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Autora Profa Gabriela Rodrigues Zinn Colaboradora Profa Laura Cristina da Cruz Dominciano Práticas Educativas em Saúde Professora conteudista Gabriela Rodrigues Zinn Enfermeira graduada em 2001 pela Universidade de São Paulo especialista em Enfermagem Gerontológica pela Universidade de São Paulo mestre em Psicologia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e doutoranda do Programa de Gerenciamento em Enfermagem da Universidade de São Paulo onde desenvolve um trabalho sobre a Política de Educação Permanente em Saúde Atuou como enfermeira assistencial no Hospital Universitário da Universidade de São Paulo de 2002 a 2005 Atua como docente da Universidade Paulista UNIP desde 2004 e coordena o curso de enfermagem desde 2006 e alguns campi atualmente no campus de Sorocaba Todos os direitos reservados Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma eou quaisquer meios eletrônico incluindo fotocópia e gravação ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista Dados Internacionais de Catalogação na Publicação CIP Z78p Zinn Gabriela Rodrigues Práticas Educativas em Saúde Gabriela Rodrigues Zinn São Paulo Editora Sol 2021 72 p il Nota este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP Série Didática ISSN 15179230 1 Práticas educativas 2 Comunicação humana 3 Modelos de educação I Título CDU 616083 U51000 21 Prof Dr João Carlos Di Genio Reitor Prof Fábio Romeu de Carvalho ViceReitor de Planejamento Administração e Finanças Profa Melânia Dalla Torre ViceReitora de Unidades Universitárias Profa Dra Marília AnconaLopez ViceReitora de PósGraduação e Pesquisa Profa Dra Marília AnconaLopez ViceReitora de Graduação Unip Interativa EaD Profa Elisabete Brihy Prof Marcello Vannini Prof Dr Luiz Felipe Scabar Prof Ivan Daliberto Frugoli Material Didático EaD Comissão editorial Dra Angélica L Carlini UNIP Dr Ivan Dias da Motta CESUMAR Dra Kátia Mosorov Alonso UFMT Apoio Profa Cláudia Regina Baptista EaD Profa Deise Alcantara Carreiro Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico Prof Alexandre Ponzetto Revisão Carla Moro Geraldo Teixeira Jr Sumário Práticas Educativas em Saúde APRESENTAÇÃO 7 INTRODUÇÃO 7 Unidade I 1 BASES CONCEITUAIS E CONTEXTUAIS 9 11 Considerações iniciais 9 2 REFERENCIAIS TEÓRICOS PARA COMPREENSÃO DE PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE 13 21 O processo saúdedoença 13 22 O processo ensinoaprendizagem 15 23 Educação uma prática de liberdade e emancipação 17 24 A organização política dos serviços de saúde no Brasil 18 3 POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE 20 4 COMUNICAÇÃO HUMANA INSTRUMENTO ESSENCIAL PARA A PRÁTICA EDUCATIVA 24 41 Fundamentos da comunicação humana 24 42 Saber ouvir 29 Unidade II 5 MODELOS PEDAGÓGICOS NA EDUCAÇÃO EM SAÚDE 37 51 Evolução dos pensamentos pedagógicos 37 511 A promoção da saúde e os modelos de educação em saúde 41 512 O modelo preventivo de educação em saúde 43 513 O modelo radical de educação em saúde 43 6 MODELOS DE EDUCAÇÃO EM SAÚDE REFLEXO DO CONTEXTO HISTÓRICO46 Unidade III 7 PLANEJAMENTO E EXCECUÇÃO DE UMA AÇÃO EDUCATIVA 54 71 Elaboração de um projeto educativo 54 711 Diagnóstico 54 712 Plano de ação 59 8 AVALIAÇÃO 62 7 APRESENTAÇÃO O presente livrotexto almeja uma aproximação do leitor com o tema educação e saúde para isso apresentará alguns conceitos e discussões que possibilitem a construção de conhecimento na área e além disso vislumbra especialmente suscitar a reflexão sobre as possibilidades de atuação do profissional de saúde na prática educativa Compreender a relação indissociável entre educação e saúde contextualizar essa relação e descobrir caminhos que a transformem em uma prática consciente de cuidado com o outro é o que esperamos INTRODUÇÃO A disciplina Práticas Educativas em Saúde aborda conceitos do processo saúdedoença e do processo ensinoaprendizagem em um exercício de prática reflexiva privilegiando os elementos que podem diferenciar o futuro profissional na prática de educação em saúde A disciplina tem como objetivos compreender a evolução histórica dos conceitos de educação em saúde relacionar a educação em saúde com a promoção da saúde compreender a relação ensinoaprendizagem e suas implicações sociais compreender a posição do profissional da saúde no processo ensinoaprendizagem conhecer as diversas metodologias de ensino com destaque ao modelo dialógico habilitarse no desenvolvimento de um projeto educativo em saúde 9 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE Unidade I 1 BASES CONCEITUAIS E CONTEXTUAIS 11 Considerações iniciais Para discorrer sobre a relação entre educação e saúde tornase pertinente explicitar os referenciais teóricos nos quais estarão pautados os conceitos que serão discutidos Temos que a saúde envolve compreensões que evoluíram ao longo da história sofrendo grandes modificações Desde a crença nos aspectos sobrenaturais evoluindo para o outro extremo no qual a verdade é considerada apenas a partir de aspectos físicos e orgânicos concretamente comprovados sendo essa forma de perceber a saúde atrelada ao contexto filosófico positivista Nessa evolução chegase nas formas atuais de compreender a saúde que abrangem definições amplas e complexas o que não é surpreendente uma vez que se trata de um atributo humano e sendo humano tornase evidentemente complexo Olhar para a saúde como um processo já é um grande avanço e inserir nesse processo os aspectos contextuais em que ele ocorre amplia ainda mais o olhar para esse fenômeno Assim hoje temos que o processo saúdedoença é influenciado por questões de ordem política econômica ambiental cultural social emocional e até espiritual Ao encontro da forma de olhar o processo saúde doença descrito anteriormente podese trazer à discussão o processo ensinoaprendizagem que também sofreu mudanças conceituais e procedimentais ao longo da história Nesse sentido evoluiuse do olhar empírico e intuitivo no processo ensinoaprendizagem passando por práticas metódicas de transmissão de conteúdos até chegar às discussões mais atuais em educação que considera a participação e foca a formação crítica e política dos sujeitos envolvidos nesse processo Como ponto de partida para esse panorama teóricoconceitual que será apresentado colocase em destaque a reflexão que nos remete à existência na modernidade do processo progressivo e permanente de construção dos direitos democráticos em choque com a lógica do capital Este choque entre o que podemos chamar de cidadania ou democracia e o capitalismo não é um fato explosivo e concentrado em um único momento mas sim uma contradição existente em forma de processo marcado por avanços e recuos porém com uma tendência predominante da introdução cada vez maior de novas lógicas não mercantis na regulação da vida social COUTINHO 2000 Em síntese colocase como principal característica da modernidade a existência de um processo dinâmico e contraditório uma época histórica caracterizada pela promessa de emancipação do homem de todas as opressões e alienações contraditoriamente produzidas e reproduzidas pelo capitalismo e 10 Unidade I conclui que as possibilidades abertas na modernidade para a humanidade referentes à emancipação ainda não foram realizadas COUTINHO 2000 Observação Contextualizar o momento histórico com suas peculiaridades políticas econômicas e culturais é elementochave para a compreensão do que se pretende estudar Neste momento pretendemos contextualizar o cenário da educação em saúde e compreender que as possibilidades de emancipação do homem na modernidade ainda não foram realizadas e este é ponto de partida para problematizar e refletir sobre os caminhos possíveis para essa emancipação Nesse sentido trazemos à discussão uma questão central para o desenvolvimento deste trabalho que é a saúde Dejours 1986 questiona o conceito de saúde da Organização Mundial da Saúde OMS e coloca em foco uma nova possibilidade de compreender esse fenômeno Para OMS saúde é um completo estado de bemestar físico psíquico e social Destacase a crítica desse autor à definição internacional de saúde quando ele considera que a saúde não se trata de um estado de bemestar mas de um estado que se busca aproximar ou seja a saúde como um fim um objetivo a ser atingido e não como algo estático Assim saúde é um processo e não um estado DEJOURS 1986 Além