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Direito ·
Teoria Geral do Direito Civil
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O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS INCAPACIDADES PELO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA REINTERPRETAÇÃO ATRAVÉS DO DISCERNIMENTO THE EMPTYING OF THE THEORY OF DISABILITIES BY THE STATUTE OF THE PERSON WITH DISABILITIES REINTERPRETATION THROUGH DISCERNMENT Taisa Maria Macena de Lima1 Professora dos Programas de Graduação e PósGraduação stricto sensu em Direito PUCMinas Belo HorizonteMG Brasil Jéssica Rodrigues Godinho2 Mestre em Direito Civil PUCMinas Belo HorizonteMG Brasil 1 Doutora e mestre em Direito Civil pela UFMG Desembargadora do Trabalho Exbolsista do DAAD Serviço alemão de intercâmbio acadêmico Email taisamacenayahoocombr Currículo http lattescnpqbr2794879775502752 Orcid httpsorcidorg0000000254549387 2 Bolsista Fapemig Especialista em Direito Civil pela PUCMinas Advogada Email jessicagodinho yahoocombr Currículo httplattescnpqbr5012158592823917 Orcid httpsorcidorg0000 000256696268 ÁREAS direito civil Estatuto da Pessoa com Deficiência RESUMO O Estatuto da Pessoa com Deficiência trouxe importantes alterações para o regime das incapacidades alterando o rol dos arts 3º e 4º do Código Civil esvaziando a teoria das incapacidades formatada e até então aplicada O discernimento foi deixado de lado como critério definidor da incapacidade e seu grau considerando que todas as pessoas seriam em tese capazes e que não haveria mais a incapacidade absoluta por motivo de saúde Assim é importante a análise da teoria e sua interpretação e refundação por meio do critério do discernimento que se mostra como o mais adequado para refletir na ordem jurídica as situações concretas da vida real ABSTRACT The Statute of the Person with Disabilities brought important changes 408 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional to the disability regime changing the role of articles 3 and 4 of the Civil Code emptying the Theory of Disabilities formatted and until then applied Discernment was left aside as the defining criterion of disability and its degree considering that all people would in theory be capable and that there would no longer be absolute incapacity for health reasons Thus it is important to analyze the theory and its interpretation and refoundation through the criterion of discernment which shows itself as the most appropriate to reflect in the juridical order the concrete situations of real life PALAVRASCHAVE teoria das incapacidades Estatuto da Pessoa com Deficiência capacidade discernimento KEYWORDS theory of disabilities Statute of Person with Disabilities capacity discernment SUMÁRIO Introdução 1 A teoria das incapacidades e o critério do discernimento 2 A modificação da teoria das incapacidades e a necessidade de ciências e conceitos fora do Direito 3 De lege lata refundação através da interpretação ao problema colocado pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência 4 De lege ferenda proposta de revisão da teoria das incapacidades Conclusão Referências SUMMARY Introduction 1 The theory of disabilities and the criterion of discernment 2 The modification of the theory of disabilities and the need of sciences and concepts outside the law 3 De lege lata refoundation through interpretation of the problem posed by the Statute of the Disabled Person 4 De lege ferenda proposed revision of the theory of disabilities Conclusion References INTRODUÇÃO A teoria das incapacidades não é uma preocupação dos juristas circunscrita ao tempo presente sofrendo críticas em razão de ter sido construída sob um paradigma patrimonialista Ainda criticavase também a forma negligente como é aplicada sem se considerar princípios básicos como a autonomia privada O discernimento por sua vez é elemento que sempre se fez presente na teoria desde sua formatação por Teixeira de Freitas e era o critério utilizado para adequação nas possibilidades de incapacidade previstas pelas legislações civilistas brasileiras Código Civil de 1916 e de 2002 Após a alteração promovida pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência Lei nº 131462015 não se pode mais identificar o discernimento como fator Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 409 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS primordial da incapacidade uma vez que desconsiderando as infinidades de características e situações que compõem o indivíduo o Estatuto decretou uma capacidade plena geral que não pode ser mitigada pela deficiência No presente trabalho pretendese discutir o papel do discernimento para a teoria das incapacidades pensar sobre o seu esvaziamento e propor novos contornos de interpretação e até mesmo de revisão da teoria 1 A TEORIA DAS INCAPACIDADES E O CRITÉRIO DO DISCERNIMENTO O discernimento é um conceito metajurídico Sua análise ultrapassa o universo jurídico mas a ele é aplicado em diversas de suas searas No conceito atribuído pelo dicionário discernimento é a faculdade de discernir tino juízo apreciação análise3 O verbo discernir por sua vez é definido como conhecer distintamente saber distinguir fazer apreciação de algo4 Em uma avaliação médica Miguel Chalub5 entende discernimento como a conjugação de duas faculdades o entendimento momento intelectivo e a determinação momento volitivo Precisase entender o ato e ter a vontade consciente de praticálo ciente de suas consequências Para Ana Carolina Brochado Teixeira discernimento significa possibilidade de exercer escolhas de forma responsável apresentando condições psíquicas de arcar com as consequências de seus atos Por isso falase em liberdade responsável6 Para discernir é necessário apreciar saber fazer a análise da situação para apurar quais serão as consequências Tratase de uma atividade cognitiva e volitiva Na seara do direito civil essa cognição e ação volitiva são expressas na prática de atos da vida civil 3 FERREIRA Aurélio Buarque de Holanda Discernimento In FERREIRA Aurélio Buarque de Holanda Mini Aurélio O dicionário da Língua Portuguesa 8 ed Curitiba Positivo 2010 p 257 4 FERREIRA Aurélio Buarque de Holanda Discernir In FERREIRA Aurélio Buarque de Holanda Mini Aurélio O dicionário da Língua Portuguesa 8 ed Curitiba Positivo 2010 p 257 5 CHALUB Miguel Medicina forense psiquiatria forense e lei In ADBALLAFILHO Elias CHALUB Miguel TELLES Lisieux E de Borba Psiquiatria forense de Taborda 3 ed Porto Alegre Artmed Cap 1 p 9 2016 6 TEIXEIRA Ana Carolina Brochado Integridade psíquica e capacidade de exercício Revista Trimestral de Direito Civil Rio de Janeiro v 9 n 33 p 336 jan 2008 p 17 410 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional Desta feita percebese a importância que o discernimento tem para o direito civil é por meio dessa avaliação individual cognitiva e volitiva que o sujeito irá ponderar sobre a ação e suas consequências o que ocasiona também na responsabilização da pessoa por seus próprios atos O discernimento está intimamente ligado à aptidão intelectual e volitiva do indivíduo o que resulta no exercício dos direitos em nome próprio Não estando apto ao exercício dos direitos per si a incapacidade civil pode ser um dos instrumentos jurídicos utilizados para a proteção da pessoa Além dos considerados incapazes há os plenamente capazes aqueles a quem a legislação não limita a capacidade de fato Presumese que os que possuem a capacidade plena têm o discernimento totalmente desenvolvido para a prática de atos jurídicos e negociais sem mácula de sua cognição podendo livremente expressar sua vontade Assim a autonomia dessas pessoas não sofre limitações como as que sofrem os incapazes Diversamente a legislação presume a falta ou diminuição de discernimento dos incapazes por critério etário ou de doença Rafael Garcia Rodrigues aduz que desta forma a manifestação de vontade destas pessoas não se constitui em elemento suficientemente hábil à prática de atos jurídicos pois lhe carece discernimento maculando a própria vontade7 Assim o discernimento passa a ser fator fundamental no que tange à capacidade de fato delimitando o poder de atuação do indivíduo 2 A MODIFICAÇÃO DA TEORIA DAS INCAPACIDADES E A NECESSIDADE DE CIÊNCIAS E CONCEITOS FORA DO DIREITO Em julho de 2015 foi promulgado o Estatuto da Pessoa com Deficiência EPD que se destina a assegurar os direitos da pessoa com deficiência e integrá la à sociedade Entre as alterações promovidas uma das mais significativas na legislação civilista foi a modificação dos arts 3º e 4º do Código Civil que elencam as hipóteses de incapacidade absoluta e relativa consecutivamente 7 RODRIGUES Rafael Garcia A pessoa e o ser humano no novo Código Civil In TEPEDINO Gustavo Coord A parte geral do novo Código Civil estudos na perspectiva civilconstitucional Rio de Janeiro Renovar Cap 1 p 14 2002 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 411 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS O art 6º do EPD decretou que a deficiência não pode afetar a plena capacidade o que se se analisar de forma profunda já era o que vigia no sistema anterior pois a capacidade sempre foi a regra e a incapacidade a exceção que deve ser provada Contudo após essa declaração o esquema estabelecido pelo Código Civil foi alterado passando a ser da seguinte forma a incapacidade absoluta é definida apenas pelo critério etário abrangendo apenas os menores de dezesseis anos A incapacidade relativa é definida tanto por critério etário quanto de saúde sendo relativamente incapazes os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos os ébrios habituais e os viciados em tóxico aqueles que por causa transitória ou permanente não puderem exprimir sua vontade os pródigos8 Pelas hipóteses de incapacidade não se pode identificar qual o critério utilizado pelo legislador para a definição das categorias Essa situação não ocorria na teoria formatada por Teixeira de Freitas aproveitada por Beviláqua no Código Civil de 1916 e pouco modificada pelo Código Civil de 2002 eis que a teoria em sua base elegeu o critério do discernimento para as atividades cíveis como limite entre capacidade e incapacidade Em parecer ao então Substitutivo da Câmara dos Deputados nº 4 de 2015 que depois se tornou o EPD o Senador Romário Faria PodemosRJ reconhece o papel do discernimento na teoria das incapacidades ao analisar o art 6º em conjunto com o art 84 e 114 do EPD Seu cerne é o reconhecimento de que condição de pessoa com deficiência isoladamente não é elemento relevante para limitar a capacidade civil Assim a deficiência não é a priori causadora de limitações à capacidade civil Os elementos que importam realmente para eventual limitação dessa capacidade são o discernimento para tomar decisões e a aptidão para manifestar vontade Uma pessoa pode ter deficiência e pleno discernimento ou pode não ter deficiência alguma e não conseguir manifestar sua vontade grifos nossos9 8 BRASIL Lei nº 10406 de 10 de janeiro de 2002 Institui o Código Civil Diário Oficial da União Brasília 11 jan 2002 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03leis2002L10406 htm Acesso em 5 maio 2019 9 FARIA Romário Parecer nº 266 de 2015 Substitutivo da Câmara dos Deputados nº 4 de 2015 ao Projeto de Lei do Senado nº 6 de 2003 Projeto de Lei nº 7699 de 2006 na Câmara dos Deputados 412 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional Apesar de o próprio senador atestar o papel do discernimento o EPD não coaduna com essa concepção Se é o discernimento que pode ser definidor da limitação da capacidade esvaziar completamente o art 3º do CC2002 não se harmoniza com esse posicionamento Então apesar de ser reconhecida a importância do discernimento para a teoria das incapacidades mesmo com as mudanças promovidas pelo EPD a forma como foi traduzida a intenção de integração e equidade nos arts 3º e 4º do Código Civil considerando também todas as reverberações da teoria na legislação civilista não privilegia a proteção integral do incapaz Ao simplesmente esvaziar o rol do art 3º chegouse à interpretação de que só é possível a incapacidade absoluta pelo critério etário desconsiderando as realidades fáticas que ocorrem no mundo O discernimento e a impossibilidade de expressão da vontade o que na prática resultava no mesmo10 foram extirpados do sistema jurídico cível criando um vácuo dogmático incontornável11 É incontornável pois se passa a ter que admitir situações de patente desproteção às pessoas que dela necessitam Assim se um indivíduo com síndrome de Down grave ou em coma profundo ou portador de outra espécie de demência que lhe retirasse o discernimento se qualquer dessas pessoas fosse interditada era considerada absolutamente incapaz sendolhe nomeado um curador para representála Atualmente não há mais essa possibilidade porque segundo a redação do art 4º do Código Civil mesmo na ausência de discernimento ou na impossibilidade de expressão da vontade a pessoa será considerada relativamente incapaz12 Na prática é que essa situação parece criar o chamado vácuo dogmático do Senador Paulo Paim que institui o Estatuto da Pessoa com Deficiência Lei Brasileira da Inclusão Disponível em httplegissenadolegbrsdleggetterdocumentodm4541434dispositioninli ne Acesso em 5 maio 2019 p 8 10 FIUZA César NOGUEIRA Roberto Henrique Pôrto Regime jurídico das incapacidades e tutela da vulnerabilidade In LIMA Taisa Maria Macena de SÁ Maria de Fátima Freire de MOUREIRA Diogo Luna Org Autonomia e vulnerabilidade Belo Horizonte Arraes Cap 2 p 17 2017 11 FIUZA NOGUEIRA 2017 p 17 12 FIUZA NOGUEIRA 2017 p 17 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 413 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS Na prática isso significa o quê Significa que se um indivíduo em coma for interditado será considerado relativamente incapaz sendolhe nomeado um curador Seguramente na sentença ao fixar os deveres e limites da curatela o juiz não terá outra opção que não a de considerar o curador representante do incapaz A assistência nesse caso é inviável Ora que incapacidade relativa é essa em que o incapaz não tenha sua vontade levada em conta em que seja representado provavelmente em todos os atos da vida civil inclusive nos de caráter existencial O mesmo se diga do indivíduo com síndrome de Down grave ou portador de síndrome de Alzheimer avançada ou por absurdo de um anencéfalo que sobreviva aos 18 anos Todos eles serão considerados formalmente relativamente incapazes apesar de serem efetivamente representados e de não terem condições de manifestar sua vontade por faltarlhes praticamente ou absolutamente todo o discernimento Que incapacidade relativa é essa afinal13 Assim ao fixar a sentença que define a curatela o juízo terá que ter atenção redobrada para definir a forma de auxílio que a pessoa curatelada terá que ter além de uma postura ativa frente às questões que lhe forem apresentadas A deficiência per si nunca foi critério automático para a interdição Nas antigas hipóteses dos arts 3º e 4º não se vislumbra em nenhum inciso a deficiência sozinha como definidora da incapacidade Além disso ainda que houvesse essa previsão a capacidade permanece sendo a regra A exceção a incapacidade tem que ser provada em processo judicial sendo preservadas todas as garantias processuais São muitas as críticas a essa mudança paradigmática realizada pelo EPD Veja Ao esvaziar o conceito de capacidade de fato o que o EPD fez na verdade foi retirar das pessoas com deficiência a proteção que o ordenamento jurídico lhes garantia Ao 13 FIUZA NOGUEIRA 2017 p 17 414 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional que parece o legislador se equivocou ao considerar que a lei presumia a ausência de discernimento de todos os deficientes mentais o que nunca foi o caso e para corrigir a aparente injustiça presumiu a existência de discernimento de todos o que parece com efeito ser muito mais perigoso e potencialmente lesivo Na ânsia de ser politicamente correto o Estatuto da Pessoa com Deficiência com relação aos atos da vida civil acabou por abandonar os deficientes à própria sorte14 Concordase plenamente com o posicionamento exposto acima O discernimento é um fato da Psiquiatria não podendo a lei presumir que todos o têm de forma integral sem a previsão de situações de resguardo àqueles que não o possuem Por isso defendese