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Livro O Normnl e o Patológico Autor Georges Canguilhem Edição Rio de Janeiro Forense Universitária 1990 Por Rosana Sigler Reflexão filosófica de Canguilhem um outro olhar sobre as diferenças A evolucão nas idéias médicas entre os séculos XVII e XVIII resultou numa teoria se tornou um dogma no século XIX segundo a qual os fenômenos patológicos nos organismos vivos são apenas variações quantitativas dos fenÔmenos fisiológicos normais Em O Normal e o Patológico Georges Canguilhem filósofo e médico posicionase contra a tese da identidade entre fenómenos vitais normais e patológicos Ele faz uma reflexão filosófica sobre este pensamento seus métodos e técnicas resgatando algumas de suas representações especialmente nas idéias dos franceses Augusto Comte e Claude Bernard em função de sua influência sobre a ñlosoña a ciência e a literatura A primeira e segunda partes deste livro são a reedição de sua tese de doutorado em medicina e úYma parte escrlta vinte anos depois é uma reafirmação de sua tese acrescida de outras considerações na mesma direção Alguns pontos fundamentais de sua argumentação referemse ao desvelamento do caráter implícito nas conceituações dos estados normal e patológico 2 insuficiência explicativa dos termos quantitativos na diferenciação daqueles estados e à inerente às normas vitais Todos estes desdobramentos de sua argu Mestranda em Psicologia no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo realizando pesquisa Em cozfnfo com a loucura a experiência de trabalhadores em serviço de Saúde Mental comproposta atendimentopautadapela cHtica ao paradgmapszquiábico Bolsista da FAPESP Resenhas Imaginário USP n 5 p 175188 1999 179 mentação convergem para a necessidade ao se buscar a diferenciação entre os fenômenos normais e patológicos de considerar cada organismo VIVO como uma totalidade dotada de normas particulares Há ainda uma premissa fundamentalmente diferente da que sustenta a tese da identidade entre os fenômenos normais e patológicos cada um dos organismos vivos está em contínuo processo de inovação ofisiológica sem que haja reversibilidade no sentido de uma regressão a estados anterlores ontogenética ou fllogeneticamente O caráter valorativo implícito nas conceituações em questão é desvelado pelo autor quando procura mostrar que o patológico é antes de qualquer busca por explicação científica um estado evidenciado no organismo como um todo que ele próprio pode qualificar como indesejável sendo por isso possível atribuirlhe um valoE negativo Do ponto de vista do organismo há uma diferença qualitativa entre a vida saudável freqüentemente referida como normal e a vida patológica O próprio investimento na compreensão da diferença entre fenômenos normais e patológicos e a conceituação destas diferenças já refletem um interesse voltado para a saúde este Interesse é evidência de um reconhecimento subjetivo portanto do cientista de que o estado de saúde é preferível ao estado mórbido A busca pela compreensão científica dos fenômenos Vltais normais prezada pelos adeptos da tese da identidade por acreditarem trazer esclarecimentos sobre os suafenômenos patológicos é na verdadeprecedida pela atividade clínica o médico tem contato com organismos completos que evidenciam a falência de suas funções vitais O estudo de seu funcionamento a consideração de suas partes de seus mecanismos a fisiologia é conseqüência daquele primeiro contato com a totalidade do organismo E neste sentido que o autor afirma que a Patologia precede a Fisiologia e não o contrário e que acreditar na possibilidade de uma patologia objetiva com base no estudo dos processos vitais normais é ser vítima da mais grave confusão do ponto de vista filosófico e às vezes da mais perlgosa do ponto de vista terapêutico p 185 Portanto as categorias saúde e doença normal e patológico não são científicas e objetivas mas técnicas e subjetivas Objetivamente só é possível definir variedades ou diferenças Os conceitos de saúde e de doença referemse Slm a normas que possibilitam a comparação entre diferentes estados biológicos num mesmo 180 Resenhas organismo Disto tudo já se pode inferir que Canguilhem não considera possível que se fale em um estado padrão de saúde como referência a uma realidade universal objetivável Para os adeptos da tese da identidade haveria a possibilidade de conce ber este estado padrão o normal passível de ser objetivamente mensurado em busca do qual deveriam se dedicar quem pratica a atividade clínica Canguilhem considera também insuficientes e enganosos os parâmetros estritamente quantitativos