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TORTURA A história da repressão política no Brasil Antonio Carlos Fon Comitê Brasileiro pela Anistia SP Antonio Carlos Fon TORTURA A História da Repressão Política no Brasil 1979 by Antonio Carlos Fon Capa Carlos Clemen Revisão Dina de Deus Nº do Catálogo 1146 Direitos Reservados por GLOBAL EDITORA E DISTRIBUIDORA LTDA Rua José Antonio Coelho 814 CEP 04011 Tel 5493137 São Paulo SP Composto na ARTESTILO Impresso nas oficinas da EDITORA PARMA LTDA Rua da Várzea 394 Tel 8264973 SP Brasil Este livro é dedicado a três grupos de pessoas A todos aqueles que sofreram nas câmaras de torturas especialmente a Virgílio Gomes da Silva A todos os que esperaram pela Anistia e já não poderão vêla especialmente a meu pai Aton Fon A todos os que lutam por uma Anistia ampla geral e irrestrita Especialmente àquele grupo de Gaviões da Fiel a flamante torcida corintiana que sendo povo sabe que a Anistia interessa antes de tudo ao povo Antonio Carlos Fon nasceu em Salvador Bahia há 33 anos Começou no jornalismo em 1967 no jornal O Dia de São Paulo como repórterpolicial Daí transferiuse para o Diário Popular e mais tarde Jornal da Tarde onde trabalhou durante seis anos sempre cobrindo a área policial Em 1974 transferiuse para a revista Visão onde durante um ano cobriu as áreas de economia e política Fez parte do grupo que lançou em 1975 o jornal Aqui São Paulo antes de se transferir para Veja onde voltou a se dedicar à reportagem policial Fui preso às seis e meia da manhã de 29 de setembro de 1969 Na época eu trabalhava no Jornal da Tarde de São Paulo cobrindo a área policial e naquela noite ficara até às quatro da madrugada conversando e bebendo com dois policiais o escrivão Waldemar de Paula e o delegado Luiz Orsatti ambos lotados no DOPS Cheguei em casa um apartamento de terceiro andar na esquina das avenidas São João e Duque de Caxias às quatro e meia da manhã e cansado e meio alto fui me deitar no quarto do meu irmão Aton Fon Filho que se encontrava viajando Dormi duas horas e acordei com algo frio encostado no nariz Abri os olhos e o quarto estava cheio de homens armados de fuzis e metralhadoras O objeto frio encostado no meu nariz era o cano de uma pistola calibre 45 empunhada pelo delegado Raul Nogueira que eu já conhecia como integrante do grupo clandestino de extremadireita Comando de Caça aos Comunistas e policial que encontrava um estranho prazer em espancar estudantes Quem comandou a invasão da minha casa fiquei sabendo depois foi o capitão do Exército Mauricio Lopes Lima Eles mandaram que me vestisse e fui levado para a sala onde meus pais e minhas irmãs já se encontravam detidos para ser acareado com um homem baixo e entroncado que eles chamavam David e que mais tarde eu vim a saber se chamar Francisco Gomes da Silva David estava cansado e machucado As equimoses eram visíveis em seu rosto e tinha um curativo na testa Sentado em uma poltrona ele tinha as mãos algemadas e uma metralhadora apontada para o peito O capitão Mauricio Lopes Lima queria que David me identificasse mas ele foi categórico em afirmar que não me conhecia o que era verdade Ficamos ali dez minutos após o que o capitão Mauricio Lopes Lima mandou que eu fosse levado para a sede com a recomendação de que eu deveria ser liberado após a tomada do depoimento Fui algemado com as mãos à frente do corpo e levado por dois policiais um deles o delegado Raul Nogueira apelidado de Raul Careca por seus colegas do CCC As mãos de Raul tremiam não sei por que mas na hora me pareceu medo Ao nos aproximarmos do elevador ele engatilhou a 45 e encostoua na minha cabeça Lembro perfeitamente de que senti medo um arrepio que percorreu a espinha e não reclamei porque um pensamento passoume pela cabeça Diante de um covarde armado o melhor é obedecer sem conversar O outro policial também percebeu a situação Prá que isso doutor ele chegou a perguntar Raul Nogueira respondeu que essa gente é muito perigosa muito perigosa Na porta do edifício esperavanos uma perua Veraneio azul com o motorista e outro policial Raul foi no banco da frente com o motorista eu no banco de trás entre os dois policiais No percurso até a Operação Bandeirantes na rua Tutóia no bairro do Paraíso permitiram que eu fumasse e um dos policiais que me acompanhavam acendeu o cigarro O carro estacionou no pátio dos fundos do 34º Distrito Policial e eu fui levado aos empurrões para a porta do pequeno prédio de três pavimentos onde funciona até hoje a Operação Bandeirantes Eu ainda tinha alguma esperança de que aquela situação se esclarecesse rapidamente mas ela se desvanecceu logo Esse é daqueles que não sabem de nada explicou o delegado Raul Careca ao entregarme a dois homens que esperavam na porta O capitão Benone de Arruda Albernaz e o sargento PM Paulo Bordini os dois homens que me receberam ficaram famosos na Operação Bandeirantes Paulo Bordini foi apelidado de Risadinha devido às risadas histéricas que dava enquanto torturava os presos Albernaz foi um dos torturadores mais ferozes que passaram pelo CODIDOI Em seus dias de plantão o terror era dobrado nos xadrezes da Operação Bandeirantes Quando não tinha o que fazer costumava descer ao xadrez e escolher um prisioneiro para espancar Mais tarde depois de ter sido adido militar do Brasil na Bélgica correu a informação de que tinha sido internado em uma clínica para doentes mentais Ao que parece recuperouse e hoje está reintegrado ao serviço ativo Fui levado para a câmara de torturas no segundo andar e durante três horas submetido a paudearara espancamentos e choques elétricos De tudo isto lembrome de que nada era mais terrível que os choques elétricos na cabeça com um fio preso ao lóbulo da orelha e outro percorrendo os lábios o pescoço ou o nariz Esses choques provocam uma contração tão forte dos músculos da face que a língua é mordida e estraçalhada pelos dentes Fiquei vários dias sem poder comer até que um enfermeiro do Exército obteve autorização para levarme um pouco de gelo que anestesiava momentaneamente a língua permitindo que eu me alimentasse Fiquei 17 dias na Operação Bandeirantes Se o inferno existe a Operação Bandeirantes é pior Éramos de início doze pessoas em uma cela de cerca de 35 X 45 metros Dormíamos no chão cobrindonos com jornais velhos e um cobertor que era reservado ao preso que estivesse em piores condições físicas A alimentação era levada do quartel da Polícia do Exército e servida uma vez por dia à noite Isto tem um motivo Uma pessoa alimentada não pode ser pendurada no paudearara ou submetida a choques elétricos sob o risco de morrer de congestão Então nós éramos alimentados apenas à noite para ficarmos disponíveis durante o dia para sermos torturados No entanto conseguíamos armazenar algumas coisas Como castigo suplementar os homens da Operação Bandeirantes costumavam deixar aberta a marmita que continha a carne para que esfriasse Com isso a gordura solidificavase formando uma crosta de sebo onde os pedaços de carne ficavam presos Nós guardávamos esse sebo e o pão para comêlos durante o dia Cigarros sempre era mais fácil obter De vez em quando recebíamos alguns maços enviados por nossos familiares outras vezes mandávamos comprar Um dos presos baleado no momento da prisão teve que ser levado para o Hospital do Exército Lá médicos e enfermeiros compadecidos de sua situação fizeram uma lista e deramlhe dois mil cruzeiros que ele levou para a Operação Bandeirantes escondido no ânus Com esse dinheiro comprávamos cigarros e açúcar Doce era uma das coisas de que mais sentíamos falta na Operação Bandeirantes Quando conseguíamos um pouco de açúcar nós o comíamos puro aos punhados Felizmente sempre era possível subornar um guarda ou carcereiro para comprar cigarros e açúcar embora pagássemos um preço altíssimo às vezes até dez vezes o valor dessas mercadorias Lembrome de que uma vez ganhei uma dúzia de pães do capitão Roberto Pontuschka Esse capitão Roberto era um homem estranho Durante o dia torturavanos à noite descia aos xadrezes para distribuir bíblias e tentar salvar nossas almas Uma noite procuramos conversar com ele pedindolhe que explicasse como podia um homem tão religioso torturar seus semelhantes Eu trago a palavra de Deus ele explicou mas para quem se recusa a ouvila eu uso esta outra linguagem disse apontando a pistola calibre 45 que trazia na cintura Pedilhe pão e ele respondeu que só quando eu revelasse onde se encontrava meu irmão a quem a Operação Bandeirantes procurava Acaso serei eu guardião do meu irmão respondilhe com as palavras do Gênese Ele ficou muito satisfeito com a resposta e deu o pão Alguns de nós sequer sabiam por que estavam presos Recordo de três casos extremos Osvaldo Pardal e um japonês Pardal havia sido preso porque um de seus alunos aborrecido com as notas baixas que recebia o havia denunciado como comunista O japonês fora preso na Faculdade de Economia da USP Os homens da Operação Bandeirantes haviam tentado prender um grupo de estudantes que fugiu Só ficou na escola o japonesinho que estava vendendo livros e não sabia o que acontecia O caso de Osvaldo talvez seja tragicômico Ele embebedouse em uma boate e foi preso Acordou no xadrez da Operação Bandeirantes sem conseguir se lembrar por que fora preso O agente que o detivera provavelmente também bêbado não conseguia lembrarse por que o havia prendido E durante um mês Osvaldo foi torturado para contar o motivo pelo qual havia ido parar na Operação Bandeirantes Dramática era a situação do pintor Suzuki Depois de quinze dias sendo torturado e vendo outros homens serem torturados Suzuki chegou à conclusão de que a humanidade havia regredido e que éramos todos animais Nos dias seguintes enlouqueceu e passou a agir como se fosse um macaco Ficava nu pendurado nas grades da cela e se recusava a comer outra coisa que não fosse amendoim ou bananas Os agentes do CODIDOI achavam isto muito engraçado e costumavam se reunir diante de sua cela como em frente de uma jaula do zoológico para jogarle amendoim a pipoca que Suzuki tentava apanhar com a boca Apesar de todo o sofrimento desespero e medo aqueles dias na Operação Bandeirantes me devolveram a fé no homem Vi algumas demonstrações de medo e covardia mas vi também alguns dos mais belos momentos de coragem e solidariedade humana como o dos garotos de Guaratinguetá Gasparzinho e o nissei Daniel haviam sido presos sob a acusação de envolvimento com o PC do B Junto com eles havia sido detido um terceiro rapazinho Os três eram quase meninos nenhum chegara aos vinte anos Na Operação Bandeirantes os policiais tentaram destruílos moralmente mandando que um torturasse o outro Os três se recusaram e por isso foram condenados a ser torturados em conjunto De volta à cela os três estropiados contavam emocionados como haviam se sentido mais fortes para enfrentar o suplício vendo que o amigo se mantivera firme Depois de 17 dias na Operação Bandeirantes fui transferido para o DOPS Para quem saía da Operação Bandeirantes o DOPS era o paraíso pelo menos por algum tempo Pela primeira vez desde que havia sido preso tomei um banho Comíamos três vezes ao dia exceto quando íamos ser torturados e podíamos receber roupas limpas frutas e cigarros de nossas famílias Havia até colchões e cobertas no DOPS Fiquei vinte dias no DOPS onde só fui torturado mais uma vez duas horas de paudearara e choques elétricos 13 comandados pelo delegado Roberto Guimarães e pelo investigador Moretto Esta sessão de torturas aconteceu na véspera de minha transferência para o Presídio Tiradentes e devido ao paudearara fiquei com as pernas paralisadas alguns dias Naquela noite dois policiais a quem eu conhecera anteriormente como repórter vieram me avisar que o delegado Sérgio Fernando Paranhos Fleury pretendia matarme no dia seguinte O plano era simular uma tentativa de fuga e metralhar a mim e alguns outros presos que seriam levados em um microônibus para o Presídio Tiradentes O alvo principal no entanto seria eu de quem o delegado Sérgio Fleury teria ódio devido às matérias do Jornal da Tarde onde eu trabalhava denunciando o Esquadrão da Morte Na manhã seguinte na hora da transferência lá estava de fato o delegado Sergio Fleury armado com uma metralhadora Eu e o preso Takao Amano que levara um tiro na perna ao ser preso recebemos ordem para ficar em último lugar na fila Na hora