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Ciências Econômicas ·

Economia Política

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JOHN MAYNARD KEYNES A TEORIA GERAL DO EMPREGO DO JURO E DA MOEDA Apresentação de Adroaldo Moura da Silva Tradução de Mário R da Cruz Revisão técnica de Cláudio Roberto Contador Tradução dos Prefácios de Paulo de Almeida Fundador VICTOR CIVITA 1907 1990 Editora Nova Cultural Ltda Copyright desta edição 1996 Círculo do Livro Ltda Rua Paes Leme 524 10º andar CEP 05424010 São Paulo SP Título original The General Theory of Employment Interest and Money Royal Economic Society 1973 Textos originalmente publicados no Reino Unido por Macmillan Press Ltd Londres Textos publicados sob licença de Macmillan Press Ltd Londres e Editora Atlas SA São Paulo A Teoria Geral do Emprego do Juro e da Moeda Tradução do texto de A Teoria Geral do Emprego do Juro e da Moeda publicada sob licença da Editora Atlas SA São Paulo Direitos exclusivos sobre a Apresentação de Adroaldo Moura da Silva Editora Nova Cultural Ltda São Paulo Direitos exclusivos sobre a tradução dos Prefácios de A Teoria Geral do Emprego do Juro e da Moeda Nova Cultural Ltda São Paulo Impressão e acabamento DONNELLEY COCHRANE GRÁFICA E EDITORA BRASIL LTDA DIVISÃO CÍRCULO FONE 55 11 41914633 ISBN 853510917X APRESENTAÇÃO Keynes e a Teoria Geral I John Maynard Keynes nasceu em Cambridge em junho de 1883 e faleceu em Sussex em abril de 1946 Sua vida é marcada por de sempenho excepcional em inúmeras áreas da atividade humana ho mem de negócios e diretor de Companhias de Seguro e Investimento com o que terminou por acumular expressiva riqueza pessoal1 funcio nário público por dois anos a partir de 1906 assessor influente do Tesouro Britânico e finalmente diretor do Banco da Inglaterra o Banco Central Inglês a partir de 19422 protetor das artes produtor teatral editor e colecionador de livros raros3 articulista da imprensa diária e coproprietário de um semanário londrino através do qual participou da campanha política de 1929 em defesa do Partido Liberal com o qual manteve permanente associação informal ao longo de sua vida4 5 1 Já em 1921 Keynes era chairman da National Mutual Insurance Company e posteriormente foi também diretor da Independent Investment Co e da Provincial Insurance Company 2 Keynes teve destacado papel em negociações internacionais como representante do governo inglês primeiro no Tratado de Paz em Versalhes em 1918 e segundo durante a Segunda Guerra Mundial particularmente no que respeita à reorganização financeira da economia mundial Em verdade a organização do Fundo Monetário Internacional muito deve ao gênio financeiro de Keynes 3 Esta atividade foi facilitada pela dupla associação que Keynes manteve ao largo de sua vida de um lado o acesso às fontes de financiamento que seu papel junto ao Governo lhe propor cionava de outro a sua intimidade com Duncan Grant Vanessa Bell e outros intelectuais do Bloomsbury Group e seu casamento com Lydia Lopokova bailarina russa Por conta dessa feliz associação e por ela motivado Keynes terminou desempenhando importante papel de administrador financeiro em prol do balé através da Camargo Society do VicWells Ballet e da Rambert Ballet empreendimentos que se beneficiaram do gênio financeiro de Keynes Foi mais conselheiro da National Gallery e do Council for the Encouragement of Music and the Arts Devese registrar que Keynes construiu um teatro em Cambridge com seus próprios recursos Depois de sua morte esse teatro passou ao patrimônio da cidade 4 Keynes foi diretor e por vezes editorialista do jornal semanal Nation and Athenoeum e também do New Statesman and Nation além de contribuir com artigos freqüentes para os mais conhecidos diários de Londres Editor do Economic Journal professor de Economia e administrador na Universidade de Cambridge5 Contudo acima e além de tudo Keynes foi economista e autor de uma fecunda e provavelmente a mais influente obra em teoria econômica no século XX onde merece destaque A Teoria Geral do Emprego do Juro e da Moeda ora publicada pela Abril Cultural Keynes desde cedo desfrutou da melhor educação formal e in formal que a Inglaterra vitoriana oferecia às suas mais ilustres famí lias Educouse em Cambridge cidade onde sua mãe Florence exerceu inúmeros cargos públicos inclusive o de Prefeito e na Universidade onde seu pai John Neville destacouse como professor e administrador Ao longo de sua educação Keynes dedicouse ao estudo da Matemática Filosofia e Humanidades À Economia só se voltaria após a conclusão do ensino formal Sua atuação mais destacada enquanto estudante ocorre por conta de sua participação em debates atividades políticas nãopartidárias e particularmente numa sociedade secreta fundada em 1820 os Apóstolos que então reunia um amplo grupo de futuras personalidades a exemplo de Bertrand Russell Desmond MacCarthy Lytton Strachey Leonard Woolf Clive Bell e outros Os vínculos de amizade com esse grupo tiveram marcada influên cia na vida de Keynes Em particular pelas mãos de Lytton Strachey Leonard Woolf Clive Bell Duncan Grant e Thoby Stephen Keynes se associou às irmãs Stephen irmãs de Thoby Vanessa Bell casada com Clive e Virginia Woolf casada com Leonard e constituíram o que viria a ser conhecido como o Bloomsbury Group em Londres Inte lectuais de sucesso tinham como marca de seu comportamento social a irreverência Cultivavam o ideal libertário a busca da verdade lutavam pela ampliação do papel da mulher na sociedade pela desi nibição sexual e contestavam os valores morais herdados da sociedade vitoriana6 Por conta dessa multifacetada experiência Keynes era um homem polêmico e para não poucos arrogante7 A sua atuação pública no entanto viveu dividida entre o apego e a crítica à herança cultural OS ECONOMISTAS 6 5 A atividade docente de Keynes foi intensa entre 1908 e 1915 quando se afastou para trabalhar no Tesouro Voltando à Universidade a partir de 1919 sua carga didática daí para frente se reduz dramaticamente ministra algumas conferências por ano e dirige a distância um Seminário Vive a partir de então em Londres e passa os fins de semana inclusive a 2ª feira em Cambridge No entanto começa a ter crescente influência na ad ministração dos recursos financeiros da Universidade 6 O comportamento socialmente agressivo dos membros do Grupo é bem conhecido Para uma breve história do Grupo o leitor interessado deve consultar Edel 1979 Até seu casamento com Lydia em 1925 Keynes manteve estreito contato com o Grupo particular mente com Strachey Duncan Grant e Vanessa Bell De início o Grupo reagiu friamente à esposa de Keynes Depois passaram a se reunir no que eles chamaram de Clube da Memória Uma importante contribuição de Keynes a este clube está publicada no volume X das obras completas de Keynes e recebeu o título de My Early Beliefs 7 O perfil arrogante de Keynes é destacado por exemplo por Harry Johnson em Milo Keynes 1977 Johnson acusa Keynes era um oportunista e um operador vitoriana No convívio exigido pelas suas funções de influente mem bro do governo não ficou imune aos valores da classe dirigente inglesa colonialista e angustiado com a contínua perda de prestígio econômico e político da Inglaterra que se seguiu à Primeira Guerra Mundial De outro lado a solidariedade que dedicou ao longo de sua vida aos amigos de adolescência possibilitoulhe cultivar e apren der a conviver com o novo representado pelo comportamento so cialmente agressivo de seus amigos vanguarda intelectual e liberal da cosmopolitana Londres de então8 Keynes deixa a Universidade e ingressa no funcionalismo público em 1906 Aí não encontra ambiente propício ao desenvolvimento de sua irrequieta personalidade Passa a trabalhar em sua dissertação com o propósito de voltar à vida acadêmica Seu interesse então se concentra nos fundamentos filosóficos da Probabilidade Em 1908 a submete a Cambridge não sendo aceita É então que ingressa defini tivamente no estudo da Economia A convite de Marshall e Pigou e sem vínculo formal com a Universidade volta a Cambridge para mi nistrar essa disciplina que até então fora o trabalho de Marshall e que nesse mesmo ano se aposentava Em Cambridge volta a trabalhar em sua dissertação sobre a Teoria da Probabilidade enquanto estuda e ensina Economia Sua dissertação é então aceita e assume formal mente as funções de docente da Universidade De 1908 a 1915 dedicase intensamente ao ensino e se familiariza com o universo do saber eco nômico da ortodoxia como representada por Pigou Marshall Stuart Mill Ricardo e Smith Desde então concebe a Economia como uma ciência moral valorizando a intuição em contraste à razão na escolha dos modelos relevantes e cultivando o espírito de controvérsia umbi licalmente associado à política econômica9 Seus escritos nesse período são esparsos e de pouca significação profissional É dessa fase seu livro Indian Currency and Finance 1913 KEYNES 7 8 Algumas ilustrações deste comportamento durante a primeira guerra Keynes trabalhava no Tesouro De outro lado seus amigos Strachey Duncan Grant Russell e outros eram pacifistas recusandose a atender o comando de alistamento militar compulsório exigido a partir de 1916 e criticavam Keynes por servir ao Governo durante a Guerra Keynes então decide apresentar suas objeções de consciência ao alistamento junto a um Tribunal em solidariedade e para atestar a legitimidade da demanda de seus amigos Finalmente se coloca contra a política oficial Em 1919 sai do Tesouro e publica uma devastadora crítica ao Tratado de Paz Economic Consequences of the Peace Da mesma forma Keynes evidencia em sua obra escrita uma relação de amor e ódio a seus pares de Cambridge defensores da ortodoxia econômica Aí as maiores vítimas são Pigou e Robertson 9 Em 1934 Keynes escreve Em Economia não se pode condenar o oponente pelo erro só se pode convencêlo a aceitar o mesmo E mesmo que se tenha razão não é possível persuadilo quando existe falha na sua própria capacidade de persuasão ou de exposição ou se a cabeça dele estiver já tão repleta de noções contrárias que isso não lhe permita mais captar a chave do raciocínio que se lhe tenta fornecer Cit em Moggridge 1976 p 29 Esta posição contrasta fortemente com a posição de Robbins autor do então influente texto The Nature and Significance of Economic Science Ao contrário de Robbins para Keynes Economia é uma ciência moral e não se confunde com natural science Isso porque ela trata de motivos expectativas dúvidas psicológicas Em 1915 volta ao Tesouro e aí permanece até 1919 Na qualidade de representante do Tesouro junto à Conferência de Paz em Paris critica a posição dos aliados deixa o posto e volta à Universidade Publica então The Economic Consequences of the Peace em dezembro de 1919 É a súbita notoriedade dentro e fora da Inglaterra A con trovérsia que desencadeia diz mais respeito às críticas às personali dades de Clemenceau Wilson e Lloyd George do que às críticas eco nômicas ao Tratado Já uma personalidade Keynes dedicase intensi vamente ao debate sobre a política econômica vigente e reduz sua participação na Universidade a algumas conferências anuais e à orien tação acadêmica de um grupo de jovens economistas que se agregaram no Clube de Economia Política fundado por Keynes10 Tem aí início uma nova fase na vida de Keynes É o grande momento do Keynes homem de negócios jornalista e autor de sucesso público Uma boa amostra de seus trabalhos de então está reunida em Essays in Persuasion publicado em 193111 Seu mais importante trabalho acadêmico desse período Tract on Monetary Reform 1923 em nada antecipa o Keynes da Teoria Geral Sua preocupação se con centra em temas da economia ortodoxa estabilidade de preços política cambial e moeda A questão do desemprego é tratada em seus escritos de divulgação mas não é elaborada como uma questão analítica e da teoria econômica Era em suma um bom discípulo de Marshall aplica a teoria econômica ortodoxa aos problemas da época com competência mas em nível teórico não vai além do mestre O combate ao desemprego mediante a ampliação de obras públicas só aparece de forma sistemática a partir de 1929 no panfleto Can Lloyd George do it escrito com Hubert Honderson E isso em nada o diferencia de Pigou ou Viner e muitos outros economistas ortodoxos que também advogaram progra mas de obras públicas como forma de enfrentar o desemprego Segundo seus mais autorizados biógrafos E A G Robinson R Harrod e D Moggridge a partir de 1925 tem início o período de transição que culminará com a Teoria Geral O início dessa fase coincide com dois eventos importantes na vida de Keynes O primeiro em nível pessoal depois de alguns anos de relação íntima casase com Lydia e começa a se distanciar um pouco do Bloomsbury Group Passa a ter uma vida pessoal mais organizada O segundo em nível acadêmico OS ECONOMISTAS 8 10 A partir de então nos informa E A G Robinson Keynes passa os sábados domingos e segundasfeiras em Cambridge quando cuida de afazeres administrativos na Universidade e interage com seus discípulos Dá poucas lectures e se dedica a partir de Londres ao debate sobre política econômica da época e a seus múltiplos negócios 11 Entre outras coisas estão aí reunidos os seguintes artigos Economic Consequences of Mr Churchill 1925 uma crítica à política cambial de volta ao padrão ouro The End of LaissezFaire 1925 uma nota sobre os fundamentos do liberalismo e crítica ao liberalismo primitivo da mãoinvisível Can Lloyd George do it é a interação intensa com Denis Robertson enquanto este preparava para publicação o seu Banking Policy and the Price Level 1926 que contém o germe analítico que conduzirá Keynes ao Treatise on Money e depois à Teoria Geral a separação dos atos de poupar e investir e sua interrelação com a teoria monetária na explicação das flutuações econômicas12 Nesse mesmo ano dá início ao trabalho que terminaria na publicação de A Treatise on Money em 1930 Por certo como um homem prático e intuitivo Keynes também tem sua curiosidade intelectual aguçada pelos eventos econômicos da época Na década de 20 a economia inglesa atravessa sucessivas crises que culminam na grande Depressão dos anos 30 Em 1932 por exemplo se observa desemprego em massa nas principais economias capitalistas Nessa mesma data a produção industrial americana correspondia a 58 a alemã a 65 e a inglesa a 90 da verificada em 1913 Diante dessa realidade Keynes intuitivamente começa a se afas tar da ortodoxia como representada pela Lei de Say De acordo com essa Lei não poderia ocorrer escassez de poder de compra no sistema econômico primeiramente porque o processo de produção capitalista é também o de geração de renda salário lucros aluguéis etc e por tanto de criação da fonte de financiamento da demanda e segundo porque dada a existência dos mecanismos automáticos dos mercados livres os movimentos corretivos e espontâneos de salários preços e juros garantiriam que os níveis de demanda não ficassem permanen temente aquém dos níveis de produção de pleno emprego Da crítica à Lei de Say Keynes caminha em busca de uma explicação analítica para o desemprego e tenta dar fundamento teórico às sugestões de intervenção estatal como geradora de demanda para garantir níveis elevados do emprego É importante notar que inúmeros economistas de orientação ortodoxa também advogaram gastos públicos para combater o desemprego a exemplo de Pigou e Robertson A crítica de Keynes se concentra na inconsistência entre os fundamentos teóricos desses autores de um lado e suas recomendações práticas de outro13 A sua primeira tentativa de superar a teoria clássica resulta na publicação de A Treatise on Money em 1930 Infelizmente foi uma tentativa frustrada Ainda que não tenha encontrado uma explicação analítica para o problema do desemprego nesse livro Keynes reafirma KEYNES 9 12 Harrod escreve que os amigos de Bloomsbury depois do casamento de Keynes haviam se tornado um magnífico passatempo ao invés de constituírem a razão principal de sua vida Tanto Harrod como Austin Robinson vêem em seu casamento com Lydia um impor tante marco na vida de Keynes no que respeita à reorganização de sua vida pessoal e profissional 13 Uma ilustração deste ponto nos é oferecida num comentário de Keynes quanto ao livro de Pigou Como no caso de Dennis Robertson Por que insistem em manter teorias que não servem de base para suas próprias conclusões práticas Citado em Moggridge 1976 p 25 seu prestígio profissional como conhecedor dos intrincados problemas monetários da economia capitalista Não faltaram críticas também Hayek e Robertson em particular apontaram um grave equívoco no que Keynes pretendia ser a base do livro Este seguindo as idéias de Robertson pretendia explicar as flutuações de preço e produção a partir dos desequilíbrios entre investimento e poupança Tanto Hayek quanto Robertson detectaram uma inconsistência entre a explicação dessa re lação e a equação escrita por Keynes no corpo do livro Também os discípulos de Keynes em Cambridge Joan e Austin Robinson Richard Kahn James Mead Piero Sraffa e outros anotaram várias críticas ao seu trabalho A mais severa dizia respeito ao fato de que Keynes havia desenvolvido uma teoria de flutuações de nível geral de preços que pressupunha a exemplo dos clássicos a hipótese de produto constante em nível de pleno emprego Ou seja não explicava o que se propunha explicar as flutuações de emprego e produção Essas avaliações críticas imediatamente induzem Keynes a tentar uma nova explicação Do trabalho que se segue entre 1930 e 1935 resulta a publicação da Teoria Geral em 1936 De imediato se estabe leceu uma ampla controvérsia entre Keynes e seus discípulos de um lado e Pigou Hayek Robertson Hawtrey e outros de outro O debate entre convertidos e nãoconvertidos também empolga imediatamente os economistas do outro lado do Atlântico14 Samuelson expressa com elegância o significado da obra naqueles negros dias de recessão Para o estudante moderno é totalmente impossível entender o pleno efeito do que foi convenientemente denominado A Revolução keynesiana sobre aqueles que como nós foram educados dentro da tradição orto doxa O que para os novatos de hoje é visto com freqüência como trivial é óbvio era para nós então enigmático novo e herético The General Theory atingiu a maioria dos economistas em idade abaixo dos trinta e cinco anos e fêlo com a inesperada virulência de uma doença que pela primeira vez ataca e dizima uma tribo isolada dos mares do sul15 OS ECONOMISTAS 10 14 O livro de imediato recebeu inúmeras críticas e elogios dos melhores economistas da época Dentre as críticas merecem destaque os comentários de Pigou Viner Robertson Hayek e Hawtrey De certa forma Keynes recebeu com altivez essa avalanche crítica A exceção ocorre no caso de Robertson Seu exaluno e amigo Keynes nutria profundo respeito pelo trabalho de Robertson e nele reconhecia o germe de sua própria teoria Ficou profundamente decepcionado com as críticas de Robertson tentou convencêlo infrutiferamente e por fim rompeu rudemente sua relação com ele Voltam a trabalhar juntos no Tesouro Britânico durante a Guerra mas mesmo aí mantêm relações frias Dentre os convertidos estão Harrod Hicks Meade Abba Lerner Hansen e outros 15 As duas citações de Samuelson são extraídas do artigo The General Theory publicado em LEKACHMAN R editor Keynes General Theory A esse respeito é conveniente ex pressar a opinião de um dos mais ardentes adeptos de Keynes sobre a Teoria Geral assim como a Bíblia e Das Kapital ela é profundamente ambígua e como no caso da Bíblia e de Marx essa ambigüidade ajudou muito a conquistar adeptos se houver um bom número de contradições e ambigüidades como também existem na Bíblia e em Marx o leitor sempre pode encontrar algo em que queira acreditar Isso também serve para conquistar discípulos Extraído de Galbraith J K 1980 p 214 No entanto o leitor deve ler atentamente o conselho de Samuelson sobre a Teoria Geral É um livro mal escrito e mal organizado Não serve para uso em classe É arrogante maleducado polêmico e não muito generoso nos agradecimentos É cheio de falácias e confusões desemprego involuntário unidades de salário equivalência da poupan ça e do investimento caráter intertemporal do multiplicador interações da eficiência marginal sobre a taxa de juros poupança forçada taxas de juros específicas e muitos outros depois de entendida a sua análise se mostra óbvia e ao mesmo tempo nova Em resumo é um trabalho de gênio II Discutir as contribuições de um livro tão polêmico quanto a Teoria Geral talvez seja imprudência Centenas de autores continuam a re descobrir uma nova e verdadeira teoria keynesiana a cada ano O caráter polêmico do livro ainda hoje nutre inúmeras controvérsias Creio no entanto que se possa explicitar de forma simples o conteúdo da mensagem de Keynes Saiba o leitor entretanto que isso poderá despertar iras e amores nos mais insuspeitos escaninhos da profissão Muitos se julgam isoladamente os verdadeiros cultores do Keynes da Teoria Geral Afinal qual então a novidade A mensagem básica do livro está contida nas muitas vezes re petida proposição de que o sistema capitalista tem um caráter intrin secamente instável Ou seja a operação da mão invisível ao contrário do que ainda é sustentado por economistas de inclinação mais ortodoxa não produz a harmonia apregoada entre o interesse egoístico dos agen tes econômicos e o bemestar global Em busca de seu ganho máximo o comportamento individual e racional dos agentes econômicos pro dutores consumidores e assalariados pode gerar crises a despeito do bom funcionamento das poderosas forças automáticas dos mercados livres E essas crises advêm de insuficiências de demanda efetiva Nisso se aproxima dentre outros de Marx deste no entanto se afasta ra dicalmente quanto ao método de análise e quanto ao futuro do sistema capitalista16 Vejamos o que isto significa para estudar flutuações nos níveis de produto e emprego Keynes começa por explicitar as principais de terminantes da Demanda e da Oferta Agregadas Isso posto afirma KEYNES 11 16 Em verdade Keynes nutria profunda antipatia pelos analistas marxistas Depois de uma breve viagem à Rússia em 1925 Keynes escreve Como posso aceitar uma doutrina que estabelece como sua Bíblia acima e além da crítica um livrotexto obsoleto de Economia que pelo que sei não é apenas cientificamente errôneo mas igualmente sem interesse e aplicação no mundo moderno A referência é ao Capital de Karl Marx Reproduzido de Essays in Persuasion 1931 Em outra instância se refere criticamente a um pequeno livro de Trotski Veja Essays in Biography 1933 que os níveis de produção e emprego são determinados pela igualdade entre oferta e demanda agregadas sem a garantia de que todos aqueles que queiram trabalhar possam efetivamente encontrar emprego Onde reside o problema Keynes centra sua discussão primor dialmente nos determinantes da demanda agregada A demanda agre gada é então decomposta por bens de consumo e demanda por bens de investimento A demanda por bens de consumo depende primordialmente da renda corrente dos agentes econômicos e secundariamente da taxa de juros Aqui sua inovação reside na hipótese de que o nível de consumo cresça menos que proporcionalmente com relação à renda corrente Diz mais que essa é uma relação estável A demanda por bens de investimento de outra parte depende da expectativa de lucro futuro dos empresários por ele cristalizada no conceito de eficiência marginal do capital e da taxa de juros Ora como a demanda por bens de consumo guarda uma relação estável com a renda seguese que as flutuações da demanda agregada estão associadas aos movimentos do nível de investimento Em crescimento com expectativas otimistas de lucro futuro os investimentos geram mais emprego maior nível de produto e de renda e portanto maior nível de consumo e poupança Em depressão perspectivas pessimistas de lucro geram frustração de lucro da indústria de bens de capital queda de emprego e de renda e portanto queda nos níveis de consumo e poupança Nas flutuações do nível de investimento reside portanto a chave da compreensão dos movimentos cíclicos do capitalismo É importante compreender que em Keynes investimento significa aquisição de equi pamentos do setor produtor de bens de capital ampliação da capacidade produtiva e finalmente expansão da produção corrente de bens de capital Não significa aquisição de bens físicos ou financeiros préexis tentes e nãoreproduzíveis pelo sistema econômico a exemplo de terra Então por que as decisões de investimento têm caráter instável Nesta resposta reside a grande contribuição de Keynes à teoria econômica Para Keynes em qualquer decisão de investimento o capitalista se vê obrigado a antever a evolução futura e portanto incerta do mercado para o produto específico a ser gerado pela nova instalação industrial da mesma forma a taxa de salário que ele espera pagar para o trabalhador que irá operar as novas instalações e finalmente o preço e a disponibilidade da matériaprima a ser transformada com o auxílio do novo equipamento Inquietações sobre o comportamento futuro de uma ou do conjunto destas variáveis terminam por se cons tituir na fonte primária da instabilidade dos investimentos e portanto do nível de emprego Em condições normais o empresário estima a taxa de retorno de seu investimento a eficiência marginal do capital cotejando o lucro esperado calculado a partir de sua visão sobre o comportamento das variáveis acima alinhadas com o custo de aquisição OS ECONOMISTAS 12 dos equipamentos necessários à implantação de suas decisões de in vestimento Se essa taxa de retorno é maior que a taxa para a obtenção de fundos ou de aplicação de recursos no mercado financeiro ou seja a taxa de juros então ele se sente motivado à realização desse investimento Dessa forma a instabilidade do sistema capitalista tanto pode advir de flutuações nas expectativas empresariais quanto ao lucro fu turo como do comportamento da taxa de juros É evidente que estas variáveis as expectativas sobre lucro futuro e a taxa de juros não são determinadas arbitrariamente No lado das expectativas temse o que Keynes chama de animal spirits dos empresários fundado na motivação básica do capitalismo acumu lar acumular e acumular No entanto aqui entram dois elementos fundamentais da teoria de Keynes para explicar como e por que a decisão de acumular pode ser postergada e assim engendrar crises Primeiro o fato elementar de que cada capitalista individualmente é prisioneiro de sua própria história Ou seja a decisão de expandir ou criar uma nova fábrica é também uma decisão de sair de um ativo de liquidez universal a moeda ou o capital financeiro de mercado amplo para entrar num ativo específico a exemplo de uma fábrica de automóveis cuja liquidez venda do automóvel depende de condições específicas do mercado de automóveis Ora como as má quinas de produzir automóveis só podem produzir isso e não podem ser transformadas a custo zero em máquinas de produzir leite em pó seguese que a decisão de investir é também uma decisão de assumir o risco de iliquidez de um mercado específico Embora a sociedade seja inexoravelmente vítima de algum investimento sem sucesso o capitalista individual poderia escapar da iliquidez a um custo finan ceiro se houvesse mercado organizado para fábricas ou se o mercado de ações fosse um barômetro seguro sobre a valorização dos equipa mentos existentes e fosse amplo o suficiente para absorver a venda das ações do empreendimento Keynes é enfático no entanto ao afirmar que mercados futuros ou de ações não são mais eficientes do que o capitalista individual quanto a prever ocorrências futuras Em casos de certos tipos de em preendimentos investimentos de grande intensidade de capital e longa maturação ou de produtos novos o tipo de risco envolvido não é sus cetível de medidas e portanto não dá azo à formação de mercados futuros É onde entra o animal spirits do empresário e a fonte eventual de instabilidade do capitalismo Segundo Keynes elabora sobre o risco da iliquidez a partir da demanda de dinheiro Este comanda um prêmio de liquidez sobre todas as demais mercadorias Este prêmio de liquidez determina por seu turno a taxa de juros Keynes obviamente pensa num sistema monetário estável e não sujeito a processos inflacionários crônicos KEYNES 13 Agora temos as duas peças básicas para melhor entender as flu tuações do investimento e portanto da demanda agregada a escolha intemporal entre reter ativos de liquidez universal moeda de um lado e empreender a criação de ativos de liquidez específica fábrica de automóveis de outro A segunda lâmina da tesoura é a oferta agregada ou as moti vações empresariais para ampliar ou contrair a produção e o emprego correntes O ponto de partida é a teoria de formação dos preços Da expectativa de quanto será absorvido pelo mercado e dado o processo de barganha de fixação da taxa de salário nominal assim como o es toque de capital e a tecnologia portanto a relação inversa entre nível de emprego e a produtividade do trabalho o empresário fixa tentativamente o preço com o qual espera vender o volume planejado de produto Por resíduo se realizada a venda esperada ocorre o lucro Isso define o volume planejado de vendas e portanto a Oferta Agre gada Aqui os elementos críticos são o processo de barganha entre capitalistas e assalariados o qual fixa a taxa de salário nominal onde Keynes se distancia da orientação ortodoxa que vê esta taxa como resultado das forças automáticas dos mercados livres e a produtividade do trabalho no que Keynes segue a ortodoxia Isso posto podese perguntar agora como esse sistema reage a um desequilíbrio qualquer Em Keynes esses desequilíbrios quase sem pre ocorrem através da eficiência marginal do capital Suponhase que ocorra uma queda na eficiência marginal do capital por conta da an tecipação firme de escassez aguda de uma matériaprima básica a exemplo do petróleo17 Ora como num dado momento a estrutura de produção é um dado da história e é específica fábricas para produzir automóveis fábricas para produzir máquinas de produzir automóveis etc seguese que a antevisão da escassez de petróleo representa um corte na demanda de máquinas para produzir automóveis Este corte por sua vez provoca queda de emprego e portanto de renda salários não mais pagos nesta indústria a qual por seu turno provoca nova queda de demanda desta vez no setor de bens de consumo Notese que a queda inicial da demanda é ocasionada não por queda de renda corrente mas sim por antecipação de um evento futuro Então o que fazer hoje com a renda o lucro e portanto com a poupança gerada no momento imediatamente anterior à queda do investimento Não seria inevitável que essa renda se transformasse em demanda de outros bens de consumo ou de investimento OS ECONOMISTAS 14 17 Keynes elabora sua teoria na hipótese simplificadora de que o processo de produção requer somente trabalho e equipamentos Contudo na ilustração do texto definimos a queda na eficiência marginal do capital a partir de uma matéria básica A reconciliação disto no entanto é imediata Basta se admitir uma relação de proporcionalidade entre matériaprima e insumos de trabalho Na resposta a essas questões ocorre o rompimento de Keynes com os ensinamentos da Lei de Say Para Keynes a preferência pela liquidez ou pela manutenção de ativos líquidos moeda em circuns tâncias de queda de preços como ocorreu na década dos 30 ou outros ativos com expectativa de rentabilidade real positiva em situações in flacionárias pode em circunstâncias como a anunciada constituirse numa alternativa vantajosa à demanda de novos equipamentos ou de bens de consumo Segundo a Lei de Say essa situação com mercados livres seria revertida pela queda da taxa de juros de salários e de preços Keynes então nos lembra que a queda da taxa de juros ainda que importante para eventualmente recuperar o nível de investimentos poderia não funcionar se a eficiência marginal do investimento caísse mais rapidamente que a taxa de juros E essa queda poderia ser en gendrada pela própria queda de salários e preços a qual deprimiria mais ainda a eficiência marginal do capital E este processo terminaria também por se constituir num desastre social por promover ociosidade do equipamento instalado e desemprego Isso representa uma severa crítica a um dos mitos sagrados da moral burguesa não funciona portanto a convergência entre o interesse individual no caso a pre ferência pela liquidez e o coletivo o máximo emprego possível da força de trabalho E este conflito de interesses é produto do funcionamento dos mecanismos automáticos dos mercados livres Como escapar dessa armadilha recessiva Como então evitar a acumulação improdutiva e gerar demanda efetiva Estava assim legitimada a ação do Estado como elemento inte grante e indispensável ao bom funcionamento do sistema econômico capitalista Ao Estado caberia portanto eliminar a carência de de manda efetiva em momentos de recessão e desemprego Como Fazendo déficit orçamentário e emitindo títulos para extrair a renda não gasta do setor privado e com ela garantir que as máquinas ociosas voltem a operar E aqui mais dois mitos caem Até então a poupança era encarada como um dos pilares da moral burguesa Keynes vem e diz a causa da depressão é a poupança excessiva em face da expectativa de lucro futuro num momento de elevada preferência pela liquidez Crise portanto representa carência de investimento e ociosidade de máquinas e homens e não como apregoado carência de poupança Destrói também o mito de que a operação do Estado se deve pautar por grande austeridade financeira não se gastando mais do que coleta em tributos Mostra assim que em circunstâncias de desemprego o déficit fiscal é uma peça importante para o bom funcionamento do sistema econômico A respeito do déficit é necessário fixar um ponto importante Um déficit pode ocorrer tanto por aumento de despesas quanto por queda de tributos Numa situação de depressão no entanto só o au KEYNES 15 mento de despesas garante o aumento da demanda efetiva queda na tributação pode gerar simplesmente maior demanda de ativos líquidos Eis portanto os pilares teóricos que informaram a política eco nômica a partir de fins da década dos 30 a qual foi decisiva para a saída da Depressão e muito ajudou o crescimento sem precedentes do capitalismo industrial do pósguerra18 A atividade econômica do Estado na geração de demanda efetiva é definitivamente incorporada à prática econômica do sistema capitalista para revigorálo Na maior nação ca pitalista do mundo os Estados Unidos da América do Norte as compras de bens e serviços do Governo Federal passam de 25 em 1929 para 10 do Produto Nacional Bruto em 193919 Antes de encerrar esta seção convém comentar dois aspectos con troversos da teoria keynesiana o funcionamento do mercado de trabalho e a interação do binômio poupançainvestimento Do ponto de vista da política econômica a teoria keynesiana pri vilegia as flutuações do nível de emprego e o controle da demanda efetiva A teoria clássica privilegia a estabilidade de preços e o controle monetário Vejamos este debate na perspectiva do mercado de trabalho Em Keynes a ampliação da demanda efetiva objetiva ampliar o nível de emprego da força de trabalho até o ponto de pleno emprego Para a ortodoxia esta questão é irrelevante Na medida em que ar gumentam o emprego global é o resultado espontâneo dos interesses dos agentes econômicos individuais operando em mercados livres qual quer nível de desemprego duradouro só poderá ser voluntário Se in voluntário só poderá ser temporário produto de mudanças tecno lógicas ou causadas pela impertinência dos sindicatos ou governos que impõem salários irrealistas em desrespeito às forças automáticas e não discricionárias dos mercados livres Neste caso qualquer ação do Estado só promoverá a ampliação do papel do Estado em detrimento do setor privado sem ampliar o nível de emprego Keynes muda dra maticamente a questão Primeiro porque o processo de fixação do sa lário nominal termina por cristalizar em contratos critérios de eqüidade distributiva e eficiência econômica e portanto não se pauta tãosomente por eventuais excessos de demanda eou de oferta de mercado de tra balho segundo porque além do nível de salário real o nível de emprego global é também determinado pelo nível de demanda efetiva E mais a definição da demanda agregada não é independente dos movimentos de salários e preços e assim os movimentos de salário real e seus conseqüentes efeitos sobre a demanda agregada determinam conjun tamente o nível de emprego Ou seja é um equívoco se admitir que em Keynes um aumento de salário real via aumento de salário nominal OS ECONOMISTAS 16 18 Naturalmente isso não deve minimizar os estímulos econômicos que vêm com a II Grande Guerra para a expansão da industrialização 19 Os gastos do governo em todos os níveis passam de 10 em 1924 para 20 do PIB em 1939 não cause desemprego Para Keynes este aumento também causa um corte na demanda efetiva ocasionada pela queda da liquidez real do sistema econômico a qual é engendrada pela elevação do salário no minal A posição de Keynes neste ponto é clara se o salário nominal for excessivamente elevado a estabilidade do sistema econômico será melhor preservada se o corte do salário real requerido para expandir o emprego for obtido pelo aumento de moeda e preços do que pela queda de salário nominal Se tal objetivo for perseguido através da queda do salário nominal o resultado final poderá ser menos e não mais emprego porque o movimento baixista de salários pode engendrar expectativas depressivas na eficiência marginal do capital O binômio poupançainvestimento tem sido objeto de inúmeras controvérsias Para os clássicos poupança e investimento se confundem não porque tenham identidade própria mas sim porque a operação de taxa de juros é de tal ordem poderosa que a distinção perde razão de ser Em Keynes ao contrário a distinção é magnificada exatamente porque a operação dos mecanismos de mercado via taxa de juros não tem essa força Além de juros a expectativa de lucro futuro gera in vestimento e a renda corrente gera poupança Portanto a despeito da força equilibrante dos juros sobre poupança e investimento e de renda sobre poupança pode ocorrer uma inconsistência básica entre a efi ciência marginal do capital e a taxa de juros de forma a gerar queda de produto E mais em condições normais um aumento de investimento pode gerar poupança e maior nível de renda enquanto um aumento de poupança em relação à renda corrente não gera necessariamente nem mais investimento nem aumento mas sim queda do produto Ou seja poupança não gera investimento mas investimento gera poupan ça Melhor ainda mais poupança só não gera recessão se e somente se o mecanismo da taxa de juros complementado por outros meca nismos também gerar igual aumento de investimento ou igual aumento de superávit comercial com o resto do mundo ou igual ampliação do déficit do setor público ou uma combinação destes três últimos ele mentos20 Portanto numa situação de insolvência externa com déficit KEYNES 17 20 Ao contrário do que muitos pensam ampliar os níveis de poupança não aparece como uma proposta tola em Keynes Diante de uma restrição básica a exemplo de uma economia de guerra o aumento da poupança é uma exigência das necessidades de financiamento da corrida bélica Em 1940 Keynes publica o panfleto How to pay for the War que trata do problema de aumentar a poupança Na teoria de Keynes as inoportunidades de ampliação da poupança só ocorrem em momentos depressivos No entanto em circunstâncias de es trangulamento externo ou de economia de guerra a sociedade não tem escolha a não ser aumentar a poupança doméstica No caso de estrangulamento externo isso só pode se materializar através da diminuição do déficit ou de aumento do saldo em contas correntes com o resto do mundo De qualquer forma numa economia monetária para se chegar à poupança de recursos reais o ponto de partida é a poupança financeira ainda que esta não produza necessariamente aquela Nesse caso a frustração se daria pela incapacidade de ampliar as exportações Se isto não puder ocorrer a recessão seria inevitável É este o significado do estrangulamento externo do setor público e com déficit nas trocas internacionais só há uma forma possível de aumentar a poupança interna ampliar o superávit nas trocas internacionais III É de justiça lembrar que a revolução keynesiana não foi produto tãosomente do trabalho isolado do brilhante e genial John Maynard Keynes Em primeiro lugar sua inspiração básica a do papel de de manda efetiva no sistema econômico tem longínquas e sólidas origens nos trabalhos de Malthus Hobson Marx e outros Segundo porque não seria exagero afirmar que a Teoria Geral muito reflete as idéias e críticas de um conjunto particularmente brilhante de discípulos de Keynes a exemplo de Robertson Joan Robinson Austin Robinson R Kahn James Meade e Roy Harrod e outros Com este grupo Keynes interagiu contínua e intensamente enquanto escrevia a Teoria Geral Através de cartas conversas e seminários as primeiras provas da Teo ria Geral foram discutidas corrigidas e até reescritas por sugestões deste grupo Terceiro porque alguns princípios básicos da Teoria Geral foram também formulados independente e quase simultaneamente por outros economistas sem no entanto obter a notoriedade do então já influente e brilhante economista inglês Este é o caso de M Kalecki na Polônia que tratou independentemente do princípio da demanda efetiva de forma muito semelhante a Keynes e Myrdall e de outros discípulos de Wicksell na Suécia que trataram também independen temente as questões do equilíbrio monetário à semelhança do que fizera Keynes21 Quarto porque o sucesso da obra em muito dependeu das extensões e controvérsias que ela permitiu nas mãos de um bri lhante grupo de economistas que como Keynes buscavam escapar dos ensinamentos da Lei de Say tornados obsoletos pela crise da década dos 30 Além dos jovens economistas ingleses a Teoria Geral encontra entusiasta acolhida nos Estados Unidos nos escritos da década dos 30 40 e 50 de Alvin Hansen Paul Samuelson John K Galbraith Laurence Klein e muitos outros22 A Teoria Geral nascia assim com ingredientes de uma obra clás sica seu autor era uma personalidade importante intuitiva contro OS ECONOMISTAS 18 21 Austin Robinson aluno amigo escudeiro e por fim um dos mais autorizados biógrafos de Keynes afirma que da literatura econômica se pode destacar além de Marshall Robertson 1926 e Wicksell 1936 traduzido por sugestão de Keynes como as fontes inspiradoras de Keynes para a elaboração da Teoria Geral 22 Galbraith assim relata seu primeiro encontro com Keynes Galbraith então era chefe do sistema de controle de preços Certo dia ele Keynes apareceu sem se anunciar na antesala de meu gabinete em Washington para entregar um trabalho O nome disseme ela a secretária era Kines Eu dei uma olhada nos papéis e ali estava J M Keynes Foi como se São Pedro subitamente aparecesse a um pároco de aldeia GALBRAITH 1980 p 223 versa e intelectualmente brilhante seu sistema de análise criava um paradigma consistente e adequado ao combate a um dos mais angus tiantes problemas de então a recessão e o desemprego seu tom polê mico e heterodoxo despertou entusiasmo num importante grupo de jovens economistas os quais carregaram sua bandeira os instrumentos de análise de Keynes espalharam a nova sabedoria através do en sino e da aplicação da teoria de Keynes para melhor compreensão de novos ou velhos problemas e a partir da Teoria Geral superaram a análise original na área de Comércio Internacional James Meade L Metzler Joan Robinson Samuelson e outros de Teoria Monetária Hicks Samuelson Modigliani Kahn e outros de Desenvolvimento Econômico Harrod Joan Robinson Kaldor e outros de Política Eco nômica Meade Tinbergen Samuelson e outros de Contas Nacionais Stone Colin Clark e outros e diferentes áreas No entanto convém repetir a Teoria Geral não é um livro de leitura fácil e livre de ambigüidades A controvérsia ainda hoje grassa sobre o significado da inovação contida na Teoria Geral De qualquer forma nenhum outro livro de teoria econômica escrito neste século exerceu tão dominante influência no ensino e na pesquisa quanto a Teoria Geral Infelizmente após a sua publicação Keynes teve pouca oportu nidade para esclarecer o significado de seu livro e organizar os ele mentos mais críticos do debate que sua obra suscitou23 Em meados de 1937 sofre um severo ataque cardíaco e a partir de então não mais se dedica à teoria econômica Com o início da Guerra ainda não to talmente restabelecido Keynes volta ao Tesouro Britânico onde de sempenha papel crítico porém burocrático na organização da estrutura de financiamento para os gastos bélicos É deste período o panfleto How to Pay for the War 1940 onde as categorias analíticas da Teoria Geral são elaboradas para combater não o desemprego mas sim a inflação para estimular não o investimento mas sim a poupança para ampliar não o gasto do governo mas sim a tributação É a outra face da medalha da Teoria Geral24 A partir de 1943 passa a trabalhar sobre as questões de finan ciamento internacional e os problemas que aí seriam enfrentados no pósguerra Produz então um plano sobre a reorganização do sistema financeiro internacional Como representante do Tesouro Britânico par ticipa da Conferência de Bretton Woods em 1944 cujo propósito era KEYNES 19 23 Poucos são os registros publicados de como Keynes reagiu a alguns comentários sobre o conteúdo analítico da Teoria Geral Talvez a mais importante reação de Keynes aos críticos seja The General Theory of Employment que surge como resposta a Viner Leontief Ro bertson e Taussig no QJE 1937 24 Após seu ataque cardíaco em 1937 esta talvez seja a mais importante e única obra de Keynes que ele elabora sobre problemas de teoria econômica Sua preocupação a partir de 1939 se volta inteiramente para os problemas práticos enfrentados no Tesouro Britânico organizar uma agência multilateral e supranacional de financiamento Dois planos estavam em pauta o inglês produzido por Keynes o ame ricano concebido por Harry White Da síntese de ambos emergem os fundamentos que norteariam a organização do FMI No início de 1946 atende à Conferência de Savannah onde efetivamente nasceu o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial Morre em abril de 1946 Não deixou filhos sua herança maior a Teoria Geral e um semnúmero de discípulos que souberam estender e aprofundar seus ensinamentos Voltemos à Teoria Geral A obra de Keynes é marcadamente produto de uma época caracterizada por contração da produção indus trial por desemprego e por deflação de preços Será então sua contri buição teórica hoje relevante para a compreensão da atual crise de desaceleração do crescimento desemprego e aceleração inflacionária Ou seja inflação associada a crise de crescimento não tornam obsoletos os ensinamentos de Keynes Seria naturalmente um equívoco desprezar os ensinamentos bá sicos de sua obra e acreditar que em nada ajudem à compreensão do presente É certo que Keynes não nos legou uma obra acabada e de finitiva ensinounos no entanto que a operação de uma economia monetária não pode ser compreendida a partir de modelos analíticos ancorados na Lei de Say Mais importante ainda incorporou à Econo mia a grande descoberta filosófica do século XIX cristalizada na má xima O Homem está só ou seja não podemos contar com a mão invisível para garantir o suprimento dos bens e serviços e para gerar todos os empregos requeridos por aqueles que desejam trabalhar Keynes nos ensinou que a ação do Estado através da política econômica é um ingrediente básico do bom funcionamento do sistema capitalista Ou seja o ativismo do Estado é um complemento indispensável ao funcionamento dos mercados para se obter o máximo nível de emprego possível e portanto maximizar o nível de bemestar da coletividade Esta é a mais duradoura contribuição de Keynes Ensinounos ainda o significado específico das crises do sistema capitalista Elas espelham em última instância uma ociosidade de máquinas e homens e não de escassez de poupança Indo além de Keynes mas ainda ancorados em seu trabalho hoje sabemos quais as implicações das relações contratuais expressas em moeda e da exis tência de capital físico específico a escassez de poupança é produto da inexistência de mercados externos para absorver a produção espe cífica de nosso parque industrial automóveis aço alumínio produto petroquímico café e outros O estrangulamento externo é o retrato da iliquidez do nosso parque industrial cujo funcionamento exige importações A expansão da demanda efetiva em nível mundial é con dição sine qua non para se voltar à ocupação das máquinas hoje ociosas no país e para expandir o emprego interno Igualmente equivocado seria advogar para o momento atual al OS ECONOMISTAS 20 gumas medidas da política econômica extraídas de Keynes Hoje sa bemos que nem todo déficit do Governo é igualmente saudável Dada a especialidade do nosso parque industrial sua dimensão e nível de dependência de importações expandir mais ainda o déficit do Governo para tentar expandir o nível de emprego terá um resultado perverso agudizará mais ainda o estrangulamento externo e não ocorrerá ex pansão permanente do nível de emprego Realocar sem expandir o dispêndio do setor público é o único caminho possível para se obter uma expansão dos níveis de emprego Também sabemos que nem todo investimento é igualmente saudá vel Nem o Estado é capaz de administrar e implantar com sucesso in vestimentos totalmente inviáveis do ponto de vista estritamente econômico e técnico a exemplo do projeto nuclear brasileiro Antever a especificidade da demanda no futuro e localizar por antecipação os mercados onde esta demanda se materializará aqui ou lá fora escapam ao nosso controle Esta incapacidade de perscrutar o futuro nos recoloca na tradição de Keynes devido à especificidade das máquinas e à tirania dos contratos dívida externa terminamos por nos transformar em prisioneiros do tem po Isso significa dizer que a máxima keynesiana de que investimento cria renda e portanto poupança para financiálo tropeça na especificidade do investimento e na existência ou não de mercados para absorver a produção daí resultante Este é o pecado do superinvestimento em equipamentos e plantas industriais para produzir um produto para o qual não haja mercado nem a preço abaixo dos custos Tampouco se pode encontrar na Teoria Geral a solução para a questão inflacionária Desconhecer seus ensinamentos no entanto pode nos conduzir a desastradas recomendações de política econômica que subrepticiamente tentam revigorar ensinamentos obsoletos desde 1936 Nesta categoria estão as alegações de que os sindicatos são dis torções e não como efetivamente o são características do sistema ca pitalista de que os mercados livres e o livrecomércio entre as nações produzem a alocação mais eficiente dos recursos como se as organi zações jurídicas monetárias e a própria organização das empresas mo dernas não tivessem uma enorme visibilidade na fixação das taxas de juros das taxas de câmbio das taxas de salário e muitos outros preços de produtos básicos Em suma manter em mente os ensinamentos básicos de Key nes não nos dá a garantia de que sejamos capazes de encontrar soluções para a crise de nossos dias Dános no entanto a segurança para rejeitar propostas velhas travestidas de nova roupagem a exemplo dos modelos macroeconômicos chamados de expectativas racionais e a convicção de que a partir de seus ensinamentos se pode construir algo de novo com o cuidado de que nem todo déficit do setor público é desejável e nem todo investimento será necessa riamente viável e saudável KEYNES 21 Adroaldo Moura da Silva Amazonas 1941 bacharel em Eco nomia pela Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo em 1966 obteve os graus de Mestre e Doutor PhD em Eco nomia pela Universidade de Chica go EUA com tese sobre inflação na América Latina 197072 É autor de inúmeros artigos sobre inflação intermediação financeira no Brasil e problemas de política eco nômica Professor adjunto de Ma croeconomia do Departamento de Economia da Faculdade de Econo mia e Administração da Universida de de São Paulo desde 1967 e Di retor de Pesquisa da FIPE Funda ção Instituto de Pesquisas Econômi cas É coautor de Alternativas para o Financiamento do Sistema Previ denciário 1982 Editora Pioneira e autor de Emprego Preços e Salários 1980 texto editado pela FIPE OS ECONOMISTAS 22 NOTAS BIBLIOGRÁFICAS As informações sobre a vida e a obra de Keynes foram extraí das de I HARROD R F The Life of Maynard Keynes Nova York Avon Books 1961 II LEKACHMAN R The Age of Keynes Nova York McGrowHill 1966 III MOGGRIDGE D E John Maynard Keynes Nova York Penguin série Modern Masters 1976 IV ROBINSON A John Maynard Keynes In Economic Journal Março 1947 Os demais trabalhos citados no texto são I EDEL L Bloomsbury A House of Lions Nova York Avon Books 1979 II GALBRAITH J K A Era da Incerteza São Paulo Pioneira 1980 Capítulo 7 III JOHNSON H Keynes e a Economia Inglesa In KEYNES M editor Ensaios sobre John Maynard Keynes Rio de Janeiro Paz e Terra 1977 IV SAMUELSON P A The General Theory In LEKACHMAN R editor Keynes General Theory Londres MacMillan 1964 O ensaio biográfico de A Robinson é reproduzido neste livro V ROBERTSON D H Banking Policy and Price Level Nova York Kelley 1949 1ª edição de 1926 VI WICKSELL K Interest and Prices Tradução de Kahn estimulado por Keynes Londres MacMillan 1936 Uma amostra da variedade de interpretações recentes sobre a Teoria Geral MINSKY H John Maynard Keynes Nova York Columbia Univ Press 1975 versão heterodoxa 23 PATINKIN D Keynes Monetary Thought North Carolina Duke Uni versity Press Durhom 1976 LEIJONHUFUND A On Keynesian Economics and the Economics of Keynes Nova York Oxford Univ Press 1968 HAHN F H e ARROW K General Competitive Analysis San Fran cisco HoldenDay 1971 Capítulo 14 HICKS J The Crisis in Keynesian Economics Nova York Basic Books 1974 FRIEDMAN M A Theorical Framework for Monetary Analysis Nova York National Bureau of Economic Research 1971 Textos de Keynes em Língua Portuguesa SZMRECSÁNYI J org Keynes São Paulo Editora Ática 1978 SINGER P org Ensaios Econômicos São Paulo Os Pensadores Abril Cultural 1976 p 754 Textos de Keynes The Collected Writings of John Maynard Keynes 22 volumes editados por Johnson E e Moggridge D para a Royal Economic Society e publicado pela MacMillan Londres OS ECONOMISTAS 24 A TEORIA GERAL DO EMPREGO DO JURO E DA MOEDA Tradução de Mário R da Cruz Revisão técnica de Cláudio Roberto Contador Tradução dos Prefácios de Paulo de Almeida Traduzido de KEYNES John Maynard The General Theory of Employment Interest and Money Londres The Macmillan Press 1973 Reimpressão de 1978 N do E PREFÁCIO Este livro é dirigido principalmente a meus colegas economistas Espero que ele seja inteligível a outros também mas o propósito pri mordial dele é tratar de questões difíceis de teoria e só em segundo lugar das aplicações dessa teoria à prática Se a economia ortodoxa está em desgraça o erro não se encontra na superestrutura que foi elaborada com grande cuidado levando em conta a consistência lógica mas na falta de clareza e de generalidade das premissas Assim só posso conseguir meu objetivo de persuadir os economistas a reexami narem criticamente certos de seus postulados básicos através de uma argumentação altamente abstrata e também de muita controvérsia Gostaria que tivesse podido haver menos desta última mas julgueia importante não apenas para explicar meu próprio ponto de vista como também para demonstrar em que aspectos ele diverge da teoria pre dominante Suponho que os que estão fortemente apegados àquilo que chamarei a teoria clássica flutuarão entre a crença de que estou completamente errado e a crença de que não estou dizendo nada de novo Cabe a outros determinar se uma dessas duas ou ainda uma terceira alternativa está correta Os trechos de controvérsia objetivam fornecer algum material para uma resposta e devo pedir perdão se na busca de distinções claras meus argumentos são demasiado duros Eu mesmo defendi com convicção durante anos as teorias que agora ataco e não ignoro acho seus pontos fortes Os assuntos em discussão são da máxima importância Porém se minhas explicações estiverem certas é a meus colegas economistas e não ao público em geral que tenho que convencer em primeiro lugar A esta altura da disputa o público em geral embora seja bemvindo ao debate apenas observará de fora uma tentativa de um economista no sentido de resolver as profundas divergências de opinião entre seus colegas economistas que quase chegaram a destruir a influência prática da teoria econômica e que continuarão até que sejam resolvidas a ter esse efeito A relação entre este livro e meu Tratado Sobre a Moeda JMK 27 v V e VI que publiquei há cinco anos provavelmente está mais clara para mim do que estará para os outros e aquilo que em minha mente constitui uma evolução natural numa linha de pensamento que venho seguindo há vários anos pode às vezes parecer ao leitor uma mudança confusa de ponto de vista Essa dificuldade não diminui diante de certas modificações de terminologia que me senti obrigado a fazer Essas mudanças de linguagem são destacadas no decurso das páginas seguintes mas a relação geral entre os dois livros pode ser expressa sucintamente como segue Quando comecei a escrever meu Tratado Sobre a Moeda eu ainda estava me movimentando ao longo das linhas tradicionais encarando a influência da moeda como algo por assim dizer separado da teoria geral da oferta e da demanda Quando ter minei de escrever o livro tinha feito algum progresso na tentativa de encaminhar a teoria monetária no sentido de se tornar uma teoria da produção como um todo Mas minha falta de emancipação de idéias preconcebidas apareceu naquilo que agora pareceme ser a falha prin cipal das partes teóricas daquela obra a saber os Livros III e IV isto é que eu não consegui lidar completamente com os efeitos das variações do nível de produção As minhas chamadas equações fun damentais eram uma fotografia instantânea tirada supondo um vo lume de produção dado Elas tentavam demonstrar como supondose o volume de produção dado podiam desenvolverse forças que geravam um desequilíbrio dos lucros exigindo assim uma variação do nível da produção Mas o desenvolvimento dinâmico em contraste com a foto grafia instantânea ficava incompleto e extremamente confuso O pre sente livro por outro lado evoluiu para aquilo que é precipuamente um estudo das forças que determinam as variações na escala da pro dução e do emprego como um todo e embora se descubra que a moeda entra no esquema econômico de uma maneira essencial e peculiar os detalhes monetários técnicos vão para segundo plano Uma economia monetária iremos ver é essencialmente uma economia em que as mu danças de pontos de vista sobre o futuro são capazes de influenciar o volume de emprego e não meramente a sua direção Mas nosso método de analisar o comportamento econômico do presente sob a influência das mudanças de idéias sobre o futuro é um método que depende da interação da oferta e da demanda ligandose dessa forma a nossa teoria fundamental do valor Somos levados dessa forma a uma teoria mais geral que inclui como caso particular a teoria clássica com a qual estamos familiarizados O autor de um livro como este trilhando caminhos desconhecidos terá que apoiarse muito na crítica e na troca de idéias se quiser evitar uma proporção indevida de erros É surpreendente em que coisas tolas podese acreditar temporariamente se se pensa sozinho por tempo de masiado particularmente na Economia bem como nas outras ciências morais em que muitas vezes é impossível submeter as idéias que se OS ECONOMISTAS 28 tem a um teste conclusivo quer formal quer experimental Ao escrever este livro ainda mais talvez do que no caso do meu Tratado Sobre a Moeda apoieime constantemente nos conselhos e nas críticas cons trutivas do Sr R F Kahn Há muitas coisas neste livro que não teriam assumido a forma que assumiram se não fosse por suas sugestões Também recebi muito auxílio da Sra Joan Robinson do Sr R G Hawtrey e do Sr R F Harrod que leram todas as provas O índice remissivo25 foi compilado pelo Sr D M BensusanButt do Kings Col lege Cambridge A elaboração deste livro foi para o autor uma longa luta de li bertação e sua leitura deve ser o mesmo para a maioria dos leitores se as investidas do autor sobre eles tiverem sucesso uma luta de libertação das formas habituais de pensamento e de expressão As idéias aqui expressas tão laboriosamente são extremamente simples e deveriam ser óbvias A dificuldade não está nas novas idéias mas em escapar das velhas que se ramificam para aqueles que foram criados como a maioria de nós foi por todos os cantos de nossas mentes J M Keynes 13 de dezembro de 1935 KEYNES 29 25 Não incluído na primeira edição N do E PREFÁCIO À EDIÇÃO ALEMÃ Alfred Marshall cujos Princípios de Economia constituem a obra fundamental na formação de todos os economistas ingleses contempo râneos teve um cuidado especial em destacar a continuidade existente entre o pensamento dele e o de Ricardo Sua obra em grande parte consistiu em enxertar o princípio marginalista e o princípio da subs tituição na tradição ricardiana e sua teoria da produção e do consumo como um todo ao contrário de sua teoria da produção e da distribuição de um dado montante da produção nunca foi exposta separadamente Não estou seguro de que ele mesmo sentisse a necessidade de tal teoria Mas seus sucessores imediatos e seguidores certamente a colocaram de lado e aparentemente não sentiram sua falta Foi nessa atmosfera que me formei Eu mesmo ensinei essas doutrinas e foi só na última década que passei a ter consciência de sua insuficiência Em meu pró prio pensamento e desenvolvimento portanto este livro representa uma reação uma transição no sentido de me afastar da tradição clássica ou ortodoxa inglesa A ênfase que dou nas páginas seguintes a isso e aos pontos em que divirjo da doutrina tradicional tem sido considerada por alguns na Inglaterra como indevidamente controversa Como pode porém alguém que foi educado como católico em termos de economia inglesa um sacerdote mesmo dessa fé evitar um pouco de ênfase con troversa logo quando se torna protestante Imagino no entanto que isso pode ser percebido pelos leitores alemães de uma forma ligeiramente diferente A tradição ortodoxa dominante na Inglaterra do século XIX nunca conseguiu imporse com firmeza ao pensamento alemão Sempre existiram importantes escolas de pensamento entre os economistas alemães que contestaram forte mente a adequação da teoria clássica à análise dos acontecimentos contemporâneos Tanto a escola de Manchester como o marxismo em última instância derivam de Ricardo conclusão que só surpreende ao nível superficial Mas na Alemanha sempre tem existido um amplo setor da opinião que não aderiu nem a uma nem ao outro Dificilmente se pode afirmar contudo que essa escola de pen 31 samento tenha elaborado um arcabouço teórico rival ou que tenha sequer tentado fazêlo Ela tem sido cética e realista contentandose com os métodos e resultados históricos e empíricos que dispensam a análise formal A argumentação não ortodoxa mais importante em termos de linha teórica foi a de Wicksell Seus livros podiam ser encontrados em alemão não o podiam até há pouco em inglês de fato um dos mais importantes deles foi escrito em alemão Seus seguidores porém eram principalmente suecos e austríacos sendo que estes últimos combinaram as idéias dele com teorias especifi camente austríacas de forma a encaminhálas realmente de volta para a tradição clássica Assim a Alemanha bem ao contrário de seus hábitos na maior parte das ciências contentouse por todo um século em ficar sem uma teoria formal de Economia que fosse pre dominante e geralmente aceita Talvez portanto eu possa esperar menos resistência por parte dos leitores alemães do que dos ingleses ao oferecer uma teoria do emprego e da produção como um todo que diverge em aspectos im portantes da tradição ortodoxa Mas posso esperar vencer o agnos ticismo econômico da Alemanha Posso convencer os economistas alemães de que os métodos de análise formal têm uma contribuição importante a dar à interpretação dos acontecimentos contemporâ neos e à formulação das políticas contemporâneas Afinal é alemão gostar de teorias Como os economistas alemães devem se sentir famintos e sedentos depois de ter vivido todos esses anos sem teoria Certamente vale a pena eu tentar E se eu puder contribuir com algumas migalhas para a preparação por parte dos economistas alemães de uma lauta refeição de teoria destinada a fazer frente às condições específicas da Alemanha ficarei satisfeito Confesso que a maior parte do que este livro exemplifica e expõe se refere às condições existentes nos países anglosaxões No entanto a teoria da produção como um todo que é o que o livro propõe expor seria muito mais facilmente adaptada às condições de um Estado totalitário do que a teoria da produção e distribuição de um volume dado em condições de livreconcorrência e uma ampla dose de laissezfaire A teoria das leis psicológicas referentes ao consumo e à poupança a influência das despesas baseadas em empréstimos sobre os preços e os salários reais o papel desempenhado pela taxa de juros todos esses elementos permanecem como ingredientes ne cessários em nosso esquema de pensamento Aproveito a oportunidade para expressar meus agradecimentos pelo excelente trabalho de meu tradutor Herr Waeger espero que o vocabulário organizado por ele que aparece no fim do volume26 de OS ECONOMISTAS 32 26 Não incluído na presente edição N do E monstre ser de utilidade que transcenda seu propósito imediato e a meus editores Srs Duncker e Humblot cuja iniciativa temme per mitido manter contato com os leitores alemães desde quando há de zesseis anos já publicaram meu livro As Conseqüências Econômicas da Paz J M Keynes 7 de setembro de 1936 KEYNES 33 PREFÁCIO À EDIÇÃO JAPONESA Alfred Marshall cujos Princípios de Economia constituem a obra fundamental na formação de todos os economistas ingleses contempo râneos teve um cuidado especial em destacar a continuidade existente entre o pensamento dele e o de Ricardo Sua obra em grande parte consistiu em enxertar o princípio marginalista e o princípio da subs tituição na tradição ricardiana e sua teoria da produção e do consumo como um todo ao contrário de sua teoria da produção e da distribuição de um dado montante da produção nunca foi exposta separadamente Não estou seguro de que ele mesmo sentisse a necessidade de tal teoria Mas seus sucessores imediatos e seguidores certamente a colocaram de lado e aparentemente não sentiram sua falta Foi nessa atmosfera que me formei Eu mesmo ensinei essas doutrinas e foi só na última década que passei a ter consciência de sua insuficiência Em meu pró prio pensamento e desenvolvimento portanto este livro representa uma reação uma transição no sentido de me afastar da tradição clássica ou ortodoxa inglesa A ênfase que dou nas páginas seguintes a isso e aos pontos em que divirjo da doutrina tradicional tem sido considerada por alguns na Inglaterra como indevidamente controversa Como pode porém alguém que foi educado na ortodoxia econômica inglesa que de fato chegou a ser sacerdote dessa fé evitar um pouco de ênfase controversa logo quando se torna protestante Talvez os leitores japoneses contudo nem exijam minhas inves tidas contra a tradição inglesa e nem resistam a elas Estamos bem conscientes da ampla escala em que as obras econômicas inglesas são lidas no Japão mas não estamos tão bem informados quanto à opinião que os japoneses têm delas O recente e louvável empreendimento do Círculo Econômico Internacional de Tóquio de reimprimir os Princípios de Economia Política de Malthus como o primeiro volume da Série de Reproduções de Tóquio encorajame a pensar que um livro que descende de Malthus mais do que de Ricardo possa ser recebido com simpatia pelo menos em alguns setores 35 De qualquer forma agradeço ao Economista Oriental por possi bilitar meu contato com os leitores japoneses sem a desvantagem extra de uma língua estrangeira J M Keynes 4 de dezembro de 1936 OS ECONOMISTAS 36 PREFÁCIO À EDIÇÃO FRANCESA Por cem anos ou mais a Economia Política inglesa vem sendo dominada por uma ortodoxia Isso não quer dizer que tenha prevalecido uma doutrina imutável Ao contrário Tem havido uma progressiva evolução da doutrina Mas seus pressupostos sua atmosfera seu mé todo têm continuado surpreendentemente iguais e tem sido observável uma notável continuidade através de todas as mudanças Nessa orto doxia nessa transição contínua foi que eu me formei Eu a aprendi eu a ensinei eu a escrevi Para os que observam de fora provavelmente ainda pertenço a ela Os historiadores da doutrina irão considerar este livro como pertencente essencialmente à mesma tradição Mas ao es crevêlo e em outra obra recente que levou a ele sentime rompendo com essa ortodoxia numa forte reação contra ela fugindo de alguma coisa conquistando uma emancipação E esse estado de espírito de minha parte é a explicação de certas falhas do livro em particular o tom con trovertido de alguns trechos e seu ar de ser dirigido muito aos que detêm um ponto de vista específico e pouco ad urbem et orbem Eu estava que rendo convencer meu próprio ambiente e não me dirigi de modo suficien temente direto à opinião dos de fora Agora três anos depois tendome acostumado à nova pele e quase me esquecido do cheiro da velha devo como se estivesse escrevendo de novo esforçarme para livrarme dessa falha estabelecendo minha posição de maneira mais definida Digo tudo isso em parte para explicarme e em parte para des culparme perante os leitores franceses na França não houve uma tradição ortodoxa com a mesma autoridade sobre a opinião contempo rânea como houve em meu país Nos Estados Unidos a posição é bas tante semelhante à da Inglaterra mas na França como no resto da Europa não tem havido uma escola dominante desse tipo desde a extinção da escola dos economistas liberais franceses que estiveram em seu apogeu há vinte anos apesar de terem alcançado uma idade tão provecta que bem depois de sua influência ter desaparecido cou beme quando comecei a trabalhar como jovem redator do Economic Journal escrever os necrológios de muitos deles Levasseur Molinari 37 LeroyBealieu Se Charles Gide tivesse atingido a mesma influência e o mesmo prestígio de Alfred Marshall a posição de vocês franceses seria mais semelhante à nossa Do modo como as coisas ocorreram seus economistas são ecléticos demasiado achamos nós às vezes de senraizados do pensamento sistemático Talvez isso possa fazêlos mais acessíveis ao que tenho a dizer Isso pode porém também resultar em que meus leitores às vezes fiquem imaginando a que me refiro quando estou falando com aquilo que alguns de meus críticos ingleses consi deram um mau uso da língua da escola clássica de pensamento e dos economistas clássicos Pode ser útil a meus leitores franceses portanto que eu tente indicar bem resumidamente o que considero as principais differentiae de minha perspectiva Dei a minha teoria o nome de teoria geral Com isso quero dizer que estou preocupado principalmente com o comportamento do sistema econômico como um todo com a renda global com o lucro global com o volume global da produção com o nível global de emprego com o investimento global e com a poupança global em vez de com a renda o lucro o volume da produção o nível do emprego o investimento e a poupança de ramos da indústria firmas ou indivíduos em particular E afirmo que foram cometidos erros importantes ao se estender para o sistema como um todo as conclusões a que se tinha chegado de forma correta com relação a uma parte desse sistema tomada isoladamente Permitamme apresentar exemplos daquilo a que me estou refe rindo Minha assertiva de que para o sistema como um todo o volume de renda que é poupado no sentido de que não é gasto no consumo corrente é e tem necessariamente que ser exatamente igual ao volume do novo investimento líquido tem sido considerada um paradoxo e tem provocado controvérsia generalizada A explicação para isso indu bitavelmente se encontra no fato de que essa relação de igualdade entre poupança e investimento que necessariamente se verifica com relação ao sistema como um todo não se verifica com relação a um indivíduo em particular Não há razão absolutamente por que o novo investimento pelo qual sou responsável tenha que apresentar qualquer relação com o montante de minha poupança pessoal De forma bem legítima consideramos a renda de um indivíduo independente daquilo que ele próprio consome e investe Mas isso tenho que salientar não deve nos levar a desprezar o fato de que a demanda resultante do consumo e do investimento de um indivíduo é a fonte da renda de outros indivíduos de forma que as rendas em geral não são indepen dentes muito pelo contrário da disposição dos indivíduos a des pender e a investir e já que por sua vez a inclinação dos indivíduos a despender e a investir depende de sua renda estabelecese uma relação entre a poupança global e o investimento global que pode fa cilmente ser demonstrada além de qualquer possibilidade de refutação razoável como sendo de igualdade exata e necessária Encarada de OS ECONOMISTAS 38 forma justa essa é uma conclusão banal Mas ela põe em movimento uma cadeia de raciocínio de onde se seguem questões mais substan ciosas Fica demonstrado que de modo geral o montante real da pro dução e o nível real do emprego dependem não da capacidade de pro duzir ou do nível de renda preexistentes mas das decisões correntes de produzir que dependem por sua vez das decisões correntes de in vestir e das expectativas presentes do consumo corrente e do consumo previsto Ademais assim que conhecemos a propensão a consumir e a poupar como eu a batizei isto é o resultado para a comunidade como um todo das inclinações psicológicas individuais quanto a como dispor de dadas rendas podemos calcular que nível de renda e portanto que nível de produção e de emprego está em equilíbrio lucrativo com um dado nível de novo investimento a partir do que se desenvolve a doutrina do multiplicador Ou ainda tornase evidente que o aumento da propensão a poupar provocará ceteris paribus a contração da renda e do volume da produção enquanto um aumento do estímulo a investir fará com que se expandam Estamos portanto em condições de analisar os fatores que determinam a renda e a produção do sistema como um todo temos no sentido mais exato uma teoria do emprego Desse raciocínio surgem conclusões que são particularmente relevantes para os problemas de finanças públicas e de políticas governamentais em geral e do ciclo econômico Outro aspecto especialmente característico deste livro é a teoria da taxa de juros Nos últimos tempos muitos economistas têm afirmado que o montante de poupança atual determina a oferta de capital dis ponível que o ritmo de investimento corrente governa sua demanda e que a taxa de juros é por assim dizer o fator de equilíbrio de preços determinado pelo ponto de interseção entre a curva da oferta da pou pança e a curva da demanda do investimento Mas se a poupança global é necessariamente e em todas as circunstâncias exatamente igual ao investimento global é evidente que essa explicação não se sustenta Temos que ir procurar a solução em outra parte Eu a encontro na idéia de que é função da taxa de juros preservar o equilíbrio não entre a demanda e a oferta de novos bens de capital mas entre a demanda e a oferta de dinheiro isto é entre a demanda pela liquidez e os meios de satisfazer essa demanda Nesse ponto retorno à doutrina dos eco nomistas antigos anteriores ao século XIX Montesquieu por exemplo enxergou essa verdade com considerável clareza27 Montesquieu que foi o verdadeiro equivalente francês de Adam Smith o maior de seus economistas muito acima dos fisiocratas em termos de inteligência penetrante clareza de idéias e bom senso que são qualidades que um economista deveria ter Devo deixar porém para o texto do livro a demonstração em detalhe de como tudo isso funciona Batizei este livro A Teoria Geral do Emprego dos Juros e da KEYNES 39 27 Tenho em mente de modo especial o Livro Vigésimo Segundo cap 19 de O Espírito das Leis Moeda a terceira característica para a qual quero chamar atenção é o tratamento da moeda e dos preços A análise seguinte registra minha fuga final das confusões da teoria quantitativa em que antes me ema ranhara Considero que o nível de preços como um todo é determinado precisamente da mesma maneira que os preços individuais isto é sob a influência da oferta e da demanda As condições técnicas o nível dos salários o grau de capacidade ociosa das unidades de produção e da mãodeobra e o estado do mercado e da concorrência determinam as condições de oferta dos produtores tomados individualmente e dos produtos como um todo As decisões dos empresários que originam a renda dos produtos tomados individualmente e as decisões desses in divíduos quanto à disposição dada a essa renda determinam as con dições de demanda E os preços tanto os preços tomados individual mente como o nível de preços aparecem como a resultante desses dois fatores A moeda e a quantidade da moeda não constituem in fluências diretas a essa altura do processo Elas já fizeram seu trabalho numa etapa anterior da análise A quantidade da moeda determina a oferta de recursos líquidos e conseqüentemente a taxa de juros e em conjunto com outros fatores particularmente a confiança o estí mulo a investir o que por sua vez fixa o nível de equilíbrio da renda da produção e do emprego e a cada etapa em conjunto com outros fatores o nível de preços como um todo através das influências da oferta e da demanda assim estabelecidas Acredito que a economia em toda parte até recentemente tenha sido dominada muito mais do que compreendida pelas doutrinas as sociadas ao nome de JB Say É verdade que a lei dos mercados dele já foi abandonada há tempo pela maioria dos economistas mas eles não se livraram de seus postulados básicos particularmente de sua idéia errônea de que a demanda é criada pela oferta Say estava supondo implicitamente que o sistema econômico está sempre operando com sua capacidade máxima de forma que uma atividade nova apa receria sempre em substituição e não em suplementação a alguma outra atividade Quase toda a teoria econômica subseqüente tem de fendido no sentido de que ela tem exigido esse mesmo pressuposto No entanto uma teoria com essa base é claramente incompetente para enfrentar os problemas do desemprego e do ciclo econômico Talvez eu possa exprimir melhor a meus leitores franceses o que apregôo sobre este livro dizendo que na teoria da produção ele é uma ruptura radical com as doutrinas de JB Say e que na teoria dos juros ele é um retorno às doutrinas de Montesquieu J M Keynes 20 de fevereiro de 1939 Kings College Cambridge OS ECONOMISTAS 40 CAPÍTULO 1 A Teoria Geral Denominei este livro A Teoria Geral do Emprego do Juro e da Moeda dando especial ênfase ao termo geral O objetivo deste título é contrastar a natureza de meus argumentos e conclusões com os da teoria clássica28 na qual me formei que domina o pensamento econô mico tanto prático quanto teórico dos meios acadêmicos e dirigentes desta geração tal como vem acontecendo nos últimos cem anos Ar gumentarei que os postulados da teoria clássica se aplicam apenas a um caso especial e não ao caso geral pois a situação que ela supõe achase no limite das possíveis situações de equilíbrio Ademais as características desse caso especial não são as da sociedade econômica em que realmente vivemos de modo que os ensinamentos daquela teoria seriam ilusórios e desastrosos se tentássemos aplicar as suas conclusões aos fatos da experiência 43 28 Os economistas clássicos é uma denominação inventada por Marx para designar Ricardo e James Mill e seus predecessores isto é os fundadores da teoria que culminou em Ricardo Acostumeime talvez perpetrando um solecismo a incluir na escola clássica os seguidores de Ricardo ou seja os que adotaram e aperfeiçoaram sua teoria compreendendo por exem plo J S Mill Marshall e o Prof Pigou CAPÍTULO 2 Os Postulados da Economia Clássica A maior parte dos tratados sobre a teoria do valor e da produção discorre principalmente sobre a distribuição entre usos diferentes de determinado volume de recursos aplicados e as condições que admitindo a hipótese do emprego dessa quantidade de recursos determinam suas remunerações correspondentes e os valores relativos de seus produtos29 Também a questão do volume de recursos disponíveis no sentido da quantidade da população suscetível de ser empregada da extensão da riqueza natural e do capital de equipamento acumulado tem sido muitas vezes tratada de maneira descritiva Todavia a teoria pura dos determinantes do emprego efetivo dos recursos disponíveis poucas vezes foi objeto de exame detalhado Naturalmente seria absurdo dizer que nunca foi examinada pois todas as discussões relativas às flutua ções do emprego que têm sido muitas se ocuparam dela Não quero dizer que o assunto tenha sido descuidado mas que a teoria funda mental subjacente foi julgada tão simples e óbvia que foi quando muito objeto de menção superficial30 45 29 Essa é a tradição ricardiana pois Ricardo recusou expressamente atribuir qualquer interesse ao valor do nível do dividendo nacional considerado independentemente de sua distribuição Com isso avaliava corretamente a natureza de sua própria teoria Porém seus sucessores menos perspicazes serviramse da teoria clássica nas discussões sobre as causas da riqueza Ver a carta de Ricardo a Malthus de 9 de outubro de 1820 A Economia Política no seu pensar é uma investigação sobre a natureza e as causas da riqueza eu penso que deveria chamarse investigação das leis que determinam a distribuição do produto da indústria entre as classes que concorrem para sua formação Não se pode enunciar nenhuma lei com respeito à quantidade mas se pode formulála com suficiente exatidão com respeito às proporções Cada dia mais me convenço de que o primeiro estudo é vão e ilusório e de que o segundo é o verdadeiro objetivo da ciência Keynes empregou o termo dividendo como sinônimo daquilo que mais tarde se tornou mais conhecido como renda no Brasil ou rendimento em Portugal nos sistemas mo dernos de Contas Nacionais Por fidelidade à obra o termo dividendo é mantido como a tradução mais próxima de dividend Ficam porém os leitores alertados para a sinonímia dos termos dividendo renda e rendimento N do R T 30 Por exemplo o prof Pigou em sua obra Economics of Welfare 4ª ed p 127 escreve os itálicos são meus A não ser que o contrário seja dito expressamente ignorase o fato de I A teoria clássica do emprego supostamente simples e óbvia baseouse acho eu praticamente sem discussão nos dois postulados fundamentais que seguem I O salário é igual ao produto marginal do trabalho Isso quer dizer que o salário de uma pessoa empregada é igual ao valor que se perderia se o emprego fosse reduzido de uma unidade após a dedução de quaisquer outros custos que essa redução evitaria com a restrição de que a igualdade pode ser afetada de acordo com certos princípios pela imperfeição da concorrência e dos mercados II A utilidade do salário quando se emprega determinado volume de trabalho é igual à desutilidade marginal desse mesmo volume de emprego Isto significa que o salário real de uma pessoa empregada é exa tamente suficiente na opinião das próprias pessoas empregadas para ocasionar o volume de mãodeobra efetivamente ocupado com a res trição de que a igualdade para cada unidade individual de trabalho pode ser alterada por combinações entre as unidades disponíveis para empregarse análogas às imperfeições da concorrência que qualificam o primeiro postulado O que se entende por desutilidade é qualquer motivo que induza um homem ou grupo de homens a recusar trabalho em vez de aceitar um salário que para eles representa uma utilidade inferior a certo limite mínimo Esse postulado é compatível com o que se pode chamar desem prego friccional pois uma interpretação realista do mesmo permite com plena justificação conciliar certas imperfeições de ajustamento que impedem um estado contínuo de pleno emprego como por exemplo o desemprego em razão de uma temporária desproporção dos recursos especializados resultante de cálculos errados da procura intermitente de atrasos decorrentes de mudanças imprevistas ou ainda do fato de que a transferência de um emprego para outro não se realiza sem certa demora de modo que numa sociedade não estática sempre existe certa proporção de recursos não empregados entre um e outro traba lho Além do desemprego friccional o postulado é ainda compatível com o desemprego voluntário em razão da recusa ou incapacidade de determinada unidade de mãodeobra em aceitar uma remuneração OS ECONOMISTAS 46 que alguns recursos permanecem sem emprego contra a vontade de seus proprietários Isso não afeta a essência do argumento se bem que simplifique sua exposição Assim sendo enquanto Ricardo nega expressamente qualquer intenção de referirse ao dividendo nacional como um todo o prof Pigou em um livro que se ocupa especificamente do problema do dividendo nacional sustenta que a mesma teoria é tão aplicável nos casos de desemprego involuntário quanto no caso de pleno emprego equivalente à sua produtividade marginal em decorrência da legislação dos costumes sociais de um entendimento para contrato coletivo de trabalho ou ainda da lentidão em adaptarse às mudanças ou sim plesmente em conseqüência da obstinação humana Todavia estas duas categorias de emprego friccional e voluntária são abrangentes Os postulados clássicos não admitem a possibilidade de uma terceira categoria que passarei a definir mais adiante como o desemprego involuntário Sujeito a estas restrições o volume dos recursos empregados acha se em conformidade com a teoria clássica convenientemente determi nado pelos dois postulados O primeiro dános a curva de demanda por emprego e o segundo a curva de oferta o volume do emprego é fixado pelo ponto em que a utilidade do produto marginal iguala a desutilidade do emprego marginal Como conseqüência disso haveria apenas quatro meios possíveis de aumentar o emprego a melhoria da organização ou da previsão de maneira que diminua o desemprego friccional b redução da desutilidade marginal do trabalho expressa pelo salário real para o qual ainda existe mãodeobra disponível de modo que diminua o desemprego voluntário c aumento da produtividade marginal física do trabalho nas indústrias produtoras de bens de consumo de assalariados31 para usar o termo adequado com o qual o prof Pigou designa os artigos de cujos preços dependem a utilidade dos salários no minais ou d aumento em relação aos preços dos bens de consumo de não assalariados32 comparativamente aos das outras categorias de bens juntamente com o deslocamento das despesas dos indivíduos não assalariados dos bens salariais para os de outras categorias Tal é segundo meu melhor entender a substância da obra Theory of Unemployment do prof Pigou o único relato detalhado que existe da teoria clássica do emprego33 II Será verdade que as categorias anteriores abrangem todo o pro blema considerando que de modo geral a população raramente en KEYNES 47 31 Tradução mais próxima para o termo wagegoods que corresponde aos bens e serviços básicos que compõem o consumo típico de um trabalhador assalariado N do R T 32 A obra Theory of Unemployment do prof Pigou é examinada em maiores detalhes no Apêndice ao cap 19 mais adiante 33 Cf a citação do Prof Pigou p 47 nota de rodapé contra tanto emprego quanto desejaria ao salário corrente Devese pois admitir que se fosse maior a procura de mãodeobra maior quantidade de trabalho seria oferecida ao nível do salário nominal vigente34 A escola clássica concilia este fenômeno com seu segundo postulado argumentando que se a procura de mãodeobra ao salário nominal vigente se acha satisfeita antes de estarem empregadas todas as pessoas desejosas de trabalhar em troca dele isso se deve a um acordo declarado ou tácito entre os operários de não trabalharem por menos e que se todos eles admitissem uma redução dos salários no minais maior seria o volume de emprego atendido Sendo este o caso tal desemprego embora aparentemente involuntário não o seria estrita mente falando devendo incluirse na categoria do desemprego voluntário em virtude dos efeitos dos contratos coletivos de trabalho etc Isso suscita duas observações a primeira das quais se relaciona com o comportamento dos trabalhadores em face dos salários reais e dos salários nominais respectivamente e não é teoricamente funda mental a segunda porém o é Suponhamos por enquanto que a mãodeobra não esteja dis posta a trabalhar por um salário nominal menor e que uma redução desse nível conduza através de greves ou por qualquer outro meio a uma saída do mercado de trabalho de uma parte da mãodeobra atual mente empregada Podese a partir disso deduzir que o nível presente dos salários reais equivale exatamente à desutilidade marginal do tra balho Não necessariamente pois embora uma redução do salário no minal em vigor leve à saída de certa quantidade de mãodeobra isso não quer dizer que uma redução do salário nominal medido em termos de bens de consumo de assalariados produza o mesmo efeito caso resulte de uma alta de preços desses bens Em outras palavras pode acontecer que dentro de certos limites as exigências da mãodeobra tendam a um mínimo de salário nominal e não a um mínimo de salário real A escola clássica presumiu tacitamente que este fato não traria uma mudança significativa de sua teoria Mas isso não é exato pois se a oferta de trabalho não for uma função dos salários reais como sua única variável seu argumento desmoronase por completo deixan do totalmente indeterminada a questão do que será o nível efetivo de emprego35 Esta mesma escola clássica parece não ter concebido que sua curva de oferta de mãodeobra se deslocará a cada movimento dos preços a não ser que tal oferta seja função exclusiva do salário real Diante disso seu método encontrase vinculado às suas hipóteses OS ECONOMISTAS 48 34 Termo análogo ao da nota anterior representando a tradução mais próxima de nonwage goods que corresponde aos bens e serviços finais que compõem a cesta típica de consumo de um indivíduo não assalariado N do R T 35 Este ponto será tratado detalhadamente no Apêndice ao cap 19 mais adiante muito especiais e não pode ser adaptado para se fazer uma análise do caso mais geral Ora a experiência comum ensinanos sem a menor sombra de dúvida que em vez de mera possibilidade a situação em que a mão deobra estipula dentro de certos limites um salário nominal em vez de um salário real constitui o caso normal Se bem que o trabalhador resista normalmente a uma redução do seu salário nominal não cos tuma abandonar o trabalho ao se verificar uma alta de preços dos bens de consumo salariais Costumase às vezes dizer que seria ilógico por parte do trabalhador resistir à diminuição dos salários nominais e não resistir à dos salários reais Por motivos que mencionaremos adiante p 52 talvez isso não seja tão ilógico como parece à primeira vista e conforme veremos mais tarde é vantajoso que assim o seja Todavia lógica ou ilógica a experiência prova ser este de fato o com portamento do trabalhador Ademais o argumento de que o desemprego que caracteriza um período de depressão se deva à recusa da mãodeobra em aceitar uma diminuição dos salários nominais não está claramente respaldado pelos fatos Não é muito plausível afirmar que o desemprego nos Estados Unidos em 1932 tenha resultado de uma obstinada resistência do tra balhador em aceitar uma diminuição dos salários nominais ou de uma insistência obstinada de conseguir um salário real superior ao que permitia a produtividade do sistema econômico Amplas são as varia ções por que passa o volume de emprego sem que haja mudança apa rente nos salários reais mínimos exigidos pelo trabalhador ou em sua produtividade O trabalhador não se mostra mais intransigente no pe ríodo de depressão que no de expansão antes pelo contrário Também não é verdade que a sua produtividade física seja menor Estes fatos emanados da experiência constituem prima facie o motivo para pôr em dúvida a adequação da análise clássica Seria interessante examinar os resultados de uma análise esta tística sobre as verdadeiras relações entre as mudanças dos salários nominais e reais No caso de uma variação que afeta apenas certo gênero de indústria é de se esperar que os salários reais variem no mesmo sentido dos salários nominais Mas no caso de variações no nível de salários observaríamos julgo eu que a variação dos salários reais que acompanha a dos salários nominais longe de se apresentar normalmente no mesmo sentido ocorre quase sempre em sentido opos to Isso quer dizer que quando os salários nominais sobem constatase que os salários reais baixam e quando os salários nominais baixam são os salários reais que sobem Isso se deve ao fato de que em um curto período a baixa dos salários nominais e a elevação dos salários reais constituem por motivos diferentes fenômenos ligados à diminui ção do emprego pois embora o trabalhador se mostre mais disposto a aceitar reduções de salário quando o emprego declina os salários KEYNES 49 reais tendem inevitavelmente a crescer nas mesmas circunstâncias em virtude do maior retorno marginal de determinado estoque de ca pital quando a produção diminui Se efetivamente for exato que o salário real vigente esteja um pouco abaixo do qual em nenhuma circunstância se contaria com mais mãodeobra do que a atualmente empregada nenhum outro desem prego involuntário existiria além do friccional No entanto seria ab surdo imaginar que seja sempre assim pois uma quantidade de mão deobra superior à atualmente empregada encontrase normalmente disponível ao salário nominal vigente mesmo quando se verifica uma alta no preço dos bens de consumo de assalariados e conseqüentemente decresce o salário real Sendo isso verdadeiro os bens de consumo de assalariados equivalentes ao salário nominal vigente não representam a verdadeira medida da desutilidade marginal do trabalho e o segundo postulado deixa de ter validez Existe no entanto uma objeção ainda mais fundamental O se gundo postulado decorre da idéia de que os salários reais dependem das negociações salariais entre trabalhadores e empresários Admitese por certo que essas negociações se realizam efetivamente em termos monetários e também que os salários reais considerados aceitáveis pelos trabalhadores não são de certo modo independentes do nível de salário nominal correspondente Não obstante é a este salário no minal assim fixado que se recorre para determinar o salário real A partir disso a teoria clássica considera ser sempre possível à mãode obra reduzir seu salário real aceitando uma diminuição do seu salário nominal O postulado de que o salário real tende a igualarse à desu tilidade marginal do trabalho presume claramente que a própria mão deobra esteja em condições de fixar o seu salário real embora o mesmo não aconteça com o volume de emprego oferecido em troca A teoria tradicional sustenta em essência que as negociações salariais entre trabalhadores e empresários determinam o salário real de tal modo que supondo que haja livreconcorrência entre os empre gadores e a ausência de combinação restritiva entre os trabalhadores os últimos poderiam se desejassem fazer coincidir os seus salários reais com a desutilidade marginal do volume de emprego oferecido pelos empregadores ao dito salário Não sendo assim desaparece qual quer razão para se esperar uma tendência à igualdade entre o salário real e a desutilidade marginal do trabalho É necessário ter em mente que as conclusões clássicas preten demse aplicáveis à mãodeobra em seu conjunto e não significam meramente que um indivíduo isolado possa achar trabalho aceitando uma redução no salário nominal que seus companheiros recusam Su põemse igualmente aplicáveis tanto a um sistema fechado quanto a um sistema aberto e não dependem das características próprias de um sistema aberto nem dos efeitos que uma redução dos salários no OS ECONOMISTAS 50 minais em um único país exerce sobre seu comércio exterior efeitos estes que estão completamente fora do escopo do presente raciocínio Não se prendem tampouco aos efeitos indiretos que uma redução da folha de pagamentos em termos monetários exerce sobre o sistema bancário e as condições de crédito cujos efeitos examinaremos deta lhadamente no capítulo 19 Essas conclusões baseiamse na crença de que em um sistema fechado a redução do nível geral dos salários nominais é necessariamente acompanhada pelo menos em curtos pe ríodos e apenas sujeita a algumas restrições secundárias por certa redução dos salários reais embora nem sempre proporcional Ora a hipótese de que o nível geral dos salários reais depende das negociações entre os empregadores e os trabalhadores não é ob viamente válida Na verdade é de se admirar que poucos esforços têm sido feitos no sentido de comprovar ou de refutar esta hipótese pois está longe de ser consistente com o conteúdo geral da teoria clássica que nos ensinou que os preços são determinados pelo custo marginal expresso em termos nominais e que os salários nominais governam em grande parte o custo marginal Assim sendo se houvesse variações nos salários nominais seria de esperar que a escola clássica sustentasse que os preços variassem em proporção quase igual de tal modo que o salário real e o nível de desemprego permanecessem praticamente os mesmos e como conseqüência quaisquer ganhos ou perdas por menores que sejam para a mãodeobra ocorrem à custa ou em proveito de outros elementos do custo marginal que permaneceu inalterado36 Parece entretanto que houve um desvio desse ponto de vista em parte por causa da firme convicção de que o trabalhador está em con dições de fixar o seu próprio salário real e em parte talvez pela preocupação de que os preços dependem da quantidade da moeda Ao admitir que o trabalhador está sempre em condições de fixar o seu próprio salário real esta crença continuou a ser sustentada pela con fusão com o princípio segundo o qual a mãodeobra se acha sempre em condições de determinar o salário real correspondente ao pleno emprego isto é ao volume máximo de emprego compatível com deter minado salário real Em resumo levantamse duas objeções contra o segundo postu lado da teoria clássica A primeira referese ao comportamento efetivo do trabalhador Uma redução dos salários reais devida a uma alta de preços não acompanhada da elevação dos salários nominais não de termina por via de regra uma diminuição da oferta de mãodeobra disponível à base do salário corrente abaixo do volume de emprego anterior à alta dos preços Supor o contrário seria admitir que as pes KEYNES 51 36 No meu entender este raciocínio de fato contém grande dose de verdade embora