·

Cursos Gerais ·

Linguística

Send your question to AI and receive an answer instantly

Ask Question

Preview text

Ruth Rocha Marcelo marmelo martelo e outras histórias 27ª edição Copyright 1976 Ruth Rocha Capa e ilustrações Adalberto Cornavaca Todos os direitos reservados com exclusividade pela SALAMANDRA CONSULTORIA EDITORIAL SA Av Nilo Peçanha n l55510 centro CEP 20020 Tel 2406306 Rio de Janeiro RJ Este livro foi impresso na LIS GRAFICA E EDITORA LTDA Rua Visconde de Parnaíba 2753 Belenzinho CEP 03045 São Paulo SP Fone 2925666 com filmes fornecidos pelo editor Ruth Rocha Marcelo marmelo martelo e outras histórias Marcelo Marmelo Martelo Marcelo vivia fazendo perguntas a todo mundo Papai por que é que a chuva cai Mamãe por que é que o mar não derrama Vovó por que é que o cachorro tem quatro pernas As pessoas grandes às vezes respondiam Às vezes não sabiam como responder Ah Marcelo sei lá Uma vez Marcelo cismou com o nome das coisas Mamãe por que é que eu me chamo Marcelo Ora Marcelo foi o nome que eu e seu pai escolhemos E por que é que não escolheram martelo Ah meu filho martelo não é nome de gente É nome de ferramenta Por que é que não escolheram marmelo Porque marmelo é nome de fruta menino E a fruta não podia chamar Marcelo e eu chamar marmelo No dia seguinte lá vinha ele outra vez Papai por que é que mesa chama mesa Ah Marcelo vem do latim Puxa papai do latim E latim é língua de cachorro Não Marcelo latim é uma língua muito antiga E por que é que esse tal de latim não botou na mesa nome de cadeira na cadeira nome de parede e na parede nome de bacalhau Ai meu Deus este menino me deixa louco Daí a alguns dias Marcelo estava jogando futebol com o pai Sabe papai eu acho que o tal de latim botou nome errado nas coisas Por exemplo por que é que bola chama bola Não sei Marcelo acho que bola lembra uma coisa redonda não lembra Lembra sim mas e bolo Bolo também é redondo não é Ah essa não Mamãe vive fazendo bolo quadrado O pai de Marcelo ficou atrapalhado E Marcelo continuou pensando Pois é está tudo errado Bola é bola porque é redonda Mas bolo nem sempre é redondo E por que será que a bola não é a mulher do bolo E bule E belo E bala Eu acho que as coisas deviam ter nome mais apropriado Cadeira por exemplo Devia chamar sentador não cadeira que não quer dizer nada E travesseiro Devia chamar cabeceiro lógico Também agora eu só vou falar assim Logo de manhã Marcelo começou a falar sua nova língua Mamãe quer me passar o mexedor Mexedor Que é isso Mexedorzinho de mexer café Ah colherinha você quer dizer Papai me dá o suco de vaca Que é isso menino Suco de vaca ora Que está no sucodavaqueira Isso é leite Marcelo Quem é que entende este menino O pai de Marcelo resolveu conversar com ele Marcelo todas as coisas têm um nome E todo mundo tem que chamar pelo mesmo nome porque senão ninguém se entende Não acho papai Por que é que eu não posso inventar o nome das coisas Deixe de dizer bobagens menino Que coisa mais feia Está vendo como você entendeu papai Como é que você sabe que eu disse um nome feio O pai de Marcelo suspirou Vá brincar filho tenho muito que fazer Mas Marcelo continuava não entendendo a história dos nomes E resolveu continuar a falar à sua moda Chegava em casa e dizia Bom solário pra todos O pai e a mãe de Marcelo se olhavam e não diziam nada E Marcelo continuava inventando Sabem o que eu vi na rua Um puxadeiro puxando uma carregadeira Depois o puxadeiro fugiu e o possuidor ficou danado A mãe de Marcelo já estava ficando preocupada Conversou com o pai Sabe João eu estou muito preocupada com o Marcelo com essa mania de inventar nomes para as coisas Você já pensou quando começarem as aulas Esse