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Economia ·

Formação Econômica do Brasil

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HISTÓRIA DO BRASIL REPÚBLICA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM Relacionar as principais ações do governo de Eurico Gaspar Dutra Explicar o retorno de Getúlio Vargas e suas principais realizações Reconhecer a visão da historiografia brasileira sobre a Era Vargas Introdução Neste capítulo você vai estudar um importante período da história brasileira e compreender como inúmeros aspectos e características de muitos governantes e figuras históricas que transitaram durante esse período podem ser encontrados direta ou indiretamente em diversas esferas na atualidade além do fato de ainda terem uma importância ímpar na historiografia Esse período inclui os anos de 1946 a 1954 Duas figuras são centrais para compreender os processos políticos no país Eurico Gaspar Dutra e Getúlio Vargas A partir do ano de 1946 inaugurase um período no Brasil que ficou conhecido por alguns nomes diferentes como Quarta República Brasileira República Nova República de 46 ou República Populista Esse período vai até 1964 com o Golpe CivilMilitar todavia aqui nosso recorte temporal será até 1954 ano marcante para a história do Brasil pois é o ano da morte do então presidente Getúlio Vargas O governo de Eurico Gaspar Dutra e o retorno de Getúlio Vargas Krisley Aparecida de Oliveira Eurico Gaspar Dutra ascensão e governo Antes de explicar como ocorreu a ascensão ao poder do General Eurico Gaspar Dutra é necessário que façamos uma retrospectiva rápida para situar em que período esse governante está inserido e quais são os fatos e as condições que o levaram a ocupar esse cargo uma vez que conforme aponta Bloch 2001 em seu livro a história é a ciência do homem no tempo Getúlio Vargas ocupou o cargo de governante do Brasil em dois momentos diferentes da história Para compreender tanto o governo de Gaspar Dutra quanto o retorno de Vargas para o que recebeu o nome de Governo Demo crático de Getúlio Vargas é preciso citar que o Estado Novo 19371945 ficou caracterizado como um regime autoritário que se alinhava a outros regimes autoritários vigentes no mundo naquele mesmo período como é o caso da Alemanha nazista e da Itália fascista Em 1942 alguns submarinos alemães atacaram e naufragaram navios brasileiros A população ficou revoltosa com isso e começou a pressionar Vargas para que ele declarasse guerra contra a Alemanha Sem saída Vargas o fez mas isso começou a minar o seu governo tendo em vista que declarou guerra a um país com o mesmo modelo autoritário adotado pelo seu próprio governo A partir daí ele começou a perder apoio e a sociedade passou a rejeitálo Vargas ainda tentou resgatar um pouco de sua imagem já no tér mino do Estado Novo em 1945 ao convocar uma nova Assembleia Nacional Constituinte e chamar novas eleições Além disso ele também permitiu que fosse feita uma reorganização partidária e concedeu anistia política a presos A sua imagem no entanto já estava muito desgastada e as manifestações contrárias ao seu governo ganharam grandes proporções Nesse mesmo ano surgiu um movimento visando a defender a permanência de Vargas como presidente que recebeu o nome de queremismo Segundo o que apontam as professoras Schwarcz e Starling 2015 estu dantes de direito começaram a se manifestar em prol do estabelecimento de uma democracia e organizaram uma manifestação com o intuito de ganhar apoio popular principalmente das massas que eles acreditavam até aquele momento que também estavam insatisfeitos com o governo ditatorial de Vargas Todavia não ocorreu o que eles queriam A maioria dos trabalhadores que estava na Praça da Sé local onde a manifestação foi parar começaram a gritar palavras de ordem como Nós queremos Getúlio O povo está com Getúlio e Viva os trabalhadores A partir desse momento o movimento queremista começou a crescer espalhandose Muitas pessoas de classes mais altas não compreendiam o porquê de os operários e trabalhadores O governo de Eurico Gaspar Dutra e o retorno de Getúlio Vargas 2 estarem apoiando Vargas A imprensa da época os retratava como vândalos e desordeiros Ainda de acordo com as professoras Schwarcz e Starling 2015 p 390 muito se explica com o apoio da classe trabalhadora por isso tinha natureza política a defesa dos direitos que garantiam a cidadania social obtida pelos trabalhadores a partir da década