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Carlos Alberto Sampaio Barbosa A REVOLUÇÃO MEXICANA ARevolucaomexicanaFINALindd 1 ARevolucaomexicanaFINALindd 1 16062010 215917 16062010 215917 FUNDAÇÃO EDITORA DA UNESP Presidente do Conselho Curador Herman Jacobus Cornelis Voorwald DiretorPresidente José Castilho Marques Neto EditorExecutivo Jézio Hernani Bomfi m Gutierre Assessor Editorial Antonio Celso Ferreira Conselho Editorial Acadêmico Alberto Tsuyoshi Ikeda Célia Aparecida Ferreira Tolentino Eda Maria Góes Elisabeth Criscuolo Urbinati Ildeberto Muniz de Almeida Luiz Gonzaga Marchezan Nilson Ghirardello Paulo César Corrêa Borges Sérgio Vicente Motta Vicente Pleitez EditoresAssistentes Anderson Nobara Arlete Zebber Ligia Cosmo Cantarelli ARevolucaomexicanaFINALindd 2 ARevolucaomexicanaFINALindd 2 16062010 215938 16062010 215938 Carlos Alberto Sampaio Barbosa A REVOLUÇÃO MEXICANA COLEÇÃO REVOLUÇÕES DO SÉCULO 20 DIREÇÃO DE EMÍLIA VIOTTI DA COSTA ARevolucaomexicanaFINALindd 3 ARevolucaomexicanaFINALindd 3 16062010 215938 16062010 215938 1a reimpressão 2010 Editora UNESP Direitos de publicação reservados à Fundação Editora da UNESP FEU Praça da Sé 108 01001900 São Paulo SP Tel 0xx11 32427171 Fax 0xx11 32427172 wwweditoraunespcombr wwwlivrariaunespcombr feueditoraunespbr CIP Brasil Catalogação na fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros RJ B196r Barbosa Carlos Alberto Sampaio 1966 A revolução mexicanaCarlos Alberto Sampaio Barbosa direção da série de Emília Viotti da Costa São Paulo Editora UNESP 2010 136p il mapa Revoluções do Século XX Inclui bibliografi a ISBN 9788539300426 1 México História Revolução 19101920 2 México História 18671910 3 México História 19101946 4 México História Século XX I Título II Série 102558 CDD 9720816 CDU 947219101920 Editora afi liada ARevolucaomexicanaFINALindd 4 ARevolucaomexicanaFINALindd 4 16062010 215938 16062010 215938 APRESENTAÇÃO DA COLEÇÃO O século XIX foi o século das revoluções liberais o XX o das revoluções socialistas Que nos reservará o século XXI Há quem diga que a era das revoluções está encerrada que o mito da Revolução que governou a vida dos homens desde o século XVIII já não serve como guia no presente Até mesmo entre pes soas de esquerda que têm sido ao longo do tempo os defenso res das ideias revolucionárias ouvese dizer que os movimentos sociais vieram substituir as revoluções Diante do monopólio da violência pelos governos e do custo crescente dos armamentos bélicos parece a muitos ser quase impossível repetir os feitos da era das barricadas Por toda parte no entanto de Seattle a Porto Alegre ou Mum bai há sinais de que hoje como no passado há jovens que não estão dispostos a aceitar o mundo tal como se confi gu ra em nossos dias Mas quaisquer que sejam as formas de lutas es colhidas é preciso conhecer as experiências revolucionárias do passado Como se tem dito e repetido quem não aprende com os erros do passado está fadado a repetilos Existe contudo entre as gerações mais jovens uma profunda ignorância desses acontecimentos tão fundamentais para a compreensão do passa do e a construção do futuro Foi com essa ideia em mente que a Editora UNESP decidiu publicar esta coleção Esperamos que os livros venham a servir de leitura complementar aos estudan tes da escola média universitários e ao público em geral Os autores foram recrutados entre historiadores cientistas sociais e jornalistas norteamericanos e brasileiros de posi ções políticas diversas cobrindo um espectro que vai do centro até a esquerda Essa variedade de posições foi conscientemente ARevolucaomexicanaFINALindd 5 ARevolucaomexicanaFINALindd 5 16062010 215938 16062010 215938 buscada O que perdemos talvez em consistência esperamos ganhar na diversidade de interpretações que convidam à refl exão e ao diálogo Para entender as revoluções no século XX é preciso colocálas no contexto dos movimentos revolucionários que se de sencadearam a partir da segunda metade do século XVIII resultando na destruição fi nal do Antigo Sistema Colonial e do An tigo Regime Apesar das profundas diferenças as revoluções pos teriores procuraram levar a cabo um projeto de democracia que se perdeu nas abstrações e contradições da Revolução de 1789 e se tornou o centro das lutas do povo a partir daí De fato o século XIX assistiu a uma sucessão de revoluções inspiradas na luta pela independência das colônias inglesas na América e na Revolução Francesa Em 4 de julho de 1776 as treze colônias que vieram ini cialmente a constituir os Estados Unidos da América declaravam sua independência e justifi cavam a ruptura do Pacto Colonial Em palavras candentes e profundamente subversivas para a épo ca afi rmavam a igualdade dos homens e apregoavam como seus direitos inalienáveis o direito à vida à liberdade e à busca da felicidade Afi rmavam que o poder dos governantes aos quais ca bia a defesa daqueles direitos derivava dos governados Por tanto cabia a estes derrubar o governante quando ele deixasse de cumprir sua função de defensor dos direitos e resvalasse para o despotismo Esses conceitos revolucionários que ecoavam o Ilumi nis mo foram retomados com maior vigor e amplitude treze anos mais tarde em 1789 na França Se a Declaração de Independên cia das colônias americanas ameaçava o sistema colonial a Re vo lução Francesa viria pôr em questão todo o Antigo Regime a ordem social que o amparava os privilégios da aristocracia o sis tema de monopólios o absolutismo real o poder divino dos re is Não por acaso a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão aprovada pela Assembleia Nacional da França foi redigida pelo marquês de La Fayette francês que participara das lutas pela independência das colônias americanas Este contara ARevolucaomexicanaFINALindd 6 ARevolucaomexicanaFINALindd 6 16062010 215938 16062010 215938 com a colaboração de Thomas Jefferson que se encontrava na França na ocasião como enviado do governo americano A De claração afi rmava a igualdade dos homens perante a lei De fi nia como seus direitos inalienáveis a liberdade a propriedade a segurança e a resistência à opressão sendo a preservação desses direitos o objetivo de toda associação política Estabelecia que ninguém poderia ser privado de sua propriedade exceto em ca sos de evidente necessidade pública legalmente comprovada e desde que fosse prévia e justamente indenizado Afi rmava ainda a soberania da nação e a supremacia da lei Esta era defi nida como expressão da vontade geral e deveria ser igual para todos Garantia a liberdade de expressão de ideias e de religião fi cando o indivíduo responsável pelos abusos dessa liberdade de acordo com a lei Estabelecia um imposto aplicável a todos proporcio nal mente aos meios de cada um Conferia aos cidadãos o direito de pessoalmente ou por intermédio de seus representantes par ti ci par na elaboração dos orçamentos fi cando os agentes pú blicos obrigados a prestar contas de sua administração Afi rmava ainda a separação dos poderes Essas declarações que defi nem bem a extensão e os limi tes do pensamento liberal reverberaram em várias partes da Eu ropa e da América derrubando regimes monárquicos abso lu tis tas implantando sistemas liberaldemocráticos de vários ma tizes estabelecendo a igualdade de todos perante a lei adotando a divisão dos poderes legislativo executivo e judiciário forjan do nacionalidades e contribuindo para a emancipação dos escra vos e a independência das colônias latinoamericanas O desenvolvimento da indústria e do comércio a revolu ção nos meios de transportes os progressos tecnológicos o pro ces so de urbanização a formação de uma nova classe social o pro letariado e a expansão imperialista dos países europeus na África e na Ásia geravam deslocamentos confl itos sociais e guer ras em várias partes do mundo Por toda a parte os grupos excluídos defrontavamse com novas oligarquias que não atendiam às suas necessidades e não respondiam aos seus anseios Estes ex travasavam em lutas visando a tornar mais efetiva a promessa ARevolucaomexicanaFINALindd 7 ARevolucaomexicanaFINALindd 7 16062010 215938 16062010 215938 de mocrática que a acumulação de riquezas e poder nas mãos de alguns em detrimento da maioria demonstrara ser cada vez mais fi ctícia A igualdade jurídica não encontrava correspondência na prática a liberdade sem a igualdade transformavase em mito os governos representativos representavam apenas uma minoria pois a maioria do povo não tinha representação de fato Um após outro os ideais presentes na Declaração dos Direitos do Homem foram revelando seu caráter ilusório A resposta não se fez tardar Ideias socialistas anarquistas sindicalistas comunistas ou simplesmente reformistas apareceram como críticas ao mun do criado pelo capitalismo e pela liberaldemocracia As primei ras denúncias ao novo sistema surgiram con tem po ra nea mente à Revolução Francesa Nessa época as críticas fi caram res tritas a uns poucos revolucionários mais radicais como Gracchus Babeuf No decorrer da primeira metade do século XIX condenações da ordem social e política criada a partir da Restauração dos Bourbon na França fi zeramse ouvir nas obras dos chamados socialistas utópicos como Charles Fourier 17721837 o conde de SaintSimon 17601825 Pierre Joseph Proudhon 18091865 o abade Lamennais 17821854 Étienne Cabet 17881856 Louis Blanc 18121882 entre outros Na Inglaterra Karl Marx 18181883 e seu companheiro Friedrich Engels 18201895 lançavamse na crítica sistemática ao capita lismo e à democracia burguesa e viam na luta de classes o motor da história e no proletariado a força capaz de promover a revo lução social Em 1848 vinha à luz o Manifesto comunista con cla mando os proletários do mundo a se unirem Em 1864 criavase a Primeira Internacional dos Tra balhadores Três anos mais tarde Marx publicava o primeiro volu me de O capital Enquanto isso sindicalistas reformistas e coo pe rativistas de toda espécie como Robert Owen tentavam hu ma nizar o capitalismo Na França o contingente de radicais au mentara bastante e propostas radicais começaram a mobilizar um maior número de pessoas entre as populações urbanas Os socialistas derrotados em 1848 assumiram a liderança por um ARevolucaomexicanaFINALindd 8 ARevolucaomexicanaFINALindd 8 16062010 215938 16062010 215938 breve período na Comuna de Paris em 1871 quando fo ram nova mente vencidos Apesar de suas derrotas e múltiplas diver gências entre os militantes o socialismo foi ganhando adep tos em várias partes do mundo Em 1873 dissolviase a Pri meira In ternacional Marx faleceu dez anos mais tarde mas sua obra con tinuou a exercer poderosa infl uência O segun do volume de O capital saiu em 1885 dois anos após sua morte e o terceiro em 1894 Uma nova Internacional foi fundada em 1889 O mo vi mento em favor de uma mudança radical ganhava um núme ro cada vez maior de participantes em várias partes do mundo culminando na Revolução Russa de 1917 que deu início a uma nova era No início do século XX o ciclo das revoluções liberais parecia defi nitivamente encerrado O processo revolucionário agora sob inspiração de socialistas e comunistas transcendia as fronteiras da Europa e da América para assumir caráter mais universal Na África na Ásia na Europa e na América o caminho seguido pela União Soviética alarmou alguns e serviu de inspiração a outros provocando debates e confrontos internos e externos que marcaram a história do século XX envolvendo a todos A Revolução Chinesa em 1949 e a Cubana dez anos mais tarde ampliaram o bloco socialista e forneceram novos modelos para revolucionários em várias partes do mundo Desde então milhares de pessoas pereceram nos confl itos entre o mundo capitalista e o mundo socialista Em ambos os lados a historiografi a foi profundamente afetada pelas paixões políticas suscitadas pela Guerra Fria e deturpada pela propagan da Agora com o fi m da Guerra Fria o desaparecimento da União Soviética e a participação da China em instituições até recente mente controladas pelos países capitalistas talvez seja possível dar início a uma reavaliação mais serena desses acontecimentos Esperamos que a leitura dos livros desta coleção seja para os leitores o primeiro passo numa longa caminhada em busca de um futuro em que liberdade e igualdade sejam compatíveis e a democracia seja a sua expressão Emília Viotti da Costa ARevolucaomexicanaFINALindd 9 ARevolucaomexicanaFINALindd 9 16062010 215938 16062010 215938 ARevolucaomexicanaFINALindd 10 ARevolucaomexicanaFINALindd 10 16062010 215938 16062010 215938 SUMÁRIO Lista de abreviaturas 15 Introdução 17 Cronologia 21 1 República restaurada e porfi riato 18761910 25 2 Revolução Mexicana 59 3 Estabilização política e revolução tardia 19201940 97 4 A herança revolucionária 111 Bibliografi a 129 ARevolucaomexicanaFINALindd 11 ARevolucaomexicanaFINALindd 11 16062010 215938 16062010 215938 ARevolucaomexicanaFINALindd 12 ARevolucaomexicanaFINALindd 12 16062010 215938 16062010 215938 ARevolucaomexicanaFINALindd 13 ARevolucaomexicanaFINALindd 13 16062010 215938 16062010 215938 ARevolucaomexicanaFINALindd 14 ARevolucaomexicanaFINALindd 14 16062010 215939 16062010 215939 15 LISTA DE ABREVIATURAS CGOCM Confederación General de Obreros y Campesinos de México Confederação Geral dos Operários e Camponeses do México COM Casa del Obrero Mundial Casa do Operário Mundial CROM Confederación Regional Obrera Mexicana Confederação Regional Operária Mexicana CTM Confederación de Trabalhadores de México Confederação dos Trabalhadores do México EZLN Exército Zapatista de Libertação Nacional IWW Industrial Workers of the World Trabalhadores Industriais do Mundo PAN Partido Ação Nacional PLC Partido Liberal Constitucionalista PLM Partido Liberal Mexicano PNR Partido Nacional Revolucionário PRD Partido da Revolução Democrática PRI Partido da Revolução Institucional PRM Partido da Revolução Mexicana PSS Partido Socialista do Sudeste ARevolucaomexicanaFINALindd 15 ARevolucaomexicanaFINALindd 15 16062010 215939 16062010 215939 ARevolucaomexicanaFINALindd 16 ARevolucaomexicanaFINALindd 16 16062010 215939 16062010 215939 17 INTRODUÇÃO O século XX no México começa efetivamente com a Revo lução Mexicana Foi a primeira revolução com claro cunho social a acontecer na América Latina nesse século Existem muitas razões para se refl etir sobre esse singular acontecimento na história mexicana e na latinoamericana Em primeiro lugar por que deu origem a um regime estável e duradouro Tal situação fi ca mais evidente se compararmos o México a outros países do sul do continente que ao longo do século XX passaram por golpes militares e regimes de exceção A Revolução Mexicana é um fenômeno muito complexo e durante este século muito já foi escrito sobre ela tanto por mexicanos como por estrangeiros Num primeiro momento a Revolução foi enaltecida como redentora popular e vista como uma ruptura social com o antigo regime Posteriormente seu caráter revolucionário foi negado e criticado e seus estudiosos passaram a destacar mais as continuidades entre o porfi riato e o regime pósrevolucionário Afi rmavam que não se tratou de uma revolução mas de uma grande rebelião ou um conjunto de várias rebeliões regionais que só posteriormente numa reiteração de identidade histórica comum voltaram a ser englobadas sob o conceito de a Revolução Embora reconheçamos sua complexidade com variáveis e diferenças regionais sociais e culturais entre os distintos movimentos revolucionários o que determinou seu caráter heterogêneo e multifacetado tratouse sim de uma revolução de caráter nacional popular agrária e que portanto representou uma ruptura na história mexicana ARevolucaomexicanaFINALindd 17 ARevolucaomexicanaFINALindd 17 16062010 215939 16062010 215939 18 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA Para compreender melhor esse acontecimento cabe ana lisar o período histórico imediatamente anterior à Revolução chamado República Liberal Esta pode ser dividida entre a fase da República Restaurada quando forças liberais mexicanas lideradas por Benito Juárez expulsaram os invasores franceses apoiados pelos conservadores e o longo governo do general Porfírio Díaz entre 1876 e 1911 Foi durante seu regime que o país conquistou uma relativa estabilidade política e econômica depois de décadas de crises políticas invasões estrangeiras per da de territórios e estagnação da economia Entender o período que antecede a Revolução é fundamental para compreender suas causas e seus desdobramentos A Revolução possui três fases distintas Uma primeira etapa em que as elites se fragmentam e lutam entre si contando com apoio das camadas populares Esta é a fase de caráter mais político ou maderista Na segunda etapa as camadas populares em especial os camponeses aproveitaramse da fragmentação política das classes dominantes e tomaram o poder impondo suas reivindicações especialmente a reforma agrária Embora seja um período curto esta é a fase mais radical da Revolução quando a massa impõe um governo popular A última etapa foi a fase da derrota popular e do surgimento de uma nova coali zão de poder entre setores da burguesia pequenos burgueses operários e camponeses O período que se estende entre 1920 e 1940 é a fase da institucionalização e consolidação da Revolução Nesses anos um grupo de revolucionários originários do estado de Sonora assumiu o poder Sua hegemonia foi interrompida apenas com a ascensão do governo de Lázaro Cárdenas 19341940 O governo Cárdenas representou a consumação dos projetos revolucionários da fase armada A Revolução Mexicana deixou uma herança que marcou a vida política econômica e cultural do México ao longo do século XX O Partido Nacional Revolucionário PNR criado em 1929 posteriormente Partido da Revolução Mexicana PRM ARevolucaomexicanaFINALindd 18 ARevolucaomexicanaFINALindd 18 16062010 215939 16062010 215939 19 A REVOLUÇÃO MEXICANA e por fi m Partido da Revolução Institucional PRI comandou o país até o ano 2000 quando perdeu a eleição para o Partido Ação Nacional PAN De qualquer forma a Revolução Mexicana segue como uma das poucas revoluções do século XX com alguma legitimi dade aos olhos de sua população Ainda que o PRI tenha perdido o poder central mantém uma série de governos regionais e domina muitas instituições legislativas Mesmo os partidos da oposição como o Partido da Revolução Democrática PRD reivindicam serem legítimos representantes da Revolução Isso sem esquecer os guerrilheiros das montanhas de Chiapas do Exército Zapatista de Libertação Nacional EZLN os neoza patistas que despontaram em 1994 e se dizem os verdadeiros herdeiros do legado de Emiliano Zapata ARevolucaomexicanaFINALindd 19 ARevolucaomexicanaFINALindd 19 16062010 215939 16062010 215939 ARevolucaomexicanaFINALindd 20 ARevolucaomexicanaFINALindd 20 16062010 215939 16062010 215939 21 CRONOLOGIA 1810 Em 15 de setembro o padre Miguel Hidalgo inicia a Guerra de Independência 1821 Consumação conservadora da independência 18211823 Império de Agustín de Iturbide 1836 Independência do Texas 1846 O Texas se torna mais um estado norteamericano 18461848 Guerra entre o México e os Estados Unidos 1848 Tratados de GuadalupeHidalgo põem fi m à guerra com os Estados Unidos 18541857 Guerra da Reforma entre liberais e conservadores 1857 Promulgada a Constituição Federal 1861 Vitória dos liberais na Guerra da Reforma 1862 Invasão francesa 18641867 Império do arquiduque austríaco Fernando Maximiliano 18761880 Primeiro governo do general Porfírio Díaz 18801884 Governo de Manuel González 18841911 Governos seguidos de Porfírio Díaz 1900 Os irmãos Flores Magón fundam o jornal Regeneración 1906 Greve de Cananea e protestos de Río Blanco 1910 Celebração do Centenário da Independência Porfírio Díaz é eleito presidente pela sétima vez 5 de junho de 1910 Prisão de Francisco Madero por sedição 21 de junho de 1910 Eleições presidenciais com vitória de Porfírio Díaz 22 de julho de 1910 Madero é liberado para prisão domiciliar em San Luis Potosí 6 de outubro de 1910 Fuga de Madero para os Estados Unidos ARevolucaomexicanaFINALindd 21 ARevolucaomexicanaFINALindd 21 16062010 215939 16062010 215939 22 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA 20 de novembro de 1910 Madero convoca os mexicanos à rebelião e se proclama presidente provisório 1o de dezembro de 1910 Porfírio Díaz toma posse para o mandato entre 1910 e 1916 14 de fevereiro de 1911 Francisco Madero cruza a fronteira entre os Estados Unidos e o México 24 de maio de 1911 Tratado de Ciudad Juárez e renúncia de Díaz Governo provisório de Francisco Leon de la Barra 15 de outubro de 1911 Eleições presidenciais Madero sai vitorioso 6 de novembro de 1911 Posse de Franscico Madero Dezembro de 1912 Luis Cabrera apresenta seu projeto de lei de reconstituição dos ejidos dos pueblos 9 de fevereiro de 1913 Tentativa de golpe de Estado or questrada por Félix Díaz contra o presidente Ocorrem dez dias de combates na Cidade do México que levam à desti tuição de Francisco Madero 18 de fevereiro de 1913 Pacto da Embaixada ou da Ciudadela Acordo intermediado pelo embaixador norteamericano Henry Lane Wilson assinado entre Victoriano Huerta e Félix Díaz Prisão do presidente e de seu vice 19 de fevereiro de 1913 O general Victoriano Huerta assume a Presidência 22 de fevereiro de 1913 Assassinato de Francisco Madero e de seu vice José Maria Pino Suárez 26 de março de 1913 Venustiano Carranza governador de Coahulia não reconhece o governo de Huerta e lança o Plano de Guadalupe 10 de outubro de 1913 Huerta fecha o Congresso 2 de abril de 1914 A División del Norte comandada por Francisco Pancho Villa toma a cidade de Torreón 23 de junho 1914 A División del Norte toma Zacatecas 8 de julho de 1914 É assinado o Pacto de Torreón entre as forças de Francisco Villa e de Venustiano Carranza 15 de julho de 1914 Victoriano Huerta renuncia e foge para os Estados Unidos ARevolucaomexicanaFINALindd 22 ARevolucaomexicanaFINALindd 22 16062010 215939 16062010 215939 23 A REVOLUÇÃO MEXICANA 13 de agosto de 1914 Tratado de Teoloyucan que marca a rendição e dissolução do Exército Federal 10 de outubro de 1914 Início dos trabalhos da Soberana Convenção Revolucionária na cidade de Aguascalientes 6 e 7 de abril de 1915 Batalha de Celaya e derrota da División del Norte Dezembro de 1916janeiro de 1917 Assembleia Constituinte de Querétaro 19171920 Presidência de Venustiano Carranza Maio de 1918 Criação da Confederación Regional Obrera Mexicana CROM Abril de 1919 Assassinato de Emiliano Zapata Abril de 1920 Plano de Agua Prieta início da Revolução Constitucionalista Liberal comandada por Álvaro Obregón Maio a dezembro de 1920 Adolfo de la Huerta presidente provisório 19201924 Presidência de Álvaro Obregón 19231924 Rebelião Delahuertista 19241928 Presidência de Plutarco Elias Calles 19261929 Rebelião Cristera 1928 Assassinato do presidente eleito Álvaro Obregón 19281929 Presidência provisória de Emilio Portes Gil 1929 Fundação do Partido Nacional Revolucionário PNR posteriormente 1938 Partido da Revolução Mexicana PRM e fi nalmente 1948 Partido da Revolução Institu cional PRI 19291932 Presidência de Pascual Ortiz Rubio 19321934 Presidência de Abelardo Rodriguez 19341940 Presidência de Lázaro Cárdenas ARevolucaomexicanaFINALindd 23 ARevolucaomexicanaFINALindd 23 16062010 215939 16062010 215939 ARevolucaomexicanaFINALindd 24 ARevolucaomexicanaFINALindd 24 16062010 215939 16062010 215939 25 1 REPÚBLICA RESTAURADA E PORFIRIATO 18761910 A REPÚBLICA RESTAURADA O México consolidou a independência em 1821 após ten tativas populares frustradas de emancipação comandadas pelos padres Miguel Hidalgo e José Maria Morelos A independência foi proclamada com um pacto de unidade política que permitiu avançar para a autonomia em relação à Espanha e para um novo sistema político Foi o resultado de uma complexa engenharia política costurada entre os insurgentes constitucionalistas mo narquistas e republicanos O México se emancipava da Espanha para dar origem à efêmera monarquia do imperador Agustín de Iturbide que durou até 1823 quando foi proclamada a República A primeira metade do século XIX foi um período de lutas entre federalistas e centralistas entre liberais e conservadores e entre republicanos e monarquistas Embora os conservadores te nham predominado entre 1821 e 1855 coexistia uma pluralidade de atores políticos Durante essa primeira fase independente o país perdeu aproximadamente metade do seu território para os Estados Unidos na guerra entre 1846 e 1848 A vitória dos liberais em 1855 representou a derrota dos conservadores e seus aliados a Igreja o Exército e os Ca ciques Regionais Os liberais acreditavam que as comunidades indígenas eram entraves para o progresso na medida em que impediam a transformação das terras em mercadoria e retinham uma grande quantidade de mão de obra trabalhando no cultivo de suas terras comunais Os liberais chegavam ao poder com uma plataforma de reformas que acreditavam transformariam a face do país Sumariamente falando procuravam acabar com os tribunais eclesiásticos especiais e propunham que a partir ARevolucaomexicanaFINALindd 25 ARevolucaomexicanaFINALindd 25 16062010 215939 16062010 215939 26 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA daquele momento o julgamento do clero fosse realizado por tribunais civis Buscavam também criar um Estado laico ou seja o catolicismo não mais seria a religião ofi cial Para tanto implantaram o casamento civil e proibiram a posse de terras pela Igreja Decretaram ademais o fi m das prerrogativas jurí dicas do Exército Defendiam o predomínio civil da Presidência da República pois estavam cansados do domínio de militares como o general Antonio Lopez de Santa Anna que monopolizou o poder por mais de vinte anos entre 1833 e 1855 Os conservadores não aceitaram tranquilamente a perda de privilégios e resistiram de todas as formas chegando num último gesto de desespero a fazer uma aliança com Luís Bona parte que tinha pretensões imperialistas na América Latina O resultado foi a intervenção francesa 18621867 e a imposição do arquiduque austríaco Fernando Maximiliano como monarca A segunda monarquia mexicana durou pouco e não su portou a oposição nacionalista dos liberais Com a derrota e a retirada das tropas francesas o Exército conservador aliado das forças neocoloniais foi derrotado defi nitivamente no verão de 1867 Maximiliano foi preso juntamente com os generais Miguel Miramón e Tomás Mejía submetidos à corte marcial condena dos e fuzilados na cidade de Querétaro no dia 19 de julho de 1867 Dois dias depois com a queda do regime monárquico era restaurada a República Porfírio Díaz foi um dos comandantes das tropas republicanas que entraram na Cidade do México ao lado de outro general Juan José Baz denominado comecuras alcunha recebida por sua perseguição aos religiosos Este úl timo foi designado governador do Distrito Federal e assumiu suas funções expulsando as freiras de seus conventos Executou também vários servidores públicos do regime monárquico os chamados lambiscones além de ter prendido e desterrado outros que apoiaram os conservadores O presidente eleito Benito Juárez que comandou a resis tência e havia dirigido as tropas republicanas a partir do norte do país passou por Querétaro em seu caminho para a capital especialmente para ver o cadáver de Maximiliano Dias depois ARevolucaomexicanaFINALindd 26 ARevolucaomexicanaFINALindd 26 16062010 215939 16062010 215939 27 A REVOLUÇÃO MEXICANA a imperatriz Carlota Amália embarcava para a Europa com o cadáver embalsamado de seu marido O período seguinte foi intenso para Juárez Ele procurou restabelecer a ordem e a au toridade Indicou ministros entre os quais Sebastián Lerdo de Tejada destacada fi gura desse período para a pasta de Relaciones y Gobernación Uma de suas primeiras medidas foi reduzir o exército republicano de oitenta mil homens para aproximada mente vinte mil organizandoo em cinco divisões cabendo a Porfírio Díaz o comando da divisão do Oriente A imprensa liberal em especial os periódicos El Siglo XIX e El Monitor Republicano exigia reformas radicais na Constitui ção na educação e no Exército além de novas eleições Outro tema muito debatido era a reforma agrária Nesse mesmo ano o médico Gabino Barreda proferiu o discurso intitulado Oração Cívica considerado a primeira manifestação do positivismo no México O discurso impressionou Juárez que nomeou Barreda ministro da Educação Pública Posteriormente o médico foi um dos fundadores e primeiro diretor da Escola Nacional Preparató ria Em 22 de setembro ocorreram as eleições que confi rmaram Juárez como presidente além de eleger uma Câmara de Depu tados formada por adoradores do positivismo Nos próximos trinta anos o México seria dominado por uma elite composta de letrados1 e soldados fenômeno que se repetiria em outras partes da América Latina Podese traçar um perfi l social desse grupo de letrados Eram em geral da classe média provenientes do meio urbano e fi guras de projeção nacional Formados nas melhores escolas tinham em média 45 anos Eram juristas médicos advogados e jornalistas Destacavamse pela capacidade oratória que exerce ram nas tribunas parlamentares nas cátedras na literatura na 1 Entre os letrados mais destacados podemos citar além do próprio Benito Juárez Sebastián Lerdo de Tejada José Maria Iglesias José Maria Lafragua José Maria Castillo Velasco José Maria Vigil José Maria Mata Juan José Baz Manuel Payno Guillermo Prieto Ignacio Ramírez Ignacio Luis Vallarta Francisco Zarco Ignacio Manuel Altamirano Antonio Martinez de Castro Ezequiel Montes Matias Romero e Gabino Barreda ARevolucaomexicanaFINALindd 27 ARevolucaomexicanaFINALindd 27 16062010 215939 16062010 215939 28 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA imprensa ou por meio de livros Alguns escreveram romances Payno e Altamirano peças teatrais livros de história Iglesias Prieto Altamirano Vigil e Ramirez e até poesia Em sua maioria começaram a vida pública como professores Os militares não eram tão conhecidos com exceção de Porfírio Díaz Manuel González e Vicente Riva Palácio Eram provenientes do norte socialmente advinham de famílias mais humildes possuíam uma educação precária e criação rústica A exceção foi Vicente Riva Palácio2 Faziam parte de uma gera ção mais jovem que a dos letrados tinham em média 36 anos portanto pertenciam à geração de Porfírio Díaz Entraram para o Exército durante a guerra com os Estados Unidos ou durante as revoltas liberais da década seguinte eram profi ssionais das armas e por isso lutaram tanto contra liberais quanto contra conservadores Enquanto os militares combatiam nas várias revoltas e nas disputas entre liberais e conservadores os letrados atuavam na imprensa e em cargos públicos Todos tiveram importante participação na Constituinte de 1857 Com a intervenção francesa os letrados desiludiramse e muitos fugiram para os Estados Unidos Já os militares permaneceram e lutaram contra os invasores Após a expulsão dos franceses e a restauração da República a reconstrução fi cou nas mãos dos letrados enquanto os militares fi caram com uma parcela menor do butim político o que foi motivo de ressentimentos Alguns militares no máxi mo conseguiram elegerse deputados comandantes militares e governadores Apenas Ignácio Mejía foi nacionalmente poderoso 2 Nascido em 1832 Vicente Riva Palácio foi uma das fi guras emblemáticas da história mexicana no século XIX Formouse em Direito mas durante a intervenção francesa iniciou sua atuação como militar e recebeu a patente de general Posteriormente foi nomeado governador do Estado do México e em seguida de Michoacán Em paralelo à sua atuação como militar editou jornais escreveu peças teatrais romances contos e poesias Foi também historiador e editor Foi um dos responsáveis pela edição de México através de los siglos obra de caráter enciclopédico sobre a história mexicana publicada em 1880 ARevolucaomexicanaFINALindd 