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A Clínica Psicológica Infantil em uma Perspectiva Existencial 185 Revista da Abordagem Gestáltica XVII2 185192 juldez 2011 A r t i g o A CLÍNICA PSICOLÓGICA INFANTIL EM UMA PERSPECTIVA EXISTENCIAL1 The childrens psychological clinic in an existential perspective La clínica psicológica de niños en una perspectiva existencial ANA MARIA LOPEZ CALVO DE FEIJOO Resumo Neste artigo tentaremos responder aos questionamentos acerca da viabilidade de uma clínica psicológica com base na filosofia da existência Iniciamos assinalando aspectos que apontam para a possibilidade de uma clínica psicológica infantil em uma perspectiva existencial Para tanto consideraremos que o que está em questão na criança ou seja seu caráter de indeter minação de liberdade e de cuidado em nada difere do adulto E que os aspectos essenciais na postura do clínico são a atitude fenomenológica e a preocupação libertadora Desta forma o psicólogo clínico prescindindo de qualquer posicionamento teórico e da respectiva categorização acerca do comportamento infantil pode acercarse do fenômeno tal como esse se apresenta Palavraschave Clínica infantil Fenomenologia Filosofia da existência Heidegger Abstract In this article we will try to show a child psychological clinic is possible under the existential perspective So for this we will start by considering that what is at issue in the child ie their character of indetermination freedom and care dif fers nothing from adult And that the essential aspects of posture are clinical phenomenological attitude and liberating con cern Thus the clinical psychologist besides any theoretical position and categorization about childs behavior can get closer to the phenomenon as it presents itself Keywords Child clinics Phenomenology Philosophies of existence Heidegger Resumen En este artículo intentaremos mostrar elementos que hacen viable la clínica psicológica en una perspectiva existen cial Por lo tanto vamos a empezar por considerar lo que está presente en el niño es decir su carácter de indeterminación y libertad que en nada difiere del adulto Y que los aspectos esenciales de la postura clínica son la actitud fenomenológica y la preocupación libertadora Así el psicólogo clínico sin cualquier posicionamiento teórico y sin la categorización del comporta miento infantil se acerca del fenómeno tan como éste se presenta a él Palabras clave Clínica com niños Fenomenología Filosofías de la existencia Heidegger Introdução Apresentar a clínica psicológica em uma perspectiva existencial consiste em uma tarefa desafiadora na medi da em que muitos estudiosos da psicologia consideram a relação da Filosofia com a Psicologia algo improvável Por esse motivo consideramos que muito mais do que convencer os nossos leitores da viabilidade desta rela ção devemos problematizála Porém como não só esta beleceremos um diálogo entre a filosofia da existência e a Psicologia mas também traremos à discussão a clínica psicológica e a infância consideramos que primeiramen te teremos muito mais elementos a serem clarificados para depois pensarmos na viabilidade da clínica psico lógica existencial na primeira etapa da vida A tarefa então para ser executada dependerá de seguir um per curso até podermos dispor dos elementos necessários à problematização da proposta e a consequente discussão 1 Trabalho apresentado ao II Congresso Sul Brasileiro de Fenomeno logia II Congresso de Estudos Fenomenológicos do Paraná 24 de junho de 2011 Universidade Federal do Paraná UFPR de sua viabilidade Importante aqui é trazer como esses filósofos mais especificamente Heidegger interpre tam temas tais como seraí indeterminação liberdade e responsabilidade E ainda de que modo eles dialogam polemicamente com as classificações diagnósticas muito próprias da modernidade Para a realização de nossa tarefa primeiramente te remos que nos deslocar das teorias psicológicas tradi cionais acerca do desenvolvimento da personalidade e da aprendizagem da criança e nos reconduzirmos ao fe nômeno da experiência infantil tal como ela se mostra Esse modo de reconduzirse ao fenômeno denominase Fenomenologia Para exercitarmos uma outra visada sobre a experiên cia em questão traremos alguns esclarecimentos sobre o modo como os filósofos da existência por meio de um posicionamento fenomenológico discutem e posicionam o ser da criança Os três filósofos da existência mais dis cutidos Kierkegaard Heidegger e Sartre partem da noção de que a existência acontece desde o início pelo seu caráter de indeterminação e negatividade daí o fato Ana M L C Feijoo 186 Revista da Abordagem Gestáltica XVII2 185192 juldez 2011 A r t i g o da liberdade da angústia e do desespero serem consti tutivos do existir E já ao nascer a indeterminação traz em si essas outras condições Logo a criança desde seu nascimento constituise respectivamente como espírito Kierkegaard como seraí Heidegger ou como parasi Sartre Ou ainda em uma abertura indeterminação e negatividade que estarão presentes em toda a sua existên cia É no decorrer de sua vida que a criança tomará para si o seu modo de ser em sua incompletude e sempre em jogo com as determinações do mundo A partir da filosofia da existência buscamos o que acontece frente à indeterminação e negatividade da exis tência Já que nada a princípio determina o homem como ele se constitui Como ele se determina Tratase então de uma tabula rasa Para desenvolver essas questões teremos que trazer à baila a discussão acerca do caráter de imanência da existência da cooriginalidade homem mundo de ter de ser em abertura em que o existente tornase responsável por constituirse no mundo desse ser que é responsável pela sua existência Iniciaremos para isto com esclarecimentos sobre a noção de inten cionalidade tal como introduzida e amplamente estuda da por Husserl e de seus desdobramentos em Heidegger com a noção de seraí Por fim trataremos de que modo acontecem na facticidade os processos de atribuição de identidade e de como tal procedimento acaba por resul tar em primeiro lugar em escapar do caráter de negati vidade e indeterminação Embora o homem tenda a escapar a sua negativida de e indeterminação buscando uma identidade ao mes mo tempo tenta escapulir da identidade que o outro lhe atribui por um clamor de sua liberdade Esses proces sos identificatórios acabam por alicerçar as categori zações e os diagnósticos tão frequentes na atualidade Diagnósticos que muitas vezes aliviam a angústia frente à indeterminação mas retira do homem a responsabili dade pelos seus atos e escolhas Por fim além do mundo passar a justificálos também os tutela Essa discussão em Heidegger 19271989 vai dirigirse ao modo que ele interpreta a lida com os utensílios Dado como esta se dá por meio das determinações dos objetos tendemos a nos compreender do mesmo modo que compreende mos aquilo que manuseamos logo também como se nos constituíssemos por meio de determinações e sentidos previamente dados Após esclarecermos as questões acerca da constitui ção da existência discutiremos a viabilidade de uma clí nica psicológica existencial com crianças Sabemos que Heidegger 19872001 apenas referese à clínica psicológi ca nos Seminários de Zollikon Mas por outro lado sabe mos também que a tentativa de articular a Fenomenologia hermenêutica com a clínica psicológica data dos meados do século XX com dois proeminentes psiquiatras Ludwig Binswanger e Medard Boss que mesmo pouco estudados principalmente aqui no Brasil jamais foram esqueci dos A questão que se impõe consiste em perguntar sobre o risco iminente de traduzir o pensamento filosófico em termos de mais uma disciplina E como tal acabar por reduzir as reflexões filosóficas em um produto palpável intercambiável e técnico Mas se não é isso o que que remos Como fazer para que não aconteçam essas redu ções Devemos manternos com muito esforço no cam po de questionamentos da clínica psicológica e não no das certezas Assim mantemonos em um espaço em que não importa o numérico os resultados as informações e as teorias Importa o deixarse corresponder ao essencial em uma clínica infantil Por fim despenderemos de todo esforço para apre sentar os fundamentos da filosofia da existência com um maior detalhamento das considerações heideggeria nas tentando não recair em uma disciplina ou em uma nova técnica que nos diga como devemos proceder para obtermos resultados efetivos e eficazes Para tanto ini ciaremos apresentando aquilo o que caracteriza uma fi losofia da existência A filosofia da existência consiste em não partir de pressupostos de que a constituição do homem já está apriori dada seja pela constituição biológica psíquica ou pelos condicionamentos ambientais Nesses três pressu postos o homem já ao nascer apresentase passivo frente a estas determinações A filosofia existencial defende o caráter de indeterminação da existência a partir do que esta se constitui Logo é no existir em sua articulação homemmundo que a existência acontece Este modo de articular à existência humana é expressa na máxima de Sartre 19431997 de que a existência precede a essên cia afirmativa esta que mesmo criticada por Heidegger 19471987 não deixa de tornar clara a situação de inde terminação da existência O Método Fenomenológico e a Investigação do Ser da Criança Heidegger 19471987 ao tecer considerações acer ca do sentido da existência nos primeiros anos de vida assume uma atitude fenomenológica para discorrer so bre o seraí da criança Para tanto vai suspender toda e qualquer pressuposição teórica seja da Psicologia ou da Biologia acerca do comportamento infantil E assim po der deixar que o sentido do fenômeno se dê no próprio campo de mostração deste fenômeno Husserl 1952 2007 vai denominar este posicionamento referente àquilo que se mostra de atitude antinatural Esta consiste em re duções fenomenológicas exercício que requer um esfor ço incessante para alcançar o fenômeno deixando para trás todas as pressuposições sobre o mesmo Ainda de Husserl Heidegger manteve a tese de que a consciência não pode ser tomada a partir de