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DOSSIÊ DOI httpdxdoiorg105216phiv25i252318 PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 2 87 287 DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE1 Heiberle Hirsgberg Horacio UNIMONTES23 heiberlehotmailcom Resumo No caminho dos trabalhos que versam sobre as questões envolven do a autonomia da arte categoria da Estética desde a modernidade este arti go visa desenvolver explanações sobre dois autores Arthur Schopenhauer 17881860 e Herbert Marcuse 18981979 que devedores da estética kan tiana possuem perspectivas que permitem reflexões sobre a autonomia da arte ainda que Marcuse se posicione como um crítico da perspectiva repre sentada por Schopenhauer Designadamente este artigo apresentará a com preensão estética do filósofo Arthur Schopenhauer na obra principal deste autor O Mundo Como Vontade e Representação sobretudo o lugar do gênio artístico na obra do filósofo alemão bem como apresentará os apon tamentos do filósofo Herbert Marcuse na obra Dimensão Estética de 1977 que sintetiza as principais questões da estética do autor Palavraschave Schopenhauer Marcuse Autonomia da Arte Estética 1 Recebido 15082020 Aceito 24032021 Publicado online 15042021 2 Professor titular na Universidade Estadual De Montes Claros UNIMONTES Montes Claros MG Brasil 3 ORCID httpsorcidorg0000000244861764 HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 288 APRESENTAÇÃO No caminho dos trabalhos que versam sobre as ques tões envolvendo a autonomia da arte4 categoria da Estética desde a modernidade este artigo visa desenvolver explana ções sobre dois autores Arthur Schopenhauer 17881860 e Herbert Marcuse 18981979 que devedores da estética kantiana possuem perspectivas que permitem reflexões so bre a autonomia da arte5 perspectivas que podem ter pon tos de aproximações ainda que Marcuse se posicione como um crítico àquela representada por Schopenhauer Desig nadamente este artigo apresentará a compreensão estética de Arthur Schopenhauer metafísica do belo preferiria o 4 A questão da autonomia da arte teoricamente fundada pela Crítica da faculdade de jul gar 1790 de Kant significava de um ponto de vista sóciohistórico que o objeto artístico se tornava independente de qualquer instituição Quando a instituição era de caráter religioso a arte se tornava parte do serviço a lo divino se era uma instituição política a arte devia em última análi se glorificar o príncipe O processo de autonomização que se esboçara no Renascimento italiano não teria sido possível sem a prévia existência de uma clientela que progressivamente substituíra os ricos patronos Assim a autonomia da arte implicou sua separação gradual da aristocracia o surgimento de uma burguesia enriquecida e o desenvolvimento do mercado LIMA 2004 5 Embora o entendimento da questão da autonomia da arte tenha a origem apontada na citação acima a autonomia da arte é uma categoria da sociedade burguesa Ela permite descrever a ocorrência histórica do desligamento da arte do contexto da práxis vital descrever o fato de que portanto uma sensibilidade não comprometida com a racionalidade de fins pode se desenvolver junto aos membros das classes que pelo menos temporariamente estavam livres da pressão da lu ta cotidiana pela sobrevivência Aí reside o momento de verdade do discurso da obra de arte au tônoma No entanto o que essa categoria não consegue abarcar é que esse desligamento da arte do contexto da práxis vital representa um processo histórico vale dizer socialmente condiciona do E nisso justamente consiste a não verdade da categoria o momento da deformação que é próprio de toda ideologia contanto que se use esse conceito no sentido da crítica da ideologia do jovem Marx A categoria da autonomia não permite compreender o seu objeto como tendo se tornado histórico Na sociedade burguesa a relativa dissociação da obra de arte em face da práxis vital se transforma assim na falsa representação da total independência da obra de arte em rela ção à sociedade A autonomia é por conseguinte uma categoria ideológica no sentido estrito da palavra que congrega um momento de verdade descolamento da arte da práxis vital e um mo mento de não verdade hipostasiar esse estado de coisas produzindo historicamente como essên cia da arte BURGER 2012 p9192 DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 289 filósofo SALVIANO 2019 p191 na obra principal des te autor O Mundo Como Vontade e Representação so bretudo o lugar do gênio artístico na concepção schopenhaueriana bem como apresentará os apontamentos do filósofo Herbert Marcuse na livro Dimensão Estética de 1977 que sintetiza as principais questões da estética do au tor SCHOOLMAN 1984 SILVEIRA 2018 Com isso este artigo procura possibilitar a observação de certas apro ximações nas perspectivas de autores diferentes Aproxima ção de algum modo que já foram apontadas em trabalhos de outros pesquisadores e pesquisadoras ABDO 2005 SILVEIRA 2018 que se não demonstraram exatamente uma relação entre esses dois filósofos exibiram uma alter nativa de aproximação entre as perspectivas em que eles es tão inseridos SCHOPENHAUER O MUNDO COMO VONTADE E COMO REPRESENTAÇÃO Arthur Schopenhauer mobilizador de conceitos kanti anos e platônicos realiza à sua maneira uma articulação en tre a coisaemsi do filósofo de Königsberg e a Teoria das Ideias do filósofo grego utilizando tais concepções na construção de seu sistema filosófico Schopenhauer explora a distinção efetuada por Kant entre fenômeno e noumenon coisaemsi bem como a compreensão das formas puras da sensibilidade de espaço e tempo formas a priori que não são extraídas da experiência sensível SALVIANO 2009 p 102 Schopenhauer observa que a sensibilidade só oferece a HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 290 matéria para o princípio de razão espaço tempo e causali dade e estabelece uma distinção entre entendimento e ra zão sendo que esta utiliza as representações do entendimento abstraindoas para elaborar conceitos ou se ja representações abstratas reflexivas não intuitivas No entanto para Schopenhauer o mundo fenomênico no qual os humanos se relacionamrepresentam não pode ser considerado um mundo ilusório não há uma aparência sem algo que possa aparecer De acordo com o filósofo o mundo é um fazer efeito da pessoa que a representa sendo representação de quem representa ou seja uma conclusão do entendimento dos dados fenomênicos Representar sig nifica estar diante de algo de algum fenômeno porém estar diante de algo pressupõe um sujeito que intui Portanto em Schopenhauer os dados sensíveis fenô menos são encontrados pelo princípio de razão e só ge ram efetivamente conhecimento quando passam a ser pensados pelo entendimento e suas categorias6 De acordo com Schopenhauer todo o conhecimento dos dados feno mênicos está condicionado ao princípio de razão isso por que as formas desse princípio não são atributos da coisa emsi e sim do fenômeno pois toda multiplicidade e to 6 Sobre o entendimento Schopenhauer se diferencia de Kant uma vez que para Schopenhau er pela mera sensibilidade não se obtém nenhuma intuição ela apenas oferece a matéria Stoff que servirá para a aquisição das representações intuitivas tarefa do entendimento nas quais se encontram as formas a priori do espaço e do tempo que serão regidas pelo princípio de causali dade O princípio de causa e efeito é então o único que resta no entendimento do conjunto de doze categorias kantianas De acordo com Schopenhauer Kant acaba confundindo no final das contas o princípio lógico de causalidade razãoconsequência com o princípio ontológico causaefeito fazendo com que este seja extraído daquele enquanto na teoria schopenhaueriana dáse o contrário na razão não existe nada que não tenha sido extraído do entendimento ou seja é na representação intuitiva que a representação abstrata encontra seu fundamento SALVIANO 2009 Para mais uma vigorosa diferenciação dos aspectos supracitados ver CACCIOLA 2018 DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 291 do surgir e fenecer são possíveis unicamente mediante tem po espaço causalidade também aquelas pertencem apenas aos fenômenos e de modo algum a coisaemsi SCHOPENHAUER 2000 p22 Considerando a realização da relação sensibilidade entendimentorazão em Schopenhauer podese perceber a impossibilidade do conhecimento sobre a coisaemsi a través do princípio da razão A coisaemsi não apresenta a divisibilidade nem a pluralidade dos fenômenos ela é una e indivisível pois a relação parte e todo pertencem exclusi vamente ao espaço que é a forma de conhecimento do princípio de razão Consequentemente a coisaemsi não participa desse tipo de conhecimento não só porque as formas de espaço e tempo são incompatíveis com a coisa emsi mas também porque não há interação causal entre a coisaemsi e o mundo fenomênico pois a causalidade só ocorre com as mudanças empíricas individuais Segundo o pesquisador Cristopher Janaway Schopenhauer nunca a firmara que a vontade como coisaemsi é uma causa S chopenhauer fala de manifestação da Vontade de objetivação isso quer dizer apenas que o mundo nos apre senta o lado de si que podemos experimentar JANAWAY 2003 p53 Schopenhauer então não procura encontrar a coisa emsi através do princípio da razão e investiga o noume non por vias intuitivas Ou seja Schopenhauer inspeciona então o núcleo da consciência pelo sentimento Gefühl pela via subjetiva pois o sentimento7 tem o contato com as 7 A palavra sentimento Gefühl é usada por Schopenhauer para designar os estados da Vontade no humano com a advertência de que a extensão do significado normalmente dada a este termo Cont HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 292 coisas fora das formas encontrando o núcleo do enigma traduzível na palavra vontade BARBOSA 1997 p100 Tal inspeção revela uma existência corporal puramente volitiva que permite uma possibilidade de intuição da rela ção8 do corpo com a coisaemsi sendo que esta seria a Vontade que é percebida pelo filósofo num momento em que cada consciência indica uma subjetividade puramente volitiva O filósofo observa que as ações dos corpos são a penas atos de vontades pois todo ato real da nossa vontade é ao mesmo tempo e infalivelmente um movimento do nosso corpo não podemos querer realmente um ato sem constatar no mesmo instante que ele aparece como movi mento corporal SCHOPENHAUER 2004 p110 Para Schopenhauer só é possível ter alguma intuição do que seja a Vontade como coisaemsi porque é possí vel ter certa ideia do que ela é a partir das ações sempre vo litivas do corpo dos corpos Assim realizar algo é consequentemente colocar o corpo em movimento e o corpo não é senão querer e o querer da consciência ordi nária de nada difere em sua matéria básica dos inúmeros outros processos que põem o corpo ou partes dele em mo é segundo ele um erro da razão que procura incluir sob um só conceito tudo aquilo que escapa a seu modo de representação como os gregos em relação aos bárbaros Aliás pode haver não im porta o quê sob o conceito de sentimento cuja extensão excessivamente grande abraça as coisas mais heterogêneas Não se veria por que motivo elas se mantém sob um mesmo conceito se não se reconhecesse que elas se reconciliam sob um ponto de vista negativo não são conceitos abstratos SALVIANO 2001 8 Schopenhauer quer dizer que quando há a ação o corpo se move e a consciência de seu mo vimento difere da consciência que a pessoa possui dos outros eventos que percebe A pessoa está fora dos outros objetos ou eles estão fora da pessoa que se percebe mas o próprio corpo é meu de maneira íntima que não tem comparação Isso só pode ser expresso pela afirmação de que os outros eventos são apenas observados em seu acontecer ao passo que os movimentos do meu corpo são expressões da minha vontade JANAWAY 2003 p48 DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 293 vimento JANAWAY 2003 p 49 Importa destacar que não há relação de causalidade entre o ato da vontade e o movimento mas são uma única coisa dadas de maneiras di ferentes Schopenhauer amplia a compreensão dos objetos co mo sendo a Vontade coisaemsi objetivada ao fazer a alegação de que se há o reconhecimento do corpo como re presentação e assim é todo o resto e enquanto interior o corpo é Vontade os outros objetos também o são no seu âmago pois se o núcleo do corpo humano é encontrado e existe em todos os níveis de representação compreendese que o íntimo de todos os outros corpos também é a Vonta de Assim Até o corpo é um produto da Vontade O sangue empurrado por aquela vontade a que vagamente chamamos de vida constrói seus próprios vasos abrindo sulcos no corpo do embrião os sulcos se a largam e se fecham tornandose artérias e veias A vontade de saber constrói o cérebro assim como a vontade de agarrar constrói a mão ou como a vontade de comer desenvolve o aparelho digestivo SCHOPENHAUER 2004 A VONTADE E O SOFRIMENTO HUMANO O corpo é produto da Vontade e cada objetivação da Vontade espécie organismo órgão é determinada pela sua pulsão de tal maneira que sendo o corpo produto da Vontade ele é constituído pela força desejadora da Vonta de e tal situação o leva a dor porque a Vontade já indica necessidade e no corpo o desejo é infinito mas a realização limitada Desse modo as exigências dos desejos dos indiví duos conflitam com o seu bemestar pois HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 294 é como as esmolas dadas a um mendigo que o mantém vivo hoje para que sua miséria seja prolongada amanhã Enquanto nossa consciência estiver tomada pela nossa vontade enquanto nos entre garmos a multidão de desejos com suas constantes esperanças e te mores enquanto estivermos sujeitos a ter vontade nunca poderemos ter felicidade ou paz duradoura SCHOPENHAUER 2004 Segundo o filósofo para cada desejo sanado aparecem outros que subjugam os indivíduos Schopenhauer com preende ainda que o próprio desejo já constitui um sofri mento quando não satisfeito porque satisfeito pode produzir o tédio e atinge no indivíduo o maior nível Para o autor Todo desejo nasce de uma falta de um estado que não nos satisfaz portanto é sofrimento nenhuma satisfação dura ela é apenas o ponto de partida de um novo desejo Vemos o desejo em toda parte travado em toda à parte em luta portanto sempre no estado de so frimento não existe fim último para o esforço portanto não existe termo para o sofrimento SCHOPENHAUER 2004 p325 Outro elemento da existência humana para o qual o fi lósofo chama atenção é para o fator da ilusão empírica do querer Para Schopenhauer embora os indivíduos acredi tem que através das suas escolhas podem evitar o sofrimen to pelas opções que eles fazem eles não percebem que ao desejarem já colocam em movimento uma nova série de so frimentos Além do que o sofrimento humano também é aumentado pela antecipação ou pela memória da dor já sentida Ademais o indivíduo para Schopenhauer se constitui de um paradoxo inerente Isso porque se a necessidade dá uma trégua a pessoa é atingida pelo tédio pois a perpetua ção da espécie e a luta pela sua manutenção são essenciais à DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 295 vida e sem elas há o tédio e consequentemente mais dor e sofrimento AS IDEIAS PLATÔNICAS9 COMO OBJETIVAÇÃO IMEDIATA DA VONTADE Schopenhauer porém enxerga uma suspenção mo mentânea do sofrimento Tal suspensão encontrase de al gum modo na arte do gênio no conhecimento estético que se relaciona com a manifestação das Ideias termo aqui recuperado a partir da compreensão que Schopenhauer es tabelece da concepção platônica Ou seja no conhecimen to estético é a Ideia que se expõe em uma forma singular em um signo sensível que é a obra A obra não é portanto cópia de um dado apreendido no conhecimento comum mas manifestação da Ideia a ser atingida pela atividade do gênio CACCIOLA 1999 p10 Segundo o autor a Vontade que é a coisaemsi pos sui graus de objetivação Seu aparecer não é imediato no fenômeno cada grau de objetivação da Vontade corres ponde segundo Schopenhauer às Ideias de Platão objeti vação imediata e adequada da Vontade De acordo