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Brazilian Journal of International Relations ISSN 22377743 Edição Quadrimestral volume 8 edição nº 1 2019 O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados a experiência do Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia nos casos de violência de gênero Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Instituto de Gestão Pública e Relações Internacionais Unversidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho A Brazilian Journal Of International Relations BJIR está indexada no International Political Science Abstracts IPSA EBSCO Publishing e Latindex 98 Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 O ESTUPRO COMO ESTRATÉGIA DE GUERRA EM CONFLITOS ARMADOS A EXPERIÊNCIA DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL PARA A ANTIGA IUGOSLÁVIA NOS CASOS DE VIOLÊNCIA DE GÊNERO Bárbara de Abreu Oliveira1 Jayme Benvenuto Lima Júnior2 Resumo A violência contra a mulher é uma prática antiga e com o passar do tempo os crimes de natureza sexual foram se naturalizando ainda mais em conflitos domésticos e internacionais em que a situação de vulnerabilidade é sentida de forma ainda mais contundente por mulheres que sofrem agressão sexual O século XX foi marcado por conflitos como o da antiga Iugoslávia conhecido como um dos marcos da discussão jurídica sobre a violência contra a mulher como crime internacional Por meio de uma pesquisa bibliográfica este artigo propõe estudar como o Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia incorporou os crimes de violência sexual na sua normativa e jurisprudência considerando a prática desses atos de natureza sexual uma estratégia de guerra em que o principal objetivo é desmoralizar e destruir uma população em função de elementos étnicos e nacionais Com a incorporação de gênero na jurisprudência do tribunal o Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia tipifica os crimes de violência sexual como crime contra humanidade e entende que esse tipo de violação também deveria ser julgado sob o art 3º em condição de Violações das Leis ou Costumes de guerra A prática desses crimes é muito mais que a simples prática de opressão a um grupo vulnerável por parte do Estado mas uma imposição do símbolo de poder de gênero Palavraschave Direitos Humanos Violência Sexual Conflitos Internacionais Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia THE RAPE AS A WAR STRATEGY IN ARMED CONFLICTS AN EXPERIENCE OF THE INTERNATIONAL CRIMINAL COURT FOR OLD YUGOSLAVIA IN THE CASES OF GENDER VIOLENCE 1 Graduada em Relações Internacionais pela Universidade Federal de Uberlândia UFU É discente do Programa de Pós Graduação em Direitos Humanos na Universidade Federal de Pernambuco UFPE Email barbaraabreu1995hotmailcom 2 Professor Doutor dos Programas de PósGraduação stricto sensu em Direito e em Direitos Humanos da Universidade Federal de Pernambuco UFPE Ministra a disciplina Direito Internacional Público na UFPE É Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco e Doutor em direito pela Universidade de São Paulo USP Realizou estágio PósDoutoral em Direito Internacional dos Direitos Humanos na Universidade de Norte Dame É bolsista do CNPq em pesquisa Email jaymebenvenutounilaedbr O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados 99 BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 Abstract Violence against women is an old practice and over time crimes of a sexual nature have been further naturalized in domestic and international conflicts where the situation of vulnerability is felt even more bluntly by women who suffer sexual assault The twentieth century was marked by conflicts such as that of the former Yugoslavia known as one of the milestones of the legal discussion on violence against women as an international crime Through a bibliographical research the present article proposes to study how the International Criminal Tribunal for the former Yugoslavia incorporated the crimes of sexual violence in its normative and jurisprudence considering the practice of these acts of a sexual nature a war strategy in which the The main objective is to demoralize and destroy a population based on ethnic and national elements With the incorporation of gender in the jurisprudence of the court the International Criminal Tribunal for the former Yugoslavia typifies crimes of sexual violence as a crime against humanity and understands that this type of violation should also be judged under art 3 in the condition of Violations of Laws or Customs of war The practice of these crimes is much more than the simple practice of oppression of a vulnerable group by the state but an imposition of the symbol of gender power Keywords Humans rights Sexual Violence International Conflicts International Criminal Tribunal for the Former Yugoslavia 100 Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 I INTRODUÇÃO Após a Segunda Guerra Mundial o debate no âmbito da comunidade internacional sobre os crimes de natureza sexual contra a mulher passou a contribuir para a ampliação da proteção dos direitos humanos e do direito humanitário internacionais especialmente na perspectiva de gênero Esse fato se deu em paralelo a um processo de emancipação das mulheres e à ampliação da participação delas em espaços públicos Um dos marcos importantes na luta dos direitos das mulheres é a Declaração Universal dos Direitos Humanos adotada pelas Nações Unidas em 1948 Nesse sentido convém ressaltar que o texto da declaração afirma que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos sem distinção de raça cor sexo religião origem nacional ou social entre outros JELIN 1994 p 121 A Declaração expressa princípios tidos como universais entre os quais a defesada igualdade e da liberdade Em relação à busca dos direitos e à participação das mulheres na sociedade contemporânea esses elementos ampliaram possibilidades de luta e ações em busca da cidadania JELIN 1994 Com o passar do tempo e o desenvolvimento de pesquisas que passaram a ter como recorte a perspectiva de gênero as práticas de violência sexual contra mulheres foram sendo visibilizadas em números alarmantes das violações de direitos nos conflitos armados Em situações de conflitos o estupro é utilizado como uma estratégia de guerra constituindose em ferramenta para ameaçar humilhar torturar eou desestabilizar o inimigo passível de ser utilizado como instrumento para genocídio e limpeza étnica PEREIRA CAVALCANTI 2015 p 8 Além de serem submetidas a atos de violência sexual a vida e os corpos dessas mulheres eram objetificados sendo usados também como recompensa nos espólios de guerra em situações em que muitas mulheres foram transformadas em escravas AZEVEDO 2014 p 3 No campo do direito internacional humanitário entendido aqui como complementar aos direitos humanos e do direito penal internacional o tema da violência sexual passou a ser objeto de decisões judiciais relacionadas a crimes de guerra crimes contra a humanidade e como formas de genocídio3 A violação dos direitos das mulheres vem sendo relatada por 3A complementaridade entre os direitos humanos e o direito internacional humanitário é defendida por autores que entendem os direitos humanos como o direito da pessoa em qualquer tempo e o direito internacional humanitário como um direito de exceção o direito de militares e civis em situação de conflito armado Os primeiros tratados internacionais a reconhecer o direito das mulheres civis em conflitos armados foram as Convenções de Genebra e seus Protocolos O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados 101 BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 exemplo em alguns casos julgados pelo Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia o que permite identificar práticas comuns de opressão da mulher por meio da violência sexual Esse tipo de discussão também passou a fazer parte de um debate póspositivista e feminista na Teoria de Relações Internacionais que questiona também como formulações teóricas tendem a reproduzir hierarquias de poder no âmbito das sociedades As formas relativas de como os aspectos ideacionais impactam e são impactados pelas relações internacionais são importantes na discussão sobre o caráter socialmente construído da violência presente nas relações sociais TICKNER 1992 p 8 Nesse sentido por meio de uma análise qualitativa considerando o estupro como uma estratégia de guerra para disseminar o ódio e o medo entre a população o principal objetivo deste artigo é estudar como se deu a incorporação dos crimes de violência sexual contra a mulher na normativa e na jurisprudência do Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia adotando uma abordagem histórica e teórica sobre a violência de gênero Fruto de uma pesquisa bibliográfica o artigo é desenvolvido utilizando fontes primárias e secundárias relacionadas às temáticas de violência de gênero estudos feministas conflitos armados e ao Tribunal ad hoc para Ex Iugoslávia Após uma análise precisa além desta introdução o artigo está dividido em três partes Na primeira sessão intitulada A discussão teórica sobre a violência de gênero buscouse apresentar uma breve contextualização acerca da violência de gênero apresentando os principais conceitos trabalhados na teoria feminista Na segunda sessão O conflito étnico na Ex Iugoslávia e a política de estupro de mulheres como estratégia de guerra de forma sucinta são apresentadas as principais causas e consequências oriundas do conflito étnico que ocorreu na Ex Iugoslávia dando enfoque principalmente à violação dos direitos humanos das mulheres Na terceira sessão deste artigo A experiência do Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia nos casos de violência de gênero buscouse evidenciar aspectos da jurisprudência do Tribunal ad hoc para Ex Iugoslávia tendo como foco os principais casos que comprovem a violência de gênero como um crime do direito internacional Por fim o estudo compreende a importância que a instauração do mecanismo significou para a jurisprudência internacional principalmente em relação à tipificação ao julgamento e à condenação de indivíduos que compactuam com crimes que violam os direitos das mulheres A violência contra a mulher é um fenômeno antigo e visando à naturalização destes crimes na sociedade entendese a magnitude do tema e a importância de uma análise sobre a violência contra a mulher em situações de conflitos internacionais julgados pelo Tribunal ad hoc para a Ex Iugoslávia Atualmente existem inúmeros estudos de gênero principalmente em inglês Portanto além da contribuição nos 102 Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 estudos sob perspectiva de gênero este trabalho busca tratar uma temática que merece ter o conhecimento ampliado no Brasil II A DISCUSSÃO TEÓRICA SOBRE A VIOLÊNCIA DE GÊNERO A violência contra a mulher em conflitos armados é tanto uma manifestação da desigualdade de gênero entre homens e mulheres quanto uma arma cujo objetivo é disseminar o ódio e o medo na população É uma maneira que os grupos conflitantes estabelecem relações de poder entre si e sobre a área afetada FALCÃO 2015 p 8 Ao longo do século XX os crimes de natureza sexual contra mulheres foram sendo evidenciados em situações de conflitos domésticos e internacionais em que a situação de vulnerabilidade da população é sentida de forma ainda mais contundente por mulheres que