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Direito Administrativo

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Número 2 maiojunhojulho de 2005 Salvador Bahia Brasil AS PARCERIAS PÚBLICOPRIVADAS PPPS NO DIREITO POSITIVO BRASILEIRO Prof Alexandre Aragão Professor de Pósgraduação da UERJ e da UFF Professor do Mestrado em Regulação e Concorrência da Universidade Candido Mendes Procurador do Estado do Rio de Janeiro Advogado I A Conjuntura do Surgimento do Instituto II Parcerias públicoprivadas em sentido amplo e restrito III Conceito e Classificação das Parcerias públicoprivadas na Lei Federal nº 1107904 III1 Concessões Patrocinadas III2 Concessões Administrativas III3 Proposta de Conceito de Parcerias PúblicoPrivadas IV Leis Estaduais e Municipais de PPPs V PPPs e Responsabilidade Fiscal VI Financiamento e Garantias VII Peculiaridades do Procedimento Licitatório VIII Peculiaridades do Contrato VIII1 Divisão de Riscos VIII2 Sociedade de Propósito Específico SPE IX Órgãos Planejadores e Reguladores das PPPs I A CONJUNTURA DO SURGIMENTO DO INSTITUTO Com a crise de financiamento do Estado na década de oitenta foi perdida a sua capacidade de financiamento de uma série de obras de infraestrutura e de serviços públicos que na maioria das vezes eram prestados através daquelas rodovias hidrovias linhas de transmissão de energia redes de distribuição de água e de coleta de esgoto gasodutos etc Muitos desses serviços apesar de o Estado não ter capacidade financeira para implantálos o que foi acompanhado da idéia de o Estado ser menos eficiente do que a iniciativa privada para fazêlo poderiam perfeitamente ser prestados à sociedade pela iniciativa privada gerando de per se bons resultados para os investidores que construíram ou aperfeiçoaram a infraestrutura Foram esses os serviços públicos ditos serviços públicos econômicos que nas décadas de oitenta e noventa constituíram o objeto por excelência da 2 desestatização com a delegação da atividade à iniciativa privada Esses serviços podiam ter tamanho potencial de lucratividade que a empresa privada além de não receber qualquer suporte financeiro do Poder Público ainda lhe pagava um valor de outorga estabelecido na licitação remunerandose integralmente com as tarifas pagas pelos usuários ao longo do prazo de vigência da concessão ou permissão1 Ultrapassado esse primeiro momento da desestatização teríamos idealmente um Estado mais leve e com mais recursos apto a investir nas atividades prestacionais insuscetíveis de exploração lucrativa pela iniciativa privada Por exemplo rodovias importantes para o desenvolvimento de regiões pobres mas de ainda pouco movimento para que o pedágio fosse suficiente para pagar a sua reforma e manutenção construção de presídios ou de escolas públicas de ensino básico que não geram qualquer receita tarifária2 Ocorre que mesmo após as desestatizações da década de noventa o Estado mantevese em grave crise fiscal sujeito a uma grande dívida interna e externa taxada com juros da magnitude que todos conhecemos com o que em mais uma frustração da cidadania nem aqueles serviços públicos essenciais passaram a ter verba para poderem ser prestados como deveriam O problema hoje é que para essa crise fiscal ser pelo menos mitigada o País tem que crescer e para tanto precisa reformar e ampliar a sua infra estrutura para o que no entanto continua sem os recursos suficientes e com a capacidade de endividamento esgotada Buscase uma saída para esse impasse para crescer e sair da crise financeira o Estado tem que investir em infra estrutura mas não tem como financeiramente realizar tais investimentos A conjuntura que ensejou o surgimento da idéia de parcerias público privadas no Brasil pode então assim ser sintetizada 1 gargalos de infra estrutura impeditivas do crescimento e conseqüente melhora da situação fiscal do Estado 2 Existência de uma série de atividades de relevância coletiva muitas delas envolvendo as referidas infraestruturas não autosustentáveis financeiramente e sem que o Estado tenha condições de financiálas sozinho As parcerias públicoprivadas surgem como uma tentativa de Estado e iniciativa privada dividirem os custos com a implantação de infraestruturas já que nenhum deles teria condições de com elas arcar individualmente o Estado por não ter condições financeiras e a iniciativa privada porque a tarifa seria insuficiente ou em alguns casos até inexistente para cobrir todos os seus custos e a legítima margem de lucro do negócio 1 Ressalvase apenas as receitas alternativas complementares acessórias ou de projetos associados previstas no art 11 da Lei nº 898795 que como seu próprio nome denota possuem um papel coadjuvante no financiamento das concessões tradicionais 2 Em algumas atividades prestacionais há inclusive vedação constitucional para que sejam remuneradas por tarifas a exemplo da educação e da saúde que devem ser gratuitas para os cidadãos 3 Dessa forma o Estado lança mão também de uma criativa e não muito explícita nova forma de financiamento do custo de infraestruturas que não possam ser amortizadas apenas com tarifas Ao invés de realizar uma operação de empréstimo direta com uma instituição financeira para obter esses recursos contrata uma empresa privada que via de regra vai por sua conta realizar uma similar operação de crédito para efetuar as obras e prestar os serviços contratados Mas como a tarifa não é suficiente concessões patrocinadas ou é até mesmo inexistente concessões administrativas o Estado irá aos poucos ao longo do prazo de vigência do contrato e apenas depois de disponibilizado o serviço pagando pelo montante despendido previamente pela empresa privada Tratando de realidade latinoamericana semelhante à nossa AGUSTÍN GORDILLO também observa que na situação de crise econômica em que vivemos com recessão inflação desemprego subemprego etc é óbvio que muitas pessoas simplesmente não têm capacidade econômica suficiente para pagar pelo serviço No passado a resposta fácil ao problema era o Estado subsidiar por razões sociais esse déficit A resposta contrária de pura e simplesmente refutar todo e qualquer subsídio também é simplista sendo certo que se deve chegar a um meiotermo em relação ao apoio que o Estado deve dar em matéria de tarifas3 Ao invés do mecanismo da concessão tradicional em que é dado o direito ao particular de explorar determinado serviço público econômico que será remunerado ao longo do tempo com as tarifas nas parcerias públicoprivadas será o próprio Estado que arcará com parte ou com a totalidade do investimento realizado pelo particular Mas não fará de imediato com o que seria mera terceirização ou empreitada de obra pública até porque não possuiria dinheiro nem crédito para tanto Primeiro obterá a obra e o serviço e depois de já estarem disponibilizados irá paulatinamente pagando pelos custos adiantados pela empresa e por seus lucros Foi sem dúvida uma maneira de o Estado contornar a sua falta de caixa para investimentos e o esgotamento da sua capacidade de contrair novas dívidas A sua constitucionalidade e a compatibilidade com a Lei de Responsabilidade Fiscal que é uma lei complementar devem contudo ser examinadas com bastante cautela Dizse que as parcerias públicoprivadas têm origem na inglesa Private Finance Iniciative PFI que vista à luz do Direito Administrativo europeu continental não passa de uma modalidade da clássica concessão de obras ou de serviços públicos Existe porém uma novidade substancial na figura d PFI É que o mecanismo clássico de concessão tinha a ver somente com obras ou 3 GORDILLO Agustín Después de la Reforma del Estado Fundación de Derecho Administrativo Buenos Aires 1996 pp II9 e II10 Para Héctor Jorge Escola o apoio do Estado à tarifa é sempre condicionado à manutenção da impossibilidade econômica dos usuários arcarem com o valor cheio da retribuição pelo serviço pois têm dois inconvenientes injustiça na carga fiscal com toda a coletividade pagando por serviços prestados a apenas alguns de seus membros individualmente e uma certa postura paternalista em relação ao Estado sempre se esperando que ele possa e deva prover quase tudo ESCOLA Héctor Jorge El Interés Público como Fundamento del Derecho Administrativo Ed Depalma Buenos Aires 1989 pp 125 e 126 4 serviços onerosos ou seja pagos pelos utentes mediante taxas ou tarifas de utilização sendo o investimento do concessionário amortizado e remunerado pelos rendimentos da sua exploração Mediante a concessão o Poder Público dispensavase de qualquer envolvimento financeiro recebendo no final da concessão a obra ou serviço em funcionamento livre de encargos em princípio O mecanismo da concessão não era por isso aplicável às obras e serviços públicos gratuitos ou quase gratuitos para os utentes como hospitais e escolas O que há de novo na PFI é justamente a utilização da iniciativa privada para a construção e gestão concessionada de serviços públicos não onerosos ou seja não pagos pelos utentes tradicionalmente montados e geridos diretamente pelo poder público ensino saúde etc O esquema é formalmente o mesmo da concessão clássica O capital privado é chamado a construir e explorar durante um certo período mais ou menos longo 25 30 anos um estabelecimento público hospital escola biblioteca teatro estabelecimento prisional etc revertendo ele no final para o Estado A diferença está em que como o serviço público em causa não é pago pelos utentes ou só em pequena parte o é a amortização e remuneração do capital privado têm de ser assegurados pelo próprio poder público mediante pagamentos regulares feitos pelo Estado durante o período do contrato de acordo com a produção do serviço concessionado4 II PARCERIAS PÚBLICOPRIVADAS EM SENTIDO AMPLO E RESTRITO A exposição feita no tópico anterior já faz antever que adotaremos na presente obra um conceito restrito de parceria públicoprivada ligada ao seu conceito no Direito Positivo Brasileiro especialmente da Lei Federal nº 11079 de 30 de dezembro de 2004 e não o seu conceito mais amplo de caráter mais sociológico e político De fato a noção de parceria entre o Estado e a iniciativa privada há muito principalmente desde a crise fiscal e a globalização da década de oitenta é reiteradamente invocada como um mecanismo apto à soma de esforços de Estado e iniciativa privada na consecução de objetivos públicos Porém nessa acepção as parcerias adquirem um significado tão amplo abrangente de instrumentos negociais tão diversos como as concessões tradicionais permissões acordos de programa subsídios empresariais convênios de toda espécie com entidades sem fins lucrativas mais modernamente chamadas de Organizações nãoGovernamentais ONGs Organizações Sociais OSs 4 MOREIRA Vital A Tentação da Private Finance Iniciative PFI in MARQUES Maria Manuel Leitão e MOREIRA Vital A mão visível mercado e regulação Ed Almedina Coimbra 2003 pp 1878 As parcerias públicoprivadas podem também ser vistas sob a perspectiva da teoria dos quasemercados nos quais o Estado continua financiando o serviço público que no entanto não é mais prestado pela Administração Pública mas sim por empresas privadas Tudo isto porque na ótica da ortodoxia neoliberal os quasemercados podem ser considerados uma solução engenhosa para os problemas derivados das deficiências tanto do mercado como do Estado São o mecanismo que permite aproveitar a força da concorrência para superar os problemas de ineficiência desinteresse e falta de prioridades que caracteriza os sistemas estatais evitando ao mesmo tempo os riscos de injustiça e de informação deficiente normalmente associados aos mercados normais GUERRA Jorge Rodríguez Capitalismo Flexible y Estado de Bienestar Ed Comares Granada 2001 p 200 5 Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público OSCIPs empresas conjuntas franquias etc que a sua conceituação dogmática resultaria se não impossível pelo menos desprovida de utilidade prática É esse o sentido de parceria adotado por MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO em obra há de se ressaltar concebida bem antes da Lei nº 1107904 falase em pareceria entre poder público e iniciativa privada pra designar fórmulas antigas como a concessão e a permissão de serviços públicos Ora são institutos velhos que renascem com nova força e novo impulso como a concessão de serviço público ora são institutos velhos que aparecem com nova roupagem O que muda é principalmente a ideologia é a forma de conceber o Estado e a Administração Pública Não se quer mais o Estado prestador de serviços querse o Estado que estimula que ajuda que subsidia a iniciativa privada As idéias de pareceria e colaboração dominam todos os setores com reflexos inevitáveis no âmbito do Direito Algumas das formas de parceria tratadas neste livro já estão disciplinadas pelo Direito outras estão a merecer atenção do legislador 5 No Direito Comparado inclusive no modelo inglês e no português tão comumente invocados a noção de parceria públicoprivada é dotada dessa maior amplitude6 fazendo com que o seu estudo nos seja mais útil para analisarmos a formas de cooperação em geral entre o Poder Público e entidades privadas do que para as específicas duas formas de cooperação contempladas na Lei nº 1107904 concessões patrocinadas e concessões administrativas 5 DI PIETRO Maria Sylvia Zanella Parcerias na Administração Pública 4ª edição Ed ATLAS São Paulo 2002 pp 15 e 16 6 Cf FREITAS Juarez Parcerias públicoprivadas PPPs Características Regulação e Princípios in Interesse Público vol 29 2005 p 15 O autor lembra inclusive o conceito português do Decretolei nº 8603 Entendese por pareceria públicoprivada o contrato ou a união de contratos por via dos quais entidades privadas designadas por parceiros privados se obrigam de forma duradoura perante um parceiro público a assegurar o desenvolvimento de uma atividade tendente à satisfação de uma necessidade coletiva e em que o financiamento e a responsabilidade pelo investimento e pela exploração incumbem no todo ou em parte ao parceiro privado O conceito de parcerias públicoprivadas na primeira versão do projetodelei enviada ao Congresso Nacional pelo Poder Executivo Projeto de Lei nº 254603 também era bem mais amplo Art 2 Para os fins desta Lei o contrato de Parceria PúblicoPrivada é instrumento firmado entre o Poder Público e entes Privados destinado a estabelecer vínculo obrigacional entre as partes para implantação ou gestão de serviços e atividades de interesse público em que o financiamento e a responsabilidade pelo investimento e pela exploração incumbem no todo ou em parte ao ente privadoobservando os seguintes princípios O conceito e a sistematização da Lei que a deixaram bem diferente do primeiro projeto adveio de substitutivo apresentado no Senado Federal em relação ao qual houve a colaboração de grupo de juristas de interlocução com a Casa Civil da Presidência da República o qual tivemos a honra de integrar juntamente com os professores Adílson Abreu Dallari Carlos Ari Sundfeld Floriano de Azevedo Marques Neto Marçal Justen Filho Paula Forgioni e Odete Medauar devendo ser feito o registro da contribuição direta que as sugestões do Professor Carlos Ari Sundfeld tiveram para o conceito classificação e nomenclatura das parcerias públicoprivadas que acabaram sendo encampadas pela Lei nº 1107904 Uma notícia do fato também consta de JUSTEN FILHO Marçal Curso de Direito Administrativo Ed Saraiva São Paulo 2005 p 550 A solução reflete a decisiva colaboração de Carlos Ari Sundfeld que propugnou inclusive pela aplicação subsidiária das regras da Lei de Concessões para disciplinar as PPPs 6 O presente estudo terá como objeto portanto o conceito restrito de parcerias públicoprivadas tal como positivado na Lei nº 1107904 até porque muitas das espécies do que seria uma noção ampla de parcerias públicoprivadas devem ser objeto de estudos específicos III CONCEITO E CLASSIFICAÇÃO DAS PARCERIAS PÚBLICOPRIVADAS NA LEI FEDERAL Nº 1107904 Abandonando a pretensão de um conceito amplo de parcerias público privadas a Lei nº 1107904 adotou um conceito mais modesto de parcerias públicoprivadas utilizandose em maior ou menor grau a disciplina já existente das licitações públicas Lei nº 866693 e das concessões de serviços públicos Lei nº 898795 Ao reduzir a sua complexidade e ineditismo reduziu também muitas dúvidas e desconfianças hermenêuticas que pairavam sobre o Projeto o que sem dúvida contribuiu para facilitar a sua aprovação Antes de propormos um conceito de parcerias públicoprivadas mister se faz apreciarmos as duas espécies admitidas na Lei de cuja junção advirá