da crítica o autor apresenta a contribuição de uma nova forma de conceituar a saúde a saúde para cada homem cada mulher ou criança é ter meios de traçar um caminho pessoal e original em direção ao bemestar físico psíquico e social Para o bemestar físico o autor acredita na liberdade de regular as variações que o organismo apresenta por exemplo dar ao corpo o direito de descansar quando está cansado Para o bemestar psíquico a liberdade proporcionada ao desejo de cada um na organização da sua vida e por fim para o bemestar social a liberdade de se agir individual e coletivamente na organização do trabalho DEJOURS 1986 Desse modo temos até aqui uma nova forma de olhar a saúde como um ideal a ser atingido e que o elemento fundamental para o alcance dessa meta é a liberdade Essa ideia vai ao encontro do que Merhy 2012 apresenta em relação ao sistema de saúde do Brasil O autor compreende o SUS como utopia o que traz a ideia de algo a ser alcançado mas para o autor esse SUS apresentado como utopia representa a base para o reconhecimento de que este campo de práticas sociais é pautado em disputas radicais impactando os modos de produzir o cuidado em saúde tanto no plano individual como coletivo Em consonância com a ideia de Deleuze 2010 Merhy 2012 destaca que não se trata de questões simplesmente conceituais mas algo a ser vivido e assim o SUS como utopia permite construir nas ações práticas cotidianas de construção de novos sentidos enriquecedores dos viveres como forma de produzir saúde MERHY 2012 Assim podemos correlacionar essa ideia de SUS utopia à ideia de saúde utopia no sentido de uma práxis pautada na liberdade que produz possibilidades de aproximação ao que seria o completo bemestar físico psíquico e social 11 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE Saiba mais Veja o seguinte filme que remete à reflexão e contribui para este mergulho no pensamento da liberdade como elemento da emancipação humana UM SONHO de liberdade Dir Frank Darabont Estados Unidos Warner Home Video 1994 Merhy 2012 levanta uma questão central e muito contraditória a aposta de que a vida de qualquer um vale a pena não como algo a ser representado no pensamento mas para ser vivida nos encontros com os outros especialmente no mundo do trabalho em saúde Os milhares de encontros que ocorrem entre usuários e trabalhadores de saúde constituem em si um ato vivo A tensão existente é expressa no questionamento de como conseguir operar o enfrentamento de que a vida de qualquer um vale em uma realidade material de produção que é evidentemente centrada em uma lógica invertida na qual a vida do outro interessa como consumidor e substrato para o lucro MERHY 2012 O desafio apresentado está em ultrapassar e vazar essa lógica a partir do agir micropolítico ou seja do trabalho vivo em ato que ocorre nos milhares de encontros entre profissionais de saúde e usuários nas diversas dimensões da produção do cuidado produzindo novas possibilidades de sentido MERHY 2012 Observação Nesse sentido inserimos a reflexão do trabalho em saúde e sua formação elementar e permanente compreendendo que aí está o potencial de transformar os encontros entre profissionais de saúde e usuários em novas possibilidades de liberdade e valorização da vida de qualquer um A intervenção profissional na área da saúde ocorre com o corpo vivo e em interação com o social e com o ambiente a partir de processos de subjetivação Entretanto a formação dos profissionais de saúde tende a enfrentar o corpo vivo apenas ao final da graduação o que gera uma tensão elementar entre a imagem de dessecação do corpo apreendida ao longo da formação e não pela escuta e contato com sua alteridade CARVALHO CECCIM 2009 Cabe citar o estabelecimento de discussões no âmbito éticopolítico acerca da formação em saúde ao longo das últimas décadas Podese pontuar como exemplo o estabelecimento do Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde PróSaúde em 2005 para os cursos de medicina enfermagem e odontologia com ênfase na integração entre instituições de ensino estruturas de gestão 12 Unidade I da saúde órgãos de representação popular e os serviços de atenção à saúde CARVALHO CECCIM 2009 Entretanto essas diretrizes políticas e curriculares relativamente recentes ainda são pontuais e não esgotam a demanda de discussão da formação em saúde aqui propostas Evidenciamos a necessidade de nos voltarmos para os sentidos valores e significados do que e para quem fazemos nossas ações em saúde As questões de natureza ética e humana têm sido preteridas na formação à medida que não se adotam metodologias de ensino que promovam a participação do aluno e a sua responsabilização no processo de formação CARVALHO CECCIM 2009 Como elemento concreto para discussão e concretização do SUS utopia pautada no conceito de saúde utopia e a partir de um trabalho vivo que considera a vida de qualquer um como algo a ser muito bem cuidada apresentase a Política Nacional de Educação Permanente em Saúde que em seu texto elucida conceitos coerentes com o que foi apresentado até aqui A Educação Permanente é aprendizagem no trabalho onde o aprender e o ensinar se incorporam ao cotidiano das organizações e ao trabalho A educação permanente se baseia na aprendizagem significativa e na possibilidade de transformar as práticas profissionais A educação permanente pode ser entendida como aprendizagemtrabalho ou seja ela acontece no cotidiano das pessoas e das organizações Ela é feita a partir dos problemas enfrentados na realidade e leva em consideração os conhecimentos e as experiências que as pessoas já têm Propõe que os processos de educação dos trabalhadores da saúde se façam a partir da problematização do processo de trabalho e considera que as necessidades de formação e desenvolvimento dos trabalhadores sejam pautadas pelas necessidades de saúde das pessoas e populações Os processos de educação permanente em saúde têm como objetivos a transformação das práticas profissionais e da própria organização do trabalho BRASIL 2009 p 20 Transformar diretrizes políticas em trabalho vivo é um desafio que passa pela necessidade de mobilizações éticopolíticas técnicocientíficas e psicossociais Há a possibilidade de mudanças que se tornarão reais nos atos vivos de cada profissional de saúde nos seus encontros seja no âmbito da gestão ou do cuidado direto com o usuário do serviço de saúde A proposta da educação permanente se alicerçada em estrutura favorável possibilitará a atuação de todos os sujeitos envolvidos na atenção das reais demandas locais e assim vislumbramos uma nova forma de conceber e agir em saúde Observação O desafio apresentado é complexo e enfrenta muitas contradições mas encontra na atuação micropolítica a possibilidade de transformações 13 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE Assim apresentase a seguir um panorama teórico sobre o processo saúdedoença o processo ensinoaprendizagem o contexto político e social da organização dos serviços de saúde com enfoque na PNEPS 2 REFERENCIAIS TEÓRICOS PARA COMPREENSÃO DE PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE 21 O processo saúdedoença A compreensão do conceito de processo saúdedoença é necessária para que possamos atuar de forma assertiva nos fatores que envolvem esse processo Podemos afirmar que a saúde e o adoecer são modos pelos quais a vida se manifesta eles remetem a experiências únicas e subjetivas que não podem ser reconhecidas e significadas integralmente pela palavra Contudo é por meio da palavra que a pessoa expressa seu malestar bem como o médico dá significação às queixas de seu paciente Nessa relação entre a ocorrência do fenômeno concreto de adoecer e as palavras do paciente e do profissional de saúde situase a tensão entre a subjetividade da experiência da doença e a objetividade dos conceitos que lhe dão sentido e propõem intervenções CZERESNIA 2003 O discurso médico científico não abrange a significação mais ampla da saúde e do adoecer pois a saúde não é objeto que se possa delimitar não pode ser traduzida em conceito científico bem como o sofrimento que envolve o adoecer Descartes considerado o primeiro formulador da concepção mecanicista do corpo reconheceu que há partes do corpo humano vivo que são exclusivamente acessíveis a seu titular CAPONI 1997 Nessa perspectiva ressaltamos que a questão da saúde não diz respeito