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RESUMO Este artigo aborda o tratamento jurídico dado pelo ordenamento brasileiro à pornografia de vingança observando tratarse de fenômeno que tem aumentado estatisticamente a partir dos avanços tecnológicos e das transformações nos relacionamentos sociais nos últimos tempos A temática tem sua origem nas diferenças culturalmente fincadas acerca dos gêneros diante da estrutura social patriarcal No âmbito do direito civil abordamse os danos sofridos pelas vítimas e as formas de indenização previstas Em especial analisase a pertinência no reconhecimento ao denominado dano existencial ou dano ao projeto de vida tendo em vista a gravidade das consequências que em regra acometem as vítimas No âmbito do direito penal enfatizam se alterações legislativas recentes que introduziram tipos penais específicos nos quais se insere a vingança pornográfica Não se perde de vista contudo que o direito é insuficiente para a solução ou para a melhoria da problemática abordada na medida em que se faz necessária a adoção de políticas públicas preventivas bem como que permitam a inserção da mulher na sociedade em condição de efetiva paridade para desconstruir a cultura patriarcal a partir da educação de gênero e de outras medidas de viés interdisciplinar com outros ramos do conhecimento PALAVRASCHAVE Literatura erótica Delitos sexuais Identidade de gênero Sexualidade ABSTRACT This article addresses the legal treatment given by the Brazilian legal system to revenge pornog raphy observing that it is a phenomenon that has increased statistically due to the technological advances and transformations in social relationships in recent times The theme has its origin in the culturally entrenched differences about gender in view of the patriarchal social structure In the field of civil law the damage suf fered by the victims and the forms of compensation provided for are addressed In particular the pertinence in the recognition to the denominated existential damage or damage to the life project is analyzed consider ing the seriousness of the consequences that as a rule affect the victims In criminal law recent legislative changes have been emphasized that have introduced specific criminal types into which pornographic revenge falls However one should not lose sight of the fact that Law is insufficient to solve or improve the problem addressed as it is necessary to adopt preventive public policies as well as allowing the insertion of women in society under the condition of effective parity in order to deconstruct the patriarchal culture based on gender education and other measures of interdisciplinary bias with other branches of knowledge KEYWORDS Erotica Sex offenses Gender Sexuality SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 178 O tratamento da pornografia de vingança pelo ordenamento jurídico brasileiro The treatment of revenge pornography by the Brazilian legal system Renata de Lima Machado Rocha1 Roberta Duboc Pedrinha2 Maria Helena Barros de Oliveira3 DOI 101590010311042019S415 1 Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro TJRJ Rio de Janeiro RJ Brasil renatarlm4outlookcom 2 Universidade Federal Fluminense UFF Niterói RJ Brasil 3 Fundação Oswaldo Cruz Fiocruz Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca Ensp Departamento de Direitos Humanos Saúde e Diversidade Cultural DIHS Rio de Janeiro RJ Brasil ENSAIO ESSAY Este é um artigo publicado em acesso aberto Open Access sob a licença Creative Commons Attribution que permite uso distribuição e reprodução em qualquer meio sem restrições desde que o trabalho original seja corretamente citado SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 O tratamento da pornografia de vingança pelo ordenamento jurídico brasileiro 179 Noções introdutórias Fomentado pelo avanço tecnológico e por laços sociais cada vez mais enfraquecidos diaria mente aumenta o número de nudes sexting e pornografia de revanche O nude é a troca de imagens contendo nudez O sexting ocorre diante da permuta de mensagens textuais ou de imagem ou áudios de conteúdos eróticos entre parceiros íntimos A pornografia de vingança é espécie do gênero exposição pornográfica não consentida devendo investigarse para sua configuração a motivação que leva à di vulgação não autorizada1 Haverá o contexto de revanche ou vingança se a intenção na disseminação do material sem o consentimento do parceiro for a exposição da vítima sujeitandoa a linchamento moral causandolhe reveses sociais e emocionais por meio da rápida viralização do conteúdo2 Em regra as consequências daí advindas são graves não somente para as mulheres mas também para seu círculo de afetos Geram sofrimento emocional diminuição da auto estima prejuízo ao pleno desenvolvimento angústia medo tristeza raiva ansiedade es tresse dores de cabeça e de estômago distúr bios do sono e do apetite humilhação e culpa Ademais quando não impele suas vítimas a mudanças acentuadas em sua rotina pode chegar às raias do suicídio3 O conceito de saúde proposto pela Organização Mundial da Saúde muito embora tenha sofrido severas críticas ao longo do tempo adequase aos fins do presente traba lho Saúde é um estado de completo bemestar físico mental e social e não simplesmente a ausência de doenças ou enfermidades457 Nesse sentido a pornografia de vingança mais do que ofender a intimidade honra e vida privada das mulheres afronta a própria saúde considerada na esfera biopsicossocial individual5 com intensa afronta aos direitos humanos da vítima Pesquisa do Cyber Civil Rights Initiative do Department of Psychology da Florida International University que administra o site EndRevengePornorg httpswwwcy bercivilrightsorg em 2017 com 3044 par ticipantes nos Estados Unidos revela que entre as pessoas que sofreram divulgação ou ameaça de divulgação de material íntimo é maior o número de mulheres 158 do que de homens 93 A Organização Não Governamental ONG Safernet httpshelplineorgbrindicadores que auxilia vítimas e monitora violações dos di reitos humanos na internet juntamente com a Polícia Federal e com o Ministério Público Federal aponta que em 2018 a maior quantidade de pedidos de ajuda se relacionou à exposição não consentida de imagens íntimas n669 Desse total n669 440 eram de mulheres enquanto 229 eram de homens no ano de 2017 o total de atendimentos acerca do tema foi de 289 sendo 204 provenientes de mulheres e 85 oriundos de homens Em 2016 do total de solicitações n300 202 eram de mulheres sendo 98 de homens Essas estatísticas sugerem que a exposi ção não consentida de material íntimo e em consequência a pornografia de revanche se conectam intimamente com as diferenças de gênero presentes na sociedade Gênero é conceito das ciências sociais e se vincula à construção social do masculino e do feminino enquanto a palavra sexo designa a anatomia e a fisiologia dos seres e da atividade sexual a concepção de gênero relacionase com o aspecto social6 As complexidades do gênero ligamse intima mente às da sexualidade que segundo Foucault6 é instrumento elaborado social e historicamente a partir de múltiplos discursos sobre sexo que se refletem nos corpos comportamentos relações sociais e não relações de poder A sexualidade e em especial a da mulher vem sendo utilizada como forma de controle social ao longo de todo o curso da história A noção de controle social está associada aos conceitos de poder e de dominação política constituída por mecanismos que disciplinam uma sociedade e que submetem seus indivíduos a padrões e a princípios Pode ser formal exercido SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 Rocha RLM Pedrinha RD Oliveira MHB 180 pelo Estado ou informal realizado pelos grupos sociais7 sendo este último o eminentemente di rigido às mulheres e muito em função de sua sexualidade no âmbito familiar e educacional8 O patriarcado por outro lado é um sistema de dominação masculina expressão de poder político que incorpora as dimensões da se xualidade da reprodução e da relação entre homens e mulheres e perpassa todas as estru turas sociais Tem como um de seus pilares o controle da sexualidade feminina8 A constituição e a manutenção do patriar cado têm relação com as várias formas de vio lência interpretada pelo senso comum como a ruptura de qualquer forma de integridade do outro física psíquica sexual ou moral8 Vale dizer o patriarcado se utiliza da violência sendo esta inerente àquele Por considerar que o mesmo fato pode ser compreendido por uma mulher como violento mas avaliado como normal por outra Saffioti9 propõe utilizar o conceito de direitos humanos para apurar a existência da violência contra a mulher Violência simbólica por seu turno é con ceito que aborda uma forma de vis exercida pelo corpo sem coação física com funda mento na fabricação contínua de crenças no processo de socialização que induzem o indivíduo a se posicionar segundo o discurso dominante legitimandoo Para Bourdieu10 dominação masculina equivale à violência simbólica na constru ção social dos gêneros e legitima a suposta superioridade masculina em detrimento da inferioridade feminina Nesse cenário quando a mulher se insurge contra o sistema patriarcal por conduta que desatenda aos comportamentos que dela se esperam inclusive o de romper um relaciona mento afetivo ou exercer sua sexualidade li vremente o ambiente social admite uma forma de punila pelo suposto desvio mediante o uso da violência Na pornografia de revanche tal violência consiste na publicação de material íntimo com ausência de consentimento O controle social da sexualidade da mulher que durante longos anos foi realizado sob o prisma religioso e médicohigienista11 a partir da revolução sexual do século XX e diante do avanço da tecnologia na contemporaneidade é hodiernamente realizado por mecanismos mais sutis e tecnológicos próprios da socieda de de controle proposta por Deleuze12 Na era do consumo as relações sociais tornamse impessoais e superficiais com a banalização do sexo as parcerias são tro cadas como se fossem bens de consumo13 mediadas pela exposição de identidades e espetacularização das intimidades próprias da sociedade do espetáculo14 Vivese na sociedade de