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coleção 165 primeiros passos Jair Ferreira dos Santos O QUE É PÓSMODERNO editora brasiliense O que é PósModerno Jair Ferreira dos Santos Coleção Primeiros Passos 165 Editora Brasiliense Contra capa Coleção Primeiros Passos Uma Enciclopédia Crítica Que ligação existe entre o microcomputador e a sexchop Por que a massa consumista tem no rosto um misto de fascinação e melancolia O que ocorreu nas artes com o fim das vanguardas Por que o niilismo voltou à boca dos filósofos Há qualquer coisa nova mas indefinível no ar Cabeças mais sensitivas a chamam de pós modernismo mescla de purpurina com circuito integrado liberação dos costumes com pós industrialismo Um bem Um mal Quem viver verá Áreas de interesse Artes Comunicações Brasiliense Copyright by Jair Ferreira dos Santos 1986 Nenhuma parte desta publicação pode ser gravada armazenada em sistemas eletrônicos fotocopiada reproduzida por meios mecânicos ou outros quaisquer sem autorização da editora Primeira Edição 1986 22ª Impressão 2004 Revisão Rosana N Morales e Newton T L Sodré Capa Carlos Matuck Dados internacionais e Catalogação na Publicação CIP Câmara Brasileira do Livro SP Brasil Santos Jair Ferreira dos O que é pósmodernoJair Ferreira dos Santos São Paulo Brasiliense 2004 Coleção primeiros passos 165 22ª reimpr da 1ª ed de 1986 ISBN 851101165X 1 Pósmodernismo I Título II Série 040163 CDD 70904 Índices para catálogo sistemático 1 Pósmodernismo 70904 Editora brasiliense sa Rua Airi 22 Tatuapé CEP 03310010 São Paulo SP FoneFax 0xx11 61981488 Email brasilienseedituolcombr wwweditorabrasiliensecombr livraria brasiliense sa Rua Emília Marengo 216 Tatuapé CEP 03336000 São Paulo SP FoneFax 0xx11 66750188 Índice Vem comigo que no caminho eu explico07 Do boom ao bit ao blip20 Do sacrossanto não ao zero patafísico32 Anartistas em nuliverso 43 Adeus às ilusões71 A massa fria com narciso no trono86 Demônio terminal e anjo anunciador106 Indicações para leitura112 Para Érica Villa no brilho dos seus dez anos e para Marilu Mártens e Ruy e Arlene Sampaio Todo livro nasce também da colaboração voluntária ou involuntária de amigos Devo agradecer portanto a Carlos Alberto de Mattos Eduardo Neiva Jr Elvira Borges Sônia Khède Arthur Omar Lúcia Mattos Camilo Attie Lina Soares Carlos Deane Maria Emilia Bender Bruno Bonvini Dráuzio Gonzaga e Antonio Fernando VEM COMIGO QUE NO CAMINHO EU EXPLICO Caçando o fantasma Há qualquer coisa no ar Um fantasma circula entre nós nestes anos 80 o pósmodernismo Uma vontade de participar e uma desconfiança geral Jogging sexshops mas gente dizendo Deus está morto Marx também e eu não estou me sentindo muito bem Videogames em casa auroras de laser na danceteria Nietzsche e Boy George comandam o desencanto radical sob o guardachuva nuclear Nessa geléia total uns vêem um piquenique no jardim das delícias outros o último tango à beira do caos Pósmodernismo é o nome aplicado às mudanças ocorridas nas ciências nas artes e nas sociedades avançadas desde 1950 quando por convenção Pág 8 se encerra o modernismo 19001950 Ele nasce com a arquitetura e a computação nos anos 50 Toma corpo com a arte Pop nos anos 60 Cresce ao entrar pela filosofia durante os anos 70 como crítica da cultura ocidental E amadurece hoje alastrandose na moda no cinema na música e no cotidiano programado pela tecnociência ciência tecnologia invadindo o cotidiano com desde alimentos processados até microcomputadores sem que ninguém saiba se é decadência ou renascimento cultural Mas apertemos o cerco ao fantasma Imaginemos uma fabulazinha onde o herói seja um certo urbanóide pósmoderno você Ao acordálo o rádiorelógio digital dispara informações sobre o tempo e o trânsito Ligando a FM lá está o U2 O vibromassageador amacialhe a nuca enquanto o forno microondas descongela um sanduíche natural No seu micro Apple II sua agenda indica REUNIÃO AGENCIA 10H TENIS CLUBE 12H ALMOÇO TROCAR CARTÃO MAGNETICO BANCO TRABALHAR 15H PSICOTERAPIA 18H SHOPPING OPÇÕES INDIANA JONESBLADE RUNNER VIDEOCASSETE ROSE SE LIGAR SE NÃO LIGAR OPÇÕES LER O NOME DA ROSA ECO DALLAS NA TV DORMIR COM SONIFEROS VITAMINADOS Seu programa rolou fácil Na rua divertiuse pacas com a manifestação feminista próaborto que contava com um bloco só de freiras e a Pág 9 metros dali com a escultura que refazia a Pietá aquela do Miguelangelo com baconzitos e cartões perfurados Rose ligou Você embarcou no filme Indiana Jones sentado numa poltrona estilo Menphis uma pirâmide laranja em vinil desfiando piadas sobre a tese dela em filosofia Em Cena a Decadência A câmera adaptada ao vídeo filmou vocês enquanto faziam amor Será o pornô que animará a próxima vez Ao trazêlo de carro para casa Rose que esticaria até uma festa veio tipo impacto maquiagem teatral brincos enormes e uma gravata prateada sobre o camisão lilás Na cama um sentimento de vazio e irrealidade se instala em você Sua vida se fragmenta desordenadamente em imagens dígitos signos tudo leve e sem substância como um fantasma Nenhuma revolta Entre a apatia e a satisfação você dorme A fabulazinha claro não tem moral nem permite conclusões mas põe na bandeja os lugares por onde circula o fantasma pósmoderno 1 Para começar ele invadiu o cotidiano com a tecnologia eletrônica de massa e individual visando à sua saturação com informações diversões e serviços Na Era da Informática que é o tratamento computadorizado do conhecimento e da informação lidamos mais com signos do que com coisas O motor a explosão detonou a revolução moderna há um século o chip microprocessador Pág 10 com o tamanho de um confete está causando o rebu pósmoderno com a tecnologia programando cada vez mais o diaadia 2 Na economia ele passeia pela ávida sociedade de consumo agora na fase do consumo personalizado que tenta a sedução do indivíduo isolado até arrebanhálo para sua moral hedonista os valores calcados no prazer de usar bens e serviços A fábrica suja feia foi o templo moderno o shopping feérico em luzes e cores é o altar pósmoderno 3 Mas foi na arte que o fantasma pósmoderno ainda nos anos 50 começou a correr mundo Da arquitetura ele pulou para a pintura e a escultura daí para o romance e o resto sempre satírico pasticheiro e sem esperança Os modernistas vejam Picasso complicaram a arte por levála demasiado a sério Os pósmodernistas querem rir levianamente de tudo 4 Enfim o pósmodernismo ameaça encarnar hoje estilos de vida e de filosofia nos quais viceja uma idéia tida como arquisinistra o niilismo o nada o vazio a ausência de valores e de sentido para a vida Mortos Deus e os grandes ideais do passado o homem moderno valorizou a Arte a História o Desenvolvimento a Consciência Social para se salvar Dando adeus a essas ilusões o homem pós moderno já sabe que não existe Céu nem sentido para a História e assim se entrega ao presente e ao prazer ao consumo e ao indivi Pág 11 dualismo E aqui você pode escolher entre ser a a criança radiosa o indivíduo desenvolto sedutor hedonista integrado à tecnologia narcisista com identidade móvel flutuante liberado sexualmente conforme o incensam Lipovestsky Fiedler e Toffler alegres gurus que vamos visitar logo mais b o andróide melancólico o consumidor programado e sem história indiferente átomo estatístico na massa boneco da tecnociência segundo o abominam Nietzsche e Baudrillard Lyotard profetas do apocalipse cujo evangelho também vamos escutar Assim tecnociência consumo personalizado arte e filosofia em torno de um homem emergente ou decadente são os campos onde o fantasma pósmoderno pode ser surpreendido Ele ainda está bastante nebuloso mas uma coisa é certa o pósmodernismo é coisa típica das sociedades pós industriais baseadas na Informação EUA Japão e centros europeus A rigor nada tem a ver com o Brasil embora já se assista a um trailer desse filme por aqui Bye bye real Tornemos mais concretas as coisas Vejamos o Pág 12 que significa o ambiente pósmoderno Saque essa Que criança linda disse a amiga à mãe da garota Isto é porque você não viu a fotografia dela a cores respondeu a mãe Cínica a piada contém a essência da pósmodernidade preferimos a imagem ao objeto a cópia ao original o simulacro a reprodução técnica ao real E por quê Porque desde a perspectiva renascentista até a televisão que pega o fato ao vivo a cultura ocidental foi uma corrida em busca do simulacro perfeito da realidade Simular por imagens como na TV que dá o mundo acontecendo significa apagar a diferença entre real e imaginário ser e aparência Fica apenas o simulacro passando por real Mas o simulacro tal qual a fotografia a cores embeleza intensifica o real Ele fabrica um hiperreal espetacular um real mais real e mais interessante que a própria realidade Observe o videoclip que abre o programa de TV Fantástico o Show da Vida que já no título espetaculariza o viver Uma pirâmide e um cone dourados evoluem na tela fragmentamse em anéis transformados em plataformas suspensas onde bailarinos em trajes ao mesmo tempo futuristas e antigos dançam uma peça musical executada por orquestra e sintetizador Para quem não sabe o balé foi filmado em palco normal no Maracanãzinho e um computador recortou toda a seqüência para imprimila sobre as plataformas aéreas cujos movimentos também foram criados por computa Pág 13 ção O show na verdade não é nem a energia misteriosa simbolizada pela pirâmide passado nem a ciência sugerida pelo cone futuro mas a dança livre da matéria no espaço a levitação simulada tecnologicamente Aliada ao computador a televisão simulou um espaço hiperreal espetacular que excita e alegra como um acrobata E daí Daí que a levitação em si desejável mas inviável na gravidade parece ser possível na TV O hiperreal simulado nos fascina porque é o real intensificado na cor na forma no tamanho nas suas propriedades É um quase sonho Veja um dose do iogurte Danone em revistas ou na TV Sua superfície é enorme lustrosa sedutora tátil dá água na boca O Danone verdadeiro é um alimento mixuruca mas seu simulacro hiperrealizado amplifica satura sua realidade Com isso somos levados a exagerar nossas expectativas e modelamos nossa sensibilidade por imagens sedutoras O ambiente pósmoderno significa basicamente isso entre nós e o mundo estão os meios tecnológicos de comunicação ou seja de simulação Eles não nos informam sobre o mundo eles o refazem à sua maneira hiperrealizam o mundo transformandoo num espetáculo Uma reportagem a cores sobre os retirantes do Nordeste deve primeiro nos seduzir e fascinar para depois nos indignar Caso contrário mudamos de canal Não reagimos fora do espetáculo Pág 14 Breve babado teórico Se o ambiente pósmoderno é dominado pela tecnociência aplicada à informação e à comunicação este é o caminho para se encurralar o fantasma Seja Reagan ou Brucutu das cavernas o homem é Linguagem Palavra desenho escrita pintura foto imagem em movimento são linguagens para a comunicação feitas com signos em códigos que gerando mensagens como esta frase em português representam a realidade para o homem Livro jornal cinema rádio tv são meios que vieram ampliar o público e acelerar a circulação das mensagens Só recentemente se reconheceu a importância desse Quarto Poder mas há tempos existem ciências para estudálo uma é a Semiologia ciência dos signos a outra é a Teoria da Comunicação O esqueminha a seguir é o famoso modelo de signo bolado pelos semiólogos ingleses Ogden e Richards e que tendo muito a ver com a Lingüística a Cibernética a Estética e até a Filosofia serve para explicar carradas de coisas na atualidade Signo é toda palavra número imagem ou gesto que representa indiretamente um referente uma cadeira através de uma referência a idéia da cadeira na nossa cabeça Desde a Antiguidade os filósofos olharam quando olharam com desconfiança para a Linguagem Os idealistas explicavam a matéria pelo Pág 15 Observação Juliano aqui tem um esquema em forma de pirâmide onde no ápice está escrito Espírito Idéia Sujeito Referência Na base do lado esquerdo está Signo Linguagem Simulacro Espetáculo Na base direita Referente Objeto Realidade Matéria espírito os materialistas caíam na explicação inversa mas quase ninguém foi fundo na questão dos signos Ora descobriuse há alguns anos com a Lingüística a Antropologia a Psicanálise que para o homem não há pensamento nem mundo nem mesmo homem sem linguagem sem algum tipo de Representação Mais a linguagem dos meios de comunicação dá forma tanto ao nosso mundo referente objeto quanto ao nosso pensamento referência sujeito Para serem alguma coisa sujeito e objeto passam ambos pelo signo A pósmodernidade é também uma Semiurgia um mundo super recriado pelos signos Quando nosso urbanóide na fabulazinha se sente irreal o ego e o mundo surgindolhe vagos como um fantasma é porque ele manipula cada vez mais signos em vez de coisas Sua sensibilidade é frágil sua identidade evanescente Na pósmodernidade matéria e espírito se esfumam em Pág 16 imagens em dígitos num fluxo acelerado A isso os filósofos estão chamando desreferencialização do real e dessubstancialização do sujeito ou seja o referente a realidade se degrada em fantasmagoria e o sujeito o individuo perde a substância interior sentese vazio Há exemplos chocantes disso Quanto ao referente comprase um Monza não tanto por suas qualidades técnicas mas por seu design seu nome nobre seus signos na publicidade que compõem uma imagem de status e bom gosto europeizados Comprase um discurso sobre o Monza Quanto ao sujeito a falta de substância está na extrema diferenciação que as pessoas procuram através da moda personalizandose pela aparência e o narcisismo levado à extravagância ou então imitando modelos exóticos Para encerrar uma distinção importante Os signos podem ser digitais ou analógicos Números letras línguas são digitais porque são descontínuos e arbitrários o número 470 tem os dígitos separados e é arbitrário com relação por exemplo ao ônibus que identifica Já os analógicos são contínuos e se assemelham ao objeto representado fotos gráficos se parecem com aquilo que representam seja uma criança seja a alta dos preços O digital permite escolher o analógico reconhecer ou compreender Com a invasão da computação digital no cotidiano calculadoras painéis eletrônicos estamos assistindo à digitalização do social Pág 17 Teclados e vídeos com letras e números surgem por toda parte na cozinha como nos bancos nas lojas como nos automóveis E a própria imagem que é analógica está funcionando digitalizada nas vitrines cada liquidificador é um signo analógico dos modelos à venda mas achase desenhado com traços que funcionam digitalmente para diferençálos das outras marcas Assim são as cores nas embalagens de sabonetes por exemplo Isto acelera a escolha na base do SIMNÃO oposição igual ao 01 o bit dígito binário O bit é a base lógica do computador e constitui atualmente o gargalo binário por onde o social está sendo forçado a passar Na pósmodernidade o indivíduo vive banhado num rio de testes permanente Digitalizados os signos pedem escolha Não uma decisão profunda existencial mas uma resposta rápida impulsiva boa para o consumo O pós contém um des Sublinhamos até aqui palavras que são verdadeiras senhas para invocar o fantasma pós moderno chip saturação sedução niilismo simulacro hiperreal digital desreferencialização etc Dificilmente elas serviriam para descrever o mundo de 30 ou 40 anos atrás o mundo moderno quando se falava em energia máquina produção prole Pág 18 tariado revolução sentido autenticidade Mas se a pósmodernidade significa mudanças com relação à modernidade o fato é que não se pode dispensar o aço a fábrica o automóvel a arquitetura funcional a luz elétrica conquistas associadas ao modernismo Assim no fundo