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Textos selecionados de Filosofia da Religião Série Investigação Filosófica Rodrigo Jungmann Organizador TEXTOS SELECIONADOS DE FILOSOFIA DA RELIGIÃO Série Investigação Filosófica TEXTOS SELECIONADOS DE FILOSOFIA DA RELIGIÃO Rodrigo Jungmann Organizador Pelotas 2022 REITORIA Reitora Isabela Fernandes Andrade ViceReitora Ursula Rosa da Silva Chefe de Gabinete Aline Ribeiro Paliga PróReitor de Graduação Maria de Fátima Cóssio PróReitor de Pesquisa e PósGraduação Flávio Fernando Demarco PróReitor de Extensão e Cultura Eraldo dos Santos Pinheiro PróReitor de Planejamento e Desenvolvimento Paulo Roberto Ferreira Júnior PróReitor Administrativo Ricardo Hartlebem Peter PróReitor de Gestão de Informação e Comunicação Julio Carlos Balzano de Mattos PróReitor de Assuntos Estudantis Fabiane Tejada da Silveira PróReitor de Gestão Pessoas Taís Ulrich Fonseca CONSELHO EDITORIAL DA EDITORA DA UFPEL Presidente do Conselho Editorial Ana da Rosa Bandeira Representantes das Ciências Agronômicas Victor Fernando Büttow Roll Representantes da Área das Ciências Exatas e da Terra Eder João Lenardão Representantes da Área das Ciências Biológicas Rosângela Ferreira Rodrigues Representante da Área das Engenharias e Computação Reginaldo da Nóbrega Tavares Representantes da Área das Ciências da Saúde Fernanda Capella Rugno Representante da Área das Ciências Sociais Aplicadas Daniel Lena Marchiori Neto Representante da Área das Ciências Humanas Charles Pereira Pennaforte Representantes da Área das Linguagens e Artes Lúcia Bergamaschi Costa Weymar EDITORA DA UFPEL Chefia Ana da Rosa Bandeira Editorachefe Seção de Préprodução Isabel Cochrane Administrativo Seção de Produção Suelen Aires Böettge Administrativo Anelise Heidrich Revisão Ingrid Fabiola Gonçalves Diagramação Seção de Pósprodução Madelon Schimmelpfennig Lopes Administrativo Morgana Riva Assessoria CONSELHO EDITORIAL Prof Dr João Hobuss EditorChefe Prof Dr Juliano Santos do Carmo EditorChefe Prof Dr Alexandre Meyer Luz UFSC Prof Dr Rogério Saucedo UFSM Prof Dr Renato Duarte Fonseca UFSM Prof Dr Arturo Fatturi UFFS Prof Dr Jonadas Techio UFRGS Profa Dra Sofia Albornoz Stein UNISINOS Prof Dr Alfredo Santiago Culleton UNISINOS Prof Dr Roberto Hofmeister Pich PUCRS Prof Dr Manoel Vasconcellos UFPEL Prof Dr Marco Antônio Caron Ruffino UNICAMP Prof Dr Evandro Barbosa UFPEL Prof Dr Ramón del Castillo UNEDEspanha Prof Dr Ricardo Navia UDELARUruguai Profa Dra Mónica Herrera Noguera UDELARUruguai Profa Dra Mirian Donat UEL Prof Dr Giuseppe Lorini UNICAItália Prof Dr Massimo DellUtri UNISAItália COMISSÃO TÉCNICA EDITORAÇÃO Prof Dr Juliano Santos do Carmo DiagramadorCapista DIREÇÃO DO IFISP Prof Dr João Hobuss CHEFE DO DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA Prof Dr Juliano Santos do Carmo Série Investigação Filosófica A Série Investigação Filosófica uma iniciativa do Núcleo de Ensino e Pesquisa em Filosofia do Departamento de Filosofia da UFPel e do Grupo de Pesquisa Investigação Filosófica do Departamento de Filosofia da UNIFAP sob o selo editorial do NEPFil online e da Editora da Universidade Federal de Pelotas tem por objetivo precípuo a publicação da tradução para a língua portuguesa de textos selecionados a partir de diversas plataformas internacionalmente reconhecidas tal como a Stanford Encyclopedia of Philosophy httpsplatostanfordedu por exemplo O objetivo geral da série é disponibilizar materiais bibliográficos relevantes tanto para a utilização enquanto material didático quanto para a própria investigação filosófica EDITORES DA SÉRIE Rodrigo Reis Lastra Cid IFUNIFAP Juliano Santos do Carmo NEPFILUFPEL COMISSÃO TÉCNICA Marco Aurélio Scarpino Rodrigues Revisor em Língua Portuguesa Rafaela Nóbrega DiagramadorCapista ORGANIZADOR DO VOLUME Rodrigo Jungmann UFPE TRADUTORES E REVISORES Aluízio de Araújo Couto Júnior UFMG Bruno Henrique Uchôa IFAL Gaspar Rodrigues de Souza Neto UFRN Gerson Francisco de Arruda UNICAP CRÉDITO DA IMAGEM DE CAPA Joseph Mallord William Turner Modern Rome Campo Vaccino 1839 Disponível em httpsenwikipediaorgwikiModernRomeE28093CampoVaccinomediaFileJosephM allordWilliamTurnerBritishModernRomeCampoVaccinoGoogleArtProjectjpg GRUPO DE PESQUISA INVESTIGAÇÃO FILOSÓFICA UNIFAPCNPq O Grupo de Pesquisa Investigação Filosófica DPGCNPq foi constituído por pesquisadores que se interessam pela investigação filosófica nas mais diversas áreas de interesse filosófico O grupo foi fundado em 2010 como grupo independente e se oficializou como grupo de pesquisa da Universidade Federal do Amapá em 2019 MEMBROS PERMANENTES DO GRUPO Aluízio de Araújo Couto Júnior Bruno Aislã Gonçalves dos Santos Cesar Augusto Mathias de Alencar Daniel Schiochett Daniela Moura Soares Everton Miguel Puhl Maciel Guilherme da Costa Assunção Cecílio Kherian Galvão Cesar Gracher Luiz Helvécio Marques Segundo Paulo Roberto Moraes de Mendonça Pedro Merlussi Rafael César Pitt Rafael Martins Renata Ramos da Silva Rodrigo Alexandre de Figueiredo Rodrigo Reis Lastra Cid Sagid Salles Tiago Luís Teixeira de Oliveira Série Investigação Filosófica 2022 Universidade Federal de Pelotas Departamento de Filosofia Núcleo de Ensino e Pesquisa em Filosofia Editora da Universidade Federal de Pelotas Universidade Federal do Amapá Departamento de Filosofia Grupo de Pesquisa Investigação Filosófica NEPFil online Rua Alberto Rosa 154 CEP 96010770 PelotasRS Os direitos autorais estão de acordo com a Política Editorial do NEPFil online As revisões ortográficas e gramaticais foram realizadas pelos tradutores e revisores A autorização para a tradução dos verbetes da Stanford Encyclopedia of Philosophy neste volume foi obtida pelo Grupo de Pesquisa Investigação Filosófica Primeira publicação em 2022 por NEPFil online e Editora da UFPel Dados Internacionais de Catalogação N123 Textos selecionados de filosofia da religião recurso eletrônico Organizador Rodrigo Jungmann Pelotas NEPFIL Online 2022 330p Série Investigação Filosófica Modo de acesso Internet wpufpeledubrnepfil ISBN 9786500471687 1 Filosofia 2 Religião I Jungmann Rodrigo COD 100 wpufpeledubrnepfil Sumário Sobre a série investigação filosófica 14 Introdução 16 I Filosofia da Religião 19 1 A área e sua significação 20 2 O significado das crenças religiosas 25 21 O Positivismo 27 22 A filosofia da religião de inspiração wittgensteiniana 29 3 A epistemologia religiosa 31 31 O evidencialismo a teologia reformada e a epistemologia das volições 32 32 A epistemologia da discordância 36 4 A religião e a ciência 38 5 A reflexão filosófica acerca do teísmo e de suas alternativas 42 51 A reflexão filosófica acerca dos atributos divinos 43 511 A onisciência 45 512 A eternidade 47 513 A bondade de Deus 48 52 A existência de Deus 52 521 Argumentos ontológicos 53 522 Argumentos cosmológicos 55 523 Argumentos teleológicos 58 524 Os problemas do mal 62 525 O mal e o bem maior 64 526 A experiência religiosa 68 6 O pluralismo religioso 74 Referência bibliográfica 78 10 II Argumentos morais para a existência de Deus 98 1 Os objetivos dos argumentos teístas 99 2 A história dos argumentos morais para a existência de Deus 102 3 Argumentos morais teóricos para a existência de Deus e teorias da obrigação moral fundadas na noção do mandamento divino 105 4 Argumentos baseados no conhecimento ou consciência morais 111 5 Argumentos baseados na dignidade ou no valor humanos 115 6 Argumentos morais práticos para a crença em Deus 120 7 Conclusão 127 Referência bibliográfica 127 III Argumentos Teleológicos para a Existência de Deus 131 1 Introdução 132 2 Padrões Inferenciais do Desígnio 133 21 Argumentos do Desígnio por Analogia Esquema 1 134 211 Objeções Humeanas 135 212 Problemas a Respeito de R Rodada 1 137 22 Argumentos Dedutivos do Desígnio Esquema 2 138 221 Avaliando o Argumento do Esquema 2 142 222 Problemas a Respeito de R Rodada 2 144 223 As Lacunas e Seus Descontentes 145 23 Inferência para a Melhor ExplicaçãoArgumentos Abdutivos do Desígnio Esquema 3 147 231 IME Expectabilidade e Bayes 149 3 Explicação Alternativa 151 31 Afastando um Fator Explicativo 153 311 Mudança de Nível 155 312 Possíveis Disputas 156 32 Causação Indireta Desígnio e Evidências 157 4 Discussões Contemporâneas Adicionais sobre o Desígnio 160 41 Discussão Cosmológica Ajustefino 160 411 Nenhuma Explicação é Necessária 161 4111 Princípio Antrópico Fraco 161 4112 Efeito de Seleção Observacional 162 4113 Probabilidades Não Se Aplicam 163 11 412 Explicações Rivais 164 4121 Progresso Científico 164 4122 Vida Exótica 165 4123 Multiverso 165 42 Discussão Biológica Desígnio Inteligente 166 5 A Persistência do Desígnio Enquanto Raciocínio 167 6 Conclusão 169 Referência bibliográfica 169 IV Teísmo cético 173 1 O problema do mal e o ceticismo do teísmo cético 174 11 O problema do mal 174 12 O ceticismo do teísmo cético 176 2 A abordagem de princípios epistêmicos 179 21 Uma afirmação da abordagem de princípios epistêmicos 179 22 Objeções à abordagem de princípios epistêmicos 183 221 CORNEA é falsa 183 2211 CORNEA viola o fechamento 184 2212 CORNEA é um convite ao ceticismo 185 222 A condição CORNEA é satisfeita a Analogia Reversa do Genitor 185 23 Respostas às objeções à abordagem de princípios epistêmicos 186 231 Resposta ao Problema do Fechamento 186 232 Resposta aos problemas céticos 187 233 Resposta à analogia reversa do genitor 188 3 A abordagem de limitações cognitivas gerais 189 31 Uma afirmação da abordagem de limitações múltiplas 189 32 Uma objeção à abordagem de limitações múltiplas 191 33 Respostas à objeção 191 4 A abordagem do ceticismo modalmoral em sentido amplo 192 41 Uma afirmação da abordagem do ceticismo modal em sentido amplo 192 42 Objeções à abordagem do ceticismo modal em sentido amplo 195 43 Respostas às objeções 199 5 A abordagem focada do ceticismo modalmoral 200 51 Uma afirmação da abordagem focada do ceticismo modalmoral 200 52 Objeções à abordagem focada do ceticismo modalmoral 203 53 Respostas às objeções 203 12 6 O escopo do teísmo cético 204 61 O teísmo cético e argumentos explanatórios 204 62 O teísmo cético e o problema do mal para o senso comum 206 7 Novas fronteiras no teísmo cético 208 71 Graus de ceticismo 208 72 Os tipos de ceticismo relacionados ao problema da dor animal 209 721 O ceticismo quanto à dor dos animais 209 722 O ceticismo quanto ao caráter final da morte para os animais 210 Referência bibliográfica 210 V Simplicidade divina 216 1 Motivação 218 2 A Questão da Coerência 220 3 Ontologia Constituinte versus Ontologia Não Constituinte 222 31 Deus e Sua Natureza 223 32 Deus e Sua Existência 224 33 A Identidade dos Atributos Divinos 225 34 Deus e Mann DSD e Propriedades Exemplificadas 226 35 Deus e McCann DSD e Estados de Coisa Concretos 231 4 Preservando a Transcendência Divina Enquanto se Evita a Teologia Negativa 232 41 Proposta Um Identidade de Predicados Sem Garantia de Identidade de Propriedades 234 42 Proposta Dois Perfeito como um Adjetivo Alienans 235 43 O passo Misteriano de Dolezal 237 44 A Metafísica Quântica de Stump 240 45 Hasker versus Dolezal e Stump 241 5 A Defesa Por Meio do Fazedor de Verdade 243 6 É a Simplicidade Divina Compatível com a Liberdade das Criaturas e o Conhecimento Contingente de Deus 244 Referência bibliográfica 248 Outros recursos da internet 252 VI Ateísmo e Agnosticismo 253 1 Definições de Ateísmo 254 2 Definições de agnosticismo 258 13 3 Ateísmo global versus ateísmos locais 262 4 Um argumento em defesa do agnosticismo 266 5 Um argumento em defesa do ateísmo global 269 6 Dois argumentos a favor do ateísmo local 271 61 Como argumentar em defesa do ateísmo local 271 62 O argumento da baixa probabilidade antecedente 273 63 O argumento da evidência decisiva 278 7 Um argumento contrário ao agnosticismo 284 Referência bibliográfica 287 VII A liberdade divina 290 1 A Correspondência LeibnizClarke e o Princípio da Razão Suficiente 291 2 O problema de Leibniz com a liberdade divina a necessidade de Deus escolher o que é melhor 295 3 O problema de Clarke com a liberdade divina o poder de escolher de outra forma é requerido pela liberdade 302 4 Deus pode ser livre no tocante a causar a sua própria natureza 311 5 Alternativas à criação do melhor mundo possível 316 Referência bibliográfica 324 Sobre o editor tradutor e revisor 328 Sobre os tradutores e revisores 328 SOBRE A SÉRIE INVESTIGAÇÃO FILOSÓFICA A Série Investigação Filosófica é uma coleção de livros de traduções de verbetes da Enciclopédia de Filosofia de Stanford Stanford Encyclopedia of Philosophy que se intenciona a servir tanto como material didático para os professores das diferentes subáreas e níveis da Filosofia quanto como material de estudo para a pesquisa e para concursos da área Nós professores sabemos o quão difícil é encontrar bons materiais em português para indicarmos aos estudantes e há uma certa deficiência na graduação brasileira de Filosofia principalmente em localizações menos favorecidas em relação ao conhecimento de outras línguas como o inglês e o francês Sendo assim tentamos suprir essa deficiência introduzindo essas traduções ao público de Língua Portuguesa sem nenhuma finalidade comercial meramente pela glória da Filosofia Aproveitamos para agradecer a John Templeton Foundation por financiar a publicação de vários dos livros de nossa série incluindo este e eximila de quaisquer opiniões aqui contidas as quais são de responsabilidade de seus devidos autores This publication was made possibile through a support of a grant from John Templeton Foundation The opinions expressed in this publication are those of the authors and do not necessarily reflect the views of the John Templeton Foundation Essas traduções foram todas realizadas por filósofos ou por estudantes de filosofia supervisionados além de posteriormente terem sido revisadas por especialistas nas respectivas áreas Todas as traduções dos verbetes foram autorizadas pelo querido Prof Dr Edward Zalta editor da Enciclopédia de Filosofia de Stanford razão pela qual o agradecemos imensamente Sua disposição em contribuir para a ciência brinda os países de Língua Portuguesa com um material filosófico de excelência disponibilizado gratuitamente no site da Editora da Universidade Federal de Pelotas UFPel assim contribuindo para nosso maior princípio a ideia de transmissão de conhecimento livre além de também corroborar nossa intenção a de promover o desenvolvimento da Filosofia em Língua Portuguesa e seu ensino no país Aproveitamos o ensejo para agradecer também ao editor da 15 UFPel na figura do Prof Dr Juliano do Carmo que apoiou nosso projeto desde o início Agradecemos ainda a todos os organizadores tradutores e revisores que participam de nosso projeto Sem a dedicação voluntária desses colaboradores nosso trabalho não teria sido possível Esperamos com o início desta Série abrir as portas para o crescimento desse projeto de tradução e trabalharmos em conjunto pelo crescimento da Filosofia em Língua Portuguesa Prof Dr Rodrigo Reis Lastra Cid IFUNIFAP Prof Dr Juliano Santos do Carmo NEFILUFPEL Editores da Série Investigação Filosófica INTRODUÇÃO O leitor tem agora em suas mãos o volume desta série voltado especificamente para a filosofia da religião Contudo é o caso de notar que como termo filosofia da religião está longe de ter uma denotação pacificada nos meios acadêmicos Ao menos três acepções distintas clamam por atenção nos debates acerca do tema sendo elas A A filosofia acerca do fenômeno religioso como realidade humana e social Quer sejam verdadeiras quer não as assertivas contidas no discurso religioso poucos ousariam negar a extrema importância da religião e da religiosidade na vida das mais variadas comunidades humanas Neste âmbito apresentam se alguns problemas A título de exemplo menciono I A religião exerce uma influência salutar sobre a vida humana Ou teria um efeito deletério II A religião é necessária para a moralidade e a coesão social III Quais devem ser as posições relativas e as relações mútuas das autoridades religiosas e das autoridades seculares IV Quais são as relações entre o fenômeno religioso e a psicologia humana a antropologia e as relações de poder Os autores em filosofia da religião entendida neste sentido foram por vezes indivíduos profundamente religiosos Mas é digno de nota o papel desempenhado pelos chamados mestres da suspeita Marx Nietzsche e Freud nos quais os trabalhos se revestem de importância fundamental para algumas das questões elencadas acima Um notável exemplo contemporâneo de filosofia da religião entendida sobre este prima é Suspicion Faith de Merold Wesphal 17 B Teologia filosófica Se tomarmos a priori como verdadeiras certas assertivas de teor religioso com base no que se julga ser o conteúdo da Revelação na tradição ou nos dogmas promulgado por autoridades religiosas o que a reflexão filosófica pode acrescentar à nossa compreensão do que de partida havíamos tomado por verdadeiro Esse é o tipo de reflexão filosófica que toma de antemão como verdadeiras premissas que em si mesmas não são filosóficas Exemplos I Se julgamos inquestionáveis as assertivas dogmáticas segundo as quais Deus é perfeitamente bom onipotente e onisciente como pode ser explicado o fato de que Deus ao que parece ao menos consentiu que houvesse o mal no mundo aqui entendido como o sofrimento humano imerecido II Aceita a presciência divina como a podemos conciliar com a crença de que somos livres em estrito sentido libertário ou seja que poderíamos agir ou ter agido de forma diversa III Jesus Cristo morreu na cruz para a nossa salvação Como isso se dá IV Admitindo que existam o céu e o inferno o que exatamente são e como se justificam C A filosofia acerca dos entes atitudes e eventos referidos no discurso religioso Essa abordagem contempla algumas inquirições verdadeiramente fundamentais Vêse pelos itens abaixo elencadas que as questões não pressupõem a existência de verdades religiosas a que tenhamos acesso prévio por via da revelação ou do dogma I Deus existe É possível provar a sua existência Em caso afirmativo podemos estabelecer alguma coisa a respeito da sua natureza por meio da reflexão filosófica 18 II A crença em Deus é racionalmente justificada Essa questão ganha uma premência especial caso sejamos pessimistas quanto à possibilidade de provar a existência de Deus III As experiências místicas apontam para alguma realidade sobrenatural e divina IV Existem milagres V Qual pode ser a relação entre Deus e a moralidade Atentese para o fato de que a distinção acima não é estanque Assim por exemplo o problema do mal tanto pode ser abordado como um problema de teologia filosófica por alguém que tenha como inquestionáveis a priori certas premissas quanto pode ser por alguém que se ocupe da filosofia da religião no sentido mais aberto apontado aqui Com efeito o problema é muito comumente utilizado para fornecer elementos argumentativos àqueles pensadores que negam a existência de Deus Prestados estes esclarecimentos os leitores logo que verão que é neste terceiro terreno da reflexão filosófica que se aprofundam os verbetes traduzidos para este volume O editor do volume e todos os participantes desta empreitada lhes desejam uma frutífera e rica leitura Rodrigo Jungmann TALIAFERRO C Philosophy of Religion In ZALTA E N ed Stanford Encyclopedia of Philosophy Winter Edition Stanford CA The Metaphysics Research Lab 2021 Disponível em httpsplatostanfordeduarchiveswin2021entriesphilosophyreligion Acesso em 25 abr 2021 The following is the translation of the entry on Philosophy of Religion by Charles Taliaferro in the Stanford Encyclopedia of Philosophy The translation follows the version of the entry in the SEPs archives at httpsplatostanfordeduarchiveswin2021entriesphilosophy religion This translated version may differ from the current version of the entry which may have been updated since the time of this translation The current version is located at a httpplatostanfordeduentries philosophyreligion Wed like to thank the Editors of the Stanford Encyclopedia of Philosophy mainly Prof Dr Edward Zalta for granting permission to translate and to publish this entry Finally we would like to thank to John Templeton Foundation for financially supporting this project Filosofia da Religião Autoria Charles Taliaferro Tradução Rodrigo Jungmann de Castro Revisão Gaspar Rodrigues de Souza Neto A filosofia da religião é o exame filosófico dos temas e conceitos presentes nas tradições religiosas bem como a empreitada filosófica mais ampla de reflexão sobre matérias de significação religiosa incluindo a natureza da própria religião conceitos alternativos de Deus ou da realidade última e a importância religiosa de características gerais do cosmos como as leis da natureza o surgimento da consciência e de eventos históricos por exemplo o Terremoto de Lisboa em 1755 o Holocausto A filosofia da religião também inclui a investigação e avaliação de visões de mundo tais como o naturalismo secular que são alternativas às visões religiosas de mundo A filosofia da religião abarca envolve todas as principais áreas 20 da filosofia a metafísica a epistemologia a teoria do valor incluindo a teoria moral e a ética aplicada a filosofia da linguagem a ciência a história a arte e assim por diante A Seção 1 oferece uma visão panorâmica do campo e sua significação estando as seções subsequentes voltadas para uma cobertura do que aconteceu na área desde meados do Século XX Essas seções abordam a filosofia da religião tal como é praticada principalmente mas não exclusivamente em departamentos de filosofia e de estudos religiosos que se situam em sentido amplo na tradição analítica O verbete termina enfatizando a crescente amplitude da área à medida que mais tradições fora do âmbito das fés abraâmicas o judaísmo o cristianismo e o islã vêm se tornando o foco de importantes trabalhos filosóficos 1 A área e sua significação Idealmente um guia da natureza e história da filosofia da religião começaria com uma análise ou definição de religião Infelizmente não há um consenso atual quanto à identificação precisa das condições necessárias e suficientes do que pode contar como religião Portanto faltanos presentemente um critério decisivo que possibilitaria juízos claros no que toca a certos movimentos contarem ou não como religiões por exemplo a cientologia ou os cultos das ilhas do Pacífico Mas embora o consenso nos pequenos detalhes nos escape a seguinte descrição geral do que conta como religião pode ser útil Uma religião envolve um corpo comunitário e transmissível de ensinamentos e práticas prescritas em torno de uma realidade última e sagrada ou um estado de ser que demanda reverência ou assombro um tal corpo que orienta os seus praticantes no que descreve como uma relação salvífica iluminadora ou emancipatória com esta realidade por meio de uma vida de transformação pessoal de oração meditação ritualizada eou práticas morais como o arrependimento e a regeneração pessoal Esta é uma definição ligeiramente modificada daquela presente em Religião In TALIAFERRO MARTY Dictionary of Philosophy of Religion 2010 p 196 197 2018 p 240 21 Esta definição não é afetada por algumas das dificuldades óbvias tais como a de só ter na conta de religiosa uma tradição que inclua a crença em Deus ou em deuses visto que algumas religiões reconhecidas tais como o budismo em suas formas principais não incluem uma crença em Deus ou em deuses Embora controversa a definição fornece alguma razão para pensar que a cientologia ou os cultos Cargo são protorreligiosos na medida em que esses movimentos não possuem um robusto corpo de crenças comunitário e transmissível ao passo que satisfazem as outras condições para serem religiões Assim embora ambos os exemplos não sejam decisivamente excluídos das religiões talvez seja compreensível que na Alemanha a cientologia é rotulada como uma seita ao passo que na França é classificada como um culto Para uma discussão de outras definições de religião consulte Taliaferro 2009 cap 1 e para uma análise recente distinta confira Graham Oppy 2018 cap 3 Abaixo na seção 4 Religião e ciência retomase o tópico da definição da religião Mas em vez de devotar mais espaço para definições no princípio um procedimento pragmático será adotado para os propósitos deste verbete será tomado como pressuposto que todas aquelas tradições amplamente reconhecidas hoje como religiões são de fato religiões Será tomado como pressuposto então que as religiões incluem no mínimo o hinduísmo o budismo o taoismo o confucionismo o judaísmo o cristianismo e aquelas tradições que se lhes assemelham Esta forma de delimitar um domínio é às vezes descrita como um caso de emprego de definição por exemplos definição ostensiva ou como um apelo a semelhanças de família entre coisas Será pressuposto que as concepções grecoromanas dos deuses dos rituais da vida após a morte da alma são em sentido amplo religiosas ou religiosamente significativas Dado o uso pragmático e aberto do termo religião evitase começar nossa investigação preso a uma cama de Procrusto Dada a perspectiva ampla acima apresentada do que conta como religião as raízes do que chamamos de filosofia da religião remontam às formas mais antigas de filosofia Desde o começo filósofos na Ásia no Oriente Próximo e no Oriente Médio na África do Norte e na Europa refletiram sobre os deuses ou Deus sobre os deveres para com o divino a origem e a natureza do cosmos a vida após a morte a natureza da felicidade e das obrigações bem como sobre se existem deveres sagrados para com a família ou governantes e assim por diante Assim como se deu com aquelas que hoje viriam a ser consideradas subáreas da filosofia como a filosofia da ciência e a filosofia da arte os filósofos 22 no mundo antigo se voltaram para temas de significação religiosa assim como tomaram a si a reflexão sobre o que chamamos de ciência e de arte no âmbito de sua prática geral da filosofia Embora de tempos em tempos na era medieval alguns filósofos judeus cristãos e islâmicos tenham buscado traçar uma linha para separar a filosofia da teologia ou da religião o papel evidente da filosofia da religião como uma área distintiva da filosofia não parece ser aparente até meados do Século XX Podese construir no entanto uma argumentação para mostrar que há alguns elementos que sugerem o surgimento da filosofia da religião no movimento filosófico do Século XVII conhecido como Platonismo de Cambridge Ralph Cudworth 1617 1688 Henry More 16141687 e outros integrantes deste movimento foram os primeiros filósofos a praticar a filosofia em inglês introduziram no inglês muitos dos termos que são hoje frequentemente empregados na filosofia da religião incluindo o termo filosofia da religião bem como teísmo consciência e materialismo Os plantonistas de Cambridge forneceram as primeiras versões inglesas dos argumentos cosmológico ontológico e teleológico reflexões sobre a relação entre fé e razão e uma argumentação em favor da tolerância com religiões diferentes Enquanto os plantonistas de Cambridge foram os primeiros praticantes explícitos da filosofia da religião de um modo geral seus contemporâneos e sucessores abordaram a religião como parte de seu trabalho mais geral Há razões portanto para crer que a filosofia da religião emergiu apenas gradualmente como uma subárea da filosofia em meados do Século XX Para ver uma abordagem que sugere uma datação mais precoce confira a ênfase dada por James Collins a Hume Kant e Hegel em The Emergence of Philosophy of Religion de 1967 Hoje em dia a filosofia da religião é uma das áreas mais vibrantes da filosofia Artigos em filosofia da religião aparecem em praticamente todos os principais periódicos filosóficos ao passo que alguns periódicos tais como o International Journal for Philosophy of Religion Religious Studies Sophia Faith and Philosophy entre outros são especialmente dedicados à filosofia da religião A filosofia da religião está em evidência em encontros institucionais de filósofos tais como os encontros da American Philosophical Association e da Royal Society of Philosophy Existem sociedades dedicadas à área como a Society for Philosophy of Religion EUA e a British Society for Philosophy of Religion sendo o campo apoiado por variados centros tais como o Center for Philosophy of Religion at the University of Notre Dame o Rutgers Center for Philosophy of Religion o Centre for the Philosophy of Religion at Glasgow University The John Hick Center for Philosophy of Religion at the University of Birmingham e outros lugares tais como a University of Roehampton 23 1 NT O tradutor optou por manter referências sem tradução para facilitar o trabalho de quem queira se familiarizar com essas instituições por meio de ferramentas de busca online e a Nottingham University1 A Oxford University Press publicou em 2009 em cinco volumes o The History of Western Philosophy of Religion que contaram com o trabalho de mais de 100 colaboradores OPPY TRAKAKIS 2009 e a também em cinco volumes Wiley Blackwell Encyclopedia of Philosophy of Religion com mais de 350 colaboradores do mundo todo cujo lançamento aconteceu em novembro de 2021 O que explica essa efervescência Consideremse quatro razões possíveis A primeira delas é o caráter religioso da população mundial A maior parte da pesquisa social a respeito da religião apoia a visão de que a maioria da população mundial ou faz parte de uma religião ou é influenciada por uma religião vide Pew Research Center online Engajarse com a filosofia da religião é por conseguinte engajarse com um tema que afeta pessoas reais em vez de apenas tocar de forma tangencial questões de interesse social corrente Talvez uma das razões pelas quais a filosofia da religião é frequentemente o primeiro tópico em livrostextos de introdução à filosofia seja a de que esta é uma forma de propor aos leitores que o estudo filosófico pode ter impacto sobre aquilo que um grande número de pessoas de fato pensam sobre a vida e o que possui valor O papel da filosofia da religião em envolverse com as crenças e as dúvidas da vida real a respeito da religião talvez também seja posto em evidência pela popularidade atual de livros favoráveis e contrários ao teísmo no Reino Unido e nos Estados Unidos Um outro aspecto das populações religiosas que pode motivar a filosofia da religião consiste no fato de que a filosofia é um instrumento que pode ser utilizado quando as pessoas comparam as diferentes tradições religiosas A filosofia da religião pode ter um papel a desempenhar ao ajudar as pessoas a entender e avaliar as diferentes tradições religiosas e suas alternativas A segunda está ligada ao fato de que a filosofia da religião pode ser popular como área em razão da sobreposição de interesses nas tradições religiosas e filosóficas O pensamento religioso e o pensamento filosófico levantam muitas das mesmas questões e possibilidades fascinantes a respeito da natureza da realidade dos limites da razão do significado da vida e assim por diante Há boas razões para crer em Deus O que são o bem e o mal Qual é a natureza e o escopo do conhecimento humano Em Hinduism A Contemporary Philosophical Investigation 24 2018 Shyam Ranganathan argumenta que no pensamento asiático a filosofia e a religião são praticamente inseparáveis de tal sorte que o interesse por uma fornece apoio ao interesse pela outra Em terceiro lugar o estudo da história da filosofia fornece uma amplitude de razões para adquirir alguma expertise em filosofia da religião No Ocidente a maioria dos filósofos antigos medievais e modernos produziram reflexões filosóficas sobre matérias de significação religiosa Em meio a esses filósofos seria impossível engajarse de maneira abrangente com seu trabalho sem atentar para o seu trabalho filosófico sobre as crenças religiosas René Descartes 15961650 Thomas Hobbes 15881679 Anne Conway 16311679 Baruch Spinoza 16321677 Margaret Cavendish 16231673 Gottfried Leibniz 16461716 John Locke 16321704 George Berkeley 16851753 David Hume 17111776 Immanuel Kant 1724 1804 e G W Hegel 17701831 a lista é parcial E no Século XX devese tomar nota do importante trabalho filosófico feito por filósofos continentais acerca de matérias de significação filosófica Martin Heidegger 18891976 JeanPaul Sartre 19051980 Simone de Beauvoir 19081986 Albert Camus 19131960 Gabriel Marcel 18891973 Franz Rosenzweig 18861929 Martin Buber 18781956 Emmanuel Levinas 19061995 Simone Weil 19091943 e mais recentemente Jacques Derrida 19302004 Michel Foucault 19261984 e Luce Iragaray 1930 Também pode ser encontrada evidência de filósofos levando a sério as questões religiosas quando pensadores que normalmente não seriam classificados como filósofos da religião trataram da religião o que inclui A N Whitehead 18611947 Bertrand Russell 18721970 G E Moore 18731958 John Rawls 19212002 Bernard Williams 19292003 Hilary Putnam 19262016 Derek Parfitt 1942 2017 Thomas Nagel 1937 Jürgen Habermas 1929 e outros Nas filosofias chinesa e indiana há um desafio ainda maior do que no Ocidente em distinguir as importantes fontes filosóficas e religiosas da filosofia da religião Seria difícil classificar Nagarjuna 150250 dC ou Adi Shankara 788820 dC como pensadores exclusivamente filosóficos ou religiosos Seus trabalhos parecem igualmente importantes para a filosofia e para a religião vide RANGANATHAN 2018 E por fim o quarto é que um estudo abrangente da teologia ou estudos religiosos também fornece boas razões para a aquisição de expertise em filosofia da religião Como se acabou de observar a filosofia e o pensamento filosófico asiáticos estão entrelaçados e assim as questões tratadas na filosofia da religião parecem relevantes o que são o espaço e o tempo Existem muitas coisas ou uma realidade Poderia ser uma ilusão o nosso mundo observável empiricamente O 25 mundo poderia ser regido pelo karma A reencarnação é possível Em termos usados no Ocidente há razões para pensar que mesmo os textos sagrados da fé abraâmica incluem fortes elementos filosóficos No judaísmo Jó é talvez o texto mais filosoficamente explícito da Bíblia Hebraica A tradição sapiencial de cada fé abraâmica pode refletir modos de pensar filosóficos mais amplos o Novo Testamento cristão parece incluir ou abordar temas platônicos o Lógos a relação entre corpo e alma Boa parte do pensamento islâmico inclui uma reflexão crítica sobre Platão Aristóteles Plotino bem como um trabalho filosófico independente Voltemonos agora para a maneira pela qual os filósofos abordaram o significado das crenças religiosas 2 O significado das crenças religiosas Antes do Século XX um volume substancial da reflexão filosófica mas não toda sobre questões de significação religiosa foi realista Ou seja temse sustentado frequentemente que as crenças religiosas são verdadeiras ou falsas Xenófanes e outros pensadores présocráticos Sócrates Platão Aristóteles os epicuristas os estoicos Fílon Plotino todos divergiam em suas crenças ou especulações sobre o divino mas eles sustentavam por exemplo que ou havia uma realidade divina ou não havia Filósofos medievais e os filósofos modernos judeus cristãos e muçulmanos divergiam em termos de sua avaliação da fé e da razão Também se defrontaram com importantes questões filosóficas acerca da autoridade das alegações quanto à revelação presentes na Bíblia Hebraica na Bíblia Cristã e no Corão Na filosofia da religião asiática algumas religiões não contêm alegações fundadas na revelação tal como é o caso no budismo e no confucionismo mas a tradição Hindu fez os filósofos se defrontarem com os Vedas e os Upanixades Mas de modo geral os filósofos no Ocidente e no Oriente pensavam que havia verdades quanto à existência de Deus da alma da vida após a morte e daquilo que há de sagrado quer sejam entendidos pelos seres humanos ou não O realismo de algum tipo é tão difundido que o grande historiador da filosofia Richard Popkin 19232005 certa vez definiu a filosofia como a tentativa de dar uma explicação daquilo que é verdadeiro e daquilo que é importante POPKIN 1999 p 1 Importantes filósofos no Ocidente tais como Immanuel Kant 1724 1804 e Friedrich Nietzsche 18441900 entre outros contestaram as concepções realistas clássicas da verdade e da metafísica a ontologia ou a teoria do que existe 26 mas o Século XX testemunhou dois movimentos especialmente vigorosos que contestaram o realismo o positivismo lógico e a filosofia da religião inspirada por Wittgenstein Antes de abordar estes dois movimentos tomemos nota de algumas das nuances na reflexão filosófica contida no tratamento da linguagem religiosa Muitos filósofos teístas e seus críticos sustentam que a linguagem a respeito de Deus pode ser empregada de modo unívoco analógico ou equívoco Um termo é usado univocamente a respeito de Deus e dos seres humanos quando tem o mesmo sentido Poderseia argumentar que o termo conhecer é aplicado univocamente a Deus nas alegações Deus conhece você e Você conhece Londres muito embora sejam radicalmente distintas as maneiras pelas quais Deus conhece você e você conhece Londres Nos termos da última diferença apresentada os filósofos às vezes distinguem o que é atribuído a alguma coisa do modo em que algum estado tal como o conhecimento se torna real Termos são utilizados de forma analógica quando existe alguma semelhança entre o que está sendo atribuído por exemplo quando se diz que duas pessoas humanas se amam e Deus ama o mundo o termo amor pode ser usado de forma analógica quando há alguma semelhança entre esses amores Termos são usados de forma equívoca quando o significado é diferente como na afirmação de que Adão conheceu Eva que na Bíblia do Rei James significava que Adão e Eva tiveram relações sexuais e Deus conhece o mundo embora alguns dos deuses homéricos tenham mantido relações sexuais com seres humanos isso não fazia parte das cosmovisões teístas O trabalho teológico que enfatiza a nossa capacidade de formar um conceito positivo do divino foi chamado de a via positiva ou teologia catofática Por outro lado aqueles que enfatizam a incognoscibilidade de Deus abraçam a via negativa ou teologia apofática Maimônides 11351204 foi um grande proponente da via negativa favorecendo a visão segundo a qual conhecemos Deus principalmente por meio do que Deus não é Deus não é material não é mau não é ignorante e assim por diante Enquanto alguns mas não todos os filósofos da religião na tradição continental se alinharam com a teologia apofática tais como Levinas que era um nãoteísta e JeanLuc Marion 1946 um volume substancial da filosofia da religião de orientação analítica mas não toda tendeu a adotar a via positiva Um dos desafios que se apresentam para a teologia apofática está no fato de que ela parece fazer da filosofia sobre Deus algo remoto de práticas religiosas como a oração a adoração a confiança no poder e na bondade de Deus as peregrinações e a ética religiosa De acordo com Karen Armstrong alguns dos maiores teólogos de fés abraâmicas sustentavam que Deus não é bom divino poderoso ou inteligente em 27 nenhum sentido que possamos compreender Não poderíamos sequer dizer que Deus existe porque o nosso conceito de existência é limitado demais Alguns dos sábios preferia dizer que Deus é Nada porque Deus não é apenas como um outro ser Para esses teólogos algumas de nossas ideias modernas a respeito de Deus teriam parecido com a idolatria ARMSTRONG 2009 p X Uma contestação prima facie desta posição consiste na dificuldade de se acreditar que praticantes de uma religião pudessem orar adorar ou confiar em um ser que fosse de todo inescrutável ou em um ser que não possamos entender de nenhum modo Para uma filosofia de Deus calcada na via positiva que busca valorizar a força da teologia apofática confira Competing conceptions of God the personal God versus the God beyond being de Mikael Stenmark 2015 Voltemonos agora para dois proeminentes movimentos filosóficos que contestaram a filosofia realista sobre Deus 21 O Positivismo Positivismo é um termo introduzido por Auguste Comte 17981857 um filósofo francês que defendia a primazia das ciências naturais e sociais sobre a prática filosófica da metafísica O termo positivismo foi usado posteriormente às vezes ampliado para Positivismo Lógico por A J Ayer por um grupo de filósofos que se reuniam na Áustria chamado O círculo de Viena de 1922 a 1938 Este grupo que incluía Moritz Schlick e Max Planck propugnava uma explanação empírica do significado de acordo com a qual para que um proposição ser significativa ela precisava ser ou uma afirmação conceitual ou formal em matemática ou ser a respeito de definições analíticas triângulos têm três lados ou sobre matérias que podem ser objeto de verificação ou falsificação empíricas Alegações ostensivamente factuais que não façam nenhuma diferença em termos de nossa experiência empírica real ou possível são desprovidas de sentido Um filósofo britânico que frequentou o Círculo de Viena A J Ayer popularizou este critério de significado em seu livro de 1936 Language Truth and Logic Nele Ayer argumento que alegações religiosas assim como a sua negação careciam de conteúdo cognitivo A seu juízo o teísmo e também o ateísmo e o agnosticismo eram bobagens porque diziam respeito à realidade ou irrealidade ou incognoscibilidade daquilo que não faz nenhuma diferença para a nossa experiência empírica Como alguém poderia confirmar ou negar empiricamente que exista um Deus incorpóreo e invisível ou que Krishna é 28 um avatar de Vishnu De uma maneira que se tornou notória Antony Flew empregou essa estratégia na sua equiparação do Deus do teísmo a um crença de que exista um jardineiro indetectável e invisível que não podia ser ouvido ou cheirado ou descoberto empiricamente de alguma outra forma FLEW 1955 Além de rejeitar como desprovidas de significado as crenças religiosas tradicionais Ayer e outros positivistas lógicos rejeitavam a falta de sentido das afirmações morais A seu juízo afirmações morais ou éticas davam expressão a sentimentos pessoais e não a valores que possuam uma realidade independente dos sentimentos pessoais A crítica do positivismo lógico à religião não está morta Ele pode ser vista em ação em God in the Age of Science A Critique of Religious Reasons 2012 De toda sorte o critério de significado propugnado pelo positivismo lógico deparouse com uma série de objeções vide COPLESTON 1960 TALIAFERRO 2005b Consideremse cinco objeções que contribuíram para o recuo do positivismo lógico de sua posição de domínio Primeiro lançouse a objeção de que o próprio positivismo lógico se autorrefuta Seria a afirmação que contém o critério de significado preposições são significativas se e somente se dizem respeito a relações de ideias ou a matérias que estejam sujeitas à verificação ou à falsificação empíricas por si mesma sujeita à verificação ou à falsificação empíricas Pôdese argumentar que não No melhor dos casos o critério positivista de significado é uma recomendação acerca do que pode contar como significativo Segundo argumentouse que existem afirmações significativas a respeito do mundo que não estão sujeitas a uma confirmação ou negação direta ou indireta Candidatos plausíveis para preencher essa categoria incluem afirmações a respeito da origem do cosmos ou de maneira mais comezinha os estados mentais de outras pessoas ou de animais nãohumanos vide VAN CLEVE 1999 TALIAFERRO 1994 Terceiro a limitação da experiência humana ao que é compreendido de forma estreita como empírico pareceu a muitos filósofos algo arbitrário ou caprichoso C D Broad e outros defenderam uma compreensão mais ampla da experiência para dar espaço à possibilidade de ser significativa a experiência moral pôdese argumentar que é possível conhecer por experiência o erro de um ato como ocorre quando uma pessoa inocente se sente violada Quarto a rejeição por Ayer da possibilidade de ser significativa a ética pareceu militar contra a sua epistemologia ou explicação normativa das crenças pois ele interpretou o conhecimento empírico em termos do direito a ter certas crenças Se é significativo falar do direito a ter crenças por que não seria significativo 29 nos referirmos a direitos morais tais como o direito de não sermos torturados E se estivermos contemplando um conceito mais amplo do que pode ser objeto de experiência na tradição da fenomenologia que inclui a análise das aparências por que excluir como uma questão de princípio a experiência do divino ou a do sagrado Quinto e provavelmente o mais importante em termos de história das ideias o seminal filósofo da ciência Carl Hempel 19051997 sustentou que o projeto do positivismo lógico era demasiado limitado HEMPEL 1950 Era indiferente à empreitada mais ampla da investigação científica que é apropriadamente conduzida não no plano tático do escrutínio de alegações específicas sobre a experiência empírica mas em termos de uma teoria ou visão de mundo gerais e coerentes De acordo com Hempel devemos nos ocupar da investigação empírica mas vêla como estando definida por uma compreensão teórica geral da realidade e das leis da natureza Tal não era ipso facto uma posição favorável à significação da crença religiosa mas a crítica de Hempel ao positivismo removeu sua barreira para explicações metafísicas gerais da realidade fossem tais explicações teístas panteístas grosso modo Deus é tudo naturalistas e assim por diante Ademais a crítica positivista do que os positivistas chamavam de metafísica foi atacada por ser tida na conta de confusa visto que alguma metafísica estava implícita em suas alegações a respeito da experiência empírica confira o clássico habilmente intitulado The Metaphysics of Logical Positivism 1954 de Gustav Bergamnn 19061987 Voltemonos agora para Wittgenstein 18891951 e a filosofia da religião que o seu trabalho inspirou 22 A filosofia da religião de inspiração wittgensteiniana O trabalho inicial de Wittgenstein foi interpretado por alguns membros do Círculo de Viena como simpático ao seu empirismo mas eles ficaram surpresos quando ele visitou o Círculo e em vez de discutir o seu Tractatus ele lhes recitou a poesia de Rabindranath Tagore 18611941 o místico bengalês vide TALIAFERRO 2005b cap 8 Seja como for o trabalho posterior de Wittgenstein que não era simpático ao seu empirismo foi especialmente influente para a filosofia e a teologia praticadas depois da Segunda Guerra Mundial e será o foco aqui Nas Investigações Filosóficas publicadas postumamente em 1953 e em muitas outras obras incluindo a publicação de notas tomadas pelos seus estudantes em suas aulas Wittgenstein se opunha ao que ele chamava de teoria figurativa 30 do significado Segundo essa concepção as afirmações são verdadeiras ou falsas na dependência de a realidade corresponder ou não à figura expressa pelas afirmações Wittgenstein viria a ter essa concepção de significado na conta de profundamente problemática O significado da linguagem no lugar disso deve ser encontrada não na fidelidade referencial mas no seu uso daquilo a que Wittgenstein se referiu como formas de vida À medida que essa posição foi aplicada a questões religiosas D Z Phillips 1966 1976 B R Tilghman 1994 e mais recentemente Howard Wettstein 2012 buscaram deixar de parte o tradicional debate metafísico e os argumentos concernentes ao teísmo e a suas alternativas e no lugar disso enfocar a maneira pela qual a linguagem a respeito de Deus da alma da oração da ressureição da vida eterna e assim por diante funciona na vida dos praticantes religiosos Por exemplo Phillips sustentou que a prática da oração é vista sob a melhor ótica não como uma situação em que seres humanos buscam influenciar uma pessoa todopoderosa e invisível mas como uma forma de alcançar a solidariedade com outras pessoas em razão da fragilidade da vida Com isto Phillips vê a si mesmo como alguém que segue Wittgenstein ao lançar o foco não sobre que figuração da realidade parece ser a mais fiel mas nas maneiras nãoteóricas em que a religião é praticada Indagar se Deus existe não é fazer uma indagação teórica Se é algo que deve significar alguma coisa que seja é manifestar assombro acerca do louvor e da oração é se questionar se há algo em tudo isso Eis aí a razão pela qual a filosofia não pode responder à questão Deus existe seja com uma resposta afirmativa ou negativa Há um Deus embora pareça ser uma expressão vazada no modo indicativo é uma expressão de fé PHILLIPS 1976 p 181 Ao menos duas razões serviram de incentivo a esta filosofia da religião inspirada por Wittgenstein Em primeiro lugar pareceu que essa metodologia era mais fiel à prática de fazer da filosofia da religião algo verdadeiramente sobre as práticas reais das próprias pessoas religiosas Em segundo lugar em que pese ter havido uma revivescência dos argumentos filosóficos favoráveis e contrários ao teísmo e a concepções alternativas de Deus como será assinalado na seção 5 um número significativo de filósofos de meados do Século XX em diante concluíram que todos os argumentos e contraargumentos acerca das alegações metafísicas da religião nada decidem Se este for o caso a nova filosofia da religião inspirada em Wittgenstein tinha a vantagem de mudar de terreno para o que poderia ser um campo mais promissor de concordância 31 Embora essa abordagem nãorealista da religião tenha seus defensores hoje em dia especialmente no trabalho de Howard Wettstein muitos filósofos sustentaram que a vida religiosa tradicional e a contemporânea se assenta sobre o que é verdadeiramente o caso num contexto realista É difícil imaginar por que as pessoas dirigiam preces a Deus se elas literalmente pensassem que não há um Deus de tipo algum É interessante notar que talvez como herança da ênfase de Wittgenstein na prática alguns filósofos que trabalham hoje com a religião conferem uma maior proeminência ao significado da religião na vida em vez de enxergarem a crença religiosa como sendo primacialmente uma questão de avaliar uma hipótese vide COTTINGHAM 2014 3 A epistemologia reformada Segundo o prestigiado Cambridge Dictionary of Philosophy a epistemologia religiosa é um ramo da filosofia que investiga o status epistêmico das atitudes preposicionais a respeito das alegações religiosas AUDI 2015 p 925 Praticamente todas as metodologias já existentes e atuais na epistemologia foram usadas para a avaliação das alegações religiosas Alguns desses métodos foram mais de um pendor mais racionalista no sentido de que envolveram o raciocínio a partir de verdades ostensivamente autoevidentes por exemplo o princípio da razão suficiente enquanto outros foram mais calcados na experiência como o empirismo a fenomenologia a ênfase na paixão e na subjetividade a ênfase na prática tal como se encontra no pragmatismo Além disso alguns intentaram ser ahistóricos não dependentes de alegações sobre revelações na história ao passo que outros foram profundamente históricos por exemplo constituídos na revelação tal como conhecida pela pura fé ou justificados com base em evidências por meio de um apelo a milagres eou a experiência religiosa Ao longo dos últimos vinte anos tem havido uma literatura crescente sobre a natureza da fé religiosa Entre muitos filósofos na tradição analítica a fé tem sido com frequência tratada como a atitude proposicional de crença p ex a crença de que existe ou não um Deus e muito trabalho foi devotado ao exame concernente a quando uma tal crença é apoiada pela evidência e caso o seja quanta evidência e de que tipo Houve um debate famoso acerca da ética da crença determinando que tipos de crença não deveriam ser nutridos ou tolerados quando a evidência é 32 tida por insuficiente e acerca de quando questões que envolvem a fé religiosa podem ser justificadas com fundamentos pragmáticos por exemplo como uma aposta ou um risco A fé tem sido tratada filosoficamente como confiança como uma forma de esperança uma lealdade a um ideal um comprometimento e uma ação fiel com ou sem crença Para um apanhado geral confira Abraham e Aquino 2017 Já para uma defesa recente de uma fé religiosa sem crença confira Schellenberg 2017 No que segue examinase primeiro aquilo que é conhecido como evidencialismo e a teologia reformada e em seguida uma forma do que é chamado de epistemologia religiosa das volições 31 Evidencialismo epistemologia reformada e epistemologia das volições O evidencialismo é a concepção segundo a qual para que uma pessoa esteja justificada em ter uma crença tal pessoa deve ter ciência de alguma evidência a favor da crença Isto normalmente é articulado em termos de ser justificada a crença de uma pessoa dada a totalidade da evidência disponível à pessoa Segundo essa visão a crença em questão não deve ser solapada ou derrotada por outras crenças evidentes a que a pessoa adere Além disso os evidencialistas frequentemente sustentam que o grau de confiança em uma crença deveria ser proporcional à evidência O evidencialismo foi apoiado por representantes de todos os diversos pontos de vista em filosofia da religião o teísmo o ateísmo os defensores de modelos de Deus nãoteístas agnósticos Evidencialistas divergiram em termos de suas explicações para a evidência que peso deve ser dado à fenomenologia e da relação entre crenças evidentes as crenças devem ou fundacionais ou básicas ou derivadas de tais crenças fundacionais Provavelmente o evidencialista mais bem conhecido no campo da filosofia da religião a defender o teísmo é Richard Swinburne 1934 Swinburne foi e ainda é o principal defensor de uma teologia natural teísta desde o começo dos anos setenta Swinburne empregou as suas consideráveis habilidades analíticas ao argumentar a favor da tese de que o teísmo é coerente e convincente e a análise e defesa de ensinamentos cristãos específicos sobre a trindade a encarnação a ressureição de Cristo a revelação e outras coisas Os projetos de Swinburne no seio da tradição evidencialista em filosofia da religião fazem parte da grande tradição da filosofia da religião britânica dos platonistas de 33 Cambridge no século XVII passando por Joseph Butler 16821752 e William Paley 17431805 até chegar aos filósofos britânicos do século XX tais como A E Taylor 18691945 e A C Ewing 18991973 A defesa afirmativa do teísmo foi confrontada no trabalho de muitos filósofos vigorosos e mais recentemente por Ronald Hepburn 19272008 J L Mackie 19171981 Antony Flew 19232010 Richard Gale 19322015 William Rowe 19312015 Michael Martin 19322015 Graham Oppy 1960 J L Schellenberg 1959 e Paul Draper 1957 Para uma visão panorâmica de tal trabalho confira The Routledge Companion to Theism TALIAFERRO HARRISON GOETZ 2012 Houve ao menos duas linhas desenvolvidas recentemente na filosofia da religião dentro do arcabouço do evidencialismo Uma foi aquela propugnada por John Schellenberg que argumenta que se o Deus do cristianismo existisse a realidade de Deus seria muito mais evidente do que é Poderseia argumentar consoante a compreensão cristã dos valores que uma relação evidente com Deus é parte integrante do maior bem para o ser humano e que se Deus fosse amoroso Deus produziria tal bem Visto que há evidência de que Deus não torna o próprio Deus disponível a pessoas que buscam tal relação com seriedade isto é evidência de que um tal Deus não existe De acordo com esta linha de raciocínio a ausência de evidência a favor do Deus do cristianismo é uma evidência de ausência vide SCHELLENBERG 2007 HOWARDSNYDER MOSER 2001 O argumento tem aplicação para além dos valores cristãos e do teísmo e para qualquer conceito de Deus em que Deus é poderoso e bom e tal que uma relação com um tal Deus seria satisfatória e boa para as criaturas Não funcionaria com um conceito de Deus como encontramos por exemplo no trabalho de Aristóteles segundo o qual Deus não está engajado com o mundo de uma forma amorosa e providencial É frequentemente a referência a essa linha de raciocínio em termos da ocultação de Deus Outra linha interessante desenvolvida foi aquela proposta por Sandra Menssen e Thomas Sullivan Na reflexão filosófica a respeito de Deus a tendência tem sido a de dar prioridade ao que se pode chamar de teísmo simples a avaliação da plausibilidade da existência do Deus do teísmo em vez de a dar a um conceito mais específico de Deus Essa prioridade faz sentido na extensão em que a plausibilidade de uma tese geral existem mamíferos na savana será maior do que a de uma tese específica existem 12796 girafas na savana Mas Menssen e Sullivan argumentam que praticar a filosofia da religião a partir de um contexto mais particular e especialmente o cristão fornece uma base de dados mais rica para a reflexão 34 A insistência muito comum entre os filósofos de que o procedimento apropriado requer que se estabeleça a probabilidade da existência de Deus antes de testar as alegações fundadas na revelação remove uma parte enorme da base de dados relevante para uma argumentação favorável ao teísmo Pois é difícil estabelecer como provável a existência de Deus a não ser que alguma explicação possa ser dada para os males do mundo e a explicação que o cristianismo tem a oferecer é inimaginavelmente mais rica do que qualquer explicação não religiosa A explicação cristã a que temos acesso pelas escrituras é um estória de amor do amor de Deus por nós e daquilo que Deus preparou para aqueles que o amam É uma estória do valor salvífico do sacrifício os nossos sofrimentos estão entrelaçados com os de Cristo e estão incluídos nos sacrifícios adequados para a redenção do mundo sofrimentos de que Cristo desejou apropriarse Em termos da ordem em que é conduzida a investigação pode às vezes ser útil considerar posições filosóficas mais específicas por exemplo pode parecer à primeira vista que o materialismo é um caminho sem saída até que nos ocupemos com os recursos de alguma explicação materialista específica que inclua o funcionalismo mas poderseia argumentar que isto por si só não basta para compensar a primazia lógica da tese mais geral quer essa seja a do teísmo simples ou do materialismo simples Talvez a relevância da proposta de Menssen e Sullivan resida no fato de que os filósofos da religião precisam aprimorar sua avaliação crítica das posições gerais ao mesmo tempo em que levam a sério explicações mais específicas para os problemas que se apresentam por exemplo quando se trata do teísmo com a avaliação do problema do mal em termos de posições teológicas possíveis acerca da redenção tais como são apresentados na revelação ostensiva O evidencialismo tem sido contestado por diversas razões Alguns argumentam que é demasiado austero temos muitas crenças evidentes que teríamos dificuldade em justificar Em vez do evidencialismo alguns filósofos adotam uma forma de confiabilismo de acordo com o qual uma pessoa pode estar justificada em uma crença com a condição de que a crença seja produzida por meios confiáveis quer a pessoa esteja ou não ciente da evidência que justifica a crença Dois movimentos na filosofia da linguagem elaboram posições que não se alinham com a tradição evidencial tradicional a epistemologia reformada e a epistemologia das volições A epistemologia reformada foi defendida por Alvin Plantinga 1932 e Nicholas Woltersorff 1932 entre outros A epistemologia reformada é reformada no sentido de que se vale do trabalho do reformador João Calvino 15091564 que afirmou que as pessoas são criadas com um sentido direcionado a Deus sensus 35 divinitatis Conquanto tal sentido possa não estar aparente devido ao pecado ele pode estimular de forma confiável as pessoas a crer em Deus e dar suporte a uma vida de fé cristã Embora esse estímulo possa desempenhar um papel evidencial em termos da experiência ou percepção ostensiva de Deus também pode avalizar a crença cristã na ausência de evidências ou argumentos vide CLARK VANARRAGON 2011 BERGMANN 2017 PLANTINGA BERGMANN 2016 Na linguagem introduzida por Plantinga a crença em Deus pode ser tão apropriadamente básica quanto as nossas crenças comuns a respeito de outras pessoas ou do mundo O arcabouço da epistemologia reformada é condição uma vez que apresenta a tese de que se há um Deus e se Deus de fato nos criou com um sensus divinitatis que nos leva de maneira confiável a acreditar verazmente que Deus existe então tal crença é avalizada Há um certo sentido em que a epistemologia reformada apresenta mais o caráter de uma estratégia defensiva oferecendo fundamentos para pensar que a crença religiosa caso verdadeira é avalizada do que o uma provisão de uma razão positiva para que as pessoas que não têm nem creem que têm um sensus divinitatis devam abraçar a fé cristã Plantinga argumentou que ao menos uma alternativa à fé cristã o naturalismo secular é profundamente problemático quando não mesmo autorrefutador mas essa posição caso seja persuasiva foi apresentada mais como uma razão para não ser um naturalista do que como uma razão para ser um teísta Para uma versão mais forte do argumento de que o teísmo oferece uma explicação melhor para a normatividade da razão do que as alternativas confira o trabalho de Angus Menug Agents Under Fire 2004 A epistemologia reformada não é ipso facto uma forma de fideísmo O fideísmo é explícito em seu endosso da legitimidade da fé sem o suporte não apenas de evidência proposicional mas também da razão MACSWAIN 2013 De maneira contrastante a epistemologia reformada oferece uma explicação metafísica e epistemológica do aval de acordo com a qual a crença em Deus pode ser avalizada mesmo que não seja apoiada por evidências e oferece uma explicação da crença apropriadamente básica de acordo com a qual a crença básica em Deus está no mesmo patamar que as nossas crenças básicas comuns a respeito do mundo e de outras mentes que parece ser paradigmaticamente racional Todavia conquanto a epistemologia reformada não seja necessariamente fideísta partilha com o fideísmo a ideia de que uma pessoa pode ter uma crença religiosa justificada na ausência de evidência Considerese agora o que na filosofia da religião é chamado de epistemologia das volições Paul Moser argumentou sistematicamente a favor de um arcabouço 36 profundamente diferente no qual ele se bate pela tese de que se o Deus do cristianismo existe este Deus não seria evidente para questionadores que por exemplo têm a curiosidade de saber se Deus existe No entender de Moser o Deus do cristianismo só se tornaria evidente em um processo que envolveria a transformação moral e espiritual das pessoas MOSER 2017 Este processo poderia incluir pessoas que recebem e aceitam a revelação de Jesus Cristo como o agente da redenção e da santificação que chama as pessoas a uma vida radical de compaixão amorosa até o ponto de amarmos os nossos inimigos Ao se submeter voluntariamente ao amor imperioso de Deus uma pessoa nesta relação filial com Deus por meio de Cristo poderia experimentar uma mudança de caráter passando de uma atitude egocêntrica a uma disposição para servir os outros na qual o caráter da pessoa ou o seu próprio ser pode vir a servir como evidência das verdades da fé 32 A epistemologia da discordância O terreno coberto até aqui neste verbete indica uma discordância considerável a respeito da justificação epistêmica e da crença religiosa Se os experts discordam nessas questões o que deveriam pensar e fazer os nãoexperts Ou colocando a questão para os assim chamados experts se você como questionador treinado discorda no tocante às questões acima daqueles que você considera igualmente inteligentes e abertos ao impacto da evidência deveria esse fato por si só levar você a modificar ou mesmo abandonar a confiança que preserva acerca de suas próprias crenças Alguns filósofos propõem que em caso de discordância entre pares epistêmicos devese buscar algum tipo de explicação para a discordância Por exemplo há alguma razão para pensar que a evidência disponível para você e os seus pares difere ou que é concebida de modo diferente Talvez haja maneiras de explicar por exemplo por que os budistas alegam que não observam a si mesmos como eus substantivos com existência ao longo do tempo ao passo que não budistas poderiam alegar que a autoobservação fornece razões para acreditar que as pessoas são agentes substantivos e duradouros LUND 2005 O nãobudista poderia precisar de uma outra razão para preferir o seu arcabouço ao dos budistas mas deveria ao menos talvez ter encontrado uma maneira de explicar por que pessoas igualmente razoáveis chegariam a conclusões diferentes diante de evidências ostensivamente idênticas 37 Avaliar a significação da discordância a respeito da crença religiosa é muito diferente de avaliar a significação da discordância em domínios nos quais existem compreensões partilhadas mais claras da metodologia e da evidência Por exemplo se dois detetives igualmente proficientes examinam a mesma evidência de que Smith assassinou Jones sua discordância deveria com outras coisas mantendose iguais levarnos a modificar a nossa confiança ao crermos que Smith é o culpado visto que se pode presumir que os detetives usam a mesma evidência e métodos de investigação Mas ao avaliarmos as discordâncias entre os filósofos acerca por exemplo da coerência e plausibilidade do teísmo os filósofos de hoje frequentemente se valem de metodologias diferentes a fenomenologia o empirismo a análise linguística ou conceitual a psicanálise e assim por diante Mas o que acontece se uma pessoa aceita uma dada religião como sendo razoável e no entanto reconhece que questionadores igualmente razoáveis maduros e responsáveis adotam uma religião diferente e incompatível com a sua própria e que todos eles partilham uma metodologia filosófica semelhante Esta situação não é uma experiência de pensamento abstrata No diálogo entre cristãos e muçulmanos os filósofos frequentemente partilham uma herança filosófica comum vinda de Platão Aristóteles Plotino e um vasto espectro de concepções compartilhadas a respeito da perfeição de DeusAlá Uma opção seria adotar um pluralismo epistemológico de acordo com o qual as pessoas podem estar igualmente bem justificadas ao afirmarem crenças incompatíveis Esta opção aparentemente fornece algumas razões para a humildade epistêmica AUDI 2011 WARD 2002 2014 2017 Em um ensaio com o título apropriado Why religious pluralism is not an evil and is in some respects quite good 2018 Robert McKim apresenta razões pelas quais de um ponto de vista filosófico pode ser uma coisa boa encorajar e não apenas reconhecer cosmovisões de razoabilidade ostensivamente idêntica Para um apanhado do atual estado do debate em filosofia da religião sobre o tópico da discordância religiosa confira Disagreement and the Epistemology of Theology KING KELLY 2017 No fim desta seção também vale a pena anotar duas observações sobre as discordâncias epistêmicas Primeiro as nossas crenças e a nossa confiança na verdade das nossas crenças podem não estar sob o nosso controle voluntário Talvez você forme uma crença na verdade do budismo com base no que acredita ser evidência decisiva Mesmo que você esteja convencido de que pessoas igualmente inteligentes não chegam a uma conclusão similar isso por se só pode não o encher de vigor suficiente para negar o que a você parece ser decisivo Em segundo lugar se a discordância entre os experts lhe dá uma razão para abandonar uma posição 38 então o próprio princípio de que você está se valendo devese abandonar uma crença de que X se os experts discordam a respeito de X seria solapado pois os experts discordam quanto ao que se deve fazer quando os experts discordam Para apanhados e explorações do trabalho filosófico relevante numa ambientação pluralista consulte New Models of Religious Undestanding 2017 editado por Fiona Ellis e Renewing Philosophy of Religion 2017 editado por Paul Draper e J L Schellenberg 4 A religião e a ciência A relação entre a religião e a ciência tem sido um tópico importante na filosofia da religião no Século XX e parece muito importante hoje Esta seção começa com considerações acerca da declaração da Academia Nacional das Ciências e o Instituto de Medicina agora a Academia Nacional de Medicina sobre a relação entre a ciência e a religião A ciência e a religião estão baseadas em aspectos diferentes da experiência humana Na ciência as explicações devem ser baseadas na evidência extraída do exame do mundo natural Observações ou experimentos baseados na ciência que entram em conflito com uma explicação devem acabar por conduzir a uma modificação ou mesmo ao abandono daquela explicação A fé religiosa em contraste não depende apenas da evidência empírica não é necessariamente modificado diante de evidências conflitantes e tipicamente inclui forças ou entidades sobrenaturais Por não serem parte da natureza as entidades sobrenaturais não podem ser investigadas pela ciência Neste sentido a ciência e a religião são separadas e se voltam para aspectos da compreensão humana de maneiras distintas Tentativas de jogar a ciência contra a religião criam controvérsia onde nenhuma controvérsia precisa existir NASIM 2008 p 12 Esta visão de ciência e religião parece promissora em vários frontes Se a afirmação vista acima sobre a ciência e a religião for aceita então parece assegurar que haja um conflito mínimo entre dois domínios daquilo a que as Academias se referem como experiência humana As Academias Nacionais parecem de fato estar corretas ao deixarem pressuposto que os elementos centrais de muitas religiões não admitem investigações científicas diretas nem se prendem somente à evidência empírica Nem Deus nem Alá nem Brahman o divino tal como concebido no judaísmo no cristianismo no Islã e no hinduísmo é um objeto ou processo físico ou material Parece então que o divino ou o sagrado e muitos outros elementos 39 das religiões do mundo a meditação a oração o pecado e o perdão a liberação dos desejos só podem ser investigados cientificamente de uma maneira indireta Assim um neurologista pode produzir estudos detalhados dos cérebros de monges e freiras quando oram e meditam e pode haver estudos comparativos da saúde daqueles que praticam uma religião e daqueles que não o fazem mas é muito difícil formar uma concepção de como mensurar cientificamente Deus ou Alá ou Brahman ou o Dao o céu e assim por diante A despeito da plausibilidade inicialmente aparentada pela postura das Academias no entanto ela pode ser problemática Em primeiro lugar um ponto crítico menor e controverso em resposta às Academias A declaração faz uso dos termos forças e entidades sobrenaturais que não são parte da natureza O termo sobrenatural não é o termo padrão usado com referência exclusiva a Deus ou ao divino provavelmente em parte porque em inglês o termo sobrenatural se refere não apenas a Deus ou ao divino mas também a poltergeists fantasmas demônios bruxas médiuns oráculos e assim por diante Estes últimos são uma panóplia daquilo em que normalmente se pensa como superstições ridículas a semelhança dos termos sobrenatural e supersticioso pode não ser acidental O termo filosófico padrão para a referência a Deus na língua inglesa do Século XVII em diante é teísmo do grego theós para deusDeus Então em vez de tomar a afirmação como fazendo referência a forças ou entidades sobrenaturais uma frase mais conforme ao princípio de caridade pode fazer referência a quantas religiões do mundo são teístas ou envolvem alguma realidade sagrada que não é observável direta e empiricamente Indo além deste ponto terminológico de menor importância as crenças religiosas foram consideradas tradicionalmente e ainda são assim vistas hoje como sendo sujeitas à evidência A evidência favorável às crenças religiosas apelaram para a contingência do cosmos e para os princípios da explanação para a ostensiva aparência de propósito do cosmos o surgimento da consciência e assim por diante A evidência contrária à crença religiosa apelou para a evidente quantidade de mal no mundo o sucesso das ciências naturais e assim por diante Uma razão contudo para apoiar a noção das Academias de que a religião e a ciência não se sobrepõem está no fato de que na ciência moderna houve uma supressão de referências a mentes e ao que é mental Vale dizer que as ciências se ocuparam de mundo físico independente das mentes ao passo que na religião este é principalmente um domínio relacionado à mente sentimentos emoções pensamentos ideias e assim por diante mentes criadas e no caso de algumas religiões a mente de Deus A ciência de Kepler Copérnico Galileu e Newton foi 40 realizada com um estudo explícito do mundo sem apelar para nada que envolvesse aquilo a que hoje em dia se faria referência como o psicológico a mente ou o mental Assim as leis de movimento de Newton acerca da atração e repulsão de objetos materiais não faz menção de como o amor ou o desejo ou a necessidade emocional poderiam ser necessárias para explicar o movimento de dois corpos materiais para se abraçarem romanticamente A supressão da mente das ciências físicas não foi um sinal de que os primeiros cientistas tivessem quaisquer dúvidas sobre a existência o poder e a importância das mentes Isto é de Kepler a Newton e até o começo do Século XX os próprios cientistas não punham em dúvida a significação causal das mentes eles simplesmente não incluíam as mentes as suas próprias mentes ou as de outras pessoas entre os dados do que estavam estudando Mas é interessante notar que cada um dos primeiros cientistas acreditava que o que eles estavam estudando era de alguma forma tornado possível por ser a totalidade do mundo natural terrestre e celestial criada e sustentada em sua existência por uma Mente Divina um criador interinamente bom e necessariamente existente Eles tinham uma cosmovisão genérica ou abrangente de acordo com a qual a própria ciência era razoável e fazia sentido Os cientistas têm de ter uma espécie de fé ou confiança em seus métodos e em que o cosmos está ordenado de tal forma que os seus métodos são efetivos e confiáveis Os primeiros cientistas modernos pensavam que tal fé naquilo a que Einstein se refere como a racionalidade e a inteligibilidade do mundo CAIN 2015 p 42 EINSTEIN 1954 1973 p 262 era razoável em razão de sua crença na existência de Deus Se há ou não evidência suficiente a favor ou contra alguma concepção religiosa do cosmos é um ponto que será abordado na seção 4 Façamos um breve contraste contudo entre duas visões muito diferentes quanto a ter a ciência moderna solapado a crença religiosa De acordo com Steven Pinker a ciência mostrou que são falsas as crenças presentes em muitas religiões Para começar os achados da ciência implicam que os sistemas de crenças de todas as culturas e religiões tradicionais do mundo suas teorias a respeito das origens da vida dos seres humanos e da sociedade são equivocados no que concerne aos fatos Sabemos mas nossos ancestrais não sabiam que todos os seres humanos pertencem a uma única espécie de primata africano que desenvolveu a agricultura o governo e a escrita numa fase tardia da história Sabemos que a nossa espécie é um pequenino galho de uma árvore genealógica que incluem todas as coisas vivas e que surgiu de elementos químicos probióticos há quase quatro 41 bilhões de anos Sabemos que as leis que governam o mundo físico com a inclusão de acidentes doenças e outros infortúnios não têm objetivos que sejam pertinentes ao bemestar dos seres humanos Não existem coisas como destino providência karma encantamentos maldições augúrios retribuição divina ou orações respondidas embora a discrepância entre as leis da probabilidade e o funcionamento da cognição possa explicar por que as pessoas pensam que elas existem PINKER 2013 Dando prosseguimento à linha de raciocínio de Pinker devese notar que hoje não seria cientificamente aceitável apelar para milagres ou a atos diretos de Deus Qualquer disposto milagre seria para muitos se não mesmo para todos os cientistas um tipo de derrota e seria uma forma de das boasvindas a um mistério inaceitável É por isso que alguns filósofos da ciência propõem a tese de que as ciências são metodologicamente ateístas ou seja embora a própria ciência não exprima um juízo acerca da existência de Deus embora alguns filósofos da ciência o façam apelar para a existência de Deus não forma nenhuma parte de suas investigações e teorias científicas Há alguma razão para pensar que a argumentação de Pinker pode estar indo longe demais contudo e que seria mais justo caracterizar as ciências como metodologicamente agnósticas simplesmente não tomando posição na questão relativa à existência de Deus e não ateísta tomando posição na matéria Em primeiro lugar os exemplos de Pinker do que a ciência mostrou ser errado parecem carecer de substância Como assinala Michael Ruse 2014 p 7475 Os argumentos que são fornecidos para sugerir que a ciência torna o ateísmo necessário não são convincentes É fora de questão que muitas das alegações da religião não são mais aceitáveis à luz da ciência moderna Adão e Eva o Dilúvio de Noé o sol que estaciona para Josué Jonas e a baleia e muito mais Mas os cristãos mais sofisticados já sabem disto A questão é que essas coisas não esgotam o que há nas religiões e muitos diriam que estão muito longe de ser as alegações centrais da religião como as de que Deus existe e é o criador e tem um lugar especial reservado para os seres humanos e assim por diante 42 Ruse 2014 p 76 prossegue e assinala que as religiões se voltam para preocupações importantes que vão além do que é passível de ser abordado do ponto de vista das ciências naturais Por que existe alguma coisa em vez de não existir nada Qual é o propósito de tudo E de forma um tanto mais controversa quais são os fundamentos básicos da moralidade e o que é a senciência A ciência toma o mundo como dado A ciência não vê um propósito último para a realidade Diria que visto que a ciência não se ocupa dessas questões não vejo a razão pela qual a pessoa religiosa não deveria oferecer respostas Não podem ser respostas científicas Devem ser respostas religiosas respostas em que estarão envolvidos um Deus ou deuses Existe algo em vez de não existir nada porque um Deus bom as criou por amor a partir do nada O propósito de tudo é encontrar a bemaventurança eterna na presença do Criador A moralidade existe em função da vontade de Deus consiste em fazer o que Ele quer que façamos A senciência é aquela coisa por meio da qual nos damos conta de que fomos feitos à imagem de Deus Nós humanos não somos apenas qualquer tipo antigo de organismo Isso não significa que as respostas religiosas estejam além do alcance das críticas mas elas devem ser respondidas com fundamentos filosóficos ou teológicos e não pelo simples fato de que não são científicas O debate sobre religião e ciência está em curso para se ter acesso a um trabalho promissor consulte Stenmark 2001 2004 5 A reflexão filosófica acerca do teísmo e de suas alternativas Durante boa parte da história da filosofia da religião houve uma ênfase na avaliação do teísmo Conceitos nãoteístas do divino se tornaram cada vez mais parte da filosofia da religião vide BUCKAREFF NAGASAWA 2016 DILLER 43 KASHER HARRISON 2006 2012 2015 A seção 6 dá uma atenção especial a este alargamento dos horizontes O teísmo ainda possui algum direito a reivindicar uma atenção espacial em razão da grande proporção da população mundial que se alinha às tradições teístas as fés abraâmicas e o hinduísmo teísta e da enorme atenção dada à defesa e à crítica do teísmo na filosofia da religião ao longo da história e ainda hoje 51 A reflexão filosófica acerca dos atributos divinos A especulação a respeito dos atributos divinos na tradição teísta foi levada a efeito frequentemente em consonância com aquilo a que se refere atualmente como a teologia do ser perfeito de acordo com a qual Deus é entendido como portador em grau máximo de excelências ou insuperável em grandeza Esta tradição foi notoriamente desenvolvida por Anselmo da Cantuária 103341099 Para um trabalho contemporâneo que oferece um apanhando histórico do teísmo anselmiano confira Maximal God A New Defense of Perfect Being Theism 2017 de Yujin Nagasawa Nesta tradição os atributos divinos foram identificados pelos