de sairmos um policial mandou que Takao me carregasse Foi então que surgiu o delegado Rui Franceschi que também se encontrava preso no DOPS e me carregou no colo até o ônibus que nos levaria ao Presídio Tiradentes Fiquei mais quinze dias no Presídio Tiradentes até à noite do dia 19 de novembro quando fui levado de volta para o DOPS Naquela noite mesmo fui colocado em liberdade E lembrome ainda das palavras de despedida do delegado que me libertou Que bela reportagem se você pudesse escrever hein Antonio Carlos Fon 14 O LANÇAMENTO DA OPERAÇÃO BANDEIRANTES Escondida nas páginas internas dos jornais editados na cidade de São Paulo no dia dois de julho de 1969 a notícia passou quase despercebida No dia anterior com a presença do governador do Estado Roberto Costa de Abreu Sodré do secretário da Segurança Pública paulista professor Hely Lopes Meirelles e dos comandantes do VI Distrito Naval e da 4ª Zona Aérea o general José Canavarro Pereira comandante do II Exército havia lançado oficialmente uma certa Operação Bandeirantes Sem maiores detalhes os jornais informaram apenas que o novo organismo teria como função coordenar as atividades dos diversos órgãos encarregados da repressão à subversão e ao terrorismo O general Canavarro Pereira não disse em seu discurso ele limitouse a falar da necessidade de que todos os setores da sociedade se unissem às forças armadas no esforço pela defesa da segurança interna mas aquele era um momento histórico Nem todos os presentes estavam convencidos do acerto da decisão mas o lançamento da Operação Bandeirantes naquele momento ainda um instrumento extralegal de repressão que só viria a ser oficializado meses mais tarde já no governo do general Emílio Garrastazu Médici através de uma circular secreta intitulada Instruções sobre a Segurança Interna encerrava um processo de cinco anos de discussões sobre o papel a ser desempenhado pelas forças armadas na manutenção da segurança interna A tese de um engajamento total ideológico e operacional das Forças Armadas na luta antisubversiva surgira no seio do grupo de coronéis da chamada linha dura encarregado da condução dos inquéritos policiais militares para investigar ati 15 vidades subversivas durante o governo anterior logo após a vitória do movimento de março de 1964 Levada para os debates da Escola Superior de Guerra nos anos seguintes essa tese viria a ser abraçada pelo general Jayme Portella ministro chefe da Casa Militar do presidente Arthur da Costa e Silva e por força deste cargo secretáriogeral do Conselho de Segurança Nacional E seria aí no Conselho de Segurança Nacional que a idéia viria a ser aperfeiçoada recebendo sua base jurídicofilosófica da assessoria do ministro da Justiça professor Luiz Antonio da Gama e Silva e explicitada em seus aspectos operacionais pelo ministro chefe do Serviço Nacional de Informações general Emílio Garrastazu Médici O desenvolvimento desses planos chegou a ser denunciado ainda em1968 pelo então governador paulista Roberto Costa de Abreu Sodré que localizou na assessoria direta do ministro Gama e Silva a presença de elementos ligados ao CCC Comando de Caça aos Comunistas e outros grupos terroristas de extremadireita É verdade confirma o exgovernador Abreu Sodré Quem eram esses extremistas de direita infiltrados na periferia da administração Eu prefiro não dizer desculpase o exgovernador Pode dizer que tenho muito má memória para guardar nomes de pessoas que desprezo Não apenas na área civil entretanto estes planos de engajamento total das forças armadas no combate à subversão encontravam oponentes Concluídos e decididos desde o segundo semestre do ano de 1968 esses planos não puderam ser levados imediatamente à prática todavia devido à oposição do general Manoel Maria de Carvalho Lisboa hoje presidente do conselho da Companhia de Bebidas Antarctica na época comandante do II Exército e de seu estadomaior E seria por São Paulo considerado o centro de irradiação dos movimentos de contestação violenta ao governo que o engajamento das Forças Armadas na luta deveria começar Eu me recordo bem desse período e das discussões que enfrentávamos no II Exército lembrase o coronel Sebastião Chaves hoje reformado e na época oficial do estadomaior do general Lisboa no II Exército e hoje na reserva Nós nos opúnhamos à participação do Exército em operações poli ciais da forma como era pretendida embora não nos negássemos a combater o comunismo por uma questão de doutrina e por saber a que extremos um envolvimento deste tipo fatalmente nos levaria continua ele Doutrinariamente a discussão era travada a nível de estadomaior a respeito do momento em que o Exército deveria intervir para a garantia da ordem interna A opinião dominante no estadomaior do II Exército naquele período era de que esta intervenção só deveria ocorrer quando houvesse a necessidade de massa e potência de fogo para enfrentar uma insurreição aberta incapaz de ser controlada pelas polícias civil e militar Entre outros motivos porque o Exército não recebe treinamento para a execução de operações policiais que não faz parte de suas funções constitucionais Exorbitas essas funções e atirarse em tarefas para as quais não somos preparados levaria como levou pela própria determinação do militar em cumprir a qualquer preço uma missão recebida a novas transgressões da lei prossegue o coronel Chaves mas havia outro grupo minoritário mas de ponderável proporção que pensava de forma diferente Entre os militares que advogavam uma participação maior e imediata no que era definido como processo de guerra revolucionária estava o coronel Danilo Darcy de Sá da Cunha e Mello comandante de um regimento de infantaria e que mais tarde viria a ocupar o cargo de secretário de Segurança Pública paulista No segundo semestre de 1968 o quartelgeneral do II Exército passou a ser assediado com frequência também por militantes de grupos de extremadireita que haviam travado conhecimento com o coronel Sebastião Chaves alguns anos antes durante a conspiração para depor o governo anterior Eles sentiamse ameaçados pelo ascenso do movimento esquerdista e principalmente depois da guerra dos três dias entre os estudantes de direita encastelados na Universidade Mackenzie e de esquerda entrincheirados na Faculdade de Filosofia da USP desejavam a intervenção do Exército para desarmar e desbaratar os grupos de extremaesquerda Nós procurávamos acalmálos mas deixando claro que não pretendíamos participar daquele estágio da luta conta o oficial Mas foi em 1968 e ainda sob o comando do general Manoel Rodrigues de Carvalho Lisboa que o II Exército participaria pela primeira vez de uma operação de segurança interna enviando um contingente por solicitação do secretário da Segurança Pública professor Hely Lopes Meirelles e do reitor Alfredo Buzaid para desocupar o CRUSP Conjunto Residencial da Universidade de São Paulo Depois dessa operação lembra o oficial nós começamos a ter notícias de que violências estariam sendo praticadas no quartel da Polícia do Exército mas não tivemos condições ou tempo para confirmálas no dia 10 de abril de 1969 eu deixei oficialmente o estadomaior do II Exército devido à substituição do general Manoel Rodrigues de Carvalho Lisboa pelo general José Canavarro Pereira Dois meses e vinte dias depois foi criada a Operação Bandeirantes A ordem para a montagem de um organismo que reunisse elementos das três forças armadas da polícia estadual Civil e Militar e da Polícia Federal para o trabalho específico de combate à subversão entretanto havia sido ditada muito tempo antes desta data Eu a recebi em fins de 1968 se não me falha a memória recordase o professor Hely Lopes Meirelles então secretário da Segurança Pública de São Paulo Foi durante uma reunião de todos os secretários de Segurança Pública do país realizada em Brasília sob a orientação do Ministério da Justiça A ordem me foi passada pelo ministro da Justiça professor Luiz Antonio da Gama e Silva e pelo general Carlos de Meira Mattos que encontravase na chefia da Inspetoria Geral das Polícias Militares diz Hely Lopes Meirelles Eles afirmaram que a ordem tinha origem em uma decisão tomada no próprio Palácio do Planalto Desta reunião em Brasília oficialmente designada de Seminário de Segurança Interna saiu não apenas a ordem para a criação de um organismo centralizador da luta antisubversiva mas também a estratégia governamental para a aplicação de sua doutrina de segurança interna Esta estratégia baseavase em dois planos de trabalho um de responsabilidade do Ministério da Justiça o Plano Político de Segurança Interna ou PPSI e outro a ser elaborado pelo EstadoMaior das Forças Armadas e intitulado Plano Militar de Segurança Interna ou PMSI Esses dois planos traçados através de consultas mútuas do EMFA e do Ministério da Justiça delineariam a linha geral sobre a segurança interna a ser aplicada em todo o território nacional Nos Estados a adaptação do Plano Político de Segurança Interna e sua colocação em prática ficava a cargo do governador e por seu intermédio do secretário da Segurança Pública As autoridades estaduais deveriam ainda coordenar seu trabalho com o comandante militar da área encarregado da execução do PMSI Este entrosamento tornavase mais fácil pelo fato dos comandantes das polícias militares devido às características das corporações que dirigiam participarem tanto da elaboração do PPSI quanto do Plano Militar de Segurança Interna em seus Estados Da junção do PPSI com o PMSI deveria resultar em cada Estado um Plano Estadual de Segurança Interna PESI a ser montado por um grupo de planejamento composto por um representante da Polícia Civil o comandante da Polícia Militar e um elemento do estadomaior do comando militar da área sob a supervisão do secretário da Segurança Pública Este Plano Estadual de Segurança Interna deveria basicamente analisar a situação da segurança no Estado identificando as principais áreas geradoras de problemas e os agentes perturbadores da ordem definindo os objetivos a serem alcançados Embora devido à grande gama de assuntos que eram considerados de interesse da segurança nacional esses planos abrangessem desde a fiscalização das fronteiras até a censura às diversões públicas e à imprensa seus objetivos primordiais já haviam sido bem delimitados nas discussões anteriores no Ministério da Justiça Eles deveriam conter medidas visando assegurar a ordem política e social garantir a proteção moral e material das populações salvaguardar as instalações e recursos de interesse nacional e coordenar as ações civis e militares Para executar este último item coordenar as ações civis com as militares foi criada a Operação Bandeirantes em São Paulo cidade considerada o centro irradiador dos movimentos de esquerda na época Rapidez informações e potência de fogo é o tripé em que se baseia o segredo da eficiência dos chamados órgãos de 19 segurança Foi com o objetivo de fornecer rapidamente informações aos grupos de choque encarregados do combate armado nas ruas que em fins da década passada foram montadas as estruturas dos organismos de repressão política com suas equipes de interrogatório análise e capturas E foi também essa necessidade de informações rápidas a responsável pela avalanche de denúncias de torturas que cobriram o país nos últimos anos Comandado sempre por um oficial superior até o posto de coronel e ligado ao comando militar da área através da segunda seção do estadomaior um CODI Centro de Operações de Defesa Interna como a Operação Bandeirantes passou a se chamar em 1970 pode coordenar as atividades de um ou vários DOI Departamento de Operações de Informações Na prática porém apesar das duas siglas terem se celebrado em conjunto ao CODI acabou restando o trabalho burocrático administrativo do organismo ficando para o DOI a parte operacional Assim enquanto ao CODI cabe além do serviço burocrático a análise das informações e o planejamento estratégico do combate à subversão definindo as metas prioritárias em sua área de ação o DOI com suas equipes de interrogatórios e capturas se incumbe da execução dos planos traçados pelo CODI Dentro deste organograma é o DOI que mantém o contato direto com o prisioneiro embora eventualmente um funcionário do CODI geralmente das equipes de análise de informações possa querer interrogálo para dirimir alguma dúvida