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Direito de Família
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Texto de pré-visualização
III ENCONTRO VIRTUAL DO CONPEDI GÊNERO SEXUALIDADES E DIREITO I JOSÉ EDMILSON DE SOUZA LIMA RENATO DURO DIAS SILVANA BELINE TAVARES Copyright 2021 Conselho Nacional de Pesquisa e PósGraduação em Direito Todos os direitos reservados e protegidos Nenhuma parte deste anal poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados sem prévia autorização dos editores Diretoria CONPEDI Presidente Prof Dr Orides Mezzaroba UFSC Santa Catarina Diretora Executiva Profa Dra Samyra Haydêe Dal Farra Naspolini UNIVEMFMU São Paulo Vicepresidente Norte Prof Dr Jean Carlos Dias Cesupa Pará Vicepresidente CentroOeste Prof Dr José Querino Tavares Neto UFG Goiás Vicepresidente Sul Prof Dr Leonel Severo Rocha Unisinos Rio Grande do Sul Vicepresidente Sudeste Profa Dra Rosângela Lunardelli Cavallazzi UFRJPUCRio Rio de Janeiro Vicepresidente Nordeste Profa Dra Gina Vidal Marcilio Pompeu UNIFOR Ceará Representante Discente Prof Dra Sinara Lacerda Andrade UNIMARFEPODI São Paulo Conselho Fiscal Prof Dr Caio Augusto Souza Lara ESDHC Minas Gerais Prof Dr João Marcelo de Lima Assafim UCAM Rio de Janeiro Prof Dr José Filomeno de Moraes Filho Ceará Prof Dr Lucas Gonçalves da Silva UFS Sergipe Prof Dr Valter Moura do Carmo UNIMAR São Paulo Secretarias Relações Institucionais Prof Dra Daniela Marques De Moraes UNB Distrito Federal Prof Dr Horácio Wanderlei Rodrigues UNIVEM São Paulo Prof Dr Yuri Nathan da Costa Lannes Mackenzie São Paulo Comunicação Prof Dr Liton Lanes Pilau Sobrinho UPFUnivali Rio Grande do Sul Profa Dra Maria Creusa De Araújo Borges UFPB Paraíba Prof Dr Matheus Felipe de Castro UNOESC Santa Catarina Relações Internacionais para o Continente Americano Prof Dr Heron José de Santana Gordilho UFBA Bahia Prof Dr Jerônimo Siqueira Tybusch UFSM Rio Grande do Sul Prof Dr Paulo Roberto Barbosa Ramos UFMA Maranhão Relações Internacionais para os demais Continentes Prof Dr José Barroso Filho ENAJUM Prof Dr Rubens Beçak USP São Paulo Profa Dra Viviane Coêlho de Séllos Knoerr Unicuritiba Paraná Eventos Prof Dr Antônio Carlos Diniz Murta Fumec Minas Gerais Profa Dra Cinthia Obladen de Almendra Freitas PUC Paraná Profa Dra Livia Gaigher Bosio Campello UFMS Mato Grosso do Sul Membro Nato Presidência anterior Prof Dr Raymundo Juliano Feitosa UMICAP Pernambuco G326 Gênero sexualidades e direito I Recurso eletrônico online organização CONPEDI Coordenadores Elisaide Trevisam Renato Duro Dias Silvana Beline Tavares Florianópolis CONPEDI 2021 Inclui bibliografia ISBN 9786556483054 Modo de acesso wwwconpediorgbr em publicações Tema Saúde segurança humana para a democracia 1 Direito Estudo e ensino Pósgraduação Encontros Nacionais 2 Gênero 3 Sexualidade III Encontro Virtual do CONPEDI 1 2021 Florianópolis Brasil CDU 34 Conselho Nacional de Pesquisa e PósGraduação em Direito Florianópolis Santa Catarina Brasil wwwconpediorgbr III ENCONTRO VIRTUAL DO CONPEDI GÊNERO SEXUALIDADES E DIREITO I Apresentação Mesmo em um período de extrema dificuldade em virtude da crise sanitária pesquisadoras e pesquisadores de instituições de várias regiões do país continuaram a se desafiar produzindo potentes investigações no campo das temáticas de gênero raça sexualidades e direito Neste III Encontro Virtual do CONPEDI os estudos reverberaram o caráter interdisciplinar e marcadamente de uma epistemologia de resistência necessários a denunciar dialogar e problematizar os campos teóricos e metodológicos oxigenando a área do direito Saudamos as importantes contribuições apresentadas conforme relação abaixo O trabalho Inexistência de estereótipos de gênero na jurisprudência portuguesa desenvolvido por Janaina da Silva de Sousa busca compreender a jurisprudência portuguesa no sentido de manutençãoconstrução de hierarquias de gênero a partir de análise de decisões judiciais dos Tribunais de Relação de Lisboa e Porto com processos no período de 2016 a 2019 sobre crime de violação Gabriella da Mata Facco Queiroz e Renato Bernardi em A revenge porn terminologia historicidade e sua incidência no gênero feminino analisam o fenômeno abordando sua construção no meio social e sua incidência no gênero feminino Em A adoção civil por famílias homoafetivas no brasil Jonatas Marcos da Silva Santos e Thainá da Silva de Lima criticam os principais aspectos da legislação infraconstitucional acerca da adoção civil e a relação com o reconhecimento da união estável homoafetiva pautando os avanços e entraves postos à construção da proteção jurídicolegal às novas entidades familiares A partir da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas Emília Paranhos Santos Marcelino Cecilia Paranhos S Marcelino e Palmira Paranhos Santos Lins de Carvalho com o trabalho A efetivação do ODS nº 5 e as políticas públicas para uma igualdade de gênero no brasil fazem uma investigação sobre políticas públicas e a efetividade no atendimento à ODS nº5 no Brasil Elísio Augusto Velloso Bastos Brenda Dinorah Mendes Marques e Marcella Nobrega Merabet trazem aspectos relevantes da vida das mulheres transexuais no ambiente prisional assim como as constantes violações de seus Direitos no artigo A proteção dos direitos de gênero das mulheres transexuais no ambiente prisional do Brasil inovações e perspectivas a partir da ADPF 527 Em A subrepresentação feminina no supremo tribunal federal brasileiro e o perfil das ministras de Elida De Cássia Mamede Da Costa e Luan de Souza Afonso podese perceber como ocorreu a presença feminina no Supremo Tribunal Federal STF ao longo de sua história O artigo Autoidentificação e cidadania substituição do prenome e do gênero nos assentos de nascimento e casamento por pessoas transexuais no direito brasileiro de Artur Gustavo Azevedo do Nascimento traz a decisão do Supremo Tribunal Federal e ato do Conselho Nacional de Justiça que reconhecem o direito da pessoa transgênero de substituir seu prenome e o gênero perante os Oficiais de Registro Civil independentemente de cirurgia de redesignação ou da realização de tratamentos hormonais ou patologizantes A séria questão sobre tráfico de mulheres para fins de exploração sexual é analisada por Cassius Guimaraes Chai Beatriz de Araujo Caldas e Amanda Cristina de Aquino Costa no trabalho Da invisibilidade para as estatísticas o tráfico internacional de mulheres e exploração sexual uma perspectiva de gênero e violação de direitos humanos A partir da abordagem interseccional de raça e de classe Glaucia Fernanda Oliveira Martins Batalha analisa o agravamento da divisão sexual do trabalho e das assimetrias sociais de gênero desencadeadas pela pandemia do COVID19 em Desigualdade de gênero e a economia do cuidado em tempos de pandemia da covid19 o agravamento da divisão sexual do trabalho e das assimetrias sociais no contexto neoliberal O trabalho Ecofeminismo análise da mulher como vetor de sustentabilidade de Flavia Piccinin Paz e Marcelo Wordell Gubert alerta que o conhecimento e sua relação com o ambiente estão intrinsicamente ligado ao empoderamento da mulher a partir do desenvolvimento de atividades sustentáveis Ronaldo da Costa Formiga discute a realidade familiar contemporânea a partir de temas como divórcio litigioso alienação parental guarda compartilhada e cultura individualista com o trabalho Famílias contemporâneas e a perspectiva sistêmica os desafios do judiciário frente os efeitos da ideologia individualista As dificuldades para coibir a violência contra as mulheres nas relações domésticas e familiares é analisada por Fábia Lopes Gomes da Silva em Feminicídio da conivência do estado à necessidade de capacitação do sistema de justiça criminal em que denuncia à conivência do Estado ao ratificar os desmandos da cultura patriarcal no Brasil por mais de 500 anos Em Grandes casos da suprema corte dos Estados Unidos sobre orientação sexual Raphael Rego Borges Ribeiro analisa 04 casos da Suprema Corte dos EUA sobre orientação sexual e descreve a postura da Corte entre 1986 e 2015 em relação à sexualidade Concepções sobre identidade de gênero e diversidade são apresentadas no artigo Identidade de gênero um comparativo de decisões judiciais e da opinião consultiva nº 2417 em que Lorena Araujo Matos e Thiago Augusto Galeão De Azevedo analisam a evolução sobre a temática no Poder Judiciário brasileiro além de conceitos introduzidos em documento internacional Bibiana de Paiva Terra e Bianca Tito em Igualdade de gênero na constituição federal de 1988 o movimento feminista brasileiro e a conquista do princípio da igualdade abordam acerca da conquista do Princípio da Igualdade na Constituição Federal de 1988 assim como a trajetória de luta do movimento feminista para essa conquista Partindo da teoria do reconhecimento de Axel Honneth Patrícia Oliveira de Carvalho em seu artigo Teoria do reconhecimento como farol sobre as vulnerabilidade interseccionais da mulher negra vítima de violência de gênero analisa os números do Mapa da Violência para pensar saídas e interpretações para o recrudescimento da quantidade de casos de violência de gênero que atingem mulheres negras Finalmente o artigo Uma análise do descumprimento das determinações legais concernentes à igualdade de gênero na representação política à luz da jurisprudência do tribunal superior eleitoral de Thaiane Correa Cristovam questiona a posição adotada pelo TSE diante de partidos políticos que descumprem a obrigações legais concernentes à igualdade de gênero na política É com imensa satisfação que convidamos todasoses a atenta leitura de cada uma das referenciadas produções acadêmicas Pesquisas que orgulham o Grupo de Trabalho Gênero Sexualidade e Direito do CONPEDI Silvana Beline Tavares UFG Renato Duro Dias FURG José Edmilson de Souza Lima UNICURITIBA A REVENGE PORN TERMINOLOGIA HISTORICIDADE E SUA INCIDÊNCIA NO GÊNERO FEMININO THE REVENGE PORN TERMINOLOGY HISTORICITY AND ITS INCIDENCE IN FEMALE GENDER Gabriella da Mata Facco Queiroz Renato Bernardi Resumo O presente artigo visa a analisar o fenômeno da revenge porn abordando a problemática de sua terminologia construção no meio social e sua incidência no gênero feminino Com esses fatores expostos será trazida a legislação vigente que aborda sobre tais questões A partir da metodologia do método indutivo sob enfoque na prática da disseminação não consentida de conteúdo íntimo foram desenvolvidas as análises mencionadas Palavraschave Pornografia de vingança Pornografia não consentida Violência de gênero Crimes virtuais sexuais Violação de privacidade AbstractResumenRésumé This article aims to analyze the phenomenon of revenge porn addressing the problems of its terminology construction in the social environment and its incidence in the female gender With these factors exposed the current legislation that addresses these issues will be brought up Based on the methodology of the inductive method focusing on the practice of the non consensual dissemination of intimate content the aforementioned analyzes were developed KeywordsPalabrasclavesMotsclés Revenge porn Nonconsensual pornography Violence of gender Virtual sexual crimes Violation of privacy 24 INTRODUÇÃO A democratização da internet nos últimos anos trouxe consigo a facilitação no compartilhamento de dados Se no último século era necessária a impressão de imagens ou a gravação física de conteúdo de vídeo nos dias atuais apenas poucos cliques na tela de um smartphone são capazes de disseminar qualquer tipo de material digital É notório que a efemeridade na dissipação de conteúdo traz consigo maior conforto à vida das pessoas no entanto também abriu espaço para que práticas reprováveis ocupassem espaço no meio digital Uma dessas condutas será o objeto de pesquisa do presente trabalho a pornografia de vingança ou o termo mais adequado disseminação não consentida de conteúdo íntimo conforme será abordado O presente trabalho busca analisar o fenômeno da pornografia de vingança desde a sua terminologia firmamento no contexto histórico e social à incidência em maioria no gênero feminino A partir da reação do legislador à ocorrência desta prática será trazida a análise da evolução legislativa atual bem como críticas às desconexões entre a intenção do legislador e a letra da lei O primeiro capítulo discorrerá sobre a terminologia pornografia de vingança suas problematizações e propostas mais adequadas ao entendimento de diferentes pesquisadores Entre os crimes virtuais em especial de exposição de material íntimo de forma não consentida será realizada a diferenciação e especificação da temática bem como sua construção no meio social Ainda será abordada a incidência desta prática em maioria no gênero feminino trazendose entendimentos doutrinários acerca de gênero e construção social como forma de justificar os dados em desfavor das mulheres No segundo capítulo