menino vai dar trabalho Que nada Laura Isso é uma fase que passa Coisa de crian ça Mas estava custando a passar Quando vinham visitas era um caso sério Marcelo só cumprimentava dizendo Bom solário bom lunário que era como ele chamava o dia e a noite E os pais de Marcelo morriam de vergonha das visitas Até que um dia O cachorro do Marcelo o Godofredo tinha uma linda casinha de madeira que Seu João tinha feito para ele E Marcelo só chamava a casinha de moradeira e o cachorro de Latildo E aconteceu que a casa do Godofredo pegou fogo Alguém jogou uma ponta de cigarro pela grade e foi aquele desastre Marcelo entrou em casa correndo Papai papai embrasou a moradeira do Latildo O quê menino Não estou entendendo nada A moradeira papai embrasou Eu não sei o que é isso Marcelo Fala direito Embrasou tudo papai está uma branqueira danada Seu João percebia a aflição do filho mas não entendia nada Quando Seu João chegou a entender do que Marcelo estava falando já era tarde A casinha estava toda queimada Era um montão de brasas O Godofredo gania baixinho E Marcelo desapontadíssimo disse para o pai Gente grande não entende nada de nada mesmo Então a mãe do Marcelo olhou pro pai do Marcelo E o pai do Marcelo olhou pra mãe do Marcelo E o pai do Marcelo falou Não fique triste meu filho A gente faz uma moradeira nova pro Latildo E a mãe do Marcelo disse É sim Toda branquinha com a entradeira na frente e um cobridor bem vermelhinho E agora naquela família todo mundo se entende muito bem O pai e a mãe do Marcelo não aprenderam a falar como ele mas fazem força pra entender o que ele fala E nem estão se incomodando com o que as visitas pensam Você gostou do fim da história Se você fosse o autor como é que você gostaria que a história acabasse Por que é que você não escreve a história de um menino ou de uma menina que também inventou um jeito diferente de falar Depois mostre sua história à sua professora No text present in the image Gabriela menina Gabriela levada Ô menina encapetada Gabriela sapeca Menina como é que você se chama Eu não me chamo não os outros é que me chamam Gabriela Gabriela serelepe Menina para onde vai essa rua A rua não vai não a gente é que vai nela Gabriela na escola Gabriela quem foi que descobriu o Brasil Ah professora isso é fácil eu só queria saber quem foi que cobriu Gabriela não deixava a professora em paz Professora céu da boca tem estrelas Professora barriga da perna tem umbigo Professora pé de alface tem calos Gabriela era quem inventava as brincadeiras Vamos brincar de amarelinha Todo mundo ia Vamos brincar de pegador Todos concordavam Todos queriam brincar com Gabriela Foi aí que mudou para a mesma rua da Gabriela a Teresinha Teresinha loirinha bonitinha arrumadinha Teresinha estudiosa vestida de corderosa Teresinha Que belezinha Os amigos vinham contar a Gabriela Teresinha tem um vestido com rendinha Teresinha tem uma caixinha de música Teresinha tem cachos no cabelo Gabriela já estava enciumada Grande coisa cachos Bananeira também tem cachos Gabriela não queria nem ver Teresinha Menina enjoada não sabe correr não suja o vestido só vive estudando Deus me livre Mas ela é boazinha os meninos diziam Boazinha nada Ela é sonsa Mas você nunca falou com ela Gabriela Não interessa Não falei e não gostei pronto Mas Gabriela já estava impressionada de tanto que falavam da Teresinha E Gabriela começou a se olhar no espelho e achar o seu cabelo muito sem graça Mamãe eu queria fazer cachos nos cabelos Mamãe eu queria um vestido corderosa Mamãe eu queria uma caixinha de música E Gabriela começou a se modificar Na escola no recreio Gabriela não pulava corda e nem brincava de escondeesconde Ficava sentadinha