com o pesquisador Jarlee Oliveira Silva Salviano as Ideias são re presentações mas não são fenômenos estes são espaço temporais sob a regência da causalidade Assim pertence às Ideias uma única forma a do serobjetoparaumsujeito ObjektfüreinSubjektsein SALVIANO 2019 p 193 9 O artigo adotará o uso Ideias platônica ou Ideias de Platão porque assim aparecem na obra de Schopenhauer e guardam uma certa especificidade da interpretação dada por Schopenhauer da concepção platônica HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 296 As Ideias de Platão são a coisaemsi na forma mais geral de representação e semelhantes a ela são unas atem porais e alheias às formas de espaço tempo e a causalidade Quanto a isto diz Schopenhauer A coisa individual que aparece em conformidade com o princípio de razão é portanto uma objetivação mediata da coisaemsi que é a vontade entre as quais se encontra a Idéia como a única objetivi dade imediata da vontade ao não adotar forma alguma própria ao conhecer como tal senão a da representação em geral ie do ser ob jeto para um sujeito SCHOPENHAUER 2000 p27 A Ideia no modo como Schopenhauer atribui signifi cado à concepção platônica é ainda uma representação e difere da coisaemsi nesse aspecto Porém ela não está subordinada ao princípio de razão e mantém a forma primeira e universal tornandose objeto para um sujeito Notase ainda que o essencial de todos os graus de objetiva ção da Vontade constitui a Ideia e o desdobramento desta é estendido aos fenômenos diversos Nas palavras do filóso fo Reconhecíamos as Idéias de Platão em tais graduações na medida em que estas são espécies determinadas ou as formas e propriedades invariáveis originárias de todos os corpos naturais orgânicos ou i norgânicos como também as forças genéricas se manifestando con forme leis naturais tais Ideias portanto se manifestam em indivíduos e particularidades inumeráveis comportando se como modelo para estas suas imagens SCHOPENHAUER 2000 p21 Para Schopenhauer a apreensão das Ideias é o mais ob jetivo conhecimento do mundo que se pode possuir só al cançado através da obra de arte DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 297 O ESTADO ESTÉTICO COMO SUPRESSÃO DA DOR A OBRA DE ARTE E AS IDEIAS A obra de arte resulta de um estado estético dado da in tuição da Ideia que é objetivação imediata da Vontade e o modo de conhecimento que existe exterior a toda relação fenomênica O estado estético se define como o da intuição dos objetos imutáveis dos arquétipos das coisas isto é das Ideias Neste estado esses arquétipos são intuídos inde pendentes do princípio de razão para além da representa ção ou seja para a Ideia o princípio de razão não possui significado algum SCHOPENHAUER 2000 p21 Desse modo a obra de arte Reproduz as idéias eternas apreendidas mediante pura contempla ção o essencial e permanente de todos os fenômenos do mundo e conforme a matéria em que ela reproduz se constitui em artes plás ticas poesia ou música Sua única origem é o conhecimento das i déias seu único objetivo a comunicação deste conhecimento SCHOPENHAUER 2000 p36 Vale destaque que para ocorrer o conhecimento intui tivo da Ideia é imprescindível o afastamento da individua lidade empírica no sujeito cognoscente isso como condição para tornar as Ideias objeto de conhecimento Schope nhauer indica a necessidade de uma transformação no su jeito para obtenção do acesso ao conhecimento intuitivo Nele o sujeito deixa de ser indivíduo e tornase puro sujeito do conhecimento não mais se ocupando do conhecimento através das relações simplesmente causais A força do espírito contemplativo tira alguns indivíduos do modo comum de examinar as coisas cessando de acom panhar somente as relações entre si cujo objetivo último é HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 298 sempre a relação com a própria vontade pelo fio condutor das configurações do princípio de razão SCHOPENHAUER 2000 p29 Na intuição há um preenchimento da consciência pela contemplação do objeto e não se pode mais distinguir intu ição do sujeito que intui pois ambos se tornam um e o in divíduo se torna puro sujeito do conhecimento se dissolvendo no objeto contemplado e se torna ele mesmo objeto Consequentemente suprimindo o conhecedor su primese também o mundo como representação e o conhe cimento servo da Vontade e o fim dessa servidão pode suspender o sofrimento O estado estético que suspende o sofrimento condição estimada por Epicuro como o mais elevado dos bens e o estado dos deuses SCHOPENHAUER 2000 p47 pode ocorrer em duas condições quando há um estímulo exteri or ou quando há uma disposição interior que liberta mes mo que momentaneamente o sujeito da servidão da Vontade Há o sentimento do sublime e há o sentimento do belo que distintamente rompem a cadeia de sofrimento causada pelo desejo incessante O sentimento dado no sublime se dá quando alguns objetos possuem uma relação hostil à vontade humana na sua objetividade seja por eles ameaçandoa com uma supe rioridade que mina qualquer resistência ou reduzindoa ao nada por sua grandeza descomunal se apresentam violen tamente à Vontade SCHOPENHAUER 2000 p5 O sublime advém de um estado de exaltação engrandecimen to ele liberta através da violência da força do objeto con templado Segundo Schopenhauer a sensação do sublime possui vários graus desde uma região erma sem agitação DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 299 com horizonte ilimitado calmo sem pessoas plantas ou a nimais que por não apresentar objetos à Vontade possibi lita a contemplação pura até quando num grau maior é produzido por um ambiente onde A natureza em tempestuosa agitação penumbra deitada por negras e ameaçadoras nuvens rochas pendentes monstruosas descalvadas impedindo a visão torrentes espumantes e estrondosas aridez total suspiros provocados pelo ar fustigado pelos abismos SCHOPENHAUER 2000 p54 Observase também a sensação do sublime quando há grandezas espaciais ou temporais e essas grandezas dão a sensação de que o humano foi reduzido Esses tipos de sen sações de sublime10 Schopenhauer baseado em Kant de nominou como sublimedinâmico e sublimematemático respectivamente Segundo Schopenhauer o sentimento do sublime se origina aqui pela interiorização da insignificân cia de nosso próprio corpo em face de uma grandeza que por outro lado apenas reside em nossa representação e cujo portador somos enquanto sujeito cognoscente SCHOPENHAUER 2000 p56 A respeito do sentimento do belo com o que se ocupa este texto o conhecimento puro independente da Vonta de ocorre sem luta se dá pela beleza do objeto contempla do pois sua constituição facilita o conhecimento das Ideias O belo permite aos humanos tornaremse sujeitos puros do 10 Schopenhauer escreve também sobre o oposto do sublime denominando tal sensação como provocante No provocante há uma excitação da Vontade pois sempre mostra objetos que a satis faz Diferente do sublime o provocante atrai o contemplador com objetos que provocam a Von tade Para o filósofo pior do que o provocante somente o repugnante que estimula a Vontade através da destruição da contemplação estética pura causando repulsa o que consequentemente desperta a Vontade só que desta vez pela aversão desta ao objeto apreendido HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 300 conhecimento onde não são mais indivíduos já que nesse estado se igualam ao objeto contemplado Schopenhauer observa que o prazer estético se dá ora mais pelo conheci mento das Ideias ora mais pelo conhecer liberto da Vonta de Esta diferenciação incide de acordo com o grau de ideia intuitivamente apreendida ou seja de acordo com a eleva ção da objetivação da Vontade Dessa caracterização desse nivelamento da apreensão das Ideias surge uma hierarquização das Ideias e conse quentemente Schopenhauer faz uma hierarquização da ar te que é a exposição das ideias É importante ressaltar que esta hierarquização não diz respeito à qualidade da arte mas sim ao grau de objetividade que elas representam Schopenhauer inicia sua hierarquia com a arquitetura11 que segundo o filósofo possui as Ideias mais elementares e confere à música o título de arte suprema pois ela não é um arquétipo das Ideias mas a linguagem imediata e uni versal da coisaemsi porque a música é um análogo do mundo Escreve o filósofo a música seguindo além das idéias também é inteiramente inde pendente do mundo aparente que ignora e sua existência seria pos sível mesmo com a inexistência do mundo o que não se pode afirmar das outras artes Porque a música é uma reprodução e uma objetivação tão imediata de toda a vontade como a constitui o pró prio mundo como são as idéias cujo fenômeno multiplicado forma 11 Schopenhauer faz uma análise da arquitetura como arte abstraindo de sua destinação as finali dades úteis já que quando essa serve à utilidade está servindo à Vontade e não a um conhecimen to puro Todavia o filósofo compreende a importância da arquitetura como edificação prática e tenta conciliar em seu pensamento essas duas perspectivas Para o filósofo a luta entre a gravidade e a rigidez que junto com a coesão e a dureza constituem o grau mais inferior da objetividade da Vontade é a única matéria estética da arquitetura e fazer com que ressalte com inteira clareza de maneira diversificada é sua tarefa SCHOPENHAUER 2000 p 63 DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 301 o mundo das coisas individuais SCHOPENHAUER 2000 p 104 Para Schopenhauer se a música nasce sem qualquer in tencionalidade consciente e reflexiva por parte do composi tor ela mesmo sendo especial como toda arte é feita pelo gênio artista que se diferencia do indivíduo comum por que o gênio artístico desvela as coisas através da inspiração O GÊNIO ARTÍSTICO A natureza do gênio consiste na capacidade de contem plação das Ideias O objeto da arte são essas Ideias e o obje tivo da arte é a comunicação das Ideias apreendidas pelo gênio O gênio só possui a capacidade de apreensão das I deias porque se liberta de toda individualidade empírica de seus interesses próprios e seus próprios fins e tornarse pu ro sujeito do conhecimento receptivo apenas ao conheci mento intuitivo12 pois a genialidade é a capacidade de se comportar apenas intuitivamente se perder na intuição e arrebatar o conhecimento existente origi nalmente somente para tal fim ao serviço da vontade ie abstrair por completo de seu interesse seu querer seus objetivos despojarse por um tempo inteiramente de sua personalidade para permanecer como sujeito puro do conhecimento límpida vista do mundo e isto não por instantes mas durante o tempo necessário e com tal cir cunspeção para reproduzir o apreendido mediante uma arte estuda da SCHOPENHAUER 2000 p35 12 Schopenhauer tece considerações sobre os copistas que diferentes dos gênios não intuem a ideia mas iniciam a confecção da obra pelo conceito reproduzem o que lhes agradam nas obras verdadeiras entretanto não conseguem permitir através desta o prazer estético e sim aceitações momentâneas Para Schopenhauer criar a obra de arte partindo do conceito é uma atitude con denável logo é inadmissível para o filósofo a destinação de uma obra de arte proposital ou expli cativa HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 302 Schopenhauer observa no gênio um aparelho cognitivo mais elevado capaz de atingir um estado de objetividade mais completo uma percepção pura livre da Vontade uma força intelectual superior à necessária ao serviço de uma vontade individual SCHOPENHAUER 2000 p 35 Para ele o gênio é a objetivação da Vontade que sofre me nos interferência desta Diz Schopenhauer a condição fundamental do gênio é uma predominância anormal da sensibilidade e da irritabilidade sobre o poder reprodutor SCHOPENHAUER 2000 Na genialidade contudo ainda existe Vontade mas o gênio é capaz de desvencilharse de uma maneira mais vigo rosa e o desvencilhamento leva o gênio a ser um puro inte lecto um conhecimento fora do princípio de razão um conhecimento onde é preciso imaginação para completar organizar amplificar fixar reter e repetir a bel prazer todos os quadros significativos da vida JANAWAY 2003 p97 De acordo com Schopenhauer o indivíduo empírico é incapaz de uma observação desinteressada SALVIANO 2019 Ele se prende a coisas que possuem uma relação com a sua vontade ele não possui a capacidade de intuir de ma neira significativa por isso esgota tudo com rapidez obras de arte objetos belos da natureza SCHOPENHAUER 2000 p38 Para Schopenhauer mesmo sendo a capacidade de en xergar fora do princípio de razão inerente a todos os huma nos em grau diverso e mais reduzido esta capacidade reduzida apenas os permite apreciar as obras de arte con tudo nunca criar já que para criar é necessária a genialida de Todas as manifestações artísticas são cunhadas pelo gê DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 303 nio que através delas comunica as Ideias apreendidas aos demais humanos Assim como mencionou Schopenhauer o artista nos permite contemplar o mundo por seus olhos 2000 O modo genial não ocorre em todos os momentos da vida é uma ação baseada na inspiração Tal inspiração re sulta na obra que comunica a Ideia e esta permanece inal terada é genuína O prazer estético proporcionado na obra de arte é o mesmo que o intuído na bela natureza Contudo na arte há uma maior facilidade de se atingir o prazer estético já que o artista isola a Ideia da realidade eliminando as con tingências que podem atrapalhar tal observação O gênio que possui uma apreensão num grau elevado compreende a natureza de uma maneira mais vigorosa proferindo claramente o que ela apenas balbucia e assim torna manifesto na obra de arte a beleza da forma da Idei a SCHOPENHAUER 2000 p 71 Portanto na estética schopenhaueriana a arte é obra do gênio seu objeto são as Ideias mediação ontológica entre a Vontade e os fenômenos são representações mas consti tuídas de uma única forma a de serobjetoparaumsujeito SALVIANO 2019 p 191 O gênio só consegue apreen dêlas através da libertação de toda a sua individualidade na transição para um conhecimento intuitivo exercício que leva o gênio a ser um puro sujeito do conhecimento13 A ca 13 Jarlee Salviano em artigo recente 2019 faz decisiva contribuição ao esclarecer os termos da satisfação do querer na estética de Schopenhauer em que escreve o autor diferentemente de Kant para quem o termo Wohlgefallen foi utilizado para significar a satisfação de um modo geral a complacência em suas três configurações em Schopenhauer o conceito Wohlgefallen serve ao filósofo exclusivamente para a designação da satisfação estética Por outro lado a satisfação empí Cont HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 304 pacidade no gênio se dá através da inspiração e o tipo de conhecimento operado por ele não é baseado nas relações causais e nas formas espaçostemporais Assim sendo é possível observar uma perspectiva estéti ca do século XIX que pode comportar uma possibilidade de reflexões relacionadas à autonomia da arte sobretudo pela articulação que Schopenhauer constrói entre as Idei as o gênio artístico a obra de arte desinteressada de ne gação do interesse empírico conceitual sua universalidade e a satisfação estética sendo que alguns desses traços como o da satisfação estética possui seu enraizamento na filoso fia de Kant SALVIANO 2019 perspectiva estética kanti ana que por sua vez passou pela crítica de quem mobiliza o debate sobre autonomia da arte14 Desse modo a possibilidade da tentativa de relação da estética schopenhaueriana com o debate sobre a autonomia da arte passa de certa maneira pela aproximação 15 rica o malogrado contentamento do sujeito do querer é grafada como Erfüllung ou Befriedi gung 14 O sociólogo Pierre Bourdieu na obra A distinção crítica social do julgamento sem pretender destituir a importância filosófica da Terceira Crítica de Kant tece considerações sobre a perspec tiva estética do filósofo alemão relacionadas ao debate sobre a autonomia da arte Não é a inten ção deste artigo realizar atividade análoga com a estética de Schopenhauer mas indicar possibilidades de