são trazidas as evoluções legislativas cabíveis ao tema desde a Lei Carolina Dieckmann Lei nº 127372012 Marco Civil da Internet Lei nº 129652014 até as mais recentes Lei de Importunação Sexual Lei nº 137182018 e Lei nº 137722018 bem como suas respectivas alterações e instituições no ordenamento jurídico brasileiro Por consequência da importância de suas vigências também à desconexão entre intenção do legislador e letra da lei fora objeto de crítica sendo trazidas tais considerações 1 REVENGE PORN COMPLEXIDADE DE SUA TERMINOLOGIA CONSTRUÇÃO HISTÓRICA NO MEIO SOCIAL E IMPACTO NO GÊNERO FEMININO 25 O termo em inglês revenge porn significa em tradução literal pornografia de vingaça ou pornografia de revanche Essa prática consiste na exposição não consentida de imagens vídeos íntimos realizada geralmente peloa excompanheiroa da vítima na intenção de prejudicála A temática desencadeia diversas discussões desde sua nomenclatura a responsabilização do agente disseminador ou do meio utilizado para a propagação revistas sites aplicativos de mensagens instantâneas até suas consequências na vida da vítima Com isto a pornografia de vingança pode ser definida como a divulgação de imagens sexuais fotográficas ou audiovisuais por uma pessoa que tem ou já teve um vínculo afetivo com a vítima E apesar de muitas vezes apesar de o material ser filmado com o consentimento dela ou mesmo por ela concedido sexting a exposição do material é feita sem a permissão dela o que configura o crime GOMES 2014 p 16 Franks e Citron grandes pesquisadoras do tema definem a nonconsensual pornography em tradução literal pornografia não consentida como a distribuição de imagens sexuais de indivíduos sem seu consentimento Isto inclui imagens obtidas originalmente sem o consentimento por exemplo através de câmeras escondidas ou gravação de violência sexual bem como as obtidas no contexto privado ou confidencial de um relacionamento por exemplo imagens obtidas pela própria vítima enviadas para um parceiro íntimo que posteriormente as distribui sem o seu consentimento popularmente conhecido como pornografia de vingança Além de imagens e vídeos obtidos de forma não consensual trazidos por grande parte da doutrina Castro e Sydow ainda acrescentam a divulgação de áudios eróticos à vingança pornográfica Vingança pornográfica é a terminologia usada para descrever a distribuiçãopublicação não consensual de imagens de nus em fotografias eou vídeos sexualmente explícitos também a publicação de áudios de conteúdo erótico pode se encaixar em tal terminologia CASTRO SYDOW 2019 p 39 A revenge pornpornografia de vingança é comumente usada como abreviação de todas as formas de nonconsensual pornography pornografia não consentidaexposição pornográfica não consentida existindo a intercambialidade entre estes termos conforme Citron e Franks Ainda as autoras atribuem o mesmo sentido às expressões cyber rape e involuntary porn estupro virtual e pornografia involuntária Castro e Sydow discordam 26 acerca da intercambialidade destes termos tendo em vista que a exposição pornográfica não consentida pode apresentarse de diversas formas com repercussão social e gravidade de cada uma a serem apreciadas conforme sua especificidade Quanto à terminologia pornografia de vingança supracitada Alice de Perdigão Lana traz no livro Mulheres Expostas 2018 que deve ser objeto de crítica uma vez que essas locuções trazem o reconhecimento da ideia de vingança A partir disso pressupõese que alguma ação da mulher previamente deu ensejo à retaliação portanto mesmo sem ser a intenção esta acabase por justificar a conduta de quem dissemina as imagens Nesse sentido embora pornografia de vingança e exposição pornográfica não consentida não sejam tecnicamente termos intercambiáveis conforme mencionado anteriormente Castro e Sydow optam pela adoção do segundo termo excluindo a noção de vingança Além do termo revenge trazer consigo uma carga revitimizadora o termo porn carrega uma condenação moral da nudez ou pornografia em geral como discorrem Valente Neriz Ruiz e Bulgarelli no livro O Corpo é o Código 2016 Ademais seria errôneo entender como pornografia um material íntimo produzido no contexto de uma relação com destinatários estritamente específicos por vezes para uma única visualização em aplicativos que permitem esta opção Esta ideia reforça a revitimização uma vez que a pornografia apesar das problemáticas é uma exposição consentida pelas partes envolvidas Por conseguinte associase que a vítima produziu a imagem eou vídeo na intenção ou assumindo o risco de compartilhamento com terceiros Logo na introdução do livro O Corpo é o Código os autores mencionam sobre a decisão terminológica que tiveram que tomar para a desenvoltura do mesmo Devido o conhecimento popular do termo pornografia de vingança optaram por não abandonálo totalmente para que interessados no tema se deparassem com a referida produção ao buscarem fontes acerca No entanto da mesma forma que o termo possui teor explicativo de outro reforça visões que carregam preconceitos conforme supramencionado VALENTE NERIZ RUIZ e BULGARELLI 2016 p 5 Ao longo do livro as pesquisadoras realizam entrevistas com juristas Entre as entrevistadas encontrase Silvia Chakian Promotora de Justiça no Estado de São Paulo Ao ser questionada o que achava do termo pornografia de vingança posicionase Péssimo Péssimo totalmente contra um termo pejorativo que atribui o termo pornografia de vingança já julga né Que aquilo é pornográfico que é imoral que a 27 mulher Tem um julgamento moral embutido nisso que a mulher que E são muitos os casos em que aquele conteúdo foi produzido com o consentimento dela e ela tem esse direito Muitas mulheres o fazem como determinação de gênero eu quero tirar para mim é importante eu me acho bonita eu quero divulgar Mas quando você embute a palavra pornografia você já julga você já diz que aquilo é errado que é condenável sob o aspecto moral Acho que essa nomenclatura tinha que mudar a gente não tinha que adotar essa pornografia de vingança e outra o termo vingança também pressupõe que a mulher fez alguma coisa de errado e o sujeito está se vingando mas o que ela fez de errado É porque ela rompeu um relacionamento Então eu vejo problema nas duas palavras vingança e pornografia Então alguma coisa no sentido de exposição indevida da imagem sabe Divulgação indevida Isso é muito mais condizente com a conduta de quem veicula a imagem de forma inapropriada da mulher VALENTE NERIZ RUIZ e BULGARELLI 2019 p 50 Grifos dos autores A expressão non consensual intimate images tem sido adotada por ativistas e acadêmicos da língua inglesa Portanto por motivos de conceituação e praticidade ao invés de insistir no termo pornografia de vingança fora adotada no livro mencionado a expressão Disseminação Não Consensual de Imagens Íntimas utilizando a sigla NCII excluindo o D de Disseminação para que fosse possível repassar o conteúdo sem mediações e ainda dialogar com a literatura internacional Este termo tira o foco tanto de revenge quanto de porn e busca focar no aspecto da autonomia da mulher com o foco na ideia de consentimento VALENTE NERIZ RUIZ e BULGARELLI 2016 p 52 Devido à consolidação do termo tanto no âmbito social e jornalístico quanto no acadêmico e até jurídico neste trabalho por vezes serão utilizadas denominações que incluem as palavras pornografia e vingança propositalmente entre aspas em consequência de sua presença nas referências utilizadas Entretanto pelos motivos mencionados embora seja mais abrangente a prioridade será utilizar o termo trazido por Ruiz e Bulgarelli de disseminação não consensual de imagens íntimas ou ainda disseminação não consensual de conteúdo íntimo que não se limita apenas à imagens para referenciar a exposição dessa prática A pornografia de vingança encontrase como uma forma de divulgação não consentida de conteúdo íntimo Para a verificação de seu enquadramento é necessário analisar a fonte da captura a forma de circulação e a motivação Assim quanto a exposição de conteúdo íntimo não consentido Castro e Sydow propõem a seguinte classificação 1 Conforme a fonte a oriunda da própria vítima b oriunda do parceiro ou da parceira sexual c oriunda de terceira pessoa não participante do ato ou d de captação pública ou e de origem ignorada 2 Conforme a obtenção do material a consentida ou b não consentida 28 3 Conforme a permissão para disseminação do material a de divulgação consentida b de divulgação parcialmente consentida ou c de divulgação nãoconsentida de divulgação proibida 4 Conforme a motivação da disseminação a por vingança b para humilhação da vítima c por vaidade ou fama do divulgador d com o objetivo de chantagem ou para obtenção de vantagem ou e com o objetivo de lucro CASTRO SYDOW 2019 p 41 Grifo dos autores Em análise do caso da chamada pornografia de vingança a fonte e obtenção podem ocorrer de quaisquer formas no entanto quanto à permissão para disseminação do material ocorre de forma nãoconsentidaproibida Decorrente disto a principal característica é quanto ao ânimo do agente disseminador que age por motivo de vingança divulgando o conteúdo na intenção de prejudicar àquele que aparece no material geralmente sua ex companheira em casos de conflitos ou términos de relacionamentos 11 A construção histórica da exposição íntima não consentida no meio social Em investigação quanto à origem das exposições íntimas não consentidas encontrase sobre a seção Beaver Hunt da revista pornográfica estadunidense Hustler voltada para o público masculino fundada em 1974 pelo empresário Larry Flynt Essa seção era destinada para os leitores enviarem fotografias não profissionais de mulheres nuas sob o pagamento de 5000 cinquenta dólares caso a imagem fosse selecionada para a publicação Também era possível enviar o nome da modelo seu endereço e fantasias sexuais CASTRO SYDOW 2019 p 53 A precariedade na verificação das informações e assinaturas enviadas à revista junto às imagens íntimas proporcionaram um espaço para divulgação de imagens sem o consentimento da mulher exposta A primeira ação indenizatória em razão disso ocorreu com LaJuan Wood e seu marido Bill Wood que tiveram imagens íntimas subtraídas por vizinhos e expostas de forma fraudulenta na seção Beaver Hunt Sob o argumento legal de falsa representação altamente ofensiva e revelação de fatos privados alheios ao interesse público fora fixada pelo Quinto Circuito da Corte de Apelação dos Estados Unidos a indenização para LaJuan no valor de US15000000 cento e cinquenta mil dólares Quanto à pornografia de vingança trazida pela revista Hustler destacase o caso da estudante universitária Sabrina Gallon publicado na edição de outubro de 1983 A fotografia 29 foi tirada na primavera de 1982 por seu convivente Waldo Emerson WaldronRamsey Após ser vítima de espancamento e estupro pelo companheiro em dezembro do mesmo ano a jovem registrou ocorrência disciplinar estudantil e criminal A vítima ficou sabendo por intermédio de amigos da publicação de sua foto No caso de Gallon a Hustler foi condenada pela Corte Distrital do Nono Distrito de Nova Iorque ao pagamento de indenização no valor de US 3000000 trinta mil dólares devido ao inadequado processo de verificação de informações enviadas à seção Beaver Hunt sendo o material sensível e não ordinariamente destinados à publicação CASTRO SYDOW 2019 p 56 Notase que a responsabilização nestes casos sempre foi imposta à empresa disseminadora do conteúdo mas nunca pelos que enviaram o material para a mesa Ainda que a punição para a exposição íntima de terceiros sem critérios para têla impedido limitouse ao âmbito civil como se o ressarcimento financeiro fosse capaz de suprir todos os danos causados às vítimas No início dos anos 2000 a revolução do videoteipe transformou a acessibilidade aos filmes pornográficos podendo ser assistidos na privacidade do lar A ascensão da internet trouxe uma nova revolução ao mercado enquanto forma de propagação em massa Com o início da popularização da internet surgiam sites gratuitos que permitiam criação de grupos sexuais de interesses específicos Sergio Messina trouxe novos rumos a pornografia amadora com a consolidação do termo Realcore que demonstra produções visuais realizadas por pessoas reais retratando relações sexuais de fato e não apenas assumindo uma performance para a câmera CASTRO SYDOW 2019 p 57 É no complicado e movimentado cruzamento sociocultural entre a hipocrisia o desejo de vingança a ambição financeira o fetichismo por Realcore e o incontrolável poder de disseminação da era virtual que se encontra em rápida propagação a exposição pornográfica não consentida vale dizer há quem a dissemine para punir ou lucrar há quem a consuma por prazer ou morbidez e não há mecanismos suficientemente eficazes para controlála CASTRO SYDOW 2019 p 59 Grifo nosso Com essa tendência em crescimento cada vez mais