a importância de Ciências auxiliares ao Direito O ordenamento jurídico busca ser completo abrangendo o maior número de situações possíveis para propiciar a vida em sociedade e a solução de litígios contudo o Direito sozinho não é capaz de fornecer respostas a todos os problemas que surgem Portanto o Direito traz regulações para a adaptação social buscandose a vontade social15 Cabe à pesquisa o aprofundamento das soluções e a aplicação dessa vontade sem que se mitigue direitos de setores relevantes da sociedade16 Por meio da pesquisa é possível atualizar a legislação para acompanhar o desenvolvimento da ciência e o desenvolvimento social mantendo as leis eficazes e aplicáveis à realidade que se apresenta As diversas searas do Direito são complementares assim como diversas ciências podem também complementar o Direito sem que ele perca sua unicidade Dessa forma as diferentes partes do Direito não se situam uma ao lado da outra como coisas acabadas e estáticas pois o Direito é ordenação 14 CARVALHO Felipe Quintella Machado de A teoria das capacidades no Direito brasileiro de Teixeira de Freitas e Clovis Beviláqua ao Estatuto da Pessoa com Deficiência In PEREIRA Fabio Queiroz MORAIS Luísa Cristina de Carvalho LARA Mariana Alves Org A teoria das incapacidades e o Estatuto da Pessoa com Deficiência Belo Horizonte DPlácido Cap 1 p 31 2018 15 NADER Paulo Filosofia do Direito 21 ed Rio de Janeiro Forense 2012 p 44 16 NADER 2012 p 44 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 415 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS que dia a dia se renova17 Para a unicidade do saber jurídico algumas Ciências devem ser aplicadas para dar sentido à norma como a Medicina lato sensu Psiquiatria Psicologia e Assistência Social Como a aferição da incapacidade deve analisar a situação biopsicossocial em que está inserida a pessoa precisase verificar seu estado de saúde corporal bem como sua saúde mental e como a pessoa se relaciona em seu ambiente buscando resgatar a história vivida e construída para que a curatela seja efetivamente medida de proteção não uma forma de substituição integral Nesse sentido temse que Sendo a lei relativamente estática mutável apenas após complexo e demorado processo legislativo ou de consolidação jurisprudencial e a realidade fática à qual deve ser aplicada extremamente rica heterogênea e dinâmica é compreensível que os operadores do Direito necessitem muitas vezes se socorrer do auxílio de especialistas em determinadas áreas para que possam apreender a realidade subjacente de forma adequada Uma dessas áreas requisitada com frequência pelos tribunais é a psiquiatria Da aplicação judicial da psiquiatria ao ambiente do fórum deriva pois a expressão psiquiatria forense Cabe então ao psiquiatra forense em síntese informar Magistrados membros do Ministério Púbico e advogados sobre questões fáticas que digam respeito basicamente a transtornos mentais e às consequências jurídicas que eles ensejam18 grifos dos autores A lei não consegue acompanhar detidamente todas as evoluções sociais em virtude da rapidez com que elas acontecem e pela demora que há nos processos legislativos Ainda se a cada inovação a regra for alterada terseia um sistema legislativo inchado com diversas normas mortas e uma extrema dificuldade de aplicação do Direito Por isso é interessante a presença de princípios que 17 REALE Miguel Lições preliminares de Direito 27 ed São Paulo Saraiva 2002 p 6 18 TABORDA José G V ADBALLAFILHO Elias MECLER Kátia MORAES Talvane de Avaliação da capacidade civil pontoschave In ADBALLAFILHO Elias CHALUB Miguel TELLES Lisieux E de Borba Psiquiatria forense de Taborda 3 ed Porto Alegre Artmed Cap 12 p 203 2016 416 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional guiem a aplicação das normas vigentes e de ciências especializadas que possam trazer atualidade às normas postas Assim as funções do psiquiatra forense passam a ser principalmente duas estabelecer a existência ou não de doença mental perturbação da saúde mental ou transtorno do desenvolvimento em determinada pessoa definir se essa pessoa apresentando um transtorno mental demonstra aptidão mental suficiente que lhe permita gerir de forma autônoma seus interesses de forma pragmática e objetiva de acordo com seus valores e história de vida19 Como se pode perceber a análise é dúplice primeiramente verificase a condição de saúde para após definir em que essa condição influencia na aptidão mental discernimento Não se pode parar no primeiro ponto pois isso seria uma forma de discriminação em virtude de uma vulnerabilidade apenas Quando se analisa o discernimento o que se pretende o fundamento da decisão é a proteção da pessoa não a morte civil com sua exclusão do tráfego jurídico O papel do psiquiatra é de extrema relevância para que abusos não sejam cometidos Veja O legislador atribui ao psiquiatra o papel de avaliar os indivíduos sobre os quais pairam dúvidas quanto à possibilidade de se autogerirem Cabe ao psiquiatra estabelecer a complexa distinção entre o doente e o sadio o capaz e o incapaz Devese firmar um diagnóstico transpôlo para a terminologia jurídica descrever os déficits e definir como tais prejuízos podem interferir na capacidade civil20 É de extrema relevância que o médico utilize termos claros para que pessoas leigas possam entender o que se está passando Ainda a descrição minuciosa da situação do paciente auxilia na avaliação do juízo A avaliação deve 19 TABORDA et al 2016 p 203 20 TELLES Lisieux E de Borba DAY Vivian Peres ZORATTO Pedro Henrique Iserhard Transtornos psicóticos In ADBALLAFILHO Elias CHALUB Miguel TELLES Lisieux E de Borba Psiquiatria forense de Taborda 3 ed Porto Alegre Artmed Cap 23 p 435 2016 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 417 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS ser individualizada e flexível21 pois cada caso trará consigo uma peculiaridade que deverá ser considerada no momento do exame médico Patente é a necessidade de Ciências complementares ao Direito para que se defina com certa segurança qual é a medida mais adequada ao caso concreto privilegiando em grau máximo na medida do possível a autonomia pessoal e o poder de decisão individual sem transferir a tomada de decisões a outrem Nesse sentido quem determina a presença ou a falta de discernimento competência não é o Direito Logo na construção da incapacidade devese dar atenção às contribuições que a Psiquiatria e a Psicologia dão ao diagnóstico e tratamento das pessoas em razão de sua saúde mental22 Naquilo que Vitor Frederico Kümplel e Bruno de Ávila Borgarelli23 chamam de mutilação dos arts 3º e 4º do Código Civil temse que o EPD sob um fundamento moralmente elevado acabou por desproteger a pessoa à medida que não reconhece suas vulnerabilidades Nesse sentido Lara e Pereira aduzem que Quando referenciadas nos arts 3º e 4º do Código Civil a enfermidade e a deficiência mental só redundavam em uma qualificação de incapacidade se fossem acompanhadas de uma redução ou de uma ausência de discernimento Nesse sentido a preocupação da codificação não estava centrada na deficiência mental mas sim na possibilidade dessa mesma deficiência ser geradora de situações de ausência ou redução de níveis de discernimento Em outras palavras a legislação anterior buscava proteger os indivíduos que não apresentavam níveis de cognição adequados que os permitissem expressar a sua vontade com a devida qualidade Se uma ausência de discernimento ou sua redução é identificada revelase imperioso o estabelecimento 21 TELLES DAY ZORATTO 2016 p 435 22 TEIXEIRA Ana Carolina Brochado SOUZA Iara Antunes de Algumas reflexões sobre a limitação da curatela às questões patrimoniais no Estatuto da Pessoa com Deficiência In LIMA Taisa Maria Macena de SÁ Maria de Fátima Freire de MOUREIRA Diogo Luna Org Autonomia e vulnerabilidade Belo Horizonte Arraes Cap 14 p 159 2017 23 KÜMPEL Vitor Frederico BORGARELLI Bruno de Ávila As aberrações da Lei 131462015 Migalhas 11 ago 2015 Disponível em httpswwwmigalhascombrdePeso16MI22490561044Asaberra coesdalei131462015 Acesso em 5 maio 2019 418 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional de mecanismos protetivos que permitam que os atos jurídicos praticados sejam realizados em consonância com os seus reais interesses sem que causem prejuízo ao aludido sujeito de direito24 Lara e Pereira grifos nossos Carvalho também entende que o discernimento como causa de incapacidade foi extirpado do sistema jurídico apresentando o fato de as pessoas que não podem exprimir sua vontade passarem para o rol das pessoas relativamente incapazes não permite mais dizer que o critério é o discernimento presumidamente reduzido ou incompleto25 Para o autor não é mais claro o que distingue a incapacidade absoluta da relativa O critério para a incapacidade absoluta após o EPD é apenas o etário Desconhecese o critério usado para a incapacidade relativa considerando a miscelânea que resultou das alterações realizadas pela Lei nº 13146 Hosni26 entende que houve o rompimento com o fundamento da incapacidade pelo EPD considerando que pelo modelo estruturado pela CIF o discernimento não tem mais cabimento por ser um elemento intrínseco enquanto para a CIF devemse analisar elementos intrínsecos e extrínsecos Entretanto conforme já mencionado anteriormente não se acredita ser os elementos excludentes entre si Devese de fato considerar o ambiente em que a pessoa está inserida mas também é necessário que se verifique qual é a aptidão individual para a prática de negócios jurídicos Portanto o EPD rompeu com os pressupostos da teoria das incapacidades ao de forma explícita na legislação desconsiderar o discernimento como elemento definidor da capacidade 24 LARA Mariana Alves PEREIRA Fabio Queiroz Estatuto da Pessoa com Deficiência proteção ou desproteção In PEREIRA Fabio Queiroz MORAIS Luísa Cristina de Carvalho LARA Mariana Alves Org A teoria das incapacidades e o Estatuto da Pessoa com Deficiência 2 ed Belo Horizonte DPlácido Cap 5 p 107 2018 25 CARVALHO 2018 p 30 26 HOSNI David S S O conceito de deficiência e sua assimilação legal incompatibilidade entre a concepção não etimológica adotada no Estatuto da Pessoa com Deficiência e a fundamentação da incapacidade na falta de discernimento In PEREIRA Fabio Queiroz MORAIS Luísa Cristina de Carvalho LARA Mariana Alves Org A teoria das incapacidades e o Estatuto da Pessoa com Deficiência 2 ed Belo Horizonte DPlácido Cap 2 p 54 2018 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 419 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS É interessante o comentário de Sá e Moureira sobre formas de melhorar a qualidade de vida daqueles que são portadores de transtornos mentais Boas políticas bons planos e bons programas são essenciais Também uma boa legislação Propostas existem mas não a sua efetivação que necessita contar com recursos voltados especificamente à saúde mental27 A boa legislação é o último recurso utilizado no período o que acreditase não ser por acaso Contudo a mera alteração legislativa sem se firmar em bases sólidas sem um pano de fundo teórico coerente acaba por não proporcionar a integração desejada Há tempos a doutrina clamava por uma alteração na teoria das incapacidades pois ainda que com conquistas atingidas as interpretações errôneas acabavam por algumas vezes prejudicar os interesses da pessoa a ser curatelada28 Para a inclusão acreditase ser salutar primeiramente realizar políticas planos e programas voltados para as pessoas com deficiência ou transtornos mentais para que o comportamento social seja alterado ao invés de tentar alterá lo por meio de mudanças legislativas 3 DE LEGE LATA REFUNDAÇÃO ATRAVÉS DA INTERPRETAÇÃO AO PROBLEMA COLOCADO PELO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA Da forma como se encontra configurado o regime das incapacidades hodiernamente entendese que não existe mais a possibilidade de incapacidade absoluta Contudo em casos concretos podese verificar que há pessoas que não têm nenhum discernimento para autonomamente tomar diversas decisões cotidianas que afetariam sua vida e seu patrimônio Pessoas em coma com questões que afetem sua saúde mental de forma grave como o Alzheimer ou uma esquizofrenia severa por exemplo podem se mostrar completamente sem aptidão cognitiva Assim como pensar em um sistema protetivo para que essas pessoas não fiquem à própria sorte 27 SÁ Maria de Fátima Freire de Sá MOUREIRA Diogo Luna A capacidade dos incapazes Rio de Janeiro Lumen Juris 2011 p 164 28 SÁ MOUREIRA 2011 p 154 420 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional Ao discutir a antiga redação do Código Civil Maria de Fátima Freire de Sá e Diogo Luna Moureira argumentam que É certo que a análise da sua incapacidade dos relativamente incapazes parte de uma presunção relativa É certo também que o Código Civil de 2002 em seu art 4º deixou em aberto as hipóteses de incapacidade relativa Porém o que na prática ocorre é muito mais um exercício de subsunção dos fatos a um dos incisos do art 4º do Código Civil do que um esforço hermenêutico por parte do intérprete e aplicador da norma jurídica para a verificação da incapacidade e por consequência os limites do exercício da curatela29 Já se apontaram críticas ao regime das incapacidades estabelecido mais como forma de proteção ao patrimônio do que proteção da pessoa que necessita de apoio para a tomada de decisões Entretanto com o advento da Constituição de 1988 a dignidade da pessoa humana passou a ser o farol pelo qual os institutos jurídicos devem ser guiados inaugurando uma interpretação que dá ênfase ao ser humano e a suas características pessoais Alterar o comportamento não é algo simples Portanto a decretação da incapacidade em alguns casos não se pode generalizar poderia privilegiar a situação legal em detrimento da situação real Com as modificações entendese que o processo de subsunção passou a ser o exercício feito pelos julgadores não por falta de reflexão hermenêutica mas sim por ser essa a forma de conceder proteção à pessoa O que se percebe na prática é que para que não se deixe a pessoa desprotegida acabase por tentar enquadrar a situação em uma das hipóteses estabelecidas no art 4º do CC2002 Assim podese entender a nova formatação da teoria sobre três vieses que a teoria se manteve intacta apesar das modificações que foi mitigada ou que foi completamente modificada Não se pode concordar que a teoria foi mantida pois o discernimento não é mais o critério legal eleito como definidor da capacidade A mitigação30 também não parece a corrente mais adequada 29 SÁ MOUREIRA 2011 p 142 30 Defendida por Nelson Rosenvald 2015 sp Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 421 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS pelo mesmo motivo anterior A modificação completa31 então parece ser o que ocorreu Nesse sentido Diante do exposto foi possível concluir que a entrada em vigor do Estatuto da Pessoa com Deficiência enraizado nos objetivos traçados pela Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência promoverá a reconfiguração de clássicos institutos e teorias do direito privado em prol de uma nova realidade jurídica das pessoas com deficiência32 Flávio Tartuce salienta que tais dispositivos foram profundamente alterados pela Lei nº 13146 de julho de 2015 que instituiu o EPD criando uma nova teoria das incapacidades dentro do direito civil brasileiro33 Assim com esse novo panorama os julgadores acabam por ter que atuar ativamente subsumindo os casos apresentados às figuras do art 4º A causa mais abrangente é a constante no inciso III Aqueles que por causa transitória ou permanente não puderem exprimir sua vontade34 Flávio Tartuce salienta que Todavia pode ser feita uma crítica inicial em relação à mudança do sistema Ela foi pensada para a inclusão das pessoas com deficiência o que é um justo motivo sem dúvidas Porém acabou por desconsiderar muitas outras situações concretas como a dos psicopatas que não serão mais enquadrados como absolutamente incapazes no sistema civil Será necessário um grande esforço doutrinário e jurisprudencial para conseguir situálos no inciso III do art 4º do Código Civil 31 Defendida por Vitor Frederico Kümpel e Bruno de Ávila Borgarelli 2015 Flávio Tartuce 2017 p 132 Moacyr Petrocelli de Ávila Ribeiro 2015 p 