de 1930 Ao perceber que o Estado Novo caminhava para um final desfavorável ao presidente os trabalhadores saíram às ruas suspeitavam que o conjunto de lei de proteção ao trabalho até então com dois gumes sem Getúlio poderia começar a cortar de um lado só o lado do patrão Com o maior alcance do movimento queremista Vargas se aproximou do movimento que lhe deu apoio e o utilizou como forma de propaganda A partir disso foram criados comitês queremistas no país com o apoio do Ministério do Trabalho e do Departamento de Imprensa e Propaganda DIP Houve então a organização de eventos discursos eram transmitidos via rádio e panfletagens eram feitas bem como comícios e outros Figura 1 O Partido Trabalhista Brasileiro PTB que foi a criado por Vargas também se uniu aos queremistas e lhe deu apoio porém a crise no governo de Vargas apenas aumentou e em 29 de outubro os militares deram um ultimato a Vargas que sem escolha acabou renunciando Figura 1 Comício queremista no Largo da Carioca RJ em 1945 Fonte Queremismo c2020 O governo de Eurico Gaspar Dutra e o retorno de Getúlio Vargas 3 Quando ainda fazia parte do Ministério de Guerra no Estado Novo Eurico Gaspar Dutra fora sondado por grupos oposicionistas a Getúlio Vargas que o convidaram para dar um golpe para afastar o então presidente Seu nome foi pautado pelos setores governistas em associação com o Partido Social Democrático PSD para concorrer à presidência A oposição em torno da União Democrática Nacional UDN colocou o nome de Eduardo Gomes Dutra ganhou as eleições com a ajuda decisiva do PTB e de Vargas que utilizou a sua imagem junto àqueles que ainda o apoiavam para pedir votos ao seu exministro de guerra De acordo com Moura 1990 as principais análises desse momento apon tam para uma descontinuidade econômica e para a continuidade da política institucional do governo Dutra que seguiu o mesmo padrão do Estado Novo Corpos legislativos partidos políticos e eleições voltaram a existir Apesar disso o autoritarismo sobreviveu em partes da nova Constituição de 1946 e não enfrentou uma forte oposição No final de 1946 a maioria da UDN apoiou uma frente partidária com o PSD Com isso as medidas de repressão social e política que foram colocadas em ação pelo governo não sofreram intervenção Em relação à política externa do governo Dutra houve uma continuação política dos últimos anos do governo Vargas conforme aponta Moura 1990 p 2122 Desde o início o governo Dutra acreditava na ligação especial do Brasil com os aliados ocidentais e confiava que um alinhamento estreito à política norteame ricana constituía a melhor defesa para enfrentar um novo conflito global Para os planejadores políticos brasileiros o alinhamento aos Estados Unidos deveria conferir ao país um certo número de vantagens a mais importante das quais seria a manutenção de uma posição militar única na América Latina e sua correspondente posição política Uma segunda vantagem seria a participação ativa nas conversações de paz do pósguerra e no estabelecimento de uma nova ordem internacional Dois temas gerais faziam parte das formulações da política externa co laboração e amizade com as nações do continente e colaboração com as nações democráticas para a consolidação da paz Porém com Vargas esse alinhamento foi feito como um instrumento da política externa brasileira ao passo que com Dutra ele se tornou na prática o objetivo da política Grande parte das decisões após a Constituição de 1946 e a retirada da perspectiva personificadora ficou a cargo do Itamarati que nesse período era extrema mente influenciado por perspectivas liberais e preocupações jurídicas as quais fizeram com que o alinhamento governamental de Dutra fosse no fim das contas voltado para políticas em favor dos Estados Unidos Ianni 1986 chama esse período de Período do Liberalismo Econômico no qual ocorreu O governo de Eurico Gaspar Dutra e o retorno de Getúlio Vargas 4 o desmantelamento da estrutura estatal em nome do capital estrangeiro Investimentos em setores públicos foram drasticamente reduzidos e a Consti tuição com cunho liberal passou a fornecer bases para as ações econômicas do governo Com isso o custo desse alinhamento que favorecia o capital estrangeiro levou os salários ao congelamento e a inflação teve alta além disso instalouse uma recessão econômica e consequentemente houve perda de poder aquisitivo para parte da população do país A concentração ficou maior e por essa razão o