sofrem agressão sexual De acordo com Griffiths e OCallaghan 2002 é após a década de 1980 que o feminismo passa a ter relevância nos estudos de Relações Internacionais Segundo o autor As críticas iniciais do feminismo ao estudo das relações internacionais vieram inicialmente para desafiar as bases fundamentais da disciplina e apontar formas com que as mulheres eram excluídas das análises dos estados da política econômica internacional e da segurança internacional GRIFFITHS OCALLAGHAN 2002 p 107 De fato no ambiente acadêmico de Relações Internacionais um dos obstáculos mais destacados em relação ao movimento feminista é a forma como a violência de gênero foi conceitualmente excluída como objeto de estudo Os desafios feministas bem definidos e defendidos nas Relações Internacionais chamam atenção para compreender a violência em relação à segurança SHEPHERD 2007 p 240 Além disso Veneracion Rallonza 2004 afirma que atualmente as mulheres e a questão de gênero se encontram interligadas nos espaços nacionais e internacionais e a partir do momento que o feminismo adiciona esses conceitos às Relações Internacionais tratase de uma tentativa de tornar tanto o discurso quanto a prática responsáveis até mesmo ao ponto de travar uma batalha discursiva com grandes teorias tradições positivistas e hegemonias metodológicas VENERACION RALLONZA 2004 p 387 Tradução nossa4 Laura J Shepherd 2007 em sua obra intitulada Victims Perpetrators and Actors revisited exploring the potential for a feminist reconceptualisation of internacional security 4 Versão Original na attempt to render both the discourse and practice of the field accountable even to the point of waging a discursive battle with grand theories positivist traditions and methodological hegemons VENERACION RALLONZA 2004 p 387 O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados 103 BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 and gender violence adiciona em seu argumento que a noção de soberania é um elemento principal na literatura sobre segurança internacional Pesquisas que enfocam a violência contra as mulheres colocam as mulheres como sujeitos coerentes e estáveis cujas experiências de vida podem ser melhoradas por uma prática política apropriada O sujeito construído através do discurso da violência contra as mulheres é assumido como soberano as mulheres afetadas pela violência têm direitos soberanos sobre suas próprias formas materiais e não devem portanto ser submetidas à violência Além disso essa soberania é pré constituída e considerada uma realidade empírica SHEPHERD 2007 p 243 244 Tradução nossa5 O termo gênero como uma forma de referência à organização social da relação entre os sexos passou a ser adotado pelos estudos e teorias feministas em um processo de afirmação da abordagem SCOTT 1986 p 1053 De acordo com a mesma autora apud RODRIGUES e ARAÚJO 2016 os quatro elementos que constituem o termo gênero são a identidade subjetiva que deve ter um referencial histórico e não unicamente psicológico a percepção política e as instituições sociais a noção de que gênero se baseia no sexo mas não é determinado por ele e por último que ele é uma forma de representação de poder RODRIGUES ARAÚJO 2016 p 4 Para Scott 1986 esses fragmentos estão interrelacionados Ademais gênero é um elemento constitutivo das relações sociais baseado nas diferenças existentes entre os sexos ou seja é uma forma primária das relações de poder SCOTT 1988 p 42 44 Em conformidade com Scott 1986 os historiadores feministas buscavam empregar uma variedade de abordagens para a análise de gênero porém passaram a abordar três posições teóricas A primeira tenta explicar as origens do patriarcado A segunda encontrase no âmbito da tradição marxista e procura uma acomodação com as críticas feministas e a terceira constituída entre os estudiosos pósestruturalistas busca explicar a produção e a reprodução da identidade de gênero SCOTT 1986 p 1057 1058 Este trabalho não adota uma perspectiva específica mas busca ressaltar diversas contribuições teóricas que contribuem para pensar a violência de gênero incorporada à jurisprudência dos tribunais internacionais com foco no Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia 5 Versão Original Research that focuses on violence against women posits women as coherent and stable subjects whose life experiences can be ameliorated by appropriate policy practice The subject constructed through the discourse of violence against women is assumed sovereign the women affected by violence have sovereign rights over their own material forms and should not therefore be subjected to violence Moreover this sovereignty is preconstituted and taken to be an empirical reality SHEPHERD 2007 p 243 244 104 Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 Em Women and the postsovereign state a feminist analytic of the state in the age of globalization Lourdes Veneracion Rallonza 2004 analisa o crescimento do movimento feminista em busca dos direitos das mulheres e como este movimento tem desafiado a hegemonia masculina principalmente no direito internacional uma vez que os direitos das mulheres começaram a ser evidenciados nas agendas estatais Ao argumentar sobre a situação das mulheres em tempos de guerras Yuval Davis 1997 p 109 apud VENERACION RALLONZA 2004 p 387 Tradução nossa 6a autora deixa claro seu argumento afirmando que até recentemente não se dava muita atenção para consequências de gênero na guerra uma vez que 80 da população de refugiados são compostas por mulheres e crianças E muitas delas são submetidas à tortura e ao estupro pelos soldados inimigos Nesse sentido uma das referências importantes que orientaram este estudo é o artigo de Marilena Chauí intitulado Participando do debate sobre mulher e violência que tem como foco a violência de gênero Em sua obra a autora argumenta que a violência contra as mulheres é o resultado de uma dominação masculina que pode ser produzida tanto por homens como por mulheres Além disso Chauí define a violência como um ato que tende a transformar diferenças em desigualdades cujo objetivo é dominar explorar e oprimir CHAUÍ 1985 p 36 Antes da obra de Chauí 1985 foi publicado por Susan Brownmiller 1975 o artigo Against Our Will Men Women and Rape que tratou especificamente sobre o crime de natureza sexual contra a mulher como uma demonstração de força dos homens sobre as mulheres FALCÃO 2015 p 9 Nas palavras da autora como uma arma básica de força contra as mulheres o estupro uma prerrogativa masculina é menos um crime sexual do que uma chantagem protetora é um crime político onde os homens mantêm as mulheres subordinadas como o segundo sexo BROWNMILLER 1975 p 1516 Tradução nossa7 Conforme Saffioti 2011 argumenta violência de gênero é o conceito mais amplo abrangendo vítimas como mulheres crianças e adolescentes de ambos os sexos Com efeito a ideologia de gênero é insuficiente para garantir a obediência das vítimas potenciais aos ditames do patriarca tendo este necessidade de fazer uso da violência SAFFIOTI 2011 p 115116 Tradução nossa8 6 Versão Original Until recently not much attention has been given to the gendered consequences of war where up to 80 percent of the refugee population is made up of women and children YuvalDavis 1997 p 109 or where women are put through the torture of rape by enemy soldiers 7 Versão Original As basic weapon of force against women rape a male prerogative is less a sexual crime than a protective blackmail It is a political crime the definitive means of men keep women subordinate as the second sex 8 Além disso Saffioti 2011 acredita que nada impede a mulher de praticar violência física contra seu companheiro e ressalta que as mulheres também podem desenvolver a função patriarcal SAFFIOTI 2011 p 116 O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados 105 BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 Em conflitos armados os corpos das mulheres tornamse campos de batalhas acarretando em resultados devastadores para as vítimas De acordo com Brown 2012 o próprio estupro é infundido com a dinâmica de poder uma vez que já foi reconhecido por parte dos estudiosos feministas que a violação é muito mais sobre o poder do que sobre o sexo BROWN 2012 p 27 Um exemplo que Brown 2012 usa a favor de seu argumento são os inúmeros conflitos armados que marcaram a República Democrática do Congo Muitosas teóricosas feministas veem os crimes de natureza sexual contra a mulher como uma arma de guerra resultando no fato de que a violência sexual e de gênero aumentou simultaneamente devido à sua eficácia nos conflitos armados BROWN 2012 p 27 Conforme Falcão 2015 argumenta muitos autores da teoria feminista nas décadas de 19902000 vão seguir o pressuposto da violência sexual contra a mulher como arma de guerra buscando enfatizar os casos ocorridos na antiga Iugoslávia e em Ruanda FALCÃO 2010 p 10 Além dos crimes de violência sexual em conflitos armados estabelecerem o medo e o terror Falcão 2015 ressalta que é especialmente cruel para as mulheres pois estas se vêem vítimas de múltiplas violências de guerra mas quando se trata das mulheres a violência dos conflitos armados assume um caráter de gênero pois as vítimas sempre são humilhadas torturadas e violentadas por meio de agressões de cunho sexual FALCÃO 2015 p 1011 Ao abordar a teoria feminista no processo de globalização VeneraciónRallonza 2004 argumenta que para o feminismo o estado póssoberano representa oportunidades em dois sentidos Por um lado o feminismo se estabelece como uma força relevante no âmbito global regional e nacional e por outro lado ao fazer uso do espaço global é preciso manter certa distância para que a luta pela justiça de gênero não enfraqueça Portanto para o feminismo o estado póssoberano é visto tanto como um parceiro quanto como um inimigo Um grande avanço na luta das mulheres foi o reconhecimento dos seus direitos na Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas em 1948 como sujeitos de do direito internacional Porém VeneraciónRallonza 2004 apresenta uma critica feminista à formulação tradicional de Direitos Humanos afirmando que os fabricantes das convenções não conseguiram ver que os direitos humanos tradicionais são formulados com base na 106 Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 normativa masculina e aplicados às mulheres como uma reflexão tardia VENERACION RALLONZA 2004 p 394 Tradução nossa9 Com o propósito de entender o uso do estupro como uma arma de guerra a próxima seção deste artigo tem como principal objetivo apresentar uma breve contextualização sobre o conflito étnico que marcou a antiga Iugoslávia com foco na violação dos Direitos Humanos das mulheres que foram sexualmente abusadas III O CONFLITO ÉTNICO NA EXIUGOSLÁVIA E A POLÍTICA DE ESTUPRO DE MULHERES COMO ESTRATÉGIA DE GUERRA A República Federativa Socialista da Iugoslávia situada no Sudeste do continente Europeu era composta por seis repúblicas além de duas províncias autônomas10 abrangendo sérvios croatas eslovenos macedônios montenegrinos e muçulmanos e outros BENVENUTO 2006 p 223 As origens do conflito no território da antiga Iugoslávia estenderamse por vários anos De acordo com Maia 2001 o conflito teve início em 1941 mediante a ação nazista de invasão do território da Iugoslávia estabelecendo aliança com os croatas que posteriormente deram início ao processo de deportação da população sérvia MAIA 