64 e Felipe Quintella Machado de Carvalho 2018 p 30 32 RIBEIRO Moacyr Petrocelli de Ávila Estatuto da Pessoa com Deficiência a revisão da teoria das incapacidades e os reflexos jurídicos na ótica do notário e do registrador Revista eletrônica do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região CuritibaPR v 5 n 46 p 5864 nov 2015 Disponível em https hdlhandlenet205001217887594 Acesso em 5 maio 2019 p 64 33 TARTUCE Flávio Direito civil Lei de Introdução e parte geral 13 ed Rio de Janeiro Forense v 1 2017 ebook p 132 34 BRASIL 2002 422 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional tratandoos como relativamente incapazes Não sendo isso possível os psicopatas serão considerados plenamente capazes para o direito civil35 Parece ser esse o esforço perpetrado pelos julgadores para garantir a proteção aos incapazes No Processo nº 01149463820138130245 julgado perante o Tribunal de Justiça de Minas Gerais relatado alhures a psiquiatra em seu laudo afirmou que devido a sintomas cognitivos de déficit considerável da memória de trabalho prejuízo na interação interpessoal embotamento afetivo e isolamento social imposta por tal agravo tal paciente não é capaz de gerir sozinho os atos da vida civil36 grifos nossos Mesmo com esse laudo a Desembargadora Alice Birchal entendeu não ser mais possível a decretação absoluta de incapacidade mas que deixar a pessoa interditada sem auxílio também não coaduna com a necessidade que se apresenta Foi então decretada a incapacidade relativa nos termos do art 4º III do CC2002 No Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul encontrouse decisão no mesmo sentido A apelante foi declarada relativamente incapaz em virtude de transtorno afetivo bipolar que afetava sua capacidade de se autogerir O Desembargador Luiz Felipe Brasil Santos entendeu da seguinte forma Portanto a apelante a partir da vigência do Estatuto da Pessoa com Deficiência não pode mais ser considerada absolutamente incapaz mas sim relativamente incapaz nos termos da nova redação do art 4º III do Código Civil37 35 TARTUCE Flávio Alterações do Código Civil pela Lei 131462015 Estatuto da Pessoa com Deficiência Repercussões para o Direito de Família e confrontações com o novo CPC Parte I Migalhas Família e Sucessões 29 jul 2015 Disponível em httpswwwmigalhascombrFamiliae Sucessoes104MI22421721048AlteracoesdoCodigoCivilpelalei131462015EstatutodaPes soacom Acesso em 5 maio 2019 sp 36 MINAS GERAIS Tribunal de Justiça Processo nº 01149463820138130245 Relatora Alice Birchal Belo Horizonte 21 fev 2017 Disponível em httpwww5tjmgjusbrjurisprudencia pesquisaPalavrasEspelhoAcordaodonumeroRegistro1totalLinhas5paginaNumero1 linhasPorPagina1palavrasCURATELApesquisarPorementaorderByData2listaR elator089920referenciaLegislativaClique20na20lupa20para20pesquisar20as20 referEAncias20cadastradaspesquisaPalavrasPesquisar Acesso em 5 maio 2019 37 RIO GRANDE DO SUL Tribunal de Justiça Processo nº 01224732220168217000 Relator Luiz Felipe Brasil Santos Porto Alegre 17 ago 2016 Disponível em httpwww1tjrsjusbrsitephp consultaconsultaprocessophpnomecomarcaTribunaldeJustiE7aversaoversao Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 423 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS O laudo pericial contava que a apelante era relativamente incapaz para residir sozinha e para gerenciar seu tratamento médico uma vez que não aceitava ser portadora de transtorno afetivo bipolar38 O laudo também mencionou que a incapacidade era permanente para atos da vida civil39 Acreditase ser essa uma das soluções possíveis frente ao EPD Outra solução seria o reconhecimento de curatela sem a decretação de incapacidade No Superior Tribunal de Justiça encontrouse julgamento que acompanha essa última posição Consta na ementa que 9 A partir do novo regramento observase uma dissociação necessária e absoluta entre o transtorno mental e o reconhecimento da incapacidade ou seja a definição automática de que a pessoa portadora de debilidade mental de qualquer natureza implicaria na constatação da limitação de sua capacidade civil deixou de existir40 Essa posição acompanha o texto literal do art 6º do EPD segundo o qual a deficiência não influencia na plena capacidade civil Portanto ainda que haja redução do discernimento que no sistema anterior implicava incapacidade relativa ou absoluta a pessoa não pode ser considerada incapaz ela continuará plenamente capaz podendo contar com o auxílio de um curador para questões patrimoniais e negociais Ao discutir a capacidade plena das pessoas com deficiência Lima e Sá criticam Por outro lado conferir capacidade de exercício ex ante a seres humanos que em razão de gravíssima deficiência mental e intelectual não têm condições reais de autogoverno também leva ao esvaziamento de direitos fonetica1tipo1idcomarca700numprocessomask70069122794numprocesso70069122 794codEmenta6896195temIntTeortrue Acesso em 5 maio 2019 38 RIO GRANDE DO SUL 2016 39 RIO GRANDE DO SUL 2016 40 BRASIL Superior Tribunal de Justiça Recurso Especial nº 1694984MS Relator Luis Felipe Salomão Quarta Turma Diário de Justiça Eletrônico Brasília 1º fev 2018 Disponível em httpsww2 stjjusbrprocessorevistainteiroteornumregistro201700120810dtpublicacao01022018 Acesso em 24 nov 2018 424 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional personalíssimos Neste caso não é a ordem jurídica ou barreiras sociais que obstam o exercício do direito mas a condição peculiar do próprio sujeito jurídico e isso não foi considerado na elaboração do Estatuto41 Nesta pesquisa concordase com esse posicionamento Acreditase ser anacrônica a solução de apenas atribuir plena capacidade às pessoas com deficiência pois não se concebe como uma terceira pessoa pode interferir no julgamento de alguém que tem sua capacidade íntegra plena Ainda que o ideário do EPD seja a inclusão não há como afetar a própria natureza humana Outra solução possível que pode ser conjugada com as anteriormente citadas é a apresentada por Iara Antunes de Souza Para a autora a forma em que se dará a curatela pode ser fluida dependendo do caso concreto O critério definidor mais uma vez seria o discernimento Caso a equipe multidisciplinar reconheça a falta completa de discernimento a medida protetiva cabível seria a representação caso seja reconhecido o discernimento parcial poderseia determinar a assistência prestigiando a autonomia da pessoa curatelada sempre que possível42 Vejase Vislumbrase que a representação é possível desde que a equipe multidisciplinar reconheça que a falta de discernimento é em tal grau que somente a substituição da vontade a supra Para tanto não se importa se o sistema fala em ausência de hipóteses de incapacidade absoluta em razão da saúde mental Afinal interpretação diversa seria considerar a possibilidade de o Direito fechar os olhos para a realidade o que os anseios constitucionais não permitiriam O que se defende é a possibilidade de representação ainda que se reconheça nos termos da lei uma incapacidade relativa O que é permitido se interpretar dentro do Estatuto da Pessoa 41 LIMA Taisa Maria Macena de SÁ Maria de Fátima Freire de Estatuto da Pessoa com Deficiência e questões médicas In LIMA Taisa Maria Macena de SÁ Maria de Fátima Freire de MOUREIRA Diogo Luna Org Autonomia e vulnerabilidade Belo Horizonte Arraes Cap 11 p 119120 2017 42 SOUZA Iara Antunes de Estatuto da pessoa com deficiência curatela e saúde mental Conforme a Lei 131462015 Estatuto da Pessoa com Deficiência131052015 Novo Código de Processo Civil Belo Horizonte DPlácido 2016 p 288 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 425 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS com Deficiência eis que ele prevê o cuidado como medida excepcional temporária e casuística43 A autora ainda salienta que O que se propõe em suma é afastar a lógica de que o absolutamente incapaz é representado e o relativamente incapaz é assistido relegando ao reconhecimento do nível de ausência de discernimento por equipe multidisciplinar de saúde mental a aplicação da medida necessária para o fomento da personalidade44 Ao tratar dos institutos da representação e da assistência de forma fluida podese adequar a forma de proteção a cada caso de acordo com o laudo da equipe multidisciplinar que tem maiores condições de aferir a realidade concreta Essa concepção mostrase interessante por harmonizar com ambas as correntes acima apresentadas pois não diz respeito à interdição e sim à forma que a curatela se dará Como nas duas teorias há o estabelecimento da curatela devese pensar a forma de moldála de maneira a preservar a pessoalidade do curatelado Harmoniza ainda com o texto do art 755 do CPC pois a sentença será modulada de acordo com a situação casuística e as potencialidades habilidades vontades e preferências do curatelado serão observadas e respeitadas Devese primar por assegurar as garantias constitucionais do processo na construção de uma decisão jurisdicional que diga respeito à limitação da autonomia do indivíduo para a prática de atos que se refiram à sua vida enquanto sujeito de direitos45 São essas portanto as alternativas que se verificam para a aplicação da legislação vigente 4 DE LEGE FERENDA PROPOSTA DE REVISÃO DA TEORIA DAS INCAPACIDADES 43 SOUZA 2016 p 297 44 SOUZA 2016 p 297 45 SÁ MOUREIRA 2011 p 143 426 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional Antes da promulgação do EPD a doutrina jurídica clamava por uma reforma na teoria das incapacidades de modo a prestigiar em grau máximo a individualidade daquele a ser submetido a um processo de interdição Entendese que as bases teóricas estabelecidas são sólidas devendo seus fundamentos serem mantidos O necessário seria a ruptura com a forma patrimonialista de se pensar a teoria e sua aplicação Não se percebe pelos textos apresentados neste trabalho que a fundamentação lógica da teoria das incapacidades precisa ser refeita Sua aplicação é que requer um critério elevado de limitação pois é medida extrema que não pode ocasionar total exclusão da pessoa do tráfego jurídico Dessa forma a refundação legal e prática urge O EPD atendeu à parte dos reclames coadunando com os princípios constitucionais de dignidade da pessoa humana e isonomia Contudo a forma como alguns dispositivos legais foram apresentados e a ruptura nos arts 3º e 4º do Código Civil consequentemente os efeitos que deles decorriam acabaram por gerar um campo de desproteção muito grande Apresentaramse em seção anterior algumas formas de aplicação da lei tendo em vista como se encontra no momento Entretanto não se acredita ser o estado em que a lei se encontra o mais adequado Nesse aspecto Iara Antunes de Souza pertinentemente perquire Qual o meio jurídico adequado para que o ordenamento jurídico brasileiro garanta na maior medida do possível a autonomia privada da pessoa com deficiência mental e intelectual e sua dignidade humana nos moldes reclamados pela Medicina e Psicologia pela Carta de Nova York e pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência 46 Além disso a autora ressalta também que Para se responder à pergunta não se olvida da necessidade de mudanças interpretativas do Direito em especial para que de fato o desiderato seja alcançado O Direito não pode ser um instrumento de segregação e exclusão enquanto o movimento médico psicológico 46 SOUZA 2016 p 360 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 427 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS e de toda área de saúde é no sentido de inclusão e garantia47 Portanto como conjugar todos esses preceitos de forma que o Direito seja uma ferramenta inclusiva e garanta a proteção das pessoas Já se argumentou que o discernimento é o ponto central da teoria das incapacidades e entendese que assim deve permanecer O que se propõe é que seja inteiramente retirada do Direito a definição de quem tem ou não tem discernimento Afinal como reiteradamente defendido não cabe ao Direito definir em que ponto há ou não há discernimento48 Esse encargo deverá ser de uma equipe multidisciplinar porque O estado pessoal patológico ainda que permanente da pessoa que não seja absoluto ou total mas graduado e parcial não se pode traduzir em uma série estereotipada de limitações proibições e exclusões que no caso concreto isto é levando em consideração o grau e a qualidade do déficit psíquico não se justificam e acabam por representar camisas de força totalmente desproporcionadas e principalmente contrastantes com a realização do pleno desenvolvimento da pessoa49 Classificações prédefinidas como ocorrem no art 4º e também ocorria no art 3º do Código Civil acabam por se tornar amarras à aplicação do Direito verdadeiros estereótipos O que ocorre é a subsunção do caso ao disposto na lei como forma de prática positiva e legalista O que se busca é a aplicação casuística analisando as situações em concreto as vicissitudes que cada caso e cada pessoa apresenta para que seja moldado individualmente o cuidado necessário sem predeterminações Assim A pessoa constrói diuturnamente sua pessoalidade e portanto tanto a capacidade quanto a incapacidade somente podem ser verificadas no caso concreto sem figuras determinadas aprioristicamente ainda que 47 SOUZA 2016 p 360 48 SOUZA 2016 p 284 49 PERLINGIERI Pietro Perfis do direito civil introdução ao direito civil constitucional 2 ed Rio de Janeiro Renovar 2002 p 164 428 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional uma vez reconhecidas os papéis estejam na norma jurídica50 Propõese portanto que a norma que trata da incapacidade seja aberta que não existam gradações já definidas51 ou hipóteses a serem observadas de antemão Isso beneficiaria a participação da pessoa curatelada no processo que seria uma construção feita pelas partes a fim de chegar a um resultado que beneficiasse a integridade pessoal individual Se a dignidade da pessoa humana é o eixo do sistema como se proclama a torto e a direito engessar o poder do juiz de proteger de forma plena alguém acometido por uma situação incapacitante é garantir essa dignidade O que protege melhor a flexibilidade ou a rigidez A possibilidade do amplo exercício do estado de direito por meio da jurisdição ou a sua inibição52 Uma norma aberta flexível mostrase ideal para que seja feita a construção da melhor solução na seara jurisdicional Outro ponto a ser privilegiado seria a avaliação por equipe multidisciplinar ponto central da construção Essa avaliação deveria ser obrigatória e não facultativa como atualmente ocorre A análise da situação concreta por diversas ciências ajudaria a ter uma definição mais realística do caso com a aferição da extensão do discernimento que a pessoa apresenta para cada ato específico que for impugnado Por isso para a atribuição da curatela do cuidado será necessária a constatação de limitação total ou parcial ao discernimento por uma equipe multidisciplinar composta por psiquiatra psicólogo assistente social terapeuta ocupacional etc que concluirá acerca da existência ou não de um transtorno mental ou de uma deficiência mental ou intelectual mas independentemente disso sua influência no 50 TEIXEIRA SOUZA 2017 p 158 51 Apesar de também ser um assunto digno de discussão ressaltase que não se trata da gradação da capacidade em função da idade nesta pesquisa 52 KÜMPEL BORGARELLI 2015 sp Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 429 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS discernimento para o exercício dos atos da vida civil culminando na interdição53 Além disso Cabe a uma equipe multidisciplinar verificar a deficiência art 2 parágrafo único do Estatuto da Pessoa com Deficiência54 e também cabe a ela avaliar se excepcionalmente a deficiência afeta a autodeterminação da pessoa ou seja afeta seu discernimento para exercer os atos da vida civil Se a capacidade é a regra a incapacidade deve ser provada quando existir e nos limites em que existir55 grifos nossos A análise passa a ser mais criteriosa e individualizada com regras flexíveis Apenas a doença mental não pode caracterizar medida tão extrema quanto à interdição eou à curatela A insuficiência mental para justificar um estatuto particular de incapacidade ou limitada capacidade deve representar objetivamente um estado patológico Esse estado patológico pode ser individuado mediante uma complexa avaliação das condições