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Capítulo 02 A Teoria da Variação e Mudança Linguística noções básicas 23 do especialmente a variação fonológica na língua inglesa Seu grupo de pesquisa sediado na Universidade da PensilvâniaUSA tornouse o centro irradiador dessa nova e instigante abordagem da língua Fundamentos empíricos para uma teoria da mudança linguística Empirical foundations for a theory of language change No Brasil as pesquisas na área da Sociolinguística laboviana ti veram início na Universidade Federal do Rio de Janeiro na década de 1970 sob a orientação do professor Anthony Naro Desde então as li nhas de pesquisa que se ocupam da descrição de fenômenos variáveis no português do Brasil PB se multiplicaram espalhandose pelas dife rentes regiões do país Na Universidade Federal de Santa Catarina por exemplo temos o Projeto VARSUL Variação Linguística na Região Sul do Brasil que conta com um banco de dados de fala de informantes da Região Sul Paraná Santa Catarina e Rio Grande do Sul do país para o desenvolvimento de pesquisas sociolinguísticas 22 Conceitos fundamentais 221 Concepção de língua como sistema heterogêneo Na abordagem laboviana vale lembrar que o fato de a variação ser inerente às línguas está ligado diretamente à noção de heterogeneidade as línguas são sistemas heterogêneos e não homogêneos conforme pos tulam Saussure e Chomsky No entanto como ainda estamos falando em sistema somos levados a assumir que a variação pode ser sistematizada Não se trata portanto de um caos linguístico Uma evidência de que a he terogeneidade é organizada ou sistematizada é o fato de os indivíduos de Variação É o processo pelo qual duas formas podem ocorrer no mesmo con texto linguístico com o mesmo valor referen cial ou com o mesmo valor de verdade ie com o mesmo signifi cado Dois requisitos devem pois ser cum pridos para que ocorra variação as formas envolvidas precisam i ser intercambiáveis no mesmo contexto e ii manter o mesmo significado Falaremos mais sobre esse Projeto na Unidade D Sociolinguística 24 uma comunidade se entenderem se comunicarem apesar das variações ou diversidades linguísticas A partir desse postulado teórico a Teoria da Variação e Mudança fornece um instrumental metodológico que permite analisar e sistematizar os diferentes tipos de variação linguística Então mesmo que a princípio se possa pensar que heterogeneidade implica ausência de regras a língua é dotada de heterogeneidade estru turada portanto há regras sim Só que enquanto a língua concebida como sistema homogêneo contém somente regras categóricas ou obri gatórias ou invariantes ie que sempre se aplicam da mesma maneira por todos a língua concebida como um sistema heterogêneo compor ta ao lado de regras categóricas também regras variáveis Um exemplo de regra que é categórica no português é a da colo cação do artigo em relação ao nome que ele determina o artigo sem pre aparece antes do nome assim dizemos a casa mas nunca casa a O fenômeno cujo comportamento a Sociolinguística busca des vendar são as regras variáveis da língua as regras que permitem que em certos momentos em certos contextos linguísticos e sociais fale mos de uma forma e em outros contextos de outra forma O apara to teórico e metodológico da Sociolinguística surgiu e até hoje vem sendo construído para que com cada vez mais precisão essa reali dade até então posta de lado nos estudos linguísticos seja compreen dida levandose em conta a influência não só dos elementos internos da língua mas dos elementos externos a ela o componente social mencionado acima 222 Variedade variação variável variante Mas que tal agora abordarmos alguns exemplos reais de variação no português brasileiro e vermos como esses princípios se aplicam a uma análise concreta de dados Aproveitaremos o ensejo para introduzir a você mais alguns conceitos básicos relacionados à pesquisa sociolinguística Um fenômeno variável bastante perceptível em nosso dia a dia de falantes do português é o da alternância entre os pronomes pessoais tu e você para a expressão da segunda pessoa do singular Muitos de vocês já devem ter se dado conta de que por Talvez você já tenha se dado conta A noção de regra variável implica que não existe variação livre como se vê numa abordagem estrutu ralista Uma regra variável relaciona duas ou mais formas linguísticas de modo que quando a regra se aplica ocorre uma das formas e quando não se aplica ocorrem as outras formas A apli cação ou não das regras variáveis é condicionada por fatores do contexto social eou linguístico Os aspectos metodoló gicos da Sociolinguística serão abordados na Unidade D O mesmo você que muitos ainda insistem em chamar de pronome de tratamen to listandoo no mesmo rol de vossa excelência e vossa santidade Capítulo 02 A Teoria da Variação e Mudança Linguística noções básicas 25 de que dependendo da origem de uma pessoa ou por vezes do grau de formalidade com o qual ela nos trata podemos ouvila se referindo a nós tanto por tu quanto por você Se ainda não percebeu preste atenção quando alguém de outra região do país é entrevistado na TV ou mesmo quando você tu conversa online com os tutores de uma disciplina ou com seus colegas de curso As formas são diferentes mas não há dúvida de que ambas estão sendo usadas com o mesmo propósito o de referir a segunda pessoa do singular O que ocorre aí nada mais é do que o fenômeno que vimos discu tindo até agora a variação linguística Para um