surgiam sítios na internet especializados em Realcore Estes sítios não são empresas produtoras de conteúdo pornográfico mas sim plataformas especializadas na hospedagem desse tipo de material lucrando com anúncios e parte do auferido por amadores que comercializam vídeos por meio 30 do site Um ambiente virtual destinado ao upload de Realcore tornouse também propício para o compartilhamento de conteúdo de Realcore revenge porn CASTRO SYDOW 2019 p 59 Em outubro de 2007 o termo revenge porn passou a constar no dicionário colaborativo Urban Dictionary popular nos Estados Unidos GOMES 2014 p 6 Com a enorme repercussão de materiais intitulados como pornografia de vingança logo surgiram sítios especializados para o compartilhamento desta prática Entre estes destacase o site Is Anyone Up criado por Hunter Moore em 2010 Além de a hospedagem de usuários no intuito de vingança ou diversão o site permitia que fossem divulgados nome completo cidade profissão e links de redes sociais de quem estava no material para que quem pesquisasse pudesse encontrar facilmente nos mecanismos de pesquisa Inspirado no sucesso de Moore e sincronizado com esta ideia Kevin Bollaert criou o site UGotPostedcom com tradução literal você foi postadocom Bollaert foi ainda mais ousado que Moore criando também um site chamado ChangeMyReputationcom em tradução literal mude minha reputaçãocom que extorquia as vítimas para que imagens carregadas no UGotPostedcom fossem removidas mediante taxa de remoção Tais como os exemplos mencionados existiram e ainda existem diversos sites e sessões destinadas à pornografia de vingança em plataformas pornográficas online Com a ascensão dos smartphones a criação de aplicativos de mensagens instantâneas e adaptação de sites para aplicativos a possibilidade de troca de conteúdo entre os usuários sendo textos imagens vídeos eou sons tornouse ainda mais facilitada Dessa forma a disseminação não consentida de imagens íntimas desde a captura do conteúdo pela vítima à sua disseminação pelo destinatário passou a ocorrer em questão de segundos Em análise ao contexto histórico nunca foi tão fácil e rápido expor uma pessoa como nos dias atuais Percebese portanto que a prática do que hoje é denominado pornografia de vingança começou antes da internet embora tenha sido extensivamente multiplicado a partir dela O aparecimento das mídias sociais aplicativos de batepapo e redes sociais também contribuiu devido à precária regulamentação principalmente no Brasil GOMES 2014 p 16 Notase em vista disso que a divulgação não consentida de imagens e vídeos íntimos não é uma problemática recente no entanto a internet pode proporcionar enorme repercussão a estes casos As principais vítimas desta prática são mulheres e adolescentes 31 sendo por consequência o grupo social que mais se preocupa com essa temática VALENTE NERIZ RUIZ e BULGARELLI 2016 p 2 Este apontamento acerca da ocorrência em maioria entre as mulheres será melhor explorado no subtópico a seguir 12 A incidência da disseminação de conteúdo íntimo não consentido no gênero feminino A memorável frase de Simone de Beauvoir ninguém nasce mulher tornase mulher inaugura o segundo volume do livro O Segundo Sexo Nesta é trazida a carga sociocultural atribuída às mulheres limitandoas a papéis específicos No entanto isto não ocorre de forma natural inerente à existência feminina mas sim decorrente da construção social de comportamentos entendidos como femininos e atribuídos ao gênero BEAUVOIR 1967 p 9 Em decorrência da desigualdade nas atribuições aos gêneros à mulher atribuise a postura do recato e obediência enquanto ao homem de virilidade e dominância Essas demandas estendemse a todas as manifestações dentro das relações entre os gêneros inclusive a sexualidade A partir disso surge uma duplicidade de comportamentos a serem assumidos pelo segundo sexo ao mesmo tempo que uma serva submissa ao homem um ídolo intocada Para ser graciosa ela deverá reprimir seus movimentos espontâneos pedemlhe que não tome atitudes de menino proíbemlhe exercícios violentos brigas em suma incitamna a ser como as mais velhas uma serva e um ídolo BEAUVOIR 1967 p 23 Diante dessa disparidade entre o masculino e o feminino a violência de gênero não ocorre de forma aleatória mas sim derivada de uma organização social de gênero que privilegia o masculino É o que discorre Heleieth Saffioti no livro Gênero Patriarcado Violência de 2004 Assim a autora afirma que a inferiorização do feminino está intrínseco à violência sofrida por este gênero A violência de gênero pode se manifestar de diversas maneiras A ascensão da internet conforme mencionado possibilita a sua utilização para fins negativos incluindo a prática violência de gênero em quaisquer de suas formas sendo necessário um enfoque aos crimes sexuais virtuais Nesse sentido as pesquisadoras Layana Laiter e Geanna Moraes da Silva abordam 32 Embora exista no ambiente virtual a injúria ameaça e perseguição no âmbito da violência contra a mulher e até mesmo doméstico é necessário dar maior atenção aos crimes contra a liberdade sexual da mulher pois são práticas talvez não tão recentes que ganharam espaço no âmbito penal apenas nos últimos anos LAITER SILVA 2020 p 8 A ministra Nancy Andrighi em julgamento do Recurso Especial nº 1679465SP interposto pela Google Brasil Internet LTDA julgado pela Terceira Turma do Supremo Tribual de Justiça em março de 2018 reconheceu a disseminação de conteúdo íntimo não consensual intitulado pela mesma como pornografia não consensual como forma de violência de gênero Ainda fez constar que embora as mulheres não sejam as únicas vítimas deste tipo de violência esta prática é praticada principalmente contra elas sendo reflexo de uma questão de gênero A exposição pornográfica não consentida da qual a pornografia de vingança é uma espécie constitui uma grave lesão aos direitos de personalidade da pessoa exposta indevidamente além de configurar uma grave forma de violência de gênero que deve ser combatida de forma contundente pelos meios jurídicos disponíveis Superior Tribunal de Justiça Recurso Especial nº 1679465SP Terceira Turma julgado em 13032018 DJe 19032018 Desse modo a disseminação de conteúdo íntimo não consensual surgida num contexto de inovações tecnológicas atrelada à cultura patriarcal possibilitou a configuração de uma nova manifestação de violência contra a mulher A maior incidência destas dáse pela inserção num contexto social que reprime sua sexualidade e lhes culpabiliza pela agressão o que resulta em graves consequências que refletem em todos os aspectos de suas vidas GUIMARÃES 2019 pg 49 A SaferNet Brasil organização nãogovernamental que atua em prol dos direitos humanos na internet possui um serviço de atendimento online a Helpline Em 2014 o chamado sexting1 foi o principal motivo de busca por ajuda contabilizando 222 tópicos sobre o tema seguido de cyberbullyingofensa com 177 tópicos de conversa VALENTE NERIZ RUIZ e BULGARELLI 2019 pg 3 1 A SaferNet Brasil definesexting como uma palavra originada da união de duas palavras em inglês sex sexo texting envio de mensagens O Sexting descreve um fenômeno recente no qual adolescentes e jovens usam seus celulares câmeras fotográficas contas de email salas de batepapo comunicadores instantâneos e sites de relacionamento para produzir e enviar fotos sensuais de seu corpo nu ou seminu Envolve também mensagens de texto eróticas no celular ou Internet com convites e insinuações sexuais para namoradoa pretendentes eou amigosas Disponível em httpwwwsafernetorgbrsiteprevencaocartilhasaferdicassexting Acesso em 12 abril 2021 33 O Instituto Avon em parceria com o Data Popular realizou em 2014 a pesquisa intitulada Violência contra a mulher o jovem está ligado a partir da oitiva de 2046 jovens brasileiros entre 16 a 24 anos sendo 1017 homens e 1029 mulheres O estudo trouxe as percepções dos jovens em relação à violência de gênero impressões sobre valores machistas assédio agressões físicas e o papel da internet na perpetuação da violência contra a mulher INSTITUTO AVON DATA POPULAR 2014 Quando indagadas sobre o uso da internet para relacionamentos e sexo 40 quarenta por cento das jovens entrevistadas alegaram que já se relacionaram com alguém que conheceu virtualmente Entre as entrevistadas 15 quinze por cento afirmaram já terem praticado sexo virtual com uma conhecidoa e 14 quatorze por cento com uma desconhecidoa Quanto às respostas dos jovens entrevistados os números sobem para 24 vinte e quatro por cento e 27 vinte e sete por cento respectivamente Ao serem questionadas acerca de ações que ocorreram com o término do relacionamento 13 treze por cento das jovens afirmaram que o parceiro espalhou detalhes íntimos do casal Quanto ao compartilhamento de imagens de mulheres nuas 28 vinte e oito por cento dos jovens afirmaram já terem repassado esse tipo de material Esta porcentagem cai para apenas 11 onze por cento quando as mulheres são questionadas sobre tal ação A organização estadunidense sem fins lucrativos Cyber Civil Rights Initiative2 atende vítimas em todo o mundo e defende a inovação tecnológica social e legal voltada para o combate de abuso online Numa pesquisa publicada em 2017 realizada com 3044 adultos estadunidenses os resultados apontam que entre 8 usuários de redes sociais 1 foi vítima de disseminação de conteúdo íntimo não consentido Entre os entrevistados 158 são mulheres que relatam terem sido vítimas ou pelo menos terem sido ameaçadas sendo a porcentagem reduzida a 8 oito por cento em correspondência aos homens CYBER CIVIL RIGHTS INITIATIVE 2017 Dessarte notase que a ocorrência de disseminação não consentida de conteúdo íntimo ocorre principalmente em desfavor das mulheres É notória a relação entre a 2 A organização originouse com a campanha End Revenge Porn liderada pela ativista Holly Jacobs que já foi uma vítima de nonconsensual pornography NCP A partir de um site que coletava assinaturas a favor da criminalização da nonconsensual pornography a plataforma online acabou tornandose um centro de apoio às vítimas e defensores com serviços de baixo custo ou gratuitos para ajudálas a se recuperarem da exposição não consentida Disponível em httpswwwcybercivilrightsorg Acesso em 12 abril 2021 34 construção social do gênero feminino e os prejuízos ocasionados pela exposição podendo ser entendida como uma forma de violência de gênero conforme discorre Gomes 2014 A análise desses dados permite que a pornografia de revanche seja considerada uma forma de violência de gênero pois como foi visto as vítimas são de modo majoritário jovens mulheres Dessa forma assim como em estupros na violência doméstica e em perseguições de cunho pessoal na pornografia de vingança são violados parâmetros legais e sociais para a promoção da igualdade de gênero GOMES 2014 pg 17 A partir do exposto é possível perceber que a violência de gênero assume sua propagação também nos meios virtuais Por consequência disto a prática da disseminação de conteúdo íntimo sem consentimento mostrase como mais uma forma de consolidação de violência agindo de forma ofensiva além da integridade física da mulher mas também atingindo também seu psicológico e dignidade sexual 2 Evolução legislativa acerca da exposição não consentida de conteúdo íntimo no Brasil A disseminação de conteúdo íntimo sem consentimento da parte registrada pelo teor invasivo e vexatório de divulgação de intimidade infringe valores constitucionais como o da dignidade da pessoa humana inciso III do art 1º e da intimidade vida privada honra e imagem inciso X art 5º Em consideração a mera ameaça ou já infração destes bens jurídicos tornouse necessária a adequação do ordenamento jurídico brasileiro a partir de formulação de legislação específica que versasse sobre o tema A Lei nº 127372012 conhecida como Lei Carolina Dieckmann foi pioneira ao tratar sobre crimes informáticos no Brasil criminalizando invasões cibernéticas3 Estas tipificações penais surgiram após a repercussão do caso da atriz Carolina Dieckmann motivo pelo qual a lei fora batizada com seu nome Nesta situação hackers invadiram o email da 3 Art 154A Invadir dispositivo informático alheio conectado ou não à rede de computadores mediante violação indevida de mecanismo de segurança e com o fim de obter adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano e multa 1º Na mesma pena incorre quem produz oferece distribui vende ou difunde dispositivo ou programa de computador com o intuito de permitir a prática da conduta definida no caput 3º Se da invasão resultar a obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas segredos comerciais ou industriais informações sigilosas assim definidas em lei ou o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido Pena reclusão de 6 seis meses a 2 dois anos e multa se a conduta não constitui crime mais grave 35 vítima tendo acesso a diversas imagens incluindo