para explicar as patologias como diferenciação para mais ou para menos dos fenômenos normais Segundo ele desde os autores que antecedem Broussais passando pelo tratamento que Comte dá ao assunto até as idéias de Claude Bernard derivadas de sua medicina experimental há evidências do caráter implicitamente qualitativo das descrições relativas às patologias ainda que pretensamente colocadas como descrições quanHtaffvas em sua relação com os fenômenos Vitais normais Constatase o uso de conceitos que não podem ser perfeitamente transpostos em termos quantitativos e que apontam para uma outra dimensão como por exemplo a noção de comportamento renal referida ao mecanismo da secreção urlnária E claro que os fenomenos normais e patológicos remetem à mesma composição físicoquímica mas a identidade de sua dimensão concreta não corresponde a identidade de seu valor biológico O que distingue o alimento do excremento não é a sua composição físicoquímica da mesma forma o que distingue a Fisiologia da Patologia não são as propriedades concretas de seu objeto de estudo Mais uma vez é a dimensão valorativa que estabelece essas diferenciações O mal orgânico não poderia ser reduzido a alterações quantitativas até mesmo porque uma constatação objetiva de alterações quantitativas relativas a determinada função biológica ou a determinado órgão não corresponde necessariamente a uma patologia Como diz o autor Descobrese então que determinado indivíduo que hospeda na sua faringe bacilos de Loeffler não está com difteria p 185 Uma análise mecanicista e quantitativa ao ter como premissa a identidade dos fenômcnos normais e patológicos em função da identidade de seus processos fisicoquímicos esvazia o sentido da palavra patológico mais do que o explica Isso porque está claro este sentido não corresponde a uma existência concreta mas à condição existencial do organismo que transcende a concretude de suas partes e que escapa a Resenhas Imaginário USP n 5 p 175188 1999 181 uma análise que a elas se limite Por isso a diferenciação qualitativa entre o normal e o patológico remete necessanamente ao funcionamento do organismo como um todo Ao nos referirmos ao todo orgânico caminhamos para outro aspecto fundamental da argumentação de Canguilhem a questão da norma que ele entende dever ser um conceito relativo ao próprio indivíduo considerado em sua totalidade Quan do se fala em norma estáse trabalhando deliberadamente com a dimensão qualitativa dos fenômenos vitais portanto com valores e nãofatos Canguilhem chama a atenção para o risco em confundir fatos e valores no fazer científico considerando por exemplo um deterrninado fenômeno normal como fenômeno ideal universal e saudável perdendo de vista o juízo de valor implicado nesta conceituação O autor examina então um procedimento freqüente derivado daquele engodo filosófico a dedução de um padrão normal como equivalente de ideal universal e saudável de determinada característica biológica a partir de algum dos diferentes cálculos possíveis de média de uma população de indivíduos Isto só teria sentido se atuassem na constituição de determinada característica as leis do acaso ou seja leis que exprimem a influência de uma multiplicidade indeterminável de causas não sistematicamente orientadas p 123 Canguilhem recorre às idéias do sociólogo Maurice Halbwachs para explicitar a inviabilidade e o equívoco em considerar a variabilidade de qualquer característica humana como resultante das leis do acaso há fatores sociais que determlnam incluslve a ordem vital Se não se pode falar em leis do acaso na determinação da variabilidade de determinada característica dos organismos humanos não faz nenhum sentido acreditar que ao extrair alguma média desta característica sobre diferentes indivíduos seja possível considerála como o padrão normal na acepção de ideal universal e saudável Mesmo no mundo anlmal Canguilhem defende que não seria possível extralr este padrão normal a partir da média pois as leis do acaso não determinam a variabilidade de nenhum ser vivo O alto índice de determinada característica em dada população apenas indica que esta população exibe uma norma que deve ser compreendida em função de suas condições específicas Nas palavras do autor Um traço humano não serla normal por ser freqüente mas seria freqüente por ser normal isto é normativo num determlnado gênero de vida p 126 182 Resenhas No que se refere à saúde dos organismos Canguilhem defende que ela só pode ser apreciável individualmente A doença não é aumento ou diminuição de elementos do padrão normal é uma outra norma que corresponde a outra forma