2001 p 102 Em 1944 em uma ação comandada pelo Marechal Josip Broz Tito com a ajuda da URSS e do Reino Unido os alemães foram expulsos do território da Iugoslávia Posteriormente em 1980 após a morte do Marechal Tito os conflitos voltaram a emergir agravandose em 1987 juntamente com a crise econômica que desestabilizava o país MAIA 2001 p 103 Em 1989 o controle do Estado caiu em mãos do líder sérvio Slobodan Milosevic que devido aos ressentimentos que a minoria sérvia sentiu em Kosovo utilizou destes para dar início a uma perseguição à minoria albanesa que residia na Iugoslávia PENACHIONI 2017 p 39 Devido ao tratamento frio por parte do presidente Slobodan Milosevic na província de Kosovo que teve sua autonomia extinta contando com diversas manifestações violentas as demais províncias também se sentiram reprimidas e assim a Eslovênia Croácia e a ex República Iugoslava da Macedônia declararamse independentes em 1991 e a Bósnia Herzegovina em 1992 BENVENUTO 2006 p 225 Portanto entendese que em nome do 9 Versão Original What the covenant makers failed to see is that traditional human rights formulations are based on normative male models and applied to women as na afterthought RALLONZA 2007 p 394 10 O território da antiga Iugoslávia era formado por seis repúblicas sendo elas Eslovênia Croácia Bósnia Herzegovina Sérvia Montenegro e Macedônia Além das duas províncias Voivodina e Kosovo BENVENUTO 2006 p 223 O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados 107 BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 direito à autodeterminação dos povos as declarações de independência das províncias da antiga Iugoslávia acirraram ainda mais o conflito já existente De acordo com Fernandes 2006 o principal objetivo do conflito iniciado pelos sérvios era realizar uma limpeza étnica no território da Iugoslávia E como resultado esperavase a formação de uma GrãSérvia FERNANDES 2006 p 69 O território era conhecido por sua grande diversidade étnicoreligiosa portanto no momento em que a limpeza étnica ocorreu é necessário evidenciar os inúmeros casos de violações contra o Direito Humanitário e os Direitos Humanos no território destacando principalmente os casos de genocídio NAKAMURA 2009 p 30 Nesse sentido Andréa Peres 2011 destaca em sua obra A limpeza étnica fundamental para homogeneização populacional do território realizouse através da transferência de população literalmente um ônibus pegava as pessoas em casa e as levava até o território sob domínio dos seus expulsão e extermínio Queimas de casas templos religiosos e plantações estupros torturas e assassinatos também contribuíram nesse processo que podemos dizer foi bem sucedido ao dividir o território separando pessoas com base em sua ascendência étnica nacional religiosa e fazendo com que o antigo modo de vida baseado na coexistência e na heterogeneidade passasse a ser inconcebível PERES 2011 p 125 Entre as inúmeras violações de direitos humanos este conflito foi marcado por incontáveis violações contra os direitos das mulheres De acordo com Gustavo Silva 2011 o estupro era uma estratégia usada pelas forças sérvias contra a população resultando na criação de campos direcionados apenas para essa prática Estimase que de 20000 a 50000 mulheres sofreram agressão sexual no conflito da antiga Iugoslávia SILVA 2011 p 64 A violação de mulheres e meninas acontecia ou durante os expurgos da limpeza étnica nas casas nos barracões em espaços públicos ou em campos especiais Algumas vítimas relataram que eram requisitadas para servir aos combatentes sérvios Na associação para as vítimas do genocídio em Zenica há evidência de dezessete campos de estupro principalmente em motéis escolas serrarias e casas privadas Há mulheres que foram pegas em suas casas e levadas às linhas de frente onde eram submetidas aos mais bestiais dos abusos Em Foča mulheres relatam estupros em público na frente de maridos e crianças de vizinhos e de outros soldados VULLIAMY 1994 p 199 apud PERES 2011 p 12811 Como mencionado foram criados inúmeros campos de estupro Em geral os campos funcionavam em escolas armazéns hotéis entre outros estabelecimentos e os crimes eram praticados principalmente contra as muçulmanas bósnias as quais eram forçadas a terem relações sexuais com mais de um soldado repetidas vezes PERES 2011 p 119 11 VULLIAMY Ed Seasons in hell understanding Bosnias war New York NY St Martins Press 1994 108 Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 Segundo relatos apresentados na obra de Andréa Peres 2011 intitulada Campos de estupro as mulheres e a guerra na Bósnia vítimas afirmam que muitas dessas mulheres que foram propositalmente engravidadas eram mantidas em cárcere e liberadas quando não pudessem realizar o aborto Esses relatos afirmam que com o intuito de interromper a gravidez as mulheres se golpeavam na barriga ou introduziam água fervente na vagina para provocar a eliminação do feto Além disso as crianças que nasciam advindas do estupro carregavam consigo a possibilidade de serem rejeitadas por suas famílias e serem entregues para adoção PERES 2011 p 133 por serem indesejadas Esse tipo de atitude tem como objetivo claro controlar a descendência dos povos como afirma Peres 2011 Numa guerra de extermínio ou de limpeza étnica como ocorreu na Bósnia fazer as mulheres terem os filhos é controlar a descendência matando seus homens e dominando a prole e concordando com Hayden 2000 transformando animosidade em ódio e medo impelindo o outro a não retornar PERES 2011 p 120 Em busca por fazer justiça às vitimas e exprimir todo o sofrimento sofrido pelas mulheres no conflito a Associação MulheresVítimas da Guerra 2010 apud PERES 2011 dirigida por Bakira Hasečić também vítima de estupro expôs sua vivência no conflito na antiga Iugoslávia relatando que Acometeramnos crimes de violência sexual abusos físicos indizíveis para um ser humano normal Fomos mortas jogadas em buracos e valas comuns Fomos estupradas em massa raptadas trancadas em prisões e campos torturadas levadas a fazer trabalhos forçados expulsas à força de nossas vilas e cidades pilharam nossos imóveis e bens de valor e inúmeras outras formas brutais de humilhação e não raramente meninas entre 12 e 14 anos eram retiradas à força de suas famílias e levadas a locais específicos onde eram submetidas a terríveis torturas estupradas e submetidas a outras formas de abusos incluindo punições físicas e morte Tal crime é a ideologia daqueles cujo objetivo era realizar a pior forma de genocídio estupro É difícil dizer aqui o número exato de mulheres estupradas e vítimas de abuso durante a agressão à BiH12 Não é pequeno o número de mulheres estupradas que preferiram o silêncio tamanha é a dor e não desejam dividir sua terrível humilhação com ninguém Muitas meninas e moças não desejam nunca casar Muitas devido ao estupro foram largadas pelos maridos e sobre muitas nem os maridos nem os membros da família sabem o que lhes aconteceu Os estrategistas e planejadores da agressão conheciam muito bem as vítimas sabiam precisamente qual a reação que o estupro provocaria na vítima e no seu meio imediato família parentes e vizinhos Das muitas ameaças declaradas que sofreram ecoa aquela que diz Se disser a alguém o que aconteceu com você será morta A ameaça mantém a vítima em constante medo de contar a verdade A luta pela verdade vence em muitos casos mas sabemos que seguramente há ainda muitas histórias não contadas Por isso nós rompemos o silêncio falamos claramente sobre os estupros e 12 BósniaHerzegóvina ou Bosna i Hercegovina A forma abreviada é do original O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados 109 BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 abusos que aconteceram durante a agressão contra à BiH PERES 2011 p 151 152 As graves violações aos Direitos Humanos fizeram com que o Conselho de Segurança da ONU se manifestasse classificandoo como doméstico determinando posteriormente em sua resolução 713 que era objetivo da ONU a preservação da integridade da Iugoslávia uma vez que o conflito caracterizava uma ameaça para a paz e segurança mundiais impondo embargo à venda de armamentos MAIA 2001 p 103 Nesse sentido o Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia foi instaurado em 1993 por meio da resolução 8273 aprovada pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas CSNU a fim de julgar as inúmeras atrocidades cometidas no território dos Bálcãs DEVENS 2004 p 49 Os estupros genocidas ocorridos no território da antiga Iugoslávia funcionaram como uma forma de destruir determinados grupos da sociedade sendo os atos violentos praticados interpretados como um modo de humilhar suas vítimas em função da origem étnica A próxima seção deste artigo visa entender como o Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia reconhece a violência de gênero como um crime contra o direito internacional em seu Estatuto IV A EXPERIÊNCIA DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL PARA A ANTIGA IUGOSLÁVIA NOS CASOS DE VIOLÊNCIA DE GÊNERO Em 1993 o Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia foi instaurado com o objetivo de julgar pessoas responsáveis por graves violações do direito internacional humanitário que foram vivenciadas no conflito que marcou esse país desde 1991 TRINDADE 2013 p 31 Estabelecido no dia 25 de maio de 1993 pela resolução 82793 o Tribunal com sede em Haia já indiciou mais de 160 pessoas O TPIY indiciou vários líderes políticos acusados de cometerem crimes que violaram os direitos de várias etnias localizadas na Croácia na Bósnia e Herzegovina em Kosovo na Sérvia entre os anos de 1991 a 200113 Com a instauração do Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia foi atribuída à corte a competência para julgar os crimes mais relevantes e amplamente reconhecidos pela sociedade internacional Em quatro categorias o Estatuto prevê o julgamento baseados nos artigos 2º ao 5º sendo eles Infrações graves às convenções de Genebra de 1949 Violações 13 Todas as informações sobre o Tribunal ad hoc para a exIugoslávia estão no sítio eletrônico das Nações Unidas Disponível em httpwwwictyorgenabout 110 Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 das leis ou costumes de guerra Genocídio e Crimes contra a humanidade BENVENUTO 2006 p 236 No que se refere à evolução dos direitos das mulheres o Estatuto do Tribunal concebe o crime de violação como crime contra humanidade art 5º al g No entanto diferente do Tribunal Internacional para Ruanda o estatuto do TPIY não foi claro na atribuição da competência para julgar crimes de violência contra mulher como crime de guerra Em termos concretos porém o Tribunal tem entendido que a violação não deve ser julgada apenas como crime contra humanidade por força de coerência normativa Portanto o Tribunal buscou incorporar outras diretrizes nos julgamentos que envolvem a violação dos direitos das mulheres como Sónia Fidalgo 2007 expressa em seu texto o TPIJ em inúmeras situações condenou os arguidos por violação e outras formas de violência sexual socorrendose de outras normas do Estatuto e afirmou que a violação e outras formas de violência sexual devem ser consideradas graves violações das leis e costumes de guerra FIDALGO 2007 p7 Uma das grandes contribuições do TPIY é o avanço no sentido de reconhecer os crimes que envolvem a violência sexual contra as mulheres como crime de guerra e crime contra a humanidade No