risco expressão que descreve a maneira como o grupo social procura responder aos riscos decorrentes dos avanços tecnológicos e industriais dos últimos anos e que atingem os campos político social econômico e individual sem que haja certeza acerca dos resultados que poderão daí advir15 Entre as contradições que defluem da sociedade de risco está a dificuldade de as instituições acompanharem as novidades em face da rapidez com que ocorrem A pornografia de vingança se vincula muito intimamente com as modernidades tecnoló gicas relacionandose profundamente com aqueles riscos especialmente diante da dificul dade de as instituições políticas sociais e jurí dicas acompanharem as mudanças e darem as respostas satisfatórias que demandam O ambiente social portanto favorece o crescimento da prática de vingança porno gráfica ao mesmo tempo que as instituições têm dificuldade de responder aos problemas provocados por ela A pornografia de vingança perante o ordenamento jurídico brasileiro O tratamento da vingança pornográfica pelo ordenamento jurídico brasileiro deve ser con textualizado a partir do reconhecimento dos SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 O tratamento da pornografia de vingança pelo ordenamento jurídico brasileiro 181 direitos humanos pelo direito internacional que tem início com a Carta das Nações de 194516 e com a Declaração Universal de 194817 Os tratados internacionais sobre direitos humanos são incorporados ao ordenamento ju rídico brasileiro mediante aprovação em cada casa legislativa em dois turnos com quórum qualificado a partir do que serão equivalentes a emendas constitucionais parágrafo 3º do art 5º da Constituição da República18 São duas as Convenções Internacionais de maior relevo para as mulheres no Brasil a Convenção pela Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher ou Convenção da Mulher Cedaw19 aprovada na Organização das Nações Unidas ONU em 1979 e ratificada pelo Brasil em 1984 e a Convenção de Belém do Pará ou Convenção Interamericana para Prevenir Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher aprova da pela Organização dos Estados Membros em 1994 e ingressando no ordenamento brasileiro pelo Decreto nº 1973199620 Esta última aduz no art 1º que a violên cia contra a mulher constitui violação dos direitos humanos e liberdades fundamentais e ofensa contra a dignidade humana e é ma nifestação das relações de poder historica mente desiguais entre mulheres e homens Estabelece como violência contra a mulher qualquer ato ou conduta baseada no gênero que cause morte dano ou sofrimento físico sexual ou psicológico à mulher A Declaração dos Direitos Sexuais de 199721 estabelecida em Valência III Congresso Mundial de Sexologia reconheceu os direitos sexuais como direitos humanos e declarou a possibilidade de ter experiências sexuais prazerosas e seguras livres de coerção dis criminação ou violência e que todos têm o direito de controlar e de decidir sobre questões relativas à sua sexualidade e aos seus corpos Destaca o direito à privacidade relacionada com a sexualidade vida sexual e escolhas vedando interferências arbitrárias e reco nhece o direito de controlar a divulgação de informação relacionada com a sexualidade Em âmbito interno a Constituição da República do Brasil18 tem como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana e prevê a igualdade entre homens e mulheres arts 1º III art 5º I Repudia a violência doméstica parágrafo 8º do art 226 preven do a criação de mecanismos para reprimir a violência no âmbito das relações da família a qual materializouse principalmente com a Lei Maria da Penha22 O art 5º da Lei Maria da Penha22 prevê como violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte lesão sofrimento físico sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial inserida no âmbito da unidade doméstica da família ou em qualquer relação íntima de afeto independentemente de coabitação A relação íntima de afeto é entendida como casamento convivência namoro ou qualquer relação casual eventual ou passageira conso ante o Enunciado 210032015 da Copevid do Conselho Nacional dos Procuradores Gerais A Lei Maria da Penha se aplica a quaisquer relações íntimas de afeto ainda que eventuais eou efêmeras23109 Acerca da vingança pornográfica sobressa em as violências psicológica e moral A violên cia psicológica é qualquer conduta que induza dano emocional e diminuição da autoestima ou que perturbe o pleno desenvolvimento ou vise degradar ou controlar ações comporta mentos crenças e decisões mediante ameaça constrangimento humilhação manipulação isolamento vigilância perseguição insulto chantagem violação de intimidade ridicula rização exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que provoque prejuízo à saúde psicológica e à autodeter minação A violência moral é compreendida como qualquer conduta que configure calúnia difamação ou injúria agredindo a honra e a respeitabilidade da pessoa A violação da intimidade da mulher passou a constar expressamente do inciso II do art 7º como uma espécie de violência psicológica após o advento da Lei nº 13772201824 SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 Rocha RLM Pedrinha RD Oliveira MHB 182 A Constituição da República garante a in violabilidade da intimidade da vida privada da honra e da imagem das pessoas bem como o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação inaugurando a tutela geral dos direitos da personalidade e o princípio da reparação integral dos danos Silva25 aponta que o direito à privacida de deve ser compreendido de forma ampla abarcando todas as manifestações da esfera íntima privada e da personalidade abrangen do o conjunto de informações que o indivíduo pode preferir manter exclusivamente sob seu controle ou se desejar comunicálo poderá decidir em que condições fazêlo Honra é o conjunto de qualidades que ca racterizam a dignidade pessoal o respeito dos concidadãos o bom nome a reputação A inviolabilidade da imagem consiste na tutela do aspecto visível por outrem acerca de um indivíduo seja quanto ao aspecto físico seja quanto à personalidade A reparação integral dos prejuízos prevista constitucionalmente abrange todas as formas de danos materiais e extrapatrimoniais Danos materiais atingem o patrimônio abarcando o que efetivamente se perdeu bem como o que razoavelmente se deixou de lucrar Quanto aos danos extrapatrimoniais prevalece o en tendimento de que estão presentes sempre em que há lesão a direito da personalidade25 Existem algumas espécies do gênero danos imateriais tais como dano moral puro dano à identidade à vida privada à intimidade à imagem ao prestígio à reputação dano esté tico dano psíquico e o dano existencial O dano existencial ou dano ao projeto de vida passou a ser classificado como uma ca tegoria autônoma da responsabilidade civil a partir da década de 1990 na Itália Decorre de episódio que provoca modificação prejudicial total ou parcial permanente ou temporária a uma atividade ou conjunto de atividades que a vítima tinha como incorporado ao seu cotidiano Igualmente pode alcançar uma po tencialidade para abranger atividades que a pessoa pela lógica do razoável ou segundo as regras de experiência poderia desenvolver no curso normal de sua vida26 O indivíduo realiza projetos de vida para dar sentido à própria existência e ao suceder um infortúnio do qual não tem controle o curso da existência pode modificarse inteiramente provocando até um vazio existencial ou a perda do sentido da vida Esses aspectos atingem em maior ou menor grau quem sofre a pornografia de vingança visto que muitas das vítimas necessitam mudar inteiramente os rumos da sua existência ou modificar suas atividades e outras ainda se veem tão fulminadas pelo acontecimento que perdem inteiramente a vontade de viver a ponto de se suicidarem Por ora o dano existencial ou dano ao projeto de vida ainda não vem associado à pornografia de vingança No entanto Sydow e Castro1 defendem sua autonomia e a possi bilidade de sua cumulação com o dano moral puro diante da intensidade com que se atinge a vida das vítimas De outro giro o Marco Civil da Internet Lei nº 129652014 estabeleceu princípios garan tias direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil trazendo os direitos humanos como um de seus fundamentos art 2º II e como princípios basilares a proteção da privacidade e a responsabilização dos agentes segundo sua atuação art 3º II e VI27 Significativamente a Lei do Marco Civil estabelece em seu art 21 uma exceção à regra geral da reserva de jurisdição em casos de di vulgação não consentida de material íntimo ao determinar que o provedor de internet retire do ar a partir de notificação realizada pelo próprio interessado e independentemente de determinação judicial o material de caráter privado tornando mais ágil o procedimento de exclusão do conteúdo privado da rede mundial de computadores Na esfera criminal o Código Penal brasilei ro28 norma da década de 40 do século passado vem sofrendo reformas pontuais e recentes alterações em relação aos crimes sexuais que se concentram em torno do valor constitucional SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 O tratamento da pornografia de vingança pelo ordenamento jurídico brasileiro 183 da dignidade humana em busca de proteger o sexo livre e desimpedido29 Em geral a tipificação dos delitos sexuais zela pelo bem jurídico da liberdade sexual vertente da dignidade humana garantindo a autodeterminação individual nesse âmbito abrangendo a capacidade de dispor livremente do próprio corpo e manter comportamento sexual segundo os desejos individuais30 O ano de 2018 trouxe importante alterações normativas acerca do tema em debate A Lei nº 13718201831 criou o tipo penal do art 218C do Código Penal que estabelece ser crime oferecer trocar disponibilizar transmi tir vender ou expor à venda distribuir publi car ou divulgar por qualquer meio inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática fotografia vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática ou sem o consentimento da vítima cena de sexo nudez ou pornografia fixando a pena de reclusão de um a cinco anos se o fato não constitui crime mais grave O