o conceito da categoria geral a qual pertencem Notese que o próprio art 2º da Lei nº 1107904 conceitua as parcerias públicoprivadas simplesmente como sendo o contrato administrativo de concessão na modalidade patrocinada ou administrativa III1 CONCESSÕES PATROCINADAS Em primeiro lugar temos como espécie de parcerias públicoprivadas na Lei nº 1107904 as concessões ditas patrocinadas que também poderiam ser chamadas de subsidiadas subvencionadas ou em alguns casos de receita mínima assegurada Nos termos do 1º do seu art 2º são concessões que envolvem adicionalmente à tarifa cobrada do usuário contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado diferenciandose das concessões tradicionais de serviços e obras públicas em razão dessas serem financiadas apenas por tarifas Lei nº 8987957 A sua única diferença para as concessões comuns é portanto que nessa a amortização dos investimentos privados é feita ao menos em linha de princípio integralmente pelas tarifas pagas pelos usuários enquanto na concessão patrocinada a amortização é feita ao mesmo tempo com tarifas e verbas do próprio Erário 7 Lei nº 1107904 Art 2º 3o Não constitui parceria públicoprivada a concessão comum assim entendida a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei no 8987 de 13 de fevereiro de 1995 quando não envolver contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado 7 É a semelhança existente nos demais aspectos que fez com que o art 3º 1º da Lei nº 1107904 determinasse genericamente a aplicação subsidiária de toda a Lei nº 898795 e das demais leis que tratam das concessões comuns ex 907495 às concessões patrocinadas O objeto das concessões patrocinadas é por excelência os serviços públicos econômicos atividades econômicas lato sensu titularizadas com exclusividade pelo Estado suscetíveis de exploração pela iniciativa privada apenas mediante delegação já que passíveis de exploração mediante pagamento de tarifas pelos usuários ainda que o valor pago não seja suficiente para financiar todos os investimentos do concessionário8 Essa proximidade com as concessões tradicionais da Lei nº 898795 faz inclusive com que muitos autores sustentem que a consagração legal da modalidade patrocinada de concessão não era imprescindível uma vez que mesmo sob a égide apenas da Lei nº 898795 já seria possível ao Poder Público complementar direta ou indiretamente o valor arrecadado com as tarifas para viabilizar a prestação desses serviços públicos econômicos pela iniciativa privada MARÇAL JUSTEN FILHO por exemplo invocando os valores constitucionais da dignidade da pessoa humana de cuja realização as concessões de serviços públicos são meros instrumentos sustentava que a Lei nº 8987 não pretendia impedir a realização de valores consagrados constitucionalmente A temática da colaboração estatal para a remuneração do concessionário tem de ser interpretada em face desses princípios constitucionais fundamentais Bem por isso será vedada a subvenção quando configurar uma forma de benefício injustificado para o concessionário Não se admite em face da própria Constituição é o concessionário receber benesses do poder concedente com pagamentos destinados a eliminar de modo absoluto o risco intrínseco e inafastável Mas não haverá inconstitucionalidade quando a contribuição estatal for instrumento para assegurar a modicidade da tarifa valor fundamental para o cumprimento das destinações do serviço público ou a realização das funções estatais inerentes à persecução do interesse coletivo9 Em outras palavras para o autor paranaense se o apoio financeiro10 do Estado ao concessionário era a 8 A oferta de serviços públicos de forma bastante simplificada pode ser financiada ou com recursos amealhados indistintamente da coletividade via instrumentos tributários ou por valores auferidos da própria prestação cobrada diretamente daqueles que delas fazem uso Não há outra opção Admitese apenas as variáveis puras ou a combinação das duas formas por exemplo o que ocorre na prestação de serviços públicos remunerados pelos usuários mas com alguma espécie de subsídio tarifário arcado pelo Estado mediante recurso de fonte tributária MARQUES NETO Floriano de Azevedo Concessão de Serviço Público sem ônus para o Usuário in Direito Público Estudos em Homenagem ao Professor Adilson Abreu Dallari Ed Del Rey bh 2004 p 339 9 JUSTEN FILHO Marçal Teoria Geral das Concessões de Serviço Público Ed Dialética São Paulo 2003 p 93 10 Esse apoio financeiro do Estado seja no contexto de uma concessão comum seja no de uma PPP não pode ser considerado uma manifestação da atividade de fomento do Estado pois além de versar sobre atividade estatal não sobre uma atividade econômica privada o fomento pressupõe a gratuidade o caráter de doação via de regra com encargos dos recursos 8 condição para que o serviço público pudesse ser prestado de forma acessível à população não haveria porque proscrevêlo O grande obstáculo a essa interpretação construtiva da Lei nº 898795 era o veto ao seu art 24 que já previa uma modalidade de concessão patrocinada11 mas que foi vetado pela seguinte razão Garantias como essa do estabelecimento de receita bruta mínima além de incentivarem ineficiência operacional do concessionário representam na realidade um risco potencial de dispêndio com subsidio pelo Poder Público O caso mais recente foi o mecanismo instituído pela Lei n 565571 que criou a Conta de Resultados a Compensar CRC extinta em 18393 com a regulamentação da Lei n 863193 gerando dispêndios líquidos para a União da ordem de US 198 bilhões Ora por mais que o veto não integre a lei é claro que constitui elemento histórico de grande importância para a sua interpretação que ao nosso ver salvo em casos extremos de a lei restar ilógica não pode levar a resultados expressamente refutados pelo veto Em outras palavras não se pode via hermenêutica repor aquilo que o veto retirara Apesar disso não seria correto afirmar que a concessão patrocinada era desconhecida no Direito Brasileiro Basta lembrarmos do apoio que o Estado muita vezes deu cedendo ao concessionário a exploração de imóveis sem relação necessária com o serviço reequilibrando a equação econômicofinanceira do contrato com o aporte de verbas ao invés de aumentar tarifas que já se encontravam no limite da capacidade dos usuários assumindo a obrigação de realizar certos investimentos que ordinariamente caberiam ao concessionário ex Metrô do Estado do Rio de Janeiro em que a concessionária apenas opera o sistema mas a expansão das linhas e a aquisição de novos vagões continua sendo de responsabilidade do Estado12 De toda sorte todos esse debates demonstram que a expressa admissão das concessões patrocinadas pela Lei nº 1107904 não foi despicienda já que sob a égide apenas da Lei nº 898795 as discussões eram tantas que muitos agentes públicos e privados não tinham segurança suficiente para celebrar dados pelo Estado cf RIVA Ignacio M de la Ayudas Públicas Incidencia de la intervención estatal en el funcionamiento del mercado Ed Hammurabi Buenos Aires 2004 p 181 11 Art 24 O poder concedente poderá garantir no contrato de concessão uma receita bruta mínima ou no caso de obras viárias o correspondente a um tráfego mínimo durante o primeiro terço do prazo da concessão 12 Vejase o 3º do art 2º da Lei Estadual nº 286997 que dispõe sobre o regime de prestação do serviço público de transporte ferroviário e metroviário de passageiros e sobre o serviço público de saneamento básico no Estado do Rio de Janeiro 3º Fica o Poder Executivo autorizado nos termos da Lei nº 2831 de 13 de novembro de 1997 a subsidiar a concessão de serviço público de transporte ferroviário na forma do que dispuser o Edital a proposta vencedora o contrato de concessão e as leis orçamentárias anuais Sobre a modelagem da delegação do serviços públicos de transporte metroviário do Estado do Rio de Janeiro ver SOUTO Marcos Juruena Villela Direito Administrativo das Concessões Ed Lumen Juris Rio de Janeiro 2004 pp 246 a 265 9 delegações de serviços públicos com essa modelagem mais criativa com alguma espécie de apoio financeiro direto do Poder Público13 Subsistem contudo em setor da doutrina mesmo após a Lei nº 1107904 dúvidas constitucionais quanto à admissibilidade de concessões total ou parcialmente subsidiadas pelo Estado já que interpretam o art 175 da Constituição Federal como admitindo apenas as concessões que sejam remuneradas integralmente por tarifas pagas pelos usuários por conta e risco do concessionário o que seria inferido inclusive da determinação de que a concessão deve ter uma política tarifária art 175 parágrafo único III CF A nosso ver a mera referência à política tarifária não pode levar a tão longe O que essa opinião estaria alcançando seria na prática a constitucionalização do conceito doutrinário brasileiro majoritário no momento da promulgação da Constituição de concessão de serviço público que realmente era lecionado como pressupondo a remuneração do concessionário exclusivamente por tarifas e a atribuição de todos os riscos apenas a ele ressalvados somente os fatos imprevisíveis ou causados pela própria Administração que provocassem o desequilíbrio da equação econômico financeira Não é possível admitir que o Constituinte tenha engessado de tal maneira o Legislador a ponto de colocálo sempre atado a uma definição doutrinária tradicional de concessão indiferente a todas as enormes mudanças sociais econômicas e políticas verificadas após 05 de outubro de 1988 Ademais política tarifária pode perfeitamente ser entendida como a política segundo a qual a tarifa deve cobrir apenas parte do custo do serviço público sendo o restante arcado pelo Estado Devemos atentar também para o fato de que o conceito tradicional restrito de concessão majoritário na doutrina administrativista brasileira pré1988 era claramente inspirada na doutrina dos países que constituíram a raiz do nosso Direito Administrativo especialmente da França Ocorre que nesses países se a concessão realmente tem um conceito restrito mas mesmo assim não tanto quanto o sustentado no Brasil ela é apenas uma entre as diversas modalidades existentes de delegação de serviços 13 Ainda é defensável contudo que além das modalidades previstas na Lei nº 898795 e na Lei nº 1107904 a Administração Pública pode criar outras espécies de concessão que não forem vedadas pelo Direito não precisando cada uma delas possuir previsão legislativa específica A Lei das PPP previu um regime jurídico próprio a um tipo de parceria entre poder público e iniciativa privada É dizer a Lei nº 1107904 contém regras para duas modalidades específicas de parcerias aquelas configuradas como concessões administrativas ou concessões patrocinadas não sendo aplicável e portanto não vedando outras modalidades de parceria que não se enquadrem na definição das duas modalidades nela referidas Tenham estas parcerias a configuração de concessões de serviço público típicas art 2º 3º tenham elas outras configurações não vedadas na legislação e submetidas ao regime jurídico geral dos contratos administrativos MARQUES NETO Floriano de Azevedo As Parcerias PúblicoPrivadas no Saneamento Ambiental mimeo 2005 10 públicos14 ao contrário do Brasil em que essas tradicionalmente se limitaram às concessões e permissões de serviços públicos mesmo assim sem muitas diferenças entre elas razão pela qual a alusão a elas pelo art 175 da CF deve ser considerada pelo menos em uma acepção razoavelmente ampla que contemple algumas espécies 15 Na França por exemplo temos além das concessões uma série de modalidades de delegação em que a remuneração não se dá exclusivamente por tarifa assemelhandose às parcerias públicoprivadas da Lei nº 1107904 Há na França16 com efeito os seguintes tipos básicos de delegação de serviços públicos 1 Concession de service public Modelotipo da delegação de serviço público é o contrato em virtude do qual o concedente pessoa pública encarrega um concessionário pessoa pública ou privada de explorar um serviço público por sua conta e risco Assegurando a exploração do serviço público por seu risco e prejuízo se poderia dizer por seus riscos e lucros o concessionário é remunerado pela exploração do serviço ou seja por meio da receita que auferir dos usuários Ele pode todavia receber do poder concedente certas participações que podem ter a forma de garantias de empréstimo de subvenções para equipamentos ou para o equilíbrio do contrato ou ainda através de indenizações de recomposição da equação econômicofinanceira b Affermage Muito próximo da concessão se diferencia dela apenas em razão de o objeto da delegação ser apenas a prestação em si do serviço sem a construção de infraestrutura que já é entregue pelo Poder Público ou por um concessionário anterior que construíra a infraestrutura Como o fermier fica livre dos ônus da criação da infraestrutura frais de premier établissement e o Estado continua responsável pela eventual expansão da infraestrutura geralmente deve pagar ao Poder Concedente certa quantia pelo direito delegado c Régie Interessé Situada entre a delegação e a mera terceirização é pela maioria mas não pela totalidade da doutrina francesa ainda considerada como um tipo daquela O delegatário presta um serviço a partir de uma infraestrutura já fornecida pelo Poder Concedente que mantém a sua propriedade ao longo de todo o contrato 14 No estrangeiro os países com cultura jurídica similar à brasileira conhecem figuras equivalentes àquela que é identificada no Brasil pela expressão concessão a ela atribuindo regime jurídico equivalente ao vigente entre nós Quando muito verificase uma diferenciação terminológica reservandose a expressão concessão para uma espécie de delegação É o que se passa na França e na Espanha Já em outras órbitas aquele mesmo vocábulo é utilizado para indicar um gênero albergando inúmeras variações distintas Assim ocorre no âmbito da União Européia e da própria Itália Em face do pensamento alienígena a concessão pressupõe vínculo entre a remuneração do concessionário e os resultados da exploração empresarial Mas isso não significa a impossibilidade de o concessionário ser satisfeito através de verbas de origem pública JUSTEN FILHO Marçal As Diversas Configurações da Concessão de Serviço Público in Revista de Direito Público da Economia RDPE vol 1 2003 p 135 15 O art 175 não impôs uma disciplina restritiva para o legislador A referência à delegação por meio de concessão de serviço público não significou nem a consagração de um único e determinado tipo de avença nem a vedação a que outras avenças sejam praticadas a propósito de obras públicas JUSTEN FILHO Marçal Curso de Direito Administrativo Ed Saraiva São Paulo 2005 p 506 16 As considerações sobre o Direito Administrativo francês expendidas nesse Tópico advém sobretudo da obra de BOITEAU Claudie Les Conventions de Délégation de Service Public Imprimerie Nationale Paris 1999 pp 96 a 106 11 Deve realizar apenas pequenas obras de manutenção e naturalmente a prestação do serviço O serviço é pago pelos usuários mas diretamente ao Estado que por sua vez paga orçamentariamente ao régisseur uma quantia calculada de acordo com a quantidade de usuários e a qualidade do serviço prestado d Bail Emphytéotique Administratif Por ele o particular faz determinados investimentos em imóvel público ou colocado à disposição do Estado que servirão à prestação de determinado serviço público remunerando se através da exploração de outras instalações por ele construídas no imóvel ex constrói um hospital e um shopping Vemos portanto que além de o Direito francês possuir diversos tipos de delegação de serviços públicos a própria concessão é apenas via de regra remunerada só pelos usuários admitindo algumas espécie de garantias financeiras do Estado Ademais admite uma liberdade geral à Administração Pública para lançar mão de contratos atípicos e inominados de delegação de serviços públicos não precisando serem todos eles previamente tipificados em lei Essa plasticidade contratual não é obviamente apenas francesa mas exigência da sociedade pósmoderna cujo dinamismo e necessidades sempre novas são muito pouco aprisionáveis em compartimentos conceituais estanques e exaustivos Isso revela a obsolescência dos modelos tradicionais de delegação A tipologia clássica dos contratos de gestão delegada pouco a pouco se desvanece diante das concessões complexas que são aplicadas a esses modelos O Poder Público elabora contratos que apresentam o caráter de patchwork e que nem sempre têm uma denominação específica Além do fato de o juiz não estar vinculado