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ISBN 9788522506811 Copyright Daniel Aarão Reis e Pedro de Moraes Direitos desta edição reservados à EDITORA FGV Rua Jornalista Orlando Dantas 37 22231010 Rio de Janeiro RJ Brasil Tels 0800217777 2125594427 Fax 2125594430 email editorafgvbr pedidoseditorafgvbr web site wwwfgvbreditora Impresso no Brasil Printed in Brazil Todos os direitos reservados A reprodução não autorizada desta publicação no todo ou em parte constitui violação do copyright Lei n 961098 Os conceitos emitidos neste livro são de inteira responsabilidade dos autores 1a edição 1988 2a edição revista e atualizada 1998 3a edição revista e atualizada 2008 PREPARAÇÃO DE ORIGINAIS Maria Lucia Leão Velloso de Magalhães EDITORAÇÃO ELETRÔNICA FA Editoração Eletrônica REVISÃO Fatima Caroni e Marco Antonio Corrêa ILUSTRAÇÕES Claudio Mesquita CAPA Sérgio Campante FOTOS DE CAPA E 4a CAPA Pedro de Moraes Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Mario Henrique SimonsenFGV Reis Filho Daniel Aarão 1946 1968 a paixão de uma utopia Daniel Aarão Reis e Pedro de Moraes 3 ed rev e atual Rio de Janeiro Editora FGV 2008 268 p Inclui bibliografia I Movimentos estudantis Brasil 1968 2 Estudantes Atividades políticas Brasil 1968 I Moraes Pedro de II Fundação Getulio Vargas III Título CDD 32244 O ano mágico Daniel Aarão Reis Lembra o tempo que você sentia e sentir era a forma mais sábia de saber e você nem sabia Alice Ruiz J á se passaram 20 anos quase o tempo de uma geração um raio leve na dimensão larga da história uma cicatriz nas pessoas que amadureceram e modelaram suas vidas sob o signo daquele ano mágico 1968 é um redemoinho de imagens atravessando a neblina do tempo Um mundo em movimento conflitos projetos e sonhos de mudança gestos de revolta lutas apaixonadas revolução nos costumes na música nas artes plásticas no comportamento e nas relações pessoais no estilo de vida e nas tentativas novas não só de derrubar o poder vigente mas de propor uma relação diferente entre a política e a sociedade O que se questiona de modo confuso e vago é a articulação da sociedade e suas grandes orientações seus propósitos seu modo de tentarse de mudar de sociedade e de vida No Brasil 1968 foi também um ano de tormentas com um personagem central a rebelião estudantil Estudantes universitários pouco mais de 200 mil menos de 05 da população quase todos filhos da classe média Ao seu lado o mais amplo e diferenciado contingente de estudantes secundaristas Por que lutavam e se rebelavam os estudantes em 1968 19 mouse numa sucessão de conflitos numa rebelião A rebelião veio germinando lentamente Em 1964 quando os militares derrubaram o governo constitucional de João Goulart contaram com o amplo apoio da classe média Os estudantes assistiram passivos ou respiraram aliviados diante da nova situação Na oposição apenas alguns núcleos esboçaram débil resistência logo dominada No dia seguinte à vitória do golpe os partidários mais extremados do novo regime queimaram o prédio da União Nacional dos Estudantes a UNE no Rio de Janeiro O governo organizou inquéritos policiais militares nas faculdades incentivando a delação No final do ano aprovouse a Lei Suplicy com o objetivo de controlar as entidades representativas do movimento estudantil Foram anos de perplexidade e dúvida para a classe média A frente de forças ampla e heterogênea que propôs e apoiou a derrubada de Goulart desejava uma intervenção militar rápida para salvar o país do comunismo do sindicalismo e da corrupção Ora o que tomava corpo era um projeto definido a hegemonia do grande capital internacional e associado apoiada num regime que assumia a forma de uma ditadura militar A classe média foi tomada pelo desencanto O golpe fora bemvindo para garantir a sua participação política Seus direitos e prerrogativas Para deter a inflação preservando porém o seu poder aquisitivo A política dos militares no entanto surpreendia Era aceitável o controle sobre a massa dos trabalhadores desde que não se cometesse excessos mas a repressão estava perdendo o rumo e a capacidade seletiva Atingia indistintamente lideranças populares os demagogos e pessoas de bem Além disso a política financeira provocava milhares de falências entre as pequenas e médias empresas O arrocho salarial não penalizava apenas os operários o que poderia ser lamentado mas compreendido mas alcançava todos os assalariados inclusive os de classe média A classe média sentiuse traída E sua amargura estimulou a luta e o protesto dos estudantes A rebelião tomava corpo Em 1965 houve os primeiros ensaios uma vaia ao generalpresidente Castelo Branco na Universidade Federal do Rio de Janeiro Um plebiscito nacional sobre a Lei Suplicy no qual a ampla maioria dos estudantes decidiu manter suas entidades fora do controle do governo Uma pequena passeata contra o Ato Institucional nº 2 também no Rio E a luta dos estudantes de Brasília em defesa da sua universidade ameaçada pela política do governo No ano seguinte o movimento transbordou para as ruas Em março em Belo Horizonte uma passeata de calouros foi atacada pela polícia O movimento de solidariedade tomou os principais centros estudantis Em meados do ano a UNE se reuniu na clandestinidade e elegeu nova diretoria No segundo semestre foi a vez da setembrada sequência de manifestações que agitaram as principais cidades do país em protesto contra a repressão Um fato provocou comoção a invasão da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro por tropas da Polícia Militar que espancaram e prenderam centenas de estudantes O ano de 1967 foi de refluxo mas o clima não era de derrota Ainda na clandestinidade a UNE conseguiu organizar seu congresso em São Paulo Houve lutas de importância regional O movimento estendiase em escala nacional articulavase melhor tateava caminhos 1968 amadurecia Os estudantes já compreendiam que a política educacional do governo era o avesso de suas reivindicações A universidade gratuita o governo antepunha a universidade paga Em vez de soluções originais para os problemas brasileiros o governo preferia os assessores e os acordos com os norteamericanos No lugar da ampliação das matrículas um ensino ainda mais seletivo nas universidades públicas a perspectiva do ensino pago a serviço das grandes empresas No lugar de uma política de assistência a revogação dos subsídios o fechamento dos restaurantes Por isso é que as entidades estudantis precisavam ser fechadas ou controladas As propostas de democratização da universidade e da educação entravam em rota de colisão com os objetivos dos donos do poder Um Conselho Nacional promovido pela UNE em começos de 1968 tentaria definir novos caminhos Todos desconfiavam do governo e se opunham à política educacional mas havia dúvidas quanto às opções de luta manter em primeiro plano as denúncias políticas tentando retomar as manifestações de rua de 1966 ou concentrar a atenção nos interesses imediatos da categoria estudantil evitando os enfrentamentos de rua e priorizando a luta nas escolas Nenhuma das duas orientações excluía a luta política ou a luta reivindicatória a luta geral ou a luta específica A diferença capital do ponto de vista do encaminhamento prático das lutas residia nas distintas ênfases e prioridades Por maioria apertada o Conselho Nacional pronunciouse pela segunda posição prioridade para as reivindicações imediatas e para a organização nas escolas e universidades Mas as divergências se mantiveram e reapaereciam no decorrer do ano que se iniciava 20 21 As primeiras lutas em janeiro e fevereiro mobilizaram os chamados excedentes e os estudantes do Calabouço Uns queriam mais vagas os outros a ampliação e a melhoria do restaurante que os servia As reivindicações opunhamse à política educacional do regime As manifestações foram combativas mas ninguém parecia supor que estava começando um ano fora do comum Em março o movimento por mais vagas cresceu O impulso vinha agora de São Paulo Estudantes de filosofia da USP da Fundação Getulio Vargas e da PUC acamparam nas respectivas reitorias No Rio o pessoal do Calabouço não aceitava as condições em que fora reaberto o seu restaurante Foi justamente numa das escaramuças em torno do Calabouço que surgiu o primeiro grande conflito social de 1968 Era uma quintafeira 28 de março entardia no Rio e os estudantes preparavam nova manifestação pelas ruas do centro da cidade armavam faixas e bandeiras desenhavam cartazes Os choques da polícia militar chegaram como sempre pretendendo fazer medo intimidar Receberam vaias e assobios Os policiais resolveram então invadir o restaurante e já o fizeram de armas na mão Diante da vaia agora ensurdecedora foram os policiais que se amedrontaram e começaram a atirar Mataram Edson Luís de Lima Souto E ainda feriram outros com tiros a esmo e pancadas dos cassetetes Depois fugiram Quem matou Edson Luís Por ordem de quem Perguntas sem resposta apesar dos rigorosos inquéritos Mas o crime não ficou sem resposta Os estudantes levaram o corpo para a Assembléia Legislativa funcionando então na Cinelândia E se recusaram a entregálo às autoridades que desejavam autopsiálo no Instituto Médico Legal receando que sumissem com o corpo Acampados na Assembléia os estudantes guardaram o corpo do colega enquanto a notícia da morte e a denúncia do crime circulavam pela cidade No dia seguinte a praça amanheceu tomada pelo povo O governo reitou a polícia das ruas e mais de 50 mil pessoas puderam enterrar a primeira de uma longa série de vítimas da violência policial Houve passeatas de protesto em todo o país Mas em Goiânia a polícia se permitiu atacar os manifestantes e invadir a catedral da cidade atirando em rapazes e moças que ali estavam refugiados matando mais um estudante No dia 1º de abril os estudantes resolveram comemorar a seu modo o quarto aniversário do regime militar No dia 4 as missas rezadas pelo sétimo dia da morte de Edson Luís registrariam novos choques violentos destacandose a cavalaria da polícia militar que atacou as pessoas na saída da Igreja da Candelária no Rio de Janeiro No restante do mês de abril e em maio houve um refluxo para as escolas para as lutas setoriais e locais O movimento refazia forças inventariava os problemas da universidade discutia reivindicações Sucederamse no entanto manifestações pequenos atos públicos comíciosrelâmpago greves Parecia que os estudantes não se haviam deixado abater Em alguns lugares lutas parciais anunciavam a possibilidade de novos conflitos Em junho o transbordamento das reivindicações para as ruas seria mais consistente e orgânico Expromia a maturação de uma discussão mais elaborada das reivindicações verbas vagas currículos métodos de ensino relações entre professores e alunos A política educacional do governo era o alvo principal da crítica Desde o dia 5 de junho 16 mil estudantes da Universidade Federal do Rio de Janeiro entraram em greve No dia 7 a União Estadual dos Estudantes de São Paulo promoveu uma concentração na Reitoria da USP que poucos dias depois seria ocupada O movimento não se limitava a denúncias gerais apresentava reivindicações precisas propunha diálogos setoriais com as autoridades universitárias e negociações globais com o Ministério da Educação Os dirigentes estudantis não eram 22 23 organizadas por estudantes e professores tornavase realidade Entretanto a abertura do segundo semestre escolar não poderia ocultar os sinais do refluxo natural de uma luta reivindicatória que esbarra num impasse a resistência a concessões por parte das autoridades e a impossibilidade de ulteriores avanços sem a remoção desse obstáculo Dois outros pontos contribuíram para o fenômeno de um lado o início em julho da luta aberta entre as correntes presentes no movimento estudantil pelo controle da renovação das entidades a ser realizada em agostosetembro As divergências voltavam a polarizar vanguardas e lideranças De outro a intensificação da repressão tentando aproveitar o refluxo para desarticular o movimento prisão de lideranças condenações de estudantes presos em passeatas mobilizações maciças de tropas para impedir manifestações invasões de universidades espancamentos utilização de forças parapoliciais para provocar e matar estudantes como o Comando de Caça aos Comunistas CCC Os estudantes tentavam articular respostas a cada provocação a cada agressão mas o próprio jogo de ações e reações parecia condenar um movimento em curva descendente Assim logo depois da prisão de Vladmir Palmeira no começo de agosto houve passeatas de protesto O mesmo ocorreu quando da invasão da Universidade de Brasília Nos primeiros dias de outubro em face da agressão do Comando de Caça aos Comunistas à Faculdade de Filosofia da USP novas passeatas seriam organizadas Mas as mobilizações reuniam cada vez menos gente e enfrentavam uma reação policial cada vez mais forte Protestos contra assassinatos resultavam em mais assassinatos As mortes em manifestações públicas tornaramse anônimas banais Foi então que houve o Congresso da UNE em Ibiúna São Paulo onde os estudantes resolveram realizar também na clandestinidade mais uma reunião de sua entidade nacional Iniciado em 11 de outubro o congresso foi estourado pela polícia no dia seguinte Cerca de 700 líderes estudantis foram presos numa só operação um desastre político tendo em vista o declínio em que se encontrava o movimento Ainda foi possível organizar pequenas manifestações de protesto Mas o grosso dos estudantes não mais respondia aos apelos Nessas condições de pouco valia convocar um Dia Nacional de Protesto em 22 de outubro A polícia já não hesitava em dissolver à bala manifestações pacíficas invadir igrejas e hospitais Sua ação provocava desânimo e medo em vez de indignação A insistência em responder nas ruas a cada desafio conduziria apenas ao isolamento de algumas centenas de estudantes que já não eram acom A gente sabia que eram estudantes e ouvia no rádio que eles estavam atacando Brasília Podiam proclamar a República e ai Mas ninguém estava querendo ir na cidade falar com a polícia Fui duas vezes e agora a gente pode ficar mais sossegado Os bandidos tão presos Eu vi lá ontem Miguel Góis caboclo de Ibiúna sobre o XXX Congresso dos Estudantes panhados nem mesmo pelos próprios colegas O refluxo consolidavase O movimento mais amplo perdia fôlego Era necessário inventar novas formas de luta e organização O movimento estudantil de 1968 estava derrotado s estudantes foram personagens centrais nas lutas de 1968 mas não os únicos Junto com eles formou uma comunidade de interesses estiveram profissionais liberais jornalisas escritores artistas e religiosos Participaram da denúncia do regime e das lutas sociais movidos pelo mesmo desencanto diante dos rumos que tomava o novo regime Desde 1964 insurgiramse contra a censura denunciaram os excessos da repressão o desmantelamento da Universidade de Brasília e a ofensiva contra as manifestações culturais e artísticas Artigos e colunas nos jornais filmes e peças de teatro manifestos à nação testemunham um movimento crescente de crítica uma atitude de desafio ao poder Em fins de 1965 um ato simbólico oito intelectuais erguem faixas de denúncia e protesto à entrada do generalpresidente Castelo Branco na reunião da Organização dos Estados Americanos OEA realizada no Hotel Glória no Rio Os músicos e compositores exprimiriam a insatisfação generalizada Os festivais de música popular e os shows musicais divulgariam temas indagações propostas que colocavam em questão o Brasil oficial incentivando a crítica e a rebeldia Em 1967 o lançamento de O rei da vela Oswald de AndradeJosé Celso Martinez Correa no teatro de Terra em transe Glauber Rocha no cinema e do movimento tropicalista Caetano Gil Tomzé e os Mutantes desenha o perfil de uma intelectualidade inassimiliada pelo discurso oficial Os artistas não pareciam atemorizados mantinhamse críticos e criativos Até quando o regime toleraria o desafio 27 Digitalizado com