do organismo interaglr com o meio Não é portanto a constatação de um desvio em relação a um padrão que determina se há patologla ou não mas a condição existencial do organismo considerado em sua totalidade Ele pode dentro deste raciocínio exibir uma norma diferente da maioria e estar doente como poderia exlblr essa diferença sem estar doente Mas o que significa exatamente doença para o autor se ele a considera como uma outra norma da mesma forma que há uma norma na vida saudável A questão da norma individual remete ao caráter ativo dos organismos ou seja a inventividade de formas do viver em busca de um equilfrrio entre suas necessidades e o seu meio O saudável é um ideal funcional individual e pode ser deflnido como a capacidade do organismo de estabelecer normas de acordo com as imposições do meio A saúde está relacionada então com a possibilidade de transformação destas normas sempre que necessário A contrapartida desta concepção de saúde é a de doença como redução da margem de tolerância às infidelidades do melo em função do estabelecimento de uma norma inferior por não tolerar alterações em direção a outras normas que possibilitem uma interação melhor A doença embora represente também um equilíbrio uma norma do organismo com o meio corresponde a uma situação mais vulnerável na medida em que há possibilidades reduzidas de novos reajustes A patologia é uma inflexibilidade uma rigidez do organismo no que se refere a sua norma e a cura nesse sentido é um processo que visa o estabelecimento de uma ordem na qual haja um melhor equilíbrio do organismo com seu melo Canguilhem apresenta uma reflexão filosófica do fazer científico no campo da Medicina cujo objeto concreto de conhecimento a ordem vital não garante a objetividade deste conhecimento Suas considerações são bastante proveitosas para a reflexão crítica em outros campos do saber que igualmente postulem estados normais e patológicos Este tema está intimamente relacionado ao tema das diferenças em ciências humanas pois as atitudes profissionais e científicas são diversas conforme sejam Resenhas Imaginário USP n 5 p 175188 1999 183 postulados ou não padrões ideais de comportamento apenas com base em crltérios estatísticos No entanto ao relativizarmos a noção de patológico previnindonos de atitudes preconceituosas em relação ao diferente corremos o risco de descaracterizar a patologia esvaziando mais uma vez este conceito A definição de doença para Canguilhem como norma Individual inflexível pareceme especialmente interessante na medida em que respeita o caráter relativo das normas nos indivíduos e nas populações sem com isso anular a existência de estados desfavoráveis ao organismo Considerar a doença como uma norma individual inflexível é a um só tempo reconhecer sua faceta problemática e também reconhecer a inventividade das forma de vida E considerar que cada organismo ou população expressa uma norma vital que não precisa ser universal aponta para considerações que não se prendem às normas quer do ponto de vista individual quer do ponto de vista grupal do pesquisador e do profissional Revista Publicação do Núcleo Interdisciplinar do Imaginário e Memória NIME s Imaginário e do Laboratório de Estudos do Imaginário LABI Departamento de no 5 1999 Psicologia da Aprendizagem do Desenvolvrnento e da Personalidade ISSN 1413666x PSA do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo IPUSP Conselho Editorial Maria Luisa Sandoval Schmidt Maria Regina Toledo Sader Maria de Lourdes Beldi de Alcântara Márcia Maria Cabreira Monteiro de Souza Marcelo Pedro de Arruda Bernadete Castro Oliveira Tatiana Freitas Stockler das Neves Carla Regina Hanssen Conselho Consultivo Antonio Candido Décio de Almeida Prado Renato da Silva Queiroz Francine Saillant Universidade de Laval Canadá Adalberto Santana UNAM México Paulo Vanzolini Maria Regina Toledo Sader Maria Luisa Sandoval Schmidt Editor Maria de Lourdes Beldi de Alcântara Secretaria Denise Poli Felix Capa e Ilustração Liana Cardoso Soares Editoração Eletrônica Joceley Vieira de Souza Fotografia Rômulo Fieldini Revisão Tatiana Freitas Stockler das Neves Endereço para Correspondência Imaginário Laboratório de Estudos do Imaginário LABI Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo IPUSP Av Prof Lúcio Martins Rodrigues Trav 4 Bloco 1 7 Sala 22 CEP 05508900 São Paulo SP Brasil Fone Oxx 1 1 8184386 ramal 22 Fax Oxk 118184475 email labieduuspbr ImaginárioNIMELABI Instituto de Psicologia Universidade de São Paulo n05 São Paulo 1999 Patrocínio Cultural Anual ISSN 1413666x 1 Antropologia 2 Arte 3 Geografia 4 Psicologia Credibel 5 Sociologia