à incorporação de um novo discurso que migra da dimensão da objetividade à da subjetividade do universal ao singular do quantitativo ao qualitativo Não se trata de optar por valores que ficaram subjugados no decorrer do desenvolvimento da racionalidade científica moderna submetendose agora aos que eram anteriormente hegemônicos A questão não é construir novos posicionamentos que mantêm a reprodução de antigas oposições mas de conseguir transitar entre diferentes níveis e formas de entendimento e de apreensão da realidade tomando como base os acontecimentos que nos mobilizam a elaborar e a intervir e não sistemas de pensamento CZERESNIA 2003 Entretanto com a finalidade de contextualização do processo saúdedoença ressaltamos a relação dialética entre o biológico e o social ou seja consideramos que a reprodução dos grupos sociais nas diversas etapas produtivas deve ser levada em conta na detecção do perfil epidemiológico das classes sociais BREILH 1980 Dessa forma tornase relevante a análise dos perfis epidemiológicos em uma dada formação social de classes e frações de classe em que se segmenta a sociedade A categoria classe social é base para uma análise da produção e distribuição das enfermidades LAURELL 1983 14 Unidade I Considerase que no modelo capitalista de organização social temos diferentes classes sociais que se inserem nos modos de produção de formas distintas e portanto reproduzem ou seja vivem conforme a inserção nesses modos de produção lhes possibilita Essas diferentes formas de produzir e reproduzir no cenário de uma sociedade capitalista geram fatores de fortalecimento e desgaste no que se refere ao processo saúdedoença ZINN 2007 Assim podemos relacionar as estratégias de promoção à saúde com as ações de fortalecimento das classes sociais nos modos de reprodução social A atuação do profissional de saúde consiste em focalizar o potencial da pessoa para o bemestar e encorajála a modificar ou fortalecer hábitos pessoais estilo de vida e ambiente de modo a reduzir os riscos e aumentar a saúde e o bemestar Para isso o princípio de corresponsabilização nas práticas terapêuticas tornase fundamental Saiba mais Uma importante leitura que resgata as diferentes teorias interpretativas do processo saúdedoença ao longo da história é o artigo OLIVEIRA M A C EGRY E Y A historicidade das teorias interpretativas do processo saúdedoença RevEscEnf USP São Paulo v 34 n 1 p 915 2000 Exemplo de aplicação Exemplo de aplicação Após a leitura do artigo sugerido anteriormente reflita sobre o último parágrafo das considerações finais transcrito a seguir Na medida em que se evitasse que as necessidades de saúde fossem reduzidas a processos fisiopatológicos em que se buscassem formas de assistir que fossem cada vez mais totalizadoras e não meramente a somatória de especificidades tecnológicas em que se resgatasse a subjetividade quer da coletividade quer dos trabalhadores em saúde como parte desse processo de inovação SCHRAIBER MENDESGONÇALVES 1996 apud OLIVEIRA EGRY 2000 p 15 Essa afirmação se refere ao questionamento de como as necessidades de saúde são consideradas para que sejam planejadas as ações de promoção e intervenção em saúde Tal levantamento decorre da compreensão do que seja saúde ou doença Dessa forma reflita O que você compreende por saúde O que você compreende por doença Qual seria a infraestrutura necessária de atenção à sua saúde hoje 15 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE 22 O processo ensinoaprendizagem A atuação na promoção da saúde envolve necessariamente a compreensão de educação em saúde pois através das práticas educativas em saúde os profissionais envolvidos podem concretizar as ações de fortalecimento da população frente aos riscos de agravos à saúde A educação é compreendida como mediação básica da vida social de todas as comunidades humanas SEVERINO 2000 A díade educação e saúde compreendem práticas socialmente produzidas em tempos e espaços históricos específicos RUIZMORENO et al 2005 Considerando a relação entre educação e saúde e compreendendo que esse binômio está diretamente relacionado com o amplo contexto de vida das pessoas ressaltamos a importância de modelos de intervenção adequados para uma prática educativa efetiva que possibilita uma aproximação à saúde utopia Refletimos sobre a reorientação do modelo hegemônico de educação em saúde para um modelo dialógico em que a diferença consiste basicamente na consideração do sujeito no processo de aprendizagem partindo do pressuposto de que os usuários dos serviços de saúde são portadores de saberes acerca do processo saúdedoençacuidado e de condições concretas do cotidiano ALVES 2005 Assim se o objetivo é o fortalecimento das populações para que as classes sociais possam fazer face de maneira mais adequada aos determinantes do processo saúdedoença é preciso lançar mão de uma pedagogia não normativa mas dialógica e emancipatória ZINN 2007 Entretanto esses pressupostos dialógicos e emancipatórios são contraditórios a muitas situações reais de atenção à saúde uma vez que os profissionais de saúde não têm praticado ações de fortalecimento mas sim a ministração de prescrições comportamentais utilizadas no verbo imperativo a exemplo de não fume use cinto de segurança dentre outros LEFÈVRE LEFÈVRE 2007 Em uma reflexão paradigmática sobre a assistência de enfermagem temos que o processo de formação acadêmica historicamente tem se baseado predominantemente nos conhecimentos oriundos das ciências biológicas de forma fragmentada Diante dessa limitação teórica sugerese a busca de subsídios que fundamentem um ensino que não apenas reitere nossas vivências mas que favoreça a formação profissional de enfermeiros capazes de apreender e praticar um cuidado pautado no pensamento complexo SILVA CIAMPONE 2003 Essa reflexão vai ao encontro do pensamento de Severino 2000 que elucida a educação como elemento gerador de novas formas de concepção de mundo potencialmente capazes de se contraporem à concepção de mundo dominante rompendo assim com a ideia de elemento de reprodução de determinado sistema social como sugerem as teorias reprodutivistas Severino 2000 nos traz uma concepção de educação que a compreende como a mediação da articulação intencionalizante entre o conhecimento e as práticas históricas O autor discute a educação como uma práxis cujo sentido é intencionalizar as práticas reais pelas quais os homens buscam implementar sua existência 16 Unidade I O autor coloca em pauta a relação visceral entre o processo educacional e o da sociedade a partir de uma atitude crítica e de superação em uma relação que pode ser reprodutora ou transformadora das ideologias e relações sociais dominantes Nesse sentido Severino 2000 lembra Gramsci que transportando para o campo educacional a filosofia políticosocial do marxismo concebe a educação como força de transformação social O fio condutor dessa discussão é a concepção de homem como um ser natural histórico determinado pelas condições objetivas e que atua sobre elas por meio de sua práxis Assim inferimos a compreensão do educador como um mediador da prática transformadora através de sua práxis O autor nos remete à discussão da educação como uma práxis técnica laboral política sociabilidade e simbólica SEVERINO 2000 Referente à perspectiva técnica o autor discute o teor laboral da educação questionando a produção de bens materiais concretos por meio deste trabalho Com efeito quando os homens desempenham suas práticas predominantemente simbolizadoras desenvolvemnas também para prover sua existência material Tanto é que nas modernas sociedades capitalistas as atividades intelectuais são remuneradas com o salário que assume a forma de um bem universal permutável por qualquer outro de que se necessite Sem dúvida o produto imediato da educação não é material mas é socialmente útil sob a forma de um serviço necessário à sociedade SEVERINO 2001 p 71 Quanto à dimensão política a prática educativa compreende o compromisso em preparar os educandos para o trabalho e mais do que isso aprender a viver e sobreviver O último aspecto referese ao fato de que a preparação para o mundo do trabalho se realizada a partir de práticas laborais torna a aprendizagem mais significativa É portanto por meio da prática que se educa e se aprende Toda a discussão aqui apresentada acerca da educação deve ser inserida