CamScanner 5 No principio de 1968 haveria no Rio o lançamento de Roda viva Chico BuarqueJosé Celso Martinez Correa a proposta de um teatro corrosivo e agressivo decidido a enfrentar preconceitos e a retirar o espectador de seu papel passivo e consumidor Um mês depois os artistas fechariam os teatros numa greve de protesto contra a censura O pessoal de teatro voltaria à greve em protesto contra o assassinato de Edson Luis em março Dali em diante em todas as grandes manifestações estudantis estariam presentes atores cineastas músicos escritores jornalisas e profissionais liberais Entre artistas e estudantes havia um intercâmbio permanente de energias Podese dizer que se estimulavam reciprocamente em suas buscas indagações e caminhos O público estudantil compunha em sua maioria a platéia participativa dos festivais de música das peças de teatro dos filmes e dos shows Além disso entre os estudantes multiplicavamse iniciativas que acompanhavam os passos dos artistas 1968 assistiria ao crescimento do movimento de cineclubes festivais de cinema e teatro estudantis sem falar nos jornais e revistas dos diretórios acadêmicos Intelectuais e estudantes também formaram uma comunidade de gostos inclinações e interesses na divulgação e defesa de novos valores e comportamentos que se opunham às preferências e políticas do poder político Distinguiase na aparência das roupas a revolução da minissaia na preferência pelas cores na comum hostilidade à rotinização da vida na procura de novos horizontes musicais de novas propostas de vida afetiva a revolução da pílula e de percepção da vida o consumo das drogas leves ampliavase suavemente entre os adeptos da paz e do amor Os artistas tiveram aqui um papel de vanguarda A crítica ao conservadorismo ultrapassava o domínio estrito do discurso político do poder para alcançar as raízes do comportamento das relações afetivas da vida cotidiana O intercâmbio entre estudantes e intelectuais se expressaria politicamente na Comissão dos Cem Mil legitimada em praça pública para conduzir o diálogo com as autoridades A intransigência das mesmas o refluxo do movimento estudantil e o ainda frágil vertebramento dos movimentos de artistas e intelectuais entre outros fatores contribuíram para fazer morrer o que seria por uma semana apenas o símbolo de uma proposta de organização popular de oposição Os estudantes ainda encontraram apoio entre os religiosos brasileiros mais um fenômeno de inversão de alianças A hierarquia da Igreja Católica abençoou o movimento que depôs o presidente Goulart Os terços e os tanques irmanaramse O objetivo é abrir uma série de Vietnãs no campo da cultura uma guerra contra a cultura oficial de consumo fácil O sentido da eficácia do teatro hoje é o sentido da guerrilha teatral e ser travada com as armas do teatro anárquico cruel grosso como a grosseira apatia em que vivemos José Celso Martinez Correa sobre a peça Roda viva O povo pobre tem direito a violência na defesa de seus direitos Declaração de 700 padres nas grandes marchas da Família com Deus pela Liberdade Rapidamente entretanto setores do episcopado e a própria hierarquia tomariam suas distâncias Mais tarde os rumos do capitalismo selvagem entrariam em rota de colisão com o processo que o catolicismo passou a viver em escala mundial A atualização da Igreja determinada pelo Concílio Vaticano II pelas encíclicas papais de João XXIII e de Paulo VI implicava opções incompatíveis com o regime que os militares e os capitalistas impunham ao país Já em 19651967 algumas ordens religiosas franciscanos dominicanos e beneditinos cediam prédios e igrejas para reuniões estudantis ile gais A UNE e muitas UEE rearticularamse freqüentemente graças à compreensão de representantes da religião católica Em 1968 não faltariam choques às vezes brutais entre os homens da religião e o poder Os religiosos denunciariam a miséria do povo a injustiça social a doutrina da segurança nacional que se transmuda em insegurança para a grande maioria E reclamariam reformas em primeiro lugar a reforma agrária compromisso assumido e esquecido pelos que lideraram a intervenção militar Denunciariam também repressão aos direitos humanos celebrados nos discursos e desrespeitados na prática Uma corrente progressista se destacou na hierarquia e entre os leigos Estaria presente nas passeatas nas greves operárias na Comissão dos Cem Mil Tentaria intermediar entre manifestantes e policiais abriria as portas de igrejas e seminários para missas de sétimo dia para reuniões políticas para abrigo de fugas E sofreria como os demais opositores os inquéritos as proibições as prisões A Conferência do Episcopado LatinoAmericano Celam em fins de agosto de 1968 em Medellín na Colômbia confirmaria opções pelas mudanças pela justiça social pela liberdade Tomaria então corpo a Teologia da Libertação que procurava sintetizar a crítica social marxista e os princípios cristãos Não faltaram padres e leigos desiludidos com as 28 Manchete mais apenas portavozes de um descontentamento difuso mas lideranças de aspirações enraizadas no cotidiano de estudantes e professores Dai sua legitimidade e o melhor nível de organização demonstrado por universidade por faculdade em cada turma As lutas radicalizaramse ao mesmo tempo em vários centros greves ocupação de faculdades manifestações concentrações Os estudantes reclamavam definições e exigiam diálogo As autoridades negaceavam A polícia reprimia No dia 20 de junho no Rio de Janeiro reunidos na Reitoria da UFRJ numa assembléia que durou cerca de oito horas os estudantes quase obrigaram os professores do Conselho Universitário a discutir sobre os problemas da universidade e da educação no país Na rua a polícia cercou a universidade alegando ordens para prender líderes estudantes De nada serviu a intermediação dos próprios professores A polícia preparavase para reeditar a invasão da Praia Vermelha em setembro de 1966 Mas os estudantes não se dispuseram a esperar o fechamento do cerco Armados de paus e pedras forçaram a saída em meio a nuvens de gás lacrimogêneo tiros e bombas de efeito moral Centenas deles porém foram presos e encurralados no estádio de futebol do Botafogo na rua General Severiano Ali sofreram o vexame do espancamento da identificação policial do medo e da angústia As fotografias dessas cenas divulgadas pelos jornais provocariam a revolta No dia seguinte houve a sextafeira sangrenta Os estudantes protestaram contra os acontecimentos do dia anterior e já se dispersavam quando a polícia chegou atirando para ferir e matar Muitos morreram nessa tarde de sangue Dessa vez no entanto a cidade reagiu como pôde usando paus pedras objetos contundentes jogados do alto das janelas fios de arame para derrubar os cavalos A batalha durou mais de sete horas e levou à prisão mais de mil pessoas Mas a polícia também foi obrigada a contar suas baixas um morto 35 feridos mais de 10 camburões incendiados A gente é contra essa estrutura e na rua a ditadura tem medo da gente porque são o quê da voz do povo e da voz dos estudantes sai a condenação dos grandes donos dos grandes exploradores deste país Vladimír Palmeira na Passeata dos 50 Mil Não sou mágico que cria avanços e recuos fabrica passeatas Quem faz isso são os estudantes Vladimir Palmeira Enquanto isso a polícia cercava e invadia novamente a Universidade de Brasília Em São Paulo os estudantes ocupavam a Faculdade de Filosofia dispostos a lá permanecerem até que suas reivindicações fossem atendidas A combatividade ganhava outros focos dia 24 em Fortaleza Belo Horizonte e Porto Alegre Os estudantes do Rio convocavam nova passeata para quartafeira 26 de junho O governo mais uma vez cederia à pressão da opinião pública a polícia voltou a desaparecer das ruas Estavam criadas as condições para a Passeata dos 100 Mil O povo voltou a ocupar as ruas e praças públicas com calma pacificamente apresentando reivindicações e denúncias Uma comissão dos Cem Mil foi designada para dialogar com o governo reunindo representantes dos estudantes dos profissionais liberais dos professores dos religiosos e das mães dos estudantes Mas a negociação não avançou pois o governo recusavase a considerar uma reivindicação preliminar a liberação dos presos em passeatas anteriores Rompidas as conversações o Rio ainda assistiria a uma última manifestação pacífica a dos 50 mil em 3 de julho O movimento parecia ter chegado a um impasse embora conservando força e entusiasmo em Fortaleza Salvador São Paulo A ocupação da Faculdade de Filosofia e do Conjunto Residencial da USP ensejava novas experiências os estudantes formavam grupos de estudo e pesquisa discutiam os currículos constituíamse em gestores da vida cotidiana da faculdade A reinvindicação das comissões paritárias 24 Manchete Pedro de Moraes mais apenas portavozes de um descontentamento difuso mas lideranças de aspirações enraizadas no cotidiano de estudantes e professores Dai sua leigitimidade e o melhor nível de organização demonstrado por universidade por faculdade em cada turma As lutas radicalizaramse ao mesmo tempo em vários centros greves ocupação de faculdades manifestações concentrações Os estudantes reclamavam definições e exigiam diálogo As autoridades negaceavam A polícia reprimia No dia 20 de junho no Rio de Janeiro reunidos na Reitoria da UFRJ numa assembléia que durou cerca de oito horas os estudantes quase obrigaram os professores do Conselho Universitário a discutir sobre os problemas da universidade e da educação no país Na rua a polícia cercou a universidade alegando ordens para prender líderes estudantes De nada serviu a intermediação dos próprios professores A polícia preparavase para reeditar a invasão da Praia Vermelha em setembro de 1966 Mas os estudantes não se dispuseram a esperar o fechamento do cerco Armados de paus e pedras forçaram a saída em meio a nuvens de gás lacrimogêneo tiros e bombas de efeito moral Centenas deles porém foram presos e encurralados no estádio de futebol do Botafogo na rua General Severiano Ali sofreram o vexame do espancamento da identificação policial do medo e da angústia As fotografias dessas cenas divulgadas pelos jornais provocariam a revolta No dia seguinte houve a sextafeira sangrenta Os estudantes protestaram contra os acontecimentos do dia anterior e já se dispersavam quando a polícia chegou atirando para ferir e matar Muitos morreram nessa tarde de sangue Dessa vez no entanto a cidade reagiu como pôde usando paus pedras objetos contundentes jogos do alto das janelas fios de arame para derrubar os cavalos A batalha durou mais de sete horas e levou à prisão mais de mil pessoas Mas a polícia também foi obrigada a contar suas baixas um morto 35 feridos mais de 10 camburões incendiados A gente é contra essa estrutura e na rua a ditadura tem medo da gente porque são o da voz do povo e da voz dos estudantes sai a condenação dos grandes donos dos grandes exploradores deste país Vladímir Palmeira na Passeata dos 50 Mil Não sou mágico que cria avanços e recuos fabrica passeatas Quem faz isso são os estudantes Vladimír Palmeira Pedro de Moraes Enquanto isso a polícia cercava e invadia novamente a Universidade de Brasília Em São Paulo os estudantes ocupavam a Faculdade de Filosofia dispostos a lá permanecerem até que suas reivindicações fossem atendidas A combatividade ganhava outros focos dia 24 em Fortaleza Belo Horizonte e Porto Alegre Os estudantes do Rio convocavam nova passeata para quartafeira 26 de junho O governo mais uma vez cederia à pressão da opinião pública a polícia voltou a desaparecer das ruas Estavam criadas as condições para a Passeata dos 100 Mil O povo voltou a ocupar as ruas e praças públicas com calma pacificamente apresentando reivindicações e denúncias Uma comissão dos Cem Mil foi designada para dialogar com o governo reunindo representantes dos estudantes dos profissionais liberais dos professores dos religiosos e das mães dos estudantes Mas a negociação não avançou pois o governo recusavase a considerar uma reivindicação preliminar a liberação dos presos em passeatas anteriores Rompidas as conversações o Rio ainda assistiria a uma última manifestação pacífica a dos 50 mil em 3 de julho O movimento parecia ter chegado a um impasse embora conservando força e entusiasmo em Fortaleza Salvador São Paulo A ocupação da Faculdade de Filosofia e do Conjunto Residencial da USP ensejava novas experiências os estudantes formavam grupos de estudo e pesquisa discutiam os currículos constituíamse em gestores da vida cotidiana da faculdade A reinvindicação das comissões paritárias 25 Digitalizado com CamScanner 3 Manchete Pedro de Moraes possibilidades de diálogo que se inclinariam pelo enfrentamento armado contra os regimes dominantes na América Latina e no Brasil A repressão e o isolamento social os alcançariam a todos artistas escritores professores profissionais liberais religiosos Seu movimento de protesto e crítica seria igualmente derrotado em 1968 O relato até o momento evidencia uma ausência a massa dos trabalhadores manuais A maioria do povo deste país como sentiu e como participou dos acontecimentos Os trabalhadores manuais ao contrário da classe média viveram a intervenção militar como um desastre Organizações sindicais sob intervenção lideranças em fuga presos Os políticos em quem confiavam ou votavam desapareceram do cenário cassados impedidos pela força de permanecer no jogo institucional Foi um desabamento de referências Um longo processo de aprendizado foi subitamente negado as lutas sindicais por reajustes salariais ritmadas pelos dissídios coletivos arbitradas pela Justiça do Trabalho marcadas pelas assembléias manifestações e greves de pressão A tolerância a cumplicidade ou o patrocínio do Estado mais ou menos amplos segundo as conjunturas mais ou menos generosos de acordo com os governantes A corte dos políticos sempre acentuada nos períodos eleitorais impondo concessões em troca do apoio verbas por votos Durante quase 20 anos e apesar das limitações da legislação trabalhista os trabalhadores urbanos e rurais desde fins dos anos 1950 foram construindo organizações formando lideranças ocupando um lugar no jogo político constituindose como interlocutores de fato e de direito A conquista de um simulacro de cidadania sob os governos de Vargas e Goulart mais do que os aumentos salariais eventuais mais do que os empregos fez dos trabalhadores adeptos das lideranças e da ideologia trabalhistas Essas mesmas razões levariam as elites sociais as Forças Armadas e a classe média à exasperação O golpe militar teria tido antes e acima de tudo uma função colocar os trabalhadores manuais em seus devidos lugares liquidar pela força o que havia sido conquistado em longas e incertas negociações O novo regime por isso mesmo não se limitaria a perseguir e a prender Elaboraria toda uma nova Há uma conspiração calada e eficaz contra a paz cujas causas se encontram no colonialismo interno e nos monopólios internacionais Uma violência institucionalizada no campo social Não devemos estranhar a tentação da violência É mais surpreendente a paciência de um povo que suporta durante anos uma condição que não aceitariam nunca os que têm uma consciência desenvolvida dos direitos humanos II Conferência Episcopal LatinoAmericana em Medellín Colômbia Se uma minoria conseguir empalmar greve por índice salarial acima do índice oficial e não oferecido espontaneamente pelos patrões ou essa minoria tem um dispositivo militar capaz de levar tudo de roldão ou não tem Se não o tem espere para ver o que vai dar Jarbas Passarinho ministro do Trabalho coronel quando da ameaça de greve dos bancários em Belo Horizonte legislação Derrubaria conquistas e erqueria barreiras à participação dos trabalhadores Lei de Greve Lei de Arrocho Salarial derrogação da estabilidade esvaziamento da Justiça do Trabalho exclusão dos trabalhadores do controle da previdência social Era preciso não só esmagar o que existia mas dificultar ao máximo