28 ARevolucaomexicanaFINALindd 28 16062010 215939 16062010 215939 29 A REVOLUÇÃO MEXICANA como ministro da Guerra nos governos de Juárez e Sebastián Lerdo de Tejada Ambos os grupos de militares e de letrados eram católicos A apostasia3 atribuída pelos conservadores aos liberais era apenas uma fi cção Os liberais eram anticlericais e a favor da separação entre Igreja e Estado Seriam presidentes secretários de Estado legisladores e juízes da Suprema Corte que tentaram implantar um programa liberal Nem os militares nem os conservadores participaram diretamente desse processo limitandose a opinar Na República Restaurada esses papéis se inverteriam O programa liberal em traços gerais propunha uma nova ordem política mediante a efetiva aplicação da Constituição de 1857 Seus objetivos eram a pacifi cação do país por meio da debilitação dos profi ssionais da violência os militares o fortalecimento da Fazenda Pública e da democracia Na ordem social buscava estimular a imigração de europeus favorecer o minifúndio e os pequenos proprietários rurais a liberdade de associação e o surgimento de uma classe média No tocante à questão racial era favorável à incorporação dos indígenas por meio de sua assimilação na sociedade mexicana Na esfera econômica suas metas eram construir estradas atrair o capital estrangeiro introduzir novos métodos agrícolas desenvolver as manufaturas e converter o México numa ponte entre a Europa e o Oriente ou seja resumidamente promover o desenvolvimento econômico do país No âmbito cultural professava a liberdade de credo e de imprensa o estímulo à educação bem como a nacionalização das letras e das artes Segundo Luis González para os liberais o passado deveria ser removido radicalmente a fi m de fazer o país avançar para o futuro Entre outras coisas era necessária a transculturação do indígena Segundo o autor é possível sintetizar os objetivos do programa liberal em três ideias básicas Catolicismo com viés 3 Apostasia é a separação ou deserção do corpo constituído ao qual se pertence o abandono da fé de uma Igreja ou o abandono do estado religioso ou sacerdotal ARevolucaomexicanaFINALindd 29 ARevolucaomexicanaFINALindd 29 16062010 215939 16062010 215939 30 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA protestante desclerizado apolítico para o uso doméstico libe ralismo sem libertinagem para a vida pública e ciência cimento do progresso material para o trabalho González 1988 p913 A realidade que vingou porém foi reacionária Contra a democracia pesava a indiferença das elites e da grande massa da população que pouco usufruía dela Apenas uma minoria conhecia e queria a Constituição de 1857 Contra a pacifi cação conspiravam três costumes a ambição política dos militares o modo de vida de quem dependia da guerra e da bandidagem e a pretensão de autonomia das tribos e comunidades locais Ou seja existia no México uma tradição de violência difícil de resolver A imigração europeia não vingou pois o país não era atraente ao europeu que preferia os Estados Unidos Não se chegou à divisão dos latifúndios e o desenvolvimento dos transportes não ocorreu devido à falta de recursos e às difi cul dades geográfi cas do país Os liberais no poder não conseguiram atrair o capital estrangeiro o catolicismo continuou enraizado no mexicano a educação não avançou nem se conquistou o almejado nacionalismo nas letras A Igreja sofreu um duro golpe com a Lei Lerdo Pro mulgada por Miguel Lerdo de Tejada essa lei exigia que a Igreja vendesse todas as suas propriedades Também proibia a compra de novas propriedades no futuro A lei atingiu os bens das corporações civis o que afetou particularmente as terras das comunidades indígenas os ejidos e tinha como objetivo tornar o México um país de pequenos e médios proprietários O declínio do poder da Igreja do Exército e dos caciques não levou aos objetivos desejados mas a uma maior concentração das terras nas mãos dos hacendados ricos o Exército não garantia a estabilidade política e consumia muito dinheiro o país continuou fragmentado e a classe média não aumentou A democracia não funcionou a contento Dos 112 meses que a República Restaurada durou em 49 deles as garantias indi viduais foram suspensas Entretanto a liberdade de imprensa funcionou e o debate verbal chegou a alcançar níveis nunca antes atingidos Ocorreram sedições e motins comandados ARevolucaomexicanaFINALindd 30 ARevolucaomexicanaFINALindd 30 16062010 215939 16062010 215939 31 A REVOLUÇÃO MEXICANA pelos antigos heróis militares em quase todas as regiões do país assim como diversas rebeliões das populações indígenas contra a perda de terras comunais ou seja a pacifi cação do país caminhava muito lentamente No tocante à reforma administrativa houve avanços tanto no mundo dos militares como na Fazenda Conseguiuse uma diminuição da dívida externa e melhoras no orçamento O mesmo não se pode dizer com relação à criação de mini fúndios à eliminação da peonaje da servidão por dívidas ou dos maustratos aos trabalhadores rurais A organização dos trabalhadores urbanos teve melhor sorte surgiram associações com ideais mistos de liberalismo e socialismo e aconteceram as primeiras greves Houve um grande esforço para estender o telégrafo e expandir as estradas Foi nessa fase que a primeira estrada de ferro ligando a Cidade do México a Veracruz foi inaugurada em 1873 O progresso da agricultura capitalista da mineração e das manufaturas ocorreu a passos lentos assim como os investimentos estrangeiros Os maiores êxitos da República Restaurada foram no tocante ao desenvolvimento da cultura laica e da liberdade de expressão na imprensa Houve alguns avanços na educação primária embora o anseio de um México dotado de uma unidade cultural não ter sido atingido princi palmente no que diz respeito aos indígenas que na sua maioria continuavam isolados Do ponto de vista de sua implantação as realizações da República Restaurada foram proveitosas Consideradas pelo prisma das metas a que se propôs deixam muito a desejar As guerras civis e de expulsão dos franceses acarretaram caos eco nômico em especial na mineração e nas fazendas deixaram um tesouro vazio e espantaram os investimentos externos A Repú blica deixou como legado um Estado mexicano constituído por um Exército superdimensionado e uma burocracia enfraquecida As estratégias políticas de Juárez abrangiam maior centralização política aumento das liberdades democráticas e expansão da burocracia do Estado Mas apesar da desmobili ARevolucaomexicanaFINALindd 31 ARevolucaomexicanaFINALindd 31 16062010 215939 16062010 215939 32 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA zação e do antimilitarismo acabou ocorrendo um aumento da infl uência do Exército devido à necessidade de sua presença para conter as revoltas locais Juárez anistiou os conservadores e até mesmo membros da Igreja Esta última a grande derrotada nos anos anteriores começou uma lenta recuperação sob a batuta de Juárez A ten tativa de conciliação funcionou com setores da elite e da classe média mas desagradou aos camponeses o que só serviu para aumentar a agitação política O governo não conseguiu dimi nuir a tensão com uma tímida reforma agrária assim como não acabou com a servidão por dívida Durante o governo de Juárez ocorreram vários levantes de camponeses contra o aumento dos impostos e a expropriação das terras comunais Se compararmos com o ocorrido no período colonial quando as rebeliões eram locais e limitadas a uma aldeia ou voltadas a questões particulares na República Restaurada as rebeliões tornaramse mais radicais e com raio de ação mais amplo envolvendo principalmente a região do México Central e agora motivadas pelo aumento dos impostos e pela apropriação das terras comunais Simultaneamente crescia o banditismo4 O PORFIRIATO Os liberais que lutaram contra os conservadores e pos teriormente contra a invasão francesa denominaram essa fase de segunda guerra da independência Foi de fato o último confronto entre as velhas classes dominantes ainda originárias do período colonial e as novas forças políticas e econômicas que caracterizariam o México no último quarto do século XIX O Exército formado a partir de 1810 desapareceu e a Igreja teve sua espinha dorsal enfraquecida para dar passagem à nova fração de classe que ascendia ao poder político e econômico No âmbito externo os Estados Unidos que já tinham expandido seu território até o Pacífi co com a compra de territórios e de uma 4 Ver o excelente trabalho sobre o banditismo no México no livro de Lopes 1995 ARevolucaomexicanaFINALindd 32 ARevolucaomexicanaFINALindd 32 16062010 215939 16062010 215939 33 A REVOLUÇÃO MEXICANA guerra de agressão inauguram uma nova fase de penetração econômica e se voltam para a América Latina Em muitos países do continente os dirigentes surgidos nesse momento passam a representar os interesses dos grandes latifundiários e de uma burguesia comercial favorável ao desenvolvimento de um capi talismo dependente Esses líderes trabalham para reprimir todo tipo de manifestação política ou movimentos sociais capazes de prejudicar os grandes investimentos estrangeiros ou nacionais Em vários Estados latinoamericanos surgem regimes oligárqui cos com líderes reformadores que iniciaram sua carreira como caudilhos populares e terminam como ditadores personalistas Foi esse o caso de Porfírio Díaz no México No caso mexicano o governo de Porfírio Díaz 1876 1911 de perfi l oligárquico estabilizou a economia e a política no último quarto do século XIX depois de meio século de insta bilidade após a independência Seu regime foi responsável pela centralização política e econômica do país O Estado oligárquico foi muito importante para o México pois propiciou a unifi cação nacional e a centralização política Seu governo foi responsável pela colonização de terras baldias melhorou as comunicações e os transportes realizou mais obras públicas e as cidades foram objeto de reformas urbanísticas Em paralelo setores importantes da sociedade como a população trabalhadora e os camponeses foram reprimidos em nome do progresso Abriuse defi nitivamente o país ao capital estrangeiro em especial norte americano o que levou à integração da economia mexicana no mercado externo Nesse sentido as indústrias extrativistas se converteram em campo privilegiado para o investimento estrangeiro o que exigiu a construção de ferrovias Por sua vez estas foram responsáveis pela penetração do capitalismo no país Durante o regime porfi rista dinamizouse o processo de uma civilização urbana com o aumento no número dos trabalhadores urbanos e da classe média intelectual Foram esses fenômenos que entraram em confl ito com as formas locais da vida social e levaram à eclosão da Revolução Mexicana Mas vejamos com mais detalhes esse período da história do México ARevolucaomexicanaFINALindd 33 ARevolucaomexicanaFINALindd 33 16062010 215939 16062010 215939 34 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA Porfi rio Díaz era considerado um homem rústico sem educação Muitos alegavam que não sabia falar nem se vestir Nasceu numa casa pobre do estado de Oaxaca em 15 de se tembro de 1830 Aprendeu carpintaria e sapataria e aos treze anos foi para um seminário católico Foi também bibliotecário estudante de Direito e professor embora não cultivasse o gosto pela leitura e tivesse profundo desprezo pelos letrados Ingressou nas armas para lutar contra os norteamerica nos em 1846 foi rebelde entre 1854 e 1855 quando se tornou capitão e lutou contra os conservadores durante as guerras da Reforma Foi deputado e novamente voltou às armas com a in vasão francesa Seus principais feitos militares ocorreram entre 1862 e 1867 quando tinha entre 31 e 36 anos durante as lutas contra os franceses O ponto culminante de sua carreira militar foi a retomada de Puebla no dia 2 de abril até então ocupada pelos franceses o que fez dele um herói nacional Em 1867 foi candidato à Presidência da República e a governador de Oaxaca mas obteve apenas um mandato como deputado Em 1871 disputou novamente a Presidência da Re pública mas perdeu e tentou liderar uma rebelião no ano seguinte Essa revolta teve como foco central seu estado natal Oaxaca e contou com o apoio de seu irmão Félix Díaz além do general Geronimo Treviño comandante de tropas em estados do norte do país como Nuevo Leon Durango Sinaloa e Zacatecas Essa primeira tentativa foi rapidamente debelada primeiro por Benito Juárez e depois com a morte deste por Sebastián Lerdo de Tejada que assumiu a Presidência e convocou eleições das quais saiu vitorioso em 1872 Tejada tentou manter o programa juarista ou seja procurou fortalecer o Estado centralizando ainda mais o poder com medidas como a criação do Senado e o aumento do poder do Executivo Mas descontentou a Igreja com um recrudescimento das leis reformistas a desapropriação das propriedades eclesiásticas remanescentes e a expulsão dos jesuítas do país Teve uma atuação ambígua com relação à elite vinculada aos interesses estrangeiros em especial àqueles seto res ligados a empresas ferroviárias norteamericanas Conseguiu ARevolucaomexicanaFINALindd 34 ARevolucaomexicanaFINALindd 34 16062010 215939 16062010 215939 35 A REVOLUÇÃO MEXICANA reelegerse em 1876 mas contou com a forte oposição dos que viram em Porfírio Díaz um caminho para tomar o poder Em sua segunda tentativa de golpe Porfírio Díaz saiuse vitorioso Lançou o Plano de Tuxtepec em que pregava a não reeleição Esse plano foi levado adiante pelo comandante militar de Oaxaca e tinha como alvo principal a tentativa de reeleição de Tejada Este quase sem apoio político viu suas tropas serem facilmente derrotadas pelas de Díaz Por fi m renunciou e fugiu Ainda restava um obstáculo o presidente da Suprema Corte de Justiça o advogado José Maria Iglesias que era o próximo na linha de sucessão Este procurou encastelarse em Guanajuato mas suas forças foram também facilmente debeladas e só lhe restou renunciar O programa porfi rista era baseado em três propostas pacifi cação e ordem depois progresso econômico por último a política se possível No seu primeiro mandato sem grandes feitos desapontou seus adeptos Mas conseguiu eleger seu ami go Manuel González para o período seguinte de 1880 a 1884 González fez um bom trabalho na primeira metade da sua admi nistração mas a segunda foi desastrosa marcada por rebeliões populares e perda de prestígio O governo de González foi visto como corrupto e inepto e essa imagem negativa foi agravada pela crise econômica de 1884 favorecendo a volta de Díaz Díaz elegeuse para o período seguinte com uma esposa jovem e educada nos Estados Unidos com a aparência de uma rainha segundo os contemporâneos Neste seu segundo manda to acabou com os cacicazos que não tinham sido eliminados nem por ele no primeiro governo nem por González que ajudara a eleger e reprimiu as tentativas de sublevações militares além de combater as rebeliões ou revoltas de índoles políticas ou sociais tais como as dos indígenas apaches yaquis maias e outros e as dos camponeses Com a volta dos pagamentos da dívida externa restabeleceu as relações com os Estados Unidos Com isso a situação fi nanceira do país melhorou Para evitar as relações monogâmicas com o vizinho do norte para muitos um dos grandes problemas do país Díaz procurou uma aproximação ARevolucaomexicanaFINALindd 35 ARevolucaomexicanaFINALindd 35 16062010 215939 16062010 215939 36 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA também com a Europa Neste segundo mandato foram colocados em prática vários códigos legais civil penal de mineração e comércio substituindo antigas leis espanholas que vigoravam desde o período colonial Aumentou as concessões para os investidores estrangei ros com benefícios para os construtores de estradas de ferro oferecendolhes em contrapartida terras consideradas públicas mas que eram cultivadas há anos por pequenos proprietários e comunidades indígenas que não conseguiam apresentar títulos de posse Revogou a lei segundo a qual o subsolo era do Estado favorecendo os donos de minas e novos investidores A comparação da situação econômica do país em 1877 com a de 1888 ou seja após mais ou menos dez anos de porfi rismo revelase esclarecedora O progresso econômico segundo a visão ofi cial do período seria resultado de quatro pontos a ordem e a pacifi cação do país a riqueza natural do país a presença de imigrantes e o investimento de capital estrangeiro A produção de alimentos cresceu de acordo com o incremen to da população e o mesmo se aplica à produção pecuária Foi um pouco melhor na mineração e na manufatura e bem melhor no comércio em especial o voltado para a exportação partindo de 40 mil pesos em 1877 para 76 mil em 1888 Um setor de grande desenvolvimento foi a construção de estradas de ferro que pulou de 640 km para 80 mil km em 1888 além das redes de comunicações como estradas e linhas telegráfi cas No setor das fi nanças houve o surgimento de diversos bancos e instituições fi nanceiras Díaz adotou na economia o princípio liberal do laissez faire De início permitiu a livre associação dos trabalhadores e até incentivou a criação de organizações trabalhistas como o Congresso Operário embora as mantivesse sob o controle do go verno As greves e disputas entre operários e patrões entretanto sempre acabavam pendendo para os últimos Na realidade as condições do trabalhador eram muito díspares Em alguns se tores como na indústria petrolífera elas até melhoraram com a construção de moradias escolas e inclusive o estabelecimento de ARevolucaomexicanaFINALindd 36 ARevolucaomexicanaFINALindd 36 16062010 215939 16062010 215939 37 A REVOLUÇÃO MEXICANA um rudimentar sistema de saúde embora as empresas exigissem obediência inconteste Na indústria têxtil a situação era muito pior com trabalhadores que não recebiam em dinheiro mas em vales e tinham de comprar nos armazéns da companhia Até a virada do século greves e protestos eram raros Díaz aceitou as atividades da Igreja Católica que se ex pandiram durante seu governo No mesmo sentido estabeleceu uma política de conciliação com os grupos políticos derrotados os lerdistas e os conservadores O Congresso e a imprensa no entanto foram menos livres que no período anterior A partir de seu segundo mandato em 1884 Díaz praticamente impediu a eleição de integrantes da oposição para o Congresso Com esse controle do Legislativo abriu espaço para mudanças constitucio nais a seu favor como a aprovação da reeleição ocorrida em 1888 e a ampliação do mandato de quatro para seis anos em 1892 Díaz incentivou atividades públicas e de diversão popular como touradas e festas regionais além de criar um verdadeiro calendário de datas cívicas Criou a comemoração do dia 5 de fevereiro dia da Constituição de 5 de maio dia da vitória sobre os franceses e de 2 de abril dia da sua vitória sobre os lerdistas Ampliou a rede de educação pública embora esta ainda continuasse circunscrita à classe média urbana Resumindo poderseia dizer que nascia um país diferen te no campo político Díaz criou uma espécie de monarquia re publicana um regime da ordem e da paz no campo econômico iniciou a construção de um mercado nacional com um parque fabril destinado ao consumo interno a mineração de metais industriais e o favorecimento de investimentos estrangeiros A virada de 1887 para 1888 marcou o fortalecimento de Porfírio Díaz e o início da fase áurea de seu regime Esse período fi cou conhecido como a época da Pax Porfi riana assinalando a mudança de uma geração no poder Aos poucos Díaz tirou os militares do governo e aproximouse da geração mais jovem urbana atraindo para a administração do Estado os chamados científi cos Essa burocracia tecnocrata tinha sua origem numa classe média nascida entre 1840 e 1856 e seus membros tinham ARevolucaomexicanaFINALindd 37 ARevolucaomexicanaFINALindd 37 16062010 215939 16062010 215939 38 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA entre 30 e 40 anos Esse grupo que não passava de cinquenta pessoas ao todo tornouse rapidamente a elite governamental ou o núcleo forte do poder entre 1888 e 1904 Se agregarmos a ele um par de bispos poetas e um pintor José Maria Velasco podese considerálo a elite cultural do país Os principais membros dentre esses científi cos forma vam um bloco biográfi co Eram oriundos do meio urbano e ignoravam a vida rancheira e pueblerina do campo possuíam formação acadêmica e eram advogados médicos e engenheiros Formavam uma equipe de bacharéis tribunos professores poetas e jornalistas alguns foram historiadores tais como Justo Sierra Francisco Bulnes Emilio Rabasa e Alfredo Chavero Re presentavam ainda o enlace entre o governo e o capital externo pois vários deles enriqueceram com sua atuação no governo Tendiam para o conservadorismo a oligarquia a tecnocracia e eram em geral positivistas admiravam mais a França que os Estados Unidos como modelo Díaz soube porém limitar o poder desse grupo Dividir para manipular era a estratégia porfi rista tanto para os científi cos como para outros grupos a exemplo dos jacobinos liberais os conservadores os militares e os mais jovens da oposição A partir de 1888 emergiu um governo personalista com o lema pouca política e muita administração Com a aprovação tácita da opinião pública Díaz reuniu em sua pessoa o poder nacional e local e os governadores tornaramse vicereis Díaz praticamente silenciou a oposição parlamentar Reduziu ao mínimo o debate de índole política na imprensa do país e no começo do seu terceiro período de governo já era um especialista na arte de comandar e se impor Era um insuperável defensor da autoridade Foi um presidente imperador Nesse período a centralização política tornouse uma realidade Foi a ditadura mais longa no México desde sua independência O presidente converteuse no Caudilho Indis pensável e no General Necessário A estabilidade do gabinete era assombrosa alguns de seus ministros ou secretários como são chamados no México ARevolucaomexicanaFINALindd 38 ARevolucaomexicanaFINALindd 38 16062010 215939 16062010 215939 39 A REVOLUÇÃO MEXICANA chegaram a durar vinte anos em suas pastas A imobilidade dos funcionários foi ainda mais clara nos governos estaduais Quase sempre os governadores chamados ironicamente de vicereis deixavam seus postos apenas quando morriam O Congresso converteuse nas palavras da imprensa de oposição da época num hospital de inválidos ou depósito de ofi ciais uma espécie de museu de história natural com um exemplar de cada espécie enquanto o Senado se tornou com o passar do tempo um asilo para governadores e generais senis A censura à imprensa recrudesceu e o quarto poder tornouse mais escravo que uma entidade livre Enquanto isso a política externa gerou poucos acontecimentos relevantes apenas a discussão com a Guatemala e a Inglaterra a respeito de Belize e a questão da fronteira com os Estados Unidos ao longo do rio Bravo O Exército passou por uma relativa reorganização tornou se bem vestido alimentado e armado Começou a realizar bonitos desfi les e manobras e perdeu a fama de brutal Foi considerado um Exército de paz mas mantinha a tradição de recrutar seus ofi ciais entre as famílias decentes e as tropas por meio da força entre a população pobre Díaz não titubeava em controlar o Exército com repressão e cooptação e criou ou incen tivou forças paramilitares como os rurales5 Com a Igreja houve a conjugação de reconciliação e cooptação com vistas grossas Tanto para as classes dominantes e médias como para os camponeses o governo Díaz representou perda de poder Porém para as duas primeiras houve ganhos econômicos en quanto para os camponeses nem isso ocorreu Estes perderam a autonomia local de comunidades aldeias vilas cidades e 5 Os rurales eram uma polícia rural surgida durante o governo de Benito Juárez na década de 1860 para perseguir e aprisionar bandidos e tornouse um símbolo do período porfi rista Os primeiros grupos foram compostos por camponeses e artesãos além de alguns exguerrilheiros e exbandidos Suas atividades básicas eram guardar as grandes propriedades rurais e as linhas férreas transportar prisioneiros vigiar as eleições prender prisioneiros e sufocar as revoltas no campo ARevolucaomexicanaFINALindd 39 ARevolucaomexicanaFINALindd 39 16062010 215939 16062010 215939 40 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA colônias militares do norte As fi nanças foram organizadas sob as ordens do ministro das Finanças Don José Ives Limantour e assim foram pagas ou renegociadas as dívidas com os Estados Unidos e os países europeus Para muitos analistas foi um período apolítico e burocrático A consolidação da ditadura baseouse em dois processos a estabilidade interna a chamada Pax Porfi riana e a emer gência de um Estado efi ciente e poderoso A pacifi cação passou pela repressão e a cooptação com a troca dos caciques locais por homens de confi ança de Díaz e seu posterior enriquecimento tanto os de dentro como os de fora do governo Porfírio Díaz proibiu a existência de partidos políticos de oposição como o ligado aos científi cos e procurou dividir os grupos políticos mesmo os que o apoiavam Surgiram assim entre os que o apoiavam a facção civil com Manuel Romero Rubio e depois José Ives Limantour científi cos e a facção militar liderada por Manuel González e depois Bernardo Reyes O desenvolvimento econômico foi a principal marca do governo da segunda etapa do porfi riato Cabe um rápido balanço da economia mexicana naquele momento Se bem que a agri cultura para o mercado interno não tenha prosperado em seu conjunto a voltada para a exportação situada em melhores ter ras teve um grande crescimento com as culturas de café chicle6 e sisal henequén A pecuária conheceu módicos progressos no norte mas continuou sendo extensiva prosperando um pouco mais a partir de 1902 com investimentos norteamericanos A mineração aumentou de ritmo crescendo a uma taxa de 6 ao ano com a produção de metais preciosos prata e ouro e outros minerais destinados à indústria como cobre segundo produtor mundial em 1901 chumbo antimônio e zinco A 6 O chicle ou chiclete designa a seiva retirada da árvore Sapota zapotilla conhecida no Brasil como sapoti originário das Américas Central e do Sul Sua produção comercial começou por volta de 1870 quando o americano Thomas Adams Jr passou a vendêla como goma de mascar misturada com alcaçuz e licor tornandose rapidamente uma moda ARevolucaomexicanaFINALindd 40 ARevolucaomexicanaFINALindd 40 16062010 215939 16062010 215939 41 A REVOLUÇÃO MEXICANA manufatura também acelerou o ritmo de crescimento em três setores mais dinâmicos açúcar têxteis e tabaco No período do apogeu econômico do porfi riato acelerouse a incorporação dos mercados locais ao nacional e deste ao mundial As exportações cresceram em volume valor e variedade a taxas de 8 ao ano e atingiram superávit da balança comer cial em torno de 25 milhões de pesos anuais Eram exportados principalmente os minerais e produtos agrícolas café e sisal Os Estados Unidos eram o principal comprador seguidos de Grã Bretanha França Alemanha e Espanha A obsessão ferroviária continuou assim como a expansão da rede de telégrafos correios e obras portuárias Todos esses avanços foram possíveis graças aos investimentos estrangeiros que encontraram uma opinião pública favorável ao seu ingresso no país O México desse momento estava dividido entre o mundo rural e o urbano No campo os antigos donos de haciendas eram ricos apenas no nome enquanto os novos de mentalidade capitalista como os Terraza no norte os García Pimentel em Morelos os Madero em Coahuila foram os que criaram as haciendas produtivas e lucrativas e assim rapidamente enrique ceram Os rancheiros arrendatários e pequenos proprietários também caminhavam para o modo de produção capitalista Não tinham maiores problemas afora confl itos contra outros rancheiros e companhias de demarcação de terras Enquanto isso os pueblos indígenas estavam preocupados em perder suas terras para o governo para os latifundiários e para as compa nhias de demarcação de terras e fi cavam à mercê das tropas federais Viviam pobres e de quando em quando se levantavam em armas Outra categoria de trabalhadores rurais eram os peo nes que podiam ser acasillados ou livres de tarea Os peones acasillados eram pagos por dia em vales a serem trocados nas tiendas de raya conseguindo apenas o indispensável para comer e vestir moravam permanentemente na fazenda e recebiam um lote de terra para agricultura ou criação de pequenos animais o que eventualmente lhes permitia melhorar a condição de vida Os livres invejavam os acasillados pois não tinham qualquer ARevolucaomexicanaFINALindd 41 ARevolucaomexicanaFINALindd 41 16062010 215940 16062010 215940 42 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA garantia Eram trabalhadores eventuais em geral camponeses que residiam em aldeias próximas e recebiam um pequeno salário Os peones livres das haciendas do norte frequentemente iam para os Estados Unidos atrás de trabalho enquanto os do centro iam para fábricas locais quando fi cavam desempregados Havia ainda os jornaleiros que conforme a região eram cha mados de gananes ou braceros Eram forçados a trabalhar de sol a sol e às vezes eram presos ou sujeitos à servidão por dívidas No âmbito urbano os operários e trabalhadores eram muito sacrificados Os patrões os viam como preguiçosos dados ao ócio à luxúria e à bebida Imbuídos dessas ideias consideravamse benfeitores por oferecer trabalho e disciplina Os trabalhadores por sua parte trataram de se organizar em sindicatos cooperativas e associações e recorriam às greves para suas reivindicações como as de 1892 1895 1898 e 1900 contra baixos salários e maustratos Ainda na cidade mas em posição superior havia uma burguesia industrial comercial e de serviços Essa elite econômica em geral se situava na capital e em mais seis grandes cidades Guadalajara Puebla Querétaro Monterrey Guanajuato e San Luis Potosí Em grande parte formada por estrangeiros era pouco numerosa e com um espírito voltado para o lucro rápido e não muito custoso Era uma burguesia egoísta e ostentosa A população aumentou de 10 milhões para 15 milhões principalmente pelo crescimento natural uma vez que a imi gração europeia praticamente não cresceu pois os europeus preferiam rumar para os Estados Unidos O crescimento econômico voltouse à exportação com o desenvolvimento das estradas de ferro Atividades como a mineração a agricultura a pecuária a indústria extrativista e demais indústrias foram estimuladas principalmente pela entrada maciça do capital norteamericano Os setores mais importantes da economia estavam na mão de estrangeiros com exceção da agricultura As concessões mexicanas aos europeus a princípio não se chocavam com as dos norteamericanos mais interessados no norte enquanto ingleses franceses e alemães ARevolucaomexicanaFINALindd 42 ARevolucaomexicanaFINALindd 42 16062010 215940 16062010 215940 43 A REVOLUÇÃO MEXICANA preferiam o centro e o sul Estes se dedicavam principalmente às fi nanças à indústria têxtil e de armamentos e os norte americanos se voltavam mais para estradas de ferro mineração indústria do petróleo e pecuária Se o desenvolvimento econômico na gestão Díaz foi de 8 ao ano em média também produziu grandes disparidades As desigualdades regionais no cenário mexicano eram fl agrantes no sul e sudeste do país onde as atividades produtivas baseavam se em um ou dois produtos de agricultura de exportação com pouca diversifi cação Os principais eram o sisal em Yucatán a borracha e o café em Chiapas e Tabasco em geral em haciendas de propriedade de estrangeiros No norte a economia desenvol veuse rapidamente quase toda voltada para os Estados Unidos Nessa região a economia era mais diversifi cada e com mais investimentos estrangeiros exportando principalmente minérios cobre estanho prata e produtos agrícolas como grãodebico além de