o pósmodernismo é um fantasma que passeia por castelos modernos Mas as relações entre os dois são ambíguas Há mais diferenças que semelhanças menos prolongamentos que rupturas O individualismo atual nasceu com o modernismo mas o seu exagero narcisista é um acréscimo pósmoderno Um filho da civilização industrial mobilizava as massas para a luta política o outro florescente na sociedade pósindustrial dedicase às minorias sexuais raciais culturais atuando na micrologia do cotidiano Por ora contentemonos com saber que o pós contém um des um princípio esvaziador diluidor O pósmodernismo desenche desfaz princípios regras valores práticas realidades A des referencialização do real e a dessubstancialização do sujeito motivadas pela saturação do cotidiano pelos signos foram os primeiros exemplos Muitos outros virão Entendamos ainda que o pósmodernismo é um ecletismo isto é mistura várias tendências e estilos sob o mesmo nome Ele não tem unidade é aberto plural e muda de aspecto se passamos da tecnociência para as artes plásticas da sociedade Pág 19 para a filosofia Inacabado sem definição precisa eis por que as melhores cabeças estão se batendo para saber se a condição pósmoderna mescla de purpurina com circuito integrado é decadência fatal ou renascimento hesitante agonia ou êxtase Ambiente Estilo Modismo Charme Para dor dos corações dogmáticos o pósmodernismo por enquanto flutua no indecidível Pág 20 DO BOOM AO BIT AO BLIP Apocalipse Uau Simbolicamente o pósmodernismo nasceu às 8 horas e 15 minutos do dia 6 de agosto de 1945 quando a bomba atômica fez boooom sobre Hiroxima Ali a modernidade equivalente à civilização industrial encerrou seu capítulo no livro da História ao superar seu poder criador pela sua força destruidora Desde então o Apocalipse ficou mais próximo Historicamente o pósmodernismo foi gerado por volta de 1955 para vir à luz lá pelos anos 60 Nesse período realizações decisivas irromperam na arte na ciência e na sociedade Perplexos sociólogos americanos batizaram a época de pósmoderna usando termo empregado pelo historiador Toynbee em 1947 Pág 21 Em 1955 arquitetos italianos abrem as baterias contra o internacionalismo na arquitetura moderna propondo uma revalorização do passado e da cor local O pintor Jaspers Johns um pioneiro Pop ironiza a América com sua bandeira americana sobre a tela E John Barth publica nos EUA um romance amoral e cínico The Floating Opera A Ópera Flutuante A crítica aplaude seu humor apocalíptico Um pouco antes em 1953 a descoberta do DNA o código da vida impulsionaria o salto para a biologia molecular hoje tão cortejada O desenho do chip em 1957 permitirá a redução dos computadoresdinossauros aos micros abelhas atuais Nesse mesmo ano o sputinik soviético revoluciona a astronáutica e as telecomunicações O selfservice acoplado ao marketing e à publicidade em alta rotação consagra o consumo massivo A pílula o rock o motel a minissaia liberadores que emergem nos anos 60 preparam a paisagem desolada da civilização industrial para a quermesse eletrônica pósindustrial A dama de ferro Capitalista ou socialista a sociedade industrial descende da máquina produtora de artigos em série padronizados Sua canção é uma só boom Pág 22 explodir expandir No século XVIII essa dama de ferro celebra as núpcias da Ciência com a Liberdade individual do burguês capitalista para gerar o Progresso e cria o chamado Projeto Iluminista da modernidade o desenvolvimento material e moral do homem pelo Conhecimento A essa dama pode ser creditado o imenso progresso das nações capitalistas nos séculos XIX e XX progresso fundado nas grandes fábricas ferrovias navegação e claro na exploração Com ela vieram o automóvel e o avião o telégrafo o telefone o rádio a TV o petróleo e a eletricidade o crédito ao consumidor e a publicidade o indivíduo burguês sujeito livre empreendedor e seu arquiinimigo o operário revolucionário junto com macroempresas burocratizadas rotinizando a vida ela promoveu o Estado nacional que cuida dos serviços saúde transporte ensino e exerceu modernamente o controle social e político exército polícia Completando o cenário moderno com a dama de ferro expandiramse também as metrópoles industriais as classes médias consumidoras de moda e lazer surgiu a família nuclear maridomulher filhos isolados no ap e a cultura de massa revista filme romance policial novela de TV Dando a vitória à Razão técnicocientífica inspirada no Iluminismo a máquina fez recuar a tradição a religião a moral e ditou novos valores mais livres urbanos mas sempre atrelados ao Pág 23 progresso social Por fim ela gerou a massa industrial combativa e o indivíduo mecanizado solitário na multidão das grandes cidades desumanizado tema tão explorado pela arte moderna Essa imagem da civilização moderna industrial assentada na produção e na máquina iria se modificar desde os anos 50 ao rumar para a sociedade pósindustrial mobilizada pelo consumo e a informação Rede pensante gandaia global O que há de comum entre um empréstimo noturno ao Brasil por um banco de Tóquio e o penteado simulado por um computador gráfico num cabelereiro em Nova York Há o seguinte 1 são serviços 2 são informação e comunicação dependendo de tecnologias avançadas como o computador o satélite há 1000 deles no cosmos 3 chegaram com a sociedade pósindustrial e a multinacional 4 significam a desmaterialização da economia pela informação 5 constituem o próprio cenário pós moderno No ano 2000 diz relatório da empresa de consultoria Rand Corporation 2 da força de trabalho produzirão todos os bens necessários à sociedade americana O resto estará manipulando signos nos setores de serviços e técnicocientíficos Pág 24 Observação Tabela Esquema de mudança social de Daniel Bell adaptado Préindustrial Regiões Ásia África América Latina Setores Primário caça pesca agric estração Ocupação Agricultor mineiro n especializado Tecnologia Matériasprimas Projeto Jogo c natureza Metodologia Senso comum exper Perspectiva Passadorepetição Princípio Tradiçãoterra Industrial Regiões Europa Ocid Oriental Setores Secundário Industrial Ocupação Operário especializado engenheiro Tecnologia Energia Projeto Jogo c máquina Metodologia Empirismo experim Perspectiva Presenteadaptação Princípio Expansão econômica Pósindustrial Regiões EUA Japão Centros europeus Setores Terciário serviços saúde consumo educação pesquisa comunicação Ocupação Técnicos e cientistas Tecnologia Informação Projeto Jogo entre pessoas Metodologia Teoria modelos sistemas simulação comput Perspectiva Futuroprogramação Princípio Centralização codificação do conhecimento Pág 25 Isto será possível pela automação quase completa da produção industrial Essa automação é resultado da segunda revolução industrial ora em marcha capitaneada pela tecnociência em especial a informática No esquema proposto pelo sociólogo americano Daniel Bell vemos que a sociedade industrial produz bens materiais enquanto a pósindustrial consome serviços isto é mensagens entre pessoas Comércio finanças lazer ensino pesquisa científica não exigem fábricas com linha de montagem mas pedem um aceleradíssimo sistema de informação Da balística dos mísseis ao ticket de metrô tudo é signo processado passado pela lógica 01 do computador Eis por que o boom se faz bit e as grandes fábricas convivem superadas em número com pequenas empresas de serviços tendo menos de 300 funcionários Codificar e manipular o conhecimento e a informação na lógica 01 é vital para as sociedades pósindustria is também chamadas sociedades programadas onde cada serviço banco biblioteca turismo tem uma tela e um teclado com dígitos para você operar A programação da produção do consumo e da vida social significa projetar o comportamento produtivo consumidor e social a partir de informações prévias O objetivo é aumentar a performance o desempenho veja a diferença de rapidez entre a perfuração manual e a eletrônica dos cartões de loteria As sociedades Pág 26 pósindustriais são programadas e performatizadas pela tecnociência para produzir mais e mais rápido em todos os setores e com isso presumivelmente facilitar a vida das pessoas Assim é mais importante descobrir um programa para computarizar um torno mecânico do que fabricar milhares de tornos mecânicos O desenvolvimento é função da qualidade do conhecimento técnicocientífico aplicado à produção As novas indústrias dos anos 70 química fina eletrônica aeroespacial comunicações estão fundadas integralmente na tecnociência A grande vantagem é que não se precisa mais recorrer ao experimento físico O conhecimento prévio resolve a questão Basta levar um modelo teórico ao computador previamente instruído com dados e se tem uma simulação completa das soluções possíveis para o problema com gráficos no vídeo ou simulacros em laser a três dimensões hologramas Poupamse tempo e dinheiro Edifícios em Londres e a invasão de Granada pelos EUA foram projetados assim Isso posto temos que nas sociedades programadas a tecnociência atravessa de ponta a ponta a vida cotidiana O ambiente pósmoderno é povoado pela cibernética a robótica industrial no Japão há 150 mil robôs nas indústrias a biologia molecular a medicina nuclear a tecnologia de alimentos as terapias psicológicas a climatização as técnicas de embelezamento o trânsito computadorizado Pág 27 junto com o walkman o videogame o videocassete o videodata tvcomputadortelefone a TV por cabo já em 40 dos lares nos EUA com 6 mil empresas no setor e os computadores domésticos Essa revolução em grande parte se deve ao chip Com milhares de microcircuitos em 12 cm2 ele reduziu a computação à escala individual Pois bem depois que a matéria se desintegrou em energia boom e esta agora se sublima em informação bit assistimos na sociedade pósindustrial à desmaterialização da economia O mundo se pulveriza em signos o planeta é uma rede pensante enquanto o sujeito fica um nó de células nervosas a processar mensagens fragmentárias Eis por que falamos há pouco em desreferencialização do real e dessubstancialização do sujeito O que foi processado em bit real é difundido em blip pontos retalhos fragmentos de informações para o sujeito O individuo na condição pósmoderna é um sujeito blip alguém submetido a um bombardeio maciço e aleatório de informações parcelares que nunca formam um todo e com importantes efeitos culturais sociais e políticos Pois a vida no ambiente pós moderno é um show constante de estímulos desconexos onde as vedetes são o design a moda a publicidade os meios de comunicação Projetando formas atraentes embalagens apelativas o design estetiza embeleza o cotidiano saturado por objetos Eles viram informação Pág 28 estética com suas cores suas superfícies lisas suas linhas aerodinâmicas e são verdadeiras iscas de sedução Vaise ao hipermercado onde a mercadoria é o espetáculo para passear e comprar gesto banal tornase um jogo de gratificação A moda e a publicidade por sua vez têm por missão erotizar o diaadia com fantasias e desejos de posse Uma carga erótica deve envolver por igual pessoas e objetos para impactar o social sugerindo ao indivíduo isolado um ideal de consumo personalizado ao massagear seu narcisismo A comunicação desde as FM até os videoclips agitase para mantêlo o tempo todo ligado na base do não se reprima O circuito informaçãoestetizaçãoerotizaçãopersonalização do cotidiano não é inocente Com modelos e imagens nos massmedia ele é o sangue dos sistemas pósindustriais Cria a própria ambiência pósmoderna Capitalistas e multinacionais os sistemas pósindustriais EUA Japão centros europeus reúnem empresas e Estado burocratizados informatizados para racionalizar a produção e a organização social pela tecnociência programadora Buscam a constante elevação do nível de vida pelo consumo acelerado de bens e serviços que são cada vez mais diversificados Ricos oferecem uma variada gama de mercadorias de modo a fragmentar o social em faixas de mercado e nelas visar o individuo arrebanhálo para o consumo persona Pág 29 lizado videocassete TV por cabo walkman microcomputador privatizam isto é personalizam o consumo da informação por exemplo Tal como atende a vários gostos no nível material o sistema comporta uma grande variedade de idéias e comportamentos A sociedade se despolitiza ao se descontrair em mil jogos aquisitivos em esportes espetáculos facilidades A participação social assim se orienta para pequenos objetivos pragmáticos eou personalizados embutidos na micrologia nos pequenos espaços do cotidiano hobbies esportes ecologia feminismo direitos do consumidor macrobiótica Um sujeito pósmoderno pode ser ao mesmo tempo programador andrógino zenbudista vegetariano integracionista antinuclearista São participações brandas frouxas sem estilo militante com metas a curto prazo e onde há expressão pessoal Renunciase aos temas grandiosos como Revolução Democracia Plena Ordem Social coisas da modernidade industrial Na pósmodernidade só há revolução no cotidiano O sistema pósindustrial temse mostrado resistente aos mecanismos de luta modernos sindicato partido Ao mesmo tempo gigantesco e diferençado ele não forma um todo e não possui centro Tendo pulverizado a massa numa nebulosa de consumidores isolados com interesses diferentes ele absorve qualquer costume qualquer idéia revolucionários ou alternativos Pois é flexível e variado o suficiente para nele conviverem os Pág 30 comportamentos e as idéias mais disparatadas Para vingar mesmo as idéias antisistema deveriam entrar pelos meios de massa serem consumidas em grande escala de modo personalizado mas isto significaria tornaremse mais uma mercadoria do sistema O próprio Estado que poderia ser um centro mortal é antes um investidor na economia e na pesquisa um administrador de serviços um encarregado da defesa externa em vez de ser fundamentalmente um aparelho de repressão política Desse modo o circuito informaçãoestetizaçãoerotizaçãopersonalização realiza o controle social agora na forma soft branda discursiva em oposição à forma moderna hard dura policial O consumo e atuação no cotidiano são os únicos horizontes oferecidos pelo sistema Nesse contexto surge o neoindividualismo pósmoderno no qual o sujeito vive sem projetos sem ideais a não ser cultuar sua autoimagem e buscar a satisfação aqui e agora Narcisista e vazio desenvolto e apático ele está no centro da crise de valores pósmoderna Cá na Belindia O Brasil já se disse é um misto de Bélgica com Índia a Belíndia Monza com miséria Somos um país em vias de industrialização mas mercadorias Pág 31 vedetes pósindustriais já pintam no eixo RioSão Paulo micros os vídeo todos etc Existem aqui 200 mil computadores e 1000 empresas na área de informática setor que cresceu 40 em 1984 Em 1982 havia 200 mil videocassetes servidos por uma maré crescente de videoclubes E o projeto Cirandão de telemática com 477 bases de dados está em andamento Mas se esse aparato é ainda pobre os signos de pósmodernismo estão nas ruas nos mass media Óculos coloridos cabelinhos newwave cintos metaleiros rock punk por ai vai Mas recentemente fulgurou na Belíndia uma verdadeira diva pósmoderna o travesti Roberta Close Por que pósmoderna Primeiro porque ela para nós e informação só passou a existir depois de produzida pelos mass media Depois porque ela é um ardil bemsucedido de simulação a bioestética com o silicone fez dela uma hipermulher repare como Close um simulacro é mais mulher que as mulheres e o referente Luis Roberto dançou E finalmente porque ela ampliou a liberação sexual na Belíndia machocêntrica ao favorecer pela banalização pela frivolidade a aceitação das minorias eróticas Pág 32 DO SACROSSANTO NÃO AO ZERO PATAFÍSICO Merda aos museus abaixo o luar Até aqui já deu para sacar