao trabalho Diversos sistemas foram tentados nesses anos e em geral a maior parte deles baseavase em dois tipos de remuneração uma relativa ao plantio e ao cuidado com o cafezal ao longo do ano e outra relativa à colheita Cerca de metade da renda monetária anual de cada família na área cafeeira de São Paulo de acordo com Holloway22 adivinha dos pagamentos contratualmente estabelecidos pelo cuidado dos cafeeiros durante o ciclo anual de produção sendo que a outra metade da folha salarial anual do fazendeiro correspondia ao pagamento pela colheita Contudo o grosso das remunerações em forma monetária concentravase na época da colheita uma vez que boa parte dos pagamentos a trabalhadores ao longo do ano se fazia em espécie ou através de lançamentos contábeis nas contas correntes entre fazendeiro e colono Assim sendo sob o ponto de vista do gasto monetário com o pagamento de salários as necessidades de capital de giro das fazendas de café eram essencialmente sazonais e obviamente tanto mais marcadamente sazonais quanto maiores fossem os encargos monetários com o pagamento de salários e também quanto maior fosse a safra Entretanto não se resumi am somente ao pagamento de salários os gastos monetários da cafeicultura À época de safra os fazendeiros também arcavam com uma série de outras despesas de beneficiamento e comercialização além de frequentemente serem contratados trabalhadores adicionais pagos em dinheiro o que sem dúvida reforçava ainda mais o caráter sazonal das necessidades de numerário da fazenda Era precisamente na época da colheita que os fazendeiros mais pressionavam seus comissários por adiantamentos e empréstimos para mover a safra E como em última análise era no sistema bancário que se financiavam os comissários na época da safra manifestavase uma forte pressão de demanda por crédito sobre o sistema bancário Por outro lado também o modo como a safra afluía para os portos seu tamanho e as expectativas dos comissários quanto aos preços futuros podiam determinar pressões adicionais sobre o sistema bancário Se a safra fosse grande e os comissários adiassem os embarques de modo a impedir quedas de preço possivelmente a retenção de estoques haveria de ser financiada pelo sistema bancário que ficava assim sujeito a uma pressão adicional O sistema bancário localizavase predominantemente na Corte que era sem dúvida o centro financeiro do País e alimentava um setor comercial de avantajadas proporções23 Dado que a procura por crédito por parte do comércio da capital não tinha nenhum padrão de sazonalidade perceptível quando da época de safra havia uma forte pressão sobre o crédito bancário que produzia geralmente uma elevação da taxa de desconto e dificuldades de liquidez na praça do Rio Essa pressão de demanda sobre o crédito podia em determinadas circunstâncias ter consequências sérias e mesmo provocar um abalo grave na praça As tanto mencionadas crises de numerário na praça do Rio a partir dos anos sessenta encontram sua explicação em alguma medida no caráter acentuadamente sazonal da procura por crédito Esse fenômeno já era perceptível bem antes do trabalho assalariado começar a difundirse no campo Referindose à década de sessenta Calógeras argumenta que as 25 colheitas exigiam remessas periódicas de dinheiro as quais empobreciam as praças de onde o papelmoeda era exportado e esse só retornava lentamente dada a dificuldade das comunicações O Rio principalmente capital econômica e também política assistia à época das colheitas do Norte à drenagem do seu numerário para as praças dessa região e sofria as consequências disso elevação da taxa de descontos tabelas de juros muito altos dificuldade de realizar negócios pela falta de numerário penúria de moeda24 O mesmo fenômeno davase ainda na década de oitenta sendo que a essa altura as remessas também tinham o destino da cafeicultura As remessas periódicas que tinham o Norte como destino eram de vulto considerável 25 contudo diferentemente daquelas destinadas à região cafeeira não se prestavam ao financiamento da safra e sim à sua aquisição O Nordeste exportava açúcar para o mercado consumidor do Rio de Janeiro26 e as entradas na praça do Rio concentravamse em geral nos primeiros meses do ano e freqüentemente nos últimos meses do ano anterior como mostra a tabela 3 Aos pagamentos relativos a essas entradas correspondia a maior parte das remessas de valores para o Norte ao longo do ano Sendo assim a praça do Rio sofria periodicamente um dreno de liquidez oriundo da liquidação dos pagamentos do comércio com o Norte e o Sul que como sugerem os números da tabela 3 era superavitário para o Norte27 durante alguns meses do ano Essas pressões se juntavam às oriundas do financiamento da safra cafeeira no sentido de tornar instável a liquidez na praça do Rio seja pela sazonalidade na procura por crédito seja pelos drenos de numerário oriundos do comércio interprovincial TABELA 3 Entradas Trimestrais de Açúcar na Praça do Rio de Janeiro 18871890 Em sacas de 60 kg 1887 1888 1889 1890 Trimestre Do De Do De Do De Do De Norte Campos Norte Campos Norte Campos Norte Campos I 119957 29023 85792 75205 165098 41426 270972 11010 II 79824 37694 34331 29344 75179 33894 139652 24846 III 2398 204027 13404 175374 30306 89040 43501 147378 IV 10002 163109 37682 149339 180340 28455 126393 72127 Fonte RCJC vários números 26 Um outro fator que se acrescentava à instabilidade do crédito no Rio de Janeiro era a distribuição geográfica do comércio internacional do País O porto do Rio de Janeiro era geralmente deficitário no seu comércio exterior como mostra a tabela 4 porque concentrava a maior parte das importações do País São Paulo por exemplo tinha em seu comércio com o exterior grandes saldos positivos daí resultando que os importadores do Rio de Janeiro em determinadas épocas do ano tinham de fazer remessas de numerário para Santos a fim de lá adquirirem as cambiais de que necessitavam Em algumas ocasiões essas remessas davam origem a um dreno temporário na liquidez bancária do Rio de Janeiro em favor de São Paulo mas que tendia a corrigirse com alguma rapidez através do comércio entre as duas praças que era como sugere a tabela 4 favorável para o Rio de Janeiro TABELA 4 Comércio Exterior e Comércio Interno do Rio de Janeiro e de São Paulo 18801888 Em contos de réis Comércio Exterior Comércio com Outras Províncias Exercícios Rio de Janeiro São Paulo Rio de Janeiro São Paulo Expor Impor Expor Impor Expor Impor Expor Impor tação tação tação tação tação tação tação tação 18801881 115332 100362 29375 7829 18811882 99346 96190 32535 7745 33517 12732 2444 11170 18821883 91490 102485 30955 7787 18834 11933 1951 8155 18831884 85727 103588 46205 12059 18629 11474 2198 9662 18841885 109145 91144 47207 10416 17283 11763 1150 7373 18851886 92469 103699 35889 15324 25894 10843 881 9060 18861887 110524 105586 99417 32974 18122 18650 5014 16697 1888 95753 131369 51228 31753 22010 14747 1046 4419 Fonte RMF vários números Devese notar todavia que as pressões sazonais sobre os bancos extravasavam em geral o que se podia chamar de dificuldades ocasionais na praça do Rio Fatores institucionais tornavam esse problema um pouco mais sério O incipiente desenvolvimento da rede bancária como veremos a seguir tornava os bancos bastante vulneráveis às variações na procura por crédito e nos seus depósitos O sistema bancário não só era pouco desenvolvido como estava fortemente concentrado na capital A tabela 5 que nos mostra os bancos em funcionamento no País em junho de 1888 pode ilustrar adequadamente essas considerações Os dados da tabela 5 nos mostram um sistema bancário pouco desenvolvido e bastante concentrado Para melhor ilustrálo podemos utilizar o conceito de densidade bancária 28 segundo o qual em 1888 haveria 0043 agência bancária para cada dez mil habitantes29 o que seria considerado uma densidade muito baixa indicando um reduzido grau de desenvolvimento bancário30 Todavia como os 13 bancos da capital detinham mais de 80 do capital realizado total e proporção similar dos depósitos poderia parecer que o Rio de Janeiro era bastante desenvolvido financeiramente O mesmo índice de densidade mostra a existência de 0443 agência para cada 10 mil habitantes da província31 o que ainda caracteriza um baixo grau de desenvolvimento do sistema bancário Uma conseqüência importante do reduzido desenvolvimento do sistema bancário e sua pouca penetração no interior era tornar o entesouramento um hábito corrente nas cidades e ainda mais acentuado no interior Tecnicamente isso significa uma maior preferência do público não bancário em reter moeda sob forma de moeda manual em vez de sob forma de depósitos bancários Segundo The Economist em 1890 no Brasil era raro o uso de cheques com hábito comum ali de reterem os indivíduos em seu poder largas quantias em vez de depositálas em bancos Os pequenos negociantes os taverneiros por exemplo no Rio de Janeiro apenas excepcionalmente depositam 27 TABELA 5 Rede Bancária em 30 de junho de 1888 Valores em contos de réis Bancos Sede Capital Realizado Depósitosc Sucursais Ano da Fundação Banco do Brasil RJ 33000 58039 1853 Banco do Brasil Sucursal de S Paulo SP 8000 8139 nd Banco Internacional do Brasil RJ 12000 9124 3 1886 Banco do Comércio RJ 9900 4851 1874 Banco Comercial do Rio de Janeiro RJ 10000 10250 186566 Banco Industrial e Mercantil do Rio de Janeiro RJ 6000 5066 1872 London and Brazilian Bank RJ 5555 3522 13 1862 Brazilianische Fûr Deutschland RJ 4460 nd 1888 English Bank of Rio de Janeiro RJ 4444 5213 8 1863 Banco Rural e Hipotecário RJ 10000 28175 1854 Banco Predial RJ 2000 nd 1871 Banco de Crédito Real do Brasil RJ 999 25 1883 Banco União do Crédito RJ 200 834 1885 Banco Auxiliar RJ 500 423 1880 Banco del Credere RJ 2000 717 1886 Banco de Crédito Real de São Paulo SP 2000 nd 1881 Banco Mercantil de Santos SP 1000 2187 3 1872 Banco Comercial de São Paulo SP 1000 1817 2 1886 Banco da Lavoura de São Paulo SP 600 875 1885 Casa Bancária de São Paulo Nielsen Cia SP 1440 6779 nd Banco Popular de São Paulo SP 188 156 1888 Banco Territorial e Mercantil de Minas MGb 497 1200 1 1887 Banco Hipotecário MA nd nd nd nd Banco do Maranhão MA 1000a nd nd 1857 Banco Comercial do Maranhão MA nd nd nd 1869 Banco Comercial do Pará PA 2000a nd nd nd Banco do Pará Novo PA 1000a nd nd nd Banco da Bahia BA 8000a nd nd nd Banco Mercantil da Bahia BA nd nd nd nd Caixa Hipotecária da Bahia BA nd nd nd nd Sociedade de Comércio da Bahia BA nd nd nd nd Banco da Província RS nd nd nd nd Total 123323 133471 62d aCapital subscrito b Juiz de Fora cIncluem as contas correntes garantidas modernamente chamadas depósitos a prazo dConsideramos que os bancos dos quais não temos informações sobre sucursais têm apenas uma Fonte L R DOliveira 1889 p 34782 nos estabelecimentos De ordinário preferem ter consigo o seu dinheiro até a época de pagamentos satisfazendo então os seus débitos com as somas acumuladas em casa no decurso de seis a nove meses O mesmo sucede com as classes que vivem de 28 salário Os agricultores e outros habitantes do interior amuam grandes somas para satisfazer às suas necessidades e esse dinheiro leva meses ou anos para ir ter aos bancos A receita das alfândegas em vez de se depositar nos bancos e por eles transmitirse para o Rio de Janeiro acumulase em somas importantes expedidas periodicamente pelos paquetes para a capital 32 A baixa propensão do público para reter moeda sob forma de depósitos bancários significava uma limitação estrutural à capacidade dos bancos em expandir os seus empréstimos ou por outra expressava um reduzido valor do multiplicador bancário33 Nessas condições para que os bancos expandissem o crédito coeteris paribus obrigatoriamente veriam reduzirse sua relação encaixedepósitos ficando portanto em uma posição de liquidez mais vulnerável34 Na época de safra os bancos sofriam um dreno de caixa ao verem seus depósitos migrarem para o campo e ao ficarem mais vulneráveis viamse forçados a assumir políticas defensivas reduzindo suas aplicações eou elevando suas taxas de desconto Frequentemente esse fenômeno criava dificuldades na praça do Rio que se aproximavam de caracterizar uma crise comercial nesse sentido a sazonalidade envolvida na procura de crédito tornavase um problema para a economia do Rio de Janeiro cujos determinantes estavam ligados ao baixo grau de desenvolvimento do sistema bancário e sua pouca penetração no interior Havia uma percepção mais ou menos clara de que as dificuldades de liquidez nas épocas de safra eram temporárias Referindose à crise de liquidez do final de 1886 por exemplo o Jornal do Commercio afirmava que tal estado de coisas era apenas a repetição da crise periódica que se observa nessa praça nos fins dos semestres e quando grandes somas são mandadas para as províncias a fim de aí moverem as safras 35 Na capital o comércio frequentemente referiase ao fenômeno acima descrito como a inelasticidade do meio circulante De acordo com o Jornal do Commercio a elasticidade do meio circulante é a sua propriedade de contrairse ou expandirse acompanhando os movimentos dos mercados com a mesma facilidade com que a sombra acompanha os movimentos do corpo36 Assim como eram variáveis as necessidades dos negócios ao longo do ano o sistema bancário deveria ajustar a oferta de crédito a esse movimento mas como frequentemente nas épocas de safras os bancos não conseguiam fazêlo diziase que era inelástico o meio circulante Poderseia argumentar que a criação em larga escala de bancos principalmente no interior atuaria no sentido da estabilidade pois permitiria que o público utilizasse mais os depósitos bancários visàvis moeda manual como forma de armazenar poder de compra Dessa maneira o caráter sazonal da procura por crédito por parte da lavoura não seria tão perigoso uma vez que o sistema bancário contaria com maior grau de liberdade para prevenir oscilações violentas na liquidez Por outro lado devese mencionar que a procura por moeda por parte da lavoura não era apenas sazonal mas também bastante instável As safras de café por exemplo estavam sujeitas a diversos elementos aleatórios sendo que no curto prazo a instabilidade era propiciada pelo fato de que os mercados de café nos portos do Rio e de Santos eram essencialmente especulativos dominados por expectativas voláteis e também pelas flutuações do mercado de câmbio que era como veremos nas duas seções seguintes ainda mais instável Assim em função do acima descrito podemos ter alguma indicação quanto à natureza do impacto da disseminação do trabalho assalariado no campo sobre o sis29 tema monetário A elevação das necessidades de numerário no campo haveria de se mostrar clara nas safras dos anos próximos a 1888 A presença de crises de liquidez nesses anos especialmente quando ligadas a remessas para o interior constitui uma evidência do impacto acima mencionado Mais adiante no entanto vamos examinar detidamente a configuração dessas crises assim como os outros fatores que sobre elas tiveram influência 12 A política monetária nos anos oitenta O Segundo Império é tido em geral como um período no qual a administração monetária teria sido marcadamente conservadora e apesar de alguns poucos per todos de exceção a economia teria estado sob um contínuo viés deflacionista No entender de Furtado isso seria especialmente válido nos últimos anos do Império pois a política monetária do governo imperial nos anos oitenta traumatizada pela miragem da conversibilidade por um lado conduzia a um grande aumento da dívida externa e por outro mantivera o sistema econômico em regime de permanente escassez de meios de pagamento37 Entretanto uma avaliação global da década de oitenta é problemática uma vez que esses anos abrigam um claro período de estagnação na primeira metade da década e um de expansão e também de profundas transformações na segunda metade Envolve decerto um problema de causalidade afirmarse que houve restrição de liquidez nos primeiros anos da década de oitenta a partir da evidência de que a oferta de moeda permaneceu estável Essa mesma evidência como a seguir veremos não estava isenta de algumas qualificações importantes Os meios de pagamentos no Brasil do final do Império incluíam diversas espécies de moeda Havia notas inconvertíveis do Tesouro em grande quantidade notas inconvertíveis de vários bancos moedas metálicas nacionais e estrangeiras e depósitos bancários Em geral tomase a série de notas do Tesouro somadas às do Banco do Brasil como o melhor indicador para os meios de pagamento uma vez que não estão disponíveis dados anuais para os outros componentes dos meios de pagamento o que não significa que esses outros componentes não tenham sido importantes A tabela 6 mostra o volume de notas do Tesouro e do Banco do Brasil em circulação de 1872 a 1889 A esses valores devem ser acrescentados os das notas do Banco da Bahia das quais em setembro de 1890 ainda restava em circulação cerca de 904 contos do Banco do Maranhão que na mesma data somavam 155 contos e do Rio Grande do Sul cujo valor provavelmente pequeno era desconhecido38 Também se deveria acrescentar aos totais da tabela 6 os valores de moedas metálicas em circulação cujos montantes entretanto são difíceis de determinar A tabela 7 fornece a cunhagem de moedas de ouro e prata no Brasil desde 1810 Apesar de o total ser representativo39 é impossível dizer que percentagem daquelas moedas ainda permaneciam em circulação no País40 Para contarmos com uma série relativa aos meios de pagamento ainda teríamos de computar os depósitos bancários A média dos depósitos à vista e a prazo41 para os anos de 1879 e 1880 foi de 97904 contos Para o biênio 18861887 a média chegou a 112414 contos e para 18881889 atingiu 121366 contos42 De 18791880 e de 18881889 o crescimento dos depósitos seria próximo a 24 e se aceitarmos que os 30 TABELA 6 Notas do Tesouro e do Banco do Brasil 18721889 Em contos de réis Exercícios Notas do Tesouro Notas do Banco do Brasila Total 1872 158078 40727 198805 1873 149579 33432 185011 1874 149579 35432 187011 1875 149502 32367 181869 1876 149422 30042 179422 1877 149347 30009 179356 1878 181279 27656 208965 1879 181279 27656 208965 1880 189199 26478 215677 1881 188155 24129 212284 1882 188110 24129 212129 1883 188041 22956 210997 1884 187936 21689 209625 1885 187343 20517 207862 1886 194282 19300 213582 1887 184335 17956 202291 1888 188869 16419 205288 1889 195486 11337 206823 aNotas emitidas quando o Banco foi emissor e com curso forçado desde 1866 Fonte Brasil Secretaria de Planejamento da Presidência da República Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística FIBGE Anuário Estatístico do Brasil 193940 p 1353 TABELA 7 Cunhagem de Moedas de Ouro e Prata no Brasil 18101887 Em contos de réis Anos Ouro Prata 18101829 8114 16039 18301849 951 67 18491859 37240 8181 18591887 8411 10788 Total 54716 35075 Fonte GrãBretanha Report on the Finances 1887 and 1888 Wyndham to the Marquis of Salisbury p 145 depósitos representavam 13 dos meios de pagamento então apesar de um decréscimo de cerca de 4 no papelmoeda em circulação ainda teríamos um crescimento superior a 5 nos meios de pagamento Esse crescimento pode não caracterizar uma situação de 31 restrição de liquidez dependendo de como evoluiu a procura por moeda nos anos oitenta A ausência de medidas precisas para a oferta de meios de pagamento dificulta a tarefa de buscar indicadores quantitativos do caráter restritivo da política monetária É possível detectar no entanto a orientação da política monetária nos anos oitenta através de outras considerações Uma maneira de captar a intenção deflacionista da política monetária durante a maior parte da década de oitenta é atentar para a aversão das autoridades em recorrer à emissão de moeda para financiar os déficits do Tesouro De fato apesar da presença de déficits em quase todos os exercícios de 1880 a 1888 a emissão de moeda para financiálos foi praticamente inexistente como mostra a tabela 8 Em virtude da constante presença de déficit orçamentário só foi possível manter estável o estoque de notas emitidas4 3 ao custo de uma dívida pública crescente A dívida pública interna em 1881 era da ordem de 407700 contos e em 1888 atingiu 443943 contos44 A dívida externa cresceu de 165 milhões de libras em 1880 para 286 milhões de libras em 1888 Diante dos encargos criados pelo crescimento da dívida pública poderseia indagar por que tamanho empenho em não elevar a emissão do Tesouro E para isso os contemporâneos tinham como adiante veremos justificativas bastante articuladas TABELA 8 Execução Orçamentária do Tesouro Nacional 18801888 Em milhares de contos Exercício 188081 188182 188283 188384 188485 188586 188687a 1888 Ministro Cons J A Saraiva Cons J A Saraiva M A Silva Campos Visc de Paranaguá Cons Lafayette Cons J A Saraiva Francisco Belizário J Alfredo Receita 1283 1304 1297 1326 1219 1268 2187 1507 Despesa 1386 1395 1529 1543 1585 1536 2270 1474 Saldo 103 91 232 217 366 278 83 33 Saldo anterior 233 33 nd 725 Emissão títulos 110 40 177 189 nd 473 Emissão de moedab 01 01 02 02 01 nd 03 nd Empréstimos externos 350 527 Bilhetes em circulaçãoc 116 289 289 467 466 500 748 313 aNesse exercício houve mudança do ano fiscal Os exercícios anteriores iam de junho a junho e os exercícios posteriores a 188687 iam de janeiro a dezembro Na mudança de ano fiscal o exercício de 188687 ficou com três semestres o que explica seus valores elevados para receita e despesa bCorresponde à emissão de moedas de níquel para troco cEsses bilhetes são títulos do Tesouro prazos de quatro a seis meses que pagavam juros de 4 12 e eram emitidos mediante autorização legislativa geralmente como antecipação de receita Em virtude do movimento de amortização e emissão desses títulos os valores correspondentes ao financiamento do déficit do Tesouro não coincidem exatamente com o valor do próprio déficit Fonte Brasil Balanço de Receita e Despesa vários números e RMF vários números 32 A política monetária nos anos oitenta foi conduzida efetivamente de acordo com a meta da conversibilidade Os Ministros da Fazenda da época assim como a maioria dos contemporâneos repetiamse incansavelmente sobre as vantagens da circulação metálica conversível Isso significava uma oferta monetária composta apenas por notas livremente conversíveis em ouro de acordo com a paridade oficial estabelecida em 1846 isto é 27 pence por mil réis4 5 Entretanto a aspiração pelo estabelecimento da circulação metálica viase dificultada pela crônica escassez de reservas metálicas no País Como o País não dispunha de metal para exportar de modo a preservar a paridade em situações onde o balanço de pagamentos era adverso a taxa de câmbio caía abaixo do par e a conversibilidade era imediatamente suspensa Nessas condições a adesão do País ao padrãoouro mantendose a paridade de 1846 embora desejável esbarrava por um lado na intransponível barreira de um balanço de pagamentos permanentemente deficitário e por outro lado na relutância do governo em seguir um plano deflacionista até as suas últimas consequências E assim a atitude do Tesouro esteve próxima por vezes de simplesmente aguardar que a taxa de câmbio atingisse a paridade como resultado natural das forças em operação no mercado de câmbio para aí decretar a conversibilidade Cogitouse também de se contrair um grande empréstimo externo destinado a fazer o resgate do papelmoeda e instaurar a conversibilidade Acreditavase no entanto que o empréstimo poderia elevar o câmbio à paridade mas tão logo cessassem os efeitos do influxo de metal o câmbio se desvalorizaria e haveria uma corrida para a conversão das notas com perdas para o Tesouro Por outro lado notese que um empréstimo como esse dificilmente livraria o Tesouro de perder alguma autonomia na condução da política monetária doméstica face às prováveis sugestões de política econômica dos banqueiros Acreditavase outrossim que a depreciação do câmbio tinha causas bem definidas as quais era preciso combater Segundo Francisco Belizário Ministro da Fazenda em 1886 e provavelmente o mais renomado financista conservador de seu tempo a baixa do câmbio deviase inequívocamente à superabundância de papelmoeda inconversível46 Para Belizário o valor do papelmoeda depende de sua quantidade mas não é na soma numérica das notas que se pode achar o critério para conhecer a deficiência ou o excesso do meio circulante o critério único está no preço do ouromercadoria e no estado do câmbio sendo a depreciação consequência do excesso de papelmoeda ir reduzindo a sua quantidade será aumentarlhe o valor Nisto consiste a primeira condição para chegarmos à circulação metálica47 Inúmeras expressões das mesmas idéias podem ser coletadas nos discursos e documentos da maioria dos Ministros da Fazenda e estadistas do Império É interessante notar contudo que essas idéias baseavamse em uma doutrina bastante articulada e de origens não só remotas como ilustres A noção de que a existência de ágio sobre o preço do ouro ou a permanência da taxa de câmbio abaixo da paridade era um indicador do excesso de oferta ou superabundância de papelmoeda fora o argumento central de David Ricardo nas controvérsias inglesas em torno da suspensão da conversibilidade das notas do Banco da Inglaterra durante as guerras napoleônicas48 Em certa medida a controvérsia inglesa foi resolvida por uma comissão do Parlamento que produziu um documento que exerceu uma influência extraordinária sobre o pensamento econômico49 e que recomendava o retorno da GrãBretanha ao 33 padrãoouro à paridade anterior à guerra representando uma clara vitória 50 de Ricardo e seus adeptos que ficaram conhecidos como bulionistas Podese interpretar o pensamento metalista brasileiro dessa época com o auxilio de diversas teorias modernas mas essas diferentes leituras acusariam poucas diferenças essenciais entre si Podese por exemplo interpretar as idéias bulionistas através do moderno enfoque monetário do balanço de pagamentos mas não parece que isso nos vá ser de alguma valia Devemos lembrar que as visões de Hume Smith Ricardo Torrens Bagehot Marshall ou Keynes podem ser essenciais para explicar por que determinadas políticas foram adotadas políticas essas que afetaram o curso da história econômica mas na suposição de que suas teorias explicavam os eventos a que elas se seguiram é um assunto bastante diferente 51 Como este é um trabalho sobre política econômica interessanos primordialmente o formato contemporâneo das teorias nas quais se baseava a política econômica e muito pouco o mérito analítico das ditas teorias De acordo com Ricardo o estoque mundial de ouro monetário se encontra dividido entre os diversos países de acordo com o estado do seu comércio e riqueza 52 e a taxa de câmbio entre as moedas de dois países que mantenham circulação metálica conversível é exatamente igual à razão entre os respectivos estoques de moeda metálica 53 Se um país aumenta seu volume de notas em circulação faz as mercadorias pelas quais sua moeda é trocada comparativamente mais caras ou baratas 54 O aumento do volume de notas em circulação eleva portanto todos os preços reduzindo o valor isto é o poder de compra dessas notas A lei de Gresham determina então que o ouro desapareça da circulação eou que seja exportado pois em retorno pelo ouro exportado mercadorias serão importadas o que é freqüentemente tido como uma balança comercial desfavorável para o país exportador de moeda ou barras de ouro 55 As exportações de ouro prosseguem até que a relação de troca se alinhe com a proporção dos estoques de ouro entre os dois países 56 Em um regime de taxas de câmbio flexíveis as emissões em demasia teriam efeitos sobre o câmbio que nada mais seria nessas condições e de acordo com esta teoria que o poder de compra do meio circulante metálico do País O câmbio será portanto um critério razoavelmente apurado pelo qual podemos avaliar a degradação da moeda em virtude do papelmoeda depreciado 57 Esta é apenas uma maneira muito simples de descrever o mecanismo monetário de ajustamento automático sob o padrãoouro O fato de que grande parte dos financistas brasileiros da época pensavam exatamente dessa forma e adiante nesse trabalho vamos documentálo fartamente pode explicar em alguma medida a orientação da política monetária durante o Segundo Império e também em alguns períodos posteriores Entretanto a política econômica é governada por interesses ou melhor as metas da política econômica são determinadas por interesses E a adesão do País ao padrãoouro era um objetivo cujo principal subproduto a estabilidade cambial vinha de encontro aos mais variados interesses A taxa de câmbio era sem dúvida o mais importante preço em vigor nessa época Isso se devia a seu impacto sobre o nível de atividade sobre os gastos do governo sobre o nível de preços e sobre a distribuição da renda O câmbio tinha relações com a formação doméstica de capital na medida em que tinha influência sobre os preços dos bens de capital importados sobre o grau de proteção à indústria 34 doméstica e sobre a lucratividade do setor exportador 58 O câmbio dominava as variações no nível de preços domésticos face à elevada participação dos bens de consumo importados na composição da demanda doméstica Mais da metade da receita tributária da União advinha dos impostos sobre as importações 59 e várias despesas eram denominadas em libras os pagamentos relativos à dívida externa à dívida interna em ouro e as garantias de juro a empresas estrangeiras 60 O resultado de caixa do Tesouro era portanto fortemente influenciado pelas flutuações no câmbio Além disso o câmbio era um determinante importante das rendas em mil réis dos exportadores e dos lucros do comércio importador As flutuações na taxa de câmbio eram freqüentes e violentas como mostra a tabela 9 A instabilidade do câmbio se devia inequivocamente à instabilidade do próprio balanço de pagamentos do País Pelo lado comercial devese notar que as exportações de café variavam bastante de ano para ano em função de diversos fatores exógenos como os ciclos cafeíros os preços internacionais e a procura As exportações atingiram cerca de 195 milhões em 1884 caíram para 151 milhões em 1885 subiram novamente para 205 milhões em 188661 Pelo lado da contacapital notese que o investimento direto estrangeiro atingiu 68 milhões em 1883 caiu para 451 mil no ano seguinte subiu em seguida gradativamente para 18 milhão em 1887 e atingiu o expressivo valor de 128 milhões em 188862 Afora isso o Tesouro realizou três empréstimos externos em 1883 1886 e 1889 respectivamente de 4 milhões o primeiro e 6 milhões os dois seguintes O saldo desses movimentos superpostos não poderia deixar de ocasionar uma notável instabilidade da taxa de câmbio Devese também mencionar o fato de que o mercado de câmbio era um mercado caracteristicamente especulativo 63 Era um mercado aberto no sentido de que qualquer pessoa poderia comprar e vender divisas embora o mercado fosse dominado por alguns grandes operadores como os bancos ingleses o Banco do Brasil o Banco TABELA 9 Taxas de Câmbio 18801888 Médias mensais Pence por mil réis Meses 1880 1881 1882 1883 1884 1885 1886 1887 1888 Jan 23 14 22 12 20 1316 21 58 21 34 19 12 17 1316 22 216 24 116 Fev 21 710 21 35 20 716 21 36 22 16 19 17 1516 22 16 24 14 Mar 20 15 21 716 20 78 21 12 21 58 18 58 18 1516 21 1316 23 716 Abr nd 21 14 21 23 21 12 21 18 14 20 916 21 58 23 716 Maio 20 12 21 18 21 716 21 12 20 38 18 310 21 78 22 14 23 78 Jun 22 35 21 35 21 12 21 38 20 45 18 18 21 18 22 18 24 38 Jul 23 14 22 21 12 21 14 20 18 20 34 22 18 25 16 Ago 23 12 22 18 21 516 21 14 20 58 18 116 21 18 22 38 26 16 Set 23 38 22 1516 21 316 21 14 19 78 18 38 21 916 22 58 26 12 Out 22 1516 nd 21 716 21 12 19 34 18 22 22 38 27 16 Nov 22 1516 nd 21 916 21 12 19 12 17 78 21 78 22 34 27 16 Dez 22 38 nd 21 14 21 58 19 12 18 22 516 23 316 27 16 Fonte RCJC vários números e RMF vários números 35 Internacional e o Tesouro Nacional 64 Era um mercado organizado no sentido de que era geograficamente localizado faziamse negócios na Bolsa de Valores em geral a maior parte e em bancos 65 e havia funcionários do mercado cujo único trabalho era divulgar a informação relevante cotações e negócios feitos por exemplo Era um mercado onde o produto era mais ou menos homogêneo 66 e tinha custos de estocagem desprezíveis 67 em relação às oscilações de preço o que abria a possibilidade de especulação bem sucedida À luz disso tudo podemos concluir que a estrutura institucional do mercado de câmbio não contribuía no sentido de atenuar as flutuações cambiais 68 As flutuações cambiais impunham alterações bruscas na distribuição da renda nos preços e no nível de atividade Além disso freqüentemente resultavam em despesas vultosas para o Tesouro como diferenças de câmbio Os estadistas do Império percebiam com clareza as conseqüências da instabilidade cambial Torres Homem Ministro da Fazenda em 1871 propunha então uma volta ao regime de circulação metálica como remédio radical às grandes flutuações dos valores sem o que a indústria ou a propriedade não podem progredir pois que lhes falta a estabilidade do valor no instrumento de circulação dos seus produtos Não é só o comércio que sofre as consequências do papelmoeda todas as classes de população estão sujeitas à sua perniciosa influência 69 O Visconde de Paranaguá afirmava em seu relatório de 1883 que o câmbio com as suas oscilações e tendências deprimentes perturba todos os cálculos e arroja o Tesouro a precipícios e perdas incalculáveis 70 Para Belizário a instabilidade cambial entorpece o crescimento das indústrias e tornase o cancro oneroso de todas as classes 71 Também os credores do País preocupavamse com a instabilidade cambial pois lhes criava incertezas quanto a seus negócios financeiros e comerciais De acordo com o cônsul inglês em princípios de 1889 em sendo a estabilidade do câmbio uma necessidade primária para o Brasil seria também indiretamente muito mais satisfatória para a Inglaterra do ponto de vista dos negócios assim como do ponto de vista da amizade e interesse na prosperidade desse Império 72 A meta da estabilidade cambial juntamente com as posturas doutrinárias que mencionamos explicam em toda a sua extensão o contínuo desejo das autoridades em promover a circulação metálica conversível Pouco se discutia por outro lado se realmente com a conversibilidade seria eliminada a instabilidade macroeconômica causada em última