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Psicologia Social

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Psicologia em Pesquisa UFJF 72 220229 JulhoDezembro de 2013 DOI 105327Z19821247201300020010 Trajetórias Investigativas da Possessão Uma Abordagem Etnopsicológica Investigative Courses on Spirit Possession An Ethnopsychological Approach Rafael de Nuzzi Dias I José Francisco Miguel Henriques Bairrão I Resumo Não obstante a sua grande difusão na sociedade nacional o estudo da possessão tem recebido relativamente pouca atenção por parte dos psicólogos brasileiros Neste artigo com base em uma revisão da principal literatura clássica e contemporânea sobre possessão e na descrição sumária dos resultados de algumas pesquisas discutemse vantagens comparativas de uma abordagem etnopsicológica da possessão embasada na psicanálise lacaniana Palavraschave Etnopsicologia possessão psicanálise e cultura cultos afrobrasileiros Abstract Despite its large diffusion in the national society the study of possession has received relatively little attention from Brazilian psychologists In this article based on a review of major classic and contemporary literature about possession and on a brief description of some researches results comparative advantages of an ethnopsychological approach to possession grounded in Lacanian psychoanalysis are discussed Keywords Ethnopsychology spirit possession psychoanalysis and culture afrobrazilian cults I Universidade de São Paulo Ribeirão Preto Brasil Embora a utilização científica do conceito de possessão possa ser objeto de discussão e mesmo de objeção e mereça ser investigada a sua genealogia que mais não seja em virtude do elo que implicita mente estabelece entre a demonologia cristã e práti cas de povos selvagens Johnson 2011 é fato que independentemente dos termos adotados e da sua diversidade há na maioria das culturas dispositivos culturais que permitem a outras vozes falarem por meio dos corpos humanos e há indícios de que elas falam mais vezes e mais alto em contextos de dissidên cia contra situações de opressão e de subordinação de uma cultura por outra Hegeman 2013 O transe de possessão a comunicação direta com o sagrado através da incorporação de espíritos por pessoas dispostas e preparadas para a função é um fenômeno complexo existente em todo o mundo e elemento central na maioria dos sistemas religiosos Bourguignon 1973 que há muito intriga os pesqui sadores tendo se tornado um importante campo de estudo das ciências humanas e sociais Contudo não obstante enquanto forma parti cular de contato com o sobrenatural seja uma referên cia constante na religiosidade brasileira um fenômeno que é bastante familiar a todos na nossa cultura mas que nem por isso deixa de despertar sentimentos con traditórios de medo e fascínio Birman 1985 p 89 até o momento os estudos sobre a possessão cal cados em abordagens por assim dizer transdisciplina res sensíveis não apenas aos seus aspectos simbóli coculturais e sociológicos mas também aos subjetivos e psicológicos restringiramse em grande medida a autores estrangeiros Tal fato não é casual sendo corolário por um lado do ainda restrito número de Dias R N Bairrão J F M H 220 Psicologia em Pesquisa UFJF 72 220229 JulhoDezembro de 2013 cientistas sociais brasileiros empenhados em investigar a possessão levando em consideração suas dimensões propriamente psicológicas e por outro consequência do relativo desinteresse da Psicologia brasileira em re lação às religiões de forma em geral e aos cultos de possessão em particular O presente artigo tem por objetivo proceder com base em uma revisão da literatura científica clás sica e mais recente sobre possessão e apoio em uma exposição sumária de alguns resultados de pesquisa a uma apresentação das contribuições e utilidade de uma abordagem etnopsicológica viabilizada por aportes teó ricometodológicos oferecidos pela psicanálise em sua vertente lacaniana no intuito de mostrar como esta possibilita enfrentar o estudo dessa temática ultrapas sando dificuldades e aprofundando soluções das abor dagens anteriores Os Primórdios dos Estudos sobre a Possessão e o Problema dos Reducionismos Em trabalho clássico Concone 1987 apre senta algumas das principais concepções científicas propostas sobre a possessão chamando a atenção para como as discussões giraram ao longo de décadas em torno da temática da normalidade sendo a posses são muitas vezes caracterizada como patologia mental ou inversamente como uma espécie de terapia catár tica coletiva Nesse contexto um dos