os resul tados completos e uma alteração nos salários nominais sejam menos simples como veremos no cap 19 mais adiante soas no momento desempregadas embora desejosas de trabalhar ao salário corrente deixariam de oferecer os seus serviços no caso de uma pequena elevação do custo de vida Mesmo assim é nesta curiosa su posição que parece basearse a obra Theory of Unemployment do pro fessor Pigou37 e é ela que tacitamente admitem todos os partidários da escola ortodoxa Contudo a outra objeção de fundamental importância que for mularemos nos capítulos seguintes decorre de nossa contestação da hipótese de que o nível geral dos salários reais seja diretamente de terminado pelo caráter das negociações sobre salários Ao supor que as negociações sobre salários determinam o salário real a escola clás sica descambou para uma hipótese arbitrária pois os trabalhadores em conjunto não dispõem de nenhum meio de fazer coincidir o equi valente do nível geral de salários nominais expresso em bens de con sumo com a desutilidade marginal do volume de emprego existente Provavelmente não existe nenhum expediente por meio do qual a mão deobra em conjunto possa reduzir os seus salários reais a uma cifra determinada revisando as cláusulas monetárias dos acordos celebrados com os empregadores Esta será a nossa argumentação Esforçarnos emos para demonstrar que o papel principal na determinação do nível geral dos salários reais é desempenhado por diversos outros fatores Um dos nossos temas principais será a elucidação desse problema Sustentaremos ter havido nessa matéria um malentendido fundamen tal no tocante às regras que determinam o real funcionamento da eco nomia em que vivemos III Embora se julgue freqüentemente que a luta entre indivíduos e grupos pelos salários nominais determina o nível dos salários reais na realidade essa luta tem um objetivo diferente Uma vez que a mo bilidade do trabalho é imperfeita e os salários não tendem a estabelecer uma exata igualdade de vantagens líquidas para as diferentes ocupa ções qualquer indivíduo ou grupo de indivíduos que consinta numa redução dos seus salários nominais em relação a outros sofre uma redução relativa do salário real o que é suficiente para justificar a sua resistência Por outro lado seria impraticável oporse a qualquer redução dos salários reais que resultasse de alteração no poder aqui sitivo do dinheiro e que afetasse igualmente a todos os trabalhadores com efeito não há em geral resistência a este modo de reduzir os salários nominais a não ser que isto venha atingir níveis excessivos Além do mais a oposição às reduções nos salários nominais aplicadas a certas indústrias não ergue a mesma barreira insuperável ao aumento OS ECONOMISTAS 52 37 Cf cap 19 Apêndice do emprego agregado que resultaria de uma resistência análoga a toda e qualquer redução dos salários reais Em outras palavras a competição em torno dos salários nominais influi primordialmente sobre a distribuição do salário real agregado entre os diferentes grupos de trabalhadores e não sobre o montante médio por unidade de emprego o qual depende como veremos de outra série de fatores A conseqüência da união de um grupo de tra balhadores é a proteção de seu salário real relativo O nível geral dos salários reais depende de outras forças do sistema econômico É pois uma circunstância favorável os trabalhadores mostra remse por instinto embora sem se aperceberem disso economistas mais razoáveis do que a escola clássica pelo fato de resistirem às reduções dos salários nominais que raramente ou nunca assumem ca ráter geral mesmo que o equivalente real destes salários exceda a desutilidade marginal do emprego existente isso enquanto não se opõ em às reduções do salário real que acompanham os aumentos do em prego agregado e deixam inalterados os salários nominais relativos a não ser que essas reduções atinjam tal proporção que o salário real corra o risco de cair abaixo da desutilidade marginal do volume de emprego existente Todos os sindicatos oferecerão alguma resistência por menor que seja a uma redução dos salários nominais Mas con siderandose que os sindicatos não ousariam entrar em greve toda vez que houvesse um aumento de custo de vida eles não representam obstáculo como pretende a escola clássica a um aumento do volume agregado de emprego IV Precisamos agora definir a terceira categoria de desemprego ou seja o desemprego involuntário no sentido estrito da palavra cuja possibilidade a teoria clássica não admite É claro que por desemprego involuntário não queremos signi ficar a mera existência de uma capacidade de trabalho parcialmente utilizada Uma jornada de oito horas não constitui desemprego sim plesmente porque não está além da capacidade humana de trabalhar dez horas Nem devemos considerar desemprego involuntário o aban dono do trabalho por um grupo de trabalhadores que preferisse não trabalhar abaixo de certa remuneração real Além disso convém excluir da nossa definição de desemprego involuntário o desemprego fric cional Esta definição será portanto a seguinte Existem desempre gados involuntários quando no caso de uma ligeira elevação dos preços dos bens de consumo de assalariados relativamente aos salários nomi nais tanto a oferta agregada de mãodeobra disposta a trabalhar pelo salário nominal corrente quanto a procura agregada da mesma ao dito salário são maiores que o volume de emprego existente No capítulo seguinte p 60 et seq daremos outra definição que na realidade cor responde a esta KEYNES 53 Resulta dessa definição que a igualdade entre o salário real e a desutilidade marginal do emprego presumida pelo segundo postulado corresponde quando interpretada de maneira realista à ausência de desemprego involuntário Descreveremos este estado de coisas deno minandoo pleno emprego englobando tanto o desemprego friccional quanto o voluntário dentro do conceito de pleno emprego em uma única definição Isto coincide como verificaremos com outras caracte rísticas da teoria clássica que deveria ser logicamente considerada uma teoria da distribuição em condições de pleno emprego À medida que os postulados clássicos permanecem válidos o desemprego que é involuntário no sentido anterior não poderá ocorrer O desemprego aparente deve conseqüentemente ser o resultado de uma perda tem porária de trabalho do tipo de transição entre empregos de caráter intermitente da procura de recursos altamente especializados ou de uma política dos sindicatos no sentido de impedir o emprego de mão deobra não sindicalizada Por isso os autores que seguem a tradição clássica ignorando a hipótese especial em que se baseava a sua teoria foram levados à conclusão inevitável e perfeitamente lógica de acordo com essa hipótese de que o desemprego aparente salvo as exceções admitidas era fundamentalmente devido à recusa dos fatores não em pregados em aceitar uma remuneração correspondente à sua produti vidade marginal Um economista clássico pode simpatizar com a mão deobra quando esta se nega a aceitar uma redução do seu salário nominal e admitirá que talvez não seja prudente obrigála a sujei tarse a condições transitórias mas a probidade científica forçao a declarar que esta negativa nem por isso deixa de ser a causa funda mental das dificuldades Contudo se a teoria clássica é apenas aplicável ao caso do pleno emprego tornase obviamente enganoso aplicála aos problemas de de semprego involuntário supondose que tal coisa exista e quem o negará Os teóricos da escola clássica são comparáveis aos geômetras euclidianos em um mundo não euclidiano os quais descobrindo que na realidade as linhas aparentemente paralelas se encontram com muita freqüência as criticam por não se conservarem retas como único recurso contra as desastrosas interseções que se produzem Sendo esta a realidade não há de fato nenhuma outra solução a não ser rejeitar o axioma das paralelas e elaborar uma geometria não euclidiana A ciência econômica reclama hoje uma medida desse gênero Precisamos desembaraçarnos do segundo postulado da doutrina clássica e elaborar um sistema econômico em que o desemprego involuntário seja possível no seu sentido mais estrito V Ao enfatizar os aspectos que os separam da doutrina clássica não devemos esquecer uma concordância importante Manteremos pois OS ECONOMISTAS 54 o primeiro postulado como até aqui apenas sujeito às mesmas restrições da teoria clássica e convém fazer uma pausa por um instante a fim de examinarlhe as conseqüências Significa este postulado que em certo estado de organização equipamento e técnica os salários reais e o volume de produção e portanto do emprego são correlacionados de uma única forma de tal modo que em termos gerais um aumento do emprego só pode ocorrer simultaneamente com um decréscimo da taxa de salários reais Com isso não estou contestando este fato fundamental que os economistas clássicos corretamente declararam inatacável Em certo estado de organização equipamento e técnica em cada nível de salário real ganho por uma unidade de trabalho há uma única correlação inversa com o volume de emprego Portanto se o emprego aumenta isso quer dizer que em períodos curtos a remuneração por unidade de trabalho ex pressa em bens de consumo dos assalariados deve em geral diminuir e os lucros devem aumentar38 Este é simplesmente o reverso da pro posição já bastante conhecida segundo a qual a indústria trabalha normalmente sujeita a rendimentos decrescentes a curto prazo durante o qual se supõe que permaneçam constantes o equipamento etc dessa forma o produto marginal das indústrias de bens de consumo dos assalariados o qual determina os salários reais necessariamente se reduz à medida que o emprego aumenta Portanto na medida em que se considerar válida esta proposição qualquer meio destinado a au mentar o emprego conduzirá inevitavelmente a uma diminuição pa ralela do produto marginal e portanto do nível dos salários medido em termos desse produto Uma vez afastado o segundo postulado porém um declínio do emprego embora necessariamente associado ao fato de que o trabalho receba um salário equivalente a uma quantidade maior de bens de consumo não se deve necessariamente ao fato de que a mãodeobra reclame uma quantidade maior desses bens e a aceitação pela mão deobra de menores salários nominais não é necessariamente um remédio para o desemprego A teoria dos salários em sua relação com o emprego à qual estamos sendo conduzidos pelo raciocínio aqui ex KEYNES 55 38 O raciocínio configurase da seguinte maneira n homens encontramse empregados o ené simo acrescenta um bushel diário à colheita e os salários têm o poder aquisitivo de um bushel por dia O n 1 ésimo homem entretanto apenas acrescentaria 09 bushel por dia e o emprego não pode portanto subir a n 1 homens a não ser que o preço do trigo suba em relação aos salários até que o poder aquisitivo dos salários seja de 09 bushel Os salários agregados seriam então de 910 n 1 bushel quando anteriormente eram de n bushel Destarte o emprego de um homem suplementar no caso de ocorrer implica uma transferência de recursos dos que antes estavam empregados para os empregadores No original em inglês aparece o termo bushel uma medida de volume sem tradução para o português correspondente a 0036 m3 na Inglaterra ou 35238 litros nos EUA Por fide lidade ao texto é mantido o termo original Como se trata de um exemplo hipotético não há maiores problemas decorrentes da conservação desta medida N do R T posto não pode ser completamente elucidada antes de chegarmos ao capítulo 19 e a seu Apêndice VI Desde o tempo de Say e de Ricardo os economistas clássicos têm ensinado que a oferta cria sua própria procura isto significa de modo expressivo mas não claramente definido que o total dos custos de produção deve ser gasto por completo direta ou indiretamente na compra do produto Na obra Principles of Political Economy de J S Mill esta doutrina está expressamente exposta O que constitui os meios de pagamento das mercadorias são as próprias mercadorias Os meios de que cada indivíduo dispõe para pagar a produção alheia são os produtos que ele mesmo possui Todos os vendedores são no próprio sentido da palavra compradores Se pudéssemos duplicar repentinamente as forças produtoras de um país poderíamos duplicar a oferta de merca dorias em todos os mercados mas ao mesmo tempo duplicaríamos o poder aquisitivo Todo o mundo duplicaria simultaneamente a procura e a oferta todos poderiam comprar o dobro pois teriam duas vezes mais para oferecer em troca39 Como corolário desta mesma doutrina julgouse que qualquer ato individual de abstenção de consumir necessariamente leva e equi vale a um investimento na produção de riqueza sob a forma de capital resultante do trabalho e das mercadorias assim liberadas da necessi dade de consumo A seguinte passagem da obra Pure Theory of Domestic Values40 de Marshall ilustra o ponto de vista tradicional A renda total de cada pessoa é inteiramente gasta na com pra de mercadorias e serviços Dizse mesmo que um homem gasta uma parte de sua renda e economiza a outra Porém é um axioma econômico muito conhecido que um homem compra trabalho e mercadorias com a parte da renda poupada do mes mo modo que com a parte despendida Quando alguém procura obter uma satisfação imediata por meio dos serviços e merca dorias que compra dizse que gasta Quando faz com que o trabalho e as mercadorias que compra contribuam para a pro dução de riqueza da qual espera tirar meios de satisfação no futuro dizse que poupa É verdade que dificilmente se poderiam citar passagens seme OS ECONOMISTAS 56 39 Principles of Political Economy Livro Terceiro cap XIV 2 40 P 34 lhantes nas obras posteriores de Marshall41 e nas de Edgeworth ou do professor Pigou A doutrina não é hoje exposta de forma tão rudi mentar Mas nem por isso deixa de ser a base sobre a qual se assenta toda a teoria clássica que sem ela desmoronaria Economistas con temporâneos que hesitariam em aceitar a doutrina de Mill aceitam sem vacilação as conclusões que requerem essa doutrina como premissa A convicção que permeia por exemplo em quase toda a obra do pro fessor Pigou de que a moeda não faz realmente grande diferença exceto de forma friccional e de que a teoria da produção e do emprego pode ser elaborada como a de Mill sobre uma base de trocas reais e com a moeda introduzida superficialmente num capítulo posterior O pensamento contemporâneo está ainda fortemente impregnado da noção de que se o dinheiro não for gasto de uma forma o será de outra42 Na verdade os economistas do pósguerra nem sempre logra ram sustentar este ponto de vista de maneira consistente pois suas idéias atuais achamse demasiadamente influenciadas pela tendência contrária e por fatos da experiência em flagrante desacordo com sua concepção anterior43 Todavia não foram extraídas dessa situação con seqüências de longo alcance nem houve uma revisão de sua teoria fundamental Em primeiro lugar estas conclusões podem terse aplicado ao tipo de economia em que realmente vivemos por falsa analogia com algum tipo de economia sem trocas como a de Robinson Crusoé na qual a renda que os indivíduos consomem ou poupam como resultado de sua atividade produtiva é real e exclusivamente constituída pela produção in specie dessa atividade Porém fora disso a conclusão de que os custos de produção são sempre globalmente cobertos pelo produto das vendas resultantes da procura é bastante plausível porque é difícil distinguir esta proposição de outra análoga e incontestavelmente ver dadeira ou seja a de que a renda obtida globalmente por todos os KEYNES 57 41 J A Hobson depois de citar o parágrafo anterior de Mill em sua obra Physiology of Industry p 102 assinala que Marshall fez o seguinte comentário em uma de suas primeiras obras Economics of Industry p 154 Contudo embora os homens tenham o poder de comprar podem preferir não se utilizarem dele Mas acrescenta Hobson ele não parece ter percebido a importância capital deste fato e dá a impressão de limitarlhe as conse qüências aos períodos de crise Este comentário é válido julgo eu à luz dos trabalhos posteriores de Marshall 42 Cf MARSHALL Alfred e Mary Economics of Industry p 17 Não é conveniente para a indústria que existam roupas feitas com tecido que se gasta depressa pois se as pessoas não gastassem seus recursos na compra de roupas novas iriam gastálos em coisas que proporcionariam trabalho de alguma outra maneira O leitor há de notar que estou citando os primeiros trabalhos de Marshall O Marshall da obra Principles tornouse bastante cético para ser cauteloso e evasivo Mas as antigas idéias nunca foram repudiadas nem extirpadas das hipóteses fundamentais de sua teoria 43 O prof Robbins distinguese por ser quase o único que continua a defender uma linha consistente de pensamento suas recomendações práticas pertencem ao mesmo sistema de sua teoria elementos da comunidade que participam de uma atividade produtiva tem necessariamente um valor exatamente igual ao valor da produção Do mesmo modo é natural supor que o ato pelo qual um indivíduo enriquece sem aparentemente tirar nada de outro deve também en riquecer a comunidade inteira em conseqüência disso como na pas sagem de Marshall que acabamos de citar um ato de poupança in dividual conduz inevitavelmente a um ato paralelo de investimento pois mais uma vez é incontestável que a soma dos incrementos líquidos da riqueza dos indivíduos deve ser exatamente igual ao incremento líquido agregado da riqueza da comunidade Os que assim pensam foram contudo vítimas de uma ilusão de óptica que confunde duas atividades essencialmente diferentes Julga ram erradamente que existe um nexo unindo as decisões de absterse de um consumo imediato às de prover a um consumo futuro quando não há nenhuma relação simples entre os motivos que determinam as primeiras e os que determinam as segundas Portanto a hipótese da igualdade entre o preço da procura da produção global e o preço da oferta é que deve ser considerada o axioma das paralelas da teoria clássica Admitida esta hipótese tudo o mais se deduz naturalmente as vantagens sociais da poupança individual e nacional a atitude tradicional para com a taxa de juros a teoria clássica do desemprego a teoria quantitativa da moeda as vantagens ilimitadas do laissezfaire quanto ao comércio externo e muitos outros aspectos que teremos de discutir VII Em diversos pontos deste capítulo fizemos sucessivamente a teoria clássica depender das seguintes hipóteses 1 que o salário real é igual à desutilidade marginal do tra balho existente 2 que não existe o que se chama desemprego involuntário no seu sentido estrito 3 que a oferta cria a sua própria procura no sentido de que o preço da procura agregada é igual ao preço da oferta agregada para todos os níveis de produção e de emprego Essas três hipóteses entretanto equivalemse entre si no sentido de que subsistem ou desmoronam juntas pois qualquer delas depende logicamente das outras duas OS ECONOMISTAS 58 CAPÍTULO 3 O Princípio da Demanda Efetiva I Precisamos de início recorrer a alguns termos os quais serão definidos com mais rigor posteriormente Em determinada situação técnica de recursos e de custos o emprego de certo volume de mão deobra impõe ao empresário duas espécies de gastos a primeira são os montantes que ele paga aos fatores de produção excetuandose os que paga a outros empresários por seus serviços habituais e que de nominaremos custo de fatores do emprego em questão a segunda são os montantes que paga a outros empresários pelo que lhes compra juntamente com o sacrifício que faz utilizando o seu equipamento em vez de o deixar ocioso ao que chamaremos custo de uso do emprego em questão44 A diferença entre o valor da produção resultante e a soma do custo de fatores e do custo de uso é o lucro ou como passaremos a chamarlhe a renda do empresário O custo de fatores vem a ser naturalmente a renda dos fatores de produção considerada do ponto de vista do empresário de modo que o custo de fatores e o lucro formam juntamente o que definiremos como renda total resultante do emprego oferecido pelo empresário O lucro do empresário assim definido é como deveria ser a quantia que ele procura elevar ao máximo quando está decidindo qual o volume de emprego que deve oferecer Por vezes quando se trata do problema da ótica do empresário é conveniente chamar a renda agregada isto é custo de fatores mais lucro resultante de certo volume de emprego de produto deste nível de emprego Por outro lado o preço da oferta agregada45 da produção resultante de determinado volume de emprego é o produto esperado que é exata 59 44 Uma definição precisa de custo de uso será apresentada no cap 6 45 Que não deve ser confundida ver infra com o preço de oferta de uma unidade de produto no sentido comum do termo mente suficiente para que os empresários considerem vantajoso oferecer o emprego em questão46 Disso se deduz que levando em conta certas condições da técnica de recursos e de custo dos fatores por unidade de emprego tanto para cada firma individual quanto para a indústria em conjunto o volume do emprego depende do nível de receita que os empresários esperam receber da correspondente produção47 Os empresários pois esforçam se por fixar o volume de emprego ao nível em que esperam maximizar a diferença entre a receita e o custo dos fatores Seja Z o preço de oferta agregada da produção resultante do emprego de N homens e seja a relação entre Z e N que chamaremos função da oferta agregada48 representada por Z φ N Da mesma forma seja D o produto que os empresários esperam receber do emprego de N homens sendo a relação entre D e N a que chamaremos função da demanda agregada representada por D ƒ N Dessa maneira se para determinado valor de N o produto espe rado for maior que o preço da oferta agregada isto é se D for superior a Z haverá um incentivo que leva os empresários a aumentar o emprego acima de N e se for necessário a elevar os custos disputando os fatores de produção entre si até chegar ao valor de N para o qual Z é igual a D Assim o volume de emprego é determinado pelo ponto de interseção da função da demanda agregada e da função da oferta agregada pois OS ECONOMISTAS 60 46 O leitor observará que elimino o custo de uso tanto da receita quanto do preço de oferta agregada de determinado volume de produção de tal forma que ambos os termos devem ser interpretados como líquidos relativamente ao custo de uso ao passo que as somas agregadas pagas pelos compradores são naturalmente o bruto relativamente ao custo de uso As razões para assim proceder serão apresentadas no cap 6 O essencial é que as receitas agregadas e o preço da oferta agregada líquidos do custo de uso possam definirse de maneira exclusiva e não ambígua Visto que evidentemente o custo de uso depende do grau de integração da indústria e da importância das compras que os empresários realizam entre si não pode haver definição das somas agregadas pagas pelos compradores incluindo o custo de uso que seja independente desses fatores Há uma dificuldade seme lhante mesmo na definição de preço de oferta no sentido comum da expressão para um produtor individual e no caso da oferta agregada da produção em conjunto correse o risco de sérias dificuldades de duplicação que nem sempre foram levadas em conta Se o termo for interpretado incluindo o custo de uso os inconvenientes só podem ser vencidos à custa de hipóteses especiais a respeito do grau de integração dos empresários em grupos conforme sua produção seja de bens de consumo ou de capital hipóteses que são em si mesmas obscuras e complicadas e não correspondem aos fatos Se pelo contrário o preço de oferta agregada se define como antes isto é líquido relativamente ao custo de uso essas dificuldades desaparecem O leitor deverá aguardar o cap 6 e seu Apêndice onde há uma análise mais completa dessa questão 47 Um empresário que tenha de tomar uma decisão prática a respeito da sua escala de produção não terá naturalmente uma única expectativa indubitável sobre qual será a receita de venda de uma produção determinada mas várias expectativas hipotéticas for muladas com graus variáveis de probabilidade e de exatidão Por sua expectativa de receita quero dizer portanto aquela que se formulada em condições de certeza o levaria à mesma conduta que o conjunto das possibilidades mais diversas e vagas que compõem o seu estado de expectativa no instante de tomar sua decisão 48 No cap 20 a função que está intimamente ligada à anterior será designada função do emprego é neste ponto que as expectativas de lucro dos empresários serão ma ximizadas Chamaremos demanda efetiva o valor de D no ponto de interseção da função da demanda agregada com o da oferta agregada Como esta é a essência da Teoria Geral do Emprego a qual nos pro pomos expor os capítulos seguintes serão em grande parte consagra dos ao exame dos diversos fatores de que dependem essas duas funções A doutrina clássica por outro lado que se resumia categorica mente na proposição de que a Oferta cria a sua própria Demanda e que continua subjacente em toda a teoria econômica ortodoxa envolve uma hipótese especial a respeito da relação existente entre estas duas funções Isso porque a proposição a Oferta cria a sua própria Demanda deve significar que ƒN e φ N são iguais para todos os valores de N isto é para qualquer volume de produção e de emprego e que quando há um aumento em Z φN correspondente a um aumento em N D ƒN aumenta necessariamente na mesma quantidade que Z A teoria clássica supõe em outras palavras que o preço da demanda agregada ou produto sempre se ajusta ao preço da oferta agregada de tal modo que seja qual for o valor de N o produto D adquire um valor igual ao do preço da oferta agregada Z que corresponde a N Isto quer dizer que a demanda efetiva em vez de ter um único valor de equilíbrio comporta uma série infinita de valores todos igualmente admissíveis e que o volume de emprego é indeterminado salvo na medida em que a desutilidade marginal do trabalho lhe fixe um limite superior Se isso fosse verdade a concorrência entre os empresários levaria sempre a um aumento do emprego até o ponto em que a oferta agregada cessa de ser elástica ou seja um ponto a partir do qual um novo aumento no valor da demanda efetiva já não é acompanhado por um aumento da produção Evidentemente isto é o mesmo que o pleno emprego No capítulo anterior demos uma definição de pleno emprego baseada no comportamento da mãodeobra Outro critério aliás equi valente a que chegamos agora é o da situação em que o emprego agregado é inelástico diante de um aumento na demanda efetiva re lativamente ao nível de produto correspondente àquele nível de em prego Assim a lei de Say segundo a qual o preço da demanda agregada da produção em conjunto é igual ao preço da sua oferta agregada para qualquer volume de produção equivale à proposição de que não há obstáculo para o pleno emprego Contudo não sendo esta a verdadeira lei que relaciona a demanda agregada e as funções da oferta falta ainda escrever um capítulo da teoria econômica cuja importância é decisiva e sem o qual é inútil qualquer discussão a respeito do volume do emprego agregado II Para o leitor talvez seja útil neste ponto a apresentação de um breve sumário da teoria do emprego que será desenvolvida no decorrer KEYNES 61 dos capítulos seguintes ainda que esse resumo possa não ser de todo inteligível Os termos usados serão em seu devido tempo definidos com maior precisão Neste resumo passaremos a supor que o salário nominal e os outros elementos de custo permaneçam constantes por unidade de trabalho agregada Entretanto esta simplificação de que mais tarde prescindiremos é introduzida apenas para facilitar a ex posição O fato de os salários nominais e de outros aspectos estarem ou não sujeitos a variação em nada altera a natureza do raciocínio As grandes linhas da nossa teoria podem expressarse da maneira que se segue Quando o emprego aumenta aumenta também a renda real agregada A psicologia da comunidade é tal que quando a renda real agregada aumenta o consumo de agregado também aumenta po rém não tanto quanto a renda Em conseqüência os empresários so freriam uma perda se o aumento total do emprego se destinasse a satisfazer a maior demanda para consumo imediato Dessa maneira para justificar qualquer volume de emprego deve existir um volume de investimento suficiente para absorver o excesso da produção total sobre o que a comunidade deseja consumir quando o emprego se acha em determinado nível A não ser que haja este volume de investimento as receitas dos empresários serão menores que as necessárias para induzilos a oferecer tal volume de emprego Daqui se segue portanto que dado o que chamaremos de propensão a consumir da comunidade o nível de equilíbrio do emprego isto é o nível em que nada incita os empresários em conjunto a aumentar ou reduzir o emprego dependerá do montante de investimento corrente O montante de investimento corrente dependerá por sua vez do que chamaremos de incentivo para investir o qual como se verificará depende da relação entre a escala da eficiência marginal do capital e o complexo das taxas de juros que incidem sobre os empréstimos de prazos e riscos diversos Assim sendo dada a propensão a consumir e a taxa do novo investimento haverá apenas um nível de emprego compatível com o equilíbrio visto que qualquer outro levaria a uma desigualdade entre o preço da oferta agregada da produção em conjunto e o preço da demanda agregada Este nível não pode ser maior que o pleno emprego isto é o salário real não pode ser menor que a desutilidade marginal do trabalho Mas não há em geral razão para que ele seja igual ao pleno emprego A demanda efetiva associada ao pleno emprego é um caso especial que só se verifica quando a propensão a consumir e o incentivo para investir se encontram associados entre si numa deter minada forma Esta relação particular que corresponde às hipóteses da teoria clássica é em certo sentido uma relação ótima Mas ela só se verifica quando por acidente ou desígnio o investimento corrente proporciona um volume de demanda justamente igual ao excedente do preço da oferta agregada da produção resultante do pleno emprego OS ECONOMISTAS 62 sobre o que a comunidade decida gastar em consumo quando se encontre em estado de pleno emprego Esta teoria pode ser resumida nas seguintes proposições 1 Sob certas condições de técnica de recursos e de custos a renda tanto monetária quanto real depende do volume de emprego N 2 A relação entre a renda de uma comunidade e o que se pode esperar que ela gaste em consumo designado por D1 dependerá das características psicológicas da comunidade a que chamaremos de sua propensão a consumir Isso quer dizer que o consumo depende do mon tante da renda agregada e portanto do volume de emprego N exceto quando houver alguma mudança na propensão a consumir 3 A quantidade de mãodeobra N que os empresários resolvem empregar depende da soma D de duas quantidades a saber D1 o montante que se espera seja gasto pela comunidade em consumo e D2 o montante que se espera seja aplicado em novos investimentos D é o que já chamamos antes de demanda efetiva 4 Desde que D1 D2 D φ N onde φ é a função da oferta agregada e como segundo vimos em 2 D1 é uma função de N a qual podemos escrever χ N que depende da propensão a consumir deduzse que φ N χ N D2 5 Conseqüentemente o nível de emprego de equilíbrio depende i da função da oferta agregada φ ii da propensão a consumir χ e iii do montante do investimento D2 Esta é a essência da Teoria Geral do Emprego 6 A cada volume de N corresponde certa produtividade marginal da mãodeobra nas indústrias de bens de consumo dos assalariados e é isto que determina o salário real A proposição 5 está portanto sujeita à condição de que N não pode exceder o valor que reduz o salário real até chegar à igualdade com a desutilidade marginal da mãodeobra Isto significa que nem todas as variações de D são com patíveis com a nossa hipótese provisória de que os salários nominais sejam constantes Desse modo é essencial para a exposição completa de nossa teoria que coloquemos de parte esta hipótese 7 Na teoria clássica segundo a qual D φ N para todos os valores de N o nível de emprego está em equilíbrio neutro sempre que N seja inferior ao seu valor máximo de modo que se possa esperar que as forças da concorrência entre os empresários o elevem até esse KEYNES 63 valor máximo Apenas neste ponto segundo a teoria clássica pode haver um equilíbrio estável 8 Quando o emprego aumenta D1 também aumenta porém não tanto quanto D visto que quando nossa renda sobe nosso consumo também sobe embora menos A chave do nosso problema prático en contrase nesta lei psicológica Disso decorre que quanto maior for o nível de emprego maior será a diferença entre o preço da oferta agre gada Z da produção correspondente e a soma D1 que os empresários esperam recuperar com os gastos dos consumidores Conseqüentemen te quando a propensão a consumir não varia o emprego não pode aumentar a não ser que isso aconteça ao mesmo tempo que D2 cresça de modo que preencha a crescente lacuna entre Z e D1 Diante disso o sistema econômico pode encontrar um equilíbrio estável com N em um nível inferior ao pleno emprego isto é no nível dado pela interseção da função da procura agregada e da função da oferta agregada excluídas as hipóteses especiais da teoria clássica segundo as quais quan do o emprego aumenta certa força intervém sempre obrigando D2 a subir o necessário para preencher a lacuna crescente entre Z e D1 Não é portanto a desutilidade marginal do trabalho expressa em termos de salários reais que determina o volume de emprego exceto no caso em que a oferta de mãodeobra disponível a certo salário real fixe um nível máximo de emprego A propensão a consumir e o nível do novo investimento é que determinam conjuntamente o nível de emprego e é este que certamente determina o nível de salários reais não o inverso Se a propensão a consumir e o montante de novos investimentos resultam em uma insuficiência da demanda efe tiva o nível real do emprego se reduzirá até ficar abaixo da oferta de mãodeobra potencialmente disponível ao salário real em vigor e o salário real de equilíbrio será superior à desutilidade marginal do nível de emprego de equilíbrio Esta análise nos oferece uma explicação do paradoxo da pobreza em meio à abundância pois a simples existência de uma demanda efetiva insuficiente pode paralisar e freqüentemente paralisa o au mento do emprego antes de haver ele alcançado o nível de pleno em prego A insuficiência da demanda efetiva inibirá o processo de pro dução a despeito do fato de que o valor do produto marginal do trabalho continue superior à desutilidade marginal do emprego Além disso quanto mais rica for a comunidade mais tenderá a ampliar a lacuna entre a sua produção efetiva e a potencial e portanto mais óbvios e maléficos os defeitos do sistema econômico Assim uma comunidade pobre tenderá a consumir a maior parte da sua produção de modo que um investimento modesto será suficiente para lhe garantir o pleno emprego ao passo que uma comunidade rica terá de descobrir OS ECONOMISTAS 64 oportunidades de investimento muito mais amplas para que possa conciliar a propensão para a poupança dos seus membros mais ricos com o emprego dos seus membros mais pobres Se em uma comunidade potencialmente rica o incentivo para investir for fraco a insuficiência da demanda efetiva a obrigará a reduzir sua produção real até que a despeito de sua riqueza potencial ela se torne tão pobre que os excedentes sobre o consumo diminuam até chegar ao nível correspon dente ao seu fraco incentivo para investir A situação contudo é ainda mais sombria Não apenas a pro pensão marginal a consumir49 é mais fraca em uma comunidade rica como também em virtude de o capital acumulado já ser grande as oportunidades para novos investimentos são menos atrativas a não ser que a taxa de juros desça a um ritmo bastante rápido isso nos leva à teoria da taxa de juros e às razões pelas quais esta não baixa automaticamente ao nível adequado assunto de que nos ocuparemos no Livro Quarto Por essa razão a análise da propensão a consumir a definição da eficiência marginal do capital e a teoria da taxa de juros são as três lacunas principais dos nossos atuais conhecimentos que temos necessidade de preencher Quando isso for conseguido veremos que a teoria dos preços ocupará o seu lugar apropriado como assunto subsi diário da nossa teoria geral Constataremos ademais que a moeda representa um papel essencial na nossa teoria da taxa de juros e ten taremos desemaranhar as características particulares que a distinguem de outros fatores III Na economia ricardiana que serve de base ao que nos vem sendo ensinado há mais de um século a idéia de que podemos pôr de lado sem outras cogitações a função da demanda agregada é fundamental Malthus na verdade se opôs com veemência à doutrina de Ricardo de que era impossível uma insuficiência da demanda efetiva porém em vão Não tendo conseguido explicar com clareza a não ser por fatos da observação prática como e por que a demanda efetiva poderia ser deficiente ou excessiva deixou de fornecer uma estrutura capaz de substituir a tese que atacava assim Ricardo conquistou a Inglaterra de maneira tão completa como a Santa Inquisição conquistara a Es panha Sua teoria não só foi aceita pelos meios influentes de Londres pelos estadistas e pelo mundo acadêmico como também cessou toda controvérsia e o ponto de vista contrário desapareceu por completo e deixou de ser discutido O grande enigma da demanda efetiva com que Malthus havia lutado desapareceu da literatura econômica Não se lhe KEYNES 65 49 Definida no cap 10 faz nenhuma menção uma vez sequer em toda a obra de Marshall de Edgeworth e do professor Pigou que deram à teoria clássica a sua forma mais definitiva Apenas sobreviveu furtivamente nos subterrâ neos do mundo de Karl Marx de Silvio Gesell e do major Douglas O fato de a vitória ricardiana ter sido tão completa faz com que seja revestida de curiosidade e de mistério Essa vitória provavelmente se deveu a um complexo de afinidades entre a sua doutrina e o meio em que foi lançada Creio que o fato de ter chegado a conclusões in teiramente diversas das que poderia esperar um indivíduo comum e pouco instruído contribuiu para seu prestígio intelectual Deulhe vir tude a circunstância de que seus ensinamentos transportados para a prática eram austeros e por vezes desagradáveis Deulhe primor o poder sustentar uma superestrutura lógica vasta e coerente Deulhe autoridade o fato de poder explicar muitas injustiças sociais e cruel dades aparentes como incidentes inevitáveis na marcha do progresso e de poder mostrar que a tentativa de modificar esse estado de coisas tinha de modo geral mais chances de causar danos que benefícios Por ter formulado certa justificativa à liberdade de ação do capitalista individual atraiulhe o apoio das forças sociais dominantes agrupadas atrás da autoridade Embora até há pouco a doutrina em si nunca tenha sido con testada pelos economistas ortodoxos sua óbvia inadequação no que tange às finalidades de predição científica diminuiu bastante com o passar do tempo o prestígio de seus adeptos Aparentemente depois de Malthus os economistas profissionais ficaram insensíveis diante da falta de conformidade entre os resultados de sua teoria e dos fatos observados uma discrepância que o homem comum não deixa de ob servar como resultado de uma crescente obstinação em conceder aos economistas a manifestação de respeito que tributa a outros grupos de cientistas cujas conclusões teóricas são confirmadas pela observação quando aplicadas aos fatos O celebrado otimismo da teoria econômica tradicional que levou os economistas a serem considerados Cândidos os quais tendose re tirado do mundo para cultivarem seus jardins clamam que tudo ca minha do melhor modo no melhor dos mundos possível contanto que deixemos as coisas andarem sozinhas tem como origem no meu entender o fato de não haver sido levado em conta o empecilho que uma insuficiência da demanda efetiva pode significar para a prospe ridade pois em uma sociedade que funciona de acordo com os postulados clássicos deveria existir uma tendência natural para o emprego ótimo dos recursos Pode muito bem ser que a teoria clássica represente o caminho que a nossa economia segundo o nosso desejo deveria seguir mas supor que na realidade ela assim se comporta é presumir que todas as dificuldades estejam removidas OS ECONOMISTAS 66 CAPÍTULO 4 A Escolha das Unidades I Neste e nos três capítulos seguintes procuraremos esclarecer cer tas dúvidas que não têm relação peculiar ou exclusiva com os problemas cujo exame nos propusemos fazer de maneira especial Assim estes capítulos devem ser considerados uma digressão que nos afastará tem porariamente do nosso tema principal Estes assuntos são estudados aqui por nunca terem sido tratados em nenhuma outra parte de modo conveniente para as necessidades de minha investigação particular As três perplexidades que mais dificultaram meu progresso na elaboração deste livro e impediram que me expressasse conveniente mente até encontrar alguma solução para elas foram em primeiro lugar a escolha das unidades quantitativas adequadas aos problemas do sistema econômico em seu conjunto em segundo o papel represen tado pelas expectativas na análise econômica e em terceiro a definição da renda II A imperfeição das unidades com que os economistas costumam trabalhar pode ser ilustrada pelos conceitos de dividendo nacional es toque de capital real e nível geral de preços i O dividendo nacional tal como o definiram Marshall e o pro fessor Pigou50 mede o volume da produção corrente ou renda real e não o valor da produção ou renda monetária51 Além disso depende 69 50 Ver PIGOU Economics of Welfare et pas e particularmente Parte Primeira cap III 51 Embora se considere comumente por razões de um ajuste conveniente a renda real que constitui o dividendo nacional como limitada aos bens e serviços que se podem comprar com dinheiro em certo sentido da produção líquida quer dizer da adição líquida aos recursos da comunidade disponíveis para o consumo ou retidos como provisão de capital que resulta das atividades econômicas e dos sacrifícios de um período depois de levado em conta o desgaste do estoque do capital real existente no começo desse mesmo período Sobre estas bases se procurou erigir uma ciência quantitativa Há porém séria objeção a este conceito aplicado para tal fim no fato de a produção da comunidade em bens e serviços ser um complexo não homogêneo que não se pode medir no estrito sentido da palavra senão em casos especiais como por exemplo quando todos os artigos de uma produção entram na mesma proporção em outra produção ii A dificuldade é ainda mais acentuada quando para calcular a produção líquida se procura medir a adição líquida de equipamento ao capital pois é necessário encontrar alguma base de comparação quantitativa entre as novas formas de equipamento produzidas durante o período e as antigas consumidas pelo desgaste Para chegar ao di videndo nacional líquido o professor Pigou52 deduz aquela margem de obsolescência etc que pode razoavelmente denominarse normal e a prática de normalidade é aquela em que a obsolescência é bastante regular para ser prevista se não em detalhe pelo menos grosso modo Mas como essa dedução não se faz em unidades monetárias o pro fessor Pigou é levado a considerar que pode haver uma variação na quantidade física embora não tenha havido variação física alguma isto é ele está introduzindo implicitamente variações no valor Além disso ele é incapaz de conceber uma fórmula satisfatória53 para avaliar o equipamento novo em relação ao antigo quando em virtude de mudanças na técnica os dois deixam de ser idênticos Creio que o conceito apontado pelo professor Pigou é o correto e adequado para a análise econômica Enquanto não for adotado um sistema satisfatório de unidades é uma tarefa impossível definilo com precisão O problema de comparar uma produção real com outra e calcular depois a produção líquida compensando com as novas partidas de equipamento o desgaste das antigas acarreta enigmas que podemos dizer com segurança são insolúveis iii Em terceiro lugar o conhecido mas inevitável elemento de imprecisão que como se sabe acompanha o conceito do nível geral de preços torna o uso deste termo muito inadequado para análise causal que deve ser exata OS ECONOMISTAS 70 52 Economics of Welfare Parte Primeira Cap V em What is meant by Maintaining Capital Intact conforme as correções feitas em recente artigo no Economic Journal Junho de 1935 p 225 53 Cf as críticas do Prof HAYEK In Economica Agosto de 1935 p 247 Essas dificuldades contudo são justamente consideradas enig mas Elas são puramente teóricas no sentido de que jamais con fundem ou afetam de qualquer maneira as decisões dos homens de negócios não influindo na seqüência causal dos fenômenos econômicos tão claros e determinados apesar da indeterminação quantitativa des tes conceitos É natural portanto concluir que estes conceitos não apenas carecem de precisão como também são desnecessários É evi dente que a nossa análise quantitativa deva ser exposta sem usar nenhum termo quantitativamente vago E na verdade uma vez ini ciada essa tarefa verificase como espero demonstrar que se pode muito bem passar melhor sem eles O fato de dois grupos incomensuráveis de objetos diversos não poderem fornecer por si mesmos o material necessário para uma aná lise quantitativa não deve naturalmente impedirnos de realizar com parações estatísticas aproximadas que dependendo mais de elementos de apreciação imperfeitos do que de cálculos rigorosos deixam de ser dentro de certos limites válidas e significativas Mas o verdadeiro lugar de conceitos como a produção real líquida e o nível geral de preços é dentro do campo da descrição estatística e histórica e o seu objeto deveria ser satisfazer a curiosidade histórica ou social propósito para o qual não é habitual nem necessária uma precisão absoluta tal como exige a nossa análise causal seja ou não completo ou exato o nosso conhecimento dos valores reais das quantidades envolvidas Dizer que a produção líquida de hoje é maior que a de dez anos atrás ou a do ano anterior mas que o nível de preços é inferior equivale a afirmar que a Rainha Vitória era uma soberana melhor porém não uma mulher mais feliz que a Rainha Elisabete asserção não desprovida de significado ou de interesse mas inútil como material para o cálculo diferencial Nossa precisão seria ilusória se usássemos tais conceitos parcialmente vagos e não quantitativos como base de uma análise quantitativa III Não esqueçamos que em todos os casos concretos um empresário preocupase com decisões a respeito da escala em que usará certo equi pamento de capital e quando afirmamos que a expectativa de um acréscimo de demanda ou seja de um deslocamento da função de demanda agregada conduz a um aumento na produção agregada o que realmente queremos dizer é que as empresas proprietárias do equi pamento de capital se verão induzidas a associarlhe um volume maior de emprego de mãodeobra agregada No caso de uma empresa ou indústria isolada que produza artigos homogêneos é legítimo falar se quisermos de aumentos e diminuições de produção Porém quando somarmos as atividades de todas as empresas só nos exprimiremos com exatidão por meio de quantidades de emprego aplicadas a deter KEYNES 71 minado equipamento Os conceitos de produção total e seu nível de preços deixam então de ser indispensáveis pois não necessitamos de uma medida absoluta da produção agregada corrente como a que nos permitiria comparar o seu montante com o que resultaria da associação de um equipamento de capital diferente e uma quantidade de emprego diferente Quando para fins descritivos ou de simples comparação queremos falar do aumento de produção devemos aceitar a suposição geral de que o volume de emprego associado a determinado equipa mento de capital será um índice satisfatório do montante da produção que daí resulta supondose que ambos aumentem e diminuam juntos ainda que não em proporção numérica definida Para tratar da teoria do emprego proponhome portanto usar apenas duas unidades de quantidades fundamentais a saber quanti dades de valor monetário e quantidades de emprego As primeiras são estritamente homogêneas e podese fazer com que as segundas assim o sejam pois na medida em que diversas categorias e espécies de trabalho e emprego assalariado obtêm uma remuneração relativa mais ou menos fixa a quantidade de emprego pode ser satisfatoriamente definida para a nossa finalidade tomando uma hora de emprego de mãodeobra comum como unidade e ponderando uma hora de mãodeobra especializada proporcionalmente à sua remuneração ou seja contando por duas uma hora de mãodeobra especializada remunerada ao dobro da taxa comum Chamaremos unidade de trabalho à unidade em que se mede o volume de emprego e unidade de salário ao salário nominal de uma unidade de trabalho54 Portanto E representa a folha de salários W a unidade de salários e N a quantidade de emprego E N W Esta hipótese de homogeneidade na oferta de mãodeobra não se altera pelo fato evidente de grandes diferenças na capacidade pro fissional dos diversos trabalhadores e nas suas aptidões para as tarefas diversas Se a remuneração da mãodeobra é proporcional à sua efi ciência as diferenças são levadas em conta ao considerar que os indi víduos contribuem para a oferta de trabalho proporcionalmente à sua remuneração ao passo que à medida que a produção aumenta a em presa se vê obrigada a ocupar mãodeobra cada vez menos útil para seus fins especiais por unidade de salário pago este é apenas um entre os fatores que levam ao retorno decrescente do equipamento de capital em termos de produção quando uma quantidade maior de trabalho lhe é aplicada Englobamos por assim dizer a heterogeneidade das unidades de trabalho igualmente remuneradas dentro do equipamento o qual consideramos cada vez menos adequado para empregar as uni dades de trabalho disponíveis à medida que a produção aumenta em vez de considerar que estas unidades de trabalho disponíveis se tornam OS ECONOMISTAS 72 54 Se X representa uma unidade qualquer medida em unidades monetárias será na maioria dos casos conveniente representar por Xw a mesma quantidade medida em unidades de salário cada vez menos aptas a utilizar um equipamento de capital homogêneo Conseqüentemente se não há excedente de mãodeobra especializada ou qualificada e se o emprego da mãodeobra menos capacitada causa maior custo de trabalho por unidade de produção isto quer dizer que o rendimento do equipamento diminui mais depressa com a expansão do emprego do que diminuiria numa situação em que houvesse exce dente de mãodeobra55 Mesmo no caso extremo em que as diferentes unidades de trabalho fossem de tal modo especializadas que não pu dessem absolutamente substituirse umas pelas outras isso não traria dificuldades significando apenas que a elasticidade da oferta da pro dução derivada de um tipo especial de equipamento de capital desce repentinamente a zero quando toda a mãodeobra especializada dis ponível para seu uso já se encontra empregada56 Portanto a nossa hipótese de uma unidade de trabalho homogênea não suscita objeções a não ser que haja grande instabilidade na remuneração relativa das diferentes unidades de trabalho e ainda assim esta dificuldade pode ser levada em conta caso se apresente supondo que a oferta de mão deobra e a forma da função da oferta agregada também estariam sujeitas a mudanças bruscas No meu entender evitarseia muita perplexidade desnecessária KEYNES 73 55 É principalmente por essa razão que o preço de oferta da produção cresce ao mesmo tempo que a demanda mesmo quando existe um excedente de equipamento do tipo idêntico ao que está em uso Se supomos que o excedente de oferta de mãodeobra compõe uma reserva igualmente utilizável por todos os empresários e que a mãodeobra empregada para um fim determinado recebe remuneração pelo menos em parte por unidade de esforço e não estrita mente em proporção com a sua eficiência no emprego específico hipótese comprovada na maioria dos casos a eficiência decrescente da mãodeobra empregada é um exemplo marcante da alta de preço de oferta com o aumento da produção não devida a deseconomias internas 56 Não posso dizer de que modo se supõe que a curva de oferta no seu uso comum leva em conta a dificuldade acima pois aqueles que delas se têm servido não esclareceram sufi cientemente suas hipóteses Provavelmente supõem que a mãodeobra empregada para fim determinado é sempre remunerada em estrita proporção com a sua eficiência para este fim mas isto é irrealista Talvez a razão principal para se considerar a variação da eficiência da mãodeobra como se esta se relacionasse com o equipamento resida no fato de os crescentes excedentes que surgem à medida que há aumento de produção beneficiarem na prática sobretudo os proprietários do equipamento e não a mãodeobra mais eficiente embora esta possa ter a vantagem de ser empregada com maior regularidade e conseguir promoções mais rápidas isto significa que homens de diferentes eficiências que trabalham no mesmo serviço raramente são pagos em exata proporção com a sua eficiência Quando entretanto a remuneração aumenta com a produtividade e à medida que o caso se apresenta meu método tomao em consideração visto que para calcular o número de unidades de trabalho empregadas se atribui a cada trabalhador individual um coeficiente de ponderação proporcional à sua remuneração Partindo das minhas hipóteses obviamente surgem com plicações interessantes quando se trata de curvas da oferta específicas em se considerando que a sua forma depende de procura de mãodeobra qualificada para outros fins Ignorar essas complicações seria como disse negar a realidade No entanto não precisamos leválas em conta quando se trata do emprego em conjunto visto termos suposto que certo volume da demanda efetiva se distribui de modo preciso entre os diferentes produtos aos quais está singularmente associada Pode acontecer todavia que essa distribuição não se man tenha em virtude de causas específicas de variações na demanda Por exemplo um aumento na demanda efetiva devido a um fortalecimento da propensão a consumir poderia encontrarse associado a uma função de oferta agregada diferente da que corresponderia a um aumento igual da demanda devido a um maior incentivo a investir Tudo isso contudo pertence à análise pormenorizada das idéias gerais expostas e que não tenciono de imediato abordar se nos limitássemos estritamente às duas unidades moeda e emprego quando tratamos do comportamento do sistema econômico em seu con junto reservando o uso de unidades de determinadas produções e equi pamentos para a análise da produção de empresas ou indústrias con sideradas isoladamente e ao uso de conceitos vagos como o volume de produção global a quantidade de equipamento do capital como um todo e o nível geral de preços para as ocasiões em que buscamos alguma comparação histórica que dentro de certos limites às vezes bem amplos é reconhecidamente imprecisa e aproximativa Seguese daqui que mediremos as mudanças da produção corrente com referência ao número de horas de trabalho pagas e aplicadas ao equipamento existente tanto para satisfazer os consumidores como para produzir novo equipamento de capital ponderando as horas de trabalho qualificado de acordo com sua remuneração Não precisamos fazer uma comparação quantitativa entre esta produção e a que re sultaria da associação de um grupo de trabalhadores diferente com um equipamento de capital diferente Para prever a maneira como os empresários que possuem certo equipamento reagiriam às variações da função da demanda agregada não é necessário saber como o volume da produção resultante o nível de vida e o nível geral de preços se comparariam com o que seriam em outras épocas e em outros países IV É fácil demonstrar que as condições da oferta tais como se ex pressam geralmente pela curva da oferta e a elasticidade da oferta que relaciona a produção com o preço podem ser tratadas nas duas unidades escolhidas por meio da função da oferta agregada sem re ferência às quantidades de produção quer se trate de uma empresa ou indústria individual quer da atividade econômica em conjunto pois a função da oferta agregada para determinada firma e de modo se melhante para determinada indústria ou para a indústria em conjunto está representada por Zr φr Nr em que Zr representa o produto deduzido o custo de uso cuja expec tativa motivará um volume de emprego Nr Portanto se a relação entre emprego e produção for tal que um emprego Nr resulte numa produção Or na qual Or ψr Nr seguese que p Zr UrNr Or φrNr UrNr ψrNr é a curva convencional da oferta onde UrNr é o custo de uso previsto correspondente a um volume de emprego Nr Por esta razão no caso de qualquer produto homogêneo para o OS ECONOMISTAS 74 qual Or ψrNr tenha um valor definido podemos avaliar Zr φrNr da maneira comum mas então podemos agregar as quantidades Nr de uma forma que não é possível agregar com as Or porque ΣOr não é uma quantidade numérica Além disso se nos for permitido supor que em determinadas circunstâncias certo volume agregado de emprego será dis tribuído de uma forma específica entre as indústrias de tal modo que Nr seja função de N podese chegar a maiores simplificações KEYNES 75 CAPÍTULO 5 A Expectativa como Elemento Determinante do Produto e do Emprego I Toda produção se destina em última análise a satisfazer o con sumidor Normalmente decorre algum tempo às vezes bastante entre o momento em que o produtor assume os custos tendo em vista o consumidor e o da compra da produção pelo consumidor final En quanto isso o empresário aplicandose esta designação tanto ao pro dutor quanto ao investidor tem de fazer as melhores previsões57 que lhe são possíveis sobre o que os consumidores estarão dispostos a pa garlhe quando após um lapso de tempo que pode ser considerável estiver em condições de os satisfazer direta ou indiretamente e não lhe resta outra alternativa senão guiarse por estas previsões se sua produção tem de ser realizada de qualquer forma por processos que requerem tempo Estas expectativas das quais dependem as decisões da atividade econômica dividemse em dois grupos havendo certos indivíduos ou firmas especializadas na elaboração de expectativas do primeiro tipo e outras na elaboração do segundo O primeiro tipo relacionase com o preço que um fabricante pode esperar obter pela sua produção aca bada no momento em que se compromete a iniciar o processo que o produzirá considerando que os produtos estão acabados do ponto de vista do fabricante quando prontos para serem usados ou vendidos a outrem O segundo referese ao que o empresário pode esperar ganhar sob a forma de rendimentos futuros no caso de comprar ou talvez manufaturar produtos acabados para os adicionar a seu equipamento 77 57 Com respeito ao método para alcançar um equivalente destas expectativas expresso em receitas de vendas ver a nota 4 Livro Primeiro cap 3 de capital Chamaremos às primeiras expectativas a curto prazo e às segundas expectativas a longo prazo Deste modo o comportamento de cada firma individual ao fixar sua produção diária58 é determinado pelas expectativas a curto prazo expectativas relativas ao custo da produção em diversas escalas e expectativas relativas ao produto da venda desta produção no caso de adições ao equipamento de capital ou mesmo de vendas a distribuidores estas expectativas a curto prazo dependerão em grande parte das expectativas a longo prazo ou prazo médio de outrem São estas di versas expectativas que determinam o volume de emprego oferecido pelas empresas Os resultados efetivamente realizados da fabricação e da venda da produção só terão influência sobre o emprego na medida em que contribuam para modificar as expectativas subseqüentes Tam bém são irrelevantes por outro lado as expectativas iniciais que in duziram a firma a adquirir o equipamento de capital e o estoque de produtos intermediários e materiais semiacabados de que dispõe no momento em que deve decidir sobre a produção do dia seguinte Por tanto todas as vezes que tiver de ser tomada uma decisão ela o será levando em conta este equipamento e estes estoques mas à luz das expectativas atuais a respeito dos custos e das vendas futuras Diante disso de modo geral uma mudança nas expectativas quer a curto quer a longo prazo só produzirá pleno efeito sobre o emprego depois de um lapso de tempo considerável A variação do emprego resultante dessa mudança de expectativas não será no segundo dia igual à mudança do primeiro nem no terceiro igual à do segundo e assim por diante ainda que não se verifiquem novas mudanças de expectativas No caso de expectativas a curto prazo isto ocorre pelo fato de as mudanças de expectativas não se verificarem em geral com suficiente violência ou rapidez quando desfavoráveis para ocasionar o abandono do trabalho em todos os processos produtivos cujo início à luz de uma nova expectativa tenha sido um erro ao passo que quando são favoráveis tornase necessário que decorra certo tempo de preparação antes que o emprego alcance o nível a que teria chegado se as expectativas tivessem sido revistas antes No caso das expecta tivas a longo prazo o equipamento que não for substituído continuará proporcionando emprego até tornarse desgastado ao passo que se a mudança de expectativa a longo prazo for favorável o emprego pode estar em um nível mais alto no princípio do que depois de passado o tempo necessário para ajustar o equipamento à nova situação Se supusermos que certo estado de expectativa dure o tempo suficiente para que seus efeitos sobre o emprego sejam tão completos OS ECONOMISTAS 78 58 Diária significa aqui o intervalo mais curto após o qual a empresa se acha livre para revisar sua decisão quanto ao volume de emprego que pretende oferecer É por assim dizer a unidade efetiva mínima de tempo econômico que em termos gerais não haja nenhuma parcela do nível de emprego existente que não seja produto deste estado de expectativas o volume estável do emprego assim obtido poderá chamarse emprego a longo prazo59 correspondente a esse estado de expectativa Seguese daí que embora as expectativas possam mudar com tal freqüência que o volume real do emprego nunca tenha tido tempo de alcançar o emprego a longo prazo correspondente ao estado de expectativa existente a cada estado de expectativa corresponde um volume específico de emprego a longo prazo Consideraremos em primeiro lugar o processo de transição para uma posição de longo prazo devida a uma mudança nas expectativas quando a transição não é perturbada nem interrompida por qualquer outra mudança de expectativa Suponhamos primeiro uma mudança de tal natureza que o novo volume de emprego de longo prazo seja maior que o antigo Em regra a princípio só será afetado de maneira considerável o montante dos insumos isto é o volume de trabalho nas primeiras etapas dos novos processos de produção ao passo que a produção dos bens de consumo e o volume de emprego nas etapas finais dos processos empreendidos antes da mudança continuarão sen sivelmente os mesmos Na medida em que existam estoques de artigos semiacabados esta conclusão poderá ser modificada embora pareça provável que o aumento inicial de emprego seja moderado Entretanto com o passar dos dias o emprego aumentará gradualmente Além disso é fácil imaginar condições que o levarão em determinado ponto a um nível mais alto que o do novo emprego a longo prazo O processo de criar capital para satisfazer o novo estado das expectativas pode levar a um nível de emprego e também a um montante de consumo corrente superiores aos atingidos quando alcançada a posição de longo prazo Assim as mudanças nas expectativas podem levar o emprego a subir gradualmente até atingir um ponto máximo e em seguida declinar até o novo nível do longo prazo Isto também acontece ainda que o novo nível seja igual ao anterior sempre que a mudança represente uma nova orientação do consumo que torne obsoletos certos processos existentes juntamente com seu respectivo equipamento Ou ainda se o novo volume de emprego a longo prazo for menor que o antigo o volume de emprego durante a transição pode estabilizarse por algum tempo abaixo do nível que depois será alcançado Por esta razão uma simples mudança de expectativa é capaz no decorrer do período em que a mesma se verifica de provocar uma oscilação comparável à de um movimento cíclico Foi esta espécie de movimentos que estudei em KEYNES 79 59 Não é necessário que o volume de emprego a longo prazo seja constante isto é as condições de longo prazo não são necessariamente estáticas Por exemplo um aumento regular da riqueza ou da população pode constituir um dos elementos de uma expectativa invariável A única condição é que as expectativas existentes devam ter sido formuladas com suficiente antecedência minha obra Treatise on Money a propósito da formação e diminuição dos estoques de capital circulante e líquido que acompanham as mudanças Um processo de transição ininterrupto como o anterior até che gar a uma nova posição de longo prazo pode complicarse nos porme nores Mas o curso real dos acontecimentos é mais complicado ainda pois o estado de expectativas está sujeito a variações constantes sur gindo uma nova expectativa antes que a anterior haja produzido todo o seu efeito de tal modo que o mecanismo econômico está sempre ocupado com numerosas atividades que se sobrepõem cuja existência se deve aos vários estados anteriores das expectativas Isto nos conscientiza da importância que tem este tema para o fim a que nos propomos É evidente pelo que foi dito acima que o volume de emprego em um momento qualquer depende em certo sen tido não apenas do estado atual das expectativas mas também de todos os estados de expectativa que existiram no curso de certo período anterior Todavia as expectativas passadas que ainda não se dissol veram por completo estão incorporadas no equipamento de capital atual diante disso o empresário deve tomar suas decisões pois aquelas só influem sobre estas na medida em que nelas tenham sido incorpo radas Podese pois a despeito do anterior dizer que o emprego de hoje é governado pelas expectativas de hoje consideradas juntamente com o equipamento de capital de hoje Raramente se podem evitar as referências expressas às expecta tivas correntes a longo prazo Contudo podese evitar uma alusão ex pressa à expectativa a curto prazo visto que na prática o processo de revisão das expectativas a curto prazo é gradual e contínuo e ocorre em sua maior parte tendo em vista os resultados realizados de tal modo que os resultados esperados e os realizados se confundem e se entrelaçam nos seus efeitos Isso porque embora a produção e o em prego sejam determinados pelas expectativas a curto prazo do produtor e não pelos resultados obtidos no passado mesmo assim os resultados mais recentes desempenham papel predominante na determinação des sas expectativas Seria complicado demais elaborar as expectativas de novo toda vez que se iniciasse um processo produtivo mais do que isto seria perder tempo porque de modo geral grande parte das cir cunstâncias se mantém substancialmente invariável de um dia para outro É portanto com razão que os produtores baseiam suas expec tativas na hipótese de que a maioria dos resultados observados mais recentemente continuará salvo no caso de haver motivos definidos para se esperar uma mudança Por isso existe na realidade uma grande sobreposição dos efeitos sobre o emprego os advindos do mon tante obtido com as vendas já realizadas da produção recente e os advindos das vendas que se espera realizar da produção corrente Quando os produtores modificam gradualmente as suas previsões fa OS ECONOMISTAS 80 zemno com mais freqüência à luz dos resultados obtidos do que tendo em vista as mudanças prováveis60 Não devemos entretanto esquecer que no caso dos bens duráveis as expectativas a curto prazo do produtor baseiamse nas expectativas correntes a longo prazo do investidor e que não faz parte da natureza das expectativas a longo prazo poderem ser revistas a curtos intervalos à luz dos resultados realizados Além disso as expectativas a longo prazo estão sujeitas a revisões imprevistas como veremos no capítulo 12 onde pretendemos examinálas mais detalhadamente Assim o fator das expectativas correntes a longo prazo não pode nem sequer apro ximadamente ser eliminado ou substituído pelos resultados realizados KEYNES 81 60 Esta ênfase na expectativa que se faz quando a decisão de produzir é tomada concorda na minha opinião com o ponto de vista de Hawtrey quando expõe que o uso dos fatores de produção e o emprego sofrem a influência da acumulação dos estoques antes que os preços tenham baixado ou que a frustração com respeito à produção se reflita numa perda sofrida proporcionalmente à expectativa Isso porque a acumulação de estoques não vendidos ou a diminuição de pedidos para o futuro é precisamente o tipo de acontecimento que mais probabilidade tem de fazer com que o uso de fatores produtivos difira mais ainda que o indicado pelas simples estatísticas a respeito da receita de vendas da produção prévia se as mesmas fossem projetadas sem levar em conta o período seguinte CAPÍTULO 6 Definição de Renda Poupança e Investimento I Renda Dentro de determinado período um empresário terá vendido pro dutos acabados a consumidores ou a outros empresários por uma im portância que designaremos A Ele terá também gasto certa soma que será designada A1 para comprar artigos acabados de outros em presários Terá ao final um equipamento de capital que inclui tanto seus estoques de bens não acabados ou capital circulante como seus estoques de bens acabados com o valor de G Entretanto certa parte de A G A1 não deve ser atribuída às atividades do período em questão e sim ao equipamento de capital que o empresário possuía no início do período Portanto a fim de chegar ao nosso conceito de renda do período corrente temos de deduzir de A G A1 certo montante que é de certa forma devido ao equipamento herdado do período anterior O problema de definir a renda será re solvido logo que tenhamos encontrado um método satisfatório para calcular esta dedução Há dois processos diferentes para este cálculo cada qual com sua importância um deles se relaciona com a produção e o outro se relaciona com o consumo Vamos examinálos sucessivamente i O valor efetivo G do equipamento de capital no fim do período é o resultado líquido de um lado do que o empresário fez para con serválo e melhorálo durante esse período quer pelas compras a outros empresários quer pelo trabalho por ele mesmo realizado e de outro lado do desgaste ou da depreciação decorrente do uso a que o submeteu na produção de bens Se ele tivesse decidido não usálo para a produção ainda assim lhe conviria gastar certo montante de recursos a título de otimização para mantêlo e melhorálo Suponhamos que neste caso tivesse gasto a quantia B para essa conservação e melhoria e que 83 nessas circunstâncias o valor do equipamento fosse G no final do período Isto significa que G B é o máximo valor líquido que poderia ter sido conservado do período anterior se o equipamento não houvesse sido utilizado na produção de A O excedente desse valor potencial do equipamento sobre G A1 é a medida do que se sacrificou de um modo ou de outro para produzir A Chamaremos a essa quantidade a saber G B G A1 que mede o sacrifício do valor compreendido na produção de A o custo de uso de A O custo de uso será representado por U61 À quantia paga pelo empresário aos demais fatores de produção em troca de seus ser viços que para os mesmos vem a ser a sua renda chamaremos custo de fatores de A Chamaremos custo primário da produção A à soma do custo de fatores F e do custo de uso U Podemos então definir a renda62 do empresário como a diferença entre o valor da sua produção acabada vendida durante o período e o custo primário Esta é a quantidade que ele busca maximizar sujeita à escala de sua produção ou seja é o seu lucro bruto na acepção corrente deste termo o que está de acordo com o senso comum Con seqüentemente como a renda do resto da comunidade é igual ao custo de fatores do empresário a renda agregada é igual a A U A renda assim definida é uma quantidade completamente ine quívoca Ademais como a expectativa do empresário quando fixa o volume de emprego a conceder aos outros fatores de produção é obter a máxima diferença entre esta quantidade e a soma paga aos fatores de produção seguese que a renda do empresário tem importância vital para o emprego Podese conceber naturalmente que G A1 exceda G B de modo que o custo de uso venha a ser negativo Isto pode ser o caso por exemplo se acontecer de escolhermos um período em que a utili zação dos insumos tenha aumentado sem que a produção resultante tenha tido tempo de alcançar a etapa de acabamento e de venda O mesmo poderá também ocorrer sempre que houver investimento po sitivo se considerarmos a possibilidade de a indústria chegar a tal grau de integração que os empresários produzam eles próprios a maior parte de seu equipamento Não obstante isso desde que o custo de uso apenas seja negativo quando o empresário tenha aumentado seu equipamento com o próprio trabalho podemos pensar que o custo de uso é normalmente positivo numa economia cujo equipamento de capital tenha sido em sua maior parte fabricado por empresas diferentes das OS ECONOMISTAS 84 61 O custo de uso será objeto de observações mais amplas no Apêndice a este capítulo 62 Diferente de seu rendimento líquido que definiremos mais adiante que o utilizam Além disso é difícil conceber um caso em que o custo de uso marginal associado a um aumento de A isto é dU dA seja outra coisa que não positivo Talvez seja conveniente mencionar aqui em antecipação à última parte deste capítulo que para a comunidade em conjunto o consumo agregado C do período é igual a Σ A A1 e o investimento agregado I igual a Σ A1 U Além disso U é o desinvestimento do empresário individual e U seu investimento relativamente ao seu próprio equi pamento excluindo o que ele compra a outros empresários Assim num sistema completamente integrado no qual A1 O o consumo é igual a A e o investimento a U isto é a G G B A pequena complicação anterior causada pela introdução de A1 devese simples mente ao desejo de adotar uma fórmula geral que compreenda o caso de um sistema de produção não integrado Além disso a demanda efetiva é simplesmente a renda agregada ou produto que os empresários esperam receber incluídas as rendas que fazem passar às mãos dos outros fatores de produção por meio do volume de emprego corrente que resolvem conceder A função de demanda agregada relaciona várias quantidades hipotéticas de empre go com os rendimentos que se espera obter do volume de sua produção e a procura efetiva é um ponto na função da demanda agregada que se torna realidade porque levando em conta as condições da oferta ela corresponde ao nível de emprego que maximiza as expectativas de lucro do empresário Este conjunto de definições tem ainda a vantagem de nos permitir igualar o valor do produto marginal ou renda ao custo marginal dos fatores chegando assim à mesma série de proposições que relaciona o produto marginal como foi definido com o custo marginal dos fatores tal como foi estabelecido pelos economistas que ignorando o custo de uso ou supondoo zero igualaram o preço da oferta63 ao custo marginal dos fatores64 KEYNES 85 63 O preço de oferta é penso eu uma expressão insuficientemente definida quando se ignora o conceito de custo de uso O assunto será estudado mais amplamente no Apêndice a este capítulo onde sustento que a exclusão do custo de uso do preço de oferta embora seja por vezes correta para o caso do preço da oferta agregada é inadequada quando se trata dos problemas relativos ao preço de oferta de uma unidade de produção para uma empresa individual 64 Por exemplo tomemos Zω φN ou alternativamente Z W φN como a função da oferta agregada onde W é a unidade de salário e XZω Z Então desde que a receita marginal seja igual ao custo marginal dos fatores para cada ponto da curva da oferta agregada temos N Aω Uω Zω φN isto é φN desde que o custo de fatores mantenha relação constante com o custo de salário e que a função da oferta agregada para cada empresa cujo número se supõe constante seja independente do número de homens empregados nas outras indústrias de maneira ii Passemos em seguida ao segundo dos princípios mencionados antes Até aqui tratamos da parte das variações no valor do equipa mento de capital entre o começo e o fim do período resultantes das decisões voluntárias tomadas pelo empresário a fim de conseguir o lucro máximo Mas podem também ser verificadas perdas ou lucros involuntárias no valor do seu equipamento de capital por motivos que escapam ao seu controle e que são independentes de suas decisões correntes como por exemplo uma mudança nos valores de mercado desgaste por obsolescência ou mera ação do tempo ou ainda destruição resultante de catástrofes tais como uma guerra ou um terremoto Al gumas dessas perdas involuntárias embora inevitáveis não são em termos gerais imprevisíveis como é o caso das perdas devidas à ação do tempo independentemente do uso e também da obsolescência normal que como acentua o professor Pigou é bastante regular para ser prevista se não em detalhe pelo menos grosso modo In cluindo poderíamos acrescentar as perdas da comunidade em conjunto as quais são bastante regulares para ser habitualmente consideradas riscos seguráveis Ignoremos por enquanto o fato de que o montante das perdas previstas varia segundo a época em que se supõe formulada a expectativa e chamemos à depreciação do equipamento que é involuntária mas não imprevista ao excedente da depreciação prevista sobre o custo de uso de custo suplementar que representaremos por V Decerto é desnecessário indicar que esta definição não é a mesma do custo suplementar de Marshall embora a idéia subjacente que é a de levar em consideração a parte da depreciação prevista que não entra no custo primário seja semelhante Portanto quando se calculam a renda líquida e o lucro líquido do empresário é comum deduzir da renda e do lucro bruto tais como foram definidos antes o montante computado do custo suplementar porque o efeito psicológico do custo suplementar sobre o empresário quando este considera o que pode gastar ou poupar é virtualmente igual ao que lhe produziria o lucro bruto Na sua qualidade de produtor decidindo se utilizará ou não o seu equipamento o custo primário e o lucro bruto tais como foram definidos anteriormente são para ele os conceitos importantes Porém na qualidade de consumidor o mon tante do custo suplementar exerce em sua mente o mesmo efeito que se fizesse parte do custo primário Portanto ao definirmos a renda agregada líquida deduzindo tanto o custo suplementar como o custo de uso de maneira que a renda líquida agregada seja igual a A U V OS ECONOMISTAS 86 que os termos da equação anterior válidos para cada empresário individual possam apli carse a todos em conjunto Isso quer dizer que se os salários forem constantes e os demais fatores do custo conservarem relação fixa com a folha de salários a função da oferta agregada é linear com uma inclinação dada pela recíproca dos salários nominais não apenas nos aproximamos do costume generalizado como também chegamos a um conceito relevante para o nível de consumo Restanos examinar a variação no valor do equipamento decor rente de mudanças imprevistas nos valores de mercado obsolescência excepcional ou destruição por efeito de catástrofes variação esta que é num sentido amplo imprevista A perda real decorrente desta variação que não levamos em conta mesmo ao calcular a renda líquida e que lançamos na conta de capital pode chamarse perda imprevisível A importância causal da renda líquida reside na influência psi cológica da magnitude de V sobre o montante do consumo corrente pois a renda líquida é a quantia que o homem comum considera sua renda disponível quando decide quanto gastará em seu consumo cor rente Isto não é naturalmente o único fator que ele tem em vista quando decide o montante de seus gastos Atribui por exemplo con siderável importância aos lucros ou perdas imprevisíveis que realiza na conta de capital Mas o custo suplementar e uma perda imprevisível diferem no sentido de que as alterações no primeiro podem afetálo exatamente da mesma maneira que as variações de seu lucro bruto O que governa o consumo do empresário é o excedente do produto da venda da produção corrente sobre a soma do custo primário e do custo suplementar ao passo que mesmo quando as perdas ou lucros im previsíveis intervêm nas suas decisões não o fazem na mesma escala pois determinada perda imprevisível não tem o mesmo efeito que um custo suplementar correspondente Contudo devemos agora recorrer à idéia de que a linha de se paração entre os custos suplementares e as perdas imprevisíveis isto é entre as perdas inevitáveis que julgamos normal debitar à conta de renda e as que consideramos razoável computar como perda ou lucro imprevisível à conta de capital é em parte convencional ou psicológica dependendo de quais sejam os critérios comumente aceitos para a es timativa das primeiras Não se pode pois estabelecer um princípio exclusivo para as avaliações do custo suplementar e o seu montante dependerá do método de cálculo que escolhermos O valor previsto do custo suplementar quando se produz inicialmente o equipamento é uma quantidade definida Porém se tornar a ser calculado em época ulterior seu montante para o resto da vida do equipamento pode ter variado em conseqüência de uma alteração que se tenha produzido no intervalo em nossas expectativas sendo as perdas imprevisíveis de capital o valor descontado da diferença entre as séries prováveis de U V nas expectativas antiga e revisada É um princípio ampla mente admitido na contabilidade comercial com a sanção das autori dades do Inland Revenue65 fixar em certa quantia a soma do custo KEYNES 87 65 Board of Inland Revenue Na GrãBretanha o órgão encarregado de fixar e de recolher taxas diretas imposto sobre a renda imposto sobre ganhos de capital imposto sobre trans ferência de capital etc suplementar e do custo de uso quando se adquire o equipamento e mantêlo sem alteração durante a vida do equipamento quaisquer que sejam as mudanças ulteriores da expectativa Neste caso considerase custo suplementar correspondente a um período qualquer o excedente da quantia fixada de antemão sobre o custo de uso real Isto tem a vantagem de assegurar que os lucros ou perdas imprevisíveis se re duzirão a zero enquanto durar o equipamento considerado em seu conjunto Também é razoável em certas circunstâncias tornar a cal cular o custo suplementar na base dos valores e das expectativas cor rentes a intervalos contábeis arbitrários por exemplo anualmente De fato os homens de negócio divergem sobre o método a ser adotado Talvez seja conveniente chamar a expectativa inicial do custo suple mentar quando se adquire o equipamento de custo suplementar básico e de custo suplementar atual a mesma quantidade reajustada na base dos valores e das expectativas atuais O mais que podemos aproximarnos portanto de uma definição quantitativa do custo suplementar é dizer que ele inclui as deduções feitas por um empresário típico em sua renda antes de calcular o que ele considera a sua renda líquida quando declara um dividendo no caso de uma sociedade ou quando determina a escala do seu consumo corrente no caso de um indivíduo Desde que não se podem suprimir os encargos imprevistos da conta de capital é naturalmente preferível em caso de dúvida lançar um item nesta conta de capital e só incluir no custo suplementar o que rigorosamente lhe corresponda Qualquer sobrecarga pois na primeira pode ser corrigida atribuindolhe mais importâncias sobre o montante do consumo corrente do que lhe seria destinado de outro modo Observese que a nossa definição de renda líquida se aproxima muito da definição de renda de Marshall quando este decidiu refu giarse nas práticas das autoridades do Imposto sobre a Renda e em termos gerais considerar renda tudo o que aquelas autoridades de acordo com sua experiência julgam dever ser tratado como tal Isso porque a estrutura de suas decisões pode ser considerada o resultado da análise mais cuidadosa e extensa de que se dispõe para interpretar o que na prática habitualmente se considera renda líquida Ela cor responde também ao valor monetário do dividendo nacional segundo a mais recente definição do professor Pigou66 Acontece entretanto que a renda líquida não é uma noção per feitamente clara por repousar num critério equívoco que diferentes autoridades podem interpretar de forma diferente O professor Hayek por exemplo sugeriu que individualmente um proprietário de bens de capital pode procurar manter constante a renda que deles tira de OS ECONOMISTAS 88 66 Economic Journal Junho de 1935 p 235 tal modo que não se sente livre para gastar sua renda em consumo antes de haver posto de lado o suficiente para compensar qualquer tendência para baixa que por qualquer motivo manifestasse a sua renda destinada a investimento67 Duvido que exista semelhante indi víduo mas evidentemente não se pode opor nenhuma objeção teórica a esta dedução como base de um possível critério psicológico de renda líquida Contudo quando o professor Hayek deduz que os conceitos de poupança e de investimento são marcados por uma correspondente imprecisão só tem razão à medida que se refere à poupança líquida e ao investimento líquido As noções de poupança e de investimento que são relevantes na teoria do emprego estão isentas desse defeito e conforme já demonstramos antes admitem uma definição objetiva É pois um erro pôr toda a ênfase na renda líquida cuja relevância apenas se aplica às decisões relativas ao consumo e que além disto está separada unicamente por uma tênue linha dos vários outros fatores que afetam o consumo é também um erro negligenciar como acontece comumente o conceito de renda propriamente dito que é o conceito relevante para as decisões concernentes à produção corrente e que está isento de qualquer ambigüidade As definições de renda e de renda líquida apresentadas acima procuram aproximarse tanto quanto possível do uso comum Devo portanto lembrar desde já ao leitor que em minha obra Treatise on Money defini a renda num sentido especial A peculiaridade da minha definição anterior referiase à parte da renda agregada que obtêm os empresários já que não levei em conta a renda bruta ou líquida de fato proveniente das suas operações correntes nem o lucro que espe ravam conseguir quando resolveram iniciar suas novas operações cor rentes mas antes em certo sentido que agora me parece insuficien temente definido se considerarmos a possibilidade de mudanças na escala de produção um lucro normal ou de equilíbrio com o resultado de que nesta definição a poupança superava o investimento no exce dente do lucro normal sobre o lucro real Receio que o uso destes termos tenha causado bastante confusão especialmente na utilização correla tiva da palavra poupança visto que as conclusões especialmente as relacionadas com o excedente da poupança sobre o investimento ape nas válidas se os termos empregados fossem interpretados no sentido especial que lhes atribuí passaram a ser freqüentemente usadas em discussões populares onde os termos são empregados num sentido mais comum Por esta razão e também porque os termos de que me servi deixaram de ser indispensáveis para exprimir minhas idéias com pre cisão resolvi abandonálos lamentando muito a confusão que eles te nham causado KEYNES 89 67 The Maintenance of Capital In Economica Agosto de 1935 p 241 et seqs II Poupança e Investimento É sempre agradável descobrir um ponto fixo em meio ao turbilhão de acepções divergentes das palavras Segundo eu entendo todos con cordam em que poupança significa o excedente do rendimento sobre os gastos de consumo Assim sendo as únicas dúvidas possíveis a res peito do significado de poupança são as dúvidas que podem originar quer o sentido de renda quer o sentido de consumo A renda já foi definida acima Os gastos em consumo durante um período qualquer deve representar o valor dos artigos vendidos aos consumidores durante esse período o que nos reconduz ao problema de saber o que se entende por consumidorcomprador Qualquer definição razoável da linha de separação entre consumidorescompradores e investidorescompradores nos será igualmente útil desde que aplicada de maneira coerente Já se tem discutido sobre problemas como por exemplo o de saber se é legítimo considerar a compra de um automóvel um gasto de consumo e a compra de uma casa um gasto de investimento e eu nada tenho de essencial a acrescentar ao debate O critério deve evidentemente corresponder ao ponto em que se há de traçar a linha que separa o consumidor do empresário Assim ao definirmos A1 como o valor do que um empresário compra a outro resolvemos implicitamente a ques tão Seguese daqui que o gasto em consumo pode ser definido ine quivocamente como Σ A A1 onde ΣA representa o total das vendas feitas durante o período e ΣA1 o total das vendas em geral por um empresário a outro no que segue convirá em geral omitir Σ e designar por A as vendas agregadas de todas as espécies por A1 as vendas agregadas realizadas entre empresários e por U a soma agregada do custo de uso dos empresários Chegandose agora à definição tanto de renda como de consumo a definição de poupança que é o excedente da renda sobre o consumo tornase uma conseqüência natural Uma vez que a renda é igual a A U e o consumo a A A1 deduzse que a poupança é igual a A1 U De modo semelhante a poupança líquida que é o excedente da renda líquida sobre o consumo é igual a A1 U V Nossa definição de renda também nos leva logo à definição de investimento corrente Queremos pois dizer com isso a adição corrente ao valor do equipamento de capital que resultou da atividade produtiva do período Evidentemente ela equivale ao que acaba de ser definido como poupança pois representa a parte da renda do período não ab sorvida pelo consumo Como vimos acima o resultado das operações produtivas de um período é que os empresários deduzidas as compras A1 que fazem entre si chegam ao fim do período tendo vendido os produtos acabados com valor A e conservando um equipamento de capital que sofreu como resultado da venda A uma deterioração medida por U ou uma melhoria expressa por U onde U é negativo Durante OS ECONOMISTAS 90 o mesmo período terão sido absorvidos pelo consumo produtos acabados com valor de A A1 O excedente de A U sobre A A1 ou seja A1 U é a adição ao equipamento de capital que resultou das atividades produtivas do período constituindo portanto o investimento realizado nesse período Do mesmo modo A1 U V que é a adição líquida ao equipamento de capital um vez deduzida a depreciação normal do seu valor independente do uso e independente das mudanças impre visíveis de valor do equipamento que podem ser lançáveis à conta de capital é o investimento líquido do período Por esta razão embora o montante da poupança seja o resul tado do comportamento coletivo dos consumidores individuais e o montante do investimento resulte do comportamento coletivo dos empresários estes dois montantes são necessariamente iguais vis to que qualquer deles é igual ao excedente da renda sobre o consumo Ademais esta conclusão de modo algum depende de sutilezas ou peculiaridades de definição de renda exposta antes Desde que se admita que a renda seja igual ao valor da produção corrente que o investimento corrente seja igual à parte da dita produção corrente não consumida e que a poupança seja igual ao excedente da renda sobre o consumo sendo que tudo isto está de conformidade com o senso comum e com o costume tradicional da grande maioria dos economistas a igualdade entre a poupança e o investimento é uma conseqüência natural Em resumo Renda valor da produção consumo investimento Poupança renda consumo Portanto poupança investimento Assim qualquer conjunto de definições que satisfaça as condições anteriores leva à mesma conclusão É apenas com a negação da validez de qualquer uma delas que se pode evitar esta conclusão A equivalência entre a quantidade de poupança e a quantidade de investimento decorre do caráter bilateral das transações entre o produtor de um lado e o consumidor ou o comprador de equipamento de capital de outro lado A renda criase pelo excedente do valor que o produtor obtém da produção que vendeu sobre o custo de uso mas a totalidade desta produção deve ter sido vendida obviamente a um consumidor ou a outro empresário e o investimento corrente de cada empresário é igual ao excedente sobre o seu próprio custo de uso do equipamento que comprou a outros empresários Portanto em conjunto o excedente da renda sobre o consumo a que chamamos poupança não pode diferir da adição a equipamento de capital a que chamamos investimento O mesmo sucede com a poupança líquida e o investimento líquido A poupança de fato não passa de um simples resíduo As decisões de consumir e as decisões de investir determinam conjunta KEYNES 91 mente os rendimentos Presumindo que as decisões de investir se tor nem efetivas é forçoso que elas restrinjam o consumo ou ampliem a renda Assim sendo nenhum ato de investimento por si mesmo pode deixar de determinar que o resíduo ou margem a que chamamos pou pança aumente numa quantidade equivalente Poderia acontecer naturalmente que os indivíduos fossem tão tête montée em suas decisões a respeito do que deveriam poupar ou investir respectivamente que não houvesse nível de equilíbrio de preços em que as transações pudessem realizarse Neste caso nossas proposições deixariam de ser aplicáveis visto que a produção não mais teria um valor de mercado definido e os preços não encontrariam ponto de equi líbrio entre zero e o infinito Todavia a experiência mostra que de fato não é assim e que existem reações psicológicas habituais que permitem alcançar um equilíbrio no qual a disposição de comprar é igual à disposição de vender A existência de um valor de mercado para a produção é ao mesmo tempo que condição necessária para que a renda nominal tenha um valor definido uma condição suficiente para que o montante agregado que os que poupam decidem poupar seja igual ao montante agregado que os que investem decidem investir Talvez neste ponto o assunto possa ser esclarecido pensandose de preferência em termos das decisões de consumir ou de se abster de consumir em vez das decisões de poupar Uma decisão de consumir ou não consumir está certamente ao alcance do indivíduo o mesmo sucedendo com uma decisão de investir ou não investir Os montantes da renda agregada e da poupança agregada são resultados da livre escolha dos indivíduos sobre se consumirão ou deixarão de consumir sobre se farão ou não investimentos porém nenhum desses montantes logrará alcançar um valor independente que resulte de um grupo se parado de decisões estranhas às que concernem ao consumo e ao in vestimento De acordo com este princípio o conceito da propensão a consumir tomará na continuação desta obra o lugar da propensão ou disposição a poupar OS ECONOMISTAS 92 APÊNDICE SOBRE O CUSTO DE USO I O custo de uso na minha opinião tem para a teoria clássica do valor uma importância que tem sido muitas vezes ignorada Há mais para dizer a esse respeito do que seria relevante ou oportuno fazêlo aqui Porém a título de digressão faremos neste apêndice uma análise mais pormenorizada a seu respeito O custo de uso de um empresário é por definição igual a A1 G B G onde A1 representa o montante das compras que o empresário faz a outros empresários G o valor real do seu equipamento de capital no fim do período e G o valor que esse equipamento teria no fim do período se ele se houvesse abstido de o utilizar e tivesse gasto a soma ótima B para sua manutenção e melhoramento Ora G G B a saber o excedente do valor do equipamento do empresário sobre o valor líquido proveniente do período anterior representa o investimento corrente do empresário feito no seu equipamento que pode ser expresso por I Assim U o custo de uso de seu giro de vendas A é igual a A1 I onde A1 representa o que ele comprou a outros empresários e I o que ele investiu correntemente no seu próprio equipamento Uma li geira reflexão mostrará que isso não passa de simples senso comum Uma parte de seus desembolsos que vão para outros empresários é compensada pelo valor do investimento corrente realizado em seu pró prio equipamento e o resto representa o sacrifício que lhe custou a produção vendida além da soma que ele pagou aos fatores da produção Se o leitor tentar exprimir o essencial destas idéias de outra forma verificará que esta oferece a vantagem de evitar problemas de conta bilidade insolúveis e desnecessários Creio não haver outro meio de analisar de forma inequívoca os resultados correntes da produção Se 93 a indústria se acha completamente integrada ou se o empresário nada comprou fora de maneira que A1 0 o custo de uso é simplesmente o equivalente do desinvestimento corrente relativo ao uso do equipa mento mas ficanos a vantagem de não ter em momento algum desta análise de distribuir o custo dos fatores entre os bens que se vendem e o equipamento que se conserva Podemos assim considerar o volume de emprego oferecido por uma empresa individual ou integrada como resultado de uma única decisão global método que corresponde ao caráter efetivamente interdependente entre a produção do que se vende correntemente e a produção total O conceito de custo de uso nos permite além disso dar uma definição mais clara que a usual do preço da oferta de curto prazo de uma unidade da produção vendável de uma empresa pois o preço da oferta a curto prazo é com efeito a soma do custo marginal de fatores e do custo marginal de uso Ora é uma prática usual na teoria moderna do valor igualar o preço de oferta de curto prazo somente ao custo marginal dos fatores Contudo é óbvio que tal prática só é válida quando o custo marginal de uso for zero ou se for adotada uma definição especial do preço de oferta que exclua o custo marginal de uso da mesma maneira que defini p 59 o produto de vendas e o preço da oferta agregada sem levar em conta o custo de uso agregado Porém embora possa ser às vezes conveniente deduzir o custo de uso quando se estuda a produção como um todo este método tira à nossa análise todo realismo se de modo habitual e tácito se aplica à produção de uma única indústria ou empresa pois cria uma diferença entre o preço de oferta de um artigo e o seu preço no sentido habitual da palavra e esta prática pode ter originado certa confusão Parece que se supôs ter o preço de oferta um significado evidente quando se aplica a uma unidade da produção destinada à venda proveniente de uma firma individual sem julgar necessário entrar em maiores discussões