instância pelos movimentos erráticos do balanço de pagamentos simplesmente pela eliminação da causa aparente de todos os problemas a instabilidade do câmbio Pouco se falava também no que seria necessário fazer para conservar a taxa de câmbio a 27 pence por mil réis caso fosse atingida Havia uma crença estabelecida durante os anos oitenta da qual voltaremos a tratar mais adiante de que os movimentos do câmbio eram imprevisíveis e incontroláveis de modo que a taxa de paridade que as forças em operação no mercado de câmbio pudessem trazer pod a rapidamente desaparecer sob o efeito das mesmas forças Parecia haver possibilidades de erigir instituições monetárias que tivessem algum poder para estabilizar o câmbio mas acreditavase que as oscilações nas nossas contas externas pareciam mesmo grandes demais para serem neutralizadas por intervenções no mercado de câmbio Também grande ou ao menos inconveniente parecia ser a deflação necessária para apreciar o câmbio ao par Diversas vezes a tentativa teve início mas jamais 36 continuidade Os documentos dos Ministros da Fazenda das últimas décadas do Império sempre começavam por grandiloqüentes demonstrações bulionistas e austeros planos de contenção de despesa e recolhimento de papelmoeda E os invariáveis insucessos eram justificados por circunstâncias adversas ou pela necessidade de evitar uma recessão muito violenta Ao se colocar o problema da reforma monetária no final dos anos oitenta pensavase em um conjunto de instituições que se amoldassem às novas condições mas que obrigatoriamente promovessem a estabilidade cambial Para os expoentes da ortodoxia metalista isto significava que as novas condições teriam de permitir ou facilitar um plano deflacionista que levasse à conversibilidade Mas essa idéia iria chocarse com a própria resposta que era exigida pelas novas condições que como veremos de forma clara no segundo capítulo tornavam a expansão uma necessidade imperiosa 13 O balanço de pagamentos Em alguma medida os contemporâneos percebiam que as variações das contas externas influíam sobre as oscilações na taxa de câmbio Admitiase mais precisamente que sob um regime de inconvertibilidade o câmbio ficava sujeito à influência da balança comercial e dos eventuais empréstimos externos contraídos pelo Tesouro Frequentemente mencionavase também que a especulação no mercado de divisas pela qual seriam responsáveis os bancos ingleses era uma causa importante para as flutuações cambiais Mas a visão contemporânea dos determinantes da taxa de câmbio sob um regime de inconvertibilidade limitavase em geral a essa visão parcial e incompleta das relações do País com o exterior Essa percepção incompleta somente poderia jusfificarse pela insignificância de todos os outros itens do balanço de pagamentos ou pelo fato de que esses outros itens eram pouco perceptíveis e portanto a compreensão do balanço de pagamentos no sentido moderno era reduzida A balança comercial e os empréstimos públicos eram influências bastante visíveis sobre o câmbio e assim suas flutuações eram algumas vezes perfeitamente previsíveis Sabiase por exemplo que quando o Tesouro sacava sobre um crédito em Londres o câmbio provavelmente sofreria uma influência positiva ou que analogamente o câmbio baixaria quando o Tesouro fosse ao mercado adquirir os meios para fazer frente a seus compromissos no exterior Entretanto freqüentemente a taxa de câmbio acusava flutuações violentas que se apresentavam aos contemporâneos como inexplicáveis O Tesouro os bancos nacionais e ingleses demonstravam a mais genuína perplexidade nessas ocasiões e em geral os últimos eram objeto de extremadas acusações Esses fatos estilizados que nos capítulos que se seguem iremos documentar parecem sugerir que havia influências significativas sobre o câmbio que não eram percebidas pelos contemporâneos Um exame expost da evolução do comércio exterior brasileiro assim como dos empréstimos públicos nas últimas décadas do século XIX de fato pouco revela sobre as flutuações cambiais Aparentemente movimentos de capital e outros itens invisíveis do balanço de pagamentos poderiam ser úteis para explicar as flutuações cambiais A consideração explícita desses itens cuja evolução até hoje não foi objeto de estudo sistemático poderia fornecer uma alternativa promis 37 sora tanto às visões conservadoras que ainda associam o câmbio à oferta de moeda quanto às interpretações que se sustentam sobre alguma forma de superestimação do papel do preço do café ou do estado dos negócios cafeiros na formação da taxa de câmbio Essas considerações sugerem a oportunidade em se proceder à difícil tarefa de construir estimativas para o balanço de pagamentos do Brasil do final do século XIX Embora haja inúmeras imprecisões nas estatísticas existentes que por sua vez não se encontram disponíveis para diversos itens importantes foi possível coligir algarismos para a maior parte das contas mais importantes As omissões e as imprecisões nas estatísticas não nos autorizam a classificar nossos resultados mostrados na tabela que se segue em mais do que uma estimativa para o balanço de pagamentos do Brasil de 1876 a 1897 Os dados são apresentados na base de médias anuais para os períodos indicados porque dessa maneira se atenuam algumas imprecisões existentes nas séries anuais 7 3 A escolha dos períodos a que se referem as médias baseouse na simples inspeção dos dados anuais reproduzidos no anexo e a periodização obtida revelouse coerente não só com a evolução da taxa de câmbio como também com algumas hipóteses interessantes sobre o relacionamento do Brasil com o exterior Apesar de todas as omissões qualificações e vieses a que esses números estão sujeitos e que são extensamente discutidos no anexo a esta seção os dados se mostram coerentes com a idéia de que as contas externas brasileiras contavam com itens muito significativos além das contas comerciais e empréstimos públicos Os dados da tabela 10 mostram saldos negativos em conta corrente durante todo o período apesar de que a balança comercial tenha se mostrado em média superavitária Isso se devia em parte ao fato de que a comercialização e o transporte de mercadorias importadas e exportadas eram feitos na sua quase totalidade por empresas estrangeiras E se devia também aos gastos governamentais no exterior notada TABELA 10 Estimativa para o Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 Médias anuais em milhares de libras 187680 188185 188689 189094 189597 1 Balança Comercial 3867 1769 3696 3525 2240 Exportações FOB 20036 18124 23563 29374 28934 Importações CIF 16169 16355 19867 25849 26694 2 Saldo de Serviços 4177 4376 5264 7263 7674 Fretes Seguros 2691 2731 2575 2716 2761 Rendas de Capitais 1275 1351 2106 2445 2525 Outros Serviços 211 294 583 2102 2388 3 Transações Correntes 310 2607 1568 3738 5434 4 Movimento de Capitais 805 2481 10965 549 6190 Empréstimos 121 854 10539 902 4250 Amortizações 632 669 4984 455 465 Investimento Direto 1315 2666 5410 102 2405 5 Saldo Global 495 126 9397 3189 756 Fonte Ver anexo a esta seção 38 mente com o serviço da dívida pública externa e garantias de juros O volume desses gastos como se pode verificar na tabela 10 dobrou do primeiro ao último período sendo que podemos localizar esse salto nos anos 18861894 A esse crescimento correspondeu por um lado um significativo aumento do volume de comércio a partir de 1886 O período 18861894 engloba anos de altos preços e maior volume de produção de café em relação ao decênio anterior 7 4 A receita em divisas das exportações de café elevouse a partir da média de 117 milhões em 18761885 ao valor de 136 milhões em 18881889 e em seguida à média anual de 200 milhões em 18901894 tendo no período seguinte se mantido em 195 milhões 7 5 As importações acusaram também um aumento significativo em 18861889 e outro ainda maior em 18901894 Esse aumento poderia ser atribuído naturalmente à própria expansão do nível de atividade doméstica As importações de bens intermediários e de capital ingleses por exemplo que atingiram a soma de 84 milhões durante 18851889 elevaramse a cerca de 143 milhões no qüinqüênio seguinte que representavam 368 das importações oriundas da Inglaterra contra 284 em 18851889 e 269 em 18801884 7 6 Juntamente com o crescimento do volume de comércio durante 18861894 cresceram bastante as despesas governamentais no exterior especialmente com a dívida externa É difícil no entanto apreciar com precisão quais foram os números absolutos de cada item dos gastos governamentais no exterior devido à maneira como eram contabilizados 7 7 O crescimento da conta outros serviços deveuse quase que inteiramente às diferenças de câmbio que por sua vez correspondiam a todos os gastos do governo no exterior incluindo alguns como importações de mercadorias e amortizações que não deveriam constar da conta de serviços O saldo de outros serviços encontrase portanto superestimado mas não de maneira muito séria O saldo do movimento de capitais como se pode verificar na tabela 10 apresenta flutuações bastante significativas A conta de empréstimos por exemplo registra em 18861889 um valor demasiadamente alto em relação aos outros períodos o que também é verdade para a conta de amortizações Isso na verdade corresponde a um fenômeno apenas contábil Em 1889 realizouse um grande empréstimo externo no valor de 198 milhões que destinavase somente a converter os títulos dos empréstimos anteriores de 5 para 4 12 A operação significava um acréscimo líquido de somente 2275 mil na dívida externa uma vez que iria amortizar um valor correspondente a 17652 mil correspondentes a títulos dos empréstimos de 1865 1871 1875 e 1886 que pagavam 5 de juros Por essa razão o valor referente a amortizações no período 18861889 encontrase inflado apenas contabilmente Mesmo levando em conta que houve um aumento apenas contábil no valor dos empréstimos no período 18861889 ainda assim se poderia destacálo com um período de elevadas entradas de capital de empréstimos O Tesouro contraiu dois empréstimos no valor de 60 milhões em 1886 e 1888 que somados aos 66 milhões de empréstimos privados contraídos no período e aos 2275 mil líquidos oriundos do empréstimo de conversão fornecem o valor total de 20895 mil várias vezes superior ao volume total de empréstimos contraídos no período anterior 4274 mil e ao total do período seguinte 4510 mil Notese que os empréstimos públicos representavam até certo ponto algum controle por parte do Tesouro dos saldos da conta capital Entretanto esses empréstí 39 mos públicos enquanto instrumento de política cambial tinham sua potencialidade diminuída pelo fato de que tinham de ser em alguma parte utilizados para financiamentos de déficit orçamentário Evidentemente quanto maior o déficit orçamentário uma vez bloqueada a possibilidade de emissão de moeda ou títulos da dívida pública interna menores eram os graus de liberdade do governo no manejo de suas reservas para fins de política cambial Por outro lado o recurso ao empréstimo nem sempre estava disponível ou nem sempre se podia fazêlo em condições satisfatórias Os Rothschild assim como o mercado onde eles colocavam nossos títulos tinham padrões rígidos de avaliação da credibilidade do País e esses critérios freqüentemente estavam em desacordo com a condução da política econômica local A contratação de empréstimos nessas condições era dificultada não só pela relutância dos banqueiros como também pelo fato de que condições desfavoráveis de lançamento comprometiam a execução orçamentária futura Assim o controle que o Tesouro podia exercer sobre os movimentos de capital de empréstimos era condicionado pela folga orçamentária e pelas possibilidades de colocação de títulos brasileiros em Londres Mesmo essa reduzida margem de controle o Tesouro já não tinha com relação aos movimentos de capital de risco O investimento direto estrangeiro parecia obedecer em maior escala às condições da economia internacional e ao estado dos principais mercados financeiros do que aos fatores de atração originados pela política econômica local como as concessões de garantias de juro ou diferenciais de taxa de juros78 Na verdade havia uma correspondência bastante estrita entre as exportações de capital inglês para o mundo e para a América do Sul e os investimentos estrangeiros no Brasil o que sugere a exogeneidade dos movimentos de capital estrangeiro para o Brasil mas não afasta a possibilidade de o Tesouro exercer algum controle sobre esses movimentos Essa correspondência pode ser observada na tabela 11 Os anos 18761880 coincidem com um período de desaceleração nas exportações de capital inglês mas antes de 1880 já havia sinais de recuperação O ano de 1883 correspondeu a um pico nos investimentos estrangeiros no Brasil e também correspondeu a um pico no investimento inglês na América do Sul Os anos 18861889 mostraram um acentuado crescimento das exportações de capital inglês no mundo inteiro sendo que os valores relativos à América do Sul nesses anos situavamse bem acima da média e no Brasil verificase em 1888 o maior valor registrado em todo o período Nos anos 18901894 ocorre uma violenta crise no balanço de pagamentos cuja origem se localiza inequivocamente na conta capital Nenhum abalo importante nos preços do café se verificou nesses anos79 o que demonstrava que apesar de a demanda por café estar associada ao andamento das principais economias centrais os ciclos de preço do café não se apresentavam sincronizados comos ciclos de movimento de capital Embora esses dois ciclos pudessem se sobrepor os anos 18901894 mostram movimentos claramente divergentes entre o movimento comercial e o movimento de capitais No período 18901894 a queda verificada nos investimentos estrangeiros no Brasil foi ainda mais abrupta que a verificada nas exportações de capital inglês para o mundo e para a América do Sul As oscilações nos movimentos de capital para o Brasil correspondiam às verificadas para a América do Sul e resto do mundo mas a intensidade das flutuações obedecia em determinados casos a fatores estritamente locais Nos 40 TABELA 11 Investimentos Ingleses no Exterior e Investimentos Estrangeiros no Brasil 18761897 Em milhões de libras No Mundo Na América do Sul No Brasild Imlaha Hobsonb Simonc Simonc Investimento Direto Empréstimos 1876 232 263 304 15 21 1877 131 137 194 06 23 1878 169 250 317 19 04 01 1879 355 270 205 11 00 1880 356 407 417 31 17 05 1881 657 600 742 62 17 01 1882 587 498 675 76 17 1883 488 455 612 138 68 40 1884 723 570 630 97 05 00 1885 623 559 553 71 09 01 1886 789 562 698 193 12 62 1887 877 658 844 189 27 27 1888 919 1012 1191 403 128 90 1889 809 1071 1229 402 50 67 1890 985 1013 1166 233 10 1891 694 512 576 94 04 1892 591 323 398 54 10 1893 530 252 321 54 01 38 1894 387 489 483 17 01 07 1895 400 576 777 41 05 60 1896 568 373 685 118 58 20 1897 416 367 784 49 09 47 Fontes e observações a A Imlah 1958 p 7275 b C K Hobson 1914 p 219 c M Simon 1967 p 5256 Os totais correspondem a investimentos de portfolio d Vejase tabela A4 no anexo a esta seção Notese que a série referente à América do Sul referese a investimentos ingleses de portfolio enquanto que os valores assinalados são investimentos diretos estrangeiros Daí se explicam os dois valores para o Brasil que são superiores aos verificados para a América do Sul anos 18901894 por exemplo dois fatores específicos atuaram no sentido de contrair violentamente as entradas de capital Por um lado a mudança de regime e a instabilidade política que se seguiram ao 15 de novembro de 1889 provocaram uma violenta queda das cotações dos títulos brasileiros em Londres e também criaram dúvidas sobre a estabilidade política dos anos seguintes e mesmo sobre a integridade do território nacional Por outro lado em 1890 uma crise financeira em Londres oriunda da suspensão de pagamentos da casa Baring teve efeitos decisivos sobre o investimento inglês na América do Sul e em particular na Argentina A falência da casa Baring deveuse a um acúmulo excessivo de títulos argentinos nas mãos desses banqueiros títulos esses que não foram honrados pela Argentina A insolvência argentina deu origem a uma séria crise financeira em Londres que teve como resultado criar um clima de desconfiança para com investimentos na Argentina que facilmente se estendeu face a algumas similaridades entre os dois países ao Brasil e à América do Sul em geral No período 18901894 não se registrou sequer uma nova companhia inglesa destinada a operar no Brasil e tampouco nenhuma das existentes lançou novas ações em Londres 41 As flutuações na taxa de câmbio verificadas neste período podem ser bastante bem explicadas com o auxílio da tabela 10 Vemos por exemplo que nos anos 18861889 quando o balanço de pagamentos foi fortemente superavitário a taxa de câmbio acusou uma apreciação gradativa de 17 1316 pence por mil réis em janeiro de 1886 e a taxa de paridade 27 pence por mil réis em outubro de 1888 e só caiu desse nível em dezembro de 1889 Nos anos seguintes em virtude do violento déficit no balanço de pagamentos a taxa de câmbio caiu de 24 78 pence por mil réis em janeiro de 1890 a 12 110 pence por mil réis em dezembro de 1891 tendo atingido 9 14 pence por mil réis em julho de 1894 Ao que parece os mesmos movimentos de capital que provocaram uma súbita apreciação do câmbio em 18861889 provocaram a mais importante crise cambial do século XIX80 Não pretendemos com isso sugerir que as contas comerciais foram irrelevantes na determinação da taxa de câmbio81 mas ressaltar a importância dos movimentos de capital na determinação da taxa de câmbio Não há dúvida de que o capital estrangeiro exerceu um papel fundamental para o equilíbrio dos pagamentos internacionais brasileiros e por conseguinte para o equilíbrio cambial Como a maioria dos países periféricos o Brasil teria o seu balanço de pagamentos auxiliado a longo prazo pelas grandes importações de capital posto à sua disposição pelos mercados financeiros da Europa industrial mas pagaria por essa dependência por meio de flutuações despropositadas na disponibilidade de tal capital e em seus termos de comércio durante o ciclo A instabilidade das taxas de câmbio dos países mais subdesenvolvidos encontra aqui uma de suas inúmeras explicações82 A análise do balanço de pagamentos é importante para a análise das reformas monetárias não só porque fornece uma explicação para as importantes flutuações cambiais ocorridas no período mas também porque o impacto monetário do resultado global do balanço de pagamentos constituía uma influência importante sobre a liquidez doméstica e conseqüentemente sobre o crescimento econômico Em sendo bastante variável o saldo global do balanço de pagamentos a liquidez doméstica ficava sujeita a flutuações que poderiam determinar inflexões indesejáveis no ritmo de crescimento econômico do País Mas essa possibilidade poderia ser contornada se o País fosse dotado de um sistema monetário que pudesse variar o estoque de ativos domésticos de modo a neutralizar do ponto de vista da liquidez doméstica as flutuações da oferta de ouro Mas esse não era o caso do Brasil do final dos anos oitenta O sistema monetário existente nos anos oitenta não possuía uma autoridade monetária depositária das reservas internacionais no sentido moderno O Tesouro detinha reservas cambiais em contas correntes com os Rothschild com o Banco do Brasil e com o Banco Internacional Além disso mantinha reservas na sua delegacia em Londres e na Caixa de Amortização Os bancos ingleses assim como os principais bancos nacionais mantinham contas correntes com correspondentes ou matrizes estrangeiros sendo que os bancos ingleses levavam sobre os outros a vantagem de receber os depósitos em libras das companhias inglesas operando no Brasil83 Assim sendo as reservas cambiais do País dispersavamse pelo sistema bancário sem que houvesse algum instituto especialmente mais bem provido enquanto detentor de reservas Os grandes superávits no balanço de pagamentos verificados nos anos 18861889 obviamente traduziramse em um significativo afluxo de reservas ouro prata letras cambiais e saldos sobre correspondentes no exterior ao sistema bancário 42 Tão logo a taxa de câmbio atingiu o seu valor de paridade cresceram as importações de espécies metálicas implicando uma modificação da composição das reservas internacionais do País em favor de ouro em espécie Em virtude da reconhecida instabilidade da taxa de câmbio os bancos por aversão ao risco evitaram monetizar as suas reservas isto é convertêlas em moeda circulante o que no caso de ouro significava leválo à Casa da Moeda para aí serem cunhadas moedas brasileiras pois dessa maneira o sistema bancário tornava uma parte de seu ativo imune à flutuações cambiais Todavia em vista dos limites estruturais a que os bancos estavam sujeitos para a expansão de seus empréstimos 84 e diante do fato de que o ativo do sistema bancário estava em grande medida comprometido com empréstimos a fazendeiros insolventes do Vale do Paraíba e com grandes carteiras de títulos da Dívida Pública difíceis de serem realizados e cotados abaixo do par os bancos começaram em certa altura a verse em dificuldades para absorver reservas e ao mesmo tempo expandir os seus empréstimos de modo a acompanhar o crescente nível de atividade Dessa maneira não podendo expandir suas exigibilidades os bancos viam esgotaremse as possibilidades de expansão de suas operações ativas sem debilitar em demasia a sua caixa de modo que o sistema bancário terminava por dificultar a transmissão à economia doméstica do impulso expansionista gerado pela excepcional situação das contas externas do País Essas dificuldades seriam facilmente contornadas se desaparecesse o limite que se impunha à expansão das exigibilidades do sistema bancário o que seria imediatamente alcançado com a obtenção pelos bancos da faculdade emissora Se permitidas as emissões bancárias deixavam de existir os problemas estruturais de expansão do crédito bancário vale dizer o multiplicador bancário perderia qualquer sentido enquanto teto à expansão da moeda bancária pois os bancos poderiam criar base monetária Em síntese há base para que se argumente que alguns anos bastante favoráveis de balanço de pagamentos fizessem surgir alguma pressão da parte dos bancos da capital no sentido de se obter a faculdade emissora em particular sobre base metálica Nesse sentido a emissão sobre base metálica aparecia como o expediente através do qual o rígido e arcaico sistema bancário do País se transformaria para não bloquear o choque externo favorável dos anos 18861889 e que também permitiria como adiante veremos que o nível de atividade doméstica se defendesse do choque desfavorável dos anos 18901894 Anexo à Seção 13 Metodologia para a Construção da Estimativa do Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 Este anexo destinase a esclarecer a metodologia utilizada para a construção dos dados da tabela 10 Não só existe um grande número de observações e qualificações referentes àqueles dados como também é conveniente reproduzir as séries anuais e os detalhamentos das várias contas do balanço de pagamentos Optamos por deslocar essa discussão metodológica para um anexo tão somente para não prejudicar a continuidade do texto principal a Balança Comercial A série anual utilizada e que é reproduzida na tabela A1 foi retirada do Anuário Estatístico do Brasil do IBGE edição de 193940 Os dados referemse até 1887 ao exercício fiscal que ia de julho do ano indicado a junho do ano seguinte No ano de 1887 fezse a mudança do ano fiscal de tal modo que os valores da tabela A1 referentes ao ano de 1887 incluem somente o segundo semestre do ano e os anos posteriores mostram valores registrados de janeiro a dezembro A consequência disso é que não poderíamos compatibilizar esses números com outros referentes ao ano de janeiro a dezembro sem cometer alguma arbitrariedade Optamos por utilizar como uma série anual da balança comercial os dados da tabela A1 exatamente como estão Não nos parece que para nossos propósitos essa opção signifique alterar a essência dos resultados A clara subestimação que existe com relação ao que consideramos o volume de comércio durante 1887 não parece ser problemática de vez que o saldo comercial resulta compatível com os dos outros anos TABELA A1 Balança Comercial do Brasil 18761897 Em milhares de libras Anos Exportações Importações Saldo Comercial FOB CIF 18761877 20573 16504 4069 18771878 19063 16728 2355 18781879 19508 15631 3877 18791880 19789 15454 4335 18801881 21249 16529 4720 18811882 19138 16621 2517 18821883 17378 16782 596 18831884 19393 18187 1306 18841885 19504 15381 4123 18851886 15110 15306 196 18861887 20502 16120 4382 1887 2º sem 11703 9960 2013 1888 21714 19724 1990 1889 28552 24002 4550 1890 26382 24019 2363 1891 27136 25565 1571 1892 30854 26302 4552 1893 32007 26215 5792 1894 30491 27145 3346 1895 32586 29212 3374 1896 28333 27880 453 1897 25883 22990 2893 Fonte IBGE Anuário Estatístico do Brasil 193940 p 13581359 próximos Para fins de cálculo de médias anuais para a tabela 9 calculamos em primeiro lugar a média semestral dos exercícios 18851886 18861887 1887 2o semestre 1888 e 1889 e em seguida multiplicamos por dois A tabela 9 portanto está a rigor isenta de subestimações no volume de comércio Existe no entanto uma outra dificuldade correta e minuciosamente apontada por L A Corrêa do Lago 85 com relação aos dados do Anuário Estatístico de 193940 Das importações e exportações reproduzidas no Anuário constam importações e exportações de moedas e barras de ouro e prata 86 que não deveriam constar dessas estatísticas Os movimentos de metal têm o caráter de movimentos de capital compensatório resultantes do saldo global do balanço de pagamentos e não devem ser classificados como importações e exportações de mercadorias Não dispomos contudo dos dados referentes aos movimentos de metal amoedado 87 o que não apenas dificulta uma apreciação exata do comércio de mercadorias como também impede a construção de um demonstrativo de resultado para o saldo global do balanço de pagamentos Temos no entanto alguns dados que fornecem uma idéia aproximada das magnitudes envolvidas mas que não bastam para representar o movimento total de metal amoedado A tabela A2 fornece o movimento de moedas metálicas e barras de ouro e prata entre Brasil e Inglaterra Os movimentos anuais sugerem que podem existir em alguns anos consideráveis alterações na série da tabela A1 Mas nada se pode afirmar com segurança acerca do total do movimento de metais sem examinarmos as estatísticas de outros países Em 1888 por exemplo somente pelo porto do Rio de Janeiro registrouse a importação de cerca de 1483 mil em soberanos vindos quase que totalmente do Rio da Prata 88 TABELA A2 Movimentos de Metal Amoedado entre Brasil e Inglaterra 18821896 Em milhares de libras Anos Saídas Entradas Saldos 1882 462 156 306 1883 174 277 102 1884 153 437 285 1885 497 192 305 1886 582 288 294 1887 143 213 70 1888 95 528 433 1889 88 3411 3324 1890 2545 1205 1340 1891 3364 1535 1828 1892 624 556 68 1893 650 397 253 1894 274 377 104 1895 259 1930 1671 1896 243 548 304 Fonte GrãBretanha Statistical Abstract of the United Kingdom 18821896 p 134140 O trabalho de separar os movimentos de metal do movimento comercial é muito importante para se ter a correta noção do comércio de mercadorias e também como discutiremos adiante para a construção do demonstrativo de resultado portanto para a análise do impacto monetário dos saldos globais do balanço de pagamentos Mas infelizmente não dispomos dos dados necessários o que nos força a utilizar a série da tabela A1 exatamente como está b Contas de Serviços A grande dificuldade relativa às contas de serviço diz respeito às despesas de seguro e frete para as quais não existem registros Para estimálas multiplicamos ano a ano a tonelagem total dos oito principais produtos de exportação do País café açúcar fumo cacau ervamate borracha algodão e couros8 9 pelos preços dos fretamentos ingleses9 0 a cujo total adicionamos um valor correspondente a 5 do valor total das exportações a título de seguros e comissões Com isso estamos implicitamente considerando como insignificante a tonelagem das exportações transportada por navios brasileiros9 1 O resultado de nossas estimativas consta da tabela A3 adiante Outra dificuldade diz respeito à contabilização das despesas do governo no exterior A praxe era tomar a despesa feita no exterior em mil réis convertidos ao câmbio do dia e dividila em duas partes o valor em mil réis da despesa em libras convertidos à taxa de paridade e o valor que faltava para completar o total efetivamente gasto em mil réis Esse segundo valor era lançado na conta de diferenças de câmbio e o primeiro aparecia discriminado nas contas de cada Ministério Todo o problema é que não se pode identificar a que despesas correspondem as diferenças de câmbio embora a maior parte delas corresponda a despesas da conta de serviços Uma imprecisão clara resulta de que existem diferenças de câmbio no pagamento de amortizações relativas à dívida externa e assim sendo as diferenças de câmbio que utilizamos incluem uma parcela que não pertence à conta de serviços9 2 Os balanços de receita e despesa do governo por outro lado sempre discriminam as despesas do governo entre despesas com pessoal e com material Para efeitos de nossa conta de serviços somente levamos em conta as despesas governamentais com pessoal além das garantias de juros e juros de títulos da Dívida Pública pagos em ouro As despesas do governo com material correspondem a importações que presumivelmente já estão contabilizadas nas contas comerciais A discriminação das contas de serviços é apresentada na tabela A3 c Conta Capital Uma dificuldade com a conta capital é que apesar de contarmos com registros minuciosos dos empréstimos governamentais e respectivas amortizações o mesmo não se passa com os empréstimos provinciais municipais e principalmente privados Para esses conseguimos levantar um bom número de operações mas não contamos com os valores anuais relativos às amortizações e aos serviços desses empréstimos A série de investimento direto estrangeiro por outro lado apresenta também alguns problemas Em primeiro lugar convém notar que a série utilizada representa em geral o valor de lançamento do capital de empresas estrangeiras destinadas a operar no Brasil Não se pode afirmar com os dados que dispomos se os valores lançados TABELA A3 Contas de Serviço do Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 Em milhares de libras Anos Fretes Seguros Serviços da Divida Externa Garantias de Juro MP Garantias de Juro MTA Juros Remessas de Lucro Subisídio à Capitalização Outros Receita de Cambio Diferenças de Cambio Total 1876 2757 939c 4404 4404 1877 2687 894 107 191 194a 126 70 28 133 d 57 151 150 158c 4186 4186 1878 2947 95 18 19 87 88 89 40 63 170 217 259 c 4025 4025 1879 2867 796 30 110 115 88 63 20 58 10 177 123 199c 4025 4025 1880 2687 739 18 75 210 87 52 70 88 204 186 243 4448 4448 1881 2682 868 8 276 134 133 71 27 86 20 434 460 483c 4448 4448 1882 2779 583 0 154 331 335 52 81 244 283 186c 4244 4244 1883 2781 638 0 134 437b 608b 60 63 561 587 570c 4204 4204 1884 2833 712 0 526 378 88 554 565 561 4209 4209 1885 2163 594 0 526 765 53 786 750 698 4093 4093 1886 2551 884 0 70b 166 50b 217 209 201c 4079 4079 1887 2597 970 39 990 43 1084 1070 1004c 4065 4065 1888 2591 838 41 1190c 267 242 508 472 415c 4027 4027 1889 2909 1339 42 1331 70 0 1401 1379 1253c 3987 3987 1890 2593 1170 0 1909 27 1936 1881 1800c 3981 3981 1891 2968 1319 46 2171 43 2214 2237 2188c 3973 3973 1892 2959 1309 0 886 256 1142 1214 1388c 3965 3965 1893 2619 1369 12 175 61 236 221 221 3958 3958 1894 2984 1434 12 404 451 759 4 380 1594 1528 1386c 3942 3942 1895 2889 1485 22 645 526 231 498 1381 1345 1344c 3924 3924 1896 2784 1448 24 375 20 306 398 680 666 656c 3908 3908 1897 2842 1423 22 406 48 197 298 543 521 523c 3901 3901 Dados originais Dobração C Estimado a partir da taxa média do ano de 1871 16 Fontes e Observações 1 Estimado a partir da tonelagem das exportações IBGE Anuário Estatístico do Brasil 193940 p 1375 1376 Dados originais retirados de V Bouças 1955 2 Retirado de V Bounas 1950 e V Bouças 1955 3 Estão garantias de juros ao 2 sob responsabilidade das províncias da Bahia Pernambuco e São Paulo Retirados de RMF vários números e RCJC vários números 4 São amortizações relativas aos empréstimos contraidos 5 Pagamentos em ouro a residentes no exterior e nãoresidentes no exterior de juros e correspondentes a títulos dos emprestimos feitos ao Brasil Retirados de RMF vários números e de RCJC vários números 6 Juros pagos aos residentes no exterior 7 São remessas em ouro feitas por estrangeiros principalmente investidores imobiliários e por viajantes Retirados de RMF vários números 8 Calculados como 5 do valor total das exportações nacionais de produtos agrícolas e industriais apresentados para os Ministérios os dados com matéria I Previdência 1980 item 13 página 8 para 18711890 e informaçoes dos anebo I da Receita de Despesa 9 Importações de origem naval pressupostos pessoais variados indicados em O Desenvolvimento do Brasil Balanço de Receita e Despesa vários números 10 Retirados de Brasil Balanço de Receita e Despesa vários números constituíram entradas efetivas de capital no País e também não se pode saber ao certo se as entradas no País se verificaram no mesmo ano do lançamento das companhias E ainda outro problema é que nem sempre a série se refere ao capital efetivamente subscrito sendo que às vezes referese ao capital autorizado ou mesmo realizado Por último notese que os aumentos de capital dessas empresas nem sempre significam entradas de capital no Brasil pois podem ser subscritos no próprio país Feitas essas observações seguemse os valores relativos à conta capital no período 18761897 TABELA A4 Contas de Capital do Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 Em milhares de libras Anos Empréstimos Investimento Amortizações Total Governo Federal 1 Estados Municípios 2 Privados 3 Total Direto 4 5 1876 2102 535 1567 1877 2361 572 1789 1878 100 100 409 774 265 1879 35 35 595 560 1880 471 471 1709 688 1492 1881 127 127 1671 868 920 1882 1712 566 1146 1883 4000 35 4035 6777 617 10195 1884 42 42 451 592 99 1885 70 70 878 704 244 1886 6000 250 6250 1209 602 6857 1887 2674 2674 2679 680 4673 1888 6000 1957 1034 8991 12752 602 21141 1889 