quietinha fazendo tricô De tarde Gabriela não ia mais brincar na rua para não sujar o vestido E à noite muito em segredo Gabriela enchia a cabeça de papelotes para encrespar os cabelos Os amigos vinham chamar Gabriela Gabriela vamos andar de bicicleta Agora eu não posso respondia Gabriela Preciso ajudar a mamãe A mãe de Gabriela estranhava Que é isso menina Você não tem nada para fazer agora E Gabriela com ares de gente grande respondia Eu já estou crescida para essas brincadeiras E Teresinha O que é que estava acontecendo com Teresinha Teresinha só ouvia falar de Gabriela Gabriela é que sabe pular corda Gabriela usa rabodecavalo para o cabelo não atrapalhar Gabriela só usa calças compridas Teresinha respondia com poucocaso Que menina mais sem modos Deus me livre Mas quando as crianças saíam Teresinha pedia Mamãe eu quero umas calças compridas E no fundo do quintal Teresinha treinava pulando corda e amarelinha para ir brincar na rua como Gabriela E na primeira vez que as duas se encontraram a turma nem queria acreditar Gabriela fazendo pose de moça de cabelos cacheados sapatos de pulseirinha vestido todo bordado Gabriela empurrando o carrinho da boneca comportadíssima Teresinha pulando sela assoviando levadíssima As duas se olharam no começo desconfiadíssimas Depois começaram a rir porque estavam mesmo muito engraçadas 39 Agora Teresinha e Gabriela são grandes amigas E cada uma aprendeu muito com a outra Gabriela sabe a lição de história do Brasil embora seja ainda a campeã de bolinha de gude E Teresinha embora seja ainda uma boa aluna na escola já sabe andar de bicicleta pular amarelinha e até já está aprendendo a fazer suas gracinhas Ontem quando a professora perguntou a Teresinha Minha filha o que você vai ser quando crescer Teresinha não teve dúvidas Vou ser grande ué Você acha que foi bom ou que foi ruim Terezinha e Gabriela ficarem amigas Você também tem amigos diferentes de você O que é que você aprende com eles E eles O que é que eles aprendem com você Invente um amigo que você gostaria de ter Com todas as qualidades que você gosta e com alguns defeitos também Por que todo mundo tem defeitos O Dono da Bola Este é o Caloca Ele é um amigo legal Mas ele não foi sempre as sim não Antigamente ele era o menino mais enjoado de toda a rua E não se chamava Caloca O nome dele era Carlos Alberto E sabem por que ele era assim enjoado Eu não tenho certeza mas acho que é porque ele era o dono da bola Mas me deixem contar a história do começo Caloca morava na casa mais bonita da nossa rua Os brinquedos que Caloca tinha vocês não podem imaginar Até um trem elé trico ele ganhou do avô E tinha bicicleta com farol e buzina e tinha tenda de índio carri nhos de todos os tamanhos e uma bola de futebol de verdade Caloca só não tinha amigos Porque ele brigava com todo mundo Não deixava ninguém brincar com os brinquedos dele Mas futebol ele tinha que jogar com a gente porque futebol não se pode jogar sozinho O nosso time estava cheio de amigos O que nós não tínhamos era bola de futebol Só bola de meia mas não é a mesma coisa Bom mesmo é bola de couro como a do Caloca Mas toda vez que a gente ia jogar com Caloca acontecia a mesma coisa Era só o juiz marcar qualquer falta do Caloca que ele gritava logo Assim eu não jogo mais Dá aqui a minha bola Ah Caloca não vá embora tenha espírito esportivo jogo é jogo Espírito esportivo nada berrava Caloca E não me chame de Caloca meu nome é Carlos Alberto E assim Carlos Alberto acabava com tudo que era jogo A coisa começou a complicar mesmo quando resolvemos entrar no campeonato do nosso bairro A gente precisava treinar com bola de verdade para não estranhar na hora do jogo Mas os