conteúdo íntimo Com isto passaram a realizar ligações para a atriz solicitando R1000000 dez mil reais para que as fotos não fossem divulgadas O Marco Civil da Internet instaurado pela Lei nº 12965 de 23 de abril de 2014 estabelece princípios garantias direitos e deveres para o uso da internet no Brasil Os princípios norteadores são dispostos nos incisos do artigo 3º condizentes aos valores constitucionais destacando na temática a proteção da privacidade e dados pessoais e responsabilização dos agentes de acordo com suas atividades nos termos da lei O artigo 19 da referida lei apenas responsabiliza o provedor de aplicações de internet por danos decorrente de conteúdo gerado por terceiros caso não tome providências para tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente após decisão judicial específica A exceção a esta regra é trazida pelo art 21 na qual o provedor será responsabilizado subsidiariamente pela violação de intimidade pela publicação não autorizada de materiais que contenham cena de nudez ou ato sexuais e após serem notificados por estes ou seus representantes legais não tornaram indisponíveis o conteúdo nos limites técnicos de seu serviço Notase que condizente ao nome Marco Civil a responsabilização mencionada era no âmbito da esfera civil limitandose a obrigação de fazer remoção de material eou ações indenizatórias por danos morais Em âmbito penal as vítimas de exposição não consentida de material íntimo na ausência de lei específica poderiam entrar com ação penal por difamação e injúria arts 139 e 140 do Código Penal a ser julgada pelo Juizado Especial Criminal com penas mais brandas A Lei nº 13718 de 24 de setembro de 2018 conhecida como Lei de Importunação Sexual altera o Código Penal DecretoLei nº 36881941 para tipificar os crimes de importunação sexual e de divulgação de cena de estupro Estes passam a tornar os crimes contra a liberdade sexual e crimes sexuais contra vulnerável ações penais de natureza pública incondicionada Nesse sentido surge o art 218C que discorre como crime além de dispor acerca do aumento de pena Art 218C Oferecer trocar disponibilizar transmitir vender ou expor à venda distribuir publicar ou divulgar por qualquer meio inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática fotografia vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de 36 vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática ou sem o consentimento da vítima cena de sexo nudez ou pornografia Pena reclusão de 1 um a 5 cinco anos se o fato não constitui crime mais grave Aumento de pena 1º A pena é aumentada de 13 um terço a 23 dois terços se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou humilhação BRASIL 2018 A existência de um tipo penal específico para a exposição de conteúdo íntimo não consentido no ordenamento jurídico brasileiro mostrase benéfica sendo possível traduzir de forma mais eficiente a gravidade da conduta e suas repercussões na vida pessoal da vítima e meio social No entanto a maneira que se encontra disposta dentro do tipo a criminalização da conduta perde parte de sua força cogente CASTRO SYDOW 2019 pg 127 Cabe mencionar que quando se trata de conteúdo envolvendo crianças e adolescentes ocorre o amparo pelo Estatuto da Criança e do Adolescente Lei nº 80691990 no capítulo de crimes em espécie O art 241A dispõe sobre a oferta troca dispobilização transmissão distribuição publicação ou divulgação de material que contenha sexo explícito ou pornografia envolvendo criança ou adolescente com pena de reclusão de 3 três a 6 seis anos e multa Ainda o art 241B abrange também a posse ou armazenamento por qualquer meio do referido material contendo criança ou adolescente com pena de reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa A supracitada Lei de Importunação Sexual é resultante do PL nº 54522016 posteriormente apensado ao PL nº 57982016 O art 218C foi acrescido por motivo de aproveitamento na Lei nº 137182018 e encontrase no Título VI Dos Crimes Contra a Dignidade Sexual especificamente no Capítulo II Dos Crimes Sexuais Contra Vulnerável trazendo a noção de sua aplicabilidade apenas no contexto de vulnerabilidade Nesse sentido desde as discussões quanto ao PL nº 57982016 a Comissão de Constituição e Justiça posicionouse indicando a necessidade da transferência do artigo para o Capítulo I Dos Crimes Contra a Liberdade Sexual4 Imperioso portanto é o deslocamento do novo tipo penal para o Capítulo I do Título VI Dos Crimes Contra a Liberdade Sexual do Código Penal pois desse modo a 4 Parecer do Relator Deputado Fábio Ramalho Disponível em httpswwwcamaralegbrproposicoesWebpropmostrarintegracodteor1516351filenameTramitacaoPL5 4522016 Acesso 15 abril 2021 37 conduta descrita não ficará restrita às vítimas vulneráveis que inclusive quando se tratar de criança ou adolescente estão protegidas pelo referido dispositivo penal do ECA com pena mais rigorosa o qual assim continuará vigente A localização topográfica desse novo dispositivo penal dentro do Capítulo I do Título VI do Código Penal visa portanto à proteção de vítima maior de 18 anos a qual a par da hipótese de estupro com violência ou grave ameaça não consente com a divulgação de sua imagem em situação de intimidade sexual com oa parceiroa de relacionamento BRASIL 2016 Ainda é cabível a problematização da natureza incondicionada da ação penal Embora a intenção do legislador seja trazer o aumento da reprovabilidade em iniciar a persecução penal independente do desejo da vítima a consequência prática pode ser justamente o contrário Esta conduta pode ensejar na revitimização da ofendida diante a exposição indesejada da vítima aos agentes de segurança pública e justiça CASTRO SYDOW 2019 pg 144 A Lei nº 13772 de 19 de dezembro de 2018 traz alterações na Lei Maria da Penha Lei nº 113402006 e Código Penal DecretoLei nº 28481941 de modo a reconhecer a violação da intimidade como violência doméstica e familiar criminalizando o registro não autorizado de conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado A Lei Maria da Penha dispõe nos incisos do artigo 7º formas de violência doméstica e familiar contra a mulher sendo estas I violência física II violência psicológica III violência sexual IV violência patrimonial e V violência moral A supracitada Lei nº 137722018 altera a redação do inciso II do art 7º sendo acrescida a violação de intimidade como forma de violência psicológica Ainda instituiu o art 216B ao Código Penal criando especificamente para tal o Capítulo IA Da Exposição da Intimidade Sexual Art 216B Produzir fotografar filmar ou registrar por qualquer meio conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado sem autorização dos participantes Pena detenção de 6 seis meses a 1 um ano e multa Parágrafo único Na mesma pena incorre quem realiza montagem em fotografia vídeo áudio ou qualquer outro registro com o fim de incluir pessoa em cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo 38 Castro e Sydow trazem críticas a este capítulo tendo em vista a desconexão entre o tipo penal e o título discorrido tornandoo inócuo O artigo menciona a prática de registro sexual não autorizado que ao entendimento dos autores tratase de violação de intimidade sexual CASTRO SYDOW 2019 pg 148 O título do capítulo por sua vez disserta sobre exposição da intimidade Assim mostramse incongruentes a intenção do legislador em tipificar a disseminação do conteúdo íntimo e a letra da lei que aborda meramente sobre o seu registro Dessarte embora existam legislações específicas que versem sobre a conduta de disseminação de material íntimo não consentido Castro e Sydow em relação à Lei nº 137722018 trazem considerações que podem ser estendidas também à Lei nº 13772 de que a redação é confusa e certas condutas são inexequíveis do ponto de vista pragmático sendo necessário reparos nas mesmas CASTRO SYDOW 2019 pg 148 CONCLUSÃO Diante o exposto é possível perceber que as tecnologias disponíveis ao longo da história referentes à comunicação também abriram espaço para propagação de material íntimo sem a anuência daqueles retratados no conteúdo Imersa nessa disseminação de material íntimo não consentido surgiu a chamada pornografia de vingança que também desencadeou discussões quanto à sua adequada terminologia Enganase quem atribui esta prática às ferramentas de comunicações instantâneas atuais É fato que estes meios facilitam a propagação de informações na fração de segundos permitindo a produção e compartilhamento de dados em praticamente qualquer horário e lugar do mundo No entanto a origem da exposição íntima de conteúdo íntimo não consentido adveio da popularização do conteúdo visual produzido por revistas voltadas ao público masculino na década de 1970 Demandadas pelas ações reprováveis quanto aos crimes sexuais virtuais o surgimento de legislações específicas como a Lei nº 137182018 e a Lei nº 137722018 trouxeram o simbolismo punitivo para tais Mesmo com disposições acerca a conduta contra mulheres ainda ocorre e seus resultados são devastadores na vida pessoal das vítimas Não há dúvida que a mera criminalização de uma conduta não resolve por si só a problemática do cometimento de delitos sendo necessário entender as questões complexas por detrás das condutas violadoras de valores juridicamente protegidos CASTRO SYDOW 2019 p 167 39 Conforme mencionado no presente trabalho é necessário que as disposições legais supramencionadas disponham de forma clara e coesa acerca da temática Para tanto é necessário uma reforma na letra da lei atualmente vigente tendo em vista suas interpretações ambíguas e colocações inadequadas Dessa forma restará especificado ao magistrado a aplicabilidade da lei para a conduta abordada Os autores ainda discorrem sete ações norteadoras e de prevenção à exposição de conteúdo íntimo não consentido ao usuário comum sendo a 1 educação e conscientização acerca da problemática especialmente entre adolescentes em jovens 2 proteção informática 3 atenção às senhas 4 cuidados com a webcam 5 acesso responsável de sites 6 scams ou seja golpes aplicados na internet e por fim 7 dispositivos sem vigilância CASTRO SYDOW 2019 p 172 Por fim as diferentes formas de manifestação de violência de gênero às mulheres decorrem das relações de poder construídas historicamente em sociedade Para a erradicação de ações violentas contra a mulher seja espaço físico ou cibernético devese insistir na desconstrução dos estereótipos e papéis atribuídos aos gêneros masculino e feminino em dicotomia Este é um caminho longo e árduo a ser enfrentado no entanto a cada produção acadêmica projeto de lei proposto aprovação de legislativa entre outras abordagens mostramse avanços quanto à percepção do tema e sua reprovabilidade em meio social A partir disso o ordenamento jurídico mostrase sincronizado com a responsabilização daqueles que infringirem a violação de terceiros principalmente no meio virtual Por fim o que já fora conhecido como terra sem lei mostrase cada vez mais direcionada aos valores constitucionais da União de garantia de direitos fundamentais como a dignidade da pessoa humana intimidade vida privada honra e imagem 40 REFERÊNCIAS BRASIL Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03constituicaoconstituicaohtm Acesso em 14 abril 2021 BRASIL Decretolei nº 2848 de 07 de dezembro de 1940 Institui o Código Penal Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03decretoleidel2848compiladohtm Acesso em 14 abril 2021 BRASIL Lei nº 8069 de 13 de julho de 1990 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03leisl8069htm Acesso em 14 abril 2021 BRASIL Lei nº 11340 de 07 de agosto de 2006 Disponível em httpswwwplanaltogovbrccivil03Ato200420062006LeiL11340htm Acesso em 14 abril 2021 BRASIL Lei nº 12737 de 30 de novembro de 2012 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03ato201120142012leil12737htm Acesso em 14 abril 2021 BRASIL Lei nº 12965 de 23 de abril de 2014 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03ato201120142014leil12965htm Acesso em 14 abril 2021 BRASIL Lei nº 13718 de 24 de setembro de 2018 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03ato201520182018leiL13718htm Acesso em 14 abril 2021 BRASIL Lei nº 13772 de 19 de dezembro de 2018 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03ato201520182018leiL13772htm Acesso em 14 abril 2021 BEAUVOIR Simone de O Segundo Sexo Experiência Vivida 2ª Edição São Paulo Difusão Europeia do Livro 1967 500 p CASTRO Ana Lara Camargo de SYDOW Spencer Toth Exposição Pornográfica Não Consentida na Internet da Pornografia de Vingança ao Lucro Coleção Cybercrimes 2ª Edição Belo Horizonte Editora DPlácido 2019 190 p CITRON Danielle Keats FRANKS Mary Anne Criminalizing Revenge Porn 2014 Disponível em httpdigitalcommonslawumarylandeducgiviewcontentcgiarticle2424contextfacp ubs Acesso em 9 abril 2021 CYBER CIVIL RIGHTS INITIATIVE Nonconsensual porn a common offense Disponível em httpswwwcybercivilrightsorg2017natlncpresearchresults Acesso em 12 abril 2021 FRANKS Mary Anne Drafting An Effective Revenge Porn Law A Guide for Legislators Disponível em 41 httpswwwcybercivilrightsorgwpcontentuploads201504GuideforLegislators33015 pdf Acesso em 9 abril 2021 G1 Suspeitos do roubo das fotos de Carolina Dieckmann são descobertos Disponível em httpg1globocomriodejaneironoticia201205suspeitosdoroubodasfotosdecarolina dieckmannsaodescobertoshtml Acesso em 13 abril 2021 GOMES Marilise Mórtagua As Genis do século XXI análise de casos de pornografia de vingança através das redes sociais Monografia orientada pela profª Cristiane Henriques Costa Faculdade Federal do Rio de Janeiro 2014 GUIMARÃES Ana Larissa Gonçalves Crimes Virtuais e Novas Modalidades de Violência de Gênero A Divulgação Não Consentida de Imagens Íntimas na Internet Monografia orientada pelo prof Dr Raul Carneiro Nepomuceno Universidade Federal do Ceará 2019 INSTITUTO AVON DATA POPULAR Violência Contra a Mulher O Jovem Está Ligado Disponível em httpsinstitutoavonorgbrviolenciacontraamulherpostnossaatuacaoemnumeros Acesso em 12 abril 2021 LAITER Layana SILVA Geanna Moraes da Crimes Sexuais Contra a Mulher na Internet no Contexto Pandêmico do Novo Coronavírus Disponível em httpconpedidanilolrinfopublicacoesnl6180k3vv9u5o3i Acesso em 9 abril 2021 LANA Alice de Perdigão Mulheres Expostas Revenge Porn Gênero e o Marco Civil da Internet Curitiba GEDAIUFPR 2019 SAFFIOTI Heleieth Iara Bongiovani Gênero Patriarcado Violência São Paulo Editora Fundação Perseu Abramo 2004 VALENTE Mariana Giorgetti NERIS Natália RUIZ Juliana Pacetta BULGARELLI Lucas O Corpo é o Código estratégias jurídicas de enfrentamento ao revenge porn no Brasil InternetLab São Paulo 2016 42
