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Organização Comitê Científico Double Blind Review pelo SEEROJS Recebido em 16072024 Aprovado em 24082024 Revista Brasileira de Direito Empresarial Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 46 RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS ENTERPRISES SOCIAL RESPONSABILTIYE Marcos Antonio Nunes da Silva RESUMO O estudo tem como objetivo analisar os aspectos gerais da responsabilidade social no setor empresarial brasileiro Buscase investigar a relação entre as práticas de responsabilidade social corporativa e a lucratividade nas empresas como também a coercibilidade das normas e ações voltadas para a responsabilidade social A problemática reside na compreensão dos desafios enfrentados pelas empresas brasileiras na incorporação efetiva de práticas de responsabilidade social Questionase como será possível uma reconciliação com o lucro e o papel das medidas coercitivas Com uso do método indutivo o estudo alcançou resultados que oferecem uma análise detalhada da evolução histórica da responsabilidade social no Brasil avaliando criticamente sua relação com a lucratividade e a eficácia de medidas coercitivas para promover práticas responsáveis Como principal contribuição o estudo constatou uma evolução da responsabilidade social empresarial no Brasil A integração de práticas socialmente responsáveis nas estratégias empresariais compatibiliza a busca pelo lucro e as expectativas sociais e ambientais O estudo conclui pela necessidade de uma regulamentação mais robusta da temática equilibrada e estratégica para uma responsabilidade social que harmonize objetivos econômicos compromissos sociais e ambientais para um desenvolvimento sustentável e inclusivo no setor empresarial brasileiro Palavraschave Responsabilidade Social Empresas Direito Empresarial Autonomia Privada Atividade empresarial ABSTRACT The study aims to analyze the general aspects of social responsibility in the Brazilian business sector The aim is to investigate the relationship between corporate social responsibility practices and profitability in companies as well as the coercion of norms and actions aimed at social responsibility The problem lies in understanding the challenges faced by Brazilian companies in effectively incorporating social responsibility practices The question arises as to how reconciliation with profit and the role of coercive measures will be possible Using the inductive method the study achieved results that offer a detailed analysis of the historical evolution of social responsibility in Brazil critically evaluating its relationship with profitability and the effectiveness of coercive measures to promote responsible practices As its main contribution the study found an evolution of corporate social responsibility in Brazil The integration of socially responsible practices into business strategies makes the search for profit and social and environmental expectations compatible The study concludes that there is a need for more robust balanced and strategic regulation of the issue for social responsibility that harmonizes economic objectives social and Doutorando e Mestre em Direito Empresarial e Cidadania UNICURITIBA Mestre em Direito Empresarial Aplicado FAMEC Master Trainer em Programação Neurolinguística INL PósGraduado em Direito Civil e Processual Civil PUCPR Advogado Email marcosmarcosnunesadvbr Lattes httplattescnpqbr36991 79235155669 ORCID httpsorcidorg0000000163425987 RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 47 environmental commitments for sustainable and inclusive development in the Brazilian business sector Keywords Social Responsibility Companies Commercial Law Private Autonomy Business activity INTRODUÇÃO Segundo Bonnomi 2021 p 296 1 a responsabilidade social da empresa compreende um atuar de forma ética em conformidade com suas obrigações legais e de modo a minimizar impactos negativos ao meio ambiente à sociedade e à saúde humana decorrentes de suas atividades O avanço da responsabilidade social nas empresas brasileira destaca o crescente engajamento com o tema evidenciando uma tendência de adesão contínua aos seus princípios e a adoção de uma perspectiva solidária especialmente em empresas de grande porte Apesar do progresso observado o debate sobre responsabilidade corporativa ainda é incipiente com muitas empresas particularmente de médio e pequeno porte permanecendo distantes dos preceitos da responsabilidade corporativa e ancoradas no paradigma contratualista do direito empresarial Contudo o aumento das discussões e pesquisas sobre o tema sinaliza um futuro promissor com uma conscientização crescente entre administradores sócios e acionistas sobre a importância das práticas de responsabilidade social para o sucesso empresarial O atual artigo tem como objetivo analisar os aspectos gerais da responsabilidade social no setor empresarial brasileiro destacando seu desenvolvimento histórico a interação com a busca por lucro e a efetividade das medidas coercitivas para estimular a adoção de práticas socialmente responsáveis Como objetivos específicos buscase mapear a evolução histórica da responsabilidade social no Brasil identificando marcos históricos que influenciaram sua trajetória no cenário nacional examinar a relação entre as práticas de responsabilidade social corporativa e a lucratividade nas empresas além de investigar a coercibilidade das normas e ações voltadas para a responsabilidade social 1 Para os fins deste artigo o termo empresa deve ser interpretado enquanto tradução de firm sendo essa definida como estrutura ou organização da atividade empresária Quando se fizer referência ao termo empresa na qualidade de atividade consoante estabelecido no art 966 do Código Civil utilizarseá a expressão atividade empresarial Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 48 A problemática central gira em torno da compreensão dos desafios enfrentados pelas empresas brasileiras na incorporação efetiva de práticas de responsabilidade social questionando como estas podem ser reconciliadas com a busca contínua por lucro e qual o papel das medidas coercitivas na garantia de sua adoção Para tanto fará o estudo fará uso do método dedutivo associado aos precedentes de pesquisa bibliográfica e documental Inicialmente será apresentado o percalço da construção da concepção da responsabilidade social no cenário pátrio destacandose os marcos históricos sobre a matéria Ato contínuo examinarseá a relação entre a prática de ações vinculadas à responsabilidade corporativa e a busca pelo resultado econômico positivo e a remuneração pelo capital investido pelos sócios e acionistas leiase lucro atestandose a necessidade de compatibilização dessas perspectivas para o bom desenvolvimento da atividade empresarial Encaminhando para uma análise sob o prisma prático do tema em seguida se dará enfoque às demandas contemporâneas do mercado e sua coercibilidade em face das sociedades para a realização de medidas de responsabilidade social momento no qual será colocado em debate a necessidade de o Direito impor normas de sanção negativa para obrigar que as empresas adotem condutas promocionais de direitos fundamentais relacionadas à doutrina da responsabilidade social Ao final serão apresentadas as conclusões e o resultado dos dados analisados com a síntese das perspectivas e tendências da responsabilidade social corporativa 2 NOTÍCIA HISTÓRICA DA CONSTRUÇÃO DA CONCEPÇÃO DE RESPONSABILIDADE SOCIAL NO BRASIL Contemporaneamente à concepção da missão dos negócios sob o viés estritamente econômico correspondente à busca desenfreada pela maximização dos lucros adicionaramse novas questões de ordem social Nesse novo paradigma do capitalismo denominado capitalismo stakeholder ou ainda capitalismo consciente as empresas sofrem pressões de vários setores da sociedade civil para que se tornem mais comprometidas com práticas em benefícios dos interesses da comunidade Em outras palavras a sociedade civil passa a ser considerada um novo agente da operação econômica bem como as empresas são alçadas ao posto de verdadeiras integrantes da estrutura RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 49 econômicosocial cuja atuação deve ter em mente também a proteção e promoção dos direitos fundamentais Nos Estados Unidos e na Europa a responsabilidade social das empresas é objeto de discussão mais intensa desde meados do século XX mas as primeiras menções à temática surgiram já no início do século passado pelas obras de Charles Eliot 1906 Arthur Hakley 1907 e John Clarck 1916 Mais especificamente a expressão responsabilidade social foi escrita pela primeira vez em um manifesto de industriais ingleses o qual mencionava o compromisso dos empresários em manter um equilíbrio entre os interesses dos consumidores dos funcionários e dos acionistas Contudo por serem consideradas de cunho socialista não houve ampla adesão e difusão da temática Saltiél 2016 Assim somente na década de 1950 iniciouse o desenvolvimento teórico sobre o tema da responsabilidade social Em um dos primeiros livros escritos sobre o tema Social Responsabilities of the Businessman de Howard Bowen 1953 defendeuse a ideia de que as empresas deveriam entender seu impacto social adotandose uma postura ativa diante dos recursos à sua disposição a fim de que fossem utilizados para fins sociais e não apenas para os interesses privados de maximização dos lucros Saltiél 2016 No Brasil por sua vez a responsabilidade social passou a ocupar a pauta dos empresários com mais visibilidade nos anos 1990 a partir do movimento de redemocratização e abertura econômica do país com a nova ordem instaurada pela Constituição Federal de 1988 Reis 2007 O processo de implementação da responsabilidade social nas empresas brasileiras é portanto mais recente e encontra desafios no contexto socioeconômico do país Enquanto os primórdios das discussões sobre responsabilidade social empresarial nos Estados Unidos e na Europa tratavam de problemas relativos ao meio ambiente e aos direitos dos consumidores a realidade brasileira suscita questões relativas às necessidades básicas da população fome desemprego exclusão social etc conduzindo as discussões acerca da responsabilidade social das empresas a outro patamar Não obstante a distinção apontada mesmo nos países pioneiros no movimento da responsabilidade social inicialmente os dirigentes empresariais se mostraram reticentes e contrários a essa postura exigida das empresas em relação às demandas sociais A predominância do critério econômico fez com que a responsabilidade social fosse vista como um mal necessário Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 50 a menos que fosse assegurado um retorno lucrativo Além do que acreditavam que só pelo fato de proverem empregos para a comunidade já praticariam ações sociais Guimarães 1984 Delineouse três diferentes posicionamentos frente às demandas de responsabilidade social i uma posição assumiu uma postura mais tradicional de que a única função da empresa é a maximização dos lucros de modo que o investimento por parte da empresa na área social é uma forma de lesar os acionistas ao diminuir seus dividendos ii uma posição diametralmente oposta à anterior defendeu que o benefício social de uma empresa deve estar acima do benefício econômico abolindose a propriedade privada e compartilhandose os benefícios econômicos e iii uma posição intermediária partiu da ideia de que o lucro é legítimo e justo mas também é exigível da empresa uma postura social Guimarães 1984 sendo essa última a que ganhou mais adeptos ao longo do tempo Os processos de globalização e reestruturação do setor produtivo pela introdução de novas tecnologias vêm transformando todas as esferas da sociedade capitalista As consequências das profundas transformações no contexto socioeconômico mundial implicam aumento dos problemas de ordem comunitária Nesse contexto em que não é mais possível permanecer alheio a todas essas mudanças a responsabilidade social das empresas ganhou notoriedade e passou a integrar os debates públicos dos problemas sociais No Brasil o histórico da responsabilidade social tem como marco inicial o ano de 1977 quando houve a fundação e consolidação da Associação dos Dirigentes Cristãos de Empresas ADCE que reunia grupos comprometidos com a transformação de sua empresa em um ambiente de melhoria pessoal de modo a contribuir para uma sociedade solidária justa livre e humana Reis 2007 A ADCE foi a primeira a lançar o debate sobre o Balanço Social embora sua publicação só tenha iniciado em 1984 com a empresa Nitrofértil seguida pelo balanço do Banco do Estado de São Paulo Banespa em 1992 Reis 2007 Os balanços sociais são relatórios elaborados pelas empresas indicando quais foram as suas contribuições sociais em determinado período A ideia surgiu nos Estados Unidos na década de 1960 porque várias empresas estavam ligadas à Guerra do Vietnã e dessa forma podiam ser identificadas pela sociedade e sofrer boicotes Em 1977 a França instituiu a obrigatoriedade de publicação de balanços sociais pelas empresas de maior porte Filho 2003 No Brasil a partir de 1993 mais empresas passaram a publicar o Balanço Social mas a sua visibilidade nacional somente se deu em 1997 por meio de parceria do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas Ibase que lançou o Selo do Balanço Social Atualmente o RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 51 Balanço Social é utilizado por muitas empresas em vários estados do Brasil e tem caráter obrigatório em São Paulo para empresas privadas com mais de cem funcionários Reis 2007 Em 1982 a Câmara Americana de Comércio de São Paulo Amcham instituiu o Prêmio ECOEmpresa e Comunidade que foi pioneiro no reconhecimento de empresas que adotam práticas responsáveis no âmbito do desenvolvimento empresarial sustentável no Brasil Anos depois em 1995 um grupo de empresários em parceria com a Amcham criou um subcomitê de filantropia que resultou no Grupo de Instituições Fundações e Empresas GIFE com o objetivo de auxiliar tecnicamente as empresas interessadas em investimentos sociais por meio da difusão de conceitos e práticas de gestão que otimizassem melhor os recursos aplicados Reis 2007 Devido à articulação do GIFE com outros grupos de apoio as doações pelas empresas hoje são passíveis de deduções de incentivos fiscais O Governo Federal autoriza as empresas tributadas em regime de lucro real a deduzirem 2 do lucro operacional bruto em doações desde que destinadas a entidades sem fins lucrativos pela Lei das OSCIPS nº 97901999 ou a entidades declaradas como de utilidade pública pela Lei nº 351991 Reis 2007 Em 1990 foi instituída a Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente entidade de utilidade pública federal cuja missão é promover a defesa dos direitos e o exercício da cidadania das crianças e dos adolescentes com iniciativas que buscam engajar empresas em uma atuação social em especial na prevenção e na erradicação do trabalho infantil Outra iniciativa que merece destaque é a criação em 1994 do Instituto Ayrton Senna uma organização não governamental de origem empresarial cujo objetivo é oferecer condições de desenvolvimento humano a crianças e jovens brasileiras em parceria com o Poder Público e o setor privado Reis 2007 Todas essas iniciativas do segmento empresarial brasileiro de mobilização no sentido de desenvolver um comportamento socialmente responsável desembocaram em 1998 na criação do Instituto Ethos de Responsabilidade Social uma associação de empresas interessadas em desenvolver suas atividades de forma socialmente responsável por meio da informação conferências debates e encontros assistência técnica e articulação A missão do Ethos propõese a disseminar a prática da responsabilidade social empresarial ajudando as instituições a compreender e incorporar de forma progressiva o conceito do comportamento empresarial socialmente responsável implementar políticas e práticas que atendam a elevados critérios éticos contribuindo para o alcance do sucesso econômico sustentável em longo prazo assumir suas responsabilidades com todos aqueles que são atingidos por suas atividades Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 52 demonstrar a seus acionistas a relevância de um comportamento socialmente responsável para o retorno em longo prazo sobre seus investimentos identificar formas inovadoras e eficazes de atuar em parceria com as comunidades na construção do bemestar comum prosperar contribuindo para um desenvolvimento social econômica e ambientalmente sustentável2 A partir dessa breve incursão sobre o histórico da responsabilidade social das empresas no Brasil notase que sua evolução pode ser dividida em três estágios que abrangem diferentes enfoques e públicosalvo primeiro estágio exercício da gestão social interna segundo estágio exercício da gestão social externa terceiro estágio exercício da gestão social cidadã Reis 2007 O exercício da gestão social interna primeiro estágio direcionase a questões regulares da empresa referentes aos seus funcionários e a seus familiares como condições de saúde e segurança o oferecimento de benefícios a remuneração e a qualidade no ambiente de trabalho Reis 2007 No âmbito da gestão social externa segundo estágio a preocupação da empresa volta se à comunidade em que está inserida bem como seus clientes fornecedores e entidades públicas Nesse âmbito a filantropia empresarial é prática adotada com frequência no cenário da responsabilidade social no Brasil por meio de investimentos em programas sociais e doações de recursos financeiros Reis 2007 A responsabilidade social das empresas brasileiras ainda se encontra num segundo estágio focado predominantemente em ações de doação filantropia e assistência social o que denota seu caráter pessoal e circunstancial o qual embora minimize a situação de desigualdade social no país acaba contribuindo em alguma medida para a manutenção da situação social vigente Pesquisas revelam que de modo geral o que motiva a ação social das empresas é o caráter