sociolinguista o fato de em uma comunidade ou mesmo na fala de um indivíduo convive rem tanto a forma tu quanto você não pode ser considerado marginal acidental ou irrelevante em termos de pesquisa e de avanço de conhe cimento Como já vimos a variação é inerente às línguas e não compro mete o bom funcionamento do sistema linguístico nem a possibilidade de comunicação entre falantes De fato palavras ou construções em va riação em vez de comprometerem o mútuo entendimento são ricas em significado social e têm o poder de comunicar a nossos interlocutores mais do que o significado representacional pelo qual disputam As di ferentes formas que empregamos ao falar e ao escrever dizem de certa forma quem somos dão pistas a quem nos ouve ou lê sobre i o local de onde viemos ii o quanto estamos inseridos na cultura letrada do minante de nossa sociedade iii quando nascemos iv com que grupo nos identificamos entre várias outras informações É essa realidade acima descrita que o sociolinguista tenta captar sem qualquer tipo de ideia preconcebida tanto como linguista acredi tando por exemplo que a variação é mero acidente na língua que não pode ser estudada com rigor e que o sistema a ser descrito está num plano mais abstrato que o da fala quanto como cidadão acreditando por exemplo que um falante que diz nós vai tem menos capacidade de pensar e de se expressar do que o falante que diz nós vamos Tratase do que chama mos de variação diatópi ca ou regional e variação estilística conceitos que serão trabalhados na Unidade B E é essa postura aberta à pesquisa e isenta de pre conceitos como veremos uma das maiores contri buições que a Sociolin guística tem a nos trazer quando trabalhamos com o ensino de língua mater na ou quando tentamos compreender e comba ter o preconceito linguís tico em nossa sociedade Sociolinguística 26 Esse é o olhar sobre a língua e sobre o fenômeno da variação que um sociolinguista adota ao trabalhar com dados reais produzidos por fa lantes reais em uma comunidade real Seu objetivo é descobrir quais os mecanismos que regulam a variação como ela interage com os outros elementos do sistema linguístico e também da matriz social em que ocorre e como que ela pode levar à mudança na língua Nas palavras da sociolinguista brasileira Maria Cecilia Mollica 2008 p 11 Cabe à Sociolinguística investigar o grau de estabilidade ou de mutabilidade da variação diagnosticar as variáveis que têm efei to positivo ou negativo sobre a emergência dos usos linguísticos alternativos e prever seu comportamento regular e sistemático E quais são os meios pelos quais chegamos a esses objetivos Bem a pesquisa sociolinguística envolve etapas metodológicas bastante refina das com o fim de melhor colheremse os dados que servirão como fonte das análises e de melhor tratálos para que cheguemos a resultados e con clusões confiáveis A Unidade D deste livrotexto será dedicada exclusi vamente a isso motivo por que suspenderemos por ora essa discussão Retomemos nosso exemplo de variação para estabelecermos uma distinção importante no que concerne à terminologia empregada nos estudos de variação a distinção entre variável e variantes No exemplo acima em que mencionamos a variação entre os pronomes tu e você comumente chamamos de variável o lugar na gramática em que locali zamos variação de forma mais abstrata no caso a variável com a qual estamos lidando é a da expressão pronominal da segunda pessoa do sin gular Chamamos de variantes dessa variável as formas individuais que disputam pela expressão da variável no caso os pronomes tu e você Outro exemplo de variável no sistema pronominal do PB é a ex pressão da primeira pessoa do plural cujas variantes são os pronomes nós e a gente Lembrese variável corresponde a um aspecto ou categoria da língua que se encontra em variação variantes são as formas individuais que concorrem em uma variável Existe ainda o conceito de variedade que não deve ser confundido com o de variável ou o de variante variedade representa a fala de uma comuni dade de modo global considerandose todas as suas particularidades tanto categóricas quanto variáveis é o mesmo que dialeto ou falar Capítulo 02 A Teoria da Variação e Mudança Linguística noções básicas 27 Em um caso de variação as formas variantes costumam receber valores distintos pela comunidade Trabalharemos com o significado social das variantes logo mais mas por enquanto vale estabelecermos a diferença entre as variantes padrão e não padrão As variantes pa drão são grosso modo as que condizem com as prescrições dos manuais de norma padrão já as variantes não padrão se afastam desse modelo Mesmo que não seja a variante mais usada por uma comunidade a va riante padrão é em geral a variante de prestígio enquanto a não pa drão é muitas vezes estigmatizada por essa comunidade pode haver comentários negativos à forma ou aos falantes que a empregam Ade mais as variantes padrão tendem a ser conservadoras fazendo parte do repertório linguístico da comunidade há mais tempo ao passo que as variantes não padrão tendem a ser inovadoras na comunidade Mais um aspecto importante relacionado à variação é o fato de que esse fenômeno não está limitado a um dos níveis da gramática encon tramos variação no nível fonológico bem como no morfológico no sin tático no lexical e no discursivo No nível fonológico note que podemos realizar certos ditongos tan to de maneira plena quanto reduzida como em caixacaxa e em outro otro no morfológico