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ISSN 1413389X Trends in Psychology Temas em Psicologia Março 2017 Vol 25 nº 1 2940 DOI 109788TP2017103Pt Modelos Teóricos em Psicossomática Psicanalítica Uma Revisão Maíra Bittar Galdi1 Faculdade de Ciências da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho Bauru SP Brasil Érico Bruno Viana Campos Departamento de Psicologia da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho Bauru SP Brasil Resumo Este artigo é um estudo teórico da literatura psicanalítica sobre o tema da psicossomática que tem por objetivo revisar os modelos de abordagem desse fenômeno buscando a compreensão de suas diferenças e similitudes em termos de fundamentação teórica Os resultados apontam para duas maneiras distintas de ver as doenças psicossomáticas ligadas a duas tradições em psicanálise Na vertente francesa ligada mais ou menos diretamente à perspectiva lacaniana cujas principais referências foram Jacques Alain Miller e Pierre Marty o fenômeno não constitui um deslocamento representacional mas sim uma falha nos processos de simbolização Em uma segunda vertente que congrega a Escola Psicossomática de Chicago até autores franceses não lacanianos cujas principais referências foram Joyce McDougall e Christophe Dejours o fenômeno psicossomático é compreendido em uma linha divergente relacionan do a formação do sintoma a confl itos inconscientes que são simbolizados na doença mas em uma forma de simbolização mais precária em relação ao modelo da histeria Apesar das divergências entendese que há conciliação quanto aos princípios na direção do tratamento que consiste em defi nir um sentido para o sintoma não por meio do resgate de uma fantasia inconsciente como no modelo clássico da his teria e sim construindo um sentido onde não havia encadeamento históriconarrativo Palavraschave Psicanálise psicossomática somatização simbolização Theoretical Models in Psychosomatic Psychoanalysis A Review Abstract This article is a theoretical study of the psychoanalytic literature on the subject of psychosomatic that aims to review the approach models this phenomenon seeking to understand their differences and simi larities in terms of theoretical basis The results point to two different ways of looking at psychosomatic illnesses In the French side linked more or less directly to the Lacan perspective the main references were JacquesAlain Miller and Pierre Marty the phenomenon is not a representational shift but a failure in symbolization processes In a second aspect which brings together from the Psychosomatic School of Chicago to French authors not Lacanian the main references were Joyce McDougall and Christophe Dejours the psychosomatic phenomenon is understood in a divergent line relating the formation of the 1 Endereço para correspondência Rua Christiano Pagani 851 Apto 53ª Bairro Jardim Auri Verde Bauru SP Brasil 17047144 Fone 14 3204897914981116015 Email mahbghotmailcom Este trabalho é fruto da pesquisa de iniciação científi ca Fundamentos da Psicossomática Psicanalítica desenvolvida pela primeira autora e orientada pelo segundo autor no programa de Iniciação sem Bolsa da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho UNESP PIBICISB Galdi M B Campos E B V 30 symptom the unconscious confl icts They are symbolized in the disease but in a more precarious form of symbolization from the model of hysteria Despite the differences it is understood that no compro mise on the principles towards the treatment which is to defi ne a meaning for the symptom not by the rescue of an unconscious fantasy as in the classic model of hysteria but building a sense where there was no historical narrative thread Keywords Psychoanalysis psychosomatic somatization symbolization Modelos Teóricos en Psicosomática Psicoanalítica Una Revisión Resumen Este artículo es un estudio teórico de la literatura psicoanalítica sobre el tema de psicosomática que tiene como objetivo revisar los modelos de aproximación a este fenómeno que tratan de comprender sus diferencias y similitudes Los resultados apuntan a dos formas diferentes En el lado francés vinculado más o menos directamente a la perspectiva Lacaniana las referencias principales fueron JacquesAlain Miller y Pierre Marty el fenómeno no es un cambio de representación pero un fallo en los procesos de simbolización En un segundo aspecto que reúne en la Escuela Psicosomática de Chicago a los autores franceses no Lacanianos las referencias principales fueron Joyce McDougall y Christophe Dejours el fenómeno psicosomático se entiende en una línea divergente relativa a la formación del síntoma los confl ictos inconscientes Ellos están simbolizadas en la enfermedad pero en una forma más precaria del modelo de la histeria A pesar de las diferencias se entiende que hay compromiso en los principios hacia el tratamiento que consiste en defi nir un signifi cado para el síntoma no por el rescate de una fantasía inconsciente como en el modelo clásico de la histeria pero la construcción de un sentido en que no había ningún hilo narrativo histórico Palabras clave Psicoanálisis psicosomática somatización simbolización No século XIX o surgimento dos casos de histeria fez emergir questões capciosas para o projeto da medicina científi ca e naturalista Em um contexto histórico onde a razão e o culto à consciência imperavam os sintomas como pa ralisias e inibições que não tinham seu corres pondente orgânico intrigavam e se colocavam como um desafi o para a época o que permitiu que outras ciências que não se encerravam na lógica positivista lançassem as diretrizes de um arcabouço teórico que pudesse dar conta dessa realidade Nesse sentido no contexto dos estu dos sobre a histeria de Freud e Breuer 1895 o conceito de Inconsciente vai sendo delineado bem como as técnicas e os métodos que permi tem sua investigação levando à composição de uma nova ciência a Psicanálise constituída por um objeto e um método específi cos Inicialmente investigado através da técnica da hipnose o Inconsciente foi descoberto como possuindo suas próprias leis de funcionamento que fogem totalmente à consciência e é por meio dessas leis que Freud desvendou o mecanismo conversivo que havia por trás dos sintomas his téricos A conversão foi descrita por Freud como um mecanismo inconsciente presente na matriz clínica da neurose histérica em que a pulsão ligada a uma ideia é recalcada e convertida em representantes ideativos do próprio corpo Mas não se trata aqui do corpo biológico e sim do corpo erógeno dotado de uma anatomia imagi nária que subverte o corpo real de tal forma que a ordem erógena se constitui como um duplo da ordem biológica a partir da superfície corporal Leclaire 19791992 O corpo erógeno é aquele que tem em sua anatomia imaginária fantasias sexuais específi cas que de alguma maneira es tão interligadas a um órgão correspondente É portanto um corpo desejante que supera o de terminismo biológico os órgãos não são utili zados somente para satisfazer as necessidades de sobrevivência como ocorre com os animais Modelos Teóricos em Psicossomática Psicanalítica Uma Revisão 31 mas também satisfazem expressam e evocam desejos e é nisso que o homem se diferencia dos animais ele tem pulsões e não instintos Porém o corpo erógeno não nasce com o ser humano Para que ele exista e se desenvolva é necessário um outro alguém que o invista se xualmente ou seja que deseje que imagine uma história que direcione seu olhar para o corpo Todo esse processo não é simples vai desde a etapa do narcisismo primário até as etapas poste riores de construção da sexualidade e sempre por alguns infortúnios da vida a que todos estão sujeitos pode ser interrompido se desorganizar ou regredir para fases anteriores do desenvolvi mento O corpo erógeno também é passível de falhas O investimento libidinal nele nunca é uniforme podese investir demais em uma re gião como na histeria ou falhar em outra como se supõe que aconteça no fenômeno psi cossomático e essa questão também é fruto de algumas divergências teóricas no campo Sendo assim a psicanálise em sua desco berta e na investigação do mecanismo de conver são abalou os pilares do racionalismo cartesiano rompendo defi nitivamente com a medicina com a introdução do conceito de corpo erógeno inau gurando uma nova forma de saber o Inconscien te É por essa razão que falar em Psicossomática em Psicanálise revelase uma questão espinho sa Como teorizar sobre aquilo que ela própria negou em sua origem como campo de saber Ao mesmo tempo em que essa negação do corpo real a defi niu em sua ruptura com o positivismo agora a divide e se coloca enquanto desafi o con temporâneo visto que atualmente o mal estar psíquico tem suas mais variadas expressões no corpo biológico Mas o que é a Psicossomática Também essa questão se apresenta de forma difusa Mes mo na medicina vemos divergências quanto a sua defi nição Uma vertente da medicina de in fl uência hipocrática tem na psicossomática uma fi losofi a uma visão de homem e de mundo no qual corpo e mente não se dividem Tudo abran ge Psiquê e Soma ou seja tanto a saúde como a doença fazem parte de processos mentais e somáticos que são unifi cados e que formam a totalidade que é o ser humano Por outro lado outra vertente considera apenas alguns tipos de doenças sendo psicossomáticas o que retoma as discussões dualistas já que sob essa perspec tiva existem doenças que englobam a psique e outras não Mello Burd 2010 Com relação a esta última vertente vemos que mesmo com a ruptura com a medicina na qual a Psicanálise surgiu em alguns aspectos elas ainda se aproxi mam tal como a descrição e categorização des sas doenças correlacionandoas com confl itos inconscientes específi cos realizada pela Escola de Chicago Casetto 2006 Dessa forma o limite tênue entre processos fi siológicos e psicológicos é novamente proble matizado com a reinserção da psicanálise nas questões do real do corpo Dessa investigação surge a noção de que para além das fantasias que são simbolizadas em uma anatomia imaginária o corpo biológico também pode servir de escoa douro para fantasias não nomeadas e até mesmo de suporte para simbolizações precárias ou seja modalidades mais arcaicas de representação do que aquelas consideradas no modelo neurótico clássico No entanto as diferentes vertentes das escolas psicanalíticas se dividem quanto à natu reza específi ca desse fenômeno trazendo con vergências e divergências entre si Os principais pontos de discussão residem nas elucidações sobre uma entidade clínica pre sente ou não nos casos dos fenômenos psicosso máticos a inexistência ou não de uma articula ção simbólica na doença e por fi m a difi culdade com que a psicanálise se encontra até os dias atuais de descrever metapsicologicamente esse tipo de fenômeno Para tanto serão estudados alguns dos principais teóricos envolvidos nessa problemática Franz Alexander líder da Esco la Psicossomática de Chicago Pierre Marty do Instituto de Psicossomática de Paris IPSO Ja cques Alain Miller Joyce McDougall e Christo phe Dejours Caracterização A psicanálise no geral considera doença psicossomática todo fenômeno que não se res tringe apenas às explicações biológicas médicas mas que insiste em aparecer permanecer e que Galdi M B Campos E B V 32 também não se enquadra nos sintomas de neu roses clássicas É um diagnóstico portanto por exclusão e também por isso que surgiram tantos rumores principalmente de autores próximos a Lacan se não estaríamos diante de uma nova matriz clínica que não as clássicas neuroses psi coses e perversões Desse grupo de pensadores Pierre Marty é o mais representativo dessa linha de pensamen to Líder do Instituto de Psicossomática de Paris IPSO sua obra se divide em basicamente três períodos No primeiro mais biologicista des crevendo