gado e madeira Para o mercado interno produziase principalmente algodão na região de La Laguna entre os es tados de Coahuila e Durango A região norte teve um surto de desenvolvimento industrial principalmente em Monterrey onde surgiram siderúrgicas fundições e indústrias de processamento de alimentos Na região do México Central as mudanças foram menores Em Morelos ainda prevaleciam as grandes fazendas de milho trigo e canadeaçúcar Mas houve um forte desen volvimento industrial do Vale do México em Puebla e Veracruz Foi durante o governo de Díaz que ocorreu a domestica ção da fronteira setentrional mais especifi camente os estados de Sonora Chihuahua Nuevo Leon e Durango tanto com a subjugação dos apaches e dos yaquis dos quais falaremos mais adiante como por meio de uma política de imigração em massa de norteamericanos e de mexicanos do sul atraí dos pelos investimentos de empresas de mineração pecuária agricultura e transportes Tais elementos eram provenientes de uma composição social e econômica diversifi cada mas essen cialmente urbana No início do século XX o norte era uma das regiões mais modernas e dinâmicas do capitalismo mexicano ARevolucaomexicanaFINALindd 43 ARevolucaomexicanaFINALindd 43 16062010 215940 16062010 215940 44 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA tanto em termos econômicos como sociais Assim surgiu uma sociedade em que o índice de analfabetismo era menor que no sul as relações sociais eram mais capitalistas que tradicionais a peonaje perdeu espaço as mobilidades geográfi ca e social davam a tônica e as novas relações sociais entre meeiros parceiros vaqueiros e fazendeiros progressistas eram intensas e frequen temente confl itantes Era nessa região que se encontrava a maior violência social e política durante todo o período porfi riano Em muitos sentidos a tensão e o confl ito se davam entre aqueles que podiam ser chamados de o setor moderno da sociedade e os elementos tradicionais da sociedade Entretanto as estruturas tradicionais coexistiram com as capitalistas ou modernas A nova hacienda capitalista não desalojou completamente a antiga hacienda patriarcal Porém tudo favorecia os grandes proprietários como a nova legislação sobre terrenos baldios e as empresas de demarcação desses ter renos O regime porfi rista favoreceu tais empresas ao conceder o direito a uma porcentagem das terras que demarcassem como federais ou baldias Como muitos proprietários comunidades aldeãs ou pequenos proprietários não possuíam a documentação legal das terras tornaramse alvos fáceis para as empresas de demarcação As companhias de construção de estradas de ferro foram outro grupo favorecido Recebiam o direito pelas terras às margens da ferrovia o que as tornava grandes proprietárias A contradição e as difíceis relações entre as duas socie dades que conviviam na realidade do México de um lado um Estado moderno surgido das reformas liberais e aprofundado pelo regime de Porfírio Díaz de outro uma sociedade tradicional vinculada aos pueblos7 camponeses e grupos indígenas foi uma das causas da Revolução Mexicana 7 Pueblo a tradução literal de pueblo seria vila ou aldeia No caso mexicano esse termo é mais complexo e remete a uma mistura de características das propriedades comunais das populações nativas americanas em que algumas delas remontariam à estrutura de organização populacional do período précolonial e a alguns traços dos pueblos espanhóis ARevolucaomexicanaFINALindd 44 ARevolucaomexicanaFINALindd 44 16062010 215940 16062010 215940 45 A REVOLUÇÃO MEXICANA Um dos exemplos mais simbólicos dos setores tradicionais são os yaquis Como estes não aceitavam pacifi camente a perda de suas terras estabeleceram uma estratégia de resistência O go verno de Díaz iniciou uma campanha de repressão e deportação dos yaquis para a península de Yucatán estado no extremo sul do México no início do século XX Essa política de imigração for çada foi a fórmula encontrada para subjugar a resistência tenaz que essa nação opunha ao projeto porfi rista de centralização e inserção das comunidades indígenas na estrutura de propriedade individual da terra Para compreender melhor essa situação cabe uma breve explanação sobre a história singular dessa etnia Os yaquis eram originários da parte ocidental do estado de Sonora e sua trajetória é particular dentro da história mexicana A postura de resistência desse grupo à assimilação e aculturação à sociedade ocidental foi específi ca Talvez aqui resida uma das singularidades dessa etnia Defenderam sua identidade étnica sua comunidade seu modo de vida suas terras e sua cultura por meio de guerras e negociações Sua resistência permitiu que mantivessem parte de sua autonomia e forma de organização em relação aos governos estadual e federal até a virada do século XIX para o XX Mas sua particularidade com relação a outros grupos que lutaram pelos mesmos objetivos reside no fato de que os yaquis se integraram à economia mexicana mais ampla sem com isso perder sua identidade Seus membros além de manterem o trabalho nas terras comunais partiram para o trabalho assalariado nos empreendimentos mineiros que sur giram em várias regiões do norte do México principalmente em Sonora como foi o caso da mina de Cananea e também nos Estados Unidos no estado do Arizona Evelyn HuDeHart defi niu essa postura como uma característica dual de separa tismo por uma parte e integração parcial por outra 1990 p135 tendo sido esta a origem da força deste grupo étnico e a chave de sua sobrevivência O primeiro contato entre os europeus e os yaquis aconteceu em 1533 mas foram os jesuítas os responsáveis pela pacifi cação das beligerantes tribos das margens férteis do rio Yaqui por volta ARevolucaomexicanaFINALindd 45 ARevolucaomexicanaFINALindd 45 16062010 215940 16062010 215940 46 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA de 1610 As várias tribos foram agrupadas em oito vilas e esses agrupamentos passaram a chamarse Ocho Pueblos defi nindo a nação yaqui A ação jesuíta fazia parte do projeto de uma con quista espiritual como alternativa à proposta de pacifi cação pela força Os indígenas aproximaramse das missões basicamente pela possibilidade de adquirir alimentos roupas instrumentos de metal e presentes As missões eram organizadas em rígidas disciplinas Trabalhavam três dias nas terras comunais e os demais dias em suas terras familiares Outros meios de sustento eram a pecuária e as ofi cinas de tecelagem e de artesanato Evelyn HuDeHart afi rma que foi essa organização jesuíta que estruturou uma incipiente ideia de nação yaqui com uma linguagem própria e fronteiras políticas Essa região foi o centro das preocupações jesuítas na Nova Espanha Os yaquis eram a maior nação indígena do noroeste com cerca de trinta mil habitantes e sob o controle dos jesuítas tornouse profunda mente coesa produtiva segura estável e dócil Mas isso não foi o sufi ciente para manter a paz durante o período colonial uma vez que essa nação esteve envolvida numa rebelião de grandes proporções por volta de 1740 Participavam do conflito três grupos os jesuítas os espanhóis representados pela fi gura do governador da região que desejava a secularização das missões interessado na mão de obra muito valorizada por sua disciplina e os yaquis Estes não permaneceram passivos muito pelo contrário pareciam não querer nem manter uma lealdade contínua à missão como era desejo dos jesuítas nem se incorporar plenamente à sociedade colonial como queria o governador A política dos yaquis pode ser defi nida como de fl exibilização tanto que essa rebelião não se confi gurou como uma guerra de castas visando ao aniqui lamento da população branca A revolta era dirigida contra os denominados vecinos população espanhola localizada nas margens das terras dos yaquis e que ameaçava desestruturar suas comunidades pela infl uência cultural e econômica Por outro lado a rebelião se voltava contra a excessiva expropriação do excedente econômico pelos jesuítas ARevolucaomexicanaFINALindd 46 ARevolucaomexicanaFINALindd 46 16062010 215940 16062010 215940 47 A REVOLUÇÃO MEXICANA Se durante a colônia houve apenas uma rebelião no século XIX elas foram contínuas integradas somente por yaquis ou confederadas com outras tribos Em outras ocasiões aliaram se a setores da própria sociedade mexicana independente ou mesmo a grupos estrangeiros Estes grupos os atraíam com promessas de terra e autonomia Cabe esclarecer que após a rebelião do período colonial uma grande parcela dos yaquis não retornou para suas terras preferindo o trabalho nas minas Mas mesmo os integrados à sociedade mexicana mantinham uma forte ligação com as suas respectivas comunidades A partir da rebelião de 1740 os yaquis começaram a afi rmar sua independência graças à sua forma de adaptação à economia colonial Mesmo após a expulsão dos jesuítas ou depois da crise econômica pósindependência conseguiram manter sua identidade individual ligada a cada um dos oito pueblos ao mesmo tempo em que crescia um sentido de yaquinidad comum Sua estrutura social se manteve numa base igualitária relacionada ao pequeno excedente que era produzido Também formaram milícias e desenvolveram uma liderança militar tornandose uma sociedade militarista Soli difi caram formas políticas organizativas autônomas como os governadores dos pueblos Esse processo se deu paralelamente a um declínio da infl uência da Igreja nas comunidades Apesar da afi rmação de sua autonomia e separação cultural isso nunca implicou um isolamento total Não cabe aqui expor as várias rebeliões do século XIX O importante é destacar a participação dos yaquis na maioria das lutas políticas que a sociedade mexicana vivenciou Eles contribuíram para uma certa instabilidade geral no estado de Sonora aliandose às diferentes facções políticas do estado ou de fora dele de acordo com os interesses específi cos da comunida de Respondiam rapidamente a qualquer ameaça externa a sua cultura e suas terras e sua resistência adotava formas fl exíveis e inovadoras Mesmo após mudanças ocorridas durante todo esse século a busca de autonomia política e de autossufi ciência econômica continuou a ser um objetivo prioritário e estas eram ARevolucaomexicanaFINALindd 47 ARevolucaomexicanaFINALindd 47 16062010 215940 16062010 215940 48 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA propostas inaceitáveis para o governo porfi rista cujo projeto tinha como pedra angular a centralização política do país As relações econômicas tanto no que diz respeito à propriedade das terras como à mão de obra também eram importantíssi mas Assim coube ao governo federal no fi nal do século XIX a incumbência de pacifi car a região A não aceitação das propostas do governo de Porfírio Díaz por essa tribo levoua a uma nova forma de resistência a guerrilha Esta via de luta era facilitada pela dispersão dos seus indivíduos como trabalhadores nas minas ferrovias fazendas e cidades tanto do lado mexicano como dos Estados Unidos que proporcionavam apoio material e moral Portanto a ma nutenção de um espírito guerreiro foi sua marca registrada Essa característica levou o governo porfi rista a iniciar uma nova política de controle a deportação em massa da população entre 1902 e 1907 Entretanto existia uma difi culdade para lidar com eles devido à facilidade que encontravam em fugir para as montanhas Por isso era muito raro encontrar um peon yaqui preso por dívida com a fazenda pois ele se evadia As famílias também encontravam refúgio nas montanhas tornando difícil a sua localização e aprisionamento A acelerada mudança da estrutura econômica que atingiu o México na segunda metade do século XIX e no começo do XX com a expansão do capitalismo e a modernização da sociedade não deixou intactas nem as comunidades indígenas nem os camponeses Naquele momento a repressão à resistência de integração de um grupo étnico se deu não mais por elementos locais e tropas regionais mas pela repressão do governo federal As tropas que fi zeram a captura das famílias e as custodiaram possuíam traços semelhantes aos dos próprios prisioneiros Eram compostas por yaquis integrados ou indígenas de outras etnias de regiões próximas Os confrontos entre esse grupo étnico e o governo central não se limitaram ao campo mas ocuparam também as cidades mineiras como foi o caso de Huitemea líder dos trabalhadores mineiros vários deles yaquis em greve na mina de Cananea ARevolucaomexicanaFINALindd 48 ARevolucaomexicanaFINALindd 48 16062010 215940 16062010 215940 49 A REVOLUÇÃO MEXICANA Esta greve ocorrida em 1906 foi um dos estopins da Revolução e será detalhada mais adiante O acontecimento feriu os brios nacionalistas dos mexicanos e causou uma grande indignação na opinião pública Para a classe camponesa do México central e do sul o principal problema foi a expropriação da terra que vinha ocorrendo desde os governos liberais mas que foi acelerada durante o porfi riato Para se ter uma ideia em 1821 40 das terras para agricultura no centro e no sul pertenciam às aldeias comunais em 1910 às vésperas da Revolução apenas 5 As sim nessa época 90 dos camponeses não possuíam terras Durante o governo Díaz houve mais incentivos à expropriação das terras comunais no intuito de maximizar a produção e ao mesmo tempo expulsar os camponeses de suas terras tentando dessa forma ampliar a mão de obra disponível para trabalhar nas fazendas e nas empresas industriais Tais objetivos foram atingidos com a especulação com novas leis e com um maior poder de repressão e força para impor as novas políticas Quais foram os maiores benefi ciários dessa política A princípio os hacendados ricos em detrimento dos peões pobres e sem terra e dos camponeses Mas percebese que nesse pro cesso surgiu também uma classe média agrária os chamados rancheiros O surgimento de uma classe média no campo con tribuiu para a desintegração dos órgãos de resistência como a administração comunal das aldeias e a transformação das relações de clientela tradicionais Ocorreram duas situações contraditórias Enquanto no norte e no centro do país o desenvolvimento da economia impulsionado pelas indústrias e ferrovias e a necessidade de mais trabalhadores para as lavouras comerciais acarretavam uma escassez da mão de obra e o desaparecimento da peonaje no sul particularmente em Yucatán e Chiapas a peonaje tendeu a manterse ou a aumentar Segundo contemporâneos no fi nal do século XIX e nos primeiros anos do século XX tais mudanças eram o testemunho de que o país tinha progredido mas que esse progresso se dera à custa da expropriação dos campone ARevolucaomexicanaFINALindd 49 ARevolucaomexicanaFINALindd 49 16062010 215940 16062010 215940 50 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA ses e de uma crescente dependência nacional em relação aos capitais estrangeiros No auge do porfi riato ocorreu um renascimento religioso mas não podemos dizer que o regime de Díaz fosse clerical Al guns setores da burguesia buscaram o protestantismo copiando os norteamericanos A educação ofi cial era claramente de índole burguesa e voltada para as classes alta e média nem o Estado nem a Igreja gastaram muito com ela A cultura também era bur guesa e se mantinha restrita às cidades A sociedade porfi riana mantevese longe da cultura escrita apenas 18 da população sabia ler A imprensa sofria perseguições prisões multas e a competição desonesta de jornais ofi ciais como El Imparcial vendido por alguns centavos o que causou o desaparecimento de alguns periódicos Apesar disso a atividade literária e artística foi intensa Em suma os últimos anos do século XIX assim como o início do século XX foram de prosperidade para as classes dominantes e para a nação mexicana e de empobrecimento para muitos grupos subalternos Fenômeno idêntico aconteceu em outros países da América Latina e do mundo ocidental Apesar da crescente tensão social havia uma relativa ordem e estabilidade política e econômica sob um governo autoritário e personalista O começo do século XX no México foi marcado pelo en velhecimento de seus governantes e signifi cou a fase decadente do porfi riato Díaz havia se tornado emotivo e sentimental Tinha perdido o talento para o poder Executivo Passou a des confi ar de seus mais próximos colaboradores A idade média dos ministros naquele momento era de 70 anos Os jovens do regime eram sessentões chamados ironicamente de Câmara Baixa Na última década de seu regime rompeuse a base da Pax Porfi riana que fora a aliança entre grupos e classes que tradicionalmente se rebelavam desde as primeiras décadas do México independente o Exército a elite e a classe média que em muitos casos infl uenciava as classes subalternas Díaz mostrouse cada vez menos capaz de manter o consenso entre a classe alta e a média que se distanciaram e arrastaram con sigo as classes subalternas As mudanças políticas nos âmbitos ARevolucaomexicanaFINALindd 50 ARevolucaomexicanaFINALindd 50 16062010 215940 16062010 215940 51 A REVOLUÇÃO MEXICANA nacional e regional aumentaram a visibilidade da repressão governamental As causas políticas no entanto não foram as únicas responsáveis pela crise do regime de Díaz Este enfrentou ainda uma crise econômica Somese a isso a sua idade avançada a luta pela sucessão além do surgimento de uma consciência nacionalista principalmente entre os trabalhadores e a classe média Até mesmo as disputas imperialistas entre os Estados Unidos e países europeus tornaram os últimos dez anos do governo muito tensos O México era uma sociedade jovem governada por um punhado de anciãos As esperanças entre os partidários do porfi riato residiam em três indivíduos Justo Sierra ministro de Educação Pública desde 1905 era um deles José Yves Limantour um dos ministros mais eminentes era um dos científi cos e conhecido como o mago das fi nanças Havia conseguido atingir superávits signifi cativos e em 1904 conseguira um empréstimo na Europa para a nacionalização das ferrovias Por fi m havia Bernardo Reyes que apesar dos sinais de senilidade e de ter sido retirado do Ministério da Guerra possuía ascendência sobre os militares e afi nal deixou um Exército muito disciplinado embora mal equipado corrupto formado por tropas engajadas à força desarticulado e sem generais com experiência em combate Entre 1904 e 1908 a maior base de apoio do porfi riato veio dos empresários e dos investidores estrangeiros Num balanço rápido da economia nesse último decênio podemos dizer que a agricultura para o mercado interno havia crescido um pouco mais rápido principalmente a produção de milho chicle arroz e mescal A agricultura industrial voltada para a exportação com itens como canadeaçúcar café grãodebico sisal e baunilha teve um grande salto A pecuária teve avanços modestos A extração de metais preciosos e as indústrias tornaramse mais ágeis com destaque para a produção de ferro e de petróleo Surge também uma indústria siderúrgica e começam a se tornar sig nifi cativas as exportações de produtos manufaturados cordas chapéus e açúcar O comércio exterior encolheu um pouco e o interior se expandiu junto com as ferrovias ARevolucaomexicanaFINALindd 51 ARevolucaomexicanaFINALindd 51 16062010 215940 16062010 215940 52 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA No começo do século XIX a elite econômica era regional ou local No fi nal do século começava a tornarse nacional pois se estendera às outras regiões do país e ao mesmo tempo tinha diversifi cado suas atividades Um exemplo disso foram os TerrazaCreel que eram fazendeiros fi nancistas industriais possuíam bancos e atuavam na extração de petróleo em socieda de com os ingleses José Y Limantour fi lho de um comerciante francês foi um dos científi cos mais destacados Possuía também terras e era diretor de empresas estrangeiras Embora autores como Friedrich Katz afi rmem que os científi cos tinham uma orientação próeuropeia devido a uma visão nacional de que o país precisava aumentar a concessão aos europeus e as alian ças com comerciantes de origem europeia para contrabalançar a forte presença norteamericana é mais provável que essa burguesia nacional tivesse se tornado intermediária do capital internacional e se aliasse ora aos europeus ora aos americanos de acordo com os seus interesses A atitude dessa elite parecia esquizofrênica Mostravase totalmente subserviente ao capital internacional com repentes de surtos nacionalistas Essas novas elites encontraram forte oposi ção das elites regionais que ao longo da penetração do capital in ternacional na economia mexicana haviam sido gradativamente excluídas do poder Estas contavam com o apoio dos militares de viés nacionalista cujo principal líder era Bernardo Reyes Nessa última década do regime ocorreu um rápido crescimento do proletariado industrial As alterações do cenário econômico mudaram drasticamente as condições de vida e verifi couse uma transformação em sua consciência de classe embora com variações de acordo com as regiões e as atividades nas quais trabalhavam A partir da virada do século infl uenciado pelos contatos com trabalhadores estrangeiros e a migração para os Estados Unidos surgiu um sentimento nacionalista motiva do pela discriminação interna e externa e pelo nascimento de uma consciência de classe Cabe lembrar que em setores como o ferroviário a mineração e a indústria petrolífera todos com forte participação internacional os melhores postos e salários ARevolucaomexicanaFINALindd 52 ARevolucaomexicanaFINALindd 52 16062010 215940 16062010 215940 53 A REVOLUÇÃO MEXICANA eram reservados aos estrangeiros Enquanto até o século XIX as greves eram raras pois os padrões de vida eram melhores se comparados aos dos trabalhadores no campo no século XX devido a essa nova consciência as greves se multiplicaram O regime de Díaz tentou controlar o mercado de trabalho com a criação de organizações trabalhistas e pela repressão A classe média foi em parte cooptada pelo progresso econômico ou social embora seja claro que tenha surgido uma oposição entre grupos de intelectuais como jornalistas e profes sores e também de comerciantes Os jovens letrados tornaramse mais agressivos em suas críticas muito em função da sua não incorporação ao poder Uma juventude intelectual que não era propriamente revolucionária mas nacionalista insurgese contra Díaz e as múmias como eram chamados seus mais próximos assessores devido à idade avançada aferradas ao poder político e econômico Em 1901 reuniuse pela primeira vez um grupo de liberais convocados por Camilo Arriaga que lança um mani festo com base no liberalismo e no antiporfi rismo Sobrinho de Ponciano Arriaga deputado constituinte em 1857 era fi lho de Benigno Arriaga que apoiara Porfírio Díaz em 1876 Quando chegou ao poder este compensou a família com cargos políticos Camilo formouse engenheiro pela Escola Nacional Preparatória e foi muito infl uenciado pelo positivismo de Gabino Barreda Posteriormente começou a ler Marx Engels Proudhon e Bakúnin Entre o fi nal do século XIX e o início do século XX juntamente com outros intelectuais como Juan Sarabia Antonio Díaz Soto y Gama e os irmãos Jesús Ricardo e Enrique Flores Magón editores do jornal Regeneración8 funda um clube 8 Os irmãos Flores Magón são originários do estado de Oaxaca fi lhos de Teodoro Flores militar que lutou contra a invasão norteamericana em 1848 na Revolução Liberal e contra a invasão francesa ao lado de Porfírio Díaz em 1876 Jesus estudou na Escola Nacional de Direito e Ricardo na Escola Nacional Preparatória Destacaramse como jornalistas e editores de oposição ao governo de Porfírio Díaz e foram os fundadores e editores do jornal Regeneración Mais informações serão dadas adiante ARevolucaomexicanaFINALindd 53 ARevolucaomexicanaFINALindd 53 16062010 215940 16062010 215940 54 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA liberal onde se liam as obras da biblioteca de Camilo Arriaga O grupo volta a se reunir em 1902 pregando a liberdade de expressão o sufrágio efetivo municípios livres e a reforma agrária Formam uma rede de cerca de duzentos clubes liberais por todo o país e em seguida lançam o jornal El Renascimiento Com o lançamento em 1903 de outro manifesto foram perse guidos pelo regime e alguns líderes fugiram para os Estados Unidos Nesse país fundam o Partido Liberal Mexicano PLM mas devido a divergências políticas Camilo Arriaga se separa dos irmãos Flores Magón Em 1906 o PLM em St Louis no Missouri EUA lança um programa político de combate à reeleição antimilitarista livre pensador anticlerical trabalhis ta a favor da reforma agrária Nesse momento podemos falar que uma parcela da classe média se torna antiporfi rista assim como os rancheiros pequenos e médios proprietários braceros e operários cerca de setecentos mil à época Nesse período ocorrem greves e protestos de trabalhadores que terão um forte impacto no imaginário político mexicano como as de Cananea e de Río Blanco A greve na Cananea Consolidated Copper Company mina de propriedade do coronel norteamericano William Greene teve início em 1o de junho de 1906 quando os líderes mineiros alguns deles ligados ao Partido Liberal Mexicano incitaram os trabalhadores a reivindicar aumento de salário e equiparação aos trabalhadores norteamericanos da empresa Os protestos dos trabalhadores levaram a um confronto com seguranças da companhia Como a mina fi cava próxima da fronteira com o Estado do Arizona nos Estados Unidos o proprietário pediu ajuda de tropas americanas que prontamente acorreram a re primir com violência os grevistas causando a morte de vários deles A situação foi controlada rapidamente pelo uso da força mas a repercussão incendiou o país O periódico Regeneración noticiou o ocorrido e divulgou amplamente a oposição nacio nalista ao porfi rismo visto como conivente com a intervenção norteamericana ARevolucaomexicanaFINALindd 54 ARevolucaomexicanaFINALindd 54 16062010 215940 16062010 215940 55 A REVOLUÇÃO MEXICANA No fi nal de 1906 na região de Tlaxcala e Puebla ocor reram greves nas indústrias têxteis por melhores condições de trabalho Em protesto contra essas paralisações os empresários da região resolveram fazer lockout interrupção das atividades a fi m de deter a crescente organização dos trabalhadores Em reta liação os trabalhadores de Río Blanco depredaram uma fábrica e foram violentamente reprimidos pela polícia Seguemse dois dias de intenso confl ito entre trabalhadores e órgãos de repres são As lideranças dos trabalhadores eram vinculadas a clubes liberais e ao Regeneración As estimativas são contraditórias mas entre 400 e 800 pessoas morreram ao longo do processo Esses dois movimentos são considerados precursores da Revolução Mexicana pois apresentam por um lado o des contentamento com o governo Díaz e a violência com que este reprimia a oposição e por outro expressam o surgimento de uma consciência de classe e a organização dos trabalhadores e de setores da classe média em torno dos clubes liberais A crise econômica de 1907 e 1908 contribuiu para o aumento da tensão e dos protestos Embora muitos falassem que era apenas mais uma das crises cíclicas esta teve seu epicentro nos Estados Unidos e gerou uma recessão levando muitos mexicanos que trabalhavam naquele país a voltar para seus locais de origem aumentando ainda mais o desemprego no México Em sua volta os imigrantes até então nos Estados Unidos encontraram nas cidades uma nova geração de traba lhadores e uma nova oposição sindical A situação agravouse pela seca e pelas inundações que afetaram a agricultura Em 1908 a crise atingiu em cheio o campo provocando escassez de alimentos e afetou também o setor da produção industrial A balança comercial tornouse defi citária A crise instalou um malestar geral na sociedade A intelectualidade escreveu manifestos folhetos e livros tratando das mazelas mexicanas na economia na política e na sociedade Acelerouse assim a formação de grupos e partidos de oposição o Partido Democrático o Clube Central Antidemocrático o que posteriormente se transformou no Partido Antirreeleicionista ARevolucaomexicanaFINALindd 55 ARevolucaomexicanaFINALindd 55 16062010 215940 16062010 215940 56 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA com um jornal que será redigido por José Vasconcelos e terá a participação de Francisco Madero e o Partido Nacionalista Democrático ligado a simpatizantes de Bernardo Reyes Já os grupos de apoio a Díaz como o Clube Reeleicionista também se fi zeram presentes e contavam em seus quadros tanto com científi cos como com conservadores Ao fi nal de 1909 toda a movimentação política estava concentrada em dois polos ou partidos o Reeleicionista e o Antirreeleicionista Esse contexto levou ao crescimento do Partido Liberal Mexicano Era uma oposição em escala nacional que infl uenciava não só trabalhadores mas a classe média A repressão a esse partido levouo a posições mais radicais Díaz ao contrário do passado não conseguiu dividir as forças políticas e aproximou se ainda mais dos científi cos indicando Ramón Corral para ser seu vice no mandato de 1904 a 1910 e afastou Bernando Reyes líder da facção militar Por sua vez ocorreram confl itos entre as elites e entre estas contra elementos e empresas de estrangei ros Em Chihuahua a repressão e a crise levaram a uma união multiclassista enquanto em Coahuila o clã Madero uma das famílias mais tradicionais e pertencentes à elite fi cou extrema mente insatisfeito com a entrada de empresas norteamericanas o que praticamente acabou com seu predomínio em alguns segmentos da atividade mineradora Em Morelos a ascensão da oligarquia canavieira ligada aos científi cos expropriava as terras das comunidades aldeãs para a ampliação das plantações O descontentamento desses camponeses converteuse num dos principais movimentos da futura Revolução de 1910 Por fi m um erro tático de Díaz foi uma entrevista concedida a James Creelman um jornalista norteamericano na qual afi rmava que o México estava pronto para a democracia e que ele pretendia se aposentar da política Num balanço do liberalismo mexicano Alfonso Reyes observou que a era dos liberais que se estendera por 43 anos havia durado mais do que a natureza parecia consentir A época da história do México que vai do verão de 1867 à pri mavera de 1911 admite alguns adjetivos duradoura autoritária ARevolucaomexicanaFINALindd 56 ARevolucaomexicanaFINALindd 56 16062010 215940 16062010 215940 57 A REVOLUÇÃO MEXICANA liberal dependente nacionalista pacífi ca centralista positivista urbana estrangeirista egoísta feudal corrupta e conservadora A República Restaurada e o porfi riato foram responsáveis pela integração defi nitiva do território nacional e pela elaboração de uma consciência e identidade nacionais O período porfi rista deve ser visto em relação com o antes e o depois da história do México e não em termos absolutos Foi menos sangrento que esses antes e depois Entretanto a ditadura negou às gerações mais jovens o acesso ao poder e produziu a violência que queria combater O autoritarismo foi uma mescla de concentração de poder de caráter personalista com descumprimento da lei abandono da crítica política e indiferença pelas demandas populares e pelas eleições Díaz foi implacável com a oposição periodista e parlamentar A época entre 1867 e 1911 foi centralista em todas as es feras Instalados no Palácio Nacional tanto González como Díaz não permitiram nenhuma autoridade aos caciques regionais mandando e desmandando em relação aos poderes locais O poder o dinheiro e a sabedoria concentraramse num número cada vez menor de capitalinos9 sanguessugas Se compararmos as duas fases liberais da segunda me tade do século XIX no México a República Restaurada e o porfi riato no tocante à liberdade podemos dizer que em termos políticos ela existiu de maneira restrita na primeira e foi quase nula na segunda A liberdade econômica e de ensino foi irrestrita nas duas A liberdade religiosa foi restrita