encontramos variação por exemplo na marcação do infinitivo dos verbos andarandá beberbebê etc na sintaxe encon tramos variação na realização das orações relativas Esse é o livro de que eu gosto Esse é o livro que eu gosto Esse é o livro que eu gosto dele no discursivo um estudo com dados de Florianópolis VALLE 2001 mostra o uso alternado dos marcadores discursivos sabe não tem e entende na variável requisito de apoio discursivo no nível do léxico vem logo à mente o exemplo do aipimmandiocamacaxeira com distintos traços regionais como há vários outros Em suma como vimos constatando a variação linguística não só é um fenômeno inerente às línguas naturais mas também se manifesta em qualquer nível de análise que se tome Agora que já tratamos dos conceitos de variável e de variantes e que vimos como estas se encontram em todos os níveis da gramática passemos ao exame das armas de que se equipam as formas varian tes de uma variável na disputa pela expressão de um significado os condicionadores linguísticos e sociais Ocorrem ainda variáveis no que podemos chamar de interfaces de níveis como o nível morfossintá tico e o morfofonológico Mais sobre isso será discu tido na Unidade B Apresentamos aqui ape nas alguns exemplos já que a Unidade B trabalha rá com essa dimensão da variação linguística Sociolinguística 28 Não eles não são produtos para o cabelo Os condicionadores em um caso de variação são os fatores que regulam que condicionam nossa escolha entre uma ou outra variante É o controle rigoroso desses fatores que permite ao linguista sugerir em que tipo de ambiente tanto linguís tico quanto extralinguístico uma variante tem maior probabilidade de ser escolhida em detrimento de suas rivalis Os condicionadores ajudam o analista a delimitar quais exatamente são os contextos mais propícios para a ocorrência das variantes em es tudo Eles são divididos em dois grandes grupos em função de serem mais ligados a aspectos internos ao sistema linguístico ou externos a ele No primeiro caso são também chamados de condicionadores lin guísticos exemplos são a ordem dos constituintes a categoria das pa lavras ou construções envolvidas aspectos semânticos etc No segundo caso são também chamados de condicionadores extralinguísticos ou sociais entre eles os mais comuns são o sexogênero o grau de escola ridade e a faixa etária do informante Com o controle refinado da frequência de ocorrência de formas variantes e em função dos condicionadores linguísticos e sociais sele cionados para nossa análise podemos traçar um quadro respaldado por resultados quantitativos precisos de quais condicionadores favorecem ou desfavorecem a ocorrência das formas em consideração Para que vejamos isso de modo mais claro retomemos nosso exem plo da variação entre tu e você Que aspectos do próprio sistema linguís tico eou da sociedade que o emprega poderiam influenciar na escolha de uma das duas formas Como já adiantamos a região de origem do falante parece ser deci siva nesse caso há diversas regiões do país cujos falantes nativos falam apenas você outras em que o tu é predominante e outras em que as duas formas convivem havendo uma diferenciação no uso por outros fatores o grau de intimidade entre os interlocutores por exemplo Temos aí dois condicionadores externos ao sistema linguístico os quais como já deve ter ficado claro de modo algum são rejeitados em uma pesquisa sociolinguística pelo contrário eles são mais possibilidades disponíveis ao analista para que este desvende os mecanismos da variação Condicionadores lin guísticos e sociais Os condicionares lin guísticos e sociais são também tratados por variáveis indepen dentes ou grupos de fatores enquanto a variável propriamente dita também pode ser tratada por variável dependente Capítulo 02 A Teoria da Variação e Mudança Linguística noções básicas 29 Bem e quanto aos fatores intrínsecos ao sistema linguístico Que condicionadores internos poderíamos controlar em um estudo dessa variável Um dos diversos estudos sobre a variação entre tu e você no português do Brasil o de Lucca 2005 controlou como fatores inter nos por exemplo o tempo e o modo do verbo a que o pronome se refere e o tipo semântico do pronome se genérico ou específico Pesquise a Pense um pouco em como você percebe esse caso de variação tu você e sugira outros condicionadores linguísticos e sociais para o emprego de cada forma b Pense também em outras variáveis e sugira condicionadores rele vantes para a escolha de cada variante c Compartilhe suas reflexões com os colegas É essa em suma a postura investigativa que se adota no trabalho com a Sociolinguística Com ela identificase uma variável no uso cor rente da língua de uma comunidade identificamse a seguir as varian tes dessa variável a partir das hipóteses que elaboramos quanto aos fa tores que possam estar em jogo no favorecimento ou desfavorecimento das variantes prosseguese à coleta e posteriormente à análise de da dos para a confirmação ou refutação de nossas hipóteses iniciais Mas essa é somente a síntese Como você já deve estar percebendo uma pes quisa sociolinguística deve ir muito além disso se quiser efetivamente esclarecer um pouco mais sobre a complexa relação que há entre língua e sociedade através do estudo da variação e da mudança linguística A Sociolinguística assume portanto que existe uma forte correla ção entre os mecanismos internos da língua e fatores externos a ela tan to de uma ordem micro envolvendo nosso