humanitário dos empresários brasileiros que sensibilizados com a situação social do país realizam doações financeiras comprometendo a avaliação o aperfeiçoamento e a continuidade das práticas de responsabilidade social pelas empresas nacionais Reis 2007 Em uma gestão social cidadã terceiro estágio a responsabilidade social das empresas passa a ser concebida como um modelo de comportamento ético e consciente de gestão que resgata valores e práticas em respeito às partes envolvidas no negócio mesmo indiretamente Assim a responsabilidade social incorporada às empresas como modelo de gestão dos negócios não se reduz a uma ferramenta de marketing ou a ações pontuais de filantropia Resulta em uma mudança 2 Disponível em httpswwwethosorgbrconteudosobreoinstitutomissao Acesso em 4 set 2021 RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 53 cultural pela qual a empresa se compreende responsável pelo desenvolvimento de uma sociedade mais igualitária com maiores oportunidades de acesso da população a produtos e serviços Em suma a gestão social cidadã busca não só cumprir com sua função econômica mas contribuir para a melhoria da qualidade de vida da sociedade como um todo À vista do exposto constatase que a construção histórica da responsabilidade social nas empresas brasileiras ainda é recente e tem muito a avançar rumo a uma mudança cultural na forma de conduzir os negócios Como se nota no Brasil o movimento de responsabilidade social está em desenvolvimento rumo ao terceiro estágio de gestão social cidadã Inobstante isso acreditase que essa postura predominantemente filantrópica no campo da responsabilidade social empresarial tende a mudar com o crescente aumento da discussão sobre o tema nos meios empresariais e acadêmicos no país Para tanto é necessário que as empresas brasileiras incorporem a responsabilidade social na gestão de seus negócios adotandose uma cultura de corresponsabilidade no enfrentamento das mazelas que impedem o desenvolvimento social 3 A COMPATIBILIZAÇÃO DA RESPONSABILIDADE SOCIAL E A REALIZAÇÃO DO ESCOPO FIM DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA Conforme exposto desde a década de 1960 várias empresas brasileiras passaram a adotar uma postura ativa diante das questões sociais Dessa forma a responsabilidade social é gradativamente incorporada no âmbito das empresas como nova forma de gestão que integra preocupações sociais nas suas decisões e ações As empresas passaram a ser vistas como agentes sociais que não devem só visar a maximização dos seus lucros e atender os interesses de seus acionistas mas contribuir com o desenvolvimento social do país3 Entendese que o fundamento dessa assunção de responsabilidade está no poder econômico das empresas que não pode ser exercido a fim de atender exclusivamente aos interesses do titular deste poder mas deve atuar em favor da comunidade em que se situa Por seu turno como ensinam os professores Francisco Cardozo Oliveira e Luiz Eduardo Gunther 2021 p 50 em termos de fundamentos normativos de responsabilidade social das empresas é exatamente a ação 3 Tal perspectiva é verificável especialmente pela filiação da Lei das Sociedades Anônimas à teoria institucionalista da empresa a qual enxerga a firm enquanto importante instituição social dotada de uma função social a ser desempenhada por ela mesma em contraposição à teoria contratual e à visão estritamente econômica da empresa na qual seus interesses decorrerem da mera soma da vontade dos sócios e da busca pela maximização dos lucros Gouvêa Gärner Guerra 2021 Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 54 solidária necessária ao exercício da liberdade que confere sentido à ação desencadeada pelas empresas no mercado A despeito desse fundamento a responsabilidade social gera questionamentos sobre os interesses efetivamente envolvidos principalmente quando suas ações estão voltadas à gestão interna Nesse tocante indagase se o objetivo é aumentar a motivação e o comprometimento dos funcionários apenas para o fim de incrementar a produtividade o que a torna um fim em si mesma ou se visa contemplar objetivos sociais mais amplos de mudança de cultura Do mesmo modo no âmbito externo observase que o processo de globalização da economia faz com que as empresas se preocupem com a sustentabilidade de seu negócio e com sua imagem pública do que dessume que a ideia de investir em projetos sociais pode estar ligado à própria lucratividade da empresa com base em sua reputação no mercado A realidade demonstra ser cada vez mais necessária a existência de uma boa reputação para a empresa sob pena da perda de consumidores acionistas fornecedores e até mesmo do apoio governamental Nessa ótica a responsabilidade social corporativa tornouse preocupação das empresas na medida que estas passaram a ser avaliadas não somente por seu desempenho financeiro mas também pelo desempenho social Reis 2007 Contudo se os interesses comerciais relacionados à estratégia empresarial como a melhoria da imagem da empresa e o aumento da produtividade do trabalho são os que movem as empresas a adotarem práticas de responsabilidade social em um momento inicial a pressão por parte da sociedade civil por ações efetivas do empresariado no sentido de contribuir no processo de desenvolvimento do país tem despertado maior conscientização das empresas sobre seu papel social Assim a sociedade demanda a adoção de novos padrões de relacionamento entre a empresa e a coletividade na medida que surge uma maior conscientização em torno de temas como a exploração do trabalho a questão ambiental a origem e destinação dos produtos a discriminação racial e social etc Pesquisas têm demonstrado que nos Estados Unidos e na Europa 50 dos consumidores comprariam mais produtos de empresas socialmente responsáveis e 70 não os comprariam mesmo com descontos se fabricados por empresas não preocupadas com as questões éticas Nessa linha a atuação consciente das empresas no caminho da responsabilidade social tem se demonstrado um importante fator para agregar valor às empresas com o que ganham o respeito de consumidores e de seus colaboradores permitindo a perpetuação de seus negócios Duarte 2004 RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 55 É inegável que uma atuação empresarial alinhada aos ideais de responsabilidade social pode atrair grupos de interesse em termos de investimento por exemplo As decisões econômicas mais racionais levam em conta uma perspectiva de responsabilidade social Nesse sentido a legitimidade da economia de mercado está sujeita à satisfação de normas e valores que não se destinam a seguir interesses egocêntricos mas devem permitir articular as orientações individuais de tal modo que o interesse de um se converta no interesse do outro Portanto a responsabilidade social da empresa não é algo incompatível com os objetivos mais essenciais da atividade mercantil haja vista que a ação da empresa no mercado adquire racionalidade na medida em que informada pela responsabilidade social Oliveira Gunther 2021 Nesses termos as empresas devem assumir o compromisso de que suas ações têm consequências na sociedade e na medida em que têm responsabilidade pelos problemas sociais também são responsáveis pelo seu enfrentamento Além disso como a atividade empresarial se vale de um grande volume de recursos comuns esperase em contrapartida que elas também revertam a utilização desses recursos em favor dessa sociedade Guimarães 1984 O modelo de responsabilidade social na empresa deve pretender aliar o desenvolvimento econômico ao desenvolvimento de qualidade de vida dos indivíduos Nessa perspectiva a reflexão sobre as consequências da atividade empresarial na sociedade significa compreender o seu comprometimento tanto em relação a seus funcionários quanto ao que se percebe no exterior a quem se destinam e de que forma os cidadãos são afetados Desse modo a adesão aos princípios da responsabilidade social empresarial não pode ser uma iniciativa de fachada imbuída pela expectativa egoísta de gerar impactos na imagem da empresa Darcanchy 2008 mas o resultado de uma conscientização profunda e efetiva por parte do empresariado do seu compromisso social no enfrentamento dos problemas sociais do país que abarca todo o conjunto de políticas e práticas empresariais Assim o ideal seria uma mudança estrutural no setor privado que priorizasse valores e práticas sociais em sintonia com os interesses econômicos O objetivo da empresa é acima de tudo o lucro mas uma empresa também é uma organização social formada por grupos de pessoas que buscam a satisfação de suas necessidades Assim compatibilizar o interesse privado ao interesse comum é um desafio a ser enfrentado É certo que não há consenso em até que ponto os interesses econômicos das empresas se compatibilizam com os objetivos da sociedade assim como não estão claras quais decisões as empresas podem e devem tomar para que realmente favoreçam fins sociais Reis 2007 Nesse Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 56 tocante cabe ao direito regulamentar as condições para que as empresas assumam sua responsabilidade social e efetivamente promovam ações que se revertam em contribuições no âmbito social Darcanchy 2008 Podese dizer que atualmente a responsabilidade social da empresa não é obrigação disciplinada expressamente pelo ordenamento jurídico brasileiro assumindo contornos de mera faculdade sem qualquer coercibilidade A Constituição Federal de 1988 atenta às mudanças sociais experimentadas nas relações da empresa com a sociedade oferece um primeiro olhar sobre a responsabilidade social no Brasil Nos incisos do art 7º da CF estão estipulados os direitos fundamentais dos trabalhadores brasileiros o que surge como um exercício de responsabilidade social para os empresários que devem observálos em sua gestão interna A Constituição também dedicou o Capítulo VI do Título VIII que trata da Ordem Social exclusivamente para tratar das questões ambientais colocando a preservação e a defesa do meio ambiente como um dever da coletividade no que ficam implícitas as instituições as entidades da sociedade civil e a empresa Portanto como uma das manifestações da responsabilidade social as empresas devem implementar programas de preservação ambiental com a utilização consciente dos recursos naturais Além disso o art 170 da CF estabelece que a Ordem Econômica terá como fundamento a valorização do trabalho humano e a livre iniciativa com o intuito de assegurar à sociedade existência digna de acordo com os ditames da justiça social O mesmo dispositivo determina como princípios da ordem econômica a soberania nacional a propriedade privada a função social da propriedade a livre concorrência a defesa do consumidor a redução das desigualdades regionais e sociais a busca do pleno emprego e o tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte Ainda existem outros previstos no texto constitucional que fazem menção ao princípio da livre iniciativa art 1º IV ao princípio do desenvolvimento social art 3º II ao princípio da erradicação da pobreza e da marginalização art 3º III aos quais as empresas também devem se submeter em atenção à responsabilidade social Dentre os princípios mencionados um dos mais importantes relacionados à responsabilidade social da empresa é a sua função social que constitui o poderdever de os administradores harmonizarem as atividades empresárias segundo o interesse da sociedade mediante o cumprimento de determinados deveres Filho 2003 Este princípio inferido tanto do princípio da função social do contrato como da função social da propriedade Buzzi Oliveira RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 57 2016 preconiza que a propriedade dos bens de produção deve cumprir a função social sem concentrar os interesses juridicamente protegidos na esfera de titularidade dos empresários Oliveira Veronese 2016 Mas os deveres afetos à responsabilidade social não se esgotam na Constituição No âmbito infraconstitucional o 4º do art 154 da Lei nº 64041976 Lei das Sociedades por Ações dispõe que o conselho de administração ou a diretoria podem autorizar a prática de atos gratuitos razoáveis em benefício dos empregados ou da comunidade de que participe a empresa tendo em vista suas responsabilidades sociais Inclusive esses gastos podem ser deduzidos do montante a ser pago a título de imposto de renda Esse artigo também estipula que o administrador deve exercer suas atribuições de acordo com as exigências da função social da empresa Oliveira Gunther 2021 Não se ignora que ante todos esses princípios e normas a responsabilidade social da empresa parece entrar em conflito com os objetivos que se lhe impõe o paradigma tradicional da empresa voltado exclusivamente à obtenção de lucro Por isso ainda há dificuldade em se estabelecer até que ponto a lei pode exigir da empresa a prática de ações visando os interesses da sociedade Não obstante a atuação social da empresa há de ser concebida como uma forma de propiciar melhores condições pela via da atividade produtiva que vai além da geração de empregos produção de bens e serviços ou pagamento de impostos Deve se estabelecer uma relação de harmonia e complementariedade entre os ideais de maximização do lucro e as obrigações decorrentes da adoção da responsabilidade social na atividade empresarial 4 A RESPONSABILIDADE SOCIAL DA EMPRESA COMO UMA DEMANDA DO MERCADO E SUA TUTELA PELO DIREITO No ponto anterior buscouse evidenciar que não existe como se poderia pressupor a uma primeira vista uma necessária contraposição entre o adimplemento dos deveres sociais pela empresa e a busca pelo lucro não obstante não seja possível delimitar até que ponto essas duas vertentes são convergentes Entretanto contemporaneamente é inegável que o resultado econômico positivo da empresa não raro perpassa por um estrito cumprimento de sua responsabilidade social Poucos temas dentro do âmbito da governança corporativa e do direito empresarial sofreram uma reviravolta tão radical como a necessidade de abordagem da proteção e promoção Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 58 dos direitos humanos e das garantias fundamentais por parte das empresas Gouvêa Gärner Guerra 2019 Tal fato se deve especialmente aos diversos impulsos do próprio mercado que impõem às empresas o dever de adotarem medidas que visem tutelar direitos de ordem social fazendo com que a prática de ações de responsabilidade social assuma contornos de compulsoriedade Com efeito há uma exigência por parte da sociedade consumidora e dos investidores como um todo para que as empresas adotem práticas sustentáveis do ponto de vista social trabalhista e ambiental bem como se comprometam do ponto de vista ético e comercial Nascimento 2022 sob pena de não receberem os aportes financeiros necessários ao desenvolvimento das atividades empresariais Essa virada de paradigma por sua vez tem gerado impactos sensíveis nas políticas internas e externas das sociedades empresárias brasileiras gerando reformas na condução dos negócios Nesse sentido em pesquisa promovida pela Universidade de São Paulo verificouse que dentre as 128 principais companhias listadas na Bolsa de Valores a 22 vinte e duas empresas mencionaram Direitos Humanos em seus formulários b 100 cem empresas mencionaram Desenvolvimento sustentável c 96 noventa e seis empresas mencionaram Ética d 98 noventa e oito empresas mencionaram Meio ambiente e 31 trinta e uma empresas mencionaram Incentivo à cultura f 32 trinta e duas empresas mencionaram Bemestar social e g 47 quarenta e sete empresas mencionaram Política anticorrupção Gouvêa Gärner Guerra 2019 A mesma pesquisa constatou ainda que dentre exemplos de práticas de boa governança corporativa adotadas pelas principais grandes empresas brasileiras a Magazine Luiza SA prevê a quebra de contrato com empresas que compactuem com a violação de direitos humanos4 enquanto a Natura Cosméticos SA dispõe de um mecanismo contratual semelhante denominado como política de tolerância zero em relação a violações de direitos humanos Por fim a Tim 4 Encontrase nos contratos firmados pela empresa a seguinte cláusula Da Responsabilidade Social e Ambiental O Magazine Luiza defende o cumprimento da legislação a preservação do meio ambiente o respeito às pessoas e aos direitos humanos A empresa se posiciona firmemente contrária a práticas de desmatamento de áreas embargadas ou de proteção ambiental assim como é contra a utilização de trabalhadores em condições indignas eou ilegais e é contra a utilização de mão de obra infantil práticas de preconceito assédio moral e assédio sexual O Magazine Luiza explicita que seus fornecedores e parceiros empresas devem comungar destas convicções e adotar práticas contra a degradação do meio ambiente e do ser humano Caso haja evidências de práticas contrárias a estas premissas o Magazine Luiza romperá os acordos e compromissos comerciais com as empresas até que elas revejam sua posição e redirecionem suas atitudes RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 59 Participações SA mantém uma lista de direitos essenciais dos trabalhadores5 prevendo sanções para o caso de descumprimento destes A contínua adoção de práticas de responsabilidade social pelas empresas também recebe o apoio e incentivo dos agentes reguladores do mercado Em 2021 o Conselho Monetário Nacional editou as Resoluções nº 49432021 49442021 e 49452021 no qual relaciona a gestão de riscos financeiros na perspectiva ESG aos riscos de crédito liquidez operacional e legal Por sua vez a CVM também possui importantes marcos regulatórios acerca da responsabilidade social das empresas dentre eles se destacando as ICVMs 4802009 5522014 5862017 e a Resolução CVM nº 142020 Igualmente no contexto do mercado de capitais foi recentemente instituído o índice SPB3 Brasil ESG o sétimo relacionado à responsabilidade social das empresas que proporciona ao investidor a possibilidade de realizar a gestão dos riscos reputacionais das companhias antes de realizar seu investimento Nesse sentir vêse que a responsabilidade social se tornou