um eventual renascimento A resistência foi débil A debilidade evidenciaria as carências do movimento dos trabalhadores Dependência do Estado e principalmente de lideranças carismáticas a quem tudo se pedia e de quem tudo se esperava Separação entre lideranças integradas em negociações e jogadas políticas mas desligadas de suas bases imersas em preocupações cotidianas de salários e condições de trabalho Divisões reais entre categorias profissionais lutas descoordenadas dispersas entre os trabalhadores do campo e da cidade Ausência de uma sólida organização nos locais de trabalho Não é difícil inventariar as causas de uma derrota depois que ela acontece A rearticulação seria lenta e quebradiça Exprimia num desenho tortuoso as tendências adquiridas ao longo do tempo e de difícil reversão sobretudo sob condições desfavoráveis No entanto a insatisfação e o descontentamento com as políticas do regime militar levariam a um processo de reconstrução molecular Daí emergiria o MIA Movimento Intersindical Antiarrocho um esboço de organização em 19661967 mas que não foi capaz de dirigir nenhuma luta de envergadura Faltavam bases sociais para tanto E então de surpresa viriam o movimento e as greves de 1968 Em Contagem cidade industrial perto de Belo Horizonte os operários cruzariam os braços em abril exigindo um reajuste acima das determinações da política salarial vigente Acabaram conseguindo um pequeno abono A greve parecia ressurgir como instrumento de conquistas reivindicatórias Nas comemorações do 1º de Maio Dia Internacional do Trabalho pela primeira vez depois de 1964 os trabalhadores saíram dos recintos fechados para os comícios de rua Em São Paulo o então governador Abreu Sodré compareceu com seus assessores mas quando desejou falar foi surpreendido por um núcleo de trabalhadores que o recebeu com vaias e pedras Só lhe restou refugiarse numa igreja próxima enquanto os trabalhadores tomavam e queimavam o palanque das autoridades Da praça da Sé os operários saíram em passeata também a primeira desde a instauração do regime militar Em julho seria a vez de Osasco centro industrial próximo de São Paulo Nova greve dessa vez com ocupação de empresas Os operários 30 31 reclamavam reajustes equivalentes à perda real provocada pela inflação Um contrato coletivo de trabalho Era promessa de novos reajustes trimestrais sempre acompanhando a inflação Reclamavam ainda da política salarial e criticavam o governo por sua atitude hostil em relação aos interesses dos trabalhadores Mas as autoridades estavam alertas e imediatamente decretaram a ilegalidade da greve criminalizaram o movimento anunciaram o nãopagamento dos dias parados ameaçaram com dispensas maciças e mandaram a polícia expulsar os operários das empresas ocupadas Além disso anunciaram a intervenção no sindicato e a prisão preventiva das lideranças A greve não durou mais do que três dias Ao longo do segundo semestre surgiram novas propostas de luta entre os bancários os metalúrgicos do Rio e de São Paulo uma segunda greve em Contagem dessa vez uma tentativa que cedo se frustrou Pequenos ensaios O governo acabaria analisando os movimentos como os últimos estreme cimentos de um adversário já fora de combate Para os estudantes as greves eram o prenúncio de novas e gigantescas batalhas Contagem e Osasco tornamse palavras mágicas anunciando enfrentamentos apocalípticos Centenas de jovens se mobilizaram em conseqüência venda de bônus distribuição de panfletos nas cidades e nas portas das fábricas solidariedade ativa Em São Paulo chegouse a organizar uma passeata estudantil de apoio à greve e mais de uma assembléia ouviria a voz de lideranças operárias que pela primeira vez cruzavam as portas das universidades para falar de suas reivindicações e aspirações As greves de 1968 não se reduziam a arrancos dispersos e derradeiros do movimento derrotado em 1964 Havia novas características organizações por locais de trabalho coordenação clandestina combinação entre o trabalho sindical e a organização nas bases das empresas lideranças jovens nenhum vínculo com o Estado e com os partidos políticos tradicionais Mas por outro lado não se confirmaria a previsão de que elas dariam origem a grandes lutas sociais A inércia e a dispersão prevaleceriam sobre o espírito de luta e o inconformismo das greves de Osasco e Contagem ainda falta falar de outro personagem não de todo evidente na crônica dos fatos os partidos políticos de esquerda Em certos momentos pareceu haver uma fusão de linhas entre os partidos de esquerda e o movimento estudantil Os partidos adquiriram feição estudantil dada a composição social da maioria dos militantes Além disso a força e a influência dos partidos dependiam em larga medida do movimento estudantil Por outro lado os partidos marcavam com suas concepções e iniciativas o ritmo e a dinâmica do movimento Seria difícil em 1968 encontrar uma liderança estudantil desvinculada de um partido de esquerda A relação íntima entre partidos e movimento não poderia fazer esquecer porém a autonomia de ambos marcada por característi32 33 cas próprias objetivos específicos distintos percursos Os partidos de esquerda foram brutalmente atingidos em 1964 obrigados dali em diante a agir na clandestinidade Foi doloroso enfrentar os novos tempos Não tanto devido às condições impostas pela repressão mas pela desorientação em que todos se encontravam Nos limites deste trabalho é impossível evidenciar as nuances que diferenciavam as correntes de esquerda mas é certo afirmar que todas depositavam enormes esperanças nos movimentos populares anteriores a 1964 e nenhuma esperava em conseqüência uma vitória tão rápida de seus inimigos Foi necessário rever conceitos e concepções Entretanto nas discussões que se abriram ganharia pouca força a perspectiva de se analisar em profundidade as bases sociais e históricas da derrota política Prevaleceu a inclinação pela busca de bodes expiatórios e pela crucificação dos culpados Entre os partidos a grande vítima foi o Partido Comunista Brasileiro o PCB O velho partido fundado em 1922 definiase pelas propostas de aliança com a burguesia nacional e pelo caminho pacífico para a obtenção das reformas de base que transformariam o país Acreditava no caráter irreversível da democracia brasileira e na força de um dispositivo militar nacionalista e legalista que impediria no nascedouro qualquer tentativa golpista A instauração do regime militar desmenteira seus cálculos e prognósticos Também aqui haveria um desabamento de referências O trabalhismo foi outro bode expiatório Responsabilizado pelo anestesiamento das massas seus líderes em fuga para o exílio eram culpados pela passividade do povo Chamados de populistas perderiam o respeito da crítica revolucionária posterior a 1964 Afirmaramse então concepções que primavam pela clareza e pela simplicidade O novo regime exprimia o que de mais retrógrado havia no país os interesses do grande latifúndio e das empresas imperialistas Estava portanto condenado a uma só política conter reprimir e afundar o país na estagnação Assim o povo cego abriria os olhos e despertaria do sono que lhe fora imposto pelos reformistas do PCB e pelos populistas do PTB O Brasil estava num impasse sem saída era um barril de pólvora prestes a explodir Tudo se resumia numa questão de tempo de pouco tempo Caberia aos partidos de esquerda apressar o momento do enfrentamento A luta armada aparecia então como a grande alternativa a solução para os problemas que atormentavam o país o povo e a esquerda Também entraram em crise os padrões de organização conhecidos O esquema piramidal do PCB baseado nas células e numa sucessão de comités dirigidos por um comitê central e por um secretáriogeral mais ou menos imitado pelos demais partidos foi associado à derrota criticado como incapaz de assumir a agilidade dos tempos novos que se anunciavam Caíram nesse contexto evidentes os dirigentes mais experimentados sua credibilidade foi a zero não resistindo à derrota de suas concepções políticas e partidárias Seguiramse a dispersão e a fragmentação orgânicas e a proliferação de siglas Um processo inevitável em larga medida tendose em vista o panorama da atomização em que se encontravam as forças sociais cujos interesses a esquerda pretendia representar Apesar de tudo os partidos de esquerda desempenharam papel decisivo nas entidades estudantis polarizando o movimento Em 1968 dois blocos se defrontariam de um lado a Ação Popular AP parcialmente apoiada pelo Partido Comunista do Brasil PCdoB e pelo Partido Comunista Brasileiro Revolucionário PCBR De outro as dissidências do PCB oriundas dos comitês universitários do velho partido aliadas à Organização Revolucionária Marxista Política Operária ORMPolop e em certos momentos ao próprio PCB As alianças no movimento estudantil estavam determinadas pelas concepções respectivas a respeito do papel dos estudantes no que todos entendiam ser o processo da revolução brasileira em marcha E pelas diferenças de ênfase na definição dos programas e nas escolhas das formas de luta O bloco liderado pela AP enfatizava as denúncias políticas gerais e as lutas de rua enquanto as dissidências e seus aliados preferiam concentrar a atenção nas lutas reivindicatórias e na articulação e organização nas escolas e nas universidades Mas os partidos não se diluíam nas alianças e blocos ao contrário lutavam para afirmar um perfil próprio e não seriam incomuns desavenças e enfrentamentos em cada bloco ou aliança É que todos os partidos na verdade viam horizontes mais amplos se queriam revolucionários e se proclamavam vanguardas de um processo inevitável de transformações sociais que cedo ou tarde desembocaria no socialismo De acordo com essas concepções o movimento estudantil era um e mais um terreno de lutas um elo numa corrente mais vasta um peção num jogo mais complicado e que tinha peças mais importantes É claro que na prática os partidos muitas vezes se deixavam arrastar e dominar pela dinâmica dos estudantes Mas não pretendiam ser regidos por eles ao contrário desejavam dirigilos segundo seus objetivos Daí vinha uma inclinação para instrumentalizar as aspirações ime 34 35 diatas estudantis Nesse sentido as organizações de vanguarda obedeciam à sua lógica intrínseca O movimento estudantil enquanto movimento social não teria sido capaz mesmo em 1968 de criar mecanismos de controle dos partidos de esquerda Em conseqüência sofreria os influxos negativos de suas orientações gerais A utopia da revolução imediata dos grandes e decisivos enfrentamentos que se aproximavam a ilusão de uma guerra iminente dificultaram enormemente a percepção da curva de declínio do movimento estudantil O mesmo ocorreria por ocasião das greves operárias de Contagem e Osasco superestimadas por sua localização ilusão no xadrez mais grandioso de um processo revolucionário que só existia no delírio da imaginação dos partidos de esquerda Duas organizações de vanguarda radicalizariam ainda mais suas expectativas revolucionárias a Ação Libertadora Nacional ALN e a Vanguarda Popular Revolucionária VPR Para elas a guerra já começara e o movimento estudantil não passava de um epifenômeno que se esgotaria em si mesmo Tratavase de preparar a guerrilha rural arrecadando fundos expropriando armas e explosivos realizando ações de propaganda As chamadas ações de meios recursos para as organizações e para a guerrilha rural que se pretendia desencadear começariam ainda antes de 1968 Bancos carros e trens pagadores casas de armas pedreiras com seus depósitos de dinamite algumas ações de propaganda mereceram destaque o carrobomba lançado em junho de 1968 contra o QuartelGeneral do II Exército em São Paulo o justiçamento do capitão do Exército norteamericano Charles Chandler em outubro também em São Paulo Coincidentemente mas não passou de uma coincidência o que não deixa de ser altamente simbólico ações realizadas em momentos decisivos vividos pelo movimento estudantil A primeira na madrugada seguinte à Passeata dos 100 Mil A segunda no próprio dia em que seria estourado o Congresso de Ibiúna Linhas paralelas não se cruzariam Para lideranças desanimadas com o declínio do movimento estudantil as ações guerrilheiras bem protegidas aparentemente eficazes e incapturáveis surgiam como uma alternativa A força gravitacional das organizações nelas empenhadas logo se faria sentir Num momento seguinte muitos partidos já organizavam grupos armados enquanto outros deslocavam os melhores militantes para o campo guerrilha rural e para as fábricas Essa verdadeira hemorragia de quadros seria um fator a mais do enfraquecimento E os partidos de esquerda não percebiam que estavam contribuindo para secar a fonte de apoio de que dispunham Pelas novas formas de ação e organização adotadas ainda teriam um tempo de sobrevida maior que o do movimento de onde retiravam força e influência Mas também não escapariam de uma dolorosa derrota nos de luta mas também de derrotas e repressão E no entanto a repressão não foi monolítica desde o início nem sua evolução linear Entre as forças heterogêneas que apoiaram a deposição de Goulart as contradições logo surgiram a respeito da natureza que deveria revestir a intervenção militar e do tipo de projeto de desenvolvimento a ser imposto no país As divergências se exprimiram na disparidade entre o discurso que prestava homenagem aos valores liberaldemocráticos adotado inclusive pelos generais que se sucediam no poder e a prática de um regime de exceção que se acentuou até tomar a forma do Ato Institucional nº 5 AI5 No meio tempo sucederamse querelas e crises entre os vencedores Disso se aproveitaria o movimento estudantil É certo que a polícia atacou sempre suas manifestações mas por outro lado a ditadura parecia às vezes hesitar Além disso a própria legislação em certo grau e num dado período protegia as vítimas do arbítrio É que os estudantes pertenciam à classe média base social importante do golpe militar Caberia portanto contemporizar preservar seu apoio As declarações de respeito à democracia e os compromissos passados com aliados de todo o tipo também importiam um certo grau de tolerância às vozes da oposição consentida Daí a linha de ziguezagues e as incertezas atribuídas por muitos a supostas divisões entre linha dura e linha moderada Cassavam lideranças mas limitavam o próprio poder de cassar Afastavam juízes e castravam suas funções mas não as extinguiriam de todo Liquidavam os velhos partidos mas propunham a criação imediata de novos Reduziam os poderes do Congresso e até fechavam o Parlamento mas o continuavam caracterizando como fonte de poder e instância legitimadora para a eleição dos próprios generaispresidentes Instauravam o Estado de exceção mas faziam aprovar uma Constituição preparada a toque de caixa por uma comissão submissa ao generalpresidente de plantão Quando o general Costa e Silva investiuse no poder em 1967 con centrando os superpoderes conferidos pela Constituição imposta ao país dois meses antes afirmou sem sorrir que se comprometia a construir um país humano e democrático Uma abertura Ou mais um ziguezague As ilusões dissiparamse em 1968 No decorrer do ano a linha da política repressiva estaria sempre em ascensão salvo em raros momentos Quando o estudante do Calabouço morreu baleado no Rio alguns ainda puderam atribuir o crime a um policial isolado Mas nos dias seguintes a repressão mataria outro estudante em Goiânia Desde então e executada a semana de liberdade das passeatas em junho a repressão policial continuaria dissolvendo a tiros as passeatas banalizando a morte nas ruas No segundo semestre embora o movimento já estivesse em declínio continuou sendo violentamente atacado A repressão não se limitária à ação dos policiais Um de seus aspectos mais agressivos se revelaria através dos grupos paramilitares atuando à sombra da própria lei Bombas em teatros do Rio e São Paulo em editoras jornais faculdades espaços culturais instituições