julgamento dos casos Karadizic14 e Mladic15 o Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia concluiu que as práticas de violência sexual contra mulheres eram parte de uma estratégia para atingir o grupo oponente utilizando métodos que interferiram nos valores religiosos e únicos cultivados por esses povos De acordo com Trindade 2016 um dos métodos utilizados para desestabilizar o grupo foram os constantes estupros contra mulheres considerados sistemáticos Além disso no caso Kunarac Kvocka e Vukovic16 o tribunal decidiu que o estupro foi usado como um instrumento de terror por parte dos membros das forças armadas sérvias e bósnias No julgamento foi estabelecido que uma orgia infernal de perseguição marcou Omarska e alguns acampamentos situados na Bósnia AJONU 2012 Os réus foram acusados de estupro além de haverem praticado ajudado e influenciado em atos sexuais contra mulheres incluindo uma jovem de 15 anos As investigações conduzidaspelo tribunal foram consideradas eficazes tanto que os réus foram sentenciados a penas entre 12 e 28 anos de prisão ICTY 2017 Portanto de acordo com Trindade 2016 o genocídio em massa no conflito na antiga Iugoslávia pode ser visto como um ato de violência maciça usada com fins estratégicos para 14 Caso IT95518 Disponível em httpwwwictyorgxcaseskaradziccisenciskaradzicenpdf 15 Caso IT0992 Disponível em httpwwwictyorgxcasesmladiccisencismladicenpdf 16 Caso IT 9623 Disponível em httpwwwictyorgxcaseskunaraccisenciskunaracalenpdf O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados 111 BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 atingir seus objetivos ideológicos TRINDADE 2016 p 172 A autora Susan Brownmiller 1975 apud MARTINS 2016 argumenta que o estupro é uma prática sintomática na sociedade na qual fazem parte como instrumento do patriarcado e este dispõe de dois dispositivos ideológicos de submissão e opressão das mulheres o machismo e a misoginia Ambos estimulam e encorajam as diversas formas de violência perpetradas contra as mulheres entre elas o estupro MARTINS 2016 p 3 O tema da violência sexual contra a mulher vem se inserindo em um debate cada vez mais amplo em termos de direitos humanos Embora este artigo aprecie questões no âmbito do TIPY o mesmo busca contribuições para entender a evolução do direito das mulheres em situações de conflitos armados Portanto é de extrema relevância entender a importância dos tribunais penais internacionais ad hoc para a antiga Iugoslávia e Ruanda como mecanismos que reconheceram a violência de gênero como um crime contra o direito internacional A prática dos tribunais ad hoc acabou por constituir importante jurisprudência do Tribunal Penal Internacional permanente De acordo com o Comitê Internacional da Cruz Vermelha CICV a criação dos tribunais ad hoc foi muito além da criação de simples tribunais representou um grande avanço no Direito Internacional Humanitário uma vez que ratificaram o caráter consuetudinário de determinados princípios reduzindo a brecha entre as normas aplicáveis aos conflitos internacionais e as que se aplicam aos conflitos não internacionais e adaptando as disposições mais tradicionais do DIH à realidade atual mediante interpretações mais flexíveis CICV 2010 Os tribunais penais internacionais ad hoc para a antiga Iugoslávia TPIY e Ruanda TPIR fazem parte de um marco efetivo na história da jurisdição penal internacional Ao estabelecêlos o Conselho de Segurança buscou entender a gravidade e o impacto que as crises humanitárias referentes às violações dos direitos humanos passaram a ter no âmbito da segurança internacional FURTADO 2013 V CONCLUSÃO No decorrer da história as práticas violentas de natureza sexual foram se destacando em contextos de conflitos armados como uma estratégia de guerra em que as mulheres são vistas como espólios de guerra para soldados além de submetidas a atos sexuais involuntários A violência sexual contra mulheres em conflitos armados é muito mais que uma tática de guerra 112 Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 é uma ação que tem o propósito de deslocar famílias de suas regiões desmoralizar e até destruir populações inteiras Ao serem generalizados em conflitos armados os atos sexuais cometidos contra as mulheres passam a serem entendidos como uma consequência inevitável do conflito Classificado como um crime contra a humanidade pelo TPIY a violência sexual utilizada como uma arma de guerra afeta principalmente mulheres em condições vulneráveis como migrantes viúvas chefes de família entre outras ICRC Além disso as violências praticadas podem trazer sérios traumas tanto físicos quanto psicológicos Além das lesões as mulheres que são submetidas a este tipo de violação sofrem com a estigmatização e a rejeição pelas suas famílias e comunidades ICRC 2016 Portanto além de sofrerem uma violação indesejada as vítimas ainda precisam enfrentar inúmeros desafios para se reintegrarem na comunidade o que muita das vezes pode significar um processo conturbado uma vez que o acesso à estruturas médicas ou psicológicas pode ser limitado Por muito tempo os acontecimentos relacionados à violência sexual contra as mulheres não foram alvo de muita atenção Foi a partir da década de 1980 que o tema do combate à violência sexual passou a ser inserido em um debate mais amplo à luz dos direitos humanos bem como nos estudos de gênero em Relações Internacionais em que a ocorrência desses crimes é vista como uma prática da desigualdade de gênero entre homens e mulheres Frequentemente o ato de violência tem como propósito oprimir e abusar Foi mediante a institucionalização da justiça penal internacional que se teve a criação dos tribunais militares os quais contribuíram para a posterior criação dos tribunais ad hoc como é o caso do Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia Além de serem considerados como um avanço no direito penal os tribunais ad hoc passaram a ser vistos como um grande progresso no âmbito do Direito Internacional Humanitário Com a criação da jurisdição para julgar infrações graves às convenções de Genebra de 1949 violações das leis ou costumes de guerra genocídio e crimes contra humanidade e após o julgamento de inúmeros casos o Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia mostrouse apto a identificar e julgar crimes que envolviam a violação dos direitos humanos das mulheres Um dos casos em que é visível a eficiência do Tribunal é o caso Kunurac Kvocka e Vukovic em que foi determinado pelo tribunal que o estupro foi utilizado como uma arma de guerra por parte dos membros das forças armadas sérvias e bósnias Neste caso a jurisprudência do tribunal determinou o cumprimento de penas entre 12 e 28 anos de prisão aos réus Por meio do estudo para a elaboração deste artigo podese concluir que o avanço na institucionalização penal contribuiu para a punição dos crimes de natureza sexual O O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados 113 BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 estabelecimento e a eficiência do Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia significaram um grande avanço no tratamento dos casos que comprovam a violência sexual Além de buscar contribuir com o fim de atrocidades como essas a instauração do TPIY acabou por influenciar o estabelecimento de uma Corte permanente para julgar inúmeros crimes no âmbito internacional Criado com base no Estatuto dos Tribunais ad hoc o Estatuto de Roma contempla o avanço nos direitos humanos das mulheres tipificando os atos de violência sexual contra mulheres como crimes de guerra crimes contra humanidade genocídio e crimes de agressão VI REFERÊNCIAS AZEVEDO F A Violência Sexual Contra a Mulher e o Direito Internacional Centro de Estudos em Direito e Negócios 2014 Disponível em httpwwwcedincombrwp contentuploads201405AViolC3AAnciaSexualContraaMulhereoDireito Internacionalpdf Acesso em 10 Jul 2018 BENVENUTO Jayme O Tribunal Penal Internacional para a Antiga Iugoslávia In Manoel Severo Neto Org Direito Cidadania Processo 2006 p 221248 BROWN Carly Rape as a weapon of war in the Democratic Republic of the Congo Torture v 22 n1 2012 Disponível em httpsirctorgassetsuploadsRapeasweapon war12012pdf Acesso em 11 Jul 2018 BROWNMILLER S Against our will men women and rape New York NY 1975 CHAUÍ Marilena Participando do Debate sobre Mulher e Violência In FRANCHETTO Bruna CAVALCANTI Maria Laura V C HEILBORN Maria Luiza orgs Perspectivas Antropológicas da Mulher 4 São Paulo Zahar Editores 1985 COMITÊ INTERNACIONAL DA CRUZ VERMELHA Tribunais ad hoc 2010 Disponível em 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1 2015 Rio de Janeiro Disponível em httpwwwjornadaehhistoriaufrjbrwpcontentuploads201602AnaTaisadaSilva FalcC3A3opdf Acesso em 16 Jul 2018 FERNANDES David Augusto Tribunal Penal Internacional a concretização de um sonho Rio de Janeiro Renovar 2006 FIDALGO Sónia Mariza Florêncio Os crimes sexuais no Direito Internacional Penal In XV CONGRESSO DE DEFESA SOCIAL 2007 Toledo Espanha Disponível em httpwwwdefensesocialeorgxvcongresopdfcfp0729CrimessexuaisnoDireitoInte rnacionalPenalFidalgopdf Acesso em 04 Jul 2018 FURTADO Rogério Dourado O Tribunal Penal Internacional o caso Slobodan Milosevic Âmbito Jurídico Rio Grande XVI n 115 ago 2013 Disponível em httpambitojuridicocombrsitenlinkrevistaartigosleituraartigoid13509 Acesso em 05 Jul 2018 GRIFFITHS M OCALLAGHAN T 2002 International Relations The Key Concepts London Routledge INTERNATIONAL CRIMINAL TRIBUNAL FOR THE FORMER YUGOSLAVIA Kunarac Kovac Vukovic CaseDisponível em httpwwwictyorgxcaseskunaraccisenciskunaracalenpdf Acesso em 05 Jul 2018 INTERNATIONAL CRIMINAL TRIBUNAL FOR THE FORMER YUGOSLAVIA Radovan Karadzic Case Disponível em httpwwwictyorgxcaseskaradziccisenciskaradzicenpdf Acesso em 12 jul 2018 INTERNATIONAL CRIMINAL TRIBUNAL FOR THE FORMER YUGOSLAVIA Ratko Maladic Case Disponível em httpwwwictyorgxcasesmladiccisencismladicenpdf Acesso em 12 Jul 2018 INTERNATIONAL CRIMINAL TRIBUNAL FOR THE FORMER YUGOSLAVIA Página inicial Disponível em httpwwwictyorgenabout Acesso em 02 Jul 2018 JELIN Elizabeth Mulheres e Direitos Humanos Revista Estudos Feministas Florianópolis v 2 n 3 p 117 jan 1994 ISSN 18069584 Disponível em httpsperiodicosufscbrindexphprefarticleview16293 Acesso em 25 mar 2019 MAIA Marrielle Tribunal Penal Internacional Aspectos institucionais jurisdição e princípio da complementaridade Belo Horizonte Del Rey 2001 MARTINS Núbia Sanches In segurança das mulheres no conflito da exIugoslávia uma análise pela perspectiva da psicologia política e da segurança humana feminista II O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados 115 BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 Encontro Humanístico Multidisciplinar CLAEC Jaguarão RS 2016 Disponível em httpswwwclaecorgeventosindexphpehm2ehmpaperdownload365149 Acesso em 03 Jul 2018 NAKAMURA Julian Roberto O Tribunal Penal Internacional Contextualização Histórica Características e Incorporação ao Direito Brasileiro Monografia graduação em Direito Universidade Federal do Paraná Curitiba 2009 Disponível em httpwwwacervodigitalufprbrbitstreamhandle188431198Julian20Roberto20Naka murapdfsequence1 Acesso em 07 Jul 2018 PENACHIONI Júlia Battistuzzi Violência sexual em conflitos armadas e ataques generalizados ou sistemáticos a criminalização pelo Tribunal Penal Internacional 2017 Disponível em