verdadeira métrica de investimentos e de consumo como bem destaca Juliana Oliveira Nascimento 2022 o lucro das organizações passa a fazer parte de um contexto que envolve a busca por um propósito maior e a discussão sobre uma economia voltada para stakeholders ganha cada vez mais força não só no mercado brasileiro mas globalmente A nova economia digital traz em seu bojo uma sociedade hiperconectada com fácil acesso à informação mais ativista e com hábitos de consumo cada vez mais sustentáveis São essas mesmas pessoas que passam a observar as práticas de governança corporativa e utilizálas como norte para as suas opções de investimentos Nesse contexto possuir um firme compromisso com o desenvolvimento de um negócio sustentável e de impacto social passou a ser um diferencial para os investidores Exemplificativamente estimase que mais de um trilhão de dólares em ativos estejam hoje sob a gestão de fundos que aplicam seus recursos apenas em negócios e empresas com práticas sustentáveis Igualmente a questão da responsabilidade social se faz presente em diversos acordos relevantes de investimento estrangeiro como o TPP o CETA e o ACFI se mostrando um importante elemento para viabilizar a capitalização da empresa Bonnomi 2021 Portanto vêse que a questão da responsabilidade social das empresas é medida imposta pelo próprio mercado tornandose o adimplemento das condutas com ela relacionadas contemporaneamente fator estrito para o sucesso do desenvolvimento das atividades empresárias 5 A lista de garantia de direitos fundamentais prevê termos como Trabalho infantil Trabalho forçado Saúde e segurança Liberdade de associação e direito à negociação coletiva Discriminação e assédio Procedimentos disciplinares Valorização da diversidade Horário de trabalho Remuneração Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 60 O questionamento que sobrevive entretanto é em até que ponto a simples existência de uma constatada coercitividade econômica se mostra suficiente para que as empresas cumpram os deveres relacionados à responsabilidade social e se não se faria necessário que o Direito regulasse a matéria e até estabelecesse sanções específicas e rígidas para empresas que deixem de promover direitos fundamentais6 A fim de responder esse questionamento inicialmente é necessário destacar que já existem diversas normas jurídicas que estabelecem punições em relação à violação de direitos fundamentais por pessoas jurídicas de direito privado tanto em nível constitucional quanto infraconstitucional Podese citar a título de exemplo o artigo 243 da Constituição Federal que expressamente estabelece a sanção de confisco em face de propriedades rurais e urbanas em que haja exploração do trabalho escravo Na seara infraconstitucional por sua vez cabe destacar o papel relevante da Lei nº 960598 a qual dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente e da Lei nº 137092018 a denominada Lei Geral de Proteção de Dados De uma leitura tópica e sistêmica do cenário jurídico brasileiro concluise que já existem normas que sancionam empresas que violem direitos fundamentais havendo uma adequada intervenção do Estado no âmbito privado nesses casos Existe uma lacuna entretanto no aspecto de promoção dos direitos fundamentais que tem sido preenchido conforme destacado acima pela coerção exercida pelo próprio mercado partindo da própria racionalidade do capitalismo stakeholder Bortoli 2008 É dizer não obstante existam normas de sanções positivas que estipulam benefícios geralmente de ordem fiscal para empresas que assumam a prática de ações que favoreçam a consumação de direitos de ordem social não há atualmente uma norma de sanção negativa para empresas que deixem de realizar ações promocionais razão pela qual é correta a colocação de que as ações promocionais de responsabilidade social têm caráter estritamente voluntarista na perspectiva brasileira Oliveira Gunther 2021 A questão colocada acima portanto é o caráter promocional dos direitos fundamentais na perspectiva da responsabilidade social das empresas deveria ser tutelado por normas de sanção 6 Em favor da criação de leis específicas sobre tema destacase a posição de Marcia Bataglin Dalcastel Pedro Moreira Alonso e Yuri da Costa Campos Ferreira 2018 p 206 Dito de outra forma enquanto não houver punição real atribuída em lei capaz de desestimular a perpetuação da atividade lesiva cabe ao investidor e ao consumidor consciente dar destaque às empresas que se destacam em função da aderência ao movimento ético proporcionado pelo capitalismo consciente RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 61 negativa Neste ponto seguindo a lição de Francisco Cardozo Oliveira e Luiz Eduardo Gunther 2021 a resposta teria de ser negativa sob pena de comprometer a liberdade individual do empresário e das empresas imputandolhes ônus excessivos Como bem destaca Otávio Luiz Rodrigues Jr 2019 neste ponto é mais adequado à sociedade brasileira um modelo fraco da eficácia indireta dos direitos fundamentais uma vez que no âmbito do Direito Privado deve prevalecer o interesse privado e a autonomia privada É dizer nos casos em que a prática de medidas promocionais da responsabilidade social pode se mostrar contrária à busca pela maximização do lucro da empresa devese tutelar a liberdade do empresário para que escolha qual deve prevalecer Nesse sentido o caráter promocional dos direitos fundamentais deve ser medida que parta da própria empresa sendo pautada na ética empresarial na esteira do pensamento de Calixto Salomão Filho 2012 Ana Frazão e Angelo Gamba Prata de Carvalho 2017 Em face dessa sujeição nas palavras de Francisco Cardozo Oliveira e Luiz Eduardo Gunther 2021 p 56 a ação de responsabilidade social oscila entre manterse atrelada ao espírito de filantropia ou servir a propósitos de marketing e de governança de territórios em benefício do aumento da lucratividade Convém destacar que conforme se extrai dos dados acima apresentados a coercitividade do mercado já se mostra eficaz para coagir as empresas a tomarem medidas que promovam direitos sociais devendo apenas ser incrementada à semelhança do que fizeram outros países o que também respalda em nível consequencial o posicionamento ora adotado Diante de todo o exposto vêse que i a responsabilidade social já é tutelada pelo direito em sua vertente referente a sancionar negativamente empresas que violem os direitos fundamentais ii em igual sentido a responsabilidade social em sua vertente promocional é ratificada por normas de sanção positiva embora não exista norma de sanção negativa no direito brasileiro e iii a coercitividade do mercado se mostra suficiente para tutelar a responsabilidade social das empresas em sua vertente promocional não obstante deva ser incrementada não sendo adequada uma intervenção estatal legislativa neste ponto sob pena de violação da autonomia privada da empresa e dos empresários CONCLUSÃO Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 62 O presente estudo buscou analisar o tema da responsabilidade social das empresas para identificar suas principais características e atual estágio de desenvolvimento Neste percurso inicialmente verificouse que i a partir da segunda metade do século XX intensificaramse os estudos da responsabilidade corporativa das empresas que desembocaram em uma nova concepção do próprio sistema capitalista doravante designado capitalismo stakeholder ii os estudos acerca do tema no cenário brasileiro ainda são incipientes não obstante seja possível identificar especialmente no pósConstituição Federal de 1988 um avanço na matéria iii fazse necessário harmonizar e compatibilizar a busca pela maximização do lucro com o adimplemento dos deveres de responsabilidade social para viabilizar o sucesso da empresa iv tais vertentes entretanto podem não se verificar congruentes sendo que nesses casos no aspecto promocional da responsabilidade social deve ser tutelado o direito da empresa em escolher qual posição adotar v a demanda do mercado por empresas que sejam socialmente responsáveis atua como importante forma de coerção para que as empresas adotem medidas promocionais de responsabilidade corporativa que aliadas a normas de sanção positiva se mostram importantes ferramentas para a consolidação da responsabilidade social das empresas vi existem normas de sanção negativa positivadas no direito brasileiro que obrigam que as empresas sejam socialmente responsáveis e não violem direitos fundamentais o que também é exigido pelo próprio mercado e vii não é adequada uma intervenção estatal para estabelecer normas de sanção negativa em relação à questão promocional da responsabilidade social devendo tais medidas partirem diretamente das empresas sob pena de violação da autonomia privada A título conclusivo importante destacar que as empresas brasileiras têm cada vez mais avançado na temática da responsabilidade social percebendose uma tendência em uma contínua recepção de seus princípios e uma consequente adoção da perspectiva solidária por parte das empresas Igualmente é possível verificar uma abrangência do tema na medida em que cada vez mais se evidencia o interesse de empresas especialmente de grande porte em adotar medidas de responsabilidade social Não obstante o debate ainda se faz incipiente sendo que diversas empresas especialmente de médio e pequeno porte ainda se fazem alheias aos preceitos da responsabilidade corporativa e presas ao paradigma da modernidade contratualista do direito empresarial Entretanto o crescimento das discussões e produções sobre a temática apontam para um futuro esperançoso com uma contínua conscientização de administradores sócio e acionistas da necessidade de RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 63 realização de medidas de responsabilidade social como elemento fundamental para o sucesso da atividade empresarial Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 64 REFERÊNCIAS BONNOMI Natália Paulino Responsabilidade social corporativa e investimento estrangeiro lições do TPP CETA e ACFI Revista de Direito Constitucional e Internacional v 128 p 289 304 novdez 2021 Disponível em httpswwwoasisbribictbrvufindRecordSTJ 1e8e4383730043a85e780adfed495c938 Acesso em 8 abr 2024 BUZZI Gabriele Cristine OLIVEIRA Francisco Cardozo Função social da empresa no brasil no contexto de globalização econômica luta por reconhecimento de direitos e mercado Revista Brasileira de Direito Empresarial Brasília v 2 n 1 p 201218 jan jul 2016 Disponível em httpswwwindexlaworgindexphpdireitoempresarialarticleview1013 Acesso em 8 abr 2024 DALCASTEL Marcia Bataglin ALONSO Pedro Moreira FERREIRA Yuri da Costa Campos Empresa e Direitos Humanos Governança Corporativa e capitalismo consciente como instrumentos de proteção Revista Publicum v 4 n 1 p 193 207 2018 Disponível em httpswwwepublicacoesuerjbrindexphppublicumarticleview34071 Acesso em 5 abr 2024 DARCANCHY Mara Vidigal Responsabilidade social da empresa e a constituição Revista de Direito Constitucional e Internacional v 63 n 63 p 195 211 abr jun 2008 Disponível em httpsbdjurstjjusbrjspuihandle201184241modefull Acesso em 5 abr 2024 DE BORTOLI Andrea A função social da empresa e suas implicações na governança corporativa e na gestão de stakeholders Revista de Direito Empresarial v 9 p 175 193 janjun 2008 Disponível em httpswwwlexmlgovbrurnurnlexbrredevirtualbibliotecasartigorevista200810008844 04 Acesso em 5 abr 2024 DUARTE Regina A Duarte A responsabilidade social da empresa breves considerações Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo v 13 p 146 152 janjun 2004 Disponível em httpsbdjurstjjusbrjspuihandle201187878 Acesso em 8 abr 2024 FRAZÃO Ana CARVALHO Angelo Gamba Prata de Responsabilidade social empresarial In FRAZÃO Ana org Constituição empresa e mercado Brasília Faculdade de Direito UnB 2017 p 200 221 GOUVÊA Carlos Pagano Botana Portugal GÄRNER Bruna Magalhães GUERRA João Paulo Braune Governança Corporativa e Direitos Humanos uma análise empírica do novo mercado Homa Publica Revista Internacional de Derechos Humanos Y Empresas v 3 n 2 p 139 158 fev jun 2019 Disponível em httpswwwbingcomckap692e9653593231edJmltdHM9MTcxMjc5MzYwMCZpZ3 VpZD0zMDllOGI2NC05MmRkLTZjZGUtMGRlMC05ZjY0OTM5YjZkNTMmaW5zaWQ9 RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 65 NTE5Mwptn3ver2hsh3fclid309e8b6492dd6cde0de0 9f64939b6d53psqGOUVc38aA2cCarlosPaganoBotanaPortugal3bGc38 4RNER2cBrunaMagalhc3a3es3bGUERRA2cJoc3a3oPauloBrauneG overnanc3a7aCorporativaeDireitosHumanos3aumaanc3a1liseempc3a dricadonovomercadoHomaPublicae28093RevistaInternacionaldeDerech osHumanosYEmpresas2cv32cn22cp139e280931582cfev2 fjun2019ua1aHR0cHM6Ly9lZGlzY2lwbGluYXMudXNwLmJyL3BsdWdpbmZpbG UucGhwLzUwNDM2ODQvbW9kX2ZvbGRlci9jb250ZW50LzAvUE9SVFVHQUwlMjBHT 1VWJUMzJThBQSUyMGV0JTIwYWwuJTIwLSUyMEdvdmVybmFuJUMzJUE3YSUyME NvcnBvcmF0aXZhJTIwZSUyMERpcmVpdG9zJTIwSHVtYW5vcy5wZGYntb1 Acesso em 8 abr 2023 GUIMARÃES Heloísa Werneck Mendes Responsabilidade social da empresa uma visão histórica de sua problemática RAERevista de Administração de Empresas v 24 n 4 p 211 219 out dez 1984 Disponível em httpsperiodicosfgvbrraearticleview39221 Acesso em 8 abr 2024 GUNTHER Luiz Eduardo OLIVEIRA Francisco Cardozo Responsabilidade social da empresa pandemia e o Direito brasileiro entre liberdade e solidariedade Revista Brasileira de Direito Empresarial v 7 n 2 p 39 57 jul dez 2021 HESPANHA António Manuel Cultura Jurídica Europeia Síntese de um milênio 3 ed Coimbra Almedina 2015 NASCIMENTO Juliana Oliveira ESG O Cisne Verde e o Capitalismo de Stakeholder 2 ed São Paulo Revista dos Tribunais 2022 REIS Carlos Nelson dos A responsabilidade social das empresas o contexto brasileiro em face da ação consciente ou do modernismo do mercado Revista de Economia Contemporânea Rio de Janeiro v 11 n 2 p 279 305 mai ago 2007 Disponível em httpswwwbingcomckaped370e06ac9a19b2JmltdHM9MTcxMjc5MzYwMCZpZ3 VpZD0zMDllOGI2NC05MmRkLTZjZGUtMGRlMC05ZjY0OTM5YjZkNTMmaW5zaWQ9 NTIwMAptn3ver2hsh3fclid309e8b6492dd6cde0de0 9f64939b6d53psqREIS2cCarlosNelsondosAresponsabilidadesocialdasempre sas3aocontextobrasileiroemfacedaac3a7c3a3oconscienteoudomoder nismodomercado3fRevistadeEconomiaContemporc3a2nea2cRiodeJaneir o2cv112cn22cp279e280933052cmai2fago2007ua1aHR 0cHM6Ly93d3cuc2NpZWxvLmJyL2ovcmVjL2EvcldwU1p6MzZMclA1OFB4YzluY21HVk Ivntb1 Acesso em 8 abr 2024 RODRIGUES JR Otávio Luiz Direito Civil Contemporâneo Estatuto epistemológico Constituição e Direitos Fundamentais 2 ed Rio de Janeiro Forense Universitária 2019 SALOMÃO FILHO Calixto Regulamentação da Atividade Empresarial para o Desenvolvimento p 60 73 In SALOMÃO FILHO Calixto org Regulação e Desenvolvimento Novos Temas 1 ed São Paulo Malheiros 2012 Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 66 SALTIÉL Augusto Von O desenvolvimento econômico sustentável no século XXI a responsabilidade social empresarial Revista de Direito Privado v 72 p 75 89 2016 Disponível em httpswwwbingcomckap38d133a820185f22JmltdHM9MTcxMjc5 MzYwMCZpZ3VpZD0zMDllOGI2NC05MmRkLTZjZGUtMGRlMC05ZjY0OTM5YjZkNT MmaW5zaWQ9NTE4NQptn3ver2hsh3fclid309e8b6492dd6cde0de0 9f64939b6d53psqSALTIc389L2cAugustoVonOdesenvolvimentoeconc3 b4micosustentc3a1velnosc3a9culoXXI3aaresponsabilidadesocialempres arialRevistadeDireitoPrivado2cv722cp75e28093892c2016Dis ponc3advelem3axxxxAcessoem3a8abr2024ua1aHR0cHM6Ly9iZC50 amRmdC5qdXMuYnIvanNwdWkvaGFuZGxlL3RqZGZ0LzQyODg3ntb1 Acesso em 8 abr 2024 TOMASEVICIUS FILHO Eduardo A função social da empresa Revista dos Tribunais São Paulo v 810 p 33 50 2003 Disponível em httpsbdjurstjjusbrjspuihandle2011115471 Acesso em 8 abr 2024 VERONESE Eduardo Felipe OLIVEIRA Francisco Cardozo A atividade empresarial e sua função social a efetivação dos direitos fundamentais Percurso v 1 n 18 p 196 214 2017 Disponível em httpswwwsemanticscholarorgpaperAATIVIDADE EMPRESARIALESUAFUNC387C383OSOCIAL3AADOSVeronese Oliveira6f5b7ef115ade3141a868bec847d9befbbef5887 Acesso em 8 abr 2024 RESUMO DO ARTIGO RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS de Marcos Antonio Nunes da Silva O artigo conduz uma análise crítica e historicamente situada da responsabilidade social empresarial no Brasil abordando a tensão estrutural e ainda mal resolvida entre interesse econômico e dever social O ponto de partida do autor é uma provocação como conciliar no atual modelo de empresa brasileira o imperativo do lucro com o imperativo éticosocial A pergunta não se pretende retórica O estudo responde com rigor técnico e método indutivo desdobrandose em três frentes o desenvolvimento histórico no país sua relação com a lucratividade e a efetividade de instrumentos coercitivos para a indução de condutas responsáveis No plano conceitual adotase uma definição funcionalista da responsabilidade social tratase de um agir empresarial ético juridicamente conforme e ambientalmente consciente com impacto minimizador sobre os danos sistêmicos da atividade econômica O autor destaca a crescente adesão de grandes empresas a esse modelo embora a penetração da responsabilidade entre médias e pequenas ainda se mostre tímida resquício do paradigma contratualista e da resistência a uma visão solidária da função social da empresa O fio condutor da narrativa histórica remonta às origens doutrinárias do conceito no hemisfério norte Bowen e transita até sua chegada tardia e desigual ao Brasil sobretudo após a Constituição de 1988 A partir da redemocratização e da abertura econômica o discurso da RSE foi ganhando densidade institucional com iniciativas e a obrigatoriedade do Balanço Social em alguns contextos regulatórios marcos que corporificam a tentativa de integração de valores sociais à lógica empresarial O autor traça uma tipologia evolutiva da RSE no Brasil em três estágios gestão social interna voltada para empregados e seus dependentes gestão social externa foco na comunidade e stakeholders indiretos com forte componente filantrópico e por fim a gestão social cidadã ainda incipiente mas vista como horizonte ideal onde a empresa assume papel de agente transformador engajada estruturalmente na promoção de uma sociedade mais igualitária No plano normativo a análise