Inexperientes em investigações de caráter policial os oficiais destacados para a Operação Bandeirantes tiveram em seus primeiros tempos de valerse quase exclusivamente da experiência de delegados e investigadores da Polícia Civil Quase sem o público tomar conhecimento por se tratar de medida administrativa interna da Secretaria da Segurança Pública um grande contingente de policiais da Divisão de Crimes Contra o Patrimônio foi transferido em meados de 1969 para o DOPS paulista e em seguida uma parte deles para a Operação Bandeirantes Na escolha desses homens dos quais o delegado Sérgio Fernando Paranhos Fleury na época conhecido apenas por 20 ser acusado de pertencer ao Esquadrão da Morte viria a se tornar o mais famoso foram obedecidos dois critérios o da identidade ideológica como no caso do delegado Raul Nogueira o Raul Careca conhecido integrante do Comando de Caça aos Comunistas e o critério da competência profissional Competência profissional que na Divisão de Crimes Contra o Patrimônio conhecida entre os marginais como a pesada pelos seus cruéis métodos de interrogatório significava quase exclusivamente o conhecimento das formas de torturar Foi ali por exemplo que foi inventado o mais brasileiro dos equipamentos de tortura o paudearara também chamado de varau ou cambau E foi por ali que 25 anos antes ainda na década de 40 o delegado José Ary de Moraes Novaes introduziu no Brasil o uso da máquina de choques elétricos no interrogatório de suspeitos de roubo Eu cheguei a comentar várias vezes com o procurador Hélio Pereira Bicudo contra um general com importante comando de tropas que para mim o Fleury e homens como ele não passa de um bandido Mas era de bandidos que nós precisávamos naquela ocasião para combater o terrorismo A verdade é que a princípio os métodos de interrogatório levados para o combate à subversão pelos policiais acostumados a utilizálos contra criminosos comuns gerou alguns desentendimentos Esses métodos de trabalho já eram conhecidos pelos homens que faziam a polícia política mas a frequência e a violência com que a ele recorriam os policiais oriundos da Divisão de Crimes Contra o Patrimônio chegou a chocar antigos delegados do DOPS e até mesmo alguns oficiais da Operação Bandeirantes Um detalhe que poucas pessoas conhecem é que o então tenentecoronel Waldir Coelho já falecido primeiro comandante da Operação Bandeirantes era a princípio contrário à tortura como forma de arrancar informações de subversivos presos Mais tarde porém passou a encarála como um mal necessário até se transformar em seu decidido defensor Com base na experiência da Operação Bandeirantes e por determinação das Instruções sobre a Segurança Interna baixadas nos primeiros meses do governo Médici foram criados em 1970 os CODIDOI nos outros três Exércitos Desses o mais 21 famoso que iria rivalizar em violência com o de São Paulo seria o do I Exército no Rio de Janeiro Das discussões para sua formação participaram o generaldeexército Sizeno Sarmento então comandante do I Exército o brigadeiro João Paulo Penido Burnier representando a Aeronáutica e o almirante Roberto Teixeira pela Marinha ENTREVISTA COM UM EXSECRETÁRIO DA SEGURANÇA Trancado em seu escritório de advocacia no centro da cidade de São Paulo protegido por correntes de segurança que sua secretária só abre depois de verificar os documentos de quem pretende entrar o jurista Hely Lopes Meirelles 61 anos exjuiz exsecretário do Interior da Justiça e da Segurança Pública do Estado de São Paulo não gosta de dar entrevistas principalmente sobre sua gestão à frente da Secretaria da Segurança Pública Acusado de ter permitido e até incentivado o surgimento do Esquadrão da Morte aqueles foram meses difíceis para Hely Lopes Meirelles Tenho sempre me recusado a falar sobre aquele período ele explicou ao autor e vou conversar contigo apenas por uma questão de respeito profissional Eu respeito muito o trabalho A seguir sua conversa com o autor Professor como começou a violência política em São Paulo Meirelles É interessante O terrorismo político começou em São Paulo no dia da minha posse na Secretaria da Segurança Pública em dez de abril de 1968 com a primeira bomba sendo lançada contra o quartelgeneral da extinta Força Pública hoje Polícia Militar Eu tomei posse às 14h00 e a bomba explodiu às 23h00 E como se deu o início da repressão Meirelles As polícias Civil e Militar não tinham nenhum preparo para realizar a identificação e repressão desse tipo de atividade inteiramente novo no Brasil Daí por diante tivemos uma verdadeira escalada do terrorismo bomba no quartel general do II Exército bomba no DOPS a guerra entre Filosofia e Mackenzie e subversão no CRUSP culminando com o congresso da UNE em Ibiúna quando foram detidos 712 participantes vindos de todo o Brasil Além disso tínhamos manifestações quase diárias de estudantes que chegaram a incendiar 26 carros oficiais E como a Secretaria da Segurança Pública enfrentou a situação Meirelles Naquela conjuntura as instruções do presidente Arthur da Costa e Silva e do governador Abreu Sodré eram no sentido de que não se praticasse qualquer violência tendo em vista as ocorrências do Rio de Janeiro onde tinha havido vítimas fatais Cumprindo as ordens recomendamos às polícias Civil e Militar que contivessem as manifestações sem violência procurando apenas oferecer garantias de vida e propriedade aos particulares E como foram cumpridas essas ordens Meirelles Graças a Deus não houve nenhuma morte nem se praticou torturas contra estudantes Afinal tivemos de intervir na luta entre a Filosofia e Mackenzie da mesma forma como também fomos obrigados a desalojar os estudantes que ocuparam a faculdade de Direito do largo São Francisco mas tudo foi feito sem violência E quanto ao terrorismo Meirelles Não havia nenhuma sistemática de repressão Com a reiteração das ações subversivas foise formando a técnica pela polícia em cooperação com elementos de segurança das três forças armadas responsáveis pela manutenção da ordem na área e através de troca de informações de todos os serviços de segurança Como se deu essa cooperação Meirelles Esse entrosamento da polícia com as forças armadas surgiu de entendimentos entre os comandos militares da área com a Secretaria da Segurança Pública Entrosamento que veio sendo aprimorado cada vez mais para as ações necessárias A partir de quando esse entrosamento se tornou mais estreito Meirelles Esse entrosamento foi o resultado de entendimentos com o estadomaior das Forças Armadas e se tornou maior a partir de uma ordem das autoridades federais Essa ordem eu a recebi em fins de 1968 se não me falha a memória E como foi criada a Operação Bandeirantes Meirelles Desse entrosamento da Secretaria da Segurança Pública com o general Canavarro Pereira e com os comandantes da Marinha e Aeronáutica surgiu a Operação Bandeirantes que era a ação conjunta para repressão da subversão no Estado Como eram divididas as tarefas entre os participantes Meirelles Todos os planos eram elaborados em conjunto repartindose a execução ao órgão mais adequado no momento ficando algumas ações para a Polícia Federal A Operação Bandeirantes visava combater toda e qualquer ação de subversão sempre com a colaboração das polícias Civil e Militar A Polícia Federal dirigida na época pelo general Silvio Corrêa de Andrade cuidava preferentemente das ações políticas Em que momento a repressão se tornou mais violenta Meirelles A Operação Bandeirantes entrou em atividade no fim da minha gestão quando passei a Secretaria da Segurança Pública ao general Vianna Moog Não tenho elementos para fixar o momento em que se acirrou a violência entre os manifestantes estudantes e polícia porque isso obedeceu um processo gradativo após a minha saída da Secretaria da Segurança Pública mesmo porque a subversão teve seu auge em 1969 declinando daí para a frente E em meados daquele ano deixei a Secretaria da Segurança Pública passando a titular da Secretaria da Justiça e interinamente da Secretaria da Educação onde só presenciei o final das passeatas de estudantes 25 É verdade que o senhor deixou a Secretaria da Segurança Pública por ser contrário à violência Meirelles Não É verdade que eu sempre fui contra a violência mas a minha saída não se deveu a qualquer desentendimento neste sentido com os governos estadual ou federal mas sim para atuar na área da justiça que julgava mais adequada à minha formação profissional de exjuiz de Direito 26 PRENDER TORTURAR MATAR Prender torturar matar tudo é permitido para defender a segurança nacional A base jurídicofilosófica para justificar qualquer ato tornando lícito o que é intrinsecamente ilícito foi desenvolvida durante três anos de prolongados debates na Escola Superior de Guerra ESG e encontravase já cristalizada em meados de 1968 um ano antes da criação em São Paulo da Operaçáo Bandeirantes Ela fundamentavase na transposição para o âmbito das relações internas entre o Estado e os indivíduos de alguns princípios do Direito Internacional Público que tratam das relações entre Estados beligerantes Para se compreender como esta transposição veio a legalizar todos os atos ilegais cometidos em nome da segurança nacional é necessário entender o próprio desenvolvimento do conceito de segurança nacional Para a elaboração do conceito de segurança a ESG somou o conceito de segurança subjetiva a ausência de temor por se acreditar seguro ao de segurança objetiva ou seja a convicção de se possuir os meios necessários para enfrentar o perigo Da conjunção dessas duas definições surgiria então o conceito final de segurança que pode ser expresso de uma forma genérica como a certeza de que tudo trabalha regularmente na atividade humana considerada conforme trabalho elaborado pela ESG e publicado no segundo semestre de 1968 pela revista Segurança e Desenvolvimento Para a conceituação de nação a Escola Superior de Guerra procurou conciliar a doutrina alemã de nacionalidade e fundada na identidade de raça integridade de território e na comu 27 nidade de língua religião costumes história tradições e limites naturais para o Estado com a teoria francoitaliana que define a nação como uma sociedade natural de homens que a unidade de território de origem de costumes e de língua leva à comunidade de vida e de consciência sociais Da fusão dessas duas escolas a ESG retirou seu próprio conceito de nação definindoa como uma estrutura históricocultural constituída por determinada parcela da humanidade que vive em determinado espaço de terra aglutinada sob tradições costumes hábitos linguagem idéias crenças vocações lutas e vicissitudes comuns que visa a preservar os valores alcançados e a realizar os objetivos colimados Finalmente ao Estado que serve à nação embora com ela não possa ser confundido cabe a tarefa de preservar os valores alcançados e realizar os objetivos colimados Definidos os conceitos de segurança e nação chegase enfim ao de segurança nacional Na aplicação deste conceito tradicionalmente voltado para a prevenção de agressões partidas de outros Estados a ESG passou a se preocupar cada vez mais com a segurança interna diante da concepção de guerra total e permanente em que um Estado procuraria conquistar o outro através de ações políticas econômicas psicossociais e militares em tempo de paz também conhecida como guerra fria Foi diante deste quadro que o marechal Humberto de Alencar Castello Branco explicou as preocupações com a segurança nacional em sua aula inaugural na Escola Superior de Guerra em 13 de março de 1967 O conceito tradicional de defesa nacional coloca mais ênfase sobre os aspectos militares da segurança e correlatamente os problemas da agressão externa A noção de segurança é mais abrangente Compreende por assim dizer a defesa global das instituições incorporando por isso os aspectos psicossociais a preservação do desenvolvimento e da estabilidade política interna além disso o conceito de segurança muito mais explicitamente que o de defesa toma em linha de conta a agressão interna corporificando na infiltração e subversão ideológica até mesmo nos movimentos de guerrilha formas hoje mais prováveis de conflito que a agressão externa De acordo com esta teoria de segurança nacional desenvolvida pela ESG o Estado por ser responsável pela preservação dos valores alcançados e realização dos objetivos