filósofos como aqueles atributos que formam o maior conjunto simultaneamente possível de propriedades que conferem grandeza as propriedades são simultaneamente possíveis quando podem ser instanciadas pelo mesmo ser Tradicionalmente os atributos divinos foram identificados como a onipotência a onisciência a perfeita bondade o fato de ser digno de adoração a existência necessária ou nãocontingente e a eternidade a existência fora do tempo ou atemporal Cada um desses atributos foi submetido a uma análise diferente e rica em nuances como se notará abaixo Deus também foi tradicionalmente concebido como incorpóreo ou imaterial imutável impassível onipresente E diferentemente do que ocorre no judaísmo e no Islã os teístas cristãos concebem Deus como trino a Divindade não é homogênea mas se constitui de três Pessoas o Pai o Filho e o Espírito Santo e incarnado como Jesus de Nazaré plenamente divino e plenamente humano Uma das ferramentas que os filósofos usam em sua investigação dos atributos divinos inclui as experiências de pensamento Nas experiências de pensamento são descritos casos hipotéticos casos que podem representar ou não o modo como as coisas são Nessas descrições os termos normalmente usados em um contexto são empregados em cenários expandidos Assim ao pensar em Deus como onisciente uma pessoa poderia começar com um caso nãocontroverso 44 2 Taliaferro comete um equívoco aqui A expressão necessariamente teria de ser secunda facie com adjetivo e substantivo declinados no caso ablativo latino cujo sentido estrito é à segunda vista Ademais secundum não concorda com o substantivo qualificado facies no singular feminino ablativo facie de uma pessoa que sabe que uma proposição é verdadeira atentando para o que significa alguém possuir tal conhecimento e para as maneiras pelas quais o conhecimento é assegurado Uma experiência de pensamento teísta buscaria estender a nossa compreensão do conhecimento à medida que pensamos nele em nosso próprio caso trabalhando para atingir a concepção de uma excelência máxima ou suprema adequada ao entendimento sobre Deus dos crentes religiosos Vários graus de refinamento seriam então necessários enquanto a pessoa especula sobre a extensão do conjunto máximo de proposições conhecidas mas também sobre como elas poderiam ser conhecidas Isto é ao atribuir alguém onisciência a Deus estaria no próprio ato alegando que Deus conhece todas as verdades de uma maneira que seja análoga à maneira pela qual conhecemos verdades sobre o mundo Uma analogia demasiado estreita produziria uma imagem peculiar de um Deus que confia por exemplo na indução na experiência sensorial ou no testemunho de outras pessoas Um dos procedimentos na filosofia sobre Deus foi o de asseverar que a alegação de que Deus sabe de alguma coisa emprega a palavra sabe univocamente quando lida como individuando a tese de que Deus sabe de alguma coisa ao passo que usa o termo de uma maneira apenas remotamente analógica quando lida como uma forma de identificar como Deus sabe de alguma coisa SWINBURNE 1977 O uso de experiências de pensamento frequentemente emprega um princípio das aparências Uma das versões do princípio das aparências é a de que uma pessoa tem uma razão para acreditar que algum estado de coisas AEC é possível se ela puder conceber descrever ou imaginar o AEC sendo instanciado e ela não sabe de nenhuma razão independente para acreditar que o AEC é impossível Tal como enunciado o princípio é proposto como algo que simplesmente oferece uma razão para acreditar que o AEC é possível e assim pode ser visto como algo que apresenta uma razão prima facie Mas poderia ser vista como uma razão secundum facie2 à medida que a pessoa examine cuidadosamente o AEC e os seus possíveis derrotadores vide TALIAFERRO KNUTHS 2017 Alguns filósofos 45 se mantêm céticos quanto ao emprego de experiências de pensamento confira Van Inwagen 1998 para uma defesa Taliaferro 2002 Kwan 2013 e Swinburne 1979 Para tratamentos gerais consulte Sorensen 1992 e Gendler e Hawthorne 2002 511 A onisciência Imagine que exista um Deus que conheça as futuras ações livres dos seres humanos Se Deus de fato sabe que você cometerá livremente algum ato X então é verdade que você de fato fará X Mas se você é livre você não seria livre para evitar fazer X Dado que há presciência de que você fará X parece que você não seria livre para deixar de cometer o ato De início esse paradoxo parece fácil de afastar Se Deus tem ciência de sua ação futura então Deus sabe que você fará alguma coisa livremente e que não poderia ter deixado de fazêla A presciência divina do ato não o torna necessário Não se daria o caso de que o paradoxo só surge porque a proposição Necessariamente se Deus sabe de X então X está sendo confundida com Se Deus sabe de X então necessariamente X Afinal de contas necessariamente se dá o caso de que se alguém sabe que você está lendo este verdade agora mesmo então é verdade que você está lendo este verbete mas o fato de você estar lendo este verbete pode ainda ser visto como um estado de coisas contingente e não necessário Mas o problema não é tão facilmente dissolvido contudo porque o conhecimento de Deus diferentemente do conhecimento humano é infalível e se Deus sabe de modo infalível que algum está de coisas se verifica então não pode ocorrer que o estado de coisas não se verifique Considerese o que às vezes é chamado de necessidade do passado uma vez que um estado de coisas tenha se verificado dáse inalterável ou necessariamente o caso de que ele de fato ocorreu Se o futuro é conhecido com precisão e abrangência não seria o futuro assim como o passado algo que se dá necessária e inalteravelmente Se o problema é colocado na primeira pessoa e se imagina que Deus tem presciência de que você livremente passará a ler um outro verbete desta Enciclopédia além disso Deus sabe com insuperável precisão quando você o fará que verbete você escolherá e o que você achará dele então uma solução fácil para o problema parece ser difícil de obter Para sublinhar a natureza do problema imagine que Deus lhe diga o que você fará livremente na próxima hora Sob tais condições seria ainda inteligível a crença de que você tem a capacidade de fazer algo diverso se é do conhecimento de Deus bem como de 46 você mesmo o que você de fato optará por fazer A presciência dos próprios atos então produz um problema adicional correlato porque a psicologia da escolha parece requerer uma ignorância prévia do que você escolherá Várias respostas foram dadas no debate sobre liberdade e presciência Algumas pessoas adotam o compatibilismo afirmando a compatibilidade do livre arbítrio com o determinismo Embora alguns proeminentes teístas filosóficos do passado tenham seguido por essa rota e de forma mais dramática Jonathan Edwards 17031758 esta parece ser a posição minoritária em filosofia da religião hoje em dia as exceções incluem Paul Helm John Fischer e Lynne Baker Uma segunda posição adere à perspectiva libertária que insiste que a liberdade envolve um exercício de poder radical e indeterminado e conclui que Deus não pode ter ciência de futuras ações livres O que impede esses filósofos de negarem que Deus seja onisciente é que eles sustentam que não existem verdades a respeito de futuras ações livres ou que embora existam verdades a respeito do futuro ou Deus não pode ter presciência dessas verdades Swinburne ou escolhe livremente não as conhecer para preservar a livre escolha John Lucas De acordo com a primeira concepção antes de alguém realizar uma ação livre não existe o fato constituído de que ele ou ela cometerá um determinado ato Isso está em harmonia com uma interpretação tradicional ainda que controversa da filosofia de Aristóteles acerca do tempo e da verdade Aristóteles pode não ter pensado que fosse nem verdadeiro nem falso antes de uma determinada batalha naval que um dos lados a venceria Alguns teístas tais como Richard Swinburne adotam esta linha hoje sustentando que o futuro não pode ser conhecido Se ele não pode ser conhecido por razões metafísicas então a onisciência pode ser analisada como o conhecimento de tudo aquilo que é possível conhecer O fato de que Deus não pode conhecer futuras ações livres não prejudica mais a alegação de que Deus é onisciente do que a incapacidade de Deus de fazer círculos quadrados prejudica a alegação de que Deus é onipotente Eles insistem que a presciência de Deus é compatível com a liberdade concebida em termos libertários e buscam escapar do dilema com a alegação de que Deus não está preso ao tempo não se dá tanto o caso de que Deus tenha presciência do futuro ele conhece o que para nós é o futuro de um ponto de vista eterno e com a afirmação de que o ponto de vantagem exclusivo de um Deus onisciente impede qualquer efeito sobre a liberdade Deus simplesmente pode conhecer o futuro sem que isso tem de estar fundado em um futuro estabelecido e determinado Mas isso só funciona se não houver para a eternidade nenhuma necessidade análoga à necessidade do passado Por que alguém haveria de pensar 47 que temos mais controle sobre as crenças atemporais de Deus do que sobre a crença de Deus no passado Se não for assim então há um dilema quanto ao conhecimento atemporal de Deus em paralelo exato com o dilema já visto Para uma análise notável e atual da liberdade e da presciência vejase o trabalho de Linda Zagzebski 512 A eternidade Poderia existir um ser que estivesse fora do tempo Nas grandes tradições monoteístas pensase em Deus como não tendo nenhum tipo de princípio ou fim Não poderá nunca deixar de existir e na verdade não pode nunca deixar de existir Alguns teístas filosóficos sustentam que a temporalidade de Deus é muito semelhante à nossa no sentido de que há um antes um durante e um depois para Deus ou um passado presente e futuro para Deus Às vezes é feita referência a essa visão como a tese de que Deus tem duração ilimitada Aqueles que adotam uma posição mais radical alegam que Deus é independente da temporalidade argumentando que ou Deus não está em absoluto no tempo ou que Deus está simultaneamente em ou dentro de todos os pontos do tempo A essa visão às vezes se chama de a tese de que Deus é eterno em vez de possuidor de um duração ilimitada Por que valeria a pena adotar a posição mais radical Uma das razões já mencionada é a de que se Deus não está preso ao tempo pode haver uma resolução para o problema anterior acerca da reconciliação da liberdade com a presciência Como disse Santo Agostinho de Hipona de tal forma que aquelas coisas que surgem no tempo o futuro na verdade ainda não são e o passado não mais é mas todas essas coisas são compreendidas por Ele em sua presença eterna e estável A Cidade de Deus XI 21 Se Deus está fora do tempo também pode haver um fundamento seguro para explicar a imutabilidade invariabilidade de Deus a sua incorruptibilidade e imortalidade Ademais pode haver uma oportunidade para usar a presença de Deus fora do tempo para adiantar o argumento de que Deus é o criador do tempo 48 Aqueles que afirmam que Deus não é limitado por sequências temporais se confrontam com vários paradoxos que eu aqui aponto sem tentar resolvêlos Se de alguma forma Deus está em ou dentro de todos os pontos no tempo Deus está simultaneamente em ou dentro de cada um deles Se este for o caso há o seguinte problema Se Deus é simultâneo ao evento do incêndio de Roma em 410 d C e também simultâneo à sua leitura deste verbete então parece que Roma deve estar ardendo em chamas no mesmo tempo em que você está lendo este verbete Este problema foi apresentado por Nelson Pike 1970 Stump e Kretzmann 1981 responderam que a simultaneidade presente no conhecimento de Deus não é transitiva Um problema diferente surge com relação à eternidade e à onisciência Se Deus está fora do tempo Deus pode saber qual o tempo de agora Poderse ia argumentar que é matéria fatual ser agora digamos à meianoite de 1º de julho de 2018 Um Deus fora do tempo poderia saber que certas coisas ocorrem à meia noite de 1º de julho de 2018 mas será que Deus poderia saber quando esse ponto do tempo é o de agora O problema é que quanto mais ênfase se coloca na alegação de que a existência suprema de Deus é independente do tempo mais parece haver o risco de que o tempo tal como o conhecemos não seja levado a sério Por fim embora as grandes tradições monoteístas forneçam uma imagem do Divino como algo de supremamente diferente da criação há também uma insistência na proximidade ou imanência de Deus Para alguns teístas não há um uso equívoco da linguagem em descrições de Deus como uma pessoa ou como assemelhado a uma pessoa Deus ama age conhece Mas não está claro que um Deus eterno possa ser pessoal Para um trabalho recente sobre a relação de Deus com o tempo vejase o trabalho de Katherine Rogers 2007 2008 513 A bondade de Deus Todas as religiões de âmbito mundial conhecidas abordam a natureza e recomendam maneiras de atingir o bemestar humano quer seja pensado em termos de salvação liberação libertação iluminação tranquilidade ou um estado de Nirvana desprovido de um eu A despeito de diferenças importantes há em muitas religiões uma sobreposição substancial entre muitas dessas concepções do bem tal como testemunhada pela recomendação da Regra de Ouro Faça aos outros o que você gostaria que lhe fizessem Algumas religiões interpretam o Divino como estando em algum aspecto além das nossas noções de bem e mal 49 Em algumas formas de hinduísmo por exemplo Brahman tem sido exaltado como possuidor de um tipo de transcendência moral e alguns teólogos e filósofos cristãos têm insistido de modo semelhante em que Deus só é um agente moral em um sentido altamente limitado se é que chega a sêlo DAVIES 1993 Chamar Deus de bom é para eles muito diferente de chamar de bom a um ser humano Aqui estão algumas das maneiras pelas quais os filósofos deram forma articulada ao que significa chamar Deus de bom No tratamento da questão houve uma tendência ou a explicar a bondade de Deus em termos de padrões que não são criação de Deus e assim em alguma medida independentes da vontade de Deus ou em termos da vontade de Deus e dos padrões que Deus criou A última visão foi chamada de voluntarismo teísta Uma versão comum do voluntarismo teísta consiste na alegação de que ser alguma coisa boa ou correta significa simplesmente que Deus a aprova ou permite e ser alguma coisa má ou errada significa que Deus a desaprova ou proíbe Os teístas voluntaristas se deparam com várias dificuldades a linguagem moral parece inteligível sem ter de ser explicada em termos da vontade Divina Com efeito muitas pessoas fazem aquilo que consideram julgamentos morais sem fazer nenhuma referência a Deus Se estão usando a linguagem moral de maneira inteligível como pode se dar o caso de que o próprio significado de tal linguagem moral deva ser analisada em termos de volições Divinas O trabalho recente na filosofia da linguagem pode ser útil para os teístas voluntaristas De acordo com a teoria causal da referência água necessariamente designa H2O Não é um fato contingente à água ser H2O a despeito de que muitas pessoas usam o termo água sem conhecerem a sua composição De maneira semelhante será que não se poderia dar o caso de que bom possa se referir àquilo que é resultado da vontade de Deus ainda que muitas pessoas não estejam cientes da existência de Deus ou até mesmo a neguem Uma outra dificuldade para o voluntarismo está na explicação do conteúdo significativo aparente de alegações como Deus é bom Parece ser o caso que ao chamar de bom a Deus ou em especial de boa à vontade de Deus o crente religioso está a dizer algo mais do que Deus quer o que Deus quer Se é assim não deve a própria noção de bondade ter algum significado independente da vontade de Deus Também em jogo está a preocupação de que em sendo aceito o voluntarismo o teísta terá ameaçado a objetividade normativa dos julgamentos morais Deus poderia fazer com que se desse o caso de os julgamentos morais serem virados de cabeça para baixo Por exemplo Deus poderia fazer da crueldade algo de bom Poderseia argumentar que o universo moral não é tão maleável 50 Em resposta alguns voluntaristas buscaram entender a imutabilidade das leis morais à luz na natureza necessária e imutavelmente fixada de Deus Ao se interpretar a bondade de Deus em termos do ser de Deus e não apenas da vontade de Deus chegase perto de uma postura nãovoluntarista Aquino e outros sustentam que Deus é essencialmente bom em virtude do próprio ser de Deus Todas essas posições são nãovoluntaristas no sentido de que não alegam que o significado de algo ser bom está no fato de que Deus queira que o seja A bondade de Deus pode ser articulada de várias formas seja com o argumento de que a perfeição de Deus requer que Deus seja bom como agente seja com o argumento de que a bondade de Deus pode ser articulada em termos de outros atributos Divinos como aqueles delineados acima Por exemplo por ser o conhecimento um bem em si mesmo a onisciência é um bem supremo Deus também tem sido considerado bom no sentido de que criou e conserva a existência de um cosmos bom Debates a respeito do problema do mal se Deus é de fato onipotente e perfeitamente bom por que existe o mal ganham a sua pungência precisamente porque um dos lados contesta o julgamento principal acerca da bondade de Deus o debate sobre o problema do mal é abordado na seção 524 Raramente é estrita a escolha entre o voluntarismo e a visão do próprio ser de Deus como bom Alguns teístas que se opõem ao voluntarismo em escala plena dão espaço a elementos voluntaristas parciais De acordo com uma de tais posturas moderadas em que pese ao fato de que Deus não pode fazer da crueldade algo de bom Deus pode fazer com que sejam moralmente requeridas ou proibidas algumas ações que do contrário seriam moralmente neutras Argumentos neste sentido foram baseados na tese de que o cosmos e tudo o que ele contém são criação de Deus De acordo com algumas teorias da propriedade um agente que faça algo de bom ganha direitos sobre a propriedade Os passos cruciais em argumentos segundo os quais o cosmos e o que ele contém pertencem ao seu Criador foram os de estar em guarda contra a ideia de que pais humanos possuiriam os seus filhos não o fazem porque pais não são criadores em um sentido radical como Deus o é e contra a ideia de que a propriedade Divina permitiria qualquer coisa representando assim os deveres humanos devidos a Deus como os deveres de um escravo para com o seu senhor uma visão à qual nem todos os teístas objetaram Teorias com detalhes sobre o porquê e o como de o cosmos pertencer a Deus foram proeminentes em todas as três tradições monoteístas Platão defendeu a noção assim como o fizeram Aquino e Locke vide BRODY 1974 51 Um novo desenvolvimento na teorização sobre a bondade de Deus foi proposto por Linda Zagzebski 2004 Zagzebski sustenta que ser uma pessoa de virtude exemplar consiste em ter boas motivações Motivações têm uma estrutura interna afetiva ou emotiva Uma emoção é uma percepção afetiva do mundo 2004 p XVI que dá início e direção à ação 2004 p 1 O fundamento último do que torna boas as motivações humanas consiste em estarem em consonância com as motivações de Deus A teoria de Zagzebski talvez seja a mais ambiciosa teoria já publicada e pautada na noção de virtude uma teoria que oferece uma explicação das virtudes humanas à luz do teísmo Nem todos os teístas dão ressonância à sua ousada alegação de que Deus é uma pessoa que tem emoções mas muitos admitem que ao menos em algum sentido analógico Deus possa ser visto como pessoal e como possuidor de estados afetivos Um outro esforço digno de nota feito para ligar os julgamentos sobre o bem e o mal com os julgamentos sobre Deus se assenta na teoria ética do observador ideal De acordo com esta teoria os julgamentos morais podem ser analisados em termos relativos a como um observador ideal julgaria as questões Dizer que um ato é correto acarreta um compromisso com a defesa da tese de que se houvesse um observador ideal ele aprovaria o ato alegar que um ato é errado acarreta a tese de que se houvesse um observador ideal ele desaprovaria o ato A teoria pude ser encontrada nas obras de Hume Adam Smith R M Hare e R Firth vide FIRTH 1952 1970 O observador ideal é descrito de várias formas mas tipicamente é concebido como imparcial e onisciente no que concerne aos fatos nãomorais fatos que podem ser apreendidos sem que já se conheça o status moral ou as implicações do fato por exemplo Ele fez algo mau é um fato moral Ele bateu em Smith não é e como onipercipiente o termo de Firth para a adoção de uma posição de apreciação afetiva universal dos pontos de vista de todas as partes envolvidas A teoria ganha algum amparo do fato de que a maior parte das disputas morais podem ser analisadas em termos do desafio colocado pelas diferentes partes umas às outras para que sejam imparciais para que conheçam corretamente os fatos empíricos e para que sejam mais sensíveis por exemplo dandose conta da sensação que alguém tem ao estar numa posição de desvantagem A teoria tem críticos e apoiadores portentosos Se for verdadeira não se segue que exista um observador ideal mas se for verdadeira e os julgamentos morais forem coerentes então a ideia de um observador imparcial é coerente Dadas certas concepções de Deus presentes nas três grandes tradições monoteístas Deus se adequa à descrição do observador ideal e mais do que isso é claro Isso não necessariamente tem 52 de ser uma conclusão ingrata para os ateístas Caso a teoria do observador ideal seja persuasiva um teísta teria alguma razão para alegar que ateístas comprometidos com julgamentos éticos normativos também estão comprometidos com a ideia de Deus ou de um ser semelhante a Deus Para uma defesa de uma versão teísta da teoria do observador imparcial confira Taliaferro 2005a Para críticas veja Anderson 2005 Para trabalhos adicionais sobre Deus a bondade e a moralidade confira Evans 2013 e Hare 2015 Para um trabalho interessante sobre a noção de autoridade religiosa consulte Zagzebski 2012 Devese assinalar que além da atenção aos atributos divinos clássicos discutidos nessa seção houve trabalhos filosóficos recentes sobre a simplicidade a imutabilidade a impassibilidade a onipresença a liberdade de Deus a divina necessidade a soberania e a relação de Deus com os objetos abstratos os ensinamentos cristãos a respeito da Trindade a encarnação a expiação os sacramentos e coisas mais 52 A existência de Deus Em algumas antologias e livrostextos de introdução à filosofia os argumentos favoráveis à existência de Deus são apresentados como pretensas provas que mais adiante são reveladas como falíveis Por exemplo um argumento que parta da aparência de ordem do cosmos e de sua natureza dotada de propósitos será criticado com o fundamento de que quando muito o argumento mostraria que há em operação no universo uma inteligência que alberga desígnios e propósitos Isso fica muito longe de estabelecer que exista um Deus que é onipotente onisciente benevolente e assim por diante Mas aqui precisam ser feitos dois comentários Em primeiro lugar essa conclusão acanhada seria suficiente por si só para perturbar uma visão científica e naturalista que deseje excluir a possibilidade de todas as formas de inteligência transcendental Em segundo lugar poucos são os filósofos hoje em dia que apresentam um único argumento como prova Habitualmente um argumento do desígnio poderia ser apresentado junto com um argumento baseado na experiência religiosa e com os outros argumentos a serem considerados abaixo Fiéis ao aconselhamento de Hempel citado anteriormente sobre uma investigação abrangente é cada vez mais comum ver as posições filosóficas seja o naturalismo científico seja o teísmo defendido por meio de argumentos cumulativos uma vasta gama de considerações e não com uma única prova que supostamente venderia por knockdown 53 Esta seção procede a um levantamento dos principais argumentos teístas 521 Argumentos ontológicos Existe um amplo leque de argumentos sob essa rubrica se uma versão do argumento é funcional então pode ser implementada com o único exclusivo do conceito de Deus como um ser de excelências máximas e com alguns princípios concernentes à possibilidade e à necessidade Não é necessário contudo que o argumento rechace qualquer suporte empírico como será indicado O ponto focal do argumento é a tese de que se há um Deus então a existência de Deus é necessária Por outras palavras a existência de Deus não é contingente Deus não é o tipo de ser que simplesmente possa existir ou não Que a existência necessária esteja embutida no conceito de Deus é uma posição que pode ser apoiada apelandose para a maneira pela qual Deus é concebido nas tradições judaica cristã e islâmica Isso incluiria algum grau de pesquisa empírica a posteriori acerca da maneira na qual Deus é concebido nessas tradições Numa vertente alternativa um defensor do argumento ontológico poderia esperar convencer os outros de que o conceito de Deus é o conceito de um ser que existe necessariamente começando pela ideia de um ser dotado do máximo de perfeições Se houvesse um ser dotado de perfeições máximas como ele seria Tem se argumentado que em meio à sua coleção de qualidades que conferem grandeza a onisciência e a onipotência estaria a qualidade de existência necessária Uma vez que o argumento seja plenamente elaborado pode se argumentar que um ser de perfeições máximas que existisse necessariamente poderia ser chamado de Deus Para um tratamento interessante e recente da relação entre o conceitos de existência necessária de um ser e o de existência de Deus vejase Necessary Existence de Alexander Pruss e Joshua Rasmussen 2018 cap 13 O argumento ontológico remonta a Santo Anselmo 1033341109 mas esta seção vai explorar uma versão atual que defenda em grande medida do princípio de que se é possível que alguma coisa seja necessária então ela é necessária O princípio pode ser ilustrado no caso das proposições A proposição de que o número seis é o menor dos números perfeitos aquele número que é igual à soma dos seus divisores incluindo o número um mas não o próprio número não parece ser o tipo 54 3 A explicação do autor talvez não seja tão clara quanto deveria ser Dizse que um inteiro N é um número perfeito quando a soma dos números inteiros pelos quais pode ser dividido com a inclusão do divisor universal o número um mas com a exclusão do próprio N é igual a N Exemplifico 1 2 3 6 sendo certo que 1 2 e 3 são inteiros pelos quais 6 pode ser dividido Já o número 8 não é próprio como se vê facilmente com a soma dos seus divisores 1 2 4 7 O próximo número na sequência de números perfeitos é 28 Temos que 1 2 4 7 14 28 de coisa simplesmente poderia calhar de ser verdadeira3 Em vez disso ou é necessariamente verdadeira ou é necessariamente falsa No último caso não é uma possibilidade No primeiro é uma possibilidade Se uma pessoa sabe que é possível que seis seja o menor número perfeito então essa pessoa tem uma boa razão para acreditar que seja Temse uma razão para pensar que seja possível que Deus exista necessariamente Os defensores do argumento respondem na afirmativa e inferem que Deus existe Houve centenas de objeções e respostas a este argumento Talvez a objeção mais ambiciosa seja a de que o mesmo tipo de raciocínio pode ser usado para argumentar que Deus não pode existir afinal se é possível que Deus não exista e que a existência necessária seja parte do significado de Deus então se segue que Deus não pode existir Entre os clássicos versões alternativas do argumento ontológico são propostas por Anselmo Spinoza e Descartes com versões atuais sendo propostas por Alvin Plantinga Charles Hatsthorne Norman Malcolm e C Dore críticos entre os clássicos incluem Gaunilo e Kant ao passo que os críticos atuais são muitos incluindo William Rowe J Barnes G Oppy e J L Mackie Os últimos tratamentos do argumento ontológico com extensão típica de livros são duas defesas Rethinking the Ontological Argument de Daniel Dombrowski 2006 e Maximal God A New Defence of Perfect Being Theism 2017 Nem todos os defensores de uma teologia pautada pela noção de um ser perfeito acolhem o argumento ontológico É notório o fato de que Tomás de Aquino não o aceitou Alvin Plantinga que é um dos filósofos responsáveis pela revivescência do interesse pelo argumento ontológico sustenta que embora ele pessoalmente considere o argumento correto porque ele acredita que a conclusão de que Deus existe necessariamente é verdadeira o que implica que é verdadeira a premissa de que é possível que Deus exista necessariamente ele não crê que o argumento seja forte o bastante para convencer um ateísta PLANTINGA 1974 p 216217 55 522 Argumentos cosmológicos Os argumentos dessa natureza são enraizados de maneira mais firme do que o argumento ontológico na reflexão empírica a posteriori mas algumas versões também empregam razões a priori Existem várias versões Alguns argumentam que o cosmos teve uma causa inicial fora de si uma Causa Primeira no tempo Outros argumentam que o cosmos tem uma causa necessária que o sustenta de um instante ao instante seguinte não importando se o cosmos teve uma origem temporal ou não As duas versões não são mutuamente excludentes pois é possível tanto que o cosmos tenha tido uma Causa Primeira quanto que tenha uma causa continua a sustentálo em sua existência O argumento cosmológico depende da inteligibilidade da noção de que possa existir ao menos um ser poderoso que exista por si mesmo ou cuja origem e continuação enquanto ser não dependa de nenhum outro ser Isso poderia ser a total necessidade de preeminência suprema através de todos os mundos possíveis usada em versões do argumento ontológico ou uma noção mais local e limitada de um ser que carece de causa no mundo realmente existente Caso seja bemsucedido o argumento forneceria razões para pensarmos que há ao menos um tal ser de extraordinário poder responsável pela existência do cosmos No melhor dos casos o argumento não chega a justificar a imagem completa do Deus da religião uma Primeira Causa seria poderosa mas não necessariamente onipotente mas iria não obstante desafiar as alternativas naturalistas e fornecer alguma razão para o teísmo o último ponto é análogo à ideia de que a evidência de que exista alguma forma de vida em outro planeta não provaria que tal vida é inteligente mas que ainda assim aumenta talvez apenas ligeiramente a força da hipótese de que exista vida inteligente em outro planeta Ambas as versões do argumento nos pedem que consideremos o cosmos no seu estado presente Seria o mundo tal como o conhecemos algo que necessariamente existe Ao menos no que diz respeito a nós mesmos ao planeta ao sistema solar e à galáxia este não parece ser o caso Com relação a esses componentes do cosmos faz sentido perguntar por que existem em vez de não existirem Com relação às explicações científicas do mundo natural tais investigações sobre as causas fazem abundante sentido e talvez sejam até mesmo pressuposições essenciais das ciências naturais Alguns dentre os proponentes do argumento 56 sustentam que sabemos a priori que se alguma coisa existe há uma razão para a sua existência Então por que o cosmos existe Poderseia argumentar que se as explicações da existência contingente do cosmos ou de estados do cosmos só ocorrem em termos de outras coisas contingentes estados anteriores do cosmos então uma explicação completa nunca será obtida Contudo se há ao menos um ser necessário não contingente casualmente responsável pelo cosmos o cosmos tem uma explicação Neste ponto as duas verões do argumento enveredam por caminhos diferentes Argumentos que concluem por uma Primeira Causa no plano temporal sustentam que um regresso temporal continuo de uma existência contingente a uma outra nunca dariam conta de explicar a existência do cosmos e concluem que é mais razoável aceitar a existência de uma Primeira Causa do que aceitar um regresso ou a alegação de que o cosmos simplesmente surgiu do nada Argumentos que concluem pela existência de uma causa que mantém o universo em existência alegam que explicações sobre o porquê de alguma coisa existir agora não podem ser suficientes sem que se pressuponha uma causa mantenedora presente e contemporânea Os argumentos foram baseados na negação de todas as formas de infinitude ou a aceitação de algumas formas de infinitude por exemplo a coerência da suposição de que exista um número infinito de estrelas atrelada à rejeição de um regresso infinito de explicações que envolvam exclusivamente estados de coisas contingentes O regresso do último tipo foi descrito como vicioso em contastete com uma forma benigna de contraste Há exemplos plausíveis de regressos infinitos viciosos que não geram explicações por exemplo imagine que Tom explique a sua posse de um livro reportando que o obteve de A que o obteve de B e assim por diante ao infinito Isso não explicaria como Tom obteve o livro De maneira alternativa imagine um espelho que reflita a luz que incide sobre ele A presença da luz seria explicada com sucesso se alguém alegasse que a luz é o reflexo da luz de um outro espelho e a deste espelho de mais um outro e assim ao infinito Considerese um caso final Você se depara com uma palavra que desconhece seja essa palavra ongggt Você indaga sobre o significado dela e lhe apresentam outra palavra que lhe é ininteligível e assim por diante formando um regresso infinito Você chegaria um dia a conhecer o significado do primeiro termo A força desses exemplos consiste em mostrar quão semelhantes são ao regresso das explicações contingentes As versões do argumento que rejeitam todas as formas reais de infinitude se deparam com o embaraço de ter de explicar o que deve ser feito com a Primeira Causa especialmente considerando que ela poderia ter algumas características 57 que são de realmente infinitas Craig e outros alegaram que não têm nenhuma objeção às formas de infinitude em potencial embora a Primeira Causa nunca vá deixar de existir nunca se tornará uma verdadeira infinitude Aceitam ademais que antes da criação a Primeira Causa não estava no tempo o que representa uma posição que depende da teoria de que o tempo tem um caráter relacional em vez de absoluto A atual popularidade científica da visão relacional pode servir de apoio aos defensores do argumento Foi lançada a objeção de que ambas as versões do argumento cosmológico estabelecem uma imagem inflacionada do tipo de explicações que são razoáveis Por que o cosmos como um todo haveria de necessitar uma explicação Se todas as coisas no universo podem ser explicadas ainda que por meio de explicações com regressos infinitos o que mais há a ser explicado Poderseia responder ou com a negação de regresso infinitos de fato fornecem explicações satisfatórias ou que é arbitrária a escolha por não buscar uma explicação do todo A questão Por que há um cosmos parece ser perfeitamente inteligível Se existem explicações para coisas dentro do cosmos por que não haveria para o todo O argumento não está assentado na falácia de tratar todas as totalidades como se tivessem todas as propriedades das suas partes Mas se tudo no cosmos é contingente parece tão razoável acreditar que a totalidade do cosmos é contingente quanto seria acreditar que se tudo no cosmos é invisível o cosmos como um todo é invisível Uma outra objeção é a de que em vez de explicar o cosmos contingente o argumento cosmológico introduz uma entidade misteriosa para a qual mal conseguimos fornecer qualquer sentido filosófico ou científico Como poderia a postulação de ao menos uma Primeira Causa fornecer uma melhor explicação do cosmos do que a teríamos simplesmente concluindo que o cosmos carece em última análise de uma explicação No final das contas o teísta parece ser forçado a admitir que a razão pela qual a Primeira Causa chegou a criar o que quer que seja é uma questão contingente Se por outro lado o teísta tem de alegar que a Primeira Causa tinha de fazer o que fez então não seria o cosmos necessário em vez de contingente Alguns teístas chegam próximos à conclusão de que foi de fato essencial que Deus criasse o mundo Se Deus é supremamente bom teria de haver algum transbordamento de bondade na forma de um cosmos Sobre as ideias de Dionísio o Areopagita confira Stump e Kretzmann 1981 e consulte Rowe 2004 sobre os argumentos segundo os quais Deus não é livre Mas os teístas tipicamente preservam algum papel para a liberdade de Deus e assim buscam reter a ideia de que o cosmos é contingente Os defensores do argumento cosmológico sustentam ainda que a 58 sua explicação do cosmos possui uma simplicidade abrangente que falta a visões alternativas As escolhas de Deus podem ser contingentes mas não a existência de Deus e a opção Divina pela criação do cosmos pode ser compreendida como profundamente simples em seu esforço supremo e prevalecente de criar algo de bom Swinburne argumentou que a explicação das leis naturais em termos da vontade de Deus fornece um arcabouço simples e prevalente para compreender a ordem e o caráter do cosmos enquanto dotado de um propósito vide FOSTER 2004 Os defensores do argumento cosmológico incluem Swinburne Richard Taylor Hugo Meynell Timothy OConnor Bruce Reichenbach Robert Koons Alexander Pruss e William Rowe opositores proeminentes incluem Antony Flew Michael Martin Howard Sobel Graham Oppy Nicholas Everitt e J L Mackie Embora Rowe tenha defendido o argumento cosmológico as suas reservas quanto ao princípio da razão suficiente o impedem de aceitar o argumento como plenamente satisfatório 523 Argumentos teleológicos Esses argumentos enfocam as características do cosmos que parecem refletir o desígnio ou intencionalidade de Deus ou mais modestamente de um ou mais forças dotadas de propósito poderosas inteligentes e semelhantes a Deus Uma parte do argumento pode ser formulada como a apresentação de evidências de que o cosmos é o tipo de realidade que seria produzida por um ser inteligente e em seguida com o argumento de que a postulação dessa fonte é mais razoável do que o agnosticismo a seu respeito ou a sua negação Como no caso do argumento cosmológico o defensor do argumento teleológico pode querer afirmar que ele apenas fornece alguma razão para pensar que Deus existe Pode se dar o caso de que algum tipo de argumentação cumulativa em defesa do teísmo requereria a interpretação de vários argumentos como fontes de reforço mútuo Caso tenha êxito na defesa de uma causa inteligente e transcósmica o argumento teleológico pode fornecer alguma razão para pensar que a Primeira Causa do argumento cosmológico se este for exitoso é dotada de propósito ao passo que o argumento ontológico se possuir alguma força probante pode fornecer alguma razão para pensar que faz sentido postular um ser que tem atributos Divinos e necessariamente existe Por trás de todos eles um argumento fundado na experiência religiosa vide abaixo pode fornecer algumas razões para buscar apoio adicional para uma concepção religiosa do cosmos e para questionar a suficiência do naturalismo 59 Uma das versões do argumento teleológico dependerá da inteligibilidade da explicação fundada na noção de propósito No nosso próprio caso humano parece que explicações baseadas em intenções e propósitos são legítimas e que podem de fato explicar a natureza e a ocorrência de eventos Ao pensarmos sobre uma explicação para o caráter do cosmos em última instância é mais provável que o cosmos seja explicado em termos de um agente poderoso e inteligente ou em termos de um esquema naturalista de leis finais sem nenhuma inteligência subjacente a elas Os teístas que empregam o argumento teleológico chamam atenção para a ordem e a estabilidade do cosmos o surgimento da vida vegetativa e animal a exigência da consciência da moralidade dos agentes racionais e coisas assemelhadas em um esforço para identificar o que poderia de forma plausível ser visto como as características do cosmos que são dotadas de propósito e passíveis de explicação As explicações naturalistas quer ocorram na biologia quer ocorram na física são então apresentadas como comparativa locais em sua aplicação quando contrastadas com o esquema mais amplo de uma metafísica teísta Explicações darwinianas da evolução biológica para começo de discussão não necessariamente nos ajudarão a ponderar questões concernentes ao porquê de existirem quaisquer dessas leis ou quaisquer organismos Argumentos que apoiam ou contrariam o argumento teleológico se parecerão então com os argumentos acerca do argumento cosmológico com o lado que defenda a posição negativa a sustentar que não há nenhuma necessidade de ir além de uma explicação naturalista e o lado que defende a tese afirmativa a buscar estabelecer que não é razoável deixar de ir além do naturalismo Ao se avaliar o argumento teleológico considerese a objeção baseada na noção de unicidade O cosmos é absolutamente único Não há acesso a múltiplos universos acerca de alguns dos quais sabemos que houve desígnio enquanto sabemos acerca de alguns que não houve Sem podermos comparar o cosmos com grupos alternativos de mundos cósmicos o argumento fracassa As respostas a essa objeção sustentaram que se devêssemos insistir que não são cabíveis inferências em casos únicos então isso excluiria explicações da origem do cosmos que são respeitáveis em outros aspectos Além disso embora não seja possível comparar a conformação de diferentes histórias cósmicas é possível em princípio imaginar conceber mundos que parecem caóticos aleatórios ou baseados em leis que arruínam a possibilidade de surgimento da vida Agora podemos imaginar que um ser inteligente crie esses mundos mas mediante o exame de suas características 60 podemos articular alguns sinais distintivos de desígnio que evidência propósitos com o fim de julgar se é mais razoável acreditar que o cosmos tenha sido produzido por desígnio e não na possibilidade de que não tenha sido Alguns críticos apelam para a possibilidade de que o cosmos tenha uma história infinita para fortalecer e reapresentar a objeção baseada na unicidade Com tempo e possibilidades infinitas parece provável que alguma coisa assemelhada ao nosso mundo chegará a existir com toda a sua aparência de desígnio Se isso for o caso por que deveríamos ter na conta de tão espantoso que o nosso mundo possua o seu desígnio aparente e por que a explicação do mundo deveria requerer a postulação de um ou mais projetistas inteligentes As respostas repetem a manobra anterior ao insistir que se a objeção houvesse de ser decisiva então muitas explicações aparentemente respeitáveis também deveriam ser deixadas de lado Com frequência concedese o ponto de que o argumento teleológico não demonstra que um ou mais projetistas sejam requeridos em vez disso busca estabelecer que a é razoável a postulação de uma tal inteligência dotada de propósitos e que isso é preferível ao naturalismo Defensores recentes do argumento incluem George Schlesinger Robin Collins e Richard Swinburne O argumento é rejeitado por J L Mackie Michael Martin Nicholas Everitt e muitos outros Uma característica do argumento teleológico que atualmente recebe uma atenção crescente enfoca a epistemologia Foi apresentado o argumento por Richard Taylor 1963 Alvin Plantinga 2011 e em Beilby 2002 entre outros de que se dependemos com razoabilidade das nossas faculdades cognitivas é razoável acreditar que estás não são produzidas por forças naturalistas forças que ou são inteiramente conduzidas pelo acaso ou são o resultado de processos que não foram formados por uma inteligência prevalecente Uma ilustração pode ser de valia para a compreensão do argumento Imagine que Tom se depare com aquilo que parece ser um sinal que reporta alguma informação sobre a sua atual altitude algumas rochas numa configuração que lhe dá a sua localização atual e a altura precisa em metros do lugar a partir do nível do mar Se ele tivesse razões para pensar que este sinal fosse por completo o resultado de configurações casuais ele seria razoável em confiar no sinal Alguns teístas argumentam que não seria razoável e que a confiança nas nossas faculdades cognitivas exige de nós que aceitemos que foram formados por um agente criador bom e prevalente Isso reacende o ponto argumentativo de Descartes quanto a confiarmos na bondade de Deus para que se assegure que as nossas faculdades cognitivas estão em boas condições de funcionamento Objeções a esse argumento enfocam as explicações naturalistas 61 especialmente aquelas que são simpáticas à evolução Na epistemologia evolucionária tentase explicar a confiabilidade das nossas faculdades cognitivas em termos de tentativa e erro que levam à sobrevivência Uma réplica usada pelos teístas é a de que a sobrevivência por si só não necessariamente é ligada a crenças verdadeiras Em princípio poderia darse o caso de que crenças falsas aumentam as chances de sobrevivência De fato alguns ateístas acreditam que a crença em Deus foi crucial para a sobrevivência das pessoas embora a crença seja radicalmente falsa Os epistemologistas evolucionários respondem que a falta de uma ligação necessária entre as crenças que promovem a sobrevivência e a verdade e o fato de que algumas crenças falsas ou mecanismos que produzem crenças inconfiáveis promovem a sobrevivência não chegam nem perto de minar a epistemologia evolucionária Confira os trabalhos de Martin 1990 Mackie 1983 e Tooley 2008 cap 246 entre outros que lançam objeções ao argumento teleológico epistêmico Um outro desenvolvimento recente na argumentação teleológica incluiu um argumento baseado na noção de sintonia fina Argumentos baseados na noção de sintonia fina sustentam que a vida não existiria de não fosse pelo fato de que múltiplos parâmetros físicos por exemplo a constante cosmológica e a razão entre a massa do nêutron e a do próton possuem valores numéricos que caem dentro de uma gama de valores que conforme sabemos permite o surgimento da vida e é muita estreita em comparação com a gama de valores compatíveis com a teoria física corrente e que segundo sabemos impedem o surgimento da vida Por exemplo até mesmo pequenas mudanças na força nuclear fraca não teriam permitido o surgimento de estrelas nem tampouco as estrelas teriam perdurado se houvesse sido muito diferente a razão entre as forças do eletromagnetismo e da gravitação John Leslie observa Alterações de menos de uma parte em um bilhão na velocidade de expansão do universo na fase inicial do Big Bang teriam levado a uma expansão descontrolada com tudo se diluindo com tamanha rapidez que nenhuma estrela poderia ter se formado ou do contrário teriam levado ao colapso gravitacional em menos de um segundo LESLIE 2007 p 76 Robin Collins 2009 e outros argumentaram que o teísmo dá uma explicação melhor à sintonia fina do que o naturalismo Para críticas ao argumento consulte 62 Craig e Smith 1993 Para uma coleção de artigos que cobrem ambos os lados do debate e os argumentos de desígnio tanto na variante biológica quanto na cosmológica confira Manson 2003 Uma objeção mais encorpada contra praticamente todas as versões do argumento teológico afronta à assunção de que o cosmos é bom ou que é o tipo de coisa que seria produzida por um ser inteligente e completamente benevolente Isso nos leva diretamente à próxima questão central na filosofia de Deus 524 Os problemas do mal Se há um Deus que é onipotente onisciente e completamente bom por que existe o mal O problema do mal é a objeção ao teísmo mais largamente considerada tanto na filosofia ocidental quanto na oriental Há duas versões gerais do problema a versão dedutiva ou lógica que assere que a existência de qualquer mal independentemente do papel que possa desempenhar na produção de algum bem é incompatível com a existência de Deus e a versão probabilística que assere que dada a quantidade e a severidade do mal que de fato existe é improvável que Deus exista Atualmente o problema dedutivo é um tópico de debate menos frequente porque muitos filósofos mas não todos eles reconhecem que um ser completamente bom poderia permitir ou infligir algum mal sob certas condições que o compelem moralmente como quando se causa dor a uma criança para tirar do seu corpo um estilhaço O debate mais intenso diz respeito à probabilidade ou mesmo à possibilidade de que exista um Deus completamente bom à luz da vasta quantidade de mal existente no cosmos Tais argumentos do mal baseados em evidências podem ser argumentos dedutivos ou indutivos mas eles incluem alguma tentativa de mostrar que algum fato conhecido a respeito do mal traz um aporte de evidência contrária em relação ao teísmo por exemplo diminui a sua probabilidade ou o torna improvável quer seja logicamente incompatível com o teísmo quer não seja Consideremse o sofrimento humano e animal caudados pela morte pela ação de predadores por defeitos de nascença doenças galopantes a perversidade humana praticamente sem freios a tortura o estupro a opressão e os desastres naturais Considerese a frequência com que são de todo inocentes aqueles que padecem Por que deveria haver tanto sofrimento gratuito e aparentemente sem razão de ser Confrontados com o problema do mal alguns filósofos e teólogos negam que Deus seja onipotente e onisciente John Stuart Mill adotou essa linha e teólogos 63 panenteístas dos dias atuais também põem em questão os tratamentos tradicionais do poder Divino De acordo com o panenteísmo Deus é imanente no mundo experimentando o sofrimento dos oprimidos e laborando para produzir o bem a partir do mal embora a despeito dos esforços de Deus o mal sempre vá inevitavelmente macular a ordem da criação Uma outra resposta consiste em pensar em Deus como sendo muito diferente de um agente moral Brian Davies e outros sustentaram que o que significa Deus ser bom é diferente do que significa um agente ser moralmente bom DAVIES 2006 Confira também Gods Own Ethics Norms of Divine Agency and the Argument from Evil Uma estratégia diferente e mais substancial consiste em negar a existência do mal mas é difícil conciliar o monoteísmo tradicional com o ceticismo moral Ademais à medida em que seguimos considerando Deus como digno de adoração e como um objeto adequado do amor humano o apelo ao ceticismo moral terá muito pouco peso A ideia de que o mal é uma privação ou deturpação do bem pode ter alguma valia na reflexão cuidadosa sobre o problema do mal mas é difícil ver como por si só possa ir longe como forma de defender a crença na bondade de Deus A dor excruciante e o sofrimento sem fim parecem demasiado reais mesmo que sejam analisados em termos que os tornem de um ponto de vista filosófico de natureza parasitária à de alguma coisa valiosa As três grandes tradições monoteístas abraâmicas com sua ampla insistência na realidade do mal oferecem poucas razões para tentar desativar o problema do mal seguindo essa rota Na verdade o judaísmo clássico o cristianismo e o islã estão a tal ponto comprometidos com a existência do mal que uma razão para rejeitar o mal seria uma razão para rejeitar essas tradições religiosas Qual seria o sentido do ensinamento judaico sobre o Êxodo Deus liberando o povo de Israel da escravidão ou do ensinamento cristão sobre a encarnação Cristo revelando Deus como amor e liberando um poder Divino que no fim triunfará sobre a morte ou o ensinamento islâmico de Maomé o santo profeta de Alá que é inteiramente justo e misericordioso se a escravidão o ódio a morte e a injustiça não existissem Em parte a magnitude da dificuldade que alguém julgue que o problema do mal representa para o teísmo dependerá de seus comprometimentos em outras áreas da filosofia especialmente a ética a epistemologia e a metafísica Se no terreno da ética você sustenta que não deveria por nenhuma razão haver qualquer sofrimento evitável independentemente da causa ou consequência então o problema do mal entrará em conflito com a sua aceitação do teísmo tradicional Ademais se você sustenta que qualquer solução para o problema do mal deveria ser evidente para todos então uma vez mais o teísmo tradicional fica em perigo pois claramente 64 a solução não é evidente para todos Em larga medida o debate tem enfocado a legitimidade da adoção de uma posição de meio termo uma teoria dos valores que preservaria uma avaliação clara do profundo mal existente no cosmos bem como alguma compreensão de como isso poderia ser compatível com a existência de um Criador todopoderoso e completamente bom Poderia haver quaisquer razões pelas quais Deus permitiria males cósmicos Se não sabemos que razões poderiam ser estas estamos numa posição que nos permita concluir que não há nenhuma ou mesmo que não poderia haver nenhuma A exploração de diferentes possibilidades será conformada pela metafísica que se adote Por exemplo se você não acredita que o livrearbítrio existe então você não se deixará afetar por nenhum apelo dirigido ao valor positivo do livrearbítrio e do papel que teria a desempenhar ao produzir o bem como compensação pelo seu papel ao produzir o mal As respostas teístas ao problema do mal estabelecem uma distinção entre o que é uma defesa e o que é uma teodiceia Uma defesa busca estabelecer que ainda é possível uma crença racional na existência de Deus quando a defesa é empregada no enfrentamento da versão lógica do problema do mal e que a existência do mal não torna improvável a existência de Deus quando usada contra a versão probabilística Alguns adotaram a estratégia de defesa enquanto argumentam que estamos numa boa posição para termos uma crença racional na existência do mal e também em um Deus completamente bom que odeia este mal embora possamos ser incapazes de ver como essas duas crenças são compatíveis Uma teodiceia é uma empreitada mais ambiciosa e tipicamente é uma parte de um projeto mais amplo ao argumentar que é razoável acreditar que Deus existe com base no bem assim como no mal evidente presente no cosmos Numa teodiceia o projeto não é o de explicar todo e qualquer mal mas o de fornecer ao menos o arcabouço abrangente no seio do qual se possa entender ao menos vagamente como o mal que ocorre é parte de algum bem de amplitude geral por exemplo a superação do mal é em si mesma um grande bem Na prática defesa e teodiceia apelam frequentemente para fatores semelhantes sendo o primeiro e mais importante deles o que muitos chamam de Defesa do Bem Maior 525 O mal e o bem maior Na Defesa do Bem Maior sustentase que o mal pode ser compreendido ou como um acompanhamento necessário à produção de bens maiores ou como 65 uma parte integral desses bens Assim numa versão chamada frequentemente de Defesa Baseada no Livre Arbítrio propõese que constitui um bem a existência de criaturas livres que são capazes de se importar umas com as outras e cujo bem estar depende de sua ação livremente escolhida Para que esse bem se torne uma realidade argumentase deve haver a possibilidade bona fide de que pessoas façam mal umas às outras Às vezes a defesa baseada no livre arbítrio é usada de maneira estreita apenas para dar conta do mal que ocorre como resultado direto ou indireto da ação humana Mas tem sido estendida de maneira especulativa por aqueles que propõem uma defesa e não uma teodiceia para dar conta de outros males que poderiam ser produzidos por agentes sobrenaturais distintos de Deus De acordo com a argumentação empregada na visão do Bem Maior o mal cria a oportunidade de realizar grandes valores como as virtudes da coragem e da busca da justiça Reichenbach 1982 Tennant 1930 Swinburne 1979 e van Inwagen 2006 também sublinharam o bem representado por um mundo estável de leis naturais no qual os seres humanos e os animais aprendem sobre o cosmos e se desenvolvem de maneira autônoma independentemente da certeza de que Deus existe Alguns ateístas conferem valor ao bem de viver em um mundo sem Deus e essas visões têm sido usados pelos teístas para dar suporte à alegação de que Deus poderia ter tido razões para criar um cosmos em que a existência Divina não nos seja óbvia de uma maneira irresistível Se a existência de Deus fosse óbvia de uma maneira irresistível então as motivações voltadas para a virtude poderiam ser toldadas pelo interesse próprio e pelo simples medo de ofender um ser onipotente Além disso pode até haver algum bem em agir virtuosamente mesmo se as circunstâncias garantirem um desenlace trágico John Hick 1966 1977 assim argumentou e desenvolveu o que ele interpreta como uma abordagem irineica do problema do mal assim chamada em alusão a São Irineu do século 2 dC A partir dessa abordagem vêse como um bem que a humanidade desenvolva gradualmente a vida virtuosa evoluindo em direção a uma vida plena de graça maturidade e amor Isso entra em contraste com a teodiceia associada a Santo Agostinho de acordo com a qual Deus nos fez perfeitos e então permitiu que caíssemos na perdição apenas para sermos posteriormente redimidos por Cristo Hick pensa que o modelo agostiniano fracassa ao passo que o irineico é crível Algumas pessoas basearam um argumento a partir do problema do mal na alegação de que este não é o melhor mundo possível Se houvesse um Deus supremo de excelências em grau máximo seguramente Deus produziria a melhor criação possível Porque esta não é a melhor criação possível não há um Deus 66 supremo de excelências em grau máximo Na esteira de Adams 1987 muitos agora respondem que a noção de um melhor mundo possível em sua inteireza assim como a do número mais alto possível é incoerente Se a noção de um mundo melhor possível for incoerente isso contaria contra a crença de que poderia haver um ser supremo de excelências máximas Argumentouse em sentido contrário que as excelências Divinas admitem limites ou pontos máximos superiores que não sejam quantificáveis à maneira de uma série por exemplo a onipotência Divina inclui ser capaz de fazer qualquer coisa que seja lógica ou metafisicamente possível mas não requer que de fato seja realizado o maior número de atos ou uma série de atos tais que não possa haver mais deles Aqueles que estão preocupados com o problema do mal entram em disputas acerca de como avaliar a probabilidade da existência Divina Alguém que afirma que não vê nenhum propósito na existência do mal nem nenhuma justificação para que Deus o permite parece dar a entender que veria o propósito se este existisse Atentese para a diferença entre ver que não há um propósito e não ver um propósito No caso do cosmos será que fica mesmo algo de claro que se houvesse uma razão a justificar a existência do mal nós a veríamos William Rowe pensa que alguma compreensão plausível das razões que para Deus justificam o mal deveria ser detectável mas que há casos de males que são de todo gratuitos Defensores como William Hasker 1989 e Stephen Wykstra 1984 respondem que esses casos não constituem contraexemplos decisivos contra a alegação de que há um Deus bom Esses filósofos sustentam que podemos reconhecer o mal e compreender o nosso dever de fazer tudo aquilo de que formos capazes para prevenilo ou aliviálo Mas não deveríamos ter nossa incapacidade de enxergar a razão que Deus pode ter para permitir o mal na conta de fundamentos para pensar que não haja nenhuma razão Esse último passo levou a uma posição comumente chamada de teísmo cético Michael Bergmann Michael Rea William Alston e outros argumentaram que temos boas razões para sermos céticos sobre a nossa capacidade de avaliar se males ostensivamente gratuitos podem ser permitidos ou não por um Deus completamente bom BERGMANN 2012a 2012b 2001 BERGMANN REA 2005 Para críticas consulte Almeida e Oppy 2003 e Draper 2014 2013 1996 De modo geral é preciso notar que do suposto fato de que é improvável que vejamos a razão de Deus para permitir algum mal mesmo que ela exista seguese apenas que a nossa incapacidade de ver tal razão não constitui evidência forte contra o teísmo Para uma aplicação prática interessante do tradicional problema do mal ao tópico da ética da procriação consulte Marsh 2015 Argumentouse que se 67 uma pessoa de fato acredita que o mundo não é bom então isso pode fornecer uma razão prima facie contra a procriação Por que alguém deveria trazer filhos para um mundo que não é bom Um outro desenvolvimento recente e interessante na literatura em filosofia da religião tem sido o envolvimento dos filósofos com males ostensivos que Deus ordena na Bíblia vide BERGMANN MURRAY REA 2010 Para um envolvimento fascinante com o problema do mal que faz uso de narrativas bíblicas confira Wandering in Darkness de Eleonore Stump O tratamento do problema do mal também se estendeu a uma reflexão importante sobre o sofrimento de animais nãohumanos vide CLARK 1987 1995 2017 MURRAY 2008 MEISTER 2018 Os problemas colocados pelo mal e pelo sofrimento são múltiplos e estão sendo abordados por filósofos contemporâneos através dos espectros que incluem os religiosos e os nãoreligiosos Veja por exemplo The History of Evil editado por Meister e Taliaferro em seis volumes com as contribuições de mais de 130 autores com praticamente todos os pontos de vista religiosos e seculares e o recente The Cambridge Companion to the Problem of Evil editado por Meister e Moser 2017 Algumas representações da vida após a morte parecem ter pouca pertinência para a nossa resposta à magnitude do mal aqui e agora Há alguma ajuda para o entendimento de por que Deus permite o mal se todas as suas vítimas estiverem destinadas à felicidade depois Mas é difícil tratar a possibilidade de uma vida após a morte como inteiramente irrelevante A morte representa a aniquilação das pessoas ou ela é um evento que envolve uma transfiguração que as alça a um estado mais elevado Se você acha que não tem nenhuma importância se as pessoas continuam a existir depois da morte então tal especulação é de pouca relevância Mas suponha que uma vida após a morte está interligada num aspecto moral com esta vida com a oportunidade de reforma moral e espiritual com a transfiguração dos perversos com o rejuvenescimento e ocasiões para uma vida nova e talvez até mesmo com a reconciliação e a comunhão entre os opressores em busca de perdão e as suas vítimas Então essas considerações poderiam ser de valia em defesas contra argumentos baseados na existência do mal À medida que não se pode excluir a possibilidade de uma vida após a morte ligada do ponto de vista moral com a nossa vida então não se pode excluir a possibilidade de que Deus traga algo de bom dos males cósmicos O trabalho mais recente sobre a vida após a morte na filosofia da religião enfocou a compatibilidade de uma vida após a morte individual com algumas formas de fisicalismo Poderseia argumentar que um tratamento dualista das pessoas humanas é mais promissor Se você não é metafisicamente idêntico ao seu corpo 68 então talvez a aniquilação do seu corpo não seja a sua aniquilação Hoje uma diversidade de filósofos argumentaram que mesmo se o fisicalismo for verdadeiro uma vida após a morte ainda é possível Peter van Inwagen Lynne Baker Trenton Merricks e Kevin Corcoran A importância desse trabalho para o problema do mal está no fato de que o possível valor redentor de uma vida após a morte não deveria ser excluído sem argumentos se se pressupõe que o fisicalismo é verdadeiro para uma fonte de recursos rica e extraordinária sobre a literatura pertinente confira The Oxford Handbook of Eschatology de 2007 editado por J Walls 526 A experiência religiosa Talvez a justificação mais amplamente oferecida da crença religiosa diga respeito à ocorrência da experiência religiosa ou ao peso acumulado do testemunho daqueles que alegam ter tido experiências religiosas Colocando a segunda argumentação em termos teístas o argumento apela para o fato de que muitas pessoas deram testemunho de terem sentido a presença de Deus Tal testemunho fornece evidências de que Deus existe Que constitui evidência é uma conclusão que foi objeto de argumentos de Jerome Gellman Keith Yandell William Alston Caroline Davis Gary Gutting KaiMan Kwan Richard Swinburne Charles Taliaferro e de outros Que não constitui ou que sua força evidencial tem um valor trivial foi um ponto defendido com argumentos por Michael Martin J L Mackie Kai Nelson Matthew Bagger John Schellenberg William Rowe Graham Oppy e outros Num esforço para estimular investigações ulteriores considerese o seguinte esboço de alguns dos passos de um lado e do outro deste debate Objeção Uma experiência religiosa não pode ser uma experiência de Deus pois a experiência da percepção é apenas sensorial e se Deus é não físico Deus não pode ser objeto dos sentidos Resposta A tese de que a experiência da percepção é apenas sensorial pode ser contestada Yandell delimita algumas experiências como a que ocorre quando alguém tem uma sensação de que alguém está presente mas o faz sem nenhuma sensação que a acompanhe que podem fornecer fundamentos 69 para que se questione uma noção sensorial estreita da experiência da percepção Objeção Um testemunho de que se teve experiência de Deus é apenas um testemunho de que uma pessoa pensa que teve experiência de Deus é apenas o testemunho de uma convicção não evidência Resposta A literatura sobre a experiência religiosa dá testemunho da existência de uma experiência de algum ser Divino com base na qual o sujeito da experiência vem a pensar que a experiência é de Deus Numa leitura caritativa o testemunho não é o testemunho de uma convicção mas de experiências que constitui os fundamentos para a convicção Confira Bagger de 1999 para uma articulação vigorosa desta objeção e atente para a resposta de Kaiman Kwan de 2003 Objeção Visto que a experiência religiosa tem um caráter único como poderia alguém chegar a determinar se ela é confiável Simplesmente nos falta a capacidade de examinar o objeto da experiência religiosa para testar se as experiências reportadas são de fato confiáveis Resposta Como aprendemos com Descartes todas as nossas experiências de objetos externos se deparam com o problema da unicidade É possível em princípio que todos os nossos sentidos estejam equivocados e que não tenhamos a vida pública dentro de um corpo que pensamos ter Não podemos sair de nossa própria subjetividade para defender as nossas crenças comuns baseadas na percepção num grau em nada maior do que o poderíamos fazer no caso religioso Confira o debate entre William Alston 2004 e Evan Fales 2004 70 Objeção Os vários casos reportados da experiência religiosa diferem entre si radicalmente e o testemunho de um campo neutraliza o testemunho dos outros O testemunho dos hindus cancela o testemunho dos cristãos O testemunho dos ateístas de terem experiência da ausência de Deus cancela o testemunho dos crentes Resposta Várias respostas poderiam ser oferecidas aqui Um testemunho de que se experimenta a ausência de Deus poderia ser mais bem compreendido como um testemunho de que não se tem experiência de Deus O insucesso em ter uma experiência de Deus poderia constituir uma justificação para acreditar que Deus não existe somente até o ponto em que possamos ter razões para crer que se Deus existe todos teriam experiência de Deus Os teístas poderiam até fazer uso da alegação de muitos ateístas de que pode ser algo de virtuoso viver de uma maneira ética com crenças ateístas Talvez se existir um Deus Deus não pense que isso seja de todo mal e na verdade deseje que a crença religiosa ganhe forma sob condições que envolvem a confiança e a fé em vez do conhecimento A diversidade das experiências religiosas levou alguns defensores do argumento da experiência religiosa a enfraquecer a sua conclusão Assim Gutting 1982 sustenta que o argumento não é forte o bastante para defender plenamente uma tradição religiosa específica mas que é forte o bastante para derrubar um naturalismo antirreligioso Outros defensores usam a sua tradição particular para lidar com alegações em competição ostensiva baseadas em diferentes tipos de experiências religiosas Os teístas propuseram que as experiências mais impessoais do Divino representam apenas um aspecto de Deus Deus é uma pessoa ou é semelhante a uma pessoa mas Deus também pode ser experimentado por exemplo por pura unidade luminosa Os hindus alegaram que a experiência de 71 Deus como um ser pessoal representa apenas um estágio na totalidade da jornada da alma no caminho da verdade sendo a maior verdade o fato de que Brahman transcende a pessoalidade Para uma discussão dessas objeções respostas e referências consulte Taliaferro 1998 A que conclusão final uma pessoa pode levar o argumento é algo que dependerá de suas concepções globais em muitas áreas da filosofia A natureza holística e entrelaçada tanto dos argumentos teístas quanto dos ateístas pode ser prontamente ilustrada Se você diminui o valor das implicações da experiência religiosa e mantém um padrão elevado no que concerne ao ônus da prova para qualquer tipo de perspectiva religiosa então é altamente provável que os argumentos clássicos favoráveis à existência de Deus não serão persuasivos Ademais se for possível mostrar que o teísmo é desde o princípio intelectualmente confuso então os argumentos teístas de experiência religiosa terão pouco peso Um testemunho de ter experimentado Deus não terá mais peso do que um testemunho de ter experimentado um círculo quadrado e as explicações nãoreligiosas da experiência religiosa como as de Freud como resultantes do desejo de satisfação de desejos as de Marx como reflexo da base econômica ou as de Durkheim como produto de forças sociais terão os seus atrativos aumentados Se por outro lado você pensa que o quadro teísta é coerente e que o testemunho de uma experiência religiosa fornece alguma evidência favorável ao teísmo então a sua avaliação dos argumentos teístas clássicos poderia ser mais favorável pois eles serviriam para corroborar e dar apoio adicional àquilo em que você já tem alguma razão para acreditar Desse ponto privilegiado de observação o apelo à satisfação de desejos à economia e às forças sociais poderia exercer um papel mas o papel é o de explicar por que algumas partes envolvidas não têm experiências de Deus e de contrariar a acusação de que o insucesso em ter tais experiências fornece evidência de que não há uma realidade religiosa Para uma coleção excelente de trabalhos recentes sobre a explicação do surgimento e da continuação da experiência religiosa confira Schloss e Murray 2009 Não há espaço aqui para cobrir os muitos outros argumentos favoráveis e contrários à existência de Deus mas alguns argumentos adicionais recebem uma breve menção O argumento dos milagres parte de eventos extraordinários específicos argumentado que eles fornecem razões para acreditar que exista um agente 72 sobrenatural ou mais modestamente razões para ceticismo quanto à suficiência de uma visão de mundo naturalista O argumento atraiu muita atenção filosófica especialmente desde a rejeição dos milagres por David Hume O debate voltouse em larga medida para a maneira pela qual se deve define um milagre se compreendem as leis da natureza e se específica os princípios de evidência que governam a explicação de experiências históricas altamente incomuns Há um debate considerável sobre se se dá o caso de que a argumentação de Hume contra os milagres simplesmente incorre em petição de princípio contra os crentes Uma exposição detalhada é impossível neste curto verbete Taliaferro argumentou alhures que a melhor forma de enxergar a argumentação de Hume contra a racionalidade da crença em Deus é como parte integrante da sua argumentação geral a favor de uma forma de naturalismo TALIAFERRO 2005b Há vários argumentos que são propostos para motivar a crença religiosa Um dos mais interessantes e populares é um argumento baseado numa aposta e frequentemente associado a Pascal 16231662 Destinase a oferecer razões práticas para cultivar a crença em Deus Imagine que você esteja incerto quanto a existir ou não um Deus Está ao seu alcance viver de acordo com qualquer das duas pressuposições e talvez mediante práticas variadas ser levado a acreditar em uma ou em outra Haveria boas consequências trazidas pela crença em Deus mesmo se sua crença fosse falsa e se a crença for verdadeira você receberá um bem ainda maior Também haveria boas consequências resultantes de acreditar que não há nenhum Deus mas nesse caso as consequências não seriam distintas se você estivesse certo Se no entanto você acreditar que não há nenhum Deus e você estiver errado então você estaria se arriscando a perder muitos bens resultantes da crença em que Deus existe e da própria efetiva existência Divina Com esse fundamento pode parecer razoável acreditar que há um Deus Em formas diferentes o argumento pode receber contornos mais duros por exemplo imagine que se você não acreditar em Deus e Deus existir o inferno está à espera O argumento pode ser posto como um apelo ao interesse próprio individual você ficará melhor ou de forma mais geral os crentes cujas vidas estão unidades podem realizar alguns dos bens presentes em uma vida religiosa madura Aqueles que lançam objeções se preocupam com a suposição de que alguém possa um dia ser capaz de reduzir o número de escolhas possíveis a apenas uma seleção estreita por exemplo a de escolher ou teísmo ou o naturalismo Alguns pensam que o argumento é por demais egoísta e como tal ofensivo à religião Muitas dessas objeções levaram a respostas plausíveis RESCHER 1985 Para uma exploração 73 profunda dos argumentos pertinentes vejase a coleção de ensaios editada por Jeffrey Jordan 1994 O trabalho recente acerca das apostas de teor pascaliano é pertinente para o trabalho sobre a natureza da fé ela é voluntária ou involuntária o seu valor quando é se é que chega a ser uma virtude e a relação com a evidência à medida que a fé envolve a crença é possível ter fé sem evidência Para uma visão panorâmica e uma análise promissora confira Chappell 1996 Swinburne 1979 e Schellenberg 2005 Uma característica promissora deste trabalho recente está no fato de que é frequentemente acompanhado de uma compreensão apurada da revelação que não se limita a uma escritura sagrada mas que vê um papel revelador na escritura acrescida da história de sua interpretação o uso dos credos ícones e assim por diante vide ABRAHAM 1998 Uma questão que tem florescido nos últimos anos é a de determinar se a ciência cognitiva da religião CCR é significativa para a verdade ou a racionalidade do comprometimento religioso De acordo com a CCR a crença em agentes sobrenaturais parece ser natural do ponto de vista cognitivo BARRETT 2004 KELEMEN 2004 DENNETT 2006 DE CRUZ DE SMEDT 2010 e fácil de disseminar BOYER 2001 A tese de que a religião é algo que vem naturalmente levou alguns filósofos inclusive Alvin Plantinga como parece ser o caso 2011 p 60 a inferir que possuímos evidência científica da existência do sensus divinitatis proposto por Calvino Mas outros argumentaram que a CCR pode intensificar o problema do ocultamento divino visto que diversos conceitos religiosos são naturais do ponto de vista cognitivo e visto que os primeiros seres humanos parecem ter carecido de qualquer coisa semelhante a um conceito teísta Marsh 2013 Há muitos outras questões relativas à CCR que estão sendo investigados como por exemplo se ela fornece uma contestação apta a desacreditar a religião MURRAY SCHLOSS 2009 se ela representa uma contestação a perspectivas religiosas como o Ultimismo de Schellenberg MARSH 2014 e se ela representa um desafio para o valor da dignidade humana AUDI 2013 Não é necessário dizer que no momento presente não há nada assemelhado a um consenso claro quanto a ser a CCR algo que deve ser visto pelos crentes religiosos como preocupante bemvindo ou nenhuma das duas coisas Para ter acesso a algum trabalho adicional sobre o arcabouço no qual se pode avaliar a evidência a favor e contrária ao teísmo e outras cosmovisões religiosas e seculares confira Evans 2010 e Chandler e Harrison 2012 Nos últimos vinte anos temse dado uma atenção crescente à dimensão estética dos argumentos favoráveis e contrários a concepções religiosamente significativas de 74 4 NT A Enciclopédia foi publicada em novembro de 2021 GOETZ S TALIAFERRO C ed Encyclopedia of Philosophy of Religion 4 volumes Hoboken NJ Wyley Blackwell 2021 uma realidade última e do significado da vida vide BROWN 2004 WYNN 2013 HADLEY 2016 MAWSON 2016 TALIAFERRO EVANS 2010 2013 6 O pluralismo religioso Em meio ao trabalho recente sobre as tradições filosóficas tem havido uma firme e crescente presença das tradições nãomonoteístas Um proponente inicial deste formato expandido foi Ninian Smart 19272001 que por meio de muitas publicações acadêmicas e também populares garantiu para as filosofias do hinduísmo e do budismo um lugar como componentes do cânone em filosofia da religião no âmbito da língua inglesa Smart defendia a tese de que há diferenças genuínas entre as tradições religiosas Portanto ele resistiu à ideia de ver alguma experiência central como algo que possa capturar a identidade essencial do que é ser religioso Sob a tutela de Smart tem havido um crescimento considerável na filosofia da religião que atravessa barreiras culturais Wilfred Cantwell Smith 19162000 também fez muito para melhorar a representatividade da reflexão e das religiões nãoocidentais Vejase por exemplo a série da Routledge Investigating Philosophy of Religion com volumes já publicados ou vindouros sobre o budismo BURTON 2017 hinduísmo RANGANATHAN 2018 taoismo e confucionismo A Encyclopedia of Philosophy of Religion já mencionada anteriormente em cinco volumes a ser publicada pela Wyley Blackwell projetada para 20214 conterá amplas contribuições no mais amplo espectro até a época presente de tratamentos filosóficos de religiões diversas A explicação da filosofia da religião tem incluído traduções novas de textos filosóficos e religiosos da Índia China Sudeste Asiático e África As figuras excepcionais das tradições nãoocidentais tem um papel ampliado na filosofia da religião intercultural e no diálogo religioso O falecido Bimal Krishna Matilal 1935 1991 deu contribuições destacadas para enriquecer a exposição do Ocidente à filosofia da religião indiana vide MATILAL 1882 Entre os filósofos asiáticos de meados do Século XX dois que se alçam a uma posição de especial de destaque 75 são T R V Murti 1955 e S N Dasgupta 19221955 Ambos introduziram altos níveis de exigência filosófica bem como a filologia essencial para educar os pensadores ocidentais Como evidência da produtividade nãoocidental no mundo anglófono confira Arvind Sharma 1990 1995 Existem agora tratamentos extensos do panteísmo e guias a diversas concepções religiosas do cosmos que são acessíveis aos estudantes O maior interesse pelo pluralismo religioso levou a uma extensa reflexão sobre a compatibilidade e possível síntese das religiões John Hick é a figura preeminente no trabalho de síntese a respeito das tradições religiosas Hick 1973a 1973b propôs um quadro complexo da vida após a morte incluindo componentes de diversas tradições Ao longo de publicações que se estenderam por muitos anos Hick transitou de uma visão teísta de Deus com uma base ampla para o que chama de o Real uma realidade sagrada numenal Hick alega que religiões diferentes nos fornecem um relance ou acesso parcial ao Real Em um artigo influente The New Map of the Universe of Faiths 1973a Hick salientou a possibilidade de que muitas das grandes religiões do mundo são reveladoras do Real Vistos em um contexto histórico esses movimentos de fé o judaicocristão o budista o hindu o muçulmano não são essencialmente rivais Eles começaram em épocas diferentes e em lugares diferentes e cada um se expandiu para dentro do mundo circundante de religiões naturais primitivas até que a maior parte do mundo fosse arrastada para um ou outra das grandes fés reveladas E assim que esse padrão global havia se estabelecido permaneceu desde então razoavelmente estável Então na Pérsia apareceu o grande profeta Zoroastro a China produziu LaoTsé e então viveram o Buda o Mahavira o fundador da