de oposição ao regime sequestros e espancamentos de artistas e estudantes Dezenas de ações que se sucederam sem que a responsabilidade de uma única fosse apurada Em dois momentos pelo menos seria possível tomar conhecimento detalhado dessas operações Em 1º de setembro a polícia paulista prendeu um cidadão chamado Sabato Dinotos também conhecido por Aladino Félix O homem confessou exercer a chefia de um grupo de soldados e graduados da Força Pública que havia cometido dezenas de atentados e assaltos em São Paulo Acusou o general José Paulo Trajano como mandante e envolveu nas acusações o general Freitas do Departamento da Polícia Federal subordinado direto da Casa Militar da Presidência da República chefiada pelo general Jayme Portela também secretáriogeral do Conselho de Segurança Nacional Em algum lugar as investigações subseqüentes emperraram e dias depois por uma distração dos carcereiros o presumido chefe do grupo terrorista simplesmente sumiu da cadeia O outro escândalo foi denunciado da tribuna do Parlamento e envolveu a utilização de uma tropa de elite da Aeronáutica o ParaSar na prática de missões criminosas O ministro da Aeronáutica desmentiu a denúncia mas oficiais e praças do ParaSar serviço especializado em salvamentos a confirmariam Teriam sido de fato em abril convocados pelo brigadeiro João Paulo Burnier chefe do Serviço de Informações da Aeronáutica para executar ações terroristas explosão A peça Roda viva transformouse em autêntico show depravado Como se não bastasse conclama o público burguês a se levantar incitandoo a derrubar a ditadura que se implantou no Brasil Num processo de ridicularização apresenta artistas com indumentárias de sacerdote soldados e inclusive a Virgem Maria sendo possuída pelo anjo Há cenas de mulheres com mulheres e homens com homens e muito palavreado subversivo Do despachado da Polícia Federal em outubro proibido em todo o território nacional a peça Roda viva O entendimento perfeito entre o governo e as classes trabalhadoras e estudantes existirá no meu governo por obrigação e não por favor Presidente Costa e Silva em março do gásometro no Rio eliminação de lideranças estudantis e políticas nacionais que seriam atribuídas a partidos de esquerda O superior imediato dos denunciantes confirmou os fatos e solicitou abertura de inquérito Ora as autoridades preferiram defender os denunciados prendendo e demitindo de seus postos os denunciantes Nos dois episódios estabeleceuse a cumplicidade entre os responsáveis pela lei e a ilegalidade entre a autoridade e o crime Também no plano institucional o regime se fechava Logo no começo do ano a Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional recebeu por decreto novos e amplos poderes A oposição extraparlamentar a Frente Ampla foi proibida pelo Ministério da Justiça Em junho aprovouse o instituto das sublegendas para garantir o partido do governo Depois veio a proibição das passeatas estudantis e os quatro exércitos seriam chamados a participar do controle da ordem pública Em setembro pela primeira vez e já sob determinação dos tribunais militares foram condenados quatro estudantes a penas de até dois anos de prisão por terem supostamente incendiado um camburão O cerco se fechava O desfecho veio com a representação dos ministros militares requerendo abertura de processo contra o deputado Márcio Moreira Alves por ter em discurso ofendido a honra das Forças Armadas Quando o Congresso no uso de suas atribuições legais negou a autorização disparouse o AI5 Reinstauravase o Estado de exceção agora sem prazos sem autoimunidades de nenhum tipo Não se sustenta portanto a idéia ou a tese de que o fechamento foi uma reação a pressões políticas insuportáveis Como se o governo estivesse acuado por forças descontroladas e tivesse recorrido ao AI5 como última linha de defesa Nem é possível acreditar que as investidas dos movimentos sociais cada vez mais enfraquecidas tenham feito tremer o governo militar Na verdade o governo não estava ameaçado nem acuado ao contrário mantinha a ofensiva E precisava do AI5 para levar às últimas conseqüências o modelo de desenvolvimento econômicosocial em vigor O AI5 aferrolhou mais ainda a sociedade mas foi sobretudo uma decantação de alianças um golpe dentro do golpe Suportamos seus efeitos até hoje E as suas conseqüências se prolongarão ainda por muitos anos Os movimentos sociais no Brasil só podem ser compreendidos no contexto dos acontecimentos que se desenrolaram em nosso país Apenas a máfé poderia vêlos como expressão de centrais subversivas movendo cordéis secretos pelo mundo afora Mas isso não significa que não recebessem influxos e inspirações nem que determinados processos internacionais deixassem de marcar com seu magnetismo as imaginações os programas e as formas de luta aqui adotadas Mesmo porque 1968 foi um ano de paixões desencadeadas em todo o mundo Seria difícil inventariar as influências Mas é possível ressaltar certas linhas de força Em torno delas se formavam mitos e utopias Em primeiro lugar o Vietnã A Guerra do Vietnã se arrastava desde os anos 1940 Mas a intervenção norteamericana alcançando o ponto máximo exatamente em 1968 polarizou as atenções de todo o mundo sobre um pequeno povo que enfrentava a força da maior potência mundial Dessa luta era possível extrair muitas conclusões Os que lutavam no Brasil naturalmente tratavam de selecionar as mais aptas a confirmálos em suas opções A guerra popular no Sudeste asiático sugeria a idéia de que a fraqueza militar era algo relativo que uma dada correlação de forças podia ser alterada desde que houvesse união do povo determinação e organização Eram estes aliás segundo Giap e Ho Chi Minh os fatores essenciais da vitória O ser humano era mais importante do que a técnica A vontade política valia mais do que as máquinas Um guerrilheiro com um bom fuzil podia mais do que uma superfortaleza voadora da força aérea norteamericana Os relatos da guerra mostravam como as forças revolucionárias multiplicavamse fortaleciamse a partir do nada até alcançar o nível de resistência que aparava os golpes da máquina de guerra dos Estados Unidos Uma guerra justa moralmente justa seria inevitavelmente vitoriosa Os mais impacientes ainda apontariam uma lição maior a luta do Vietnã era de vida ou morte armada um enfrentamento decisivo não comportava os meiostermos os tons cinzentos as vacilações Essas idéias não flutuavam no ar encarnavamse em experiências práticas O Vietnã fervilhava nos meios de comunicação e através deles vieram as notícias da ofensiva do Tet anonovo lunar desfechada em 30 de janeiro de 1968 No exato momento em que os Estados Unidos defendiam a tese de que a guerra estava sob controle que poderia até mesmo ser vencida mais de 50 mil guerrilheiros brotavam da terra para atacar capitais provinciais tomar cidades importantes e de forte simbolismo como Huê antiga capital imperial investir contra a própria capital do país Saigon tomando por seis horas a embaixada dos Estados Unidos Mais que o feito militar contou o impacto psicológico A coesão do povo norteamericano já abalada não pôde mais ser recuperada Afloraram amargos debates sobre as responsabilidades da guerra surgiria a revolta da juventude O próprio presidente Lyndon Johnson foi politicamente constrangido a renunciar à disputa de mais um mandato As negociações de paz começaram em maio em Paris Embora elas ainda fossem durar mais sete anos a guerra fora decidida pela ofensiva do Tet Outras guerrilhas retomariam as lições do Vietnã Da África negra chegavam notícias de movimentos armados Zimbábue Namíbia Angola GuinéBissau Moçambique Davam conta de avanços moleculares mas sólidos lutas prolongadas invariáveis Era preciso lutar a vitória viria com o tempo apesar do tempo A mensagem era tão forte que os reveses da guerrilha latinoamericana eram simplesmente recusados Antes de 1968 já estavam praticamente liquidadas as experiências guerrilheiras na Argentina Paraguai Peru Venezuela sem falar no desastre maior a morte de Che Guevara nas selvas da Bolívia Em 1968 continuaram os desastres a morte do líder do Exército de Libertação Nacional na Colômbia Os relatos dos salvados da guerrilha de Che refugiados no Chile O frustrado desembarque de um grupo guerrilheiro no Haiti Na Guatemala o anúncio da morte de Cesar Montes e o frustrado sequestro do embaixador norteamericano John Gordon Mein morto na ação Os fracassos foram sumariados nas páginas do diário de Che Guevara Durante quase um ano ele anotou as dificuldades e os problemas que cercavam e condicionavam o foco guerrilheiro que apesar de todo o seu talento militar seria derrotado de forma fulminante pelos rangers bolivianos Mas a morte de Che seria menor do que sua legenda O heroísmo de CHE ESTA NA UhB sua dedicação continuaria sendo exaltado nos cartazes e bandeiras das passeatas nas pichações e no coro dos estudantes E o fracasso da guerrilha foi absolvido pelo heroísmo do guerrilheiro As suas palavras de encorajamento criar um dois três muitos Vietnãs falariam mais alto do que a derrota da alternativa que propunha ou do que o silenciamento de seu fuzil Entretanto os enfrentamentos de 1968 nem sempre assumiram a forma de conflitos guerrilheiros Por toda a parte levantaramse movimentos sociais com diferentes padrões de atuação diversas referências mas que de uma forma ou de outra questionavam a ordem vigente A sociedade norteamericana foi atingida por uma onda de descontentamento que modelaria toda uma geração Duas vertentes se destacaram o movimento dos negros e o movimento estudantil Desde 1967 incêndios e saques em cidades norteamericanas anunciavam o desespero em que se encontravam os negros sempre discriminados e empobrecidos Em 1968 o movimento ganhou força sob a liderança do reverendo Martin Luther King líder pacifista da luta pela conquista de iguais direitos civis para todos os cidadãos norteamericanos independentemente da cor da pele de cada um Entretanto um atentado racista silenciou Luther King quando se preparava em começos de abril mais uma passeata Milhares de pessoas se manifestaram em protesto contra a intolerância e em homenagem ao líder assassinado Mais de 100 mil pessoas presenciaram seu enterro Seus conselhos porém sempre favoráveis à utilização de métodos não violentos não conteriam a revolta e a indignação durante quase uma semana 125 cidades em 28 estados seriam novamente atingidas pelos incêndios pela destruição pelas mortes A influência dos Panteras Negras e de sua proposta de luta armada cresceria com o desespero Um mês depois tomaria corpo mais uma das iniciativas de Luther King embora não mais com sua presença a marcha do povo pobre em Washington reunindo os deserdados da sociedade norteamericana vítimas da discriminação no emprego na habitação na educação negros chicanos portoriquenhos índios Lado a lado exigiam a consideração e o respeito devidos a seres humanos O mês de abril também foi acecido pelo movimento dos estudantes revoltados contra a hipótese de morrer no Vietnã Sucederase as ocupações de universidades Cornell Boston Ohio Berkeley Columbia E os conflitos com os policiais de São Francisco a Nova York Em fins do mês um dia nacional de luta reuniria milhares de manifestantes contra a guerra em 17 cidades quase 100 mil somente em Nova York Um outro ponto culminante ocorreu em agosto na Convenção do Partido Democrata em Chicago quando a polícia atacou de forma violenta os jovens que vinham protestar contra o partido responsável pela política que atolara os Estados Unidos numa guerra suja e sem esperança Os estudantes fugiam à conscrição Os negros se sabiam discriminados também na morte porque morriam muito mais na guerra proporcionalmente Da composição decorreria uma aliança de interesses visível nas manifestações de rua Outros movimentos cresceram Os presidiários capturavam reféns bloqueavam pavilhões chamavam a atenção da opinião pública para o tratamento que lhes era dispensado Revoltavamse nas penitenciárias de Oregon Raleigh Ohio Colúmbia Atlanta Os homossexuais denunciavam a discriminação que sofriam reivindicavam liberdade mostravam a hipocrisia da sociedade formavam organizações próprias As mulheres faziam renascer o feminismo mais amplo e abrangente que as campanhas passadas Da diferença entre os sexos não poderia derivar a desigualdade no trabalho nos postos de responsabilidade no salário no enfrentamento das tarefas do cotidiano no tratamento dos filhos Revoltavamse contra o machismo sufocante que negava na prática o discurso e os códigos democráticos Foi um tempo de desafios de liberação sexual de mani How many years can some people exist Before they are allowed to be free How many times can a man turn his head And pretend that he just doesnt see The answer my friend is blowing in the wind The answer SÍNTESE CRÍTICA Os anos vão passando e através desse processo se formos analisar cada momento traz consigo modelagens e adaptações Essas mudanças estão relacionadas aos nossos gostos musicais gestos crenças estilos de vida comportamentos e assim por diante A mudança de cada um reflete na sociedade em que vivemos atinge o meio social e político O ano de 1968 foi de grandes mudanças e polêmicas dentre elas a revolução estudantil A proposta era reivindicar maiores quantidades de verbas para as universidades cujo objetivo era melhorar a estrutura das universidades seus espaços físicos e a capacitação dos Professores que ali lecionavam além de potencializar o auxílio estudantil relacionado a bolsas de estudo e assistência médica Essa época foi marcada pela voz dos estudantes A partir desse momento outros nichos começaram a lutar por seus direitos e uma sociedade mais democrática Houveram diversas manifestações que tiveram que ser controladas pela polícia Esse movimento social estendeuse pelo país O foco era a política educacional A partir do posicionamento político e social demonstrado pelas práticas políticas houve desacordo entre estudantes e policiais o que gerou grande conflito Houve um grande conflito entre universidades públicas e universidades particulares Dessa forma se instalou um conflito que perduraria por anos após a democratização e os donos do poder Além das manifestações eram feitas greves Se concentravam nas faculdades até que duas reivindicações fossem atendidas Por consequência alguns estudantes acabavam sendo presos Para continuar combatendo as normas políticas e sociais não democráticas era necessário que os estudantes criassem formas de luta organizadas Cada um lutava por seus direitos através da sua forma os estudantes e professores faziam passeatas e protestos os músicos compunham canções relacionadas a sua insatisfação e os eventos de médio e grande porte propunham questionamentos aos seus ouvintes e participantes Mais adiante o conflito se estendeu para religiosos e políticos De um lado os religiosos denunciavam a miséria do povo e as injustiças sociais Do outro lado os donos do poder enfáticos em suas posturas e dizerem políticos sociais não democráticos Foi um momento de grande repressão aos direitos humanos A quantidade de pessoas insatisfeitas com a legislação só aumentava Diante disso uma nova sociedade estava sendo construída Foram criados sindicatos para os trabalhadores A partir da consolidação de partidos políticos aparentemente os estudantes tinham sintonia com os partidos de esquerda Entretanto os partidos não buscavam ser regidos pelos estudos e sim direcionálos Seus objetivos eram revolucionar o sistema brasileiro gerando assim o socialismo Essa nova geração estimulou muitos outros povos aos questionamentos homossexuais denunciavam a discriminação que sofriam as mulheres requeriam igualdade de direitos em relação aos homens Posteriormente a passeatas começaram a ser proibidas em que o Exercito seria chamado para promover a ordem pública Sendo assim quatro estudantes foram condenados Diante disso as autoridades respondiam com desprezo e intolerância