à denominação do contrato cuja legalidade é por ele examinada o caráter patchwork é progressivamente digerido pela noção genérica de delegação de serviço público17 Comparativamente com o Direito Administrativo francês podemos dizer que a principal conseqüência que a Lei nº 1107904 operou no ordenamento jurídico brasileiro foi a de ampliar o conceito de concessão de serviço público tornandoa próxima à noção genérica que a expressão delegação de serviço público possui naquele País Mesmo na tradição do Direito Brasileiro as concessões de serviços públicos não têm um conceito que inequivocamente abranja apenas as 17 BOITEAU Claudie Les Conventions de Délégation de Service Public Imprimerie Nationale Paris 1999 pp 96 e 97 A expressão patchwork utilizada pela autora deve ser compreendida não apenas no sentido figurado ou metafórico da comparação com as colchas feitas com retalhos de inúmeros tecidos no caso um contrato atípico feito com características e elementos parciais de vários contratos típicos mas sobretudo à luz da contemporânea filosofia desconstrutivista francesa especialmente a de Gilles Deleuze que trouxe a expressão patchwork para o âmbito filosófico É uma coleção amorfa de pedaços justapostos cuja junção pode ser feita de infinitas maneiras O espaço liso do patchwork mostra bastante bem que liso não quer dizer homogêneo ao contrário é um espaço amorfo informal e que prefigura a opart DELEUZE Gilles e GUATARRI Félix Mil Platôs trad Peter Pál Pelbart e janice Caiafa vol 5 Ed 34 1997 São Paulo p 182 12 concessões remuneradas exclusivamente por tarifas As primeiras concessões de serviços públicos ferroviários celebradas no Brasil por exemplo já estabeleciam nos termos da Lei Geral nº 641 de 26 de junho de 1852 como cláusula básica a garantia de rentabilidade do capital investido garantia de juros de até 5 aa Garantias de juros ou seja um subsídio que garantia a rentabilidade do capital investido são tipicamente instrumentos de uma política de desenvolvimento econômico ainda que com a roupagem do século XIX18 No Direito latinoamericano DANIEL EDGARDO MALJAR valendose das lições de GARRIDO FALLA também explicou Pode ocorrer que em razão da retração da demanda o capital investido não gere lucro no final prazo contratual Para evitar esse problema surgiu uma dúplice técnica ou a subvenção do déficit ou a técnica da garantia administrativa de lucro Ambas respondem à finalidade de dar um maior incentivo ao capital considerando a dificuldade de apreciação a priori dos custos de produção Nesses casos a Administração promete uma subvenção em branco de acordo com os resultados da empresa beneficiária ou uma garantia de lucratividade Essa última técnica foi usada na Espanha para favorecer a exploração ferroviária A Administração cobriria então a diferença existente entre o que a empresa obtém da exploração e o lucro garantido19 Não há portanto um conceito universal de concessão de serviço público pelo qual o Constituinte teria vinculado o Legislador razão pela qual afigurase plenamente constitucional face ao art 175 da CF a previsão legal de concessões financeiramente apoiadas pelo Estado seja pelo pagamento direto de uma quantia a ser determinada seja pela garantia de receita mínima ou de uma dada quantidade de usuários Na verdade a Lei nº 1107904 delega ao contrato a determinação dessa repartição de riscos e despesas Admite assim as mais diversas modelagens contratuais desde que já estejam previstas no edital de licitação e que o Estado dê apoio financeiro apenas após o serviço estar disponibilizado20 III2 CONCESSÕES ADMINISTRATIVAS As chamadas pela Lei nº 1107904 de concessões administrativas são contratos em que a cobrança de tarifas é inviável econômica ou socialmente de acordo com decisão política a ser discricionária e fundamentadamente tomada pelo Estado ou até mesmo juridicamente vedada como a cobrança pela saúde ou educação públicas artigos 196 e 206 IV CF ou ainda porque o único usuário do serviço a ser prestado é o próprio Estado Aqui não se fala mais sequer em 18 JOHNSON Bruce Baner et alli Serviços Públicos no Brasil mudanças e perspectivas Ed Edgard Blücher São Paulo 1996 p 54 19 MALJAR Daniel Edgardo Intervención del Estado en la Prestación de Servicios Públicos Ed Hammurabi Buenos Aires 1998 pp 2923 20 Sobre as diversas modelagens contratuais das PPPs quanto à repartição de riscos ver o Tópico 8 infra 13 tarifa a ser complementada por verbas do Estado mas da inexistência tout court de tarifas Nos termos do 2º do art 2º da Lei nº 1107904 a concessão administrativa é o contrato de prestação de serviços de que a Administração Pública seja a usuária direta ou indireta ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens CARLOS ARI SUNDFELD21 define as concessões administrativas como sendo os contratos de prestação de serviços de que a Administração é usuária mediata ou imediata em que a há investimento do concessionário na criação de infraestrutura relevante b o preço é pago periódica e diferidamente pelo Concedente em um prazo longo permitindo a amortização dos investimentos e o custeio e c o objeto não se restringe à execução de obra ou ao fornecimento de mãodeobra e bens estes se existirem deverão estar vinculados à prestação de serviços Em outras palavras tem que haver a gestão do bem prestação de serviços através dele o que ao mesmo tempo diferencia as concessões administrativas da simples prestação terceirizada de serviços em que não há a disponibilização da infraestrutura pelo contratado à Administração Pública e da empreitada de obras públicas em que há a disponibilização da infraestrutura pelo contratado mas não a prestação de serviços através dela Enquanto o objeto das concessões patrocinadas restringese aos serviços públicos econômicos o das concessões administrativas têm como possível objeto um leque bem mais amplo de atividades administrativas algumas delas sequer enquadráveis no conceito mais restrito de serviços públicos Assim podemos enumerar sem pretensão exauriente as seguintes espécies de atividades que podem ser objeto da concessão administrativa 1 serviços públicos econômicos em relação aos quais o Estado decida não cobrar tarifa alguma dos usuários ex rodovia em uma região muito pobre 2 serviços públicos sociais como a educação a saúde e a cultura e o lazer em geral que também podem ser prestados livremente pela iniciativa privada Lembremos por exemplo de algumas experiências já vividas em algumas entidades da federação de terceirização da administração de hospitais públicos 3 atividades preparatórias ou de apoio ao exercício do poder de polícia que em si é indelegável à iniciativa privada22 nos termos aliás também expressamente 21 SUNDFELD Carlos Ari Projetos de Lei de Parcerias PúblicoPrivadas Análise e Sugestões mimeo 2004 22 Caracterizadas as suas funções como exercício de poder de polícia que é a atividade revestida de potestade estatal por excelência só poderia ser pela doutrina clássica que hoje sofre fortes contestações desempenhada por pessoas jurídicas de direito público ou seja Entes da Federação ou autarquias abstemonos aqui da contenda quanto à natureza das fundações instituídas pelo Poder Público Este entendimento tradicional é claramente inspirado no Direito Administrativo Francês país no qual o Conseil dEtat afirmou Além disso a jurisprudência proíbe que a Administração conceda o serviço público de polícia a uma pessoa privada Conseil dEtat 23 mai 1958 Amoudruz Rec 302 apud DE FORGES JeanMichel Droit Administratif Presses Universitaires de France PUF 1995 p 165 Outra parcela da doutrina apenas admite a delegação dos atos meramente preparatórios do exercício da polícia administrativa que são os 14 estabelecidos no art 4º III da Lei nº 110790423 Seriam os casos da hotelaria em presídios da colocação de pardais eletrônicos em vias públicas prestação de serviços de reboque para remoção de veículos estacionados irregularmente etc 4 Atividades internas da Administração Pública em que o próprio Estado aí incluindo os seus servidores é o único beneficiário do serviço ex construção e operação de uma rede de creches ou restaurantes para os servidores públicos construção e operação de um centro de estudos sobre a gestão administrativa para elaboração de projetos para a maior eficiência do Estado etc Especialmente em relação aos serviços públicos sociais ou culturais as concessões administrativas revelam um grande espaço por elas deixado para a cooperação entre o Poder Público e as entidades privadas inclusive sem fins lucrativos o chamado terceiro setor Como observa PAULO MODESTO na verdade a participação de entidades privadas na prestação de serviços sociais autorizada expressamente pela Constituição vg art 199 202 204 I 209 216 1º 218 4º 225 não apenas é pragmática como pode ser percebida como uma das respostas conseqüentes à crise do aparelho do Estado no âmbito da prestação dos serviços sociais O Estado não tem efetivamente condições de monopolizar a prestação direta executiva dos serviços de assistência social de interesse coletivo Estes podem ser geridos ou executados por outros sujeitos públicos ou privados preferencialmente instituições públicas não estatais pessoas privadas de fim público sem fins lucrativos consoante diferencia a própria Constituição CF art 199 1º sob a fiscalização e supervisão imediata do Estado Nestes casos não prover diretamente não quer dizer tornarse irresponsável perante essas necessidades sociais básicas ou negar o direito fundamental à saúde à educação à defesa do meio ambiente à pesquisa científica e tecnológica O Estado não deve nem pode demitirse da responsabilidade de assegurar e garantir direitos sociais quando não executar deve fomentar ou financiar diretamente a execução de serviços sociais necessários à coletividade O Estado contemporâneo continua executor regulador fiscalizador e financiador de serviços sociais mas pode contar também com mecanismos de parceria ágeis para ampliar a sua capacidade de assegurar a efetiva fruição dos direitos sociais básicos24 As concessões administrativas se encontram no meio caminho entre a delegação e a terceirização Entendemos serem de fato delegações de atividades administrativas não necessariamente de serviços públicos não meras terceirizações pois pressupõem a construção expansão reforma ou manutenção que podem ser objeto de PPPs cf PROVENZA Vittorio Constantino Parecer in Revista de Direito da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro 359382 23 Art 4oNa contratação de parceria públicoprivada serão observadas as seguintes diretrizes III indelegabilidade das funções de regulação jurisdicional do exercício do poder de polícia e de outras atividades exclusivas do Estado 24 MODESTO Paulo Reforma do Estado Formas de Prestação de Serviços ao Público e Parcerias PúblicoPrivadas demarcando as fronteiras dos conceitos de serviço público serviços de relevância pública e serviços de exploração econômica para as parcerias públicoprivadas mimeo 2005 grifos no original N EConferir também o texto do autor na coletânea SUNDFELD Carlos Ari Parcerias PublicoPrivadas São Paulo Ed Malheiros 2005 15 de infraestruturas através das quais também prestará serviços sendo vedada a sua utilização se tiver como objeto único o fornecimento de mãodeobra o fornecimento e instalação de equipamentos ou a execução de obra pública art 2º 4º III Lei nº 1107904 com que teríamos aí sim uma mera terceirização ou empreitada d obra pública regidas pela Lei nº 866693 O que assemelharia a concessão administrativa de uma terceirização complexa que combinaria um contrato de empreitada de obra pública com um contrato de prestação do serviço que se faria através da obra depois de pronta seria o fato de ser remunerada direta e integralmente pelos cofres públicos25 Todavia a forma de cálculo do valor a ser pago à empresa deve ser variável de acordo com as utilidades concretamente prestadas à Administração Pública ou à população o que decorre do Princípio da Eficiência e da necessidade de compartilhamento de riscos que anima as parcerias público privadas arts 4º VI e 5º III Lei nº 1107904 já que com o preço fixo o risco ficaria exclusivamente com o Poder Público como nos contratos regidos pela Lei nº 86669326 Nos contratos chamados pela Lei nº 1107904 de concessões administrativas há autonomia de gestão da empresa contratada na gestão da infraestrutura e na prestação do serviço por intermédio dela viabilizada A concessão administrativa seria assim muito semelhante à régie interessé do Direito francês que são as delegações contratuais de serviço público a uma pessoa geralmente privada na qual o Poder Público guarda somente a responsabilidade pelos seu funcionamento A empresa não se remunera diretamente dos usuários do serviço público Ela percebe do Estado valores associados aos resultados da sua gestão Tratase de um modo privado de gestão que não é uma concessão de serviço público já que não há qualquer remuneração direta sobre os usuários do serviço27 A concessão administrativa se aproxima mais da régie interessé em que apesar de não haver qualquer remuneração tarifária o particular se remunera em razão dos resultados da sua gestão do que da gérance não considerada pela maioria da doutrina e jurisprudência francesas como uma forma de delegação já que apesar de gerar um direito a remuneração por parte do Estado que pode ser calculada em relação à atividade considerada não consiste em uma participação no resultado financeiro da exploração do serviço não correndo portanto riscos financeiros Nessa modelagem a gérance é materialmente 25 No caso de a Administração Pública ser a única beneficiária do serviço não havendo usuários tarifados ou gratuitos parte da doutrina francesa assim estatui A diferença fundamental entre uma empreitada e uma delegação é que pela primeira a pessoa pública obtém uma prestação da qual precisa e pela segunda ela confia ao cocontratante o dever de efetuar uma prestação da qual ela não é salvo acidentalmente a beneficiária RAYMUNDIE Olivier Gestion Deleguée dês Services Publics en France et en Europe Éditions Le Moniteur Paris 1995 p 73 26 Sobre a necessidade de divisão de riscos ver Tópico 81 27 VALETTE JeanPaul Le Service Public à la Française Ed Ellipses Paris 2000 p 108 Sobre os institutos de delegação da gestão de atividades administrativas no Direito Francês ver Também a exposição feita no Tópico 31 supra 16 apenas uma empreitada de obra pública ou uma prestação serviços por conta do próprio Estado Para que a gérance seja excepcionalmente considerada uma delegação da gestão deve a remuneração da empresa no mínimo ter um liame substancial com as receitas de exploração e que não apareça como um simples preço28 Logicamente que nos casos concretos podem surgir muitos matizes sendo a jurisprudência do Conselho de Estado como dificilmente poderia deixar de ser bastante casuística e errática na identificação do contrato como uma delegação ou não De toda sorte todavia pode ser fixado que o ponto principal para identificar uma delegação é a circunstância de o particular participar dos resultados da sua exploração29 A concessão administrativa enquanto delegação da gestão de determinada infraestrutura administrativa deve em primeiro lugar assegurar ao concessionário autonomia empresarial no desenvolvimento da atividade podendo definir a maior parte dos meios que julga aptos a alcançar os objetivos estabelecidos contratualmente Essa autonomia de gestão decorre inclusive da vedação de as parcerias públicoprivadas se dirigirem unicamente ao fornecimento de mãodeobra ao fornecimento e instalação de equipamentos ou à execução de obra pública art 2º 4º III Lei nº 1107904 Em segundo lugar a remuneração do concessionário administrativo deve ainda que não seja uma participação financeira ter relação direta com a quantidade eou qualidade das utilidades concretamente prestadas à Administração Pública ou à população o que constitui decorrência direta de a Lei impor a repartição de riscos arts 4º VI e 5º III Lei nº 1107904 A sua remuneração não pode portanto ser fixa indiferente à quantidade e qualidade dos serviços prestados com o que a Administração Pública assumiria todos os riscos a exemplo do que acontece com a terceirização e empreitada da Lei nº 86669330 As concessões administrativas são portanto também uma espécie de delegação da gestão de atividades administrativas não necessariamente de 28 VALETTE JeanPaul Le Service Public à la Française Ed Ellipses Paris 2000 pp 132 e 133 29 Naturalmente que a analogia com os institutos do Direito Francês