pessoais do sujeito e daquelas sociais culturais e ambientais mas sempre em relação ao exclusivo interesse das manifestações do desenvolvimento pessoal e não já alegando razões de interesse superior que bem se prestariam a legitimar qualquer instrumentalização 56 O discernimento é o ponto central a ser avaliado mas não apenas ele As interações da pessoa com o mundo social com o que está à sua volta também se 53 SOUZA 2016 p 378 54 Elucidase que é o primeiro parágrafo do art 2º do EPD que traz a necessidade de avaliação por equipe multidisciplinar como se mostra a seguir 1º A avaliação da deficiência quando necessária será biopsicossocial realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará I os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo II os fatores socioambientais psicológicos e pessoais III a limitação no desempenho de atividades e IV a restrição de participação BRASIL 2015b 55 TEIXEIRA SOUZA 2016 p 161 56 PERLINGIERI 2002 p 166 430 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional mostram de suma importância Em especial nesse momento vivenciado em que o modelo médico já foi superado pois não há que se tratar apenas a doença de forma a adaptar a pessoa ao ambiente O ambiente também deve estar preparado para receber a pessoa e por isso a avaliação não pode ser feita apenas do ponto de vista médico Sempre que as faculdades intelectivas e afetivas estiveram intactas ainda que de forma residual deverão ser preservadas pois dessa forma contribuise para o desenvolvimento da personalidade dando ao sujeito o reconhecimento de seu estado como pessoa e cidadão que coadunem com sua situação biopsicossocial57 Sobre a flexibilização do instituto da incapacidade Teixeira e Souza explicam que Portanto existia toda uma corrente doutrinária que proclamava a necessidade de se fazer valer a estreita relação existente entre integridade psíquica e capacidade de exercício de modo a valorizar a vontade do incapaz portador de discernimento revelando respeito às suas parcelas de poder e de autodeterminação Assim propunhase que a capacidade de agir deveria ser diretamente proporcional ao grau de discernimento que a pessoa tem sendo o caso nesta hipótese de acabar com a rígida separação entre absolutamente e relativamente incapazes para que seja efetivamente possível uma visão quantitativa e qualitativamente diferente dos atos praticados por aqueles que não têm a totalidade do seu discernimento58 Filiase neste trabalho a essa corrente entendendo ser a flexibilização medida que coaduna com a dignidade da pessoa humana e propicia a autonomia privada Não haveria hipóteses apriorísticas para a declaração da incapacidade nem argumentos pragmáticos que justifiquem a limitação da capacidade59 57 PERLINGIERI 2002 p 164165 58 TEIXEIRA SOUZA 2017 p 157 59 SÁ MOUREIRA 2011 p 137 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 431 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS Sobre a função do direito civil na atualidade Nelson Rosenvald entende que essa é revisitar o ser humano subjacente ao indivíduo e que a dignidade cláusula geral de proteção é também uma forma de proteção da integridade psicofísica do indivíduo corpo alma e intelecto60 Portanto a própria capacidade fundase na dignidade devendo ser restringida em situações excepcionais e não deve nunca ser uma punição pelo simples fato de se comportar de modo diferenciado61 pois todos os seres humanos de uma forma ou outra possuem vulnerabilidades que são permanentemente superadas para que se afirme a subjetividade individual62 O foco deve estar não na doença por si só mas sim em que a doença afeta no comportamento cognitivo volitivo e social Com um sistema aberto poderseá também flexibilizar a forma de cuidado de acordo com a necessidade pessoal conforme defendido por Iara Antunes de Souza e apresentado na seção anterior A pessoa poderia ser representada ou assistida a depender da necessidade de cuidado Não se teria a definição de que a incapacidade absoluta pressupõe a representação e a incapacidade relativa pressupõe a assistência pois todos esses conceitos não seriam mais predefinidos e sim construídos durante o processo É importante salientar que a norma jurídica aberta não influenciaria na judicialização de processos com aumento do número deles pois a interdição ou curatela deve ser declarada em juízo Ela por ser medida extraordinária não se presume Creditase grande valor às palavras de Lara e Pereira que entendem que um sistema de incapacidades adequado é aquele que se constrói estando atento às peculiaridades que marcam cada um dos indivíduos mas que tenha também sua base nas potencialidades e nos diferentes graus de discernimento que caracterizam cada uma dessas pessoas63 Isto é o que se propõe neste trabalho que as potencialidades a autonomia o desenvolvimento da personalidade e a pessoalidade de cada indivíduo sejam 60 ROSENVALD Nelson A necessária revisão da teoria das incapacidades In BRAGA NETTO Felipe Peixoto SILVA Michael César Org Direito privado e contemporaneidade desafios e perspectivas do direito privado no século XXI Belo Horizonte DPlácido Cap 1 p 18 2014 61 ROSENVALD 2014 p 19 62 ROSENVALD 2014 p 19 63 LARA PEREIRA 2018 p 97 432 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional respeitados para que não tenha mais mortes civis e que não haja estigma sobre o processo de interdição Com a participação de equipes multidisciplinares e do próprio curatelando a solução será construída para cada caso individualmente respeitandose os princípios constitucionais os da CDPD os do EPD e os do processo CONCLUSÃO Analisadas as alterações promovidas pelo Estatuto no Código Civil e na teoria das incapacidades verificase que atualmente em razão da saúde mental existem apenas duas possibilidades ou se é plenamente capaz ou se é relativamente incapaz Quanto ao discernimento esse foi desconsiderado pelo Estatuto que pretendendo atribuir igualdade esqueceuse de que a igualdade não pode ser apenas formal Ela deve primordialmente ser material Todas as pessoas são portadoras de vulnerabilidades em maior ou menor medida que devem ser reconhecidas e protegidas para que as relações sociais possam ser realizadas de forma equitativa sem vantagens para uma ou outra parte Para que não se gerem desproteções vêse que na prática muitos julgadores estão determinando a incapacidade relativa fazendo um verdadeiro exercício de ativismo para enquadrar a situação principalmente na hipótese do inciso III do art 4º do CC2002 para que as pessoas não fiquem desprotegidas Outros por sua vez estão determinando a curatela ainda que reconheçam a capacidade plena nos termos do art 6º do EPD Não se concorda com essa medida por se entender que ela é controversa Como reconhecer uma medida de cuidado a alguém que é plenamente capaz Uma situação não se conecta a outra o que acaba por criar um abismo jurídico Outra solução apresentada foi a teoria de fluidez da aplicação das medidas de cuidado a assistência e a representação proposta por Iara Antunes de Souza Portanto ainda que a pessoa seja declarada relativamente incapaz ou que mantenha a capacidade plena o caso concreto considerando os relatórios da equipe multidisciplinar guiará a medida mais adequada a ele Se o indivíduo necessita de um cuidado mais próximo com a substituição de sua vontade por não ter discernimento completo moldarseá a sentença considerando a curatela em forma de representação se de forma diversa o indivíduo preserva em qualquer grau o discernimento a medida adequada deve ser a assistência Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 433 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS Por fim tratouse da possibilidade de revisão da teoria das incapacidades em que não se existiriam hipóteses fechadas mas sim uma cláusula aberta Não se ousou todavia fazer uma proposta de mudança legislativa entendendo ser essa uma tarefa para especialistas Uma regra aberta sem hipóteses taxativas propiciaria uma construção caso a caso com participação em máximo grau do curatelando Uma avaliação multidisciplinar tornarseá obrigatória pois com base nela se dariam as discussões jurídicas Além disso poderseão construir sentenças que seriam moldadas a cada situação apresentada prestigiando a autonomia de cada indivíduo sem apagar sua história ou substituílo por outrem o que causa uma verdadeira morte civil O que se pretende é que o discernimento volte a ser a base da aplicação da teoria pois se entende que dessa forma não haveria estigmatização de pessoas e doenças Estas não são a causa da incapacidade e sim a unidade do discernimento Dessa forma garantirseia a proteção necessária como construída pelo sistema legal ao se pensar nos efeitos que as incapacidades relativa e absoluta proporcionam e principalmente preservarseia a autonomia de cada indivíduo que poderá participar da construção da sua própria história REFERÊNCIAS BRASIL Lei nº 10406 de 10 de janeiro de 2002 Institui o Código Civil Diário Oficial da União Brasília 11 jan 2002 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03 leis2002L10406htm Acesso em 5 maio 2019 Lei nº 13146 de 6 de julho de 2015 Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência Estatuto da Pessoa com Deficiência Diário Oficial da União Brasília 7 jul 2015b Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03ato2015 20182015leil13146htm Acesso em 5 maio 2019 Superior Tribunal de Justiça Recurso Especial 1694984MS Relator Luis Felipe Salomão Quarta Turma Diário de Justiça Eletrônico Brasília 1º fev 2018 Disponível em httpsww2stjjusbrprocessorevistainteiroteornum registro201700120810dtpublicacao01022018 Acesso em 24 nov 2018 CARVALHO Felipe Quintella Machado de A teoria das capacidades no Direito brasileiro de Teixeira de Freitas e Clovis Beviláqua ao Estatuto da Pessoa com Deficiência In PEREIRA Fabio Queiroz MORAIS Luísa Cristina de Carvalho LARA Mariana Alves 434 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional Org A teoria das incapacidades e o Estatuto da Pessoa com Deficiência Belo Horizonte DPlácido cap 1 p 1733 2018 CHALUB Miguel Medicina forense Psiquiatria forense e lei In ADBALLAFILHO Elias CHALUB Miguel TELLES Lisieux E de Borba Psiquiatria forense de Taborda 3 ed Porto Alegre Artmed Cap 1 p 312 2016 TELLES Lisieux E de Borba Psiquiatria forense de Taborda 3 ed Porto Alegre Artmed Cap 12 p 201215 2016 HOSNI David S S O conceito de deficiência e sua assimilação legal incompatibilidade entre a concepção não etimológica adotada no Estatuto da Pessoa com Deficiência e a fundamentação da incapacidade na falta de discernimento In PEREIRA Fabio Queiroz MORAIS Luísa Cristina de Carvalho LARA Mariana Alves Org A teoria das incapacidades e o Estatuto da Pessoa com Deficiência 2 ed Belo Horizonte DPlácido Cap 2 p 3558 2018 FARIA Romário Parecer nº 266 de 2015 Substitutivo da Câmara dos Deputados nº 4 de 2015 ao Projeto de Lei do Senado nº 6 de 2003 Projeto de Lei nº 7699 de 2006 na Câmara dos Deputados do Senador Paulo Paim que institui o Estatuto da Pessoa com Deficiência Lei Brasileira da Inclusão Disponível em httplegissenadolegbr sdleggetterdocumentodm4541434dispositioninline Acesso em 5 maio 2019 FERREIRA Aurélio Buarque de Holanda Discernimento In FERREIRA Aurélio Buarque de Holanda Mini Aurélio O dicionário da Língua Portuguesa 8 ed Curitiba Positivo p 257 2010 Discernir In FERREIRA Aurélio Buarque de Holanda Mini Aurélio O dicionário da Língua Portuguesa 8 ed Curitiba Positivo p 257 2010 FIUZA César NOGUEIRA Roberto Henrique Pôrto Regime jurídico das incapacidades e tutela da vulnerabilidade In LIMA Taisa Maria Macena de SÁ Maria de Fátima Freire de MOUREIRA Diogo Luna Org Autonomia e vulnerabilidade Belo Horizonte Arraes Cap 2 p 1022 2017 KÜMPEL Vitor Frederico BORGARELLI Bruno de Ávila As aberrações da Lei 131462015 Migalhas 11 ago 2015 Disponível em httpswwwmigalhascombr dePeso16MI22490561044Asaberracoesdalei131462015 Acesso em 5 maio 2019 LARA Mariana Alves PEREIRA Fabio Queiroz Estatuto da Pessoa com Deficiência proteção ou desproteção In PEREIRA Fabio Queiroz MORAIS Luísa Cristina de Carvalho LARA Mariana Alves Org A teoria das incapacidades e o Estatuto da Pessoa com Deficiência 2 ed Belo Horizonte DPlácido Cap 5 p 95124 2018 LIMA Taisa Maria Macena de SÁ Maria de Fátima Freire de Estatuto da Pessoa com Deficiência e questões médicas In LIMA Taisa Maria Macena de SÁ Maria de Fátima Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 435 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS Freire de MOUREIRA Diogo Luna Org Autonomia e vulnerabilidade Belo Horizonte Arraes Cap 11 p 118131 2017 MINAS GERAIS Tribunal de Justiça Processo nº 01149463820138130245 Relator Alice Birchal Belo Horizonte 21 fev 2017 Disponível em httpwww5tjmgjusbr jurisprudenciapesquisaPalavrasEspelhoAcordaodonumeroRegistro1totalLinh as5paginaNumero1linhasPorPagina1palavrasCURATELApesquisarPore mentaorderByData2listaRelator089920referenciaLegislativaClique20na20 lupa20para20pesquisar20as20referEAncias20cadastradaspesquisaPalavr asPesquisar Acesso em 5 maio 2019 NADER Paulo Filosofia do Direito 21 ed Rio de Janeiro Forense 2012 PERLINGIERI Pietro Perfis do direito civil introdução ao direito civil constitucional 2 ed Rio de Janeiro Renovar 2002 REALE Miguel Lições preliminares de Direito 27 ed São Paulo Saraiva 2002 RIBEIRO Moacyr Petrocelli de Ávila Estatuto da Pessoa com Deficiência a revisão da teoria das incapacidades e os reflexos jurídicos na ótica do notário e do registrador Revista Eletrônica do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região CuritibaPR v 5 n 46 p 5864 nov 2015 Disponível em httpshdlhandlenet205001217887594 Acesso em 5 maio 2019 RIO GRANDE DO SUL Tribunal de Justiça Processo nº 01224732220168217000 Relator Luiz Felipe Brasil Santos Porto Alegre 17 ago 2016 Disponível em http www1tjrsjusbrsitephpconsultaconsultaprocessophpnomecomarcaTrib unaldeJustiE7aversaoversaofonetica1tipo1idcomarca700num processomask70069122794numprocesso70069122794codEmenta6896195tem IntTeortrue Acesso em 5 maio 2019 RODRIGUES Rafael Garcia A pessoa e o ser humano no novo Código Civil In TEPEDINO Gustavo Coord A parte geral do novo Código Civil estudos na perspectiva civilconstitucional Rio de Janeiro Renovar Cap 1 p 134 2002 ROSENVALD Nelson A necessária revisão da teoria das incapacidades In BRAGA NETTO Felipe Peixoto SILVA Michael César Org Direito privado e contemporaneidade desafios e perspectivas do direito privado no século XXI Belo Horizonte DPlácido Cap 1 p 1531 2014 SÁ Maria de Fátima Freire de Sá MOUREIRA Diogo Luna A capacidade dos incapazes Rio de Janeiro Lumen Juris 2011 SOUZA Iara Antunes de Estatuto da Pessoa com Deficiência curatela e saúde mental Conforme a Lei 131462015 Estatuto da Pessoa com Deficiência131052015 Novo Código de Processo Civil Belo Horizonte DPlácido 2016 436 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional TABORDA José G V ADBALLAFILHO Elias MECLER Kátia MORAES Talvane de Avaliação da capacidade civil pontoschave In ADBALLAFILHO Elias CHALUB Miguel TELLES Lisieux E de Borba Psiquiatria forense de Taborda 3 ed Porto Alegre Artmed Cap 12 p 201215 2016 TARTUCE Flávio Alterações do Código Civil pela Lei 131462015 Estatuto da Pessoa com Deficiência Repercussões para o Direito de Família e confrontações com o novo CPC Parte I Migalhas Família e Sucessões 29 jul 2015 Disponível em httpswww migalhascombrFamiliaeSucessoes104MI22421721048AlteracoesdoCodigoCivi lpelalei131462015EstatutodaPessoacom Acesso em 5 maio 2019 Direito civil Lei de Introdução e parte geral 13 ed Rio de Janeiro Forense v 1 2017 ebook TEIXEIRA Ana Carolina Brochado Integridade psíquica e capacidade de exercício Revista Trimestral de Direito Civil Rio de Janeiro v 9 n 33 p 336 jan 2008 SOUZA Iara Antunes de Algumas reflexões sobre a limitação da curatela às questões patrimoniais no Estatuto da Pessoa com Deficiência In LIMA Taisa Maria Macena de SÁ Maria de Fátima Freire de MOUREIRA Diogo Luna Org Autonomia e vulnerabilidade Belo Horizonte Arraes Cap 14 p 154167 2017 TELLES Lisieux E de Borba DAY Vivian Peres ZORATTO Pedro Henrique Iserhard Transtornos psicóticos In ADBALLAFILHO Elias CHALUB Miguel TELLES Lisieux E de Borba Psiquiatria forense de Taborda 3 ed Porto Alegre Artmed Cap 23 p 431444 2016 Submissão em 22062019 Avaliado em 30062019 Avaliador C Avaliado em 19072019 Avaliador E Aceito em 02092019