aspectos mais enfatizados é a consideração do transe de possessão como um estado transitório e reversível de alteração da consciência caracterizado por processos dissociati vos e descontinuidades das funções da personalidade e dos padrões comportamentais normais A subordinação do estudo da possessão ao campo da saúde mental seja para tentar escrutinála psiquiatri camente Onchev 2001 seja para ensaiar explicála pela psicanálise Hollan 2000 seja para simplesmente deba ter se e em que medida pode ser entendida como um fenômeno normal ou patológico Cardeña Van Duijl Weiner Terhune 2009 seja para propôla como um dispositivo terapêutico Bojuwoye 2013 embora tenha sabido reformularse e sofisticarse ao longo do tempo Swartz 2011 é recorrente e ainda atual Seria possível alongarse a este respeito mas por não ser esse o objetivo do presente artigo a cunho ilustrativo apenas nos dete remos em alguns dos trabalhos mais recentes e represen tativos deste viés A propósito do culto zar que desde o trabalho pioneiro de Leiris 19581996 talvez seja o principal campo de pesquisa e de reflexão acadêmica sobre pos sessão o etnopsiquiatra Tobie Nathan já em pleno sé culo XXI afirma sem reserva que o djinn palavra ára be de que se originou o português gênio central no zar pode ser entendido como um conceito suscetível de implicações populares e clínicas e que o seu trata mento requer um enfoque que combine psicopato logia com Sociologia e Antropologia Nathan 2005 Deste modo ostensivamente ignora ou menospreza a volumosa literatura que vê no culto zar muito mais do que patologias e terapias e que tem sublinhado prestarse à expressão dos mais diversos temas culturais dentre os quais constructos etnopsicológicos de self e de mundo concepções de bem e de mal e assimetrias de poder en tre os sexos Nelson 1971 compreensão que pode se alargar ao entendimento da possessão neste caso e em outros similares como um meio de produzir sentidos a respeito das circunstâncias cambiantes da vida coti diana e um metacomentário dramatizado a respeito de acontecimentos locais atuais Kenyon 1995 muitas vezes em termos satíricos que possibilitam uma espé cie de crítica velada e de reflexão sobre a condição de mulher Boddy 1989 Mas Nathan não está sozinho como o comprovam estudos igualmente recentes sobre uma jovem italotunisina tratada por uma combinação de psiquiatria transcultural com fluoxetina Bragazzi Del Puente 2012 e o estudo de caso de um meni no egípciocanadense Guzder 2007 Assiste total razão a Lambek 1988 quando afirma que a possessão deve ser vista precipuamente como uma instituição social e apenas secundariamen te como aflição ou terapia e dado o reducionismo e o preconceito inerentes àquelas abordagens histori camente a ênfase tem se deslocado para sua dimensão sociológica e cultural sendo o transe de possessão en tendido como crença que tecnicamente só pode ser vinculada a um contexto cultural isto é a um conjunto de fórmulas explicativas de caráter místi co Concone 1987 p 99 Transferido o eixo do problema modificouse também seu campo disciplinar de referência que migrou da Medicina para as Ciências Sociais Con sequentemente sob várias abordagens que acompa nharam a trilha das grandes escolas que emergiram nas Ciências Sociais ao longo do século passado o transe de possessão foi perscrutado em termos da sa tisfação pessoal que provoca e das funções terapêuti Investigação Etnopsicológica da Possessão 221 Psicologia em Pesquisa UFJF 72 220229 JulhoDezembro de 2013 cas que desempenha Boddy 1988 como expressão e reflexão individual Masquelier 2002 ou coletiva de memórias ou acontecimentos atuais aflitivos Bairrão 2004 como meio de resistência velada à subordina ção a estruturas de gênero Brac de la Perrière 2007 como uma afirmação de exclusividade sobre o atinen te ao saber nativo Van De Port 2005 ora portavoz do socialmente desviante ora como mecanismo ativo mantenedor do status quo Lewis 1977 ou ainda como drama e performance cultural fenômeno espe tacular legitimado segundo linhas de força articuladas no interior do sistema religioso Turner 1988 ape nas para mencionar algumas abordagens Em estudo sobre a possessão no candomblé an gola Goldman 1984 empenhado em uma aborda gem estruturalista e antirreducionista que desse conta da estrutura lógica subjacente ao fenômeno e repousa ria em última instância sobre mecanismos básicos do pensamento p 158159 endossa a tese de que his toricamente se sobressaíram fundamentalmente dois modelos teóricos básicos para a explicação do êxtase religioso que possuem em comum