distanciamento social entre as classes aumentou exponencialmente Para tentar estimular o desenvolvimento dos setores da Saúde Alimenta ção Transporte e Energia o governo desenvolveu o plano econômico SALTE que é justamente a junção das letras iniciais de cada um dos setores men cionados No setor da saúde o plano tinha como objetivo melhorar o nível sanitário da população principalmente a rural No setor dos transportes o plano era reaparelhar os portos e melhorar a navegabilidade dos rios bem como aparelhar a frota marítima e construir oleodutos Referente à energia a maioria das iniciativas estava ligada à exploração da energia financiada pelo capital privado e estrangeiro e caberia portanto ao governo estimular as empresas concessionárias Dessa forma visando a coordenar os gastos públicos e a dirigir investimentos para esses setores prioritários o plano de Dutra sacrificou os trabalhadores para tentar conter a inflação pois causou uma redução no poder aquisitivo do salário mínimo Sob a perspectiva de Ianni 1986 a situação social do Brasil no final do governo Dutra era um caos Governo democrático de Getúlio Vargas Conforme aponta Ianni 1986 com os quatro anos de congelamento dos salários dos trabalhadores e a grande repressão o período de governança de Dutra chegou ao fim dando espaço para que Getúlio Vargas retornasse ao poder nas eleições de 1950 tudo isso somado ao fato de que essa seria a segunda eleição de um país que caminhava para uma democracia No primeiro momento em que esteve no poder entre os anos de 1930 a 1945 Vargas mi nou a participação de agremiações políticas sindicados e partidos e como vimos anteriormente sobre o governo de Dutra não fez grandes mudanças nos modos de governança Sendo assim quando chegaram as eleições de 1950 os partidos políticos ainda não estavam totalmente organizados e portanto não conseguiram apresentar de maneira substancial nomes paras as eleições É importante também ressaltar que nesse espaço de tempo em que não esteve na chefia do país Vargas conseguiu consolidar ainda mais a O governo de Eurico Gaspar Dutra e o retorno de Getúlio Vargas 5 sua imagem carismática de defensor do povo sendo inclusive eleito Senador no Rio Grande do Sul em 1946 Para o pleito de 1950 o PSD no qual era filiado Gaspar Dutra apresentou o nome do político mineiro Cristiano Machado para concorrer Já a UDN repetiu o nome de Eduardo Gomes que havia sido candidato em 1946 contra Dutra e perdido Vargas abraçou então a legenda do PTB que ajudou a criar e se lançou como candidato aproveitandose ainda da imagem que conseguiu criar e dos apoios conquistados entre lideranças populares Além disso ele se utilizou do velho conhecido clientelismo ou seja da troca de favores para conseguir apoio dos líderes do PSD ganhando dessa maneira votos de pessoas de pequenos centros urbanos e do campo Segundo DAraujo 1992 nesse momento de corrida eleitoral a única pessoa que poderia oferecer risco à campanha vitoriosa de Vargas seria Ademar de Barros principal liderança do Partido Social Progressista PSP Ao perceber essa ameaça Vargas logo tratou de iniciar negociações com Ade mar Lopes para que ele desistisse de sua candidatura própria para apoiálo prometendo portanto que nas próximas eleições ele apoiaria Ademar Lopes para a presidência O Quadro 1 apresenta os nomes listados para a eleição Quadro 1 Candidatos à presidência e à vicepresidência e seus partidos Presidente Vicepresidente Principais partidos Eduardo Gomes Cristiano Machado João Mangabeira Getúlio Vargas Odilon Braga Altino Arantes Vitorino Freire Alipio Correia Neto Café Filho UDN PRP PL PSD PR PST PSB PTB PSP Fonte Adaptado de DAraujo 1992 p 78 Levando em consideração a dinâmica partidária que se estabeleceu e os acordos em campanha que foram feitos Vargas ganhou sem muita surpresa as eleições daquele ano Segundo DAraujo 1992 p 78 Os resultados eleitorais asseguram 487 do total de votos a Getúlio Vargas seguido por Eduardo Gomes 297 Cristiano Machado 215 e João Mangabeira 01 A candidatura Vargas é vitoriosa em 18 das 24 unidades da federação perdendo apenas no Pará Maranhão Piauí Ceará Minas Gerais e nos territórios do Acre e Amapá É interessante registrar que apenas em um grande estado Minas Gerais a votação fica eqüitativamente distribuída entre os três principais candidatos com ligeira vantagem para Eduardo Gomes O governo de Eurico Gaspar Dutra e o retorno de Getúlio Vargas 6 Os setores políticos