uma concepção de que esta se constitui como substância e de que se encontra espacial e temporalmente determinada Husserl confere à consciência uma imanência logo por seu caráter de inten A Clínica Psicológica Infantil em uma Perspectiva Existencial 187 Revista da Abordagem Gestáltica XVII2 185192 juldez 2011 A r t i g o cionalidade encontrase sempre dirigida aHeidegger denomina então de Dasein seraí a este campo de ima nência onde a existência se dá A Psicologia dispõe de diferentes teorias do desenvol vimento infantil que muitas vezes servem de base para a compreensão do modo de ser da criança por meio dos critérios de normalidade e ajustamento podendose assim prescrever os comportamentos inadequados desajusta dos enfim fora dos padrões estabelecidos pelo numéri co ou qualitativo Assumir uma postura fenomenológi ca frente ao fenômeno consiste em suspender qualquer posicionamento ontológico seja da ciência ou do senso comum sobre as coisas fenômenos Sem qualquer posi cionamento ontológico prévio acerca do comportamento das crianças é possível assim se aproximar daquele modo que se mostra em sua expressão singular O Caráter de Indeterminação da Existência Cuidado e Liberdade Cabe esclarecer que liberdade na perspectiva exis tencial diz respeito ao fato da indeterminação da exis tência o que torna o homem responsável por aquilo que fizer de si A indeterminação a liberdade e a angústia são temas presentes nos três grandes representantes da filosofia que se voltam para a existência anteriormente mencionados Kierkegaard 18422010 referese à posição psicológica de liberdade como sendo a posição que o ho mem se apresenta frente a sua indeterminação e respec tiva angústia À tentativa de escapar da mobilização da angústia Kierkegaard denomina de posição psicológica de nãoliberdade na qual o homem tenta a qualquer preço posicionarse como se ele fosse determinado por algo que transcende seu existir Heidegger 19271989 denomina essa situação de cuidado que consiste em tomar o seraí como aquele que sempre tem de ser e assim ele tem de assumir a tutela por sua existência Sartre 19431997 diz que estamos fadados à liberdade Logo a criança seraí parasi que desde sempre é um existente não prescinde de seu caráter de indeterminação liberdade e responsa bilidade por sua existência e a tentativa de fugir dessa condição é o que muitas vezes mobiliza a criança e seus pais a buscarem psicoterapia A liberdade e a responsabilidade na perspectiva exis tencial dizem respeito ao caráter de indeterminação da existência e ao fato de que qualquer que seja a etapa da vida cada um tem de cuidar de sua existência Os fi lósofos da existência apontam para a indeterminação como o caráter mais próprio do existir Kierkegaard em O conceito de angústia esclarece a situação de indeter minação do homem como marca da existência humana A este respeito diz O surgimento da angústia condensa o fulcro de toda a questão O ser humano é uma síntese de corpo e alma esta apenas se torna inimaginável se ambos os elementos não se reunirem em um terceiro O terceiro é o espírito No estado de inocência o homem não é apenas um animal e finalmente e se alguma vez o fosse em qualquer instante de sua existência nunca se tornaria homem Assim o espírito já está presente ainda que em um estado de imediatidade de sonho Kierkegaard 18422010 p 47 O pensador dinamarquês responde prontamente a per gunta que ele mesmo colocou Qual é portanto a relação do homem com a potência ambígua Qual é a relação do espírito com ele mesmo e com sua condição A relação é a angústia ibid p 47 Para este filósofo aquilo que confere humanidade ao homem é a presença do espírito síntese do eterno e do temporal do finito e infinito dos possíveis e do necessário mesmo que de início esse se encontre adormecido Heidegger na mesma linha de pensamento de Kierkegaard em Ser y tiempo 19271989 já afirma que as estruturas existenciais não são estruturas ônticas e nesse sentido elas podem ser encontradas em qualquer experiência de mundo do seraí Isto não diz respeito apenas à caracterização do seraí europeu desenvolvi do mas tanto ao que se refere ao seraí infantil como ao seraí dos povos primitivos o que estará em questão é o seraí humano E a base do seraí humano é seu cará ter essencialmente histórico E por mais que Heidegger 19292008 afirme que as estruturas existenciais se mos tram mais claramente no homem primitivo ou no aborí gine por conta da simplicidade da vida desses homens as estruturas históricas existenciais estão presentes em seu caráter de aí em todos os homens em todas as épo cas lugares ou fases de desenvolvimento de suas vidas E é a partir deste caráter que o seraí conquista o poder ser que ele é Sartre 20051939 em seu conto A infância de um chefe deixa clara a sua defesa ao caráter de indetermi nação e liberdade presentes no percurso de vida do prota gonista do conto Lucien Fleurier O filósofo traz o modo como Lucien vai traçando a sua existência do princípio ao fim O marcante nesse trajeto é que sempre ele tem de escolher frente àquilo que o mundo lhe apresentava mostrando que a determinação está ausente A tarefa de Lucien consiste em determinarse por si mesmo por meio das referências da sua situação Agora vale ressaltar como acontece esse constituirse já que a criança ao nascer já se constitui na relação com o mundo Cabe perguntar como isto é possível se a criança nada sabe nada conhece Não haveria uma determina ção biológica que a levaria a sobreviver conduzindoa a alimentarse Ou ela não sobreviria caso não tivesse a presença de outros homens Estas questões foram ampla mente debatidas na década de 50 e 60 quando o menino Victor abandonado em uma selva nos primeiros anos de vida foi encontrado em Eveyron na França A partir de Ana M L C Feijoo 188 Revista da Abordagem Gestáltica XVII2 185192 juldez 2011 A r t i g o então todos os posicionamentos teóricos sejam inatistas ou empiristas tentaram comprovar suas teses por meio daquilo que no comportamento de Victor evidenciaria e comprovaria as premissas das teorias racionalista e em pirista A primeira que os fundamentos do humano são inatos e a segunda que são aprendidos As filosofias da existência surgem em uma tentati va de se deslocar das discussões epistemológicas que se interessam pela origem pelas determinações iniciais Kierkegaard em La enfermidad mortal 18492008 p 33 ao tratar da constituição do eu referese ao desespero O homem é espírito mas o que é o espírito O espírito é o eu Mas o que é o eu O eu é uma relação que se rela ciona consigo mesmo Dito de outra maneira é o que na relação faz com que a relação se relacione consigo mes ma O eu não é a relação mas o fato de que a relação se relaciona consigo mesma O homem é uma síntese de in finitude e finitude de temporal e de eterno de liberdade e necessidade em uma palavra é uma síntese2 Kierkegaard nesse trecho deixa claro que é na relação que a existência se constitui daí o fato da liberdade e da responsabilidade que cada um carrega com relação a sua existência A relevância e importância dada ao existir em detrimento a qualquer posicionamento apriorístico sobre a constituição do homem são marcadamente explicita das por Kierkegaard a quem devemos a retomada do as pecto sensível da existência humana a que denominou com estádio estético também marcante da experiência infantil tanto que no seu texto A rotação dos cultivos que conta da obra O lo uno o lo otro 18422006 referin dose a tal experiência recomenda do lugar do conse lheiro esteta que quem procura uma babá nunca deve contratála pelas suas características éticas Explicase a moça vai ser muito fiel aos horários e ao cumprimen to do estabelecido porém vai entediar a criança A boa babá diz através do pseudônimo esteta é aquela que en tregue ao caráter sensível da brincadeira sabe distrair a criança de modo que quando esta se encontrar tomada pelo tédio na intranquilidade que lhe é própria possa distrairse com as brincadeiras da babá e assim rapida mente possa se afastar do entediarse próprio à repetição do existir Essa situação de fuga do tédio e da repetição vai estar presente segundo o filósofo dinamarquês du rante todas as etapas da existência humana As considerações de Kierkegaard sobre a existência embora pautadas em observações atentas e ricas em de talhes davamse por meio de um gesto fenomenológico ou seja não considerando as teorias e os sistemas que tentavam já em sua época elaborar sistematicamente o acontecimento da vida Kierkegaard tentava acompanhar as experiências e descrevêlas a partir do modo como ele as apreendia Dizia que o caráter universal das experiên cias humanas poderia ser encontrado em suas expressões singulares 19591966 2 Tradução livre da autora Porém foi Husserl que trouxe o como poderíamos utilizar um modo de alcançar o fenômeno em sua mo bilidade estrutural na existência mesma Dois aspectos desenvolvidos por Husserl em sua Fenomenologia foram fundamentais para o desenrolar das filosofias da exis tência assim denominadas por retomarem o aspecto fáctico da existência humana São eles a noção de inten cionalidade e a atitude antinatural E é a partir dessas duas concepções que tanto Heidegger quanto Sartre vão proceder as suas ontologias Para Heidegger pensar no seraí das crianças requer primeiramente esclarecer de que modo se dá este ente em seu primeiro momento de vida Em uma interpreta ção existencial partimos da noção de que desde o iní cio a criança seraí é um ente que tem o caráter de in determinado exposto jogado lançado para fora dele Ao tomar a existência como se constituindo pela indetermi nação deslocamonos de qualquer tentativa de posicio nar o homem a partir de determinações biológicas ou so ciais para aproximarmonos assim da existência mesma Com isto a ênfase acontece na intencionalidade espaço onde a existência acontece Logo já que a existência se constitui nesse espaço a que Husserl denominou inten cionalidade nada aprioristicamente pode ser considera do como constituindo o homem que não seja ele mesmo na esfera do existir A Desconstrução das Teorias Identificatórias Para