grau de contato e de identi ficação com os grupos com os quais interagimos no dia a dia quanto de uma ordem macro relacionada a uma estratificação social mais ampla Sociolinguística 30 Síntese da seção É necessário aprender a ver a linguagem tanto de um ponto de vis ta diacrônico como de um ponto de vista sincrônico como um ob jeto possuidor de heterogeneidade sistemática Isso significa que Ӳ a língua é um sistema heterogêneo dotado de variação Ӳ sendo um sistema a língua é constituída por um conjunto estru turado de regras Ӳ além de regras categóricas existem regras variáveis que são inerentes ao sistema Ӳ as regras variáveis podem ser mais ou menos aplicadas depen dendo do ambiente linguístico eou social Ӳ explicações para as escolhas dos falantes por uma ou outra va riante linguística são buscadas pelo controle de fatores condi cionadores variáveis independentes Ӳ a natureza do sistema é probabilística o que pressupõe o em prego de técnicas quantitativas para a observação das regulari dades que o regem Nas seções a seguir continuaremos tratando de alguns conceitos básicos da Sociolinguística Variacionista Entram em jogo a partir de agora o significado social das formas variantes os diferentes tipos de variáveis que podemos ter a partir desse significado a um tanto polê mica definição de comunidade de fala e o modo como todo o arca bouço teórico que vimos apresentando se presta a uma questão bastante pertinente que escapa às fronteiras da pesquisa acadêmica e lança luz sobre um problema social a do preconceito linguístico 23 Significado social das formas variantes Prosseguimos nosso contato inicial com a Sociolinguística reto mando uma questão que já foi apresentada a você há alguns semestres na disciplina de Estudos Gramaticais Tratase do valor ou significado Capítulo 02 A Teoria da Variação e Mudança Linguística noções básicas 31 social das formas variantes Repetimos aqui o mesmo exemplo daquela disciplina a fim de que tenhamos um ponto de partida conhecido para nossas reflexões Considere as sentenças Tu vai sair A gente vamos sair Nós vai sair O que difere as três quanto à ocorrência de um fenômeno variável A princípio nada pois em todas há manifestações do mesmo fenôme no o da concordância variável entre verbo e sujeito No entanto algo parece nos dizer que elas não são totalmente idênticas na manifestação desse fenômeno para muitos pelo menos para muitos oriundos da região Sul do país as duas últimas sentenças são menos aceitáveis que a primeira soam mais erradas Isso reflete uma face da variação pela qual a Sociolinguística também se interessa a do significado social das variantes A concordância tu vai apesar de também não fazer parte da variedade padrão do português em certas regiões já se encontra am plamente difundida por diversas camadas socioeconômicas Já a gente vamos e nós vai ainda se encontram fortemente associadas a grupos de falantes específicos em nossa sociedade nomeadamente os pertencen tes a camadas com baixa renda e pouca escolaridade Ou seja não há nada intrínseco ao fenômeno de variação observável nos três exemplos acima que faça com que um seja melhor que o outro O que distingue as sentenças é o valor atribuído a um estrato da sociedade que usa ou que imaginamos que usa certas construções e não outras Essa confusão entre fazer julgamento à língua e julgamento ao falante é um dos fatores que permitem a existência e a perpetuação do pre conceito linguístico em nossa sociedade Com o falso argumento de que uma construção é em si errada abrese espaço para que taxemos de ignorantes entre outros adjetivos os falantes que fazem uso dessa construção Uma das contribuições da Sociolinguística é justamente a de desmascarar esse argumento incontáveis pesquisas já confirmaram que não há nada nas formas variáveis de uma língua que permita afir mar que umas são melhores ou mais corretas do que as outras Sociolinguística 32 Segue daí portanto que o julgamento ou em termos mais claros o preconceito é social e geralmente parte de cima para baixo ou seja das camadas dominantes econômica e culturalmente para as cama das dominadas Dizer que tal pessoa ou tal grupo é ignorante por que fala de uma forma e não de outra é apenas mais um mecanismo de afirmação e de perpetuação desse preconceito que se manifesta como preconceito linguístico mas que nunca deixou de ser social Felizmente não é apenas para a manutenção do preconceito lin guístico que se prestam os significados sociais da variação Vimos ante riormente que as formas da língua não veiculam apenas seu significado denotacional elas denunciam em grande medida quem somos a região de onde viemos nossa idade nossa inserção na cultura dominante atra vés do grau em que dominamos a variedade padrão nossas atitudes em relação a determinados grupos E nada mais adequado e interessante que incorporar o valor do significado social de formas ao programa de estudos da Sociolinguística Como veremos melhor mais adiante o prestígio ou o estigma que uma comunidade associa a uma determinada variante tem o poder de acelerar ou de barrar uma mudança na língua Essa não é uma afirma ção banal Esperamos que ainda lhe esteja fresca na memória a breve história dos estudos linguísticos que traçamos no Capítulo 1 Até pou cas décadas atrás afirmavase que a mudança não era passível de estudo rigoroso que não era perceptível e muito menos se considerava impor tante buscar fora do sistema possíveis explicações para esse