o paralelismo entre sociedade industrialmodernismo e pósindustrial pósmodernismo Vejamos que diferenças existem entre eles quanto à arte A arte moderna iniciada com os movimentos e manifestos futuristas no começo deste século é um não ao passado uma revolta ante o convencionalismo na arte Contra regras antigas e castradoras o novo em liberdade de experimentação Era preciso destruir a estética tradicional estética é o conjunto de normas e valores segundo os quais numa dada época o artista deve criar e o critico julgar Essa estética tradicional impunha a Representação realista da realidade Para ela que dura do Renascimento até Pág 33 fins do século XIX a arte devia ser uma ilusão perfeita do real As vanguardas modernistas futurismo cubismo expressionismo significarão a quebra do universo racional fornecido pela ciência e refletido pela estética por muito tempo Nesse universo a Representação realista imitativa ilusionista supunha que a literatura ou a pintura espelhavam ponto por ponto o real Mas a sociedade industrial com o automóvel o avião a eletricidade os conflitos sociais a descoberta do inconsciente iria colocála em xeque O modernismo é a Crise da Representação realista do mundo e do sujeito na arte A estética tradicional fracassa ao captar um mundo cada vez mais confuso e um indivíduo cada vez mais fragmentado Novas linguagens deveriam surgir para que um sujeito caótico pudesse não representar mas interpretar livremente a realidade segundo sua visão particular Para isso a nova estética modernista cavou um fosso entre arte e realidade A arte fica autônoma libertase da representação das coisas a fotografia já o fazia muito melhor decretando o fim da figuração usando a deformação a fragmentação a abstração o grotesco a assimetria a incongruência Linguagem nova quer dizer forma nova não imitativa Nascem ai o formalismo e o hermetismo da arte moderna que é um jogo com formas inventadas Pois ela não fala de um mundo exterior Pág 34 ao quadro à escultura Deformando ou banindo o referente o real ela cria formas novas e tornase por isso autoreferencializada Ela é seu próprio assunto linhas cores volumes composição Basta comparar Da Vinci com Picasso Reconheceríamos na rua a Mona Lisa mas jamais encontraríamos fora da tela as cubistas Senhoritas dAvignon feitas em losangos que abrem a pintura moderna em 1907 Vanguarda quer dizer militar à frente De fato os modernos não só estavam à frente como estavam contra o público burguês conformista Eram boêmios bizarros críticos Queriam o escândalo Criaram uma grande tensão entre a arte e o público Levaram ao absoluto suas emoções suas visões subjetivas e declararamse anjos condutores da humanidade a arte sendo um conhecimento superior da existência Anunciaram a morte de Deus e o desespero do homem num mundo absurdo já que a carnificina da Primeira Guerra Mundial provocara uma derrocada espiritual É nesse clima que na pintura os expressionistas explodem seus sentimentos em borrões os surrealistas dão vida ao sonho com humor ou terror Na poesia Eliot Pound Mário de Andrade quebram a sintaxe usam imagens irracionais soltam as palavras em liberdade No romance Joyce Kafka e Proust descem às camadas mais profundas da mente para desvendar segredos e dissolver o tempo o personagem e o enredo realistas Na música em Pág 35 Foto Chip aumentado dez vezes por onde circula a alma pósmoderna National Geographic vol 162 nº 4 p 427 Foto Oblíquas curvas imaginação irracionalidade humor gosto popular The Language of post modern Archietecture Charles A Jencks Pág 36 1910 Schoenberg e Stravinski injetam harmonias dissonantes à primeira audição desagradáveis É uma arte irracional emotiva humanista Um caso à parte na arquitetura a Bauhaus escola alemã fundada por Gropius em 1919 fará triunfar a racionalidade funcional contra o ornamento clássico e assim projetar com ferro concreto vidro e ângulo reto as megalópoles atuais O alegre desbundar Em meados dos anos 50 a revolta modernista tinha esgotado seu impulso criador A sociedade industrial incorporara no design na moda nas artes gráficas não só a estética como o culto do novo pregado pelas vanguardas Revistas e luminárias usavam a assimetria desenhos abstratos decoravam papéis de parede A interpretação individual o hermetismo os escândalos soavam ocos ante a sociedade de massa Foi contra o subjetivismo e o hermetismo modernos que surgiu a arte Pop primeira bomba pós moderna Convertida em antiarte a arte abandona os museus as galerias os teatros É lançada nas ruas com outra linguagem assimilável pelo público os signos e objetos de massa Dando valor artístico à banalidade cotidiana anúncios heróis de gibi rótulos sabonetes fotos stars de Pág 37 cinema hamburguers a pinturaescultura Pop buscou a fusão da arte com a vida aterrando o fosso aberto pelos modernistas A antiarte pósmoderna não quer representar realismo nem interpretar modernismo mas apresentar a vida diretamente em seus objetos Pedaço do real dentro do real veja as garrafas reais penduradas num quadro não um discurso à parte a antiarte é a desestetização e a desdefinição da arte Ela põe fim à beleza à forma ao valor supremo e eterno da arte desestetização e ataca a própria definição de arte ao abandonar o óleo o bronze o pedestal a moldura apelando para materiais não artísticos do cotidiano como plástico latão areia cinza papelão fluorescente banha mel cães e lebres vivos ou mortos desdefinição Isto só foi possível por duas razões Primeiro porque o cotidiano se acha estetizado pelo design e como vimos os objetos em série são signos digitalizados e estilizados para a escolha do consumidor Depois porque nosso ambiente é todo ele constituído pelos mass media Vivemos imersos num rio de signos estetizados O artista Pop pode diluir a arte na vida porque a vida já está saturada de signos estéticos massificados A antiarte trabalha sobre a arte dos ilustradores de revistas publicitários e designers e acaba sendo uma ponte entre a arte culta e a arte de massa pela singularização do banal quando Andy Warhol empilha caixas de sabão dentro de uma galeria e diz que é escultura Pág 38 ou pela banalização do singular quando Roy Litchtenstein repinta em amarelo e vermelho cores de massa a Mulher com o Chapéu Florido de Picasso Elite e massa se fundem na antiarte Ao trocar a arte abstrata difícil modernista pela figuração acessível nos objetos e imagens de massa a antiarte pósmoderna estava revivendo o dadaísmo tendência modernista que durou pouco 19161921 e se dedicava a brincar com objetos no caos cotidiano No dadaísmo como na antiarte o importante é o gesto o processo inventivo não a obra Acabouse também a contemplação fria e intelectual dos modernos A antiarte é participativa o público reagindo pelo envolvimento sensorial corporal Brincase à vontade com as bolhas de plástico criadas aqui no Brasil por Lígia Clark Pop minimal conceitual hiperrealismo processos happenings performances transvanguarda vídeoarte seja qual for o estilo a antiarte pósmoderna se apóia nos objetos não no homem na matéria não no espírito no momento não no eterno no riso não no sério Ela é frívola pouco crítica não aponta nenhum valor ou futuro para o homem Desestetizandose desdefinindose tornando difícil saberse o que é arte o que é realidade ela tende ao niilismo a zerar a própria arte Pois na condição pósmoderna se o NÃO modernista é inútil dado o gigantismo dos sistemas então vamos desbundar alegre e niilisticamente no ZERO PATAFÍSICO Oposta às soluções Pág 39 séries a patafísica segundo seu criador o dadaísta Jarry é a ciência das soluções imaginárias e ridículas Escrituras exóticas escribas excêntricos Em literatura particularmente na ficção o pósmodernismo prolonga a liberdade de experimentação e invenção modernista mas com diferenças importantes Enquanto o modernismo lutava pelo máximo de forma e originalidade os pósmodernistas querem a destruição da forma romance como no noveau roman francês ou então querem o pastiche a paródia o uso de formas gastas romance histórico e de massa romance policial ficção científica como na meta ficção americana Num e noutro caso entretanto está fora de cogitações a representação realista da realidade o ilusionismo Na literatura pósmoderna não é para se acreditar no que está sendo dito não é um retrato da realidade mas um jogo com a própria literatura suas formas a serem destruídas sua história a ser retomada de maneira irônica e alegre Há portanto uma desdefinição do romance Existem meios para isso O nouveau roman que começa nos anos 50 destrói a forma romance banindo o enredo o assunto e o personagem Pág 40 Nathalie Sarraute escreve romances sobre nada apenas um buraco na porta por exemplo Certo conto de Nove Novena do brasileiro Osman Lins reduz os personagens a sinais gráficos A fragmentação da narrativa é total podendose misturar os narradores em geral não sabemos quem está falando Raramente o personagem tem psicologia ou posição social Pode mudar de nome cor ou idade sem razões aparentes para isso Os finais costumam ser múltiplos John Fowles em A Mulher do Tenente Francês propõe dois finais diferentes E são comuns as construções em abismo uma história dentro de outra que está dentro de outra sem fim Por sua vez a metaficção americana que produz ficção a partir de ficção entregase a paródias e a pastiches imitações irônicas de formas antigas tais como o conto de fadas no romance Branca de Neve de Donald Barthelme em que a personagem infantil é convertida em ninfomaníaca ou de formas populares como a ficção científica em Giles o Menino Bode de John Barth como a pornografia em O Almoço Nu de William Burroughs Surgem ainda gêneros indefinidos que misturam reportagem e ficção com a atuação de pessoas reais a exemplo de Dispatches romance de Michael Herr sobre o Vietnã enquanto outros embolam autobiografia com fantasia igual na literatura brasileira atual Temas como drogas perversão loucura sexo Pág 41 violência pesadelo tecnológico inclinam as narrativas para o grotesco o escabroso isto é aproximam o homem da sua natureza animal mas em clima cômico Quase sempre os textos vêm recheados com citações colagens fotos gráficos anúncios e referências à própria literatura Isto e a literatura pós moderna é intertextual para lêla é preciso conhecer outros textos To in to out Uma comparação final com o modernismo facilitará a caminhada pelo carnaval pósmoderno Na ficção como nas demais artes a antiarte prolonga traços modernistas mas às vezes acentuandoos até a extravagância Antiilusionismo experimentalismo permanecem São de lei A fragmentação do texto pode descambar para o acaso total a leitura ficando sem rumo e sem fio condutor A paródia e o pastiche antes ocasionais hoje em dia são quase regra No entanto embora sejam mais nítidas nas artes plásticas do que no romance ou no cinema por exemplo as diferenças é que servem de melhor guia Modernismo Pôsmodernismo Cultura elevada Cotidiano banalizado Arte Antiarte Pág 42 Estetização Desestetização Interpretação Apresentação Obraoriginalidade Processopastiche Formaabstração Conteúdofiguração Hermetismo Fácil compreensão Conhecimento superior Jogo com a arte Oposição ao público Participação do público Crítica cultural Comentário cômico social Afirmação da arte Desvalorização obraautor Pág 43 ANARTISTAS EM NULIVERSO Desordem e Pangresso Enquanto a arte moderna nasceu com estéticas bem claras e manifestos escandalosos a antiarte pósmoderna não apresenta propostas definidas nem coerência nem linha evolutiva Os estilos convivem sem choques as tendências se sucedem com rapidez Não há grupos ou movimentos unificados o pluralismo e o ecletismo mistura de estilos são a norma Também não existe mais vanguarda porque o público já está vacinado contra o escândalo Falase agora em transvanguarda quer dizer além da vanguarda vale tanto um estilo retrô para trás quanto a vídeoarte para frente Os anartistas pósmodernos só se sentem bem na desordem na ausência de princípios na criação sem fronteiras pangredindo caminhando para todos os lados Passemos em revista as principais manifestações artísticas que na arquitetura artes plásticas literatura cinema música Pág 44 teatro dança vieram desestetizando e desdefinindo a arte dos anos 50 para cá Pau na Bauhaus Nas artes o pósmodernismo apareceu primeiro na arquitetura já nos anos 50 O inimigo mais visado foi o funcionalismo racional da Bauhaus e seu dogma modernista a forma segue a função Primeiro a finalidade depois a beleza E funcionalismo significava racionalidade com simplicidade clareza abstração janelas em série ângulo reto Em suma os espigões das selvas de pedra em que vivemos A reação pósmoderna começa com arquitetos italianos depois com americanos e ingleses Contra o estilo universal modernista eles se voltam para o passado pesquisam novos e velhos materiais estudam o ambiente a fim de criar uma arquitetura que fale a linguagem cultural das pessoas que vão utilizála A função passou a obedecer à forma e à fantasia Aos materiais oferecidos pela indústria moderna eles acrescentam materiais abandonados cascalho ou bem recentes fórmica e plexiglass O ornamento é recuperado até colunas gregas reaparecem Os valores simbólicos o pórtico senhorial são prestigiados junto com o retorno a estilos antigos como o barroco Mas é ao orga Pág 45 nizar o espaço que o espírito carnavalesco do pósmodernismo se declara Às retas racionais opõemse a emoção e o humor das curvas Contra a pureza o ecletismo juntase ornamento barroco com vidro fumê No lugar da abstração a fantasia edifícios em forma de piano e buscase a vida com a volta da cor Evitase a série repetitiva monótona O humor é flagrante no Hotel Bonaventura em Los Angeles além dos elevadores externos que caem com espalhafato num lago o espaço interno é divertidamente complicado sendo difícil acharse o caminho para as lojas Mas a marca típica da arquitetura pós moderna é a combinatória linhas e formas curvas com linhas e formas oblíquas Dá em desequilíbrio decoração movimento bizarrice fantasia alegria o oposto do modernismo Se deu a largada na arquitetura só recentemente no entanto o pósmodernismo chegou ao design E também para desancar a Bauhaus No mobiliário na decoração onde o pioneirismo está com o Studio Menphis de Milão aparecem móveis com desenhos fantasiosos e revestimentos em cores berrantes Portas a quatro cores se abrem para camas em forma de ringue esculturas de neon piscam sobre poltronas cônicas pintadas como onça O ecletismo rompe a fronteira entre o bom e o mau gosto Exemplo brasileiro divertido é o bufê modelo Lampião em forma de trapézio com madeira folheada com plástico pés de ferro ver Pág 46 melho puxadores de latão tendo no topo um espelho em semicírculo com estrelas para lembrar um chapéu nordestino Várias idéias pósmodernas estão aí ecletismo de materiais cultura popular chapéu combinação curvaoblíqua semicírculo trapézio humor colorido contra o tédio imposto pelo bom tom e o rigor modernistas Pintandoesculpindo o sete no pedaço Decretando uma comunicação direta jovem alegre na pintura e na escultura a Arte Pop termo proposto pelos críticos americanos Fiedler e Banhan em 1956 foi a primeira expressão pósmoderna nas artes plásticas Objetos e imagens tiradas do consumo popular entram em cena Sua origem a rigor é inglesa pois foi em Londres que Richard Hamilton ainda em 1955 produziu a sua estonteante colagem O que Faz os Lares Atuais tão Sedutores painel de 3m x 3m saturado com TVs poltronas posters mulher nua halterofilista secador de cabelo Em 1963 amplamente difundida pelo mundo a arte Pop tem seu núcleo mais ativo em Nova York cujas galerias depois de rejeitálos passam a acolher os chamados cinco