referirse ao modo identificatório em que o ho mem moderno tenta se posicionar Kierkegaard utilizase da denominação de estádio estádio em que a existência é tomada de acordo com um processo normativo Heidegger em Ser y tiempo diz que no início e na maioria das vezes o seraí se toma como coisa e assim se compreende Isso acontece porque se considera do mesmo modo em que se dá a sua lida com os objetos a sua volta na ocupação Ao tomarse com um ente presente à vista logo com de terminações e identificações dadas em si mesmo acaba por esquecer seu caráter de poderser e acredita que do mesmo modo que os objetos ele possui características e funções previamente determinadas No entanto o seraí não se deixa aprisionar apresentando sempre duas possi bilidades a de clarificação e a de obscurecimento de seu ser E Sartre 19431997 referese ao modo como o homem busca uma identidade e ao mesmo tempo a considera o seu inferno já que é o fato do olhar do outro que o torna um emsi Esse filósofo relata com riqueza de detalhes o percurso de Lucien Fleurier em sua existência no conto A infância de um chefe 19392005 Lucien logo de iní cio ao confundiremno com uma menina questionase Serei uma menina ou um menino Este entre outros trechos deixa claro como a criança se define a partir do mundo No final já homem Lucien diz precisar de um bigode para parecer um chefe E pelo caráter do indeter A Clínica Psicológica Infantil em uma Perspectiva Existencial 189 Revista da Abordagem Gestáltica XVII2 185192 juldez 2011 A r t i g o minado da existência e a tentativa de sair da situação da indeterminação é que as categorizações se enraizam em todas as especialidades sejam médicas ou psicológicas É preciso cuidado para não nos deixarmos conduzir por tais rótulos que obscurecem a visada daquilo que se mostra Aliás a clínica existencial vai logo de início retirar de seu campo de visão todos os rótulos diagnósticos e categori zações que provêm tanto das disciplinas científicas como do senso comum numa postura frente ao fenômeno que Husserl denominou de atitude antinatural Em síntese a clínica psicológica infantil com funda mentos existenciais requer primeiramente uma postura fenomenológica suspendendo todos os posicionamen tos teóricos seja da psicologia do desenvolvimento da personalidade da aprendizagem ou qualquer outro Em segundo lugar cabe dizer que liberdade e responsabi lidade na perspectiva existencial dizem respeito ao ca ráter de indeterminação da existência e ao fato de que qualquer que seja a etapa da vida cada um tem de cui dar de sua existência Tomar a existência como se cons tituindo pela indeterminação consiste em deslocarse de qualquer tentativa de posicionar o homem no caso a criança a partir de determinações biológicas ou sociais E por fim para pensar em uma clínica fenomenológico existencial infantil é preciso partir da ideia de que desde o início a criança é este ente que por se constituir pela indeterminação exposto jogado lançado para fora dele livre de determinações é marcada pelo caráter de poder ser e ter de ser A Clínica Psicológica com Crianças Como anteriormente explicado a atitude fenomenoló gica consiste em abandonar todas as teorias e técnicas em Psicologia que determinam caminhos e procedimentos Duas situações deixam evidente a importância de assu mirmos tal postura A primeira situação consiste em ver a criança a partir dos diagnósticos previamente dados Aproximarse fenomenologicamente da situação consiste em reconduzir aquilo que é apresentado de forma a não se deixar conduzir pelo que previamente já foi posiciona do A segunda seria partir do princípio de que a criança não pode jamais assumir a responsabilidade pelas suas ações e situações Já a postura antinatural na clínica consistiria em acompanhar a criança porém deixando que ela mesma tutele as suas decisões e escolhas Assim a primeira situação consiste quando a criança chega ao consultório portando todos os rótulos e deter minações de seus problemas que normalmente a esco la e os pais dentre outros já atribuíram como diagnós tico e as interpretações do que vem acontecendo Com esta configuração previamente determinada o fenômeno propriamente dito desaparece dando lugar a uma con figuração do real previamente dada com determinações também já dadas Uma atitude fenomenológica na clínica consistirá em suspender qualquer interpretação acerca do que está acontecendo com a criança trazida ao con sultório Assim poderseá acompanhar o fenômeno no seu modo de revelarse ou seja na sua própria mobili dade estrutural Em uma atitude natural acreditase que a criança deva ficar sempre na tutela do adulto e que a este com pete toda a responsabilidade pelas escolhas da criança Desta forma nós estamos correspondendo ao horizonte histórico em que nos encontramos o qual interpreta o primeiro momento de vida como uma situação natural mente frágil não cabendo à criança nenhum compromis so com sua existência desonerandoa de sua responsa bilidade transferida aos pais ou aos adultos próximos a ela Os adultos de um modo geral também neste mes mo horizonte tendem a assumir a tutela sem nem mes mo refletirem acerca do modo como se relacionam com a criança E ainda temendo que a criança fique sozinha tentam a qualquer preço distraíla por variados e dife rentes modos E por não conseguirem sustentar a criança no seu silêncio acabam assumindo para si mesmos todo o cuidado e tutela deixando assim que a criança acabe por acreditar que não cabe a ela mesma a responsabili dade por sua existência E o medo da solidão e a não res ponsabilidade por sua existência acaba acompanhandoa não só na primeira etapa da vida mas em todas as suas etapas É isso que Kierkegaard vai considerar as sequelas da existência e Sartre vai denominar de máfé Adotar uma atitude fenomenológica na clínica psico lógica implica em não fazer ou pensar o que naturalmen te se faz ou se pensa Junto à criança o profissional não assumirá no lugar dela o seu cuidado ou seja a respon sabilidade pelo seu existir E assim desprovido de um modo de pensar como naturalmente se pensa o psicó logo pode questionar o que naturalmente se toma como verdade pronta e acabada Nisso consiste o seu ofício E ao assumir um posicionamento fenomenológico o clíni co estará sempre presente e ao mesmo tempo deixando parecer à criança que ele está ausente Desta forma per mite que a criança entregue a si mesma o mais demora damente possível possa ter uma experiência de perma necer consigo mesma e assim desvelese no seu caráter de ter de cuidar de si e poderser A postura antinatural consiste em poder dar um passo atrás deixando a criança no momento clínico na tutela por si mesma Ao recuar podese acompanhar as determinações oriundas do seu comportamento a partir da sua própria tutela Heidegger 19271989 denomina esse modo de acompanhar o outro de preocupação por anteposição ou libertadora Para esclarecer o que foi dito até aqui e exemplificar a postura fenomenológica em uma situação de atendimento clínico infantil apresentaremos fragmentos de um caso clínico Neste caso a atenção voltase para a criança em seu modo próprio de comportarse deixandoa que ela se mostre por si mesma E ao mesmo tempo confiar no caráter de indeterminação do seu ser que lhe confere a Ana M L C Feijoo 190 Revista da Abordagem Gestáltica XVII2 185192 juldez 2011 A r t i g o libertação de todos os diagnósticos estabelecidos seja pela Psiquiatria pela Psicologia ou pelo senso comum E nisso consistem a liberdade e responsabilidade desta criança Mantêla em liberdade entregandoa a sua pró pria tutela ou seja à sua responsabilidade é a própria relação psicoterápica Deixála caminhar por si mesma sem tentar desonerála desta tarefa de diferentes modos é o caminho no qual a criança perde a tutela do adulto mas pode ganhar a si mesma ao assumir o seu cuidado por si próprio a sua tutela O adulto ao mesmo tempo sem preocuparse ao modo substitutivo tem sob os olhos o que está acontecendo No caso apresentado a seguir os dados foram trocados a fim de garantir o sigilo da criança atendida Antônio tinha sete anos quando sua mãe procurou acompanha mento psicológico para ele A primeira entrevista foi com ambos os pais por ser importante que os dois trouxessem a questão de Antônio e o modo como vinham lidando com aquilo que se apresentava Além disto os dois deveriam estar de acordo com o acompanhamento psicológico com prometendose a comparecer quando solicitados Os pais de Antonio procuram psicoterapia por in dicação de um psiquiatra preocupados com o fato de a criança estar pegando coisas dos outros O médico dissera que se tratava de uma cleptomania A mãe co locara em dúvida o diagnóstico médico acrescentando que Antônio só queria chamar a atenção dos pais Tenta assim justificar o comportamento do filho usando uma determinação psíquica Ela mostrase bastante aflita com a situação e inicia Antônio vem pegando coisas dos ou tros chora Isto me preocupa muito porém acho que ele está querendo chamar a atenção estamos precisando fi car mais próximos dele sempre muito preocupados com o trabalho e outras coisas e acho que Antônio vai ficando meio esquecido Por isso vim aqui te pedir ajuda todos nós precisamos ser ajudados as coisas andam meio confusas Ao dizer que o menino só queria chamar a atenção dos pais retiralhe a responsabilidade de seu ato e colocao na tutela do psíquico O pai também dá uma interpreta ção a partir de sua experiência e em uma atmosfera afe tiva de irritabilidade com a situação Eu só quero saber porque Antônio está me agredindo João o irmão é total mente diferente um garoto exemplar faz tudo como deve ser feito Eu digo sempre para Antônio João o irmão é um exemplo a ser seguido Agora se ele insistir em me provocar se não mudar se continuar a ter atos ilícitos eu não vou mais querer saber dele Se continuar me agredin do eu vou esquecer que ele existe O pai deixa claro que caso o menino não modifique a situação ele suspenderá a sua tutela pois não aceita um ato ilícito Apenas com esse breve trecho podemos refletir sobre como se dá uma atitude fenomenológica frente à questão