aproximações por isso o artigo desenvolveu uma explanação da metafísica do belo de Schopenhauer não só porque Bourdieu critica na perspectiva estética de Kant justa mente alguns traços que se mantém na perspectiva schopenhaueriana mas porque há elementos específicos na de Schopenhauer as Ideias e o gênio que permitem reflexões relacionadas ao deba te supracitado 15 Apesar das críticas de Schopenhauer ao intelectualismo da teoria da arte de Kant ambas concepções estéticas se aproximam se vistas de modo diverso Por um lado numa leitura de Kant tal como a de Lebrun que mostre em contrapartida à de Schopenhauer a recusa do inte lectualismo na estética kantiana de fato basta notar que o juízo reflexionante referese a um conceito porém indeterminado sendo a Idéia estética uma representação da imaginação a que nenhum conceito é adequado e que nenhuma linguagem alcança totalmente e pode tornar inte ligível Kant 1 p 345 Por outro numa leitura que mostre que o desinteresse em Schopenhauer não reflete apenas uma atitude niilista em face do mundo mas tem por função principal traduzir a especificidade da arte enquanto esta constitui uma instância paralela ao mundo e suscetível Cont DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 305 CACCIOLA 1999 da estética de Schopenhauer com a do filósofo Kant isso não só no sentido em que foi a Crítica da Faculdade do Juízo do autor de Königsberg que moti vou conceitos fundamentais da estética de Schopenhauer como o belo e o sublime SALVIANO 2019 p192 ou porque segundo o pesquisador Dax Moraes todo o valor da Estética enquanto Filosofia do Belo para ambos os pen sadores reside precisamente no fato de tratar da reconcilia ção entre as partes cuja unidade é o próprio homem sendo este mesmo o papel da Crítica do Juízo como um todo MORAES 2010 p156 A aproximação entre os autores que aqui é mobilizada à procura da possibilidade de pensar a articulação da esté tica schopenhaueriana com o debate sobre a autonomia da arte tem relação com a concepção de arte desinteressa da16 pois concordam também as duas filosofias em que todo eudaimonismo fundado na motivação empírica nas sensações do sujeito empírico leva ao interesse e exclui to da possibilidade de valoração positiva ética ou estética SALVIANO 2019 p196 E nessa esteira podese obser var que tanto em Kant quanto em Schopenhauer o fun de um outro tipo de abordagem CACCIOLA 1999 p14 16 Vale mencionar que há uma diferença entre os dois autores mesmo nesse ponto em que se a proximam pois a negação do interesse vista como central na estética deste autor Schopenhau er leva a uma leitura que a contrapõe à estética de Kant em que o desinteresse estaria relacionado não com a negatividade do sensível mas com uma mera indiferença em relação à e xistência do objeto para constituir um campo próprio da arte no qual vige o puro prazer estético CACCIOLA 1999 p1 De acordo com Salviano há uma diferença que diz respeito ao concei to de interesse Para Kant a única atividade do sujeito absolutamente desinteressada é o juízo de gosto estético Para Schopenhauer tanto a fruição da arte como a ação moral podem ser desinte ressadas no fenômeno da compaixão na ética de Schopenhauer o critério para o julgamento moral da ação o agente já está despido de sua individualidade age tão somente motivado pela dor alheia sem qualquer resquício de egoísmo portanto desinteressadamente SALVIANO 2019 p 196 HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 306 damento da valoração estética assim como da valoração moral está relacionado ao modo de satisfação proporcio nado ao sujeito na sua relação com a representação do obje to SALVIANO 2019 p 191 Ademais a aproximação entre as estéticas dos autores supracitados opera também na compreensão da universalidade17 pois na arte não se está mais no âmbito do indivíduo mas do universal Isto se dá graças à ausência do interesse subjetivo próprio ao indiví duo e ao seu quererviver Nesse ponto fica patente uma concordân cia com a estética kantiana pois para Kant é o desinteresse que torna possível a universalidade para o juízo estético já que o caráter privado do interesse a impediria CACCIOLA 1999 p 10 Desse modo a obra manifestação da Ideia apreendi da pelo gênio que possui na sua forma de conhecimento a orientação objetiva do espírito não degradada pelas formas sensíveis do conhecimento SALVIANO 2019 p191 sendo o gênio o sujeito puro do conhecimento e não o indivíduo empírico Portanto É o gênio que se mostra em Schopenhauer como o olho claro do mundo capaz de dissipar a obscuridade em que está o indivíduo tanto na sucessão dos impulsos inconscientes como nas séries dos fenômenos A concepção do gênio como pouco afeito ao conheci 17 Mesmo que não comprometa o entendimento de universalidade que este texto está mobilizan do importa citar que há certa diferença entre os dois autores ainda que nesse ponto também se aproximem como coloca Cacciola Já que apontamos o caráter não individual da apreensão do belo em Schopenhauer aproximandoo assim de Kant a crítica que Schopenhauer faz do juízo sobre o belo não viria justamente pôr a perder tal proximidade De fato é por uma outra via que Schopenhauer pretende garantir o caráter universal do belo É através da mediação da Idéia que ele define como não abstrata que o sentimento do belo passa a ser supraindividual A solução schopenhaueriana exige o recurso às idéias que como ele mesmo diz foram tomadas de emprés timo a Platão para garantir a intuibilidade direta do belo deixando de lado o caráter de juízo que segundo ele denota uma interferência do abstrato naquilo que é intuitivo Se é a voz universal que traduz a comunicabilidade e universabilidade do juízo de gosto para Kant em Schopenhauer é o conceito de puro sujeito do conhecimento ou seja a anulação do indivíduo enquanto sujeito empírico que garante a universalidade da experiência estética CÁCCIOLA 1999 DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 307 mento relacional quer dos eventos presentes quer das séries da me mória dotado em compensação de imensa capacidade intelectual a liada a uma vontade poderosa é que lhe permite sobreporse à visão comum de mundo e aos interesses ligados à mera sobrevivência Esse conhecimento puro que traduz o sentimento do belo pode ser visto não só como o prazer puro presente na Estética de Kant mas como o verdadeiro conhecimento CACCIOLA 1999 p10 Assim sendo a genialidade é a capacidade de pro ceder de maneira puramente intuitiva de perderse na intu ição e afastar por inteiro dos olhos o conhecimento que existe originariamente apenas a serviço da Vontade ou se ja de seu interesse querer e fins SCHOPENHAUER apud SALVIANO 2019 e como afirma a pesquisadora Maria Lúcia Cacciola se configura em Schopenhauer uma metafísica do belo pois é a arte que torna possível um co nhecimento pleno desvinculado dos interesses do querer viver CACCIOLA 1999 p 8 São os atributos supracitados tanto os que se aproxi mam da perspectiva kantiana como a obra desinteressada e a universalidade quanto aqueles próprios da estética s chopenhaueriana como o gênio e sua relação com a mani festação da Ideia que podem ser pensados na tentativa de estabelecer a relação da estética schopenhaueriana ao deba te sobre a autonomia da arte debate que permeia outros devedores da estética kantiana já no século XX como Mar cuse18 Nas páginas seguintes será possível observar a perspecti va de Herbert Marcurse que como Schopenhauer também é devedor da estética kantiana e que também permite refle 18 Silveira menciona que essa herança de Kant aparece explicitamente no capítulo 9 de Eros e Civilização intitulado a dimensão estética SILVEIRA 2015 HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 308 xões sobre a autonomia da arte inclusive críticas à perspec tiva representada por Schopenhauer ORTODOXIA ESTÉTICA MARXISTA E A AUTONOMIA DA ARTE EM MARCUSE Herbert Marcuse que deu o nome de A Dimensão Es tética para um dos capítulos do livro Eros e Civilização de 1955 no ensaio intitulado A Dimensão Estética publicado em 1977 realiza uma crítica à ortodoxia marxista no campo da estética e mesmo não debatendo diretamente a questão da autonomia da arte ela está presente o tempo inteiro no ensaio supracitado Baseado também na teoria marxista mas contrariando o que denominou de estetas marxistas ortodoxos Herbert Marcuse defende que o potencial político da arte se realiza na sua forma estética em si autônoma perante as relações sociais estabelecidas e capaz de questionálas e transcendê las bem como de subverter as consciências envolvidas nes sas relações sociais Herbert Marcuse observando o potencial político da arte na própria arte 1977 p11 quer com isso questionar a perspectiva da ortodoxia marxista no campo da arte que tende a compreender a obra de arte determinada pelas rela ções de produção existentes contentora e representante de interesses e visões de mundo de determinadas classes soci ais O filósofo alemão considerando que a arte é tratada como ideologia e é enfatizada em seu caráter de classe pela estética marxista indica que devem passar por um reexame DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 309 crítico as seguintes teses dessa estética marxista 1Existe uma relação definida entre a arte e a base material entre a arte e a totalidade das relações de produção Com a modificação das relações de produção a própria arte transformase como parte da su perestrutura embora tal como outras ideologias possa ficar para trás ou antecipar a mudança social 2 Há uma conexão definida entre arte e classe social A única arte autêntica verdadeira e progressista é a arte de uma classe em ascen são que exprime a tomada de consciência desta classe19 3 Consequentemente o político e o estético o conteúdo revolucio nário e a qualidade artística tendem a coincidir 4 O escritor tem a obrigação de articular e exprimir os interesses e as necessidades da classe em ascensão No capitalismo esta seria o proletariado 5 A classe declinante ou os seus representantes só podem produzir uma arte decadente 6 O realismo em vários sentidos é considerado a forma de arte que corresponde mais convenientemente às relações sociais constituindo assim a forma de arte correta MARCUSE 1977 p16 Herbert Marcuse observa que as teses supracitadas indi cam que as relações sociais de produção devem estar repre sentadas na obra literária 1977 p16 em sua lógica interna O filósofo considera que tal esquema se enrijeci do pode ser maléfico já que implicaria em uma noção normativa da base material como a verdadeira realidade e uma desvalorização política de forças não materiais particu 19 Marcuse faz uma observação crítica sobre esse ponto De acordo com Marcuse para a estética marxista o sujeito da consciência é o proletariado que como classe particular é a classe univer sal A ênfase está no particular o proletariado é a única classe na sociedade capitalista que não tem interesse pela preservação da sociedade existente O proletariado é livre em relação aos valo res desta sociedade e por conseguinte livre para a libertação de toda a humanidade Segundo esta concepção a consciência do proletariado seria também a consciência que valida a verdade da arte Esta teoria corresponde a uma situação que já não é ou ainda não é a que prevalece nos países capitalistas avançados MARCUSE 1977 p 40 HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 310 larmente da consciência individual do subconsciente e da sua função política IDEM p17 O filósofo alemão adverte sobre os perigos de que a su pracitada concepção negligencie a força e a importância da subjetividade 20 deprecie não só o sujeito racional mas também a interioridade os afetos as emoções e a imagina ção dos indivíduos Marcuse salienta que a perspectiva que marginaliza a subjetividade dissolvendoa em uma consci ência de classe não leva em consideração que a revolução deve ser movida pela subjetividade inteligência e paixões Herbert Marcuse se opõe a uma perspectiva que estabe lece uma conceituação reducionista da consciência colo cando a subjetividade como átomo da objetividade concebendo a subjetividade como que submetida a uma consciência coletiva que ameniza a força e a importância dos afetos e da própria subjetividade MARCUSE 1977 p7 No tocante à subjetividade o filósofo alemão afirma que libertar a subjetividade faz parte da história dos indi víduos que de acordo com Marcuse não é idêntica à exis tência social de cada indivíduo Pois a história individual é a história das paixões alegrias melancolias afetos e outras experiências que não são compreensíveis a partir da situa 20 Marcuse põe em dúvida a interpretação da subjetividade como uma noção burguesa Para ele do ponto de vista histórico isto é duvidoso Mas mesmo na sociedade burguesa a insistência na verdade e no direito de interioridade não é realmente um valor burguês Com a afirmação da in terioridade da subjetividade o indivíduo emerge do emaranhado das relações de troca e dos valo res de troca retirase da realidade da sociedade burguesa e entra noutra dimensão da existência Na verdade esta evasão da realidade levou a uma experiência que podia e pode tornarse uma força poderosa na invalidação dos principais valores burgueses nomeadamente desviando o foco da realização individual do domínio do princípio da realização e do motivo do lucro para o dos recursos íntimos do ser humano a paixão a imaginação a consciência MARCUSE 1977 p18 DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 311 ção de classe das pessoas MARCUSE 1977 p19 Se gundo Herbert Marcuse Sem dúvida as manifestações concretas da sua história são determi nadas pela situação de classe mas esta situação não é a causa do seu destino do que lhes acontece na vida Especialmente nos seus as pectos não materiais o contexto de classe é ultrapassado É muito difícil relegar o amor e o ódio a alegria e a tristeza a esperança e o desespero para o domínio da psicologia removendo assim estes sen timentos da preocupação da práxis radical Na realidade em termos de economia política eles talvez não sejam efetivamente forças de produção mas são decisivos e constituem a realidade de cada ser humano MARCUSE 1977 p19 A FORMA ESTÉTICA COMO RESPONSÁVEL PELA SUBVERSÃO O filósofo alemão defende que em virtude da sua for ma estética a arte é absolutamente autônoma perante as re lações sociais existentes MARCUSE 1977 p11 e que essa autonomia levaa a contestar estas relações e a trans cendêlas Questionando a perspectiva supracitada da esté tica marxista ortodoxa Herbert Marcuse defende a seguinte tese As qualidades radicais da arte ou seja a acusação da realidade esta belecida e sua invocação da bela imagem Schöner Schein da liber tação baseiamse principalmente nas dimensões em que a arte transcende a sua determinação social e se emancipa a partir do uni verso real do discurso e do comportamento preservando no entan to a sua presença esmagadora Assim a arte cria o mundo em que a subversão da experiência própria da arte se torna possível o mundo formado pela arte é reconhecido como uma realidade suprimida e distorcida na realidade existente A lógica interna da obra de arte termina na emergência de outra razão outra sensibilidade que desa fiam a racionalidade e a sensibilidade incorporadas nas instituições sociais dominantes MARCUSE 1977 p20 HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 312 Ainda de acordo com os argumentos do filósofo a arte até pode ser revolucionária em vários sentidos seja por re presentar uma mudança radical no estilo e na técnica seja por romper com a realidade social petrificada abrindo os caminhos da libertação No entanto Herbert Marcuse con sidera restrito o primeiro sentido do estilo e da técnica mesmo admitindo que a mudança nesses aspectos pode re fletir transformações significativas na sociedade Marcuse considera restrito o caráter revolucionário da obra em seu aspecto técnico e estilístico porque avalia que a definição técnica da arte não está relacionada à qualidade da obra tampouco à sua autenticidade e verdade Herbert Marcuse valoriza a forma estética como o carac terístico