grandes os quais transferem para a arte culta sua experiência com os mass media Andy Warhol e Roy Litchtenstein Pág 47 foram publicitários James Rosenquist trabalhou com cartazes Claes Oldemburg foi ilustrador de revistas e Tom Wesselmann dedicouse ao desenho animado Exploremos Warhol Litchtenstein e Rosenquist Warhol ficou famoso por circular no jetset decretando em entrevistas a morte da arte Mas sua fama veio mesmo por ter pintado em cores selvagens amarelo verde rosa latas de sopa Campbell e garrafas de CocaCola repetidas em série Suas 50 Marilyns aproveitam foto publicitária da estrela no filme Niágara serializandoa em amarelo laranja e azul cores do glamour de massa mas o olho treinado no supermercado percebe pequenas variações de uma foto para outra Warhol faz arte sobre a arte de massa a foto publicitária e o real o referente Marilyn Monroe esfumouse por trás do simulacro espetacular da sua imagem massificada A escala e o impacto do outdoor fizeram a glória do fantástico F111 de James Rosenquist mural com 30m x 3m onde um avião caça F111 é fragmentado por preocupações correntes na vida americana pneus de automóveis cogumelo atômico uma garotinha no secador de cabelo e um mar de espaguete enlatado A idéia é simples quem garante a sociedade de consumo é o poder a aviação militar Rosenquist combina aqui o exagero 30 metros com o fragmento a vida feita em pedaços pelo consumo Pág 48 Décadas atrás ninguém imaginaria que o gibi acabaria em museu Mas o humor Pop de Litchtenstein recortando quadrinhos ampliandoos com projetor e pintandoos com cores muito fortes levouos para lá Esse mesmo método foi aplicado a um anúncio publicitário de luademel A mulher de maiô segurando uma bola na praia está desenhada como num gibi e comunica uma felicidade oca banalizada massificada Sua alegria vazia representa a dessubstancialização do sujeito ou mesmo a morte do sujeito de que falam os filósofos atuais No Brasil a arte Pop vai encontrar em Duke Lee Rubens Gerchman Antonio Dias Cláudio Tozzi Carlos Vergara artistas atentos à transformação da paisagem urbana e social do pais após o golpe militar de 1964 O real vira hiperreal O hiperrealismo ou fotorealismo é uma forma de Arte Pop e pósmoderna pois copia minuciosamente em tinta acrílica fotografias simulacros de automóveis paisagens urbanas fachadas anúncios que depois são apresentados em tamanho natural ou monumental hiper enorme A tinta acrílica lustrosa deixa o real mais intenso bonito ou então o poliéster na escultura deixa a figura mais Pág 49 viva vibrante como se vista numa TV a cores Novamente o pósmodernismo se apóia no simulacro Cláudio Bravo Duane Hanson Richard Smith estão entre os hiperrealistas aclamados internacionalmente enquanto Gregório Correia com quadros que surpreendem o Anhangabaú em São Paulo num abandono triste morto é o fotorealista brasileiro de maior notoriedade Na escultura as peças hiper vêm cobertas com materiais reais roupas óculos celofane etc Menos é mais Entre 1966 e 1969 a antiarte pósmoderna enveredou pela chamada Minimal Art um gesto a mais na desestetização e na desdefinição da arte tradicional A teoria minimal dizia o seguinte vamos tirar os traços estéticos forma cor composição emoção do objeto artístico e reduzilo a estruturas primárias a apenas aquele mínimo que de longe lembra arte Uma prancha de fiberglass ou um bloco de espuma plástica encostados ria parede são esculturas minimais Pois apresentam materiais industriais na sua pureza textura peso em suma nas suas qualidades mínimas de matéria Carl André Sol Le Witt Donald Judd planejaram Pág 50 e fábricas executaram esculturas com módulos padrões que se repetem e se combinam segundo regras matemáticas mudando de uma exposição para outra Na mesma medida em que a Pop homenageia o consumo e os mass media a minimal tece o elogio da tecnologia dos seus materiais sintéticos Sem mensagem sem protesto Pensar espectador pensar A Pop e a minimal desdefinem desestetizam a arte mas mantêm seu objeto o quadro a escultura A arte conceitual dá um passo a mais em direção ao vazio pósmoderno desmaterializa a arte ao dar sumiço em seu objeto Grandes ou pequenas boas ou más pinturas e esculturas são supérfluas Só interessa a idéia a criação mental do artista registrada num esboço esquema ou frase Frases se a arte é linguagem forma para representar alguma coisa ela pode ser reduzida a frases simples e diretas que valham por um objeto Os conceptualistas foram muito influenciados pela filosofia da linguagem reinante na Inglaterrae em 1968 Sol Le Witt escreveu Um trabalho artístico deve ser compreendido como um fio condutor da mente do artista para a mente do espectador Em vez de contemplar o objeto pronto o público deve ativar a imaginação para Pág 51 visualizar o que está sendo proposto pelo artista numa frase num diagrama Ambientes assim na terra como no céu A antiarte pósmoderna se desestetiza porque a vida se acha estetizada pelo design a decoração Os ambientes atuais já são arte e assim pintura e escultura podem se fundir com a arquitetura a paisagem urbana tornandose fragmentos do real dentro do real Desde os anos 60 até hoje artistas como Allan Kaprow Lucas Samarras El Lissitsky e os brasileiros Hélio Oiticica Cildo Meireles têm produzido obras que incorporam todo o espaço ambiental Objetos acumulados ou distribuídos ao acaso envolvem o espectador para que ele esteja não diante mas dentro da obra com os sentidos todos afetados Misturamse pintura escultura música arquitetura É o mixedmedia a fusão de meios É o ambiente Tropicália sala com pássaros plantas e música tropicais montado por Hélio Oiticica no Rio em 1967 São os Penetráveis de Jesus Soto tubos plásticos pendentes do teto que à nossa passagem criam ondas visuais e os Labirintos armados pelo GRAV Grupo de Pesquisa de Arte Visual sediado em Paris É She The Cathedral Ela a Catedral uma enorme Pág 52 mulher deitada em posição de coito medindo 30m x 10 m x 7m pintada psicodelicamente construída com tubos e linho em 1966 por Niki de SaintPhalle por cuja vagina quando exposta em Estocolmo passaram 80 mil pessoas A arte ambiental foi também para os espaços abertos Houve a cortina de nylon laranja com 4 toneladas e 400 metros estendida em 1972 pelo búlgaro Jaraeff Christo sobre o vale Hogback no Cobrado e lá ficando como um pássaro flexível a levantar vôo na paisagem E Hans Haacke mandaria a escultura pelos ares literalmente em 1967 com a sua Sky Line Linha Celeste 100 balões cheios de hélio alinhavados por um fio formando um colar de pérolas dançante nos céus do Central Park em Nova York Anartistas no agito happenings processos performances Desestetizada desdefinida desmaterializada a obra sumiu mas sobrou o artista O happening acontecimento é a intervenção preparada ou de surpresa do artista no cotidiano não através da obra mas fazendo da intervenção uma obra É o máximo de fusão artevida como querem os pós modernos pois utiliza a rua a galeria pessoas e objetos que estão na própria realidade para Pág 53 Foto Trabalho de Duane Hanson Florida Shopper Hiperrealismo poliéster o consumo o colorido a vida sem saídas Movements in art since 1945 Edward LucieSmith p 252 Pág 54 desencadear um acontecimento criativo É uma provocação com o público mas amplia sua percepção do mundo onde vive Essa prática se difundiu pelo mundo desde os anos 60 inclusive no bloco socialista Irromper vestido como Batman numa galeria e ali soltar pássaros e borboletas tocando uma sirene é um happening Haverá riso pânico e choque emocional no público A performance desempenho é uma variedade do happening Ela atrai a atenção para o artista e os materiais que ele utiliza para chocar o público sob algum aspecto O alemão Joseph Beuys escultor ligado em materiais pobres como a banha é um teórico da arte sem limites Sua tempestuosa performance Como Explicar Quadros a uma Lebre Morta realizouse em 1965 em Dusseldorf Beuys o rosto coberto com banha e pó dourado ficou horas e horas falando com uma lebre morta no colo O grupo vienense formado por Hermann Nitsch também manipulou animais mortos cujas vísceras eram arrancadas e mostradas ao público Schwarzkogler membro do grupo matouse em 1969 em nome da arte mediante sucessivos atos de automutilação Igual ao happening e à performance a arte processual quer ampliar ao infinito os domínios da arte pela desdefinição Objetos animais jornais postais alimentos máquinas fotos tudo pode dar arte Qualquer processo que intervenha sobre a realidade para modificála desequilibrála de Pág 55 modo inventivo e gratuito é arte Desenhar com giz uma piroquinha pequenininha sobre a enorme cueca Zorba num outdoor é arte processual Escrever um poema numa vaca que pasta como fez Herman Damen na Holanda também é Idem idem para o pãopoemaprocesso com dez metros de comprimento comido em praça pública no Recife em 1970 por cinco mil pessoas Novos bichos a Geração 80 Entre os anos 50 e 70 houve outras manifestações artísticas opart arte cinética arte pobre arte da terra mas os movimentos que resumimos vieram com o essencial do pósmodernismo comunicação direta fusão com a estética de massa materiais não artísticos objetividade antiintelectualismo antihumanismo superficial idade efemeridade fim da arte culta emotiva superior eterna Foi digamos o primeiro tempo pósmoderno Com a geração 80 cansada de tanta experimentação fechada num beco sem saídas porque a arte se desdefiniu e não tem mais para onde ir iniciase o segundo tempo É como se o pós modernismo enfrentasse cara a cara a sua verdade a invenção parece esgotada A solução assim é voltar ao passado pela paródia o pastiche o neoexpres Pág 56 sionismo Ou então atolarse no presente com imagens de TV graffiti de rua e a tecnociência expressa na vídeoarte no neonrealismo É a Bad Painting Má Pintura representada pelo americano Philip Guston que pinta grosseiramente sem refinamento como se fosse um cartunista Guston é um pioneiro da Transvanguarda liderada nos EUA por Julian Schnabel e seus quadros neoexpressionistas figuras destorcidas monstruosas feitas com tinta e cacos de louça seguida na Europa por jovens franceses e italianos Estes se dedicam à paródia e ao pastiche de mestres modernistas como Picasso De Chirico Miró Transvanguarda significa não só o fim das vanguardas mas também a defesa do ecletismo total misturamse anjos barrocos e cenários Pop e a ausência de compromisso social ou intelectual na arte Num ramo mais alegre porém ainda eclético encontramos o americano Kenny Scharf pondo o Gato Félix sobre um pedestal grego e os brasileiros Jorge Barrão que pinta gibis em tubos de tv e Carlos Matuck e Alex Vaulari com grafites em homenagem a personagens de histórias em quadrinhos Vindo das ruas para as galerias o grafitismo exige no mínimo que o artista saiba desenhar ao criar seus moldes e usar o spray Outra postura pósmoderna é a escultura com neon o neonrealismo Não só casas mas também túneis passarelas colunas estão sendo decoradas Pág 57 nos EUA com pássaros vaqueiros nuvens em esculturas lineares elétricas coloridas desenhadas no estilo comercial que ilumina a noite em Las Vegas Mas é o chip que vem provocando a novidade maior A videoarte casa computador com videogame Programandose um micro ele preenche a tela com figuras que podem deslocarse mudar de forma ou de cor ficar tridimensionais em suma pintar o diabo a quatro em forma de blips O bode entrópico Estados Unidos e França desde os anos 60 e mais recentemente a Itália são os centros irradiadores da literatura pósmoderna representada sobretudo pela ficção Nosso urbanóide lá atrás lia O Nome da Rosa do italiano Umberto Eco É um romance histórico escrito como narrativa policial situado na Itália medieval contando os crimes a violência sexual e a destruição de um mosteiro em 1327 É um livro sobre outro livro a parte perdida da Poética inacabada do filósofo Aristóteles Muita coisa é pósmoderna aí Uma delas bem antimoderna a volta ao passado Outra o recurso a uma forma antiga e gasta o romance histórico E o uso da narrativa policial um gênero de massa A intertextualidade tanto pela referência a essas formas literárias quanto pelo fato de ser um livro Pág 58 sobre outro livro a Poética O ecletismo ao misturar o sério histórico e documental com o divertimento o policial a fantasia E tratase de uma paródia um pastiche do romance histórico pois não faz sentido escreverse hoje a sério um romance sobre a Idade Média Só por jogo e divertimento Mas há outro elemento pósmoderno importantíssimo em O Nome da Rosa É a progressiva desordem reinante no mosteiro lugar fechado metáfora dos sistemas isolados que só podem receber energia de fora até culminar na sua destruição Isto espelha a situação atual decadência de valores ausência de sentido para a vida e a História ameaça de destruição atômica Mas reflete também uma idéia que está no coração da pósmodernidade a entropia Entropia significa a perda crescente de energia pelo Universo um sistema isolado pois além dele só há o nada e ele não tem assim como receber energia de fora até sua desagregação no caos na máxima desordem Essa idéia migrou da física e foi pousar na sociologia Nas sociedades atuais tudo parece rolar para a confusão sem valores sólidos sem ordem que segure a barra Pois bem a literatura pósmoderna trata desse bode entrópico seja na forma a destruição do romance seja no conteúdo a destruição do mundo e dos valores mas sem desespero com riso ou frieza Tanto a metaficção americana Pág 59 quanto o nouveau roman francês vêm promovendo esse quebraquebra São os anartistas do nuliverso anarquistas artistas do nulo universo Absurdetes americanas ou Fodase o Dia das Mães Filhos da bomba atômica com o pesadelo tecnológico pósindustrial os escritores americanos são os que mais têm vivido o drama do absurdo social Veremos como Kurt Vonnegut John Barth Thomas Pynchon entre outros responderam comicamente às vezes cinicamente a esse drama desde os anos 60 Em 1963 Kurt Vonnegut publicou nos EUA Cats Cradle Cama de Gato um romance curto em capítulos curtinhos com personagens superengraçados Só que a situação é apocalíptica Políticos cientistas religiosos empresários estão correndo atrás do Gelo9 substância cujas gotas podem congelar mares inteiros E congelam decretando o fim do mundo Um pouco antes Vonnegut faz um americano típico convertido ao bokononismo uma religião patafísica e niilista exclamar Fodase o Dia das Mães É a família em apuros Com humor cínico Vonnegut reduz a pó a tecnociência e a religião enquanto guias para o Pág 60 homem num mundo irracional O romance é pósmoderno entre outras coisas porque funde arte culta com ficção científica forma de massa e sua mensagem é patafísica só rindo do caos em que vivemos Niilistagozador genial John Barth escreve romances enormes e admira muito Machado de Assis Seu livro mais interessante Giles GoatBoy Giles o Menino Bode narra em 810 páginas as aventuras de Giles para chegar a ser o Grande Chefe dos estudantes no Campus Universitário Oeste regido pelo poderoso e maléfico computador WESCAC há anos em guerra aberta com LESCAC o computador do Leste Giles é filho de WESCAC com uma mulher mas por erro na programação saiu parecido com um bode Ele passará a vida tentando provar que é homem e herói predestinado Para isso Gimes enganará ministros tecnocratas cientistas e o próprio WESCAC seu pai em cuja presença pratica um belo 69 com sua mãe Anastácia num incesto à moda de Édipo o grego que mata o pai e come a mãe No final sem convencer que nasceu para herói um pilantra roubalhe a Grande Chefia Giles o Menino Bode é uma sátira divertidíssima do conhecimento e da História desde a teologia à matemática dos mitos gregos à guerra