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ISBN 9788522506811 Copyright Daniel Aarão Reis e Pedro de Moraes Direitos desta edição reservados à EDITORA FGV Rua Jornalista Orlando Dantas 37 22231010 Rio de Janeiro RJ Brasil Tels 0800217777 2125594427 Fax 2125594430 email editorafgvbr pedidoseditorafgvbr web site wwwfgvbreditora Impresso no Brasil Printed in Brazil Todos os direitos reservados A reprodução não autorizada desta publicação no todo ou em parte constitui violação do copyright Lei n 961098 Os conceitos emitidos neste livro são de inteira responsabilidade dos autores 1a edição 1988 2a edição revista e atualizada 1998 3a edição revista e atualizada 2008 PREPARAÇÃO DE ORIGINAIS Maria Lucia Leão Velloso de Magalhães EDITORAÇÃO ELETRÔNICA FA Editoração Eletrônica REVISÃO Fatima Caroni e Marco Antonio Corrêa ILUSTRAÇÕES Claudio Mesquita CAPA Sérgio Campante FOTOS DE CAPA E 4a CAPA Pedro de Moraes Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Mario Henrique SimonsenFGV Reis Filho Daniel Aarão 1946 1968 a paixão de uma utopia Daniel Aarão Reis e Pedro de Moraes 3 ed rev e atual Rio de Janeiro Editora FGV 2008 268 p Inclui bibliografia I Movimentos estudantis Brasil 1968 2 Estudantes Atividades políticas Brasil 1968 I Moraes Pedro de II Fundação Getulio Vargas III Título CDD 32244 O ano mágico Daniel Aarão Reis Lembra o tempo que você sentia e sentir era a forma mais sábia de saber e você nem sabia Alice Ruiz J á se passaram 20 anos quase o tempo de uma geração um raio leve na dimensão larga da história uma cicatriz nas pessoas que amadureceram e modelaram suas vidas sob o signo daquele ano mágico 1968 é um redemoinho de imagens atravessando a neblina do tempo Um mundo em movimento conflitos projetos e sonhos de mudança gestos de revolta lutas apaixonadas revolução nos costumes na música nas artes plásticas no comportamento e nas relações pessoais no estilo de vida e nas tentativas novas não só de derrubar o poder vigente mas de propor uma relação diferente entre a política e a sociedade O que se questiona de modo confuso e vago é a articulação da sociedade e suas grandes orientações seus propósitos seu modo de tentarse de mudar de sociedade e de vida No Brasil 1968 foi também um ano de tormentas com um personagem central a rebelião estudantil Estudantes universitários pouco mais de 200 mil menos de 05 da população quase todos filhos da classe média Ao seu lado o mais amplo e diferenciado contingente de estudantes secundaristas Por que lutavam e se rebelavam os estudantes em 1968 19 mouse numa sucessão de conflitos numa rebelião A rebelião veio germinando lentamente Em 1964 quando os militares derrubaram o governo constitucional de João Goulart contaram com o amplo apoio da classe média Os estudantes assistiram passivos ou respiraram aliviados diante da nova situação Na oposição apenas alguns núcleos esboçaram débil resistência logo dominada No dia seguinte à vitória do golpe os partidários mais extremados do novo regime queimaram o prédio da União Nacional dos Estudantes a UNE no Rio de Janeiro O governo organizou inquéritos policiais militares nas faculdades incentivando a delação No final do ano aprovouse a Lei Suplicy com o objetivo de controlar as entidades representativas do movimento estudantil Foram anos de perplexidade e dúvida para a classe média A frente de forças ampla e heterogênea que propôs e apoiou a derrubada de Goulart desejava uma intervenção militar rápida para salvar o país do comunismo do sindicalismo e da corrupção Ora o que tomava corpo era um projeto definido a hegemonia do grande capital internacional e associado apoiada num regime que assumia a forma de uma ditadura militar A classe média foi tomada pelo desencanto O golpe fora bemvindo para garantir a sua participação política Seus direitos e prerrogativas Para deter a inflação preservando porém o seu poder aquisitivo A política dos militares no entanto surpreendia Era aceitável o controle sobre a massa dos trabalhadores desde que não se cometesse excessos mas a repressão estava perdendo o rumo e a capacidade seletiva Atingia indistintamente lideranças populares os demagogos e pessoas de bem Além disso a política financeira provocava milhares de falências entre as pequenas e médias empresas O arrocho salarial não penalizava apenas os operários o que poderia ser lamentado mas compreendido mas alcançava todos os assalariados inclusive os de classe média A classe média sentiuse traída E sua amargura estimulou a luta e o protesto dos estudantes A rebelião tomava corpo Em 1965 houve os primeiros ensaios uma vaia ao generalpresidente Castelo Branco na Universidade Federal do Rio de Janeiro Um plebiscito nacional sobre a Lei Suplicy no qual a ampla maioria dos estudantes decidiu manter suas entidades fora do controle do governo Uma pequena passeata contra o Ato Institucional nº 2 também no Rio E a luta dos estudantes de Brasília em defesa da sua universidade ameaçada pela política do governo No ano seguinte o movimento transbordou para as ruas Em março em Belo Horizonte uma passeata de calouros foi atacada pela polícia O movimento de solidariedade tomou os principais centros estudantis Em meados do ano a UNE se reuniu na clandestinidade e elegeu nova diretoria No segundo semestre foi a vez da setembrada sequência de manifestações que agitaram as principais cidades do país em protesto contra a repressão Um fato provocou comoção a invasão da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro por tropas da Polícia Militar que espancaram e prenderam centenas de estudantes O ano de 1967 foi de refluxo mas o clima não era de derrota Ainda na clandestinidade a UNE conseguiu organizar seu congresso em São Paulo Houve lutas de importância regional O movimento estendiase em escala nacional articulavase melhor tateava caminhos 1968 amadurecia Os estudantes já compreendiam que a política educacional do governo era o avesso de suas reivindicações A universidade gratuita o governo antepunha a universidade paga Em vez de soluções originais para os problemas brasileiros o governo preferia os assessores e os acordos com os norteamericanos No lugar da ampliação das matrículas um ensino ainda mais seletivo nas universidades públicas a perspectiva do ensino pago a serviço das grandes empresas No lugar de uma política de assistência a revogação dos subsídios o fechamento dos restaurantes Por isso é que as entidades estudantis precisavam ser fechadas ou controladas As propostas de democratização da universidade e da educação entravam em rota de colisão com os objetivos dos donos do poder Um Conselho Nacional promovido pela UNE em começos de 1968 tentaria definir novos caminhos Todos desconfiavam do governo e se opunham à política educacional mas havia dúvidas quanto às opções de luta manter em primeiro plano as denúncias políticas tentando retomar as manifestações de rua de 1966 ou concentrar a atenção nos interesses imediatos da categoria estudantil evitando os enfrentamentos de rua e priorizando a luta nas escolas Nenhuma das duas orientações excluía a luta política ou a luta reivindicatória a luta geral ou a luta específica A diferença capital do ponto de vista do encaminhamento prático das lutas residia nas distintas ênfases e prioridades Por maioria apertada o Conselho Nacional pronunciouse pela segunda posição prioridade para as reivindicações imediatas e para a organização nas escolas e universidades Mas as divergências se mantiveram e reapaereciam no decorrer do ano que se iniciava 20 21 As primeiras lutas em janeiro e fevereiro mobilizaram os chamados excedentes e os estudantes do Calabouço Uns queriam mais vagas os outros a ampliação e a melhoria do restaurante que os servia As reivindicações opunhamse à política educacional do regime As manifestações foram combativas mas ninguém parecia supor que estava começando um ano fora do comum Em março o movimento por mais vagas cresceu O impulso vinha agora de São Paulo Estudantes de filosofia da USP da Fundação Getulio Vargas e da PUC acamparam nas respectivas reitorias No Rio o pessoal do Calabouço não aceitava as condições em que fora reaberto o seu restaurante Foi justamente numa das escaramuças em torno do Calabouço que surgiu o primeiro grande conflito social de 1968 Era uma quintafeira 28 de março entardia no Rio e os estudantes preparavam nova manifestação pelas ruas do centro da cidade armavam faixas e bandeiras desenhavam cartazes Os choques da polícia militar chegaram como sempre pretendendo fazer medo intimidar Receberam vaias e assobios Os policiais resolveram então invadir o restaurante e já o fizeram de armas na mão Diante da vaia agora ensurdecedora foram os policiais que se amedrontaram e começaram a atirar Mataram Edson Luís de Lima Souto E ainda feriram outros com tiros a esmo e pancadas dos cassetetes Depois fugiram Quem matou Edson Luís Por ordem de quem Perguntas sem resposta apesar dos rigorosos inquéritos Mas o crime não ficou sem resposta Os estudantes levaram o corpo para a Assembléia Legislativa funcionando então na Cinelândia E se recusaram a entregálo às autoridades que desejavam autopsiálo no Instituto Médico Legal receando que sumissem com o corpo Acampados na Assembléia os estudantes guardaram o corpo do colega enquanto a notícia da morte e a denúncia do crime circulavam pela cidade No dia seguinte a praça amanheceu tomada pelo povo O governo reitou a polícia das ruas e mais de 50 mil pessoas puderam enterrar a primeira de uma longa série de vítimas da violência policial Houve passeatas de protesto em todo o país Mas em Goiânia a polícia se permitiu atacar os manifestantes e invadir a catedral da cidade atirando em rapazes e moças que ali estavam refugiados matando mais um estudante No dia 1º de abril os estudantes resolveram comemorar a seu modo o quarto aniversário do regime militar No dia 4 as missas rezadas pelo sétimo dia da morte de Edson Luís registrariam novos choques violentos destacandose a cavalaria da polícia militar que atacou as pessoas na saída da Igreja da Candelária no Rio de Janeiro No restante do mês de abril e em maio houve um refluxo para as escolas para as lutas setoriais e locais O movimento refazia forças inventariava os problemas da universidade discutia reivindicações Sucederamse no entanto manifestações pequenos atos públicos comíciosrelâmpago greves Parecia que os estudantes não se haviam deixado abater Em alguns lugares lutas parciais anunciavam a possibilidade de novos conflitos Em junho o transbordamento das reivindicações para as ruas seria mais consistente e orgânico Expromia a maturação de uma discussão mais elaborada das reivindicações verbas vagas currículos métodos de ensino relações entre professores e alunos A política educacional do governo era o alvo principal da crítica Desde o dia 5 de junho 16 mil estudantes da Universidade Federal do Rio de Janeiro entraram em greve No dia 7 a União Estadual dos Estudantes de São Paulo promoveu uma concentração na Reitoria da USP que poucos dias depois seria ocupada O movimento não se limitava a denúncias gerais apresentava reivindicações precisas propunha diálogos setoriais com as autoridades universitárias e negociações globais com o Ministério da Educação Os dirigentes estudantis não eram 22 23 organizadas por estudantes e professores tornavase realidade Entretanto a abertura do segundo semestre escolar não poderia ocultar os sinais do refluxo natural de uma luta reivindicatória que esbarra num impasse a resistência a concessões por parte das autoridades e a impossibilidade de ulteriores avanços sem a remoção desse obstáculo Dois outros pontos contribuíram para o fenômeno de um lado o início em julho da luta aberta entre as correntes presentes no movimento estudantil pelo controle da renovação das entidades a ser realizada em agostosetembro As divergências voltavam a polarizar vanguardas e lideranças De outro a intensificação da repressão tentando aproveitar o refluxo para desarticular o movimento prisão de lideranças condenações de estudantes presos em passeatas mobilizações maciças de tropas para impedir manifestações invasões de universidades espancamentos utilização de forças parapoliciais para provocar e matar estudantes como o Comando de Caça aos Comunistas CCC Os estudantes tentavam articular respostas a cada provocação a cada agressão mas o próprio jogo de ações e reações parecia condenar um movimento em curva descendente Assim logo depois da prisão de Vladmir Palmeira no começo de agosto houve passeatas de protesto O mesmo ocorreu quando da invasão da Universidade de Brasília Nos primeiros dias de outubro em face da agressão do Comando de Caça aos Comunistas à Faculdade de Filosofia da USP novas passeatas seriam organizadas Mas as mobilizações reuniam cada vez menos gente e enfrentavam uma reação policial cada vez mais forte Protestos contra assassinatos resultavam em mais assassinatos As mortes em manifestações públicas tornaramse anônimas banais Foi então que houve o Congresso da UNE em Ibiúna São Paulo onde os estudantes resolveram realizar também na clandestinidade mais uma reunião de sua entidade nacional Iniciado em 11 de outubro o congresso foi estourado pela polícia no dia seguinte Cerca de 700 líderes estudantis foram presos numa só operação um desastre político tendo em vista o declínio em que se encontrava o movimento Ainda foi possível organizar pequenas manifestações de protesto Mas o grosso dos estudantes não mais respondia aos apelos Nessas condições de pouco valia convocar um Dia Nacional de Protesto em 22 de outubro A polícia já não hesitava em dissolver à bala manifestações pacíficas invadir igrejas e hospitais Sua ação provocava desânimo e medo em vez de indignação A insistência em responder nas ruas a cada desafio conduziria apenas ao isolamento de algumas centenas de estudantes que já não eram acom A gente sabia que eram estudantes e ouvia no rádio que eles estavam atacando Brasília Podiam proclamar a República e ai Mas ninguém estava querendo ir na cidade falar com a polícia Fui duas vezes e agora a gente pode ficar mais sossegado Os bandidos tão presos Eu vi lá ontem Miguel Góis caboclo de Ibiúna sobre o XXX Congresso dos Estudantes panhados nem mesmo pelos próprios colegas O refluxo consolidavase O movimento mais amplo perdia fôlego Era necessário inventar novas formas de luta e organização O movimento estudantil de 1968 estava derrotado s estudantes foram personagens centrais nas lutas de 1968 mas não os únicos Junto com eles formou uma comunidade de interesses estiveram profissionais liberais jornalisas escritores artistas e religiosos Participaram da denúncia do regime e das lutas sociais movidos pelo mesmo desencanto diante dos rumos que tomava o novo regime Desde 1964 insurgiramse contra a censura denunciaram os excessos da repressão o desmantelamento da Universidade de Brasília e a ofensiva contra as manifestações culturais e artísticas Artigos e colunas nos jornais filmes e peças de teatro manifestos à nação testemunham um movimento crescente de crítica uma atitude de desafio ao poder Em fins de 1965 um ato simbólico oito intelectuais erguem faixas de denúncia e protesto à entrada do generalpresidente Castelo Branco na reunião da Organização dos Estados Americanos OEA realizada no Hotel Glória no Rio Os músicos e compositores exprimiriam a insatisfação generalizada Os festivais de música popular e os shows musicais divulgariam temas indagações propostas que colocavam em questão o Brasil oficial incentivando a crítica e a rebeldia Em 1967 o lançamento de O rei da vela Oswald de AndradeJosé Celso Martinez Correa no teatro de Terra em transe Glauber Rocha no cinema e do movimento tropicalista Caetano Gil Tomzé e os Mutantes desenha o perfil de uma intelectualidade inassimiliada pelo discurso oficial Os artistas não pareciam atemorizados mantinhamse críticos e criativos Até quando o regime toleraria o desafio 27 Digitalizado com