em um contexto histórico uma vez que conforme apresentado por Pereira 2003 a evolução das abordagens pedagógicas acompanhando os diferentes momentos políticos e econômicos apresentou modelos compreendidos como tradicionais renovados por condicionamento e libertadores sendo estes últimos mais eficazes em seus resultados que os demais Acrescentamos ainda que ao dizer anteriormente de uma prática educativa dialógica e emancipatória tais características estão inseridas no conceito de educação libertadora 17 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE Saiba mais Para maior compreensão da evolução histórica dos modelos pedagógicos leia GADOTTI M História das ideias pedagógicas São Paulo Ática 2001 23 Educação uma prática de liberdade e emancipação Dejours 1986 nos apresenta como meio para o alcance da saúde a liberdade esta se torna questão singular na dinâmica de busca pelo estado de bemestar físico psíquico e social Em consonância com essa forma de pensar temos a necessidade da liberdade como elemento essencial no processo ensinoaprendizagem Freire 2005 diz que a libertação autêntica trata da humanização em processo ou seja não é algo que se deposita nos homens não é uma palavra mas sim uma práxis a qual demanda ação e reflexão dos homens sobre o mundo para transformálo A educação que se impõe aos que verdadeiramente se comprometem com a libertação não pode fundarse numa compreensão dos homens como seres vazios a quem o mundo encha de conteúdos não pode basearse numa consciência espacializada mecanicistamente compartimentada mas nos homens como corpos conscientes e na consciência como consciência intencionada ao mundo Não pode ser a do depósito de conteúdos mas a da problematização dos homens em suas relações com o mundo FREIRE 2005 p 77 A proposta pedagógica de Paulo Freire remete à crítica e à superação dos modelos educacionais hegemônicos A educação apresentase como um caminho para a mudança social para a formação de sujeitos históricos atores e autores de seus processos cotidianos de emancipação coletiva e individual OLIVEIRA et al 2008 Destacamos a importância do diálogo como meio dessa relação educador e educando em um processo ensinoaprendizagem libertador Freire 2005 nos traz elementos importantes para pensarmos o diálogo ele afirma que se não há profundo amor ao mundo e aos homens não há diálogo O autor ainda nos diz que sem humildade também não há diálogo pois a autossuficiência impede a aproximação necessária ao diálogo Nessa aproximação ou seja neste lugar de encontro não há ignorantes totais nem sábios absolutos mas sim homens em comunhão que almejam saber mais FREIRE 2005 Complementarmente no aspecto metodológico Freire 2005 destaca que a investigação desde o seu início necessita da presença crítica de representantes da comunidade do início ao fim desde a análise da temática levantada prolongandose na organização de conteúdo programático da ação educativa 18 Unidade I Partimos da ideia de educação como um ato de troca em que o educador é aquele que enquanto educa é educado em diálogo com o educando que ao ser educado também educa FREIRE 2005 Educar vem do latim educere que significa conduzir É preciso então entender que a proposta educativa de tipo condutivista na promoção da saúde deve ser abandonada em favor da proposta informativa porque as pessoas não devem ser educadas mas ao contrário com a ajuda da informação e dialogando com a informação técnica devidamente decodificada conduzir sua vida Em vez de educar conduzindo é preciso informar o cidadão de modo claro transparente LEFÈVRE LEFÈVRE 2007 Saiba mais Uma leitura fundamental FREIRE P Pedagogia da autonomia saberes necessários à prática educativa São Paulo Paz e Terra 1996 Exemplo de aplicação Exemplo de aplicação Como estratégia de reflexão e pertencimento ao tema aqui apresentado reflita a partir das seguintes direções 1 Pense em uma experiência de aprendizado positiva que você já vivenciou e tente compreender quais os fatores que tornaram essa experiência positiva 2 Pense em um professor que você teve ao longo da sua trajetória de vida e que você considerou como um ótimo educador Quais características desse docente fizeram com que você o admirasse 3 Em contraposição lembrese de um professor que você não considerou com bom desempenho Que características desse educador fizeram com que você não o admirasse 24 A organização política dos serviços de saúde no Brasil O SUS mais do que uma forma de sistematizar e portanto nortear a administração do setor saúde é um modelo de atenção à saúde e surge como um ideal contrahegemônico constituído a partir de um expressivo esforço da sociedade civil O SUS foi elaborado com base em intensas discussões que tiveram como marco o Movimento da Reforma Sanitária na década de 1970 exemplo de um movimento resultante da organização 19 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE da sociedade que em síntese criticava e lutava pela mudança nas práticas e na organização dos serviços de saúde Estas práticas na ocasião eram fundamentadas na dicotomia entre preventivo e curativo individual e coletivo com ênfase no âmbito curativo e individual restritas aos contribuintes previdenciários SALUM 1998 O cenário vigente no setor saúde não era portanto democrático uma vez que o acesso à saúde não era universal mas restrito a parcelas da população e além de não ser integral era reducionista centrado na patologia e fragmentado não atendendo à totalidade das necessidades de saúde do indivíduo ZINN 2007 A Reforma Sanitária constituiuse de um processo modernizador e democratizante de transformação nos âmbitos políticojurídico políticoinstitucional e políticooperativo para dar conta da saúde dos cidadãos entendida como um direito universal e suportada por um Sistema Único de Saúde constituído sob regulação do Estado permeado pela eficiência eficácia e equidade com foco de construção permanentemente através do incremento de sua base social da ampliação da consciência sanitária da implantação de um outro paradigma assistencial do desenvolvimento de uma nova ética profissional e da criação de mecanismos de gestão e controle populares sobre o sistema VILAÇA 1994 As discussões levantadas no Movimento da Reforma Sanitária foram oficializadas na VIII Conferência Nacional de Saúde CNS ocorrida em 1986 e foi baseada nessas discussões que a nova Constituição Brasileira de 1988 instituiu o SUS e elaborou o texto que rege a área da saúde A implantação de um sistema de saúde universal no Brasil foi iniciada em um contexto político e econômico não favorável em meio a um cenário neoliberal com evidente posicionamento de organizações internacionais contrárias ao financiamento público de sistemas de saúde nacionais e universais PAIM et al 2011 Apesar de todos os avanços o SUS é um sistema de saúde em desenvolvimento que permanece na luta para garantir a cobertura universal e equitativa A participação do setor privado no mercado é crescente e as interações entre os setores público e privado criam contradições e uma competição injusta culminando em ideologias e objetivos opostos a exemplo do acesso universal contrário à segmentação do mercado Isso gera resultados negativos na equidade no acesso aos serviços de saúde e nas condições de saúde Um dado importante para esta análise é que apesar do financiamento federal ter aumentado cerca de quatro vezes desde o início da última década a porcentagem do orçamento federal destinada ao setor de saúde não cresceu acarretando restrições de financiamento infraestrutura e recursos humanos PAIM et al 2011 É evidente a necessidade de um modelo baseado na promoção intersetorial da saúde e na integração dos serviços de saúde Nesse sentido o Pacto pela Saúde e sua proposta de uma rede de serviços de saúde organizada com fundamentos na atenção básica associado às recomendações da Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais da Saúde as quais orientam para a necessidade de abordar as causas primordiais dos problemas de saúde podem ajudar nessa conformação de modelos de atenção ampliados PAIM et al 2011 20 Unidade I Podese dizer que o maior desafio enfrentado pelo SUS é político Aspectos como o financiamento a articulação entre público e privado e as desigualdades persistentes não poderão ser resolvidas unicamente na esfera técnica PAIM et al 2011 Observação Inferimos aqui que