apresentada pelo médico e pelos pais O médico em uma atitude natural tende a classificar o comportamento da criança pelas características que constam nos manuais de Psicopatologia e conclui a partir dos sintomas que se trata de uma cleptomania Assim os comportamentos do menino se transformam em sintomas E o conjunto des ses sintomas são o suficiente para deduzir que se trata de uma compulsão A criança e seus comportamentos de saparecem dando lugar a uma categoria de diagnóstico que fala por si mesmo Outra atitude natural foi assumida pela mãe ao in terpretar a ação da criança como uma tentativa de cha mar a atenção Aqui não é mais a voz da ciência que dá o veredicto mas a do senso comum Deste modo o furto teria sido motivado por algo que se encontrava por trás do ato no caso chamar a atenção Segundo esta visão não caberia mais a Antônio o compromisso com sua ação estava totalmente justificado Já o pai caracteriza a situ ação como ilícita Assim uma vez identificado por uma classificação psiquiátrica pelo senso comum ou pela con travenção não era mais Antônio que pegava as coisas dos outros e sim aquilo com que o passaram a identificar A postura fenomenológica implica em deslocarse das interpretações comumente atribuídas assumindo uma atitude antinatural com relação à questão que se apre senta ou seja tomando o modo de ser da criança em sua expressão singular Na postura antinatural o psicólogo clínico suspende o diagnóstico dado pela mãe e pelo médico Ao voltarse para o fenômeno em sua mobilidade estrutural importa o sentido que Antônio dá a sua expe riência A visada sobre o fenômeno que se apresenta não se dá a partir de nenhum pressuposto em tese acerca do que possa ser uma compulsão a furtar coisas e a aten ção clínica voltase para a criança em seu modo próprio de comportarse Permitese que a criança se mostre por si mesma deixandoa livre para si mesma para assim poder assumir a sua liberdade e responsabilidade Em uma clínica fenomenológica a criança será rece bida a partir daquilo que vai acontecer na relação neste momento estabelecida Para tanto vaise suspender todo e qualquer pressuposto que anteriormente se fez presen te inclusive no relato dos pais Para exemplificar este modo de proceder clinicamente apresentaremos um tre cho desse atendimento Antônio Eu queria contar um problema Pedro vai ter a festa de aniversário dele só que vai ser na casa dele Eu não tenho vontade de ir sabe Eu não quero ir à festa tem muita gente que rouba e também tem um pequeno probleminha acusam a pessoa de uma coisa que ela não fez Alex rouba as coisas dos outros Eu desconfio também da Flávia ela também pega as coisas dos outros Mas não é só isso não tem outro problema meu pai vai sair com João e eu também quero ficar com meu pai sair com os dois Psicóloga Então você tem dois motivos para não querer ir à festa Antônio Tem outro tenho medo de não controlar Psicóloga Tem medo de não controlar o quê Antônio A vontade silêncio Psicóloga Vontade de que Antônio Antônio De pegar as coisas dos outros Eu não quero A Clínica Psicológica Infantil em uma Perspectiva Existencial 191 Revista da Abordagem Gestáltica XVII2 185192 juldez 2011 A r t i g o pegar mas eu olho a coisa e me dá muita vontade vontade mesmo Também tenho medo que Flávia coloque coisas na minha bolsa e depois me culpe Ela já fez isso guardou no meu estojo o lápis de Bruna Bruna sentiu a falta do lápis aí eu coloquei o lápis na mesa de Bruna só que ela me viu colocando o lápis e eu me defendi disse que tinha sido a Flávia que tinha colocado no meu estojo só que ninguém acreditou ficou todo mundo olhando para mim Antônio fica calado parecendo triste abaixa a ca beça põe a mão no rosto parecia estar chorando Repentinamente levantou a cabeça e fitoume por um longo tempo Na tentativa de mobilizálo e tentar com preender o que estava acontecendo falei Psicóloga Parece que essa situação te deixa muito triste Antônio E vou ficar muito sozinho Psicóloga E como é ficar sozinho para você Antonio permanece em silêncio Não ter ninguém por perto nunca vivi isto tenho medo ficar sozinho no recreio Assumindo uma atitude fenomenológica a psicóloga não interveio nem se colocou como alguém que desde o início já sabia qual era o problema Caso partisse de diagnósticos ou de teorias acerca do problema criaria obstáculos à apresentação do fenômeno Na situação de Antônio seria por exemplo destinarlhe uma identidade de cleptomaníaco e insistir para que ele falasse no tema buscando rapidamente o que determinava esse compor tamento Assim entregue a si mesmo pode ver as conse quências do modo como vinha se comportando só a ele cabendo a decisão do que iria ou não fazer Partir do diagnóstico que lhe havia sido previamen te conferido seria darlhe uma identidade que além de retirarlhe o seu caráter de poder ser também o desone raria de sua escolha Assim todo o seu modo de ser seria justificado por tal identidade não cabendo a ele a sua tu tela Retirar o caráter de poder ser de sua existência por um procedimento identitário constituise em um cami nho de acesso fácil porém pode acabar por sedimentar um determinado modo de ser Esse processo é discutido com muita pertinência em Sartre 2001 ao referirse a todo percurso do personagem Lucien Fleurier até tornar se um chefe tal como já havia sido decidido pelos seus pais muito antes dele nascer A atenção fenomenológica consiste em abandonar toda e qualquer identidade estabelecida para a criança seja com relação a um diagnóstico expectativa familiar ou social entre outros modos Em uma postura fenome nológica cabe então ao psicólogo deixar a criança em li berdade e entregála a sua própria tutela ou seja à sua responsabilidade Tratase sem dúvida de uma tarefa de licada No entanto deixála caminhar por si mesma sem tentar desonerála desta tarefa de diferentes modos pa rece ser o caminho pelo qual a criança perde a tutela do adulto mas ganha a si mesma Deixála sozinha consi go mesma nesta abordagem é uma arte que consiste em estar sempre presente sem mostrar a criança que se está ali E assim permitir que a criança por si própria possa aproximarse entregue a si mesma o mais demoradamen te possível de uma experiência de si mesma Considerações Finais Com o desenvolvimento da temática acerca da clíni ca psicológica em uma perspectiva existencial pudemos afiançar que a filosofia da existência traz aspectos for mais que criam um espaço de articulação de uma práxis clínica por diferentes motivos O primeiro deles é que as filosofias da existência retomam o que as filosofias mo dernas haviam abandonado ou seja a existência mes ma tal como acontece em seu campo de imanência Esse projeto de voltarse à imanência foi ineditamente apre sentado por Husserl Esse filósofo deslocouse da noção de consciência como algo encapsulado que se encontra localizado em uma interioridade e com sentidos e deter minações dados em si mesmo tomando então a consci ência como algo que acontece em um espaço relacional logo imanente Ele referese então à intencionalidade que passou a ser o elemento fundamental mesmo que com di ferentes acepções das filosofias da existência Heidegger e Sartre deram continuidade ao projeto de retomada da existência cada um a seu modo mas preocupados com a facticidade onde o existir acontece Esse mesmo movi mento foi acompanhado pela Psicologia que primeira mente seguindo o projeto moderno tomou o psíquico em todas as suas denominações como algo da ordem de uma interioridade que se relaciona com o exterior Ao surgir uma Psicologia Fenomenológica a pretensão também é de pensar o psíquico como algo imanente cooriginário ao mundo e portanto não passível de ser determinado nem localizado em uma interioridade Pensar a Psicologia a partir das filosofias da existên cia consiste em assumir o caráter de indeterminação que não pressupõe mais uma essência seja ela qual for que precede a existência Consiste ainda em aceitar a árdua tarefa de não ter como prever nem garantir nenhum re sultado dado o caráter de abertura e consequente liber dade em que a existência sempre se encontra Articular uma proposta de clínica infantil com base na filosofia existencial tornase possível ao tomar a crian ça na mesma perspectiva em que se toma o adulto Trata se de pensar a existência em sua imanência qualquer que seja a etapa de vida em que nos encontramos Logo importa é que aquele que tenta evitar a sua condição de liberdade abertura e indeterminação possa assumirse como um ser de possibilidades logo em liberdade para dizer sim e não às determinações inseridas no horizonte histórico em que se encontra Ana M L C Feijoo 192 Revista da Abordagem Gestáltica XVII2 185192 juldez 2011 A r t i g o Referências Heidegger M 19292008 Introdução à filosofia São Paulo Martins Fontes Heidegger M 19271989 Ser y tiempo Madrid Editorial Gredos Heidegger M 19872001 Seminários de Zollikon Petrópolis RJ Vozes Heidegger M 19471987 Carta sobre o humanismo Lisboa Guimarães editores Heidegger M 19292006 Os conceitos fundamentais da me tafísica mundo finitude e solidão Rio de Janeiro Forense Universitária Husserl E1952 2007 La filosofia como ciencia restricta La Plata Terramar Kierkegaard S 18422010 O conceito de angústia Petrópolis Vozes São Paulo Editora Universitária São Francisco Kierkegaard S 18492008 La enfermidad mortal Madri Editorial Trotta Kierkegaard S 19591966 Ponto de vista explicativo da mi nha obra como escritor Porto Edições 70 Kierkegaard S 18422006 O lo uno o lo otro un fragmento de vida Madri Editorial Trotta v 1 Sartre JP 19392005 A infância de um chefe In O muro Rio de Janeiro Nova Fronteira Sartre JP 19431997 O ser e o nada Petrópolis Vozes Ana Maria Lopez Calvo de Feijoo Doutora em Psicologia Professor Adjunto da Graduação e do Programa de PósGraduação em Psicologia Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro Endereço Institucional Universidade do Estado do Rio de Janeiro Departamento de Psicologia Clínica Instituto de Psicologia Rua São Francisco Xavier 524 Maracanã CEP 20550013 Rio de JaneiroRJ Email anamariafeijoogmailcombr Recebido em 150311 Aceito em 220911