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III ENCONTRO VIRTUAL DO CONPEDI GÊNERO SEXUALIDADES E DIREITO I JOSÉ EDMILSON DE SOUZA LIMA RENATO DURO DIAS SILVANA BELINE TAVARES Copyright 2021 Conselho Nacional de Pesquisa e PósGraduação em Direito Todos os direitos reservados e protegidos Nenhuma parte deste anal poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados sem prévia autorização dos editores Diretoria CONPEDI Presidente Prof Dr Orides Mezzaroba UFSC Santa Catarina Diretora Executiva Profa Dra Samyra Haydêe Dal Farra Naspolini UNIVEMFMU São Paulo Vicepresidente Norte Prof Dr Jean Carlos Dias Cesupa Pará Vicepresidente CentroOeste Prof Dr José Querino Tavares Neto UFG Goiás Vicepresidente Sul Prof Dr Leonel Severo Rocha Unisinos Rio Grande do Sul Vicepresidente Sudeste Profa Dra Rosângela Lunardelli Cavallazzi UFRJPUCRio Rio de Janeiro Vicepresidente Nordeste Profa Dra Gina Vidal Marcilio Pompeu UNIFOR Ceará Representante Discente Prof Dra Sinara Lacerda Andrade UNIMARFEPODI São Paulo Conselho Fiscal Prof Dr Caio Augusto Souza Lara ESDHC Minas Gerais Prof Dr João Marcelo de Lima Assafim UCAM Rio de Janeiro Prof Dr José Filomeno de Moraes Filho Ceará Prof Dr Lucas Gonçalves da Silva UFS Sergipe Prof Dr Valter Moura do Carmo UNIMAR São Paulo Secretarias Relações Institucionais Prof Dra Daniela Marques De Moraes UNB Distrito Federal Prof Dr Horácio Wanderlei Rodrigues UNIVEM São Paulo Prof Dr Yuri Nathan da Costa Lannes Mackenzie São Paulo Comunicação Prof Dr Liton Lanes Pilau Sobrinho UPFUnivali Rio Grande do Sul Profa Dra Maria Creusa De Araújo Borges UFPB Paraíba Prof Dr Matheus Felipe de Castro UNOESC Santa Catarina Relações Internacionais para o Continente Americano Prof Dr Heron José de Santana Gordilho UFBA Bahia Prof Dr Jerônimo Siqueira Tybusch UFSM Rio Grande do Sul Prof Dr Paulo Roberto Barbosa Ramos UFMA Maranhão Relações Internacionais para os demais Continentes Prof Dr José Barroso Filho ENAJUM Prof Dr Rubens Beçak USP São Paulo Profa Dra Viviane Coêlho de Séllos Knoerr Unicuritiba Paraná Eventos Prof Dr Antônio Carlos Diniz Murta Fumec Minas Gerais Profa Dra Cinthia Obladen de Almendra Freitas PUC Paraná Profa Dra Livia Gaigher Bosio Campello UFMS Mato Grosso do Sul Membro Nato Presidência anterior Prof Dr Raymundo Juliano Feitosa UMICAP Pernambuco G326 Gênero sexualidades e direito I Recurso eletrônico online organização CONPEDI Coordenadores Elisaide Trevisam Renato Duro Dias Silvana Beline Tavares Florianópolis CONPEDI 2021 Inclui bibliografia ISBN 9786556483054 Modo de acesso wwwconpediorgbr em publicações Tema Saúde segurança humana para a democracia 1 Direito Estudo e ensino Pósgraduação Encontros Nacionais 2 Gênero 3 Sexualidade III Encontro Virtual do CONPEDI 1 2021 Florianópolis Brasil CDU 34 Conselho Nacional de Pesquisa e PósGraduação em Direito Florianópolis Santa Catarina Brasil wwwconpediorgbr III ENCONTRO VIRTUAL DO CONPEDI GÊNERO SEXUALIDADES E DIREITO I Apresentação Mesmo em um período de extrema dificuldade em virtude da crise sanitária pesquisadoras e pesquisadores de instituições de várias regiões do país continuaram a se desafiar produzindo potentes investigações no campo das temáticas de gênero raça sexualidades e direito Neste III Encontro Virtual do CONPEDI os estudos reverberaram o caráter interdisciplinar e marcadamente de uma epistemologia de resistência necessários a denunciar dialogar e problematizar os campos teóricos e metodológicos oxigenando a área do direito Saudamos as importantes contribuições apresentadas conforme relação abaixo O trabalho Inexistência de estereótipos de gênero na jurisprudência portuguesa desenvolvido por Janaina da Silva de Sousa busca compreender a jurisprudência portuguesa no sentido de manutençãoconstrução de hierarquias de gênero a partir de análise de decisões judiciais dos Tribunais de Relação de Lisboa e Porto com processos no período de 2016 a 2019 sobre crime de violação Gabriella da Mata Facco Queiroz e Renato Bernardi em A revenge porn terminologia historicidade e sua incidência no gênero feminino analisam o fenômeno abordando sua construção no meio social e sua incidência no gênero feminino Em A adoção civil por famílias homoafetivas no brasil Jonatas Marcos da Silva Santos e Thainá da Silva de Lima criticam os principais aspectos da legislação infraconstitucional acerca da adoção civil e a relação com o reconhecimento da união estável homoafetiva pautando os avanços e entraves postos à construção da proteção jurídicolegal às novas entidades familiares A partir da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas Emília Paranhos Santos Marcelino Cecilia Paranhos S Marcelino e Palmira Paranhos Santos Lins de Carvalho com o trabalho A efetivação do ODS nº 5 e as políticas públicas para uma igualdade de gênero no brasil fazem uma investigação sobre políticas públicas e a efetividade no atendimento à ODS nº5 no Brasil Elísio Augusto Velloso Bastos Brenda Dinorah Mendes Marques e Marcella Nobrega Merabet trazem aspectos relevantes da vida das mulheres transexuais no ambiente prisional assim como as constantes violações de seus Direitos no artigo A proteção dos direitos de gênero das mulheres transexuais no ambiente prisional do Brasil inovações e perspectivas a partir da ADPF 527 Em A subrepresentação feminina no supremo tribunal federal brasileiro e o perfil das ministras de Elida De Cássia Mamede Da Costa e Luan de Souza Afonso podese perceber como ocorreu a presença feminina no Supremo Tribunal Federal STF ao longo de sua história O artigo Autoidentificação e cidadania substituição do prenome e do gênero nos assentos de nascimento e casamento por pessoas transexuais no direito brasileiro de Artur Gustavo Azevedo do Nascimento traz a decisão do Supremo Tribunal Federal e ato do Conselho Nacional de Justiça que reconhecem o direito da pessoa transgênero de substituir seu prenome e o gênero perante os Oficiais de Registro Civil independentemente de cirurgia de redesignação ou da realização de tratamentos hormonais ou patologizantes A séria questão sobre tráfico de mulheres para fins de exploração sexual é analisada por Cassius Guimaraes Chai Beatriz de Araujo Caldas e Amanda Cristina de Aquino Costa no trabalho Da invisibilidade para as estatísticas o tráfico internacional de mulheres e exploração sexual uma perspectiva de gênero e violação de direitos humanos A partir da abordagem interseccional de raça e de classe Glaucia Fernanda Oliveira Martins Batalha analisa o agravamento da divisão sexual do trabalho e das assimetrias sociais de gênero desencadeadas pela pandemia do COVID19 em Desigualdade de gênero e a economia do cuidado em tempos de pandemia da covid19 o agravamento da divisão sexual do trabalho e das assimetrias sociais no contexto neoliberal O trabalho Ecofeminismo análise da mulher como vetor de sustentabilidade de Flavia Piccinin Paz e Marcelo Wordell Gubert alerta que o conhecimento e sua relação com o ambiente estão intrinsicamente ligado ao empoderamento da mulher a partir do desenvolvimento de atividades sustentáveis Ronaldo da Costa Formiga discute a realidade familiar contemporânea a partir de temas como divórcio litigioso alienação parental guarda compartilhada e cultura individualista com o trabalho Famílias contemporâneas e a perspectiva sistêmica os desafios do judiciário frente os efeitos da ideologia individualista As dificuldades para coibir a violência contra as mulheres nas relações domésticas e familiares é analisada por Fábia Lopes Gomes da Silva em Feminicídio da conivência do estado à necessidade de capacitação do sistema de justiça criminal em que denuncia à conivência do Estado ao ratificar os desmandos da cultura patriarcal no Brasil por mais de 500 anos Em Grandes casos da suprema corte dos Estados Unidos sobre orientação sexual Raphael Rego Borges Ribeiro analisa 04 casos da Suprema Corte dos EUA sobre orientação sexual e descreve a postura da Corte entre 1986 e 2015 em relação à sexualidade Concepções sobre identidade de gênero e diversidade são apresentadas no artigo Identidade de gênero um comparativo de decisões judiciais e da opinião consultiva nº 2417 em que Lorena Araujo Matos e Thiago Augusto Galeão De Azevedo analisam a evolução sobre a temática no Poder Judiciário brasileiro além de conceitos introduzidos em documento internacional Bibiana de Paiva Terra e Bianca Tito em Igualdade de gênero na constituição federal de 1988 o movimento feminista brasileiro e a conquista do princípio da igualdade abordam acerca da conquista do Princípio da Igualdade na Constituição Federal de 1988 assim como a trajetória de luta do movimento feminista para essa conquista Partindo da teoria do reconhecimento de Axel Honneth Patrícia Oliveira de Carvalho em seu artigo Teoria do reconhecimento como farol sobre as vulnerabilidade interseccionais da mulher negra vítima de violência de gênero analisa os números do Mapa da Violência para pensar saídas e interpretações para o recrudescimento da quantidade de casos de violência de gênero que atingem mulheres negras Finalmente o artigo Uma análise do descumprimento das determinações legais concernentes à igualdade de gênero na representação política à luz da jurisprudência do tribunal superior eleitoral de Thaiane Correa Cristovam questiona a posição adotada pelo TSE diante de partidos políticos que descumprem a obrigações legais concernentes à igualdade de gênero na política É com imensa satisfação que convidamos todasoses a atenta leitura de cada uma das referenciadas produções acadêmicas Pesquisas que orgulham o Grupo de Trabalho Gênero Sexualidade e Direito do CONPEDI Silvana Beline Tavares UFG Renato Duro Dias FURG José Edmilson de Souza Lima UNICURITIBA A REVENGE PORN TERMINOLOGIA HISTORICIDADE E SUA INCIDÊNCIA NO GÊNERO FEMININO THE REVENGE PORN TERMINOLOGY HISTORICITY AND ITS INCIDENCE IN FEMALE GENDER Gabriella da Mata Facco Queiroz Renato Bernardi Resumo O presente artigo visa a analisar o fenômeno da revenge porn abordando a problemática de sua terminologia construção no meio social e sua incidência no gênero feminino Com esses fatores expostos será trazida a legislação vigente que aborda sobre tais questões A partir da metodologia do método indutivo sob enfoque na prática da disseminação não consentida de conteúdo íntimo foram desenvolvidas as análises mencionadas Palavraschave Pornografia de vingança Pornografia não consentida Violência de gênero Crimes virtuais sexuais Violação de privacidade AbstractResumenRésumé This article aims to analyze the phenomenon of revenge porn addressing the problems of its terminology construction in the social environment and its incidence in the female gender With these factors exposed the current legislation that addresses these issues will be brought up Based on the methodology of the inductive method focusing on the practice of the non consensual dissemination of intimate content the aforementioned analyzes were developed KeywordsPalabrasclavesMotsclés Revenge porn Nonconsensual pornography Violence of gender Virtual sexual crimes Violation of privacy 24 INTRODUÇÃO A