militares e econômicos logo absorveram os resultados das eleições sem muitas contestações com exceção da UDN que marcada mente em posição de combate ao getulismo começou a colocar objeções para a posse de Vargas e de acordo com DAraujo 1992 p 79 Liderado pelo Deputado Aliomar Baleeiro esse partido lança mão de um recurso jurídico tendo por base que uma interpretação rigorosa da Constituição exigia a maioria absoluta nas eleições presidenciais Todavia contrariando os ude nistas o Supremo Tribunal Eleitoral em janeiro de 1951 proclamou Getúlio Vargas e Café Filho como os candidatos legalmente eleitos Esse governo porém conhecido como democrático de Vargas foi marcado por graves crises sociais políticas e econômicas e também por uma forte oposição ao governo Criouse então uma dualidade no que diz respeito ao debate político sobre o planejamento da economia que seria colocada em prática no país De um lado havia o grupo que sustentava uma perspectiva nacionalista ou seja a defesa da ausência da influência de capital ou grupos estrangeiros no país com o planejamento da economia sendo conduzido por empresas nacionais e pelo Estado No outro lado havia o grupo que acreditava que as ações de empresas e grupos estrangeiros seriam boas para o país Esse debate também chegou ao exército que refletia as preocupações que existiam acerca do comunismo por conta do contexto internacional da Guerra Fria Skidmore 2010 menciona que o dinheiro que a Agência Central de Inteli gência do inglês Central Intelligence Agency CIA investiu em diversas orga nizações brasileiras teve como objetivo introduzir as noções estadunidenses no exército do Brasil Vargas tentou equilibrar essas duas perspectivas em sua agenda de governança mas acabou sendo muito mais nacionalista Uma das projeções nacionalistas dentro dessa esfera foi a que envolveu a criação de instituições estatais para que o Estado explorasse matériasprimas específi cas como o petróleo Nesse contexto surgiram a Eletrobras e a Petrobras mas isso não foi tão simples haja vista que Vargas foi extremamente boicotado e criticado pela oposição e diversos empecilhos ficaram no caminho para que não ocorresse a criação dessas estatais A Eletrobras e a Petrobras segundo Schwarcz e Starling 2015 prejudicaria as indústrias de petróleo e energia estrangeiras que estavam sendo instaladas no Brasil Isso deixa claro que parte dos ataques dos opositores de Vargas se deu porque a perspectiva nacionalista executada por ele se opunha aos interesses internacionais que estavam em atividade no Brasil A maioria de seus opositores formada por políticos filiados à UDN ar gumentava que os projetos nacionalistas que Vargas executava no país po deriam abrir margem para atitudes subversivas da população e portanto O governo de Eurico Gaspar Dutra e o retorno de Getúlio Vargas 7 que eles deveriam buscar uma revolução chegando a afirmar que Vargas tinha o intuito de iniciála seguindo o exemplo de Juan Domingo Perón na Argentina Isso fez com que as classes altas ficassem agitadas e temerosas de que as políticas nacionalistas levassem o Brasil a uma revolução das classes baixas ou algo parecido Vargas com seu típico clientelismo e carisma fez tentativas de apoio com alguns políticos da oposição porém a UDN pregava o antigetulismo e o presidente não conseguiu portanto o apoio que desejava conforme DAraujo 1992 p 31 Todas essas questões são permeadas pelo temor ao comunismo e pela descon fiança de que o Governo não seja capaz de fazer preservar e respeitar a ordem constitucional A crise de desconfiança dá margem a que se explorem de forma sensacionalista todas as suspeitas alimentadas contra o Presidente Amplamente divulgada essa campanha vem abalar ainda mais a estabilidade governamental O tensionamento social marcou profundamente e prejudicou esse governo varguista Um dos principais fatores nesse sentido foi o aumento elevado das despesas básicas Conforme aponta Skidmore 2010 por exemplo no Rio de Janeiro o padrão de vida aumentou de 11 em 1950 para 21 em 1952 acrescido ainda do fato de os trabalhadores não terem aumento de seus salários desde 1943 o que estava ocasionando baixo poder aquisitivo Os sindicatos se organizaram novamente e os operários começaram a exigir melhorias salariais e isso acarretou manifestações Em março de 1953 em decorrência desses fatos duas grandes manifestações ocorreram a Marcha das Panelas Vazias e a Greve dos 300 mil Como essas