CamScanner 5 No principio de 1968 haveria no Rio o lançamento de Roda viva Chico BuarqueJosé Celso Martinez Correa a proposta de um teatro corrosivo e agressivo decidido a enfrentar preconceitos e a retirar o espectador de seu papel passivo e consumidor Um mês depois os artistas fechariam os teatros numa greve de protesto contra a censura O pessoal de teatro voltaria à greve em protesto contra o assassinato de Edson Luis em março Dali em diante em todas as grandes manifestações estudantis estariam presentes atores cineastas músicos escritores jornalisas e profissionais liberais Entre artistas e estudantes havia um intercâmbio permanente de energias Podese dizer que se estimulavam reciprocamente em suas buscas indagações e caminhos O público estudantil compunha em sua maioria a platéia participativa dos festivais de música das peças de teatro dos filmes e dos shows Além disso entre os estudantes multiplicavamse iniciativas que acompanhavam os passos dos artistas 1968 assistiria ao crescimento do movimento de cineclubes festivais de cinema e teatro estudantis sem falar nos jornais e revistas dos diretórios acadêmicos Intelectuais e estudantes também formaram uma comunidade de gostos inclinações e interesses na divulgação e defesa de novos valores e comportamentos que se opunham às preferências e políticas do poder político Distinguiase na aparência das roupas a revolução da minissaia na preferência pelas cores na comum hostilidade à rotinização da vida na procura de novos horizontes musicais de novas propostas de vida afetiva a revolução da pílula e de percepção da vida o consumo das drogas leves ampliavase suavemente entre os adeptos da paz e do amor Os artistas tiveram aqui um papel de vanguarda A crítica ao conservadorismo ultrapassava o domínio estrito do discurso político do poder para alcançar as raízes do comportamento das relações afetivas da vida cotidiana O intercâmbio entre estudantes e intelectuais se expressaria politicamente na Comissão dos Cem Mil legitimada em praça pública para conduzir o diálogo com as autoridades A intransigência das mesmas o refluxo do movimento estudantil e o ainda frágil vertebramento dos movimentos de artistas e intelectuais entre outros fatores contribuíram para fazer morrer o que seria por uma semana apenas o símbolo de uma proposta de organização popular de oposição Os estudantes ainda encontraram apoio entre os religiosos brasileiros mais um fenômeno de inversão de alianças A hierarquia da Igreja Católica abençoou o movimento que depôs o presidente Goulart Os terços e os tanques irmanaramse O objetivo é abrir uma série de Vietnãs no campo da cultura uma guerra contra a cultura oficial de consumo fácil O sentido da eficácia do teatro hoje é o sentido da guerrilha teatral e ser travada com as armas do teatro anárquico cruel grosso como a grosseira apatia em que vivemos José Celso Martinez Correa sobre a peça Roda viva O povo pobre tem direito a violência na defesa de seus direitos Declaração de 700 padres nas grandes marchas da Família com Deus pela Liberdade Rapidamente entretanto setores do episcopado e a própria hierarquia tomariam suas distâncias Mais tarde os rumos do capitalismo selvagem entrariam em rota de colisão com o processo que o catolicismo passou a viver em escala mundial A atualização da Igreja determinada pelo Concílio Vaticano II pelas encíclicas papais de João XXIII e de Paulo VI implicava opções incompatíveis com o regime que os militares e os capitalistas impunham ao país Já em 19651967 algumas ordens religiosas franciscanos dominicanos e beneditinos cediam prédios e igrejas para reuniões estudantis ile gais A UNE e muitas UEE rearticularamse freqüentemente graças à compreensão de representantes da religião católica Em 1968 não faltariam choques às vezes brutais entre os homens da religião e o poder Os religiosos denunciariam a miséria do povo a injustiça social a doutrina da segurança nacional que se transmuda em insegurança para a grande maioria E reclamariam reformas em primeiro lugar a reforma agrária compromisso assumido e esquecido pelos que lideraram a intervenção militar Denunciariam também repressão aos direitos humanos celebrados nos discursos e desrespeitados na prática Uma corrente progressista se destacou na hierarquia e entre os leigos Estaria presente nas passeatas nas greves operárias na Comissão dos Cem Mil Tentaria intermediar entre manifestantes e policiais abriria as portas de igrejas e seminários para missas de sétimo dia para reuniões políticas para abrigo de fugas E sofreria como os demais opositores os inquéritos as proibições as prisões A Conferência do Episcopado LatinoAmericano Celam em fins de agosto de 1968 em Medellín na Colômbia confirmaria opções pelas mudanças pela justiça social pela liberdade Tomaria então corpo a Teologia da Libertação que procurava sintetizar a crítica social marxista e os princípios cristãos Não faltaram padres e leigos desiludidos com as 28 Manchete mais apenas portavozes de um descontentamento difuso mas lideranças de aspirações enraizadas no cotidiano de estudantes e professores Dai sua legitimidade e o melhor nível de organização demonstrado por universidade por faculdade em cada turma As lutas radicalizaramse ao mesmo tempo em vários centros greves ocupação de faculdades manifestações concentrações Os estudantes reclamavam definições e exigiam diálogo As autoridades negaceavam A polícia reprimia No dia 20 de junho no Rio de Janeiro reunidos na Reitoria da UFRJ numa assembléia que durou cerca de oito horas os estudantes quase obrigaram os professores do Conselho Universitário a discutir sobre os problemas da universidade e da educação no país Na rua a polícia cercou a universidade alegando ordens para prender líderes estudantes De nada serviu a intermediação dos próprios professores A polícia preparavase para reeditar a invasão da Praia Vermelha em setembro de 1966 Mas os estudantes não se dispuseram a esperar o fechamento do cerco Armados de paus e pedras forçaram a saída em meio a nuvens de gás lacrimogêneo tiros e bombas de efeito moral Centenas deles porém foram presos e encurralados no estádio de futebol do Botafogo na rua General Severiano Ali sofreram o vexame do espancamento da identificação policial do medo e da angústia As fotografias dessas cenas divulgadas pelos jornais provocariam a revolta No dia seguinte houve a sextafeira sangrenta Os estudantes protestaram contra os acontecimentos do dia anterior e já se dispersavam quando a polícia chegou atirando para ferir e matar Muitos morreram nessa tarde de sangue Dessa vez no entanto a cidade reagiu como pôde usando paus pedras objetos contundentes jogados do alto das janelas fios de arame para derrubar os cavalos A batalha durou mais de sete horas e levou à prisão mais de mil pessoas Mas a polícia também foi obrigada a contar suas baixas um morto 35 feridos mais de 10 camburões incendiados A gente é contra essa estrutura e na rua a ditadura tem medo da gente porque são o quê da voz do povo e da voz dos estudantes sai a condenação dos grandes donos dos grandes exploradores deste país Vladimír Palmeira na Passeata dos 50 Mil Não sou mágico que cria avanços e recuos fabrica passeatas Quem faz isso são os estudantes Vladimir Palmeira Enquanto isso a polícia cercava e invadia novamente a Universidade de Brasília Em São Paulo os estudantes ocupavam a Faculdade de Filosofia dispostos a lá permanecerem até que suas reivindicações fossem atendidas A combatividade ganhava outros focos dia 24 em Fortaleza Belo Horizonte e Porto Alegre Os estudantes do Rio convocavam nova passeata para quartafeira 26 de junho O governo mais uma vez cederia à pressão da opinião pública a polícia voltou a desaparecer das ruas Estavam criadas as condições para a Passeata dos 100 Mil O povo voltou a ocupar as ruas e praças públicas com calma pacificamente apresentando reivindicações e denúncias Uma comissão dos Cem Mil foi designada para dialogar com o governo reunindo representantes dos estudantes dos profissionais liberais dos professores dos religiosos e das mães dos estudantes Mas a negociação não avançou pois o governo recusavase a considerar uma reivindicação preliminar a liberação dos presos em passeatas anteriores Rompidas as conversações o Rio ainda assistiria a uma última manifestação pacífica a dos 50 mil em 3 de julho O movimento parecia ter chegado a um impasse embora conservando força e entusiasmo em Fortaleza Salvador São Paulo A ocupação da Faculdade de Filosofia e do Conjunto Residencial da USP ensejava novas experiências os estudantes formavam grupos de estudo e pesquisa discutiam os currículos constituíamse em gestores da vida cotidiana da faculdade A reinvindicação das comissões paritárias 24 Manchete Pedro de Moraes mais apenas portavozes de um descontentamento difuso mas lideranças de aspirações enraizadas no cotidiano de estudantes e professores Dai sua leigitimidade e o melhor nível de organização demonstrado por universidade por faculdade em cada turma As lutas radicalizaramse ao mesmo tempo em vários centros greves ocupação de faculdades manifestações concentrações Os estudantes reclamavam definições e exigiam diálogo As autoridades negaceavam A polícia reprimia No dia 20 de junho no Rio de Janeiro reunidos na Reitoria da UFRJ numa assembléia que durou cerca de oito horas os estudantes quase obrigaram os professores do Conselho Universitário a discutir sobre os problemas da universidade e da educação no país Na rua a polícia cercou a universidade alegando ordens para prender líderes estudantes De nada serviu a intermediação dos próprios professores A polícia preparavase para reeditar a invasão da Praia Vermelha em setembro de 1966 Mas os estudantes não se dispuseram a esperar o fechamento do cerco Armados de paus e pedras forçaram a saída em meio a nuvens de gás lacrimogêneo tiros e bombas de efeito moral Centenas deles porém foram presos e encurralados no estádio de futebol do Botafogo na rua General Severiano Ali sofreram o vexame do espancamento da identificação policial do medo e da angústia As fotografias dessas cenas divulgadas pelos jornais provocariam a revolta No dia seguinte houve a sextafeira sangrenta Os estudantes protestaram contra os acontecimentos do dia anterior e já se dispersavam quando a polícia chegou atirando para ferir e matar Muitos morreram nessa tarde de sangue Dessa vez no entanto a cidade reagiu como pôde usando paus pedras objetos contundentes jogos do alto das janelas fios de arame para derrubar os cavalos A batalha durou mais de sete horas e levou à prisão mais de mil pessoas Mas a polícia também foi obrigada a contar suas baixas um morto 35 feridos mais de 10 camburões incendiados A gente é contra essa estrutura e na rua a ditadura tem medo da gente porque são o da voz do povo e da voz dos estudantes sai a condenação dos grandes donos dos grandes exploradores deste país Vladímir Palmeira na Passeata dos 50 Mil Não sou mágico que cria avanços e recuos fabrica passeatas Quem faz isso são os estudantes Vladimír Palmeira Pedro de Moraes Enquanto isso a polícia cercava e invadia novamente a Universidade de Brasília Em São Paulo os estudantes ocupavam a Faculdade de Filosofia dispostos a lá permanecerem até que suas reivindicações fossem atendidas A combatividade ganhava outros focos dia 24 em Fortaleza Belo Horizonte e Porto Alegre Os estudantes do Rio convocavam nova passeata para quartafeira 26 de junho O governo mais uma vez cederia à pressão da opinião pública a polícia voltou a desaparecer das ruas Estavam criadas as condições para a Passeata dos 100 Mil O povo voltou a ocupar as ruas e praças públicas com calma pacificamente apresentando reivindicações e denúncias Uma comissão dos Cem Mil foi designada para dialogar com o governo reunindo representantes dos estudantes dos profissionais liberais dos professores dos religiosos e das mães dos estudantes Mas a negociação não avançou pois o governo recusavase a considerar uma reivindicação preliminar a liberação dos presos em passeatas anteriores Rompidas as conversações o Rio ainda assistiria a uma última manifestação pacífica a dos 50 mil em 3 de julho O movimento parecia ter chegado a um impasse embora conservando força e entusiasmo em Fortaleza Salvador São Paulo A ocupação da Faculdade de Filosofia e do Conjunto Residencial da USP ensejava novas experiências os estudantes formavam grupos de estudo e pesquisa discutiam os currículos constituíamse em gestores da vida cotidiana da faculdade A reinvindicação das comissões paritárias 25 Digitalizado com CamScanner 3 Manchete Pedro de Moraes possibilidades de diálogo que se inclinariam pelo enfrentamento armado contra os regimes dominantes na América Latina e no Brasil A repressão e o isolamento social os alcançariam a todos artistas escritores professores profissionais liberais religiosos Seu movimento de protesto e crítica seria igualmente derrotado em 1968 O relato até o momento evidencia uma ausência a massa dos trabalhadores manuais A maioria do povo deste país como sentiu e como participou dos acontecimentos Os trabalhadores manuais ao contrário da classe média viveram a intervenção militar como um desastre Organizações sindicais sob intervenção lideranças em fuga presos Os políticos em quem confiavam ou votavam desapareceram do cenário cassados impedidos pela força de permanecer no jogo institucional Foi um desabamento de referências Um longo processo de aprendizado foi subitamente negado as lutas sindicais por reajustes salariais ritmadas pelos dissídios coletivos arbitradas pela Justiça do Trabalho marcadas pelas assembléias manifestações e greves de pressão A tolerância a cumplicidade ou o patrocínio do Estado mais ou menos amplos segundo as conjunturas mais ou menos generosos de acordo com os governantes A corte dos políticos sempre acentuada nos períodos eleitorais impondo concessões em troca do apoio verbas por votos Durante quase 20 anos e apesar das limitações da legislação trabalhista os trabalhadores urbanos e rurais desde fins dos anos 1950 foram construindo organizações formando lideranças ocupando um lugar no jogo político constituindose como interlocutores de fato e de direito A conquista de um simulacro de cidadania sob os governos de Vargas e Goulart mais do que os aumentos salariais eventuais mais do que os empregos fez dos trabalhadores adeptos das lideranças e da ideologia trabalhistas Essas mesmas razões levariam as elites sociais as Forças Armadas e a classe média à exasperação O golpe militar teria tido antes e acima de tudo uma função colocar os trabalhadores manuais em seus devidos lugares liquidar pela força o que havia sido conquistado em longas e incertas negociações O novo regime por isso mesmo não se limitaria a perseguir e a prender Elaboraria toda uma nova Há uma conspiração calada e eficaz contra a paz cujas causas se encontram no colonialismo interno e nos monopólios internacionais Uma violência institucionalizada no campo social Não devemos estranhar a tentação da violência É mais surpreendente a paciência de um povo que suporta durante anos uma condição que não aceitariam nunca os que têm uma consciência desenvolvida dos direitos humanos II Conferência Episcopal LatinoAmericana em Medellín Colômbia Se uma minoria conseguir empalmar greve por índice salarial acima do índice oficial e não oferecido espontaneamente pelos patrões ou essa minoria tem um dispositivo militar capaz de levar tudo de roldão ou não tem Se não o tem espere para ver o que vai dar Jarbas Passarinho ministro do Trabalho coronel quando da ameaça de greve dos bancários em Belo Horizonte legislação Derrubaria conquistas e erqueria barreiras à participação dos trabalhadores Lei de Greve Lei de Arrocho Salarial derrogação da estabilidade esvaziamento da Justiça do Trabalho exclusão dos trabalhadores do controle da previdência social Era preciso não só esmagar o que existia mas dificultar ao máximo