o processo de desorganização psicos somática como resultado de uma tensão entre os Instintos de Vida e os Instintos de Morte Estes teriam uma fonte somática e a morte não era o fi m mas sim a consequência desse desequilíbrio biológico diferentemente do que afi rmavam os lacanianos e os outros membros do instituto Sendo assim as desorganizações atingiam pri meiro as áreas do corpo erógeno com o intui to de proteger o corpo contra desorganizações maiores até que o psiquismo se reestabeleça Caso a desorganização seja mais grave o cor po essencialmente biológico também é atingido podendo causar a morte O psiquismo segundo ele é evolutivamente mais recente que os pontos somáticos Casetto 2006 e por isso mesmo o primeiro a ser atingido na decorrência de um trauma A segunda parte de seu trabalho foi voltada para uma construção teórica mais psicanalítica com a introdução dos conceitos chaves de sua obra mentalização pensamento operatório e depressão essencial Para ele uma baixa capaci dade de mentalização ou seja de metabolização de traumas através dos símbolos leva o sujeito à chamada depressão essencial A depressão es sencial é caracterizada por uma depressão sem objeto específi co muito diferente do luto por exemplo que geralmente tem o componente da perda do objeto com seu desinvestimento libi dinal conseguinte A desvitalização psíquica da depressão essencial não tem seu correspondente no investimento em pensamentos suicidas ou de preciadores como ocorre nos casos de depres são clássica Há um desinvestimento maciço em tudo não se tratando tanto de tristeza mas sim de apatia aumentando a frequência de doenças e acidentes psicossomáticos Na última fase de sua obra Marty de preo cupou em formular uma classifi cação nosoló gica da psicossomática segundo categorias diferentes com relação à capacidade de mentali zação Elas seriam mais inferiores em relação à capacidade de simbolização que os neuróticos psicóticos e perversos Inicialmente chamou as de neurose de comportamento e neuroses de caráter e depois subdividiu as últimas em neu rose mal mentalizada neurose de mentalização incerta e neuroses bem mentalizadas Casetto 2006 p 12 Talvez por uma infl uência de sua fase bio logicista Vieira 1997 aponta que para Marty a doença psicossomática não tem o papel que a pulsão de morte tem para Freud pois seu ob jetivo fi nal não é a morte pelo contrário pode ser uma defesa que impedindo desorganizações mais severas opera para assegurar a integridade do organismo Pouco a pouco os conceitos de mentalização e pensamento operatório foram se sobrepujando em relação a outros aspectos teóricos de sua jornada como os conceitos de depressão essencial e até mesmo sobre a fase mais voltada para a descrição biologicistas Sua contribuição teórica é bastante marcada pelo destaque na carência de simbolizações do psi quismo nos pacientes psicossomáticos e esse aspecto será retomado aprofundado e problema tizado por todos os outros autores posteriores Outra grande vertente na Psicossomática Psicanalítica foi a Escola de Chicago lidera da por Franz Alexander Ela limita as doenças psicossomáticas em sete perturbações clássicas asma brônquica úlcera gástrica artrite reuma toide retocolite ulcerativa dermatoses tireoto xicoses e hipertensão Diferentemente do que ocorre com a histeria Volich 2000 aponta que Alexander não considera o fenômeno como uma solução de compromisso ou seja o fenômeno não é uma tentativa de cura e solução do confl i to psíquico Para ele Alexander desenvolveu a noção de constelação psicodinâmica específi ca para tentar explicar a origem da doença Nela propõe que certos confl itos internos estão direta mente relacionados a reações emocionais especí Modelos Teóricos em Psicossomática Psicanalítica Uma Revisão 33 fi cas cada uma correspondendo a cada confl ito embora a relação estabelecida entre as emoções e as doenças não seja causal Essas duas grandes escolas desempenha ram um papel muito importante tanto na práti ca como na construção de uma teoria psicana lítica sobre as doenças psicossomáticas Foram elas que construíram um corpo teórico no qual os psicanalistas posteriores se apoiaram modi fi caram e problematizaram essas construções contribuindo para o avanço dos conhecimentos nesse assunto relativamente recente Em discus sões posteriores encontramos importantes refe renciais teóricos em JacquesAlain Miller Joyce McDougall e Christophe Dejours Até então as construções teóricas sobre a psicossomática psicanalítica não consideravam a possibilidade do desenvolvimento de doenças psicossomáticas em outras estruturas subjeti vas que não as que funcionam no modo opera tório Sobre esse ponto Miller 1987 chega a considerar a existência do fenômeno em outras estruturas subjetivas porém não deixa de teori zar sobre uma possível subjetivação própria do psicossomático Segundo esse autor o psicossomático pode ser uma estruturação muito primitiva próxima da psicose e da debilidade mental Ele deixa muito evidente a relação de oposição do fenô meno psicossomático ao sintoma histérico A diferença que se dá precisamente reside no fato de que diferentemente do que ocorre no fenô meno o sintoma conversivo não incide no cor po real biológico mas sim no corpo erógeno imaginário O sintoma segundo ele reside no campo das neuroses obedecendo a uma estru tura de linguagem subjacente que opera através dos processos da metáfora e do deslocamento sendo portanto carregado de signifi cados in conscientes o que segundo ele não ocorre nos fenômenos psicossomáticos Certamente é crucial essencial distinguir o sintoma especialmente o histérico e o fe nômeno psicossomático precisamente nisso que esta relação ao Outro é constitutiva do sintoma histérico o que de nenhum modo é o caso do fenômeno psicossomático se ele existe Miller 1987 p 89 O fenômeno não está inserido em uma es trutura de linguagem mas também não está completamente fora dela caracterizandose por um fenômeno limite Isso quer dizer que embo ra haja alguns aspectos da linguagem presente seus mecanismos de formação ainda não são claros para ele por pertencerem a uma simbo lização muito mais arcaica fora do campo das neuroses Embora Miller reconhecesse que o fe nômeno não esteja restrito somente a um tipo de personalidade isso não obteve muito destaque em sua concepção teórica que foi inteiramente desenvolvida sob a noção de uma estruturação psíquica específi ca que por apresentar difi cul dades nos processos simbólicos apresentava a somatização como consequência Não houve maiores esclarecimentos sobre o que pode levar a uma saída psicossomática psi cótica ou autista visto que para Miller 1987 essas estruturas são muito próximas Além dis so não fi ca explicito o porquê de uma falha na simbolização em alguma área circunscrita não pode ter o retorno em delírio ou uma passagem ao ato O que é percebido é que esses fenômenos apresentam muita semelhança com as psicoses tanto em seus mecanismos quanto na estrutura familiar A carência de simbolização o fato de não ter sido idealizado e representado por um signifi cante pelos pais são comuns a essas duas estruturas resultando em uma lacuna nas repos tas que poderiam existir sobre a escolha por uma saída ou outra Joyce McDougall de certa forma supera essas elucidações teóricas ao reconhecer que não existe uma estrutura subjetiva própria dos fenômenos psicossomáticos Além disso em seu livro Teatros do Corpo McDougall 1996 a autora aborda a somatização como todo tipo de passagem ao ato que inclui o uso de substân cias o aumento da vulnerabilidade aos acidentes corporais e as falhas do sistema imunológico Para denominar esse mecanismo muito fre quentes nos somatizadores no qual o afeto não é pensado McDougall 1996 criou o termo de safetação O afeto é um conceito limite assim como é o de pulsão estando entre o somático e o psíquico O estado de desafetação consiste ba sicamente em uma incapacidade de refl etir so Galdi M B Campos E B V 34 bre as emoções vividas intensamente O fato de essas pessoas vivenciarem emoções fortes não é tão prejudicado embora haja constantemente uma tentativa de fuga dessas vivências Mas a capacidade de nomeação diferenciação e refl e xão sobre seus estados afetivos mais intensos é quase nula Além da projeção dos afetos a desa fetação consiste em um mecanismo que também projeta a representação para o exterior Nesse ponto McDougall afi rma um novo destino para os afetos o repúdio para fora do ego a acrescen tar nos três já existentes deslocamento conver são transformação em angústia Ao afeto que foi ejetado em sua parte psíquica resta somente se exprimir através de sua dimensão orgânica como na primeira infância reduzindo assim a mensagem do psiquismo a um funcionamento não verbal À primeira vista há algumas semelhanças com o pensamento operatório descrito pelo Ins tituto de Psicossomática de Paris principalmen te com relação a ruptura do sistema consciente inconsciente resultando em um funcionamento psíquico pragmático e muito concreto Porém no caso do pensamento operatório há também uma incapacidade de vivenciar essas emoções o que pode ocorrer na desafetação mas não cons titui necessariamente uma regra Há certa semelhança entre os mecanismos de desafetação foraclusão e projeção visto que são mecanismos brutais de extirpação de afetos e representações As diferenças residem no fato de que na projeção o conteúdo de uma pulsão é suprimida e deformada retornando ao conscien te como uma representação ligada a um objeto externo Na desafetação é o afeto que é repu diado sem retorno sobre um objeto externo ou alucinatório Seu destino é ser escoado pela via somática Na projeção portanto a representação não é totalmente lançada para fora do psiquismo já que algumas representações permanecem no objeto externo Na desafetação toda cadeia re presentativa é excluída sem retorno Quanto às angústias dominantes no quadro das doenças psicossomáticas essas estão muito mais próximas das angústias psicóticas do que das histéricas Basicamente se referem á perda da identidade individual sexual e à perda dos li mites corporais Esses medos primitivos deixam em qualquer indivíduo vestígios psíquicos que estão ligados aos temores de todo bebê que são em grande parte resolvidos na fase fálicoedi piana Mas quando não resolvidas e a angústia psicótica domina o quadro clínico não estamos mais diante de uma problemática histérica em bora os pacientes somatizadores também não sejam psicóticos Talvez estejamos na posição de perguntarnos se muitas organizações neuró ticas histéricas e obsessivas não são no fundo construídas a partir de um núcleo psicótico McDougall 1996 p 21 Muito se fala nos textos revisados sobre a etiologia das doenças psicossomáticas Joyce McDougall nesse ponto não difere muito com relação aos outros autores A organização fami liar agressiva e sua consequente pobreza mental que abrem caminho para uma doença são fato res citados em praticamente todas as obras Mas pouco é dito sobre os mecanismos metapsicoló gicos existentes nela Apesar de a autora ter cria do um novo conceito o da desafetação pouco se entende sobre sua especifi cidade A desafetação se defi nindo pelo repúdio para fora do ego é um mecanismo semelhante ao dos psicóticos que utilizam a foraclusão termo utilizado pela escola lacaniana ou a projeção termo próprio da escola inglesa A autora ressalta a dimensão afetiva que é repudiada talvez essa seja a dife rença com relação á foraclusão que ejeta somen te a representação sem a carga afetiva Pouco é dito também sobre a formação da doença a partir desse mecanismo somente uma passagem breve que afi rma que quando a dimensão psíqui ca do afeto é repudiada a dimensão orgânica se expressa Além disso ela afi rma que a desafe tação não tem um retorno em forma de delírio como tem a foraclusão ou a