democratização da internet nos últimos anos trouxe consigo a facilitação no compartilhamento de dados Se no último século era necessária a impressão de imagens ou a gravação física de conteúdo de vídeo nos dias atuais apenas poucos cliques na tela de um smartphone são capazes de disseminar qualquer tipo de material digital É notório que a efemeridade na dissipação de conteúdo traz consigo maior conforto à vida das pessoas no entanto também abriu espaço para que práticas reprováveis ocupassem espaço no meio digital Uma dessas condutas será o objeto de pesquisa do presente trabalho a pornografia de vingança ou o termo mais adequado disseminação não consentida de conteúdo íntimo conforme será abordado O presente trabalho busca analisar o fenômeno da pornografia de vingança desde a sua terminologia firmamento no contexto histórico e social à incidência em maioria no gênero feminino A partir da reação do legislador à ocorrência desta prática será trazida a análise da evolução legislativa atual bem como críticas às desconexões entre a intenção do legislador e a letra da lei O primeiro capítulo discorrerá sobre a terminologia pornografia de vingança suas problematizações e propostas mais adequadas ao entendimento de diferentes pesquisadores Entre os crimes virtuais em especial de exposição de material íntimo de forma não consentida será realizada a diferenciação e especificação da temática bem como sua construção no meio social Ainda será abordada a incidência desta prática em maioria no gênero feminino trazendose entendimentos doutrinários acerca de gênero e construção social como forma de justificar os dados em desfavor das mulheres No segundo capítulo são trazidas as evoluções legislativas cabíveis ao tema desde a Lei Carolina Dieckmann Lei nº 127372012 Marco Civil da Internet Lei nº 129652014 até as mais recentes Lei de Importunação Sexual Lei nº 137182018 e Lei nº 137722018 bem como suas respectivas alterações e instituições no ordenamento jurídico brasileiro Por consequência da importância de suas vigências também à desconexão entre intenção do legislador e letra da lei fora objeto de crítica sendo trazidas tais considerações 1 REVENGE PORN COMPLEXIDADE DE SUA TERMINOLOGIA CONSTRUÇÃO HISTÓRICA NO MEIO SOCIAL E IMPACTO NO GÊNERO FEMININO 25 O termo em inglês revenge porn significa em tradução literal pornografia de vingaça ou pornografia de revanche Essa prática consiste na exposição não consentida de imagens vídeos íntimos realizada geralmente peloa excompanheiroa da vítima na intenção de prejudicála A temática desencadeia diversas discussões desde sua nomenclatura a responsabilização do agente disseminador ou do meio utilizado para a propagação revistas sites aplicativos de mensagens instantâneas até suas consequências na vida da vítima Com isto a pornografia de vingança pode ser definida como a divulgação de imagens sexuais fotográficas ou audiovisuais por uma pessoa que tem ou já teve um vínculo afetivo com a vítima E apesar de muitas vezes apesar de o material ser filmado com o consentimento dela ou mesmo por ela concedido sexting a exposição do material é feita sem a permissão dela o que configura o crime GOMES 2014 p 16 Franks e Citron grandes pesquisadoras do tema definem a nonconsensual pornography em tradução literal pornografia não consentida como a distribuição de imagens sexuais de indivíduos sem seu consentimento Isto inclui imagens obtidas originalmente sem o consentimento por exemplo através de câmeras escondidas ou gravação de violência sexual bem como as obtidas no contexto privado ou confidencial de um relacionamento por exemplo imagens obtidas pela própria vítima enviadas para um parceiro íntimo que posteriormente as distribui sem o seu consentimento popularmente conhecido como pornografia de vingança Além de imagens e vídeos obtidos de forma não consensual trazidos por grande parte da doutrina Castro e Sydow ainda acrescentam a divulgação de áudios eróticos à vingança pornográfica Vingança pornográfica é a terminologia usada para descrever a distribuiçãopublicação não consensual de imagens de nus em fotografias eou vídeos sexualmente explícitos também a publicação de áudios de conteúdo erótico pode se encaixar em tal terminologia CASTRO SYDOW 2019 p 39 A revenge pornpornografia de vingança é comumente usada como abreviação de todas as formas de nonconsensual pornography pornografia não consentidaexposição pornográfica não consentida existindo a intercambialidade entre estes termos conforme Citron e Franks Ainda as autoras atribuem o mesmo sentido às expressões cyber rape e involuntary porn estupro virtual e pornografia involuntária Castro e Sydow discordam 26 acerca da intercambialidade destes termos tendo em vista que a exposição pornográfica não consentida pode apresentarse de diversas formas com repercussão social e gravidade de cada uma a serem apreciadas conforme sua especificidade Quanto à terminologia pornografia de vingança supracitada Alice de Perdigão Lana traz no livro Mulheres Expostas 2018 que deve ser objeto de crítica uma vez que essas locuções trazem o reconhecimento da ideia de vingança A partir disso pressupõese que alguma ação da mulher previamente deu ensejo à retaliação portanto mesmo sem ser a intenção esta acabase por justificar a conduta de quem dissemina as imagens Nesse sentido embora pornografia de vingança e exposição pornográfica não consentida não sejam tecnicamente termos intercambiáveis conforme mencionado anteriormente Castro e Sydow optam pela adoção do segundo termo excluindo a noção de vingança Além do termo revenge trazer consigo uma carga revitimizadora o termo porn carrega uma condenação moral da nudez ou pornografia em geral como discorrem Valente Neriz Ruiz e Bulgarelli no livro O Corpo é o Código 2016 Ademais seria errôneo entender como pornografia um material íntimo produzido no contexto de uma relação com destinatários estritamente específicos por vezes para uma única visualização em aplicativos que permitem esta opção Esta ideia reforça a revitimização uma vez que a pornografia apesar das problemáticas é uma exposição consentida pelas partes envolvidas Por conseguinte associase que a vítima produziu a imagem eou vídeo na intenção ou assumindo o risco de compartilhamento com terceiros Logo na introdução do livro O Corpo é o Código os autores mencionam sobre a decisão terminológica que tiveram que tomar para a desenvoltura do mesmo Devido o conhecimento popular do termo pornografia de vingança optaram por não abandonálo totalmente para que interessados no tema se deparassem com a referida produção ao buscarem fontes acerca No entanto da mesma forma que o termo possui teor explicativo de outro reforça visões que carregam preconceitos conforme supramencionado VALENTE NERIZ RUIZ e BULGARELLI 2016 p 5 Ao longo do livro as pesquisadoras realizam entrevistas com juristas Entre as entrevistadas encontrase Silvia Chakian Promotora de Justiça no Estado de São Paulo Ao ser questionada o que achava do termo pornografia de vingança posicionase Péssimo Péssimo totalmente contra um termo pejorativo que atribui o termo pornografia de vingança já julga né Que aquilo é pornográfico que é imoral que a 27 mulher Tem um julgamento moral embutido nisso que a mulher que E são muitos os casos em que aquele conteúdo foi produzido com o consentimento dela e ela tem esse direito Muitas mulheres o fazem como determinação de gênero eu quero tirar para mim é importante eu me acho bonita eu quero divulgar Mas quando você embute a palavra pornografia você já julga você já diz que aquilo é errado que é condenável sob o aspecto moral Acho que essa nomenclatura tinha que mudar a gente não tinha que adotar essa pornografia de vingança e outra o termo vingança também pressupõe que a mulher fez alguma coisa de errado e o sujeito está se vingando mas o que ela fez de errado É porque ela rompeu um relacionamento Então eu vejo problema nas duas palavras vingança e pornografia Então alguma coisa no sentido de exposição indevida da imagem sabe Divulgação indevida Isso é muito mais condizente com a conduta de quem veicula a imagem de forma inapropriada da mulher VALENTE NERIZ RUIZ e BULGARELLI 2019 p 50 Grifos dos autores A expressão non consensual intimate images tem sido adotada por ativistas e acadêmicos da língua inglesa Portanto por motivos de conceituação e praticidade ao invés de insistir no termo pornografia de vingança fora adotada no livro mencionado a expressão Disseminação Não Consensual de Imagens Íntimas utilizando a sigla NCII excluindo o D de Disseminação para que fosse possível repassar o conteúdo sem mediações e ainda dialogar com a literatura internacional Este termo tira o foco tanto de revenge quanto de porn e busca focar no aspecto da autonomia da mulher com o foco na ideia de consentimento VALENTE NERIZ RUIZ e BULGARELLI 2016 p 52 Devido à consolidação do termo tanto no âmbito social e jornalístico quanto no acadêmico e até jurídico neste trabalho por vezes serão utilizadas denominações que incluem as palavras pornografia e vingança propositalmente entre aspas em consequência de sua presença nas referências utilizadas Entretanto pelos motivos mencionados embora seja mais abrangente a prioridade será utilizar o termo trazido por Ruiz e Bulgarelli de disseminação não consensual de imagens íntimas ou ainda disseminação não consensual de conteúdo íntimo que não se limita apenas à imagens para referenciar a exposição dessa prática A pornografia de vingança encontrase como uma forma de divulgação não consentida de conteúdo íntimo Para a verificação de seu enquadramento é necessário analisar a fonte da captura a forma de circulação e a motivação Assim quanto a exposição de conteúdo íntimo não consentido Castro e Sydow propõem a seguinte classificação 1 Conforme a fonte a oriunda da própria vítima b oriunda do parceiro ou da parceira sexual c oriunda de terceira pessoa não participante do ato ou d de captação pública ou e de origem ignorada 2 Conforme a obtenção do material a consentida ou b não consentida 28 3 Conforme a permissão para disseminação do material a de divulgação consentida b de divulgação parcialmente consentida ou c de divulgação nãoconsentida de divulgação proibida 4 Conforme a motivação da disseminação a por vingança b para humilhação da vítima c por vaidade ou fama do divulgador d com o objetivo de chantagem ou para obtenção de vantagem ou e com o objetivo de lucro CASTRO SYDOW 2019 p 41 Grifo dos autores Em análise do caso da chamada pornografia de vingança a fonte e obtenção podem ocorrer de quaisquer formas no entanto quanto à permissão para disseminação do material ocorre de forma nãoconsentidaproibida Decorrente disto a principal característica é quanto ao ânimo do agente disseminador que age por motivo de vingança divulgando o conteúdo na intenção de prejudicar àquele que aparece no material geralmente sua ex companheira em casos de conflitos ou términos de relacionamentos 11 A construção histórica da exposição íntima não consentida no meio social Em investigação quanto à origem das exposições íntimas não consentidas encontrase sobre a seção Beaver Hunt da revista pornográfica estadunidense Hustler voltada para o público masculino fundada em 1974 pelo empresário Larry Flynt Essa seção era destinada para os leitores enviarem fotografias não profissionais de mulheres nuas sob o pagamento de 5000 cinquenta dólares caso a imagem fosse selecionada para a publicação Também era possível enviar o nome da modelo seu endereço e fantasias sexuais CASTRO SYDOW 2019 p 53 A precariedade na verificação das informações e assinaturas enviadas à revista junto às imagens íntimas proporcionaram um espaço para divulgação de imagens sem o consentimento da mulher exposta A primeira ação indenizatória em razão disso ocorreu com LaJuan Wood e seu marido Bill Wood que tiveram imagens íntimas subtraídas por vizinhos e expostas de forma fraudulenta na seção Beaver Hunt Sob o argumento legal de falsa representação altamente ofensiva e revelação de fatos privados alheios ao interesse público fora fixada pelo Quinto Circuito da Corte de Apelação dos Estados Unidos a indenização para LaJuan no valor de US15000000 cento e cinquenta mil dólares Quanto à pornografia de vingança trazida pela revista Hustler destacase o caso da estudante universitária Sabrina Gallon publicado na edição de outubro de 1983 A fotografia 29 foi tirada na primavera de 1982 por seu convivente Waldo Emerson WaldronRamsey Após ser vítima de espancamento e estupro pelo companheiro em dezembro do mesmo ano a jovem registrou ocorrência disciplinar estudantil e criminal A vítima ficou sabendo por intermédio de amigos da publicação de sua foto No caso de Gallon a Hustler foi condenada pela Corte Distrital do Nono Distrito de Nova Iorque ao pagamento de indenização no valor de US 3000000 trinta mil dólares devido ao inadequado processo