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O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS INCAPACIDADES PELO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA REINTERPRETAÇÃO ATRAVÉS DO DISCERNIMENTO THE EMPTYING OF THE THEORY OF DISABILITIES BY THE STATUTE OF THE PERSON WITH DISABILITIES REINTERPRETATION THROUGH DISCERNMENT Taisa Maria Macena de Lima1 Professora dos Programas de Graduação e PósGraduação stricto sensu em Direito PUCMinas Belo HorizonteMG Brasil Jéssica Rodrigues Godinho2 Mestre em Direito Civil PUCMinas Belo HorizonteMG Brasil 1 Doutora e mestre em Direito Civil pela UFMG Desembargadora do Trabalho Exbolsista do DAAD Serviço alemão de intercâmbio acadêmico Email taisamacenayahoocombr Currículo http lattescnpqbr2794879775502752 Orcid httpsorcidorg0000000254549387 2 Bolsista Fapemig Especialista em Direito Civil pela PUCMinas Advogada Email jessicagodinho yahoocombr Currículo httplattescnpqbr5012158592823917 Orcid httpsorcidorg0000 000256696268 ÁREAS direito civil Estatuto da Pessoa com Deficiência RESUMO O Estatuto da Pessoa com Deficiência trouxe importantes alterações para o regime das incapacidades alterando o rol dos arts 3º e 4º do Código Civil esvaziando a teoria das incapacidades formatada e até então aplicada O discernimento foi deixado de lado como critério definidor da incapacidade e seu grau considerando que todas as pessoas seriam em tese capazes e que não haveria mais a incapacidade absoluta por motivo de saúde Assim é importante a análise da teoria e sua interpretação e refundação por meio do critério do discernimento que se mostra como o mais adequado para refletir na ordem jurídica as situações concretas da vida real ABSTRACT The Statute of the Person with Disabilities brought important changes 408 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional to the disability regime changing the role of articles 3 and 4 of the Civil Code emptying the Theory of Disabilities formatted and until then applied Discernment was left aside as the defining criterion of disability and its degree considering that all people would in theory be capable and that there would no longer be absolute incapacity for health reasons Thus it is important to analyze the theory and its interpretation and refoundation through the criterion of discernment which shows itself as the most appropriate to reflect in the juridical order the concrete situations of real life PALAVRASCHAVE teoria das incapacidades Estatuto da Pessoa com Deficiência capacidade discernimento KEYWORDS theory of disabilities Statute of Person with Disabilities capacity discernment SUMÁRIO Introdução 1 A teoria das incapacidades e o critério do discernimento 2 A modificação da teoria das incapacidades e a necessidade de ciências e conceitos fora do Direito 3 De lege lata refundação através da interpretação ao problema colocado pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência 4 De lege ferenda proposta de revisão da teoria das incapacidades Conclusão Referências SUMMARY Introduction 1 The theory of disabilities and the criterion of discernment 2 The modification of the theory of disabilities and the need of sciences and concepts outside the law 3 De lege lata refoundation through interpretation of the problem posed by the Statute of the Disabled Person 4 De lege ferenda proposed revision of the theory of disabilities Conclusion References INTRODUÇÃO A teoria das incapacidades não é uma preocupação dos juristas circunscrita ao tempo presente sofrendo críticas em razão de ter sido construída sob um paradigma patrimonialista Ainda criticavase também a forma negligente como é aplicada sem se considerar princípios básicos como a autonomia privada O discernimento por sua vez é elemento que sempre se fez presente na teoria desde sua formatação por Teixeira de Freitas e era o critério utilizado para adequação nas possibilidades de incapacidade previstas pelas legislações civilistas brasileiras Código Civil de 1916 e de 2002 Após a alteração promovida pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência Lei nº 131462015 não se pode mais identificar o discernimento como fator Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 409 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS primordial da incapacidade uma vez que desconsiderando as infinidades de características e situações que compõem o indivíduo o Estatuto decretou uma capacidade plena geral que não pode ser mitigada pela deficiência No presente trabalho pretendese discutir o papel do discernimento para a teoria das incapacidades pensar sobre o seu esvaziamento e propor novos contornos de interpretação e até mesmo de revisão da teoria 1 A TEORIA DAS INCAPACIDADES E O CRITÉRIO DO DISCERNIMENTO O discernimento é um conceito metajurídico Sua análise ultrapassa o universo jurídico mas a ele é aplicado em diversas de suas searas No conceito atribuído pelo dicionário discernimento é a faculdade de discernir tino juízo apreciação análise3 O verbo discernir por sua vez é definido como conhecer distintamente saber distinguir fazer apreciação de algo4 Em uma avaliação médica Miguel Chalub5 entende discernimento como a conjugação de duas faculdades o entendimento momento intelectivo e a determinação momento volitivo Precisase entender o ato e ter a vontade consciente de praticálo ciente de suas consequências Para Ana Carolina Brochado Teixeira discernimento significa possibilidade de exercer escolhas de forma responsável apresentando condições psíquicas de arcar com as consequências de seus atos Por isso falase em liberdade responsável6 Para discernir é necessário apreciar saber fazer a análise da situação para apurar quais serão as consequências Tratase de uma atividade cognitiva e volitiva Na seara do direito civil essa cognição e ação volitiva são expressas na prática de atos da vida civil 3 FERREIRA Aurélio Buarque de Holanda Discernimento In FERREIRA Aurélio Buarque de Holanda Mini Aurélio O dicionário da Língua Portuguesa 8 ed Curitiba Positivo 2010 p 257 4 FERREIRA Aurélio Buarque de Holanda Discernir In FERREIRA Aurélio Buarque de Holanda Mini Aurélio O dicionário da Língua Portuguesa 8 ed Curitiba Positivo 2010 p 257 5 CHALUB Miguel Medicina forense psiquiatria forense e lei In ADBALLAFILHO Elias CHALUB Miguel TELLES Lisieux E de Borba Psiquiatria forense de Taborda 3 ed Porto Alegre Artmed Cap 1 p 9 2016 6 TEIXEIRA Ana Carolina Brochado Integridade psíquica e capacidade de exercício Revista Trimestral de Direito Civil Rio de Janeiro v 9 n 33 p 336 jan 2008 p 17 410 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional Desta feita percebese a importância que o discernimento tem para o direito civil é por meio dessa avaliação individual cognitiva e volitiva que o sujeito irá ponderar sobre a ação e suas consequências o que ocasiona também na responsabilização da pessoa por seus próprios atos O discernimento está intimamente ligado à aptidão intelectual e volitiva do indivíduo o que resulta no exercício dos direitos em nome próprio Não estando apto ao exercício dos direitos per si a incapacidade civil pode ser um dos instrumentos jurídicos utilizados para a proteção da pessoa Além dos considerados incapazes há os plenamente capazes aqueles a quem a legislação não limita a capacidade de fato Presumese que os que possuem a capacidade plena têm o discernimento totalmente desenvolvido para a prática de atos jurídicos e negociais sem mácula de sua cognição podendo livremente expressar sua vontade Assim a autonomia dessas pessoas não sofre limitações como as que sofrem os incapazes Diversamente a legislação presume a falta ou diminuição de discernimento dos incapazes por critério etário ou de doença Rafael Garcia Rodrigues aduz que desta forma a manifestação de vontade destas pessoas não se constitui em elemento suficientemente hábil à prática de atos jurídicos pois lhe carece discernimento maculando a própria vontade7 Assim o discernimento passa a ser fator fundamental no que tange à capacidade de fato delimitando o poder de atuação do indivíduo 2 A MODIFICAÇÃO DA TEORIA DAS INCAPACIDADES E A NECESSIDADE DE CIÊNCIAS E CONCEITOS FORA DO DIREITO Em julho de 2015 foi promulgado o Estatuto da Pessoa com Deficiência EPD que se destina a assegurar os direitos da pessoa com deficiência e integrá la à sociedade Entre as alterações promovidas uma das mais significativas na legislação civilista foi a modificação dos arts 3º e 4º do Código Civil que elencam as hipóteses de incapacidade absoluta e relativa consecutivamente 7 RODRIGUES Rafael Garcia A pessoa e o ser humano no novo Código Civil In TEPEDINO Gustavo Coord A parte geral do novo Código Civil estudos na perspectiva civilconstitucional Rio de Janeiro Renovar Cap 1 p 14 2002 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 411 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS O art 6º do EPD decretou que a deficiência não pode afetar a plena capacidade o que se se analisar de forma profunda já era o que vigia no sistema anterior pois a capacidade sempre foi a regra e a incapacidade a exceção que deve ser provada Contudo após essa declaração o esquema estabelecido pelo Código Civil foi alterado passando a ser da seguinte forma a incapacidade absoluta é definida apenas pelo critério etário abrangendo apenas os menores de dezesseis anos A incapacidade relativa é definida tanto por critério etário quanto de saúde sendo relativamente incapazes os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos os ébrios habituais e os viciados em tóxico aqueles que por causa transitória ou permanente não puderem exprimir sua vontade os pródigos8 Pelas hipóteses de incapacidade não se pode identificar qual o critério utilizado pelo legislador para a definição das categorias Essa situação não ocorria na teoria formatada por Teixeira de Freitas aproveitada por Beviláqua no Código Civil de 1916 e pouco modificada pelo Código Civil de 2002 eis que a teoria em sua base elegeu o critério do discernimento para as atividades cíveis como limite entre capacidade e incapacidade Em parecer ao então Substitutivo da Câmara dos Deputados nº 4 de 2015 que depois se tornou o EPD o Senador Romário Faria PodemosRJ reconhece o papel do discernimento na teoria das incapacidades ao analisar o art 6º em conjunto com o art 84 e 114 do EPD Seu cerne é o reconhecimento de que condição de pessoa com deficiência isoladamente não é elemento relevante para limitar a capacidade civil Assim a deficiência não é a priori causadora de limitações à capacidade civil Os elementos que importam realmente para eventual limitação dessa capacidade são o discernimento para tomar decisões e a aptidão para manifestar vontade Uma pessoa pode ter deficiência e pleno discernimento ou pode não ter deficiência alguma e não conseguir manifestar sua vontade grifos nossos9 8 BRASIL Lei nº 10406 de 10 de janeiro de 2002 Institui o Código Civil Diário Oficial da União Brasília 11 jan 2002 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03leis2002L10406 htm Acesso em 5 maio 2019 9 FARIA Romário Parecer nº 266 de 2015 Substitutivo da Câmara dos Deputados nº 4 de 2015 ao Projeto de Lei do Senado nº 6 de 2003 Projeto de Lei nº 7699 de 2006 na Câmara dos Deputados 412 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional Apesar de o próprio senador atestar o papel do discernimento o EPD não coaduna com essa concepção Se é o discernimento que pode ser definidor da limitação da capacidade esvaziar completamente o art 3º do CC2002 não se harmoniza com esse posicionamento Então apesar de ser reconhecida a importância do discernimento para a teoria das incapacidades mesmo com as mudanças promovidas pelo EPD a forma como foi traduzida a intenção de integração e equidade nos arts 3º e 4º do Código Civil considerando também todas as reverberações da teoria na legislação civilista não privilegia a proteção integral do incapaz Ao simplesmente esvaziar o rol do art 3º chegouse à interpretação de que só é possível a incapacidade absoluta pelo critério etário desconsiderando as realidades fáticas que ocorrem no mundo O discernimento e a impossibilidade de expressão da vontade o que na prática resultava no mesmo10 foram extirpados do sistema jurídico cível criando um vácuo dogmático incontornável11 É incontornável pois se passa a ter que admitir situações de patente desproteção às pessoas que dela necessitam Assim se um indivíduo com síndrome de Down grave ou em coma profundo ou portador de outra espécie de demência que lhe retirasse o discernimento se qualquer dessas pessoas fosse interditada era considerada absolutamente incapaz sendolhe nomeado um curador para representála Atualmente não há mais essa possibilidade porque segundo a redação do art 4º do Código Civil mesmo na ausência de discernimento ou na impossibilidade de expressão da vontade a pessoa será considerada relativamente incapaz12 Na prática é que essa situação parece criar o chamado vácuo dogmático do Senador Paulo Paim que institui o Estatuto da Pessoa com Deficiência Lei Brasileira da Inclusão Disponível em httplegissenadolegbrsdleggetterdocumentodm4541434dispositioninli ne Acesso em 5 maio 2019 p 8 10 FIUZA César NOGUEIRA Roberto Henrique Pôrto Regime jurídico das incapacidades e tutela da vulnerabilidade In LIMA Taisa Maria Macena de SÁ Maria de Fátima Freire de MOUREIRA Diogo Luna Org Autonomia e vulnerabilidade Belo Horizonte Arraes Cap 2 p 17 2017 11 FIUZA NOGUEIRA 2017 p 17 12 FIUZA NOGUEIRA 2017 p 17 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 413 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS Na prática isso significa o quê Significa que se um indivíduo em coma for interditado será considerado relativamente incapaz sendolhe nomeado um curador Seguramente na sentença ao fixar os deveres e limites da curatela o juiz não terá outra opção que não a de considerar o curador representante do incapaz A assistência nesse caso é inviável Ora que incapacidade relativa é essa em que o incapaz não tenha sua vontade levada em conta em que seja representado provavelmente em todos os atos da vida civil inclusive nos de caráter existencial O mesmo se diga do indivíduo com síndrome de Down grave ou portador de síndrome de Alzheimer avançada ou por absurdo de um anencéfalo que sobreviva aos 18 anos Todos eles serão considerados formalmente relativamente incapazes apesar de serem efetivamente representados e de não terem condições de manifestar sua vontade por faltarlhes praticamente ou absolutamente todo o discernimento Que incapacidade relativa é essa afinal13 Assim ao fixar a sentença que define a curatela o juízo terá que ter atenção redobrada para definir a forma de auxílio que a pessoa curatelada terá que ter além de uma postura ativa frente às questões que lhe forem apresentadas A deficiência per si nunca foi critério automático para a interdição Nas antigas hipóteses dos arts 3º e 4º não se vislumbra em nenhum inciso a deficiência sozinha como definidora da incapacidade Além disso ainda que houvesse essa previsão a capacidade permanece sendo a regra A exceção a incapacidade tem que ser provada em processo judicial sendo preservadas todas as garantias processuais São muitas as críticas a essa mudança paradigmática realizada pelo EPD Veja Ao esvaziar o conceito de capacidade de fato o que o EPD fez na verdade foi retirar das pessoas com deficiência a proteção que o ordenamento jurídico lhes garantia Ao 13 FIUZA NOGUEIRA 2017 p 17 414 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional que parece o legislador se equivocou ao considerar que a lei presumia a ausência de discernimento de todos os deficientes mentais o que nunca foi o caso e para corrigir a aparente injustiça presumiu a existência de discernimento de todos o que parece com efeito ser muito mais perigoso e potencialmente lesivo Na ânsia de ser politicamente correto o Estatuto da Pessoa com Deficiência com relação aos atos da vida civil acabou por abandonar os deficientes à própria sorte14 Concordase plenamente com o posicionamento exposto acima O discernimento é um fato da Psiquiatria não podendo a lei presumir que todos o têm de forma integral sem a previsão de situações de resguardo àqueles que não o possuem Por isso defendese a importância de Ciências