sobre o assunto Todavia ao tratar do que se compra a outras firmas e da depreciação do equipamento da própria firma como conseqüência da produção mar ginal tropeçase com toda a série de complicações que acompanham a definição de renda Mesmo admitindo que no caso de compras feitas a outras empresas o custo marginal das compras correspondentes à venda de uma unidade adicional deva ser deduzido do produto da venda dessa unidade a fim de obter o que definimos como preço de oferta da empresa restanos ainda levar em conta o investimento marginal que acarreta no próprio equipamento da empresa a produção da unidade marginal Ainda que toda a produção estivesse a cargo de uma empresa completamente integrada não seria motivo para supor que o custo marginal de uso fosse zero isto é que em geral o desinvestimento marginal determinado no equipamento pela produção marginal possa ser negligenciado OS ECONOMISTAS 94 Os conceitos de custo de uso e de custo suplementar também nos permitem estabelecer uma relação mais clara entre o preço de oferta para longo prazo e o preço de oferta para curto prazo O custo de longo prazo deve naturalmente incluir uma soma destinada a cobrir o custo suplementar básico assim como uma média do custo primário previsto devidamente calculada para a duração do equipamento Isto significa que o custo de produção de longo prazo é igual à soma prevista para o custo primário e o custo suplementar e além disso para que haja um lucro normal o preço de oferta de longo prazo deve exceder o custo de longo prazo assim calculado num montante que se deter mina aplicando ao custo do equipamento um percentual adicional igual à taxa de juros corrente sobre empréstimos de prazos e riscos equiva lentes Ou se preferirmos tomar uma taxa de juros padrão pura deveremos incluir no custo de longo prazo um terceiro termo a que poderíamos chamar custo de risco destinado a cobrir as diferenças que possam surgir por motivos ignorados entre o rendimento previsto e o efetivo Portanto o preço de oferta de longo prazo é igual à soma do custo primário do custo suplementar do custo de risco e do custo de juros o qual pode ser analisado examinandose estes componentes O preço de oferta de curto prazo por outro lado é igual ao custo primário marginal O empresário quando compra ou constrói o seu equipamento deve portanto esperar cobrir os seus custos suplementares de risco e de juros com o excedente de valor marginal do custo primário sobre o valor médio do mesmo desse modo no equilíbrio a longo prazo o excedente do custo primário marginal sobre o custo primário médio é igual à soma dos custos suplementar de risco e de juros68 O nível da produção no qual o custo primário marginal é exa tamente igual à soma dos custos primários e suplementares médios tem uma importância especial por ser aquele no qual os custos e as receitas do empresário se equilibram Isto é corresponde ao ponto em que o lucro líquido é zero ao passo que com uma produção menor estará ele operando com perda líquida À medida que é necessário atender ao custo suplementar inde KEYNES 95 68 Essa maneira de exprimir tem como base a hipótese conveniente de que a curva do custo primário marginal é contínua em toda a faixa de variações na produção De fato esta hipótese nem sempre se adapta à realidade e pode haver um ou mais pontos de descon tinuidade sobretudo quando a produção alcança um volume correspondente à plena capa cidade técnica do equipamento Neste caso a análise marginal é parcialmente defeituosa e o preço pode exceder o custo primário marginal quando este seja calculado no caso de uma ligeira diminuição da produção Igualmente pode apresentarse com certa freqüência uma descontinuidade para baixo isto é para um decréscimo da produção abaixo de certo nível Isto é importante quando consideramos o preço de oferta de curto prazo no equilíbrio de longo prazo pois em tal caso devemse supor em ação quaisquer descontinuidades cor respondentes ao nível de plena capacidade técnica Assim o preço de oferta de curto prazo no equilíbrio a longo prazo pode ter de exceder o custo primário marginal calculado em termos de uma ligeira diminuição da produção pendentemente do custo primário varia muito de um tipo de equipa mento para outro Eis aqui dois casos extremos i Uma parte da manutenção do equipamento deve necessaria mente realizarse pari passu com o ato de utilização por exemplo lubrificar a máquina Este tipo de gasto à parte as compras feitas fora incluise no custo de fatores Se por motivos de ordem física o montante exato do total da depreciação corrente tiver de ser coberto deste modo o montante do custo de uso à parte as compras feitas fora seria igual e oposto ao do custo suplementar e no equilíbrio a longo prazo o custo marginal de fatores excederia o custo médio de fatores numa soma igual aos custos de risco e de juros ii Uma parte da diminuição do valor do equipamento só se produz quando este é utilizado Esta parcela é debitada ao custo à medida que não é realizada pari passu com o ato de utilização Se a perda do valor do equipamento se verificasse unicamente desta ma neira o custo suplementar seria zero Talvez valha a pena assinalar que um empresário não utiliza em primeiro lugar o seu equipamento pior e mais velho pelo fato de seu custo de uso ser baixo pois este pode ser mais que anulado pela sua ineficiência relativa ou seja pela elevação do custo de fatores Por este motivo um empresário utiliza de preferência a parte do seu equipamento em que o custo de uso mais o custo dos fatores é mínimo por unidade produzida69 Seguese que a cada volume de produção do bem em pauta corresponde um custo de uso70 mas que não existe relação uniforme entre este custo de uso total e o custo de uso marginal isto é com o aumento do custo de uso resultante de um aumento do nível de produção II O custo de uso é um dos elos que ligam o presente e o futuro pois quando um empresário fixa a sua escala de produção tem de escolher entre utilizar imediatamente o seu equipamento ou conserválo para o utilizar mais tarde O que determina o montante do custo de OS ECONOMISTAS 96 69 Uma vez que o custo de uso depende em parte das expectativas relativas ao nível futuro dos salários uma redução na unidade de salário que se espere seja provisória fará com que o custo de fatores e o custo de uso se desloquem em proporções diferentes e deste modo influam sobre o tipo de equipamento a ser usado e possivelmente sobre o montante da demanda efetiva pois o custo de fatores e o custo de uso podem intervir de maneira diferente na determinação da demanda efetiva 70 O custo de uso do equipamento utilizado em primeiro lugar não é necessariamente inde pendente do volume total da produção vejase mais adiante isto é o custo de uso pode ser afetado em toda a sua extensão quando o volume total da produção varia uso é o sacrifício esperado de lucros futuros decorrente da utilização imediata e é o volume marginal deste sacrifício que juntamente com o custo marginal dos fatores e a receita marginal esperada determina a sua escala de produção Como então calcula o empresário o custo de uso de um ato de produção Definimos o custo de uso como sendo a redução de valor sofrida pelo equipamento em virtude de sua utilização comparada com a que teria sofrido se não tivesse havido tal utilização levando em conta o custo de manutenção e das melhorias que conviesse realizar além das compras a outros empresários Para determinar esse custo de uso portanto deve ser calculado o valor descontado do rendimento adicional provável que se obteria em data posterior se o equipamento não fosse utilizado imediatamente Ora este valor deve ser pelo menos igual ao valor atual da oportunidade de adiar a reposição do equipamento em virtude de sua inatividade e o mesmo pode ser maior71 Se não houver estoques excessivos ou redundantes de maneira que novas unidades de equipamento similar sejam produzidas todos os anos para serem adicionadas às antigas ou substituílas é evidente que o custo marginal de uso se calculará tendo em conta a redução da vida pelo uso ou a eficácia do equipamento e tendo em conta também o custo corrente de reposição Se pelo contrário o equipamento for redundante o custo de uso também dependerá da taxa de juros e do custo suplementar corrente quer dizer calculado de novo no período anterior àquele em que se prevê que a redundância será absorvida pelo desgaste etc Desta maneira o custo de juros e o custo suplementar corrente entram diretamente nos cálculos do custo de uso O cálculo apresentase em sua forma mais simples e inteligível quando o custo de fatores é zero como por exemplo no caso de um estoque redundante de matériaprima tal como o cobre de acordo com os princípios que estabeleci em minha obra Treatise on Money v II cap 29 Tomemos os valores prováveis do cobre em várias datas futuras série que será determinada pela proporção em que o excedente seja absorvido e tenda gradualmente para o custo julgado normal O valor atual ou o custo de uma tonelada de cobre excedente será portanto igual ao maior dos valores que possam ser obtidos subtraindose do valor futuro calculado de uma tonelada de cobre para qualquer data estabelecida o custo dos juros e o custo suplementar corrente de uma tonelada de cobre entre a data considerada e o momento atual Do mesmo modo o custo de uso de um navio uma fábrica ou uma máquina quando há oferta excedente destes tipos de equipamento é o seu custo KEYNES 97 71 Será maior quando se espera conseguir um rendimento superior ao normal em alguma data futura e esse período não seja bastante longo para justificar ou permitir a produção de um equipamento novo O custo de uso atual é igual ao máximo dos valores descontados dos rendimentos potenciais esperados em todas as datas futuras esperado de reposição descontado a uma taxa igual à percentagem que representa a soma do seu custo de juro e do custo suplementar corrente com base na data presumível da absorção do excedente Supusemos que o equipamento será oportunamente substituído por outro artigo idêntico Se o equipamento em questão não for substituído por outro idêntico quando estiver gasto seu custo de uso deverá ser cal culado aplicandose ao custo de uso do equipamento novo que será instalado no lugar do antigo na época em que este for posto fora de uso um coe ficiente determinado pela sua respectiva eficiência relativa III O leitor deve notar que quando o equipamento não é obsoleto mas apenas supérfluo no momento a diferença entre o custo de uso efetivo e o seu valor normal isto é o valor que teria se não houvesse equipamento de sobra varia com o intervalo de tempo que se julga transcorrer antes que o excedente seja absorvido Portanto se o tipo de equipamento considerado for dos que se vão acabando aos poucos e não de uma só vez de modo que uma proporção razoável chegue ao fim de sua vida útil anualmente o custo marginal de uso não cairá muito a menos que a parte supérflua seja excepcionalmente grande No caso de uma depressão geral o custo marginal de uso dependerá da duração provável que os empresários atribuírem à crise Deste modo a alta do preço de oferta quando os negócios começarem a melhorar pode deverse em parte a um rápido aumento do custo marginal de uso resultante de uma revisão das expectativas Contrariamente à opinião dos homens de negócios temse sus tentado algumas vezes que os esquemas organizados para transformar em sucata as instalações industriais excedentes não podem produzir os desejados efeitos de elevar os preços a não ser que se apliquem ao total da instalação excedente A noção de custo de uso porém mostra como a eliminação digamos da metade do equipamento excedente pode provocar uma alta imediata dos preços porque ao aproximarse a data da reabsorção do material excedente essa política aumenta o custo marginal de uso e conseqüentemente eleva o preço corrente de oferta Poderia assim parecer que os homens de negócios têm implícita em mente a noção do custo de uso embora não a formulem claramente Se o custo suplementar for elevado deduzse que o custo de uso será baixo quando houver equipamento excedente Além disso quando houver equipamento excedente não é provável que os custos marginais de fatores e de uso ultrapassem em muito seus valores médios Se estas duas condições são atendidas a existência de equipamento ex cedente levará provavelmente o empresário a trabalhar com uma per da líquida e talvez com uma elevada perda líquida Não haverá transição brusca deste estado de coisas para o de lucros normais que surge no momento em que o equipamento excedente é absorvido À OS ECONOMISTAS 98 medida que o excedente diminui o custo de uso elevase gradualmente e a diferença entre o valor marginal e o valor médio dos custos de fatores e de uso pode também aumentar gradualmente IV Na obra Principles of Economics de Marshall 6ª ed p 360 uma parte do custo de uso é incluída no custo primário sob a rubrica de desgaste extra do equipamento Mas não há nenhuma indicação sobre o modo de calcular este fator ou sobre a sua importância Na sua obra Theory of Unemployment p 42 o Professor Pigou supõe expressamente que o desinvestimento marginal determinado no equi pamento pela produção marginal pode em geral ser desprezado As variações no montante do desgaste sofrido pelo equipamento e nos custos do trabalho não manual empregado que acompanham as va riações do volume de produção em geral não são levadas em conta por serem de importância secundária72 Na verdade a idéia de que o desinvestimento no equipamento é zero na margem de produção en contrase em boa parte da teoria econômica recente Mas o problema adquire importância evidente logo que se apresenta a necessidade de explicar com exatidão o que significa o preço de oferta de uma firma individual É verdade que o custo de manutenção de um equipamento inativo pode freqüentemente pelas razões indicadas reduzir o montante do custo marginal de uso especialmente quando se prevê que a depressão durará muito tempo Não obstante isso um custo de uso baixo na margem não é a característica do período curto como tal mas antes de certas situações e espécies de equipamento cujo custo de manutenção se revela elevado quando inativo bem como dos desequilíbrios que se caracterizam por uma rápida obsolescência ou grande redundância especialmente se unidos a uma grande proporção de equipamento com parativamente novo No caso das matériasprimas a necessidade de levar em conta o custo de uso é óbvia se uma tonelada de cobre for utilizada hoje não poderá ser utilizada amanhã e o valor que o cobre teria para os propósitos de amanhã deve ser considerado uma parte do custo mar ginal Mas o que não se tem levado em conta é que o cobre é apenas um caso extremo do que sucede sempre que o equipamento de capital é utilizado para produzir A hipótese de que existe uma separação nítida entre as matériasprimas cujo desinvestimento deve ser levado em conta quando utilizadas na produção e o capital fixo cujo desin vestimento pode ser legitimamente desconsiderado não corresponde à KEYNES 99 72 Hawtrey Economica Maio de 1934 p 145 chamou a atenção para o fato de que o prof Pigou identifica o preço da oferta com o custo marginal da mãodeobra e sustenta que os argumentos do prof Pigou se encontram portanto seriamente viciados realidade especialmente em condições normais quando se tem de repor cada ano uma parte do equipamento e sua utilização torna mais próxima a data em que essa reposição é necessária Uma vantagem dos conceitos relativos ao custo de uso e ao custo suplementar consiste em serem aplicáveis tanto ao capital circulante e ao capital líquido como ao capital fixo A diferença essencial entre as matériasprimas e o capital fixo não reside na sua sujeição aos custos de uso e suplementar mas no fato de que o retorno do capital líquido se faz num único período ao passo que no caso do capital fixo que é durável e se gasta gradualmente esse retorno compreende uma série de custos de uso e de lucros obtidos em sucessivos períodos OS ECONOMISTAS 100 CAPÍTULO 7 Maiores Considerações Sobre o Significado de Poupança e de Investimento I No capítulo anterior a poupança e o investimento foram de tal modo definidos que são forçosamente de montante igual e para a comunidade considerada em conjunto não passam de dois aspectos da mesma coisa Alguns escritores contemporâneos inclusive eu próprio em minha obra Treatise on Money deram entretanto definições es peciais destes dois termos que não lhes atribuem necessariamente uma igualdade Outros discorreram sobre eles baseandose na hipótese de que podem não ser iguais sem todavia prefaciar seus argumentos com qualquer definição Será conveniente portanto a fim de ligar o que precede a outros estudos de que eles foram objeto classificar al gumas das suas várias acepções que parecem correntes Que eu saiba todo o mundo está de acordo em designar por poupança o excesso da renda sobre o que se gasta em consumo Cer tamente seria muito inconveniente e enganador darlhe outro signifi cado Também não há divergências de opinião sobre o que se pretende designar por gastos de consumo Assim sendo as diferenças de inter pretação surgem da definição de investimento ou na de renda II Tomemos o investimento em primeiro lugar Na linguagem cor rente esta palavra designa a compra de um ativo velho ou novo por um indivíduo ou por uma empresa Por vezes o alcance do termo é limitado à compra de um ativo na Bolsa de Valores Mas também falamos igualmente de investimentos em imóveis máquinas estoques de produtos acabados ou não e de maneira geral novo investimento por oposição a reinvestimento significa a compra por aplicação dos rendimentos de um bem de capital de qualquer espécie Se conside 101 rarmos a venda de um investimento como um investimento negativo isto é como um desinvestimento minha própria definição está de acordo com a de uso popular visto que as transações ocorridas nos investi mentos antigos forçosamente se anulam Naturalmente temos de ajus tar o caso com vista à criação e à liquidação de débitos incluindo as variações da quantidade de crédito ou de moeda mas embora para a comunidade em seu conjunto o aumento ou a diminuição no saldo do crédito agregado seja sempre exatamente igual ao aumento ou à diminuição do saldo do débito agregado esta complicação se neutraliza também quando se trata do investimento agregado Por conseqüência admitindose que a noção popular de renda coincide com a minha de renda líquida o investimento agregado no sentido corrente corresponde à minha definição de investimento líquido ou seja à adição líquida a toda espécie de equipamentos de capital após dedução das variações no valor dos equipamentos de capital velhos que entram no cálculo da renda líquida O investimento assim definido inclui portanto o aumento do equipamento de capital quer ele consista em capital fixo capital cir culante ou capital líquido e as principais diferenças entre as definições abstraindose da distinção entre investimento e investimento líquido são devidas à exclusão de uma ou de várias destas categorias Hawtrey por exemplo que atribui grande importância às varia ções do capital líquido isto é aos aumentos ou às diminuições invo luntários do estoque de produtos não vendidos propôs uma definição de investimento de onde são excluídas as variações dessa natureza Neste caso um excesso de poupança sobre o investimento seria o mesmo que um aumento involuntário no estoque de produtos não vendidos isto é um aumento do capital líquido Hawtrey não me convenceu de que seja este o fator preponderante visto pôr toda a ênfase na correção das variações não previstas no início comparativamente às que bem ou mal foram antecipadas Hawtrey considera que a diferença entre a escala de produção fixada todos os dias pelos empresários e a escala do dia anterior depende das variações sofridas pelo estoque de produtos não vendidos Sem dúvida no caso dos bens de consumo estas variações desempenham papel importante em suas decisões Entretanto não vejo motivo para excluir a influência exercida sobre essas decisões por outros fatores e prefiro portanto dar ênfase à variação total da demanda efetiva e não apenas à parte da variação que reflete o aumento ou a diminuição dos estoques não vendidos no período anterior Além disso no caso do capital fixo o aumento ou a diminuição de sua capacidade não utilizada corresponde em seus efeitos sobre as decisões de produzir ao aumento ou à diminuição dos estoques de bens não vendidos e não vejo como o método de Hawtrey possa lidar com este fator pelo menos tão importante quanto o outro Parece provável que a formação de capital e o consumo de capital OS ECONOMISTAS 102 tal como os consideram os economistas da escola austríaca não sejam idênticos ao investimento nem ao desinvestimento segundo a definição acima nem ao investimento ou desinvestimento líquido Em especial dizse que o consumo de capital ocorre em circunstâncias tais que não há claramente diminuição líquida no equipamento de capital tal como foi definido acima Todavia não encontrei referência nenhuma onde se explicasse claramente o significado destes termos Por exemplo dizer que a formação de capital ocorre quando se prolonga o período de produção pouco contribui para esclarecer o assunto III Passamos agora às divergências entre poupança e investimento devidas a uma definição especial da renda e logo do excesso da renda sobre o consumo O emprego que fiz destes termos em minha obra Treatise on Money é um bom exemplo disso pois conforme expliquei na página 51 a definição de renda que aí adotei se distingue da que estou agora dando pelo fato de que então era considerada renda dos empresários não os lucros realmente obtidos mas em certo sentido o seu lucro normal Assim por excedente da poupança sobre o in vestimento queria dizer que a escala de produção era tal que os em presários como proprietários do equipamento de capital estavam re tirando um lucro inferior ao normal e quando falava de um excesso maior de poupança sobre o investimento queria dizer que os lucros efetivos estavam sendo reduzidos de tal maneira que os empresários teriam motivo para contrair a produção Na minha maneira atual de pensar de um lado o volume de emprego e por conseqüência o da produção e da renda real é fixado pelo empresário sob o motivo de procurar maximizar seus lucros pre sentes e futuros sendo a previsão correspondente ao custo de uso de terminada segundo a maneira como ele concebe a utilização do equi pamento para que este lhe proporcione no curso de sua duração um rendimento máximo de outro lado o volume de emprego que lhe pro porcionará este máximo de lucros depende da função da demanda agre gada determinada pelas suas previsões de vendas que nas diferentes hipóteses devem resultar respectivamente do consumo e do investi mento Em minha obra Treatise on Money o conceito de variações no excedente do investimento sobre a poupança como foi ali definido era um meio de tratar as variações do lucro embora nesse livro não fizesse distinção clara entre os resultados previstos e os realizados73 Dizia eu então que a variação no excesso do investimento sobre a poupança era a força motora que governava as modificações do volume da pro KEYNES 103 73 Meu método nessa obra consiste em considerar os lucros conseguidos no presente como determinadores da expectativa corrente desses lucros dução Desta maneira o raciocínio novo embora sendo pelo menos na minha opinião atual muito mais exato e instrutivo é essencialmente um desenvolvimento do anterior Traduzido na linguagem de minha obra Treatise on Money assim se enunciaria a expectativa de um aumento no excesso do investimento sobre a poupança dado o volume anterior de emprego e produção induzirá os empresários a aumentar o volume do emprego e da produção A importância de meus raciocínios atuais e anteriores reside na sua tentativa de mostrar como o volume de emprego é determinado pelas estimativas da demanda efetiva feitas pelos empresários sendo o critério para um aumento na dita demanda um aumento previsto do investimento em relação à poupança conforme a definição apresentada em Treatise on Money É verdade porém que minha exposição em Treatise on Money se apresenta muito confusa e incompleta à luz dos novos desenvolvimentos aqui expostos D H Robertson definiu a renda de hoje como sendo igual ao consumo de ontem mais o investimento de modo que a poupança de hoje no sentido que ele lhe atribuiu é igual ao investimento de ontem mais o excesso de consumo de ontem sobre o de hoje Segundo esta definição a poupança pode ser superior ao investimento isto é por haver um excesso na renda de ontem no sentido por mim atribuído sobre a de hoje Assim quando Robertson diz que há um excedente de poupança sobre o investimento exprime literalmente a mesma idéia que eu quando digo que a renda decai e o excedente da poupança no seu entender é exatamente igual ao declínio da renda no meu entender Se fosse certo que as expectativas correntes fossem sempre determi nadas pelos resultados obtidos ontem a demanda efetiva de hoje seria igual à renda de ontem Podese portanto considerar o método de Robertson uma tentativa alternativa do meu sendo talvez uma pri meira aproximação dele para estabelecer a mesma distinção tão vital para a análise causal que tentei fazer pondo em contraste a demanda efetiva e a renda74 IV Abordamos em seguida as idéias muito vagas associadas à ex pressão poupança forçada O que se poderá depreender disso Em minha obra Treatise on Money v I p 171 nota de rodapé JMK v V p 154 dei algumas referências sobre o uso anteriormente feito desta expressão e sugeri que ela teria certa afinidade com a diferença entre investimento e poupança no sentido em que ali usei este último termo Não me parece haver tanta afinidade como havia pensado De qualquer maneira estou certo de que poupança forçada e as expres OS ECONOMISTAS 104 74 Ver o artigo de ROBERTSON Saving and Hoarding In Economic Journal Setembro de 1933 p 399 e o debate entre Robertson Hawtrey e eu próprio In Economic Journal Dezembro de 1933 p 658 JMK v XIII sões análogas empregadas mais recentemente por exemplo pelos Pro fessores Hayek e Robbins não têm relação definida com a diferença entre investimento e poupança no sentido que lhe dei em Treatise on Money Embora estes autores não tenham explicado exatamente a significação que atribuíram a esse termo é claro que para eles a pou pança forçada é um fenômeno diretamente resultante das variações na quantidade de moeda ou do crédito bancário cuja medida se faz por essas mesmas variações É evidente que uma variação no volume da produção e do emprego provocará mudanças na renda medida em unidades de salário que uma variação na unidade de salário ocasionará por sua vez uma al teração na distribuição da renda entre os mutuários e os mutantes e uma variação na renda agregada medida em moeda e que em ambos os casos haverá ou poderá haver uma variação no montante poupado Como as variações na quantidade de moeda podem conseqüentemente ter como resultado agindo sobre a taxa de juros modificar o volume e a distribuição da renda conforme veremos mais adiante é possível que tenham uma ação indireta sobre o montante poupado Estas al terações no montante poupado não são porém mais poupança forçada do que qualquer outra variação no montante poupado em virtude de uma variação das circunstâncias e não há meio para distinguir esses dois casos a não ser que especifiquemos o montante poupado em certas condições tomadas como norma ou padrão Além disso como veremos a amplitude das alterações na poupança agregada que resulta de de terminada modificação na quantidade de moeda é extremamente va riável e depende de muitos outros fatores Assim sendo a expressão poupança forçada não tem sentido a não ser que tomemos como padrão alguma taxa de poupança Se es colhermos como parece razoável a taxa que corresponda a um nível observado de pleno emprego a definição passa a ser Poupança forçada é o excedente da poupança real sobre o que se pouparia se houvesse pleno emprego numa situação de equilíbrio a longo prazo Esta defi nição teria sentido mas significaria ser o excedente forçado da poupança um fenômeno muito raro e muito instável e uma deficiência forçada da poupança o estado normal da atividade econômica O interessante trabalho do professor Hayek intitulado Note on the Development of the Doctrine of Forced Saving75 mostra que este foi de fato o significado original do termo Poupança forçada ou frugalidade forçada foi originalmente uma concepção de Bentham e Bentham afirmou expressamente ter em mente as conseqüências de um aumento na quantidade de moeda relativamente à quantidade de coisas vendáveis contra moeda em circunstâncias em que todos os KEYNES 105 75 Quarterly Journal of Economics Novembro de 1932 p 123 braços estivessem empregados da maneira mais vantajosa possível76 Em tais circunstâncias observa Bentham a renda real não pode au mentar e por conseqüência o investimento adicional que se produz como resultado da transição implica frugalidade forçada à custa do bemestar nacional e da justiça nacional Todos os autores do século XIX que se ocuparam do assunto tiveram virtualmente presente a mes ma idéia Mas uma tentativa para estender esta noção perfeitamente clara a uma situação que não seja a de pleno emprego acarreta difi culdades É verdade naturalmente que em virtude dos rendimentos decrescentes de uma quantidade crescente de emprego aplicada a de terminado equipamento de capital qualquer aumento no emprego im põe um sacrifício da renda real às pessoas já empregadas mas a ten tativa de relacionar esse sacrifício ao acréscimo de investimento que pode acompanhar o aumento de emprego dificilmente será bemsuce dida De qualquer maneira pelo que eu saiba nenhum esforço foi tentado pelos autores modernos que se interessaram pela poupança forçada para estender essa idéia a uma situação em que o emprego esteja aumentando e parece que esses autores na sua maior parte ignoram o fato de que para ser aplicado a situações de emprego in feriores ao pleno emprego o conceito de Bentham da frugalidade forçada requer alguma explicação ou qualificação V A preponderância da idéia de que a poupança e o investimento tomados no seu sentido literal podem ser diferentes só se explica no meu entender por uma ilusão de ótica em virtude de a relação entre um depositante individual e seu banco ser encarada como uma tran sação unilateral em vez de bilateral como realmente é Supõese que um depositante e seu banco podem articularse de maneira que realizem uma operação que faça desaparecer as poupanças do sistema bancário de modo a se perderem para o investimento ou pelo contrário que o sistema bancário torne possível a realização de um investimento a que não corresponde poupança alguma Ninguém pode porém poupar sem adquirir uma valor ativo seja dinheiro um débito ou bens de capital e para que alguém possa adquirir um bem que antes não possuía é necessário que outro bem de valor igual se crie ou que outra pessoa se desfaça de um bem do mesmo valor que antes possuía No primeiro caso há um investimento novo correspondente no segundo alguém tem de deixar de poupar uma quantia igual porque sua perda de riqueza decorre de fato de um excesso do seu consumo sobre a sua renda e não de uma perda na conta de capital por modificação no valor de um ativo de capital pois não se trata aqui de uma perda OS ECONOMISTAS 106 76 Loc cit p 125 sobre o valor que seu ativo de capital tinha anteriormente o indivíduo recebe justamente o valor corrente de seu ativo e contudo não o retém em forma alguma de riqueza isto é deve estar gastando no consumo corrente excedendo o rendimento corrente Além disso se é o sistema bancário que cede um bem alguém tem de renunciar à posse de dinheiro líquido Daqui se deduz que a poupança agregada do primeiro indivíduo somada à dos outros deve ser necessariamente igual ao montante do novo investimento corrente A idéia de que a criação de crédito pelo sistema bancário permite realizar investimentos aos quais nenhuma poupança genuína cor responde resulta unicamente de se isolar uma das conseqüências do aumento do crédito bancário com a exclusão das demais Se a concessão de um crédito adicional a créditos já existentes permite ao empresário efetuar uma adição ao seu investimento corrente que de outro modo não poderia ocorrer as rendas aumentarão necessariamente e numa proporção que em geral excederá a do investimento suplementar Além disso salvo em caso de pleno emprego tanto a renda real como a monetária serão acrescidas O público exercerá uma livre escolha das proporções em que dividirá o seu acréscimo de rendas entre poupança e dispêndio e é impossível que a intenção do empresário que pediu emprestado para aumentar o seu investimento possa tornarse efetiva exceto como substituição dos investimentos de outros empresários que do contrário teriam ocorrido a um ritmo mais acelerado do que o público decide aumentar as suas poupanças Além disso as poupanças que resultam dessa decisão são tão genuínas quanto quaisquer outras Não se pode obrigar ninguém a ficar na posse da moeda adicional correspondente ao novo crédito bancário a não ser que esse alguém prefira deliberadamente guardar mais dinheiro a outra forma de ri queza Mesmo assim o emprego as rendas e os preços não podem subtrairse ao movimento que na nova situação lhes impõe o fato de alguém preferir conservar o dinheiro adicional É verdade que o au mento inesperado do investimento numa direção particular pode causar no montante agregado da poupança e do investimento uma perturbação que se não verificaria se ele tivesse sido previsto com bastante ante cipação Também é verdade que a concessão do crédito bancário faz surgir três tendências 1 aumento da produção 2 alta no valor da produção marginal expressa em unidades de salário o que em condições de rendimentos decrescentes deve necessariamente acompanhar um aumento da produção e 3 alta da unidade de salários em termos de moeda efeito que em geral acompanha a melhoria do emprego e estas tendências podem afetar a distribuição da renda real entre os diferentes grupos Mas estas tendências são características de um es tado de produção crescente e se manifestam do mesmo modo quando o aumento da produção tem outra origem que não a extensão do crédito bancário Elas só podem ser evitadas se eliminarmos qualquer ação KEYNES 107 capaz de melhorar o emprego Aliás grande parte do que foi dito acima antecipa o resultado da análise posterior Deste modo o ponto de vista já antiquado de que a poupança sempre supõe investimento embora incompleto e enganoso é certa mente mais justo que a idéia moderna segundo a qual pode haver poupança sem investimento ou investimento sem poupança genuína O erro ocorre quando se chega à dedução plausível de que quando um indivíduo poupa aumenta em quantidade igual o investimento agregado É verdade que quando um indivíduo poupa ele aumenta sua própria riqueza Concluir porém que ele aumenta também a ri queza agregada é querer ignorar as reações possíveis do ato de poupança de um indivíduo sobre as poupanças de outrem e portanto sobre a riqueza de outrem A conciliação da identidade entre a poupança e o investimento com a aparente livre vontade do indivíduo para economizar o que quiser independentemente do que os outros ou ele mesmo possa in vestir depende especialmente do fato de ser a poupança como dispên dio um fenômeno de duplo caráter Embora não seja provável porque o montante da poupança de um indivíduo tenha alguma influência sensível sobre a sua própria renda as reações do montante do seu consumo sobre as rendas dos outros tornam impossível que todos os indivíduos poupem simultaneamente quaisquer somas dadas Toda ten tativa de poupar mais reduzindo o consumo age de tal modo sobre as rendas que necessariamente anula a si mesma É sem dúvida igualmente impossível à comunidade em sua totalidade poupar menos que o montante do investimento corrente já que uma tentativa desta ordem fará subir necessariamente os rendimentos até a um nível em que as somas que os indivíduos decidem poupar alcancem uma cifra exatamente igual ao montante do investimento Há uma estreita analogia entre o que ficou dito e a proposição segundo a qual a liberdade de todo indivíduo de fazer variar quando lhe aprouver a quantidade de dinheiro que detém conciliase com a necessidade de que o volume total de dinheiro formado pela soma dos encaixes individuais iguale exatamente o montante da moeda que o sistema bancário criou Neste último caso a igualdade resulta do fato de que o montante de dinheiro que cada qual decide conservar não é independente da sua renda ou dos preços das coisas principalmente certificados de valores que é natural comprar em vez de conservar dinheiro Assim as rendas do mesmo modo que os preços variam obri gatoriamente até que se estabeleça a igualdade entre o montante agre gado das somas em dinheiro que os indivíduos resolvem guardar no nível de rendimentos e preços e o montante da moeda criado pelo sistema bancário Isto constitui na verdade a proposição fundamental da teoria monetária Mas estas proposições decorrem simplesmente do fato de que OS ECONOMISTAS 108 não pode haver um comprador sem um vendedor nem um vendedor sem um comprador Embora um indivíduo cujas transações são de pouca importância em relação ao mercado possa despreocupadamente desprezar o fato de que a demanda não é uma operação unilateral seria insensatez desprezálo tratandose da demanda agregada É esta a diferença vital entre a teoria do comportamento econômico da comu nidade e a do comportamento de uma unidade individual na qual admitimos que as variações na demanda do próprio indivíduo não afe tam sua renda KEYNES 109 LIVRO TERCEIRO A PROPENSÃO A CONSUMIR CAPÍTULO 8 A Propensão a Consumir I Os Fatores Objetivos I Estamos agora em condições de voltar ao nosso tema principal de que nos afastamos no final do Livro Primeiro para examinar certos problemas gerais de método e definição O objetivo final de nossa análise é descobrir o que determina o volume de emprego Até aqui estabele cemos a conclusão preliminar de que o volume de emprego é determi nado pelo ponto de interseção da função de oferta agregada com a função de procura agregada A função de oferta agregada contudo que depende principalmente das condições físicas da oferta envolve poucas considerações que ainda não nos são familiares A forma pode ser pouco conhecida mas os fatores nela subjacentes não são novos Voltaremos a ocuparnos da função de oferta agregada no capítulo 20 quando examinaremos a sua inversa sob o nome de função de emprego Em termos gerais porém o que se tem descuidado é da parte corres pondente à função de demanda agregada e é à função da demanda agregada que dedicaremos os Livros Terceiro e Quarto A função de demanda agregada relaciona determinado volume de emprego com o produto das vendas que se espera realizar desse volume de emprego O produto das vendas formase pela soma de duas quantidades a soma que será despendida em consumo quando o emprego está em certo nível e a soma que se destinará ao investimento Os fatores que determinam estas duas quantidades são bastante dife rentes Neste livro estudaremos os primeiros a saber quais os fatores que determinam a soma que se gastará em consumo quando o emprego se acha em determinado nível no Livro IV continuaremos com os fatores que fixam a soma a ser empregada no investimento Considerando que aqui nos interessa a determinação da soma que deve ser gasta em consumo quando o emprego está em certo nível devemos estritamente falando tratar da função que liga o montante de C ao nível de N Todavia é mais conveniente operar com uma 113 função ligeiramente diferente ou seja a que relaciona o consumo me dido em unidades de salário Cω com a renda medida em unidades de salário Yω correspondente a certo volume de emprego N Este método está sujeito à restrição de que Yω não é uma função unívoca de N o qual é idêntico em todas as circunstâncias Com efeito a relação entre Yω e N pode depender embora provavelmente em grau muito limitado da natureza precisa do emprego Em outras palavras duas distribuições desiguais de um emprego agregado N entre ocupações diferentes em virtude da forma diferente das funções do emprego in dividual questão que será tratada no capítulo 20 podem conduzir a valores diferentes de Yω Em certos casos poderia ser necessário dar especial atenção a este fator Em geral porém constitui uma boa apro ximação considerar Yω como determinado por N de maneira unívoca Definiremos portanto aquilo a que chamaremos propensão a consumir como a relação funcional χ entre Yω determinado nível de renda medida em unidades de salário e Cω o gasto que para o consumo se toma do dito nível de rendimento de modo que Cω χYω ou C WχYω O montante que a comunidade gasta em consumo depende evi dentemente i em parte do montante da sua renda ii em parte de outras circunstâncias objetivas que o acompanham e iii em parte das necessidades subjetivas propensões psicológicas e hábitos dos in divíduos que o compõem bem como dos princípios que governam a distribuição da renda entre eles que são passíveis de modificações à medida que aumenta a produção Os motivos que impelem a gastar caracterizamse por sua interação e uma tentativa de classificálos pode levar a divisões arbitrárias Não obstante isso para clareza das idéias vamos separálos em duas categorias que chamaremos fatores objetivos e fatores subjetivos Os fatores subjetivos que examinaremos mais detalhadamente no próximo capítulo incluem as características psicológicas da natureza humana bem como os costumes e as insti tuições sociais que embora não imutáveis apresentam poucas proba bilidades de sofrer variações ponderáveis em curto período de tempo salvo circunstâncias anormais ou revolucionárias Uma análise histó rica ou uma comparação entre dois sistemas sociais de tipos diferentes deverá necessariamente levar em conta a maneira pela qual as mu danças nos fatores subjetivos podem afetar a propensão a consumir Na continuação desta obra porém consideraremos os fatores subjetivos como dados e admitiremos que a propensão a consumir apenas depende das alterações nos fatores objetivos II Os principais fatores objetivos que influem na propensão a con sumir parecem ser os seguintes OS ECONOMISTAS 114 1 Uma variação na unidade de salário O consumo C é evi dentemente uma função em certo sentido muito mais da renda real do que da renda nominal Em dada situação da técnica das preferências do público e das condições sociais que determinam a distribuição da renda a renda real de um indivíduo sobe e desce com a quantidade de unidades de trabalho de que pode dispor isto é com o montante da sua renda medida em unidades de salário embora a sua renda real suba em proporção menor que o seu rendimento medido em uni dades de salário devido à influência dos rendimentos decrescentes quando o volume agregado da produção muda Podemos portanto ad mitir razoavelmente como primeira aproximação que se a unidade de salário varia o gasto em consumo correspondente a certo nível de emprego variará assim como os preços na mesma proporção ainda que em certas circunstâncias tenhamos de levar em conta as possíveis conseqüências sobre o consumo agregado de uma mudança na dis tribuição da renda real entre os empresários e os rentiers provocada por uma variação na unidade de salário Além do mais já conside ramos anteriormente as variações na unidade de salário quando definimos a propensão a consumir em termos de renda medida em unidades de salário 2 Uma variação na diferença entre renda e renda líquida De monstramos antes que o montante do consumo depende mais da renda líquida do que da renda visto que por definição é a renda líquida que o indivíduo tem em mente antes de mais nada quando decide a escala do seu consumo Em determinada situação pode existir certa relação estável entre ambos os conceitos no sentido de que haverá uma função relacionando de maneira biunívoca os diversos níveis de renda aos correspondentes níveis de renda líquida Entretanto se não for este o caso a parte da variação da renda que não afete a renda líquida deve ser negligenciada pois não influi sobre o consumo e de forma semelhante deve ser levada em conta a variação na renda líquida que não reflita na renda Todavia salvo circunstâncias especiais duvido que este fator tenha importância prática Faremos na quarta seção deste capítulo uma análise mais detalhada dos efeitos sobre o consumo da diferença entre renda e renda líquida 3 Variações imprevistas nos valores de capital não considerados no cálculo da renda líquida Estas variações têm importância muito maior para modificar a propensão a consumir por não guardarem ne nhuma relação estável ou regular com o montante da renda O consumo das classes proprietárias de riqueza pode ser extremamente suscetível às variações imprevistas no valor nominal de seus bens Este fator deve ser considerado entre os mais importantes daqueles capazes de ocasionar variações de curto prazo na propensão a consumir KEYNES 115 4 Variações na taxa intertemporal de desconto isto é na relação de troca entre os bens presentes e os bens futuros Não se trata aqui da mesma coisa que a taxa de juros já que esta leva em conta as variações futuras no poder aquisitivo do dinheiro à medida que são previstas Devese considerar também toda a sorte de riscos tais como a probabilidade de não viver bastante para usufruir dos bens futuros ou de uma tributação confiscatória A título de aproximação contudo podemos identificar isto com a taxa de juros A influência deste fator sobre a proporção em que se gasta de terminada renda está sujeita a muitas dúvidas Para a teoria clássica da taxa de juros77 que se baseia na idéia de ser a taxa de juros o fator de equilíbrio entre a oferta e a procura de poupança era conve niente supor que as despesas de consumo coet par variassem na razão inversa das variações na taxa de juros de maneira que qualquer elevação da taxa de juros diminuiria consideravelmente o consumo Todavia reconheceuse há muito tempo que o efeito total das variações da taxa de juros sobre a propensão a despender em consumo imediato é complexo e incerto dependendo de tendências antagônicas dado que alguns dos motivos subjetivos para poupar são mais facilmente satis feitos quando a taxa de juros sobe enquanto outros diminuem A longo prazo é provável que variações substanciais na taxa de juros tendam a modificar consideravelmente os hábitos sociais e portanto a pro pensão subjetiva a despender embora sem as luzes da experiência se torne difícil indicar em que sentido Contudo não é provável que o tipo usual de flutuação a curto prazo na taxa de juros tenha muita influência direta sobre os gastos num sentido ou no outro Raras são as pessoas que alteram o seu modo de vida porque a taxa de juros baixou de 5 para 4 quando a sua renda agregada permanece a mesma Indiretamente porém podem ocorrer outros efeitos embora não todos na mesma direção Talvez a influência mais importante que opera através de variações na taxa de juros sobre a propensão a gastar fundos provenientes de determinada renda seja o efeito dessas variações sobre a alta ou baixa do preço de títulos e de outros ativos Se uma pessoa se beneficia de um aumento inesperado no valor de seu capital é natural que os seus motivos para gastar no período corrente se fortaleçam ainda que em termos de renda o valor de seu capital não tenha au mentado ao passo que se estiver sofrendo perdas de capital seus motivos para gastar enfraquecerão Já no item 3 porém levamos em conta esta influência indireta Fora disso a conclusão mais importante sugerida pela experiência é segundo creio a de que a influência a curto prazo da taxa de juros sobre os gastos individuais feitos com determinada renda é secundária e relativamente de pouca importância OS ECONOMISTAS 116 77 Cf cap 14 excetuandose talvez o caso de variações excepcionalmente grandes Quando a taxa de juros baixa muito o aumento da razão entre o valor de uma perpetuidade comprável por determinada importância e o juro anual que se obtém dessa mesma importância pode contudo proporcionar uma importante fonte de poupança fortalecendo a prá tica de precaverse contra as vicissitudes da velhice pela compra de uma perpetuidade A situação anormal em que a propensão a consumir se vê pro fundamente afetada pela concorrência de incerteza extrema quanto ao futuro e ao que ele possa trazer deveria talvez ser incluída também neste parágrafo 5 Variações na política fiscal Se o incentivo do indivíduo para poupar depender dos futuros rendimentos que espera ele evidente mente dependerá não só da taxa de juros como também da política fiscal do Governo Os impostos sobre a renda particularmente quando gravam a renda não ganha os impostos sobre lucros de capital sobre heranças etc são tão importantes quanto a taxa de juros sendo mesmo possível que as modificações eventuais da política fiscal tenham pelo menos nas expectativas maior influência que a própria taxa de juros Se a política fiscal for usada como um instrumento deliberado para conseguir maior igualdade na distribuição das rendas seu efeito sobre o aumento da propensão a consumir será naturalmente tanto maior78 Convém levar igualmente em conta a influência exercida sobre a propensão agregada a consumir pelos fundos de amortização que o Governo reserva para saldar sua dívida utilizando o produto dos im postos comuns Estes fundos representam uma espécie de poupança de empresa de modo que uma política tendente a criar grandes fundos de amortização deve ser considerada em determinadas circunstâncias uma forma de reduzir a propensão a consumir Por esta razão uma reviravolta da política do Governo passando do endividamento à criação de fundos de amortização ou viceversa pode ocasionar uma séria diminuição ou notável expansão da procura efetiva 6 Modificações das expectativas acerca da relação entre os níveis presentes e futuros da renda Devemos incluir este fator para que a enumeração seja completa Mas embora ele possa afetar consideravel mente a propensão a consumir de um indivíduo é provável que quando se trata da comunidade como um todo seus efeitos tendam a compen sarse Ademais tratase de uma questão que suscita em geral muita incerteza para poder exercer influência importante KEYNES 117 78 Devese mencionar de passagem que a respeito da influência exercida pela política fiscal sobre o aumento da riqueza há um sério malentendido contudo só o poderemos analisar adequadamente com o auxílio da taxa de juros que será exposta no Livro Quarto Chegamos pois à conclusão de que em determinada situação a propensão a consumir pode ser considerada uma função relativamente estável desde que tenhamos eliminado as variações na unidade de salário em termos de moeda As flutuações imprevistas nos valores de capital podem modificar a propensão a consumir bem como poderão afetála variações substanciais na taxa de juros e na política fiscal porém não é provável que os outros fatores objetivos capazes de atuar sobre ela conquanto não devam ser desprezados tenham importância em circunstâncias comuns Em virtude da situação econômica geral o fato de o gasto de consumo em termos de unidade de salário depender essencialmente do volume da produção e do emprego justifica o agrupamento dos outros fatores na expressão composta a propensão a consumir Isto porque conquanto os demais fatores possam variar e convém não esquecer isto a renda agregada medida em unidades de salário é regra geral a principal variável de que depende o componente consumo da função de procura agregada III Admitindo pois que a propensão a consumir é uma função bas tante estável de maneira que em geral o montante do consumo agre gado depende principalmente do montante da renda agregada ambos medidos em unidades de salário e considerando de importância se cundária as variações na mesma propensão qual é a forma normal desta função A lei psicológica fundamental em que podemos basearnos com inteira confiança tanto a priori partindo do nosso conhecimento da natureza humana como a partir dos detalhes dos ensinamentos da experiência consiste em que os homens estão dispostos de modo geral e em média a aumentar o seu consumo à medida que a sua renda cresce embora não em quantia igual ao aumento de sua renda Isto quer dizer que se Cω é o montante do consumo e Yω o da renda ambos medidos em unidades de salário Cω tem o mesmo sinal que Yω porém é de grandeza menor isto é dCω dYω é positivo e inferior à unidade Este é o caso especialmente quando temos em vista períodos curtos como no caso das chamadas flutuações cíclicas do emprego durante as quais os hábitos naquilo em que se distinguem das pro pensões psicológicas mais permanentes não dispõem de tempo bastante para se adaptarem às mudanças nas circunstâncias objetivas O padrão de vida habitual de um indivíduo baseiase na primeira satisfação que pode extrair da sua renda e ele tende a poupar a diferença que surge entre a sua renda efetiva e as despesas correspondentes ao seu padrão costumeiro de vida ou então no caso de acomodar os seus gastos às OS ECONOMISTAS 118 variações na sua renda em períodos curtos só o fará imperfeitamente Por conseguinte uma renda crescente será com freqüência acompanhada de uma poupança maior e uma renda decrescente o será de uma poupança menor em maior escala a princípio do que posteriormente Fora das variações de curto período no nível da renda porém também é evidente que a elevação absoluta do montante da renda contribui via de regra para alargar a brecha entre a renda e o consumo Isso porque a satisfação das necessidades primárias imediatas de um indivíduo e de sua família é normalmente mais forte que os seus motivos para poupar que só adquirem predomínio efetivo quando se alcança determinado nível de conforto Estas razões fazem com que em geral uma proporção maior da renda seja poupada à medida que a renda real aumenta Porém poupese ou não numa proporção maior somos levados a considerar regra psicológica fundamental em uma co munidade moderna que quando a sua renda real aumenta o seu con sumo não crescerá em montante absoluto igual de modo que ela pou pará necessariamente uma soma absoluta maior a não ser que ao mesmo tempo ocorra uma alteração fora do comum nos demais fatores Como veremos depois79 a estabilidade do sistema econômico depende essencialmente da predominância desta regra na prática Isto significa que se o emprego e portanto a renda agregada aumentam nem todo o emprego adicional será requerido para satisfazer as necessidades do consumo adicional Por outro lado uma diminuição da renda devida à queda no volume de emprego se for além de certos limites pode muito bem ser motivo para que o consumo exceda a renda não apenas porque os indivíduos ou instituições passam a utilizar as reservas financeiras acumuladas em melhores dias como também porque o Governo deli beradamente ou não poderá cair num déficit orçamentário ou poderá vir a fornecer auxílio em caso de desemprego por exemplo com dinheiro emprestado Por isso quando o emprego desce a um nível baixo o consumo agregado cairá em volume menor que a diminuição da renda real tanto por força das reações habituais dos indivíduos como por força da política provável dos Governos o que explica a possibilidade de conseguir muitas vezes uma nova posição de equilíbrio dentro de limites razoáveis de flutuação Se assim não fosse o declínio do emprego e da renda uma vez iniciado poderia ir muito longe Este princípio simples leva como se poderá ver à mesma con clusão de antes a saber o emprego só pode aumentar pari passu com um aumento do investimento a não ser bem entendido que ocorra alguma mudança na propensão a consumir Com efeito visto que no caso de um aumento do emprego os consumidores vão gastar menos KEYNES 119 79 Cf p 240 do que o aumento no preço da oferta agregada o dito aumento de emprego se revelará desvantajoso a não ser que um acréscimo no investimento venha preencher a lacuna IV Não devemos subestimar a importância do fato já assinalado an teriormente de que enquanto o emprego é função do consumo e do investimento previstos o consumo é coet par função da renda líquida isto é do investimento líquido sendo a renda líquida igual ao consumo mais o investimento líquido Em outras palavras quanto maior for a provisão financeira que se julgue necessário constituir antes de calcular a renda líquida menos favorável será para o consumo e portanto para o emprego um volume determinado de investimento Quando toda esta provisão financeira ou custo suplementar é efetivamente gasta na conservação do equipamento de capital existente não é provável que isso passe despercebido Contudo quando a provisão financeira excede o gasto real de conservação nem sempre se avaliam as conseqüências práticas que daí resultam para o emprego pois o montante deste excedente não dá origem direta a um investimento corrente nem se acha disponível para o consumo Tem portanto de ser equilibrado com novo investimento cuja procura nasce de motivos completamente independentes do desgaste atual do equipamento velho para o qual se constituiu a provisão financeira com a conseqüência de que o novo investimento disponível para manter a renda atual di minui paralelamente e se torna necessária uma procura mais intensa de novos investimentos para que se torne possível atingir determinado nível de emprego Além disso considerações muito parecidas se aplicam aos elementos do custo de uso destinados a compensar o desgaste quando este não é efetivamente reparado Tomemos por exemplo uma casa que continua sendo habitável até que seja demolida ou abandonada Se do aluguel anual pago pelos inquilinos é descontada certa parte do seu valor que o proprietário não gasta em sua conservação nem considera renda líquida disponível para o consumo esta reserva quer faça parte de U ou de V constitui um empecilho para o emprego durante todo o tempo em que dure a casa empecilho este que logo será compensado de uma só vez quando a casa for reconstruída Em uma economia estacionária talvez não valesse a pena men cionar esses fatores em se considerando que os abatimentos pela de preciação feitos anualmente sobre as casas velhas seriam exatamente compensados pelas casas novas construídas em substituição das que em cada ano chegam ao fim de suas vidas Tais fatores porém podem ser de muita importância numa economia não estática especialmente durante o período imediato a uma expansão pronunciada de investi mentos em capital de longa vida útil Em tais circunstâncias grande OS ECONOMISTAS 120 parte dos novos itens de investimento pode ser absorvida pelas maiores provisões financeiras que os empresários fazem para preparar e renovar o equipamento de capital existente o qual embora se desgaste com o tempo ainda não chegou ao ponto de exigir gastos que se aproximem do total da reserva financeira constituída como conseqüência as rendas não podem subir além de um nível bastante baixo para corresponder à pequena quantia agregada do investimento líquido Os fundos de amortização e outras reservas análogas podem portanto reduzir o poder de dispêndio do consumidor muito tempo antes que ocorra a necessidade dos gastos de reposição para os quais tais reservas foram constituídas isto é diminuem a procura efetiva corrente e só a au mentam no ano em que efetivamente se faz a reposição Se este efeito for agravado pela prudência financeira ou seja pela idéia da conve niência de amortizar o custo inicial com maior rapidez que o desgaste real do equipamento o resultado cumulativo pode ser bastante sério Nos Estados Unidos por exemplo ao chegar em 1929 a rápida expansão de capital nos cinco anos anteriores levou cumulativamente à constituição com vista a um equipamento que não necessita ser renovado de fundos de amortização e de margens de depreciação em tão grande escala que se tornava necessário um volume enorme de investimentos completamente novos apenas para absorver essas reser vas financeiras chegou ainda a ser quase impossível encontrar mais investimentos novos em escala suficiente para corresponder ao volume de poupança nova que uma comunidade próspera e em situação de pleno emprego se dispusera a guardar Apenas este fator bastaria provavelmente para causar uma depressão E além disso a mesma prudência financeira continuou a ser exercida ao longo da depressão pelas grandes firmas em condições de fazêlo fato que constituiu sério obstáculo para uma recuperação imediata Também na GrãBretanha na atualidade 1935 o grande volume de construções e outros investimentos realizados depois da guerra le varam a um volume de fundos de amortização muito superior às ne cessidades presentes para os gastos de reparações e renovações ten dência que se fortaleceu no caso dos investimentos feitos pelas auto ridades locais e públicas de acordo com os princípios de sã adminis tração financeira que freqüentemente requerem fundos de amortização suficientes para recuperar o custo inicial algum tempo antes que a reposição se faça necessária com o resultado de que mesmo se os particulares estivessem dispostos a gastar o total de suas rendas lí quidas seria uma difícil tarefa restabelecer o pleno emprego diante deste volume opressivo de reservas estatutárias constituídas pelas au toridades públicas e semipúblicas inteiramente dissociadas de qualquer investimento novo correspondente Creio que no momento80 os fundos KEYNES 121 80 As cifras suscitam tão pouco interesse que só são publicadas com atraso de dois anos ou mais de amortização das autoridades locais alcançam uma cifra anual su perior à metade da soma que essas autoridades gastam em todos os seus novos investimentos81 E decerto o Ministério da Saúde quando insiste em exigir dessas autoridades locais a formação de fundo de amortização ignora até que ponto semelhante política contribui para agravar o problema do desemprego No caso de adiantamentos feitos por sociedades imobiliárias para ajudar um indivíduo a construir sua própria casa o desejo de se livrar da dívida antes que a casa se deteriore pode estimular o proprietário a poupar mais do que faria de outra forma embora talvez se devesse classificar este fator como capaz de reduzir a propensão a consumir diretamente em vez de causar efeito sobre a renda líquida De fato as amortizações dos empresários hipotecários feitos pelas sociedades imobiliárias que em 1925 al cançavam 24 milhões de libras esterlinas subiram para 68 milhões de libras em 1933 em comparação com novos adiantamentos no montante de 103 milhões de libras hoje as amortizações são pro vavelmente ainda maiores O fato de ser o investimento bruto mais do que o investimento líquido que se manifesta nas estatísticas de produção depreendese de maneira natural e concludente da obra de Colin Clark National Income 19241931 Ele também mostra que há uma elevada proporção de de preciação e outros fatores que normalmente afetam o investimento Ele calcula por exemplo que na GrãBretanha os montantes do in vestimento e do investimento líquido entre 1928 e 193182 foram os mencionados adiante embora o investimento bruto para ele seja pro vavelmente um pouco maior que o meu investimento na medida em que poderá incluir parte do custo de uso e não fica claro até que ponto o seu investimento líquido coincide com a minha definição deste termo OS ECONOMISTAS 122 81 No decorrer do ano financeiro que terminou em 31 de março de 1930 as autoridades locais gastaram 87 milhões de libras esterlinas na conta de capital dos quais 37 milhões de libras foram proporcionados pelos fundos de amortização etc correspondentes aos gastos anteriores da mesma natureza no ano que terminou em 31 de março de 1933 as cifras foram respectivamente 81 e 46 milhões de libras 82 Op cit pp 117138 Kuznets chegou a conclusão parecida ao compilar as estatísticas da formação bruta de capital o que eu chamo investimento nos Estados Unidos entre 1919 e 1933 O fato físico que as estatísticas da produção constatam não é inevitavelmente o investimento líquido mas o bruto Kuznets identificou também as dificuldades que são encontradas para passar do investimento bruto ao líquido A dificul dade escreve ele em passar da formação bruta do capital à formação líquida isto é a dificuldade de fazer correções correspondentes ao con sumo dos bens duráveis finais existentes não reside unicamente na falta de dados O próprio conceito do consumo anual de bens que duram certo número de anos está sujeito a ambigüidade Ele se apóia portanto na hipótese de que a reserva para depreciação e exaustão nos livros das empresas representa corretamente o volume de consumo dos bens du ráveis existentes usados por essas empresas83 Por outro lado não tenta fazer dedução alguma relativamente a casas e a outros bens duráveis em mãos dos indivíduos Seus resultados muito interessantes relativos aos Estados Unidos podem ser resumidos como segue KEYNES 123 83 Estas citações são extraídas do Bulletin nº 52 do National Bureau of Economic Research no qual se dão os resultados preliminares do livro em preparação de Kuznets Deste quadro ressaltam vários fatos importantes A formação lí quida de capital conservouse muito estável no qüinqüênio 19251929 apenas com um aumento de 10 na última etapa do movimento as cendente As deduções correspondentes aos gastos dos empresários com reparações manutenção depreciação e exaustão mantiveramse numa cifra alta mesmo no ponto culminante da depressão O método de Kuznets porém leva certamente a uma subestimativa do aumento anual na depreciação etc pois calcula esta última em menos de 15 da nova formação líquida do capital Verificase sobretudo que a for mação líquida do capital sofreu um desastroso colapso depois de 1929 descendo em 1932 a uma cifra não menos que 95 inferior à média do qüinqüênio 19251929 O que foi dito anteriormente não passa até certo ponto de uma digressão Todavia é importante insistir sobre a magnitude do abati mento que deve ser feito da renda de uma sociedade que já possui grande estoque de capital antes de chegar à renda líquida que está normalmente disponível para o consumo Se ignorarmos este fator arriscamos subestimar o poderoso freio que modera a propensão a con sumir mesmo quando o público esteja disposto a consumir grande parte da sua renda líquida O consumo para repetir o óbvio é o único fim e objetivo da atividade econômica As oportunidades de emprego estão necessa riamente limitadas pela extensão da procura agregada A demanda agregada só pode ser derivada do consumo presente ou das reservas para o consumo futuro O consumo que podemos prover vantajosamente com antecedência não pode estenderse indefinidamente no futuro Não podemos como sociedade prover consumo futuro por meio de expe dientes financeiros mas apenas mediante a produção física corrente Na medida em que nossa organização social e comercial separa a for mação de reservas financeiras para o futuro da provisão física futura de tal forma que os esforços para assegurar as primeiras não arrastem necessariamente consigo a consecução da segunda a prudência finan ceira pode causar restrições na procura agregada e portanto diminuir o bemestar conforme testemunham muitos exemplos Mais do que isso quanto maior for a provisão que façamos com antecedência para o consumo maior será a dificuldade em encontrar novas necessidades para prover e maior a nossa dependência do consumo presente como fonte de procura Entretanto quanto maiores forem as nossas rendas maior infelizmente será a margem entre essas rendas e o nosso con sumo Na ausência de algum novo expediente não há como veremos maneira de resolver o enigma exceto a que consiste num desemprego suficiente para provocar um empobrecimento bastante para que a di ferença entre nosso consumo e a nossa renda não seja maior que o OS ECONOMISTAS 124 equivalente da provisão física para o consumo futuro que seja lucrativo constituir hoje Examinemos também a questão pelo seguinte prisma O consumo se satisfaz em parte com os bens produzidos na atualidade e em parte com os produzidos anteriormente isto é com o desinvestimento Na medida em que o consumo se satisfizer com os bens do segundo tipo verificase uma contração na demanda corrente visto que na mes ma medida uma parte dos gastos presentes deixa de retornar como parte da renda líquida Pelo contrário sempre que se produz uma mercadoria durante o período com a intenção de satisfazer o consumo posteriormente resulta daí uma expansão da demanda corrente Ora todo o investimento de capital está destinado a resultar mais cedo ou mais tarde em desinvestimento de capital Destarte o problema de conseguir que os novos investimentos de capital excedam sempre o desinvestimento de capital na medida necessária para preencher a lacuna que separa a renda líquida do consumo apresenta dificuldade crescente à medida que o capital aumenta Os novos investimentos de capital só podem realizarse em excesso ao desinvestimento atual do capital quando se espera um aumento dos gastos futuros em consumo Cada vez que garantimos o equilíbrio de hoje aumentando o investi mento estamos agravando a dificuldade de assegurar o equilíbrio de amanhã Uma diminuição na propensão a consumir de hoje só pode conformarse com o interesse público se esperarmos que haja algum dia maior propensão a consumir Isso nos faz recordar a Fábula das Abelhas as satisfações de amanhã são absolutamente indispensáveis para justificar as privações de hoje É curioso e digno de nota que a sabedoria popular só pareça perceberse desta perplexidade final no caso dos investimentos públicos quando por exemplo se trata da construção de estradas de habitações ou algo semelhante Apresentase comumente como objeção aos planos tendentes a aumentar o emprego por meio de investimentos patroci nados pela autoridade pública o fato de que assim estão sendo criadas dificuldades para o futuro Que faremos perguntase quando tiver mos construído todas as casas estradas prefeituras redes de energia elétrica sistemas de distribuição de água e outras instalações de que possa necessitar a população estacionária do futuro Há contudo mais dificuldades em compreender que o mesmo inconveniente se apresenta no caso dos investimentos privados e da expansão industrial particu larmente com a última desde que é muito mais fácil prever a próxima saturação das necessidades de novas fábricas e equipamentos que iso ladamente absorvem pouco dinheiro do que a procura de construções para moradia O obstáculo que se antepõe a um claro entendimento destas ques KEYNES 125 tões parece constituirse como sucede na maioria das discussões aca dêmicas sobre o capital de uma apreciação inadequada do fato de que o capital não é uma entidade que subsista por si mesma independen temente do consumo Pelo contrário cada enfraquecimento na propen são a consumir considerada hábito permanente leva a demanda de capital a enfraquecerse juntamente com a demanda de consumo OS ECONOMISTAS 126 CAPÍTULO 9 A Propensão a Consumir II Os Fatores Subjetivos I Restanos examinar a segunda categoria de fatores que afetam o montante do consumo de uma renda a saber as forças subjetivas e sociais que determinam o montante dos gastos depois de conhecidos a renda agregada medida em unidades de salário e os fatores ob jetivos relevantes já analisados Como a análise desses fatores não levanta nenhum problema novo talvez seja suficiente enumerar os mais importantes sem entrarmos em maiores considerações a seu respeito Há em geral oito motivos ou fins importantes de caráter subjetivo em virtude dos quais os indivíduos se abstêm de gastar sua renda i constituir uma reserva para fazer face a contingências im previstas ii prepararse para uma relação futura prevista entre a renda e as necessidades do indivíduo e sua família diferente da que existe no momento como por exemplo no que diz respeito à ve lhice à educação dos filhos ou ao sustento das pessoas depen dentes iii beneficiarse do juro e da valorização isto é porque um consumo real maior em data futura é preferível a um consumo imediato mais reduzido iv desfrutar de um gasto progressivamente crescente satis fazendo assim um instinto normal que leva os homens a encarar a perspectiva de um nível de vida que melhore gradualmente de preferência ao contrário mesmo que a capacidade de satisfação tenda a diminuir v desfrutar de uma sensação de independência ou do poder 127 de fazer algo mesmo sem idéia clara ou intenção definida da ação específica vi garantir uma masse de manoeuvre para realizar projetos especulativos ou econômicos vii legar uma fortuna viii satisfazer a pura avareza isto é inibirse de modo irracional mas persistente de realizar qualquer ato de despesa como tal Estes oito motivos podem ser chamados de Precaução Previdên cia Cálculo Melhoria Independência Iniciativa Orgulho e Avareza também poderíamos formular uma lista de motivos para consumir tais como Prazer Imprevidência Generosidade Irreflexão Ostentação e Extravagância Além das poupanças acumuladas pelos indivíduos há também uma grande proporção de rendas variável talvez numa comunidade industrial moderna como a GrãBretanha ou os Estados Unidos entre um e dois terços da acumulação total que é retida pelos Governos centrais ou locais por instituições e por empresas comerciais por motivos muito semelhantes mas não idênticos aos que animam os indivíduos e mais particularmente pelos quatro seguintes i o motivo de empresa conseguir recursos para realizar um novo investimento de capital sem contrair dívida ou recorrer ao capital do mercado ii o motivo de liquidez garantir recursos líquidos para enfrentar as emergências dificuldades e crises iii o motivo de melhoria assegurar um aumento gradual de renda que incidentalmente isentará os dirigentes da crítica visto que no aumento da renda é difícil distinguir o que resulta da acumulação do que provém da eficiência iv o motivo da prudência financeira e a preocupação de se sentir seguro pela constituição de uma reserva financeira que exceda o custo de uso e o custo suplementar de modo que liquide os débitos e que amortize o custo do ativo a um ritmo antes superior do que inferior ao ritmo real de desgaste e obsolescência dependendo a força deste motivo sobretudo da quantidade e da natureza do equipamento de capital e da rapidez do progresso técnico A estes motivos que tendem a excluir do consumo uma parte da renda correspondem outros que às vezes provocam um excedente do consumo sobre a renda Vários dos motivos que favorecem uma poupança positiva enumerados antes e que afetam os indivíduos OS ECONOMISTAS 128 têm sua contrapartida na poupança negativa em data posterior como sucede por exemplo com a poupança feita para prover às necessi dades da família ou da velhice O auxílio de desemprego financiado por empréstimos deve ser considerado de preferência uma poupança negativa Agora a força de todos estes motivos varia enormemente segundo as instituições e a organização da sociedade econômica que presumimos segundo os hábitos devidos à raça à educação às convenções à religião e às atitudes morais correntes segundo as esperanças atuais e a ex periência passada segundo a escala e a técnica do equipamento de capital segundo a forma prevalecente da distribuição da riqueza e os níveis de vida estabelecidos Todavia na tese que constitui o objetivo desta obra não nos ocuparemos exceto em digressões ocasionais dos resultados das mudanças sociais de longo prazo nem dos lentos efeitos do progresso secular Isso significa que daremos por aceita a base dos motivos subjetivos que levam respectivamente a poupar e a consumir Na medida em que a distribuição da riqueza é determinada pela es trutura social mais ou menos permanente da comunidade podemos igualmente considerar essa base um fator que só varia em ritmo lento e no curso de um longo período o que também daremos por aceito no presente estudo II Considerando portanto que a base principal das forças subjetivas e sociais muda lentamente enquanto por outro lado a influência a curto prazo nas alterações da taxa de juros e outros fatores subjetivos é no mais das vezes de importância secundária somos levados a con cluir que as variações de curto prazo no consumo dependem em grande parte das alterações do ritmo com que se ganham as rendas medidas em unidades de salário e não das variações na propensão a consumir uma parte de determinada renda Devemos no entanto precavernos contra um malentendido O que ficou dito acima significa que a influência de variações moderadas na taxa de juro sobre a propensão a consumir é geralmente pequena Não significa que as variações na taxa de juros tenham apenas uma influência limitada sobre as quantias realmente poupadas ou consu midas Pelo contrário a influência dessas variações sobre o montante realmente poupado é de primordial importância mas se exerce em direção oposta à que geralmente lhe é atribuída Mesmo se a atração de uma renda futura maior a ser obtida de uma elevação da taxa de juros tiver por conseqüência diminuir a propensão a consumir podemos estar certos de que uma elevação da mesma taxa de juros resulta numa redução da quantia realmente poupada Com efeito a poupança KEYNES 129 agregada depende do investimento agregado e a elevação da taxa de juros se não for compensada por uma elevação correspondente na es cala da procura de investimento fará baixar o investimento portanto uma elevação da taxa de juros terá por efeito baixar as rendas a um nível em que a diminuição da poupança iguala a do investimento Em se considerando que em valor absoluto as rendas diminuem mais que o investimento é indubitável que o consumo diminui quando a taxa de juros aumenta Isso porém não quer dizer que a margem da pou pança fique por isso acrescida Ao contrário a poupança e o dispêndio sofrerão ambos uma diminuição Desse modo ainda que uma elevação na taxa de juros possibilite à comunidade maior poupança com determinada renda podese ter a certeza de que a elevação da taxa de juros se não ocorrer nenhuma mudança favorável na escala da procura de investimento fará diminuir o próprio montante agregado da poupança A mesma linha de raciocínio pode mesmo nos dizer em quanto coet par um aumento da taxa de juros fará diminuir as rendas Isso porque as rendas para uma propensão a consumir terão de baixar ou serem redistribuídas um montante exatamente suficiente para diminuir as poupanças numa soma igual à que a taxa de juros provocaria de diminuição do inves timento para um esquema de eficiência marginal do capital Um exame detido dessa questão será objeto do capítulo seguinte A elevação da taxa de juros poderia induzirnos a poupar mais se as nossas rendas permanecessem invariáveis Se essa elevação da taxa de juros retarda o investimento porém nossas rendas não ficarão nem poderão continuar inalteráveis Elas têm de baixar forçosamente até que o declínio da capacidade de poupar seja suficiente para com pensar o estímulo correspondente ocasionado por uma taxa de juros mais alta Quanto mais virtuosos quanto mais resolutamente frugais e mais obstinadamente ortodoxos formos em nossas finanças particu lares e nacionais mais terão de baixar as nossas rendas quando o juro subir proporcionalmente à eficiência marginal do capital A obstinação só nos trará um castigo e jamais uma recompensa pois o resultado é inevitável Com toda certeza portanto os montantes reais da poupança e do consumo agregados não dependem da Precaução da Previdência do Cálculo da Melhoria da Independência da Iniciativa do Orgulho ou da Avareza A virtude e o vício não têm papel a desempenhar Tudo depende da medida com que a taxa de juros seja favorável ao inves timento levandose em conta a eficiência marginal do capital84 Não OS ECONOMISTAS 130 84 Em algumas passagens desta seção antecipamos idéias que só serão desenvolvidas no Livro Quarto isso não é uma afirmação exagerada Se a taxa de juros fosse governada de tal modo que mantivesse continuamente o pleno emprego a virtude tomaria sua posição dominante a taxa de acumulação do capital de penderia da debilidade da propensão a consumir Assim mais uma vez o tributo que os economistas clássicos prestam à virtude é uma conseqüência da sua disfarçada hipótese de que a taxa de juros é sempre governada desse modo KEYNES 131 CAPÍTULO 10 A Propensão Marginal a Consumir e o Multiplicador Demonstramos no capítulo 8 que o emprego só pode aumentar pari passu com o investimento a não ser que haja uma mudança na propensão a consumir Podemos levar esta idéia um pouco mais adiante pois em dadas circunstâncias é possível estabelecer uma relação de finida que chamaremos multiplicador entre a renda e o investimento e sujeita a algumas simplificações entre o emprego total e o emprego diretamente ligado ao investimento a que chamaremos emprego pri mário Este passo adiante constitui parte integrante da nossa teoria do emprego visto que dada a propensão a consumir estabelece uma relação precisa entre o fluxo de investimento e os volumes agregados do emprego e da renda O conceito de multiplicador foi introduzido pela primeira vez na teoria econômica por R F Kahn em seu artigo versando sobre The Relation of Home Investment to Unemployment Economic Journal junho de 1931 Seu raciocínio nesse artigo de pendia da noção fundamental de que se a propensão a consumir em várias circunstâncias hipotéticas bem como em algumas outras con dições for dada como aceita e se supormos que a autoridade monetária ou outra autoridade pública tomem medidas para estimular ou retrair o investimento a variação do volume de emprego será função da va riação líquida do montante do investimento pretendia ainda estabe lecer princípios gerais para calcular a relação quantitativa real entre o incremento do investimento líquido e o aumento de emprego agregado que o acompanha Todavia antes de chegar ao multiplicador convém introduzir o conceito de propensão marginal a consumir I As flutuações da renda real consideradas neste livro são as que resultam da aplicação de diferentes quantidades de emprego isto é de unidades de trabalho a dado equipamento de capital de tal modo que a renda real aumenta e diminui conforme o número de unidades 133 de trabalho empregadas Se como geralmente admitimos houver um retorno decrescente marginal quando o número de unidades de trabalho aplicadas a certo equipamento de capital aumenta a renda medida em unidades de salário aumentará mais que proporcionalmente em relação ao volume de emprego que por sua vez subirá mais que pro porcionalmente ao aumento da renda real medida se isto for possível em unidades de produção Não obstante a renda real calculada em termos de produção e a renda medida em unidades de salário aumen tarão e diminuirão conjuntamente no curto período em que o equipa mento de capital permanece virtualmente inalterado Portanto em se considerando que a renda real expressa em unidades de produção não se possa medir numericamente com exatidão convém muitas vezes considerar a renda em unidades de salário Yω um índice adequado das modificações na renda real Em certos casos não po demos desprezar o fato de que em geral Yω aumenta e diminui proporcionalmente mais que a renda real porém em outros a cir cunstância de que os dois sempre sobem e descem juntos tornaos virtualmente intercambiáveis A nossa lei psicológica normal de que no caso de aumentos e diminuições da renda real da comunidade o consumo aumenta e di minui mas não tão depressa pode portanto traduzirse sem pre cisão absoluta decerto mas apenas sujeita a reservas evidentes que se podem demonstrar facilmente e de maneira formal pelas propo sições de que Cω e Yω têm o mesmo sinal mas Yω Cω onde Cω representa o consumo medido em unidades de salário Isto significa simplesmente repetir a proposição já expressa na página 32 Definamos portanto dCω dYω como a propensão marginal a consumir Esta quantidade é de considerável importância por nos dizer como se dividirá o próximo incremento da produção entre o consumo e o in vestimento Isso porque Yω Cω Iω onde Cω e Iω são incre mentos do consumo e do investimento de maneira que podemos escrever Yω k Iω onde 1 1 k é igual à propensão marginal a consumir Chamemos a k o multiplicador de investimento Ele nos indica que quando se produz um acréscimo no investimento agregado a renda sobe num montante igual a k vezes o acréscimo do investimento II O multiplicador de Kahn é pouco diferente deste constituindo o que poderíamos chamar de multiplicador de emprego a ser designado por k visto que mede a relação do aumento de emprego total derivado de determinado incremento do emprego primário nas indústrias de OS ECONOMISTAS 134 investimento Quer dizer se o incremento do investimento Iω leva a um aumento do emprego primário N2 nas indústrias de investimento o incremento do emprego total N kN2 Não há razão em geral para supor que k k pois nada leva necessariamente a admitir que formatos das funções da oferta agregada peculiares aos diferentes tipos de indústrias sejam tais que a proporção do aumento num dos grupos de indústrias relativamente ao incremento da demanda que o provocou seja a mesma nos demais grupos de in dústrias85 Na verdade é possível facilmente imaginar casos como por exemplo quando a propensão marginal a consumir é muito diferente da propensão média tal que existiria uma presunção em favor de certa desigualdade entre Yω N e Iω N2 uma vez que haveria variações pro porcionais muito divergentes na procura de bens de consumo e de bens de investimento respectivamente Se quisermos levar em conta essas possíveis diferenças na forma das partes relevantes das funções da oferta agregada para os dois grupos de indústrias respectivamente não haverá dificuldade em reconstruir o argumento seguinte em sua forma mais generalizada Entretanto para aclarar as idéias que ele contém será conveniente considerar o caso simplificado em que k k Como conseqüência disso quando a atitude psicológica da comu KEYNES 135 85 Podese dizer de maneira mais precisa que se ee e ee são as elasticidades de emprego na indústria em conjunto e nas indústrias de bens de capital respectivamente e se N e N2 são o número de homens empregados em toda a indústria e nas de bens de capital teremos nidade a respeito do consumo é tal que induz por exemplo a consumir nove décimos de um incremento de renda86 o multiplicador k é igual a 10 e o emprego total causado por exemplo por um incremento de obras públicas será dez vezes superior ao emprego primário propor cionado pelas próprias obras públicas supondo que não haja redução de investimentos em outros setores Apenas no caso de a comunidade manter seu consumo inalterado a despeito do aumento do emprego e portanto da renda real ficará o aumento do emprego restringido ao aumento do emprego primário proporcionado pelas obras públicas Se por outro lado ela decide consumir o total de qualquer incremento da renda não haverá um equilíbrio estável e os preços subirão sem limite De acordo com as hipóteses psicológicas normais um aumento no em prego só será acompanhado por declínio do consumo se ao mesmo tempo se produzir uma alteração na propensão a consumir como resultado por exemplo da propaganda em tempo de guerra tendente a diminuir o consumo individual somente neste caso o aumento de emprego nas indústrias de investimento será acompanhado de repercussão desfavo rável sobre o emprego nas indústrias que trabalham para o consumo Isso apenas resume numa fórmula o que em termos gerais já devia ser evidente para o leitor Um incremento do investimento medido em unidades de salário só pode ocorrer se o público estiver disposto a aumentar a sua poupança computada nas mesmas unidades Co mumente falando o público não fará isso a não ser que sua renda agregada medida em unidades de salário estiver aumentando Desse modo seu esforço para consumir uma parte da renda suplementar estimulará a produção até que o novo nível e distribuição das rendas proporcione uma margem de poupança suficiente para corresponder ao maior investimento O multiplicador diz em que proporção terá de aumentar o emprego para provocar um acréscimo na renda real sufi ciente para induzir o público a realizar uma poupança adicional e é função de suas propensões psicológicas87 Se a poupança é a pílula e o consumo é a geléia a geléia extra tem de ser proporcional ao tamanho da pílula adicional Se as tendências psicológicas do público são real mente as que supomos estabelecemos aqui a lei de que o aumento de emprego consagrado ao investimento estimula necessariamente as in dústrias que produzem para o consumo determinando assim um au mento total do emprego que é um múltiplo do emprego primário exigido pelo próprio investimento Deduzse do que foi dito que se a propensão marginal a consumir não está longe da unidade as pequenas flutuações no investimento provocarão grandes variações no emprego porém ao mesmo tempo OS ECONOMISTAS 136 86 Em todo o raciocínio as quantidades serão medidas em unidades de salários 87 Embora no caso mais generalizado seja também função das condições físicas da produção nas indústrias de investimento e nas de consumo respectivamente um aumento relativamente pequeno do investimento bastará para cau sar o pleno emprego Se por outro lado a propensão marginal a con sumir está próxima de zero as pequenas flutuações do investimento ocasionarão pequenas flutuações do emprego mas ao mesmo tempo pode ser necessário um incremento considerável do investimento para produzir o pleno emprego No primeiro caso o desemprego involuntário é um mal de cura fácil embora suscetível de se agravar rapidamente se o deixarmos desenvolver No segundo caso o emprego pode ser menos instável mas tende a fixarse num nível baixo e a mostrarse refratário a qualquer remédio salvo os mais drásticos Na realidade a propensão marginal a consumir parece situarse entre esses dois extremos embora bem mais perto da unidade que de zero com o resultado de que nos encontramos em certo sentido com a pior de ambas as circunstâncias porque as flutuações no emprego são consideráveis e ao mesmo tempo para determinar o pleno emprego seria necessário um incremento de investimento demasiado grande para que se possa manejálo com fa cilidade Infelizmente as flutuações têm sido suficientes para impedir que se compreenda a natureza crônica do mal e por outro lado essa gravidade é tamanha que se torna impossível remediála sem lhe com preender a natureza Quando o pleno emprego é alcançado qualquer tentativa de au mentar ainda mais o investimento faz com que os preços tendam a subir sem limite seja qual for a propensão marginal a consumir isto é chegase a um estado de verdadeira inflação88 Até este ponto no entanto a alta dos preços será acompanhada de um aumento da renda real agregada III Até agora temonos ocupado dos acréscimos líquidos do investi mento Portanto se quisermos aplicar sem restrições o que ficou dito aos efeitos por exemplo de um incremento de obras públicas teremos de supor que esse incremento não é compensado por um decréscimo do investimento em outros setores e não há naturalmente nenhuma mudança concomitante na propensão da comunidade a consumir No artigo citado Kahn procurou sobretudo examinar as compensações que por causa da sua importância merecem ser consideradas e apresentou sugestões de estimativas quantitativas No caso concreto em que haja um aumento específico do investimento existem com efeito diversos fatores que concorrem com esse aumento para o resultado final Se por exemplo um governo emprega 100 mil homens a mais em obras públicas e o multiplicador tal como foi definido antes for 4 não há motivo para supor que o emprego agregado aumentará de 400 mil KEYNES 137 88 Cf cap 21 p 283 unidades pois semelhante política pode ter reações desfavoráveis sobre o investimento em outras direções Os fatores que se seguem segundo Kahn são os que provavel mente numa comunidade moderna devem ser levados em consideração em virtude da sua importância embora os dois primeiros não se tornem completamente inteligíveis antes que se chegue ao Livro Quarto i O método de financiar a política e o aumento de capital de giro exigido pelo emprego adicional e a alta de preços que o acompanha podem ter por efeito elevar a taxa de juros e retardar assim o inves timento em outros setores caso a autoridade monetária não tome pro vidências em contrário enquanto ao mesmo tempo a elevação dos custos dos bens de capital reduz a sua eficiência marginal para o in divíduo que investe sendo necessária uma baixa efetiva na taxa de juros para compensar esse efeito ii Dada a psicologia confusa que freqüentemente prevalece o programa do Governo pode através de seus efeitos sobre a confiança aumentar a preferência pela liquidez ou diminuir a eficiência marginal do capital o que também contribui para retardar outros investimentos se não houver medidas que o contrabalancem iii Num sistema aberto que mantém relações comerciais com o exterior parte do multiplicador do investimento suplementar bene ficiará o emprego em países estrangeiros visto que certa porção do consumo adicional reduzirá o saldo favorável do balanço externo do nosso país de modo que se considerarmos apenas o efeito sobre o emprego doméstico como distinto do emprego mundial temos de re duzir a cifra do multiplicador Por outro lado as perdas dessa natureza podem ser mais ou menos compensadas pelas repercussões favoráveis devidas à ação do multiplicador nos países estrangeiros que aumentam a sua atividade econômica Além disso se considerarmos modificações substanciais temos de levar em conta uma mudança progressiva na propensão marginal a consumir e portanto no multiplicador à medida que o acréscimo na margem se desloca gradualmente A propensão marginal a consumir não é constante para todos os níveis de emprego e é provável que em geral tenda a diminuir quando o emprego aumenta ou seja quando a renda real cresce a comunidade só desejará consumir uma parte gradualmente decrescente da mesma Além da ação da regra geral que acabamos de mencionar outros fatores poderão ainda fazer variar a propensão marginal a consumir e portanto o multiplicador e parece que estes outros fatores comu mente contribuem mais para acentuar do que para atenuar o efeito da regra geral Pois em primeiro lugar o aumento do emprego tende OS ECONOMISTAS 138 por efeito dos rendimentos decrescentes em períodos curtos a aumentar a proporção da renda agregada destinada aos empresários cuja pro pensão marginal a consumir é provavelmente inferior à média para o conjunto da comunidade Em segundo lugar o desemprego se mani festa geralmente associado a uma poupança negativa em certos setores privados ou públicos porque os desempregados podem estar vivendo tanto das suas economias pessoais como das de seus amigos como ainda do auxílio público parcialmente financiado por empréstimos com o resultado de que o reemprego diminuirá aos poucos estas formas específicas de poupança negativa reduzindo portanto a propensão marginal a consumir mais rapidamente do que o faria um acréscimo igual da renda real da comunidade obtido em circunstâncias diferentes De qualquer maneira o multiplicador será provavelmente maior para um pequeno incremento líquido do investimento do que para um grande de modo que quando se têm em vista mudanças substanciais devemos guiarnos pelo valor médio do multiplicador tomando como base o valor médio da propensão marginal a consumir na amplitude de variação em causa Kahn examinou o resultado quantitativo provável dos fatores des ta natureza em certos casos hipotéticos especiais Porém não é evi dentemente possível generalizar muito Podese dizer apenas que por exemplo numa comunidade moderna típica compondo um sistema fe chado e no qual o consumo dos desempregados é pago por transferências do consumo de outros consumidores a tendência será provavelmente de consumir não muito menos de 80 de qualquer incremento da renda real de modo que o multiplicador levando em conta as compensações talvez não se mostre muito inferior a 5 Todavia num país em que o comércio exterior representa digamos 20 do consumo e onde os de sempregados recebem por meio de empréstimos ou seu equivalente até 50 de seu consumo normal quando empregados o multiplicador pode descer até o ponto de corresponder a 2 ou 3 vezes o volume de emprego proporcionado por um investimento novo Por isso num país onde o comércio externo desempenha um papel importante e no qual o auxílio aos desempregados é financiado em larga escala por emprés timos como sucedeu por exemplo na GrãBretanha em 1931 a flu tuação do emprego que acompanha certa variação do investimento é bem menos violenta do que num país onde esses fatores são menos importantes como nos Estados Unidos em 193289 Entretanto é pelo princípio geral do multiplicador que se deve explicar como as flutuações no montante do investimento comparati vamente pequenas em proporção à renda nacional podem gerar alte KEYNES 139 89 Cf entretanto p 141 uma estimativa norteamericana rações no emprego e na renda agregada de amplitude muito maior que elas próprias IV Até agora o raciocínio vem tomando como base uma alteração do investimento agregado prevista com bastante antecipação para que as indústrias de bens de consumo progridam pari passu juntamente com as indústrias de investimento sem maior transtorno para o preço dos bens de consumo que o derivado de um aumento na quantidade produzida em condições de rendimento decrescente Todavia precisamos em geral levar em conta o caso em que a iniciativa provenha de um aumento não inteiramente previsto na pro dução dos bens de capital É evidente que uma iniciativa destas só produz todos os seus efeitos sobre o emprego depois de transcorrido certo lapso de tempo Tenho observado entretanto na discussão que este fato evidente dá muitas vezes origem a alguma confusão entre a teoria lógica do multiplicador cuja aplicação se verifica continua mente sem atraso em todos os instantes e as conseqüências de uma expansão nas indústrias de bens de capital que só atua gradualmente com atraso e após certo intervalo A relação entre estes dois fatores pode ser esclarecida observando em primeiro lugar que uma expansão imprevista das indústrias de bens de capital não se produz instantaneamente por um acréscimo de igual importância no montante agregado do investimento apenas oca siona um aumento gradual desse montante e em segundo lugar que pode criar uma divergência temporária entre a propensão marginal a consumir e o seu valor normal verificandose entretanto um gradual retorno à sua posição original Assim sendo uma expansão nas indústrias de bens de capital determina uma série de aumentos no investimento agregado que se apresentam em períodos sucessivos num certo intervalo de tempo e uma série de valores da propensão marginal a consumir durante esses períodos sucessivos que difere tanto do que teriam sido esses valores se a dita expansão houvesse sido prevista como do que serão quando a comunidade chegar a estabilizarse num novo e firme nível de in vestimento agregado Porém em cada período a teoria do multiplicador continua sendo válida no