colimados contra agressões externas ou internas recebe por delegação da nação a obrigação de zelar por seu direito à segurança E é neste ponto que auxiliada agora pela assessoria do então ministro da Justiça professor Luiz Antonio da Gama e Silva a Escola Superior de Guerra vai justificar os excessos cometidos no combate à subversão com base no jus belli ou seja os princípios de Direito Internacional Público que tratam das relações entre Estados beligerantes Entre os direitos fundamentais de todo Estado reconhecidos por qualquer corte internacional de justiça está o direito de conservação É o direito de qualquer Estado de existir e tomar as medidas necessárias de ordem preventiva ou repressiva diante de uma agressão partida de outro Estado para continuar existindo Desse direito de conservação decorrem os direitos de legítima defesa e de represálias Reconhecido pelo artigo 51 da Carta da Organização das Nações Unidas o direito de legítima defesa é o direito de um Estado de responder imediata e violentamente ao ataque armado de outro Estado Quanto ao direito de represálias ele foi definido pelo Instituto de Direito Internacional como medidas derrogatórias das regras ordinárias do direito das gentes tomadas por um Estado em conseqüência de atos ilícitos cometidos em seu prejuízo por outro Estado e tendo por fim impor a esse por meio de um prejuízo o respeito de um direito O direito de represália foi por exemplo o argumento utilizado pelos Estados Unidos para justificar a colocação de minas nos portos e rios do Vietnã do Norte durante a guerra do Vietnã Além desses dois a doutrina de segurança nacional da Escola Superior de Guerra invocava também um terceiro direito de aceitação ainda controvertida nas cortes internacionais de justiça o direito de necessidade Desenvolvida pelos juristas alemães a teoria do estado de necessidade é a transposição para o Direito Internacional Público do princípio universalmente aceito para as relações entre indivíduos do estado de necessidade Por este princípio em uma situação extrema um indivíduo tem o direito de cometer um crime até mesmo tirando a vida de um inocente para salvar a própria vida Levado para o Direito Internacional Público o direito de necessidade foi a base para o torpedeamento de navios de passageiros e o uso de gases tóxicos contra a população civil pelos exércitos alemães na I Guerra Mundial e para a invasão da Bélgica apesar de sua neutralidade pelos exércitos nazistas na II Guerra Mundial Adotando o princípio da necessidade a Escola Superior de Guerra o explicitava da seguinte forma O princípio da necessidade justifica as medidas excepcionais de caráter repressivo ou preventivo obviamente diversas das comuns providências acauteladoras da ordem adotadas pelos governantes na defesa do Estado ou da Nação quando se positivam ameaças tentativas de subversão ou subversões baseadas em antagonismos ou pressões de origem interna externa ou externointerna Tais medidas transpõem as regras que tutelam em época normal os direitos antes de tudo individuais assegurados habitualmente pelos textos constitucionais e também pela Declaração Universal dos Direitos do Homem ou pelas leis ordinárias específicas Transpostos para as relações entre o Estado e os indivíduos os direitos de legítima defesa de represálias e da necessidade formaram a base jurídicofilosófica sobre a qual se assentaram as justificativas para a prisão tortura e morte de subversivos ou de simples suspeitos Afinal de acordo com a tese da ESG O interesse nacional tem a primazia sobre o interesse privado ou individual Mas não é possível compreenderse aquelas discussões fora do contexto da época explica o general Hugo Abreu na época adido militar nos Estados Unidos Havia se realizado em Havana a conferência da OLAS Organização LatinoAmericana de Solidariedade e nela o líder comunista Carlos Marighella havia anunciado a decisão de enveredar com seu grupo pelo caminho da contestação armada ao governo com o flagrante apoio do governo cubano A promessa cubana de auxiliar os grupos subversivos brasileiros que optaram pela violência foi de importância capital na decisão governamental de aplicar ao conflito interno o jus belli do Direito Internacional Público Em um trabalho sobre o assunto a ESG afirma que O direito da legítima defesa se exerce também contra os ataques internos e internoexternos oriundos dos nacionais associados às forças da subversão internacional e com elas vinculados pelo apoio político e logístico a bandos armados ou a guerras chamadas revolucionárias mas na realidade formas disfarçadas de submissão a soberanias alienígenas O que aconteceu foi que com a tese da internalização da guerra passouse a aplicar no próprio país os regulamentos de Assuntos Civis e Governo Militar utilizados em territórios inimigos sob ocupação conta o coronel Sebastião Chaves na época no centro dos acontecimentos Nos períodos de paz a missão da 5a seção de qualquer estadomaior é o de assuntos civis ou seja relações públicas Durante a guerra a 5a seção é encarregada da guerra psicológica e do governo militar dos territórios conquistados ao inimigo O que se argumentava era que lutávamos contra um inimigo externo o comunismo internacional cujo exército estava disseminado dentro de nossa própria população assegura um coronel ainda em serviço ativo Era uma situação semelhante à de um território ocupado onde pelo menos teoricamente toda pessoa é potencialmente um soldado inimigo Por isso todos os exércitos do mundo concedem ao chefe do governo militar de uma zona de ocupação a autoridade de exercer justiça sumária A idéia de encarar a população das áreas onde operavam grupos subversivos armados como potencialmente inimigas chegou a extremos Lembrome de um incidente ocorrido em um seminário sobre relações públicas durante o governo Médici contra um general com importante comando de tropas O então coronel Octávio Costa chefe da Assessoria Especial de Relações Públicas da Presidência da República e apelidado de Goebells brasileiro pelas esquerdas foi chamado de ingênuo por um coronel do Centro de Informações do Exército por ter se atrevido a dizer que relações públicas se faz divulgando a verdade Nós estamos em guerra coronel respondeu o oficial do CIE e na guerra psicológica não importa se o que se divulga é verdade ou mentira o que importa são os resultados obtidos Mal digeridos pelos homens que participavam do combate direto aos grupos subversivos os conceitos de internalização da guerra e a base jurídicofilosófica para a suspensão das garantias individuais na luta pela segurança interna levaram a extremos ainda mais dramáticos Estamos em guerra repetiam os interrogadores às suas vítimas nas câmaras de torturas e na guerra vale tudo Sistematizada a partir da criação da Operação Bandeirantes a prática da tortura como forma de arrancar informações e confissões ou simplesmente humilhar prisioneiros políticos já era um mal em processo de franco desenvolvimento em julho de 1969 De forma intermitente entretanto ela nunca deixou de ser usada desde sua introdução no arsenal à disposição da política brasileira durante o Estado Novo Após 1945 as denúncias iriam se tornar assustadoramente mais frequentes a partir do dia 1º de abril de 1964 quando o velho líder comunista Gregório Bezerra foi arrastado pelas ruas do Recife amarrado à traseira de um jipe do Exército As cenas fotografadas filmadas e televisionadas daquele homem de 65 anos cabelos brancos seminu e ensangüentado exibidas pelas ruas da capital pernambucana levaram o marechal Humberto de Alencar Castello Branco a designar o chefe de sua casa militar para investigar as acusações de que oficiais do IV Exército haviam se envolvido em espancamentos de prisioneiros O relatório do expresidente da República general Ernesto Geisel não negava as violências embora as circunscrevesse aos excessos naturais que se seguem à vitória de qualquer movimento armado A lisura com que foram conduzidas aquelas investigações não pode de qualquer forma ser contestada É preciso deixar bem claro que o Presidente sempre foi contra a tortura conta um exmembro de sua assessoria direta antes por motivos puramente morais depois em 1975 lembrome de têlo ouvido dizer que ainda que não fosse imoral a tortura é uma burrice UM SARGENTO ASSASSINADO É à firmeza com que foram apurados os incidentes do Recife que é atribuído o fato de não terem surgido novas denúncias nos dois anos seguintes até o dia 24 de agosto de 1966 quando foi encontrado morto com as mãos amarradas e claras marcas de tortura afogado nas águas do rio Jacuí em Porto Alegre o exsargento do Exército Manoel Raimundo Soares Exparticipante do movimentos dos sargentos no período João Goulart e preso algumas semanas antes pelo DOPS gaúcho a pedido do III Exército Soares tinha estado desde então na Ilha do Presídio para onde naquela ocasião eram levados os suspeitos de subversão detidos no Rio Grande do Sul Instaurada uma Comissão Parlamentar de Inquérito pela Assembléia Legislativa gaúcha para apurar as circunstâncias da morte do exsargento todas as evidências apontavam em direção à polícia política Os assassinos porém nunca chegaram a ser punidos apesar de várias testemunhas entre elas um padre declararem ter visto Soares sendo torturado por policiais A impunidade dos autores do assassinato do exsargento e a escalada das manifestações de protesto promovidas pelos estudantes levou à generalização das denúncias de torturas por todo o Brasil nos dois anos seguintes Locais apontados como centros de tortura eram além de todos os DOPS estaduais a sede do Departamento de Polícia Federal em Pernambuco o quartel da Polícia do Exército no Barbalho em Salvador e o Pelotão de Investigações Criminais onde viria mais tarde a funcionar um DOI do Comando Militar do Planalto em Brasília Nenhum desses lugares era tão temido no entanto quanto o presídio da Ilha das Flores operado pelo Cenimar Centro de Informações da Marinha no Rio de Janeiro principalmente pela presença de Ringo um cão pastor treinado para morder os testículos do prisioneiro até que um oficial o mandasse parar Na Ilha das Flores cuja guarnição era comandada àquela época pelo então capitãodemareguerra Clemente José Monteiro Filho as torturas eram praticadas geralmente durante a madrugada na casa n 29 situada em um recanto afastado da ilha e conhecida como a casa branca 34 O CASO PARASAR Em abril de 1968 finalmente ocorreria o último passo da escalada em direção a um engajamento de grandes setores das Forças Armadas em ações de seqüestro tortura e eliminação sumária o eufemismo usado para assassinato de opositores políticos do regime nos anos seguintes Com a morte do estudante Edson Luís de Lima Souto no dia 28 de março de 1968 as autoridades responsáveis pela segurança da área passaram a esperar com ansiedade as manifestações do dia 5 de abril data marcada para a missa de sétimo dia do estudante A principal preocupação era a adesão de funcionários de escritórios do centro da cidade que nas últimas passeatas vinham se colocando ao lado dos manifestantes jogando de suas janelas pesos sobre as cabeças dos policiais encarregados da repressão às passeatas Na madrugada do dia quatro para o dia cinco de abril o major Gil Lessa levou a equipe de plantão no ParaSar o serviço de salvamento da FAB para as ruas com roupas civis e uma recomendação Localizem as janelas de onde atiram objetos nos policiais subam e liquidem com quem estiver lá Os homens do ParaSar não chegaram a matar ninguém naquele dia Mas inconformados com aquela ordem os capitães Sérgio Miranda de Carvalho e Rubens Marques dos Santos procuraram seus superiores para pedir que a cancelassem já que apenas um oficial do ParaSar o capitão Roberto Camara Lima Ypiranga dos Guaranys concordava em executar missões daquele tipo A entrevista do capitão Sergio Miranda que seria punido por revelar este plano com o brigadeiro João Paulo Penido Bunier a quem era atribuída a ordem aconteceu em 13 de junho de 1968 35 No caso de guerra ante a necessidade de resgatar um companheiro ferido ou prisioneiro o ParaSar teria que matar para cumprir a missão em caso de guerra civil com o país dividido o ParaSar teria de matar para cumprir missão idêntica em caso de paz mas com agitações de rua o ParaSar também deveria matar argumentou o brigadeiro