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A Clínica Psicológica Infantil em uma Perspectiva Existencial 185 Revista da Abordagem Gestáltica XVII2 185192 juldez 2011 A r t i g o A CLÍNICA PSICOLÓGICA INFANTIL EM UMA PERSPECTIVA EXISTENCIAL1 The childrens psychological clinic in an existential perspective La clínica psicológica de niños en una perspectiva existencial ANA MARIA LOPEZ CALVO DE FEIJOO Resumo Neste artigo tentaremos responder aos questionamentos acerca da viabilidade de uma clínica psicológica com base na filosofia da existência Iniciamos assinalando aspectos que apontam para a possibilidade de uma clínica psicológica infantil em uma perspectiva existencial Para tanto consideraremos que o que está em questão na criança ou seja seu caráter de indeter minação de liberdade e de cuidado em nada difere do adulto E que os aspectos essenciais na postura do clínico são a atitude fenomenológica e a preocupação libertadora Desta forma o psicólogo clínico prescindindo de qualquer posicionamento teórico e da respectiva categorização acerca do comportamento infantil pode acercarse do fenômeno tal como esse se apresenta Palavraschave Clínica infantil Fenomenologia Filosofia da existência Heidegger Abstract In this article we will try to show a child psychological clinic is possible under the existential perspective So for this we will start by considering that what is at issue in the child ie their character of indetermination freedom and care dif fers nothing from adult And that the essential aspects of posture are clinical phenomenological attitude and liberating con cern Thus the clinical psychologist besides any theoretical position and categorization about childs behavior can get closer to the phenomenon as it presents itself Keywords Child clinics Phenomenology Philosophies of existence Heidegger Resumen En este artículo intentaremos mostrar elementos que hacen viable la clínica psicológica en una perspectiva existen cial Por lo tanto vamos a empezar por considerar lo que está presente en el niño es decir su carácter de indeterminación y libertad que en nada difiere del adulto Y que los aspectos esenciales de la postura clínica son la actitud fenomenológica y la preocupación libertadora Así el psicólogo clínico sin cualquier posicionamiento teórico y sin la categorización del comporta miento infantil se acerca del fenómeno tan como éste se presenta a él Palabras clave Clínica com niños Fenomenología Filosofías de la existencia Heidegger Introdução Apresentar a clínica psicológica em uma perspectiva existencial consiste em uma tarefa desafiadora na medi da em que muitos estudiosos da psicologia consideram a relação da Filosofia com a Psicologia algo improvável Por esse motivo consideramos que muito mais do que convencer os nossos leitores da viabilidade desta rela ção devemos problematizála Porém como não só esta beleceremos um diálogo entre a filosofia da existência e a Psicologia mas também traremos à discussão a clínica psicológica e a infância consideramos que primeiramen te teremos muito mais elementos a serem clarificados para depois pensarmos na viabilidade da clínica psico lógica existencial na primeira etapa da vida A tarefa então para ser executada dependerá de seguir um per curso até podermos dispor dos elementos necessários à problematização da proposta e a consequente discussão 1 Trabalho apresentado ao II Congresso Sul Brasileiro de Fenomeno logia II Congresso de Estudos Fenomenológicos do Paraná 24 de junho de 2011 Universidade Federal do Paraná UFPR de sua viabilidade Importante aqui é trazer como esses filósofos mais especificamente Heidegger interpre tam temas tais como seraí indeterminação liberdade e responsabilidade E ainda de que modo eles dialogam polemicamente com as classificações diagnósticas muito próprias da modernidade Para a realização de nossa tarefa primeiramente te remos que nos deslocar das teorias psicológicas tradi cionais acerca do desenvolvimento da personalidade e da aprendizagem da criança e nos reconduzirmos ao fe nômeno da experiência infantil tal como ela se mostra Esse modo de reconduzirse ao fenômeno denominase Fenomenologia Para exercitarmos uma outra visada sobre a experiên cia em questão traremos alguns esclarecimentos sobre o modo como os filósofos da existência por meio de um posicionamento fenomenológico discutem e posicionam o ser da criança Os três filósofos da existência mais dis cutidos Kierkegaard Heidegger e Sartre partem da noção de que a existência acontece desde o início pelo seu caráter de indeterminação e negatividade daí o fato Ana M L C Feijoo 186 Revista da Abordagem Gestáltica XVII2 185192 juldez 2011 A r t i g o da liberdade da angústia e do desespero serem consti tutivos do existir E já ao nascer a indeterminação traz em si essas outras condições Logo a criança desde seu nascimento constituise respectivamente como espírito Kierkegaard como seraí Heidegger ou como parasi Sartre Ou ainda em uma abertura indeterminação e negatividade que estarão presentes em toda a sua existên cia É no decorrer de sua vida que a criança tomará para si o seu modo de ser em sua incompletude e sempre em jogo com as determinações do mundo A partir da filosofia da existência buscamos o que acontece frente à indeterminação e negatividade da exis tência Já que nada a princípio determina o homem como ele se constitui Como ele se determina Tratase então de uma tabula rasa Para desenvolver essas questões teremos que trazer à baila a discussão acerca do caráter de imanência da existência da cooriginalidade homem mundo de ter de ser em abertura em que o existente tornase responsável por constituirse no mundo desse ser que é responsável pela sua existência Iniciaremos para isto com esclarecimentos sobre a noção de inten cionalidade tal como introduzida e amplamente estuda da por Husserl e de seus desdobramentos em Heidegger com a noção de seraí Por fim trataremos de que modo acontecem na facticidade os processos de atribuição de identidade e de como tal procedimento acaba por resul tar em primeiro lugar em escapar do caráter de negati vidade e indeterminação Embora o homem tenda a escapar a sua negativida de e indeterminação buscando uma identidade ao mes mo tempo tenta escapulir da identidade que o outro lhe atribui por um clamor de sua liberdade Esses proces sos identificatórios acabam por alicerçar as categori zações e os diagnósticos tão frequentes na atualidade Diagnósticos que muitas vezes aliviam a angústia frente à indeterminação mas retira do homem a responsabili dade pelos seus atos e escolhas Por fim além do mundo passar a justificálos também os tutela Essa discussão em Heidegger 19271989 vai dirigirse ao modo que ele interpreta a lida com os utensílios Dado como esta se dá por meio das determinações dos objetos tendemos a nos compreender do mesmo modo que compreende mos aquilo que manuseamos logo também como se nos constituíssemos por meio de determinações e sentidos previamente dados Após esclarecermos as questões acerca da constitui ção da existência discutiremos a viabilidade de uma clí nica psicológica existencial com crianças Sabemos que Heidegger 19872001 apenas referese à clínica psicológi ca nos Seminários de Zollikon Mas por outro lado sabe mos também que a tentativa de articular a Fenomenologia hermenêutica com a clínica psicológica data dos meados do século XX com dois proeminentes psiquiatras Ludwig Binswanger e Medard Boss que mesmo pouco estudados principalmente aqui no Brasil jamais foram esqueci dos A questão que se impõe consiste em perguntar sobre o risco iminente de traduzir o pensamento filosófico em termos de mais uma disciplina E como tal acabar por reduzir as reflexões filosóficas em um produto palpável intercambiável e técnico Mas se não é isso o que que remos Como fazer para que não aconteçam essas redu ções Devemos manternos com muito esforço no cam po de questionamentos da clínica psicológica e não no das certezas Assim mantemonos em um espaço em que não importa o numérico os resultados as informações e as teorias Importa o deixarse corresponder ao essencial em uma clínica infantil Por fim despenderemos de todo esforço para apre sentar os fundamentos da filosofia da existência com um maior detalhamento das considerações heideggeria nas tentando não recair em uma disciplina ou em uma nova técnica que nos diga como devemos proceder para obtermos resultados efetivos e eficazes Para tanto ini ciaremos apresentando aquilo o que caracteriza uma fi losofia da existência A filosofia da existência consiste em não partir de pressupostos de que a constituição do homem já está apriori dada seja pela constituição biológica psíquica ou pelos condicionamentos ambientais Nesses três pressu postos o homem já ao nascer apresentase passivo frente a estas determinações A filosofia existencial defende o caráter de indeterminação da existência a partir do que esta se constitui Logo é no existir em sua articulação homemmundo que a existência acontece Este modo de articular à existência humana é expressa na máxima de Sartre 19431997 de que a existência precede a essên cia afirmativa esta que mesmo criticada por Heidegger 19471987 não deixa de tornar clara a situação de inde terminação da existência O Método Fenomenológico e a Investigação do Ser da Criança Heidegger 19471987 ao tecer considerações acer ca do sentido da existência nos primeiros anos de vida assume uma atitude fenomenológica para discorrer so bre o seraí da criança Para tanto vai suspender toda e qualquer pressuposição teórica seja da Psicologia ou da Biologia acerca do comportamento infantil E assim po der deixar que o sentido do fenômeno se dê no próprio campo de mostração deste fenômeno Husserl 1952 2007 vai denominar este posicionamento referente àquilo que se mostra de atitude antinatural Esta consiste em re duções fenomenológicas exercício que requer um esfor ço incessante para alcançar o fenômeno deixando para trás todas as pressuposições sobre o mesmo Ainda de Husserl Heidegger manteve a tese de que a consciência não pode ser tomada a partir de