fundamental da arte revolucionária uma vez que ela seria promotora de uma sublimação estética libertadora capaz de promover a transcendência da realidade imediata e destruir com isso uma objetividade subjugadora ancorada nas relações sociais estabelecidas A forma estética ao mes mo tempo em que leva à sublimação estética deve levar à dessublimação da percepção ordinária e condicionada dos indivíduos Percepção essa controlada por normas e neces sidades e que pode ser rompida pela força dissidente da ar te A verdade ou autenticidade da obra de arte não é dada pelo seu conteúdo definido como representação correta das condições sociais mas pelo conteúdo tornado forma MARCUSE 1977 p21 Dessa maneira a forma estética responsável pela fun ção crítica da arte e por desviála da realidade pura da luta de classes é definida como o resultado da transformação de um dado conteúdo fato atual ou histórico pessoal ou social num todo independente um poema peça romance DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 313 etc MARCUSE 1977 p21 A obra de arte que é esse todo independente do processo condicionado da realidade denuncia a realidade ao mesmo tempo em que a representa E faz isso ainda segundo o filósofo promovendo uma re modelação da linguagem da percepção e da compreensão de modo a revelarem a essência da realidade na sua aparên cia as potencialidades reprimidas do homem e da natureza 1977 p21 Para Marcuse a verdade da arte está na sua força de romper o monopólio da realidade para definir o que é o real e nessa operação de ruptura o mundo fictí cio da arte aparece como verdadeira realidade Utilizando um conceito próprio a Marcuse o mundo da arte é de ou tro Princípio da Realidade21 1977 p22 No tocante à literatura por exemplo Marcuse afirma que ela não é revolucionária por ser escrita para a classe trabalhadora ou para a revolução mas que ela pode ser re volucionária tendo como referência a si própria como con teúdo tornado forma na sua própria dimensão estética MARCUSE 1977 p14 Como supramencionado de acordo com o autor a verdadeira obra de arte revolucionária é subversiva de per cepção e da compreensão uma acusação da realidade esta belecida a aparição da imagem de libertação MARCUSE 1977 p13 Vale destacar que para Marcuse o caráter progres 21 Em uma leitura da obra de Freud Marcuse vai dizer o princípio de realidade supera o princí pio de prazer o homem aprende a renunciar ao prazer momentâneo incerto e destrutivo substi tuindoo pelo prazer adiado restringido mas garantido A substituição do princípio de prazer pelo princípio de realidade é o grande acontecimento traumático no desenvolvimento do homem no desenvolvimento do gênero filogênese tanto quanto do indivíduo ontogênese MARCUSE 1968 p3 HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 314 sista da obra do autor não é medido pela origem do escri tor tampouco pela ideologia da sua classe ou pela presença ou ausência da classe oprimida nas obras feitas por ele O caráter progressista estará na própria obra no que ela diz e como ela diz MARCUSE 1977 p30 Falando do sentido da arte pela arte e evidenciando a forma estética como e lemento revolucionário Marcuse menciona como exem plo a poesia de Mallarmé já que para o filósofo alemão os seus poemas evocam modos de percepção imaginação gestos uma festa de sensualidade que destrói a experiência de todos os dias e antecipa um princípio de realidade dife rente MARUSE 1977 p30 Tratando do que chamou de literatura esotérica que tem Baudelaire Proust e Va lery como seus representantes22 Marcuse considera que O protesto secreto desta literatura esotérica reside no ingresso das forças eróticodestrutivas primárias que destroem o universo normal da comunicação e do comportamento A sua verdadeira natureza é associal constituindo uma rebelião subterrânea contra a ordem soci al Porquanto esta literatura revela o domínio de Eros e Thanatos para além de todo o controle social invoca as necessidades e as satis fações que são essencialmente destrutivas Não contribui em nada para a luta pela libertação exceto ao desvendar as zonas intermedi árias da natureza e da sociedade em que mesmo a morte e o diabo incluem como aliados na recusa de se submeterem à lei e à ordem de repressão Esta literatura é uma das formas históricas de transcen dência estética crítica MARCUSE 1977 p32 Outro aspecto relevante evidenciado por Marcuse e 22 O grau a que a distância e o afastamento da práxis constituem o valor emancipatório da arte tornase particularmente claro nas obras literárias que parecem fecharse rigidamente contra tal práxis Walter Benjamin rastreou isso nas obras de Poe Baudelaire Proust e Valery Elas expri mem uma consciência de crise Krisenbwusstsein um prazer na decadência na destruição na beleza do mal uma exaltação do associal do anomico a rebelião secreta da burguesia contra a própria classe MARCUSE 1977 p31 DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 315 fundamental para a compreensão da perspectiva considera da no ensaio A Dimensão Estética é o que o autor deno minou de mimese crítica Para o autor A mimese é a representação através do distanciamento a subversão da consciência A experiência é intensificada até o ponto de ruptura a intensificação da percepção pode ir ao ponto de distorcer as coisas de modo que o indizível é dito o invisível se torna visível e o insuportável explode Assim a transformação estética transformase em denúncia mas também em celebração do que resiste à injustiça e ao terror e do que ainda se pode salvar MARCUSE 1977 p53 De acordo com Marcuse a mimese que deve ser rees truturadora encontra expressão tanto em Beckett Goethe Baudelaire Stendhal e Kafka quanto em Brecht E é o próprio Brecht que mesmo sendo um defensor da imedia tidade da necessidade de mudança e não sendo exata mente partidário da autonomia da arte aparece no ensaio A Dimensão Estética afirmando que uma obra que não exi ba a sua independência em relação à realidade e que não outorgue a independência ao público em relação à realida de não é uma obra de arte MARCUSE 1977 p42 A pesquisadora Sandra Abdo 2005 questiona a con cepção de forma estética de Marcuse elemento que sus tentaria a autonomia da arte conforme a interpretação dela do pensamento do filósofo alemão Residiria aí para a au tora o comprometimento da possibilidade levantada por Marcuse na dificuldade em conceber uma suposta forma autônoma das relações sociais CONCLUSÃO HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 316 Por fim se este trabalho objetivou exibir duas perspec tivas diferentes que permitem reflexões sobre a questão da autonomia da arte foi porque ele de algum modo mobili za entendimentos já realizados como por exemplo SILVEIRA 2018 que observam que há três modos de a bordar a questão da autonomia da arte autonomia como liberdade essencial da arte frente a sociedade defendida pe los partidários da arte pela arte autonomia como mera fantasia dos artistas posição da sociologia positivista e au tonomia como fenômeno historicamente condicionado SILVEIRA 2018 sendo Herbert Marcuse vinculado a esta última vertente de acordo com o autor dessa classificação enquanto Schopenhauer se aproximaria da primeira A respeito da estética de Schopenhauer ao longo do texto foi apresentada a possibilidade de reflexões que rela cionem a perspectiva do filósofo e o debate sobre autono mia da arte possibilidade que pode ser compreendida de dois modos inseparáveis Isso visto que reflexões sobre a estética schopenhaueri ana relacionada ao debate sobre a autonomia da arte po dem ser feitas explorando as aproximações existentes entre esta estética e a estética kantiana e os elementos que as compõem como a obra desinteressada e sua universali dade Até porque a perspectiva de Kant e os seus elementos constituintes alguns presentes no mínimo de maneira a proximada também na estética schopenhaueriana já pas saram por críticas relacionadas à autonomia da arte como a que foi realizada por Pierre Bourdieu na obra A distinção crítica social do julgamento Na mesma esteira também é possível refletir sobre a es tética schopenhaueriana relacionada ao debate sobre a au DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 317 tonomia da arte a partir das elaborações específicas da pers pectiva de Schopenhauer como o gênio artístico que intui o belo CACCIOLA 1999 p 12 e tem uma relação espe cífica com a manifestação das Ideias que conforme exposto ao longo do texto não possuem vínculos com as determi nações interesses ou produções sociais como a ciência23 A respeito da ciência por exemplo se a arte é obra do gênio o suprassumo da subjetividade pura do conhecimento a ciência incessantemente segue a cadeia causal do princípio de razão SALVIANO 2019 p 194 princípio que não compreende o conhecimento puro desinteressado Portanto se alguns elementos supracitados como os vindos da estética kantiana e a própria estética desse au tor já tinham sidos relacionados aos debates sobre a auto nomia da arte este texto procurou apresentar outros designadamente a própria estética schopenhaueriana que possam ser pensados nas produções que versam sobre a au tonomia da arte A respeito das produções sobre o tema vale mencionar que há trabalhos que ainda observam resíduos de certo eruditismo estético na perspectiva de Marcuse mesmo sendo ele crítico de perspectivas que se aproximam à scho penhaueriana perspectivas que rompem com qualquer vín culo entre o considerado artista e a ordem social que o considera apreciando o artista como um gênio excepcional ABDO 2005 GARTMAN 2013 SILVEIRA 2018 Ademais a despeito de este artigo ter tido como objeti 23 Segundo Brigitte Scheer é na estética de Schopenhauer que se revela a crítica direta ou indire ta do conhecimento racional na ciência e é a estética que dá a medida para a verdade objetiva Marcase assim a função corretiva do conhecimento estético em relação ao conhecimento científi co e à razão instrumental CACCIOLA 1999 p8 HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 318 vo específico exibir as concepções dos dois filósofos resta sugerir a leitura de trabalhos que observam que as perspec tivas desses diferentes autores possuem certo ponto de a proximação no que tange à autonomia da arte ABDO 2005 SILVEIRA 2018 e sugerir também a possibilidade de uma reflexão crítica e articulada das perspectivas de S chopenhauer e Herbert Marcuse com as concepções sobre o campo da arte do sociólogo francês Pierre Bourdieu que pode ser uma teoria que problematize produzindo bons rendimentos algumas concepções que versam sobre a autonomia da arte inclusive resguardando nesse encontro com o sociólogo a especificidade da reflexão filosófica ação que o próprio Bourdieu fez na sua obra A respeito da contribuição de Bourdieu para o deba te ele rompe com o vínculo da autonomia não como se paração de uma atividade da vida cotidiana mas como processo de desenvolvimento do campo artístico ou seja de consolidação da arte como uma atividade humana au torregulada e dotada de identidade social própria SILVEIRA 2018 Além do que Bourdieu pensa a relação entre o campo literário e o campo do poder que envolve a obra de arte propondo uma compreensão da construção e aceitação da obra a partir do campo de pertencimento des ta e seus sistemas de classificação bem como das determi nações externas a que o autor de toda obra está submetido De todo modo as reflexões críticas articuladas desses três autores talvez possam não só problematizar as teorias que não mencionam qualquer vínculo da arte com a or dem social ou aquelas em que mesmo mencionando esse vínculo possuem dificuldades para pensarem para além da dicotomia do autor como representante de uma classe e da DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 319 obra para além de todas as classes mas também problema tizar decisivamente o papel da arte na manutenção ou na superação das relações de dominação SILVEIRA 2018 questão sempre premente e nunca esgotada Abstract Along the way of works that deal with issues involving the auton omy of art a category of Aesthetic since modernity this article aims to de velop explanations about two authors Arthur Schopenhauer 17881860 and Herbert Marcuse 18981979 who influenced by the aesthetic of Kant have perspectives that allow reflections on the autonomy of art although Marcuse positions himself as a critic of the perspective represented by Schopenhauer In particular this article will present the aesthetic under standing of the philosopher Arthur Schopenhauer in the main work of this author The World as Will and Representation above all the place of the ar tistic genius in the work of the German philosopher as well as presenting the notes of the philosopher Herbert Marcuse in the work The Aesthetic Dimension from 1977 which summarizes the main issues of the authors aesthetic Keywords Schopenhauer Marcuse Autonomy of Art aesthetic REFERÊNCIAS ABDO Sandra N Sobre o problema da autonomia da arte e suas implicações her menêuticas e ontológicas Kriterion v46 n112 dez2005 ARAMAYO R Leudemonologia di Schopenhauer nel suo fondo kantiano In SchopenhauerJahrbuch Band 92 Würzburg Verlag Königshausen Neumann 2011 p 4968 BARBOSA Jair A Decifração do Enigma do Mundo São Paulo Moderna 1997 BOURDIEU Pierre A distinção crítica social do julga HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 320 mento São Paulo Edusp Porto Alegre RS Zouk 2007 Razões Práticas Petrópolis Vozes 1996 As regras da arte gênese do campo literário São Paulo Companhia das Letras 1996 O amor pela arte museus de arte na Europa e seu público Porto Alegre Editora Zouk 2003 BÜRGER Peter Teoria da Vanguarda Tradução José Pedro Antunes SP Cosac Naify 2012 CACCIOLA Maria Lúcia Schopenhauer e a questão do dogmatismo São Paulo EDUSP 1994 O conceito de interesse Cadernos de Filosofia Ale mã 5 p 515 1999 A crítica da razão no pensamento de Schopenhauer Dissertação de Mestrado São Paulo FFLCHUSP 1981 EPICURO Carta sobre a Felicidade A Meneceu São Paulo Editora Unesp 1997 GARDMAN David Culture Class and Critical Theory between Bourdieu and the Frankfurt School NY Rou tledge 2013 JANAWAY Christopher Schopenhauer São Paulo edi ções Loyola 2003 KANT Immanuel Crítica da faculdade do juízo Trad Valério Rohden e António Marques Rio de Janeiro Fo rense Universitária 1995 DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 321 LIMA Luiz Costa A autonomia da arte e o mercado ARS São Paulo São Paulo v 2 n 3 p 1021162004 MARCUSE Herbert Eros e Civilização RJ Zahar Edito res 1968 A Dimensão Estética Lisboa Edições 70 1977 A ideologia da sociedade industrial o Homem Uni dimensional Rio de Janeiro Zahar Editores 1982 MORAES Dax Desinteresse e comprazimento estético considerações acerca da apreciação da estética kantiana por Schopenhauer face às de Hegel e Heidegger O que nos faz pensar nº28 dezembro de 2010 SALVIANO Jarlee Oliveira Silva Complacência estética e satisfação do querer na metafísica do belo de Schope nhauer Voluntas Santa Maria v 10 n 3 p 190198 setdez 2019 O fundamento epistemológico da metafísica da Vontade de Arthur Schopenhauer TransFormAção São Paulo v322 2009 p101118 O niilismo de Schopenhauer São Paulo dissertação de mestrado USP 2001 SCHOPENHAUER Arthur O Mundo como Vontade e Representação Trad MF Sá Correia Rio de Janeiro E ditora Contraponto 2001 O Mundo como Vontade e como Representação Trad Jair Barbosa São Paulo Editora da UNESP 2005 HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 322 O Mundo como Vontade e Representação parte III Crítica da filosofia kantiana Parerga e Paralipomena Tradução de Wolfgang Leo Maar e Maria Lúcia 226 Cac ciola São Paulo Nova Cultural in Os Pensadores caps V VII XII XIV 2000 Sobre o fundamento da moral Tradução de Maria Lúcia M O Cacciola São Paulo Martins Fontes 1ª edi ção 1995 SILVEIRA Luiz Gustavo G Bourdieu e a papel da legi timação social do discurso filosófico sobre a autonomia da arte Tese de Doutorado em Filosofia no Programa de PósGraduação em Filosofia da FLCHUSP 2015