Burnier O senhor já matou perguntou o capitão Sérgio Não Ainda não matei respondeu o brigadeiro Burnier mas isto é uma questão de tempo Estava armado o palco para o drama dos seis anos seguintes 36 SANGUE DE PATRIOTA Você está vendo este sangue É de um patriota Você também quer ser patriota Capitão de Infantaria Benone de Arruda Albernaz em 1970 na sede da Operação Bandeirantes O sangue era de Virgílio Gomes da Silva 36 anos operário da indústria química casado pais de três filhos membro da organização Ação Libertadora Nacional chefe do grupo que sequestrou o embaixador norteamericano Charles Burke Elbrick e comandante do Grupo Tático Armado da ALN em São Paulo sob o nomedeguerra de Jonas Foi preso às 9h30 da manhã do dia 29 de setembro de 1969 na esquina das avenidas Duque de Caxias e São João no centro da cidade de São Paulo Chegou à Operação Bandeirantes à rua Tutóia nº 721 bairro do Paraíso às 10h00 À uma hora da tarde estava morto Foi morto a pontapés pelos capitães Benone de Arruda Albernaz Homero Cesar Machado Dalmo Luiz Cirillo pelo major hoje tenentecoronel servindo o 15º Regimento de Cavalaria Mecanizada Inocêncio Fabrício de Mattos Beltrão e pelo sargento da Polícia Militar do Estado de São Paulo Paulo Bordini Eles não sabiam naquele momento mas o assassinato de Jonas foi um erro Furiosos porque Jonas resistira à prisão e mesmo na câmara de torturas da Operação Bandeirantes e algemado batera e escarrara em seus rostos eles o mataram Não sabiam que Virgílio era o chefe do GTA em São Paulo em condições portanto de os levar à direção da ALN a Joaquim Câmara Ferreira e ao próprio Carlos Marighella Por não saberem disso os 37 torturadores perguntavamlhe apenas onde era seu aparelho onde estavam escondidas as metralhadoras Na rua XV de Novembro As metralhadoras estão na rua XV de Novembro respondialhes Jonas pendurado no paudearara e enquanto era espancado O endereço Jonas qual é o endereço impacientavamse os torturadores Me leva lá que eu mostro dizialhes Virgílio Gomes da Silva Há um detalhe neste diálogo até hoje desconhecido pelos assassinos havia realmente metralhadoras na rua XV de Novembro mas elas não pertenciam à ALN Se eu algum dia for preso costumava dizer Jonas a seus companheiros procuro levar os alemães era assim que ele chamava os policiais e militares da Operação Bandeirantes até à rua XV de Novembro Lá arranco a metralhadora de um daqueles soldados que eles colocaram nas portas dos bancos e ou fujo ou morro lutando Mas o seu truque não deu certo Retirado do paudearara por volta das 12h30 Virgílio um exlutador de box e excorredor da São Silvestre surpreendeu seus assassinos tentando reagir às agressões Mãos e pés amarrados ele foi então derrubado em um canto da sala e durante os vinte minutos seguintes massacrado a pontapés As manchas de sangue permaneceram durante meses na câmara de torturas da Operação Bandeirantes uma pequena sala de 4 4 metros fechada por uma divisória de compensado no fundo do corredor do segundo andar da edícula do 34º Distrito Policial em São Paulo O corpo de Jonas foi enterrado em cova rasa como indigente no cemitério da cidadezinha de Perus pelos assassinos 38 TORTURANDO CRIANÇAS Presa em uma casa em São Sebastião no litoral paulista pelo capitão de Infantaria Maurício Lopes Lima no dia seguinte foi a vez de Hilda Gomes da Silva atualmente morando em Cuba com seus filhos conhecer a sala onde seu marido fora assassinado Operária mãe de três crianças pequenas Hilda não sabia das atividades do marido Sem ter o que dizer ela foi torturada durante dois dias até que seus carrascos sem acreditar que ela não conhecia os segredos do marido e sabendo depois de interrogar outros prisioneiros da importância de Jonas na ALN resolveram utilizar outro meio para fazêla falar Hilda foi retirada do paudearara e amarrada à cadeiradodragão Os mesmos homens que mataram seu marido era novamente seu dia de trabalho levaram para a câmara de torturas uma mesa onde foi colocada Isabel Gomes da Silva filha de Virgílio e Hilda de apenas quatro meses de idade Eles faziam perguntas a Hilda e quando ela dizia não saber as respostas davam choques elétricos na criança Em um interrogatório conta um delegado paulista cujo nome figura na lista de 233 torturadores denunciados por presos políticos o essencial é quebrar o moral o espírito de resistência do interrogado Você vai pressionando até o momento em que ele se decompõe e começa a falar Para ele tudo resumese a uma questão técnica É importante que você afirme sua autoridade aos olhos do interrogado Para um cidadão honesto cumpridor das leis que cometeu um pequeno deslize basta um tom de voz mais firme um grito ou uma careta e ele fala o marginal exige um pouco mais de rispidez mas ele tem consciência de que desrespeitou a lei e de certa forma espera ser punido explica ele 39 A FAZENDA 31 DE MARÇO Morto na alameda Lavandisca no bairro de Indianópolis em São Paulo às 23h00 do dia 23 de outubro de 1970 de um ataque cardíaco ao tentar resistir aos policiais do DOPS que chefiados pelo delegado Sergio Fernando Paranhos Fleury tentavam prendêlo Esta é a versão oficial para a morte de Joaquim Câmara Ferreira 57 anos jornalista exmilitante do Partido Comunista Brasileiro e dirigente nacional da organização Ação Libertadora Nacional ALN também conhecido pelos codinomes de Toledo ou simplesmente O Velho Uma versão feita de meiasverdades De fato Toledo resistiu à prisão lutou e feriu a socos pontapés e dentadas vários policiais e morreu de uma parada cardíaca Uma síncope provocada pelas torturas mais precisamente choques elétricos que recebeu no caminho entre a alameda Lavandisca onde foi preso às 19h30 daquele dia e um sítio no bairro de Embura em Parelheiros na região da Grande São Paulo onde morreu O sítio na verdade uma fazendola chamada Fazenda 31 de Março era usada na época pelo delegado Sergio Fernando Paranhos Fleury e mais tarde por grupos páramilitares de extremadireita como o Braço Clandestino da Repressão como campo de concentração para esconder prisioneiros cujas informações ele pretendia sonegar aos militares do CODIDOI Por ali teriam passado pelo que se pode depreender dos comentários de um torturador ao advogado Affonso Celso Nogueira Monteiro anos mais tarde diversas pessoas cujos nomes hoje figuram nas listas de desaparecidos 40 A necessidade do delegado em utilizar o sítio para esconder prisioneiros deviase às divergências surgidas entre os policiais do DOPS e os homens do CODIDOI onze meses antes em novembro de 1969 quando o delegado Sergio Fleury não avisou com antecedência a Operação Bandeirantes sobre a diligência em que morreu o exdeputado Carlos Marighella As relações entre o delegado do DOPS e o CODIDOI ficaram ainda mais tensas em março de 1970 quando foi preso o militante da VPR Shizuo Ozawa que usava o codinome de Mario Japa NINGUÉM SAI VIVO Shizuo Ozawa foi preso após um acidente de automóvel por policiais de uma radiopatrulha e entregue ao DOPS Através dele o delegado Sergio Fleury pretendia chegar ao excapitão Carlos Lamarca na época treinando guerrilhas no Vale do Ribeira no Estado de São Paulo Por isso ele não se conformou quando o CODIDOI requisitou o preso para interrogatório Obrigado a entregar Mario Japa ao CODIDOI Fleury quebrou várias costelas do prisioneiro para impedir que o CODIDOI tivesse condições de torturálo e obter as informações que ele desejava para si Depois desse incidente e sabendo que alguns delegados de polícia ligados às organizações páramilitares de extremadireita informavam ao CODIDOI tudo que se passava no DOPS o delegado Sergio Fleury passou a esconder no sítio os presos considerados mais importantes capazes de levar à descoberta dos dirigentes de suas organizações Só muito tempo depois efetivamente os agentes do CODIDOI conseguiram localizar o sítio Completamente ilegal o sítio passou a ser mais temido pelos militantes das organizações de esquerda armada que o próprio CODIDOI E havia motivos para isso de todos os prisioneiros que passaram por lá só se tem notícias de quatro que continuaram vivos Coisa aliás que fez questão de frisar um integrante do grupo Braço Clandestino da Repressão ao recepcionaar o advogado Affonso Celso Nogueira Monteiro seqüestrado às 9h30 do dia 1º de outubro de 1975 na esquina da rua Condessa de São Joaquim e da avenida Brigadeiro Luís Antonio em São Paulo Affonso Celso Nogueira Monteiro você está em poder do Braço Clandestino da Repressão Daqui ninguém pode tirálo Aqui não há covardes nem valentes e daqui ninguém sai com vida A MORTE DE TOLEDO Naquele dia 23 de outubro de 1970 quando o delegado Sergio Fernando Paranhos Fleury retornou da alameda Lavandisca levando preso Joaquim Câmara Ferreira já havia outros três prisioneiros no sítio Maurício Segall diretor do Museu de Arte Lazar Segall e Maria de Lourdes Rego Melo conhecida na ALN como Maria Baixinha tinham sido presos às 15h30 no bairro de Vila Mariana Viriato Xavier de Melo Filho também integrante da ALN foi preso horas depois Todos foram levados para o sítio e torturados No bolso de Maria Baixinha os policiais encontraram o ponto endereço e horário para o encontro de Maria de Lourdes com Toledo Joaquim Câmara Ferreira já chegou ao sítio respirando com dificuldade e a princípio o delegado Sergio Fleury pensou que ele estivesse apenas fingindo um malestar conta Maurício Segall Pára com isso Velho ele chegou a exigir Como Toledo piorasse a cada momento porém os policiais chamaram um dos médicos encarregados de acompanhar as torturas para impedir que o supliciado morresse antes de falar para socorrêlo O médico ainda encontrou O Velho com vida mas nada mais pôde fazer Alguns minutos depois Joaquim Câmara Ferreira morria O delegado levou então seu cadáver de volta à alameda Lavandisca onde foi armada a cena de sua morte Os outros três prisioneiros encapuzados o tempo inteiro apenas puderam ouvir os esforços dos torturadores para interrogálo e adiar sua morte Entregues no dia seguinte ao CODIDOI os três foram considerados restos de interrogatório Por isso tiveram seus depoimentos tomados sem sequer serem torturados antes de os devolverem ao DOPS 42 ATIRAR PARA MATAR Não Os páraquedistas não torturaram ninguém Matar sim nós matamos mas em combate Mas também perdemos homens nessa luta e quando havia feridos do nosso lado ou do deles procurávamos socorrêlos conta o general Hugo Abreu excomandante da Brigada de Páraquedistas do Exército Naquele período era muito comum o pessoal do CODIDOI pedir ajuda aos páraquedistas Eles faziam as investigações e na hora da prisão chamavam os páraquedistas para travar o combate Os páraquedistas saíam do quartel com ordens muito explícitas efetuar a prisão e entregar o prisioneiro ao pessoal do CODIDOI De forma alguma deveriam se envolver em interrogatórios ou torturas aos presos Agora na hora da prisão se o inimigo reagisse a ordem era para atirar E nós atirávamos para matar Foi numa expedição deste tipo que morreu o major José Júlio Toja Martinez Filho na madrugada do dia três de abril de 1971 Recém transferido para a Brigada de Páraquedistas o major Martinez foi encarregado da 2ª Seção o serviço de informações da unidade Aquela seria a sua primeira tarefa para a captura de subversivos Os agentes do CODIDOI haviam plotado localizado o endereço de um casal de terroristas no subúrbio de Campo Grande no Rio de Janeiro Ficaram vários dias fazendo o levantamento do local até que decidiram é hoje E chamaram os páraquedistas lembra o general Hugo Abreu Como chefe da 2ª Seção o major Martinez Filho comandou o grupo que em trajes civis deveria efetuar a prisão Fomos para lá espalhamos nossos homens e ficamos à espera conti 43 nua um oficial páraquedista O CODIDOI havia mostrado fotografias do casal e descrito o automóvel que eles estavam usando Mas algo não correu como havia sido previsto naquela noite Era madrugada quando recebemos o aviso que eles estavam se aproximando recordase o militar mas quando o automóvel reduziu a marcha para parar nós vimos que não era o carro que estávamos esperando mas sim um táxi Foi por isso que o major Martinez resolveu aproximarse para verificar se os passageiros eram as pessoas que deveria prender Não recordo os nomes eles eram Mario de Souza Prata e Marilene Villas Boas Pinto ambos militantes da ALN mas eram bem jovens O rapaz