religião jainista e provavelmente no fim deste período foi escrito o Bhagavad Ghita e a Grécia produziu Pitágoras e então terminando a idade de ouro Sócrates e Platão Então depois do intervalo de cerca de trezentos anos veio Jesus de Nazaré e o surgimento do cristianismo e depois de outro intervalo o profeta Maomé e a ascensão do islã A sugestão que devemos considerar é a de que todos esses foram movimentos da revelação divina HICK 1989 p 136 grifo acrescentado 76 Hick vê essas tradições assim como outras como diferentes pontos de contato em que uma pessoa poderia estar em uma relação com a mesma realidade ou o Real As grandes fés de alcance mundial dão corpo a percepções e concepções diferentes e concomitantemente a diferentes respostas ao Real de dentro do âmbito das principais formas variantes de ser humano e àquilo em que dentro de cada uma delas tem lugar a transformação da existência humana de um estado autocentrado para um estado centrado na Realidade 1989 p 240 Hick usa Kant para desenvolver a sua tese central Kant estabelece uma distinção entre númeno e fenômeno ou entre uma Ding an sich a coisa em si e a coisa como ela aparece à consciência humana Nesta vertente do pensamento de Kant não a única vertente mas aquela que eu estou buscando usar a serviço da epistemologia da religião o mundo numenal existe independentemente da nossa percepção dele e o mundo fenomênico é o mesmo mundo tal como aparece para a consciência humana Eu pretendo dizer que o Real numenal é experienciado e pensado por diferentes mentalidades humanas que formam e são formadas por tradições religiosas diferentes como a gama de bens e absolutos que a fenomenologia da religião atesta 1989 p 241242 Uma vantagem da posição de Hick é a de corroer as justificativas para o conflito religioso Caso seja exitosa essa abordagem ofereceria uma forma de acomodar as diversas comunidades e de minar os fundamentos do foi uma fonte de graves conflitos no passado O trabalho realizado por Hick desde o começo da década dos oitentas forneceu um ímpeto para não tomar aquilo que aparente ser um conflito religioso 77 como contradições abertas Ele propôs uma filosofia da religião que concedeu uma atenção cuidadosa ao contexto histórico e social Ao fazêlo Hick pensava que descrições aparentemente conflitantes do sagrado poderiam ser reconciliadas como representações de diferentes perspectivas em torno da mesma realidade o Real vide HICK 2004 2006 A reposta à proposta de Hick tem sido variada Alguns sustentam que o próprio conceito de o Real é incoerente ou inadequado numa perspectiva religiosa De fato articular a natureza do Real não é uma tarefa fácil Hick escreve que do Real não se pode dizer que seja uma coisa ou muitas uma pessoa ou coisa uma substância ou um processo bom ou mau dotado de propósitos ou não Nenhuma das descrições concretas que têm aplicação no âmbito da experiência humana pode se aplicar literalmente ao fundamento insuscetível de ser experienciado de tal âmbito Não podemos sequer falar disso como uma coisa ou uma entidade 1989 p 246 Argumentouse que Hick não assegurou a idêntica aceitabilidade das diversas religiões mas antes a sua inaceitabilidade Nas suas formas clássicas o judaísmo o islã e o cristianismo são divergentes Se digamos a Encarnação de Deus em Cristo não ocorreu não se segue que o cristianismo é falso Em resposta Hick buscou interpretar alegações científicas acerca da Encarnação de maneiras que não comprometem os cristãos com a verdade literal de Deus se fazendo carne A verdade da Encarnação foi interpretada em termos tais como estes em Jesus Cristo ou nas narrativas a respeito de Cristo Deus é revelado Ou ainda Jesus Cristo estava de tal forma unido à vontade de Deus que as suas ações foram e são a exibição funcional do caráter de Deus Talvez em razão do desafio de Hick o trabalho filosófico a respeito da encarnação e de outras crenças e práticas específicas de tradições religiosas tem recebido uma atenção renovada vide TALIAFERRO MEISTER 2009 Hick foi uma força condutora e amplamente apreciada na expansão da filosofia da religião no fim do Século XX Além da expansão da filosofia da religião no sentido de passar a levar em conta uma conjunto mais amplo de religiões o campo também testemunhou uma expansão em termos metodológicos Os filósofos da religião redescobriram a filosofia medieval floresceram as novas traduções e comentários de textos medievais 78 cristãos judaicos e islâmicos Há agora um esforço consciente e deliberado de combinar o trabalho feito a respeito dos conceitos na crença religiosa com uma compreensão crítica das suas raízes sociais e políticas o trabalho de Foucault foi influente neste terreno a filosofia feminista da religião tem sido especialmente importante no processo de repensar o que pode ser chamado de ética da metodologia e visto que esse é em alguns aspectos o debate mais atual no campo é um ponto apropriado para concluir este verbete dando destaque ao trabalho de Pamela Sue Anderson 19552017 e de outros Anderson 1997 2018 procura questionar os aspectos nos quais a problemática do gênero adentra as concepções tradicionais de Deus e nas suas repercussões morais e políticas Ela também propõe um conceito de método que delimita a justiça e o florescimento humano Um sinal de legitimação da filosofia deveria ser o grau em que ela contribui para o bemestar humano Num certo sentido está é a venerável tese presente em parte da filosofia antiga e especificamente platônica que enxergava o objetivo e o método da filosofia em termos da virtude e do bem A filosofia feminista hoje não é exclusivamente uma empreitada crítica uma crítica do patriarcado Para um tratamento construtivo e sútil da contemplação e prática religiosas consulte Coakley 2002 Um outro movimento chave que está em desenvolvimento veio a ser chamado de Filosofia Continental da Religião Um grande defensor dessa nova virada é John Caputo Esse movimento aborda os temas deste verbete o conceito de Deus o pluralismo a experiência religiosa a metafísica e a epistemologia à luz de Heiddegger Derrida e outros filósofos continentais Para um tratamento representativo deste movimento confira os trabalhos de Caputo 2001 e Crocket Putt e Robins 2014 Referência bibliográfica ABRAHAM W J Canon and Criterion in Christian Theology Oxford Oxford University Press 1998 doi10109301992500300010001 ABRAHAM W J AQUINO F D ed The Oxford Handbook of the Epistemology of Theology Oxford Oxford University Press 2017 doi101093oxfordhb 97801996622410010001 ADAMS M M 1999 Horrendous Evils and the Goodness of God Ithaca NY Cornell University Press 1999 79 ADAMS R M The Virtue of Faith and Other Essays in Philosophical Theology New York Oxford University Press 1987 ALMEIDA M J OPPY G Sceptical Theism and Evidential Arguments from Evil Australasian Journal of Philosophy 814 496516 2003 doi101080713659758 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Argumentos morais são importantes e interessantes São interessantes porque a avaliação de sua correção requer que atentemos para praticamente todas as questões filosoficamente importantes tratadas na metaética São importantes em razão da posição proeminente 99 que ocupam em argumentos apologéticos populares em apoio à crença religiosa A evidência para tanto pode ser encontrada na impressionante popularidade de Mere Christianity Cristianismo puro e simples 1952 de C S Lewis que é quase com certeza o livro de apologética mais vendido do século XX e que começa com um argumento moral para a existência de Deus Muitas pessoas comuns veem a religião como aquilo que de alguma forma fornece uma base ou fundamento para a moralidade Poderia parecer que este fato favorece os argumentos religiosos para a moralidade em vez de favorecer os argumentos morais para a existência de Deus mas se alguém acredita que a moralidade é de alguma forma objetiva ou real e que tal realidade moral requer uma explanação os argumentos morais em defesa da realidade de Deus apresentamse naturalmente A aparente conexão entre a moralidade e a religião parece no entender de muitos sustentar a alegação de que as verdades morais requerem um fundamento religioso ou que podem ser mais bem explicadas pela existência de Deus ou por algumas qualidades e ações de Deus Depois de oferecer alguns comentários gerais acerca de argumentos teístas e uma breve história dos argumentos morais este ensaio discutirá diversas formas do argumento moral Uma distinção muito importante é aquela existente entre os argumentos morais de natureza teórica e aqueles de feição prática ou pragmática Dos primeiros podese dizer que é melhor vêlos como argumentos que se iniciam a partir de supostos fatos morais e que argumentam que Deus é necessário para explicar tais fatos ou ao menos que Deus fornece para eles uma melhor explicação do que podem oferecer uma explicação melhor do que as de cunho secular Já os últimos tipicamente principiam com alegações acerca de algum bem ou fim requerido pela moralidade e argumentam que esse fim é inatingível a não ser que Deus exista A questão concernente a como saber se essa distinção é firme e consistente será uma das questões a serem discutidas visto que algumas pessoas argumentam que argumentos práticos considerados em si mesmos não podem servir de base para a crença racional Para lidar com tais preocupações os argumentos práticos podem ter de incluir também uma dimensão teórica 1 Os objetivos dos argumentos teístas Antes de tentarmos explicar e avaliar os argumentos morais para a existência de Deus seria útil obter alguma visão mais ampla sobre os objetivos dos argumentos para a existência de Deus De forma genérica meu termo para os argumentos 100 favoráveis à existência de Deus será argumentos teístas Naturalmente há visões diversas a esse respeito mas a maior parte dos proponentes contemporâneos de tais argumentos não enxergam nos argumentos teístas tentativas de fornecer provas no sentido em que destas se supõe que possam fornecer argumentos válidos com premissas que nenhuma pessoa razoável poderia negar Um parâmetro de realização exitosa de tal magnitude certamente representaria uma exigência excessiva para o que pode ser tido na conta de um sucesso e é com razão que os proponentes de argumentos teístas assinalam que em qualquer campo fora da lógica formal argumentos filosóficos com conclusões interessantes quase nunca alcançam esse patamar Questões mais razoáveis a serem feitas sobre os argumentos teístas presumivelmente seriam as seguintes Há argumentos válidos para a conclusão de que Deus existe com premissas que sejam objeto de conhecimento ou crença razoável por parte de algumas pessoas As premissas de tais argumentos são mais razoáveis do que sua negação ao menos no entender de algumas pessoas razoáveis Argumentos que satisfizessem tais rigores poderiam ser valiosos para tornar a crença em Deus algo de razoável para algumas pessoas ou mesmo para dar a algumas pessoas o conhecimento da existência de Deus ainda que venha a ser o caso que algumas das premissas presentes nos argumentos pudessem ser negadas de forma razoável por outras pessoas e por conseguinte que os argumentos falhem como provas Naturalmente é possível que um argumento para a existência de Deus possa fornecer alguma evidência de que Deus existe no sentido de que o argumento aumenta a probabilidade ou a plausibilidade da alegação de que Deus existe mesmo que o argumento por si só não forneça sustentação suficiente para a crença plenamente estabelecida de que Deus existe Um proponente do argumento moral que concebesse o argumento desta forma poderia em sendo esse o caso ter o argumento moral na conta de um componente a ser agregado a outros no âmbito de uma defesa cumulativa do teísmo e sustentar que o argumento moral deve ser suplementado por outros argumentos possíveis tais como o argumento da sintonia fina baseado nas constantes físicas do universo ou ainda o argumento da experiência religiosa Um nãocrente poderia até mesmo conceder o ponto de que alguma versão de um argumento teísta possui alguma força enquanto evidência e no entanto alegar que o balanço geral da evidência disponível não dá suporte à crença Uma questão muito importante à qual não poderemos dar uma resposta aqui diz respeito a quem teria o ônus da prova no que concerne aos argumentos teístas Muitos filósofos secularistas seguem Antony Flew 1976 ao sustentarem 101 que há uma presunção de ateísmo Acreditar em Deus é como acreditar no Monstro do Loch Ness ou em duendes algo que pessoas razoáveis não fazem sem evidência suficiente Na falta de tal evidência a postura correta é o ateísmo e não o agnosticismo Esta presunção de ateísmo tem sido desafiada de diversas formas Alvin Plantinga 2000 argumentou que uma crença razoável em Deus não tem de ser baseada em evidência proposicional mas que pode ser apropriadamente básica Nesta concepção uma crença razoável em Deus pode resultar de uma faculdade básica chamada de sensus divinitatis pelo teólogo João Calvino e assim não precisa de nenhum suporte argumentativo em absoluto Como resposta alguns argumentariam que mesmo se a crença teísta não for fundamentada em evidência proposicional ainda assim poderia requerer evidência nãoproposicional como a experiência de tal sorte que não resta claro que a concepção de Plantinga afaste por si só o desafio associado ao ônus da prova Uma segunda maneira de desafiar a presunção de ateísmo consiste em questionar uma assunção implícita adotada por aqueles que defendem tal presunção que é a de que a crença em Deus é epistemologicamente mais arriscada do que a descrença A assunção poderia ser defendida da seguinte forma Poderseia pensar que teístas e ateístas partilham crenças em muitas entidades átomos objetos físicos de tamanho mediano animais e estrelas por exemplo Contudo alguém que creia em duendes ou monstros marítimos além desses objetos comumente aceitos incorre ao fazêlo na posse do ônus da prova Uma tal pessoa crê em uma coisa a mais e assim parece incorrer em um risco epistemológico adicional Poder seia pensar que a crença em Deus se assemelha de uma maneira relevante à crença em um duende ou em um monstro marinho e que assim sendo o teísta também carrega um ônus da prova adicional Sem boas evidências a favor da crença em Deus a opção segura é refrear o ímpeto de formar uma crença Contudo o teísta pode sustentar que está explicação não fornece uma representação precisa da situação Em vez disso o teísta pode argumentar que o debate que o debate entre o teísmo e o ateísmo não é apenas uma discussão sobre a existência ou inexistência de uma coisa a mais no mundo Com efeito Deus não deve ser entendido em absoluto como uma entidade constante do mundo qualquer entidade do gênero por definição não seria Deus Na verdade é melhor encarar o debate como sendo um debate acerca da natureza do universo O teísta crê que cada objeto presente no mundo natural existe porque Deus cria e conserva aquele objeto cabendo a todas as coisas finitas a característica de serem dependentes de Deus O ateísta o nega e afirma que as entidades bases do mundo natural têm 102 5 NT Usei com uma ligeira adaptação a tradução de Alexandre Correia para a Suma Teológica publicada pela editora Ecclesiae como característica existirem por conta própria Se esta for a maneira correta de pensar sobre o debate então não é óbvio que o ateísmo seja mais seguro do que o ateísmo O debate não é acerca da existência de um objeto em particular mas acerca da natureza do universo como um todo As duas partes da contenda fazem alegações acerca da natureza de tudo que há no mundo material e as alegações de ambas as partes parecem ser arriscadas Esse ponto é particularmente importante ao lidarmos com os argumentos morais a favor do teísmo visto que uma das questões postas por tais argumentos é a adequação de uma visão de mundo naturalista como explicação da moralidade Filósofos comprometidos com as evidências podem indagar com propriedade acerca das evidências a favor do teísmo mas também parece apropriado indagar acerca da evidência favorável ao ateísmo se o ateísta estiver comprometido com uma visão metafísica rival tal como o naturalismo 2 A história dos argumentos morais para a existência de Deus Algo assemelhado a um argumento moral para a existência de Deus ou ao menos um argumento fundamentado na noção de valor pode ser encontrado na quarta prova presente nas Cinco Vias AQUINO 12651274 I I 3 Ali Aquino começa com a alegação de que dentre os seres de posse de qualidades tais como bom verdadeiro nobre verificamse gradações Presumivelmente o que ele quer dizer é que algumas coisas que são boas são melhores do que outras coisas boas talvez algumas pessoas nobres sejam mais nobres do que outras que são nobres Com efeito Aquino alega que ao estabelecermos desta forma gradações nas coisas estamos ao menos implicitamente comparandoas a algum padrão absoluto Aquino acredita que tal padrão não pode ser meramente ideal ou hipotético e que sendo assim tal gradação só é possível se houver algum ser que tenha a qualidade em questão em sua extensão máxima de modo que há portanto algo verdadeiríssimo ótimo e nobilíssimo e consequentemente maximamente ser pois as coisas maximamente verdadeiras são maximamente seres como diz Aristóteles na Metafísica II5 Em seguida Aquino afirma que este ser que fornece o padrão é também a causa ou explicação para a existência de tais qualidades e que uma tal 103 causa deve ser Deus É óbvio que o argumento se remete em profundidade a assunções platônicas e aristotélicas que já não são mais amplamente aceitas pelos filósofos Para que o argumento se mostre plausível nos dias de hoje tais assunções teriam de ser defendidas ou em caso contrário o argumento teria de ser reformulado de uma maneira que o libere de seu lar metafísico original Provavelmente as versões mais influentes do argumento moral em apoio à crença em Deus pode deixarse remontar a Kant 1788 1956 que de modo notório argumentou que os argumentos teóricos para a existência de Deus são malsucedidos mas que apresentou um argumento racional para a crença em Deus como sendo um postulado da razão prática Kant sustentava que a vontade de um ser racional e moral deve necessariamente voltarse para o mais elevado bem o que consiste em um mundo no qual as pessoas sejam moralmente boas e felizes e no qual a virtude moral seja a condição para a felicidade A última condição implica que este último fim deve ser buscado exclusivamente pela ação moral Contudo Kant sustentava que uma pessoa não pode querer racionalmente um tal fim sem acreditar que as ações morais podem ter sucesso em lograr um tal fim e que isso demanda a crença em que a estrutura causal da natureza é propícia à realização deste fim por meios morais Isso é equivalente à crença em Deus um ser moral que é responsável em última análise pelo caráter do mundo natural Os argumentos de Kant serão discutidos mais adiante neste artigo Argumentos inspirados em Kant foram proeminentes no século XIX e continuaram a ser importantes até meados do século XX Tais argumentos podem ser encontrados por exemplo em W R Sorley 1918 Hastings Rashdall 1920 e A E Taylor 19451930 Embora Henry Sidgwick não tenha sido ele mesmo um proponente de um argumento moral para a existência de Deus algumas pessoas argumentaram que o seu pensamento apresenta os ingredientes para um tal argumento vide WALLS BAGGETT 2011 No século XIX John Henry Newman 1870 também fez um bom uso de um argumento moral em sua argumentação a favor da crença em Deus desenvolvendo o que poderia ser chamado de um argumento fundado na consciência Na filosofia recente houve uma revivescência de teorias metaéticas fundadas na noção de mandamento divino o que por seu turno ensejou novas versões do argumento moral encontradas em pensadores como Robert Adams 1987 John Hare 1996 e C Stephen Evans 2010 Contudo é importante assinalar que existem versões do argumento moral para a existência de Deus que são 104 completamente independentes da teoria do mandamento divino e ainda que tal possibilidade pode ser vista em argumentos elaborados por Angus Ritchie 2012 e Mark Linville 2009 Talvez a explanação mais extensa e elaborada de um argumento moral para a existência de Deus produzido na filosofia recente seja aquele encontrado em David Baggett e Jerry L Walls 2016 Este livro examina uma forma abrangente do argumento moral e apresenta uma exploração extensa das questões subjacentes Nem é necessário dizer que esses argumentos renovados também deram azo a novas críticas Argumentos morais para a existência de Deus podem ser compreendidos como variações do seguinte modelo 1Existem fatos morais objetivos 2 Deus fornece a melhor explicação para a existência de fatos morais objetivos 3 Portanto Deus provavelmente existe Como veremos há uma diversidade de características da moralidade às quais se pode apelar no primeiros passo dos argumentos contemplados neste modelo assim como uma diversidade de maneiras pelas quais poderseia pensar que Deus fornece uma explicação de tais características no segundo passo do modelo O uso de expressões um tanto vagas como fatos morais objetivos destina se a dar espaço a tal diversidade Ambos os tipos de premissas são obviamente suscetíveis a serem contestadas Por exemplo a primeira premissa de um argumento desta natureza pode ser contestada mediante concepções metaéticas populares que veem a moralidade como subjetiva ou expressiva e não como algo que consista em fatos objetivos assim como pode ser também contestada por pensadores céticos em moralidade A segunda premissa pode ser contestada com base em explicações rivais da natureza da moralidade explicações que não requeiram Deus Nesse caso argumentos acerca da segunda premissa podem demandar uma comparação entre explicações teístas da moralidade e estas concepções rivais É fácil perceber que à proponente de um argumento moral cabe uma tarefa complexa Ela deve defender a realidade e a realidade e a objetividade da característica da moralidade em exame mas também defender a alegação de que Deus é a a melhor explicação de tal característica A segunda parte da tarefa pode recorrer não apenas que se demonstrem os pontos fortes de uma explicação teísta mas também que se apontem os pontos fracos de explicações seculares rivais Ambas 105 as partes da tarefa são essenciais mas vale a pena assinalar que as duas componentes não podem ser realizadas simultaneamente Cabe ao teísta defender a realidade da moralidade contra os críticos de pendor subjetivista e niilista Pressuposta a execução prévia desta tarefa o teísta deve então tentar mostrar que a moralidade assim compreendida requer uma explicação teísta É interessante observar no entanto que no que se refere a ambas as partes da tarefa o teísta pode elencar nãoteístas como aliados O teísta pode muito bem fazer causa comum tanto com naturalistas em ética quanto com nãonaturalistas em ética ao defender o realismo moral contra teorias projetivas tais como o expressivismo Contudo o teísta também pode valerse do apoio de teóricos do erro como J L Mackie 1977 e ainda de niilistas morais como Friedrich Nietzsche 1887 ao argumentar que Deus é necessário para a moralidade objetiva Nietzsche por exemplo sustenta explicitamente a tese de que Deus não existe mas também alega que a nãoexistência de Deus subverte a realidade a realidade da moralidade ocidental tradicional O fato de que teístas podem elencar aliados tão improváveis não significa que é correto o argumento moral para a existência de Deus mas ao menos sugere sim que não se trata de um argumento que incorre de maneira óbvia numa petição de princípio visto que por vezes ambas as premissas são aceitas por nãocrentes de matizes distintos 3 Argumentos morais teóricos para a existência de Deus e teorias da obrigação moral fundadas na noção do mandamento divino Uma versão facilmente compreensível de um argumento moral teísta depende de uma analogia entre as leis humanas promulgadas por naçõesestados e as leis morais Estados soberanos podem promulgar leis que fazem com que certos atos sejam proibidos ou requeridos Se eu sou um cidadão dos Estados Unidos e tenho uma renda superior a uma pequena soma em dinheiro sou obrigado a fazer uma declaração de rendimentos todos os anos Também me é proibido em virtude das leis em vigência nos Estados Unidos discriminar candidatos com base nos critérios de idade ou raça ao empregálos Muitas pessoas acreditam na existência de leis morais que têm força vinculante sobre os indivíduos da mesma forma que as leis resultantes da atividade política Sou obrigado por um princípio moral a não mentir para outras pessoas e de maneira semelhante sou obrigado a cumprir as promessas que fiz Podese manter o entendimento de que tanto as 106 leis do direito como as da moralidade têm um valor prima facie de tal sorte que em algumas situações uma pessoa pode violar uma lei para poder obedecer a outra mais importante Sabemos como as leis humanas passam a existir São promulgadas por legislaturas ou por monarcas absolutos em alguns países que possuem autoridade para aprovar tais leis Como então se deveria explicar a existência de leis morais A muitos parece plausível sustentar que elas devem ter um fundamento assemelhado em alguma autoridade moral apropriada e que o único candidato plausível para esse papel é Deus Alguns filósofos descartaram argumentos desde tipo sob a alegação de que seriam toscos presumivelmente porque sua força é tão óbvia que nenhum treinamento filosófico especial é necessário para compreendêlo e perceber a sua atração No entanto o fato de que alguém pode entender o argumento sem possuir muita habilidade filosófica não necessariamente representa um defeito Se algum indivíduo supõe que há um Deus e que Deus quer que os homens o conheçam e se relacionem com ele tal indivíduo esperaria que Deus tornasse sua realidade conhecida dos seres humanos de maneiras muito óbvias vide EVANS 2010 Afinal de contas críticos da crença teísta tais como J L Schellenberg 1993 argumentaram que há um grave problema no fato de que a realidade de Deus não é óbvia para aqueles que gostariam de crer nele Se for de fato o caso que quando alguém está ciente de obrigações morais também está ciente dos mandamentos ou leis divinas então a pessoa comum que esteja ciente de obrigações morais possui na verdade uma espécie de ciência do próprio Deus É claro que uma tal pessoa poderia ter ciência das leis de Deus sem se dar conta de que são leis de Deus poderia ter ciência dos mandamentos de Deus sem deles ter ciência sob essa descrição O apologista religioso poderia ver nessa pessoa alguém que já possui uma espécie de consciência de re de Deus porque uma obrigação moral é simplesmente uma expressão da vontade de Deus Como poderia uma tal consciência ser convertida numa crença plena em Deus Uma maneira de fazer isso consistiria em ajudar a pessoa a adquirir as habilidades necessárias para reconhecer leis morais como aquilo que são ou seja como mandamentos divinos ou leis divinas Se é possível que leis morais sejam objeto de experiência então a experiência moral poderia ser vista como um tipo de experiência religiosa ou ao menos protorreligiosa Talvez alguém que tenha tido um tal tipo de experiência de Deus não precise de um argumento moral nem de nenhum tipo de argumento para ter uma crença razoável em Deus Isso pode ser um exemplo daquele tipo de caso que Alvin Plantinga 2000 e os epistemologistas 107 reformados têm em mente quando alegam que uma crença em Deus pode ser apropriadamente básica Vale a pena notar que poderia haver algo como um conhecimento de Deus que deita raízes na experiência moral sem que tal conhecimento seja o resultado de um argumento moral Mesmo se este for o caso contudo um argumento moral ainda poderia desempenhar um papel valioso Um tal argumento poderia ser uma maneira de ajudar um indivíduo a entender que obrigações morais são de fato leis ou mandamentos divinos Mesmo se for verdade que algumas pessoas comuns podem saber que Deus existe sem necessidade de um argumento um argumento poderia ser útil para defender a alegação de que esta é a realidade É concebível que uma pessoa possa precisar de um argumento para a alegação de segunda ordem de que a pessoa conhece Deus sem necessidade de um argumento Seja como for uma teoria metaética baseada no mandamento divino fornece os ingredientes para um tal argumento A revivescência de teorias do mandamento divino TMD acerca da obrigação moral deve ser creditada principalmente ao trabalho de Philip Quinn 19791978 e Robert Adams 1999 A versão de Adams de uma TMD foi particularmente influente e bem adequada para a defesa da alegação de que o conhecimento moral pode fornecer conhecimento de Deus A versão de Adams de uma TMD se constitui numa explicação das obrigações morais e deve ser distinguida de concepções mais voluntaristas e gerais em ética que tratam outras propriedades morais tais como a propriedade de ser bom como sendo dependentes da vontade de Deus Como será explicado abaixo ao limitar a teoria ao campo das obrigações Adams evita a objeção padrão baseada no Eutífron que alega que as concepções baseadas na noção de mandamento divino reduzem a ética ao nível da arbitrariedade A explicação de Adams que toma as obrigações morais como mandamentos divinos fundase numa teoria social mais geral das obrigações Existem é claro muitos tipos de obrigações obrigações legais obrigações financeiras obrigações da etiqueta e obrigações que se impõem em virtude do pertencimento a algum clube ou associação para ficar apenas em umas poucas É claro que essas obrigações são distintas das obrigações morais visto que em alguns casos as obrigações morais podem entrar em conflito com as destes outros tipos O que seria distintivo acerca das obrigações em geral Elas não são redutíveis simplesmente a alegações normativas sobre aquilo que uma pessoa tem uma boa razão para fazer J S Mill 1874 p 164165 argumentou que podemos explicar os princípios normativos sem fazer nenhuma referência Ele sustenta que o sentimento de obrigação deriva de 108 algo a que consciência interior testemunha em sua própria natureza e que assim sendo a lei moral diferentemente das leis humanas não se origina na vontade de um legislador ou legislatura exterior à mente É fora de dúvida que Mill tinha em mente nesse contexto princípios lógicos tais como é errado crer em p e não p ao mesmo tempo Mill argumenta que tais princípios normativos vigem sem nenhuma exigência que uma autoridade lhes sirva de fundamento embora alguns teístas tenham argumentado que os naturalistas em metafísica enfrentam dificuldades para explicar qualquer tipo de normatividade vide DEVINE 1989 p 8889 Contudo mesmo que Mill esteja certo quanto à normatividade em geral disso não se segue que sua concepção seja correta quanto às obrigações que possuem um caráter especial Uma obrigação possui um tipo especial de força devemos ter cuidado em agir de acordo com ela e é apropriado que violações de obrigações incorram em inculpação ADAMS 1999 p 235 Se eu cometer um erro lógico posso me sentir tolo estupido ou embaraço mas não tenho razões para me sentir culpado a não ser que o erro reflita alguma falta de descaso da minha parte a qual em si mesma constitua uma violação de uma obrigação moral Adams argumenta que os fatos que dizem respeito às obrigações são constituídos por exigências em larga medida sociais ibid p 233 Por exemplo o papel social atribuído aos pais são parcialmente constituídas pelas obrigações assumidas por quem se torna um genitor e o papel social de um cidadão é parcialmente constituído pelas obrigações de obedecer às leis do país do qual se é cidadão Todas as obrigações são por conseguinte constituídas por exigências sociais de acordo com Adams Contudo nem todas as obrigações constituídas por exigências sociais são obrigações morais Que relação social poderia ser a base das obrigações morais Adams argumenta que não é qualquer relação social humana que possuirá a necessária autoridade Uma obrigação moralmente válida não será simplesmente constituída por qualquer demanda propugnada por um sistema de relações sociais que alguém de fato valorize Algumas de tais demandas não possuem força moral e alguns sistemas sociais são inteiramente perversos ibid p 242 Se existe um Deus bom e amoroso e se ele criou todos os seres humanos então é a relação social existente entre os seres humanos e Deus que possui as características corretas para explicar as obrigações morais Afinal se as obrigações morais derivam das exigências de Deus elas serão objetivas mas também terão força motivadora visto que uma relação com Deus claramente seria um grande bem que os seres humanos têm razão em valorizar Visto que se pode argumentar que uma relação apropriada com Deus é mais importante do que qualquer outra 109 relação social também podemos entender por que as obrigações morais prevalecem sobre outros tipos de obrigação De acordo com essa visão podemos explicar por que as obrigações morais têm um caráter transcendente o que é importante porque uma concepção genuinamente moral das obrigações deve possuir os recursos necessários para realizar a crítica moral de sistemas sociais e suas demandas ibid p 242243 Atentese para o fato de que a versão de TMD defendida por Adams é ontológica não semântica consiste numa alegação de que as obrigações morais são de fato algo idêntico aos mandamentos divinos em vez de consistir numa alegação de que obrigações morais tem o mesmo significado que mandamentos divinos Consoante a sua explicação o significado de obrigação moral é fixado pelo papel que o conceito desempenha em nossa linguagem Tal papel inclui fatos como os seguintes Obrigações morais devem ter uma natureza motivadora e objetiva Também devem fornecer um fundamento para uma avaliação crítica de outros tipos de avaliação e devem ser tais que alguém que viole uma obrigação moral seja apropriadamente sujeito à inculpação Adams argumenta que são os mandamentos divinos que satisfazem da melhor maneira esses desiderata A existência de Deus fornece assim a melhor explicação das obrigações morais Se as obrigações morais forem idênticas aos mandamentos divinos ou talvez se forem fundados nos mandamentos divinos ou se sua existência for causada pelos mandamentos divinos podese construir facilmente um argumento para a existência de Deus a partir de tais obrigações 1 Existem obrigações morais objetivas 2 Se existem obrigações morais objetivas existe um Deus que explica essas obrigações 3 Existe um Deus Este argumento é aqui apresentado numa forma dedutiva mas é fácil uma reformulação verbal que o torna um argumento da melhor explicação probabilístico como segue 1 Existem obrigações morais objetivas 2 Deus fornece a melhor explicação para a existência de obrigações morais 3 Deus provavelmente existe 110 É óbvio que aquelas pessoas que não consideram a TMD convincente não julgarão que este argumento fundado nas obrigações morais tenha força alguma Contudo Adams se antecipa a uma crítica comum à TMD e lhe dá uma resposta vigorosa Argumentase frequentemente que uma TMD deve fracassar em razão de um dilema paralelo àquele derivado do Eutífron de Platão O dilema para uma TMD pode ser derivado da seguinte questão Partindo da assunção de que Deus ordena o que é certo ele ordena aquilo que é correto porque é correto Se o proponente de uma TMD responder afirmativamente então parece se dar o caso de que a qualidade de correção deve ter uma vigência anterior e por conseguinte independente dos mandamentos divinos Se contudo o proponente negar que Deus ordena o que é correto porque é correto então os mandamentos divinos parecerão arbitrários A versão de Adams para uma TMD evita este dilema ao sustentar que Deus é essencialmente bom e que seus mandamentos são necessariamente voltados para o bem Isto permite a Adams alegar que os mandamentos de Deus tornam as ações obrigatórias ou proibidas enquanto lhe permite ao mesmo tempo negar que os mandamentos sejam arbitrários Embora a versão de Adams de uma TMD tenha êxito contra a objeção fundada no Eutífron há outras críticas fortes que se levantaram na literatura filosófica contra esta teoria metaética Tais objeções podem ser encontradas nos escritos de Wes Morrison 2009 Erik Wielenberg 2005 2014 cap 2 e por Nicholas Wolterstorff 2007 entre outros Wielenberg defende explicitamente como alternativa à metaética do mandamento divino uma concepção que ele chama de realismo normativo sem Deus Esta é essencialmente a visão de que as verdades morais possuem um caráter básico ou fundamental que não deriva de fatos naturais nem de quaisquer fatos metafísicos ainda mais fundamentais Parece assim assemelharse à concepção normalmente chamada de nãonaturalismo ético Tal concepção certamente fornece uma alternativa significativa à metaética do mandamento divino Contudo vale notar que algumas das críticas que os naturalistas em metafísica dirigem a uma metaética teísta também podem se aplicar à visão de Wielenberg Especificamente filósofos como J L Mackie 1977 consideram noções éticas nãonaturais de qualquer tipo algo de esquisito visto que elas são tão dissimilares das realidades descobertas pela ciência Os fatos morais brutos postulados por Wielenberg como verdades necessárias parecem ser vulneráveis à mesma crítica Na verdade a crítica pode possuir uma força mais pungente contra a visão de Wielenberg visto que verdades éticas podem parecer menos estranhas num universo fundado em última análise 111 numa pessoa Respostas às objeções de Wielenberg Morriston e de outros também vêm sendo fornecidas vide EVANS 2013 BAGGETT WALLS 2011 2016 Claramente a versão de um argumento moral para a existência de Deus que repousa numa teoria do mandamento divino serão consideradas fortes apenas por aqueles que julgam plausível uma TMD e nesse campo certamente estará uma minoria de filósofos Contudo vale a pena assinalar que nenhuma teoria metaética parece desfrutar de apoio amplo entre os filósofos de tal sorte que uma TMD não é a única visão minoritária Todavia aqueles que julgam forte uma TMD também verão nas obrigações morais uma evidência forte para a realidade de Deus 4 Argumentos baseados no conhecimento ou consciência morais Argumentos dos mais variados foram produzidos para mostrar que Deus é necessário para explicar a consciência humana da verdade moral ou o conhecimento moral se se supuser que tal consciência moral chega a ser conhecimento Richard Swinburne 2004 p 218 por exemplo argumenta que não há uma grande probabilidade de que a consciência moral ocorra em um universo sem Deus Na visão de Swinburne as verdades morais ou são verdades necessárias ou são verdades contingentes que têm fundamento nas verdades necessárias Por exemplo é obviamente contingente que É errado jogar uma bomba atômica em Hiroshima visto que é contingente que exista uma cidade tal como Hiroshima Mas se poderia sustentar que esta proposição é verdadeira pressupondo que seja por causa de alguma outra verdade tal como É errado matar seres humanos inocentes o que de fato vale universalmente e é necessariamente verdadeira Swinburne não pensa que um argumento baseado em fatos morais tenha força como tal Contudo o fato de que nós seres humanos temos consciência de fatos morais é surpreendente por si só e requer uma explicação Pode ser verdade que criaturas pertencentes a grupos que se comportam de maneira altruísta possam ter alguma vantagem no que concerne à sua sobrevivência face a grupos que carecem deste traço de caráter Contudo as crenças morais não são requeridas para produzir tal comportamento visto que há muitas espécies de animais que se inclinam naturalmente a ajudar outros membros de sua espécie e no entanto não possuem crenças morais SWINBURNE 2004 p 217 Se Deus existe ele tem uma razão significativa para gerar seres conscientes dotados de consciência moral visto que seu propósito para os seres humanos inclui fazer com 112 que lhes seja possível escolher o bem contra o mal visto que isso fará com que lhes seja possível desenvolver uma relação com Deus Swinburne não pensa que este argumento por si só forneça uma evidência muito forte para a existência de Deus mas sim que fornece algum suporte indutivo para uma crença em Deus É um dentre vários fenômenos que parecem ser mais prováveis em um universo teísta do que em um universo sem Deus À medida que formos levando em conta um número cada vez maior de tais fenômenos tornarseá cada vez mais improvável que todos eles ocorram ibid p 218 Juntos todos esses argumentos indutivos podem então fornecer apoio substancial para a crença teísta mesmo que nenhum deles seja por si só suficiente para sustentar uma crença racional A versão de Swinburne para o argumento é um tanto breve e pouco elaborada mas algumas alegações que poderiam ser usadas em apoio a uma versão mais elaborada do argumento a ser descrita mais abaixo podem ser encontradas em um artigo bem conhecido e muito citado de Sharon Street 2006 O argumento de Street como sugerido pelo seu título não se destina de forma alguma a apoiar um argumento moral a favor do teísmo Pelo contrário o propósito dela é o de defender teorias metaéticas antirrealistas contra teorias realistas que veem a verdade moral como independentes de uma tomada de posição pelo que respeita às atitudes e emoções humanas Street coloca o realista moral ante um dilema posto pela indagação acerca de como nossas crenças humanas valorativas estão relacionadas com a evolução humana Resta claro segundo ela crê que a evolução moldou intensamente nossas atitudes valorativas A questão diz respeito a como tais atitudes estão relacionadas com as verdades valorativas objetivas aceitas pelo realista Se o realista sustenta que não há nenhuma relação entre tais verdades e nossas atitudes valorativas então isso implica que a maior parte de nossos julgamentos valorativos vão pelo caminho errado em razão das distorções causadas pela influência de processos darwinianos A outra alternativa para o realista consiste em alegar que existe tal relação e que sendo assim não há um acidente ou milagre no fato de que nossas crenças valorativas sigam pelo caminho de verdades objetivas Contudo essa visão alega Street é cientificamente implausível Street argumenta por conseguinte que uma estória evolutiva a ser contada sobre como chegamos a formar os julgamentos morais que formamos solapa a confiança na verdade objetiva de tais julgamentos É claro que o argumento de Street é controverso e pensadores tais como Erik Wielenberg 2014 argumentaram contra argumentos de cunho evolucionário Ainda assim muitos têm esses argumentos na conta de problemáticos para aqueles que querem defender o realismo moral particularmente quando são desenvolvidos na forma de um argumento global KOHANE 2010 113 O argumento de Street também foi contestado por críticos tais como Russ ShaferLandau 2012 Contudo o seu argumento e argumentos semelhantes foram reconhecidos por alguns realistas em moralidade tais como David Enoch 2011 e Erik Wielenberg 2012 como tendo colocado um problema significativo para a sua visão Enoch por exemplo embora ofereça uma resposta ao argumento de Street demonstra de forma evidente algumas preocupações em sua resposta Wielenberg intentando evitar a crítica de que em um universo nãoteísta teria havido um extremo golpe de sorte se a evolução elegesse valores morais objetivamente verdadeiros como objetos de crença propõe que as leis naturais que produzem esse resultado podem ser metafisicamente necessárias e que assim não há nenhum fator sorte Contudo muitos filósofos encararão essa visão das leis naturais como representando um preço alto demais a pagar para evitar o teísmo Poderia parecer que Street está oferecendo um argumento simples segundo o qual a teoria evolucionária faz com que seja improvável que seres humanos viessem a ter um conhecimento moral objetivo Contudo não é da evolução por si só que resulta como previsão a improbabilidade de um conhecimento moral objetivo mas a conjunção da evolução com o naturalismo metafísico Uma boa parte da força do argumento de Street deriva da assunção de que o naturalismo é verdadeiro e que portanto o processo evolucionário não é guiado Visto que não é a evolução por si que coloca um desafio para o realismo moral mas a conjunção da evolução com o realismo metafísico então a rejeição do naturalismo fornece ao realista moral uma maneira de resolver o problema Parece efetivamente que em um universo naturalista poderíamos esperar que um processo de evolução darwiniano selecionasse uma propensão para a formação de julgamentos morais que rastreiem a necessidade de sobrevivência e não as verdades morais objetivas Mark Linville 2009 p 391 446 desenvolveu um argumento detalhado em favor da alegação de que é difícil para os naturalistas em metafísica apresentarem uma estória evolucionária plausível acerca de como nossos julgamos poderiam ter garantia epistemológica Contudo se supusermos que o processo evolucionário foi guiado por Deus que tem como um dos seus objetivos a criação de criaturas humanas moralmente significativas capazes de desfrutar de uma relação com Deus então não pareceria ser haver algo de acidental ou mesmo de improvável no fato de que Deus asseguraria que os seres humanos têm valores morais que são em grande medida corretos Alguns filósofos acreditam que o caráter randômico da seleção natural darwiniana exclui a possibilidade de qualquer tipo de guiamento divino se exerça ao longo de um tal processo Alguns pensadores aí incluídos tanto ateístas quanto 114 alguns proponentes do que é chamado de ciência da criação acreditam que a evolução e Deus representem hipóteses rivais e mutuamente excludentes as origens do mundo natural O que pode ser explicado cientificamente não necessita de explicação religiosa Contudo isso está longe de ser uma verdade óbvia com efeito se o teísmo for verdadeiro a tese é claramente falsa De uma perspectiva teísta o pensamento de que Deus e a ciência fornecem explicações que competem entre si representa um fracasso de captar a relação entre Deus e o mundo natural que resulta de conceber Deus como uma causa a mais dentro do mundo natural Mas se Deus existe em absoluto Deus não é uma entidade dentro do mundo natural mas o criador do mundo natural com todos os seus processos causais Se Deus existe Deus é a razão pela qual existe um mundo natural e a razão para a existência dos processos causais do mundo natural Em princípio portanto uma explicação natural nunca poderá impedir uma explicação teísta Mas e o que dizer do caráter randômico que representa uma parte crucial da estória darwiniana O ateísta poderia alegar que uma vez que a teoria evolucionária postula que o processo pelo qual as plantas e animais evoluíram envolveu mutações genéticas randômicos ele não pode ser guiado e que assim sendo Deus não pode ter usado meios evolucionários para atingir seus fins Contudo este argumento fracassa Depende de uma ambiguidade quanto ao que se quer dizer por randômico Quando os cientistas alegam que as mutações genéticas são randômicas não querem dizer com isso que não têm uma causa ou mesmo que seja imprevisível do ponto de vista da bioquímica mas apenas que as mutações não ocorrem em resposta às necessidades adaptativas do organismo É inteiramente possível que um processo natural inclua o caráter randômico neste sentido mesmo que a ordem natural inteira seja criada e sustentada por Deus O sentido de caráter randômico requerido pela teoria evolucionária não implica que o processo evolucionário deva carecer de guiamento Um Deus que fosse responsável pelas leis da natureza e pelas condições iniciais que conformam o processo evolucionário certamente poderia assegurar que o processo atingisse certos fins Assim como outros argumentos morais a favor da existência de Deus o argumento do conhecimento moral pode ser facilmente apresentado na forma de proposições e eu creio que Swinburne está certo ao sustentar que a melhor maneira de interpretar o argumento consiste em ver nele um argumento probabilístico que apela para Deus como a melhor explicação do conhecimento moral que é possível em um universo naturalista 115 1 Seres humanos possuem conhecimento moral objetivo 2 Provavelmente se Deus não existisse os seres humanos não possuiriam conhecimento moral objetivo 3 Provavelmente Deus existe Há um tipo de argumento do conhecimento moral também implícito no recente livro de Angus Ritchie From Morality to Metaphysics The Theistic Implications of our Ethical Commitments 2012 Ritchie enfatiza um tipo de dilema nas explicações nãoteístas da moralidade Teorias subjetivistas tais como o expressivismo certamente podem ver sentido no fato de que fazemos os julgamentos morais que fazemos mas elas esvaziam a moralidade de sua autoridade objetiva Teorias objetivistas que levam a moralidade a sério contudo têm dificuldade em explicar nossa capacidade de fazer julgamentos morais a não ser que o processo pelo qual chegamos a deter tais capacidades seja controlado por um ser como Deus O argumento moral do conhecimento não será convincente para ninguém que esteja comprometido com qualquer forma de expressivismo ou com uma outra teoria metaética nãoobjetiva e é claro que muitos filósofos acham atrativas essas visões E certamente haverá muitos filósofos que julgarão que se o objetivismo moral implica o teísmo ou requer a plausibilidade do teísmo esta é uma reductio das visões objetivistas Além disso filósofos morais nãoteístas quer sejam naturalistas ou nãonaturalistas têm estórias a contar sobre como o conhecimento moral seria possível No entanto há questões bem reais acerca da plausibilidade de tais estórias e assim sendo alguns daqueles que estão convencidos de que o realismo moral é verdadeiro podem julgar que o conhecimento moral fornece algum suporte à crença teísta 5 Argumentos baseados na dignidade ou no valor humanos Muitos filósofos pensam que a filosofia moral de Immanuel Kant ainda oferece uma abordagem frutífera para a ética Dentre as muitas formas de imperativo categórico que Kant oferece a fórmula que considera os seres humanos como fins em si mesmos é especialmente atraente Aja de uma tal maneira que você sempre trate a humanidade seja na sua própria pessoa ou na pessoa de qualquer outro nunca simplesmente como um meio mas sempre ao mesmo tempo como 116 um fim KANT 1795 1964 p 96 Muitos filósofos morais contemporâneos influenciados por Kant tais como Christine Korsgaard 1996 veem em Kant alguém que ofereceu uma posição metaética construtivista Supõese que o construtivismo ofereça uma terceira via entre o realismo moral e visões subjetivistas da moralidade Assim como os subjetivistas os construtivistas pretendem ver a moralidade como uma criação humana Contudo assim como os realistas morais os construtivistas pretendem ver as questões morais como tendo respostas objetivas O construtivismo é uma tentativa de desenvolver uma moralidade objetiva que seja livre dos comprometimentos metafísicos do realismo moral É contudo uma questão controversa ter Kant sido ou não um construtivista neste sentido Uma das razões para questionar se essa seria a maneira correta de ler Kant se segue do fato de que o próprio Kant não julgava que a moralidade estivesse livre de comprometimentos metafísicos Por exemplo Kant pensava que seria impossível para alguém que acreditasse que o determinismo mecânico representasse a verdade liberal acerca de si mesmo pudesse também acreditar que é um agente moral visto que a moralidade requer uma autonomia que é incompatível com o determinismo Para ver a mim mesmo como uma criatura que possui o tipo de valor que Kant chama de dignidade não devo ver a mim mesmo como sendo um mero produto do meio físico assemelhado a uma máquina Por isso Kant pensava que fosse crucial para a moralidade que a sua Filosofia Crítica havia mostrado que a perspectiva determinista a respeito dos seres humanos é simplesmente uma parte do mundo dos fenômenos o qual é o objeto do conhecimento científico e não a realidade numenal que seria se algum tipo de realismo científico fosse a visão metafísica verdadeira Quando fazemos ciência vemos a nós mesmos como determinados mas a ciência nos diz apenas como é a aparência do mundo não como ele realmente é O reconhecimento deste fato sugere que quando Kant postula que os seres humanos têm esse valor intrínseco que ele chama de dignidade ele não está construindo o valor que os seres humanos têm mas reconhecendo o valor que têm seres de um certo tipo Os seres humanos só podem ter este tipo de valor se forem um tipo de criatura em particular Quer Kant tenha ou não sido ele próprio um realista moral certamente há elementos em sua filosofia que apontam numa direção realista Se a alegação de que as pessoas humanas têm um tipo de dignidade ou valor intrínsecos é um verdadeiro princípio objetivo e se fornece o princípio fundamental da moralidade bem vale a pena inquirir sobre que tipos de implicações metafísicas a alegação poderia ter Essa é a questão que Mark Linville 2009 p 417446 leva 117 avante no segundo argumento moral que desenvolve Linville começa notando que mal poderia alguém alegar que pessoas humanas têm dignidade intrínseca é uma afirmação verdadeira se pessoas humanas não existissem É claro que algumas posições metafísicas incluem a negação da existência de pessoas humanas tais como as formas de Monismo Absoluto que sustentam que apenas uma Realidade Absoluta existe Contudo também parece se dar o caso de que algumas formas de Naturalismo Científico são comprometidas com a negação de pessoas enquanto eus substantivos que possuem essencialmente um ponto de vista ancorado na primeira pessoa vide DENNETT 2006 p 107 Daniel Dennett por exemplo sustenta que a categoria de pessoas não fará parte de uma explicação científica última para as coisas Dennett sustenta que pensar nos seres humanos como sendo pessoas é o mesmo que simplesmente adotar uma certa postura a seu respeito a qual ele chama de postura intencional mas é claro que o tipo de imagem dos seres humanos que obtemos quando pensamos sobre eles desta forma não corresponde às suas propriedades metafísicas intrínsecas Não resta claro como os sistemas a respeito dos quais adotamos uma postura intencional poderiam ser verdadeiramente autônomos e possuir assim o tipo de valor que Kant acredita que as pessoas humanas possuem O argumento da dignidade pode ser expresso em forma proposicional como segue 1 Pessoas humanas têm um tipo especial de valor intrínseco que chamamos de dignidade 2 A única ou a melhor explicação para o fato de que os seres humanos possuem dignidade consiste em terem sido criados por um Deus supremamente bom na própria imagem de Deus 3 Provavelmente existe um Deus supremamente bom Um naturalista pode querer contestar a premissa 2 encontrando alguma outra estratégia para explicar a dignidade humana Michael Martin 2002 por exemplo tentou sugerir que os julgamentos morais podem ser analisados como sendo os sentimentos de aprovação ou desaprovação de um observador perfeitamente imparcial e bem informado Linville 2009 lança a objeção de que não fica claro como os sentimentos de um tal observador possam constituir o valor intrínseco de uma pessoa visto que 118 se pensaria que propriedades intrínsecas seriam nãorelacionais e independentes da mente Em todo caso Linville assinala que um problema com a natureza daquele do Eutífron permanece à espreita para uma tal teoria do observador ideal visto que normalmente se pensaria que tal observador tomaria uma pessoa como intrinsecamente valiosa porque a pessoa tem valor intrínseco Uma outra estratégia seguida por construtivistas como Korsgaard consiste em ligar o valor atribuído a seres humanos à capacidade de reflexão racional A ideia é que até onde eu esteja comprometido com a reflexão racional eu devo valorizar a mim mesmo como possuidor desta capacidade e de forma consistente também valorizar outros que a possuam Uma estratégia semelhante se encontra na forma de nãonaturalismo ético defendido por Wielenberg uma vez que Wielenberg argumenta que é necessariamente verdadeiro que qualquer ser dotado de certas capacidades reflexivas terá valor moral WIELENBERG 2014 cap 4 Está longe de ser claro no entanto que a racionalidade humana forneça um fundamento adequado para os direitos morais Muitas pessoas acreditam que crianças pequenas e pessoas que sofrem de demência ainda possuem está dignidade intrínseca mas em ambos os casos não há nenhuma capacidade de reflexão racional Algum apoio para esta crítica à tentativa de ver a razão como a base do valor dos seres humanos pode ser encontrado no trabalho recente de Nicholas Wolterstorff a respeito da justiça 2007 cap 8 Wolterstorff defende neste trabalho a alegação de que existem direitos humanos naturais e que a violação de tais direitos é uma maneira de agir injustamente com uma pessoa Por que os seres humanos têm tais direitos Wolterstorff afirma que tais direitos são fundados no valor e dignidade básicos que os seres humanos possuem Quando eu busco torturar ou matar um ser humano inocente falto ao devido respeito por este valor Wolterstorff argumenta que a crença em que os seres humanos têm essa qualidade não apenas foi historicamente produzidas por concepções cristãs e judaicas acerca da pessoa humana mas que mesmo agora não podem ser defendidas de maneira apartada dessa concepção Em particular ele argumenta que as tentativas de argumentar que o nosso valor deriva de alguma excelência que possamos possuir tal como a razão não explicarão o valor das crianças nem daquelas pessoas com lesões cerebrais severas ou demência Uma visão de mundo teísta teria mais êxito em fornecer uma explicação para o valor especial da dignidade humana Em um universo teísta o próprio Deus é visto como o bem supremo Com efeito platonistas teístas usualmente identificam Deus com o Bem Se o próprio Deus é uma pessoa então isto parece ser um 119 6 NT Neste ponto fui forçado a fazer uma adaptação O original traz a construção literalmente intraduzível the critic might bite the bullet uma expressão corriqueira na literatura filosófica americana para se referir à atitude daqueles que aceitam o teor da objeção do oponente mas não suas consequências teóricas É como se o filósofo criticado dissesse Sim é isso mesmo E daí Não vejo problema compromisso com a ideia de que o próprio estatuto de pessoa é algo que deve ser intrinsecamente bom Se as pessoas humanas são feitas à imagem de Deus como o afirmam tanto o judaísmo como o cristianismo então disso parece se seguir que os seres humanos de fato possuem um tipo de valor intrínseco simplesmente em virtude de serem o tipo de criaturas que são Naturalmente muitos não julgaram convincente este argumento Alguns negarão a premissa 1 seja por rejeitarem o realismo moral como postura metafísica seja por rejeitarem a alegação normativa de que os seres humanos têm qualquer tipo de valor ou dignidade especiais Talvez possam até vir a pensar que tal alegação seja uma forma de especiesismo Outros terão a premissa 2 como suspeita Podem estar inclinados a concordar que as pessoas humanas têm uma dignidade especial mas sustentam que a fonte de tal dignidade se encontra em qualidades humanas tais como a racionalidade No que respeita ao status das crianças e daqueles que sofrem de demência o crítico poderia dar de ombros e se mostrar indiferente à objeção e simplesmente aceitar o fato de a dignidade humana não se estende a esses indivíduos ou ainda argumentar que o fato de que crianças e pessoas afetadas por um colapso de suas faculdades mentais fazem parte de uma espécie cujos membros tipicamente possuem racionalidade basta para que mereçam um respeito especial mesmo se eles próprios carecem desta qualidade enquanto indivíduos6 Outros julgarão duvidosa a premissa 2 porque consideram desprovida de clareza a explicação teísta da dignidade Uma outra alternativa consiste em procurar uma explicação construtivista da dignidade talvez vendo no status especial dos seres humanos algo que nós humanos decidimos estender uns aos outros Talvez a alternativa nãoteísta mais forte venha a ser alguma forma de nãonaturalismo ético na qual se afirma simplesmente que a alegação de que as pessoas têm uma dignidade especial constitui uma verdade a priori que não exige explicação Com efeito essa é a decisão a ser tomada por uma forma nãoteísta de platonismo O proponente do argumento bem pode concordar quanto a serem alegações sobre o status especial dos seres humanos verdadeiras a priori e assim também 120 optar por alguma forma de platonismo Contudo o proponente do argumento notará que algumas verdades necessárias podem ser explicadas por outras verdades necessárias O teísta acredita que estás verdades acerca do status especial dos seres humanos nos dizem algo a respeito do tipo de universo no qual os seres humanos se encontram Dizer que os seres humanos são criados por Deus é o mesmo que dizer que a propriedade de ser uma pessoa não é uma característica efêmera ou acidental do universo porque no fundo a realidade é ela mesma pessoal MAVRODES 1986 6 Argumentos morais práticos para a crença em Deus Como já foi assinalado a versão mais famosa e talvez a mais influente do argumento moral para a crença em Deus se encontra em Immanuel Kant 1788 O própria Kant insistia em que o seu argumento não era um argumento teórico mas um argumento fundado na razão prática A conclusão do argumento não é Deus existe ou Deus provavelmente existe mas Eu como agente racional e moral devo acreditar que Deus existe Veremos no entanto que há algumas razões para pôr em dúvida a separação nítida de argumentos práticos dos argumentos teóricos A versão de Kant para o argumento pode ser apresentada de distintas maneiras mas talvez a que se segue capture uma interpretação plausível do argumento A moralidade é fundada na razão prática pura e o agente moral deve agir com base em premissas que possam ser endossadas racionalmente como princípios universais As ações morais não são portanto determinadas por resultados ou consequências mas pelas máximas em que se baseiam Contudo todas as ações incluindo as ações morais necessariamente voltamse para fins Kant argumenta que o fim ao qual as ações morais se voltam é o maior bem o que vem a ser um mundo no qual tanto a virtude moral quanto a felicidade sejam maximizadas sendo o valor da liberdade um valor contingente face ao da virtude Para Kant dever implica poder e nesse caso se eu tenho uma obrigação de buscar o maior bem devo acreditar que seja possível alcançar um tal bem Contudo devo buscar o maior bem apenas agindo de acordo com a moralidade não se admitem atalhos para a felicidade Isto parece requerer que eu acredite que a ação em conformidade com a moralidade terá eficácia causal para alcançar o maior bem Contudo é razoável crer que as ações morais serão eficazes nesse sentido apenas se as leis da causalidade tiverem sido instituídas de uma tal maneira que essas leis 121 sejam propícias à eficácia da ação moral Certamente ambas as partes componentes do maior bem parecem difíceis de atingir Nós seres humanos temos fraquezas de caráter que parecem difíceis quando não impossíveis de superar mediante os nossos próprios esforços Além disso enquanto criaturas temos necessidades subjetivas que devem ser satisfeitas se formos felizes mas temos poucas razões empíricas para pensar que tais necessidades serão satisfeitas por meio de ações morais mesmo que tenhamos sucesso em nos tornar virtuosos Se uma pessoa acredita que o mundo natural é simplesmente uma máquina nãomoral e sem nenhum senso de propósito então uma tal pessoa não teria nenhuma razão para crer que a ação moral pode ser exitosa porque não há nenhuma razão a priori para pensar que a ação moral atingirá o maior bem e pouca razão empírica para crer nisto também Kant conclui portanto que um agente moral deve postular a existência de Deus como uma pressuposição racional da vida moral Um problema deste argumento reside no fato de que muitas pessoas negarão que a moralidade requeira de nós que procuremos o maior bem no sentido de Kant Mesmo se o maior bem kantiano parecer razoável como ideal alguns lançarão a objeção de que não temos a obrigação de atingir um tal estado de coisas mas meramente a de trabalhar no sentido de realizar a maior aproximação possível de um tal estado vide ADAMS 1987 p 152 Sem o amparo divino a perfeita virtude é talvez inalcançável mas neste caso não podemos ser obrigados a realizar um tal estado se não existir um Deus Talvez não possamos esperar que a felicidade seja apropriadamente proporcional à virtude no mundo real se Deus não existir mas nesse caso nossa obrigação consistirá apenas em realizar tanta felicidade quanto possa ser obtida por meios morais É fora de dúvida que Kant rejeitaria está crítica visto que no seu entender os fins da moralidade são oferecidos a priori diretamente à razão prática pura e não somos livres para ajustar tais fins com base em crenças empíricas Contudo poucos filósofos contemporâneos partilhariam aqui da visão confiante de Kant quanto à razão e senso assim a crítica tem força O próprio Kant admite num dado momento que uma crença plena em Deus não é necessária de um ponto de vista racional visto que é concebível que se possa procurar o maior bem com a simples crença na possibilidade da existência de Deus KANT 17811787 p 651 Uma outra maneira de interpretar o argumento de Kant concede uma ênfase amor sobre a conexão entre o desejo de felicidade de um indivíduo e a obrigação de fazer aquilo que é moralmente correto A moralidade requer de mim o sacrifício de minha felicidade pessoal se isto for necessário para fazer aquilo que 122 é certo E no entanto é um fato psicológico os seres humanos necessariamente desejarem a sua própria felicidade Num tal estado parece que agentes morais humanos serão dilacerados por aquilo que Henry Sidgwick chamou de dualismo da razão prática 1884 401 A razão requer tanto que os seres humanos busquem sua própria felicidade como que a sacrifiquem O próprio Sidgwick assinalou que só se existir um Deus poderemos esperar que este dualismo seja resolvido para que aqueles que buscam agir de maneira moral possam ao fim e ao cabo também estar agindo para promover a sua própria felicidade e bemestar é interessante o fato de que o próprio Sidgwick não dá endosso a esse argumento mas ele claramente vê este problema como parte integrante da atração exercida pelo teísmo Um argumento contemporâneo semelhante a este foi desenvolvido por C Stephen Layman 2002 O crítico desta versão do argumento kantiano pode responder que a moralidade kantiana enxerga o dever como algo que deve ser feito independentemente das consequências e assim sendo uma pessoa verdadeiramente moral não pode fazer de seu comprometimento com a moralidade algo de aplicação contingente à obtenção da felicidade De um ponto de vista kantiano essa resposta parece correta Kant afirma inequivocamente que as ações morais devem ser realizadas por dever e não a partir de qualquer desejo de recompensa pessoal No entanto especialmente para qualquer filósofo disposto a endossar qualquer forma de eudaimonismo ver a mim mesmo fazendo a bem do dever o sacrifício daquilo que não posso deixar de desejar de fato parece problemático Como afirma John Hare Se devemos endossar de todo o coração a conformação a longo prazo de nossas vidas temos de ver essa conformação como sendo consistente com a nossa felicidade 1996 p 88 A isto o crítico pode responder simplesmente aceitando o fato lamentável de que há algo de trágico e mesmo de absurdo acerca da condição humana O mundo pode não ser o mundo que desejaríamos que fosse mas isso não nos fornece qualquer razão para crer que ele seja diferente do que é Se há uma tensão entre as demandas da moralidade e as do interesse próprio então este pode ser simplesmente um fato bruto que deve ser encarado Esta resposta levanta uma questão que deve ser encarada por todas as formas de argumentos práticos ou pragmáticos em defesa da crença Muitos filósofos insistem em que a crença racional deve ser fundamentada exclusivamente na evidência teórica O fato de que seria melhor para mim acreditar em p por si só não me fornece nenhuma razão para acreditar em p Esta crítica não tem por alvo apenas Kant mas também todos os outros argumentos morais práticos Por exemplo Robert 123 Adams argumenta que se os seres humanos não acreditarem que há no universo uma ordem moral eles ficarão desmoralizados na sua busca da moralidade coisa que é moralmente indesejável 1987 p 151 O ateísta poderia conceder o ponto de que o ateísmo é um tanto desmoralizante mas negar que isso forneça qualquer razão para acreditar que há uma ordem moral no universo De maneira semelhante Linda Zagzebski 1987 argumenta que a moralidade não será uma empreitada racional a não ser que as ações boas aumentem a extensão do bem no mundo Contudo dado que as ações morais frequentemente envolvem o sacrifício da felicidade não há nenhuma razão para acreditar que a ação moral aumentará a extensão do bem a não ser que exista um poder que transcenda a atividade humana ao laborar do lado do bem Aqui o ateísta pode alegar que a ação moral de fato aumenta a extensão do bem porque tais ações sempre aumentam a extensão do bom caráter pessoal Contudo mesmo que essa resposta fracasse o ateísta poderá uma vez mais alegar que pode haver algo de trágico ou absurdo acerca da condição humana e que o fato de que podemos desejar que as coisas fossem diferentes não constitui uma razão para crer que sejam Então o problema deve ser encarado seriam os argumentos morais meras formas racionalizas de expressar o desejo de que nossa realização seja atingida O teísta poderia responder de várias esse tipo de preocupação A primeira coisa a ser dita é que o fato de que uma visão naturalista do universo implica que o universo deve ser trágico ou absurdo se verdadeiro seria por direito próprio uma conclusão importante e interessante Contudo deixando isso de lado faz muita diferença a maneira como se interpreta o que poderíamos chamar de situação epistêmica de background Se uma pessoa acredita que nossa evidência teórica favorece o ateísmo então parece plausível sustentar que se deveria manter uma visão naturalista mesmo que de um ponte de vista prático fosse indesejável que o mundo tivesse uma tal natureza Nesse caso um argumento moral a favor da crença religiosa poderia ser julgado como a necessidade de ter nossos desejos realizados Contudo não parece ser dessa maneira que os defensores de um tal argumento prático veem a situação Kant afirma que os limites da razão estabelecidos na Crítica da Razão Pura silenciariam todas as objeções à moralidade e à religião de uma maneira socrática a saber por meio da prova mais clara da ignorância dos que lançam as objeções 1781 1787 p 30 530531 De fato a situação na realidade favorece o teísmo visto que Kant sustenta que a razão teórica enxerga valor no conceito de Deus enquanto ideal regulador mesmo que a existência de Deus não possa ser proclamada teoricamente como sendo conhecimento Se 124 apelarmos para a vontade de Deus para explicar o que acontece na ordem natural acabamos por solapar tanto a ciência quanto a religião visto que nesse caso não mais buscaríamos evidências empíricas para a causalidade e faríamos de Deus um objeto finito do mundo natural 1781 1787 p 562563 Contudo enquanto ideal regulador o conceito de Deus é um conceito que a razão teórica considera útil A assunção de uma inteligência suprema como a única causa do universo mesmo no plano das ideias pode portanto sempre beneficiar a razão e nunca a prejudicar 1781 1787 p 560 Há um sentido no qual a própria razão teórica se inclina a afirmar a existência de Deus porque ela deve pressupor que a realidade é cognoscível pela razão Se alguém deseja obter um conhecimento sistemático do mundo deveria vêlo como se tivesse sido criado por uma razão suprema KANT 1786 p 298 Embora a razão teórica não possa afirmar a existência de Deus ela julga útil pensar no mundo natural como tendo os tipos de características que teria se Deus de fato existisse Assim se fundamentos racionais para a crença em Deus vêm da razão prática a razão teórica não colocará nenhuma objeção Para Kant o argumento da razão prática para a crença em Deus não é uma forma de satisfação de desejos porque o seu fundamento não é um desejo ou uma vontade arbitrários mas uma necessidade real associada com a razão KANT 1786 p 296 Os seres humanos não se limitam a realizar especulações teóricas sobre o universo mas agentes Não é sempre racional ou mesmo possível nos refrearmos da ação e no entanto a ação pressupõe crenças sobre o modo de ser das coisas Para uma boa leitura e defesa dessa interpretação de Kant acerca da relação entre a ação e a crença confira Wood 1970 p 1725 Assim sendo em alguns casos não é possível a suspensão do julgamento O crítico pode argumentar que uma pessoa pode agir como se p fosse verdadeiro sem acreditar em p Contudo não resta claro que sempre possa ser seguido esse aconselhamento para que se distinga a ação baseada em p e a crença em p Para começar empiricamente parece se dar o caso de que uma maneira de adquirir uma crença em p consiste simplesmente em começar a agir como se p fosse verdadeiro Por conseguinte começar a agir como se p fosse verdadeiro é no mínimo embarcar numa linha de ação que torna mais provável a crença em p Em segundo lugar bem pode haver um sentido de crença segundo o qual agir como se p fosse verdadeiro é suficiente para constituir a crença Obviamente esse é o caso conforme as explicações pragmatistas da crença Mas mesmo aqueles que rejeitam uma explicação pragmática geral da crença bem podem ver os atrativos de algo desse gênero no que diz respeito à crença religiosa Muitos crentes religiosos sustentam que a melhor maneira de 125 medir a fé religiosa de uma pessoa é em termos das ações da pessoa Assim uma pessoa que esteja disposta a agir com base em uma crença religiosa especialmente se as ações adotadas são arriscadas ou custosas é verdadeiramente um crente religioso mesmo que tal pessoa estiver cheia de dúvidas a ansiedade Tal pessoa bem poderia ser vista como sendo mais genuinamente um crente do que uma pessoa que dá às doutrinas religiosas um assentimento presunçoso mas que não esteja disposta a agir com base nelas Talvez a maneira correta de pensar nos argumentos morais não consista em vêlos como justificativas da crença que carecem de prova mas como argumentos que ajustam o montante da evidência visto como necessário Esta é a lição que algumas pessoas extrairiam do fenômeno da invasão pragmática que tem sido muito discutido na epistemologia recente Aqui segue um exemplo de invasão pragmática Você Estou indo substituir o ventilador de teto da cozinha Esposa Você desligou a fonte principal de energia elétrica da casa Você Sim Esposa Se você tiver esquecido pode ser eletrocutado Você É melhor eu voltar e checar vide MCBRAYER 2014 RIZZIERI 2013 Uma interpretação plausível deste cenário é a de que normalmente alegações como as que eu fiz baseadas na memória são justifica das e valem como conhecimento Contudo nesta situação está em jogo algo mais sério porque minha vida está em risco e meu conhecimento se perde porque a situação pragmática invadiu as condições normais do conhecimento para o orientadas pela verdade A invasão pragmática é controversa e a ideia de uma tal invasão é rejeitada por alguns epistemologistas Contudo os defensores sustentam que é razoável considerar o que está em jogo do ponto de vista pragmático ao se considerar a evidência para uma crença subjacente a uma ação significativa vide FANTI MCGRATH 2007 Se isto estiver correto então parece razoável considerar a situação pragmática ao determinarmos o quanto de evidência é suficiente para justificar crenças religiosas Em teoria o ajusta poderia apontar para qualquer das duas direções dependendo de que custos estão associados com um erro e de que lado do debate será afetado por esses custos 126 Em todo o caso não resta claro que os argumentos morais pragmáticos podem ser sempre claramente distinguidos dos argumentos morais teóricos A razão para isso ser assim reside no fato de que em muitos casos a situação prática descrita parece ela mesma ser ou envolver um tipo de evidência para a verdade da crença que se intenta justificar Considere por exemplo o argumento clássico de Kant Uma coisa que o argumento de Kant faz é trazer à nossa atenção que seria enormemente estranho que os seres humanos são criaturas morais sujeitas a uma lei moral objetiva mas também acreditar que o universo que os seres humanos habitam é indiferente à moralidade Em outras palavras a existência de pessoas humanas entendidas como seres morais pode por si só ser compreendida como uma evidência acerca do caráter do universo em que os seres humanos se encontram Peter Byrne 2013 1998 criticou os argumentos práticos com base no fato de que eles pressupõem algo semelhante à seguinte proposição O mundo provavelmente é organizado de uma maneira destinada a satisfazer as nossas necessidades humanas mais profundas Byrne argumenta que esta premissa provavelmente é falsa se não existir Deus e sendo assim argumentos que a tomam por assente parecem ser circulares Contudo não resta claro que só aqueles que já acreditam em Deus julgarão atraente esta premissa A razão para isso é a de que os seres humanos são eles mesmos parte do universo natural e parece ser uma característica desejável numa visão metafísica que ela explique em vez de recusar a necessidade de explicar aspectos da exigência humana que parecem reais e importantes Portanto é provável que qualquer apelo a um argumento prático também venha a incluir um componente teórico mesmo se tal componente não for sempre tornado explícito No entanto isto não significa que os argumentos morais não possuam algumas características importantes e distintivas Para Kant era muito importante que as crenças religiosas fossem derivadas da razão prática Pois se a crença religiosa fosse fundada apenas na razão teórica então tal crença deveria ser conforme uma legislação extrínseca e arbitrária Kant 1799 p 131 Kant pensa que uma tal religião seria fundada no medo e na submissão e que assim sendo é bom que a crença religiosa seja motivada principalmente por um ato moral livre por meio do qual o fim último do nosso ser nos seja apresentado 1790 p 159 Afinal qualquer argumento moral faz da crença religiosa algo de existencial a questão não reside simplesmente no que eu creio que seja verdadeiro a respeito do universo mas em como eu viverei minha vida neste universo 127 7 Conclusão Parece claro que nenhuma versão do argumento moral constitui uma prova da existência de Deus Cada versão encerra premissas que muitos pensadores sensatos rejeitam Contudo isso não significa que o argumento não tenha força Poderseia pensar que cada uma das versões procura explicitar o custo de rejeitar a conclusão Alguns filósofos certamente estarão dispostos a arcar com este custo e de fato têm razões independentes para fazêlo Contudo certamente seria interessante e importante se as pessoas se convencessem de que o ateísmo requer a rejeição completa do realismo moral ou que requer que se abrace uma explicação implausível sobre como o conhecimento moral é adquirido Para aqueles que pensam que alguma versão ou algumas versões são fortes o peso cumulativo a favor da crença teísta pode ser aumentado por tais argumentos Referência bibliográfica ADAMS R Moral Arguments for Theism In The Virtue of Faith and Other Essays in Philosophical Theology New York Oxford University Press 1987 p 144163 ADAMS R Finite and Infinite Goods New York Oxford University 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mai 2022 The following is the translation of the entry on Teleological Arguments for Gods Existence