processo Na abordagem sociolinguística como podemos acompanhar o quadro é justamente o oposto 231 Estereótipos marcadores e indicadores Vamos adiante com nossas reflexões Labov reconhece que há jul gamentos sociais conscientes e inconscientes sobre a língua Com base no nível de consciência que o falante tem sobre determinada variável o autor distingue três tipos de elementos Capítulo 02 A Teoria da Variação e Mudança Linguística noções básicas 33 Ӳ Os estereótipos são traços socialmente marcados de forma consciente Alguns estereótipos podem ser estigmatizados so cialmente o que pode conduzir à mudança linguística rápida e à extinção da forma estigmatizada Outros estereótipos podem ter um prestígio que varia de grupo para grupo podendo ser positivo para alguns e negativo para outros Exemplos de estereótipos Ӳ O fonema e átono final pronunciado como e e não como como em leite quente forma encontrada na variedade paranaense e de parte do oeste catarinen se e gaúcho Ӳ As consoantes d e t pronunciadas como d e t e não como e diante de i como em bom dia titia formas típicas de variedades nordestinas Ӳ O fonema l de encontros consonantais pronunciado como r como em craro Cráudia forma associada a variedades rurais eou pouco escolarizadas e portan to socialmente estigmatizada como vimos no texto de apresentação da disciplina Os estereótipos são comumente explorados com certo exagero na composição de personagens de programas humorísticos em piadas e mesmo em novelas e em filmes Ӳ Os marcadores correlacionamse às estratificações sociais e estilísticas e podem ser diagnosticados em testes subjetivos São traços linguísticos social e estilisticamente estratificados que podem ser diagnosticados em certos teste de atitude ava liação embora o julgamento social seja inconsciente Os resul tados de alguns testes têm mostrado que apesar de os falantes diagnosticarem certos usos como feios ou errados isso não significa que não fazem uso deles Muitas vezes esse uso se dá inconscientemente Na Unidade D serão apre sentados a você alguns teste de atitude avalia ção subjetiva Sociolinguística 34 Exemplos de marcadores O uso alternado dos pronomes tu e você verificado em certas regiões do Brasil apresenta variação estilística e social enquanto tu costuma ser usado para referir um interlocutor íntimo familiar você é usado como pronome de segunda pessoa quando o interlocutor é um desco nhecido ou uma pessoa mais velha ou ainda tu é usado em registros mais informais e você em registros mais formais O uso desses prono mes em geral não é estigmatizado mas está correlacionado a vari áveis estilísticas grau de intimidade por exemplo e sociais como a faixa etária dos falantes Tratase pois de marcadores Ӳ Os indicadores são elementos linguísticos sobre os quais ha veria pouca força de avaliação podendo haver diferenciação social de uso dessas formas correlacionada à idade à região ou ao grupo social mas não quanto a motivações estilísticas Em outras palavras indicadores são traços socialmente estratifica dos mas não sujeitos à variação estilística sem força avaliativa com julgamentos sociais inconscientes Exemplos de indicadores Entre os indicadores podemos inserir por exemplo a monotonga ção dos ditongos ey e ow no português falado atual em palavras como peixepexe feijãofejão couvecove courocoro isenta de valor social e estilístico Reflita A depender da região uma variante pode ser interpretada tanto como marcador quanto como estereótipo Exemplos disso são as formas tu foi e vou ir No Rio Grande do Sul tratase de marcadores e não de estereó tipos pois não são estigmatizadas e marcam identidade local Contudo essa certamente não é a situação em outras localidades Como essas formas são avaliadas em sua região Capítulo 02 A Teoria da Variação e Mudança Linguística noções básicas 35 A classificação de variáveis em estereótipos marcadores e indica dores é uma ferramenta relevante para a Sociolinguística pois nos auxi lia a compreender por exemplo o processo da mudança linguística e da escorregadia definição de uma comunidade de fala esta será tratada na seção 24 e aquela na Unidade C 232 A questão do preconceito linguístico Vimos até agora como a Sociolinguística surgiu em oposição a cer tos princípios dos modelos hegemônicos da linguística do século XX como através principalmente da figura de William Labov a regulari dade da variação e da mudança linguística pôde ser comprovada e que o estudo dessa regularidade só teria a ganhar se passassem a ser consi derados fatores não só internos mas externos à língua Assim a partir da inserção da Sociolinguística no quadro mais amplo de interesses da linguística fica atestada a íntima relação que existe entre língua e socie dade E é por causa dessa constatação a de que o estudo da língua não pode prescindir até certo ponto do da sociedade que o acúmulo em teoria e em pesquisas da Sociolinguística pode nos ajudar a compreen der melhor um fenômeno social o preconceito linguístico Tratase do que já adiantamos acima dar vida ao preconceito lin guístico é julgar falantes ou grupos inteiros em uma comunidade pelas formas linguísticas que empregam e essas formas geralmente são as que se afastam do padrão O argumento é que há em uma língua cons truções corretas e incorretas melhores e piores e que os falantes que erram em suas escolhas ao falar e ao escrever são consequentemente também imperfeitos pessoas que ou desprezam ou que têm dificuldade em atingir o nível