desceu do táxi mas percebeu alguma coisa e atirou no major Martinez depois tentou correr Nessa situação nós tinhamos ordens de atirar para matar E quando o major caiu nós atiramos o rapaz recebeu mais de 15 tiros e morreu ali mesmo a moça ainda tentou fugir no táxi mas levou seis tiros O pessoal do CODIDOI queria interrogála mas nós a levamos para o hospital do Exército Se não me engano morreu alguns dias depois 44 OS GRUPOS ESPECIAIS A partir de 1972 entretanto os CODIDOI de São Paulo e Rio de Janeiro criaram grupos que mais que autorizados eram especialmente treinados para matar No Rio de Janeiro baseada no CISA Centro de Informações da Aeronáutica conhecido entre os torturadores como Forte Apache esta equipe era chamada de Grupo Coruja Em São Paulo comandado por um tenente da Polícia Militar este destacamento especializado em assassinato foi apelidado de GTA numa alusão jocosa à sigla utilizada pela ALN para os seus grupos táticos armados As atividades desses grupos de caráter secreto até mesmo dentro dos CODIDOI são até hoje a área mais misteriosa da atividade dos chamados órgãos de segurança Eles tinham até mesmo uma terminologia própria uma estranha gíria em que plantar significava enterrar levar para as 200 jogar no mar e código 12 morte em trânsito em que o significado de cada termo é ainda hoje quase totalmente desconhecido até para exintegrantes do CODIDOI que não faziam parte daquele grupo específico E eu ouvi falar alguma coisa sobre o assunto mas sinceramente não acredito conta um delegado paulista durante muito tempo lotado no Departamento Estadual de Ordem Política e Social Parecendo saídas das páginas de um conto de terror as técnicas de execução desses grupos foram aprendidas no Panamá na escola de contrainsurreição mantida na área pelo governo dos Estados Unidos em um curso chamado As 27 maneiras de se matar um homem 45 Parece incrível capitão e o senhor pode achar que eu estou ficando louco chegaria a confessar um certo sargento Xavier ao atarantado capitão Sergio Miranda de Carvalho seu excomandante mas tudo isto é verdade O código 12 existe eu mesmo já o apliquei mais de uma vez Matar simulando suicídios atropelamentos acidentes de automóvel ou ainda desaparecendo com o corpo da vítima era enfim o trabalho dos grupos especiais CRIMES IMPUNES Provar sob essas circunstâncias a existência de crime nessas mortes era quase tão difícil quanto inútil Inútil foi provar por exemplo que o estudante de medicina Chael Charles Schreier havia sido morto sob torturas Preso na noite de 21 de novembro de 1969 no nº 1053 da rua Aquidabã no Rio de Janeiro juntamente com Antonio Roberto Espinoza e Maria Auxiliadora Lara Barcelos por uma equipe de policiais do DOPS da Guanabara Chael foi levado naquela mesma noite para o quartel da Polícia do Exército na Vila Militar De lá ele sairia morto na noite seguinte depois de os policiais que o prenderam terem afirmado aos jornais que Chael não havia sido ferido no ato de sua prisão Levado para o Hospital Central do Exército o estudante de medicina já chegaria ao hospital morto segundo o generaldebrigada Galeno de Penha Franco diretor do hospital para quem a transferência do cadáver foi apenas uma formalidade já que ele provinha de uma unidade militar E de acordo com o atestado de óbito publicado por vários órgãos da imprensa fornecido pelo legista Rubens Pedro Macuco Janini do Instituto Médico Legal carioca que o examinou Chael morreu devido a uma contusão abdominal com ruptura do mesocólon transverso e mesentério com hemorragia interna Apesar desta prova e dos depoimentos de Antonio Roberto Espinoza e Maria Auxiliadora Lara Barcelos que assistiram à tortura de Chael nenhuma investigação oficial sobre o crime foi feita e seus assassinos continuam impunes até hoje 46 Uma evidente má vontade por parte da Justiça Militar em apurar denúncias de torturas naquele período pode ser aquilatada pelo caso de Paulo de Tarso Vanuck Em junho de 1972 Vanuck que se encontrava preso e participando de uma greve de fome de presos políticos na Casa de Detenção de São Paulo teve sua transferência para o CODIDOI para que o alimentassem autorizada pelo juiz da II Auditoria do Exército Nelson da Silva Machado Guimarães Três dias depois ao ser apresentado à Justiça Militar para uma audiência Vanuck apresentava um hematoma no olho marcas de pancadas nas pernas e um corte no pescoço produzidos segundo denunciou durante as sessões de torturas em que para alimentálo os torturadores pretendiam introduzirlhe leite no ânus Incidentalmene essas torturas foram comprovadas pelos médicos da Casa de Detenção É que como o preso encontravase em greve de fome para resguardar a responsabilidade das autoridades carcerárias antes de sua transferência os médicos Geraldo Sales Colonesi e Walter Lunardi da Casa de Detenção o haviam submetido a exames para determinar que ele se encontrava em boas condições físicas E quando de seu retorno puderam então comprovar as sevícias de que fora vítima no CODIDOI Diante das denúncias de seu constituinte e da recusa do juiz Nelson da Silva Machado Guimarães em apurálas a advogada Eny Raimundo Moreira requereu à Procuradoria Geral do Superior Tribunal Militar que determinasse a abertura de inquérito para investigálas arrolando como testemunhas quatro advogados que se encontravam presentes à audiência e o próprio promotor da II Auditoria Militar Henrique Vailatt Nunca mais tive notícias dessa representação conta a advogada JUSTIÇA E TORTURA Se como regra havia uma evidente má vontade por parte da Justiça Militar em averiguar as acusações de maustratos é 47 fora de dúvidas também que mais de uma vez promotores e membros dos conselhos de sentença das auditorias militares assistiram ou participaram diretamente de sessões de torturas E pelo menos uma vez as próprias dependências da Justiça Militar foram utilizadas pelos agentes do CODIDOI para torturar prisioneiros Assim no Rio de Janeiro o promotor da Justiça Militar José Manes Leitão chegou a assistir e a fazer perguntas ao prisioneiro Cláudio Torres ser interrogado e torturado na sede do Cenimar Centro de Informações da Marinha no prédio do I Distrito Naval na praça Mauá Torres em uma audiência de instrução do processo em que era acusado de atividades subversivas chegou a narrar este fato diante do mesmo promotor José Manes Leitão que funcionou na acusação Essas denúncias evidentemente não foram apuradas E em São Paulo entre outros o capitão do Exército Roberto Pontuschloa Filho um estranho personagem pastor evangélico que entre os anos de 196970 durante o dia participava das sessões de tortura na Operação Bandeirantes e à noite com uma pistola calibre 45 na cintura descia ao xadrez para distribuir bíblias aos supliciados foi em 1971 transferido para o Conselho Permanente de Justiça da 2a Auditoria da II Circunscrição da Justiça Militar onde julgou vários prisioneiros que ele mesmo havia torturado Foi em São Paulo ainda que no ano de 1972 os agentes do CODIDOI torturaram o excabo do Exército José Mariani no próprio prédio da Justiça Militar Mariani que havia desertado do IV Regimento de Infantaria em janeiro de 1969 com o excapitão Carlos Lamarca insistia em negar durante uma audiência as confissões que fizera no CODIDOI alegando que elas haviam sido arrancadas mediante o uso de torturas Suspensa a sessão para que os membros da corte fizessem seu lanche Mariani foi levado para uma sala no porão do velho casarão e espancado para que reiniciada a sessão confirmasse os depoimentos prestados no CODIDOI 48 TORTURADORES TORTURADOS Sistematizado para o combate à subversão o uso da tortura generalizouse rapidamente entre os militantes brasileiros a partir do ano de 1969 O recurso à violência atingiu tais dimensões que nos anos seguintes seria utilizado indiscriminadamente até mesmo dentro das Forças Armadas para a apuração de crimes comuns praticados por militares chegando a atingir integrantes dos próprios órgãos de segurança torturados por seus excompanheiros As denúncias feitas por doze religiosos da cidade de Barra Mansa entre eles o bispo Dom Waldir Calheiros no Rio de Janeiro no segundo semestre de 1971 de que os militares do 1º Batalhão de Infantaria Blindada estavam torturando presos políticos o procurador militar Osíris Josephson respondeu ao pedir o arquivamento do inquérito aberto para investigar as acusações que nenhuma prova foi produzida das torturas nem pelas supostas vítimas nem pelos padres signatários da cartadenúncia As provas chegariam em janeiro de 1973 com a condenação pelo Conselho Especial de Justiça da 2ª Auditoria do Exército no Rio de Janeiro do tenentecoronel Gladston Pemassetti Teixeira capitão Dalgio Miranda Niebrus segundotenente Paulo Reinard Miranda da Silva terceirosargento Sidnei Guedes e o cabo Celso Gomes de Freitas Filho todos do 1º Batalhão de Infantaria Blindada Eles eram acusados de assassinarem sob torturas quatro soldados do 1º BIB acusados de crimes comuns Também na 2ª Auditoria do Exército no Rio de Janeiro aguardando julgamento e ainda sob segredo de justiça o processo nº 1774 é um exemplo de como a tortura acabou se voltando contra alguns dos próprios militares que a empregaram Acusados de terem se envolvido com contrabandistas passando a assaltar caminhões que transportavam mercadorias contrabandeadas por quadrilhas rivais os capitães Luís Fernando de Brito Ailton Guimarães Jorge e Ailton Joaquim além dos sargentos Euler Moraes Valter da Silva Rangel Paulo Roberto 49 Andrade e o subtenente Walace Andriatta Magessi foram presos por seus excompanheiros de CODIDOI Mais tarde prestando depoimento na Justiça Militar eles negariam as confissões feitas anteriormente alegando que foram submetidos às mesmas torturas que já haviam praticado no CODI 50 CODIDOI X DOPS Criada com o objetivo de harmonizar e melhorar a eficiência das operações de segurança interna a Operação Bandeirantes que mais tarde viria a se transformar no CODIDOI do II Exército e cujo modelo seria seguido em todo o Brasil embora tivesse se tornado de fato o mais eficiente aparelho de repressão política jamais conseguiu obter a harmonia entre os diversos órgãos cujas ações deveria coordenar Dominado pelo Exército o próprio CODIDOI paulista viria a se envolver em uma interminável disputa com o DOPS e o delegado Sergio Fernando Paranhos Fleury que chegaria ao extremo em março de 1970 quando um contingente do CODIDOI invadiu o Departamento Estadual de Ordem Política e Social para resgatar um prisioneiro das mãos da Polícia Civil O ponto de partida nessa desavença foi o fato de o delegado Sergio Fernando Paranhos Fleury não ter avisado com antecedência ao CODIDOI das investigações para a localização do exdeputado Carlos Marighella A primeira pista que levaria a Marighella surgiu da junção de dois fragmentos de informações reunidas pelos analistas do serviço secreto do DOPS Como sua apuração dependesse de investigações também no Rio de Janeiro o delegado Sergio Fleury viajou para lá onde entrou em contato com os oficiais do Cenimar Centro de Informações da Marinha para que seguissem algumas pessoas De volta a São Paulo Fleury não comunicou à Operação Bandeirantes os resultados de suas investigações Assim enquanto o Cenimar sabia com antecedência dos preparativos para a captura de Marighella a Operação Bandeirantes só 51 tomou conhecimento das investigações após a morte do exdeputado A irritação aumentou ainda mais quatro meses depois quando foi preso o subversivo Shizuo Ozawa militante da Vanguarda Popular Revolucionária onde era conhecido como Mario Japa FLEURY EM DESGRAÇA Mario Japa os órgãos de segurança sabiam estava em contato com o excapitão Carlos Lamarca na época fins de fevereiro de 1970 treinando guerrilhas no Vale do Ribeira Depois da morte de Marighella Lamarca havia se transformado com o jornalista Joaquim Câmara Ferreira no principal alvo dos órgãos de segurança Ainda enciumados com o sucesso de Fleury nas investigações para localização de Marighella os homens da Operação Bandeirantes exigiram que ele lhes entregasse o preso Fleury recusouse e na noite de primeiro de março de 1970 um destacamento da Operação Bandeirantes invadiu o DOPS à procura de Shizuo Ozawa Antes de finalmente aceder em entregar o prisioneiro aos militares porém Fleury obrigou Mario Japa a deitarse no chão e saltou com