é apenas aproximada já que o critério da participação em resultados financeiros para definir a presença de delegação não nos afigura inteiramente apropriado à luz da Lei nº 1107904 uma vez que as concessões administrativas na maioria das vezes versarão sobre atividades insuscetíveis de exploração econômica razão pel qual não se haveria de falar nunca em participação em resultados financeiros A idéia no entanto de uma remuneração nãofixa e que guarde relação com a utilidade concretamente gerada pelo contratado énos extremamente útil principalmente tendo em vista o longo tempo de elaboração da jurisprudência do Conselho de Estado na caracterização de contratos administrativos como contratos de delegação ou não 30 Naturalmente que a remuneração da prestação terceirizada de serviços à Administração Pública pode ser fixada de acordo com a quantidade do objeto contratual mas essa quantidade está totalmente fora da autonomia de gestão empresarial do contratado primeiro elemento cumulativo de caracterização da concessão administrativa cf supra já que previamente definida no edital de licitação prédefinição essa impossível de ser feita nas concessões objeto da Lei nº 1107904 17 serviços públicos propriamente ditos o que não poucas conseqüências práticas além de teóricas possui para fins de responsabilidade objetiva reversão de bens etc aplicáveis somente à delegações de atividades administrativas e não às demais modalidades de contratos administrativos Não é por outra razão que a Lei nº 1107904 apesar de não determinar uma aplicação subisidiária genérica da Lei das Concessões de Serviços Públicos Lei nº 898795 às concessões administrativas a exemplo do que faz em relação às concessões patrocinadas31 prescrevelhe a aplicação das suas disposições relativas ao ressarcimento pelo concessionário dos projetos prévios à licitação art21 às cláusulas essenciais do contrato entre elas a de reversão de bens art 23 à subcontratação art 25 à transferência da concessão ou do controle da concessionária art 27 à garantia com os direitos emergentes da concessão art 28 a todas as obrigações do poder concedente e da concessionária artigos 29 a 31 e à intervenção e todas as modalidades de extinção artigos 32 a 39 tudo nos termos do art 3º caput e 9º 1º da Lei nº 110790432 A aplicação da Lei nº 898795 às PPPs em qualquer das suas modalidades deve no entanto ainda quando haja previsão expressa da sua aplicação se dar apenas no que couber ou seja no que não contrariar a própria natureza das PPPs em que há uma dependência financeira do Poder Concedente bastante significativa ao passo que nas concessões comuns a dependência financeira se dá preponderantemente em relação à clientela pagante das tarifas Assim não nos parece por exemplo que seja aplicável às PPPs o parágrafo único do art 39 da Lei nº 898795 que prevê que mesmo na inadimplência do Poder Concedente o concessionário não pode suspender a prestação dos serviços antes de obtida a rescisão judicial transitada em julgada do contrato vedação da exceção do contrato não cumprido Parecenos que na hipótese o art 78 XV da Lei nº 866693 que versa sobre contratos em que também há uma contraprestação financeira da Administração Pública se coaduna melhor com o arcabouço financeiro das PPPs Com aplicação de todos esses dispositivos da Lei nº 898795 que constituem a estrutura jurídica e econômica básica dos contratos nela disciplinados a concessão administrativa também é a exemplo das concessões comuns e patrocinadas um investimento privado amortizável no longo prazo findo o qual os bens construídos reformados ou mantidos pelo particular revertem ao Poder Público A única diferença é que essa amortização se fará com verbas 31 A remissão genérica se explica em razão de nas concessões patrocinadas estar da mesma forma que nas concessões comuns presente o elemento tarifário ainda que parcialmente 32 Não fica evidentemente descartada de forma absoluta a aplicação às concessões administrativas de outros dispositivos da Lei nº 898795 a depender do caso concreto Os outros dispositivos não foram referidos no art 3º caput da Lei nº 1107904 mas continuam integrando o ordenamento jurídico como elemento hermenêutico ou de analogia Igualmente apesar de a Lei nº 866693 não ter salvo em alguns pontos específicos ex art 5º VIII Lei nº 1107904 tido a sua aplicação subsidiária genericamente determinada para as parcerias públicoprivadas a sua aplicação é dependendo do caso concreto perfeitamente possível O que em caso algum é admissível é que a aplicação subsidiária da Lei nº 898795 ou da Lei nº 866693 acabe desvirtuando a natureza e o espírito de divisão de riscos que inspiram as duas espécies de parcerias públicoprivadas da Lei nº 1107904 18 do Erário e não através total concessões comuns ou parcialmente concessões patrocinadas de tarifas dos usuários III3 PROPOSTA DE CONCEITO DE PARCERIAS PÚBLICOPRIVADAS Como já afirmando o conceito restrito e legal das parcerias público privadas deve advir da junção das duas espécies de contratos contempladas na Lei nº 1107904 não de conceitos sociológicos políticos ou econômicos que não teriam utilidade jurídica por abrangerem fenômenos imensamente díspares entre si Assim podemos conceituar as parcerias públicoprivadas no Direito positivo brasileiro como sendo os contratos de delegação da construção ampliação reforma ou manutenção de determinada infraestrutura e da gestão da totalidade ou parte das atividades administrativas prestadas por seu intermédio mediante remuneração de longo prazo arcada total ou parcialmente pelo Estado fixadas em razão da quantidade ou qualidade das utilidades concretamente propiciadas pelo parceiro privado à Administração Pública ou à população Os incisos I e II do 4º do art 2º da Lei nº 1107904 estabelece que as parcerias públicoprivadas em ambas as suas modalidades não poderão ter um valor menor do que R 20 milhões e que não poderão ter prazo inferior a cinco anos O art 5º I estabelece por sua vez que o prazo além de não poder ser inferior a cinco anos também não poderá ser superior a trinta e cinco incluindo eventuais prorrogações O objetivo dessas normas é que as PPPs não sejam vulgarizadas reservandoas apenas para grandes projetos de infraestrutura até porque a sua utilização tem que ser feita de forma planejada e fixandose prioridades em razão do limite de um por cento da receita corrente líquida que cada Ente tem para o conjunto das suas PPPs artigos 22 e 28 Lei nº 110790433 33 Já não são poucos os que vem questionando a aplicabilidade dessas normas aos Estados e Municípios por estabelecerem detalhes de prazo e de valor que não se coadunariam com a natureza de normas gerais Argúem sobretudo que o valor de R 20 milhões é elevado para muitos municípios Não nos parece que seja assim pois como demonstrado acima as normas se relacionam com o objetivo geral de as parcerias públicoprivadas serem utilizadas seletivamente apenas para grandes projetos de infraestrutura além de se ter que considerar os elevados riscos fiscais que acarretam e um número menor de parcerias públicoprivadas é mais fácil de se controlar O fato desse legítimo objetivo geral muitas vezes não ser aplicável a pequenos municípios não faz com que a norma deixe de ser geral já que combina o princípio da economicidade com o princípio da eficiência centrando os escassos recursos públicos disponíveis em projetos que realmente sejam capazes de dar sustentabilidade ao desenvolvimento O que a Lei pretende é que as parcerias públicoprivadas não sejam utilizadas para projetos que não tenham grande magnitude não evitar que pequenos municípios se utilizem delas Se isso vier a ocorrer em alguns casos concretos tratarseá de conseqüência meramente reflexa da mesma forma que diversos outros instrumentos jurídicos como por exemplo algumas linhas de crédito e as PPPs têm muito dessa característica não estão disponíveis aos Municípios brasileiros mais modestos Devemos ainda lembrar que grande parte das dificuldades de pequenos municípios se 19 O valor e os prazo mínimos e máximo não são porém por mais relevantes que sejam elementos conceituais nucleares das parcerias público privadas mas sim requisitos que devem ser preenchidos para que o instrumento das PPPs possa ser adotada IV LEIS ESTADUAIS E MUNICIPAIS DE PPPS A Lei nº 1107904 ao dispor sobre normas gerais de contratos adminstrativos e licitações públicas é na forma do art 22 XXVII CF uma lei de incidência nacional aplicável a todos os Entes da Federação no que puder ser considerada norma geral Para evitar discussões que grassaram sobre outras leis dessa natureza devidas em grande parte à dificuldade de se determinar objetivamente o caráter genérico ou específico das normas34 a Lei nº 1107904 afastando ao menos em parte tantas discussões já especificou a parte das suas normas sobretudo de Direito Administrativo organizacional ex órgão gestor fundo garantidor que se dirigem apenas à União artigos 14 a 22 A edição das normas gerais de consolidação das contas públicas aplicáveis aos contratos de parceria público privada foi por sua vez em norma de questionável constitucionalidade delegada à Secretaria do Tesouro Nacional art 25 Lei nº 1107904 Naturalmente que sempre restarão discussões sobre o caráter genérico dessa ou daquela norma mas podemos afirmar que de forma geral a quase totalidade das normas da Lei nº 110790435 fora naturalmente os já mencionados valerem das PPPs poderá ser afastada mediante a utilização dos consórcios intermunicipais com as novas potencialidades dadas pela Lei nº 11107 de 06 de abril de 2005 que poderíamos chamar de lei da parceria públicopúblico Ademais ponto fulcral na aferição da constitucionalidade da imposição daquele valor mínimo será a interpretação a respeito de os R 20 milhões se referirem ao valor do investimento ao valor da remuneração a ser paga pela Administração Pública ou a todas as receitas do parceiro privado Deve ser dada à questão interpretação que mais favoreça a Federação e no caso de PPPs com prazos muitos longos a diluição desse valor ao longo de décadas o torna mesmo bem menos significativorestritivo 34 É de Cláudio Pacheco um dos mais completos conceitos de normas gerais lineamentos fundamentais da matéria serão as estipulações que apenas darão estrutura plano e orientação Podese conceituar ainda pelo feito indireto e fracionário de negativas que serão aquelas que não especificarão que não aplicarão soluções optativas que não concretizarão procedimentos que não criarão direções e serviços que não selecionarão e discriminarão atividades que não preceituarão para a emergência para a oportunidade a modalidade especial e para o caso ocorrente que não condicionarão a aplicabilidade e adaptabilidade que não descerão a minúcias e requisitos Sintetizando os vários conceitos doutrinários de normas gerais colacionados por Luís Roberto Barroso elas podem ser definidas como as normas que sem entrar em pormenores da matéria ou pretender esgotála dispõem apenas acerca dos seus princípios diretrizes linhas mestras e questões fundamentais não possuindo por isso aplicação direta cf BARROSO Luís Roberto Interpretação constitucional Direito Constitucional Intertemporal Autonomia desportiva conteúdo e limites Conceito de Normas Gerais in Revista de Direito Público vol nº 97 1991 p 97 35 Algumas das que podem ter o seu caráter geral questionado foram tratadas em tópicos específicos desse estudo 20 artigos 14 a 22 realmente constituem normas gerais especialmente aquelas que fixam princípios e definem as modalidades de parcerias públicoprivadas Pois bem obedecidas essas normas gerais os Estados e Municípios podem editar as suas próprias leis A maioria iniciou os respectivos processos legislativos ou ainda discussões internas no Executivo apenas após a promulgação da Lei nº 110790436 mas os Estados de Minas Gerais Lei nº 1486993 pioneiramente de São Paulo Lei nº 1168804 do Rio Grande do Sul Lei nº 1223405 de Goiás Lei Nº 1491004 e de Santa Catarina Lei nº 1293004 se antecederam à lei federal No âmbito municipal há a Lei nº 626104 do Município de Vitória Via de regra essas leis estaduais37 adotaram um conceito de parcerias públicoprivadas mais amplo do adotado na lei federal38 até porque se inspiraram na primeira versão do projeto de lei federal que como já visto também adotava uma definição bem mais ampla Isso não faz contudo que essas leis estaduais tenham perdido a validade ou a eficácia com a edição da lei federal mas sim que a elas deve ser dada uma aplicação e interpretação que as restrinja às modalidades de parcerias públicoprivadas contempladas na Lei nº 1107904 Já as regras estaduais que contrariarem as normas gerais nacionais deverão mesmo ter a sua aplicação afastada salvo no que puderem ser consideradas como meras especificações do que já estiver disposto na Lei nº 110790439 V PPPS E RESPONSABILIDADE FISCAL Face às necessidades de realização de investimentos em infraestruturas impossibilitados em razão da falta de verba própria do Estado e do esgotamento da sua capacidade de investimento a que as parcerias públicoprivadas visam fazer frente sempre foi considerado o risco de as PPPs servirem como meio de afrouxamento das normas de responsabilidade fiscal ainda mais considerando serem substancialmente uma forma de o Estado financiar no longo prazo infra 36 Vejase por exemplo o projeto de lei encaminhado pela Mensagem nº 6659I do Governador do Estado do Ceará 37 Inclusive a lei do Rio Grande do Sul que apesar de promulgada após a Lei nº 1107904 teve toda a sua concepção realizada anteriormente 38 O parágrafo único do art 1º da lei mineira por exemplo dispõe As parcerias público privadas de que trata esta Lei constituem contratos de colaboração entre o Estado e o particular por meio dos quais nos termos estabelecidos em cada caso o ente privado participa da implantação e do desenvolvimento de obra serviço ou empreendimento público bem como da exploração e da gestão das atividades deles decorrentes cabendolhe contribuir com recursos financeiros materiais e humanos e sendo remunerado segundo o seu desempenho na execução das atividades contratadas 39 O resultado prático das legislações estaduais foram até a promulgação da Lei nº 1107904 insignificantes até em razão de não terem propiciado a segurança jurídica necessária sem um marco jurídico federal 21 estruturas com as quais não poderia arcar de uma só vez no presente e o assumido objetivo de ampliar o espaço fiscal40 Esse foi com efeito um dos mais candentes pontos de discussão nos debates parlamentares sobre o projeto de lei que gerou a Lei nº 1107904 sendo inclusive uma das razões do longo tempo tomado pelo seu processo legislativo Também no exterior essa é uma das principais preocupações com a adoção desse modelo de contrato pela Administração Pública Por um lado esse esquema permite aos governos lançarem e fazerem executar obras e serviços públicos sem necessidade de sobrecarregarem o orçamento nem a dívida pública Isto é especialmente importante quando os crescentes encargos financeiros com os serviços públicos por exemplo na área de saúde coabitam com a necessidade de equilíbrio das finanças públicas déficit zero de aperto das receitas fiscais sob pressão da competitividade fiscal e de limitações ao endividamento público como sucede com o Pacto de Estabilidade e Crescimento da União Européia Por outro lado porém a Private Finance Iniciative PFI embora desonerando o Estado do investimento inicial não o liberta naturalmente do pagamento do investimento privado limitandose a repartilo ao longo de um período de tempo mais ou menos longo Tal como no caso do investimento direto do Estado com recurso ao endividamento público também na PFI sempre serão os contribuintes que pagarão no futuro a factura O perigo da PFI é que ela constitui um modo tentador de os governos fazerem obra rapidamente sob pressão política sem uma rigorosa avaliação do seu custo final para os contribuintes A desnecessidade de endividamento público para construir a obra e o diferimento dos encargos para o futuro têm em si mesmos um efeito anestesiador da opinião pública As cláusulas de revisão de custos normalmente inseridas nos acordos de PFI só muito depois se vêm a revelar mais onerosas do que o previsto E a gratuidade desses serviços para os utentes tornaos impróprios para funcionarem como contervailing power face aos concessionários no que respeita aos custos financeiros são os contribuintes em geral que pagam Como disse rudemente o insuspeito jornal Economist a principal virtude da PFI para os seus promotores está