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DOSSIÊ DOI httpdxdoiorg105216phiv25i252318 PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 2 87 287 DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE1 Heiberle Hirsgberg Horacio UNIMONTES23 heiberlehotmailcom Resumo No caminho dos trabalhos que versam sobre as questões envolven do a autonomia da arte categoria da Estética desde a modernidade este arti go visa desenvolver explanações sobre dois autores Arthur Schopenhauer 17881860 e Herbert Marcuse 18981979 que devedores da estética kan tiana possuem perspectivas que permitem reflexões sobre a autonomia da arte ainda que Marcuse se posicione como um crítico da perspectiva repre sentada por Schopenhauer Designadamente este artigo apresentará a com preensão estética do filósofo Arthur Schopenhauer na obra principal deste autor O Mundo Como Vontade e Representação sobretudo o lugar do gênio artístico na obra do filósofo alemão bem como apresentará os apon tamentos do filósofo Herbert Marcuse na obra Dimensão Estética de 1977 que sintetiza as principais questões da estética do autor Palavraschave Schopenhauer Marcuse Autonomia da Arte Estética 1 Recebido 15082020 Aceito 24032021 Publicado online 15042021 2 Professor titular na Universidade Estadual De Montes Claros UNIMONTES Montes Claros MG Brasil 3 ORCID httpsorcidorg0000000244861764 HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 288 APRESENTAÇÃO No caminho dos trabalhos que versam sobre as ques tões envolvendo a autonomia da arte4 categoria da Estética desde a modernidade este artigo visa desenvolver explana ções sobre dois autores Arthur Schopenhauer 17881860 e Herbert Marcuse 18981979 que devedores da estética kantiana possuem perspectivas que permitem reflexões so bre a autonomia da arte5 perspectivas que podem ter pon tos de aproximações ainda que Marcuse se posicione como um crítico àquela representada por Schopenhauer Desig nadamente este artigo apresentará a compreensão estética de Arthur Schopenhauer metafísica do belo preferiria o 4 A questão da autonomia da arte teoricamente fundada pela Crítica da faculdade de jul gar 1790 de Kant significava de um ponto de vista sóciohistórico que o objeto artístico se tornava independente de qualquer instituição Quando a instituição era de caráter religioso a arte se tornava parte do serviço a lo divino se era uma instituição política a arte devia em última análi se glorificar o príncipe O processo de autonomização que se esboçara no Renascimento italiano não teria sido possível sem a prévia existência de uma clientela que progressivamente substituíra os ricos patronos Assim a autonomia da arte implicou sua separação gradual da aristocracia o surgimento de uma burguesia enriquecida e o desenvolvimento do mercado LIMA 2004 5 Embora o entendimento da questão da autonomia da arte tenha a origem apontada na citação acima a autonomia da arte é uma categoria da sociedade burguesa Ela permite descrever a ocorrência histórica do desligamento da arte do contexto da práxis vital descrever o fato de que portanto uma sensibilidade não comprometida com a racionalidade de fins pode se desenvolver junto aos membros das classes que pelo menos temporariamente estavam livres da pressão da lu ta cotidiana pela sobrevivência Aí reside o momento de verdade do discurso da obra de arte au tônoma No entanto o que essa categoria não consegue abarcar é que esse desligamento da arte do contexto da práxis vital representa um processo histórico vale dizer socialmente condiciona do E nisso justamente consiste a não verdade da categoria o momento da deformação que é próprio de toda ideologia contanto que se use esse conceito no sentido da crítica da ideologia do jovem Marx A categoria da autonomia não permite compreender o seu objeto como tendo se tornado histórico Na sociedade burguesa a relativa dissociação da obra de arte em face da práxis vital se transforma assim na falsa representação da total independência da obra de arte em rela ção à sociedade A autonomia é por conseguinte uma categoria ideológica no sentido estrito da palavra que congrega um momento de verdade descolamento da arte da práxis vital e um mo mento de não verdade hipostasiar esse estado de coisas produzindo historicamente como essên cia da arte BURGER 2012 p9192 DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 289 filósofo SALVIANO 2019 p191 na obra principal des te autor O Mundo Como Vontade e Representação so bretudo o lugar do gênio artístico na concepção schopenhaueriana bem como apresentará os apontamentos do filósofo Herbert Marcuse na livro Dimensão Estética de 1977 que sintetiza as principais questões da estética do au tor SCHOOLMAN 1984 SILVEIRA 2018 Com isso este artigo procura possibilitar a observação de certas apro ximações nas perspectivas de autores diferentes Aproxima ção de algum modo que já foram apontadas em trabalhos de outros pesquisadores e pesquisadoras ABDO 2005 SILVEIRA 2018 que se não demonstraram exatamente uma relação entre esses dois filósofos exibiram uma alter nativa de aproximação entre as perspectivas em que eles es tão inseridos SCHOPENHAUER O MUNDO COMO VONTADE E COMO REPRESENTAÇÃO Arthur Schopenhauer mobilizador de conceitos kanti anos e platônicos realiza à sua maneira uma articulação en tre a coisaemsi do filósofo de Königsberg e a Teoria das Ideias do filósofo grego utilizando tais concepções na construção de seu sistema filosófico Schopenhauer explora a distinção efetuada por Kant entre fenômeno e noumenon coisaemsi bem como a compreensão das formas puras da sensibilidade de espaço e tempo formas a priori que não são extraídas da experiência sensível SALVIANO 2009 p 102 Schopenhauer observa que a sensibilidade só oferece a HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 290 matéria para o princípio de razão espaço tempo e causali dade e estabelece uma distinção entre entendimento e ra zão sendo que esta utiliza as representações do entendimento abstraindoas para elaborar conceitos ou se ja representações abstratas reflexivas não intuitivas No entanto para Schopenhauer o mundo fenomênico no qual os humanos se relacionamrepresentam não pode ser considerado um mundo ilusório não há uma aparência sem algo que possa aparecer De acordo com o filósofo o mundo é um fazer efeito da pessoa que a representa sendo representação de quem representa ou seja uma conclusão do entendimento dos dados fenomênicos Representar sig nifica estar diante de algo de algum fenômeno porém estar diante de algo pressupõe um sujeito que intui Portanto em Schopenhauer os dados sensíveis fenô menos são encontrados pelo princípio de razão e só ge ram efetivamente conhecimento quando passam a ser pensados pelo entendimento e suas categorias6 De acordo com Schopenhauer todo o conhecimento dos dados feno mênicos está condicionado ao princípio de razão isso por que as formas desse princípio não são atributos da coisa emsi e sim do fenômeno pois toda multiplicidade e to 6 Sobre o entendimento Schopenhauer se diferencia de Kant uma vez que para Schopenhau er pela mera sensibilidade não se obtém nenhuma intuição ela apenas oferece a matéria Stoff que servirá para a aquisição das representações intuitivas tarefa do entendimento nas quais se encontram as formas a priori do espaço e do tempo que serão regidas pelo princípio de causali dade O princípio de causa e efeito é então o único que resta no entendimento do conjunto de doze categorias kantianas De acordo com Schopenhauer Kant acaba confundindo no final das contas o princípio lógico de causalidade razãoconsequência com o princípio ontológico causaefeito fazendo com que este seja extraído daquele enquanto na teoria schopenhaueriana dáse o contrário na razão não existe nada que não tenha sido extraído do entendimento ou seja é na representação intuitiva que a representação abstrata encontra seu fundamento SALVIANO 2009 Para mais uma vigorosa diferenciação dos aspectos supracitados ver CACCIOLA 2018 DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 291 do surgir e fenecer são possíveis unicamente mediante tem po espaço causalidade também aquelas pertencem apenas aos fenômenos e de modo algum a coisaemsi SCHOPENHAUER 2000 p22 Considerando a realização da relação sensibilidade entendimentorazão em Schopenhauer podese perceber a impossibilidade do conhecimento sobre a coisaemsi a través do princípio da razão A coisaemsi não apresenta a divisibilidade nem a pluralidade dos fenômenos ela é una e indivisível pois a relação parte e todo pertencem exclusi vamente ao espaço que é a forma de conhecimento do princípio de razão Consequentemente a coisaemsi não participa desse tipo de conhecimento não só porque as formas de espaço e tempo são incompatíveis com a coisa emsi mas também porque não há interação causal entre a coisaemsi e o mundo fenomênico pois a causalidade só ocorre com as mudanças empíricas individuais Segundo o pesquisador Cristopher Janaway Schopenhauer nunca a firmara que a vontade como coisaemsi é uma causa S chopenhauer fala de manifestação da Vontade de objetivação isso quer dizer apenas que o mundo nos apre senta o lado de si que podemos experimentar JANAWAY 2003 p53 Schopenhauer então não procura encontrar a coisa emsi através do princípio da razão e investiga o noume non por vias intuitivas Ou seja Schopenhauer inspeciona então o núcleo da consciência pelo sentimento Gefühl pela via subjetiva pois o sentimento7 tem o contato com as 7 A palavra sentimento Gefühl é usada por Schopenhauer para designar os estados da Vontade no humano com a advertência de que a extensão do significado normalmente dada a este termo Cont HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 292 coisas fora das formas encontrando o núcleo do enigma traduzível na palavra vontade BARBOSA 1997 p100 Tal inspeção revela uma existência corporal puramente volitiva que permite uma possibilidade de intuição da rela ção8 do corpo com a coisaemsi sendo que esta seria a Vontade que é percebida pelo filósofo num momento em que cada consciência indica uma subjetividade puramente volitiva O filósofo observa que as ações dos corpos são a penas atos de vontades pois todo ato real da nossa vontade é ao mesmo tempo e infalivelmente um movimento do nosso corpo não podemos querer realmente um ato sem constatar no mesmo instante que ele aparece como movi mento corporal SCHOPENHAUER 2004 p110 Para Schopenhauer só é possível ter alguma intuição do que seja a Vontade como coisaemsi porque é possí vel ter certa ideia do que ela é a partir das ações sempre vo litivas do corpo dos corpos Assim realizar algo é consequentemente colocar o corpo em movimento e o corpo não é senão querer e o querer da consciência ordi nária de nada difere em sua matéria básica dos inúmeros outros processos que põem o corpo ou partes dele em mo é segundo ele um erro da razão que procura incluir sob um só conceito tudo aquilo que escapa a seu modo de representação como os gregos em relação aos bárbaros Aliás pode haver não im porta o quê sob o conceito de sentimento cuja extensão excessivamente grande abraça as coisas mais heterogêneas Não se veria por que motivo elas se mantém sob um mesmo conceito se não se reconhecesse que elas se reconciliam sob um ponto de vista negativo não são conceitos abstratos SALVIANO 2001 8 Schopenhauer quer dizer que quando há a ação o corpo se move e a consciência de seu mo vimento difere da consciência que a pessoa possui dos outros eventos que percebe A pessoa está fora dos outros objetos ou eles estão fora da pessoa que se percebe mas o próprio corpo é meu de maneira íntima que não tem comparação Isso só pode ser expresso pela afirmação de que os outros eventos são apenas observados em seu acontecer ao passo que os movimentos do meu corpo são expressões da minha vontade JANAWAY 2003 p48 DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 293 vimento JANAWAY 2003 p 49 Importa destacar que não há relação de causalidade entre o ato da vontade e o movimento mas são uma única coisa dadas de maneiras di ferentes Schopenhauer amplia a compreensão dos objetos co mo sendo a Vontade coisaemsi objetivada ao fazer a alegação de que se há o reconhecimento do corpo como re presentação e assim é todo o resto e enquanto interior o corpo é Vontade os outros objetos também o são no seu âmago pois se o núcleo do corpo humano é encontrado e existe em todos os níveis de representação compreendese que o íntimo de todos os outros corpos também é a Vonta de Assim Até o corpo é um produto da Vontade O sangue empurrado por aquela vontade a que vagamente chamamos de vida constrói seus próprios vasos abrindo sulcos no corpo do embrião os sulcos se a largam e se fecham tornandose artérias e veias A vontade de saber constrói o cérebro assim como a vontade de agarrar constrói a mão ou como a vontade de comer desenvolve o aparelho digestivo SCHOPENHAUER 2004 A VONTADE E O SOFRIMENTO HUMANO O corpo é produto da Vontade e cada objetivação da Vontade espécie organismo órgão é determinada pela sua pulsão de tal maneira que sendo o corpo produto da Vontade ele é constituído pela força desejadora da Vonta de e tal situação o leva a dor porque a Vontade já indica necessidade e no corpo o desejo é infinito mas a realização limitada Desse modo as exigências dos desejos dos indiví duos conflitam com o seu bemestar pois HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 294 é como as esmolas dadas a um mendigo que o mantém vivo hoje para que sua miséria seja prolongada amanhã Enquanto nossa consciência estiver tomada pela nossa vontade enquanto nos entre garmos a multidão de desejos com suas constantes esperanças e te mores enquanto estivermos sujeitos a ter vontade nunca poderemos ter felicidade ou paz duradoura SCHOPENHAUER 2004 Segundo o filósofo para cada desejo sanado aparecem outros que subjugam os indivíduos Schopenhauer com preende ainda que o próprio desejo já constitui um sofri mento quando não satisfeito porque satisfeito pode produzir o tédio e atinge no indivíduo o maior nível Para o autor Todo desejo nasce de uma falta de um estado que não nos satisfaz portanto é sofrimento nenhuma satisfação dura ela é apenas o ponto de partida de um novo desejo Vemos o desejo em toda parte travado em toda à parte em luta portanto sempre no estado de so frimento não existe fim último para o esforço portanto não existe termo para o sofrimento SCHOPENHAUER 2004 p325 Outro elemento da existência humana para o qual o fi lósofo chama atenção é para o fator da ilusão empírica do querer Para Schopenhauer embora os indivíduos acredi tem que através das suas escolhas podem evitar o sofrimen to pelas opções que eles fazem eles não percebem que ao desejarem já colocam em movimento uma nova série de so frimentos Além do que o sofrimento humano também é aumentado pela antecipação ou pela memória da dor já sentida Ademais o indivíduo para Schopenhauer se constitui de um paradoxo inerente Isso porque se a necessidade dá uma trégua a pessoa é atingida pelo tédio pois a perpetua ção da espécie e a luta pela sua manutenção são essenciais à DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 295 vida e sem elas há o tédio e consequentemente mais dor e sofrimento AS IDEIAS PLATÔNICAS9 COMO OBJETIVAÇÃO IMEDIATA DA VONTADE Schopenhauer porém enxerga uma suspenção mo mentânea do sofrimento Tal suspensão encontrase de al gum modo na arte do gênio no conhecimento estético que se relaciona com a manifestação das Ideias termo aqui recuperado a partir da compreensão que Schopenhauer es tabelece da concepção platônica Ou seja no conhecimen to estético é a Ideia que se expõe em uma forma singular em um signo sensível que é a obra A obra não é portanto cópia de um dado apreendido no conhecimento comum mas manifestação da Ideia a ser atingida pela atividade do gênio CACCIOLA 1999 p10 Segundo o autor a Vontade que é a coisaemsi pos sui graus de objetivação Seu aparecer não é imediato no fenômeno cada grau de objetivação da Vontade corres ponde segundo Schopenhauer às Ideias de Platão objeti vação imediata e adequada da Vontade De acordo com o pesquisador Jarlee Oliveira Silva Salviano as Ideias são re presentações