os dois pés sobre seu peito quebrandolhe várias costelas para impedir que os militares pudessem torturálo e descobrir onde estava Lamarca Desta vez as contrapressões do Cenimar não foram suficientes para impedir que as exigências do comando da Operação Bandeirantes à Secretaria da Segurança Pública fossem atendidas Dois dias após a invasão do DOPS pelos agentes do CODIDOI Fleury foi transferido da Divisão de Ordem Social para o 41º Distrito Policial na Vila Rica um longínquo bairro da zona leste da cidade de São Paulo Ali seu desterro duraria pouco menos de seis meses até que em agosto o Cenimar viria novamente em seu socorro No dia 21 de agosto os agentes do Centro de Informações da Marinha prenderam no Rio de Janeiro o exsoldado do Exército desertor do IV Regimento de Infantaria junto com o exca 52 pitão Carlos Lamarca Eduardo Leite que utilizava o codinome de Bacuri Exmilitante da VPR e naquela ocasião ligado a um grupo denominado REDE Resistência Democrática Eduardo Leite foi entregue pelos agentes do Cenimar ao delegado Sergio Fleury no 41º Distrito Policial Usando a prisão de Bacuri como trunfo Fleury voltou ao DOPS AGENTE ITINERANTE O fato de Fleury ter entregue Eduardo Leite ao CODIDOI não foi suficiente entretanto para que fosse esquecida a velha animosidade Os militares não ficaram satisfeitos ao saberem que o delegado e o Cenimar já haviam interrogado o prisioneiro e o devolveram depois de torturálo por vários dias ao DOPS Com as pernas paralisadas Bacuri tornouse incômodo no DOPS e Fleury anunciou à imprensa que ele havia fugido Ainda no DOPS Eduardo Leite ficou sabendo de sua fuga através dos jornais Mais tarde ele seria retirado do DOPS e levado para local ignorado até ser assassinado no dia 8 de dezembro de 1970 em Santos Seu corpo foi entregue à família com os dois olhos vazados as orelhas decepadase todos os dentes arrancados A disputa entre o DOPS e o CODIDOI iria se intensificar ainda mais a partir de outubro de 1970 após a prisão e morte do dirigente da Ação Libertadora Nacional Joaquim Câmara Ferreira quando mais uma vez o delegado não avisou os militares do desenvolvimento de suas investigações Em represália os homens do CODIDOI passaram a enviar para o DOPS apenas os prisioneiros que já não tinham nada a informar ou que se encontravam em condições físicas tão precárias que os tornavam incapazes de serem interrogados Estes episódios todavia serviram para estreitar as ligações do policial com o Centro de Informações da Marinha E seria essa ligação que levaria o delegado Sergio Fernando Paranhos Fleury a participar de sessões de interrogatório sob torturas em vários Estados do Brasil e segundo denúncias de exilados brasileiros presos no Chile e no Uruguai após os golpes de Estado nesses países até no exterior 53 A DOUTRINA DA SEGURANÇA NACIONAL A defesa da segurança nacional pela doutrina da Escola Superior de Guerra não se baseia apenas nas ações do Estado Na verdade de interesse vital para toda a nação a defesa da segurança nacional é uma tarefa básica à qual devem se aplicar todos os setores da sociedade Essa necessidade de integração da sociedade civil com os órgãos governamentais encarregados da manutenção da segurança nacional está expressa no conceito formulado pela ESG segundo o qual A Nação fornece os meios e o Estado as ações para obter a segurança nacional Como desenvolvimento deste raciocínio logo após a vitória do movimento de março de 1964 os militares brasileiros procuraram criar um organismo que reunisse militares e empresários iniciativa aceita com entusiasmo pelos empresários que viam nela a possibilidade de abertura de um novo campo para a iniciativa privada e de ocupação da capacidade ociosa de suas indústrias Aproveitando as teses e a experiência adquirida durante a II Guerra Mundial pelo National War College norteamericano a ESG desejava que este organismo conjunto examinasse a viabilidade em caso de guerra da indústria adaptar suas instalações para a fabricação de equipamento bélico Integrado neste organismo conjunto o GPMI Grupo Permanente de Mobilização Industrial foi o industrial Henning Albert Boilensen dinamarquês naturalizado brasileiro de 55 anos um dos diretores do grupo Ultra que em 1969 colocou aos industriais ligados ao GPMI a questão da participação do empresariado na luta pela manutenção da segurança interna A idéia era de que como a guerra externa a luta antisubversiva 54 era também uma tarefa de defesa da segurança nacional da qual deveriam participar todos os setores da sociedade incluindose aí os empresários Imbuído desta decisão Boilensen reuniu um grupo de empresários que passou a contribuir com dinheiro ou equipamento para os órgãos de segurança O seu entusiasmo por este trabalho que o levou a participar pessoalmente de várias sessões de torturas na Operação Bandeirantes acabou por provocar também a sua morte Na manhã do dia 15 de abril de 1971 ao se dirigir à casa de seu filho o automóvel de Boilensen foi interceptado por um grupo armado O industrial ainda tentou fugir mas foi assassinado com uma rajada de metralhadora pelas costas TORTURA E CORRUPÇÃO Antes mesmo da morte de Boilensen entretanto já havia outros grupos recolhendo dinheiro para financiar as atividades dos órgãos de segurança E se parece fora de dúvidas que Boilensen agia movido por motivos ideológicos acreditando sinceramente no que fazia parece certo também que grande parte das pessoas que se envolveram neste tipo de atividade o fez mais para locupletarse ilicitamente dos dividendos da luta antisubversiva Não é novidade para ninguém que sempre houve no Brasil uma indústria do anticomunismo explica um exdiretor de um órgão de informações mas em nenhum momento de nossa história a exploração da psicose anticomunista de nossas elites gerou tantas fortunas quanto no período que vai de 1969 e 1974 Conservador e profundamente anticomunista ele mesmo recordase de alguns fatos ocorridos naqueles anos Por várias vezes eu fui procurado pelo empresário Paulo Henrique Sawaia Filho economista e exassessor do na época ministro da Fazenda professor Antonio Delfim Netto que vinha me oferecer o equipamento ou dinheiro de que precisasse sem necessidade de qualquer prestação de contas Pessoalmente este exdiretor de serviço de informações sempre recusouse a receber este tipo de auxílio eu lhe dizia 55 apenas que o dinheiro de que necessitava estava na caixa do meu departamento ele lembrase mas tem consciência de que sua atitude foi apenas uma exceção que confirma a regra de corrupção em que se envolveu o aparelho de repressão política Também não é segredo para ninguém ele continua que os agentes dos órgãos de segurança recebiam prêmios mensais muitas vezes superiores a seus salários oficiais E esses prêmios eram ainda mais reforçados quando ocorria a eliminação de algum dirigente subversivo considerado particularmente perigoso A FALSA CIA O aperfeiçoamento deste esquema de corrupção levou à criação de duas empresas de consultoria encarregadas de arrecadar e gerir o dinheiro destinado ao pagamento de prêmios aos agentes dos órgãos de segurança a CIA Consultores Industriais Associados SC e a Intelligence Assessoria Integral Com escritórios no Rio de Janeiro na avenida Passos e em São Paulo na rua Marquês de Itu essas duas empresas possuíam ainda agentes em todas as cidades onde estivessem sediados CODIDOI No Rio de Janeiro para assustar aos contribuintes mais ingênuos os diretores dessas empresas pintaram nas portas de seu escritório o letreiro CIA Intelligence levando os incautos a acreditarem ser ali um escritório da própria CIA Central Intelligence Agency norteamericana Dos quatro diretores conhecidos dessas duas empresas Paulo Henrique Sawaia Filho comandante reformado da Marinha Helio Viana o exjornalista Robert Lentz Plassing e coronel também reformado do Exército Álvaro Galvão dois pelo menos envolveramse direta e pessoalmente na tortura a presos políticos Paulo Henrique Sawaia Junior em São Paulo e Robert Lentz Plassing que no CODIDOI do Rio de Janeiro utilizava o codinome de Samuca Sawaia evidentemente nega tudo Nunca torturei ninguém não conheço nenhum delegado ou diretor de órgão de informações Conheço o Lentz Plassing de quem fui sócio mas não arrecadei dinheiro para a tortura nem sei se ele arrecadou Sou amigo do Jorge 56 Wolney Atalla presidente da Copersucar que também é acusado de financiar a tortura mas não sei se ele fez isso ou não A quanto chegava exatamente o movimento mensal de dinheiro para o financiamento dos órgãos de repressão política através dessas duas empresas talvez nunca se chegue a saber embora seja certo que andava na casa de vários milhões de cruzeiros O interesse dos próprios contribuintes em permanecerem no anonimato tinha um motivo mais forte que a simples ilegalidade da operação a possibilidade de retaliação por parte dos grupos subversivos Um temor compreensível já que além de matarem o industrial Henning Albert Boilensen os grupos de extrema esquerda destruíram vários carros distribuidores de um grupo jornalístico paulista que depois de entregar a direção de um de seus jornais a elementos ligados aos órgãos de segurança cedeu automóveis para serem utilizados pelos agentes do CODIDOI Assim movimentando sem qualquer espécie de controle enormes quantidades de dinheiro é certo que os intermediários faziam chegar às mãos das pessoas diretamente envolvidas na luta antisubversiva apenas uma parte do dinheiro ficando outra parte retida em seus cofres SOB EXTORSÃO Nem todos os empresários que contribuíram para o financiamento das atividades do aparelho de segurança porém o fizeram voluntariamente Na verdade os arrecadadores encontravam uma maior disposição em colaborar por parte dos diretores de empresas multinacionais responsáveis pelo maior volume de dinheiro entregue mensalmente para ser repassado aos órgãos de segurança O que acontecia é que um alto executivo de empresa multinacional não tinha muito a temer Em caso de perigo ele podia simplesmente ser transferido para outro país enquanto o diretor de uma empresa brasileira teria que passar toda sua vida aqui mesmo Por isso contra os empresários brasileiros que se recusavam a colaborar eles praticavam a extorsão ex 57 plica o empresário Kurt Mirow diretor da Codima Máquinas e Acessórios SA ele mesmo vítima dessas pressões Em 1974 Mirow foi procurado por Lentz Plassing que para demonstrar a influência que dizia possuir em círculos governamentais cobrou Cr 3000000 para reescalonar em 200 anos a dívida da Codima com o Instituto Nacional de Previdência Social Feito o reescalonamento conta Mirow Plassing disse que a Codima deveria contribuir com Cr 5000000 mensais para os órgãos de segurança que seriam repassados através de sua empresa Diante de sua negativa Mirow foi a seguir procurado pelo coronel Álvaro Galvão Dizendo ser funcionário do SNI Serviço Nacional de Informações o coronel Galvão mostroulhe aquilo que seria sua ficha pessoal no SNI bem como as dos outros diretores da empresa e a ficha de avaliação economica da Codima com base na qual teria sido estipulada a importância de Cr 5000000 como contribuição mensal Continuei me negando a contribuir e as pressões aumentaram Logo eles estavam fazendo ameaças de violências físicas lembrase o empresário Essas ameaças aumentaram ainda mais quando eles souberam que eu estava escrevendo o livro A Ditadura dos Cartéis porque como as multinacionais eram seus principais contribuintes esse grupo utilizava os agentes do CODIDOI para defender seus interesses pressionando empresários brasileiros Nos meses seguintes Mirow passou a andar armado e acompanhado de um guardacostas diante dos avisos de que iriam colocar uma bomba em sua casa ou automóvel As ameaças de morte só pararam afirma ele quando lhes mostrei cópias protocoladas dos documentos que havia entregue às embaixadas dos principais países europeus denunciando as multinacionais como responsáveis por qualquer coisa que viesse a me acontecer O fim das ameaças de violências físicas não representou entretanto o término das pressões Nosso crédito no Banco do Brasil foi cortado recordase Mirow e tivemos uma série de outros problemas Diante disso não é difícil compreender porque não houve muitos casos de empresários que se dispusessem 58 a afrontálas Na verdade havia muito a ganhar em troca de uma