auxiliares ao Direito O ordenamento jurídico busca ser completo abrangendo o maior número de situações possíveis para propiciar a vida em sociedade e a solução de litígios contudo o Direito sozinho não é capaz de fornecer respostas a todos os problemas que surgem Portanto o Direito traz regulações para a adaptação social buscandose a vontade social15 Cabe à pesquisa o aprofundamento das soluções e a aplicação dessa vontade sem que se mitigue direitos de setores relevantes da sociedade16 Por meio da pesquisa é possível atualizar a legislação para acompanhar o desenvolvimento da ciência e o desenvolvimento social mantendo as leis eficazes e aplicáveis à realidade que se apresenta As diversas searas do Direito são complementares assim como diversas ciências podem também complementar o Direito sem que ele perca sua unicidade Dessa forma as diferentes partes do Direito não se situam uma ao lado da outra como coisas acabadas e estáticas pois o Direito é ordenação 14 CARVALHO Felipe Quintella Machado de A teoria das capacidades no Direito brasileiro de Teixeira de Freitas e Clovis Beviláqua ao Estatuto da Pessoa com Deficiência In PEREIRA Fabio Queiroz MORAIS Luísa Cristina de Carvalho LARA Mariana Alves Org A teoria das incapacidades e o Estatuto da Pessoa com Deficiência Belo Horizonte DPlácido Cap 1 p 31 2018 15 NADER Paulo Filosofia do Direito 21 ed Rio de Janeiro Forense 2012 p 44 16 NADER 2012 p 44 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 415 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS que dia a dia se renova17 Para a unicidade do saber jurídico algumas Ciências devem ser aplicadas para dar sentido à norma como a Medicina lato sensu Psiquiatria Psicologia e Assistência Social Como a aferição da incapacidade deve analisar a situação biopsicossocial em que está inserida a pessoa precisase verificar seu estado de saúde corporal bem como sua saúde mental e como a pessoa se relaciona em seu ambiente buscando resgatar a história vivida e construída para que a curatela seja efetivamente medida de proteção não uma forma de substituição integral Nesse sentido temse que Sendo a lei relativamente estática mutável apenas após complexo e demorado processo legislativo ou de consolidação jurisprudencial e a realidade fática à qual deve ser aplicada extremamente rica heterogênea e dinâmica é compreensível que os operadores do Direito necessitem muitas vezes se socorrer do auxílio de especialistas em determinadas áreas para que possam apreender a realidade subjacente de forma adequada Uma dessas áreas requisitada com frequência pelos tribunais é a psiquiatria Da aplicação judicial da psiquiatria ao ambiente do fórum deriva pois a expressão psiquiatria forense Cabe então ao psiquiatra forense em síntese informar Magistrados membros do Ministério Púbico e advogados sobre questões fáticas que digam respeito basicamente a transtornos mentais e às consequências jurídicas que eles ensejam18 grifos dos autores A lei não consegue acompanhar detidamente todas as evoluções sociais em virtude da rapidez com que elas acontecem e pela demora que há nos processos legislativos Ainda se a cada inovação a regra for alterada terseia um sistema legislativo inchado com diversas normas mortas e uma extrema dificuldade de aplicação do Direito Por isso é interessante a presença de princípios que 17 REALE Miguel Lições preliminares de Direito 27 ed São Paulo Saraiva 2002 p 6 18 TABORDA José G V ADBALLAFILHO Elias MECLER Kátia MORAES Talvane de Avaliação da capacidade civil pontoschave In ADBALLAFILHO Elias CHALUB Miguel TELLES Lisieux E de Borba Psiquiatria forense de Taborda 3 ed Porto Alegre Artmed Cap 12 p 203 2016 416 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional guiem a aplicação das normas vigentes e de ciências especializadas que possam trazer atualidade às normas postas Assim as funções do psiquiatra forense passam a ser principalmente duas estabelecer a existência ou não de doença mental perturbação da saúde mental ou transtorno do desenvolvimento em determinada pessoa definir se essa pessoa apresentando um transtorno mental demonstra aptidão mental suficiente que lhe permita gerir de forma autônoma seus interesses de forma pragmática e objetiva de acordo com seus valores e história de vida19 Como se pode perceber a análise é dúplice primeiramente verificase a condição de saúde para após definir em que essa condição influencia na aptidão mental discernimento Não se pode parar no primeiro ponto pois isso seria uma forma de discriminação em virtude de uma vulnerabilidade apenas Quando se analisa o discernimento o que se pretende o fundamento da decisão é a proteção da pessoa não a morte civil com sua exclusão do tráfego jurídico O papel do psiquiatra é de extrema relevância para que abusos não sejam cometidos Veja O legislador atribui ao psiquiatra o papel de avaliar os indivíduos sobre os quais pairam dúvidas quanto à possibilidade de se autogerirem Cabe ao psiquiatra estabelecer a complexa distinção entre o doente e o sadio o capaz e o incapaz Devese firmar um diagnóstico transpôlo para a terminologia jurídica descrever os déficits e definir como tais prejuízos podem interferir na capacidade civil20 É de extrema relevância que o médico utilize termos claros para que pessoas leigas possam entender o que se está passando Ainda a descrição minuciosa da situação do paciente auxilia na avaliação do juízo A avaliação deve 19 TABORDA et al 2016 p 203 20 TELLES Lisieux E de Borba DAY Vivian Peres ZORATTO Pedro Henrique Iserhard Transtornos psicóticos In ADBALLAFILHO Elias CHALUB Miguel TELLES Lisieux E de Borba Psiquiatria forense de Taborda 3 ed Porto Alegre Artmed Cap 23 p 435 2016 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 417 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS ser individualizada e flexível21 pois cada caso trará consigo uma peculiaridade que deverá ser considerada no momento do exame médico Patente é a necessidade de Ciências complementares ao Direito para que se defina com certa segurança qual é a medida mais adequada ao caso concreto privilegiando em grau máximo na medida do possível a autonomia pessoal e o poder de decisão individual sem transferir a tomada de decisões a outrem Nesse sentido quem determina a presença ou a falta de discernimento competência não é o Direito Logo na construção da incapacidade devese dar atenção às contribuições que a Psiquiatria e a Psicologia dão ao diagnóstico e tratamento das pessoas em razão de sua saúde mental22 Naquilo que Vitor Frederico Kümplel e Bruno de Ávila Borgarelli23 chamam de mutilação dos arts 3º e 4º do Código Civil temse que o EPD sob um fundamento moralmente elevado acabou por desproteger a pessoa à medida que não reconhece suas vulnerabilidades Nesse sentido Lara e Pereira aduzem que Quando referenciadas nos arts 3º e 4º do Código Civil a enfermidade e a deficiência mental só redundavam em uma qualificação de incapacidade se fossem acompanhadas de uma redução ou de uma ausência de discernimento Nesse sentido a preocupação da codificação não estava centrada na deficiência mental mas sim na possibilidade dessa mesma deficiência ser geradora de situações de ausência ou redução de níveis de discernimento Em outras palavras a legislação anterior buscava proteger os indivíduos que não apresentavam níveis de cognição adequados que os permitissem expressar a sua vontade com a devida qualidade Se uma ausência de discernimento ou sua redução é identificada revelase imperioso o estabelecimento 21 TELLES DAY ZORATTO 2016 p 435 22 TEIXEIRA Ana Carolina Brochado SOUZA Iara Antunes de Algumas reflexões sobre a limitação da curatela às questões patrimoniais no Estatuto da Pessoa com Deficiência In LIMA Taisa Maria Macena de SÁ Maria de Fátima Freire de MOUREIRA Diogo Luna Org Autonomia e vulnerabilidade Belo Horizonte Arraes Cap 14 p 159 2017 23 KÜMPEL Vitor Frederico BORGARELLI Bruno de Ávila As aberrações da Lei 131462015 Migalhas 11 ago 2015 Disponível em httpswwwmigalhascombrdePeso16MI22490561044Asaberra coesdalei131462015 Acesso em 5 maio 2019 418 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional de mecanismos protetivos que permitam que os atos jurídicos praticados sejam realizados em consonância com os seus reais interesses sem que causem prejuízo ao aludido sujeito de direito24 Lara e Pereira grifos nossos Carvalho também entende que o discernimento como causa de incapacidade foi extirpado do sistema jurídico apresentando o fato de as pessoas que não podem exprimir sua vontade passarem para o rol das pessoas relativamente incapazes não permite mais dizer que o critério é o discernimento presumidamente reduzido ou incompleto25 Para o autor não é mais claro o que distingue a incapacidade absoluta da relativa O critério para a incapacidade absoluta após o EPD é apenas o etário Desconhecese o critério usado para a incapacidade relativa considerando a miscelânea que resultou das alterações realizadas pela Lei nº 13146 Hosni26 entende que houve o rompimento com o fundamento da incapacidade pelo EPD considerando que pelo modelo estruturado pela CIF o discernimento não tem mais cabimento por ser um elemento intrínseco enquanto para a CIF devemse analisar elementos intrínsecos e extrínsecos Entretanto conforme já mencionado anteriormente não se acredita ser os elementos excludentes entre si Devese de fato considerar o ambiente em que a pessoa está inserida mas também é necessário que se verifique qual é a aptidão individual para a prática de negócios jurídicos Portanto o EPD rompeu com os pressupostos da teoria das incapacidades ao de forma explícita na legislação desconsiderar o discernimento como elemento definidor da capacidade 24 LARA Mariana Alves PEREIRA Fabio Queiroz Estatuto da Pessoa com Deficiência proteção ou desproteção In PEREIRA Fabio Queiroz MORAIS Luísa Cristina de Carvalho LARA Mariana Alves Org A teoria das incapacidades e o Estatuto da Pessoa com Deficiência 2 ed Belo Horizonte DPlácido Cap 5 p 107 2018 25 CARVALHO 2018 p 30 26 HOSNI David S S O conceito de deficiência e sua assimilação legal incompatibilidade entre a concepção não etimológica adotada no Estatuto da Pessoa com Deficiência e a fundamentação da incapacidade na falta de discernimento In PEREIRA Fabio Queiroz MORAIS Luísa Cristina de Carvalho LARA Mariana Alves Org A teoria das incapacidades e o Estatuto da Pessoa com Deficiência 2 ed Belo Horizonte DPlácido Cap 2 p 54 2018 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 419 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS É interessante o comentário de Sá e Moureira sobre formas de melhorar a qualidade de vida daqueles que são portadores de transtornos mentais Boas políticas bons planos e bons programas são essenciais Também uma boa legislação Propostas existem mas não a sua efetivação que necessita contar com recursos voltados especificamente à saúde mental27 A boa legislação é o último recurso utilizado no período o que acreditase não ser por acaso Contudo a mera alteração legislativa sem se firmar em bases sólidas sem um pano de fundo teórico coerente acaba por não proporcionar a integração desejada Há tempos a doutrina clamava por uma alteração na teoria das incapacidades pois ainda que com conquistas atingidas as interpretações errôneas acabavam por algumas vezes prejudicar os interesses da pessoa a ser curatelada28 Para a inclusão acreditase ser salutar primeiramente realizar políticas planos e programas voltados para as pessoas com deficiência ou transtornos mentais para que o comportamento social seja alterado ao invés de tentar alterá lo por meio de mudanças legislativas 3 DE LEGE LATA REFUNDAÇÃO ATRAVÉS DA INTERPRETAÇÃO AO PROBLEMA COLOCADO PELO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA Da forma como se encontra configurado o regime das incapacidades hodiernamente entendese que não existe mais a possibilidade de incapacidade absoluta Contudo em casos concretos podese verificar que há pessoas que não têm nenhum discernimento para autonomamente tomar diversas decisões cotidianas que afetariam sua vida e seu patrimônio Pessoas em coma com questões que afetem sua saúde mental de forma grave como o Alzheimer ou uma esquizofrenia severa por exemplo podem se mostrar completamente sem aptidão cognitiva Assim como pensar em um sistema protetivo para que essas pessoas não fiquem à própria sorte 27 SÁ Maria de Fátima Freire de Sá MOUREIRA Diogo Luna A capacidade dos incapazes Rio de Janeiro Lumen Juris 2011 p 164 28 SÁ MOUREIRA 2011 p 154 420 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional Ao discutir a antiga redação do Código Civil Maria de Fátima Freire de Sá e Diogo Luna Moureira argumentam que É certo que a análise da sua incapacidade dos relativamente incapazes parte de uma presunção relativa É certo também que o Código Civil de 2002 em seu art 4º deixou em aberto as hipóteses de incapacidade relativa Porém o que na prática ocorre é muito mais um exercício de subsunção dos fatos a um dos incisos do art 4º do Código Civil do que um esforço hermenêutico por parte do intérprete e aplicador da norma jurídica para a verificação da incapacidade e por consequência os limites do exercício da curatela29 Já se apontaram críticas ao regime das incapacidades estabelecido mais como forma de proteção ao patrimônio do que proteção da pessoa que necessita de apoio para a tomada de decisões Entretanto com o advento da Constituição de 1988 a dignidade da pessoa humana passou a ser o farol pelo qual os institutos jurídicos devem ser guiados inaugurando uma interpretação que dá ênfase ao ser humano e a suas características pessoais Alterar o comportamento não é algo simples Portanto a decretação da incapacidade em alguns casos não se pode generalizar poderia privilegiar a situação legal em detrimento da situação real Com as modificações entendese que o processo de subsunção passou a ser o exercício feito pelos julgadores não por falta de reflexão hermenêutica mas sim por ser essa a forma de conceder proteção à pessoa O que se percebe na prática é que para que não se deixe a pessoa desprotegida acabase por tentar enquadrar a situação em uma das hipóteses estabelecidas no art 4º do CC2002 Assim podese entender a nova formatação da teoria sobre três vieses que a teoria se manteve intacta apesar das modificações que foi mitigada ou que foi completamente modificada Não se pode concordar que a teoria foi mantida pois o discernimento não é mais o critério legal eleito como definidor da capacidade A mitigação30 também não parece a corrente mais adequada 29 SÁ MOUREIRA 2011 p 142 30 Defendida por Nelson Rosenvald 2015 sp Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 421 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS pelo mesmo motivo anterior A modificação completa31 então parece ser o que ocorreu Nesse sentido Diante do exposto foi possível concluir que a entrada em vigor do Estatuto da Pessoa com Deficiência enraizado nos objetivos traçados pela Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência promoverá a reconfiguração de clássicos institutos e teorias do direito privado em prol de uma nova realidade jurídica das pessoas com deficiência32 Flávio Tartuce salienta que tais dispositivos foram profundamente alterados pela Lei nº 13146 de julho de 2015 que instituiu o EPD criando uma nova teoria das incapacidades dentro do direito civil brasileiro33 Assim com esse novo panorama os julgadores acabam por ter que atuar ativamente subsumindo os casos apresentados às figuras do art 4º A causa mais abrangente é a constante no inciso III Aqueles que por causa transitória ou permanente não puderem exprimir sua vontade34 Flávio Tartuce salienta que Todavia pode ser feita uma crítica inicial em relação à mudança do sistema Ela foi pensada para a inclusão das pessoas com deficiência o que é um justo motivo sem dúvidas Porém acabou por desconsiderar muitas outras situações concretas como a dos psicopatas que não serão mais enquadrados como absolutamente incapazes no sistema civil Será necessário um grande esforço doutrinário e jurisprudencial para conseguir situálos no inciso III do art 4º do Código Civil 31 Defendida por Vitor Frederico Kümpel e Bruno de Ávila Borgarelli 2015 Flávio Tartuce 2017 p 132 Moacyr Petrocelli de Ávila Ribeiro 2015 p 64 e Felipe Quintella Machado de