manifestações tiveram um contingente muito grande de pessoas Vargas já estava ciente de que não tinha mais o mesmo apoio das massas e dos trabalhadores Nesse momento ele fez uma jogada ousada com a indicação de João Goulart para comandar o Ministério do Trabalho pelo fato de este manter uma relação boa e tranquila com os movimentos sindicalistas João Goulart era um político de destaque do PTB Na época este já era bastante conhecido como Jango Por ter uma capacidade notória de comu nicação e negociação Vargas via nele uma forma de tentar reaproximar o trabalhador da cidade e os operários do governo Correspondendo às ex pectativas de Vargas Jango conseguiu caminhar alguns passos e organizou essa reaproximação mas ele não era bem visto pelas classes mais altas já que tinha fama de agitador Isso fez com que essa classe temerosa de uma república sindicalista se afastasse mais ainda de Vargas A imprensa junto à UDN começou a atacar fortemente a figura de Jango principalmente por que ele propôs um aumento salarial de 100 para os trabalhadores o que O governo de Eurico Gaspar Dutra e o retorno de Getúlio Vargas 8 desagradou todos os grupos formados por opositores de Vargas De acordo com DAraujo 1992 p 131 Para os meios conservadores particularmente a UDN e os militares um projeto socializante de esquerda é o que não deveria acontecer e para tal se fazia necessário intensificar a vigilância em torno dos desvios e dos desmandos governamentais A presença de João Goulart na pasta do Trabalho contribuía efetivamente para fortalecer as preocupações que esses setores mantinham em relação ao Governo Alvo de freqüentes pressões inclusive por parte de militares João Goulart passa a ser denunciado como portador de planos secretos para transformar o Brasil numa república sindicalista Para tentar conter os ânimos Vargas precisou retirar Jango do cargo e anunciou como novo ministro no lugar deste um militar que era também anticomunista com o objeto de agradar a classe dos militares Apesar disso mesmo pressionado ele manteve o aumento salarial de 100 Ainda nesse contexto outro fator demonstrou o desgaste entre Vargas e os militares que recebeu o nome de Manifesto dos Coronéis Segundo DAraujo 1992 p 178 tratavase de uma espécie de abaixoassinado com a participação de 82 coronéis que demonstrava a possibilidade eminente de um golpe por essa classe O memorial assinado por 82 coronéis e enviado ao Ministro da Guerra e à cúpula militar era uma denúncia contra a iminência de perda de valores fundamentais para a corporação militar e um alerta quanto ao perigo de desagregação e de infiltração de ideologias antidemocráticas dentro do Exército Tinha o sentido de um apelo para que o elemento militar fosse mais valorizado e para que fossem corrigidas as desigualdades e injustiças que desmotivavam os militares em relação à carreira impelindoos para a vida civil Em 1954 o cenário continuava extremamente difícil e os grupos que faziam oposição continuavam com ataques Denúncias de tentativas de colabo ração entre o Brasil e a Argentina mesmo sem comprovação fizeram com que houvesse uma tentativa de impeachment mas este foi barrado pelo Congresso A situação do governo atingiu o ápice de sua crise quando em 5 agosto de 1954 ocorreu um atentado contra Carlos Lacerda um grande expoente no movimento de oposição a Vargas Lacerda ficou levemente fe rido e um dos seus seguranças foi morto A investigação chegou à conclusão que quem orquestrou o crime fora o responsável pela segurança do palácio presidencial Gregório Fortunato A partir disso também descobriuse que Fortunato mantinha relação com esquemas de corrupção porém na verdade se comprovou que as denúncias tinham ligação com Vargas O governo de Eurico Gaspar Dutra e o retorno de Getúlio Vargas 9 Após o atentado com a situação já não se sustentando Café Filho vice de Vargas rompeu a sua ligação com ele e isso aliado ao cenário fez com que os militares exigissem a renúncia de Vargas De acordo com DAraújo 1992 como Vargas se recusou a renunciar eles começam a arquitetar a sua derrubada por meio de imposições militares o que resultou dois fatos totalmente imprevisíveis o suicídio de Vargas e a reação popular em relação à sua morte Figura 2 Figura 2 Funeral de Getúlio Vargas Fonte Memorial da Democracia 2018 O portal do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contem porânea do Brasil organizado pela Fundação Getúlio Vargas FGV traz uma