um caráter essen cialmente reducionista seja reduzindo o transe a uma esfera biopsicológica enca randoa ora como doença mental propria mente dita ora como forma de tratamento primitivo para esse tipo de perturbação ou ainda no máximo considerandoo como emergência direta de fenômenos psí quicos normais seja transpondo esse re ducionismo para um plano interno à so ciedade e vendo na possessão e no culto que a encerra o puro reflexo de estruturas sociopolíticas abrangentes tidas como mais substantivas e determinantes Goldman 1984 p 193 Consequentemente Goldman 1984 alerta que o enfrentamento teóricometodológico do etno centrismo e do reducionismo deve ser pressuposto na formulação de propostas para a investigação da pos sessão Isso não obstante ele mesmo ao propor uma abordagem verdadeiramente antropológica volta da ao desnudamento de suas estruturas discerníveis simbolicamente não a reconhecer enquanto veículo portador de subjetividades expressas em nível sensível e estético De modo que apesar da contribuição que empreende ao deslocar a tradição dos estudos sobre os cultos de possessão do âmbito dos modelos redu cionistas calcados na tradução do fenômeno em termos palatáveis a constructos teóricos extrínsecos e previamente estabelecidos Goldman desconsidera que é preciso transitar por intensidades sensíveis por vezes impensáveis e indizíveis com vistas a apreender e conhecer o fenômeno humano em sua totalidade FavretSaada 2005 Na realidade um amplo movimento de revisão e ruptura no campo dos estudos acerca da possessão a partir da tomada de consciência dos problemas do etnocentrismo e do reducionismo já estava em curso Concone 1987 exemplifica essa tendência ao afir mar que o comportamento religioso específico no caso o transe de possessão só pode ser convenientemente avaliado no quadro das regras do comportamento religioso das normas de comunicação Os atos es pecíficos só podem ser compreendidos dentro desse universo de normas e as ações só fazem sentido quando referidas a um universo semântico p 111112 grifos nossos Além da ênfase na necessidade de se levar em conta o quadro de referência cultural intrínseco ao fe nômeno compreendendoo em seus próprios termos ou seja na linguagem daqueles que o vivenciam esse trecho apresenta outra perspectiva norteadora dos es tudos contemporâneos acerca do transe de possessão sua dimensão comunicativa A Possessão como Fenômeno Comunicativo e Reflexivo Apesar das diferenças encontradas no transe de possessão em diferentes culturas os modelos con temporâneos parecem convergir no reconhecimento da centralidade de suas dimensões comunicativa e reflexiva e tentam fornecer respostas às importantes questões imediatamente suscitadas quem comunica exerce agência O que se comunica e elabora Como a comunicação se manifesta e sob que condições en gendra reflexão Em que termos a comunicação refle xiva fornece escopo a um modelo teórico que abranja o fenômeno em seus mais variados níveis psíquico social histórico simbólico cultural estético ritual performático e corporal Dias R N Bairrão J F M H 222 Psicologia em Pesquisa UFJF 72 220229 JulhoDezembro de 2013 Os espíritos podem assumir novas conotações em função de mudanças culturais Ambros 2010 A este propósito cumpre dizer que muitas vezes a possessão foi discutida em termos lato sensu parapsi cológicos como se houvesse de se admitir ou refutar nos seus episódios a interveniência real de coisas tais como espíritos sobrenaturais Na realidade esse en foque não parece autorizarse do ponto de vista do que se infere das suas manifestações Bairrão 2008b que em diferentes graus podem reconhecerse clara mente como em si mesmas uma espécie de ficção ou teatro alusivo a espíritos Snodgrass 2002 sem que com isso de modo algum se desautorize a verdade da experiência e as suas implicações subjetivas Crapanzano 1977 entende a possessão como um idioma cultural coletivamente compartilhado ca paz de fornecer aos indivíduos e grupos que dele se uti lizam a capacidade de articular comunicar e elaborar as mais variadas experiências e situações da vida cotidiana Entretanto salienta que os sentidos que se consubstan ciam no idioma da possessão são articulados de modo eminentemente relacional por meio de relações con tinuamente estabelecidas no interior de enquadres so ciais definidos que implicam não apenas uma estrutura simbólica calcada em padrões lógicos de referência embora essa gramática seja da maior relevância mas também uma irredutível dimensão dialógica Des sa forma para se compreender a possessão seria im