treinos nunca chegavam ao fim Carlos Alberto estava sempre procurando encrenca Se o Beto jogar de centroavante eu não jogo Se eu não for o capitão do time vou embora Se o treino for muito cedo eu não trago a bola E quando não se fazia o que ele queria já se sabe levava a bola embora e adeus treino Catapimba que era o secretário do clube resolveu fazer uma reunião Esta reunião é pra resolver o caso do Carlos Alberto Cada vez que ele se zanga carrega a bola e acaba com o treino Carlos Alberto pulou vermelhinho de raiva A bola é minha eu carrego quantas vezes eu quiser Pois é isso mesmo disse o Beto zangado É por isso que nós não vamos ganhar campeonato nenhum Pois azar de vocês eu não jogo mais nessa droga de time que nem bola tem E Caloca saiu pisando duro com a bola debaixo do braço Todas as vezes que o Carlos Alberto fazia isso ele acabava voltando e dando um jeito de entrar no time de novo Mas daquela vez nós estávamos por aqui com ele A primeira vez que ele veio ver os treinos ninguém ligou Ele subiu no muro com a bola debaixo do braço como sempre e ficou esperando que alguém pedisse para ele jogar Mas ninguém disse nada Quando o Xereta passou por perto ele puxou conversa Que tal jogar com bola de meia Xereta deu uma risadinha Serve Um dia nós ouvimos dizer que o Carlos Alberto estava jogando no time do FazdeConta que é um time lá da rua de cima Mas foi por pouco tempo A primeira vez que ele quis carregar a bola no melhor do jogo como fazia conosco se deu muito mal O time inteiro do FazdeConta correu atrás dele e ele só não apanhou porque se escondeu na casa do Batata Aí o Carlos Alberto resolveu jogar bola sozinho A gente passava pela casa dele e via Ele batia bola com a parede Acho que a parede era o único amigo que ele tinha Mas eu acho que jogar com a parede não deve ser muito divertido Porque depois de três dias o Carlos Alberto não agüentou mais Apareceu lá no campinho Se vocês me deixarem jogar eu empresto a minha bola Nós não queremos sua bola não Ué por quê Você sabe muito bem No melhor do jogo você sempre dá um jeito de levar a bola embora Eu não só quando vocês me amolam Pois é por isso mesmo que nós não queremos só se você der a bola para o time de uma vez Ah essa não Está pensando que eu sou bobo E Carlos Alberto continuou sozinho Mas eu acho que ele já não estava gostando de estar sempre sozinho No domingo ele convi dou o Xereta para brincar com o trem elétrico Na segunda levou o Beto para ver os peixes na casa dele Na terça me chamou para brincar de índio E na quarta mais ou menos no meio do treino lá veio ele com a bola debaixo do braço Oi turma que tal jogar com uma bola de verdade Nós estávamos loucos para jogar com a bola dele Mas não podíamos dar o braço a torcer Olha Carlos Alberto você apareça em outra hora Agora nós precisamos treinar disse Catapimba Mas eu quero dar a bola ao time De verdade Nós todos estávamos espantados E você nunca mais pode levar embora E o que é que você quer em troca Eu só quero jogar com vocês Os treinos recomeçaram animadíssimos O final do campeonato estava chegando e nós precisávamos recuperar o tempo perdido Carlos Alberto estava outro Jogava direitinho e não criava caso com ninguém E quando nós ganhamos o jogo final do campeonato todo mundo se abraçou A gente gritava Viva o EstreladAlva Futebol Clube Viva Viva o Catapimba Viva Viva o Carlos Alberto Viva Então o Carlos Alberto gritou Ei pessoal não me chamem de Carlos Alberto Podem me chamar de Caloca Faça de conta que Caloca tinha um diário Escreva o diário do Caloca E conte como é que o Caloca se sentia desde que ganhou a bola até que deu a bola ao time Você já deu alguma coisa sua a seus amigos