a proposta de educação libertadora viabiliza a reflexão de atuação política de cada cidadão ultrapassando os aspectos técnicos e científicos assim corrobora com a ideia de transformação da realidade a partir de uma atuação éticopolítica reconhecidamente necessária para seguir na luta de manutenção dos princípios do SUS em especial os princípios doutrinários de universalidade equidade e integralidade 3 POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE A PNEPS foi instituída pela Portaria GMMS nº 198 de 13 de fevereiro de 2004 e foi alterada pela Portaria GMMS nº 1996 de 20 de agosto de 2007 que dispõe sobre novas diretrizes e estratégias para a implantação desta Essa política traz a proposta de constituir o SUS em uma redeescola modificando o pensamento do ensino transmitido de modo unidirecional dos detentores do conhecimento para os trabalhadores de saúde mas considerando o espaço concreto de trabalho como um local de ensinoaprendizagem compartilhado Além disso a Educação Permanente em Saúde constitui estratégia que viabiliza as transformações do trabalho na saúde para que este seja local de atuação crítica reflexiva propositiva compromissada e tecnicamente competente BRASIL 2009 CECCIM 2005 A Educação Permanente é aprendizagem no trabalho onde o aprender e o ensinar se incorporam ao cotidiano das organizações e ao trabalho A educação permanente se baseia na aprendizagem significativa e na possibilidade de transformar as práticas profissionais A educação permanente pode ser entendida como aprendizagemtrabalho ou seja ela acontece no cotidiano das pessoas e das organizações Ela é feita a partir dos problemas enfrentados na realidade e leva em consideração os conhecimentos e as experiências que as pessoas já têm Propõe que os processos de educação dos trabalhadores da saúde se façam a partir da problematização do processo de trabalho e considera que as necessidades de formação e desenvolvimento dos trabalhadores sejam pautadas pelas necessidades de saúde das pessoas e populações Os processos de educação permanente em saúde têm como objetivos a transformação das práticas profissionais e da própria organização do trabalho BRASIL 2009 p20 21 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE Cabe lembrar que a Organização PanAmericana de Saúde lançou no início dos anos 1980 a proposta de Educação Permanente em Saúde com vistas a uma nova conceituação e uma reorientação dos processos de capacitação de trabalhadores dos serviços de saúde DAVINI NERVI ROSCHKE 2002 Dessa forma a produção PNEPS representou o esforço de cumprir uma das metas da saúde coletiva de tornar a rede pública de saúde uma rede de ensinoaprendizagem no exercício do trabalho CECCIM 2005 Destacamos entretanto a necessidade de descentralizar e disseminar a capacidade pedagógica por dentro do setor para nos permitir constituir o SUS verdadeiramente como uma redeescola CECCIM 2005 Aquilo que deve ser realmente central à Educação Permanente em Saúde é sua porosidade à realidade mutável e mutante das ações e dos serviços de saúde é sua ligação política com a formação de perfis profissionais e de serviços a introdução de mecanismos espaços e temas que geram autoanálise autogestão implicação mudança institucional enfim pensamento disruptura com instituídos fórmulas ou modelos e experimentação em contexto em afetividade sendo afetado pela realidadeafecção CECCIM 2005b p162 Em estudo recente com o objetivo de analisar a prática de atividades educativas de trabalhadores da saúde em Unidade Básica de Saúde segundo as concepções de educação permanente em saúde e de educação continuada concluiuse que apesar da presença majoritária de estratégias de ensino participativas que indicam a preconização da reflexão sobre as práticas de saúde em espaços de discussão coletiva verificouse uma prática pautada na concepção de educação continuada a qual preconiza os fundamentos técnicocientíficos das áreas profissionais específicas para promover o desenvolvimento das instituições Ressaltase do trabalho realizado a necessidade de ampliação das ações educativas de trabalhadores no próprio espaço cotidiano de trabalho PEDUZZI et al 2009 Complementarmente ressaltamos que o conceito de educação continuada está atrelado ao saber técnicocientífico e utiliza a atualização do conhecimento específico das categorias profissionais com utilização recorrente da transferência de conteúdos o que conduz à fragmentação das práticas de saúde SILVA 2009 Constatamos que os conceitos de educação continuada e educação permanente possuem características técnicas teóricas e políticas diferentes Porém algo conceitualmente distinto pode eventualmente possuir semelhanças na aplicação prática uma vez que são os sujeitos envolvidos que dão vida em ato às propostas e diretrizes existentes Portanto há a necessidade de um cuidado peculiar na aplicação fidedigna da proposta de educação permanente em saúde a qual em detrimento de protocolos predefinidos apenas lança os princípios para uma construção coletiva e interdisciplinar do processo de ensinoaprendizagem 22 Unidade I Peduzzi e Montanha 2010 nos apresentam o resultado de um estudo referente ao levantamento de necessidades educacionais de trabalhadores de enfermagem O foco está nas falhas identificadas e nos problemas evidenciados resultando em ações educativas voltadas para os procedimentos técnicos de enfermagem o que se desdobra na reiteração do modelo de cuidado e de atenção hegemônico e biomédico à saúde e na concepção também dominante de educação continuada apesar de em menor escala também outras fontes serem utilizadas no planejamento das atividades educativas As autoras vislumbram em suas conclusões uma possível resposta ao questionamento de como seria possível investir em uma dimensão emancipatória a partir de um cotidiano restrito à reiteração do paroxismo técnicocientífico A possível resposta apresentase a partir dos resultados que apesar de atestarem o predomínio de ações educativas de trabalhadores de enfermagem orientadas pela concepção de educação continuada coexistem com a identificação por parte desses mesmos trabalhadores da necessidade e possibilidade de atividades educativas com novos formatos conteúdos e sentidos na perspectiva da educação permanente Isso corrobora com o entendimento de que ambas as concepções podem ser complementares e que a distinção clara entre elas permite o reconhecimento do espaço que devem ocupar na gestão do trabalho PEDUZZI MONTANHA 2010 A PNEPS sugere sem a intenção de esgotar as possibilidades um quadro para sistematizar uma sequência que vai da prática à informação da informação à aquisição de competências e capacidades e da aquisição à programação de soluções práticas Considerar esta sequência é importante uma vez que o acesso a informações e conhecimentos será pobre de significados se não houver reflexão e identificação na prática dos problemas BRASIL 2009 O quadro referido anteriormente é apresentado a seguir BRASIL 2009 Quadro 1 Problematizar as práticas Identificar problemas Açãoreflexão Investigaçãoação Estudo de casos Trabalho de campo Sistematização de dados locais Construção e priorização de problemas Ampliar o conhecimento Acesso bibliográfico Acesso a dados Acesso à educação virtual Acesso a outras experiências Seminário de estudos Estágio in loco Grupos de discussão Teleconferências e redes interativas Desenvolver competências específicas e da equipe Aquisição de competências e capacidades específicas Supervisãocapacitante Treinamentos focalizados específicos Oficinas de elaboração de projetos de trabalho Buscar soluções Colocálas em prática e avaliálas Coordenar condutas com outros e Trabalho em redes Grupos operativos de qualidade Oficinas de programação local Avaliação de processos e resultados 23 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE Saiba mais O artigo de Ricardo B Ceccim contribui para a compreensão da Educação Permanente em saúde CECCIM R B Educação Permanente em Saúde desafio ambicioso e necessário Comunic Saúde Educ v 9 n 16 p 16177 2005 Leia atentamente a situaçãoproblema abaixo Uma enfermeira que atua em uma Unidade Básica de Saúde UBS da periferia do Município de São Paulo recebeu esta semana para consulta de enfermagem o Sr JAB 72 anos morador do bairro em que está situada a UBS aposentado trabalhava na lavoura residente em uma casa de