sentido de que o incremento da demanda agregada é igual ao produto do acréscimo do investimento agregado e do multiplicador determinado pela propensão marginal a consumir A explicação dessas duas ordens de fatos surge com maior clareza quando se considera o caso extremo em que o aumento de emprego nas indústrias dedicadas à produção de bens de capital é de tal maneira imprevisto que a princípio não se verifica aumento algum na produção de bens de consumo Neste caso os esforços dos que foram recentemente empregados nas indústrias de bens de capital para consumir certa OS ECONOMISTAS 140 proporção das suas rendas farão subir os preços dos bens de consumo até que se alcance um equilíbrio temporário entre a oferta e a procura causado em parte pelo adiamento do consumo provocado pela elevação dos preços em parte pela redistribuição de renda favorável às classes que poupam devido ao aumento de seus lucros gerado pelos preços altos e em parte pela depleção dos estoques causada pela elevação dos preços Na medida em que o equilíbrio se restabelece pelo adiamento do consumo apresentase uma redução temporária da propensão mar ginal a consumir isto é do próprio multiplicador e na medida em que haja uma depleção dos estoques o acréscimo do investimento agregado permanece durante certo tempo inferior ao acréscimo do investimento realizado nas indústrias de bens de capital isto é o valor a ser multiplicado não aumenta na proporção do total do investimento feito nas indústrias de bens de capital Entretanto as indústrias de bens de consumo vãose com o passar do tempo adaptando por si mesmas à nova demanda de modo que quando se realiza o consumo antes adiado a propensão marginal a consumir sobe temporariamente além do seu nível normal para compensar a baixa anterior e eventualmente retorna a seu nível normal enquanto a reconstituição dos estoques faz com que o acréscimo do investimento agregado seja temporaria mente superior ao do investimento nas indústrias de bens de capital tendo temporariamente o mesmo efeito o incremento do capital cir culante correspondente ao aumento da produção O fato de que uma mudança imprevista só exerce o seu pleno efeito sobre o emprego após certo lapso de tempo tem importância em determinados casos intervém especialmente na análise do ciclo eco nômico da maneira que indiquei em minha obra Treatise on Money Todavia não afeta de modo algum o alcance da teoria do multiplicador tal como foi exposta neste capítulo nem lhe retira a sua utilidade como indicador do aumento total do emprego que se pode esperar de uma expansão das indústrias produtoras de bens de capital Mais do que isso salvo condições em que as indústrias de consumo já estejam perto da sua capacidade total de tal modo que um aumento da produção exige outro aumento correspondente do equipamento e não simples mente um emprego mais intensivo não há razão para supor que deva decorrer mais de um curto intervalo antes que o emprego nas indústrias de bens de consumo progrida pari passu com o das indústrias de bens de capital com o multiplicador atuando perto da sua cifra normal V Vimos que quanto maior for a propensão marginal a consumir maior será o multiplicador e por conseqüência maior distúrbio causará sobre o emprego uma variação do investimento Isso parece conduzir nos à conclusão paradoxal de que uma comunidade pobre poupando apenas uma parte muito pequena de suas rendas está mais exposta KEYNES 141 a flutuações violentas do que uma comunidade rica na qual a poupança represente uma proporção maior da renda e portanto o multiplicador seja maior Esta conclusão no entanto não levaria em conta a diferença exis tente entre os efeitos da propensão marginal a consumir e os da propensão média a consumir pois enquanto uma alta propensão marginal a consumir implica um efeito proporcionalmente maior como resultado de certa per centagem de variação no investimento o efeito absoluto será todavia menor se a propensão média a consumir for também alta Isso pode ser ilustrado através do exemplo numérico apresentado a seguir Suponhamos que a propensão a consumir de uma comunidade seja tal que desde que sua renda real não exceda a produção obtida pelo trabalho de 5 milhões de homens com o equipamento de capital que possui ela consuma integralmente a dita renda que a produção resultante do emprego dos primeiros 100 mil homens adicionais seja consumida à razão de 99 a dos 100 mil seguintes à razão de 98 a dos 100 mil que vêm em terceiro lugar à razão de 97 e assim por diante e que a cifra de 10 milhões de homens represente o pleno emprego Deduzse daqui que quando 5 000 000 n 100 000 estiverem empregados o multiplicador na margem será 100 n e que nn 1 250 n por cento da renda nacional serão investidos Deste modo quando 52 milhões estão empregados o multipli cador é muito alto isto é igual a 50 mas o investimento representa apenas uma parte insignificante da renda corrente ou seja 006 com o resultado de que se o investimento diminui em grande escala digamos em dois terços o emprego só baixará até 51 milhões o que representa aproximadamente 2 Por outro lado quando estiverem empregados 9 milhões de homens o multiplicador será relativamente baixo igual a 25 porém o investimento representará agora uma parte substancial da renda corrente ou seja 9 com o resultado de que se o investimento diminui de dois terços o emprego baixará a 69 milhões isto é 19 No limite em que o investimento caia a zero o emprego baixará em cerca de 4 no primeiro caso enquanto no se gundo caso baixará a 4490 No exemplo anterior a mais pobre das duas comunidades com paradas é mais pobre por motivo de subemprego Porém o mesmo ra ciocínio se aplica mediante uma adaptação fácil caso a pobreza se deva à inferioridade da habilitação profissional da técnica ou do equi pamento Conseqüentemente embora o multiplicador seja maior numa OS ECONOMISTAS 142 90 O volume de investimento acima mediuse pelo número de homens empregados em realizálo Desse modo se os rendimentos por unidade de emprego decrescem à medida que o emprego aumenta o que é o dobro do montante da inversão na escala anterior será menos do dobro na escala física supondo que ela exista comunidade pobre o efeito das variações do investimento sobre o em prego será muito maior numa comunidade rica supondo que nesta o investimento corrente representa uma proporção muito mais elevada da produção corrente91 É evidente pelas observações anteriores que o emprego de certo número de homens em obras públicas produzirá nas hipóteses consi deradas sobre o emprego agregado um efeito muito maior quando o desemprego for severo do que mais tarde quando o pleno emprego estiver prestes a ser alcançado No exemplo apresentado se no momento em que o emprego desceu a 52 milhões se empregarem nas obras públicas mais 100 mil homens o emprego total subirá a 64 milhões Mas se o emprego já é de 9 milhões quando se usarem mais 100 mil homens nos mesmos trabalhos o emprego total apenas subirá a 92 milhões Assim em tempos de desemprego rigoroso as obras públicas ainda que de duvidosa utilidade podem ser altamente compensadoras mesmo que apenas pelo menor custo dos gastos de assistência desde que se possa admitir que a parte poupada da renda seja menor quanto mais intenso for o desemprego porém a validade desta proposição tor nase cada vez mais contestável à medida que nos aproximamos do pleno emprego Além disso se for correta a nossa hipótese de que a propensão marginal a consumir diminui constantemente à medida que nos aproximamos do pleno emprego deduzse que se torna cada vez mais difícil alcançar novos aumentos do emprego através de investi mentos crescentes Não seria difícil compor um gráfico da propensão marginal a consumir em cada etapa do ciclo econômico com as estatísticas supondo que estivessem disponíveis da renda agregada e do investimento agre gado em datas sucessivas No momento contudo as nossas estatísticas não são bastante exatas ou compiladas com esse objetivo específico para nos permitirem mais do que estimativas aproximadas As melho res para esta finalidade das quais tenho conhecimento são as cifras apresentadas por Kuznets relativas aos Estados Unidos já mencio nadas na página 123 embora bastante incompletas Tomadas junta mente com os cálculos da renda nacional indicam sem que se leve KEYNES 143 91 De modo mais geral a relação entre a variação proporcional na demanda total e a ocorrida no investimento é em conta os seus méritos tanto uma cifra menor como mais estável para o multiplicador de investimento do que eu esperaria Se tomarmos anos isolados o resultado é ainda mais incongruente Se os juntarmos porém aos pares o multiplicador parece ter sido inferior a 3 e pro vavelmente bastante estável ao redor de 25 Isto sugere uma propen são marginal a consumir não maior do que 60 a 70 cifra perfeitamente admissível para o período de expansão mas surpreendentemente pe quena e no meu entender pouco verossímil em período de crise Talvez isto se explique pelo extremado conservadorismo da política financeira das empresas americanas mesmo durante a crise Por outras palavras se houver uma enorme queda de investimento devido à ausência de trabalhos de reparação de substituição e se for constituída uma reserva financeira para compensar este desajuste o efeito será impedir o cres cimento que teria ocorrido na propensão marginal a consumir cresci mento esse que de outra maneira teria acontecido Pareceme que este fator talvez tenha desempenhado um papel importante no agra vamento da recente crise nos Estados Unidos Aliás é possível que as estatísticas exagerem de certo modo o declínio do investimento que em geral se avalia em mais de 75 entre 1929 e 1932 ao passo que a queda da formação líquida do capital foi de mais de 95 uma ligeira diferença nestas estimativas pode modificar substancialmente o multiplicador VI Quando existe desemprego involuntário a desutilidade marginal do trabalho é necessariamente menor que a utilidade do produto mar ginal Na realidade pode ser muito menor pois certa quantidade de trabalho para um homem que esteve muito tempo desempregado em vez de desutilidade pode ter utilidade positiva Admitindo isto o ra ciocínio anterior demonstra como os gastos inúteis provenientes de empréstimos92 podem apesar disso enriquecer no fim de contas a co munidade A construção de pirâmides os terremotos e até as guerras podem contribuir para aumentar a riqueza se a educação dos nossos estadistas nos princípios da economia clássica for um empecilho a uma solução melhor É curioso ver como o bom senso popular em seus esforços para fugir a conclusões absurdas pôde chegar a preferir as formas e gastos OS ECONOMISTAS 144 92 É muitas vezes conveniente usar a expressão despesas com empréstimos para designar tanto o investimento público financiado por empréstimos de indivíduos como qualquer outro gasto público corrente coberto pelo mesmo meio Estritamente falando este último deveria ser considerado uma poupança negativa mas a política oficial nesta matéria não obedece a motivos psicológicos análogos aos que governam a poupança privada A expressão despesas com empréstimos é por isso conveniente para designar o produto líquido dos empréstimos contraídos pelas autoridades públicas seja em conta de capital ou em conta para cobrir um déficit orçamentário A primeira dessas formas de despesas de empréstimos atua no sentido de aumentar o investimento e a segunda de elevar a propensão a consumir de empréstimos totalmente inúteis às que apenas o são parcialmente e que por não serem completamente desprovidas de utilidade tendem a ser julgadas à luz de princípios estritamente econômicos Por exem plo o auxílio aos desempregados financiado por empréstimo é mais facilmente aceito que financiamento de melhorias a um custo inferior à taxa de juros corrente e a solução de abrir buracos no chão conhecida pelo nome de mineração de ouro que não acrescenta nada à riqueza real do mundo e ainda supõe a desutilidade do trabalho é a mais aceitável de todas Se o Tesouro se dispusesse a encher garrafas usadas com papel moeda as enterrasse a uma profundidade conveniente em minas de carvão abandonadas que logo fossem cobertas com o lixo da cidade e deixasse à iniciativa privada de acordo com os bem experimentados princípios do laissezfaire a tarefa de desenterrar novamente as notas naturalmente obtendo o direito de fazêlo por meio de concessões sobre o terreno onde estão enterradas as notas o desemprego poderia de saparecer e com a ajuda das repercussões é provável que a renda real da comunidade bem como a sua riqueza em capital fossem sen sivelmente mais altas do que na realidade o são Claro está que seria mais ajuizado construir casas ou algo semelhante mas se tanto se opõem dificuldades políticas e práticas o recurso citado não deixa de ser preferível a nada Entre este expediente e o da exploração das minas de ouro do mundo real a analogia é completa Nos períodos em que o ouro é encontrado a profundidades convenientes a experiência ensina que a riqueza real do mundo aumenta rapidamente e quando ele só é en contrável em pequenas quantidades a riqueza permanece estável ou mesmo diminui Desse modo as minas de ouro são do mais alto valor e importância para a civilização Da mesma forma que as guerras têm sido a única forma de gastos com empresários em grande escala que os estadistas acharam justificável a extração de ouro é o único pretexto para abrir buracos no chão que os banqueiros consideram uma atitude financeira saudável e cada uma destas atividades representou o seu papel no progresso pelo fato de não se encontrar uma solução melhor Um detalhe a ser assinalado é a tendência do preço de o ouro subir em termos de mãodeobra e de materiais durante as depressões aju dando a eventual recuperação porque aumenta a profundidade da mi neração e diminui a qualidade do minério capaz de ser custeável Além do efeito provável da crescente oferta de ouro sobre a taxa de juros há dois motivos para que a extração de ouro seja uma forma altamente recomendável de investimento se não pudermos aumentar o emprego por meios que ao mesmo tempo elevem os nossos estoques de riqueza útil Em primeiro lugar em virtude da atração especulativa dessa espécie de investimento há a tendência de o realizar sem levar muito em conta a taxa de juros vigente Em segundo lugar o seu KEYNES 145 resultado ou seja o aumento do estoque de ouro não tem como em outros casos de investimento o efeito de lhe reduzir a utilidade mar ginal Desde que o valor de uma casa depende de sua utilidade cada casa que se construa tende a reduzir a renda provável que se pode obter das futuras construções e portanto diminui o atrativo de futuros investimentos similares a não ser que a taxa de juros baixe pari passu A extração do ouro não apresenta o mesmo inconveniente e só pode so brevir um impedimento através de uma alta taxa de salários medida em ouro o que é pouco provável acontecer a não ser que o emprego se tenha tornado substancialmente maior Além disso em virtude das reservas constituídas a título do custo de uso e do custo suplementar como no caso de riquezas menos duráveis não há um efeito reverso posterior O antigo Egito tinha a dupla vantagem que sem dúvida explica a sua fabulosa riqueza de possuir duas espécies de atividades a cons trução de pirâmides e a extração de metais preciosos cujos frutos pelo fato de não servirem às necessidades do homem pelo seu consumo não se aviltavam por serem abundantes A Idade Média edificou ca tedrais e entoou cânticos Duas pirâmides duas missas de réquiem valem duas vezes mais que uma o que porém não é verdade tra tandose de duas estradas de ferro que ligam Londres a York Destarte assim nos mostramos tão razoáveis e nos educamos de modo tão se melhante aos financistas prudentes meditando bem antes de aumentar as cargas financeiras das futuras gerações pela edificação das casas onde se pode viver que já nos não é tão fácil escapar aos inconvenientes do desemprego Temos de aceitar esse fato como o resultado inevitável de aplicar à conduta do Estado as máximas concebidas para enrique cer um indivíduo permitindolhe acumular direitos a satisfações que ele não tenciona exercer em qualquer época determinada OS ECONOMISTAS 146 CAPÍTULO 11 A Eficiência Marginal do Capital I Quando um indivíduo obtém um investimento ou um bem de capital adquire o direito ao fluxo de rendas futuras que espera obter da venda de seus produtos enquanto durar esse capital feita a dedução das despesas correntes necessárias à obtenção dos ditos produtos Con vém chamar a essa série de anuidades Q1 Q2 Qn renda esperada do investimento Em contraste com a renda esperada do investimento temos o preço de oferta do bem de capital querendo dizer com esta expressão não o preço de mercado ao qual pode comprarse efetivamente no mo mento um bem desse tipo mas o preço que bastaria exatamente para induzir um fabricante a produzir uma nova unidade suplementar desse capital isto é aquilo a que por vezes se chama custo de reposição A relação entre a renda esperada de um bem de capital e seu preço de oferta ou custo de reposição isto é a relação entre a renda esperada de uma unidade adicional daquele tipo de capital e seu custo de pro dução dános a eficiência marginal do capital desse tipo Mais preci samente defino a eficiência marginal do capital como sendo a taxa de desconto que tornaria o valor presente do fluxo de anuidades das rendas esperadas desse capital durante toda a sua existência exatamente igual ao seu preço de oferta Isto nos dá as eficiências marginais dos diferentes tipos de bens de capital A mais alta destas eficiências mar ginais pode então ser considerada a eficiência marginal do capital em geral O leitor notará que a eficiência marginal do capital é definida aqui em termos da expectativa da renda e do preço de oferta corrente do bem de capital Ela depende da taxa de retorno que se espera obter do dinheiro investido num bem recentemente produzido e não do re 149 sultado histórico obtido por um investimento em relação a seu custo original quando examinado retrospectivamente ao fim de sua vida Quando o investimento em dado tipo de capital aumenta durante certo período a eficiência marginal desse capital diminui à medida que o investimento aumenta em parte porque a renda prospectiva baixará conforme suba a oferta desse tipo de capital e em parte porque a pressão sobre as fábricas produtoras daquele dado tipo de capital causará normalmente uma elevação de seu preço de oferta sendo que o segundo destes fatores é geralmente o mais importante para estabelecer o equilíbrio no curto prazo embora quanto mais longo for o período que se considere maior importância adquire o primeiro fator Podemos assim criar para cada tipo de capital uma escala mostrando a proporção em que deverá aumentar o investimento nesse capital durante o período para que a sua eficiência marginal baixe para de terminado nível Podemos depois agregar essas escalas de todos os diferentes tipos de capital de modo que se obtenha outra escala que relacione a taxa de investimento agregado com a correspondente efi ciência marginal do capital em geral que aquela taxa de investimento estabelecerá Chamaremos a isto de curva da demanda por investimento ou alternativamente a curva da eficiência marginal do capital Tornase portanto evidente que a taxa efetiva de investimento corrente tende a aumentar até o ponto em que não haja mais nenhuma classe de bem de capital cuja eficiência marginal exceda a taxa de juros corrente Em outras palavras o investimento vai variar até aquele ponto da curva de demanda de investimento em que a eficiência mar ginal do capital em geral é igual à taxa de juros do mercado93 Esta idéia pode também ser expressa da maneira que segue Se Qr for o retorno esperado de um ativo no tempo r e dr for o valor presente de 1 libra diferido por r anos à taxa corrente de juros ΣQrdr é o preço de demanda do investimento e este será efetuado até o ponto em que ΣQrdr se torne igual ao preço da oferta do investimento na forma como foi definido antes Se por outro lado ΣQrdr for menor que o preço de oferta não haverá investimento corrente no bem considerado Seguese que o incentivo para investir depende em parte da curva de demanda por investimento e em parte da taxa de juros Só no final do Livro Quarto será possível ter uma visão global dos fatores que determinam a taxa de investimento em sua real complexidade Contudo peço ao leitor tomar nota desde já de que nem o conhecimento OS ECONOMISTAS 150 93 Para maior simplicidade de exposição omiti o fato de que estamos tratando com uma complexidade de taxas de juros e de descontos correspondentes aos diferentes períodos que devem transcorrer antes que surjam os diversos retornos esperados dos ativos porém não é difícil reformular o argumento a fim de cobrir esse ponto do retorno esperado de um ativo nem o conhecimento da sua eficiência marginal nos permitem deduzir a taxa de juros ou o valor presente desse ativo Temos de determinar a taxa de juros em alguma outra fonte e só então poderemos avaliar o bem capitalizando a sua renda prospectiva II Como se relaciona a definição anterior da eficiência marginal do capital com a linguagem corrente A Produtividade a Renda a Efi ciência ou a Utilidade Marginais do capital são termos familiares que temos empregado com freqüência Não é fácil porém encontrar na literatura econômica uma exposição clara do sentido que os economistas lhes têm geralmente querido atribuir Há pelo menos três ambigüidades a esclarecer A primeira dessas ambigüidades é a de saber se o que nos interessa é o incremento da produção física por unidade de tempo que resulta do emprego suple mentar de uma unidade física de capital ou o incremento em valor que resulta do emprego adicional de uma unidade de valor de capital No primeiro caso a definição da unidade física de capital causa difi culdades que me parecem ao mesmo tempo insolúveis e desnecessárias Naturalmente podese dizer que dez trabalhadores colherão mais trigo numa área determinada se puderem recorrer ao uso de certas máquinas adicionais mas não vejo meio algum de reduzir esta idéia a uma ex pressão aritmética inteligível que não traga consigo a noção de valor Contudo numerosas discussões sobre este tema parecem referirse principalmente à produtividade física do capital embora os autores não logrem fazerse claros Em segundo lugar vem a questão de saber se a eficiência mar ginal do capital é uma quantidade absoluta ou uma proporção Os contextos em que ela aparece e o costume de a tratar como se ela tivesse a mesma dimensão que a taxa de juros parecem requerer que ela seja uma proporção Todavia não é geralmente indicado claramente quais são os termos desta proporção Resta por fim uma distinção cuja negligência tem sido a causa principal de confusão e equívocos entre o incremento de valor que se pode obter usando uma quantidade adicional de capital na situação existente e a série de incrementos que se espera obter através de todo o período de utilização do bem de capital adicional isto é a distinção entre Q1 e a série complexa Q1 Q2Qr Este aspecto envolve toda a questão do papel das expectativas na teoria econômica A maioria das discussões sobre a eficiência marginal do capital parece desconsi derar os outros termos da série excetuandose Q1 Tal posição porém só poderia justificarse numa teoria estática em que todos os valores de Q fossem iguais A teoria usual da distribuição na qual se supõe que o capital obtém no presente valor igual à sua produtividade mar KEYNES 151 ginal num sentido ou no outro só é válida numa situação estacionária A renda agregada corrente do capital não tem relação direta com a sua eficiência marginal ao passo que a sua renda corrente na margem de produção isto é retorno do capital que entra no preço de oferta da produção é o seu custo marginal de uso que também não tem relação imediata com a sua eficiência marginal Há como já disse anteriormente uma evidente falta de esclare cimento sobre o assunto Ao mesmo tempo estou convencido de que a definição que apresentei acima se aproxima bastante da acepção que Marshall deu ao termo A expressão utilizada por Marshall é eficiência marginal líquida de um fator de produção ou alternativamente a utilidade marginal do capital O que segue é um resumo das passagens mais relevantes que pude encontrar em sua obra Principles 6ª ed pp 519520 Reuni algumas sentenças que não são contíguas no livro para destacar a essência de seu pensamento Em certa fábrica podemse empregar 100 libras esterlinas adicionais de maquinário de modo que não acarrete nenhum outro gasto suplementar e acrescentar 3 libras anuais de valor à pro dução líquida dessa fábrica feitas as deduções correspondentes ao seu uso e desgaste Se os investidores de capital aplicarem esse montante em qualquer uso que apresente perspectivas de lucro alto e se uma vez feito o investimento e encontrado o equilíbrio ainda compensar o emprego desse maquinário pode mos deduzir que a taxa anual de juros é de 3 Os exemplos desta espécie somente indicam porém parte da influência das grandes causas que governam o valor Não se pode sem raciocinar em círculo vicioso servirse deles para construir uma teoria da taxa de juros ou mesmo uma teoria dos salários Suponhamos que a taxa de juros de certos papéis absolutamente garantidos seja de 3 ao ano e que a indústria chapeleira absorva o capital de 1 milhão de libras Isto significa que a indústria de chapéus até a quantia de 1 milhão de libras está em condições de tirar do capital um lucro suficiente para pagar pela sua utilização o juro líquido de 3 ao ano em vez de prescindir dele Pode haver maquinário de que a indústria se negue a prescindir se a taxa de juros for de 20 ao ano Se a taxa houvesse sido de 10 mais maquinário teria sido empregado se fosse de 6 mais ain da mais ainda se fosse de 4 e finalmente sendo de 3 utiliza maquinário ainda em maior quantidade Quando esse volume de maquinário é empregado a sua eficiência marginal i é a utilidade desse maquinário que exatamente vale a pena usar medese por 3 É evidente pelo que foi visto acima que Marshall estava per feitamente ciente do fato de que nos envolvemos num círculo vicioso OS ECONOMISTAS 152 quando tentamos determinar por semelhante raciocínio o valor efetivo da taxa de juros94 Neste trecho parece aceitar o ponto de vista antes exposto segundo o qual a taxa de juros determina o montante que o investimento novo tende a alcançar dada a curva da eficiência marginal do capital Se a taxa de juros for de 3 significa isto que ninguém pagará 100 libras por uma máquina a não ser que espere acrescentar 3 libras à sua produção anual líquida depois deduzidos os custos de uso e de depreciação No capítulo 14 porém veremos que Marshall foi menos cauteloso em outros pontos embora recuasse quando o raciocínio o levava a um terreno incerto Embora não lhe chame eficiência marginal do capital o Pro fessor Irving Fisher deu na sua Theory of Interest 1930 uma definição daquilo que denomina a taxa de rendimento em relação ao custo definição essa idêntica à minha A taxa de rendimento em relação ao custo diz ele95 é a taxa que usada para medir o valor presente de todos os custos e de todos os rendimentos torna essas duas quantidades iguais O professor Fisher explica que a expansão dos investimentos em qualquer sentido dependerá de uma comparação entre a taxa de rendimento em relação ao custo e à taxa de juros Para induzir inves timentos novos a taxa de rendimento em relação ao custo deve ser superior à taxa de juros96 Esta nova grandeza ou fator representa em nosso estudo o papel principal do lado referente às oportunidades de investimento da teoria do juro97 Portanto o professor Fisher usa a sua taxa de rendimento em relação ao custo no mesmo sentido e com o mesmo objetivo que eu empreguei a eficiência marginal do capital III A confusão mais importante quanto à importância e ao significado da eficiência marginal do capital advém do fato de não se ter com preendido que ela depende também da renda esperada do capital e não apenas da sua renda corrente Isso pode ser melhor ilustrado in dicandose o efeito sobre a eficiência marginal do capital que tem a expectativa de modificações no custo prospectivo de produção quer se esperem essas mudanças como resultado de alterações no custo do trabalho isto é na taxa de salário quer de invenções e técnicas novas A produção obtida com o equipamento fabricado hoje terá de competir enquanto durar com a do equipamento fabricado mais tarde talvez a um custo menor em trabalho talvez com uma técnica melhor que pos sibilite vender sua produção a preços menores e a aumente em quan KEYNES 153 94 Mas não estaria ele enganado ao supor que a teoria da produtividade marginal dos salários é igualmente um círculo vicioso 95 Op cit p 168 96 Op cit p 159 97 Op cit p 155 tidade até que seu preço tenha descido ao mínimo satisfatório Além disso o lucro do empresário em termos monetários advindo do equi pamento velho ou novo será reduzido se todo o produto vier a ser produzido de modo mais barato À medida que tais desenvolvimentos pareçam prováveis ou mesmo apenas possíveis a eficiência marginal do capital produzido no presente diminui apropriadamente Este é o fator através do qual a expectativa de modificações no valor da moeda influi sobre o volume da produção presente A expec tativa de uma baixa no valor da moeda estimula o investimento e em conseqüência o emprego em geral porque eleva a curva da eficiência marginal do capital isto é a escala da demanda de investimentos a expectativa de uma alta no valor da moeda produz ao contrário efeito depressivo porque reduz a escala da eficiência marginal do capital Esta é a verdade implícita na teoria do professor Irving Fisher originalmente chamada Appreciation and Interest Valorização e Juro ou seja a distinção entre a taxa nominal e a taxa real de juros pela qual a segunda se iguala à primeira depois de devidamente corrigida para atender às variações no valor da moeda É difícil encontrar um sentido na teoria assim apresentada pois não está claro se a mudança no valor da moeda está ou não sendo suposta como esperada Não há como escapar do dilema de que se a mudança não é prevista nenhum efeito terá sobre os negócios correntes ao passo que se for prevista os preços das mercadorias se ajustarão tão depressa e de tal maneira que as vantagens de reter moeda e mercadorias se igualam novamente e será tarde demais para que os detentores de moeda possam ganhar ou sofrer uma alteração na taxa de juros que compense a variação esperada no valor do dinheiro emprestado no decorrer da duração do empréstimo Tampouco o professor Pigou conseguiu escapar desse di lema através do expediente de supor que a variação esperada no valor da moeda é prevista por um grupo de pessoas e não por outro O erro consiste em supor que as variações esperadas no valor da moeda atuam diretamente sobre a taxa de juros em vez de fazêlo sobre a eficiência marginal de determinado volume de capital Os preços dos bens existentes sempre se ajustarão às mudanças nas expectativas concernentes ao valor esperado da moeda A importância de tais mu danças nas expectativas reside nos seus efeitos sobre a rapidez de se produzir novos bens através da sua reação sobre a eficiência marginal do capital A expectativa da elevação dos preços tem um efeito esti mulante não porque faça subir a taxa de juros o que seria um modo paradoxal de estimular a produção à medida que a taxa de juros sobe o estímulo é neutralizado na mesma extensão mas porque eleva a eficiência marginal de determinado volume de capital Se a taxa de juros subisse pari passu com a eficiência marginal do capital a expec tativa da alta de preços não teria efeitos estimulantes pois o estímulo à produção depende do aumento da eficiência marginal de certo volume OS ECONOMISTAS 154 de capital relativamente à taxa de juros Haveria decerto vantagem em refazer a teoria do professor Fisher em termos de uma taxa real de juros definida como sendo a taxa de juros que subseqüente a uma variação no estado da expectativa quanto ao valor futuro da moeda devesse prevalecer de modo que essa variação não exercesse nenhuma influência sobre a produção corrente98 Convém notar que a expectativa de uma queda futura na taxa de juros terá por efeito fazer baixar a escala da eficiência marginal do capital pois significa que a produção resultante do equipamento criado hoje terá de competir durante parte de sua vida com a produção proveniente de equipamento a que bastará uma retribuição menor Esta expectativa não terá grande efeito depressivo pois as expectativas que se fazem relativamente ao complexo das taxas de juros para di ferentes prazos que prevalecerão no futuro se refletirão em parte no complexo das taxas de juros que prevalecem hoje Não obstante poderá verificarse certo efeito depressivo pois pode ser que no período final da vida do equipamento fabricado hoje a produção obtida por seu intermédio tenha de concorrer com a produção de um equipamento muito mais novo ao qual é bastante uma retribuição menor em virtude de taxa de juros menor que prevalece nos períodos seguintes ao término da duração do equipamento produzido hoje É importante compreender a dependência que há entre a eficiên cia marginal de determinado volume de capital e as variações na ex pectativa pois é principalmente esta dependência que torna a eficiência marginal do capital sujeita a certas flutuações violentas que explicam o ciclo econômico No capítulo 22 veremos que a alternância da expansão e da depressão pode ser descrita e analisada em termos das flutuações da eficiência marginal do capital relativamente à taxa de juros IV Dois tipos de riscos comumente não diferenciados mas que devem ser distinguidos afetam o volume do investimento O primeiro é o risco do empresário ou o risco do tomador do empréstimo e surge das dúvidas que o mesmo tem quanto à probabilidade de conseguir real mente a retribuição que espera Quando alguém aventura o próprio dinheiro esse é o único risco que é relevante Mas quando existe um sistema de conceder empréstimos e de tomar emprestado e com isso pretendo designar a concessão de créditos protegidos por certa margem de garantia real ou pessoal aparece um segundo tipo de risco a que podemos chamar risco do emprestador Este pode deverse ou a uma contingência moral isto é falta voluntária KEYNES 155 98 Cf o artigo de ROBERTSON Industrial Fluctuations and the Natural Rate of Interest In Economic Journal Dezembro de 1934 ou qualquer outro meio talvez lícito para fugir ao cumprimento da obrigação ou à possível insuficiência da margem de segurança isto é nãocumprimento involuntário causado por uma expectativa malogra da Podese acrescentar um terceiro motivo de risco ou seja a possi bilidade de uma variação desfavorável no valor do padrão monetário tornando o empréstimo em dinheiro menos seguro à medida da de preciação do que um ativo real embora todo ou a maior parte deste risco já deveria terse refletido e portanto sido incorporado nos preços dos bens reais duráveis Sucede que o primeiro tipo de risco é em certo sentido um custo real apesar de ser suscetível de diminuição pela média de sua dis tribuição ou por efeito de uma exatidão maior nas previsões O segundo pelo contrário é uma pura adição ao custo do investimento que não existiria se quem empresta e quem toma empestado fossem a mesma pessoa Além disso supõe em parte a duplicação de uma parcela do risco do empresário o qual é adicionado duas vezes à taxa de juros pura que é comparada à renda mínima esperada que induz a investir Se uma empresa for arriscada a pessoa que toma emprestado neces sitará de uma margem mais ampla entre sua expectativa quanto ao retorno e a taxa de juros à qual lhe parece vantajoso contrair a dívida ao passo que justamente a mesma razão levará a pessoa que empresta a exigir uma margem maior entre a sua remuneração e a taxa de juros que basta para induzilo a emprestar salvo se o poder e a riqueza do devedor forem tão grandes que lhe permitam oferecer uma margem excepcional de garantia A esperança de um resultado muito favorável que pode compensar o risco na idéia do tomador do empréstimo não é adequada para tranqüilizar o mutuante Esta dupla precaução com uma parcela do risco não recebeu que eu saiba até agora a sua devida importância porém em certos casos pode adquirir relevância Em período de expansão a opinião correta sobre a magnitude de ambos os riscos o do tomador do empréstimo e o do emprestador pode representar uma subestimativa anormal e pe rigosamente baixa V A escala da eficiência marginal do capital é de fundamental im portância por ser sobretudo através deste fator muito mais do que pela taxa de juros que a expectativa do futuro influi sobre o presente O erro de considerar a eficiência marginal do capital principalmente em termos do rendimento corrente do equipamento de capital o que só seria correto numa economia estática onde nenhuma mudança futura pudesse influir sobre o presente teve como resultado a ruptura do elo teórico entre o hoje e o amanhã Mesmo a taxa de juros é virtual OS ECONOMISTAS 156 mente99 um fenômeno corrente se reduzirmos a eficiência marginal do capital à mesma condição renunciamos a levar em consideração diretamente a influência do futuro na análise do equilíbrio presente O fato de que as hipóteses da situação estática estão quase sem pre subjacentes na teoria econômica contemporânea conduz a uma grande dose de irrealismo A introdução porém dos conceitos de custo de uso e da eficiência marginal do capital conforme se definiram antes terá o efeito acho eu de trazêla de volta à realidade reduzindo ao mínimo o grau de indispensável adaptação É a existência de um equipamento durável que liga a economia futura à economia presente É portanto consoante com e em concordância a nossos princípios gerais de pensamento que a expectativa sobre o futuro deva afetar o presente por intermédio do preço de demanda por equipa mento durável KEYNES 157 99 Porém não completamente pois a taxa de juros reflete em parte a incerteza do futuro Além disso a relação entre as taxas de juros para diferentes prazos depende das expectativas CAPÍTULO 12 O Estado da Expectativa a Longo Prazo I Vimos no capítulo anterior que o volume de investimento de pende da relação entre a taxa de juros e a curva da eficiência marginal do capital correspondente aos diferentes volumes de investimento cor rente ao passo que a eficiência marginal do capital depende da relação entre o preço de oferta de um ativo de capital e a sua renda esperada No presente capítulo examinaremos mais detalhadamente alguns dos fatores que determinam a renda esperada de um ativo As considerações sobre as quais se baseiam as expectativas de rendas esperadas são em parte fatos existentes que se pode supor sejam conhecidos mais ou menos com certeza e em parte eventos futuros que podem ser previstos com um maior ou menor grau de confiança Entre os primeiros destacase o volume existente dos vários tipos de bens de capital e os ativos de capital em geral bem como a intensidade da procura atual dos consumidores no tocante a artigos que requerem para que sua produção seja eficiente uma assistência maior de capital Entre os segundos figuram as mudanças do tipo e da quantidade do estoque dos bens de capital e as preferências dos consumidores a intensidade da procura efetiva nos diversos períodos da vida do investimento considerado e por fim as variações da taxa de salário em termos nominais que podem ocorrer durante o respectivo período Podemos resumir o estado da expectativa psicológica resultante dos segundos fatores na expressão estado da expectativa a longo prazo salientandose que deve ser feita a distinção da expectativa a curto prazo com base na qual os produtores fazem a estimativa do que poderão obter pelo produto acabado no caso de decidirem iniciar sua produção hoje com as instalações existentes e que examinamos no capítulo 5 159 II Seria insensato na formação de nossas expectativas atribuir grande importância a tópicos que para nós são muito incertos100 É portanto razoável que nos deixemos guiar em grande parte pelos fatos que merecem nossa confiança mesmo se sua relevância for menos decisiva para os resultados esperados do que outros fatos a respeito dos quais o nosso conhecimento é vago e limitado Por essa razão os fatos atuais desempenham um papel que em certo sentido podemos julgar desproporcional na formação de nossas expectativas a longo pra zo sendo que o nosso método habitual consiste em considerar a situação atual e depois projetála no futuro modificandoa apenas na medida em que tenhamos razões mais ou menos definidas para esperarmos uma mudança O estado da expectativa a longo prazo que serve de base para as nossas decisões não depende portanto exclusivamente do prognós tico mais provável que possamos formular Depende também da con fiança com a qual fazemos este prognóstico na medida em que pon deramos a probabilidade de o nosso melhor prognóstico revelarse in teiramente falso Se esperarmos grandes mudanças mas não tivermos certeza quanto à forma precisa com que tais mudanças possam ocorrer nosso grau de confiança será então fraco O estado de confiança que é o termo comumente empregado constitui uma matéria à qual os homens práticos dedicam a mais cui dadosa e desvelada atenção Todavia os economistas não analisaram esta matéria com o devido cuidado e se limitaram no mais das vezes a discutila em termos gerais Em particular não se demonstrou com clareza que sua relevância relativamente aos problemas econômicos decorre da considerável influência que exerce sobre a curva da eficiência marginal do capital Não se trata de dois fatores distintos exercendo influência sobre o fluxo de investimento ou seja a escala de eficiência marginal do capital e o estado de confiança O estado de confiança é relevante pelo fato de ser um dos principais fatores que determinam essa escala a qual é idêntica à curva da demanda de investimento Entretanto não há muito para se falar a priori a respeito do estado de confiança Nossas conclusões devem fundamentarse prin cipalmente na observação prática dos mercados e da psicologia dos negócios Esta é a razão pela qual a digressão que se segue está colocada em um nível diferente de abstração relativamente à maior parte do presente livro Para simplificar a exposição na discussão que se segue sobre o OS ECONOMISTAS 160 100 Quando utilizo muito incertos não quero dizer a mesma coisa que muito improváveis Cf minha obra Treatise on Probability JMK v VIII Cap 6 The Weight of Arguments estado de confiança suporemos que não há nenhuma variação da taxa de juros discorreremos nas seções seguintes como se as variações dos valores de investimento fossem provenientes exclusivamente de mu danças nas expectativas de suas rendas esperadas e jamais das varia ções da taxa de juros sobre cuja base estas rendas prováveis são ca pitalizadas É entretanto fácil sobrepor o efeito das variações da taxa de juros ao efeito das variações do estado de confiança III O fato de maior importância é a extrema precariedade da base do conhecimento sobre o qual temos que fazer os nossos cálculos das rendas esperadas O nosso conhecimento dos fatores que regularão a renda de um investimento alguns anos mais tarde é em geral muito limitado e com freqüência desprezível Se falarmos com franqueza temos de admitir que as bases do nosso conhecimento para calcular a renda provável dentro de dez anos de uma estrada de ferro uma mina de cobre uma fábrica de tecidos a aceitação de um produto farma cêutico um navio transatlântico ou um imóvel no centro comercial de Londres pouco significam e às vezes a nada levam De fato aqueles que tentam com seriedade fazer um cálculo desta natureza constituem uma pequena minoria cuja conduta não chega a influenciar o mercado Em outros tempos quando as empresas pertenciam quase todas aos que as tinham fundado ou aos seus amigos e sócios o investimento dependia da existência de um número suficiente de indivíduos de tem peramento entusiástico e de impulsos construtivos que empreendessem negócios como uma maneira de viver sem realmente tomar como base os cálculos precisos de lucros prováveis Os negócios eram em parte uma loteria embora o resultado final fosse predominantemente de terminado pelo fato de serem as aptidões e o temperamento dos diri gentes superiores ou inferiores à média Uns fracassariam outros se riam bemsucedidos Mas mesmo após o acontecimento ninguém ficava sabendo se a média dos resultados em relação às somas investidas era superior igual ou inferior à taxa de juros prevalecente contudo se excluirmos a exploração dos recursos naturais e a dos monopólios é provável que a média efetiva dos resultados dos investimentos mesmo em períodos de progresso e prosperidade tenha frustrado as esperanças que inspiraram tal acontecimento Os homens de negócio fazem um jogo que é uma mescla de habilidade e de sorte cujos resultados médios são desconhecidos pelos jogadores que dele participam Se a natureza humana não sentisse a tentação de arriscar a sorte nem de sentir a satisfação excluindose o lucro de construir uma fábrica uma estrada de ferro de explorar uma mina ou uma fazenda provavelmente não haveria muitos investimentos como mero resultado de cálculos frios Todavia as decisões de investir em negócios privados do tipo antigo eram em grande parte irrevogáveis não só para a comunidade KEYNES 161 em geral como também para os indivíduos Com a separação entre a propriedade e a gestão que prevalece atualmente e com o desenvolvi mento de mercados financeiros organizados surgiu um novo fator de grande importância que às vezes facilita o investimento mas que às vezes contribui sobremaneira para agravar a instabilidade do sistema Na ausência de bolsas de valores não há motivo para se procurar com freqüência reavaliar os investimentos que fazemos Mas a bolsa de valores reavalia todos os dias os investimentos e estas reavaliações proporcionam a oportunidade freqüente a cada indivíduo embora isto não ocorra para a comunidade como um todo de rever suas aplicações É como se um agricultor tendo examinado seu barômetro após o café da manhã pudesse decidir retirar seu capital da atividade agrícola entre as dez e as onze da manhã para reconsiderar se deveria investilo mais tarde durante a semana Todavia as reavaliações diárias da bolsa de valores embora se destinem principalmente a facilitar a transferência de investimentos já realizados entre indivíduos exercem inevitavelmente uma influência decisiva sobre o montante do inves timento corrente Isso porque não há nenhum sentido em se criar uma empresa nova a um custo maior quando se pode adquirir uma empresa similar existente por um preço menor ao passo que há uma indução para se aplicarem recursos em um novo projeto que possa parecer exigir uma soma exorbitante desde que esse empreendimento possa ser liquidado na bolsa de valores com um lucro imediato101 Destarte certas categorias de investimento são reguladas pela expectativa média dos que negociam na bolsa de valores tal como se manifesta no preço das ações em vez de expectativas genuínas do empresário profissio nal102 Como se realizam então na prática estas reavaliações dos in vestimentos existentes que ocorrem todos os dias mesmo todas as ho ras e que são de suma importância IV Na prática concordamos geralmente em recorrer a um método que é na verdade uma convenção A essência desta convenção em bora ela nem sempre funcione de uma forma tão simples reside em OS ECONOMISTAS 162 101 Em minha obra Treatise on Money v II p 195 JMK v VI p 174 observei que quando as ações de uma empresa são cotadas muito alto de modo que essa mesma empresa possa aumentar seu capital emitindo novas ações em condições favoráveis os resultados daí decor rentes são os mesmos que se ela conseguisse obter empréstimos a uma taxa reduzida de juros Agora eu descreveria este fato dizendo que uma cotação alta para as ações existentes supõe um aumento na eficiência marginal do tipo correspondente de capital e portanto tem o mesmo efeito que uma diminuição na taxa de juros uma vez que o investimento depende de uma comparação entre a eficiência marginal do capital e a taxa de juros 102 Isto não se aplica naturalmente ao tipo de empresas que não podem ser facilmente cotadas na bolsa de valores e para as quais tampouco existam instrumentos de negociação próximos a esses papéis que estamos discutindo As categorias que se enquadram nessas exceções eram anteriormente numerosas Todavia sua importância relativamente ao valor total do novo investimento está diminuindo rapidamente se supor que a situação existente dos negócios continuará por tempo indefinido a não ser que tenhamos razões concretas para esperar uma mudança Isto não quer dizer que na realidade acreditemos na duração indefinida do estado atual dos negócios A vasta experiência ensina que tal hipótese é muito improvável Os resultados reais de um inves timento no decorrer de vários anos raras vezes coincidem com as previsões originais Também não podemos racionalizar a nossa atitude argumentando que para um homem em estado de ignorância os erros em qualquer sentido são igualmente prováveis e que portanto subsiste uma esperança estatística baseada em probabilidades iguais Isso por que podemos facilmente demonstrar que a hipótese de probabilidades aritmeticamente iguais baseada em um estado de ignorância conduz a absurdos Efetivamente estamos supondo que a avaliação do mercado existente seja qual for a maneira por que a ela se chegou é singu larmente correta em relação ao nosso conhecimento atual dos fatos que influirão sobre a renda do investimento e só mudará na proporção em que variar o dito conhecimento embora no plano filosófico essa avaliação não possa ser univocamente correta uma vez que o nosso conhecimento atual não nos fornece as bases suficientes para uma esperança matematicamente calculada De fato nas avaliações do mer cado intervém toda a espécie de considerações que são de modo algum relevantes para a renda esperada Entretanto o método convencional de cálculo acima indicado será compatível com um considerável grau de continuidade e estabilidade em nossos negócios enquanto pudermos confiar na continuação do raciocínio Se existem mercados organizados de investimento e desde que possamos confiar na continuação do argumento o investidor pode le gitimamente encorajarse com a idéia de que não corre outro risco senão aquele de uma variação efetiva nas condições do futuro imediato sobre cuja probabilidade pode tentar formar uma opinião pessoal e que não é provável seja cotada em alto nível Na suposição de que o raciocínio subsista estas mudanças são as únicas que podem afetar o valor do seu investimento e ele não terá de perder o sono pelo simples fato de não ter nenhuma idéia do valor que o seu investimento terá dez anos mais tarde Desse modo o investimento tornase razoavel mente seguro para o investidor individual em períodos curtos e por conseqüência para uma sucessão de tais períodos por mais numerosos que sejam desde que ele possa razoavelmente confiar na validade do raciocínio e portanto tenha a oportunidade de rever suas decisões e modificar o investimento antes que haja tempo suficiente para que ocorram grandes alterações Assim os investimentos que são fixos para a comunidade tornamse líquidos para o indivíduo Estou certo de que os nossos principais mercados de investimento se desenvolveram baseados em procedimentos parecidos Todavia não KEYNES 163 é de se surpreender que um argumento em certos aspectos tão arbi trário apresente seus pontos fracos É a sua precariedade que cria uma parte considerável do problema contemporâneo de obtenção de um volume suficiente de investimentos V Podem ser mencionados brevemente alguns dos fatores que agra vam essa precariedade 1 Como resultado do aumento gradual da proporção que repre sentam no investimento agregado de capital da comunidade as ações possuídas por pessoas que não dirigem nem têm conhecimento especial das circunstâncias reais ou esperadas dos negócios em questão há uma séria redução do elemento de real conhecimento na avaliação desses investimentos feita pelos que os possuem ou pelos que tencionam adquirilos 2 As flutuações de curto prazo dos lucros nos investimentos existentes embora sejam manifestamente efêmeras e desprovidas de significação tendem a exercer sobre o mercado uma influência excessiva e mesmo absurda Dizse por exemplo que as ações das empresas norteamericanas que fabricam gelo podem ser vendidas a um preço mais elevado no verão quando os seus lucros são sazonalmente ele vados do que no inverno quando ninguém quer gelo A ocorrência de feriados bancários mais prolongados pode aumentar o valor de mercado do sistema ferroviário britânico em vários milhões de libras 3 Uma avaliação convencional fruto da psicologia de massa de grande número de indivíduos ignorantes está sujeita a modificações violentas em conseqüência de repentinas mudanças na opinião susci tada por certos fatores que na realidade pouco significam para a renda provável já que essa avaliação carece de raízes profundas que permitam sua sustentação Em períodos anormais em particular quando a hi pótese de uma continuação indefinida do estado atual dos negócios é menos plausível do que usualmente mesmo que não existam motivos concretos para prever determinada mudança o mercado estará sujeito a ondas de sentimentos otimistas ou pessimistas que são pouco ra zoáveis e ainda assim legítimos na ausência de uma base sólida para cálculos satisfatórios 4 Há porém uma característica especial que merece a nossa atenção Talvez se tenha suposto que a concorrência entre os profis sionais competentes dotados de julgamento mais seguro e de conhe cimentos mais amplos do que o investidor privado médio corrigiria os devaneios do indivíduo ignorante e à mercê de sua própria iniciativa OS ECONOMISTAS 164 Sucede porém que as energias e as habilidades do investidor profis sional e do especulador estão principalmente aplicadas de outra ma neira Com efeito a maioria deles dedicase não a fazer previsões aba lizadas a longo prazo sobre a renda provável de um investimento por toda sua vida mas em prever mudanças de curto prazo com certa antecedência em relação ao público em geral Não se preocupam com o que realmente significa um valor de investimento para o indivíduo que o comprou para guardar mas com o valor que lhe atribuirá o mercado dentro de três meses ou um ano sob a influência da psicologia de massas Ademais esta conduta não é o resultado de um propensão mal direcionada mas a conseqüência inevitável de um mercado finan ceiro organizado segundo as normas descritas Na verdade seria in sensato pagar 25 por um investimento cuja renda esperada supõese justifica um valor de 30 se por outro lado se acredita que o mercado o avaliará em 20 três meses depois Dessa maneira o investidor profissional sentese forçado a estar alerta para antecipar essas variações iminentes nas notícias ou na atmosfera que como demonstra a experiência são as que exercem maior influência sobre a psicologia coletiva do mercado Este é o re sultado inevitável dos mercados financeiros organizados em torno da chamada liquidez Entre as máximas da finança ortodoxa segura mente nenhuma é mais antisocial que o fetiche da liquidez a doutrina que diz ser uma das virtudes positivas das instituições investidoras concentrar seus recursos na posse de valores líquidos Ela ignora que não existe algo como a liquidez do investimento para a comunidade como um todo A finalidade social do investimento bem orientado de veria ser domínio das forças obscuras do tempo e da ignorância que rodeiam o nosso futuro O objetivo real e secreto dos investimentos mais habilmente efetuados em nossos dias é sair disparado na frente como se diz coloquialmente estimular a multidão e transferir adiante a moeda falsa ou em depreciação Esta luta de esperteza para prever com alguns meses de ante cedência as bases da avaliação convencional muito mais do que a renda provável de um investimento durante anos nem sequer exige que haja idiotas no público para encher a pança dos profissionais a partida pode ser jogada entre estes mesmos Também não é necessário que alguns continuem acreditando ingenuamente que a base conven cional de avaliação tenha qualquer validez real a longo prazo Tratase por assim dizer de brincadeiras como o jogo do anel a cabracega as cadeiras musicais É preciso passar o anel ao vizinho antes de o jogo acabar agarrar o outro para ser por este substituído encontrar uma cadeira vaga antes que a música pare Estes passatempos podem cons tituir agradáveis distrações e despertar muito entusiasmo embora to dos os participantes saibam que é a cabracega que está dando voltas a esmo ou que quando a música pára alguém ficará sem assento KEYNES 165 Para variar um pouco de metáfora o investimento por parte de profissionais pode ser comparado aos concursos organizados pelos jor nais onde os participantes têm de escolher os seis rostos mais belos entre uma centena de fotografias ganhando o prêmio o competidor cuja seleção corresponda mais aproximadamente à média das prefe rências dos competidores em conjunto assim cada concorrente deverá escolher não os rostos que ele próprio considere mais bonitos mas os que lhe parecem mais próprios a reunir as preferências dos outros concorrentes os quais encaram o problema do mesmo ponto de vista Não se trata de escolher os rostos que no entender de cada um são realmente os mais lindos nem mesmo aqueles que a opinião geral considere realmente como tais Alcançamos o terceiro grau no qual empregamos a nossa inteligência em antecipar o que a opinião geral espera que seja a opinião geral E há pessoas segundo creio que vão até o quarto e o quinto grau ou mais longe ainda Talvez o leitor observe que durante um período bastante longo um indivíduo inteligente e indiferente ao passatempo da moda pode realizar grandes lucros à custa de outros jogadores se persistir fazendo investimentos de acordo com as suas mais perfeitas expectativas a longo prazo A isto convém responder desde logo que existem na verdade pessoas com este tipo de mentalidade séria e que de fato para um mercado de investimento haverá uma enorme diferença de pendendo da influência que essas pessoas exerçam sobre a opinião dos jogadores Mas devemos acrescentar que diversos fatores afetam a pre dominância de tais pessoas nos modernos mercados de capital O in vestimento baseado nas previsões autênticas a longo prazo é hoje tão difícil que mal pode ser posto em prática Os que tentarem fazêlo poderão estar certos de passar dias de trabalho muito intenso e de correr riscos muito maiores que os que tentam adivinhar as reações do público melhor que o próprio público e dada igual inteligência eles podem cometer erros muito mais desastrosos Não há evidência clara a demonstrar que a política de investimento socialmente mais vantajosa coincida com a mais lucrativa É preciso mais inteligência para derrotar as forças do tempo e da nossa ignorância sobre o futuro do que para sair na frente Além disso a vida não é bastante longa para essa tarefa a natureza humana exige sucessos imediatos há um deleite especial em ganhar dinheiro rapidamente e os lucros remotos são descontados pelo homem médio a taxas muito elevadas O jogo dos investidores profissionais é intoleravelmente fastidioso e demasiado exigente para quem não tenha absolutamente o instinto de jogador quem o tem há de pagar o correspondente tributo por essa inclinação Mais ainda o investidor que se proponha a ignorar as flutuações de muito curto prazo do mercado necessita maiores recursos para a sua segurança e não deve operar em tão larga escala se é que opera em alguma com dinheiro emprestado uma razão a mais para que dada OS ECONOMISTAS 166 a igualdade de inteligência e de recursos lhe seja mais vantajoso de dicarse ao passatempo Finalmente o investidor a longo prazo é aquele que melhor serve o interesse público e é o que na prática incorre em maior crítica ao passo que os fundos de investimento são manejados por comissões ou bancos103 pois em essência sua conduta é excêntrica inconvencional e temerária aos olhos da opinião média Se obtém êxito isso apenas confirmará a crença geral na sua temeridade se no final de contas sofre reveses momentâneos pouco serão os que dele se com padecerão A sabedoria universal indica ser melhor para a reputação fracassar junto com o mercado do que vencer contra ele 5 Até agora tivemos em vista principalmente o estado de con fiança do próprio especulador ou investidor especulativo e talvez pareça que tenhamos suposto implicitamente que se ele está satisfeito com suas próprias perspectivas tem acesso ilimitado ao dinheiro à taxa de juro do mercado Tal não é evidentemente o caso Por isso devemos considerar também outro aspecto do estado de confiança ou seja o grau de confiança que as instituições de crédito concedem às pessoas que nelas procuram empréstimos e que às vezes se denominam con dições de crédito Uma baixa violenta no preço das ações que produz um efeito desastroso sobre a eficiência marginal do capital pode ser provocada pelo enfraquecimento seja da confiança especulativa seja das condições de crédito Mas enquanto o debilitamento de qualquer dos dois fatores é suficiente para determinar uma queda violenta a recuperação exige que ambos sejam restaurados pois conquanto o en fraquecimento do crédito seja bastante para levar a uma crise o seu fortalecimento embora uma condição necessária da recuperação não é condição suficiente VI Estas considerações não deveriam sair do campo da análise eco nômica Contudo convém colocálas em sua devida perspectiva Se me é permitido aplicar o termo especulação à atividade que consiste em prever a psicologia do mercado e o termo empreendimento à que consiste em prever a renda provável dos bens durante toda sua existência de modo algum se pode dizer que a especulação sempre prevaleça sobre o empreendimento À medida que progride a organização dos mercados de investimento o risco de um predomínio da especulação entretanto aumenta Num dos maiores mercados de investimento do mundo a KEYNES 167 103 A prática geralmente considerada prudente que leva as companhias que administram fundos de investimento ou as companhias de seguros a calcular com freqüência não apenas a renda de sua carteira de investimento mas também a valorização de seu capital no mercado pode igualmente levar a atribuir importância excessiva às flutuações a curto prazo desse mesmo mercado saber o de Nova York a influência da especulação no sentido da palavra acima exposto é enorme Mesmo fora do campo das finanças a tendência dos americanos é atribuir um interesse excessivo na des coberta do que a opinião julga ser a opinião média e este pender nacional encontra seu castigo na Bolsa de Valores Dizse ser raro um americano investir como o fazem ainda muitos ingleses para obter uma renda e que somente na expectativa de um gancho de capital está disposto a adquirir um título Isto é apenas outra maneira de dizer que quando um americano compra um investimento está colocando suas esperanças não tanto em sua renda provável mas em sua mudança favorável nas bases convencionais de avaliação ou seja que ele é o sentido dado acima um especulador Os especuladores podem não causar dano quan do são apenas bolhas num fluxo constante de empreendimento mas a situação tornase séria quando o empreendimento se converte em bolhas no turbilhão especulativo Quando o desenvolvimento do capital em um país se converte em subproduto das atividades de um cassino o trabalho tende a ser malfeito A medida do êxito obtido por Wall Street considerada uma instituição cuja finalidade social precípua é conduzir os novos investimentos pelos canais mais produtivos em ter mos de rendimento futuro não pode ser apontada como um dos mais brilhantes triunfos do capitalismo do tipo laissezfaire o que não é de surpreender se é verdade como penso que os mais brilhantes cé rebros de Wall Street se orientam de fato para um fim diferente Estas tendências são uma conseqüência quase inevitável do êxito de se terem organizado os mercados de investimentos líquidos Ad mitese em geral que no próprio interesse do público o acesso a cassinos deve ser difícil e dispendioso E talvez o mesmo deveria acon tecer no caso das Bolsas de Valores O fato de que os pecados da Bolsa de Valores de Londres tenham sido menores do que os de Wall Street talvez não se deva tanto a diferenças nos temperamentos nacionais como à circunstância de que para o inglês mediano Throgmorton Street é inacessível e muito dispendiosa comparada com Wall Street para o mesmo tipo de norteamericano A proporção dos jogadores as altas comissões de corretagem e as pesadas taxas sobre transferências que se pagam ao Tesouro gastos que acompanham todas as transações na Bolsa de Valores de Londres reduzem a liquidez do mercado embora a prática das liquidações quinzenais opere em sentido inverso o sufi ciente para eliminar grande parte das operações características de Wall Street104 A criação de um elevado imposto sobre as transferências para todas as transações talvez fosse a mais salutar das medidas ca OS ECONOMISTAS 168 104 Dizse que quando Wall Street está em período ativo pelo menos metade das compras e vendas de títulos de investimento se realiza com a intenção por parte do especulador de se desfazer desses títulos no mesmo dia Isto se aplica também com freqüência às bolsas de mercadorias pazes de atenuar nos Estados Unidos o predomínio da especulação sobre o empreendimento O espetáculo dos mercados financeiros modernos levoume algu mas vezes a concluir que se as operações de compra de um investi mento fossem tornadas definitivas e irrevogáveis à maneira do casa mento salvo em caso de morte ou por outro motivo grave os males da nossa época seriam com grande utilidade aliviados Isso obrigaria os investidores a dirigir sua atenção apenas para as perspectivas a longo prazo Basta porém um momento de reflexão para compreender que semelhante método nos leva a um dilema e nos mostra que se a liquidez do mercado financeiro às vezes dificulta um novo investimento em compensação facilitao com mais freqüência isso porque o fato de cada investidor individualmente considerado ter a ilusão de que par ticipa de um negócio líquido embora isso não possa ser verdadeiro para todos os investidores coletivamente acalmalhe os nervos e ani mao muito mais a correr o risco Se as aquisições individuais de valores de investimento perdessem sua liquidez daí poderiam resultar sérias dificuldades para os investimentos novos sempre que se oferecessem aos indivíduos outros meios de conservar suas economias Aqui jaz o dilema Na medida em que um indivíduo possa empregar sua riqueza entesourando ou emprestando dinheiro a alternativa de adquirir bens reais de capital não seria bastante atraente sobretudo para a pessoa que não maneja esses bens e pouco sabe a respeito deles exceto or ganizando mercados onde esses bens possam converterse facilmente em dinheiro O único remédio radical para as crises de confiança que afligem a vida econômica do mundo moderno seria restringir a escolha do in divíduo à única alternativa de consumir a sua renda ou servirse dele para encomendar a produção de bens específicos de capital que embora com evidência precária se lhe afiguram o investimento mais interes sante ao seu alcance Talvez em certos momentos quando se visse mais do que de costume assoberbado por dúvidas a respeito do futuro a perplexidade o levasse a consumir mais e a realizar menos investi mentos novos mas isto evitaria as repercussões desastrosas cumula tivas e de amplo alcance oriundas do fato de poder absterse de gastar a sua renda de uma ou de outra forma Os que vinham insistindo nos perigos sociais resultantes do en tesouramento da moeda tinham em vista naturalmente considerações análogas a estas Contudo não deram a devida atenção à possibilidade de que o fenômeno pode ocorrer sem modificação alguma ou pelo menos sem uma variação apreciável no entesouramento da moeda VII Além da causa devida à especulação a instabilidade econômica encontra outra causa inerente à natureza humana no fato de que KEYNES 169 grande parte das nossas atividades positivas depende mais do otimismo espontâneo do que de uma expectativa matemática seja moral hedo nista ou econômica Provavelmente a maior parte das nossas decisões de fazer algo positivo cujo efeito final necessita de certo prazo para se produzir deva ser considerada a manifestação do nosso entusiasmo como um instinto espontâneo de agir em vez de não fazer nada e não o resultado de uma média ponderada de lucros quantitativos multiplicados pelas probabilidades quantitativas O empreendedor pro cura convencer a si próprio de que a principal força motriz da sua atividade reside nas afirmações de seu propósito por mais ingênuas e sinceras que possam ser Basta que o empreendimento seja um pouco maior que uma expedição ao Pólo Sul para ser baseado no cálculo exato dos lucros futuros Dessa maneira ao se arrefecer o entusiasmo e ao vacilar o otimismo espontâneo ficamos na dependência apenas da previsão matemática e aí o empreendimento desfalece e morre embora o temor da perda seja tão desprovido de base lógica como eram antes as esperanças de ganhar Podese afirmar sem receio que a empresa que depende de es peranças futuras beneficia a comunidade como um todo A iniciativa individual porém somente será adequada quando a previsão razoável for secundada e sustentada pelo dinamismo de tal maneira que a idéia dos prejuízos finais que freqüentemente vence os pioneiros como a experiência prova tanto a nós quanto a eles é repelida do mesmo modo que o homem saudável repele a probabilidade de sua morte Isto significa infelizmente que não só as crises e as depressões têm a sua intensidade agravada como que a prosperidade econômica depende excessivamente de um clima político e social que satisfaça ao tipo médio do homem de negócios Quando o temor de um governo trabalhista ou de New Deal deprime a empresa esta situação não é necessariamente conseqüência de previsões ou de manobras com fi nalidades políticas é o simples resultado de um transtorno no delicado equilíbrio do otimismo espontâneo Ao calcular as perspectivas que se oferecem ao investimento devemos levar em conta os nervos e a histeria além das digestões e das reações às condições climáticas das pessoas de cuja atividade espontânea ele depende principalmente Não devemos concluir daí que tudo depende de ondas de psicologia irracional Pelo contrário o estado de expectativa a longo prazo é no mais das vezes estável e mesmo quando não o seja os outros fatores exercem seus efeitos compensatórios O que apenas desejamos lembrar é que as decisões humanas que envolvem o futuro sejam elas pessoais políticas ou econômicas não podem depender da estrita expectativa matemática uma vez que as bases para realizar semelhantes cálculos não existem e que o nosso impulso inato para a atividade é que faz girar as engrenagens sendo que a nossa inteligência faz o melhor possível para escolher o melhor que pode haver entre as diversas al OS ECONOMISTAS 170 ternativas calculando sempre que se pode mas retraindose muitas vezes diante do capricho do sentimento ou do azar VIII Há além disso outros fatores importantes que tendem a atenuar na prática os efeitos da nossa ignorância do futuro Em virtude do mecanismo do juro composto e da probabilidade de obsolescência com o correr do tempo existem numerosos investimentos individuais cuja renda provável está legitimamente dominada pelos rendimentos num futuro comparativamente próximo No caso da principal categoria de investimentos a prazo muito longo ou seja a construção o risco pode ser freqüentemente transferido do investidor para o inquilino ou pelo menos pode ser repartido entre ambos por meio de contratos a longo prazo ficando o risco compensado na mente do inquilino pela conti nuidade e segurança de seu direito de inquilinato No caso de outra classe importante de investimento a longo prazo as empresas de ser viços públicos uma grande proporção da renda provável está pratica mente garantida pelos privilégios de monopólio e pelo direito de au mentar as tarifas na medida necessária para manter certa margem estipulada Há finalmente uma categoria crescente de investimentos empreendida em sociedade ou garantida pelas autoridades públicas claramente influenciada pela presunção geral de haver vantagens so ciais prováveis no investimento seja qual for seu resultado comercial dentro de uma larga margem e sem procurar saber se a esperança matemática da renda será pelo menos igual à taxa corrente de juros embora a taxa que a autoridade pública tenha de pagar possa ainda desempenhar um papel decisivo na determinação do volume das ope rações de investimento a que ela podese engajar Assim após haver plenamente assinalado a importância da in fluência das mudanças a curto prazo no estado das expectativas a longo prazo independentemente das variações na taxa de juros ainda devemos voltarnos a essa última que exerce de qualquer modo em circunstâncias normais grande influência embora não decisiva sobre o fluxo de investimento Só a experiência contudo pode mostrar até que ponto a administração da taxa de juros é capaz de estimular continuamente um fluxo de investimento adequado Da minha parte sou presentemente algo cético quanto ao êxito de uma política meramente monetária orientada no sentido de exercer influência sobre a taxa de juros Encontrandose o Estado em situação de poder calcular a eficiência marginal dos bens de capital a longo prazo e com base nos interesses gerais da comunidade espero vêlo assumir uma responsabilidade cada vez maior na organização direta dos investimentos ainda mais considerandose que provavelmente as flutuações na estimativa do mercado da eficiência marginal dos diversos tipos de capital calculada na forma descrita antes serão demasiado grandes para que se possa compensálas por meio de mudanças viáveis na taxa de juros KEYNES 171 CAPÍTULO 13 A Teoria Geral da Taxa de Juros I Mostramos no capítulo 11 que embora certas forças façam subir ou descer a taxa de investimento de modo que iguale a eficiência mar ginal do capital à taxa de juros a eficiência marginal do capital em si é um conceito diferente da taxa de juros corrente Podese dizer que a curva da eficiência marginal do capital governa as condições em que se procuram fundos disponíveis para novos investimentos enquan to a taxa de juros governa os termos em que esses fundos são corre tamente oferecidos Para complementar a nossa teoria precisamos portanto saber o que determina a taxa de juros No capítulo 14 e em seu Apêndice consideraremos as respostas que até agora foram dadas a esta pergunta Em termos gerais veri ficaremos que elas condicionam a taxa de juros à interação entre a curva da eficiência marginal do capital e a propensão psicológica a poupar A taxa de juros seria o fator de equilíbrio que estabelece a igualdade entre de um lado a demanda de poupança resultante do investimento novo que pode ser realizado a determinada taxa de juros e de outro lado a oferta de poupança suprida essa taxa pela propensão psicológica da comunidade a poupar Todavia esta teoria vem abaixo tão logo se perceba ser impossível deduzir a taxa de juros a partir do conhecimento destes dois fatores Qual será portanto a nossa própria resposta a esta pergunta II Para efetivar plenamente suas preferências psicológicas tempo rais um indivíduo deparase com dois conjuntos de decisões a serem tomadas A primeira relacionase com aquele aspecto de preferência temporal que denominei propensão a consumir fator que sob a in fluência dos diversos motivos expostos no Livro Terceiro determina 173 que parte de sua renda cada indivíduo consumirá e que parte reservará sob alguma forma de comando sobre o consumo futuro Uma vez tomada esta decisão porém outra o espera a saber em que forma conservará o poder de comando sobre o consumo futuro quer de sua renda corrente quer de sua poupança anterior Deseja conserválo sob a forma líquida imediata isto é em dinheiro ou seu equivalente Ou está disposto a alienar esse poder aquisitivo imediato por um período específico ou indeterminado deixando à situação futura do mercado a fixação das condições em que pode se necessário con verter o poder de comando postergado sobre bens específicos em poder aquisitivo imediato sobre bens em geral Em outras palavras qual é o grau de sua preferência pela liquidez onde a preferência pela liquidez do indivíduo é representada por uma escala do volume dos seus recursos medidos em termos monetários ou em unidades de salário que deseja conservar em forma de moeda em diferentes circunstâncias Veremos que nas teorias aceitas o erro consistiu em querer de duzir a taxa de juros do primeiro destes dois elementos da preferência psicológica temporal negligenciando o segundo é esta omissão que devemos procurar reparar Deveria ser óbvio que a taxa de juros não pode ser um rendimento da poupança ou da espera como tal Quando alguém acumula suas economias sob a forma de dinheiro líquido não ganha juro embora economize tanto quanto antes Pelo contrário a simples definição da taxa de juros diznos literalmente que ela é a recompensa da renúncia à liquidez por um período determinado pois a taxa de juros não é em si outra coisa senão o inverso da relação existente entre uma soma de dinheiro e o que se pode obter desistindo por um período determi nado105 do poder de comando da moeda em troca de uma dívida106 Desse modo sendo a taxa de juros a qualquer momento a re compensa da renúncia à liquidez é uma medida de relutância dos que possuem dinheiro alienar o seu direito de dispor do mesmo A taxa de juros não é o preço que equilibra a demanda de recursos para investir OS ECONOMISTAS 174 105 Para uma discussão geral ao contrário dos problemas concretos em que o período de débito é expressamente especificado é conveniente que a taxa de juros signifique o complexo das várias taxas correntes para os diferentes períodos isto é para dívidas de maturações diferentes 106 Sem distorcer esta definição podemos traçar a linha divisória entre dinheiro e débito em qualquer ponto que melhor convier ao estudo de determinado problema Podemos por exemplo considerar moeda qualquer comando sobre o poder geral de compra do qual o possuidor não aliena por um período superior a três meses e débito o que se pode recuperar em períodos mais longos Em vez de três meses podemos também estabelecer um mês três dias ou três horas ou outro período ou podemos excluir da moeda tudo que não seja moeda legal corrente É muitas vezes conveniente na prática incluir como moeda os depósitos a prazo nos bancos e ocasionalmente mesmo certos instrumentos de crédito como por exemplo as Letras do Tesouro De modo geral adotarei a mesma suposição apresentada em minha obra Treatise on Money em que foi dito que a moeda compreende os depósitos bancários e a propensão de absterse do consumo imediato É o preço mediante o qual o desejo de manter a riqueza em forma líquida se concilia com a quantidade de moeda disponível Isso implica que se a taxa de juros fosse menor isto é se a recompensa da renúncia à liquidez se reduzisse o montante agregado de moeda que o público desejaria conservar ex cederia a oferta disponível e que se a taxa de juros se elevasse haveria um excedente de moeda que ninguém estaria disposto a reter Se esta explicação for correta a quantidade de moeda é outro fator que aliado à preferência pela liquidez determina a taxa corrente de juros em certas circunstâncias A preferência pela liquidez é uma potencialidade ou tendência funcional que fixa a quantidade de moeda que o público reterá quando a taxa de juros for dada resulta daí que r é a taxa de juros M a quantidade de moeda e L a função da preferência pela liquidez teremos M Lr Isto mostra onde e como a quantidade de moeda entra no esquema econômico A esta altura contudo é necessário que voltemos atrás e examinemos por que existe o que se denomina preferência pela liquidez Para este fim convirá usar a velha distinção entre o uso da moeda para as transações comerciais correntes e seu uso como reserva de riqueza No que concerne ao primeiro destes usos é evidente que vale a pena sacrificar até certo ponto alguma quantidade de juro pela conveniência da liquidez Porém dado que a taxa de juros nunca é negativa por que alguém preferiria guardar sua riqueza de forma que renda pouco ou nenhum juro a con servála de outra que renda algum supondo naturalmente neste estágio que o risco de perda é igual tanto para um depósito bancário quanto para uma obrigação A explicação integral deste fato é complexa e só poderá ser dada no capítulo 15 Há todavia uma condição necessária sem a qual não poderia existir a preferência de liquidez pela moeda como meio de conservação da riqueza Esta condição necessária é a existência de incerteza quanto ao futuro da taxa de juros isto é quanto ao complexo de taxas para vencimentos variáveis a prevalecer em datas futuras pudéssemos pois prever com certeza todas as taxas que iriam dominar no futuro todas as taxas vindouras poderiam ser inferidas das taxas presentes para as dívidas de diversos vencimentos e estas se ajustariam ao valor conhe cido das taxas futuras Por exemplo se 1dr é o valor no presente ano 1 de 1 libra diferidos r anos e se sabe que ndr será o valor no ano n de 1 libra diferidos r anos a partir daquela data teremos ndr 1dn r 1dn de onde se deduz que a taxa a que uma dívida qualquer pode ser convertida em dinheiro n anos mais tarde será determinada por duas entre o complexo de taxas de juros correntes Se a taxa corrente for positiva para as dívidas de qualquer prazo será sempre mais van tajoso adquirir uma dívida do que conservar a riqueza em forma de dinheiro líquido KEYNES 175 Se pelo contrário a taxa futura for incerta não mais podemos inferir com segurança que chegando o momento ndr será efetivamente igual a 1dn r 1dn Por isso no caso concebível de poder produzirse even tualmente uma necessidade de liquidez antes de expirarem os n anos há o risco de se incorrer em perda na aquisição de uma dívida a longo prazo ao convertêla depois em dinheiro comparativamente a ter con servado o dinheiro enquanto tal O lucro atuarial ou esperança mate mática de ganho calculado na base das probabilidades existentes caso esse cálculo possa ser feito o que é duvidoso deve ser suficiente para compensar o risco de reveses Há além disso outra razão para a preferência pela liquidez re sultante da incerteza quanto ao futuro da taxa de juros desde que haja um mercado organizado para negociar com débitos Cada qual prevê o futuro a sua maneira e aquele que divergir da opinião domi nante tal como ela se manifesta nas cotações do mercado pode ter boas razões para conservar recursos líquidos com o fim de realizar um lucro se estiver certo ao comprovar no momento oportuno que as re lações entre os 1dr estavam erradas107 Este fenômeno tem muita analogia com o que já abordamos com certa amplitude ao tratar da eficiência marginal do capital Assim como achamos que a eficiência marginal do capital não é determinada pela melhor opinião e sim pela avaliação do mercado tal como ela resulta da psicologia de massas assim também as expectativas quanto ao futuro da taxa de juros fixada pela psicologia de massa têm seus reflexos na preferência pela liquidez com o acréscimo porém de que o indivíduo para quem as futuras taxas de juros estarão acima daquelas previstas pelo mercado tem motivos para conservar em caixa dinheiro líquido108 ao passo que quem diverge do mercado em sentido oposto terá motivos para pedir dinheiro emprestado a curto prazo a fim de adquirir débitos a prazo mais longo O preço do mercado se fixará no nível em que a venda dos baixistas se equilibrar com as compras dos altistas As três divisões que acabamos de distinguir na preferência pela liquidez podem ser definidas pelos motivos que as governam i o motivo transação isto é a necessidade de moeda para as operações correntes de trocas pessoais e comerciais ii o motivo precaução ou seja o OS ECONOMISTAS 176 107 Este é o mesmo ponto que discuti em minha obra Treatise on Money sob a designação das duas opiniões e da posição em alta e em baixa 108 Poderseia supor da mesma maneira que se um indivíduo achasse que o rendimento provável dos investimentos fosse inferior ao previsto pelo mercado teria razão suficiente para conservar dinheiro Mas não é esse o caso Ele tem bons motivos para reter moeda ou dívidas de preferência a ações todavia a aquisição de um título de dívida será uma alternativa preferível à de guardar dinheiro a não ser que ele julgue também que a taxa futura de juros seja superior à que supõe o mercado desejo de segurança com relação ao equivalente do valor monetário futuro de certa parte dos recursos totais e iii o motivo especulação isto é o propósito de obter lucros por saber melhor que o mercado o que trará o futuro Tal como quando discutimos a eficiência marginal do capital a questão de saber se é desejável ter um mercado organizado para a negociação de débitos nos coloca diante de um dilema na au sência de um mercado organizado a preferência pela liquidez devida ao motivo de precaução aumentaria muito ao passo que a existência de um mercado organizado proporcionaria a oportunidade de amplas flu tuações da preferência pela liquidez devida ao motivo de especulação Talvez se esclareça este raciocínio através do seguinte argumento supondo que a preferência pela liquidez devida ao motivo transação e ao motivo precaução absorva uma quantidade de moeda que não seja muito sensível à influência direta das alterações na taxa de juros sem levar em conta suas reações devidas ao aumento da renda a quantidade total de moeda diminuída dessa quantidade fica assim disponível para satisfazer a preferência pela liquidez devido ao motivo especulação A taxa de juros e o preço das obrigações devem então fixarse ao nível em que a soma global que certos indivíduos desejam conservar líquida porque nesse nível se sentem baixistas relativamente ao fu turo das obrigações seja exatamente igual à quantidade de moeda disponível para atender às atividades do motivo de especulação Des tarte cada aumento na quantidade de dinheiro deve aumentar o preço das obrigações o suficiente para exceder as previsões de alguns altistas e influir sobre eles para que as vendam e venham juntarse ao grupo dos baixistas Não obstante se houver uma procura insignificante de moeda para satisfazer o motivo de especulação exceto para um curto período de transição um aumento da quantidade de moeda deve fazer baixar quase imediatamente a taxa de juros e no grau necessário para elevar o nível de emprego e a unidade de salários na medida suficiente para que a moeda adicional seja absorvida pelos motivos de transação e de precaução Via de regra podemos admitir que a curva da preferência pela liquidez que relaciona a quantidade de moeda à taxa de juros é dada por uma curva regular a qual mostra que essa taxa vai decrescendo à medida que a quantidade de moeda aumenta Há diversas causas que levam a esse resultado Em primeiro lugar à medida que a taxa de juros baixa é provável coeteris paribus que a preferência pela liquidez em virtude do motivo de transação absorva mais moeda Se a queda da taxa de juros aumenta a renda nacional o volume de moeda que convém reservar para as transações crescerá mais ou menos proporcionalmente com o aumento da renda enquanto ao mesmo tempo diminuirá o custo da conveniên cia de manter abundante a moeda em termos dos juros perdidos Re sultados análogos serão produzidos se o aumento de emprego que segue KEYNES 177 a uma baixa da taxa de juros determina uma alta dos salários isto é uma alta no valor monetário da unidade de salários a não ser que a preferência pela liquidez seja medida em unidades de salário em vez de unidades de moeda que é conveniente em certos contextos Em segundo lugar cada queda na taxa de juros pode como acabamos de ver aumentar a quantidade de moeda que certos indivíduos desejam conservar porque seus pontos de vista quanto à futura taxa de juros diferem dos do mercado No entanto podem ocorrer determinadas circunstâncias em que mesmo um acréscimo considerável da quantidade de moeda exercerá uma influência comparativamente pequena sobre a taxa de juros Esse grande acréscimo pode ocasionar tal incerteza quanto ao futuro que a preferência pela liquidez decorrente do motivo precaução pode ser for talecida por outro lado é possível que haja uma opinião tão unânime sobre a futura taxa de juros que uma ligeira variação nas taxas atuais determine um movimento maciço em direção à busca da liquidez É interessante observar como a estabilidade do sistema e sua sensibili dade diante das variações na quantidade de moeda dependem a tal ponto da existência de uma diversidade de opiniões sobre o que é incerto O melhor seria que conhecêssemos o futuro Mas não sendo este o caso se tivermos de controlar a atividade do sistema econômico através da variação da quantidade de moeda é importante que haja divergên cias de opinião Assim sendo este método de controle é mais precário nos Estados Unidos onde todos tendem a adotar a mesma opinião ao mesmo tempo do que na Inglaterra onde as divergências de opinião são mais comuns III Introduzimos assim a moeda em nosso nexo causal e podemos ter uma primeira idéia do modo como as variações na quantidade de moeda intervêm no sistema econômico Contudo se nos vemos tentados a con siderar a moeda como a bebida que estimula a atividade do sistema não nos esqueçamos que podem surgir muitos percalços entre a taça e os lábios Embora seja de esperar que coeteris paribus um aumento na quantidade de moeda reduza a taxa de juros isto não ocorrerá se a pre ferência do público pela liquidez aumentar mais que a quantidade de moeda e conquanto se possa esperar que coeteris paribus uma baixa na taxa de juros estimule o fluxo de investimento isto não acontecerá se a escala da eficiência marginal do capital cair mais rapidamente que a taxa de juros quando enfim se possa esperar que coeteris paribus um aumento do fluxo de investimento faça aumentar o emprego isso não se produzirá se a propensão a consumir estiver em declínio Finalmente se o emprego aumentar os preços subirão numa proporção que depende em parte da forma das funções da oferta e em parte da tendência da taxa de salários subir em termos monetários Quando a produção tiver au OS ECONOMISTAS 178 mentado e os preços subido o efeito que daí resultará sobre a preferência pela liquidez será o de aumentar a quantidade de moeda necessária para aumentar dada taxa de juros IV Embora a preferência pela liquidez devida ao motivo especulação corresponda ao que em minha obra Treatise on Money denominei o estado da baixa estes dois conceitos não são de modo algum idênticos Esse baixismo não foi definido naquela obra como a relação funcional entre a taxa de juros ou preços das dívidas e a quantidade de moeda mas entre o preço de ativos e débitos tomados em conjunto e quantidade de moeda Este conceito entretanto envolve certa confusão entre os resultados de correntes da variação na taxa de juros e aqueles oriundos da variação na escala da eficiência marginal do capital o que espero ter evitado aqui V O conceito de entesouramento pode ser considerado uma primeira aproximação do conceito de preferência pela liquidez De fato se subs tituíssemos entesouramento por propensão a entesourar chegaría mos substancialmente ao mesmo resultado Porém quando por en tesouramento queremos significar um aumento efetivo dos encaixes líquidos isto se configura como uma idéia incompleta e que pode causar sérios erros se formos levados a pensar em entesouramento e não entesouramento como simples alternativas A decisão de en tesourar não é tomada de maneira absoluta ou sem levar em conta as vantagens oferecidas pela renúncia à liquidez essa decisão resulta do equilíbrio de vantagens e temos portanto de saber o que há no outro prato da balança Ademais é impossível que o montante real do en tesouramento varie como resultado das decisões do público desde que consideremos o entesouramento como sendo o encaixe efetivo de moe da O volume de entesouramento tem de ser igual à quantidade de moeda ou segundo certas definições à quantidade de moeda menos o que se requer para satisfazer o motivo transação e a quan tidade de moeda não é determinada pelo público A única coisa que a propensão do público a entesourar pode conseguir é fixar a taxa de juros que iguale o desejo global de entesourar ao encaixe disponível O hábito de não se dar a devida atenção à relação da taxa de juros com o entesouramento pode explicar em parte a razão pela qual o juro tem sido usualmente considerado uma recompensa por não gastar quando na realidade ele é a recompensa por não entesourar KEYNES 179 CAPÍTULO 14 A Teoria Clássica da Taxa de Juros I Que é a teoria clássica da taxa de juros Tratase da teoria que serviu de base para a formação de todos nós e que até recentemente todos nós aceitamos quase sem reservas Mesmo assim pareceme difícil expôla com precisão ou descobrirlhe um enunciado explícito nos prin cipais tratados da escola clássica moderna109 É bastante claro entretanto que essa tradição considerou a taxa de juros o fator que equilibra a demanda de investimentos com a oferta para a poupança O investimento representa a demanda por recursos para investir a poupança representa a oferta e a taxa de juros é o preço dos recursos investíveis que torna essas duas quantidades iguais Da mesma forma que o preço de uma mercadoria é fixado necessariamente ao nível em que sua procura seja igual à oferta a taxa de juros se regula necessariamente sob a ação das forças do mercado no ponto em que o montante de investimento a essa taxa seja igual ao montante de poupança à mesma taxa O raciocínio acima não é encontrado nesses mesmos termos nos Principles de Marshall Não obstante parece ser esta a sua teoria a mesma em que também fui educado e que por meu turno ensinei a outros por muitos anos Tomemos por exemplo a seguinte passagem dos Principles O juro sendo o preço pago pelo uso do capital em qualquer mercado tende a um nível de equilíbrio tal que a procura agregada de capital no dito mercado a essa taxa de juros é igual ao estoque agregado que nele se apresenta à mesma taxa110 Do mesmo modo em Nature and Necessity of Interest o professor Cassel explica que o investimento constitui a procura da espera a poupança a oferta 181 109 Ver no Apêndice a este capítulo um resumo do que foi possível encontrar 110 Cf p 133 para uma análise complementar sobre esta passagem da espera e o juro é um preço que serve isto está subentendido para tornar as duas quantidades iguais mas também não encontrei nenhum trecho para citar No capítulo 6 de sua obra Distribution of Wealth o professor Carver considera claramente o juro como o fator que põe em equilíbrio a desutilidade marginal da espera com a pro dutividade marginal do capital111 Sir Alfred Flux Economic Principles p 95 escreve Se há verdade nas teses da nossa argumentação geral temse de admitir que se produz um ajuste automático entre a poupança e as oportunidades de empregar o capital lucrativamente A poupança não terá ultrapassado a sua possibilidade de aplicação útil enquanto a taxa de juros líquida for superior a zero O professor Taussig Principles v II p 29 traça uma curva da oferta de poupança e uma curva da procura representando a produtividade decrescente de sucessivos volumes de capital tendo previamente es tabelecido p 20 que a taxa de juros se estabiliza num ponto em que a produtividade marginal do capital é suficiente para fazer surgir o volume de poupança112 Walras no Apêndice I III de sua obra Élé ments déconomie pure onde se ocupa de Léchange dépargnes contre capitaux neufs sustenta expressamente que correspondendo a cada possível taxa de juros há uma soma que os indivíduos poupam e outra que investirão em novos bens de capital que estes dois agregados tendem a igualarse e que a taxa de juros é a variável que os iguala de tal modo que esta se fixa no nível em que a poupança que representa a oferta de capital novo é igual à procura do mesmo Diante disso ele se coloca rigorosamente dentro da tradição clássica Certamente o homem prático banqueiro funcionário público ou político educado na teoria tradicional e também o economista profissional vivem na idéia de que sempre que um indivíduo realiza um ato de poupança faz algo que automaticamente reduz a taxa de juros e que essa baixa estimula automaticamente a criação de capital e de que a baixa na taxa de juros tem lugar precisamente na proporção que se necessita para estimular a produção de capital numa amplitude OS ECONOMISTAS 182 111 A análise do prof Carver sobre o juro é difícil de ser acompanhada 1 porque não esclarece o sentido da produtividade marginal do capital isto é se se trata de quantidade de produto marginal ou de valor do produto marginal e 2 porque não procura definir a quantidade de capital 112 Numa análise muito recente destes problemas KNIGHT Prof F H Capital Time and the Interest Rate In Economica Agosto de 1934 a qual inclui muitas observações pro fundas e interessantes sobre a natureza do capital e confirma a solidez da tradição mars halliana sobre a inutilidade da análise de BöhmBawerk a teoria do juro é apresentada de maneira precisa e conforme a tradição clássica O equilíbrio no domínio da produção de capital significa segundo o prof Knight uma taxa de juros tal que as poupanças afluam ao mercado justamente a um ritmo ou velocidade iguais à sua absorção pelos investimentos que produzem uma taxa de rendimento igual à paga pelo seu uso aos que fazem poupança igual ao aumento da poupança e de que isto é além do mais um fenômeno de ajustamento autoregulador que opera sem necessidade de nenhuma intervenção especial ou de cuidados maternais por parte da autoridade monetária De maneira idêntica e esta é uma crença ainda mais generalizada mesmo hoje cada ato adicional de inves timento fará necessariamente subir a taxa de juros se não for com pensado por uma mudança na disposição para poupar Ora a análise dos capítulos anteriores evidencia que esta expli cação da matéria deve ser errônea Antes de remontar à origem da divergência entre as duas opiniões ocupemonos em primeiro lugar dos seus pontos de concordância Ao contrário da escola neoclássica que julga possível a desigual dade entre a poupança e o investimento a escola clássica propriamente dita admitiu o princípio de sua igualdade Marshall por exemplo acre ditava com certeza embora não o tenha dito expressamente que a poupança agregada e o investimento agregado são necessariamente iguais De fato a maioria dos membros da escola clássica levou esta crença demasiadamente longe visto sustentar que todo ato individual de aumento na poupança suscita necessariamente outro correspon dente