mas não são fenômenos estes são espaço temporais sob a regência da causalidade Assim pertence às Ideias uma única forma a do serobjetoparaumsujeito ObjektfüreinSubjektsein SALVIANO 2019 p 193 9 O artigo adotará o uso Ideias platônica ou Ideias de Platão porque assim aparecem na obra de Schopenhauer e guardam uma certa especificidade da interpretação dada por Schopenhauer da concepção platônica HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 296 As Ideias de Platão são a coisaemsi na forma mais geral de representação e semelhantes a ela são unas atem porais e alheias às formas de espaço tempo e a causalidade Quanto a isto diz Schopenhauer A coisa individual que aparece em conformidade com o princípio de razão é portanto uma objetivação mediata da coisaemsi que é a vontade entre as quais se encontra a Idéia como a única objetivi dade imediata da vontade ao não adotar forma alguma própria ao conhecer como tal senão a da representação em geral ie do ser ob jeto para um sujeito SCHOPENHAUER 2000 p27 A Ideia no modo como Schopenhauer atribui signifi cado à concepção platônica é ainda uma representação e difere da coisaemsi nesse aspecto Porém ela não está subordinada ao princípio de razão e mantém a forma primeira e universal tornandose objeto para um sujeito Notase ainda que o essencial de todos os graus de objetiva ção da Vontade constitui a Ideia e o desdobramento desta é estendido aos fenômenos diversos Nas palavras do filóso fo Reconhecíamos as Idéias de Platão em tais graduações na medida em que estas são espécies determinadas ou as formas e propriedades invariáveis originárias de todos os corpos naturais orgânicos ou i norgânicos como também as forças genéricas se manifestando con forme leis naturais tais Ideias portanto se manifestam em indivíduos e particularidades inumeráveis comportando se como modelo para estas suas imagens SCHOPENHAUER 2000 p21 Para Schopenhauer a apreensão das Ideias é o mais ob jetivo conhecimento do mundo que se pode possuir só al cançado através da obra de arte DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 297 O ESTADO ESTÉTICO COMO SUPRESSÃO DA DOR A OBRA DE ARTE E AS IDEIAS A obra de arte resulta de um estado estético dado da in tuição da Ideia que é objetivação imediata da Vontade e o modo de conhecimento que existe exterior a toda relação fenomênica O estado estético se define como o da intuição dos objetos imutáveis dos arquétipos das coisas isto é das Ideias Neste estado esses arquétipos são intuídos inde pendentes do princípio de razão para além da representa ção ou seja para a Ideia o princípio de razão não possui significado algum SCHOPENHAUER 2000 p21 Desse modo a obra de arte Reproduz as idéias eternas apreendidas mediante pura contempla ção o essencial e permanente de todos os fenômenos do mundo e conforme a matéria em que ela reproduz se constitui em artes plás ticas poesia ou música Sua única origem é o conhecimento das i déias seu único objetivo a comunicação deste conhecimento SCHOPENHAUER 2000 p36 Vale destaque que para ocorrer o conhecimento intui tivo da Ideia é imprescindível o afastamento da individua lidade empírica no sujeito cognoscente isso como condição para tornar as Ideias objeto de conhecimento Schope nhauer indica a necessidade de uma transformação no su jeito para obtenção do acesso ao conhecimento intuitivo Nele o sujeito deixa de ser indivíduo e tornase puro sujeito do conhecimento não mais se ocupando do conhecimento através das relações simplesmente causais A força do espírito contemplativo tira alguns indivíduos do modo comum de examinar as coisas cessando de acom panhar somente as relações entre si cujo objetivo último é HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 298 sempre a relação com a própria vontade pelo fio condutor das configurações do princípio de razão SCHOPENHAUER 2000 p29 Na intuição há um preenchimento da consciência pela contemplação do objeto e não se pode mais distinguir intu ição do sujeito que intui pois ambos se tornam um e o in divíduo se torna puro sujeito do conhecimento se dissolvendo no objeto contemplado e se torna ele mesmo objeto Consequentemente suprimindo o conhecedor su primese também o mundo como representação e o conhe cimento servo da Vontade e o fim dessa servidão pode suspender o sofrimento O estado estético que suspende o sofrimento condição estimada por Epicuro como o mais elevado dos bens e o estado dos deuses SCHOPENHAUER 2000 p47 pode ocorrer em duas condições quando há um estímulo exteri or ou quando há uma disposição interior que liberta mes mo que momentaneamente o sujeito da servidão da Vontade Há o sentimento do sublime e há o sentimento do belo que distintamente rompem a cadeia de sofrimento causada pelo desejo incessante O sentimento dado no sublime se dá quando alguns objetos possuem uma relação hostil à vontade humana na sua objetividade seja por eles ameaçandoa com uma supe rioridade que mina qualquer resistência ou reduzindoa ao nada por sua grandeza descomunal se apresentam violen tamente à Vontade SCHOPENHAUER 2000 p5 O sublime advém de um estado de exaltação engrandecimen to ele liberta através da violência da força do objeto con templado Segundo Schopenhauer a sensação do sublime possui vários graus desde uma região erma sem agitação DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 299 com horizonte ilimitado calmo sem pessoas plantas ou a nimais que por não apresentar objetos à Vontade possibi lita a contemplação pura até quando num grau maior é produzido por um ambiente onde A natureza em tempestuosa agitação penumbra deitada por negras e ameaçadoras nuvens rochas pendentes monstruosas descalvadas impedindo a visão torrentes espumantes e estrondosas aridez total suspiros provocados pelo ar fustigado pelos abismos SCHOPENHAUER 2000 p54 Observase também a sensação do sublime quando há grandezas espaciais ou temporais e essas grandezas dão a sensação de que o humano foi reduzido Esses tipos de sen sações de sublime10 Schopenhauer baseado em Kant de nominou como sublimedinâmico e sublimematemático respectivamente Segundo Schopenhauer o sentimento do sublime se origina aqui pela interiorização da insignificân cia de nosso próprio corpo em face de uma grandeza que por outro lado apenas reside em nossa representação e cujo portador somos enquanto sujeito cognoscente SCHOPENHAUER 2000 p56 A respeito do sentimento do belo com o que se ocupa este texto o conhecimento puro independente da Vonta de ocorre sem luta se dá pela beleza do objeto contempla do pois sua constituição facilita o conhecimento das Ideias O belo permite aos humanos tornaremse sujeitos puros do 10 Schopenhauer escreve também sobre o oposto do sublime denominando tal sensação como provocante No provocante há uma excitação da Vontade pois sempre mostra objetos que a satis faz Diferente do sublime o provocante atrai o contemplador com objetos que provocam a Von tade Para o filósofo pior do que o provocante somente o repugnante que estimula a Vontade através da destruição da contemplação estética pura causando repulsa o que consequentemente desperta a Vontade só que desta vez pela aversão desta ao objeto apreendido HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 300 conhecimento onde não são mais indivíduos já que nesse estado se igualam ao objeto contemplado Schopenhauer observa que o prazer estético se dá ora mais pelo conheci mento das Ideias ora mais pelo conhecer liberto da Vonta de Esta diferenciação incide de acordo com o grau de ideia intuitivamente apreendida ou seja de acordo com a eleva ção da objetivação da Vontade Dessa caracterização desse nivelamento da apreensão das Ideias surge uma hierarquização das Ideias e conse quentemente Schopenhauer faz uma hierarquização da ar te que é a exposição das ideias É importante ressaltar que esta hierarquização não diz respeito à qualidade da arte mas sim ao grau de objetividade que elas representam Schopenhauer inicia sua hierarquia com a arquitetura11 que segundo o filósofo possui as Ideias mais elementares e confere à música o título de arte suprema pois ela não é um arquétipo das Ideias mas a linguagem imediata e uni versal da coisaemsi porque a música é um análogo do mundo Escreve o filósofo a música seguindo além das idéias também é inteiramente inde pendente do mundo aparente que ignora e sua existência seria pos sível mesmo com a inexistência do mundo o que não se pode afirmar das outras artes Porque a música é uma reprodução e uma objetivação tão imediata de toda a vontade como a constitui o pró prio mundo como são as idéias cujo fenômeno multiplicado forma 11 Schopenhauer faz uma análise da arquitetura como arte abstraindo de sua destinação as finali dades úteis já que quando essa serve à utilidade está servindo à Vontade e não a um conhecimen to puro Todavia o filósofo compreende a importância da arquitetura como edificação prática e tenta conciliar em seu pensamento essas duas perspectivas Para o filósofo a luta entre a gravidade e a rigidez que junto com a coesão e a dureza constituem o grau mais inferior da objetividade da Vontade é a única matéria estética da arquitetura e fazer com que ressalte com inteira clareza de maneira diversificada é sua tarefa SCHOPENHAUER 2000 p 63 DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 301 o mundo das coisas individuais SCHOPENHAUER 2000 p 104 Para Schopenhauer se a música nasce sem qualquer in tencionalidade consciente e reflexiva por parte do composi tor ela mesmo sendo especial como toda arte é feita pelo gênio artista que se diferencia do indivíduo comum por que o gênio artístico desvela as coisas através da inspiração O GÊNIO ARTÍSTICO A natureza do gênio consiste na capacidade de contem plação das Ideias O objeto da arte são essas Ideias e o obje tivo da arte é a comunicação das Ideias apreendidas pelo gênio O gênio só possui a capacidade de apreensão das I deias porque se liberta de toda individualidade empírica de seus interesses próprios e seus próprios fins e tornarse pu ro sujeito do conhecimento receptivo apenas ao conheci mento intuitivo12 pois a genialidade é a capacidade de se comportar apenas intuitivamente se perder na intuição e arrebatar o conhecimento existente origi nalmente somente para tal fim ao serviço da vontade ie abstrair por completo de seu interesse seu querer seus objetivos despojarse por um tempo inteiramente de sua personalidade para permanecer como sujeito puro do conhecimento límpida vista do mundo e isto não por instantes mas durante o tempo necessário e com tal cir cunspeção para reproduzir o apreendido mediante uma arte estuda da SCHOPENHAUER 2000 p35 12 Schopenhauer tece considerações sobre os copistas que diferentes dos gênios não intuem a ideia mas iniciam a confecção da obra pelo conceito reproduzem o que lhes agradam nas obras verdadeiras entretanto não conseguem permitir através desta o prazer estético e sim aceitações momentâneas Para Schopenhauer criar a obra de arte partindo do conceito é uma atitude con denável logo é inadmissível para o filósofo a destinação de uma obra de arte proposital ou expli cativa HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 302 Schopenhauer observa no gênio um aparelho cognitivo mais elevado capaz de atingir um estado de objetividade mais completo uma percepção pura livre da Vontade uma força intelectual superior à necessária ao serviço de uma vontade individual SCHOPENHAUER 2000 p 35 Para ele o gênio é a objetivação da Vontade que sofre me nos interferência desta Diz Schopenhauer a condição fundamental do gênio é uma predominância anormal da sensibilidade e da irritabilidade sobre o poder reprodutor SCHOPENHAUER 2000 Na genialidade contudo ainda existe Vontade mas o gênio é capaz de desvencilharse de uma maneira mais vigo rosa e o desvencilhamento leva o gênio a ser um puro inte lecto um conhecimento fora do princípio de razão um conhecimento onde é preciso imaginação para completar organizar amplificar fixar reter e repetir a bel prazer todos os quadros significativos da vida JANAWAY 2003 p97 De acordo com Schopenhauer o indivíduo empírico é incapaz de uma observação desinteressada SALVIANO 2019 Ele se prende a coisas que possuem uma relação com a sua vontade ele não possui a capacidade de intuir de ma neira significativa por isso esgota tudo com rapidez obras de arte objetos belos da natureza SCHOPENHAUER 2000 p38 Para Schopenhauer mesmo sendo a capacidade de en xergar fora do princípio de razão inerente a todos os huma nos em grau diverso e mais reduzido esta capacidade reduzida apenas os permite apreciar as obras de arte con tudo nunca criar já que para criar é necessária a genialida de Todas as manifestações artísticas são cunhadas pelo gê DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 303 nio que através delas comunica as Ideias apreendidas aos demais humanos Assim como mencionou Schopenhauer o artista nos permite contemplar o mundo por seus olhos 2000 O modo genial não ocorre em todos os momentos da vida é uma ação baseada na inspiração Tal inspiração re sulta na obra que comunica a Ideia e esta permanece inal terada é genuína O prazer estético proporcionado na obra de arte é o mesmo que o intuído na bela natureza Contudo na arte há uma maior facilidade de se atingir o prazer estético já que o artista isola a Ideia da realidade eliminando as con tingências que podem atrapalhar tal observação O gênio que possui uma apreensão num grau elevado compreende a natureza de uma maneira mais vigorosa proferindo claramente o que ela apenas balbucia e assim torna manifesto na obra de arte a beleza da forma da Idei a SCHOPENHAUER 2000 p 71 Portanto na estética schopenhaueriana a arte é obra do gênio seu objeto são as Ideias mediação ontológica entre a Vontade e os fenômenos são representações mas consti tuídas de uma única forma a de serobjetoparaumsujeito SALVIANO 2019 p 191 O gênio só consegue apreen dêlas através da libertação de toda a sua individualidade na transição para um conhecimento intuitivo exercício que leva o gênio a ser um puro sujeito do conhecimento13 A ca 13 Jarlee Salviano em artigo recente 2019 faz decisiva contribuição ao esclarecer os termos da satisfação do querer na estética de Schopenhauer em que escreve o autor diferentemente de Kant para quem o termo Wohlgefallen foi utilizado para significar a satisfação de um modo geral a complacência em suas três configurações em Schopenhauer o conceito Wohlgefallen serve ao filósofo exclusivamente para a designação da satisfação estética Por outro lado a satisfação empí Cont HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 304 pacidade no gênio se dá através da inspiração e o tipo de conhecimento operado por ele não é baseado nas relações causais e nas formas espaçostemporais Assim sendo é possível observar uma perspectiva estéti ca do século XIX que pode comportar uma possibilidade de reflexões relacionadas à autonomia da arte sobretudo pela articulação que Schopenhauer constrói entre as Idei as o gênio artístico a obra de arte desinteressada de ne gação do interesse empírico conceitual sua universalidade e a satisfação estética sendo que alguns desses traços como o da satisfação estética possui seu enraizamento na filoso fia de Kant SALVIANO 2019 perspectiva estética kanti ana que por sua vez passou pela crítica de quem mobiliza o debate sobre autonomia da arte14 Desse modo a possibilidade da tentativa de relação da estética schopenhaueriana com o debate sobre a autonomia da arte passa de certa maneira pela aproximação 15 rica o malogrado contentamento do sujeito do querer é grafada como Erfüllung ou Befriedi gung 14 O sociólogo Pierre Bourdieu na obra A distinção crítica social do julgamento sem pretender destituir a importância filosófica da Terceira Crítica de Kant tece considerações sobre a perspec tiva estética do filósofo alemão relacionadas ao debate sobre a autonomia da arte Não é a inten ção deste artigo realizar atividade análoga com a estética de Schopenhauer mas indicar possibilidades de aproximações por isso o artigo desenvolveu uma explanação da metafísica do belo