projeção Se na de safetação toda cadeia representativa é destruída como explicar seu retorno no corpo sob uma for ma precária de simbolização Também perdura aqui a questão do porque o retorno não se dar em forma de delírio Sobre os elementos que poderiam ser utili zados na construção de um sentido pouco tam bém é dito Sabemos que ele não se confi gura em uma simbolização como ocorre na histeria pois Modelos Teóricos em Psicossomática Psicanalítica Uma Revisão 35 é muito mais arcaico mas não sabemos do que dispomos para desvendálo Sobre esse ponto o próximo autor acrescenta contribuições teóricas muito importantes se atendo na importância da dimensão agressiva não representada presente na somatização através de um mecanismo se melhante que ele denominou de clivagem do in consciente Além disso o autor procura explicar e oferecer uma solução para as indagações que não foram respondidas pelos autores anteriores sobre a questão do elemento que diferiria entre uma saída psicossomática ou psicótica baseado na observação das diferenças entre os pais dos psicóticos e os dos somatizadores Porém antes é necessário explicar alguns conceitos básicos de sua teoria como sua própria defi nição de doen ças psicossomáticas a noção de subversão libi dinal e de construção do corpo erógeno Dejours 1991 ressalta que em sua con cepção se existe um dualismo presente é aquele entre o corpo erógeno e o corpo fi siológico não a partir de uma relação de oposição mas sim de superação do segundo sobre o primeiro No entanto a construção do corpo erógeno nunca é completamente bemsucedida podendo ocorrer falhas na convocação de algum órgão ou tam bém do desapoio da pulsão de alguma área a partir de algum traumatismo ocorrido na vida do sujeito É assim que a questão da escolha de ór gão é tratada as áreas corporais que não foram sufi cientemente subvertidas são facilmente atin gidas nas somatizações Apesar da semelhança com a teoria de La can no que se refere à questão da escolha de órgão há divergências entre as opiniões com re lação à origem da pulsão Para Dejours 1991 a pulsão provém de uma fonte biológica inata enquanto que para Lacan e para os autores póslacanianos a pulsão provém da linguagem mais especifi camente de signifi cantes que a mãe insere no bebê em seus primeiros meses de vida Após essa abordagem inicial sobre os pre ceitos básicos que orientam sua teoria algumas questões mais específi cas sobre a problemática das somatizações serão abordadas como a ter ceira tópica ou tópica da clivagem e a di mensão agressiva não representada como a pro blemática central das doenças psicossomáticas A agressividade que não pôde ser represen tada ocorre a partir da clivagem do inconsciente em inconsciente primáriosecundário O autor retoma a hipótese freudiana a de que o incons ciente também é constituído por traços fi loge néticos considerando o inconsciente primário como sede dos traços herdados Já o inconscien te secundário por sua vez é aquele ligado às representações simbólicas A pulsão de morte portanto impedida de ser representada pelo pré consciente opera de forma destrutiva no corpo orgânico através das doenças psicossomáticas Dessa forma o sujeito permanece desconheci do de sua própria violência Buscando preservar a aparente normalidade no vínculo social essa violência não é atuada mas sim dirigida contra o próprio sujeito que desfere um golpe incons ciente contra o próprio corpo em forma de so matização Dejours 1991 sugere que a própria somatização pode ser simbolizadora de algum aspecto perdido da história dessas pessoas Essa é mais uma inovação no campo da psicossomá tica psicanalítica pois até agora nenhum autor havia citado a possibilidade de ver a somatiza ção como um elemento facilitador que faz de senrolar o processo da análise A violência do analisando não é expressa concretamente De forma mais sutil ela é percebida mais no âm bito negativo faltam palavras que signifi quem suas experiências emocionais em seu discurso bem como expressões corporais e faciais mais espontâneas e autênticas Outro mecanismo de defesa é proposto na tentativa de explicar o pro cesso de somatização o de repressão dos afetos agressivos Esse mecanismo procura eliminar os afetos desde sua fonte que segundo o autor é biológica Ele se diferencia do mecanismo do re calcamento porque este opera somente sobre as representações em nível préconscienteincons ciente impedindo que as representações recal cadas ultrapassem a barreira do inconsciente até o préconsciente O consciente perde totalmente o contato com o conteúdo recalcado enquanto que na repressão a representação aparece por vezes intacta ao consciente podendo sumir logo em seguida Diferentemente do recalcamento a repressão opera a nível conscientepréconscien te Ela se opõe mais especifi camente contra o Galdi M B Campos E B V 36 desenvolvimento do afeto e não de elementos re presentacionais Portanto vemos que o recalque opera mais a nível psíquico das representações enquanto que a repressão em um nível mais afe tivo e corporal A partir disso o autor declara que interpre tar um sintoma psicossomático se trata efetiva mente de interpretar a pulsão de morte Esse é um processo que procura vincular a pulsão de morte com a pulsão de vida esvaziando seu po tencial traumático As somatizações simboliza doras devem ser identifi cadas segundo o autor eliminando a hipótese de depressão essencial Portanto ele considera toda a proposição teórica do Instituto de Paris mas faz uma diferenciação entre os tipos de somatização as desorganiza ções progressivas são diferentes das somatiza ções simbolizadoras Nas primeiras a violência é parcialmente inibida ao passo que na segunda é reprimida maciçamente O que é observado então é que algumas somatizações abrem ca minho para revelar um confl ito ou uma parte da história do sujeito que permanecia oculta a qual ele não entrava em contato por ser uma história traumática A partir disso observavase que o decurso da análise antes aparentemente conge lado começava a se desenrolar o que permite também evocar a noção de facilitação psicos somática Dejours 1991 p 28 As semelhanças encontradas com as rela ções mãebebê dos psicóticos também são mui tas Dejours 1991 ressalta que a diferença resi de no fato de que os pais do psicótico procuram desviar os pensamentos dos fi lhos criando um pensamento alienado não original Os pais do psicossomático entretanto procuram destruir qualquer tipo de pensamento que ele possa vir a ter principalmente os de cunho sexual Mas não é somente nesse aspecto que na teoria de De jours essas psicopatologias passam a ser próxi mas ele propõe uma hipótese de que as doenças mentais em especial as psicoses sejam agrega das às doenças psicossomáticas Nesse ponto o autor leva em conta as descobertas das neuroci ências segundo a qual essas funções dependem da montagem hereditária do sistema nervoso Dessa forma é pensado também que no caso das psicoses o desapoio da pulsão ao invés de se dar nas áreas viscerais como ocorre com as doenças psicossomáticas se dá no cérebro comprometendo as áreas referentes à cognição e à linguagem que são as funções mais compro metidas nos psicóticos Dejours 1991 e McDougall 1996 já ofe recem um maior avanço na técnica no sentido de que um trabalho interpretativo é arriscado sendo por isso mais operativo embora Dejours 1991 também considere a relevância da tera pêutica de Marty procedimento do qual deno minou páraexcitação A escolha entre os dois procedimentos terapêuticos segundo ele de pende da disposição do analisando de enfrentar sua verdade Do ponto de vista clínico Dejours 1991 oferece uma inovação ao constatar que as somatizações ocorrem também em estruturas neuróticas de personalidade No que se refere à técnica o autor também insere uma nova propo sição a de que as somatizações devem ser inter pretadas através de seus conteúdos agressivos e mortíferos Para ele portanto um sentido subja cente à doença pode ser desvendado procurando ligar a dimensão traumática da pulsão de morte à libido Discussão Apesar de haver algumas divergências te óricas como já constatado as opiniões acerca dos fenômenos psicossomáticos seguem certo padrão no que se refere às características dos pacientes que apresentam esse tipo de problemá tica Há consenso com relação à incapacidade de simbolização presente nesses quadros clínicos embora as teorias tenham seguido um movi mento de no início considerar a falta de sim bolização como sendo estruturante nesses casos se desdobrando para a noção de que a essa falta não é estruturante mas sim circunscrita a alguns pontos do discurso Também perdura de ma neira geral a concordância com relação à falta de afetividade as referências à ausência de vida onírica e fantasmática além de uma extrema concretude de pensamentos concomitantemente a um estilo de vida extremamente pragmático Todos esses fatores são elencados e denomina dos pelos membros do Instituto de Psicossomá Modelos Teóricos em Psicossomática Psicanalítica Uma Revisão 37 tica de Paris de pensamento operatório na Es cola Psicossomática de Chicago de Alexitimia e Joyce McDougall utiliza o mecanismo defensivo da desafetação para designar esses elementos ca racterísticos Dejours não chega a criar um novo conceito para denominar essas características da personalidade sendo que a ênfase de sua teoria recai na hipótese da clivagem do inconsciente e na dimensão da agressividade não representada Contudo as incursões teóricas de autores pós Lacanianos como Miller apontam para a con sideração de outros mecanismos defensivos que possam coexistir com o de foraclusão dando a ideia de que a foraclusão do NomedoPai não instaura a lógica geral de simbolização nos ca sos psicossomáticos como ocorre nos psicóti cos mas sim é um mecanismo circunscrito que pode coexistir com o recalque a denegação etc No entanto ainda assim um perfi l do paciente psicossomático é mantido e este se encontra muito próximo do perfi l do psicótico o que pa rece permanecer uma opinião contraditória com o restante da teoria ou ainda que faltam mais elementos teóricos para se pensar na ocorrência das somatizações no âmbito das subjetividades bem mentalizadas As ideias de McDougall ca minham para a aproximação da psicossomática com a histeria concordando com a dimensão simbólica mas mais arcaica do que o sintoma que o fenômeno oferece A aproximação da psicossomática com a psicose também é realizada por Dejours mas com a diferença de que nesse caso há a pro posição de tratar as doenças conhecidas como mentais em nossos dias atuais como doenças psicossomáticas também onde haveria o desa poio da pulsão e dessa forma a vulnerabilidade para a pulsão de morte Isso explicaria o porquê dos psicóticos e autistas serem prejudicados nas funções de linguagem e cognição enquanto que seu sistema imunológico permanece extrema mente forte Dejours oferece uma pista para uma melhor compreensão acerca das diferenças en contradas na saída psicótica e na psicossomática Apesar das semelhanças elencadas entre ambas vemos que existe a diferença com relação aos destinos dos pensamentos dos pacientes na pri meira infância Também é notável o papel im portante exercido pelos pais na libidinização das áreas corporais que segundo ele pode ser deci sivo entre uma eclosão psicótica ou uma eclosão psicossomática Com relação às discussões sobre a atribui ção de um sentido simbólico sobre a doença e so bre os mecanismos metapsicológicos envolvidos nela alguns avanços também foram alcançados no desenrolar das teorias como a construção de um sentido sobre a doença o que também ofere ce um avanço na prática clínica que se mostra dessa maneira um pouco mais operativa Além disso algumas descobertas importantes sobre a dimensão agressiva presente nessa problemática possibilitou com que fossem