uma concepção de que esta se constitui como substância e de que se encontra espacial e temporalmente determinada Husserl confere à consciência uma imanência logo por seu caráter de inten A Clínica Psicológica Infantil em uma Perspectiva Existencial 187 Revista da Abordagem Gestáltica XVII2 185192 juldez 2011 A r t i g o cionalidade encontrase sempre dirigida aHeidegger denomina então de Dasein seraí a este campo de ima nência onde a existência se dá A Psicologia dispõe de diferentes teorias do desenvol vimento infantil que muitas vezes servem de base para a compreensão do modo de ser da criança por meio dos critérios de normalidade e ajustamento podendose assim prescrever os comportamentos inadequados desajusta dos enfim fora dos padrões estabelecidos pelo numéri co ou qualitativo Assumir uma postura fenomenológi ca frente ao fenômeno consiste em suspender qualquer posicionamento ontológico seja da ciência ou do senso comum sobre as coisas fenômenos Sem qualquer posi cionamento ontológico prévio acerca do comportamento das crianças é possível assim se aproximar daquele modo que se mostra em sua expressão singular O Caráter de Indeterminação da Existência Cuidado e Liberdade Cabe esclarecer que liberdade na perspectiva exis tencial diz respeito ao fato da indeterminação da exis tência o que torna o homem responsável por aquilo que fizer de si A indeterminação a liberdade e a angústia são temas presentes nos três grandes representantes da filosofia que se voltam para a existência anteriormente mencionados Kierkegaard 18422010 referese à posição psicológica de liberdade como sendo a posição que o ho mem se apresenta frente a sua indeterminação e respec tiva angústia À tentativa de escapar da mobilização da angústia Kierkegaard denomina de posição psicológica de nãoliberdade na qual o homem tenta a qualquer preço posicionarse como se ele fosse determinado por algo que transcende seu existir Heidegger 19271989 denomina essa situação de cuidado que consiste em tomar o seraí como aquele que sempre tem de ser e assim ele tem de assumir a tutela por sua existência Sartre 19431997 diz que estamos fadados à liberdade Logo a criança seraí parasi que desde sempre é um existente não prescinde de seu caráter de indeterminação liberdade e responsa bilidade por sua existência e a tentativa de fugir dessa condição é o que muitas vezes mobiliza a criança e seus pais a buscarem psicoterapia A liberdade e a responsabilidade na perspectiva exis tencial dizem respeito ao caráter de indeterminação da existência e ao fato de que qualquer que seja a etapa da vida cada um tem de cuidar de sua existência Os fi lósofos da existência apontam para a indeterminação como o caráter mais próprio do existir Kierkegaard em O conceito de angústia esclarece a situação de indeter minação do homem como marca da existência humana A este respeito diz O surgimento da angústia condensa o fulcro de toda a questão O ser humano é uma síntese de corpo e alma esta apenas se torna inimaginável se ambos os elementos não se reunirem em um terceiro O terceiro é o espírito No estado de inocência o homem não é apenas um animal e finalmente e se alguma vez o fosse em qualquer instante de sua existência nunca se tornaria homem Assim o espírito já está presente ainda que em um estado de imediatidade de sonho Kierkegaard 18422010 p 47 O pensador dinamarquês responde prontamente a per gunta que ele mesmo colocou Qual é portanto a relação do homem com a potência ambígua Qual é a relação do espírito com ele mesmo e com sua condição A relação é a angústia ibid p 47 Para este filósofo aquilo que confere humanidade ao homem é a presença do espírito síntese do eterno e do temporal do finito e infinito dos possíveis e do necessário mesmo que de início esse se encontre adormecido Heidegger na mesma linha de pensamento de Kierkegaard em Ser y tiempo 19271989 já afirma que as estruturas existenciais não são estruturas ônticas e nesse sentido elas podem ser encontradas em qualquer experiência de mundo do seraí Isto não diz respeito apenas à caracterização do seraí europeu desenvolvi do mas tanto ao que se refere ao seraí infantil como ao seraí dos povos primitivos o que estará em questão é o seraí humano E a base do seraí humano é seu cará ter essencialmente histórico E por mais que Heidegger 19292008 afirme que as estruturas existenciais se mos tram mais claramente no homem primitivo ou no aborí gine por conta da simplicidade da vida desses homens as estruturas históricas existenciais estão presentes em seu caráter de aí em todos os homens em todas as épo cas lugares ou fases de desenvolvimento de suas vidas E é a partir deste caráter que o seraí conquista o poder ser que ele é Sartre 20051939 em seu conto A infância de um chefe deixa clara a sua defesa ao caráter de indetermi nação e liberdade presentes no percurso de vida do prota gonista do conto Lucien Fleurier O filósofo traz o modo como Lucien vai traçando a sua existência do princípio ao fim O marcante nesse trajeto é que sempre ele tem de escolher frente àquilo que o mundo lhe apresentava mostrando que a determinação está ausente A tarefa de Lucien consiste em determinarse por si mesmo por meio das referências da sua situação Agora vale ressaltar como acontece esse constituirse já que a criança ao nascer já se constitui na relação com o mundo Cabe perguntar como isto é possível se a criança nada sabe nada conhece Não haveria uma determina ção biológica que a levaria a sobreviver conduzindoa a alimentarse Ou ela não sobreviria caso não tivesse a presença de outros homens Estas questões foram ampla mente debatidas na década de 50 e 60 quando o menino Victor abandonado em uma selva nos primeiros anos de vida foi encontrado em Eveyron na França A partir de Ana M L C Feijoo 188 Revista da Abordagem Gestáltica XVII2 185192 juldez 2011 A r t i g o então todos os posicionamentos teóricos sejam inatistas ou empiristas tentaram comprovar suas teses por meio daquilo que no comportamento de Victor evidenciaria e comprovaria as premissas das teorias racionalista e em pirista A primeira que os fundamentos do humano são inatos e a segunda que são aprendidos As filosofias da existência surgem em uma tentati va de se deslocar das discussões epistemológicas que se interessam pela origem pelas determinações iniciais Kierkegaard em La enfermidad mortal 18492008 p 33 ao tratar da constituição do eu referese ao desespero O homem é espírito mas o que é o espírito O espírito é o eu Mas o que é o eu O eu é uma relação que se rela ciona consigo mesmo Dito de outra maneira é o que na relação faz com que a relação se relacione consigo mes ma O eu não é a relação mas o fato de que a relação se relaciona consigo mesma O homem é uma síntese de in finitude e finitude de temporal e de eterno de liberdade e necessidade em uma palavra é uma síntese2 Kierkegaard nesse trecho deixa claro que é na relação que a existência se constitui daí o fato da liberdade e da responsabilidade que cada um carrega com relação a sua existência A relevância e importância dada ao existir em detrimento a qualquer posicionamento apriorístico sobre a constituição do homem são marcadamente explicita das por Kierkegaard a quem devemos a retomada do as pecto sensível da existência humana a que denominou com estádio estético também marcante da experiência infantil tanto que no seu texto A rotação dos cultivos que conta da obra O lo uno o lo otro 18422006 referin dose a tal experiência recomenda do lugar do conse lheiro esteta que quem procura uma babá nunca deve contratála pelas suas características éticas Explicase a moça vai ser muito fiel aos horários e ao cumprimen to do estabelecido porém vai entediar a criança A boa babá diz através do pseudônimo esteta é aquela que en tregue ao caráter sensível da brincadeira sabe distrair a criança de modo que quando esta se encontrar tomada pelo tédio na intranquilidade que lhe é própria possa distrairse com as brincadeiras da babá e assim rapida mente possa se afastar do entediarse próprio à repetição do existir Essa situação de fuga do tédio e da repetição vai estar presente segundo o filósofo dinamarquês du rante todas as etapas da existência humana As considerações de Kierkegaard sobre a existência embora pautadas em observações atentas e ricas em de talhes davamse por meio de um gesto fenomenológico ou seja não considerando as teorias e os sistemas que tentavam já em sua época elaborar sistematicamente o acontecimento da vida Kierkegaard tentava acompanhar as experiências e descrevêlas a partir do modo como ele as apreendia Dizia que o caráter universal das experiên cias humanas poderia ser encontrado em suas expressões singulares 19591966 2 Tradução livre da autora Porém foi Husserl que trouxe o como poderíamos utilizar um modo de alcançar o fenômeno em sua mo bilidade estrutural na existência mesma Dois aspectos desenvolvidos por Husserl em sua Fenomenologia foram fundamentais para o desenrolar das filosofias da exis tência assim denominadas por retomarem o aspecto fáctico da existência humana São eles a noção de inten cionalidade e a atitude antinatural E é a partir dessas duas concepções que tanto Heidegger quanto Sartre vão proceder as suas ontologias Para Heidegger pensar no seraí das crianças requer primeiramente esclarecer de que modo se dá este ente em seu primeiro momento de vida Em uma interpreta ção existencial partimos da noção de que desde o iní cio a criança seraí é um ente que tem o caráter de in determinado exposto jogado lançado para fora dele Ao tomar a existência como se constituindo pela indetermi nação deslocamonos de qualquer tentativa de posicio nar o homem a partir de determinações biológicas ou so ciais para aproximarmonos assim da existência mesma Com isto a ênfase acontece na intencionalidade espaço onde a existência acontece Logo já que a existência se constitui nesse espaço a que Husserl denominou inten cionalidade nada aprioristicamente pode ser considera do como constituindo o homem que não seja ele mesmo na esfera do existir A Desconstrução das Teorias Identificatórias Para