novo tipo penal prevê como causa de aumento de pena o fato de o agente manter ou haver mantido relação íntima de afeto com a vítima ou quando há finalidade de vingança ou humilhação É exatamente a hipótese da vingança pornográfica O ilícito penal existirá ainda que o conteúdo tenha sido gravado ou colhido com a anuência da vítima ou mesmo que esta o tenha transmi tido para destinatários específicos Nesse caso repreendese a deslealdade daquele que em confiança recebe o material íntimo enca minhado pela vítima mas lhe dá publicidade sem consentimento Em se tratando de vítima menor de 18 anos a hipótese pode se amoldar aos arts 241 e 241A a E do Estatuto da Criança e do Adolescente32 Contudo agiu o legislador com falta de técnica na redação daquele dispositivo legal posto que previu a exposição pública de cena de sexo nudez ou pornografia sem o consen timento da vítima após capitular uma série de outras condutas relacionadas com a exposição de cena de estupro Tal tipo penal veio inserido no Capítulo II Dos crimes sexuais contra vulnerável sob o Título VI Dos crimes contra a dignidade sexual Essa posição topográfica no Código Penal e a redação do dispositivo podem ensejar er roneamente a interpretação de que a prática punível se refere tão somente à exposição pornográfica relacionada com o estupro Não foi essa contudo a intenção do legis lador o que pode ser apurado pelo exame do trâmite legislativo que culminou com a pro mulgação da norma a ser adiante abordado Já a Lei nº 13772201824 passou a prever o tipo penal do art 216B do Código Penal introduzindo o Capítulo IA sob a rubrica Da exposição da intimidade sexual Tal dis positivo vem topograficamente localizado sob o Título VI que protege a dignidade sexual punindose as condutas de produzir fotografar filmar ou registrar por qualquer meio conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado sem autorização dos participantes Punível igualmente a conduta de realizar montagem a fim de inserir a vítima no material audiovisual de conteúdo sexual Vários projetos de lei redundaram na criação dos dois novos tipos penais O projeto de Lei nº 6630201333 do deputado federal Romário juntamente com outros projetos correlatos pretendia punir a divulgação de cenas de sexo sem consentimento da vítima Não obstante em desacordo com o projeto de lei inicial a redação final do art 216B deixou de fora as ações relacionadas com a divulgação de tais conteúdos para somente punir aquelas em se realiza a captação dos momentos de intimidade sem a autorização da vítima Por outro lado o Projeto de Lei nº 5452201634 da senadora Vanessa Grazziotin tinha por finalidade a instituição do crime de estupro coletivo ao mesmo tempo que o Projeto de Lei da Câmara nº 18201735 pre tendia promover alteração do Código Penal para incluir mais um delito contra a honra e SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 Rocha RLM Pedrinha RD Oliveira MHB 184 não contra a liberdade sexual tomando essa concepção por ocasião do seu parecer final quando a conduta foi capitulada como expo sição pública da intimidade sexual indepen dentemente de anuência da vítima Depreendese pois que quando veio a lume a lei que previu o crime de violação da intimi dade sexual pelo art 216B o delito ficou bem aquém da intenção legislativa inicial haja vista que o novo dispositivo somente previu como punível a conduta de registrar a intimidade sexual mas não a de divulgar Por sua vez a conduta de expor as cenas de nudez sexo e pornografia acabou por ser inserida açodadamente sob a capitulação do art 218C juntamente com condutas relacio nadas com a divulgação de cenas de estupro e de estupro de vulnerável no tópico dos crimes sexuais contra vulnerável Em uma interpretação sistemática tele ológica e portanto segundo a intenção do legislador extraída dos projetos de lei e suas respectivas tramitações é possível concluir que as novas leis vieram no sentido de crimina lizar tanto as condutas de registrar o conteúdo íntimo quanto a sua divulgação independen temente de que houvesse um estupro Isto é mesmo no sexo consentido Sob outro prisma verificase que as pena lidades estabelecidas nos novos tipos penais trazem penas restritivas de liberdade bastante amplas uma vez que em relação ao crime do registro não autorizado da intimidade sexual art 216B a pena é de detenção de seis meses a um ano e quanto ao delito de divulgação não autorizada de cena de sexo nudez ou pornografia art 218C a pena é de reclusão de um a cinco anos se o fato não constitui crime mais grave Há previsão no parágrafo 1º de causa de aumento de pena de um terço a dois terços se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou humilhação Comparando as penas previstas na legisla ção vêse que se encontram em patamar bas tante superior às de delitos cujos resultados em tese podem ser mais graves do que os decorrentes da pornografia de revanche a exemplo do crime de lesão corporal simples cuja pena de detenção é de três meses a um ano Na lesão corporal grave que provoca in capacidade por mais de 30 dias ou debilidade permanente de membro sentido ou função e aceleração de parto a penalidade cominada é exatamente a mesma do delito tipificado no art 218C divulgação não autorizada de cena de sexo nudez ou pornografia isto é reclusão de um a cinco anos Se a lesão corporal simples ocorrer na seara da violência domés tica a previsão legal é de pena de detenção de três meses a três anos O princípio da proporcionalidade das penas exige um juízo de ponderação entre o bem que é lesionado ou posto em perigo gravidade do fato e o bem de que alguém pode vir a ser privado in casu a liberdade do acusado36 Ao estabelecer os patamares de penas dos novos crimes em especial o do art 218C o legislador parecer ter agido em desacordo com a proporcionalidade e razoabilidade cabíveis Por outro lado a partir da Lei nº 13718201831 todas as infrações constantes do Capítulo I Dos crimes contra a liberdade sexual e Capítulo IA Da exposição da inti midade sexual e do Capítulo II Dos crimes sexuais contra vulnerável do Título VI Dos crimes contra a dignidade sexual são de ação penal pública incondicionada isto é a per secução penal se desenrola por iniciativa do Ministério Público independentemente de manifestação do ofendido Antes da entrada em vigor das Leis nº 1371831 e nº 1377224 de 2018 as práticas que caracterizam a pornografia de revanche eram abarcadas pelos tipos penais da difamação ou injúria crimes contra a honra Se o fato ocorresse mediante a utilização de meio que facilitasse a divulgação ou em presença de várias pessoas o agente respondia com causa de aumento de pena Sob outra vertente a Lei Maria da Penha22 art 17 proibiu a aplicação de pena pecuniária e multa substitutiva aos crimes com violência SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 O tratamento da pornografia de vingança pelo ordenamento jurídico brasileiro 185 doméstica ou familiar contra a mulher e no art 41 vedou a aplicação dos institutos des penalizadores transação penal e suspensão condicional do processo da Lei de Juizados Especiais Criminais Lei nº 9099199537 O afastamento da possibilidade da aplicação das medidas despenalizadoras é questionado por vários segmentos da doutrina mormente diante das Teorias Minimalistas por exprimir uma demanda por sofrimento penal psíquico em detrimento de uma sanção moral ou patri monial38 Tais reflexões originamse a partir de intensas críticas ao sistema penal as quais denunciam a seletividade com que opera e por promover a inversão das suas próprias promessas de ressocialização demonstrando se a falsidade de seu discurso de igualdade humanidade e legalidade39 Tais teorias muitas vezes conflitam com os posicionamentos do Movimento Feminista Nessa seara Smaus40 refuta as Teorias Minimalistas e defende que o direito penal na tipificação de delitos contra a mulher consubstancia um instrumento na luta para a mudança da estrutura social patriarcal e que a capitulação penal dessas condutas é necessária na medida em que a criminalização de comportamentos vio lentos dos homens contra as mulheres juntamente com outras conquistas dos Movimentos Feministas ajuda a tornar públicos problemas que ocorriam na esfera privada e nela se mantinham velados Nesse sentido assenhoramonos dos dizeres de Gustav Radbrunch41 citados por Baratta42207 a melhor reforma do direito penal seria substituílo não por um direito penal melhor mas por qualquer coisa melhor que o direito penal Como ainda não é possível prescindir do direito penal que ele funcione como baliza jurídica de contenção dos excessos do poder punitivo e limitador da violência atinente ao gênero Nesse passo o Supremo Tribunal Federal em decisão vinculante Ação de Constitucionalidade 1943 entendeu pela cons titucionalidade dos dispositivos da Lei Maria da Penha22 que vedam a aplicação dos insti tutos despenalizadores da Lei nº 90999537 em crimes de violência doméstica e familiar contra a mulher A Lei Maria da Penha22 prevê a possibili dade de concessão de medidas protetivas de urgência adequadas ao caso concreto para a mulher em situação de violência domés tica e familiar art 22 parágrafo 1º cujo descumprimento configura o crime previsto no art 24A com pena de detenção de três meses a dois anos Todas as questões relacionadas com o direito e com a prática jurídica aqui debati das são insuficientes para alcançar a alme jada igualdade substancial entre mulheres e homens diante dos múltiplos aspectos do problema com raízes sociais e históricas se dimentadamente constituídas Para que se caminhe na direção da igualda de efetiva muito mais do que aprofundarse nas consequências jurídicas das diferenças de gênero fazse mister a adoção de políti cas públicas dirigidas à conscientização da sociedade em geral acerca das desigualdades ainda reinantes o que deverá ocorrer no amplo campo do debate político possibilitando levar se a efeito a educação de gênero bem como ações afirmativas em favor da mulher por meio de políticas públicas de gênero para melhor inserila no mercado de trabalho e no âmbito político com cotas O poder público precisa atentar para o de senvolvimento de agendas em prol da mulher propiciando atividades de capacitação