alvenaria de dois cômodos com um dos sete filhos a nora e três netos com idades abaixo de dez anos A renda familiar é de um salário mínimo e meio O Sr JAB é portador de Hipertensão Arterial Sistêmica HAS e Diabetes Mellitus DM É analfabeto e permanece a maior parte do tempo sozinho em sua casa Na consulta ao ser questionado sobre o uso dos medicamentos a enfermeira percebeu compreensão insuficiente do Sr JAB sobre o uso adequado dos medicamentos ele referiu uso irregular conforme sensação de bemestar ou malestar Como o Sr JAB possui vínculo com a enfermeira há mais de um ano sentiuse à vontade para dizer que parou de fazer uso do remédio de urinar Hidroclorotiazida pois estava sentindo muita fraqueza Referiu ainda muita dor em membros inferiores e dificuldade para enxergar Agora leia a seguinte afirmativa Exemplo de aplicação Exemplo de aplicação A educação influencia e é influenciada pelas condições de saúde estabelecendo um estreito contato com todos os movimentos de inserção nas situações cotidianas em seus complexos aspectos sociais políticos econômicos culturais dentre outros MENDES VIANA 2001 Faça a reflexão sobre as seguintes questões 1 Qual é a relação entre a situaçãoproblema apresentada e a afirmação dos autores Mendes e Viana 2001 2 Quais são os fatores sociais e econômicos encontrados na situaçãoproblema apresentada que podem influenciar a saúde do Sr JAB 3 Quais seriam as ações educativas possíveis de serem desenvolvidas nesta situação 24 Unidade I 4 Como colocar essas ações educativas em prática recursos tempo estratégias 5 Como mobilizar a equipe de saúde a trabalhar de forma coerente com a afirmação citada de Mendes e Viana 2001 6 O vínculo estabelecido entre o Sr JAB e a enfermeira configura uma relação profissional positiva ou negativa nessa situação Por quê 4 COMUNICAÇÃO HUMANA INSTRUMENTO ESSENCIAL PARA A PRÁTICA EDUCATIVA 41 Fundamentos da comunicação humana Sabemos que a comunicação destacase como o principal instrumento para que a interação e a troca aconteçam e consequentemente o processo de cuidar no seu sentido mais amplo tenha espaço para acontecer Segundo Mendes 1994 os componentes da comunicação formam o clima e a nutrição para a compreensão Etimologicamente a palavra comunicar originase do latim communicare que significa pôr em comum Mendes 1994 A comunicação interpessoal pode ser definida como um conjunto de movimentos integrados que calibra regula mantém e por isso torna possível a relação entre os homens SILVA 2001 Encontramos muitas definições para o que vem a ser comunicação afinal como afirmam Watzlawizk Beavin e Jackson 1967 não se comunicar é impossível mesmo na inatividade ou no silêncio tudo tem valor de mensagem a comunicação é o princípio natural que une um ser a outroRUESCH 1987 Segundo Silva 2006 a comunicação pode ser dividida em verbal associada às palavras expressas por meio da fala ou da escrita e em não verbal desenvolvida através de gestos silêncio expressões faciais postura corporal entre outros Ao compreendermos a educação em saúde como um elemento de cuidado humano percebemos logo a importância de uma comunicação com qualidade para que haja uma atenção efetiva e de qualidade Waldow 1998 ao fazer uma reflexão histórica sobre como o corpo e o toque são percebidos referese à possibilidade do mundo da tecnologia avançada substituir esse instrumento próprio do ser humano A autora lembra que o afago e o aperto de mão que oferecem apoio e suporte bem como o olhar carinhoso e amigo parecem não ser mais necessários A máquina assume o cuidado e o cuidador permanece ocupado e absorvido no manuseio desta tecnologia por vezes esquecendo o ser humano a ela conectado Na comunicação há o envolvimento do comportamento recíproco entre as pessoas que estão se relacionando o que significa que não existe um fluxo de comportamento numa só direção MENDES 1994 Com ou sem intenção sempre há a transmissão de mensagens uma vez estabelecida a interação 25 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE O indivíduo participa simultaneamente de duas dimensões existenciais que decorrem de duas formas de se relacionar com o mundo uma verbal que lhe confere um repertório psicolinguístico proporcionando uma exteriorização do ser social e outra não verbal que constitui um estatuto psicobiológico proporcionando uma exteriorização ser psicológico SILVA 2006 A comunicação é um processo pautado em compreender e compartilhar mensagens enviadas e recebidas estas mensagens exercem influência no comportamento das pessoas que vivenciam essa interação STEFANELLI 2005 Exemplo de aplicação Exemplo de aplicação Foi apresentada uma afirmação de Stefanelli 2005 importante para o eixo da nossa discussão pois se as mensagens enviadas e recebidas exercem influência no comportamento das pessoas que vivenciam essa interação apresentamos perguntas para reflexão Como estamos nos comunicando no exercício da nossa profissão Como influenciamos e somos influenciados pelos nossos colegas de trabalho Como influenciamos e somos influenciados pelas pessoas de quem cuidamos para quem prestamos um serviço de saúde Será que temos consciência das nossas expressões não verbais Será que estamos atentos às expressões não verbais das pessoas com quem nos relacionamos Vale destacar uma pesquisa desenvolvida com crianças cegas e surdas desde o nascimento e que apesar de nunca terem aprendido por imitação pois nunca puderam olhar o rosto da mãe elas demonstram as emoções da mesma maneira que nós que enxergamos Seus olhos brilham e sorriem quando estão felizes choram quando estão tristes ficam vermelhas e desviam a direção do olhar quando estão com vergonha levantam as sobrancelhas e abrem mais os olhos e conforme o grau de surpresa também a boca SILVA 2006 Silva 2002 constatou portanto que as emoções básicas são expressas da mesma maneira em qualquer ser humano A autora coloca em destaque que os pacientes olham para o rosto dos profissionais e não para as mãos porque esperam entender o que os profissionais da saúde sentem ao lhes prestar cuidados pois nem sempre têm condições de fazer a avaliação técnica desse trabalho Assim a autora nos ensina que A compreensão que os pacientes precisam ter do profissional da área da saúde passa principalmente pela compreensão de que quando nos comunicamos com as pessoas não temos apenas o compromisso de passar um conteúdo 26 Unidade I uma informação pois toda comunicação envolve um sentimento ou seja o que é que sentimos quando ficamos diante do outro o que é que sentimos quando ficamos diante daquela pessoa e diante da informação que temos a transmitir o quanto concordamos com Natagori quando ele diz Abandonarei todas as honras menos a de te servir SILVA 2002 p74 Silva 2006 nos lembra que toda comunicação tem duas partes de um lado o conteúdo o fato a informação que queremos transmitir de outro o que estamos sentindo quando nos comunicamos com a pessoa O conteúdo está intimamente ligado ao referencial de cultura e cabe lembrar que o profissional de saúde tem uma cultura própria diferente do leigo por isso é importante saber que quanto mais informações possuirmos sobre aquela pessoa e quanto maior a nossa habilidade em correlacionar esse saber do outro com o nosso melhor será o nosso desempenho no aspecto da informação e do conteúdo Aqui inferimos o quanto essa afirmação vai ao encontro das premissas de Paulo Freire que nos apresenta um modelo de educação dialógica na qual os saberes do outro são fundamentais para uma construção de novos saberes A comunicação pressupõe a informação e o domínio sobre o que queremos comunicar a nossa intenção emoção e o que pretendemos quando nos aproximamos do nosso cliente ou do nosso paciente O interessante é que nem sempre o profissional da área de saúde tem a consciência de que ao falarmos em comunicação não falamos apenas das palavras expressas para a outra pessoa que podem ser dimensionadas como comunicação verbal Acontece que toda comunicação humana face a face interpessoal também se faz através da comunicação não verbal ou seja de todas as formas de comunicação que não envolvem diretamente as palavras Até podemos afirmar que quando falamos de relacionamento interpessoal a comunicação verbal sozinha não existe pois além dela existe a maneira como falamos que podemos chamar de paraverbal os silêncios e grunhidos que utilizamos ao falar