em que ela permite esconder o verdadeiro custo dos programas de despesa do sector público A isso acresce a vantagem de permitir libertar o endividamento para outras despesas públicas ampliando assim as disponibilidades financeiras do Estado mas sempre sobrecarregando mais os futuros contribuintes41 O Direito Brasileiro procurou se armar com alguns antídotos contra esses riscos fiscais das PPPs 40 Declaração do então Ministro do Planejamento Guido Mantega à coluna de Merval Pereira no jornal O Globo de 1372004 Sobre essas questões de conjuntura ver Tópico 1 supra 41 MOREIRA Vital A Tentação da Private Finance Iniciative PFI in MARQUES Maria Manuel Leitão e MOREIRA Vital A mão visível mercado e regulação Ed Almedina Coimbra 2003 pp 188 a 190 grifamos 22 O Art 30 I da Lei de Responsabilidade Fiscal Lei Complementar nº 1010042 dispõe competir ao Senado Federal o estabelecimento de limites globais para a dívida consolidada e para as operações de crédito dos Entes da Federação na forma do art 52 VI a IX da Constituição Federal tendo a mesma Lei Complementar definido as operações de crédito como o compromisso financeiro assumido em razão de mútuo abertura de crédito emissão e aceite de título aquisição financiada de bens recebimento antecipado de valores provenientes da venda a termo de bens e serviços arrendamento mercantil e outras operações assemelhadas inclusive com o uso de derivativos financeiros art 29 III O art 167 II CF por sua vez veda as operações de crédito que excedam o montante das despesas de capital salvo as execeções ali contempladas de créditos orçamentários especiais ou especiais É importante saber então como as obrigações econômicas assumidas pelo Governo com as parcerias públicoprivadas devem ser contabilizadas se como dívida ou como despesa corrente43 O detalhamento de como se fará essa contabilização foi transferido para a Secretaria do Tesouro Nacional nos termos do art 25 da Lei nº 1107904 função que assumirá uma importância notável em relação aos contratos de PPP cuja modelagem financeira os situe em uma zona grísea entre o endividamento e as despesas correntes Se deverá no entanto que uma PPP propriamente dita apesar da semelhança não envolve juridicamente uma operação de crédito pois o Estado não encomenda simplesmente uma obra para pagamento em parcelas mas sim a operação contínua de uma utilidade paga por ela própria construída pelo parceiro privado sob seu risco e propriedade As PPPs então não devem ser entendidas como a compra de uma obra a prazo pela administração mas a contratação de um serviço com remuneração atrelada à sua disponibilidade e ao cumprimento das metas44 Os casos limítrofes entre essas duas estruturas contratuais deverão ter a sua contabilização disciplinada pela Secretaria do Tesouro Nacional art 25 da Lei nº 1107904 42 Ex vi do art 24 I e 2º cc art 163 ambos da Constituição Federal as normas gerais de finanças públicas aplicáveis a todos os entes da federação devem ser veiculadas mediante lei complementar 43 A Lei de Responsabilidade Fiscal LRF estipula dois tipos de controle para a criação de despesas por meio da celebração de novos contratos Controle pelo fluxo Pay as you go arts 1517 e Limite da dívida consolidada e das operações de crédito LRF art 29 e seguintes Se a contraprestação da Administração é caracterizada como pagamento por serviço despesas correntes somente o controle pelo fluxo se aplica Se a contraprestação da Administração é caracterizada como pagamento para a aquisição de um ativo deve ser classificado como dívida e submetido ao limite de dívida e às condições para contratar operações de crédito RIBEIRO Maurício Portugal Parcerias PúblicoPrivadas A Lei Brasileira de PPP in httpwwwsiniconcombr050202MMPRLe20dePPPemportuguespdf acessado em 06 de abril de 2005 44 COSTA José Andrade Costa Pontos Observáveis aos Aspectos Legais das Parcerias PúblicoPrivadas in httppppspgscgovbr12081 acessado em 05 de abril de 2005 23 De qualquer forma dados os inegáveis objetivos de parcial alívio fiscal das PPPs fica evidente o cuidado da Lei nº 1107904 com a responsabilidade fiscal Muitos dos dispositivos que contemplaram essa preocupação não têm maior importância do ponto de vista do cumprimento de todas as regras específicas da Lei de Responsabilidade Fiscal LRF já que apenas fixadores do princípio da responsabilidade fiscal ex art 4º IV Lei nº 1107904 ou da necessidade de observância na fase interna da licitação de regras da Lei de Responsabilidade Fiscal LRF que não poderiam de qualquer maneira deixar de ser uma lei complementar ex art 10 I b e c Lei nº 1107904 O dispositivo que realmente tranqüilizou os críticos da possibilidade de as parcerias públicoprivadas propiciarem a irresponsabilidade fiscal45 o dispositivo do acordo46 foi o art 22 da Lei nº 110790447 que limitou os gastos com parcerias públicoprivadas a um por cento da receita corrente líquida48 Ficava contudo o problema de sua constitucionalidade formal já que teríamos normas de finanças públicas veiculadas em uma lei ordinária violando assim o art 163 da Constituição Federal A solução foi fazer que o art 22 se dirigisse apenas à União Federal como uma autolimitação de gastos não como uma norma de finanças públicas Mas como fazer com que o limite de 1 valesse também para Municípios e Estados A solução dada foi não forçar que Estados e Municípios cumprissem esse limite sem lei complementar que o estabelecesse mas sim dispor que a concessão voluntária de garantias e repasse de recursos também voluntários por parte da União aos outros Entes federativos ficasse condicionado a que as suas PPPs cumprissem a Lei de Responsabilidade Fiscal LRF e o indigitado limite de um por cento conforme aferição a ser feita pela Secretaria do tesouro Nacional nos termos do art 28 da Lei nº 110790449 45 Entre esses críticos deve ser registrado o papel de destaque que teve o Senador Tasso Jereissati no debate nacional que então se travou 46 Para os detalhes das negociações que levaram a essa solução legislativa ver as declarações do Senador Aloizio Mercadante à coluna de Ribamar Oliveira nO Estado de S Paulo de 12112004 47 Art 22 A União somente poderá contratar parceria públicoprivada quando a soma das despesas de caráter continuado derivadas do conjunto das parcerias já contratadas não tiver excedido no ano anterior a 1 um por cento da receita corrente líquida do exercício e as despesas anuais dos contratos vigentes nos 10 dez anos subseqüentes não excedam a 1 um por cento da receita corrente líquida projetada para os respectivos exercícios 48 A receita corrente líquida é basicamente a o somatório das receitas tributárias de contribuições patrimoniais industriais agropecuárias de serviços transferências correntes e outras receitas também correntes deduzidas entre outros valores as transferências constitucionais compulsórias a outros Entes da federação art 2º IV e 1º a 3º Lei de Responsabilidade Fiscal LRF 49 Art 28 A União não poderá conceder garantia e realizar transferência voluntária aos Estados Distrito Federal e Municípios se a soma das despesas de caráter continuado derivadas do conjunto das parcerias já contratadas por esses entes tiver excedido no ano anterior a 1 um por cento da receita corrente líquida do exercício ou se as despesas anuais dos contratos vigentes nos 10 dez anos subseqüentes excederem a 1 um por cento da receita corrente líquida projetada para os respectivos exercícios 1o e 2º omissis Seria plausível se argüir que o art 28 incide em desvio de poder legislativo já que condiciona o repasse de recursos voluntários a certos limites de gastos com parcerias públicoprivadas que na maioria das vezes nada têm a 24 VI FINANCIAMENTO E GARANTIAS Como se constata na Lei nº 1107904 a disciplina das PPPs se dirige a concessões que precisam total ou parcialmente de verbas estatais para terem sustentabilidade econômica Diferentemente das concessões comuns Lei nº 898795 pelo menos em sua modelagem tradicional a empresa não terá a segurança que os seus investimentos serão amortizados e remunerados pela cobrança de valores dos usuários Nas PPPs o concessionário dependerá em parte concessões patrocinadas ou exclusivamente concessões administrativas que o Poder Público cumpra as suas obrigações pecuniárias para com ele parceiro privada Ocorre que a confiança das qualidades do Estado brasileiro como pagador são muito diminutas E não sem razão bastando lembrar a verdadeira moratória em que o Estado se encontra com o pagamento dos precatórios judiciais e as dificuldades nada raras de que os contratados durante uma gestão de Governo recebam os seus legítimos pagamentos em uma outra gestão como se o contratante fosse o agente público não a pessoa jurídica estatal da qual ele era apenas um servidor Ora em um contrato que tende a ser de longuíssima duração como as PPPs que certamente passarão por várias gestões de Governo e dependentes de vultosas verbas estatais não será certamente a mera previsão legal e contratual de que o Estado terá a obrigação de pagar determinados montantes à concessionária que fará com que os virtuais investidores confiem que receberão o que lhes será devido O problema infelizmente não está sequer mais em como se garantir a adimplência do Estado mas sim em como diante da inadimplência fazer valer os seus direitos Ordinariamente o credor do Estado tem que iniciar o seu périplo propondo uma ação no Poder Judiciário que demoraria anos a ser julgada e depois esperar o seu precatório ser pago o que via de regra demanda no mínimo a mesma quantidade de anos ainda mais se considerando os fortes contingenciamentos que os últimos orçamentos vêm sofrendo Não há obviamente projeto de longo prazo viável em que ao mesmo tempo haja tamanha dependência de verbas de uma das partes e impotência da outra em se necessário executálas com alguma agilidade Foi para tranqüilizar os investidores privados de que no caso das PPPs ocorrendo inadimplência do Estado eles não passarão por tamanhas dificuldades que a Lei nº 1107904 criou uma série de regras especiais em relação às dívidas do Estado com o parceiro privado o que não há como se negar constituem exceção ao caminho que os credores em geral têm que percorrer para receber o pagamento de dívidas do Estado ver com as necessidades a serem atendidas através dos referidos repasses Todavia se vermos a questão do ponto de vista do equilíbrio fiscal global do conjunto das atividades do Ente o argumento não se sustenta 25 Em primeiro lugar o art 11 III da Lei nº 1107904 admite a possibilidade de a lide não precisar ser levada ao Poder Judiciário ao prever o emprego dos mecanismos privados de resolução de disputas inclusive a arbitragem a ser realizada no Brasil e em língua portuguesa50 nos termos da Lei da Arbitragem A expressa previsão legal afasta ao nosso ver qualquer impugnação à constitucionalidade da adoção da arbitragem nas parcerias públicoprivadas uma vez que mesmo para aqueles que equivocadamente a vêem como uma forma de disponibilização do interesse público no caso haveria expressa autorização legal para tanto Em segundo lugar ao contrário dos contratos administrativos em geral em que o foco é dado às garantias de execução contratual pelo particular há sem descartar essas um grande destaque às garantias a serem dadas pelo Estado ao parceiro privado prevendo o art 8º da Lei nº 1107904 quase todas as garantias em tese possíveis de serem dadas pela Administração Pública51 desde que previstas no edital art 11 parágrafo único Lei nº 1107904 Na execução dessas garantias tem se procurado mecanismos que façam com que o parceiro privado eventualmente credor da Administração não fique sujeito à regra constitucional do precatório art 100 CF A Lei Paulista de nº 1168804 optou por exemplo pela constituição de uma pessoa jurídica de Direito Privado integrante da Administração Indireta a Companhia Paulista de Parcerias artigos 12 e segs com a competência de dar garantias do cumprimento das obrigações do Estado nas PPPs art 15 VI e VII e que como ente privado não se subsume ao conceito de Fazenda Pública estando por conseguinte fora do regime de espera pelo pagamento na ordem dos precatórios No âmbito federal a fórmula escolhida visando a alcançar os mesmos resultados exclusão dos precatórios foi a constituição pela União de um Fundo Garantidor de Parcerias PúblicoPrivadas FGP de natureza privada com patrimônio separado dos seus cotistas União suas autarquias e Fundações que o integralizarão mediante bens e direitos art 16 Lei nº 1107904 sendo 50 Alguns autores estão aventando a inconstitucionalidade da exigência de a arbitragem ser feita no Brasil e em português por violar o Princípio da Proporcionalidade ao impor restrições sem nenhum ganho para o interesse público ou seja restrições desnecessárias Não nos parece ser assim A ausência de tal exigência não faria que a admissão da arbitragem fosse inconstitucional mas outrossim não resta dúvida que ainda mais em se tratando de contrato de relevantíssimo interesse para toda a sociedade o fato de ser realizado no local de sua execução no Brasil e na língua acessível a todos os interessados os usuários dos serviços públicos objeto do contrato e a imprensa por eles acessada faz com que haja um controle imediato uma accountability e uma transparência mais incisivos 51 Tem havido argumentos no sentido da inconstitucionalidade desse dispositivo em razão de apenas lei complementar poder dispor sobre garantias a serem dadas pelo Estado art 163 III CF Ocorre que as garantias previstas na Lei nº 1107904 podem ser consideradas como já referidas pela Lei de Responsabilidade Fiscal LRF Lei Complementar nº 10100 especialmente por seu artigo 40 26 administrado e representado por instituição financeira controlada pela União art 17 Lei nº 110790452 O FGP dará os bens e direitos integralizados como garantia do cumprimento das obrigações assumidas por seus cotistas nos contratos de parceria públicoprivada arts 17 3º e 18 O parceiro privado poderá em caso de inadimplência do cotista do Fundo acionar diretamente a garantia dada pelo FGP hipoteca penhor alienação fiduciária ou qualquer outro contrato de garantia art 18 1º para a satisfação da dívida sendo inclusive expressamente admitida a constrição judicial dos seus bens art 18 4º a 7º O FGP funcionará assim como uma espécie de patrimônio de afetação ou seja como um patrimônio segregado destinado apenas a garantir o respeito a determinadas obrigações sendo até mesmo uma afetação parcial ou seja de parte do FGP para garantia específica e exclusivamente de determinada dívida art 21 O FGP vem contudo sendo impugnado por conforme se alega constituir desvio de poder legislativo ou seja uma forma de colateralmente evadirse do art 100 CF criando uma categoria de credores especiais do Poder Público que podem ser pagos independentemente de qualquer ordem em relação aos credores em geral53 KIYOSHI HARADA afirma também a sua incompatibilidade com o art 165 9º II CF que impõe lei complementar para estabelecer as condições para a instituição e funcionamento de fundos e com o art 71 da Lei nº 432064 lei ordinária com força passiva de lei complementar 54 que vedaria que os fundos se prestassem a garantir dívidas pecuniárias55 Ora não parece ser bem assim O que o art 165 9º II CF impõe é que as condições para a instituição e funcionamento de fundos sejam genericamente disciplinadas por lei complementar não que a criação de cada fundo específico o seja Essa lei complementar leiquadro já existe é a Lei nº 432064 cujos arts 71 a 74 se referem apenas à lei portanto lei ordinária para instituir o fundo Quanto á alegada violação ao art 71 da Lei nº 432064 ele apenas afirma que as receitas dos fundos se vinculam à realização de determinados objetivos 52 O Decreto nº 541105 regulamentou parte do FGP autorizando a integralização das suas cotas pela União mediante a transferência de uma série de ações de sua propriedade referentes a participações minoritárias em empresas e às participações que forem desnecessárias à manutenção do controle da União sobre suas sociedades de economia mista Muitas dessas ações serão inclusive oriundas do Fundo Nacional de Desestatização FND e do Fundo de Amortização da Dívida Pública Federal FAD Entre as ações transferidas ao Fundo encontramse papéis de empresas como a Petrobrás Embraer Eletropaulo Gerdau e Usiminas 53 O dispositivo que mais vem sendo inquinado como inconstitucional é o 7º do art 18 da Lei nº 1107904 que dispõe Em caso de inadimplemento os bens e direitos do Fundo poderão ser objeto de constrição judicial e alienação