pro fissional maior número de ofertas de vagas em estabelecimentos públicos de ensino para seus filhos inclusive e especialmente creches acesso à saúde e educação sexual reprodutiva e de gênero entre outros Logo na busca por uma sociedade melhor com arranjos mais pacificadores e mais iguali tários entre mulheres e homens não é possível se prescindir do direito posto que sua utiliza ção deve darse tendo como finalidade última a maior reflexão conscientização e educação da sociedade acerca das desigualdades de gênero SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 Rocha RLM Pedrinha RD Oliveira MHB 186 Considerações finais No presente artigo após contextualização do cenário social que permeia o aumento do número de casos de vingança pornográfica almejouse apresentar breve panorama acerca do tratamento da pornografia de vingança pelo ordenamento jurídico brasileiro Após rápida incursão pelo direito inter nacional viuse o tratamento do tema no Brasil Em destaque a proteção dada à dig nidade humana das vítimas de pornografia de vingança cujos direitos da personalidade sofrem prejuízos Na seara civil é garantido o direito à in denização pelo dano material ou imaterial decorrente da exposição não consentida de conteúdo íntimo Entre as várias espécies de prejuízos extra patrimoniais ressaltouse o dano existencial ou dano ao projeto ou plano de vida cuja au tonomia se defende em razão da intensidade dos efeitos advindos às vítimas Observouse que o Marco Civil da Internet permite maior agilidade na retirada do ma terial nocivo da rede mediante notificação pela vítima ao provedor acerca do conteúdo não autorizado Em âmbito penal no ano de 2018 foram rea lizadas alterações normativas acerca da porno grafia de vingança com as Leis nº 1371818 e nº 1377218 que criaram tipos penais específicos a alcançarem a vingança pornográfica os quais foram examinados Considerando todavia que as concepções de gênero foram histórica e socialmente cons truídas ao longo do tempo e são arraigadas no corpo social apenas alterações legislativas para criar tipos penais que resguardem direi tos das mulheres ou o aprofundamento dos operadores do direito nos estudos de gênero são insuficientes para o advento de um novo paradigma que se almeja O tema impõe a adoção de políticas pú blicas amplas e dirigidas a toda a socieda de mediante ações afirmativas em prol da mulher incremento da educação de gênero desenvolvimento de atividades de capacita ção profissional maior número de ofertas de vagas em estabelecimentos públicos de ensino para seus filhos garantia de acesso à saúde e educação sexual e reprodutiva tudo enfim para a efetivação da igualdade substancial entre homens e mulheres em um novo pacto para a superação da lógica binária dos gênero e que permita um novo olhar para as diferenças Colaboradores Rocha RLM 0000000263304162 Pedrinha RD 0000000290939083 e Oliveira MHB 0000000210784502 con tribuíram para concepção do estudo coleta e análise das informações preparação do manus crito revisão crítica do conteúdo e aprovação da versão final s Orcid Open Researcher and Contributor ID SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 O tratamento da pornografia de vingança pelo ordenamento jurídico brasileiro 187 Referências 1 Sydow ST Castro ALC Exposição pornográfica não consentida na internet da pornografia de vingança ao lucro Belo Horizonte DPlácido 2017 2 Buzzi VM Mulheres na rede a pornografia de vin gança como instrumento de violência de gênero In Gostinski A Bispo A organizadoras Estudos femi nistas por um direito menos machista Florianópo lis Empório do Direito 2016 3 Silva AS Pinheiro RB Exposição que fere percepção que mata a urgência de uma abordagem psicosocioju rídica da pornografia de vingança à luz da Lei Maria da Penha Rev Fac Direito UFPR 2017 623243265 4 Batistella C Abordagens contemporâneas do concei to de saúde In Fonseca AF Dandrea Corbo AM O território e o processo saúdedoença Rio de Janei ro Fiocruz 2007 5 Heilborn ML Gênero sexualidade e saúde In Silva DM organizador Saúde sexualidade e reprodução compartilhando responsabilidades Rio de Janeiro UERJ 1997 6 Foucault M História da sexualidade a vontade de saber Rio de Janeiro Paz e Terra 2017 7 Sabadell AL Manual de sociologia jurídica Introdu ção a uma leitura externa do direito São Paulo Re vista dos Tribunais 2017 8 Baratta A O paradigma do gênero In Campos CH organizadora Criminologia e feminismo Porto Ale gre Sulina 1999 9 Saffioti H Gênero patriarcado e violência São Paulo Expressão Popular Fundação Perseu Abramo 2015 10 Bourdieu P A dominação masculina Rio de Janeiro Bertrand Brasil 2014 11 Pedrinha RD Sexualidade controle social e práticas punitivas do signo sacro religioso ao modelo científico médico higienista Rio de Janeiro Lumen Juris 2009 12 Deleuze G Conversações São Paulo Editora 34 1992 13 Bauman Z Amor líquido sobre a fragilidade dos la ços humanos Rio de Janeiro Jorge Zahar 2004 14 Debord G A sociedade do espetáculo S l eBookLi bris 2003 15 Beck U Giddens A Lash S Modernização reflexiva política tradição e estética na ordem social moder na Oeiras Celta 2000 16 Brasil Decreto nº 19841 de 22 de outubro de 1945 internet Promulga a Carta das Nações Unidas da qual faz parte integrante o anexo Estatuto da Corte Internacional de Justiça assinada em São Francisco a 26 de junho de 1945 Diário Oficial da União 23 Out 1945 acesso em 2018 mar 9 Disponível em http wwwplanaltogovbrccivil03decreto19301949 D19841htm 17 Organização das Nações Unidas Declaração Univer sal dos Direitos Humanos adotada e proclamada pela resolução 217 A III da Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948 internet aces so em 2018 mar 9 Disponível em httpsunesdoc unescoorgark48223pf0000139423 18 Brasil Constituição da República Federativa do Brasil internet Brasília DF Senado Federal 1988 acesso em 2018 set 15 Disponível em httpwwwplanal togovbrccivil03constituicaoconstituicaohtm 19 Brasil Decreto nº 4377 de 13 de setembro de 2002 internet Promulga a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mu lher de 1979 e revoga o Decreto nº 89460 de 20 de março de 1984 Diário Oficial da União 14 Set 2002 acesso em 2018 mar 11 Disponível em httpwww planaltogovbrccivil03decreto2002D4377htm 20 Brasil Decreto nº 1973 de 1º de agosto de 1996 in ternet Promulga a Convenção Interamericana para Prevenir Punir e Erradicar a Violência contra a Mu lher concluída em Belém do Pará em 9 de junho de SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 Rocha RLM Pedrinha RD Oliveira MHB 188 1994 Diário Oficial da União 2 Ago 1996 acesso em mar 8 2018 Disponível em httpwwwplanaltogov brccivil03decreto1996D1973htm 21 World Association for Sexual Health Declaração dos direitos sexuais internet S l S n 2013 acesso em 2019 nov 27 Disponível em httpsworldsexu alhealthnetwpcontentuploads201308declara tionofsexualrightssep032014pdf 22 Brasil Lei nº 11340 de 7 de agosto de 2006 internet Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher nos termos do 8º do art 226 da Constituição Federal da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher dispõe sobre a criação dos Juizados de Vio lência Doméstica e Familiar contra a Mulher altera o Código de Processo Penal o Código Penal e a Lei de Execução Penal e dá outras providências Diário Oficial da União 8 Ago 2006 acesso em 2019 fev 6 Disponível em httpwwwplanaltogovbrcci vil03Ato200420062006LeiL11340htm 23 Mello AR Feminicídio uma análise sociojurídica da violência contra a mulher no Brasil 2 ed Rio de Ja neiro LMJ Mundo Jurídico 2017 24 Brasil Lei nº 13772 de 19 de dezembro de 2018 in ternet Altera a Lei nº 11340 de 7 de agosto de 2006 Lei Maria da Penha e o DecretoLei nº 2848 de 7 de dezembro de 1940 Código Penal para reconhe cer que a violação da intimidade da mulher configu ra violência doméstica e familiar e para criminalizar o registro não autorizado de conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado acesso em 2019 fev 6 Disponível em http wwwplanaltogovbrccivil03Ato201520182018 LeiL13772htm 25 Silva JA Curso de Direito Constitucional Positivo 13 ed São Paulo Malheiros Editores 1996 Revisada 26 Tartuce F Manual de Direito Civil volume único 5 ed Rio de Janeiro Forense São Paulo Método 2015 Revisada Atualizada e Ampliada 27 Soares FR Dano existencial uma leitura da responsa bilidade civil por danos extrapatrimoniais sob a ótica da proteção humana dissertação 2007 Porto Ale gre Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul 2007 223 p 28 Brasil Lei nº 12965 de 23 de abril de 2014 inter net Estabelece princípios garantias direitos e de veres para o uso da Internet no Brasil Diário Oficial da União 24 Abr 2014 acesso em 2019 fev 6 Dis ponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03 ato201120142014leil12965htm 29 Brasil Lei nº 12965 de 23 de abril de 2014 inter net Estabelece princípios garantias direitos e de veres para o uso da Internet no Brasil Diário Oficial da União 24 Abr 2014 acesso em 2019 fev 6 Dis ponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03 ato201120142014leil12965htm 30 Prado LR Curso de direito penal brasileiro São Pau lo Revista dos Tribunais 2013 31 Brasil Lei nº 13718 de 24 de setembro de 2018 in ternet Altera o DecretoLei nº 2848 de 7 de dezem bro de 1940 Código Penal para tipificar os crimes de importunação sexual e de divulgação de cena de estupro tornar pública incondicionada a natureza da ação penal dos crimes contra a liberdade sexual e dos crimes sexuais contra vulnerável estabelecer causas de aumento de pena para esses crimes e de finir como causas de aumento de pena o estupro co letivo e o estupro corretivo e revoga dispositivo do DecretoLei nº 3688 de 3 de outubro de 1941 Lei das Contravenções Penais Diário Oficial da União 25 Set 2018 acesso em 2019 fev 6 Disponível em http wwwplanaltogovbrccivil03ato201520182018 leiL13718htm 32 Brasil Lei nº 8069 de 13 de julho de 1990 internet Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescen te e dá outras providências Diário Oficial da União 16 Jul 1990 acesso em 2019 mar 3 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03leisL8069 htm 33 Brasil Projeto de Lei nº 6630 de 23 de outubro de SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 O tratamento da pornografia de vingança pelo ordenamento jurídico brasileiro 189 2013 internet acesso em 2019 mar 2 Disponível em httpswwwcamaralegbrproposicoesWebfi chadetramitacaoidProposicao598038 34 Brasil Projeto de Lei nº 5452 de 2016 internet acesso em 2019 mar 2 Disponível em httpswww camaralegbrproposicoesWebfichadetramitacaoi dProposicao2086414 35 Brasil Projeto de Lei da Câmara nº 18 de 2017 in ternet acesso em 2019 mar 2 Disponível em ht tpslegissenadolegbrsdleggetterdocumentod m5068988ts1550060365849dispositioninline 36 Greco R Curso de direito penal parte geral 4 ed Rio de Janeiro Impetus 2004 37 Brasil Lei nº 9099 de 26 de setembro de 1995 in ternet Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências Diário Oficial da União 27 Set 1995 acesso em 2019 mar 6 Dispo nível em httpwwwplanaltogovbrccivil03leis L9099htm 38 Batista N Só Carolina não viu violência domésti ca e políticas criminais no Brasil In Mello AR or ganizadora Comentários à lei de violência domésti ca e familiar contra a mulher 2 ed Rio de Janeiro Lumen Juris 2009 39 Campos CH Criminologia feminista teoria feminis ta e crítica às criminologias Rio de Janeiro Lumen Juris 2017 40 Smaus G Abolicionismo el punto de vista feminis ta No Hay Derecho n 7 1992 internet acesso em 2019 fev 28 Disponível em httpsptscribdcom document117173969Abolicionismoelpuntode vistafeministaPorGerlindaSmaus 41 Radbruch G Rechtsphilosophie 2 ed Heidelberg CF Mueller 2003 42 Baratta A Criminologia crítica e crítica do direito pe nal introdução à sociologia do direito penal 6 ed Rio de Janeiro Revan 2011 Tradução Juarez Ciri no dos Santos 43 Brasil Ação Declaratória de Constitucionalidade 19 Distrito Federal internet Relator Min Mar co Aurélio Brasília DF Supremo Tribunal Fede ral 2001 acesso em 2019 fev 28 Disponível em httpportalstfjusbrprocessosdownloadPeca aspid217154893extpdf Recebido em 16082019 Aprovado em 03112019 Conflito de interesses inexistente Suporte financeiro não houve
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RESUMO Este artigo aborda o tratamento jurídico dado pelo ordenamento brasileiro à pornografia de vingança observando tratarse de fenômeno que tem aumentado estatisticamente a partir dos avanços tecnológicos e das transformações nos relacionamentos sociais nos últimos tempos A temática tem sua origem nas diferenças culturalmente fincadas acerca dos gêneros diante da estrutura social patriarcal No âmbito do direito civil abordamse os danos sofridos pelas vítimas e as formas de indenização previstas Em especial analisase a pertinência no reconhecimento ao denominado dano existencial ou dano ao projeto de vida tendo em vista a gravidade das consequências que em regra acometem as vítimas No âmbito do direito penal enfatizam se alterações legislativas recentes que introduziram tipos penais específicos nos quais se insere a vingança pornográfica Não se perde de vista contudo que o direito é insuficiente para a solução ou para a melhoria da problemática abordada na medida em que se faz necessária a adoção de políticas públicas preventivas bem como que permitam a inserção da mulher na sociedade em condição de efetiva paridade para desconstruir a cultura patriarcal a partir da educação de gênero e de outras medidas de viés interdisciplinar com outros ramos do conhecimento PALAVRASCHAVE Literatura erótica Delitos sexuais Identidade de gênero Sexualidade ABSTRACT This article addresses the legal treatment given by the Brazilian legal system to revenge pornog raphy observing that it is a phenomenon that has increased statistically due to the technological advances and transformations in social relationships in recent times The theme has its origin in the culturally entrenched differences about gender in view of the patriarchal social structure In the field of civil law the damage suf fered by the victims and the forms of compensation provided for are addressed In particular the pertinence in the recognition to the denominated existential damage or damage to the life project is analyzed consider ing the seriousness of the consequences that as a rule affect the victims In criminal law recent legislative changes have been emphasized that have introduced specific criminal types into which pornographic revenge falls However one should not lose sight of the fact that Law is insufficient to solve or improve the problem addressed as it is necessary to adopt preventive public policies as well as allowing the insertion of women in society under the condition of effective parity in order to deconstruct the patriarchal culture based on gender education and other measures of interdisciplinary bias with other branches of knowledge KEYWORDS Erotica Sex offenses Gender Sexuality SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 178 O tratamento da pornografia de vingança pelo ordenamento jurídico brasileiro The treatment of revenge pornography by the Brazilian legal system Renata de Lima Machado Rocha1 Roberta Duboc Pedrinha2 Maria Helena Barros de Oliveira3 DOI 101590010311042019S415 1 Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro TJRJ Rio de Janeiro RJ Brasil renatarlm4outlookcom 2 Universidade Federal Fluminense UFF Niterói RJ Brasil 3 Fundação Oswaldo Cruz Fiocruz Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca Ensp Departamento de Direitos Humanos Saúde e Diversidade Cultural DIHS Rio de Janeiro RJ Brasil ENSAIO ESSAY Este é um artigo publicado em acesso aberto Open Access sob a licença Creative Commons Attribution que permite uso distribuição e reprodução em qualquer meio sem restrições desde que o trabalho original seja corretamente citado SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 O tratamento da pornografia de vingança pelo ordenamento jurídico brasileiro 179 Noções introdutórias Fomentado pelo avanço tecnológico e por laços sociais cada vez mais enfraquecidos diaria mente aumenta o número de nudes sexting e pornografia de revanche O nude é a troca de imagens contendo nudez O sexting ocorre diante da permuta de mensagens textuais ou de imagem ou áudios de conteúdos eróticos entre parceiros íntimos A pornografia de vingança é espécie do gênero exposição pornográfica não consentida devendo investigarse para sua configuração a motivação que leva à di vulgação não autorizada1 Haverá o contexto de revanche ou vingança se a intenção na disseminação do material sem o consentimento do parceiro for a exposição da vítima sujeitandoa a linchamento moral causandolhe reveses sociais e emocionais por meio da rápida viralização do conteúdo2 Em regra as consequências daí advindas são graves não somente para as mulheres mas também para seu círculo de afetos Geram sofrimento emocional diminuição da auto estima prejuízo ao pleno desenvolvimento angústia medo tristeza raiva ansiedade es tresse dores de cabeça e de estômago distúr bios do sono e do apetite humilhação e culpa Ademais quando não impele suas vítimas a mudanças acentuadas em sua rotina pode chegar às raias do suicídio3 O conceito de saúde proposto pela Organização Mundial da Saúde muito embora tenha sofrido severas críticas ao longo do tempo adequase aos fins do presente traba lho Saúde é um estado de completo bemestar físico mental e social e não simplesmente a ausência de doenças ou enfermidades457 Nesse sentido a pornografia de vingança mais do que ofender a intimidade honra e vida privada das mulheres afronta a própria saúde considerada na esfera biopsicossocial individual5 com intensa afronta aos direitos humanos da vítima Pesquisa do Cyber Civil Rights Initiative do Department of Psychology da Florida International University que administra o site EndRevengePornorg httpswwwcy bercivilrightsorg em 2017 com 3044 par ticipantes nos Estados Unidos revela que entre as pessoas que sofreram divulgação ou ameaça de divulgação de material íntimo é maior o número de mulheres 158 do que de homens 93 A Organização Não Governamental ONG Safernet httpshelplineorgbrindicadores que auxilia vítimas e monitora violações dos di reitos humanos na internet juntamente com a Polícia Federal e com o Ministério Público Federal aponta que em 2018 a maior quantidade de pedidos de ajuda se relacionou à exposição não consentida de imagens íntimas n669 Desse total n669 440 eram de mulheres enquanto 229 eram de homens no ano de 2017 o total de atendimentos acerca do tema foi de 289 sendo 204 provenientes de mulheres e 85 oriundos de homens Em 2016 do total de solicitações n300 202 eram de mulheres sendo 98 de homens Essas estatísticas sugerem que a exposi ção não consentida de material íntimo e em consequência a pornografia de revanche se conectam intimamente com as diferenças de gênero presentes na sociedade Gênero é conceito das ciências sociais e se vincula à construção social do masculino e do feminino enquanto a palavra sexo designa a anatomia e a fisiologia dos seres e da atividade sexual a concepção de gênero relacionase com o aspecto social6 As complexidades do gênero ligamse intima mente às da sexualidade que segundo Foucault6 é instrumento elaborado social e historicamente a partir de múltiplos discursos sobre sexo que se refletem nos corpos comportamentos relações sociais e não relações de poder A sexualidade e em especial a da mulher vem sendo utilizada como forma de controle social ao longo de todo o curso da história A noção de controle social está associada aos conceitos de poder e de dominação política constituída por mecanismos que disciplinam uma sociedade e que submetem seus indivíduos a padrões e a princípios Pode ser formal exercido SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 Rocha RLM Pedrinha RD Oliveira MHB 180 pelo Estado ou informal realizado pelos grupos sociais7 sendo este último o eminentemente di rigido às mulheres e muito em função de sua sexualidade no âmbito familiar e educacional8 O patriarcado por outro lado é um sistema de dominação masculina expressão de poder político que incorpora as dimensões da se xualidade da reprodução e da relação entre homens e mulheres e perpassa todas as estru turas sociais Tem como um de seus pilares o controle da sexualidade feminina8 A constituição e a manutenção do patriar