prescindível estar atento não apenas aos espíritos mas também às relações dialogicamente estabelecidas entre eles os médiuns que os recebem e a comunidade que os acolhe e cultua por meio de uma abordagem capaz de abarcar o fenômeno tanto em suas dimensões lexical e sintática quanto em sua dimensão relacional subjeti vamente referida e perscrutar a mediação que se opera entre os níveis pessoal coletivo e histórico simbolizan do experiências complexas e fornecendo aos agentes do culto pontos de orientação biográfica coletivamente compartilhados Na mesma linha Lambek 1980 sublinha a exis tência de uma dimensão subjetiva inerente e concomi tante aos aspectos simbólicos da possessão concebendoa como um sistema simbólicocomunicativo capaz de vei cular mensagens em vários níveis e mediar as esferas pes soal e coletiva da experiência através do estabelecimento de negociações entre a multiplicidade de posições e pa péis que interpelam o sujeito membro de uma sociedade e participante de uma cultura Entretanto tais mensa gens seriam apenas discerníveis por aqueles familiariza dos com as propriedades específicas que imprimem or ganicidade lógica ao sistema e inseridos nos contextos pragmáticos em que se expressam cerimoniais e litúrgi cos mas também cotidianos e ordinários Obeyesekere 1981 é outro autor preocupado com a dimensão subjetiva envolvida nas produções de sentidos que se efetuam em meio a processos simbó licoculturais Partindo da crítica aos cientistas sociais que negam a existência de uma dimensão psicológica inerente aos símbolos culturais e utilizandose de um enfoque psicanalítico o autor defende que os símbolos operam simultaneamente em nível pessoal e cultural ambos mutuamente imbricados na conformação da experiência religiosa A possessão permite ao indivíduo apropriarse de símbolos que consubstanciam a produ ção de sentidos de realidade compartilhados em lugar de fantasias ou delírios individuais e propiciam integra ção social criando laços de pertencimento e solidarieda de e psíquica fornecendo dispositivos simbólicos que estabelecem elos entre as exigências motivacionais do sujeito e os imperativos organizacionais da sociedade Stoller 1995 desenvolve uma abordagem da pos sessão que leva em consideração sua dimensão estética e sensível corporalmente inscrita ou seja que inclua os sentimentos sensações intuições e percepções vividas nos seus mais variados níveis Concebendo o corpo e suas propriedades sensoriais e perceptivas como um verdadei ro lócus de saber capaz de armazenar e refletir memórias coletivas cognoscentes Stoller discute como ao inscreve remse no corpo vivo e conceberemse como uma espécie de poética comovente e arrebatadora os espíritos evocam o passado em revivências que reelaboram o presente e permitem sínteses compreensivas e construtivas entre as pessoas e os seus lugares no mundo e na história Além disso salienta a importância de serem levadas em conta não apenas as experiências dos nativos mas também as do pesquisador o que requer uma percepção mais ampla e aguda que envolva e conceda dignidade epistêmica ao corpo suas sensações e afetos Mageo 1996 apresenta os cultos de possessão como sistemas comunicativos veiculadores de discur sos morais históricos e geográficos constitutivos da memória coletiva de um povo entremeados a signifi cados e experiências subjetivas atinentes ao indivíduo possuído Partindo de uma perspectiva que reconhe ce e integra os níveis individual psíquico e coletivo sóciohistóricocultural do fenômeno afirma que muitas das tensões e contradições vivenciadas pelos possuídos e mobilizadoras de suas crises encontram sua fundamentação em conflitos coletivos calcados em paradoxos morais histórica e culturalmente cons Investigação Etnopsicológica da Possessão 223 Psicologia em Pesquisa UFJF 72 220229 JulhoDezembro de 2013 truídos daí a possibilidade de serem expressos e refle tidos através da manipulação dos símbolos mobiliza dos pela possessão Corin 1998 discute como o diálogo com os espíritos permite negociações capazes de rearticular estruturalmente a posição do sujeito em relação aos conflitos que o perturbam Tomados como alterida des cognoscentes e familiares eles apresentam uma possibilidade de interlocução e subjetivação de ten sões vivenciadas imaginariamente como um embate entre si mesmo e outros poderes subjugantes e opressivos Consequentemente emoções inconfessas desejos insuspeitos e imperativos socioculturais são simbolicamente remodelados ressignificados e subje tivados adquirindo novo estatuto e dignidade à me dida que os