19837 1742 2662 24241 5002 18054 11189 1890 972 699 273 1891 429 390 39 1892 1073 393 1466 1893 3710a 100 3810 130 404 3536 1894 700 700 53 392 363 1895 6000 6000 489 445 6044 1896 1000 1000 2000 5839 564 7275 1897 2000 2600 150 4750 890 386 5254 a Empréstimos feitos originalmente pela Estrada de Ferro Oeste de Minas mas o governo federal utilizouse do empréstimo repassando à empresa o correspondente em mil réis Fontes e Observações 1 Retirado de V Bouças 1955 e J Cavalcanti 1923 2 Retirado de V Bouças 1950 3 Inclui obrigações de empresas estrangeiras retirados de A C Castro 1979 e outros empréstimos privados em libras francos e marcos convertidos à taxa de câmbio média do ano registrados nos RCJC vários números e RMF vários números 4 Retirado da tabela matriz da A C Castro 1979 RCJC vários números e O Onody 1971 5 Retirado de V Bouças 1950 Os dados reproduzidos mostram a variação do estoque total da dívida externa 48 d Observações Gerais Além de todas as dificuldades que já observamos relativas às diversas contas que compõem a nossa estimativa para o balanço de pagamentos há de se mencionar que algumas contas foram totalmente omitidas em virtude de não contarmos com nenhuma informação que nos permitisse estimálas As principais omissões são as contas referentes a remessas de imigrantes a gastos de viajantes à dívida externa do Paraguai e Uruguai para com o Brasil aos serviços dos empréstimos externos privados e aos fretes de navios estrangeiros empregados em cabotagem Dessas entretanto somente a primeira e a última parecem ser importantes Embora se suponha que a conta de transferências seja fortemente deficitária em função das remessas dos imigrantes entrados nos anos oitenta devese atentar para o fato de que muitos dos imigrantes traziam economias Poderseja estimar as remessas com base na população de imigrantes e as entradas de economias com base no número de famílias Mas tais cálculos seriam suficientemente arbitrários por serem imprecisos Quanto à cabotagem feita por navios estrangeiros embora possamos contar com os dados referentes à tonelagem nacional e estrangeira no Porto do Rio de Janeiro não existem estimativas sobre os fretes Apenas para demonstrar a importância da participação estrangeira na navegação de cabotagem notese que em 1888 o movimento93 de navios empregados em cabotagem foi de 2525 navios 749 dos quais estrangeiros e da tonelagem total de 1199 mil toneladas 623 mil toneladas ou seja cerca de 52 eram transportadas por navios estrangeiros94 Quanto aos gastos de viajantes uma estimativa da década de sessenta95 supunha 480 viajantes brasileiros no exterior por ano e para cada um arbitrava o gasto de 5 contos de réis O total anual estaria em torno de 250 mil libras anuais o que certamente teria aumentado nos anos a que se refere a tabela 9 A dívida externa das Repúblicas do Uruguai e do Paraguai junto ao Brasil atingia 6804 contos em 189096 o que permite supor que o serviço de tal dívida para o qual não temos informações não era um montante significativo Quanto aos juros e amortizações relativos a empréstimos privados tomados no exterior que ao contrário não eram desprezíveis não temos informações que autorizem estimálos e Resultados Por último resta discutir as dificuldades envolvidas na construção de um demonstrativo do resultado global do balanço de pagamentos A dificuldade insuperável é a ausência de informação acerca de certas contas de caráter compensatório Entre essas incluemse a importação líquida de metais cujos dados para o balanço de pagamentos bilateral Brasil Inglaterra se encontram na tabela A2 e as variações dos saldos no exterior dos diversos bancos brasileiros e do Tesouro junto a seus agentes no exterior Os saldos bancários provavelmente correspondiam à maior parte das reservas do País mas os valores das reservas do Tesouro não eram insignificantes como mostra a tabela A5 Os dados de que dispomos são portanto insuficientes para que se possa construir um demonstrativo de resultado Mesmo assim o que os dados nos sugerem acerca dos movimentos compensatórios é compatível embora em volume bem mais reduzido com nossas estimativas do saldo global do balanço de pagamentos 49 TABELA A5 Saldos do Tesouro Nacional na sua Delegacia de Londres 18761897 Em milhares de libras Anos Saldos Anos Saldos Anos Saldos 1876 661 1884 575 1892 279 1877 707 1885 299 1893 182 1878 513 1886 nd 1894 271 1879 593 1887 43 1895 102 1880 nd 1888 3184 1896 188 1881 743 1889 2612 1890 1752 1897 31 1882 501 1891 nd 1883 nd Fonte Brasil Balanço de Receita e Despesa vários números A série anual de nossas estimativas para o balanço de pagamentos do Brasil é apresentada na tabela A6 TABELA A6 Estimativa Preliminar para o Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 Em milhares de libras Anos Exportaçõesᵃ Importaçõesᵃ Balança Comercialᵃ Saldo de Serviçosᵇ Transações Correntes Conta Capitalᶜ Saldo Global 1876 20573 16504 4069 4404 335 1567 1232 1877 19063 16728 2335 4186 1847 1789 58 1878 19508 15631 3877 4245 368 265 633 1879 19789 15454 4335 4002 333 560 227 1880 21249 16529 4720 4048 672 1492 2164 1881 19138 16621 2517 4244 1727 920 807 1882 17378 16782 596 4283 3687 1146 2541 1883 19493 18187 1306 4609 3303 10195 6892 1884 19504 15381 4123 4665 542 99 641 1885 15110 15306 196 4079 4275 244 4031 1886 20502 16120 4382 5028 646 6857 6211 1887 11703 9690 2013 4521 2508 4673 2165 1888 21714 19724 1990 5247 3257 21141 17884 1889 28552 24002 4550 5276 726 11189 10463 1890 26382 24019 2363 6816 3753 273 3480 1891 27136 25565 1571 7610 6039 39 6000 1892 30854 26302 4552 6755 2203 1466 3669 1893 32007 26215 5792 7601 1809 3536 1727 1894 30491 27145 3346 7335 3989 363 3626 1895 32586 29212 3374 7121 3747 6044 2297 1896 28333 27880 453 7731 7278 7275 3 1897 25883 22990 2893 8170 5277 5254 23 ᵃOs dados de 1876 a 1886 referemse ao ano fiscal os de 1887 referemse somente ao segundo semestre e a partir de 1888 os dados são relativos ao ano que vai de janeiro a dezembro ᵇAlguns dados de acordo com o ano fiscal outros não Vejase tabela A3 ᶜDados correspondentes ao ano de janeiro a dezembro Fonte Tabelas A1 A3 e A4 50 A Reforma Imperial A economia brasileira vinha atravessando uma fase de relativa estagnação até meados dos anos oitenta quando esta tendência começou a inverterse Pelo que nos sugerem os dados da tabela 12 na altura de 18841886 a economia brasileira teria transposto um período de estagnação com preços crescentes para um de expansão a preços declinantes A reversão da tendência na direção do crescimento parecia como veremos a seguir induzida pelo aspecto favorável das contas externas98 mas viuse de início constrangida pelo agravamento dos problemas relativos ao caráter sazonal e instável da procura por crédito e aos dremos periódicos na caixa dos bancos Essas seriam as circunstâncias como o relato a seguir procurará demonstrar que originariam as primeiras tentativas importantes de se modificarem as instituições monetárias TABELA 12 Nível de Atividade e Preços 18801888 1880100 Preços Nível de atividade Anos E Loboᵃ M Buescuᵇ ContadorHaddadc 1880 1000 1000 1000 1881 1023 1011 967 1882 1086 1042 870 1883 1076 1045 844 1884 1039 1032 830 1885 1112 990 891 1886 1001 968 1024 1887 1009 962 1134 1888 991 nd 1174 Fontes ᵃE Lobo et alii 1971 p 261 ᵇM Buescu 1973 p 220 ᶜC Contador 1974 p 193 21 A crise de 1887 e o projeto original Em seu relatório de 1884 o Ministro da Fazenda Lafayette Rodrigues Pereira afirmava que desde fins de 1883 o movimento das transações vinha sendo embaraçado pela falta de meio circulante atribuída principalmente à migração de dinheiro para 51 algumas praças do Norte exigida pelas magníficas safras ali colhidas99 Nessa ocasião a crise de liquidez não chegou a atingir proporções críticas mas despertou alarme a ponto de que se propusesse a restauração da lei de 1875 que permitia ao Tesouro o recurso a emissões temporárias 100 A proposta do Ministro Lafayette perdeu sua força tão logo cessaram as dificuldades do Rio de Janeiro Mas no ano seguinte era revivida com ainda mais ênfase pelo novo Ministro da Fazenda e também membro do Partido Liberal Conselheiro José Antônio Saraiva Falando ao Parlamento em maio de 1885 lembrou Saraiva que se aproximava o último mês do semestre que era a ocasião das liquidações dos pagamentos quando os devedores previdentes preparam fundos para saldar suas contas no interior e remeter para as províncias do Norte elevadas somas e por isso darseía forçosamente a escassez de meio circulante e a crise monetária a que se havia assistido nos últimos semestres poderia pois repetirse 101 Os temores de Saraiva não se haviam confirmado em julho quando a idéia da restauração da lei de 1875 foi ter ao Senado Ali ouviu queixas de que o papelmoeda era já superabundante102 mas defendeuse com o argumento de que a medida proposta não era para aumentar o meio circulante e sim para conjurar uma crise103 A Comissão de Orçamento do Senado opinou pela aprovação do projeto de Saraiva lembrando que se a emissão ficasse limitada ao suprimento da penúria de numerário na praça do Rio de Janeiro e só durante o tempo correspondente á retração do capital monetário nenhuma perturbação poderia trazer aos valores existentes e nem mesmo ao câmbio104 É a idéia de Saraiva transformouse em lei a 18 de julho de 1885 A lei de apenas dois artigos autorizava o governo a emitir até 25 mil contos aplicáveis a auxiliar os bancos de depósitos da Corte105 As emissões como na lei de 1875 seriam utilizadas para fins de empréstimos aos bancos sob garantia de títulos da Dívida Pública e cujos juros seriam destinados ao recolhimento do papelmoeda do Tesouro 106 que como se acreditava era superabundante Logo que a nova lei foi aprovada o Banco do Brasil que não estava em boa situação começou a apelar repetidamente para que a medida fosse aplicada a seu favor107 No espaço de tempo entre 30 de dezembro de 1885 e 17 de fevereiro de 1886 o banco obteve cerca de 11 mil contos nos termos da nova lei o que pareceu solucionar as suas dificuldades109 E isso sem dúvida contribuiu de forma importante para o alívio do mercado monetário Em 1886 os evidentes sintomas do renascimento da confiança109 desde o início do ano indicavam que a conjuntura depressiva parecia inverterse Segundo o Jornal do Commercio a causa mais visível e imediata do melhoramento que observamos no ano de 1886 foi sem dúvida o maior valor de nosso quase exclusivo produto o café110 Os preços do café subiram de 3915 em janeiro gradativamente até 5545 em dezembro chegando a atingir 9940 em junho de 1887111 Durante quase todo o ano de 1886 o mercado monetário esteve muito folgado112 mas já nos últimos meses de 1886 sentiase certo malestar proveniente da dificuldade de obter empréstimos e adiantamentos escasseando o numerário Parecia porém que tal estado era apenas a repetição da crise periódica que se observa nos fins de semestre113 As dificuldades se tornariam ainda mais sérias nos primeiros meses de 1887 atingindo o seu ápice em junho quando a taxa de desconto para as 52 melhores firmas subiu nos bancos aos extremos de 10 e 12114 De acordo com o Jornal do Commercio a demora no retorno das quantias enviadas para as províncias a urgência de remessas para os mercados de café a realização de entradas que dos seus acionistas pediram algumas instituições bancárias aumentavam o número dos que solicitavam descontos desfalcaram os depósitos e enfraqueciam a caixa dos bancos115 Além disso a crise de liquidez se via agravada por um estado de medo ou pelo menos de incerteza inteiramente desfavorável ao comércio em geral e máxime a operações de crédito116 criado pelos rumores de insurreição de escravos e relativos ao precário estado de saúde do Imperador O Banco do Brasil novamente solicitou empréstimo ao Tesouro de acordo com a lei de 1885 e o total obtido entre 10 de janeiro e 30 de junho atingiu 8 mil contos117 Dessa vez no entanto não houve melhoria na situação do banco Até novembro de 1887 o banco nada pudera ressarcir desses empréstimos E em reunião do Conselho Diretor de 28 de novembro reconheciase que o estado da caixa do Banco e o aspecto geral dos negócios não só obstavam ao pagamento como tornavam indispensável o aumento deste débito estando o crédito do banco ameaçado de padecer cruéis provações118 A crise de liquidez no primeiro semestre de 1887 a despeito do bom estado dos negócios cafeíros fora bastante violenta mas diluíase gradualmente no segundo semestre pelo efeito dos auxílios ao Banco do Brasil e também a outros bancos e pelo efeito do refluxo natural do dinheiro aos bancos A crise no entanto fez parecer pouco oportuna a política monetária do então Ministro da Fazenda Francisco Belizário119 que se empenhava firmemente em reduzir o meio circulante que considerava superabundante Belizário entendia que estando a taxa de câmbio abaixo de seu valor de paridade havia excesso de papelmoeda em circulação e nessas condições segundo dizia o câmbio não pode firmarse pois faltamlhe para o corretivo natural a importação e exportação de metal e achase sujeito unicamente à lei do oferecimento e procura de cambiais às correntes de confiança e desconfiança e pois em constantes flutuações A causa de todas as perturbações está no excesso de papelmoeda120 Belizário tomou medidas efetivas no sentido de conseguir o equilíbrio orçamentário e estabeleceu que recolheria anualmente valores em papelmoeda próximos de 5 mil contos Em junho de 1887 no fim do exercício comentava em seu relatório que retirara de circulação os 5 mil contos prometidos mas que não os havia incinerado porque precisava emprestar ao Banco do Brasil nos termos da lei de 1885 Como notou seu sucessor João Alfredo que assumiu a pasta da Fazenda em fins de 1887 as necessidades do comércio foram destarte invalidando os esforços que empregava o governo para retirar a emissão121 Para ele o simples resgate das notas se influi beneficamente no valor do dinheiro nacional constrange o comércio e as indústrias e esse mal pode agravarse com a transformação do sistema de trabalho e o crescimento que vai tendo a colonização122 De fato uma política de equilíbrio orçamentário e recolhimento do papelmoeda não contribuía para que se aliviasse o mercado monetário da instabilidade originada pelas transformações que vinham se intensificando no campo Belizário ao mesmo 53 tempo que recolhia papelmoeda viase forçado a injetálo novamente em circulação atuando portanto em flagrante contradição com seus próprios objetivos Durante a crise de 1887 assim como a política monetária de Belizário perdeu credibilidade a lei de 1885 Mesmo alguns de seus defensores como o exMinistro Lafayette já se mostravam céticos quanto às possibilidades da lei em fazer frente às pressões que incidiam sobre o mercado monetário da capital Este ceticismo que atingiu um máximo quando a crise se tornava mais aguda juntamente com a tentativa de buscar soluções mais efetivas e prontas para a crise deu origem ao primeiro grande projeto de reforma monetária123 que foi apresentado no Senado na sessão de 17 de junho de 1887 Seus proponentes eram o próprio exMinistro Lafayette e os Senadores Affonso Celso depois Visconde de Ouro Preto e Jerônimo José Teixeira Jr depois Visconde de Cruzeiro124 O principal autor do projeto o Senador Teixeira Jr assim se exprimia É deplorável a pressão que há cerca de seis meses sofre o comércio da capital do Império o que entre outras coisas se atribui à escassez do meio circulante É inútil demonstrar que este mal conquanto se julgue transitório é altamente prejudicial à riqueza pública porque embarça o desenvolvimento de todas as indústrias e impossibilita a ação benéfica da elasticidade do crédito 125 E em vista disso motivados quase que exclusivamente pela crise de 1887126 os autores do projeto propunham uma profunda reorganização no sistema bancário que teria como molde a experiência norteamericana dos bancos nacionais127 O projeto autorizava a criação dos bancos emissores visando estabelecer um sistema bancário fundado no chamado princípio da liberdade bancária O projeto não estabelecia restrição alguma quanto ao número ou o tamanho dos bancos emissores mas determinava que a emissão de cada instituição não poderia ultrapassar 18 mil contos128 A idéia consistia em estabelecer um sistema bancário competitivo composto de um grande número de bancos sem que houvesse nenhuma forma de privilégio a nenhuma instituição A superioridade desse tipo de organização bancária cujo fundamento advinha de considerações doutrinárias acerca dos benefícios da competição e do laissezfaire era comumente referida na época como a doutrina da liberdade bancária129 O lastro sobre o qual se faria a emissão seria constituído por títulos da Dívida Pública os quais deveriam ser depositados na Caixa de Amortização130 As emissões não poderiam ultrapassar o valor correspondente a 90 do valor de mercado das apólices depositadas e os bancos se obrigavam a manter em caixa em papelmoeda um montante de no mínimo 20 do valor total de sua emissão131 As notas bancárias emitidas deveriam ser livremente conversíveis em papelmoeda do Tesouro ao portador e à vista e teriam recebimento garantido por lei em quaisquer repartições públicas sendo inclusive os bancos obrigados a receber as notas uns dos outros O Tesouro emitiria apólices especiais de 4 12 especialmente para servirem como lastro O produto da venda desses títulos aos bancos seria utilizado para o resgate de títulos de 5 em circulação132 Parte da economia obtida no pagamento de juros sobre as apólices juntamente com um imposto de 2 que era proposto sobre os dividendos dos bancos emissores seria destinada ao resgate do papelmoeda do Tesouro O projeto previa simultaneamente o recolhimento do papelmoeda do Tesouro e a emissão bancária de modo que o resultado líquido desses dois movimentos deter 54 minaria a variação final sobre o papelmoeda em circulação O projeto estabelecia uma emissão bancária total de 180 mil contos e o saldo de notas do Tesouro a ser recolhido montava a 1843 mil contos de modo que o efeito final sobre a base monetária não era muito significativo Assim sendo o projeto não se apresentava como deflacionista no que se referia a seu efeito final e menos ainda segundo se acreditava no tocante a seus efeitos de curto prazo Quanto aos possíveis efeitos de curto prazo da implantação do novo projeto é interessante notar que para a maioria dos contemporâneos um sistema governado pela liberdade bancária de certo modo se autoregulava o que poderia ser expresso pelo preceito de que o montante de notas em circulação era adequadamente controlado pelo processo ordinário de competição bancária e se a exigência de conversibilidade fosse mantida não poderia exceder às necessidades dos negócios por qualquer período apreciável de tempo se práticas bancárias incorretas levassem ocasionalmente à excessiva concessão de crédito isso traria seus próprios corretivos133 Esse preceito da Banking School inglesa se aplicava estritamente a um sistema onde estivesse em vigor a conversibilidade metálica134 e o sistema proposto pelo projeto era caracteristicamente de moeda inconversível Assim sendo acreditavase que a emissão prevista no projeto sem o freio da conversibilidade cresceria rapidamente em resposta às dificuldades então vigentes na praça do Rio de Janeiro enquanto que o resgate das notas do Tesouro se faria lentamente A possibilidade dessa expansão monetária ainda que temporária naturalmente não poderia estar em sintonia com as idéias conservadoras do Parlamento135 Mas antes que se manifestasse qualquer divergência acerca do projeto ele foi remetido às Comissões da Fazenda e de Legislação do Senado para que sobre ele se manifestassem Em parecer conjunto as comissões fizeramlhe variadas objeções alegando que o projeto ensejaria o aumento da circulação inconversível e que assim segundo o parecer continuarão os maus efeitos de nossa perniciosa circulação desde que a nova emissão bancária não tem por garantia moeda metálica e seus bilhetes têm de ser convertidos em moeda corrente do Império que é papel136 As comissões propuseram em vista disso que o produto da venda das apólices de 4 12 não fosse utilizado no resgate de títulos de 5 e sim no recolhimento e incineração do papelmoeda do Tesouro As comissões acreditavam que dessa maneira a cada mil réis emitido em notas bancárias corresponderia um mil réis incinerado de notas do Tesouro e assim seriam eliminados os riscos de emissão em demasia durante a fase de implantação do novo sistema e que poderiam agravar a depreciação já existente do meio circulante enquanto seu resgate progressivo não corrigir a superabundância que se lbe atribui137 Por outro lado as comissões também propunham que os bilhetes dos bancos não pudessem ser aceitos para pagamentos de direitos de importação e juros da Dívida Pública Essa idéia implicava em uma limitação ao curso dos bilhetes que poderia inibir em certa medida as emissões Mas tinha conseqüências de mais largo alcance pois à medida que fosse desaparecendo o papelmoeda do Tesouro esses pagamentos seriam progressivamente transformados em pagamentos em ouro a única moeda que seria aceita para esses fins Com isso cerca de 50 da receita tributária da União os direitos de importação seria recebida em ouro e cerca de 20 da despesa o serviço da 55 Dívida Pública seria paga em ouro do que resultaria um saldo positivo em ouro para o Tesouro138 O projeto parecia vantajoso ao Tesouro do ponto de vista de seu orçamento O novo sistema criaria um amplo mercado para novos títulos da Dívida Pública e poderia permitir a redução da oferta monetária sem impor restrições à execução orçamentária do Tesouro O aspecto desinteressante do projeto na visão do Tesouro era justamente a possibilidade de expansão monetária ou emissões em excesso durante a fase de implantação do novo sistema A sugestão das comissões bloquearia essa possibilidade mas isto não seria aceito pelos proponentes do projeto que tinham em vista especificamente a crise vigente no mercado monetário A essência da oposição ao projeto como veremos na seção seguinte era uma diferença de percepção acerca da condução da política monetária e da caracterização das emissões em demasia Para a corrente metalistabulionista só há um critério segundo Belizário para julgarse da abundância ou da escassez permanente do meio circulante inconversível é a sua apreciação ou depreciação Só há um meio para a elevação do seu valor é a sua diminuição139 Em oposição a essa visão existia um grupo heterogêneo de parlamentares jornalistas e homens de negócios que sustentavam que as emissões deviam acompanhar estritamente as variáveis e flutuantes necessidades dos negócios e que portanto o meio circulante devia ser dotado do requisito da elasticidade Essa corrente em um momento anterior tivera em Mauá o seu grande expoente140 mas ao final dos anos oitenta era antes considerada uma expressão dos interesses do comércio do que uma posição legitimada pela autoridade de uma doutrina Essa corrente atribuía as freqüentes crises de liquidez e as altas taxas de juros à escassez de moeda Segundo o Jornal do Commercio pretendem alguns que não há excesso que o papelmoeda não é mau não pela quantidade mas pela qualidade Dizer que o papelmoeda é mau porque é muito abundante ou porque é muito fraco é sempre dizer a mesma coisa a saber que ele não corresponde às necessidades do momento O papelmoeda é mau porque lhe falta o requisito essencial de qualquer meio circulante isto é a elasticidade141 O Brasil possuía de acordo com essa corrente um péssimo meio circulante142 pois freqüentemente desaparecia das praças de comércio ocasionando crises de liquidez A corrente metalista contestava qualquer indicação de que havia escassez de moeda De acordo com Belizário143 concluirse que todas as crises provêm da falta de numerário ou que a abundância deste possa prevenir todas as crises vai uma grande distância será preciso confundir a moeda com o capital supondo que aumentando aquela este ficará barato abundante e ao alcance de todos144 As duas correntes discordavam frontalmente quanto ao indicador mais apropriado para a política monetária Belizário e seus adeptos batiamse pela conversibilidade e afirmavam ser a diferença entre a taxa de câmbio de mercado e a de paridade ou o ágio do ouro o melhor guia para a política monetária Os antimetalistas tinham como meta a elasticidade do meio circulante ou seja a constante correspondência entre a oferta de moeda e as necessidades dos negócios o que poderia ser atestado pelo estado da taxa de juros A corrente metalistabulionista como vimos na seção 12 encontrava sua principal sustentação na conveniência da meta da estabilidade cambial que seria o subproduto da conversibilidade À corrente oposta evidentemente também era conveniente a 56 meta da estabilidade cambial e por isso também era pela circulação metálica De acordo com o Jornal do Commercio Por nossa parte preferíamos que o nosso péssimo meio circulante desaparecesse para sempre estabelecendose a circulação bancária solidamente firmada na base metálica145 Mas a circulação metálica não necessariamente solucionava o problema da inelasticidade do meio circulante o que para os antimetalistas seria minorado ao se fomentar a criação de bancos de depósito e descontos nas províncias e animar uma espécie de consórcio entre esses bancos e os da nossa praça146 Em vista disso parecia que o comércio entendia que a raiz do problema dos drenos temporários de liquidez da praça do Rio de Janeiro advinha da pouca penetração do sistema bancário no interior Assim sendo os antimetalistas desse período até o aparecimento de Rui Barbosa logo à frente não eram defensores da moeda fiduciária e por isso não se constituíam em adversários frontais e aguerridos da ortodoxia metalista Isso se devia por um lado ao fato de que a estabilidade cambial que adviria da conversibilidade era do interesse de todos E por outro lado ainda não se havia apresentado um problema de gravidade suficiente para polarizar ou radicalizar as posições Com a evolução da conjuntura a partir de 1888 tal problema surgiria e tornaria as duas visões inconciliáveis como veremos adiante Somente em 1888 teria lugar um embate frontal entre as duas correntes em torno da discussão do projeto de vez que este permaneceria cerca de um ano sem entrar em discussão talvez em conseqüência de estar inicialmente órfão de apoio governamental147 E quando a discussão da matéria se iniciou em junho de 1888 a Abolição tinha sido decretada a imigração crescera enormemente e o País começava a acumular reservas metálicas Essa mudança de conjuntura que será explorada na seção seguinte daria urgência para a questão monetária e novo caráter às divergências entre metalistas e antimetalistas 22 A expansão de 1888 e a reforma A situação do mercado monetário melhorou sensivelmente no segundo semestre de 1887 em conseqüência segundo o Jornal do Commercio de terse tornado menos ativo o movimento de mercados de importação e exportação148 O mercado de café em particular ficou paradisado149 nos meses que se seguiram à notícia chegada em meados de junho de uma grande e repentina baixa150 nas bolsas de café de Nova Iorque e Havre As vendas no Porto do Rio de Janeiro caíram de 3319 mil sacas em maio para 893 mil sacas em junho e 196 mil sacas em julho151 e os preços no Porto do Rio de Janeiro iniciaram uma tendência decrescente que os levou de 9465 em junho de 1887 a 4905 em março de 1888152 tendo permanecido em torno desse valor durante todo o ano de 1888 O ano de 1888 foi de notável prosperidade para a economia da Corte O andamento dos negócios foi de tal ordem que segundo afirmou o Jornal do Commercio o comércio não conservou senão gratas recordações do ano de 1888153 O dinheiro foi abundante e fácil154 durante quase todo o ano e essa abundância e conseqüente facilidade provinham da existência nessa praça de grandes somas ordinariamente enviadas para as províncias não só para mover as respectivas safras mas também para o jogo 57 do câmbio As safras das províncias em geral ou pela diminuição da quantidade ou pela redução dos preços puderam ser movidas quase exclusivamente com o numerário próprio155 Diversos fatores contribuíram para que não se manifestassem pressões sérias sobre o mercado monetário da capital Os embarques de café em Santos por exemplo diminuíram em cerca de 25156 e estando os preços baixos as remessas para aquele porto destinadas a adquirir cambiais foram reduzidas As entradas de açúcar dos Estados do Norte no Rio de Janeiro caíram de 212386 sacas em 1887 para 171109 sacas em 1888157 o que também atuou no sentido de reduzir as remessas de valores para o Nordeste As exportações de açúcar do Nordeste em 1888 tiveram significativa redução158 talvez em consequência de certa desorganização na produção ocasionada pela Abolição o que também reduziu as remessas de fundos para aquisição de cambiais naquela região Além disso a safra cafeeira do Vale do Paraíba foi de tal modo elevada que mesmo com as perdas ocasionadas pela Abolição159 as exportações pelo Porto do Rio de Janeiro em 1888 elevaramse a 3330185 sacas contra 2241755 sacas em 1887160 Essa e outras influências favoráveis sobre o balanço de pagamentos contribuíram para não criar embaraços aos importadores do Rio de Janeiro O movimento de saques contra Londres negociados no Rio de Janeiro sofreria na verdade uma redução em 1888 sendo de 22570 mil contra 25320 mil em 1887161 mas em contrapartida verificouse uma grande abundância de espécies metálicas no Rio de Janeiro em 1888 A importação líquida de metais preciosos pelo Porto do Rio de Janeiro elevouse a 20563 contos162 em 1888 contra 7395 contos verificados nos três semestres de junho de 1886 a dezembro de 1887 e 3899 contos de junho de 1885 a junho de 1886163 Em função disso havia na praça do Rio abundância de meios para realizaremse importações não sendo necessário recorrerse a outras praças Todos esses fatores atuaram no sentido de reduzir as remessas de fundos para praças distantes embora o maior dispêndio monetário dos fazendeiros ocasionado pela necessidade de empregar trabalhadores assalariados tenha atuado em sentido contrário A tabela que se segue mostra as remessas de valores do Rio de Janeiro por cabotagem e o estado das caixas dos bancos em 1887 e 1888 Do total de 214756 contos da exportação de valores do Rio de Janeiro por cabotagem no ano de 1887 128942 contos dirigiramse para o Norte do Império 68295 contos para o Sul do Império e o restante para o exterior164 Em 1888 o total das remessas reduziuse para 162201 contos sendo que para o Norte foram 98442 contos para o Sul 50588 contos e o restante para o exterior165 A redução no total das remessas superior a 5 mil contos166 era significativa uma vez que se tratava em geral de fundos remetidos a portos distantes de onde demoravam a voltar Houve em contrapartida um aumento nas remessas para a região cafeeira do Vale do Paraíba que eram feitas através de ferrovias e correspondiam em grande medida ao aumento nas entradas de café no Porto do Rio de Janeiro como mostra a tabela 14 Os efeitos negativos das remessas de numerário para a região do Vale do Paraíba eram menos pronunciados que os resultantes de remessas para o Nordeste ou para São Paulo e isso se devia basicamente à proximidade da capital e à presteza das comunicações ferroviárias Em 1888 o crescimento das remessas para o Vale não parece ter sido tão significativo quanto a redução verificada nas remessas por cabotagem de 58 TABELA 13 Remessas de Valores do Rio de Janeiro Caixa dos Bancos e Relação Encaixe Depósitos de julho de 1887 a dezembro de 1888 Valores mensais em contos de réis Ano Meses Remessasa Caixa dos Bancos Relação Encaixe Depósitosb 1887 Julho 1699 10259 0095 Agosto 722 9164 0086 Setembro 1735 10617 0099 Outubro 3126 9494 0089 Novembro 2153 9540 0092 Dezembro 2326 10534 0105 1888 Janeiro 2224 11241 0107 Fevereiro 1087 10317 0099 Março 2838 9436 0085 Abril 521 9966 0090 Maio 723 17120 0147 Junho 332 14855 0126 Julho 566 18694 0145 Agosto 721 20150 0151 Setembro 948 19870 0151 Outubro 2346 17421 0140 Novembro 2244 13394 0110 Dezembro 1670 13938 0127 aSão remessas de valores por cabotagem que incluem papelmoeda moedas metálicas metais em espécie brilhantes e outros valores Em 1888 as remessas de papelmoeda representaram cerca de 91 do total de modo que os outros valores eram pouco importantes Notese que uma pequena parcela das remessas menos de 10 destinavase ao exterior apesar de transportada em cabotagem bOs depósitos incluem letras por dinheiro a prêmio que são depósitos a prazo Fonte RCJC 1887 Quadro 28 p 77 RCJC 1888 p 33 e 34 modo que os efeitos negativos das primeiras sobre os bancos provavelmente foram compensados pelos efeitos positivos das outras Outros fatores no entanto contribuíram no sentido de melhorar a caixa dos bancos e a liquidez no mercado monetário do Rio de Janeiro Por um lado ao aproximarse o desfecho da questão servil os bancos reduziram consideravelmente suas operações com a lavoura em particular o segmento que se veria arruinado com a libertação dos cativos Os bancos temiam que com a Abolição muitos fazendeiros especialmente cafeicultores do Vale do Paraíba não tivessem condições de fazer as colheitas e conseqüentemente não tivessem meios para ressarcir adiantamentos para financiamento de safra Essa postura se tornou evidente nos meses que se seguiram à Abolição e dela resultou que os bancos mantiveram em caixa um grande volume de recursos que normalmente teriam sido destinados às operações de financiamento de safra167 Por outro lado o Tesouro ajudou o Banco do Brasil não só abstendose de cobrar os empréstimos feitos em 1887 segundo a lei de 1885 como também celebrou três 59 TABELA 14 Remessas de Valores Através de Ferrovias para a Região Cafeeira do Vale do Paraíba e Entradas de Café no Porto do Rio de Janeiro 1888 Em contos de réis e mil sacas de 60 kg Meses Estr de Ferro Leopoldina 1 Estação Central 2 Entradas de Café 3 Janeiro 503 2677 2002 Fevereiro 378 2278 1140 Março 510 23 1705 Abril 223 172 973 Maio 237 546 1170 Junho 1375 2566 Julho 1578 891 3521 Agosto 2099 7078 4305 Setembro 1787 8788 4091 Outubro 1591 6725 3662 Novembro 1796 7335 4735 Dezembro nd 8116 4561 Total 12771 44625 34430 Fontes e observações 1 Diz respeito a Suprimentos fornecidos à lavoura Retirado do RMF 1891 1 