na pri meira e mais ampla na segunda A liberdade de imprensa ir restrita na primeira foi limitada na segunda A liberdade de trabalho e organização dos trabalhadores foi muito restrita em ambas Os principais vetores ideológicos da era liberal provinham do positivismo Os quatro presidentes liberais fi zeram o possível para criar um clima propício ao desenvolvimento das forças produtivas do país A prosperidade porfírica assim como a de 9 Habitantes da Cidade do México Distrito Federal ARevolucaomexicanaFINALindd 57 ARevolucaomexicanaFINALindd 57 16062010 215940 16062010 215940 58 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA seus antecessores não alcançou a grande maioria da população e foi mais visível nas cidades O progresso aristocrático e urba no foi obtido ao custo de uma boa dose de dependência Mas paradoxalmente apesar da dependência econômica externa e do estrangeirismo crescente a elite política da era liberal foi profundamente patriótica ARevolucaomexicanaFINALindd 58 ARevolucaomexicanaFINALindd 58 16062010 215940 16062010 215940 59 2 REVOLUÇÃO MEXICANA A Revolução Mexicana eclodiu no fi nal de 1910 quando se aproximava mais um período de eleições presidenciais Apesar de ter anunciado que se aposentaria naquele ano Porfírio Díaz lançouse candidato a uma nova reeleição a sétima para o mandato de 19101916 A crise da sucessão presidencial era a expressão de uma disputa política que possuía raízes mais pro fundas vinculada a embates entre setores da classe dominante que por sua vez estava interligada a uma crise econômica e social que perpassava todo o México e atingia as classes subalternas A Revolução Mexicana se inicia como uma revolução política mas a crise política é apenas a espuma na superfície do mar social que se agitava em suas profundezas Para compreendermos as transformações que se operavam precisamos acompanhar o desenrolar dos acontecimentos da disputa presidencial em torno do candidato Francisco I Madero Ao seu redor se aglutinou toda a oposição a Díaz e a seu regime desde setores das elites como a própria família Madero constituída de proprietários de terras e industriais no norte do país até setores da burguesia asfi xiados pela ditadura porfi rista passando pela classe média que exigia maior participação política O descontentamento atingia também setores operários que buscavam liberdade para sua organização política e melhores condições de vida e camponeses que sofriam perseguição política e expropriação de suas terras CRISE DAS ELITES E MOBILIZAÇÃO DAS MASSAS 19101914 O ano do cometa Halley 1910 criou uma grande comoção no imaginário social e popular mexicano As camadas populares falavam que a queda de Montezuma ocorrera num ano em que ARevolucaomexicanaFINALindd Sec159 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec159 16062010 215940 16062010 215940 60 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA um cometa passou muito próximo da Terra assim como aconte ceria neste Já as camadas superiores por seu turno também se alvoroçaram pois os cientistas e astrólogos falavam que o Halley passaria próximo demais do nosso planeta e que sua cauda poderia atingir a Terra Outro acontecimento que mobilizou a população foi o recenseamento nacional Muitos acreditavam que estava sendo feito para aumentar os impostos e promover o recrutamento forçado para as tropas federais O censo revelou a tendência da população de emigrar para o norte atraída pelo desenvolvimento econômico dessa região e de concentrarse cada vez mais em cidades em virtude das melhores condições de trabalho por outro lado o censo também documentou a expansão das grandes propriedades no campo O crescimento médio da população era de 2 ao ano Para a economia 1910 foi um ano de avanços a crise parecia ter sido superada e todos os dados indicavam progresso e bonança para os anos vindouros O Partido Antirreeleicionista em convenção ratifi cou Madero como candidato Logo após sua indicação este saiu num giro político pelo norte do país Acusado de sedição foi preso antes mesmo de ocorrerem as eleições quando se encontrava na cidade de San Luis Potosí Com Madero no cárcere as eleições ocorreram conforme o esperado e Díaz reelegeuse facilmente como de costume Após as eleições um destaque especial deve ser dado para o mês de setembro marcado pelas comemorações do Centenário da Independência Nesse momento questões políticas e econômicas fi caram em segundo plano O mês foi marcado por desfi les comemorativos inaugurações procissões fogos confetes tiros de canhão discursos músicas luzes sere natas exposições e banquetes Mas dessa vez Díaz encontrou um candidato obstinado Francisco Madero Este era fi lho de uma família tradicional do Estado de Coahuila prejudicada pela competição com empresas norteamericanas Após as eleições Madero fora posto em prisão domiciliar Em seguida fugiu para os Estados Unidos e lançou um manifesto aos mexicanos o Plano de San Luis Potosí para que se sublevassem contra a ditadura porfi rista no dia 20 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec160 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec160 16062010 215940 16062010 215940 61 A REVOLUÇÃO MEXICANA de novembro O plano em geral fazia demandas políticas com exceção do artigo terceiro que de forma ambígua e vaga falava da questão das terras expropriadas aos camponeses Abusando de la ley de terrenos baldíos numerosos pe queños propietarios en su mayoría indígenas ha sido despojados de sus terrenos Siendo de toda justicia restituir a sus antiguos poseedores los terrenos de que se les despojo de un modo tan arbi trario se declaran sujetas a revisión tales disposiciones y fallos y se les exigirá a los que los adquirieron de un modo tan inmoral o a sus herederos que los restituyan a sus primitivos propietarios a quienes pagarán también una indemnización por los perjuicios su fridos Plano de San Luis Potosí 1910 Apud Córdova 1992 p431 Abusando da lei de terrenos baldios muitos proprietá rios em sua maioria indígenas foram despojados de suas terras Sendo justo restituir a seus antigos donos as terras que lhes foram usurpadas de modo tão arbitrário tais disposições e sentenças se declaram sujeitas à revisão e será exigido de todos os que adquiriram terras de modo tão imoral ou de seus herdeiros que as restituam a seus primitivos donos a quem pagarão também uma indenização pelos prejuízos Não há indícios claros de apoio dos Estados Unidos e das empresas multinacionais norteamericanas a Madero e sua revolução mas de seu lado o governo estadunidense não colocou obstáculos a que os maderistas organizassem suas atividades do lado de lá de sua fronteira As relações entre os dois países eram tensas desde 1900 Os científi cos mostraramse indignados com o intervencionismo norteamericano na América Central e no Caribe depois da Guerra HispanoAmericana Devido à hostili dade à política americana os científi cos estimularam a presença europeia na economia do país e Porfírio Díaz apoiou o presidente liberal da Nicarágua José Santos Zelaya que fora deposto em 1907 por uma invasão norteamericana Díaz concedeu asilo político ao expresidente fato que desgostou o governo estadu ARevolucaomexicanaFINALindd Sec161 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec161 16062010 215940 16062010 215940 62 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA nidense Essa situação não deixa de ser paradoxal porque no México Díaz era visto como próEstados Unidos e os americanos estavam descontentes com as últimas medidas de seu governo A Revolução Mexicana foi uma das poucas revoluções ocorridas com data e horário marcados para começar dia 20 de novembro de 1910 às 18 horas Esta primeira tentativa de levante foi um fracasso mas não impediu que o chamado de Madero fosse ouvido e respondido pelos mais diferentes grupos descontentes com o governo principalmente no meio rural Tinha início o que se convencionou chamar de Fase Maderista da Revolução defi nida como a fase política e que se desenrolou de novembro de 1910 a fevereiro de 1913 A Revolução não esperada pelos contemporâneos era uma fi lha inesperada do projeto liberal do século XIX e não foi fruto da miséria e da estagnação mas provocada pela desordem da expan são econômica e das transformações sociais e políticas decorren tes dessas mudanças Qual tinha sido o sonho em 1857 Instalar uma república democrática igualitária racional industrialista e aberta à inovação e ao progresso Qual era a realidade em 1910 Uma república oligárquica autoritária morosa desconjuntada sacudida pelas inovações e presa à tradição colonial Continuava a ser uma sociedade católica indígena baseada nas haciendas corporativa com uma indústria restrita principalmente nas áreas têxtil e de mineração e com um comércio incipiente Em resposta ao apelo de Madero ocorreram levantamen tos em Chihuahua com Pascual Orozco Pancho Villa e Abraham González em Sonora com José María Maytorena e em Coahuila com os pequenos proprietários Eulálio e Luis Gutiérrez Na Baixa Califórnia com José María Leyva em Guerrero com os Figueroa em Zacatecas com Luis Moya Todos acatavam difusamente Francisco Madero como chefe exceto o grupo dos irmãos Flores Magón que além de mexicanos contava com combatentes de diversas nacionalidades e que tentou invadir a Baixa Califórnia a partir do território estadunidense em fi ns de janeiro de 1911 Aqui cabe falar um pouco mais profundamente do movi mento magonista tão esquecido pela historiografi a ofi cial Grupos ARevolucaomexicanaFINALindd Sec162 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec162 16062010 215940 16062010 215940 63 A REVOLUÇÃO MEXICANA do Partido Liberal Mexicano PLM organizaram uma das mais poderosas colunas da campanha de Chihuahua comandada pelo líder militar do partido Prisciliano Silva Outro grupo vindo dos Estados Unidos tomou as cidades fronteiriças de Mexicali e Tiju ana no Estado da Baixa Califórnia tudo isso com os principais líderes no cárcere A força do movimento magonista deveuse muito ao seu jornal Regeneración Este periódico circulou por 18 anos fruto da tradição liberal de possuir um jornal para divulgar suas ideias Fundado em 1900 foi uma obra coletiva que além dos irmãos Ricardo e Jesús Flores Magón contava com a participação de Juan e Manuel Sarabia Librado Rivera Anselmo Figueroa e Práxedis Guerrero A publicação tornouse rapidamente uma das vozes mais críticas ao regime porfi rista e por isso foi duramente perseguida pelo governo que levou seus editores à prisão e posteriormente ao exílio nos Estados Unidos onde continuaram a publicar e enviar para o México pelo correio os exemplares do jornal Por meio de uma rede de distribuição este chegou a ser vendido no Uruguai na Argentina e mesmo no Brasil Em 1906 saiu publicado no jornal o Programa do Partido Liberal Mexicano Em 1910 por meio do Regeneración o PLM assume sua postura anarquista e o projeto de organizar uma revolução no México para derrubar Díaz e transformar o país Quais eram as táticas do PLM e da organização dos magonistas para atingir seus objetivos Em primeiro lugar or ganizar células ou clubes políticos em segundo seus membros deveriam incorporarse em organizações de massa e por fi m instrumentalizar essas organizações com técnicas políticas e núcleos armados para entrar em combate Tentaram colocar em prática tais táticas com relativo sucesso como demonstram as greves de Cananea e de Río Blanco onde seus membros tiveram participação decisiva No artigo Aos Proletários o jornal lançou um chamado à luta aos trabalhadores da cidade e do campo Os magonistas propunham uma luta contra o centralismo político e econômico e a favor de uma reforma agrária A partir de 1911 redefi nem a luta por uma perspectiva mais radical embora alguns de seus membros aderissem ao movimento maderista ARevolucaomexicanaFINALindd Sec163 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec163 16062010 215940 16062010 215940 64 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA sua direção rejeitou a aproximação pois julgou Madero uma espécie de Kerenski Foi desse ano a primeira declaração pública do anarquismo como ideologia do grupo magonista Os mago nistas durante sua estada em terras estadunidenses contaram com o apoio dos militantes do sindicato Industrial Workers of the World IWW de tendência anarcosindicalista e sofreram infl uência de suas ideias assim como do anarquismo espanhol No início da revolução em 1911 foi a principal força política alternativa ao maderismo sendo a única organização políticomilitar com inserção social nacional Passou de uma aliança com a burguesia a uma posição mais radical e autônoma Entretanto em fi nais de 1911 já sob a presidência de Francisco Madero o Exército Federal entrou no norte da Baixa Califórnia e derrotou facilmente a efêmera república fl oresmagonista na região Depois de 1912 o PLM entra em crise Como explicar essa crise Em primeiro lugar a ideologia anarquista não abordava o problema do poder centralizado ou seja do Estado apesar de construir um partido centralizado e usar uma tática intuitivamente leninista sem a conhecer O fracasso segundo Armando Batra estaria no fato de que o operariado mexicano não estava maduro para levar a cabo uma aliança operáriocamponesa em que os primeiros tomassem a direção A luta na Revolução Mexicana enveredou para uma guerra camponesa prolongada e os operários não se uniram aos camponeses Esta união ocorreu apenas em alguns casos Zapata chegou a convidar a Junta Organizadora do PLM para ir a More los mas Ricardo Flores Magón não aceitou Não se colocava no horizonte desses revolucionários lançaremse ao campo embora entre 1914 e 1915 quando o governo da Convenção fi cou sob a jurisdição dos zapatistas que ocuparam a Cidade do México as relações entre o movimento operário e os camponeses torna ramse mais sólidas Esse tópico será retomado mais adiante Os limites do movimento foram impostos pelo próprio periódico Regeneración ou seja a difi culdade de usar um jornal e fazer propaganda por via escrita num país composto majori tariamente de analfabetos Ademais nem todos os leitores do ARevolucaomexicanaFINALindd Sec164 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec164 16062010 215940 16062010 215940 65 A REVOLUÇÃO MEXICANA jornal eram necessariamente militantes do PLM Outra limita ção se dá quando a revolução se torna uma guerra camponesa prolongada Quando isso aconteceu o magonismo não soube realizar a aliança operáriocamponesa Devese destacar que algumas das principais propostas apresentadas em seu programa de reivindicações tais como liberdade política regime democrático salário mínimo jornada de oito horas liberdade de organização operária divisão de terras anulação de dívidas dos peões ampliação do mercado interno desenvolvimento industrial e luta contra o imperialismo foram incorporadas na Constituição de 1917 Cabe lembrar também que em outras regiões do México os socialistas tiveram papel importante por exemplo em Yucatán Grosso modo surgem dois centros geográfi cos revolu cionários duradouros no sul forças camponesas do estado de Morelos lideradas por Emiliano Zapata iniciam uma revolução agrária Esse movimento que passou boa parte dos anos de lutas civis 19101920 de forma autônoma em relação às outras forças contribuiu decisivamente para o caráter social popular e camponês da revolução O exército camponês comandado por Emiliano Zapata era orientado com base na proposta de restituição das terras comunais dos pueblos expropriados pelas grandes fazendas da região plasmadas no Plano Ayala O Plano Ayala foi redigido e assinado pelos chefes zapatis tas em Ayoxustla Puebla em 28 de novembro de 1911 A partir desse momento o plano se torna o programa zapatista sendo discutido por Emiliano Zapata e Otílio Montaño1 e redigido por este último O Plano Ayala desconhecia Madero como presidente e pedia sua destituição Seus artigos fundamentais defendiam três pontos a os pueblos ou cidadãos que possuíssem os do 1 Otílio Montaño é uma figura singular no processo revolucionário mexicano Nascido em Villa de Ayala no estado de Morelos realizou seus estudos em Cuatla e foi designado professor em escolas de Jonacatepec e Tepalcingo Chegou a ser diretor de uma escola em Villa de Ayala Apoiou a revolução maderista desde seu início posteriormente unindose à Zapata ARevolucaomexicanaFINALindd Sec165 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec165 16062010 215940 16062010 215940 66 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA cumentos de terras expropriadas pelos fazendeiros tomariam imediatamente a posse delas e as manteriam de armas em punho até o fi nal da revolução b expropriação de um terço das terras e propriedades dos grandes latifúndios mediante pagamento de indenização a fi m de que os povos e cidadãos do México pudes sem trabalhar nelas c nacionalização da totalidade dos bens dos grandes fazendeiros científi cos ou caciques políticos que se opunham direta ou indiretamente ao plano O plano embora simples e até limitado pois tratava apenas da questão da terra possuía um caráter profundamente revolucionário na medida em que determinava a nacionalização dos bens dos inimigos da revolução ou seja os latifundiários e os capitalistas e por outro lado estipulava que os camponeses e pueblos tomassem posse de suas terras imediatamente O Norte ao contrário do Sul não produziu um movimento uniforme Dois grupos principais formavam as tropas made ristas um liderado por Pascual Orozco e outro composto de guerrilheiros comandados por Francisco Villa O movimento de Pancho Villa não possuía formas de mobilização e bandeiras políticas tão claras como o do Sul o que difi cultou a elaboração de um programa político de reformas sociais mais claras Ainda no Norte formaramse outros movimentos revolucionários advindos de forças heterogêneas que no futuro dariam origem a uma nova elite revolucionária Em sua maioria seus líderes eram originários da classe média e seus exércitos eram advindos de forças repressivas provinciais que posteriormente deram origem aos exércitos revolucionários liderados por Venustiano Carranza em Coahuila e Álvaro Obregón no estado de Sonora A Revolução transformouse num emaranhado de forças políticas e sociais e Madero não conseguiu ter um controle efetivo sobre os vários grupos que se uniram à sua causa Em todo o país os grupos revolucionários se multiplicavam princi palmente na fronteira norte desencadeando vários movimentos heterogêneos entre si Podemse citar além dos dois grupos anteriores as facções ligadas a Bernardo Reyes ao Partido Nacional Católico e a Abraham González ARevolucaomexicanaFINALindd Sec166 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec166 16062010 215940 16062010 215940 67 A REVOLUÇÃO MEXICANA Em primeiro de abril de 1911 Díaz foi à Câmara de Deputados para abrir as sessões legislativas e dar o informe de governo Prometia emendas jurídicas como a não reeleição o fi m dos abusos das instituições ofi ciais a reforma da lei elei toral a reorganização do poder jurídico e o fracionamento dos latifúndios Seus conselheiros não se atreviam a informálo da gravidade da situação no país Díaz não estava sufi cientemente inteirado dos contínuos reveses sofridos pelas tropas federais Começou a tomar conhecimento dos fatos depois de 15 de abril Esse foi o mês das derrotas e das quedas de várias cidades Chi lapa Inde Cuencamé Durango San Andrés Tuxtla Sombrerete Agua Prieta em maio a cada dia os revoltosos traziam uma nova surpresa No dia 10 caiu Ciudad Juárez Ato contínuo novas negociações foram abertas e no dia 21 as tropas federais assinaram um acordo com os revolucionários Finalmente após cinco meses de confl ito a 25 de maio de 1911 Porfírio Díaz renunciou Era o fi m de um longo período da história mexicana Foi substituído por Francisco Léon de la Barra como presidente provisório até a convocação de novas eleições Os acordos de Ciudad Juárez haviam selado a continui dade do Estado burguês entre o governo de Porfírio Díaz e o de Madero Os acordos deixam claro qual era seu objetivo dar cabo da revolução camponesa em gestação Um balanço rápido desses primeiros fatos revolucioná rios revela que a Revolução foi fruto de um descontentamento agrário resultado das décadas de usurpações das terras das comunidades camponesas do sul centro e norte do país Soma se a isso a oposição política que aumentou durante a primeira década do século XX principalmente entre a classe média e a operária ou seja a Revolução também foi instigada pelo mono pólio político e econômico da oligarquia porfi riana Contribuiu ainda a infl ação causada pela alta dos impostos governamentais para manter a máquina estatal A Revolução foi também produto do desenvolvimento econômico Os investimentos estrangeiros principalmente norte americanos e britânicos deram origem a novos empreendimen ARevolucaomexicanaFINALindd Sec167 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec167 16062010 215940 16062010 215940 68 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA tos mineiros que provocaram ondas migratórias e concentraram grandes quantidades de operários em cidades do norte do país Ao mesmo tempo desenvolveramse a pecuária e a agricultura capitalistas surgidas para abastecer o mercado mineiro e os Estados Unidos Não podemos esquecer a indústria têxtil e seu capital francês e espanhol Assim viuse o despontar do Norte sob os auspícios de um surto capitalista e um boom econômico com o surgimento de ferrovias bancos a indústria petroleira de mineração e de fundição em Monterrey Esse surto migratório veio a ser conhecido como o chamado do Norte ou do deserto Esse processo vinculado ao trabalhador livre foi o núcleo da rebelião maderista no eixo montanhoso e de concentração das cidades mineiras com forte presença de trabalhadores localizados na Sierra Madre Ocidental ou seja o norte serrano Essa que era a região mais dinâmica do capitalismo mexicano e a mais integrada à economia mundial e em especial à norteame ricana foi portanto a mais afetada pela crise mundial de 1908 Cabe lembrar que esses trabalhadores rapidamente de senvolveram uma consciência nacional dando origem a uma ideologia nacionalista Esse fato se deve a que muitas empresas estrangeiras as norteamericanas em especial principalmente dos setores ferroviário petrolífero e minerador reservavam seus melhores empregos e salários a estrangeiros cabendo aos mexicanos os cargos e salários inferiores Além disso essas empresas tinham uma longa tradição de maustratos aos traba lhadores Nesse sentido a Revolução Mexicana foi uma resposta ao imperialismo norteamericano2 O porfi riato engendrou o seu próprio fi m ao afastar uma parcela das elites regionais e ao agir em favor dos interesses es trangeiros promovendo ao mesmo tempo uma nova geração de oligarcas Também acelerou o processo de centralização política 2 Assim como outras revoluções nesse mesmo período a Revolução Mexicana foi uma resposta nacionalista ao imperialismo britânico e norte americano Para um aprofundamento dessa discussão ver o excelente capítulo Causalidade mundial Irã China Rússia e México no livro de Hart 1990 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec168 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec168 16062010 215940 16062010 215940 69 A REVOLUÇÃO MEXICANA e a eliminação de certos caciques regionais O ano de 1908 foi apenas a semeadura do colapso Com a renúncia de Porfírio Díaz foram realizadas novas eleições que aclamaram Francisco Madero Essa primeira fase da Revolução não causou grandes danos à economia mexicana principalmente porque a luta armada fi cou restrita a regiões espe cífi cas do país o extremo norte e o estado de Morelos As eleições ocorreram em 1o de outubro de 1911 e Francisco Madero foi eleito com 53 dos votos pelo Partido Progressista Constitucional o antigo Partido Antirreeleicionista O curto governo de Fran cisco Madero novembro de 1911 a fevereiro de 1913 foi hostil ao movimento operário e tratou de controlálo e regulamentálo Para tanto criou o Departamento do Trabalho Acabou com a censura à imprensa e em geral foi um governo de respeito às liberdades democráticas mas fechado às transformações sociais Nesse sentido não causa estranheza que procurasse reprimir os magonistas na Baixa Califórnia como já foi citado Sua relação com o movimento camponês foi distinta Na medida em que os camponeses em especial os zapatistas se negaram a depor as armas procurou reprimilos Realizou sucessivas campanhas contra eles em especial a comandada pelo san guinário general Juvêncio Robles em 1912 para acabar com o levantamento em Morelos Nessas campanhas Juvêncio Robles usou a mesma política que quase meio século depois as tropas norteamericanas utilizariam no Vietnã fuzilamento em massa queima de pueblos saque e tortura contra camponeses suspeitos Madero e seu governo enfrentaram a violenta oposição de Zapata e seus camponeses que continuaram em armas e lançaram o já mencionado manifesto político denominado Plano Ayala em 25 de novembro de 1911 Em Morelos onde já havia ocorrido a reforma agrária os camponeses ocuparam as terras que lhes haviam sido usurpadas pelos grandes proprietários Com essa retomada colocaram em cheque o eixo da acumulação capitalista no país qual seja o grande latifúndio Este confl ito é uma expressão da luta de classes na medida em que o Plano Ayala inverte a juridicidade burguesa quando propõe que serão ARevolucaomexicanaFINALindd Sec169 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec169 16062010 215941 16062010 215941 70 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA os hacendados que terão de comprovar quais propriedades lhes pertenciam Tal ato era a expressão clara e orgânica da afronta das forças sociais Além das resistências à esquerda de zapatistas e traba lhadores Madero sofre oposição pela direita de grupos rema nescentes do porfi riato inconformados com a perda do poder Eclodiram as revoltas do general Bernardo Reyes na região nordeste no norte a dos irmãos Emílio e Francisco Vázquez Gómez a de Pascual Orozco um de seus primeiros partidários a dos corpos auxiliares do Exército e de governadores As duas revoltas de Orozco e dos irmãos Vázquez Gómez tiveram como palco mais precisamente o estado de Chihuahua Para debelar essas rebeliões Madero teve de reforçar o Exército comandado por Victoriano Huerta e viuse obrigado a recorrer a emprés timos externos O governo Madero viveu uma democracia constantemente ameaçada de um golpe Os golpistas contavam com o apoio da Câmara de Deputados e do Senado o centro da contrarrevo lução da imprensa e dos Estados Unidos então governado pelo presidente William Howard Taft do Partido Republicano o qual apoiou governo no México favorável aos Estados Unidos mesmo tendo perdido as eleições de 1912 para o democrata Woodrow Wilson Havia também uma oposição advinda dos antigos porfi ristas Estes executaram três tentativas de golpe A primeira em outubro de 1912 comandada por Félix Díaz sobrinho de Porfírio Díaz teve por base a cidade de Veracruz principal porto de exportação mexicano Ela foi debelada e seu líder preso Madero novamente foi obrigado a aumentar sua dívida com o Exército A segunda tentativa golpista foi comandada pelo general Manuel Mondragón e ocorreu na capital em 9 de fevereiro de 1913 O ob jetivo dessa insurreição era libertar os generais Bernardo Reyes e Félix Díaz e em seguida tomar o Palácio Nacional O primeiro intento foi alcançado mas a tomada do palácio não ocorreu e ainda causou a morte de Reyes Os golpistas retrocederam para um local conhecido como Ciudadela e ali se entrincheiraram ARevolucaomexicanaFINALindd Sec170 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec170 16062010 215941 16062010 215941 71 A REVOLUÇÃO MEXICANA Victoriano Huerta designado comandante das tropas federais foi enviado para reprimir o cuartelazo Esses acontecimentos marcaram o início do que fi cou conhecido como Decena Trágica Durante dez dias de 9 a 18 de fevereiro a cidade viveu momentos de pânico assistindo às batalhas entre rebelados e tropas fi éis ao governo constitucional Naquele momento a debilidade social e política do governo havia alcançado seu ponto mais alto e sua sorte estava lançada No fi nal com a intermediação do embaixador norte americano no México Huerta fez um acordo com os rebela dos para destituir Madero e instaurar um triunvirato e assim traiu a confi ança que Madero depositara nele prendendo e assassinando o presidente e seu vice Na sequência assumiu a presidência rompendo o acordo estabelecido Dessa forma após dois golpes fracassados as facções militares os conservadores e os partidários remanescentes do porfi riato conseguiram retornar ao poder Madero no fi nal foi derrubado não por um general de Porfírio mas por sua própria ala direita seu ministro da Guerra Com o fi m do governo maderista desaparecia o último verniz de legitimidade do sistema e a revolução das camadas populares tendo à frente os camponeses que já fervilhava sub terraneamente eclodiu A partir de fevereiro de 1913 iniciase o governo con trarrevolucionário de Victoriano Huerta ao qual se opôs uma nova onda revolucionária A princípio não houve nenhuma resistência ao golpe por parte do Exército da Justiça ou da maioria dos governadores sinal inequívoco da fragilidade do governo de Madero e do apoio das elites e de seus represen tantes Apenas o governador Venustiano Carranza do pequeno estado de Coahuila no nordeste do país desconheceu o novo governo Esse movimento lançou o Plano de Guadalupe em que o poder federal não era reconhecido nem os governadores que não rompessem com Huerta além de declarar Carranza o Primeiro Chefe da revolução Um detalhe importantíssimo foi que neste plano muito próximo da postura de Madero não consta nenhum artigo referente às demandas sociais ARevolucaomexicanaFINALindd Sec171 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec171 16062010 215941 16062010 215941 72 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA Em seguida as forças políticas do estado de Sonora tam bém se uniram a Carranza Esses grupos todos se denominavam constitucionalistas pois se diziam defensores da Constituição de 1857 As forças revolucionárias possuíam uma fachada múltipla no norte com três grandes grupos revolucionários Carranza Obregón e Villa e uma fachada única no sul com Zapata As forças zapatistas em Morelos que permaneceram continua mente em luta mesmo durante o governo Madero mantiveram sua autonomia Quanto às relações internacionais os governos posicionaramse de forma ambígua e não reconheceram o novo mandatário de imediato Do ponto de vista econômico houve uma crise principal mente na indústria de mineração devido à queda nos preços da prata Por outro lado o governo conseguiu um empréstimo internacional insufi ciente porém para fazer a economia deslan char Os refl exos da crise na mineração e nos pequenos negócios do Norte logo se fi zeram sentir e para completar a seca desse ano fez os preços dos grãos aumentarem determinando uma desvalorização do peso frente ao dólar As forças constitucionalistas estavam basicamente agru padas em três exércitos a Divisão do Norte comandada por Francisco Villa e que tinha como teatro de operações os estados de Chihuahua Durango e Zacatecas o Exército do Nordeste liderado por Pablo Gonzaléz e atuando nas regiões de Coahuila Nuevo Leon Tamaulipas Tampico e o Exército do Noroeste capitaneado por Álvaro Obregón e atuando em Sonora e Sinaloa Os levantes dos revolucionários do estado de Sonora resultam de uma tentativa de supremacia políticomilitar pois as forças federais eram vistas como um exército de ocupação Assim elementos como Álvaro Obregón Adolfo de la Huerta Plutarco Elias Calles Salvador Alvarado e outros todos pequenos e médios agricultores comerciantes ou rancheiros modestos organizaram uma revolução