fria O livro é muito complexo e pode ser lido ao mesmo tempo como paródia da Bíblia do mito Pág 61 de Édipo como romance picaresco e de ficção científica No fundo é patafísico os homens perderam a cabeça caíram no ridículo deixando o computador programar seus fins e nada há a fazer a não ser rir Outro autor de grande calibre é Thomas Pynchon Físico por formação lida diretamente com a entropia em The Crying of Lot 49 O Leilão do Lote 49 de 1966 Ali ele mostra a desintegração mental de Oedipa Maas que em contato com um bando de malucos inclusive os roqueiros The Paranoids acaba destruída pelo excesso de informações desordenadas ao tentar penetrar no mistério de uma organização de correios secreta na Califórnia Qualquer semelhança com nossa época hiperinformada e superconfusa não é mera coincidência Outras absurdetes poderiam engrossar esse time O hippie Richard Brautingan escreve fábulas bonitas e trágicas situadas no Oeste americano Ronald Sukenick é um pornógrafo muito inteligente E Robert Coover reconta a morte do casal Rosemberg na cadeira elétrica nos anos 50 em seu romance The Public Burning A Execução Pública tendo como narrador advinhe quem O doce Richard Nixon Pág 62 Cerebráticos franceses ou o romance morto pela masturbação Faz 30 anos que o nouveau roman novo romance vem tentando matar o romance Para isso ele recusa o realismo o parecer verdadeiro recusa o enredo com começo meio e fim o herói metido em aventuras o retrato psicológico e social a mensagem política ou moral Contra o modernismo ele abandona o psicologismo e a literatura como conhecimento superior Por outro lado ele quer valorizar os objetos que são analisados pelo olhar como por uma câmara cinematográfica Usa vários narradores simultaneamente Mistura realidade sonho delírio para criar clima de incerteza Embaralha a ordem espacial e temporal dos acontecimentos numa extrema fragmentação E privilegia o texto o ato de escrever Com isso os cerebráticos franceses porque existe aqui muito de masturbação mental pretendem dizer que a realidade atual é impenetrável desordenada um verdadeiro bode entrópico Nathalie Sarraute Michel Butor Alain RobeGrillet Phillipe Sollers Jean Pierre Faye e Maurice Roche são os nomes significativos dessa vertente da literatura pósmoderna que realça sobretudo a técnica de construçãodestruição do romance em detrimento do conteúdo Em La Maison de RendezVous no Brasil Encontro em HongKong RobeGrillet começa e Pág 63 recomeça indefinidamente a contar sempre a mesma história um tiro num prostíbulo onde num número de streaptease um cachorro vai rasgando as roupas de uma adolescente Tudo é dúvida e fragmentação Não entendemos o que veio antes ou depois os fatos se modificam a cada versão e não sabemos quem os relata se Manneret que muda de nome e aparência ao longo do texto se Lady Ava a dona do prostíbulo se é o papo entre dois desconhecidos num bar RobeGrillet usou o mesmo estilo no filme O Ano Passado em Mariembad para mostrar o seguinte o real não existe ele é sempre a versão fragmentária parcial de alguém Temos aqui também a famosa desreferencialização do real pósmoderna junto com a paródia do romance policial cujas características realismo aventura interesse desvendamento do crime o autor quer destruir Outro nome importante no nouveau roman e Michel Butor Seu romance mais festejado A Modificação conta a viagem por trem entre Paris e Roma de um homem que abandonou a família pela amante Mas à medida que o trem avança para o futuro ele corre para o passado para suas lembranças e aos poucos vai modificando sua decisão A novidade é que o romance é narrado na segunda pessoa do singular Tu estás sentado Tu contemplas a planície É como se o autor falasse com o personagem mas porque durante a leitura nos identificamos com ele o autor passa Pág 64 a falar conosco e assim vivemos por tabela uma aventura amorosa Phillipe Sollers é o mais badalado entre os escritores da RevistaGrupo Tel Quel que nos anos 70 exerceu forte influência na França na Europa e no Brasil Seu Drame Drama 1965 põe em cena um autor às voltas com um romance que deseja escrever mas não sabe sobre o quê O verdadeiro drama são as dúvidas os suores as angústias e hesitações do autor ante o ato de escrever Seu penúltimo livro Femmes Mulheres 1983 deixa essa torre de marfim para mergulhar no feminismo atual Erotismo sedução contestação retratam a ascensão feminina na pósmodernidade Em literatura como nas demais artes o pósmodernismo é um monte de estilos pluralismo convivendo sem briga no mesmo saco Não há mais hierarquia este não é melhor nem preferível àquele E claro não há fórmula única Por isso jóias pósmodernas pintam bem diferentes umas das outras por toda parte Na Itália com Italo Calvino Cosmicomics Se um Viajante numa Noite de Inverno na Alemanha com Günter Grass O Tambor O Linguado na América Latina com Jorge Luis Borges que muitos dizem ser o avó do pósmodernismo com seus textos baseados em outros textos reais ou imaginários Júlio Cortázar O Jogo da Amarelinha e Gabriel Garcia Marques Cem Anos de Solidão Pág 65 Back to Belíndia No Brasil onde o modernismo foi um movimento cultural muito forte e influencia a literatura até hoje o pósmodernismo apresenta na ficção aqui e ali apenas traços superficiais Osman Lins em Avalovara está muito próximo do nouveau roman por seu cerebralismo Em A Festa Ivan Ângelo montou um quebracabeças político social cronológico dos mais intrigantes Rubem Fonseca em O Cobrador dá um tratamento hiperrealista ele carrega nas tintas ao sexo e à violência Os três no entanto se acham demasiado presos ao realismo ao compromisso social enquanto o pósmodernismo exige fantasia exagero humor carnaval paródia destruição Victor Giudice com seu fantasioso romance Bolero e Sérgio SantAnna nos contos com pessoas reais de O Concerto de João Gilberto no Rio de Janeiro aproximamse do pósmoderno embora por caminhos diversos Foi a poesia que nos tristes e repressivos anos 70 rompeu o compromisso com a realidade com o intelectualismo e o hermetismo modernistas e partiu para ser marginal diluidora anticultural pós moderna Brotaram a poesia do mimeógrafo a lixeratura o poema pornô com Chacal Samaral Cacaso Fred Chico Alvin Leila Mícolis Ana Cristina César São poemas espontâneos malacabados irônicos em linguagem coloquial que falam do mundo imediato do próprio poeta Pág 66 zombam da cultura escarnecem a própria literatura Seu campo é a banalidade cotidiana o corpo o consumo mas com um estilo solto frio frívolo sem paixão nem grandes imagens Ainda na poesia mais duas correntes cruzaram a fronteira pósmoderna o poemaprocesso e a arte postal Mobilizando o espaço visual da página régua e compasso na mão os poetasprocesso montam painéis com palavras e todo tipo de imagem foto diagramas rótulos anúncios Para eles o poema precisa assimilar a imagem a publicidade os signos do cotidiano abolindo o verso Um cheque ouro do Banco do Brasil carimbado com a suástica nazista era um poema processo na época da ditadura Wlademir Dias Pino Joaquim Branco Ronaldo Werneck e Álvaro Sá formam a linha de frente dessa corrente A arte postal é basicamente o poemaprocesso enviado pelo correio À margem do livro e das editoras utiliza o postal o cartaz o carimbo a xerox O poema consiste em criações em cima de mensagens já veiculadas O resultado é quase sempre humor ironia mas em tom frio pósmoderno No som no corpo na cena no cinema Embora menos freqüentes o pósmodernismo tem feito visitas à música à dança ao teatro e Pág 67 Foto Rainer Fetting Dançarinos ecletismo retrô Matisse expressionismo primitivismo Movements in art since 1945 Edward LucieSmith p 273 Foto Poemaprocesso surpresa ironia humor sobre os signos de massa Laser para Lazer Joaquim Branco Pág 68 ao cinema Na música ele assume formas diversas Está nas experiências que o revolucionário e imprevisível John Cage faz com o silêncio como nas peças compostas por Steve Reich para mãos batendo descompassadas Soa nos temas minimalistas de Philip Glass frases tocadas em uníssono repetidas à exaustão com pequenas variações de timbres e no som tecnopop de Laurie Anderson a voz humana os instrumentos e os gêneros populares ou eruditos mais o rock sendo processados pela parafernália eletrônica E de quebra temos ainda o rock punk e new wave com letras brandas descontraídas ou então niilistas tipo A Gente Somos Inútil do Ultraje Cortando o formalismo e o drama a dança pósmoderna põe no tablado até mesmo o grotesco a feiúra oferecida por dançarinas gorduchas E a desestetização Bailarinos podem ficar meia hora passando bolas de borracha uns para os outros ou ainda na linha minimalista andarem de um lado para o outro repetindo gestos banais como em Transit de Steve Paxton O grande nome no entanto é a alemã Pina Bausch cujas coreografias passando do belo ao horroroso desdefinem a dança ao máximo No teatro as experiências mais chocantes começaram com o Living Theater de Julian Beck a peça vira happening com a participação do público para vir a dar atualmente nos transvanguardistas italianos do grupo Gaia Scienza cuja peça Os Insetos Preferem as Urtigas não tem Pág 69 texto nem enredo só corpos a imitar no palco fenômenos biológicos crisálidas fetos desabrochamentos No cinema enfim com altos efeitos especiais corre solta a nostalgia acoplada à ficção científica Reina o ecletismo mistura de estilos e o pastiche imitação barata Indiana Jones é a volta ao gibi ao seriado Guerra nas Estrelas leva para o cosmos as batalhas medievais apoiandose nó computador e no laser Zelig de Woody Allen é o cinema do cinema A nostalgia dos anos 2030 é refilmada com base em documentários da época Mesclado ao filme policial o futuro espetacular da tecnociência é focalizado por Blade Runner E analisando a condição pósmoderna circularam Salvese Quem Puder de Godard note o individualismo e ParisTexas de Wim Wenders dois passeios cruéis pelo deserto atual Bit balanço Dizer Sim ou Não 0 ou 1 para a antiarte pósmoderna A discussão está em aberto Muitos a vêem decadente Das criações grandiosas de Picasso e Joyce às brincadeiras e paródias atuais sem força intelectual sem regras estéticas houve queda ou fim de padrões A arte agora é pastiche e ecletismo porque perdeu a originalidade não sabe mais criar Niilista a desestetização levou à Pág 70 morte da arte É uma Mas outros sentem no pósmodernismo uma praga boa e saudável Abala preconceitos põe abaixo o muro entre arte culta e de massa rompe as barreiras entre os gêneros traz de volta o passado os modernos só queriam o novo Democratizando a produção ele diz que venham a diferença a dispersão A desordem é fértil Pluralista ele propõe a convivência de todos os estilos de todas as épocas sem hierarquias num valetudo que acredita no seguinte sendo o mercado um cardápio variado e não havendo mais regras absolutas cada um escolhe o prato que mais lhe agrada Morte ou renovação também na arte o pósmodernismo flutua no indecidível Pág 71 ADEUS ÀS ILUSÕES O fliperama do nada O pósmodernismo desembarcou na filosofia em fins dos anos 60 com uma mensagem demolidora na mochila a Desconstrução do discurso filosófico ocidental da maneira como o Ocidente pensa e age Discurso é fala é o dito Do grego Platão no século 4 aC até o francês Sartre em nossos dias os filósofos ocidentais disseram as coisas de determinado modo com certas atitudes e pressupostos inconscientes Desconstruir o discurso não é destruílo nem mostrar como foi construído mas pôr a nu o nãodito por trás do que foi dito buscar o silenciado reprimido sob o que foi falado Com os pensadores pósmodernos a filosofia e a própria cultura ocidental caíram sob um fogo cerrado Pág 72 Rose lá na fabulazinha escrevia uma tese Em Cena a Decadência O pósmodernismo está associado à decadência das grandes idéias valores e instituições ocidentais Deus Ser Razão Sentido Verdade Totalidade Ciência Sujeito Consciência Produção Estado Revolução Família Pela desconstrução a filosofia atual é uma reflexão sobre ou uma aceleração dessa queda no niilismo Niilismo da palavra latina nihil nada quer dizer desejo de nada morte em vida falta de valores para agir descrença em um sentido para a existência A desconstrução pretende revelar o que está por trás desses ideais maiúsculos agora abalados da cultura ocidental Desde a Grécia antiga as filosofias são discursos globais totalizantes que procuram os primeiros princípios e os fins últimos para explicar ordenadamente o Universo a Natureza o Homem A pós modernidade entrou nessa ela é a valsa do adeus ou o declínio das grandes filosofias explicativas dos grandes textos esperançosos como o cristianismo e sua fé na salvação o Iluminismo com sua crença na tecnociência e no progresso o marxismo com sua aposta numa sociedade comunista Hoje os discursos globais e totalizantes quase não atraem ninguém Dáse um adeus às ilusões Mas como é possível o niilismo irracional a decadência brotar nas sociedades pósindustriais dominadas pela tecnociência pela programação Pág 73 que são a própria racionalidade na produção no trabalho na burocracia e até no cotidiano Basta olhar para o mundo atual O choque entre a racionalidade produtiva e os valores morais e sociais já se esboçava no mundo moderno o industrial Na atualidade pósmoderna ele ficou agudo bandeiríssimo porque a tecnociência invade o cotidiano com mil artefatos e serviços mas não oferece nenhum valor moral além do hedonismo consumista Ao mesmo tempo tais sociedades fabricaram fantasmas alarmantes como a ameaça nuclear o desastre ecológico o terrorismo a crise econômica a corrupção política os gastos militares a neurose urbana a insegurança psicológica Elas têm meios racionais mas só perseguem fins irracionais lucro e poder Ora o barato de alguns não todos filósofos pósmodernos é que eles não querem restaurar os valores antigos mas desejam revelar sua falsidade e sua responsabilidade nos problemas atuais Para isso eles lutam em duas frentes 1 Desconstrução dos princípios e concepções do pensamento ocidental Razão Sujeito Ordem Estado Sociedade etc promovendo a critica da tecnociência e seu casamento com o poder político e econômico nas sociedades avançadas que resultou no tão amaldiçoado Sistema 2 Desenvolvimento e valorização de temas antes considerados menores ou marginais em filosofia Pág 74 desejo loucura sexualidade linguagem poesia sociedades primitivas jogo cotidiano elementos que abrem novas perspectivas para a liberação individual e aceleram a decadência dos valores ocidentais Para essa guerra filósofos pósmodernos tais como Jacques Derrida Gilles Deleuze François Lyotard Jean Baudrillard foram buscar armas em vários arsenais Num pensador maldito Nietzsche o primeiro a desconstruir os valores ocidentais na Semiologia pois atacam as sociedades pós industriais baseadas na informação isto é no signo e no ecletismo Marx com Freud fundindo aspectos pouco conhecidos de suas obras Esse pimpampum de idéias no fliperama digital do nada é interessante Viver não é sobreviver ou o profeta de Walkman Nietzsche entrou em moda nos anos 70 e continua no hitparade Pósmoderno já no fim do século XIX ele foi fundo com o dedo na ferida atual o niilismo a desvalorização dos valores supremos o desencanto com a vida Por isso Nietzsche agride a Razão o Estado a Ciência a Organização social moderna por domesticarem o homem anulando seu instinto e criatividade Três conceitos e valores Pág 75 ocidentais vão ser desmascarados por sua crítica desconstrutiva Fim Unidade Verdade Para Nietzsche a própria criação de valores supremos significou niilismo decadência pois trocou se a vida carnal instintiva concreta por modelos ideais inatingíveis O Belo O Bom O Justo Mas vendose abandonado