exposição virtual rica em imagens e documentos sobre a Campanha política de 1950 que levou Getúlio Vargas novamente ao poder O governo de Eurico Gaspar Dutra e o retorno de Getúlio Vargas 10 Historiografia em debate o balanço da Era Vargas Como bem disse o célebre historiador brasileiro Manoel Luiz Salgado Gui marães na apresentação do livro Século XIX e a história o caso de Fustel de Coulanges de François Hartog 2003 p 9 Cada geração reinventa o legado que deseja assumir como seu legado presente e essa tarefa cria a necessidade de repensar a história especialmente para aqueles que a tomaram como o exercício de um ofício de uma profissão e de um magistério Nesse mesmo movimento repensam as regras de seu ofício redefinem as práticas que viabilizam o conhecimento do passado reinventando a própria operação his tórica nem cenário de tensões e conflitos a partir do qual a disputa pelo passado remete às disputas pela significação do próprio presente Existe a necessidade sempre presente de voltar àquilo que já foi pesqui sado produzido e escrito sobre os mais diversos temas para reinterpretálos Nenhum tema assunto evento ou fato histórico está esgotado há sempre a possibilidade de construir novas narrativas a partir de pesquisas metodica mente guiadas com novas documentações e olhares Conforme aponta Gui marães 1995 buscando desfazer a noção de que o conhecimento do passado seja mera rememoração a história da história aliada às demandas de uma nova etapa epistemológica da disciplina começou a se orientar sobre uma série de perguntas sobre categorias conceitos e procedimentos que fazem com que seja possível a sua elaboração Sendo assim desde que começou a ser compreendida como dotada de historicidade ou seja condicionada pela perspectiva de seu autor local de sua elaboração e tempo tanto as pesquisas quanto as escritas da história passaram a demandar uma abordagem crítica das produções historiográficas Getúlio Vargas é considerado uma das figuras mais importantes da história do Brasil É possível ainda afirmar que Vargas pode ser considerado uma das personalidades mais controversas e difíceis de ser analisada Para fazer um balanço historiográfico sobre o período em que governou é preciso ponderar suas ações e projeções desde 1930 quando ocupou pela primeira vez o posto de líder da nação e começou a criar a sua imagem nacional pública A cultuação personalística no Brasil é muito forte ao longo da história brasileira e isso acontece com inúmeras figuras mas principalmente com a imagem de governantes No caso de Vargas não é diferente A historia dora Hebe Mattos 2005 ao fazer uma análise da memória dos descentes de pessoas escravizadas no Brasil relata que uma parte considerável das pessoas que entrevistou faz uma associação entre as figuras da princesa O governo de Eurico Gaspar Dutra e o retorno de Getúlio Vargas 11 Isabel e Vargas apontando que ela teria dado a liberdade e ele os direitos civis Recai sobre Vargas portanto a figura de um herói figura que tem sempre muita expectativa depositada Vargas é visto como o responsável necessário para a solução de um país com o histórico de séculos de problemas sociais econômicos etc Dessa maneira a partir disso forjouse a imagem de um homem mitificado personalístico Conforme apontamos anteriormente ocorreram inúmeros momentos marcantes ao longo da Era Vargas No caso específico discutido aqui em torno do governo democrático de Vargas é possível pontuar a forte crise opositora iniciada por diversos grupos bem como o ainda forte apoio de grande parte da população que inclusive deu início ao movimento queremista Além disso a partir do seu suicídio houve a forte comoção social que tomou conta das pessoas e levou inclusive a revoltas contra a UDN partido que fazia a principal frente de oposição ao governo varguista Em relação ao primeiro período de Vargas no poder que vai de 1930 a 1945 podemos destacar o modo como foram tratados os movimentos operários que pelo menos de maneira mais intensificada desde a década de 1920 com a criação do Partido Comunista do Brasil o PCB mais tarde com o nome de Partido Comunista Brasileiro faziam muitas movimentações em prol de direitos Vargas muito astuto percebeu que muitas coisas precisavam ser alteradas para conseguir estabelecer algum grau de proximidade com esses trabalhadores porém a maneira violenta de repressão que fora utilizada nas primeiras décadas de república continuou vigente em seu