Carvalho 2018 p 30 32 RIBEIRO Moacyr Petrocelli de Ávila Estatuto da Pessoa com Deficiência a revisão da teoria das incapacidades e os reflexos jurídicos na ótica do notário e do registrador Revista eletrônica do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região CuritibaPR v 5 n 46 p 5864 nov 2015 Disponível em https hdlhandlenet205001217887594 Acesso em 5 maio 2019 p 64 33 TARTUCE Flávio Direito civil Lei de Introdução e parte geral 13 ed Rio de Janeiro Forense v 1 2017 ebook p 132 34 BRASIL 2002 422 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional tratandoos como relativamente incapazes Não sendo isso possível os psicopatas serão considerados plenamente capazes para o direito civil35 Parece ser esse o esforço perpetrado pelos julgadores para garantir a proteção aos incapazes No Processo nº 01149463820138130245 julgado perante o Tribunal de Justiça de Minas Gerais relatado alhures a psiquiatra em seu laudo afirmou que devido a sintomas cognitivos de déficit considerável da memória de trabalho prejuízo na interação interpessoal embotamento afetivo e isolamento social imposta por tal agravo tal paciente não é capaz de gerir sozinho os atos da vida civil36 grifos nossos Mesmo com esse laudo a Desembargadora Alice Birchal entendeu não ser mais possível a decretação absoluta de incapacidade mas que deixar a pessoa interditada sem auxílio também não coaduna com a necessidade que se apresenta Foi então decretada a incapacidade relativa nos termos do art 4º III do CC2002 No Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul encontrouse decisão no mesmo sentido A apelante foi declarada relativamente incapaz em virtude de transtorno afetivo bipolar que afetava sua capacidade de se autogerir O Desembargador Luiz Felipe Brasil Santos entendeu da seguinte forma Portanto a apelante a partir da vigência do Estatuto da Pessoa com Deficiência não pode mais ser considerada absolutamente incapaz mas sim relativamente incapaz nos termos da nova redação do art 4º III do Código Civil37 35 TARTUCE Flávio Alterações do Código Civil pela Lei 131462015 Estatuto da Pessoa com Deficiência Repercussões para o Direito de Família e confrontações com o novo CPC Parte I Migalhas Família e Sucessões 29 jul 2015 Disponível em httpswwwmigalhascombrFamiliae Sucessoes104MI22421721048AlteracoesdoCodigoCivilpelalei131462015EstatutodaPes soacom Acesso em 5 maio 2019 sp 36 MINAS GERAIS Tribunal de Justiça Processo nº 01149463820138130245 Relatora Alice Birchal Belo Horizonte 21 fev 2017 Disponível em httpwww5tjmgjusbrjurisprudencia pesquisaPalavrasEspelhoAcordaodonumeroRegistro1totalLinhas5paginaNumero1 linhasPorPagina1palavrasCURATELApesquisarPorementaorderByData2listaR elator089920referenciaLegislativaClique20na20lupa20para20pesquisar20as20 referEAncias20cadastradaspesquisaPalavrasPesquisar Acesso em 5 maio 2019 37 RIO GRANDE DO SUL Tribunal de Justiça Processo nº 01224732220168217000 Relator Luiz Felipe Brasil Santos Porto Alegre 17 ago 2016 Disponível em httpwww1tjrsjusbrsitephp consultaconsultaprocessophpnomecomarcaTribunaldeJustiE7aversaoversao Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 423 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS O laudo pericial contava que a apelante era relativamente incapaz para residir sozinha e para gerenciar seu tratamento médico uma vez que não aceitava ser portadora de transtorno afetivo bipolar38 O laudo também mencionou que a incapacidade era permanente para atos da vida civil39 Acreditase ser essa uma das soluções possíveis frente ao EPD Outra solução seria o reconhecimento de curatela sem a decretação de incapacidade No Superior Tribunal de Justiça encontrouse julgamento que acompanha essa última posição Consta na ementa que 9 A partir do novo regramento observase uma dissociação necessária e absoluta entre o transtorno mental e o reconhecimento da incapacidade ou seja a definição automática de que a pessoa portadora de debilidade mental de qualquer natureza implicaria na constatação da limitação de sua capacidade civil deixou de existir40 Essa posição acompanha o texto literal do art 6º do EPD segundo o qual a deficiência não influencia na plena capacidade civil Portanto ainda que haja redução do discernimento que no sistema anterior implicava incapacidade relativa ou absoluta a pessoa não pode ser considerada incapaz ela continuará plenamente capaz podendo contar com o auxílio de um curador para questões patrimoniais e negociais Ao discutir a capacidade plena das pessoas com deficiência Lima e Sá criticam Por outro lado conferir capacidade de exercício ex ante a seres humanos que em razão de gravíssima deficiência mental e intelectual não têm condições reais de autogoverno também leva ao esvaziamento de direitos fonetica1tipo1idcomarca700numprocessomask70069122794numprocesso70069122 794codEmenta6896195temIntTeortrue Acesso em 5 maio 2019 38 RIO GRANDE DO SUL 2016 39 RIO GRANDE DO SUL 2016 40 BRASIL Superior Tribunal de Justiça Recurso Especial nº 1694984MS Relator Luis Felipe Salomão Quarta Turma Diário de Justiça Eletrônico Brasília 1º fev 2018 Disponível em httpsww2 stjjusbrprocessorevistainteiroteornumregistro201700120810dtpublicacao01022018 Acesso em 24 nov 2018 424 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional personalíssimos Neste caso não é a ordem jurídica ou barreiras sociais que obstam o exercício do direito mas a condição peculiar do próprio sujeito jurídico e isso não foi considerado na elaboração do Estatuto41 Nesta pesquisa concordase com esse posicionamento Acreditase ser anacrônica a solução de apenas atribuir plena capacidade às pessoas com deficiência pois não se concebe como uma terceira pessoa pode interferir no julgamento de alguém que tem sua capacidade íntegra plena Ainda que o ideário do EPD seja a inclusão não há como afetar a própria natureza humana Outra solução possível que pode ser conjugada com as anteriormente citadas é a apresentada por Iara Antunes de Souza Para a autora a forma em que se dará a curatela pode ser fluida dependendo do caso concreto O critério definidor mais uma vez seria o discernimento Caso a equipe multidisciplinar reconheça a falta completa de discernimento a medida protetiva cabível seria a representação caso seja reconhecido o discernimento parcial poderseia determinar a assistência prestigiando a autonomia da pessoa curatelada sempre que possível42 Vejase Vislumbrase que a representação é possível desde que a equipe multidisciplinar reconheça que a falta de discernimento é em tal grau que somente a substituição da vontade a supra Para tanto não se importa se o sistema fala em ausência de hipóteses de incapacidade absoluta em razão da saúde mental Afinal interpretação diversa seria considerar a possibilidade de o Direito fechar os olhos para a realidade o que os anseios constitucionais não permitiriam O que se defende é a possibilidade de representação ainda que se reconheça nos termos da lei uma incapacidade relativa O que é permitido se interpretar dentro do Estatuto da Pessoa 41 LIMA Taisa Maria Macena de SÁ Maria de Fátima Freire de Estatuto da Pessoa com Deficiência e questões médicas In LIMA Taisa Maria Macena de SÁ Maria de Fátima Freire de MOUREIRA Diogo Luna Org Autonomia e vulnerabilidade Belo Horizonte Arraes Cap 11 p 119120 2017 42 SOUZA Iara Antunes de Estatuto da pessoa com deficiência curatela e saúde mental Conforme a Lei 131462015 Estatuto da Pessoa com Deficiência131052015 Novo Código de Processo Civil Belo Horizonte DPlácido 2016 p 288 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 425 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS com Deficiência eis que ele prevê o cuidado como medida excepcional temporária e casuística43 A autora ainda salienta que O que se propõe em suma é afastar a lógica de que o absolutamente incapaz é representado e o relativamente incapaz é assistido relegando ao reconhecimento do nível de ausência de discernimento por equipe multidisciplinar de saúde mental a aplicação da medida necessária para o fomento da personalidade44 Ao tratar dos institutos da representação e da assistência de forma fluida podese adequar a forma de proteção a cada caso de acordo com o laudo da equipe multidisciplinar que tem maiores condições de aferir a realidade concreta Essa concepção mostrase interessante por harmonizar com ambas as correntes acima apresentadas pois não diz respeito à interdição e sim à forma que a curatela se dará Como nas duas teorias há o estabelecimento da curatela devese pensar a forma de moldála de maneira a preservar a pessoalidade do curatelado Harmoniza ainda com o texto do art 755 do CPC pois a sentença será modulada de acordo com a situação casuística e as potencialidades habilidades vontades e preferências do curatelado serão observadas e respeitadas Devese primar por assegurar as garantias constitucionais do processo na construção de uma decisão jurisdicional que diga respeito à limitação da autonomia do indivíduo para a prática de atos que se refiram à sua vida enquanto sujeito de direitos45 São essas portanto as alternativas que se verificam para a aplicação da legislação vigente 4 DE LEGE FERENDA PROPOSTA DE REVISÃO DA TEORIA DAS INCAPACIDADES 43 SOUZA 2016 p 297 44 SOUZA 2016 p 297 45 SÁ MOUREIRA 2011 p 143 426 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional Antes da promulgação do EPD a doutrina jurídica clamava por uma reforma na teoria das incapacidades de modo a prestigiar em grau máximo a individualidade daquele a ser submetido a um processo de interdição Entendese que as bases teóricas estabelecidas são sólidas devendo seus fundamentos serem mantidos O necessário seria a ruptura com a forma patrimonialista de se pensar a teoria e sua aplicação Não se percebe pelos textos apresentados neste trabalho que a fundamentação lógica da teoria das incapacidades precisa ser refeita Sua aplicação é que requer um critério elevado de limitação pois é medida extrema que não pode ocasionar total exclusão da pessoa do tráfego jurídico Dessa forma a refundação legal e prática urge O EPD atendeu à parte dos reclames coadunando com os princípios constitucionais de dignidade da pessoa humana e isonomia Contudo a forma como alguns dispositivos legais foram apresentados e a ruptura nos arts 3º e 4º do Código Civil consequentemente os efeitos que deles decorriam acabaram por gerar um campo de desproteção muito grande Apresentaramse em seção anterior algumas formas de aplicação da lei tendo em vista como se encontra no momento Entretanto não se acredita ser o estado em que a lei se encontra o mais adequado Nesse aspecto Iara Antunes de Souza pertinentemente perquire Qual o meio jurídico adequado para que o ordenamento jurídico brasileiro garanta na maior medida do possível a autonomia privada da pessoa com deficiência mental e intelectual e sua dignidade humana nos moldes reclamados pela Medicina e Psicologia pela Carta de Nova York e pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência 46 Além disso a autora ressalta também que Para se responder à pergunta não se olvida da necessidade de mudanças interpretativas do Direito em especial para que de fato o desiderato seja alcançado O Direito não pode ser um instrumento de segregação e exclusão enquanto o movimento médico psicológico 46 SOUZA 2016 p 360 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 427 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS e de toda área de saúde é no sentido de inclusão e garantia47 Portanto como conjugar todos esses preceitos de forma que o Direito seja uma ferramenta inclusiva e garanta a proteção das pessoas Já se argumentou que o discernimento é o ponto central da teoria das incapacidades e entendese que assim deve permanecer O que se propõe é que seja inteiramente retirada do Direito a definição de quem tem ou não tem discernimento Afinal como reiteradamente defendido não cabe ao Direito definir em que ponto há ou não há discernimento48 Esse encargo deverá ser de uma equipe multidisciplinar porque O estado pessoal patológico ainda que permanente da pessoa que não seja absoluto ou total mas graduado e parcial não se pode traduzir em uma série estereotipada de limitações proibições e exclusões que no caso concreto isto é levando em consideração o grau e a qualidade do déficit psíquico não se justificam e acabam por representar camisas de força totalmente desproporcionadas e principalmente contrastantes com a realização do pleno desenvolvimento da pessoa49 Classificações prédefinidas como ocorrem no art 4º e também ocorria no art 3º do Código Civil acabam por se tornar amarras à aplicação do Direito verdadeiros estereótipos O que ocorre é a subsunção do caso ao disposto na lei como forma de prática positiva e legalista O que se busca é a aplicação casuística analisando as situações em concreto as vicissitudes que cada caso e cada pessoa apresenta para que seja moldado individualmente o cuidado necessário sem predeterminações Assim A pessoa constrói diuturnamente sua pessoalidade e portanto tanto a capacidade quanto a incapacidade somente podem ser verificadas no caso concreto sem figuras determinadas aprioristicamente ainda que 47 SOUZA 2016 p 360 48 SOUZA 2016 p 284 49 PERLINGIERI Pietro Perfis do direito civil introdução ao direito civil constitucional 2 ed Rio de Janeiro Renovar 2002 p 164 428 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional uma vez reconhecidas os papéis estejam na norma jurídica50 Propõese portanto que a norma que trata da incapacidade seja aberta que não existam gradações já definidas51 ou hipóteses a serem observadas de antemão Isso beneficiaria a participação da pessoa curatelada no processo que seria uma construção feita pelas partes a fim de chegar a um resultado que beneficiasse a integridade pessoal individual Se a dignidade da pessoa humana é o eixo do sistema como se proclama a torto e a direito engessar o poder do juiz de proteger de forma plena alguém acometido por uma situação incapacitante é garantir essa dignidade O que protege melhor a flexibilidade ou a rigidez A possibilidade do amplo exercício do estado de direito por meio da jurisdição ou a sua inibição52 Uma norma aberta flexível mostrase ideal para que seja feita a construção da melhor solução na seara jurisdicional Outro ponto a ser privilegiado seria a avaliação por equipe multidisciplinar ponto central da construção Essa avaliação deveria ser obrigatória e não facultativa como atualmente ocorre A análise da situação concreta por diversas ciências ajudaria a ter uma definição mais realística do caso com a aferição da extensão do discernimento que a pessoa apresenta para cada ato específico que for impugnado Por isso para a atribuição da curatela do cuidado será necessária a constatação de limitação total ou parcial ao discernimento por uma equipe multidisciplinar composta por psiquiatra psicólogo assistente social terapeuta ocupacional etc que concluirá acerca da existência ou não de um transtorno mental ou de uma deficiência mental ou intelectual mas independentemente disso sua influência no 50 TEIXEIRA SOUZA 2017 p 158 51 Apesar de também ser um assunto digno de discussão ressaltase que não se trata da gradação da capacidade em função da idade nesta pesquisa 52 KÜMPEL BORGARELLI 2015 sp Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 429 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS discernimento para o exercício dos atos da vida civil culminando na interdição53 Além disso Cabe a uma equipe multidisciplinar verificar a deficiência art 2 parágrafo único do Estatuto da Pessoa com Deficiência54 e também cabe a ela avaliar se excepcionalmente a deficiência afeta a autodeterminação da pessoa ou seja afeta seu discernimento para exercer os atos da vida civil Se a capacidade é a regra a incapacidade deve ser provada quando existir e nos limites em que existir55 grifos nossos A análise passa a ser mais criteriosa e individualizada com regras flexíveis Apenas a doença mental não pode caracterizar medida tão extrema quanto à interdição eou à curatela A insuficiência mental para justificar um estatuto particular de incapacidade ou limitada capacidade deve representar objetivamente um estado patológico Esse estado patológico pode ser individuado mediante uma complexa avaliação das condições pessoais do sujeito e daquelas