em que só se empregam as construções aceitáveis corretas A aceitação dessa ideia e da noção de erro no uso linguístico que está por trás dela autoriza a exclusão social gerada pelo preconceito linguístico uma exclusão que em muitos casos é bastante dura Entre os mitos que compõem o discurso do preconceito linguístico está o de que o português é uma língua muito difícil mesmo para seus falantes nativos o de que seu domínio é uma tarefa árdua atingida ape nas por poucos intelectuais professores e escritores o de que por essa razão a maioria de nós brasileiros não sabe português ou o sabe de Sociolinguística 36 modo parcial incompleto e incorreto Ora nenhum de nós precisa ir muito longe para falsear todos esses mitos que alimentam o preconceito e o bolso de muitos autores de obras do tipo não erre mais Com tudo que já foi trabalhado nesta disciplina e ao longo do cur so temos base suficiente para defender que o português não pode ser uma língua difícil para seus falantes nativos simplesmente porque essa é a língua materna deles e a eles deve ser creditado todo o conheci mento das regras que a compõem O que se defende como língua aí é a norma padrão do português aquele ideal de língua prescrito nas gra máticas e nos livros didáticos adotado pelo ensino tradicional de língua materna e por diversos espaços na mídia Esquecemse esses espaços infelizmente da realidade heterogênea da língua de como ela é plural o suficiente para dar conta dos mais diversos matizes semânticos prag máticos e sociais de nossa realidade Lembrandonos do conceito de significado social dos itens da lín gua podemos imaginar que em uma sociedade estratificada em classes como a nossa mesmo que o preconceito não fosse amparado e difundido pelo ensino e pela mídia ainda assim talvez houvesse algum tipo de va loração social estigmatizadora sobre as formas empregadas pelas classes mais baixas ou por quem não teve acesso à escolarização plena Contu do o preconceito linguístico vigora firme e sem ser percebido como tal em nossa sociedade e muitos passam suas vidas acreditando que de fato não são capazes de se expressar que falam uma língua toda errada e que nunca terão acesso a alguns de seus direitos mais básicos como cida dãos como o direito à justiça à inclusão e à livre defesa de suas posições Nesse quadro em que lugar somos colocados nós especialistas no estudo da linguagem Estamos em um lugar que nos permite saber o que acontece através da disseminação do preconceito linguístico e quais os mecanismos pelos quais ele se manifesta Agora o que podemos fazer com esse conhecimento Este não é um livrotexto de política não podemos nem quere mos que esta introdução à Sociolinguística se destine a qualquer tipo de militância Entretanto fazemos a você um convite à reflexão princi palmente neste momento em que lidamos com esta subárea dos estudos linguísticos que se detém na complexa relação entre língua e sociedade Releia sobre o conceito de norma e sobre seu papel como conteúdo do ensino de língua portuguesa no seu livrotexto de Estudos Gramaticais Capítulo 02 A Teoria da Variação e Mudança Linguística noções básicas 37 Para refletir O conhecimento que temos acumulado sobre a sistematicidade da va riação nas línguas e sobre os danos ao indivíduo e a camadas inteiras de uma comunidade por conta da valoração social que recai sobre for mas variantes não nos torna equipados para uma postura como pro fessores e como cidadãos mais aberta à heterogeneidade da língua e em último grau da sociedade De que modo isso poderia se efetivar 24 As noções de comunidade de fala e de redes sociais A Teoria da Variação e Mudança trata da estrutura e evolução da língua dentro do contexto social da comunidade de fala ou seja é nes se espaço que se dá a interação entre língua e sociedade Logo é a co munidade de fala e não o indivíduo que interessa mais ao pesquisador sociolinguista De acordo com Labov é na comunidade de fala que a variação e a mudança tomam lugar Cumpre então tentarmos definir esse termo Ocorre que na busca por uma conceituação se percebe que por um lado não há um consenso entre os estudiosos da área acerca do assunto e por outro não se trata de uma noção fácil de ser caracteri zada Vamos nos ater aqui às definições de dois autores Labov e Guy Segundo Labov uma comunidade de fala não pode ser concebida como um grupo de falantes que usam todos as mesmas formas ela é mais bem definida como um grupo que compartilha as mesmas normas a respeito da língua 2008 1972 p 188 Ainda de acordo com o autor os membros de uma comunidade de fala compartilham um conjunto comum de padrões normativos mesmo quando encontramos variação altamente estratificada na fala real LABOV 2008 1972 p 225 Das afirmações acima depreendemos que o principal critério labo viano para definir comunidade de fala não é o uso linguístico compar tilhado pelos falantes mas suas atitudes semelhantes diante dos fatos linguísticos Nesse caso é preciso considerar que a uniformidade das normas compartilhadas pelo grupo ocorre quando a variável linguís Sociolinguística 38 tica possui marcas sociais evidentes aos falantes Isso significa que eles devem ter consciência desses usos e ser capazes de emitir juízos de va lor sobre as formas linguísticas variáveis Normalmente ao grupo de prestígio cuja fala é dominante na escola no trabalho na mídia etc são atribuídos valores positivos ex a fala é bonita correta etc ao grupo socialmente desprestigiado em