no universo o homem ocidental projetou valores supremos que lhe acalmassem a angústia lhe justificassem a existência Fim para garantir um sentido um happyend Unidade para assegurar que o universo é um todo conhecível pela ciência e Verdade para guiarse pelo ser pela real natureza das coisas Uma vez projetados a História ocidental se encarregou de desvalorizar os valores suprem os substituindoos pela banalidade cotidiana o conformismo o pessimismo a passividade a falta de força moral Quem se preocupa hoje com a verdade Quem busca hoje a salvação eterna Por que multidões viraram carneiros indo para o trabalho o exército o estádio Finalmente acha Nietzsche que o niilismo será a fonte para uma transvaloração de todos os valores Novos valores virão em bases mais sólidas A superação do niilismo será um rejuvenescimento cultural culminando com a chegada do Superhomem e sua aposta na vida instintiva na intensificação dos sentidos do prazer Não uma vida com ideais no Céu ou no Olimpo mas aquela que flui Pág 76 para todos os lados sem rotinas enraizada no presente e aberta ao devir ao futuro Fim Unidade e Verdade e sua valorização desvalorização e transvaloração Com isso Nietzsche está abalando três pilares da cultura ocidental cristianismo Fim o conhecimento científico Unidade e a Razão filosófica e moral Verdade A pósmodernidade é o momento em que tais valores ainda atentos e fortes durante a modernidade industrial entram em decadência acelerada Se isso vai dar ou não na transvaloração no Superhomem é outro papo Mas voltando a Nietzsche ao propor que uma outra vida lá no Céu seria o Fim do homem o cristianismo negou a vida aqui na Terra e com ela negou o corpo o prazer a alegria o presente Além disso um Deus punitivo plantou no coração do homem a culpa sua flor mais nefasta A suposta Unidade do cosmos levou a ciência a opor o Homem o conhecedor à Natureza o conhecido Ao mesmo tempo fragmentou a Natureza em campos de conhecimento Física Química Biologia e decretou pela Matemática a quantificação do mundo natural e social para tornar as coisas previsíveis isto é programáveis matando assim a eterna novidade do futuro o movimento sempre incerto com que jorra a vida Escravizandose à Verdade enfim o homem ocidental quis governar sua existência só pela Razão que supostamente mergulha no ser das Pág 77 coisas traça uma moral racional quando na realidade a vida é também instinto e emoção força e imaginação prazer e desordem paixão e tragédia Abra os jornais todo dia tem gente matando ou glorificandose por alguns desses impulsos quase nunca pela Verdade ou pela Razão Para superar o niilismo que está pondo abaixo os valores supremos alimenta o pessimismo e a fraqueza a transvaloração de todos os valores perseguida por Nietzsche ergueria uma cultura voltada para o prazer na alegria o corpo integrado à imaginação poética à arte em suma Nem a religião nem a ciência nem a filosofia mas a arte com sua embriaguez dos sentidos enraizada no presente mas aberta ao futuro a arte seria o fio condutor para um novo estilo de vida Nesse estilo quanto aos Fins nada de Deus nem de Estado mas cada um vivendo sem sobreviver realizando o melhor de si como obra de arte aqui e agora Quanto à Unidade nada de conhecimento científico de programação pois o cosmos como a vida é um jogo indefinido aberto sem direção e o pluralismo isto é a diversidade das formas dos caminhos é a sua lei Quanto à Verdade nada de conceitos universais e eternos mas a sabedoria do corpo o valor do erro e da ilusão a afirmação segundo a perspectiva de cada um o sujeito deixandose rolar pelo tempo guiado pelo pragmatismo dos instintos num ego a flutuar Pág 78 de experiência em experiência sem se preocupar com uma identidade fixa Tanta lucidez e desejo de liberação levaram Nietzsche a morrer louco em 1900 Esse profeta que pensava durante longas caminhadas usaria hoje um walkman sem som para melhor enxergar na confusão da nossa época Abaixo o Ocidente sem se preocupar Na trilha aberta por Nietzscheo filósofo Jacques Derrida que inventou a palavra desconstrução atacou a besta chamada Logocentrismo ocidental O Ocidente segundo ele só sabe pensar pelo Logos que em grego significa palavra razão espírito Paremos aqui e voltemos a fita um pouco Derrida é pósmoderno porque pósestruturalista O estruturalismo nas ciências humanas é a corrente que nos últimos 30 anos recebeu grande impulso na Lingüística e na Semiologia Ele analisa os fenômenos sociais e humanos como se fossem textos discursos A moda o casamento o sonho podem ser lidos como se fossem frases de uma língua signos com um significante e um significado no sonho as imagens são significantes cujo significado o analista descobre Pois bem na Antropologia na Psicanálise na Sociologia o estrutu Pág 79 ralismo explicou cientificamente muita coisa no homem que antes era privilégio da Filosofia comentar Assim a Filosofia ficou meio desempregada meio boca inútil Após o estruturalismo só lhe restou voltarse sobre si mesma pensar a sua própria história investigar o seu próprio discurso É aí que entra Derrida com a desconstrução do Logocentrismo No centro da cultura e da filosofia ocidentais está o Logos isto é o espírito racional que fala discursa E como O Logos é a razão e a palavra falada no sujeito humano transformando as coisas em conceitos universais O conceito cadeira por exemplo expresso pela palavra cadeira produz um modelo universal para esse objeto apagando as diferenças entre as cadeiras reais de pau de ferro de palha O conceito torna idênticas todas as cadeiras porque elimina as diferenças entre elas O Logocentrismo acaba com as diferenças entre as coisas reais ao reduzilas à identidade no conceito Mas isso não ficou apenas nas modestas cadeiras É um jeito ocidental de pensar e agir Os jesuítas convertiam as diferentes tribos brasileiras a uma idêntica religião o cristianismo Os brancos europeus submeteram vários povos de diferentes raças a uma idêntica economia o capitalismo A linha de montagem impôs a diferentes personalidades gestos idênticos O ocidente sempre se deu mal com as diferenças a do índio do negro do louco do homossexual da criança da poesia Pág 80 expulsa da República por Platão Ora embutida no Logos Derrida descobre uma cadeia desses grandes conceitos universais que atravessa toda a cultura ocidental Logos é Espírito que dá em Razão que faz Ciência que promove a Consciência que impõe a Lei que estabelece a Ordem que organiza a Produção No entanto a cadeia das maiúsculas só se promoveu reprimindo e silenciando como inferiores os termos de uma outra cadeia corpo emoção poesia inconsciente desejo acaso invenção Além de matar as diferenças em identidades o Logos comete uma segunda violência hierarquiza esses elementos valoriza torna uns superiores aos outros Os primeiros maiúsculos superiores reduzem o mundo a identidades são sólidos centrais racionais duradouros programáveis Os outros minúsculos inferiores pulverizam o mundo em diferenças são fugidios sem centro irracionais breves imprevisíveis Em guerra com a tradição ocidental ao desconstruir seu discurso para trazer à tona o reprimido Derrida e outros filósofos pósmodernos querem injetar vida nova nas diferenças contra a identidade na desordem contra a hierarquia na poesia contra a lógica Eles pensam contra as manias mentais ocidentais um pensar sem centro e sem fim mais para literatura que para filosofia Vinculado a pequenas causas é um meditar minoritário tendo como objeto o corpo a prostituição Pág 81 a loucura o cotidiano contra o Espírito a Família a Normalidade e a Grande Revolução Final Marx Freud Ilimitada Eclético por excelência o pensamento pósmoderno andou cruzando em várias posições Marx com Freud marxismo e psicanálise para desmantelar algumas ficções ocidentais Em 1972 o filósofo Gilles Deleuze e o psicanalista Felix Guattari bagunçaram as idéias contemporâneas com um petardo chamado O AntiÉdipo O livro metia a noção marxista de produção nos porões do inconsciente freudiano Este deixava de ser o cenário das imagens e emoções recalcadas para virar máquina desejante energia produtora de desejos A idéia de máquina desejante era filha do cruzamento da sociedade capitalista Marx máquina com o inconsciente individual Freud desejo Sociedade e individuo eram uma coisa só máquinas desejantes Só que entoava o AntiÉdipo essas máquinas estavam com suas energias domesticadas dirigidas para outros fins que não a liberdade e o prazer No indivíduo para ser sujeito ter uma identidade todo mundo passa pelo complexo de Édipo o desejo de matar o pai e trepar com a mãe Se a criança supera essa fase entre os 3 e 4 anos a educação terá sucesso em programar sua identi Pág 82 dade o sujeito será cidadão normal consumidor trepará bonitinho pênis in vagina com sua mulher obedecerá os horários etc Se não supera se rejeita a programação social a criança fica esquizofrênica Na sociedade capitalista dinheiro luz elétrica transportes mercadorias trabalho humano lazer são energias dominadas pela programação racional da produção e destinadas ao lucro Nos dois casos há repressão as máquinas desejantes estão com sua produção desvirtuada sem gozo pleno Para derrotar o sistema e liberar o desejo em sua plenitude a duplinha DeleuzeGuattari só vê uma saída promover o AntiÉdipo o esquizofrênico a pura máquina desejante que o Complexo de Édipo isto é a família não programou Desprogramado o esquizofrênico usa suas energias como lhe dá na telha Não come ou come quando quer não caga ou caga onde está não respeita horários nem patrões goza com todas as saliências e buracos Mas atenção conforme disse Guattari numa entrevista ele não é o psicótico que está fora da realidade Liberado em seu desejo deixando suas energias fluírem e se conectarem com outras máquinas desejantes como mais lhe agradar o esquizofrênico é o modelo para o revolucionário de nossos dias Ele desmonta ponto por ponto a programação capitalista na fábrica na família nos serviços no sexo ao liberar os fluxos de energia que correndo livremente acoplarão e desacoplarão boca e pênis ânus e seio Pág 83 tal as máquinas Isso claro é uma utopia às avessas Mas Deleuze e Guattari sabem que Estados países burocracias empresas partidos sindicatos escolas são máquinas enormes onde as energias seguem programações repressivas e assim a única liberação possível é pela Revolução Molecular fragmentar o Sistema desconstruir os grandes organismos na aula em casa no hospício no banco no trânsito na praça até reduzilo às suas menores moléculas A Revolução não virá mais da massa reunida no Partido ou no Sindicato grandes totalidades Ela se fará por despedaçamento anarquia evitandose as unidades maiores as normas os centros de comando Dai que a Revolução Molecular se bate pelo feminismo a droga a antieducação a antipsiquiatria o trabalho improdutivo Ela não berra Proletários de todo o mundo univos Mas faz correr de boca em boca Morte ao Todo viva a Partícula Outra fusão Marx com Freud foi tentada pelo filósofo francês Jean François Lyotard Ele criou uma economia libidinal libido é a energia sexual freudiana que também visa à liberação do desejo na micropolítica do cotidiano na cama no hospital no supermercado onde quer que pinte repressão A contribuição mais importante de Lyotard no entanto está no livro A Condição Pósmoderna 1979 Ali ele expõe como a tecnociência hoje coração integrado das sociedades pósindustriais e da pós modernidade não procura mais como a Pág 84 Ciência moderna a Verdade Concentrada em áreas ligadas à linguagem comunicação cibernética informática telemática ela busca a performance o melhor resultado Nestes ramos associada ao poder econômico e político a tecnociência não visa mais a conhecer o real espelhandoo em números e leis mas tende antes a acelerar informações para a indústria e os serviços produzirem novas realidades a um ritmo mais rápido e a um custo mais baixo A tecnociência tornouse performativa performance desempenho resultado As sucessivas gerações de computadores com capacidade lógica e de processamento sempre maiores não descobrem novas verdades mas ampliam a performatividade Foi assim que após semanas processando dados um computador permitiu ao ciclista Francesco Moser quebrar seu próprio recorde mundial ao percorrer 51151 km em uma hora Técnicos em medicina biologia informática coletaram dados e prepararam o evento O computador combinou as medidas coletadas até estabelecer os momentos mais favoráveis à aceleração e ao descanso otimizando a performance do corredor A máquina calculou melhor que o homem os momentos ideais para decisões humanas Mas como disse uma vendedora de vibradores no Macys em Nova York Se funciona aleluia Mais para cabaré do que para capela a cena filosófica pósmoderna tem no palco a tecnociên Pág 85 cia em contradança com o niilismo Lyotard e outros que desejam acelerar o niilismo a decadência se bate por uma ciência pósmoderna não performativa mas permissiva uma ciência do instável do contraditório do paradoxal tudo isso é antiocidental tal como surge na teoria das catástrofes de René Thon ou na da comunicação paradoxal de Watzlawick que permite entender melhor os esquizofrênicos Dessa idéia estão perto Feyerabend um cientista que avacalha a ciência em favor da liberdade humana e o físico russo exilado na Bélgica Ilya Prigogine para quem a desordem não é o caos mas parteira de estruturas racionais e práticas certos insetos constroem belíssimas arquiteturas juntando materiais ao acaso Outros querem deter a avalanche niilista O americano Daniel Bell sociólogo mais para a direita só vê a saída num retorno à religião Já Jurgen Habbermas filósofo alemão herdeiro atual da famosa Escola de Frankfurte portanto um esquerdista pensa que a saída na era da informação está na comunicação autêntica recrutando em Marx e Freud armas para combater os efeitos maléficos da comunicação de massa diluidora antihumana Outros ainda como Gilles Lipovetsky autor do livro LÉre du Vide A Era do Vazio acham o niilismo um barato pois libera o indivíduo das velharias e alimenta seu desejo de personalização e responsabilidade por si mesmo num mundo sem Deus nem o Diabo Pág 86 A MASSA FRIA COM NARCISO NO TRONO Clipextravagância Nestes anos 80 o pósmodernismo chegou aos jornais e revistas caiu na boca da massa Um novo estilo de vida com modismos e idéias gostos e atitudes nunca dantes badalados em geral coloridos pela extravagância e o humor vide o Planeta Diário brota por toda parte Micro videogame vídeobar FM moda eclética maquilagem pesada new wave ecologia pacifismo esportivismo pornô astrologia terapias apatia social e sentimento de vazio estes elementos povoam a galáxia cotidiana pósmoderna que gira em torno de um só eixo o indivíduo em suas três apoteoses consumista hedonista narcisista O individuo pósmoderno consome como um Pág 87 jogo personalizado bens e serviços do disco a laser ao horóscopo por telefone O hedonismo moral do prazer não de valores buscada na satisfação aqui e agora é sua filosofia portátil E a paixão por si mesmo a glamurização da sua autoimagem pelo cuidado com a aparência e a informação pessoal o entregam a um narcisismo militante É o neoindividualismo decorado pelo narcisismo Enquanto estilo extremamente individualista o pósmodernismo prolonga o jeito de ser liberado e imaginoso vivido na boêmia pelas vanguardas artísticas modernistas Ele é hoje a democratização no cotidiano daquilo que as vanguardas pretendiam com a arte expressão pessoal expansão da experiência vida privada Isto parece se chocar com a sociedade programada mas logo veremos como a questão é complicada e ambígua Em contraste com o individualismo moderno forjado pelo