criadas tentativas mais esclarecedoras da metapsicologia envolvi da no caso das somatizações fato que é verifi ca do na proposição da terceira tópica de Dejours Sendo assim apesar de no início a relação entre a incapacidade de simbolização e a eclosão de uma doença corporal ter sido abordada de for ma mais direta progressivamente foi observado a presença de mais elementos metapsicológicos envolvidos nas somatizações como o mecanis mo de desafetação e de clivagem das imagos de McDougall e da tópica da clivagem e da repres são da agressividade de Dejours que de certa forma problematizaram uma questão que apa rentemente se apresentava de forma um pouco mais simplifi cada e direta Com relação ao caminho percorrido pelas discussões sobre o sentido do fenômeno psicos somático vemos que as discussões iniciais clás sicas da psicanálise realizadas pelos membros do Instituto de Psicossomática de Paris cami nharam para questionar se o fenômeno chegaria a abarcar a estrutura de linguagem Apesar dessa opinião também parecer ser a posição tomada por Lacan Miller não conclui a questão oscilan do entre as posições de afi rmação da inexistência de qualquer elemento simbólico contido nela ou admitindo a possibilidade de alguma inserção na linguagem o que abriria a possibilidade para classifi cálo como um fenômeno de borda ou seja que está nos limites do universo simbólico Entre os autores franceses é apenas com a introdução das ideias de Dejours que uma cons trução de sentido sobre a lesão é proposta mas Galdi M B Campos E B V 38 diferentemente do sintoma histérico que é inter pretado através das fantasias eróticas recalcadas do sujeito o fenômeno psicossomático deve ser interpretado a partir das pulsões agressivas re primidas No entanto Dejours não é considerado um autor estritamente póslacaniano permane cendo desconhecidas as posições tomadas por estes na atualidade Já McDougall realiza uma aproximação com as ideias de Dejours refor çando que a somatização se trata de uma história oculta da vida do sujeito que foi impossibilitada de ser representada para ele próprio e para al guém Por isso a necessidade de reconstrução dessa história perdida que daria sentido à so matização Ainda assim apesar de haver esses avanços tanto no âmbito teórico quanto no clí nico as simbolizações dos fenômenos psicosso máticos são muito mais arcaicas que as de um sintoma histérico permanecendo uma certa difi culdade em seu desvendamento Sobre o movimento percorrido das cons truções teóricas acerca de um sentido Casetto 2006 observa colocandose estas diferenças em pers pectiva no tempo detectase o que parece ser um certo movimento dialético a soma tização transita de um modelo mais estrita mente conversivo para a sua negação e em seguida para um terceiro estado em que se apresenta como um horizonte de signifi ca ções ainda irrealizado p 17 Apesar desses avanços no percurso trilha do uma teoria que explique todos os mecanis mos metapsicológicos por trás das somatizações ainda não foi alcançada Talvez essa difi culdade advenha da própria problemática que se reve la em casos difíceis pela extrema neutralização com que esses pacientes se apresentam na clíni ca mas ainda mais do que esse fato sobrevém a constatação de que a doença psicossomática é um fenômeno que abarca tanto a dimensão bio lógica quanto psíquica sendo necessário por isso rever nossas concepções acerca da nature za da mente e do corpo bem como o modo de interação que se dá entre essas duas instâncias Isso fi cou muito claro na obra de Dejours a par tir de seu conceito de subversão libidinal mas embora a psicanálise tenha inovado com o con ceito limite de pulsão ela se apegou muito mais a teorizar sobre mecanismos psíquicos care cendo de explicações quando se depara com um fenômeno tanto biológico quanto psíquico Essa difi culdade já foi apontada por Birman 2001 que considera que esse fato muito mais do que ser traduzido por uma insufi ciência teórica foi estabelecido por um pacto entre a psicanálise e a medicina operando uma separação entre as questões do psiquismo que deve ser investiga das pela primeira e as questões do corpo res tritas somente à segunda Essa cisão ocorreu na emergência da psicanálise e seu questionamento das ciências positivistas e deve ser revista nos dias atuais através de uma demanda da própria realidade psicossomática que vem aumentando nas clínicas Por fi m há a necessidade também da con sideração de outros aspectos constitutivos do fenômeno psicossomático que não apenas os genéticos inconscientes e aqueles construídos a partir das relações primitivas com os pais Isso se refere a uma maior busca por respostas no âm bito da vida social dos sujeitos pois se as doen ças psicossomáticas vêm aumentando nos dias atuais não haveria na nossa sociedade contem porânea elementos presentes nos quais estariam contribuindo para um aumento do malestar psí quico expresso através do corpo A discussão se amplia para uma observação do próprio funcionamento de nossa sociedade atual na qual as relações de trabalho refl etiriam apenas um aspecto de seu funcionamento Os valores difundidos pelos meios sociais como o individualismo o consumismo e a competição estariam contribuindo para a construção de iden tidades fragmentadas despersonalizadas A questão seria será que a sociedade ca pitalista contemporânea com seus valores supremos atrelados ao consumo não estaria produzindo uma espécie de despersonaliza ção que viria à reboque do fenômeno de mas sifi cação Vivemos em uma cultura cujos imperativos favorecem o aparecimento da doença normótica Fica aqui uma hipótese mais ampla a ser trabalhada em outro mo mento de que o estilo de vida fragmentário que nos oferece a sociedade contemporânea Modelos Teóricos em Psicossomática Psicanalítica Uma Revisão 39 afi nal em nada favorece aquilo que se pode chamar de uma boa mentalização Ferraz 1997 p 172 Esse é um debate interessante e necessário para a psicanálise que oferece a possibilidade de pensar a construção da subjetividade para além daquela estabelecida pelas relações familiares da primeira infância buscando integrar tam bém aspectos atuais da vida do sujeito tanto relacionais como o sofrimento psíquico no tra balho caminhando de modo mais amplo para discussões do próprio contexto histórico e social na qual está inserido o que é um fator importan te visto que estabelece maiores relações com o meio externo e relacional sem deixar de lado as dinâmicas intrapsíquicas Considerações Finais As discussões em psicossomática percorre ram um caminho que mantém certo padrão de teorização principalmente no que se refere aos sintomas e funcionamento psíquico que nas des crições se caracterizam como um funcionamento concreto pragmático carente de símbolos e vida onírica Como vimos em Miller e Pierre Mar ty a ideia de uma estrutura de personalidade do psicossomático é mais forte As primeiras incur sões de Lacan não deixam muito claras se ele concluiu sua opinião com relação a isso já que ele considerava que as doenças psicossomáticas estariam no limite do analisável por ser consi derado um fenômeno da ordem do real do cor po Talvez esse seja o motivo pelo qual ele não incluiu o psicossomático em suas classifi cações de estruturas psíquicas Ainda assim fi ca implí cita a questão de um mecanismo estruturante de forclusão do NomedoPai que aproximaria o psicossomático do psicótico e do autista Entre tanto Miller afi rma que o fenômeno psicosso mático é um fenômeno limite porque adere em alguns aspectos ainda desconhecidos à estru tura de linguagem Seria o caso de considerar já a partir de Lacan a possibilidade em se pensar no psicossomático como um arranjo limítrofe visto que não se chegou a alcançar um funciona mento neurótico mas também foi ultrapassada a organização psicótica Pois é visto que a sim bolização não é ausente como é nos psicóticos mas também é de ordem mais arcaica do que ocorre com os neuróticos Apesar de Dejours e McDougall terem re conhecido o fenômeno para além desse tipo de funcionamento psíquico suas teorizações ainda transitam nesse âmbito com McDougall discor rendo sobre a desafetação e Dejours sobre a re pressão da agressividade Portanto os mecanis mos que estariam por trás das somatizações em psiquismos com funcionamento mais neurótico ainda permanecem carente de explicações e elu cidações metapsicológicas Com relação às difi culdades encontradas no processo de pesquisa estas residem na pró pria difi culdade inerente ao tema que pouco é explorado pelos autores psicanalíticos e quan do o fazem realizam uma teoria voltada para o negativo a incapacidade simbólica desse tipo de subjetivação é citada em todos os autores revisa dos e apesar de reconhecerem que as doenças psicossomáticas não estão restritas somente ao modo operatório os elementos também carecem para se pensar essa problemática fora desse âm bito postulado por Pierre Marty Além disso os textos apresentados sobre esse tema muitas ve zes são concisos e pouco didáticos em sua expla nação Nesse sentido houve muita difi culdade na carência de maiores explicações de alguns conceitos e até mesmo de exemplos concretos para um melhor entendimento Talvez no fundo a psicanálise ainda seja um pouco leiga quando se trata do assunto da psicossomática e por isso as obras revisadas caminham no mesmo sentido de mecanismos gerais de explicação e descrição e carecem um pouco da contribuição de novos elementos para se pensar nessa problemática Nossas impressões caminham para a opi nião de que as doenças psicossomáticas são muito mais frequentes e muito menos restritas do que sugerem os autores tradicionais da psi cossomática psicanalítica Talvez uma pista para identifi car a ocorrência de uma doença psicosso mática seja se ater em fatos desencadeadores da lesão na vida do sujeito o que diferiria de outras doenças que sua etiologia possa ser atribuída a causas mais orgânicas e menos psíquicas Acre ditamos ainda que as discussões acerca da de Galdi M B Campos E B V 40 limitação das doenças psicossomáticas das não psicossomáticas deva ser revista pois também é notório que a ocorrência de alguns traumas luto separação desencadeie doenças orgânicas e estas deveriam ser consideradas mais psicosso máticas do que aquelas que não comportam um acontecimento emocional desencadeador Por fi m reiteramos sobre a importância de estabe lecer um diálogo com os modos de subjetivação que vêm sendo produzidos em nossa sociedade pois a própria psicanálise caminha para discus sões existentes entre o modo de produção capita lista atual e o adoecimento no trabalho Referências Birman J 2001 Corpos e formas de subjetivação em Psicanálise Estados Gerais de Psicaná lise Recuperado em httpegpdreamhosters comencontrosmundialrjdownload3Bir man38020903portpdf Casetto S J 2006 Sobre a importância de adoe cer Uma visão em perspectiva da psicosso mática psicanalítica no século XX Psychê 10 17 122 Recuperado em httppepsicbvsalud orgscielophpscriptsciarttextpidS1415 11382006000100008lngesnrmiso Dejours C 1991 Repressão e subversão em psi cossomática Pesquisas psicanalíticas sobre o corpo Rio de Janeiro RJ Jorge Zahar Ferraz F C 1997 O malestar no trabalho In R M Volich Psicossoma Psicossomática Psica nalítica II São Paulo SP Casa do Psicólogo Leclaire S 1992 O corpo erógeno Uma introdu ção à teoria do complexo de Édipo São Paulo SP Escuta Original publicado em 1979 McDougall J 1996 Teatros do corpo O Psicossoma em psicanálise 2 ed São Paulo SP Martins Fontes Mello J Filho Burd M Eds 2010 Psicosso mática hoje 2 ed Porto Alegre RS Artmed Miller JA 1987 Algumas refl exões sobre o fenô meno psicossomático In R Wartel Psicosso mática e Psicanálise pp 8797 Rio de Janeiro RJ Jorge Zahar Vieira W de C 1997 A psicossomática de Pierre Marty In F C Ferraz M R Volich Psicos soma Psicossomática Psicanalítica pp 1522 São Paulo SP Casa do Psicólogo Volich R M 2000 Psicossomática 2 ed São Paulo SP Casa do Psicólogo Recebido 08102015 Aceite fi nal 14012016