contrapartida costumam ser vin culados valores negativos ex a fala é feia errada etc Essa atribuição consciente de um valor social às formas da língua define algo que vimos há pouco os estereótipos Por isso a essas alturas você já deve estar se perguntando o seguinte As normas em relação à língua que são compartilhadas pelos falantes só dizem respeito aos es tereótipos Uma comunidade de fala é delimitada com base em estereó tipos E quanto às variáveis que não são necessariamente reconhecidas pelos falantes Essas indagações são bastante pertinentes pois tocam num ponto relativamente frágil da noção laboviana de comunidade de fala Bem vimos na seção 231 que apesar de os estereótipos serem mar cados com uma valoração social consciente os marcadores também são de certa forma avaliados na matriz social Assim podemos inferir que as normas compartilhadas pelos falantes se associam aos estereótipos e aos marcadores os quais podem ser percebidos pelos falantes e identificados por meio de técnicas que testam a avaliação subjetiva da língua Considerando a uniformidade do comportamento dos falantes quanto a normas sociais em relação à língua Labov busca uma certa homogeneidade na definição de comunidade de fala já que ela não vai ser caracterizada pelas regras linguísticas presentes na fala dos indivídu os as quais são altamente variáveis e sim pelas atitudes dos falantes em relação às regras e formas linguísticas que são mais uniformes Figueroa 1994 faz uma crítica ao modelo laboviano afirmando que a falta de uma vinculação clara entre indivíduo e comunidade de fala tor na difícil a observação dos dados linguísticos pois embora eles sejam provenientes de falas individuais o comportamento linguístico deve na proposta de Labov ser visto no grupo De fato na teoria laboviana o in divíduo é um ser estratificado isto é um tipo social caracterizado por um conjunto de fatores sexo idade escolaridade profissão etc Assim inte ressa menos ao pesquisador sociolinguista se o informante que fornece os Essa questão do valor social das formas linguísti cas já vista nesta Unidade será ainda retomada mais adiante na Unidade C quando for apresentado o princípio da avaliação Capítulo 02 A Teoria da Variação e Mudança Linguística noções básicas 39 dados é João Maria ou José o que interessa mais é identificar o tipo social indivíduo do sexo masculino situado na faixa etária de 26 a 40 anos com grau de escolaridade correspondente ao Ensino Médio nascido e residen te na zona urbana da cidade tal ou indivíduo do sexo feminino com ida de entre 15 e 25 anos com nível de escolaridade fundamental nascido e residente na zona rural da cidade tal Em outras palavras os indivíduos são identificados por pertencerem a determinadas células sociais Outras questões são suscitadas em relação ao modelo laboviano como a seguinte Existe um número determinado de formas linguísticas variáveis frente às quais os falantes teriam uma atitude uniforme que per mite a identificação de uma comunidade de fala Essa questão e aquelas anteriormente levantadas mostram a dificuldade que encontramos na ope racionalização da noção de comunidade de fala nos moldes labovianos Percebendo as dificuldades ligadas a essa noção o sociolinguista Gregory Guy parte da concepção laboviana de comunidade de fala e a amplia Guy 2001 considera que a comunidade de fala se constitui a partir de três critérios 1 Os falantes devem compartilhar traços linguísticos que sejam diferentes de outros grupos 2 Devem ter uma frequência de comunicação alta entre si 3 Devem ter as mesmas normas e atitudes em relação ao uso da linguagem Como se pode notar apenas o terceiro critério acima coincide com a proposta de Labov Guy amplia os elementos caracterizadores de uma comunidade de fala ao considerar também o compartilhamento de tra ços linguísticos identificadores de um grupo social e a frequência de comunicação entre os falantes Em síntese a noção de comunidade de fala recobre tanto aspec tos sociais quanto linguísticos pois envolve atitudesnormas sociais compartilhadas pelos falantes que por sua vez compartilham ca racterísticas linguísticas que os diferem de outros grupos sociais Essa propriedade do mo delo laboviano é central na composição de bancos de dados de fala e na metodologia da pesquisa sociolinguística Trabalha remos mais com a estrati ficação da comunidade de fala na Unidade D Sociolinguística 40 Não obstante os problemas apontados no que se refere a estabelecer as fronteiras de uma comunidade de fala essa noção tem sido utilizada nas pesquisas sociolinguísticas Por exemplo na cidade de Florianópo lis SC o Projeto VARSUL dispõe de entrevistas realizadas com infor mantes nascidos e residentes na zona urbana de Florianópolis e também com informantes nascidos e residentes no Ribeirão da Ilha e na Barra da Lagoa duas comunidades pesqueiras não urbanas com caracterís ticas sóciohistóricas e geográficas diferenciadas Nesse caso dispomos de dados linguísticos de três comunidades de fala em Florianópolis Por outro lado se tomarmos amostras de fala de indivíduos de Curitiba PR Florianópolis SC e Porto Alegre RS também estaremos com parando três comunidades de fala só que dessa vez correspondentes às capitais da região Sul do Brasil e assim por diante A pesquisa de campo sobre a fala das comunidades traz importantes contribuições para a descrição do português brasileiro pois podemos ir compondo o mosaico que representa os diferentes falares à medida que