p 143 2 O título da tabela no original RMF 1891 I p 144 é Relação do Dinheiro Despachado na Estação Central para as do Interior 3 RCJC 1888 Quadro 12 p 51 contratos com o Banco do Brasil e com o Banco da Bahia pelos quais comprometiase a adiantar até 21 mil contos a esses estabelecimentos especialmente para fins de empréstimos à lavoura168 A essas circunstâncias somavase também o aspecto altamente favorável das contas externas que vinha se acentuando desde 1886169 Em conseqüência disso a taxa de câmbio que começara o mês de janeiro a 22 38 atingiu a taxa de paridade em outubro170 Segundo o Jornal do Commercio o câmbio melhorou consideravelmente não só pela alta da taxa como pela estabilidade Este resultado observava o jornal foi devido não só ao fato de conservarse afastado do mercado o Tesouro que dispunha em Londres de fundos provenientes da operação de crédito no valor de 60 milhões ali efetuada como também às grandes vendas de café e aos empréstimos levantados por diversas empresas171 E a isso também se somava o elevado valor de 128 milhões correspondentes ao capital das companhias estrangeiras formadas para operar no Brasil A conjunção de todos esses fatores determinou uma maior e mais persistente acumulação de dinheiro172 mas mesmo assim as carteiras de títulos comerciais dos bancos registravam valores ligeiramente inferiores aos de 1887173 provavelmente em função da acumulação de espécies metálicas em bancos que mantinham a expectativa de vir a obter a faculdade emissora 60 O estado de liquidez a situação lisonjeira das contas externas e do câmbio assim como a Abolição e o crescimento da imigração174 criaram em 1888 condições bastante favoráveis para uma expansão de grande vulto Crescia a oferta de trabalho e também o mercado consumidor a apreciação e estabilidade do câmbio favoreciam uma expansão das importações e a situação dos bancos indicava possibilidades de expansão do crédito em 1888 Um expressivo boom começava pois a firmarse Em 1888 a Junta Comercial registrou 21 novas companhias com o capital total de 16991 contos175 sendo que em 1887 havia registrado 17 companhias novas com 9745 contos de capital176 Além disso em 1888 formaramse outros sete bancos177 com o capital total de 18660 contos dentre eles o Brazilianische Bank Für Deutschland com o capital de 10 milhões de marcos178 Três novas indústrias têxteis se constituíram com um capital total de 3500 contos179 assim como outras companhias de fins diversos com 9252 contos de capital subscrito180 Ao mesmo tempo 22 novas companhias estrangeiras formaramse para funcionar no Brasil representando um aporte total de capital da ordem de 128 milhões Dentre essas 12 eram companhias de navegação e quatro de seguros sendo que essas 16 companhias respondiam por quase 90 do aporte total de capital estrangeiro de risco em 1888181 Ganhava assim surpreendente impulso em 1888 o boom que estivera em gestação desde 1886 quando se tornaram favoráveis as contas externas Ao mesmo tempo as possibilidades de expansão pareciam ilimitadas em 1888 face ao crescimento do fluxo migratório e à ampliação do setor assalariado da economia Entretanto sabiase que a liquidez favorável182 em 1888 se devia a uma conjugação de circunstâncias passageiras que poderiam subitamente reverterse Como anteriormente sugerimos a reduzida propensão do público a reter moeda sob forma de depósitos bancários impunha limites à criação de crédito de modo que o baixo grau de desenvolvimento do sistema bancário a que isso se devia podia constranger a continuação da expansão que se acelerava em 1888 Nessas condições cresceu a preocupação em se garantir que uma possível restrição de liquidez no futuro não viesse a comprometer o boom Não se tratava mais como em 1887 de conjurar uma crise através de uma expansão monetária e sim de permitir a continuação da expansão Reconheciase que a monetização nas áreas rurais elevava as necessidades de moeda na economia Segundo um dos proponentes da reforma acresce a necessidade de numerário para pagamento dos salários que a lavoura daqui por diante terá de pagar e que já se ouviu calcular a homens práticos em 50 mil contos183 E dessa maneira como afirmava o Senador Teixeira Jr já Visconde de Cruzeiro em junho de 1888 se em 1887 era reconhecida a urgência de providência eficaz mais evidente é hoje em face das novas necessidades da lavoura provocadas pela Abolição184 Paralelamente a situação da taxa de câmbio recolocava em discussão a restauração da conversibilidade Com a aproximação da taxa de paridade começaram os bancos a acumular metais eou saldos em seus correspondentes no exterior utilizando assim sua reduzida capacidade para expandir suas exigibilidades para absorver superávits no balanço de pagamentos Como sugerimos na seção 13 essa é uma circunstância em que facilmente se produz a reivindicação da faculdade emissora pelos bancos 61 Cresceu também e significativamente o interesse do Tesouro pela modificação nas instituições monetárias e em particular pelo projeto do Visconde de Cruzeiro Apresentavase uma oportunidade de se instituir a tão desejada circulação conversível sem exigir nenhum esforço deflacionista ou austeridade fiscal Ao mesmo tempo a reorganização bancária oferecia ao Tesouro a chance de desvencilharse da posição de lenderoflastresort que lhe reservava a lei de 1885 e lhe subtraía graus de liberdade na condução de sua política financeira O Ministro da Fazenda bem sabia que a sua ajuda se devia em grande parte a situação favorável da liquidez em 1888 Mas não sabia ao certo o que lhe seria exigido no futuro quando as transformações no campo se manifestassem em toda a sua extensão Assim como o interesse do Tesouro o boom o estado favorável das contas externas e as transformações no campo deram aparência completamente diversa à defesa e às discussões em torno do projeto de reforma bancária do Visconde de Cruzeiro A intenção de elevar o meio circulante tinha nessa ocasião muito mais autoridade e legitimidade face à Abolição ao crescimento do nível da atividade e ao estado lisonjeiro do câmbio A discussão voltarseia por conseguinte menos para a sua aceitação do que para os seus condicionantes e controles E assim depois de um ano de espera o projeto foi finalmente posto em discussão no Senado na sessão de 14 de junho de 1888 23 A lei de 24 de novembro de 1888 Em junho de 1888 quando o projeto de reforma bancária voltou à apreciação do Senado trazia uma resposta às sugestões apresentadas pelas comissões de Fazenda e Legislação Na seção 21 apontamos o fato de que as comissões buscavam prevenir a possibilidade de que houvesse expansão monetária enquanto se estivesse fazendo o resgate das notas do Tesouro A idéia das comissões era de que às emissões bancárias correspondesse uma quantidade igual ou mesmo maior de notas do Tesouro incineradas Como vimos na seção 21 tal intenção contrariava francamente o propósito dos proponentes do projeto que era justamente o de promover uma expansão monetária Assim sendo os autores propuseram uma alteração nos termos do projeto com intuito claramente conciliador De acordo com o Visconde de Cruzeiro querendo prestar homenagem ao parecer das ilustradas comissões tanto quanto for possível sem prejudicar o fim principal do projeto que é como fica dito obviar a insuficiência do meio circulante pensam os autores do projeto que se pode atender à emenda da comissão determinandose que seja incinerada somente a metade do papelmoeda com que for pago pelos bancos o preço das apólices substituindo a aplicação da outra metade ao resgate das apólices de 5185 De acordo com a sugestão do Visconde de Cruzeiro uma emissão de 900 réis acarretaria nos termos do projeto a compra pelos bancos de 1000 réis em apólices de 4 12 e dos recursos provenientes dessa compra o Tesouro incineraria 500 réis em notas do Tesouro e recolocaria outra tanto em circulação através da compra de apólices de 5 Resultaria da operação uma expansão monetária líquida de 400 réis Prevalecendo esse mecanismo ao ser atingido o limite das emissões isto é 180 mil contos o 62 depósito em títulos de 4 12 atingiria o valor de 200 mil contos e o montante de papelmoeda incinerado elevarseia a 100 mil contos resultando portanto um acréscimo final à oferta de moeda da ordem de 80 mil contos186 Ainda que o parecer das comissões tivesse em parte sido aceito persistia a orientação de se elevar o meio circulante o que de maneira alguma era aceitável para os metalistas Assim sendo o projeto despertou objeções incisivas entre os senadores metalistas O Senador Pereira da Silva por exemplo notou que as emissões bancárias cresceriam muito mais rapidamente do que decrescia o volume de notas do Tesouro em circulação e assinalou que daí resultaria tal superabundância de papel fiduciário que perturbaria mais o restabelecimento do padrão monetário elevando o valor do ouro com a depreciação das notas e formando de novo como que aquele carnaval financeiro de que tanto se falou no ano de 1857187 O Senador Silveira da Mota em completa concordância com Pereira da Silva afirmava que a idéia do projeto pode dar a hipótese de uma superabundância muito grande de emissão inconvérsvel e prosseguia o senador se a atual já provoca a baixa do câmbio no momento em que se apresenta uma nova onda de emissão havemos de contar com o câmbio como o tivemos na época da Guerra do Paraguai188 A tentativa de Cruzeiro Ouro Preto e Lafayette de estabelecer alguma forma de conciliação entre a sua intenção de expandir a oferta de moeda e a dos metalistas de reduzila era na realidade bastante dificultada pela flagrante contradição em que se encontravam O compromisso entre as duas tendências foi no entanto se tornando mais fácil à medida que avançava o segundo semestre de 1888 e o câmbio continuamente se apreciava até atingir a taxa de 27 pence por mil réis no começo de outubro Surgiram ao longo dessa trajetória duas propostas da parte dos próprios autores do projeto no sentido de conciliar as duas tendências sugerindo o estabelecimento da circulação metálica conversível sem prejuízo da emissão sobre apólices que haviam proposto189 Os autores do projeto sugeriram outrossim que os bancos do projeto fossem simplesmente autorizados a emitir bilhetes conversíveis em ouro na base do triplo do valor do lastro metálico E propuseram também que quando fosse incinerada metade do papelmoeda do Tesouro então em circulação o que aconteceria no momento em que as emissões bancárias estivessem próximas de alcançar o seu limite os bancos fossem obrigados a converter os seus bilhetes metade em ouro metade em notas do Tesouro O montante total de notas do Tesouro em circulação em 1888 era de 188869 contos e de acordo com a nova sugestão quando 944345 contos em notas do Tesouro fossem incinerados o que corresponderia a uma situação onde as emissões bancárias teriam atingido a cifra de 169983 contos então esse mesmo volume de notas bancárias emitidas seria tornado conversível metade em ouro metade em papel Desse modo 849915 contos seriam a reserva metálica para a perfeita conversibilidade Estas duas propostas tinham implicações completamente diversas caso a taxa de câmbio estivesse ao par ou abaixo deste No primeiro caso a conversibilidade já seria efetiva pois estarseia trocando livremente no mercado ouro por notas do Tesouro e dos bancos ao preço de 27 pence por mil réis Nesse caso se as emissões sobre apólices atingissem o valor de 169983 contos nada se alteraria pois os bilhetes bancários já seriam conversíveis Se o câmbio estivesse ao par e existisse a expectativa de que af 63 Contexto Histórico da Política do Encilhamento Introdução O Encilhamento foi um período crucial e tumultuado na história econômica do Brasil marcado por reformas monetárias e financeiras que ocorreram entre 1889 e 1891 Este trabalho busca analisar o contexto histórico dessa política suas causas suas principais ações e seus impactos na economia e na sociedade brasileira da época Em um cenário de grandes mudanças políticas com a Proclamação da República e a transição de um regime monárquico para um regime republicano o Brasil enfrentava a necessidade urgente de modernização e crescimento econômico As políticas do Encilhamento foram idealizadas e implementadas em um momento de euforia econômica e de grande otimismo quanto ao futuro do Brasil como uma potência emergente O principal arquiteto dessas reformas foi Rui Barbosa então Ministro da Fazenda que buscava inspiração nos princípios do liberalismo econômico para impulsionar o desenvolvimento industrial e modernizar a economia brasileira Através de medidas como a expansão do crédito e a emissão de papelmoeda Rui Barbosa pretendia criar um ambiente propício ao surgimento de novas empresas e ao crescimento econômico acelerado No entanto as consequências dessas políticas foram desastrosas A falta de regulamentação adequada e a emissão desenfreada de papelmoeda levaram a uma crise econômica severa marcada por inflação descontrolada desvalorização da moeda e uma série de falências empresariais Este período de grande euforia seguido por uma profunda crise econômica ficou conhecido como Encilhamento e suas repercussões foram sentidas em todo o país tanto na economia quanto na política e na sociedade Neste trabalho examinaremos os antecedentes econômicos do Encilhamento as reformas implementadas por Rui Barbosa a crise econômica que se seguiu e as consequências sociais e políticas desse período Nossa análise será baseada no capítulo do livro fornecido e complementada por outras referências para oferecer uma visão abrangente e detalhada do contexto histórico dessa importante fase da história brasileira Contexto Histórico do Encilhamento Antecedentes Econômicos O final do século XIX foi um período de grandes transformações para o Brasil A Proclamação da República em 1889 trouxe mudanças significativas na estrutura política do país que até então era uma monarquia A nova República necessitava de uma economia robusta para sustentar suas políticas e promover o desenvolvimento A economia brasileira predominantemente agrária estava fortemente dependente da exportação de produtos agrícolas especialmente o café No entanto havia um crescente reconhecimento da necessidade de diversificação econômica e industrialização O Brasil ainda se recuperava dos efeitos da abolição da escravatura em 1888 que trouxe profundas mudanças na estrutura social e econômica A transição para uma economia baseada no trabalho assalariado e a necessidade de modernização das técnicas agrícolas e industriais criaram um ambiente propício para a implementação de reformas econômicas Neste contexto as políticas do Encilhamento foram vistas como uma oportunidade para acelerar o crescimento econômico e modernizar a infraestrutura produtiva do país Reformas de Rui Barbosa Rui Barbosa então Ministro da Fazenda foi o principal responsável pela formulação e implementação das políticas econômicas do Encilhamento Inspirado pelos ideais do liberalismo econômico Rui Barbosa buscou estimular a economia por meio de uma série de reformas que incluíam Criação de novos bancos A liberalização do sistema bancário permitiu a criação de inúmeros novos bancos o que facilitou o acesso ao crédito Expansão do crédito Aumentouse significativamente a oferta de crédito com o objetivo de incentivar investimentos e a criação de empresas Emissão de papelmoeda A emissão de grandes quantidades de papel moeda visava aumentar a liquidez na economia e fomentar o consumo e o investimento Essas medidas resultaram em um boom econômico inicial com a criação de muitas novas empresas e um aumento significativo na atividade econômica No entanto muitas dessas empresas eram especulativas ou inexistentes o que levou a um aumento da inflação e a uma bolha econômica O capítulo do livro fornecido detalha como a política de emissão de papelmoeda sem lastro suficiente causou uma inflação galopante corroendo o poder de compra da população e desestabilizando a economia Crise Econômica e Consequências A euforia inicial foi seguida por um colapso econômico A inflação descontrolada a desvalorização da moeda e a especulação desenfreada resultaram em uma crise de confiança no sistema financeiro brasileiro Muitas empresas faliram e o país mergulhou em uma recessão profunda A crise também teve consequências políticas levando à renúncia de Deodoro da Fonseca e à ascensão de Floriano Peixoto O capítulo fornecido descreve como a ausência de regulamentação adequada e a falta de mecanismos de controle contribuíram para o agravamento da crise A liberalização excessiva do mercado financeiro permitiu a criação de empresas fantasmas e a emissão de ações sem lastro o que culminou em uma bolha especulativa que ao estourar deixou muitos investidores e empresários em situação de insolvência Impactos Sociais e Políticos Além dos impactos econômicos o Encilhamento teve significativos efeitos sociais e políticos A crise financeira agravou as desigualdades sociais e gerou um clima de instabilidade e desconfiança na recéminstaurada República O episódio do Encilhamento serviu como uma lição sobre os perigos da falta de regulamentação financeira e as consequências de políticas econômicas mal planejadas A instabilidade política gerada pela crise econômica culminou na renúncia de Deodoro da Fonseca o primeiro presidente do Brasil e na subsequente ascensão de Floriano Peixoto que adotou medidas mais conservadoras para estabilizar a economia e restaurar a confiança da população O capítulo fornecido destaca como a crise financeira também teve um impacto profundo nas classes trabalhadoras urbanas que enfrentaram desemprego e uma queda no poder de compra Conclusão O Encilhamento foi um marco na história econômica do Brasil destacandose como um período de grande euforia seguido por uma crise devastadora A análise do contexto histórico mostra como as políticas econômicas quando implementadas sem a devida cautela e regulamentação podem levar a consequências severas tanto para a economia quanto para a sociedade A história do Encilhamento serve como um alerta sobre os riscos da especulação e a importância de um sistema financeiro robusto e bem regulado As lições aprendidas com o Encilhamento são relevantes até os dias de hoje A necessidade de um equilíbrio entre liberalização econômica e regulamentação é fundamental para garantir a estabilidade financeira e evitar crises semelhantes O episódio também destaca a importância de políticas econômicas bem fundamentadas e planejadas capazes de promover o desenvolvimento sustentável sem causar desequilíbrios econômicos e sociais Em resumo o Encilhamento ilustra os perigos de uma expansão econômica desenfreada e a falta de controle sobre o sistema financeiro O período teve consequências duradouras para a economia e a sociedade brasileira moldando a forma como futuras políticas econômicas seriam implementadas e regulamentadas no país Referências FRANCO Gustavo Henrique Barroso Reforma monetária e instabilidade durante a transição republicana 1987 Dissertação Mestrado em Economia do Setor Público Departamento de Economia Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro Rio de Janeiro 1987 CARVALHO Fernando J Cardim de Reforma monetária indexação generalizada e o plano de estabilização Revista de Economia Política v 10 n 2 p 520 1990 Disponível em httpswwwscielobrjrepa cGqhBTjTqVxSQ4yRjYNxfTQabstractlangpt Acesso em 16 maio 2024 GOMES Ângela de Castro KORNIS Mônica Almeida Com a história no bolso a moeda e a República no Brasil In SEMINÁRIO INTERNACIONAL O outro lado da moeda 2001 Rio de Janeiro Livro do Seminário Internacional Rio de Janeiro Museu Histórico Nacional 2002 p 107134 Disponível em httpsrepositoriofgvbrbitstreamsbf9e79c061fa491daedaa21c09cc097f download Acesso em 16 maio 2024
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Texto de pré-visualização
Gustavo Henrique Barroso Franco REFORMA MONETÁRIA E INSTABILIDADE DURANTE A TRANSIÇÃO REPUBLICANA 7º PRÊMIO BNDES DE ECONOMIA BNDES BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL Gustavo Henrique Barroso Franco REFORMA MONETÁRIA E INSTABILIDADE DURANTE A TRANSIÇÃO REPUBLICANA Dissertação de Mestrado apresentada ao Departamento de Economia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro como parte dos requisitos para obtenção do grau de Mestre em Economia do Setor Público Professororientador WINSTON FRITSCH Rio de Janeiro 1987 7º PRÊMIO BNDES DE ECONOMIA FICHA CATALOGRÁFICA FRANCO Gustavo Henrique Barroso F825r Reforma monetária e instabilidade durante a transição republicana Gustavo Henrique Barroso Franco Rio de Janeiro BNDES 1983 189 p Tese M Sc PUCRJ Departamento de Economia e Vencedora do 7o Prêmio BNDES de Economia 1 Brasil Política econômica 18841890 2 História econômica 3 Política monetária I Título 338981 CDD Para Vera Bela e Arinos Apresentação O trabalho Reforma monetária e instabilidade durante a transição republicana de autoria de Gustavo Henrique Barroso Franco foi o vencedor do 7º Prêmio BNDES de Economia referente ao ano de 1983 A escolha do trabalho coube a uma Comissão Examinadora presidida pelo professor Isaac Kerstenetzky e formada pelos professores Andrea Sandro Calabi Charles Mueller Fábio Stefano Erber Fernando Holanda Barbosa José Marcelino Monteiro da Costa Osmundo Rebouças Pérsio Arida e Wilson Cano O Prêmio BNDES de Economia instituído em 1977 tem o objetivo de estimular a pesquisa no campo da Ciência Econômica pura e da Ciência Econômica aplicada segundo a perspectiva nacional regional e setorial Agradecimentos Este trabalho foi realizado durante os meses de maio de 1981 a julho de 1982 e diversas pessoas contribuíram de forma essencial para a sua realização Devo agradecer em primeiro lugar ao professor Winston Fritsch pela dedicação e pelo rigor acadêmico com que conduziu o esplêndido trabalho de orientação sem o qual este trabalho jamais poderia ter sido feito Agradeço também de forma especial ao professor Luiz Aranha Corrêa do Lago tanto pela leitura atenta e minuciosa desta tese quanto por terme permitido utilizar parte do meu tempo com os problemas monetários do século XIX quando eu deveria ocuparme com os da atualidade Meu débito com Edmar Lisboa Bacha extravas de muito a ajuda que me prestou nas primeiras fases de elaboração deste trabalho pois compreende as mais variadas lições que aprendi com esse grande economista e professor durante o Curso de Mestrado em Economia na PUCRJ A dois grandes amigos que como eu se iniciam na profissão pela história do país Marco Antonio Reis Guarita e Pedro Aranha Corrêa do Lago sou grato pelo estímulo e colaboração durante esses 14 meses de trabalho Aos amigos professores e alunos do Departamento de Economia da PUCRJ agradeço pelo irrestrito apoio resultado inequívoco do elevado espírito de colaboração acadêmica existente nessa escola Agradeço também e de forma muito especial a Maria Mirtes Figueiredo pelo paciente e competente trabalho de datilografia Todas essas pessoas contribuíram fundamentalmente para que se reduzissem os erros e imprecisões que o trabalho trazia originalmente sendo que evidentemente os remanescentes se devem exclusivamente à minha própria teimosia A todas essas pessoas ele é expressamente dedicado com a esperança de que possa estar à altura Trabalhar em história econômica especialmente na pesquisa de um passado remoto e esquecido é uma experiência gratificante em todos os sentidos sobretudo no que se refere ao prazer da descoberta mas é também um trabalho solitário que nos abstrai de nossa própria época e afeta a convivência com as pessoas Por isso o contínuo encorajamento e companheirismo de meus pais e especialmente de minha mulher Vera foram absolutamente fundamentais A eles devo muito mais do que este trabalho Introdução 17 1 Antecedentes da Reforma Monetária 21 11 Transformações no Regime de Trabalho e a Instabilidade do Crédito 21 12 Política Monetária nos Anos Oitenta 30 13 O Balanço de Pagamentos e a Taxa de Câmbio 37 Anexo Metodologia para a Construção da Estimativa do Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 43 2 A Reforma Imperial 51 21 A Crise de 1887 e o Projeto Original 51 22 A Expansão de 1888 e a Reforma 57 23 A Lei de 24 de Novembro de 1888 62 24 A Regulamentação 66 3 A Gestão Ouro Preto 73 31 Condições Políticas 73 32 Os Auxílios à Lavoura 77 33 A Circulação Metálica Conversível 91 34 A República e o Colapso do Sistema 95 4 A Gestão Rui Barbosa 101 41 A Nova Lei Bancária 101 42 A Crise no Ministério e as Modificações no Decreto 109 43 A Conjuntura e a Evolução da Legislação em 1890 115 44 O Grande Banco 128 5 Epílogo As Reformas Monetárias em Perspectiva Histórica 135 Notas 143 Sumário Bibliografia Utilizada 177 Índice de Tabelas 1 Distribuição Geográfica Aproximada e Exportações de Café da Região Cafeeira 18691900 22 2 Imigração Bruta Anual para o Brasil e para São Paulo 18761893 24 3 Entradas Trimestrais de Açúcar na Praça do Rio de Janeiro 18871890 26 4 Comércio Exterior e Comércio Interno do Rio de Janeiro e de São Paulo 18801888 27 5 Rede Bancária em 30 de Junho de 1888 28 6 Notas do Tesouro e do Banco do Brasil 18721889 31 7 Cunhagem de Moedas de Ouro e Prata no Brasil 18101887 31 8 Execução Orçamentária do Tesouro Nacional 18801888 32 9 Taxas de Câmbio Valores Mensais 18801888 35 10 Estimativa para o Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 38 11 Investimentos Ingleses no Exterior e Investimentos Estrangeiros no Brasil 18761897 41 A1 Balança Comercial do Brasil 18761897 44 A2 Movimentos de Metal Amoedado entre Brasil e Inglaterra 18821896 45 A3 Contas de Serviço do Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 47 A4 Contas de Capital no Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 48 A5 Saldos do Tesouro Nacional na sua Delegacia de Londres 18761897 50 A6 Estimativa para o Balanço de Pagamentos do Brasil Série Anual 18761897 50 12 Nível de Atividade e Preços 18801888 51 13 Remessas de Valores do Rio de Janeiro Caixa dos Bancos e Relação EncaixeDepósitos Julho de 1887 a Dezembro de 1888 59 14 Remessas de Valores Através de Ferrovias para a Região Cafeira do Vale do Paraíba e Entradas de Café no Porto do Rio de Janeiro 1888 60 15 Preços Extremos Mensais das Apólices de 5 no Rio de Janeiro 18871889 70 16 Contratos de Auxílio à Lavoura 84 17 Mapa Demonstrativo do Empréstimo Nacional de 109694000000 85 18 Liquidez Bancária no Rio de Janeiro em 1889 86 19 Repasses do Tesouro aos Bancos para Auxílios à Lavoura e as Operações por Eles Efetuadas até 31 de Agosto de 1890 87 20 Aplicação dos Fundos Recebidos do Tesouro Através dos Contratos de Auxílios à Lavoura 89 21 Bancos Emissores sobre Base Metálica 1889 95 22 Taxas de Câmbio Bancos que Afixaram Cotações Abaixo do Mercado Emissão em Circulação e Caixa do Banco Nacional em Dezembro de 1889 99 23 Regiões Bancárias Estabelecidas pelo Decreto de 17 de Janeiro de 1890 106 24 Preços Extremos e Vendas Mensais das Apólices de 5 em Fins de 1889 e em 1890 107 25 Notas do Tesouro em Circulação em Fins de 1889 e em 1890 120 26 Movimento da Bolsa de Valores 1889 e 1890 121 27 Número e Valor do Capital das Companhias que Registraram Estatutos na Junta Commercial em 1890 121 28 Oferta Monetária em 30 de Setembro de 1890 125 29 Variação nas Emissões Autorizadas em Conseqüência do Decreto de 7 de Dezembro de 1890 130 30 Estrutura da Moeda 18151913 136 31 Investimentos Ingleses de Portfolio na América do Sul e na Argentina Investimento Direto e Empréstimos Externos no Brasil 18851892 141 Para simplificar a apresentação de citações utilizamos algumas abreviaturas para indicar fontes bastante citadas FPR Finanças e Política na República Discursos e Escripts de Rui Barbosa 1892 Inclui os discursos O Papel e a Baixa do Câmbio Senado 3 de novembro de 1891 p 1132 Os Bancos Emissores O Projecto Official Senado 12 de janeiro de 1892 p 133218 e A Reforma em Projecto Senado 13 de janeiro de 1892 p 21998 O volume inclui também o Manifesto à Nação p 30199 que é uma coletânea de artigos publicados em vários jornais da época no período de 20 de janeiro a 1º de fevereiro de 1892 O volume além disso contém apêndices com informações diversas OCRB Indica as Obras Completas de Rui Barbosa editadas em vários volumes pela Fundação Casa de Rui Barbosa A referência sempre indica o volume e o tomo a que diz respeito RCJC Indica o Retrospecto Commercial do Jornal do Commercio que era publicado em base anual a referência sempre indica o ano a que diz respeito RMF Relatórios de Ministros da Fazenda publicados por ocasião da proposta orçamentária para o próximo exercício fiscal A referência indica o ano para o qual é proposto o orçamento Notese também que as referências ao relatório de 1891 correspondem à edição em três volumes da Fundação Casa de Rui Barbosa e não aos originais A referência ao RMF1891 indica sempre o volume a que se refere Abreviaturas Utilizadas O ouro inicialmente pairando no céu com sua consorte a prata tal como o Sol e a Lua tendo em seguida despido seus sagrados atributos e vindo à Terra como um autocrata pode agora ser rebaixado à sóbria posição de monarca constitucional assessorado por um gabinete de bancos e ainda é possível que nunca seja necessário proclamar uma república Mas isto ainda não ocorreu a evolução poderá ser bem diferente Os amigos do ouro terão de ser extremamente sábios e moderados se quiserem evitar uma revolução J M Keynes A Treatise on Money Resumo Este trabalho discute os motivos e as consequências das reformas monetárias implementadas por sucessivos governos no período 18881890 Começa com a análise dos efeitos da difusão do trabalho assalariado da expansão do nível de atividade econômica e da excepcional posição do balanço de pagamentos ao final dos anos 80 sobre a demanda de moeda e a liquidez doméstica que explicam o clamor contemporâneo por reformas institucionais nos sistemas bancário e monetário A dissertação se desenvolve com a discussão crítica dos vários projetos de reforma e termina com a interpretação das causas dos desequilíbrios monetários e de balanço de pagamentos que se seguem às reformas de Rui Barbosa em 1890 avaliando a experiência à luz da tendência mundial por uma maior intervenção na gestão monetária Introdução O período que este trabalho se propõe a estudar engloba os últimos anos da década de oitenta do século passado e em especial o ano de 1890 Por referirse a um período de tempo bastante reduzido este trabalho difere de grande parte dos estudos recentes sobre a história econômica do Brasil que trata de construir grandes sínteses interpretativas ou periodizações de várias décadas freqüentemente sem o apoio de monografias de escopo temporal mais reduzido e baseadas em algum trabalho de pesquisa em fontes primárias que forneceriam a indispensável sustentação empírica a estudos dessa natureza Durante esses poucos anos verificaramse os momentos críticos da transição do regime de trabalho servil para o assalariado em conseqüência do notável crescimento da imigração estrangeira a partir de meados dos anos oitenta e da extinção da escravatura Ao mesmo tempo a economia brasileira atravessava um período de grande prosperidade em vista das condições extremamente favoráveis do balanço de pagamentos e do grande crescimento do nível de atividade Durante ese período e em função dessas mesmas circunstâncias verificaramse bruscas e radicais mudanças de orientação na política econômica e uma inusitada concentração de importantes reformas institucionais no sistema monetário através das quais tomariam feição característica tanto o boom industrial e financeiro quanto a realocação regional de recursos na agricultura A evolução das reformas e também da política monetária verificada nesses anos constitui o objeto principal deste trabalho A evolução das reformas monetárias é abordada segundo dois ângulos Por um lado procurase estudar as reformas em si procurando mostrar sua funcionalidade o sentido de sua evolução e as suas consequências examinandoas com a perspectiva da evolução de longo prazo do sistema monetário brasileiro Por outro lado o estudo das reformas monetárias serve como fio condutor de uma interpretação mais ampla do período e que toma como base a idéia de que se trata de um período de grande instabilidade sobretudo do ponto de vista macroeconômico Este trabalho não trata de um período pouco estudado mas em relação aos trabalhos existentes sobre esses anos tem características essencialmente diversas Os estudos recentes sobre a política econômica neste período1 reproduzem em maior ou menor grau o viés característico dos trabalhos de Taunay Calógeras e Antônio Carlos2 de considerarse a política econômica desses anos como contagiada pelo inflacionismo e pelo delírio especulador Tais estudos têm como objeto principal o fenômeno do Encilhamento e portanto tendem a colocar a Bolsa de Valores no centro dos acontecimentos como elemento que articula e determina as idas e vindas da política econômica numa clara superestimação da influência da especulação bursátil que em 17 consequência obscurece a influência de alguns outros fenômenos econômicos de muito maior importância Em vista disso parece perdurar a tradição segundo a qual a Bolsa seria como na superlativa descrição de Taunay uma espécie de redemoinho fatal de Maelstrom oceânico abismo insondável vórtice de indômita possança e invencível empuxo a que iam convergir em desapoderada carreira as forças vivas do Brasil Quanto ao governo contagiado pelo delírio inflacionista promulgava decretos sobre decretos expedia avisos e mais avisos concessões de todas as espécies garantias de juros subvenções favores sem fim sem conta sem nexo sem plano E de acordo com o severo veredito de Taunay tratavase a responsabilidade do País em somas pavorosas e brincavase com o crédito o nome e o porvir da Nação3 Creditasse algum exagero ao relato de Taunay velho monarquista execrado pela República mas as finanças conservadoras que praticamente dominaram a Primeira República e da qual Calógeras e Antônio Carlos foram destacados expoentes4 cuidaram de preservar a visão de que nos primeiros anos da República houve inimaginável descalabro e irresponsabilidade para cuja expiação nem a violenta deflação de 18981901 teria sido suficiente Recentemente contudo essa visão tradicional começou a ser questionada quando se verificou que os primeiros anos da República registraram importantes e autênticos avanços