um eventual renascimento A resistência foi débil A debilidade evidenciaria as carências do movimento dos trabalhadores Dependência do Estado e principalmente de lideranças carismáticas a quem tudo se pedia e de quem tudo se esperava Separação entre lideranças integradas em negociações e jogadas políticas mas desligadas de suas bases imersas em preocupações cotidianas de salários e condições de trabalho Divisões reais entre categorias profissionais lutas descoordenadas dispersas entre os trabalhadores do campo e da cidade Ausência de uma sólida organização nos locais de trabalho Não é difícil inventariar as causas de uma derrota depois que ela acontece A rearticulação seria lenta e quebradiça Exprimia num desenho tortuoso as tendências adquiridas ao longo do tempo e de difícil reversão sobretudo sob condições desfavoráveis No entanto a insatisfação e o descontentamento com as políticas do regime militar levariam a um processo de reconstrução molecular Daí emergiria o MIA Movimento Intersindical Antiarrocho um esboço de organização em 19661967 mas que não foi capaz de dirigir nenhuma luta de envergadura Faltavam bases sociais para tanto E então de surpresa viriam o movimento e as greves de 1968 Em Contagem cidade industrial perto de Belo Horizonte os operários cruzariam os braços em abril exigindo um reajuste acima das determinações da política salarial vigente Acabaram conseguindo um pequeno abono A greve parecia ressurgir como instrumento de conquistas reivindicatórias Nas comemorações do 1º de Maio Dia Internacional do Trabalho pela primeira vez depois de 1964 os trabalhadores saíram dos recintos fechados para os comícios de rua Em São Paulo o então governador Abreu Sodré compareceu com seus assessores mas quando desejou falar foi surpreendido por um núcleo de trabalhadores que o recebeu com vaias e pedras Só lhe restou refugiarse numa igreja próxima enquanto os trabalhadores tomavam e queimavam o palanque das autoridades Da praça da Sé os operários saíram em passeata também a primeira desde a instauração do regime militar Em julho seria a vez de Osasco centro industrial próximo de São Paulo Nova greve dessa vez com ocupação de empresas Os operários 30 31 reclamavam reajustes equivalentes à perda real provocada pela inflação Um contrato coletivo de trabalho Era promessa de novos reajustes trimestrais sempre acompanhando a inflação Reclamavam ainda da política salarial e criticavam o governo por sua atitude hostil em relação aos interesses dos trabalhadores Mas as autoridades estavam alertas e imediatamente decretaram a ilegalidade da greve criminalizaram o movimento anunciaram o nãopagamento dos dias parados ameaçaram com dispensas maciças e mandaram a polícia expulsar os operários das empresas ocupadas Além disso anunciaram a intervenção no sindicato e a prisão preventiva das lideranças A greve não durou mais do que três dias Ao longo do segundo semestre surgiram novas propostas de luta entre os bancários os metalúrgicos do Rio e de São Paulo uma segunda greve em Contagem dessa vez uma tentativa que cedo se frustrou Pequenos ensaios O governo acabaria analisando os movimentos como os últimos estreme cimentos de um adversário já fora de combate Para os estudantes as greves eram o prenúncio de novas e gigantescas batalhas Contagem e Osasco tornamse palavras mágicas anunciando enfrentamentos apocalípticos Centenas de jovens se mobilizaram em conseqüência venda de bônus distribuição de panfletos nas cidades e nas portas das fábricas solidariedade ativa Em São Paulo chegouse a organizar uma passeata estudantil de apoio à greve e mais de uma assembléia ouviria a voz de lideranças operárias que pela primeira vez cruzavam as portas das universidades para falar de suas reivindicações e aspirações As greves de 1968 não se reduziam a arrancos dispersos e derradeiros do movimento derrotado em 1964 Havia novas características organizações por locais de trabalho coordenação clandestina combinação entre o trabalho sindical e a organização nas bases das empresas lideranças jovens nenhum vínculo com o Estado e com os partidos políticos tradicionais Mas por outro lado não se confirmaria a previsão de que elas dariam origem a grandes lutas sociais A inércia e a dispersão prevaleceriam sobre o espírito de luta e o inconformismo das greves de Osasco e Contagem ainda falta falar de outro personagem não de todo evidente na crônica dos fatos os partidos políticos de esquerda Em certos momentos pareceu haver uma fusão de linhas entre os partidos de esquerda e o movimento estudantil Os partidos adquiriram feição estudantil dada a composição social da maioria dos militantes Além disso a força e a influência dos partidos dependiam em larga medida do movimento estudantil Por outro lado os partidos marcavam com suas concepções e iniciativas o ritmo e a dinâmica do movimento Seria difícil em 1968 encontrar uma liderança estudantil desvinculada de um partido de esquerda A relação íntima entre partidos e movimento não poderia fazer esquecer porém a autonomia de ambos marcada por característi32 33 cas próprias objetivos específicos distintos percursos Os partidos de esquerda foram brutalmente atingidos em 1964 obrigados dali em diante a agir na clandestinidade Foi doloroso enfrentar os novos tempos Não tanto devido às condições impostas pela repressão mas pela desorientação em que todos se encontravam Nos limites deste trabalho é impossível evidenciar as nuances que diferenciavam as correntes de esquerda mas é certo afirmar que todas depositavam enormes esperanças nos movimentos populares anteriores a 1964 e nenhuma esperava em conseqüência uma vitória tão rápida de seus inimigos Foi necessário rever conceitos e concepções Entretanto nas discussões que se abriram ganharia pouca força a perspectiva de se analisar em profundidade as bases sociais e históricas da derrota política Prevaleceu a inclinação pela busca de bodes expiatórios e pela crucificação dos culpados Entre os partidos a grande vítima foi o Partido Comunista Brasileiro o PCB O velho partido fundado em 1922 definiase pelas propostas de aliança com a burguesia nacional e pelo caminho pacífico para a obtenção das reformas de base que transformariam o país Acreditava no caráter irreversível da democracia brasileira e na força de um dispositivo militar nacionalista e legalista que impediria no nascedouro qualquer tentativa golpista A instauração do regime militar desmenteira seus cálculos e prognósticos Também aqui haveria um desabamento de referências O trabalhismo foi outro bode expiatório Responsabilizado pelo anestesiamento das massas seus líderes em fuga para o exílio eram culpados pela passividade do povo Chamados de populistas perderiam o respeito da crítica revolucionária posterior a 1964 Afirmaramse então concepções que primavam pela clareza e pela simplicidade O novo regime exprimia o que de mais retrógrado havia no país os interesses do grande latifúndio e das empresas imperialistas Estava portanto condenado a uma só política conter reprimir e afundar o país na estagnação Assim o povo cego abriria os olhos e despertaria do sono que lhe fora imposto pelos reformistas do PCB e pelos populistas do PTB O Brasil estava num impasse sem saída era um barril de pólvora prestes a explodir Tudo se resumia numa questão de tempo de pouco tempo Caberia aos partidos de esquerda apressar o momento do enfrentamento A luta armada aparecia então como a grande alternativa a solução para os problemas que atormentavam o país o povo e a esquerda Também entraram em crise os padrões de organização conhecidos O esquema piramidal do PCB baseado nas células e numa sucessão de comités dirigidos por um comitê central e por um secretáriogeral mais ou menos imitado pelos demais partidos foi associado à derrota criticado como incapaz de assumir a agilidade dos tempos novos que se anunciavam Caíram nesse contexto evidentes os dirigentes mais experimentados sua credibilidade foi a zero não resistindo à derrota de suas concepções políticas e partidárias Seguiramse a dispersão e a fragmentação orgânicas e a proliferação de siglas Um processo inevitável em larga medida tendose em vista o panorama da atomização em que se encontravam as forças sociais cujos interesses a esquerda pretendia representar Apesar de tudo os partidos de esquerda desempenharam papel decisivo nas entidades estudantis polarizando o movimento Em 1968 dois blocos se defrontariam de um lado a Ação Popular AP parcialmente apoiada pelo Partido Comunista do Brasil PCdoB e pelo Partido Comunista Brasileiro Revolucionário PCBR De outro as dissidências do PCB oriundas dos comitês universitários do velho partido aliadas à Organização Revolucionária Marxista Política Operária ORMPolop e em certos momentos ao próprio PCB As alianças no movimento estudantil estavam determinadas pelas concepções respectivas a respeito do papel dos estudantes no que todos entendiam ser o processo da revolução brasileira em marcha E pelas diferenças de ênfase na definição dos programas e nas escolhas das formas de luta O bloco liderado pela AP enfatizava as denúncias políticas gerais e as lutas de rua enquanto as dissidências e seus aliados preferiam concentrar a atenção nas lutas reivindicatórias e na articulação e organização nas escolas e nas universidades Mas os partidos não se diluíam nas alianças e blocos ao contrário lutavam para afirmar um perfil próprio e não seriam incomuns desavenças e enfrentamentos em cada bloco ou aliança É que todos os partidos na verdade viam horizontes mais amplos se queriam revolucionários e se proclamavam vanguardas de um processo inevitável de transformações sociais que cedo ou tarde desembocaria no socialismo De acordo com essas concepções o movimento estudantil era um e mais um terreno de lutas um elo numa corrente mais vasta um peção num jogo mais complicado e que tinha peças mais importantes É claro que na prática os partidos muitas vezes se deixavam arrastar e dominar pela dinâmica dos estudantes Mas não pretendiam ser regidos por eles ao contrário desejavam dirigilos segundo seus objetivos Daí vinha uma inclinação para instrumentalizar as aspirações ime 34 35 diatas estudantis Nesse sentido as organizações de vanguarda obedeciam à sua lógica intrínseca O movimento estudantil enquanto movimento social não teria sido capaz mesmo em 1968 de criar mecanismos de controle dos partidos de esquerda Em conseqüência sofreria os influxos negativos de suas orientações gerais A utopia da revolução imediata dos grandes e decisivos enfrentamentos que se aproximavam a ilusão de uma guerra iminente dificultaram enormemente a percepção da curva de declínio do movimento estudantil O mesmo ocorreria por ocasião das greves operárias de Contagem e Osasco superestimadas por sua localização ilusão no xadrez mais grandioso de um processo revolucionário que só existia no delírio da imaginação dos partidos de esquerda Duas organizações de vanguarda radicalizariam ainda mais suas expectativas revolucionárias a Ação Libertadora Nacional ALN e a Vanguarda Popular Revolucionária VPR Para elas a guerra já começara e o movimento estudantil não passava de um epifenômeno que se esgotaria em si mesmo Tratavase de preparar a guerrilha rural arrecadando fundos expropriando armas e explosivos realizando ações de propaganda As chamadas ações de meios recursos para as organizações e para a guerrilha rural que se pretendia desencadear começariam ainda antes de 1968 Bancos carros e trens pagadores casas de armas pedreiras com seus depósitos de dinamite algumas ações de propaganda mereceram destaque o carrobomba lançado em junho de 1968 contra o QuartelGeneral do II Exército em São Paulo o justiçamento do capitão do Exército norteamericano Charles Chandler em outubro também em São Paulo Coincidentemente mas não passou de uma coincidência o que não deixa de ser altamente simbólico ações realizadas em momentos decisivos vividos pelo movimento estudantil A primeira na madrugada seguinte à Passeata dos 100 Mil A segunda no próprio dia em que seria estourado o Congresso de Ibiúna Linhas paralelas não se cruzariam Para lideranças desanimadas com o declínio do movimento estudantil as ações guerrilheiras bem protegidas aparentemente eficazes e incapturáveis surgiam como uma alternativa A força gravitacional das organizações nelas empenhadas logo se faria sentir Num momento seguinte muitos partidos já organizavam grupos armados enquanto outros deslocavam os melhores militantes para o campo guerrilha rural e para as fábricas Essa verdadeira hemorragia de quadros seria um fator a mais do enfraquecimento E os partidos de esquerda não percebiam que estavam contribuindo para secar a fonte de apoio de que dispunham Pelas novas formas de ação e organização adotadas ainda teriam um tempo de sobrevida maior que o do movimento de onde retiravam força e influência Mas também não escapariam de uma dolorosa derrota nos de luta mas também de derrotas e repressão E no entanto a repressão não foi monolítica desde o início nem sua evolução linear Entre as forças heterogêneas que apoiaram a deposição de Goulart as contradições logo surgiram a respeito da natureza que deveria revestir a intervenção militar e do tipo de projeto de desenvolvimento a ser imposto no país As divergências se exprimiram na disparidade entre o discurso que prestava homenagem aos valores liberaldemocráticos adotado inclusive pelos generais que se sucediam no poder e a prática de um regime de exceção que se acentuou até tomar a forma do Ato Institucional nº 5 AI5 No meio tempo sucederamse querelas e crises entre os vencedores Disso se aproveitaria o movimento estudantil É certo que a polícia atacou sempre suas manifestações mas por outro lado a ditadura parecia às vezes hesitar Além disso a própria legislação em certo grau e num dado período protegia as vítimas do arbítrio É que os estudantes pertenciam à classe média base social importante do golpe militar Caberia portanto contemporizar preservar seu apoio As declarações de respeito à democracia e os compromissos passados com aliados de todo o tipo também importiam um certo grau de tolerância às vozes da oposição consentida Daí a linha de ziguezagues e as incertezas atribuídas por muitos a supostas divisões entre linha dura e linha moderada Cassavam lideranças mas limitavam o próprio poder de cassar Afastavam juízes e castravam suas funções mas não as extinguiriam de todo Liquidavam os velhos partidos mas propunham a criação imediata de novos Reduziam os poderes do Congresso e até fechavam o Parlamento mas o continuavam caracterizando como fonte de poder e instância legitimadora para a eleição dos próprios generaispresidentes Instauravam o Estado de exceção mas faziam aprovar uma Constituição preparada a toque de caixa por uma comissão submissa ao generalpresidente de plantão Quando o general Costa e Silva investiuse no poder em 1967 con centrando os superpoderes conferidos pela Constituição imposta ao país dois meses antes afirmou sem sorrir que se comprometia a construir um país humano e democrático Uma abertura Ou mais um ziguezague As ilusões dissiparamse em 1968 No decorrer do ano a linha da política repressiva estaria sempre em ascensão salvo em raros momentos Quando o estudante do Calabouço morreu baleado no Rio alguns ainda puderam atribuir o crime a um policial isolado Mas nos dias seguintes a repressão mataria outro estudante em Goiânia Desde então e executada a semana de liberdade das passeatas em junho a repressão policial continuaria dissolvendo a tiros as passeatas banalizando a morte nas ruas No segundo semestre embora o movimento já estivesse em declínio continuou sendo violentamente atacado A repressão não se limitária à ação dos policiais Um de seus aspectos mais agressivos se revelaria através dos grupos paramilitares atuando à sombra da própria lei Bombas em teatros do Rio e São Paulo em editoras jornais faculdades espaços culturais instituições