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ISSN 1413389X Trends in Psychology Temas em Psicologia Março 2017 Vol 25 nº 1 2940 DOI 109788TP2017103Pt Modelos Teóricos em Psicossomática Psicanalítica Uma Revisão Maíra Bittar Galdi1 Faculdade de Ciências da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho Bauru SP Brasil Érico Bruno Viana Campos Departamento de Psicologia da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho Bauru SP Brasil Resumo Este artigo é um estudo teórico da literatura psicanalítica sobre o tema da psicossomática que tem por objetivo revisar os modelos de abordagem desse fenômeno buscando a compreensão de suas diferenças e similitudes em termos de fundamentação teórica Os resultados apontam para duas maneiras distintas de ver as doenças psicossomáticas ligadas a duas tradições em psicanálise Na vertente francesa ligada mais ou menos diretamente à perspectiva lacaniana cujas principais referências foram Jacques Alain Miller e Pierre Marty o fenômeno não constitui um deslocamento representacional mas sim uma falha nos processos de simbolização Em uma segunda vertente que congrega a Escola Psicossomática de Chicago até autores franceses não lacanianos cujas principais referências foram Joyce McDougall e Christophe Dejours o fenômeno psicossomático é compreendido em uma linha divergente relacionan do a formação do sintoma a confl itos inconscientes que são simbolizados na doença mas em uma forma de simbolização mais precária em relação ao modelo da histeria Apesar das divergências entendese que há conciliação quanto aos princípios na direção do tratamento que consiste em defi nir um sentido para o sintoma não por meio do resgate de uma fantasia inconsciente como no modelo clássico da his teria e sim construindo um sentido onde não havia encadeamento históriconarrativo Palavraschave Psicanálise psicossomática somatização simbolização Theoretical Models in Psychosomatic Psychoanalysis A Review Abstract This article is a theoretical study of the psychoanalytic literature on the subject of psychosomatic that aims to review the approach models this phenomenon seeking to understand their differences and simi larities in terms of theoretical basis The results point to two different ways of looking at psychosomatic illnesses In the French side linked more or less directly to the Lacan perspective the main references were JacquesAlain Miller and Pierre Marty the phenomenon is not a representational shift but a failure in symbolization processes In a second aspect which brings together from the Psychosomatic School of Chicago to French authors not Lacanian the main references were Joyce McDougall and Christophe Dejours the psychosomatic phenomenon is understood in a divergent line relating the formation of the 1 Endereço para correspondência Rua Christiano Pagani 851 Apto 53ª Bairro Jardim Auri Verde Bauru SP Brasil 17047144 Fone 14 3204897914981116015 Email mahbghotmailcom Este trabalho é fruto da pesquisa de iniciação científi ca Fundamentos da Psicossomática Psicanalítica desenvolvida pela primeira autora e orientada pelo segundo autor no programa de Iniciação sem Bolsa da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho UNESP PIBICISB Galdi M B Campos E B V 30 symptom the unconscious confl icts They are symbolized in the disease but in a more precarious form of symbolization from the model of hysteria Despite the differences it is understood that no compro mise on the principles towards the treatment which is to defi ne a meaning for the symptom not by the rescue of an unconscious fantasy as in the classic model of hysteria but building a sense where there was no historical narrative thread Keywords Psychoanalysis psychosomatic somatization symbolization Modelos Teóricos en Psicosomática Psicoanalítica Una Revisión Resumen Este artículo es un estudio teórico de la literatura psicoanalítica sobre el tema de psicosomática que tiene como objetivo revisar los modelos de aproximación a este fenómeno que tratan de comprender sus diferencias y similitudes Los resultados apuntan a dos formas diferentes En el lado francés vinculado más o menos directamente a la perspectiva Lacaniana las referencias principales fueron JacquesAlain Miller y Pierre Marty el fenómeno no es un cambio de representación pero un fallo en los procesos de simbolización En un segundo aspecto que reúne en la Escuela Psicosomática de Chicago a los autores franceses no Lacanianos las referencias principales fueron Joyce McDougall y Christophe Dejours el fenómeno psicosomático se entiende en una línea divergente relativa a la formación del síntoma los confl ictos inconscientes Ellos están simbolizadas en la enfermedad pero en una forma más precaria del modelo de la histeria A pesar de las diferencias se entiende que hay compromiso en los principios hacia el tratamiento que consiste en defi nir un signifi cado para el síntoma no por el rescate de una fantasía inconsciente como en el modelo clásico de la histeria pero la construcción de un sentido en que no había ningún hilo narrativo histórico Palabras clave Psicoanálisis psicosomática somatización simbolización No século XIX o surgimento dos casos de histeria fez emergir questões capciosas para o projeto da medicina científi ca e naturalista Em um contexto histórico onde a razão e o culto à consciência imperavam os sintomas como pa ralisias e inibições que não tinham seu corres pondente orgânico intrigavam e se colocavam como um desafi o para a época o que permitiu que outras ciências que não se encerravam na lógica positivista lançassem as diretrizes de um arcabouço teórico que pudesse dar conta dessa realidade Nesse sentido no contexto dos estu dos sobre a histeria de Freud e Breuer 1895 o conceito de Inconsciente vai sendo delineado bem como as técnicas e os métodos que permi tem sua investigação levando à composição de uma nova ciência a Psicanálise constituída por um objeto e um método específi cos Inicialmente investigado através da técnica da hipnose o Inconsciente foi descoberto como possuindo suas próprias leis de funcionamento que fogem totalmente à consciência e é por meio dessas leis que Freud desvendou o mecanismo conversivo que havia por trás dos sintomas his téricos A conversão foi descrita por Freud como um mecanismo inconsciente presente na matriz clínica da neurose histérica em que a pulsão ligada a uma ideia é recalcada e convertida em representantes ideativos do próprio corpo Mas não se trata aqui do corpo biológico e sim do corpo erógeno dotado de uma anatomia imagi nária que subverte o corpo real de tal forma que a ordem erógena se constitui como um duplo da ordem biológica a partir da superfície corporal Leclaire 19791992 O corpo erógeno é aquele que tem em sua anatomia imaginária fantasias sexuais específi cas que de alguma maneira es tão interligadas a um órgão correspondente É portanto um corpo desejante que supera o de terminismo biológico os órgãos não são utili zados somente para satisfazer as necessidades de sobrevivência como ocorre com os animais Modelos Teóricos em Psicossomática Psicanalítica Uma Revisão 31 mas também satisfazem expressam e evocam desejos e é nisso que o homem se diferencia dos animais ele tem pulsões e não instintos Porém o corpo erógeno não nasce com o ser humano Para que ele exista e se desenvolva é necessário um outro alguém que o invista se xualmente ou seja que deseje que imagine uma história que direcione seu olhar para o corpo Todo esse processo não é simples vai desde a etapa do narcisismo primário até as etapas poste riores de construção da sexualidade e sempre por alguns infortúnios da vida a que todos estão sujeitos pode ser interrompido se desorganizar ou regredir para fases anteriores do desenvolvi mento O corpo erógeno também é passível de falhas O investimento libidinal nele nunca é uniforme podese investir demais em uma re gião como na histeria ou falhar em outra como se supõe que aconteça no fenômeno psi cossomático e essa questão também é fruto de algumas divergências teóricas no campo Sendo assim a psicanálise em sua desco berta e na investigação do mecanismo de conver são abalou os pilares do racionalismo cartesiano rompendo defi nitivamente com a medicina com a introdução do conceito de corpo erógeno inau gurando uma nova forma de saber o Inconscien te É por essa razão que falar em Psicossomática em Psicanálise revelase uma questão espinho sa Como teorizar sobre aquilo que ela própria negou em sua origem como campo de saber Ao mesmo tempo em que essa negação do corpo real a defi niu em sua ruptura com o positivismo agora a divide e se coloca enquanto desafi o con temporâneo visto que atualmente o mal estar psíquico tem suas mais variadas expressões no corpo biológico Mas o que é a Psicossomática Também essa questão se apresenta de forma difusa Mes mo na medicina vemos divergências quanto a sua defi nição Uma vertente da medicina de in fl uência hipocrática tem na psicossomática uma fi losofi a uma visão de homem e de mundo no qual corpo e mente não se dividem Tudo abran ge Psiquê e Soma ou seja tanto a saúde como a doença fazem parte de processos mentais e somáticos que são unifi cados e que formam a totalidade que é o ser humano Por outro lado outra vertente considera apenas alguns tipos de doenças sendo psicossomáticas o que retoma as discussões dualistas já que sob essa perspec tiva existem doenças que englobam a psique e outras não Mello Burd 2010 Com relação a esta última vertente vemos que mesmo com a ruptura com a medicina na qual a Psicanálise surgiu em alguns aspectos elas ainda se aproxi mam tal como a descrição e categorização des sas doenças correlacionandoas com confl itos inconscientes específi cos realizada pela Escola de Chicago Casetto 2006 Dessa forma o limite tênue entre processos fi siológicos e psicológicos é novamente proble matizado com a reinserção da psicanálise nas questões do real do corpo Dessa investigação surge a noção de que para além das fantasias que são simbolizadas em uma anatomia imaginária o corpo biológico também pode servir de escoa douro para fantasias não nomeadas e até mesmo de suporte para simbolizações precárias ou seja modalidades mais arcaicas de representação do que aquelas consideradas no modelo neurótico clássico No entanto as diferentes vertentes das escolas psicanalíticas se dividem quanto à natu reza específi ca desse fenômeno trazendo con vergências e divergências entre si Os principais pontos de discussão residem nas elucidações sobre uma entidade clínica pre sente ou não nos casos dos fenômenos psicosso máticos a inexistência ou não de uma articula ção simbólica na doença e por fi m a difi culdade com que a psicanálise se encontra até os dias atuais de descrever metapsicologicamente esse tipo de fenômeno Para tanto serão estudados alguns dos principais teóricos envolvidos nessa problemática Franz Alexander líder da Esco la Psicossomática de Chicago Pierre Marty do Instituto de Psicossomática de Paris IPSO Ja cques Alain Miller Joyce McDougall e Christo phe Dejours Caracterização A psicanálise no geral considera doença psicossomática todo fenômeno que não se res tringe apenas às explicações biológicas médicas mas que insiste em aparecer permanecer e que Galdi M B Campos E B V 32 também não se enquadra nos sintomas de neu roses clássicas É um diagnóstico portanto por exclusão e também por isso que surgiram tantos rumores principalmente de autores próximos a Lacan se não estaríamos diante de uma nova matriz clínica que não as clássicas neuroses psi coses e perversões Desse grupo de pensadores Pierre Marty é o mais representativo dessa