relativamente pequena importância em dinheiro e muito a perder em caso de recusa A VERDADEIRA CIA Você pode descobrir por si mesmo quem foram os grandes financiadores e beneficiários da tortura garante um exdiretor de um órgão de informações basta procurar identificar as grandes fortunas que se fizeram naquele período de forma fácil e aparentemente inexplicável Ele mesmo confessa costumava acompanhar o processo de formação dessas fortunas através da comparação dos relatórios sobre cada empresa elaborados por seus analistas econômicos com as informações que recebia de outras áreas Há o caso por exemplo cita ele sem identificar o personagem de um grande empresário hoje conhecido internacionalmente por patrocinar alguns eventos esportivos e que enriqueceu em poucos anos Diante desse quadro não é difícil compreender também por que João Carlos Di Genio proprietário do cursinho prévestibular Objetivo e mais tarde de uma rede de ensino que inclui colégios secundários e escolas de nível superior fazia questão de alardear sua amizade com o delegado Sergio Fernando Paranhos Fleury Circular como fazia Di Genio nos bares boates e restaurantes da moda em companhia do capitão do Exército Maurício Lopes Lima chefe de uma equipe de busca do CODIDOI do II Exército e acusado de torturar centenas de pessoas hoje promovido a major ele é presidente da Federação Paulista de Ginástica rendia dividendos de caráter mais que puramente sociais Di Genio como Sawaia nega as acusações Não é verdade não contribuí com dinheiro ou de qualquer outra forma para a tortura Conheci o Fleury por acaso porque ele era chefe de segurança da radio Jovem Pan mas não conheço o capitão Maurício Eu até colaboro na campanha dos candidatos do MDB Não apenas empresários nacionais ou estrangeiros entretanto participaram do esforço para a montagem e manutenção 59 dos órgãos onde se praticava a tortura Além deles diversas organizações de extremadireita como a TFP Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição Família e Propriedade cujo militante mais conhecido entre aqueles que envolveramse na tortura foi o delegado paulista Octávio Gonçalves Junior mais tarde morto no Rio de Janeiro ou até mesmo religiosos e católicos conservadores justificaram ou participaram de torturas Entre esses ficou famoso o caso do jornalista e pensador católico Lenildo Tabosa Pessoa acusado de participar do interrogatório de alguns padres presos pelo DOPS paulista O jornalista como os outros nega ter participado de interrogatórios afirmando ter apenas entrevistado os prisioneiros Até mesmo alguns governos estrangeiros participaram através do fornecimento de equipamento ou instrutores das atividades dos órgãos de repressão política Em Minas Gerais lembrase o exchefe do Cenimar Centro de Informações da Marinha no Estado Nelson Galvão Sarmento 51 anos atuavam a partir de 1968 vários agentes da CIA norteamericana doutrinando e instruindo a polícia e os órgãos de segurança nas novas e violentas técnicas de interrogatório Foi por não concordar com essas novas e violentas técnicas de interrogatório afirma o próprio Sarmento que ele se afastou dos órgãos oficiais de combate à subversão Entre esses agentes estava Dan Mitrione que mais tarde seria seqüestrado e morto pelos guerrilheiros uruguaios Tupamaros Mitrioni tornouse bastante conhecido entre os policiais mineiros no biênio 196768 quando a convite do governo do Estado e enviado pelo Ponto IV organismo do governo norteamericano que treina policiais e militares latinoamericanos em operações de contrainsurreição treinou os policiais em atividades nos órgãos de segurança Certa ocasião conta o advogado Geraldo Magela 39 anos advogado de presos políticos há dez anos o norteamericano colocou um preso político nu em frente a 200 policiais e deu uma aula prática de tortura Durante quase uma hora o professor mostrou dando exemplos práticos os locais do corpo humano onde deveriam ser aplicados os choques elétricos e as pancadas para mais facilmente quebrar a resistência do interrogado 60 AUXÍLIO INTERNACIONAL Mas não foram somente norteamericanos que treinaram os torturadores brasileiros Nos relatos das vítimas de torturas daquela época existem várias referências à presença de instrutores sulcoreanos sulafricanos e portugueses A presença de estrangeiros entre os torturadores de serviço nos órgãos de repressão política brasileiros chegou a provocar ameaçar de seqüestro e morte do cônsul de um país do Oriente Médio em São Paulo Após a morte do industrial Henning Albert Boilensen em abril de 1971 a tarefa de recolher subsídios em dinheiro para premiar os agentes dos organismos de segurança foi assumida durante um curto período por este cônsul que já havia trazido ao Brasil um grupo de oficiais do exército de seu país especialistas em torturas para treinar os torturadores brasileiros Esta participação foi descoberta e durante algum tempo as organizações de extremaesquerda ameaçaram sequestrar e justiçar o diplomata Mais eficiente no sentido de leválo a romper estes vínculos no entanto foram as pressões exercidas pela comunidade que representava revoltada com a morte de um de seus membros algum tempo antes em um quartel do Exército no Rio de Janeiro Eu não cheguei a conhecer bem este pessoal nem mesmo o Boilensen conta um delegado de polícia que durante algum tempo esteve lotado na Divisão de Ordem Social do DOPS paulista Pessoalmente conheci apenas o Paulo Sawaia que costumava aparecer na delegacia mas ouvi o pessoal falar muito daquele capitão norteamericano Charles Chandler Segundo ouvi dizer mas eu não posso afirmar porque não vi ele exercia em São Paulo as mesmas funções do Dan Mitrione em Minas até ser assassinado pelos terroristas Ele conheceu bem todavia Pepe um marroquino condenado à morte em seu país por envolvimento em tráfico de entorpecentes e assassinato que a partir de 1970 passou a colaborar com os órgãos de repressão política participando de equipes encarregadas da prisão de subversivos e arrombamento de residências suspeitas Com o aprimoramento do sistema de pagamento de prêmios aos policiais envolvidos na luta anti subversiva vários desses marginais foram recrutados para prestarem serviços aos órgãos de segurança A esses informantes que haviam se ligado aos policiais como alcaguietes de bandidos comuns eram reservadas sempre as tarefas menos qualificadas ou mais perigosas como auxiliares de torturadores ou homens encarregados de abrir a porta de um aparelho residência onde se julgava haver perigo de tiroteio Como não participavam da distribuição de prêmios promovidas pelos empresários trabalhavam pelo direito de saque aos aparelhos subversivos que descobriam e pela certeza de impunidade em seus negócios ilícitos VI COISAS DE ARREPIAR Meu Deus meu Deus o que eu fiz da minha vida O desabafo arrependido é de J um delegado da polícia paulist a lotado durante vários anos na Divisão de Ordem Social do DOPS e cujo nome figura na relação de 233 torturadores preparada pelos presos políticos paulistas Não estou arrependido pelo que fiz porque felizmente nunca precisei fazer nada de que me envergonhe nem pelo que lutei porque continuo anticomunista ele explica Arrependome pelo que não fiz diante do que vi e por ter sido tão ingênuo acreditando em promessas que nunca foram cumpridas onde está a reforma agrária de que tanto nos falaram ele pergunta As promessas segundo J eram de democracia liberdade e distribuição de renda para se chegar a uma sociedade mais justa Foi por isso que eu lutei arrisquei minha vida em tiroteios de rua e apesar de nunca ter torturado ninguém vi coisas de arrepiar J saiu do DOPS a pedido por livre e espontânea vontade ele faz questão de frisar em 1974 quando estava apenas se iniciando por decisão do então presidente Ernesto Geisel o processo de desativação do aparelho de segurança do Estado Um processo lento que durou quase quatro anos e não se desenvolveu sem dificuldades que iria ter seu ponto culminante em janeiro de 1976 com a saída imediatamente após a morte do operário Manoel Fiel Filho nas dependências dos CODIDOI paulista do general Ednardo DÁvila Mello do comando do II Exército Mas o ponto de no return havia sido alcançado três meses antes em outubro de 1975 no episódio da morte do jornalista Vladimir Herzog no CODIDOI do II Exército conta BERNARDO Odair Oliveira SOUZA Maria Tereza Saraiva de DEMAJOROVIC Jacques FON Antonio Calos Tortura A história da repressão política no Brasil São Paulo Global 1979 GAZZOTI Juliana O livro escrito pelo jornalista Antonio Carlos Fon Tortura a história da repressão política no Brasil é um grande e corajoso livro publicado no ano de 1979 ano em que ocorria a Ditadura Militar no Brasil Nesse sentido Fon denuncia de maneira assídua as torturas e assassinatos que foram praticados nos porões do DOPS e do DOICODI no qual o próprio autor conta também as suas próprias torturas Diante do exposto é necessário frisar os acontecimentos descritos na obra para se entender a importância da mesma para a história política do Brasil Nessa ótica Antônio traz sua visão de que prender torturar matar eram coisas permitidas em prol de defender a segurança nacional Com isso é de suma relevância notar que o tema abordado por Fon a política sistemática de tortura a presos políticos durante a ditadura ainda era um tema muito sensível e desconhecido pela sociedade da época Desse modo o livro fez com que entrasse em pauta no Brasil o debate político nacional Ademais Fon ainda descreve de maneira muito eficaz como a morte do ex sargento Manoel Raimundo Soares gerou uma grande gama de manifestações pois haviam muitas evidências que apontavam como culpado à polícia política Sendo que a polícia não foi punida apesar de várias testemunhas e isso fez com que várias manifestações de protestos promovidas por estudantes produzissem a generalização de denúncias de torturas por todo o Brasil Nessa ótica a obra flui facilmente e infelizmente com várias mortes descaradas e injustas realizadas pela polícia da época as quais são importantes destacar para mostrar a realidade da época e também o que Antonio Fon quis produzir com estes relatos Nesse viés a injustiça da vez foi referente a morte de Virgílio Gomes no qual impacta pela maneira da mesma Desse modo Virgílio era denominado Jonas e Jonas foi morto por centenas de pontapés produzidos pelos capitães furiosos por ele resistir à prisão e mesmo na câmara de tortura e algemado foi corajoso e se contrapôs aos capitães recusando a dizer onde estavam seus companheiros e revidando às agressões Em suma os relatos de resistências os meios de torturas feito por policiais da época e os instrumentos utilizados são descritos com propriedade por Antonio Fon Nessa perspectiva acredito que a importância crucial da obra se dá pelo fato do ditado popular Um povo que não conhece a própria história está destinado a sempre repetir os mesmos erros Dessa forma o livro estando presente na literatura histórica brasileira é um grande pontapé inicial para que o Povo não deixe acontecer novamente estas crueldades que aconteceram nos anos de Ditadura Militar e que resistam da melhor maneira que conseguirem BERNARDO Odair Oliveira SOUZA Maria Tereza Saraiva de DEMAJOROVIC Jacques FON Antonio Calos Tortura A história da repressão política no Brasil São Paulo Global 1979 GAZZOTI Juliana Resenha escrita por Coloque seu nome O livro escrito pelo jornalista Antonio Carlos Fon Tortura a história da repressão política no Brasil é um grande e corajoso livro publicado no ano de 1979 ano em que ocorria a Ditadura Militar no Brasil Nesse sentido Fon denuncia de maneira assídua as torturas e assassinatos que foram praticados nos porões do DOPS e do DOICODI no qual o próprio autor foi torturado nesses porões Diante do exposto é necessário frisar os acontecimentos descritos na obra para se entender a importância da mesma para a história política do Brasil Nessa ótica Antônio traz sua ótica de que prender torturar matar eram coisas permitidas em prol de defender a segurança nacional com isso é de suma relevância notar que o tema abordado por Fon a política sistemática de tortura a presos políticos durante a ditadura ainda era um tema muito sensível e desconhecido pela sociedade Desse modo o livro fez com que entrasse em pauta no Brasil o debate político nacional Ademais