de verificação de informações enviadas à seção Beaver Hunt sendo o material sensível e não ordinariamente destinados à publicação CASTRO SYDOW 2019 p 56 Notase que a responsabilização nestes casos sempre foi imposta à empresa disseminadora do conteúdo mas nunca pelos que enviaram o material para a mesa Ainda que a punição para a exposição íntima de terceiros sem critérios para têla impedido limitouse ao âmbito civil como se o ressarcimento financeiro fosse capaz de suprir todos os danos causados às vítimas No início dos anos 2000 a revolução do videoteipe transformou a acessibilidade aos filmes pornográficos podendo ser assistidos na privacidade do lar A ascensão da internet trouxe uma nova revolução ao mercado enquanto forma de propagação em massa Com o início da popularização da internet surgiam sites gratuitos que permitiam criação de grupos sexuais de interesses específicos Sergio Messina trouxe novos rumos a pornografia amadora com a consolidação do termo Realcore que demonstra produções visuais realizadas por pessoas reais retratando relações sexuais de fato e não apenas assumindo uma performance para a câmera CASTRO SYDOW 2019 p 57 É no complicado e movimentado cruzamento sociocultural entre a hipocrisia o desejo de vingança a ambição financeira o fetichismo por Realcore e o incontrolável poder de disseminação da era virtual que se encontra em rápida propagação a exposição pornográfica não consentida vale dizer há quem a dissemine para punir ou lucrar há quem a consuma por prazer ou morbidez e não há mecanismos suficientemente eficazes para controlála CASTRO SYDOW 2019 p 59 Grifo nosso Com essa tendência em crescimento cada vez mais surgiam sítios na internet especializados em Realcore Estes sítios não são empresas produtoras de conteúdo pornográfico mas sim plataformas especializadas na hospedagem desse tipo de material lucrando com anúncios e parte do auferido por amadores que comercializam vídeos por meio 30 do site Um ambiente virtual destinado ao upload de Realcore tornouse também propício para o compartilhamento de conteúdo de Realcore revenge porn CASTRO SYDOW 2019 p 59 Em outubro de 2007 o termo revenge porn passou a constar no dicionário colaborativo Urban Dictionary popular nos Estados Unidos GOMES 2014 p 6 Com a enorme repercussão de materiais intitulados como pornografia de vingança logo surgiram sítios especializados para o compartilhamento desta prática Entre estes destacase o site Is Anyone Up criado por Hunter Moore em 2010 Além de a hospedagem de usuários no intuito de vingança ou diversão o site permitia que fossem divulgados nome completo cidade profissão e links de redes sociais de quem estava no material para que quem pesquisasse pudesse encontrar facilmente nos mecanismos de pesquisa Inspirado no sucesso de Moore e sincronizado com esta ideia Kevin Bollaert criou o site UGotPostedcom com tradução literal você foi postadocom Bollaert foi ainda mais ousado que Moore criando também um site chamado ChangeMyReputationcom em tradução literal mude minha reputaçãocom que extorquia as vítimas para que imagens carregadas no UGotPostedcom fossem removidas mediante taxa de remoção Tais como os exemplos mencionados existiram e ainda existem diversos sites e sessões destinadas à pornografia de vingança em plataformas pornográficas online Com a ascensão dos smartphones a criação de aplicativos de mensagens instantâneas e adaptação de sites para aplicativos a possibilidade de troca de conteúdo entre os usuários sendo textos imagens vídeos eou sons tornouse ainda mais facilitada Dessa forma a disseminação não consentida de imagens íntimas desde a captura do conteúdo pela vítima à sua disseminação pelo destinatário passou a ocorrer em questão de segundos Em análise ao contexto histórico nunca foi tão fácil e rápido expor uma pessoa como nos dias atuais Percebese portanto que a prática do que hoje é denominado pornografia de vingança começou antes da internet embora tenha sido extensivamente multiplicado a partir dela O aparecimento das mídias sociais aplicativos de batepapo e redes sociais também contribuiu devido à precária regulamentação principalmente no Brasil GOMES 2014 p 16 Notase em vista disso que a divulgação não consentida de imagens e vídeos íntimos não é uma problemática recente no entanto a internet pode proporcionar enorme repercussão a estes casos As principais vítimas desta prática são mulheres e adolescentes 31 sendo por consequência o grupo social que mais se preocupa com essa temática VALENTE NERIZ RUIZ e BULGARELLI 2016 p 2 Este apontamento acerca da ocorrência em maioria entre as mulheres será melhor explorado no subtópico a seguir 12 A incidência da disseminação de conteúdo íntimo não consentido no gênero feminino A memorável frase de Simone de Beauvoir ninguém nasce mulher tornase mulher inaugura o segundo volume do livro O Segundo Sexo Nesta é trazida a carga sociocultural atribuída às mulheres limitandoas a papéis específicos No entanto isto não ocorre de forma natural inerente à existência feminina mas sim decorrente da construção social de comportamentos entendidos como femininos e atribuídos ao gênero BEAUVOIR 1967 p 9 Em decorrência da desigualdade nas atribuições aos gêneros à mulher atribuise a postura do recato e obediência enquanto ao homem de virilidade e dominância Essas demandas estendemse a todas as manifestações dentro das relações entre os gêneros inclusive a sexualidade A partir disso surge uma duplicidade de comportamentos a serem assumidos pelo segundo sexo ao mesmo tempo que uma serva submissa ao homem um ídolo intocada Para ser graciosa ela deverá reprimir seus movimentos espontâneos pedemlhe que não tome atitudes de menino proíbemlhe exercícios violentos brigas em suma incitamna a ser como as mais velhas uma serva e um ídolo BEAUVOIR 1967 p 23 Diante dessa disparidade entre o masculino e o feminino a violência de gênero não ocorre de forma aleatória mas sim derivada de uma organização social de gênero que privilegia o masculino É o que discorre Heleieth Saffioti no livro Gênero Patriarcado Violência de 2004 Assim a autora afirma que a inferiorização do feminino está intrínseco à violência sofrida por este gênero A violência de gênero pode se manifestar de diversas maneiras A ascensão da internet conforme mencionado possibilita a sua utilização para fins negativos incluindo a prática violência de gênero em quaisquer de suas formas sendo necessário um enfoque aos crimes sexuais virtuais Nesse sentido as pesquisadoras Layana Laiter e Geanna Moraes da Silva abordam 32 Embora exista no ambiente virtual a injúria ameaça e perseguição no âmbito da violência contra a mulher e até mesmo doméstico é necessário dar maior atenção aos crimes contra a liberdade sexual da mulher pois são práticas talvez não tão recentes que ganharam espaço no âmbito penal apenas nos últimos anos LAITER SILVA 2020 p 8 A ministra Nancy Andrighi em julgamento do Recurso Especial nº 1679465SP interposto pela Google Brasil Internet LTDA julgado pela Terceira Turma do Supremo Tribual de Justiça em março de 2018 reconheceu a disseminação de conteúdo íntimo não consensual intitulado pela mesma como pornografia não consensual como forma de violência de gênero Ainda fez constar que embora as mulheres não sejam as únicas vítimas deste tipo de violência esta prática é praticada principalmente contra elas sendo reflexo de uma questão de gênero A exposição pornográfica não consentida da qual a pornografia de vingança é uma espécie constitui uma grave lesão aos direitos de personalidade da pessoa exposta indevidamente além de configurar uma grave forma de violência de gênero que deve ser combatida de forma contundente pelos meios jurídicos disponíveis Superior Tribunal de Justiça Recurso Especial nº 1679465SP Terceira Turma julgado em 13032018 DJe 19032018 Desse modo a disseminação de conteúdo íntimo não consensual surgida num contexto de inovações tecnológicas atrelada à cultura patriarcal possibilitou a configuração de uma nova manifestação de violência contra a mulher A maior incidência destas dáse pela inserção num contexto social que reprime sua sexualidade e lhes culpabiliza pela agressão o que resulta em graves consequências que refletem em todos os aspectos de suas vidas GUIMARÃES 2019 pg 49 A SaferNet Brasil organização nãogovernamental que atua em prol dos direitos humanos na internet possui um serviço de atendimento online a Helpline Em 2014 o chamado sexting1 foi o principal motivo de busca por ajuda contabilizando 222 tópicos sobre o tema seguido de cyberbullyingofensa com 177 tópicos de conversa VALENTE NERIZ RUIZ e BULGARELLI 2019 pg 3 1 A SaferNet Brasil definesexting como uma palavra originada da união de duas palavras em inglês sex sexo texting envio de mensagens O Sexting descreve um fenômeno recente no qual adolescentes e jovens usam seus celulares câmeras fotográficas contas de email salas de batepapo comunicadores instantâneos e sites de relacionamento para produzir e enviar fotos sensuais de seu corpo nu ou seminu Envolve também mensagens de texto eróticas no celular ou Internet com convites e insinuações sexuais para namoradoa pretendentes eou amigosas Disponível em httpwwwsafernetorgbrsiteprevencaocartilhasaferdicassexting Acesso em 12 abril 2021 33 O Instituto Avon em parceria com o Data Popular realizou em 2014 a pesquisa intitulada Violência contra a mulher o jovem está ligado a partir da oitiva de 2046 jovens brasileiros entre 16 a 24 anos sendo 1017 homens e 1029 mulheres O estudo trouxe as percepções dos jovens em relação à violência de gênero impressões sobre valores machistas assédio agressões físicas e o papel da internet na perpetuação da violência contra a mulher INSTITUTO AVON DATA POPULAR 2014 Quando indagadas sobre o uso da internet para relacionamentos e sexo 40 quarenta por cento das jovens entrevistadas alegaram que já se relacionaram com alguém que conheceu virtualmente Entre as entrevistadas 15 quinze por cento afirmaram já terem praticado sexo virtual com uma conhecidoa e 14 quatorze por cento com uma desconhecidoa Quanto às respostas dos jovens entrevistados os números sobem para 24 vinte e quatro por cento e 27 vinte e sete por cento respectivamente Ao serem questionadas acerca de ações que ocorreram com o término do relacionamento 13 treze por cento das jovens afirmaram que o parceiro espalhou detalhes íntimos do casal Quanto ao compartilhamento de imagens de mulheres nuas 28 vinte e oito por cento dos jovens afirmaram já terem repassado esse tipo de material Esta porcentagem cai para apenas 11 onze por cento quando as mulheres são questionadas sobre tal ação A organização estadunidense sem fins lucrativos Cyber Civil Rights Initiative2 atende vítimas em todo o mundo e defende a inovação tecnológica social e legal voltada para o combate de abuso online Numa pesquisa publicada em 2017 realizada com 3044 adultos estadunidenses os resultados apontam que entre 8 usuários de redes sociais 1 foi vítima de disseminação de conteúdo íntimo não consentido Entre os entrevistados 158 são mulheres que relatam terem sido vítimas ou pelo menos terem sido ameaçadas sendo a porcentagem reduzida a 8 oito por cento em correspondência aos homens CYBER CIVIL RIGHTS INITIATIVE 2017 Dessarte notase que a ocorrência de disseminação não consentida de conteúdo íntimo ocorre principalmente em desfavor das mulheres É notória a relação entre a 2 A organização originouse com a campanha End Revenge Porn liderada pela ativista Holly Jacobs que já foi uma vítima de nonconsensual pornography NCP A partir de um site que coletava assinaturas a favor da criminalização da nonconsensual pornography a plataforma online acabou tornandose um centro de apoio às vítimas e defensores com serviços de baixo custo ou gratuitos para ajudálas a se recuperarem da exposição não consentida Disponível em httpswwwcybercivilrightsorg Acesso em 12 abril 2021 34 construção social do gênero feminino e os prejuízos ocasionados pela exposição podendo ser entendida como uma forma de violência de gênero conforme discorre Gomes 2014 A análise desses dados permite que a pornografia de revanche seja considerada uma forma de violência de gênero pois como foi visto as vítimas são de modo majoritário jovens mulheres Dessa forma assim como em estupros na violência doméstica e em perseguições de cunho pessoal na pornografia de vingança são violados parâmetros legais e sociais para a promoção da igualdade de gênero GOMES 2014 pg 17 A partir do exposto é possível perceber que a violência de gênero assume sua propagação também nos meios virtuais Por consequência disto a prática da disseminação de conteúdo íntimo sem consentimento mostrase como mais uma forma de consolidação de violência agindo de forma ofensiva além da integridade física da mulher mas também atingindo também seu psicológico e dignidade sexual 2 Evolução legislativa acerca da