cado têm relação com as várias formas de vio lência interpretada pelo senso comum como a ruptura de qualquer forma de integridade do outro física psíquica sexual ou moral8 Vale dizer o patriarcado se utiliza da violência sendo esta inerente àquele Por considerar que o mesmo fato pode ser compreendido por uma mulher como violento mas avaliado como normal por outra Saffioti9 propõe utilizar o conceito de direitos humanos para apurar a existência da violência contra a mulher Violência simbólica por seu turno é con ceito que aborda uma forma de vis exercida pelo corpo sem coação física com funda mento na fabricação contínua de crenças no processo de socialização que induzem o indivíduo a se posicionar segundo o discurso dominante legitimandoo Para Bourdieu10 dominação masculina equivale à violência simbólica na constru ção social dos gêneros e legitima a suposta superioridade masculina em detrimento da inferioridade feminina Nesse cenário quando a mulher se insurge contra o sistema patriarcal por conduta que desatenda aos comportamentos que dela se esperam inclusive o de romper um relaciona mento afetivo ou exercer sua sexualidade li vremente o ambiente social admite uma forma de punila pelo suposto desvio mediante o uso da violência Na pornografia de revanche tal violência consiste na publicação de material íntimo com ausência de consentimento O controle social da sexualidade da mulher que durante longos anos foi realizado sob o prisma religioso e médicohigienista11 a partir da revolução sexual do século XX e diante do avanço da tecnologia na contemporaneidade é hodiernamente realizado por mecanismos mais sutis e tecnológicos próprios da socieda de de controle proposta por Deleuze12 Na era do consumo as relações sociais tornamse impessoais e superficiais com a banalização do sexo as parcerias são tro cadas como se fossem bens de consumo13 mediadas pela exposição de identidades e espetacularização das intimidades próprias da sociedade do espetáculo14 Vivese na sociedade de risco expressão que descreve a maneira como o grupo social procura responder aos riscos decorrentes dos avanços tecnológicos e industriais dos últimos anos e que atingem os campos político social econômico e individual sem que haja certeza acerca dos resultados que poderão daí advir15 Entre as contradições que defluem da sociedade de risco está a dificuldade de as instituições acompanharem as novidades em face da rapidez com que ocorrem A pornografia de vingança se vincula muito intimamente com as modernidades tecnoló gicas relacionandose profundamente com aqueles riscos especialmente diante da dificul dade de as instituições políticas sociais e jurí dicas acompanharem as mudanças e darem as respostas satisfatórias que demandam O ambiente social portanto favorece o crescimento da prática de vingança porno gráfica ao mesmo tempo que as instituições têm dificuldade de responder aos problemas provocados por ela A pornografia de vingança perante o ordenamento jurídico brasileiro O tratamento da vingança pornográfica pelo ordenamento jurídico brasileiro deve ser con textualizado a partir do reconhecimento dos SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 O tratamento da pornografia de vingança pelo ordenamento jurídico brasileiro 181 direitos humanos pelo direito internacional que tem início com a Carta das Nações de 194516 e com a Declaração Universal de 194817 Os tratados internacionais sobre direitos humanos são incorporados ao ordenamento ju rídico brasileiro mediante aprovação em cada casa legislativa em dois turnos com quórum qualificado a partir do que serão equivalentes a emendas constitucionais parágrafo 3º do art 5º da Constituição da República18 São duas as Convenções Internacionais de maior relevo para as mulheres no Brasil a Convenção pela Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher ou Convenção da Mulher Cedaw19 aprovada na Organização das Nações Unidas ONU em 1979 e ratificada pelo Brasil em 1984 e a Convenção de Belém do Pará ou Convenção Interamericana para Prevenir Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher aprova da pela Organização dos Estados Membros em 1994 e ingressando no ordenamento brasileiro pelo Decreto nº 1973199620 Esta última aduz no art 1º que a violên cia contra a mulher constitui violação dos direitos humanos e liberdades fundamentais e ofensa contra a dignidade humana e é ma nifestação das relações de poder historica mente desiguais entre mulheres e homens Estabelece como violência contra a mulher qualquer ato ou conduta baseada no gênero que cause morte dano ou sofrimento físico sexual ou psicológico à mulher A Declaração dos Direitos Sexuais de 199721 estabelecida em Valência III Congresso Mundial de Sexologia reconheceu os direitos sexuais como direitos humanos e declarou a possibilidade de ter experiências sexuais prazerosas e seguras livres de coerção dis criminação ou violência e que todos têm o direito de controlar e de decidir sobre questões relativas à sua sexualidade e aos seus corpos Destaca o direito à privacidade relacionada com a sexualidade vida sexual e escolhas vedando interferências arbitrárias e reco nhece o direito de controlar a divulgação de informação relacionada com a sexualidade Em âmbito interno a Constituição da República do Brasil18 tem como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana e prevê a igualdade entre homens e mulheres arts 1º III art 5º I Repudia a violência doméstica parágrafo 8º do art 226 preven do a criação de mecanismos para reprimir a violência no âmbito das relações da família a qual materializouse principalmente com a Lei Maria da Penha22 O art 5º da Lei Maria da Penha22 prevê como violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte lesão sofrimento físico sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial inserida no âmbito da unidade doméstica da família ou em qualquer relação íntima de afeto independentemente de coabitação A relação íntima de afeto é entendida como casamento convivência namoro ou qualquer relação casual eventual ou passageira conso ante o Enunciado 210032015 da Copevid do Conselho Nacional dos Procuradores Gerais A Lei Maria da Penha se aplica a quaisquer relações íntimas de afeto ainda que eventuais eou efêmeras23109 Acerca da vingança pornográfica sobressa em as violências psicológica e moral A violên cia psicológica é qualquer conduta que induza dano emocional e diminuição da autoestima ou que perturbe o pleno desenvolvimento ou vise degradar ou controlar ações comporta mentos crenças e decisões mediante ameaça constrangimento humilhação manipulação isolamento vigilância perseguição insulto chantagem violação de intimidade ridicula rização exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que provoque prejuízo à saúde psicológica e à autodeter minação A violência moral é compreendida como qualquer conduta que configure calúnia difamação ou injúria agredindo a honra e a respeitabilidade da pessoa A violação da intimidade da mulher passou a constar expressamente do inciso II do art 7º como uma espécie de violência psicológica após o advento da Lei nº 13772201824 SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 Rocha RLM Pedrinha RD Oliveira MHB 182 A Constituição da República garante a in violabilidade da intimidade da vida privada da honra e da imagem das pessoas bem como o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação inaugurando a tutela geral dos direitos da personalidade e o princípio da reparação integral dos danos Silva25 aponta que o direito à privacida de deve ser compreendido de forma ampla abarcando todas as manifestações da esfera íntima privada e da personalidade abrangen do o conjunto de informações que o indivíduo pode preferir manter exclusivamente sob seu controle ou se desejar comunicálo poderá decidir em que condições fazêlo Honra é o conjunto de qualidades que ca racterizam a dignidade pessoal o respeito dos concidadãos o bom nome a reputação A inviolabilidade da imagem consiste na tutela do aspecto visível por outrem acerca de um indivíduo seja quanto ao aspecto físico seja quanto à personalidade A reparação integral dos prejuízos prevista constitucionalmente abrange todas as formas de danos materiais e extrapatrimoniais Danos materiais atingem o patrimônio abarcando o que efetivamente se perdeu bem como o que razoavelmente se deixou de lucrar Quanto aos danos extrapatrimoniais prevalece o en tendimento de que estão presentes sempre em que há lesão a direito da personalidade25 Existem algumas espécies do gênero danos imateriais tais como dano moral puro dano à identidade à vida privada à intimidade à imagem ao prestígio à reputação dano esté tico dano psíquico e o dano existencial O dano existencial ou dano ao projeto de vida passou a ser classificado como uma ca tegoria autônoma da responsabilidade civil a partir da década de 1990 na Itália Decorre de episódio que provoca modificação prejudicial total ou parcial permanente ou temporária a uma atividade ou conjunto de atividades que a vítima tinha como incorporado ao seu cotidiano Igualmente pode alcançar uma po tencialidade para abranger atividades que a pessoa pela lógica do razoável ou segundo as regras de experiência poderia desenvolver no curso normal de sua vida26 O indivíduo realiza projetos de vida para dar sentido à própria existência e ao suceder um infortúnio do qual não tem controle o curso da existência pode modificarse inteiramente provocando até um vazio existencial ou a perda do sentido da vida Esses aspectos atingem em maior ou menor grau quem sofre a pornografia de vingança visto que muitas das vítimas necessitam mudar inteiramente os rumos da sua existência ou modificar suas atividades e outras ainda se veem tão fulminadas pelo acontecimento que perdem inteiramente a vontade de viver a ponto de se suicidarem Por ora o dano existencial ou dano ao projeto de vida ainda não vem associado à pornografia de vingança No entanto Sydow e Castro1 defendem sua autonomia e a possi bilidade de sua cumulação com o dano moral puro diante da intensidade com que se atinge a vida das vítimas De outro giro o Marco Civil da Internet Lei nº 129652014 estabeleceu princípios garan tias direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil trazendo os direitos humanos como um de seus fundamentos art 2º II e como princípios basilares a proteção da privacidade e a responsabilização dos agentes segundo sua atuação art 3º II e VI27 Significativamente a Lei do Marco Civil estabelece em seu art 21 uma exceção à regra geral da reserva de jurisdição em casos de di vulgação não consentida de material íntimo ao determinar que o provedor de internet retire do ar a partir de notificação realizada pelo próprio interessado e independentemente de determinação judicial o material de caráter privado tornando mais ágil o procedimento de exclusão do conteúdo privado da rede mundial de computadores Na esfera criminal o Código Penal brasilei ro28 norma da década de 40 do século passado vem sofrendo reformas pontuais e recentes alterações em relação aos crimes sexuais que se concentram em torno do valor constitucional SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 O tratamento da pornografia de vingança pelo ordenamento jurídico brasileiro 183 da dignidade humana em busca de proteger o sexo livre e desimpedido29 Em geral a tipificação dos delitos sexuais zela pelo bem jurídico da liberdade sexual vertente da dignidade humana garantindo a autodeterminação individual nesse âmbito abrangendo a capacidade de dispor livremente do próprio corpo e manter comportamento sexual segundo os desejos individuais30 O ano de 2018 trouxe importante alterações normativas acerca do tema em debate A Lei nº 13718201831 criou o tipo penal do art 218C do Código Penal que estabelece ser crime oferecer trocar disponibilizar transmi tir vender ou expor à venda distribuir publi car ou divulgar por qualquer meio inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática fotografia vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática ou sem o consentimento da vítima cena de sexo nudez ou pornografia fixando a pena de reclusão de um a cinco anos se o fato não constitui crime mais grave O novo tipo penal prevê como causa de aumento de pena o fato de o agente manter ou haver mantido relação íntima de afeto com a vítima ou quando há finalidade de vingança ou humilhação É exatamente a hipótese da vingança pornográfica O ilícito penal existirá ainda que o conteúdo tenha sido gravado ou colhido com a anuência da vítima ou mesmo que esta o tenha transmi tido para destinatários específicos Nesse caso repreendese a deslealdade daquele que em confiança recebe o material íntimo enca minhado pela vítima mas lhe dá publicidade sem consentimento Em se tratando de vítima menor de 18 anos a hipótese pode se amoldar aos arts 241 e 241A a E do Estatuto da Criança e do Adolescente32 Contudo agiu o legislador com falta de técnica na redação daquele dispositivo legal posto que previu a exposição pública de cena de sexo nudez ou pornografia sem o consen timento da vítima após capitular uma série de outras condutas relacionadas com a exposição de cena de estupro Tal tipo penal veio inserido no Capítulo II Dos crimes sexuais contra vulnerável sob o Título VI Dos crimes contra a dignidade sexual Essa posição topográfica no Código Penal e a redação do dispositivo podem ensejar er roneamente a interpretação de que a prática punível se refere tão somente à exposição pornográfica relacionada com o estupro Não foi essa contudo a intenção do legis lador o que pode ser apurado pelo exame do trâmite legislativo que culminou com a pro mulgação da norma a ser adiante abordado Já a Lei nº 13772201824 passou a prever o tipo penal do art 216B do Código Penal introduzindo o Capítulo IA sob a rubrica Da exposição da intimidade sexual Tal dis positivo vem topograficamente localizado sob o Título VI que protege a dignidade sexual punindose as condutas de produzir fotografar filmar ou registrar por qualquer meio conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado sem autorização dos participantes Punível igualmente a conduta de realizar montagem a fim de inserir a vítima no material audiovisual de conteúdo sexual Vários projetos de lei redundaram na criação dos dois novos tipos penais O projeto de Lei nº 6630201333 do deputado federal Romário juntamente com outros projetos correlatos pretendia punir a divulgação de cenas de sexo sem consentimento da vítima Não obstante em desacordo com o projeto de lei inicial a redação final do art 216B deixou de fora as ações relacionadas com a divulgação de tais conteúdos para somente punir aquelas em se realiza a captação dos momentos de intimidade sem a autorização da vítima Por outro lado o Projeto de Lei nº 5452201634 da senadora Vanessa Grazziotin tinha por finalidade a instituição do crime de estupro coletivo ao mesmo tempo que o Projeto de Lei da Câmara nº 18201735 pre tendia promover alteração do Código Penal para incluir mais um delito contra a honra e SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 Rocha RLM Pedrinha RD Oliveira MHB 184 não contra a liberdade sexual tomando essa concepção por ocasião do seu parecer final quando a conduta foi capitulada como expo sição pública da intimidade sexual indepen dentemente de anuência da vítima Depreendese pois que quando veio a lume a lei que previu o crime de violação da intimi dade sexual pelo art 216B o delito ficou bem aquém da intenção legislativa inicial haja vista que o novo dispositivo somente previu como punível a conduta de registrar a intimidade sexual mas não a de divulgar Por sua vez a conduta de expor as cenas de nudez sexo e pornografia acabou por ser inserida açodadamente sob a capitulação do art 218C juntamente com condutas relacio nadas com a divulgação de cenas de estupro e de estupro de vulnerável no tópico dos crimes sexuais contra vulnerável Em uma interpretação sistemática tele ológica e portanto segundo a intenção do legislador extraída dos projetos de lei e suas respectivas tramitações é possível concluir que as novas leis vieram no sentido de crimina lizar tanto as condutas de registrar o conteúdo íntimo quanto a sua divulgação independen temente de que houvesse um estupro Isto é mesmo no sexo consentido Sob outro prisma verificase que as pena lidades estabelecidas nos novos tipos penais trazem penas restritivas de liberdade bastante amplas uma vez que em relação ao crime do registro não autorizado da intimidade sexual art 216B a pena é de detenção de seis meses a um ano e quanto ao delito de divulgação não autorizada de cena de sexo nudez ou pornografia art 218C a pena é de reclusão de um a cinco anos se o fato não constitui crime mais grave Há previsão no parágrafo 1º de causa de aumento de pena de um terço a dois terços se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou humilhação Comparando as penas previstas na legisla ção vêse que se encontram em patamar bas tante superior às de delitos cujos resultados em tese podem ser mais graves do que os decorrentes da pornografia de revanche a exemplo do crime de lesão corporal simples cuja pena de detenção é de três meses a um ano Na lesão corporal grave que provoca in capacidade por mais de 30 dias ou debilidade permanente de membro sentido ou função e aceleração de parto a penalidade cominada é exatamente a mesma do delito tipificado no art 218C divulgação não autorizada de cena de sexo nudez ou pornografia isto é reclusão de um a cinco anos Se a lesão corporal simples ocorrer na seara da violência domés tica a previsão legal é de pena de detenção de três meses a três anos O princípio da proporcionalidade das penas exige um juízo de ponderação entre o bem que é lesionado ou posto em perigo gravidade do fato e o bem de que alguém pode vir a ser privado in casu a liberdade do acusado36 Ao estabelecer os patamares de penas dos novos crimes em especial o do art 218C o legislador parecer ter agido em desacordo com a proporcionalidade e razoabilidade cabíveis Por outro lado a partir da Lei nº 13718201831 todas as infrações constantes do Capítulo I Dos crimes contra a liberdade sexual e Capítulo IA Da exposição da inti midade sexual e do Capítulo II Dos crimes sexuais contra vulnerável do Título VI Dos crimes contra a dignidade sexual são de ação penal pública incondicionada isto é a per secução penal se desenrola por iniciativa do Ministério Público independentemente de manifestação do ofendido Antes da entrada em vigor das Leis nº 1371831 e nº 1377224 de 2018 as práticas que caracterizam a pornografia de revanche eram abarcadas pelos tipos penais da difamação ou injúria crimes contra a honra Se o fato ocorresse mediante a utilização de meio que facilitasse a divulgação ou em presença de várias pessoas o agente respondia com causa de aumento de pena Sob outra vertente a Lei Maria da Penha22 art 17 proibiu a aplicação de pena pecuniária e multa substitutiva aos crimes com violência SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 O tratamento da pornografia de vingança pelo ordenamento jurídico brasileiro 185 doméstica ou familiar contra a mulher e no art 41 vedou a aplicação dos institutos des penalizadores transação penal e suspensão condicional do processo da Lei de Juizados Especiais Criminais Lei nº 9099199537 O afastamento da possibilidade da aplicação das medidas despenalizadoras é questionado por vários segmentos da doutrina mormente diante das Teorias Minimalistas por exprimir uma demanda por sofrimento penal psíquico em detrimento de uma sanção moral ou patri monial38 Tais reflexões originamse a partir de intensas críticas ao sistema penal as quais denunciam a seletividade com que opera e por promover a inversão das suas próprias promessas de ressocialização demonstrando se a falsidade de seu discurso de igualdade humanidade e legalidade39 Tais teorias muitas vezes conflitam com os posicionamentos do Movimento Feminista Nessa seara Smaus40 refuta as Teorias Minimalistas e defende que o direito penal na tipificação de delitos contra a mulher consubstancia um instrumento na luta para a mudança da estrutura social patriarcal e que a capitulação penal dessas condutas é necessária na medida em que a criminalização de comportamentos vio lentos dos homens contra as mulheres juntamente com outras conquistas dos Movimentos Feministas ajuda a tornar públicos problemas que