ganha tensão Se por um lado a responsabilidade das empresas ainda opera majoritariamente como voluntarismo moral e marketing reputacional por outro impõese a necessidade de um marco regulatório mais robusto O autor propõe um reposicionamento abandonar a caridade como cosmética e avançar rumo à normatização estratégica da responsabilidade social Ou seja transformar o gesto isolado em obrigação estruturante integrandoo à racionalidade do Direito Empresarial não como tutela do mercado mas como mediação ética entre autonomia privada e função social A obra sugere sem didatismo que a transição da filantropia para uma ética corporativa institucionalizada exige coerção A experiência revela que a livre iniciativa sem indução normativa tende à inércia ou à apropriação retórica da pauta A coerção portanto não é antagonista da responsabilidade é seu catalisador O estudo conclui com um paradoxo produtivo a responsabilidade quando efetivamente incorporada à estratégia empresarial não é inimiga do lucro ao contrário pode ampliar a legitimidade institucional da empresa gerar valor simbólico e econômico e criar vantagem competitiva sustentável Contudo para que isso ocorra é necessário ultrapassar o discurso e instaurar um novo ethos empresarial crítico integrado e consciente de sua responsabilidade compartilhada na construção de um capitalismo socialmente admissível Mais adiante no terceiro eixo analítico do artigo de Nunes da Silva confronta com refinamento crítico um dilema central da teoria empresarial contemporânea é possível compatibilizar o escopo final da empresa o lucro com o compromisso ético político da responsabilidade social A resposta não é simples nem deve sêlo O autor articula um raciocínio que tensiona os fundamentos econômicos da atividade empresarial desvelando a crescente e ainda assim incômoda simbiose entre performance financeira e legitimidade social A narrativa começa pela constatação empírica do fenômeno empresas brasileiras vêm desde a década de 1960 incorporando práticas socialmente responsáveis em suas estratégias Contudo o autor não se ilude tampouco pretende iludir o leitor sobre as motivações reais A RSE em seu estágio atual ainda está muitas vezes atrelada a um utilitarismo reputacional uma resposta tática às pressões do mercado e da opinião pública Não é altruísmo é estratégia Mas também não é necessariamente cinismo é talvez o primeiro passo de uma reconversão cultural ainda em curso Nesse ponto emerge o argumento de maior sofisticação a responsabilidade social não é antagônica ao lucro ela é cada vez mais condição de sua legitimidade A lógica mercantil pressionada por stakeholders consumidores conscientes e uma sociedade civil cada vez mais vigilante começa a operar sob novos parâmetros O capital se quiser manterse hegemônico precisa negociar com valores que antes ignorava justiça social sustentabilidade ambiental ética nas relações de trabalho A crítica do autor recai sobre o risco da instrumentalização da responsabilidade reduzida a tática de marketing ou ferramenta de contenção reputacional Nesse cenário ações sociais voltadas à motivação de empregados ou à imagem pública da marca acabam paradoxalmente reafirmando o modelo individualista que dizem superar É o discurso da responsabilidade esvaziado de conteúdo transformador ornamental conveniente e portanto inócuo Contudo o autor não assume um tom fatalista Ao contrário argumenta que a crescente exigência social por padrões éticos empresariais tem potencial disruptivo Com base em dados empíricos Duarte demonstra que consumidores em mercados desenvolvidos já penalizam empresas negligentes e recompensam aquelas que adotam práticas responsáveis Isso sugere um redesenho possível da racionalidade econômica onde reputação e responsabilidade passam a compor o núcleo duro da competitividade A virada teórica se dá então pela reinterpretação da empresa não como um feixe contratual voltado exclusivamente ao interesse dos sócios mas como instituição social dotada de função pública implícita Leitura institucionalista herdada da doutrina moderna e corroborada pela Constituição de 1988 fundamenta a ideia de que a empresa não apenas pode mas deve operar segundo critérios de solidariedade Afinal sua atuação mobiliza recursos comuns impacta comunidades inteiras e gera externalidades que extrapolam a lógica interna do negócio O autor percorre nesse ponto o arcabouço normativo que sustenta tal exigência A função social da empresa derivada dos princípios constitucionais da livre iniciativa da valorização do trabalho e da justiça social deixa de ser um ideal retórico para tornarse um vetor de legitimação jurídica Ainda que a responsabilidade social não esteja tipificada como obrigação legal stricto sensu ela é no plano axiológico do ordenamento uma diretriz de conduta esperada e cada vez mais exigível Exemplos normativos confirmam a teseos arts 7º 170 e 225 da CF88 a Lei das SAe mesmo as deduções fiscais previstas para ações filantrópicas configuram uma rede normativa de incentivo e em certa medida indução indireta Não se trata ainda de um regime de coerção plena mas de um conjunto de mecanismos para construir institucionalmente uma cultura de corresponsabilidade O autor insiste em um ponto nevrálgico a atuação empresarial com responsabilidade social não pode ser episódica nem cosmética Precisa ser estrutural incorporada ao modelo de negócios informada por valores substantivos orientada à transformação e não apenas à adaptação Isso exige uma mutação interna a passagem do ethos da maximização para o ethos da corresponsabilidade onde a função lucrativa é articulada e não mais oposta ao dever de justiça social O que está em jogo afinal não é a negação do lucro mas sua reconfiguração enquanto meio e não fim absoluto A responsabilidade social nesse cenário não é um luxo ético mas um imperativo estratégico normativo e político A empresa que ignora essa realidade por mais rentável que seja no curto prazo caminha para a obsolescência social A que compreende sua função ampliada por outro lado torna se agente legítimo do novo pacto civilizatório que se impõe à força por pressão ou por convicção A seção final do estudo opera uma inflexão decisiva desloca o foco da responsabilidade social empresarial do plano idealnormativo para o plano empírico da economia de mercado e com isso revela uma ironia sistêmica Não foi o Direito nem os princípios constitucionais que impuseram a responsabilidade social às empresas brasileiras Foi o próprio mercado em sua lógica de autopreservação reputacional e de exigência sistêmica por legitimidade quem passou a ditar os termos de uma conduta corporativa eticamente aceitável O capital enfim cobra ética ao capital Essa virada do voluntarismo para a compulsoriedade pragmática é evidenciada por dados objetivos A pesquisa da USP citada no estudo mostra que entre as principais companhias brasileiras há menções expressas a direitos humanos meio ambiente ética e políticas anticorrupção em contratos relatórios e políticas internas Casos como os da Magazine Luiza Natura e TIM exemplificam esse novo ethos corporativo embora ainda precário parcialmente performático mas sintomático Cláusulas de ruptura contratual por violação de direitos humanos códigos internos de conduta ética critérios ESG incorporados à governança Não são mais enfeites discursivos São cada vez mais prérequisitos operacionais O autor avança o mercado financeiro também assumiu papel indutor Fundos de investimento priorizam empresas com práticas sustentáveis agências reguladoras como a CVM e o Conselho Monetário Nacional editam normas específicas e índices como o SPB3 ESG reconfiguram a métrica de risco reputacional A responsabilidade social assim convertese em critério de viabilidade econômica transformandose de ideal ético em exigência estrutural de competitividade Surge então uma questão provocadora se o mercado já impõe condutas minimamente responsáveis seria o caso de o Direito avançar sobre a seara promocional da RSE criando sanções negativas para empresas que se omitam A resposta do autor deliberadamente controversa é negativa Em defesa da autonomia privada sustenta que a promoção de direitos fundamentais não pode ser objeto de obrigação jurídica coercitiva sob pena de desfigurar o próprio regime do Direito Privado O gesto ético empresarial para ser legítimo deve partir de uma consciência endógena ainda que catalisada por pressões externas e não de um mandamento estatal A distinção entre sanção por violação que já existe e é constitucionalmente legítima e sanção por omissão promocional ainda inexistente e juridicamente sensível é o eixo do argumento O autor reconhece há normas punitivas claras em casos de trabalho escravo de danos ambientais ou de violação à proteção de dados Contudo quando se trata da ausência de atuação positiva isto é de não promover ativamente os direitos a coerção estatal encontra limite na liberdade empresarial Nesse ponto entra em cena a ideia de um modelo fraco da eficácia indireta dos direitos fundamentais nas relações privadas defendido por Otávio Luiz Rodrigues Jr a RSE como política promocional deve ser incentivada mas não imposta O estudo por fim defende que o mecanismo de coerção eficaz já está em operação e não é jurídico mas econômico Tratase de uma sanção reputacional de uma exclusão progressiva do mercado para empresas que insistam em práticas predatórias excludentes ou antiéticas O capitalismo sob pressão interna e externa está redesenhando seus próprios contornos não por benevolência mas por sobrevivência estratégica E isso paradoxalmente pode ser mais eficiente que qualquer norma estatal autor traça ao longo do texto um arco argumentativo sólido inicia com uma contextualização histórica da RSE no Brasil ainda marcada por uma filantropia episódica evolui para uma análise das suas contradições internas entre motivação ética e interesse reputacional e culmina com um diagnóstico preciso do papel do mercado como instância disciplinadora A função social da empresa antes confinada ao discurso jurídico agora emerge como condição operacional imposta pelo próprio sistema Não obstante esse avanço o autor adverte o cenário ainda é desigual Enquanto grandes corporações integram progressivamente a lógica da RSE em suas estruturas pequenas e médias empresas permanecem reféns do paradigma contratualista insensíveis às demandas coletivas e refratárias à transformação O Direito nesse contexto tem papel ambivalente sanciona abusos estimula boas práticas mas deve evitar o risco de sufocar a liberdade negocial com um intervencionismo mal calibrado O que se desenha portanto é um novo pacto tácito entre empresa e sociedade Um pacto que não se impõe exclusivamente por normas mas que tampouco sobrevive sem elas Um pacto que articula incentivos regula reputações impõe limites e cobra coerência Um pacto enfim onde a responsabilidade social deixa de ser exceção ética para tornarse critério de legitimidade econômica A última seção do estudo tensiona com precisão cirúrgica a fronteira entre a responsabilidade social empresarial como opção estratégica e sua possível transfiguração em dever jurídico E faz isso partindo de uma constatação incômoda e por isso mesmo fecunda não é o Estado quem lidera o processo de incorporação da responsabilidade social pelas empresas É o mercado Mais que isso é a lógica de sobrevivência reputacional é o risco de exclusão financeira é o cerco dos stakeholders hiperconscientes e hiperconectados A responsabilidade social deixou de ser um diferencial e passou a ser um mínimo operacional O lucro nesse novo paradigma exige uma pedagogia da ética E as empresas ao menos as que pretendem manterse solventes política econômica e simbolicamente são forçadas a responder É essa a virada do voluntarismo filantrópico à compulsoriedade estrutural Porém o estudo não se satisfaz com a euforia tecnocrática O autor avança sobre o limite do Direito podese compelir juridicamente empresas a promoverem direitos fundamentais sob pena de sanções negativas A resposta sustentada com base na doutrina e no princípio da autonomia privada é não O direito brasileiro já prevê punições para violações diretas trabalho escravo dano ambiental discriminação mas não há nem deveria haver obrigação legal de adoção de condutas promocionais A ética empresarial dizse não pode ser decretada Esse posicionamento repousa sobre um equilíbrio delicado por um lado reconhecese a eficácia coercitiva do mercado mais ágil mais sensível mais pragmática que o Estado por outro preservase a liberdade empresarial como núcleo inviolável do Direito Privado A adesão à responsabilidade social quando forçada pela legislação pode degenerar em cinismo normativo Quando estimulada pela lógica econômica porém tende a ser mais duradoura menos formal e mais estratégica O estudo encerrase com uma constatação dupla o avanço da responsabilidade social nas grandes empresas brasileiras é inegável mas permanece desigual frágil condicionado por pressões externas mais do que por convicção interna Pequenas e médias empresas ainda resistem presas ao paradigma da maximização bruta impermeáveis às demandas difusas da sociedade É necessário e inevitável que a cultura empresarial mude Mas que mude por dentro Que se converta por cálculo ou por convicção à ética da corresponsabilidade O texto de Marcos Antonio Nunes da Silva articula com rigor acadêmico e acuidade crítica uma leitura contemporânea do papel da empresa na sociedade brasileira Mais do que um apelo à moralidade corporativa sua análise revela um processo em curso o deslocamento da responsabilidade social do plano da retórica para o da estrutura E se esse processo é incompleto desigual e por vezes ambíguo ele é também irreversível Não se trata aqui de exigir heroísmo das empresas Tratase de reconhecer que no século XXI não há mais espaço para a empresa que ignora seu entorno O capital precisa de legitimidade E legitimidade hoje passa pela sustentabilidade social A responsabilidade social enquanto prática não apenas discurso tornouse fator de competitividade E isso muda tudo Ainda assim o estudo insiste em um ponto fundamental o Direito deve resistir à tentação de colonizar esse espaço A sanção negativa por omissão em matéria promocional seria além de ineficaz ilegítima A coerção precisa vir do mercado dos investidores dos consumidores e em última instância da própria consciência empresarial A responsabilidade social eficaz é aquela que nasce do reconhecimento de que lucro e ética não se excluem Convivem por vezes tensionam mas podem sim convergir O desafio está posto compatibilizar a racionalidade econômica com a exigência ética Não como concessão mas como estratégia Não como ornamento mas como fundamento O artigo conduz uma análise crítica e historicamente situada da responsabilidade social empresarial no Brasil abordando a tensão estrutural e ainda mal resolvida entre interesse econômico e dever social O ponto de partida do autor é uma provocação como conciliar no atual modelo de empresa brasileira o imperativo do lucro com o imperativo éticosocial A pergunta não se pretende retórica O estudo responde com rigor técnico e método indutivo desdobrandose em três frentes o desenvolvimento histórico no país sua relação com a lucratividade e a efetividade de instrumentos coercitivos para a indução de condutas responsáveis No plano conceitual adotase uma definição funcionalista da responsabilidade social tratase de um agir empresarial ético juridicamente conforme e ambientalmente consciente com impacto minimizador sobre os danos sistêmicos da atividade econômica O autor destaca a crescente adesão de grandes empresas a esse modelo embora a penetração da responsabilidade entre médias e pequenas ainda se mostre tímida resquício do O artigo conduz uma análise crítica e historicamente situada da responsabilidade social empresarial no Brasil abordando a tensão estrutural e aindamal resolvida entre interesse econômico e dever socialO ponto de partida do autor é uma provocação como conciliar no atual modelo de empresa brasileira o imperativo do lucro com o imperativo éticosocialA pergunta não se pretende retóricaO estudo responde com rigor técnico e método indutivo desdobrandose em três frentes o desenvolvimento histórico no país sua relação com a lucratividade e a efetividade de instrumentos coercitivos para a indução de condutas responsáveisNo plano conceitual adotase uma definição funcionalista da responsabilidade social tratase de um agir empresarial ético juridicamente conforme e ambientalmente consciente com impacto minimizador sobre os danos sistêmicos da atividade econômicaO autor destaca a crescente adesão de grandes empresas a O artigo conduz uma análise crítica e historicamente situada da responsabilidade social empresarial no Brasil abordando a tensão estrutural e ainda mal resolvida entre interesse econômico e dever social O ponto de partida do autor é uma provocação como conciliar no atual modelo de empresa brasileira o imperativo do lucro com o imperativo éticosocial A pergunta não se pretende retórica O estudo responde com rigor técnico e método indutivo desdobrandose em três frentes o desenvolvimento histórico no país sua relação com a lucratividade e a efetividade de instrumentos coercitivos para a indução de condutas responsáveis No plano conceitual adotase uma definição funcionalista da responsabilidade social tratase de um agir empresarial ético juridicamente conforme e ambientalmente consciente com impacto minimizador sobre os danos sistêmicos da atividade econômica O autor destaca a crescente adesão de grandes empresas a esse modelo embora a penetração da responsabilidade entre médias e pequenas ainda se mostre tímida resquício do passado A adoção de responsabilidades sociais empresariais no Brasil é um fenômeno relativamente recente e seu estudo contribui para a compreensão das dinâmicas sociais e econômicas do país bem como dos desafios e oportunidades relacionados ao crescimento sustentável e à justiça social em contextos empresariais