em termos de crescimento industrial5 Esta descoberta na medida em que coloca em questão a suposta primazia da especulação e do inflacionismo sobre a política econômica abre espaço para uma investigação minuciosa sobre a política monetária e principalmente sobre as reformas que são comumente consideradas as causadoras da anarquia monetária dos anos noventa Este trabalho contém cinco capítulos O primeiro trata dos fatores determinantes das reformas monetárias os três seguintes da evolução cronológica das reformas de 1884 e 1890 e o último traz um ensaio interpretativo que serve como conclusão do trabalho No primeiro capítulo procuramos estudar os antecedentes das reformas monetárias discutindo especialmente alguns pontos mais estruturais Fazemos na primeira seção uma análise do sistema bancário do final dos anos oitenta de suas relações com a lavoura e das possíveis consequências da transformação do regime de trabalho no que diz respeito à procura agregada por moeda e à estabilidade do crédito Na segunda seção tratamos de discutir alguns aspectos quantitativos relacionados à política monetária e procuramos apontar as concepções e as metas que determinavam a sua condução E na seção 13 procuramos alinhar e interpretar nossas estimativas para o balanço de pagamentos do Brasil atentando para a influência das contas externas sobre a taxa de câmbio e para a importância dos movimentos de capital estrangeiro dirigidos para o Brasil nos anos oitenta e noventa O segundo capítulo estuda a evolução da conjuntura e das reformas partindo da crise de 1884 até a primeira grande reforma posta em vigor em janeiro de 1889 Procurase af identificar a ocorrência de crises de liquidez que denotavam a difusão do trabalho assalariado no campo e que punham em perigo a continuação do boom no nível de atividade Procuramos mostrar como essas circunstâncias acirraram o debate em torno da reforma monetária e produziramna afinal em 24 de novembro de 1888 O capítulo também trata da discussão doutrinária em torno da aprovação da lei de 1888 salientando as incompatibilidades entre as concepções metalista e antimetalista das quais teria resultado o fracasso da própria reforma O capítulo 3 trata da administração do Visconde de Ouro Preto Ministro da Fazenda e chefe do último Gabinete Imperial A primeira seção explora as circunstâncias políticas que permitiram a ascensão de Ouro Preto e sugere a existência de conexões entre a sua política econômica e o seu projeto político de preservação da ordem monárquica A seção 32 trata dos problemas ligados ao crédito rural e discute a importância dos chamados Auxílios à Lavoura para a realocação de recursos que se operava na agricultura Nas duas seções que se seguem analisamos o efêmero experimento da conversibilidade metálica em fins de 1889 apontando as condições que permitiram o seu estabelecimento e determinaram em seguida o seu colapso O quarto capítulo é dedicado à gestão de Rui Barbosa no Ministério da Fazenda As duas primeiras seções tratam da famosa reforma bancária de 17 de janeiro de 1890 Na primeira analisamos a reforma em si e discutimos as justificativas de Rui Barbosa para a mesma Na segunda documentamos a crise ministerial de fins de janeiro resultante da reforma e que determinou as primeiras modificações no decreto original Nas seções 43 e 44 examinamos a evolução da conjuntura ao longo do ano de 1890 e as alterações no decreto de janeiro que terminaram em dezembro de 1890 por estabelecer um grande banco emissor destinado a ser o agente financeiro do governo e o responsável pela política monetária e cambial A marcha das reformas monetárias parecia levar o País a constituir um sistema monetário que melhor utilizasse os instrumentos monetários e creditícios para o desenvolvimento industrial e melhor promovesse a estabilidade cambial Mas progressos seriam posteriormente destruídos com o crescimento da influência de homens ligados às finanças conservadoras a partir de 1891 Esses temas e algumas outras observações gerais sobre a evolução das reformas monetárias no Brasil de 1887 a 1890 compõem o ensaio conclusivo relativo ao capítulo 5 1 Os Antecedentes da Reforma Monetária 11 As transformações no regime de trabalho e a instabilidade do crédito A partir de meados da década de oitenta começava a intensificarse uma discussão acerca de reforma monetária Era esse um tema que há muito não era objeto de atenção do Parlamento ou dos círculos financeiros ainda que se possa dizer que o interesse sobre a matéria tenha se tornado crescente após a crise bancária de 1875 Desde 1866 quando foi suprimida a faculdade emissora do Banco do Brasil6 o sistema monetário não havia sofrido modificações institucionais de grande importância7 pelo menos em relação às numerosas reformas concentradas nos anos de 1888 a 1890 Assim sendo o renascimento da questão monetária depois de algum tempo de reticência era fato de interesse Como acontece em geral com reformas institucionais o ressurgimento do interesse público pelo desenho das instituições monetárias estava ligado às novas condições que impunham novas exigências ao sistema monetário Estas novas circunstâncias eram o produto de um conjunto de transformações importantes que vinham se desdobrando há algum tempo e teriam maior intensidade na segunda metade dos anos oitenta Tais fatos permitiriam que se referisse o sistema monetário vigente ao final do Império como inadequado ou destituído de elasticidade8 e serviriam em consequência como justificativa para a necessidade de uma reforma monetária O esforço de compreender as causas do renascimento da discussão sobre o sistema monetário assim como a necessidade de sua recomposição deve se articular em torno de três eixos principais a difusão do trabalho assalariado e a realocação de recursos provocada pela maciça entrada de imigrantes e posteriormente pela Abolição a notável expansão no nível de atividade verificada a partir de meados de 1885 e a sucessão de anos excepcionalmente favoráveis para o balanço de pagamentos começada em 1886 Esses três fatores viriam a criar necessidades de numerário para as quais o sistema monetário de então não estava aparelhado e seriam em última análise os determinantes da reforma As últimas décadas do século XIX marcam os momentos decisivos de uma importante transformação na economia brasileira o fato de maior relevância ocorrido na economia brasileira no último quartel do século XIX foi sem lugar à dúvida o aumento da importância relativa do setor assalariado9 Esse fenômeno estava relacionado em grande medida ao fim da escravidão e à entrada maciça de imigrantes a partir do final dos anos oitenta A atividade agrícola principal atividade econômica do País sofreria em consequência uma violenta realocação de recursos que se estenderia também para a atividade urbana Sem dúvida o principal problema que se colocava para a agricultura nos anos oitenta era o da eliminação do trabalho escravo Esse era contudo um problema que se apresentava de modo diverso nas várias regiões do País uma vez que existiam diferenças significativas em natureza e dinamismo entre as principais atividades econômicas regionais Na região cafeeira por exemplo havia profundas diferenças entre as várias áreas produtoras diferenças cujos efeitos podem ser avaliados pelas alterações na distribuição geográfica das exportações nas últimas décadas do século mostradas na tabela 1 TABELA 1 Distribuição Geográfica Aproximada e Exportações de Café da Região Cafeeira 18691900 Em milhares de arrobas 186970 188081 188889 189697 a a a a 187172 188283 189091a 18991900b Exportações do Rio de Janeiro 7398 9271 5530 5383 pelo Porto do Rio 552 407 240 141 Exportações de São Paulo 1314 1778 1109 c pelo Porto do Rio 98 78 48 nd Exportações de São Paulo 2278 6155a 10178 22294 pelo Porto de Santos 170 270 441 582 Exportações Totais de 3592 7933 11287 São Paulo 268 348 489 nd Exportações de Minas Gerais 1919 4828 4948 8743 pelo Porto do Rio 143 212 215 228 Exportações do 499 726 1297d 1894 Espírito Santo 37 32 56 49 Total da Região 13408 22758 23062 38304e Cafeeira 100 100 100 100 a Depois de 187172 os dados de exportações através de Santos somente se referem a exportações totais de modo que a adição desse total ao do correspondente ao café de São Paulo exportado pelo porto do Rio não é estritamente correto b As exportações através de Santos foram as verificadas no ano fiscal de julho a junho ao passo que para os outros portos os dados registram as exportações de janeiro a dezembro CA média exclui 1891 d Referese somente a 1891 e às exportações totais Os dados anteriores referemse somente à produção exportada pelo porto do Rio e Não inclui as exportações de café paulista pelo porto do Rio de Janeiro Em 1895 essas exportações eram aproximadamente de 213 mil arrobas Obs Os números entre parênteses correspondem às participações percentuais sobre o total da exportação da região Fonte L A Corrêa do Lago 1978 p 412 A tabela 1 revela não só a notável expansão10 da caficultura paulista como também a estagnação da produção do Vale do Paraíba O declínio da caficultura do Vale se devia a um amplo complexo de causas dentre as quais podemos resumidamente apontar o esgotamento do solo a dificuldade de expansão do plantio por incorporação de nova terra escassez e conseqüente elevação dos preços de mãodeobra escrava falta de sensibilidade para o problema da transição para o trabalho livre além do grave endividamento dos fazendeiros do Vale na década de oitenta junto a alguns bancos da praça do Rio Tais fatores concorreram para deprimir decisivamente a rentabilidade da empresa e dificultar o reinvestimento e portanto provocaram estagnação e o declínio da caficultura do Vale do Paraíba11 A situação da caficultura do oeste paulista era completamente diversa A expansão do plantio se dava em ritmo acelerado12 contando com o apoio de uma rede ferroviária igualmente em expansão13 As taxas de rentabilidade da empresa eram elevadas e a utilização do trabalho livre se já não era algo razoavelmente disseminado na província nos anos oitenta não era estranha à mentalidade local Em função de condições essencialmente diversas no Vale e no oeste de São Paulo o problema da transição para o trabalho livre nas duas regiões assumia caráter diverso Entretanto esse caráter diverso se devia menos à disposição humanitária dos fazendeiros em extinguir a escravatura do que às possibilidades econômicas de cada região em suplantar os problemas de mãodeobra criados pela disseminação do trabalho livre14 A extinção do trabalho servil gerava apreensões generalizadas não apenas quanto ao problema da existência de braços para o trabalho mas também quanto às dificuldades que surgiriam com a introdução de pagamentos de salários monetários Quanto ao primeiro problema a introdução em larga escala do imigrante mostrada na tabela 2 parece têlo em grande medida superado Boa parte dos imigrantes localizavase nas imediações da zona cafeeira de São Paulo15 o que sem dúvida sugere um grande avanço do trabalho assalariado no campo no final da década de oitenta e início dos anos noventa É discutível no entanto que tenha se dado nos anos de que este trabalho se ocupa a transição para um sistema de assalariamento em que as remunerações ao trabalhador se fizessem exclusivamente sob a forma de salários monetários Há evidência de que logo após a Abolição foram utilizados diversos regimes de trabalho tais como parcerias e empreitadas tanto no Vale quanto em São Paulo cujos pagamentos se faziam sem que se utilizasse dinheiro16 No entanto é certamente admissível que as remunerações monetárias tornaramse muito mais disseminadas no final dos anos oitenta e as causas desse fenômeno são sem dúvida a introdução do imigrante e a eliminação do trabalho escravo Não resta dúvida de que a disseminação do trabalho assalariado no campo deuse de forma súbita mas possivelmente não tanto quanto poderia à primeira vista parecer O trabalho assalariado vinha sendo crescentemente utilizado na agricultura paulista nos anos anteriores à Abolição ao mesmo tempo que a imigração crescia e a multiplicação de fugas e alforrias reduzia a mãodeobra servil efetivamente empregada17 Para as províncias do Norte que de longa data eram exportadoras de escravos é possível afirmar que o trabalho livre já se encontrasse razoavelmente disseminado por ocasião da Abolição18 Essas considerações contudo não alteram o fato de que o 23 TABELA 2 Imigração Bruta Anual para o Brasil e para São Paulo 18761893 Médias móveis de cinco anos Ano Total São Paulo 1876 22594 1877 23044 1878 26789 1879 22887 1880 28520 1881 23766 1882 24306 1883 25448 1884 29935 1885 35688 230 1886 56606 370 1887 64818 500 1888 79224 540 1889 115879 580 1890 121927 660 1891 122238 660 189 2 121245 750 1893 133274 810 Fonte Douglas Graham 1973 p 11 e os dados para São Paulo são de Thomas Holloway 1972 apêndice II p 179 Os dados para São Paulo se encontram arredondados para o milhar mais próximo assalariamento no campo teve um avanço abrupto durante a passagem para os anos noventa No caso de São Paulo por exemplo alguns algarismos podem nos dar uma idéia aproximada do choque da eliminação do trabalho escravo Em março de 1887 havia 67966 escravos registrados nas áreas rurais de São Paulo tributárias do porto de Santos incluindo mulheres crianças e escravos de idade avançada Holloway estimou em 77 mil trabalhadores o total da força de trabalho necessária para mover a safra de 1887 o que nos sugere que pelo menos 20 da força de trabalho constituíamse no início de 1887 de trabalhadores livres Durante o ano de 1887 entraram 32112 imigrantes em São Paulo e em 1888 92086 o que sugere também que havia substituição de mãodeobra escrava por mãodeobra estrangeira19 A disseminação dos pagamentos de salários por certo alterava as necessidades de capital de giro das fazendas de café uma vez que antes de 1888 os recursos financeiros necessários para o custeio da fazenda eram relativamente pequenos pois a parte mais importante desse custeio que era o pagamento da mãodeobra praticamente não existia20 São comuns as referências ao fato de que os fazendeiros mantinham contas correntes com seus comissários nos portos e liquidavam seus compromissos através de um jogo de lançamentos contábeis sem que se utilizasse dinheiro em volu 24 mes significativos21 A difusão do trabalho assalariado no campo no entanto viria a modificar drasticamente essa praxe Evidentemente o impacto da transição para o trabalho livre sobre as necessidades de capital de giro para as fazendas em forma monetária dependia diretamente do modo como seriam feitos os pagamentos ao trabalho Diversos sistemas foram tentados nesses anos e em geral a maior parte deles baseavase em dois tipos de remuneração uma relativa ao plantio e ao cuidado com o cafezal ao longo do ano e outra relativa à colheita Cerca de metade da renda monetária anual de cada família na área cafeeira de São Paulo de acordo com Holloway22 adivinha dos pagamentos contratualmente estabelecidos pelo cuidado dos cafeeiros durante o ciclo anual de produção sendo que a outra metade da folha salarial anual do fazendeiro correspondia ao pagamento pela colheita Contudo o grosso das remunerações em forma monetária concentravase na época da colheita uma vez que boa parte dos pagamentos a trabalhadores ao longo do ano se fazia em espécie ou através de lançamentos contábeis nas contas correntes entre fazendeiro e colono Assim sendo sob o ponto de vista do gasto monetário com o pagamento de salários as necessidades de capital de giro das fazendas de café eram essencialmente sazonais e obviamente tanto mais marcadamente sazonais quanto maiores fossem os encargos monetários com o pagamento de salários e também quanto maior fosse a safra Entretanto não se resumi am somente ao pagamento de salários os gastos monetários da cafeicultura À época de safra os fazendeiros também arcavam com uma série de outras despesas de beneficiamento e comercialização além de frequentemente serem contratados trabalhadores adicionais pagos em dinheiro o que sem dúvida reforçava ainda mais o caráter sazonal das necessidades de numerário da fazenda Era precisamente na época da colheita que os fazendeiros mais pressionavam seus comissários por adiantamentos e empréstimos para mover a safra E como em última análise era no sistema bancário que se financiavam os comissários na época da safra manifestavase uma forte pressão de demanda por crédito sobre o sistema bancário Por outro lado também o modo como a safra afluía para os portos seu tamanho e as expectativas dos comissários quanto aos preços futuros podiam determinar pressões adicionais sobre o sistema bancário Se a safra fosse grande e os comissários adiassem os embarques de modo a impedir quedas de preço possivelmente a retenção de estoques haveria de ser financiada pelo sistema bancário que ficava assim sujeito a uma pressão adicional O sistema bancário localizavase predominantemente na Corte que era sem dúvida o centro financeiro do País e alimentava um setor comercial de avantajadas proporções23 Dado que a procura por crédito por parte do comércio da capital não tinha nenhum padrão de sazonalidade perceptível quando da época de safra havia uma forte pressão sobre o crédito bancário que produzia geralmente uma elevação da taxa de desconto e dificuldades de liquidez na praça do Rio Essa pressão de demanda sobre o crédito podia em determinadas circunstâncias ter consequências sérias e mesmo provocar um abalo grave na praça As tanto mencionadas crises de numerário na praça do Rio a partir dos anos sessenta encontram sua explicação em alguma medida no caráter acentuadamente sazonal da procura por crédito Esse fenômeno já era perceptível bem antes do trabalho assalariado começar a difundirse no campo Referindose à década de sessenta Calógeras argumenta que as 25 colheitas exigiam remessas periódicas de dinheiro as quais empobreciam as praças de onde o papelmoeda era exportado e esse só retornava lentamente dada a dificuldade das comunicações O Rio principalmente capital econômica e também política assistia à época das colheitas do Norte à drenagem do seu numerário para as praças dessa região e sofria as consequências disso elevação da taxa de descontos tabelas de juros muito altos dificuldade de realizar negócios pela falta de numerário penúria de moeda24 O mesmo fenômeno davase ainda na década de oitenta sendo que a essa altura as remessas também tinham o destino da cafeicultura As remessas periódicas que tinham o Norte como destino eram de vulto considerável 25 contudo diferentemente daquelas destinadas à região cafeeira não se prestavam ao financiamento da safra e sim à sua aquisição O Nordeste exportava açúcar para o mercado consumidor do Rio de Janeiro26 e as entradas na praça do Rio concentravamse em geral nos primeiros meses do ano e freqüentemente nos últimos meses do ano anterior como mostra a tabela 3 Aos pagamentos relativos a essas entradas correspondia a maior parte das remessas de valores para o Norte ao longo do ano Sendo assim a praça do Rio sofria periodicamente um dreno de liquidez oriundo da liquidação dos pagamentos do comércio com o Norte e o Sul que como sugerem os números da tabela 3 era superavitário para o Norte27 durante alguns meses do ano Essas pressões se juntavam às oriundas do financiamento da safra cafeeira no sentido de tornar instável a liquidez na praça do Rio seja pela sazonalidade na procura por crédito seja pelos drenos de numerário oriundos do comércio interprovincial TABELA 3 Entradas Trimestrais de Açúcar na Praça do Rio de Janeiro 18871890 Em sacas de 60 kg 1887 1888 1889 1890 Trimestre Do De Do De Do De Do De Norte Campos Norte Campos Norte Campos Norte Campos I 119957 29023 85792 75205 165098 41426 270972 11010 II 79824 37694 34331 29344 75179 33894 139652 24846 III 2398 204027 13404 175374 30306 89040 43501 147378 IV 10002 163109 37682 149339 180340 28455 126393 72127 Fonte RCJC vários números 26 Um outro fator que se acrescentava à instabilidade do crédito no Rio de Janeiro era a distribuição geográfica do comércio internacional do País O porto do Rio de Janeiro era geralmente deficitário no seu comércio exterior como mostra a tabela 4 porque concentrava a maior parte das importações do País São Paulo por exemplo tinha em seu comércio com o exterior grandes saldos positivos daí resultando que os importadores do Rio de Janeiro em determinadas épocas do ano tinham de fazer remessas de numerário para Santos a fim de lá adquirirem as cambiais de que necessitavam Em algumas ocasiões essas remessas davam origem a um dreno temporário na liquidez bancária do Rio de Janeiro em favor de São Paulo mas que tendia a corrigirse com alguma rapidez através do comércio entre as duas praças que era como sugere a tabela 4 favorável para o Rio de Janeiro TABELA 4 Comércio Exterior e Comércio Interno do Rio de Janeiro e de São Paulo 18801888 Em contos de réis Comércio Exterior Comércio com Outras Províncias Exercícios Rio de Janeiro São Paulo Rio de Janeiro São Paulo Expor Impor Expor Impor Expor Impor Expor Impor tação tação tação tação tação tação tação tação 18801881 115332 100362 29375 7829 18811882 99346 96190 32535 7745 33517 12732 2444 11170 18821883 91490 102485 30955 7787 18834 11933 1951 8155 18831884 85727 103588 46205 12059 18629 11474 2198 9662 18841885 109145 91144 47207 10416 17283 11763 1150 7373 18851886 92469 103699 35889 15324 25894 10843 881 9060 18861887 110524 105586 99417 32974 18122 18650 5014 16697 1888 95753 131369 51228 31753 22010 14747 1046 4419 Fonte RMF vários números Devese notar todavia que as pressões sazonais sobre os bancos extravasavam em geral o que se podia chamar de dificuldades ocasionais na praça do Rio Fatores institucionais tornavam esse problema um pouco mais sério O incipiente desenvolvimento da rede bancária como veremos a seguir tornava os bancos bastante vulneráveis às variações na procura por crédito e nos seus depósitos O sistema bancário não só era pouco desenvolvido como estava fortemente concentrado na capital A tabela 5 que nos mostra os bancos em funcionamento no País em junho de 1888 pode ilustrar adequadamente essas considerações Os dados da tabela 5 nos mostram um sistema bancário pouco desenvolvido e bastante concentrado Para melhor ilustrálo podemos utilizar o conceito de densidade bancária 28 segundo o qual em 1888 haveria 0043 agência bancária para cada dez mil habitantes29 o que seria considerado uma densidade muito baixa indicando um reduzido grau de desenvolvimento bancário30 Todavia como os 13 bancos da capital detinham mais de 80 do capital realizado total e proporção similar dos depósitos poderia parecer que o Rio de Janeiro era bastante desenvolvido financeiramente O mesmo índice de densidade mostra a existência de 0443 agência para cada 10 mil habitantes da província31 o que ainda caracteriza um baixo grau de desenvolvimento do sistema bancário Uma conseqüência importante do reduzido desenvolvimento do sistema bancário e sua pouca penetração no interior era tornar o entesouramento um hábito corrente nas cidades e ainda mais acentuado no interior Tecnicamente isso significa uma maior preferência do público não bancário em reter moeda sob forma de moeda manual em vez de sob forma de depósitos bancários Segundo The Economist em 1890 no Brasil era raro o uso de cheques com hábito comum ali de reterem os indivíduos em seu poder largas quantias em vez de depositálas em bancos Os pequenos negociantes os taverneiros por exemplo no Rio de Janeiro apenas excepcionalmente depositam 27 TABELA 5 Rede Bancária em 30 de junho de 1888 Valores em contos de réis Bancos Sede Capital Realizado Depósitosc Sucursais Ano da Fundação Banco do Brasil RJ 33000 58039 1853 Banco do Brasil Sucursal de S Paulo SP 8000 8139 nd Banco Internacional do Brasil RJ 12000 9124 3 1886 Banco do Comércio RJ 9900 4851 1874 Banco Comercial do Rio de Janeiro RJ 10000 10250 186566 Banco Industrial e Mercantil do Rio de Janeiro RJ 6000 5066 1872 London and Brazilian Bank RJ 5555 3522 13 1862 Brazilianische Fûr Deutschland RJ 4460 nd 1888 English Bank of Rio de Janeiro RJ 4444 5213 8 1863 Banco Rural e Hipotecário RJ 10000 28175 1854 Banco Predial RJ 2000 nd 1871 Banco de Crédito Real do Brasil RJ 999 25 1883 Banco União do Crédito RJ 200 834 1885 Banco Auxiliar RJ 500 423 1880 Banco del Credere RJ 2000 717 1886 Banco de Crédito Real de São Paulo SP 2000 nd 1881 Banco Mercantil de Santos SP 1000 2187 3 1872 Banco Comercial de São Paulo SP 1000 1817 2 1886 Banco da Lavoura de São Paulo SP 600 875 1885 Casa Bancária de São Paulo Nielsen Cia SP 1440 6779 nd Banco Popular de São Paulo SP 188 156 1888 Banco Territorial e Mercantil de Minas MGb 497 1200 1 1887 Banco Hipotecário MA nd nd nd nd Banco do Maranhão MA 1000a nd nd 1857 Banco Comercial do Maranhão MA nd nd nd 1869 Banco Comercial do Pará PA 2000a nd nd nd Banco do Pará Novo PA 1000a nd nd nd Banco da Bahia BA 8000a nd nd nd Banco Mercantil da Bahia BA nd nd nd nd Caixa Hipotecária da Bahia BA nd nd nd nd Sociedade de Comércio da Bahia BA nd nd nd nd Banco da Província RS nd nd nd nd Total 123323 133471 62d aCapital subscrito b Juiz de Fora cIncluem as contas correntes garantidas modernamente chamadas depósitos a prazo dConsideramos que os bancos dos quais não temos informações sobre sucursais têm apenas uma Fonte L R DOliveira 1889 p 34782 nos estabelecimentos De ordinário preferem ter consigo o seu dinheiro até a época de pagamentos satisfazendo então os seus débitos com as somas acumuladas em casa no decurso de seis a nove meses O mesmo sucede com as classes que vivem de 28 salário Os agricultores e outros habitantes do interior amuam grandes somas para satisfazer às suas necessidades e esse dinheiro leva meses ou anos para ir ter aos bancos A receita das alfândegas em vez de se depositar nos bancos e por eles transmitirse para o Rio de Janeiro acumulase em somas importantes expedidas periodicamente pelos paquetes para a capital 32 A baixa propensão do público para reter moeda sob forma de depósitos bancários significava uma limitação estrutural à capacidade dos bancos em expandir os seus empréstimos ou por outra expressava um reduzido valor do multiplicador bancário33 Nessas condições para que os bancos expandissem o crédito coeteris paribus obrigatoriamente veriam reduzirse sua relação encaixedepósitos ficando portanto em uma posição de liquidez mais vulnerável34 Na época de safra os bancos sofriam um dreno de caixa ao verem seus depósitos migrarem para o campo e ao ficarem mais vulneráveis viamse forçados a assumir políticas defensivas reduzindo suas aplicações eou elevando suas taxas de desconto Frequentemente esse fenômeno criava dificuldades na praça do Rio que se aproximavam de caracterizar uma crise comercial nesse sentido a sazonalidade envolvida na procura de crédito tornavase um problema para a economia do Rio de Janeiro cujos determinantes estavam ligados ao baixo grau de desenvolvimento do sistema bancário e sua pouca penetração no interior Havia uma percepção mais ou menos clara de que as dificuldades de liquidez nas épocas de safra eram temporárias Referindose à crise de liquidez do final de 1886 por exemplo o Jornal do Commercio afirmava que tal estado de coisas era apenas a repetição da crise periódica que se observa nessa praça nos fins dos semestres e quando grandes somas são mandadas para as províncias a fim de aí moverem as safras 35 Na capital o comércio frequentemente referiase ao fenômeno acima descrito como a inelasticidade do meio circulante De acordo com o Jornal do Commercio a elasticidade do meio circulante é a sua propriedade de contrairse ou expandirse acompanhando os movimentos dos mercados com a mesma facilidade com que a sombra acompanha os movimentos do corpo36 Assim como eram variáveis as necessidades dos negócios ao longo do ano o sistema bancário deveria ajustar a oferta de crédito a esse movimento mas como frequentemente nas épocas de safras os bancos não conseguiam fazêlo diziase que era inelástico o meio circulante Poderseia argumentar que a criação em larga escala de bancos principalmente no interior atuaria no sentido da estabilidade pois permitiria que o público utilizasse mais os depósitos bancários visàvis moeda manual como forma de armazenar poder de compra Dessa maneira o caráter sazonal da procura por crédito por parte da lavoura não seria tão perigoso uma vez que o sistema bancário contaria com maior grau de liberdade para prevenir oscilações violentas na liquidez Por outro lado devese mencionar que a procura por moeda por parte da lavoura não era apenas sazonal mas também bastante instável As safras de café por exemplo estavam sujeitas a diversos elementos aleatórios sendo que no curto prazo a instabilidade era propiciada pelo fato de que os mercados de café nos portos do Rio e de Santos eram essencialmente especulativos dominados por expectativas voláteis e também pelas flutuações do mercado de câmbio que era como veremos nas duas seções seguintes ainda mais instável Assim em função do acima descrito podemos ter alguma indicação quanto à natureza do impacto da disseminação do trabalho assalariado no campo sobre o sis29 tema monetário A elevação das necessidades de numerário no campo haveria de se mostrar clara nas safras dos anos próximos a 1888 A presença de crises de liquidez nesses anos especialmente quando ligadas a remessas para o interior constitui uma evidência do impacto acima mencionado Mais adiante no entanto vamos examinar detidamente a configuração dessas crises assim como os outros fatores que sobre elas tiveram influência 12 A política monetária nos anos oitenta O Segundo Império é tido em geral como um período no qual a administração monetária teria sido marcadamente conservadora e apesar de alguns poucos per todos de exceção a economia teria estado sob um contínuo viés deflacionista No entender de Furtado isso seria especialmente válido nos últimos anos do Império pois a política monetária do governo imperial nos anos oitenta traumatizada pela miragem da conversibilidade por um lado conduzia a um grande aumento da dívida externa e por outro mantivera o sistema econômico em regime de permanente escassez de meios de pagamento37 Entretanto uma avaliação global da década de oitenta é problemática uma vez que esses anos abrigam um claro período de estagnação na primeira metade da década e um de expansão e também de profundas transformações na segunda metade Envolve decerto um problema de causalidade afirmarse que houve restrição de liquidez nos primeiros anos da década de oitenta a partir da evidência de que a oferta de moeda permaneceu estável Essa mesma evidência como a seguir veremos não estava isenta de algumas qualificações importantes Os meios de pagamentos no Brasil do final do Império incluíam diversas espécies de moeda Havia notas inconvertíveis do Tesouro em grande quantidade notas inconvertíveis de vários bancos moedas metálicas nacionais e estrangeiras e depósitos bancários Em geral tomase a série de notas do Tesouro somadas às do Banco do Brasil como o melhor indicador para os meios de pagamento uma vez que não estão disponíveis dados anuais para os outros componentes dos meios de pagamento o que não significa que esses outros componentes não tenham sido importantes A tabela 6 mostra o volume de notas do Tesouro e do Banco do Brasil em circulação de 1872 a 1889 A esses valores devem ser acrescentados os das notas do Banco da Bahia das quais em setembro de 1890 ainda restava em circulação cerca de 904 contos do Banco do Maranhão que na mesma data somavam 155 contos e do Rio Grande do Sul cujo valor provavelmente pequeno era desconhecido38 Também se deveria acrescentar aos totais da tabela 6 os valores de moedas metálicas em circulação cujos montantes entretanto são difíceis de determinar A tabela 7 fornece a cunhagem de moedas de ouro e prata no Brasil desde 1810 Apesar de o total ser representativo39 é impossível dizer que percentagem daquelas moedas ainda permaneciam em circulação no País40 Para contarmos com uma série relativa aos meios de pagamento ainda teríamos de computar os depósitos bancários A média dos depósitos à vista e a prazo41 para os anos de 1879 e 1880 foi de 97904 contos Para o biênio 18861887 a média chegou a 112414 contos e para 18881889 atingiu 121366 contos42 De 18791880 e de 18881889 o crescimento dos depósitos seria próximo a 24 e se aceitarmos que os 30 TABELA 6 Notas do Tesouro e do Banco do Brasil 18721889 Em contos de réis Exercícios Notas do Tesouro Notas do Banco do Brasila Total 1872 158078 40727 198805 1873 149579 33432 185011 1874 149579 35432 187011 1875 149502 32367 181869 1876 149422 30042 179422 1877 149347 30009 179356 1878 181279 27656 208965 1879 181279 27656 208965 1880 189199 26478 215677 1881 188155 24129 212284 1882 188110 24129 212129 1883 188041 22956 210997 1884 187936 21689 209625 1885 187343 20517 207862 1886 194282 19300 213582 1887 184335 17956 202291 1888 188869 16419 205288 1889 195486 11337 206823 aNotas emitidas quando o Banco foi emissor e com curso forçado desde 1866 Fonte Brasil Secretaria de Planejamento da Presidência da República Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística FIBGE Anuário Estatístico do Brasil 193940 p 1353 TABELA 7 Cunhagem de Moedas de Ouro e Prata no Brasil 18101887 Em contos de réis Anos Ouro Prata 18101829 8114 16039 18301849 951 67 18491859 37240 8181 18591887 8411 10788 Total 54716 35075 Fonte GrãBretanha Report on the Finances 1887 and 1888 Wyndham to the Marquis of Salisbury p 145 depósitos representavam 13 dos meios de pagamento então apesar de um decréscimo de cerca de 4 no papelmoeda em circulação ainda teríamos um crescimento superior a 5 nos meios de pagamento Esse crescimento pode não caracterizar uma situação de 31 restrição de liquidez dependendo de como evoluiu a procura por moeda nos anos oitenta A ausência de medidas precisas para a oferta de meios de pagamento dificulta a tarefa de buscar indicadores quantitativos do caráter restritivo da política monetária É possível detectar no entanto a orientação da política monetária nos anos oitenta através de outras considerações Uma maneira de captar a intenção deflacionista da política monetária durante a maior parte da década de oitenta é atentar para a aversão das autoridades em recorrer à emissão de moeda para financiar os déficits