linha de pensamen to Líder do Instituto de Psicossomática de Paris IPSO sua obra se divide em basicamente três períodos No primeiro mais biologicista des crevendo o processo de desorganização psicos somática como resultado de uma tensão entre os Instintos de Vida e os Instintos de Morte Estes teriam uma fonte somática e a morte não era o fi m mas sim a consequência desse desequilíbrio biológico diferentemente do que afi rmavam os lacanianos e os outros membros do instituto Sendo assim as desorganizações atingiam pri meiro as áreas do corpo erógeno com o intui to de proteger o corpo contra desorganizações maiores até que o psiquismo se reestabeleça Caso a desorganização seja mais grave o cor po essencialmente biológico também é atingido podendo causar a morte O psiquismo segundo ele é evolutivamente mais recente que os pontos somáticos Casetto 2006 e por isso mesmo o primeiro a ser atingido na decorrência de um trauma A segunda parte de seu trabalho foi voltada para uma construção teórica mais psicanalítica com a introdução dos conceitos chaves de sua obra mentalização pensamento operatório e depressão essencial Para ele uma baixa capaci dade de mentalização ou seja de metabolização de traumas através dos símbolos leva o sujeito à chamada depressão essencial A depressão es sencial é caracterizada por uma depressão sem objeto específi co muito diferente do luto por exemplo que geralmente tem o componente da perda do objeto com seu desinvestimento libi dinal conseguinte A desvitalização psíquica da depressão essencial não tem seu correspondente no investimento em pensamentos suicidas ou de preciadores como ocorre nos casos de depres são clássica Há um desinvestimento maciço em tudo não se tratando tanto de tristeza mas sim de apatia aumentando a frequência de doenças e acidentes psicossomáticos Na última fase de sua obra Marty de preo cupou em formular uma classifi cação nosoló gica da psicossomática segundo categorias diferentes com relação à capacidade de mentali zação Elas seriam mais inferiores em relação à capacidade de simbolização que os neuróticos psicóticos e perversos Inicialmente chamou as de neurose de comportamento e neuroses de caráter e depois subdividiu as últimas em neu rose mal mentalizada neurose de mentalização incerta e neuroses bem mentalizadas Casetto 2006 p 12 Talvez por uma infl uência de sua fase bio logicista Vieira 1997 aponta que para Marty a doença psicossomática não tem o papel que a pulsão de morte tem para Freud pois seu ob jetivo fi nal não é a morte pelo contrário pode ser uma defesa que impedindo desorganizações mais severas opera para assegurar a integridade do organismo Pouco a pouco os conceitos de mentalização e pensamento operatório foram se sobrepujando em relação a outros aspectos teóricos de sua jornada como os conceitos de depressão essencial e até mesmo sobre a fase mais voltada para a descrição biologicistas Sua contribuição teórica é bastante marcada pelo destaque na carência de simbolizações do psi quismo nos pacientes psicossomáticos e esse aspecto será retomado aprofundado e problema tizado por todos os outros autores posteriores Outra grande vertente na Psicossomática Psicanalítica foi a Escola de Chicago lidera da por Franz Alexander Ela limita as doenças psicossomáticas em sete perturbações clássicas asma brônquica úlcera gástrica artrite reuma toide retocolite ulcerativa dermatoses tireoto xicoses e hipertensão Diferentemente do que ocorre com a histeria Volich 2000 aponta que Alexander não considera o fenômeno como uma solução de compromisso ou seja o fenômeno não é uma tentativa de cura e solução do confl i to psíquico Para ele Alexander desenvolveu a noção de constelação psicodinâmica específi ca para tentar explicar a origem da doença Nela propõe que certos confl itos internos estão direta mente relacionados a reações emocionais especí Modelos Teóricos em Psicossomática Psicanalítica Uma Revisão 33 fi cas cada uma correspondendo a cada confl ito embora a relação estabelecida entre as emoções e as doenças não seja causal Essas duas grandes escolas desempenha ram um papel muito importante tanto na práti ca como na construção de uma teoria psicana lítica sobre as doenças psicossomáticas Foram elas que construíram um corpo teórico no qual os psicanalistas posteriores se apoiaram modi fi caram e problematizaram essas construções contribuindo para o avanço dos conhecimentos nesse assunto relativamente recente Em discus sões posteriores encontramos importantes refe renciais teóricos em JacquesAlain Miller Joyce McDougall e Christophe Dejours Até então as construções teóricas sobre a psicossomática psicanalítica não consideravam a possibilidade do desenvolvimento de doenças psicossomáticas em outras estruturas subjeti vas que não as que funcionam no modo opera tório Sobre esse ponto Miller 1987 chega a considerar a existência do fenômeno em outras estruturas subjetivas porém não deixa de teori zar sobre uma possível subjetivação própria do psicossomático Segundo esse autor o psicossomático pode ser uma estruturação muito primitiva próxima da psicose e da debilidade mental Ele deixa muito evidente a relação de oposição do fenô meno psicossomático ao sintoma histérico A diferença que se dá precisamente reside no fato de que diferentemente do que ocorre no fenô meno o sintoma conversivo não incide no cor po real biológico mas sim no corpo erógeno imaginário O sintoma segundo ele reside no campo das neuroses obedecendo a uma estru tura de linguagem subjacente que opera através dos processos da metáfora e do deslocamento sendo portanto carregado de signifi cados in conscientes o que segundo ele não ocorre nos fenômenos psicossomáticos Certamente é crucial essencial distinguir o sintoma especialmente o histérico e o fe nômeno psicossomático precisamente nisso que esta relação ao Outro é constitutiva do sintoma histérico o que de nenhum modo é o caso do fenômeno psicossomático se ele existe Miller 1987 p 89 O fenômeno não está inserido em uma es trutura de linguagem mas também não está completamente fora dela caracterizandose por um fenômeno limite Isso quer dizer que embo ra haja alguns aspectos da linguagem presente seus mecanismos de formação ainda não são claros para ele por pertencerem a uma simbo lização muito mais arcaica fora do campo das neuroses Embora Miller reconhecesse que o fe nômeno não esteja restrito somente a um tipo de personalidade isso não obteve muito destaque em sua concepção teórica que foi inteiramente desenvolvida sob a noção de uma estruturação psíquica específi ca que por apresentar difi cul dades nos processos simbólicos apresentava a somatização como consequência Não houve maiores esclarecimentos sobre o que pode levar a uma saída psicossomática psi cótica ou autista visto que para Miller 1987 essas estruturas são muito próximas Além dis so não fi ca explicito o porquê de uma falha na simbolização em alguma área circunscrita não pode ter o retorno em delírio ou uma passagem ao ato O que é percebido é que esses fenômenos apresentam muita semelhança com as psicoses tanto em seus mecanismos quanto na estrutura familiar A carência de simbolização o fato de não ter sido idealizado e representado por um signifi cante pelos pais são comuns a essas duas estruturas resultando em uma lacuna nas repos tas que poderiam existir sobre a escolha por uma saída ou outra Joyce McDougall de certa forma supera essas elucidações teóricas ao reconhecer que não existe uma estrutura subjetiva própria dos fenômenos psicossomáticos Além disso em seu livro Teatros do Corpo McDougall 1996 a autora aborda a somatização como todo tipo de passagem ao ato que inclui o uso de substân cias o aumento da vulnerabilidade aos acidentes corporais e as falhas do sistema imunológico Para denominar esse mecanismo muito fre quentes nos somatizadores no qual o afeto não é pensado McDougall 1996 criou o termo de safetação O afeto é um conceito limite assim como é o de pulsão estando entre o somático e o psíquico O estado de desafetação consiste ba sicamente em uma incapacidade de refl etir so Galdi M B Campos E B V 34 bre as emoções vividas intensamente O fato de essas pessoas vivenciarem emoções fortes não é tão prejudicado embora haja constantemente uma tentativa de fuga dessas vivências Mas a capacidade de nomeação diferenciação e refl e xão sobre seus estados afetivos mais intensos é quase nula Além da projeção dos afetos a desa fetação consiste em um mecanismo que também projeta a representação para o exterior Nesse ponto McDougall afi rma um novo destino para os afetos o repúdio para fora do ego a acrescen tar nos três já existentes deslocamento conver são transformação em angústia Ao afeto que foi ejetado em sua parte psíquica resta somente se exprimir através de sua dimensão orgânica como na primeira infância reduzindo assim a mensagem do psiquismo a um funcionamento não verbal À primeira vista há algumas semelhanças com o pensamento operatório descrito pelo Ins tituto de Psicossomática de Paris principalmen te com relação a ruptura do sistema consciente inconsciente resultando em um funcionamento psíquico pragmático e muito concreto Porém no caso do pensamento operatório há também uma incapacidade de vivenciar essas emoções o que pode ocorrer na desafetação mas não cons titui necessariamente uma regra Há certa semelhança entre os mecanismos de desafetação foraclusão e projeção visto que são mecanismos brutais de extirpação de afetos e representações As diferenças residem no fato de que na projeção o conteúdo de uma pulsão é suprimida e deformada retornando ao conscien te como uma representação ligada a um objeto externo Na desafetação é o afeto que é repu diado sem retorno sobre um objeto externo ou alucinatório Seu destino é ser escoado pela via somática Na projeção portanto a representação não é totalmente lançada para fora do psiquismo já que algumas representações permanecem no objeto externo Na desafetação toda cadeia re presentativa é excluída sem retorno Quanto às angústias dominantes no quadro das doenças psicossomáticas essas estão muito mais próximas das angústias psicóticas do que das histéricas Basicamente se referem á perda da identidade individual sexual e à perda dos li mites corporais Esses medos primitivos deixam em qualquer indivíduo vestígios psíquicos que estão ligados aos temores de todo bebê que são em grande parte resolvidos na fase fálicoedi piana Mas quando não resolvidas e a angústia psicótica domina o quadro clínico não estamos mais diante de uma problemática histérica em bora os pacientes somatizadores também não sejam psicóticos Talvez estejamos na posição de perguntarnos se muitas organizações neuró ticas histéricas e obsessivas não são no fundo construídas a partir de um núcleo psicótico McDougall 1996 p 21 Muito se fala nos textos revisados sobre a etiologia das doenças psicossomáticas Joyce McDougall nesse ponto não difere muito com relação aos outros autores A organização fami liar agressiva e sua consequente pobreza mental que abrem caminho para uma doença são fato res citados em praticamente todas as obras Mas pouco é dito sobre os mecanismos metapsicoló gicos existentes nela Apesar de a autora ter cria do um novo conceito o da desafetação pouco se entende sobre sua especifi cidade A desafetação se defi nindo pelo repúdio para fora do ego é um mecanismo semelhante ao dos psicóticos que utilizam a foraclusão termo utilizado pela escola lacaniana ou a projeção termo próprio da escola inglesa A autora ressalta a dimensão afetiva que é repudiada talvez essa seja a dife rença com relação á foraclusão que ejeta somen te a representação sem a carga afetiva Pouco é dito também sobre a formação da doença a partir desse mecanismo somente uma passagem breve que afi rma que quando a dimensão psíqui