liberalismo econômico no século XVIII e que era burguês progressista tenso o neoindividualismo atual é consumista e descontraído mantendo relações muito especiais com a sociedade pósindustrial sua mãe dileta Aparentemente ele consagra o Sistema mas também lhe cria problemas De que maneira As sociedades pósindustriais planejadas pela tecnociência programam a vida social nos seus menores detalhes pois nelas tudo é mercadoria paga a uma empresa privada ou estatal seja um telex em banco ou uma hidromassagem Sendo Pág 88 economias muito ricas que têm como única meta a elevação constante do nível de vida elas deixam ao indivíduo a opção de consumir entre uma infinidade de artigos mas não a opção de não consumir Além disso há o apelo constante do novo Viver é estar de mudança para a próxima novidade Com uma gama enorme de bens e serviços para todas as faixas e gostos a seu alcance só resta ao indivíduo escolher entre eles e combinálos para marcar fortemente sua individualidade Embora a produção seja massiva o consumo é personalizado vide o cheque personalizado Assim o sistema propõe o indivíduo dispõe É o pleno conformismo e o sistema parece triunfar de cabo a rabo Mas sua vitória não é tranqüila Têm surgido contra o sistema efeitos bumerangues tipicamente pósmodernos O individualismo exacerbado está conduzindo à desmobilização e à despolitização das sociedades avançadas Saturada de informação e serviços a massa começa a dar uma banana para as coisas públicas Nascem aqui a famosa indiferença o discutido desencanto das massas ante a sociedade tecnificada e informatizada É a sua colorida apatia frente aos grandes problemas sociais e humanos Ora com mil demônios não é precisamente isso que interessa ao sistema todo mundo consumindo e conformado Até certo ponto sim Mas daí em diante é o tecido social que começa Pág 89 a se descoser a se fazer em fiapos O consumo apenas não segura a barra Eis por que para se legitimar para se garantir além da eficiência econômica o sistema precisa manter em cena velhos valores e instituições como Pátria Democracia História Família Religião Ética do trabalho ainda que eles sejam puros simulacros Prova disso são os discursos ultranacionalóides de Reagan a Reaganóia e a campanha na França para elevar a taxa de natalidade Mas a moçada está resistindo Extravagantes e apáticos vivendo em clip ritmo apressado os indivíduos que formam a massa pósmoderna estão criando uma paisagem social diferente daquela desenhada pela massa moderna Vejamos que traços a desmobilização e a despolitização vêm esboçando nas sociedades pósindustriais A massa não é mais aquela Até há pouco a massa moderna era industrial proletária com idéias e padrões rígidos Procurava dar um sentido à História e lutava em bloco por melhores condições de vida e pelo poder político Crente no futuro mobilizavase para grandes metas através de sindicatos e partidos ou apelos nacionais Sua participação era profunda basta lembrar as duas guerras mundiais Pág 90 A massa pósmoderna no entanto é consumista classe média flexível nas idéias e nos costumes Vive no conformismo em nações sem ideais e achase seduzida e atomizada fragmentada pelos mass media querendo o espetáculo com bens e serviços no lugar do poder Participa sem envolvimento profundo de pequenas causas inseridas no cotidiano associações de bairro defesa do consumidor minorias raciais e sexuais ecologia A esta mudança os sociólogos estão chamando deserção do social É como tornar deserta uma região Pela desmobilização e a despolitização o neoindividualismo pósmoderno que tende ao descompromisso ao não tenho nada com isso vem esvaziando as instituições sociais História política ideologia trabalho instituições antes postas em xeque apenas pela vanguarda artística já não orientam o comportamento individual e seu enfraquecimento é contínuo nos países avançados A deserção é uma sacação nova da massa Ela não é orientada nem surge conscientemente como também não visa à tomada do poder mas pode abalar uma sociedade ao afrouxar os laços sociais Há dados para se avaliar esse esvaziamento como igualmente há novas atitudes substituindo as tradicionais Deserção da História Não houve desertores americanos na guerra da Coréia em 1950 na do Vietnã finda em 1975 houve aos montes A massa Pág 91 moderna acreditava que a História e seus países marchava pela revolução ou pelo progresso para situações mais democráticas e felizes Esse otimismo não existe na massa pósmoderna que perdeu o senso de continuidade histórica Ela vive sem as tradições do passado e sem um projeto de futuro Só o presente conta Pátria heróis e mitos colam muito pouco num tempo programado pela tecnociência Além disso o pesadelo nuclear as crises econômicas e a velocidade de mudança estão armando para o término do século um clima apocalíptico de fim da História Por outro lado em vez de crer e atuar na História os indivíduos estão se concentrando em si mesmos hiperprivatizando suas vidas Eles investem é em saúde informação lazer aprimoramento pessoal A massa moderna queria a História quente combativa a pósmoderna quer esfriar a História congelála numa sucessão de instantes isolados e sem rumo Veja não houve uma só guerra entre países capitalistas avançados de 1945 para cá Deserção do político e do ideológico Nos EUA nas últimas eleições presidenciais entre 40 e 45 dos eleitores não votaram As greves políticas praticamente cessaram na Europa capitalista desde 1968 As eleições dependem mais da performance do candidato nos mass media que de suas idéias E ninguém no planeta acredita que políticos e tecnocratas apinhados no Estado representam o povo ou possuam altos ideais O trambique político Pág 92 é demasiado transparente No plano ideológico nos anos 70 o eurocomunismo abrandou a carranca do comunismo e as democracias sociais européias frearam a fúria capitalista Ou seja posições rígidas o comunista o fascista o capitalismo selvagem cedem lugar a posições flexíveis pragmáticas em busca da eficácia a curto prazo Até a luta sindical perde vigor na França por exemplo o índice de trabalhadores sindicalizados caiu de 50 em 1955 para 25 em 1985 Essa descrença no político faz a massa pósmoderna dar as costas para as grandes causas Ela cobra do sistema eficiência na administração e nos serviços tais como educação transportes saúde mostrandose essencial mente pragmática e não ideológica Se a modernidade teve intensa mobilização política duas guerras mundiais revoluções guerras anticoloniais a pósmodernidade se interessa antes pelo transpolítico liberação sexual feminismo educação permissiva questões vividas no diaa dia Normalmente o indivíduo pósmoderno evita a militância fogosa e disciplinada Ele é frio prefere movimentos com fins práticos nos quais a participação é flutuante e personalizada Nada de lutas prolongadas ou patrulhamento ideológico Ele vai na onda nas subculturas punk metaleira yuppie Deserção do trabalho A massa pósmoderna não tem ilusões sabe que trabalhará sempre para um sistema capitalista socialista ou marciano Por Pág 93 isso ela não crê no valor moral do trabalho nem vê na profissão a única via para a autorealização Inclinada ao lazer ela falta muito ao trabalho absenteísmo A França levou dez anos para situar seu índice de absenteísmo em pouco abaixo dos 83 atingidos em 1974 E há filósofos defendendo a improdutividade Concentrado no setor de serviços lojas bancos escritórios administração laboratórios o trabalho pósmoderno é um jogo comunicativo entre pessoas Sem a tensão da linha de montagem moderna pede antes o sorriso a descontração a moça do Bradesco por exemplo É mais leve Mesmo assim as pessoas vivem correndo para o lazer e não reivindicam tanto melhores salários como desejam uma semana de quatro dias Os esportes individuais asa delta windsurf tênis skate ski atletismo disputam com as viagens a informação o aprendizado de línguas estrangeiras e de instrumentos musicais a primazia no uso do tempo livre Deserção na família Há bom tempo a família não é o foco da existência individual Escola e mass media predominam na formação da personalidade Saise cedo de casa casase tarde descasase com facilidade e sobretudo reproduzse pouco Nos EUA pessoas morando sozinhas casais sem filhos ou coabitando simplesmente somam 57 das casas O lar afunda No lugar da família guardiã moral apoio psicológico a pósmodernidade propõe ligações abertas Pág 94 tipo amizade colorida O swing é experiência válida e a educação evolui para o permissivo ninguém expulsa a filha de casa só porque ela deu uma bimbadinha com o namorado A pílula faz recuar o poder paterno O rei pênis e seus dois assessores impõem menos o sexo genital ante a vaga homossexual e transexual em ascensão Moral branda amor descontraído Sai o tango entra o rock amor sem preconceitos sexo total Deserção da religião O pósmodernismo já se disse é o túmulo da fé As religiões antigas cedem ante uma porção de pequenas seitas sem futuro os indivíduos procuram credos menos coletivos mais personalizados meditações zenbudismo voga esoterismo astrologia e a transcendência divina acabará fechando por falta de clientes 45 dos franceses entre 15 e 35 anos não acreditam em Deus É que o homem pósmoderno não é religioso é psicológico Pensa mais na expansão da mente que na salvação da alma Há toda uma cultura psi fazendo a cabeça da moçada psicanálise psicodrama gestalt bioenergética biodança grito primal e por aí vai Para não falar no dilúvio de bolinhas e alucinógenos que rola Nisso tudo o bom é que a cultura religiosa era culpabilizante enquanto a psi é liberadora Ao sujeito pósmoderno interessa um ego sem fronteiras não uma consciência vigilante Pág 95 O vazio cintilante Vimos que desertos enfraquecidos os valores e instituições tradicionais ainda conservados pela modernidade burguesa vêm perdendo terreno na moldagem motivação e controle dos indivíduos nas sociedades avançadas Que mecanismos então exercem esses papéis O consumo os mass media e a tecnociência claro A resposta é boa mas parece de polichinelo Não diz por que nem como Vamos primeiro ao por quê As sociedades pósindustriais vivem saturadas pela informação Vaise ao consumo pela informação publicitária consomese informação no design na embalagem devorase informação nos mass media e na parafernália ofertada pela tecnociência micro vídeo etc O sujeito se converte assim num terminal de informação Mas um terminal isolado de outros terminais pois as mensagens não se destinam a um público reunido mas a um público disperso cada um em sua casa seu carro seu micro Eis por que a massa pósmoderna é atomizada ultrafragmentada Enquanto a massa moderna era um bloco movido por interesses de classe e por idéias na pósmodernidade ela é uma nebulosa de indivíduos atomizados recebendo informação em separado Ora para motivar e controlar sujeitos atomizados a autoridade e a polícia são secundárias Basta bombardeálos com mensagens que excitem seus desejos Pág 96 Agora vamos ao como De que maneira o consumo os mass media e a tecnociência modelam motivam e controlam a nebulosa pósmoderna pelo bombardeio informacional As mensagens são lançadas ao acaso mas não são boladas de qualquer jeito Não apenas representando o real mas sendo hoje o real as mensagens são criadas visando à espetacularização da vida à simulação do real e à sedução do sujeito Assim as compreende o sociólogo francês Jean Baudrillard A espetacularização converte a vida em um show contínuo e as pessoas em espectadores permanentes Antigamente os espetáculos paradas festas jogos eram ocasionais e à parte Agora a começar pela arquitetura monumental eles reinam em pleno cotidiano TV vitrines revistas moda ruas na sociedade de consumo geram um fluxo espetacular cuja função é embelezar e magnificar o diaadia pelas cores e formas envolventes o tamanho e o movimento de impacto Tudo fica incrível fantástico sensacional O espectador é o que vê mas também o que espera por novas imagens atraentes e fragmentárias para consumir Ele se acha mergulhado na cultura blip cultura do fragmento informacional cintilações no vídeo Assim por um lado a espetacularização motiva e controla a nebulosa de espectadores mantendoa continuamente à espera de novas imagens bens e serviços por outro pela estetização glamuriza e alivia a banalidade coti Pág 97 diana Procuramos nas ruas nos rostos o farto colorido das revistas e da TV Como isto é possível Pela simulação pelos simulacros Em outras épocas os simulacros mapas maquetes estátuas quadros foram instrumentos ou obras de arte Na pósmodernidade eles formam a própria ambiência diária Materiais e processos simulantes trazidos pela tecnociência reproduzem com mágica perfeição o real A fórmica simula o jacarandá Um flavourizante põe sabor morango no chocolate Batalhas siderais se travam no videogame e sintetizadores programáveis tocam flauta O silicone recicla marmanjos em gatonas vide La Close enquanto vaginas eletromasturbantes fabricam a cópula a um Pontos coloridos na TV avivam o mundo ao mesmo tempo que computadores simulam na Terra pousos lunares Vimos lá atrás certa mamãe preferindo mostrar a filha na foto no simulacro a exibir a filha real Temos aí a operação básica da pósmodernidade a transformação da realidade em signo Simulacro signo A fórmica é signo do jacarandá o Monza na TV é signo do Monza na estrada Mas e daí Daí que se o real é duro intratável o simulacro é dócil e maleável o suficiente para permitir a criação de uma hiperrealidade Intensificado estetizado o simulacro faz o real parecer mais real dálhe uma aparência desejável A fórmica é mais lisa e lustrosa que o jacarandá o Monza na Pág 98 TV surge mais ágil e nobre que na estrada Esse hiper esse mais agregado pela tecnociência aos simulacros resulta em espetáculo e em desreferencialização das coisas temos mesa de jacarandá sem jacarandá concerto de flauta sem flauta Partese então para se desejar os objetos segundo o código dos simulacros É comum as donas decasa ao prepararem um pudim industrializado se sentirem frustradas porque ele não fica brilhante como o pudim da embalagem Foise tempo em que havia separação clara entre real e imaginário signo e coisa Vivese agora entre simulacros em espetáculo para seduzir o desejo A sedução pósmoderna diz de mil maneiras ao indivíduo libere seus desejos há bens e serviços só para você A modernidade produtora de energia era dominada pela força máquinas armas disciplina polícia A pósmodernidade consumidora de informação motiva e controla basicamente pela sedução personalização comunicação erotismo moda humor Seduzir quer dizer atrair encantar artificialmente O cotidiano hoje é o espaço para o envio de mensagens encantatórias destinadas a fisgar o desejo e a fantasia mediante a promessa da personalização exclusiva Selfservice para você escolher Música 24 horas na FM para seu deleite Esportes e massagens para seu corpo À personalização aliamse o erotismo o humor e a moda que não deixam espaços mortos no diaadia O teste é Pág 99 permanente O erotismo vai dos anúncios ao surto pornô passando pela cultura psi e seu convite ao desrecalque O humor outra sedução massiva pósmoderna sabor dos tempos descontrai e desdramatiza o social Na arte moderna riase com o absurdo assunto sério Atualmente o lance é rir sem tensão descrisparse desencucarse Slogans e manchetes recorrem ao trocadilho à malícia O fino que satisfaz Cínico vadio Snoopy circula pelos jornais do mundo Lojas recebem nomes gozados Lelé da Cuca e camisetas levam ditos divertidos Sem calor videogames e fliperamas forçam o relax É normal locutores de rádio brincarem com os ouvintes e na TV noticiários são temperados com pitadas irônicas Esse humor não é agressivo nem