espíritos fornecem operadores simbólicos que viabilizam o estabelecimento de novas identifica ções capazes de remodelar a maneira como o indiví duo experiencia a si mesmo e se situa em meio à socie dade onde está inserido evadindose de uma posição de vítima impotente e tornandose agente frente aos dramas e acontecimentos da sua vida Kramer 1993 sublinha o estatuto essencial mente epistêmico e ontológico do fenômeno instru mento de transmissão armazenamento e reelaboração de saberes constitutivos da realidade dos povos que dele se beneficiam Interessado na temática da arte o autor argumenta que os chamados objetos de arte africanos não se constituem enquanto tal no contex to das culturas em que foram forjados manifestan do na realidade uma forma cultural de produção de conhecimento sobre o outro seja ele o estrangeiro o socialmente desviante a natureza antítese da civili zação ou outros internos emoções sensações im pulsos Paralelamente afirma que o mesmo se aplica aos cultos de possessão uma vez que o encontro com o sagrado é via de acesso a relações de alteridade in dispensáveis à produção de sentidos capazes de darem forma e consistência ao fragmentado mundo da expe riência Assim aspectos contraditórios da experiência individual ou coletiva podem ser integrados e rear ticulados simbolicamente na possessão por meio da comunicação e da identificação com poderes outros presentificados em espíritos dotados de força desejos e intenções Augras 2008 sustenta o potencial da possessão para a conformação de processos dinâmicos de trans formação pessoal metamorfoses identitárias por meio da experiência de duplos articulados no interior de redes de relações sociais comunitárias e rituais e simbólicas míticas Ademais destaca que tais efeitos são possíveis pela existência de um sistema simbólico compartilhado salientando ainda a importância de aspectos não verbais na veiculação de mensagens car regadas de forte teor emocional Uma Abordagem Etnopsicológica da Possessão Umbandista Segundo Levine 2005 Etnopsicologia é uma abordagem descri tiva da experiência humana que levan ta questões teóricas difíceis tanto para a psicologia como para a antropologia Ao descrever as categorias psicológicas nativas de uma cultura em particular le vanta a questão de saber se os conceitos psicológicos ocidentais são apropriados ou necessários para entender pessoas em contextos nãoocidentais e se a psicolo gia como a conhecemos é apenas uma dentre muitas conceptualizações possí veis em vez de uma teoria científica de validade universal Concomitantemente uma consideração etnopsicológica põe em questão se a experiência individual e coletiva pode ser adequadamente com preendida exclusivamente em termos de categorias culturais nativas ou se para uma explicação satisfatória requer a as sunção de processos mentais universais p 475476 tradução nossa Ainda conforme Levine a etnopsicologia foi independentemente inventada muitas vezes por pesquisado res de campo que encontraram gente de outras culturas usando termos vernáculos para descrever e explicar o que podería mos chamar de seus processos mentais e experiências subjetivas 2005 p 476 de modo que um passo a ser dado pelos estudiosos da área seria a condução de investigações por pesquisa dores que orientassem a sua atenção para as suas próprias culturas de origem em vez do modelo tradicional de oci dentais que procedem a longas e exaustivas imersões em outras culturas Exemplificao mencionando os estudos Dias R N Bairrão J F M H 224 Psicologia em Pesquisa UFJF 72 220229 JulhoDezembro de 2013 de Doi 1973 sobre relacionamentos interpessoais no Japão e de Obeyesekere 1981 sobre possessão no Sri Lanka Algo dessa ordem tem vindo a desenvolverse no Brasil com base em cultos de possessão afrobrasileiros em interpretações dos seus pontos de vis ta Bairrão 2003a p 289 Quando interpeladas tais perspectivas podem como a umbanda A possessão umbandista caracterizase pela aber tura ao atípico e ao inesperado sendo sua prática ra ramente atrelada a um controle rígido o que permi te a conformação de espíritos singulares que podem variar de um terreiro ou de um médium para outro dependendo de suas idiossincrasias e de seus aspectos biográficos genealogias familiares valores e aspirações Rotta Bairrão 2012 Nesse contexto memórias coletivas e cenários históricogeográficos também po dem alçarse a significantes e diretrizes para a ação Macedo Bairrão 2011 Essas possibilidades en tretanto estão longe de serem caóticas ou arbitrárias encontrando limites estabelecidos por certos tipos de