ato de aumento de investimento No presente contexto também não há uma diferença substancial entre minha escala de eficiência marginal do capital ou da escala da procura de investimento e a curva da procura de capital como a consideravam alguns dos autores clássicos antes citados Quando chegamos à propensão a consumir e ao seu corolário a propensão a poupar estamos mais próximos de uma dife rença de opinião pois os economistas clássicos enfatizaram o papel representado pela taxa de juros nas variações da propensão a poupar Mas presumivelmente eles não desejariam negar que o nível de renda exerce uma influência também importante sobre o total poupado en quanto da minha parte não negaria que a taxa de juros possa talvez influir embora aliás não na forma que eles supõem sobre a parte poupada de dada renda Todos estes pontos de concordância podem ser resumidos numa proposição que a escola clássica aceitaria e eu não contestaria ou seja que se se supõe conhecido de antemão o nível de renda podemos inferir que a taxa corrente de juros deve estar no ponto onde a curva da demanda por capital correspondente às diferentes taxas intercepta a curva de oferta das quantidades poupadas dessa renda a diferentes taxas de juros Mas este é o ponto em que um erro decisivo se insinua na teoria clássica Se a proposição anterior da escola clássica se limitasse a de duzir que dadas a curva da procura de capital e a influência das variações na taxa de juros sobre a disposição a poupar partindo de determinados níveis de renda a renda e a taxa de juros devem ter uma correlação bastante singular neste caso nada haveria a opor Além disso essa proposição levaria naturalmente a outra proposição KEYNES 183 que contém uma verdade importante ou seja dadas a taxa de juros a curva da procura de capital e a influência dos juros sobre a disposição a poupar de níveis de renda conhecidos o nível de renda deve ser o fator que iguala o montante poupado com o montante investido A teoria clássica porém não apenas ignora a influência das variações do nível da renda como ainda promove um erro formal Dessa forma a teoria clássica como provam as citações acima supõe que se pode proceder ao exame do efeito produzido sobre a taxa de juros por um deslocamento da curva de demanda por capital por exemplo sem contradizer ou modificar a hipótese relativa ao nível da renda dado do qual vai fazerse a poupança Na teoria clássica da taxa de juros as variáveis independentes são a curva da demanda por capital e a influência da taxa de juros sobre a parte de dada renda que se poupa e quando por exemplo a curva de demanda por capital se desloca a nova taxa de juros de acordo com esta teoria é dada pelo ponto de interseção dessa nova curva com a que relaciona a taxa de juros com os montantes que serão poupados dessa dada renda A teoria clássica da taxa de juros parece supor que se a curva de demanda por capital se desloca ou a que liga a taxa com os montantes poupados de dada renda se desloca ou se ambas se deslocam a nova taxa de juros será determinada pelo ponto de interseção das novas posições das duas curvas Mas essa é uma teoria absurda pois a hipótese de que a renda seja constante não é compatível com a de que estas duas curvas podem deslocarse independentemente uma da outra Se qualquer delas se desloca em geral a renda varia também e por conseqüência todo o esquema baseado na hipótese de cada renda se desintegra A posição só poderia ser salva por uma complicada hipótese que previsse uma variação automática na unidade de salários com efeito sobre a prefe rência pela liquidez de tal magnitude que bastasse exatamente para estabelecer uma taxa de juros suficiente para compensar o suposto deslocamento de modo que deixasse a produção no mesmo nível prévio De fato não se encontra nos autores citados nenhuma sugestão sobre a necessidade de semelhante hipótese a qual na melhor das cir cunstâncias só seria possível tratandose de um equilíbrio a longo prazo mas que não poderia servir de base a uma teoria de prazo curto entretanto tampouco há razão para supor que ela tenha va lidez para o longo prazo Na verdade a teoria clássica não se manteve alerta para a importância das variações do nível de renda ou para a possibilidade de que este nível seja efetivamente uma função da taxa de investimento Os argumentos acima podem ser ilustrados por meio do diagra ma113 seguinte OS ECONOMISTAS 184 113 Este diagrama foime sugerido por R F Harrod Cf também um esquema em parte semelhante de ROBERTSON D H Economic Journal Dezembro de 1934 p 652 Neste diagrama o montante do investimento ou da poupança I é medido verticalmente e a taxa de juros r horizontalmente X1X1 é a primeira posição da curva da procura de investimento e X2X2 é a segunda posição desta curva A curva Y1 relaciona os montantes pou pados de uma renda Y1 com os vários níveis da taxa de juros sendo Y2 Y3 etc as curvas correspondentes para níveis de renda Y2 Y3 etc Suponhamos que Y1 seja a curva Y compatível com uma taxa de juros r1 e uma curva da procura de investimento X1X1 Ora se a curva da procura de investimento se desloca de X1X1 para X2X2 em geral a renda se deslocará também Entretanto o diagrama acima não contém dados suficientes para nos indicar qual será o novo valor e portanto não sabendo qual é a curva Y apropriada não sabemos em que ponto ela será cortada pela nova curvademanda dos investimentos Todavia se considerarmos o estado da preferência pela liquidez e a quantidade de moeda e conhecidos estes dois fatores soubermos que a taxa de juros é r2 então toda a posição fica determinada A curva Y que corta X2X2 no ponto situado na vertical acima de r2 a saber a curva Y2 será a curva apropriada Desta forma a curva X e as curvas Y nada nos dizem sobre a taxa de juros Apenas nos indicam qual será a renda sempre que por outros meios possamos determinar qual a taxa de juros Se não houver nenhuma alteração no estado da preferência pela liquidez nem na quantidade de moeda de modo que a taxa de juros permaneça invariável então a curva Y2 que corta a nova curva de demanda dos investimentos abaixo do ponto onde a curva Y1 cortava a antiga curva da demanda será a curva Y apropriada e Y2 será o novo nível de renda Destarte as funções utilizadas pela teoria clássica a saber as KEYNES 185 respostas do investimento e da poupança de determinada renda às variações na taxa de juros não fornecem elementos suficientes para uma teoria da taxa de juros entretanto poderiam ser utilizadas para determinar o montante da renda quando conhecida por outros meios a taxa de juros e alternativamente caso o nível de renda tenha de ser mantido em determinado montante por exemplo no nível corres pondente ao pleno emprego o qual será a taxa de juros O erro se origina em se considerar o juro como a recompensa da espera como tal em vez da recompensa pelo nãoentesouramento assim como as taxas de retorno dos empréstimos ou dos investimentos que implicam graus diversos de risco devem ser consideradas a recompensa não da espera em si mas da aceitação do risco Sem dúvida não existe uma linha definida entre estas e as chamadas taxas de juros puras pois todas elas são a recompensa da aceitação de um risco ou incerteza de qualquer natureza Só no caso em que a moeda servisse apenas para transações e nunca fosse empregada como reserva de valor uma teoria diferente poderia ser apropriada114 Há entretanto dois pontos conhecidos que poderiam talvez ter advertido a escola clássica de que alguma coisa estava errada Em primeiro lugar tem sido aceito pelo menos desde a publicação de Na ture and Necessity of Interest do professor Cassel que não é certo que a parte poupada de dada renda aumente necessariamente quando sobe a taxa de juros ao passo que ninguém duvida que a curva da procura de investimento baixe ao subir a taxa de juros Se as curvas Y e X porém vierem a baixar quando subir a taxa de juros nada garante que determinada curva Y cortará outra curva determinada X em um ponto qualquer Isto sugere que não podem ser as curvas Y e X por si sós que determinam a taxa de juros Em segundo lugar temse usualmente suposto que um aumento na quantidade de moeda tende a reduzir a taxa de juros pelo menos num primeiro momento e em períodos curtos Mas nenhuma razão se deu ainda para que uma variação da quantidade de moeda afete a curva de procura por investimentos ou a propensão a poupar parte de uma renda dada Desta forma a escola clássica adotou duas teorias da taxa de juros completamente diferentes uma no volume I que trata da Teoria do Valor e a outra no volume II que trata da Teoria da Moeda Parece aliás não se ter perturbado com a contradição e pelo menos que eu saiba não fez nenhum esforço para construir uma ponte entre as duas teorias Naturalmente isso se refere à escola clássica propriamente dita pois foram as tentativas da escola neoclássica de construir uma ponte que levaram à pior das confusões Esta última escola acabou chegando à conclusão de que deve haver duas fontes de OS ECONOMISTAS 186 114 Cf cap 17 adiante oferta para se chegar à curva da procura de investimento a saber a poupança propriamente dita da qual se ocupa a escola clássica mais a soma que se torna disponível em conseqüência de qualquer aumento na quantidade de moeda sendo a oferta equilibrada por certas espécies de imposições ou tributação sobre o público chamados poupança for çada ou coisa semelhante Isto leva à idéia de que existe uma taxa de juros natural ou neutra115 ou de equilíbrio ou seja uma taxa que iguala o investimento com a poupança efetiva no sentido clássico sem adição alguma à poupança forçada e conduz finalmente supondo que se esteja na trilha adequada desde o princípio para a solução mais evidente de todas isto é que se a quantidade de moeda pudesse manterse constante em qualquer circunstância nenhuma dessas difi culdades se apresentaria pois os males que se atribuem a um suposto excesso dos investimentos sobre a poupança efetiva deixariam de ser possíveis Nesse instante porém entramos em águas profundas O pato selvagem mergulhou até o fundo o mais fundo que pôde chegar e agarrouse firmemente à vegetação às algas e ao lodo ali existentes seria necessário um cão extremamente hábil para mergulhar e trazêlo de volta à superfície Destarte a análise tradicional é defeituosa porque não conseguiu isolar corretamente as variáveis independentes do sistema A poupança e o investimento são as variáveis determinadas e não os determinantes do sistema São o produto gêmeo dos determinantes quer dizer da propensão a consumir da escala da eficiência marginal do capital e da taxa de juros Na verdade estes determinantes são por si só com plexos e cada um deles pode ser afetado pelas variações prováveis dos outros mas continuam independentes no sentido de que seus valores não podem ser deduzidos uns dos outros A análise tradicional compreendeu que a poupança depende da renda mas se esqueceu do fato de que esta depende do investimento em tal relação que quando o investimento varia a renda é forçada a variar no grau justamente necessário para fazer com que a variação na poupança seja igual à do investimento De forma idêntica essas teorias não lograram sucesso na tenta tiva de fazer com que a taxa de juros dependesse da eficiência marginal do capital É verdade que em equilíbrio a taxa de juros será igual à eficiência marginal do capital visto que será vantajoso aumentar ou diminuir o volume corrente de investimento até que se atinja a igualdade mas fazer disso uma teoria da taxa de juros ou derivar daí a taxa de juros é cair num círculo vicioso como percebeu Marshall quando estava a meio caminho de uma explicação da taxa de juros baseada neste princípio116 A eficiência marginal do capital depende KEYNES 187 115 A taxa de juros neutra dos economistas contemporâneos difere tanto da taxa natural de BöhmBawerk quanto da taxa natural de Wicksell 116 Ver o Apêndice a este capítulo pois em parte do volume corrente de investimento e para calcular esse volume é necessário conhecer antes a taxa de juros A conclusão importante é que o fluxo de investimento se estende até que a eficiência marginal do capital caia ao nível da taxa de juros e o que a escala da eficiência marginal do capital nos indica não é taxa de juros mas os pontos até os quais o fluxo de novos investimentos tende a alcançar quando a taxa de juros tem um valor dado O leitor perceberá sem dificuldade a importância teórica fun damental e o alcance prático considerável do problema que estamos examinando Os economistas quase sempre basearam seus conselhos práticos na teoria de que coeteris paribus uma diminuição nos gastos tenderá a fazer baixar a taxa de juros e um aumento do investimento tenderá a fazêla subir porém se o que estas duas quantidades de terminam não é a taxa de juros mas o volume agregado do emprego então nossa visão sobre o funcionamento do sistema econômico nos aparecerá profundamente modificada Uma menor disposição para gas tar será vista de uma perspectiva bastante diferente se em vez de considerála um fator que coeteris paribus aumenta o investimento for considerada um fator que coeteris paribus faz diminuir o emprego OS ECONOMISTAS 188 APÊNDICE AO CAPÍTULO 14 Apêndice Sobre a Taxa de Juros em Principles of Economics de Marshall em Principles of Political Economy de Ricardo e em Outras Obras I Não há nenhum estudo sistemático sobre a taxa de juros nas obras de Marshall de Edgeworth e do professor Pigou excetuandose obiter dicta aqui ali e acolá Além da passagem já citada anteriormente p 103 a única indicação importante sobre a posição de Marshall a respeito da taxa de juros encontrase em sua obra Principles of Eco nomics 6ª ed Livro VI p 534 e 593 cuja essência pode ser encontrada nas citações seguintes O juro sendo pago pelo uso do capital em qualquer mercado tende a um nível de equilíbrio no qual a procura agregada de capital no dito mercado a essa taxa de juros é igual ao estoque agregado117 que nele se apresenta à mesma taxa Se o mercado que estamos considerando for pequeno digamos uma única cidade ou um ramo de comércio isolado em um país em progresso um aumento na sua procura de capital será logo compensado pelo aumento da oferta proveniente de distritos ou ramos comer ciais vizinhos Porém se considerarmos o mundo em conjunto ou pelo menos todo grande país como um único mercado de ca pital não poderemos pensar que uma variação na taxa de juros 189 117 Devese notar que Marshall emprega a palavra capital e não moeda bem como a palavra estoque e não empréstimo todavia o juro é um pagamento pelo empréstimo de moeda e procura de capital neste contexto deveria significar procura de empréstimos de moeda para comprar um estoque de bens de capital Mas a igualdade entre o estoque de bens de capital ofertado e o volume demandado é criada pelo preço dos bens de capital e não pela taxa de juros O que a taxa de juros iguala efetivamente é a procura e a oferta de empréstimos de moeda isto é de débitos altere rápida e amplamente a oferta agregada de capital O fundo geral de capital é o produto do trabalho e da espera o trabalho extra118 e a espera extra para os quais uma alta na taxa de juros seria um incentivo não atingiriam grandes volumes num prazo breve comparados com o trabalho e a espera que originam a totalidade do estoque existente de capital Grande aumento da procura de capital em geral é pois satisfeito durante certo tempo menos por um incremento da oferta do que por uma alta na taxa de juros119 o que levará o capital a desviarse parcialmente dos usos em que a sua utilidade marginal seja menor A alta na taxa de juros só aumentará o estoque total de capital de forma lenta e gradual p 534 É necessário sempre repetir que a expressão taxa de juros só é aplicável em sentido muito limitado aos antigos investimentos de capital120 Poderíamos por exemplo calcular que um capital industrial de uns sete bilhões está investido nas diferentes ati vidades produtivas desse país a uma taxa de juros líquida de cerca de 3 Mas esta maneira de dizer embora conveniente e justificável em muitos casos não é exata O que se deveria dizer é que considerando a taxa de juros líquida sobre os investimentos de capital novo em cada uma dessas atividades isto é sobre os investimentos marginais em torno de 3 a renda agregada lí quida produzida por todo o capital investido nas diversas ativi dades é de tal natureza que capitalizada em 33 anos ou seja OS ECONOMISTAS 190 118 Isso supõe que a renda não é constante mas a maneira pela qual a alta taxa de juros provoca o trabalho extra não é explicitada claramente Deverseia entender que uma elevação da taxa de juros pelo fato de tornar maiores os atrativos do trabalho com o fim de poupar é para ser considerada uma forma de aumento dos salários reais que induzirá os fatores de produção a trabalharem por um salário menor Tal é penso eu o modo de ver de D H Robertson num contexto semelhante Certamente isto não significaria grande coisa a curto prazo e seria temerário para não dizer absurdo querer explicar deste modo as flutuações efetivas do investimento A forma em que redigiria de novo a segunda metade desta frase seria e se um aumento considerável na demanda de capital em geral em virtude de um deslocamento na curva da eficiência marginal do capital não for compensado por uma alta da taxa de juros o aumento subseqüente do emprego e da renda resultante de um acréscimo na produção de bens de capital levará a um montante de espera extra que medido em termos monetários será exatamente igual ao valor do incremento efetivo de capital e bastará portanto justamente para o satisfazer 119 Por que não por uma alta no preço de oferta dos bens de capital Suponhamos por exemplo que o grande aumento na demanda de capital em geral se deva a uma baixa na taxa de juros Sugeriria que a frase tivesse esta nova redação Portanto na medida em que um aumento considerável na procura de bens de capital não possa ser imediatamente satisfeito por um aumento do estoque total este aumento deverá ser contido durante o tempo que se fizer necessário por uma elevação do preço de oferta dos bens de capital que baste para conservar a eficiência marginal do capital em equilíbrio com a taxa de juros sem que haja alteração substancial no montante físico do investimento enquanto isso como sempre acontece os fatores de produção adaptados à produção de bens de capital serão usados para elaborar aqueles bens cuja eficiência marginal seja maior nas novas condições 120 De fato não se pode falar de tal coisa absolutamente Podemos falar propriamente apenas da taxa de juros sobre o dinheiro que foi tomado emprestado para a aquisição de investi mentos de capital novo ou velho ou para qualquer outro objetivo à taxa de 3 alcançaria o montante de uns sete bilhões de libras pois o valor do capital já investido para preparar a terra na construção de edifícios de estradas de ferro ou de máquinas é o valor agregado descontado correspondente a suas futuras rendas líquidas estimadas ou quaserendas e se a sua renda provável diminuísse seu valor baixaria proporcionalmente e não seria mais que o valor capitalizado dessa renda reduzida depois de levada em conta a depreciação p 593 Em sua obra Economics of Welfare 3ª ed p 163 o professor Pigou escreve A natureza do serviço da espera tem sido muito mal inter pretada Algumas vezes foi feita a suposição de que consistia na provisão de moeda outras vezes na provisão de tempo e em ambas as hipóteses sustentouse que ela em nada contribui para o dividendo Nenhuma destas suposições é correta A espera significa apenas adiar o consumo que uma pessoa tem o direito de efetuar imediatamente liberando assim os recursos que po deriam ter sido destruídos para tomar a forma de instrumentos de produção121 A unidade de espera é portanto o uso de uma quantidade determinada de recursos122 por exemplo mãode obra ou maquinaria durante certo tempo Em termos mais gerais podemos dizer que a unidade de espera é uma unidade de valor anual ou na linguagem mais simples embora menos exata do dr Cassel uma libraano É preciso que se faça uma advertência contra o ponto de vista generalizado de que o volume de capital acumulado durante um ano seja necessariamente igual ao montante das poupanças feitas durante o mesmo Tal não é o caso ainda que interpretemos a palavra poupanças no sentido de poupanças líquidas eliminando assim a poupança de um indivíduo emprestada a outro para aumentar seu consumo e ignorando as acumulações temporárias de direitos de haver não exercidos sob a forma de moeda bancária pois muitas das poupanças destinadas a se converterem em capital de fato não cumprem o seu objetivo desviadas que são para usos que repre sentam um desperdício123 KEYNES 191 121 Esta formulação é ambígua não nos diz se o adiamento do consumo tem necessariamente este efeito ou se tem apenas por resultado liberar recursos que conforme as circunstâncias ficarão em emprego ou servirão para investimentos 122 E não cumpre notar a quantidade de dinheiro que o beneficiário do rendimento poderia gastar mas não gasta em consumo a remuneração da espera tem portanto o caráter não de um juro mas de uma quaserenda Esta frase parece admitir implicitamente que os recursos liberados são necessariamente usados Qual será pois a remuneração da espera se os recursos liberados não forem utilizados 123 Esta passagem não nos diz se as poupanças líquidas seriam iguais ou não ao incremento do capital caso não levássemos em conta os investimentos mal orientados embora consi A única menção significante feita pelo professor Pigou a respeito do que determina a taxa de juros se encontra acho eu em seu livro Industrial Fluctuations 1ª ed p 251253 onde discute a tese de que a taxa de juros pelo fato de ser determinada pelas condições gerais da oferta e da procura de capital físico escapa ao controle dos bancos ou do banco central Em contradição a esta tese apresenta o seguinte argumento Quando os banqueiros criam mais crédito para os homens de negócios efetuam em seu próprio interesse conforme explicações feitas no capítulo XIII da Parte Primeira124 uma tributação for çada sobre os bens reais do público aumentando assim o fluxo corrente de capital real de que dispõem e ocasionando uma baixa na taxa real de juros tanto para o longo quanto para o curto prazo Em resumo é certo que a taxa bancária do dinheiro está ligada por um vínculo mecânico à taxa real de juros nos emprés timos a longo prazo mas não é verdade que esta última seja determinada por fatores que escapam completamente ao controle dos bancos Meus breves comentários sobre as passagens acima foram feitos nas notas de rodapé A perplexidade que verifico nas idéias de Marshall sobre o assunto reside fundamentalmente na introdução do conceito de juro o qual pertence a uma economia monetária num tratado que não leva em conta a moeda O juro na realidade está fora de contexto na obra Principles of Economics de Marshall pertence a outro ramo da matéria O professor Pigou de acordo com suas outras hipóteses tácitas levanos a concluir em sua obra Economics of Welfare que a unidade de espera é a mesma que a unidade de investimento corrente e que a remuneração de espera tem o caráter de uma qua serenda praticamente quase nunca menciona o juro e tem razão em não o mencionar Contudo estes autores não estão tratando com OS ECONOMISTAS 192 derássemos as acumulações temporárias dos direitos de haver não exercidos sob forma de moeda bancária Mas o prof Pigou em Industrial Fluctuations p 22 explica claramente que tais acumulações não têm efeito sobre o que ele chama poupança real 124 O texto a que o prof Pigou se refere op cit p 129134 expõe seu ponto de vista sobre a medida em que a criação pelos bancos aumenta o fluxo de capital real disponível para os empresários Na verdade procura deduzir do crédito flutuante concedido aos empresários por meio de criação de crédito o capital flutuante que teria sido fornecido por outros meios se os bancos não estivessem lá Depois de feitas estas deduções o raciocínio tornase bastante obscuro Para começar as pessoas que vivem de rendas rentiers têm uma renda de 1 500 da qual consomem 500 e economizam 1 000 o ato de criação de crédito reduzlhes a renda a 1 300 da qual consomem 500 x e economizam 800 x e x conclui o prof Pigou representa o aumento líquido de capital que ficou disponível em razão da criação de crédito Devese supor que a renda dos empresários é inflada pelo montante que eles conseguem emprestado dos bancos depois de feitas as deduções citadas Ou aumenta pelo valor 200 subtraído da renda dos rentiers Em qualquer das hipóteses devese supor que poupam o total desse valor O investimento suplementar é igual aos créditos criados menos as deduções Ou é igual a x Parece que o raciocínio acaba onde deveria começar uma economia não monetária se é que existe tal coisa admitem cla ramente que se utiliza a moeda e que existe um sistema bancário Igualmente em Industrial Fluctuations do professor Pigou onde es tuda sobretudo as flutuações da eficiência marginal do capital ou em sua Theory of Unemployment que é primordialmente um estudo das causas da variação no volume de emprego na hipótese de que não exista desemprego involuntário a taxa de juros tampouco representa um papel mais importante do que em sua obra Economics of Welfare II A passagem seguinte extraída da obra Principles of Political Eco nomy p 511 contém o essencial da teoria de Ricardo sobre a taxa de juros O juro do dinheiro não é regulado pela taxa à qual o banco emprestará seja ela de 5 3 ou 2 mas pela taxa de lucro que se pode obter do emprego do capital a qual é inteiramente in dependente da quantidade ou do valor do dinheiro Ainda que o Banco empreste um milhão dez milhões ou cem milhões isso não altera de modo permanente a taxa de juros do mercado senão apenas o valor da moeda assim emitida Em certo caso poderseia necessitar de dez ou vinte vezes mais dinheiro do que em outro para explorar o mesmo negócio Os pedidos de empréstimos bancários dependem portanto da relação entre a taxa de lucro que se pode conseguir com seu emprego e aquela à qual o Banco está disposto a emprestálos Se esta última for menor que a taxa de juros do mercado não haverá dinheiro bas tante que não possa ser emprestado se for maior apenas os esbanjadores e os pródigos estarão dispostos a tomálo Isto é tão claro que oferece um ponto de partida para uma melhor discussão das afirmações dos autores subseqüentes os quais sem real mente se afastarem da essência da doutrina ricardiana se sentem entretanto constrangidos a ponto de procurarem refúgio em colocações nebulosas Decerto o que foi dito como sempre acontece quando se trata de Ricardo tem de ser interpretado como uma doutrina de longo prazo com ênfase sobre a palavra permanente inserida no meio da passagem e é interessante considerar as hipóteses necessárias para validar esta teoria Uma vez mais a hipótese que se aplica é a hipótese clássica de que há sempre pleno emprego desse modo supondo a inexistência de mudanças na curva de oferta de trabalho em termos de produto há apenas um nível possível de emprego no equilíbrio a longo prazo Nesta hipótese e com a usual condição de coeteris paribus isto é de que não haja nas propensões ou expectativas psicológicas nenhuma outra mudança além daquelas decorrentes de uma alteração na quantidade KEYNES 193 de moeda a teoria ricardiana é válida no sentido de que com base nessas hipóteses resta apenas uma taxa de juros compatível com o pleno emprego a longo prazo Ricardo e seus sucessores não deram a devida importância ao fato de que mesmo a longo prazo o nível de emprego não é necessariamente pleno podendo alcançar níveis diversos e que a cada política bancária corresponde um nível de emprego dife rente a longo prazo em conseqüência pode haver a longo prazo di versas posições de equilíbrio correspondentes às diversas políticas de juros suscetíveis de serem adotadas pela autoridade monetária Se Ricardo houvesse restringido a apresentação de seu argumento à sua aplicação apenas às variações da quantidade de moeda criada pela autoridade monetária teria ainda sido correto admitindo a hi pótese de que os salários nominais fossem flexíveis Em outros termos se Ricardo houvesse sustentado que a taxa de juros não sofreria alte ração permanente embora a autoridade monetária fixasse em dez mi lhões ou em cem milhões a quantidade de moeda a sua conclusão seria válida Mas se por política da autoridade monetária queremos significar também os termos em que essa autoridade aumentará ou diminuirá a quantidade de moeda isto é a taxa de juros à qual seja por mudança no volume dos descontos seja por operações de mercado aberto ela aumentará ou reduzirá suas disponibilidades que é ex pressamente o que Ricardo está dizendo na citação acima então deixa de ser exato que a política monetária seja ineficaz ou que apenas uma única política seja compatível com o equilíbrio a longo prazo embora no caso extremo em que se supõe uma baixa ilimitada nos salários nominais em face do desemprego involuntário em razão da inútil concorrência entre os trabalhadores desocupados haja apenas duas posições possíveis a longo prazo pleno emprego e nível de emprego correspondente à taxa de juros em que a preferência pela liquidez se torna absoluta caso este volume de emprego seja inferior ao pleno emprego Admitindo salários nominais flexíveis a quantidade de moeda como tal é com efeito ineficaz a longo prazo mas os termos em que a autoridade monetária modifica essa quantidade intervêm no esquema econômico como determinante real Vale a pena acrescentar que as últimas frases da citação sugerem que Ricardo não levou em conta as possíveis modificações na eficiência marginal do capital de acordo com o montante investido Mas isto pode ser interpretado como um novo exemplo da sua maior coerência lógica comparada à dos seus sucessores Se tomarmos como dados o volume de emprego e das tendências psicológicas da comunidade só pode de fato haver uma taxa possível de acumulação de capital Ricardo ofe recenos a suprema realização intelectual inatingível por espíritos me nos privilegiados de adotar um mundo hipotético distante da expe riência como se fora o próprio mundo da experiência e em seguida de nele viver consistentemente No caso da maior parte dos seus su OS ECONOMISTAS 194 cessores é impossível evitar a interferência do bom senso que causa prejuízos à coerência lógica III O professor von Mises propôs uma teoria peculiar da taxa de juros a qual foi adotada pelo professor Hayek e também creio eu pelo professor Robbins Segundo esta teoria poderseiam identificar as variações da taxa de juros com as dos níveis de preços relativos dos bens de consumo e dos bens de capital125 O meio de chegar a esta conclusão não ficou claro Mas o raciocínio parece desenvolverse da seguinte maneira através de uma simplificação um tanto drástica a eficiência marginal do capital é considerada como medida pela relação entre os preços de oferta dos novos bens de consumo e por preços de oferta dos novos bens de produção126 Em seguida esta relação é iden tificada com a taxa de juros Chamase a atenção para o fato de que uma baixa na taxa de juros é favorável ao investimento Ergo uma baixa na relação entre os preços dos bens de consumo e os bens de produção é favorável ao investimento Por este meio criase um elo entre o incremento da poupança de um indivíduo e do investimento agregado pois é sabido que o au mento da poupança individual faz baixar o preço dos bens de consumo e possivelmente em proporção bem maior que o dos bens de produção portanto isto significa de acordo com o raciocínio precedente uma redução da taxa de juros que estimulará o investimento Tornase portanto evidente que uma diminuição da eficiência marginal de certos bens de capital específicos e em conseqüência uma baixa da curva da eficiência marginal do capital em geral produzem um efeito exata mente oposto ao que presume o raciocínio anterior pois o investimento é estimulado quer por uma alta da curva da eficiência marginal quer por uma baixa da taxa de juros Por haver confundido a eficiência marginal do capital com a taxa de juros o professor von Mises e seus discípulos chegaram a conclusões exatamente contrárias e erradas Um bom exemplo de confusão desta espécie é o seguinte trecho do professor Alvin Hansen127 Alguns economistas sugeriram que uma redução dos gastos teria como resultado líquido um nível de preços dos bens de con sumo inferior ao que existiria em outras condições e que em KEYNES 195 125 The Theory of Money and Credit p 339 et pas particularmente p 363 126 Num equilíbrio de longo prazo poderseiam conceber hipóteses especiais em que este ra ciocínio seria exato mas quando os preços em questão são os que prevalecem em período de crise é errado supor a título de simplificação que o empresário faz suas previsões como se esses preços devessem ser permanentes Além disso se o fizer os preços de bens de produção existentes baixariam na mesma proporção que os preços dos bens de consumo 127 Economic Reconstruction p 233 conseqüência o estímulo para o investimento em capital fixo ten deria a reduzirse Este ponto de vista é contudo incorreto e baseiase numa confusão entre os efeitos que exercem respecti vamente sobre a formação do capital 1 da alta ou baixa do preço dos bens de consumo e 2 das variações da taxa de juros É verdade que em conseqüência da redução dos gastos e do au mento da poupança os preços dos bens de consumo baixaram em relação aos dos bens de produção Mas isto significa na rea lidade uma taxa de juros menor e uma taxa de juros menor provoca uma expansão do investimento de capital em áreas onde não seria lucrativo se as taxas fossem mais elevadas OS ECONOMISTAS 196 CAPÍTULO 15 Os Incentivos Psicológicos e Empresariais para a Liquidez I Cumprenos agora analisar mais detalhadamente os motivos da preferência pela liquidez que apresentamos de forma introdutória no capítulo 13 O assunto é substancialmente idêntico ao que por vezes tem sido estudado sob a designação de demanda de moeda Isto se relaciona também de forma íntima com aquilo que se tem chamado a velocidaderenda da moeda pois a velocidaderenda da moeda mede simplesmente a proporção de renda que o público deseja conservar em forma de moeda de tal modo que um aumento na velocidaderenda da moeda pode ser sintoma de uma redução na preferência pela liquidez Todavia não é a mesma coisa uma vez que é em relação ao seu enfoque acumulado de poupança em vez de em relação à sua renda que o indivíduo pode exercer sua escolha entre a liquidez e a iliquidez E de qualquer maneira a expressão velocidaderenda da moeda tem implícita a sugestão enganosa de assumir que a procura da moeda em conjunto seja proporcional ou tenha determinada relação com a renda ora conforme veremos esta suposição só deverá aplicarse a uma parte dos encaixes líquidos do público como resultado disso não leva em conta o papel desempenhado pela taxa de juros Em minha obra Treatise on Money estudei a demanda total da moeda sob três designações depósitos de renda depósitos para negócios e depósitos de poupança e pareceme desnecessário repetir aqui a aná lise do capítulo 3 dessa obra O dinheiro guardado para cada um destes três motivos constitui no entanto um fundo único que o seu detentor não precisa dividir em três compartimentos estanques pois eles podem não ser nitidamente separados nem mesmo em sua mente e certa soma pode ser reservada primordialmente para um fim e secundaria mente para outro Destarte podemos de forma idêntica e talvez melhor considerar a demanda agregada da moeda do indivíduo em 197 determinadas circunstâncias como uma decisão única para a qual concorrem vários motivos diferentes Ao analisar estes motivos é apesar de tudo conveniente classi ficálos como foi feito anteriormente em categorias a primeira das quais corresponde em linhas gerais aos depósitos de renda e aos de pósitos para negócios e as duas últimas aos depósitos de poupança Já os apresentei sucintamente no capítulo 13 sob as designações de motivotransação que pode ainda subdividirse em motivorenda e mo tivosnegócios motivoprecaução e motivoespeculação i O motivorenda Uma das razões para conservar recursos lí quidos é garantir a transição entre o recebimento e o desembolso da renda A força deste motivo para induzir uma decisão de conservar um montante agregado de moeda dependerá principalmente do mon tante da renda e da duração normal do intervalo entre o seu recebi mento e o seu desembolso O conceito de velocidaderenda da moeda é estritamente apropriado apenas a este contexto ii Os motivosnegócios Da mesma maneira os recursos líquidos são conservados para assegurar o intervalo entre o momento em que começam as despesas e o do recebimento do produto das vendas in cluindose sob este título os recursos líquidos que conservam os em presários para garantir o intervalo entre a compra e a realização A intensidade desta demanda dependerá principalmente do valor da produção corrente e portanto do rendimento corrente e do número de mãos através das quais passa essa produção iii O motivoprecaução Entre outros motivos para conservar recursos líquidos destacamse os de atender às contingências inespe radas e às oportunidades imprevistas de realizar compras vantajosas e os de conservar um ativo de valor fixo em termos monetários para honrar uma obrigação estipulada em dinheiro A força desses três tipos de motivos dependerá em parte do custo e da segurança dos métodos para obter dinheiro em caso de necessidade por meio de alguma forma de empréstimo temporário especialmente retiradas a descoberto ou o seu equivalente pois não há necessidade de conservar dinheiro ocioso para assegurar os inter valos se se pode obtêlo sem dificuldade no momento oportuno Sua força dependerá também do que podemos denominar o custo relativo da retenção de recursos líquidos Se os recursos líquidos só podem ser retidos mediante o sacrifício da compra de um bem lucrativo esta circunstância aumenta o custo relativo de sua retenção e portanto debilita o motivo para guardar certo montante de recursos líquidos Se os depósitos auferem juros ou se se evitam despesas bancárias con servando o dinheiro isso diminui o custo e reforça o motivo Este fator OS ECONOMISTAS 198 contudo pode ser de importância secundária salvo em caso de grandes alterações no custo da retenção de recursos líquidos iv Resta o motivoespeculação Ele requer um estudo mais de talhado que os outros tanto pelo fato de ser menos compreendido como por ser especialmente importante para transmitir os efeitos de uma variação na quantidade de moeda Em circunstâncias normais o volume de moeda necessário para satisfazer os dois motivos transação e precaução é principalmente o resultado da atividade geral do sistema econômico e do nível da renda nacional em termos monetários Todavia a administração monetária ou em sua ausência as mudanças fortuitas que podem advir da quan tidade de moeda faz sentir seu efeito sobre o sistema econômico por sua influência sobre o motivoespeculação Isso porque a demanda de moeda para satisfazer os motivos anteriores é em geral insensível a qualquer influência que não a de uma alteração efetiva na atividade econômica geral e no nível da renda ao passo que a experiência mostra que a demanda de moeda para satisfazer o motivoespeculação varia de modo contínuo sob o efeito de uma alteração gradual na taxa de juros isto é há uma curva contínua relacionando as variações na de manda de moeda para satisfazer o motivoespeculação com as que ocor rem na taxa de juros devidas às variações no preço dos títulos e às dívidas de vencimentos diversos De fato se assim não fosse as operações de mercado aberto seriam impraticáveis Eu disse que a experiência indica a relação constante há pouco mencionada porque de fato o sistema bancário está sempre apto em circunstâncias normais a comprar ou vender títulos e obri gações em troca de moeda oferecendo por eles um preço de mercado modestamente maior ou menor e quanto maior for a quantidade de recursos líquidos que os bancos desejam criar ou cancelar pela compra ou venda de títulos e dívidas maior deverá ser a baixa ou alta na taxa de juros Entretanto quando as operações de mercado aberto como nos Estados Unidos em 19331934 se limitam à compra de títulos de vencimento muito próximo o seu efeito pode evidentemente limitarse à simples taxa de juros a prazo muito curto e provocar apenas ligeira reação sobre as taxas de juros a longo prazo que são muito mais importantes Ao tratar do motivo de especulação convém distinguir entre as variações da taxa de juros as que se devem a mudanças na oferta de moeda disponível para satisfazer esse motivo sem que haja ocorrido alteração alguma na função de liquidez e as que têm como causa principal as mudanças nas expectativas que afetam diretamente essa função As operações de mercado aberto podem sem dúvida influir sobre a taxa de juros de ambas as maneiras quer alterando o volume de moeda quer dando origem a novas expectativas relativamente à KEYNES 199 política futura do banco central ou do governo As mudanças próprias da função de liquidez resultantes de modificações nas informações que provocam revisão das previsões são freqüentemente descontínuas e engendram descontinuidades correspondentes nas variações da taxa de juros Decerto só haverá lugar para uma atividade maior de negócios no mercado de títulos na medida em que a variação de informações for interpretada de modo diferente pelos diferentes indivíduos ou afete os interesses individuais de maneira desigual Quando uma mudança no noticiário afeta a opinião e as necessidades de cada um de forma precisamente idêntica a taxa de juros tal como é indicada pelos preços de títulos e dívidas se ajustará imediatamente à nova situação sem necessidade de quaisquer transações de mercado Assim sendo no caso mais simples em que todos os indivíduos têm opiniões e interesses semelhantes uma alteração nas circunstân cias ou nas expectativas não ocasionará nenhum deslocamento de moe da apenas modificará a taxa de juros no grau necessário para contra balançar o desejo que no nível anterior de juro cada indivíduo sentia no sentido de ajustar suas reservas líquidas às circunstâncias ou expec tativas novas e desde que todos mudem no mesmo grau suas idéias quanto à taxa que os induzam a alterar suas reservas líquidas não re sultará transação alguma A cada conjunto de circunstâncias e de expec tativas corresponderá uma taxa de juros apropriada e nunca se verificarão suspeitas de alguém modificar suas reservas líquidas habituais De modo geral entretanto uma alteração nas circunstâncias ou expectativas provocará um reajuste nas reservas líquidas individuais desde que de fato uma mudança influa nas idéias dos diferentes indivíduos de modo diverso devido em parte às diferenças de meio ambiente e ao motivo que os levou a guardar dinheiro e em parte às diferenças de conhecimento e interpretação da nova situação Desse modo a nova posição de equilíbrio da taxa de juros estará associada a uma redistribuição da retenção dos recursos líquidos Todavia o que mais nos interessa é a mudança na taxa de juros e não a redistribuição dos recursos líquidos Esta última é devida apenas a diferenças even tuais entre os indivíduos ao passo que o fenômeno essencial é o que ocorre no caso mais simples Mais do que isso mesmo no caso geral a variação da taxa de juros é comumente o efeito mais importante da reação a uma mudança nas informações O movimento nos preços dos títulos e obrigações está como costumam dizer os jornais fora de qualquer proporção com a atividade dos negócios e é natural que assim o seja tendose em vista que as reações dos diversos indi víduos às informações são muito mais similares do que dessemelhantes II Embora o montante de recursos líquidos que um indivíduo resolve conservar para satisfazer os motivos de transações e de precaução não OS ECONOMISTAS 200 seja inteiramente independente do que ele conserva para satisfazer o motivo de especulação podemos considerar como uma abordagem ini cial válida estas duas categorias de recursos líquidos como sendo em grande parte independentes uma da outra Conseqüentemente para facilitar nossa análise apresentada a seguir desdobraremos o problema deste ponto de vista Sejam M1 o montante de recursos líquidos conservado para sa tisfazer o motivotransação e o motivoprecaução e M2 o montante con servado para satisfazer o motivoespeculação Correspondendo a estes dois compartimentos de recursos líquidos temos então duas funções de liquidez L1 e L2 L1 depende principalmente do nível de renda enquanto L2 depende da relação entre a taxa corrente de juros e o estado das expectativas Portanto M M1 M2 L1 Y L2 r onde L1 é a função de liquidez correspondente à renda Y que de termina M1 e L2 a função de liquidez em relação à taxa de juros r que determina M2 Isto leva à confusão de que há três questões a investigar i a relação entre as variações de M e as de Y e r ii os fatores que determinam a forma de L1 iii os fatores que determinam a forma de L2 i A relação entre as variações de M e as de Y e r depende na primeira instância da maneira como ocorrem as variações de M Su ponhamos que M consista em moedas de ouro e que só possa variar em conseqüência de um incremento de renda nas atividades de mine ração de ouro pertencente ao sistema econômico que está sendo exa minado Neste caso as variações de M estão na primeira instância diretamente associadas às de Y em se considerando que o novo ouro se acrescenta à renda de alguém A situação é exatamente a mesma quando as variações de M são devidas a emissões de papelmoeda feitas pelo Governo para atender a suas despesas correntes neste caso também o novo dinheiro se acrescenta à renda de alguém O novo nível de renda entretanto não permanecerá suficientemente alto para que as necessidades de M1 absorvam todo o aumento de M e uma parte do dinheiro procurará saída na compra de títulos ou de outros bens até que r tenha baixado de modo que provoque uma alta no montante de M2 e ao mesmo tempo estimule um aumento de Y a tal ponto que o novo dinheiro seja absorvido quer por M2 quer por M1 o que corresponde ao aumento de Y ocasionado pela baixa de r Este caso tornase assim aproximadamente igual ao outro em que o novo dinheiro só pode ser emitido na primeira instância por meio de um afrouxamento das condições de crédito por parte do sistema bancário de modo que induza alguém a vender aos bancos um título ou letra em troca de nova moeda KEYNES 201 Estaremos portanto bem fundamentados se tomarmos o último caso como típico Podese admitir que uma variação de M conduza a uma variação em r e uma variação em r conduza a novo equilíbrio em parte por alterar M2 e em parte por modificar Y e conseqüente mente M1 Na posição de equilíbrio a divisão do incremento de recursos líquidos entre M1 e M2 dependerá da reação do investimento a uma baixa na taxa de juros e da renda a um acréscimo do investimento128 Desde que Y depende em parte de r segue que determinada variação em M terá de ocasionar uma variação suficiente em r para que a soma das variações resultantes de M1 e M2 seja igual à variação dada de M ii Nem sempre ficou claro se a velocidaderenda da moeda é definida como a proporção entre Y e M ou como a proporção entre Y e M1 Proponho contudo tomála neste último sentido Assim sendo se V for a velocidaderenda da moeda teremos L1 Y Y V M1 Não há naturalmente nenhuma razão para supor que V seja constante Seu valor dependerá do caráter da organização bancária e industrial dos hábitos sociais da distribuição da renda entre as dife rentes classes e do custo real de conservar dinheiro ocioso Não obstante isso se tivermos um prazo curto em mente e se pudermos admitir que não haverá mudança substancial em nenhum destes fatores poderemos considerar V quase constante iii Resta finalmente a questão da relação entre M2 e r Vimos no capítulo 13 que a incerteza das futuras variações na taxa de juros é a única explicação inteligível da preferência pela liquidez L2 que justifica a conservação de recursos líquidos M2 Seguese daí que entre certo montante e certa taxa de juros r não haverá relação quan titativa definida o que importa não é o nível absoluto de r mas o seu grau de divergência quanto ao que se considera um nível razoavelmente seguro de r levando em conta os cálculos de probabilidade a que se recorre Existem entretanto duas razões para crer que em certo estado de expectativa uma baixa de r estará associada a um aumento de M2 Em primeiro lugar se o nível de r que a opinião geral considera seguro permanece invariável cada baixa de r diminui a taxa do mercado re lativamente ao nível considerado seguro e portanto aumenta os riscos de liquidez em segundo lugar cada baixa de r reduz os lucros correntes provenientes da iliquidez que está disponível como uma espécie de OS ECONOMISTAS 202 128 Temos de postergar para o Livro Quinto a questão de saber o que determina o caráter do novo equilíbrio prêmio de seguro para compensar o risco de perda de capital em quan tidade igual à diferença entre os quadrados da taxa antiga de juros e da nova Por exemplo se a taxa de juros nas dívidas a longo prazo for de 4 é preferível que se sacrifique a liquidez a não ser que um balanço da probabilidade faça temer uma alta da taxa de juros a longo prazo superior a 4 do seu valor por ano isto é superior a 016 ao ano Entretanto se a taxa de juros for de 2 o rendimento corrente apenas compensará uma alta eventual do juro de 004 ao ano É este de fato o principal obstáculo para uma baixa muito acentuada da taxa de juros A não ser que possam existir razões para crer que a experiência futura seja muito diferente da passada uma taxa de juros a longo prazo de digamos 2 deixa mais a temer de que a esperar e ao mesmo tempo oferece um rendimento corrente que é apenas suficiente para compensar um ligeiro temor É portanto evidente que a taxa de juros é um fenômeno basi camente psicológico Veremos de fato no Livro Quinto que ela não poderá manterse em equilíbrio em um nível inferior ao que corresponde ao pleno emprego porque nesse nível se produzirá um estado de inflação real em que M1 absorverá quantidades sempre crescentes de dinheiro Porém num nível que esteja acima do correspondente ao pleno em prego a taxa de juros a longo prazo dependerá não apenas da política corrente da autoridade monetária mas também das expectativas do mercado no que se refere à sua política futura A autoridade monetária controla com facilidade a taxa de juros a curto prazo não só pelo fato de não ser difícil criar a convicção de que sua política não mudará sensivelmente em um futuro muito próximo como também em virtude de a possível perda ser pequena quando comparada com o rendimento corrente a não ser que este chegue a ponto de ser quase nulo Mas a taxa a longo prazo pode mostrarse mais recalcitrante no momento em que caia a um nível que com base na experiência passada e nas expectativas correntes da política monetária futura a opinião abalizada considera inseguro Por exemplo em um país ligado a um padrãoouro internacional uma taxa de juros inferior à prevalecente em qualquer outra parte será vista com justificável desconfiança mesmo assim uma taxa de juros interna elevada à paridade com a mais alta a mais alta depois de considerados os riscos existente nos outros países perten centes ao sistema internacional pode estar muito acima do nível com patível com o pleno emprego interno Assim sendo uma política monetária que a opinião pública con sidere experimental em sua natureza e facilmente sujeita a mudanças pode falhar no seu objetivo de reduzir consideravelmente a taxa de juros a longo prazo porque M2 pode levar a um aumento quase sem limite em resposta a uma redução de r abaixo de certa cifra A mesma política por outro lado pode ser facilmente bemsucedida se a opinião pública julgála razoável e compatível com o interesse público baseada KEYNES 203 em convicção sólida e promovida por uma autoridade que não corra risco de ser suplantada Talvez fosse mais exato dizer que a taxa de juros seja um fenô meno altamente convencional do que basicamente psicológico pois o seu valor observado depende sobremaneira do valor futuro que se lhe prevê Qualquer taxa de juros aceita com suficiente convicção como provavelmente duradoura será duradoura sujeita naturalmente em uma sociedade em mudança a flutuações originadas por diversos mo tivos em torno do nível normal esperado Em particular quando M1 aumenta mais depressa que M a taxa de juros subirá e viceversa Mas pode flutuar durante décadas ao redor de um nível cronicamente elevado demais para permitir o pleno emprego particularmente se prevalecer a opinião de que o ajuste da taxa de juros se faz de maneira automática se se julgar que o nível estabelecido pela convenção tenha suas raízes em bases objetivas muito mais firmes que a convenção uma vez que de modo algum está associada na mente do público ou das autoridades a idéia de não ser possível alcançar um nível ótimo de emprego com a existência de uma gama inadequada de taxas de juros Já devem ser bastante evidentes para o leitor as dificuldades que se antepõem ao propósito de manter uma demanda efetiva de nível suficientemente alto para garantir o pleno emprego resultantes da associação de uma taxa de juros a longo prazo convencional e bas tante estável com uma eficiência marginal do capital inconstante e altamente instável Se quisermos tirar proveito de reflexões mais animadoras temos de procurálo convictos de que a convenção nem sempre oferecerá muita resistência a uma lógica contundente e a um firme propósito da au toridade monetária A opinião pública é suscetível de acostumarse com bastante rapidez a uma baixa moderada da taxa de juros e con seqüentemente podem modificarse as expectativas convencionais quanto ao futuro preparandose assim o caminho para um novo mo vimento até certo ponto A baixa da taxa de juros a longo prazo na GrãBretanha após ter sido abandonado o padrãoouro fornece um exemplo interessante desse fato os movimentos mais amplos realiza ramse por meio de uma série de saltos descontínuos na medida em que a função de liquidez do público que se acostumara às sucessivas reduções ficou apta a responder a certos novos incentivos do noticiário ou da política das autoridades III Podemos resumir a proposição acima estabelecendo que em qual quer estado de expectativa há na mente do público certa inclinação para conservar dinheiro líquido em quantidade superior à que requer o motivo de transação ou o motivo de precaução que se traduzirá em detenção efetiva de moeda dependendo dos termos em que a autoridade OS ECONOMISTAS 204 monetária se acha disposta a criar recursos líquidos É esta potencia lidade que resume a função de liquidez L2 A cada montante da quantidade de moeda criada pela autoridade monetária corresponderá portanto coeteris paribus determinada taxa de juros ou mais estritamente determinado complexo de taxas de juros para as dívidas de diversos vencimentos A mesma proposição entretanto aplicase para qualquer outro fator do sistema econômico isoladamente considerado Assim sendo esta análise só será útil e significativa quando houver alguma relação particularmente direta ou objetiva entre as variações na quantidade de moeda e as que se veri fiquem na taxa de juros A razão que nos leva a supor a existência de tal relação especial é inspirada pelo fato de que falando em termos gerais o sistema bancário e a autoridade monetária negociam com dinheiro e dívidas e não com valores ou bens de consumo Se a autoridade monetária estivesse disposta a operar em termos especificados nos dois sentidos com dívidas de qualquer vencimento e mais ainda se estivesse disposta a operar com dívidas de riscos va riáveis a relação entre o complexo das taxas de juros e a quantidade de moeda seria direta O complexo das taxas de juros exprimiria ape nas os termos em que o sistema bancário estivesse disposto a adquirir ou ceder as dívidas e a quantidade de dinheiro seria igual ao montante que pudesse encontrar retenção na posse de indivíduos que consi deradas todas as circunstâncias relevantes preferissem o controle de recursos líquidos a cedêlos em troca de dívidas nas condições in dicadas pela taxa de juros do mercado A melhoria prática mais im portante que talvez se pudesse introduzir na técnica de administração monetária seria a substituição da taxa de desconto única para os títulos a curto prazo por uma oferta complexa do banco central de comprar e vender a preços fixados os títulos e papéis de primeira linha de qualquer prazo Hoje entretanto na prática real como os preços das dívidas conforme fixados pelo sistema bancário são efetivos nos mercados querendo dizer com isso que são esses preços que governam o preço corrente de mercado a magnitude deles varia segundo as características dos diversos sistemas Às vezes ela é mais efetiva num sentido que noutro significando isso que o sistema bancário pode comprometerse a comprar dívidas a certo preço mas não necessariamente a vendêlas por um montante que represente apenas uma comissão de corretagem embora não haja nenhuma razão para impedir que o preço se torne efetivo nos dois sentidos com a ajuda de operações de mercado aberto Existe também uma exceção importante que surge do fato de a au toridade monetária não estar por via de regra disposta a negociar com a mesma facilidade dívidas de qualquer vencimento A autoridade monetária geralmente tende na prática a concentrar sua atividade nas dívidas a curto prazo e a deixar o preço das obrigações de longo KEYNES 205 prazo sob a influência tardia e imperfeita das reações provenientes do preço das dívidas de curto prazo embora também aqui não haja motivo algum que a obrigue a agir desta maneira Nas circunstâncias em que estas exceções intervêm a relação direta entre a taxa de juros e a quantidade de dinheiro sofre modificações Na GrãBretanha parece que o campo de controle deliberado vai alargandose Mas cada vez que se aplica a presente teoria a casos particulares convém levar em conta as características especiais do método realmente empregado pela autoridade monetária Se a autoridade monetária negocia apenas com dívidas a curto prazo devese examinar que influências exercem o preço corrente e o preço prospectivo dos títulos de curto prazo sobre as dívidas de vencimentos mais prolongados Diante disso há certas limitações na capacidade da autoridade monetária no sentido de estabelecer certo complexo de taxas de juros para dívidas de diferentes prazos e riscos que podem resumirse da seguinte maneira 1 Há limites que a própria autoridade se impõe aplicando res trições a suas operações de modo que negocie apenas com dívidas de um tipo particular 2 Há a possibilidade por motivos expostos anteriormente de que tão logo a taxa de juros haja baixado a certo nível a preferência pela liquidez se torne virtualmente absoluta no sentido de que todos prefiram manter recursos líquidos a conservar uma dívida que rende uma taxa de juros tão baixa Nesse caso a autoridade monetária teria perdido o controle efetivo sobre a taxa de juros Mas conquanto este caso extremo possa vir a ter importância prática no futuro não conheço ainda nenhum exemplo do mesmo De fato considerando a relutância da maioria das autoridades monetárias em operar destemidamente com dívidas a longo prazo não se ofereceram muitas oportunidades para fazer uma prova semelhante Ademais se tal situação se apre sentasse significaria que a própria autoridade pública poderia obter empréstimos em escala limitada do sistema bancário a uma taxa de juros nominal 3 Os exemplos mais notáveis de um colapso completo da esta bilidade da taxa de juros em virtude de nivelamento da função de liquidez em uma direção ou em outra ocorreram em circunstâncias muito anormais A Rússia e a Europa Central conheceram depois da guerra uma crise ou fuga da moeda durante a qual não se podia induzir ninguém a conservar de forma alguma haveres em dinheiro ou dívidas mesmo uma taxa de juros elevada e crescente foi incapaz de manter o ritmo da eficiência marginal do capital especialmente em OS ECONOMISTAS 206 se tratando de estoque de bens líquidos sob a influência da previsão de uma baixa ulterior maior no valor do dinheiro enquanto isso nos Estados Unidos em certos períodos de 1932 verificouse uma crise de natureza oposta uma crise financeira ou de liquidação quando foi impossível convencer praticamente qualquer pessoa a desfazerse dos seus haveres líquidos em qualquer condição razoável 4 Resta finalmente a dificuldade já examinada na seção IV do capítulo 11 p 53 que impede a taxa de juros efetiva de baixar além de certa cifra dificuldade esta que pode tornarse séria numa época de taxas de juros baixas ou seja os custos intermediários de estabelecer o contato entre o mutuário e o mutuante final bem como na margem para risco especialmente para o risco moral que o mutuante exige além da taxa de juros pura Ao se verificar um declínio na taxa de juros pura não segue como conseqüência natural um declínio pari passu das margens para despesas e riscos Assim sendo a taxa de juros que há de pagar o mutuário típico pode baixar mais lentamente que a taxa de juros pura e conforme os métodos da organização bancária e financeira existente pode ser impossível trazêla abaixo de certa cifra mínima Este fato adquire importância especial quando o risco moral é calculado num valor apreciável pois quando o risco provém de dúvidas que o mutuante vislumbra sobre a honestidade do mutuário este que não tenciona ser desonesto nada tem para compensar o en cargo maior que daí lhe resulta Esse mesmo fator é também importante no caso dos empréstimos a curto prazo por exemplo os empréstimos bancários quando os custos de captação são elevados pois um banco pode ser obrigado a cobrar aos seus clientes de 15 a 2 mesmo que a taxa de juros pura seja nula para o mutuante IV Antecipando aquilo que será objeto do capítulo 21 mais adiante talvez convenha indicar brevemente a esta altura a relação do que foi dito acima com a teoria quantitativa da moeda Numa sociedade estática ou numa sociedade em que por qualquer outra razão ninguém experimente nenhuma incerteza sobre as futuras taxas de juros a função de liquidez L2 ou a propensão a entesourar como poderíamos chamarlhe será sempre zero quando em equilíbrio Portanto em estado de equilíbrio M2 O e M M1 de modo que qualquer variação em M fará com que a taxa de juros flutue até que o rendimento alcance um nível no qual a variação M1 seja igual à que se supõe que ocorre em M Ora sendo V a velocidaderenda da moeda tal como foi antes definida e Y a renda agregada temos M1V Y Portanto se é possível medir a quantidade Y e o preço P da produção KEYNES 207 corrente temos Y OP e portanto MV OP relação que tem muita analogia com a teoria quantitativa da moeda em sua forma tradicional129 Para os propósitos do mundo real uma grande falha da teoria quantitativa é que ela não faz distinção entre as variações nos preços que são uma função das variações da produção e as que provêm das modificações na unidade de salário130 Esta omissão talvez possa ser explicada pelas hipóteses de que nunca há propensão a entesourar e que há sempre pleno emprego pois neste caso sendo O constante e M2 igual a zero seguese se também pudermos tomar V como constante que tanto a unidade de salários quanto o nível de preços são direta mente proporcionais à quantidade de moeda OS ECONOMISTAS 208 129 Se tivéssemos definido V não igual a YM1 mas igual a YM naturalmente a teoria quantitativa seria um truísmo que se mantém em qualquer circunstância embora sem nenhum significado 130 Este ponto será desenvolvido mais amplamente no cap 21 CAPÍTULO 16 Observações Diversas Sobre a Natureza do Capital I Um ato de poupança individual significa por assim dizer uma decisão de não jantar hoje mas não implica necessariamente a decisão de jantar ou de comprar um par de sapatos daqui a uma semana ou um ano ou de consumir uma coisa específica numa data especificada Assim sendo produz um efeito depressivo sobre as atividades econô micas aplicadas na preparação do jantar de hoje sem estimular as que prepararam algum ato futuro de consumo Não é uma substituição da demanda de consumo presente por uma demanda de consumo futuro mas apenas uma diminuição líquida desta demanda Além disso a expectativa de consumo futuro está de tal modo baseada no conheci mento do consumo presente que qualquer redução do último provavel mente deprimirá o primeiro com o resultado de que esse ato de pou pança não apenas fará baixar o preço dos bens de consumo indepen dentemente da eficiência marginal do capital existente como também pode enfraquecer esta última Nesse caso pode reduzir a demanda de investimento atual tanto quanto a demanda de consumo presente Se a poupança consistisse não apenas em absterse de um con sumo presente mas também em fazer simultaneamente uma reserva específica para um consumo posterior o resultado poderia ser bem diferente Aumentaria pois em tal caso a expectativa de tirar certo rendimento do investimento e os recursos liberados da disposição do consumo presente poderiam ser utilizados na provisão do consumo fu turo Não que esses recursos o fossem mesmo neste caso numa escala necessariamente igual ao montante dos recursos liberados visto que o intervalo desejado de espera poderia exigir um método de produção tão desfavoravelmente indireto que a sua eficiência se tornasse bas tante inferior à taxa de juros corrente então o efeito favorável ao 209 emprego determinado por uma encomenda para consumo futuro não se manifestaria logo senão numa data posterior de tal modo que a conseqüência imediata do ato de poupar continuaria sendo ainda ad versa ao emprego De qualquer maneira uma decisão individual de poupar não significa de fato emitir um pedido concreto para consumo posterior mas apenas o cancelamento de um pedido presente Assim sendo admitindose que a expectativa de consumo seja a única raison dêtre do emprego não há nenhum paradoxo na conclusão de que uma diminuição na propensão a consumir tenha coeteris paribus um efeito depressivo sobre o emprego A dificuldade surge do fato de que o ato de poupar supõe não uma substituição do consumo presente por algum consumo adicional específico cuja preparação exija tanta atividade econômica quanto a que se necessitaria para o consumo equivalente à soma poupada mas antes um desejo de riqueza como tal isto é a possibilidade de con sumir um artigo indeterminado em uma data indeterminada A idéia absurda embora quase universal de que um ato de poupança individual é tão favorável à procura efetiva quanto outro de consumo individual emana da falácia muito mais plausível do que a conclusão dela deri vada de que o desejo de possuir mais riqueza sendo mais ou menos idêntico ao de fazer mais investimentos deve aumentando a procura de investimento estimular a produção respectiva de onde segue que a poupança individual favorece o investimento corrente à mesma me dida que diminui o consumo atual É muito difícil eliminar esta falácia da mente dos homens Ela provém da suposição de que o proprietário de riqueza deseja um bem de capital por si mesmo quando na realidade o que ele realmente deseja é o seu rendimento provável Ora este rendimento provável depende inteiramente da previsão da procura efetiva em relação às futuras condições da oferta Portanto se um ato de poupança nada faz por melhorar o rendimento provável também em nada contribuirá para estimular o investimento Além disso para que um indivíduo que poupa possa atingir o seu fim que é o de adquirir riqueza não é necessário que um novo bem de capital seja produzido para satisfazêlo O mero ato de poupar realizado por um indivíduo sendo bilateral como demonstramos antes obriga outro indivíduo a transferirlhe al guma riqueza velha ou nova Cada ato de poupança implica transfe rência forçada inevitável de riqueza a quem poupa embora este por sua vez possa sofrer as conseqüências da poupança dos outros Essas transferências de riqueza não requerem a criação de riqueza nova na realidade como vimos podem ser ativamente antagônicas A criação de riqueza nova depende inteiramente de que o seu rendimento provável alcance o nível estabelecido para a taxa corrente de juros O rendimento provável do novo investimento marginal não aumenta pelo fato de que OS ECONOMISTAS 210 alguém deseje aumentar sua riqueza pois que ele depende da expec tativa de procura de determinado bem em data determinada Não escapamos a esta conclusão argumentando que o possuidor de riqueza deseja não um rendimento provável determinado porém o rendimento provável mais vantajoso entre os que lhe são oferecidos de maneira que um desejo maior de possuir riqueza reduz o rendimento provável com que terão de confrontarse os produtores de novos inves timentos Este raciocínio não considera pois o fato de que sempre se pode opor uma alternativa à propriedade de bens reais de capital ou seja a propriedade de dinheiro ou débitos desse modo o rendimento provável com que terão de contentarse os produtores de investimentos novos não pode baixar além do nível fixado para a taxa de juros corrente E a taxa de juros corrente depende conforme vimos não da intensidade do desejo de possuir riqueza mas da intensidade do desejo de conser vála respectivamente em forma líquida ou ilíquida aliada à magnitude da oferta de riqueza numa dessas formas em relação à sua oferta na outra Se o leitor se acha ainda perplexo perguntese por que perma necendo inalterada a quantidade de dinheiro um novo ato de poupança deveria diminuir a soma que se deseja conservar em forma líquida à taxa existente de juros Examinaremos no próximo capítulo algumas dificuldades mais sérias que podem apresentarse quando tentamos aprofundarnos nas razões de como e por que isso ocorre II Em vez de dizer do capital que ele é produtivo é preferível dizer que ele fornece no curso da sua existência um rendimento excedente sobre seu custo original A única razão pois pela qual um bem permite uma expectativa de render durante sua existência serviços com um valor agregado superior ao seu preço de oferta inicial devese ao fato de que é escasso e continua sendo escasso pela concorrência da taxa de juros do dinheiro À medida que o capital se torna menos escasso o excedente de rendimento diminuirá sem que ele se torne por isso menos produtivo pelo menos no sentido físico Por isso eu aceito a doutrina préclássica de que tudo é produzido pelo trabalho além da ajuda do que antes era chamado de arte e agora se chama técnica dos recursos naturais isentos de custos ou que custam uma renda conforme sua escassez ou abundância e dos resultados do trabalho anterior incorporados aos bens patrimoniais que auferem também um preço variável segundo sua escassez ou abundância É preferível considerar o trabalho incluindo naturalmente os serviços pessoais do empresário e de seus colaboradores como o único fator da produção operando dentro de um ambiente de técnica recursos natu rais equipamentos e procura efetiva Isto explica em parte por que pudemos tomar a unidade de trabalho como a única unidade física de KEYNES 211 que necessitamos em nosso sistema econômico à parte das unidades de moeda e de tempo É verdade que certos processos longos e indiretos são fisicamente eficientes embora o mesmo aconteça com alguns processos curtos Os processos longos não derivam sua eficiência tendo como causa a sua extensão Alguns deles provavelmente a maior parte seriam fisica mente muito ineficientes em virtude das probabilidades de perdas e de estragos causados pelo tempo131 Para determinada força de trabalho há um limite definido no tocante à quantidade de trabalho suscetível de ser incorporado nos processos indiretos que pode ser usado vanta josamente Fora de outras considerações deve haver uma proporção definida entre a quantidade de trabalho empregada em construir má quinas e a que será empregada em utilizálas A quantidade final de valor obtido não aumenta indefinidamente em relação à quantidade de trabalho empregado na medida em que os processos adotados se tornam cada vez mais indiretos mesmo no caso de a sua eficiência física continuar aumentando Só no caso de o desejo de adiar o consumo ser bastante intenso para criar uma situação em que o pleno emprego exigisse um volume de investimento suficientemente grande para tor nar negativa a eficiência marginal do capital seria vantajoso um pro cesso pelo simples fato de ser demorado nesse caso deveríamos adotar os processos que são fisicamente ineficientes desde que fossem bastante longos para que o lucro proporcionado pelo adiamento equilibrasse a sua eficiência Acabaríamos encontrandonos de fato numa situação em que os processos curtos teriam de conservarse bastante escassos para que sua eficiência física compensasse a desvantagem da pronta entrega do seu produto Uma teoria correta portanto deve ser rever sível de modo que possa incluir os casos de eficiência marginal do capital correspondentes a uma taxa de juros tanto positiva quanto negativa e no meu entender só a teoria da escassez esboçada acima tem esta propriedade Além disto há inúmeras razões para que as diversas espécies de serviços e facilidades sejam escassas e portanto dispendiosas relativamente à quantidade de trabalho que lhes está incorporada Por exemplo os processos dos quais emana mau cheiro implicam remuneração maior pois de outro modo não se encontraria gente para os executar O mesmo sucede com os processos arriscados Entretanto não delineamos uma teoria da produtividade com base em processos dos quais emane mau cheiro ou que sejam arriscados Em resumo nem todo o trabalho se realiza em circunstâncias igualmente agradáveis e as condições de equilíbrio exigem que os artigos produ zidos em condições menos atraentes caracterizadas pelo mau cheiro o risco ou o lapso de tempo continuem bastante escassos para que se OS ECONOMISTAS 212 131 Cf a nota de Marshall sobre BöhmBawerk Principles p 583 lhes atribua um preço mais elevado Se o transcurso de tempo se torna porém uma circunstância agradável o que pode muito bem ser o caso e já o é para muitos indivíduos então como disse antes são os processos curtos que devem continuar suficientemente escassos Dado o grau ótimo em que um processo possa ser indireto es colheremos naturalmente os processos indiretos mais eficientes que possamos encontrar para atingir o total requerido Esse grau ótimo em si mesmo deveria ser adequado para satisfazer nas datas corres pondentes a parte da demanda dos consumidores cujo adiamento se deseja Em condições ótimas o que se quer dizer é que a produção deve ser organizada de maneira mais eficiente para que seja compatível com a entrega nas datas em que se espera que a demanda dos con sumidores se torne efetiva Nada adianta produzir para entrega em datas diferentes destas ainda que a mudança das datas de entrega pudesse aumentar a produção física salvo se por assim dizer a perspectiva de uma refeição mais abundante induzir o consumidor a antecipar ou a retardar a hora de jantar Se depois de ouvir todos os pormenores sobre os pratos que pode obter marcando o jantar para horas diferentes esperase que o consumidor se decida pelas 8 horas compete ao cozinheiro preparar a melhor refeição que possa ser servida a essa hora sem levar em conta que às 730 8 horas ou 830 poderia ser o horário que mais lhe conviria se o tempo não fosse levado em consideração de um modo ou de outro e se sua única tarefa consistisse em preparar absolutamente o melhor jantar possível Em certas fases da sociedade talvez pudéssemos obter refeições fisicamente melhores jan tando mais tarde do que costumamos mas é igualmente concebível que em outras fases as conseguíssemos melhores fazendoo mais cedo Como dissemos antes nossa teoria é aplicável às duas contingências Se a taxa de juros fosse zero haveria um intervalo ótimo para qualquer artigo dado entre a data média do início de sua fabricação e a data de consumo para o qual o custo em trabalho seria mínimo um processo de produção mais curto seria tecnicamente menos eficiente ao passo que um processo mais longo seria também menos eficiente em virtude das despesas de armazenagem e de deterioração Contudo se a taxa estiver acima de zero introduzse um novo elemento de custo que aumenta com a duração do processo desse modo o intervalo ótimo se reduzirá e a fabricação corrente para entrega eventual do artigo terá de ser diminuída até que o preço provável tenha subido o suficiente para cobrir o aumento do custo um custo que se elevará tanto pelos encargos do juro quanto pela menor eficiência do método abreviado de produção Do contrário se a taxa de juros cair abaixo de zero admitindo que isto seja tecnicamente possível o inverso se verificará Dada a provável demanda dos consumidores em vez de se iniciar a produção corrente hoje temse a alternativa de começála em data posterior Conseqüentemente o início da produção corrente só se justificaria quan KEYNES 213 do seu baixo custo em virtude de maior eficiência técnica ou de pers pectivas de variações de preços ao se produzir hoje ou em data pos terior for insuficiente para compensar o rendimento menor de juros negativos No caso da grande maioria dos artigos seria de grande ineficiência técnica o início de sua produção em uma época que se pode considerar modestamente anterior ao seu provável consumo Deste modo mesmo que a taxa de juros seja zero há um limite estrito para a proporção da demanda provável dos consumidores que convém co meçar a atender de antemão e se a taxa de juros sobe a proporção da demanda provável dos consumidores para a qual convém produzir hoje restringese pari passu III Vimos que a longo prazo o capital deve conservarse suficien temente escasso para que a sua eficiência marginal seja pelo menos igual à taxa de juros correspondentes à duração de sua existência tal como o determinam as condições psicológicas e institucionais Que sig nificaria isso para uma sociedade tão bem provida de capital cuja eficiência marginal fosse zero e se tornasse negativa em conseqüência de um investimento suplementar mesmo possuindo um sistema mo netário em que o dinheiro conserva o seu valor envolvendo apenas despesas de armazenagem e conservação de pouca monta de modo que na prática o juro não possa ser negativo e que em situação de pleno emprego estivesse disposta a poupar Se em tais circunstâncias partimos da posição de pleno emprego os empresários terão naturalmente prejuízos se continuarem a oferecer emprego em uma escala que utilize a totalidade do capital existente Em conseqüência o estoque de capital e o volume de emprego terão de reduzirse até que a comunidade se ache bastante pobre para que a poupança agregada seja nula neutralizandose a poupança positiva de certos indivíduos ou grupos pela poupança negativa de outros Para uma sociedade tal como a que acabamos de supor a situação de equi líbrio em regime de laissezfaire será aquela em que o emprego seja bastante baixo e o nível de vida suficientemente miserável para levar as poupanças a zero O mais provável é que haja um movimento cíclico em redor desta posição de equilíbrio Se persiste pois a incerteza a respeito do futuro a eficiência marginal do capital subirá ocasional mente acima de zero levando a uma expansão e na depressão seguinte o estoque de capital pode baixar durante certo tempo a um nível inferior ao que determinaria a longo prazo uma eficiência mar ginal de zero Supondo previsões corretas o nível de equilíbrio do es toque de capital ao qual corresponderá uma eficiência marginal de zero será naturalmente inferior ao correspondente ao pleno emprego da mãodeobra disponível pois o equipamento que corresponde a essa proporção de desemprego será o que assegurar uma poupança nula OS ECONOMISTAS 214 A única outra posição de equilíbrio possível seria uma situação em que um estoque de capital bastante elevado para ter uma eficiência marginal nula representasse também uma quantidade de riqueza suficiente para saciar por completo o desejo agregado do público de atender ao futuro mesmo em situação de pleno emprego em circuns tâncias tais que nenhuma bonificação em forma de juro pudesse ser obtida Contudo seria uma coincidência improvável que a propensão a poupar em condições de pleno emprego se satisfizesse justamente no instante em que o estoque de capital atinge o montante que torna nula a sua eficiência marginal Por conseguinte se esta possibilidade mais favorável intervém deve normalmente produzirse não no mo mento exato em que a taxa de juro se anula mas em algum momento anterior durante o declínio progressivo da taxa de juros Admitimos até agora um fator institucional que não permite taxa de juros negativa o que se caracteriza por moeda para a qual as des pesas de conservação são muito pequenas Existem de fato fatores institucionais e fatores psicológicos que marcam limite muito acima de zero para o declínio praticamente possível da taxa de juros Em especial os custos de estabelecimento de contato entre os mutuários e mutuantes e a incerteza quanto ao futuro da taxa de juros que já examinamos antes fixam um limite mínimo que nas circunstâncias presentes talvez não seja inferior a 2 ou 25 a longo prazo Se isto for exato em breve poderá apresentarse na prática a desagradável possibilidade de um estoque crescente de riqueza em condições que impedem a taxa de juros de baixar mais em um regime de laissezfaire Além disso se o mínimo abaixo do qual é praticamente impossível fazer cair a taxa de juros estiver sensivelmente acima de zero menor é a probabilidade de que o desejo agregado de acumular riqueza se sacie antes de a taxa de juros haver alcançado seu nível mínimo As experiências do pósguerra da GrãBretanha e dos Estados Unidos oferecem exemplos reais de como uma acumulação de riqueza tão grande que sua eficiência marginal tenha caído mais rapidamente do que é possível à taxa de juros baixar diante dos fatores institucionais e psicológicos prevalecentes pode interferir em condições principal mente de laissezfaire com um volume de emprego razoável e com o nível de vida que as condições técnicas de produção são capazes de proporcionar Daí resulta que se duas comunidades iguais dispõem da mesma técnica mas de diferentes estoques de capital a comunidade que tem menor estoque de capital poderá gozar durante certo tempo de um nível de vida mais alto que a comunidade possuidora de maiores es toques todavia quando a comunidade mais pobre alcançar a mais rica o que é de se presumir que eventualmente aconteça ambas co nhecerão a sorte de Midas Esta conclusão pessimista está natural mente sujeita à hipótese de que a propensão a consumir e o fluxo de KEYNES 215 investimento em vez de serem deliberadamente controlados a bem do interesse social sejam em grande parte abandonados pela influência do laissezfaire Se por qualquer razão a queda da taxa de juros não puder ser tão rápida quanto a queda da eficiência marginal do capital de terminada por uma acumulação correspondente ao que a comunidade preferiria poupar a uma taxa de juros igual à eficiência marginal do capital em situação de pleno emprego então mesmo um desvio do desejo de guardar riqueza para a aquisição de bens que de fato não produzirão nenhum fruto econômico aumentará o bemestar econômico O dia em que a abundância de capital venha a interferir com a abun dância da produção pode ser postergado à medida que os milionários encontrem satisfação em edificar vastas mansões para nelas morarem enquanto vivos e pirâmides para se recolherem depois de mortos ou arrependidos de seus pecados levantem catedrais e dotem mosteiros ou missões no estrangeiro Cavar buracos no chão à custa da poupança não só aumentará o emprego como também a renda nacional em bens e serviços úteis Contudo não é razoável que uma comunidade sensata concorde em depender de paliativos tão fortuitos e freqüentemente tão extravagantes quando já sabemos de que influências depende a de manda efetiva IV Suponhamos que se tomem medidas para que a taxa de juros seja compatível com o investimento que corresponde ao pleno emprego Suponhamos ademais que a ação do Estado intervenha como elemento de equilíbrio para regular o crescimento do capital e impedir que ele tenda para o seu ponto de saturação a uma velocidade capaz de impor à geração presente uma redução excessiva de seu padrão de vida Dadas estas hipóteses suponho que uma comunidade racional mente dirigida e provida de recursos técnicos modernos e cuja popu lação não cresça rapidamente seria capaz no espaço de uma única geração de reduzir a eficiência marginal do capital a um nível de equilíbrio próximo de zero de tal modo que atingiríamos as condições de uma comunidade quase estacionária na qual as mudanças e os progressos resultariam unicamente de modificações em técnicas gostos população e instituições vendendose os produtos do capital a um preço em proporção ao trabalho etc a eles incorporados justamente com os princípios que regem os preços dos bens de consumo nos quais os en cargos de capital entram em proporção insignificante Se tenho razão em supor que é relativamente fácil tornar os bens de capital tão abundantes que sua eficiência marginal seja zero este pode ser o caminho mais razoável para eliminar gradualmente a maio ria das características repreensíveis do capitalismo Um instante de reflexão mostrará as enormes mudanças sociais que resultariam do OS ECONOMISTAS 216 desaparecimento progressivo de uma taxa de rendimento sobre a ri queza acumulada Qualquer pessoa poderia ainda acumular o rendi mento de seu trabalho com a intenção de o gastar em data posterior Mas sua acumulação não cresceria Ela estaria simplesmente na posição do pai de Pope que ao retirarse dos negócios levou um baú cheio de guinéus para sua vila de Twickenham para atender às despesas do mésticas na medida de suas necessidades Embora o rendeiro desaparecesse continuaria entretanto ha vendo lugar para o empreendimento e para a habilidade na estimativa dos rendimentos prováveis suscetíveis das mais diferentes opiniões O que ficou dito referese pois em primeiro lugar à pura taxa de juros independentemente de qualquer previsão para o risco e circuns tâncias semelhantes e não ao rendimento bruto dos valores patrimo niais incluindo a retribuição referente ao risco Destarte a não ser que a taxa de juros se mantivesse num nível negativo haveria ainda um rendimento positivo para o investimento sensato em determinados valores patrimoniais apresentando certa probabilidade de lucro Desde que houvesse determinada relutância em correr riscos haveria também um rendimento líquido positivo do conjunto de tais valores durante um período de tempo Não é provável porém que nessas circunstâncias houvesse tal avidez de obter uma renda dos investimentos duvidosos que em conjunto seu rendimento líquido acabasse sendo negativo KEYNES 217 CAPÍTULO 17 As Propriedades Essenciais dos Juros e do Dinheiro I A taxa de juros sobre o dinheiro parece portanto representar um papel especial na fixação de um limite ao volume de emprego visto marcar o nível que deve alcançar a eficiência marginal de um bem de capital para que ele se torne objeto de nova produção Que isto deva ser assim é à primeira vista muito confuso É natural que se indague então qual é a peculiaridade que distingue o dinheiro de outros valores patrimoniais procurando determinar se apenas o di nheiro possui uma taxa de juros bem como o que acontece numa economia não monetária Enquanto não tivermos encontrado respostas a estas ques tões o sentido da nossa teoria não se tornará suficientemente claro A taxa monetária de juros queremos chamar a atenção do leitor outra coisa não é que a percentagem de excedentes de uma soma de dinheiro contratada para entrega futura por exemplo a um ano de prazo sobre o que podemos chamar o preço spot ou a vista da dita soma contratada para entrega futura Parece portanto que para cada categoria de bens de capital deveria existir uma taxa análoga à do juro sobre o dinheiro Pois há uma quantidade definida de por exemplo trigo para ser entregue dentro de um ano que tem hoje o mesmo valor de troca de 100 quartos132 de trigo para entrega imediata Se a primeira quantidade é de 105 quartos podemos dizer que a taxa de juros do trigo é de 5 ao ano e se é 95 quartos dizemos que é menos de 5 ao ano Assim para cada bem durável temos uma taxa de juros calculada em termos do próprio bem uma taxa de juros do trigo uma taxa de juros do cobre uma taxa de juros da habitação uma taxa de juros de uma usina siderúrgica 219 132 No original consta a medida de volume quarter que corresponde a 14 de tonelada N do R T A diferença entre os contratos a termo e a vista relativos a um bem como o trigo que tem cotação no mercado mantém uma relação definida com a taxa de juros do trigo mas desde que o contrato a termo é cotado em moeda para entrega futura e não em trigo para entrega imediata esta diferença também depende da taxa monetária de juros A relação exata é a seguinte Suponhamos que o preço do trigo para entrega imediata seja de 100 libras esterlinas por 100 quartos e que o preço do trigo em contrato a termo para entrega dentro de um ano seja de 107 libras por 100 quartos e que a taxa monetária de juros seja de 5 qual é a taxa de juros do trigo 100 libras comprarão hoje 105 para entrega futura e 105 libras para entrega futura comprarão 105 107 100 98 quartos nas mesmas condições Por sua vez 100 libras hoje comprarão 100 quartos de trigo para entrega imediata Assim sendo 100 quartos de trigo para entrega imediata comprarão 98 quartos a termo De onde se conclui que a taxa de juros do trigo é menos de 2 ao ano133 Seguese não haver razão para que suas taxas de juros devam ser iguais para bens diferentes para que a taxa do trigo deva ser igual à taxa de juros do cobre pois a relação entre os contratos a vista e a termo tal como as cotações de mercado é notoriamente diferente para diferentes bens Isto como verificaremos nos levará à trilha que procuramos Pois pode suceder que seja a mais elevada das taxas específicas de juro como poderemos chamarlhes que estabeleça o parâmetro pois é a maior das taxas que a eficiência marginal de um bem de capital tem de alcançar para este vir a ser o objeto de nova produção e talvez haja razões para que a taxa monetária de juros seja freqüentemente a mais elevada pois como veremos certas forças que contribuem para reduzir as taxas de juros específicas de outros bens não atuam no caso do dinheiro Podese acrescentar que da mesma maneira que existem para cada momento taxas de juros diferentes para as mercadorias também os cambistas estão familiarizados com o fato de que a taxa de juros não é igual sequer para duas moedas diferentes por exemplo a libra e o dólar Porque também aqui a diferença entre os contratos a vista e a termo para uma moeda estrangeira em termos de libra esterlina varia em geral de uma moeda para outra Ora cada uma dessas mercadoriaspadrão nos oferece a mesma facilidade que a moeda para medir a eficiência marginal do capital Podemos com efeito escolher a que quisermos por exemplo o trigo e calcular o valortrigo dos rendimentos prováveis de qualquer bem OS ECONOMISTAS 220 133 Esta relação foi assinalada pela primeira vez por Sraffa Economic Journal Março de 1932 p 50 de capital a taxa de desconto que iguala o valor presente destas séries de anuidades de trigo ao preço atual de oferta do bem em termos de trigo nos dá expressa em trigo a eficiência marginal desse bem Se nenhuma variação é esperada no valor relativo dos dois padrões dife rentes a eficiência marginal de um bem de capital será a mesma em qualquer de ambos que se meça visto que o numerador e o denominador da fração que a exprime variarão na mesma proporção Todavia se se espera que um desses padrões mude de valor em relação ao outro a eficiência marginal de todos os bens de capital permanecerá a mesma em qualquer um dos dois padrões usados para a medida Para ilustrar este raciocínio tomemos o caso mais simples em que se espera que um dos dois padrões o trigo suba de valor a um ritmo de a por cento ao ano em termos de moeda a eficiência marginal de um bem que se exprime em moeda por x por cento será então x a por cento em termos de trigo Uma vez que as eficiências marginais dos diversos bens de capital se alterarão na mesma proporção deduzse que a ordem das suas grandezas será igual seja qual for o padrão escolhido Se houvesse uma mercadoria composta que se pudesse considerar representativa no sentido estrito da palavra poderíamos considerar que a taxa de juros e a eficiência marginal do capital determinados por meio dessa mercadoria seriam em certo sentido a taxa de juros única e a eficiência marginal única do capital Porém isto levanta evidentemente os mesmos obstáculos que a fixação de um padrão único de valor Até agora portanto a taxa monetária de juros não apresenta nenhuma singularidade encontrandose exatamente no mesmo pé comparada com outras Onde está então a peculiaridade da taxa monetária de juro onde reside a importância prática predominante que lhe foi atribuída nos capítulos anteriores Por que devem os volumes da produção e do emprego depender mais estreitamente da taxa monetária de juros do que da taxa de juros do trigo ou da taxa de juros de moradias II Consideremos quais serão normalmente as taxas de juros das mercadorias no período digamos de um ano para os diferentes bens Desde que tomemos cada um dos bens como padrão os rendimentos de cada um devem considerarse para este propósito como medidos em termos de si mesmos Há três atributos que os diversos tipos de bens possuem em graus diferentes conforme a exposição feita em seguida i Alguns bens dão um rendimento ou produção q medidos em termos de si mesmos para facilitarem algum processo de produção ou prestarem serviços a um consumidor KEYNES 221 ii A maioria dos bens excetuando o dinheiro sofre desgaste ou acarreta alguma despesa pelo simples correr do tempo independente mente de qualquer alteração no seu valor relativo sejam ou não uti lizados em produzir rendimento isto é implicam um custo de manu tenção c medidos em termos de si mesmos Para o nosso objetivo pre sente não importa saber exatamente onde colocaremos a linha de se paração entre os custos que deduzimos antes de calcular q e os que incluímos em c visto que a seguir apenas nos ocuparemos de q c iii Finalmente o poder de dispor de um bem durante certo tempo pode oferecer uma conveniência ou segurança potencial que não é igual para os bens de natureza diferente embora sejam do mesmo valor inicial Não há por assim dizer nenhum resultado em forma de produção no fim do período considerado e mesmo assim tratase de algo pelo qual as pessoas estão dispostas a pagar um preço Chamaremos prêmio de liquidez l de certo bem ao montante medido em termos de si mesmo que as pessoas estão dispostas a pagar pela conveniência ou segurança potenciais proporcionadas pelo poder de dispor dele excluindo o rendimento ou os custos de manutenção que lhe são próprios Deduzse que a retribuição total que se espera da propriedade de um bem durante certo período é igual ao seu rendimento menos o seu custo de manutenção mais o seu prêmio de liquidez ou seja a q c l Por outras palavras q c l é a taxa de juros específica de qualquer bem onde q c e l se medem em unidades de si mesmos como padrão A característica fundamental do capital instrumental por exem plo uma máquina ou do capital de consumo por exemplo uma casa é o fato de que seus rendimentos excedem em geral seu custo de manutenção e de que seu prêmio de liquidez é provavelmente des prezível a característica de um estoque de bens líquidos ou ainda de um excedente de capital instrumental ou de consumo é ser gravada por um custo de manutenção expressa em unidades de si mesmo que nenhum rendimento compensa sendo nesse caso geralmente despre zível também o prêmio de liquidez sempre que os estoques ultrapassam um nível moderado embora suscetível de tornarse apreciável em cir cunstâncias especiais a característica da moeda enfim é ter um ren dimento nulo um custo de manutenção insignificante porém um prê mio de liquidez substancial Na verdade os diferentes bens podem ter graus diferentes de prêmio de liquidez e a moeda pode incorrer em certo volume de custo de manutenção por exemplo o de custódia É porém uma diferença essencial entre a moeda e todos os demais bens ou a maioria que no caso da moeda o seu prêmio de liquidez exceda de muito o seu custo de manutenção ao passo que no dos outros bens seu custo de manutenção é muito maior que o prêmio de liquidez Com a finalidade de ilustrar o raciocínio suponhamos que o rendimento OS ECONOMISTAS 222 das casas seja q1 e o custo de manutenção bem como o prêmio de liquidez sejam desprezíveis que para o trigo o custo de manutenção seja c2 e o rendimento e prêmio de liquidez insignificantes e que para a moeda o prêmio de liquidez seja l3 e o rendimento e o custo de manutenção desprezíveis Significa isto que q1 é a taxa de juros da casa c2 a taxa de juros do trigo e l3 a taxa monetária de juros Para determinar as relações entre os rendimentos esperados dos diferentes tipos de bens compatíveis com o equilíbrio precisamos tam bém conhecer as variações que se esperam em seus valores relativos durante o ano Tomemos a moeda como padrão de medida que para este fim pode ser apenas uma moeda de conta ou poderíamos igual mente tomar o trigo e suponhamos que a percentagem de valorização ou depreciação esperada das casas seja a1 e a do trigo a2 Chamamos q1 c2 e l3 às taxas de juros específicas das casas do trigo e da moeda medidas em termos de si mesmas como padrão de valor isto é q1 é a taxa de juros da casa medida em casas c2 é a taxa de juros do trigo medida em trigo e l3 a taxa monetária de juros medida em dinheiro Também convirá chamar a1 q1 a2 c2 e l3 que representam as mesmas quantidades reduzidas a moeda como padrão de valor a taxa monetária de juros da casa a taxa monetária de juros do trigo e a taxa monetária de juros sobre a moeda respectivamente Com esta observação é fácil ver que a demanda dos possuidores de riqueza se orientará para as casas para o trigo ou para a moeda dependendo de qual é o maior a1 q1 a2 c2 ou l3 Assim sendo em estado de equilíbrio o preço de demanda das casas e o do trigo em termos de moeda serão tais que desaparecerá qualquer vantagem entre as alter nativas quer dizer a1 q1 a2 c2 e l3 serão iguais A escolha de padrão de valor não altera esta conclusão porque a substituição de um padrão por outro modificará por igual todos os termos ou seja numa quantidade idêntica à taxa de valorização ou depreciação que se espera no novo padrão relativamente ao antigo Ora os bens cujo preço normal de oferta é menor que o preço da demanda serão agora objeto de nova produção e esses serão os bens que têm uma eficiência marginal maior sobre a base do seu preço normal de oferta que a taxa de juros sendo ambas as quantidades medidas pelo mesmo padrão de valor qualquer que este seja À medida que aumenta