ca do afeto é repudiada a dimensão orgânica se expressa Além disso ela afi rma que a desafe tação não tem um retorno em forma de delírio como tem a foraclusão ou a projeção Se na de safetação toda cadeia representativa é destruída como explicar seu retorno no corpo sob uma for ma precária de simbolização Também perdura aqui a questão do porque o retorno não se dar em forma de delírio Sobre os elementos que poderiam ser utili zados na construção de um sentido pouco tam bém é dito Sabemos que ele não se confi gura em uma simbolização como ocorre na histeria pois Modelos Teóricos em Psicossomática Psicanalítica Uma Revisão 35 é muito mais arcaico mas não sabemos do que dispomos para desvendálo Sobre esse ponto o próximo autor acrescenta contribuições teóricas muito importantes se atendo na importância da dimensão agressiva não representada presente na somatização através de um mecanismo se melhante que ele denominou de clivagem do in consciente Além disso o autor procura explicar e oferecer uma solução para as indagações que não foram respondidas pelos autores anteriores sobre a questão do elemento que diferiria entre uma saída psicossomática ou psicótica baseado na observação das diferenças entre os pais dos psicóticos e os dos somatizadores Porém antes é necessário explicar alguns conceitos básicos de sua teoria como sua própria defi nição de doen ças psicossomáticas a noção de subversão libi dinal e de construção do corpo erógeno Dejours 1991 ressalta que em sua con cepção se existe um dualismo presente é aquele entre o corpo erógeno e o corpo fi siológico não a partir de uma relação de oposição mas sim de superação do segundo sobre o primeiro No entanto a construção do corpo erógeno nunca é completamente bemsucedida podendo ocorrer falhas na convocação de algum órgão ou tam bém do desapoio da pulsão de alguma área a partir de algum traumatismo ocorrido na vida do sujeito É assim que a questão da escolha de ór gão é tratada as áreas corporais que não foram sufi cientemente subvertidas são facilmente atin gidas nas somatizações Apesar da semelhança com a teoria de La can no que se refere à questão da escolha de órgão há divergências entre as opiniões com re lação à origem da pulsão Para Dejours 1991 a pulsão provém de uma fonte biológica inata enquanto que para Lacan e para os autores póslacanianos a pulsão provém da linguagem mais especifi camente de signifi cantes que a mãe insere no bebê em seus primeiros meses de vida Após essa abordagem inicial sobre os pre ceitos básicos que orientam sua teoria algumas questões mais específi cas sobre a problemática das somatizações serão abordadas como a ter ceira tópica ou tópica da clivagem e a di mensão agressiva não representada como a pro blemática central das doenças psicossomáticas A agressividade que não pôde ser represen tada ocorre a partir da clivagem do inconsciente em inconsciente primáriosecundário O autor retoma a hipótese freudiana a de que o incons ciente também é constituído por traços fi loge néticos considerando o inconsciente primário como sede dos traços herdados Já o inconscien te secundário por sua vez é aquele ligado às representações simbólicas A pulsão de morte portanto impedida de ser representada pelo pré consciente opera de forma destrutiva no corpo orgânico através das doenças psicossomáticas Dessa forma o sujeito permanece desconheci do de sua própria violência Buscando preservar a aparente normalidade no vínculo social essa violência não é atuada mas sim dirigida contra o próprio sujeito que desfere um golpe incons ciente contra o próprio corpo em forma de so matização Dejours 1991 sugere que a própria somatização pode ser simbolizadora de algum aspecto perdido da história dessas pessoas Essa é mais uma inovação no campo da psicossomá tica psicanalítica pois até agora nenhum autor havia citado a possibilidade de ver a somatiza ção como um elemento facilitador que faz de senrolar o processo da análise A violência do analisando não é expressa concretamente De forma mais sutil ela é percebida mais no âm bito negativo faltam palavras que signifi quem suas experiências emocionais em seu discurso bem como expressões corporais e faciais mais espontâneas e autênticas Outro mecanismo de defesa é proposto na tentativa de explicar o pro cesso de somatização o de repressão dos afetos agressivos Esse mecanismo procura eliminar os afetos desde sua fonte que segundo o autor é biológica Ele se diferencia do mecanismo do re calcamento porque este opera somente sobre as representações em nível préconscienteincons ciente impedindo que as representações recal cadas ultrapassem a barreira do inconsciente até o préconsciente O consciente perde totalmente o contato com o conteúdo recalcado enquanto que na repressão a representação aparece por vezes intacta ao consciente podendo sumir logo em seguida Diferentemente do recalcamento a repressão opera a nível conscientepréconscien te Ela se opõe mais especifi camente contra o Galdi M B Campos E B V 36 desenvolvimento do afeto e não de elementos re presentacionais Portanto vemos que o recalque opera mais a nível psíquico das representações enquanto que a repressão em um nível mais afe tivo e corporal A partir disso o autor declara que interpre tar um sintoma psicossomático se trata efetiva mente de interpretar a pulsão de morte Esse é um processo que procura vincular a pulsão de morte com a pulsão de vida esvaziando seu po tencial traumático As somatizações simboliza doras devem ser identifi cadas segundo o autor eliminando a hipótese de depressão essencial Portanto ele considera toda a proposição teórica do Instituto de Paris mas faz uma diferenciação entre os tipos de somatização as desorganiza ções progressivas são diferentes das somatiza ções simbolizadoras Nas primeiras a violência é parcialmente inibida ao passo que na segunda é reprimida maciçamente O que é observado então é que algumas somatizações abrem ca minho para revelar um confl ito ou uma parte da história do sujeito que permanecia oculta a qual ele não entrava em contato por ser uma história traumática A partir disso observavase que o decurso da análise antes aparentemente conge lado começava a se desenrolar o que permite também evocar a noção de facilitação psicos somática Dejours 1991 p 28 As semelhanças encontradas com as rela ções mãebebê dos psicóticos também são mui tas Dejours 1991 ressalta que a diferença resi de no fato de que os pais do psicótico procuram desviar os pensamentos dos fi lhos criando um pensamento alienado não original Os pais do psicossomático entretanto procuram destruir qualquer tipo de pensamento que ele possa vir a ter principalmente os de cunho sexual Mas não é somente nesse aspecto que na teoria de De jours essas psicopatologias passam a ser próxi mas ele propõe uma hipótese de que as doenças mentais em especial as psicoses sejam agrega das às doenças psicossomáticas Nesse ponto o autor leva em conta as descobertas das neuroci ências segundo a qual essas funções dependem da montagem hereditária do sistema nervoso Dessa forma é pensado também que no caso das psicoses o desapoio da pulsão ao invés de se dar nas áreas viscerais como ocorre com as doenças psicossomáticas se dá no cérebro comprometendo as áreas referentes à cognição e à linguagem que são as funções mais compro metidas nos psicóticos Dejours 1991 e McDougall 1996 já ofe recem um maior avanço na técnica no sentido de que um trabalho interpretativo é arriscado sendo por isso mais operativo embora Dejours 1991 também considere a relevância da tera pêutica de Marty procedimento do qual deno minou páraexcitação A escolha entre os dois procedimentos terapêuticos segundo ele de pende da disposição do analisando de enfrentar sua verdade Do ponto de vista clínico Dejours 1991 oferece uma inovação ao constatar que as somatizações ocorrem também em estruturas neuróticas de personalidade No que se refere à técnica o autor também insere uma nova propo sição a de que as somatizações devem ser inter pretadas através de seus conteúdos agressivos e mortíferos Para ele portanto um sentido subja cente à doença pode ser desvendado procurando ligar a dimensão traumática da pulsão de morte à libido Discussão Apesar de haver algumas divergências te óricas como já constatado as opiniões acerca dos fenômenos psicossomáticos seguem certo padrão no que se refere às características dos pacientes que apresentam esse tipo de problemá tica Há consenso com relação à incapacidade de simbolização presente nesses quadros clínicos embora as teorias tenham seguido um movi mento de no início considerar a falta de sim bolização como sendo estruturante nesses casos se desdobrando para a noção de que a essa falta não é estruturante mas sim circunscrita a alguns pontos do discurso Também perdura de ma neira geral a concordância com relação à falta de afetividade as referências à ausência de vida onírica e fantasmática além de uma extrema concretude de pensamentos concomitantemente a um estilo de vida extremamente pragmático Todos esses fatores são elencados e denomina dos pelos membros do Instituto de Psicossomá Modelos Teóricos em Psicossomática Psicanalítica Uma Revisão 37 tica de Paris de pensamento operatório na Es cola Psicossomática de Chicago de Alexitimia e Joyce McDougall utiliza o mecanismo defensivo da desafetação para designar esses elementos ca racterísticos Dejours não chega a criar um novo conceito para denominar essas características da personalidade sendo que a ênfase de sua teoria recai na hipótese da clivagem do inconsciente e na dimensão da agressividade não representada Contudo as incursões teóricas de autores pós Lacanianos como Miller apontam para a con sideração de outros mecanismos defensivos que possam coexistir com o de foraclusão dando a ideia de que a foraclusão do NomedoPai não instaura a lógica geral de simbolização nos ca sos psicossomáticos como ocorre nos psicóti cos mas sim é um mecanismo circunscrito que pode coexistir com o recalque a denegação etc No entanto ainda assim um perfi l do paciente psicossomático é mantido e este se encontra muito próximo do perfi l do psicótico o que pa rece permanecer uma opinião contraditória com o restante da teoria ou ainda que faltam mais elementos teóricos para se pensar na ocorrência das somatizações no âmbito das subjetividades bem mentalizadas As ideias de McDougall ca minham para a aproximação da psicossomática com a histeria concordando com a dimensão simbólica mas mais arcaica do que o sintoma que o fenômeno oferece A aproximação da psicossomática com a psicose também é realizada por Dejours mas com a diferença de que nesse caso há a pro posição de tratar as doenças conhecidas como mentais em nossos dias atuais como doenças psicossomáticas também onde haveria o desa poio da pulsão e dessa forma a vulnerabilidade para a pulsão de morte Isso explicaria o porquê dos psicóticos e autistas serem prejudicados nas funções de linguagem e cognição enquanto que seu sistema imunológico permanece extrema mente forte Dejours oferece uma pista para uma melhor compreensão acerca das diferenças en contradas na saída psicótica e na psicossomática Apesar das semelhanças elencadas entre ambas vemos que existe a diferença com relação aos destinos dos pensamentos dos pacientes na pri meira infância Também é notável o papel im portante exercido pelos pais na libidinização das áreas corporais que segundo ele pode ser deci sivo entre uma eclosão psicótica ou uma eclosão psicossomática Com relação às discussões sobre a atribui ção de um sentido simbólico sobre a doença e so bre os mecanismos metapsicológicos envolvidos nela alguns avanços também foram alcançados no desenrolar das teorias como a construção de um sentido sobre a doença o que também ofere ce um avanço na prática clínica que se mostra