baseada no palácio do governo estadual num processo profi ssional de agrupamento militar O motivo ideológico desse grupo vinculado a uma pequena ARevolucaomexicanaFINALindd Sec172 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec172 16062010 215941 16062010 215941 73 A REVOLUÇÃO MEXICANA burguesia agrária ou urbana era derrotar os últimos vestígios do antigo regime e ascender na política local e nacional Já os motivos de Villa resultavam de uma condensação de vários levantamentos fragmentários de caráter mais popular e radical com um vago projeto da utopia militar de atualização das antigas colônias militares A esta altura podemos afirmar que existiam quatro grandes eixos da nova rebelião a a frente zapatista no sul b as colunas próximas ao primeirochefe Venustiano Carranza comandadas por Pablo González c as forças organizadas pelo governo de Sonora e comandadas por Álvaro Obregón d a torrente villista Foi por meio do Pacto de Monclova que se deu a união dos quatro eixos formando o que fi cou conhecido como Revolução Constitucionalista Mas essa união continha divisões internas uma fratura representada pela disputa CarranzaVilla e outra pela visão preconceituosa que os nortistas tinham do exército sulista considerado por aqueles com uma forte carga colonial e indígena com o cheiro do México velho Afi nal o norte era laico empreendedor branco rancheiro e comedor de trigo enquanto os sulistas eram predominantemente mestiços camponeses e comedores de milho O governo de Huerta fez três iniciativas na tentativa de costurar uma hegemonia política e militar no México Convocou eleições e aproximouse politicamente da Igreja dos progres sistas científi cos e reystas além de aumentar seguidamente o efetivo do Exército Durante o verão de 1913 o Exército Federal conquistou uma série de vitórias contra os Exércitos do Nordeste e do Noroeste Na frente externa os Estados Unidos enxergavam no governo de Huerta uma aproximação com a Inglaterra o que afetava segundo sua ótica as indústrias petrolíferas norte americanas O novo governo democrata de Woodrow Wilson fez sérias ameaças a Huerta e não reconheceu seu governo Huerta saiuse vitorioso nas eleições presidenciais e obteve maioria no Congresso graças ao apoio dos católicos Ao mesmo tempo os exércitos do Nordeste e do Noroeste se reorganizavam assim como a Divisão do Norte e partiam numa contraofensiva ARevolucaomexicanaFINALindd Sec173 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec173 16062010 215941 16062010 215941 74 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA Essa estratégia das forças contrarrevolucionárias de Huer ta funcionou até o início de 1914 quando chegou a dominar dois terços do país Até então continuava a dominar os principais portos do território e mantinha sob controle a Igreja os em presários e os banqueiros Apesar de o Exército Federal chegar a contar com duzentos e cinquenta mil homens a Revolução cresceu e conquistou vitórias importantes como a tomada de Monterrey Tampico e Torreón no norte enquanto os zapatistas atacavam o estado de Guerrero ao sul O não reconhecimento pelos Estados Unidos da adminis tração de Huerta levou a uma crise com esse país Os Estados Unidos planejaram invadir o México com a tomada dos portos de Veracruz e Tampico por fuzileiros navais norteamericanos Wilson usou a desculpa da prisão de alguns marinheiros em Tampico e ordenou à sua frota no Atlântico que tomasse as duas cidades Esperava que com essa ação Huerta renunciasse e se isso não acontecesse planejava tomar a Cidade do México a fi m de derrubálo A intervenção fracassou devido à resistência da guarnição mexicana ao desembarque dos fuzileiros em Veracruz e as forças que se dirigiam para Tampico tiveram de ser redirecionadas para Veracruz Huerta acabou obtendo um fugaz apoio dos católicos e das populações das cidades principalmente devido ao antiamericanismo enraizado nos mexicanos Wilson teve de se contentar em permanecer em Veracruz e aceitou a mediação do grupo de países denominado ABC Argentina Brasil e Chile Mas indiretamente os desejos norteamericanos se concreti zaram pois a situação de Huerta começou a deteriorar devido à perda da receita da alfândega de seu principal porto com o embargo de compras de novas armas e munição que também chegavam predominantemente por ali Esses acontecimentos levaram ao enfraquecimento do governo Huerta não possuía base de sustentação política suas forças foram sufi cientes para dar o golpe mas não para construir uma hegemonia Ademais a mobilização das camadas populares se mostrava irreversível Enquanto os exércitos do Nordeste e do Noroeste praticamente ARevolucaomexicanaFINALindd Sec174 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec174 16062010 215941 16062010 215941 75 A REVOLUÇÃO MEXICANA não avançavam as tropas da coalizão camponesa da Divisão do Norte comandadas por Francisco Villa seguiam de vitória em vitória aproximandose da capital e só não a tomaram devido à interrupção no fornecimento de carvão para os trens que transportavam seus exércitos A ordem de cortar os combustíveis para os trens de Villa partiu de Carranza temeroso da força que Villa adquiriria A hostilidade de Carranza era reforçada pelas diferenças de classes existentes entre os dois Nesse ínterim apoiado por Carranza Obregón avançou pela costa do Pacífi co onde não encontrou muita resistência das forças federais Em 8 de julho de 1914 Huerta renunciou logo após a queda de Guadalajara a segunda maior cidade do país Os comandantes do Exército Federal assinaram os tratados de Teoloyucan com as forças revolucionárias representadas por Álvaro Obregón e em agosto de 1914 suas tropas entraram na capital federal O tratado estipulava que as Forças Armadas seriam dissolvidas e que Venustiano Carranza assumiria como presidente provisório A dissolução do Exército Federal e sua substituição pelo Exército Constitucionalista marcou uma ruptu ra de peso na Revolução O Exército Federal era o mesmo desde o tempo de Porfírio Díaz e somente com a derrota defi nitiva e sua dissolução ocorreu a ruptura total com o antigo regime Por outro lado a continuidade do movimento revolucionário dos za patistas signifi cava que a guerra de classes não se interrompera Nesses primeiros anos da Revolução verifi case uma fragmentação das elites mexicanas e uma gradual mobilização das camadas populares capitaneadas pelas forças revolucio nárias camponesas em especial as zapatistas e villistas tendo em segundo plano grupos urbanos provenientes de setores do proletariado e da classe média A mobilização das camadas populares levou a um novo degrau na luta revolucionária o objetivo agora era a tomada do poder central Com a derrota do Exército Federal e a saída de cena de Victoriano Huerta era natural que a aliança multiclassista que enfrentara as forças contrarrevolucionárias entrasse em crise e abrisse espaço para uma guerra de classes ARevolucaomexicanaFINALindd Sec175 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec175 16062010 215941 16062010 215941 76 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA CONFRONTO DE CLASSES E VITÓRIA MOMENTÂNEA DOS CAMPONESES 19141915 Entre agosto de 1914 e outubro de 1915 o México viveu o período mais intenso da Revolução Nessa fase deuse a frag mentação das forças revolucionárias em várias facções e ocorreu a radicalização dos camponeses Nesse momento os grupos vitoriosos entraram numa intensa disputa pela defi nição do tipo de regime que deveriam construir Quatro grandes exércitos revolucionários haviam se desenvolvido em diferentes regiões do México tanto material como socialmente Eram os exércitos do Nordeste do Noroeste do Norte e do Sul cada um representan do uma confi guração particular das forças sociais em luta Os exércitos do Nordeste e do Noroeste possuíam semelhanças em sua composição social e propostas ideológicas mas em relação aos outros dois estes se desenvolveram de maneira tão diferente que a luta para construir o novo Estado teria de começar como uma guerra em torno das relações sociais da produção com a questão da terra no centro da disputa Na realidade a divisão das forças constitucionalistas já tinha ocorrido meses antes quando praticamente houve o rompimento entre Villa e Carranza Uma última esperança de manter a união foi feita com o Pacto de Torreón em que as várias facções se comprometeram a convocar uma assembleia assim que o inimigo comum fosse derrotado Se economicamente o país conseguiu passar sem proble mas pelos três primeiros anos da guerra civil nos anos seguintes ele se encontrava numa situação caótica Havia ocorrido um colapso das transações comerciais e políticas tanto em nível nacional como regional e local O país tinha perdido o crédito internacional o Tesouro fora levado à exaustão com os seguidos esforços de guerra e a dívida externa atingiu patamares estra tosféricos O sistema bancário estava na bancarrota as estradas de ferro destruídas a mineração interrompida e a agricultura estava em crise Nesse momento podese dividir as forças revolucionárias em ação em dois grandes grupos As forças constitucionalistas ARevolucaomexicanaFINALindd Sec176 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec176 16062010 215941 16062010 215941 77 A REVOLUÇÃO MEXICANA formadas pelos exércitos do Nordeste e do Noroeste que se assemelhavam pois ambos tinham sido formados com base em contingentes mais ou menos profi ssionais ganhavam soldo e seus líderes todos agora generais à época em que haviam entrado nas tropas revolucionárias eram jovens saídos das classes média e alta de comerciantes e fazendeiros médios ou pequenos Mais próximos das organizações trabalhistas não davam muita atenção para a questão agrária não se interes savam pela situação do peão não possuíam propostas sociais que a estes favorecessem e eram profundamente anticlericais traço característico dos liberais mexicanos desde o século XIX Por sua vez as forças camponesas integrantes da Divisão do Norte e comandadas por Francisco Pancho Villa compostas por cerca de trinta mil soldados eram heterogêneas formadas por camponeses mineiros vaqueiros ferroviários desempre gados e bandidos todos imbuídos de um vago projeto social O Exército do Sul contava com quinze mil soldados regulares e aproximadamente dez mil guerrilheiros todos habitantes do estado de Morelos e arredores em sua maioria camponeses e pequenos proprietários Possuíam um projeto social explicitado no Plano Ayala que propunha a devolução aos pueblos das terras expropriadas durante o governo de Díaz pelas grandes fazendas estatais de açúcar como vimos anteriormente Apesar de existirem grupos independentes estas eram as principais forças militares do país em outubro de 1914 Foram estes grupos heterogêneos que fi zeram a primeira tentativa de estabelecer um ordenamento jurídico para o país com a convocação de uma Convenção Revolucionária a se reunir na Cidade do México a partir daquela data Com a vitória militar da coalizão de forças opostas ao go verno de Huerta e dissolvido o Exército Federal a grande tarefa que se assomava no horizonte dos revolucionários mexicanos era reorganizar o Estado e isto passava pela pacifi cação do país mediante a realização de um grande acordo entre as diversas facções em luta Coube a Álvaro Obregón mais à esquerda dentro do espectro político do carrancismo exercer um papel funda ARevolucaomexicanaFINALindd Sec177 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec177 16062010 215941 16062010 215941 78 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA mental na tentativa de manter a unidade e de convencer tanto os representantes villistas como os carrancistas a cumprirem o Pacto de Torreón Este pacto selara o acordo entre Francisco Villa e Venustiano Carranza no qual fi cara estabelecido que assim que fosse derrubado o governo ditatorial de Victoriano Huerta seria convocada uma Convenção das tropas revolucionárias para discutir as eleições e demais assuntos de interesse geral A Convenção Revolucionária Mexicana iniciou seus trabalhos no dia 1o de outubro de 1914 Todos os militares envolvidos na luta contra Huerta teriam participação representados por delegados eleitos na proporção de um para cada mil revolucionários A convenção se realizaria na Cidade do México no recinto da Câmara dos Deputados A princípio os villistas recusaramse a comparecer alegando que a capital não era um local neutro A Convenção Revolucionária no intuito de aglutinar as forças aprovou a mu dança de local e escolheu a cidade de Aguascalientes Assim no dia 10 de outubro reiniciaramse os trabalhos no Teatro Morelos As diversas facções revolucionárias foram convidadas a enviar representantes Existiam cinco grupos distintos os carrancistas os villistas um terceiro grupo de 26 delegados zapatistas que chegaram apenas no dia 26 de outubro um quarto grupo de delegados obregonistas a ala da esquerda do carrancismo ou como foram chamados depois jacobinos e por fi m um grupo de representantes independentes Faziam parte desta Con venção 57 generais governadores militares 95 representantes de tropas e mais a delegação zapatista que possuía direito de voz mas não de voto Portanto a convenção fi cou restrita aos elementos militares deixando de fora os civis que em grande parte apoiavam Carranza A Soberana Convenção título conferido no primeiro dia de atuação para marcar a posição de independência dos diversos grupos políticos na tentativa de resolver as rivalidades entre os vários líderes votou pela renúncia simultânea dos três principais Carranza Villa e Zapata O primeiro não reconheceu a autoridade jurídica da assembleia e retirouse para Veracruz ARevolucaomexicanaFINALindd Sec178 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec178 16062010 215941 16062010 215941 79 A REVOLUÇÃO MEXICANA O novo presidente provisório Eulálio Gutiérrez reconheceu Villa como chefe da Divisão do Norte e Zapata como chefe do Exército do Sul Obregón e seus delegados optaram por permanecer ao lado de Carranza e abandonaram a assembleia Depois que Carranza deixa a capital as tropas que apoiavam a Convenção basicamente zapatistas e villistas ocupam a Cidade do México o que ocorreu nos dias 24 e 25 de novembro de 1914 Com a Cidade do México desocupada pelas forças constitucionalistas a Convenção transferese para a capital a partir de 1o de janeiro de 1915 Essa mudança para a Cidade do México foi uma das muitas que se realizaram até sua dissolução completa em outubro de 1915 A Convenção signifi cou a união das facções villista e zapatista por alguns meses porque depois houve desentendimentos que causaram uma ruptura entre elas Essa união temporária permitiu a ocupação do poder central No processo revolucionário mexicano o Exército do Sul representou a evolução mais profunda das lutas camponesas ao longo da história desse país Devese aos camponeses indígenas e mestiços de Zapata mais do que a qualquer outro dos grupos revolucionários a orientação fundamentalmente agrária da Revolução Mexicana Graças a eles a Revolução assumiu as proporções de uma revolução social visto que os demais mo vimentos revolucionários eram antes de tudo políticos Por que Morelos representa um fator decisivo na Revo lução Por aspectos econômicos históricos e culturais Logo após a conquista essa região foi transformada no Marquesado del Valle de Cortés que só compreendia indígenas e excluía os brancos Ainda no período colonial os marqueses tinham o direito de alienar as terras assim elas foram fragmentadas e vendidas para capitalistas que ali implantaram engenhos de açúcar dando origem a uma rica classe proprietária No início do século XX essa região ainda era densamente povoada por indígenas e por isso concentrava abundante mão de obra ca racterística fundamental para o desenvolvimento de engenhos de açúcar Suas terras quentes e férteis estavam próximas da capital e eram propícias ao cultivo de canadeaçúcar ARevolucaomexicanaFINALindd Sec179 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec179 16062010 215941 16062010 215941 80 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA Devido a essa história particular era constante a tensão entre as comunidades indígenas e as haciendas em função do avanço destas sobre as terras comunais O processo de moder nização das haciendas açucareiras de Morelos fez surgir uma pressão pelas terras e pela mão de obra indígena aumentando exponencialmente durante o governo de Porfírio Díaz Assim os indígenas se transformaram em peões e como não conheciam a greve partiram para a forma de luta que conheciam os levantes e as rebeliões rurais O movimento zapatista seria o último elo de uma longa cadeia de rebeliões camponesas ocorridas no fi nal do século XIX por todo o território mexicano como defi ne muito bem o historiador François Chevalier em seu artigo clássico no qual afi rma De modo que o levante zapatista não é um fenômeno isolado extraordinário e único como nos apresentam alguns historiadores da Revolução Mexicana porque parece melhor como a explosão da zona mais crítica deste profundo mal estar social cujas manifestações mais evidentes haviam sido a bandidagem endêmica no Estado de Morelos no século XIX e sobretudo a sucessão quase ininterrupta de insurreições de indígenas e de camponeses por motivos essencialmente agrários Chevalier 1960 p168 A princípio a rebelião zapatista assemelhavase aos movimentos camponeses tradicionais os rebeldes lutavam para recuperar a terra perdida pelas comunidades contando com o apoio da forte tradição comunitária coletiva que remete ao calpulli préhispânico no qual não existia o individualismo Como o movimento camponês possuía então fortes vínculos comunitários muitos intérpretes viram nesse grupo um lo calismo exacerbado Seus membros destacavamse por suas vestimentas e tradições marcadamente indígenas Utilizavam a tática guerrilheira em que o comandante era escolhido entre os mais corajosos ou enérgicos e apesar de não possuírem uma organização centralizada tinham uma intendência e um setor ARevolucaomexicanaFINALindd Sec180 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec180 16062010 215941 16062010 215941 81 A REVOLUÇÃO MEXICANA de fi nanças central Recebiam forte apoio das comunidades sob a forma de alimentos e reconhecimento do terreno ao mesmo tempo em que davam continuidade ao trabalho agrá rio plantio e colheita Seus líderes demonstravam profundo respeito e simpatia pela Igreja pelo clero e pela religião Cabe destacar que enfrentavam o antagonismo e o forte preconceito da população urbana branca a gente de razão que via nessas populações mestiças e indígenas zapatistas do meio rural uma força elementar cega e desprovida de razão O líder dessa facção era Emiliano Zapata Cabe dizer que este não era um camponês típico Possuía instrução primária sua inteligência era intuitiva e era dotado de grande sensatez Provavelmente era um mestiço de sangue negro que falava com os indígenas de igual para igual Na realidade sua origem advém de líderes comunitários de Anenecuilco e da Villa de Ayala e por isso não vestia no cotidiano nem a manta branca nem as sandálias de huaraches típicas dos camponeses do sul do México Usava habitualmente o traje de charro com calças justas grandes esporas jaqueta curta e sombrero galoneado decorado Seus generais logo começaram a seguir esse modelo de vestimenta Zapata era um tratador de cavalos o que não implica uma desvinculação com a população que lidera Era um indivíduo do campo e portanto estava inserido na sua tradição camponesa Tornouse soldado a contragosto e viveu na Cidade do México por um curto período como tratador de cavalos de um rico proprietário Portanto apesar de ser um homem do campo possuía experiência urbana Seus contemporâneos o descrevem como um exímio ginete O pensamento político de Zapata é fruto da inspiração popular e rural Posteriormente derivou para uma posição mais radical e jacobina ou socializante infl uenciado provavelmente por Antonio Díaz Soto y Gama Essa mudança levou à ratifi cação do Plano Ayala que signifi cou uma radicalização da proposta de reforma agrária A outra ala das forças camponesas é complementada pelo movimento liderado por Francisco Pancho Villa no norte O ARevolucaomexicanaFINALindd Sec181 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec181 16062010 215941 16062010 215941 82 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA movimento villista desenvolvese geografi camente na região serrana e dos desertos da fronteira mexicana ao norte e de certa forma retoma aspirações de independência ou autonomia que vinham desde o século XVIII Muitos habitantes mais antigos dessa região remontam aos descendentes dos colonos militares que para lá foram deslocados ainda no período de domínio espanhol para colonizar a região Essa parte do México desde então caracterizouse pela baixa densidade populacional e a escassa presença de populações indígenas em função das difi culdades de sobrevivência devido à inexistência de terras férteis e à escassez de água Como mencionamos anteriormente a região começou a mudar com a integração da economia mexicana à norteamerica na o que atraiu uma grande quantidade de mão de obra levando ao nascimento de cidades que surgiam praticamente do nada e à formação de uma classe trabalhadora constituída principalmente de mineiros e ferroviários No âmbito rural surgiu uma espécie de classe média de pequenos proprietários chamados rancheros e a camada dos trabalhadores agrícolas em especial vaqueiros Essa população desenvolveu uma prática militar e de cavalaria nos embates com as populações indígenas belicosas gradativa mente subjugadas e também na lide com o gado Tais atividades criaram a tradição de uso de armas de fogo ao mesmo tempo em que concederam grande autonomia à população local que se via obrigada a constantes deslocamentos causados pelas lutas com os índios ou pela busca de novas pastagens A falta de apoio governamental e o domínio de uma elite econômica em alguns casos neófita somados à crise econômica fi zeram com que muitos respondessem ao chamado revolucionário de Madero dando origem a diversos líderes com seus respectivos exércitos da Revolução tais como Pascual Orozco Abraham González e Álvaro Obregón para citar os mais conhecidos Dentre eles José Doroteo Arango ou Francisco Villa destacouse como um dos líderes revolucionários mais carismáticos Nascido em Durango em 1878 tinha sido arrieiro soldado e bandoleiro acusado de roubar gado ARevolucaomexicanaFINALindd Sec182 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec182 16062010 215941 16062010 215941 83 A REVOLUÇÃO MEXICANA Villa foi uma figura ambígua de ampla publicidade dentro e fora do México Seu caráter contraditório e esquivo contribuiu para tornálo uma personalidade confusa e mul tifacetada Encarnou o machismo mexicano e hispânico mas também correspondia a imagens positivas da invencibilidade do bandidoprovidencia do heroísmo épico Existem três lendas sobre ele a lenda branca que apresenta um Villa vítima tanto do despotismo dos latifundiários como das autoridades porfi rianas Segundo esta versão ele teria sido forçado a cair na ilegalidade ao chegar a sua casa e encontrar o fazendeiro para quem trabalhava assediando sua irmã Movido pela fúria atirou e feriuo no pé Denunciado como agressor fugiu para as mon tanhas onde viveu como foragido Foi preso algumas vezes mas escapou tentou viver legalmente mas tendo sido reconhecido voltou à marginalidade e começou a roubar cavalos Aqui Villa aparece como uma vítima do sistema social e econômico do México homem honrado e digno que não podia tomar outro caminho Essa interpretação foi baseada principalmente no livro Memórias de Pancho Villa de Martín Luis Guzmán A lenda negra retratouo como um bandido sanguinário assassino sem escrúpulos e ladrão de gado Nessa versão ele integrouse à Revolução por mero acaso pois estava visitando uma namorada num rancho quando as tropas federais acredi tando que alguns revolucionários ali se encontravam escondidos atacaram a localidade Villa convencido de que era o verdadeiro alvo do ataque respondeu aos disparos e fugiu unindose pos teriormente a Pascual Orozco para assim iniciar sua carreira revolucionária Essa versão foi difundida por Celia Herrera em suas memórias Francisco Villa ante la História Celia Herrera era de uma família tradicional de Chihuahua que teve um inte grante morto por Villa Já na lenda épica erigida ao longo da própria Revolução Villa aparece como um herói popular antes mesmo da eclosão do movimento Villa já então seria um herói do campesinato uma espécie de Robin Hood mexicano que roubava os grandes latifundiários e ajudava a população mais pobre da sua região ARevolucaomexicanaFINALindd Sec183 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec183 16062010 215941 16062010 215941 84 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA Essa imagem foi construída e difundida pelas canções populares e em grande medida por John Reed jornalista estadunidense em suas reportagens publicadas nos Estados Unidos e poste riormente em seu livro México Insurgente As tropas de Villa foram formadas por uma massa de soldados camponeses mas também por exofi ciais de origem pequenoburguesa pobres da província militares de formação mineiros ferroviários e bandidos No que toca aos camponeses da Divisão do Norte suas aspirações à terra não estavam basea das nas antigas comunidades como no sul O norte do México era composto de pequenas e médias propriedades rancherías e as leis agrárias villistas refl etem uma preferência por essa forma de propriedade da terra O amplo espectro que conformava suas tropas refl etia a heterogeneidade das forças villistas Os objetivos sociais do movimento villista são mais difusos que os do movimento sulista mas sem dúvida ainda possuíam algum projeto social Os villistas pretendiam confi scar as terras de grandes fazendeiros e realizar uma reforma agrária limitada aos soldados e aos antigos colonos Porém não existia uma pressão pela reforma agrária tão forte como em Morelos Eles também buscavam ampliar o crédito para os colonos arrui nados e previam o pagamento de uma pensão para as viúvas e os órfãos da revolução Durante o tempo em que dominaram vastas regiões não ocorreu qualquer mudança na estrutura agrária e seus interesses convergiam para fi ns militares Muitas fazendas expropriadas foram mantidas em funcionamento para suprir as necessidades de seu exército Com este objetivo dedicaramse ainda à venda de gado para os Estados Unidos Nesse sentido a fronteira oferecia condições que os diferenciavam dos zapatistas Usavam a estratégia de luta da guerra de posições clássicas ao contrário dos zapatistas Também durante um bom tempo os villistas respeitaram as propriedades de norteamericanos Devido à sua autonomia os exércitos ligados à Divisão do Norte possuíam grande fl exibilidade de deslocamento para outras re giões embora fossem limitados por sua dependência das linhas de suprimentos Além disso suas tropas não interrompiam as ARevolucaomexicanaFINALindd Sec184 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec184 16062010 215941 16062010 215941 85 A REVOLUÇÃO MEXICANA atividades militares para cuidar do campo como ocorria com os exércitos zapatistas Outra diferença era o anticlericalismo dos villistas que contrastava com a religiosidade das tropas de Zapata Por fi m cabe dizer que o movimento villista foi radica lizando suas posições políticas ao longo da guerra civil Seu rompimento com Carranza e a aproximação aos zapatistas representou a ascensão social dos camponeses ao domínio do poder central Surgia naquele momento uma clara divisão de classes de um lado as forças camponesas do outro as forças burguesas e pequenoburguesas Essa divisão se expressava nas questões relativas à propriedade da terra e às reformas sociais A aliança de Villa e Zapata levou ao ponto culminante da revolução popular e social Assim em dezembro de 1914 as forças da Convenção ou seja os exércitos camponeses comandados por Francisco Villa e Emiliano Zapata ocuparam a Cidade do México Foi durante esse período que Emiliano Zapata reiterou o ofereci mento feito anteriormente aos irmãos Flores Magón para que publicassem o jornal Regeneración em domínios zapatistas principalmente porque nesse momento controlavam a fábrica de papel de San Rafael Os magonistas mantiveram excelentes relações com os zapatistas entre 1912 e 1916 mas não aceitaram o convite Foi a seu modo uma tentativa de estabelecer uma aliança operáriocamponesa Embora os magonistas não tenham aceitado o convite de Zapata as relações entre o movimento operário organizado e o zapatismo se tornaram mais sólidas Essa colaboração foi mais intensa com o Sindicato Mexicano de Eletricistas que apoiou a administração zapatista da capital Esse projeto de organização políticosocial envolveu grupos não vinculados ao constitucionalismo A Convenção estabeleceu um Poder Judiciário do Distrito Federal e posteriormente foi formado um Conselho Executivo da República Mexicana com um presidente e um Conselho de Governo que passou a legislar para todo o território nacional o que nega a tese de localismo do movimento zapatista O ARevolucaomexicanaFINALindd Sec185 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec185 16062010 215941 16062010 215941 86 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA Conselho Executivo legislou além da reforma agrária criando uma lei eleitoral e estabelecendo autonomia municipal direitos trabalhistas tais como o direito de greve a jornada de oito horas liberdade de associação o fi m das tiendas de raya3 e leis fi scais Enfi m houve a produção de uma extensa legislação em várias áreas na tentativa de organizar um verdadeiro Estado com a constituição de um Exército uma rede de educação relações exteriores sistemas de comunicação agricultura Fazenda e Justiça além de fundar um banco para o crédito rural No fi nal de janeiro as tropas de Obregón retomaram a cidade para as forças constitucionalistas Em seguida os ope rários lançaram uma ofensiva combinada com os zapatistas A Federação de Sindicatos do Distrito Federal convoca uma greve geral que é rapidamente reprimida com a decretação da pena de morte e a prisão de seus líderes Carranza e os líderes cons titucionalistas perceberam que a greve fazia parte de um plano mais amplo e a coalizão constitucionalista percebeu o perigo Sob a pressão dos acontecimentos e em especial da ala jacobina do constitucionalismo liderada por Obregón Carranza abandona sua posição em matéria de legislação social Lança uma dupla ofensiva militar e política A militar tinha por objetivo o combate ao zapatismo a política com a lei agrária carrancista de 6 de janeiro de 1915 procurava arrebatar dos zapatistas o monopólio da iniciativa da reforma agrária O ideal zapatista de reforma agrária exerceu pressão para que fossem votadas tanto essa lei como as demais leis sociais da nova Constituição O anticapitalismo empírico ou como 3 As tiendas de raya eram estabelecimentos de crédito similares aos nossos armazéns para o abastecimento de camponeses e operários que viviam perto de fábricas e fazendas Esse nome deriva do fato de que por serem praticamente todos analfabetos em vez de assinar seu nome traçavam uma linha Era uma forma de mantêlos presos à fazenda pois eram obrigados a fazer todas as suas compras nesses locais mesmo quando recebiam salário Foi uma forma suplementar de extrair o excedente econômico dos trabalhadores No México o auge dessa prática ocorreu no fi nal do século XIX durante o governo de Porfírio Díaz ARevolucaomexicanaFINALindd Sec186 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec186 16062010 215941 16062010 215941 87 A REVOLUÇÃO MEXICANA alguns dos seus críticos chamavam o socialismo bárbaro de Zapata foi uma experiência concreta especialmente em Morelos Como afi