de oposição ao regime sequestros e espancamentos de artistas e estudantes Dezenas de ações que se sucederam sem que a responsabilidade de uma única fosse apurada Em dois momentos pelo menos seria possível tomar conhecimento detalhado dessas operações Em 1º de setembro a polícia paulista prendeu um cidadão chamado Sabato Dinotos também conhecido por Aladino Félix O homem confessou exercer a chefia de um grupo de soldados e graduados da Força Pública que havia cometido dezenas de atentados e assaltos em São Paulo Acusou o general José Paulo Trajano como mandante e envolveu nas acusações o general Freitas do Departamento da Polícia Federal subordinado direto da Casa Militar da Presidência da República chefiada pelo general Jayme Portela também secretáriogeral do Conselho de Segurança Nacional Em algum lugar as investigações subseqüentes emperraram e dias depois por uma distração dos carcereiros o presumido chefe do grupo terrorista simplesmente sumiu da cadeia O outro escândalo foi denunciado da tribuna do Parlamento e envolveu a utilização de uma tropa de elite da Aeronáutica o ParaSar na prática de missões criminosas O ministro da Aeronáutica desmentiu a denúncia mas oficiais e praças do ParaSar serviço especializado em salvamentos a confirmariam Teriam sido de fato em abril convocados pelo brigadeiro João Paulo Burnier chefe do Serviço de Informações da Aeronáutica para executar ações terroristas explosão A peça Roda viva transformouse em autêntico show depravado Como se não bastasse conclama o público burguês a se levantar incitandoo a derrubar a ditadura que se implantou no Brasil Num processo de ridicularização apresenta artistas com indumentárias de sacerdote soldados e inclusive a Virgem Maria sendo possuída pelo anjo Há cenas de mulheres com mulheres e homens com homens e muito palavreado subversivo Do despachado da Polícia Federal em outubro proibido em todo o território nacional a peça Roda viva O entendimento perfeito entre o governo e as classes trabalhadoras e estudantes existirá no meu governo por obrigação e não por favor Presidente Costa e Silva em março do gásometro no Rio eliminação de lideranças estudantis e políticas nacionais que seriam atribuídas a partidos de esquerda O superior imediato dos denunciantes confirmou os fatos e solicitou abertura de inquérito Ora as autoridades preferiram defender os denunciados prendendo e demitindo de seus postos os denunciantes Nos dois episódios estabeleceuse a cumplicidade entre os responsáveis pela lei e a ilegalidade entre a autoridade e o crime Também no plano institucional o regime se fechava Logo no começo do ano a Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional recebeu por decreto novos e amplos poderes A oposição extraparlamentar a Frente Ampla foi proibida pelo Ministério da Justiça Em junho aprovouse o instituto das sublegendas para garantir o partido do governo Depois veio a proibição das passeatas estudantis e os quatro exércitos seriam chamados a participar do controle da ordem pública Em setembro pela primeira vez e já sob determinação dos tribunais militares foram condenados quatro estudantes a penas de até dois anos de prisão por terem supostamente incendiado um camburão O cerco se fechava O desfecho veio com a representação dos ministros militares requerendo abertura de processo contra o deputado Márcio Moreira Alves por ter em discurso ofendido a honra das Forças Armadas Quando o Congresso no uso de suas atribuições legais negou a autorização disparouse o AI5 Reinstauravase o Estado de exceção agora sem prazos sem autoimunidades de nenhum tipo Não se sustenta portanto a idéia ou a tese de que o fechamento foi uma reação a pressões políticas insuportáveis Como se o governo estivesse acuado por forças descontroladas e tivesse recorrido ao AI5 como última linha de defesa Nem é possível acreditar que as investidas dos movimentos sociais cada vez mais enfraquecidas tenham feito tremer o governo militar Na verdade o governo não estava ameaçado nem acuado ao contrário mantinha a ofensiva E precisava do AI5 para levar às últimas conseqüências o modelo de desenvolvimento econômicosocial em vigor O AI5 aferrolhou mais ainda a sociedade mas foi sobretudo uma decantação de alianças um golpe dentro do golpe Suportamos seus efeitos até hoje E as suas conseqüências se prolongarão ainda por muitos anos Os movimentos sociais no Brasil só podem ser compreendidos no contexto dos acontecimentos que se desenrolaram em nosso país Apenas a máfé poderia vêlos como expressão de centrais subversivas movendo cordéis secretos pelo mundo afora Mas isso não significa que não recebessem influxos e inspirações nem que determinados processos internacionais deixassem de marcar com seu magnetismo as imaginações os programas e as formas de luta aqui adotadas Mesmo porque 1968 foi um ano de paixões desencadeadas em todo o mundo Seria difícil inventariar as influências Mas é possível ressaltar certas linhas de força Em torno delas se formavam mitos e utopias Em primeiro lugar o Vietnã A Guerra do Vietnã se arrastava desde os anos 1940 Mas a intervenção norteamericana alcançando o ponto máximo exatamente em 1968 polarizou as atenções de todo o mundo sobre um pequeno povo que enfrentava a força da maior potência mundial Dessa luta era possível extrair muitas conclusões Os que lutavam no Brasil naturalmente tratavam de selecionar as mais aptas a confirmálos em suas opções A guerra popular no Sudeste asiático sugeria a idéia de que a fraqueza militar era algo relativo que uma dada correlação de forças podia ser alterada desde que houvesse união do povo determinação e organização Eram estes aliás segundo Giap e Ho Chi Minh os fatores essenciais da vitória O ser humano era mais importante do que a técnica A vontade política valia mais do que as máquinas Um guerrilheiro com um bom fuzil podia mais do que uma superfortaleza voadora da força aérea norteamericana Os relatos da guerra mostravam como as forças revolucionárias multiplicavamse fortaleciamse a partir do nada até alcançar o nível de resistência que aparava os golpes da máquina de guerra dos Estados Unidos Uma guerra justa moralmente justa seria inevitavelmente vitoriosa Os mais impacientes ainda apontariam uma lição maior a luta do Vietnã era de vida ou morte armada um enfrentamento decisivo não comportava os meiostermos os tons cinzentos as vacilações Essas idéias não flutuavam no ar encarnavamse em experiências práticas O Vietnã fervilhava nos meios de comunicação e através deles vieram as notícias da ofensiva do Tet anonovo lunar desfechada em 30 de janeiro de 1968 No exato momento em que os Estados Unidos defendiam a tese de que a guerra estava sob controle que poderia até mesmo ser vencida mais de 50 mil guerrilheiros brotavam da terra para atacar capitais provinciais tomar cidades importantes e de forte simbolismo como Huê antiga capital imperial investir contra a própria capital do país Saigon tomando por seis horas a embaixada dos Estados Unidos Mais que o feito militar contou o impacto psicológico A coesão do povo norteamericano já abalada não pôde mais ser recuperada Afloraram amargos debates sobre as responsabilidades da guerra surgiria a revolta da juventude O próprio presidente Lyndon Johnson foi politicamente constrangido a renunciar à disputa de mais um mandato As negociações de paz começaram em maio em Paris Embora elas ainda fossem durar mais sete anos a guerra fora decidida pela ofensiva do Tet Outras guerrilhas retomariam as lições do Vietnã Da África negra chegavam notícias de movimentos armados Zimbábue Namíbia Angola GuinéBissau Moçambique Davam conta de avanços moleculares mas sólidos lutas prolongadas invariáveis Era preciso lutar a vitória viria com o tempo apesar do tempo A mensagem era tão forte que os reveses da guerrilha latinoamericana eram simplesmente recusados Antes de 1968 já estavam praticamente liquidadas as experiências guerrilheiras na Argentina Paraguai Peru Venezuela sem falar no desastre maior a morte de Che Guevara nas selvas da Bolívia Em 1968 continuaram os desastres a morte do líder do Exército de Libertação Nacional na Colômbia Os relatos dos salvados da guerrilha de Che refugiados no Chile O frustrado desembarque de um grupo guerrilheiro no Haiti Na Guatemala o anúncio da morte de Cesar Montes e o frustrado sequestro do embaixador norteamericano John Gordon Mein morto na ação Os fracassos foram sumariados nas páginas do diário de Che Guevara Durante quase um ano ele anotou as dificuldades e os problemas que cercavam e condicionavam o foco guerrilheiro que apesar de todo o seu talento militar seria derrotado de forma fulminante pelos rangers bolivianos Mas a morte de Che seria menor do que sua legenda O heroísmo de CHE ESTA NA UhB sua dedicação continuaria sendo exaltado nos cartazes e bandeiras das passeatas nas pichações e no coro dos estudantes E o fracasso da guerrilha foi absolvido pelo heroísmo do guerrilheiro As suas palavras de encorajamento criar um dois três muitos Vietnãs falariam mais alto do que a derrota da alternativa que propunha ou do que o silenciamento de seu fuzil Entretanto os enfrentamentos de 1968 nem sempre assumiram a forma de conflitos guerrilheiros Por toda a parte levantaramse movimentos sociais com diferentes padrões de atuação diversas referências mas que de uma forma ou de outra questionavam a ordem vigente A sociedade norteamericana foi atingida por uma onda de descontentamento que modelaria toda uma geração Duas vertentes se destacaram o movimento dos negros e o movimento estudantil Desde 1967 incêndios e saques em cidades norteamericanas anunciavam o desespero em que se encontravam os negros sempre discriminados e empobrecidos Em 1968 o movimento ganhou força sob a liderança do reverendo Martin Luther King líder pacifista da luta pela conquista de iguais direitos civis para todos os cidadãos norteamericanos independentemente da cor da pele de cada um Entretanto um atentado racista silenciou Luther King quando se preparava em começos de abril mais uma passeata Milhares de pessoas se manifestaram em protesto contra a intolerância e em homenagem ao líder assassinado Mais de 100 mil pessoas presenciaram seu enterro Seus conselhos porém sempre favoráveis à utilização de métodos não violentos não conteriam a revolta e a indignação durante quase uma semana 125 cidades em 28 estados seriam novamente atingidas pelos incêndios pela destruição pelas mortes A influência dos Panteras Negras e de sua proposta de luta armada cresceria com o desespero Um mês depois tomaria corpo mais uma das iniciativas de Luther King embora não mais com sua presença a marcha do povo pobre em Washington reunindo os deserdados da sociedade norteamericana vítimas da discriminação no emprego na habitação na educação negros chicanos portoriquenhos índios Lado a lado exigiam a consideração e o respeito devidos a seres humanos O mês de abril também foi acecido pelo movimento dos estudantes revoltados contra a hipótese de morrer no Vietnã Sucederase as ocupações de universidades Cornell Boston Ohio Berkeley Columbia E os conflitos com os policiais de São Francisco a Nova York Em fins do mês um dia nacional de luta reuniria milhares de manifestantes contra a guerra em 17 cidades quase 100 mil somente em Nova York Um outro ponto culminante ocorreu em agosto na Convenção do Partido Democrata em Chicago quando a polícia atacou de forma violenta os jovens que vinham protestar contra o partido responsável pela política que atolara os Estados Unidos numa guerra suja e sem esperança Os estudantes fugiam à conscrição Os negros se sabiam discriminados também na morte porque morriam muito mais na guerra proporcionalmente Da composição decorreria uma aliança de interesses visível nas manifestações de rua Outros movimentos cresceram Os presidiários capturavam reféns bloqueavam pavilhões chamavam a atenção da opinião pública para o tratamento que lhes era dispensado Revoltavamse nas penitenciárias de Oregon Raleigh Ohio Colúmbia Atlanta Os homossexuais denunciavam a discriminação que sofriam reivindicavam liberdade mostravam a hipocrisia da sociedade formavam organizações próprias As mulheres faziam renascer o feminismo mais amplo e abrangente que as campanhas passadas Da diferença entre os sexos não poderia derivar a desigualdade no trabalho nos postos de responsabilidade no salário no enfrentamento das tarefas do cotidiano no tratamento dos filhos Revoltavamse contra o machismo sufocante que negava na prática o discurso e os códigos democráticos Foi um tempo de desafios de liberação sexual de mani How many years can some people exist Before they are allowed to be free How many times can a man turn his head And pretend that he just doesnt see The answer my friend is blowing in the wind The answer SÍNTESE CRÍTICA Os anos vão passando e através desse processo se formos analisar cada momento traz consigo modelagens e adaptações Essas mudanças estão relacionadas aos nossos gostos musicais gestos crenças estilos de vida comportamentos e assim por diante A mudança de cada um reflete na sociedade em que vivemos atinge o meio social e político O ano de 1968 foi de grandes mudanças e polêmicas dentre elas a revolução estudantil A proposta era reivindicar maiores quantidades de verbas para as universidades cujo objetivo era melhorar a estrutura das universidades seus espaços físicos e a capacitação dos Professores que ali lecionavam além de potencializar o auxílio estudantil relacionado a bolsas de estudo e assistência médica Essa época foi marcada pela voz dos estudantes A partir desse momento outros nichos começaram a lutar por seus direitos e uma sociedade mais democrática Houveram diversas manifestações que tiveram que ser controladas pela polícia Esse movimento social estendeuse pelo país O foco era a política educacional A partir do posicionamento político e social demonstrado pelas práticas políticas houve desacordo entre estudantes e policiais o que gerou grande conflito Houve um grande conflito entre universidades públicas e universidades particulares Dessa forma se instalou um conflito que perduraria por anos após a democratização e os donos do poder Além das manifestações eram feitas greves Se concentravam nas faculdades até que duas reivindicações fossem atendidas Por consequência alguns estudantes acabavam sendo presos Para continuar combatendo as normas políticas e sociais não democráticas era necessário que os estudantes criassem formas de luta organizadas Cada um lutava por seus direitos através da sua forma os estudantes e professores faziam passeatas e protestos os músicos compunham canções relacionadas a sua insatisfação e os eventos de médio e grande porte propunham questionamentos aos seus ouvintes e participantes Mais adiante o conflito se estendeu para religiosos e políticos De um lado os religiosos denunciavam a miséria do povo e as injustiças sociais Do outro lado os donos do poder enfáticos em suas posturas e dizerem políticos sociais não democráticos Foi um momento de grande repressão aos direitos humanos A quantidade de pessoas insatisfeitas com a legislação só aumentava Diante disso uma nova sociedade estava sendo construída Foram criados sindicatos para os trabalhadores A partir da consolidação de partidos políticos aparentemente os estudantes tinham sintonia com os partidos de esquerda Entretanto os partidos não buscavam ser regidos pelos estudos e sim direcionálos Seus objetivos eram revolucionar o sistema brasileiro gerando assim o socialismo Essa nova geração estimulou muitos outros povos aos questionamentos homossexuais denunciavam a discriminação que sofriam as mulheres requeriam igualdade de direitos em relação aos homens Posteriormente a passeatas começaram a ser proibidas em que o Exercito seria chamado para promover a ordem pública Sendo assim quatro estudantes foram condenados Diante disso as autoridades respondiam com desprezo e intolerância