dessa maneira um pouco mais operativa Além disso algumas descobertas importantes sobre a dimensão agressiva presente nessa problemática possibilitou com que fossem criadas tentativas mais esclarecedoras da metapsicologia envolvi da no caso das somatizações fato que é verifi ca do na proposição da terceira tópica de Dejours Sendo assim apesar de no início a relação entre a incapacidade de simbolização e a eclosão de uma doença corporal ter sido abordada de for ma mais direta progressivamente foi observado a presença de mais elementos metapsicológicos envolvidos nas somatizações como o mecanis mo de desafetação e de clivagem das imagos de McDougall e da tópica da clivagem e da repres são da agressividade de Dejours que de certa forma problematizaram uma questão que apa rentemente se apresentava de forma um pouco mais simplifi cada e direta Com relação ao caminho percorrido pelas discussões sobre o sentido do fenômeno psicos somático vemos que as discussões iniciais clás sicas da psicanálise realizadas pelos membros do Instituto de Psicossomática de Paris cami nharam para questionar se o fenômeno chegaria a abarcar a estrutura de linguagem Apesar dessa opinião também parecer ser a posição tomada por Lacan Miller não conclui a questão oscilan do entre as posições de afi rmação da inexistência de qualquer elemento simbólico contido nela ou admitindo a possibilidade de alguma inserção na linguagem o que abriria a possibilidade para classifi cálo como um fenômeno de borda ou seja que está nos limites do universo simbólico Entre os autores franceses é apenas com a introdução das ideias de Dejours que uma cons trução de sentido sobre a lesão é proposta mas Galdi M B Campos E B V 38 diferentemente do sintoma histérico que é inter pretado através das fantasias eróticas recalcadas do sujeito o fenômeno psicossomático deve ser interpretado a partir das pulsões agressivas re primidas No entanto Dejours não é considerado um autor estritamente póslacaniano permane cendo desconhecidas as posições tomadas por estes na atualidade Já McDougall realiza uma aproximação com as ideias de Dejours refor çando que a somatização se trata de uma história oculta da vida do sujeito que foi impossibilitada de ser representada para ele próprio e para al guém Por isso a necessidade de reconstrução dessa história perdida que daria sentido à so matização Ainda assim apesar de haver esses avanços tanto no âmbito teórico quanto no clí nico as simbolizações dos fenômenos psicosso máticos são muito mais arcaicas que as de um sintoma histérico permanecendo uma certa difi culdade em seu desvendamento Sobre o movimento percorrido das cons truções teóricas acerca de um sentido Casetto 2006 observa colocandose estas diferenças em pers pectiva no tempo detectase o que parece ser um certo movimento dialético a soma tização transita de um modelo mais estrita mente conversivo para a sua negação e em seguida para um terceiro estado em que se apresenta como um horizonte de signifi ca ções ainda irrealizado p 17 Apesar desses avanços no percurso trilha do uma teoria que explique todos os mecanis mos metapsicológicos por trás das somatizações ainda não foi alcançada Talvez essa difi culdade advenha da própria problemática que se reve la em casos difíceis pela extrema neutralização com que esses pacientes se apresentam na clíni ca mas ainda mais do que esse fato sobrevém a constatação de que a doença psicossomática é um fenômeno que abarca tanto a dimensão bio lógica quanto psíquica sendo necessário por isso rever nossas concepções acerca da nature za da mente e do corpo bem como o modo de interação que se dá entre essas duas instâncias Isso fi cou muito claro na obra de Dejours a par tir de seu conceito de subversão libidinal mas embora a psicanálise tenha inovado com o con ceito limite de pulsão ela se apegou muito mais a teorizar sobre mecanismos psíquicos care cendo de explicações quando se depara com um fenômeno tanto biológico quanto psíquico Essa difi culdade já foi apontada por Birman 2001 que considera que esse fato muito mais do que ser traduzido por uma insufi ciência teórica foi estabelecido por um pacto entre a psicanálise e a medicina operando uma separação entre as questões do psiquismo que deve ser investiga das pela primeira e as questões do corpo res tritas somente à segunda Essa cisão ocorreu na emergência da psicanálise e seu questionamento das ciências positivistas e deve ser revista nos dias atuais através de uma demanda da própria realidade psicossomática que vem aumentando nas clínicas Por fi m há a necessidade também da con sideração de outros aspectos constitutivos do fenômeno psicossomático que não apenas os genéticos inconscientes e aqueles construídos a partir das relações primitivas com os pais Isso se refere a uma maior busca por respostas no âm bito da vida social dos sujeitos pois se as doen ças psicossomáticas vêm aumentando nos dias atuais não haveria na nossa sociedade contem porânea elementos presentes nos quais estariam contribuindo para um aumento do malestar psí quico expresso através do corpo A discussão se amplia para uma observação do próprio funcionamento de nossa sociedade atual na qual as relações de trabalho refl etiriam apenas um aspecto de seu funcionamento Os valores difundidos pelos meios sociais como o individualismo o consumismo e a competição estariam contribuindo para a construção de iden tidades fragmentadas despersonalizadas A questão seria será que a sociedade ca pitalista contemporânea com seus valores supremos atrelados ao consumo não estaria produzindo uma espécie de despersonaliza ção que viria à reboque do fenômeno de mas sifi cação Vivemos em uma cultura cujos imperativos favorecem o aparecimento da doença normótica Fica aqui uma hipótese mais ampla a ser trabalhada em outro mo mento de que o estilo de vida fragmentário que nos oferece a sociedade contemporânea Modelos Teóricos em Psicossomática Psicanalítica Uma Revisão 39 afi nal em nada favorece aquilo que se pode chamar de uma boa mentalização Ferraz 1997 p 172 Esse é um debate interessante e necessário para a psicanálise que oferece a possibilidade de pensar a construção da subjetividade para além daquela estabelecida pelas relações familiares da primeira infância buscando integrar tam bém aspectos atuais da vida do sujeito tanto relacionais como o sofrimento psíquico no tra balho caminhando de modo mais amplo para discussões do próprio contexto histórico e social na qual está inserido o que é um fator importan te visto que estabelece maiores relações com o meio externo e relacional sem deixar de lado as dinâmicas intrapsíquicas Considerações Finais As discussões em psicossomática percorre ram um caminho que mantém certo padrão de teorização principalmente no que se refere aos sintomas e funcionamento psíquico que nas des crições se caracterizam como um funcionamento concreto pragmático carente de símbolos e vida onírica Como vimos em Miller e Pierre Mar ty a ideia de uma estrutura de personalidade do psicossomático é mais forte As primeiras incur sões de Lacan não deixam muito claras se ele concluiu sua opinião com relação a isso já que ele considerava que as doenças psicossomáticas estariam no limite do analisável por ser consi derado um fenômeno da ordem do real do cor po Talvez esse seja o motivo pelo qual ele não incluiu o psicossomático em suas classifi cações de estruturas psíquicas Ainda assim fi ca implí cita a questão de um mecanismo estruturante de forclusão do NomedoPai que aproximaria o psicossomático do psicótico e do autista Entre tanto Miller afi rma que o fenômeno psicosso mático é um fenômeno limite porque adere em alguns aspectos ainda desconhecidos à estru tura de linguagem Seria o caso de considerar já a partir de Lacan a possibilidade em se pensar no psicossomático como um arranjo limítrofe visto que não se chegou a alcançar um funciona mento neurótico mas também foi ultrapassada a organização psicótica Pois é visto que a sim bolização não é ausente como é nos psicóticos mas também é de ordem mais arcaica do que ocorre com os neuróticos Apesar de Dejours e McDougall terem re conhecido o fenômeno para além desse tipo de funcionamento psíquico suas teorizações ainda transitam nesse âmbito com McDougall discor rendo sobre a desafetação e Dejours sobre a re pressão da agressividade Portanto os mecanis mos que estariam por trás das somatizações em psiquismos com funcionamento mais neurótico ainda permanecem carente de explicações e elu cidações metapsicológicas Com relação às difi culdades encontradas no processo de pesquisa estas residem na pró pria difi culdade inerente ao tema que pouco é explorado pelos autores psicanalíticos e quan do o fazem realizam uma teoria voltada para o negativo a incapacidade simbólica desse tipo de subjetivação é citada em todos os autores revisa dos e apesar de reconhecerem que as doenças psicossomáticas não estão restritas somente ao modo operatório os elementos também carecem para se pensar essa problemática fora desse âm bito postulado por Pierre Marty Além disso os textos apresentados sobre esse tema muitas ve zes são concisos e pouco didáticos em sua expla nação Nesse sentido houve muita difi culdade na carência de maiores explicações de alguns conceitos e até mesmo de exemplos concretos para um melhor entendimento Talvez no fundo a psicanálise ainda seja um pouco leiga quando se trata do assunto da psicossomática e por isso as obras revisadas caminham no mesmo sentido de mecanismos gerais de explicação e descrição e carecem um pouco da contribuição de novos elementos para se pensar nessa problemática Nossas impressões caminham para a opi nião de que as doenças psicossomáticas são muito mais frequentes e muito menos restritas do que sugerem os autores tradicionais da psi cossomática psicanalítica Talvez uma pista para identifi car a ocorrência de uma doença psicosso mática seja se ater em fatos desencadeadores da lesão na vida do sujeito o que diferiria de outras doenças que sua etiologia possa ser atribuída a causas mais orgânicas e menos psíquicas Acre ditamos ainda que as discussões acerca da de Galdi M B Campos E B V 40 limitação das doenças psicossomáticas das não psicossomáticas deva ser revista pois também é notório que a ocorrência de alguns traumas luto separação desencadeie doenças orgânicas e estas deveriam ser consideradas mais psicosso máticas do que aquelas que não comportam um acontecimento emocional desencadeador Por fi m reiteramos sobre a importância de estabe lecer um diálogo com os modos de subjetivação que vêm sendo produzidos em nossa sociedade pois a própria psicanálise caminha para discus sões existentes entre o modo de produção capita lista atual e o adoecimento no trabalho Referências Birman J 2001 Corpos e formas de subjetivação em Psicanálise Estados Gerais de Psicaná lise Recuperado em httpegpdreamhosters comencontrosmundialrjdownload3Bir man38020903portpdf Casetto S J 2006 Sobre a importância de adoe cer Uma visão em perspectiva da psicosso mática psicanalítica no século XX Psychê 10 17 122 Recuperado em httppepsicbvsalud orgscielophpscriptsciarttextpidS1415 11382006000100008lngesnrmiso Dejours C 1991 Repressão e subversão em psi cossomática Pesquisas psicanalíticas sobre o corpo Rio de Janeiro RJ Jorge Zahar Ferraz F C 1997 O malestar no trabalho In R M Volich Psicossoma Psicossomática Psica nalítica II São Paulo SP Casa do Psicólogo Leclaire S 1992 O corpo erógeno Uma introdu ção à teoria do complexo de Édipo São Paulo SP Escuta Original publicado em 1979 McDougall J 1996 Teatros do corpo O Psicossoma em psicanálise 2 ed São Paulo SP Martins Fontes Mello J Filho Burd M Eds 2010 Psicosso mática hoje 2 ed Porto Alegre RS Artmed Miller JA 1987 Algumas refl exões 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