para satisfazer as obrigações garantidas 54 Quando da sua edição não era exigida lei complementar para a matéria mas com a imposição dessa exigência pela CF88 que recebe as leis com elas apenas formalmente incompatíveis a Lei nº 432064 passa a só poder ser revogada por leis complementares 55 HARADA Kiyoshi Parecer elaborado para a Comissão de Precatórios da OABSP disponível na página dessa Entidade na rede mundial de computadores 27 ou serviços Entre esses objetivos pode estar naturalmente o de garantir dívidas necessárias à realização de projetos de infraestrutura essenciais ao desenvolvimento nacional56 Quanto ao ponto nodal da violação do art 100 CF se considerássemos a criação de qualquer entidade privada da Administração Indireta como desvio de poder legislativo para exclusão do regime de Direito Público de atividade que constitucionalmente incumbem primariamente à União todas elas poderiam ser consideradas inconstitucionais A possibilidade de criação pela União de entidades de Direito Privado para desempenhar misteres seus é consagrada entre outros dispositivos constitucionais no art 37 caput CF que expressamente prevê as modalidades de entidades da Administração Indireta inclusive as de Direto Privado empresas públicas e sociedades de economia mista Quando a União cria uma pessoa jurídica de Direito Privado da sua Administração Indireta para desempenhar atividades de sua competência constitucional as exclui ainda que parcialmente do regime jurídico de Direito Público inclusive da execução de dívidas pelo sistema de precatório já que o art 100 CF submete apenas a Fazenda Pública Isso contudo antes de ser uma ilegítima fuga do Direito Público é uma possibilidade constitucionalmente admitida de os Entes federativos buscarem o atendimento mais eficiente dos seus objetivos ressalvada apenas a vedação da entidade de Direito Privado exercer atividades de jus imperii ou seja de imposições unilaterais aos particulares Para CARLOS ARI SUNDFELD57 o fato de o FGP não possuir expressamente personalidade jurídica não ilide essa conclusão em razão de a sua situação ser idêntica à de uma pessoa jurídica já que possui patrimônio obrigações e diretos próprios nos termos do art 16 1º Lei nº 1107904 O FGP parece fazer parte da categoria um tanto atípica das universalidades jurídicas como o condomínio e o espólio e o fato de ser administrado por outra pessoa jurídica não impede essa sua caracterização já que é perfeitamente possível que a administração até mesmo de pessoas jurídicas propriamente ditas seja atribuída a outra pessoa jurídica Tanto é assim que em caso de se ter que propor uma ação contra o FGP deverá ele próprio ser acionado não a União o que acarretaria o mecanismo de pagamento por precatório Tampouco será acionada a pessoa jurídica que o administra que não o tem como uma propriedade sua O réu em uma ação dessas será o próprio 56 O Direito Administrativo Comparado chega a fazer referência ao Princípio da Impenhorabilidade dos Fundos Públicos saídos do Erário enquanto permanecerem sendo aplicados na finalidade para a qual foram criados salvo se for penhorado para a realização dessa própria finalidade o que naturalmente será permitido O Princípio assim colocado é essencial para que a finalidade pública à qual o Fundo está afetado não fique frustrada e para que o beneficiário do apoio do Estado não sofra com o inadimplemento da Administração Pública em razão de uma ação de terceiro O interesse público visado pela concessão da ajuda pública assim exige que seja RIVA Ignacio M de la Ayudas Públicas Incidencia de la intervención estatal en el funcionamiento del mercado Ed Hammurabi Buenos Aires 2004 pp 1878 57 Baseamonos na opinião manifestada pelo publicista em palestra proferida em abril de 2005 na Universidade do Estado do Rio de Janeiro UERJ sobre o tema 28 FGP representado pela instituição financeira que o administra da mesma forma que ações são propostas contra o Espólio representado por seu inventariante As vantagens do modelo de fundogarantia sobre o de empresagarantia são a economia com despesas administrativas e de pessoal além de evitar que o fundo possa a qualquer momento como as empresas públicas ser extinto por lei Em relação ao FGP o art 10 da Lei nº 1107904 dispõe que a sua eventual extinção só poderá ser ultimada depois da quitação de todos os débitos por ele garantidos o que sequer pode ser contrariado por lei superveniente em relação a contratos já assinados pois o Fundo constituirá um elemento nuclear desses atos contratos jurídicos perfeitos protegidos portanto contra alterações legislativas nos termos do art 5º XXXVI CF Colocadas as garantias especiais que os concessionários podem diretamente receber do Poder Público verificamos que o marco jurídico das parcerias públicoprivadas não ficaria completo para o objetivo de atrair investimentos bastante vultosos para projetos de amortização de longo prazo se não só às empresas que se comprometeram a executar o serviço como os seus financiadores58 tivessem garantias satisfatórias Teríamos uma empresa operadora com segurança mas sem crédito para a execução do projeto Como os financiadores via de regra não possuem relação contratual direta com Poder Público não integrando o contrato de PPP como parte as garantias do empréstimo à concessionária não incidirão sobre direitos e bens do Estado ou do seu fundo ou empresa garantidora mas sim sobre direitos do próprio concessionário oriundos da relação contratual por ele mantida com o Estado A Lei nº 1107904 expressamente permite nessa senda a subrogação do financiador em diretos do concessionário como a possibilidade de empenhos art 5º 2º II Lei nº 1107904 e pagamentos de indenizações art 5º 2º III Lei nº 1107904 serem realizados diretamente em seu nome e a própria assunção da concessão pelo financiador como uma intervenção na concessão pela instituição financeira ainda que controlada pelo Estado art 9º 5º Lei nº 1107904 independentemente do atendimento das exigências de capacidade técnica idoneidade financeira e regularidade jurídica e fiscal necessárias à assunção do serviço impostas nas concessões comuns pelo art 27 parágrafo único I Lei nº 898795 art 5º 2º I Lei nº 1107904 O dispositivo não é inconstitucional mas a sua concretização em determinado contrato ou edital de licitação poderá vir a sêlo se for permitida uma verdadeira cessão contratual forçada da concessionária vencedora da licitação para uma instituição financiadora que não participou do certame violando a regra constitucional da licitação Mas não haverá óbices constitucionais se a admissão contratual da intervenção prevista no art 5º 2º I da Lei nº 1107904 visando à preservação da própria sobrevivência do contrato e à continuidade da atividade 58 Os financiadores podem ser pessoas jurídicas da iniciativa privada ou integrantes da Administração Pública sujeito o financiamento nesses casos aos limites fixados no art 27 da Lei nº 1107904 A participação de entidades fechadas de previdência complementar como financiadoras de parcerias públicoprivadas só será admitida nos termos serem regulamentados pelo Conselho Monetário Nacional art 24 Lei nº 1107904 29 pública que constitui o seu objeto for tãosomente instrumental ao seu saneamento financeiro no mais curto espaço de tempo possível para logo em seguida devolvêlo ao concessionário original ou transferilo a outra empresa operadora inclusive às demais classificadas na licitação nos termos que forem subsidiariamente aplicáveis da Lei nº 866693 e da Lei nº 898795 inclusive nesse ponto do seu art 27 como prevê o art 9º 1º da Lei nº 1107904 VII PECULIARIDADES DO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO Não vamos nesse Tópico traçar detalhadamente o iter de todo o procedimento licitatório para a contratação de PPPs mas apenas destacar algumas características mais peculiares dessa disciplina destacando aquelas relacionadas diretamente com a própria natureza do instituto A licitação para contratação de parcerias públicoprivadas é regida em parte pela Lei nº 1107904 já que essa contém algumas normas específicas aplicandoselhes subsidiariamente alguns dispositivos da Lei nº 898795 expressamente mencionados pela Lei nº 1107904 e a Lei nº 866693 que continua sendo o sistema normativo central das licitações públicas sobre os quais gravitam diversos subsistemas como o da legislação do pregão o das concessões comuns e agora o das licitações das PPPs Não há uma norma explícita determinando de forma genérica a aplicação subsidiária da Lei nº 866693 às parcerias públicoprivadas Há no entanto normas remetendo a essa Lei em determinados temas específicos como as garantias de proposta a serem dadas pelo contratado art 11 I Lei nº 1107904 E de qualquer forma a Lei nº 1107904 prevê em seu art 10 caput que a licitação das parcerias públicoprivadas se dará por concorrência modalidade de licitação disciplinada somente na Lei nº 866693 A concorrência tal como disciplinada na Lei nº 866693 será aplicada às parcerias públicoprivadas com as derrogações constantes da Lei nº 1107904 e dos aspectos da Lei nº 898795 que tiverem sido expressamente incorporados às licitações das parcerias públicoprivadas arts 11 caput e 12 II Lei nº 1107904 Os pontos da Lei nº 898795 expressamente aplicáveis às licitações das PPPs são os seguintes critérios de julgamento pela menor tarifa e de menor tarifa combinado com o de melhor técnica art 15 I e V Lei nº 898795 desclassificação de propostas inexeqüíveis art 15 3º Lei nº 898795 desempate em favor de empresas brasileiras art 15 4º Lei nº 898795 as cláusulas necessárias do edital art 18 Lei nº 898795 as regras para a participação de consórcios art 19 Lei nº 898795 e o ressarcimento pelo vencedor da licitação das despesas havidas pelo Estado com a elaboração de projetos para aquele contrato art 21 Lei nº 898795 Grande parte das regras de licitação fixadas pela Lei nº 1107904 para as parcerias públicoprivadas são dirigidas à fase interna da licitação ou seja aos momentos em que antes da divulgação do edital a Administração Pública ainda 30 está aferindo a possibilidade e a conveniência de buscar a celebração de determinado contrato e a modelagem que mais lhe convém A grande preocupação da Lei nº 1107904 art 10 nessa fase foi com a sustentabilidade financeira do projeto o respeito às regras de responsabilidade fiscal e a eleição das prioridades a serem atendidas com os projetos de PPP já que há limites financeiros para a adoção do instrumento da PPP O cuidado com esse último aspecto é tanto que se chegou a criar um órgão específico Comitê Gestor das Parcerias PúblicoPrivadas Federais art 14 Lei nº 1107904 e Decreto nº 538505 só para desempenhar essa função seletiva59 modelo que vem sendo acompanhada também pelas legislações estaduais geralmente até com a mesma nomenclatura ex Lei nº 1293004 do Estado de Santa Catarina art 13 Na fase interna da licitação especialmente das concessões patrocinadas também deverá ser expressamente justificada a adoção dessa modalidade em detrimento da concessão comum que não requer verbas públicas sob pena de violação do princípio da Economicidade art 70 CF Devese realmente ter extremo cuidado para que empreendimentos que poderiam ser assumidos pela iniciativa privada sem divisão de riscos com o Poder Público agora oportunistamente adotem o modelo das parcerias públicoprivadas apenas para terem maiores garantias e remuneração estatal não por inviabilidade do negócio financiado apenas por tarifa60 Ainda na fase interna da licitação mas situada já no limiar do início da fase externa o art 10 VI da Lei nº 1107904 prevê a realização de consulta pública antes da publicação do edital devendo haver pelo menos trinta dias para comentários dos interessados empresas entes públicos entidades da sociedade civil etc prazo que deve se encerrar no mínimo sete dias antes da data prevista para a publicação do edital O sentido desse prazo de sete dias é que a consulta pública não seja um simulacro de abertura da Administração Pública à oitiva da opinião da sociedade A Administração não é naturalmente obrigada a seguir as opiniões manifestadas na consulta pública mas até mesmo em razão do direito constitucional de petição e da obrigação de motivação dos atos administrativos deve explicitar as razões pelas quais aceitou ou não as sugestões apresentadas O prazo de sete dias é sem dúvida exíguo razão pela qual a Administração Pública deve já ir analisando as sugestões apresentadas ao longo dos trinta dias anteriores ou se necessário fixar um prazo maior que sete dias de anterioridade em relação ao edital Poderá até adiar a publicação do edital O que não pode é publicálo sem apreciar satisfatoriamente as sugestões da consulta pública 59 Detalhes desse órgão gestor serão vistos no Tópico 9 infra 60 Naturalmente que nessa justificativa da adoção da PPP a Administração Pública ponderará condições não apenas stricto sensu tarifárias mas também sócioeconômicas restandolhe sem dúvida um grande mas não ilimitado espaço de apreciação razoável na adoção de um ou outro modelo contratual 31 Há portanto dois requisitos de validade do edital de licitação da PPP à luz do art 10 VI da Lei nº 1107904 consulta pública prévia e resposta às sugestões nela apresentadas Passemos pois à fase externa da licitação das parcerias públicoprivadas disciplinada sobretudo pelo edital publicado na imprensa oficial Dela cuidam os artigos 11 a 13 da Lei nº 1107904 O art 11 prevê a aplicação de uma série de dispositivos da Lei nº 898795 a exigência de garantia de proposta por parte dos licitantes a possibilidade de adoção da arbitragem e que as garantias a serem dadas pelo Poder Público devem estar fixadas no edital aspectos que já foram tratados Especificamente quanto à determinação de as garantias a serem dadas pelo Estado já deverem estar previamente expressas no edital tratase de manifestação do princípio da vinculação ao instrumento convocatório art 3º caput Lei nº 866693 ainda mais em se tratando de parcerias públicoprivadas em que a questão da garantia estatal é primordial muitas vezes determinante da participação dessa ou daquela empresa no certame61 O inciso II do art 11 Lei nº 1107904 dispositivo acrescentado no processo legislativo do Congresso Nacional determinava que o edital poderia prever a responsabilidade do contratado pela elaboração dos projetos executivos das obras O que se pretendia era a contrario sensu vedar que a ele pudesse ser conferida a possibilidade de elaborar o projeto básico62 tendo merecido o veto do Chefe do Poder Executivo porque o espírito das parcerias públicoprivadas é 61 Não nos parece contudo que a aplicação concreta desse dispositivo o parágrafo único do art 11 da Lei nº 1107904 possa levar a engessamentos irrazoáveis e desinteressantes para ambas as partes durante todo o período do contrato não sendo de se descartar portanto que à luz dos princípios da proporcionalidade economicidade e eficiência da Administração Pública a garantia possa por acordo das partes ser modificada sempre a depender da análise cautelosa e parcimoniosa de cada caso concreto 62 Vejamos as definições de projeto básico e executivo dadas pela Lei nº 866693 IX Projeto Básico conjunto de elementos necessários e suficientes com nível de precisão adequado para caracterizar a obra ou serviço ou complexo de obras ou serviços objeto da licitação elaborado com base nas indicações dos estudos técnicos preliminares que assegurem a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento e que possibilite a avaliação do custo da obra e a definição dos métodos e do prazo de execução devendo conter os seguintes elementos a desenvolvimento da solução escolhida de forma a fornecer visão global da obra e identificar todos os seus elementos constitutivos com clareza b soluções técnicas globais e localizadas suficientemente detalhadas de forma a minimizar a necessidade de reformulação ou de variantes durante as fases de elaboração do projeto executivo e de realização das obras e montagem c identificação dos tipos de serviços a executar e de materiais e equipamentos a incorporar à obra bem como suas especificações que assegurem os melhores resultados para o empreendimento sem frustrar o caráter competitivo para a sua execução d informações que possibilitem o estudo e a dedução de métodos construtivos instalações provisórias e condições organizacionais para a obra sem frustrar o caráter competitivo para a sua execução e subsídios para montagem do plano de licitação e gestão da obra compreendendo a sua programação a estratégia de suprimentos