rma Adolfo Gilly com muita propriedade os zapatistas estabeleceram uma comuna camponesa ou Comuna de Morelos Durante todo o ano de 1915 os camponeses de Morelos viveram uma experiência única na história do México esta beleceram seu próprio poder ditaram suas leis através de um governo que se apoiava em suas armas as aplicaram mediante seus órgãos de autogoverno os pueblos designaram nestes seus dirigentes locais expropriaram terras e engenhos Gilly 1993 p205 Para mostrar a determinação dos constitucionalistas com essa mudança de estratégia política enviaram o general Alvarado para Yucatán como comandante militar em março de 1915 Ali ele implantou uma série de reformas sociais conquis tando o apoio dos camponeses e contrariando os fazendeiros locais Os recursos obtidos com a venda do sisal serviram para fortalecer o caixa das forças constitucionalistas A experiência tanto de Salvador Alvarado 19151918 como posteriormente de Felipe Carrillo Puerto 19221924 no papel de governadores de Yucatán com o Partido Socialista do Sudeste PSS foi muito interessante e justifi ca uma análise detalhada do que se passou nessa região onde a Revolução teve feições próprias Ao fi nal do século XIX a maioria dos pueblos maias da região tinha perdido suas terras para os grandes latifúndios produtores de sisal Sem terras essa população foi submetida ao domínio dos grandes proprietários o que levou à proletari zação e ao isolamento desses camponeses Tal situação só foi rompida pela Revolução que veio de fora com a chegada das tropas de Alvarado4 Suas leis de claro conteúdo social estiveram em sintonia com os artigos mais progressistas da Constituição de 1917 tais como os relativos à reforma agrária e aos direitos 4 Essa expressão foi tirada do trabalho de Joseph 1982 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec187 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec187 16062010 215941 16062010 215941 88 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA trabalhistas Alvarado criou escolas e universidades além de estimular a organização dos trabalhadores por meio do apoio à formação de sindicatos Foi importante para sua atuação po lítica o apoio de um grupo de intelectuais socialistas em geral jornalistas professores e alguns sindicalistas oriundos de uma pequena burguesia do Estado com destaque para Felipe Carrillo Puerto Em 1917 Alvarado foi designado comandante militar de outra região do país e embora Carlos Castro Morales tenha sido escolhido para governador pelo Partido Socialista Obrero de Yucatán as medidas reformistas perderam força sendo retomadas apenas com a eleição de Carrillo Puerto em 1922 Na capital onde Obregón selou o pacto com os operários por meio da expurgada Casa del Obrero Mundial COM em troca de concessões aos trabalhadores urbanos estes apoiariam os constitucionalistas formando batalhões vermelhos de operá rios para lutar contra os camponeses Este pacto só foi possível após a expulsão da ala radical da associação principalmente os representantes do Sindicato Mexicano dos Eletricistas que apoiavam os camponeses zapatistas Embora os batalhões de operários tenham sido apenas uma força secundária na luta contra as forças camponesas o que contou foi o valor simbólico da aliança dos trabalhadores urbanos com os constitucionalistas Por seu turno durante o ano de 1915 as forças campo nesas da Divisão do Norte o exército villista sofreram derrotas decisivas para o futuro de suas ambições nas batalhas de Celaya Léon e Aguascalientes contra as forças constitucionalistas diri gidas por Álvaro Obregón que haviam unido os exércitos do No roeste e do Nordeste Em agosto estes tomaram defi nitivamente a capital e em outubro daquele ano o governo de Carranza foi reconhecido internacionalmente A derrota política e militar dos villistas e dos zapatistas ainda que não defi nitiva e as vitórias da ala burguesa os constitucionalistas marcaram o fi m da fase heroica da revolução camponesa Os objetivos dos consti tucionalistas eram agora além de derrotar defi nitivamente os exércitos camponeses atingir a estabilidade política e promover o desenvolvimento da economia evitando o perigo de uma nova ARevolucaomexicanaFINALindd Sec188 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec188 16062010 215941 16062010 215941 89 A REVOLUÇÃO MEXICANA ascensão das camadas populares e do velho regime A derrota das forças camponesas representou para os constitucionalistas a ruptura com a ala mais radical da revolução O ano de 1915 foi um dos mais intensos da história me xicana e talvez o mais decisivo do processo revolucionário Foi o ano de uma grande experiência popular na Revolução com a formação de grandes exércitos a tomada do poder central e o início da criação de uma estrutura política revolucionária Mas foi também o período das derrotas das forças populares Marcou o início da construção da nova hegemonia com os pactos entre constitucionalistas e operários e as primeiras leis agrárias de Carranza assim como o triunfo do jacobinismo nortista Foi também o período em que os habitantes das cidades descobriram o México rural profundo E foi em 1915 que o México afrancesado da capital positivista naturalista dos velhos romancistas tornouse o México áspero e cru das novas gerações da Revolução que representou uma catarse de descobertas do que era nacional DERROTA POPULAR E VITÓRIA DAS NOVAS ELITES 19151920 Essa última fase da Revolução foi principalmente uma luta contra os já enfraquecidos exércitos camponeses e um embate pela construção das estruturas do novo Estado O ano de 1915 representou um recuo das forças camponesas do Sul e do Norte e uma reconquista do território nacional pelas tropas dos exércitos do Nordeste e do Noroeste As forças camponesas fi caram separadas geografi camente e nunca voltaram a se reunir Não obstante os rebeldes villistas e zapatistas mantiveramse atuantes nos núcleos de suas regiões Obregón celebrou alianças com a Casa del Obrero Mundial organização sindical que agluti nava os sindicados mexicanos do período buscando uma maior base social de sustentação ao governo Carranza Mas logo após a vitória sobre os camponeses o governo que não precisava mais dos trabalhadores passou a reprimilos Os batalhões vermelhos foram dissolvidos e os dirigentes da COM foram presos ARevolucaomexicanaFINALindd Sec189 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec189 16062010 215941 16062010 215941 90 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA A reconstrução nacional não foi fácil devido à fragmenta ção militar regional de alguns generais que passaram a dominar alguns Estados Podemos afi rmar resumidamente que no campo constitucionalista existiam três grupos desses generais os que apoiavam Carranza Cándido Aguilar e Cesáreo Castro os independentes Álvaro Obregón e Pablo González e outros go zando de relativa autonomia acantonados em redutos regionais Plutarco Elias Calles em Sonora Luis Caballero em Tamaulipas Manuel Diéguez em Jalisco Jesus Castro em Oaxaca e Salvador Alvarado com o seu Partido Socialista em Yucatán O ano de 1916 apesar da retomada de algumas ativida des tanto por parte de Villa em Chihuahua como de Zapata em Morelos foi marcado pela ampliação do controle militar e político do governo estabelecido Foi nesse contexto que Pablo González e Álvaro Obregón fundaram o Partido Liberal Cons titucionalista PLC e em setembro foram convocadas eleições para uma Assembleia Constituinte a ser realizada em Querétaro entre dezembro daquele ano e janeiro de 1917 A Constituinte visava encerrar o ciclo revolucionário e fi cava reservada à ala burguesa vitoriosa da Revolução Nesse período o fracionamento dos constitucionalistas se torna mais claro de um lado encontravase um grupo radical ligado a Obregón e outro conservador ligado a Carranza Este último reprimiu algumas greves e perseguiu alguns intelectuais O carrancismo contava com apoio de alguns intelectuais que em geral eram de uma veia conservadora e não originários do meio revolucionário Provinham dos círculos burocráticos do velho regime como Luis Cabrera Félix Palavicini Alfonso Cravioto e Luis Manuel Rojas Em realidade o círculo íntimo de políticos ligados a Carranza era de origem civil e por meio de intrigas e disputas políticas procuravam afastar Obregón e outros líderes militares por eles considerados rudes e de pouca instrução ou simplesmente radicais Daí foi um passo para a repressão dos sindicatos de operários e para uma aproximação e aliança com os antigos grandes proprietários de terras o que em muitos aspectos representou um obstáculo ao avanço da reforma agrária ARevolucaomexicanaFINALindd Sec190 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec190 16062010 215941 16062010 215941 91 A REVOLUÇÃO MEXICANA A Assembleia Constituinte contou com a participação de aproximadamente duzentos deputados Sua condução foi a princípio carrancista depois substituída pelos obregonistas Muitos estudos dessa Constituinte dividemna em uma ala liberal ou jacobina e outra conservadora embora tal divisão política não fosse tão simples As alianças ocorreram muito mais por vínculos pessoais e regionais que ideológicos É difícil defi nir com precisão os deputados progressistas e liberais de acordo com critérios precisos de origem social posição econô mica idade condição civil ou militar Podemos estabelecer as posições políticas dos delegados muito mais segundo critérios de procedência regional Participaram desse grupo homens que posteriormente encontraremos no governo de Lázaro Cárdenas Os jacobinos provenientes do noroeste e da costa do Golfo defendiam uma maior intervenção na economia e reformas sociais Os conservadores aproximavamse de Carranza e eram originários de Coahuila e do centro do país Os delegados dessa ala formada por uma elite civil acreditavam em métodos tradi cionais de estabilização social e defendiam poucas mudanças em relação à Constituição de 1857 Não acreditavam em reformas sociais e se batiam por um Estado que tivesse pouca capacidade de intervenção na esfera econômica e social Defendiam insti tuições semelhantes à de países como a Inglaterra e os Estados Unidos Seu principal líder era Félix Palavicini Prevaleceram as propostas da ala jacobina e promulgada a Constituição foram convocadas eleições pelas quais Venustiano Carranza foi eleito para o mandato de 1917 a 1920 O Partido Liberal Constitucionalista elegeu também todos os deputados para a Câmara Legislativa A Constituição de 1917 foi aprovada no dia 31 de janeiro de 1917 às vésperas da revolução russa de fevereiro e podese afi rmar que foi uma das mais avançadas da época Os artigos fundamentais da constituição são o 3o que trata da educação o 27o sobre a posse da terra e do subsolo o 123o sobre os direitos dos trabalhadores e o 130o sobre a secularização dos bens da Igreja Basicamente a nova Carta trata das garantias ARevolucaomexicanaFINALindd Sec191 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec191 16062010 215941 16062010 215941 92 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA democráticas da organização jurídica da eliminação da parti cipação religiosa na educação da reforma agrária e da proteção à pequena propriedade e às terras comunais da nacionalização das riquezas do subsolo do estabelecimento de limites à pro priedade submetendoa ao interesse social e da delimitação dos direitos e garantias ao trabalhador Uma refl exão pertinente é que essa constituição avançada só foi possível devido à pressão e às batalhas de camponeses e operários durante a revolução Ela expressa mesmo que indiretamente as aspirações das camadas populares mexicanas A ala mais radical da burguesia mexicana tinha noção de que devia incorporar até certo ponto as demandas dos movimentos de massa e que só assim seria possível pacifi car o país A partir da posse de Carranza em maio de 1917 pode se falar num governo constitucional A economia mostrava sinais de recuperação pelo aumento da demanda dos produtos mexicanos principalmente motivada pela guerra na Europa e também por uma maior arrecadação de impostos De sua parte o governo mostrouse profundamente conservador Devolveu terras expropriadas aos seus antigos donos continuou a repres são aos movimentos sindicais e não colocou em vigor a Cons tituição pelo contrário propôs leis revendo alguns dos artigos mais progressistas Nos estados vários generais foram eleitos governadores das respectivas regiões onde eram comandantes Mesmo numa fase de declínio e numa guerra defensiva tanto no sul como no norte os camponeses ainda mostravam algum fôlego embora entre os zapatistas o desgaste de anos de luta fosse evidente Em abril de 1919 Emiliano Zapata foi morto numa emboscada e a ala mais moderada dos zapatistas encabeçada por Gildardo Magaña se impôs Em novembro este assina a rendição a Carranza No norte infl uenciado pelo general Felipe Ángeles Villa lança o Plano do Rio Florido que propunha uma volta à constituição de 1857 ou seja um retrocesso político Entre novembro de 1918 e junho de 1920 ocorreu uma onda de violência em parte resultado da disputa política pelo poder entre Obregón e Carranza Durante todo o seu período ARevolucaomexicanaFINALindd Sec192 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec192 16062010 215941 16062010 215941 93 A REVOLUÇÃO MEXICANA governamental este procurou neutralizar o poder político de Obregón principalmente no que dizia respeito a sua infl uência entre os generais e demais militares revolucionários O seu pedido de adiamento das candidaturas visava conseguir mais tempo para a consecução de seu intento A retirada de Obregón para a vida privada como fazendeiro foi também uma estraté gia política deste a fi m de permitir maior campo de manobra e representou o rompimento entre dois dos grandes líderes da Revolução A apresentação da candidatura de Obregón foi apenas a concretização de seus objetivos anteriores Durante a campanha este fez duras críticas à administração de Carranza Lançou um manifesto à nação em 1o de junho de 1919 no qual procurou mostrar que estava vinculado à tradição dos partidos e das ideias liberais mexicanas que remontava à independência sugerindo que Carranza ao contrário estava vinculado aos conservadores Segundo Obregón o problema dos liberais no México era sua divisão em várias facções e para solucionar tal difi culdade a maior tarefa política era a fundação de um Grande Partido Liberal que unisse as diferentes correntes Esse era um prenúncio do Partido da Revolução que seria criado em 1929 Em maio de 1918 foi criada a Confederación Regional Obrera Mexicana CROM em Saltillo capital de Coahuila berço político de Carranza e contando com seu apoio O local escolhido foi estratégico distante o sufi ciente da Cidade do Mé xico onde estavam os sindicatos mais radicais Foi eleito como diretor Luis Napoleón Morones posteriormente fundador do Partido Laborista Mexicano e líder sindical pelego do governo Obregón e Calles Após o lançamento da candidatura de Obregón pelo Partido Liberal Constitucionalista e de sua campanha política pelo país outros postulantes se candidataram tais como o general Pablo González que contando com o apoio de alguns chefes militares apresentouse pela Liga Democrática e o engenheiro Ignacio Bonillas pelo Partido Liberal Democrático civilista e antimilitarista Carranza manobrava para se manter como comandante supremo da política mexicana apoiando ARevolucaomexicanaFINALindd Sec193 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec193 16062010 215941 16062010 215941 94 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA candidatos da sua confi ança aos governos estaduais Mas não obteve muito sucesso entre as camadas populares pois afi nal aparecia como o repressor de camponeses e operários Ainda fundou o Partido Nacional Cooperativista e lançou um candidato de sua confi ança Alfredo Robles Domingues Obregón também se manteve atuante conquistando o apoio de Partido Socialista de Yucatán de Salvador Alvarado negociando com a CROM com o Partido Laborista Mexicano e com Calles em Sonora Em março de 1920 selou uma aliança com Magaña e outros líderes zapatistas remanescentes obtendo seu apoio Numa última tentativa de solapar a campanha política de Obregón Carranza decretou uma intervenção militar no estado de Sonora sob pretexto de que o governo estadual não tinha se submetido às decisões federais no que dizia respeito ao rio Sonora declarado propriedade da nação As autoridades locais claramente obregonistas representadas por seu governador Adolfo de La Huerta não aceitaram tal decisão Quando foi indicado um interventor como novo comandante militar para o estado o governador e o comandante das forças do Estado o general Plutarco Ellias Calles rebelaramse e lançaram a Revolução Constitucionalista Liberal explicitando os objetivos do movimento por meio do manifesto denominado Plano de Agua Prieta em 22 de abril de 1920 Era o início da Revolução Constitucionalista Liberal O comando das tropas fi cou a cargo de Adolfo de la Huer ta governador de Sonora Pablo González procurando antecipar se a Obregón tentou dar um golpe tendo como base o estado de Puebla no centrosul do país sua principal base de apoio no Exército A sua convocação aos militares caiu no vazio pois as alianças feitas anteriormente por Obregón já haviam atraído a maioria dos generais O presidente seu ministério o Supremo Tribunal e muitos congressistas embarcaram num trem rumo a Veracruz esperando reorganizar suas forças Nunca chegaram a essa cidade e na região de Puebla foram cercados Carranza e seus seguidores mais próximos tentaram fugir a cavalo mas foram aprisionados e mortos ARevolucaomexicanaFINALindd Sec194 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec194 16062010 215941 16062010 215941 95 A REVOLUÇÃO MEXICANA No dia 12 de maio Obregón e González selaram um acordo em que os dois reconheciam De la Huerta como pre sidente provisório Em julho Francisco Villa assinou acordo para a deposição das armas em Sabinas e retirouse para uma fazenda em Durango O ano de 1920 marcou o último levante vitorioso de uma facção regional aglutinada em torno de um grupo de sonorenses liderados por Obregón e representou o fi m do período de confl ito armado da Revolução A campa nha políticomilitar de Obregón constituiuse na realização de uma série de acordos com outros revolucionários mas foi também marcada por expulsões exílios espontâneos e mortes os felicistas que atuavam desde meados de 1916 no estado de Oaxaca como facção independente depuseram as armas e seu líder Félix Díaz exilouse enquanto Manuel Peláez Fernández Ruiz e Pablo González fi zeram acordos e foram incorporados à vida política mexicana Quanto ao Exército do Sul Gildardo Magaña e Genovevo de la O últimos líderes remanescentes do zapatismo aderiram ao Plano de Agua Prieta e desfi laram junto com as tropas vencedoras na capital De la Huerta foi designado presidente provisório em maio de 1920 e convocou eleições para setembro Obregón disputou o pleito por uma coligação de partidos e ganhou o pleito contra Robles Dominguez A chegada ao poder de De la Huerta e em seguida de Obregón marcaram a imposição do domínio político do que veio a ser conhecido como dinastia sonorense Álvaro Obregón foi o caudilho apto a amealhar os fi os que o carrancis mo perdia Era ele o homem capaz da conciliação jacobina com camponeses operários e os generais revolucionários ARevolucaomexicanaFINALindd Sec195 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec195 16062010 215941 16062010 215941 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec196 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec196 16062010 215942 16062010 215942 97 3 ESTABILIZAÇÃO POLÍTICA E REVOLUÇÃO TARDIA 19201940 A DINASTIA SONORENSE 19201934 A década de 1920 e os primeiros anos da seguinte foram a época da estabilização política e da consolidação da Revolução Esse período fi cou conhecido como os anos da Reconstrução Nacional e foi dominado pelos presidentes sonorenses Adolfo de La Huerta 1920 Álvaro Obregón 19201924 e Plutarco Elias Calles 19241928 Entre 1928 e 1934 o país teve três presiden tes mas Calles foi o chefe máximo que esteve por trás destes e manteve o poder da dinastia sonorense Foi durante estes anos que se consolidaram as bases do Estado pósrevolucionário que permitiriam sua notável estabilidade política Houve nesse período duas fases distintas os anos entre 1920 e 1934 com a hegemonia sonorense e o governo de Lázaro Cárdenas entre 1934 e 1940 O grupo político sonorense tinha hábitos seculares anti clericais Seus membros eram extremamente pragmáticos e não titubeavam em utilizar a violência para atingir seus objetivos Em parte devido a essa postura eclodiram alguns confl itos contra a Igreja Católica as companhias petrolíferas e no seio da própria família revolucionária com as insurreições de 1923 1927 e 1929 e as crises sucessórias de 1928 e 1929 Esta foi a década da formação do Estado mexicano moderno O governo de Álvaro Obregón entre 1920 e 1924 foi mar cado por problemas nas relações entre o México e os Estados Unidos Estes se recusavam a reconhecer a nova administração enquanto ela não resolvesse a questão petrolífera afetada pela nova Constituição que dava amplos poderes ao Estado sobre as riquezas minerais Como as companhias petrolíferas se ARevolucaomexicanaFINALindd Sec297 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec297 16062010 215942 16062010 215942 98 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA julgavam prejudicadas por esse dispositivo queriam que a lei valesse apenas para os novos campos e que houvesse uma com pensação fi nanceira pelas perdas sofridas Internamente a nova administração buscava o restabelecimento de uma autoridade federal perdida com os anos de luta Procurou também estabelecer uma ampla base social atraindo para sua órbita de infl uência organizações trabalhistas como a CROM o Partido Laborista Mexicano organizações agrárias como as Ligas Agrárias e o Partido Nacional Agrarista e o Exército A ideologia que amalgamava esse amplo leque de apoio era o nacionalismo No terreno cultural a administração de Obregón foi marcada pela indicação de José Vasconcelos para a Secretaria de Educação Pública Este iniciou uma campanha pela erradicação do analfabetismo fundou bibliotecas e contratou uma série de artistas para pintarem as paredes de edifícios das repartições públicas dando origem ao movimento que fi cou conhecido como Escola Mexicana de Pintura ou muralismo Foi durante a presidência de Obregón que Felipe Carrillo Puerto tornouse governador de Yucatán e retomou as experiên cias de reforma no estado feitas por Salvador Alvarado entre 1915 e 1917 Carrillo Puerto nasceu em Yucatán em 1872 Ainda jovem aprendeu a língua maia e posteriormente traduziu a Constituição para este idioma em 1917 Apoiou os zapatistas e trabalhou como engenheiro agrônomo para uma comissão agrária Retornou ao seu estado junto com Salvador Alvarado que o nomeou para diversos cargos Durante seu governo realizou uma profunda reforma agrária com a distribuição de mais de seiscentos mil hectares de terras benefi ciando mais de trinta mil famílias Em nenhum outro estado do México a reforma agrária avançou tanto talvez somente em Morelos Promulgou leis de previdência social e trabalhista além de uma outra que permitia a expropriação de terras para causas sociais Criou cooperativas de produtores e consumidores e expropriou a indústria do sisal o que desagradou os grandes fazendeiros locais e internacionais Obregón e seu ministro do ARevolucaomexicanaFINALindd Sec298 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec298 16062010 215942 16062010 215942 99 A REVOLUÇÃO MEXICANA Interior Plutarco Elias Calles não lhe deram o apoio solicitado para armar os camponeses de Yucatán Embora nutrisse simpatia pelo marxismo chegando a manter uma correspondência com Lênin sua atuação guardava traços do caudilho típico da história mexicana Seu governo foi considerado um laboratório social da Revolução no qual se rea lizaram interessantes experiências com as reformas trabalhistas e educativas Sua história foi marcada também pelo romance que manteve com a jornalista estadunidense Alma Reed Obregón indicou Plutarco Elias Calles como seu sucessor Esta escolha causou descontentamento dentro das fi leiras revo lucionárias pois Adolfo de la Huerta expresidente supunha que seria o escolhido Ademais De la Huerta contava com amplo apoio entre os militares e acabou se rebelando contra o regime no fi nal de 1923 A rebelião delahuertista talvez tenha sido o levante militar que colocou mais em risco o México pósrevolucionário pois reuniu cerca de metade do efetivo do Exército Álvaro Obregón procurou evitar a rebelião com mudanças nos mais altos escalões do Exército afastando aqueles ofi ciais que pode riam apoiar a sublevação A polarização política no entanto havia atingido um grau que não permitia retroceder e entre novembro e dezembro de 1923 várias unidades militares se sublevaram principalmente nas regiões oeste e sudoeste do país Os estados mais afetados foram Veracruz e Jalisco mas ocorreram distúrbios também em Oaxaca Puebla Chihuahua Tamaulipas Tabasco Chiapas e Yucatán Durante as lutas desta última rebelião Felipe Carrillo Puerto foi preso e morto por tropas delahuertistas De la Huerta procurou dar um conteúdo social ao seu movimento lançando uma proclamação política conhecida como Plano de Veracruz Alguns generais governadores e per sonalidades importantes da política mexicana uniramse ao levante delahuertista entre eles Guadalupe Sánchez de Veracruz além de Enrique Estrada Antonio I Villareal Cándido Aguilar o governador de Oaxaca Manuel García Vigil e o exgovernador ARevolucaomexicanaFINALindd Sec299 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec299 16062010 215942 16062010 215942 100 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA de Yucatán Salvador Alvarado Os rebeldes formavam um grupo ideologicamente heterogêneo e não conseguiram imprimir um caráter político ao movimento o que os unia era o inimigo comum o governo A repressão do regime foi rápida e dura e os rebeldes perderam batalhas importantes entre fevereiro e maio de 1924 Ao todo cerca de sete mil pessoas morreram e muitos ofi ciais rebeldes foram sumariamente fuzilados Outros tiveram de abandonar as fi leiras das Forças Armadas em virtude do expurgo que atingiu o Exército revolucionário Derrotada a rebelião e eleito Calles 19241928 o início de seu mandato foi palco de uma polêmica no meio cultural entre os chamados intelectuais de máfé ou seja aqueles que combatiam o nacionalismo cultural em voga e que por isso eram considerados traidores e os intelectuais de boafé que davam apoio ao regime e à adotada cultura de forte conteúdo social Calles então com 47 anos era uma fi gura até certo ponto obscura na cena política mexicana Tinha sido governador provisório do estado de Sonora em 1917 ministro do Interior na administração Obregón e possuía fama de ser radical e socialista Era homem de confi ança de Obregón que continuou mantendo infl uência política no governo Foi dele a ideia de realizar reformas na Constituição permitindo a reeleição de expresidentes e o aumento do mandato de quatro para seis anos Os generais e candidatos presidenciais às eleições de 1928 Francisco Serrano e Arnulfo R Gómez se amotinaram contra tais reformas constitucionais Ambos foram presos e fuzilados A morte de ambos evidencia a violência que comandou a prática política mexicana nesse período Durante o governo de Calles eclodiu o confl ito com a Igreja que desembocou na Rebelión Cristera entre 1926 e 1927 O anticlericalismo mexicano deve ser visto dentro de um processo mais longo que remete aos acontecimentos da Reforma em meados do século XIX e que retirou o poder da Igreja Durante os governos de Porfírio Díaz e de Francisco Madero não houve maiores problemas com essa instituição No entanto a partir do golpe e do governo de Victoriano Huerta que contou com ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2100 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2100 16062010 215942 16062010 215942 101 A REVOLUÇÃO MEXICANA amplo apoio dos setores católicos o jacobinismo e o radicalismo dos revolucionários foi exacerbado com consequências que se materializaram na Constituição de 1917 contendo artigos que proibiam à Igreja o direito de propriedade impunham limites no âmbito da educação religiosa e restrições à própria atividade dos sacerdotes Mesmo antes do governo de Calles as relações entre Igreja e Estado já eram tensas Durante o governo de Obregón houve confl itos principalmente pela rivalidade entre a central sindical CROM liderada por Luis Napoleón Morones e as associações sindicais católicas Se Obregón com seu pragmatismo político conseguiu evitar um confl ito aberto o mesmo não se deu com Calles e seu ministro da Indústria Luis Morones O conflito armado ocorreu devido às declarações do arcebispo da cidade do México José Mora y del Río ao jornal El Universal em fevereiro de 1926 nas quais rejeitava os artigos constitucionais anticlericais A reação do governo foi imediata fechando escolas e conventos religiosos expulsando sacerdotes estrangeiros e prendendo alguns religiosos A Liga de Defensa de la Libertad Religiosa convocou um boicote econômico contra o governo A tensão recrudesceu culminando no confl ito aberto de meados de 1926 até 1929 que se estendeu pelos estados de Jalisco Colima Michoacán Guanajuato e Zacatecas Apesar da infl uência da liderança católica o movimento contou com a adesão dos camponeses católicos dessas regiões que possuíam demandas próprias A cúpula da Igreja católica do México sempre preferiu uma negociação diplomática com as elites a um confronto aberto e não apoiou completamente a rebelião rural A Guerra Cristã foi fruto de uma coalizão rural entre classes sociais distintas que não contavam com uma liderança centralizada e atuavam segundo moldes zapatistas com base em grupos guerrilheiros com poucas armas e munição Esse movimento seguia o padrão das revoltas camponesas da Revolução Mexicana O motivo que levou esses camponeses católicos à rebelião foi sua revolta contra a suspensão do culto e a interferência estatal na autonomia municipal e também na ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2101 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2101 16062010 215942 16062010 215942 102 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA política local Ou seja foi mais uma oposição rural contra o recrudescimento do controle estatal da região central do México do que uma rebelião religiosa simplesmente O confronto perdeu força com os acordos de 1929 entre o novo presidente Emilio Portes Gil e a Igreja acordos intermediados por representantes diplomáticos estadunidenses e chilenos apesar de persistirem pequenos grupos rebeldes ainda durante o governo de Lázaro Cárdenas na década de 19301 O período presidencial de Calles foi marcado ainda pela continuidade da tensão com as companhias petrolíferas e pela não resolução das questões relacionadas aos artigos constitu cionais Essa situação expôs dois problemas do país no período a ausência de um mecanismo institucional para a escolha dos candidatos presidenciais ofi ciais e a utilização dessas crises por setores do Exército para tentar impor nomes e infl uenciar nas escolhas políticas Obregón candidatouse para um novo mandato de seis anos e venceu as eleições Quando comemorava a vitória foi assassinado por um militante católico num restaurante nas pro ximidades da capital Emílio Portes Gil 19281929 um político do estado de Tamaulipas foi nomeado presidente interino pelo Congresso até a realização de novas eleições em 1929 O grupo político ligado a Obregón desconfi ava que o as sassinato de seu líder fora tramado por Calles e tentou um putsch num