by Del Ratzsch e Jeffrey Koperski in the Stanford Encyclopedia of Philosophy The translation follows the version of the entry in the SEPs archives at https platostanfordeduarchivesspr2022entriesteleologicalarguments This translated version may differ from the current version of the entry which may have been updated since the time of this translation The current version is located at a https platostanfordeduentriesteleologicalarguments Wed like to thank the Editors of the Stanford Encyclopedia of Philosophy mainly Prof Dr Edward Zalta for granting permission to translate and to publish this entry Finally we would like to thank to John Templeton Foundation for financially supporting this project Argumentos Teleológicos para a Existência de Deus Autoria Del Ratzsch e Jeffrey Koperski Tradução Aluízio Couto Revisão Rodrigo Jungmann de Castro Alguns fenômenos na natureza exibem tal requinte de estrutura função ou interconexão que muitas pessoas julgaram natural enxergar por trás desses fenômenos uma mente deliberativa e dirigente A mente em questão é tipicamente entendida como sobrenatural Pensadores com inclinação filosófica tanto no passado quanto no presente esforçaramse para moldar a intuição relevante em um raciocínio mais formal e logicamente rigoroso Os argumentos teístas resultantes em suas 132 várias formas lógicas têm como foco compartilhado o plano o propósito a intenção e o desígnio e são assim classificados como argumentos teleológicos ou frequentemente como argumentos do ou para o desígnio Embora tenham contado ao longo dos séculos com defensores proeminentes esses argumentos também atraíram críticas sérias de importantes pensadores antigos e contemporâneos Encontramse críticos e defensores não apenas entre filósofos mas também em áreas científicas e outras disciplinas Na discussão que se segue variações importantes dos argumentos teleológicos serão distinguidas umas das outras e exploradas críticas filosóficas tradicionais e outras críticas serão discutidas e os desenvolvimentos contemporâneos mais importantes argumentos do ajuste fino cósmico teorias dos vários mundos e o debate a respeito do desígnio inteligente serão mapeados A discussão será concluída com um rápido exame de uma importante abordagem não inferencial ao assunto 1 Introdução Não é incomum que humanos tenham a intuição de que um acidente aleatório sem planejamento e inexplicado simplesmente não poderia produzir ordem beleza elegância e o aparente propósito que experienciamos no mundo natural que nos rodeia Como Cleantes interlocutor de Hume expressa parece que vemos a imagem da mente refletida em nós a partir de inumeráveis objetos inanimados na natureza HUME 1779 1998 p 35 E muitas pessoas julgamse convencidas de que qualquer explicação para essa qualidade que evoca uma mente que não reconheça um papel causal para a inteligência a intenção e o propósito não pode ser seriamente plausível Argumentos cosmológicos frequentemente partem do fato bruto de que há coisas que existem contingentemente e chegam a conclusões a respeito da existência de uma causa dotada do poder de responder pela existência dessas coisas contingentes O raciocínio por trás de outros argumentos parte da premissa de que o universo nem sempre existiu e chega a uma causa que o fez existir Argumentos teleológicos ou argumentos do desígnio em contraste partem de um catálogo muito mais especializado de propriedades e terminam com uma conclusão a respeito da existência de um projetista ou designer dotado das propriedades intelectuais conhecimento propósito entendimento previdência sabedoria intenção necessárias para projetar as coisas que exibem as propriedades especiais em 133 causa Em linhas gerais então argumentos teleológicos têm como foco encontrar e identificar vários traços da atuação de uma mente nas estruturas temporais e físicas da natureza e também em seus comportamentos e cursos A ordem de algum tipo significativo é comumente o ponto de partida dos argumentos do desígnio Argumentos do tipo desígnio não são em geral problemáticos quando baseados em coisas que a natureza claramente não poderia produzir ou não produziria por exemplo a maioria dos artefatos humanos ou quando a agência inteligente é ela própria natural humana alienígena etc Identificar traços de desígnio vindos de civilizações humanas perdidas ou mesmo de civilizações não humanas via SETI poderia em princípio ser incontroverso Objeções às inferências que recorrem ao desígnio tipicamente surgem apenas quando o suposto projetista é algo mais exótico ou talvez sobrenatural Porém apesar da variedade de espirituosas investidas críticas suscitadas pelos argumentos do desígnio eles tiveram historicamente e continuam a ter disseminado apelo intuitivo de fato afirmase às vezes que argumentos do desígnio são os mais persuasivos de todos os argumentos teístas puramente filosóficos Repare que enquanto os argumentos do desígnio têm sido tradicionalmente usados para apoiar o teísmo em detrimento do naturalismo metafísico alguns desses argumentos podem ser relevantes para o panenteísmo o pampsiquismo e outras perspectivas que envolvem a teleologia irredutível 2 Padrões Inferenciais do Desígnio Os argumentos históricos que nos interessam são precisamente os potencialmente problemáticos inferências que partem de algumas características empíricas da natureza e concluem em favor da existência de um projetista Um segundo passo que embora separável é padrão o passo da teologia natural envolve a identificação do projetista com Deus Tal passo é frequentemente dado por meio de propriedades e poderes particulares requeridos pelos objetos projetados Embora o argumento tenha mostrado sua maior influência durante o século XVIII e o início do século XIX ele remonta ao menos aos gregos e de forma extremamente resumida compõe uma das Cinco Vias de Aquino Cleantes interlocutor de Hume 1779 1998 p 15 deu ao argumento uma formulação preliminar mais completa e muito elegante 134 Entretanto permanece a pergunta a respeito da estrutura formal de tais argumentos Que tipo de lógica está sendo empregada No fim a pergunta não admite apenas uma única resposta Várias respostas diferentes serão examinadas nas seções seguintes 21 Argumentos do Desígnio por Analogia Esquema 1 Argumentos do desígnio são rotineiramente classificados como argumentos por analogia vários paralelos são feitos entre artefatos humanos e certas entidades naturais e pensase esses paralelos apoiam conclusões paralelas a respeito da causação operativa em cada caso O esquema tipicamente associado ao argumento é aproximadamente o seguinte Esquema 1 1 A entidade e que está dentro da natureza ou o cosmo ou a própria natureza é semelhante a dado artefato humano a por exemplo uma máquina nas características relevantes R 2 a tem R precisamente porque é produto do desígnio deliberado da parte de um agente humano 3 Efeitos semelhantes tipicamente possuem causas semelhantes ou explicações semelhantes condições de existência semelhantes etc Portanto 4 É altamente provável que e tem R precisamente por ser também um produto do desígnio deliberado de uma agência inteligente e em aspectos relevantes semelhante à humana As características e propriedades relevantes R são referidas alternadamente por propriedades teleológicas ou por marcas ou sinais de desígnio e objetos com essas propriedades são às vezes referidos por objetos teleológicos Por simplicidade e uniformidade da discussão falarei simplesmente em termos de Rs 135 211 Objeções Humeanas Essa forma argumentativa geral em vários de seus passoschave foi criticada muito vigorosamente por Hume A discussão crítica primária de Hume está contida em Hume 1779 1998 As respostas de Hume são amplamente entendidas como a refutação filosófica paradigmática dos argumentos do desígnio tradicionais Contra 1 Hume argumentou que a analogia não é muito boa que a natureza e as várias coisas que há nela não se assemelham muito a artefatos humanos exibindo diferenças substanciais por exemplo objetos vivos versus não vivos autossustentáveis versus os que não são autossustentáveis De fato enquanto os defensores dos argumentos do desígnio frequentemente citavam similaridades entre por um lado o cosmo e por outro máquinas humanas Hume sugeriu talvez de modo apenas parcialmente irônico que o cosmo se assemelhava muito mais a um organismo vivo do que a uma máquina Mas se a dita semelhança é em aspectos relevantes distante seguese que a inferência em causa será logicamente frágil E embora 2 possa ser verdadeira em casos específicos de artefatos humanos a tal fato só se torna relevante para fenômenos naturais e via 3 que sustenta a transferência da atribuiçãochave Contra 3 Hume argumentou que inúmeras explicações alternativas possíveis poderiam ser dadas a respeito de entidades na natureza supostamente projetadas o acaso por exemplo Assim mesmo se 1 fosse verdadeira e mesmo se houvesse semelhanças importantes o argumento conferiria pouca força probabilística à conclusão De maneira mais geral Hume também argumentou que mesmo se algo como a conclusão apresentada 4 fosse estabelecida isso deixaria o argumentador distante de qualquer coisa parecida com concepção tradicional de Deus Por exemplo males naturais ou projetos aparentemente subótimos podem sugerir por exemplo um projetista amador ou um comitê de projetistas amadores E caso fenômenos instrumentais para a produção de males naturais por exemplo microrganismos causadores de doenças apresentarem vários dos Rs então eles presumivelmente deveriam ser colocados na conta do projetista o que teria o efeito de erodir ainda mais a semelhança do projetista com a deidade totalmente boa da tradição E mesmo os dados empíricos mais impressionantes poderiam estabelecer apropriadamente apenas poder e sabedoria finitos embora talvez enormes em vez do poder e sabedoria infinitos tipicamente associados à divindade Mas mesmo se fosse 136 concedida alguma substância à conclusão do argumento do desígnio isso sugere Hume apenas geraria um regresso O próprio agente projetista demandaria uma explicação exigindo em última instância uma sequência de inteligências análogas anteriores produzindo inteligências E mesmo se fosse estabelecida a existência de um projetista de coisas materiais isso ainda não estabeleceria automaticamente a existência de um criador da matéria que é moldada E dado que argumentos por analogia são um tipo de indução vide verbete analogia e raciocínio analógico a conclusão mesmo se estabelecida seria apenas estabelecida em um grau de probabilidade talvez insignificante Além disso não poderíamos fundamentar qualquer indução a respeito do nosso cosmo a partir de um indispensável porém ausente repositório de experiências de outros cosmos tidos como deliberadamente projetados e muito semelhantes ao nosso em características relevantes pela simples razão de que este universo é nossa única amostra Por fim a fração deste cosmo tanto espacial quanto temporalmente disponível à nossa inspeção é extraordinariamente pequena não é uma base promissora para uma conclusão geral do ponto de vista cósmico Hume concluiu que embora o argumento possa oferecer alguns fundamentos limitados para pensar que a causa ou causas da ordem no universo provavelmente guarda alguma remota analogia com a inteligência humana HUME 1779 1998 p 88 ênfase de Hume e isso não é uma implicação trivial nada diferente disso é estabelecido Historicamente nem todos concordaram que Hume ferira o argumento de modo fatal Simplesmente não é verdade que inferências explicativas não podem se estender de modo apropriado para além do que meramente se exige para efeitos já conhecidos Como um exemplo bastante geral baseado nas poucas observações que os humanos fizeram durante um período cosmicamente breve e em uma parte espacialmente minúscula do cosmo Newton teorizou que todas as porções de matéria em todas as épocas e em todos os lugares atraíam todas as outras porções de matéria Não havia nada logicamente suspeito aqui De fato considerações de simplicidade e uniformidade que têm considerável e merecido prestígio científico fazem pressão em favor de tais generalizações Mas Hume certamente identificou partes importantes no argumento que merecem exame detalhado Em primeiro lugar quaisquer dois grupos de objetos têm infinitas propriedades em comum e também diferem em infinitos aspectos Se é ou não o caso de artefatos e objetos naturais serem semelhantes de maneiras que apoiariam a transferência de atribuições de desígnio dos primeiros para os últimos é algo que depende exatamente de quais são os Rs relevantes Em segundo 137 lugar se realmente há meios de produzir Rs de modo independente de qualquer input mental é frequentemente uma questão empírica que não pode ser resolvida de maneira alguma por simples estipulação Por outro lado a relevância de alguns comentários do próprio Hume depende de os argumentos do desígnio mais fortes serem ou não argumentos por analogia E se são corretas algumas das sugestões de Hume a respeito do caráter indefinido de qualquer projetista inferido pelo argumento é algo que dependerá dos Rs específicos e do que pode ou não ser em última instância dito a respeito do que se exige para sua produção 212 Problemas a Respeito de R Rodada 1 Questõeschave então incluem quais são os Rs relevantes tipicamente citados Esses Rs genuinamente sinalizam propósito e desígnio Qualquer que seja a resposta como se mostra que ela é o caso Os Rs específicos em questão são obviamente centrais para os propósitos do argumento do desígnio Embora a categoria geral subjacente seja mais uma vez algum tipo especial de ordenamento e organização os aspectos específicos têm variado muito historicamente Entre os mais diretamente empíricos estão inter alia uniformidade engenhosidade ajuste de meios a fins complexidade particularmente extraordinária tipos particulares de funcionalidade delicadeza integração de leis naturais improbabilidade e a aptidão ajuste fino do reino inorgânico para o suporte à vida Várias propostas problemáticas com conteúdo empírico mais remoto e conotações axiológicas também foram avançadas incluindo a inteligibilidade da natureza a direcionalidade dos processos evolutivos características estéticas beleza elegância e similares propósito aparente valor incluindo a aptidão do nosso mundo para abrigar a existência do valor e da prática morais e a pura elegância de muitas das coisas que encontramos na natureza Muitos dos Rs específicos que foram apresentados ao longo da história se mostraram vulneráveis a críticas substantivas e frequentemente se tornaram com o passar do tempo mais e mais vulneráveis Especificamente embora fosse evidente que vários as tinham o caráter R em virtude de sua produção humana intencional era muito mais difícil estabelecer que toda ou qualquer outra ocorrência de R provavelmente também devia sua existência à intenção Como diz a história padrão a ciência adquiriu cada vez mais compreensão de como a natureza sem ser ajudada por intenção deliberada e planejamento pode produzir praticamente qualquer R proposto e assim embora 2 possa continuar valendo para praticamente 138 qualquer artefato humano a dotado de qualquer R intencional que se possa imaginar 3 e a inferência para 4 se tornou progressivamente menos defensável O desígnio nessa perspectiva poderia ser gradualmente afastado por meio de outras explicações 22 Argumentos Dedutivos do Desígnio Esquema 2 Mas alguns defensores de argumentos do desígnio estavam em busca de uma intuição mais profunda A intuição que eles tentavam capturar envolvia propriedades que por sua própria natureza constituíssem algum grau de evidência em favor do desígnio propriedades que não fossem por qualquer razão apenas ocorrentes frequentes em instâncias de desígnio Chamouse a atenção para esses Rs específicos não apenas porque tais propriedades calhavam de com frequência ou mesmo sempre ser produzidas por agentes capazes de desígnio Montanhas de lixo satisfazem essa descrição Os defensores estavam convencidos de que por mérito próprio os Rs apropriados refletiam e evocavam diretamente a cognição que isso sugeria de maneira direta a presença da mente que podíamos ver quase diretamente que eles eram o tipo geral de coisas que uma mente poderia gerar ou geraria e que consequentemente eles não dependiam para sua força evidencial de conjunções constantes previamente estabelecidas ou outras associações com instâncias conhecidas de desígnio Quando vemos uma versão em texto do Discurso de Gettysburg aquele texto diz mente de uma maneira totalmente não relacionada com qualquer indução ou analogia a partir de contatos prévios com textos Era esse tipo de testemunho da ocorrência de uma mente e de um desígnio que alguns defensores históricos de argumentos do desígnio acreditavam ter encontrado em alguns Rs observados na natureza uma confirmação que não tinha qualquer dependência na indução ou na analogia Popularmente beleza propósito e em geral valor especialmente quando estes ocorriam em conjunto com a complexidade delicada eram intuitivamente tidos como marcas do desígnio A ordem intrincada dinâmica estável e funcional do tipo que encontramos na natureza era frequentemente colocada nessa categoria Pensavase que tal ordem sugeria a presença de mentes no sentido de que ela parecia de maneira quase autoevidente o gênero de coisa que uma mente e na medida do que definitivamente se sabia apenas uma mente era propensa a produzir Era uma propriedade cuja qualidade de ecoar uma mente de fundo nós poderíamos sem hesitação atribuir a uma intenção 139 A despeito das objeções iniciais de Hume de que as coisas na natureza não são muito semelhantes a artefatos como máquinas a maior parte das pessoas incluindo oponentes dos argumentos do desígnio mais familiarizadas com as complexidades assombrosas da natureza admitem livremente que a natureza é abundante em coisas que parecem projetadas moldadas intencionalmente Francis Crick que não era nenhum entusiasta do desígnio por exemplo emitiu uma advertência a seus colegas biólogos Os biólogos devem sempre ter em mente que aquilo que eles veem não foi projetado mas é algo que evoluiu CRICK 1988 p 138 Juntamente com essa percepção de que há sugerida uma mente de fundo veio um princípio adicional o de que as características sugestivas da presença de uma mente ou de uma intenção moldadora aquelas que se assemelham ou têm a forma de um projeto designlike eram palpáveis demais para terem sido geradas por meios não intencionais Isso permite a especificação de um segundo padrão de inferência do desígnio Esquema 2 1 Algumas coisas na natureza ou a própria natureza o cosmo se assemelham a um projeto exibem um caráter R que ecoa cognição e cuja forma é típica da intenção 2 Propriedades R que se assemelham a um projeto não são passíveis de produção por meios naturais não guiados ou seja qualquer fenômeno exibindo esses Rs tem de ser produto de desígnio intencional Portanto 3 Algumas coisas na natureza ou a própria natureza o cosmos são produtos de desígnio intencional E claramente a capacidade para o desígnio intencional exige agência de algum tipo 140 7 A interpretação de Paley feita a seguir é um tanto controversa Em alguns momentos posteriores de Natural Theology a linguagem de Paley soa muito comparativa vide PALEY 1802 1963 p 37 Repare também que ele foi acusado de plagiar esse material do autor holandês Bernard Nieuwentyt JANTZEN 2014 p 16869 Repare que a referência explícita aos artefatos humanos não está mais no argumento e que ele não é mais comparativo tendo agora se tornado essencialmente dedutivo Alguns argumentos foram historicamente formulados com a pretensão de serem argumentos desse tipo Considere as muito reproduzidas passagens de abertura de Natural Theology 1802 de William Paley7 Ao cruzar uma várzea suponha que eu me deparasse com uma pedra e que me fosse perguntado como ela fora parar lá Possivelmente eu poderia responder que tanto quanto sabia ela lá havia estado desde sempre não seria talvez muito fácil mostrar a absurdidade dessa resposta Mas suponha que eu tivesse encontrado um relógio no chão e que me fosse questionado como o relógio calhara de estar naquele lugar Eu dificilmente recorreria à resposta que anteriormente ofereci a de que tanto quanto sabia o relógio havia lá estado desde sempre No entanto por que essa resposta não serviria para o relógio tal como serve para a pedra Por precisamente esta razão e por nenhuma outra quando inspecionamos o relógio percebemos o que não poderíamos descobrir na pedra que suas várias partes são concebidas e reunidas para um propósito Feita a necessária observação do mecanismo a inferência que pensamos ser inevitável é a de que o relógio tem de ter tido um feitor Cada observação feita em nosso primeiro capítulo a respeito do relógio pode de maneira estritamente apropriada ser repetida a respeito do olho a respeito dos animais a respeito das plantas a respeito de fato de todas as partes organizadas das obras da natureza O olho sozinho seria suficiente para sustentar a conclusão 141 8 A esse respeito ver também Glass e Wolfe 1986 p 1719 Veja também McPherson 1965 p 79 e Sober 1993 p 3435 que dele derivamos quanto à necessidade de um Criador inteligente Embora o argumento de Paley seja rotineiramente interpretado como um argumento por analogia ele contém uma exposição informal do tipo de argumento exposto logo acima Paley prossegue por dois capítulos discutindo o relógio discutindo suas propriedades indicadoras de desígnio destruindo potenciais objeções à conclusão de que há desígnio no relógio e discutindo o que pode e o que não pode ser concluído sobre o projetista do relógio É apenas nessa altura que entidades da natureza ou seja o olho aparecem no horizonte Obviamente Paley não atribui excessiva importância à tarefa de persuadir seus leitores a conceder que o relógio é realmente projetado e tem um projetista Ele está na verdade estabelecendo as bases e procedimentos a partir dos quais e pelos quais devemos e não devemos raciocinar sobre projetos e projetistas Daí o uso que Paley faz do termo inferência em conexão com o projetista do relógio8 Uma vez de posse dos princípios relevantes no capítulo 3 de Natural Theology Application of the Argument Paley aplica o mesmo argumento versus apresentarnos à outra metade do argumento por analogia às coisas na natureza Os casos respectivamente dos artefatos humanos e da natureza representam duas instâncias independentes de inferência até o limite o raciocínio é igualmente claro e certo tanto em um caso quanto no outro PALEY 1802 1963 p 14 Mas as instâncias são instâncias do mesmo passo inferencial a comprovação de que o olho foi feito para a visão e a de que o telescópio foi feito para auxiliála é precisamente a mesma PALEY 1802 1963 p 13 142 9 Como Elliot Sober repara se o argumento não for um argumento por analogia as críticas de Hume perdem totalmente sua força SOBER 1993 p 33 O relógio certamente desempenha um papel óbvio e crucial mas como uma instância paradigmática de desígnio e não como como o fundamento analógico para uma comparação inferencial O esquema 2 que não é estruturado analogicamente não seria vulnerável aos problemas que incidem sobre a analogia9 e por não ser indutivo reivindicaria para sua conclusão mais do que a mera probabilidade Isso não é acidental De fato temse argumentado que Paley estava ciente dos ataques anteriores de Hume aos argumentos por analogia em favor do desígnio tendo deliberadamente estruturado seus argumentos a fim de evitar as dificuldades centrais GILLISPIE 1990 p 214229 221 Avaliando o Argumento do Esquema 2 Em primeiro lugar como avaliar as premissas afirmadas por esse esquema A premissa 5 ao menos não é particularmente controversa mesmo hoje A advertência de Crick aos biólogos que vimos acima seria inócua se não houvesse a tentação de fazer atribuições ao desígnio e mesmo um oponente contemporâneo tão implacável contra os argumentos do desígnio como Richard Dawkins caracterizou a biologia assim o estudo de coisas complicadas que dão a impressão de terem sido projetadas para um propósito DAWKINS 1987 p 1 A biologia contemporânea feita no diaadia é abarrotada de termos como projeto máquina propósito e outros que vão na mesma direção Como o historiador da ciência Timothy Lenoir comentou O pensamento teleológico tem enfrentado oposição firme da biologia moderna E mesmo assim em quase todas as áreas de pesquisa os biólogos enfrentam dificuldades para encontrar uma linguagem 143 10 Na Alemanha do começo do século XIX um corpo teórico bastante coerente baseado na abordagem teleológica estava desenvolvido Ele forneceu uma fonte constantemente fértil para o avanço das ciências biológicas em várias frentes de pesquisa diferentes LENOIR 1982 p 2 John Hedley Brooke e outros avançam pontos similares que não impute propósito às formas viventes LENOIR 1982 p IX Independente de fenômenos biológicos particulares serem projetados ou não sua semelhança com um projeto é forte o suficiente para que a linguagem do desígnio não apenas se encaixe extraordinariamente bem a sistemas vivos mas para que ela também esteja na base do surgimento de concepções teóricas úteis10 Defensores dos argumentos do desígnio afirmam que o motivo pelo qual teorizar como se os organismos fossem projetados tem tanto sucesso é o fato de que os organismos são de fato projetados Os que se opõem a isso diriam que todos os conceitos teleológicos em biologia devem de uma maneira ou outra ser reduzidos à seleção natural No entanto o princípio 6 segundo o qual as propriedades centrais que aparentam ser parte de um projeto não são passíveis de produção por meios naturais não guiados será mais problemático dentro da biologia evolutiva Qual poderia ser a justificativa racional para 6 Há duas possibilidades gerais 1 Empírica indução Essencialmente a indução envolve o estabelecimento de que algum princípio vale no interior do nossoa conhecimentoexperiência esses casos são as amostras e sujeita a algumas restrições a generalização do princípio de modo a abranger áreas relevantes que estão além daquele domínio os casos teste A tentativa de estabelecer a universalidade de uma conexão entre ter os Rs relevantes e ser um produto da mente feita com base em uma conexão consistentemente observada entre ter os Rs relevantes e ser o produto da mente em todos os casos ou na maior parte nos quais o R era manifesto e sabíamos se o fenômeno em questão era ou não um produto da mente constituiria uma generalização indutiva Essa abordagem sofreria de diversas fraquezas As coisas que exibem R e das quais podemos dizer que sabíamos se eram ou não projetadas seriam quase sem exceção artefatos humanos ao passo que o fenômeno ao qual a generalização se estenderia seria quase sempre composto de coisas que estão em uma categoria muito diferente coisas na natureza E obviamente a generalização em causa 144 poderia na melhor das hipóteses estabelecer no máximo uma probabilidade que aliás seria bem modesta 2 Conceitual Podese sustentar que 6 é conhecida a partir da mesma maneira conceitual praticamente a priori em que sabemos que livrostexto não são produzidos por processos naturais não guiados por uma mente E nossa convicção aqui não é baseada em uma mera indução a partir de experiências anteriores com textos Textos carregam consigo marcas essenciais de uma mente e de fato ao entendermos um texto temos ao menos acesso parcial à mente ou às mentes envolvidas Vários artefatos de origem alienígena caso existam e com os quais não tivemos qualquer experiência prévia poderiam fazer parte dessa categoria também De forma parecida tem sido sustentado que por vezes nós reconhecemos imediatamente que a ordem de certo tipo é exatamente um sinal de que há mente e intenção De modo alternativo poderia ser argumentado que embora haja uma ligação conceitual genuína entre os Rs apropriados e a mente o desígnio a intenção etc nosso reconhecimento dessa ligação é tipicamente desencadeado por experiências específicas com artefatos ou que nossa percepção dessas conexões em seus aspectos profundos é mais nítida a partir de considerações envolvendo artefatos Aristóteles e Galileu sustentaram um ponto correlato a respeito da nossa aquisição do conhecimento dos princípios gerais que governam a natureza Nessa perspectiva uma vez que a verdade de 6 tornase manifesta através das experiências com artefatos a correção de sua aplicação mais geral se tornaria clara Isso poderia explicar por que tantos defensores dos argumentos do desígnio tanto no passado quanto no presente parecem acreditar que para ganhar assentimento quanto ao desígnio eles devem apenas apresentar uns poucos exemplos e afetar um semblante de quem se impressiona De qualquer maneira o princípio 6 ou algo parecido seria algo com o qual as inferências relevantes em favor do desígnio teriam início Uma investigação adicional de 6 exige olhar mais de perto os Rs que 6 envolve 222 Problemas a Respeito de R Rodada 2 Uma coisa que dificulta as avaliações gerais dos argumentos do desígnio é o fato de a força evidencial de Rs específicos ser afetada pelo contexto de sua ocorrência Especificamente propriedades que em artefatos conhecidos claramente 145 11 Para tentativas de argumentação em defesa da teleologia na natureza confira Boyle 1688 e Janet 1844 parecem constituir marcas de desígnio com frequência parecem ter menos força evidencial fora de seu contexto original Por exemplo nós tipicamente interpretamos a enorme complexidade presente em algo que sabemos ser um artefato manufaturado como uma característica deliberadamente planejada e produzida Mas a mera complexidade em contextos nos quais julgamos não haver artefatos o arranjo preciso das agulhas de pinheiro no chão de uma floresta por exemplo não parece ter a mesma força No caso de objetos naturais com evidente ausência de artificialidade é menos claro que essa complexidade e também os outros Rs empíricos tradicionais indiquem intenção plano e propósito Da mesma forma linhas absolutamente retas em um artefato são tipicamente resultado de intenção deliberada Que as linhas retas percorridas pelos raios de luz também o sejam soa a muitos como algo bem menos óbvio Além disso mesmo nesses dois contextos artefato e natureza os vários Rs exibem graus variados de força evidencial Por exemplo mesmo em um artefato a mera complexidade seja ela de qualquer grau comunica menos claramente a intenção do que uma frase entalhada Como a maioria dos críticos dos argumentos do desígnio apontam os exemplos encontrados da natureza não são do tipo frase entalhada Há dois resultados cruciais aqui Em primeiro lugar caso se leve em conta somente a complexidade essa complexidade pode não comunicar tão claramente a presença de intenção Em segundo lugar embora a presença de propósito e valor genuínos possa constituir evidência persuasiva de um projetista estabelecer que as características empíricas em causa realmente indicam propósito e valor genuínos e não apenas digamos funcionalidade parece a muitos algo difícil isso se não for impossível11 223 As Lacunas e Seus Descontentes A ambiguidade evidencial praticamente desapareceria caso ficasse claro que não há meios possíveis de produzir alguns R de modo independente da intenção deliberada Parte do poder persuasivo de 6 veio historicamente da ausência de 146 qualquer explicação causal alternativa plausível e de caráter não intencional para os Rs tradicionais Esses casos são frequentemente vinculados às supostas lacunas na natureza fenômenos para os quais tal como se afirma não pode haver qualquer explicação puramente natural havendo então uma lacuna entre as capacidades de produção da natureza e o fenômeno em causa Por exemplo as capacidades não guiadas da natureza estão aquém daquelas capacidades exigidas para a produção de um rádio Assim quando vemos um rádio sabemos que algo diferente a agência humana esteve envolvido em sua produção Assumese geralmente que razões em favor do desígnio que se baseiam na suposta inabilidade da natureza de produzir determinados fenômenos recorrem explícita ou implicitamente à agência sobrenatural e essas razões são tipicamente descritas como argumentos do tipo Deus das lacunas uma descrição geralmente usada de forma pejorativa Mas a evidência de desígnio na natureza não implica automaticamente que há lacunas O desígnio já de início incorporado à natureza não exigiria intervenções adicionais em seu fluxo histórico e assim não haveria qualquer lacuna Mas uma vez que a divisão artefatonatureza é paralela à divisão lacunaausência de lacuna uma maneira em que a implausibilidade dos modos alternativos de produção poderia se tornar excepcionalmente clara é a seguinte se R fosse associado a uma lacuna nas capacidades da natureza se o curso não guiado da natureza realmente não pudesse produzir ou não produzisse R e no entanto ainda víssemos R na natureza Em um caso assim o apelo à agência seria praticamente inevitável A posição de que há lacunas na natureza não é inerentemente irracional e ela pode aparentemente ser uma questão empírica legítima Porém embora as lacunas possam fortalecer bastante os argumentos do desígnio elas têm suas próprias dificuldades Lacunas são geralmente fáceis de identificar quando nos deparamos com artefatos Porém por mais que elas possam estar presentes na natureza estabelecer sua existência nela é algo que no mais das vezes pode ser feito pela ciência ao menos apenas indiretamente via considerações probabilísticas supostas limitações nas habilidades da natureza etc Várias possíveis dificuldades estão à espreita aqui Lacunas na natureza sugeririam mais uma vez agência sobrenatural e alguns pensam que a ciência opera sob a exclusão obrigatória da agência sobrenatural Essa proibição comumente conhecida como naturalismo metodológico é frequentemente considerada erradamente argumentam alguns como característica obrigatória da ciência 147 12 Consulte Ratzsch 2001 cap 8 13 De fato John Foster afirma que A única forma racional primitiva de inferência empírica é a inferência para a melhor explicação FOSTER 19821983 p 89 ênfase minha Em um trabalho posterior a mesma linha aparece novamente mas com a adição de não dedutiva após empírica FOSTER 1985 p 227 genuína12 Limitações estabelecidas tanto à ciência quanto à natureza podem ser e foram superadas no passado A possibilidade de descoberta ou postulação de meios naturais alternativos de produção constituiria uma ameaça permanente a qualquer argumento que em parte se baseasse na percepção da ausência de tais meios E o histórico irregular das supostas lacunas fornece ao menos uma nota de advertência Essas considerações irão dificultar tentativas de estabelecer com firmeza do ponto de vista empírico o desígnio com base nos tipos de propriedade que comumente encontramos na natureza As supostas lacunas tipicamente desaparecem obviamente por meio de novas propostas de teorias científicas que postulam maneiras de produção natural de fenômenos que pensavase previamente estavam além das capacidades da natureza O exemplo mais óbvio disso claramente é a teoria da evolução de Darwin e suas descendentes 23 Inferência para a Melhor ExplicaçãoArgumentos Abdutivos do Desígnio Esquema 3 Alguns filósofos da ciência afirmam que em vários exemplos científicos empregamos uma inferência para a melhor explicação IME13 A ideia básica é que caso uma entre algumas explicações concorrentes seja tudo considerado superior às outras em aspectos importantes probabilidade poder e escopo explicativos adequação causal plausibilidade amparo evidencial encaixe em teorias já aceitas poder de predição fecundidade precisão poder unificador e outros aspectos do gênero estamos então justificados provisoriamente a aceitar essa concorrente como a explicação correta dada a evidência em questão LIPTON 1991 p 58 Alguns defensores veem os argumentos do desígnio como inferências para a melhor explicação considerando que as explicações que recorrem ao desígnio 148 quaisquer que sejam suas fragilidades são prima facie superiores ao acaso à necessidade à evolução guiada pelo acaso ou a qualquer outra coisa Um esquema geral aplicado neste contexto nos daria o seguinte Esquema 3 1 Algumas coisas na natureza ou a própria natureza o cosmo exibem requintada complexidade ajuste delicado de meios a fins e outras características R relevantes 2 A hipótese de que essas características são produtos de desígnio deliberado e intencional Hipótese do Desígnio as explicaria adequadamente 3 De fato a hipótese de que essas características são produtos de desígnio deliberado e intencional Hipótese do Desígnio é tudo considerado a melhor explicação disponível para elas Portanto provavelmente 4 Algumas coisas na natureza ou a própria natureza o cosmo são produtos de desígnio deliberado e intencional ou seja podese esperar que a Hipótese do Desígnio seja verdadeira Em argumentos desse tipo considerase que as virtudes explicativas superiores de uma teoria constituem apoio epistêmico decisivo para a aceitabilidade da teoria a crença justificada nela e o quanto podemos esperar que ela seja verdadeira Há é claro um várias supostas virtudes explicativas e epistêmicas incluindo a lista incompleta apresentada logo acima e listas com esses itens evoluíram com o passar do tempo A avaliação de hipóteses em termos dessas virtudes é muitas vezes controversa uma vez que isso depende de como características mal definidas são encaradas das diferenças acerca de compromissos conceituais de fundo e de outras coisas do mesmo tipo Ainda assim no mais das vezes conseguimos nos orientar com soluções eficazes ainda que não muito refinadas 149 231 IME Expectabilidade e Bayes Uma estruturachave subjacente nesse contexto é tipicamente remontada à noção de Peirce de abdução Suponha que algum fato e surpreendente em outras circunstâncias fosse uma ocorrência que pudéssemos razoavelmente esperar caso fosse verdadeira a hipótese h Isso argumentou Peirce constituiria ao menos razões provisórias para pensar que h poderia de fato ser verdadeira A caracterização do próprio Peirce é a seguinte PEIRCE 1955 p 151 Esquema 3 O fato surpreendente C é observado Mas se A fosse verdadeira C claramente seria o resultado habitual Assim Há razão para suspeitar que A é verdadeira A medida de C ser claramente o resultado habitual dado A é frequentemente descrita como o grau em que C poderia ser antecipado caso A fosse de fato verdadeira Essa intuição é por vezes embora explicitamente não pelo próprio Peirce formalizada em termos de expectabilidade definida como se segue A expectabilidade da hipótese h dada a evidência e Pe h A expectabilidade de h é a probabilidade de encontrarmos a evidência e dado que a hipótese h é verdadeira Em casos de hipóteses explicativas rivais e digamos suas expectabilidades comparativas relativamente a uma evidência específica podem ser entendidas como um indicativo de qual das rivais uma dada evidência apoia dada a diferença entre o apoio a uma e à outra ou seja 150 14 Para mais discussões consulte Ratzsch 2003 p 124144 Princípio da Expectabilidade Pe h1 Pe h2 e apoia h1 mais do que apoia h2 O fato de a expectabilidade de h1 ser maior do que de h2 relativamente a uma evidência específica não implica automaticamente que h1 deva ser aceita que ela tem mais chances de ser verdadeira ou que ela é em um sentido geral melhor do que h2h1 até pode na verdade ser uma teoria completamente lunática que mesmo assim implica e dando a h1 a expectabilidade mais alta possível Essa expectabilidade maximal relativa à e não necessariamente alteraria o fato de h1 ser lunática A expectabilidade assim não se traduz automaticamente em uma medida de quão fortemente uma dada evidência e apoia a hipótese h1 em causa JANTZEN 2014a cap 11 Isso então levanos diretamente à teoria da probabilidade de Bayes Embora a abordagem Bayesiana seja sem dúvidas mais rigorosa do que apelos à IME poucos argumentos teleológicos são apresentados nesses termos Para um contraste entre a IME e o Bayesianismo ver o verbete abdução Para uma crítica recente importante aos argumentos teístas do desígnio em termos Bayesianos confira Sober 2009 a réplica de Kotzen 2012 e a resposta de Jantzen 2014b Independente da perspectiva que se tenha a respeito do Bayesianismo a IME tem suas próprias deficiências A avaliação do que conta como melhor não é apenas permeada por juízos de valor mas é também uma tarefa notoriamente complicada especialmente dada a relevância ambígua e difícil de estimar dos Rs em causa Há também o problema muito profundo a respeito das razões pelas quais deveríamos pensar que características que os humanos julgam atraentes nas explicações propostas rastreiam a verdade Que tipo de justificação pode estar disponível aqui Além disso tomar o desígnio como a melhor explicação para algo exige a identificação prévia de quais são as propriedades apropriadamente entendidas como relevantes relativamente ao desígnio e tal reconhecimento tem de ter uma base diferente14 E mais uma vez comparações substantivas devem envolver apenas alternativas conhecidas o que em qualquer situação representa uma fração minúscula das alternativas possíveis A escolha da melhor explicação entre as alternativas pode ser o que de melhor podemos fazer mas muitos insistiriam que 151 15 Devemos notar que embora variações acidentais e mutações aleatórias implicam que os eventos em causa não foram planejados o recurso ao que ocorre acidentalmente não significa que tais eventos sejam inexplicados Tipicamente em ciência há uma explicação parcial para eventos aleatórios o que ocorre porém em um nível mais profundo de explicação O comportamento aleatório das bolas de pinguepongue usadas nas máquinas lotéricas é em parte explicado pela natureza das colisões elásticas e geometria das bolas De maneira similar mutações aleatórias têm explicações bioquímicas que incluem influências ambientais por exemplo radiação e erros de cópia na produção celular sem alguns pressupostos adicionais importantes e suprimidos ser a melhor alternativa tal como humanos veem de um grupo restrito humanamente conhecido não justifica atribuição de verdade ou de qualquer coisa semelhante Há também outros problemas potenciais aqui Sober argumenta que sem pressupostos adicionais muito específicos a respeito do suposto projetista não podemos determinar qualquer valor específico para Pe h por exemplo a expectabilidade de que um projetista produzisse olhos de vertebrados com as características específicas que observamos neles e que dependendo dos pressupostos específicos assumidos poderíamos chegar a qualquer valor entre 0 e 1 vide SOBER 2003 p 38 Há também o problema potencial de agrupar hipóteses novas e não consideradas anteriormente em um mesmo pacote geral Sem conhecer os detalhes a respeito de hipóteses específicas ainda não consideradas simplesmente não há maneira plausível de antecipar a expectabilidade aparente de uma hipótese nova e original isso sem falar nas dificuldades de antecipar suas outras potenciais virtudes explicativas Segundo algumas perspectivas isso é essencialmente o que aconteceu com alguns argumentos do desígnio tradicionais Tais argumentos eram o que havia disponível de mais razoável até que a evolução Darwiniana ofereceu uma alternativa plausível ou superior cujos detalhes e expectabilidade não eram previamente antecipáveis 3 Explicação Alternativa Sem entrar nos detalhes já familiares argumentase que processos Darwinianos impelidos por variações não projetadas não planejadas e frutos do acaso estas por sua vez conservadas ou eliminadas por meio da seleção natural produziriam ao longo do tempo organismos primorosamente adaptados a seus nichos ambientais15 E uma vez que muitas das características tradicionalmente 152 citadas como evidências de desígnio eram adaptações diversas a evolução produziria assim entidades que se adequariam exatamente aos critérios tradicionais do desígnio A seleção natural portanto sem ajuda da intenção ou da intervenção poderia dar conta da existência de muitos talvez de todos os Rs que encontramos na biologia Um debate paralelo pode ser encontrado entre aqueles que acreditam que a própria vida requer uma explicação em termos de desígnio MEYER 2009 e aqueles que propõem uma explicação naturalista vide verbete a vida Muitos entenderam e ainda entendem que dado o exposto acima argumentos do desígnio que dependem de lacunas biológicas seriam enfraquecidos e talvez fatalmente A premissa 10 isso sem falar na premissa 6 aparentemente seria então simplesmente falsa O que antes parecia ser propósito o que exige intenção era agora aparentemente revelado como meramente uma função que não tendo a intenção em sua origem ainda assim é bemsucedida e preservada A falsidade das premissas relevantes é claro apenas erode os esquemas tais como aqui apresentados não refuta a intuição básica do desígnio ou outras formas de argumentos do desígnio Alguns críticos porém adotam uma linha muito mais dura Richard Dawkins por exemplo dá o seguinte subtítulo a um de seus livros Por que a evidência da evolução revela um universo sem desígnio DAWKINS 1987 Algo que tipicamente subjaz a afirmações desse tipo é a crença de que a evolução Darwiniana ao fornecer uma explicação apropriada da origem e do desenvolvimento da adaptação da diversidade e de itens semelhantes afastou do campo biológico a importância tanto do desígnio quanto do projetista o que ocorreu de forma semelhante a como a teoria cinética afastou o calórico De fato essa é uma ideia que está na base de respostas contemporâneas aos argumentos do desígnio No entanto erodir e afastar a importância não são necessariamente a mesma coisa e o que exatamente esse afastar pode significar e o que um afastamento bemsucedido exigiria não são coisas especificadas com clareza Assim antes de prosseguirmos precisamos de clareza a respeito de certos panoramas conceituais importantes 153 16 Algumas das direções exploradas aqui foram inicialmente sugeridas a Ratzsch por David van Baak comunicação pessoal Para mais discussões a respeito da distinção entre explicação e afastamento de um fator explicativo confira Rott 2010 p 6768 e Glass 2012 31 Afastando um Fator Explicativo16 Para que um suposto fator explicativo α seja provisoriamente afastado nos termos acima exigese que haja uma explicação alternativa Σ que satisfaça as seguintes condições a Σ é explicativamente adequada ao fenômeno em causa estrutura propriedade entidade evento b Podese apoiar Σ racionalmente em termos da evidência ou evidência provável disponível c Σ é de maneira importante superior ao original em termos de adequação ou apoio racional d Σ não exige qualquer referência indispensável a α No entanto ad são incompletas de uma maneira diretamente relevante para a presente discussão Eis um caso bem simples Suponha que um tio idoso morra em circunstâncias suspeitas e que alguns dos parentes acreditem que a explicação correta é a ação direta de uma sobrinha a primeira herdeira por meio da administração direta e deliberada de um veneno Porém a investigação forense estabelece que a causa da morte foi uma mistura entre os medicamentos que o tio estava tomando uma confusão infeliz Entretanto os parentes desconfiados sem perder a oportunidade de sustentar uma explicação recuam a agência da sobrinha a um nível anterior e propõem que a mistura foi orquestrada por ela sem dúvidas ela trocou o conteúdo dos frascos prescritos E pode muito bem calhar de isso ser verdade Nesse tipo de caso já não se apela diretamente no nível da explicação inicial do exemplo ao α em causa por exemplo a agência da sobrinha mas ele não é destituído de toda relevância explicativa no fenômeno Em geral portanto para α ser afastado no sentido de ele ser banido de toda relevância explicativa a seguinte condição também deve ser satisfeita 154 a Nenhuma referência a α é exigida em qualquer nível explicativo subjacente a Σ Grosso modo isso quer dizer que Σ não depende obrigatoriamente de qualquer parte β de qualquer explicação prévia na qual α é indispensável a β Há algumas possíveis qualificações técnicas adicionais exigidas aqui mas a intuição geral deve estar clara Assim por exemplo por mais que já não houvesse a necessidade de recorrer ao calórico em algum nível anterior ou mais profundo no caso do desígnio de acordo com vários de seus defensores ainda há uma lacuna explicativa ou uma nota promissória implícita exigindo a referência ao desígnio em algum nível explicativo anterior à evolução Darwiniana De fato como alguns enxergam e como o próprio Paley sugeriu há fenômenos que exigem explicação em termos de desígnio e eles não podem ser afastados em qualquer nível explicativo anterior com exceção do último Quando se diz que algum fenômeno α foi afastado podese entender duas coisas bem diferentes I mostrouse que não é mais racional acreditar que α existe ou II mostrouse que α não existe E frequentemente claro ambas Por exemplo poucos diriam que ainda há disponível um argumento racional para que se acredite no flogisto qualquer trabalho explicativo que ele tenha feito no nível mais próximo parece ter se extinguido e qualquer utilidade explicativa mais profunda em seu favor nunca veio a se materializar Talvez sua inexistência não tenha sido positivamente estabelecida imediatamente mas à medida que a evidência favorável a uma hipótese rival aumenta a remoção da justificação racional para que se acredite em alguma entidade pode se transformar em uma razão para sua não existência 155 311 Mudança de Nível Pretensas explicações podem ser informalmente divididas em duas categorias amplas aquelas que envolvem agentes agência intenção e similares e aquelas que envolvem mecanismo causalidade física processos naturais e similares Obviamente a distinção não é limpa artefatos funcionais tipicamente envolvem ambas mas ela é mesmo que de uma maneira não muito refinada suficientemente útil e no que se segue explicações em termos de agentes e explicações mecânicas serão usadas respectivamente como aproximações convenientes Nada de danoso é incluído seja na distinção ampla seja na terminologia específica usada a Explicações em Termos de Agentes Intenção intervenção e outros componentes agenciais das explicações podem com muita frequência ser recuados para níveis anteriores tal como afirmam muitos defensores de argumentos teleológicos O exemplo anterior do envenenamento do tio rico pela sobrinha é um caso simples disso Mas em alguns casos os detalhes de uma explicação em termos de agentes podem recorrer a um nível anterior menos plausível ou razoável Por exemplo suponha que alguém acreditasse que círculos em plantações deveriam ser explicados em termos de atividade alienígena direta A pessoa poderia ao se deparar com uma prova irrefutável em vídeo da produção humana desses círculos ainda sustentar que à distância os alienígenas controlaram o cérebro dos humanos em questão e que por causa disso a responsabilidade pelos círculos nas plantações ainda era atribuível à atividade alienígena Embora esse recuo de níveis preserve a explicação básica ele claramente carrega consigo um custo significativo dada sua implausibilidade inerente E em alguns casos recuar uma dada instância de agência em um nível parece praticamente inviável Suponha que a explicação padrão do aquecimento global fosse a atividade humana mas que depois emergisse uma explicação completa totalmente adequada e conclusiva em termos de ciclos solares Aparentemente isso afastaria a suposta causação humana e nesse tipo de caso seria difícil recuar um nível e defender que a agência e atividade humanas na verdade eram as reais condutoras dos ciclos solares 156 Mesmo assim a possibilidade de mudança de nível está regra geral disponível para propostas de explicação em termos de agência E o desígnio é tipicamente como é óbvio uma explicação em termos de agência b Explicações Mecânicas Fazer com que certos fatores explicativos recuem a um nível anterior é algo que frequentemente acarreta mais dificuldade em casos mecânicosfísicos do que em explicações que envolvem agênciaintenção Em muitos casos de tentativas de realocação mecanicista é difícil ver sequer como deveria funcionar o fator explicativo específico realocado e ainda mais difícil ver como a realocação contribui com qualquer progresso explicativo Por exemplo qual seria o papel desempenhado pelo calórico se ele fosse recuado um nível Embora a alteração do nível de fatores explicativos específicos pareça funcionar com menos facilidade em explicações puramente físicas tentativas de realocação envolvendo princípios físicos amplos podem às vezes evitar essas dificuldades Por exemplo o determinismo era um componente de fundo básico das explicações científicas processos aparentemente estocásticos tendo sido epistemicamente afastados Mas então no começo do século XX a física foi em grande parte convertida a uma concepção quântica da mecânica segundo a qual a natureza envolve um indeterminismo irredutível em um nível fundamental fenômenos aparentemente determinísticos agora sendo o que é afastado No entanto DeBroglie Bohm e outros e mesmo Einstein por um tempo tentaram reintroduzir o determinismo o recuando por meio de teorias de variáveis ocultas a um nível fundamental ainda mais profundo Embora a tentativa por meio das variáveis ocultas seja em geral tida como malsucedida sua falha não é uma falha de princípio 312 Possíveis Disputas Como se avalia a legitimidade plausibilidade ou expectabilidade de uma dada contraexplicação é algo que terá muito peso aqui e isso por sua vez dependerá significativamente entre outras coisas de crenças de fundo comprometimentos disposições metafísicas e coisas parecidas Caso se tenha um compromisso prévio com algum αchave por exemplo teísmo ateísmo naturalismo determinismo materialismo teleologia ou se atribua previamente uma alta probabilidade a tal α 157 a plausibilidade de encarar a nova explicação como algo que erode derrota ou refuta α eou Σ será profundamente afetada ao menos inicialmente O enviesamento do panorama conceitual por meio de comprometimentos prévios é ao mesmo tempo uma necessidade epistêmica de igualdade de oportunidades e uma potencial armadilha Insistir no recuo de um fator explicativo para um nível anterior é frequentemente uma indicação de forte comprometimento prévio de algum tipo Discordâncias sobre princípios mais profundos sejam eles filosóficos ou de outro tipo muitas vezes irão gerar discordâncias a respeito de quando algo foi ou não afastado Um dos lados comprometido com um princípio irá encarar uma mudança de nível como a incorporação de um insight mais profundo a respeito do fenômeno em causa O outro rejeitando o princípio verá nisso um recuo ad hoc para defender um α que já foi na verdade afastado Retornando ao nosso tópico defensores do argumento do desígnio obviamente irão rejeitar a afirmação de que coisas como desígnio teleologia e agência foram afastados seja pela ciência em geral ou pela evolução Darwiniana em particular As razões irão variar Alguns considerarão que qualquer ciência evolução Darwiniana incluída é incompetente para dizer qualquer coisa pró ou contra de relevância definitiva para o desígnio Muitos em ambos os lados do debate sobre o desígnio encaixamse aqui Alguns irão considerar que a evolução fracassa em satisfazer a b eou c afirmando que a evolução Darwiniana não é explicativamente adequada para αs específicos que ela é insuficientemente apoiada pela evidência ou que para dar conta dos fenômenos relevantes ela está longe de ser superior às explicações em termos de agência Criacionistas e alguns não todos defensores do desígnio inteligente se encaixam aqui Alguns irão argumentar que a falha Darwiniana ocorre em d citando por exemplo um conceito de informação tido como indispensável para a evolução e ao mesmo tempo repleto de agência Alguns defensores do desígnio inteligente vide DEMBSKI 2002 MEYER 1998 se encaixam aqui No entanto no que nos interessa a principal disputa diz respeito a e 32 Causação Indireta Desígnio e Evidências Historicamente o entendimento comum foi o de que razões pródesígnio acomodam o desígnio e a causação indiretos por parte de agentes inteligentes caso em que as próprias estruturas produzindo os fenômenos relevantes são 158 17 Uma elegante descrição desse passo argumentativo vindo da própria ciência é dada por Whewell Demonstramos assim confiarmos que a noção de desígnio e finalidade é por parte dos pesquisadores das ciências transferida não do domínio de nosso conhecimento para aquele da nossa ignorância mas meramente do reino dos fatos para o reino das leis WHEWELL 1834 p 349 deliberadamente projetadas para o propósito de produzir esses fenômenos17 Por exemplo tipicamente se acreditava que Deus poderia ter iniciado no instante da criação condições e processos que operando inteiramente por conta própria poderiam produzir organismos e outros resultados pretendidos e projetados sem que se precisasse de qualquer intervenção posterior por parte de um agente O próprio Paley os autores dos Tratados de Bridgewater e também outros foram explicitamente claros algo ter sido ou não projetado era uma questão em grande parte separável dos meios de produção em causa Historicamente insistiuse que o desígnio na natureza no fim remontava a uma agência inteligente em algum lugar e que qualquer desígnio encontrado na natureza não estaria e não poderia lá estar caso não houvesse em última instância alguma mente envolvida Porém comentadores incluindo muitos cientistas ao menos do século XVII em diante por exemplo Francis Bacon e Robert Boyle distinguiram muito claramente o início criativo da natureza das intervenções no percurso da natureza uma vez iniciado Por exemplo mais de dois séculos antes de Darwin Bacon escreveu Deus realiza e cumpre sua vontade divina por meios que não são imediatos e diretos mas pela fixação das linhas mestras não por meio da violação da Natureza que é sua própria lei sobre a criação BACON apud WHEWELL 1834 p 358 De fato se os Rs em questão indicam diretamente a influência de uma mente então os meios de produção sejam eles uma cadeia causal contínua ou uma que admita lacunas teriam uma importância evidencial mínima Assim a afirmação contemporânea frequente de que todos os argumentos do desígnio envolvem apelos à intervenção especial divina durante o curso da história da natureza que em suma argumentos do desígnio são argumentos do tipo Deusdaslacunas representa uma séria incorreção histórica e presente vide BEHE 1996 159 18 Como C D Broad 1925 p 86 nota em relação a isso Enquanto nos preocuparmos apenas com os aspectos presentes de um sistema material e não com sua origem não há qualquer razão pela qual seus comportamentos característicos não possam ao mesmo tempo ser teleológicos e capazes de receber a uma explicação mecanicista completa No entanto se os Rs resultam de cadeias sem lacunas de processos causais naturais o impacto evidencial desses Rs corre o risco de mais uma vez tornarse problemático e ambíguo uma vez que a fortiori haverá no nível em que se está no momento uma explicação causal completa para eles18 Em casos assim o desígnio não desempenha aqui qualquer papel explicativo mecanicista o que sugere seu caráter supérfluo Mas mesmo se tais concepções fossem explicativa e cientificamente supérfluas neste nível isso não implica que elas são conceitualmente aleticamente inferencialmente ou de outras maneiras supérfluas em geral O papel da mente poderia ser indireto estar muito escondido ou estar a vários níveis de distância do mecanismo de produção observado no momento mas ainda assim teria de estar presente em algum nível Em suma no panorama acima a evolução Darwiniana não irá satisfazer a condição c para o afastamento do desígnio o que não é em si uma deficiência da evolução Darwiniana Mas qualquer argumento sem lacunas dependerá crucialmente de que os Rs em causa sejam em última instância dependentes de um agente aqueles ocorrendo como um resultado da atividade deste Esse ponto poderia ser retrospectivamente integrado a um esquema 2 alterado pela substituição de 6 por 6a Propriedades que se assemelham às de um projeto não são muito provavelmente produzíveis por meios em última instância desprovidos de mente intenção ou seja quaisquer fenômenos que exibem tais Rs tem de ser produto ou menos indiretamente do desígnio intencional O foco agora deve incidir sobre o seguinte se é ou não o caso que as leis e condições exigidas para a produção indireta de vida vida inteligente etc poderiam em algum ponto remoto talvez primordial précósmico ser independentes da intenção do desígnio e da mente 160 4 Discussões Contemporâneas Adicionais sobre o Desígnio 41 Discussão Cosmológica Ajustefino Intuitivamente se as leis da física fossem diferentes a evolução da vida não teria tomado o mesmo rumo Se por exemplo a gravidade fosse mais forte insetos voadores e girafas muito provavelmente não existiriam A verdade é muito mais dramática Mesmo uma alteração extraordinariamente pequena em um dos muitos parâmetroschave nas leis da física teria tornado a vida impossível em qualquer lugar do universo Considere dois exemplos 1 A taxa de expansão do universo é representada pela constante cosmológica Λ Se Λ fosse ligeiramente maior não haveria fontes de energia como as estrelas Se ela fosse ligeiramente menor o Bing Bang rapidamente teria levado a um Grande Retraimento Big Crunch no qual o universo colapsaria sobre si mesmo Para a vida ser possível Λ não pode variar mais do que uma parte em 1053 COLLINS 2003 2 A vida depende entre outras coisas de um equilíbrio de carbono e de oxigênio no universo Se a força nuclear forte fosse diferente em 04 não haveria o suficiente de um ou de outro para a vida existir OBERHUMMER CSÓTÓ SCHLATTL 2000 Variar essa constante para mais ou para menos destruiria quase todo o carbono ou quase todo o oxigênio em todas as estrelas BARROW 2002 p 155 Muitos exemplos de ajuste fino têm a ver com a formação das estrelas As estrelas são importantes porque a vida exige uma variedade de elementos oxigênio carbono hidrogênio nitrogênio cálcio e fósforo As estrelas contêm o único mecanismo conhecido para produzir grandes quantidades desses elementos sendo portanto necessárias para a vida Lee Smolin estima que quando todos os exemplos de ajuste fino são considerados as chances de estrelas existirem no universo são de 1 em Em minha opinião uma probabilidade assim tão pequena não é algo que 161 podemos deixar sem explicação A sorte certamente não irá servir aqui precisamos de alguma explicação racional de como algo tão improvável veio a ser o caso SMOLIN 1999 p 45 Smolin não está meramente afirmando que todos os eventos improváveis requerem uma explicação mas que alguns eventos improváveis são especiais No pôquer cada conjunto de cinco cartas entregue ao jogador têm a mesma probabilidade assumindo que as cartas estejam suficientemente embaralhadas Se um par é dado a um jogador em três mãos seguidas não se exige qualquer explicação Se uma sequência real é dada ao jogador em três mãos seguidas uma explicação seria corretamente exigida e a improbabilidade desse exemplo nem sequer está próxima da magnitude da improbabilidade mencionada por Smolin Com Smolin os físicos que escreveram sobre o ajuste fino concordam que tal improbabilidade clama por uma explicação Uma explicação é a de que o universo aparenta ser finamente ajustado para a existência da vida porque ele literalmente foi construído com essa finalidade por um agente inteligente Há outros dois tipos de respostas ao ajuste fino i na verdade ele não exige qualquer explicação e ii há explicações alternativas ao desígnio teísta Consideremos ambas brevemente ver também o verbete sobre o ajuste fino 411 Nenhuma Explicação é Necessária Considerase que três abordagens enfraquecem a exigência de explicação colocada pelo ajuste fino 4111 Princípio Antrópico Fraco Em um sentido é necessário que as constantes finamente ajustadas tenham valores dentro do intervalo que permite a vida se esses valores não estivessem nesse intervalo as pessoas não existiriam As constantes finamente ajustadas têm de assumir os valores que elas têm até mesmo para que haja cientistas surpresos com sua descoberta Na realidade eles sequer poderiam ter descoberto qualquer coisa diferente De acordo com o princípio antrópico fraco nós não deveríamos ficar surpresos por termos feito essa descoberta uma vez que nenhuma outra observação era possível Mas se não deveríamos ficar surpresos por termos feito essa descoberta não há qualquer coisa incomum aqui que exija uma explicação 162 especial A demanda por explicação simplesmente não tem lugar 4112 Efeito de Seleção Observacional Sober oferece um argumento relacionado porém mais forte baseado nos efeitos de seleção observacional SOBER 2009 p 7780 Digamos que Jones com sua rede captura um grande número de peixes todos com mais de 10 polegadas de um lago local Seja htodos todos os peixes no lago têm mais de 10 polegadas de comprimento e h12 metade dos peixes no lago têm mais de 10 polegadas de cumprimento A evidência e é tal que P e htodos P e h12 Agora digamos que Jones descubra que a rede está repleta de buracos com 10 polegadas o que o impede de capturar qualquer peixe menor Neste caso e não favorece uma hipótese em detrimento de outra A evidência e é um artefato da própria rede e não uma amostra aleatória dos peixes no lago Quando se trata do ajuste fino Sober considera hdesígnio as constantes foram estabelecidas por uma inteligência especificamente Deus e hacaso as constantes são o que são como fruto do acaso aleatório sem a intervenção de qualquer mente Embora seja intuitivo que Pas constantes são exatamente as adequadas para a vida hdesígnio Pas constantes são exatamente as adequadas para a vida hacaso é preciso considerar o papel do observador que é análogo à rede no exemplo da pescaria Uma vez que observadores humanos só poderiam detectar constantes dentro do intervalo que permite haver vida argumenta Sober as probabilidades corretas são Pas constantes são adequadas para a vida hdesígnio você existe Pas constantes são adequadas para a vida hacaso você existe 163 Dada essa igualdade o ajuste fino não favorece hdesígnio sobre hacaso O efeito de seleção impede qualquer confirmação do desígnio A análise de Sober é criticada em Monton 2006 e Kotzen 2012 Ver também Jantsen 2014a seção 184 Devemos notar que se Sober estiver correto as explicações naturalistas para o ajuste fino consideradas abaixo também estão equivocadas 4113 Probabilidades Não Se Aplicam Seja C um parâmetro de ajuste fino com valores fisicamente possíveis no intervalo 0 Se assumirmos que a natureza não é enviesada em favor de um valor de C em detrimento de outro devese atribuir igual probabilidade a cada subintervalo unitário nesse intervalo O ajuste fino é surpreendente na medida em que o intervalo de C que permite a existência da vida é minúsculo quando comparado ao intervalo completo o que corresponde a uma probabilidade muito pequena Como McGrew McGrew e Vestrup 2001 argumentam há aqui um problema no sentido de que estritamente falando probabilidades matemáticas não se aplicam nessas circunstâncias Quando uma distribuição probabilística é definida sobre um espaço de resultados possíveis ela tem de totalizar 1 Porém em qualquer distribuição uniforme sobre um espaço infinitamente grande a soma das probabilidades vai se tornar arbitrariamente grande à medida que cada intervalo unitário for adicionado Uma vez que o âmbito de C é infinito McGrew et al concluem que não há qualquer sentido em que universos amigáveis à vida sejam improváveis as probabilidades são matematicamente indefinidas Uma solução para esse problema é truncar o intervalo de valores possíveis Em vez de permitir que C tenha a variação 0 podese formar um intervalo finito 0 N em que N é muito grande relativamente ao intervalo de C que permite a vida Uma distribuição de probabilidade poderia então ser definida sobre o intervalo truncado Uma solução mais rigorosa envolve a teoria da medida A medida é por vezes usada na física como uma substituta da probabilidade Por exemplo há muito mais números irracionais do que números racionais Em termos da teoria da medida quase todos os números reais são irracionais em que quase todos quer dizer todos exceto um conjunto de medida zero Na física uma propriedade encontrada para quase todas as soluções de uma equação não requer explicação é o que se deveria esperar Não é incomum por exemplo que um alfinete se equilibrando em sua ponta venha a cair A queda é o que se espera Em contraste caso realmente 164 fosse observado que uma propriedade com medida zero no espaço relevante é o caso tal como o alfinete permanecer equilibrado sobre sua ponta isso exigiria uma explicação especial Assumindo que nosso modelo para o sistema esteja correto a natureza parece ter um forte viés contra esse comportamento GIBBONS HAWKING STEWART 1987 p 736 O argumento em favor do ajuste fino pode então ser reformulado de um modo tal que quase todos os valores de C estão fora do intervalo que permite a vida O fato de nosso universo permitir a vida é portanto o que requer uma explicação Se as probabilidades não se aplicam ou têm sido aplicadas de maneira imprópria ao ajuste fino cosmológico é uma questão que continua a atrair atenção Para mais material sobre isso ver Davies 1992 Callender 2004 Holder 2004 Koperski 2005 Manson 2009 Jantzen 2014a seção 183 e Sober 2019 seção 51 Manson 2018 argumenta que nem o teísmo e nem o naturalismo fornecem uma explicação melhor para o ajuste fino 412 Explicações Rivais Assumindo que o ajuste fino requer uma explicação é possível adotar várias abordagens em relação a isso KOPERSKI 2015 seção 24 4121 Progresso Científico Que o universo tem um ajuste fino em favor da vida é algo baseado na ciência atual Porém tal como muitas outras anomalias acabaram sendo explicadas o mesmo pode ocorrer com o ajuste fino A ciência pode um dia encontrar uma resposta naturalista eliminando assim a necessidade do desígnio Para sugestões nessa linha ver Harnik Kribs e Perez 2006 e Loeb 2014 Embora essa seja uma posição popular ela é obviamente uma nota promissória e não uma explicação O apelo ao que ainda pode ser descoberto não é uma hipótese rival 165 4122 Vida Exótica É concebível que a vida pudesse existir no universo em casos nos quais os valores dentro do parâmetro fossem tais que tipicamente não acreditamos que eles permitiriam a vida Em outras palavras pode haver formas exóticas de vida que poderiam sobreviver em um tipo bem diferente de universo Se isso for o caso talvez os intervalos que realmente permitem a existência não sejam no fim finamente ajustados A principal dificuldade com essa sugestão é que toda a vida precisa de um meio para vencer a segunda lei da termodinâmica A vida exige a extração de energia do ambiente Qualquer forma de vida imaginável precisa portanto dispor de sistemas que permitam algo como o metabolismo e a respiração o que por sua vez exige uma quantidade mínima de complexidade por exemplo não pode haver formas de vida compostas de uma molécula única Muitos exemplos de ajuste fino não acomodam entretanto essa complexidade Por exemplo se não houvesse estrelas não haveria fontes estáveis de energia e nenhum mecanismo para produzir os elementos mais pesados da tabela periódica A esse universo faltariam as peças químicas fundamentais que são necessárias para que uma entidade viva extraia energia do ambiente e assim resista ao puxão da entropia 4123 Multiverso Embora as chances de ganhar na loteria nacional sejam baixas suas chances obviamente aumentariam se você comprasse vários milhões de bilhetes Esta mesma ideia se aplica à explicação mais popular para o ajuste fino o multiverso Talvez a realidade física consista em uma coleção imensa de universos cada um com um conjunto diferente de valores para as constantes relevantes Se há muitos talvez infinitos universos as chances de um universo que permite a vida ser produzido seriam aparentemente bem maiores Embora a maioria dos universos no multiverso seria inadequada para a vida prossegue o argumento nosso universo é um dos poucos em que todas as constantes têm os valores necessários Embora a literatura filosófica sobre o multiverso continue a aumentar vide COLLINS 2009 2012 KRAAY 2014 muitos dos argumentos contra ele compartilham uma premissa comum um multiverso por si próprio não seria uma explicação suficiente para o ajuste fino Teríamos de saber mais a respeito do modo como os universos são produzidos Em uma analogia o fato de uma roleta ter 38 espaços 166 19 Jantzen 2014a e Sober 2019 oferecem críticas às abordagens de Behe e Dembski à complexidade e ao desígnio Confira o capítulo 14 de Jantzen a respeito da dificuldade de tornar a complexidade uma noção rigorosa não garante que a probabilidade de o resultado ser Vermelho 25 seja de 138 Se a roleta estiver de algum modo viciada pelo uso de ímãs por exemplo para impedir esse resultado então a probabilidade correspondente pode ser extremamente pequena Caso a mesa estivesse viciada e mesmo assim 25 Vermelho fosse o resultado isso demandaria uma explicação especial Da mesma forma se uma propriedade tem medida zero dentro do espaço de universos possíveis e mesmo assim a propriedade é observada sua existência demandaria uma explicação EARMAN 1987 p 315 Isso é verdade independentemente de o espaço dos universos ser finita ou infinitamente grande Para explicar o ajuste fino o proponente do multiverso ainda teria de mostrar que os universos que permitem a vida não têm medida zero dentro do espaço de todos os universos KOPERSKI 2005 pp 30709 42 Discussão Biológica Desígnio Inteligente Um célebre desenvolvimento nos argumentos do desígnio ocorrido aproximadamente nos últimos 20 anos envolve o que veio a ser conhecido como Desígnio Inteligente DI Embora haja variantes o DI geralmente envolve esforços para formular argumentos do desígnio levandose em conta vários desenvolvimentos científicos contemporâneos primariamente em biologia bioquímica e cosmologia desenvolvimentos que como a maioria dos defensores do DI enxergam revelam a inadequação das abordagens explicativas mais comumente aceitas a condição a e fornecem evidências convincentes em favor do desígnio na natureza em algum nível a condição e mais uma vez Os defensores do DI propõem dois Rs específicos a complexidade irredutível BEHE 1996 e a informação complexa especificada DEMBSKI 1998 200219 Embora as distinções às vezes sejam pouco claras enquanto os argumentos do DI envolvendo cada um desses Rs tendem a ser argumentos por lacunas uma atenção extra aos aspectos da natureza que refletem uma mente é em geral mais perceptível nos argumentos do DI que mencionam complexidades especificadas 167 20 Consulte Ratzsch 2001 2005 Por exemplo mesmo se fosse verdade que os esforços próDI têm motivação religiosa o que não é verdade em todos os casos isso pouco implicaria a respeito das teorias do DI do que nos argumentos que mencionam complexidades irredutíveis O movimento atraiu críticas vigorosas e oposição Os oponentes responderam com algumas objeções ao DI que incluem inter alia discordâncias no sentido de que o defensores do DI simplesmente entenderam erradamente a ciência em questão de que mesmo quando a ciência está corretamente entendida as evidências empíricas mencionadas por defensores do desígnio não constituem base substantiva para as conclusões em favor do desígnio de que a existência de alternativas demonstravelmente superiores para os fenômenos mencionados erodem a cogência das razões próDI e de que teorias do desígnio não são ciência legítima mas apenas criacionismo disfarçado argumentos do tipo Deusdaslacunas argumentos motivados religiosamente etc Não vamos nos aprofundar nessa disputa aqui mas vale notar que mesmo que se argumente que o DI não é ciência legítima o que é controverso20 isso por si só não demonstraria um defeito nos argumentos do desígnio enquanto tais Não precisamos encarar a ciência como algo que exaure o espaço das conclusões legítimas extraídas de dados empíricos De qualquer modo as torrentes de críticas cáusticas no debate atual sobre o DI sugerem que muito mais está em jogo do que a correção de determinadas inferências feitas a partir de evidências empíricas particulares 5 A Persistência do Desígnio Enquanto Raciocínio A questão é por que argumentos do desígnio permanecem tão resistentes se a evidência empírica é inferencialmente ambígua os argumentos logicamente controversos e as conclusões ferozmente disputadas Uma possibilidade é a de que eles são argumentos melhores do que seus críticos filosóficos concedem Outra possibilidade é que intuições pró desígnio não se baseiam de modo algum em inferências A situação pode ser análoga àquelas envolvendo o mundo externo a existência de outras mentas e outras questões familiares Thomas Reid o filósofo escocês do século XVIII vinculado ao realismo de senso comum argumentou em 168 21 Ver Ratzsch 2003 para uma discussão mais detalhada de Reid companhia de seus seguidores contemporâneos que simplesmente somos constituídos de tal modo que em certas circunstâncias experienciais comuns simplesmente percebemos que temos convicções involuntárias sobre o mundo outras mentes e assim em diante Isso explicaria a razão pela qual tentativas filosóficas históricas de reconstruir os argumentos por meio dos quais essas crenças surgiram ou foram justificadas se mostraram fracassos notáveis falhas em face das quais as crenças comuns continuaram a avançar de modo livre e desimpedido Se um mecanismo involuntário de produção de crenças operasse no âmbito das intuições pródesígnio isso explicaria da mesma forma a razão pela qual as tentativas argumentativas pródesígnio não se mostraram universalmente convincentes e mesmo assim as ideias em seu favor não desapareceram apesar do suposto fracasso desses argumentos Historicamente algumas figuras importantes chegaram a sustentar que nós poderíamos determinar mais ou menos perceptualmente que várias coisas na natureza eram candidatas à atribuição de desígnio que elas em aspectos essenciais parecem ou têm a forma de um projeto Alguns como William Whewell sustentaram que poderíamos perceptualmente identificar algumas coisas como mais do que meras candidatas ao desígnio WHEWELL 1834 p 344 Thomas Reid também sustentou uma perspectiva próxima a isso21 e o Cleantes de Hume fez sugestões nessa direção Se o processo operativo fosse algo como o descrito acima o DI ao tentar forjar um vínculo entre ciência e desígnio por meio de inferências a partir de evidências empiricamente estabelecidas estaria entendendo mal a base real para a crença no desígnio e o mesmo erro seria cometido por argumentos do desígnio em sentido mais geral Talvez seja revelador a esse respeito que a teorização científica tipicamente envolve muita criatividade e que as teorias resultantes são em geral originais e inesperadas As intuições pródesígnio no entanto não parecem surgir como concepções originais oriundas de interações criativas com os dados Elas estão embutidas quase que naturalmente em nosso raciocínio tanto que mais uma vez Crick pensa que os biólogos têm de ser imunizados contra elas 169 6 Conclusão A percepção e a apreciação da incrível complexidade e beleza das coisas na natureza sejam elas biológicas ou cósmicas certamente fizeram com que muitos se inclinassem em favor das ideias de propósito e desígnio na natureza tendo também constituído momentos importantes de afirmação para aqueles que já aceitavam posições pródesígnio O estatuto dos argumentos correspondentes obviamente não é apenas uma questão de disputa corrente a temperatura da disputa parece estar aumentando E independente do que nesta altura se pense a respeito dos argumentos enquanto a natureza tiver o poder de nos estimular até mesmo Kant admitiu que o céu estrelado sobre nós o estimulava