o estoque de bens cuja eficiência marginal era a princípio pelo menos igual à taxa de juros essa eficiência marginal tende a baixar pelas razões suficientemente claras já apresentadas Chega então o momento em que deixará de ser vantajoso continuar a produ zilos a menos que a taxa de juros caia pari passu Quando não houver mais bem algum cuja eficiência marginal alcance a taxa de juros a produção de novos bens de capital será paralisada Suponhamos como mera hipótese nesta altura do raciocínio que há certo bem por exemplo a moeda cuja taxa de juros seja fixa ou KEYNES 223 decline à medida que sua produção aumenta mais devagar que qual quer outra taxa de juros de mercadoria como se equilibrará esta po sição Uma vez que a1 q1 a2 c2 e l3 são necessariamente iguais e uma vez que por hipótese l3 é fixa ou declina com mais lentidão que q1 ou c2 deduzse que a1 e a2 tenderão a aumentar Por outras palavras os preços normais correntes de quaisquer outros bens que não a moeda tenderão a baixar relativamente às previsões dos preços futuros Conseqüentemente se q1 e c2 continuarem descendo chegará um momento em que não haverá vantagem em produzir qualquer des ses bens salvo se se espera uma alta de tal magnitude no custo de produção em alguma data futura relativamente ao atual que baste para cobrir os custos de manutenção do estoque produzido entre o momento atual e a data provável do aumento de preço Parece agora que a nossa afirmação anterior de que a taxa mo netária de juros marca um limite ao volume da produção não era es tritamente correta Deveríamos ter dito que a taxa de juros do bem que declina mais lentamente à medida que o estoque de bens em geral aumenta é a que eventualmente elimina a produção vantajosa de cada um dos outros salvo no caso mencionado de uma relação entre os custos presentes e os custos prováveis de produção À medida que a produção aumenta as taxas específicas de juros baixam a níveis nos quais um bem após outro cai abaixo do que corresponde à produção vantajosa até que finalmente uma ou mais taxas específicas de juros se fixam num nível superior à eficiência marginal de qualquer bem Se por moeda entendemos o padrão de valor tornase claro não ser necessariamente a taxa de juros monetária que causa a dificuldade Para fugir às dificuldades não bastaria como alguns acreditaram decretar simplesmente que o trigo ou as casas sejam o padrão de valor em vez do ouro ou da libra esterlina Pois agora vemos que a existência de um bem qualquer continuará a provocar as mesmas dificuldades caso a sua taxa de juros resista a baixar quando a sua produção aumenta Pode acontecer por exemplo que o ouro continue a exercer uma influência dessa natureza num país que adotou um padrão inconversível III Portanto ao atribuir uma significação especial à taxa monetária de juros supusemos tacitamente que o tipo de moeda a que estamos acostumados tem algumas características especiais que tornam a sua taxa específica de juros expressa por meio de si mesma como padrão mais resistente à baixa quando a produção aumenta que as taxas específicas de juros de qualquer outro bem expressas da mesma forma Será justificada esta suposição No meu entender a reflexão mostra que as peculiaridades seguintes que de ordinário caracterizam a moeda tal como a conhecemos são capazes de a justificar Na medida em que OS ECONOMISTAS 224 o padrão de valor estabelecido tenha estas peculiaridades será válida a proposição sumária de que a taxa monetária de juros é a importante i A primeira característica que leva à conclusão anterior é o fato de ter a moeda tanto a logo como a curto prazo uma elasticidade de produção igual a zero ou pelo menos muito pequena no que respeita o poder da empresa privada como coisa distinta da autoridade mone tária querendo dizer por elasticidade de produção134 neste sentido a resposta do volume de mãodeobra dedicado a produzila diante de um aumento na quantidade de trabalho que se pode obter com uma unidade da mesma Quer isto dizer que a moeda não se pode produzir facilmente os empresários não podem aplicar à vontade trabalho para produzir dinheiro em quantidades crescentes à medida que o seu preço sobe em termos de unidades de salários No caso de uma moeda inconvertível esta condição satisfazse estritamente No caso porém de uma moeda de padrãoouro também ainda sucede de maneira apro ximada no sentido de que o máximo da quantidade de trabalho su plementar suscetível de ser empregado dessa forma é proporcional mente muito pequeno salvo naturalmente num país em que a mine ração de ouro seja a indústria principal Ora no caso dos bens cuja produção demonstre elasticidade a razão pela qual admitimos que a sua taxa específica de juros declina decorre do fato de supormos que o seu estoque aumenta em conse qüência do maior volume da produção No caso do dinheiro entretanto adiando por enquanto o exame dos efeitos de uma redução na unidade de salários ou de uma alta deliberada em sua oferta provocada pela autoridade monetária a oferta é fixa Assim a característica segundo a qual a moeda não pode produzirse facilmente pelo trabalho leva imediatamente a supor prima facie ser correto o ponto de vista de que a sua taxa específica de juros será relativamente refratária à baixa ao passo que se a moeda pudesse ser cultivada como um cereal ou fabricada como um automóvel as depressões poderiam ser evitadas ou atenuadas porque se o preço de outros bens tendesse a baixar em termos de moeda mais trabalho seria desviado para a produção de dinheiro como vemos ser o caso nos países de mineração de ouro embora para o mundo em conjunto o desvio máximo neste sentido seja quase insignificante ii É evidente no entanto que não apenas a moeda satisfaz a condição anterior mas também todos os fatores puramente de renda cuja produção é completamente inelástica Portanto necessitase uma segunda condição para distinguir a moeda de outros elementos de renda KEYNES 225 134 Ver cap 20 A segunda differentia da moeda é que ela tem uma elasticidade de substituição igual ou quase igual a zero o que significa que quando o seu valor de troca sobe não aparece nenhuma tendência para subs tituíla por algum outro fator a não ser talvez em proporção ínfima quando a moedamercadoria é também usada na manufatura ou nas artes Isto decorre da particularidade de a moeda ter uma utilidade derivada apenas do seu valor de troca de tal modo que ambos sobem e descem pari passu quando o seu valor de troca aumenta não há portanto como no caso de outros fatores de renda motivo ou tendência para substituíla por qualquer outro fator Assim sendo não apenas é impossível empregar mais mãodeobra na produção de moeda quando o seu preço em relação à mãodeobra sobe como também a moeda constitui um poço sem fundo para o poder de compra quando a sua demanda cresce visto não haver como no caso de outros fatores de renda um valor acima do qual essa demanda é desviada para outras coisas A única restrição para esta situação vem da incerteza que a ele vação do valor da moeda ocasiona com relação à sua própria duração caso em que a1 e a2 sobem o que equivale a um aumento nas taxas de juros monetários da mercadoria e é portanto um estímulo para a produção de outros bens iii Em terceiro lugar devemos considerar se estas conclusões se alteram pelo fato de que mesmo quando é impossível aumentar a quantidade de moeda desviando mais trabalho para sua produção não se justifica a suposição de que sua oferta efetiva seja absolutamente imutável Em particular uma redução da unidade de salários deixará em liberdade os recursos de moeda circulante que se destinavam a outros usos para a satisfação do motivo de liquidez enquanto além disso à medida que os valores monetários baixam o estoque de moeda manterá uma proporção mais elevada relativamente à riqueza total da comunidade Não é possível negar que por princípios puramente teóricos esta reação poderia levar a uma baixa adequada da taxa monetária de juros Todavia por diversas razões que tomadas em conjunto têm uma força decisiva é muito provável que numa economia do tipo a que estamos acostumados a taxa monetária de juros resista com fre qüência a baixar adequadamente a Temos de levar em conta em primeiro lugar os efeitos que uma baixa na unidade de salários produz sobre as eficiências marginais dos outros bens em termos de moeda pois é a diferença entre estas e a taxa monetária de juros que nos interessa Se o efeito da baixa na unidade de salários for uma expectativa de alta posterior o resultado OS ECONOMISTAS 226 será completamente favorável Se pelo contrário seu efeito for produzir uma expectativa de nova baixa futura a reação sobre a eficiência mar ginal do capital pode contrabalançar a baixa na taxa de juros135 b O fato de serem os salários propensos à rigidez quando medidos em moeda sendo o salário nominal mais estável que o real tende a aumentar a propensão da unidade de salários a baixar em termos de moeda Ademais se assim não fosse a situação poderia ser antes pior do que melhor porque se os salários nominais pudessem baixar com facilidade isso contribuiria nas mais das vezes para criar uma pre visão de nova baixa com reações desfavoráveis para a eficiência mar ginal do capital Além disso se os salários fossem estipulados em qual quer outra mercadoria por exemplo em trigo é improvável que con tinuassem sendo rígidos É por causa das outras características da moeda especialmente as que a fazem líquida que os salários quando estipulados em moeda manifestam certa rigidez136 c Em terceiro lugar chegamos à consideração mais importante neste contexto ou seja às características da moeda que satisfazem a preferência pela liquidez Pois em determinadas circunstâncias que aliás ocorrem com freqüência elas farão com que a taxa de juros per maneça insensível particularmente abaixo de certo nível137 a um au mento mesmo substancial na quantidade de moeda proporcionalmente às outras formas de riqueza Por outras palavras a baixa que um acréscimo da quantidade de moeda determina no rendimento que o dinheiro proporciona em razão de sua liquidez tornase além de certo nível insignificante em relação à baixa do rendimento dos outros tipos de riqueza que acompanha um aumento comparável de sua quantidade A esse respeito os baixos ou insignificantes custos de manu tenção da moeda representam um papel essencial pois se os custos de manutenção fossem apreciáveis compensariam o efeito das previsões sobre o valor do dinheiro em épocas futuras A presteza com que o público aumenta o seu estoque de moeda por efeito de um estímulo relativamente pequeno devese ao fato de que as vantagens da liquidez real ou suposta não têm compensação alguma em forma de custo de manutenção no decorrer do tempo No caso de uma mercadoria diferente do dinheiro um pequeno estoque da mesma pode oferecer algumas vantagens para os que a utilizam Mas mesmo quando um estoque maior pudesse ter certo atrativo como reserva de riqueza possuindo um valor estável essa vantagem ficaria neutralizada pelos custos de KEYNES 227 135 Esta questão será examinada mais detalhadamente no cap 19 136 Se os salários e os contratos fossem estipulados em trigo pode ser que este adquirisse uma parte do prêmio de liquidez do dinheiro voltaremos ao assunto em IV a seguir 137 Ver p 76 manutenção da dita riqueza sob a forma de despesas de armazenagem desgaste etc Portanto além de certo nível conservar um estoque maior leva a um prejuízo certo Todavia no caso da moeda as coisas não se passam assim como vimos e isso por diversas razões como por exemplo aquelas que no entender do público tornam o dinheiro líquido par excellence Por tanto os reformadores que viram um remédio na criação de custos artificiais de manutenção da moeda através do expediente de obriga rem os meios de pagamento com curso legal a serem periodicamente carimbados com uma taxa determinada a fim de poderem conservar a sua qualidade de moeda estavam no caminho certo e o valor prático de suas proposições merece consideração O significado da taxa de juros monetária surge portanto da com binação de características que sob a influência do motivo de liquidez faz com que a taxa possa ser mais ou menos insensível a uma mudança na proporção que a quantidade de moeda guarda com outras formas de riqueza medidas em dinheiro e que este tem ou pode ter elasti cidades nulas ou insignificantes de produção e que a moeda tem ou pode ter elasticidades nulas ou insignificantes de substituição A pri meira condição significa que a demanda pode concentrarse na moeda a seguinte que quando isto ocorre não se pode empregar trabalho para produzir mais moeda e a terceira que é esta situação seja qual for a sua gravidade não pode ser atenuada pela intervenção de outro fator capaz se suficientemente barato de prestar os mesmos serviços que a moeda A única solução fora das variações da eficiência mar ginal do capital provém enquanto a preferência pela liquidez se mantenha constante do aumento da quantidade da moeda ou o que vem a dar exatamente na mesma de uma alta do valor da moeda que permita a uma quantidade determinada prestar maiores serviços monetários Assim sendo um aumento da taxa monetária de juros retarda a produção de riquezas em todos os ramos em que ela é elástica sem estimular a produção da moeda que por hipótese é perfeitamente inelástica A taxa monetária de juros determinando o nível de todas as demais taxas de juros de mercadorias refreia o investimento para produzir essas mercadorias sem poder estimular o investimento ne cessário para produzir moeda que por hipótese não pode ser produzida Além disso em virtude da elasticidade da demanda de recursos líquidos em termos de débitos uma ligeira variação nas condições que regem essa demanda pode não alterar muito a taxa monetária de juros en quanto por outro lado dada a inelasticidade da produção da moeda também não é possível fora da intervenção oficial as forças naturais fazerem baixar a taxa monetária de juros através de uma influência sobre a oferta No caso de uma mercadoria comum a inelasticidade da demanda de estoques líquidos da mesma permitiria que pequenas OS ECONOMISTAS 228 variações dessa demanda se traduzissem por uma alta ou baixa ime diata da taxa de juros enquanto a elasticidade de sua oferta também tenderia a impedir grande ágio das entregas presentes sobre as futuras Assim se os outros bens fossem abandonados a si mesmos as forças naturais isto é as forças comuns do mercado tenderiam a fazer baixar as suas taxas de juros até que o pleno emprego produzisse nas mer cadorias em geral a inelasticidade da oferta que supusemos como uma característica normal da moeda Desse modo à falta de moeda e naturalmente devemos supôlo também de qualquer outra mer cadoria com as características que atribuímos à moeda as taxas de juros só se equilibrariam em condições de pleno emprego Quer isso dizer que o desemprego aumenta porque as pessoas querem a Lua os homens não podem conseguir emprego quando o objeto de seus desejos isto é o dinheiro é uma coisa que não se produz e cuja demanda não pode ser facilmente contida O único re médio consiste em persuadir o público de que Lua e queijo verde são praticamente a mesma coisa e a fazer funcionar uma fábrica de queijo verde isto é um banco central sob o controle do poder público É interessante notar que a característica tradicionalmente con siderada a que torna o ouro especialmente adequado para servir de padrão de valor a saber a inelasticidade de sua oferta vem a ser juntamente a característica que é o ponto focal do problema Nossa conclusão pode ser enunciada na forma mais geral dada a propensão a consumir da seguinte maneira O volume do investi mento não pode ser aumentado quando a mais alta das taxas de juros específicas de todos os bens disponíveis medidos por certo padrão é igual à mais alta das eficiências marginais de todos os bens medida pelo mesmo padrão Em condições de pleno emprego esta condição satisfazse neces sariamente Mas ela também pode ser satisfeita antes que o pleno emprego seja alcançado caso haja algum bem cujas elasticidades de produção e de substituição138 sejam nulas ou relativamente pequenas e cuja taxa de juros decline à medida que sua produção aumente mais lentamente que as eficiências marginais de bens de capital medidas em termos desse bem IV Já vimos antes que não é suficiente uma mercadoria ser o padrão de valor para que a taxa de juros dessa mercadoria seja significativa Todavia é interessante considerar até que ponto as características da moeda tal como a conhecemos e que conferem à sua taxa de juros uma importância significativa estão ligadas ao fato de ser ela o padrão KEYNES 229 138 Uma elasticidade zero é condição mais estrita do que a que necessariamente se requer em que habitualmente se estipulam as dívidas e os salários O assunto deve ser considerado sob dois aspectos Em primeiro lugar o fato de serem os contratos fixos e de serem os salários geralmente bastante estáveis em termos de moeda con tribui sem dúvida em larga medida para que a moeda tenha um prêmio de liquidez tão elevado Há uma vantagem evidente em conservar bens no mesmo padrão e que irão vencer os compromissos futuros e nele esperar que o custo de vida permaneça relativamente estável Ao mesmo tempo a expectativa de relativa estabilidade no custo monetário da produção futura não se manteria com muita confiança se o padrão de valor fosse um bem com grande elasticidade de produção Além disso os baixos custos de manutenção da moeda contribuem tanto quanto a importância do seu prêmio de liquidez para dar à sua taxa de juros uma importância significativa O que interessa com efeito é a diferença entre o prêmio de liquidez e os custos de manutenção e no caso da maior parte dos bens que não sejam ouro prata ou notas de banco os custos de manutenção são pelo menos tão elevados quanto o prêmio de liquidez que geralmente acompanha o padrão em que são estipulados os contratos e os salários de tal modo que mesmo se o prêmio de liquidez que agora tem por exemplo a libra esterlina se transferisse por exemplo para o trigo seria ainda improvável que a taxa de juros do trigo se elevasse acima de zero Não obstante os contratos e salários serem fixados em termos monetários aumentar a importância da taxa monetária de juros não bastaria entretanto por si só para conferir a essa taxa as características que lhe têm sido atribuídas O segundo ponto a considerar é mais sutil A expectativa normal de que o valor da produção seja mais estável em termos de moeda de que em termos de qualquer outro bem não depende naturalmente do fato de os salários serem estipulados em moeda mas do fato de em termos de moeda eles serem relativamente rígidos Que sucederia então se se presumisse que os salários fossem mais rígidos isto é mais estáveis em termos de uma ou mais mercadorias diferentes da moeda do que em termos da própria moeda Tal expectativa exigiria não apenas que os custos do bem em questão fossem relativamente constantes em unidades de salários para uma escala de produção maior ou menor tanto no curto como no longo prazo mas também que qual quer excedente sobre a demanda normal ao preço de custo pudesse ser incluído no estoque sem despesas isto é o seu prêmio de liquidez excederia os seus custos de manutenção pois de outro modo quando não há esperança de lucro mediante um preço mais alto a manutenção de um estoque tem de supor necessariamente um prejuízo Se houver um bem que satisfaça estas condições nada impede sem dúvida que ele se torne um rival da moeda Assim sendo não é logicamente im OS ECONOMISTAS 230 possível a existência de um bem em termos do qual o valor da produção pareça ser mais estável do que em relação à moeda Mas não parece provável que exista tal bem Concluo portanto que o bem em função do qual se espera que os salários sejam mais rígidos só pode ser um cuja elasticidade de produção seja mínima e cujo excedente de custos de manutenção sobre o prêmio de liquidez seja igualmente mínimo Em outras pa lavras a expectativa de rigidez relativa dos salários em termos de moeda é um corolário do fato de o excedente do prêmio de liquidez sobre os custos de manutenção ser maior para a moeda do que para qualquer outro bem Vemos assim que as várias características que se combinam para tornar significativa a taxa monetária de juros interagem de forma cu mulativa O fato de ter a moeda baixas elasticidades de produção e substituição e baixos custos de manutenção tende a criar a expectativa de certa estabilidade de salários expressos em moeda essa expectativa aumenta o prêmio de liquidez do dinheiro e evita a correlação excep cional entre a taxa monetária de juros e as eficiências marginais de outros bens que poderia se existisse privar esta taxa monetária de juros de seu predomínio O professor Pigou entre outros costumava supor a existência de uma presunção no sentido de que os salários reais são mais estáveis que os nominais Porém isto só poderia ocorrer em virtude de outra presunção em favor da estabilidade do emprego Ademais resta ainda a dificuldade de que os bens de consumo salariais são gravados de elevados custos de manutenção Na verdade se se tentasse estabilizar os salários reais estipulando a remuneração do trabalho em bens de consumo salariais o único resultado seria uma violenta oscilação dos preços monetários pois qualquer ligeira flutuação da propensão a con sumir e do incentivo a investir faria com que os preços nominais os cilassem violentamente entre zero e o infinito Serem os salários no minais mais estáveis que os salários reais é uma condição para que o sistema possua uma estabilidade intrínseca Atribuir aos salários reais uma estabilidade relativa é não apenas cometer um erro de fato e de experiência mas também um erro de lógica isto se supusermos que o sistema considerado é estável no sentido de que as pequenas variações na propensão a consumir e no incentivo a investir não produzem efeitos violentos sobre os preços V Como comentário ao que ficou dito talvez seja útil insistir sobre o fato já assinalado de que a liquidez e os custos de manutenção são ambos questão de grau e que é unicamente na importância da primeira em relação aos últimos que reside a peculiaridade da moeda KEYNES 231 Consideremos por exemplo uma economia na qual não há um bem cujo prêmio de liquidez esteja sempre acima de seus custos de manutenção esta é a melhor definição que posso dar da chamada economia não monetária Quer dizer não haveria nessa economia senão determinados bens de consumo e determinados equipamentos de capital mais ou menos diferenciados conforme a natureza dos bens de consumo que num espaço de tempo mais ou menos longo produzem ou ajudam a produzir todos estes bens ao contrário do dinheiro líquido caso se conservem em estoque se deterioram ou supõem despesas de um valor maior que o seu prêmio de liquidez Em semelhante economia os equipamentos de capital se distin guem uns dos outros a pela variedade dos bens de consumo em cuja produção podem intervir b pela estabilidade do valor de sua produção no sentido de que o valor do pão é mais estável através do tempo do que o das novidades que logo passam de moda e c pela rapidez com que a riqueza que lhes está incorporada pode tornarse líquida ou seja pela rapidez com que criam bens cujo produto da venda pode ser reincorporado se se desejar de forma inteiramente diferente Os proprietários de riqueza ponderarão a falta de liquidez no sentido anterior dos diferentes equipamentos de capital como meio de conservar a riqueza com o cálculo atuarial melhor possível dos seus rendimentos prováveis após considerar o risco Observaremos que o prêmio de liquidez se assemelha em parte ao prêmio de risco porém dele difere em parte a diferença corresponde à que existe entre os melhores cálculos que possamos fazer das probabilidades e a confiança com que o faremos139 Quando tratamos em capítulos anteriores do cálculo do rendimento esperado não entramos em pormenores sobre como era feito esse cálculo e para não complicar o raciocínio não distinguimos as diferenças de liquidez das diferenças de risco propria mente dito É contudo evidente que no cálculo da taxa de juros es pecífica devemos leválas em conta É claro que não existe um padrão de liquidez absoluto mas sim plesmente uma escala de liquidez um prêmio variável que se tem de levar em conta além do rendimento do uso e dos custos de manutenção ao calcular o atrativo de conservar diversas formas de riqueza A noção do que contribui para a liquidez é em parte vaga modificandose de tempos em tempos e dependendo das práticas sociais e das instituições Existe entretanto na idéia dos proprietários de riqueza uma ordem de preferência bem definida na qual eles exprimem em qualquer tempo o OS ECONOMISTAS 232 139 Ver a nota de rodapé da p 158 que pensam a respeito da liquidez e não precisamos de mais nada para a nossa análise do comportamento do sistema econômico Pode ser que em determinadas circunstâncias históricas os pro prietários de riqueza tenham pensado que a posse de terra se carac terizava por um alto prêmio de liquidez e visto que a terra participava com a moeda da particularidade de ter em princípio elasticidades de produção e de substituição muito baixas140 é concebível que tenha havido na história ocasiões em que o desejo de possuir terra haja de sempenhado o mesmo papel que a moeda em tempos recentes no sen tido de manter a taxa de juros num nível demasiado alto É difícil determinar esta influência quantitativamente dada a falta de um preço futuro para a terra medido em unidades de si mesma que seja estri tamente comparável à taxa de juros de uma dívida monetária Temos entretanto um fator que em certas épocas desempenhou papel análogo representado pelas elevadas taxas de juros hipotecários141 As altas taxas de juros sobre hipotecas da terra muitas vezes excedendo o rendimento provável de sua cultura constituem um aspecto comum de muitas economias agrícolas As leis sobre usura eram especial mente dirigidas contra as extorsões dessa natureza E com razão pois nas antigas organizações sociais nas quais inexistiam as obri gações a longo prazo no sentido moderno a concorrência de uma elevada taxa de juros sobre hipotecas pode muito bem ter tido o mesmo efeito em retardar o crescimento da riqueza procedente do investimento corrente em ativos de capital recémproduzidos tanto quanto as altas taxas de juros sobre dívida de longo prazo o fizeram nos tempos mais recentes O fato de ser o mundo tão pobre como é em bens de capital acumulados apesar da ininterrupta poupança individual durante vá rios milênios não deve ser explicado na minha opinião pela tendência da humanidade para a imprevidência nem mesmo pelas destruições das guerras mas antes pelos prêmios de liquidez que outrora tinha a propriedade da terra e que agora tem a moeda Neste ponto a minha KEYNES 233 140 O atributo de liquidez não é de maneira alguma independente destas duas características Pois se a oferta de um bem pode ser facilmente aumentada ou se o desejo de que ele é objeto pode facilmente ser desviado por uma variação no seu preço relativo não é provável que esse bem goze do atributo de liquidez na idéia dos possuidores de riqueza O próprio dinheiro não tarda a perder o atributo de liquidez quando se esperam fortes variações na sua oferta 141 É evidente que uma hipoteca e seu juro se estipulam em termos monetários Porém o fato de o devedor de hipoteca gozar da faculdade de entregar a terra para saldar sua dívida e assim tem de fazer se não conseguir oportunamente o dinheiro fez com que o sistema de hipotecas se aproximasse de um contrato de terra para entrega futura contra terra para entrega imediata Tem havido vendas de terras aos arrendatários contra hipotecas efetuadas por eles que de fato se aproximaram muito das transações desta natureza opinião diverge da doutrina antiga tal como Marshall a exprimiu com dogmatismo incomum em sua obra Principles of Economics p 581 Todos sabem que a acumulação de riqueza é refreada e que a taxa de juros se sustenta em virtude da preferência que a maior parte da humanidade tem pelas satisfações imediatas sobre as diferidas ou em outras palavras pela sua relutância em esperar VI Em minha obra Treatise on Money defini o que pretendia ser uma taxa de juros de natureza única a que chamei taxa natural de juros isto é aquela que na terminologia de meu Treatise mantinha a igualdade entre o montante da poupança segundo a definição ali adotada e o montante do investimento Pensei assim desenvolver e esclarecer a noção de taxa natural de juros de Wicksell que segundo ele era a que conservaria a estabilidade de certo nível de preços não muito bem definida Tinha eu contudo ignorado o fato de que segundo esta definição há em cada sociedade uma taxa de juros diferente para cada volume teórico de emprego hipotético E para ele a mesma é natural no sentido de que o sistema estará em equilíbrio com esse nível de taxa de juros e esse volume de emprego Foi portanto um erro falar da taxa natural de juros ou sugerir que a anterior definição lhe daria um valor único independentemente do volume de emprego Eu não compreendera então que em certas circunstâncias o sistema pode estar em equilíbrio abaixo do pleno emprego Agora já não sou da opinião de que o conceito de uma taxa natural de juros que antes me pareceu uma idéia das mais pro missoras possa trazer à nossa análise uma contribuição verdadei ramente útil ou importante Ela é simplesmente a taxa que manterá o status quo e em geral não temos interesse predominante no status quo como tal Se existe taxa de juros única e importante tem de ser aquela a que poderíamos chamar neutra142 isto é a taxa natural no sentido anterior que é consistente com o pleno emprego dados os outros pa râmetros do sistema aliás talvez fosse preferível designála pelo nome de taxa ótima A taxa neutra de juros pode definirse mais rigorosamente como OS ECONOMISTAS 234 142 Esta definição não corresponde a nenhuma das diversas definições de moeda neutra dadas por autores modernos embora haja talvez certa relação com o objetivo que esses autores têm em mente sendo a que prevalece em equilíbrio quando a produção e o emprego são tais que a elasticidade do emprego como um todo é zero143 O que ficou dito nos dá mais uma vez a resposta à questão de qual hipótese é necessário admitir tacitamente para que a teoria clás sica de juros tenha um sentido Essa teoria supõe que a taxa real é sempre igual à neutra no sentido em que acabamos de definila ou reciprocamente que a taxa real de juros é sempre igual à que manterá o emprego em certo nível especificado e constante Se a teoria tradi cional for assim interpretada pouco ou nada há em suas conclusões práticas com que deixaremos de estar de acordo A teoria clássica supõe que a autoridade bancária ou as forças naturais levam a taxa juros do mercado a satisfazer uma ou outra das condições anteriores e in vestiga as leis que governam nesta hipótese a aplicação e a remune ração dos recursos produtivos da comunidade Com essa limitação o volume da produção depende unicamente do nível constante de em prego que se supõe aliado à técnica e ao equipamento atuais e ficamos devidamente protegidos no mundo ricardiano KEYNES 235 143 Cf cap 20 CAPÍTULO 18 Novo Enunciado da Teoria Geral do Emprego I Chegamos ao momento de reunir todos os fios do nosso raciocínio Para começar poderia ser útil indicar quais elementos do sistema eco nômico tomamos habitualmente como dados quais são as variáveis independentes do nosso sistema e quais as dependentes Tomamos como dados a capacidade e a quantidade de mãodeobra disponível a qualidade e quantidade do equipamento disponível o es tado da técnica o grau de concorrência os gostos e hábitos dos con sumidores a desutilidade das diferentes intensidades de trabalho e das atividades de supervisão e organização bem como a estrutura so cial incluindo as forças que determinam a distribuição da renda na cional não compreendidas em nossas variáveis citadas mais adiante Isso não significa que suponhamos constantes tais fatores mas sim plesmente que neste instante e neste contexto nos abstemos de ana lisar ou mesmo de levar em consideração as conseqüências das suas variações Nossas variáveis independentes são em primeiro lugar a pro pensão a consumir a escala da eficiência marginal do capital e a taxa de juros embora como já vimos estas variações sejam suscetíveis de maior análise Nossas variáveis dependentes são o volume de emprego e a renda nacional ou dividendo nacional medida em unidade de salários Os fatores que tomamos como dados influem sobre as nossas variáveis independentes mas não as determinam completamente Por exemplo a escala da eficiência marginal do capital depende em parte do volume de equipamento existente que é um dos fatores dados mas também em parte das expectativas a longo prazo que não se pode inferir dos fatores dados Há porém outros elementos tão completa 237 mente determinados pelos fatores já conhecidos que podemos tratar estes elementos derivados como se também fossem dados Por exemplo os fatores dados permitem saber qual o montante da renda nacional medido em unidades de salário que corresponderá a qualquer volume de emprego de maneira que dentro da estrutura econômica que con sideramos dada a renda nacional depende do volume de emprego isto é da quantidade de esforço atual consagrado à produção no sentido de que há uma correlação única entre os dois144 Dos fatores dados podemos além disso deduzir a forma das funções da oferta agregada que compreendem as condições físicas da oferta para os diferentes tipos de produtos quer dizer o volume de emprego que se dedicará à pro dução correspondente a dado nível qualquer da demanda efetiva me dida em unidades de salários Finalmente nos dão a função da oferta de mãodeobra ou esforço indicando inter alia em que ponto a função do emprego145 deixará de ser elástica A escala da eficiência marginal do capital depende contudo em parte dos fatores dados e em parte do rendimento provável dos bens de capital de diferentes espécies ao passo que a taxa de juros é par cialmente governada pelo estado da preferência pela liquidez isto é pela função de liquidez e também pela quantidade de moeda medida em unidades de salários Assim podemos em alguns casos considerar variáveis independentes finais 1 os três fatores psicológicos funda mentais a saber a propensão psicológica a consumir a atitude psico lógica relativa à liquidez e a expectativa psicológica do rendimento futuro dos bens de capital 2 a unidade de salários tal como é de terminada pelos acordos celebrados entre patrões e operários e 3 a quantidade de moeda tal como é determinada pela ação do banco central de maneira que se tomarmos como dados os fatores antes especificados estas variáveis determinam a renda ou dividendo nacional e o volume de emprego Mas elas são também suscetíveis de análise ulterior e não constituem os nossos últimos elementos mínimos independentes A divisão das determinantes do sistema econômico nos dois grupos de fatores dados e das variáveis independentes é de um ponto de vista absoluto completamente arbitrária Ela deve basearse apenas na ex periência de modo que corresponda por um lado aos fatores cujas variações parecem ser tão lentas ou tão pouco importantes que apenas tenham pequena e comparativamente desprezível influência a curto prazo em nosso quaesitum e por outro lado aos fatores cujas variações exercem na prática uma influência dominante em nosso quaesitum OS ECONOMISTAS 238 144 Deixamos de lado neste ponto certas dificuldades que surgem quando as funções de emprego dos diferentes produtos têm curvaturas desiguais ao redor do nível de emprego relevante Ver cap 20 145 Definida no cap 20 O nosso objetivo presente é descobrir o que em dado sistema econômico determina em um momento preciso a renda nacional e o que vem a ser quase a mesma coisa o volume de emprego que lhe corresponde o que significa num estudo tão complexo como o da economia onde não é possível esperar generalizações completamente exatas descobrir os fatores cujas variações determinam principalmente o nosso quaesi tum Nossa tarefa final poderia consistir em selecionar as variáveis que a autoridade central pode controlar ou dirigir deliberadamente no tipo de sistema em que realmente vivemos II Tentemos agora resumir o raciocínio dos capítulos anteriores tomando os fatores na ordem inversa àquela em que foram introduzidos Existe um incentivo para aumentar o fluxo de investimentos no vos até um ponto em que a alta do preço de oferta de cada espécie de bem de capital seja suficiente dado o seu rendimento provável para fazer cair a eficiência marginal do capital em geral até as proximidades da taxa de juros Isso significa que as condições físicas da oferta nas indústrias de bens de capital o estado da confiança quanto ao rendi mento provável a atitude psicológica relativa à liquidez e a quantidade de moeda calculada de preferência em termos de unidades de salários determinam em conjunto o fluxo de investimentos novos No entanto um aumento ou diminuição do fluxo de investimen tos acompanhase necessariamente de um aumento ou diminuição do fluxo de consumo pois o comportamento do público é em geral de tal natureza que só presta a alargar ou estreitar a lacuna que separa seu rendimento e seu consumo se o rendimento for por sua vez au mentado ou diminuído Isso significa que as variações do fluxo de con sumo estão em geral na mesma direção embora de grandeza menor que as variações do fluxo de rendimento A relação entre um incremento de consumo e o incremento na poupança a que ele está associado é determinada pela propensão marginal a consumir A relação assim determinada entre um incremento do investimento e o incremento correspondente à renda agregada ambos medidos em unidades de sa lários é dada pelo multiplicador de investimento Finalmente se supusermos como primeira aproximação que o multiplicador de emprego é igual ao multiplicador de investimento podemos aplicandoo ao incremento ou ao decrescimento que os fa tores anteriormente indicados provocam no fluxo de investimento in ferir dele o incremento do emprego Um incremento ou decrescimento do emprego pode contudo fazer subir ou baixar a curva da preferência pela liquidez existindo três maneiras de aumentar a demanda da moeda a saber pelo fato de que o valor da produção sobe quando o emprego aumenta mesmo que a unidade de salários e os preços em unidades de salários não KEYNES 239 mudem pelo fato de que a própria unidade de salários tende a subir à medida que o emprego melhora e pelo fato de que o aumento da produção é acompanhado por uma alta de preços em termos da unidade de salários devida ao aumento dos custos em prazo curto A posição de equilíbrio será portanto afetada por estas reper cussões e também por outras Além disso não há um só dos elementos anteriores que não esteja sujeito a variar sem prévio aviso e às vezes substancialmente Como conseqüência a extrema complexidade do cur so real dos acontecimentos Em todo caso estes parecem ser os fatores que é conveniente e útil isolar Quando examinamos um problema concreto de acordo com o esquema anterior achamolo mais fácil de manejar e a nossa intuição prática que pode levar em conta um con junto de fatos mais pormenorizados do que é possível tratar segundo princípios gerais se exercerá sobre um material menos inabordável III O que ficou dito é um resumo da Teoria Geral Os fenômenos reais do sistema econômico porém estão também coloridos por certas características especiais de propensão a consumir da escala da efi ciência marginal do capital e da taxa de juros sobre as quais podemos generalizar com segurança a partir da experiência mas que não são logicamente necessárias Em especial é uma das características essenciais do sistema eco nômico em que vivemos não ser ele violentamente instável mesmo estando sujeito a severas flutuações no que concerne à produção e ao emprego Na verdade ele parece apto a permanecer em condições crô nicas de atividade subnormal durante um tempo considerável sem ten dência marcada para a recuperação ou o colapso completo Ademais a evidência prova que o pleno emprego ou mesmo o aproximadamente pleno é uma situação tão rara quanto efêmera As flutuações podem começar de repente mas parecem atenuarse antes de chegar a grandes extremos e o nosso destino é a situação intermediária não propria mente desesperada e tampouco satisfatória Foi no fato de que as flu tuações tendem a atenuarse por si mesmas antes de alcançarem limites extremos e de eventualmente se inverterem que se baseou a teoria dos ciclos econômicos de fase regular O mesmo se aplica aos preços que em resposta a uma causa inicial de perturbação se mostram aptos a encontrar um nível em que podem permanecer relativamente estáveis por certo tempo Ora como estes fatos da experiência não são deduzidos por ne cessidade lógica devese admitir que eles por sua natureza produzem estes resultados em virtude das tendências psicológicas e das circuns tâncias do mundo moderno Será portanto útil começar examinando quais são as tendências psicológicas que por hipótese tornam um sis tema estável e depois verificar se é plausível levando em conta os OS ECONOMISTAS 240 nossos conhecimentos gerais da natureza humana contemporânea atri buílas ao mundo em que vivemos Segundo a análise precedente as condições de estabilidade pró prias para explicar os resultados observados são as seguintes i A propensão marginal a consumir é tal que quando a produção de determinada comunidade aumenta ou diminui porque se aplica mais ou menos mãodeobra ao seu equipamento de capital o mul tiplicador que relaciona os dois aumentos é superior à unidade mas não muito grande ii Quando se produz uma variação no rendimento provável do capital ou na taxa de juros a curva da eficiência marginal do capital deverá ser tal que a variação do novo investimento não fique em grande desproporção com a mudança no primeiro isto é as variações mode radas no rendimento provável do capital ou na taxa de juros não devem ser associadas a variações muito grandes de fluxo de investimento iii Quando o volume de emprego varia os salários nominais tendem a variar na mesma direção mas não de forma muito despro porcionada isto é as variações moderadas no emprego não se acom panham de grandes alterações nos salários nominais Esta é uma con dição da estabilidade dos preços ao invés do emprego iv Podemos acrescentar uma quarta condição que não se rela ciona tanto com a estabilidade do sistema como com a tendência de as flutuações em certo sentido se inverterem no devido tempo tal condição é a de que um fluxo de investimento superior ou inferior ao que prevalecia começa a reagir desfavoravelmente ou favoravel mente sobre a eficiência marginal do capital se se prolongar por um período que medido em anos não seja muito longo i Nossa primeira condição de estabilidade a de que o multipli cador embora superior à unidade não é muito elevado é perfeitamente plausível se considerada uma característica psicológica da natureza humana À medida que a renda aumenta as necessidades não satis feitas tornamse menos prementes e a margem sobre o nível de vida estabelecido aumenta quando a renda real diminui verificase o con trário É portanto natural ao menos para o termo médio da comu nidade que em caso de aumento de emprego o consumo corrente se amplie porém em menor proporção que o incremento absoluto da renda real e que em caso de diminuição do emprego ele decline embora não tanto quanto a baixa absoluta do rendimento real Além disso o que é certo para a maioria dos indivíduos provavelmente tam bém o será para os governos especialmente numa época em que o KEYNES 241 aumento progressivo do desemprego obriga geralmente o Estado a fornecer ajuda com recursos emprestados Quer esta lei psicológica a priori pareça ou não plausível ao leitor o fato é que a realidade seria bastante diferente se tal lei não fosse válida Nesse caso um acréscimo do investimento por menor que fosse desencadearia um aumento cumulativo da demanda efetiva até que se alcançasse uma situação de pleno emprego ao passo que uma diminuição do investimento provocaria uma queda cumulativa da demanda efetiva até que ninguém mais tivesse emprego Não obstante isso a experiência prova que nos encontramos geralmente em posição intermediária Não é impossível haver uma área onde de fato reine a instabilidade mas se assim o é será provavelmente em estreitos limites além dos quais e em qualquer direção a nossa lei psicológica é incontestavelmente válida Além disso é evidente também que o multiplicador embora ultrapasse a unidade não é em circunstâncias normais excessivamente grande Se o fosse determinada variação no fluxo de investimento implicaria grande modificação apenas limitada pelo emprego pleno ou nulo no fluxo de consumo ii Enquanto a primeira condição nos garante que uma variação moderada no fluxo de investimento não provocará outra variação in definidamente grande na demanda de bens de consumo nossa segunda condição estabelece que uma variação moderada no rendimento pro vável dos bens de capital ou na taxa de juros não provocará uma variação de grandeza indeterminada no fluxo de investimento Este é provavelmente o caso devido ao custo crescente de uma produção mais volumosa com o equipamento existente Decerto se partirmos de uma posição em que existam grandes excedentes de recursos para a produção de bens de capital pode haver dentro de certos limites uma instabi lidade considerável o mesmo não sucederá porém se o excedente de recursos for utilizado em grande escala Além disso esta condição marca um limite à instabilidade resultante das rápidas variações do rendi mento provável dos bens de capital como acontece no caso de bruscas flutuações da psicologia nos meios de negócios ou após invenções que marcam época talvez mais em direção ascendente que descendente iii Nossa terceira condição concorda com nossa experiência da natureza humana Embora a luta pelos salários nominais tenha por fim essencial como já assinalamos manter um elevado salário relativo é provável que à medida que o emprego aumenta essa luta venha a intensificarse em cada caso individual primeiro porque o operário se beneficia nas negociações de uma posição mais favorável e depois por que a reduzida utilidade marginal do seu salário e a melhoria de sua margem financeira o tornam mais inclinado a correr riscos Assim sen do estas influências atuarão dentro de certos limites e os trabalhadores OS ECONOMISTAS 242 não procurarão um salário nominal muito maior quando o emprego aumenta ou preferirão suportar certo grau de desemprego a consen tirem numa sensível redução dos salários Mas outra vez seja esta conclusão plausível ou não a priori a experiência mostra que deve haver uma lei psicológica deste tipo válida na realidade Isso porque se a concorrência entre os trabalhadores sem emprego conduzisse sempre a uma grande redução dos salários nominais o nível de preços estaria sujeito a uma violenta instabilidade Ademais não poderia haver posição de equilíbrio estável salvo em condições compatíveis com o pleno emprego desde o momento em que a unidade de salários devesse baixar sem limite até que o efeito da abundância de dinheiro em unidades de salários sobre a taxa de juros fosse suficiente para estabelecer um nível de pleno emprego Em ne nhum outro ponto poderia haver equilíbrio durável146 iv Nossa quarta condição que não é tanto de estabilidade como de recessão e de recuperação alternadas baseiase simplesmente na presunção de que os bens de capital datam de épocas diversas gas tamse com o tempo e nem todos são muito duráveis assim se o fluxo de investimento cai além de certo nível mínimo basta certo lapso de tempo à falta de grandes flutuações em outros elementos para de terminar na eficiência marginal do capital uma alta bastante forte para que se restabeleça o fluxo de investimento acima desse mínimo E naturalmente de modo similar se os investimentos sobem a um nível maior que antes basta igualmente certo lapso de tempo para determinar na eficiência marginal do capital uma baixa suficientemente forte para provocar uma recessão a não ser que mudanças compen sadoras se produzam em outros fatores Por essa razão é provável que mesmo aqueles graus de recupe ração e de recessão que podem ocorrer dentro das limitações estabe lecidas pelas nossas outras condições de estabilidade provoquem um movimento de retrocesso até que as mesmas forças de antes tornem a inverter a direção se persistirem por um lapso de tempo suficiente e não forem contrariadas por variações nos outros elementos As nossas quatro condições tomadas em conjunto bastam por tanto para explicar os aspectos salientes da nossa experiência real isto é mostram que oscilamos evitando os extremos mais graves das flutuações no emprego e nos preços em ambas as direções ao redor de uma posição intermediária sensivelmente abaixo do pleno emprego e sensivelmente acima do mínimo já que uma queda abaixo deste mínimo constitui um perigo de vida Não devemos porém concluir que a posição intermediária assim KEYNES 243 146 Os efeitos das variações na unidade de salário serão tratados em detalhe no cap 19 determinada pelas tendências naturais a saber pelas tendências que provavelmente persistirão à falta de medidas expressamente destina das a corrigilas corresponda a uma situação inevitável O predomínio das condições anteriores é um fato observado no mundo tanto no pre sente como no passado mas não um princípio necessário que não possa ser modificado OS ECONOMISTAS 244 LIVRO QUINTO SALÁRIOS NOMINAIS E PREÇOS CAPÍTULO 19 Variações nos Salários Nominais I Teria sido preferível examinar os efeitos das variações nos sa lários nominais em capítulo anterior pois a teoria clássica tem o cos tume de basear numa pretensa fluidez dos salários nominais a suposta aptidão do sistema econômico para se ajustar por si mesmo e quando há rigidez de atribuir a essa rigidez a responsabilidade pelos desa justamentos Era impossível entretanto fazer um estudo completo desta ques tão antes de ter exposto a nossa própria teoria pois as conseqüências de uma alteração nos salários nominais são complexas Uma redução dos salários é capaz em determinadas circunstâncias de estimular a produção tal como o supõe a teoria clássica A diferença entre esta teoria e a minha reside principalmente na matéria de análise de modo que não poderia expôla claramente antes que o leitor estivesse fami liarizado com meu método A explicação geralmente admitida é no meu entender muito simples Ela não depende das repercussões indiretas como as que exa minaremos em seguida O argumento consiste simplesmente em que uma redução nos salários nominais estimulará coeteris paribus a de manda ao fazer baixar o preço dos produtos acabados aumentando portanto a produção e o emprego até o ponto em que a redução que os operários concordaram aceitar em seus salários nominais fique com pensada justamente pela eficiência marginal decrescente do trabalho à medida que aumenta a produção de determinado equipamento Em sua forma mais rudimentar isto equivale a supor que a redução dos salários nominais não afetará a demanda Há talvez al guns economistas que sustentam não haver razão para que a demanda seja afetada argüindo que a demanda agregada depende da quantidade de moeda multiplicada pela velocidaderenda da mesma e que não há 247 razão evidente para que uma redução dos salários nominais diminua a quantidade de moeda ou a sua velocidaderenda Poderão sustentar ainda que a baixa dos salários aumenta necessariamente os lucros Pareceme mais normal entretanto convir que a redução dos salários nominais pode ter algum efeito sobre a demanda agregada através da queda que ocasiona no poder de compra de alguns trabalhadores em bora a demanda real de outros fatores cujas rendas nominais não foram reduzidas se veja estimulada pela baixa de preços e a demanda agregada dos próprios trabalhadores aumente com bastante probabi lidade como resultado do maior volume de emprego a não ser que a elasticidade da demanda de mãodeobra em resposta às modificações nos salários nominais seja inferior à unidade Conseqüentemente quando o novo equilíbrio se estabelece há mais emprego do que existiria em outras condições exceto talvez em alguns casos extremos que carecem de realidade na prática Divirjo fundamentalmente deste tipo de análise ou melhor do que parece estar por trás de observações como as anteriores pois enquanto o que ficou dito representa muito bem segundo creio o es pírito com que falam e escrevem muitos economistas raras vezes o raciocínio em que se baseiam foi exposto detalhadamente Parece entretanto provável que se tenha chegado a esse modo de pensar da maneira que se segue Em qualquer indústria temos uma curva da demanda do seu produto que relaciona as quantidades disponíveis para a venda aos preços solicitados temos uma série de curvas de oferta indicando os preços que serão exigidos para a venda de diferentes quantidades em cada base de custo e a combinação destas curvas permite obter uma nova que supondo a invariabilidade dos demais custos exceto como conseqüência de uma mudança na produ ção nos dá a curva da demanda de mãodeobra na indústria rela cionando o volume de emprego com os diferentes níveis de salário sendo que a forma desta curva em cada um dos seus pontos fornece a elasticidade da demanda de mãodeobra Transferese então este conceito sem modificações substanciais para o conjunto da indústria e supõese por analogia que temos para a indústria inteira uma curva da demanda de mãodeobra relacionando o volume de emprego com diferentes níveis de salários Afirmase que este argumento não se altera essencialmente quer se raciocine em termos de salários nominais ou reais Se pensamos em termos de salários nominais temos natu ralmente de fazer as correções correspondentes às variações no valor da moeda mas isso não altera a tendência geral do argumento pois decerto os preços não variam em proporção exata com as modificações nos salários nominais Se é esta a base do raciocínio e do contrário não sei qual possa ser tratase evidentemente de algo falacioso Para traçar pois a curva da demanda em indústrias em particular é indispensável adotar OS ECONOMISTAS 248 certas hipóteses fixas quanto à forma das curvas da oferta e da procura nas outras indústrias e quanto ao montante da demanda agregada efetiva Não é válido portanto aplicar o argumento à indústria em conjunto a não ser que lhe transfiramos também a nossa hipótese de que a demanda efetiva agregada é fixa Esta hipótese reduz porém o argumento a um ignoratio elenchi Ninguém pensaria pois em negar a proposição de que uma redução dos salários nominais acompanhada de demanda efetiva agregada idêntica a níveis anteriores é seguida por um aumento de emprego mas a questão que se propõe é justamente saber se os salários nominais reduzidos serão ou não acompanhados por uma demanda agregada efetiva que medida em dinheiro seja igual à demanda anterior ou pelo menos não tenha sofrido uma redução plenamente proporcional à dos salários nominais isto é que seja um tanto maior quando medida em unidades de salários Se não é per mitido porém à teoria clássica estender suas conclusões por analogia da indústria em particular à indústria em conjunto ela é inteiramente incapaz de responder que efeitos produzirá sobre o emprego uma baixa dos salários nominais Não há pois nenhum método de análise que possibilite resolver o problema Pareceme que a Theory of Unemploy ment do professor Pigou extrai da teoria clássica tudo quanto se pode tirar dela com o resultado de que o livro se converte numa demons tração surpreendente de que essa teoria nada tem para oferecer quando aplicada ao problema de saber o que determina o volume real do em prego no agregado147 II Apliquemos portanto o próprio método de análise à solução do problema O método dividese em duas questões 1 Uma redução nos salários nominais coeteris paribus tende a aumentar diretamente o emprego e com coeteris paribus se quer dizer que a propensão a consumir a curva da eficiência marginal do capital e a taxa de juros são as mesmas que antes para a comunidade em conjunto 2 De maneira certa ou provável uma redução nos salários nominais tende a afetar o emprego num sentido particular através de suas repercussões certas ou prováveis sobre esses três fatores Já respondemos à primeira pergunta em sentido negativo nos capítulos anteriores Demonstramos que o nível de emprego depende unicamente do da demanda efetiva medida em unidades de salários e que sendo esta a soma do consumo provável e do investimento pro vável não pode variar se a propensão a consumir a curva da eficiência marginal do capital e a taxa de juros permanecem constantes Se na KEYNES 249 147 Num Apêndice ao presente capítulo será criticada em detalhe a Theory of Unemployment do prof Pigou ausência de qualquer modificação nestes elementos os empresários aumentassem o volume de emprego seus rendimentos seriam neces sariamente inferiores ao preço da oferta Para refutar a conclusão sumária de que uma redução dos salários nominais aumentaria o emprego porque reduz o custo de produção talvez seja útil seguir o curso dos acontecimentos na hipótese mais adequada a este raciocínio isto é que os empresários esperam que a redução dos salários nominais produza esse efeito Sem dúvida não é improvável que o empresário individual vendo diminuir seus próprios custos comece negligenciando efeitos sobre a demanda de seu produto e atue baseado na hipótese de que será capaz de vender com lucro uma produção maior que a de antes Se os empresários em geral re gularem sua atitude baseandose nesta expectativa conseguirão eles na realidade aumentar os seus lucros Somente se a propensão mar ginal a consumir da comunidade for igual à unidade de modo que não haja lacuna entre o incremento dos rendimentos e o incremento do consumo ou então se houver um aumento no investimento que cor responda à lacuna existente entre o incremento da renda e o incremento do consumo o que só acontecerá no caso de a curva das eficiências marginais do capital ter aumentado relativamente à taxa de juros Desse modo os resultados obtidos com o aumento de produção desa nimarão os empresários e o emprego voltará outra vez ao seu nível anterior salvo se a propensão marginal a consumir for igual à unidade ou a redução dos salários nominais resultar num aumento da escala das eficiências marginais do capital em relação à taxa de juros e por tanto no montante do investimento Se os empresários oferecem bas tante emprego admitindose que possam vender sua produção ao preço previsto para que das rendas correspondentes a esse emprego o pú blico retire poupança superior ao investimento correspondente os em presários arriscamse a sofrer um prejuízo igual à diferença este será o caso seja qual for o nível dos salários nominais Na melhor das hipóteses a data do seu desapontamento apenas será retardada por um intervalo de tempo no qual os seus próprios investimentos para acréscimo do capital circulante estiverem preenchendo a lacuna Desse modo a redução dos salários nominais não tenderá a au mentar o emprego durante muito tempo a não ser pelas suas reper cussões sobre a propensão da comunidade em conjunto a consumir sobre a curva da eficiência marginal do capital ou sobre a taxa de juros Não há outro método para analisar as conseqüências de tal redução que o de acompanhar os seus possíveis efeitos sobre esses três fatores Na prática as repercussões mais importantes sobre estes fatores parecem ser as seguintes 1 Uma redução dos salários nominais diminuirá em certa me OS ECONOMISTAS 250 dida os preços Acarretará portanto certa redistribuição da renda real a dos assalariados para outros fatores que entrem no custo pri mário marginal e cuja remuneração não tenha sido reduzida e b dos empresários para os rendeiros aos quais se garantiu certo rendimento fixo em termos monetários Qual será o efeito dessa redistribuição sobre a propensão a con sumir da comunidade em conjunto A transferência de rendimento dos que recebem salários para outros fatores de produção tenderá prova velmente a reduzir a propensão a consumir O resultado da transfe rência dos empresários para os que vivem de renda é mais duvidoso Se os que vivem de renda porém representam em conjunto a parte mais rica da comunidade e o grupo cujo nível de vida é menos flexível o efeito será também desfavorável Só podemos conjecturar sobre qual será o resultado líquido da soma destas considerações Provavelmente será mais adverso que favorável 2 Se nos referimos a um sistema não fechado e se a redução dos salários nominais for uma redução relativamente aos salários no minais no estrangeiro quando ambos se convertem a uma unidade comum evidentemente a mudança será favorável ao investimento visto tender a melhorar o saldo da balança comercial Isso implica natu ralmente que a vantagem não seja anulada por alterações nas tarifas cotas etc Se a crença tradicional na eficácia de uma redução de salários nominais como meio de aumentar o emprego é mais firme na GrãBre tanha do que nos Estados Unidos isso se deve provavelmente ao fato de este último país ser um sistema fechado em comparação com o britânico 3 No caso de um sistema aberto é provável que uma redução dos salários nominais embora aumente o saldo favorável da balança comercial piore os termos comerciais Portanto haverá uma redução nos rendimentos salvo no caso dos recémempregados o que pode in fluir no aumento da propensão a consumir 4 Se se espera que a baixa dos salários nominais seja uma redução relativamente aos salários nominais no futuro a mudança será favorável ao investimento porque como vimos antes aumen tará a eficiência marginal do capital ao mesmo tempo que pela mesma razão poderá ser favorável ao consumo Se por outro lado a redução leva à expectativa ou pelo menos à séria possibilidade de uma baixa posterior terá justamente o efeito contrário pois di minuirá a eficiência marginal do capital e provocará o adiamento do investimento e do consumo 5 A redução da folha de salário acompanhada por certa baixa KEYNES 251 nos preços e nos rendimentos monetários em geral diminuirá a ne cessidade de recursos líquidos para o pagamento de rendimentos e para as transações e por conseqüência fará baixar pro tanto a curva da preferência pela liquidez da comunidade em conjunto Coeteris pa ribus isto reduzirá a taxa de juros e será favorável ao investimento Neste caso o efeito da previsão relativamente ao futuro será de ten dência oposta à que consideramos em 4 Se se espera portanto mais tarde um novo aumento dos salários e dos preços a reação favorável será muito menos acentuada no caso dos empréstimos a longo do que nos a curto prazo Além disso se a redução dos salários diminui a confiança no plano político por causa do descontentamento popular o aumento na preferência pela liquidez decorrente desta causa poderá compensar a liberação de recursos líquidos da circulação ativa 6 Desde que uma redução especial dos salários nominais é sem pre vantajosa para um empresário ou indústria individualmente uma redução geral embora os seus efeitos reais sejam diferentes pode também dar um tom otimista às idéias dos empresários os quais por sua vez podem romper o círculo vicioso dos cálculos indevidamente pessimistas sobre a eficiência marginal do capital e regular as coisas de modo que estas funcionem sobre bases mais normais de expectativa Por outro lado se os trabalhadores cometerem o mesmo erro que seus patrões sobre os efeitos de uma redução geral as disputas trabalhistas poderão anular esta circunstância favorável eventualidade esta tanto mais de temer pelo fato de não existir via de regra meio algum de conseguir uma redução igual e simultânea dos salários nominais em todas as indústrias e portanto cada trabalhador tem interesse em oporse a ela em seu caso particular De fato um movimento dos em pregadores com vista a uma redução dos salários nominais pela revisão dos contratos encontrará resistência muito maior que a baixa gradual e automática dos salários reais como resultado da alta dos preços 7 Por outro lado a influência deprimente que exerce sobre os empresários a responsabilidade crescente das dívidas pode neu tralizar em parte qualquer reação otimista proveniente da redução dos salários Na verdade se a baixa dos salários e dos preços alcança certa extensão os empresários fortemente endividados podem chegar logo ao estado de insolvência com efeitos extremamente adversos sobre o investimento Ademais as conseqüências de um nível inferior de preços sobre a carga real da dívida nacional e portanto sobre os impostos são de natureza a provocar nos meios de negócios um profundo abalo da confiança A enumeração precedente não é uma lista completa das conse qüências que no complexo mundo real podem ser causadas por uma OS ECONOMISTAS 252 redução dos salários Entretanto inclui no meu entender as comu mente mais importantes Portanto se limitarmos o nosso raciocínio ao caso de um sistema fechado e admitirmos que nada se pode esperar a não ser simples mente o contrário das repercussões que a nova distribuição da renda real produz sobre a propensão da comunidade a despender a esperança de que uma redução dos salários nominais possa atuar favoravelmente sobre o emprego deve basearse principalmente numa melhoria do investimento devida a um aumento na eficiência marginal do capital segundo 4 ou numa taxa menor de juros de acordo com 5 Exami naremos mais de perto estas duas possibilidades A contingência favorável de um aumento na eficiência marginal do capital é aquela em que se julga que os salários nominais tenham alcançado o seu limite inferior de modo que as variações posteriores tenham de ser em direção ascendente A contingência mais desfavorável é aquela em que os salários nominais descem lentamente e em que cada redução diminui a confiança na probabilidade que têm os mesmos de se manterem Quando entramos num período de declínio da demanda efetiva uma baixa repentina e substancial dos salários nominais le vandoos a um nível tão ínfimo que ninguém pudesse acreditar na sua continuidade indefinida seria o acontecimento mais favorável para res taurar a demanda efetiva Mas isso só poderia ser realizado por uma decisão administrativa e dificilmente seria possível num regime de livre discussão dos salários Por outro lado seria muito mais vantajoso que os salários fossem rigidamente fixados e julgados isentos de va riações importantes do que a ocorrência de períodos de depressão acom panhados de uma tendência progressiva para a baixa dos salários no minais com a esperança de que cada nova redução moderada nos sa lários traduzisse um aumento de digamos 1 no volume de desem prego Supondo por exemplo que se espera uma baixa de digamos 2 nos salários durante o ano seguinte essa previsão determinará um efeito mais ou menos equivalente ao de uma alta de 2 no juro pagável por um empréstimo de igual duração As mesmas observações aplicamse mutatis mutandis a um período de expansão Segue que com as práticas e as instituições existentes no mundo contemporâneo é mais conveniente abandonar uma política de salários nominais rígidos do que uma política flexível que se adapte gradual mente às variações do desemprego isto é no que se refere à eficiência marginal do capital Mas não se alterará esta conclusão quando tra tarmos a taxa de juros Por isso é sobre o efeito que um nível decrescente de preços e salários provoca na demanda de dinheiro que devem basear o peso de sua argumentação os que acreditam na capacidade do sistema econô mico de ajustarse automaticamente embora não me conste que o te nham feito jamais Se a quantidade de moeda é por si mesma função KEYNES 253 do nível de salários e preços não há de fato nada a esperar neste sentido Porém se a quantidade de moeda for virtualmente fixa é evidente que por meio de uma redução adequada dos salários a quan tidade de moeda medida em unidades de salários pode ser aumentada indefinidamente e que o seu montante em proporção aos rendimentos em geral pode ser grandemente aumentado dependendo o limite desse aumento da proporção que o custo dos salários conserva com o custo primário marginal e da reação de outros elementos do custo primário marginal relativamente à baixa na unidade de salários Podemos portanto ao menos teoricamente produzir os mesmos efeitos sobre a taxa de juros reduzindo os salários sem alterar a quan tidade de moeda e aumentando a quantidade de moeda sem alterar o nível dos salários Daí deduzse que as reduções dos salários como método de assegurar o pleno emprego estão sujeitas às mesmas limi tações que o método para aumentar a quantidade de moeda As mesmas razões antes mencionadas que limitam a eficácia dos aumentos na quantidade de dinheiro como meio de elevar o investimento à cifra ótima aplicamse mutatis mutandis às reduções de salários Assim como um acréscimo moderado na quantidade de moeda pode exercer uma influência inadequada sobre a taxa de juros a longo prazo um aumento excessivo pode neutralizar pelos seus efeitos perturbadores sobre a confiança as outras vantagens que apresenta do mesmo modo uma redução moderada nos salários nominais pode revelarse pouco eficaz enquanto a redução exagerada supondo que fosse exeqüível poderia destruir a confiança Não há portanto motivo para crer que uma política flexível de salários possa manter um estado permanente de pleno emprego nem como pensar que uma política monetária de mercado aberto possa atin gir sozinha este resultado Tais meios não são suficientes para conferir ao sistema econômico a propriedade de se ajustar por si mesmo Se na realidade os trabalhadores pudessem intervir e assim o fizessem sempre que o emprego fosse inferior ao nível pleno para reduzir por uma ação combinada as suas demandas de moeda no ponto em que a abundância de dinheiro relativamente à unidade de salários bastasse para fazer baixar a taxa de juros a um nível compatível com o pleno emprego a administração da política monetária estaria de fato nas mãos dos sindicatos operários com vista ao pleno emprego e não nas do sistema bancário Embora uma política flexível de salários e uma política monetária flexível venham a constituir analiticamente a mesma coisa visto que ambas são meios de alterar a quantidade de moeda medida em unidades de salários não é menos verdade que a outros respeitos haja diferenças fundamentais entre as mesmas Gostaria de recordar brevemente ao leitor as três considerações principais OS ECONOMISTAS 254 i Exceto numa comunidade socializada onde a política salarial é fixada por decreto não há meio algum de assegurar reduções uni formes de salários para todas as categorias de mãodeobra O resultado só pode ser conseguido por uma série de mudanças graduais e irregu lares que nenhum critério de justiça social ou de conveniência econô mica justifica e que provavelmente só se completam depois de lutas desastrosas e nocivas nas quais os que se acham em posição mais fraca para negociar padecem em comparação com os outros Por outro lado a modificação da quantidade de dinheiro já está na alçada da minoria dos governos que a realizam por meio da política de mercado aberto ou medidas análogas Considerando a natureza humana e nossas instituições somente uma pessoa insensata preferiria uma política de salários flexíveis a uma política monetária elástica a não ser que pu desse invocar a favor da primeira vantagens impossíveis de serem obtidas com a segunda Além disso em igualdade de condições em outros aspectos um método comparativamente fácil de aplicar deveria ser pre ferível a outro sem dúvida mais difícil a ponto de ser impraticável ii Quando os salários nominais permanecem constantes os pre ços só podem variar exceção feita por exemplo aos preços dirigidos ou aos de monopólio que são determinados por outros fatores além do custo marginal por motivo da diminuição da produtividade marginal do equipamento que acompanha o aumento da produção Assim man terseá a maior eqüidade exeqüível entre a mãodeobra e os fatores cuja remuneração nominal fixa é garantida por contrato ou seja os que vivem de rendas e as pessoas que têm ordenados fixos nos quadros permanentes das empresas das instituições ou do Estado Para que as classes sociais importantes tenham remuneração nominal que per maneça fixa em qualquer caso a justiça e a conveniência social ficam mais bem servidas se a remuneração de todos os fatores for de certo modo inflexível em termos de dinheiro Levandose em conta os grandes grupos de rendas que são comparativamente inflexíveis em termos nominais apenas uma pessoa injusta pode preferir uma política flexível de salários a outra flexível da moeda a não ser que a primeira ofereça vantagens que não se podem obter na segunda iii O método para aumentar a quantidade de dinheiro em unidades de salários através da redução da unidade dos mesmos eleva proporcio nalmente a carga dos débitos ao passo que o mesmo resultado pelo au mento da quantidade de moeda sem mudar a unidade de salários causa o efeito oposto Considerando a carga excessiva de muitos tipos de débitos somente uma pessoa inexperiente pode preferir o primeiro iv Se para conseguir uma queda da taxa de juros for preciso reduzir o nível de salários existirá pelas razões expostas antes um KEYNES 255 duplo empecilho à eficiência marginal do capital e um duplo motivo para adiar os investimentos retardando assim a recuperação III Daí se deduz que se a mãodeobra respondesse à diminuição gradual do emprego oferecendo seus serviços por um salário nominal gradualmente baixo não resultaria disso como regra geral nenhuma diminuição dos salários reais que aliás poderiam aumentar por meio de sua influência adversa sobre o volume de produção O efeito principal de semelhante política seria causar grande instabilidade de preços talvez violenta o bastante para tornar fúteis os cálculos empresariais em uma economia funcionando como aquela em que vivemos Supor que a política de salários flexíveis seja um atributo normal e correlato de um sistema baseado em seu conjunto no princípio de laissezfaire é o oposto à verdade Apenas em uma sociedade altamente autoritária capaz de impor mudanças súbitas substanciais e completas poderia funcionar com êxito uma política de salários flexíveis Podese imagi nála operando na Itália na Alemanha ou na Rússia mas não na França nos Estados Unidos ou na GrãBretanha Se como na Austrália fosse feita a tentativa de fixar por via legislativa os salários reais haveria então certo volume de emprego correspondente ao nível dos mesmos e o volume efetivo de emprego num sistema fechado oscilaria violentamente entre esse nível e a au sência total de emprego conforme o investimento fosse superior ou inferior ao montante compatível com o dito volume ao passo que os preços se achariam em equilíbrio instável quando o investimento al cançasse o nível crítico tendendo para zero quando este se encontrasse abaixo do dito nível e subindo até o infinito quando ele estivesse acima O elemento de estabilidade se acaso existisse teria de ser encontrado no fato de as forças que governam a quantidade de moeda estarem determinadas de tal modo que sempre houvesse algum nível de salários nominais no qual a quantidade de moeda fosse a necessária para criar uma relação entre a taxa de juros e a eficiência marginal do capital requerida para manter o investimento no nível crítico Nesta circuns tância o emprego seria então constante no nível adequado para o salário real legal e os salários nominais e os preços oscilariam rapi damente na medida justa para manter esta taxa de investimento na cifra conveniente No caso concreto da Austrália a solução foi encon trada em parte é claro na inevitável incapacidade da legislação para atingir os seus fins mas em parte também no fato de que a Austrália não é um sistema fechado de modo que o nível dos salários nominais era por si mesmo uma determinante do investimento externo e con seqüentemente do investimento total enquanto a relação de inter câmbio exercia uma influência importante sobre os salários reais À luz destas considerações sou agora de opinião que a manu OS ECONOMISTAS 256 tenção de um nível geral estável de salários nominais é resumindo todas as considerações a política mais aconselhável para um sistema fechado a mesma conclusão permanece válida para um sistema aberto desde que o equilíbrio com o resto do mundo possa ser assegurado pelas flutuações do câmbio A existência de certo grau de flexibilidade dos salários em determinadas indústrias tem suas vantagens desde que sirva para facilitar a transferência de mãodeobra das indústrias que se encontram em decadência relativa para as que estão relativa mente progredindo O nível geral dos salários nominais porém deve ser mantido tão estável quanto possível pelo menos em períodos curtos Esta política terá como resultado um grau conveniente de esta bilidade no nível dos preços maior estabilidade em todo caso do que com uma política de salários flexíveis Excetuandose os preços dirigidos ou os de monopólio o nível de preços só se modificará em períodos curtos à medida que as variações do emprego afetem os custos primários marginais já nos períodos longos só variará em conseqüência da baixa do custo de produção devida a novas técnicas e a equipamentos novos ou ampliados É verdade que se apesar de tudo ocorrerem grandes flutuações no emprego elas serão acompanhadas de substanciais variações no nível dos preços Estas flutuações como disse serão porém menos importantes do que uma política de salários flexíveis Assim sendo com uma política rígida de salários a estabilidade dos preços está ligada em períodos curtos à ausência de flutuações no emprego Por outro lado no que concerne aos períodos longos ainda nos resta escolher entre uma política de salários estáveis permitindo aos preços que baixem lentamente com o progresso da técnica e do equipamento e uma política de preços estáveis deixando os salários subir lentamente Em linhas gerais prefiro a segunda alternativa por que é mais fácil conservar o nível real de emprego dentro de determi nada escala de pleno emprego com esperança de maiores salários no futuro do que com a expectativa de salários menores e também em virtude das vantagens sociais de alívio gradual das dívidas da maior facilidade nos deslocamentos de mãodeobra das indústrias que decli nam para as que progridem e do estímulo psicológico que ordinaria mente resulta de uma tendência moderada a subir dos salários nomi nais Mas isso não envolve nenhum princípio essencial e me faria ir além de meu presente objetivo para expor em detalhe argumentos em ambos os sentidos KEYNES 257 APÊNDICE AO CAPÍTULO 19 A Theory of Unemployment do Professor Pigou Em sua Theory of Unemployment o professor Pigou faz o vo lume de emprego depender de dois fatores fundamentais a saber 1 as taxas de salários reais estipulados pelos trabalhadores e 2 a forma da Função da Demanda Real de Mãodeobra As partes centrais de seu livro procuram determinar a forma desta função A circunstância de que os trabalhadores estipulam de fato os seus salários não em termos reais mas nominais não é ignorada mas admitese com efeito que a taxa efetiva de salários nominais di vidida pelo preço dos bens de consumo salariais pode servir de medida à taxa real que se procura As equações que como ele diz constituem o ponto de partida do estudo da Função da Demanda Real de Mãodeobra são dadas na página 90 de sua Theory of Unemployment mas como as hipóteses tácitas que regem a aplicação de sua análise desaparecem quase no princípio da sua argumentação farei um resumo da matéria por ele tratada até o ponto crucial O professor Pigou divide as indústrias em duas categorias a saber as que produzem os bens de consumo salariais para uso no país bem como os bens exportáveis cuja venda no exterior cria direitos sobre bens de consumo salariais no exterior e as outras indústrias a que convém chamar respectivamente indústrias que produzem bens de consumo salariais e indústrias que produzem bens não destinados ao consumo salarial Ele supõe que x homens estão empregados nas primeiras e y homens nas segundas Chama Fx ao valor dos bens de consumo salariais produzidos pelos x homens e Fx à taxa geral de salários Isto embora ele não se detenha a mencionálo equivale a supor que o custo marginal do salário é igual ao custo primário mar ginal148 Além disso supõe que x y φ x isto é que o número de 259 148 A origem da prática errônea de igualar o custo marginal do salário ao custo primário homens empregados nas indústrias de bens de consumo salariais é função do emprego total Em seguida mostra que a elasticidade da demanda real agregada de mãodeobra que nos dá a forma do nosso quaesitum ou seja a Função da Demanda Real de Mãodeobra pode escreverse Er φ x φ x F x F x No que respeita à notação não há diferença significativa entre esta e as minhas próprias formas de expressão Na medida em que possamos identificar os bens de consumo salariais do professor Pigou com os meus bens de consumo e os seus outros bens com os meus bens de investimento deduzse que sendo o seu F x F x o valor da produção das indústrias de bens de consumo salariais medido em uni dades de salários é o mesmo que o meu Cω Além disto sua função φ sujeita à identificação dos bens de consumo salariais com os bens de consumo é uma função daquilo a que chamei antes o multiplicador do emprego k Porque x ky de maneira que φ x 1 1 k Destarte a elasticidade da demanda real agregada de mãode obra do professor Pigou é uma estrutura semelhante a algumas das minhas dependendo em parte das condições físicas e técnicas da in dústria na forma dada pela sua função F e em parte da propensão OS ECONOMISTAS 260 marginal vem talvez de uma ambigüidade no sentido de custo marginal do salário Podemos darlhe o significado tanto do custo de uma unidade adicional de produção quando não é gravada por nenhum outro custo adicional além dos custos dos salários como de custo adicional dos salários que implica a produção de uma unidade adicional de riqueza quando realizada nas condições mais econômicas com a ajuda do equipamento existente ou de outros fatores não empregados No primeiro caso não podemos combinar com a mãodeobra adicional a menor intervenção adicional do empresário do capital circulante ou de qualquer coisa diferente do trabalho que se acrescentaria ao custo nem sequer podemos permitir a essa mãodeobra que desgaste o equipamento mais depressa do que o faria um menor contingente de trabalho Visto que excluímos do custo primário marginal qualquer elemento de custo alheio ao trabalho seguese naturalmente que o custo marginal dos salários e o custo primário marginal são iguais As conclusões de uma análise baseada nesta premissa porém quase não têm aplicação visto que na prática a hipótese básica raramente se realiza pois não somos bastante insensatos na prática para recusar associar ao trabalho adicional quantidades apropriadas de outros fatores na medida em que se encontrem disponíveis e a hipótese só se aplica portanto se supusermos que todos os fatores ex cluindose o trabalho já estão empregados ao máximo a consumir os bens de consumo salariais na forma dada pela sua função φ sempre com a condição de que os limitemos ao caso especial de que o custo marginal do trabalho seja igual ao custo primário marginal Para determinar o volume de emprego o professor Pigou combina então uma função de oferta de mãodeobra com sua demanda real de mãodeobra Supõe que isso seja uma função do salário real e nada mais pois como também já supôs que o salário real é função do número de homens x empregados nas indústrias que produzem bens de consumo salariais isto equivale a supor que a oferta total de mão deobra no nível existente de salários reais é função de x e de nada mais Isso quer dizer que n χ x onde n é a oferta de mãodeobra disponível a um salário real de F x Assim livre de qualquer complicação a análise do professor Pigou equivale a uma tentativa de encontrar o volume efetivo de emprego por meio das equações x y φ x e n χ x Aqui há porém três incógnitas e apenas duas equações Parece claro que ele contornou esta dificuldade considerando n x y Isto supõe naturalmente que há desemprego involuntário no sentido estrito da palavra isto é que a mãodeobra disponível ao salário real existente está toda empregada Neste caso x tem o valor que satisfaz a equação φ x χ x e quando achamos assim que o valor de x é igual a digamos n1 y deve ser igual a χn1 n1 e o emprego total n é igual a χn1 Vale a pena determonos um momento para considerar o que isto significa Quer dizer que se a função da oferta de mãodeobra se modifica ficando disponível mais trabalho a dado salário real de modo que n1 dn1 seja agora o valor de x que satisfaz a equação φ x χ x a demanda pela produção das indústrias de bens não destinados ao consumo salarial será tal que o emprego nessas indústrias haverá de subir justamente o necessário para manter a igualdade entre φ n1 dn1 e χ n1 dn1 A única alternativa que resta para que o emprego agregado varie é através de uma mudança na propensão a comprar respectivamente bens de consumo de assalariados e bens não destinados ao consumo de assalariados de modo que haja um aumento de y acompanhado de uma diminuição maior de x KEYNES 261 A suposição de que n x y significa naturalmente que a mãodeobra está sempre em condições de poder determinar o seu pró prio salário real Portanto a suposição de que a mãodeobra está em condições de determinar o seu próprio salário real significa que a de manda pela produção das indústrias que produzem bens não destinados ao consumo de assalariados obedece às leis anteriores Em outras pa lavras supõese que a taxa de juros sempre se ajusta por si mesma à curva da eficiência marginal do capital de modo que mantenha o pleno emprego Sem esta suposição do professor Pigou a análise de monstra e não mais oferece meios de determinar qual será o volume de emprego É realmente estranho que o professor Pigou tenha ima ginado poder apresentar uma teoria do desemprego que não faz ne nhuma alusão às variações no montante do investimento isto é às variações do emprego nas indústrias de bens não destinados ao consumo de assalariados e que não provém de mudanças na função de oferta da mãodeobra mas de modificações por exemplo na taxa de juros ou no estado da confiança O título de Theory of Unemployment é conseqüentemente um tanto impróprio Na realidade o livro não trata desta questão É um estudo sobre qual será o volume de emprego dada a função de oferta de mãodeobra quando se acham satisfeitas as condições de pleno emprego A finalidade do conceito de elasticidade da demanda real agregada de mãodeobra é mostrar em que proporção subirá ou baixará o pleno emprego em face de certo deslocamento na função de oferta de mãodeobra Ou alternativamente e talvez mais precisamente podemos considerar esta obra uma investigação não causal das relações funcionais determinadas do nível de salários reais que corresponderá a qualquer volume dado de emprego Ela não é porém capaz de nos dizer o que determina o volume efetivo do emprego e não tem relação direta com o problema do desemprego involuntário Se o professor Pigou negasse como talvez o fizesse a possibilidade do desemprego involuntário no sentido que anteriormente o defini seria assim mesmo difícil ver como poderia ser aplicada sua análise pois abstendose de discutir o que determina a relação entre x e y isto é entre o emprego nas indústrias de bens de consumo de assalariados e o emprego nas demais indústrias respectivamente ele comete ainda uma omissão irreparável Além disso ele admite que em certos limites os trabalhadores freqüentemente estipulam a sua remuneração não em salários reais dados mas em salários nominais Neste caso a função da oferta de mãodeobra já não é apenas função de Fx mas também do preço nominal dos bens de consumo de assalariados com a conseqüência de OS ECONOMISTAS 262 que a análise prévia se desmorona e passa a intervir um fator novo sem que exista uma equação nova para atender a esta incógnita su plementar Não seria possível ilustrar melhor os perigos de um método pseudomatemático que só pode progredir fazendo que tudo seja função de uma única variável e supondo que todas as diferenciais desapareçam Não teria sentido pois admitir mais tarde que de fato existem outras variáveis e apesar disso prosseguir no raciocínio sem retificar o que foi escrito até então Desse modo se dentro de certos limites os tra balhadores estipulam a sua remuneração em salários nominais o nú mero de dados é ainda insuficiente mesmo supondo que n x y salvo se os fatores que determinam o preço nominal dos bens de con sumo de assalariados sejam conhecidos porque o preço nominal dos bens de consumo de assalariados dependerá do volume agregado de emprego Conseqüentemente não podemos saber qual será o volume agregado de emprego enquanto não conhecermos o preço nominal dos bens de consumo de assalariados e não podemos saber qual será o preço nominal dos bens de consumo de assalariados enquanto não co nhecermos o volume agregado do emprego Falta como disse uma equação Todavia é uma suposição provisória da rigidez dos salários nominais em vez dos salários reais que faz a nossa teoria mais se aproximar da realidade Por exemplo na GrãBretanha apesar da de sordem da incerteza e das amplas flutuações dos preços que marcaram a década de 19241934 os salários nominais apenas variaram dentro de um limite de 6 por cento enquanto os salários reais variaram em mais de 20 por cento Uma teoria não pode pretenderse geral desde que não seja aplicável ao caso ou dentro dos limites em que os salários nominais sejam fixos bem como a qualquer outro caso Os políticos têm direito de queixarse de que os salários deveriam ser altamente flexíveis porém um teórico deve estar preparado para tratar indiferentemente todas as situações que se apresentarem Uma teoria científica não pode pretender que os fatos se ajustem a suas próprias hipóteses Quando o professor Pigou chega a examinar expressamente as conseqüências de uma redução dos salários nominais mais uma vez se torna manifesto no meu entender que os dados introduzidos são insuficientes para obter uma solução definitiva Ele começa por rejeitar o argumento op cit p 101 de que se o custo primário marginal é igual ao custo marginal do salário os rendimentos dos não assalariados alterarseão quando os salários nominais se reduzirem na mesma proporção que os dos assalariados baseandose em que isto só é válido se o volume de emprego permanecer invariável o que é precisamente o ponto em discussão Mas na página seguinte op cit p 102 ele próprio comete o erro ao supor que no princípio nada aconteceu ao KEYNES 263 rendimento nominal dos não assalariados o que como ele próprio acaba de mostrar só é válido se o volume de emprego não permanecer invariável que é precisamente o que se discute De fato o problema não admite nenhuma solução enquanto não se introduzirem outros fatores entre os dados que consideramos O fato de que a mãodeobra estipula determinado salário nominal e não dado salário real contanto que o salário real não desça além de certo limite afeta a análise de um modo que se pode também mos trar assinalando a hipótese fundamental segundo a qual uma quan tidade maior de trabalho só se oferece em troca de um salário real mais alto que quase todo o raciocínio desmorona O professor Pigou rejeita por exemplo a teoria do multiplicador op cit p 75 supondo que se conheça a taxa de salários reais isto é supondo que alcançando o pleno emprego não haverá oferta de mãodeobra adicional a um salário real menor Dentro dessa hipótese o seu argumento é sem dúvida correto Nessa passagem porém o professor Pigou está criti cando uma proposição relativa à política prática é exagero afirmar que num momento em que as estatísticas de desemprego excediam na GrãBretanha a cifra de 2 milhões isto é quando havia 2 milhões de homens dispostos a trabalhar ao salário nominal existente qualquer elevação no custo de vida por moderada que fosse em relação ao salário nominal ocasionaria a retirada do mercado de trabalho de uma quantidade de mãodeobra superior à equivalente a esses 2 milhões de homens Importa enfatizar que todo o livro do professor Pigou se baseia na hipótese de que qualquer elevação no custo de vida por mais mo derada que seja em relação ao salário nominal ocasionará a retirada do mercado de trabalho de um número de trabalhadores maior que o de todos os desempregados existentes Além disso o professor Pigou não nota nesta passagem op cit p 75 que o argumento que opõe ao emprego secundário como re sultado de obras públicas é igualmente contrário nas mesmas hipó teses ao aumento do emprego primário com a mesma política pois se a taxa de salários reais em vigor nas indústrias de bens de consumo salariais for dada nenhum aumento se torna possível exceto na turalmente se os não assalariados reduzirem seu consumo de bens salariais porque as pessoas que entraram recentemente no emprego primário decerto aumentarão seu consumo de bens salariais o qual reduzirá o salário real e conseqüentemente segundo sua hipótese levará a retirarse do mercado mãodeobra antes empregada Não obs tante o professor Pigou aceita aparentemente a possibilidade de au mento do emprego primário A linha que separa o emprego primário OS ECONOMISTAS 264 do secundário parece ser o ponto crítico psicológico em que o seu bom senso deixa de prevalecer em face da sua má teoria A divergência de conclusões a que conduzem as diferenças ante riores de hipóteses e de raciocínio evidenciase nesta importante pas sagem em que o professor Pigou resume seu ponto de vista Com uma concorrência perfeitamente livre entre os trabalhadores e a mãode obra perfeitamente móvel a natureza da relação isto é entre os tipos de salários reais estipulados pela mãodeobra e a função da demanda de trabalho será das mais simples Haverá sempre uma forte tendência no sentido de que as taxas de salários conservem uma relação tal com a demanda que todos estejam empregados Portanto em condições es táveis todos estarão realmente empregados Isto significa que o de semprego existente em qualquer momento se deve unicamente a que as condições da demanda variam de maneira contínua e que as resis tências friccionais impedem a realização imediata dos ajustamentos correspondentes aos salários149 Ele concluiu op cit p 253 que o desemprego se deve sobretudo a uma política de salários que não consegue adaptarse suficientemente às modificações da demanda real de mãodeobra Conseqüentemente o professor Pigou acha que a longo prazo o desemprego pode ser remediado por meio de ajustes salariais150 en quanto eu sustento que o salário real sujeito apenas a um limite fixado pela desutilidade marginal do emprego não é determinado primordial mente pelos ajustes salariais embora estes possam intervir mas pelas outras forças do sistema algumas das quais especialmente a relação entre a curva da eficiência marginal do capital e a taxa de juros o professor Pigou não incluiu se estiver correta a minha maneira de pensar no seu esquema formal Finalmente quando o professor Pigou chega à Causação do De semprego fala na verdade tanto quanto eu de flutuações no estado da demanda porém ele identifica o estado da demanda com a Função Real da Demanda de Mãodeobra esquecendo quão estreita é a sua definição desta última Por definição a Função Real da Demanda de Mãodeobra depende conforme vimos antes exclusivamente de dois fatores a saber 1 a relação existente em dado meio entre o número total de homens empregados e o número dos que devem ser empregados nas indústrias de bens de consumo de assalariados para lhes fornecer o que consomem e 2 o estado da produtividade marginal nas indús trias de bens de consumo de assalariados Contudo na Parte V de sua Theory of Unemployment ele atribui um papel importante às flutuações da demanda real de mãodeobra A demanda real de mãodeobra KEYNES 265 149 Op cit p 252 150 Não há nenhuma alusão ou sugestão ao fato de que este ajuste se realize por meio das relações sobre a taxa de juros é considerada um fator capaz de variar amplamente a curto prazo op cit Parte Quinta cap VIXII e parece sugerir que as oscilações na demanda real de mãodeobra são combinadas com a falta de sen sibilidade da política de salários às oscilações da demanda real de mãodeobra responsáveis em grande parte pelo ciclo comercial À pri meira vista tudo isto parecerá ao leitor razoável e familiar pois a não ser que ele retorne à definição as flutuações na demanda real de mãodeobra lhe trarão à mente o mesmo gênero de idéias que eu desejo provocar com as flutuações no estado da demanda agregada Se voltarmos à definição da demanda real de mãodeobra tudo isto perde a sua lógica pois acabamos descobrindo que não há nada no mundo menos sujeito a oscilações pronunciadas a curto prazo do que este fator A demanda real de mãodeobra do professor Pigou depende por definição apenas de Fx que representa as condições físicas da produção de bens de consumo de assalariados e de φ x que representa a relação funcional entre o emprego nas indústrias que produzem bens de consumo de assalariados e o emprego total correspondente a qual quer nível dado do último É difícil ver uma razão pela qual alguma destas duas funções devesse mudar a não ser gradualmente em pe ríodos longos Não há certamente motivo algum para crer que elas possam flutuar durante um ciclo comercial Pois Fx só pode mudar com lentidão e num sentido favorável se a comunidade realiza pro gressos técnicos ao passo que φ x permanecerá estável a não ser que imaginemos uma repentina manifestação de frugalidade nas classes operárias ou mais geralmente um brusco deslocamento na propensão a consumir Eu esperaria portanto que a demanda real de mãodeobra permanecesse virtualmente igual durante todo um ciclo comercial Re pito que o professor Pigou omitiu completamente em sua análise o fator instável a saber as flutuações na escala do investimento que no mais das vezes não são a causa do fenômeno das flutuações no emprego Critiquei de maneira detalhada a teoria do desemprego do pro fessor Pigou não porque ela me pareça mais criticável que outras teorias dos economistas clássicos mas porque representa o único esforço que conheço para expor a teoria clássica do desemprego de modo preciso Por esta razão achei ser meu dever dirigir minhas objeções contra esta teoria na exposição mais audaz que dela ainda se fez OS ECONOMISTAS 266 CAPÍTULO 20 A Função de Emprego151 I No capítulo 3 p 59 definimos a função da oferta agregada Z φ N que liga o emprego N ao preço da oferta agregada da produção correspondente A função de emprego apenas difere da função de oferta agregada pelo fato de que é praticamente a sua função inversa e se exprime em unidades de salário sendo o objetivo da função de emprego relacionar o volume da demanda efetiva medida em unidades de sa lário que compete a determinada empresa ou