as pausas que fazemos entre as frases e palavras a ênfase que colocamos na voz Além do paraverbal temos as expressões faciais as nossas posturas corporais diante do outro a maneira como o tocamos as distâncias interpessoais que mantemos com essa outra pessoa SILVA 2006 apud SILVA 2002 p75 Dessa forma para afirmarmos que a comunicação está efetivamente ocorrendo temos que ter coerência nas nossas palavras e em toda nossa comunicação não verbal E aqui se destaca as quatro finalidades da comunicação não verbal SILVA 2002 1 A primeira é complementar a comunicação verbal Por exemplo quando dizemos bom dia sorrindo para o outro e olhando nos seus olhos 2 A segunda é contradizer o verbal Por exemplo quando dizemos muito prazer e apertamos a mão do outro com medo ou nojo de tocar 27 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE 3 A terceira é substituir o verbal Por exemplo o meneio positivo da cabeça olhando para a outra pessoa e dizendo não verbalmente estou te ouvindo estou atenta a você 4 A quarta finalidade do não verbal é a demonstração dos nossos sentimentos SILVA 2002 Comunicação não verbal SILVA 1996 Paralinguagem qualquer som produzido pelo aparelho fonador que não faça parte do sistema sonoro da língua usada Cinésica linguagem do corpo movimentos Proxêmica é o uso que o homem faz do espaço Tacêsica é tudo que envolve a comunicação tátil Características físicas são a própria forma e a aparência do corpo De maneira geral não temos consciência nem controle voluntário de toda essa sinalização não verbal Exemplo disso é uma situação de interação na qual gostamos do que está acontecendo a nossa pupila se dilata involuntária e inconscientemente Evidentemente em situações onde não existe alteração de luminosidade nem alterações químicas porém é fato comprovado que quando a interação é prazerosa para a pessoa a sua pupila se dilata É interessante que diante da contradição na dúvida entre a mensagem verbal e a não verbal as pessoas confiam na linguagem silenciosa que fala da essência do ser humano e do que estamos sentindo MCCASKEY 1999 Cabe aqui destacar que em um processo educativo eou em um processo de cuidado em saúde estamos tratando de interação humana e portanto a habilidade em se comunicar será elemento fundamental para qualificar a relação estabelecida Se o que foi apresentado até aqui evidencia que a comunicação não verbal transmite o que sentimos ao nos relacionarmos retomo o que Paulo Freire nos ensina ao dizer que educar exige querer bem aos educandos FREIRE 1996 e o parafraseio dizendo que cuidar exige querer bem àqueles de quem cuidamos Fica claro que se alguém está apenas preocupado em transmitir informações e não interessado na compreensão do que o outro apreende da informação o seu não verbal expressará mensagens de descuidado Dessa forma o outro que estará ouvindo a informação perceberá na sutileza do não verbal a impossibilidade de questionamento a impossibilidade de esclarecer dúvidas Então a dica é tomarmos consciência do que pretendemos fazer em uma prática de educação em saúde Queremos apenas cumprir uma meta institucional eou política Ou almejamos contribuir para uma efetiva reflexão e construção de modos saudáveis de vida Temos que ter a consciência de que o discurso sozinho tem pouco impacto se não acompanhado da confirmação não verbal E essa expressão não verbal não mente ela emite a mensagem do nosso real sentimento em determinada situação 28 Unidade I Saiba mais A leitura do livro Comunicação tem remédio é uma possibilidade de aprender sobre a comunicação e sobre como nos comunicarmos SILVA M J P Comunicação tem remédio a comunicação nas relações interpessoais em saúde 11 ed São Paulo Gente 2006 Leia atentamente a parábola O canto do galo Era uma vez um granjeiro Era um granjeiro incomum intelectual e progressista Estudou administração para que sua granja funcionasse cientificamente Não satisfeito fez um doutorado em criação de galinhas No curso de administração aprendeu que num negócio o essencial é a produtividade O improdutivo dá prejuízo deve portanto ser eliminado Aplicado à criação de galinhas esse princípio se traduz assim galinha que não bota ovo não vale a ração que come Não pode ocupar espaço no galinheiro Deve portanto ser transformada em cubinhos de caldo de galinha Com o propósito de garantir a qualidade total de sua granja o granjeiro estabeleceu um rigoroso sistema de controle da produtividade de suas galinhas Produtividade de galinhas é um conceito matemático que se obtém dividindose o número de ovos botados pela unidade de tempo escolhida Galinhas cujo índice de produtividade fosse igual ou superior a 250 ovos por ano podiam continuar a viver na granja como galinhas poedeiras O granjeiro estabeleceu inclusive um sistema de mérito galináceo as galinhas que botavam mais ovos recebiam mais ração As galinhas que botavam menos ovos recebiam menos ração As galinhas cujo índice de produtividade fosse igual ou inferior a 249 ovos por ano não tinham mérito algum e eram transformadas em cubinhos de caldo de galinha Acontece que conviviam com as galinhas poedeiras galináceos peculiares que se caracterizavam por um hábito curioso A intervalos regulares e sem razão aparente eles esticavam os pescoços abriam os bicos e emitiam um ruído estridente e ato contínuo subiam nas costas das galinhas seguravamnas pelas cristas com o bico e obrigavamnas a se agachar Consultados os relatórios de produtividade verificou o granjeiro que isso era tudo o que os galos esse era o nome daquelas aves faziam Ovos mesmo nunca jamais em toda a história da granja qualquer um deles botara Lembrouse o granjeiro então das lições que aprendera na escola e ordenou que todos os galos fossem transformados em cubos de caldo de galinha As galinhas continuaram a botar ovos como sempre haviam botado os números escritos nos relatórios não deixavam margens a dúvidas Mas uma coisa estranha começou a acontecer Antes os ovos eram colocados em chocadeiras e ao final de vinte e um dias eles se quebravam e de dentro deles saíam pintinhos vivos Agora os ovos das mesmas galinhas depois de vinte e um dias não quebravam Ficavam lá inertes Deles não saíam pintinhos E se ali continuassem por muito tempo estouravam e de dentro deles o que saía era um cheiro de coisa podre Coisa morta Aí o granjeiro científico aprendeu duas coisas Primeiro o que importa não é a quantidade dos ovos o que importa é o que vai dentro 29 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE deles A forma dos ovos é enganosa Muitos ovos lisinhos por fora são podres por dentro Segundo há coisas de valor superior aos ovos que não podem ser medidas por meio de números Coisas sem as quais os ovos são coisas mortas Fonte ALVES R Entre a ciência e a sapiência O dilema da educação 6 ed São Paulo Loyola 2001 pp 6771 Exemplo de aplicação Exemplo de aplicação Com base na leitura da parábola reflita Que associações podem ser feitas a partir da mensagem contida no texto e as práticas educativas em saúde que encontramos no cenário econômico e social em que vivemos 42 Saber ouvir Para refletir sobre o tema saber ouvir seleciono um texto que fala por si Escutatória de Rubem Alves com grifos para reflexão Sempre vejo anunciados cursos de oratória Nunca vi anunciado curso de escutatória Todo mundo quer aprender a falar Ninguém quer aprender a ouvir Pensei em oferecer um curso de escutatória Mas acho que ninguém vai se matricular Escutar é complicado e sutil Diz o Alberto Caeiro que não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores É preciso também não ter filosofia nenhuma Filosofia é um monte de ideias dentro da cabeça sobre como são as coisas Aí a gente que não é cego abre os olhos Diante de nós fora da cabeça nos campos e matas estão as árvores e as flores Ver é colocar dentro da cabeça aquilo que existe fora O cego não vê porque as janelas dele estão fechadas O que está fora não consegue entrar A gente não é cego As árvores e as flores entram Mas coitadinhas delas entram e caem num mar de ideias São misturadas nas palavras da filosofia que mora em nós Perdem a sua simplicidade de existir Ficam outras coisas Para ver é preciso que a cabeça esteja vazia Faz muito tempo nunca me esqueci Eu ia de ônibus Atrás duas mulheres conversavam Uma delas contava para a amiga os seus sofrimentos contoume uma amiga nordestina que o jogo que as mulheres