de Schopenhauer não só porque Bourdieu critica na perspectiva estética de Kant justa mente alguns traços que se mantém na perspectiva schopenhaueriana mas porque há elementos específicos na de Schopenhauer as Ideias e o gênio que permitem reflexões relacionadas ao deba te supracitado 15 Apesar das críticas de Schopenhauer ao intelectualismo da teoria da arte de Kant ambas concepções estéticas se aproximam se vistas de modo diverso Por um lado numa leitura de Kant tal como a de Lebrun que mostre em contrapartida à de Schopenhauer a recusa do inte lectualismo na estética kantiana de fato basta notar que o juízo reflexionante referese a um conceito porém indeterminado sendo a Idéia estética uma representação da imaginação a que nenhum conceito é adequado e que nenhuma linguagem alcança totalmente e pode tornar inte ligível Kant 1 p 345 Por outro numa leitura que mostre que o desinteresse em Schopenhauer não reflete apenas uma atitude niilista em face do mundo mas tem por função principal traduzir a especificidade da arte enquanto esta constitui uma instância paralela ao mundo e suscetível Cont DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 305 CACCIOLA 1999 da estética de Schopenhauer com a do filósofo Kant isso não só no sentido em que foi a Crítica da Faculdade do Juízo do autor de Königsberg que moti vou conceitos fundamentais da estética de Schopenhauer como o belo e o sublime SALVIANO 2019 p192 ou porque segundo o pesquisador Dax Moraes todo o valor da Estética enquanto Filosofia do Belo para ambos os pen sadores reside precisamente no fato de tratar da reconcilia ção entre as partes cuja unidade é o próprio homem sendo este mesmo o papel da Crítica do Juízo como um todo MORAES 2010 p156 A aproximação entre os autores que aqui é mobilizada à procura da possibilidade de pensar a articulação da esté tica schopenhaueriana com o debate sobre a autonomia da arte tem relação com a concepção de arte desinteressa da16 pois concordam também as duas filosofias em que todo eudaimonismo fundado na motivação empírica nas sensações do sujeito empírico leva ao interesse e exclui to da possibilidade de valoração positiva ética ou estética SALVIANO 2019 p196 E nessa esteira podese obser var que tanto em Kant quanto em Schopenhauer o fun de um outro tipo de abordagem CACCIOLA 1999 p14 16 Vale mencionar que há uma diferença entre os dois autores mesmo nesse ponto em que se a proximam pois a negação do interesse vista como central na estética deste autor Schopenhau er leva a uma leitura que a contrapõe à estética de Kant em que o desinteresse estaria relacionado não com a negatividade do sensível mas com uma mera indiferença em relação à e xistência do objeto para constituir um campo próprio da arte no qual vige o puro prazer estético CACCIOLA 1999 p1 De acordo com Salviano há uma diferença que diz respeito ao concei to de interesse Para Kant a única atividade do sujeito absolutamente desinteressada é o juízo de gosto estético Para Schopenhauer tanto a fruição da arte como a ação moral podem ser desinte ressadas no fenômeno da compaixão na ética de Schopenhauer o critério para o julgamento moral da ação o agente já está despido de sua individualidade age tão somente motivado pela dor alheia sem qualquer resquício de egoísmo portanto desinteressadamente SALVIANO 2019 p 196 HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 306 damento da valoração estética assim como da valoração moral está relacionado ao modo de satisfação proporcio nado ao sujeito na sua relação com a representação do obje to SALVIANO 2019 p 191 Ademais a aproximação entre as estéticas dos autores supracitados opera também na compreensão da universalidade17 pois na arte não se está mais no âmbito do indivíduo mas do universal Isto se dá graças à ausência do interesse subjetivo próprio ao indiví duo e ao seu quererviver Nesse ponto fica patente uma concordân cia com a estética kantiana pois para Kant é o desinteresse que torna possível a universalidade para o juízo estético já que o caráter privado do interesse a impediria CACCIOLA 1999 p 10 Desse modo a obra manifestação da Ideia apreendi da pelo gênio que possui na sua forma de conhecimento a orientação objetiva do espírito não degradada pelas formas sensíveis do conhecimento SALVIANO 2019 p191 sendo o gênio o sujeito puro do conhecimento e não o indivíduo empírico Portanto É o gênio que se mostra em Schopenhauer como o olho claro do mundo capaz de dissipar a obscuridade em que está o indivíduo tanto na sucessão dos impulsos inconscientes como nas séries dos fenômenos A concepção do gênio como pouco afeito ao conheci 17 Mesmo que não comprometa o entendimento de universalidade que este texto está mobilizan do importa citar que há certa diferença entre os dois autores ainda que nesse ponto também se aproximem como coloca Cacciola Já que apontamos o caráter não individual da apreensão do belo em Schopenhauer aproximandoo assim de Kant a crítica que Schopenhauer faz do juízo sobre o belo não viria justamente pôr a perder tal proximidade De fato é por uma outra via que Schopenhauer pretende garantir o caráter universal do belo É através da mediação da Idéia que ele define como não abstrata que o sentimento do belo passa a ser supraindividual A solução schopenhaueriana exige o recurso às idéias que como ele mesmo diz foram tomadas de emprés timo a Platão para garantir a intuibilidade direta do belo deixando de lado o caráter de juízo que segundo ele denota uma interferência do abstrato naquilo que é intuitivo Se é a voz universal que traduz a comunicabilidade e universabilidade do juízo de gosto para Kant em Schopenhauer é o conceito de puro sujeito do conhecimento ou seja a anulação do indivíduo enquanto sujeito empírico que garante a universalidade da experiência estética CÁCCIOLA 1999 DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 307 mento relacional quer dos eventos presentes quer das séries da me mória dotado em compensação de imensa capacidade intelectual a liada a uma vontade poderosa é que lhe permite sobreporse à visão comum de mundo e aos interesses ligados à mera sobrevivência Esse conhecimento puro que traduz o sentimento do belo pode ser visto não só como o prazer puro presente na Estética de Kant mas como o verdadeiro conhecimento CACCIOLA 1999 p10 Assim sendo a genialidade é a capacidade de pro ceder de maneira puramente intuitiva de perderse na intu ição e afastar por inteiro dos olhos o conhecimento que existe originariamente apenas a serviço da Vontade ou se ja de seu interesse querer e fins SCHOPENHAUER apud SALVIANO 2019 e como afirma a pesquisadora Maria Lúcia Cacciola se configura em Schopenhauer uma metafísica do belo pois é a arte que torna possível um co nhecimento pleno desvinculado dos interesses do querer viver CACCIOLA 1999 p 8 São os atributos supracitados tanto os que se aproxi mam da perspectiva kantiana como a obra desinteressada e a universalidade quanto aqueles próprios da estética s chopenhaueriana como o gênio e sua relação com a mani festação da Ideia que podem ser pensados na tentativa de estabelecer a relação da estética schopenhaueriana ao deba te sobre a autonomia da arte debate que permeia outros devedores da estética kantiana já no século XX como Mar cuse18 Nas páginas seguintes será possível observar a perspecti va de Herbert Marcurse que como Schopenhauer também é devedor da estética kantiana e que também permite refle 18 Silveira menciona que essa herança de Kant aparece explicitamente no capítulo 9 de Eros e Civilização intitulado a dimensão estética SILVEIRA 2015 HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 308 xões sobre a autonomia da arte inclusive críticas à perspec tiva representada por Schopenhauer ORTODOXIA ESTÉTICA MARXISTA E A AUTONOMIA DA ARTE EM MARCUSE Herbert Marcuse que deu o nome de A Dimensão Es tética para um dos capítulos do livro Eros e Civilização de 1955 no ensaio intitulado A Dimensão Estética publicado em 1977 realiza uma crítica à ortodoxia marxista no campo da estética e mesmo não debatendo diretamente a questão da autonomia da arte ela está presente o tempo inteiro no ensaio supracitado Baseado também na teoria marxista mas contrariando o que denominou de estetas marxistas ortodoxos Herbert Marcuse defende que o potencial político da arte se realiza na sua forma estética em si autônoma perante as relações sociais estabelecidas e capaz de questionálas e transcendê las bem como de subverter as consciências envolvidas nes sas relações sociais Herbert Marcuse observando o potencial político da arte na própria arte 1977 p11 quer com isso questionar a perspectiva da ortodoxia marxista no campo da arte que tende a compreender a obra de arte determinada pelas rela ções de produção existentes contentora e representante de interesses e visões de mundo de determinadas classes soci ais O filósofo alemão considerando que a arte é tratada como ideologia e é enfatizada em seu caráter de classe pela estética marxista indica que devem passar por um reexame DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 309 crítico as seguintes teses dessa estética marxista 1Existe uma relação definida entre a arte e a base material entre a arte e a totalidade das relações de produção Com a modificação das relações de produção a própria arte transformase como parte da su perestrutura embora tal como outras ideologias possa ficar para trás ou antecipar a mudança social 2 Há uma conexão definida entre arte e classe social A única arte autêntica verdadeira e progressista é a arte de uma classe em ascen são que exprime a tomada de consciência desta classe19 3 Consequentemente o político e o estético o conteúdo revolucio nário e a qualidade artística tendem a coincidir 4 O escritor tem a obrigação de articular e exprimir os interesses e as necessidades da classe em ascensão No capitalismo esta seria o proletariado 5 A classe declinante ou os seus representantes só podem produzir uma arte decadente 6 O realismo em vários sentidos é considerado a forma de arte que corresponde mais convenientemente às relações sociais constituindo assim a forma de arte correta MARCUSE 1977 p16 Herbert Marcuse observa que as teses supracitadas indi cam que as relações sociais de produção devem estar repre sentadas na obra literária 1977 p16 em sua lógica interna O filósofo considera que tal esquema se enrijeci do pode ser maléfico já que implicaria em uma noção normativa da base material como a verdadeira realidade e uma desvalorização política de forças não materiais particu 19 Marcuse faz uma observação crítica sobre esse ponto De acordo com Marcuse para a estética marxista o sujeito da consciência é o proletariado que como classe particular é a classe univer sal A ênfase está no particular o proletariado é a única classe na sociedade capitalista que não tem interesse pela preservação da sociedade existente O proletariado é livre em relação aos valo res desta sociedade e por conseguinte livre para a libertação de toda a humanidade Segundo esta concepção a consciência do proletariado seria também a consciência que valida a verdade da arte Esta teoria corresponde a uma situação que já não é ou ainda não é a que prevalece nos países capitalistas avançados MARCUSE 1977 p 40 HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 310 larmente da consciência individual do subconsciente e da sua função política IDEM p17 O filósofo alemão adverte sobre os perigos de que a su pracitada concepção negligencie a força e a importância da subjetividade 20 deprecie não só o sujeito racional mas também a interioridade os afetos as emoções e a imagina ção dos indivíduos Marcuse salienta que a perspectiva que marginaliza a subjetividade dissolvendoa em uma consci ência de classe não leva em consideração que a revolução deve ser movida pela subjetividade inteligência e paixões Herbert Marcuse se opõe a uma perspectiva que estabe lece uma conceituação reducionista da consciência colo cando a subjetividade como átomo da objetividade concebendo a subjetividade como que submetida a uma consciência coletiva que ameniza a força e a importância dos afetos e da própria subjetividade MARCUSE 1977 p7 No tocante à subjetividade o filósofo alemão afirma que libertar a subjetividade faz parte da história dos indi víduos que de acordo com Marcuse não é idêntica à exis tência social de cada indivíduo Pois a história individual é a história das paixões alegrias melancolias afetos e outras experiências que não são compreensíveis a partir da situa 20 Marcuse põe em dúvida a interpretação da subjetividade como uma noção burguesa Para ele do ponto de vista histórico isto é duvidoso Mas mesmo na sociedade burguesa a insistência na verdade e no direito de interioridade não é realmente um valor burguês Com a afirmação da in terioridade da subjetividade o indivíduo emerge do emaranhado das relações de troca e dos valo res de troca retirase da realidade da sociedade burguesa e entra noutra dimensão da existência Na verdade esta evasão da realidade levou a uma experiência que podia e pode tornarse uma força poderosa na invalidação dos principais valores burgueses nomeadamente desviando o foco da realização individual do domínio do princípio da realização e do motivo do lucro para o dos recursos íntimos do ser humano a paixão a imaginação a consciência MARCUSE 1977 p18 DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 311 ção de classe das pessoas MARCUSE 1977 p19 Se gundo Herbert Marcuse Sem dúvida as manifestações concretas da sua história são determi nadas pela situação de classe mas esta situação não é a causa do seu destino do que lhes acontece na vida Especialmente nos seus as pectos não materiais o contexto de classe é ultrapassado É muito difícil relegar o amor e o ódio a alegria e a tristeza a esperança e o desespero para o domínio da psicologia removendo assim estes sen timentos da preocupação da práxis radical Na realidade em termos de economia política eles talvez não sejam efetivamente forças de produção mas são decisivos e constituem a realidade de cada ser humano MARCUSE 1977 p19 A FORMA ESTÉTICA COMO RESPONSÁVEL PELA SUBVERSÃO O filósofo alemão defende que em virtude da sua for ma estética a arte é absolutamente autônoma perante as re lações sociais existentes MARCUSE 1977 p11 e que essa autonomia levaa a contestar estas relações e a trans cendêlas Questionando a perspectiva supracitada da esté tica marxista ortodoxa Herbert Marcuse defende a seguinte tese As qualidades radicais da arte ou seja a acusação da realidade esta belecida e sua invocação da bela imagem Schöner Schein da liber tação baseiamse principalmente nas dimensões em que a arte transcende a sua determinação social e se emancipa a partir do uni verso real do discurso e do comportamento preservando no entan to a sua presença esmagadora Assim a arte cria o mundo em que a subversão da experiência própria da arte se torna possível o mundo formado pela arte é reconhecido como uma realidade suprimida e distorcida na realidade existente A lógica interna da obra de arte termina na emergência de outra razão outra sensibilidade que desa fiam a racionalidade e a sensibilidade incorporadas nas instituições sociais dominantes MARCUSE 1977 p20 HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 312 Ainda de acordo com os argumentos do filósofo a arte até pode ser revolucionária em vários sentidos seja por re presentar uma mudança radical no estilo e na técnica seja por romper com a realidade social petrificada abrindo os caminhos da libertação No entanto Herbert Marcuse con sidera restrito o primeiro sentido do estilo e da técnica mesmo admitindo que a mudança nesses aspectos pode re fletir transformações significativas na sociedade Marcuse considera restrito o caráter revolucionário da obra em seu aspecto técnico e estilístico porque avalia que a definição técnica da arte não está relacionada à qualidade da obra tampouco à sua autenticidade e verdade Herbert Marcuse valoriza a forma estética como o carac terístico fundamental da arte revolucionária uma vez que ela seria promotora de uma