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Organização Comitê Científico Double Blind Review pelo SEEROJS Recebido em 16072024 Aprovado em 24082024 Revista Brasileira de Direito Empresarial Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 46 RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS ENTERPRISES SOCIAL RESPONSABILTIYE Marcos Antonio Nunes da Silva RESUMO O estudo tem como objetivo analisar os aspectos gerais da responsabilidade social no setor empresarial brasileiro Buscase investigar a relação entre as práticas de responsabilidade social corporativa e a lucratividade nas empresas como também a coercibilidade das normas e ações voltadas para a responsabilidade social A problemática reside na compreensão dos desafios enfrentados pelas empresas brasileiras na incorporação efetiva de práticas de responsabilidade social Questionase como será possível uma reconciliação com o lucro e o papel das medidas coercitivas Com uso do método indutivo o estudo alcançou resultados que oferecem uma análise detalhada da evolução histórica da responsabilidade social no Brasil avaliando criticamente sua relação com a lucratividade e a eficácia de medidas coercitivas para promover práticas responsáveis Como principal contribuição o estudo constatou uma evolução da responsabilidade social empresarial no Brasil A integração de práticas socialmente responsáveis nas estratégias empresariais compatibiliza a busca pelo lucro e as expectativas sociais e ambientais O estudo conclui pela necessidade de uma regulamentação mais robusta da temática equilibrada e estratégica para uma responsabilidade social que harmonize objetivos econômicos compromissos sociais e ambientais para um desenvolvimento sustentável e inclusivo no setor empresarial brasileiro Palavraschave Responsabilidade Social Empresas Direito Empresarial Autonomia Privada Atividade empresarial ABSTRACT The study aims to analyze the general aspects of social responsibility in the Brazilian business sector The aim is to investigate the relationship between corporate social responsibility practices and profitability in companies as well as the coercion of norms and actions aimed at social responsibility The problem lies in understanding the challenges faced by Brazilian companies in effectively incorporating social responsibility practices The question arises as to how reconciliation with profit and the role of coercive measures will be possible Using the inductive method the study achieved results that offer a detailed analysis of the historical evolution of social responsibility in Brazil critically evaluating its relationship with profitability and the effectiveness of coercive measures to promote responsible practices As its main contribution the study found an evolution of corporate social responsibility in Brazil The integration of socially responsible practices into business strategies makes the search for profit and social and environmental expectations compatible The study concludes that there is a need for more robust balanced and strategic regulation of the issue for social responsibility that harmonizes economic objectives social and Doutorando e Mestre em Direito Empresarial e Cidadania UNICURITIBA Mestre em Direito Empresarial Aplicado FAMEC Master Trainer em Programação Neurolinguística INL PósGraduado em Direito Civil e Processual Civil PUCPR Advogado Email marcosmarcosnunesadvbr Lattes httplattescnpqbr36991 79235155669 ORCID httpsorcidorg0000000163425987 RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 47 environmental commitments for sustainable and inclusive development in the Brazilian business sector Keywords Social Responsibility Companies Commercial Law Private Autonomy Business activity INTRODUÇÃO Segundo Bonnomi 2021 p 296 1 a responsabilidade social da empresa compreende um atuar de forma ética em conformidade com suas obrigações legais e de modo a minimizar impactos negativos ao meio ambiente à sociedade e à saúde humana decorrentes de suas atividades O avanço da responsabilidade social nas empresas brasileira destaca o crescente engajamento com o tema evidenciando uma tendência de adesão contínua aos seus princípios e a adoção de uma perspectiva solidária especialmente em empresas de grande porte Apesar do progresso observado o debate sobre responsabilidade corporativa ainda é incipiente com muitas empresas particularmente de médio e pequeno porte permanecendo distantes dos preceitos da responsabilidade corporativa e ancoradas no paradigma contratualista do direito empresarial Contudo o aumento das discussões e pesquisas sobre o tema sinaliza um futuro promissor com uma conscientização crescente entre administradores sócios e acionistas sobre a importância das práticas de responsabilidade social para o sucesso empresarial O atual artigo tem como objetivo analisar os aspectos gerais da responsabilidade social no setor empresarial brasileiro destacando seu desenvolvimento histórico a interação com a busca por lucro e a efetividade das medidas coercitivas para estimular a adoção de práticas socialmente responsáveis Como objetivos específicos buscase mapear a evolução histórica da responsabilidade social no Brasil identificando marcos históricos que influenciaram sua trajetória no cenário nacional examinar a relação entre as práticas de responsabilidade social corporativa e a lucratividade nas empresas além de investigar a coercibilidade das normas e ações voltadas para a responsabilidade social 1 Para os fins deste artigo o termo empresa deve ser interpretado enquanto tradução de firm sendo essa definida como estrutura ou organização da atividade empresária Quando se fizer referência ao termo empresa na qualidade de atividade consoante estabelecido no art 966 do Código Civil utilizarseá a expressão atividade empresarial Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 48 A problemática central gira em torno da compreensão dos desafios enfrentados pelas empresas brasileiras na incorporação efetiva de práticas de responsabilidade social questionando como estas podem ser reconciliadas com a busca contínua por lucro e qual o papel das medidas coercitivas na garantia de sua adoção Para tanto fará o estudo fará uso do método dedutivo associado aos precedentes de pesquisa bibliográfica e documental Inicialmente será apresentado o percalço da construção da concepção da responsabilidade social no cenário pátrio destacandose os marcos históricos sobre a matéria Ato contínuo examinarseá a relação entre a prática de ações vinculadas à responsabilidade corporativa e a busca pelo resultado econômico positivo e a remuneração pelo capital investido pelos sócios e acionistas leiase lucro atestandose a necessidade de compatibilização dessas perspectivas para o bom desenvolvimento da atividade empresarial Encaminhando para uma análise sob o prisma prático do tema em seguida se dará enfoque às demandas contemporâneas do mercado e sua coercibilidade em face das sociedades para a realização de medidas de responsabilidade social momento no qual será colocado em debate a necessidade de o Direito impor normas de sanção negativa para obrigar que as empresas adotem condutas promocionais de direitos fundamentais relacionadas à doutrina da responsabilidade social Ao final serão apresentadas as conclusões e o resultado dos dados analisados com a síntese das perspectivas e tendências da responsabilidade social corporativa 2 NOTÍCIA HISTÓRICA DA CONSTRUÇÃO DA CONCEPÇÃO DE RESPONSABILIDADE SOCIAL NO BRASIL Contemporaneamente à concepção da missão dos negócios sob o viés estritamente econômico correspondente à busca desenfreada pela maximização dos lucros adicionaramse novas questões de ordem social Nesse novo paradigma do capitalismo denominado capitalismo stakeholder ou ainda capitalismo consciente as empresas sofrem pressões de vários setores da sociedade civil para que se tornem mais comprometidas com práticas em benefícios dos interesses da comunidade Em outras palavras a sociedade civil passa a ser considerada um novo agente da operação econômica bem como as empresas são alçadas ao posto de verdadeiras integrantes da estrutura RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 49 econômicosocial cuja atuação deve ter em mente também a proteção e promoção dos direitos fundamentais Nos Estados Unidos e na Europa a responsabilidade social das empresas é objeto de discussão mais intensa desde meados do século XX mas as primeiras menções à temática surgiram já no início do século passado pelas obras de Charles Eliot 1906 Arthur Hakley 1907 e John Clarck 1916 Mais especificamente a expressão responsabilidade social foi escrita pela primeira vez em um manifesto de industriais ingleses o qual mencionava o compromisso dos empresários em manter um equilíbrio entre os interesses dos consumidores dos funcionários e dos acionistas Contudo por serem consideradas de cunho socialista não houve ampla adesão e difusão da temática Saltiél 2016 Assim somente na década de 1950 iniciouse o desenvolvimento teórico sobre o tema da responsabilidade social Em um dos primeiros livros escritos sobre o tema Social Responsabilities of the Businessman de Howard Bowen 1953 defendeuse a ideia de que as empresas deveriam entender seu impacto social adotandose uma postura ativa diante dos recursos à sua disposição a fim de que fossem utilizados para fins sociais e não apenas para os interesses privados de maximização dos lucros Saltiél 2016 No Brasil por sua vez a responsabilidade social passou a ocupar a pauta dos empresários com mais visibilidade nos anos 1990 a partir do movimento de redemocratização e abertura econômica do país com a nova ordem instaurada pela Constituição Federal de 1988 Reis 2007 O processo de implementação da responsabilidade social nas empresas brasileiras é portanto mais recente e encontra desafios no contexto socioeconômico do país Enquanto os primórdios das discussões sobre responsabilidade social empresarial nos Estados Unidos e na Europa tratavam de problemas relativos ao meio ambiente e aos direitos dos consumidores a realidade brasileira suscita questões relativas às necessidades básicas da população fome desemprego exclusão social etc conduzindo as discussões acerca da responsabilidade social das empresas a outro patamar Não obstante a distinção apontada mesmo nos países pioneiros no movimento da responsabilidade social inicialmente os dirigentes empresariais se mostraram reticentes e contrários a essa postura exigida das empresas em relação às demandas sociais A predominância do critério econômico fez com que a responsabilidade social fosse vista como um mal necessário Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 50 a menos que fosse assegurado um retorno lucrativo Além do que acreditavam que só pelo fato de proverem empregos para a comunidade já praticariam ações sociais Guimarães 1984 Delineouse três diferentes posicionamentos frente às demandas de responsabilidade social i uma posição assumiu uma postura mais tradicional de que a única função da empresa é a maximização dos lucros de modo que o investimento por parte da empresa na área social é uma forma de lesar os acionistas ao diminuir seus dividendos ii uma posição diametralmente oposta à anterior defendeu que o benefício social de uma empresa deve estar acima do benefício econômico abolindose a propriedade privada e compartilhandose os benefícios econômicos e iii uma posição intermediária partiu da ideia de que o lucro é legítimo e justo mas também é exigível da empresa uma postura social Guimarães 1984 sendo essa última a que ganhou mais adeptos ao longo do tempo Os processos de globalização e reestruturação do setor produtivo pela introdução de novas tecnologias vêm transformando todas as esferas da sociedade capitalista As consequências das profundas transformações no contexto socioeconômico mundial implicam aumento dos problemas de ordem comunitária Nesse contexto em que não é mais possível permanecer alheio a todas essas mudanças a responsabilidade social das empresas ganhou notoriedade e passou a integrar os debates públicos dos problemas sociais No Brasil o histórico da responsabilidade social tem como marco inicial o ano de 1977 quando houve a fundação e consolidação da Associação dos Dirigentes Cristãos de Empresas ADCE que reunia grupos comprometidos com a transformação de sua empresa em um ambiente de melhoria pessoal de modo a contribuir para uma sociedade solidária justa livre e humana Reis 2007 A ADCE foi a primeira a lançar o debate sobre o Balanço Social embora sua publicação só tenha iniciado em 1984 com a empresa Nitrofértil seguida pelo balanço do Banco do Estado de São Paulo Banespa em 1992 Reis 2007 Os balanços sociais são relatórios elaborados pelas empresas indicando quais foram as suas contribuições sociais em determinado período A ideia surgiu nos Estados Unidos na década de 1960 porque várias empresas estavam ligadas à Guerra do Vietnã e dessa forma podiam ser identificadas pela sociedade e sofrer boicotes Em 1977 a França instituiu a obrigatoriedade de publicação de balanços sociais pelas empresas de maior porte Filho 2003 No Brasil a partir de 1993 mais empresas passaram a publicar o Balanço Social mas a sua visibilidade nacional somente se deu em 1997 por meio de parceria do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas Ibase que lançou o Selo do Balanço Social Atualmente o RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 51 Balanço Social é utilizado por muitas empresas em vários estados do Brasil e tem caráter obrigatório em São Paulo para empresas privadas com mais de cem funcionários Reis 2007 Em 1982 a Câmara Americana de Comércio de São Paulo Amcham instituiu o Prêmio ECOEmpresa e Comunidade que foi pioneiro no reconhecimento de empresas que adotam práticas responsáveis no âmbito do desenvolvimento empresarial sustentável no Brasil Anos depois em 1995 um grupo de empresários em parceria com a Amcham criou um subcomitê de filantropia que resultou no Grupo de Instituições Fundações e Empresas GIFE com o objetivo de auxiliar tecnicamente as empresas interessadas em investimentos sociais por meio da difusão de conceitos e práticas de gestão que otimizassem melhor os recursos aplicados Reis 2007 Devido à articulação do GIFE com outros grupos de apoio as doações pelas empresas hoje são passíveis de deduções de incentivos fiscais O Governo Federal autoriza as empresas tributadas em regime de lucro real a deduzirem 2 do lucro operacional bruto em doações desde que destinadas a entidades sem fins lucrativos pela Lei das OSCIPS nº 97901999 ou a entidades declaradas como de utilidade pública pela Lei nº 351991 Reis 2007 Em 1990 foi instituída a Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente entidade de utilidade pública federal cuja missão é promover a defesa dos direitos e o exercício da cidadania das crianças e dos adolescentes com iniciativas que buscam engajar empresas em uma atuação social em especial na prevenção e na erradicação do trabalho infantil Outra iniciativa que merece destaque é a criação em 1994 do Instituto Ayrton Senna uma organização não governamental de origem empresarial cujo objetivo é oferecer condições de desenvolvimento humano a crianças e jovens brasileiras em parceria com o Poder Público e o setor privado Reis 2007 Todas essas iniciativas do segmento empresarial brasileiro de mobilização no sentido de desenvolver um comportamento socialmente responsável desembocaram em 1998 na criação do Instituto Ethos de Responsabilidade Social uma associação de empresas interessadas em desenvolver suas atividades de forma socialmente responsável por meio da informação conferências debates e encontros assistência técnica e articulação A missão do Ethos propõese a disseminar a prática da responsabilidade social empresarial ajudando as instituições a compreender e incorporar de forma progressiva o conceito do comportamento empresarial socialmente responsável implementar políticas e práticas que atendam a elevados critérios éticos contribuindo para o alcance do sucesso econômico sustentável em longo prazo assumir suas responsabilidades com todos aqueles que são atingidos por suas atividades Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 52 demonstrar a seus acionistas a relevância de um comportamento socialmente responsável para o retorno em longo prazo sobre seus investimentos identificar formas inovadoras e eficazes de atuar em parceria com as comunidades na construção do bemestar comum prosperar contribuindo para um desenvolvimento social econômica e ambientalmente sustentável2 A partir dessa breve incursão sobre o histórico da responsabilidade social das empresas no Brasil notase que sua evolução pode ser dividida em três estágios que abrangem diferentes enfoques e públicosalvo primeiro estágio exercício da gestão social interna segundo estágio exercício da gestão social externa terceiro estágio exercício da gestão social cidadã Reis 2007 O exercício da gestão social interna primeiro estágio direcionase a questões regulares da empresa referentes aos seus funcionários e a seus familiares como condições de saúde e segurança o oferecimento de benefícios a remuneração e a qualidade no ambiente de trabalho Reis 2007 No âmbito da gestão social externa segundo estágio a preocupação da empresa volta se à comunidade em que está inserida bem como seus clientes fornecedores e entidades públicas Nesse âmbito a filantropia empresarial é prática adotada com frequência no cenário da responsabilidade social no Brasil por meio de investimentos em programas sociais e doações de recursos financeiros Reis 2007 A responsabilidade social das empresas brasileiras ainda se encontra num segundo estágio focado predominantemente em ações de doação filantropia e assistência social o que denota seu caráter pessoal e circunstancial o qual embora minimize a situação de desigualdade social no país acaba contribuindo em alguma medida para a manutenção da situação social vigente Pesquisas revelam que de modo geral o que motiva a ação social das empresas é o caráter humanitário dos empresários brasileiros