convicções e argumentos pródesígnio provavelmente não irão desaparecer silenciosamente Referência bibliográfica BABBAGE Charles Ninth Bridgewater Treatise A Fragment London J Murray 1838 BARROW J D The Constants of Nature New York Pantheon Books 2002 BEHE M Darwins Black Box New York Free Press 1996 BOYLE R Free Inquiry into the Vulgarly Receivd Notions of Nature In HALL 1965 p 150153 BOYLE R A Disquisition about the Final Causes of Natural Things London John Taylor 1688 BROAD C D The Mind and its Place in Nature London Kegan Paul 1925 CALLENDER C Measures Explanations and the Past Should Special Initial Conditions Be Explained British Journal for the Philosophy of Science 552 195217 2004 CHESTERTON G K Ethics of Elfland In Orthodoxy New York John Lane 1908 p 106107 COLLINS R 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impropriedades que certamente restaram Michael Bergmann também comentou porções extensas de uma versão anterior Matt Getz Naomi Luce Allison Thornton John Giannini Chris Tweedt e Nick Colgrove também fizeram comentários úteis e forneceram um apoio editorial sem o qual este trabalho não se realizaria A escrita deste verbete foi financiada em parte por uma bolsa generosa do Institute for Studies of Religion da Baylor University e também contou com o apoio do Center for Philosophy of Religion como o Skeptical Theism Fellow com financiamento da John Templeton Foundation A graça redentora de um recurso eletrônico é que os erros podem ser corrigidos à medida que são percebidos O autor ficará grato a quem descubra quaisquer erros DOUGHERTY T Skeptical Theism In ZALTA E N ed Stanford Encyclopedia of Philosophy Spring Edition Stanford CA The Metaphysics Research Lab 2022 Disponível em httpsplatostanfordeduarchivesspr2022entriesskepticaltheism Acesso em 20 mai 2022 The following is the translation of the entry on Skeptical Theism by Trent Dhougherty in the Stanford Encyclopedia of Philosophy The translation follows the version of the entry in the SEPs archives at httpsplatostanfordeduarchivesspr2022entriesskepticaltheism This translated version may differ from the current version of the entry which may have been updated since the time of this translation The current version is located at a https platostanfordeduentriesskepticaltheism Wed like to thank the Editors of the Stanford Encyclopedia of Philosophy mainly Prof Dr Edward Zalta for granting permission to translate and to publish this entry Finally we would like to thank to John Templeton Foundation for financially supporting this project Teísmo cético Autoria Trent Dougherty22 Tradução Rodrigo Jungmann de Castro Revisão Aluízio Couto 174 O teísmo cético é uma estratégia voltada para fazer valer as limitações cognitivas humanas em resposta a argumentos do mal contra a existência de Deus Este verbete considerará as quatro formas mais proeminentes do teísmo cético Embora estas estratégias sejam apresentadas numa ordem próxima à histórica cada estratégia ainda ganha corpo nas conversações correntes na literatura filosófica 1 O problema do mal e o ceticismo do teísmo cético Esta seção apresenta um esboço do argumento do mal e do ceticismo do teísta cético ou como é referido algumas vezes o agnosticismo como em Alston 1996 p 98 e HowardSnyder 2009 p 18 11 O problema do mal Diremos que a ocorrência de um mal M é sem sentido ou injustificada se e somente se não há nenhuma razão suficiente quando tudo é considerado para que Deus a permita nem mesmo uma razão nãoespecífica ou indireta tal como a de que M ocorreu por acaso como resultado de um processo aleatório cuja admissão Deus julgou que fosse o melhor Um tipo padrão de razão suficiente para permitir uma ocorrência de um mal M seria a de que um bem grande o bastante B tal que seja admissível que Deus permita ou se arrisque a permitir a ocorrência de M e B Além disso a ocorrência de M torna suficientemente provável a ocorrência de B e o somatório de M e G é mais valioso do que M e B Um outro tipo de razão padrão considerado na literatura para permitir M é a de que permitir a ocorrência de M ou de algo de igualmente ruim ou pior é logicamente necessário para alcançar algum bem maior B ou para evitar algum mal igualmente ruim ou pior Podese conceber que tais bens existam quer Deus exista quer não de tal forma que a existência de males sem sentido até onde diga respeito a qualquer coisa dita até aqui é consistente com o ateísmo Pretendese que tais termos sejam compreendidos de um modo tal que um estado de coisas ruim possa ser sem sentido para um Deus quer exista um Deus quer não Visto que nos termos da presente noção de falta de sentido a existência do mal injustificado não é compatível com a existência de Deus vale dizer nenhum mundo possível contém simultaneamente Deus e o mal injustificado podemos 175 apresentar um enquadramento muito simples para um argumento idealizado e generalizado do mal que pode assumir muitas formas quando expandidos em variadas extensões e de variados modos Premissa teológica Necessariamente se há um Deus não há males sem sentido Premissa empírica Há males sem sentido Conclusão Não há Deus Há dois modos principais pelos quais a premissa empírica pode ser justificada Em primeiro lugar poderia ser uma inferência a partir da existência de males inescrutáveis Males inescrutáveis são males de tal natureza que não se consegue discernir nenhuma razão suficiente para permitilos mesmo depois de um exame cuidadoso Este argumento se assemelha a um argumento por amostra nenhum bem observado foi bom o bastante para justificar certos males então provavelmente nenhuma forma de mal em absoluto é justificada Em segundo lugar a premissa poderia ser defendida com uma referência a exemplos particulares do mal especialmente os males especialmente terríveis caso em que parece óbvio que os males são injustificados A versão do argumento do mal que recebeu mais atenção é a de William Rowe 1979 1988 1991 1995 1996 2006 TRAKAKIS 2007 que ofereceu o argumento do mal por amostra As quatro principais formas de teísmo cético apresentadas abaixo foram formuladas primordialmente em resposta aos argumentos de Rowe A questão relativa a poderem elas ou não ser estendidas para cobrir outros argumentos como o de Draper 1989 1996 ou o de Tooley TOOLEY PLANTINGA 2008 ou o de Dougherty 2008 será discutida brevemente na Seção 6 deste artigo A principal linha de defesa de Rowe para a premissa empírica é a existência de males que parecem sem sentido males inescrutáveis O fato de parecerem sem sentido foi por vezes interpretado como um insight direto e em outras ocasiões como o resultado de uma inferência ROWE 1979 Um modo correto de apresentar a inferência é como um tipo de indução simples da variedade que funciona por amostragem a respeito de algum dado mal terrível M Premissa Todas as razões possíveis para permitir M examinadas até o momento se mostraram insuficientes para que Deus os permitisse Conclusão Não há justificação para M 176 23 NT O mosquito em questão em língua inglesa chamase noseeum No Brasil tal inseto é conhecido como maruim No entanto para acompanhar a ocorrência frequente nos trabalhos publicados em língua portuguesa resolvemos manter o termo noseeum tal qual aparece no texto original A Premissa Empírica é apenas uma generalização existencial desta conclusão Este é um exemplo do tipo de dedução que veio a ser chamada de Inferência Noseeum em alusão aos insetos do Meiooeste23 que são tão pequenos que ninguém parece capaz de encontrálos nas próprias tendas embora se saiba que estão lá WYKSTRA 1996 Esta é a razão pela qual este nome foi aplicado Os teístas céticos salientam que a ausência de evidência nem sempre é evidência de ausência Algumas entidades são de tal natureza que se espera que a sua presença seja detectada ao passo que no caso de outras não se espera que a sua presença seja detectada Se houver um urso pardo no nosso campo esperamos encontrálo de modo que não ver um é evidência que não há nenhum lá Mas a situação é diferente no caso de pequenos insetos O fato de não os vemos no nosso campo não constitui uma boa evidência de que não estejam lá Abaixo se concederá uma grande atenção às razões para pensar que as razões de Deus deveriam ser detectadas Na Premissa apresentada acima o lugar de M pode ser ocupado por algum mal em particular ou poderia ser usado como um nome para fazer referência a algum tipo de soma orgânica de todo o mal se é que uma tal coisa existe para assinalar o ponto de que não conseguimos ver uma razão para o padrão geral do mal que observamos no mundo a sua magnitude duração e distribuição Há uma margem considerável para flexibilidade e criatividade quando se elaboram os detalhes deste argumento no sentido de uma linha estratégica em particular Assim se o teísmo cético houver de ser plenamente exitoso devese cuidar para que seja aplicável a cada variedade do problema do mal 12 O ceticismo do teísmo cético Variantes de ceticismo de todos os tipos aparecem em graus variados O ceticismo dos teístas mais céticos parece ser total ou quase total Vale dizer tendem 177 a aceitar a Tese da Ausência de Peso A Tese da Ausência de Peso Considerações relativas ao mal não confirmam em absoluto a falsidade do teísmo Isto é as observações da ocorrência do mal não alcançam sequer o status de evidência VAN INWAGEN p 95105 Van Inwagen fundamenta o seu teísmo cético em seu extremo ceticismo modal e moral um ceticismo quanto à nossa habilidade para discernir as verdades relevantes nos âmbitos da moralidade e da possibilidade e não um ceticismo quanto a existirem tais verdades 1995 p 84 e prossegue com a afirmação reiterada de que não temos nenhuma razão para aceitar o que ele julga ser a premissa crucial do argumento indiciário do mal Na verdade ele pensa que devido à veracidade das suas teses céticas o argumento indiciário do mal não pode sequer decolar 1995 p 85 Alston não é tão explícito mas parece estar de acordo Ele chama a posição por ele defendida de agnosticismo 1996 p 98 Ele diz que os nossos recursos cognitivos são radicalmente insuficientes para fornecer uma justificativa suficiente para aceitar a principal premissa do argumento indiciário e de uma tal maneira que o argumento indutivo entra em colapso p 98 Ele conclui que o argumento indutivo do mal não está em melhor forma do que o seu falecido primo de caráter dedutivo p 121 É geralmente aceito que o argumento dedutivo por vezes chamado de problema lógico fracassa por completo e ao chamálo de falecido Alston parece estar de acordo Wykstra recuou das suas alegações feitas em 1984 1984 p 74 79 80 9091 no sentido de que o mal não fornece nenhuma evidência para o ateísmo Ele agora chama tais alegações de imprudentes 1996 p 148 n 14 Ele agora admite que a evidência a partir da existência do mal deixando em suspenso o juízo sobre a evidência da existência de Deus inclina a favor de modo bem significativo 1996 p 138 do ateísmo mas não o bastante para justificar a crença no ateísmo mesmo quando se parte do agnosticismo Bergmann parece propor claramente o Argumento da Ausência de Peso Ele também diz com frequência que não temos nenhuma razão para pensar que os bens dos quais temos ciência são representativos dos bens que existem 2001 p 288 289 Por três vezes em seu artigo de 2001 e em todo o seu artigo de 2008 178 ele usa a expressão no escuro para tratar da nossa situação cognitiva no que respeita às razões que dão justificação a Deus E Bergmann e Rea 2005 p 248 parecem indicar que eles aceitam que não podemos atribuir nenhuma probabilidade em absoluto à classe relevante de proposições a respeito dos bens vide VAN INWAGEN 1995 p 75 O compromisso de Bergmann com a Tese da Ausência de Peso pode ser vista ulteriormente no seu endosso a uma outra tese a Tese de que o Argumento do Mal nem Decola A Tese de que o Argumento do Mal nem Decola A existência do mal não chega sequer a fornecer uma razão prima facie contra o teísmo que teria de ser contrariada por considerações céticas Aqui uma razão prima facie é grosso modo uma razão que poderia ser derrubada por considerações adicionais É às vezes também chamada de uma razão derrotável porque pode ser derrotada por considerações adicionais Poder seia pensar que a existência do mal fornece uma razão prima facie para o ateísmo que o teísmo cético foi criado para derrotar Contudo não é assim que Bergmann pensa na situação Swinburne 1998 p 13 explica o teísmo cético deste modo mas Bergmann o corrige O principal problema com a objeção de Swinburne ao ceticismo do teísta cético está no fato de que o teísta cético pensa que há uma boa razão para não conceder a sua primeira afirmação de que parece que não há nenhuma razão que dê uma justificação a Deus para que permita males horrendos De acordo com ST1ST4 não parece que não haja nenhuma razão que dê justificação a Deus para que permita M1 e M2 dois exemplos de ocorrência do mal 2008 p 387 Bergmann 2008 p 338 continua com a afirmação de que a resposta do teísta cético é 179 a de que não estamos justificados em pensar que o juízo relativo à probabilidade parece de início ser o que Swinburne diz que parece ser Um pensamento claro e a reflexão sobre as teses céticas do teísta cético revelam que não há nenhum valor ou variação de valores a não ser a variação entre 0 e 1 que a probabilidade em questão pareça assumir Este parece ser um compromisso perfeitamente claro com a Tese de que o Argumento do Mal nem Decola e portanto com a Tese da Ausência de Peso Vemos assim que de modo geral o ceticismo do teísta cético assume um grau muito elevado no que diz respeito ao seu alvo a nossa habilidade de ter conhecimento dos tipos de possibilidades especialmente possibilidades morais necessários para fazer decolar o argumento do mal 2 A abordagem de princípios epistêmicos A primeira abordagem de peso na literatura contemporânea para relacionar os limites cognitivos ao problema do mal é a de princípios epistêmicos iniciada por Wykstra 1984 mas confira também Alston 1996 1991 p 122 n 11 presente em Snyder 1996b Ele continuou a defender e a expandir esta estratégia até o hoje RUSSELL WYKSTRA 1988 WYKSTRA 1996 2007 2009 WYKSTRA PERRINE 2012 no prelo HowardSnyder 2009 fornece uma resposta semelhante e mais detalhada baseada num princípio epistêmico semelhante mas diferente em aspectos importantes Plantinga 1988 também toca no assunto vide DOUGHERTY 2011c 21 Uma afirmação da abordagem de princípios epistêmicos O argumento do mal se destina a usar a evidência a respeito do mal no mundo em apoio à proposição de que não há Deus Assim uma linha natural de resposta a tal argumento consiste em mostrar que algum princípio geral aplicável no que concerne ao apoio indiciário não é satisfeito no caso do mal e do teísmo Wykstra propõe precisamente um tal princípio com a sua Condição de Acesso 180 24 N T O termo em inglês costuma ser abreviado como CORNEA usado logo a seguir como sigla Epistêmico Razoável Condition of ReasoNable Epistemic Access24 Wykstra e Perrine também oferecem uma versão probabilística de CORNEA para lidar com um contraexemplo em McBrayer 2009 CORNEA Com base numa situação conhecida s uma pessoa humana H tem o direito de alegar que Parece que p somente se for razoável para H acreditar que dadas as suas faculdades cognitivas e o uso que ela fez delas se p não fosse o caso s provavelmente seria diferente do que é de alguma maneira discernível para ela Confira Rowe 1996 p 270 para ter acesso a um tratamento das questões interpretativas relativas à CORNEA Wykstra nota que em todas as versões a ideia principal por trás de CORNEA é um teste proposto para determinar se alguma suposta evidência E fornece um apoio sério a alguma hipótese H Pergunte se se H for falsa E ainda é praticamente o mesmo que se esperaria Se a resposta é Sim então E não pode fornecer um apoio sério a H 2007 p 88 Fica claro no diálogo de Wykstra com Russell 1988 que a noção chave em operação por trás de CORNEA é a de que a hipótese de que Deus existe prevê que as razões para o sofrimento não seriam transparentes para o observador humano mas antes obscuras Portanto podemos enfocar o seguinte princípio Princípio da Obscuridade Se houver um Deus que tenha boas razões para permitir o sofrimento que ocorre é improvável que saibamos na maior parte dos casos quais são estas razões 181 Se o Princípio da Obscuridade for verdadeiro ele fornece uma boa razão para pôr em dúvida a justificação acumulada por meio de um princípio epistêmico do senso comum o Princípio da Credulidade Em trabalho de 1998 Swinburne apresenta o problema do mal nos termos deste princípio No trabalho de 2001 o autor explica e defende o princípio Princípio da Credulidade PC Se parece que p então deixando de lado considerações adicionais provavelmente p ou um princípio mais fraco Apego ao Senso Comum das Razões Apego ao Senso Comum das Razões ASCR Se a S parece que p então S tem com isso alguma razão para p Dado ASCR a razão que S tem para acreditar em p é uma consideração que tem algum peso positivo a favor de p que poderia potencialmente ser contrabalançado por razões em contrário PC ou ASCR ou algum princípio semelhante pode ser usado em apoio direto à Premissa Empírica É nesses moldes que Swinburne 1998 apresenta o problema A verdade do Princípio da Obscuridade seria a consideração adicional que mostra que o fato de parecerquep não pode ser objeto de confiança Wykstra defende o Princípio da Obscuridade ou coisas que apoiam o Princípio da Obscuridade principalmente por meio da Analogia com o Genitor Analogia com o Genitor AG Assim como esperamos que uma criança pequena seja cega às razões que um adulto tem para permitir que ela sofra com alguma dor justificada assim também devemos esperar que seríamos cegos para as razões que Deus tenha para permitir o nosso sofrimento justificado Wykstra apelou reiteradamente para a analogia com o genitor 1984 p 88 RUSSELL WYKSTRA 1988 p 135 144 146 1996 p 139 em defesa do 182 Princípio da Obscuridade vide DOUGHERTY 2011 De início parece ser uma resposta do senso comum ao argumento do mal em completa consonância com o que esperaríamos que uma pessoa média diria Como veremos há razões para pensar que está aparência pode ser enganosa O princípio de HowardSnyder HS difere disto de um modo importante HS Não podemos ver um x justifica que se acredite que não há um x somente se não tivermos uma boa razão para pôr em dúvida que teríamos uma grande probabilidade de ver um x se houvesse um Recordese de que o princípio de Wykstra requer que se tenha uma boa razão para pensar que os xs seriam visíveis O princípio de HowardSnyder requer apenas que não se esteja em dúvida ou talvez numa formulação melhor que não se tenha fundamentos particulares para a dúvida quanto à sua visibilidade Se algumas crenças básicas têm uma justificação prima facie isto é se estão justificados até que haja alguma razão para duvidar delas sem razões explícitas então o ceticismo representará uma ameaça maior com a adoção do princípio epistêmico de Wykstra do que com o de HowardSnyder Note que a verdade do Princípio da Obscuridade também funcionará bem com o princípio de HowardSnyder de modo que uma defesa da analogia com o genitor também serviria à argumentação de HowardSnyder HowardSnyder acrescenta dois argumentos à defesa do Princípio da Obscuridade Em primeiro lugar ele apresenta o Argumento do Progresso 1996 p 301 O teor fundamental do argumento é o de que houve no passado uma progresso significativo no conhecimento e na compreensão das verdades morais incluindo o conhecimento de que bens intrínsecos existem e que não há nenhuma razão para pensar que esta tendência esteja acabando Mas se esse é o caso seguese que agora desconhecemos certos bens intrínsecos E tanto quanto saibamos estes bens poderiam incluir os bens em nome dos quais Deus permite o mal Ele combina isto com o Argumento da Complexidade 1996 p 331 Este argumento começa por recordar que os dados dos quais se originam os mais fortes argumentos do mal são a profusão ou o excesso aparente do mal no mundo que na verdade parece estar integrado na tessitura da natureza e da sociedade Mas 183 justamente por esta razão o seu caráter complexo e intricado qualquer totalidade boa e complexa da qual estes males formam uma parte tem de ser extremamente complexa Assim ele extrai a inferência de que não seria surpreendente se estivesse além da capacidade de sondar 22 Objeções à abordagem de princípios epistêmicos A reação de resistir à estratégia dos princípios epistêmicos inclui a necessidade de argumentar em defesa de uma de duas alegações ou a de que o princípio epistêmico empregado é falso ou inaplicável ou a de que a condição que ele impõe é de fato satisfeita Objeções de ambos os tipos foram levantadas contra a estratégia de princípios epistêmicos 221 CORNEA é falsa Dois tipos de argumentos foram sugeridos para mostrar que CORNEA é falsa Alguns autores LARAUDOGOITIA 2000 GRAHAM MAITZEN 2007 argumentaram que CORNEA viola um princípio plausível de fechamento Princípios de fechamento são uma família de princípios que afirmam que quando uma proposição tem alguma forma de status epistêmico positivo o conhecimento digamos e está em alguma relação relevante com outra proposição acarretandoo logicamente digamos então tal segunda proposição tem o mesmo status epistêmico que a primeira Um princípio popular entre os simpatizantes do fechamento é o seguinte Se alguém sabe que p e competentemente deduz q de p enquanto preserva o conhecimento de p e se vem a acreditar em q com este fundamento então se sabe que q Estes autores argumentam que se o teísmo cético fosse verdadeiro então um princípio de fechamento intuitivamente plausível seria falso Outros autores RUSSELL 1988 MCBRAYER 2009 também argumentaram que CORNEA é falsa com fundamento no fato de que implica o ceticismo 184 2211 CORNEA viola o fechamento Laraudogoitia 2000 acusa CORNEA de sair pela culatra ao desconsiderar um fato a respeito do fechamento O teísta cético argumenta que CORNEA acarreta que a atitude justificada quanto à questão de existirem males sem sentido é o agnosticismo Mas o teísta pensa que é razoável acreditar em Deus e ele sabe que se Deus existe então não há nenhum mal gratuito E o seguinte princípio de fechamento permanecerá válido para os teístas normais em circunstâncias normais Princípio do Fechamento PF Se para S é razoável acreditar que p e S sabe que p implica q então S está comprometido com a razoabilidade de q A partir deste princípio junto com o teísmo do teísta e o conhecimento acerca da implicação pertinente seguese que o teísta está justificado em acreditar que não há nenhum mal gratuito Mas isso contradiz o agnosticismo imposto por CORNEA Graham e Maitzen 2007 notam a semelhança de CORNEA com alguns princípios de outras áreas da epistemologia Eles tentam relacionar as objeções a estes princípios a CORNEA Os princípios são a condição de sensibilidade ao conhecimento proposta por Nozick e a explicação semelhante de Dretske que inclui razões conclusivas A condição de sensibilidade ao conhecimento proposta por Nozick é grosso modo a de que você tem conhecimento apenas se caso p fosse falsa você não acreditaria em p A explicação de Dretske é de modo aproximado a de que você sabe que p se você tiver uma razão R para p uma condição tal que se p não fosse verdadeira você não teria R eou R não seria verdadeira os detalhes variam Uma das principais objeções a estas teorias é a de que elas violam praticamente qualquer princípio plausível de fechamento aplicado ao conhecimento O princípio de fechamento em questão é essencialmente este Se S sabe que p e S sabe que p implica q então S está em posição apropriada para saber que q Eles argumentam que assim como os princípios de Nozick e Dretske a aplicação deste princípio a alguns casos é incompatível com CORNEA 185 2212 CORNEA é um convite ao ceticismo Russell 1988 p 148 1996 nota que CORNEA parece abrir a porta para algo como o ceticismo cartesiano Recordemse da condição que CORNEA estabelece a coisa em que segundo afirma precisase de uma razão para uma pessoa acreditar se p não fosse o caso s provavelmente seria muito diferente do que é de algum modo discernível para ela Agora considere a seguinte possibilidade você é um cérebro que está sendo mantido vivo numa cuba cheia de nutrientes e é estimulado de uma maneira que causa as suas atuais experiências e impressões hauridas da memória Seja p a proposição Não sou um cérebro numa cuba indexada a você e considere se você teria uma razão para pensar que as coisas teriam uma aparência diferente para você se isso fosse falso ou seja se você fosse um cérebro numa cuba Ex hypothesi não teriam Então CORNEA parece conduzir rapidamente à conclusão cética de que não sabemos que não somos simples cérebros em cubas McBrayer 2009 apresenta um tratamento extenso disso elaborando o argumento com mais detalhes incorporando também analogias à epistemologia de Nozick e Dretske 222 A condição CORNEA é satisfeita a Analogia Reversa do Genitor Alguns proponentes do argumento do mal oferecem algumas razões para pensar que na verdade a condição que CORNEA impõe pode ser satisfeita Isto é fornecem algumas razões para pensar que se houvesse um Deus então provavelmente as coisas seriam diferentes Isto é oferecem razões para pensar que se houvesse um Deus veríamos mais das razões pelas quais os males são permitidos Em suma oferecem razões para pensar que o Princípio de Obscuridade é falso Russell 1998 p 147 e Rowe 2001 p 298 1996 p 274276 2006 p 89 apresentam ambos uma analogia com o genitor a favor da negação do Princípio da Obscuridade e Dougherty 2011b ampliou estes argumentos O problema é o de que enquanto a Analogia com o Genitor AG leva em conta o conhecimento ilimitado de Deus ela fracassa em dar o peso devido aos seus ilimitados poder e amor Assim Russell Rowe e Dougherty defendem uma analogia reversa do genitor AG que é uma extensão da analogia com o genitor 186 AG Assim como esperaríamos que um genitor amoroso com a capacidade de fazêlo levasse uma criança que necessariamente sofrerá a entender as razões para o seu sofrimento também assim esperaríamos que um Deus amoroso que certamente tem a capacidade de fazêlo nos faça capazes de entender a razão para o nosso sofrimento A analogia reversa do genitor parece ser mais forte do que a AG porque apela para um quadro mais robusto dos atributos de Deus e dá suporte à negação do Princípio da Obscuridade Podemos chamar esta tese de Princípio da Transparência Princípio da Transparência É alta a probabilidade de que veríamos as razões de Deus para permitir o mal dado que há um Deus com tais razões 23 Respostas às objeções à abordagem de princípios epistêmicos Esta seção considera respostas breves às objeções tratadas acima 231 Resposta ao Problema do Fechamento Wykstra 2007 responde ao problema do fechamento destacando aspectos de CORNEA que sugerem uma maneira de evitar o problema Wykstra nota 2007 p 91 que na sua formulação original ele estabeleceu uma distinção que está no cerne da sua resposta a Graham e Maitzen A distinção em apreço é ou se relaciona de modo relevante com a distinção de Carnap entre a confirmação incremental e a confirmação absoluta ou o que Wykstra chama de apoio dinâmico e estático Um elemento de evidência E fornece apoio dinâmico a uma proposição alvo p quando dá a p um incremento adicional ou impulso à probabilidade Obviamente isso é consistente com uma situação em que p permanece muito improvável num balanço geral com relação a um conjunto da evidência total Um corpo de evidência total E fornece apoio estático à proposição alvo p quando a veracidade de p têm 187 maior probabilidade a seu favor do que contra si dado E Wykstra assinala que ele pode aceitar o fechamento Ele pode aceitar por exemplo a implicação de fechamento presente na circunstância em que S saber que está vendo uma zebra e que ser uma zebra exclui a possibilidade de ser uma mula disfarçada implica que S está em posição de saber que ela não está olhando para uma mula habilmente disfarçada ao mesmo tempo em que nega que precisamente a mesma evidência E por meio da qual S vem a estar justificado em acreditar que há uma zebra pode por si só justificar ou até mesmo impulsionar a probabilidade de a proposição de que não é uma mula habilmente disfarçada Ademais Rowe deixa claro que está deixando de lado a evidência favorável ao teísmo para efeito de argumentação e que está apenas alegando que a contribuição indiciária do mal foi a de reduzir a probabilidade do teísmo e assim fazer a balança do agnóstico pender para o ateísmo Visto que Rowe não está considerando toda a evidência relevante para o teísmo ele só está interessado no que Wykstra chama de apoio dinâmico Se houvéssemos de considerar toda a nossa evidência poderíamos em princípio descobrir que o balanço geral da nossa evidência total apoia o teísmo e inferir a partir da verdade do teísmo que não há mal sem sentido Ele chama esta passagem do teísmo para a negação do mal sem sentido de o desvio de Moore 1996 p 68 assim chamado em razão da resposta seca dada por Moore ao cético O teísta cético pode de modo consistente avançar a causa de CORNEA e do desvio de Moore porque ela apenas argumenta que CORNEA bloqueia a inferência indutiva que leva à conclusão de que não há nenhuma justificação para algum mal o que é um caso de suposto apoio dinâmico e não que a atitude que se tenha para com o mal sem sentido depois que tudo é considerado deva ser o agnosticismo o que seria um caso de apoio estático 232 Resposta aos problemas céticos Tanto as objeções de Russell quanto as de McBrayer que alegam as implicações céticas de CORNEA dependem de que se interprete CORNEA como um condicional contrafactual ou seja um condicional subjuntivo com um antecedente falso Embora esta seja uma interpretação natural ela enfrentou a resistência de Wykstra e Perrine 2011 no prelo De acordo com os princípios padrão do raciocínio baseado no senso comum derrotável se a um indivíduo parece que p então se tem com isso alguma razão para crer em p embora esta razão possa acabar no 188 fim por ser superada Assim o defensor da abordagem de princípios epistêmicos poderia conceder o ponto de que o defensor do argumento do mal tem razões derrotáveis a favor do ateísmo mas acrescentar que a força racional destas razões é neutralizada pelo Princípio da Obscuridade que parece ser o núcleo duro de CORNEA Isto ainda mantém de pé o debate sobre o Princípio da Obscuridade mas evita de modo plausível as objeções céticas às quais CORNEA foi submetida 233 Resposta à analogia reversa do genitor Tanto os proponentes quanto os opositores do argumento do mal reivindicaram a analogia do genitor Em resposta à analogia reversa do genitor no entanto note uma importante característica estrutural do problema do mal Quando uma hipótese H torna muito provável a ocorrência de um evento E e E não ocorre o fato de E não ocorrer claramente desconfirma H E se H torna muito provável a ocorrência de E e E de fato ocorre o fato de E ocorrer claramente serve como confirmação de H Se H não torna a ocorrência de E muito provável ou improvável ou seja H e E estão próximos de serem independentes do ponto de vista probabilístico então nem a ocorrência de E nem a não ocorrência de E faz alguma clara diferença para a probabilidade de H Assim a negação do teísmo será confirmada por nossa incapacidade de descobrir razões para os males que observamos apenas se o teísmo previr com uma força significativa que devemos ser capazes de detectar as razões Assim diz Rowe seria suficiente enfraquecer a inferência que vai de P nenhum bom estado de coisas que conhecemos é tal que a sua satisfação por parte de um ser onipotente e onisciente atenderia o requisito moral para que tal ser permita algum mal horrendo para Q nenhum bom estado de coisas é tal que a sua satisfação por parte de um ser onipotente e onisciente atenderia o requisito moral para que tal ser permita um mal horrendo para mostrar que se houvesse um ser o onipotente e inteiramente bom que criou o nosso mundo então os bens em virtude dos quais ele permite algum mal horrendo teriam a mesma probabilidade de ser indetectáveis quanto de ser detectáveis por nós p 88 n 15 189 Ademais ao responder a analogia reversa do genitor o teísta pode relacioná la a razões a favor da ocultação divina Como deve estar claro a essa altura o problema do mal conduz de modo inteiramente natural ao problema do silêncio ocultação divino Assim se houvesse boas razões para Deus se velar de algum modo para fornecer alguma distância epistêmica entre ele e o observador casual então estas razões poderiam ser usadas de modo plausível para defender o Princípio da Obscuridade Pois então sejam R as razões em apreço A probabilidade de que não estejamos cientes das razões para tanto sofrimento dado o teísmo poderia ser baixa mas a probabilidade de que não estejamos cientes das razões para tanto sofrimento dados o teísmo e R ainda poderia ser alta Naturalmente se a probabilidade de R dado o teísmo for alta então poderíamos haver descoberto por meio da reflexão que o primeiro valor não é baixo no fim das contas 3 A abordagem das limitações cognitivas gerais A abordagem de Alston 1996a 1991 examina os detalhes particulares contidos na inferência que vai do mal inescrutável ao mal sem sentido Ele chama a atenção para um aglomerado de limitações algumas das quais claramente podem ser generalizadas para além do argumento presente na inferência de maruins 31 Uma afirmação da abordagem de limitações múltiplas Alston apresenta uma lista de seis desvantagens com que nos defrontamos ao determinar se há males sem sentido a partir do fato de que há males inescrutáveis 1996b p 120 Farei referência a esta lista como O Inventário 1 A falta de dados relevantes 2 Uma complexidade maior do que aquela com a qual conseguimos lidar 3 A dificuldade de determinar o que é metafisicamente possível ou necessário 4 A ignorância do âmbito completo de possibilidades 5 A ignorância do âmbito completo de valores 190 6 Limites à nossa capacidade de fazer julgamentos de valor bem considerados Estas dificuldades podem ser usadas neste argumento 1 Estamos sujeitos às limitações cognitivas tais como descritas no Inventário 2 Se 1 é o caso então não estamos em posição de julgar se há males sem sentido com base nos males inescrutáveis 3 Portanto não estamos em posição de julgar se há males sem sentido com base nos males inescrutáveis Pouco se pôs em dúvida que estejamos sujeitos às dificuldades listadas no Inventário ao menos num grau considerável de modo que a Premissa 1 parece estar segura A questão então é se o fato de estarmos sujeitos a tais limitações nos torna completamente incapazes de fazer com justificação a inferência que vai dos males inescrutáveis para os males sem sentido Uma das maneiras de pensar sobre esta objeção é a de que esta inferência cai numa categoria de um tal tipo que não estamos justificados quando fazemos inferências em tais circunstâncias 1 Estamos sujeitos às limitações cognitivas tais como descritas no Inventário 2 Quando estamos sujeitos ao tipo de limitações listados em 1 não estamos justificados ao fazer julgamentos para os quais os fatos de ter o tipo relevante de dados que determinam quais são as possibilidades relevantes e o fato de conhecer o âmbito completo de valores são diretamente relevantes 3 A inferência que vai dos males inescrutáveis para os males sem sentido é uma inferência para a qual o fato de ter o tipo relevante de dados que determinam quais são as possibilidades relevantes e o fato de conhecer o âmbito completo de valores são completamente relevantes 4 Portanto quando estamos sujeitos aos tipos de limitações anunciados em 1 estamos numa posição na qual fazer a inferência seria fazer um tipo de 191 inferência que não está justificado A partir de 2 e 3 5 Portanto estamos numa posição na qual fazer a inferência que vai do mal inescrutável para o mal sem sentido seria de um tipo que não está justificado A partir de 1 e 4 32 Uma objeção à abordagem das limitações múltiplas A primeira coisa a ser dita numa objeção à abordagem das limitações múltiplas é que cada item no Inventário parece criar um problema para o próprio teísmo Ou seja cada item é em si mesmo um mau estado de coisas que pode parecer surpreendente dado o teísmo o que expande a reflexão de Dougherty 2011b Uma maneira de ver isso é recordar a analogia reversa do genitor 222 acima É ruim que nos faltem dados relevantes para uma questão muito importante Afinal muitas pessoas parecem perder a sua fé a salvação eterna como resultado da existência do mal É ruim que nos falte a capacidade de processamento necessária para chegar a uma decisão extremamente importante se há um Deus Objeção rápida Não é um bem no entanto o fato de que tenhamos de nos empenhar para descobrir verdades importantes Resposta rápida Às vezes sim às vezes não é plausível que não seja assim no caso de algo tão grave que se aplica a cada pessoa individualmente É uma coisa ruim o fato de não sabermos o âmbito de desenlaces de uma questão importante e que não saibamos dizer para propostas específicas se estão no seu interior Então poderia ser considerada uma estratégia muito estranha a de tentar responder um argumento do mal chamando a atenção para adicionais estados de coisas ruins que não são de início o que esperaríamos do teísmo 33 Respostas à objeção Um dos tipos de resposta à objeção dada consiste em argumentar que aquele que propõe a objeção se apossou dos dados do argumento do mal tipicamente males horrendos e os substituiu por alguns males relativamente menores Quer sejam esperados quer não estes males menores não representariam grande coisa como argumentação contra a existência de Deus Ora ou o argumento de Alston 192 funciona ou não Ou seja ou ele mostra ou não mostra que não estamos em posição de inferir que há males sem sentido do fato de que há males gratuitos Se o argumento for exitoso coisa que não parece estar sendo contestada pela objeção então os dados usuais sobre o mal horrível não podem servir como um bom fundamento de um argumento do mal Assim nos restariam os males presentes no Inventário que provavelmente não reduzirão marcadamente a credibilidade do teísmo para muitas pessoas Para reflexões adicionais Seja o Inventário a proposição de que estamos sujeitos às limitações mencionadas nele poderseia pensar que a probabilidade dele dado o teísmo é muito baixa de modo que a probabilidade do teísmo é aproximadamente igual à probabilidade do teísmo Inventário Isto tornaria relevante a probabilidade de males inescrutáveis mas não sem sentido dado o teísmo Inventário que poderia plausivelmente ser muito baixa Isso se constitui provavelmente no material para uma réplica por parte do defensor do argumento do mal 4 A abordagem do ceticismo modalmoral em sentido amplo Peter van Inwagen vem defendendo há muito tempo uma forma de ceticismo modal ou seja o ceticismo a respeito do nosso conhecimento de que estados de coisas são possíveis vide Ontological Arguments 1977 1995 Ele o aplica numa resposta ao argumento do mal 1991 1995 1996 2006 Esta é uma vigorosa aplicação dos itens 3 e 4 do inventário de Alston A ideia aqui é a de que não há nenhuma razão para pensar que são confiáveis as nossas intuições modais acerca de questões que não estão relacionadas à vida comum É plausível que o ceticismo moral contido seja apenas uma subclasse do ceticismo modal contido e mesmo que não seja uma subclasse todas as questões são inteiramente paralelas Assim a bem da brevidade o foco aqui será principalmente sobre o ceticismo modal puro embora venhamos a ter um pouco mais a dizer sobre o ceticismo moral potencial na Seção 5 41 Uma afirmação da abordagem do ceticismo modal em sentido amplo O ceticismo modal pode ser relacionado com o argumento do mal da seguinte maneira 193 1 As nossas intuições modais que não estão relacionadas à vida comum são inconfiáveis 2 A inferência que vai dos males inescrutáveis para os males sem sentido se justifica apenas se forem confiáveis certas intuições modais que não estão relacionadas à vida comum 3 Assim o juízo de que não há males sem sentido carece de justificação O que pode ser dito a favor da Premissa 1 Uma ideia aventada frequentemente por van Inwagen e por HowardSnyder 2009 p 27 é a de que as nossas faculdades cognitivas se desenvolveram num meio que pode corroborar a sua confiabilidade na vida comum mas que não se estende fora deste domínio Assim confiar na nossa intuição quanto a questões extramundanas seria como confiar na leitura de um barômetro calibrado no nível do mar a 4320 metros nos Contrafortes a Oeste do Denali Seria como confiar na visão debaixo dágua Seria simplesmente insensato fazêlo e ao que parece os resultados sejam crenças inferências juízos ou que for resultantes da confiança nas nossas próprias intuições pouco teriam a justificálos O próprio van Inwagen aplica o ceticismo modal de um modo um pouco diferente É possível que ele aceite uma teoria do conhecimento similar num sentido relevante à de David Lewis de acordo com a qual se deve eliminar todas as possibilidades relevantes ou no caso de van Inwagen reais mas há uma outra maneira de a tomar Ele conta uma estória de acordo com a qual o mundo tem a quantidade e a distribuição de males que pensamos que tenha e Deus existe o que ele nos diz é uma possibilidade real ou seja algo que poderia ser verdadeiro tanto quanto saibamos A ideia de uma possibilidade real tem a sua melhor ilustração no que um advogado de uma programa televisivo chamaria de teoria alternativa do crime van Inwagen em discussão pessoal que seja plausível o bastante para ocasionar dúvida no sentido de uma incapacidade de assentir quanto à proposição de que o acusado é culpado O seu alvo é um argumento como o argumento do mal neohumeano proposto por Draper 1989 1996 que é um argumento inspirado por Hume mas significativamente modernizado Assim o alvo direto é o de que a proposição S que descreve que o sofrimento provavelmente existe é menos provável em se admitindo o teísmo do que a hipótese da indiferença O argumento deve proceder 194 mais ou menos desta forma em que as intuições modais em questão dizem respeito a certas possibilidades propostas serem ou não possibilidades genuínas usando T para o teísmo 1 As nossas intuições modais que não estão relacionadas à vida comum são inconfiáveis 2 Um juízo sobre o valor da probabilidade de haver o sofrimento que provavelmente há dado o teísmo justificase apenas se certas intuições modais que não estão relacionadas à vida comum são confiáveis 3 Assim qualquer juízo sobre o valor da probabilidade de haver o sofrimento que provavelmente há dado o teísmo é injustificado Um exemplo do tipo de possibilidade proposta em questão será útil Eis aqui um estado de coisas que alguns alegam serem capazes de intuir como possíveis que é relevante para uma versão importante do argumento do mal que Deus cuida tanto para que não sofra todo animal que não é observado quanto para que as leis naturais não sejam massivamente irregulares Este é um tipo de possibilidade proposta que um proponente do argumento do mal poderia apresentar para mostrar que o atual estado de coisas é injustificado O cético modal de van Inwagen não aceitará isso como uma possibilidade genuína visto que é afastada demais da vida comum Obviamente visto que estar relacionado com a vida comum é uma propriedade que apresenta gradações haverá questões atinentes ao seu caráter vago que afetam a aplicação desta estratégia Portanto frequentemente não será claro se um proposição deve ser posta em dúvida pelo realista modal com base no afastamento da vida comum Na verdade podemos usar a possibilidade proposta acima acerca do sofrimento animal e da regularidade como um exemplo do problema em delinear a vida comum Pois é claro que a nossa física popular ou seja a nossa ideia comum sobre como o mundo físico funciona inclui o fato de que o mundo é muito regular e que o sofrimento animal e o comportamento predatório são parte das vidas da maior parte das pessoas ao menos daquelas que um dia possuíram um animal de estimação ou visitaram uma fazenda ou são consumidores regulares de carne 195 42 Objeções à abordagem do ceticismo modal em sentido amplo Uma primeira questão óbvia para o defensor deste argumento diz respeito a saber se a própria Premissa 1 é uma questão da vida comum Ou seja a questão acerca de quando as intuições estão justificadas é uma questão da vida comum Não é claro de modo algum que elas estejam E se não estiverem então o argumento poderia ter um problema autorreferencial Se a primeira premissa for verdadeira então a primeira premissa é injustificada Um outro problema autorreferencial para o próprio van Inwagen está no fato de que ele apresenta uma defesa que exibe uma proposição tão distante da vida comum como a do exemplo acima Especificamente a proposição acima que Deus cuida tanto para que não sofra todo animal que não é observado quanto para que as leis naturais não sejam massivamente irregulares cuja possibilidade genuína van Inwagen rejeitaria não parece estar mais afastada da vida comum do que as possibilidades que o próprio van Inwagen propõe como genuínas vide VAN INWAGEN 2006 p 114 Há também outros problemas a respeito da delineação dos limites da delineação dos limites da vida comum Há aqui tanto um problema sincrônico num momento quanto um problema diacrônico ao longo do tempo O problema sincrônico consiste em delinear os limites da vida comum a qualquer dado momento no tempo ou segmento do tempo O problema diacrônico aqui consiste no fato de que aquilo que conta como a vida cotidiana muda com o tempo Passouse um longo tempo desde o surgimento do Homo sapiens e as nossas vidas mudaram de modo significativo desde então Por isso argumentos da forma Isso não era parte da vida cotidiana 115000 anos atrás logo não podemos confiar nisso são dúbios Os nossos olhos não se desenvolveram num ambiente no qual dirigir um carro era relevante para a sobrevivência mas nós o fazemos bastante bem apesar disso Em segundo lugar mesmo quando sabemos que alguma coisa não está funcionando no ambiente para o qual foi destinada por Deus ou pela evolução ou por ambos mas sobre isso diremos mais em seguida ainda podemos confiar em juízos feitos baseados nela se soubermos um pouquinho sobre o modo pelo qual é provável que estejam errados Então vamos voltar aos 4320 metros nos Contrafortes a Oeste do Denali com o nosso barômetro que foi calibrado pela última vez no nível do mar Visto que sabemos algo a respeito da relação entre a altitude e a pressão barométrico podemos extrapolar ou estimar o verdadeiro valor a partir de um valor reportado para obter uma gama de variação no interior da qual é provável que o 196 verdadeiro valor esteja se tivermos dados precisos podemos gerar intervalos de confiabilidade que sob boas circunstâncias seriam bastante estreitos E certamente podemos confiar em certos juízos comparativos mesmo se formos quase completamente ignorantes quanto a como corrigir à luz da mudança de altitude se o valor da leitura cai rapidamente de modo consistente por uma hora podemos inferir com segurança que está se aproximando uma frente de baixa pressão Então até um instrumento mal calibrado pode ser útil se possuirmos uma compreensão apropriada de suas operações internas Portanto mesmo que tenhamos razões para acreditar que as nossas intuições modais estarão defasadas em certos domínios ainda poderíamos ter ou uma teoria razoável acerca do modo pelo qual é provável que estejam defasadas e ter assim a capacidade de as corrigir ou ao menos ser capazes de fazer certos juízos comparativos Por exemplo se parece ser de uma obviedade gritante o fato de que as constantes fundamentais do universo poderiam ter tido valores diferentes do que têm ou que poderia ter havido outras partículas fundamentais forças campos ou seja lá o que for poderíamos pensar depois de refletir sobre o quanto à possibilidade proposta está distante da vida comum que a nossa intuição está fornecendo uma leitura forte demais e fazêla recuar para admitir que é muito provável que estas sejam possibilidades genuínas Seria um ato cético patentemente em demasia simplesmente descartar a intuição De modo semelhante se nos parece de uma obviedade gritante o fato de que não há nenhum modo de todos os mundos dignos de serem criados ou os melhores ou o que bem se queira conterem aproximadamente a quantidade ou a proporção ou a severidade do mal que pensamos que há então dandonos conta de que isto está muito longe da vida diária poderíamos recuar para a conclusão mais moderada de que na média há mundos dignos de serem criados com uma quantidade significativamente menor ou severidade ou proporção ou o que bem se queira do mal Isso está muito longe da própria conclusão de van Inwagen de que não temos nenhuma razão VAN INWAGEN 1996 1991 p 163 para aceitar as alegações relevantes concernentes às possibilidades Em terceiro lugar a teoria evolucionária não parece ser uma boa razão para duvidar que a intuição será um guia inconfiável fora da vida comum Pois há duas maneiras em que a evolução pode ocorrer com o teísmo ou sem o teísmo Assim seja a intuição estendida o nome da tese de que a nossa intuição é confiável de maneiras que se estendem de modo importante além da vida cotidiana pressupondo que esta última noção seja elaborada de forma coerente Embora a probabilidade 197 da intuição estendida dados a Evolução o Teísmo possa ser baixa a probabilidade da intuição estendida dados a Evolução o Teísmo é plausivelmente bastante elevada e certamente não demasiado baixa Então a questão da confiabilidade da nossa intuição que em domínios que estão além da vida cotidiana mas que são relevantes para o nosso objetivo final proposto no sentido religioso e que portanto talvez sejam uma questão cotidiana de toda sorte não é independente do fato de já se pensar que há um Deus Em quarto lugar alegouse que o ceticismo modal usado pelo teísta cético conduz a um ceticismo disseminado a respeito de questões comuns e talvez até mesmo ao ceticismo total RUSSELL 1996 GALE 1996 HASKER 2010b A objeção parece estar baseada na tese de que o apelo feito pelo teísta cético a possibilidades que não foram eliminadas pode ser combinado com qualquer proposição comum para impedir que ela seja conhecida Para usarmos uma versão mais tradicional o exemplo de Russell 1996 mas também o trabalho anterior de Russell e Wykstra 1998 e posteriormente Russell 2004 considerese a proposição de que o mundo foi criado cerca de seis mil anos atrás ao cair da noite que precedeu o sábado de 23 de outubro sim esta é a verdadeira atribuição feita pelo Bispo Usher tendo a aparência de ter uma idade muito maior Os criacionistas da terra jovem fornecem razões para pensarmos que Deus tenha razões para este engodo geológico Visto que a teoria inclui aparências enganosas ela é consistente com todos os dados observacionais Assim não pode jamais ser excluída pela evidência empírica Em conformidade com essa posição não parece ser improvável face a nenhuma evidência de que dispomos Esta objeção sugere que o ceticismo do teísta cético acerca daquilo que vai além da vida comum volta para nos incomodar de mais perto no ceticismo acerca de questões comuns tal como é plausivelmente o caso da idade da Terra ou seja é plausível que a terra e a idade das coisas sejam questões comuns ainda que não sejam um tópico de conversação comum Isso sugere que praticamente qualquer crença comum é colocada em questão pelo teísmo cético Em quinto lugar a tese do teísta modal segundo a qual as nossas intuições não devem ser objeto da nossa confiança fora da vida comum ou do ambiente para o qual se desenvolveram parece não se harmonizar com a efetividade da matemática na física de partículas cosmologia e coisas semelhantes As crenças matemáticas do Homo sapiens original eram certamente bastante primitivas é irrelevante para os propósitos presentes quanto de processamento inconsciente era realizado pelo cérebro É interessante notar que a teologia natural foi comparada com a física teórica EARMAN 2000 Se esta comparação se sustenta parece ser desfavorável ao presente argumento modal cético 198 Em sexto lugar surgem algumas preocupações com referência à existência de possibilidades reais Os procedimentos apropriados numa corte de justiça obviamente não se aplicam à sala de um filósofo Pode ser prudente e socialmente útil trancafiar ou de alguma outra maneira punir seriamente aqueles indivíduos a quem se imputam crimes somente se se pode apresentar uma argumentação que mostre que são culpados além de uma dúvida razoável Mas ao considerar aquilo em que é racional crer é claro que uma pessoa pode descrer racionalmente de p quando p não está além de uma dúvida razoável Assim mesmo que van Inwagen esteja correto em pensar que a sua defesa contra o argumento do mal é exitosa nos seus termos tão exitosa quanto uma teoria alternativa sobre o crime para absolver o acusado ainda se poderia descrer no teísmo racionalmente ou ao menos crer que ele é improvável Além disso quão forte uma razão contrária precisa ser para constituir uma dúvida razoável Uma questão paralela quão provável uma narrativa precisa ser para ser uma possibilidade real Para ser uma possibilidade real num sentido epistêmico um sentido que seja relevante para a razoabilidade da crença ela teria de ter uma probabilidade de ao menos 5 Não teria de ter uma probabilidade de 50 Fica em algum lugar a meio caminho digamos 2533 E não devemos introduzir aqui de um modo confuso considerações de racionalidade prática Poderíamos dizer falando de modo pouco rigoroso que há uma possibilidade real de um revólver carregado disparar acidentalmente embora isso seja extremamente raro Mas e quanto a fazer mira com um revólver padrão de seis balas com apenas uma bala inserida no tambor Apostaríamos contra a probabilidade de que o primeiro puxão no gatilho resulte no disparo de uma bala Mas isso seria uma possibilidade real no sentido de van Inwagen É difícil dizer mas vai aqui um argumento no sentido de que seria Parece ser errado acreditar que o revólver não vai disparar Isso sugere que o limiar para a crença razoável está acima de 83 Então a tese de que há possibilidades reais que incluem tanto a circunstância de que Deus exista quanto a de que existe o mal do tipo que encontramos pode apenas implicar que há uma probabilidade de 10 15 de que haja uma tal possibilidade Assim uma possibilidade real que contenha Deus e o mal tais como julgamos que existam neste mundo poderia tornar irrazoável acreditar que não há Deus mas certamente não exclui o agnosticismo quanto à existência de Deus ou um ateísmo mitigado no sentido de que é muito provável que não haja nenhum Deus 199 43 Respostas às objeções No que diz respeito a delinear os limites da vida comum o cético modal poderia talvez se fiar numa noção fisicalista Ou seja poderiam julgar que a referência tenha como foco às atividades apropriadamente relacionadas com a reprodução o que implica a sobrevivência até o momento da delação sexual o que implica uma certa duração de vida Isso pode exacerbar a quinta objeção e outras semelhantes a ela mas vejase abaixo uma resposta para esse problema No que concerne à sugestão de que ainda podemos obter informações úteis da intuição extramundana o cético modal pode pressionar alguém que apresente esta objeção para que elabore em maiores detalhes como a extrapolação ou o ajuste funciona e em seguida se prender aos detalhes No que concerne à acusação de ceticismo geral pouco se disse Van Inwagen 1996 alega que as suas estórias defensivas não são à diferença de hipóteses céticas gerais improváveis relativamente àquilo que conhecemos Note que isso é diferente de ser improvável relativamente à nossa evidência empírica coisa que as hipóteses céticas não são Certamente hipóteses céticas gerais não são possibilidades reais no sentido de van Inwagen que ele insiste em chamar de possibilidades epistêmicas não são alternativas plausíveis que fariam com que as pessoas comuns vacilassem nos seus juízos Teremos mais a dizer sobre isso visto que o problema surge novamente na Seção 6 No que concerne ao argumento baseado na efetividade da matemática poderseia responder que toda a matemática contida na física está de algum modo contida na matemática básica cotidiana ou ao menos que as habilidades computacionais dos indivíduos que se ocupam da matemática avançada estão contidas nas habilidades computacionais do Homo sapiens primordial É óbvio que estas são alegações disputadas e que em alguns casos têm uma natureza empírica Assim essa linha de resposta precisaria preencher muitos detalhes para ser muito efetiva No que concerne ao ponto a respeito das possibilidades reais e da probabilidade o cético modal poderia dizer que excluir a possibilidade de ter certeza de que Deus não existe é algo que vale a pena fazer Poderia por exemplo tornar relevantes consideração pascalianas 200 5 A abordagem focada do ceticismo modalmoral A última seção tratou de um ceticismo modal e moral extremo VAN INWAGEN 1996 1991 p 163 1995 p 84 2006 p 123 Mas há ceticismos modais e morais mais focados que se pretendem mais moderados e com alvos mais delimitados Ou seja há abordagens que não atribuem limites à intuição modal e moral como tal Em vez disso elas se ocupam de algumas limitações ao nosso conhecimento modal que ao que parece todos deveriam admitir Os teístas céticos sugerem que estas limitações se aplicam especialmente no caso do argumento do mal 51 Uma afirmação da abordagem focada do ceticismo modalmoral Na sua forma agora padronizada encontrada principalmente em Bergmann 2001 279 e 2008 376 o núcleo do teísmo cético consiste em quatro teses céticas ST1 Não temos nenhuma boa razão para pensar que os possíveis bens de que temos conhecimento sejam representativos dos possíveis bens que existem representativos vale dizer relativamente a figurar positivamente numa razão que potencialmente dê a Deus uma razão que justifique que ele permita os males inescrutáveis que vemos a nossa volta ST2 Não temos nenhuma boa razão para pensar que os possíveis males de que temos conhecimento sejam representativos dos possíveis males que existem ST3 Não temos nenhuma boa razão para pensar que as relações de implicação de que temos conhecimento entre os possíveis bens e a permissão dos possíveis males sejam representativas das relações de implicação que existem entre os possíveis bens e a permissão dos possíveis males ST4 Não temos nenhuma boa razão para pensar que o valor ou a carência de valor morais totais que percebemos em certos estados de coisas complexos 201 reflitam o valor ou a carência de valor morais totais que eles realmente têm Uma maneira de defender a tese de que o mal sem sentido existe vide ROWE 1979 é com referência ao fato de que há males para os quais não somos capazes de pensar em nenhuma boa razão mesmo com um grau de reflexão considerável ou seja males inescrutáveis Considerese este exemplo do tipo de inferência noseeum que encontramos na seção 11 A inferência noseeum versão simples Não vejo nenhum sentido no mal M então provavelmente não há nenhum sentido Esta é apenas uma primeira aproximação é claro e uma versão adequada requereria bastante refinamento Por exemplo uma pessoa precisaria ter uma confiança especial em si mesma para brandir a inferência tal como ela é No entanto a substituição de eu por ninguém e o ajuste gramatical também seria injustificada sem um apoio adicional visto que tem um escopo por demais amplo Mas a razão de ser da inferência é clara o bastante Uma versão da Inferência Noseeum tem essa forma A inferência noseeum expandida Na população representativa de possíveis bens examinados nenhum teve a propriedade de ser uma razão para permitir o mal M Portanto provavelmente na população total de possíveis bens nenhum tem a propriedade de ser uma razão para permitir o mal M Notese que ST1ST3 estão todas na negativa Ou seja afirmam que carecemos de uma razão para pensar que a amostra é representativa Portanto para que sejam aplicáveis à inferência noseeum o teísta cético precisa acrescentar um lema como este O princípio da representatividade Devemos tratar uma amostra como não sendo representativa até que tenhamos uma boa razão para acreditar que ela é representativa 202 Com este lema parece ser claro que se ST1ST3 são verdadeiras então a Inferência Noseeum Expandida é incorreta Contudo isto pode ser uma fraqueza pois notese uma diferença crucial entre a primeira das teses céticas de Bergmann e a tese agnóstica de HowardSnyder ST1 Não temos nenhuma boa razão para pensar que os bens possíveis dos quais temos conhecimento sejam representativos dos bens possíveis que existem BERGMANN 2001 p 279 grifo acrescentado AT1 Deveríamos estar em dúvida quanto à questão de os bens de que temos conhecimento constituírem uma amostra representativa de todos os bens que existem HOWARDSNYDER 2009 p 18 grifo acrescentado Enquanto Bergmann foca a falta de uma razão positiva para a representatividade HowardSnyder foca a presença de dúvida a respeito da representatividade Aqui a abordagem de HowardSnyder está em maior consonância com a de Wykstra visto que a defesa feita por Wykstra do Princípio da Obscuridade estabeleceria AT1 ao passo que fornece apenas um apoio fraco a ST1 Uma vantagem de AT1 está no fato de que diferentemente de ST1 não requer o Princípio da Representatividade para ser efetivo Pois é plausível que o lema dependa de algo como o seguinte princípio Para que alguém esteja justificado em acreditar que P com fundamento em M deve não apenas 1 estar justificado em acreditar em M mas também justificado em acreditar que M torna P provável vide verbete as teorias fundacionalistas da justificação epistêmica Fumerton 1995 p 36 55 apresenta uma argumentação vigorosa no sentido de que uma vez que este princípio seja aceito é muito difícil evitar o ceticismo Assim se Bergmann está comprometido com este princípio ele parece haver assumido um importante comprometimento que HowardSnyder não assume 203 52 Objeções à abordagem focada do ceticismo moralmodal Uma razão para pensar que ST1ST3 são falsas é a de que além das preocupações com o ceticismo a respeito do conhecimento visto acima o teísmo cético foi acusado de vários tipos de ceticismo moral RUSSELL 1996 ALMEIDA OPPY 2003 2004 GRAHAM MAITZEN 2007 2009 A principal ameaça vem da possibilidade em aberto dadas ST1ST4 de que não podemos nunca saber que ação terá o melhor resultado Na verdade não podemos sequer atribuir de forma sensata probabilidades a que atos terão o melhor resultado Assim para ilustrar o ponto suponha que você está testemunhando uma tentativa de assassinato que você poderia impedir facilmente com a sua intervenção De acordo com a probabilidade em apreço você não pode de modo sensato atribuir nenhuma probabilidade à proposição de que o homem que está sendo morto seja um terrorista perigoso que é alvo de um assassinato seletivo em caráter emergencial Parece então que não há como você possa concluir em absoluto que impedir a morte é a melhor coisa a fazer E se não pode então como poderia fazêlo de um modo correto 53 Respostas às objeções A respeito da acusação de ceticismo moral podese argumentar que um juízo moral sólido precisa apenas levar em consideração o que se sabe ao longo do período de tempo disponível na prática Então é necessário ter ciência apenas de um dever prima facie de impedir aquilo que a nossa evidência corrente indica ser um mau estado de coisas para que se tenha tudo aquilo de que se necessita para agir corretamente quer a ação tenha o melhor resultado quer não Em suma a ação correta é baseada em bens e males conhecidos e não num conjunto que contém bens e males desconhecidos Sendo desconhecidos eles simplesmente não podem e não precisam ser levados em consideração deixando de lado questões de previsibilidade Assim no caso do terrorista assassinado há um resultado iminente conhecido e ruim a morte de modo que há uma razão para intervir e não há nenhum resultado ruim ou provável ou previsível ou se há tal como o de ferir levemente o agressor são claramente contrabalançados de modo que a coisa correta a fazer é intervir Assim a porção consequencialista de nossa teoria moral pode ser tornada adequadamente subjetiva para evitar o problema vide BERGMANN REA 2005 Uma resposta alternativa é a de adotar um consequencialismo próximo 204 que apenas avalia as consequências causais diretas de um ato ou que de outros modos circunscreve de modo mais estreito a delineação das consequências Confira Sinnott Armstrong 2011 para ter acesso a uma explicação do consequencialismo causal direto e consulte Collins Hall e Paul 2004 pela sua negação da transitividade da causação Uma preocupação ligada a esta resposta é a de que é plausível que todos os bens e males conhecidos sejam uma base sólida para a ação apenas se se tem razão para pensar que os bens e males na amostra são representativos de todos os bens e males relacionados no que respeita a propriedade de justificar a ação ou seja que se tenha razão para pensar que conhecer a estória mais ampla não reverteria o nosso juízo ou ao menos que careça de uma razão para pensar que a estória mais ampla levaria numa outra direção É ainda mais plausível que os bens e males conhecidos sejam uma base sólida para a ação apenas se não se dá o caso de que o agnosticismo não é a atitude justificada para a proposição de que as razões na amostra são representativas da totalidade das razões objetivas e ainda mais plausível se o indivíduo pensou nisto Ademais alguns autores HASKER 2010b julgam que já é mau o bastante o fato de que o teísmo cético admite que nunca podemos ter uma boa razão para pensar que um ato é o melhor quando tudo é considerado pois de fato às vezes temos boas razões para pensar que alguma ação é a melhor no cômputo geral no sentido de ter o melhor resultado Além disso os teístas céticos podem alegar que está ao seu alcance uma outra via para obter o conhecimento de que um ato é o melhor tal como uma revelação divina embora não seja claro que os problemas não sejam recorrentes visto que se precisaria de uma razão para pensar que Deus não teve uma razão suficiente para o engodo com a suposta revelação 6 O escopo do teísmo cético Historicamente o teísmo cético voltouse apenas para a inferência noseeum Mas nem todas as versões do problema do mal dependem de tal ilação 61 O teísmo cético e os argumentos explanatórios O teísmo cético parece não ter nada a dizer a respeito de um argumento do mal humeano Um argumento humeano em sentido amplo DRAPER 1989 205 1996 2008 2009 invocará considerações explanatórias tais como o poder explanatório e a simplicidade Considerese então este argumento explanatório a favor do naturalismo 1 A distribuição do sofrimento no mundo é mais esperada pressupondo o naturalismo do que pressupondo o teísmo 2 O naturalismo é ao menos de modo aproximado uma teoria tão simples quanto o teísmo 3 Se 1 e 2 então o naturalismo é uma explicação melhor do mal do que o teísmo 4 Se 3 então a evidência do mal confirma o naturalismo de preferência ao teísmo Não há nenhuma inferência noseeum neste argumento Será que alguma das estratégias dos teístas céticos funciona contra este argumento Bergmann 2009 p 383 pensa que sim Pois ele pensa que a premissa 1 depende da atribuição de um valor à probabilidade desta espécie de distribuição do sofrimento dado o teísmo Mas isso é precisamente o que ele pensa que não podemos fazer dadas as suas teses céticas O teísmo cético tenta bloquear a Premissa 1 do argumento acima bloqueando a atribuição de uma probabilidade ao mal observado em se pressupondo o teísmo Contudo considerese esta reformulação Sendo dado que O universo parece ser indiferente ao sofrimento dos seres sencientes 1 É sabido que a hipótese da indiferença prevê os dados de um universo aparentemente indiferente 2 Não se sabe se a hipótese do teísmo prevê os dados 3 As hipóteses têm probabilidades prévias aproximadamente iguais ou seja uma chance igual de serem verdadeiras antes de se considerar a evidência observacional 4 Portanto os dados confirmam a hipótese da indiferença e não a hipótese do teísmo Eis como funciona o argumento Imagine um par de pratos de balança nos quais estamos pesando a evidência acerca do teísmo e do ateísmo Um dos lados das balança é rotulado como Teísmo e o outro lado é rotulado como Hipótese da 206 Indiferença A Premissa 3 diz que os pratos estão inicialmente no mesmo plano A Premissa 2 diz que não há nada para colocar no prato marcado como Teísmo A Premissa 1 diz que há algo para colocar no prato marcado como Hipótese da Indiferença A conclusão diz após termos pesado a evidência a balança pende para o lado rotulado como Hipótese da Indiferença Não apenas é verdade que este argumento não faz uma inferência noseeum como na verdade não atribui nenhuma probabilidade a todos os males observados dado o teísmo Assim esta versão parece ser fundamentalmente imune a considerações pertinentes ao teísmo cético exceto na medida em que possam ter relação com a premissa 3 62 O teísmo cético e o problema do mal para o senso comum Uma questão semelhante à que é exposta assim deriva do Problema do Mal para o Senso Comum O problema é este vide DOUGHERTY 2008 Uma pessoa razoável pode ter uma rede de crenças de fundo a respeito do que esperar de um ser de recursos infinitos tais que o acréscimo de fatos a respeito do mal pode leválos a ter uma crença inferencial nãobásica de que Deus não existe Embora a justificação dependa de relações de apoio que poderiam ser chamadas de inferenciais no sentido de que se tivéssemos de ensaiálas numa sequência de passos teríamos de chamála de inferência então não há inferências feitas e assim nenhuma inferência noseeum Assim o fato de que o mundo não os impressiona de um modo inteiramente diverso do que o teísmo preveria quando digamos um mal lhes causa a impressão de ser injustificável nenhuma forma padrão do teísmo cético pode aplicarse visto que todos os teísmos céticos existentes se voltam para inferências noseeum O problema do mal para o senso comum surge quando as pessoas veem o mundo como injustificavelmente ruim vide GELLMAN 1992 Considerese a tese do apelo ao senso comum das razões ASCR ASCR Se parece a S que p então S com isso tem alguma razão para p Agora consideremse os seguintes valores para p P1 Que o mal é injustificado P2 Que o mal é injustificável 207 P3 Deus nunca permitiria isso P4 Isso é algo cuja admissão é absolutamente impermissível P5 O universo é indiferente ao nosso sofrimento P6 Não há Deus Há indivíduos possíveis e provavelmente reais que satisfazem conjuntamente aos seguintes critérios a um dado momento C1 Ao menos algum valor de p listado acima satisfaz a ASCR para S e S tem com isso uma razão para acreditar em p C2 O background de evidências de S não contém nada que apoie p com mais força do que a razão que ele obtém para p em sendo verdadeiro C1 C3 O background de S não contém nada que apoie a tese de que a aparência de que p é enganoso com força bastante para reduzir o apoio que S tem para p em virtude C1 ser verdadeiro até chegar ao ponto de ser mais razoável que ele acredite em p e não em p C4 O subgrupo relevante das faculdades cognitivas de S estão funcionando apropriadamente nos aspectos relevantes Tais indivíduos têm um justificação imediata e nãoinferencial para acreditar que o ateísmo é verdadeiro Assim o teísmo cético tal como concebido de forma padrão um mecanismo de ataque contra a inferência noseeum não se aplica A tese de que o problema nem decola de que o mal não nos fornece sequer uma razão prima facie contra o teísmo que teria de enfrentar a oposição de considerações céticas é falsa quando aplicada ao Problema do Mal para o Senso Comum Talvez os teístas céticos possam adaptar a sua estratégia à provisão de um derrotador para a razão que se adquire quando se satisfazem C1C4 mas isso não muda o debate significativamente vide MATHESON 2012 DOUGHERTY 2016b Bergmann 2012 oferece uma teoria com apelo ao erro para oferecer uma explicação que afaste a acachapante impressão de injustificabilidade a de que não 208 podemos compreender males muito piores do que aqueles que dão ensejo a esta impressão Mas isso parece ser irrelevante pois o espectro dos males verdadeiramente horrendos é amplo o bastante para que a impressão de injustificabilidade já possa ser gerada na extremidade inferior do espectro deixando exemplos na extremidade superior como prova de que podemos conceber males piores do que aqueles cuja suficiência é a mínima para gerar o problema do mal para o senso comum 7 Novas fronteiras no teísmo cético Este verbete considerou até aqui o escopo e limites atuais do teísmo cético Agora de modo breve serão consideradas possíveis extensões futuras do teísmo cético 71 Graus de ceticismo Entre o ceticismo cético bergmanniano e o ceticismo cético van inwageniano há muitas gradações Um dos modos pelos quais o teísmo cético pode ser expandido é o seguinte No caso de van Inwagen o modo em que o ceticismo atua para a defesa é este Ele diz Aqui está uma estória que contém tanto Deus quanto o padrão de males que observamos e por sabermos tão pouco não sabemos que não é verdadeira Mas esta alegação parece fraca Suponhase que o limiar de probabilidade para o conhecimento seja de aproximadamente 095 Isso coloca estas estórias o melhor que pode ser dito a favor das quais é que não se dá o caso de que saibamos que são falsas entre um ponto pouco acima do zero e talvez 5 Há espaço para que esta estória seja expandida para a categoria ampla entre isso e o que é verdadeiramente crível ou seja entre 5 e qualquer que seja a probabilidade suficiente para a crença que alguns dizem ser maior do que 50 SWINBURNE 2001 e outros pensam ser tão alta quanto aquela para o conhecimento WILLIAMSON 2000 Por exemplo poderseia ter uma estória que se leva muito a sério poderseia até estar um tanto tentado a nela acreditar em que se defende como o que poderíamos chamar de possibilidade séria algo que implique o seu maior peso no cotejo com possibilidades reais Van Inwagen é explícito em sua sustentação de que possibilidades reais não têm de ser plausíveis 1996 p 160 161 Poderia haver muitas de tais estórias que devido a algum tipo de limitação cognitiva não somos capazes de apoiar com força suficiente que não é suficiente 209 para a crença mas que são muito plausíveis comece em 5050 e vá em ambas as direções estórias que têm 30 de probabilidade digamos ou 60 de probabilidade Estes tipos de estórias colocam limites significativos ao montante de probabilidade que o mal retira do teísmo Estas estórias seriam mais como as estórias do tipo é simplesmente isso que os cientistas contam para cobrir as anomalias Elas variam daquilo que simplesmente não se sabe ser falso até aquilo que não é de todo crível mas é de todo plausível A nossa ignorância frequentemente coloca as possibilidades na vizinhança dos 50 e tais estórias podem ter efeitos significativos sobre a probabilidade final do teísmo Pois se p implica q e p tem uma probabilidade de 50 q tem sérios problemas em ser derivado da nossa evidência para p muito embora estejamos longe de saber se p é verdadeira ou falsa 72 Os tipos de ceticismo relacionados ao problema da dor animal O argumento original de Rowe 1979 enfocava a morte de um corço num incêndio florestal O caso do sofrimento animal ilustra modos pelos quais o teísmo cético pode ser aplicado além dos modos em que foi até o presente Até um período surpreendentemente recente o sofrimento de animais nãohumanos não era um fator importante no problema do mal Mas com o aumento do interesse pelo bem estar dos animais tal problema assomou como uma parte importante do problema do mal 721 O ceticismo quanto à dor dos animais Muitos teístas céticos tentam refutar o argumento do mal enfatizando o ceticismo quanto à nossa habilidade de discernir as razões de Deus para agir Mas o teísta cético poderia buscar bloquear o argumento do mal ao direcionar o ceticismo para outros alvos Por exemplo Michael Murray que se mostra explicitamente cético quanto à capacidade cognitiva humana de tratar o sofrimento animal 2008 p 199 é cético quanto à nossa capacidade de saber se os animais experimentam uma dor moralmente significativa Ele considera argumentos originados em Descartes e em outros segundo os quais algum tipo de pensamento de segunda ordem é necessário para que uma experiência seja moralmente significativa Ele é explícito quanto ao fato de que não está defendendo que estas posições como sendo prováveis 2008 p 58 mas em vez disso apenas como sendo tais que uma pessoa pode ter uma 210 perspectiva razoável que não implica a sua rejeição 2008 p 72 Isso tem claramente as marcas de uma estratégia teísta cética mas de modo inteiramente distinto da estratégia de Wykstra o ceticismo em jogo não é motivado pela grandeza de Deus nem como nos casos de van Inwagen e Bergmann por um tipo de ceticismo geral de cunho moralmodal mas em vez disso um tipo muito diferente de limitação cognitiva humana a nossa incapacidade de penetrar na mente do animal 722 O ceticismo quanto ao caráter final da morte para os animais Uma outra extensão natural do raciocínio do teísta cético que é ilustrada no caso dos animais é o ceticismo quanto a termos conhecimento do seu destino postmortem Suponhase então que uma pessoa é um agnóstico razoável que suspende o juízo quanto a haver ou não um Deus mas tendo uma razão um tanto melhor para duvidar do que para acreditar que há um Deus Se o teísta cético pode elaborar um bom argumento de que é altamente provável dado o teísmo que o sofrimento dos animais será derrotado numa vida após a morte em que seguindo a afirmação de Marilyn McCord Adams 2000 um mal como o sofrimento é derrotado no contexto da vida do indivíduo se a vida do indivíduo é um todo bom para o qual o mal carrega a relevante unidade orgânica em virtude de estar integrado de modo relevante na relação do indivíduo com um bem grande o bastante p 2829 então o ceticismo do próprio agnóstico quanto a haver ou não um Deus o compromete com o ceticismo quanto ao sofrimento dos animais ser derrotado ou não na vida após a morte E sem saber se o sofrimento dos animais é derrotado ou não na vida após a morte a argumentação contra a existência de Deus baseada no sofrimento animal é severamente enfraquecida Referência bibliográfica ADAMS M M Horrendous Evils and the Goodness of God Ithaca Cornell University Press 2000 ADAMS M M ADAMS R M The Problem of Evil Oxford Oxford University Press 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financially supporting this project Simplicidade Divina Autoria William F Vallicella Tradução Aluízio Couto Revisão Rodrigo Jungmann de Castro De acordo com o teísmo clássico de Agostinho Anselmo Tomás de Aquino e seus seguidores Deus é radicalmente diferente das criaturas e não pode ser adequadamente compreendido das maneiras apropriadas a elas Deus é simples no sentido de que Deus transcende todas as formas de complexidade e composição familiares ao intelecto discursivo Uma consequência é que o Deus simples não tem partes Essa falta não é uma deficiência mas sim um atributo positivo Deus é ontologicamente superior à toda entidade divisível e sua ausência de partes é um indicador disso Entendida de maneira mais geral parte captura não apenas partes espaciais e temporais caso existam mas também partes metafísicas ou constituintes 217 ontológicos Dizer que a Deus faltam partes metafísicas é dizer inter alia que Deus é livre da composição matériaforma da composição potênciaato e da composição existênciaessência Também não há qualquer distinção real entre Deus enquanto sujeito de seus atributos e seus atributos Assim Deus é em algum sentido idêntico a cada um de seus atributos o que implica