crítico Busca um bemestar cool frio Não esquenta fica frio dão o tom pósmoderno Porém o mais doido e acelerado cavalo de batalha em ação é a moda Moda e modismos em alta rotatividade ditam o ritmo social Oposta ao bom gosto moderno com seu corte solene alta costura hierarquias a moda pósmoderna vai de extravagância e liberdade combinatória com humor na fantasia O casual comanda o mix total camisão com colete paletó com minissaia gravata com tênis O look deve ser jovem e sexy a invenção personalizada e informal Jorrando cores a moda anima a festa mercadológica que é o cotidiano e para isso promove a convivência Pág 100 de todos os estilos retrô com futurista esporte com passeio lã azul com lycra laranja E faz alusão à vestimenta oriental militar circense Também danças gírias produtos complementos tudo vai e volta sob a batuta do novo A função da moda é manter o sujeito mergulhado no presente e para que ele tenha como horizonte apenas o cotidiano não pára de botar brilho no vazio Como dizia o Gil Quanto mais purpurina melhor A essa altura inteligente o leitor deve estar pensando mas o ambiente pósmoderno é pura ilusão Quase Empresas e tecnocratas levam uma grana alta Levam É puro trambique e mistificação em cima de gente alienada Seria Para que fosse seria preciso explicar um detalhe desagradável a adesão maciça dos indivíduos ao consumo E não quaisquer indivíduos mas gente escolarizada bem informada pagando altos impostos Não dá para chamálos de alienados porque como vimos nas várias deserções eles não querem o poder Querem espetáculos e bons serviços E repetindo sabem que no frigir dos ovos terão de trabalhar sem estar no poder em qualquer regime dada a complexidade das sociedades atuais O problema é outro A riqueza pósindustrial é em grande parte financiada pelos países em desenvolvimento pois o capitalismo avançado se fez multinacional Vem para cá a indústria pesada e suja aço automóveis ficam lá as leves e limpas Pág 101 eletrônica comunicações Seu controle social pode ser soft brando pela sedução mas o nosso tem de ser hard moderno duro policial na base do cassetete Eu me amo eu me amo eu não consigo viver sem mim Se o neoindividualismo conduziu a massa fria a nebulosa atomizada à desmobilização o que está acontecendo ao indivíduo pósmoderno Ele é o narcisista acossado pela dessubstancialização do sujeito Vamos destrinchar isso Em 220484 o jornal Le Monde publicou o retrato falado do novo egoísta em ação Pragmatismo e cinismo Preocupações a curto prazo Vida privada e lazer individual Sem religião apolítico amoral naturista Narcisista Na pósmodernidade o narcisismo coincide com a deserção do indivíduo cidadão que não mais adere aos mitos e ideais de sua sociedade Esse esboço contraria da cabeça aos pés o indivíduo burguês e moderno Antes porém uma banda filosófica No ocidente o sujeito humano em oposição ao objeto era até há pouco o senhor absoluto do conhecimento racional da liberdade da criação Há décadas no entanto as Ciências Humanas vieram borrar essa imagem ao descobrir Pág 102 seus condicionamentos e limites A psicanálise revelouo o escravo do seu inconsciente irracional O marxismo deuo como escravo da sua classe social e um átomo insignificante na massa E a lingüística disse que seu pensamento criador era na verdade escravo das palavras Falouse então até na morte do sujeito Assim o indivíduo burguês que supunha uma identidade fixa e uma liberdade total aferrado ao dinheiro como capital tanto quanto a princípios morais e a valores sociais esse sujeito dançou Os modernos na arte começaram a caricaturar seu retrato a expor sua falsidade Os indivíduos pós modernos na prática vêm tendendo ao máximo à sua dissolução Na ambiência Pósmoderna espetáculo simulação sedução constituem jogos com signos A esse universo informacional sem peso e desreferencializado só pode corresponder um sujeito informatizado leve e sem conteúdo É o Narciso dessubstancializado Narcisismo amor desmedido pela própria imagem e dessubstancialização falta de identidade sentimento de vazio resumem o sujeito pós moderno Vimos na fabulazinha que o urbanóide pósmoderno podia ser uma criança radiosa aquela dedicada ao hedonismo consumista cultuando narcisicamente seu ego O micro facilitalhe a vida Mil serviços trabalham sua aparência A cultura psi lhe dá massagens mentais Sempre na moda Pág 103 seu gosto é eclético vai de ET a Fassbinder no cinema do poema pornô a Borges em literatura Versátil desenvolto o sujeito blip feito com fiapos de informação e vivências não tem ego estável nem princípios rígidos Descontraído mutante seu ego flutua conforme os testes das circunstâncias É um experimentador um improvisador por excelência pondo mais em se na prática e na sedução que nas idéias Narciso sem substância a criança radiosa bem poderia ser a cantora Madonna charme com raio laser Mas com essa criança glamurizada mora um outro o andróide melancólico também dessubstancializado e narcisista Em sociedades movidas a informação acelerada o sujeito também vira signo em alta rotação sem substância por baixo Os valores foram trocados pelos modismos os ideais pelo ritmo cotidiano Saturado de consumo e informação ele encosta no conformismo refletindo a famosa apatia pósmoderna Sem laços ou impressões fortes sua apatia logo cai na depressão e na ansiedade ambas melancólicas A melancolia sentimento frio é o último grau da apatia a doença da vontade prevista por Nietzsche para o homem ocidental quando ele fosse o andróide programado pela tecnociência Temendo a robotização mas sem projetos sua vida interior é sem substância Absorvido em si e nostálgico sempre a analisarse como Narciso sua sensação mais comum é de irrealidade O Pág 104 andróide melancólico bem poderia ser Woody Allen com seu desencanto humorado e frio Criança radiosa e andróide melancólico são modelos ideais que em doses variadas entram na sensibilidade dos indivíduos pósmodernos Eles espelham ainda os dois niilismos da atualidade o niilismo ativo da criança radiosa que acelera a decadência em direção a um possível Renascimento e o niilismo passivo do andróide melancólico desorientado pelo fim dos valores tradicionais amedrontado pelo apocalipse nuclear ou ecológico Agora pondo na mesma cama Madona e Woody Allen que criatura eles iriam gerar Sem dúvida que Boy George Fixem os vários visuais dele Em todos ele aparece homem e mulher colorido e branco infantil e programado desenvolto e apático permissivo e frio fascinante e melancólico Boy George não tem a unidade nem a identidade fixa do indivíduo burguês moderno Múltiplo ele é o próprio sincretismo pósmoderno O indivíduo atual é sincrético isto é sua natureza é confusa indefinida plural feita com retalhos que não se fundem num todo Por isso nas definições da sensibilidade pósmoderna as palavras nunca batem apatia desenvolta desencanto extravagante narcisismo melancólico Tomemos a apatia desenvolta Apatia quer dizer insensibilidade indiferença falta de energia Desenvolta significa desembaraço inquietação personalidade Os dois termos são Pág 105 quase contraditórios mas convivem lado a lado no indivíduo pósmoderno São fruto da programação oferecida pelo sistema e da personalização buscada pelo sujeito duas coisas meio em choque Mas a apatia desenvolta a agitação sem felicidade salta aos olhos quando no indivíduo se juntam vazio e colorido na danceteria tédio e curiosidade ante um filme pornô frieza e fascinação ante os dígitos na tela de um computador banalidade e excitação no shopping center Por que isso Porque no mundo pósmoderno objetos e informação circulando em alta velocidade são descartáveis Da mesma forma os sujeitos também produzem personalidades descartáveis Bom Mau Indecidível ninguém sabe São simulacros espetaculares e sedutores de si mesmos Vide a importância da maquilagem David Bowie de baton declarou quando me canso das minhas expressões maneirismos aparência me dispo deles e visto uma nova personalidade Ao mesmo tempo num mundo de máquinas frias igual ao computador que só funciona em ambientes com temperatura inferior a 18C os sujeitos também espelham frieza distância indiferença Assim o ritmo agitado criado pelo descartável e o novo aliado à frieza do ambiente tecnológico bem podem explicar a apatia desenvolta e a dessubstancialização do Narciso O sujeito pósmoderno é a glorificação do ego no instante sem esperança alguma no futuro Pág 106 DEMÔNIO TERMINAL E ANJO ANUNCIADOR e e e e e e e Conseguimos dar corpo ao fantasma do pósmodernismo Sob esse rótulo em contraste com o modernismo descrevemos as mudanças ocorridas nas sociedades pósindustriais desde os anos 50 Tais mudanças afetaram as ciências a tecnologia as artes o pensamento o social o individual e começaram a delinear um ambiente e condição inéditos para o homem O ambiente pósmoderno instalandose como uma teia na paisagem moderna é o cotidiano povoado pela tecnociência micros vídeos laser biotecnologia medicina nuclear e o diabo a quatro em bens e serviços para o indivíduo consumir num pique de liberação e personalização onde é importante o papel dos modelos gerados pela publicidade e os mass media É um ambiente mais para cool frio pois o chip é sem calor enquanto Pág 107 Foto Desdefinição da arte levada a conseqüências extremas Before ou after Permutations 1972 Wegman Traverses nºs 3334 pp1623 Pág 108 O automóvel deus moderno é uma máquina hot quente Socialmente ele se inclina para o soft brando pela informação comunicação e sedução contra o hard duro moderno que privilegiava a indústria a crítica a luta de classes a polícia a tensão Quanto à condição pósmoderna aí o buraco é mais embaixo Condição quer dizer como é que as pessoas sentem e representam para si mesmas o mundo onde vivem Ora a condição pósmoderna é precisamente a dificuldade de sentir e representar o mundo onde se vive A sensação é de irrealidade com vazio e confusão Só se fala em desencanto desordem descrença deserto É como se a lógica e a imaginação humana falhassem ao representar a realidade e alguma coisa estivesse se esvaziando zerando Olhemos o quadro abaixo Sacamos que o pós continha vários des princípio esvaziador Outros des poderiam ser apontados Com que soma algébrica com que resultado Des referencialização do Real Des materialização da Economia Des estetização da Arte Des construção da Filosofia Des politização da Sociedade Des substancialização do Sujeito Des Des Soma ZERO da Pág 109 Um minuto mais Parece claro como água que esta série de des está esvaziando todas as ordenadas estáveis com que o Ocidente até a modernidade representou o mundo para si mesmo o Real são os referentes não os simulacros a Economia é matéria feita energia não informação a Sociedade são os ideais políticos dos cidadãos e do Estado não as causas minoritárias Pois salvese quem puder porque essa representação está sendo esvaziada e no limite um dia poderá ser zerada Devagar com o andor Para representar as coisas com clareza precisamos organizar e para organizar precisamos de identidades fixas e definidas que permitam separar isto daquilo preto ou branco rico ou pobre real ou imaginário A representação clara ordenada funciona na base do OU que é separação e exclusão Até a modernidade trabalhouse assim erase capitalista ou socialista normal ou louco culto ou analfabeto Agora mergulhe na geléia geral pósmoderna Pense na confusão mundial cheia de ameaças E no gigantismo na complexidade inimagináveis dos sistemas E nas mágicas da tecnociência robôs japoneses que dançam valsas e micros com 1 milhão de operações por segundo e romances telemáticos para o leitor ler no vídeo não seguindo o enredo mas montando o seu enredo e máquinas sutis capazes de registrar até 1 nanossegundo 0000000001 s proezas impossíveis para a mente humana A tecnociência inclusive com seus Pág 110 meios poderosos de simulação como o som de f lauta que não vem de flauta está alterando as formas humanas de pensamento percepção tempo e espaço E pense ainda em Boy George o homem e mulher e na moda unissex masculina e feminina e no vulcapiso borracha e mármore e na arquitetura barroco e moderno e clássico e na escultura com laser massa e luz e no sujeito blip apatia e desenvoltura A imaginação e a inteligência broxam Nada tem identidade definida Não se distingue o verdadeiro do falso Só há combinações ecletismos Estáse passando de uma lógica fundada no OU para uma lógica calcada no e Com isso não se pode separar nem ordenar ou seja representar Aqueles des esvaziadores no limite darão como soma o ZERO DA REPRESENTAÇÃO Na condição pós moderna num ambiente saturado com informações tão volumosas tão rápidas e tão complexas o sujeito humano não consegue mais representar o mundo em que vive Ele se dissolve em blip num real desfeito em bit Assim todo o rebu pósmoderno passa por um paradoxo muito louco NÃO SE PODE REPRESENTAR O FIM DA REPRESENTAÇÃO Sem identidade hierarquias no chão estilos misturados a pósmodernidade é isto e aquilo num presente aberto pelo e A tecnociência avança maravilhosa programando tudo mas sem rumo Pág 111 O sujeito blip sem perseguir uma identidade única harmoniosa vive a vida justapondo lado a lado suas vivências e e e e Vivências pequenas fragmentárias porque não se crê mais em totalidades ou valores maiúsculos tipo Céu Pátria Revolução Trabalho mas se prestigia a prática na micrologia do cotidiano Assim posto enfim o pósmodernismo continua a flutuar no indecidível Não há como decidir Fim do moderno e começo do pósmoderno E demônio terminal e anjo anunciador Na condição pós moderna como já se disse a vida não é um problema a ser resolvido mas experiências em série para se fazer Abertas ao infinito pelo pequenino e Pág 113 INDICAÇÕES PARA LEITURA Há pouquíssimos livros sobre pósmodernismo publicados em português Mas você caso entre numa poderá se aprofundar no assunto encarando um tijolo de 500 páginas chamado A Terceira Onda de Alvin Toffler Ed Record bestseller importante sobre as sociedades pósindustriais Trabalho dos mais inteligentes é A Máquina de Narciso de Muniz Sodré Ed Achiamé evidenciando os ardis pelos quais a televisão vem forjando o mundo de hoje como telerrealidade Imperdível inclusive pelo prazer da leitura é A Viagem pela Irrealidade Cotidiana de Umberto Eco Ed Nova Fronteira um passeio intrigante e bem humorado pelas extravagâncias das sociedades pósmodernas Igualmente proveitosa é a leitura de A Cultura do Narcisismo de Cristopher Lasch Ed mago estudo sobre o apego narcisista do indivíduo a si mesmo com estilo meio contestador Para checar os aspectos filosóficos e sociais das artes moderna e pósmoderna especialmente na arquitetura é bom abrir o compacto mas denso Da Vanguarda ao PósModerno de Eduardo Subirats Ed Nobel Finalmente se você nunca esteve com uma granada niilista nas mãos vá correndo pegar o panfleto altamente explosivo mas cerebral do francês Jean Baudrillard intitulado À Sombra das Maiorias Silenciosas Ed Brasiliense Sobre o autor Sou poeta ficcionista e ensaísta Nasci em 1946 em Cornélio Procópio norte do Paraná Desde 1971 resido no Rio de Janeiro onde me formei em Comunicação e Editoração pela UFRJ tendo em preparo atualmente dissertação de mestrado sobre Pésmodernismo Sou autor do livro de contos Kafka na Cama Civilização Brasileira 1980 e do volume de poemas A Faca Serena Achiamé 1983 premiado pela Associação dos Críticos de Arte de São Paulo Gosto de jazz de futebol de cinema e de longas caminhadas Montale Hart Crane Wallace Stevens e Mário Faustino estão entre meus poetas preferidos Osman Lins Clarice Lispector John Barth John Updike Kafka Musil e Proust são os ficcionistas que mais admiro Trabalho presentemente em novo livro de contos Corações Gentis