do Tesouro De fato apesar da presença de déficits em quase todos os exercícios de 1880 a 1888 a emissão de moeda para financiálos foi praticamente inexistente como mostra a tabela 8 Em virtude da constante presença de déficit orçamentário só foi possível manter estável o estoque de notas emitidas4 3 ao custo de uma dívida pública crescente A dívida pública interna em 1881 era da ordem de 407700 contos e em 1888 atingiu 443943 contos44 A dívida externa cresceu de 165 milhões de libras em 1880 para 286 milhões de libras em 1888 Diante dos encargos criados pelo crescimento da dívida pública poderseia indagar por que tamanho empenho em não elevar a emissão do Tesouro E para isso os contemporâneos tinham como adiante veremos justificativas bastante articuladas TABELA 8 Execução Orçamentária do Tesouro Nacional 18801888 Em milhares de contos Exercício 188081 188182 188283 188384 188485 188586 188687a 1888 Ministro Cons J A Saraiva Cons J A Saraiva M A Silva Campos Visc de Paranaguá Cons Lafayette Cons J A Saraiva Francisco Belizário J Alfredo Receita 1283 1304 1297 1326 1219 1268 2187 1507 Despesa 1386 1395 1529 1543 1585 1536 2270 1474 Saldo 103 91 232 217 366 278 83 33 Saldo anterior 233 33 nd 725 Emissão títulos 110 40 177 189 nd 473 Emissão de moedab 01 01 02 02 01 nd 03 nd Empréstimos externos 350 527 Bilhetes em circulaçãoc 116 289 289 467 466 500 748 313 aNesse exercício houve mudança do ano fiscal Os exercícios anteriores iam de junho a junho e os exercícios posteriores a 188687 iam de janeiro a dezembro Na mudança de ano fiscal o exercício de 188687 ficou com três semestres o que explica seus valores elevados para receita e despesa bCorresponde à emissão de moedas de níquel para troco cEsses bilhetes são títulos do Tesouro prazos de quatro a seis meses que pagavam juros de 4 12 e eram emitidos mediante autorização legislativa geralmente como antecipação de receita Em virtude do movimento de amortização e emissão desses títulos os valores correspondentes ao financiamento do déficit do Tesouro não coincidem exatamente com o valor do próprio déficit Fonte Brasil Balanço de Receita e Despesa vários números e RMF vários números 32 A política monetária nos anos oitenta foi conduzida efetivamente de acordo com a meta da conversibilidade Os Ministros da Fazenda da época assim como a maioria dos contemporâneos repetiamse incansavelmente sobre as vantagens da circulação metálica conversível Isso significava uma oferta monetária composta apenas por notas livremente conversíveis em ouro de acordo com a paridade oficial estabelecida em 1846 isto é 27 pence por mil réis4 5 Entretanto a aspiração pelo estabelecimento da circulação metálica viase dificultada pela crônica escassez de reservas metálicas no País Como o País não dispunha de metal para exportar de modo a preservar a paridade em situações onde o balanço de pagamentos era adverso a taxa de câmbio caía abaixo do par e a conversibilidade era imediatamente suspensa Nessas condições a adesão do País ao padrãoouro mantendose a paridade de 1846 embora desejável esbarrava por um lado na intransponível barreira de um balanço de pagamentos permanentemente deficitário e por outro lado na relutância do governo em seguir um plano deflacionista até as suas últimas consequências E assim a atitude do Tesouro esteve próxima por vezes de simplesmente aguardar que a taxa de câmbio atingisse a paridade como resultado natural das forças em operação no mercado de câmbio para aí decretar a conversibilidade Cogitouse também de se contrair um grande empréstimo externo destinado a fazer o resgate do papelmoeda e instaurar a conversibilidade Acreditavase no entanto que o empréstimo poderia elevar o câmbio à paridade mas tão logo cessassem os efeitos do influxo de metal o câmbio se desvalorizaria e haveria uma corrida para a conversão das notas com perdas para o Tesouro Por outro lado notese que um empréstimo como esse dificilmente livraria o Tesouro de perder alguma autonomia na condução da política monetária doméstica face às prováveis sugestões de política econômica dos banqueiros Acreditavase outrossim que a depreciação do câmbio tinha causas bem definidas as quais era preciso combater Segundo Francisco Belizário Ministro da Fazenda em 1886 e provavelmente o mais renomado financista conservador de seu tempo a baixa do câmbio deviase inequívocamente à superabundância de papelmoeda inconversível46 Para Belizário o valor do papelmoeda depende de sua quantidade mas não é na soma numérica das notas que se pode achar o critério para conhecer a deficiência ou o excesso do meio circulante o critério único está no preço do ouromercadoria e no estado do câmbio sendo a depreciação consequência do excesso de papelmoeda ir reduzindo a sua quantidade será aumentarlhe o valor Nisto consiste a primeira condição para chegarmos à circulação metálica47 Inúmeras expressões das mesmas idéias podem ser coletadas nos discursos e documentos da maioria dos Ministros da Fazenda e estadistas do Império É interessante notar contudo que essas idéias baseavamse em uma doutrina bastante articulada e de origens não só remotas como ilustres A noção de que a existência de ágio sobre o preço do ouro ou a permanência da taxa de câmbio abaixo da paridade era um indicador do excesso de oferta ou superabundância de papelmoeda fora o argumento central de David Ricardo nas controvérsias inglesas em torno da suspensão da conversibilidade das notas do Banco da Inglaterra durante as guerras napoleônicas48 Em certa medida a controvérsia inglesa foi resolvida por uma comissão do Parlamento que produziu um documento que exerceu uma influência extraordinária sobre o pensamento econômico49 e que recomendava o retorno da GrãBretanha ao 33 padrãoouro à paridade anterior à guerra representando uma clara vitória 50 de Ricardo e seus adeptos que ficaram conhecidos como bulionistas Podese interpretar o pensamento metalista brasileiro dessa época com o auxilio de diversas teorias modernas mas essas diferentes leituras acusariam poucas diferenças essenciais entre si Podese por exemplo interpretar as idéias bulionistas através do moderno enfoque monetário do balanço de pagamentos mas não parece que isso nos vá ser de alguma valia Devemos lembrar que as visões de Hume Smith Ricardo Torrens Bagehot Marshall ou Keynes podem ser essenciais para explicar por que determinadas políticas foram adotadas políticas essas que afetaram o curso da história econômica mas na suposição de que suas teorias explicavam os eventos a que elas se seguiram é um assunto bastante diferente 51 Como este é um trabalho sobre política econômica interessanos primordialmente o formato contemporâneo das teorias nas quais se baseava a política econômica e muito pouco o mérito analítico das ditas teorias De acordo com Ricardo o estoque mundial de ouro monetário se encontra dividido entre os diversos países de acordo com o estado do seu comércio e riqueza 52 e a taxa de câmbio entre as moedas de dois países que mantenham circulação metálica conversível é exatamente igual à razão entre os respectivos estoques de moeda metálica 53 Se um país aumenta seu volume de notas em circulação faz as mercadorias pelas quais sua moeda é trocada comparativamente mais caras ou baratas 54 O aumento do volume de notas em circulação eleva portanto todos os preços reduzindo o valor isto é o poder de compra dessas notas A lei de Gresham determina então que o ouro desapareça da circulação eou que seja exportado pois em retorno pelo ouro exportado mercadorias serão importadas o que é freqüentemente tido como uma balança comercial desfavorável para o país exportador de moeda ou barras de ouro 55 As exportações de ouro prosseguem até que a relação de troca se alinhe com a proporção dos estoques de ouro entre os dois países 56 Em um regime de taxas de câmbio flexíveis as emissões em demasia teriam efeitos sobre o câmbio que nada mais seria nessas condições e de acordo com esta teoria que o poder de compra do meio circulante metálico do País O câmbio será portanto um critério razoavelmente apurado pelo qual podemos avaliar a degradação da moeda em virtude do papelmoeda depreciado 57 Esta é apenas uma maneira muito simples de descrever o mecanismo monetário de ajustamento automático sob o padrãoouro O fato de que grande parte dos financistas brasileiros da época pensavam exatamente dessa forma e adiante nesse trabalho vamos documentálo fartamente pode explicar em alguma medida a orientação da política monetária durante o Segundo Império e também em alguns períodos posteriores Entretanto a política econômica é governada por interesses ou melhor as metas da política econômica são determinadas por interesses E a adesão do País ao padrãoouro era um objetivo cujo principal subproduto a estabilidade cambial vinha de encontro aos mais variados interesses A taxa de câmbio era sem dúvida o mais importante preço em vigor nessa época Isso se devia a seu impacto sobre o nível de atividade sobre os gastos do governo sobre o nível de preços e sobre a distribuição da renda O câmbio tinha relações com a formação doméstica de capital na medida em que tinha influência sobre os preços dos bens de capital importados sobre o grau de proteção à indústria 34 doméstica e sobre a lucratividade do setor exportador 58 O câmbio dominava as variações no nível de preços domésticos face à elevada participação dos bens de consumo importados na composição da demanda doméstica Mais da metade da receita tributária da União advinha dos impostos sobre as importações 59 e várias despesas eram denominadas em libras os pagamentos relativos à dívida externa à dívida interna em ouro e as garantias de juro a empresas estrangeiras 60 O resultado de caixa do Tesouro era portanto fortemente influenciado pelas flutuações no câmbio Além disso o câmbio era um determinante importante das rendas em mil réis dos exportadores e dos lucros do comércio importador As flutuações na taxa de câmbio eram freqüentes e violentas como mostra a tabela 9 A instabilidade do câmbio se devia inequivocamente à instabilidade do próprio balanço de pagamentos do País Pelo lado comercial devese notar que as exportações de café variavam bastante de ano para ano em função de diversos fatores exógenos como os ciclos cafeíros os preços internacionais e a procura As exportações atingiram cerca de 195 milhões em 1884 caíram para 151 milhões em 1885 subiram novamente para 205 milhões em 188661 Pelo lado da contacapital notese que o investimento direto estrangeiro atingiu 68 milhões em 1883 caiu para 451 mil no ano seguinte subiu em seguida gradativamente para 18 milhão em 1887 e atingiu o expressivo valor de 128 milhões em 188862 Afora isso o Tesouro realizou três empréstimos externos em 1883 1886 e 1889 respectivamente de 4 milhões o primeiro e 6 milhões os dois seguintes O saldo desses movimentos superpostos não poderia deixar de ocasionar uma notável instabilidade da taxa de câmbio Devese também mencionar o fato de que o mercado de câmbio era um mercado caracteristicamente especulativo 63 Era um mercado aberto no sentido de que qualquer pessoa poderia comprar e vender divisas embora o mercado fosse dominado por alguns grandes operadores como os bancos ingleses o Banco do Brasil o Banco TABELA 9 Taxas de Câmbio 18801888 Médias mensais Pence por mil réis Meses 1880 1881 1882 1883 1884 1885 1886 1887 1888 Jan 23 14 22 12 20 1316 21 58 21 34 19 12 17 1316 22 216 24 116 Fev 21 710 21 35 20 716 21 36 22 16 19 17 1516 22 16 24 14 Mar 20 15 21 716 20 78 21 12 21 58 18 58 18 1516 21 1316 23 716 Abr nd 21 14 21 23 21 12 21 18 14 20 916 21 58 23 716 Maio 20 12 21 18 21 716 21 12 20 38 18 310 21 78 22 14 23 78 Jun 22 35 21 35 21 12 21 38 20 45 18 18 21 18 22 18 24 38 Jul 23 14 22 21 12 21 14 20 18 20 34 22 18 25 16 Ago 23 12 22 18 21 516 21 14 20 58 18 116 21 18 22 38 26 16 Set 23 38 22 1516 21 316 21 14 19 78 18 38 21 916 22 58 26 12 Out 22 1516 nd 21 716 21 12 19 34 18 22 22 38 27 16 Nov 22 1516 nd 21 916 21 12 19 12 17 78 21 78 22 34 27 16 Dez 22 38 nd 21 14 21 58 19 12 18 22 516 23 316 27 16 Fonte RCJC vários números e RMF vários números 35 Internacional e o Tesouro Nacional 64 Era um mercado organizado no sentido de que era geograficamente localizado faziamse negócios na Bolsa de Valores em geral a maior parte e em bancos 65 e havia funcionários do mercado cujo único trabalho era divulgar a informação relevante cotações e negócios feitos por exemplo Era um mercado onde o produto era mais ou menos homogêneo 66 e tinha custos de estocagem desprezíveis 67 em relação às oscilações de preço o que abria a possibilidade de especulação bem sucedida À luz disso tudo podemos concluir que a estrutura institucional do mercado de câmbio não contribuía no sentido de atenuar as flutuações cambiais 68 As flutuações cambiais impunham alterações bruscas na distribuição da renda nos preços e no nível de atividade Além disso freqüentemente resultavam em despesas vultosas para o Tesouro como diferenças de câmbio Os estadistas do Império percebiam com clareza as conseqüências da instabilidade cambial Torres Homem Ministro da Fazenda em 1871 propunha então uma volta ao regime de circulação metálica como remédio radical às grandes flutuações dos valores sem o que a indústria ou a propriedade não podem progredir pois que lhes falta a estabilidade do valor no instrumento de circulação dos seus produtos Não é só o comércio que sofre as consequências do papelmoeda todas as classes de população estão sujeitas à sua perniciosa influência 69 O Visconde de Paranaguá afirmava em seu relatório de 1883 que o câmbio com as suas oscilações e tendências deprimentes perturba todos os cálculos e arroja o Tesouro a precipícios e perdas incalculáveis 70 Para Belizário a instabilidade cambial entorpece o crescimento das indústrias e tornase o cancro oneroso de todas as classes 71 Também os credores do País preocupavamse com a instabilidade cambial pois lhes criava incertezas quanto a seus negócios financeiros e comerciais De acordo com o cônsul inglês em princípios de 1889 em sendo a estabilidade do câmbio uma necessidade primária para o Brasil seria também indiretamente muito mais satisfatória para a Inglaterra do ponto de vista dos negócios assim como do ponto de vista da amizade e interesse na prosperidade desse Império 72 A meta da estabilidade cambial juntamente com as posturas doutrinárias que mencionamos explicam em toda a sua extensão o contínuo desejo das autoridades em promover a circulação metálica conversível Pouco se discutia por outro lado se realmente com a conversibilidade seria eliminada a instabilidade macroeconômica causada em última instância pelos movimentos erráticos do balanço de pagamentos simplesmente pela eliminação da causa aparente de todos os problemas a instabilidade do câmbio Pouco se falava também no que seria necessário fazer para conservar a taxa de câmbio a 27 pence por mil réis caso fosse atingida Havia uma crença estabelecida durante os anos oitenta da qual voltaremos a tratar mais adiante de que os movimentos do câmbio eram imprevisíveis e incontroláveis de modo que a taxa de paridade que as forças em operação no mercado de câmbio pudessem trazer pod a rapidamente desaparecer sob o efeito das mesmas forças Parecia haver possibilidades de erigir instituições monetárias que tivessem algum poder para estabilizar o câmbio mas acreditavase que as oscilações nas nossas contas externas pareciam mesmo grandes demais para serem neutralizadas por intervenções no mercado de câmbio Também grande ou ao menos inconveniente parecia ser a deflação necessária para apreciar o câmbio ao par Diversas vezes a tentativa teve início mas jamais 36 continuidade Os documentos dos Ministros da Fazenda das últimas décadas do Império sempre começavam por grandiloqüentes demonstrações bulionistas e austeros planos de contenção de despesa e recolhimento de papelmoeda E os invariáveis insucessos eram justificados por circunstâncias adversas ou pela necessidade de evitar uma recessão muito violenta Ao se colocar o problema da reforma monetária no final dos anos oitenta pensavase em um conjunto de instituições que se amoldassem às novas condições mas que obrigatoriamente promovessem a estabilidade cambial Para os expoentes da ortodoxia metalista isto significava que as novas condições teriam de permitir ou facilitar um plano deflacionista que levasse à conversibilidade Mas essa idéia iria chocarse com a própria resposta que era exigida pelas novas condições que como veremos de forma clara no segundo capítulo tornavam a expansão uma necessidade imperiosa 13 O balanço de pagamentos Em alguma medida os contemporâneos percebiam que as variações das contas externas influíam sobre as oscilações na taxa de câmbio Admitiase mais precisamente que sob um regime de inconvertibilidade o câmbio ficava sujeito à influência da balança comercial e dos eventuais empréstimos externos contraídos pelo Tesouro Frequentemente mencionavase também que a especulação no mercado de divisas pela qual seriam responsáveis os bancos ingleses era uma causa importante para as flutuações cambiais Mas a visão contemporânea dos determinantes da taxa de câmbio sob um regime de inconvertibilidade limitavase em geral a essa visão parcial e incompleta das relações do País com o exterior Essa percepção incompleta somente poderia jusfificarse pela insignificância de todos os outros itens do balanço de pagamentos ou pelo fato de que esses outros itens eram pouco perceptíveis e portanto a compreensão do balanço de pagamentos no sentido moderno era reduzida A balança comercial e os empréstimos públicos eram influências bastante visíveis sobre o câmbio e assim suas flutuações eram algumas vezes perfeitamente previsíveis Sabiase por exemplo que quando o Tesouro sacava sobre um crédito em Londres o câmbio provavelmente sofreria uma influência positiva ou que analogamente o câmbio baixaria quando o Tesouro fosse ao mercado adquirir os meios para fazer frente a seus compromissos no exterior Entretanto freqüentemente a taxa de câmbio acusava flutuações violentas que se apresentavam aos contemporâneos como inexplicáveis O Tesouro os bancos nacionais e ingleses demonstravam a mais genuína perplexidade nessas ocasiões e em geral os últimos eram objeto de extremadas acusações Esses fatos estilizados que nos capítulos que se seguem iremos documentar parecem sugerir que havia influências significativas sobre o câmbio que não eram percebidas pelos contemporâneos Um exame expost da evolução do comércio exterior brasileiro assim como dos empréstimos públicos nas últimas décadas do século XIX de fato pouco revela sobre as flutuações cambiais Aparentemente movimentos de capital e outros itens invisíveis do balanço de pagamentos poderiam ser úteis para explicar as flutuações cambiais A consideração explícita desses itens cuja evolução até hoje não foi objeto de estudo sistemático poderia fornecer uma alternativa promis 37 sora tanto às visões conservadoras que ainda associam o câmbio à oferta de moeda quanto às interpretações que se sustentam sobre alguma forma de superestimação do papel do preço do café ou do estado dos negócios cafeiros na formação da taxa de câmbio Essas considerações sugerem a oportunidade em se proceder à difícil tarefa de construir estimativas para o balanço de pagamentos do Brasil do final do século XIX Embora haja inúmeras imprecisões nas estatísticas existentes que por sua vez não se encontram disponíveis para diversos itens importantes foi possível coligir algarismos para a maior parte das contas mais importantes As omissões e as imprecisões nas estatísticas não nos autorizam a classificar nossos resultados mostrados na tabela que se segue em mais do que uma estimativa para o balanço de pagamentos do Brasil de 1876 a 1897 Os dados são apresentados na base de médias anuais para os períodos indicados porque dessa maneira se atenuam algumas imprecisões existentes nas séries anuais 7 3 A escolha dos períodos a que se referem as médias baseouse na simples inspeção dos dados anuais reproduzidos no anexo e a periodização obtida revelouse coerente não só com a evolução da taxa de câmbio como também com algumas hipóteses interessantes sobre o relacionamento do Brasil com o exterior Apesar de todas as omissões qualificações e vieses a que esses números estão sujeitos e que são extensamente discutidos no anexo a esta seção os dados se mostram coerentes com a idéia de que as contas externas brasileiras contavam com itens muito significativos além das contas comerciais e empréstimos públicos Os dados da tabela 10 mostram saldos negativos em conta corrente durante todo o período apesar de que a balança comercial tenha se mostrado em média superavitária Isso se devia em parte ao fato de que a comercialização e o transporte de mercadorias importadas e exportadas eram feitos na sua quase totalidade por empresas estrangeiras E se devia também aos gastos governamentais no exterior notada TABELA 10 Estimativa para o Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 Médias anuais em milhares de libras 187680 188185 188689 189094 189597 1 Balança Comercial 3867 1769 3696 3525 2240 Exportações FOB 20036 18124 23563 29374 28934 Importações CIF 16169 16355 19867 25849 26694 2 Saldo de Serviços 4177 4376 5264 7263 7674 Fretes Seguros 2691 2731 2575 2716 2761 Rendas de Capitais 1275 1351 2106 2445 2525 Outros Serviços 211 294 583 2102 2388 3 Transações Correntes 310 2607 1568 3738 5434 4 Movimento de Capitais 805 2481 10965 549 6190 Empréstimos 121 854 10539 902 4250 Amortizações 632 669 4984 455 465 Investimento Direto 1315 2666 5410 102 2405 5 Saldo Global 495 126 9397 3189 756 Fonte Ver anexo a esta seção 38 mente com o serviço da dívida pública externa e garantias de juros O volume desses gastos como se pode verificar na tabela 10 dobrou do primeiro ao último período sendo que podemos localizar esse salto nos anos 18861894 A esse crescimento correspondeu por um lado um significativo aumento do volume de comércio a partir de 1886 O período 18861894 engloba anos de altos preços e maior volume de produção de café em relação ao decênio anterior 7 4 A receita em divisas das exportações de café elevouse a partir da média de 117 milhões em 18761885 ao valor de 136 milhões em 18881889 e em seguida à média anual de 200 milhões em 18901894 tendo no período seguinte se mantido em 195 milhões 7 5 As importações acusaram também um aumento significativo em 18861889 e outro ainda maior em 18901894 Esse aumento poderia ser atribuído naturalmente à própria expansão do nível de atividade doméstica As importações de bens intermediários e de capital ingleses por exemplo que atingiram a soma de 84 milhões durante 18851889 elevaramse a cerca de 143 milhões no qüinqüênio seguinte que representavam 368 das importações oriundas da Inglaterra contra 284 em 18851889 e 269 em 18801884 7 6 Juntamente com o crescimento do volume de comércio durante 18861894 cresceram bastante as despesas governamentais no exterior especialmente com a dívida externa É difícil no entanto apreciar com precisão quais foram os números absolutos de cada item dos gastos governamentais no exterior devido à maneira como eram contabilizados 7 7 O crescimento da conta outros serviços deveuse quase que inteiramente às diferenças de câmbio que por sua vez correspondiam a todos os gastos do governo no exterior incluindo alguns como importações de mercadorias e amortizações que não deveriam constar da conta de serviços O saldo de outros serviços encontrase portanto superestimado mas não de maneira muito séria O saldo do movimento de capitais como se pode verificar na tabela 10 apresenta flutuações bastante significativas A conta de empréstimos por exemplo registra em 18861889 um valor demasiadamente alto em relação aos outros períodos o que também é verdade para a conta de amortizações Isso na verdade corresponde a um fenômeno apenas contábil Em 1889 realizouse um grande empréstimo externo no valor de 198 milhões que destinavase somente a converter os títulos dos empréstimos anteriores de 5 para 4 12 A operação significava um acréscimo líquido de somente 2275 mil na dívida externa uma vez que iria amortizar um valor correspondente a 17652 mil correspondentes a títulos dos empréstimos de 1865 1871 1875 e 1886 que pagavam 5 de juros Por essa razão o valor referente a amortizações no período 18861889 encontrase inflado apenas contabilmente Mesmo levando em conta que houve um aumento apenas contábil no valor dos empréstimos no período 18861889 ainda assim se poderia destacálo com um período de elevadas entradas de capital de empréstimos O Tesouro contraiu dois empréstimos no valor de 60 milhões em 1886 e 1888 que somados aos 66 milhões de empréstimos privados contraídos no período e aos 2275 mil líquidos oriundos do empréstimo de conversão fornecem o valor total de 20895 mil várias vezes superior ao volume total de empréstimos contraídos no período anterior 4274 mil e ao total do período seguinte 4510 mil Notese que os empréstimos públicos representavam até certo ponto algum controle por parte do Tesouro dos saldos da conta capital Entretanto esses empréstí 39 mos públicos enquanto instrumento de política cambial tinham sua potencialidade diminuída pelo fato de que tinham de ser em alguma parte utilizados para financiamentos de déficit orçamentário Evidentemente quanto maior o déficit orçamentário uma vez bloqueada a possibilidade de emissão de moeda ou títulos da dívida pública interna menores eram os graus de liberdade do governo no manejo de suas reservas para fins de política cambial Por outro lado o recurso ao empréstimo nem sempre estava disponível ou nem sempre se podia fazêlo em condições satisfatórias Os Rothschild assim como o mercado onde eles colocavam nossos títulos tinham padrões rígidos de avaliação da credibilidade do País e esses critérios freqüentemente estavam em desacordo com a condução da política econômica local A contratação de empréstimos nessas condições era dificultada não só pela relutância dos banqueiros como também pelo fato de que condições desfavoráveis de lançamento comprometiam a execução orçamentária futura Assim o controle que o Tesouro podia exercer sobre os movimentos de capital de empréstimos era condicionado pela folga orçamentária e pelas possibilidades de colocação de títulos brasileiros em Londres Mesmo essa reduzida margem de controle o Tesouro já não tinha com relação aos movimentos de capital de risco O investimento direto estrangeiro parecia obedecer em maior escala às condições da economia internacional e ao estado dos principais mercados financeiros do que aos fatores de atração originados pela política econômica local como as concessões de garantias de juro ou diferenciais de taxa de juros78 Na verdade havia uma correspondência bastante estrita entre as exportações de capital inglês para o mundo e para a América do Sul e os investimentos estrangeiros no Brasil o que sugere a exogeneidade dos movimentos de capital estrangeiro para o Brasil mas não afasta a possibilidade de o Tesouro exercer algum controle sobre esses movimentos Essa correspondência pode ser observada na tabela 11 Os anos 18761880 coincidem com um período de desaceleração nas exportações de capital inglês mas antes de 1880 já havia sinais de recuperação O ano de 1883 correspondeu a um pico nos investimentos estrangeiros no Brasil e também correspondeu a um pico no investimento inglês na América do Sul Os anos 18861889 mostraram um acentuado crescimento das exportações de capital inglês no mundo inteiro sendo que os valores relativos à América do Sul nesses anos situavamse bem acima da média e no Brasil verificase em 1888 o maior valor registrado em todo o período Nos anos 18901894 ocorre uma violenta crise no balanço de pagamentos cuja origem se localiza inequivocamente na conta capital Nenhum abalo importante nos preços do café se verificou nesses anos79 o que demonstrava que apesar de a demanda por café estar associada ao andamento das principais economias centrais os ciclos de preço do café não se apresentavam sincronizados comos ciclos de movimento de capital Embora esses dois ciclos pudessem se sobrepor os anos 18901894 mostram movimentos claramente divergentes entre o movimento comercial e o movimento de capitais No período 18901894 a queda verificada nos investimentos estrangeiros no Brasil foi ainda mais abrupta que a verificada nas exportações de capital inglês para o mundo e para a América do Sul As oscilações nos movimentos de capital para o Brasil correspondiam às verificadas para a América do Sul e resto do mundo mas a intensidade das flutuações obedecia em determinados casos a fatores estritamente locais Nos 40 TABELA 11 Investimentos Ingleses no Exterior e Investimentos Estrangeiros no Brasil 18761897 Em milhões de libras No Mundo Na América do Sul No Brasild Imlaha Hobsonb Simonc Simonc Investimento Direto Empréstimos 1876 232 263 304 15 21 1877 131 137 194 06 23 1878 169 250 317 19 04 01 1879 355 270 205 11 00 1880 356 407 417 31 17 05 1881 657 600 742 62 17 01 1882 587 498 675 76 17 1883 488 455 612 138 68 40 1884 723 570 630 97 05 00 1885 623 559 553 71 09 01 1886 789 562 698 193 12 62 1887 877 658 844 189 27 27 1888 919 1012 1191 403 128 90 1889 809 1071 1229 402 50 67 1890 985 1013 1166 233 10 1891 694 512 576 94 04 1892 591 323 398 54 10 1893 530 252 321 54 01 38 1894 387 489 483 17 01 07 1895 400 576 777 41 05 60 1896 568 373 685 118 58 20 1897 416 367 784 49 09 47 Fontes e observações a A Imlah 1958 p 7275 b C K Hobson 1914 p 219 c M Simon 1967 p 5256 Os totais correspondem a investimentos de portfolio d Vejase tabela A4 no anexo a esta seção Notese que a série referente à América do Sul referese a investimentos ingleses de portfolio enquanto que os valores assinalados são investimentos diretos estrangeiros Daí se explicam os dois valores para o Brasil que são superiores aos verificados para a América do Sul anos 18901894 por exemplo dois fatores específicos atuaram no sentido de contrair violentamente as entradas de capital Por um lado a mudança de regime e a instabilidade política que se seguiram ao 15 de novembro de 1889 provocaram uma violenta queda das cotações dos títulos brasileiros em Londres e também criaram dúvidas sobre a estabilidade política dos anos seguintes e mesmo sobre a integridade do território nacional Por outro lado em 1890 uma crise financeira em Londres oriunda da suspensão de pagamentos da casa Baring teve efeitos decisivos sobre o investimento inglês na América do Sul e em particular na Argentina A falência da casa Baring deveuse a um acúmulo excessivo de títulos argentinos nas mãos desses banqueiros títulos esses que não foram honrados pela Argentina A insolvência argentina deu origem a uma séria crise financeira em Londres que teve como resultado criar um clima de desconfiança para com investimentos na Argentina que facilmente se estendeu face a algumas similaridades entre os dois países ao Brasil e à América do Sul em geral No período 18901894 não se registrou sequer uma nova companhia inglesa destinada a operar no Brasil e tampouco nenhuma das existentes lançou novas ações em Londres 41 As flutuações na taxa de câmbio verificadas neste período podem ser bastante bem explicadas com o auxílio da tabela 10 Vemos por exemplo que nos anos 18861889 quando o balanço de pagamentos foi fortemente superavitário a taxa de câmbio acusou uma apreciação gradativa de 17 1316 pence por mil réis em janeiro de 1886 e a taxa de paridade 27 pence por mil réis em outubro de 1888 e só caiu desse nível em dezembro de 1889 Nos anos seguintes em virtude do violento déficit no balanço de pagamentos a taxa de câmbio caiu de 24 78 pence por mil réis em janeiro de 1890 a 12 110 pence por mil réis em dezembro de 1891 tendo atingido 9 14 pence por mil réis em julho de 1894 Ao que parece os mesmos movimentos de capital que provocaram uma súbita apreciação do câmbio em 18861889 provocaram a mais importante crise cambial do século XIX80 Não pretendemos com isso sugerir que as contas comerciais foram irrelevantes na determinação da taxa de câmbio81 mas ressaltar a importância dos movimentos de capital na determinação da taxa de câmbio Não há dúvida de que o capital estrangeiro exerceu um papel fundamental para o equilíbrio dos pagamentos internacionais brasileiros e por conseguinte para o equilíbrio cambial Como a maioria dos países periféricos o Brasil teria o seu balanço de pagamentos auxiliado a longo prazo pelas grandes importações de capital posto à sua disposição pelos mercados financeiros da Europa industrial mas pagaria por essa dependência por meio de flutuações despropositadas na disponibilidade de tal capital e em seus termos de comércio durante o ciclo A instabilidade das taxas de câmbio dos países mais subdesenvolvidos encontra aqui uma de suas inúmeras explicações82 A análise do balanço de pagamentos é importante para a análise das reformas monetárias não só porque fornece uma explicação para as importantes flutuações cambiais ocorridas no período mas também porque o impacto monetário do resultado global do balanço de pagamentos constituía uma influência importante sobre a liquidez doméstica e conseqüentemente sobre o crescimento econômico Em sendo bastante variável o saldo global do balanço de pagamentos a liquidez doméstica ficava sujeita a flutuações que poderiam determinar inflexões indesejáveis no ritmo de crescimento econômico do País Mas essa possibilidade poderia ser contornada se o País fosse dotado de um sistema monetário que pudesse variar o estoque de ativos domésticos de modo a neutralizar do ponto de vista da liquidez doméstica as flutuações da oferta de ouro Mas esse não era o caso do Brasil do final dos anos oitenta O sistema monetário existente nos anos oitenta não possuía uma autoridade monetária depositária das reservas internacionais no sentido moderno O Tesouro detinha reservas cambiais em contas correntes com os Rothschild com o Banco do Brasil e com o Banco Internacional Além disso mantinha reservas na sua delegacia em Londres e na Caixa de Amortização Os bancos ingleses assim como os principais bancos nacionais mantinham contas correntes com correspondentes ou matrizes estrangeiros sendo que os bancos ingleses levavam sobre os outros a vantagem de receber os depósitos em libras das companhias inglesas operando no Brasil83 Assim sendo as reservas cambiais do País