governo O movimento operário continuava sendo reprimido Aliado a isso havia o anti comunismo que deu forte munição para a perseguição a prisão e a expulsão de inúmeras pessoas do país Luís Carlos Prestes por exemplo foi preso durante esse período além de ter a sua esposa Olga Benário Prestes enviada para a Alemanha e morta em um campo de concentração nazista mas antes disso ele teve uma filha de nome Anita Leocádia Prestes que não pôde ver enquanto estava preso tudo isso sob ordens de Vargas A criação do DIP em 1937 foi fundamental para a criação da imagem per sonalista de Vargas A partir dele como o governo de Vargas que seguia o padrão centralizador da época foi empreendida uma campanha muito forte de censura a tudo aquilo que fosse desfavorável ao seu governo mas ao mesmo tempo usando a sua imagem de maneira positiva Conforme aponta a professora Capelato 1998 nunca havia se visto antes na história brasileira um uso tão efetivo da propaganda por parte do Estado Todavia é necessário pontuar que apesar da característica autoritária não há como colocar no mesmo pé de igualdade o regime varguista com o nazifascismo europeu que O governo de Eurico Gaspar Dutra e o retorno de Getúlio Vargas 12 vigorava na época Segundo Capelato 1998 p 32 a repressão foi intensa e as liberdades foram anuladas nesse período mas não ocorreu o monopólio absoluto do Estado no plano físico jurídico ou econômico Jose Honório Rodrigues 1985 intelectual carioca que atravessou grande parte da história do Brasil República e produziu muito sobre esse período conseguiu analisar de maneira esclarecedora a Era Vargas No ano de 1981 Rodrigues realizou uma palestra na Câmara dos Deputados em decorrência das festividades do movimento que ocorreu em 1930 o golpe que levou Vargas ao poder pela primeira vez e já apontava na época os problemas que envolviam o fato de esse momento ser chamado de Revolução de 1930 Para Rodrigues 1985 p 73 A revolução é uma mudança macrohistórica uma ruptura do sistema sob crescente tensão psicossocial Daí sua incontrolabilidade Para seu rompimento é preciso que a estrutura isto é o sistema econômicosocial e a situação ou seja a crise a curto prazo dentro do sistema com tensões de longo prazo entrem em choque com forças sociais e econômicas e com novas aspirações De acordo com Oliveira 2019 Rodrigues foi enfático em sua análise ao afirmar que em relação à situação econômica em meados de 1930 Vargas manteve uma postura que aparentava ser amistoso em relação ao investi mento de países estrangeiros especialmente dos Estados Unidos que naquele momento ultrapassava a GrãBretanha passando a ocupar um lugar de destaque no cenário econômico Rodrigues 1970 aponta ainda que Thomas Skidmore acusava Vargas de ter se calado em relação à reforma agrária Segundo ele Thomas os latifundiários e os grandes proprietários de terra que dominavam a política até 1930 continuaram no poder mesmo com a ascensão de Vargas na medida em que este não mudou a estrutura agrária do país Por essa razão não houve uma revolução ruptura nesse evento haja vista que não ocorreu uma ruptura social Os trabalhadores urbanos as classes mais baixas os operários entre outras classes sempre lutaram ao longo da história do Brasil desde os tem pos da colônia até o momento em que Vargas presidiu o país Eles travaram imensas lutas para que pudessem gozar de direitos trabalhistas organizando para tanto sindicatos manifestações e greves A população se fez presente na conquista da Consolidação das Leis do Trabalho CLT porém como ela ocorreu no governo de Vargas o DIP usou isso para alavancar a imagem de Vargas Em geral a participação do povo nesse processo de conquista de direitos trabalhistas é deixada de lado mas a ênfase naquele momento e O governo de Eurico Gaspar Dutra e o retorno de Getúlio Vargas 13 na maneira como se construiu a imagem de Vargas é a de que foi ele quem deu esses direitos aos trabalhadores Em se tratando do segundo momento de Vargas no poder governo demo crático Rodrigues 1970 p 251 aponta que Getúlio defendia a instituição do seguro agrícola e dizia estarem adiantados os estudos da reforma agrária Ele afirmando que Vargas desagradava as classes dominantes que tinham medo de uma reforma estrutural o que corrobora aquilo discorremos ao longo deste capítulo acerca de toda a perseguição que recebeu Para Rodrigues 1970 p 251 o Getúlio Vargas de 19511954 não é o mesmo de 19301945 Rodrigues 1985 via