httpssapientiapucspbrbitstreamhandle198432JC3BAlia20Battistuzzi20Penachi onipdf Acesso em 02 Jul 2018 PEREIRA Haula Hamad T F Pascoal CAVALCANTI Sabrinna Correia Medeiros A prática do estupro de mulheres como estratégia de guerra sob o viés do direito internacional Revista online do CESED Centro de Ensino Superior e Desenvolvimento v16 n 2425 Janeiro a Dezembro de 2015 Disponível em httprevistatemafacisaedubrindexphprevistatemaarticleview232 Acesso em 25 Mar 2019 PERES Andréa Campos de Estupro as mulheres e a guerra na Bósnia 2011 Disponível emhttpwwwscielobrpdfcpan37a05n37pdf Acesso em 03 Jul 2018 RODRIGUES Hosana S J ARAÚJO Carla Dayane M H Violência contra a mulher uma discussão de gênero2016 II CINTEDI nov 2016 Disponível emhttpseditorarealizecombrrevistascinteditrabalhosTRABALHOEV060MD1SA9 ID263207092016145800pdf Acesso em 02 Jul 2018 SAFFIOTI Heleith I B Contribuições Feministas para o estudo da violência de gênero 2011Cadernos Pagu v 16 2001 p 115136 Disponível em httpwwwscielobrpdfcpan16n16a07pdf Acesso em 02 Jul 2018 SCOTT Joan W Gender A useful category of historical analysis The American historical review v 91 n 5 p 10531075 1986 SCOTT Joan Wallach Gender A Useful Category of Historical Analysis In Gender and the Politics of History Nova Iorque Columbia University Press 1988 SHEPHERD Laura J Victims perpetrators and actors revisited exploring the potential for a feminist reconceptualisation of international security and gender violence The British Journal of Politics International Relations v 9 n 2 p 239256 2007 Disponível em httpwwwcesucptficheiros2filesSHEPHERDLauraVictimspdf Acesso em 02 Jul 2018 SILVA Gustavo Da rosa ao pó histórias da Bósnia pósgenocídio 1 ed Rio de Janeiro Tinta Negra Bazar Editorial 2011 116 Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 TICKNER J Ann Gender in International Relations Feminist Perspectives on Achieving Global Security Columbia University Press 1992 TRINDADE Antônio Augusto Cançado O papel dos tribunais internacionais na evolução do direito internacional contemporâneo In Os Tribunais Internacionais Contemporâneos Brasília FUNAG 2013 p 9132 Disponível em httpwwwoasorgessladdidocspublicacionesdigitalXLIcursoderechointernacional 2014AntonioAugustoCancadoTrindadepdf Acesso em 05 Jul 2018 TRINDADE Antônio Augusto Cançado A Visão Humanista da Missão dos Tribunais Internacionais Contemporâneos Ed Fortaleza Expressão Gráfica e Editora 2016 VENERACION RALLONZA Lourdes Women and the post sovereign state a feminist analytic of the state in the age of globalization Gender Technology and Development 8 3 2004 Sage Publications New DelhiThousand Oaks London Disponível em httpsjournalssagepubcomdoiabs101177097185240400800304 Acesso em 27 Mar 2019 Recebido em outubro2018 Aprovado em abril2019
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Brazilian Journal of International Relations ISSN 22377743 Edição Quadrimestral volume 8 edição nº 1 2019 O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados a experiência do Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia nos casos de violência de gênero Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Instituto de Gestão Pública e Relações Internacionais Unversidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho A Brazilian Journal Of International Relations BJIR está indexada no International Political Science Abstracts IPSA EBSCO Publishing e Latindex 98 Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 O ESTUPRO COMO ESTRATÉGIA DE GUERRA EM CONFLITOS ARMADOS A EXPERIÊNCIA DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL PARA A ANTIGA IUGOSLÁVIA NOS CASOS DE VIOLÊNCIA DE GÊNERO Bárbara de Abreu Oliveira1 Jayme Benvenuto Lima Júnior2 Resumo A violência contra a mulher é uma prática antiga e com o passar do tempo os crimes de natureza sexual foram se naturalizando ainda mais em conflitos domésticos e internacionais em que a situação de vulnerabilidade é sentida de forma ainda mais contundente por mulheres que sofrem agressão sexual O século XX foi marcado por conflitos como o da antiga Iugoslávia conhecido como um dos marcos da discussão jurídica sobre a violência contra a mulher como crime internacional Por meio de uma pesquisa bibliográfica este artigo propõe estudar como o Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia incorporou os crimes de violência sexual na sua normativa e jurisprudência considerando a prática desses atos de natureza sexual uma estratégia de guerra em que o principal objetivo é desmoralizar e destruir uma população em função de elementos étnicos e nacionais Com a incorporação de gênero na jurisprudência do tribunal o Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia tipifica os crimes de violência sexual como crime contra humanidade e entende que esse tipo de violação também deveria ser julgado sob o art 3º em condição de Violações das Leis ou Costumes de guerra A prática desses crimes é muito mais que a simples prática de opressão a um grupo vulnerável por parte do Estado mas uma imposição do símbolo de poder de gênero Palavraschave Direitos Humanos Violência Sexual Conflitos Internacionais Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia THE RAPE AS A WAR STRATEGY IN ARMED CONFLICTS AN EXPERIENCE OF THE INTERNATIONAL CRIMINAL COURT FOR OLD YUGOSLAVIA IN THE CASES OF GENDER VIOLENCE 1 Graduada em Relações Internacionais pela Universidade Federal de Uberlândia UFU É discente do Programa de Pós Graduação em Direitos Humanos na Universidade Federal de Pernambuco UFPE Email barbaraabreu1995hotmailcom 2 Professor Doutor dos Programas de PósGraduação stricto sensu em Direito e em Direitos Humanos da Universidade Federal de Pernambuco UFPE Ministra a disciplina Direito Internacional Público na UFPE É Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco e Doutor em direito pela Universidade de São Paulo USP Realizou estágio PósDoutoral em Direito Internacional dos Direitos Humanos na Universidade de Norte Dame É bolsista do CNPq em pesquisa Email jaymebenvenutounilaedbr O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados 99 BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 Abstract Violence against women is an old practice and over time crimes of a sexual nature have been further naturalized in domestic and international conflicts where the situation of vulnerability is felt even more bluntly by women who suffer sexual assault The twentieth century was marked by conflicts such as that of the former Yugoslavia known as one of the milestones of the legal discussion on violence against women as an international crime Through a bibliographical research the present article proposes to study how the International Criminal Tribunal for the former Yugoslavia incorporated the crimes of sexual violence in its normative and jurisprudence considering the practice of these acts of a sexual nature a war strategy in which the The main objective is to demoralize and destroy a population based on ethnic and national elements With the incorporation of gender in the jurisprudence of the court the International Criminal Tribunal for the former Yugoslavia typifies crimes of sexual violence as a crime against humanity and understands that this type of violation should also be judged under art 3 in the condition of Violations of Laws or Customs of war The practice of these crimes is much more than the simple practice of oppression of a vulnerable group by the state but an imposition of the symbol of gender power Keywords Humans rights Sexual Violence International Conflicts International Criminal Tribunal for the Former Yugoslavia 100 Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 I INTRODUÇÃO Após a Segunda Guerra Mundial o debate no âmbito da comunidade internacional sobre os crimes de natureza sexual contra a mulher passou a contribuir para a ampliação da proteção dos direitos humanos e do direito humanitário internacionais especialmente na perspectiva de gênero Esse fato se deu em paralelo a um processo de emancipação das mulheres e à ampliação da participação delas em espaços públicos Um dos marcos importantes na luta dos direitos das mulheres é a Declaração Universal dos Direitos Humanos adotada pelas Nações Unidas em 1948 Nesse sentido convém ressaltar que o texto da declaração afirma que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos sem distinção de raça cor sexo religião origem nacional ou social entre outros JELIN 1994 p 121 A Declaração expressa princípios tidos como universais entre os quais a defesada igualdade e da liberdade Em relação à busca dos direitos e à participação das mulheres na sociedade contemporânea esses elementos ampliaram possibilidades de luta e ações em busca da cidadania JELIN 1994 Com o passar do tempo e o desenvolvimento de pesquisas que passaram a ter como recorte a perspectiva de gênero as práticas de violência sexual contra mulheres foram sendo visibilizadas em números alarmantes das violações de direitos nos conflitos armados Em situações de conflitos o estupro é utilizado como uma estratégia de guerra constituindose em ferramenta para ameaçar humilhar torturar eou desestabilizar o inimigo passível de ser utilizado como instrumento para genocídio e limpeza étnica PEREIRA CAVALCANTI 2015 p 8 Além de serem submetidas a atos de violência sexual a vida e os corpos dessas mulheres eram objetificados sendo usados também como recompensa nos espólios de guerra em situações em que muitas mulheres foram transformadas em escravas AZEVEDO 2014 p 3 No campo do direito internacional humanitário entendido aqui como complementar aos direitos humanos e do direito penal internacional o tema da violência sexual passou a ser objeto de decisões judiciais relacionadas a crimes de guerra crimes contra a humanidade e como formas de genocídio3 A violação dos direitos das mulheres vem sendo relatada por 3A complementaridade entre os direitos humanos e o direito internacional humanitário é defendida por autores que entendem os direitos humanos como o direito da pessoa em qualquer tempo e o direito internacional humanitário como um direito de exceção o direito de militares e civis em situação de conflito armado Os primeiros tratados internacionais a reconhecer o direito das mulheres civis em conflitos armados foram as Convenções de Genebra e seus Protocolos O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados 101 BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 exemplo em alguns casos julgados pelo Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia o que permite identificar práticas comuns de opressão da mulher por meio da violência sexual Esse tipo de discussão também passou a fazer parte de um debate póspositivista e feminista na Teoria de Relações Internacionais que questiona também como formulações teóricas tendem a reproduzir hierarquias de poder no âmbito das sociedades As formas relativas de como os aspectos ideacionais impactam e são impactados pelas relações internacionais são importantes na discussão sobre o caráter socialmente construído da violência presente nas relações sociais TICKNER 1992 p 8 Nesse sentido por meio de uma análise qualitativa considerando o estupro como uma estratégia de guerra para disseminar o ódio e o medo entre a população o principal objetivo deste artigo é estudar como se deu a incorporação dos crimes de violência sexual contra a mulher na normativa e na jurisprudência do Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia adotando uma abordagem histórica e teórica sobre a violência de gênero Fruto de uma pesquisa bibliográfica o artigo é desenvolvido utilizando fontes primárias e secundárias relacionadas às temáticas de violência de gênero estudos feministas conflitos armados e ao Tribunal ad hoc para Ex Iugoslávia Após uma análise precisa além desta introdução o artigo está dividido em três partes Na primeira sessão intitulada A discussão teórica sobre a violência de gênero buscouse apresentar uma breve contextualização acerca da violência de gênero apresentando os principais conceitos trabalhados na teoria feminista Na segunda sessão O conflito étnico na Ex Iugoslávia e a política de estupro de mulheres como estratégia de guerra de forma sucinta são apresentadas as principais causas e consequências oriundas do conflito étnico que ocorreu na Ex Iugoslávia dando enfoque principalmente à violação dos direitos humanos das mulheres Na terceira sessão deste artigo A experiência do Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia nos casos de violência de gênero buscouse evidenciar aspectos da jurisprudência do Tribunal ad hoc para Ex Iugoslávia tendo como foco os principais casos que comprovem a violência de gênero como um crime do direito internacional Por fim o estudo compreende a importância que a instauração do mecanismo significou para a jurisprudência internacional principalmente em relação à tipificação ao julgamento e à condenação de indivíduos que compactuam com crimes que violam os direitos das mulheres A violência contra a mulher é um fenômeno antigo e visando à naturalização destes crimes na sociedade entendese a magnitude do tema e a importância de uma análise sobre a violência contra a mulher em situações de conflitos internacionais julgados pelo Tribunal ad hoc para a Ex Iugoslávia Atualmente existem inúmeros estudos de gênero principalmente em inglês Portanto além da contribuição nos 102 Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 estudos sob perspectiva de gênero este trabalho busca tratar uma temática que merece ter o conhecimento ampliado no Brasil II A DISCUSSÃO TEÓRICA SOBRE A VIOLÊNCIA DE GÊNERO A violência contra a mulher em conflitos armados é tanto uma manifestação da desigualdade de gênero entre homens e mulheres quanto uma arma cujo objetivo é disseminar o ódio e o medo na população É uma maneira que os grupos conflitantes estabelecem relações de poder entre si e sobre a área afetada FALCÃO 2015 p 8 Ao longo do século XX os crimes de natureza sexual contra mulheres foram sendo evidenciados em situações de conflitos domésticos e internacionais em que a situação de vulnerabilidade da população é sentida de forma ainda mais contundente por mulheres que sofrem agressão sexual De acordo com Griffiths e OCallaghan 2002 é após a década de 1980 que o feminismo passa a ter relevância nos estudos de Relações Internacionais Segundo o autor As críticas iniciais do feminismo ao estudo das relações internacionais vieram inicialmente para desafiar as bases fundamentais da disciplina e apontar formas com que as mulheres eram excluídas das análises dos estados da política econômica internacional e da segurança internacional GRIFFITHS OCALLAGHAN 2002 p 107 De fato no ambiente acadêmico de Relações Internacionais um dos obstáculos mais destacados em relação ao movimento feminista é a forma como a violência de gênero foi conceitualmente excluída como objeto de estudo Os desafios feministas bem definidos e defendidos nas Relações Internacionais chamam atenção para compreender a violência em relação à segurança SHEPHERD 2007 p 240 Além disso Veneracion Rallonza 2004 afirma que atualmente as mulheres e a questão de gênero se encontram interligadas nos espaços nacionais e internacionais e a partir do momento que o feminismo adiciona esses conceitos às Relações Internacionais tratase de uma tentativa de tornar tanto o discurso quanto a prática responsáveis até mesmo ao ponto de travar uma batalha discursiva com grandes teorias tradições positivistas e hegemonias metodológicas VENERACION RALLONZA 2004 p 387 Tradução nossa4 Laura J Shepherd 2007 em sua obra intitulada Victims Perpetrators and Actors revisited exploring the potential for a feminist reconceptualisation of internacional security 4 Versão Original na attempt to render both the discourse and practice of the field accountable even to the point of waging a discursive battle with grand theories positivist traditions and methodological hegemons VENERACION RALLONZA 2004 p 387 O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados 103 BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 and gender violence adiciona em seu argumento que a noção de soberania é um elemento principal na literatura sobre segurança internacional Pesquisas que enfocam a violência contra as mulheres colocam as mulheres como sujeitos coerentes e estáveis cujas experiências de vida podem ser melhoradas por uma prática política apropriada O sujeito construído através do discurso da violência contra as mulheres é assumido como soberano as mulheres afetadas pela violência têm direitos soberanos sobre suas próprias formas materiais e não devem portanto ser submetidas à violência Além disso essa soberania é pré constituída e considerada uma realidade empírica SHEPHERD 2007 p 243 244 Tradução nossa5 O termo gênero como uma forma de referência à organização social da relação entre os sexos passou a ser adotado pelos estudos e teorias feministas em um processo de afirmação da abordagem SCOTT 1986 p 1053 De acordo com a mesma autora apud RODRIGUES e ARAÚJO 2016 os quatro elementos que constituem o termo gênero são a identidade subjetiva que deve ter um referencial histórico e não unicamente psicológico a percepção política e as instituições sociais a noção de que gênero se baseia no sexo mas não é determinado por ele e por último que ele é uma forma de representação de poder RODRIGUES ARAÚJO 2016 p 4 Para Scott 1986 esses fragmentos estão interrelacionados Ademais gênero é um elemento constitutivo das relações sociais baseado nas diferenças existentes entre os sexos ou seja é uma forma primária das relações de poder SCOTT 1988 p 42 44 Em conformidade com Scott 1986 os historiadores feministas buscavam empregar uma variedade de abordagens para a análise de gênero porém passaram a abordar três posições teóricas A primeira tenta explicar as origens do patriarcado A segunda encontrase no âmbito da tradição marxista e procura uma acomodação com as críticas feministas e a terceira constituída entre os estudiosos pósestruturalistas busca explicar a produção e a reprodução da identidade de gênero SCOTT 1986 p 1057 1058 Este trabalho não adota uma perspectiva específica mas busca ressaltar diversas contribuições teóricas que contribuem para pensar a violência de gênero incorporada à jurisprudência dos tribunais internacionais com foco no Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia 5 Versão Original Research that focuses on violence against women posits women as coherent and stable subjects whose life experiences can be ameliorated by appropriate policy practice The subject constructed through the discourse of violence against women is assumed sovereign the women affected by violence have sovereign rights over their own material forms and should not therefore be subjected to violence Moreover this sovereignty is preconstituted and taken to be an empirical reality SHEPHERD 2007 p 243 244 104 Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 Em Women and the postsovereign state a feminist analytic of the state in the age of globalization Lourdes Veneracion Rallonza 2004 analisa o crescimento do movimento feminista em busca dos direitos das mulheres e como este movimento tem desafiado a hegemonia masculina principalmente no direito internacional uma vez que os direitos das mulheres começaram a ser evidenciados nas agendas estatais Ao argumentar sobre a situação das mulheres em tempos de guerras Yuval Davis 1997 p 109 apud VENERACION RALLONZA 2004 p 387 Tradução nossa 6a autora deixa claro seu argumento afirmando que até recentemente não se dava muita atenção para consequências de gênero na guerra uma vez que 80 da população de refugiados são compostas por mulheres e crianças E muitas delas são submetidas à tortura e ao estupro pelos soldados inimigos Nesse sentido uma das referências importantes que orientaram este estudo é o artigo de Marilena Chauí intitulado Participando do debate sobre mulher e violência que tem como foco a violência de gênero Em sua obra a autora argumenta que a violência contra as mulheres é o resultado de uma dominação masculina que pode ser produzida tanto por homens como por mulheres Além disso Chauí define a violência como um ato que tende a transformar diferenças em desigualdades cujo objetivo é dominar explorar e oprimir CHAUÍ 1985 p 36 Antes da obra de Chauí 1985 foi publicado por Susan Brownmiller 1975 o artigo Against Our Will Men Women and Rape que tratou especificamente sobre o crime de natureza sexual contra a mulher como uma demonstração de força dos homens sobre as mulheres FALCÃO 2015 p 9 Nas palavras da autora como uma arma básica de força contra as mulheres o estupro uma prerrogativa masculina é menos um crime sexual do que uma chantagem protetora é um crime político onde os homens mantêm as mulheres subordinadas como o segundo sexo BROWNMILLER 1975 p 1516 Tradução nossa7 Conforme Saffioti 2011 argumenta violência de gênero é o conceito mais amplo abrangendo vítimas como mulheres crianças e adolescentes de ambos os sexos Com efeito a ideologia de gênero é insuficiente para garantir a obediência das vítimas potenciais aos ditames do patriarca tendo este necessidade de fazer uso da violência SAFFIOTI 2011 p 115116 Tradução nossa8 6 Versão Original Until recently not much attention has been given to the gendered consequences of war where up to 80 percent of the refugee population is made up of women and children YuvalDavis 1997 p 109 or where women are put through the torture of rape by enemy soldiers 7 Versão Original As basic weapon of force against women rape a male prerogative is less a sexual crime than a protective blackmail It is a political crime the definitive means of men keep women subordinate as the second sex 8 Além disso Saffioti 2011 acredita que nada impede a mulher de praticar violência física contra seu companheiro e ressalta que as mulheres também podem desenvolver a função patriarcal SAFFIOTI 2011 p 116 O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados 105 BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 Em conflitos armados os corpos das mulheres tornamse campos de batalhas acarretando em resultados devastadores para as vítimas De acordo com Brown 2012 o próprio estupro é infundido com a dinâmica de poder uma vez que já foi reconhecido por parte dos estudiosos feministas que a violação é muito mais sobre o poder do que sobre o sexo BROWN 2012 p 27 Um exemplo que Brown 2012 usa a favor de seu argumento são os inúmeros conflitos armados que marcaram a República Democrática do Congo Muitosas teóricosas feministas veem os crimes de natureza sexual contra a mulher como uma arma de guerra resultando no fato de que a violência sexual e de gênero aumentou simultaneamente devido à sua eficácia nos conflitos armados BROWN 2012 p 27 Conforme Falcão 2015 argumenta muitos