as normas de fiscalização e outros dados necessários em cada caso f orçamento detalhado do custo global da obra fundamentado em quantitativos de serviços e fornecimentos propriamente avaliados X Projeto Executivo o conjunto dos elementos necessários e suficientes à execução completa da obra de acordo com as normas pertinentes da Associação Brasileira de Normas Técnicas ABNT 32 justamente se valer da expertise privada para dar melhores soluções às necessidades públicas63 Alguns elementos do projeto básico deverão contudo estar estabelecidos no edital mas apenas na medida do necessário para que o contrato tenha um objeto identificado64 O que se busca é fixar o resultado final a ser alcançado pelo contrato deixando a definição dos meios para alcançálos o mais possível na órbita do parceiro privado principalmente quando da elaboração da sua proposta técnica não o vinculando a um projeto básico prévia definitiva e unilateralmente fixado pela Administração como determinado pela Lei nº 866693 para as empreitadas de obras públicas65 Mesmo com o veto ao inciso II do art 11 da Lei das parcerias público privadas poderá haver discussão a respeito de ele ter sido ou não suficiente para conferir ao licitante a elaboração do projeto básico ao licitante Poserseia argumentar que os fundamentos do veto não integram a lei e que a Lei nº 1107904 não admite expressamente essa possibilidade bem como que a modalidade licitatória da concorrência tal como disciplinada na Lei nº 866693 determina a existência do projeto básico Ocorre que os fundamentos do veto apesar de logicamente não integrarem a lei constituem elementos importantíssimos para a sua interpretação E ademais a aplicação da Lei nº 866693 é como já explicitado meramente subsidiária apenas no que couber e na matéria a ratio de todo o sistema da Lei nº 1107904 é justamente o de se valer dos benefícios oriundos de se ter uma pareceria com a iniciativa privada inclusive para que ela elabore o melhor detalhamento possível de como o objeto contratual será realizado que é justamente o papel do projeto básico 63 Razões do veto O inciso II do art 11 permite que apenas a elaboração do projeto executivo das obras seja delegada ao parceiro privado Dessumese do seu texto que a Administração teria a obrigação de realizar o projeto básico das obras Isto seria reproduzir para as parcerias públicoprivadas o regime vigente para as obras públicas ignorando a semelhança entre as parcerias e as concessões semelhança esta que levou o legislador a caracterizar as parcerias públicoprivadas brasileiras como espécies de concessões a patrocinada e a administrativa As parceiras públicoprivadas só se justificam se o parceiro privado puder prestar os serviços contratados de forma mais eficiente que a administração pública Este ganho de eficiência pode advir de diversas fontes uma das quais vem merecendo especial destaque na experiência internacional a elaboração dos projetos básico e executivo da obra pelo parceiro privado Contratos de parcerias públicoprivadas realizados em diversos países já comprovaram que o custo dos serviços contratados diminui sensivelmente se o próprio prestador do serviço ficar responsável pela elaboração dos projetos Isso porque o parceiro privado na maioria dos casos dispõe da técnica necessária e da capacidade de inovar na definição de soluções eficientes em relação ao custo do investimento sem perda de qualidade refletindo no menor custo do serviço a ser remunerado pela Administração ou pelo usuário 64 Notese que já nas concessões comuns regidas pela Lei nº 898795 as idéias de flexibilidade na eleição dos meios para atingir os objetivos contratuais e de inexistência de projeto básico sempre estiveram presentes Contrariamente a essa assertiva sustentando a necessidade de projeto básico nas licitações para as concessões da Lei nº 898795 ver JUSTEN FILHO Marçal Curso de Direito Administrativo Ed Saraiva São Paulo 2005 p 513 65 Lei nº 866693 art 7º 2º As obras e os serviços somente poderão ser licitados quando I houver projeto básico aprovado pela autoridade competente e disponível para exame dos interessados em participar do processo licitatório 33 Nas licitações de PPPs admitese a qualificação técnica anterior ao julgamento art 12 I como um fator de desclassificação do licitante o que aliás também já era admitido pelo art 114 da Lei nº 866693 aplicável às parcerias públicoprivadas no que couber Quanto aos critérios de julgamento foram admitidos os de menor tarifa de menor tarifa combinado com o de melhor técnica art 12 II Lei nº 1107904 cc art 15 I e V Lei nº 898795 menor valor da contraprestação a ser paga pela Administração Pública contraprestação que será a totalidade concessões administrativas ou uma parcela concessões patrocinadas das receitas do concessionário ou por derradeiro o critério de julgamento da menor contraprestação combinada com a melhor técnica art 12 II e 2º Notese que a não alusão ao critério de maior outorga valor pago pelo licitante vencedor admitido pelo art 15 da Lei nº 898795 para as concessões comuns é eloqüente pois veda que o Estado possa cobrar do particular pelo direito de exercer aquela atividade Com efeito o Estado já está financiando uma infraestrutura e se não houvesse essa vedação as parcerias públicoprivadas poderiam acabar tornandose substancialmente contratos de empréstimo para o Estado O Estado na verdade pagaria ao longo do tempo o dinheiro que lhe teria sido pago na assinatura do contrato comprometendo mais ainda as finanças públicas das gerações vindouras É admitida a combinação de propostas escritas com lances verbais art 12 III e 1º Lei nº 1107904 sob inspiração da legislação do pregão tão criticado inicialmente por setores da doutrina mas que na prática demonstrou grande ganho de economicidade para a Administração Pública Ainda sob inspiração da modalidade licitatória do pregão o art 13 admite a inversão das fases da licitação O edital poderá prever que primeiro se decidirá o licitante que ofertou a melhor proposta e os em seguida classificados para em um segundo momento verificar sucessivamente se cumpriram as condições de habilitação Inabilitado o licitante melhor classificado serão analisados os documentos habilitatórios do licitante com a proposta classificada em segundo lugar e assim sucessivamente até que um licitante classificado atenda às condições fixadas no edital sendo o objeto da licitação adjudicado ao vencedor habilitado nas condições técnicas e econômicas por ele ofertadas 66 É bastante mitigada a exigência do 3º do art 43 da Lei nº 866693 de que as diligências para sanar falhas na documentação dos licitantes só são admissíveis para esclarecimento de documento que já havia sido entregue vedada a apresentação de novo documento o que muitas vezes por erros burocráticos da empresa afastava desproporcionalmente concorrentes capacitados Nas parcerias públicoprivadas o art 12 IV da Lei nº 1107904 admite uma ampla possibilidade de correção de falhas na documentação 66 Na matéria dos artigos art 12 III e 1º e 13 da Lei nº 1107904 entendemos que face à identidade de ratio pode haver também a aplicação subsidiária da legislação do pregão no que couber naturalmente considerando que foi nela que esses dispositivos se abeberaram para disciplinar as licitações das parcerias públicoprivadas 34 inclusive a contrario sensu do 3º do art 43 da Lei nº 866693 com a apresentação de documentos não constantes originariamente dos envelopes de habilitação ainda mais porque a habilitação só será verificada em relação ao licitante vencedor É lógico contudo que a faculdade de saneamento de falhas na documentação deve ser admitida razoavelmente não podendo o licitante participar da licitação de forma temerária postergando as condições de sua habilitação para esse momento Não seria por exemplo admissível por imposição inclusive do princípio da boafé que rege as relações entre particulares e a Administração Pública que empresa sabedora de determinada dívida fiscal deixasse para quitála apenas se sagrada vencedora apresentando apenas então a devida certidão negativa de débitos VIII PECULIARIDADES DO CONTRATO As características principais dos contratos de parcerias públicoprivadas já foram vistas ao analisarmos as suas duas espécies O presente Tópico se destina a detalhálas e a tratar de algumas características ancilares da disciplina a eles dada pela Lei nº 1107904 A maioria das cláusulas obrigatórias nos contratos de parcerias público privadas já decorreriam da aplicação a ambas as espécies de PPPs do art 23 da Lei 898795 determinada pelo caput do art 5º da Lei nº 1107904 penalidade atualização monetária VIII1 DIVISÃO DE RISCOS Um dos pontos específicos mais relevantes a ser minuciosa e sobretudo objetivamente disciplinado nos contratos de PPP é a repartição dos riscos entre o parceiro público e o privado o que terá intrínseca relação com os valores a serem pagos pelo Poder Público Há nas parcerias públicoprivadas o elemento de arbitramento repartição de riscos Cada PPP envolverá uma repartição específica de riscos amoldada à peculiaridade do escopo da parceria Em termos de definição legal é importante que se deixe claro o fato de ser inerente a uma PPP um regime de riscos compartilhado e absolutamente detalhado em contrato67 Nos contratos administrativos em geral regidos pela Lei nº 866693 o risco é exclusivo da Administração Pública que contrata a realização de determinada obra pública ou a prestação de serviço por determinado valor independentemente de a obra ou o serviço vierem a ser efetivamente utilizados ou em que intensidade o serão Será sempre devido ao cocontrante privado o valor préfixado na licitação após a entrega do objeto do contrato 67 MARQUES NETO Floriano de Azevedo As Parcerias PúblicoPrivadas no Saneamento Ambiental mimeo 2005 35 Já nas concessões comuns disciplinadas pela Lei nº 898795 o risco é como já visto acima pelo menos de acordo com a teoria tradicional tendencialmente do concessionário privado Se o serviço público concedido vai ser mais ou menos efetivamente utilizado pelos seus destinatários finais é em princípio considerado um risco inerente ao negócio Apenas o risco por fatos imprevisíveis ex racionamento de energia que gera uma inesperada redução de energia ou de responsabilidade do próprio Estado ex aumento de tributos alteração unilateral do contrato são assumidos pelo Poder Concedente por força do direito do concessionário ao reequilíbrio da equação econômicofinanceira do contrato68 As PPPs se situam exatamente entre esses dois modelos permitindo uma divisão de riscos entre o Poder Público e o concessionário maior do que a meramente direcionada a fatos imprevisíveis ou de jus imperii Admite portanto uma manutenção da equação econômicofinanceira diferente da tradicionalmente aplicável aos contratos administrativos em geral dita estática e referenciada apenas ao momento inicial do contrato Em uma manutenção da equação econômicofinanceira dinâmica e permanentemente atualizada poderão ser incluídos elementos como previsão de demanda e de variação dos custos ordinários com insumos e pessoal que não poderiam ser considerados como fatos imprevisíveis para efeito de reequilíbrio de uma equação econômico financeira estática69 A Lei não vai contudo a pormenores de qual seria a divisão de riscos que caracterizaria as parcerias públicoprivadas Atribui essa especificação ao contrato que deverá prever a repartição objetiva dos riscos entre as partes artigos 4º VI e 5º III Lei nº 110790470 A Lei nº 1107904 portanto diversamente das Leis nº 866693 e 898795 que já estabeleceram um critério básico de divisão de riscos apenas prevê que o Poder Público assumirá parcela dos riscos através do pagamento de determinadas quantias ao parceiro privado A Lei das parcerias públicoprivadas delega ao contrato à autonomia contratual da Administração Pública legalmente estabelecida e delimitada a determinação de que parcela de riscos será assumida pelo Estado e os critérios de como será calculada em pecúnia71 68 Já vimos acima que mesmo nas concessões comuns é possível uma modelagem não tão rígida como o seu modelo teórico tradicional 69 Deve ser lembrado que a revisão qüinqüenal prevista em muitos contratos de concessão já representou uma grande evolução em relação à equação econômicofinanceira estática 70 Cada parceria consoante seu objeto específico e seu arranjo de viabilidade haverá de ter uma delimitação específica Segue daí que o verdadeiro regime da PPP não estará na lei e sim no contrato que lhe dá forma MARQUES NETO Floriano de Azevedo As Parcerias Público Privadas no Saneamento Ambiental mimeo 2005 71 A remuneração a ser arcada pelo Estado pode nos termos do art 6º da Lei nº 1107904 ser tanto em dinheiro como em direitos sobre bens públicos ex construção de um teatro com o direito de explorar um shopping anexo a ele Em estudo pioneiro sobre a matéria Celso Antônio Bandeira de Mello propunha a seguinte solução para quando o Estado não tivesse verbas orçamentárias para arcar com determinada obra pública nem os cidadãos condições de 36 Não há portanto modelagem contratual de divisão de riscos que seja ex ante vedada ou fixada pela Lei nº 1107904 havendo considerável margem discricionária administrativa para na modelagem da desestatização que se estiver tratando adotar os mais diferenciados modelos de repartição de riscos podendo se chegar inclusive ao chamado pedágio sombra muito utilizado em parcerias públicoprivadas em rodovias de Portugal em que é medido o tráfico na via mas o pedágio não é pago pelos usuários mas sim direta e integralmente pelo Estado72 Mesmo em relação aos riscos decorrentes de fatos imprevisíveis caso fortuito força maior fato do príncipe e álea econômica extraordinária o art 5º III 2ª parte da Lei nº 1107904 confere ao contrato a atribuição de definir como serão repartidos A Lei determina que o contrato deverá necessariamente prever como os riscos serão repartidos mas não há determinação legal de como deverão sêlo PAULO MODESTO sustenta que todos esses riscos devem ser divididos entre as partes por exemplo os custos decorrentes de um aumento de imposto deveriam deixar de gerar um direito integral do concessionário ao reequilíbrio contratual devendo ele arcar com parte desse gravame o que não nos parece ter sido prédeterminado pelo Legislador73 pagar pelo seu uso O Estado dispõe de seu próprio patrimônio imobiliário normalmente vasto O todo ou a parte de cada uma das suas propriedades que não tinha que estar necessariamente comprometida com uma utilização pública podem ser adscritos à exploração econômica dos empreendedores particulares que neles ou em outro sítio se disponham a realizar as obras públicas em cuja realização o Poder Público esteja interessado Dependendo do vulto e da natureza do empreendimento a parte do patrimônio imobiliário estatal alheia ao uso especial da Administração e não voltada à utilização coletiva pode ser outorgada a título de concessão de uso concessão de direito real de uso aforamento ou simplesmente alienada ao empreendedor particular como meio de pagamento de obras por este custeadas BANDEIRA DE MELLO Celso Antônio Obra Pública a Custo Zero instrumentos jurídicos para realização de obras públicas a custo financeiro zero in Revista Trimestral de Direito Público RTDP vol 03 1993 p p 32 72 Quando a exploração da obra se dá de uma forma que não se prevê retribuição alguma por parte do usuário sendo a Administração Pública que paga ao concessionário o risco comercial se transfere integralmente a ela Todavia há uma forma intermediária entre esse modelo e o da remuneração exclusiva pelos usuários consiste em deixar com Administração Pública a responsabilidade pelo pagamento modulandoo contudo de acordo com uso que for feito pelos usuários da infraestrutura Quanto maior o êxito na exploração maior a remuneração Esta seria a forma do pedágiosombra puro que naturalmente admite modulações de financiamento misto procedente parcialmente da Administração e em parte dos usuários Em todos esses casos não se produz uma transferência integral dos riscos à Administração Pública com o qual o recurso ao financiamento privado mantém o seu verdadeiro sentido MACHADO Santiago Muñoz Tratado de Derecho Administrativo y de Derecho Público General Tomo I Civitas Madrid 2004 pp 1314 73 Vejamos contudo com mais vagar a fundamentada posição do jurista baiano As concessões de obra ou serviço público são caracterizadas no Brasil como contratos administrativos em que o risco é exclusivamente do concessionário Essa concepção no entanto é