exposição não consentida de conteúdo íntimo no Brasil A disseminação de conteúdo íntimo sem consentimento da parte registrada pelo teor invasivo e vexatório de divulgação de intimidade infringe valores constitucionais como o da dignidade da pessoa humana inciso III do art 1º e da intimidade vida privada honra e imagem inciso X art 5º Em consideração a mera ameaça ou já infração destes bens jurídicos tornouse necessária a adequação do ordenamento jurídico brasileiro a partir de formulação de legislação específica que versasse sobre o tema A Lei nº 127372012 conhecida como Lei Carolina Dieckmann foi pioneira ao tratar sobre crimes informáticos no Brasil criminalizando invasões cibernéticas3 Estas tipificações penais surgiram após a repercussão do caso da atriz Carolina Dieckmann motivo pelo qual a lei fora batizada com seu nome Nesta situação hackers invadiram o email da 3 Art 154A Invadir dispositivo informático alheio conectado ou não à rede de computadores mediante violação indevida de mecanismo de segurança e com o fim de obter adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita Pena detenção de 3 três meses a 1 um ano e multa 1º Na mesma pena incorre quem produz oferece distribui vende ou difunde dispositivo ou programa de computador com o intuito de permitir a prática da conduta definida no caput 3º Se da invasão resultar a obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas segredos comerciais ou industriais informações sigilosas assim definidas em lei ou o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido Pena reclusão de 6 seis meses a 2 dois anos e multa se a conduta não constitui crime mais grave 35 vítima tendo acesso a diversas imagens incluindo conteúdo íntimo Com isto passaram a realizar ligações para a atriz solicitando R1000000 dez mil reais para que as fotos não fossem divulgadas O Marco Civil da Internet instaurado pela Lei nº 12965 de 23 de abril de 2014 estabelece princípios garantias direitos e deveres para o uso da internet no Brasil Os princípios norteadores são dispostos nos incisos do artigo 3º condizentes aos valores constitucionais destacando na temática a proteção da privacidade e dados pessoais e responsabilização dos agentes de acordo com suas atividades nos termos da lei O artigo 19 da referida lei apenas responsabiliza o provedor de aplicações de internet por danos decorrente de conteúdo gerado por terceiros caso não tome providências para tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente após decisão judicial específica A exceção a esta regra é trazida pelo art 21 na qual o provedor será responsabilizado subsidiariamente pela violação de intimidade pela publicação não autorizada de materiais que contenham cena de nudez ou ato sexuais e após serem notificados por estes ou seus representantes legais não tornaram indisponíveis o conteúdo nos limites técnicos de seu serviço Notase que condizente ao nome Marco Civil a responsabilização mencionada era no âmbito da esfera civil limitandose a obrigação de fazer remoção de material eou ações indenizatórias por danos morais Em âmbito penal as vítimas de exposição não consentida de material íntimo na ausência de lei específica poderiam entrar com ação penal por difamação e injúria arts 139 e 140 do Código Penal a ser julgada pelo Juizado Especial Criminal com penas mais brandas A Lei nº 13718 de 24 de setembro de 2018 conhecida como Lei de Importunação Sexual altera o Código Penal DecretoLei nº 36881941 para tipificar os crimes de importunação sexual e de divulgação de cena de estupro Estes passam a tornar os crimes contra a liberdade sexual e crimes sexuais contra vulnerável ações penais de natureza pública incondicionada Nesse sentido surge o art 218C que discorre como crime além de dispor acerca do aumento de pena Art 218C Oferecer trocar disponibilizar transmitir vender ou expor à venda distribuir publicar ou divulgar por qualquer meio inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática fotografia vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de 36 vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática ou sem o consentimento da vítima cena de sexo nudez ou pornografia Pena reclusão de 1 um a 5 cinco anos se o fato não constitui crime mais grave Aumento de pena 1º A pena é aumentada de 13 um terço a 23 dois terços se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou humilhação BRASIL 2018 A existência de um tipo penal específico para a exposição de conteúdo íntimo não consentido no ordenamento jurídico brasileiro mostrase benéfica sendo possível traduzir de forma mais eficiente a gravidade da conduta e suas repercussões na vida pessoal da vítima e meio social No entanto a maneira que se encontra disposta dentro do tipo a criminalização da conduta perde parte de sua força cogente CASTRO SYDOW 2019 pg 127 Cabe mencionar que quando se trata de conteúdo envolvendo crianças e adolescentes ocorre o amparo pelo Estatuto da Criança e do Adolescente Lei nº 80691990 no capítulo de crimes em espécie O art 241A dispõe sobre a oferta troca dispobilização transmissão distribuição publicação ou divulgação de material que contenha sexo explícito ou pornografia envolvendo criança ou adolescente com pena de reclusão de 3 três a 6 seis anos e multa Ainda o art 241B abrange também a posse ou armazenamento por qualquer meio do referido material contendo criança ou adolescente com pena de reclusão de 1 um a 4 quatro anos e multa A supracitada Lei de Importunação Sexual é resultante do PL nº 54522016 posteriormente apensado ao PL nº 57982016 O art 218C foi acrescido por motivo de aproveitamento na Lei nº 137182018 e encontrase no Título VI Dos Crimes Contra a Dignidade Sexual especificamente no Capítulo II Dos Crimes Sexuais Contra Vulnerável trazendo a noção de sua aplicabilidade apenas no contexto de vulnerabilidade Nesse sentido desde as discussões quanto ao PL nº 57982016 a Comissão de Constituição e Justiça posicionouse indicando a necessidade da transferência do artigo para o Capítulo I Dos Crimes Contra a Liberdade Sexual4 Imperioso portanto é o deslocamento do novo tipo penal para o Capítulo I do Título VI Dos Crimes Contra a Liberdade Sexual do Código Penal pois desse modo a 4 Parecer do Relator Deputado Fábio Ramalho Disponível em httpswwwcamaralegbrproposicoesWebpropmostrarintegracodteor1516351filenameTramitacaoPL5 4522016 Acesso 15 abril 2021 37 conduta descrita não ficará restrita às vítimas vulneráveis que inclusive quando se tratar de criança ou adolescente estão protegidas pelo referido dispositivo penal do ECA com pena mais rigorosa o qual assim continuará vigente A localização topográfica desse novo dispositivo penal dentro do Capítulo I do Título VI do Código Penal visa portanto à proteção de vítima maior de 18 anos a qual a par da hipótese de estupro com violência ou grave ameaça não consente com a divulgação de sua imagem em situação de intimidade sexual com oa parceiroa de relacionamento BRASIL 2016 Ainda é cabível a problematização da natureza incondicionada da ação penal Embora a intenção do legislador seja trazer o aumento da reprovabilidade em iniciar a persecução penal independente do desejo da vítima a consequência prática pode ser justamente o contrário Esta conduta pode ensejar na revitimização da ofendida diante a exposição indesejada da vítima aos agentes de segurança pública e justiça CASTRO SYDOW 2019 pg 144 A Lei nº 13772 de 19 de dezembro de 2018 traz alterações na Lei Maria da Penha Lei nº 113402006 e Código Penal DecretoLei nº 28481941 de modo a reconhecer a violação da intimidade como violência doméstica e familiar criminalizando o registro não autorizado de conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado A Lei Maria da Penha dispõe nos incisos do artigo 7º formas de violência doméstica e familiar contra a mulher sendo estas I violência física II violência psicológica III violência sexual IV violência patrimonial e V violência moral A supracitada Lei nº 137722018 altera a redação do inciso II do art 7º sendo acrescida a violação de intimidade como forma de violência psicológica Ainda instituiu o art 216B ao Código Penal criando especificamente para tal o Capítulo IA Da Exposição da Intimidade Sexual Art 216B Produzir fotografar filmar ou registrar por qualquer meio conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado sem autorização dos participantes Pena detenção de 6 seis meses a 1 um ano e multa Parágrafo único Na mesma pena incorre quem realiza montagem em fotografia vídeo áudio ou qualquer outro registro com o fim de incluir pessoa em cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo 38 Castro e Sydow trazem críticas a este capítulo tendo em vista a desconexão entre o tipo penal e o título discorrido tornandoo inócuo O artigo menciona a prática de registro sexual não autorizado que ao entendimento dos autores tratase de violação de intimidade sexual CASTRO SYDOW 2019 pg 148 O título do capítulo por sua vez disserta sobre exposição da intimidade Assim mostramse incongruentes a intenção do legislador em tipificar a disseminação do conteúdo íntimo e a letra da lei que aborda meramente sobre o seu registro Dessarte embora existam legislações específicas que versem sobre a conduta de disseminação de material íntimo não consentido Castro e Sydow em relação à Lei nº 137722018 trazem considerações que podem ser estendidas também à Lei nº 13772 de que a redação é confusa e certas condutas são inexequíveis do ponto de vista pragmático sendo necessário reparos nas mesmas CASTRO SYDOW 2019 pg 148 CONCLUSÃO Diante o exposto é possível perceber que as tecnologias disponíveis ao longo da história referentes à comunicação também abriram espaço para propagação de material íntimo sem a anuência daqueles retratados no conteúdo Imersa nessa disseminação de material íntimo não consentido surgiu a chamada pornografia de vingança que também desencadeou discussões quanto à sua adequada terminologia Enganase quem atribui esta prática às ferramentas de comunicações instantâneas atuais É fato que estes meios facilitam a propagação de informações na fração de segundos permitindo a produção e compartilhamento de dados em praticamente qualquer horário e lugar do mundo No entanto a origem da exposição íntima de conteúdo íntimo não consentido adveio da popularização do conteúdo visual produzido por revistas voltadas ao público masculino na década de 1970 Demandadas pelas ações reprováveis quanto aos crimes sexuais virtuais o surgimento de legislações específicas como a Lei nº 137182018 e a Lei nº 137722018 trouxeram o simbolismo punitivo para tais Mesmo com disposições acerca a conduta contra mulheres ainda ocorre e seus resultados são devastadores na vida pessoal das vítimas Não há dúvida que a mera criminalização de uma conduta não resolve por si só a problemática do cometimento de delitos sendo necessário entender as questões complexas por detrás das condutas violadoras de valores juridicamente protegidos CASTRO SYDOW 2019 p 167 39 Conforme mencionado no presente trabalho é necessário que as disposições legais supramencionadas disponham de forma clara e coesa acerca da temática Para tanto é necessário uma reforma na letra da lei atualmente vigente tendo em vista suas interpretações ambíguas e colocações inadequadas Dessa forma restará especificado ao magistrado a aplicabilidade da lei para a conduta abordada Os autores ainda discorrem sete ações norteadoras e de prevenção à exposição de conteúdo íntimo não consentido ao usuário comum sendo a 1 educação e conscientização acerca da problemática especialmente entre adolescentes em jovens 2 proteção informática 3 atenção às senhas 4 cuidados com a webcam 5 acesso responsável de sites 6 scams ou seja golpes aplicados na internet e por fim 7 dispositivos sem vigilância CASTRO SYDOW 2019 p 172 Por fim as diferentes formas de manifestação de violência de gênero às mulheres decorrem das relações de poder construídas historicamente em sociedade Para a erradicação de ações violentas contra a mulher seja espaço físico ou cibernético devese insistir na desconstrução dos estereótipos e papéis atribuídos aos gêneros masculino e feminino em dicotomia Este é um caminho longo e árduo a ser enfrentado no entanto a cada produção acadêmica projeto de lei proposto aprovação de legislativa entre outras abordagens mostramse avanços quanto à percepção do tema e sua reprovabilidade em meio social A partir disso o ordenamento jurídico mostrase sincronizado com a responsabilização daqueles que infringirem a violação de terceiros principalmente no meio virtual Por fim o que já fora conhecido como terra sem lei mostrase cada vez mais direcionada aos valores constitucionais da União de garantia de direitos fundamentais como a dignidade da pessoa humana intimidade vida privada honra e imagem 40 REFERÊNCIAS 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