personagens como caboclos pretosvelhos baianos boiadeiros ciganos pombagiras exus dentre outros menos recorrentes Concone 2001 Em geral articulados a partir de figuras popula res que simbolizam e rememoram episódios dramáti cos da história nacional esses personagens ou catego rias espirituais são em seu conjunto o eixo central dos ritos e mitos umbandistas cada qual com caracterís ticas tipológicas específicas bem demarcadas e relati vamente persistentes e uniformes Na prática tais es píritos apresentamse como agentes que se expressam estética corporal e verbalmente Pagliuso Bairrão 2010 e configuram a dimensão propriamente enun ciativa da umbanda Bairrão 2005 lugares simbó licos que organizam sentidos no interior do sistema religioso Tal qual o sistema de iluminação de um palco composto de luzes estrategicamente posicionadas opostas oblíquas ou adjacentes entre si a um banda é composta por perspectivas Bairrão 2002 que delimitam e circunscrevem a maneira específica por meio da qual são abordados ou iluminados os conteúdos postos em seu palco enunciativo Essas perspectivas são correlativas às categorias do panteão e seus subtipos personagenssímbolos que funcionam ao mesmo tempo como imagens que convidam a olhar e outros olhares que iluminam circunscrições próxi mas do mesmo contexto imaginal e podem narrálo e narrarse ao incorporaremse lançar luz a certos aspectos de um conteúdo factual ou ideacional sendo entretanto incapazes de ilu minar outros assim como determinada luz em um palco é incapaz de iluminar a face oculta de um obje to focado Comparandose os efeitos de iluminação produzidos desde diferentes perspectivas podese ve rificar que são complementares compõem uma orga nicidade lógica estabelecem relações e discriminam aquilo que só pode ser visto ou apreendido quando contemplado de uma determinada posição Ademais essas perspectivas enunciativas compor tam uma dimensão dupla Por um lado referem posições subjetivas lugares desde onde se pode atuar como su jeito articuladas em torno de símbolos extraídos da matériaprima disponível na cultura compreendida aqui nos termos do Outro lacaniano como função de alteridade identificada ao funcionamento da linguagem em sentido amplo conjunto de significantes submeti dos a determinadas regras de encadeamento Por outro lado abrangem também o espectro de sentidos passíveis de serem imaginariamente pro duzidos desde determinadas posições espécie de po tencial semântico que define os usos pragmáticos que podem ser empreendidos na elaboração de conflitos e situações cotidianas Como alguns sentidos somente podem ser enunciados pela via de determinados ele mentos do código ou seja não podem prescindir de uma ancoragem significante específica ocorre que a cada posição corresponde um potencial semântico circunscrito aos tipos de relações de significância que podem surgir em meio às associações significantes estabelecidas pelos adeptos no afã de obterem uma mediação significativa de suas vivências de realidade Nesse sentido as entidades espirituais devem ser também pensadas em função de como os traços simbólicos que as compõem acontecem e se ajustam à singularidade de cada médium Bairrão 2003a p 286 ou seja dos usos psicológicos que cada médium faz de seu panteão pessoal Pensar as idiossincrasias das entidades que incorporam em determinado médium não é o mesmo que abordálas enquanto produtos só ciohistóricos de modo que se pode falar delas tanto num contexto subjetivo e singular intrínseco à dupla médiumentidade quanto num contexto cultural simbolicamente articulado Rotta Bairrão 2010 Investigação Etnopsicológica da Possessão 225 Psicologia em Pesquisa UFJF 72 220229 JulhoDezembro de 2013 O reconhecimento desses dois níveis imbrica dos desde onde se pode perscrutar o fenômeno um simbólicocultural e outro subjetivopragmático pa rece o ponto de partida para a reflexão de como uma aproximação pela via da psicanálise na sua vertente a possibilidade de uma alteridade íntima que se desdobra em alteridade social p 167168 Porém cabe definir o que se implica pela di lacaniana torna possível entender a possessão um bandista não meramente como um tipo de ritual capaz de pôr em cena um vasto repertório de símbolos mas como sendo intrinse camente um dizer um processo enuncia tivo Bairrão 2007 p 165 canal polissêmico veiculador de mensagens em diversos níveis e sistema idiomático composto por sig nificantes passíveis de serem apropriados e remodela dos para a conformação de sentidos subjetivados ape nas discerníveis no âmbito das trajetórias individuais