antes um mito ou um mantra dogmático um fraseado repetido sistematicamente sem reflexão ou crítica do que um dado da ordem jurídica positiva o direito brasileiro reduz o conceito de álea ordinária conjunto de riscos que o concessionário deve suportar e amplia ao máximo a proteção do concessionário em face da álea extraordinária nas duas modalidades álea administrativa e álea econômica obrigando o Estado a assumir diversos riscos durante o contrato 37 O que a Administração Pública não pode é no uso da margem de modelagem dada pela Lei nº 1107904 adotar critério de divisão de riscos que descaracterize o próprio instituto e a sua natureza de delegação como ocorreria se por exemplo a Administração Pública devesse pagar quantia fixa sem relação com a quantidade e qualidade das utilidades disponibilizadas pelo parceiro privado74 Nesse caso não se trataria mais de parcerias público privadas mas sim de contrato administrativo comum apenas excepcionada a regra de trinta dias para a realização dos pagamentos após a entrega do objeto contratual ou de suas parcelas à Administração art 40 XIV Lei nº 866693 Não haveria a repartição de riscos preconizada nos artigos 4º VI e 5º III Lei nº 1107904 A liberdade administrativa de modelar a repartição de riscos nas parcerias públicoprivadas não pode assim equivaler nem ao modelo da Lei nº 866693 de concessão de serviço ou de obra pública A teoria do fato do princípe nos contratos de concessão por exemplo possui entre nós um alcance muito mais amplo do que no direito francês no direito brasileiro de ordinário o Estado cobre com exclusividade os desequilíbrios contratuais decorrentes de medidas gerais por ele impostas que afetem indistintamente toda a coletividade como os tributos o que não ocorre como regra no direito francês Por igual entre nós a noção de equilíbrio econômicofinanceiro do contrato de concessão tem sido extremamente generosa para o concessionário pois diante de fatos imprevistos excepcionais que afetem a economia do contrato têmse invocado a responsabilidade integral do Estado pela cobertura destes riscos enquanto no direito francês os prejuízos decorrentes de fatos imprevisíveis e anômalos álea econômica são partilhados entre o concedente e o concessionário Essa dupla redução de riscos para o concessionário é extraída pela doutrina majoritária do disposto no art 37 XXI da Constituição Federal na parte que estatui que as obras e serviços serão contratados com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento mantidas as condições efetivas da proposta Sem embargo dessas garantias do concessionário que nada mais são do que assunção pelo Estado de parte dos riscos da concessão a Lei 8987 de 13 de fevereiro de 1995 define a concessão de obra ou serviço público como contrato em que o concessionário deve fazer prova de possuir capacidade para executar a obra ou serviço por sua conta e risco art 2º II III e IV A Lei 110792004 Lei das PPPs foi mais austera impôs a repartição objetiva de riscos entre as partes art 4º VI inclusive os referentes a caso fortuito força maior fato do príncipe e álea econômica extraordinária art 5º III Não tenho dúvida que muitos autores inquinarão o novo dispositivo de inconstitucional por afronta ao precitado art 37 XXI da Constituição Federal Mas considero que esta será uma leitura apressada ou interessada o dispositivo constitucional obriga que sejam mantidas as condições efetivas da proposta mas não impede que o legislador determine aos particulares que na proposta contemplem objetiva catalogação dos riscos que estão dispostos a assumir em relação a situações típicas de caso fortuito força maior fato do príncipe e álea econômica extraordinária O conceito de condições efetivas da proposta não deve atinar apenas com o preço e as tarefas assumidas deve encerrar ao menos nos contratos de parceria públicoprivada um objetivo catálogo de situações que indique quais os riscos serão partilhados entre os parceiros e quais os riscos serão de responsabilidade exclusiva de cada parte É o início do fim dos contratos administrativos elípticos e mal ajustados de poucas páginas que asseguram todas as garantias possíveis ao concessionário e deixam o Estado sem clareza sobre a extensão do risco efetivo assumido pelo concessionário MODESTO Paulo Reforma do Estado Formas de Prestação de Serviços ao Público e Parcerias PúblicoPrivadas demarcando as fronteiras dos conceitos de serviço público serviços de relevância pública e serviços de exploração econômica para as parcerias públicoprivadas texto inédito em mimeo gentilmente fornecido pelo autor 2005 grifos do original 74 Ser for assegurado ao particular um rendimento vinculado apenas ao seu esforço estará excluída uma característica essencial da concessão Passará a se configurar uma empreitada em que o direito do particular à remuneração deriva da execução da prestação dele exigida JUSTEN FILHO Marçal Curso de Direito Administrativo Ed Saraiva São Paulo 2005 p 504 38 nem ao da Lei nº 898795 com o que o contrato seria respectivamente caracterizado como contrato administrativo em geral terceirização ou empreitada ou como concessão comum não como uma parceria públicoprivada regida pela Lei nº 110790475 Além disso sempre que possível a critério do edital eventuais lucros acima de determinado limite também poderão ser repartidos havendo a obrigação de as vantagens oriundas da redução dos custos de financiamento em virtude das garantias especiais dadas pelo Poder Público nesse tipo de contrato serem necessariamente repartidas art 5º IX Lei nº 110790476 Por derradeiro no caso de concessões patrocinadas o aporte financeiro do Poder Público não pode ser superior a setenta por cento da remuneração do particular salvo autorização legislativa específica art 10 3º Lei nº 110790477 75 É assim que ao nosso ver deve ser interpretado o parágrafo único do art 6º da Lei nº 1107904 segundo o qual o contrato poderá prever o pagamento ao parceiro privado de remuneração variável vinculada ao seu desempenho conforme metas e padrões de qualidade e disponibilidade definidos no contrato O verbo poderá nesse contexto combinado com os artigos 4º VI e 5º III da mesma Lei é no sentido da admissão de uma estrutura contratual de repartição de riscos não admissível a priori nas concessões comuns e nos contratos administrativos em geral regidos pela Lei nº 866693 Há contudo ao nosso ver diante de algumas das modalidades de contraprestação pública previstas no caput do art 6º ex cessão de créditos e de direitos sobre bens públicos a possibilidade de direitos fixos serem outorgados ao particular sempre dependentes contudo de uma qualidade e quantidade mínima de utilidades públicas a serem proporcionadas pelo particular 76 Ver também as restrições percentuais ao financiamento por entidades da Administração Pública constantes do art 27 77 Pode vir a ser sustentado que a exigência de autorização legislativa específica como meio de controle da atividade contratual da Administração Pública é inconstitucional por violação da separação dos poderes Essa tem sido a posição adotada pelo STF em relação às exigências de autorização legislativa para a Administração Pública celebrar convênios Vejase por exemplo a ADI 342PR relatada pelo Min Sydney Sanches Ementa Direito constitucional convênios autorização ou ratificação por assembléia legislativa Usurpação de competência do Poder Executivo Princípio da separação de poderes Ação Direta de Inconstitucionalidade do inciso XXI do art 54 da Constituição do Estado do Paraná que diz Compete privativamente à Assembléia legislativa XXI autorizar convênios a serem celebrados pelo Governo do Estado com entidades de direito público ou privado e ratificar os que por motivo de urgência e de relevante interesse público forem efetivados sem essa autorização desde que encaminhados à Assembléia Legislativa nos noventa dias subseqüentes à sua celebração 1 A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que a regra que subordina a celebração de acordos ou convênios firmados por órgãos do Poder Executivo à autorização prévia ou ratificação da Assembléia Legislativa fere o princípio da independência e harmonia dos poderes art 2º da CF Precedentes 2 Ação Direta julgada procedente para a declaração de inconstitucionalidade do inciso XXI do art 54 da Constituição do Estado do Paraná O argumento não é contudo aplicável à espécie em razão de o art 175 parágrafo único exigir lei para a disciplinar cada serviço público que vier a ser prestado mediante concessão e a autorização específica seria então se for o caso conteúdo necessário dessa lei 39 VIII2 SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO SPE O art 9º da Lei nº 110790478 estabelece que o contrato de PPP deve sempre ser celebrado com uma sociedade de propósito específico SPE ou seja uma sociedade constituída sob qualquer modalidade societária especificamente para realizar o empreendimento licitado que constituirá o seu objeto social único Em outros termos podemos dizer que a SPE é uma joint venture personalizada Normalmente a SPE é constituída apenas após definida a vencedora da licitação mas naturalmente antes do contrato que deverá ser por ela assinada já como SPE A depender da situação concreta e do que dispuser o edital de licitação a empresa vencedora constitui uma subsidiária que será a SPE ou em caso do vencedor ser uma consórcio ele próprio poderá ser transformado na SPE Ainda é admissível a hipótese de a partilha dos riscos da PPP ser instrumentalizada através da entrada do Estado como sócio do licitante vencedor na sociedade de propósito específico que será a concessionária o que constituiria um interessante e seguro dada a consolidação do Direito Societário mecanismo de divisão de riscos e lucros entre o Estado e o parceiro privado Caso se opte por esse modelo a Administração Pública não poderá ser controladora da SPE art 9º 4º Lei nº 1107904 Poderá até ter a maioria do capital mas não a maioria do capital votante Notese ainda que face ao art 7º da Lei nº 1107904 que determina que a contraprestação pública só pode ser feita após disponibilizado o serviço ou a infraestrutura o Estado deverá antes desse momento apenas subscrever a sua participação integralizandoa apenas após a referida disponibilização 79 A grande vantagem da SPE nas PPPs é facilitar o controle da execução do contrato e a saúde financeira da concessionária e do respectivo project finance tanto por parte do Poder Concedente como dos financiadores da concessionária em virtude da segregação patrimonial contábil e jurídica que a SPE implica Se a concessionária de PPP não tivesse que ser uma SPE possuindo outras atividades poderia haver uma nebulosidade em relação aos investimentos e receitas concernentes especificamente ao empreendimento público diante do conjunto de todas as outras atividades da empresa 78 O art 9º da Lei nº 1107904 pode ser considerado tanto uma norma sobre contratos administrativos como também uma norma de Direito Societário ramo do Direito Comercial cuja competência para legislar é privativa da União art 22 I CF 79 Nessa e em outras passagens desse Tópico valemonos das valiosas contribuições trazidas por Henrique Bastos Rocha em palestra proferida na Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro sobre o tema das sociedades de propósito específico nas PPPs em 2005 40 IX ÓRGÃOS PLANEJADORES E REGULADORES DAS PPPS Ao tratarmos da limitação das PPPs a projetos de mais de R 20 milhões já percebemos que essa modalidade contratual administrativa não se destina a ser usada pela Administração Pública de forma generalizada mas sim focadamente em determinados projetos prioritários do ponto de vista do desenvolvimento nacional devendo portanto ser inseridas dentro de um projeto nacional global Não é por outra razão que a Lei nº 1107904 no Capítulo aplicável apenas à União Capítulo VI80 prevê em seu art 14 regulamentado pelo Decreto nº 538505 a constituição de um órgão gestor das parcerias públicoprivadas81 integrado e subordinado ao Executivo Central82 com amplas competências em relação às PPPs sendo que algumas dessas competências vão além do que se poderia supor integrar apenas uma função de planejamento83 Nos termos do art 14 da Lei nº 1107904 compete ao órgão gestor definir os serviços prioritários para execução no regime de parceria públicoprivada o que certamente constitui uma função de planejamento e definição de macro políticas públicas Todavia as competências previstas no mesmo artigo de disciplinar os procedimentos para a celebração dos contratos e de aprovar o respectivo edital tendem a constituir um desnecessário exercício de funções técnicoexecutivas que idealmente seriam da competência dos órgãos setoriais tecnicamente especializados Ministérios ou agências reguladoras dependendo do setor Ao prever a competência do órgão gestor para apreciar os relatórios de execução dos contratos a Lei nº 1107904 pode parecer mesmo entrar no núcleo das competências das agências reguladoras de serviços públicos que é justamente fiscalizar a execução dos contratos de concessão Essa percepção centralizadora do órgão gestor não mitigada pelos termos genéricos com que o art 15 da Lei nº 1107904 assegura algumas competências aos Ministérios e agências reguladoras84 é reforçada pelo Decreto nº 538505 80 O modelo vem no entanto sendo seguido com maior ou menor espírito centralizador pelas leis estaduais 81 O Decreto nº 538505 o denomina de Comitê Gestor de Parceria PúblicoPrivada Federal CGP 82 O órgão gestor possui uma composição que vem sendo criticada por ser demasiadamente centralizadora já que integrado apenas pelos Ministérios do Planejamento da Fazenda e pela Casa Civil Das suas reuniões poderão participar sem direito a voto o órgão da Administração Direta excluídas portanto autarquias eventualmente competentes inclusive agências reguladoras cuja área de competência seja pertinente ao objeto da licitação em análise 83 Também lhe são atribuídas funções de controle do atendimento pelo projeto de PPP em análise dos limites fiscais impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal e pela própria Lei nº 1107904 art 14 3º II Lei nº 1107904 84 Art 15 Compete aos Ministérios e às Agências Reguladoras nas suas respectivas áreas de competência submeter o edital de licitação ao órgão gestor proceder à licitação acompanhar e fiscalizar os contratos de parceria públicoprivada Parágrafo único Os Ministérios e Agências Reguladoras encaminharão ao órgão a que se refere o caput do art 14 desta Lei com 41 que o regulamentou e que em seu art 3º atribui ao órgão competências para apreciar e aprovar os relatórios semestrais de execução de contratos de parceria públicoprivada enviados pelos Ministérios e Agências Reguladoras autorizar a abertura de procedimentos licitatórios e aprovar os instrumentos convocatórios os contratos e as suas alterações estabelecer modelos de editais de licitação e de contratos de parceria públicoprivada e estabelecer os procedimentos básicos para o seu acompanhamento e avaliação periódica Algumas dessas competências parecem desbordar até mesmo da larga esfera de competências já conferida pelo art 14 da Lei nº 1107904 que por exemplo atribui ao Comitê Gestor competência apenas para aprovar ao edital de licitação não o contrato em si e as suas alterações Outras competências do órgão gestor apenas acrescem atos de controle que continuarão a ser concorrentemente praticados também pelos órgãos setoriais competentes85 com grande riscos para os Princípios da Celeridade Processual e da Eficiência Administrativa respectivamente arts 5º LXXVIII 37 caput CF em razão da desnecessária cumulação de instâncias êReferência Bibliográfica deste Trabalho ABNT NBR60232000 ARAGÃO Alexandre Santos de As Parcerias PúblicoPrivadas PPPs no Direito Positivo Brasileiro Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico Salvador Instituto de Direito Público da Bahia nº 2 maiojunjul 2005 Disponível na Internet httpwwwdireitodoestadocombr Acesso em xx de xxxxxxxx de xxxx Obs Substituir x por dados da data de acesso ao site direitodoestadocombr Publicação Impressa Informação não disponível periodicidade semestral relatórios circunstanciados acerca da execução dos contratos de parceria públicoprivada na forma definida em regulamento 85 Decreto nº 538505 Art 3º 1º A autorização e a aprovação de que trata o inciso III deste artigo não supre a autorização específica do ordenador de despesas nem a análise e aprovação da minuta de edital feita pelo órgão ou entidade que realizar a licitação de parceria públicoprivada