em Vargas uma figura histórica que mantinha uma política interna e externa sempre oscilando de acordo com as condições e circunstâncias do momento e que sempre sofreu com as pressões das forças armadas e dos americanos Para Oliveira 2019 p 34 Rodrigues ao falar de Vargas o coloca na História como uma figura realmente dupla ora de forma positiva ora de forma negativa Portanto a maneira como foi construída a figura e a imagem de Vargas ao longo da história bem como as considera ções sobre as possibilidades de mais de uma interpretação e mais que isso a necessidade de intepretação de uma figura histórica em seu contexto agindo de acordo com o seu tempo e as demandas que o cercam o que os historiadores e outros pesquisadores que se debruçam sobre o tema têm buscado fazer ao longo dos anos é desmistificar as imagens unilaterais ou bilaterais que por ventura foram construídas sobre a imagem desse que foi uma das maiores figuras históricas da história do país Não cabe portanto à historiografia fazer com que a imagem de Vargas seja a de herói ou vilão sendo assim é necessário que a figura de Vargas seja analisada levando em consideração toda a sua complexidade sem que a imagem dele seja ora exaltada ora defenestrada deixando de lado os messianismos bem como os mitos e as crenças O historiador não deve demonizar ou santificar a imagem de nenhum personagem histórico Getúlio conforme é apresentado por Rodrigues foi uma figura que cultivou acertos e erros ao longo de sua trajetória política e isso deve ser levado em consideração quando estudamos e analisamos a sua história Referências BLOCH M L B Apologia da história ou O ofício de historiador Rio de Janeiro Zahar 2001 CAPELATO M H R Multidões em cena propaganda política no varguismo e no pero nismo Campinas Papirus 1998 O governo de Eurico Gaspar Dutra e o retorno de Getúlio Vargas 14 DARAÚJO M C S O segundo governo Vargas 19511954 democracia partidos e crise política 2 ed São Paulo Ática 1992 Disponível em httpsbibliotecadigitalfgvbr dspacebitstreamhandle10438678148pdf Acesso em 29 out 2020 GUIMARÃES M L S Historiografia e cultura histórica notas para um debate Ágora Revista do Departamento de História e Geografia v 1 n 1 1995 HARTOG F O século XIX e a história o caso Fustel de Coulanges Rio de Janeiro Ed UFRJ 2003 IANNI O Estado e planejamento econômico no Brasil 4 ed Rio de Janeiro Civilização Brasileira 1986 MATTOS H Memórias do cativeiro narrativa e identidade negra no antigo sudeste cafeeiro In RIOS A L MATTOS H Memórias do cativeiro família trabalho e cidadania no pósabolição Rio de Janeiro Civilização Brasileira 2005 Parte I MEMORIAL DA DEMOCRACIA 24 de agosto de 1954 Getúlio se mata com um tiro no coração Carta Maior o portal da esquerda 2018 Disponível em httpswwwcarta maiorcombrEditoriaMemoria24deagostode1954Getuliosematacomum tironocoracao5141529 Acesso em 29 out 2020 MOURA G O alinhamento sem recompensa a política externa do governo Dutra Rio de Janeiro FGV 1990 Disponível em httpsbibliotecadigitalfgvbrdspacehan dle104386613 Acesso em 29 out 2020 OLIVEIRA K A José Honório Rodrigues e a historiografia brasileira em defesa de uma concepção de história Dissertação Mestrado em História Universidade Federal de Goiás Goiânia 2019 Disponível em httpsrepositoriobcufgbrtedehandle tede9437 Acesso em 29 out 2020 QUEREMISMO FGV CPDOC c2020 Disponível em httpscpdocfgvbrproducaodos siesAEraVargas1anos3745QuedaDeVargasQueremismo Acesso em 29 out 2020 RODRIGUES J H História e historiografia Petrópolis Vozes 1970 RODRIGUES J H História viva São Paulo Global 1985 SCHWARCZ L M STARLING H M Brasil uma biografia São Paulo Companhia das Letras 2015 SKIDMORE T E Brasil de Getúlio a Castello 193064 São Paulo Companhia das Letras 2010 Leituras recomendadas CAMPANHA DE 1950 FGV CPDOC 2020 Disponível em httpsexpovirtualcpdocfgv brcampanhade1950 Acesso em 29 out 2020 VARGAS G Getúlio Vargas diário Rio de Janeiro Fundação Getúlio Vargas 1995 O governo de Eurico Gaspar Dutra e o retorno de Getúlio Vargas 15 Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados e seu funcionamento foi comprovado no momento da publicação do material No entanto a rede é extremamente dinâmica suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo Assim os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade precisão ou integralidade das informações referidas em tais links O governo de Eurico Gaspar Dutra e o retorno de Getúlio Vargas 16 Conteúdo