que sensibilizados com a situação social do país realizam doações financeiras comprometendo a avaliação o aperfeiçoamento e a continuidade das práticas de responsabilidade social pelas empresas nacionais Reis 2007 Em uma gestão social cidadã terceiro estágio a responsabilidade social das empresas passa a ser concebida como um modelo de comportamento ético e consciente de gestão que resgata valores e práticas em respeito às partes envolvidas no negócio mesmo indiretamente Assim a responsabilidade social incorporada às empresas como modelo de gestão dos negócios não se reduz a uma ferramenta de marketing ou a ações pontuais de filantropia Resulta em uma mudança 2 Disponível em httpswwwethosorgbrconteudosobreoinstitutomissao Acesso em 4 set 2021 RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 53 cultural pela qual a empresa se compreende responsável pelo desenvolvimento de uma sociedade mais igualitária com maiores oportunidades de acesso da população a produtos e serviços Em suma a gestão social cidadã busca não só cumprir com sua função econômica mas contribuir para a melhoria da qualidade de vida da sociedade como um todo À vista do exposto constatase que a construção histórica da responsabilidade social nas empresas brasileiras ainda é recente e tem muito a avançar rumo a uma mudança cultural na forma de conduzir os negócios Como se nota no Brasil o movimento de responsabilidade social está em desenvolvimento rumo ao terceiro estágio de gestão social cidadã Inobstante isso acreditase que essa postura predominantemente filantrópica no campo da responsabilidade social empresarial tende a mudar com o crescente aumento da discussão sobre o tema nos meios empresariais e acadêmicos no país Para tanto é necessário que as empresas brasileiras incorporem a responsabilidade social na gestão de seus negócios adotandose uma cultura de corresponsabilidade no enfrentamento das mazelas que impedem o desenvolvimento social 3 A COMPATIBILIZAÇÃO DA RESPONSABILIDADE SOCIAL E A REALIZAÇÃO DO ESCOPO FIM DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA Conforme exposto desde a década de 1960 várias empresas brasileiras passaram a adotar uma postura ativa diante das questões sociais Dessa forma a responsabilidade social é gradativamente incorporada no âmbito das empresas como nova forma de gestão que integra preocupações sociais nas suas decisões e ações As empresas passaram a ser vistas como agentes sociais que não devem só visar a maximização dos seus lucros e atender os interesses de seus acionistas mas contribuir com o desenvolvimento social do país3 Entendese que o fundamento dessa assunção de responsabilidade está no poder econômico das empresas que não pode ser exercido a fim de atender exclusivamente aos interesses do titular deste poder mas deve atuar em favor da comunidade em que se situa Por seu turno como ensinam os professores Francisco Cardozo Oliveira e Luiz Eduardo Gunther 2021 p 50 em termos de fundamentos normativos de responsabilidade social das empresas é exatamente a ação 3 Tal perspectiva é verificável especialmente pela filiação da Lei das Sociedades Anônimas à teoria institucionalista da empresa a qual enxerga a firm enquanto importante instituição social dotada de uma função social a ser desempenhada por ela mesma em contraposição à teoria contratual e à visão estritamente econômica da empresa na qual seus interesses decorrerem da mera soma da vontade dos sócios e da busca pela maximização dos lucros Gouvêa Gärner Guerra 2021 Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 54 solidária necessária ao exercício da liberdade que confere sentido à ação desencadeada pelas empresas no mercado A despeito desse fundamento a responsabilidade social gera questionamentos sobre os interesses efetivamente envolvidos principalmente quando suas ações estão voltadas à gestão interna Nesse tocante indagase se o objetivo é aumentar a motivação e o comprometimento dos funcionários apenas para o fim de incrementar a produtividade o que a torna um fim em si mesma ou se visa contemplar objetivos sociais mais amplos de mudança de cultura Do mesmo modo no âmbito externo observase que o processo de globalização da economia faz com que as empresas se preocupem com a sustentabilidade de seu negócio e com sua imagem pública do que dessume que a ideia de investir em projetos sociais pode estar ligado à própria lucratividade da empresa com base em sua reputação no mercado A realidade demonstra ser cada vez mais necessária a existência de uma boa reputação para a empresa sob pena da perda de consumidores acionistas fornecedores e até mesmo do apoio governamental Nessa ótica a responsabilidade social corporativa tornouse preocupação das empresas na medida que estas passaram a ser avaliadas não somente por seu desempenho financeiro mas também pelo desempenho social Reis 2007 Contudo se os interesses comerciais relacionados à estratégia empresarial como a melhoria da imagem da empresa e o aumento da produtividade do trabalho são os que movem as empresas a adotarem práticas de responsabilidade social em um momento inicial a pressão por parte da sociedade civil por ações efetivas do empresariado no sentido de contribuir no processo de desenvolvimento do país tem despertado maior conscientização das empresas sobre seu papel social Assim a sociedade demanda a adoção de novos padrões de relacionamento entre a empresa e a coletividade na medida que surge uma maior conscientização em torno de temas como a exploração do trabalho a questão ambiental a origem e destinação dos produtos a discriminação racial e social etc Pesquisas têm demonstrado que nos Estados Unidos e na Europa 50 dos consumidores comprariam mais produtos de empresas socialmente responsáveis e 70 não os comprariam mesmo com descontos se fabricados por empresas não preocupadas com as questões éticas Nessa linha a atuação consciente das empresas no caminho da responsabilidade social tem se demonstrado um importante fator para agregar valor às empresas com o que ganham o respeito de consumidores e de seus colaboradores permitindo a perpetuação de seus negócios Duarte 2004 RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 55 É inegável que uma atuação empresarial alinhada aos ideais de responsabilidade social pode atrair grupos de interesse em termos de investimento por exemplo As decisões econômicas mais racionais levam em conta uma perspectiva de responsabilidade social Nesse sentido a legitimidade da economia de mercado está sujeita à satisfação de normas e valores que não se destinam a seguir interesses egocêntricos mas devem permitir articular as orientações individuais de tal modo que o interesse de um se converta no interesse do outro Portanto a responsabilidade social da empresa não é algo incompatível com os objetivos mais essenciais da atividade mercantil haja vista que a ação da empresa no mercado adquire racionalidade na medida em que informada pela responsabilidade social Oliveira Gunther 2021 Nesses termos as empresas devem assumir o compromisso de que suas ações têm consequências na sociedade e na medida em que têm responsabilidade pelos problemas sociais também são responsáveis pelo seu enfrentamento Além disso como a atividade empresarial se vale de um grande volume de recursos comuns esperase em contrapartida que elas também revertam a utilização desses recursos em favor dessa sociedade Guimarães 1984 O modelo de responsabilidade social na empresa deve pretender aliar o desenvolvimento econômico ao desenvolvimento de qualidade de vida dos indivíduos Nessa perspectiva a reflexão sobre as consequências da atividade empresarial na sociedade significa compreender o seu comprometimento tanto em relação a seus funcionários quanto ao que se percebe no exterior a quem se destinam e de que forma os cidadãos são afetados Desse modo a adesão aos princípios da responsabilidade social empresarial não pode ser uma iniciativa de fachada imbuída pela expectativa egoísta de gerar impactos na imagem da empresa Darcanchy 2008 mas o resultado de uma conscientização profunda e efetiva por parte do empresariado do seu compromisso social no enfrentamento dos problemas sociais do país que abarca todo o conjunto de políticas e práticas empresariais Assim o ideal seria uma mudança estrutural no setor privado que priorizasse valores e práticas sociais em sintonia com os interesses econômicos O objetivo da empresa é acima de tudo o lucro mas uma empresa também é uma organização social formada por grupos de pessoas que buscam a satisfação de suas necessidades Assim compatibilizar o interesse privado ao interesse comum é um desafio a ser enfrentado É certo que não há consenso em até que ponto os interesses econômicos das empresas se compatibilizam com os objetivos da sociedade assim como não estão claras quais decisões as empresas podem e devem tomar para que realmente favoreçam fins sociais Reis 2007 Nesse Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 56 tocante cabe ao direito regulamentar as condições para que as empresas assumam sua responsabilidade social e efetivamente promovam ações que se revertam em contribuições no âmbito social Darcanchy 2008 Podese dizer que atualmente a responsabilidade social da empresa não é obrigação disciplinada expressamente pelo ordenamento jurídico brasileiro assumindo contornos de mera faculdade sem qualquer coercibilidade A Constituição Federal de 1988 atenta às mudanças sociais experimentadas nas relações da empresa com a sociedade oferece um primeiro olhar sobre a responsabilidade social no Brasil Nos incisos do art 7º da CF estão estipulados os direitos fundamentais dos trabalhadores brasileiros o que surge como um exercício de responsabilidade social para os empresários que devem observálos em sua gestão interna A Constituição também dedicou o Capítulo VI do Título VIII que trata da Ordem Social exclusivamente para tratar das questões ambientais colocando a preservação e a defesa do meio ambiente como um dever da coletividade no que ficam implícitas as instituições as entidades da sociedade civil e a empresa Portanto como uma das manifestações da responsabilidade social as empresas devem implementar programas de preservação ambiental com a utilização consciente dos recursos naturais Além disso o art 170 da CF estabelece que a Ordem Econômica terá como fundamento a valorização do trabalho humano e a livre iniciativa com o intuito de assegurar à sociedade existência digna de acordo com os ditames da justiça social O mesmo dispositivo determina como princípios da ordem econômica a soberania nacional a propriedade privada a função social da propriedade a livre concorrência a defesa do consumidor a redução das desigualdades regionais e sociais a busca do pleno emprego e o tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte Ainda existem outros previstos no texto constitucional que fazem menção ao princípio da livre iniciativa art 1º IV ao princípio do desenvolvimento social art 3º II ao princípio da erradicação da pobreza e da marginalização art 3º III aos quais as empresas também devem se submeter em atenção à responsabilidade social Dentre os princípios mencionados um dos mais importantes relacionados à responsabilidade social da empresa é a sua função social que constitui o poderdever de os administradores harmonizarem as atividades empresárias segundo o interesse da sociedade mediante o cumprimento de determinados deveres Filho 2003 Este princípio inferido tanto do princípio da função social do contrato como da função social da propriedade Buzzi Oliveira RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 57 2016 preconiza que a propriedade dos bens de produção deve cumprir a função social sem concentrar os interesses juridicamente protegidos na esfera de titularidade dos empresários Oliveira Veronese 2016 Mas os deveres afetos à responsabilidade social não se esgotam na Constituição No âmbito infraconstitucional o 4º do art 154 da Lei nº 64041976 Lei das Sociedades por Ações dispõe que o conselho de administração ou a diretoria podem autorizar a prática de atos gratuitos razoáveis em benefício dos empregados ou da comunidade de que participe a empresa tendo em vista suas responsabilidades sociais Inclusive esses gastos podem ser deduzidos do montante a ser pago a título de imposto de renda Esse artigo também estipula que o administrador deve exercer suas atribuições de acordo com as exigências da função social da empresa Oliveira Gunther 2021 Não se ignora que ante todos esses princípios e normas a responsabilidade social da empresa parece entrar em conflito com os objetivos que se lhe impõe o paradigma tradicional da empresa voltado exclusivamente à obtenção de lucro Por isso ainda há dificuldade em se estabelecer até que ponto a lei pode exigir da empresa a prática de ações visando os interesses da sociedade Não obstante a atuação social da empresa há de ser concebida como uma forma de propiciar melhores condições pela via da atividade produtiva que vai além da geração de empregos produção de bens e serviços ou pagamento de impostos Deve se estabelecer uma relação de harmonia e complementariedade entre os ideais de maximização do lucro e as obrigações decorrentes da adoção da responsabilidade social na atividade empresarial 4 A RESPONSABILIDADE SOCIAL DA EMPRESA COMO UMA DEMANDA DO MERCADO E SUA TUTELA PELO DIREITO No ponto anterior buscouse evidenciar que não existe como se poderia pressupor a uma primeira vista uma necessária contraposição entre o adimplemento dos deveres sociais pela empresa e a busca pelo lucro não obstante não seja possível delimitar até que ponto essas duas vertentes são convergentes Entretanto contemporaneamente é inegável que o resultado econômico positivo da empresa não raro perpassa por um estrito cumprimento de sua responsabilidade social Poucos temas dentro do âmbito da governança corporativa e do direito empresarial sofreram uma reviravolta tão radical como a necessidade de abordagem da proteção e promoção Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 58 dos direitos humanos e das garantias fundamentais por parte das empresas Gouvêa Gärner Guerra 2019 Tal fato se deve especialmente aos diversos impulsos do próprio mercado que impõem às empresas o dever de adotarem medidas que visem tutelar direitos de ordem social fazendo com que a prática de ações de responsabilidade social assuma contornos de compulsoriedade Com efeito há uma exigência por parte da sociedade consumidora e dos investidores como um todo para que as empresas adotem práticas sustentáveis do ponto de vista social trabalhista e ambiental bem como se comprometam do ponto de vista ético e comercial Nascimento 2022 sob pena de não receberem os aportes financeiros necessários ao desenvolvimento das atividades empresariais Essa virada de paradigma por sua vez tem gerado impactos sensíveis nas políticas internas e externas das sociedades empresárias brasileiras gerando reformas na condução dos negócios Nesse sentido em pesquisa promovida pela Universidade de São Paulo verificouse que dentre as 128 principais companhias listadas na Bolsa de Valores a 22 vinte e duas empresas mencionaram Direitos Humanos em seus formulários b 100 cem empresas mencionaram Desenvolvimento sustentável c 96 noventa e seis empresas mencionaram Ética d 98 noventa e oito empresas mencionaram Meio ambiente e 31 trinta e uma empresas mencionaram Incentivo à cultura f 32 trinta e duas empresas mencionaram Bemestar social e g 47 quarenta e sete empresas mencionaram Política anticorrupção Gouvêa Gärner Guerra 2019 A mesma pesquisa constatou ainda que dentre exemplos de práticas de boa governança corporativa adotadas pelas principais grandes empresas brasileiras a Magazine Luiza SA prevê a quebra de contrato com empresas que compactuem com a violação de direitos humanos4 enquanto a Natura Cosméticos SA dispõe de um mecanismo contratual semelhante denominado como política de tolerância zero em relação a violações de direitos humanos Por fim a Tim 4 Encontrase nos contratos firmados pela empresa a seguinte cláusula Da Responsabilidade Social e Ambiental O Magazine Luiza defende o cumprimento da legislação a preservação do meio ambiente o respeito às pessoas e aos direitos humanos A empresa se posiciona firmemente contrária a práticas de desmatamento de áreas embargadas ou de proteção ambiental assim como é contra a utilização de trabalhadores em condições indignas eou ilegais e é contra a utilização de mão de obra infantil práticas de preconceito assédio moral e assédio sexual O Magazine Luiza explicita que seus fornecedores e parceiros empresas devem comungar destas convicções e adotar práticas contra a degradação do meio ambiente e do ser humano Caso haja evidências de práticas contrárias a estas premissas o Magazine Luiza romperá os acordos e compromissos comerciais com as empresas até que elas revejam sua posição e redirecionem suas atitudes RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 59 Participações SA mantém uma lista de direitos essenciais dos trabalhadores5 prevendo sanções para o caso de descumprimento destes A contínua adoção de práticas de responsabilidade social pelas empresas também recebe o apoio e incentivo dos agentes reguladores do mercado Em 2021 o Conselho Monetário Nacional editou as Resoluções nº 49432021 49442021 e 49452021 no qual relaciona a gestão de riscos financeiros na perspectiva ESG aos riscos de crédito liquidez operacional e legal Por sua vez a CVM também possui importantes marcos regulatórios acerca da responsabilidade social das empresas dentre eles se destacando as ICVMs 4802009 5522014 5862017 e a Resolução CVM nº 142020 Igualmente no contexto do mercado de capitais foi recentemente instituído o índice SPB3 Brasil ESG o sétimo relacionado à responsabilidade social das empresas que proporciona ao investidor a possibilidade de realizar a gestão dos riscos reputacionais das companhias antes de realizar seu investimento Nesse sentir vêse que a responsabilidade social se tornou verdadeira métrica de investimentos e de