de seus interlocutores Além de fenômeno cultural em sentido estri to repertório de símbolos e imagens que resguarda tradições valores e memórias de parte significativa dos brasileiros a cosmologia umbandista apresentase simultaneamente como matériaprima significativa e significante disponível à reflexão de experiências in dividuais e coletivas Bairrão 2003b transmutando representações étnicas ancestrais em traços de iden tificação e marcas de pertencimento com as quais é possível situarse no mundo contemporâneo Bairrão 2011a Tal processo se dá na relação que cada umbandista estabelece com os espíritos que in corpora ou com os quais se identifica pois é no espaço dialógico estabelecido diacronicamente com o sagra do enunciante que são promovidas as transformações identitárias que permitem ao sujeito vislumbrar novas maneiras de entender e se inscrever no mundo Con forme atesta Bairrão 2007 É crucial entender a leitura do psicológico no espiritual tãosomente como espelha mento do sujeito por um sagrado intrin secamente especular Frequentemente é em transe com base na reflexão dos espí ritos que o sujeito se interpela e se pune absolve ou admoesta As personificações de categorias do transe não apenas inte gram uma espécie de diálogo do sujeito consigo mesmo como também encar nam relações sociais Sempre manifestam mensão enunciativa da possessão Quem efetivamente enuncia produzindo efeitos discerníveis tanto no nível simbólicoestrutural do sistema quanto no de uma se mântica do vivido que organiza e integra aspectos exis tenciais e subjetivos do agente religioso Certamente não o médium resumido à sua individualidade consciência redutível a uma dimensão psíquica objetiva mas algo de si além da sua autorrepresentação que tem como marca indelével a insistência em fazerse movimento forçando trilhas de sentido possíveis através dos significantes dis ponibilizados pelo Outro Mais especificamente quem enuncia são os espíritos pensados não enquanto entida des proposicionalmente conceptualizáveis afinal não se pretende dizer o que os espíritos em última instância são procedimento que desvirtuaria a proposta em algum tipo de teologia ou metafísica mas enquanto reali zações subjetivas de algum aspecto do ser irredutível à consciência Na umbanda os espíritos realizam dimen sões do Espírito como letras na acepção psicanalítica lacaniana em função de agência inscri tas corporalmente e portanto operam como significantes representantes do su jeito perante outros significantes plastica mente antropomorfizados para mediarem corporalmente uma interlocução com a totalidade do idioma Na qualidade de agente suposto sujeito o espírito é inobje tivável podendo configurarse na posição de eu tu ele e ao mesmo tempo su porse vento folha cobra Bairrão 2011b p 168 Em outros termos na possessão quem enun cia é o Outro enquanto agente que se identifica com o enunciado e pronunciase eu Bairrão 2008a função de alteridade que interpela desde o íntimo do ser desde o abismo que constitui o sujeito enquanto dividido e marcado pela falta Lacan 19661998 que diz espelha e implica transferencialmente e para além da consciência O Outro se apresenta e enuncia como sujeito do inconsciente entendido lacaniana mente não enquanto espaço mental depositário de representações psíquicas mas em termos semióticos Dias R N Bairrão J F M H 226 Psicologia em Pesquisa UFJF 72 220229 JulhoDezembro de 2013 como lugar de enunciação de natureza desconhecida estabelecido fora dos limites da consciência onde o sujeito se percebe e recebe pelos meios da mediação simbólica Bairrão 2006 Tais considerações permitem retirar da análise da possessão a noção de que seus elementos simbó licos estão como que localizados em uma dimensão de exterioridade espécie de revestimento em rela ção a supostos processos internos conformativos do psiquismo Na verdade lacanianamente entendida o que se passa na possessão é da ordem de um atra vessamento em que não faz sentido a dicotomia in teriorexterior em que a construção da realidade não redutível ao linguístico uma vez que o corpo e o gestual já possuem uma dimensão simbólica e do que quer que seja da ordem do indivíduo não é senão uma produção de efeito das e nas com binatórias possíveis entre a presentificação de um real incognoscível e imperativo e o universo cultural significante disponível assimilado intersubjetiva mente através dos encontros estabelecidos com ou tros agentes sejam eles espíritos deuses ou pessoas concretas socialmente acessíveis De fato não há sujeito sem o Outro e sem sujeito sem uma