indústria ou a uma indústria inteira com o volume de emprego cuja produção tenha um preço de oferta comparável com o volume de demanda efetiva Assim sendo se um montante de demanda efetiva Dwr medido em unidade de salários orientado para uma firma ou indústria faz surgir nessa firma ou nessa indústria um volume de emprego Nr a função de em prego será dada por Nr Fr Dwr Ou de modo mais geral se nos for permitido supor que a cada montante Dwr da demanda efetiva total corresponde um único valor de Dw a função de emprego será dada por Nr Fr Dw O que quer dizer que Nr homens estarão empregados na indústria r quando a demanda efetiva for Dw Exporemos neste capítulo certas propriedades da função de em prego Mas seja qual for o interesse que essas possam ter há duas razões pelas quais a substituição da função de emprego pela curva convencional de oferta concorda com os métodos e finalidades deste livro Em primeiro lugar expressa os fatos relevantes em termos das unidades a que decidimos restringirnos sem introduzir nenhuma das que têm um caráter quantitativo duvidoso Em segundo lugar prestase melhor que a curva habitual da oferta ao estudo dos problemas relativos 267 151 Os que com razão não têm inclinação para a álgebra poderão omitir a primeira parte deste capítulo sem perder muita coisa à indústria e à produção como um todo distinguindoos dos de uma indústria ou firma isolada em meio determinado pelas razões que seguem A curva habitual da demanda de dado bem é traçada com base em suposições sobre os rendimentos do público em geral e tem de ser corrigida sempre que esses rendimentos variam Da mesma forma a curva habitual da oferta de determinado bem é traçada com base em suposições sobre o volume da produção da indústria inteira e está sujeita a modificações quando o montante agregado da indústria varia Portanto quando examinamos a reação das indústrias individuais às variações do emprego agregado encontramonos necessariamente em presença não de uma única curva de demanda para cada indústria conjugada com uma única curva de oferta mas de um conjunto de curvas pertencentes a duas famílias correspondendo cada qual à hi pótese de certo volume de emprego agregado No caso da função de emprego todavia é mais fácil obter uma função que reflita para a indústria em conjunto as variações globais do emprego Suponhamos para começar que a propensão a consumir se acha determinada assim como os outros elementos que no capítulo 18 de mos por conhecidos e que estamos examinando as modificações no emprego resultantes das mudanças na taxa de investimento De acordo com esta hipótese para cada nível de demanda efetiva em termos de unidades de salários haverá um volume agregado de emprego e esta demanda efetiva vaise dividir em determinadas proporções entre o consumo e o investimento Além disso cada nível de demanda efetiva corresponderá a certa distribuição da renda É razoável portanto supor também que a determinado montante da demanda efetiva corresponde uma distribuição singular da mesma entre as diversas indústrias Isso nos permite determinar que volume de emprego correspon derá em cada indústria a cada volume dado de emprego agregado O que quer dizer que nos dá o volume de emprego em cada indústria particular correspondente a cada nível da demanda efetiva agregada medida em unidades de salários de modo que fiquem satisfeitas as condições da segunda forma da função de emprego para a indústria antes indicada a saber Nr Fr Dw Temos assim a vantagem nestas condições de que as funções individuais de emprego são aditivas no sentido de que a função de emprego para a indústria em conjunto correspondente a certo nível de demanda efetiva é igual à soma das funções de emprego para cada indústria em separado isto é FDw N ΣNr ΣFr Dw Em seguida definamos a elasticidade do emprego A elasticidade do emprego para determinada indústria é OS ECONOMISTAS 268 eer dNr dDwr Dwr Nr visto que mede a reação do número de unidades de trabalho empregadas nessa indústria às variações do número de unidades de salário que se espera serem gastas na compra de sua produção Representamos a elasticidade do emprego para a indústria em seu conjunto por ee dN dDw Dw N Caso pudéssemos encontrar algum método suficientemente sa tisfatório para medir a produção seria útil também definir o que poderia chamarse a elasticidade da produção que dá a medida do coeficiente da produção em qualquer indústria quando se dirige para ela uma demanda efetiva medida em unidades de salários mais elevada a saber eor dOr dDwr Dwr Or Se pudéssemos supor que o preço fosse igual ao custo primário marginal teríamos então Dwr 1 1 eor Pr onde Pr representa o lucro esperado152 Seguese disso que se eor O KEYNES 269 152 Com efeito se pwr for o preço previsto de uma unidade de produção expresso em unidades de salários isto é se a produção da indústria for perfeitamente inelástica prevêse que a alta total da demanda efetiva medida em unidades de salários caberá inteiramente ao empresário como lucro isto é Dwr Pr ao passo que se eor 1 isto é se a elasticidade de produção for igual à unidade prevêse que nenhum suplemento de lucro resultará do au mento da demanda efetiva sendo ele totalmente absorvido pelos ele mentos que entram no custo primário marginal Ademais se a produção de uma indústria for função φ Nr da mãodeobra empregada nela teremos153 1 eor eer NrφNr pwr φ Nr 2 onde pwr é o preço previsto de uma unidade de produção expressa em unidades de salários Deste modo a condição eor 1 significa que φ Nr O isto é que há retornos constantes em resposta ao cresci mento do emprego Ora na medida em que a teoria clássica supõe que os salários reais são sempre iguais à desutilidade marginal do trabalho e que esta aumenta ao mesmo tempo que o emprego de maneira que a oferta de mãodeobra diminui coeteris paribus quando os salários reais baixam equivale a suporse que na prática é impossível au mentar a despesa em termos de unidade de salários Se isso fosse verdade o conceito de elasticidade do emprego não teria um campo de aplicação Além disso neste caso seria impossível aumentar o emprego elevando a despesa em termos monetários porque os sa lários nominais subiriam proporcionalmente ao acréscimo da despesa monetária e em definitivo não haveria nenhum aumento de despesa medida em unidades de salários nem por conseqüência aumento de emprego Porém se a hipótese clássica não for válida será pos sível aumentar o emprego fazendo subir as despesas em termos monetários até que os salários reais tenham baixado de modo que OS ECONOMISTAS 270 153 Pois desde que Dwr pwrOr temos se igualem à desutilidade marginal do trabalho ponto em que por definição haverá pleno emprego Convencionalmente está claro eor terá um valor intermediário entre zero e a unidade A extensão em que subirão os preços em termos de unidades de salários isto é a extensão em que os salários reais baixam quando aumentam as despesas monetárias depende por tanto da elasticidade que a produção apresente em resposta às despesas em termos de unidades de salários Consideremos que a elasticidade do preço previsto pwr em res posta às variações na demanda efetiva Dwr a saber dpwr dDwr Dwr pwr seja escrita epr Uma vez que Orpwr Dwr teremos dOr dDwr Dwr Or dpwr dDwr Dwr pwr 1 ou epr eor 1 O que equivale a dizer que a soma das elasticidades do preço e da produção como resposta às mudanças na demanda efetiva medidas em unidades de salários é igual à unidade A variação da demanda efetiva é absorvida pelas variações que provoca em parte no nível e em parte no preço da produção de acordo com esta lei Se considerarmos a indústria em conjunto e estivermos dispostos a admitir a existência de uma unidade permitindo medir a produção global o mesmo tipo de raciocínio se aplica de maneira que ep eo 1 onde as elasticidades sem o sufixo r se referem ao conjunto da indústria Meçamos agora os valores em moeda e não mais em unidades de salários e apliquemos neste caso as nossas conclusões relativas à indústria em conjunto Se W representa o salário nominal de uma unidade de trabalho e p o preço esperado de uma unidade da produção total em termos nominais podemos designar por ep Ddp pdD a elasticidade dos preços nominais em resposta às variações da demanda efetiva medida em termos nominais e por ew DdW WdD a elasticidade dos salários nominais em resposta às variações da demanda efetiva medida em termos no minais Então facilmente se demonstra que KEYNES 271 ep 1 eo 1 ew154 Esta equação como veremos no próximo capítulo constitui o pri meiro passo para uma forma geral da teoria quantitativa da moeda Se eo 0 ou se ew 1 a produção permanecerá invariável e os preços subirão na mesma proporção que a demanda efetiva em termos mo netários De outro modo subirão em proporção menor II Voltemos à função do emprego Supusemos nas exposições pre cedentes que a cada nível de demanda efetiva agregada corresponde uma única distribuição dessa demanda entre os produtos de cada in dústria individual Ora quando o montante da despesa agregada varia a despesa correspondente aos produtos de uma indústria individual não variará em geral na mesma proporção em parte porque os indi víduos não aumentarão proporcionalmente as somas que destinam à compra dos produtos de cada indústria à medida que sobem as suas rendas e em parte porque os preços dos diferentes bens reagirão em diferentes graus às variações da despesa de que são objeto Disso se deduz que a hipótese de que as variações do emprego dependem unicamente das variações da demanda efetiva medida em unidade de salário e na qual até agora baseamos o nosso raciocínio não passa de uma primeira aproximação admitindo que haja mais de um modo de gastar um aumento de rendas A maneira que supomos para a distribuição prevista de um acréscimo de demanda agregada entre os diferentes bens pode influir consideravelmente sobre o volume OS ECONOMISTAS 272 154 Visto que p pwW e D DwW temos do emprego Se por exemplo a demanda suplementar for em grande parte dirigida para as indústrias com alta elasticidade de emprego o aumento agregado de emprego será maior do que se o mesmo se orientar para as indústrias que oferecem pouca elasticidade de emprego Do mesmo modo o emprego pode baixar sem que tenha ocorrido nenhuma mudança na demanda agregada se a orientação da demanda se modificar em proveito das indústrias com elasticidade relativamente baixa de emprego Estas considerações são particularmente importantes quando nos ocupamos dos fenômenos a curto prazo no sentido de variações no montante ou na direção da demanda que não foram previstas com certa antecipação A produção de certos bens leva tempo de modo que é praticamente impossível aumentar a sua oferta com rapidez Assim se a demanda adicional se encaminha para eles sem prévio aviso sua produção evidenciará uma baixa elasticidade de emprego embora possa acontecer que se houver aviso com bastante antecedência sua elasti cidade de emprego se aproxime da unidade É a esse respeito que a idéia de um período de produção parece ter maior importância Preferiria dizer155 que se um produto tem um período de produção n será necessário dar aviso das variações em sua demanda com antecipação de n unidades de tempo para que ele tenha a elasticidade máxima de emprego Evidentemente os bens de consumo considerados em conjunto têm o mais longo período de produção visto serem a etapa final de todo o processo produtivo Em conseqüência disso se a expansão da demanda efetiva tiver por causa primeira um aumento do consumo a elasticidade inicial do emprego estará mais abaixo do seu nível eventual de equilíbrio do que se esse impulso pro viesse de um acréscimo no investimento Além do mais se a demanda adicional se dirige aos produtos que têm elasticidade relativamente baixa de emprego uma proporção maior dessa demanda irá aumentar as rendas dos empresários e outra proporção menor irá aumentar a dos que recebem salários e outros fatores que entram no custo primário com o resultado de que as repercussões poderão então mostrarse um pouco menos favoráveis à despesa visto que é provável que os empre sários economizem uma parte maior de sua renda suplementar do que a que economizariam os assalariados Entretanto a diferença entre os dois casos não deve ser exagerada pois as reações em ambos serão em grande parte as mesmas156 Por mais cedo que ocorra a antecipação com que se avisam os empresários de uma provável alteração na demanda não é possível que a elasticidade inicial de emprego em conseqüência de dado acrés KEYNES 273 155 Esta definição não é idêntica à usual mas pareceme conter o que a idéia tem de importante 156 Um tratamento mais detalhado desta questão pode ser encontrado em minha obra Treatise on Money JMK v V Livro Quarto cimo no investimento seja da mesma grandeza do seu valor eventual de equilíbrio a não ser que haja excedentes de estoques e de capacidade produtiva em cada etapa da produção Por outro lado a exaustão do excesso de estoque terá efeito compensador sobre o montante do in vestimento adicional Se admitirmos que haja algum excedente inicial em todos os setores a elasticidade inicial de emprego pode aproximarse da unidade em seguida quando os estoques se tiverem esgotado porém antes que surja um aumento adequado da oferta nas primeiras etapas da produção a elasticidade declinará tendendo de novo para a unidade quando nos aproximarmos da nova posição de equilíbrio Isto está su jeito no entanto a certas limitações na medida em que houver fatores de renda que absorvam mais despesa quando aumenta o emprego ou se a taxa de juros subir Por essas razões é impossível uma estabilidade perfeita de preços numa economia sujeita a mudanças salvo todavia se houver algum mecanismo especial que determine flutuações tem porárias na propensão a consumir exatamente na amplitude desejada Mas a instabilidade dos preços originada desta maneira não conduz à espécie de estímulo de lucro que possa ocasionar um excesso de capa cidade pois os lucros imprevistos irão em sua totalidade para as mãos dos empresários que possuam mercadorias numa etapa relativamente adiantada de produção e o empresário que não possui recursos espe cializados do tipo adequado não tem meio algum de atrair para si o dito lucro Por esse motivo a inevitável instabilidade dos preços em razão de mudanças não pode influir nas ações dos empresários senão apenas encaminhar uma riqueza de facto inesperada para as mãos dos mais felizes mutatis mutandis quando a suposta mudança ocorre em sentido contrário Esse fato tem sido no meu entender ignorado em certas recentes controvérsias sobre as modalidades práticas de uma política de estabilização dos preços É verdade que numa sociedade propensa a mudar tal política não alcançaria êxito completo Porém não segue disso que todo o pequeno desvio transitório relativo à estabilidade de preços ocasione necessariamente um desequilíbrio cumulativo III Demonstramos que quando a demanda efetiva é deficiente existe subemprego de mãodeobra no sentido de que há homens desempre gados dispostos a trabalhar por um salário real menor que o existente Conseqüentemente à medida que a demanda efetiva aumenta o em prego sobe embora a um salário real igual ou menor que o existente até o momento em que não haja excedente de mãodeobra disponível ao salário real então em vigor isto é até que não haja mais homens ou horas de trabalho disponíveis salvo se a partir desse ponto os salários nominais subirem mais depressa que os preços O problema seguinte é considerar o que acontecerá se atingido este ponto a despesa continuar a crescer OS ECONOMISTAS 274 Até este ponto a diminuição de renda que acompanhava o au mento da mãodeobra aplicada a certo equipamento de capital foi neu tralizada pela aquiescência da mãodeobra em ver reduzido seu salário real Mas para além deste ponto uma unidade de trabalho exigiria o estímulo do equivalente de uma quantidade maior de produto enquanto o emprego de uma unidade suplementar de mãodeobra resulta numa quantidade menor de produto As condições de equilíbrio estrito exigem portanto que os salários e os preços e também conseqüentemente os lucros subam todos na mesma proporção da despesa sem que a posição real incluindo o volume da produção e do emprego sofra a menor alteração em qualquer sentido Isso significa que chegamos a uma si tuação na qual a teoria quantitativa da moeda em sua forma rudi mentar interpretando a velocidade como velocidaderenda satis fazse plenamente porque a produção fica inalterada e os preços sobem na medida exatamente proporcional a MV Todavia essa conclusão oferece certas limitações práticas as quais devem ser consideradas quando aplicadas a um caso real 1 Ao menos por certo tempo os preços crescentes pelas ilu sões que criam nos empresários podem leválos a aumentar o em prego além do nível que eleva ao máximo os seus lucros individuais medidos em termos do produto pois eles estão de tal modo acostu mados a ver no aumento do volume de vendas em termos monetá rios o sinal de um desenvolvimento da produção que podem con tinuar a considerálo assim quando essa política já deixou de lhes convir na realidade isto é que podem subestimar o custo marginal de uso no novo ambiente de preços 2 Uma vez que parte do lucro que o empresário é obrigado a ceder ao rentier157 é fixa em termos de moeda a alta de preços mesmo quando não acompanhada por qualquer mudança na produção provoca em benefício do empresário e em detrimento dos que vivem de renda uma distribuição de renda que pode afetar a propensão a consumir Este contudo não é um processo que apenas se manifesta quando se alcançou o pleno emprego desenvolvese de maneira regular durante o período de aumento de despesa Se o rentier for menos inclinado a gastar que o empresário a diminuição gradual do rendimento real daquele significa que o pleno emprego exigirá um aumento da quan tidade de moeda e uma redução menor da taxa de juros do que na hipótese contrária Uma vez alcançado o pleno emprego uma nova alta de preços significará caso a primeira hipótese continue válida que a taxa de juros terá de elevarse um pouco para evitar que os KEYNES 275 157 O termo inglês rentier significa o agente que vive de rendas Não existe uma tradução em português expressa numa única palavra preços continuem subindo indefinidamente e que o aumento relativo da quantidade de moeda será inferior ao da despesa ao passo que se a segunda hipótese prevalecer se verificará o contrário Pode acontecer que ao ir diminuindo o rendimento real do rentier chegue o momento em que se passe da primeira hipótese para a segunda em conseqüência do seu empobrecimento relativo momento este que pode situarse tanto antes quanto depois de ter sido atingido o pleno emprego IV Há talvez certo motivo de perplexidade na aparente assimetria que se manifesta entre a inflação e a deflação Enquanto uma deflação da demanda efetiva abaixo do nível adequado para o pleno emprego fará baixar o emprego e os preços uma inflação da mesma acima desse nível apenas afetará os preços Contudo esta assimetria reflete sim plesmente o fato de que enquanto a mãodeobra está sempre em con dições de se recusar a trabalhar numa escala correspondente a um salário real inferior à desutilidade marginal desse volume de emprego não está em condições de reclamar que lhe ofereçam trabalho em quan tidade suficiente para comportar um salário real que não exceda a desutilidade marginal correspondente a esse volume de emprego OS ECONOMISTAS 276 CAPÍTULO 21 A Teoria dos Preços I Ocupandose do que se chama teoria do valor os economistas acostumaramse a ensinar que os preços são regidos pelas condições da oferta e da procura e em particular as variações no custo marginal e a elasticidade da oferta em períodos curtos têm neste aspecto de sempenhado um papel preponderante Porém quando em um volume II ou mais freqüentemente em um tratado em separado passam a abordar a teoria da moeda e dos preços não mais ouvimos falar desses conceitos familiares e simples de compreender e passamos para um mundo onde os preços são governados pela quantidade de moeda pela sua velocidaderenda pela velocidade de circulação em relação ao vo lume de transações pelo entesouramento pela poupança forçada pela inflação e pela deflação et hoc genus omne nunca ou quase nunca se tenta ligar essas expressões mais vagas aos nossos antigos conceitos das elasticidades da oferta e da procura Quando refletimos sobre as teorias que nos foram ensinadas e tentamos darlhes uma forma ra cional nas análises mais simples parece que a elasticidade da oferta deve ter chegado a zero e a procura parece ser proporcional à quantidade de moeda ao passo que nos estudos mais elaborados nos achamos perdidos em um nevoeiro onde nada é claro e tudo é possível A todos nós já ocorreu encontrarmonos algumas vezes de um lado da lua e outras vezes do lado oposto sem sabermos que caminho os liga res tandonos apenas os nossos passos e a nossa imaginação Um dos objetivos dos capítulos precedentes foi procurar evitar esta dupla existência e restabelecer um estreito contato entre a teoria dos preços em seu conjunto e a teoria do valor A divisão da Economia em teoria do valor e da distribuição de um lado e em teoria da moeda do outro pareceme falsa A dicotomia correta é no meu modo de ver entre a teoria da indústria ou da empresa individual e das remune 277 rações e distribuição de dada quantidade de recursos entre diversos usos de uma parte e a teoria da produção e do emprego como um todo de outra Enquanto nos limitarmos ao estudo da indústria ou empresa individual supondo que a quantidade agregada de recursos é constante e provisoriamente que as condições de outras indústrias ou empresas não mudaram é verdade que não estaremos tratando características da moeda Mas no momento em que passarmos ao pro blema do que determina a produção e o emprego como um todo tornase indispensável a teoria completa de uma economia monetária Talvez pudéssemos traçar uma linha divisória entre a teoria do equilíbrio estacionário e do equilíbrio móvel querendo designar com o último a teoria de um sistema onde as variações de pontos de vista sobre o futuro podem influir sobre a situação presente porque a importância da moeda decorre essencialmente do fato de consistir ela um elo entre o presente e o futuro Podemos considerar que a distribuição de recursos entre os diferentes usos será compatível com o equilíbrio sob a influência dos motivos econômicos normais em um mundo no qual as nossas opiniões relativas ao futuro são estáveis e dignas de confiança a respeito de tudo talvez com outra divisão para separar uma economia imutável de outra sujeita a variar mas na qual seria previsto desde o começo Ou talvez pudéssemos passar desta prope dêutica simplificada aos problemas do mundo real no qual as nossas expectativas anteriores podem trazernos desapontamentos e as nossas esperanças no futuro afetar nossos atos presentes Só após termos rea lizado esta transição é que deveríamos introduzir em nossos cálculos as particularidades da moeda como um elo entre o presente e o futuro Mas embora a teoria do equilíbrio móvel deva necessariamente ser concebida em termos de uma economia monetária permanece mesmo assim uma teoria do valor e da distribuição e não uma teoria da moeda independente A moeda considerada em seus atributos mais significativos é sobretudo um processo sutil de ligar o presente ao futuro e sem ela nem sequer poderíamos iniciar o estudo dos efeitos das expectativas mutáveis sobre as atividades correntes Não há meios para nos libertarmos da moeda mesmo abolindo o ouro a prata e os meios legais de pagamento Enquanto subsistir algum bem durável ele poderá possuir os atributos monetários158 e conseqüentemente dar origem aos problemas característicos de uma economia monetária II Em uma indústria específica o seu nível de preços depende em parte da taxa de remuneração dos fatores produtivos que entram no custo marginal e em parte da escala de produção Não há motivo OS ECONOMISTAS 278 158 Cf cap 17 algum para modificar essa conclusão quando passamos à indústria em conjunto O nível geral dos preços depende em parte da taxa de re muneração dos fatores produtivos que entram no custo marginal e em parte da escala global da produção isto é do volume de emprego considerando conhecidos o equipamento e a técnica É verdade que quando passamos à produção como um todo o custo da mesma para qualquer indústria depende parcialmente da produção das demais in dústrias A diferença principal que não temos levado em conta porém é que as variações da demanda atuam ao mesmo tempo sobre os custos e sobre o volume É a partir desse aspecto que temos de introduzir idéias completamente novas quando estudamos a demanda em conjunto e não mais a de um produto isolado supondo invariável a demanda como um todo III Se supusermos a título de simplificação que as formas de re muneração dos diversos fatores produtivos que entram no custo mar ginal variam todas na mesma proporção que a unidade de salários seguese que o nível geral dos preços dependerá então dados como conhecidos o equipamento e a técnica em parte da unidade de salários e em parte do volume de emprego Conseqüentemente o efeito das variações da quantidade de moeda sobre o nível de preços pode ser considerado a resultante dos efeitos que exerce sobre a unidade de salário e sobre o emprego Para tornar mais claras as idéias contidas nesta proposição sim plifiquemos ainda mais as nossas hipóteses e suponhamos 1 que os recursos de todos os desempregados sejam homogêneos e intercambiá veis no que concerne à sua eficiência para produzir o que se deseje e 2 que os fatores de produção que entram no custo marginal se con tentem com o mesmo salário nominal enquanto houver um excedente deles sem emprego Nesse caso teremos rendimentos constantes e uma unidade rígida de salários enquanto houver qualquer desemprego Se guese daí que havendo desemprego o aumento da quantidade de moeda não terá nenhum efeito sobre os preços e qualquer aumento da quantidade de moeda na demanda efetiva se traduzirá por um au mento exatamente proporcional do emprego ao passo que tão logo se alcance o pleno emprego a unidade de salários e os preços subirão daí em diante na medida exatamente proporcional ao aumento da demanda efetiva Assim sendo se a oferta permanece perfeitamente elástica enquanto subsiste o desemprego e tornase perfeitamente ine lástica tão logo o pleno emprego é alcançado e ainda se a demanda efetiva varia na mesma proporção que a quantidade de moeda a teoria quantitativa da moeda pode ser enunciada como segue Enquanto hou ver desemprego o emprego variará proporcionalmente à quantidade KEYNES 279 de moeda e quando o pleno emprego é alcançado os preços variarão proporcionalmente à quantidade de moeda Tendo portanto satisfeito a tradição ao introduzirmos várias hipóteses simplificadoras que nos permitem enunciar uma teoria quan titativa da moeda examinemos agora as possíveis complicações que de fato influirão sobre os acontecimentos 1 A demanda efetiva não variará em proporção exata à quan tidade da moeda 2 Desde que os recursos não são homogêneos haverá rendi mentos decrescentes e não constantes à medida que o emprego au mente gradualmente 3 Desde que os recursos não são intercambiáveis a oferta de certos bens tornarseá inelástica apesar de haver recursos desempre gados disponíveis para a produção de outros bens 4 A taxa de salários tenderá a subir antes que o pleno emprego seja alcançado 5 As remunerações dos fatores que entram no custo marginal não variam todas na mesma proporção Precisamos portanto considerar em primeiro lugar o efeito das variações na quantidade de moeda sobre o montante da demanda efe tiva como regra geral o aumento da demanda efetiva traduzse em parte pelo aumento do emprego e em parte pela elevação do nível dos preços Nestas condições os preços em vez de permanecerem cons tantes quando existe desemprego e de aumentarem proporcionalmente à quantidade de moeda quando se atinge o pleno emprego sobem pro gressivamente à medida que o emprego aumenta A teoria dos preços isto é a análise da relação entre as variações na quantidade de moeda e no nível dos preços permitindo a determinação da elasticidade dos preços em relação às variações da quantidade de moeda girará por tanto sobre os cinco fatores de complicação acima descritos Vamos examinálos um de cada vez Este procedimento porém não deve levarnos a supor que eles sejam independentes no sentido estrito da palavra Por exemplo a proporção em que se dividem os efeitos de um aumento da demanda efetiva entre a alta produção e a elevação dos preços pode influir na forma pela qual a quantidade de moeda se relaciona com o montante da demanda efetiva ou ainda as diferenças nas proporções em que variam as remunerações dos di OS ECONOMISTAS 280 versos fatores podem influir sobre a relação entre a quantidade de moeda e o montante da demanda efetiva O objetivo da nossa análise não é fornecer um mecanismo ou método de manipulação cega que nos dê uma resposta infalível mas dotarnos de um método organizado e ordenado de raciocinar sobre problemas concretos depois de obtermos uma conclusão provisória teremos de voltar atrás e levar em conta da melhor maneira possível as reações prováveis dos diversos fatores entre si Esta é a natureza do raciocínio econômico Qualquer outra maneira de aplicar os nossos princípios formais de raciocínio sem os quais contudo estaremos perdidos na floresta nos levará ao erro Os métodos pseudomatemáticos que dão a figuração simbólica de um sis tema de análise econômica como o que apresentaremos na seção VI deste capítulo têm o grave defeito de supor expressamente a indepen dência rigorosa dos fatores que utilizam e de perder sua coesão lógica e autoridade quando esta hipótese é rejeitada já no raciocínio comum onde não avançamos de olhos fechados mas onde a todo momento sabemos o que estamos fazendo e o que significam as palavras podemos conservar no fundo da mente as necessárias reservas e limitações bem como as correções que teremos de fazer depois de uma maneira pela qual não seria igualmente possível reter complicadas diferenciais parciais no verso de algumas páginas de álgebra que supõem a nu lidade de todas elas Grande parte da recente economia matemática não passa de um emaranhamento tão impreciso quanto suas hipó teses iniciais levando os autores a perder de vista num labirinto de símbolos pretensiosos e inúteis as complexidades e interdepen dências do mundo real IV 1 O efeito primário de uma variação na quantidade de moeda sobre o montante da demanda efetiva resulta de sua influência sobre a taxa de juros Se esta fosse a única reação o efeito quantitativo poderia derivarse dos três elementos seguintes a a curva de pre ferência pela liquidez que nos indica quanto a taxa de juros deve baixar para que os novos meios monetários sejam absorvidos pelas pessoas desejosas de conserválos b a curva da eficiência marginal que nos diz quanto aumentará o investimento em conseqüência de certo declínio na taxa de juros e c o multiplicador de investimento que nos informa de quanto subirá a demanda efetiva em conjunto com um acréscimo dado do investimento Embora esta análise tenha o mérito de introduzir ordem e método em nossa investigação apresenta contudo uma simplicidade enganosa se esquecermos que os três fatores a b e c são também parte integrante dos elementos de complicação 2 3 4 e 5 que não foram ainda examinados A própria curva da preferência pela liquidez depende pois de quanto da nova moeda é absorvido na circulação da KEYNES 281 renda e de produtos industriais que por sua vez dependem da pro porção em que aumenta a demanda efetiva e da maneira como se divide o aumento entre a alta de preços a alta dos salários e o volume de produção e de emprego Além disso a curva da eficiência marginal depende em parte do efeito que as circunstâncias que acompanham o aumento da quantidade de moeda exercem sobre as expectativas quanto à futura situação monetária Finalmente o multiplicador será influenciado pelo modo como se distribui a renda adicional resultante do aumento da demanda efetiva entre as diferentes classes de consu midores Naturalmente esta lista não inclui todas as interações pos síveis Entretanto se dispuséssemos de todos os fatos teríamos sufi cientes equações simultâneas para obter um resultado determinado Haverá determinado volume de aumento no montante da demanda efetiva que considerados todos os fatores pertinentes corresponderá ao aumento da quantidade de moeda e ficará em equilíbrio com o mesmo Ademais só em circunstâncias muito excepcionais acontece que um aumento na quantidade de moeda seja acompanhado por uma diminuição no montante da demanda efetiva A proporção entre o montante da demanda efetiva e a quantidade de moeda corresponde muito de perto àquilo a que freqüentemente se denomina a velocidaderenda da moeda excetuandose que a de manda efetiva corresponde à venda cuja expectativa motivou a produ ção e não à renda efetivamente realizada e de outra parte corres ponderá à renda bruta e não à líquida Mas a velocidaderenda da moeda não passa em si mesma de uma expressão que nada explica Não há motivo algum para esperar que ela seja constante pois ela depende como vimos na análise anterior de muitos fatores variáveis e complexos O emprego desta expressão obscurece no meu entender o caráter real da causação e só tem provocado confusões 2 Como vimos anteriormente p 72 a distinção entre os ren dimentos decrescentes e os rendimentos constantes depende em parte do fato de os trabalhadores serem ou não remunerados em estrita proporção a sua eficiência Em caso afirmativo teremos custos de tra balho constantes em termos de unidades de salários quando o emprego aumenta Porém se o salário de certa classe de trabalhadores for uni forme independentemente da eficiência dos indivíduos verificamos que o custo do trabalho subirá independentemente da eficiência do equi pamento Além disso se o equipamento for homogêneo e certa parte dele supuser um custo primário maior por unidade de produção teremos custos primários marginais crescentes acima de qualquer aumento resultante dos custos crescentes do trabalho Assim o preço da oferta tem conseqüentemente tendência para subir à medida que a produção obtida por meio de dado equipamento aumenta Assim sendo o aumento da produção é acompanhado por OS ECONOMISTAS 282 uma alta de preços independentemente de qualquer variação na uni dade de salários 3 No item 2 consideramos a possibilidade de a oferta não ser inteiramente elástica Se houver um equilíbrio perfeito nas respectivas quantidades de recursos especializados não empregados todos eles al cançarão simultaneamente o estado de pleno emprego Mas em geral a demanda de certos serviços e bens alcançará um nível além do qual a oferta é por algum tempo inelástica embora em outras áreas haja ainda excedentes importantes de recursos sem emprego Assim au mentando a produção chegase sucessivamente a uma série de es trangulamentos nos quais a oferta de determinados bens deixa de ser elástica e seus preços têm de subir ao nível necessário seja qual for esse nível para desviar a demanda para outras direções É provável que o nível geral de preços não suba muito quando a produção aumenta enquanto houver disponíveis recursos eficientes sem emprego em todas as categorias Mas tão logo a produção tenha subido o necessário para alcançar a zona dos estrangulamentos é provável que se verifique uma alta acentuada nos preços de certas mercadorias Entretanto neste item como no item 2 a elasticidade da oferta depende em parte do transcurso do tempo Se admitirmos um intervalo suficiente para que o próprio volume de equipamento varie eventual mente as elasticidades de oferta serão decididamente maiores Nessas condições uma variação moderada da demanda efetiva que se apre sente em circunstâncias de amplo desemprego pode traduzirse prin cipalmente pelo aumento do emprego e em medida muito limitada pela alta de preços ao passo que uma variação mais acentuada que não sendo prevista leva a certos estrangulamentos temporários influi mais sobre os preços e menos sobre o emprego em maior proporção no começo do que subseqüentemente 4 O fato de que a unidade de salários pode tender a subir antes de alcançado o pleno emprego requer alguns comentários ou explicações Uma vez que cada grupo de trabalhadores tira vantagens coeteris pa ribus de uma alta de seus próprios salários verificase naturalmente uma pressão neste sentido da parte de todos os grupos à qual os empresários estarão mais dispostos a ceder quando estiverem fazendo melhores negócios É por essa razão que normalmente uma parte de qualquer aumento na demanda efetiva se destina a satisfazer a ten dência ascendente da unidade de salários Portanto além do ponto crítico final do pleno emprego no qual um aumento da demanda efetiva expressa em moeda provoca uma alta dos salários nominais inteiramente proporcional à alta de preços dos bens de consumo salariais existe uma sucessão de pontos semi KEYNES 283 críticos anteriores nos quais um aumento da demanda efetiva tende a elevar os salários nominais embora não em proporção exata à ele vação dos preços dos bens de consumo salariais o mesmo ocorre no caso de uma demanda efetiva decrescente Na prática a unidade de salários não varia de maneira uniforme em termos monetários em resposta a cada pequena alteração na demanda efetiva as reações são descontínuas Estes pontos de descontinuidade são determinados pela psicologia dos trabalhadores e pela política dos patrões e dos sindicatos trabalhistas Em um sistema aberto no qual significam uma mudança em relação aos custos de salários em outros sistemas e no ciclo de negócios onde mesmo num sistema fechado podem significar uma variação relativamente aos custos de salários previstos para o futuro sua importância prática pode ser considerável De certo ponto de vista estes pontos de descontinuidade nos quais um aumento posterior da demanda efetiva em termos de moeda pode ocasionar uma alta des contínua na unidade de salários podem ser considerados estados de semiinflação apresentando certa analogia embora muito imperfeita com a inflação absoluta cf p 283 a qual resulta de um aumento da demanda efetiva em circunstâncias de pleno emprego Eles têm além disso apreciável importância histórica Não se prestam porém facil mente a generalizações teóricas 5 A nossa primeira simplificação consistiu em supor que as remunerações dos diversos fatores que entram no custo marginal va riam todas na mesma proporção Mas se fato as taxas de remuneração dos diferentes fatores em termos monetários apresentam graus va riáveis de rigidez e esses fatores podem também mostrar diferentes elasticidades de oferta em resposta a variações nas remunerações mo netárias oferecidas Se não fosse isso poderíamos dizer que o nível de preços se compõe de dois fatores a unidade de salários e o volume de emprego Talvez o elemento mais importante no custo marginal com pro babilidades de variar em proporção diferente da unidade de salários e também de flutuar dentro de limites muito mais amplos seja o custo marginal de uso Isso porque o custo marginal de uso pode subir acen tuadamente quando o emprego começa a melhorar já que como é provável que aconteça o aumento da demanda efetiva provoca uma rápida mudança nas expectativas prevalecentes com respeito à data em que será necessário substituir o equipamento Embora para muitos fins seja bastante útil como primeira apro ximação supor que as remunerações de todos os fatores que entram no custo primário marginal variam na mesma proporção da unidade de salários talvez fosse melhor considerar uma média ponderada das remunerações que entram no custo primário marginal e a isto dar a denominação de unidade de custos A unidade de custos ou sujeita à OS ECONOMISTAS 284 aproximação anterior a unidade de salários pode assim ser conside rada o padrão essencial de valor o nível de preços dado o estado da técnica e do equipamento dependerá em parte da unidade de custos e em parte da escala de produção aumentando quando assim varia a produção mais do que quando proporcional a qualquer alta na uni dade de custos de acordo com o princípio dos rendimentos decrescentes em período curto Temos pleno emprego quando a produção atinge o nível em que o volume marginal produzido por uma unidade repre sentativa dos fatores da produção baixa ao mínimo necessário para que esses fatores se tornem disponíveis em número suficiente para o produzir V Quando um novo acréscimo no volume de demanda efetiva não mais produz aumento na produção e se traduz apenas numa alta da unidade de custos em proporção exata ao aumento da demanda efetiva teremos alcançado um estado que se pode adequadamente qualificar de verdadeira inflação Até esse ponto o efeito da expansão monetária é apenas uma questão de grau e não há ponto anterior em que possamos traçar uma linha definida e declarar que um estado de inflação se revelará Cada aumento anterior na quantidade de moeda à medida que aumente a demanda efetiva traduzse em parte numa elevação da unidade de custos e em parte num aumento da produção Parece portanto que certa assimetria se manifesta entre as duas zonas separadas pelo ponto crítico em que se observa a verdadeira inflação Uma contração da demanda efetiva abaixo do ponto crítico reduzirá o seu montante medido em unidades de custo ao passo que uma expansão da demanda efetiva acima desse nível não terá em geral o efeito de aumentála em termos de unidades de custo Esse resultado decorre da hipótese de que os fatores da produção e em particular os trabalhadores procuram resistir a uma redução nas suas remunerações monetárias e de que não há motivo correspondente para opor a um aumento delas Esta hipótese é contudo confirmada pelos fatos devido à circunstância de que uma variação que não tenha caráter geral tornase benéfica para os fatores específicos atingidos quando opera em sentido ascendente e prejudicial quando o faz no sentido descendente Se pelo contrário os salários nominais baixassem ilimitadamente sempre que houvesse uma tendência para um nível inferior ao do pleno emprego é certo que a assimetria desapareceria Porém neste caso não haveria abaixo do pleno emprego nenhuma posição de equilíbrio possível até que a taxa de juros fosse incapaz de baixar mais ou os salários chegassem a zero De fato precisamos ter algum fator cujo valor expresso em moeda seja se não fixo pelo menos rígido para dar alguma estabilidade aos valores num sistema monetário KEYNES 285 A opinião de que qualquer aumento na quantidade de moeda é in flacionário a não ser que entendamos por inflacionário apenas uma alta de preços está ligada à hipótese subjacente da teoria clássica de que sempre nos encontramos em circunstâncias tais que uma baixa das remunerações reais dos fatores produtivos levará a uma redução de sua oferta VI Com o auxílio das anotações apresentadas no capítulo 20 pode mos se quisermos exprimir de forma simbólica a substância do que ficou dito Escrevemos MV D onde M representa a quantidade de moeda V sua velocidaderenda definição que se difere por pequenos detalhes da indicada antes relativamente à definição usual e D a demanda efetiva Se então V for constante para que os preços variem propor cionalmente à quantidade de moeda é necessário que ep Ddp pdD seja unitário Esta condição é satisfeita ver p 270 se eo 0 ou se ew 1 Esta condição significa que a unidade de salários expressa em termos de moeda sobe proporcionalmente à demanda visto que ew DdW WdD e a condição eo 0 quer dizer que a produção não mais reage ao aumento da demanda efetiva visto que eo DdO OdD Em ambos os casos a produção permanecerá invariável Podemos em seguida examinar o caso em que a velocidaderenda não é constante introduzindo ainda uma nova elasticidade a saber a elasticidade da demanda efetiva relativa às variações na quantidade de moeda ed MdD DdM Isso nos dá Mdp pdM ep ed onde ep 1 ee eo 1 ew de modo que e ed 1 ew ed ee eo ed1 ee eo ee eo ew onde e sem sufixo Mdp pdM representa o vértice desta pirâmide e mede a reação dos preços nominais às variações na quantidade de moeda OS ECONOMISTAS 286 Visto que esta última expressão nos dá a proporção em que variam os preços em resposta à variação na quantidade de moeda podemos considerála uma expressão generalizada da teoria quantitativa da moe da Pessoalmente não dou muito valor a manipulações desta espécie e quero repetir a advertência feita anteriormente de que elas implicam tantas hipóteses tácitas a respeito de quais variáveis se consideram independentes ignorando completamente as diferenciais parciais quantas se fazem no raciocínio comum duvidando ao mesmo tempo que elas nos levem mais longe do que o raciocínio comum Talvez a sua maior utilidade seja a de evidenciar a grande complexidade da relação entre os preços e a quantidade de moeda quando tentamos darlhe uma expressão formal Vale a pena entretanto chamar a aten ção para os quatro termos ed ew ee e eo que governam o efeito das variações da quantidade de moeda sobre os preços ed representa os fatores de liquidez que determinam a demanda de moeda em cada situação ew os elementos de trabalho ou mais exatamente os que entram no custo primário que determinam a medida na qual os salários nominais sobem quando o emprego aumenta e enfim ee e eo os fatores físicos que determinam a taxa dos rendimentos decrescentes quando se associa mais emprego ao equipamento existente Se o público conserva uma proporção constante de seus rendi mentos em moeda ed 1 se os salários nominais fossem fixos ew 0 se houver rendimentos constantes de modo que o rendimento mar ginal iguale o rendimento médio eeeo 1 e se houver pleno emprego da mãodeobra ou do equipamento eeeo 0 Neste caso e 1 se ed 1 e ew 1 ou se ed 1 ew 0 e eeeo 0 ou se ed 1 e eo 0 Existem evidentemente outros casos especiais em que e 1 Porém em geral e não iguala a unidade e talvez não haja inconveniente em fazer a generalização de que segundo hipóteses plausíveis relativas ao mundo real e excluindo o caso de uma fuga do dinheiro no qual ed e ew alcançam um valor alto e é via de regra menor que a unidade VII Até agora nos ocupamos principalmente da maneira como as va riações na quantidade de moeda influem nos preços a curto prazo Mas não haverá nos preços a longo prazo uma relação mais simples Este é um problema que se relaciona mais com a generalização histórica do que com a teoria pura Se o estado da preferência pela liquidez dá provas de certa tendência para a uniformidade a longo prazo é muito possível que haja uma relação indefinida entre a renda nacional e a quantidade de moeda necessária para satisfazer a prefe rência pela liquidez tomada como termo médio dos períodos de pes simismo e de otimismo em conjunto Por exemplo é possível que o KEYNES 287 público não conserve em períodos longos e na forma de saldos ociosos uma soma superior a certa proporção bastante estável da renda na cional desde que a taxa de juros se mantenha superior a certo mínimo psicológico de tal modo que se a quantidade de moeda que excede as necessidades da circulação ativa ultrapassar esta proporção da renda nacional haverá uma tendência mais cedo ou mais tarde para a queda da taxa de juros nas proximidades deste mínimo A taxa de juros de crescente aumentará então coeteris paribus a demanda efetiva e a crescente demanda efetiva alcançará um ou mais dos pontos semicrí ticos nos quais a unidade de salários tenderá a mostrar uma alta descontínua com o efeito correspondente sobre os preços As tendências opostas manifestarseão se a quantidade de moeda excedente estiver em proporção anormal baixa com a renda nacional Assim sendo o resultado líquido das flutuações será estabelecer após certo tempo um nível médio compatível com a proporção estável que a psicologia do público tende mais cedo ou mais tarde a restabelecer entre a quan tidade de moeda e a renda nacional Estas tendências atuarão provavelmente com menos fricção no sentido ascendente que no descendente Se a quantidade de moeda continuar sendo muito escassa por longo tempo porém a solução será encontrada normalmente na mudança do padrão monetário ou do sistema monetário que aumentará a quantidade de moeda preferivel mente a uma compensação da unidade de salários que conseqüente mente aumentará a carga dos débitos Desse modo a direção dos mo vimentos de preços em períodos muito longos foi quase sempre ascen dente Isso porque quando o dinheiro é relativamente abundante a unidade de salários sobe e quando ele é relativamente escasso sempre se encontram meios de aumentar a quantidade efetiva da moeda Durante o século XIX o acréscimo da população e das invenções a exploração de novas terras o estado da confiança e a freqüência das guerras em média digamos a cada década juntamente com a pro pensão a consumir parecem ter sido suficientes para manter uma curva da eficiência marginal do capital que permite um nível médio de em prego bastante satisfatório para ser compatível com uma taxa de juros suficientemente alta a fim de ser psicologicamente aceitável pelos pos suidores de riqueza Há evidência de que por um período de aproxi madamente cento e cinqüenta anos a taxa normal de juros a longo prazo nos principais centros financeiros foi de cerca de 5 e a dos títulos de primeira ordem oscilou entre 3 e 35 e que essas taxas de juros eram bastante módicas para suscitar um fluxo de investimento compatível com um volume médio de emprego razoavelmente baixo Por vezes a unidade de salários porém com mais freqüência o padrão monetário ou o sistema monetário especialmente através do desen volvimento da moeda bancária ajustavase para assegurar que a quan tidade de moeda medida em termos de salários bastasse para satisfazer OS ECONOMISTAS 288 a preferência normal pela liquidez sem que as taxas de juros raramente fossem inferiores às cifras normais indicadas antes A tendência da unidade de salários era como de hábito firmemente ascendente mas a eficiência do trabalho aumentava também Nestas condições o equi líbrio de forças era tal que permitia um grau razoável de estabilidade nos preços a média qüinqüenal mais elevada do índice de Sauerbeck entre 1820 e 1914 foi apenas 50 maior que a média mais baixa Isto não foi acidental Com razão atribuiuse este fato ao equilíbrio de forças numa época em que os grupos individuais de empregadores eram bastante fortes para evitar que a taxa de salários subisse muito mais depressa que a eficiência da produção e numa época em que os sistemas monetários eram ao mesmo tempo suficientemente fluidos e perma nentes para assegurar uma oferta média de moeda em termos de unidades de salários para permitir a manutenção da taxa média de juros no nível mais baixo que os possuidores de riqueza pudessem aceitar levando em conta as suas preferências pela liquidez O nível médio de emprego era sem dúvida substancialmente inferior ao do pleno emprego mas não tão intoleravelmente abaixo do mesmo a ponto de provocar mudanças revolucionárias Hoje e provavelmente no futuro a curva da eficiência marginal do capital está por diversas razões muito abaixo do que era no século XIX A agudeza e a peculiaridade de nossos problemas contemporâneos emanam portanto do fato de que a taxa média de juros compatível com um volume médio razoável de emprego pode ser inaceitável para os possuidores de riqueza de forma que seja impossível estabelecêla facilmente por meio de simples manipulações da quantidade de dinhei ro Enquanto se podia alcançar um nível tolerável de emprego durante uma média de uma duas ou três décadas simplesmente garantindo uma oferta adequada de moeda em unidades de salários mesmo o século XIX pôde encontrar soluções Se este fosse o nosso único problema na atualidade se um grau suficiente de desvalorização fosse tudo o que necessitamos certamente nós também encontraríamos hoje uma solução Porém o elemento mais estável e o mais difícil de modificar em nossa economia contemporânea tem sido até agora e poderá continuar a sêlo no futuro a taxa mínima de juros aceitável pela maioria dos possuidores de riqueza159 Se um nível tolerável de emprego requer uma taxa de juros muito inferior às taxas médias que prevaleceram no século XIX é muito duvidoso que o mesmo possa ser alcançado por simples manipulações da quantidade de moeda Da porcentagem de lucro que a curva da eficiência marginal do capital permite ao mutuário esperar ganhar tem de deduzirse 1 a despesa de pôr em contato os KEYNES 289 159 Cf a máxima do século XIX citada por Bagehot segundo a qual John Bull é capaz de suportar muitas coisas mas é incapaz de suportar uma taxa de juros de 2 mutuários e os mutuantes 2 o imposto sobre a renda e os impostos adicionais e 3 a margem que o mutuante exige para cobrir seu risco e incerteza antes de chegar ao rendimento líquido disponível para induzir o possuidor de riqueza a sacrificar a sua liquidez Em condições de uma média tolerável de emprego se este rendimento líquido resulta infinitesimal os métodos consagrados pelo tempo podem mostrarse ineficazes Para voltar ao nosso tópico imediato a relação existente a longo prazo entre a renda nacional e a quantidade de moeda dependerá das preferências pela liquidez E a estabilidade dos preços em período longo dependerá da rapidez com que a unidade de salários ou mais preci samente a unidade de custos tende a crescer comparativamente à eficiência do sistema produtivo OS ECONOMISTAS 290 LIVRO SEXTO BREVES NOTAS SUGERIDAS PELA TEORIA GERAL CAPÍTULO 22 Notas Sobre o Ciclo Econômico Visto que pensamos ter demonstrado nos capítulos anteriores o que determina o volume de emprego em qualquer momento deduzse se estivermos certos que a nossa teoria deve ser capaz de explicar o fenômeno do ciclo econômico Quando examinamos em detalhe qualquer exemplo concreto do ciclo econômico constatamos a sua grande complexidade e para a sua explicação completa serão necessários todos os elementos de nossa aná lise Verificase em especial que as flutuações na propensão a consu mir no estado da preferência pela liquidez e na eficiência marginal do capital desempenham todas o seu papel Sugiro todavia que o caráter essencial do ciclo econômico e sobretudo a regularidade de ocorrência e duração que justificam a denominação ciclo se devem principalmente ao modo como flutua a eficiência marginal do capital Na minha maneira de ver o ciclo econômico deve de preferência ser considerado o resultado de uma variação cíclica na eficiência marginal do capital embora complicado e freqüentemente agravado por modifi cações que acompanham outras variáveis importantes do sistema eco nômico no curto prazo O desenvolvimento desta tese exigiria antes um livro que um capítulo além de necessitar uma análise minuciosa dos fatos porém as seguintes breves notas serão suficientes para in dicar a linha de análise que sugere a nossa teoria anterior I Por movimento cíclico queremos dizer que quando o sistema evo lui por exemplo em direção ascendente as forças que o impelem para cima adquirem inicialmente impulso e produzem efeitos cumulativos de maneira recíproca mas perdem gradualmente a sua potência até que em certo momento tendem a ser substituídas pelas forças que operam em sentido oposto e que por sua vez adquirem também in tensidade durante certo tempo e fortalecemse mutuamente até que 293 alcançado o máximo desenvolvimento declinam e cedem lugar às forças contrárias Todavia por movimento cíclico não queremos dizer sim plesmente que essas tendências ascendentes e descendentes uma vez iniciadas não persistam indefinidamente na mesma direção mas que acabam por inverterse Queremos dizer também que existe certo grau reconhecível de regularidade na seqüência e duração dos movimentos ascendentes e descendentes Contudo para que a nossa explicação seja adequada devemos incluir outra característica do chamado ciclo econômico ou seja o fe nômeno da crise o fato de que a substituição de uma fase ascendente por outra descendente geralmente ocorre de modo repentino e violento ao passo que como regra a transição de uma fase descendente para uma fase ascendente não é tão repentina Qualquer flutuação no investimento não compensada por uma variação correspondente na propensão a consumir resulta necessaria mente numa flutuação no emprego Portanto dado que o fluxo de investimento está sujeito a influências bastante complexas é muito improvável que todas as flutuações tanto as do próprio investimento como as da eficiência marginal do capital sejam de caráter cíclico Um caso especial a saber o das flutuações associadas aos movimentos da produção agrícola será objeto de exame numa seção posterior deste capítulo Todavia no caso dos ciclos econômicos típicos da economia industrial do século XIX considero que haja certas razões definidas para que as flutuações na eficiência marginal do capital tenham tido características cíclicas Essas razões não são em si mesmas novas mesmo como explicações dos ciclos econômicos Meu único propósito aqui é relacionálas com a teoria precedente II Posso desenvolver melhor o que tenho a dizer começando pelas últimas etapas da expansão e pelo começo da crise Vimos antes que a eficiência marginal do capital160 depende não apenas da abundância ou da escassez existente de bens de capital e do custo corrente da produção dos bens de capital mas também das expectativas correntes relativas ao futuro rendimento dos bens de ca pital Conseqüentemente no caso dos bens duráveis é natural e ra zoável que as expectativas do futuro desempenhem um papel prepon derante na determinação da escala em que se julguem recomendáveis novos investimentos Como vimos porém as bases para tais expecta tivas são muito precárias Fundadas em indícios variáveis e incertos estão sujeitas a variações repentinas e violentas OS ECONOMISTAS 294 160 Quando o contexto não apresenta possibilidade de nenhum equívoco é quase sempre mais conveniente escrever a eficiência marginal do capital quando se quer apontar a curva da eficiência marginal do capital Ora para explicar a crise temos enfatizado que a taxa de juros tende a subir sob o efeito de maior demanda de moeda tanto para fins de transações como para fins especulativos Algumas vezes este fator pode certamente representar um papel de agravamento e talvez ocasional mente de desencadeamento Creio que a explicação mais normal e por vezes a essencial da crise não é primordialmente uma alta taxa de juros mas um repentino colapso da eficiência marginal do capital As últimas etapas da expansão são caracterizadas por expecta tivas otimistas relativas ao rendimento futuro dos bens de capital su ficientemente fortes para compensar a abundância crescente desses bens a alta de seus custos de produção e provavelmente também a alta taxa de juros É próprio da natureza dos mercados financeiros organizados sob a influência de compradores em sua maioria ignoran tes do que compram e de especuladores mais interessados nas previsões da próxima mudança de opinião do mercado do que numa estimativa racional do futuro rendimento dos bens de capital que quando a de cepção advém a um desses mercados otimistas em demasia e supera bastecidos as cotações desçam em movimento súbito e mesmo catas trófico161 Além disso o pessimismo e a incerteza a respeito do futuro que acompanham um colapso da eficiência marginal do capital susci tam naturalmente um forte aumento da preferência pela liquidez e conseqüentemente uma elevação da taxa de juros Nestas condições o fato de a queda da eficiência marginal do capital ser freqüentemente acompanhada por uma elevação da taxa de juros pode agravar seria mente o declínio do investimento O essencial porém de tal estado de coisas reside não obstante na queda da eficiência marginal do capital especialmente no caso das categorias de capital que no curso da fase anterior mais contribuíram para os novos investimentos A preferência pela liquidez exceto nas suas manifestações associadas ao aumento da atividade comercial e da especulação só começa a aumentar após o desmoronamento da eficiência marginal do capital É isto que de fato torna a depressão tão intratável Posterior mente um declínio de taxa de juros será de grande auxílio para a recuperação e provavelmente uma condição necessária da mesma mas de momento o colapso da eficiência marginal do capital pode ser tão completo que nenhuma redução possível de taxa de juros baste para o contrabalançar Se a redução da taxa de juros constituísse por si mesma um remédio efetivo a recuperação poderia ser conseguida num lapso de tempo relativamente curto e por meios mais ou menos diretamente sob controle da autoridade monetária Isso porém não KEYNES 295 161 Evidenciei no cap 12 que os investidores particulares raramente são diretamente respon sáveis pelas inversões novas embora os empresários que têm essa responsabilidade veri fiquem ser financeiramente vantajoso e freqüentemente obrigatório conformaremse com as idéias do mercado ainda que pessoalmente estejam mais bem informados costuma acontecer não sendo fácil reanimar a eficiência marginal do capital tal como a determina a psicologia caprichosa e indisciplinada do mundo dos negócios É a volta da confiança para empregar a lin guagem comum que se afigura tão difícil de controlar numa economia de capitalismo individualista Este é o aspecto da depressão que os banqueiros e os homens de negócios insistem com razão em enfatizar e ao qual os economistas crentes na eficácia de um remédio puramente monetário não dispensaram a atenção que merece Isto me faz alcançar o ponto a que quero chegar A explicação do elemento tempo no ciclo econômico o fato de que em geral tem de decorrer um lapso determinado de tempo antes que se inicie a recu peração deve ser procurada nas influências que governam a recupe ração da eficiência marginal do capital Há razões dadas primeiro pela extensão da vida útil dos bens duráveis em relação ao ritmo normal de crescimento em certa época e segundo pelas despesas correntes de conservação dos estoques excedentes que explicam por que a duração do movimento descendente deve ter uma magnitude que não é fortuita que não flutua entre digamos um ano agora e dez anos a próxima vez mas antes evidencia determinada regularidade situada entre di gamos três e cinco anos Voltemos ao que ocorre na crise Enquanto a expansão continua a maioria dos novos investimentos oferece um rendimento corrente que não é insatisfatório A desilusão chega porque de repente surgem dúvidas quanto à confiança que se pode ter no rendimento esperado talvez porque o rendimento atual dê sinais de baixa à medida que os estoques de bens duráveis produzidos recentemente aumentem regu larmente Se se crê que os custos correntes de produção são mais ele vados do que poderão vir a ser futuramente esta será mais uma razão para a baixa da eficiência marginal do capital Uma vez surgida a dúvida propagase rapidamente Assim no começo da depressão existe provavelmente uma boa parte do capital que apresenta uma eficiência marginal ínfima ou mesmo negativa mas o intervalo de tempo que deverá decorrer antes que a escassez do capital pelo uso a deterioração e a obsolescência se tornem bastante óbvias para aumentar a eficiência marginal pode ser uma função relativamente estável da duração média do capital numa época dada Se as características da época mudam o intervalo de tempopadrão variará Se por exemplo passarmos de um período de aumento a um período de declínio da população a fase característica do ciclo se prolongará Mas temos no que antecede uma razão substancial de por que existe uma relação definida ligando a duração da depressão à extensão da vida útil dos bens duráveis e à taxa normal de crescimento em época determinada O segundo dos fatores que conduzem a esta estabilidade de du ração temporal se deve aos custos de conservação dos estoques exce dentes que forçam a sua absorção dentro de certo período nem muito OS ECONOMISTAS 296 curto nem muito longo A repentina suspensão de novos investimentos depois da crise levará provavelmente a uma acumulação de estoques de produtos não acabados O custo de conservação destes produtos raramente é inferior a 10 ao ano Seus preços devem portanto baixar o bastante para causar uma restrição da produção que assegure a reabsorção dos estoques excedentes num prazo de digamos três a cinco anos Ora o processo de absorção dos estoques representa um investimento negativo que também contribui para diminuir o emprego e chegando a seu termo causa um considerável alívio Ademais a redução do capital circulante que necessariamente acompanha o declínio da produção é um novo fator às vezes impor tante de desinvestimento e quando a recessão se instalou este fator exerceu forte influência cumulativa no sentido da baixa Nos primeiros momentos de uma depressão típica verificase provavelmente um in vestimento no aumento dos estoques que ajuda a compensar o desin vestimento no capital circulante na fase seguinte pode haver um curto período de desinvestimento tanto em estoques como em capital circu lante depois que se alcançou o nível inferior da depressão aparece em geral um desinvestimento suplementar nos estoques que equilibra parcialmente os reinvestimentos no capital circulante e finalmente quando a recuperação tiver avançado bastante ambos os fatores serão simultaneamente favoráveis ao investimento É neste cenário que con vém examinar os efeitos adicionais devidos às flutuações do investi mento em bens duráveis Quando um declínio nesta espécie de inves timento desencadeia uma flutuação cíclica haverá poucas probabilida des de recuperação dos mesmos enquanto o ciclo não houver percorrido parte de seu caminho162 Infelizmente uma queda substancial da eficiência marginal do capital tende também a afetar negativamente a propensão a consumir pois provoca uma baixa considerável no valor do mercado de títulos Ora esta baixa exerce uma influência depressiva sobre a classe de pessoas que acompanham de perto os seus investimentos na bolsa de valores especialmente quando aplicam dinheiro emprestado A dispo sição dessas pessoas para gastar talvez dependa mais das altas e baixas no valor de seus investimentos do que do estado do fluxo de seus rendimentos Com um público de mentalidade acionista como o dos Estados Unidos de hoje um mercado de títulos em alta pode ser con dição quase essencial para uma propensão a consumir satisfatória e esta circunstância geralmente desconsiderada até há pouco serve ob KEYNES 297 162 Certa parte da argumentação em minha obra Treatise on Money JMK v V Livro Quarto gira em torno deste assunto viamente para agravar mais ainda o efeito depressivo de uma baixa na eficiência marginal do capital Uma vez iniciada a recuperação a maneira como ela se alimenta em si mesma e se desenvolve cumulativamente é óbvia Na fase des cendente porém enquanto há por certo tempo excedentes de capital fixo e de estoques de matériasprimas e há uma redução do capital circulante a curva da eficiência marginal do capital pode baixar tanto que dificilmente é possível corrigila de modo que assegure um fluxo satisfatório de novos investimentos por meio de qualquer redução exe qüível na taxa de juros Assim sendo com os mercados organizados e influenciados do modo que se verifica atualmente a estimativa que faz o mercado da eficiência marginal do capital pode sofrer flutuações de tão grande amplitude que dificilmente podem ser compensadas por flutuações correspondentes na taxa de juros Além do mais conforme vimos antes as flutuações da Bolsa de Valores podem enfraquecer a propensão a consumir justamente quando ela é mais necessária Por tanto em condições de laissezfaire talvez seja impossível evitar gran des flutuações no emprego sem uma profunda mudança na psicologia do mercado de investimentos mudança essa que não há razão para esperar que ocorra Em conclusão acho que não se pode com segurança abandonar à iniciativa privada o cuidado de regular o volume corrente de investimento III A análise anterior pode parecer de acordo com a maneira de ver dos que pretendem que o sobreinvestimento seja a característica da expansão que a abstenção desse sobreinvestimento seja o único meio de impedir a depressão subseqüente e que pelos motivos anteriores conquanto a depressão não possa ser evitada por uma baixa taxa de juros a expansão possa não obstante ser evitada por uma taxa de juros elevada Há de fato substância no argumento de que uma taxa de juros elevada é muito mais eficaz contra o auge da expansão do que uma taxa de juros baixa o é contra uma depressão Entretanto deduzir estas conclusões do que ficou dito significaria uma interpretação falsa de minha análise e a meu ver seria cometer um grave erro Isso porque o termo sobreinvestimento é ambíguo Pode aplicarse aos investimentos destinados a desapontar as expectativas que os incitaram ou para os quais não há lugar em períodos de intenso desemprego mas pode também aplicarse a uma situação caracterizada por tal abundância de capital que não haja investimento novo aparen temente capaz de mesmo em condições de pleno emprego render no curso de sua duração mais do que o seu custo de reposição É apenas neste último estado de coisas que há sobreinvestimento estritamente OS ECONOMISTAS 298 falando no sentido de que qualquer investimento posterior seria mero desperdício de recursos163 Além disso mesmo que o sobreinvestimento nesse sentido fosse uma característica normal da fase de auge da ex pansão o remédio não consistiria em fazer incidir uma elevada taxa de juros que provavelmente desanimaria alguns investimentos úteis e enfraqueceria ainda mais a propensão a consumir mas em tomar medidas enérgicas como por exemplo uma nova distribuição dos ren dimentos ou outra qualquer a fim de estimular a propensão a consumir No entanto segundo a minha análise só no primeiro sentido é que o sobreinvestimento pode ser considerado característica do período de auge da expansão A situação que estou indicando como típica não é aquela em que o capital seja tão abundante que a co munidade em conjunto não possa razoavelmente empregar mais ne nhum mas aquela em que o investimento se efetua em condições instáveis e efêmeras pelo fato de ser suscitado por expectativas des tinadas a malograr Pode acontecer naturalmente e na realidade é provável que assim seja que as ilusões da expansão levem a produzir certos tipos de bens de capital em tamanha abundância que parte da produção seja independentemente de qualquer critério um desperdício de re cursos o que às vezes se verifica podemos acrescentar mesmo quan do não há expansão Quer dizer levam a um investimento mal orien tado Além disso porém uma característica essencial do auge da ex pansão é que os investimentos que terão um rendimento efetivo de digamos 2 em condições de pleno emprego se realizam na esperança de digamos 6 e são avaliados nesta base Quando chega a desilusão esta expectativa é substituída por um erro de pessimismo inverso com o resultado de que se passa a esperar um rendimento negativo dos investimentos que em situação de pleno emprego renderiam efe tivamente 2 o colapso resultante do investimento novo que daí resulta leva então a um estado de desemprego no qual os investimentos que em situação de pleno emprego teriam rendido 2 passam de fato a render menos que nada Chegase a uma situação em que há escassez de casas de moradia na qual todavia ninguém dispõe de meios para viver nas casas que existem Assim o remédio para o auge da expansão não é a alta mas a baixa da taxa de juros164 Pois aquela pode fazer perdurar o chamado auge da expansão O verdadeiro remédio para o ciclo econômico não KEYNES 299 163 Contudo em certas hipóteses como a da distribuição no tempo da propensão a consumir os investimentos que dão um rendimento negativo poderiam ser vantajosos no sentido de que para a comunidade em conjunto maximizariam a satisfação 164 Ver adiante p 301 alguns argumentos que podem ser invocados em sentido contrário Se for inviável pois fazer grandes alterações nos nossos métodos presentes eu concordaria em que a elevação da taxa de juros durante uma fase de boom poderia ser nas condições assim concebidas um mal menor consiste em evitar o auge das expansões e em manter assim uma semidepressão permanente mas em abolir as depressões e manter deste modo permanentemente em um quasiboom O auge da expansão que acaba por levar a uma crise resulta portanto da combinação de uma taxa de juros que num estado correto de expectativa seria demasiadamente alta para permitir o pleno em prego e de um estado enganoso de expectativa que enquanto dura impede essa taxa de juros de ser de fato um obstáculo O boom é uma situação em que o excesso de otimismo triunfa sobre uma taxa de juros que julgada a sanguefrio seria considerada alta demais Exceto durante a guerra duvido que haja algum exemplo recente de uma expansão bastante forte que tenha levado ao pleno emprego Nos Estados Unidos o emprego foi muito satisfatório em 192829 jul gando por padrões normais mas não tive provas de nenhuma escassez de mãodeobra a não ser talvez em certos grupos de trabalhadores altamente especializados Verificaramse alguns estrangulamentos mas a produção em conjunto ainda apresentava capacidade para au mentos ulteriores Também não houve sobreinvestimento no sentido de que os equipamentospadrão e de habitação fossem tão elevados que todos supondo que existisse pleno emprego tivessem tudo que desejassem à taxa necessária para cobrir o custo de reposição sem desconto para os juros pelo tempo de duração da casa e tampouco de que os transportes os serviços públicos e os melhoramentos agrícolas tivessem alcançado um nível em que novos incrementos ao estoque existente não pudessem razoavelmente esperar produzir rendimentos sequer iguais a seu custo de reposição Pelo contrário seria absurdo pretender que nos Estados Unidos em 1929 tenha havido sobreinves timento no sentido estrito da palavra A verdadeira situação era de natureza bem diferente Os novos investimentos durante os cinco anos anteriores tinhamse na realidade realizado em tão grande escala em conjunto que o rendimento provável dos investimentos suplemen tares analisado com frieza estava decaindo rapidamente Uma previ são correta teria deprimido a eficiência marginal do capital a um nível sem precedentes de modo que o boom não poderia ter continuado em bases firmes exceto com uma taxa de juros a longo prazo muito baixa e evitando investimentos mal dirigidos em determinados ramos com risco de sobreexploração De fato a taxa de juros mantevese elevada o bastante para desanimar os novos investimentos exceto naqueles ramos particulares que estavam sob a influência do estímulo especu lativo e que conseqüentemente corriam um perigo especial de serem superexplorados uma taxa de juros suficiente para resistir ao movi mento especulativo teria ao mesmo tempo detido quaisquer novos investimentos razoáveis Nestas condições a elevação da taxa de juros como antídoto para a situação criada pela persistência de um fluxo OS ECONOMISTAS 300 anormal de investimentos pertence à categoria dos remédios que curam a doença matando o paciente É muito possível na verdade que a existência do emprego quase pleno durante vários anos fosse acompanhada em países tão ricos como a GrãBretanha ou os Estados Unidos por um fluxo de novos investimentos admitindo a propensão a consumir existente tão intenso que levasse eventualmente a um estado de pleno emprego no sentido de não poder mais esperar de um novo incremento de bens duráveis de qualquer tipo segundo cálculos razoáveis um rendimento agregado bruto superior a seu custo de reposição Além do mais tal estado poderia alcançarse num futuro relativamente próximo digamos dentro de vinte e cinco anos ou menos Não se deve pensar que nego esta pos sibilidade quando afirmo jamais ter existido sequer momentaneamen te uma situação de pleno investimento no sentido estrito da palavra Aliás ainda que as fases de expansão da época contemporânea pudessem levar temporariamente a uma situação de pleno investimento ou sobreinvestimento no sentido estrito continuaria sendo absurdo con siderar uma taxa de juros mais elevada como remédio adequado E isso porque nesse caso ficaria plenamente confirmada a hipótese dos que atribuem a anomalia ao subconsumo O remédio consistiria em tomar várias medidas capazes de aumentar a propensão a consumir através de uma redistribuição da renda ou de um processo semelhante de modo que dado volume de emprego pudesse ser mantido com um volume de investimento menor IV Talvez convenha no ponto a que chegamos dizer umas palavras sobre as importantes correntes de pensamento que sustentam de ma neiras diferentes que a tendência crônica das sociedades contemporâ neas para o subemprego deve ter sua causa procurada no subconsumo quer dizer nos hábitos sociais e numa distribuição da riqueza que resultam numa propensão a consumir demasiado baixa Nas condições atuais ou pelo menos nas que prevaleceram até há pouco em que o fluxo de investimento não é planejado nem dirigido antes se acha abandonado aos caprichos de uma eficiência marginal do capital que depende das opiniões pessoais de indivíduos não conhecedores ou de especuladores e à influência de uma taxa de juros a longo prazo que raras vezes ou nunca baixa além de um nível convencional essas correntes de pensamento como guias de política prática estão indubitavelmente certas Em tais condições pois não há outro meio capaz de levar o volume médio de emprego a um nível mais favorável Se é materialmente impraticável aumentar o investi mento tornase evidente não haver outros meios de alcançar um nível maior de emprego além do de aumentar o consumo Praticamente a única diferença entre essas correntes de pensa KEYNES 301 mento e a minha é que num momento em que há ainda muitas van tagens sociais a esperar de um acréscimo do investimento elas parecem dar uma ênfase um tanto exagerada ao incremento do consumo Teo ricamente entretanto podemos criticálas por desconsiderar o fato de que há dois caminhos para aumentar a produção Mesmo se tivéssemos de decidir o que seria preferível aumentar o capital mais lentamente e concentrar esforços no aumento do consumo deveríamos tomar essa decisão com muita ponderação depois de considerar a outra alternativa Pessoalmente vejo de bom alvitre as grandes vantagens sociais que ad viriam do crescimento do estoque de capital suficiente para pôr fim à sua escassez mas isso é um julgamento prático e não um imperativo teórico Aliás estou disposto a admitir que o mais prudente seria avançar em ambas as frentes ao mesmo tempo Embora procurando conseguir um fluxo de investimento controlado socialmente com vista à baixa progressiva da eficiência marginal do capital estou disposto a apoiar ao mesmo tempo toda sorte de medidas para aumentar a propensão a consumir Como é improvável que o pleno emprego possa ser mantido com a propensão a consumir existente façamos o que fizemos com relação ao investimento Há condições portanto para que ambas as políticas funcionem juntas promover o investimento e ao mesmo tempo o consumo não apenas até o nível que corresponderia ao acréscimo do investimento com a propensão a consumir existente mas também a um nível ainda maior Se empregando números redondos para ilustrar nosso racio cínio o nível médio de produção atual fosse 15 inferior ao que seria com o pleno emprego contínuo e se 10 desta produção repre sentassem o investimento líquido e os restantes 90 o consumo se o investimento líquido tivesse de subir 50 para conseguir o pleno emprego com a propensão a consumir existente de modo que com esse emprego a produção subisse de 100 para 115 o consumo de 90 para 100 e o investimento líquido de 10 para 15 poderíamos então pro pornos talvez modificar de tal maneira a propensão a consumir que com o pleno emprego o consumo subisse de 90 para 103 e o investimento líquido de 10 para 12 V Outra corrente de pensamento encontra a solução para o ciclo econômico não no aumento do consumo ou do investimento mas na diminuição da oferta de mãodeobra que procura emprego isto é al terando a distribuição do volume atual de emprego sem aumentar o emprego nem a produção Isto me parece uma política prematura muito mais claramente que o plano de aumentar o consumo Chega um momento em que todo o indivíduo pondera as vantagens de um aumento de lazer com as de um aumento de renda mas parece claro que atualmente a grande OS ECONOMISTAS 302 maioria dos indivíduos prefere um aumento de renda a um aumento de lazer e não vejo razões válidas para obrigar os que preferem mais renda a gozarem de maior lazer VI Pode parecer estranho que exista uma corrente de pensamento que tenha como remédio para o ciclo econômico refrear o auge da ex pansão em suas primeiras manifestações por meio de uma elevação da taxa de juros O único argumento que pode legitimar semelhante política é o que nos oferece D H Robertson quando pretende dizer que o pleno emprego é um ideal praticamente irrealizável e que quando muito nos é lícito esperar um nível de emprego bem mais estável que o atual e talvez ligeiramente superior à média Se excluirmos a possibilidade de uma reforma profunda da política no que concerne tanto ao controle do investimento quanto ao da pro pensão a consumir e supusermos em linhas gerais uma continuação do estado de coisas existente não me parecerá absurdo argumentar que se conseguiria em média um estado mais favorável da expectativa através de uma política bancária que destruísse sempre no embrião o início de um período de auge da expansão por meio de uma taxa de juros suficientemente alta para desencorajar o otimismo mal dirigido A desilusão quanto às expectativas característica da depressão pode acarretar tanta perda e desperdício que o nível médio de investimentos úteis poderia ser mais elevado se fosse aplicado algum método dissua sivo É difícil assegurar se esta doutrina é ou não correta em suas hipóteses pois se trata de uma questão de apreciação prática em que faltam os elementos de certeza Talvez ela não considere as vantagens sociais derivadas do aumento do consumo que acompanha até mesmo os investimentos que se mostram totalmente mal orientados tendose em vista que tais investimentos podem ser mais vantajosos do que a sua ausência total Não obstante a autoridade monetária mais lúcida se encontraria em dificuldades diante de uma expansão como a da América em 1929 não tendo outras armas além das que dispunha naquele tempo o Sistema de Reserva Federal e nenhuma das alter nativas ao seu alcance lograria modificar muito os resultados Seja como for semelhante opinião pareceme perigosa e inutilmente derro tista Recomenda ou pelo menos supõe para a aceitação permanente demasiadas características que são imperfeitas no nosso sistema eco nômico atual O ponto de vista austero que preconiza a utilização de uma taxa de juros elevada para deter imediatamente qualquer tendência de ele vação apreciável no nível de emprego digamos além da média da década anterior apóiase com mais freqüência em argumentos desti tuídos de outra base que não seja a confusão das idéias Decorre em certos casos da crença de que numa expansão o investimento tende KEYNES 303 a ultrapassar a poupança e de que uma alta da taxa de juros resta belecerá o equilíbrio contrariando o investimento por um lado e es timulando a poupança por outro lado Isso supõe que a poupança e o investimento podem ser desiguais e carece portanto de significação enquanto estes termos não forem definidos nalgum sentido especial Ou sugere algumas vezes que o aumento da poupança que acompanha o investimento crescente não é desejável nem justo porque se acha via de regra associado a uma alta de preços Se assim fosse porém qualquer elevação no nível prevalecente da produção e do emprego deveria ser considerada indesejável pois a alta de preços não se deve essencialmente ao acréscimo no investimento mas ao fato de no curto prazo o preço de oferta geralmente crescer ao aumentar a produção quer em razão do fato físico dos rendimentos decrescentes quer porque o custo unitário tende a subir em termos nominais quando a produção aumenta Se a situação se caracterizasse por um preço de oferta cons tante não haveria naturalmente elevação de preços não obstante isso como nos outros casos a poupança crescente acompanharia o acrés cimo do investimento É o incremento da produção que provoca o au mento da poupança a alta de preços não passa de um subproduto desse incremento que também ocorre quando é a propensão a consumir e não a poupança que aumenta Nenhum interesse constituído legítimo pode exigir que as compras se efetuem a preços baixos exclusivamente porque a produção está baixa Supõese também que o mal seja devido ao fato de o aumento do investimento ter tido origem numa baixa do juro provocada por um aumento na quantidade de moeda Ora a taxa de juros preexistente não apresenta nenhuma virtude intrínseca e tampouco ninguém é for çado a reter o novo dinheiro ele é criado com o fim de satisfazer a maior preferência pela liquidez correspondente à menor taxa de juros ou ao maior volume de transações e é retido pelos indivíduos que preferem conservar dinheiro a emprestálo a uma taxa de juros mais reduzida Sugerese ainda que uma expansão é caracterizada pelo consumo de capital o que provavelmente significa investimento lí quido negativo isto é por uma excessiva propensão a consumir A não ser que se tenham confundido os fenômenos do ciclo econômico com os da fuga ou recusa em reter dinheiro que se verificaram na Europa durante os colapsos monetários posteriores à Guerra os fatos indicam exatamente o contrário Além disso mesmo que assim fosse uma re dução na taxa de juros seria um remédio mais plausível para as con dições de subinvestimento do que a elevação dessa taxa Não consigo encontrar nenhum sentido nessas correntes de pensamento salvo tal vez admitindo a hipótese tácita de que a produção agregada seja in capaz de variar Todavia uma teoria que supõe uma produção constante evidentemente não é de muita utilidade para explicar o ciclo econômico OS ECONOMISTAS 304 VII Nos primeiros estudos sobre o ciclo econômico especialmente nos de Jevons a explicação foi colocada nas flutuações agrícolas devidas às estações mais do que nos fenômenos da indústria À luz da teoria acima esta explicação do problema parece bastante plausível porque mesmo na época atual as flutuações de um ano para outro dos estoques de produtos agrícolas constituem uma das causas principais das va riações do investimento corrente Entretanto na época em que Jevons escreveu e mais ainda durante o período a que se referem as suas estatísticas este fator prevaleceu de maneira considerável sobre todos os demais A teoria de Jevons de que o ciclo econômico se deve primordial mente à abundância desigual das colheitas pode ser reexposta da ma neira que segue Quando a colheita é excepcionalmente farta em geral fazse uma adição importante ao estoque conservado para os anos fu turos Os resultados desta adição acrescentamse à renda corrente dos agricultores e são considerados por estes como uma renda enquanto esse incremento não implica sangria nos gastos que os outros setores da comunidade fazem senão quando financiados pela poupança Quer isto dizer que o estoque suplementar é uma adição ao investimento corrente Esta conclusão não se invalida mesmo que os preços sofram uma queda acentuada De maneira semelhante quando a colheita é escassa recorrese aos estoques armazenados para atender ao consumo corrente de maneira que uma parte correspondente dos gastos que os consumidores fazem de suas rendas não cria nenhum rendimento cor rente para os agricultores Quer isto dizer que o que se retira dos estoques implica uma redução correspondente no investimento corrente Nestas condições se o investimento nos outros ramos da produção for constante pode ser grande a diferença no investimento agregado entre um ano em que haja uma adição substancial aos estoques e outro em que haja uma redução substancial dos mesmos e numa comunidade onde a agricultura seja a atividade predominante este fator será in comparavelmente mais importante que as outras causas de variação do investimento É portanto natural que a reversão das fases ascen dentes seja indicada por boas colheitas e a das descendentes pelas colheitas más O passo seguinte dessa teoria segundo a qual existiriam causas físicas que motivam um ciclo regular de boas e más colheitas é naturalmente assunto diferente que não nos cabe tratar aqui Segundo uma teoria proposta mais recentemente seriam as más colheitas e não as boas que estimulariam o comércio porque incitam a população a trabalhar por um salário real menor ou porque se con sidera que uma mudança na distribuição da capacidade aquisitiva seja favorável ao consumo É desnecessário dizer que não são estas as teorias KEYNES 305 a que recorro ao fazer a descrição anterior dos fenômenos das colheitas como uma explicação do ciclo econômico As causas agrícolas das flutuações têm uma importância muito menor no mundo moderno e isso por duas razões Em primeiro lugar a produção agrícola representa uma parcela muito pequena da produção total Em segundo lugar o desenvolvimento de um mercado mundial para a maior parte dos produtos agrícolas que se abastece nos dois hemisférios faz com que em média se neutralizem os efeitos das boas e das más estações sendo a porcentagem de flutuação sobre o volume das colheitas mundiais muito menor que a porcentagem de flutuação correspondente às dos países individualmente Nos tempos antigos porém quando um país dependia principalmente de suas próprias co lheitas é difícil encontrar alguma causa de flutuação do investimento excetuandose a guerra que pudesse compararse em importância às variações nos estoques de produtos agrícolas Ainda hoje é importante prestar maior atenção ao papel que re presentam as variações nos estoques de matériasprimas tanto agrí colas como minerais na determinação da taxa de investimento corrente Eu atribuiria a lenta marcha da recuperação de uma depressão uma vez alcançado o ponto de reversão principalmente ao efeito deflacio nário da baixa dos estoques redundantes aos seus volumes normais A princípio a acumulação de estoques que marca o fim da expansão modera a velocidade do colapso mas temos de pagar mais tarde esse alívio com a lentidão da marcha subseqüente da recuperação Sucede às vezes que a recuperação não se faça sentir de maneira apreciável senão quando a reabsorção dos estoques tenha sido virtualmente con cluída pois um fluxo de investimento em outras direções bastante para produzir um movimento ascendente quando não haja desinvesti mento atual nos estoques para neutralizálo pode ser inteiramente inadequado enquanto persistir esse desinvestimento Vimos no meu entender nas primeiras fases do New Deal ame ricano um exemplo notável deste fenômeno Quando o Presidente Roo sevelt encetou substanciais despesas cobertas por empréstimos os es toques de todas as espécies e notadamente os de produtos agrícolas alcançavam ainda um nível muito alto O New Deal consistiu par cialmente num esforço enérgico para reduzir esses estoques por meio de restrições à produção e por todos os outros meios A redução dos estoques a um nível normal era um processo necessário ou uma fase que tinha de ser suportada mas enquanto durou a saber por um ou dois anos significou substancial anulação dos gastos financiados com empréstimos que ocorreram em outros tempos Só quando essa fase se completou ficou aberto o caminho para sua recuperação substancial A experiência recente dos Estados Unidos da América proporcio nou também bons exemplos do papel que as flutuações dos estoques de produtos acabados ou não acabados de inventários como é OS ECONOMISTAS 306 costume chamálos agora exercem na causação das oscilações me nores que se sobrepõem ao movimento principal do ciclo econômico Os fabricantes quando estabelecem a escala de produção segundo o volume de consumo que prevêem para alguns meses mais tarde sujeitamse a cometer pequenos erros de cálculo geralmente no sen tido de adiantarse um pouco aos fatos Quando eles descobrem o erro são obrigados por algum tempo a manterse num nível de produção inferior ao do consumo corrente de modo que se produza a absorção dos inventários excedentes e a diferença de ritmo entre adiantarse um pouco e atrasar outra vez tem demonstrado influir bastante no fluxo de investimento corrente para se destacar com bastante nitidez no quadro das excelentes e completas estatísticas de que agora dispõem os Estados Unidos KEYNES 307 CAPÍTULO 23 Notas Sobre o Mercantilismo as Leis Contra a Usura o Dinheiro Carimbado e as Teorias do Subconsumo I Durante cerca de duzentos anos tanto os teóricos da economia como os homens de negócios foram unânimes em admitir que uma balança comercial favorável tinha vantagens especiais e uma balança desfavorável constituía grave perigo sobretudo quando provocava a saí da de metais preciosos Nos últimos cem anos porém surgiu uma séria divergência de opiniões Na maioria dos países quase todos os estadistas e homens de bom senso e mesmo na GrãBretanha berço da concepção oposta quase a metade deles se manteve fiel à antiga doutrina ao passo que os teóricos da economia em sua maioria afir mam que as preocupações desta ordem carecem de fundamento salvo se adotarmos um ponto de vista muito limitado visto o mecanismo do comércio externo ser de ajuste automático e as tentativas para dirigilo serem não apenas fúteis mas também de natureza a empobrecerem quem as pratica por anularem as vantagens da divisão internacional do trabalho Será conveniente de acordo com a tradição chamar a velha corrente de opinião de mercantilismo e a mais recente de livre comércio embora estes termos devam interpretarse com referência ao contexto pois cada um deles tem um sentido amplo e outro restrito Falando em termos gerais os economistas modernos sustentam não só que há via de regra um saldo positivo resultante da divisão internacional do trabalho que se sobrepõe às vantagens que razoavel mente poderia reivindicar a escola mercantilista mas também que o raciocínio da escola mercantilista se fundamenta do princípio ao fim numa confusão intelectual Marshall165 por exemplo embora nem todas as suas referências 309 165 Ver Industry and Trade Apêndice D Money Credit and Commerce p 130 e Principles of Economics Apêndice I ao mercantilismo sejam adversas abstémse de examinar como tal a sua teoria básica e nem sequer menciona os elementos de verdade que nela podem ser encontrados conforme examinaremos mais adiante166 Da mesma forma as concessões teóricas que os economistas partidários do livrecomércio concordaram em fazer nas controvérsias contempo râneas sobre por exemplo o estímulo às indústrias nascentes ou a melhoria dos termos do comércio não interessam à própria substância do pensamento mercantilista Durante as discussões fiscais do primeiro quartel deste século não recordo que nenhuma concessão jamais tenha sido feita pelos economistas ao princípio de que a proteção pode au mentar o emprego num país Talvez o mais justo seja citar como exem plo o que eu mesmo escrevi Ainda em 1923 como discípulo fiel da escola clássica que de modo algum punha em dúvida o que me havia sido ensinado e tudo aceitava sem reserva sobre esta matéria escrevi Se há uma coisa que a Proteção não pode fazer é suprimir o Desemprego Existem em favor da Proteção alguns argumentos baseados em vantagens possíveis embora improváveis para os quais não há resposta fácil Mas pretender que ela cure o De semprego implica o sofisma Protecionista em sua forma mais crua e grosseira167 Quanto à teoria mercantilista mais antiga não se dispunha de uma interpretação inteligente e fomos levados a acreditar que se tratava de coisa praticamente sem nenhum sentido Tal era o domínio soberano e absoluto que exercia a escola clássica II Desejo expor em primeiro lugar o que agora me parece haver de verdade científica na doutrina mercantilista Em seguida compara remos essa exposição com os argumentos efetivamente empregados pe los mercantilistas Devese ter presente que as vantagens proclamadas são confessadamente de caráter nacional e têm pouca probabilidade de beneficiar o mundo em seu conjunto Quando uma nação está aumentando a sua riqueza com certa rapidez sucede que em regime de laissezfaire este feliz estado de coisas pode ser interrompido por insuficiência de estímulo para novos investimentos Dados o meio social e político e as características na cionais que determinam a propensão a consumir o bemestar de uma OS ECONOMISTAS 310 166 Sua opinião sobre os mercantilistas está bem resumida na nota à primeira edição de sua obra Principles p 51 Numerosos estudos foram dedicados na Inglaterra e na Alemanha às idéias da Idade Média sobre as relações entre a moeda e a riqueza nacional Em geral devem ser considerados confusos por falta de uma idéia clara das funções da moeda mais do que julgados falsos por serem baseados na hipótese explícita de que o aumento das reservas de metais preciosos é a única coisa que pode aumentar a riqueza de uma nação 167 The Nation and the Athenaeum 24 de novembro de 1923 JMK v XVIII nação progressiva depende essencialmente pelas razões já expostas da suficiência de tais estímulos Estes podem ser encontrados tanto nos investimentos internos quanto nos externos incluindo nos últimos a acumulação de metais preciosos que juntos compõem o investimento agregado Se o volume de investimento agregado apenas obedece ao motivo de lucro a taxa de juros nacional é que acaba governando o volume dos investimentos internos enquanto o saldo credor da balança comercial determina necessariamente o volume do investimento ex terno Assim sendo numa sociedade onde não exista possibilidade de inversão direta sob a égide da autoridade pública os objetivos econô micos que devem legitimamente preocupála são a taxa de juros interna e o balanço do comércio exterior Ora se a unidade de salários for relativamente estável e não ficar sujeita a variações espontâneas de grande amplitude condição esta que quase sempre se satisfaz se o estado da preferência pela liquidez apresentar certa estabilidade no decorrer de suas flutuações a curto prazo e se as práticas bancárias forem também bastante es táveis a taxa de juros tenderá a depender do montante de metais preciosos medido em unidades de salários disponível para satisfazer o desejo de liquidez da comunidade Ao mesmo tempo numa era em que os empréstimos substanciais no estrangeiro e a propriedade direta dos bens situados no exterior são dificilmente praticáveis as altas ou baixas na quantidade de metais preciosos dependerão principalmente do caráter favorável ou desfavorável da balança comercial Ocorre assim que a preocupação das autoridades por uma ba lança comercial favorável serviu a ambos os propósitos e foi além disso o único meio disponível de promovêlos Numa época em que essas autoridades não tinham controle direto sobre a taxa de juros interna nem sobre os outros estímulos para o investimento nacional as medidas