consumo como bem destaca Juliana Oliveira Nascimento 2022 o lucro das organizações passa a fazer parte de um contexto que envolve a busca por um propósito maior e a discussão sobre uma economia voltada para stakeholders ganha cada vez mais força não só no mercado brasileiro mas globalmente A nova economia digital traz em seu bojo uma sociedade hiperconectada com fácil acesso à informação mais ativista e com hábitos de consumo cada vez mais sustentáveis São essas mesmas pessoas que passam a observar as práticas de governança corporativa e utilizálas como norte para as suas opções de investimentos Nesse contexto possuir um firme compromisso com o desenvolvimento de um negócio sustentável e de impacto social passou a ser um diferencial para os investidores Exemplificativamente estimase que mais de um trilhão de dólares em ativos estejam hoje sob a gestão de fundos que aplicam seus recursos apenas em negócios e empresas com práticas sustentáveis Igualmente a questão da responsabilidade social se faz presente em diversos acordos relevantes de investimento estrangeiro como o TPP o CETA e o ACFI se mostrando um importante elemento para viabilizar a capitalização da empresa Bonnomi 2021 Portanto vêse que a questão da responsabilidade social das empresas é medida imposta pelo próprio mercado tornandose o adimplemento das condutas com ela relacionadas contemporaneamente fator estrito para o sucesso do desenvolvimento das atividades empresárias 5 A lista de garantia de direitos fundamentais prevê termos como Trabalho infantil Trabalho forçado Saúde e segurança Liberdade de associação e direito à negociação coletiva Discriminação e assédio Procedimentos disciplinares Valorização da diversidade Horário de trabalho Remuneração Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 60 O questionamento que sobrevive entretanto é em até que ponto a simples existência de uma constatada coercitividade econômica se mostra suficiente para que as empresas cumpram os deveres relacionados à responsabilidade social e se não se faria necessário que o Direito regulasse a matéria e até estabelecesse sanções específicas e rígidas para empresas que deixem de promover direitos fundamentais6 A fim de responder esse questionamento inicialmente é necessário destacar que já existem diversas normas jurídicas que estabelecem punições em relação à violação de direitos fundamentais por pessoas jurídicas de direito privado tanto em nível constitucional quanto infraconstitucional Podese citar a título de exemplo o artigo 243 da Constituição Federal que expressamente estabelece a sanção de confisco em face de propriedades rurais e urbanas em que haja exploração do trabalho escravo Na seara infraconstitucional por sua vez cabe destacar o papel relevante da Lei nº 960598 a qual dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente e da Lei nº 137092018 a denominada Lei Geral de Proteção de Dados De uma leitura tópica e sistêmica do cenário jurídico brasileiro concluise que já existem normas que sancionam empresas que violem direitos fundamentais havendo uma adequada intervenção do Estado no âmbito privado nesses casos Existe uma lacuna entretanto no aspecto de promoção dos direitos fundamentais que tem sido preenchido conforme destacado acima pela coerção exercida pelo próprio mercado partindo da própria racionalidade do capitalismo stakeholder Bortoli 2008 É dizer não obstante existam normas de sanções positivas que estipulam benefícios geralmente de ordem fiscal para empresas que assumam a prática de ações que favoreçam a consumação de direitos de ordem social não há atualmente uma norma de sanção negativa para empresas que deixem de realizar ações promocionais razão pela qual é correta a colocação de que as ações promocionais de responsabilidade social têm caráter estritamente voluntarista na perspectiva brasileira Oliveira Gunther 2021 A questão colocada acima portanto é o caráter promocional dos direitos fundamentais na perspectiva da responsabilidade social das empresas deveria ser tutelado por normas de sanção 6 Em favor da criação de leis específicas sobre tema destacase a posição de Marcia Bataglin Dalcastel Pedro Moreira Alonso e Yuri da Costa Campos Ferreira 2018 p 206 Dito de outra forma enquanto não houver punição real atribuída em lei capaz de desestimular a perpetuação da atividade lesiva cabe ao investidor e ao consumidor consciente dar destaque às empresas que se destacam em função da aderência ao movimento ético proporcionado pelo capitalismo consciente RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 61 negativa Neste ponto seguindo a lição de Francisco Cardozo Oliveira e Luiz Eduardo Gunther 2021 a resposta teria de ser negativa sob pena de comprometer a liberdade individual do empresário e das empresas imputandolhes ônus excessivos Como bem destaca Otávio Luiz Rodrigues Jr 2019 neste ponto é mais adequado à sociedade brasileira um modelo fraco da eficácia indireta dos direitos fundamentais uma vez que no âmbito do Direito Privado deve prevalecer o interesse privado e a autonomia privada É dizer nos casos em que a prática de medidas promocionais da responsabilidade social pode se mostrar contrária à busca pela maximização do lucro da empresa devese tutelar a liberdade do empresário para que escolha qual deve prevalecer Nesse sentido o caráter promocional dos direitos fundamentais deve ser medida que parta da própria empresa sendo pautada na ética empresarial na esteira do pensamento de Calixto Salomão Filho 2012 Ana Frazão e Angelo Gamba Prata de Carvalho 2017 Em face dessa sujeição nas palavras de Francisco Cardozo Oliveira e Luiz Eduardo Gunther 2021 p 56 a ação de responsabilidade social oscila entre manterse atrelada ao espírito de filantropia ou servir a propósitos de marketing e de governança de territórios em benefício do aumento da lucratividade Convém destacar que conforme se extrai dos dados acima apresentados a coercitividade do mercado já se mostra eficaz para coagir as empresas a tomarem medidas que promovam direitos sociais devendo apenas ser incrementada à semelhança do que fizeram outros países o que também respalda em nível consequencial o posicionamento ora adotado Diante de todo o exposto vêse que i a responsabilidade social já é tutelada pelo direito em sua vertente referente a sancionar negativamente empresas que violem os direitos fundamentais ii em igual sentido a responsabilidade social em sua vertente promocional é ratificada por normas de sanção positiva embora não exista norma de sanção negativa no direito brasileiro e iii a coercitividade do mercado se mostra suficiente para tutelar a responsabilidade social das empresas em sua vertente promocional não obstante deva ser incrementada não sendo adequada uma intervenção estatal legislativa neste ponto sob pena de violação da autonomia privada da empresa e dos empresários CONCLUSÃO Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 62 O presente estudo buscou analisar o tema da responsabilidade social das empresas para identificar suas principais características e atual estágio de desenvolvimento Neste percurso inicialmente verificouse que i a partir da segunda metade do século XX intensificaramse os estudos da responsabilidade corporativa das empresas que desembocaram em uma nova concepção do próprio sistema capitalista doravante designado capitalismo stakeholder ii os estudos acerca do tema no cenário brasileiro ainda são incipientes não obstante seja possível identificar especialmente no pósConstituição Federal de 1988 um avanço na matéria iii fazse necessário harmonizar e compatibilizar a busca pela maximização do lucro com o adimplemento dos deveres de responsabilidade social para viabilizar o sucesso da empresa iv tais vertentes entretanto podem não se verificar congruentes sendo que nesses casos no aspecto promocional da responsabilidade social deve ser tutelado o direito da empresa em escolher qual posição adotar v a demanda do mercado por empresas que sejam socialmente responsáveis atua como importante forma de coerção para que as empresas adotem medidas promocionais de responsabilidade corporativa que aliadas a normas de sanção positiva se mostram importantes ferramentas para a consolidação da responsabilidade social das empresas vi existem normas de sanção negativa positivadas no direito brasileiro que obrigam que as empresas sejam socialmente responsáveis e não violem direitos fundamentais o que também é exigido pelo próprio mercado e vii não é adequada uma intervenção estatal para estabelecer normas de sanção negativa em relação à questão promocional da responsabilidade social devendo tais medidas partirem diretamente das empresas sob pena de violação da autonomia privada A título conclusivo importante destacar que as empresas brasileiras têm cada vez mais avançado na temática da responsabilidade social percebendose uma tendência em uma contínua recepção de seus princípios e uma consequente adoção da perspectiva solidária por parte das empresas Igualmente é possível verificar uma abrangência do tema na medida em que cada vez mais se evidencia o interesse de empresas especialmente de grande porte em adotar medidas de responsabilidade social Não obstante o debate ainda se faz incipiente sendo que diversas empresas especialmente de médio e pequeno porte ainda se fazem alheias aos preceitos da responsabilidade corporativa e presas ao paradigma da modernidade contratualista do direito empresarial Entretanto o crescimento das discussões e produções sobre a temática apontam para um futuro esperançoso com uma contínua conscientização de administradores sócio e acionistas da necessidade de RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 63 realização de medidas de responsabilidade social como elemento fundamental para o sucesso da atividade empresarial Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 64 REFERÊNCIAS BONNOMI Natália Paulino Responsabilidade social corporativa e investimento estrangeiro lições do TPP CETA e ACFI Revista de Direito Constitucional e Internacional v 128 p 289 304 novdez 2021 Disponível em httpswwwoasisbribictbrvufindRecordSTJ 1e8e4383730043a85e780adfed495c938 Acesso em 8 abr 2024 BUZZI Gabriele Cristine OLIVEIRA Francisco Cardozo Função social da empresa no brasil no contexto de globalização econômica luta por reconhecimento de direitos e mercado Revista Brasileira de Direito Empresarial Brasília v 2 n 1 p 201218 jan jul 2016 Disponível em httpswwwindexlaworgindexphpdireitoempresarialarticleview1013 Acesso em 8 abr 2024 DALCASTEL Marcia Bataglin ALONSO Pedro Moreira FERREIRA Yuri da Costa Campos Empresa e Direitos Humanos Governança Corporativa e capitalismo consciente como instrumentos de proteção Revista Publicum v 4 n 1 p 193 207 2018 Disponível em httpswwwepublicacoesuerjbrindexphppublicumarticleview34071 Acesso em 5 abr 2024 DARCANCHY Mara Vidigal Responsabilidade social da empresa e a constituição Revista de Direito Constitucional e Internacional v 63 n 63 p 195 211 abr jun 2008 Disponível em httpsbdjurstjjusbrjspuihandle201184241modefull Acesso em 5 abr 2024 DE BORTOLI Andrea A função social da empresa e suas implicações na governança corporativa e na gestão de stakeholders Revista de Direito Empresarial v 9 p 175 193 janjun 2008 Disponível em httpswwwlexmlgovbrurnurnlexbrredevirtualbibliotecasartigorevista200810008844 04 Acesso em 5 abr 2024 DUARTE Regina A Duarte A responsabilidade social da empresa breves considerações Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo v 13 p 146 152 janjun 2004 Disponível em httpsbdjurstjjusbrjspuihandle201187878 Acesso em 8 abr 2024 FRAZÃO Ana CARVALHO Angelo Gamba Prata de Responsabilidade social empresarial In FRAZÃO Ana org Constituição empresa e mercado Brasília Faculdade de Direito UnB 2017 p 200 221 GOUVÊA Carlos Pagano Botana Portugal GÄRNER Bruna Magalhães GUERRA João Paulo Braune Governança Corporativa e Direitos Humanos uma análise empírica do novo mercado Homa Publica Revista Internacional de Derechos Humanos Y Empresas v 3 n 2 p 139 158 fev jun 2019 Disponível em httpswwwbingcomckap692e9653593231edJmltdHM9MTcxMjc5MzYwMCZpZ3 VpZD0zMDllOGI2NC05MmRkLTZjZGUtMGRlMC05ZjY0OTM5YjZkNTMmaW5zaWQ9 RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 65 NTE5Mwptn3ver2hsh3fclid309e8b6492dd6cde0de0 9f64939b6d53psqGOUVc38aA2cCarlosPaganoBotanaPortugal3bGc38 4RNER2cBrunaMagalhc3a3es3bGUERRA2cJoc3a3oPauloBrauneG overnanc3a7aCorporativaeDireitosHumanos3aumaanc3a1liseempc3a dricadonovomercadoHomaPublicae28093RevistaInternacionaldeDerech osHumanosYEmpresas2cv32cn22cp139e280931582cfev2 fjun2019ua1aHR0cHM6Ly9lZGlzY2lwbGluYXMudXNwLmJyL3BsdWdpbmZpbG UucGhwLzUwNDM2ODQvbW9kX2ZvbGRlci9jb250ZW50LzAvUE9SVFVHQUwlMjBHT 1VWJUMzJThBQSUyMGV0JTIwYWwuJTIwLSUyMEdvdmVybmFuJUMzJUE3YSUyME NvcnBvcmF0aXZhJTIwZSUyMERpcmVpdG9zJTIwSHVtYW5vcy5wZGYntb1 Acesso em 8 abr 2023 GUIMARÃES Heloísa Werneck Mendes Responsabilidade social da empresa uma visão histórica de sua problemática RAERevista de Administração de Empresas v 24 n 4 p 211 219 out dez 1984 Disponível em httpsperiodicosfgvbrraearticleview39221 Acesso em 8 abr 2024 GUNTHER Luiz Eduardo OLIVEIRA Francisco Cardozo Responsabilidade social da empresa pandemia e o Direito brasileiro entre liberdade e solidariedade Revista Brasileira de Direito Empresarial v 7 n 2 p 39 57 jul dez 2021 HESPANHA António Manuel Cultura Jurídica Europeia Síntese de um milênio 3 ed Coimbra Almedina 2015 NASCIMENTO Juliana Oliveira ESG O Cisne Verde e o Capitalismo de Stakeholder 2 ed São Paulo Revista dos Tribunais 2022 REIS Carlos Nelson dos A responsabilidade social das empresas o contexto brasileiro em face da ação consciente ou do modernismo do mercado Revista de Economia Contemporânea Rio de Janeiro v 11 n 2 p 279 305 mai ago 2007 Disponível em httpswwwbingcomckaped370e06ac9a19b2JmltdHM9MTcxMjc5MzYwMCZpZ3 VpZD0zMDllOGI2NC05MmRkLTZjZGUtMGRlMC05ZjY0OTM5YjZkNTMmaW5zaWQ9 NTIwMAptn3ver2hsh3fclid309e8b6492dd6cde0de0 9f64939b6d53psqREIS2cCarlosNelsondosAresponsabilidadesocialdasempre sas3aocontextobrasileiroemfacedaac3a7c3a3oconscienteoudomoder nismodomercado3fRevistadeEconomiaContemporc3a2nea2cRiodeJaneir o2cv112cn22cp279e280933052cmai2fago2007ua1aHR 0cHM6Ly93d3cuc2NpZWxvLmJyL2ovcmVjL2EvcldwU1p6MzZMclA1OFB4YzluY21HVk Ivntb1 Acesso em 8 abr 2024 RODRIGUES JR Otávio Luiz Direito Civil Contemporâneo Estatuto epistemológico Constituição e Direitos Fundamentais 2 ed Rio de Janeiro Forense Universitária 2019 SALOMÃO FILHO Calixto Regulamentação da Atividade Empresarial para o Desenvolvimento p 60 73 In SALOMÃO FILHO Calixto org Regulação e Desenvolvimento Novos Temas 1 ed São Paulo Malheiros 2012 Marcos Antonio Nunes da Silva Revista Brasileira de Direito Empresarial eISSN 25260235 Encontro Virtual v 10 n 1 p 46 66 JanJul 2021 66 SALTIÉL Augusto Von O desenvolvimento econômico sustentável no século XXI a responsabilidade social empresarial Revista de Direito Privado v 72 p 75 89 2016 Disponível em httpswwwbingcomckap38d133a820185f22JmltdHM9MTcxMjc5 MzYwMCZpZ3VpZD0zMDllOGI2NC05MmRkLTZjZGUtMGRlMC05ZjY0OTM5YjZkNT MmaW5zaWQ9NTE4NQptn3ver2hsh3fclid309e8b6492dd6cde0de0 9f64939b6d53psqSALTIc389L2cAugustoVonOdesenvolvimentoeconc3 b4micosustentc3a1velnosc3a9culoXXI3aaresponsabilidadesocialempres arialRevistadeDireitoPrivado2cv722cp75e28093892c2016Dis ponc3advelem3axxxxAcessoem3a8abr2024ua1aHR0cHM6Ly9iZC50 amRmdC5qdXMuYnIvanNwdWkvaGFuZGxlL3RqZGZ0LzQyODg3ntb1 Acesso em 8 abr 2024 TOMASEVICIUS FILHO Eduardo A função social da empresa Revista dos Tribunais São Paulo v 810 p 33 50 2003 Disponível em httpsbdjurstjjusbrjspuihandle2011115471 Acesso em 8 abr 2024 VERONESE Eduardo Felipe OLIVEIRA Francisco Cardozo A atividade empresarial e sua função social a efetivação dos direitos fundamentais Percurso v 1 n 18 p 196 214 2017 Disponível em httpswwwsemanticscholarorgpaperAATIVIDADE EMPRESARIALESUAFUNC387C383OSOCIAL3AADOSVeronese Oliveira6f5b7ef115ade3141a868bec847d9befbbef5887 Acesso em 8 abr 2024 RESUMO DO ARTIGO RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS de Marcos Antonio Nunes da Silva O artigo conduz uma análise crítica e historicamente situada da responsabilidade social empresarial no Brasil abordando a tensão estrutural e ainda mal resolvida entre interesse econômico e dever social O ponto de partida do autor é uma provocação como conciliar no atual modelo de empresa brasileira o imperativo do lucro com o imperativo éticosocial A pergunta não se pretende retórica O estudo responde com rigor técnico e método indutivo desdobrandose em três frentes o desenvolvimento histórico no país sua relação com a lucratividade e a efetividade de instrumentos coercitivos para a indução de condutas responsáveis No plano conceitual adotase uma definição funcionalista da responsabilidade social tratase de um agir empresarial ético juridicamente conforme e ambientalmente consciente com impacto minimizador sobre os danos sistêmicos da atividade econômica O autor destaca a crescente adesão de grandes empresas a esse modelo embora a penetração da responsabilidade entre médias e pequenas ainda se mostre tímida resquício do paradigma contratualista e da resistência a uma visão solidária da função social da empresa O fio condutor da narrativa histórica remonta às origens doutrinárias do conceito no hemisfério norte Bowen e transita até sua chegada tardia e desigual ao Brasil sobretudo após a Constituição de 1988 A partir da redemocratização e da abertura econômica o discurso da RSE foi ganhando densidade institucional com iniciativas e a obrigatoriedade do Balanço Social em alguns contextos regulatórios marcos que corporificam a tentativa de integração de valores sociais à lógica empresarial O autor traça uma tipologia evolutiva da RSE no Brasil em três estágios gestão social interna voltada para empregados e seus dependentes gestão social externa foco na comunidade e stakeholders indiretos com forte componente filantrópico e por fim a gestão social cidadã ainda incipiente mas vista como horizonte ideal onde a empresa assume papel de agente transformador engajada estruturalmente na promoção de uma sociedade mais