que cada atributo é idêntico a cada um dos outros Deus é onisciente não em virtude de instanciar ou exemplificar a onisciência o que implicaria uma distinção real entre Deus e a propriedade da onisciência mas por ser onisciência E o mesmo modelo vale para cada um dos oniatributos divinos Deus é o que ele tem tal como diz Agostinho em A Cidade de Deus XI 10 Como é idêntico a cada um de seus atributos Deus é idêntico à sua natureza E uma vez que sua natureza ou essência é idêntica à sua existência Deus é idêntico à sua existência Esta é a doutrina da simplicidade divina DSD Mas como devemos entender identidade nesse contexto Tratase de uma relação de equivalência governada pela Indiscernibilidade dos Idênticos Ou de algum sentido mais frouxo de mesmidade Embora importantes essas questões não podem ser abordadas exceto de passagem neste verbete A DSD é representada não apenas na teologia Cristã clássica mas também nos pensamentos Judeu Grego e Islâmico A ideia deve ser entendida como uma afirmação da absoluta transcendência de Deus em relação às criaturas Deus não é apenas radicalmente nãoantropomórfico mas radicalmente diferente das criaturas em geral não apenas a respeito das propriedades que ele possui mas também a respeito da maneira pela qual ele as possui Não se trata apenas de Deus ter propriedades que nenhuma criatura tem as propriedades que ele tem são tidas por ele de uma maneira diferente do modo como qualquer criatura tem qualquer uma de suas propriedades Deus tem suas propriedades por sêlas Único em seu modo de possuir propriedades Deus é também único em seu modo de existência e em seu estatuto modal Ele não é apenas um ser necessário entre outros Sua necessidade metafísica diferentemente daquela de outros seres necessários é baseada em sua simplicidade O conjunto de fato infinito dos números naturais é presumivelmente um ser necessário juntamente com cada um de seus membros mas nem o conjunto e nem seus membros são necessários em virtude de serem ontologicamente simples Assim embora se possa dizer que o Deus simples existe em todos os mundos metafisicamente possíveis isso não dá conta de sua maneira única de necessidade baseada em sua simplicidade Deus é necessário porque ele é simples e não porque ele existe em todos os mundos metafisicamente possíveis E embora se possa dizer que o Deus simples é ou existe Deus não é um existente entre existentes ou ser 218 entre seres mas o próprio Ser esse em sua instância primitiva e quanto a isso diferente de qualquer outro ser ens Único de todos esses modos Deus é unicamente único Ele não é único dentro de um tipo mas único em transcender a distinção entre o tipo e o membro de um tipo Deus é único em seu próprio modo de unicidade Podemos dizer que o Deus simples difere de todos e quaisquer seres criados não apenas em seus atributos mas também em sua própria estrutura ontológica 1 Motivação O que poderia motivar essa doutrina estranha e aparentemente incoerente Uma consideração central em seu favor deriva da definição anselmiana de Deus como maximamente perfeito como aquilo relativamente ao qual nada maior pode ser concebido Um Deus que fosse menos que maximamente perfeito não seria uma realidade absoluta e nem um objeto adequado de adoração Um Deus que fosse menos que definitivo e absoluto seria um ídolo Ora uma realidade absoluta tem de ser a se a partir de si mesma e assim independente de qualquer coisa distinta de si mesma para sua natureza ou existência Se contudo Deus tivesse propriedades do modo como as criaturas as têm ele seria distinto delas e assim dependente delas Isso é assim seja no caso em que concebemos uma propriedade de x como um constituinte de x seja no caso em que a concebemos como uma entidade externa a x à qual x está vinculado pela relação assimétrica ou vínculo nãorelacional de instanciação Se as propriedades de x são constituintes ou partes ontológicas próprias de x então x dependerá delas do mesmo modo que qualquer todo composto de partes depende de suas partes Mas se x estiver vinculado a suas propriedades pela relação assimétrica de instanciação ainda é o caso que x dependerá delas se x é F em virtude da instanciação por parte de x da Fdade então a Fdade é uma condição logicamente prévia para x ser F Em suma a asseidade divina parece exigir que Deus seja seus atributos em vez de têlos Podese também chegar à doutrina da simplicidade via necessidade divina Como maximamente perfeito como aquilo relativamente ao qual nada maior pode ser concebido Deus tem de ser um ser metafisicamente necessário um ser que não pode não existir Um ser necessário é aquele cuja possibilidade implica sua existência e cuja não existência implica sua impossibilidade Mas qual poderia ser a base dessa necessidade da existência senão a identidade em Deus de essência 219 25 NT As palavras efetivo e efetividade foram traduzidas de actual e actuality No debate de Vallicella elas devem ser entendidas segundo o vocabulário dos mundos possíveis e existência de possibilidade e efetividade25 Dizer que Deus existe em todos os mundos metafisicamente possíveis não fornece uma base mas meramente uma representação gráfica leibniziana da noção de ser necessário A representação em termos de mundos possíveis também não distingue a necessidade de Deus daquela de um objeto abstrato tal como o conjunto efetivamente infinito dos números primos pares Deus não é apenas outro ser necessário entre seres necessários ele é unicamente necessário como a fonte e a base de tudo distinto de si mesmo incluindo todos os seres necessários não divinos De fato Deus é unicamente único ie único em seu modo de unicidade no sentido de que ele não é único dentro de um tipo ou necessariamente único dentro de um tipo mas único em transcender a própria diferença entre tipo e instância Um ser divino não pode possuir um estatuto modal contingente se Deus existe então ele é necessário e se ele não existe então ele é impossível Assim se Deus existe então há uma conexão bastante estreita entre a natureza divina e a existência divina A doutrina da simplicidade em sua forma tradicional e mais forte concebe essa estreiteza como identidade A simplicidade divina está então na base da necessidade divina Deus é necessário porque ele é simples É fácil ver que a simplicidade divina também está na base da posse por parte de Deus de propriedades essenciais Deus tem seus atributos essencialmente porque ele é idêntico a seus atributos Nada é mais essencial a uma coisa do que algo à qual ela é idêntico Uma terceira motivação para a DSD está no fato de que ela fornece uma solução para o dilema de Eutífron originalmente apresentado por Platão no diálogo homônimo Deus ordena o bem porque tal coisa é boa e proíbe o mal porque tal coisa é ruim ou o bem é bom e o mal é ruim porque Deus os ordenaproíbe No primeiro caso a vontade de Deus estaria sujeita a um padrão externo e logicamente anterior a Deus em detrimento da soberania divina No segundo caso o conteúdo da moralidade seria arbitrário por ser sujeito ao livrearbítrio de Deus Para a DSD no entanto o dilema é uma alternativa falsa Se Deus é a própria bondade em sua instância primitiva então ele não está sujeito a um padrão ele é o padrão E se Deus sendo simples é apenas sua vontade então ele não pode querer qualquer coisa senão o bem e assim a arbitrariedade desaparece Confira Feser 2009 p 129 cuja base é Stump 2003 220 Repare que enquanto a abordagem tradicional à simplicidade divina é formulada em termos de identidade essa abordagem está aberta ao que Dolezal 2011 p 136144 chama de desafio harmonista de acordo com o qual na variação de Immink 1987 os atributos divinos não são idênticos mas necessariamente equivalentes Dolezal também inclui Swinburne 1994 entre os harmonistas O harmonismo não será mais discutido neste verbete Veja Dolezal 2011 para uma crítica competente do harmonismo e para uma excelente defesa geral da DSD Além da perfeição e da necessidade a imaterialidade a eternidade e a imutabilidade também parecem apontar para a simplicidade como sua base Dado que Deus é simples ele não pode ter partes e assim não pode ter partes materiais ou temporais E dado que Deus é simples ele não pode abrigar quaisquer potencialidades não realizadas e assim tem de ser imutável A centralidade da DSD para filosofia teológica medieval é evidenciada por sua posição na ordem dos tópicos da Summa Theologica de Aquino Ela aparece como a Questão 3 logo após a Questão 2 sobre a existência de Deus 2 A Questão da Coerência A própria noção de um ser ontologicamente simples será descartada por muitos como sendo uma incoerência autoevidente Entre teístas há aqueles que irão argumentar que a DSD é incoerente com outros compromissos teístas tais como a doutrina da Trindade A principal preocupação deste artigo não é com essas questões de coerência intramuros mas com a questão de se a DSD é ela própria coerente ou não Essa questão mais ampla sobre a coerência não diz respeito à verdade da doutrina ou mesmo à possibilidade de ela ser verdadeira a questão é se é possível pensála sem contradições óbvias ou erros categoriais Em última análise a questão mais ampla sobre a coerência diz respeito ao tipo de enquadramento metafísico geral que permitiria à DSD ser discutida como uma opção viva sem ser descartada como incoerente de saída Uma ameaça central à coerência é a questão de como uma coisa poderia ser idêntica a suas propriedades Alvin Plantinga 1980 p 47 sustenta que se Deus é idêntico a suas propriedades então ele é uma propriedade o que os torna todos uma única propriedade caso em que Deus é uma propriedade única Dado que propriedades são entidades abstratas e abstrações são causalmente inertes então Deus é abstrato e causalmente inerte o que é obviamente inconsistente com o 221 princípio fundamental do teísmo clássico segundo o qual Deus é criador pessoal e sustentáculo de todo ser contingente Nenhum objeto abstrato é uma pessoa ou agente causal Nenhum objeto abstrato pode ser onisciente ou mesmo conhecer qualquer coisa que seja Mais fundamentalmente nenhuma entidade abstrata pode ser idêntica a qualquer entidade concreta Deus como pessoa e criador é concreto Entidades abstratas e concretas são mutuamente excludentes e conjuntamente exaustivas Nada pode ser ambas Objeções similares à de Plantinga foram levantadas por Richard Gale 1991 p 23 William Hasker 2016 p 703 e outros É fácil ver que objeções ao estilo de Plantinga não parecerão decisivas àqueles que rejeitam seu enquadramento metafísico De fato as acusações de erro categorial feitas por Plantinga podem soar aos que estudam os principais proponentes medievais da DSD tal como soam várias incompreensões baseadas na imposição de um enquadramento estranho às ideias desses proponentes Plantinga juntamente com vários outros filósofos julga que indivíduos e propriedades pertencem a categorias disjuntas conectadas por uma relação externa de exemplificação Indivíduos são entidades concretas causalmente eficazes ao passo que propriedades são entidades abstratas causalmente impotentes Tal abordagem ontológica torna a simplicidade inconcebível desde o início Pois se Deus é um indivíduo concreto e sua natureza concebida talvez como a conjunção de seus oniatributos é uma propriedade abstrata então a ontologia geral exclui qualquer identidade ou mesmidade entre Deus e sua natureza Qualquer identidade ou mesmidade dessa natureza violaria a separabilidade das duas categorias Identificar uma entidade concreta inexemplificável com uma entidade abstrata exemplificável equivaleria a um erro categorial No máximo uma abordagem ao estilo de Plantinga permite a exemplificação da natureza de Deus de um modo que a relação de exemplificação de primeira ordem diferentemente da relação de identidade é assimétrica e irreflexiva o que impõe a nãoidentidade aos itens da relação Em suma se Deus exemplifica sua natureza Deus tem de ser distinto de sua natureza tal como Sócrates tem de ser distinto de sua natureza A natureza de Deus é então algo que ele tem por exemplificação e não pace Agostinho algo que ele é em virtude de alguma forma de identidade ou mesmidade 222 3 Ontologia Constituinte versus Ontologia Não Constituinte Uma vez que uma abordagem à ontologia ao estilo de Plantinga inviabiliza a DSD desde o início nenhum adepto sofisticado da doutrina adorará essa abordagem O defensor da DSD irá adotar uma ontologia que acomode um ser ontologicamente simples De fato como Nicholas Wolterstorff 1991 repara proponentes clássicos da DSD tais como Aquino tinham um estilo ontológico radicalmente diferente um estilo que permitia a concebibilidade coerente da DSD Para eles os indivíduos não são ligados às suas propriedades como se estas fossem abstrações externas a eles antes eles têm suas propriedades como constituintes ontológicos Esses proponentes e também alguns ateus contemporâneos pensam em termos de uma ontologia constituinte em oposição ao que Wolterstorff chama de uma ontologia da relação ou ao que poderia ser chamado de ontologia não constituinte Teorias do feixe bundle theories são exemplos contemporâneos de ontologia constituinte Assim caracterizadas as propriedades são trazidas do paraíso de Platão para a terra O estado de união togetherness ou copresença de tropos em um feixe de tropos não é uma identidade formal mas antes um tipo de mesmidade contingente Assim os tropos vermelhidão e doçura em uma maçã não são idênticos mas contingentemente copresentes como partes do mesmo todo Um modelo como esse pode ser extrapolado de modo que no caso de Deus haja a copresença necessária dos atributos divinos Aquino o maior dos proponentes medievais da DSD é obviamente um aristotélico e não um teórico dos tropos Mas ele também adere à ontologia constitutiva Forma e matéria ato e potência e essência e existência são constituintes de substâncias primárias Essência e existência em substâncias materiais como Sócrates são distintas mas estão inseparavelmente juntas Sua unidade é contingente Esse modelo permite uma extrapolação para o caso de um ser cuja essência e existência estão necessariamente juntas ou copresentes A ontologia constituinte por mais turva que ela permaneça em um esboço como este ao menos fornece um enquadramento no qual a DSD é de alguma forma inteligível por oposição a um enquadramento ao estilo de Plantinga no qual a DSD permanece totalmente ininteligível Os argumentos em favor da DSD equivalem a argumentos contra o enquadramento ontológico não constituinte A adoção de uma ontologia constituinte não irá por si mesma imunizar a DSD contra problemas Suponha que propriedades sejam elas entendidas como universais sejam como tropos são partes ontológicas dos particulares espessos que as têm e esse ter é entendido quasemereologicamente como um tipo de relação partetodo em vez de como uma relação de exemplificação que atravessa 223 a divisão abstratoconcreto Isso ainda nos deixaria com o enigma de como um todo poderia ser idêntico a uma de suas partes próprias e com o enigma relacionado de como duas partes próprias distintas poderiam ser idênticas Em si mesma a concepção das propriedades como partes das coisas que as têm não mostra como poderia haver um ser simples Mas se propriedades são partes então ao menos a rejeição de Plantinga à DSD por meio do argumento de que nada concreto pode ser idêntico a algo abstrato pode ele próprio ser rejeitado O que é necessário para tornar a DSD coerente é uma versão particular da ontologia constituinte de acordo com a qual a natureza de uma coisa é um item unitário concreto e uma constituinte dessa coisa No caso de seres materiais a natureza estará junta de algum constituinte individualizante como a matéria assinalada ou designada materia signata A matéria os torna indivíduos e a matéria os torna indivíduos numericamente diversos Deus entretanto sendo imaterial não é individuado por qualquer coisa diferente de sua natureza e assim podemos tomá lo como natureza autoindividualizante Como autoindividualizante não há qualquer distinção real entre Deus e sua natureza Nos termos tomistas em Deus natureza e suppositum são idênticos ST I q 3 art 3 A natureza divina não é um objeto abstrato ligado através de um abismo ontológico a um indivíduo concreto a natureza divina é unidade natural concreta autoindividualizante Para Plantinga a natureza de uma coisa é uma propriedade conjuntiva cujos elementos são aquelas propriedades que a coisa exemplifica em cada mundo possível em qual existe Nessa abordagem a natureza divina é aglomerada ou formada a partir das propriedades essenciais de Deus Mas então a natureza divina é lógica e ontologicamente posterior a aquelas propriedades Claramente nenhum defensor da DSD irá encarar as naturezas dessa maneira Ele irá encarar a natureza divina como lógica e ontologicamente anterior às propriedades e ele verá as propriedades como manifestações dessa natureza unitária uma natureza a cuja unidade radical a abordagem de Plantinga não consegue dar sentido Nada disso é espetacularmente claro e muitas questões permanecem mas o que temos não é obviamente incoerente tal como a DSD seria na abordagem de Plantinga E nossa pergunta como você irá lembrar diz respeito apenas à coerência 31 Deus e Sua Natureza Podese depreender do que vimos anteriormente que as objeções ao estilo de Plantinga não são convincentes A razão mais uma vez é que não se 224 pode dar sentido à DSD no interior da ontologia não constituinte Podese dar sentido à ela assumindo que tal coisa é possível apenas no interior da ontologia constituinte o estilo de ontologia assumida por Aquino seu principal defensor Uma ontologia não constituinte como a de Plantinga pode ser representada como um argumento por Modus Ponens se Deus exemplifica sua natureza então ele é distinto dela Deus exemplifica sua natureza ergo Deus é distinto de sua natureza e a DSD é falsa Mas o defensor da ontologia constituinte está justificado a alterar para o Modus Tollens se Deus exemplifica sua natureza então ele é distinto dela Deus não é distinto de sua natureza ergo Deus não exemplifica sua natureza mas tem sua natureza sendo idêntico a ela Acabamos de ver como Deus pode ser idêntico à sua natureza em que pode ser é uma elipse de pode ser concebido sem incoerências óbvias Mas há outros dois problemas que também apresentam uma séria ameaça à coerência da DSD Um diz respeito a como Deus pode ser idêntico à sua natureza o outro a como os atributos divinos podem ser idênticos uns aos outros 32 Deus e Sua Existência Tratando antes da primeira questão não faz sentido em uma abordagem ontológica ao estilo de Plantinga dizer que Deus é idêntico à existência ou à sua existência Para Plantinga a existência é uma propriedade de primeira ordem exemplificada por tudo Dado que exemplificar capta uma relação irreflexiva e assimétrica de dois termos Deus não pode ser idêntico à existência Deus também não pode ser idêntico à sua existência Esta é presumivelmente um estado de coisas um objeto abstrato e nenhum ente concreto pode ser idêntico a um abstrato sob pena de violar a separação entre os domínios concreto e abstrato Há contudo várias razões VALLICELLA 2002 cap 2 para rejeitar a perspectiva de que a existência é uma propriedade de primeira ordem e as formulações ontológicas que a implicam Uma intuição que muitos compartilham é a de que a existência não está entre as propriedades individuais ela é antes aquilo em virtude do qual os indivíduos têm propriedades ela é mais como uma unidade de coesão das propriedades de um indivíduo VALLICELLA 2002 cap 6 Outra rota para a identidade de Deus com sua existência é a necessidade divina Embora seja verdadeiro dizer que um ser contingente existe em alguns mas não em todos mundos metafisicamente possíveis isso não é o que torna contingente 225 um ser contingente O que torna contingente um ser contingente é a distinção real nele próprio entre essência e existência O que torna necessário um ser absolutamente necessário então é a falta de tal distinção Deus cuja necessidade vem de si mesmo e não de outra coisa é portanto idêntico à sua existência Podese dizer caso se queira que Deus existe em todos os mundos metafisicamente possíveis mas que isso é verdade apenas porque em Deus essência e existência são a mesma coisa A simplicidade divina é a base da necessidade divina Dado o modo como nossa mente funciona não podemos pensar sobre Deus sem distinguir essência e existência mas isso diz respeito a nós e não a Deus Na realidade Deus é sua existência 33 A Identidade dos Atributos Divinos O que foi mencionado acima pode explicar como é concebível sem incoerência óbvia que Deus e sua natureza e Deus e sua existência sejam idênticos Mas como isso responde à segunda questão Como isso explica a concebibilidade sem que haja uma incoerência óbvia na identidade dos atributos divinos uns com os outros Se cada atributo é idêntico a Deus então cada atributo é idêntico a cada um dos outros pela Transitividade da Identidade Por exemplo se Deus onisciência e Deus onipotência então onisciência onipotência Mas como cada atributo poderia ser idêntico a Deus Se pudermos entender como cada atributo pode ser idêntico a Deus poderemos entender como cada um pode ser idêntico a cada um dos outros Já vimos como caso aceitemos uma abordagem constituinte da ontologia a natureza divina pode ser coerentemente concebida como idêntica a Deus Sendo imaterial nada há em Deus para distinguilo de sua natureza Assim ele é idêntico à sua natureza A natureza divina é ou assim pode ser pensada uma propriedade Há então ao menos uma propriedade que instancia a si mesma ela tem a si mesma como única instância e de fato como sua única instância possível Se isso é coerentemente concebível a mesma relação será verdadeira a respeito do perfeito conhecimento do perfeito poder e assim por diante se instanciados esses atributos são autoinstanciados em todos os mundos possíveis e pela mesma coisa em todos os mundos possíveis VALLICELLA 1992 Assim a natureza divina não é apenas idêntica a um indivíduo cada perfeição divina é também idêntica a um indivíduo nomeadamente Deus do que se segue que cada perfeição é idêntica a todas as outras Uma abordagem estruturalmente similar é sugerida por Christopher Hughes Pense nas propriedades de primeira ordem da mesma maneira que Davis Lewis 226 1986 p 50 como conjuntos de indivíduos efetivos e possíveis A propriedade de ser vermelho assim será o conjunto de todos os indivíduos vermelhos efetivos e possíveis e a propriedade de ser perfeitamente poderoso será o conjunto que consiste em todos os indivíduos efetivos e possíveis perfeitamente poderosos Mas há apenas um tal indivíduo que é Deus Apenas Deus é perfeitamente poderoso e apenas Deus pode ser perfeitamente poderoso Assim perfeito poder Deus Como Hughes 1989 p 65 repara Quine sustenta que um conjunto unidade e seu membro são idênticos Se isso é o caso então perfeito poder Deus Deus Devemos acrescentar que se já tivermos abandonado a ontologia não constituinte com sua rígida bifurcação entre concreto e abstrato segundo a qual os dois âmbitos são disjuntos então não temos mais razões para argumentar que um indivíduo concreto e seu conjunto unidade tem de ser com base no fato de primeiro ser concreto e o segundo abstrato distintos A ontologia constituinte permite que haja uma espécie de coalescência do concreto e do abstrato do particular e do universal De fato essa coalescência é o que encontramos no Deus simples que em algum sentido é tanto concreto quanto abstrato dado que ele é uma natureza que é seu próprio suppositum Assim parece haver justificação para partir de perfeito poder Deus e chegar a perfeito poder Deus E isso também se aplica ao conhecimento perfeito etc Dessa maneira podese tornar coerente a noção de que as perfeições constitutivas da natureza divina são idênticas umas às outras Pois se cada uma é idêntica a Deus cada uma é idêntica a todas as outras 34 Deus e Mann DSD e Propriedades Exemplificadas William Mann cita algumas dificuldades que surgem caso entendamos os atributos divinos como idênticos uns aos outros A primeira é que se Deus sabedoria e Deus vida então sabedoria vida Mas a sabedoria e a vida não são nem mesmo extensionalmente equivalentes quanto mais idênticas Se Tom estiver vivo não se segue que Tom é sábio MANN 2015 p 23 A segunda dificuldade é que se Deus é sabedoria e Sócrates é sábio por participar na sabedoria então Sócrates é sábio por participar em Deus Mas isso sugere heresia Nenhuma criatura participa em Deus MANN 2015 p 23 O problema emerge se encararmos os atributos divinos como universais 227 Entram as propriedades exemplificadas É uma coisa dizer que Deus é sabedoria e outra bem diferente dizer que Deus é a sabedoria de Deus A sabedoria de Deus é um exemplo de propriedade exemplificada E similarmente para outros atributos divinos Deus não é idêntico à vida Deus é idêntico à sua vida Suponha que dizemos que Deus sabedoria de Deus e que Deus vida de Deus Seguir seia então que a sabedoria de Deus vida de Deus mas não que Deus sabedoria ou que sabedoria vida Então se concebermos a identidade com propriedades como identidade com propriedades exemplificadas podemos evitar ambas as dificuldades acima A ideia de Mann então é a de que afirmações de identidade feitas no interior da DSD devem ser tomadas como identidades Divindadeinstância por exemplo Deus é sua onipotência e como identidades instânciainstância eg a onisciência de Deus é a onipotência de Deus mas não como identidades Divindade propriedade por exemplo Deus é onisciência ou identidades propriedadepropriedade por exemplo onisciência é onipotência Um apoio para a abordagem de Mann está prontamente disponível nos textos do doctor angelicus MANN 2015 p 24 Aquino diz coisas como Deus est sua bonitas Deus é sua bondade Mas o que exatamente é uma propriedade exemplificada Se o indivíduo concreto Sócrates instancia a propriedade universal abstrata sabedoria presumivelmente dois elementos adicionais são levados em consideração Um é o Chisholmiano Plantingiano e não BergmannianoArmstrongiano estado de coisas Sócrates ser sábio Itens desse gênero são abstratos ou seja não estão no espaço e nem no tempo O outro é a propriedade exemplificada a sabedoria de Sócrates Mann sustenta corretamente que ambos são distintos Todos os estados de coisas abstratos existem mas apenas alguns deles obtêm ou são efetivos Em contraste todas as propriedades exemplificadas são efetivas elas não podem existir sem serem efetivas A sabedoria de Sócrates é um particular um item não repetível tal como Sócrates e a sabedoria de Sócrates é concreta no espaço eou no tempo tal como Sócrates Se admitirmos propriedades exemplificadas em nossa ontologia as duas dificuldades acima podem ser evitadas Ou assim sustenta Mann Mas outros problemas emergem Um é o seguinte se a Fdade Deus se por exemplo a sabedoria de Deus Deus então Deus é uma propriedade exemplificada Mas Deus é uma pessoa Como poderia uma pessoa ser uma propriedade exemplificada Fomos da frigideira para o fogo Como poderia a estupenda e super eminente realidade de Deus ser reduzida a algo tão ontologicamente banal como uma propriedade exemplificada O problema pode ser apresentado 228 como uma tríade inconsistente a Deus é uma propriedade exemplificada b Deus é uma pessoa c Nenhuma pessoa é uma propriedade exemplificada Mann resolve a tríade negando c 2015 p 37 Algumas pessoas são propriedades exemplificadas De fato Mann argumenta que todas as pessoas são propriedades exemplificadas porque tudo é uma propriedade exemplificada 2015 p 38 Deus é uma pessoa e portanto uma propriedade exemplificada Se você objetar que as pessoas são concretas ao passo que as propriedades exemplificadas são abstratas a resposta de Mann é que ambos são concretos 2015 p 37 Ser concreto é estar no espaço eou tempo 2015 p 37 Sócrates é concreto nesse sentido mas sua propriedade de ser queimado pelo sol também é Se você objetar que pessoas são substâncias e assim itens independentes ao passo que propriedades exemplificadas não são substâncias mas dependentes de substâncias a resposta de Mann será a de que o ponto vale para propriedades exemplificadas acidentais mas não para propriedades exemplificadas essenciais Sócrates pode perder sua sabedoria mas não pode perder sua humanidade Ora todas as propriedades de Deus são essenciais Deus é essencialmente onisciente onipotente etc Para Mann a onisciência de Deus não é mais dependente de Deus do que Deus é dependente da onisciência de Deus caso um deixe de ser o outro também deixaria 2015 p 37 Isso dificilmente é decisivo x pode depender de y mesmo que ambos sejam seres necessários Tanto o conjunto cujo único membro é o número 7 e o próprio número 7 são seres necessários mas o conjunto depende de seu membro tanto para sua existência quanto para sua necessidade mas não viceversa Mais próximo de nossa discussão Aquino sustentou que alguns seres necessários ganham sua necessidade de outro ao passo que um ser tem sua necessidade em si mesmo Eu tenderia a pensar que a onisciência de Deus é dependente de Deus mas não viceversa A perspectiva de Mann no entanto não é irrazoável Intuições variam O argumento de Mann em favor da tese de que tudo é uma propriedade exemplificada envolve a noção de propriedade rica A propriedade rica de um indivíduo x é uma propriedade conjuntiva cujos membros são todas e apenas as propriedades essenciais e acidentais algumas das quais temporalmente indexadas instanciadas por x ao longo de seu curso 2015 p 38 Mann nos diz que para qualquer coisa há uma propriedade rica correspondente Disso ele conclui que tudo é uma propriedade exemplificada de uma propriedade rica ou outra p 38 Segue se que toda pessoa é uma propriedade exemplificada O argumento parece ser este a para todo indivíduo concreto x há uma propriedade rica R correspondente 229 Logo b para todo indivíduo concreto x x é uma propriedade exemplificada de uma propriedade rica ou outra Logo c para todo indivíduo concreto x se x é uma pessoa então x é uma propriedade exemplificada Vallicella 2016 p 379 argumenta que a passagem de a para b dada a ausência de alguma premissa auxiliar aparenta ser um non sequitur Aceitemos arguendo que para cada indivíduo concreto x haja uma propriedade rica R correspondente E aceitamos também que há propriedades exemplificadas Assim além de Sócrates e da Sabedoria há a sabedoria de Sócrates Relembre que essa propriedade exemplificada não deve ser confundida com o estado de coisas abstrato Sócrates ser sábio De tudo isso que aceitamos se segue que para cada x há uma propriedade exemplificada rica a Rdade de x Mas de que maneira se segue que tudo é uma propriedade exemplificada Tudo instancia propriedades e nesse sentido tudo é uma instância de propriedades mas isso não é o mesmo que dizer que tudo é uma propriedade exemplificada Sócrates instancia uma propriedade rica e assim é uma instância de uma propriedade mas disso não se segue que Sócrates é uma propriedade exemplificada Algo parece estar faltando no argumento de Mann Obviamente não há qualquer chance de o professor Mann estar confundindo entre ser uma instância de uma propriedade e ser uma propriedade exemplificada Se a instancia Fdade então a é uma instância da propriedade Fdade mas a não é uma propriedade exemplificada no sentido que os filósofos usam esta sentença a Fdade de a é uma propriedade exemplificada Então o que temos de acrescentar ao argumento de Mann para que ele gere a conclusão de que todo indivíduo concreto é uma propriedade exemplificada Como tornar válido o passo inferencial que parte de a e chega até b Seja Rs a representação da propriedade rica de Sócrates Temos de acrescentar a afirmação de que não se pode apontar algo que seria capaz de distinguir Sócrates da propriedade exemplificada gerada quando Sócrates instancia Rs propriedades exemplificadas ricas são um caso especial das propriedades exemplificadas Sócrates não pode ser idêntico à sua sabedoria porque ele pode existir mesmo que sua sabedoria não exista E ele não pode ser idêntico à sua humanidade porque há mais em Sócrates do que sua humanidade mesmo que ele não possa existir sem ela Mas uma vez que a propriedade exemplificada rica de Sócrates inclui todas suas propriedades exemplificadas por que Sócrates não pode ser idêntico à sua propriedade exemplificada rica E assim o pensamento de Mann parece ser o de que não há nada que poderia distinguir Sócrates de sua propriedade exemplificada rica Eles são então idênticos o mesmo ocorrendo para todos os outros indivíduos Mas é defensável que seja um erro sustentar que toda pessoa é 230 uma propriedade exemplificada Eis um argumento nesse sentido VALLICELLA 2016 p 379380 Propriedades Ricas e Hecceidades Sócrates pode existir sem sua propriedade rica ergo ele pode existir sem sua propriedade exemplificada rica ergo Sócrates não pode ser uma propriedade exemplificada rica ou qualquer propriedade exemplificada A verdade da premissa inicial é um resultado desagradável da definição de propriedade rica O R de x é uma propriedade conjuntiva em que cada um de seus membros é uma propriedade de x Assim a propriedade rica de Sócrates inclui tem como membro a propriedade de ser casado com Xântipe Mas ele poderia não ter tido essa propriedade do que se segue que ele poderia não ter tido R se R tem C como membro então necessariamente R tem C como membro o que implica que R não pode ser o que é sem ter exatamente os membros que ele de fato tem Um análogo do essencialismo mereológico vale para propriedades conjuntivas E uma vez que Sócrates poderia não ter tido R ele poderia não ter tido a propriedade exemplificada de R Assim Sócrates não pode ser idêntico à sua propriedade exemplificada O que Mann precisa não é de uma propriedade rica mas uma hecceidade uma propriedade que individua Sócrates através de cada um dos mundos possíveis nos quais ele existe Sua propriedade rica em contraste o individua apenas no mundo efetivo Em mundos diferentes Sócrates tem diferentes propriedades ricas E em mundos diferentes Sócrates tem diferentes propriedades exemplificadas ricas Seguese que Sócrates não pode ser idêntico ou mesmo necessariamente equivalente a qualquer propriedade exemplificada rica Uma hecceidade entretanto é uma propriedade que Sócrates tem em todos os mundos possíveis nos quais ele existe e que apenas ele tem em cada mundo no qual existe Ora se há hecceidades do tipo identidadecomSócrates talvez possamos dizer que Sócrates é idêntico a uma propriedade exemplificada nomeadamente a identidadecomSócrates de Sócrates Infelizmente há argumentos poderosos para rejeitar hecceidades VALLICELLA 2002 p 99104 Assim devemos concluir que indivíduos concretos não podem ser identificados com propriedades exemplificadas do que se segue a talvez óbvia proposição de que nenhuma pessoa é uma propriedade exemplificada nem Deus nem eu nem Sócrates 231 26 NT O termo simples deve ser entendido aqui em seu sentido técnico em metafísica ele designa um objeto sem partes próprias 35 Deus e McCann DSD e Estados de Coisa Concretos Para conceitualizar um Deus simples parece que devemos atribuir a ele uma ou outra categoria familiar Mas como isso é possível se como a DSD implica Deus é totalmente sui generis e único em seu próprio modo de unicidade Talvez isso não seja de todo possível de modo que o silêncio pode ser a resposta mais apropriada Mas não vamos desistir ainda Vallicella 1992 sugere que Deus é assimilável a uma propriedade autoexemplificadora uma Forma Platônica Hughes toma a via nominalista com sua ideia de que Deus é algo como um conjunto unidade Mann equipara Deus a uma propriedade exemplificada ou tropo Hugh McCann rejeitando a perspectiva de Mann propõe que pensemos em Deus como um estado de coisas concreto Estados de coisa concretos devem ser distinguidos dos estados de coisa abstratos Contraste Booth está assassinando Lincoln com Booth assassinando Lincoln Ambos são estados de coisas mas apenas o primeiro é concreto no sentido de ser causalmente ativopassivo Enquanto o primeiro é um ato um token de um ato o último é um tipo de ato O primeiro é causalmente eficaz o último é privado de eficácia causal em virtude de sua categoria ontológica A proposta de McCann então é a de conceber Deus como um estado de coisas concreto na mesma linha de Michelangelo está criando o teto da Capela Sistina A concretude é assegurada dessa forma mas e quanto à simplicidade Um estado de coisas concreto tal como Sócrates estar pálido é um complexo para cuja identidade tanto o sujeito quanto a propriedade ambos constituintes do complexo são necessários Propriedades exemplificadas ou tropos em contraste são simples26 o tropo palidez em Sócrates embora não possa emigrar para Platão não tem Sócrates como um constituinte e assim não está para fins de sua identidade ligado ao filósofo Ora McCann está bem ciente de que a complexidade de estados de coisas concretos não convive bem com a simplicidade divina Mas ele pensa que isso é o melhor que temos Embora McCann não o diga parece se seguir de sua abordagem geral que Deus não pode ser um membro de qualquer categoria ontológica existente ele não pode ser um universal ou um conjunto ou um tropo ou um estado de coisas 232 concreto De fato se ele é absolutamente soberano então Deus deve de alguma forma ser a fonte criativa das próprias categorias ontológicas de quantas elas são e do que elas são e não apenas a fonte das naturezas essências dos membros das categorias Deus tem de transcender todas as categorias Levado ao limite a soberania absoluta poderia parecer implicar a transcendência absoluta e a absoluta inefabilidade Claramente é nisso que a doutrina da simplicidade culmina e é isso que ela pretende preservar Há então uma tensão aqui se não uma contradição não pode ser simultaneamente verdade que Deus está além de todas as categorias ontológicas e que ele é um membro da categoria dos estados de coisa concretos Mas se ainda pretendemos ter uma concepção de Deus temos de forçosamente enquadrálo em alguma categoria existente ou outra e para McCann a categoria de estado de coisas concreto é o melhor que temos Andase na corda bamba quando se tenta evitar a teologia negativa com seu nada pode ser dito positivamente sobre Deus Citando vários textos de Aquino Eleonore Stump 2016 p 195198 mostra que o agnosticismo radical sobre a natureza divina é injustificado Para saber o que Deus não é devese ter algum conhecimento do que Deus é A afirmação de que Deus não é um corpo por exemplo repousa em afirmações como a de que Deus é o primeiro motor e é puramente efetivo 4 Preservando a Transcendência Divina Enquanto se Evita a Teologia Negativa Até aqui exploramos como Deus pode ser i idêntico à sua natureza ii idêntico à sua existência e iii isso tudo de um modo tal que tal que seus oniatributos são idênticos uns aos outros Mas um problema muito sério persiste um problema que emerge quando consideramos propriedades compartilhadas por Deus e pelas criaturas É óbvio que as perfeições divinas não podem ser compartilhadas com as criaturas apenas Deus é perfeitamente poderoso sábio bom e assim por diante Mas tem de haver algumas propriedades que Deus e as criaturas compartilham para que Deus não seja totalmente diferente das criaturas e assim esteja fora de qualquer relação com elas Essas propriedades compartilhadas no entanto apresentam uma ameaça à DSD Resumidamente o problema é o de reconciliar a transcendência divina da qual a DSD é uma expressão com a necessidade de alguma comensurabilidade entre Deus e as criaturas O problema em outras palavras é o de encontrar um modo de preservar a transcendência ao mesmo tempo em que se evita uma teologia negativa autoderrotante de acordo com a qual 233 27 NT No contexto dizer que o uso do termo poderoso não é equívoco entre ambas as formulações é dizer que em ambas o termo preserva o mesmo sentido nada pode ser positivamente afirmado sobre Deus nem mesmo que ele existe Deus é poderoso mas Sócrates também o é O uso de poderoso em Deus é poderoso e Sócrates é poderoso não é equívoco entre ambas as formulações27 Deus ser perfeitamente poderoso enquanto Sócrates é imperfeitamente poderoso não altera o fato de que ambos são poderosos Seja uma coisa perfeitamente poderosa ou imperfeitamente poderosa ela é poderosa Há uma diferença no grau de poder mas a diferença no grau parece pressupor e assim acarretar uma mesmidade a respeito de ser poderoso Ora se Deus e Sócrates são ambos poderosos então Deus tem uma propriedade com a qual ele não é idêntico nomeadamente a propriedade de ser poderoso e isso contradiz a DSD Pois se Deus é idêntico à propriedade de ser poderoso ele não pode compartilhar essa propriedade com Sócrates O argumento assim é este 1 Necessariamente para qualquer x se x é perfeitamente maximamente F então x é F De 1 em conjunção com a premissa de que Deus é perfeitamente poderoso seguese que 2 Deus é poderoso Mas entre as criaturas encontramos agentes com graus variados de poder então é também verdadeiro que 3 Sócrates é poderoso Seguese de 2 e 3 que 4 Há propriedades que Deus e criaturas compartilham Se x e y compartilham uma propriedade P então P é distinta tanto de x quanto de y Portanto 5 Há propriedades de Deus com as quais Deus não é idêntico o que implica que a DSD é falsa 234 41 Proposta Um Identidade de Predicados Sem Garantia de Identidade de Propriedades Graham Oppy 2003 sugere uma maneira de derrotar o argumento exposto acima Oppy na prática rejeita a inferência de 2 e 3 para 4 Dada a verdade de Deus é poderoso e Sócrates é poderoso daí não se segue que haja uma propriedade expressa pelo predicado poderoso compartilhada por Deus e Sócrates Na abordagem de Oppy ambas as frases são verdadeiras e o predicado poderoso tem o mesmo sentido em ambas as frases Não há equivocação e nem analogia Ocorre apenas que não existe uma propriedade única que seja expressa pelo predicado em suas duas ocorrências Se isso estiver correto então não há justificação para 4 e o argumento contra a DSD acima colapsa Oppy não está negando que muitos predicados expressam propriedades ele está negado que todos o fazem Seguindo David Armstrong 1978 ele está dizendo que predicados e seus sentidos não fornecem um guia seguro a respeito de quais propriedades universais imanentes armstrongianos o mundo contém Seguese que a estrutura ontológica do fazedor de verdade de uma frase verdadeira não pode ser extraída da estrutura sintática da frase da qual ela é o fazedor de verdade Portanto o fato de que nossas duas frases 3 e 4 têm a forma a é F não justifica a conclusão de que os respectivos fazedores de verdade têm a estrutura exemplificação por particulares mesmo universal Oppy 2003 p 15 escreve Do fato de duas frases da forma a é vermelho e b é vermelho serem verdadeiras não se segue que exista algum universal que desempenha um papel em tornar ambas verdadeiras é possível que nenhum dos universais que desempenham um papel em tornar verdadeira a frase a é vermelho tenha qualquer papel em tornar verdadeira a frase b é vermelho esse ponto é apoiado por aquelas linhas de raciocínio que sugerem que de um ponto de vista científico a vermelhidão constitui um tipo altamente heterogêneo e no que diz respeito à união das instâncias em uma coisa só arbitrário A ideia é essencialmente esta suponha que algo é um H se e somente se ele é ou um F ou um G Podese facilmente ver que se a é H e b é H daí não 235 28 NT O termo original decoy duck referese a patos artificiais feitos para atrair patos para a captura Decoy que pode ser traduzido como chamariz é usado de forma adjetivada no termo em inglês Em português esse mesmo objeto recebe o nome de chamariz de pato Por uma questão de maior fidelidade à expressão optei por pato postiço preservando assim a estrutura gramatical do exemplo se segue que exista alguma propriedade que ambos compartilham Pois pode ser que a seja H em virtude de a exemplificar a Fdade e b seja H em virtude de b exemplificar a Gdade Aplicado a Sócrates e ao Deus simples Sócrates é poderoso em virtude de exemplificar P1 ao passo que Deus é poderoso em virtude de exemplificar P2 Assim não existe uma propriedade única a propriedade de ser poderoso que ambos exemplificam Então 4 acima é falsa e o argumento contra a DSD colapsa Uma vez que uma defesa completa da defesa de Oppy da DSD está fora do escopo do presente verbete focaremos em um segundo modo de neutralizar a objeção 42 Proposta Dois Perfeito como um Adjetivo Alienans O argumento apresentado acima contra a DSD requer o pressuposto de que se x é perfeitamente F então x é F Isso é altamente plausível mas não inteiramente óbvio uma vez que como Barry Miller 1996 cap 5 argumenta perfeito pode ser um adjetivo alienans Um adjetivo alienans é um adjetivo que muda altera aliena o sentido do substantivo que ele modifica Assim postiço em pato postiço é um adjetivo alienans do fato de uma coisa ser um pato postiço não se pode inferir que ela é um pato do modo como podemos inferir do fato de uma coisa ser um pato macho que ela é um pato28 Assim se perfeitamente em perfeitamente poderoso for um adjetivo alienans então Deus pode ser perfeitamente poderoso sem ser poderoso e assim a objeção acima contra a DSD colapsa À primeira vista isso pode parecer uma sugestão disparatada Poder é um atributo que admite graus O poder perfeito é portanto muito naturalmente visto como o grau máximo do poder Assim concebido o poder perfeito é genericamente idêntico a qualquer grau submáximo de poder De acordo com Miller contudo há uma distinção importante entre um limite simpliciter e um caso limite Um limite 236 simpliciter difere meramente em grau daquilo do qual ele é o limite simpliciter ao passo que um caso limite difere absolutamente daquilo do qual ele é o caso limite Por isso o limite simpliciter de um F é um F ao passo que o caso limite de um F não é um F O argumento de Miller é que as perfeições divinas são casos limites e não limites simpliciter de propriedades tais como poder e conhecimento Enquanto tais elas não têm qualquer coisa genericamente em comum com os atributos comuns em criaturas Para perceber a distinção limite simplicitercaso limite considere a velocidade de corpos em movimento Essa velocidade tem um limite máximo Isso é um limite simpliciter Mas o limite mínimo isto é a velocidade de 0 km por segundo é um caso limite e não um limite simpliciter Enquanto o limite máximo simpliciter é uma velocidade o limite mínimo não é uma velocidade Uma partícula se movendo a 0 km por segundo não está se movendo Para um segundo exemplo considere a série predicável terciário predicável binário e predicável unário Uma vez que um predicável por exemplo é sábio precisa ter ao menos um lugar para ser um predicável um predicável unário é um limite simpliciter da série ordenada de predicáveis Embora a conversa sobre predicados zeroários surja naturalmente tal quando falamos de uma proposição como um predicável de zero lugar um predicado zeroário não é um predicável da mesma forma que o crescimento negativo não é crescimento Zeroário é um adjetivo alienans tal qual negativo em crescimento negativo Assim um predicável zeroário não é um limite simpliciter da série em questão mas um caso limite dessa série ele não é um membro da série da qual é um caso limite Não obstante ele mantém alguma relação com os membros da série na medida em que tanto eles quanto o modo em que são ordenados apontam para o caso limite MILLER 1996 p 8 A ideia então é que o poder de Deus não é o máximo ou limite simpliciter de uma série ordenada de instância de poder mas o caso limite do poder Isso implica que o poder de Deus não é uma instância de poder tal como um predicável zeroário não é um predicável Sem dúvida isso irá surpreender os teólogos do ser perfeito mas tornando a ideia mais palatável podese dizer que o poder de Deus embora não seja uma instância de poder é aquilo para o qual a série ordenada de instâncias de poder aponta e é portanto algo com o qual os membros dessa série tem uma relação definida A abordagem de Miller nos permite rejeitar a premissa do argumento acima O que a premissa enunciou na prática é que qualquer coisa que seja perfeitamente poderosa é poderosa Mas se Miller tiver razão e o poder de Deus não for o limite 237 simpliciter de uma série ordenada de instâncias de poder caso em que esse próprio poder é uma instância de poder mas pelo contrário um caso limite de poder então o que é perfeitamente poderoso não precisa ser uma instância de poder 43 O passo Misteriano de Dolezal Deus é absoluto A um absoluto não pode faltar qualquer coisa e ele não tem qualquer necessidade de se desenvolver ele é eternamente tudo o que ele pode ser Isso implica que não há distinção atopotência em Deus não há quaisquer poderes ou potencialidades não realizados Na expressão clássica Deus é actus purus puro ato inteiramente efetivo James Dolezal expressa muito bem a ideia quando ele escreve que a consideração de Deus como ipsum esse subsistens e actus purus é crucial para qualquer profissão da existência absoluta de Deus DOLEZAL 2011 p 214 Mas para sustentar a absolutez divina é também necessário que Deus seja libertariamente livre na sua produção de criaturas Ele deve ser livre seja para criar seja para não criar Pois suponha que a natureza divina seja tal que Deus tenha de criar Deus então dependeria do mundo criado para ser ele mesmo e inteiramente efetivo Ele precisaria daquilo que é distinto dele para ser ele Esse emaranhamento com o relativo comprometeria a absolutez divina Deus precisaria do mundo tanto quanto o mundo precisa de Deus Um exigiria o outro para ser o que é Porém Deus não seria absoluto DOLEZAL 2011 p 210 Logo Deus tem de ser livre seja para criar seja para não criar Deus então tem de ser simples e livre para ser absoluto Mas é muito difícil entender como um ser simples poderia ser livre no sentido incondicional poderia ter feito de outra forma Se Deus é simples então ele é ato puro tal como explicado no começo deste verbete Seguese que Deus é destituído de poderes potencialidades ou possibilidades não realizadas Agir livremente no entanto é agir de um modo tal que se poderia incondicionalmente ter feito de outra forma o que implica possibilidades não efetivadas da ação divina Ora a perspectiva de Dolezal é a de que não é apenas difícil reconciliar simplicidade e liberdade em sentido libertário mas que isso é impossível para nós ao menos em nossa condição atual Embora descubramos fortes razões para professar tanto a simplicidade quanto a liberdade em Deus não podemos formar uma noção isomorficamente adequada de como isso é o caso 2011 p 210 Na nota 55 da mesma página Dolezal levanta a dualidade ondapartícula a luz se comporta como uma partícula e como uma 238 onda Temos boas razões para acreditar que ela é ambas a despeito da dificuldade ou impossibilidade de entender como ela poderia ser ambas Com base na citação e na nota parece justo que Dolezal rotule a si mesmo como Misteriano ao menos no que diz ao problema simplicidadeliberdade que é apenas um subproblema dentro da constelação de problemas no interior da simplicidade divina Deus é ao mesmo tempo simples e livre e ele tem de ser ambos para ser Deus é um mistério contudo como ele poderia ser ambos Se temos boas razões para acreditar que p é verdadeira e boas razões para pensar que q é verdadeira temos então boas razões para pensar que p e q são logicamente consistentes uma com a outra a despeito da ausência da compreensão de como ambas poderiam ser mutuamente consistentes O que é efetivo é possível independentemente de podermos ou não tornar inteligível como ele é possível Por exemplo o movimento é efetivo e por isso possível a despeito da inabilidade que se pode ter ao confrontar as considerações inspiradas em Zenão de entender como ele é possível Vários exemplos similares poderiam ser dados E assim o passo misteriano sugere a si mesmo estamos justificados em sustentar simultaneamente que Deus é simples e que Deus é livre apesar do fato de que mesmo após longos esforços não podemos de um ponto de vista lógico dar um sentido a essa conjunção Se temos bons argumentos em favor dos dois elementos do que parece ser uma díade logicamente contraditória pode ser o caso de que a contradição é meramente aparente O fato de que a conjunção Deus é simples e Deus é livre pareçanos e talvez necessariamente nos pareça uma contradição lógica explícita ou algo que a implique não é uma razão decisiva para rejeitar a conjunção É uma razão e talvez até uma boa razão mas não uma razão decisiva Pode ser que nossa arquitetura cognitiva nos imponha limitações cognitivas irremediáveis cujo efeito é tornar impossível para nós a compreensão de como Deus poderia ser ao mesmo tempo simples e libertariamente livre O misteriano não é um dialeteísta o misteriano não afirma que há contradições verdadeiras Como o resto de nós o misteriano as evita como se fossem pragas O ponto do misteriano antes de mais nada é que a aparência não episódica e crônica de que uma proposição é contraditória não é suficiente para sua rejeição Afinal é bem possível que certas verdades sejam inacessíveis a nós em virtude de nossas limitações e defeitos mentais e que entre essas verdades existam algumas que nos aparecem apenas sob a forma de contradições e que nesta vida só podem nos aparecer dessa forma O religioso misteriano pode reforçar o ponto fazendo referência à Queda Esperase afinal que o pecado tenha consequências noéticas 239 Obviamente a menos que as tentativas atuais de reconciliar simplicidade e liberdade falhem o passo misteriano de Dolezal não pode ser dado de forma razoável Que elas sejam falhas não é difícil de acreditar Assim o misterianismo está em pleno funcionamento a despeito de seus problemas Mas quais seriam eles Em primeiro lugar se o fato de uma proposição conjuntiva aparentar após análise cuidadosa e escrutínio repetido ser ou implicar uma contradição lógica explícita não é evidência suficiente ou ao menos boa o bastante de que ela é uma contradição o que seria então Em outras palavras a inabilidade de explicar como p e q podem ser ambas verdadeiras pode ser uma evidência não demonstrativa muito boa de que p e q não são ambas verdadeiras Ora foi notado acima que o efetivo é possível sejamos ou não capazes de explicar como ele é possível Certo mas se não podemos explicar o como dúvidas são lançadas sobre a efetividade As posições podem ser invertidas Como então decidir entre essas linhas opostas de argumento A em virtude de X ser efetivo X é possível seja alguém capaz ou não de explicar como isso é possível B em virtude de que ninguém pode explicar como isso é possível isso não é possível e portanto não é efetivo Em segundo lugar se todas as tentativas atuais de reconciliar simplicidade e liberdade falham não se segue disso que não haja uma solução no horizonte Como um misteriano pode excluir a possibilidade de uma solução futura O misteriano parece comprometido com a afirmação de que é impossível ao menos nesta vida que haja uma solução Como ele pode estar tão certo disso Em terceiro lugar se uma proposição parece sob escrutínio cuidadoso ser ou implicar uma contradição será que há realmente uma proposição perante a mente Se você exige para a salvação de x que x acredite que Deus é um e três o que você exatamente está exigindo que x acredite Antes que x possa afirmar uma proposição como verdadeira x precisa entendêla mas como pode x afirmar como verdadeira uma proposição que aparenta ser necessariamente falsa É defensável que tal proposição não seja de fato uma proposição Deus é simples mas livre parece ser um caso desses Como questão de lógica pura há obviamente proposições necessariamente falsas tome os membros de um par contraditório de proposições e os una como por exemplo a neve é branca e a neve não é branca Essa proposição necessariamente falsa não é podese argumentar um objeto possível de crença por causa da nossa tendência caridosa de reinterpretar de algum modo inofensivo contradições flagrantes Quando nossa caridade hermenêutica é frustrada entretanto suspendemos a crença não na proposição mas na suposição de que a proposição é uma proposição ou de que a fórmula verbal expressa uma proposição 240 44 A Metafísica Quântica de Stump Tal como Dolezal Eleonore Stump pensa Deus como Ser esse autossubsistente Se Deus é absolutamente simples e não simples no sentido incontroverso de que lhe faltam partes materiais então Deus tem de ser Ser autossubsistente Deus é ao mesmo tempo Ser e algo que é Ele tem de ser ambos Se ele fosse Ser esse mas não um ser id quod est ele não poderia entrar em relações causais Ele não poderia fazer nada como criar o mundo intervir em suas operações ou interagir com pessoas humanas Tal Deus seria religiosamente pernicioso STUMP 2016 p 199 De fato se Deus fosse Ser mas não um ser então não se poderia sustentar razoavelmente que Deus existe Pois se o Ser é diferente de todo ser então o Ser não é é instrutivo lembrar que Martin Heidegger o famoso crítico da ontoteologia que sustenta a diferença ontológica do Ser Sein em relação a todo ser Seiendes acaba por assimilar o Ser ao Nada Nichts Por outro lado se Deus fosse entre outros seres um ser que meramente tem o Ser mas não é identicamente Ser então ele não seria absolutamente transcendente digno de adoração ou inefável Tal Deus seria confortavelmente familiar mas desconcertantemente antropomórfico MILLER 1996 p 3 Não é claro que a DSD seja suscetível a uma articulação satisfatória para a maioria dos teístas Não há razão para ser otimista Mas se essa articulação pudesse ser atingida teríamos uma via media entre a Cila da teologia negativa de acordo com a qual nada pode ser verdadeiramente dito ou conhecido sobre Deus e a Caríbdis de uma teologia antropomórfica de acordo com a qual As propriedades de Deus são meramente humanas embora estendidas ao maior grau possível MILLER 1996 p 3 O problema claro é explicar como Deus pode ser tanto Ser esse quanto algo que é ens Isso é ininteligível para o intelecto discursivo Ou o Ser é diferente dos seres ou não é Se o Ser é diferente dos outros seres então o Ser não pode ele próprio ser Isso implicaria que Deus que tem de ser ele próprio Ser para ser absoluto não pode sêlo Se por outro lado o Ser é apenas os seres tomados coletivamente então Deus seria um ser entre seres e não a realidade absoluta Ao intelecto discursivo a noção de Ser autossubsistente é contraditória Pois a ideia é que o Ser ele próprio é um ser sem dúvidas um ser muito especial mas um ser mesmo assim algo que é Uma resposta à contradição é simplesmente negar a simplicidade divina Sem dúvidas é uma resposta razoável Mas não seria também 241 razoável admitir que há coisas que a razão humana não pode entender e que uma dessas coisas é a natureza divina A razão humana pode ver que a razão humana não é capaz de compreender o quid est de Deus STUMP 2016 p 205 Em uma leitura de Stump ela como Dolezal dá um passo misteriano e ela como Dolezal 2011 p 210 n 55 invoca a dualidade ondapartícula Não podemos entender como a luz pode ser na natureza ao mesmo tempo um fenômeno de onda e também particulado e no entanto ela é ambos Que tipo de coisa é essa que tem de ser entendida tanto como uma onda quanto como uma partícula Não sabemos Isto é não sabemos o quid est da luz Analogamente podemos perguntar que tipo de coisa é essa que pode ser tanto esse quanto id quod est Não sabemos A ideia de simplicidade é a de que no fundamento metafísico último da realidade está algo que tem de ser entendido como esse mas também como id quod est Também não sabemos o que esse tipo de coisa é STUMP 2016 p 202 45 Hasker versus Dolezal e Stump Se o defensor da DSD for levado ao misterianismo muitos irão considerar isso como um salto desesperado da frigideira para o fogo Dolezal por exemplo sustenta que Deus tem de ser simples e livre em sentido libertário para ser absoluto apesar da contradição aparente Como Deus pode ser ao mesmo tempo simples e livre tem de permanecer um mistério William Hasker hesita Claramente isso não é aceitável 2016 p 19 Seu claramente é claramente um pouco de vociferação mas podemos sentir sua dor O argumento que Dolezal forneceu implica muito diretamente que a doutrina da simplicidade divina é falsa 2016 p 19 Isso não é algo irrazoável de se dizer mas é decisivo Isso força uma pessoa racional a abandonar a DSD A afirmação é tão decisiva a ponto de que a DSD pode ser descartada como um erro um erro corrigível de raciocínio no qual se cai talvez por inatenção a certas verdades óbvias Não exatamente Hasker encara a contradição aparente como real Mas será que ele pode excluir a possibilidade de a contradição ser meramente aparente Sua perspectiva se comporta bem com a noção de que Deus é um ser entre seres Mas para aqueles que sustentam que a transcendência divina requer que Deus transcenda os seres 242 em seu modo de existência seu modo de possuir propriedades seu modo de necessidade e seu modo de singularidade pode parecer mais provável que a contradição aparente que emerge quando pensamos sobre Deus reflete nossa inabilidade estrutural de pensar nele como qualquer coisa que não seja um ser muito especial entre outros seres Para Stump Deus é esse e Deus também é id quod est Essas afirmações embora aparentemente contraditórias precisam ser ambas afirmadas A contradição aparente emerge devido a uma deficiência no nosso modo de falar STUMP 2016 p 207 Ela presumivelmente quer dizer que essa deficiência é nesta vida irremediável e inelutável Na realidade contudo não há contradição as leis da lógica se aplicam a Deus e nem tudo pode ser corretamente afirmado sobre Deus 2016 p 207 Hasker 2016 p 23 n 52 não se impressiona estritamente falando nós não temos uma perspectiva coerente da natureza de Deus O que temos diferentemente disso é um conjunto de proposições mutuamente incompatíveis cada uma das quais tendo algo a ser dito em seu favor mas ao menos uma delas tem de ser falsa Stump poderia concordar com Hasker a respeito do fato de que ela não apresenta a nós uma perspectiva coerente da natureza de Deus mas acrescentar que isso é precisamente o que sua posição implica que não pode ser tido Nosso modo de falar sobre Deus é necessariamente defectivo e inacurado Se pudéssemos falar acuradamente então saberíamos a natureza de Deus Saberíamos o quid est de Deus Mas isso é precisamente o que nós não sabemos Assim embora do ponto de vista de Aquino podemos ter considerável conhecimento positivo de Deus os modos de falar sobre Deus mantém sua inexatidão a respeito de qualquer coisa que tenha a ver com a quididade de Deus STUMP 2016 p 207 A questão que divide Hasker e Stump e as posições que eles representam talvez sejam impossíveis de resolver Hasker exige uma perspectiva coerente da 243 natureza de Deus uma que satisfaça e que possa parecer que satisfaz as exigências do intelecto discursivo Hasker exige que Deus se encaixe dentro do enquadramento discursivo o que implica que ele tenha propriedades do modo como as criaturas as têm e assim por diante Stump poderia de forma razoável afirmar que Hasker faz uma exigência inadequada que não respeita a transcendência divina 5 A Defesa Por Meio do Fazedor de Verdade Proponentes da DSD fazem afirmações como Deus é sua onisciência e Deus é sua onipotência Se entendemos que os termos singulares sua onisciência e sua onipotência nessas afirmações se referem a propriedades então essas afirmações afirmam a identidade de Deus e uma propriedade uma entidade exemplificável Isso é inaceitável por razões ensaiadas na seção 2 acima De forma breve Deus é um indivíduo e não uma propriedade Se entretanto os termos singulares em questão pudessem ser entendidos como termos que se referem a indivíduos então essa objeção particular à coerência da DSD colapsaria Claramente se Deus e sua onisciência se referem a um indivíduo Deus então a coerência de Deus é sua onisciência estará fora de disputa Entra então a defesa por meio do fazedor de verdade Essa defesa se articula com uma teoria da predicação que Bergmann e Brower 2006 apresentam da seguinte maneira P A verdade de todas as predicações verdadeiras ou ao menos de todas as predicações verdadeiras da forma a é F deve ser explicada em termos de fazedores de verdade P deve ser entendida por meio do contraste com a uma teoria da predicação de acordo com a qual toda predicação verdadeira da forma a é F deve ser explicada em termos da exemplificação de uma propriedade por parte de um indivíduo Ora considere a predicação essencial Deus é onisciente Dado que um fazedor de uma verdade v é uma entidade cuja existência de maneira geral logicamente necessita a verdade de v o próprio Deus é plausivelmente encarado como o fazedor de verdade de Deus é onisciente e predicações essenciais do mesmo tipo Pois em todo mundo possível no qual Deus existe essas predicações essenciais ou as 244 29 NT Raça de cão usada sobretudo para trabalhos domésticos Na GrãBretanha de séculos atrás tal animal era colocado para correr em uma roda conectada a um mecanismo que fazia com que a carne girasse dentro da panela o que proporcionava um cozimento igual de todas as suas partes proposições que elas expressam são verdadeiras No caso das predicações essenciais por oposição às acidentais fazedores de verdade não precisam ser entendidos como estados de coisa concretos e assim não precisam ser entendidos como algo que envolve entidades exemplificáveis O próprio Sócrates não é plausivelmente encarado como sendo o fazedor de verdade da predicação acidental Sócrates é sábio ou a proposição que isso expressa uma vez que há mundos possíveis nos quais Sócrates existe mas a predicação não é verdadeira É plausível no entanto encarar Sócrates como o fazedor de verdade da predicação essencial Sócrates é humano Ora a onisciência de Deus e humanidade de Sócrates são nominalizações abstratas de Deus é onisciente e Sócrates é humano respectivamente Assim dado que Deus e Sócrates são os fazedores de verdade de suas respectivas predicações essenciais as nominalizações podem ser entendidas como referências não a propriedades mas a esses mesmos fazedores de verdade Da mesma forma dizer que Deus é idêntico à sua onisciência é apenas dizer que Deus é idêntico ao fazedor de verdade Deus é onisciente Isso equivale a dizer que Deus é idêntico a Deus Dessa forma evitase a absurdidade de dizer que Deus é idêntico à uma propriedade Deus é idêntico não à propriedade da onisciência mas ao referente de a onisciência de Deus que calha de ser o próprio Deus Isso também vale para o resto dos atributos intrínsecos e essenciais de Deus 6 É a Simplicidade Divina Compatível com a Liberdade das Criaturas e o Conhecimento Contingente de Deus Suponha que uma criatura que também é um agente performa livremente uma ação A Ele preenche sua declaração de imposto de renda digamos dentro do prazo cujo limite é 15 de abril Suponha que a liberdade envolvida aqui não seja a compatibilista liberdade de um turnspit29 para tomar emprestada a expressão de Kant mas a liberdade robusta que implica que o agente é a fonte última da 245 ação e que o agente poderia ter feito de outra maneira A performance de A torna verdadeiras um punhado de proposições contingentes todas elas conhecidas por Deus em sua onisciência Ora se o sujeito S sabe que a proposição p é o caso e p é contingente parece que o conhecimento de S de que p é ou envolve um estado intrínseco acidental e não um estado essencial de S Se Deus é onisciente ele então sabe todas as verdades nãoindexicais incluindo todas as verdades contingentes Parece se seguir que Deus tem ao menos tantos estados intrínsecos acidentais quanto há verdades contingentes Mas isso contraria a DSD de acordo com a qual nada há intrínseco a Deus que seja distinto de Deus Considere o estado mental em que Deus está quando ele sabe que Tom preenche livremente seu imposto de renda em 14 de abril de 2014 Esse estado mental divino é um estado intrínseco no qual Deus está contingentemente Se Deus fosse idêntico a esse estado ele não poderia ser a se Pois se Deus fosse idêntico a esse estado Deus seria dependente de algo da ação libertariamente livre de Tom que é externo a Deus e está além do seu controle Ora qualquer coisa que comprometa a asseidade divina irá comprometer a simplicidade divina esta última sendo uma implicação da primeira Assim parece que um Deus onisciente não pode ser simples se há criaturas livres dotadas de agência e Deus sabe o que eles fazem e deixam por fazer Há também o problema de que se o estado mental divino em questão fosse idêntico a Deus então a verdade que Deus sabe quando ele sabe que Tom preenche o imposto no dia 14 de abril seria necessária O problema pode ser expresso como uma pêntade aporética 1 Todo agente livre é um agente libertariamente livre Llivre 2 Deus é ontologicamente simples em que simplicidade é uma implicação da asseidade e viceversa nada há de intrínseco a Deus que seja distinto de Deus 3 Há itens contingentes que compõem o conhecimento total divino que não dependem inteiramente da criação divina mas dependem parcialmente da liberdade das criaturas 4 Necessariamente se Deus sabe alguma verdade v então i há um item intrínseco a Deus tal como um ato mental ou um estado de crenças ii por meio do qual Deus sabe v 5 Deus existe necessariamente 246 Cada membro da pêntade reivindica fortemente embora não de forma irresistível sua aceitação pelo teísta clássico Sobre 1 se Deus é Llivre tal como ele deve ser de acordo com o teísmo clássico é razoável sustentar que todo agente livre é Llivre Pois se poderia ter feito de outra forma é um ingrediente essencial na análise de o agente A performa livremente ação X então é altamente plausível sustentar que isso é assim seja o agente Deus ou Sócrates Do contrário livre irá significar coisas diferentes em ambos os casos Além disso se o homem é feito à imagem e à semelhança de Deus então é certamente defensável se não óbvio que isso significa em parte que o homem é um ser espiritual que é tão libertariamente livre quanto Deus o é Se o homem for um sistema determinista é de se perguntar em que sentido o homem é a imagem de Deus Sobre 2 algumas razões foram oferecidas anteriormente para pensar que um teísmo que entende a si mesmo deve sustentar a simplicidade ontológica na medida em que isso é implicado pela asseidade divina Um exemplo de 3 é o fuzilamento de Kennedy por Oswald O ato foi livremente performado por Oswald e a proposição que o registra é uma verdade contingente conhecida por Deus em sua onisciência A plausibilidade de 4 pode ser percebida da seguinte maneira seja lá o que o conhecimento for além disso ele é plausivelmente considerado como uma espécie de crença verdadeira Uma crença é um estado intrínseco de um sujeito Além disso para esmiuçar a segunda cláusula de 3 as crenças são individuadas por seus conteúdos crenças com diferentes conteúdos são crenças diferentes Não pode ser o caso que um e o mesmo ato de acreditar tenha diferentes conteúdos em momentos diferentes ou em mundos possíveis diferentes 5 caso não seja ele próprio óbvio pode ser entendida como uma implicação de 2 Se em Deus essência e existência são um Deus não pode não existir Mas embora cada membro da pêntade seja sustentado de forma plausível tipicamente por teístas que sustentam a DSD eles não podem ser todos verdadeiros Quaisquer quatro membros tomados conjuntamente implicam a negação do membro restante Para ilustrar consideremos como os membros da pêntade com exceção de 2 implicam a negação de 2 Sendo onisciente Deus sabe que Oswald 247 livremente escolhe matar Kennedy Mas a Lliberdade de Oswald nos impede de dizer que o conhecimento de Deus desse fato contingente depende apenas da vontade divina Pois ele também depende da autoria Llivre do ato maligno por parte de Oswald uma autoria que Deus não pode impedir ou a ela se sobrepor uma vez que ele criou agentes Llivres Mas isso é inconsistente com a asseidade divina Pois dizer que Deus é a se é dizer que Deus não é dependente de qualquer coisa que não seja ele próprio para sua existência propriedades intrínsecas ou estados Mas por 4 Deus está no estado de saber que Oswald livremente escolhe matar Kennedy e ele estar nesse estado depende de algo fora do controle de Deus nomeadamente a escolha Llivre de Oswald Dessa maneira a asseidade divina é comprometida e com ela a simplicidade divina Parece então que nossa pêntade aporética é uma pêntade inconsistente O defensor da DSD não pode negar nem a simplicidade divina nem a necessidade divina que é uma implicação da simplicidade Mas um adepto da simplicidade divina tem a opção de negar 1 e sustentar que embora Deus seja Llivre criaturas que são agentes são livres apenas no sentido compatibilista Clivres Se criaturas dotadas de agência são Clivres mas não Llivres então Oswald não poderia ter feito de outro modo e assim é possível para o defensor da simplicidade divina dizer que a escolha Clivre de Oswald não é mais ameaçadora à asseidade divina do que o fato de Deus saber a verdade contingente de que criaturas que são agentes existem Este último fato não é uma ameaça à asseidade divina porque a existência dessas criaturas é derivada de Deus de uma forma que a escolha Llivre de Oswald não é derivada de Deus Uma segunda resposta talvez melhor seria rejeitar 4 de alguma das maneiras examinadas por W M Grant 2012 Eis duas maneiras aparentemente promissoras No que Grant chama Modelo de Crença o conhecimento pertencente a Deus é uma espécie de crença verdadeira porém as crenças de Deus não são estados intrínsecos de Deus Elas não são atos mentais ou episódios Crenças são relacionais Ter uma crença é estar relacionado a uma proposição em que proposições não são conteúdos de estados de crença mas entidades abstratas que existem de forma independente dos sujeitos que acreditam nelas Deus acreditar que Oswald matou Kennedy é Deus estar em uma relação com uma proposição sem que haja qualquer coisa intrínseca a Deus que sirva de base ao fato de ele manter a relação de crença com proposição sobre Oswald e não com qualquer outra proposição Acreditar ao menos no caso de Deus é uma relação externa não uma relação interna baseada em uma característica intrínseca de quem acredita Várias objeções 248 podem ser mobilizadas contra o Modelo de Crença da cognição divina mas caso se possa desviar delas 4 colapsa e a pêntade é resolvida Uma segunda maneira de rejeitar 4 é adotar o que Grant chama de Modelo de Cognição Imediata do saber divino De acordo com o modelo o conhecimento pertencente a Deus não é mediado por proposições ou qualquer outra coisa mas vem diretamente das realidades contingentes O conhecimento que Deus tem de Sócrates tem como um constituinte essencial o próprio Sócrates incluindo até suas características indesejáveis Nesse modelo externalista tal como no Modelo de Crença nada há de interno e intrínseco a Deus em virtude do qual ele possua conhecimento contingente e assim nada há de contingente nele para comprometer sua simplicidade Devese perguntar no entanto se cada modelo preserva a asseidade divina que é a principal motivação em favor da simplicidade divina BROWER 2009 Se o conhecimento do Deus simples a respeito de Sócrates inclui o próprio homem em sua realidade incorporada isso aparentemente torna Deus dependente de algo diferente de si mesmo Brower pensa que o problema pode ser neutralizado pela observação de que Deus é a causa das entidades contingentes das quais seu conhecimento contingente depende Grant 2012 p 267 no entanto pensa que nenhum dos modelos externalistas apresenta um problema para a asseidade seja Deus o causador dos objetos contingentes que ele conhece ou não Se Deus existe a partir de si mesmo então ele é a se Mas a existência de uma coisa é intrínseca à ela não relacional É então suficiente para a asseidade divina que Deus não dependa de qualquer outra coisa para o que ele intrinsecamente é Que o conhecimento de Deus a respeito de Sócrates dependa de Sócrates não é o ponto esse saber é puramente relacional e não intrínseco a Deus Referência bibliográfica AQUINO S T Summa Theologica I q 3 AGOSTINHO S The City of God XI 10 ARMSTRONG D M Universals and Scientific Realism Cambridge Cambridge University Press 1978 BENNETT D The Divine Simplicity Journal of Philosophy 66 p 628637 1969 BERGMANN M BROWER J A Theistic Argument against Platonism and in Support of Truthmakers and Divine Simplicity Oxford Studies in 249 Metaphysics Vol 2 Oxford Oxford University Press 2006 BRADSHAW D Aristotle 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Acesso em 25 mai 2022 The following is the translation of the entry on Atheism and Agnosticism by Paul Draper in the Stanford Encyclopedia of Philosophy The translation follows the version of the entry in the SEPs archives at httpsplatostanfordeduentriesatheismagnosticism This translated version may differ from the current version of the entry which may have been updated since the time of this translation The current version is located at a https platostanfordeduarchivessum2022entriesatheismagnosticism Wed like to thank the Editors of the Stanford Encyclopedia of Philosophy mainly Prof Dr Edward Zalta for granting permission to translate and to publish this entry Finally we would like to thank to John Templeton Foundation for financially supporting this project Ateísmo e agnosticismo Autoria Paul Draper Tradução Rodrigo Jungmann de Castro Revisão Bruno Henrique Uchôa da Silva Gomes O propósito deste verbete é o de explorar a forma como o ateísmo e o agnosticismo se relacionam com o teísmo e ainda mais importante um com o outro Isso exige um exame da questão surpreendentemente contenciosa acerca da melhor definição dos termos ateísmo e agnosticismo A resolução desta questão ao menos para os propósitos deste verbete preparará o terreno para uma importante distinção entre o ateísmo global e o ateísmo local o que por seu turno ajudará a distinguir formas distintas de agnosticismo Disso se procederá a um exame de um argumento que apoia uma forma modesta de agnosticismo seguido pela discussão de três argumentos favoráveis ao ateísmo e de um argumento contrário a uma forma mais ambiciosa de agnosticismo 254 1 Definições de Ateísmo O ateísmo é tipicamente definido em termos do teísmo O teísmo por sua vez pode ser melhor compreendido como uma proposição algo que ou é verdadeiro ou é falso É normal definilo como a crença em que Deus existe mas aqui crença quer dizer algo em que se crê Referese ao conteúdo proposicional da crença não à atitude ou estado psicológico presente na crença É por isso que faz sentido dizer que o teísmo é verdadeiro ou falso e argumentar a favor do teísmo ou contra o teísmo Se no entanto o ateísmo é definido em termos do teísmo e o teísmo é a crença em que Deus existe e não a condição psicológica presente na crença em que há um Deus então disso se segue que o ateísmo não é a ausência na condição psicológica presente na crença de que Deus existe sobre isto temos mais a dizer adiante O a de ateísmo deve ser entendido como uma negação e não como uma ausência como não em vez de como sem Portanto na filosofia ao menos o ateísmo deve ser interpretado como sendo a proposição de que Deus não existe ou em sentido mais amplo a proposição de que não existem deuses Esta definição tem a virtude adicional de fazer do ateísmo uma resposta direta a uma das questões metafísicas mais importantes da filosofia da religião a saber Há um Deus Há apenas duas respostas diretas possíveis a essa questão sim que vem a ser teísmo e não que vem a ser o ateísmo Respostas tais como eu não sei ninguém sabe eu não me importo uma resposta afirmativa jamais foi provada ou a questão não faz sentido não são respostas diretas a esta questão Embora identificar o ateísmo com a alegação metafísica de que não há um Deus ou de que não há deuses seja