referirse ao modo identificatório em que o ho mem moderno tenta se posicionar Kierkegaard utilizase da denominação de estádio estádio em que a existência é tomada de acordo com um processo normativo Heidegger em Ser y tiempo diz que no início e na maioria das vezes o seraí se toma como coisa e assim se compreende Isso acontece porque se considera do mesmo modo em que se dá a sua lida com os objetos a sua volta na ocupação Ao tomarse com um ente presente à vista logo com de terminações e identificações dadas em si mesmo acaba por esquecer seu caráter de poderser e acredita que do mesmo modo que os objetos ele possui características e funções previamente determinadas No entanto o seraí não se deixa aprisionar apresentando sempre duas possi bilidades a de clarificação e a de obscurecimento de seu ser E Sartre 19431997 referese ao modo como o homem busca uma identidade e ao mesmo tempo a considera o seu inferno já que é o fato do olhar do outro que o torna um emsi Esse filósofo relata com riqueza de detalhes o percurso de Lucien Fleurier em sua existência no conto A infância de um chefe 19392005 Lucien logo de iní cio ao confundiremno com uma menina questionase Serei uma menina ou um menino Este entre outros trechos deixa claro como a criança se define a partir do mundo No final já homem Lucien diz precisar de um bigode para parecer um chefe E pelo caráter do indeter A Clínica Psicológica Infantil em uma Perspectiva Existencial 189 Revista da Abordagem Gestáltica XVII2 185192 juldez 2011 A r t i g o minado da existência e a tentativa de sair da situação da indeterminação é que as categorizações se enraizam em todas as especialidades sejam médicas ou psicológicas É preciso cuidado para não nos deixarmos conduzir por tais rótulos que obscurecem a visada daquilo que se mostra Aliás a clínica existencial vai logo de início retirar de seu campo de visão todos os rótulos diagnósticos e categori zações que provêm tanto das disciplinas científicas como do senso comum numa postura frente ao fenômeno que Husserl denominou de atitude antinatural Em síntese a clínica psicológica infantil com funda mentos existenciais requer primeiramente uma postura fenomenológica suspendendo todos os posicionamen tos teóricos seja da psicologia do desenvolvimento da personalidade da aprendizagem ou qualquer outro Em segundo lugar cabe dizer que liberdade e responsabi lidade na perspectiva existencial dizem respeito ao ca ráter de indeterminação da existência e ao fato de que qualquer que seja a etapa da vida cada um tem de cui dar de sua existência Tomar a existência como se cons tituindo pela indeterminação consiste em deslocarse de qualquer tentativa de posicionar o homem no caso a criança a partir de determinações biológicas ou sociais E por fim para pensar em uma clínica fenomenológico existencial infantil é preciso partir da ideia de que desde o início a criança é este ente que por se constituir pela indeterminação exposto jogado lançado para fora dele livre de determinações é marcada pelo caráter de poder ser e ter de ser A Clínica Psicológica com Crianças Como anteriormente explicado a atitude fenomenoló gica consiste em abandonar todas as teorias e técnicas em Psicologia que determinam caminhos e procedimentos Duas situações deixam evidente a importância de assu mirmos tal postura A primeira situação consiste em ver a criança a partir dos diagnósticos previamente dados Aproximarse fenomenologicamente da situação consiste em reconduzir aquilo que é apresentado de forma a não se deixar conduzir pelo que previamente já foi posiciona do A segunda seria partir do princípio de que a criança não pode jamais assumir a responsabilidade pelas suas ações e situações Já a postura antinatural na clínica consistiria em acompanhar a criança porém deixando que ela mesma tutele as suas decisões e escolhas Assim a primeira situação consiste quando a criança chega ao consultório portando todos os rótulos e deter minações de seus problemas que normalmente a esco la e os pais dentre outros já atribuíram como diagnós tico e as interpretações do que vem acontecendo Com esta configuração previamente determinada o fenômeno propriamente dito desaparece dando lugar a uma con figuração do real previamente dada com determinações também já dadas Uma atitude fenomenológica na clínica consistirá em suspender qualquer interpretação acerca do que está acontecendo com a criança trazida ao con sultório Assim poderseá acompanhar o fenômeno no seu modo de revelarse ou seja na sua própria mobili dade estrutural Em uma atitude natural acreditase que a criança deva ficar sempre na tutela do adulto e que a este com pete toda a responsabilidade pelas escolhas da criança Desta forma nós estamos correspondendo ao horizonte histórico em que nos encontramos o qual interpreta o primeiro momento de vida como uma situação natural mente frágil não cabendo à criança nenhum compromis so com sua existência desonerandoa de sua responsa bilidade transferida aos pais ou aos adultos próximos a ela Os adultos de um modo geral também neste mes mo horizonte tendem a assumir a tutela sem nem mes mo refletirem acerca do modo como se relacionam com a criança E ainda temendo que a criança fique sozinha tentam a qualquer preço distraíla por variados e dife rentes modos E por não conseguirem sustentar a criança no seu silêncio acabam assumindo para si mesmos todo o cuidado e tutela deixando assim que a criança acabe por acreditar que não cabe a ela mesma a responsabili dade por sua existência E o medo da solidão e a não res ponsabilidade por sua existência acaba acompanhandoa não só na primeira etapa da vida mas em todas as suas etapas É isso que Kierkegaard vai considerar as sequelas da existência e Sartre vai denominar de máfé Adotar uma atitude fenomenológica na clínica psico lógica implica em não fazer ou pensar o que naturalmen te se faz ou se pensa Junto à criança o profissional não assumirá no lugar dela o seu cuidado ou seja a respon sabilidade pelo seu existir E assim desprovido de um modo de pensar como naturalmente se pensa o psicó logo pode questionar o que naturalmente se toma como verdade pronta e acabada Nisso consiste o seu ofício E ao assumir um posicionamento fenomenológico o clíni co estará sempre presente e ao mesmo tempo deixando parecer à criança que ele está ausente Desta forma per mite que a criança entregue a si mesma o mais demora damente possível possa ter uma experiência de perma necer consigo mesma e assim desvelese no seu caráter de ter de cuidar de si e poderser A postura antinatural consiste em poder dar um passo atrás deixando a criança no momento clínico na tutela por si mesma Ao recuar podese acompanhar as determinações oriundas do seu comportamento a partir da sua própria tutela Heidegger 19271989 denomina esse modo de acompanhar o outro de preocupação por anteposição ou libertadora Para esclarecer o que foi dito até aqui e exemplificar a postura fenomenológica em uma situação de atendimento clínico infantil apresentaremos fragmentos de um caso clínico Neste caso a atenção voltase para a criança em seu modo próprio de comportarse deixandoa que ela se mostre por si mesma E ao mesmo tempo confiar no caráter de indeterminação do seu ser que lhe confere a Ana M L C Feijoo 190 Revista da Abordagem Gestáltica XVII2 185192 juldez 2011 A r t i g o libertação de todos os diagnósticos estabelecidos seja pela Psiquiatria pela Psicologia ou pelo senso comum E nisso consistem a liberdade e responsabilidade desta criança Mantêla em liberdade entregandoa a sua pró pria tutela ou seja à sua responsabilidade é a própria relação psicoterápica Deixála caminhar por si mesma sem tentar desonerála desta tarefa de diferentes modos é o caminho no qual a criança perde a tutela do adulto mas pode ganhar a si mesma ao assumir o seu cuidado por si próprio a sua tutela O adulto ao mesmo tempo sem preocuparse ao modo substitutivo tem sob os olhos o que está acontecendo No caso apresentado a seguir os dados foram trocados a fim de garantir o sigilo da criança atendida Antônio tinha sete anos quando sua mãe procurou acompanha mento psicológico para ele A primeira entrevista foi com ambos os pais por ser importante que os dois trouxessem a questão de Antônio e o modo como vinham lidando com aquilo que se apresentava Além disto os dois deveriam estar de acordo com o acompanhamento psicológico com prometendose a comparecer quando solicitados Os pais de Antonio procuram psicoterapia por in dicação de um psiquiatra preocupados com o fato de a criança estar pegando coisas dos outros O médico dissera que se tratava de uma cleptomania A mãe co locara em dúvida o diagnóstico médico acrescentando que Antônio só queria chamar a atenção dos pais Tenta assim justificar o comportamento do filho usando uma determinação psíquica Ela mostrase bastante aflita com a situação e inicia Antônio vem pegando coisas dos ou tros chora Isto me preocupa muito porém acho que ele está querendo chamar a atenção estamos precisando fi car mais próximos dele sempre muito preocupados com o trabalho e outras coisas e acho que Antônio vai ficando meio esquecido Por isso vim aqui te pedir ajuda todos nós precisamos ser ajudados as coisas andam meio confusas Ao dizer que o menino só queria chamar a atenção dos pais retiralhe a responsabilidade de seu ato e colocao na tutela do psíquico O pai também dá uma interpreta ção a partir de sua experiência e em uma atmosfera afe tiva de irritabilidade com a situação Eu só quero saber porque Antônio está me agredindo João o irmão é total mente diferente um garoto exemplar faz tudo como deve ser feito Eu digo sempre para Antônio João o irmão é um exemplo a ser seguido Agora se ele insistir em me provocar se não mudar se continuar a ter atos ilícitos eu não vou mais querer saber dele Se continuar me agredin do eu vou esquecer que ele existe O pai deixa claro que caso o menino não modifique a situação ele suspenderá a sua tutela pois não aceita um ato ilícito Apenas com esse breve trecho podemos refletir sobre como se dá uma atitude fenomenológica frente à questão