igualitária No plano normativo a análise ganha tensão Se por um lado a responsabilidade das empresas ainda opera majoritariamente como voluntarismo moral e marketing reputacional por outro impõese a necessidade de um marco regulatório mais robusto O autor propõe um reposicionamento abandonar a caridade como cosmética e avançar rumo à normatização estratégica da responsabilidade social Ou seja transformar o gesto isolado em obrigação estruturante integrandoo à racionalidade do Direito Empresarial não como tutela do mercado mas como mediação ética entre autonomia privada e função social A obra sugere sem didatismo que a transição da filantropia para uma ética corporativa institucionalizada exige coerção A experiência revela que a livre iniciativa sem indução normativa tende à inércia ou à apropriação retórica da pauta A coerção portanto não é antagonista da responsabilidade é seu catalisador O estudo conclui com um paradoxo produtivo a responsabilidade quando efetivamente incorporada à estratégia empresarial não é inimiga do lucro ao contrário pode ampliar a legitimidade institucional da empresa gerar valor simbólico e econômico e criar vantagem competitiva sustentável Contudo para que isso ocorra é necessário ultrapassar o discurso e instaurar um novo ethos empresarial crítico integrado e consciente de sua responsabilidade compartilhada na construção de um capitalismo socialmente admissível Mais adiante no terceiro eixo analítico do artigo de Nunes da Silva confronta com refinamento crítico um dilema central da teoria empresarial contemporânea é possível compatibilizar o escopo final da empresa o lucro com o compromisso ético político da responsabilidade social A resposta não é simples nem deve sêlo O autor articula um raciocínio que tensiona os fundamentos econômicos da atividade empresarial desvelando a crescente e ainda assim incômoda simbiose entre performance financeira e legitimidade social A narrativa começa pela constatação empírica do fenômeno empresas brasileiras vêm desde a década de 1960 incorporando práticas socialmente responsáveis em suas estratégias Contudo o autor não se ilude tampouco pretende iludir o leitor sobre as motivações reais A RSE em seu estágio atual ainda está muitas vezes atrelada a um utilitarismo reputacional uma resposta tática às pressões do mercado e da opinião pública Não é altruísmo é estratégia Mas também não é necessariamente cinismo é talvez o primeiro passo de uma reconversão cultural ainda em curso Nesse ponto emerge o argumento de maior sofisticação a responsabilidade social não é antagônica ao lucro ela é cada vez mais condição de sua legitimidade A lógica mercantil pressionada por stakeholders consumidores conscientes e uma sociedade civil cada vez mais vigilante começa a operar sob novos parâmetros O capital se quiser manterse hegemônico precisa negociar com valores que antes ignorava justiça social sustentabilidade ambiental ética nas relações de trabalho A crítica do autor recai sobre o risco da instrumentalização da responsabilidade reduzida a tática de marketing ou ferramenta de contenção reputacional Nesse cenário ações sociais voltadas à motivação de empregados ou à imagem pública da marca acabam paradoxalmente reafirmando o modelo individualista que dizem superar É o discurso da responsabilidade esvaziado de conteúdo transformador ornamental conveniente e portanto inócuo Contudo o autor não assume um tom fatalista Ao contrário argumenta que a crescente exigência social por padrões éticos empresariais tem potencial disruptivo Com base em dados empíricos Duarte demonstra que consumidores em mercados desenvolvidos já penalizam empresas negligentes e recompensam aquelas que adotam práticas responsáveis Isso sugere um redesenho possível da racionalidade econômica onde reputação e responsabilidade passam a compor o núcleo duro da competitividade A virada teórica se dá então pela reinterpretação da empresa não como um feixe contratual voltado exclusivamente ao interesse dos sócios mas como instituição social dotada de função pública implícita Leitura institucionalista herdada da doutrina moderna e corroborada pela Constituição de 1988 fundamenta a ideia de que a empresa não apenas pode mas deve operar segundo critérios de solidariedade Afinal sua atuação mobiliza recursos comuns impacta comunidades inteiras e gera externalidades que extrapolam a lógica interna do negócio O autor percorre nesse ponto o arcabouço normativo que sustenta tal exigência A função social da empresa derivada dos princípios constitucionais da livre iniciativa da valorização do trabalho e da justiça social deixa de ser um ideal retórico para tornarse um vetor de legitimação jurídica Ainda que a responsabilidade social não esteja tipificada como obrigação legal stricto sensu ela é no plano axiológico do ordenamento uma diretriz de conduta esperada e cada vez mais exigível Exemplos normativos confirmam a teseos arts 7º 170 e 225 da CF88 a Lei das SAe mesmo as deduções fiscais previstas para ações filantrópicas configuram uma rede normativa de incentivo e em certa medida indução indireta Não se trata ainda de um regime de coerção plena mas de um conjunto de mecanismos para construir institucionalmente uma cultura de corresponsabilidade O autor insiste em um ponto nevrálgico a atuação empresarial com responsabilidade social não pode ser episódica nem cosmética Precisa ser estrutural incorporada ao modelo de negócios informada por valores substantivos orientada à transformação e não apenas à adaptação Isso exige uma mutação interna a passagem do ethos da maximização para o ethos da corresponsabilidade onde a função lucrativa é articulada e não mais oposta ao dever de justiça social O que está em jogo afinal não é a negação do lucro mas sua reconfiguração enquanto meio e não fim absoluto A responsabilidade social nesse cenário não é um luxo ético mas um imperativo estratégico normativo e político A empresa que ignora essa realidade por mais rentável que seja no curto prazo caminha para a obsolescência social A que compreende sua função ampliada por outro lado torna se agente legítimo do novo pacto civilizatório que se impõe à força por pressão ou por convicção A seção final do estudo opera uma inflexão decisiva desloca o foco da responsabilidade social empresarial do plano idealnormativo para o plano empírico da economia de mercado e com isso revela uma ironia sistêmica Não foi o Direito nem os princípios constitucionais que impuseram a responsabilidade social às empresas brasileiras Foi o próprio mercado em sua lógica de autopreservação reputacional e de exigência sistêmica por legitimidade quem passou a ditar os termos de uma conduta corporativa eticamente aceitável O capital enfim cobra ética ao capital Essa virada do voluntarismo para a compulsoriedade pragmática é evidenciada por dados objetivos A pesquisa da USP citada no estudo mostra que entre as principais companhias brasileiras há menções expressas a direitos humanos meio ambiente ética e políticas anticorrupção em contratos relatórios e políticas internas Casos como os da Magazine Luiza Natura e TIM exemplificam esse novo ethos corporativo embora ainda precário parcialmente performático mas sintomático Cláusulas de ruptura contratual por violação de direitos humanos códigos internos de conduta ética critérios ESG incorporados à governança Não são mais enfeites discursivos São cada vez mais prérequisitos operacionais O autor avança o mercado financeiro também assumiu papel indutor Fundos de investimento priorizam empresas com práticas sustentáveis agências reguladoras como a CVM e o Conselho Monetário Nacional editam normas específicas e índices como o SPB3 ESG reconfiguram a métrica de risco reputacional A responsabilidade social assim convertese em critério de viabilidade econômica transformandose de ideal ético em exigência estrutural de competitividade Surge então uma questão provocadora se o mercado já impõe condutas minimamente responsáveis seria o caso de o Direito avançar sobre a seara promocional da RSE criando sanções negativas para empresas que se omitam A resposta do autor deliberadamente controversa é negativa Em defesa da autonomia privada sustenta que a promoção de direitos fundamentais não pode ser objeto de obrigação jurídica coercitiva sob pena de desfigurar o próprio regime do Direito Privado O gesto ético empresarial para ser legítimo deve partir de uma consciência endógena ainda que catalisada por pressões externas e não de um mandamento estatal A distinção entre sanção por violação que já existe e é constitucionalmente legítima e sanção por omissão promocional ainda inexistente e juridicamente sensível é o eixo do argumento O autor reconhece há normas punitivas claras em casos de trabalho escravo de danos ambientais ou de violação à proteção de dados Contudo quando se trata da ausência de atuação positiva isto é de não promover ativamente os direitos a coerção estatal encontra limite na liberdade empresarial Nesse ponto entra em cena a ideia de um modelo fraco da eficácia indireta dos direitos fundamentais nas relações privadas defendido por Otávio Luiz Rodrigues Jr a RSE como política promocional deve ser incentivada mas não imposta O estudo por fim defende que o mecanismo de coerção eficaz já está em operação e não é jurídico mas econômico Tratase de uma sanção reputacional de uma exclusão progressiva do mercado para empresas que insistam em práticas predatórias excludentes ou antiéticas O capitalismo sob pressão interna e externa está redesenhando seus próprios contornos não por benevolência mas por sobrevivência estratégica E isso paradoxalmente pode ser mais eficiente que qualquer norma estatal autor traça ao longo do texto um arco argumentativo sólido inicia com uma contextualização histórica da RSE no Brasil ainda marcada por uma filantropia episódica evolui para uma análise das suas contradições internas entre motivação ética e interesse reputacional e culmina com um diagnóstico preciso do papel do mercado como instância disciplinadora A função social da empresa antes confinada ao discurso jurídico agora emerge como condição operacional imposta pelo próprio sistema Não obstante esse avanço o autor adverte o cenário ainda é desigual Enquanto grandes corporações integram progressivamente a lógica da RSE em suas estruturas pequenas e médias empresas permanecem reféns do paradigma contratualista insensíveis às demandas coletivas e refratárias à transformação O Direito nesse contexto tem papel ambivalente sanciona abusos estimula boas práticas mas deve evitar o risco de sufocar a liberdade negocial com um intervencionismo mal calibrado O que se desenha portanto é um novo pacto tácito entre empresa e sociedade Um pacto que não se impõe exclusivamente por normas mas que tampouco sobrevive sem elas Um pacto que articula incentivos regula reputações impõe limites e cobra coerência Um pacto enfim onde a responsabilidade social deixa de ser exceção ética para tornarse critério de legitimidade econômica A última seção do estudo tensiona com precisão cirúrgica a fronteira entre a responsabilidade social empresarial como opção estratégica e sua possível transfiguração em dever jurídico E faz isso partindo de uma constatação incômoda e por isso mesmo fecunda não é o Estado quem lidera o processo de incorporação da responsabilidade social pelas empresas É o mercado Mais que isso é a lógica de sobrevivência reputacional é o risco de exclusão financeira é o cerco dos stakeholders hiperconscientes e hiperconectados A responsabilidade social deixou de ser um diferencial e passou a ser um mínimo operacional O lucro nesse novo paradigma exige uma pedagogia da ética E as empresas ao menos as que pretendem manterse solventes política econômica e simbolicamente são forçadas a responder É essa a virada do voluntarismo filantrópico à compulsoriedade estrutural Porém o estudo não se satisfaz com a euforia tecnocrática O autor avança sobre o limite do Direito podese compelir juridicamente empresas a promoverem direitos fundamentais sob pena de sanções negativas A resposta sustentada com base na doutrina e no princípio da autonomia privada é não O direito brasileiro já prevê punições para violações diretas trabalho escravo dano ambiental discriminação mas não há nem deveria haver obrigação legal de adoção de condutas promocionais A ética empresarial dizse não pode ser decretada Esse posicionamento repousa sobre um equilíbrio delicado por um lado reconhecese a eficácia coercitiva do mercado mais ágil mais sensível mais pragmática que o Estado por outro preservase a liberdade empresarial como núcleo inviolável do Direito Privado A adesão à responsabilidade social quando forçada pela legislação pode degenerar em cinismo normativo Quando estimulada pela lógica econômica porém tende a ser mais duradoura menos formal e mais estratégica O estudo encerrase com uma constatação dupla o avanço da responsabilidade social nas grandes empresas brasileiras é inegável mas permanece desigual frágil condicionado por pressões externas mais do que por convicção interna Pequenas e médias empresas ainda resistem presas ao paradigma da maximização bruta impermeáveis às demandas difusas da sociedade É necessário e inevitável que a cultura empresarial mude Mas que mude por dentro Que se converta por cálculo ou por convicção à ética da corresponsabilidade O texto de Marcos Antonio Nunes da Silva articula com rigor acadêmico e acuidade crítica uma leitura contemporânea do papel da empresa na sociedade brasileira Mais do que um apelo à moralidade corporativa sua análise revela um processo em curso o deslocamento da responsabilidade social do plano da retórica para o da estrutura E se esse processo é incompleto desigual e por vezes ambíguo ele é também irreversível Não se trata aqui de exigir heroísmo das empresas Tratase de reconhecer que no século XXI não há mais espaço para a empresa que ignora seu entorno O capital precisa de legitimidade E legitimidade hoje passa pela sustentabilidade social A responsabilidade social enquanto prática não apenas discurso tornouse fator de competitividade E isso muda tudo Ainda assim o estudo insiste em um ponto fundamental o Direito deve resistir à tentação de colonizar esse espaço A sanção negativa por omissão em matéria promocional seria além de ineficaz ilegítima A coerção precisa vir do mercado dos investidores dos consumidores e em última instância da própria consciência empresarial A responsabilidade social eficaz é aquela que nasce do reconhecimento de que lucro e ética não se excluem Convivem por vezes tensionam mas podem sim convergir O desafio está posto compatibilizar a racionalidade econômica com a exigência ética Não como concessão mas como estratégia Não como ornamento mas como fundamento O artigo conduz uma análise crítica e historicamente situada da responsabilidade social empresarial no Brasil abordando a tensão estrutural e ainda mal resolvida entre interesse econômico e dever social O ponto de partida do autor é uma provocação como conciliar no atual modelo de empresa brasileira o imperativo do lucro com o imperativo éticosocial A pergunta não se pretende retórica O estudo responde com rigor técnico e método indutivo desdobrandose em três frentes o desenvolvimento histórico no país sua relação com a lucratividade e a efetividade de instrumentos coercitivos para a indução de condutas responsáveis No plano conceitual adotase uma definição funcionalista da responsabilidade social tratase de um agir empresarial ético juridicamente conforme e ambientalmente consciente com impacto minimizador sobre os danos sistêmicos da atividade econômica O autor destaca a crescente adesão de grandes empresas a esse modelo embora a penetração da responsabilidade entre médias e pequenas ainda se mostre tímida resquício do O artigo conduz uma análise crítica e historicamente situada da responsabilidade social empresarial no Brasil abordando a tensão estrutural e aindamal resolvida entre interesse econômico e dever socialO ponto de partida do autor é uma provocação como conciliar no atual modelo de empresa brasileira o imperativo do lucro com o imperativo éticosocialA pergunta não se pretende retóricaO estudo responde com rigor técnico e método indutivo desdobrandose em três frentes o desenvolvimento histórico no país sua relação com a lucratividade e a efetividade de instrumentos coercitivos para a indução de condutas responsáveisNo plano conceitual adotase uma definição funcionalista da responsabilidade social tratase de um agir empresarial ético juridicamente conforme e ambientalmente consciente com impacto minimizador sobre os danos sistêmicos da atividade econômicaO autor destaca a crescente adesão de grandes empresas a O artigo conduz uma análise crítica e historicamente situada da responsabilidade social empresarial no Brasil abordando a tensão estrutural e ainda mal resolvida entre interesse econômico e dever social O ponto de partida do autor é uma provocação como conciliar no atual modelo de empresa brasileira o imperativo do lucro com o imperativo éticosocial A pergunta não se pretende retórica O estudo responde com rigor técnico e método indutivo desdobrandose em três frentes o desenvolvimento histórico no país sua relação com a lucratividade e a efetividade de instrumentos coercitivos para a indução de condutas responsáveis No plano conceitual adotase uma definição funcionalista da responsabilidade social tratase de um agir empresarial ético juridicamente conforme e ambientalmente consciente com impacto minimizador sobre os danos sistêmicos da atividade econômica O autor destaca a crescente adesão de grandes empresas a esse modelo embora a penetração da responsabilidade entre médias e pequenas ainda se mostre tímida resquício do passado A adoção de responsabilidades sociais empresariais no Brasil é um fenômeno relativamente recente e seu estudo contribui para a compreensão das dinâmicas sociais e econômicas do país bem como dos desafios e oportunidades relacionados ao crescimento sustentável e à justiça social em contextos empresariais