evento que fi cou conhecido como Rebelião Escobarista Esta ocorreu durante o mês de março de 1929 principalmente nos estados do norte Sonora Chihuahua Nuevo León e Durango e contou entre seus participantes além do próprio general José Gonzalo Escobar com o general e governador de Chihuahua Marcelo Caraveo e demais generais obregonistas Estes enten diam que Calles seria o verdadeiro mandante do assassinato de Obregón Assim o levantamento militar contra Calles possuía muito mais características personalistas que políticas Como 1 O trabalho de maior profundidade sobre a Rebelión Cristera é de Meyer 19731974 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2102 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2102 16062010 215942 16062010 215942 103 A REVOLUÇÃO MEXICANA outros levantes suas propostas foram divulgadas por um plano o Plano de Hermosillo Esperavam apoio dos cristeros em luta com o governo federal desde 1926 de José Vasconcelos e algum respaldo dos Estados Unidos mas não conseguiram nada disso Essa foi a última das grandes rebeliões militares após a Revolução Foi rapidamente sufocada e além de proporcionar um novo expurgo no Exército e até mesmo na Câmara no Se nado e em alguns governos estaduais serviu para desencorajar possíveis golpes de militares descontentes na medida em que deixou clara a força do governo central No período que se seguiu à morte de Obregón o México foi governado por três presidentes Emilio Portes Gil 1928 1929 Pascual Ortiz Rubio 19291932 e Abelardo Rodríguez 19321934 Essa fase fi cou conhecida na história do México como o Maximato alusão ao domínio político exercido por Cal les o chefe máximo da Revolução Assim resumidamente num intervalo de quinze anos a política mexicana fora dominada por duas fi guras Obregón e Calles As seguidas crises sucessórias eram sintomas da fragilida de do sistema político vigente Calles pensando em aperfeiçoar o sistema criou o Partido Nacional Revolucionário PNR em 1929 Mas ainda assim o novo partido não deu conta das dis putas entre as facções políticas e Calles permaneceu como uma espécie de árbitro político Essa prática do partido dominado por Calles deu origem ao que viria a ser denominado de um novo caudilhismo o caudilhismo institucional O objetivo de tal política era conquistar a adesão não só de líderes regionais ou locais mas também dos novos atores políticos os camponeses e os operários O primeiro candidato escolhido para representar o par tido foi Pascual Ortiz Rubio Seu principal oponente era José Vasconcelos que havia sido Educação Pública durante o gover no de Obregón Vasconcelos vivia exilado desde sua fracassada campanha ao governo do estado de Oaxaca e foi lançado como précandidato pelo Partido Nacional Antirreeleicionista pela Frente Nacional Renovadora e por outras pequenas agrupa ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2103 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2103 16062010 215942 16062010 215942 104 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA ções políticas O pequeno Partido Social Republicano apoiou a candidatura do veterano general revolucionário Antonio I Villarreal Outros dois candidatos participaram destas eleições o general Pedro Rodriguez Triana pelo Partido Comunista e pelo Bloco de Operários e Camponeses e o licenciado Gilberto Valenzuela José Vasconcelos procurou apresentar a sua candida tura como uma continuação dos ideais de Francisco Madero Atacou o governo como caudilhista e violento e continuador das ditaduras de Porfírio Díaz e Victoriano Huerta O México segundo seu discurso era uma nação sem sociedade civil sem partidos políticos organizados e sem iniciativa privada já que esta se encontrava adormecida Afi rmava ainda que a palavra revolucionária havia sido desnaturalizada A sua derrota e a presumível fraude eleitoral foram denunciadas de antemão a representantes da agência de notícias Associated Press no momento mesmo em que Vasconcelos fugia em direção ao norte do país temendo por sua integridade física No dia 10 de dezembro na cidade de Guaymas lançou o Plano Vasconcelista conclamando a população mexicana a se sublevar contra o governo mas não obteve sucesso Pascual Ortiz Rubio governou de 1929 a setembro de 1932 quando renunciou Ficou conhecido como o presidente sem poder Em 1932 foi escolhido o general Abelardo Rodriguez para completar os dois últimos anos do período presidencial Do ponto de vista econômico o país passava por uma fase em que foram criados o Banco Central e diversas instituições bancárias e fi nanceiras além de se executarem grandes obras públicas Na organização sindical predominava a CROM do líder sindicalista Luis N Morones Este havia rompido com Obregón em 1924 mas mantido estreitas ligações com Calles e foi ministro da Indústria Comércio e Trabalho durante sua administração Esta central sindical predominou no movimento sindical até 1928 quando então perdeu apoio Nesse período os maiores esforços da hegemonia sono rense foram voltados à estabilização política e social do país na ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2104 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2104 16062010 215942 16062010 215942 105 A REVOLUÇÃO MEXICANA tentativa de construir um novo Estado Embora tenham ocorrido transformações estruturais na economia e na sociedade a ques tão social não foi prioridade para os governantes A estabilização do regime exigia a domesticação do Exército e a ampliação do poder do governo central Destacase o surgimento de uma nova elite econômica que se tornou o cerne da elite revolucionária A família revolucionária era constituída pelos ofi ciais do novo exército que mediante privilégios em contratos concessões acesso a fontes de crédito e investimentos na infraestrutura ademais da intervenção militar em fazendas formou uma nova classe alta de latifundiários comerciantes banqueiros e industriais2 Cabe frisar que esse Estado já se notabilizava pelo controle das organizações dos trabalhadores e camponeses na tentativa de estabilizar sua base política O CARDENISMO 19341940 Nas eleições de 1934 sagrouse vencedor o general Lázaro Cárdenas para os seis anos seguintes Foi um dos primeiros presidentes desde o fi m da luta armada que não provinha do norte do país mas do altiplano central Havia sido governador do estado de Michoacán e fez parte da liderança do PNR O seu governo teve três fases distintas A primeira durou de sua posse ao rompimento com Calles e a subsequente mudança do gabinete ministerial na virada de 1935 para 1936 Nesse primeiro momento Cárdenas não tinha uma posição política forte e independente Calles acreditava que continuaria na si tuação de domínio político mas não contava com a autonomia de Cárdenas Os dois entraram em choque principalmente devido à posição deste com relação à política sindical Cárdenas conseguiu conciliar uma série de alianças com caudilhos locais o Exército e sindicatos Cárdenas apoiou e obteve respaldo dos operários via Comité de Defensa Proletaria que posteriormente se transfor 2 Essa situação foi muito bem exposta no livro de Carlos Fuentes La muerte de Artemio Cruz ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2105 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2105 16062010 215942 16062010 215942 106 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA mou na Confederación de Trabalhadores de México CTM e da Confederación General de Obreros y Campesinos de México CGOCM comandada por Vicente Lombardo Toledano Esses fatos ocorreram entre junho e dezembro de 1935 No mesmo período o Partido Comunista Mexicano aproximouse de Cár denas graças uma proposta de Frente Popular após a realização do VII Congresso da Internacional Comunista em Moscou entre julho e agosto de 1935 Foi nesse contexto nacional e internacional que Cárdenas primeiro isolou Calles e posteriormente rompeu com ele O ato simbólico foi a mudança de seu gabinete em 14 de junho de 1935 dois dias depois Calles anunciou sua retirada da vida pública e viajou para o estrangeiro mas nos bastidores conti nuou infl uindo na política mexicana Voltou em 5 de dezembro de 1935 mas a oposição que encontrou foi muito forte pois sua infl uência política achavase em declínio frente aos novos atores políticos e sociais A segunda fase do governo Cárdenas corresponde ao pe ríodo de 1936 a 1938 quando implantou uma série de políticas sociais como a reforma agrária a nacionalização das ferrovias e das companhias petrolíferas e a promoção dos sindicatos por parte do Estado A relação entre Estado e os sindicatos foi um dos pilares do regime Aproveitou a fragmentação da CROM e atraiu lideranças sindicais apresentandose como uma opção à política conservadora de Calles Conseguiu atrair setores dos sindicatos de esquerda e marxistas Foi nesse cenário que surgiu a Confederação Trabalhista Mexicana em fevereiro de 1936 Sua política de nacionalização ampliou sua infl uência no meio sin dical e a reforma agrária estendeua aos camponeses Para isso contribuiu ainda o apoio dado à formação das Ligas Agrárias bem como a nomeação de líderes agraristas para postoschave da administração federal O governo cardenista levou a cabo uma reforma agrária das mais signifi cativas que afetou uma parcela considerável da população de uma região agrícola importante Com essa reforma ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2106 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2106 16062010 215942 16062010 215942 107 A REVOLUÇÃO MEXICANA agrária a hacienda tradicional foi quase que eliminada por completo Para se ter uma ideia ao fi nal de seu governo prati camente a metade dos terrenos cultivados eram ocupados por ejidos Além do mais esses camponeses ejidatários receberam maior apoio governamental na forma de crédito ajuda técnica e suporte na comercialização O termo ejido palavra derivada do latim exitum foi criado no período colonial para denominar as áreas limítrofes dos povoados que exploravam principalmente a pecuária e a lenha Na era pósrevolucionária adquire outra conotação Atualmente o ejido uma criação da Revolução Me xicana foi o instrumento para a reforma agrária no México O ejido é uma espécie de dotação não há compra procedia da expropriação de latifúndios ou de terras do Estado e tornase propriedade da nação cedida em usufruto perpétuo e hereditário aos camponeses seja individualmente ou de forma coletiva O fato é que depois de 1935 o ritmo e o conteúdo da reforma agrária mudaram totalmente Segundo a tabela abaixo podese acompanhar como durante o mandato de Cárdenas se acelerou a distribuição de terras em relação aos outros períodos presidenciais DOTAÇÕES AGRÁRIAS POR REGIMES PRESIDENCIAIS Presidentes Período presidencial Hectares distribuídos Porcentagem do total Venustiano Carranza 19151920 132 03 Adolfo de la Huerta maio nov 1920 34 01 Álvaro Obregón 19201924 971 20 Plutarco Ellías Calles 19241928 3088 64 Emilio Portes Gil 19281930 1173 24 Pascual Ortiz Rubio 19301932 1469 30 Abelardo Rodríguez 19321934 799 17 Lázaro Cárdenas 19341940 17890 371 Fonte Informes presidenciais ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2107 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2107 16062010 215942 16062010 215942 108 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA Em seu mandato quase dezoito mil hectares foram dis tribuídos a ejidatários A partir da ocupação de postoschave na esfera federal por agraristas estes colocaram em prática uma nova política agrária que não se limitou à distribuição de terras mas também criou mecanismos de crédito agrícola e ampliou o sistema de irrigação Embora o ejido individual ainda prevalecesse foi incentivada a criação de ejidos coletivos e de cooperativas de produção surgidos em alguns casos da expropriação de fazendas produtivas como foi na região de La Laguna nos estados de Coahuila e Durango no norte do país O governo Cárdenas esteve também mais aberto aos interesses dos operários e deu apoio aos sindicatos Nesse sen tido podemos dizer que existiam certas continuidades com os governos anteriores em especial no que diz respeito à criação de uma base política de massas e seu controle Mas sem dúvida nenhuma o ponto culminante de sua política reformista foi a expropriação das companhias petrolíferas estrangeiras que foram nacionalizadas3 Enquanto isso o PNR que havia sido criado tendo em vista principalmente as questões políticas não dava mais conta da complexidade social do país Em 1938 o antigo partido foi transformado no novo Partido da Revolução Mexicana PRM com estrutura semicorporativa formada por quatro setores camponês operário popular e militar A terceira fase de 1938 até o fi nal do mandato de Cárdenas em 1940 foi um período de consolidação da política e de tentativa de manutenção das conquistas A pressão política interna causada pela alta na infl ação e pelos problemas de abastecimento levaram a uma diminuição do ritmo das reformas sociais A situação política também pesou com o acirramento de uma oposição de direita dentro da própria família revolucionária levando Cárdenas a uma posição mais cautelosa Foi nesse contexto que escolheu seu sucessor Manuel Ávila Camacho um político identifi cado com a ala mais moderada e que deu outro rumo ao país 3 Essas refl exões se devem em grande parte ao livro de Tobler 1994 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2108 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2108 16062010 215942 16062010 215942 109 A REVOLUÇÃO MEXICANA Essa exposição do governo de Lázaro Cardenas concorda com a afi rmação do historiador Hans Werner Tobler ao dizer que o cardenismo representou a consolidação da Revolução Mexicana ou a fase tardia da Revolução A relação entre a fase armada da Revolução 19101920 e o governo de Lázaro Cárdenas se deve principalmente a três razões A elite política cardenista foi formada essencialmente por membros que luta ram na Revolução e traziam consigo as experiências da luta re volucionária e de suas bandeiras de transformação social Eram em geral elementos atuantes nas alas mais radicais ou jacobinas do constitucionalismo muitos deles os principais responsáveis pela introdução das leis progressistas na Constituição de 1917 Em segundo lugar as reformas sociais e políticas implantadas sob Cárdenas signifi caram a adoção prática dos artigos mais avançados da Constituição de 1917 Foi com a realização tardia das reformas que a Revolução adquiriu uma dimensão social Por último a realização das reformas cardenistas só foi possível porque o Exército Federal instrumento de poder da oligarquia havia sido defi nitivamente eliminado pelas forças camponesas em 1914 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2109 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec2109 16062010 215942 16062010 215942 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3110 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3110 16062010 215942 16062010 215942 111 4 A HERANÇA REVOLUCIONÁRIA Desde a década de 1940 uma noção de continuidade revolucionária e de etapas sucessivas se impôs à concepção de Revolução Mexicana Os problemas surgidos da transformação do México no presente eram encarados como novas tarefas a que no decorrer dos anos os governos continuadores da Revolução dariam solução A essa concepção temporal se agrega uma ideia de nação como uma herança histórica sem fi ssuras consolidada no governo de Manuel Camacho A partir deste período a preocupação se concentrou em torno de uma industrialização do país ou seja deixou de ser política para se tornar principalmente econômica O primeiro governador civil foi eleito apenas em 1946 quase que ao mesmo tempo em que o Partido da Revolução Mexicana se torna o Partido da Revolução Institucional O período que vai de 1940 a 1968 marcou uma fase de estabilidade política e de desenvolvimento econômico assim como de retração dos focos tradicionais de oposição e de centralização da esfera política em torno do presidente da República O que predominou foi o que se convencionou chamar de tapadismo a indicação do sucessor pelo atual mandatário Tal sistema foi a marca da estrutura piramidal da política mexicana nesse período Todavia enquanto o sistema político mexicano fi cava estagnado a sociedade se transformava rapidamente em parte devido ao desenvolvimento econômico e às transformações do quadro demográfi co marcado pela mudança do perfi l da popu lação de predominantemente rural para urbano Esse processo coincide com o aumento da contestação política simbolizada pelo acontecimento que redundou nas manifestações na re ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3111 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3111 16062010 215942 16062010 215942 112 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA pressão e nas mortes ocorridas na Praça das Três Culturas em Tlatelolco na noite de 2 de outubro de 1968 Como resultado no período presidencial seguinte de Luis Echeverría 19701976 foi instituída uma prática política de caráter demagógico na tentativa de reafi rmar uma legitimidade ideológica fundada no legado da Revolução e posta em dúvida pelos fatos de 1968 No fi nal de 1988 devido a uma secessão dentro do PRI foi criado o Partido da Revolução Democrática que disputou as elei ções presidenciais tendo como candidato o fi lho de Lázaro Cár denas Cuauhtémoc Cárdenas Este chega a obter uma expressiva votação embora o candidato priista Carlos Salinas de Gortari fosse eleito Foi durante a presidência de Salinas de Gortari em 1o de janeiro de 1994 que eclodiu a rebelião do Exército Zapa tista de Libertação Nacional no Estado de Chiapas Tanto o PRD como o EZLN reivindicavam a herança legítima da Revolução Depois de oitenta anos de domínio ininterrupto em 2000 o Partido da Revolução Institucional perdeu a eleição para o Partido Ação Nacional de direita que elegeu Vicente Fox Este partido fundado em 1939 sempre se caracterizara por ser o principal partido da oposição conservadora mexicana Em 2006 conseguiu eleger o sucessor Felipe Calderón numa dis puta muito controvertida devido à acusação de fraudes e à pequena diferença de votos com relação ao candidato Andrés Manuel López Obrador do Partido da Revolução Democrática HERANÇA CULTURAL O embate pela memória da Revolução também tem sido objeto de confl itos desde praticamente o fi nal da luta armada e a experiência do muralismo é bem clara nesse sentido O muralismo ou a Escola Mexicana de Pintura surgiu logo após o término do período de luta armada incentivado por José Vasconcelos em sua estão como ministro da Educação Pública no governo Obregón 19201923 Os principais representantes dessa corrente foram Diego Rivera David Alfaro Siqueiros e José Clemente Orozco que nas paredes de edifícios públicos pintaram temas essencialmente históricos O muralismo foi visto ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3112 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3112 16062010 215942 16062010 215942 113 A REVOLUÇÃO MEXICANA como fi lho direto da Revolução e tornouse a principal corrente estética da arte mexicana moderna obtendo reconhecimento em todo o continente americano inclusive nos Estados Unidos Para muitos estudiosos é a primeira expressão plástica genuinamente latinoamericana por representar a temática histórica e social especialmente camponeses indígenas e trabalhadores Inserido na discussão sobre o papel da arte contem porânea o muralismo mexicano representou uma crítica à arte acadêmica e de cavalete produzida no século XIX e nos primórdios do século XX e respondeu aos debates políticos mexicanos de sua época Inovou ao utilizar edifícios espaços públicos e produzir obras monumentais Teve um alto grau de experimentalismo ao pesquisar e utilizar novos materiais e téc nicas Considerada uma arte engajada visava enaltecer o advento e as obras da Revolução daí a escolha dos espaços públicos pois poderiam assim atingir um maior número de pessoas Nesse sentido iam ao encontro do projeto desse novo Estado pósrevolucionário para educar as massas analfabetas Esse movimento dependia do mecenato do Estado que contratava os artistas e cedia os edifícios públicos além de garantir o prestígio nacional Entretanto enganase quem pensa que essa relação entre Estado e artistas foi isenta de confl itos e negociações no que concerne à defi nição do que deveria ser pintado1 Todavia a disputa por uma cultura revolucionária não fi cou restrita às paredes públicas Na década de 1940 durante o governo de Manuel Ávila Camacho surgiram duas iniciativas de perpetuação da memória da Revolução Em 1942 começam a ser publicados os álbuns Historia Gráfi ca de la Revolución Mexicana monumental obra editada por Gustavo Casasola que utilizou um rico acervo de fotografi as do Archivo Casasola formado por mais de seiscentas mil imagens colecionadas pela família Este material enriquecido com a aquisição de imagens de outros fotógrafos foi declarado patrimônio cultural e histó 1 Devo muito dessa refl exão sobre o muralismo ao trabalho de Camilo de Mello Vasconcellos 2007 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3113 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3113 16062010 215942 16062010 215942 114 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA rico mexicano Foi comprado pelo governo mexicano em 1976 e deu origem à Fototeca de Pachuca vinculada ao Instituto Nacional de Antropologia e História órgão do governo mexicano Nessa mesma década o governo inaugura o Museu Nacio nal de História do México localizado no Castelo de Chapultepec local simbólico no imaginário histórico e político mexicano Foi o último reduto dos mexicanos sob o comando do imperador Cuauhtémoc contra a conquista espanhola posteriormente trans formado em palácio do vicerei colégio militar residência do casal imperial Maximiliano e Carlota de Habsburgo e residência ofi cial dos presidentes mexicanos Com a criação do Museu o local foi transformado em catedral cívica da nação e guardião das relíquias mexicanas O Museu buscou elaborar uma memória revolucionária ofi cial e legitimadora principalmente em momen tos de crise do sistema político mexicano Vasconcellos 2007 Em 1950 Carmem Toscano lança o fi lme Memorias de un Mexicano realizado a partir de uma rica produção cinemato gráfi ca deixada por seu pai Salvador Toscano cinegrafi sta que registrou os acontecimentos revolucionários nacionais Numa montagem em que intercala a história de brigas familiares com as disputas políticas do processo revolucionário mexicano a cineasta procura apresentar uma história ofi cial detentora da memória nacional e silenciando memórias subalternizadas no interior deste processo uníssono Bragança 2007 p15 O culto à continuidade revolucionária presente nos mu rais álbuns museus e fi lmes foi viabilizado graças à elaboração de uma cultura visual que à sua maneira buscou atualizar o passado no momento presente Criou um culto às origens por meio da veneração de um passado fragmentário e caótico transformandoo em coeso e fundador Essa operação só foi possível pela escolha de acontecimentos e de heróis tornados visíveis por meio das imagens estampadas em murais páginas de álbuns instalações museológicas e películas Durante e depois a Revolução foi objeto de diversos escritores que buscavam revelar qual era o verdadeiro ser do mexicano encoberto pelas máscaras de séculos de história ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3114 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3114 16062010 215942 16062010 215942 115 A REVOLUÇÃO MEXICANA colonial e autoritária Assim esse acontecimento fundador do México moderno foi tema para memórias diários crônicas e obras de fi cção dos seus mais diversos participantes e obser vadores tanto mexicanos como estrangeiros Um dos intelectuais mais importantes do México desta época Martín Luis Guzmán publicou uma série de trabalhos que procuram refl etir sobre o furacão revolucionário Escreveu em Madri o livro El águila y la serpiente A águia e a serpente 1928 espécie de autobiografi a mas ao contrário de outras memórias do período não narrava os acontecimentos de sua vida de forma cronológica preferindo relatar diversos episódios vividos por ele Alguns estudiosos consideram esse livro o precursor das reportagens literárias uma reunião de pequenas crônicas das atividades revolucionárias e recordações de fatos que o autor viveu O livro relata sua relação com vários líderes revolucionários Algumas descrições dos personagens revolu cionários eram quase como retratos fotográfi cos interpretações pessoais de Guzmán Em 1929 ele publicou La sombra del caudilho A sombra do caudilho outro livro em que denuncia os governos autoritá rios de Obregón e Calles Essas obras traçam um quadro preciso da política personalista do período o que o obrigou a se afastar do país No seu regresso durante o governo de Cárdenas escre veu Memórias de Pancho Villa publicado entre 1938 e 1940 com base no arquivo pessoal desse revolucionário Essas memórias de quem lutou ou participou da Re volução tiveram ampla divulgação O material espécie de testemunho ocular ou de relatos documentais do que de fato aconteceu transposições literárias de vivências proliferaram no transcorrer da luta armada e nos anos seguintes Uma das mais célebres obras desse tipo foi a autobiografi a de José Vasconcelos 18811959 publicada em cinco volumes Ulisses Criollo 1936 La tormenta 1936 El desastre 1938 El proconsulado 1939 e La llama 1959 obra póstuma Na fi cção os romances ambientados durante a luta arma da deram origem a centenas de obras Uma das mais conhecidas ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3115 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3115 16062010 215942 16062010 215942 116 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA e populares foi Los de Abajo do escritor Mariano Azuela Este romance escrito por um médico que serviu num dos batalhões villistas retrata as lutas dos camponeses do norte contra as tropas de Carranza Provavelmente um dos livros mais vendidos no México no século XX chegou a atingir a cifra de mais de um milhão e meio de exemplares Escrito ainda em 1915 ou seja durante o confl ito armado foi publicado pela primeira vez em fascículos no jornal El Paso del Norte editado na cidade fronteiriça de El Paso nos Estados Unidos O livro de Azuela carregado do ethos revolucionário foi considerado fundador do gênero romance histórico da Revolução e ajudou a mitifi car este acontecimento como fundador do México moderno A visão dos escritores com relação à Revolução Mexicana foi marcada pelo pessimismo com que interpretavam os acon tecimentos Consideravam bárbara a atuação dos camponeses e manifestavam uma profunda decepção para com os principais caudilhos revolucionários Nesse sentido suas imagens contras tam com as dos muralistas que via de regra deixaram uma visão positiva do processo revolucionário HISTORIOGRAFIA As interpretações historiográficas das causas da pe riodização dos protagonistas e do signifi cado da Revolução Mexicana são as mais diversas e polêmicas desde os primeiros estudos logo após o término do confl ito Também são objeto de disputas e embates Os primeiros escritos que procuram refl etir e compreender o processo pelo qual o México estava passando surgiram ainda durante o processo revolucionário ou logo após seu término Estas primeiras análises satanizaram o porfi riato e defenderam o caráter agrário rural redentor global e legítimo da Revolução A concepção de Revolução difundida pelos historiadores nas primeiras décadas após sua conclusão se aproxima muito de uma noção vigente no século XIX em relação a levantes e revoluções Estas são vistas tanto como cuartelazo pronunciamento ou motim militar Nesta visão a Revolução não existia como um todo homogêneo O conceito era associado ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3116 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3116 16062010 215942 16062010 215942 117 A REVOLUÇÃO MEXICANA indistintamente a cada revolta revolução orozquista escoba rista zapatista carrancista maderista felicista etc2 As primeiras obras historiográfi cas mais profi ssionais da Revolução Mexicana possuem como traços em comum uma perspectiva eminentemente agrarista e popular além da busca das causas da Revolução no passado remoto A eclosão da Re volução havia ocorrido devido ao modelo econômico adotado há séculos e fomentara a divisão da sociedade mexicana entre grandes latifundiários pueblos ou comunidades indígenas e camponesas sem terras Ao longo do período colonial e inclusive depois da independência essas desigualdades foram acentua das o porfi riato neste caso representou o ponto máximo do latifundismo Segundo essa visão o levante iniciado em 1910 teve o grande objetivo de transformar não somente as condições sociais imediatas de que padecia grande parte da população mexicana mas todo um legado de exploração proveniente do século XVI Um terceiro elemento compartilhado por estes escritores diz respeito aos principais atores revolucionários A Revolução descrita por esta primeira geração de historiadores é um movimento de grupos e líderes vencedores Apesar de concordarem que houve uma participação geral da sociedade mexicana nos levantes e que os principais sujeitos revolu cionários foram os camponeses motivados pela luta contra a exploração e pela reforma agrária pouco espaço foi concedido aos projetos que não vingaram A narrativa desses autores concentra atenção naqueles personagens que conformaram a síntese revolucionária nacional Entre os estudiosos dessa primeira geração podemse citar Frank Tannenbaum Eyler Simpson e Jesus SilvaHerzog Frank Tannenbaum 18931969 escreveu uma das primeiras obras sobre a Revolução Este historiador e sociólogo norte americano formado pela Universidade de Columbia escreveu 2 O debate sobre a historiografi a da Revolução Mexicana foi abordado com mais profundidade em artigo escrito por mim e pela professora Maria Aparecida de Souza Lopes Ver Barbosa e Lopes 2001 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3117 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3117 16062010 215942 16062010 215942 118 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA dois livros clássicos The Mexican Agrarian Revolution 1929 e Peace by Revolution Mexico after 1910 1933 após pesquisas de campo realizadas durante a década de 1930 Tannenbaum trabalhou para o presidente Lázaro Cárdenas durante sua estada nesse país e posteriormente ao retornar aos Estados Unidos foi assessor do presidente Franklin D Roosevelt durante o New Deal Outro autor da mesma geração foi Jesús Silva Herzog 1892 1985 Formouse em Economia e durante o governo Cárdenas foi responsável pelo comitê de nacionalização do petróleo Outro autor que segue essa abordagem é Eyler Simpson Sua obra The Ejido Mexicos Way Out não é uma pesquisa direta mente voltada para a Revolução Mexicana O objetivo principal do autor é apresentar uma refl exão sobre a propriedade ejidal Neste sentido apesar de Simpson compartilhar com seus con temporâneos determinados pontos de vista sobre a Revolução é necessário ressaltar algumas discrepâncias até porque seu interlocutor direto é Tannenbaum A demanda pela terra e a posterior adoção do sistema ejidal foram segundo Simpson os aspectos que fundamentaram e deram um sentido à Revolução e aos camponeses que se levantaram em distintas partes do México a partir de 1910 sem objetivos ideológicos claros Na concepção deste autor o ejido representou um dos poucos resul tados verdadeiramente revolucionários das lutas de 1910 e 1917 A segunda geração de autores que estudaram a Revolução Mexicana fi cou conhecida como revisionista porque começou a questionar se a Revolução havia cumprido seus programas de reformas Com uma produção heterogênea suas investigações inovaram na abordagem metodológica