apresentada pelo médico e pelos pais O médico em uma atitude natural tende a classificar o comportamento da criança pelas características que constam nos manuais de Psicopatologia e conclui a partir dos sintomas que se trata de uma cleptomania Assim os comportamentos do menino se transformam em sintomas E o conjunto des ses sintomas são o suficiente para deduzir que se trata de uma compulsão A criança e seus comportamentos de saparecem dando lugar a uma categoria de diagnóstico que fala por si mesmo Outra atitude natural foi assumida pela mãe ao in terpretar a ação da criança como uma tentativa de cha mar a atenção Aqui não é mais a voz da ciência que dá o veredicto mas a do senso comum Deste modo o furto teria sido motivado por algo que se encontrava por trás do ato no caso chamar a atenção Segundo esta visão não caberia mais a Antônio o compromisso com sua ação estava totalmente justificado Já o pai caracteriza a situ ação como ilícita Assim uma vez identificado por uma classificação psiquiátrica pelo senso comum ou pela con travenção não era mais Antônio que pegava as coisas dos outros e sim aquilo com que o passaram a identificar A postura fenomenológica implica em deslocarse das interpretações comumente atribuídas assumindo uma atitude antinatural com relação à questão que se apre senta ou seja tomando o modo de ser da criança em sua expressão singular Na postura antinatural o psicólogo clínico suspende o diagnóstico dado pela mãe e pelo médico Ao voltarse para o fenômeno em sua mobilidade estrutural importa o sentido que Antônio dá a sua expe riência A visada sobre o fenômeno que se apresenta não se dá a partir de nenhum pressuposto em tese acerca do que possa ser uma compulsão a furtar coisas e a aten ção clínica voltase para a criança em seu modo próprio de comportarse Permitese que a criança se mostre por si mesma deixandoa livre para si mesma para assim poder assumir a sua liberdade e responsabilidade Em uma clínica fenomenológica a criança será rece bida a partir daquilo que vai acontecer na relação neste momento estabelecida Para tanto vaise suspender todo e qualquer pressuposto que anteriormente se fez presen te inclusive no relato dos pais Para exemplificar este modo de proceder clinicamente apresentaremos um tre cho desse atendimento Antônio Eu queria contar um problema Pedro vai ter a festa de aniversário dele só que vai ser na casa dele Eu não tenho vontade de ir sabe Eu não quero ir à festa tem muita gente que rouba e também tem um pequeno probleminha acusam a pessoa de uma coisa que ela não fez Alex rouba as coisas dos outros Eu desconfio também da Flávia ela também pega as coisas dos outros Mas não é só isso não tem outro problema meu pai vai sair com João e eu também quero ficar com meu pai sair com os dois Psicóloga Então você tem dois motivos para não querer ir à festa Antônio Tem outro tenho medo de não controlar Psicóloga Tem medo de não controlar o quê Antônio A vontade silêncio Psicóloga Vontade de que Antônio Antônio De pegar as coisas dos outros Eu não quero A Clínica Psicológica Infantil em uma Perspectiva Existencial 191 Revista da Abordagem Gestáltica XVII2 185192 juldez 2011 A r t i g o pegar mas eu olho a coisa e me dá muita vontade vontade mesmo Também tenho medo que Flávia coloque coisas na minha bolsa e depois me culpe Ela já fez isso guardou no meu estojo o lápis de Bruna Bruna sentiu a falta do lápis aí eu coloquei o lápis na mesa de Bruna só que ela me viu colocando o lápis e eu me defendi disse que tinha sido a Flávia que tinha colocado no meu estojo só que ninguém acreditou ficou todo mundo olhando para mim Antônio fica calado parecendo triste abaixa a ca beça põe a mão no rosto parecia estar chorando Repentinamente levantou a cabeça e fitoume por um longo tempo Na tentativa de mobilizálo e tentar com preender o que estava acontecendo falei Psicóloga Parece que essa situação te deixa muito triste Antônio E vou ficar muito sozinho Psicóloga E como é ficar sozinho para você Antonio permanece em silêncio Não ter ninguém por perto nunca vivi isto tenho medo ficar sozinho no recreio Assumindo uma atitude fenomenológica a psicóloga não interveio nem se colocou como alguém que desde o início já sabia qual era o problema Caso partisse de diagnósticos ou de teorias acerca do problema criaria obstáculos à apresentação do fenômeno Na situação de Antônio seria por exemplo destinarlhe uma identidade de cleptomaníaco e insistir para que ele falasse no tema buscando rapidamente o que determinava esse compor tamento Assim entregue a si mesmo pode ver as conse quências do modo como vinha se comportando só a ele cabendo a decisão do que iria ou não fazer Partir do diagnóstico que lhe havia sido previamen te conferido seria darlhe uma identidade que além de retirarlhe o seu caráter de poder ser também o desone raria de sua escolha Assim todo o seu modo de ser seria justificado por tal identidade não cabendo a ele a sua tu tela Retirar o caráter de poder ser de sua existência por um procedimento identitário constituise em um cami nho de acesso fácil porém pode acabar por sedimentar um determinado modo de ser Esse processo é discutido com muita pertinência em Sartre 2001 ao referirse a todo percurso do personagem Lucien Fleurier até tornar se um chefe tal como já havia sido decidido pelos seus pais muito antes dele nascer A atenção fenomenológica consiste em abandonar toda e qualquer identidade estabelecida para a criança seja com relação a um diagnóstico expectativa familiar ou social entre outros modos Em uma postura fenome nológica cabe então ao psicólogo deixar a criança em li berdade e entregála a sua própria tutela ou seja à sua responsabilidade Tratase sem dúvida de uma tarefa de licada No entanto deixála caminhar por si mesma sem tentar desonerála desta tarefa de diferentes modos pa rece ser o caminho pelo qual a criança perde a tutela do adulto mas ganha a si mesma Deixála sozinha consi go mesma nesta abordagem é uma arte que consiste em estar sempre presente sem mostrar a criança que se está ali E assim permitir que a criança por si própria possa aproximarse entregue a si mesma o mais demoradamen te possível de uma experiência de si mesma Considerações Finais Com o desenvolvimento da temática acerca da clíni ca psicológica em uma perspectiva existencial pudemos afiançar que a filosofia da existência traz aspectos for mais que criam um espaço de articulação de uma práxis clínica por diferentes motivos O primeiro deles é que as filosofias da existência retomam o que as filosofias mo dernas haviam abandonado ou seja a existência mes ma tal como acontece em seu campo de imanência Esse projeto de voltarse à imanência foi ineditamente apre sentado por Husserl Esse filósofo deslocouse da noção de consciência como algo encapsulado que se encontra localizado em uma interioridade e com sentidos e deter minações dados em si mesmo tomando então a consci ência como algo que acontece em um espaço relacional logo imanente Ele referese então à intencionalidade que passou a ser o elemento fundamental mesmo que com di ferentes acepções das filosofias da existência Heidegger e Sartre deram continuidade ao projeto de retomada da existência cada um a seu modo mas preocupados com a facticidade onde o existir acontece Esse mesmo movi mento foi acompanhado pela Psicologia que primeira mente seguindo o projeto moderno tomou o psíquico em todas as suas denominações como algo da ordem de uma interioridade que se relaciona com o exterior Ao surgir uma Psicologia Fenomenológica a pretensão também é de pensar o psíquico como algo imanente cooriginário ao mundo e portanto não passível de ser determinado nem localizado em uma interioridade Pensar a Psicologia a partir das filosofias da existên cia consiste em assumir o caráter de indeterminação que não pressupõe mais uma essência seja ela qual for que precede a existência Consiste ainda em aceitar a árdua tarefa de não ter como prever nem garantir nenhum re sultado dado o caráter de abertura e consequente liber dade em que a existência sempre se encontra Articular uma proposta de clínica infantil com base na filosofia existencial tornase possível ao tomar a crian ça na mesma perspectiva em que se toma o adulto Trata se de pensar a existência em sua imanência qualquer que seja a etapa de vida em que nos encontramos Logo importa é que aquele que tenta evitar a sua condição de liberdade abertura e indeterminação possa assumirse como um ser de possibilidades logo em liberdade para dizer sim e não às determinações inseridas no horizonte histórico em que se encontra Ana M L C Feijoo 192 Revista da Abordagem Gestáltica XVII2 185192 juldez 2011 A r t i g o Referências Heidegger M 19292008 Introdução à filosofia São Paulo Martins Fontes Heidegger M 19271989 Ser y tiempo Madrid Editorial Gredos Heidegger M 19872001 Seminários de Zollikon Petrópolis RJ Vozes Heidegger M 19471987 Carta sobre o humanismo Lisboa Guimarães editores Heidegger M 19292006 Os conceitos fundamentais da me tafísica mundo finitude e solidão Rio de Janeiro Forense Universitária Husserl E1952 2007 La filosofia como ciencia restricta La Plata Terramar Kierkegaard S 18422010 O conceito de angústia Petrópolis Vozes São Paulo Editora Universitária São Francisco Kierkegaard S 18492008 La enfermidad mortal Madri Editorial Trotta Kierkegaard S 19591966 Ponto de vista explicativo da mi nha obra como escritor Porto Edições 70 Kierkegaard S 18422006 O lo uno o lo otro un fragmento de vida Madri Editorial Trotta v 1 Sartre JP 19392005 A infância de um chefe In O muro Rio de Janeiro Nova Fronteira Sartre JP 19431997 O ser e o nada Petrópolis Vozes Ana Maria Lopez Calvo de Feijoo Doutora em Psicologia Professor Adjunto da Graduação e do Programa de PósGraduação em Psicologia Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro Endereço Institucional Universidade do Estado do Rio de Janeiro Departamento de Psicologia Clínica Instituto de Psicologia Rua São Francisco Xavier 524 Maracanã CEP 20550013 Rio de JaneiroRJ Email anamariafeijoogmailcombr Recebido em 150311 Aceito em 220911