particularmente útil para a prática filosófica é importante reconhecer que o termo ateísmo é polissêmico ie possui mais de um significado relacionado mesmo em filosofia Por exemplo muitos escritores identificam ao menos implicitamente o ateísmo com uma teoria metafísica positiva como o naturalismo ou mesmo o materialismo Neste sentido da palavra o significado de ateísmo não pode ser derivado de uma maneira simples do significado de teísmo Embora isto possa parecer bizarro de um ponto de vista etimológico talvez se possa montar uma tese em defesa da alegação de que algo como o naturalismo metafísico originariamente recebia a rotulação de ateísmo apenas em virtude do domínio cultural de formas nãonaturalistas de teísmo e não porque a concepção então rotulada não era nada além da negação do teísmo Consoante essa interpretação 255 teria havido ateístas mesmo se nenhum teísta jamais houvesse existido Baggini 2003 sugere essa linha de pensamento embora a sua definição oficial seja a definição metafísica padrão Embora tal definição de ateísmo seja legítima é frequentemente acompanhada de inferências falaciosas que partem da alegada falsidade ou provável falsidade do ateísmo naturalismo para estabelecer a verdade ou provável verdade do teísmo Num abandono ainda mais radical do que é a norma em filosofia uns poucos filósofos e um bom número de nãofilósofos alegam que ateísmo não deveria em absoluto ser definido como uma proposição mesmo se o teísmo for uma proposição Em vez disso o ateísmo deveria ser definido como um estado psicológico o estado em que se está ao não crer na existência de Deus ou de deuses Ganhou fama essa concepção do filósofo Antony Flew e se poderia argumentar que desempenhou um papel na sua defesa de uma alegada presunção de ateísmo 1972 Os editores do Oxford Handbook of Atheism BULLIVANT RUSE 2013 também favorecem essa definição e um deles Stephen Bullivant 2013 a defende no que julga ser sua utilidade acadêmica O seu argumento é o de que esta definição pode prestar o melhor serviço como um termo genérico um guardachuva para abrigar uma ampla variedade de posições que foram identificadas com o ateísmo Acadêmicos podem então usar adjetivos como forte e fraco para desenvolver uma taxonomia que diferencie os vários tipos específicos de ateísmo Infelizmente este argumento negligencia o fato de que se o ateísmo for definido como um estado psicológico então nenhuma proposição pode valer como uma forma de ateísmo porque uma proposição não é um estado psicológico Isso enfraquece o seu argumento em defesa da definição de Flew afinal implica que o que ele chama de ateísmo forte a proposição ou crença no sentido de algo em que se crê de que não há um Deus realmente não constitui em absoluto uma variedade de ateísmo Em suma o termo genérico que propõe o guardachuva deixa o ateísmo forte do lado de fora na chuva Embora a definição de Flew para ateísmo fracasse como termo genérico certamente é uma definição legítima no sentido de que serve para reportar a maneira como um número significativo de pessoas usa o termo Uma vez mais há mais do que uma única definição correta de ateísmo A questão para a filosofia é determinar qual definição é a mais útil para propósitos acadêmicos ou num sentido mais estreito para propósitos filosóficos Em outros contextos é claro a questão referente a como definir ateísmo ou ateísta pode assumir uma aparência muito diversa Por exemplo em alguns contextos a questão crucial pode ser a sobre qual definição 256 de ateísta por oposição a ateísmo é a mais útil do ponto de vista político especialmente à luz da intolerância com que os ateístas normalmente se confrontam O fato de que uma posição de força pode resultar do número de pessoas envolvidas pode recomendar uma definição muito inclusiva de ateísta que traga para o mesmo lado todos aqueles que não teístas Tendo dito isto seria normal pensar que em nada contribuiria para a promoção de qualquer boa causa política ou não um ataque a nãoteístas que não se identificam como ateístas simplesmente porque optam por usar o termo ateísta em algum outro sentido igualmente legítimo Se na filosofia a forma usual e mais bem compreendida de ateísmo consiste na alegação metafísica de que Deus não existe então o que bem se poderia questionar os filósofos deveriam fazer com o termo popular Novo Ateísmo Os filósofos escrevem artigos acerca do Novo Ateísmo e lhe devotam edições de periódicos acadêmicos FRENCH WETTSTEIN 2013 mas não há nada nem próximo de um consenso acerca de como tal termo deveria ser definido Felizmente não há uma real necessidade de consenso porque o termo Novo Ateísmo algum posicionamento ou fenômeno filosófico distintivo Em vez disso é uma rotulação popular para o movimento representado de forma proeminente por quatro autores Richard Dawkins Daniel Dennett Sam Harris e Christopher Hitchens cuja obra é uniforme em sua crítica da religião mas que para além disso parece ter sido unificada apenas por seu ritmo de aparição temporal e por sua popularidade Ademais poderseia questionar o que há de novo no Novo Ateísmo Não são novas as críticas específicas à religião e aos argumentos usados para defender a religião Por exemplo é lícito argumentar que uma versão mais sofisticada e convincente do argumento ateísta central de Dawkins pode ser encontrada em Diálogos de Hume WIELENBERG 2009 Além disso embora Dennett 2006 lance um apelo apaixonado para que seja feito um estudo científico da religião enquanto fenômeno natural tal estudo existiu muito antes deste apelo Com efeito até mesmo a ciência cognitiva da religião pode ser vista como remontando no mínimo ao Século XIX Passando do tratamento do conteúdo para o do estilo muitos se deixam surpreender pela atitude militante de alguns Novos Ateístas mas existiram em abundância ateístas bastante desrespeitosos para com a religião muito antes de Harris Dawkins e Hitchens Dennett não é particularmente militante Por fim o estereótipo do Novo Ateísmo como sendo de alguma maneira sem precedentes um movimento religioso ou semirreligioso ou ideológico é claramente falso além de rejeitado pelos Novos Ateístas Para uma explicação desses pontos confira Zenk 2013 257 Uma outra subcategoria de ateísmo é o ateísmo amistoso que William Rowe 1979 define como sendo a posição segundo a qual embora Deus não exista algumas pessoas intelectualmente sofisticadas têm justificação para acreditar que Deus existe Rowe um ateísta amistoso ele mesmo estabelece um contraste do ateísmo amistoso com o ateísmo inamistoso e o ateísmo indiferente O ateísmo inamistoso é a visão de que o ateísmo é verdadeiro e de que nenhuma crença teísta sofisticada tem justificação A despeito de seu nome altamente enganoso essa concepção poderia ser sustentada pela pessoa mais amistosa mais intelectualmente receptiva e mais tolerante em matéria de religião que se possa imaginar Por fim embora Rowe se refira ao ateísmo indiferente como sendo uma posição não consiste numa proposição mas em vez disso num estado psicológico e especificamente no estado que consiste em ser um ateísta que não é nem amistoso nem inamistoso vale dizer que não acredita nem que o ateísmo amistoso seja verdadeira nem que o ateísmo inamistoso seja verdadeiro Talvez uma distinção ainda mais interessante seja aquela entre o ateísmo proDeus e o ateísmo antiDeus Um ateísta proDeus como John Schellenberg que cunhou o termo é alguém que em algum sentido real ama Deus ou ao menos a ideia de Deus que faz uma tentativa muito vigorosa de imaginar que tipos de mundos maravilhosos um tal ser poderia criar em vez de simplesmente pressupor que um tal ser criaria um mundo de alguma maneira assemelhado ao mundo que observamos e que ao menos parcialmente precisamente por essa razão acredita que Deus não existe Tal ateísta poderia se mostrar simpático às seguintes impressões É um insulto a Deus acreditar em Deus Pois por um lado é o mesmo que supor que ele perpetrou atos de crueldade incalculável Por outro lado é o mesmo que supor que ele deu às suas criaturas humanas um instrumento seus intelectos que deve inevitavelmente leválos se forem desapaixonadas e honestas a negar a sua existência É tentador concluir que caso ele exista são os ateístas e agnósticos que ele ama mais dentre aqueles que tenham quaisquer pretensões à possuírem uma formação educacional Pois eles são os que o levaram mais a sério STRAWSON 1990 258 Em contraste com essa posição ateístas antiDeus como Thomas Nagel 1997 p 130131 consideram a ideia de um Deus ofensiva em sua totalidade e por esse motivo esperam muito intensamente que tal ser não exista Nagel é frequentemente chamado de antiteísta vide KAHANE 2011 mas este termo é evitado aqui propositalmente visto que possui muitos sentidos distintos KAHANE 2011 nota 9 Além disso em nenhum desses sentidos se requer que uma pessoa seja um ateísta para poder ser um antiteísta de modo que o antiteísmo não é uma variedade de ateísmo 2 Definições de agnosticismo Tornouse afamada a cunhagem dos termos agnóstico e agnosticismo no fim do século XIX pelo biólogo inglês T H Huxley 1884 Ele disse que originariamente inventou a palavra Agnóstico para denotar pessoas que como ele mesmo confessam o fato de serem desesperançados no que toca a abandonar o seu estado de ignorância acerca de muitos assuntos a respeito dos quais os metafísicos e os teólogos tanto ortodoxos quanto heterodoxos estabelecem dogmas com suprema confiança Incluindo é claro o assunto da existência de Deus Contudo ele não definiu o agnosticismo simplesmente como o estado de ser agnóstico Em vez disso ele frequentemente usou tal termo para se referir a um princípio normativo epistemológico algo semelhante embora menos rigoroso àquilo que chamamos de evidencialismo grosso modo o princípio de Huxley afirma que é errado se dizer que se sabe ou se acredita que uma proposição seja verdadeira sem possuir evidência satisfatória do ponto de vista lógico HUXLEY 1884 1889 Mas foi o uso deste princípio por Huxley para tratar das crenças teísta e ateísta que acabou por ter a maior influência sobre o significado do termo Ele argumentou que visto que nenhuma de tais crenças é adequadamente apoiada pela evidência devemos suspender o julgamento acerca da questão referente à existência ou inexistência de Deus 259 Hoje em dia o termo agnóstico é frequentemente empregado quando o que está em questão é a existência de Deus para nos referirmos àqueles que seguem a recomendação expressa na conclusão do argumento de Huxley um agnóstico é uma pessoa que considerou a proposição de que há um Deus mas que não crê nem que seja verdadeira nem que seja falsa Não é de causar surpresa então que o termo agnosticismo seja frequentemente definido tanto dentro como fora da filosofia não como um princípio ou como qualquer outro tipo de proposição mas em vez disso como sendo o estado psicológico de ser agnóstico Chamemos a isto de sentido psicológico do termo Certamente é útil possuir um termo para fazer referência a pessoas que não são nem teístas nem ateístas mas os filósofos poderiam desejar que outro termo além de agnóstico fosse usado cético em teologia talvez O problema é que também é muito útil para propósitos filosóficos ter um nome para a posição epistemológica que se segue da premissa do argumento de Huxley a posição segundo a qual não se tem conhecimento da correção nem do teísmo nem do ateísmo ou da forma mais ambiciosa de que nem a crença de que Deus existe nem a crença de que Deus não existe possuem um status epistêmico positivo de qualquer tipo Assim como a questão metafísica da existência de Deus é central para a filosofia da religião assim também o é a questão epistemológica acerca de se ter ou não conhecimento da correção do teísmo ou do ateísmo ou acerca de terem ou não algum outro tipo de status epistêmico positivo E dada a etimologia de agnóstico que outro termo poderia existir para uma resposta negativa a tal questão do que agnosticismo Ademais como sugerimos anteriormente é típico na filosofia por razões muito boas usar o sufixo ismo to fazer referência a uma proposição em vez de usálo para um estado ou condição visto que é apenas o primeiro uso que pode dentro da razoabilidade ser testado por meio de um argumento Se contudo agnosticismo é definido como uma proposição então agnóstico deve ser definido em termos de agnosticismo e não o contrário Mais especificamente um agnóstico deve ser definido como uma pessoa que acredita que a proposição contida no termo agnosticismo é verdadeira em vez de termos o agnosticismo sendo definido como o estado presente em ser um agnóstico E se a proposição em questão for a de que não se sabe nem quanto ao teísmo nem quanto ao ateísmo que um deles é verdadeiro então o termo agnóstico não pode mais servir como aqueles que não são nem teístas nem ateístas visto que é possível acreditar de forma consistente que o ateísmo ou o teísmo é verdadeiro ao mesmo tempo em que se nega que se sabe que o ateísmo ou o teísmo é verdadeiro 260 Quando é empregado neste sentido epistemológico o termo agnosticismo pode ser estendido muito naturalmente para além da questão daquilo que é ou que se pode saber que é algo que engloba uma vasta gama de posições a depender de que tipo de status epistêmico positivo está em questão Por exemplo o termo poderia ser identificado com qualquer das seguintes posições a de que nem a crença teísta nem a crença ateísta é justificada a de que nem a crença teísta nem a crença ateísta é requerida pela racionalidade a de que nenhuma das duas crenças é permissível do ponto de vista racional a de que nenhuma delas tem aval a de que nenhuma delas é razoável ou a de que nenhuma delas é provável Além disso para evitar a questão controversa acerca da natureza do conhecimento poderse ia simplesmente distinguir como membros distintos da família do agnosticismo cada uma das seguintes alegações feitas a respeito de pessoas intelectualmente sofisticadas i nem o teísmo nem o ateísmo é suficientemente apoiado por Estados interiores de tais pessoas ii nem a crença teísta nem a crença ateísta é coerente com o restante de nossas crenças iii nem a crença teísta nem a ateísta é resultado de processos confiáveis de produção de crenças iv nem a crença teísta nem a crença ateísta é resultado de faculdades voltadas para a obtenção da verdade que estejam funcionando apropriadamente em um ambiente propício e assim por diante Notese ainda que mesmo se o agnosticismo fosse definido como a posição deveras extremada segundo a qual nem a crença teísta nem a crença ateísta jamais tem status epistêmico positivo de nenhum tipo não se seguiria disso por definição que nenhum agnóstico é um teísta ou um ateísta Alguns fideístas por exemplo acreditam que nem a crença ateísta nem a crença teísta é apoiada ou sancionada de forma alguma pela razão pela qual ela deixa completamente sem solução a questão da existência de Deus E no entanto eles têm fé na existência de Deus e tal fé ao menos em alguns casos inclui a crença Assim alguns fideístas são agnósticos extremados no sentido epistemológico embora não sejam agnósticos no sentido psicológico Também vale a pena mencionar que mesmo na época de Huxley alguns teístas apofáticos abraçaram o termo agnóstico alegando que todos os bons cristãos veneram um Deus desconhecido Mais recentemente alguns ateístas passaram a chamar a si mesmos orgulhosamente de ateístas agnósticos embora numa reflexão ulterior uma reflexão sobre a simetria entre esta posição e o fideísmo poderia fazêlos parar para pensar É mais provável no entanto que o que está sendo sustentado por estes autoidentificados ateístas agnósticos é que embora sua crença de que Deus não existe tenha um status epistêmico positivo de algum 261 tipo no mínimo não é irracional não possui o tipo de status epistêmico positivo que pode transformar uma crença verdadeira em conhecimento É fora de dúvida que ambos os sentidos de agnosticismo o psicológico e o epistemológico continuarão a ser empregados tanto dentro quanto fora da filosofia É o caso de esperar que o contexto ajude a evitar ambiguidades No restante deste verbete contudo o termo agnosticismo será usado em seu sentido epistemológico Isso faz uma enorme diferença para a questão da justificação Considerese por exemplo esta passagem escrita pelo agnóstico Anthony Kenny 1983 p 8485 Não tenho ciência eu mesmo de nenhum argumento para a existência de Deus que eu julgue convincente em todos eles creio ser capaz de encontrar falhas Por igual não tenho ciência de nenhum argumento contrário à existência de Deus que seja totalmente convincente nos argumentos que conheço que são contrários à existência de Deus sou igualmente capaz de encontrar falhas Por isso minha própria posição acerca da existência de Deus é agnóstica É uma coisa questionar se a inabilidade de Kenny para encontrar argumentos que o convençam da existência ou nãoexistência de Deus o provê com uma justificativa pessoal para suspender o julgamento acerca da existência de Deus É uma outra bem diversa questionar se está inabilidade ou qualquer outra coisa justificaria sua crença de que ninguém ou ao menos ninguém que seja suficientemente inteligente e bem informado tem uma crença justificada quanto à existência de Deus Se o agnosticismo em um dos sentidos da palavra é a posição segundo a qual não se tem ciência da veracidade nem do teísmo nem do ateísmo então poderia ser útil usar o termo gnosticismo para nos referirmos à posição que contradiz ou seja a posição segundo a qual se tem ciência da veracidade do teísmo ou do ateísmo Tal visão viria naturalmente em dois sabores o gnosticismo teísta a visão de que se tem ciência da veracidade do teísmo e por consequência da falsidade do ateísmo e o gnosticismo ateísta a visão de que se tem ciência da veracidade do ateísmo e por consequência da falsidade do teísmo 262 3 Ateísmo global versus ateísmos locais Jeanine Diller 2016 assinala que assim como a maior parte dos teístas têm em mente um conceito em particular de Deus quando asseveram que Deus existe a maior parte dos ateístas têm em mente um conceito em particular de Deus quando asseveram que Deus não existe Na verdade muitos ateístas estão apenas vagamente cientes da variedade de conceitos existentes de Deus Por exemplo existem os Deuses do teísmo clássico ou neoclássico o Deus anselmiano por exemplo ou de maneira mais modesta o onipotente onisciente e perfeitamente bom Deuscriador que recebe tanta atenção na filosofia da religião contemporânea Há também os Deuses de religiões ocidentais teístas específicas como o cristianismo o Islã o judaísmo e o siquismo que podem ou não ser melhor compreendidos como Deuses clássicos ou neoclássicos Há também Deuses panenteístas e Deuses teístas ligados à teologia do processo bem como uma variedade de outros conceitos de Deus tanto de origem ocidental quanto de origem nãoocidental que são em larga medida desconsiderados até mesmo pelos ateístas mais bem informados Teístas filosoficamente sofisticados por seu turno agem frequentemente como se a refutação do naturalismo estabelecesse a existência do tipo particular de Deus em que acreditam Diller estabelece uma distinção entre o ateísmo local que nega a existência de um tipo de Deus e o ateísmo global que é a proposição de que não existem Deuses de nenhum tipo que todos os conceitos legítimos de Deus carecem de instanciação O ateísmo global é uma posição muito difícil de justificar DILLER 2016 p 1116 De fato muito poucos ateístas têm qualquer boa razão para crer que seja verdadeiro visto que a vasta maioria dos ateístas não fez nenhuma tentativa de refletir a respeito de mais do que uma ou duas dentre os muitos conceitos legítimos de Deus que existem tanto dentro quanto fora das várias comunidades religiosas Nem tampouco qualquer um deles refletiu acerca de quais critérios devem ser justificados para que um conceito de Deus possa contar como legítimo e muito menos sobre a possibilidade de que conceitos legítimos de Deus não tenham ainda sido concebidos e sobre as implicações desta possibilidade para a questão de ser o ateísmo global justificado ou não Além disso os argumentos científicos mais populares entre os filósofos que tentam mostrar que o conceito de Deus é incoerente ou que a existência de Deus é incompatível de um ponto de vista lógico com a existência de certos tipos de mal ou com a existência de certos tipos de descrença SCHELLENBERG 2007 certamente não serão suficientes para justificar o ateísmo 263 global pois mesmo se forem corretos eles pressupõem que para ser Deus um ser deve ser onipotente onisciente e perfeitamente bom e como o personagem Cleantes salienta no princípio da Parte XI dos Diálogos de Hume vide NAGASAWA 2008 há conceitos religiosamente adequados de Deus que não requerem que Deus possa esses atributos Ateístas globais poderiam objetar que mesmo se o ateísmo e o naturalismo metafísico não forem idênticos a crença no primeiro pode ser baseada na crença no segundo por outras palavras se uma pessoa dispõe de bons argumentos para a visão de que a natureza é um sistema fechado então isso remove qualquer ônus de considerar cada conceito de Deus separadamente contanto que todos os conceitos legítimos de Deus impliquem que Deus é uma entidade sobrenatural ou seja uma entidade que não é natural e que no entanto afeta a natureza A possibilidade de que essa estratégia funcione ou não para justificar o ateísmo global depende de ser possível definir naturalismo de forma estreita o bastante para implicar a nãoexistência de todos os Deus mas não de forma tão estreita a ponto de não poderem ser fornecidos argumentos convincentes em defesa de sua verdade Está não é uma tarefa simples especialmente em razão do trabalho recente a respeito de variantes naturalistas do teísmo p ex Bishop 2008 Buckareff Nagasawa 2016 Parte V Diller Kisher 2013 Parte X e Ellis 2014 Nem tampouco é óbvio que os argumentos evidenciais baseados na existência do mal possam ser estendidos para cobrir todos os conceitos legítimos de Deus embora se dê o caso de que se todos os teísmos genuínos implicam que a realidade última é a um só tempo alinhada com o bem e de valor salvífico em algum sentido religiosamente adequado de última e salvífico então talvez possam ser O ponto crucial no entanto é que até agora ninguém apresentou uma argumentação voltada para tanto A respeito da questão quanto ao que exatamente conta como um conceito de Deus legítimo e religiosamente adequado podemse encaminhar várias abordagens Uma estratégia geral consiste em identificar o papel ou papéis religiosos que qualquer coisa merecedora do nome ou título de Deus deve desempenhar e em seguida distinguir os conceitos legítimos ou ilegítimos de Deus a depender da questão referente a se alguma coisa que seja subsumida pelo conceito em questão poderia ou haveria de desempenhar tal papel vide LE POIDEVIN 2010 p 52 LEFTOW 2016 p 6671 Uma segunda abordagem compatível com a primeira pressupõe de maneira plausível que a palavra Deus é um título e não um nome próprio e em seguida indaga que qualificações são requeridas para portar este título PIKE 1970 O fato de que a maior parte dos títulos indicam ou uma posição ou uma 264 função sugere que o significado de Deus tem algo a ver ou com a ocupação de uma posição em uma hierarquia ou com o desempenho de uma função Por exemplo a usual definição dicionarizada de Deus como o Ser Supremo e a ideia anselmiana de Deus como o maior ser possível sugerem que o título de Deus indica posição hierárquica ao passo que a definição de Deus como o regente do universo se enquadra bem com a visão de que Deus é um título indicativo de função e explica por que o usual nome para designar uma classe deus poderia ser definido como o regente de alguma parte do universo ou de alguma esfera de atividade humana por exemplo Netuno o deus do mar e Marte o deus da guerra Uma terceira abordagem compatível com as duas primeiras consiste em partir da conexão estreita em significado entre Deus e adoração A adoração parece ser essencial às religiões teístas e portanto um papel essencial que qualquer ser deve desempenhar para se qualificar para o título de Deus é o de ser um objeto apropriado de adoração De fato embora haja aqui um risco de circularidade se o termo adoração for definido em termos das ações ou atitudes apropriadamente voltadas para Deus não haveria nenhum erro óbvio na alegação de que ser digna de alguma forma de adoração religiosa não é apenas necessário para a divindade mas também suficiente especialmente se ser digna de adoração acarreta ser digna de lealdade É claro que as formas de adoração variam amplamente de uma religião para a outra de modo que mesmo que ser digno de adoração seja a única característica definidora de Deus isso não significa que as crenças sobre como são esses Deuses não vão variar amplamente de uma religião para a outra Em algumas religiões especialmente mas não unicamente certas religiões monoteístas ocidentais a adoração engloba uma devoção total e um comprometimento incondicional Ser digno deste tipo de adoração se isso for sequer possível quando os adoradores em potencial são agentes autônomos como a maior parte dos seres humanos adultos requer um Deus especialmente impressionante embora seja uma matéria controversa se a condição requer ou não um Deus perfeito Se for virtuosa a ambiguidade resultante de uma definição de Deus em termos de dignidade para ser adorado então uma pessoa poderia se sentir tentada a adotar a seguinte explicação do ateísmo global e de seu oposto o ateísmo versátil Ateísmo global não existem seres dignos de adoração religiosa 265 30 NT Usouse para essa passagem de Hume a tradução presente no seguinte volume HUME D História Natural da Religião Tradução de Prof Jaimir Conte São Paulo Edunesp 2004 Ateísmo versátil existe ao menos um ser que é digno de alguma forma de adoração religiosa Notese que segundo esta explicação de ateísmo global o ateísta nega a existência de seres que sejam dignos de adoração Assim nem mesmo um ateísta global fica comprometido com a negação da existência de tudo aquilo que alguém chamou de deus ou Deus Por exemplo mesmo se os antigos egípcios adoraram o sol e o julgavam digno de tal adoração o ateísta global não precisa negar a exigência do sol Em vez disso o ateísta global pode alegar que os antigos egípcios estavam equivocados ao pensarem que o sol é digno de adoração religiosa De maneira semelhante considerese esta passagem no começo da Seção XI de A História Natural da Religião de David Hume Se examinarmos sem preconceitos a antiga mitologia pagã tal como a encontramos nos poetas não descobriremos nela absurdos tão monstruosos quanto podemos a princípio ser capazes de recear Onde está a dificuldade em conceber que os mesmos poderes ou princípios quaisquer que sejam eles que formaram este mundo visível os homens e os animais produziram também uma espécie de criaturas inteligentes de uma substância mais refinada e dotada de maior autoridade do que o resto Concebese facilmente que essas criaturas podem ser caprichosas vingativas apaixonadas e voluptuosas e não existe circunstância mais adequada para engendrar tais vícios entre os homens do que a permissão da autoridade absoluta Em suma todo o sistema mitológico é tão natural que na imensa variedade de planetas e mundos contidos neste universo parece mais provável que seja realmente levado a efeito numa ou noutra parte HUME 1757 1956 p 53 grifo acrescentado30 266 Há muito debate a respeito de Hume ter sido um ateísta ou um deísta ou nenhuma das duas coisas mas ninguém usa essa passagem em apoio à posição de que ele era na verdade um politeísta Talvez isso se passe desta forma porque mesmo que existam seres alienígenas naturais que de modo muito semelhante aos deuses gregos e romanos possuem um poder muito superior ao dos seres humanos mas bastante semelhantes nas suas qualidades morais e em outras qualidades psicológicas pôdese presumir que ninguém ao menos nos dias correntes ficaria tentado a vêlos como dignos de adoração religiosa Um possível defeito na explicação aqui proposta para o ateísmo global é o parecer implicar uma sobreposição entre o deísmo e o ateísmo Naturalmente não faz muito tempo que todos os deístas eram amplamente considerados ateístas Hoje em dia no entanto os termos ateísta deísta ou deísta ateísta soam como oxímoros Naturalmente nem todos os deístas passariam por ateístas nos termos da explicação proposta mas alguns passariam Por exemplo considerese um deísta que acredita que embora uma pessoa sobrenatural tenha projetado o universo tal deidade não tinha nenhuma intenção específica de que a vida inteligente se desenvolvesse e que não tem absolutamente nenhum interesse na condição e no destino de tal forma de vida Uma tal deidade não seria digna da adoração de ninguém especialmente se ser digno de adoração implicar ser digno de lealdade e assim pôdese argumentar que não seria um deus teísta o que implica que um ateísta poderia consoante a definição proposta acreditar na existência de uma tal deidade Talvez então o ateísmo global devesse ser definido como a posição para a qual tanto o teísmo versátil quanto o deísmo versátil são falsos e que não existem seres dignos de adoração religiosa nem tampouco criadores cósmicos ou projetistas inteligentes quer sejam dignos de adoração e de lealdade ou não Contudo mesmo esta explicação do ateísmo global pode não ser suficientemente inclusiva visto que há papéis religiosos associados estreitamente com o título de Deus e como tal noções legítimas de Deus passíveis de defesa argumentativa que poderiam ser desempenhadas por algo que não é nem um objeto apropriado de adoração nem um projetista cósmico ou criador 4 Um argumento em defesa do agnosticismo De acordo com uma forma relativamente modesta de agnosticismo nem o teísmo versátil nem sua negação o ateísmo global são conhecidos em sua 267 veracidade Robin Le Poidevin 2010 p 76 argumenta em defesa desta posição da seguinte forma 1 Não existe uma base firme sobre a qual se possa julgar que o teísmo ou o ateísmo seja intrinsecamente mais plausíveis do que o outro 2 Não existe uma base firme sobre a qual se possa julgar que a totalidade da evidência seja mais favorável ao teísmo ou ao ateísmo do que ao outro Seguese de 1 e 2 que 3 Não existe uma base firme sobre a qual se possa julgar que o teísmo ou o ateísmo seja mais provável do que o outro De 3 seguese que 4 O agnosticismo é verdadeira não é conhecida a verdade nem do teísmo nem do ateísmo Le Poidevin toma teísmo no sentido mais amplo que eu tomo como referência à proposição de que existe um ser que é a causa última e intencional da existência do universo e a fonte última do amor e do conhecimento moral 2010 p 52 Ele não usa o termo teísmo versátil mas essa seria sua explicação de seu significado Por probabilidade intrínseca ele pretende significar grosso modo a probabilidade que uma proposição possui antes que a evidência comece a chegar 2010 p 49 Esta probabilidade depende exclusivamente de considerações a priori tais como as características intrínsecas da questão por exemplo o tamanho do seu conteúdo Le Poidevin defende a primeira premissa do seu argumento ao afirmar que embora seja plausível sustentar que a probabilidade intrínseca depende em proporção inversa da especificidade de uma alegação quanto mais específica for a alegação mais formas tem de ser verdadeira e assim maior é a probabilidade de que seja verdadeira é impossível mostrar que o teísmo versátil é mais específico ou menos específico do que sua negação Está defesa parece estar incompleta 268 pois Le Poidevin nunca mostra que a probabilidade intrínseca de uma proposição depende apenas de sua especificidade e há boas razões para crer que não é caso vide SWINBURNE 2001 p 80102 Le Poidevin poderia responder no entanto que a especificidade é o único critério incontroverso de probabilidade intrínseca e esta ausência de consenso quanto aos outros critérios é tudo de que se precisa para uma defesa adequada da premissa 1 Uma maneira de defender a segunda premissa consiste em revisar a evidência disponível e argumentar que o seu valor é ambíguo LE POIDEVIN 2010 cap 4 DRAPER 2002 Uma outra maneira consiste em assinalar que o ateísmo que é apenas a proposição de que o teísmo é falso é compatível com uma variedade de posições muito distintas e que estas hipóteses variam amplamente no que toca questão de quão bem estas distintas hipóteses ateístas explicam a totalidade da evidência Assim para avaliar quão bem o ateísmo explica a totalidade da evidência seria necessário calcular uma média ponderada de quão bem estas distintas hipóteses ateístas explicam a totalidade da evidência num cenário em que as ponderações seriam as distintas probabilidades intrínsecas de cada uma destas hipóteses ateístas Tal tarefa parece comportar uma dificuldade proibitiva DRAPER 2016 e de qualquer forma não foi tentada o que dá suporte à alegação de que não existe uma base firme sobre a qual ajuizar se a totalidade da evidência apoia o teísmo ou o ateísmo Os assim chamados epistemologistas reformados vide PLANTINGA 2000 poderiam contestar a segunda premissa do argumento com o fundamento de que muitas crenças a respeito de Deus assim como muitas crenças a respeito do passado são apropriadamente básicas um resultado do funcionamento de uma faculdade cognitiva básica chamada de sensus divinitatis e assim sendo são com efeito parte da totalidade da evidência com referência à qual depende a probabilidade de qualquer afirmação O agnóstico no entanto poderia retrucar que este senso do divino diferentemente da memória quando muito opera esporadicamente e de uma maneira muito longe de ser universal Além disso diferentemente de outras faculdades cognitivas básicas pode ser facilmente um objeto de resistência e a existência das crenças que ele supostamente produz pode ser facilmente explicada sem supor em absoluto que a faculdade exista Assim a analogia com a memória é fraca Portanto na ausência de alguma base mais firme para julgar que as crenças a respeito de Deus são apropriadamente uma parte do fundamento dos sistemas de crenças de alguns teístas a premissa 2 segue forte 269 Naturalmente mesmo se forem verdadeiras as duas premissas do argumento de Le Poidevin não se segue que o argumento seja bom Pois o argumento também contém duas inferências dos passos 1 e 2 para o passo 3 e do passo 3 para o passo 4 nenhuma das quais é obviamente correta Acerca da primeira inferência suponhase por exemplo que embora não haja uma base firme para julgar acerca do teísmo e o ateísmo qual deles possui maior probabilidade intrínseca ou seja que a primeira premissa de Le Poidevin seja verdadeira há uma base firme para julgar que o teísmo não é muitas vezes mais provável intrinsicamente do que alguma versão específica de ateísmo digamos o fisicalismo reducionista E suponhase que embora não haja uma base firme para julgar acerca do teísmo e do ateísmo qual deles tem a seu favor a totalidade da evidência ou seja que a segunda premissa de Le Poidevin seja verdadeira há uma base firme para julgar que a totalidade da evidência favorece muito fortemente o fisicalismo contra o teísmo no sentido de que é por antecedência muitas vezes mais provável em se tendo como dado o fisicalismo reducionista do que o é em sendo dado o teísmo Então segue se que ambas as premissas de Le Poidevin são verdadeiras e que no entanto 3 é falsa há uma base firme que inclui a versão probabilística do teorema de Bayes aplicado ao teísmo e ao fisicalismo reducionista em vez de ao teísmo e ao ateísmo para julgar que o fisicalismo reducionista é mais provável ou até mesmo muitas vezes mais provável do que o teísmo e que por conseguinte o teísmo é provavelmente falso ou até mesmo muito provavelmente falso Poderseia argumentar que nenhuma estratégia semelhante poderia ser usada para mostrar que o teísmo é provavelmente verdadeiro a despeito de serem verdadeiras ambas as premissas de Le Poidevin Assim pode se dar o caso de que as premissas de Le Poidevin caso sejam adequadamente apoiadas estabeleçam que o gnosticismo teísta é falso ou seja que ou o agnosticismo ou o gnosticismo ateísta é verdadeiro mesmo se não estabelecerem que o agnosticismo é verdadeiro 5 Um argumento em defesa do ateísmo global Quase todos os bem conhecidos argumentos a favor do ateísmo são argumentos a favor de alguma versão de ateísmo local Uma possível exceção a esta regra é um argumento tornado popular recentemente por alguns Novos Ateístas embora não tenha sido inventado por eles Gary Gutting 2013 chama esse argumento de argumento da ausência de argumentos a favor do ateísmo 270 1 A ausência de bons argumentos para acreditar que Deus existe é por si mesma uma boa razão para acreditar que Deus não existe 2 Não há nenhuma boa razão para acreditar que Deus que existe De 1 e 2 seguese que 3 Há uma boa razão para acreditar que Deus não existe Percebase a óbvia relevância deste argumento para o agnosticismo De acordo com um membro proeminente da família de argumentos do agnosticismo não temos boas razões para acreditar que Deus existe e não temos boas razões para acreditar que Deus não existe É claro que se for verdadeira a primeira premissa deste argumento então esta versão do agnosticismo deve ser falsa Será que o argumento da ausência de argumentos pode ser interpretado como um argumento em defesa do ateísmo global Poderseia objetar que não o é visto que sua conclusão não é a de que o ateísmo é verdadeiro mas em vez disso a de que há uma boa razão para acreditar que o ateísmo é verdadeiro Mas isto é apenas uma implicância impertinente Em última análise a possibilidade de usar este argumento para defender o ateísmo global depende de como é defendida a primeira premissa O modo usual de defendêla consiste em derivála de algum princípio geral de acordo com o qual a carência de fundamentos para alegações de um certo tipo é uma boa razão para rejeitar tais alegações A restrição deste princípio para alegações de um certo tipo é crucial visto que é tanto obviamente falso o princípio de que a ausência de fundamentos para uma alegação se constitui em todos os casos numa boa razão para crer que a alegação seja falsa Alguém poderia por exemplo carecer de fundamentos para acreditar que o próximo lançamento de uma moeda dará coroa mas isso não é uma boa razão para acreditar que dará coroa Uma abordagem mais promissora restringe o princípio a alegações de existência tornandoo por esse meio uma versão da navalha de Ockham De acordo com esta versão do princípio a ausência de fundamentos em apoio a uma afirmação existencial positiva como Deus existe seja lá como se entenda Deus 271 se constitui numa boa razão para acreditar que a afirmação é falsa MCLAUGHLIN 1984 Uma objeção a esse princípio vem do fato de que nem todo tipo de coisa é tal que se existisse então seria provável que tivéssemos muito boas razões para acreditar que exista Considerese por exemplo a vida inteligente em galáxias distantes vide MORRIS 1985 Talvez contudo um princípio restringido de maneira ainda mais estreita faria o truque sempre que a assunção de que uma afirmação existencial positiva é verdadeira levaria uma pessoa à expectativa de ter fundamentos para a sua verdade então a ausência de tais fundamentos se constitui numa boa razão para acreditar que a alegação seja falsa Poderseia então argumentar que i um Deus provavelmente nos forneceria evidência convincente de Sua existência e então ii a ausência de tal evidência se constitui numa boa razão para acreditar que Deus não existe Isso transforma o argumento da ausência de argumentos em um argumento fundamentado na ocultação divina Também o transforma na melhor das hipóteses em um argumento a favor do ateísmo local visto que mesmo se digamos o Deus do teísmo clássico não houvesse de se esconder nem todos os conceitos legítimos de Deus são tais que um ser que instanciasse um tal conceito provavelmente nós forneceria evidência convincente de aos existência 6 Dois argumentos a favor do ateísmo local 61 Como argumentar em defesa do ateísmo local O tipo de Deus em cuja nãoexistência os filósofos parecem mais interessados é o Deuscriador eterno nãofísico onipotente onisciente e onibenevolente ou seja moralmente perfeito adorado por muitos muçulmanos judeus e cristãos ortodoxos de um ponto de vista teológico Chamemos de oniteísmo a proposição de que existe um Deus deste tipo Uma questão interessante então é aquela a respeito do ateísmo entendido de forma local como sendo a proposição de que o oniteísmo é falso Alegase com frequência que é impossível um bom argumento a favor do ateísmo porque embora seja ao menos possível provar que existe alguma coisa de um certo tipo é impossível provar que nada deste tipo existe Uma das razões para rejeitar essa alegação é o fato de que as descrições de alguns tipos de objetos 272 são autocontraditórias Por exemplo podemos provar que não existe nenhum círculo quadrado porque um tal objeto teria de ser circular e nãocircular o que é impossível Assim sendo uma das maneiras de argumentar a favor da nãoexistência do Deus do oniteísmo ou de um oniDeus para encurtar consiste em argumentar que um tal Deus é um objeto impossível como um quadrado circular Muitas tentativas foram feitas para construir tais argumentos Por exemplo alegouse que um ser onibenevolente seria impecável e assim incapaz de agir mal ao passo que um ser onipotente seria inteiramente capaz de fazer coisas que seria errado fazer Existem contudo respostas sofisticadas e plausíveis para argumentos como estes E o mais importante é que mesmo se um tal argumento fosse bemsucedido os oniteístas poderiam alegar de forma plausível que por onipotente eles querem significar não um ser poderoso no grau máximo mas um ser poderoso no grau mais otimizado em que o grau ótimo de poder poderia não ser o grau máximo caso o grau máximo exclua a posse num grau ótimo de outras perfeições tais como a bondade moral Problemas semelhantes afrontam as tentativas de mostrar que o oniteísmo deve ser falso por ser incompatível com certos fatos conhecidos a respeito do mundo Tais argumentos tipicamente dependem de interpretações detalhadas e contestadas de atributos divinos como a onibenevolência Uma abordagem muito diferente baseiase na ideia de que uma prova negativa não precisa ter um caráter demonstrativo O objetivo desta abordagem é mostrar que a existência de um oniDeus é tão improvável que está justificada uma crença confiante na nãoexistência de um tal Deus Dois desses argumentos são discutidos abaixo em detalhes o argumento da baixa probabilidade antecedente e o argumento da evidência decisiva Cada um desses argumento emprega a mesma estratégia específica que consiste é a de argumentar que alguma hipótese alternativa ao oniteísmo é muitas vezes mais provável do que o oniteísmo Isso não implica que a hipótese alternativa seja provavelmente verdadeira mas de fato implica que o oniteísmo é muito provavelmente falso No caso do segundo argumento poderseia argumentar que a hipótese alternativa o deísmo estético é uma forma de teísmo e mesmo no caso do primeiro argumento se poderia argumentar que a hipótese alternativa o fisicalismo da fonte é compatível com algumas formas de teísmo em particular aquelas em que Deus é uma entidade emergente Este não é contudo um problema para qualquer dos argumentos porque são ambos argumentos a favor do ateísmo local e não do ateísmo global 273 62 O argumento da baixa probabilidade antecedente A ideia básica por trás do argumento da baixa probabilidade antecedente é a de que mesmo que o agnóstico esteja certo quando se trata da existência de Deus a evidência é ambígua ou de todo ausente o que se segue não é que o teísmo tenha uma probabilidade mediana quando tudo é levado em conta mas em vez disso que o teísmo é muito provavelmente falso Dizse que a conclusão se segue porque o teísmo já começa à partida com uma probabilidade muito baixa antes de levar em conta qualquer evidência Evidência neste contexto referese a fatores extrínsecos a uma hipótese que aumentam ou abaixam a sua probabilidade Visto que uma evidência ambígua ou ausente não tem nenhum efeito sobre esta probabilidade antecedente ou intrínseca a probabilidade posterior ou a probabilidade quando tudo é levado em conta do teísmo é também muito baixa Se contudo o teísmo é muito provavelmente falso então o ateísmo deve ser muito provavelmente verdadeiro e isto implica de acordo com o defensor do argumento que está justificada a crença ateísta Está última alegada implicação é examinada na seção 7 Este tipo de argumento é muito relevante para a questão relativa a ser o teísmo ou o ateísmo a posição apropriada à partida Se o teísmo possuir uma probabilidade intrínseca suficientemente baixa então podese argumentar que o ateísmo é a posição correta à partida no sentido de que evidências ambíguas ou inexistentes justificarão não que se suspenda o julgamento quanto à questão da existência de Deus mas em vez disso que se acredite que Deus não existe Essa é a razão pela qual o argumento de Le Poidevin em defesa do agnosticismo inclui não apenas uma premissa asserindo que a evidência relevante é ambígua mas também uma premissa asserindo que ao menos no caso do teísmo versátil estamos no escuro quando se trata da questão relativa a ter o teísmo ou o ateísmo a maior probabilidade intrínseca Infelizmente muito da discussão a respeito de que posição é a posição correta à partida ou quanto a quem tem o ônus da prova é desencaminhada por analogias ruins com Papai Noel monstros voadores feitos de espaguete e a famosa analogia de Bertrand Russell com um bule de chá numa órbita elíptica ao redor do sol Para encontrar críticas a algumas destas analogias confira os trabalhos de Garvey 2010 e van Inwagen 2012 O argumento da baixa probabilidade antecedente se dirige implicitamente a esta importante questão de uma maneira muito mais sofisticada e promissora Na versão do argumento de baixa probabilidade antecedente apresentada abaixo a abordagem descrita acima é aprimorada com uma comparação do 274 oniteísmo não simplesmente com a sua negação mas no lugar disso com uma hipótese ateísta mais sofisticada chamada de fisicalismo da fonte Diferentemente do fisicalismo ontológico o fisicalismo da fonte é uma alegação a respeito da fonte de entidades mentais não da sua natureza Alguns fisicalistas da fonte quer sejam fisicalistas ontológicos ou dualistas ontológicos acreditam que o mundo físico existiu antes do mundo mental e causou a existência do mundo mental o que implica que todas as entidades mentais estão em dependência causal de entidades físicas Ademais mesmo se forem dualistas ontológicos os fisicalistas da fonte não precisam alegar que as entidades mentais nunca são a causa de entidades físicas ou de outras entidades mentais mas eles devem alegar que não existiriam entidades mentais se não fosse pela existência prévia e potência causal de uma ou mais entidades físicas O argumenta procede da seguinte forma 1 A totalidade da evidência não favorece o oniteísmo em seu confronto com o fisicalismo da fonte 2 O fisicalismo da fonte é intrinsecamente muitas vezes mais provável do que o oniteísmo De 1 e 2 seguese que 3 O fisicalismo da fonte é muitas vezes mais provável do que o oniteísmo De 3 se segue que 4 O Oniteísmo é muito provavelmente falso De 4 se segue que 5 O ateísmo aqui compreendido como a negação do oniteísmo é muito provavelmente verdadeiro Apenas as duas premissas do argumento os passos 1 e 2 são controversos Os outros passos do argumento claramente se seguem todos dos passos anteriores 275 Um exame minucioso dos argumentos favoráveis e contrários à premissa 1 é claramente impossível aqui mas vale a pena mencionar que uma defesa desta premissa não precisa alegar que os fatos conhecidos que os teólogos naturais tipicamente julgam favorecer o oniteísmo em confronto com hipóteses concorrentes como o fisicalismo da fonte não possuem nenhuma força Em vez disso poderia alegarse que qualquer força que possuam é contrabalançada ao menos em algum grau significativo por fatos mais específicos que favorecem o fisicalismo da fonte em seu confronto com o oniteísmo Os teólogos naturais desconsideram rotineiramente estes fatos mais específicos e assim parecem cometer a que poderia ser chamada de a falácia da evidência desvalorizada Para ser mais preciso este é o ponto Mesmo quando os teólogos naturais alcançam êxito em identificar algum fato geral acerca de um tópico que seja mais provável em se aceitando o oniteísmo do que o fisicalismo da fonte eles desconsideram outros fatos mais específicos acerca daquele mesmo tópico fatos que em sendo dado o fato geral parecem ser significativamente mais prováveis para o fisicalismo da fonte do que para o oniteísmo Por exemplo mesmo se o oniteísmo for apoiado pelo fato geral de que o universo é complexo não se deveria ignorar o fato mais específico descoberto pelos cientistas de que subjacente a esta complexidade no nível em que temos experiência do universo está um universo primevo muito mais simples do qual está complexidade surgiu e também um universo muito mais simples no nível micro um universo que consiste de um número relativamente pequeno de diferentes tipos de partículas todas as quais existem em um dentre um número relativamente reduzido de estados Em suma é importante levar em conta não apenas o fato geral de que o universo do qual temos experiência direta é extremamente complexo mas também o fato mais específico de que dois tipos de complexidade oculta no universo podem explicar tal complexidade Dada a existência de um universo complexo este fato mais específico é exatamente o que se esperaria com base no fisicalismo da fonte porque como dizem os melhores teólogos naturais vide SWINBURNE 2004 a complexidade do universo clama por uma explicação em termos de alguma coisa mais simples Não existe contudo nenhuma razão para esperar por este fato mais específico com base no oniteísmo visto que se os mesmos teólogos naturais estiverem certos então um Deus simples fornece uma explicação simples a complexidade observada do universo quer tal complexidade seja ou não explicada também por quaisquer causas físicas mediadoras mais simples Um outro exemplo diz respeito à consciência Sua existência de fato parece ser mais provável em se aceitando o oniteísmo do que em se aceitando o fisicalismo 276 da fonte e portanto parece aumentar a razão entre a probabilidade do oniteísmo e a probabilidade do fisicalismo da fonte Mas conhecemos muito mais acerca da consciência do que o fato de que ela existe Também sabemos em parte graças à disciplina relativamente recente da neurociência que os estados de consciência em geral e até mesmo a própria inteireza de nossas personalidades para não mencionar a aparente unidade do eu são dependentes num grau muito elevado de eventos físicos que ocorrem no cérebro Dado o fato geral de que a consciência existe temos razões compatíveis com o fisicalismo da fonte que não temos com o teísmo para esperar esses fatos mais específicos Em sendo dado o teísmo não seria em absoluto surpreendente que nossas mentes fossem mais independentes do cérebro do que de fato são Afinal de contas se o oniteísmo for verdadeiro então ao menos uma mente a de Deus não depende em absoluto de nada que seja físico Assim quando se apresenta inteiramente a evidência disponível a respeito da consciência fica longe de ser algo claro que ela seja significativamente mais favorável ao oniteísmo Problemas semelhantes ameaçam solapar os apelos feitos à sintonia fina ou seja apelos ao fato de que um bom número de parâmetros físicos aparentemente independentes possuam valores que embora não sejam fixados pela teoria física corrente não obstante vêm a estar dentro dos limites relativamente estreitos que permitem a existência da vida supondose que não haja mudanças em outros parâmetros Poderseia argumentar dado que a sintonia fina é requerida para o surgimento de vida inteligente e que um oniDeus tem razões para criar a vida inteligente então temos mais razões para esperar a sintonia fina em sendo dado o oniteísmo do que em sendo dado o fisicalismo da fonte Dada tal sintonia fina no entanto surpreende muitíssimo mais em se tomando como verdadeiro o oniteísmo do que o fisicalismo da fonte o fato de que nosso universo não está transbordando de vida inteligente e que os organismos inteligentes mais impressionantes que conhecemos são meros seres humanos primatas autocentrados e agressivos que com demasiada frequência matam violentam e torturam uns aos outros Numa concessão justa ao oniteísmo contudo devese admitir que a maior parte desses seres humanos são agentes morais e que muitos têm experiências religiosas que aparentam ser de Deus O problema é que embora a existência de agentes morais seja mais bem prevista pelo oniteísmo do que pelo fisicalismo da fonte também é verdade que dada a sua existência a variedade e a frequência de condições facilmente evitáveis que promovem um comportamento moralmente ruim e que limitam severamente a liberdade a atuação e a autonomia de incontáveis 277 seres humanos são muito mais prováveis no fisicalismo da fonte E embora experiências religiosas que aparentam ser de Deus são sem dúvida mais de se esperar se existir um oniDeus do que se os seres humanos forem o produto de forças físicas cegas também é verdade que dado que tais experiências ocorrem vários fatos atinentes à sua distribuição que deveriam se mostrar surpreendentes para os teístas são exatamente o que se esperaria no fisicalismo da fonte tal como o fato de que muitas pessoas nunca as tiveram e o fato de que aqueles que de fato as têm quase sempre já têm uma crença em Deus anterior ou uma exposição extensa a uma religião teísta Parece então que no tocante à evidência favorável ao oniteísmo em seu confronto com o fisicalismo da fonte o Senhor dá e o Senhor retira Além disso em combinação com o fato de que aquilo que conhecemos sobre o nível de bemestar dos seres sencientes e a extensão do seu sofrimento é tal que se poderia argumentar que é enormemente mais provável em se aceitando o fisicalismo da fonte do que o teísmo podese construir uma argumentação muito forte ainda que reconhecidamente controversa em defesa da premissa 1 E quanto à premissa 2 Uma séria argumentação pode ser construída em defesa de sua verdade Tal argumentação de início compara o fisicalismo da fonte não com o oniteísmo mas com o seu oposto o idealismo da fonte Idealistas da fonte acreditam que o mundo mental existia antes de existir o mundo físico e que causou a sua existência Esta concepção é consistente tanto com o idealismo ontológico quanto com o dualismo ontológico e também com o fato de as entidades físicas exercerem efeitos tanto mentais quanto físicos Dele se segue no entanto que todas as entidades físicas são em última análise dependentes do ponto de vista causal de uma ou mais entidades mentais e portanto não é consistente com o fisicalismo ontológico A simetria do fisicalismo da fonte e do idealismo da fonte se constitui numa boa razão pro tanto para se acreditar que sejam ambos igualmente prováveis intrinsecamente São ambos específicos possuem os mesmos compromissos ontológicos nem um dos pode ser formulado de maneira mais elegante do que o outro e cada qual parece ser igualmente coerente e igualmente inteligível Diferem quanto à questão de que coisas seriam dependentes de que outras coisas mas se Hume estiver certo e as relações de dependência causal só puderem ser descobertas mediante a observação e não a priori então isto não afetará as probabilidades intrínsecas das duas hipóteses O oniteísmo contudo é uma versão muito específica do idealismo da fonte implica que o idealismo da fonte é verdadeiro mas vai muito além do idealismo 278 da fonte por fazer uma diversidade de alegações muito específicas acerca do tipo de mundo mental que produziu o mundo físico Por exemplo adiciona a alegação de que uma única mente criou o universo físico e que esta mente não é apenas poderosa mas de maneira específica onipotente e não apenas sapiente mas de maneira específica onisciente Ademais pressupõe uma gama de alegações metafísicas e metaéticas controversas ao asserir além disto que este ser é eterno e moralmente perfeito Se qualquer uma dessas alegações e pressuposições for falsa então o oniteísmo é falso Assim o oniteísmo é uma forma muito específica e como tal intrinsecamente muito arriscada de idealismo da fonte e assim é muitas vezes menos provável do que o idealismo da fonte Portanto se como se argumentou acima o fisicalismo da fonte e o idealismo da fonte possuem uma probabilidade intrínseca igual então seguese que a premissa 2 é verdadeira o fisicalismo da fonte é muitas vezes mais provável intrinsecamente do que o oniteísmo 63 O argumento da evidência decisiva Notese que a estratégia geral da versão particular do argumento da baixa probabilidade antecedente discutida acima consiste em encontrar uma alternativa para o oniteísmo que seja muito menos específica do que o oniteísmo e em parte por esta razão muito mais intrinsecamente provável mantendo ao mesmo tempo um conteúdo suficiente do tipo correto para se ajustar à totalidade dos dados relevantes pelo menos tão bem quanto o teísmo o faz Por outras palavras o objetivo é o de encontrar um corredor como o fisicalismo da fonte que começa a corrida com uma grande vantagem sobre os competidores e assim ganha por uma larga margem porque disputa a corrida pela evidência que a corrobora e com isso a disputa pela maior probabilidade aproximadamente na mesma velocidade que o oniteísmo o faz Isso não mostra que o fisicalismo da fonte seja provável uma larga margem neste contexto significa um amplo quociente entre uma probabilidade e a outra não uma grande diferença entre probabilidades porque pode até haver melhores corredores na corrida contudo mostra que o oniteísmo perde a corrida por uma larga margem sendo assim muito provavelmente falso Uma estratégia alternativa consiste em encontrar um corredor que começa a corrida empatado com o oniteísmo mas que disputa a corrida em busca de apoio na evidência muito mais rapidamente do que o oniteísmo o faz assim uma vez mais vencendo a corrida por uma margem que é suficientemente larga para que 279 31 NT O autor utiliza nessa passagem um conhecido verso de William Shakespeare em As you like it Na tradução brasileira Bárbara Heliodora dispensa o advérbio que nesse caso é enfatizado pelo autor do verbete Pela boca do personagem Jaques dizse O mundo é um grande palco e os homens e mulheres são atores SHAKESPEARE W Como quiserem In SHAKESPEARE W William Shakespeare Teatro Completo Volume 2 Tradução de Bárbara Heliodora São Paulo Editora Nova Aguilar 2016 Ato 2 Cena 7 p 846 o restante do argumento prospere Um bom nome para um argumento que siga essa segunda estratégia é o argumento da evidência decisiva A escolha de uma hipótese alternativa é aqui tão crucial quanto foi para o argumento da baixa probabilidade antecedente Uma escolha promissora é o deísmo estético uma outra seria uma versão mais detalhada do fisicalismo da fonte que diferentemente do fisicalismo da fonte em geral confere aos dados relevantes uma probabilidade antecedente muito maior do que o teísmo o faz Para assegurar que o oniteísmo e o deísmo estético comecem a corrida na mesma linha de partida ou seja que tenham a mesma probabilidade intrínseca o deísmo estético é definido da melhor maneira de uma tal forma que seja quase idêntico ao oniteísmo Assim sendo podese estipular que como o oniteísmo o deísmo estético implica que um ser eterno nãofísico onipotente e onisciente criou o mundo físico A única diferença então entre o Deus do oniteísmo e a deidade do deísmo estético está no que os motiva Um Deus oniteísta seria moralmente perfeito e por isso fortemente motivado por considerações relativas ao bemestar das criaturas sencientes Um Deus do deísmo estético por sua vez conferiria prioridade aos bens estéticos de preferência aos bens morais Conquanto um tal ser houvesse de desejar um belo universo talvez a melhor metáfora aqui seja não a de um artista cósmico mas em vez disso aquela de um dramaturgo cósmico um autor que quer acima de tudo escrever uma estória interessante Como todos sabem estórias boas nunca começam com a linha e viveram felizes para sempre e se trata da última de qualquer estória que a contenha Além disso sua existência está longe de ser obrigatória para que uma estória seja boa Se o deísmo estético for verdadeiro então bem pode ser verdade que o mundo todo é um palco e todos os homens e as mulheres são meramente atores grifo acrescentado31 Seja como for a hipótese do deísmo estético faz previsões a respeito da condição dos seres sencientes no mundo que são muito diferentes daquelas feitas pela hipótese do oniteísmo Afinal aquilo que faz uma boa estória 280 ser boa com frequência consiste em alguma luta intensa entre o bem e o mal e todas as boas estórias contém alguma mistura de benefícios e danos Isto sugere que a mistura observada de bem e mal no nosso mundo favorece decisivamente o deísmo estético em seu confronto com o oniteísmo E se isto estiver correto então o deísmo estético dispara bem na frente do oniteísmo na corrida para ser mais provável com isso provando que o oniteísmo é muito improvável Aqui vai uma possível formulação deste argumento 1 O deísmo estético tem no mínimo tanta probabilidade intrínseca quanto o oniteísmo 2 A totalidade da evidência excluídos os dados sobre o bem e o mal não favorece o oniteísmo em seu confronto com o deísmo estético 3 Dada a totalidade da evidência com a exclusão dos dados sobre o bem e o mal os dados sobre o bem e o mal favorecem fortemente o deísmo estético em seu confronto com o oniteísmo Seguese de 1 2 e 3 que 4 O deísmo estético é muitas vezes mais provável do que o oniteísmo De 4 seguese que 5 O oniteísmo muito provavelmente é falso De 5 seguese que 6 O ateísmo entendido aqui como a negação do oniteísmo é muito provavelmente verdadeiro Os passos 46 deste argumento são os mesmos que os passos 35 do argumento da baixa probabilidade antecedente exceto pelo fato de que o fisicalismo da fonte no argumento da baixa probabilidade antecedente é substituído no passo 4 do argumento da evidência decisiva Isto não faz nenhuma diferença 281 no que concerne à inferência do passo 4 para o passo 5 Tal inferência assim como as inferências dos passos 13 para o passo 4 e do passo 5 para o passo 6 é claramente correta A questão chave então é serem ou não verdadeiras todas as premissas 1 2 e 3 A despeito da sobreposição quase completa entre o oniteísmo e o deísmo estético Richard Swinburne 2004 p 96109 contestaria a premissa 1 com base na alegação de que o deísmo estético diferentemente do oniteísmo deve postular um desejo perverso para explicar por que a deidade não faz o que é moralmente o melhor O oniteísmo não precisa fazer isso de acordo com Swinburne porque o que é moralmente o melhor é simplesmente o que é o melhor quando tudo é levado em conta e assim sendo um ser onisciente necessariamente fará o que é moralmente o melhor com a condição de que não possua desejos diversos daqueles desejos que possui simplesmente em virtude de saber qual é a melhor coisa a ser feita em qualquer situação dada Essa contestação no entanto depende de um intelectualismo motivacional altamente questionável é exitosa apenas se a mera crença em que uma ação é boa acarreta um desejo de fazêla De acordo com a maioria das teorias da motivação existe uma lacuna lógica entre o intelecto e o desejo Se tal lacuna existir então pareceria se dar o caso de que o oniteísmo não possui uma maior probabilidade intrínseca do que o deísmo estético É difícil cogitar uma contestação plausível para a premissa 2 porque ao menos quando se trata da evidência usual tida como favorável ao teísmo em seu confronto sobre outras hipóteses que com ele competem tais como o naturalismo o deísmo estético explica tal evidência ao menos tão bem quanto o oniteísmo o faz Por exemplo uma deidade interessada numa boa narrativa desejaria um mundo que fosse complexo e no entanto ordenado que contivesse a beleza a consciência a inteligência e a capacidade de ser um agente moral Talvez existam mais razões para esperar a existência do livre arbítrio concebido em termos libertários em se aceitando o oniteísmo do que em se aceitando o deísmo estético mas a não ser que se aceite de partida o oniteísmo parece haver poucas razões para que acreditemos que possuímos tal liberdade E mesmo que se leve a sério a evidência introspectiva ou de outra natureza nãoteológica favorável à liberdade concebida em termos libertários não é difícil construir uma deodiceia nesse caso uma boa explicação nos termos do deísmo estético seja da existência da liberdade concebida à maneira libertária seja da razão pela qual existe evidência aparentemente forte mas em última análise enganosa de sua existência Por exemplo se os proponentes do teísmo aberto estiverem certos ao afirmarem que nem mesmo um ser onisciente 282 pode saber com certeza o que as escolhas livres concebidas à maneira libertária serão feitas no futuro então o deísmo estético poderia explicar a liberdade concebida à maneira libertária e outros tipos de indeterminismo com a alegação de que uma estória com surpresas genuínas é melhor do que uma que seja completamente previsível Numa visão alternativa o que poderia ser importante para a estória é apenas que os personagens pensem que possuem livre arbítrio não que realmente o possuam Por fim há a premissa 3 que assevera que os dados a respeito do bem do mal favorecem decisivamente o deísmo estético em seu confronto com o teísmo Neste contexto os dados a respeito do bem e do mal incluem tudo o que sabemos sobre como os seres sencientes incluindo os humanos são beneficiados ou prejudicados Uma discussão completa desta premissa não é possível aqui mas o reconhecimento de sua plausibilidade parece ser tão antigo quanto o próprio problema do mal Considere se por exemplo o Livro de Jó cujo protagonista um homem justo que sofre horrorosamente acusa Deus de carecer de um comprometimento suficiente com o valor moral da justiça A ampla maioria dos comentadores concordam em que Deus não responde diretamente à acusação de Jó Em vez disso falando do interior de um furacão Ele descreve o Seu desígnio do cosmos e do reino animal de uma maneira claramente voltada para enfatizar o Seu poder e a grandiosidade de Sua criação Não fosse por preocupações de ordem teológica a respeito das perfeições morais de Deus a interpretação mais natural desta parte da história seria ou a de que Deus concorda com a acusação de Jó de que Ele é injusto ou a de que Deus nega que seja sensato o emprego por parte de Jó de termos como justo ou injusto para se referir a Ele porque Ele e Jó não são membros de nenhuma comunidade moral partilhada MORRISTON no prelo vide STUMP 2010 cap 9 Essa é a razão pela qual a primeira resposta de Jó ao discurso de Deus antes da capitulação em sua segunda resposta consiste apenas na recusa de repetir sua acusação não respondida Segundo essa interpretação o criador que se confronta com Jó não é o Deus que ele esperava e definitivamente não é o Deus do oniteísmo mas um ser muito mais assemelhado à deidade do deísmo estético Aqueles que alegam que Deus poderia permitir a existência do mal porque este é o resultado inevitável de ser o universo governado pelas leis da natureza também fornecem um apoio ainda que não o façam intencionalmente à ideia de que se existe um autor da natureza então um tal ser tem maior probabilidade de ser motivado por preocupações estéticas do que morais Por exemplo podese dar o caso de que a produção de um universo governado por umas poucas leis passíveis de serem expressas como elegantes equações matemáticas seja uma realização impressionante não apenas por causa da sabedoria e do poder necessários para 283 uma tal empreitada mas também por causa do valor estético de um tal universo Contudo é bem possível que tal valor dependa de o criador escolher não intervir regularmente na natureza para proteger as Suas criaturas do mal Grande parte do valor estético do reino animal também pode depender de ser este o resultado de um longo processo evolucionário impulsionado por mecanismos como a seleção natural Como Darwin 1859 disse nas famosas últimas linhas de A origem das espécies por meio da seleção natural Há uma grandiosidade nesta concepção da vida com as suas diversas potencialidades tendo sido originalmente infundidas em umas poucas formas ou em uma só e no fato de que enquanto este planeta seguiu nos seus ciclos de acordo com a lei da gravidade fixada incontáveis formas das mais belas e maravilhosas tenham evoluído de um princípio tão simples e continuem a evoluir Desafortunadamente um tal processo se houver de produzir vida senciente também pode acarretar muito sofrimento e incontáveis mortes prematuras Uma assunção questionável feita por alguns teóricos da teodiceia da ordem natural consiste em pensar que tais relações entre os bens estéticos e o sofrimento fornecem uma justificação moral para que Deus permita o sofrimento horroroso Poderseia argumentar que é muito mais plausível que em um tal cenário o valor da prevenção do sofrimento horrendo iria de um ponto de vista moral possuir um peso muito maior do que o do valor da regularidade sublimidade e narrativa Se este for o caso então um Deus moralmente perfeito não faria uma troca do primeiro valor por este último embora uma deidade motivada primacialmente por razões estéticas certamente houvesse de fazêlo Em resumo quase todos concordam que o mundo contém tanto bens quanto males O prazer e a dor o amor e o ódio o sucesso e o fracasso o florescimento e o padecimento e a virtude e o vício existem em grande abundância todos eles A despeito disto alguns enxergam os sinais de uma teleologia cósmica Aqueles que defendem a versão do argumento da evidência decisiva acima exposto não precisam negar a teleologia O que eles precisam é mostrar que é muito mais fácil fazer sentido da estranho mistura de bem e mal que aparece na vida HUME Dialogues XI 14 quando uma tal teleologia é interpretada como sendo amoral em vez de moral vide MULGAN 2015 MURPHY 2017 e em particular quando é 284 interpretada como sendo direcionada para fins estéticos em vez de morais 7 Um argumento contrário ao agnosticismo O tópico da seção 4 foi o argumento de Le Poidevin afirmando a verdade de uma forma modesta de agnosticismo Nesta seção será examinado um argumento favorável à falsidade de uma forma mais ambiciosa de agnosticismo Por ser mais ambiciosa o tipo de agnosticismo abordado nesta seção mais ambiciosa do que o tipo defendido por Le Poidevin é concebível que ambos os argumentos sejam exitosos em estabelecer as suas conclusões No argumento de Le Poidevin o termo agnosticismo se refere à posição de que não temos ciência da verdade nem o teísmo versátil nem do ateísmo global Nesta seção agnosticismo se refere à posição segundo a qual não é racionalmente permissível nem a crença de que oniteísmo é verdadeiro nem a crença de que é falso Esta forma de agnosticismo é mais ambiciosa porque o conhecimento é mais forte no sentido lógico do que a permissibilidade racional pode ser racionalmente permissível acreditar em proposições de cuja veracidade não temos ciência mas uma proposição não pode ter sua veracidade conhecida por alguém que não tenha permissão racional para fazê lo Assim um nome apropriado para esta forma de agnosticismo é agnosticismo forte Uma outra diferença diz respeito ao objeto das duas formas de agnosticismo O agnosticismo no argumento de Le Poidevin versava sobre a disputa entre teísmo versátil e ateísmo global Nesta seção o alvo é a disputa entre o oniteísmo e posição de ateísmo local segundo a qual o oniteísmo é falso A seção prévia enfocou dois argumentos favoráveis à conclusão de que esta forma de ateísmo local é muito provavelmente verdadeira Nesta seção a questão diz respeito a esta conclusão poder ou não caso estabelecida fornecer o fundamento de um argumento bemsucedido contra o agnosticismo forte Tal argumento pode ser formulado da seguinte maneira 1 O ateísmo entendido aqui como sendo a negação do oniteísmo é muito provavelmente verdadeiro 2 Se o ateísmo é muito provavelmente verdadeiro então a crença ateísta é racionalmente permissível 285 De 1 e 2 seguese que 3 A crença ateísta é racionalmente permissível 4 Se o agnosticismo forte concernente ao oniteísmo é verdadeiro vale dizer se suspender o julgamento sobre a verdade ou falsidade do oniteísmo é a conduta racionalmente requerida então a crença ateísta não é racionalmente permissível De 3 e 4 se segue que 5 O agnosticismo forte concernente ao oniteísmo é falso A premissa 1 foi defendida na seção 6 a premissa 4 é verdadeira pela definição de agnosticismo forte e os passos 3 e 5 seguem de passos prévios por modus ponens e modus tollens respectivamente Sobra a premissa 2 de que se o ateísmo é muito provavelmente verdadeiro então a crença ateísta é racionalmente permissível Poderseia tentar defender essa premissa com a alegação de que as probabilidades presentes na 2 são credenciais racionais e que portanto a verdade da assim chamada tese de Locke Foley 1992 justifica 2 É racional para uma pessoa S acreditar em uma proposição P se e somente se for racional que a credibilidade conferida por S a P seja suficientemente alta para fazer da atitude de S visàvis P uma atitude de crença A tese de Locke contudo necessita de justificação ela mesma Afortunadamente nada de tão forte quanto a tese de Locke é necessária para defender a premissa 2 Para mencionar apenas uma coisa tudo o que o defensor de 2 precisa é um se não um se e somente se Ademais o defensor de 2 não precisa estabelecer uma igualdade como o faz a tese de Locke entre a atitude de crença e a posse de uma alta credibilidade Assim tudo o que se requer é a seguinte tese mais modesta aqui chamada de T 286 T Se é racionalmente permissível que a credibilidade conferida por S a uma proposição P seja muito alta então é racionalmente permissível que S acredite em P Contudo até mesmo está tese mais modesta é controversa porque a sua adoção leva ao comprometimento com a posição de que a crença racional ou seja racionalmente permissível não obtém fechamento sob conjunção Por outras palavras leva ao comprometimento com a posição segundo a qual é possível que cada uma dentre uma variedade de crenças seja racional embora não seja racional a crença adicional de que todas essas crenças são verdadeiras Para entender por que isto é assim imagine que foi vendido um milhão de bilhetes da loteria Cada jogador comprou apenas um único bilhete e é certo que um dos jogadores ganhará Agora vá além e imagine que um observador informado tenha uma crença bem definida acerca de cada um dos milhões de jogadores individuais de que aquele jogador em particular perderá De acordo com a tese T cada uma destas milhões de crenças é racional Por exemplo se Sue é uma das jogadoras então de acordo com T a crença por parte do observador de que Sue perderá é racional porque é racional para o observador conferir uma credibilidade muito alta à proposição de que Sue perderá Contudo uma vez que é certo que alguém ganhará também é racional que o observador acredite que alguém ganhará Não é racional no entanto ter crenças contraditórias e assim não é racional que o observador acredite que nenhum jogador ganhará Isso implica contudo que a crença racional não tem fechamento sob a conjunção pois a proposição de que nenhum jogador vencerá consiste simplesmente na conjunção de todas as proposições que afirmam acerca de um jogador individual que ele perderá Defensores da premissa 2 alegrarão muito plausivelmente que a a implicação de T de que a crença racional não tem fechamento sob a conjunção é completamente inócua Não é óbvio por exemplo que não seria racional que um ser humano falível acreditasse que todos as suas muitas crenças são verdadeiras mesmo se cada uma dessas crenças fosse racional Outros vide OPPY 1994 p 151 no entanto veem como inaceitável a conclusão de que a crença racional não tem fechamento sob a conjunção e por esta razão rejeitarão a premissa 2 Portanto mesmo se se puder mostrar que o oniteísmo é muito provavelmente falso ainda assim não será óbvio para todos que seja racionalmente permissível ser um ateísta local e assim ainda não será óbvio para todos que um agnosticismo forte a respeito do oniteísmo seja falso 287 Referência 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preliminares desempenham um papel central no enquadramento da discussão da liberdade divina I Além da liberdade quais propriedades são consideradas essenciais a Deus II Qualis concepçãoões de liberdade regem a investigação Normalmente as discussões sobre a liberdade divina consideram a concepção tradicional de Deus como um ser que é essencialmente onipotente onisciente perfeitamente bom e eterno Com respeito à segunda questão existem duas concepções de liberdade comum na discussão filosófica a a concepção compatibilista e b a concepção 291 32 Veja Correspondência LeibnizClarke 1956 1717 As referências à Correspondência LeibnizClarke serão indicadas ao longo do texto como LC seguidas das indicações das páginas da edição de Alexander libertária O tema da liberdade divina trata da questão relativa a saber se Deus como tradicionalmente concebido pode desfrutar de qualquer tipo e grau de liberdade requerida para a responsabilidade moral a gratidão e o louvor Todavia quando se pergunta Deus pode ser livre é importante especificar a respeito do que se pode pensar que Deus age livremente Visto que Deus é essencialmente onipotente onisciente perfeitamente bom e eterno resta claro que Deus não é livre para enfraquecerse tornarse ignorante fazer algo mau ou destruir a si mesmo Mas parece importante que Deus seja livre no que diz respeito à criação de qualquer um de vários mundos possíveis bem como livre para não criar nenhum mundo em absoluto E o que dizer se no entanto entre os mundos possíveis houver um mundo que seja o melhor Essa questão tem sido o cerne de uma controvérsia por séculos Ao considerar essa e outras questões será útil considerar as perspectivas de alguns filósofos importantes que contribuíram significativamente para a literatura sobre o tema da liberdade divina Os filósofos cujas perspectivas serão consideradas de modo mais completo são Leibniz e Samuel Clarke Esses dois autores são particularmente importantes porque além de terem sido filósofos muito capazes eles se confrontaram na controvérsia entre as visões compatibilista e libertária de liberdade Na justificadamente célebre Correspondência LeibnizClarke Leibniz defendeu a concepção compatibilista enquanto Clarke representou a causa libertária Além de Leibniz e Clarke as contribuições fundamentais de Thomas Morris e Robert Adams sobre o tema no século XX também serão discutidas 1 A Correspondência LeibnizClarke e o Princípio da Razão Suficiente Em 1715 iniciouse uma série de troca de cartas entre Gottfried Leibniz e Samuel Clarke Interrompida pela morte de Leibniz em 1716 a série foi editada e publicada por Clarke em 171732 Clarke e Leibniz concordam que a razão humana pode demonstrar que necessariamente existe um ser essencialmente onipotente onisciente perfeitamente bom e que livremente criou o mundo Todavia as suas 292 explicações da liberdade divina diferem profundamente É útil portanto destacar as diferenças no que concerne à liberdade divina e considerar se qualquer concepção de liberdade divina pode ser conciliada com a perfeição absoluta do criador A questão central é a de determinar se qualquer das duas concepções de liberdade divina pode ser completamente conciliada com o requisito imposta pelo perfeita bondade de Deus nas palavras de Clarke a necessidade de sempre fazer o que é melhor Uma questão importante