ocorriam na esfera privada e nela se mantinham velados Nesse sentido assenhoramonos dos dizeres de Gustav Radbrunch41 citados por Baratta42207 a melhor reforma do direito penal seria substituílo não por um direito penal melhor mas por qualquer coisa melhor que o direito penal Como ainda não é possível prescindir do direito penal que ele funcione como baliza jurídica de contenção dos excessos do poder punitivo e limitador da violência atinente ao gênero Nesse passo o Supremo Tribunal Federal em decisão vinculante Ação de Constitucionalidade 1943 entendeu pela cons titucionalidade dos dispositivos da Lei Maria da Penha22 que vedam a aplicação dos insti tutos despenalizadores da Lei nº 90999537 em crimes de violência doméstica e familiar contra a mulher A Lei Maria da Penha22 prevê a possibili dade de concessão de medidas protetivas de urgência adequadas ao caso concreto para a mulher em situação de violência domés tica e familiar art 22 parágrafo 1º cujo descumprimento configura o crime previsto no art 24A com pena de detenção de três meses a dois anos Todas as questões relacionadas com o direito e com a prática jurídica aqui debati das são insuficientes para alcançar a alme jada igualdade substancial entre mulheres e homens diante dos múltiplos aspectos do problema com raízes sociais e históricas se dimentadamente constituídas Para que se caminhe na direção da igualda de efetiva muito mais do que aprofundarse nas consequências jurídicas das diferenças de gênero fazse mister a adoção de políti cas públicas dirigidas à conscientização da sociedade em geral acerca das desigualdades ainda reinantes o que deverá ocorrer no amplo campo do debate político possibilitando levar se a efeito a educação de gênero bem como ações afirmativas em favor da mulher por meio de políticas públicas de gênero para melhor inserila no mercado de trabalho e no âmbito político com cotas O poder público precisa atentar para o de senvolvimento de agendas em prol da mulher propiciando atividades de capacitação pro fissional maior número de ofertas de vagas em estabelecimentos públicos de ensino para seus filhos inclusive e especialmente creches acesso à saúde e educação sexual reprodutiva e de gênero entre outros Logo na busca por uma sociedade melhor com arranjos mais pacificadores e mais iguali tários entre mulheres e homens não é possível se prescindir do direito posto que sua utiliza ção deve darse tendo como finalidade última a maior reflexão conscientização e educação da sociedade acerca das desigualdades de gênero SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 Rocha RLM Pedrinha RD Oliveira MHB 186 Considerações finais No presente artigo após contextualização do cenário social que permeia o aumento do número de casos de vingança pornográfica almejouse apresentar breve panorama acerca do tratamento da pornografia de vingança pelo ordenamento jurídico brasileiro Após rápida incursão pelo direito inter nacional viuse o tratamento do tema no Brasil Em destaque a proteção dada à dig nidade humana das vítimas de pornografia de vingança cujos direitos da personalidade sofrem prejuízos Na seara civil é garantido o direito à in denização pelo dano material ou imaterial decorrente da exposição não consentida de conteúdo íntimo Entre as várias espécies de prejuízos extra patrimoniais ressaltouse o dano existencial ou dano ao projeto ou plano de vida cuja au tonomia se defende em razão da intensidade dos efeitos advindos às vítimas Observouse que o Marco Civil da Internet permite maior agilidade na retirada do ma terial nocivo da rede mediante notificação pela vítima ao provedor acerca do conteúdo não autorizado Em âmbito penal no ano de 2018 foram rea lizadas alterações normativas acerca da porno grafia de vingança com as Leis nº 1371818 e nº 1377218 que criaram tipos penais específicos a alcançarem a vingança pornográfica os quais foram examinados Considerando todavia que as concepções de gênero foram histórica e socialmente cons truídas ao longo do tempo e são arraigadas no corpo social apenas alterações legislativas para criar tipos penais que resguardem direi tos das mulheres ou o aprofundamento dos operadores do direito nos estudos de gênero são insuficientes para o advento de um novo paradigma que se almeja O tema impõe a adoção de políticas pú blicas amplas e dirigidas a toda a socieda de mediante ações afirmativas em prol da mulher incremento da educação de gênero desenvolvimento de atividades de capacita ção profissional maior número de ofertas de vagas em estabelecimentos públicos de ensino para seus filhos garantia de acesso à saúde e educação sexual e reprodutiva tudo enfim para a efetivação da igualdade substancial entre homens e mulheres em um novo pacto para a superação da lógica binária dos gênero e que permita um novo olhar para as diferenças Colaboradores Rocha RLM 0000000263304162 Pedrinha RD 0000000290939083 e Oliveira MHB 0000000210784502 con tribuíram para concepção do estudo coleta e análise das informações preparação do manus crito revisão crítica do conteúdo e aprovação da versão final s Orcid Open Researcher and Contributor ID SAÚDE DEBATE RIO DE JANEIRO V 43 N ESPECIAL 4 P 178189 DEZ 2019 O tratamento da pornografia de vingança pelo ordenamento jurídico brasileiro 187 Referências 1 Sydow ST Castro ALC Exposição pornográfica não consentida na internet da pornografia de vingança ao lucro Belo Horizonte DPlácido 2017 2 Buzzi VM Mulheres na rede a pornografia de vin gança como instrumento de violência de gênero In Gostinski A Bispo A organizadoras Estudos femi nistas por um direito menos machista Florianópo lis Empório do Direito 2016 3 Silva AS Pinheiro RB Exposição que fere percepção que mata a urgência de uma abordagem psicosocioju rídica da pornografia de vingança à luz da Lei Maria da Penha Rev Fac Direito UFPR 2017 623243265 4 Batistella C Abordagens contemporâneas do concei to de saúde In Fonseca AF Dandrea Corbo AM O território e o processo saúdedoença Rio de Janei ro Fiocruz 2007 5 Heilborn ML Gênero sexualidade e saúde In Silva DM organizador Saúde sexualidade e reprodução compartilhando responsabilidades Rio de Janeiro UERJ 1997 6 Foucault M História da sexualidade a vontade de saber Rio de Janeiro Paz e Terra 2017 7 Sabadell AL Manual de sociologia jurídica Introdu ção a uma leitura externa do direito São Paulo Re vista dos Tribunais 2017 8 Baratta A O paradigma do gênero In Campos CH organizadora Criminologia e feminismo Porto Ale gre Sulina 1999 9 Saffioti H Gênero patriarcado e violência São Paulo Expressão Popular Fundação Perseu Abramo 2015 10 Bourdieu P A dominação masculina Rio de Janeiro Bertrand Brasil 2014 11 Pedrinha RD Sexualidade controle social e práticas punitivas do signo sacro religioso ao modelo científico médico higienista Rio de Janeiro Lumen Juris 2009 12 Deleuze G Conversações São Paulo Editora 34 1992 13 Bauman Z Amor líquido sobre a fragilidade dos la ços humanos Rio de Janeiro Jorge Zahar 2004 14 Debord G A sociedade do espetáculo S l eBookLi bris 2003 15 Beck U Giddens A Lash S Modernização reflexiva política tradição e estética na ordem social moder na Oeiras Celta 2000 16 Brasil Decreto nº 19841 de 22 de outubro de 1945 internet Promulga a Carta das Nações Unidas da qual faz parte integrante o anexo Estatuto da Corte Internacional de Justiça assinada em São Francisco a 26 de junho de 1945 Diário Oficial da União 23 Out 1945 acesso em 2018 mar 9 Disponível em http wwwplanaltogovbrccivil03decreto19301949 D19841htm 17 Organização das Nações Unidas Declaração Univer sal dos Direitos Humanos adotada e proclamada pela resolução 217 A III da Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948 internet aces so em 2018 mar 9 Disponível em httpsunesdoc unescoorgark48223pf0000139423 18 Brasil Constituição da República Federativa do Brasil internet Brasília DF Senado Federal 1988 acesso em 2018 set 15 Disponível em httpwwwplanal togovbrccivil03constituicaoconstituicaohtm 19 Brasil Decreto nº 4377 de 13 de setembro de 2002 internet Promulga a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de 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conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado acesso em 2019 fev 6 Disponível em http wwwplanaltogovbrccivil03Ato201520182018 LeiL13772htm 25 Silva JA Curso de Direito Constitucional Positivo 13 ed São Paulo Malheiros Editores 1996 Revisada 26 Tartuce F Manual de Direito Civil volume único 5 ed Rio de Janeiro Forense São Paulo Método 2015 Revisada Atualizada e Ampliada 27 Soares FR Dano existencial uma leitura da responsa bilidade civil por danos extrapatrimoniais sob a ótica da proteção humana dissertação 2007 Porto Ale gre Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul 2007 223 p 28 Brasil Lei nº 12965 de 23 de abril de 2014 inter net Estabelece princípios garantias direitos e de veres para o uso da Internet no Brasil Diário Oficial da União 24 Abr 2014 acesso em 2019 fev 6 Dis ponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03 ato201120142014leil12965htm 29 Brasil Lei nº 12965 de 23 de abril de 2014 inter net Estabelece princípios garantias direitos e de veres para o uso da Internet no Brasil Diário Oficial da União 24 Abr 2014 acesso em 2019 fev 6 Dis ponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03 ato201120142014leil12965htm 30 Prado LR Curso de direito penal brasileiro São Pau lo Revista dos Tribunais 2013 31 Brasil Lei nº 13718 de 24 de setembro de 2018 in ternet Altera o DecretoLei nº 2848 de 7 de dezem bro de 1940 Código Penal para tipificar os crimes de importunação sexual e de divulgação de cena de estupro tornar pública incondicionada a natureza da ação penal dos crimes contra a liberdade sexual e dos crimes sexuais contra vulnerável estabelecer causas de aumento de pena para esses crimes e de finir como causas de aumento de pena o estupro co letivo e o estupro corretivo e revoga dispositivo do DecretoLei nº 3688 de 3 de outubro de 1941 Lei das Contravenções Penais Diário Oficial da União 25 Set 2018 acesso em 2019 fev 6 Disponível em http wwwplanaltogovbrccivil03ato201520182018 leiL13718htm 32 Brasil Lei nº 8069 de 13 de julho 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