sublimação estética libertadora capaz de promover a transcendência da realidade imediata e destruir com isso uma objetividade subjugadora ancorada nas relações sociais estabelecidas A forma estética ao mes mo tempo em que leva à sublimação estética deve levar à dessublimação da percepção ordinária e condicionada dos indivíduos Percepção essa controlada por normas e neces sidades e que pode ser rompida pela força dissidente da ar te A verdade ou autenticidade da obra de arte não é dada pelo seu conteúdo definido como representação correta das condições sociais mas pelo conteúdo tornado forma MARCUSE 1977 p21 Dessa maneira a forma estética responsável pela fun ção crítica da arte e por desviála da realidade pura da luta de classes é definida como o resultado da transformação de um dado conteúdo fato atual ou histórico pessoal ou social num todo independente um poema peça romance DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 313 etc MARCUSE 1977 p21 A obra de arte que é esse todo independente do processo condicionado da realidade denuncia a realidade ao mesmo tempo em que a representa E faz isso ainda segundo o filósofo promovendo uma re modelação da linguagem da percepção e da compreensão de modo a revelarem a essência da realidade na sua aparên cia as potencialidades reprimidas do homem e da natureza 1977 p21 Para Marcuse a verdade da arte está na sua força de romper o monopólio da realidade para definir o que é o real e nessa operação de ruptura o mundo fictí cio da arte aparece como verdadeira realidade Utilizando um conceito próprio a Marcuse o mundo da arte é de ou tro Princípio da Realidade21 1977 p22 No tocante à literatura por exemplo Marcuse afirma que ela não é revolucionária por ser escrita para a classe trabalhadora ou para a revolução mas que ela pode ser re volucionária tendo como referência a si própria como con teúdo tornado forma na sua própria dimensão estética MARCUSE 1977 p14 Como supramencionado de acordo com o autor a verdadeira obra de arte revolucionária é subversiva de per cepção e da compreensão uma acusação da realidade esta belecida a aparição da imagem de libertação MARCUSE 1977 p13 Vale destacar que para Marcuse o caráter progres 21 Em uma leitura da obra de Freud Marcuse vai dizer o princípio de realidade supera o princí pio de prazer o homem aprende a renunciar ao prazer momentâneo incerto e destrutivo substi tuindoo pelo prazer adiado restringido mas garantido A substituição do princípio de prazer pelo princípio de realidade é o grande acontecimento traumático no desenvolvimento do homem no desenvolvimento do gênero filogênese tanto quanto do indivíduo ontogênese MARCUSE 1968 p3 HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 314 sista da obra do autor não é medido pela origem do escri tor tampouco pela ideologia da sua classe ou pela presença ou ausência da classe oprimida nas obras feitas por ele O caráter progressista estará na própria obra no que ela diz e como ela diz MARCUSE 1977 p30 Falando do sentido da arte pela arte e evidenciando a forma estética como e lemento revolucionário Marcuse menciona como exem plo a poesia de Mallarmé já que para o filósofo alemão os seus poemas evocam modos de percepção imaginação gestos uma festa de sensualidade que destrói a experiência de todos os dias e antecipa um princípio de realidade dife rente MARUSE 1977 p30 Tratando do que chamou de literatura esotérica que tem Baudelaire Proust e Va lery como seus representantes22 Marcuse considera que O protesto secreto desta literatura esotérica reside no ingresso das forças eróticodestrutivas primárias que destroem o universo normal da comunicação e do comportamento A sua verdadeira natureza é associal constituindo uma rebelião subterrânea contra a ordem soci al Porquanto esta literatura revela o domínio de Eros e Thanatos para além de todo o controle social invoca as necessidades e as satis fações que são essencialmente destrutivas Não contribui em nada para a luta pela libertação exceto ao desvendar as zonas intermedi árias da natureza e da sociedade em que mesmo a morte e o diabo incluem como aliados na recusa de se submeterem à lei e à ordem de repressão Esta literatura é uma das formas históricas de transcen dência estética crítica MARCUSE 1977 p32 Outro aspecto relevante evidenciado por Marcuse e 22 O grau a que a distância e o afastamento da práxis constituem o valor emancipatório da arte tornase particularmente claro nas obras literárias que parecem fecharse rigidamente contra tal práxis Walter Benjamin rastreou isso nas obras de Poe Baudelaire Proust e Valery Elas expri mem uma consciência de crise Krisenbwusstsein um prazer na decadência na destruição na beleza do mal uma exaltação do associal do anomico a rebelião secreta da burguesia contra a própria classe MARCUSE 1977 p31 DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 315 fundamental para a compreensão da perspectiva considera da no ensaio A Dimensão Estética é o que o autor deno minou de mimese crítica Para o autor A mimese é a representação através do distanciamento a subversão da consciência A experiência é intensificada até o ponto de ruptura a intensificação da percepção pode ir ao ponto de distorcer as coisas de modo que o indizível é dito o invisível se torna visível e o insuportável explode Assim a transformação estética transformase em denúncia mas também em celebração do que resiste à injustiça e ao terror e do que ainda se pode salvar MARCUSE 1977 p53 De acordo com Marcuse a mimese que deve ser rees truturadora encontra expressão tanto em Beckett Goethe Baudelaire Stendhal e Kafka quanto em Brecht E é o próprio Brecht que mesmo sendo um defensor da imedia tidade da necessidade de mudança e não sendo exata mente partidário da autonomia da arte aparece no ensaio A Dimensão Estética afirmando que uma obra que não exi ba a sua independência em relação à realidade e que não outorgue a independência ao público em relação à realida de não é uma obra de arte MARCUSE 1977 p42 A pesquisadora Sandra Abdo 2005 questiona a con cepção de forma estética de Marcuse elemento que sus tentaria a autonomia da arte conforme a interpretação dela do pensamento do filósofo alemão Residiria aí para a au tora o comprometimento da possibilidade levantada por Marcuse na dificuldade em conceber uma suposta forma autônoma das relações sociais CONCLUSÃO HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 316 Por fim se este trabalho objetivou exibir duas perspec tivas diferentes que permitem reflexões sobre a questão da autonomia da arte foi porque ele de algum modo mobili za entendimentos já realizados como por exemplo SILVEIRA 2018 que observam que há três modos de a bordar a questão da autonomia da arte autonomia como liberdade essencial da arte frente a sociedade defendida pe los partidários da arte pela arte autonomia como mera fantasia dos artistas posição da sociologia positivista e au tonomia como fenômeno historicamente condicionado SILVEIRA 2018 sendo Herbert Marcuse vinculado a esta última vertente de acordo com o autor dessa classificação enquanto Schopenhauer se aproximaria da primeira A respeito da estética de Schopenhauer ao longo do texto foi apresentada a possibilidade de reflexões que rela cionem a perspectiva do filósofo e o debate sobre autono mia da arte possibilidade que pode ser compreendida de dois modos inseparáveis Isso visto que reflexões sobre a estética schopenhaueri ana relacionada ao debate sobre a autonomia da arte po dem ser feitas explorando as aproximações existentes entre esta estética e a estética kantiana e os elementos que as compõem como a obra desinteressada e sua universali dade Até porque a perspectiva de Kant e os seus elementos constituintes alguns presentes no mínimo de maneira a proximada também na estética schopenhaueriana já pas saram por críticas relacionadas à autonomia da arte como a que foi realizada por Pierre Bourdieu na obra A distinção crítica social do julgamento Na mesma esteira também é possível refletir sobre a es tética schopenhaueriana relacionada ao debate sobre a au DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 317 tonomia da arte a partir das elaborações específicas da pers pectiva de Schopenhauer como o gênio artístico que intui o belo CACCIOLA 1999 p 12 e tem uma relação espe cífica com a manifestação das Ideias que conforme exposto ao longo do texto não possuem vínculos com as determi nações interesses ou produções sociais como a ciência23 A respeito da ciência por exemplo se a arte é obra do gênio o suprassumo da subjetividade pura do conhecimento a ciência incessantemente segue a cadeia causal do princípio de razão SALVIANO 2019 p 194 princípio que não compreende o conhecimento puro desinteressado Portanto se alguns elementos supracitados como os vindos da estética kantiana e a própria estética desse au tor já tinham sidos relacionados aos debates sobre a auto nomia da arte este texto procurou apresentar outros designadamente a própria estética schopenhaueriana que possam ser pensados nas produções que versam sobre a au tonomia da arte A respeito das produções sobre o tema vale mencionar que há trabalhos que ainda observam resíduos de certo eruditismo estético na perspectiva de Marcuse mesmo sendo ele crítico de perspectivas que se aproximam à scho penhaueriana perspectivas que rompem com qualquer vín culo entre o considerado artista e a ordem social que o considera apreciando o artista como um gênio excepcional ABDO 2005 GARTMAN 2013 SILVEIRA 2018 Ademais a despeito de este artigo ter tido como objeti 23 Segundo Brigitte Scheer é na estética de Schopenhauer que se revela a crítica direta ou indire ta do conhecimento racional na ciência e é a estética que dá a medida para a verdade objetiva Marcase assim a função corretiva do conhecimento estético em relação ao conhecimento científi co e à razão instrumental CACCIOLA 1999 p8 HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 318 vo específico exibir as concepções dos dois filósofos resta sugerir a leitura de trabalhos que observam que as perspec tivas desses diferentes autores possuem certo ponto de a proximação no que tange à autonomia da arte ABDO 2005 SILVEIRA 2018 e sugerir também a possibilidade de uma reflexão crítica e articulada das perspectivas de S chopenhauer e Herbert Marcuse com as concepções sobre o campo da arte do sociólogo francês Pierre Bourdieu que pode ser uma teoria que problematize produzindo bons rendimentos algumas concepções que versam sobre a autonomia da arte inclusive resguardando nesse encontro com o sociólogo a especificidade da reflexão filosófica ação que o próprio Bourdieu fez na sua obra A respeito da contribuição de Bourdieu para o deba te ele rompe com o vínculo da autonomia não como se paração de uma atividade da vida cotidiana mas como processo de desenvolvimento do campo artístico ou seja de consolidação da arte como uma atividade humana au torregulada e dotada de identidade social própria SILVEIRA 2018 Além do que Bourdieu pensa a relação entre o campo literário e o campo do poder que envolve a obra de arte propondo uma compreensão da construção e aceitação da obra a partir do campo de pertencimento des ta e seus sistemas de classificação bem como das determi nações externas a que o autor de toda obra está submetido De todo modo as reflexões críticas articuladas desses três autores talvez possam não só problematizar as teorias que não mencionam qualquer vínculo da arte com a or dem social ou aquelas em que mesmo mencionando esse vínculo possuem dificuldades para pensarem para além da dicotomia do autor como representante de uma classe e da DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 319 obra para além de todas as classes mas também problema tizar decisivamente o papel da arte na manutenção ou na superação das relações de dominação SILVEIRA 2018 questão sempre premente e nunca esgotada Abstract Along the way of works that deal with issues involving the auton omy of art a category of Aesthetic since modernity this article aims to de velop explanations about two authors Arthur Schopenhauer 17881860 and Herbert Marcuse 18981979 who influenced by the aesthetic of Kant have perspectives that allow reflections on the autonomy of art although Marcuse positions himself as a critic of the perspective represented by Schopenhauer In particular this article will present the aesthetic under standing of the philosopher Arthur Schopenhauer in the main work of this author The World as Will and Representation above all the place of the ar tistic genius in the work of the German philosopher as well as presenting the notes of the philosopher Herbert Marcuse in the work The Aesthetic Dimension from 1977 which summarizes the main issues of the authors aesthetic Keywords Schopenhauer Marcuse Autonomy of Art aesthetic REFERÊNCIAS ABDO Sandra N Sobre o problema da autonomia da arte e suas implicações her menêuticas e ontológicas Kriterion v46 n112 dez2005 ARAMAYO R Leudemonologia di Schopenhauer nel suo fondo kantiano In SchopenhauerJahrbuch Band 92 Würzburg Verlag Königshausen Neumann 2011 p 4968 BARBOSA Jair A Decifração do Enigma do Mundo São Paulo Moderna 1997 BOURDIEU Pierre A distinção crítica social do julga HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 320 mento São Paulo Edusp Porto Alegre RS Zouk 2007 Razões Práticas Petrópolis Vozes 1996 As regras da arte gênese do campo literário São Paulo Companhia das Letras 1996 O amor pela arte museus de arte na Europa e seu público Porto Alegre Editora Zouk 2003 BÜRGER Peter Teoria da Vanguarda Tradução José Pedro Antunes SP Cosac Naify 2012 CACCIOLA Maria Lúcia Schopenhauer e a questão do dogmatismo São Paulo EDUSP 1994 O conceito de interesse Cadernos de Filosofia Ale mã 5 p 515 1999 A crítica da razão no pensamento de Schopenhauer Dissertação de Mestrado São Paulo FFLCHUSP 1981 EPICURO Carta sobre a Felicidade A Meneceu São Paulo Editora Unesp 1997 GARDMAN David Culture Class and Critical Theory between Bourdieu and the Frankfurt School NY Rou tledge 2013 JANAWAY Christopher Schopenhauer São Paulo edi ções Loyola 2003 KANT Immanuel Crítica da faculdade do juízo Trad Valério Rohden e António Marques Rio de Janeiro Fo rense Universitária 1995 DOSSIÊ DA ESTÉTICA SCHOPENHAUERIANA À DIMENSÃO ESTÉTICA DE MARCUSE DIFERENTES POSSIBILIDADES PARA REFLEXÕES SOBRE A AUTONOMIA DA ARTE PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 321 LIMA Luiz Costa A autonomia da arte e o mercado ARS São Paulo São Paulo v 2 n 3 p 1021162004 MARCUSE Herbert Eros e Civilização RJ Zahar Edito res 1968 A Dimensão Estética Lisboa Edições 70 1977 A ideologia da sociedade industrial o Homem Uni dimensional Rio de Janeiro Zahar Editores 1982 MORAES Dax Desinteresse e comprazimento estético considerações acerca da apreciação da estética kantiana por Schopenhauer face às de Hegel e Heidegger O que nos faz pensar nº28 dezembro de 2010 SALVIANO Jarlee Oliveira Silva Complacência estética e satisfação do querer na metafísica do belo de Schope nhauer Voluntas Santa Maria v 10 n 3 p 190198 setdez 2019 O fundamento epistemológico da metafísica da Vontade de Arthur Schopenhauer TransFormAção São Paulo v322 2009 p101118 O niilismo de Schopenhauer São Paulo dissertação de mestrado USP 2001 SCHOPENHAUER Arthur O Mundo como Vontade e Representação Trad MF Sá Correia Rio de Janeiro E ditora Contraponto 2001 O Mundo como Vontade e como Representação Trad Jair Barbosa São Paulo Editora da UNESP 2005 HEIBERLE HIRSGBERG HORACIO PHILÓSOPHOS GOIÂNIA V 25 N 2 P287322 JULDEZ 2020 322 O Mundo como Vontade e Representação parte III Crítica da filosofia kantiana Parerga e Paralipomena Tradução de Wolfgang Leo Maar e Maria Lúcia 226 Cac ciola São Paulo Nova Cultural in Os Pensadores caps V VII XII XIV 2000 Sobre o fundamento da moral Tradução de Maria Lúcia M O Cacciola São Paulo Martins Fontes 1ª edi ção 1995 SILVEIRA Luiz Gustavo G Bourdieu e a papel da legi timação social do discurso filosófico sobre a autonomia da arte Tese de Doutorado em Filosofia no Programa de PósGraduação em Filosofia da FLCHUSP 2015