para aumentar o saldo favorável da balança comercial eram o único meio direto de que dispunham para aumentar o investimento externo ao mesmo tempo as entradas de metais preciosos resultantes de uma balança comercial favorável eram os únicos meios indiretos de reduzir a taxa de juros interna e aumentar assim o estímulo para inversões dentro do país O êxito de tal política entretanto está sujeito a duas limitações que não devem ser esquecidas Se a taxa de juros interna descer tanto que o volume de investimento seja suficientemente estimulado para elevar o emprego para além do nível crítico no qual a unidade de salários se eleva o aumento do nível interior de custos começará a exercer uma ação desfavorável sobre a balança de comércio externo de maneira que o esforço para melhorar esta balança terá ido longe demais e se anulará a si mesmo Por seu turno se a diferença entre a taxa de juros interna e externa for bastante grande para provocar empréstimos externos desproporcionados com a balança favorável pode KEYNES 311 resultar daí um êxodo de metais preciosos suficiente para anular as vantagens anteriormente obtidas O risco de qualquer destas limitações se tornar realidade quando se trata de um país grande e de importância internacional com produção corrente de metais preciosos em escala relativamente pequena é devido ao fluxo de dinheiro para um país e ao êxodo de dinheiro em outro os efeitos adversos dos custos crescentes e das taxas de juros decrescentes no mercado doméstico podem por tanto acentuarse caso a política mercantilista seja amplamente exe cutada pelos custos decrescentes e as taxas de juros ascendentes no exterior A história econômica da Espanha nos fins do século XV e durante o século XVI fornecenos o exemplo de um país cujo comércio externo foi destruído pela elevação da taxa de salários resultante de uma ex cessiva abundância de metais preciosos A GrãBretanha nos anos do século XX anteriores à Guerra proporcionanos o exemplo de um país onde as excessivas facilidades concedidas aos empréstimos externos e a compra de propriedades no estrangeiro impediram freqüentemente a queda da taxa doméstica de juros necessária para assegurar o pleno emprego no país A história da Índia em todos os tempos fornece o exemplo de um país empobrecido por uma preferência pela liquidez motivada por uma paixão tão forte que apesar de um afluxo enorme e permanente de metais preciosos a taxa de juros não pôde baixar a um nível compatível com o crescimento da riqueza real Não obstante isso se considerarmos uma sociedade com uma unidade de salário mais ou menos estável e com características nacio nais suficientes para determinar a propensão a consumir e a preferência pela liquidez e com um sistema monetário que relacione de maneira rígida a quantidade de moeda com os estoques de metais preciosos a manutenção da prosperidade exige que as autoridades observem de muito perto o estado da balança comercial porque uma balança fa vorável desde que não excessiva pode ser um grande estímulo ao passo que uma balança desfavorável pode levar rapidamente a um estado de depressão persistente Isto não significa que uma restrição máxima das importações conduza a uma balança comercial mais favorável Os primeiros mer cantilistas enfatizaram muito este ponto e muitas vezes chegaram a opor as restrições comerciais porque com o tempo essas restrições viriam a obstar uma balança favorável Podese sem dúvida argumentar que nas circunstâncias especiais em que se achava a GrãBretanha nos meados do século XIX a liberdade comercial quase absoluta era a política mais adequada a levar a uma balança favorável A experiência contemporânea de restrições comerciais na Europa de pósguerra ofe rece numerosos exemplos de impedimentos mal concebidos contra a liberdade que destinados a melhorar a balança favorável produziram de fato o resultado inverso OS ECONOMISTAS 312 Por estas e outras razões o leitor não deve tirar conclusões pre maturas relativamente à política prática a que conduz o nosso racio cínio Há fortes presunções de caráter geral contra as restrições co merciais a menos que elas possam ser justificadas por razões especiais As vantagens da divisão internacional do trabalho são reais e subs tanciais apesar de a escola clássica as ter exagerado enormemente O fato de uma vantagem proporcionada a um país por uma balança favorável acarretar um prejuízo igual causado a outro país fato de que os mercantilistas tinham plena consciência não significa apenas que se torna necessária uma grande moderação para que nenhum país retenha um estoque de metais preciosos superior à sua parte legítima e razoável mas também que uma política imoderada pode desencadear uma absurda competição internacional por uma balança favorável no civa para todos sem exceção168 E finalmente a política de restrições comerciais é um instrumento perigoso mesmo quando utilizado para os seus objetivos ostensivos visto que os interesses particulares a incompetência administrativa e a dificuldade intrínseca da tarefa po dem desviála e levála a produzir resultados diretamente opostos aos pretendidos Assim sendo o peso de minha crítica é dirigido contra a inade quação das bases teóricas da doutrina do laissezfaire que me foi en sinada e que eu ensinei durante muitos anos contra a idéia de que a taxa de juros e o volume de investimentos se ajustam automaticamente ao nível ótimo de modo que toda a preocupação com a balança comercial seja uma perda de tempo pois nós professores de Economia nos tornamos culpados do presunçoso erro de considerar obsessão pueril o que durante séculos foi o objetivo principal da arte prática de governar Sob a influência desta teoria falha a City de Londres gradual mente desenvolveu a técnica mais perigosa que se possa imaginar para a manutenção do equilíbrio ou seja a de associar a técnica da taxa bancária com uma paridade rígida do câmbio Isto significou que o objetivo de manter uma taxa interna de juros compatível com o pleno emprego foi totalmente excluído Em se considerando que não era pos sível na prática ignorar o balanço de pagamentos forjouse um meio para o dirigir que em vez de preservar a taxa doméstica de juros o abandonou à ação de forças cegas Nos últimos anos os banqueiros de Londres aprenderam muito e quase se pode ter certeza de que a técnica da taxa bancária não será novamente usada na GrãBretanha para proteger a balança externa em circunstâncias em que seja possível causar o desemprego no país KEYNES 313 168 O remédio constituído por uma taxa de salários elástica permitindo combater a depressão por uma baixa dos salários apresenta pela mesma razão o inconveniente de só nos beneficiar à custa de nossos vizinhos Considerada uma teoria da empresa individual e da distribuição do produto resultante do emprego de um volume de recursos a teoria clássica forneceu ao pensamento econômico uma contribuição que não se pode negar É impossível ter idéias claras sobre este assunto sem considerar teoria como parte do nosso mecanismo mental Não quero dar a impressão de que estou negando a mesma quando chamo a aten ção para a omissão que ela cometeu ignorando a parte de verdade contida nas teorias anteriores Todavia como contribuição para a arte prática de governar que se preocupa com o sistema econômico em conjunto e tenta empregar ao máximo a totalidade dos recursos deste sistema os métodos dos pioneiros do pensamento econômico dos séculos XVI e XVII podem ter captado certos fragmentos de sabedoria prática que as abstrações irreais de Ricardo começaram por esquecer para depois obliterar Havia sabedoria em sua intensa preocupação de man ter reduzida a taxa de juros por meio de leis de usura às quais vol taremos para novas considerações mais adiante neste capítulo defen dendo o estoque doméstico de moeda e desestimulando a alta da taxa de salários assim como na sua predisposição para restaurar como único recurso os estoques de moeda por meio da desvalorização quando se tinham tornado francamente deficientes graças a uma drenagem irresistível para o exterior à elevação da taxa de salários169 ou a qual quer outra coisa III É possível que os primeiros precursores do pensamento econômico tenham adotado suas máximas de sabedoria prática sem estar muito cientes das bases teóricas em que elas repousavam Examinemos rapi damente os motivos que eles deram assim como o que recomendaram Isto nos é facilitado fazendo referência à grande obra do professor Hecks cher sobre o Mercantilismo na qual pela primeira vez as características especiais do pensamento econômico durante dois séculos são colocadas ao alcance do leitor comum de Economia As citações que se seguem foram em sua maior parte tiradas das páginas desse livro170 1 O pensamento mercantilista nunca supôs que houvesse uma OS ECONOMISTAS 314 169 A experiência que remonta pelo menos ao tempo de Sólon e que provavelmente poderia recuar ainda a muitos séculos se dispuséssemos de estatísticas indicanos o que o conhe cimento da natureza humana nos levaria a esperar ou seja que há uma tendência constante da taxa de salários para a alta através de longos períodos que somente pode ser reduzida em pleno declínio e dissolução das sociedades econômicas Assim sendo por motivos intei ramente independentes do progresso técnico e do aumento da população é indispensável que o estoque monetário aumente gradualmente 170 Elas vão perfeitamente se adequar à minha proposição porque o próprio prof Heckscher e em termos gerais partidários da teoria clássica simpatizam com as teorias mercantilistas bem menos do que eu Não há portanto risco algum de que a escolha das citações tenha sido preconcebida com o desejo de mostrar sua sabedoria tendência para o ajuste automático através do qual a taxa de juros se fixasse ao nível apropriado Pelo contrário enfatizou que uma taxa indevidamente alta era o maior obstáculo ao desenvolvimento da ri queza e os mercantilistas haviam também compreendido que a taxa de juros dependia da preferência pela liquidez e da quantidade de moeda Eles se empenharam ao mesmo tempo em diminuir a prefe rência pela liquidez e aumentar a quantidade de moeda e muitos deles declararam que a sua preocupação em aumentar a quantidade de moeda era devida ao desejo de fazerem baixar a taxa de juros O professor Heckscher resume este aspecto de sua teoria da maneira seguinte A posição dos mercantilistas mais perspicazes era neste ponto como em tantos outros perfeitamente clara dentro de certos li mites Para eles o dinheiro era empregando a terminologia atual um fator de produção equiparado à terra às vezes qua lificado de riqueza artificial para o distinguir da natural e o juro do capital era um pagamento pelo uso do dinheiro seme lhante à renda do solo À medida que os mercantilistas se esfor çavam por encontrar razões objetivas para a elevação da taxa de juros o que fizeram cada vez mais no decorrer desse período basearam essas razões no volume total da quantidade de moe da Do abundante material disponível apenas os exemplos mais típicos serão escolhidos para demonstrar antes de mais nada quanto essa idéia tinha raízes profundas e era alheia a qualquer consideração prática Ambos os protagonistas da polêmica que se deflagrou na In glaterra a respeito da política monetária e do comércio das Índias Orientais no início da década de 1620 estavam plenamente de acordo nesse ponto Gerard Malynes afirmava baseandose numa argumentação minuciosa que a abundância de dinheiro diminui a usura dos preços e das taxas Lex Mercatoria e Maintenance of Free Trade 1622 Seu truculento e pouco escrupuloso adver sário Edward Misselden replicava que o remédio para a Usura pode residir na abundância de dinheiro Free Trade or the Meanes to make Trade Florish do mesmo ano Entre os escritores no táveis meio século mais tarde Child onipotente dirigente e o mais hábil advogado da Companhia das Índias Orientais discutiu 1688 a questão da medida em que a limitação legal da taxa de juros que ele reclamava com insistência contribuiria para ex pulsar da Inglaterra o dinheiro dos holandeses Ele encontrou o remédio para esta grave desvantagem no expediente mais fácil da transferência dos títulos de dívida quando eram usados à guisa de dinheiro pois isso dizia ele poderia certamente suprir uma boa metade do numerário disponível utilizado no país Petty KEYNES 315 um outro autor situado inteiramente à margem dos interesses em conflito achavase de acordo com o resto dos autores para explicar pelo aumento do estoque monetário a baixa natural do juro de 10 para 6 Political Arithmetick 1676 e para aconselhar o empréstimo a juros como remédio adequado para um país com excessiva abundância de moeda corrente Quantulumcumque concerning Money 1682 Esta maneira de pensar não era como se poderia esperar restrita à Inglaterra Alguns anos depois 1701 e 1706 os negociantes e estadistas franceses por exemplo queixavamse da escassez de moeda disette des espèces existente como sendo a causa da elevação da taxa de juros e esforçavamse por fazer baixar essa taxa de usura aumentando a circulação da moeda171 O grande Locke foi talvez o primeiro a expressar em termos abstratos a relação existente entre a taxa de juros e a quantidade de moeda em sua controvérsia com Petty172 Opunhase à proposição de Petty de uma taxa máxima de juros sustentando que ela era tão im praticável como a de fixar uma renda máxima para a terra em se considerando que o Valor natural do Dinheiro dada a sua aptidão para fornecer uma Renda anual sob a forma de Juro depende da relação entre a quantidade global do Dinheiro circulante no Reino e o Comércio total do Reino isto é a Venda total de todas as mercadorias173 Locke explica que a moeda tem dois valores 1 o valor de uso que é determinado pela taxa de juros e nisto adquire a Natureza da Terra sendo o Rendimento de um chamado Renda e do outro Uso174 e 2 o de troca e nisto adquire a Natureza de uma Mercadoria sendo que seu valor de troca depende unicamente da Abundância ou Escassez de Moeda em proporção com a Abundância ou Escassez dos produtos e não do que será Juro Destarte Locke foi o pai de teorias quanti tativas gêmeas Em primeiro lugar ele afirmou que a taxa de juros depende da proporção entre a quantidade de moeda levando em conta a sua velocidade de circulação e o valor total das transações Em segundo lugar sustentou que o valor de troca da moeda dependia da proporção entre a quantidade de moeda e o volume total de bens no mercado Porém com um pé no mundo mercantilista e outro no OS ECONOMISTAS 316 171 HECKSCHER Mercantilism v II pp 200201 de forma ligeiramente resumida 172 Some Considerations of the Consequences of the Lowering of Interest and Raising the Value of Money 1692 porém escrito alguns anos antes 173 Ele acrescenta Não apenas da quantidade de moeda como também da sua velocidade de circulação 174 Sendo o termo uso naturalmente a velha forma inglesa para denominar o juro mundo clássico 175 confundiuse no que respeita à relação entre estas duas proporções e desconsiderou completamente a possibilidade das flutuações na preferência pela liquidez Contudo ele mostrouse ávido em explicar que a baixa da taxa de juros não tem nenhuma influência direta sobre o nível dos preços e só os afeta à medida que as Variações do Juro Comercial provocam a entrada ou saída de Dinheiro ou Mer cadorias alterando assim com o tempo a Proporção antes existente na Inglaterra isto é se a redução da taxa de juros leva à exportação de numerário ou a um aumento da produção Porém ele nunca chegou na minha opinião a uma síntese genuína176 A facilidade com que o pensamento mercantilista distinguia entre a taxa de juros e a eficiência marginal do capital é ilustrada numa passagem publicada em 1621 que Locke cita de A Letter to a Friend concerning Usury O Juro elevado arruína o Comércio As vantagens do Juro são maiores que o Lucro do Comércio o que leva os Comerciantes ricos a retirarse colocando seus Haveres a Juros e os Comer ciantes menores à Falência Fortrey Englands Interest and Improvement 1663 oferece outro exem plo dessa importância afirmando que uma taxa de juros é um fator de aumento de riqueza Os mercantilistas não ignoravam o fato de que quando uma pre ferência excessiva pela liquidez desvia para o entesouramento o influxo de metais preciosos a vantagem para a taxa de juros desaparece Em alguns casos por exemplo Mun o objetivo de reforçar o poder do Estado levouos não obstante a advogar a acumulação de um tesouro governamental Porém outros opuseramse francamente a essa política Schötter por exemplo empregava os argumentos habituais KEYNES 317 175 Hume alguns anos depois tinha pé e meio no mundo clássico pois introduziu entre os economistas a prática de dar à posição de equilíbrio mais importância do que às situações sempre cambiantes que a ela conduziam embora ainda fosse bastante mercantilista para não ignorar o fato de que a nossa existência real se encontra na transição É unicamente neste intervalo ou situação intermediária entre a aquisição de moeda e uma alta de preços que o aumento dos estoques de ouro e prata se mostra favorável à indústria Não importa absolutamente à prosperidade interna de um Estado que o dinheiro exista em maior ou menor quantidade A boa política do magistrado consiste apenas em conserválo se for possível ainda em aumento porque é assim que se mantém o espírito empreendedor da nação e se aumenta a atividade do trabalho no qual se encontram todo o poderio e riqueza reais Uma nação cujo dinheiro diminui é realmente neste momento mais fraca e miserável do que outra que não possui mais dinheiro mas que esteja em vias de aumentálo Ensaio On Money 1752 176 Isto serve para mostrar o total esquecimento em que caiu a idéia mercantilista de que o ouro significa juro sobre o dinheiro idéia que agora se me afigura indubitavelmente correta conforme se expressou o prof Heckscher como bom economista clássico resumindo sua exposição da teoria de Locke O raciocínio de Locke seria irrefutável se o juro fosse sinônimo do preço do dinheiro emprestado mas como não é assim esse raciocínio é intei ramente irrelevante Op cit v II p 204 dos mercantilistas para pintar um sombrio quadro de como a circulação dentro do país se veria defraudada de todo o dinheiro em conseqüência de um incremento excessivo de tesouro do Es tado e estabelece também paralelo perfeitamente lógico entre a acumulação de tesouros por parte dos mosteiros e a exportação das sobras de metais preciosos que eram para ele a pior coisa que se pode imaginar Davenant discorreu sobre a extrema po breza de muitas nações orientais que passam por ter mais ouro e prata que qualquer outro lugar do mundo com base no fato de elas suportarem que esses tesouros ficassem estag nados nas Arcas dos Príncipes Sendo o entesouramento do Estado considerado na melhor das hipóteses de utilidade duvi dosa e muitas vezes apresentado como um grave perigo tornase evidente que o entesouramento privado era evitado como a peste Foi essa uma das tendências contra as quais numerosos autores mercantilistas clamaram em altos brados e não parece que tenha havido uma única voz discordante177 2 Os mercantilistas estavam cientes do erro que implica a baixa de preços e do perigo de que uma concorrência exagerada venha a ser nociva à relação de intercâmbio de um país Por isso Malynes escreveu em sua obra Lex Mercatoria 1622 Não procureis em detrimento da Comunidade vender mais ba rato que os outros com o pretexto de aumentar o comércio pois o comércio não se desenvolve quando as mercadorias são muito ba ratas porque a barateza resulta da módica procura e da escassez de dinheiro que tornam as coisas baratas pelo contrário é quando existe abundância de dinheiro que as mercadorias sendo procuradas se tornam mais caras que o comércio aumenta178 O professor Heckscher assim resume esta faceta do pensamento mercantilista Durante século e meio formulouse repentinamente este ponto de vista dizendo que um país relativamente menos rico que os outros países é obrigado a vender barato e comprar caro Esta atitude já se manifestava desde a edição original da obra Discourse of the Common Weal ou seja nos meados do século XVI Hales dizia com efeito E mesmo que os estrangeiros se limitassem a tomar apenas as nossas mercadorias em troca das suas que é que os impediria de fazer subir os preços das outras coisas o que significa entre outras as que nós lhes com OS ECONOMISTAS 318 177 HECKSCHER Op cit v II pp 210211 178 HECKSCHER Op cit v II p 228 pramos apesar da barateza das que lhes vendemos E deste modo continuaríamos sendo lesados e eles acabariam por sobre pujarnos vendendo caro o seu e comprando barato o nosso e conseqüentemente enriquecendose enquanto nós nos empobre cemos Por isso me parece preferível aumentar como fazemos agora o preço das nossas mercadorias à medida que eles aumen tam o preço das deles embora alguns saiam perdendo não seriam tantos como aconteceria com outro método Neste ponto recebeu a plena aprovação de seu editor algumas décadas mais tarde 1581 No século XVII esta mesma atitude ressurgiu sem apre sentar nenhuma mudança no seu significado Desta maneira Ma lynes entendia que esta situação indesejável resultava do que ele temia acima de tudo a saber a subestimação da troca inglesa no estrangeiro Este mesmo conceito viuse repetido conti nuamente Em seu Verbum Sapienti escrito em 1665 e publicado em 1691 Petty opinava que os violentos esforços para aumentar a quantidade de moeda só deixariam de ser necessários quando tivermos certamente mais dinheiro que os nossos Estados Vizi nhos por pequenos que sejam tanto em proporção Aritmética como em proporção Geométrica No período que decorreu entre a preparação e a publicação desse livro Coke declarou Se o nosso Tesouro fosse maior que o das nossas Nações Vizinhas pouco me importa se tivéssemos uma quinta parte do Tesouro que temos atualmente 1675179 3 Os mercantilistas deram origem à proposição que atribuía as causas do desemprego ao medo dos bens e à escassez de dinheiro proposição esta que dois séculos depois os clássicos denunciaram como sendo um absurdo Um dos primeiros exemplos da aplicação do argumento do desemprego para proibir as importações ocorreu em Florença no ano de 1426 A legislação inglesa nesta matéria remonta pelo menos a 1455 Um decreto francês quase contemporâneo dessa de 1466 e que foi a base da indústria da seda em Lyon tão famoso mais tarde oferece menos interesse por não ser dirigido realmente contra mercadorias estrangeiras Mas também nele se mencionava a possibilidade de dar trabalho a dezenas de milhares de homens e mulheres desempregados Por aí se vê como nesse tempo aquela idéia andava no ar Esta questão como a maioria dos problemas econômicos e sociais foi pela primeira vez seriamente discutida na Inglaterra KEYNES 319 179 HECKSCHER Op cit v II p 235 nos meados do século XVI ou um pouco antes nos reinados de Henrique VIII e Eduardo VI A tal respeito não podemos deixar de mencionar uma série de escritos que parecem datar no má ximo da década de 1530 e dois dos quais pelo menos são atri buídos a Clement Armstrong Neles por exemplo o tema é assim formulado Em virtude da grande abundância de gêneros e mercadorias introduzidos anualmente na Inglaterra verificou se como causa não apenas a escassez da moeda como ainda a ruína de todos os ofícios em que a grande massa do povo poderia encontrar trabalho e tirar dele o dinheiro para pagar a comida e a bebida em vez de ficar reduzida como hoje a viver na ocio sidade a mendigar e a roubar180 O melhor exemplo que conheço de uma discussão tipicamente mercantilista em torno desta situação é o debate relativo à es cassez da moeda que se verificou na Câmara dos Comuns inglesa em 1621 por ocasião de uma grave crise especialmente nas ex portações de tecidos A situação foi exposta com a maior clareza por um dos membros mais influentes do Parlamento Sir Edwin Sandys Ele declarou que os agricultores e artesãos atravessavam uma situação difícil em quase toda a parte que os teares estavam parados por falta de dinheiro no país e que os camponeses se achavam na impossibilidade de cumprir seus contratos não lou vado seja Deus por falta dos frutos da terra mas por falta de dinheiro O fato levou a minuciosas investigações no sentido de averiguar para onde teria ido o dinheiro cuja escassez se fazia sentir tão amarguradamente Numerosos ataques foram dirigidos às pessoas suspeitas de terem contribuído para a exportação dos metais preciosos saldo de exportação ou para seu desapareci mento por meio de operações correspondentes dentro do país181 Os mercantilistas estavam cientes de que sua política conforme a expressão do professor Heckscher matava dois coelhos com uma cajadada De um lado livrarase o país de um indesejável excedente de mercadorias que se acre ditava ser a causa do desemprego e do outro aumentavase o estoque de dinheiro existente182 o que resultava na vantagem de fazer baixar a taxa de juros É impossível estudar as idéias a que foram arrastados os mer cantilistas pelas suas experiências concretas sem perceber que a pro pensão a economizar apresenta uma tendência crônica ao longo de OS ECONOMISTAS 320 180 HECKSCHER Op cit v II p 122 181 HECKSCHER Op cit v II p 223 182 HECKSCHER Op cit v II p 178 toda a história da humanidade a ser maior que o incentivo a investir A fraqueza da propensão a investir tem sido em todos os tempos a chave do problema econômico É possível que hoje a explicação dessa fraqueza esteja na importância dos capitais acumulados ao passo que antigamente os riscos e perigos de toda a espécie talvez tenham re presentado um papel mais importante Porém o resultado é o mesmo O desejo do indivíduo de aumentar sua fortuna pessoal abstendose de consumir tem sido geralmente mais forte que a tendência do em presário para aumentar a riqueza nacional empregando mãodeobra na produção de bens duráveis 4 Os mercantilistas não tinham a menor ilusão a respeito do caráter nacionalista de sua política e de sua tendência a promover a guerra Era a vantagem nacional e a força relativa que abertamente procuravam183 Podemos criticarlhes a aparente indiferença com que aceitavam esta conseqüência inevitável de um sistema monetário internacional Mas intelectualmente seu realismo é muito preferível às idéias confusas dos contemporâneos que advogam um padrãoouro internacional fixo e o laissezfaire em matéria de crédito internacional que acreditam ser justamente estas políticas as mais favoráveis à manutenção da paz Porque numa economia sujeita a contratos e costumes monetários mais ou menos fixos por um período de tempo apreciável na qual a moeda em circulação e a taxa de juros interna dependem principal mente do balanço de pagamentos como era o caso da GrãBretanha antes da Guerra as autoridades não dispõem de meios ortodoxos para combater o desemprego no país a não ser por um excesso de exportação e uma importação de metal monetário à custa de seus vizinhos Nunca a história registrou método mais eficaz que o padrãoouro internacional ou antigamente o da prata para que um país obtenha alguma van tagem sobre seus vizinhos Pois ele fez com que a prosperidade interna dependesse diretamente do resultado de uma luta pela posse dos mer cados e pela competição acirrada por metais preciosos Quando por um feliz acaso as novas provisões de ouro e prata eram comparativa mente abundantes a luta podia arrefecerse um pouco Mas com o incremento da riqueza e a diminuição da propensão marginal a con sumir tendeu a ser cada vez mais destrutivo para ambos os lados O papel desempenhado pelos economistas ortodoxos cujo senso comum não bastou para equilibrar a sua lógica deficiente foi desastroso até KEYNES 321 183 Inteiramente o mercantilismo perseguia fins amplamente dinâmicos Porém esta concepção conjugavase com uma idéia estática quanto à economia mundial em sua totalidade pois a isto se deve a criação do desacordo fundamental que motivou as intermináveis guerras comerciais Tal foi o drama do mercantilismo A Idade Média com seu ideal universal estático e o laissezfaire com seu ideal universal dinâmico evitaram esta conseqüência HECKSCHER Op cit v II pp 2526 o fim Pois quando alguns países no seu cego esforço para encontrar uma forma de evasão renegaram as obrigações que anteriormente impossibilitaram a existência de uma taxa de juros autônoma esses economistas ensinaram que a restauração das antigas algemas era o primeiro passo necessário para a recuperação geral Na realidade o oposto é que é verdadeiro Uma política de taxas de juros autônomas isenta de qualquer preocupação interna cional e de um programa de investimentos domésticos com vista ao nível máximo de emprego interno é duplamente salutar no sen tido de que nos ajuda ao mesmo tempo a nós e a nossos vizinhos E é a busca simultânea destas duas políticas em todos os países que pode restaurar internacionalmente a estabilidade e a força econômicas quer as meçamos pelo nível de emprego interno quer pelo volume de comércio internacional184 IV Os mercantilistas perceberam a existência do problema porém não foram capazes de levar a sua análise até o ponto de resolvêlo Mas a escola clássica ignorou este problema por ter introduzido em suas pre missas condições incompatíveis com sua existência cujo resultado foi o afastamento das conclusões da teoria econômica e as do bom senso A extraordinária realização da teoria clássica foi sobreporse às crenças do homem natural e ao mesmo tempo estar equivocada O professor Hecks cher expressouse sobre o assunto da seguinte maneira O fato de as idéias subjacentes relativas à moeda e à sua substância não terem variado desde as Cruzadas até o século XVIII prova que estamos diante de idéias fortemente enraizadas Talvez mesmo essas idéias tenham persistido além do referido período de quinhentos anos embora com muito menos força que a idéia do medo às mercadorias Excetuando o período do laissezfaire talvez nenhuma outra época tenha escapado a essas idéias Só a tenacidade verdadeiramente singular do laissezfaire pôde sobrepujar por algum tempo as crenças do homem natural nesse ponto185 Foi preciso todo o fanatismo doutrinário do laissezfaire para eliminar a idéia do medo às mercadorias que é na economia monetária a atitude mais compreensível do homem natural O Livrecomércio negava a existência de fatores que pareciam evi dentes e estava condenado ao descrédito na opinião do homem OS ECONOMISTAS 322 184 A consistente apreciação desta verdade pelo International Labour Office primeiro no tempo de Albert Thomas e depois no de H B Butler destacouse de maneira notável entre as declarações publicadas pelos numerosos organismos internacionais de pósguerra 185 HECKSCHER Op cit v II pp 176177 da rua a partir do momento em que o laissezfaire não mais fosse capaz de manter os espíritos acorrentados à sua ideologia186 Recordo a mistura de irritação e de perplexidade que se apoderava de Bonar Law perante os economistas pelo fato de negarem o que era óbvio Ele se mostrava ávido por uma explicação Recorrese à analogia entre o poder da escola clássica e o de certas religiões pois é a maior prova da força de uma idéia esconjurar a evidência do que introduzir nas idéias comuns do homem o recôndito e o remoto V Resta um assunto relacionado com isto embora diferente que durante séculos talvez mesmo por milênios ilustrou a opinião tida como certa e evidente de uma doutrina que a escola clássica repudiou como pueril mas que merece reabilitação e honras Refirome à doutrina de que a taxa de juros não se ajusta por si mesma ao nível mais adequado ao ótimo social antes tende constantemente a ele varse demais de tal modo que um governo prudente procura res tringila pela legislação e pelo costume e até mesmo invocando as sanções da lei moral As disposições contra a usura encontramse entre as práticas econômicas mais antigas de que temos memória Na Antiguidade e na Idade Média consideravase a liquidação do estímulo para investir sob o efeito de uma excessiva preferência pela liquidez como o maior dos males constituindo o principal obstáculo ao desenvolvimento da rique za O que era natural já que certos riscos e azares da vida econômica reduzem a eficiência marginal do capital ao passo que outros reforçam a preferência pela liquidez Em um mundo que ninguém considerava seguro era quase inevitável que a taxa de juros se não fosse reduzida por todos os meios de que a sociedade dispunha subisse demais para tornar possível um atrativo adequado para investir Eu fui educado na crença de que a atitude da Igreja na Idade Média para com a taxa de juros era inerentemente absurda e que os sutis argumentos visando distinguir entre o rendimento dos emprés timos monetários e a renda dos investimentos ativos não passavam de recursos jesuísticos para encontrar uma saída prática para uma teoria insensata Hoje entretanto esses argumentos parecemme um esforço intelectual honesto para conservar separado o que a teoria clás sica misturou de modo inextrincavelmente confuso a saber a taxa de juros e a eficiência marginal do capital Agora vêse claramente que as indagações dos escolásticos se destinavam a encontrar uma fórmula que permitisse à curva da eficiência marginal do capital ser elevada KEYNES 323 186 Op cit v II p 335 ao mesmo tempo que aplicavam os regulamentos os costumes e a lei moral para manter uma taxa de juros baixa O próprio Adam Smith mostrouse enormemente moderado na sua atitude com relação às leis contra a usura Ele bem sabia que as poupanças individuais podem ser absorvidas tanto pelos investimentos como pelas dívidas e que não há certeza de encontrar saída nos pri meiros Além disso ele foi a favor de uma baixa da taxa de juros pelo fato de aumentar a possibilidade de uma saída para a poupança em novos investimentos em vez de encontrála nas dívidas por essa razão numa passagem que lhe valeu ser severamente criticado por Bent ham187 recomenda uma aplicação moderada das leis contra a usura188 Ademais as críticas de Bentham incidiam principalmente sobre o rigor excessivo com que a prudência escocesa de Adam Smith abordava os precursores e sobre o fato de que uma taxa de juros máxima pouca margem deixaria para remunerar os riscos legítimos e socialmente recomendáveis Bentham entendeu por precursores todas as pessoas que perseguindo a riqueza ou mesmo qualquer outro objetivo se es forçam com a ajuda da riqueza por abrir novos caminhos à invenção todas as pessoas que seguindo qualquer dos seus propósitos tentam realizar o que pode ser chamado de aperfeiçoamento Tratase em resumo de toda a aplicação das forças humanas nas quais o engenho tem de recorrer à ajuda da riqueza Naturalmente Bentham protesta com razão contra as leis que impedem correr os riscos legítimos Nestas condições acrescenta Bentham nenhum homem prudente procurará escolher entre os bons e os maus projetos porque não se envolverá em projeto algum189 Podese perguntar se o que ficou dito corresponde exatamente à idéia que Adam Smith quis dar ao termo Ou será que estamos ouvindo em Bentham embora escrevendo em março de 1787 de Crichoff in White Russia a voz da Inglaterra do século XIX falando à do século XVIII Isso porque única e exclusivamente a exuberância que carac terizou a época culminante do atrativo para investir poderia esquecer a possibilidade teórica de sua insuficiência VI Convém mencionar neste ponto o estranho e injustificadamente esquecido profeta Silvio Gesell 18621930 cuja obra contém centelhas OS ECONOMISTAS 324 187 Em sua Letter to Adam Smith em apêndice a sua Defence of Usury 188 Wealth of Nations Livro Segundo Cap IV 189 Visto que comecei a citar Bentham neste contexto devo recordar ao leitor sua melhor passagem A carreira da arte a grande senda por onde caminham os precursores pode considerarse uma vasta e talvez limitada planície toda coberta de abismos como aquele pelo qual foi engolido Cúrsio Cada um reclama que uma vítima humana nele se precipite antes de fecharse mas quando se fecha é para não mais abrir e deste modo grande parte do caminho fica seguro para os que prosseguem de profunda percepção e esteve a ponto de alcançar a essência do pro blema Durante os anos do pósguerra seus admiradores me bombar dearam com exemplares de seus livros contudo por causa de certos defeitos palpáveis de argumentação fui completamente incapaz de des cobrirlhes os méritos Como freqüentemente acontece nos casos de intuições imperfeitamente analisadas seu significado só se me tornou claro quando cheguei por meus próprios meios a minhas próprias conclusões Nesse intervalo pareceume como a outros economistas acadêmicos que os seus esforços profundamente originais pouco maior atenção mereciam que a obra de um demente Como é provável que poucos leitores deste livro tenham bastante consciência sobre a impor tância de Gesell dedicarlheei um espaço que de outro modo pareceria exagerado Gesell foi um próspero comerciante alemão190 de Buenos Aires levado ao estudo dos problemas monetários pela crise dos últimos anos da década de 1880 que na Argentina foi especialmente violenta seu primeiro trabalho Die Reformation im Münzwesen als Brücke zum socialen Staat foi publicado em Buenos Aires em 1891 Suas idéias fundamentais sobre a moeda foram publicadas em Buenos Aires no mesmo ano com o título de Nervus Rerum a que se seguiram muitos livros e folhetos até que ele se aposentou e foi para a Suíça em 1906 como homem de certas posses capaz de dedicar as últimas décadas de sua existência às duas ocupações mais agradáveis para quem não precisa ganhar a vida ser autor e agricultor experimental A primeira parte de sua obra básica foi publicada em 1906 em Les Hauts Geneveys Suíça com o título Die Verwirklichung des Rechtes auf dem vollen Arbeitsertrag e a segunda Die neue Lehre vom Zins em 1911 em Berlim Ambas foram reunidas em um só volume publi cado em Berlim e na Suíça durante a Guerra 1916 tendo alcançado seis edições em vida do autor com o título de Die natürliche Wirts chaftsordnung durch Freiland und Freigeld a tradução inglesa feita por Philip Pye recebeu o título The Natural Economic Order Em abril de 1919 Gesell participou do efêmero gabinete soviético da Baviera como ministro da Fazenda tendo sido posteriormente julgado por um conselho de guerra Passou seus últimos dez anos de vida em Berlim e na Suíça entregue à propaganda Gesell atraindo para si o fervor quase religioso que antes cercara Henry George tornouse o profeta venerado de um culto com muitos milhares de discípulos em todo o mundo O primeiro congresso internacional da FreilandFreigeld Bund Suíça e alemã e de organizações análogas de muitos países celebrouse em Basiléia em 1923 Após sua morte em 1930 grande parte do fervor típico que suscitam doutrinas como as suas desviouse para outros KEYNES 325 190 Nascido perto da fronteira de Luxemburgo de pai alemão e mãe francesa profetas menos eminentes na minha opinião O Dr Büchi é o chefe do movimento na Inglaterra mas as publicações parecem provir de San Antonio Texas sua maior força parece estar hoje nos Estados Unidos onde o professor Irving Fisher é o único entre os economistas dos círculos acadêmicos que lhe reconheceu a importância Apesar da pompa profética com que o ornaram seus admiradores o livro mais importante de Gesell foi escrito em linguagem serena e científica embora esteja impregnado do princípio ao fim de uma de voção apaixonada e emotiva pela justiça social que alguns consideram excessiva num cientista A parte que deriva de Henry George191 que sem dúvida muito contribuiu para a força do movimento é em geral de interesse secundário Podese dizer que o intuito do livro como um todo é o estabelecimento de um socialismo antimarxista uma reação contra o laissezfaire empregando bases teóricas inteiramente diferentes das de Marx visto que mais se apóiam no repúdio do que na aceitação das hipóteses clássicas e a liberação da concorrência em vez de sua abolição Creio que o futuro terá mais a aprender do espírito de Gesell que do de Marx O leitor que consultar o prefácio de The Natural Economic Order poderá apreciar o valor moral de Gesell É nesse pre fácio no meu entender que se pode encontrar a resposta ao marxismo A contribuição específica de Gesell para a teoria da moeda e do juro é a seguinte em primeiro lugar ele distingue claramente a taxa de juros da eficiência marginal do capital e afirma ser a taxa de juros a que marca um limite ao crescimento do capital real Mostra depois que a taxa de juros é um fenômeno puramente monetário que a pe culiaridade da moeda da qual emana a importância da taxa monetária de juros reside no fato de sua posse como meio de acumular riqueza impor a quem a tem despesas de manutenção desprezíveis e que ri quezas comportando despesas de manutenção apreciáveis como os es toques de mercadorias dão de fato um rendimento que se deve ao padrão estabelecido pela moeda Cita a comparativa estabilidade da taxa de juros através dos tempos como prova de que ela não pode depender de fatores puramente físicos porque as variações destes úl timos de uma época para outra devem ter sido incalculavelmente maiores do que as observadas na taxa de juros isso quer dizer na minha terminologia que a taxa de juros que depende de fatores psi cológicos constantes permaneceu estável ao passo que os fatores mais instáveis que primordialmente atuam sobre a curva da eficiência mar ginal do capital não fixaram aquela taxa mas a proporção segundo a qual a taxa de juros mais ou menos dada permite aumentar os estoques de capital real Há porém um grande defeito na teoria de Gesell Ele demonstra OS ECONOMISTAS 326 191 Gesell diverge de George ao recomendar o pagamento de indenizações em caso de nacio nalização da terra que é unicamente por existir uma taxa monetária de juros que se pode obter um rendimento do empréstimo de estoques de mercadorias Seu diálogo entre Robinson Crusoé e um estrangeiro192 é uma excelente parábola econômica tão boa como qualquer das que se escreveram para evidenciar este ponto Porém tendo exposto as razões pelas quais a taxa monetária de juros ao contrário da maioria das taxas de juros de mercadorias não pode ser negativa esquece por completo a necessidade de explicar por que a taxa monetária de juros é positiva e não consegue demonstrar que não é o nível fixado pelo rendimento do capital produtivo que governa a taxa monetária de juros como sustenta a escola clássica Isso porque a noção de preferência pela liquidez escapoulhe Ele formulou apenas pela metade uma teoria da taxa de juros O caráter incompleto de sua teoria explicase sem dúvida pelo fato de sua obra ter sido ignorada pelos meios acadêmicos Contudo ele aprofundoua suficientemente para levála a uma recomendação prática que talvez contenha a essência das soluções necessárias embora não aplicável na forma que ele propôs Sustenta que o crescimento do capital real é contido pela taxa monetária de juros e que se esse obstáculo fosse eliminado esse crescimento no mundo moderno seria tão rápido que decerto justificaria uma taxa de juros igual a zero se não imediatamente pelo menos num prazo relativamente curto Desse modo a necessidade primordial consiste em reduzir a taxa monetária de juros e isso conforme ele indicou pode conseguirse obrigando o dinheiro a suportar despesas de manutenção iguais às que incidem sobre outros estoques de bens improdutivos Isto levouo à famosa pres crição da moeda carimbada a que está associado sobretudo o seu nome e que recebeu o beneplácito do professor Irving Fisher De acordo com sua proposta as notas em circulação e é claro que pelo menos certas formas de moeda bancária deveriam ser submetidas a esse re gime somente conservariam o seu valor se fossem carimbadas todos os meses como um cartão de seguro com estampilhas adquiridas em repartições como as do correio O custo dessas estampilhas seria fixado naturalmente em dada cifra conveniente De acordo com a minha teo ria esse prêmio deveria ser aproximadamente igual ao excedente da taxa monetária de juros excluindose as estampilhas sobre a eficiência marginal do capital correspondente ao fluxo de investimentos novos compatível com o pleno emprego O ônus sugerido por Gesell era de 1 por mil semanal equivalente a 52 ao ano Isso seria demasiado alto nas condições atuais mas a cifra correta que deveria ser modi ficada de tempos a tempos só se alcançaria por tentativas e erros A idéia em que se baseia a moeda carimbada é válida É possível KEYNES 327 192 The Natural Economic Order p 297 et seqs encontrar meios de aplicála em escala restrita Ela porém apresenta numerosas dificuldades que Gesell não considerou Em particular ele não percebeu que o dinheiro não é o único bem com propriedade de levar consigo um prêmio de liquidez que apenas difere em grau de muitos outros tirando sua importância do fato de possuir um prêmio de liquidez maior que qualquer outro Destarte se as notas em circu lação viessem a ser isentas do dito prêmio de liquidez pelo sistema de carimbo diversos tipos de sucedâneos viriam tomarlhes o lugar moeda bancária títulos à vista moeda estrangeira pedras e metais preciosos e assim por diante Como disse antes houve épocas em que sem dúvida o desejo de possuir terra independentemente de seu ren dimento contribuiu para manter elevada a taxa de juros embora no sistema de Gesell essa possibilidade fosse eliminada pela naciona lização da terra VII As teorias que examinamos antes referemse em substância ao elemento constitutivo da demanda efetiva que depende da suficiência do atrativo para investir Não é novidade entretanto atribuir o de semprego à insuficiência do outro elemento ou seja à insuficiência da propensão a consumir Mas esta outra explicação dos males econômicos atuais igualmente impopulares com os economistas clássicos re presentou um papel bem menos importante no pensamento dos séculos XVI e XVII e só adquiriu força em épocas relativamente recentes Embora as queixas contra o subconsumo fossem um aspecto bas tante secundário do pensamento mercantilista o professor Heckscher cita numerosos exemplos do que chama a arraigada crença na utilidade do luxo e na nocividade da parcimônia A parcimônia de fato era considerada a causa do desemprego por duas razões primeira por se julgar que a quantidade de moeda que não entrava na troca diminuía a renda real e segunda por se achar que a poupança retirava dinheiro de circulação193 Em 1598 Laffemas Les Trésors et Richesses pour Mettre lEstat en Splendeur combateu os adversários do uso de sedas francesas afirmando que os compradores de artigos de luxo franceses proporcionavam aos pobres meios de subsistência ao passo que os avarentos os faziam morrer de miséria194 Em 1662 Petty justificava as festas os espetáculos de gala os arcos do triunfo etc alegando que os seus custos entravam nos bolsos dos cervejeiros padeiros al faiates sapateiros e outros Fortrey aprovava o excesso de indumen tária Von Schrötter 1686 atacou os regulamentos suntuários e de clarou desejar que houvesse ainda mais fausto nas roupas e nos outros OS ECONOMISTAS 328 193 HECKSCHER Op cit v II p 208 194 Op cit v II p 290 elementos de ostentação Barbon 1690 escreveu que a Prodigalidade é um vício prejudicial ao Homem mas não aos negócios a Avareza um Vício prejudicial tanto ao Homem como aos Negócios195 Em 1695 Cary afirmou que se toda gente gastasse mais todos obteriam maiores rendimentos e poderiam viver com mais abundância196 Mas foi a Fable of the Bees de Bernard Mandeville que mais contribuiu para vulgarizar a opinião de Barbon sendo este livro de clarado subversivo pelo grande júri de Middlesex em 1723 e a sua escandalosa reputação marcalhe um lugar na história das ciências morais Registrase que apenas um homem teve palavras de elogio a seu respeito ou seja o dr Johnson o qual reconheceu que a obra longe de o estarrecer lhe abrira enormemente os olhos para a vida real A natureza da malignidade do livro pode ser melhor apreciada no resumo de Leslie Stephen no Dictionary of National Biography Mandeville cometeu uma grande ofensa com este livro no qual um cínico sistema de moralidade se torna atraente por meio de engenhosos paradoxos Sua doutrina de que os gastos con tribuem mais para a prosperidade do que a poupança coincidia com muitos sofismas econômicos em curso nessa época e que ainda não desapareceram inteiramente197 Supondo com os as cetas que os desejos humanos são essencialmente maus e por tanto dão origem a vícios privados e admitindo a opinião comum de que a riqueza é um benefício público ele demonstrou facil mente que toda a civilização implica o desenvolvimento de pro pensões viciosas O conteúdo da obra Fable of the Bees constitui um poema alegórico Os Burburinhos da Colméia ou os Velhacos transformados em honestos em que se descreve a espantosa situação de uma comu nidade próspera na qual repentinamente todos os cidadãos resolvem renunciar à vida luxuosa e o Estado reduzir os armamentos no interesse da Poupança Agora não é mais questão de Honra considerar Para poder viver e dever o que se tem gastar Librés à mostra nas lojas de penhor Carruagens a vil preço entregues sem pudor Vender cavalos e casas de campo é uma das saídas KEYNES 329 195 Op cit v II p 291 196 Op cit v II p 209 197 Em sua obra History of English Thought in the Eighteenth Century Stephen escreveu p 297 falando do sofisma tornado célebre por Mandeville que a sua completa refutação reside na doutrina tão raramente entendida que a sua plena compreensão é talvez a melhor prova para um economista de que a demanda de bens não constitui uma demanda de trabalho Para se desfazer das dívidas contraídas Os custos vãos e Fraude moral têmse de evitar Quando as Forças já se perderam no AlémMar Desdenhe a Estima dos Estrangeiros E a vã Glória conquistada por Guerreiros Eles combatem somente pela Pátria amada Quando o Direito e a Liberdade são reduzidos ao nada A altiva Cloé Reduza os gastos com esforço insano E use Vestes que durem todo o Ano E qual o resultado Quem agora a gloriosa Colméia contemplar Pode o acordo entre a Honestidade e o Comércio examinar Não há mais Fausto e o triste desenlace É um outro Ente com uma outra Face Pois não foram só eles a desaparecer Após esbanjar por anos quantias de estarrecer Mas as Multidões cuja vida deles dependia Faziam o mesmo pela força impelidas todo o dia Debalde procuraram outra Ocupação Porém de nada valeu sua desesperada ação E os preços das Casas e da Terra se tornaram aviltados E os sólidos Muros dos Palácios encantados Como os de Tebas erguidos por Magia Vão ser alugados O mister da Construção ao abandono relegado E o Artesão se encontra desempregado Quem pinta vê sua Arte condenada à Morte Quem lavra a pedra e entalha tem a mesma Sorte Portanto A Moral é Nenhuma Nação só de Virtude pode viver Em Esplendor E para renascer A Idade de Ouro há de aceitar O Vício e a Virtude no mesmo lugar As duas passagens extraídas do comentário que acompanham a alegoria mostram que não faltou base teórica ao que foi dito antes Como esta prudente economia que algumas pessoas chamam OS ECONOMISTAS 330 Poupança é nas famílias particulares o método mais certo de aumentar os patrimônios há quem imagine que seja um país estéril ou fértil o mesmo método que supõem praticável terá efeitos idênticos se for seguido por toda a nação e que por exem plo os ingleses poderiam ser muito mais ricos do que são se fossem tão frugais como alguns dos seus vizinhos Isto na minha opinião é um erro198 Pelo contrário Mandeville conclui A grande arte para tornar uma nação feliz e o que chamamos florescente consiste em dar a cada um a oportunidade de estar empregado e para isso alcançar o primeiro cuidado de um go verno deve ser promover toda a espécie de Manufaturas Artes e Ofícios que a criatividade humana possa inventar o segundo estimular a Agricultura e a Pesca em todos os seus ramos a fim de que a Terra inteira seja como o Homem levada a contribuir É por esta Política e não pela fútil regulamentação da Prodiga lidade e da Frugalidade que se pode esperar a grandeza e a felicidade das Nações porque suba ou desça o valor do Ouro e da Prata a satisfação de todas as Sociedades sempre dependerá dos Frutos da Terra e do Trabalho dos Homens coisas que juntas compõem um Tesouro mais firme mais inexaurível e mais real que o Ouro do Brasil ou a Prata de Potosi Não é de admirar que sentimentos tão perversos tenham sido do opróbrio de dois séculos de moralistas e economistas que se sentiam mais virtuosos na posse de sua austera doutrina segundo a qual fora da mais rigorosa economia tanto da parte dos indivíduos como do Estado não pode haver salvação As festas os espetáculos de gala os arcos de triunfo etc de Petty deram lugar à economia de vinténs da finança de Gladstone e a um sistema de estado que não era capaz de custear hospitais parques públicos ou edifícios majestosos nem sequer conservar os seus monumentos antigos e muito menos favorecer o esplendor da música e do teatro coisas que se confiavam à caridade privada ou à liberalidade de particulares imprevidentes Esta doutrina não reapareceu nos círculos respeitáveis senão ao cabo de um século quando na última fase de Malthus a noção da insu ficiência da demanda efetiva assumiu lugar definido como explicação cien tífica do desemprego Visto já haver tratado deste assunto com certa profundidade no meu ensaio sobre Malthus199 será suficiente repetir aqui uma ou duas passagens características citadas neste meu ensaio KEYNES 331 198 Compareo com Adam Smith o precursor da escola clássica que escreveu O que é prudência na conduta de uma família privada pode ser insensatez na de um grande reino prova velmente referindose à anterior passagem de Mandeville 199 Essays in Biography pp 139147 JMK v X pp 97103 Vemos em quase todas as partes do mundo imensas forças produtivas que não entram em ação e explico este fenômeno dizendo que por falta de uma boa distribuição dos produtos exis tentes não há motivos adequados para continuar a produzir Sustento firmemente que o esforço de acumular muito depressa implica uma diminuição considerável do consumo improdutivo e deve enfraquecendo muito os motivos habituais da produção le var a uma prematura estagnação o progresso da riqueza Porém se é certo que o esforço de acumular muito depressa pro voca entre o trabalho e o lucro uma divisão de tal natureza que faz desaparecer quase completamente o motivo e o meio de en riquecer no futuro e conseqüentemente elimina a possibilidade de manter e empregar uma população crescente não se deve reconhecer que semelhante afã de acumular ou poupar dema siadamente pode ser realmente prejudicial a um país200 A questão está em saber se esta estagnação do capital e a subseqüente estagnação da procura de mãodeobra devida a um aumento da produção não acompanhado de um aumento adequa do de consumo improdutivo por parte dos proprietários de terra e dos capitalistas pode verificarse sem causar prejuízo ao país sem ocasionar uma diminuição no grau de felicidade e de riqueza em relação ao que existiria se o consumo improdutivo dos pro prietários de terra e capitalistas fosse tão bem proporcionado aos excedentes naturais da sociedade que mantivesse perfeita conti nuidade nos motivos da produção evitando primeiro uma pro cura anormal de trabalho e em seguida uma diminuição neces sária e repentina dessa demanda Porém se assim fosse como seria certo dizer que a parcimônia embora possivelmente preju dicial aos produtores não pode ser para o Estado ou que um aumento do consumo improdutivo dos proprietários de terra e capitalistas pode não ser às vezes o remédio específico para um estado de coisas em que falhem os motivos que impulsionam a produção201 Adam Smith afirmou que a parcimônia aumenta o capital que todo o homem frugal é um benfeitor público e que o cresci mento da riqueza depende do excesso da produção sobre o con sumo Que estas proposições sejam em grande parte verdadeiras é indiscutível Mas é evidente que não são verdadeiras em termos absolutos e que os princípios da poupança levados ao extremo destruiriam o motivo para a produção Se cada um se contentasse com o alimento mais simples a roupa mais singela e a casa mais humilde é certo que não existiriam outras espécies de alimentos OS ECONOMISTAS 332 200 Uma carta de Malthus a Ricardo datada de 7 de julho de 1821 201 Uma carta de Malthus a Ricardo datada de 16 de julho de 1821 de roupas e de casas Os dois extremos são evidentes e daí se deduz que há de existir algum ponto intermediário embora os recursos da economia política não permitam determinálo em que levadas em conta a capacidade produtiva e a vontade de consumir o motivo para aumentar a riqueza é máximo202 De todas as opiniões que encontrei de homens capazes e inteligentes a de Say afirmando que un produit consommé ou détruit est un débouché fermé I i cap 15 pareceme ser a mais diretamente contrária à teoria certa e a mais unifor memente em desacordo com a experiência Mesmo assim ela é uma conseqüência direta da nova doutrina de que os bens só devem considerarse em suas relações diretas mútuas e não com os consumidores O que pergunto eu seria da procura de bens se todo o consumo excetuando o do pão e o da água fosse suspenso durante a próxima metade de ano Que acu mulação de mercadorias Quels débouchés Que prodigioso mer cado faria surgir esse evento203 Ricardo no entanto mantevese completamente surdo às obser vações de Malthus O derradeiro eco da controvérsia achase na expo sição de John Stuart Mill de sua teoria do fundo de salários204 que no seu entender foi de importância fundamental na sua rejeição da última fase de Malthus fiel aos princípios em que naturalmente se tinha educado Os sucessores de Mill rejeitaram a sua teoria do fundo de salários mas não perceberam o fato de que sua refutação de Malthus dependia dela O método consistia em afastar o problema do corpus da economia não buscando sua solução mas deixando de o mencionar E ele desapareceu por completo da controvérsia Cairncross que re centemente lhe procurou vestígios entre as figuras secundárias da época vitoriana205 encontrou talvez menos ainda do que poderia esperar206 As teorias do subconsumo limitaramse a hibernar até a aparição em 1889 da obra The Physiology of Industry de J A Hobson e A F Mummery o primeiro e o mais significativo de muitos volumes nos quais durante cerca de cinqüenta anos o professor Hobson se atirou com denodo mas também sem êxito contra as hostes da ortodoxia KEYNES 333 202 Prefácio aos Principles of Political Economy de Malthus pp 8 e 9 203 MALTHUS Principles of Political Economy p 363 nota de rodapé 204 MILL J S Political Economy Livro Primeiro cap V Há uma análise muito aprofundada e importante desta parte da teoria de Mill em MUMMERY e HOBSON Physiology of Industry p 38 et seq e particularmente de sua doutrina de que uma demanda de bens não é uma demanda de trabalho doutrina que Marshall procurou refutar em sua análise bem pouco satisfatória da teoria do fundo de salários 205 The Victorians and Investiment In Economic History 1936 206 O opúsculo de Fullarton On the Regulation of Currencies 1844 é a mais interessante de suas referências Embora hoje tenha caído completamente no esquecimento a publi cação deste livro marca em certo sentido uma época no pensamento econômico207 The Physiology of Industry foi escrito em colaboração com A F Mummery Hobson conta deste modo como surgiu a idéia de es crever o livro208 Foi só nos meados da década de 1880 que minha heterodoxia econômica começou a adquirir forma Embora a campanha de Henry George contra os valores da terra e as primeiras agitações de vários grupos socialistas contra a manifesta opressão das clas ses trabalhadoras unidas às revelações dos dois Booths sobre a pobreza em Londres causassem profunda impressão em meus sentimentos não destruíram minha fé na Economia Política Es tes sentimentos surgiram de um encontro acidental Quando eu era professor de uma escola em Exeter travei relações com um homem de negócios chamado Mummery conhecido então e pos teriormente como um grande alpinista que descobrira uma nova trilha para o topo do monte Cervino e que em 1895 morreu na tentativa de escalar a famosa montanha Nanga Parbat do Hi malaia Minhas relações com ele não se estabeleceram natural mente neste plano físico Mas ele era ao mesmo tempo um alpinista mental dotado de natural aptidão para trilhar seu pró prio caminho e de uma sublime indiferença pela autoridade in telectual Esse homem arrastouse a uma discussão sobre a pou pança excessiva que ele considerava responsável pelo subempre go de capital e de mãodeobra em períodos de crise comercial Por muito tempo tentei combater seus argumentos empregando as armas da economia ortodoxa Mas por fim ele acabou conven cendome e junteime a ele para elaborar o conceito do excesso de poupança num livro intitulado The Physiology of Industry publicado em 1889 Foi este o primeiro passo efetivo que dei na minha carreira de herético e estava longe de suspeitar suas con seqüências Justamente nessa altura acabava de abandonar meu posto de mestre de escola e iniciava um novo trabalho como pro fessor de Extensão Universitária em Economia e Literatura O primeiro choque veio do Conselho de Extensão de Londres recusando darme permissão para ministrar cursos de Economia Política Isto se deveu conforme chegou ao meu conhecimento à intervenção OS ECONOMISTAS 334 207 ROBERTSON J M The Fallacy of Saving Obra publicada em 1892 sustenta a heresia de Mummery e Hobson Porém não é uma obra de grande valor ou importância carecendo inteiramente das penetrantes intuições de The Physiology of Industry 208 De uma conferência intitulada Confessions of an Economic Heretic pronunciada perante a London Ethical Society em Conway Hall no domingo 14 de julho de 1935 Transcrevoa aqui com a devida permissão de Hobson de um professor de Economia que lera o meu livro e o considerava como raciocínio equivalente a uma tentativa para demonstrar que a terra é plana Como poderia haver limites para o montante da poupança útil quando todo o ato de poupar contribuía para aumentar a estrutura do capital e o fundo destinado ao pagamento de salários Os economistas sensatos não podiam deixar de en carar com horror um argumento que procurava impedir a fonte de todo o progresso industrial209 Outra experiência interessante ajudoume a conceber a extensão de minha iniqüidade Apesar de me proibirem de ensinar Economia em Londres fui autorizado graças à extrema liberalidade do Movimento de Extensão Uni versitária de Oxford a fazer conferências nas Províncias limi tandome a problemas práticos sobre a vida da classe operária Sucedeu então que a Charity Organization Society projetava uma campanha com o intuito de abordar assuntos econômicos e convidoume a preparar um curso Eu expressei minha dispo sição a empreender esse novo trabalho quando bruscamente sem explicação alguma me foi retirado o convite Justamente naquela ocasião me foi difícil compreender que ao pôr em dú vida a excelência da frugalidade ilimitada eu cometera um pecado imperdoável Em sua obra inicial Hobson e seu colaborador expressaramse fazendo referência mais direta à economia clássica na qual Hobson havia sido educado do que em seus escritos posteriores por esta razão e também pelo fato de ser a primeira exposição de sua teoria extraí uma citação dessa obra para mostrar o quanto tinham de significativas e de bem fundadas as críticas e as intuições desses autores Como se vê em seguida eles destacaram em seu prefácio a natureza das con clusões que foram alvo de seu ataque A poupança enriquece e os gastos empobrecem a comunidade ao mesmo tempo que o indivíduo e podese afirmar de maneira geral que o apego efetivo ao dinheiro é a origem de todo o bem estar econômico Não só enriquece o indivíduo parcimonioso como também faz subir os salários proporciona trabalho aos desem pregados e espalha por toda parte os seus benefícios Desde os jornais diários até os mais recentes tratados de economia desde os púlpitos até a Câmara dos Comuns esta afirmação se renova de modo que se tornou quase uma heresia duvidar dela Não KEYNES 335 209 Hobson escreveu irreverentemente em The Physiology of Industry p 26 A parcimônia é a fonte da riqueza nacional e quanto mais frugal for uma nação mais rica se torna Isto é o que comumente ensinam quase todos os economistas muitos dos quais empregam um tom de alta dignidade moral ao defender o infinito valor da poupança é esta a única nota que cativou nos seus fastidiosos cantos a favor do ouvido público obstante até a publicação da obra de Ricardo a camada instruída da população apoiada pela maioria dos pensadores econômicos refutava energicamente esta doutrina e sua aceitação só se deveu exclusivamente e em última análise à sua incapacidade para enfrentar a hoje desacreditada doutrina do fundo de salários Só a autoridade indiscutível dos eminentes espíritos que a susten taram pode explicar com a exclusão de qualquer outra hipótese o fato de ela ter sobrevivido ao raciocínio em que se apoiava sua base lógica A crítica econômica ainda se aventurou a atacar certos detalhes da teoria mas recuou assustada antes de chegar a suas conclusões principais Nosso propósito é demonstrar que essas conclusões são indefensáveis que é possível haver uma prática exagerada do hábito de poupar e que semelhante hábito empo brece a Comunidade priva os trabalhadores de seus empregos provoca a baixa dos salários e espalha no mundo dos negócios a estagnação e o desânimo conhecidos pelo nome de Depressão Econômica O objetivo da produção é fornecer aos consumidores utili dades e comodidades e o processo segue seu fluxo contínuo desde as primeiras manipulações da matériaprima até o mo mento em que esta é consumida sob a forma de uma utilidade ou de uma conveniência Sendo a única função do Capital fa cilitar a produção dessas utilidades e conveniências seu total a empregar variará necessariamente com a quantidade das utilidades e das conveniências que se consomem diária e se manalmente Ora a poupança ao mesmo tempo que aumenta o estoque agregado de Capital reduz o volume das utilidades e das conveniências consumidas qualquer prática exagerada deste hábito levará portanto a uma acumulação de Capital superior àquela que se necessita e o excedente irá manifes tarse sob a forma de superprodução geral210 A origem do erro de Hobson aparece na última frase deste trecho ou seja ele supõe que a conseqüência de uma poupança é uma acu mulação real de capital superior às necessidades quando na realidade se trata de um mal secundário unicamente devido a previsões mal feitas sendo que o mal primordial reside na propensão a poupar em condições de pleno emprego somas superiores ao valor do capital re querido o que impede a realização do pleno emprego excetuando o caso de erro de previsão Contudo uma ou duas páginas adiante ele expõe metade do problema com uma precisão no meu modo de ver absoluta embora esquecendo ainda o possível papel das variações na OS ECONOMISTAS 336 210 HOBSON e MUMMERY Phisiology of Industry pp IIIV taxa de juros e o estado de confiança dos negócios fatores que pro vavelmente ele supõe como dados Chegamos assim à conclusão de que as bases nas quais se assentou o ensino econômico desde Adam Smith a saber que o volume da produção anual se determina pelas quantidades agre gadas disponíveis de Agentes Naturais Capital e Trabalho estão erradas e que pelo contrário sem poder ultrapassar o limite imposto por essas quantidades agregadas o volume da produção anual pode ser mantido e de fato se mantém abaixo do máximo pelo obstáculo que opõem à produção a poupança excessiva e a subseqüente acumulação de excedentes da oferta isto é no estado normal das Comunidades industriais modernas é o consumo que limita a produção e não a produção que limita o consumo211 Finalmente ele observa a posição de sua teoria relativamente à validez dos argumentos do livrecomércio ortodoxo Notamos também que a acusação de imbecilidade comercial tão freqüentemente arremessada pelos economistas ortodoxos contra os nossos primos americanos e outras Comunidades Pro tecionistas não pode mais apoiarse nos argumentos do Livreco mércio aduzidos até agora visto que todos se baseiam na hipótese da impossibilidade do excesso da oferta212 O argumento subseqüente é a bem dizer incompleto Tratase porém da primeira declaração explícita do fato de que o capital se forma não pela propensão a poupar mas como resposta à procura resultante do consumo real e provável As citações esparsas seguintes indicam a linha do raciocínio Deve ficar claro que não pode haver vantagem no aumento do capital de uma comunidade sem o crescimento subseqüente do consumo de mercadorias Cada aumento da poupança e do capital requer para ser eficaz uma elevação correspondente no consumo imediatamente futuro213 E quando falamos de consumo não queremos dizer dentro de dez vinte ou cinqüenta anos mas num futuro muito pouco afastado do presente Se o aumento da parcimônia ou da precaução induzir os indivíduos a poupar mais no presente eles têm de concordar em consumir mais no futuro214 Não pode existir economicamente mais capital em qualquer momento do processo produtivo que o exigido para pro KEYNES 337 211 HOBSON e MUMMERY Physiology of Industry p VI 212 Op cit p IX 213 Op cit p 27 214 Op cit pp 5051 porcionar bens no nível corrente de consumo215 É evidente que minha parcimônia em nada afeta a parcimônia econômica total da comunidade apenas determinando se uma parte específica da parcimônia total será praticada por mim ou por algum outro Mostraremos como a parcimônia de uma parte da comunidade pode forçar a outra parte a gastar mais para viver do que per mitem seus rendimentos216 A maior parte dos economistas mo dernos nega que o consumo possa em qualquer circunstância ser insuficiente Podemos descobrir alguma força econômica capaz de incitar uma comunidade a este excesso e se tal força existir o mecanismo do comércio não fornecerá meios eficazes de res tringila Demonstraremos em primeiro lugar que em toda so ciedade industrial bem organizada há em funcionamento cons tante uma força que induz naturalmente a um excesso de par cimônia e em segundo lugar que os obstáculos que supostamente cria o mecanismo do comércio são completamente inoperantes ou inadequados para evitar graves danos comerciais217 A concisa resposta de Ricardo aos argumentos de Malthus e Chalmers pa rece ter sido aceita pela maioria dos economistas de tempos mais recentes A produção comprase sempre com produção ou com serviços a moeda é apenas o meio utilizado para efetuar a troca Conseqüentemente sendo um aumento de produção acompanha do sempre de um aumento correspondente do poder de aquisição e de consumo não resta possibilidade de Superprodução Ri cardo Prin of Pol Econ p 362218 Hobson e Mummery sabiam que o juro não passa de um paga mento pelo uso do dinheiro219 Sabiam também perfeitamente que os seus opositores alegariam que haveria tão notável redução na taxa de juros ou do lucro suficiente para desestimular a poupança e res taurar a relação própria entre a produção e o consumo220 Em resposta a isso observam que a queda do Lucro só pode induzir as pessoas a poupar menos de duas maneiras induzindoas a gastar mais ou indu zindoas a produzir menos221 No que respeita à primeira sustentam que quando os lucros baixam a renda agregada da comunidade se reduz e não podemos supor que quando a renda média diminui os indivíduos sejam induzidos a aumentar o ritmo de seu consumo pelo OS ECONOMISTAS 338 215 Op cit p 69 216 Op cit p 113 217 Op cit p 100 218 Op cit p 101 219 Op cit p 79 220 Op cit p 117 221 Op cit p 130 fato de que também o prêmio à parcimônia diminui de forma corres pondente quanto à segunda maneira está muito longe de nossa in tenção negar que um decréscimo do lucro devido ao excesso de oferta possa ser um obstáculo à produção que o reconhecimento do papel deste obstáculo constitua a própria base do nosso raciocínio222 En tretanto sua tese não chegou a ser completa essencialmente por lhe faltar uma teoria independente da taxa de juros com o resultado de que Hobson põe demasiada ênfase notadamente em seus últimos livros no subconsumo que leva ao superinvestimento no sentido de investi mentos desvantajosos em vez de explicar que uma propensão relati vamente fraca a consumir contribui para causar o desemprego isso porque tal propensão deveria ser acompanhada e porque não recebe esse acompanhamento de um volume compensador de novo investi mento o qual embora algumas vezes ocorrendo temporariamente em conseqüência de erros de otimismo é geralmente impedido pela baixa do lucro esperado a um nível inferior ao fixado pela taxa de juros A partir da guerra houve um dilúvio de teorias heréticas de sub consumo das quais as mais famosas são as do major Douglas A força de argumentação do major Douglas provém aliás em grande parte do fato de a ortodoxia não ter resposta válida para muitas de suas críticas destrutivas Por outro lado os detalhes de seu diagnóstico em particular o teorema chamado A B contém grande parte de pura mistificação Se o major Douglas houvesse limitado a categoria B às reservas financeiras dos empresários a que não correspondem despesas correntes com substituições ou renovações estaria bem mais perto da verdade Mesmo nesse caso porém é necessário levar em conta que essas reservas podem ser contrabalançadas tanto por investimentos novos em outros setores como por aumento dos gastos de consumo O Major Douglas faz jus ao contrário de alguns de seus opositores or todoxos pelo menos ao mérito de não haver esquecido totalmente o problema essencial do nosso sistema econômico Em todo o caso não se lhe pode dar a mesma graduação soldado raso talvez mas não major do valoroso exército dos heréticos que a Mandeville Malthus Gesell e Hobson os quais fiéis a suas intuições preferiram aceitar a verdade de forma obscura e imperfeita do que sustentar um erro ba seado sem dúvida em uma lógica simples clara e consistente mas alicerçada em hipóteses incompatíveis com os fatos KEYNES 339 222 HOBSON e MUMMERY Physiology of Industry p 131 CAPÍTULO 24 Notas Finais Sobre a Filosofia Social a que Poderia Levar a Teoria Geral I Os principais defeitos da sociedade econômica em que vivemos são a sua incapacidade para proporcionar o pleno emprego e a sua arbitrária e desigual distribuição da riqueza e das rendas A relação da teoria anteriormente exposta com o primeiro defeito é óbvia Mas há também dois pontos importantes em que ela é relevante para o segundo Desde o fim do século XIX a tributação direta imposto sobre a renda e sobretaxas e impostos sobre as heranças vem conseguindo realizar especialmente na GrãBretanha considerável progresso na diminuição das grandes desigualdades de riqueza e de renda Muitos desejariam que este processo fosse levado bem mais adiante mas vêem se impedidos por duas considerações em parte pelo receio de tornar as evasões bem urdidas demasiado vantajosas e também pelo de en fraquecer excessivamente o incentivo de correr riscos porém o que na minha opinião sobretudo os detém é a idéia de que o aumento do capital depende do vigor dos motivos que impelem à poupança e de que uma grande proporção desse crescimento depende das poupanças dos ricos a partir do que lhes é supérfluo Nossa argumentação não afeta a primeira destas considerações Mas pode modificar considera velmente o nosso ponto de vista sobre a segunda pois já vimos que dentro dos limites da existência do pleno emprego o crescimento do capital não depende absolutamente de uma baixa propensão a consu mir mas é ao contrário reprimido pela mesma e que apenas em condições de pleno emprego pode uma baixa propensão a consumir levar ao crescimento do capital Ademais a experiência ensina que nas condições existentes a poupança por meio de instituições e de fundos de amortização é mais que adequada e que as medidas desti 341 nadas a redistribuir a renda no sentido de aumentar a propensão a consumir podem ser muito favoráveis ao crescimento do capital A crença tão generalizada de que os impostos sobre heranças são responsáveis pela redução da riqueza de capital de um país reflete a confusão que reina entre o público neste aspecto Supondo que o Estado aplique o produto destes impostos em suas despesas comuns de modo que os impostos sobre a renda e o consumo se reduzam ou anulem correspondentemente é naturalmente inegável que uma política fiscal de altos impostos sobre heranças faz aumentar a propensão da comu nidade a consumir Mas como um aumento da propensão habitual a consumir contribui em geral isto é excetuando as condições de pleno emprego para elevar o incentivo ao investimento a conclusão que daí se tira é quase sempre oposta à verdade O nosso raciocínio levanos desse modo à conclusão de que nas condições contemporâneas a abstinência dos ricos mais provavelmente tolhe do que favorece o crescimento da riqueza Fica assim invalidada uma das principais justificativas sociais da grande desigualdade da riqueza Não quero dizer que haja outras razões independentes da nossa teoria capazes de justificar certa desigualdade em determinadas circunstâncias porém nossa tese elimina certamente a razão mais im portante que até agora vem sendo o motivo de pensarmos na conve niência de agir com moderação Isto afeta particularmente nosso modo de encarar os impostos sobre heranças pois há certas justificativas da desigualdade das rendas que não podem aplicarse à desigualdade das heranças Do meu ponto de vista creio haver justificativa social e psicológica para grandes desigualdades nas rendas e na riqueza embora não para as grandes disparidades existentes na atualidade Existem valiosas atividades humanas que requerem o motivo do lucro e a atmosfera da propriedade privada de riqueza para que possam dar os seus frutos Além disso a possibilidade de ganhar dinheiro e fazer fortuna pode orientar certas inclinações perigosas da natureza humana para cami nhos onde elas se tornem relativamente inofensivas e não sendo sa tisfeitas desse modo possam elas buscar uma saída na crueldade na desenfreada ambição de poder e de autoridade e ainda em outras formas de engrandecimento pessoal É preferível que alguém tiranize seu saldo no banco do que os seus concidadãos e embora o primeiro caso seja algumas vezes um meio de levar ao segundo em certos casos é pelo menos uma alternativa Todavia não é necessário para estimular essas atividades e satisfazer essas inclinações que o jogo seja feito com apos tas tão altas como agora Apostas menores levariam igualmente ao mesmo resultado desde que os jogadores se habituassem a elas A tarefa de modificar a natureza humana não deve ser confundida com a de administrála Embora na comunidade ideal os homens possam ser acostumados inspirados ou ensinados a desinteressarse do jogo OS ECONOMISTAS 342 a sabedoria e a prudência da arte política devem permitir a prática do jogo embora sob certas regras e limitações em se considerando que o homem comum ou mesmo uma fração importante da comunidade é altamente inclinado à paixão pelo lucro II Há contudo um segundo aspecto do nosso argumento cujas con seqüências são muito mais importantes para o futuro das desigualdades de riqueza a saber a nossa teoria da taxa de juros A justificativa de uma taxa de juros moderadamente elevada foi encontrada até aqui na necessidade de proporcionar estímulo suficiente à poupança De monstramos porém que a extensão da poupança efetiva é rigorosa mente determinada pelo montante de investimento e que este mon tante cresce por efeito de uma taxa de juros baixa desde que não tentemos leválo por esse caminho além do nível que corresponde ao pleno emprego Assim sendo o que mais nos convém é reduzir a taxa de juros até o nível em que em relação à curva da eficiência marginal do capital se realize o pleno emprego Não pode haver dúvida de que este critério servirá para fazer baixar a taxa de juros muito além do nível que até agora tem vigorado e à medida que se possam estimar os valores da eficiência marginal do capital que correspondem a quantidades crescentes de volumes de capital é possível que a taxa de juros caia uniformemente caso seja exeqüível manter as condições mais ou menos contínuas de pleno em prego salvo naturalmente se houver uma modificação considerável na propensão agregada a consumir incluindo o Estado Estou convencido de que a procura de capital é estritamente li mitada no sentido de que não seria difícil aumentar o estoque de capital até que sua eficiência marginal atinja uma cifra muito baixa Não quer isto dizer que o uso dos bens de capital passe a custar quase nada mas apenas que a sua retribuição cubra um pouco mais do que a depreciação devida ao desgaste e à obsolescência ao mesmo tempo que deixe uma certa margem destinada a compensar os riscos e o exercício da habilidade e do julgamento Em resumo o rendimento agregado dos bens duráveis durante toda a sua vida cobriria justa mente como no caso dos bens de curta duração o custo de trabalho necessário para os produzir mais uma margem correspondente ao risco e ao custo da habilidade e da supervisão Ora embora este estado de coisas seja perfeitamente compatível com certo grau de individualismo ainda assim levaria à eutanásia do rentier e conseqüentemente à eutanásia do poder cumulativo de opres são do capitalista em explorar o valor de escassez do capital A taxa de juros atual não compensa nenhum verdadeiro sacrifício do mesmo modo que não o faz a renda da terra O detentor do capital pode con seguir juros porque o capital é escasso assim como o dono da terra KEYNES 343 pode obter uma renda porque a terra é escassa Mas enquanto houver razões intrínsecas para a escassez da terra não há razões intrínsecas para a escassez do capital Uma razão intrínseca para semelhante escassez no sentido de um verdadeiro sacrifício que só a oferta de uma recompensa em forma de juros fizesse surgir não poderia existir de maneira durável a menos que a propensão individual a consumir fosse de tal natureza que a poupança líquida em situação de pleno emprego deixasse de existir antes de o capital chegar a ser suficien temente abundante Mesmo assim o Estado ainda teria o recurso de manter uma poupança agregada a um nível que permitisse o cresci mento do capital até que sua escassez desaparecesse Conseqüentemente eu considero o aspecto do rentier do capita lismo como sendo uma fase transitória que desaparecerá logo que tenha desempenhado sua função E com o desaparecimento deste aspecto muitas outras transformações deverão ocorrer Além disso uma grande vantagem na ordem dos acontecimentos que preconizo consiste em que a eutanásia do rentier do investidor sem função nada terá de repentino mas será meramente uma continuação gradual e prolongada do que vimos observando recentemente na GrãBretanha sem carecer de qual quer revolução Na prática portanto o nosso objetivo deveria ser conseguir e isto nada tem de irrealizável um aumento no volume de capital até que ele deixe de ser escasso de modo que o investidor sem função deixe de receber qualquer benefício e depois criar um sistema de tri butação direta que permita a inteligência a determinação a habilidade executiva do financista do empresário et hoc genus omne certamente tão orgulhosos de suas funções que poderia obterse o seu trabalho muito mais barato que agora a dedicarse ativamente à comunidade em condições razoáveis de remuneração Ao mesmo tempo temos de reconhecer que só a experiência pode mostrar até que ponto convém orientar a vontade popular incorporada na política do Estado no sentido de aumentar e suplementar o incentivo a investir e até que ponto convém estimular a propensão média a consumir sem abandonar o nosso objetivo de privar o capital de seu valor de escassez em uma ou duas gerações Pode acontecer que a propensão a consumir se fortaleça sem maiores dificuldades por efeito de uma taxa de juros decrescente de tal modo que o pleno emprego se alcance com um fluxo de acumulação pouco maior que o atual Nesse caso um plano para cobrar impostos mais elevados das grandes rendas e heranças poderia ter o inconveniente de conduzir ao pleno emprego com uma taxa de acumulação bastante inferior ao nível corrente Não se deve imaginar que nego a possibilidade ou mesmo a probabilidade deste resultado pois em assuntos desta natureza seria temerário pre ver como reagiria o homem médio em face de uma mudança de método Contudo se fosse fácil conseguir uma aproximação do pleno emprego OS ECONOMISTAS 344 com uma taxa de acumulação não muito maior que a presente pelo menos terseia resolvido um problema de máxima importância Ficaria para decidir em separado em que proporção e por que meios seria justo e razoável invocar a geração atual a reduzir seu consumo para que os seus descendentes possam gozar no devido tempo de um estado de pleno investimento III As implicações da teoria exposta nas páginas precedentes são a outros respeitos razoavelmente conservadoras Embora essa teoria in dique ser de importância vital o estabelecimento de certos controles sobre atividades que hoje são confiadas em sua maioria à iniciativa privada há muitas outras áreas que permanecem sem interferência O Estado deverá exercer uma influência orientadora sobre a propensão a consumir em parte através de seu sistema de tributação em parte por meio da fixação da taxa de juros e em parte talvez recorrendo a outras medidas Por outro lado parece improvável que a influência da política bancária sobre a taxa de juros seja suficiente por si mesma para determinar um volume de investimento ótimo Eu entendo por tanto que uma socialização algo ampla dos investimentos será o único meio de assegurar uma situação aproximada de pleno emprego embora isso não implique a necessidade de excluir ajustes e fórmulas de toda a espécie que permitam ao Estado cooperar com a iniciativa privada Mas fora disso não se vê nenhuma razão evidente que justifique um socialismo do Estado abrangendo a maior parte da vida econômica da nação Não é a propriedade dos meios de produção que convém ao Estado assumir Se o Estado for capaz de determinar o montante agre gado dos recursos destinados a aumentar esses meios e a taxa básica de remuneração aos seus detentores terá realizado o que lhe compete Ademais as medidas necessárias de socialização podem ser introdu zidas gradualmente sem afetar as tradições generalizadas da sociedade Nossa crítica à teoria econômica clássica geralmente aceita con sistiu menos em revelar os defeitos lógicos de sua análise do que em assinalar o fato de que as suas hipóteses tácitas nunca ou quase nunca são satisfeitas com a conseqüência de que ela se mostra incapaz de resolver os problemas econômicos do mundo real Entretanto se os nossos controles centrais lograrem estabelecer um volume de produção agregado correspondente o mais aproximadamente possível ao pleno emprego a teoria clássica retomará daí em diante a sua devida po sição Se considerarmos dado o volume da produção isto é se o su pusermos determinado por forças alheias à concepção da escola clássica nada há a opor à análise clássica concernente à maneira como o in teresse pessoal determinará o que se produz especificamente em que proporção se associarão os fatores para tal fim e como se distribuirá entre eles o valor da produção obtida Para reiterar a nossa opinião KEYNES 345 o fato de termos tratado de maneira diferente do problema da parci mônia não significa que haja algo a objetar à teoria clássica moderna quanto ao grau de conciliação entre as vantagens públicas e particu lares tanto em regime de concorrência perfeita quanto em regime de concorrência imperfeita Assim sendo fora a necessidade de um controle central para manter o ajuste entre a propensão a consumir e o estímulo para investir não há mais razão do que antes para socializar a vida econômica Para colocar a questão num plano concreto não vejo por que o sistema existente faria mau uso dos fatores de produção utilizados Cometemse naturalmente erros de previsão que aliás não se evita riam centralizando as decisões Quando sobre 10 milhões de homens desejosos e capazes de trabalhar há 9 milhões empregados nada per mite afirmar que o trabalho desses 9 milhões de homens seja mal orientado A queixa contra o sistema presente não consiste em que esses 9 milhões deveriam ser empregados em tarefas diferentes senão em que deveria haver trabalho disponível para o restante 1 milhão de homens É o volume e não a direção do emprego efetivo o responsável pelo colapso do sistema atual Por isso concordo com Gessell em que o preenchimento das la cunas da teoria clássica não leva a abandonar o Sistema de Manches ter mas a indicar a natureza do meio que exige o livre jogo das forças econômicas para ser capaz de realizar toda a potencialidade da pro dução Os controles centrais necessários para assegurar o pleno em prego exigirão naturalmente uma considerável extensão das funções tradicionais de governo A par disso a própria teoria clássica moderna chamou a atenção sobre as várias condições em que pode ser necessário refrear ou guiar o livre jogo das forças econômicas Todavia subsistirá ainda uma grande amplitude que permita o exercício da iniciativa e responsabilidade privadas Nesse domínio as vantagens tradicionais do individualismo continuarão ainda sendo válidas Paremos um momento para recordar essas vantagens Em parte são vantagens de eficiência as vantagens da descentralização e do jogo do interesse pessoal Do ponto de vista da eficiência as vantagens da descentralização das decisões e da responsabilidade individual são talvez maiores do que julgou o século XIX e a reação contra o atrativo do interesse pessoal talvez tenha ido demasiado longe Porém acima de tudo o individualismo se puder ser purgado de seus defeitos e abusos é a melhor salvaguarda da liberdade pessoal no sentido de que amplia mais do que qualquer outro sistema o campo para o exercício das escolhas pessoais É também a melhor salvaguarda da variedade da vida que desabrocha justamente desse extenso campo das escolhas pessoais e cuja perda é a mais sensível de todas as que acarreta o Estado homogêneo ou totalitário Essa variedade preserva as tradições que encerram o que de mais seguro e auspicioso reuniram as gerações OS ECONOMISTAS 346 passadas dá cor ao presente com os diversos matizes de sua fantasia e servindo a experiência bem como a tradição e a imaginação é o mais poderoso instrumento para conduzir à melhoria do futuro Por isso enquanto a ampliação das funções do governo que supõe a tarefa de ajustar a propensão a consumir com o incentivo para in vestir poderia parecer a um publicista do século XIX ou a um financista americano contemporâneo uma terrível transgressão do individualismo eu a defendo ao contrário como o único meio exeqüível de evitar a destruição total das instituições econômicas atuais e como condição de um bemsucedido exercício da iniciativa individual Se a demanda efetiva se mostra deficiente não só o desperdício de recursos causa no público um escândalo intolerável como também o empreendedor individual que tenta pôlos em ação joga um jogo com cartas marcadas contra si O jogo de que participa contém muitos zeros de modo que os jogadores em conjunto acabarão perdendo se tiverem bastante energia e confiança para jogar todas as cartas O crescimento da riqueza mundial tem sido menor até agora que o volume agregado das poupanças individuais e a diferença corresponde às perdas sofridas por aqueles cuja coragem e iniciativa não foram suplementadas por uma habilidade excepcional ou por uma sorte fora do comum Se a demanda efetiva for adequada porém serão suficientes apenas habi lidade e sorte normais Os regimes autoritários contemporâneos pare cem resolver o problema do desemprego à custa da eficiência e da liberdade É certo que o mundo não tolerará por muito mais tempo o desemprego que à parte curtos intervalos de excitação é uma conse qüência e na minha opinião uma conseqüência inevitável do capitalismo individualista do nosso tempo Mas pode ser possível curar o mal por meio de uma análise correta do problema preservando ao mesmo tempo a eficiência e a liberdade IV Observei de passagem que o novo sistema poderia ser mais fa vorável à paz do que antigo Vale a pena repetir e enfatizar este ponto A guerra tem diversas causas Os ditadores e pessoas semelhan tes aos quais a guerra oferece pelo menos em expectativa uma ex citação deleitável não encontram dificuldade em fomentar a natural belicosidade de seus povos Porém além disso facilitando seu trabalho de insuflar as chamas do entusiasmo do povo aparecem as causas econômicas da guerra ou seja as pressões da população e a luta acir rada pelos mercados Este segundo fator que desempenhou no século XIX e talvez venha a desempenhar ainda um papel essencial tem estreita relação com o nosso assunto Assinalei no capítulo anterior que sob o regime de laissezfaire interno e de padrão de ouro internacional como era o correto na se gunda metade do século XIX não havia qualquer outro meio disponível KEYNES 347 a um governo para aliviar a miséria econômica interna a não ser lutar pela conquista de mercados externos Isso porque todos os remédios eficazes para o desempego crônico ou intermitente estavam excluídos à exceção das medidas destinadas a melhorar o balanço de pagamentos em conta corrente Desse modo enquanto os economistas estavam acostumados a aplaudir o sistema internacional existente porque ele proporcionava os frutos da divisão internacional do trabalho e ao mesmo tempo conciliava os interesses das diferentes nações furtava à vista uma conseqüência menos benéfica e davam provas de bom senso e de uma justa compreensão do verdadeiro curso dos acontecimentos os estadistas que acreditavam que se um país antigo e rico abandonasse a luta pelos mercados veria sua prosperidade cair e desaparecer Mas se as nações podem aprender a manter o pleno emprego apenas por meio de sua política interna e também devemos acrescentar se logram alcançar o equilíbrio na tendência de crescimento de suas populações não deveria mais haver a necessidade de forças econômicas importantes destinadas a predispor um país contra os seus vizinhos Haveria o lugar para a divisão internacional do trabalho e para o crédito inter nacional em condições adequadas mas deixaria de existir motivo pre mente para que um país necessitasse impor suas mercadorias a outro ou recusar as ofertas de seus vizinhos não porque isto seja indispen sável para capacitálo a pagar o que deseja adquirir no estrangeiro mas por causa do objetivo expresso de alterar o equilíbrio de paga mentos a fim de criar uma balança comercial que lhe seja favorável O comércio internacional deixaria de ser o que é um expediente de sesperado para manter o emprego interno forçando as vendas nos mercados externos e restringindo as compras o que se tivesse êxito simplesmente deslocaria o problema do desemprego para o vizinho que levasse desvantagem na luta e se converteria num livre e desimpedido intercâmbio de mercadorias e serviços em condições de vantagens mútuas V Será uma esperança visionária confiar que estas idéias se con cretizem Têm elas raízes insuficientes nos motivos que governam a evolução das sociedades políticas São os interesses a que elas se opõem mais fortes e mais manifestos do que os que favorecem Não me cabe responder aqui a essas perguntas Seria necessário um livro de natureza bem diferente deste para indicar mesmo em linhas gerais as medidas práticas que poderiam dar corpo a tais idéias Contudo se as idéias são corretas hipótese na qual o próprio autor tem de basear o que escreve seria um erro segundo minha previsão ignorar a força que com o tempo elas virão a adquirir Presentemente há uma expectativa incomum de um diagnóstico mais bem fundamen tado mais do que nunca todos estão prontos a aceitálo e desejosos OS ECONOMISTAS 348 de o experimentar desde que ele seja pelo menos plausível Mas à parte esta disposição de espírito peculiar à época as idéias dos eco nomistas e dos filósofos políticos estejam elas certas ou erradas têm mais importância do que geralmente se percebe De fato o mundo é governado por pouco mais do que isso Os homens objetivos que se julgam livres de qualquer influência intelectual são em geral escravos de algum economista defunto Os insensatos que ocupam posições de autoridade que ouvem vozes no ar destilam seus arrebatamentos ins pirados em algum escriba acadêmico de certos anos atrás Estou con vencido de que a força dos interesses escusos se exagera muito em comparação com a firme penetração das idéias É natural que elas não atuem de maneira imediata mas só depois de certo intervalo isso porque no domínio da filosofia econômica e política raros são os homens de mais de vinte e cinco ou trinta anos que são influenciados por teorias novas de modo que as idéias que os funcionários públicos os políticos e mesmo os agitadores aplicam aos acontecimentos atuais têm pouca probabilidade de ser as mais recentes Porém cedo ou tarde são as idéias e não os interesses escusos que representam um perigo seja para o bem ou para o mal KEYNES 349 ÍNDICE Apresentação de Adroaldo Moura da Silva 5 A TEORIA GERAL DO EMPREGO DO JURO E DA MOEDA Prefácio 27 Prefácio à Edição Alemã 31 Prefácio à Edição Japonesa 35 Prefácio à Edição Francesa 37 LIVRO PRIMEIRO Introdução CAP 1 A Teoria Geral 43 CAP 2 Os Postulados da Economia Clássica 45 CAP 3 O Princípio da Demanda Efetiva 59 LIVRO SEGUNDO Definições e Idéias CAP 4 A Escolha das Unidades 69 CAP 5 A Expectativa como Elemento Determinante do Produto e do Emprego 77 CAP 6 Definição de Renda Poupança e Investimento 83 I Renda 83 II Poupança e Investimento 90 APÊNDICE Sobre o Custo de Uso 93 CAP 7 Maiores Considerações Sobre o Significado de Poupança e de Investimento 101 LIVRO TERCEIRO A Propensão a Consumir CAP 8 A Propensão a Consumir I Os Fatores Objetivos 113 351 CAP 9 A Propensão a Consumir II Os Fatores Subjetivos 127 CAP 10 A Propensão Marginal a Consumir e o Multiplicador 133 LIVRO QUARTO O Incentivo a Investir CAP 11 A Eficiência Marginal do Capital 149 CAP 12 O Estado da Expectativa a Longo Prazo 159 CAP 13 A Teoria Geral da Taxa de Juros 173 CAP 14 A Teoria Clássica da Taxa de Juros 181 APÊNDICE AO CAP 14 Apêndice Sobre a Taxa de Juros em Principles of Economics de Marshall em Principles of Political Economy de Ricardo e em Outras Obras 189 CAP 15 Os Incentivos Psicológicos e Empresariais para a Liquidez 197 CAP 16 Observações Diversas Sobre a Natureza do Capital 209 CAP 17 As Propriedades Essenciais dos Juros e do Dinheiro 219 CAP 18 Novo Enunciado da Teoria Geral do Emprego 237 LIVRO QUINTO Salários Nominais e Preços CAP 19 Variações nos Salários Nominais 247 APÊNDICE AO CAP 19 A Theory of Unemployment do Professor Pigou 259 CAP 20 A Função de Emprego 267 CAP 21 A Teoria dos Preços 277 LIVRO SEXTO Breves Notas Sugeridas pela Teoria Geral CAP 22 Notas Sobre o Ciclo Econômico 293 CAP 23 Notas Sobre o Mercantilismo as Leis Contra a Usura o Dinheiro Carimbado e as Teorias do Subconsumo 309 CAP 24 Notas Finais Sobre a Filosofia Social a que Poderia Levar a Teoria Geral 341 OS ECONOMISTAS 352