autores da teoria feminista nas décadas de 19902000 vão seguir o pressuposto da violência sexual contra a mulher como arma de guerra buscando enfatizar os casos ocorridos na antiga Iugoslávia e em Ruanda FALCÃO 2010 p 10 Além dos crimes de violência sexual em conflitos armados estabelecerem o medo e o terror Falcão 2015 ressalta que é especialmente cruel para as mulheres pois estas se vêem vítimas de múltiplas violências de guerra mas quando se trata das mulheres a violência dos conflitos armados assume um caráter de gênero pois as vítimas sempre são humilhadas torturadas e violentadas por meio de agressões de cunho sexual FALCÃO 2015 p 1011 Ao abordar a teoria feminista no processo de globalização VeneraciónRallonza 2004 argumenta que para o feminismo o estado póssoberano representa oportunidades em dois sentidos Por um lado o feminismo se estabelece como uma força relevante no âmbito global regional e nacional e por outro lado ao fazer uso do espaço global é preciso manter certa distância para que a luta pela justiça de gênero não enfraqueça Portanto para o feminismo o estado póssoberano é visto tanto como um parceiro quanto como um inimigo Um grande avanço na luta das mulheres foi o reconhecimento dos seus direitos na Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas em 1948 como sujeitos de do direito internacional Porém VeneraciónRallonza 2004 apresenta uma critica feminista à formulação tradicional de Direitos Humanos afirmando que os fabricantes das convenções não conseguiram ver que os direitos humanos tradicionais são formulados com base na 106 Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 normativa masculina e aplicados às mulheres como uma reflexão tardia VENERACION RALLONZA 2004 p 394 Tradução nossa9 Com o propósito de entender o uso do estupro como uma arma de guerra a próxima seção deste artigo tem como principal objetivo apresentar uma breve contextualização sobre o conflito étnico que marcou a antiga Iugoslávia com foco na violação dos Direitos Humanos das mulheres que foram sexualmente abusadas III O CONFLITO ÉTNICO NA EXIUGOSLÁVIA E A POLÍTICA DE ESTUPRO DE MULHERES COMO ESTRATÉGIA DE GUERRA A República Federativa Socialista da Iugoslávia situada no Sudeste do continente Europeu era composta por seis repúblicas além de duas províncias autônomas10 abrangendo sérvios croatas eslovenos macedônios montenegrinos e muçulmanos e outros BENVENUTO 2006 p 223 As origens do conflito no território da antiga Iugoslávia estenderamse por vários anos De acordo com Maia 2001 o conflito teve início em 1941 mediante a ação nazista de invasão do território da Iugoslávia estabelecendo aliança com os croatas que posteriormente deram início ao processo de deportação da população sérvia MAIA 2001 p 102 Em 1944 em uma ação comandada pelo Marechal Josip Broz Tito com a ajuda da URSS e do Reino Unido os alemães foram expulsos do território da Iugoslávia Posteriormente em 1980 após a morte do Marechal Tito os conflitos voltaram a emergir agravandose em 1987 juntamente com a crise econômica que desestabilizava o país MAIA 2001 p 103 Em 1989 o controle do Estado caiu em mãos do líder sérvio Slobodan Milosevic que devido aos ressentimentos que a minoria sérvia sentiu em Kosovo utilizou destes para dar início a uma perseguição à minoria albanesa que residia na Iugoslávia PENACHIONI 2017 p 39 Devido ao tratamento frio por parte do presidente Slobodan Milosevic na província de Kosovo que teve sua autonomia extinta contando com diversas manifestações violentas as demais províncias também se sentiram reprimidas e assim a Eslovênia Croácia e a ex República Iugoslava da Macedônia declararamse independentes em 1991 e a Bósnia Herzegovina em 1992 BENVENUTO 2006 p 225 Portanto entendese que em nome do 9 Versão Original What the covenant makers failed to see is that traditional human rights formulations are based on normative male models and applied to women as na afterthought RALLONZA 2007 p 394 10 O território da antiga Iugoslávia era formado por seis repúblicas sendo elas Eslovênia Croácia Bósnia Herzegovina Sérvia Montenegro e Macedônia Além das duas províncias Voivodina e Kosovo BENVENUTO 2006 p 223 O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados 107 BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 direito à autodeterminação dos povos as declarações de independência das províncias da antiga Iugoslávia acirraram ainda mais o conflito já existente De acordo com Fernandes 2006 o principal objetivo do conflito iniciado pelos sérvios era realizar uma limpeza étnica no território da Iugoslávia E como resultado esperavase a formação de uma GrãSérvia FERNANDES 2006 p 69 O território era conhecido por sua grande diversidade étnicoreligiosa portanto no momento em que a limpeza étnica ocorreu é necessário evidenciar os inúmeros casos de violações contra o Direito Humanitário e os Direitos Humanos no território destacando principalmente os casos de genocídio NAKAMURA 2009 p 30 Nesse sentido Andréa Peres 2011 destaca em sua obra A limpeza étnica fundamental para homogeneização populacional do território realizouse através da transferência de população literalmente um ônibus pegava as pessoas em casa e as levava até o território sob domínio dos seus expulsão e extermínio Queimas de casas templos religiosos e plantações estupros torturas e assassinatos também contribuíram nesse processo que podemos dizer foi bem sucedido ao dividir o território separando pessoas com base em sua ascendência étnica nacional religiosa e fazendo com que o antigo modo de vida baseado na coexistência e na heterogeneidade passasse a ser inconcebível PERES 2011 p 125 Entre as inúmeras violações de direitos humanos este conflito foi marcado por incontáveis violações contra os direitos das mulheres De acordo com Gustavo Silva 2011 o estupro era uma estratégia usada pelas forças sérvias contra a população resultando na criação de campos direcionados apenas para essa prática Estimase que de 20000 a 50000 mulheres sofreram agressão sexual no conflito da antiga Iugoslávia SILVA 2011 p 64 A violação de mulheres e meninas acontecia ou durante os expurgos da limpeza étnica nas casas nos barracões em espaços públicos ou em campos especiais Algumas vítimas relataram que eram requisitadas para servir aos combatentes sérvios Na associação para as vítimas do genocídio em Zenica há evidência de dezessete campos de estupro principalmente em motéis escolas serrarias e casas privadas Há mulheres que foram pegas em suas casas e levadas às linhas de frente onde eram submetidas aos mais bestiais dos abusos Em Foča mulheres relatam estupros em público na frente de maridos e crianças de vizinhos e de outros soldados VULLIAMY 1994 p 199 apud PERES 2011 p 12811 Como mencionado foram criados inúmeros campos de estupro Em geral os campos funcionavam em escolas armazéns hotéis entre outros estabelecimentos e os crimes eram praticados principalmente contra as muçulmanas bósnias as quais eram forçadas a terem relações sexuais com mais de um soldado repetidas vezes PERES 2011 p 119 11 VULLIAMY Ed Seasons in hell understanding Bosnias war New York NY St Martins Press 1994 108 Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 Segundo relatos apresentados na obra de Andréa Peres 2011 intitulada Campos de estupro as mulheres e a guerra na Bósnia vítimas afirmam que muitas dessas mulheres que foram propositalmente engravidadas eram mantidas em cárcere e liberadas quando não pudessem realizar o aborto Esses relatos afirmam que com o intuito de interromper a gravidez as mulheres se golpeavam na barriga ou introduziam água fervente na vagina para provocar a eliminação do feto Além disso as crianças que nasciam advindas do estupro carregavam consigo a possibilidade de serem rejeitadas por suas famílias e serem entregues para adoção PERES 2011 p 133 por serem indesejadas Esse tipo de atitude tem como objetivo claro controlar a descendência dos povos como afirma Peres 2011 Numa guerra de extermínio ou de limpeza étnica como ocorreu na Bósnia fazer as mulheres terem os filhos é controlar a descendência matando seus homens e dominando a prole e concordando com Hayden 2000 transformando animosidade em ódio e medo impelindo o outro a não retornar PERES 2011 p 120 Em busca por fazer justiça às vitimas e exprimir todo o sofrimento sofrido pelas mulheres no conflito a Associação MulheresVítimas da Guerra 2010 apud PERES 2011 dirigida por Bakira Hasečić também vítima de estupro expôs sua vivência no conflito na antiga Iugoslávia relatando que Acometeramnos crimes de violência sexual abusos físicos indizíveis para um ser humano normal Fomos mortas jogadas em buracos e valas comuns Fomos estupradas em massa raptadas trancadas em prisões e campos torturadas levadas a fazer trabalhos forçados expulsas à força de nossas vilas e cidades pilharam nossos imóveis e bens de valor e inúmeras outras formas brutais de humilhação e não raramente meninas entre 12 e 14 anos eram retiradas à força de suas famílias e levadas a locais específicos onde eram submetidas a terríveis torturas estupradas e submetidas a outras formas de abusos incluindo punições físicas e morte Tal crime é a ideologia daqueles cujo objetivo era realizar a pior forma de genocídio estupro É difícil dizer aqui o número exato de mulheres estupradas e vítimas de abuso durante a agressão à BiH12 Não é pequeno o número de mulheres estupradas que preferiram o silêncio tamanha é a dor e não desejam dividir sua terrível humilhação com ninguém Muitas meninas e moças não desejam nunca casar Muitas devido ao estupro foram largadas pelos maridos e sobre muitas nem os maridos nem os membros da família sabem o que lhes aconteceu Os estrategistas e planejadores da agressão conheciam muito bem as vítimas sabiam precisamente qual a reação que o estupro provocaria na vítima e no seu meio imediato família parentes e vizinhos Das muitas ameaças declaradas que sofreram ecoa aquela que diz Se disser a alguém o que aconteceu com você será morta A ameaça mantém a vítima em constante medo de contar a verdade A luta pela verdade vence em muitos casos mas sabemos que seguramente há ainda muitas histórias não contadas Por isso nós rompemos o silêncio falamos claramente sobre os estupros e 12 BósniaHerzegóvina ou Bosna i Hercegovina A forma abreviada é do original O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados 109 BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 abusos que aconteceram durante a agressão contra à BiH PERES 2011 p 151 152 As graves violações aos Direitos Humanos fizeram com que o Conselho de Segurança da ONU se manifestasse classificandoo como doméstico determinando posteriormente em sua resolução 713 que era objetivo da ONU a preservação da integridade da Iugoslávia uma vez que o conflito caracterizava uma ameaça para a paz e segurança mundiais impondo embargo à venda de armamentos MAIA 2001 p 103 Nesse sentido o Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia foi instaurado em 1993 por meio da resolução 8273 aprovada pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas CSNU a fim de julgar as inúmeras atrocidades cometidas no território dos Bálcãs DEVENS 2004 p 49 Os estupros genocidas ocorridos no território da antiga Iugoslávia funcionaram como uma forma de destruir determinados grupos da sociedade sendo os atos violentos praticados interpretados como um modo de humilhar suas vítimas