novas pesquisas vão sendo feitas nas diferentes regiões Vimos acima que um dos critérios considerados por Guy é a fre quência de comunicação alta ou baixa entre os falantes Esse critério remete à ideia de redes sociais noção que apresentamos a seguir to mando como referência os trabalhos de Milroy Redes sociais são redes de relacionamento dos indivíduos estabe lecidas na vida cotidiana Essas redes variam de um indivíduo para ou tro e são constituídas por ligações de diferentes tipos envolvendo graus de parentesco amizade ocupação ambiente de trabalho etc Quanto maior o número de pessoas que se conhecem umas às outras numa certa rede mais alta será a densidade dessa rede quanto menor o número de pessoas mais baixa será a densidade da rede Os indivíduos que se rela cionam entre si em diversas situações ex parentes e vizinhos parceiros no trabalho e no lazer estabelecem redes multiplexas já os indivíduos que se relacionam de uma única maneira estabelecem redes uniplexas A noção de redes tem sua origem na área da antropologia social sendo dependente das estruturas social econômica e política mais am plas Uma análise sociolinguística baseada em redes sociais procura cap tar a dinâmica dos comportamentos interacionais dos falantes Pesquisas Lesley Milroy é uma socio linguista americana que se interessa por aspectos dialetológicos e ideológi cos de variedades urbanas e rurais com ênfase na noção de redes sociais Capítulo 02 A Teoria da Variação e Mudança Linguística noções básicas 41 apontam que redes de alta densidade e multiplexas tendem a manter seu dialeto e a se mostrar resistentes à influência de valores externos em ra zão dos fortes laços de solidariedade existentes entre os indivíduos e da identificação dos mesmos com os valores sociais do grupo Assim as re des sociais densas são vistas como fatores conservadores fortes freando a mudança linguística O contrário ocorre com as redes sociais frouxas À ideia de rede social se associam também os conceitos de localis mo e mobilidade O localismo tem a ver com o sentimento do indivíduo em relação ao local em que vive ele o valoriza socialmente demons trando um sentimento de pertencer àquele lugar reforçando valores culturais e linguísticos da comunidade Já a mobilidade diz respeito ao grau de deslocamento dos indivíduos a partir de seu local de origem Quanto maior for a mobilidade mais os indivíduos estarão sujeitos a adotar valores de outros grupos A utilização de redes sociais possibilita o estudo de pequenos gru pos sociais como grupos étnicos minoritários migrantes populações rurais etc favorecendo a identificação das dinâmicas sociais que moti vam a mudança linguística Labov também reconhece a importância de se trabalhar com re des sociais salientando aspectos da metodologia utilizada realização de várias entrevistas individuais participação do pesquisador na esfera so cial do grupo e perguntas individuais sobre as redes sociais de relações desses falantes Segundo o autor estudos de pessoas inseridas em sua rede social nos permitem graválas conversando com quem elas geral mente falam amigos família e colegas de trabalho LABOV 2001 p 326 Esse tipo de pesquisa oferece resultados bastante relevantes para se identificarem as causas e o mecanismo social da mudança linguística especialmente quanto ao papel dos líderes da mudança pessoas que ocupam o centro de suas respectivas redes sociais e que seriam o veícu lo de expansão de características dessas redes para outros locais Além disso permite a observação de dados linguísticos mais naturais do que aqueles obtidos numa interação entrevistadorentrevistado metodolo gia que conheceremos na Unidade D Tanto o trabalho com comunidades de fala como o trabalho com redes sociais apresentam algumas limitações O primeiro por descon Sociolinguística 42 siderar o indivíduo priorizando o tipo social estratificado o segundo pela dificuldade em se levantar e sistematizar todos os grupos de inte ração em uma comunidade além de contemplar um número reduzido de indivíduos O ideal em termos de metodologia de pesquisa seria unir as duas abordagens considerando tanto as estratificações vincula das à origem e à classe social sexo idade escolaridade etnia profissão como as redes sociais a que os indivíduos escolhem pertencer as quais operam como mecanismos normatizadores Antes de concluirmos esta seção convém mencionar ainda breve mente a noção de comunidades de prática um conjunto de indivídu os negociando e aprendendo práticas que contribuem para a satisfação de um objetivo comum MEYERHOFF 2004 p 530 Exemplificando reuniões de pais e professores rotinas familiares e escolares comunida des de hackers entrevistas médicas comunidades de pescadores etc As comunidades de prática dizem respeito a práticas sociais compartilha das por indivíduos que se reúnem regularmente em torno de uma meta comum e envolvem desde crenças e valores compartilhados até formas de realizar certas atividades e de falar Eckert 2000 propõe o estudo da variação centrado nas comuni dades de prática pois nelas as variantes linguísticas assumiriam signi ficação social havendo relação direta entre língua e identidade Nesse contexto os estilos individuais como marcas de identidades sociais ocupariam um lugar central no estudo da variação linguística Esse en foque se aproxima do de redes sociais ambos de nível micro e mais qualitativo em oposição ao de comunidades de fala de nível macro e predominantemente quantitativo