sociais culturais e ambientais mas sempre em relação ao exclusivo interesse das manifestações do desenvolvimento pessoal e não já alegando razões de interesse superior que bem se prestariam a legitimar qualquer instrumentalização 56 O discernimento é o ponto central a ser avaliado mas não apenas ele As interações da pessoa com o mundo social com o que está à sua volta também se 53 SOUZA 2016 p 378 54 Elucidase que é o primeiro parágrafo do art 2º do EPD que traz a necessidade de avaliação por equipe multidisciplinar como se mostra a seguir 1º A avaliação da deficiência quando necessária será biopsicossocial realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará I os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo II os fatores socioambientais psicológicos e pessoais III a limitação no desempenho de atividades e IV a restrição de participação BRASIL 2015b 55 TEIXEIRA SOUZA 2016 p 161 56 PERLINGIERI 2002 p 166 430 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional mostram de suma importância Em especial nesse momento vivenciado em que o modelo médico já foi superado pois não há que se tratar apenas a doença de forma a adaptar a pessoa ao ambiente O ambiente também deve estar preparado para receber a pessoa e por isso a avaliação não pode ser feita apenas do ponto de vista médico Sempre que as faculdades intelectivas e afetivas estiveram intactas ainda que de forma residual deverão ser preservadas pois dessa forma contribuise para o desenvolvimento da personalidade dando ao sujeito o reconhecimento de seu estado como pessoa e cidadão que coadunem com sua situação biopsicossocial57 Sobre a flexibilização do instituto da incapacidade Teixeira e Souza explicam que Portanto existia toda uma corrente doutrinária que proclamava a necessidade de se fazer valer a estreita relação existente entre integridade psíquica e capacidade de exercício de modo a valorizar a vontade do incapaz portador de discernimento revelando respeito às suas parcelas de poder e de autodeterminação Assim propunhase que a capacidade de agir deveria ser diretamente proporcional ao grau de discernimento que a pessoa tem sendo o caso nesta hipótese de acabar com a rígida separação entre absolutamente e relativamente incapazes para que seja efetivamente possível uma visão quantitativa e qualitativamente diferente dos atos praticados por aqueles que não têm a totalidade do seu discernimento58 Filiase neste trabalho a essa corrente entendendo ser a flexibilização medida que coaduna com a dignidade da pessoa humana e propicia a autonomia privada Não haveria hipóteses apriorísticas para a declaração da incapacidade nem argumentos pragmáticos que justifiquem a limitação da capacidade59 57 PERLINGIERI 2002 p 164165 58 TEIXEIRA SOUZA 2017 p 157 59 SÁ MOUREIRA 2011 p 137 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 431 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS Sobre a função do direito civil na atualidade Nelson Rosenvald entende que essa é revisitar o ser humano subjacente ao indivíduo e que a dignidade cláusula geral de proteção é também uma forma de proteção da integridade psicofísica do indivíduo corpo alma e intelecto60 Portanto a própria capacidade fundase na dignidade devendo ser restringida em situações excepcionais e não deve nunca ser uma punição pelo simples fato de se comportar de modo diferenciado61 pois todos os seres humanos de uma forma ou outra possuem vulnerabilidades que são permanentemente superadas para que se afirme a subjetividade individual62 O foco deve estar não na doença por si só mas sim em que a doença afeta no comportamento cognitivo volitivo e social Com um sistema aberto poderseá também flexibilizar a forma de cuidado de acordo com a necessidade pessoal conforme defendido por Iara Antunes de Souza e apresentado na seção anterior A pessoa poderia ser representada ou assistida a depender da necessidade de cuidado Não se teria a definição de que a incapacidade absoluta pressupõe a representação e a incapacidade relativa pressupõe a assistência pois todos esses conceitos não seriam mais predefinidos e sim construídos durante o processo É importante salientar que a norma jurídica aberta não influenciaria na judicialização de processos com aumento do número deles pois a interdição ou curatela deve ser declarada em juízo Ela por ser medida extraordinária não se presume Creditase grande valor às palavras de Lara e Pereira que entendem que um sistema de incapacidades adequado é aquele que se constrói estando atento às peculiaridades que marcam cada um dos indivíduos mas que tenha também sua base nas potencialidades e nos diferentes graus de discernimento que caracterizam cada uma dessas pessoas63 Isto é o que se propõe neste trabalho que as potencialidades a autonomia o desenvolvimento da personalidade e a pessoalidade de cada indivíduo sejam 60 ROSENVALD Nelson A necessária revisão da teoria das incapacidades In BRAGA NETTO Felipe Peixoto SILVA Michael César Org Direito privado e contemporaneidade desafios e perspectivas do direito privado no século XXI Belo Horizonte DPlácido Cap 1 p 18 2014 61 ROSENVALD 2014 p 19 62 ROSENVALD 2014 p 19 63 LARA PEREIRA 2018 p 97 432 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional respeitados para que não tenha mais mortes civis e que não haja estigma sobre o processo de interdição Com a participação de equipes multidisciplinares e do próprio curatelando a solução será construída para cada caso individualmente respeitandose os princípios constitucionais os da CDPD os do EPD e os do processo CONCLUSÃO Analisadas as alterações promovidas pelo Estatuto no Código Civil e na teoria das incapacidades verificase que atualmente em razão da saúde mental existem apenas duas possibilidades ou se é plenamente capaz ou se é relativamente incapaz Quanto ao discernimento esse foi desconsiderado pelo Estatuto que pretendendo atribuir igualdade esqueceuse de que a igualdade não pode ser apenas formal Ela deve primordialmente ser material Todas as pessoas são portadoras de vulnerabilidades em maior ou menor medida que devem ser reconhecidas e protegidas para que as relações sociais possam ser realizadas de forma equitativa sem vantagens para uma ou outra parte Para que não se gerem desproteções vêse que na prática muitos julgadores estão determinando a incapacidade relativa fazendo um verdadeiro exercício de ativismo para enquadrar a situação principalmente na hipótese do inciso III do art 4º do CC2002 para que as pessoas não fiquem desprotegidas Outros por sua vez estão determinando a curatela ainda que reconheçam a capacidade plena nos termos do art 6º do EPD Não se concorda com essa medida por se entender que ela é controversa Como reconhecer uma medida de cuidado a alguém que é plenamente capaz Uma situação não se conecta a outra o que acaba por criar um abismo jurídico Outra solução apresentada foi a teoria de fluidez da aplicação das medidas de cuidado a assistência e a representação proposta por Iara Antunes de Souza Portanto ainda que a pessoa seja declarada relativamente incapaz ou que mantenha a capacidade plena o caso concreto considerando os relatórios da equipe multidisciplinar guiará a medida mais adequada a ele Se o indivíduo necessita de um cuidado mais próximo com a substituição de sua vontade por não ter discernimento completo moldarseá a sentença considerando a curatela em forma de representação se de forma diversa o indivíduo preserva em qualquer grau o discernimento a medida adequada deve ser a assistência Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 433 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS Por fim tratouse da possibilidade de revisão da teoria das incapacidades em que não se existiriam hipóteses fechadas mas sim uma cláusula aberta Não se ousou todavia fazer uma proposta de mudança legislativa entendendo ser essa uma tarefa para especialistas Uma regra aberta sem hipóteses taxativas propiciaria uma construção caso a caso com participação em máximo grau do curatelando Uma avaliação multidisciplinar tornarseá obrigatória pois com base nela se dariam as discussões jurídicas Além disso poderseão construir sentenças que seriam moldadas a cada situação apresentada prestigiando a autonomia de cada indivíduo sem apagar sua história ou substituílo por outrem o que causa uma verdadeira morte civil O que se pretende é que o discernimento volte a ser a base da aplicação da teoria pois se entende que dessa forma não haveria estigmatização de pessoas e doenças Estas não são a causa da incapacidade e sim a unidade do discernimento Dessa forma garantirseia a proteção necessária como construída pelo sistema legal ao se pensar nos efeitos que as incapacidades relativa e absoluta proporcionam e principalmente preservarseia a autonomia de cada indivíduo que poderá participar da construção da sua própria história REFERÊNCIAS BRASIL Lei nº 10406 de 10 de janeiro de 2002 Institui o Código Civil Diário Oficial da União Brasília 11 jan 2002 Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03 leis2002L10406htm Acesso em 5 maio 2019 Lei nº 13146 de 6 de julho de 2015 Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência Estatuto da Pessoa com Deficiência Diário Oficial da União Brasília 7 jul 2015b Disponível em httpwwwplanaltogovbrccivil03ato2015 20182015leil13146htm Acesso em 5 maio 2019 Superior Tribunal de Justiça Recurso Especial 1694984MS Relator Luis Felipe Salomão Quarta Turma Diário de Justiça Eletrônico Brasília 1º fev 2018 Disponível em httpsww2stjjusbrprocessorevistainteiroteornum registro201700120810dtpublicacao01022018 Acesso em 24 nov 2018 CARVALHO Felipe Quintella Machado de A teoria das capacidades no Direito brasileiro de Teixeira de Freitas e Clovis Beviláqua ao Estatuto da Pessoa com Deficiência In PEREIRA Fabio Queiroz MORAIS Luísa Cristina de Carvalho LARA Mariana Alves 434 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional Org A teoria das incapacidades e o Estatuto da Pessoa com Deficiência Belo Horizonte DPlácido cap 1 p 1733 2018 CHALUB Miguel Medicina forense Psiquiatria forense e lei In ADBALLAFILHO Elias CHALUB Miguel TELLES Lisieux E de Borba Psiquiatria forense de Taborda 3 ed Porto Alegre Artmed Cap 1 p 312 2016 TELLES Lisieux E de Borba Psiquiatria forense de Taborda 3 ed Porto Alegre Artmed Cap 12 p 201215 2016 HOSNI David S S O conceito de deficiência e sua assimilação legal incompatibilidade entre a concepção não etimológica adotada no Estatuto da Pessoa com Deficiência e a fundamentação da incapacidade na falta de discernimento In PEREIRA Fabio Queiroz MORAIS Luísa Cristina de Carvalho LARA Mariana Alves Org A teoria das incapacidades e o Estatuto da Pessoa com Deficiência 2 ed Belo Horizonte DPlácido Cap 2 p 3558 2018 FARIA Romário Parecer nº 266 de 2015 Substitutivo da Câmara dos Deputados nº 4 de 2015 ao Projeto de Lei do Senado nº 6 de 2003 Projeto de Lei nº 7699 de 2006 na Câmara dos Deputados do Senador Paulo Paim que institui o Estatuto da Pessoa com Deficiência Lei Brasileira da Inclusão Disponível em httplegissenadolegbr sdleggetterdocumentodm4541434dispositioninline Acesso em 5 maio 2019 FERREIRA Aurélio Buarque de Holanda Discernimento In FERREIRA Aurélio Buarque de Holanda Mini Aurélio O dicionário da Língua Portuguesa 8 ed Curitiba Positivo p 257 2010 Discernir In FERREIRA Aurélio Buarque de Holanda Mini Aurélio O dicionário da Língua Portuguesa 8 ed Curitiba Positivo p 257 2010 FIUZA César NOGUEIRA Roberto Henrique Pôrto Regime jurídico das incapacidades e tutela da vulnerabilidade In LIMA Taisa Maria Macena de SÁ Maria de Fátima Freire de MOUREIRA Diogo Luna Org Autonomia e vulnerabilidade Belo Horizonte Arraes Cap 2 p 1022 2017 KÜMPEL Vitor Frederico BORGARELLI Bruno de Ávila As aberrações da Lei 131462015 Migalhas 11 ago 2015 Disponível em httpswwwmigalhascombr dePeso16MI22490561044Asaberracoesdalei131462015 Acesso em 5 maio 2019 LARA Mariana Alves PEREIRA Fabio Queiroz Estatuto da Pessoa com Deficiência proteção ou desproteção In PEREIRA Fabio Queiroz MORAIS Luísa Cristina de Carvalho LARA Mariana Alves Org A teoria das incapacidades e o Estatuto da Pessoa com Deficiência 2 ed Belo Horizonte DPlácido Cap 5 p 95124 2018 LIMA Taisa Maria Macena de SÁ Maria de Fátima Freire de Estatuto da Pessoa com Deficiência e questões médicas In LIMA Taisa Maria Macena de SÁ Maria de Fátima Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 435 O ESVAZIAMENTO DA TEORIA DAS Freire de MOUREIRA Diogo Luna Org Autonomia e vulnerabilidade Belo Horizonte Arraes Cap 11 p 118131 2017 MINAS GERAIS Tribunal de Justiça Processo nº 01149463820138130245 Relator Alice Birchal Belo Horizonte 21 fev 2017 Disponível em httpwww5tjmgjusbr jurisprudenciapesquisaPalavrasEspelhoAcordaodonumeroRegistro1totalLinh as5paginaNumero1linhasPorPagina1palavrasCURATELApesquisarPore mentaorderByData2listaRelator089920referenciaLegislativaClique20na20 lupa20para20pesquisar20as20referEAncias20cadastradaspesquisaPalavr asPesquisar Acesso em 5 maio 2019 NADER Paulo Filosofia do Direito 21 ed Rio de Janeiro Forense 2012 PERLINGIERI Pietro Perfis do direito civil introdução ao direito civil constitucional 2 ed Rio de Janeiro Renovar 2002 REALE Miguel Lições preliminares de Direito 27 ed São Paulo Saraiva 2002 RIBEIRO Moacyr Petrocelli de Ávila Estatuto da Pessoa com Deficiência a revisão da teoria das incapacidades e os reflexos jurídicos na ótica do notário e do registrador Revista Eletrônica do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região CuritibaPR v 5 n 46 p 5864 nov 2015 Disponível em httpshdlhandlenet205001217887594 Acesso em 5 maio 2019 RIO GRANDE DO SUL Tribunal de Justiça Processo nº 01224732220168217000 Relator Luiz Felipe Brasil Santos Porto Alegre 17 ago 2016 Disponível em http www1tjrsjusbrsitephpconsultaconsultaprocessophpnomecomarcaTrib unaldeJustiE7aversaoversaofonetica1tipo1idcomarca700num processomask70069122794numprocesso70069122794codEmenta6896195tem IntTeortrue Acesso em 5 maio 2019 RODRIGUES Rafael Garcia A pessoa e o ser humano no novo Código Civil In TEPEDINO Gustavo Coord A parte geral do novo Código Civil estudos na perspectiva civilconstitucional Rio de Janeiro Renovar Cap 1 p 134 2002 ROSENVALD Nelson A necessária revisão da teoria das incapacidades In BRAGA NETTO Felipe Peixoto SILVA Michael César Org Direito privado e contemporaneidade desafios e perspectivas do direito privado no século XXI Belo Horizonte DPlácido Cap 1 p 1531 2014 SÁ Maria de Fátima Freire de Sá MOUREIRA Diogo Luna A capacidade dos incapazes Rio de Janeiro Lumen Juris 2011 SOUZA Iara Antunes de Estatuto da Pessoa com Deficiência curatela e saúde mental Conforme a Lei 131462015 Estatuto da Pessoa com Deficiência131052015 Novo Código de Processo Civil Belo Horizonte DPlácido 2016 436 Revista da AJURIS Porto Alegre v 46 n 146 Junho 2019 Doutrina Nacional TABORDA José G V ADBALLAFILHO Elias MECLER Kátia MORAES Talvane de Avaliação da capacidade civil pontoschave In ADBALLAFILHO Elias CHALUB Miguel TELLES Lisieux E de Borba Psiquiatria forense de Taborda 3 ed Porto Alegre Artmed Cap 12 p 201215 2016 TARTUCE Flávio Alterações do Código Civil pela Lei 131462015 Estatuto da Pessoa com Deficiência Repercussões para o Direito de Família e confrontações com o novo CPC Parte I Migalhas Família e Sucessões 29 jul 2015 Disponível em httpswww migalhascombrFamiliaeSucessoes104MI22421721048AlteracoesdoCodigoCivi lpelalei131462015EstatutodaPessoacom Acesso em 5 maio 2019 Direito civil Lei de Introdução e parte geral 13 ed Rio de Janeiro Forense v 1 2017 ebook TEIXEIRA Ana Carolina Brochado Integridade psíquica e capacidade de exercício Revista Trimestral de Direito Civil Rio de Janeiro v 9 n 33 p 336 jan 2008 SOUZA Iara Antunes de Algumas reflexões sobre a limitação da curatela às questões patrimoniais no Estatuto da Pessoa com Deficiência In LIMA Taisa Maria Macena de SÁ Maria de Fátima Freire de MOUREIRA Diogo Luna Org Autonomia e vulnerabilidade Belo Horizonte Arraes Cap 14 p 154167 2017 TELLES Lisieux E de Borba DAY Vivian Peres ZORATTO Pedro Henrique Iserhard Transtornos psicóticos In ADBALLAFILHO Elias CHALUB Miguel TELLES Lisieux E de Borba Psiquiatria forense de Taborda 3 ed Porto Alegre Artmed Cap 23 p 431444 2016 Submissão em 22062019 Avaliado em 30062019 Avaliador C Avaliado em 19072019 Avaliador E Aceito em 02092019