dispersavamse pelo sistema bancário sem que houvesse algum instituto especialmente mais bem provido enquanto detentor de reservas Os grandes superávits no balanço de pagamentos verificados nos anos 18861889 obviamente traduziramse em um significativo afluxo de reservas ouro prata letras cambiais e saldos sobre correspondentes no exterior ao sistema bancário 42 Tão logo a taxa de câmbio atingiu o seu valor de paridade cresceram as importações de espécies metálicas implicando uma modificação da composição das reservas internacionais do País em favor de ouro em espécie Em virtude da reconhecida instabilidade da taxa de câmbio os bancos por aversão ao risco evitaram monetizar as suas reservas isto é convertêlas em moeda circulante o que no caso de ouro significava leválo à Casa da Moeda para aí serem cunhadas moedas brasileiras pois dessa maneira o sistema bancário tornava uma parte de seu ativo imune à flutuações cambiais Todavia em vista dos limites estruturais a que os bancos estavam sujeitos para a expansão de seus empréstimos 84 e diante do fato de que o ativo do sistema bancário estava em grande medida comprometido com empréstimos a fazendeiros insolventes do Vale do Paraíba e com grandes carteiras de títulos da Dívida Pública difíceis de serem realizados e cotados abaixo do par os bancos começaram em certa altura a verse em dificuldades para absorver reservas e ao mesmo tempo expandir os seus empréstimos de modo a acompanhar o crescente nível de atividade Dessa maneira não podendo expandir suas exigibilidades os bancos viam esgotaremse as possibilidades de expansão de suas operações ativas sem debilitar em demasia a sua caixa de modo que o sistema bancário terminava por dificultar a transmissão à economia doméstica do impulso expansionista gerado pela excepcional situação das contas externas do País Essas dificuldades seriam facilmente contornadas se desaparecesse o limite que se impunha à expansão das exigibilidades do sistema bancário o que seria imediatamente alcançado com a obtenção pelos bancos da faculdade emissora Se permitidas as emissões bancárias deixavam de existir os problemas estruturais de expansão do crédito bancário vale dizer o multiplicador bancário perderia qualquer sentido enquanto teto à expansão da moeda bancária pois os bancos poderiam criar base monetária Em síntese há base para que se argumente que alguns anos bastante favoráveis de balanço de pagamentos fizessem surgir alguma pressão da parte dos bancos da capital no sentido de se obter a faculdade emissora em particular sobre base metálica Nesse sentido a emissão sobre base metálica aparecia como o expediente através do qual o rígido e arcaico sistema bancário do País se transformaria para não bloquear o choque externo favorável dos anos 18861889 e que também permitiria como adiante veremos que o nível de atividade doméstica se defendesse do choque desfavorável dos anos 18901894 Anexo à Seção 13 Metodologia para a Construção da Estimativa do Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 Este anexo destinase a esclarecer a metodologia utilizada para a construção dos dados da tabela 10 Não só existe um grande número de observações e qualificações referentes àqueles dados como também é conveniente reproduzir as séries anuais e os detalhamentos das várias contas do balanço de pagamentos Optamos por deslocar essa discussão metodológica para um anexo tão somente para não prejudicar a continuidade do texto principal a Balança Comercial A série anual utilizada e que é reproduzida na tabela A1 foi retirada do Anuário Estatístico do Brasil do IBGE edição de 193940 Os dados referemse até 1887 ao exercício fiscal que ia de julho do ano indicado a junho do ano seguinte No ano de 1887 fezse a mudança do ano fiscal de tal modo que os valores da tabela A1 referentes ao ano de 1887 incluem somente o segundo semestre do ano e os anos posteriores mostram valores registrados de janeiro a dezembro A consequência disso é que não poderíamos compatibilizar esses números com outros referentes ao ano de janeiro a dezembro sem cometer alguma arbitrariedade Optamos por utilizar como uma série anual da balança comercial os dados da tabela A1 exatamente como estão Não nos parece que para nossos propósitos essa opção signifique alterar a essência dos resultados A clara subestimação que existe com relação ao que consideramos o volume de comércio durante 1887 não parece ser problemática de vez que o saldo comercial resulta compatível com os dos outros anos TABELA A1 Balança Comercial do Brasil 18761897 Em milhares de libras Anos Exportações Importações Saldo Comercial FOB CIF 18761877 20573 16504 4069 18771878 19063 16728 2355 18781879 19508 15631 3877 18791880 19789 15454 4335 18801881 21249 16529 4720 18811882 19138 16621 2517 18821883 17378 16782 596 18831884 19393 18187 1306 18841885 19504 15381 4123 18851886 15110 15306 196 18861887 20502 16120 4382 1887 2º sem 11703 9960 2013 1888 21714 19724 1990 1889 28552 24002 4550 1890 26382 24019 2363 1891 27136 25565 1571 1892 30854 26302 4552 1893 32007 26215 5792 1894 30491 27145 3346 1895 32586 29212 3374 1896 28333 27880 453 1897 25883 22990 2893 Fonte IBGE Anuário Estatístico do Brasil 193940 p 13581359 próximos Para fins de cálculo de médias anuais para a tabela 9 calculamos em primeiro lugar a média semestral dos exercícios 18851886 18861887 1887 2o semestre 1888 e 1889 e em seguida multiplicamos por dois A tabela 9 portanto está a rigor isenta de subestimações no volume de comércio Existe no entanto uma outra dificuldade correta e minuciosamente apontada por L A Corrêa do Lago 85 com relação aos dados do Anuário Estatístico de 193940 Das importações e exportações reproduzidas no Anuário constam importações e exportações de moedas e barras de ouro e prata 86 que não deveriam constar dessas estatísticas Os movimentos de metal têm o caráter de movimentos de capital compensatório resultantes do saldo global do balanço de pagamentos e não devem ser classificados como importações e exportações de mercadorias Não dispomos contudo dos dados referentes aos movimentos de metal amoedado 87 o que não apenas dificulta uma apreciação exata do comércio de mercadorias como também impede a construção de um demonstrativo de resultado para o saldo global do balanço de pagamentos Temos no entanto alguns dados que fornecem uma idéia aproximada das magnitudes envolvidas mas que não bastam para representar o movimento total de metal amoedado A tabela A2 fornece o movimento de moedas metálicas e barras de ouro e prata entre Brasil e Inglaterra Os movimentos anuais sugerem que podem existir em alguns anos consideráveis alterações na série da tabela A1 Mas nada se pode afirmar com segurança acerca do total do movimento de metais sem examinarmos as estatísticas de outros países Em 1888 por exemplo somente pelo porto do Rio de Janeiro registrouse a importação de cerca de 1483 mil em soberanos vindos quase que totalmente do Rio da Prata 88 TABELA A2 Movimentos de Metal Amoedado entre Brasil e Inglaterra 18821896 Em milhares de libras Anos Saídas Entradas Saldos 1882 462 156 306 1883 174 277 102 1884 153 437 285 1885 497 192 305 1886 582 288 294 1887 143 213 70 1888 95 528 433 1889 88 3411 3324 1890 2545 1205 1340 1891 3364 1535 1828 1892 624 556 68 1893 650 397 253 1894 274 377 104 1895 259 1930 1671 1896 243 548 304 Fonte GrãBretanha Statistical Abstract of the United Kingdom 18821896 p 134140 O trabalho de separar os movimentos de metal do movimento comercial é muito importante para se ter a correta noção do comércio de mercadorias e também como discutiremos adiante para a construção do demonstrativo de resultado portanto para a análise do impacto monetário dos saldos globais do balanço de pagamentos Mas infelizmente não dispomos dos dados necessários o que nos força a utilizar a série da tabela A1 exatamente como está b Contas de Serviços A grande dificuldade relativa às contas de serviço diz respeito às despesas de seguro e frete para as quais não existem registros Para estimálas multiplicamos ano a ano a tonelagem total dos oito principais produtos de exportação do País café açúcar fumo cacau ervamate borracha algodão e couros8 9 pelos preços dos fretamentos ingleses9 0 a cujo total adicionamos um valor correspondente a 5 do valor total das exportações a título de seguros e comissões Com isso estamos implicitamente considerando como insignificante a tonelagem das exportações transportada por navios brasileiros9 1 O resultado de nossas estimativas consta da tabela A3 adiante Outra dificuldade diz respeito à contabilização das despesas do governo no exterior A praxe era tomar a despesa feita no exterior em mil réis convertidos ao câmbio do dia e dividila em duas partes o valor em mil réis da despesa em libras convertidos à taxa de paridade e o valor que faltava para completar o total efetivamente gasto em mil réis Esse segundo valor era lançado na conta de diferenças de câmbio e o primeiro aparecia discriminado nas contas de cada Ministério Todo o problema é que não se pode identificar a que despesas correspondem as diferenças de câmbio embora a maior parte delas corresponda a despesas da conta de serviços Uma imprecisão clara resulta de que existem diferenças de câmbio no pagamento de amortizações relativas à dívida externa e assim sendo as diferenças de câmbio que utilizamos incluem uma parcela que não pertence à conta de serviços9 2 Os balanços de receita e despesa do governo por outro lado sempre discriminam as despesas do governo entre despesas com pessoal e com material Para efeitos de nossa conta de serviços somente levamos em conta as despesas governamentais com pessoal além das garantias de juros e juros de títulos da Dívida Pública pagos em ouro As despesas do governo com material correspondem a importações que presumivelmente já estão contabilizadas nas contas comerciais A discriminação das contas de serviços é apresentada na tabela A3 c Conta Capital Uma dificuldade com a conta capital é que apesar de contarmos com registros minuciosos dos empréstimos governamentais e respectivas amortizações o mesmo não se passa com os empréstimos provinciais municipais e principalmente privados Para esses conseguimos levantar um bom número de operações mas não contamos com os valores anuais relativos às amortizações e aos serviços desses empréstimos A série de investimento direto estrangeiro por outro lado apresenta também alguns problemas Em primeiro lugar convém notar que a série utilizada representa em geral o valor de lançamento do capital de empresas estrangeiras destinadas a operar no Brasil Não se pode afirmar com os dados que dispomos se os valores lançados TABELA A3 Contas de Serviço do Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 Em milhares de libras Anos Fretes Seguros Serviços da Divida Externa Garantias de Juro MP Garantias de Juro MTA Juros Remessas de Lucro Subisídio à Capitalização Outros Receita de Cambio Diferenças de Cambio Total 1876 2757 939c 4404 4404 1877 2687 894 107 191 194a 126 70 28 133 d 57 151 150 158c 4186 4186 1878 2947 95 18 19 87 88 89 40 63 170 217 259 c 4025 4025 1879 2867 796 30 110 115 88 63 20 58 10 177 123 199c 4025 4025 1880 2687 739 18 75 210 87 52 70 88 204 186 243 4448 4448 1881 2682 868 8 276 134 133 71 27 86 20 434 460 483c 4448 4448 1882 2779 583 0 154 331 335 52 81 244 283 186c 4244 4244 1883 2781 638 0 134 437b 608b 60 63 561 587 570c 4204 4204 1884 2833 712 0 526 378 88 554 565 561 4209 4209 1885 2163 594 0 526 765 53 786 750 698 4093 4093 1886 2551 884 0 70b 166 50b 217 209 201c 4079 4079 1887 2597 970 39 990 43 1084 1070 1004c 4065 4065 1888 2591 838 41 1190c 267 242 508 472 415c 4027 4027 1889 2909 1339 42 1331 70 0 1401 1379 1253c 3987 3987 1890 2593 1170 0 1909 27 1936 1881 1800c 3981 3981 1891 2968 1319 46 2171 43 2214 2237 2188c 3973 3973 1892 2959 1309 0 886 256 1142 1214 1388c 3965 3965 1893 2619 1369 12 175 61 236 221 221 3958 3958 1894 2984 1434 12 404 451 759 4 380 1594 1528 1386c 3942 3942 1895 2889 1485 22 645 526 231 498 1381 1345 1344c 3924 3924 1896 2784 1448 24 375 20 306 398 680 666 656c 3908 3908 1897 2842 1423 22 406 48 197 298 543 521 523c 3901 3901 Dados originais Dobração C Estimado a partir da taxa média do ano de 1871 16 Fontes e Observações 1 Estimado a partir da tonelagem das exportações IBGE Anuário Estatístico do Brasil 193940 p 1375 1376 Dados originais retirados de V Bouças 1955 2 Retirado de V Bounas 1950 e V Bouças 1955 3 Estão garantias de juros ao 2 sob responsabilidade das províncias da Bahia Pernambuco e São Paulo Retirados de RMF vários números e RCJC vários números 4 São amortizações relativas aos empréstimos contraidos 5 Pagamentos em ouro a residentes no exterior e nãoresidentes no exterior de juros e correspondentes a títulos dos emprestimos feitos ao Brasil Retirados de RMF vários números e de RCJC vários números 6 Juros pagos aos residentes no exterior 7 São remessas em ouro feitas por estrangeiros principalmente investidores imobiliários e por viajantes Retirados de RMF vários números 8 Calculados como 5 do valor total das exportações nacionais de produtos agrícolas e industriais apresentados para os Ministérios os dados com matéria I Previdência 1980 item 13 página 8 para 18711890 e informaçoes dos anebo I da Receita de Despesa 9 Importações de origem naval pressupostos pessoais variados indicados em O Desenvolvimento do Brasil Balanço de Receita e Despesa vários números 10 Retirados de Brasil Balanço de Receita e Despesa vários números constituíram entradas efetivas de capital no País e também não se pode saber ao certo se as entradas no País se verificaram no mesmo ano do lançamento das companhias E ainda outro problema é que nem sempre a série se refere ao capital efetivamente subscrito sendo que às vezes referese ao capital autorizado ou mesmo realizado Por último notese que os aumentos de capital dessas empresas nem sempre significam entradas de capital no Brasil pois podem ser subscritos no próprio país Feitas essas observações seguemse os valores relativos à conta capital no período 18761897 TABELA A4 Contas de Capital do Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 Em milhares de libras Anos Empréstimos Investimento Amortizações Total Governo Federal 1 Estados Municípios 2 Privados 3 Total Direto 4 5 1876 2102 535 1567 1877 2361 572 1789 1878 100 100 409 774 265 1879 35 35 595 560 1880 471 471 1709 688 1492 1881 127 127 1671 868 920 1882 1712 566 1146 1883 4000 35 4035 6777 617 10195 1884 42 42 451 592 99 1885 70 70 878 704 244 1886 6000 250 6250 1209 602 6857 1887 2674 2674 2679 680 4673 1888 6000 1957 1034 8991 12752 602 21141 1889 19837 1742 2662 24241 5002 18054 11189 1890 972 699 273 1891 429 390 39 1892 1073 393 1466 1893 3710a 100 3810 130 404 3536 1894 700 700 53 392 363 1895 6000 6000 489 445 6044 1896 1000 1000 2000 5839 564 7275 1897 2000 2600 150 4750 890 386 5254 a Empréstimos feitos originalmente pela Estrada de Ferro Oeste de Minas mas o governo federal utilizouse do empréstimo repassando à empresa o correspondente em mil réis Fontes e Observações 1 Retirado de V Bouças 1955 e J Cavalcanti 1923 2 Retirado de V Bouças 1950 3 Inclui obrigações de empresas estrangeiras retirados de A C Castro 1979 e outros empréstimos privados em libras francos e marcos convertidos à taxa de câmbio média do ano registrados nos RCJC vários números e RMF vários números 4 Retirado da tabela matriz da A C Castro 1979 RCJC vários números e O Onody 1971 5 Retirado de V Bouças 1950 Os dados reproduzidos mostram a variação do estoque total da dívida externa 48 d Observações Gerais Além de todas as dificuldades que já observamos relativas às diversas contas que compõem a nossa estimativa para o balanço de pagamentos há de se mencionar que algumas contas foram totalmente omitidas em virtude de não contarmos com nenhuma informação que nos permitisse estimálas As principais omissões são as contas referentes a remessas de imigrantes a gastos de viajantes à dívida externa do Paraguai e Uruguai para com o Brasil aos serviços dos empréstimos externos privados e aos fretes de navios estrangeiros empregados em cabotagem Dessas entretanto somente a primeira e a última parecem ser importantes Embora se suponha que a conta de transferências seja fortemente deficitária em função das remessas dos imigrantes entrados nos anos oitenta devese atentar para o fato de que muitos dos imigrantes traziam economias Poderseja estimar as remessas com base na população de imigrantes e as entradas de economias com base no número de famílias Mas tais cálculos seriam suficientemente arbitrários por serem imprecisos Quanto à cabotagem feita por navios estrangeiros embora possamos contar com os dados referentes à tonelagem nacional e estrangeira no Porto do Rio de Janeiro não existem estimativas sobre os fretes Apenas para demonstrar a importância da participação estrangeira na navegação de cabotagem notese que em 1888 o movimento93 de navios empregados em cabotagem foi de 2525 navios 749 dos quais estrangeiros e da tonelagem total de 1199 mil toneladas 623 mil toneladas ou seja cerca de 52 eram transportadas por navios estrangeiros94 Quanto aos gastos de viajantes uma estimativa da década de sessenta95 supunha 480 viajantes brasileiros no exterior por ano e para cada um arbitrava o gasto de 5 contos de réis O total anual estaria em torno de 250 mil libras anuais o que certamente teria aumentado nos anos a que se refere a tabela 9 A dívida externa das Repúblicas do Uruguai e do Paraguai junto ao Brasil atingia 6804 contos em 189096 o que permite supor que o serviço de tal dívida para o qual não temos informações não era um montante significativo Quanto aos juros e amortizações relativos a empréstimos privados tomados no exterior que ao contrário não eram desprezíveis não temos informações que autorizem estimálos e Resultados Por último resta discutir as dificuldades envolvidas na construção de um demonstrativo do resultado global do balanço de pagamentos A dificuldade insuperável é a ausência de informação acerca de certas contas de caráter compensatório Entre essas incluemse a importação líquida de metais cujos dados para o balanço de pagamentos bilateral Brasil Inglaterra se encontram na tabela A2 e as variações dos saldos no exterior dos diversos bancos brasileiros e do Tesouro junto a seus agentes no exterior Os saldos bancários provavelmente correspondiam à maior parte das reservas do País mas os valores das reservas do Tesouro não eram insignificantes como mostra a tabela A5 Os dados de que dispomos são portanto insuficientes para que se possa construir um demonstrativo de resultado Mesmo assim o que os dados nos sugerem acerca dos movimentos compensatórios é compatível embora em volume bem mais reduzido com nossas estimativas do saldo global do balanço de pagamentos 49 TABELA A5 Saldos do Tesouro Nacional na sua Delegacia de Londres 18761897 Em milhares de libras Anos Saldos Anos Saldos Anos Saldos 1876 661 1884 575 1892 279 1877 707 1885 299 1893 182 1878 513 1886 nd 1894 271 1879 593 1887 43 1895 102 1880 nd 1888 3184 1896 188 1881 743 1889 2612 1890 1752 1897 31 1882 501 1891 nd 1883 nd Fonte Brasil Balanço de Receita e Despesa vários números A série anual de nossas estimativas para o balanço de pagamentos do Brasil é apresentada na tabela A6 TABELA A6 Estimativa Preliminar para o Balanço de Pagamentos do Brasil 18761897 Em milhares de libras Anos Exportaçõesᵃ Importaçõesᵃ Balança Comercialᵃ Saldo de Serviçosᵇ Transações Correntes Conta Capitalᶜ Saldo Global 1876 20573 16504 4069 4404 335 1567 1232 1877 19063 16728 2335 4186 1847 1789 58 1878 19508 15631 3877 4245 368 265 633 1879 19789 15454 4335 4002 333 560 227 1880 21249 16529 4720 4048 672 1492 2164 1881 19138 16621 2517 4244 1727 920 807 1882 17378 16782 596 4283 3687 1146 2541 1883 19493 18187 1306 4609 3303 10195 6892 1884 19504 15381 4123 4665 542 99 641 1885 15110 15306 196 4079 4275 244 4031 1886 20502 16120 4382 5028 646 6857 6211 1887 11703 9690 2013 4521 2508 4673 2165 1888 21714 19724 1990 5247 3257 21141 17884 1889 28552 24002 4550 5276 726 11189 10463 1890 26382 24019 2363 6816 3753 273 3480 1891 27136 25565 1571 7610 6039 39 6000 1892 30854 26302 4552 6755 2203 1466 3669 1893 32007 26215 5792 7601 1809 3536 1727 1894 30491 27145 3346 7335 3989 363 3626 1895 32586 29212 3374 7121 3747 6044 2297 1896 28333 27880 453 7731 7278 7275 3 1897 25883 22990 2893 8170 5277 5254 23 ᵃOs dados de 1876 a 1886 referemse ao ano fiscal os de 1887 referemse somente ao segundo semestre e a partir de 1888 os dados são relativos ao ano que vai de janeiro a dezembro ᵇAlguns dados de acordo com o ano fiscal outros não Vejase tabela A3 ᶜDados correspondentes ao ano de janeiro a dezembro Fonte Tabelas A1 A3 e A4 50 A Reforma Imperial A economia brasileira vinha atravessando uma fase de relativa estagnação até meados dos anos oitenta quando esta tendência começou a inverterse Pelo que nos sugerem os dados da tabela 12 na altura de 18841886 a economia brasileira teria transposto um período de estagnação com preços crescentes para um de expansão a preços declinantes A reversão da tendência na direção do crescimento parecia como veremos a seguir induzida pelo aspecto favorável das contas externas98 mas viuse de início constrangida pelo agravamento dos problemas relativos ao caráter sazonal e instável da procura por crédito e aos dremos periódicos na caixa dos bancos Essas seriam as circunstâncias como o relato a seguir procurará demonstrar que originariam as primeiras tentativas importantes de se modificarem as instituições monetárias TABELA 12 Nível de Atividade e Preços 18801888 1880100 Preços Nível de atividade Anos E Loboᵃ M Buescuᵇ ContadorHaddadc 1880 1000 1000 1000 1881 1023 1011 967 1882 1086 1042 870 1883 1076 1045 844 1884 1039 1032 830 1885 1112 990 891 1886 1001 968 1024 1887 1009 962 1134 1888 991 nd 1174 Fontes ᵃE Lobo et alii 1971 p 261 ᵇM Buescu 1973 p 220 ᶜC Contador 1974 p 193 21 A crise de 1887 e o projeto original Em seu relatório de 1884 o Ministro da Fazenda Lafayette Rodrigues Pereira afirmava que desde fins de 1883 o movimento das transações vinha sendo embaraçado pela falta de meio circulante atribuída principalmente à migração de dinheiro para 51 algumas praças do Norte exigida pelas magníficas safras ali colhidas99 Nessa ocasião a crise de liquidez não chegou a atingir proporções críticas mas despertou alarme a ponto de que se propusesse a restauração da lei de 1875 que permitia ao Tesouro o recurso a emissões temporárias 100 A proposta do Ministro Lafayette perdeu sua força tão logo cessaram as dificuldades do Rio de Janeiro Mas no ano seguinte era revivida com ainda mais ênfase pelo novo Ministro da Fazenda e também membro do Partido Liberal Conselheiro José Antônio Saraiva Falando ao Parlamento em maio de 1885 lembrou Saraiva que se aproximava o último mês do semestre que era a ocasião das liquidações dos pagamentos quando os devedores previdentes preparam fundos para saldar suas contas no interior e remeter para as províncias do Norte elevadas somas e por isso darseía forçosamente a escassez de meio circulante e a crise monetária a que se havia assistido nos últimos semestres poderia pois repetirse 101 Os temores de Saraiva não se haviam confirmado em julho quando a idéia da restauração da lei de 1875 foi ter ao Senado Ali ouviu queixas de que o papelmoeda era já superabundante102 mas defendeuse com o argumento de que a medida proposta não era para aumentar o meio circulante e sim para conjurar uma crise103 A Comissão de Orçamento do Senado opinou pela aprovação do projeto de Saraiva lembrando que se a emissão ficasse limitada ao suprimento da penúria de numerário na praça do Rio de Janeiro e só durante o tempo correspondente á retração do capital monetário nenhuma perturbação poderia trazer aos valores existentes e nem mesmo ao câmbio104 É a idéia de Saraiva transformouse em lei a 18 de julho de 1885 A lei de apenas dois artigos autorizava o governo a emitir até 25 mil contos aplicáveis a auxiliar os bancos de depósitos da Corte105 As emissões como na lei de 1875 seriam utilizadas para fins de empréstimos aos bancos sob garantia de títulos da Dívida Pública e cujos juros seriam destinados ao recolhimento do papelmoeda do Tesouro 106 que como se acreditava era superabundante Logo que a nova lei foi aprovada o Banco do Brasil que não estava em boa situação começou a apelar repetidamente para que a medida fosse aplicada a seu favor107 No espaço de tempo entre 30 de dezembro de 1885 e 17 de fevereiro de 1886 o banco obteve cerca de 11 mil contos nos termos da nova lei o que pareceu solucionar as suas dificuldades109 E isso sem dúvida contribuiu de forma importante para o alívio do mercado monetário Em 1886 os evidentes sintomas do renascimento da confiança109 desde o início do ano indicavam que a conjuntura depressiva parecia inverterse Segundo o Jornal do Commercio a causa mais visível e imediata do melhoramento que observamos no ano de 1886 foi sem dúvida o maior valor de nosso quase exclusivo produto o café110 Os preços do café subiram de 3915 em janeiro gradativamente até 5545 em dezembro chegando a atingir 9940 em junho de 1887111 Durante quase todo o ano de 1886 o mercado monetário esteve muito folgado112 mas já nos últimos meses de 1886 sentiase certo malestar proveniente da dificuldade de obter empréstimos e adiantamentos escasseando o numerário Parecia porém que tal estado era apenas a repetição da crise periódica que se observa nos fins de semestre113 As dificuldades se tornariam ainda mais sérias nos primeiros meses de 1887 atingindo o seu ápice em junho quando a taxa de desconto para as 52 melhores firmas subiu nos bancos aos extremos de 10 e 12114 De acordo com o Jornal do Commercio a demora no retorno das quantias enviadas para as províncias a urgência de remessas para os mercados de café a realização de entradas que dos seus acionistas pediram algumas instituições bancárias aumentavam o número dos que solicitavam descontos desfalcaram os depósitos e enfraqueciam a caixa dos bancos115 Além disso a crise de liquidez se via agravada por um estado de medo ou pelo menos de incerteza inteiramente desfavorável ao comércio em geral e máxime a operações de crédito116 criado pelos rumores de insurreição de escravos e relativos ao precário estado de saúde do Imperador O Banco do Brasil novamente solicitou empréstimo ao Tesouro de acordo com a lei de 1885 e o total obtido entre 10 de janeiro e 30 de junho atingiu 8 mil contos117 Dessa vez no entanto não houve melhoria na situação do banco Até novembro de 1887 o banco nada pudera ressarcir desses empréstimos E em reunião do Conselho Diretor de 28 de novembro reconheciase que o estado da caixa do Banco e o aspecto geral dos negócios não só obstavam ao pagamento como tornavam indispensável o aumento deste débito estando o crédito do banco ameaçado de padecer cruéis provações118 A crise de liquidez no primeiro semestre de 1887 a despeito do bom estado dos negócios cafeíros fora bastante violenta mas diluíase gradualmente no segundo semestre pelo efeito dos auxílios ao Banco do Brasil e também a outros bancos e pelo efeito do refluxo natural do dinheiro aos bancos A crise no entanto fez parecer pouco oportuna a política monetária do então Ministro da Fazenda Francisco Belizário119 que se empenhava firmemente em reduzir o meio circulante que considerava superabundante Belizário entendia que estando a taxa de câmbio abaixo de seu valor de paridade havia excesso de papelmoeda em circulação e nessas condições segundo dizia o câmbio não pode firmarse pois faltamlhe para o corretivo natural a importação e exportação de metal e achase sujeito unicamente à lei do oferecimento e procura de cambiais às correntes de confiança e desconfiança e pois em constantes flutuações A causa de todas as perturbações está no excesso de papelmoeda120 Belizário tomou medidas efetivas no sentido de conseguir o equilíbrio orçamentário e estabeleceu que recolheria anualmente valores em papelmoeda próximos de 5 mil contos Em junho de 1887 no fim do exercício comentava em seu relatório que retirara de circulação os 5 mil contos prometidos mas que não os havia incinerado porque precisava emprestar ao Banco do Brasil nos termos da lei de 1885 Como notou seu sucessor João Alfredo que assumiu a pasta da Fazenda em fins de 1887 as necessidades do comércio foram destarte invalidando os esforços que empregava o governo para retirar a emissão121 Para ele o simples resgate das notas se influi beneficamente no valor do dinheiro nacional constrange o comércio e as indústrias e esse mal pode agravarse com a transformação do sistema de trabalho e o crescimento que vai tendo a colonização122 De fato uma política de equilíbrio orçamentário e recolhimento do papelmoeda não contribuía para que se aliviasse o mercado monetário da instabilidade originada pelas transformações que vinham se intensificando no campo Belizário ao mesmo 53 tempo que recolhia papelmoeda viase forçado a injetálo novamente em circulação atuando portanto em flagrante contradição com seus próprios objetivos Durante a crise de 1887 assim como a política monetária de Belizário perdeu credibilidade a lei de 1885 Mesmo alguns de seus defensores como o exMinistro Lafayette já se mostravam céticos quanto às possibilidades da lei em fazer frente às pressões que incidiam sobre o mercado monetário da capital Este ceticismo que atingiu um máximo quando a crise se tornava mais aguda juntamente com a tentativa de buscar soluções mais efetivas e prontas para a crise deu origem ao primeiro grande projeto de reforma monetária123 que foi apresentado no Senado na sessão de 17 de junho de 1887 Seus proponentes eram o próprio exMinistro Lafayette e os Senadores Affonso Celso depois Visconde de Ouro Preto e Jerônimo José Teixeira Jr depois Visconde de Cruzeiro124 O principal autor do projeto o Senador Teixeira Jr assim se exprimia É deplorável a pressão que há cerca de seis meses sofre o comércio da capital do Império o que entre outras coisas se atribui à escassez do meio circulante É inútil demonstrar que este mal conquanto se julgue transitório é altamente prejudicial à riqueza pública porque embarça o desenvolvimento de todas as indústrias e impossibilita a ação benéfica da elasticidade do crédito 125 E em vista disso motivados quase que exclusivamente pela crise de 1887126 os autores do projeto propunham uma profunda reorganização no sistema bancário que teria como molde a experiência norteamericana dos bancos nacionais127 O projeto autorizava a criação dos bancos emissores visando estabelecer um sistema bancário fundado no chamado princípio da liberdade bancária O projeto não estabelecia restrição alguma quanto ao número ou o tamanho dos bancos emissores mas determinava que a emissão de cada instituição não poderia ultrapassar 18 mil contos128 A idéia consistia em estabelecer um sistema bancário competitivo composto de um grande número de bancos sem que houvesse nenhuma forma de privilégio a nenhuma instituição A superioridade desse tipo de organização bancária cujo fundamento advinha de considerações doutrinárias acerca dos benefícios da competição e do laissezfaire era comumente referida na época como a doutrina da liberdade bancária129 O lastro sobre o qual se faria a emissão seria constituído por títulos da Dívida Pública os quais deveriam ser depositados na Caixa de Amortização130 As emissões não poderiam ultrapassar o valor correspondente a 90 do valor de mercado das apólices depositadas e os bancos se obrigavam a manter em caixa em papelmoeda um montante de no mínimo 20 do valor total de sua emissão131 As notas bancárias emitidas deveriam ser livremente conversíveis em papelmoeda do Tesouro ao portador e à vista e teriam recebimento garantido por lei em quaisquer repartições públicas sendo inclusive os bancos obrigados a receber as notas uns dos outros O Tesouro emitiria apólices especiais de 4 12 especialmente para servirem como lastro O produto da venda desses títulos aos bancos seria utilizado para o resgate de títulos de 5 em circulação132 Parte da economia obtida no pagamento de juros sobre as apólices juntamente com um imposto de 2 que era proposto sobre os dividendos dos bancos emissores seria destinada ao resgate do papelmoeda do Tesouro O projeto previa simultaneamente o recolhimento do papelmoeda do Tesouro e a emissão bancária de modo que o resultado líquido desses dois movimentos deter 54 minaria a variação final sobre o papelmoeda em circulação O projeto estabelecia uma emissão bancária total de 180 mil contos e o saldo de notas do Tesouro a ser recolhido montava a 1843 mil contos de modo que o efeito final sobre a base monetária não era muito significativo Assim sendo o projeto não se apresentava como deflacionista no que se referia a seu efeito final e menos ainda segundo se acreditava no tocante a seus efeitos de curto prazo Quanto aos possíveis efeitos de curto prazo da implantação do novo projeto é interessante notar que para a maioria dos contemporâneos um sistema governado pela liberdade bancária de certo modo se autoregulava o que poderia ser expresso pelo preceito de que o montante de notas em circulação era adequadamente controlado pelo processo ordinário de competição bancária e se a exigência de conversibilidade fosse mantida não poderia exceder às necessidades dos negócios por qualquer período apreciável de tempo se práticas bancárias incorretas levassem ocasionalmente à excessiva concessão de crédito isso traria seus próprios corretivos133 Esse preceito da Banking School inglesa se aplicava estritamente a um sistema onde estivesse em vigor a conversibilidade metálica134 e o sistema proposto pelo projeto era caracteristicamente de moeda inconversível Assim sendo acreditavase que a emissão prevista no projeto sem o freio da conversibilidade cresceria rapidamente em resposta às dificuldades então vigentes na praça do Rio de Janeiro enquanto que o resgate das notas do Tesouro se faria lentamente A possibilidade dessa expansão monetária ainda que temporária naturalmente não poderia estar em sintonia com as idéias conservadoras do Parlamento135 Mas antes que se manifestasse qualquer divergência acerca do projeto ele foi remetido às Comissões da Fazenda e de Legislação do Senado para que sobre ele se manifestassem Em parecer conjunto as comissões fizeramlhe variadas objeções alegando