na correspondência LeibnizClarke diz respeito ao Princípio da Razão Suficiente PRS particularmente as suas implicações sobre como devemos entender a liberdade divina e humana Em sua segunda carta Leibniz apresenta o princípio e pronunciase sobre suas implicações para a teologia e a metafísica Ora por esse simples princípio a saber que deve haver uma razão suficiente por que as coisas devam ser assim e não de outra maneira alguém pode demonstrar o ser de um Deus e todos as outras partes da metafísica ou teologia natural LC 16 Em outros lugares Leibniz expressa o PRS mais de modo mais completo como o princípio de que nenhum fato pode ser real ou existente nenhuma declaração verdadeira a menos que exista uma razão suficiente para que isso é seja assim e não de outra maneira 1714 parágrafo 32 Ele ilustra o PRS citando o exemplo de Arquimedes que observou que se houver uma balança perfeita e pesos iguais forem pendurados nas duas extremidades da balança a balança não se moverá Por quê Leibniz responde porque nenhuma razão pode ser dada de por que razão um lado deve pesar mais do que o outro L C 16 Talvez Leibniz tenha sido infeliz ao usar esse exemplo porque isso permitiu a Clarke acusálo de não tratar um agente diferentemente de uma balança assim como uma balança não pode se mover sem um peso maior de um lado e deve moverse para baixo do lado com um peso maior também um agente não pode escolher sem algum motivo para escolher e deve escolher em conformidade com o motivo mais forte Clarke argumenta porém que isso significa negar ao agente qualquer poder de agir na ausência de um motivo e nega ao agente qualquer poder de agir em oposição ao motivo mais forte Do ponto de vista de Clarke isso significa negar por completo que haja qualquer agente genuíno Pois é da natureza de um agente ter a capacidade de agir ou não agir Uma balança não tem essa capacidade ela simplesmente é o objeto de uma ação exercida por quaisquer pesos que sejam colocados sobre ela Como Clarke conclui em sua quinta e última resposta Não existe semelhança entre uma balança ser movida por pesos ou impulsos e uma mente movendose a 293 si mesma ou agindo tendo em mira certos motivos A diferença é que a primeira é algo inteiramente passivo que está sujeito à absoluta necessidade Por sua parte a outra não apenas recebe uma ação mas também age o que é a essência da liberdade LC 97 A rejeição de Clarke a qualquer semelhança entre os movimentos de uma balança e os atos de um agente está ligada à sua discordância com Leibniz a respeito do PRS Em sua resposta à segunda carta Clarke parece aceitar o PRS Assim ele diz é bem verdade que nada é sem uma razão suficiente por que assim seja e para que seja assim em vez de outro modo LC 20 Claramente se ao escrever nada é Clarke pretende incluir qualquer fato ou verdade então ele não pode continuar consistentemente como ele faz a dispensar certos fatos ou verdades da necessidade de ter uma razão suficiente Leibniz poder ter livro o nada é de Clarke como englobando qualquer fato ou verdade o que se aproximaria do próprio entendimento de Leibniz sobre o PRS Se for assim isso explicaria por que em sua terceira carta Leibniz reclama que embora Clarke lhe conceda esse princípio importante ele o concede apenas em palavras mas o nega de fato O que mostra que ele não percebe completamente a sua forçaLC 25 No entanto a despeito de sua declaração de que nada é sem uma razão suficiente para que seja está claro que Clarke não pode ter pretendido concordar com Leibniz quanto a todo fato ou verdade ter uma razão suficiente Nem tampouco ele poderia ter concordado que todos os fatos ou verdades contingentes tenham uma razão suficiente Pois ele diz imediatamente em seguida que essa razão suficiente é não é outra coisa senão a mera vontade de Deus citando como um exemplo a vontade de Deus de criar esse sistema de matéria em algum lugar particular dentro de um espaço absoluto e não em outro lugar no espaço absoluto Simplesmente não existe nada para recomendar um lugar em particular no espaço absoluto em detrimento de outro Portanto nesse caso não pode haver nenhuma outra razão senão a simples vontade de Deus Presumivelmente Clarke diria que Deus tinha uma razão suficiente para criar este sistema de matéria em algum lugar ou outro no espaço absoluto mas ele não tinha uma razão suficiente para criálo neste espaço em particular Em sua terceira carta Leibniz cita esse caso como sendo justamente o tipo de coisa que o PRS exclui por ser impossível Segundo seu entendimento do PRS não há nenhuma situação em que uma escolha tenha sido feita sem uma razão suficiente 294 para fazer aquela escolha específica Pensar de outro modo é supor uma exceção ao PRS Leibniz concede na verdade que muitos atos humanos parecem não ter uma razão suficiente Existem atos para os quais não podemos encontrar um motivo suficiente Por exemplo nenhum motivo é aparente para o porquê um agente passar por cima da soleira com seu pé esquerdo e não com o direito Contudo em todos esses casos ele supõe existir alguma percepção inconsciente ou paixão que fornece a razão suficiente Está claro que Clarke concede tais exceções Um desacordo mais importante e profundo acerca do PRS se reflete também na reação de Clarke à analogia de Leibniz entre a razão suficiente para a balança se mover e a razão suficiente para um agente fazer algo de uma forma em vez de outra Pois Clarke concorda com Leibniz que muitas vezes o agente tem uma razão suficiente para a sua ação Assim ele concede que o PRS é satisfeito por uma vasta gama de atos humanos e divinos O que ele nega é que a razão suficiente para o agente fazer algo de uma forma em vez de outra opera sobre o agente do mesmo modo que o peso mais pesado opera sobre a balança Claramente o peso mais pesado sobre um lado da balança é uma causa determinante do movimento da balança Dadas as circunstâncias e a colocação daquele peso em um lado da balança nada mais poderia acontecer além do que de fato aconteceu Era necessário que a balança se movesse como o fez Mas supor que a razão ou motivo que é a razão suficiente para o agente fazer uma coisa em vez outra é uma causa determinante do ato livre do agente é negar qualquer poder da parte do agente para executar ou não aquele ato específico É tornar necessário o ato do agente e negar o livrearbítrio do agente Assim para Clarke uma razão ou motivo pode ser a razão suficiente para a ação do agente Mas diferente do peso na balança que é a causa determinante do movimento da balança a razão ou motivo não é a causa determinante do ato do agente Como ele afirma em outro lugar De fato eles os razões e os motivos podem ser e são ocasiões nas quais aquela substância no homem em que o princípio automovente reside exerce livremente o seu poder ativo Mas é o princípio automovente e de modo algum a razão ou motivo que é a causa física ou eficiente da ação Quando dizemos em linguagem vulgar que motivos ou razões determinam um homem isso nada é senão uma figura ou metáfora É o homem que se determina livremente a agir 1978 IV p 723 295 O que vemos é que a concepção de Clarke do que é ser um agente livre requer primeiro que o agente possa agir de algum modo particular mesmo sem ter uma razão suficiente para agir daquele modo em particular Portanto há exceções ao PRS Segundo vimos que quando um agente tem uma razão suficiente para praticar um determinado ato e o faz livremente o motivo ou razão suficiente não é uma causa determinante do ato do agente No momento do ato o agente tinha o poder de não realizar o ato Assim na visão libertária de Clarke há uma diferença profunda entre a razão suficiente para a balança se mover de um modo particular e a razão suficiente para um ato livre do agente No primeiro caso a razão suficiente é uma causa determinante e no segundo não o é Leibniz entretanto não vê nenhum necessidade para supor que existam exceções ao PRS e nenhuma necessidade de tratar o motivo do ato livre do agente como outro coisa senão uma causa determinante desse ato 2 O problema de Leibniz com a liberdade divina a necessidade de Deus escolher o que é melhor Contra este pano de fundo podemos agora olhar o problema da perfeição e liberdade divinas e em seguida considerar as soluções diferentes propostas por Clarke e Leibniz para esse problema Seguindo Leibniz podemos imaginar Deus considerando uma variedade de mundos que ele poderia criar Um poderia ser o mundo no qual não existam criaturas conscientes um mundo composto só de matéria morta Claro dado que o mundo atual inclui tudo que existe incluindo Deus o mundo em questão está aqui sendo considerado em separado de Deus outro mundo poderia ser composto em algum estágio de sua história de criaturas vivas conscientes e cujas vidas são significativas moralmente boas e felizes Se imaginarmos Deus fazendo uma escolha dentre esses dois mundos parece evidente que que ele criaria o último Certamente um mundo com criaturas conscientes que vivem vidas moralmente boas e satisfatórias é sendo outras coisas iguais um mundo muito bom e um mundo muito melhor do que outro não que não consiste em nada exceto de pedaços tediosos de matéria a rodopiar eternamente em um vazio E não é absolutamente certo que um ser onipotente perfeitamente bom criaria um mundo melhor se ele pudesse Mas se seguirmos esse raciocínio os 296 problemas começam a surgir Suponha como parece evidente que o segundo mundo é o melhor mundo Se Deus estivesse limitado a esses dois mundos ele enfrentaria três escolhas criar o mundo inferior criar o mundo superior não criar mundo algum Deus decidir não criar nenhum mundo de preferência a criar um mundo que seja considerando todas as coisas um mundo muito melhor significaria Deus fazer menos que o melhor que ele pode fazer Nesse caso parece que a bondade perfeita de Deus exigiria que ele criasse o mundo muito bom Mas se a bondade perfeita de Deus requer que ele crie um mundo muito bom em vez de criar o mundo inferior ou não criar nenhum mundo o que devemos pensar daquela parte da ideia de Deus que declara que ele criou o mundo livremente Dizer que Deus criou livremente o mundo bom parece implicar que ele era livre para não o fazer que ele poderia ter criado o mundo inferior ou se abstido de criar qualquer dos dois mundos Mas se a sua bondade perfeita requer que ele crie o mundo bom como é possível que ele fosse livre para criar o mundo inferior ou não criar qualquer mundo em absoluto Essa é uma maneira simples de ilustrar o problema da perfeição divina e da liberdade divina A princípio alguém pode ser tentado a resolver o problema vendo a perfeita bondade de Deus que inclui sua perfeição moral absoluta como análoga à nossa bondade Uma pessoa moralmente boa realmente pode fazer a melhor ação disponível a ela embora seja livre para não a fazer ou seja em vez disso livre para fazer algo mau Naturalmente se ela livremente fizesse algo ruim ela exibiria algum tipo de falha moral Mas o simples fato de que ela fosse livre para fazer o mal não impugna qualquer grau de bondade moral que ela possua Então por que a bondade perfeita de Deus o impediria de ser livre para criar um mundo menos bom ou mesmo um mundo ruim Tivesse ele feito isso ele teria deixado de ser o ser moralmente perfeito que é assim como uma pessoa moralmente boa teria diminuído um tanto a sua bondade moral se ela tivesse feito a coisa errada livremente Essa solução é falha porque embora uma pessoa humana possa se tornar menos boa ou mesmo má Deus não pode tornarse menos que absolutamente perfeito Embora possamos atingir certo grau de virtude moral em nossas vidas podemos perdêla e voltarmos a ser as pessoas moralmente medíocres que talvez já tenhamos sido Isso ocorre porque estar num certo nível de bondade não faz parte de nossa própria natureza Entretanto de acordo com a visão historicamente dominante nas religiões ocidentais Deus por natureza é onipotente onisciente e perfeitamente bom Ele não pode se tornar fraco ignorante ou ignóbil Assim como o número dois é necessariamente par Deus é necessariamente supremo em poder 297 bondade e conhecimento Ele não é algum tipo de divindade infantil que por esforço sincero lentamente adquiriu essas perfeições e como nós pode diminuir sua bondade agindo mal intencionalmente Ele necessariamente tem essas perfeições desde toda a eternidade e ele não pode se despojar delas mais do que o número dois pode deixar de ser par As perfeições de Deus são constituintes de sua natureza e não características adquiridas Assim embora possamos ser livres para perder o nosso grau de bondade ao usarmos a nossa liberdade para buscar o que é mau Deus não é livre para perder as suas perfeições ao usar a sua liberdade para buscar o que é mau Na verdade ele não é livre para buscar o que é mau pois se o fosse então ele poderia se tornar menos perfeito E isso é simplesmente impossível O problema da perfeição e liberdade divinas era particularmente grave para Leibniz Uma vez que Deus necessariamente existe e é necessariamente onipotente onisciente e perfeitamente bom parece que ele seria necessariamente atraído para criar o melhor Se for assim então quando Deus examinou todos os mundos possíveis ele deve ter escolhido o melhor com o resultado de que o mundo real é o melhor de todos os mundos possíveis Leibniz abraçou a conclusão desse raciocínio o mundo real é o melhor de todos os mundos possíveis Mas então como Deus poderia ser livre ao escolher criar o melhor Como um primeiro passo na direção de responder essa questão devese observar que surgiram duas perspectivas diferentes da liberdade divina no pensamento ocidental De acordo com a primeira perspectiva Deus é livre ao criar um mundo ou ao agir dentro do mundo que ele criou contanto que nada fora dele o determine a criar o mundo que ele criou ou o determine a agir de um modo particular no mundo que ele criou De acordo com a segunda perspectiva Deus é livre ao criar ou ao agir dentro de sua criação contanto que esteja em seu poder não criar o que criou ou não agir dentro de sua criação como ele o fez A primeira perspectiva tem a vantagem de estabelecer sem sombra de dúvida que Deus é livre das forças externas em relação à sua escolha de um mundo para criar Pois dado que ele é onipotente e o criador de todas as coisas além de si mesmo é evidente que nada fora dele o determina a criar o que ele cria E dado que o que ele cria está sob seu controle parece que ele é completamente livre para agir como achar melhor dentro do mundo que ele criou Portanto o fato de que nada fora de Deus o determina a criar ou agir como ele age claramente mostra que Deus é um agente autônomo ele é autodeterminante no sentido de que as suas ações são o resultado de decisões que são determinadas apenas por sua própria natureza Mas isso é suficiente para estabelecer que Deus é genuinamente 298 livre Em geral acreditase que um ser humano pode não ser livre para realizar uma determinada ação mesmo quando está claro que a pessoa não estava determinada realizar a ação por forças externas Talvez a pessoa estivesse nas garras de alguma paixão interna ou de um impulso irresistível que exigia a realização daquela ação superando o julgamento da pessoa de que a ação era errada ou imprudente Com relação aos seres humanos aquele que defende a primeira perspectiva da liberdade divina pode concordar que a simples ausência de agentes ou forças determinantes externas não é suficiente para que a ação de um indivíduo seja livre Mas mesmo no caso de Deus em contraposição aos seres humanos o defensor dessa posição pode argumentar que isso é suficiente pois em Deus não há a possibilidade de suas paixões sobrepujarem o julgamento da razão Como Leibniz comenta Os estoicos diziam que apenas o homem sábio é livre e na verdade a mente não é livre quando é possuída por uma grande paixão pois então não se pode desejar como se deveria ou seja com a devida deliberação É dessa forma que somente Deus é perfeitamente livre e as mentes criadas são livres apenas na medida em que estão acima da paixão 1982 p 175 A principal objeção a esta perspectiva sobre a liberdade divina é que ela não reconhece suficientemente a importância de os agentes terem controle sobre os seus atos livres Uma ação foi realizada livremente apenas se o agente estava livre para realizála e livre para não a realizar Deve ter sido da competência do agente realizar ou não aquele ato Se alguma força externa ou paixão interna estava além do controle do agente e a ação do agente era inevitável dada aquela força externa ou paixão interna então o agente não agiu livremente ao realizar aquela ação Visto que Deus é um ser puramente racional e que não está sujeito a paixões incontroláveis que às vezes compelem os agentes humanos a agir é tentador concluir que Deus desfruta de perfeita liberdade de ação Mas isso será assim apenas se não houver outras características em Deus que requeiram as suas ações e que não estejam sob o seu controle Porque geralmente se pensa que os agentes humanos têm o poder de agir contra o aconselhamento da razão creditamos os seus atos devidos à razão em contraposição àqueles atos devidos a impulsos 299 irresistíveis no rol dos atos que eles realizaram livremente Pois acreditamos que eles estiveram livres ao rejeitar o aconselhamento da razão e agir de outra forma Mas e se Deus não puder rejeitar o aconselhamento de sua razão quanto à ação a realizar Um agente humano que é moralmente bom e racional pode ainda ter ou antes tinha o poder de se abster de agir conforme o que ditam a sua bondade e a sua razão Mas isso pode ser verdadeiro no caso de Deus E se não pode ser como podemos então dizer que Deus age livremente Leibniz estava bem consciente do problema colocado pelo fato de que a escolha de Deus do que é melhor é necessária dado que ele é necessariamente onipotente onisciente e perfeitamente bom De fato a sua solução mais bem conhecida para o problema da perfeição e liberdades divinas reconhece que se a escolha por parte de Deus do melhor é absolutamente necessária então Deus não é livre em relação à criação Na sua Teodiceia e na sua correspondência com Clarke ele é cuidadoso ao distinguir a necessidade absoluta a necessidade hipotética e a necessidade moral argumentando que é moralmente necessário mas não absolutamente necessário que Deus escolha criar o melhor mundo Para determinar se Leibniz pode resolver o problema da perfeição e da liberdade divinas é importante examinar a sua distinção entre a necessidade moral e a absoluta e determinar se ele é bemsucedido em escapar à acusação de que em sua visão das coisas é absolutamente necessário que Deus escolha criar o melhor Ao discutir esse assunto será útil considerar o seguinte argumento 1 Se Deus existe e é onipotente perfeitamente sábio e bom então ele escolhe criar o melhor de todos os mundos possíveis Que Leibniz está comprometido com 1 seguese a da sua visão de que Deus é determinado pelo melhor e b da sua visão de que entre os mundos possíveis existe um único mundo melhor 2 Deus existe e é onipotente perfeitamente sábio e perfeitamente bom Leibniz endossa o Argumento Ontológico que pretende ser uma prova de 2 Portanto 300 3 Deus escolhe criar o melhor de todos os mundos possíveis Leibniz deve negar que 3 é absolutamente necessário pois o que quer que seja absolutamente necessário não pode ser logicamente de outra forma Por isso se 3 é absolutamente necessária seria logicamente impossível Deus escolher criar qualquer outro mundo que não seja o melhor Não seria uma questão contingente o fato de que Deus escolhe criar o melhor Nem tampouco é claro Deus poderia ser livre ao escolher criar o melhor Leibniz sustenta que a escolha de Deus de criar o melhor é moralmente necessária não absolutamente necessária É forçoso que Deus por uma necessidade moral faça as coisas de tal forma que não possa haver nada melhor caso contrário ele não ficaria satisfeito com a sua obra ele se culparia pela sua imperfeição e isso entra em conflito com a suprema felicidade da natureza divina 1710 p 201 O que significa então ser moralmente necessário que Deus escolha criar o melhor dos mundos possíveis Parece claro que o seu significado é tal que se Deus escolhesse criar menos do que o melhor seguirseia logicamente que lhe faltam sabedoria bondade e poder Na verdade Leibniz diz que fazer menos bem do que se poderia é carecer de sabedoria ou bondade que o entendimento mais perfeito não pode deixar de agir de forma mais perfeita e consequentemente de escolher o melhor 1710 p 201 Considere novamente a proposição 1 no argumento acima O que Leibniz diz sobre a necessidade moral implica que 1 é em si mesmo absolutamente necessária Pois ele claramente sustenta que do fato de que um ser faz menos bem do que poderia logicamente fazer seguese que o ser em questão carece de sabedoria ou bondade E não se pode sustentar isso sem estar comprometido a sustentar que a consequente de 1 logicamente se segue da antecedente de 1 Na verdade a consequente de 1 logicamente segue se da antecedente de 1 apenas se for absolutamente necessário que exista um melhor mundo possível Leibniz pensa de fato que é absolutamente necessário haver um único melhor entre os mundos possíveis Ou seja Leibniz está comprometido a sustentar que 1 é uma necessidade hipotética Uma proposição do tipo seentão 301 é uma necessidade hipotética desde que a consequente logicamente se siga da antecedente Naturalmente o simples fato de que uma consequente em particular se segue logicamente de um certa antecedente como por exemplo João não é casado logicamente se segue de João é solteiro é insuficiente para tornar a consequente absolutamente necessária Não é logicamente impossível que João não é casado seja falsa Assim embora a sua afirmação da necessidade moral de Deus de escolher criar o melhor comprometa Leibniz com a absoluta necessidade da proposição hipotética 1 em si esse compromisso ainda o deixa livre para negar que seja absolutamente necessário Deus escolher criar o melhor Dois pontos adicionais mostram que ele não pode escapar à conclusão de que a escolha de Deus de criar o melhor é absolutamente necessária Primeiro a proposição 2 Deus existe e é onipotente perfeitamente sábio e perfeitamente bom a antecedente de 1 é si absolutamente necessária Já notamos que tanto Clarke quanto Leibniz estão comprometidos com a concepção de que 2 não é uma verdade contingente é absolutamente necessária Segundo é uma regra da lógica que se uma proposição hipotética é em si absolutamente necessária e a seu antecedente é também absolutamente necessária então a sua consequente deve ser também absolutamente necessária Assim se 1 e 2 são absolutamente necessárias também 3 deve ser absolutamente necessária Uma vez que Leibniz está comprometido com a concepção de que 1 e 2 são absolutamente necessárias parece que sua visão também o compromete com a ideia de que 3 é absolutamente necessária O primeiro Leibniz brincou com a negação da regra lógica de que o que logicamente se segue do que é absolutamente necessário é em si absolutamente necessário Confira Adams 1994 cap 1 Antes de nos voltarmos para a tentativa de Clarke de resolver o problema da perfeição e liberdade divinas devemos observar que Leibniz frequentemente insiste que o ato da vontade deve ser livre no sentido de não ser exigido pelos motivos que lhe dão origem A sua observação frequentemente reiterada sobre essa questão é a de que os motivos inclinam sem tornar necessárioLC p 57 Essa posição parece conflitar com a visão que lhe atribuí a de que o motivo mais forte no agente determina ao agente a escolha que ele faz Sugere em vez disso que o agente tinha o poder de querer de outro modo muito embora o motivo e as circunstâncias se mantenham inalteradas Pois como ele diz os motivos não tornam necessário mas apenas inclinam o agente a querer como quer Mas isso não parece ser o que ele quer dizer por sua frase os motivos inclinam sem tornar necessário Do seu ponto de vista os motivos e as circunstâncias tornam necessário o ato da 302 vontade no sentido de que é lógica ou causalmente impossível que tais motivos e circunstâncias se verifiquem e o ato da vontade não ocorra A alegação de Leibniz de que elas não tornam necessário o ato da vontade quer dizer apenas que o ato da vontade em si não se torna com isso algo que é absolutamente necessário Para uma descrição mais detalhada desta interpretação do dito de Leibniz os motivos inclinam mas não tornam necessário vide PARKISON 1970 p 5053 Ou seja ele simplesmente está assinalando que muito embora haja uma conexão necessária entre o motivo e o ato da vontade isso não quer dizer que o ato da vontade não possa ser ele mesmo contingente Como vimos acima o fato de Deus ser onipotente onisciente e perfeitamente bom torna necessário que Deus escolha o que é melhor Contudo o fato de haver uma conexão necessária entre o seu ser perfeito e a sua escolha do melhor não implica que a sua escolha do melhor é absolutamente necessária Leibniz registra esse ponto de forma um tanto inexata ao dizer que os motivos de Deus inclinam sem tornar necessária a sua escolha do melhor Não nos devemos deixar enganar por essa frase ao ponto de pensar que ele sustenta que a conexão entre o seu ser perfeito e sua escolha do melhor é algo menos que absolutamente necessária E quando então notamos que o ser perfeito de Deus é absolutamente necessário a regra lógica dita a conclusão de que a sua escolha do melhor é ela mesma absolutamente necessária Sendo assim podemos concluir que a escolha de Deus em criar o melhor não é livre é absolutamente necessária 3 O problema de Clarke com a liberdade divina o poder de escolher de outra forma é requerido pela liberdade Em contraste com Locke que caracterizou a liberdade como o poder de realizar a ação que escolhemos queremos fazer deixando a própria escolha a volição se tornar causalmente necessária pelos motivos do agente Clarke localiza a liberdade diretamente no nível da escolha de agir ou não agir a essência da liberdade consiste em uma pessoa ter um poder contínuo de escolher se deve agir ou renunciarse a não agir 1738 p 101 A implicação da posição de Clarke é que autonomia liberdade seria impossível caso as escolhas de uma pessoa fossem causalmente provocadas por seus motivos ou desejos Pois se a escolha de uma pessoa por agir se tornar causalmente necessária por estados anteriores do seu corpo ou da sua mente então no momento daquela escolha não estava em poder do agente escolher não agir Para Clarke é um assunto secundário se o 303 agente é capaz de realizar sua escolha De fato como ele diz um prisioneiro acorrentando é livre para querer partir ou para querer permanecer O fato de que ele não pode ter êxito em executar sua escolha não o priva do poder de escolher Presumivelmente ele consentiria que aquele que sabe estar acorrentado possa bem ver a inutilidade de escolher partir e portanto não exercer o seu poder de escolher Claro visto que Deus é onipotente seu poder de realizar uma ação que ele escolha é ilimitado Mas a nossa questão é se Deus tem em seu poder de escolha absterse de seguir o que sabe ser o melhor curso de ação Se lhe faltar esse poder seguese da concepção de Clarke sobre liberdade que Deus não escolhe livremente o melhor curso de ação De fato seguirseia neste caso para Clarke que Deus é totalmente passivo e não um agente em absoluto Também se seguiria para Clarke que não faria nenhum sentido louvar ou render graças a Deus por escolher o melhor curso de ação Devemos ver como Clarke tenta evitar a necessidade absoluta de Deus escolher de acordo com seu conhecimento do que é o melhor curso de ação A visão geral de Clarke é suficientemente clara Ele distingue entre o intelecto entendimento e a vontade É função do entendimento determinar qual curso de ação seguir É função da vontade o poder que temos de fazer isso ou aquilo iniciar a ação especificada pelo entendimento Todavia uma coisa é chegar por deliberação ao juízo de que fazer uma determinada coisa é o melhor e outra bem diferente é escolher querer fazer tal coisa Uma vez que um juízo encerra o processo de deliberação sobre o que fazer Clarke e outros referemse a isso como o último juízo do entendimento É o juízo que encerra a deliberação e é seguido pelo ato da vontade de realizar ou de não realizar a ação especificada no juízo Muitas vezes nossos motivos e desejos são suficientemente claros e fortes para necessitar causalmente o juízo sobre o que fazer Nenhum outro juízo é possível nas circunstâncias Em suma não pode haver nenhuma liberdade em absoluto com relação ao juízo sobre que ação realizar Do ponto de vista de Clarke a liberdade entra em cena apenas quando a vontade escolhe agir ou não agir de acordo com o juízo do entendimento Assim quando existe para Deus um melhor curso de ação para executar o seu juízo do que é o melhor curso a seguir é absolutamente necessário segundo Clarke Mas a escolha de Deus de agir de acordo com o que seu entendimento aprova é completamente livre ele sempre tem o poder de escolher de outra forma 304 Deus necessariamente sempre discerne e aprova o que é justo e bom e não pode fazer de outro modo mas ele sempre age ou faz livremente o que é justo e bom ou seja tendo ao mesmo tempo o completo poder natural ou físico de agir diferentemente 1978 IV p 717 É instrutivo contrastar o ponto de vista de Clarke sobre a liberdade com uma corrente de pensamento na teologia cristã que remonta no mínimo até época de Agostinho segundo a qual os santos nos céus são aperfeiçoados em tal grau que eles não apenas não pecam mas são incapazes de pecar uma perfeição que é encontrada em Deus e nos anjos Em nosso estado terreno temos a liberdade de nos apartar do bem e fazer o mal mas na vida futura teremos um tipo superior de liberdade uma liberdade que não inclui a capacidade de fazer o mal Diz Agostinho Pois a primeira forma de livrearbítrio recebida pelo homem quando foi criado como um justo consistia na habilidade de não pecar mas também na habilidade de pecar ao passo que esta última forma de livre arbítrio será superior na medida em que ele não será capaz de pecar Essa com efeito não será uma habilidade natural mas o dom de Deus dom Porque uma coisa é ser Deus uma outra é ser partícipe de Deus Por natureza Deus não pode pecar mas quem participa de Deus recebe esta incapacidade de Deus 2017 22303 Em seu livro A Philosophical Inquiry Concerning Human Liberty Anthony Collins havia apelado para essa corrente de pensamento para apoiar o seu ponto de vista de que a liberdade não requer qualquer a capacidade de escolher ou agir de outra forma Clarke escreveu uma resposta bastante devastadora ao livro de Collins No decurso de sua resposta a Collins encontramos a seguinte observação Nem os santos nem os anjos nem o próprio Deus têm em qualquer medida menos liberdade devido à perfeição de sua natureza porque não existe nenhuma conexão entre o poder físico de ação e a perfeição de juízo que não é ação duas coisas que o autor 305 constantemente confunde Deus julga o que é correto e aprova o que é bom por uma necessidade física da natureza na qual a necessidade física toda noção de ação é necessariamente excluída Mas fazer o que é bom é inteiramente devido a um princípio ativo no qual está essencialmente incluída a noção de liberdade 1978 IV p 731 Claramente Clarke rejeita essa corrente de pensamento na teologia cristã Ele concede que os santos no céu não têm mais qualquer desejo de pecar e não têm prazer nisso De fato pode ser absolutamente certo que com desejos purificados e um juízo aperfeiçoado eles sempre farão livremente o que é certo Ver 1738 p 124 E isso será uma enorme diferença da vida na terra onde frequentemente somos tentados a pecar por maus desejos e juízos errados Mas o que não pode se dar é que os santos ou os anjos ou mesmo Deus a propósito deixe de ter a capacidade ou o poder de escolher fazer o que não é certo Pois então eles não seriam livres para escolher e fazer o que é certo Perder a capacidade de fazer de outro modo é perder a capacidade de escolher livremente e se alguém perde essa capacidade deixa por completo de ser um agente Podemos começar a compreender a dificuldade na visão de Clarke sobre a liberdade divina ao considerar as perfeições de Deus e as suas implicações para a questão relativa a poder ele livremente escolher fazer o mal Clarke vê de pronto que se um ser onisciente e perfeitamente bom houvesse de livremente escolher fazer algum mal deixaria com isso de ser perfeitamente bom E deixaria de ser perfeitamente bom mesmo se como não poderia acontecer no caso de Deus fosse impedido de realizar o mal que escolheu fazer Pois a livre escolha de fazer o mal é em si inconsistente com continuar a ser um ser onisciente e perfeitamente bom Um ser que escolhe livremente fazer o que ele saber ser um mal deixa de ser um ser perfeitamente bom Assim se Deus houvesse de livremente escolher fazer um ato mau ele deixaria de ser perfeitamente bom Em resumo não é logicamente possível que Deus livremente escolha fazer o mal e continue a ser perfeitamente bom Ora visto que Clarke concorda com Leibniz que Deus existe necessariamente e necessariamente é onipotente onisciente e perfeitamente bom podemos avançar para a conclusão mais simples de que é não logicamente possível que Deus livremente escolha fazer o mal Não é logicamente possível porque é inconsistente com o que é logicamente necessário a existência de um ser Deus que é 306 necessariamente onipotente onisciente e perfeitamente bom Um atributo essencial de um ser é um atributo que o ser necessariamente possui Clarke sustenta que as perfeições morais da divindade são aspectos essenciais da natureza divina a justiça a bondade e todos os outros atributos morais de Deus são tão essenciais à natureza divina quanto o são os atributos naturais como a eternidade a infinitude e semelhantes 1738 p 120 Agora considerese a seguinte questão Deus em algum momento livremente escolhe não fazer o mal Penso que podemos ver que a própria posição de Clarke o compromete com uma resposta negativa a esta pergunta Pois Deus livremente escolhe não fazer algo somente se estiver ao seu alcance escolher fazer aquela coisa escolher livremente insiste Clarke logicamente requer o poder de escolher fazer outra coisa Mas não pode estar ao alcance de ninguém fazer uma certa escolha se for logicamente impossível que a pessoa faça aquela escolha se não existe nenhum mundo possível no qual uma pessoa faça uma certa escolha não pode se dar o caso de que a pessoa não obstante tenha ao seu alcance a possibilidade de fazer essa escolha Portanto uma vez que é logicamente impossível para Deus escolher fazer o mal não está ao alcance de Deus escolher fazer o mal E uma vez que não está ao alcance de Deus fazer o mal não pode se dar o caso de que a escolha de Deus de não fazer o mal seja uma escolha livre Se Deus escolhe não fazer o mal então ele escolhe por necessidade e não livremente E sendo assim não faz sentido agradecermos a Deus ou serlhe gratos por escolher não fazer o mal Ele não poderia ter escolhido de outra forma Visto que a afirmação de que Deus não escolhe livremente não fazer o mal é bastante central para examinar as opiniões de Clarke sobre a perfeição e liberdade divinas será útil considerar outro argumento para a apoiar 1 Se p logicamente implica q e q é falso está ao alcance de um agente ocasionar p somente se estiver no poder do agente ocasionar q Para uma defesa desse princípio vide HASKER p 96115 2 Que Deus escolha fazer o mal logicamente implica que Deus não é perfeitamente bom 3 É falso que Deus não seja perfeitamente bom portanto 307 4 Se estar ao alcance de Deus ocasionar que ele escolha fazer o mal então está ao seu alcance fazer com que ele não seja perfeitamente bom de 1 2 e 3 5 Não está ao alcance de Deus fazer com que ele não seja perfeitamente bom portanto 6 Não está ao alcance de Deus escolher fazer o mal portanto 7 Se Deus escolhe não fazer o mal Deus escolhe não fazer o mal por necessidade e não livremente Antes de examinarmos duas tentativas de Clarke de evitar quaisquer limitações no âmbito da liberdade divina consideremos se está ao alcance de Deus escolher contrariamente ao que ele julga ser o melhor Claramente Deus não pode escolher fazer o mal Mas escolher o contrário do que se julgou ser o melhor é mau ou moralmente errado somente se escolher fazer que se julgou ser o melhor for moralmente obrigatório Afirmar que é moralmente obrigatório ignora a possibilidade real de que escolher o que é melhor é supererrogatório ou seja algo que é requerido pelo dever Existem escolhas que são boas de fazer mas não são requeridas como nosso dever Seria um equívoco portanto inferir a incapacidade de Deus de escolher agir de modo contrário ao que ele julga ser o melhor a partir da sua incapacidade de escolher fazer o mal No entanto parece ser de fato logicamente impossível que a perfeita bondade escolha agir de modo contrário ao que é melhor E essa parece ser a opinião do próprio Clarke sobre o assunto Assim ele afirma que embora Deus seja um agente perfeitamente livre mesmo assim ele não deixar de fazer sempre o que é melhor e mais sábio no todo1738 p 120121 Escolher agir de outro modo Clarke pensa é agir de modo contrário à perfeita sabedoria e bondade Como Clarke tentar evitar a conclusão de que a perfeita bondade de Deus impede que ele seja livre em muitas das suas escolhas A sua estratégia geral para lidar com dificuldade consiste em distinguir dois tipos de necessidades moral e física Se um estado ou evento fisicamente necessita de outro estado ou evento então o segundo evento ou estado não pode ocorrer livremente Assim ele diria que colocar um peso maior no lado esquerdo de uma balança precisamente calibrada 308 torna fisicamente necessário movimentar o lado esquerdo da balança para baixo Aqui mesmo se a balança fosse dotada de consciência não haveria nenhuma possibilidade de a balança moverse livremente para baixo no lado esquerdo pois a balança não tem o poder de fazer outra coisa senão moverse para baixo no lado esquerdo Para ilustrar o outro tipo de necessidade ele oferece o exemplo da promessa de Deus num determinado dia de que ele não destruirá o mundo A promessa torna moralmente necessário que Deus se abstenha de destruir o mundo naquele dia em particular Mas diz Clarke seria absurdo pensar que nesse dia portanto faltava a Deus tinha o poder físico de destruir o mundo O cumprimento da sua promessa por parte de Deus é sempre consequência de sua realização Contudo não existe conexão entre elas como ocorre entre uma causa e um efeito Pois a única causa física ou eficiente do cumprimento é seu poder ativo não a sua promessa 1978 IV p9 O ato de Deus de absterse de destruir o mundo naquele dia é moralmente necessário e livre Pois Deus mantém o poder físico de destruir o mundo naquele dia e também não pode moralmente falando quebrar sua promessa O problema com essa solução é que ela não enfoca o ato particular de escolher quebrar a sua promessa Se a aceitamos como parece que devemos fazer no caso de Deus que é logicamente impossível que Deus escolha quebrar a sua promessa solene então seguese que não está ao alcance de Deus quebrar a sua promessa solene Com efeito a escolha de Deus de quebrar a sua promessa solene é para Deus privarse da sua perfeição absoluta E claramente não é logicamente possível que Deus deixe de ser absolutamente perfeito Numa passagem reveladora Clarke parece reconhecer que existem algumas escolhas que não recaem dentro do poder de Deus porque elas logicamente implicariam a destruição das suas perfeições essenciais Ele começa a passagem observando que existem relações necessárias entre as coisas relações que Deus conhece eternamente Com isso ele quer dizer que alguns estados de coisas são necessariamente melhores que outros estados de coisas por exemplo existirem seres inocentes que não sofrem eternamente é necessariamente melhor que existir seres inocentes que sofrem eternamente Por conhecer essas relações necessárias Deus conhece as escolhas requeridas pela sua perfeita sabedoria e bondade 309 Considerando que Deus não pode senão escolher agir sempre de acordo com esse conhecimento ele prossegue Sendo tão verdadeiramente impossível para um tal agente livre que é absolutamente insuscetível de ser enganado ou depravado escolher ao agir contrariamente a tais leis destruir as suas próprias perfeições quanto o é para a existência necessária ser capaz de destruir o seu próprio ser 1738 p 122 Ele então tira a conclusão óbvia Disso então seguese que embora Deus seja tanto perfeitamente livre quanto infinitamente poderoso ainda assim ele não pode de modo algum fazer qualquer coisa que seja má A razão disto também é evidente Porque como é manifesto um poder infinito não pode estenderse a contradições naturais que implicam uma destruição daquele mesmo poder pelo qual elas devem ser eleitas assim também não pode ser estendida a contradições morais que implicam a destruição de alguns outros atributos como necessariamente pertencentes à natureza divina enquanto poder Já mostrei que a justiça a bondade e a verdade são necessárias em Deus e até de modo tão necessário quanto são o seu poder o seu entendimento e o seu conhecimento da natureza das coisas É portanto tão impossível e contraditório supor que sua vontade venha a escolher fazer qualquer coisa contrária à justiça à bondade e à verdade quanto o é supor que o seu poder seria capaz de fazer qualquer coisa inconsistente com o seu poder 1738 p122 A conclusão implicada por essas considerações é que a liberdade de Deus é limitada pela sua perfeita bondade Se a escolha de fazer algo exclui a possibilidade de que ele seja perfeitamente bom então não está ao seu alcance escolher fazer tal coisa Ele necessariamente e não livremente escolhe não fazer aquela coisa 310 Essa é a conclusão enunciada acima Clarke porém rejeita essa conclusão insistindo em vez disso que a liberdade de Deus não é diminuída no mínimo que seja Não é diminuição de poder não ser capaz de fazer coisas que não são objetos de poder E não é de modo semelhante nenhuma diminuição seja de poder seja de liberdade ter uma retidão de vontade tão perfeita e inalterável a ponto de nunca ser possível escolher fazer algo inconsistente com essa retidão 1738 p 122 A nossa pergunta final é se Clarke pode ser bemsucedido na defesa dessa resposta Como está claro a resposta depende da analogia entre ser perfeitamente poderoso onipotente e ser perfeitamente livre O seu argumento pode ser entendido como segue Existem algumas coisas que Deus não pode fazer Ele não pode fazer um círculo quadrado Nem tampouco pode escolher fazer o mal No primeiro caso ele fazer um círculo quadrado é impossível porque a ideia de um círculo quadrado é contraditória No segundo caso a contradição está na ideia de um ser perfeitamente bom escolher fazer o mal Visto que uma contradição está envolvida em casa caso sustentase que o poder de Deus não se estende nem a fazer um círculo quadrado nem a escolher fazer o mal Pois o poder de Deus só se estende para o que não é contraditório que um ser maximamente perfeito faça Clarke então afirma que o fato de que o poder de Deus não se estende a fazer um círculo quadrado ou escolher fazer o mal não implica diminuição de seu poder E por analogia ele infere que isso também não implica qualquer diminuição da liberdade de Deus Suponhase que concordemos que a incapacidade de Deus de escolher fazer o mal não é uma diminuição do seu poder Também pode ser verdade que a sua incapacidade de escolher fazer o mal não é uma diminuição da sua liberdade Não Na explicação de Clarke sobre a natureza da liberdade o poder de escolher o contrário é necessário para que a escolha seja livre Portanto se não está ao alcance de Deus escolher fazer o mal Deus não livremente escolhe não fazer o mal E se não está ao alcance de Deus escolher agir ao contrário do que é melhor Deus não escolhe livremente fazer o que é melhor Talvez Clarke possa salvar a onipotência de Deus ao dizer que o seu poder não se estende a atos inconsistentes com qualquer um dos seus atributos essenciais Mas isso não deixará intacta a sua liberdade perfeita Enquanto lhe faltar o poder de escolher fazer o mal faltalhe a 311 33 A maior parte desse material nas seções 1 a 3 é retirada com permissão de meu artigo ROWE W Clarke and Leibniz on Divine Perfection and Freedom Enlightenment and Dissent Special Issue on Samuel Clarke n 16 p 6082 1997 liberdade de escolher não fazer o mal E enquanto lhe faltar o poder de escolher de modo contrário ao que é melhor faltalhe a liberdade de escolher o que é melhor Não importará se essa falta de poder resultar de uma deficiência no seu poder ou do fato de que o seu poder não se estende a tais escolhas Clarke poderia conseguir remendar essa situação mudando a sua explicação da natureza da liberdade declarando em vez disso que se escolhe livremente apenas no caso de se ter o poder de escolher de modo contrário desde que o poder infinito se estenda à escolha de agir de outro modo Essa medida evitará a conclusão imediata de que Deus não escolhe livremente fazer o melhor Pois Clarke defende que o poder infinito de Deus não se estende a escolher de modo contrário ao que ele saber ser o melhor Mas visto que a escolha por parte de Deus de fazer o que é melhor é absolutamente necessária para Deus somos deixados sem qualquer razão para insistir que a sua escolha é realmente livre Nem tampouco somos deixados com qualquer razão para agradecer a Deus ou serlhe grato por escolher e agir de acordo com o seu conhecimento sobre o que é melhor Assim o corajoso esforço de Clarke para conciliar a liberdade perfeita de Deus com a sua perfeita bondade não é bemsucedida33 4 Deus pode ser livre no tocante a causar a sua própria natureza Partindo do pressuposto de que Deus o ser supremamente perfeito existe e que existe um mundo melhor passível de ser criado parece que Deus não é nem livre para não criar um mundo nem livre para criar um mundo de menor valor do que o melhor mundo passível de ser criado Na realidade parece que Deus necessariamente criaria o melhor dos mundos que pudessem ser criados deixando nos sem qualquer base para renderlhe graças ou louválo por criar o mundo que criou Pois dado que Deus existe e que existe um mundo melhor passível de ser criado a natureza de Deus como um ser onipotente onisciente e perfeitamente bom exigiria que ele criasse tal mundo melhor Fazer menos que o melhor que ele poderia criar o mundo melhor seria inconsistente com o fato de ele ser o ser 312 perfeito que ele é Mas e se por mais estranho que possa parecer Deus fosse causalmente responsável por ter a natureza perfeita que ele tem E se Deus criou sua natureza e em virtude de têla criado é assim causalmente responsável por sua própria natureza Tal visão se estiver correta poderia oferecer uma saída para o problema da liberdade divina Pois o problema parece repousar na suposição plausível de que nenhum ser é ou pode ser responsável pela natureza que tem E dado que essa suposição seja correta o que logicamente se segue do fato de Deus possuir a natureza que ele possui ser supremamente perfeito ou seja criar o melhor mundo possível não pode depender mais dele ser algo pelo que ele é responsável do que o faz a sua natureza como um ser supremamente perfeito algo pelo que ele é responsável Porém contra essa suposição Thomas Morris 1987 argumentou que Deus criou a sua natureza e portanto é causalmente responsável pela sua natureza Suponhase que Morris esteja certo que Deus é responsável por sua própria natureza Pois bem visto que Deus é responsável pela sua natureza ele pode então ser responsável pelo que é exigido por sua natureza Em suma Deus pode ser responsável pela criação do mundo melhor Portanto parece importar se Deus é responsável por ter a natureza que tem Naturalmente no sentido lato da expressão a natureza de uma pessoa alguém pode ser responsável por sua natureza ou ao menos por parte dela Uma pessoa com uma disposição naturalmente amigável para com estranhos pode ter desempenhado um papel ao desenvolver a sua natureza para que fosse amigável para com outros Mas ninguém ao que parece é responsável por ser o tipo básico de entidade que é um ser humano por exemplo Assim até mesmo Deus conforme se pensa não é causalmente responsável por sua natureza básica o fato de ele ser onipotente onisciente e perfeitamente bom Naturalmente diferente dos humanos Deus se ele existe não herda a sua natureza de seres anteriores Pois Deus é eterno e não gerado por outros deuses Desde a eternidade este ser não criado tem sido onipotente onisciente e perfeitamente bom Essas propriedades constituem a sua natureza intrínseca Assim parece que ninguém incluindo Deus poderia ser causalmente responsável pelo fato de Deus ter as propriedades básicas que são constitutivas de sua natureza Contudo contra esse ponto de vista Thomas Morris argumentou que não há nada de objetável do ponto de vista lógico ou metafísico quanto ao fato de Deus criar e portanto ser causalmente responsável pela sua própria natureza básica No entanto ele na verdade deseja evitar ter de afirmar que Deus é a causa de si mesmo Como ele diz a própria ideia de autocausação ou autocriação é quase universalmente caracterizada como absurda 313 incoerente ou pior O que Morris quer dizer aqui é que embora seja absurdo pensar que Deus cause a sua própria existência desde toda a eternidade não é absurdo a seu juízo supor que Deus 1 faça com que existam propriedades tais como a onipotência a onisciência e a perfeita bondade e 2 faça com que ele próprio possua essas propriedades eternamente Na proposta de Morris dizse que Deus é a causa de algo a sua natureza sem a qual Deus não pode existir de modo algum Mas pode parecer impossível que qualquer ser seja causa de alguma coisa a sua natureza sem a qual esse mesmo ser não pode existir Portanto pode parecer impossível que Deus seja causalmente responsável pela sua natureza Além disso para enfatizar novamente esse ponto visto que a natureza de Deus consiste das suas propriedades essenciais propriedades que ele deve ter para poder existir parece absurdo até mesmo sugerir que Deus é causalmente responsável por essas propriedades e por sua posse delas mesmas Morris responde essas objeções observando que Deus existe necessariamente e que portanto sempre tem as suas propriedades essenciais Assim não deveríamos pensar que Deus poderia existir sem a sua natureza e que depois cause as propriedades que constituem sua natureza a bondade absoluta o poder absoluto e o conhecimento absoluto e faça com que ele próprio as possua No entanto Morris afirma que o fato de que Deus pode existir apenas se a sua natureza também existir não impede que Deus seja causalmente responsável pela sua natureza Ele simplesmente é sempre causalmente responsável por essas propriedades e pela sua posse essencial delas Como Morris diz Parece simplesmente que não há nada de objetável do ponto de vista lógico ou metafísico quanto a Deus criar a sua própria natureza MORRIS p 48 Suponha que Morris esteja correto nessa questão que Deus é criativamente responsável pela existência de propriedades relações verdades matemáticas verdades lógicas estados necessários de coisas estados possíveis de coisas etc No entanto pode ainda assim ser verdade que o fato de Deus causar a sua natureza não tenha por si mesmo dependido de Deus Pois segundo a visão de Morris embora Deus crie toda a estrutura da realidade não dependia de Deus criar a estrutura que ele criou ou alguma outra estrutura ou mesmo não criar qualquer parte da estrutura que ele criou Deus nunca teve a escolha de criar essa estrutura ou qualquer parte dela pois nas palavras de Morris a criação de Deus da estrutura da realidade é tanto eterna quanto necessária nunca foi nunca será e não poderia ter sido diversa do que é MORRIS p170 Claramente se a criação de Deus da estrutura da realidade nunca poderia ter sido outra que não essa então Deus nunca 314 teve qualquer escolha quanto a criar a estrutura da realidade Ele a criou por necessidade e não livremente Morris está muito consciente da dificuldade observada Sua resposta é rápida e direta ao ponto Referindose à criação por Deus da estrutura da realidade ele escreve Mas existe um sentido um sentido diferente no qual ela mesma pode ser considerada livre É uma atividade que é consciente intencional e não é constrangida nem compelida por qualquer coisa existente independentemente de Deus e do seu poder causalmente eficaz A necessidade da sua criação não é imposta a ele de fora mas é antes uma característica e um resultado da natureza da sua própria atividade que é uma função do que ele é MORRIS p 170171 Aparentemente Morris reconhece que o sentido primário no qual um agente é livre para executar uma ação exige que o agente a poderia ter se abstido de realizar aquela ação ou b poderia ao menos ter se abstido de causar a sua decisão de realizar aquela ação E é esse sentido de ser livre em realizar uma ação que constitui uma condição necessária para uma agente ser moralmente responsável por uma ação que ele realize Morris compartilha a opinião aqui manifesta que a ideia libertária de liberdade é essencial para a responsabilidade moral No sentido primário de ser livre para realizar uma ação o sentido requerido para a responsabilidade moral segundo a posição libertária de responsabilidade moral o poder de não ter causado a decisão de agir é necessário pois sem esse poder o agente não tem controle sobre a realização de uma ação Não cabe ao agente determinar se ele causa ou não sua decisão e subsequente ação E sem tal poder por parte de Deus com respeito à sua criação da estrutura da realidade não faz nenhum sentido agradecer ou louvar a Deus por ter criado essa estrutura eterna Apenas em um sentido Pickwickiano poderíamos ver Deus como moralmente responsável pela criação da estrutura da realidade Isso não significa nega a distinção que Morris estabelece entre Deus e as verdades necessárias que constituem a estrutura da realidade Deus é causalmente ativo de um modo que uma verdade necessária tal como o exemplo dado por Clarke existirem seres inocentes que não sofrem eternamente é necessariamente melhor que 315 existirem seres inocentes que de fato sofrem eternamente não é Porém apesar de tudo o que Morris diz sobre o assunto Deus não tem escolha exceto a de formar o pensamento de que existirem seres inocentes que não sofrem eternamente é necessariamente melhor que existirem seres inocentes que sofrem eternamente E Deus não tem escolha exceto reconhecer a verdade desse pensamento Nenhuma dessas ações da parte de Deus ter tal pensamento reconhecer a sua verdade depende mais de Deus do que depende de uma folha ser movida ou não quando o vento sopra sobre ela Nem a folha nem Deus tem qualquer escolha nesse caso Morris acredita que Deus pode ser a causa de sua própria natureza Ele quer dizer por isso que Deus é tanto a causa das propriedades onisciência onipotência e perfeita bondade quando a causa de Deus ter aquelas propriedades Na verdade Morris sustenta que Deus é causa de todos os elementos constituintes da estrutura da realidade Além do mais Morris está bem consciente de que Deus não tem controle nem sobre o fato de ele causar as propriedades divinas nem sobre o fato de ele ter aquelas propriedades O sentido primário no qual dizemos que um agente é livre ao fazer algo exige que no momento em que ele o fez o agente poderia ter evitado fazer o que fez ou pudesse ter evitado causar a sua decisão de fazer aquela coisa É esse sentido de ter controle que muitos filósofos consideram ser essencial para que um agente seja moralmente responsável por sua decisão e ação Ignoro aqui os casos de responsabilidade derivativa em que um agente livre e conscientemente se coloca numa situação em que há uma causa para que queira fazer X e ele não pode absterse de fazer X Nesses casos num sentido derivativo podese dizer que o agente é moralmente responsável pelo que ele agora deve fazer pois o agente livremente colocase em circunstâncias que ele sabia que exigiriam o seu ato E é porque Deus não é livre no sentido requerido para responsabilidade moral quando ele realiza ações exigidas pelas suas perfeições absolutas que não faz sentido agradecerlhe ou louválo por fazer essas ações Todavia é verdade como Morris assinala que o fato de Deus não ter escolha nem sobre criar a estrutura da realidade nem sobre ter as propriedades de poder absoluto conhecimento e bondade não resulta de outra coisa que lhe imponha essa estrutura e propriedade E isto parece distinguir Deus da folha que não tem escolha sobre como se mover quando o vento sopra A necessidade do movimento da folha élhe imposta por outra coisa o vento A necessidade de Deus fazer o que é melhor é imposta pela natureza de Deus o fato de ele ser perfeitamente bom algo que é interno a Deus e algo que segundo a explicação de Morris o próprio Deus causa mas não teve escolha quanto a causar Assim ao contrário da folha ao ser movida 316 por outra coisa o vento Deus podemos dizer faz necessariamente o que é melhor porque dada sua natureza perfeita ele não pode fazer outra coisa que não seja o melhor E embora Deus cause a sua posse eterna da sua natureza perfeita ele não teve escolha quanto a causar eternamente a sua própria perfeição Considere a questão será que Deus tem mais escolha ao fazer o que é melhor do que a folha se ela fosse dotada de consciência teria quanto a se mover quando a vento sopra É claro que a resposta deve ser não Pois cada um faz necessariamente o que faz como um resultado de fatores sobre os quais nenhum dos dois tem controle E sendo assim pode ser que Deus não seja mais moralmente responsável por escolher fazer o que é melhor do que a folha o é ao moverse quando o vento sopra Mesmo assim a perspectiva que Morris apresenta é um acréscimo significante à literatura sobre o problema da liberdade divina 5 Alternativas à criação do melhor mundo possível Em um ensaio importante e influente Robert Adams argumenta que mesmo se existisse um mundo melhor passível de ser criado Deus não precisa criálo Ele supõe que o mundo que Deus cria contém criaturas cada uma das quais é tão feliz quanto em qualquer mundo possível em que exista Além disso nenhuma criatura neste mundo é tão infeliz que seria melhor se ela não tivesse existido Adams então supõe que existe algum outro mundo possível com criaturas diferentes que excedem este mundo em seu grau de felicidade um mundo que Deus poderia ter criado Assim Deus criou um mundo com um grau menor de felicidade do que ele poderia ter criado Deus agiu mal com alguém ao criar este mundo Adams argumenta que Deus não pode ter enganado as criaturas no outro mundo possível pois seres meramente possíveis não têm direitos Nem tampouco ele pode ter enganado as criaturas no mundo que ele criou pois suas vidas não poderiam ser tornadas mais felizes Adams observa que Deus teria feito alguma coisa errada em criar este mundo se o seguinte princípio fosse verdadeiro É errado conscientemente causar a existência de um ser menos excelente do que se poderia ter causado ADAMS 1972 p 329 317 Mas este princípio argumenta Adams está sujeito a contraexemplos País não fazem nada de errado ele assinala quando se abstém de tomar drogas que resultariam numa estrutura genética anormal para os seus filhos mesmo que tomar as drogas fosse resultar na existência de crianças que são sobrehumanas tanto em inteligência quanto em perspectivas de felicidade Em contraposição ao princípio incorreto que acabou de ser citado Adams efetivamente apoia o princípio mais plausível É errado que seres humanos causem de modo consciente e voluntário a procriação de uma prole de pais humanos que seja notavelmente deficiente em comparação com seres humanos normais em matéria de capacidade mental e física ADAMS 1972 p 330 Partindo destas observações sensatas acerca do que seria certo ou errado que seres humanos fizessem ao gerar uma prole Adams infere que Deus não estaria fazendo algo de errado ao causar a existência de seres humanos que são menos excelentes do que os que poderia ter feito existir Mas antes de aceitarmos esta inferência devemos notar uma diferença importante entre a situação de Deus ao considerar a criação de seres humanos e a situação de pais que consideram a possibilidade de tomar drogas para causar a existência de filhos que sejam sobre humanos tanto em inteligência quanto em perspectivas de felicidade Neste último caso há um contexto herdado de crianças existentes que são geradas de modos normais e que estabelecem o que é normal com relação à inteligência humana e às perspectivas de felicidade Face a este contexto estabelecido tanto dos modos normais de gerar filhos quanto ao que é normal em matéria de inteligência e perspectivas de felicidade é inteiramente sensato concluir que os pais não se encontram sob nenhuma obrigação de gerar crianças nãonormais que sejam sobre humanas tanto em matéria de inteligência quanto de perspectivas de felicidade Mas ao criar as criaturas humanas é o próprio Deus que estabelece qual será a norma da inteligência humana e quais serão as perspectivas de felicidade Não há nenhuma norma já existente da qual Deus possa escolher desviarse seja ao criar seres que sejam subhumanos seja ao criar seres que sejam sobrehumanos em matéria de inteligência e de perspectivas de felicidade E se supusermos que há um limite superior e um limite inferior para a inteligência e a felicidade humanas a questão passa a ser se Deus estaria fazendo algo de errado ao criar seres humanos cujas perspectivas de inteligência e felicidade são um tanto baixas ou que estejam 318 numa mediania dado que ele poderia ter criado outros seres humanos com perspectivas de um nível consideravelmente mais elevado de inteligência e felicidade Concedemos o ponto de que Deus pode não ter feito nenhum mal aos seres humanos que ele de fato criou visto que como Adams supõe eles não poderiam ter sido criados com perspectivas em nada maiores de uma vida boa e feliz Mas continua sendo difícil entender como Deus estaria justificado ao criar criaturas cujas perspectivas de uma boa vida são como ele sabe medíocres em comparação com as de outras criaturas da mesma espécie cujas perspectivas de uma boa vida são como ele sabe muito maiores visto que tal conhecimento é tudo o que pode haver de relevante para a decisão de Deus sobre que criaturas haveria de criar A meu juízo a analogia de Adams fracassa na abordagem desta questão mais séria e por via de implicação fracassa na abordagem da questão séria relativa a estar Deus obrigado a criar o melhor mundo Suponhamos no entanto que deixemos de lado quaisquer discordâncias possamos ter com Adams quanto a estes pontos e que aceitemos a conclusão do seu raciocínio Suponhamos vale dizer que concordemos com Adams quanto a Deus não estar moralmente obrigado a criar o melhor mundo que pode que seria moralmente permissível que Deus criasse o melhor mundo que pode mas também moralmente permissível que Deus criasse quaisquer de uma variedade de bons mundos do tipo que Adams descreve Se este for o caso não podemos concluir que não há nenhum conflito insolúvel entre o fato de Deus ser de modo essencial moralmente perfeito e o fato de ele desfrutar de um significativo grau de liberdade genuína Afinal agora parece se dar o caso de que a perfeição moral de Deus não requer dele que crie o melhor mundo Em suma ele é livre para criar ou não criar qualquer dentre uma variedade de bons mundos Por mais impactante e persuasivos que possam ser os argumentos de Adams não penso que resultem na conclusão de que a perfeita bondade de Deus deixa Deus livre para criar algo menos do que o melhor mundo que ele pode criar O que os argumentos de Adams mostram na melhor das hipóteses é que a perfeição moral de Deus não impõe a Deus nenhuma obrigação moral de criar o melhor mundo que pode Os seus argumentos estabelecem na melhor das hipóteses que não é forçoso que Deus esteja fazendo alguma coisa de moralmente errada ao criar um mundo diverso do melhor mundo Mas isso não é bem a mesma coisa que mostrar que a perfeita bondade de Deus não torna necessário que ele crie o melhor mundo que possa Afinal mesmo ao concedermos os pontos que Adam apresenta ainda pode haver uma inconsistência no fato de um ser moralmente perfeito criar 319 34 Devemos assinalar que a minha versão do princípio de Quinn é apresentado em termos da bondade geral de um mundo e não apenas da sua bondade moral Assim a minha versão do princípio afirma que se um ser onisciente cria um mundo quando há um outro melhor que poderia ser criado então seria possível haver um ser moralmente melhor do que ele Não enfoco exclusivamente como o faz Quinn o status moral de um mundo Afinal alguns bons estados de coisas incluem bens nãomorais como a felicidade assim como bens morais como o exercício da virtude Poderia darse o caso no entanto de ser a diferença meramente terminológica pois Quinn pode sustentar que o status moral de um mundo depende tanto do bem moral quanto do bem nãomoral que o mundo contenha algum mundo diverso do melhor mundo que ele pode criar O ponto aqui é o seguinte Um ser pode ser moralmente melhor do que um outro ainda que não o seja em virtude da realização de alguma obrigação que o outro ser deixou de realizar Pode ser moralmente melhor em virtude de realizar algum ato supererrogatório um bom ato além do exigido pelo dever que o outro ser poderia ter realizado mas não realizou De modo análogo um ser que cria um mundo melhor do que outro pode ser moralmente melhor ainda que o ser que criou o mundo inferior não faça com isso nada de errado Seguindo Philip Quinn estou inclinado a pensar que se um ser todopoderoso e sabedor de tudo cria algum mundo diverso do melhor mundo que ele pode criar então é possível que exista um ser moralmente melhor do que ele é Quinn observa Um agente moral onipotente pode conferir atualidade a qualquer mundo atualizável Se ele atualiza um mundo tal que exista um mundo moralmente melhor que ele ele não faz o melhor que pode falando em termos morais e assim é possível que exista um agente moralmente melhor do que ele é a saber um agente moral onipotente que atualiza um destes mundos moralmente melhores QUINN p 21334 Afinal seria possível haver um ser onipotente que cria o melhor mundo que o primeiro ser poderia criar mas não criou Não deveríamos então concluir que se um ser essencialmente todopoderoso sabedor de tudo é perfeitamente bom cria algum mundo que seja deve ser o melhor mundo que ele pode criar Afinal embora um ser possa não estar fazendo nenhum mal ao criar menos do que o melhor que pode criar um ser cuja natureza consiste em ser perfeitamente bom não é de uma natureza tal que seja possível haver um ser moralmente melhor do que ele Se no entanto um ser houvesse de criar um mundo quando há um mundo melhor que poderia criar então seria possível haver um ser moralmente melhor do que ele 320 O cerne do ensaio de Adams no entanto propõe uma razão para rejeitar a visão que acabamos de formular a de que se um ser houvesse de criar um mundo quando há um mundo melhor que ele poderia criar então seria possível haver um ser moralmente melhor do que ele Afinal esta posição implica nas palavras de Adams que a escolha do criador de um mundo inferior deve manifestar um defeito de caráter E a sua resposta a essa objeção é a de que a escolha de Deus de um mundo menos excelente poderia ser explicada em termos da Sua graça que é considerada uma virtude e não um defeito na ética judaicocristã ADAMS 1972 p 318319 É a compreensão que Adams tem da visão judaicocristã da graça que subjaz ao núcleo da sua objeção à concepção leibniziana de que o ser mais perfeito não pode deixar de agir do modo mais perfeito e consequentemente de escolher o melhor Assim qualquer resposta à visão de Adams segundo a qual Deus não precisa optar por criar o melhor mundo precisa levar em conta a sua visão de que a concepção judaicocristã da graça implica que Deus pode criar um mundo que é menos do que o melhor Adams define o conceito de graça como uma disposição para o amor que não depende do mérito da pessoa amada ADAMS 1972 p 324 Dada a definição e dados dois mundos W1 e W2 que diferem no sentido de que as pessoas em W1 são mais felizes e mais dispostas a se comportar de maneira moral do que o são as pessoas em W2 com o resultado vamos supor de que W1 é um mundo melhor do que W2 resta claro que um Deus cheio de graça não amaria as pessoas em W1 mais do que as pessoas em W2 Ou no mínimo dos mínimos fica claro que se Deus houvesse de amar as pessoas em W1 mais do que as pessoas em W2 não seria por serem moralmente melhores eou mais felizes Como observa Adams A pessoa cheia de graça ama sem se preocupar com o fato de ser a pessoa que ama digna do seu amor ADAMS 1972 p 324 Assim em virtude da sua graça ou Deus amará todas as pessoas num grau idêntico ou o fato de que ele poderia amar uma pessoa mais do que uma outra não teria nada a ver com o fato de que uma possui um grau de mérito ou excelência maior do que uma outra Como Adams afirma a pessoa cheia de graça vê o que é valioso na pessoa que ama e não se preocupa com o fato de ser mais ou menos valioso do que aquilo que poderia ser encontrado em alguma outra pessoa que ela poderia ter amado ADAMS 1972 p 324 E ele nos diz que na tradição judaicocristã a graça é tida como uma virtude que Deus realmente tem e que os homens devem ter ADAMS 1972 p 324 Dado que a graça é como Adams a definiu e que a graça é uma virtude que Deus possui o que podemos inferir sobre o mundo que Deus cria Podemos 321 inferir com Leibniz que se há um melhor mundo Deus deve criar tal mundo É difícil saber o que dizer aqui Tudo o que aprendemos com Adams até aqui é que seria uma coisa distinta do amor o que motivaria Deus a escolher o melhor mundo ou a propósito qualquer mundo Afinal visto que a graça é uma disposição para amar sem levar em consideração o mérito Deus será incapaz de selecionar um mundo de preferência a outro se tudo aquilo em que se baseia é a sua graça A sua graça o seu amor às criaturas independentemente do seu grau de mérito o deixará livre para criar qualquer mundo que tenha criaturas capazes de fazer o bem moral ou o mal moral independentemente de quão boas ou más elas possam ser em tal mundo Assim se Deus tiver uma razão para escolher um mundo criado de preferência a outro em vez de pegar um de modo cego por assim dizer tal razão terá pouco ou nada a ver com a graça Afinal dada a doutrina da graça o amor de Deus pelas criaturas não se baseia na qualidade moral religiosa etc das vidas que levam e é difícil ver em que outra coisa em suas vidas ele poderia se basear Na verdade parece ser inteiramente negativa a implicação da doutrina cristã da graça para a escolha feita por Deus de um mundo a criar em vez de fornecer uma razão pela qual ele poderia escolher um mundo criado em particular ou excluir outros mundos criados ela simplesmente nos diz que se Deus cria um mundo com criaturas o seu amor pelas criaturas em tal mundo não pode ser a sua razão para criálo Afinal o seu amor pelas criaturas é inteiramente independente de quem são ou do tipo de vidas que levam Basear o seu amor em quem eles são e nos tipos de vidas que levam seria o mesmo que tomar tais pessoas e as suas vidas como mais merecedoras do seu amor do que as outras pessoas e as suas vidas O que vimos até agora é que a graça de Deus o seu amor pelas criaturas sem levar em conta o seu mérito não pode fornecer a Deus uma razão para criar o melhor mundo o qualquer outro mundo em particular que seja menos do que o melhor E o que isso significa é que qualquer que seja a razão que Deus tenha para optar por criar um mundo criado de preferência a outro não pode ser encontrada no seu amor gracioso pelas criaturas Para argumentos adicionais em apoio a este ponto confira Thomas 1996 No que então dado que Deus tem uma razão para criar um mundo de preferência a outro residiria tal razão Não residiria no amor gracioso de Deus mas sugiro no seu desejo de criar o primeiríssimo e melhor estado de coisas que ele pode criar Ter um tal desejo creio não exclui o amor gracioso Não implica que Deus não possa amar nem que não ame igualmente as piores criaturas junto das melhores criaturas Deixemme explicar usando uma 322 analogia própria Pais amorosos podem estar dispostos a amar plenamente qualquer criança que nasça deles independentemente de quaisquer talentos que tal criança seja capaz de desenvolver Mas um tal amor é consistente com uma preferência por ter uma criança que nascerá sã sem deficiências mentais ou físicas uma criança que desenvolverá as capacidades dele ou dela de ter generosidade para com os outros que desenvolverá os gostos dele ou dela para a música a boa literatura etc E de maneira semelhante Deus amará graciosamente qualquer criatura que possa optar por criar e não apenas as melhores criaturas possíveis Mas isso não exclui a possibilidade de Deus ter uma preferência por criar criaturas que se esforçarão como criaturas não apenas para ter uma boa vida mas também para levar uma boa vida criaturas que se desenvolverão livremente da sua própria maneira até se tornarem filhos de Deus Com efeito embora o amor de Deus se entenda a toda criatura possível seria estranho sugerir que ele por esse motivo não poderia ter uma preferência por criar um mundo com tais criaturas de preferência a um mundo no qual as criaturas usem a sua liberdade para abusar de outros em que usem os seus talentos para transformar o bem em mal e a devotar as suas vidas a fins egoístas Seguramente o fato de Deus amar graciosamente todas as criaturas possíveis não é inconsistente com o fato de ter uma preferência por criar um mundo com criaturas que usarão a sua liberdade para buscar o melhor tipo de vida humana Como ele não poderia ter uma tal preferência Além disso conforme sugeri se Deus não tivesse uma tal preferência o seu amor gracioso pelas criaturas não lhe daria nenhuma razão para selecionar qualquer mundo possível em particular para a criação Afinal o seu amor gracioso por toda e qualquer criatura falha em lhe fornecer uma razão para criar um mundo de preferência a outro ou para criar as criaturas num mundo possível em vez de em outro Assim se Deus não fica reduzido a uma situação de ter de jogar dados com relação à seleção de um mundo para criar deve haver alguma base para a sua seleção para além do seu amor gracioso por todas as criaturas independentemente do mérito E uma tal base dada a natureza de Deus enquanto ser absolutamente perfeito só pode ser como Leibniz e Clarke afirmaram a de fazer sempre o que é a coisa melhor e mais sábia a ser feita E seguramente o que Deus pode fazer de melhor e mais sábio é criar o melhor mundo que possa Ademais fazêlo parece ser inteiramente consistente com o amor gracioso de Deus por todas as criaturas independentemente do seu mérito Adams no entanto simplesmente rejeita a posição que acabou de ser descrita uma posição que considera o amor gracioso de Deus pelas criaturas sem atenção ao mérito como sendo inteiramente consistente com o fato de ele ter uma 323 preferência quando tudo é considerado por criar o melhor mundo que possa Depois de assinalar que a graça divina é um amor que não é dependente do mérito da pessoa amada Adams passa a extrair a conclusão de que embora Deus houvesse de ser livre para escolher as melhores criaturas ele não pode ter como a sua razão para optar por criálas o fato de que são as melhores criaturas possíveis A graciosidade de Deus ao criar não implica que as criaturas que Ele escolheu criar devem ser menos excelentes do que as melhores possíveis Implica em vez disso que mesmo que sejam as melhores criaturas possíveis este não é o fundamento para a Sua escolha delas E implica que não há nada na natureza ou no caráter de Deus que exigiria que Ele aja com base no princípio da escolha das melhores criaturas possíveis para serem o objeto dos seus poderes criativos ADAMS 1972 p 324 Conforme o meu entendimento a disposição de Deus a amar independentemente do mérito das pessoas amadas não acarreta nenhuma implicação quanto a qual pode ser a razão de Deus para criar um mundo em particular exceto pelo fato de que a sua razão não pode ser o fato de que ele ama os seres neste mundo mais ou menos do que os seres em outros mundos Ademais o fato de ter uma preferência quando tudo é considerado por criar o melhor mundo não precisa estar radicado num amor maior por seres que são melhores do que outros seres Afinal devido ao Princípio das Unidades Orgânicas vide MOORE p 187 o melhor todo pode ter algumas partes que não são as melhores Portanto o melhor mundo pode conter alguns seres humanos que não são melhores ou nem mesmo tão bons quanto as suas substituições no mundo mais próximo do melhor mundo E Deus pode escolher criaturas que optarão por crescer moral e espiritualmente de preferência a criaturas que não optarão por crescer moral e espiritualmente e escolhêlas exatamente por essa razão sem que com isso ame mais as primeiras do que as últimas nem que as ame por causa do seu maior mérito A graça de Deus exclui a opção de criar o melhor mundo por ele amar os seus habitantes mais do que os habitantes de algum mundo inferior Mas não exclui a possibilidade de Deus optar por criar o melhor mundo por preferir criar as melhores pessoas contanto que ele não as ame mais do que aos habitantes de mundos inferiores Adams é claro deve estar tomando como assente que se a razão de Deus para criar um mundo 324 de preferência a outro for o fato de que as criaturas no primeiro mundo são muito melhores do as criaturas no segundo mundo de alguma maneira se segue logicamente disto que Deus deve amar as criaturas no primeiro mundo mais do que ele ama as criaturas no segundo Mas não há nada na sua apresentação da visão de que o amor de Deus pelas criaturas é independente dos seus méritos que produza este resultado Parece então que não há nenhuma boa razão para pensar que o conceito judaicocristão da graça exclua a posição de Leibniz e Clarke segundo a qual Deus deve criar o melhor mundo contanto que exista um melhor mundo Por fim devese notar que pode não haver nenhum melhor mundo possível Em vez disso pode darse o caso de que para qualquer mundo haja um mundo melhor Ou talvez haja vários mundos igualmente bons tais que não haja nenhum mundo melhor do que eles Uma outra possibilidade aparente é a de que haja mundos incomensuráveis mundos tais que não seja possível nenhuma comparação em termos do que é melhor Cada uma destas possibilidades tem implicações para a questão da liberdade divina com relação à criação Referência bibliográfica ADAMS R Must God Create the Best Philosophical Review 81 p 317332 1972 ADAMS R Leibniz Determinist Theist Idealist Oxford Oxford University Press 1994 AUGUSTINE The City of God trans M Dods New York Random House 1948 BERGMANN M COVER J Divine Responsibility without Divine Freedom Faith and Philosophy 234 p 381408 2006 BLUMENTHAL D Is the Best Possible World Possible Philosophical Review 84 p 163177 1975 BROWN R F Gods Ability to Will Moral Evil Faith and Philosophy 8 p 320 1991 CHISHOLM R M The Defeat of Good and Evil In ADAMS M ADAMS R ed The Problem of Evil Oxford Oxford University Press 1990 CLARKE S A Demonstration of the Being and Attributes of God 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de Filosofia do Instituto Federal de Alagoas Gaspar Rodrigues de Souza Neto tradutor Doutorando em Filosofia pela UFRN e mestre em Filosofia pela UFPE Atualmente é Professor Tutor de Filosofia na UNICAP e professor de Filosofia no Ensino Fundamental II e Médio na rede do Colégio 2001 Gerson Francisco de Arruda Júnior revisor Doutor em Filosofia pela Universidade de Lisboa Atualmente é professor de filosofia na Universidade Católica de Pernambuco