existên cia encarnada no significante o Outro se resumiria a uma espécie de sistema computacional conjunto morto de regras lógicas desabitado pela verdade destituído de ser Lacan 19981999 Considerações Finais Ao conceberse enquanto um aparato comuni cativo e expressivo capaz de instrumentar seus pra ticantes a dar voz e lugar a sentidos e saberes indivi duais ou coletivos que se enunciam outros além da consciência o fenômeno da possessão necessita de uma abordagem teóricometodológica apta a capturar aquilo que a constitui em sua essencialidade a exis tência de um sistema simbólico em movimento es paço de significância e alteridade no qual se articulam e atualizam realidades possíveis e posições legítimas desde onde o ser vivente pode reconhecer a si mesmo em toda a sua multiplicidade enquanto sujeito agente no mundo e na história Para tanto a psicanálise la caniana apresentase como alternativa útil e relevante Não apenas permite ultrapassar dicotomias an tigas e caras ao pensamento ocidental tais como in terioridadeexterioridade e biopsíquicosociocultural como também por seu intermédio as relações entre médiuns consulentes e os seus interlocutores espiri tuais podem ser consideradas em suas particularidades dando ouvidos não apenas às diversas posições de es tarse sujeito como também e principalmente a ou tras vozes históricas sociais políticas etc e temáticas saúde étnicas de gênero etc que as atravessam sem que obrigatoriamente o pesquisador tenha de tomar partido e decidir acerca de um significado geral do fe nômeno como a rápida revisão empreendida permitiu entrever há muitos e diversos Na realidade por meio da possessão podem ser ditas e dizemse muitas coisas A psicanálise lacaniana viabiliza que o pesquisador ab dique da condição de quem atribui e sobrepõe signifi cados à possessão em prol da posição mais rigorosa de quem dá ouvidos às interpretações e sentidos implícitos em cada manifestação do fenômeno Referências Ambros B 2010 Vengeful spirits or loving spiritual companions Changing views of animal spirits in contemporary Japan Asian Ethnology 69 1 3567 Augras M 2008 O duplo e a metamorfose a identidade mítica em comunidades nagô Petrópolis Vozes Bairrão J F M H 2002 Subterrâneos da Submissão sentidos do mal no imaginário umbandista Memorandum Memória e História em Psicologia 2 5567 Bairrão J F M H 2003a Caboclas de Aruanda a construção narrativa do transe Imaginário 9 285322 Bairrão J F M H 2003b Raízes da Jurema Psicologia USP 14 1 157184 Bairrão J F M H 2004 Sublimidade do mal e sublimação da crueldade criança sagrado e rua Psicologia Reflexão e Crítica 17 1 6173 Bairrão J F M H 2005 A Escuta participante como procedimento de pesquisa do sagrado enunciante Estudos de Psicologia 10 3 441446 Bairrão J F M H 2006 Psicologia cultural tem a psicanálise alguma coisa a dizer sobre isso Natureza Humana Revista de Filosofia e Psicanálise 8 1 293312 Bairrão J F M H 2007 Linguagem e corpo na umbanda In Arcuri I G Lopez M A Orgs Temas em Psicologia da Religião pp 165 184 São Paulo Vetor Bairrão J F M H 2008a Possessão e autoria In L V Tfouni Org Múltiplas faces da autoria análise do discurso psicanálise literatura modernidade e enunciação pp 101120 Ijuí Editora Unijuí Investigação Etnopsicológica da Possessão 227 Psicologia em Pesquisa UFJF 72 220229 JulhoDezembro de 2013 Bairrão J F M H 2008b Tulipa subsídios para uma etnopsicanálise da possessão Olhar UFSCar 1011 5368 Bairrão J F M H 2011a Adolescência em transe In L V Tfouni Org Letramento Escrita e Leitura questões contemporâneas pp 83100 Campinas Mercado de Letras Bairrão J F M H 2011b Nominação e agência sem palavras o audível não verbal num transe de possessão In F V Bocca F Caropreso R T Simanke Orgs O movimento de um pensamento ensaios em homenagem a Luiz Roberto Monzani pp 155172 Curitiba CRV Birman P 1985 O que é umbanda São Paulo Brasiliense Boddy J 1988 Spirits and selves in northern Sudan the cultural therapeutics of possession and trance American Ethnologist 15 1 427 Boddy J 1989 Wombs and Alien Spirits Women Men and the Zar Cult in Northern Sudan Wisconsin The University of Wisconsin Press Bojuwoye O 2013 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Revisto em 11092013 Aceito em 29092013 Apoio financeiro Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CAPES e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo FAPESP O artigo é uma retomada e reelaboração de parte de uma dissertação de mestrado do primeiro autor financiado com bolsa de mestrado CAPES Investigação Etnopsicológica da Possessão 229