em função da origem étnica A próxima seção deste artigo visa entender como o Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia reconhece a violência de gênero como um crime contra o direito internacional em seu Estatuto IV A EXPERIÊNCIA DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL PARA A ANTIGA IUGOSLÁVIA NOS CASOS DE VIOLÊNCIA DE GÊNERO Em 1993 o Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia foi instaurado com o objetivo de julgar pessoas responsáveis por graves violações do direito internacional humanitário que foram vivenciadas no conflito que marcou esse país desde 1991 TRINDADE 2013 p 31 Estabelecido no dia 25 de maio de 1993 pela resolução 82793 o Tribunal com sede em Haia já indiciou mais de 160 pessoas O TPIY indiciou vários líderes políticos acusados de cometerem crimes que violaram os direitos de várias etnias localizadas na Croácia na Bósnia e Herzegovina em Kosovo na Sérvia entre os anos de 1991 a 200113 Com a instauração do Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia foi atribuída à corte a competência para julgar os crimes mais relevantes e amplamente reconhecidos pela sociedade internacional Em quatro categorias o Estatuto prevê o julgamento baseados nos artigos 2º ao 5º sendo eles Infrações graves às convenções de Genebra de 1949 Violações 13 Todas as informações sobre o Tribunal ad hoc para a exIugoslávia estão no sítio eletrônico das Nações Unidas Disponível em httpwwwictyorgenabout 110 Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 das leis ou costumes de guerra Genocídio e Crimes contra a humanidade BENVENUTO 2006 p 236 No que se refere à evolução dos direitos das mulheres o Estatuto do Tribunal concebe o crime de violação como crime contra humanidade art 5º al g No entanto diferente do Tribunal Internacional para Ruanda o estatuto do TPIY não foi claro na atribuição da competência para julgar crimes de violência contra mulher como crime de guerra Em termos concretos porém o Tribunal tem entendido que a violação não deve ser julgada apenas como crime contra humanidade por força de coerência normativa Portanto o Tribunal buscou incorporar outras diretrizes nos julgamentos que envolvem a violação dos direitos das mulheres como Sónia Fidalgo 2007 expressa em seu texto o TPIJ em inúmeras situações condenou os arguidos por violação e outras formas de violência sexual socorrendose de outras normas do Estatuto e afirmou que a violação e outras formas de violência sexual devem ser consideradas graves violações das leis e costumes de guerra FIDALGO 2007 p7 Uma das grandes contribuições do TPIY é o avanço no sentido de reconhecer os crimes que envolvem a violência sexual contra as mulheres como crime de guerra e crime contra a humanidade No julgamento dos casos Karadizic14 e Mladic15 o Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia concluiu que as práticas de violência sexual contra mulheres eram parte de uma estratégia para atingir o grupo oponente utilizando métodos que interferiram nos valores religiosos e únicos cultivados por esses povos De acordo com Trindade 2016 um dos métodos utilizados para desestabilizar o grupo foram os constantes estupros contra mulheres considerados sistemáticos Além disso no caso Kunarac Kvocka e Vukovic16 o tribunal decidiu que o estupro foi usado como um instrumento de terror por parte dos membros das forças armadas sérvias e bósnias No julgamento foi estabelecido que uma orgia infernal de perseguição marcou Omarska e alguns acampamentos situados na Bósnia AJONU 2012 Os réus foram acusados de estupro além de haverem praticado ajudado e influenciado em atos sexuais contra mulheres incluindo uma jovem de 15 anos As investigações conduzidaspelo tribunal foram consideradas eficazes tanto que os réus foram sentenciados a penas entre 12 e 28 anos de prisão ICTY 2017 Portanto de acordo com Trindade 2016 o genocídio em massa no conflito na antiga Iugoslávia pode ser visto como um ato de violência maciça usada com fins estratégicos para 14 Caso IT95518 Disponível em httpwwwictyorgxcaseskaradziccisenciskaradzicenpdf 15 Caso IT0992 Disponível em httpwwwictyorgxcasesmladiccisencismladicenpdf 16 Caso IT 9623 Disponível em httpwwwictyorgxcaseskunaraccisenciskunaracalenpdf O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados 111 BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 atingir seus objetivos ideológicos TRINDADE 2016 p 172 A autora Susan Brownmiller 1975 apud MARTINS 2016 argumenta que o estupro é uma prática sintomática na sociedade na qual fazem parte como instrumento do patriarcado e este dispõe de dois dispositivos ideológicos de submissão e opressão das mulheres o machismo e a misoginia Ambos estimulam e encorajam as diversas formas de violência perpetradas contra as mulheres entre elas o estupro MARTINS 2016 p 3 O tema da violência sexual contra a mulher vem se inserindo em um debate cada vez mais amplo em termos de direitos humanos Embora este artigo aprecie questões no âmbito do TIPY o mesmo busca contribuições para entender a evolução do direito das mulheres em situações de conflitos armados Portanto é de extrema relevância entender a importância dos tribunais penais internacionais ad hoc para a antiga Iugoslávia e Ruanda como mecanismos que reconheceram a violência de gênero como um crime contra o direito internacional A prática dos tribunais ad hoc acabou por constituir importante jurisprudência do Tribunal Penal Internacional permanente De acordo com o Comitê Internacional da Cruz Vermelha CICV a criação dos tribunais ad hoc foi muito além da criação de simples tribunais representou um grande avanço no Direito Internacional Humanitário uma vez que ratificaram o caráter consuetudinário de determinados princípios reduzindo a brecha entre as normas aplicáveis aos conflitos internacionais e as que se aplicam aos conflitos não internacionais e adaptando as disposições mais tradicionais do DIH à realidade atual mediante interpretações mais flexíveis CICV 2010 Os tribunais penais internacionais ad hoc para a antiga Iugoslávia TPIY e Ruanda TPIR fazem parte de um marco efetivo na história da jurisdição penal internacional Ao estabelecêlos o Conselho de Segurança buscou entender a gravidade e o impacto que as crises humanitárias referentes às violações dos direitos humanos passaram a ter no âmbito da segurança internacional FURTADO 2013 V CONCLUSÃO No decorrer da história as práticas violentas de natureza sexual foram se destacando em contextos de conflitos armados como uma estratégia de guerra em que as mulheres são vistas como espólios de guerra para soldados além de submetidas a atos sexuais involuntários A violência sexual contra mulheres em conflitos armados é muito mais que uma tática de guerra 112 Bárbara de Abreu Oliveira Jayme Benvenuto Lima Júnior BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 é uma ação que tem o propósito de deslocar famílias de suas regiões desmoralizar e até destruir populações inteiras Ao serem generalizados em conflitos armados os atos sexuais cometidos contra as mulheres passam a serem entendidos como uma consequência inevitável do conflito Classificado como um crime contra a humanidade pelo TPIY a violência sexual utilizada como uma arma de guerra afeta principalmente mulheres em condições vulneráveis como migrantes viúvas chefes de família entre outras ICRC Além disso as violências praticadas podem trazer sérios traumas tanto físicos quanto psicológicos Além das lesões as mulheres que são submetidas a este tipo de violação sofrem com a estigmatização e a rejeição pelas suas famílias e comunidades ICRC 2016 Portanto além de sofrerem uma violação indesejada as vítimas ainda precisam enfrentar inúmeros desafios para se reintegrarem na comunidade o que muita das vezes pode significar um processo conturbado uma vez que o acesso à estruturas médicas ou psicológicas pode ser limitado Por muito tempo os acontecimentos relacionados à violência sexual contra as mulheres não foram alvo de muita atenção Foi a partir da década de 1980 que o tema do combate à violência sexual passou a ser inserido em um debate mais amplo à luz dos direitos humanos bem como nos estudos de gênero em Relações Internacionais em que a ocorrência desses crimes é vista como uma prática da desigualdade de gênero entre homens e mulheres Frequentemente o ato de violência tem como propósito oprimir e abusar Foi mediante a institucionalização da justiça penal internacional que se teve a criação dos tribunais militares os quais contribuíram para a posterior criação dos tribunais ad hoc como é o caso do Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia Além de serem considerados como um avanço no direito penal os tribunais ad hoc passaram a ser vistos como um grande progresso no âmbito do Direito Internacional Humanitário Com a criação da jurisdição para julgar infrações graves às convenções de Genebra de 1949 violações das leis ou costumes de guerra genocídio e crimes contra humanidade e após o julgamento de inúmeros casos o Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia mostrouse apto a identificar e julgar crimes que envolviam a violação dos direitos humanos das mulheres Um dos casos em que é visível a eficiência do Tribunal é o caso Kunurac Kvocka e Vukovic em que foi determinado pelo tribunal que o estupro foi utilizado como uma arma de guerra por parte dos membros das forças armadas sérvias e bósnias Neste caso a jurisprudência do tribunal determinou o cumprimento de penas entre 12 e 28 anos de prisão aos réus Por meio do estudo para a elaboração deste artigo podese concluir que o avanço na institucionalização penal contribuiu para a punição dos crimes de natureza sexual O O estupro como estratégia de guerra em conflitos armados 113 BJIR Marília v 8 n 1 p 97116 janabr 2019 estabelecimento e a eficiência do Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia significaram um grande avanço no tratamento dos casos que comprovam a violência sexual Além de buscar contribuir com o fim de atrocidades como essas a instauração do TPIY acabou por influenciar o estabelecimento de uma Corte permanente para julgar inúmeros crimes no âmbito internacional Criado com base no Estatuto dos Tribunais ad hoc o Estatuto de Roma contempla o avanço nos direitos humanos das mulheres tipificando os atos de violência sexual contra mulheres como crimes de guerra crimes contra humanidade genocídio e crimes de agressão VI REFERÊNCIAS AZEVEDO F A Violência Sexual Contra a Mulher e o Direito Internacional Centro de Estudos em Direito e Negócios 2014 Disponível em httpwwwcedincombrwp contentuploads201405AViolC3AAnciaSexualContraaMulhereoDireito Internacionalpdf Acesso em 10 Jul 2018 BENVENUTO Jayme O Tribunal Penal Internacional para a Antiga Iugoslávia In Manoel Severo Neto Org Direito Cidadania Processo 2006 p 221248 BROWN Carly Rape as a weapon of war in the Democratic Republic of the Congo Torture v 22 n1 2012 Disponível em httpsirctorgassetsuploadsRapeasweapon war12012pdf Acesso em 11 Jul 2018 BROWNMILLER S Against our will men women and rape New York NY 1975 CHAUÍ Marilena Participando do Debate sobre Mulher e Violência In FRANCHETTO Bruna CAVALCANTI Maria Laura V C HEILBORN Maria Luiza orgs Perspectivas Antropológicas da Mulher 4 São Paulo Zahar Editores 1985 COMITÊ INTERNACIONAL DA CRUZ VERMELHA Tribunais ad hoc 2010 Disponível em 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