que o projeto ensejaria o aumento da circulação inconversível e que assim segundo o parecer continuarão os maus efeitos de nossa perniciosa circulação desde que a nova emissão bancária não tem por garantia moeda metálica e seus bilhetes têm de ser convertidos em moeda corrente do Império que é papel136 As comissões propuseram em vista disso que o produto da venda das apólices de 4 12 não fosse utilizado no resgate de títulos de 5 e sim no recolhimento e incineração do papelmoeda do Tesouro As comissões acreditavam que dessa maneira a cada mil réis emitido em notas bancárias corresponderia um mil réis incinerado de notas do Tesouro e assim seriam eliminados os riscos de emissão em demasia durante a fase de implantação do novo sistema e que poderiam agravar a depreciação já existente do meio circulante enquanto seu resgate progressivo não corrigir a superabundância que se lbe atribui137 Por outro lado as comissões também propunham que os bilhetes dos bancos não pudessem ser aceitos para pagamentos de direitos de importação e juros da Dívida Pública Essa idéia implicava em uma limitação ao curso dos bilhetes que poderia inibir em certa medida as emissões Mas tinha conseqüências de mais largo alcance pois à medida que fosse desaparecendo o papelmoeda do Tesouro esses pagamentos seriam progressivamente transformados em pagamentos em ouro a única moeda que seria aceita para esses fins Com isso cerca de 50 da receita tributária da União os direitos de importação seria recebida em ouro e cerca de 20 da despesa o serviço da 55 Dívida Pública seria paga em ouro do que resultaria um saldo positivo em ouro para o Tesouro138 O projeto parecia vantajoso ao Tesouro do ponto de vista de seu orçamento O novo sistema criaria um amplo mercado para novos títulos da Dívida Pública e poderia permitir a redução da oferta monetária sem impor restrições à execução orçamentária do Tesouro O aspecto desinteressante do projeto na visão do Tesouro era justamente a possibilidade de expansão monetária ou emissões em excesso durante a fase de implantação do novo sistema A sugestão das comissões bloquearia essa possibilidade mas isto não seria aceito pelos proponentes do projeto que tinham em vista especificamente a crise vigente no mercado monetário A essência da oposição ao projeto como veremos na seção seguinte era uma diferença de percepção acerca da condução da política monetária e da caracterização das emissões em demasia Para a corrente metalistabulionista só há um critério segundo Belizário para julgarse da abundância ou da escassez permanente do meio circulante inconversível é a sua apreciação ou depreciação Só há um meio para a elevação do seu valor é a sua diminuição139 Em oposição a essa visão existia um grupo heterogêneo de parlamentares jornalistas e homens de negócios que sustentavam que as emissões deviam acompanhar estritamente as variáveis e flutuantes necessidades dos negócios e que portanto o meio circulante devia ser dotado do requisito da elasticidade Essa corrente em um momento anterior tivera em Mauá o seu grande expoente140 mas ao final dos anos oitenta era antes considerada uma expressão dos interesses do comércio do que uma posição legitimada pela autoridade de uma doutrina Essa corrente atribuía as freqüentes crises de liquidez e as altas taxas de juros à escassez de moeda Segundo o Jornal do Commercio pretendem alguns que não há excesso que o papelmoeda não é mau não pela quantidade mas pela qualidade Dizer que o papelmoeda é mau porque é muito abundante ou porque é muito fraco é sempre dizer a mesma coisa a saber que ele não corresponde às necessidades do momento O papelmoeda é mau porque lhe falta o requisito essencial de qualquer meio circulante isto é a elasticidade141 O Brasil possuía de acordo com essa corrente um péssimo meio circulante142 pois freqüentemente desaparecia das praças de comércio ocasionando crises de liquidez A corrente metalista contestava qualquer indicação de que havia escassez de moeda De acordo com Belizário143 concluirse que todas as crises provêm da falta de numerário ou que a abundância deste possa prevenir todas as crises vai uma grande distância será preciso confundir a moeda com o capital supondo que aumentando aquela este ficará barato abundante e ao alcance de todos144 As duas correntes discordavam frontalmente quanto ao indicador mais apropriado para a política monetária Belizário e seus adeptos batiamse pela conversibilidade e afirmavam ser a diferença entre a taxa de câmbio de mercado e a de paridade ou o ágio do ouro o melhor guia para a política monetária Os antimetalistas tinham como meta a elasticidade do meio circulante ou seja a constante correspondência entre a oferta de moeda e as necessidades dos negócios o que poderia ser atestado pelo estado da taxa de juros A corrente metalistabulionista como vimos na seção 12 encontrava sua principal sustentação na conveniência da meta da estabilidade cambial que seria o subproduto da conversibilidade À corrente oposta evidentemente também era conveniente a 56 meta da estabilidade cambial e por isso também era pela circulação metálica De acordo com o Jornal do Commercio Por nossa parte preferíamos que o nosso péssimo meio circulante desaparecesse para sempre estabelecendose a circulação bancária solidamente firmada na base metálica145 Mas a circulação metálica não necessariamente solucionava o problema da inelasticidade do meio circulante o que para os antimetalistas seria minorado ao se fomentar a criação de bancos de depósito e descontos nas províncias e animar uma espécie de consórcio entre esses bancos e os da nossa praça146 Em vista disso parecia que o comércio entendia que a raiz do problema dos drenos temporários de liquidez da praça do Rio de Janeiro advinha da pouca penetração do sistema bancário no interior Assim sendo os antimetalistas desse período até o aparecimento de Rui Barbosa logo à frente não eram defensores da moeda fiduciária e por isso não se constituíam em adversários frontais e aguerridos da ortodoxia metalista Isso se devia por um lado ao fato de que a estabilidade cambial que adviria da conversibilidade era do interesse de todos E por outro lado ainda não se havia apresentado um problema de gravidade suficiente para polarizar ou radicalizar as posições Com a evolução da conjuntura a partir de 1888 tal problema surgiria e tornaria as duas visões inconciliáveis como veremos adiante Somente em 1888 teria lugar um embate frontal entre as duas correntes em torno da discussão do projeto de vez que este permaneceria cerca de um ano sem entrar em discussão talvez em conseqüência de estar inicialmente órfão de apoio governamental147 E quando a discussão da matéria se iniciou em junho de 1888 a Abolição tinha sido decretada a imigração crescera enormemente e o País começava a acumular reservas metálicas Essa mudança de conjuntura que será explorada na seção seguinte daria urgência para a questão monetária e novo caráter às divergências entre metalistas e antimetalistas 22 A expansão de 1888 e a reforma A situação do mercado monetário melhorou sensivelmente no segundo semestre de 1887 em conseqüência segundo o Jornal do Commercio de terse tornado menos ativo o movimento de mercados de importação e exportação148 O mercado de café em particular ficou paradisado149 nos meses que se seguiram à notícia chegada em meados de junho de uma grande e repentina baixa150 nas bolsas de café de Nova Iorque e Havre As vendas no Porto do Rio de Janeiro caíram de 3319 mil sacas em maio para 893 mil sacas em junho e 196 mil sacas em julho151 e os preços no Porto do Rio de Janeiro iniciaram uma tendência decrescente que os levou de 9465 em junho de 1887 a 4905 em março de 1888152 tendo permanecido em torno desse valor durante todo o ano de 1888 O ano de 1888 foi de notável prosperidade para a economia da Corte O andamento dos negócios foi de tal ordem que segundo afirmou o Jornal do Commercio o comércio não conservou senão gratas recordações do ano de 1888153 O dinheiro foi abundante e fácil154 durante quase todo o ano e essa abundância e conseqüente facilidade provinham da existência nessa praça de grandes somas ordinariamente enviadas para as províncias não só para mover as respectivas safras mas também para o jogo 57 do câmbio As safras das províncias em geral ou pela diminuição da quantidade ou pela redução dos preços puderam ser movidas quase exclusivamente com o numerário próprio155 Diversos fatores contribuíram para que não se manifestassem pressões sérias sobre o mercado monetário da capital Os embarques de café em Santos por exemplo diminuíram em cerca de 25156 e estando os preços baixos as remessas para aquele porto destinadas a adquirir cambiais foram reduzidas As entradas de açúcar dos Estados do Norte no Rio de Janeiro caíram de 212386 sacas em 1887 para 171109 sacas em 1888157 o que também atuou no sentido de reduzir as remessas de valores para o Nordeste As exportações de açúcar do Nordeste em 1888 tiveram significativa redução158 talvez em consequência de certa desorganização na produção ocasionada pela Abolição o que também reduziu as remessas de fundos para aquisição de cambiais naquela região Além disso a safra cafeeira do Vale do Paraíba foi de tal modo elevada que mesmo com as perdas ocasionadas pela Abolição159 as exportações pelo Porto do Rio de Janeiro em 1888 elevaramse a 3330185 sacas contra 2241755 sacas em 1887160 Essa e outras influências favoráveis sobre o balanço de pagamentos contribuíram para não criar embaraços aos importadores do Rio de Janeiro O movimento de saques contra Londres negociados no Rio de Janeiro sofreria na verdade uma redução em 1888 sendo de 22570 mil contra 25320 mil em 1887161 mas em contrapartida verificouse uma grande abundância de espécies metálicas no Rio de Janeiro em 1888 A importação líquida de metais preciosos pelo Porto do Rio de Janeiro elevouse a 20563 contos162 em 1888 contra 7395 contos verificados nos três semestres de junho de 1886 a dezembro de 1887 e 3899 contos de junho de 1885 a junho de 1886163 Em função disso havia na praça do Rio abundância de meios para realizaremse importações não sendo necessário recorrerse a outras praças Todos esses fatores atuaram no sentido de reduzir as remessas de fundos para praças distantes embora o maior dispêndio monetário dos fazendeiros ocasionado pela necessidade de empregar trabalhadores assalariados tenha atuado em sentido contrário A tabela que se segue mostra as remessas de valores do Rio de Janeiro por cabotagem e o estado das caixas dos bancos em 1887 e 1888 Do total de 214756 contos da exportação de valores do Rio de Janeiro por cabotagem no ano de 1887 128942 contos dirigiramse para o Norte do Império 68295 contos para o Sul do Império e o restante para o exterior164 Em 1888 o total das remessas reduziuse para 162201 contos sendo que para o Norte foram 98442 contos para o Sul 50588 contos e o restante para o exterior165 A redução no total das remessas superior a 5 mil contos166 era significativa uma vez que se tratava em geral de fundos remetidos a portos distantes de onde demoravam a voltar Houve em contrapartida um aumento nas remessas para a região cafeeira do Vale do Paraíba que eram feitas através de ferrovias e correspondiam em grande medida ao aumento nas entradas de café no Porto do Rio de Janeiro como mostra a tabela 14 Os efeitos negativos das remessas de numerário para a região do Vale do Paraíba eram menos pronunciados que os resultantes de remessas para o Nordeste ou para São Paulo e isso se devia basicamente à proximidade da capital e à presteza das comunicações ferroviárias Em 1888 o crescimento das remessas para o Vale não parece ter sido tão significativo quanto a redução verificada nas remessas por cabotagem de 58 TABELA 13 Remessas de Valores do Rio de Janeiro Caixa dos Bancos e Relação Encaixe Depósitos de julho de 1887 a dezembro de 1888 Valores mensais em contos de réis Ano Meses Remessasa Caixa dos Bancos Relação Encaixe Depósitosb 1887 Julho 1699 10259 0095 Agosto 722 9164 0086 Setembro 1735 10617 0099 Outubro 3126 9494 0089 Novembro 2153 9540 0092 Dezembro 2326 10534 0105 1888 Janeiro 2224 11241 0107 Fevereiro 1087 10317 0099 Março 2838 9436 0085 Abril 521 9966 0090 Maio 723 17120 0147 Junho 332 14855 0126 Julho 566 18694 0145 Agosto 721 20150 0151 Setembro 948 19870 0151 Outubro 2346 17421 0140 Novembro 2244 13394 0110 Dezembro 1670 13938 0127 aSão remessas de valores por cabotagem que incluem papelmoeda moedas metálicas metais em espécie brilhantes e outros valores Em 1888 as remessas de papelmoeda representaram cerca de 91 do total de modo que os outros valores eram pouco importantes Notese que uma pequena parcela das remessas menos de 10 destinavase ao exterior apesar de transportada em cabotagem bOs depósitos incluem letras por dinheiro a prêmio que são depósitos a prazo Fonte RCJC 1887 Quadro 28 p 77 RCJC 1888 p 33 e 34 modo que os efeitos negativos das primeiras sobre os bancos provavelmente foram compensados pelos efeitos positivos das outras Outros fatores no entanto contribuíram no sentido de melhorar a caixa dos bancos e a liquidez no mercado monetário do Rio de Janeiro Por um lado ao aproximarse o desfecho da questão servil os bancos reduziram consideravelmente suas operações com a lavoura em particular o segmento que se veria arruinado com a libertação dos cativos Os bancos temiam que com a Abolição muitos fazendeiros especialmente cafeicultores do Vale do Paraíba não tivessem condições de fazer as colheitas e conseqüentemente não tivessem meios para ressarcir adiantamentos para financiamento de safra Essa postura se tornou evidente nos meses que se seguiram à Abolição e dela resultou que os bancos mantiveram em caixa um grande volume de recursos que normalmente teriam sido destinados às operações de financiamento de safra167 Por outro lado o Tesouro ajudou o Banco do Brasil não só abstendose de cobrar os empréstimos feitos em 1887 segundo a lei de 1885 como também celebrou três 59 TABELA 14 Remessas de Valores Através de Ferrovias para a Região Cafeeira do Vale do Paraíba e Entradas de Café no Porto do Rio de Janeiro 1888 Em contos de réis e mil sacas de 60 kg Meses Estr de Ferro Leopoldina 1 Estação Central 2 Entradas de Café 3 Janeiro 503 2677 2002 Fevereiro 378 2278 1140 Março 510 23 1705 Abril 223 172 973 Maio 237 546 1170 Junho 1375 2566 Julho 1578 891 3521 Agosto 2099 7078 4305 Setembro 1787 8788 4091 Outubro 1591 6725 3662 Novembro 1796 7335 4735 Dezembro nd 8116 4561 Total 12771 44625 34430 Fontes e observações 1 Diz respeito a Suprimentos fornecidos à lavoura Retirado do RMF 1891 1 p 143 2 O título da tabela no original RMF 1891 I p 144 é Relação do Dinheiro Despachado na Estação Central para as do Interior 3 RCJC 1888 Quadro 12 p 51 contratos com o Banco do Brasil e com o Banco da Bahia pelos quais comprometiase a adiantar até 21 mil contos a esses estabelecimentos especialmente para fins de empréstimos à lavoura168 A essas circunstâncias somavase também o aspecto altamente favorável das contas externas que vinha se acentuando desde 1886169 Em conseqüência disso a taxa de câmbio que começara o mês de janeiro a 22 38 atingiu a taxa de paridade em outubro170 Segundo o Jornal do Commercio o câmbio melhorou consideravelmente não só pela alta da taxa como pela estabilidade Este resultado observava o jornal foi devido não só ao fato de conservarse afastado do mercado o Tesouro que dispunha em Londres de fundos provenientes da operação de crédito no valor de 60 milhões ali efetuada como também às grandes vendas de café e aos empréstimos levantados por diversas empresas171 E a isso também se somava o elevado valor de 128 milhões correspondentes ao capital das companhias estrangeiras formadas para operar no Brasil A conjunção de todos esses fatores determinou uma maior e mais persistente acumulação de dinheiro172 mas mesmo assim as carteiras de títulos comerciais dos bancos registravam valores ligeiramente inferiores aos de 1887173 provavelmente em função da acumulação de espécies metálicas em bancos que mantinham a expectativa de vir a obter a faculdade emissora 60 O estado de liquidez a situação lisonjeira das contas externas e do câmbio assim como a Abolição e o crescimento da imigração174 criaram em 1888 condições bastante favoráveis para uma expansão de grande vulto Crescia a oferta de trabalho e também o mercado consumidor a apreciação e estabilidade do câmbio favoreciam uma expansão das importações e a situação dos bancos indicava possibilidades de expansão do crédito em 1888 Um expressivo boom começava pois a firmarse Em 1888 a Junta Comercial registrou 21 novas companhias com o capital total de 16991 contos175 sendo que em 1887 havia registrado 17 companhias novas com 9745 contos de capital176 Além disso em 1888 formaramse outros sete bancos177 com o capital total de 18660 contos dentre eles o Brazilianische Bank Für Deutschland com o capital de 10 milhões de marcos178 Três novas indústrias têxteis se constituíram com um capital total de 3500 contos179 assim como outras companhias de fins diversos com 9252 contos de capital subscrito180 Ao mesmo tempo 22 novas companhias estrangeiras formaramse para funcionar no Brasil representando um aporte total de capital da ordem de 128 milhões Dentre essas 12 eram companhias de navegação e quatro de seguros sendo que essas 16 companhias respondiam por quase 90 do aporte total de capital estrangeiro de risco em 1888181 Ganhava assim surpreendente impulso em 1888 o boom que estivera em gestação desde 1886 quando se tornaram favoráveis as contas externas Ao mesmo tempo as possibilidades de expansão pareciam ilimitadas em 1888 face ao crescimento do fluxo migratório e à ampliação do setor assalariado da economia Entretanto sabiase que a liquidez favorável182 em 1888 se devia a uma conjugação de circunstâncias passageiras que poderiam subitamente reverterse Como anteriormente sugerimos a reduzida propensão do público a reter moeda sob forma de depósitos bancários impunha limites à criação de crédito de modo que o baixo grau de desenvolvimento do sistema bancário a que isso se devia podia constranger a continuação da expansão que se acelerava em 1888 Nessas condições cresceu a preocupação em se garantir que uma possível restrição de liquidez no futuro não viesse a comprometer o boom Não se tratava mais como em 1887 de conjurar uma crise através de uma expansão monetária e sim de permitir a continuação da expansão Reconheciase que a monetização nas áreas rurais elevava as necessidades de moeda na economia Segundo um dos proponentes da reforma acresce a necessidade de numerário para pagamento dos salários que a lavoura daqui por diante terá de pagar e que já se ouviu calcular a homens práticos em 50 mil contos183 E dessa maneira como afirmava o Senador Teixeira Jr já Visconde de Cruzeiro em junho de 1888 se em 1887 era reconhecida a urgência de providência eficaz mais evidente é hoje em face das novas necessidades da lavoura provocadas pela Abolição184 Paralelamente a situação da taxa de câmbio recolocava em discussão a restauração da conversibilidade Com a aproximação da taxa de paridade começaram os bancos a acumular metais eou saldos em seus correspondentes no exterior utilizando assim sua reduzida capacidade para expandir suas exigibilidades para absorver superávits no balanço de pagamentos Como sugerimos na seção 13 essa é uma circunstância em que facilmente se produz a reivindicação da faculdade emissora pelos bancos 61 Cresceu também e significativamente o interesse do Tesouro pela modificação nas instituições monetárias e em particular pelo projeto do Visconde de Cruzeiro Apresentavase uma oportunidade de se instituir a tão desejada circulação conversível sem exigir nenhum esforço deflacionista ou austeridade fiscal Ao mesmo tempo a reorganização bancária oferecia ao Tesouro a chance de desvencilharse da posição de lenderoflastresort que lhe reservava a lei de 1885 e lhe subtraía graus de liberdade na condução de sua política financeira O Ministro da Fazenda bem sabia que a sua ajuda se devia em grande parte a situação favorável da liquidez em 1888 Mas não sabia ao certo o que lhe seria exigido no futuro quando as transformações no campo se manifestassem em toda a sua extensão Assim como o interesse do Tesouro o boom o estado favorável das contas externas e as transformações no campo deram aparência completamente diversa à defesa e às discussões em torno do projeto de reforma bancária do Visconde de Cruzeiro A intenção de elevar o meio circulante tinha nessa ocasião muito mais autoridade e legitimidade face à Abolição ao crescimento do nível da atividade e ao estado lisonjeiro do câmbio A discussão voltarseia por conseguinte menos para a sua aceitação do que para os seus condicionantes e controles E assim depois de um ano de espera o projeto foi finalmente posto em discussão no Senado na sessão de 14 de junho de 1888 23 A lei de 24 de novembro de 1888 Em junho de 1888 quando o projeto de reforma bancária voltou à apreciação do Senado trazia uma resposta às sugestões apresentadas pelas comissões de Fazenda e Legislação Na seção 21 apontamos o fato de que as comissões buscavam prevenir a possibilidade de que houvesse expansão monetária enquanto se estivesse fazendo o resgate das notas do Tesouro A idéia das comissões era de que às emissões bancárias correspondesse uma quantidade igual ou mesmo maior de notas do Tesouro incineradas Como vimos na seção 21 tal intenção contrariava francamente o propósito dos proponentes do projeto que era justamente o de promover uma expansão monetária Assim sendo os autores propuseram uma alteração nos termos do projeto com intuito claramente conciliador De acordo com o Visconde de Cruzeiro querendo prestar homenagem ao parecer das ilustradas comissões tanto quanto for possível sem prejudicar o fim principal do projeto que é como fica dito obviar a insuficiência do meio circulante pensam os autores do projeto que se pode atender à emenda da comissão determinandose que seja incinerada somente a metade do papelmoeda com que for pago pelos bancos o preço das apólices substituindo a aplicação da outra metade ao resgate das apólices de 5185 De acordo com a sugestão do Visconde de Cruzeiro uma emissão de 900 réis acarretaria nos termos do projeto a compra pelos bancos de 1000 réis em apólices de 4 12 e dos recursos provenientes dessa compra o Tesouro incineraria 500 réis em notas do Tesouro e recolocaria outra tanto em circulação através da compra de apólices de 5 Resultaria da operação uma expansão monetária líquida de 400 réis Prevalecendo esse mecanismo ao ser atingido o limite das emissões isto é 180 mil contos o 62 depósito em títulos de 4 12 atingiria o valor de 200 mil contos e o montante de papelmoeda incinerado elevarseia a 100 mil contos resultando portanto um acréscimo final à oferta de moeda da ordem de 80 mil contos186 Ainda que o parecer das comissões tivesse em parte sido aceito persistia a orientação de se elevar o meio circulante o que de maneira alguma era aceitável para os metalistas Assim sendo o projeto despertou objeções incisivas entre os senadores metalistas O Senador Pereira da Silva por exemplo notou que as emissões bancárias cresceriam muito mais rapidamente do que decrescia o volume de notas do Tesouro em circulação e assinalou que daí resultaria tal superabundância de papel fiduciário que perturbaria mais o restabelecimento do padrão monetário elevando o valor do ouro com a depreciação das notas e formando de novo como que aquele carnaval financeiro de que tanto se falou no ano de 1857187 O Senador Silveira da Mota em completa concordância com Pereira da Silva afirmava que a idéia do projeto pode dar a hipótese de uma superabundância muito grande de emissão inconvérsvel e prosseguia o senador se a atual já provoca a baixa do câmbio no momento em que se apresenta uma nova onda de emissão havemos de contar com o câmbio como o tivemos na época da Guerra do Paraguai188 A tentativa de Cruzeiro Ouro Preto e Lafayette de estabelecer alguma forma de conciliação entre a sua intenção de expandir a oferta de moeda e a dos metalistas de reduzila era na realidade bastante dificultada pela flagrante contradição em que se encontravam O compromisso entre as duas tendências foi no entanto se tornando mais fácil à medida que avançava o segundo semestre de 1888 e o câmbio continuamente se apreciava até atingir a taxa de 27 pence por mil réis no começo de outubro Surgiram ao longo dessa trajetória duas propostas da parte dos próprios autores do projeto no sentido de conciliar as duas tendências sugerindo o estabelecimento da circulação metálica conversível sem prejuízo da emissão sobre apólices que haviam proposto189 Os autores do projeto sugeriram outrossim que os bancos do projeto fossem simplesmente autorizados a emitir bilhetes conversíveis em ouro na base do triplo do valor do lastro metálico E propuseram também que quando fosse incinerada metade do papelmoeda do Tesouro então em circulação o que aconteceria no momento em que as emissões bancárias estivessem próximas de alcançar o seu limite os bancos fossem obrigados a converter os seus bilhetes metade em ouro metade em notas do Tesouro O montante total de notas do Tesouro em circulação em 1888 era de 188869 contos e de acordo com a nova sugestão quando 944345 contos em notas do Tesouro fossem incinerados o que corresponderia a uma situação onde as emissões bancárias teriam atingido a cifra de 169983 contos então esse mesmo volume de notas bancárias emitidas seria tornado conversível metade em ouro metade em papel Desse modo 849915 contos seriam a reserva metálica para a perfeita conversibilidade Estas duas propostas tinham implicações completamente diversas caso a taxa de câmbio estivesse ao par ou abaixo deste No primeiro caso a conversibilidade já seria efetiva pois estarseia trocando livremente no mercado ouro por notas do Tesouro e dos bancos ao preço de 27 pence por mil réis Nesse caso se as emissões sobre apólices atingissem o valor de 169983 contos nada se alteraria pois os bilhetes bancários já seriam conversíveis Se o câmbio estivesse ao par e existisse a expectativa de que af 63 Contexto Histórico da Política do Encilhamento Introdução O Encilhamento foi um período crucial e tumultuado na história econômica do Brasil marcado por reformas monetárias e financeiras que ocorreram entre 1889 e 1891 Este trabalho busca analisar o contexto histórico dessa política suas causas suas principais ações e seus impactos na economia e na sociedade brasileira da época Em um cenário de grandes mudanças políticas com a Proclamação da República e a transição de um regime monárquico para um regime republicano o Brasil enfrentava a necessidade urgente de modernização e crescimento econômico As políticas do Encilhamento foram idealizadas e implementadas em um momento de euforia econômica e de grande otimismo quanto ao futuro do Brasil como uma potência emergente O principal arquiteto dessas reformas foi Rui Barbosa então Ministro da Fazenda que buscava inspiração nos princípios do liberalismo econômico para impulsionar o desenvolvimento industrial e modernizar a economia brasileira Através de medidas como a expansão do crédito e a emissão de papelmoeda Rui Barbosa pretendia criar um ambiente propício ao surgimento de novas empresas e ao crescimento econômico acelerado No entanto as consequências dessas políticas foram desastrosas A falta de regulamentação adequada e a emissão desenfreada de papelmoeda levaram a uma crise econômica severa marcada por inflação descontrolada desvalorização da moeda e uma série de falências empresariais Este período de grande euforia seguido por uma profunda crise econômica ficou conhecido como Encilhamento e suas repercussões foram sentidas em todo o país tanto na economia quanto na política e na sociedade Neste trabalho examinaremos os antecedentes econômicos do Encilhamento as reformas implementadas por Rui Barbosa a crise econômica que se seguiu e as consequências sociais e políticas desse período Nossa análise será baseada no capítulo do livro fornecido e complementada por outras referências para oferecer uma visão abrangente e detalhada do contexto histórico dessa importante fase da história brasileira Contexto Histórico do Encilhamento Antecedentes Econômicos O final do século XIX foi um período de grandes transformações para o Brasil A Proclamação da República em 1889 trouxe mudanças significativas na estrutura política do país que até então era uma monarquia A nova República necessitava de uma economia robusta para sustentar suas políticas e promover o desenvolvimento A economia brasileira predominantemente agrária estava fortemente dependente da exportação de produtos agrícolas especialmente o café No entanto havia um crescente reconhecimento da necessidade de diversificação econômica e industrialização O Brasil ainda se recuperava dos efeitos da abolição da escravatura em 1888 que trouxe profundas mudanças na estrutura social e econômica A transição para uma economia baseada no trabalho assalariado e a necessidade de modernização das técnicas agrícolas e industriais criaram um ambiente propício para a implementação de reformas econômicas Neste contexto as políticas do Encilhamento foram vistas como uma oportunidade para acelerar o crescimento econômico e modernizar a infraestrutura produtiva do país Reformas de Rui Barbosa Rui Barbosa então Ministro da Fazenda foi o principal responsável pela formulação e implementação das políticas econômicas do Encilhamento Inspirado pelos ideais do liberalismo econômico Rui Barbosa buscou estimular a economia por meio de uma série de reformas que incluíam Criação de novos bancos A liberalização do sistema bancário permitiu a criação de inúmeros novos bancos o que facilitou o acesso ao crédito Expansão do crédito Aumentouse significativamente a oferta de crédito com o objetivo de incentivar investimentos e a criação de empresas Emissão de papelmoeda A emissão de grandes quantidades de papel moeda visava aumentar a liquidez na economia e fomentar o consumo e o investimento Essas medidas resultaram em um boom econômico inicial com a criação de muitas novas empresas e um aumento significativo na atividade econômica No entanto muitas dessas empresas eram especulativas ou inexistentes o que levou a um aumento da inflação e a uma bolha econômica O capítulo do livro fornecido detalha como a política de emissão de papelmoeda sem lastro suficiente causou uma inflação galopante corroendo o poder de compra da população e desestabilizando a economia Crise Econômica e Consequências A euforia inicial foi seguida por um colapso econômico A inflação descontrolada a desvalorização da moeda e a especulação desenfreada resultaram em uma crise de confiança no sistema financeiro brasileiro Muitas empresas faliram e o país mergulhou em uma recessão profunda A crise também teve consequências políticas levando à renúncia de Deodoro da Fonseca e à ascensão de Floriano Peixoto O capítulo fornecido descreve como a ausência de regulamentação adequada e a falta de mecanismos de controle contribuíram para o agravamento da crise A liberalização excessiva do mercado financeiro permitiu a criação de empresas fantasmas e a emissão de ações sem lastro o que culminou em uma bolha especulativa que ao estourar deixou muitos investidores e empresários em situação de insolvência Impactos Sociais e Políticos Além dos impactos econômicos o Encilhamento teve significativos efeitos sociais e políticos A crise financeira agravou as desigualdades sociais e gerou um clima de instabilidade e desconfiança na recéminstaurada República O episódio do Encilhamento serviu como uma lição sobre os perigos da falta de regulamentação financeira e as consequências de políticas econômicas mal planejadas A instabilidade política gerada pela crise econômica culminou na renúncia de Deodoro da Fonseca o primeiro presidente do Brasil e na subsequente ascensão de Floriano Peixoto que adotou medidas mais conservadoras para estabilizar a economia e restaurar a confiança da população O capítulo fornecido destaca como a crise financeira também teve um impacto profundo nas classes trabalhadoras urbanas que enfrentaram desemprego e uma queda no poder de compra Conclusão O Encilhamento foi um marco na história econômica do Brasil destacandose como um período de grande euforia seguido por uma crise devastadora A análise do contexto histórico mostra como as políticas econômicas quando implementadas sem a devida cautela e regulamentação podem levar a consequências severas tanto para a economia quanto para a sociedade A história do Encilhamento serve como um alerta sobre os riscos da especulação e a importância de um sistema financeiro robusto e bem regulado As lições aprendidas com o Encilhamento são relevantes até os dias de hoje A necessidade de um equilíbrio entre liberalização econômica e regulamentação é fundamental para garantir a estabilidade financeira e evitar crises semelhantes O episódio também destaca a importância de políticas econômicas bem fundamentadas e planejadas capazes de promover o desenvolvimento sustentável sem causar desequilíbrios econômicos e sociais Em resumo o Encilhamento ilustra os perigos de uma expansão econômica desenfreada e a falta de controle sobre o sistema financeiro O período teve consequências duradouras para a economia e a sociedade brasileira moldando a forma como futuras políticas econômicas seriam implementadas e regulamentadas no país Referências FRANCO Gustavo Henrique Barroso Reforma monetária e instabilidade durante a transição republicana 1987 Dissertação Mestrado em Economia do Setor Público Departamento de Economia Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro Rio de Janeiro 1987 CARVALHO Fernando J Cardim de Reforma monetária indexação generalizada e o plano de estabilização Revista de Economia Política v 10 n 2 p 520 1990 Disponível em httpswwwscielobrjrepa cGqhBTjTqVxSQ4yRjYNxfTQabstractlangpt Acesso em 16 maio 2024 GOMES Ângela de Castro KORNIS Mônica Almeida Com a história no bolso a moeda e a República no Brasil In SEMINÁRIO INTERNACIONAL O outro lado da moeda 2001 Rio de Janeiro Livro do Seminário Internacional Rio de Janeiro Museu Histórico Nacional 2002 p 107134 Disponível em httpsrepositoriofgvbrbitstreamsbf9e79c061fa491daedaa21c09cc097f download Acesso em 16 maio 2024