e teórica Muitos desses autores problematizaram a base fundamental dos precedentes negando o título de revolução para os acontecimentos regis trados entre 1910 e 1920 no México já que segundo eles as principais forças políticas e as facções revolucionárias radicais e populares foram derrotadas prematuramente e os resultados apenas refl etiram os interesses dos grupos mais conservadores Alguns dos fatores que explicam essas mudanças no enfoque da Revolução se inserem no contexto das décadas de ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3118 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3118 16062010 215942 16062010 215942 119 A REVOLUÇÃO MEXICANA 1960 e 1970 tais como a vitória da Revolução Cubana e sua repercussão em todo o continente Mas talvez o marco político mais importante e que infl uenciou de forma mais decisiva a reavaliação da Revolução Mexicana e principalmente de seus herdeiros foi o massacre da Praça de Tlatelolco em 1968 Durante esse episódio os protestos estudantis contra gastos excessivos com as Olimpíadas rapidamente se transformaram no questionamento da falta de democracia As manifestações ganharam força e o apoio dos trabalhadores e passaram a sa cudir a capital mexicana e a mexer com o governo As manifestações organizadas principalmente por estu dantes e setores da classe média com o apoio dos trabalhadores ocorreram entre julho e outubro No dia 2 de outubro o Exército e a polícia reprimiram com extrema violência os manifestantes resultando em várias mortes A desilusão com a repressão gover namental motivou a busca de uma nova compreensão do Estado pósrevolucionário e incentivou uma reavaliação da história mexicana em especial do seu marco fundador a Revolução Um dos questionamentos mais críticos da Revolução Mexicana foi elaborado pelo historiador Ramón Eduardo Ruíz cujo livro de 1980 The Great Rebellion México 19051924 A grande rebelião talvez seja um dos exemplos mais representati vos da historiografi a revisionista O autor destaca muito mais a continuidade do projeto de sociedade do porfi riato e o impulso dado ao sistema capitalista pósrevolucionário que segundo ele esvazia o sentido do termo revolução no caso mexicano Ainda segundo o autor as fi guras que propuseram as transformações sociais mais radicais como Emiliano Zapata e Ricardo Flores Magón foram derrotadas e praticamente eliminadas Uma das características fundamentais do Estado pós revolucionário foi a incorporação tutelada das massas popu lares num regime de governo paternalista e autoritário que objetivava o aperfeiçoamento do capitalismo segundo a análise de Arnaldo Córdova em La ideología de la Revolución Mexicana 1992 Nesse processo os sindicatos assim como o Partido ofi cial transformaramse nos veículos que possibilitaram a ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3119 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3119 16062010 215942 16062010 215942 120 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA participação popular num projeto de desenvolvimento econô mico contrário a seus interesses e que em última instância se submetia aos interesses do capital internacional Com interpretações originais para a época e escrito du rante a prisão do autor entre 1966 e 1971 o livro La revolución interrumpida A revolução interrompida de Adolfo Gilly inova ao direcionar o clímax da luta de classes para a tomada da Cidade do México pelos exércitos populares de Villa e Zapata em dezembro de 1914 e ao afi rmar que o zapatismo foi o fator decisivo na evolução dos acontecimentos retomando de certa forma a tese central já esboçada por François Chevalier e outros Gilly revaloriza a participação dos camponeses ressaltando porém que a Revolução foi interrompida devido à debilidade do proletariado urbano e à consequente inexistência de um partido que fosse capaz de costurar uma aliança operáriocamponesa daí sua conclusão de que o Estado surgido após a Revolução é bonapartista Nesta mesma linha de argumentação novos estudos começaram a buscar as causas das limitadas mudanças sociais no México durante a década de 1920 no fato de que as vozes revolucionárias mais radicais foram caladas prematuramente Uma das tendências mais importantes de um grupo destacado de trabalhos revisionistas concentrouse na recuperação de alguns personagens esquecidos da Revolução Mexicana e numa revalorização dos projetos vencidos Exemplos absolutamente claros disso são as fi guras de Francisco Villa e Emiliano Zapata ainda que no caso deste último podese encontrar um consenso e uma certa simpatia historiográfi ca com relação ao conteúdo eminentemente agrarista de suas propostas Zapata sempre foi de algum modo um herói da Revolução No entanto em relação a Villa a situação é bastante diferente Sua fi gura sempre esteve atrelada a uma série de mitos contos e histórias que tornam esse personagem atraente para qualquer pesquisador Foi somente a partir da década de 1960 que se começou a resgatar o caráter revolucionário da División del Norte e seu líder e o principal responsável foi sem dúvida alguma o historiador Friedrich Katz ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3120 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3120 16062010 215942 16062010 215942 121 A REVOLUÇÃO MEXICANA Na compreensão de Katz a difi culdade em situar o mo vimento villista no quadro de facções revolucionárias resulta precisamente da composição heterogênea da División del Norte de forma que as propostas dessa facção refl etiram um mosaico de opiniões adequado às condições regionais A fragmentação da grande propriedade não era a única demanda dos seguidores de Villa e nem o motivo pelo qual lutavam diferentemente do caso do movimento zapatista cujos membros orientaram sua ação política e militar em nome do Plano de Ayala Em Chihuahua por exemplo um dos bastiões do villismo o problema da terra não se resumia ao confl ito entre pueblos e hacendados mas sim a contradições muito mais complexas A busca por novos personagens a partir da década de 1960 é plasmada em outros dois trabalhos que têm como objeto de análise a participação e infl uência dos intelectuais na Revolução Em Precursores Intelectuales de la Revolución Mexicana James D Cockcroft 1994 pesquisa a intervenção de seis importan tes personagens da Revolução Camilo Arriaga Juan Sarabia Librado Rivera Antonio Díaz Soto y Gama Francisco I Madero e Ricardo Flores Magón Outro trabalho que segue essa mesma tendência é o livro de Enrique Krauze 1994 Caudillos culturales en la revolución mexicana resultado de uma tese de doutorado apresentada ao Colegio de Mexico em 1974 que investiga a gera ção de 1915 também conhecida como os sete sábios Antonio Castro Leal Alberto Vásquez del Mercado Vicente Lombardo Toledano Teófi lo Olea y Leyva Alfonso Caso Manuel Gómez Morín e Jesús Moreno Baça e sua relação com o Estado pós revolucionário A tentativa de construir uma biografi a política coletiva ou dos grupos intelectuais surgidos durante o período armado tem como fi os condutores dois personagens Vicente Lombardo Toledano e Manuel Gómez Morín Essa geração de historiadores foi responsável por ino vações na abordagem metodológica principalmente por seus estudos regionais O auge dessa última tendência deveuse em grande parte a um processo de descentralização da pesquisa histórica no México A partir dos anos de 1960 fundaramse ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3121 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3121 16062010 215942 16062010 215942 122 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA novos centros dedicados exclusivamente ao estudo das histórias regionais e se fortaleceram as universidades do interior do país O livro de Romana Falcón uma versão de sua tese de doutorado defendida no princípio da década de 1980 na Uni versidade de Oxford é um dos exemplos mais importantes da chamada historiografi a revisionista Em primeiro lugar porque rompe com a tradição dos estudos globais publicados até esse período e propõe uma análise profunda do curso da Revolução num Estado do Méxicio San Luis Potosí que aparentemente não foi um cenário destacado durante os combates armados Essa perspectiva metodológica regional permitiu que a autora incorporasse ao seu discurso atores pouco conhecidos no pano rama nacional tais como os denominados setores médios e um grupo de líderes locais que se responsabilizou pela continuidade da Revolução em suas zonas de atuação Teceu também uma aguda crítica aos trabalhos tradicionais acerca da Revolução que a interpretaram como um movimento fundamentalmente agrário orientado por líderes populares que reivindicavam o fi m do sistema porfi riano e a devolução de suas propriedades comunais Segundo a autora pelo menos nesse Estado a Revo lução foi organizada em grande medida pelos setores da elite descontentes com o porfi riato Nessa obra a discussão de fundo diz respeito às conse quências da dispersão do poder político ocorrido durante a fase inicial da Revolução Mexicana A Revolução assim atuou como um movimento que desintegrou a estrutura centralista porfi riana e ajudou o fortalecimento de líderes locais Na falta de um poder centralizado brotaram lideranças locais armadas que se incorporaram à Revolução não necessariamente em função de injustiças sociais mas com objetivos meramente políticos e pessoais Sua análise introduz o conceito teórico central de sua interpretação o caciquismo Os seguidores desses caciques de diferentes classes so ciais incorporaramse à luta armada devido aos seus vínculos pessoais e aos compromissos que haviam estabelecido com seus jefes em troca de recompensas materiais ou proteção ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3122 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3122 16062010 215942 16062010 215942 123 A REVOLUÇÃO MEXICANA Essa mobilização vertical segundo a autora fragilizou e em alguns casos praticamente anulou os levantes de genuíno caráter popular que ocorreram em outras partes do México da mesma forma como eliminou a construção de um programa agrário Na ausência de líderes populares argumenta Falcón surgiu outra liderança que se aproveitou da Revolução para conquistar espaços na estrutura política limitada pela oligarquia porfi riana a um grupo seleto Tais particularidades explicariam o fato de esses líderes se converterem em verdadeiros obstáculos durante o processo de consolidação do Estado revolucionário pois nessa fase eles já haviam abandonado a luta armada para ocupar postos políticos nos seus estados com amplo apoio de seus antigos seguidores Somente durante o governo Lázaro Cárdenas graças a mecanismos de cooptação ou eliminação dos caciques foi que ocorreu o fortalecimento do poder central Um trabalho paralelo a este foi a obra de Héctor Aguilar Camín 1977 sobre o estado de Sonora na qual o autor rea liza um estudo detalhado sobre um grupo político conhecido como dinastia de Sonora que comandou a política mexicana no período pósrevolucionário e teve um papel importante na reorganização do Estado nacional Da produção estrangeira sem dúvida alguma México Del Antiguo Régimen a la Revolución de FrançoisXavier Guerra é um dos livros mais polêmicos Esse trabalho não adentra a análise da Revolução em si o recorte temporal da pesquisa se inicia antes de 1876 e termina em 1911 com um capítulo sobre o levante de Madero No entanto as ideias centrais propostas sobre o porfi riato fi zeram com que este trabalho se tornasse imprescindível para o estudo das causas da Revolução Mexicana a longo prazo Inspirado pelos trabalhos de François Furet sobre a Revolução Francesa bem como pelas propostas de Fernand Braudel acerca da análise de longa duração Guerra propõe uma aguda crítica às conquistas revolucionárias de 1910 O objetivo central do autor é compreender as principais características de funcionamento do sistema porfi riano e a singularidade do ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3123 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3123 16062010 215942 16062010 215942 124 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA liberalismo adotado no México durante as últimas décadas do século XIX Chamado de ditadura pelos revolucionários e con siderado patriarcal pelos contemporâneos o regime porfi riano conseguiu subsistir por mais de trinta anos Para explicar essa longevidade Guerra baseiase fundamentalmente na análise das relações de caciquismo que segundo sua interpretação constituíram o pilar estrutural do porfi rismo A metodologia utilizada pelo autor consiste na análise do perfi l de um amplo grupo de políticos vinculados à admi nistração porfi riana nas diversas regiões do país Esse estudo abarca uma minuciosa pesquisa biográfi ca dessas personagens incluindo seu estado de origem grupo étnico formação escolar profi ssão ou grau militar fi liação política eou partidária alia dos cargos políticos adesão ou oposição aos sucessivos levantes precedentes ao porfi riato entre outros dados O autor evidenciou a existência de um confl ito latente no México do século XIX uma sociedade regida de acordo com princípios estritamente liberais permanentemente violados pela realidade social enquanto o porfi rismo foi a forma encontrada para manter o equilíbrio entre esses dois mundos heterogêneos Esse equilíbrio possibilitou levar adiante a marcha do progresso econômico no fi nal do século XIX junto com o aumento populacional a expansão das cidades e o crescimento de um setor médio composto por mineiros pequenos empresá rios comerciantes empregados municipais entre outros grupos No entanto a modernização também acabou por exacerbar as tensões inerentes à sociedade mexicana as comunidades indígenas ou não começaram a sofrer uma pressão externa que as ameaçava privar de suas posses e do grau de liberdade política e jurídica que possuíam enquanto isso as elites locais iniciavam um questionamento do regime que havia limitado e algumas vezes impossibilitado sua participação em certas instâncias da administração política Paralelamente vão se criando novos espaços de discussão política como os clubes liberais que segundo Guerra foram os primeiros núcleos da futura oposição revolucionária ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3124 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3124 16062010 215943 16062010 215943 125 A REVOLUÇÃO MEXICANA Nesse sentido a Revolução não resultou apenas da luta de camponeses sedentos por justiça social ainda que esse elemento estivesse presente Guerra introduziu um componente político ideológico a relação de contradição e a posterior ruptura do pacto entre dois tipos de atores os antigos e os modernos que segundo o autor se mantiveram em relativo equilíbrio devido à mediação de Porfírio Díaz durante o período em que esteve no poder Ainda que resultasse da incompatibilidade momentânea entre esses dois mundos a Revolução não resolveu os confl itos nem os governos pósrevolucionários elaboraram um novo sistema político ou social pelo contrário a tarefa primordial desses últimos concentrouse na reconstrução de um regime que pudesse pôr em marcha uma nova fi cção e voltasse a estabelecer o equilíbrio entre esses núcleos de poder Nas últimas duas décadas a historiografi a retornou a uma visão geral dos acontecimentos não somente no tocante à abordagem geográfi ca mas também no âmbito temporal Assim o porfi riato e os anos considerados posteriores à luta armada tornaramse períodos essenciais a serem estudados Certos autores consideram que o fi nal da Revolução acontece com o governo de Lázaro Cardenas 19341940 Algumas dessas últimas pesquisas foram fundamentais para reavaliar as linhas de investigação da Revolução Para John Mason Hart 1990 a Revolução Mexicana foi um movimento de massa de caráter nacionalista frente à penetração imperialista Neste sentido para Hart a Revolução Mexicana foi um dos primeiros levantes contra a penetração econômica e o controle político dos Estados Unidos Uma das inovações introduzidas por esse autor foi considerar que esse fenômeno histórico guardou semelhanças com outros movimentos do começo do século XX em outras partes do mundo como no Irã na China e na Rússia 1905 Estes macrofenômenos caracterizavamse por serem reações ao imperialismo britânico ou norteamericano Sem descuidar da importância que tiveram os camponeses Hart valorizou a atuação dos operários industriais urbanos Para ele houve três revoluções dentro da Revolução Mexicana ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3125 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3125 16062010 215943 16062010 215943 126 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA a primeira uma revolução camponesa a segunda de aspecto mais nacional apoiada pela pequena burguesia e a terceira uma incipiente revolução proletária Já o estudo de Alan Knight 1986 buscou registrar numa dimensão microscópica o multiforme e polifacetado processo revolucionário mexicano Para ele os conceitos de classe da teoria marxista não davam conta dessa realidade histórica e assim propôs uma nova tipologia e a divisão dos grupos sociais revolucionários entre serranos e agraristas Os primeiros foram defi nidos não tanto por sua localização geográfi ca mas mais porque se encontravam relativamente independentes do centro político do país e reagiram a uma centralização política ocorrida durante o porfi riato já os segundos eram relacionados aos camponeses que lutavam por uma revisão da questão da terra Com essa perspectiva Knight privilegiou fatores políticos e culturais em detrimento de uma análise classista como a de Hart Para Knight as forças motrizes da Revolução estavam nos fatores endógenos como os movimentos sociais locais e regionais e surgiram mais como um processo do que como uma série de programas sociopolíticos de medidas legislativas ou fatores exógenos como a intervenção dos Estados Unidos que teriam um papel secundário Para Hans Werner Tobler 1994 a Revolução deveria ser vista num processo de longa duração Para ele os aconteci mentos da década de 1930 estavam interligados com o processo revolucionário por isso sua periodização vai de 1910 até o go verno de Lázaro Cárdenas 19341940 Esse último governo foi o principal responsável pelo atendimento de diversas demandas sociais surgidas durante a luta armada e assim deu um caráter social à Revolução permitindo maior tranquilidade e estabilida de ao sistema político mexicano durante os anos subsequentes A análise da Revolução Mexicana aqui apresentada inspirase nessas interpretações e considera que para entender o México moderno do século XX e XXI é necessário compreender o porfi riato o período armado e ampliar a refl exão até a década ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3126 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3126 16062010 215943 16062010 215943 127 A REVOLUÇÃO MEXICANA de 1930 e o governo Cárdenas que foi o desfecho da Revolução Ao contrário dos revisionistas que trouxeram uma importante contribuição aos estudos históricos da Revolução entendemos que este grande movimento social representou uma ruptura na história mexicana apesar das continuidades e defi niu a feição desta nação até os dias atuais A Revolução Mexicana entre 1910 e 1920 marcou a história do México moderno Muito se discutiu e ainda hoje se debate sobre seu caráter e resultados Existem aqueles que a negam afi rmando que o que ocorreu foram diversas rebeliões no tempo e no espaço O discurso ofi cial do Partido da Revolução Institucional que queria legitimarse como herdeiro natural da Revolução ao longo de todo o século passado foi balizado na ideia de uma continuidade ininterrupta pelo menos até 2000 quando o PRI perdeu o poder A Revolução Mexicana representou uma ruptura na história do país Seu processo histórico com forte participação popular levou à construção de um Estado que incorporou as demandas populares em suas leis de forma indelével O violento ingresso das massas como protagonistas na história mexicana do início do século XX levou à criação de uma política de massas mais à esquerda do que a de outros países da América Latina Num balanço dos desdobramentos da Revolução o Mé xico foi um país que conservou um sistema civil de governo ao longo de quase todo o século XX em que pese seu caráter autoritário o que não ocorreu nos países da América do Sul por exemplo A estabilidade do seu sistema político constitui um dos seus principais resultados só possível devido ao movimento genuinamente popular e à eliminação política da oligarquia e do antigo Exército No momento em que se aproximam as comemorações do Bicentenário da Independência e do Centenário da Revolução Mexicana com a alternância de poder e o surgimento de no vos atores sociais como o EZLN é provável que se acirrem as disputas pela memória desses dois momentos fundadores da nação mexicana no transcorrer das festividades organizadas ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3127 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3127 16062010 215943 16062010 215943 128 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA pelo Estado durante este ano Um exemplo do que pode ocorrer foi o que se passou em 2006 com o Instituto Nacional de Estu dos Históricos da Revolução Mexicana fundado em 1953 no governo de Adolfo Cortines Seu nome mudou para Instituto Nacional de Estudos Históricos das Revoluções Mexicanas para englobar em suas temáticas de investigação as Revoluções de Independência a Revolução Liberal de 1857 a Revolução Me xicana de 19101920 e a transição democrática de 2000 Este é apenas mais um embate em torno da memória e da herança da Revolução Mexicana ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3128 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3128 16062010 215943 16062010 215943 129 BIBLIOGRAFIA AGUILAR CAMÍN H La frontera nómada Sonora y la revolución mexicana México Siglo XXI 1977 AGUILAR CAMÍN Héctor e MEYER Lorenzo A la sombra de la revolución mexicana México Cal y Arena 1994 ALIMONDA H A Revolução Mexicana São Paulo Moderna 1986 ALTMANN Wener México e Cuba revolução nacionalismo política externa São Leopoldo Unisinos 2001 ALTMANN Werner A trajetória contemporânea do México São Paulo Pensieri 1992 BARBOSA Carlos A S LOPES Maria A de S A historiografi a da revolução mexicana no limiar do século XXI tendências gerais e novas perspec tivas História Unesp 2001 p163198 BARBOSA Carlos Alberto S Morte e a vida da revolução mexicana Los de Abajo de Mariano Azuela Dissertação de Mestrado apresentada no Programa de PósGraduação da PUCSP 1996 BARBOSA Carlos Alberto Sampaio A construção consolidação e o espe táculo do poder no México Revolucionário Diálogos v8 n2 2004 p153187 BARBOSA Carlos Alberto Sampaio 20 de Novembro de 1910 A Revolução Mexicana São Paulo Companhia Editora NacionalLazuli Editora 2007 BARBOSA Carlos Alberto Sampaio A fotografi a a serviço de Clio uma interpretação da história visual da Revolução Mexicana 19001940 São Paulo Editora Unesp 2006 BATRA Armando La revolución mexicana de 1910 en la perspectiva del magonismo In GILLY Adolfo et al Interpretaciones de la revolución Mexicana México UNAMEditorial Nueva Imagen 1983 BRADING D A La revolución mexicana burguesa nacionalista o simple mente una gran rebelión Cuadernos Políticos México Instituto de Investigaciones Históricosociales n48 1996 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3129 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3129 16062010 215943 16062010 215943 130 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA BRADING David Caudillos y campesinos em la revolución mexicana México FCE 1993 BRAGANÇA Maurício de Registros Documentais no Cinema da Revolução Mexicana História Unesp v26 n2 2007 CAPELATO Maria Helena R Populismo LatinoAmericano em Discussão In FERREIRA Jorge O populismo e sua História debate e crítica Rio de Janeiro Civilização Brasileira 2001 p125165 CHEVALIER François Un factor decisivo de la revolución agraria de México el levantamiento de Zapata 19111919 In Cuadernos Americanos n6 novdez 1960 vCXIII p165187 COCKCROFT J D Precursores intelectuales de la revolución Mexicana México Siglo XXI 1994 CÓRDOVA A La ideología de la revolución mexicana La Formación del nuevo régimen México Era 1992 CORRÊA Anna Maria Martinez A Revolução Mexicana 19101917 São Paulo Brasiliense 1983 FALCÓN R Revolución y Caciquismo San Luis Potosí 19101938 México El Colegio de México 1984 FALCÓN R México Del Antiguo Régimen a la Revolución México Fondo de Cultura Económica 1988 t1 GILLY Adolfo La Revolución Mexicana In SEMO Enrique coordenador México un Pueblo en la Historia Volume 3 Oligarquia y revolución México Alianza Editorial 1993 GILLY Adolfo El Cardenismo una Utopia Mexicana México Cal y Arena 1994 GILLY Adolfo La revolución interrumpida Edição revista e ampliada México Era 1994 GILLY Adolfo et al Interpretaciones de la Revolución Mexicana México UNAMNueva Imagen 1983 GONZÁLEZ Luis El liberalismo triunfante In COSÍO VILLEGAS Daniel Historia General de México México ColmexHarla 1988 GUERRA FrançoisXavier México del Antiguo Régimen a la Revolución 2 volumes México Fondo de Cultura Económica 1992 GUZMÁN Martin Luis Memorias de Pancho Villa México Fondo de Cultura Económica 1987 HART John Mason El México revolucionário gestación y processo de la revolución mexicana México Alianza Editorial Mexicana 1990 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3130 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3130 16062010 215943 16062010 215943 131 A REVOLUÇÃO MEXICANA HERNÁNDEZ CHÁVEZ Alicia Anenecuilco memória y vida de um pueblo México Fondo de Cultura EconómicaColégio de México 1993 HERNÁNDEZ CHÁVEZ Alicia México Una breve historia del mundo indígena al siglo XX México Fondo de Cultura Económica 2002 HERZOG Jesus Silva Breve historia de la revolución mexicana 2v México Fondo de Cultura Económica 1995 HUDEHART Evelyn Rebelión campesina en el noroeste los indios Yaquis de Sonora 17401976 In KATZ Friedrich comp Revuelta rebelión y revolución La lucha rural en México del siglo XVI al siglo XX México Era 1990 v1 JAVIER GUERRERO Francisco Lázaro Cárdenas el Gran Viraje In SEMO Enrique coordenador México un pueblo en la historia v4 Los frutos de la revolución México Alianza Editorial 1998 JOSEPH Gilbert M Revolution from Without Yucatan Mexico and the United States 18801924 New York Cambridge University Press 1982 KATZ Friedrich compilador Revuelta rebelión y revolución la lucha rural en México del siglo XVI al siglo XX México Era 1999 KATZ Friedrich O México a República Restaurada e o Porfi riato 18671910 In BETHELL Leslie História da América Latina vV De 1879 a 1930 São PauloBrasília EduspFunagImesp 2002 KATZ Friedrich Pancho Villa los movimientos campesinos y la re forma agrária en el norte de México In BRADING David Caudillos y campesinos em la revolución mexicana México Fondo de Cultura Económica 1993 p86105 KATZ Friedrich Pancho Villa y la Revolución Mexicana Revista Mexicana de Sociología México v51 n1 1989 KATZ Friedrich La guerra secreta en México México Era 1982 t2 KATZ Friedrich Pancho Villa 2v México Era 1999 KATZ Friedrich The Secret War in Mexico Europe The United States and the Mexican Revolution Chicago The University of Chicago Press 1981 KNIGHT Alan Caudillos y campesinos en el México revolucionario 1910 1917 In BRADING D A org Caudillos y campesinos en la revolución mexicana México Fondo de Cultura Económica 1993 KNIGHT Alan México 19301946 In BETHELL Leslie org Historia de América Latina v13 México y el Caribe desde 1930 Barcelona Crítica Grijalbo Mondadori 1998 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3131 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3131 16062010 215943 16062010 215943 132 CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA KNIGHT Alan La revolución mexicana del porfi riato al nuevo régimen constitucional 2v México Editorial Grijalbo 1986 KRAUZE Enrique Caudillos culturales en la revolución mexicana México Siglo XXI 1994 LOPES Maria Aparecida de Souza De costumbres y leyes abigeato y derechos de propriedad en Chihuahua durante el porfi riato MéxicoZamora El Colegio de MéxicoEl Colegio de Michoacán 1995 MATUTE Álvaro Aproximaciones a la historiografi a de la revolución mexi cana México UNAM 2005 MEYER JR Jean La Cristiada 3v México Siglo XXI 19731974 NUNES Américo As revoluções do México São Paulo Perspectiva 1980 PAZ Octavio O labirinto da solidão e post scriptum Rio de Janeiro Paz e Terra 1992 PRADO Maria Ligia Coelho O populismo na América Latina São Paulo Brasiliense 1983 REED John México rebelde Rio de Janeiro Civilização Brasileira 1978 RUÍZ Ramon E The Great Rebellion Mexico 19051924 New York W W Norton Company Inc 1980 SIMPSON Eyler The Ejido Mexicos Way Out Chapel Hill The University of North Caroline Press 1937 SMITH Peter H México 19461990 In BETHELL Leslie org Historia de América Latina v13 México y el Caribe desde 1930 Barcelona Crítica Grijalbo Mondadori 1998 TANNENBAUM Frank Peace by Revolution New York Columbia University Press 1968 TANNENBAUM Frank The Mexican Agrarian Revolution New York Macmillan 1929 TOBLER Hans Werner La revolución mexicana algunas particularidades desde um punto de vista comparativo In Revista Mexicana de Socio logia ano LI n2 abrjun 1989 p151159 TOBLER Hans Werner La revolución mexicana transformación social y cambio político 18761940 México Alianza Editorial 1994 VASCONCELLOS Camilo de Mello Imagens da revolução mexicana o Museu Nacional de História do México 19401982 São Paulo Alameda 2007 VILLA Marco Antonio A Revolução Mexicana São Paulo Ática 1993 VILLA Marco Antonio Francisco Pancho Villa Uma liderança da vertente camponesa na revolução mexicana São Paulo Ícone 1992 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3132 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3132 16062010 215943 16062010 215943 133 A REVOLUÇÃO MEXICANA VILLA Marco Antonio Pancho Villa O herói desfocado São Paulo Brasi liense 1984 WOMACK JR John A Revolução Mexicana In BETHELL Leslie História da América Latina vV De 1879 a 1930 São PauloBrasília Edusp FunagImesp 2002 WOMACK Jr John Zapata y la revolución mexicana México Siglo XXI 1992 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3133 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3133 16062010 215943 16062010 215943 Coleção Revoluções do Século 20 Direção de Emília Viotti da Costa A Revolução Alemã 19181923 Isabel Loureiro A Revolução Boliviana Everaldo de Oliveira Andrade A Revolução Chilena Peter Winn A Revolução Chinesa Wladimir Pomar org A Revolução Colombiana Forrest Hylton A Revolução Cubana Luis Fernando Ayerbe A Revolução Guatemalteca Greg Grandin A Revolução Iraniana Osvaldo Coggiola A Revolução Nicaraguense Matilde Zimmermann A Revolução Peruana José Luis Rénique A Revolução Salvadorenha Tommie SueMontgomery e Christine Wade A Revolução Venezuelana Gilberto Maringoni A Revolução Vietnamita Paulo Fagundes Visentini As Revoluções Russas e o Socialismo Soviético Daniel Aarão Reis Filho org ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3134 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3134 16062010 215943 16062010 215943 SOBRE O LIVRO Formato 105 x 19 cm Mancha 188 x 425 paicas Tipologia Minion 105129 Papel Pólen Soft 80 gm2 miolo Cartão Supremo 250 gm2 capa 1ª edição 2010 EQUIPE DE REALIZAÇÃO Edição de Texto Maria Silvia Mourão Neto Copidesque Fabio Larsson Preparação Roberta Oliveira Stracieri Revisão Editoração Eletrônica Eduardo Seiji Seki Diagramação Projeto Visual capa e miolo Ettore Bottini Capa Megaart Foto da Capa Francisco Villa e Emiliano Zapata chegam à Cidade do México 1914 Fototeca Nacional do México Coleção SINAFOFNINAH Inventário 197988 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3135 ARevolucaomexicanaFINALindd Sec3135 24062010 121622 24062010 121622