do Nordeste gostam de fazer quando conversam umas com as outras é comparar sofrimento Quanto maior o sofrimento mais bonitas são a mulher e a sua vida Conversar é a arte de produzirse literariamente como mulher de sofrimentos Acho que foi lá que a ópera foi inventada A alma é uma literatura É nisso que se baseia a psicanálise Voltando ao ônibus Falavam de sofrimentos Uma delas contava do marido hospitalizado dos médicos dos exames complicados das injeções na veia a enfermeira nunca acertava dos vômitos e das urinas Era um relato comovente de dor 30 Unidade I Até que o relato chegou ao fim esperando evidentemente o aplauso a admiração uma palavra de acolhimento que supostamente ouvia Mas o que a sofredora ouviu foi o seguinte Mas isso não é nada A segunda iniciou então uma história de sofrimentos incomparavelmente mais terríveis e dignos de uma ópera que os sofrimentos da primeira Parafraseio o Alberto Caieiro Não é bastante ter ouvidos para se ouvir o que é dito É preciso também que haja silêncio dentro da alma Daí a dificuldade a gente não aquenta ouvir o que o outro diz sem logo dar um palpite melhor sem misturar o que ele diz com aquilo que a gente tem a dizer Como se aquilo que ele diz não fosse digno de descansada consideração e precisasse ser complementado por aquilo que a gente tem a dizer que é muito melhor No fundo somos todos iguais às duas mulheres do ônibus Certo estava Lichtenberg citado por Murilo Mendes Há quem não ouça até que lhe cortem as orelhas Nossa incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e sutil da nossa arrogância e vaidade no fundo somos os mais bonitos Tenho um velho amigo Jovelino que se mudou para os Estados Unidos estimulados pela revolução de 64 Pastor protestante não evangélico foi trabalhar num programa educacional da Igreja Presbiteriana USA voltado para minorias Contoume de sua experiência com os índios As reuniões são estranhas Reunidos o participante ninguém fala Há um longo longo silêncio Os pianistas antes de iniciar o concerto diante do piano ficam assentados em silêncio como se estivesse orando Não rezando reza é falatório para não ouvir Orando Abrindo vazios de silêncio Expulsando todas as ideias estranhas Também para se tocar piano é preciso não ter filosofia nenhuma Todos em silêncio à espera do pensamento essencial Aí de repente alguém fala Curto Todos ouvem Terminada a fala novo silêncio Falar logo em seguida seria desrespeito Pois o outro falou os seus pensamentos pensamentos que julgava essenciais Sendo dele os pensamentos não são Sãome estranhos Comida que é preciso digerir Digerir leva tempo É preciso tempo para entender o que o outro falou Se falo logo a seguir são duas as possibilidades Primeira Fiquei em silêncio só por delicadeza Na verdade não ouvi o que você falou Enquanto você falava eu pensava nas coisas que iria falar quando você terminasse sua tola fala Falo como se você não tivesse falado Ouvi o que você falou Mas isso que você falou como novidade eu já pensei há muito tempo É coisa velha para mim Tanto que nem preciso pensar sobre o que você falou Em ambos os casos estou chamando o outro de tolo O que é pior que uma bofetada O longo silêncio quer dizer Estou ponderando cuidadosamente tudo aquilo que você falou E assim vai a reunião Há grupos religiosos cuja liturgia consiste de silêncio Faz alguns anos passei uma semana num mosteiro na Suíça Grand Champs Eu e algumas outras pessoas ali estávamos para juntos escrever um livro Era uma antiga fazenda Velhas construções não me esqueço da água no chafariz onde as pombas vinham beber Havia uma disciplina de silêncio não total mas de uma fala mínima O que me deu enorme prazer às refeições 31 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE Não tinha a obrigação de manter uma conversa com meus vizinhos de mesa Podia comer pensando na comida Também para comer é preciso não ter filosofia Não ter obrigação de falar é uma felicidade Mas logo fui informado de que parte da disciplina do mosteiro era participar da liturgia três vezes por dia às 7 da manhã ao meiodia e às 6 da tarde Estremeci de medo Mas obedeci O lugar era sagrado era um velho celeiro todo de madeira teto muito alto Escuro Haviam aberto buracos na madeira ali colocando vidros de várias cores Era uma atmosfera de luz mortiça iluminado por velas sobre o altar uma mesa simples com um ícone oriental de cristo Uns poucos bancos arranjados em U definiam um amplo espaço vazio no centro onde quem quisesse podia se assentar numa almofada sobre um tapete Cheguei alguns minutos antes da hora marcada Era um grande silêncio Muito frio nuvens escuras cobriam o céu e corriam levadas por um vento impetuoso que descia dos Alpes A força do vento era tanta que o velho celeiro torcia e rangia como se fosse um navio de madeira num mar agitado O vento batia nas macieiras nuas do pomar e o barulho era como o de ondas que se quebram Estranhei Os suíços são sempre pontuais A liturgia não começava E ninguém tomava providências Todos continuavam do mesmo jeito sem nada fazer Ninguém que se levantasse para dizer Meus irmãos vamos cantar o hino Cinco minutos dez quinze Só depois de vinte minutos é que eu estúpido percebi que tudo já se iniciara vinte minutos antes As pessoas estavam lá para se alimentar de silêncio E eu comecei a me alimentar de silêncio também Não basta o silêncio de fora É preciso silêncio dentro Ausência de pensamentos E aí quando se faz o silêncio dentro a gente começa a ouvir coisas que não ouvia Eu comecei a ouvir Fernando Pessoa conhecia a experiência e se referia a algo que se ouve nos interstícios das palavras no lugar onde não há palavras É música melodia que não havia e que quando ouvida nos faz chorar A música acontece no silêncio É preciso que todos os ruídos cessem No silêncio abremse as portas de um mundo encantado que mora em nós como no poema de Mallarmé A catedral submersa que Debussy musicou A alma é uma catedral submersa No fundo do mar quem mergulha sabe a boca fica fechada Somos todos olhos e ouvidos Me veio agora a ideia de que talvez essa seja a essência da experiência religiosa quando ficamos mudos sem fala Aí livres dos ruídos do falatório e dos saberes da filosofia ouvimos a melodia que não havia que de tão linda nos faz chorar Para mim Deus é isto beleza que se ouve no silêncio Daí a importância de saber ouvir os outros há beleza lá também Comunhão é quando a beleza do outro e a beleza da gente se juntam num contraponto Está apresentado no texto acima um cenário de reflexão sobre a arte de ouvir de escutar Como percebemos não é fácil Vivemos em um mundo de muitos barulhos de muitas informações e de muita 32 Unidade I velocidade assim tornase cada vez mais difícil esvaziar nossas mentes para ouvir o outro e mais difícil ainda ter tempo para digerir a fala do outro Ressalto aqui a fala verbal e não verbal Fica então o desafio desafio de exercitarmos a escuta ao que o outro tem a nos dizer o educando o usuário do serviço de saúde Em um serviço de saúde repleto de pessoas para serem atendidas e ao mesmo tempo com todo o contexto de cobrança de produtividade quantitativa de serviço prestado como colocar em prática o exercício da comunicação que requer uma escuta reflexiva Vamos pensar que um caminho possível seria a tomada de consciência das nossas reais intenções Se realmente queremos educar bem aprender bem cuidar bem então isso será transmitido em cada ato não verbal e o mesmo tempo mesmo que curto utilizado em uma interação humana será qualificado pela consciência crítica do porquê estamos ali e o que pretendemos com esse encontro Resumo Nesta primeira unidade foi possível esboçar um panorama teóricoconceitual acerca dos temas que envolvem as práticas educativas em saúde focando o processo saúdedoença o processo ensinoaprendizagem a educação libertadora a organização dos serviços de saúde no Brasil e a Política Nacional de Educação Permanente em saúde Percebemos que contextualizar os temas a serem discutidos nos seus aspectos históricos políticos econômicos sociais e culturais é elemento que fundamenta e amplia a compreensão sobre o assunto Tornouse evidente a relação existente entre educação e saúde e o que entendemos por cada um desses conceitos que ao longo do tempo sofreu e ainda sofre modificações quanto às suas definições e práticas Mais do que compreender a relação entre educação e saúde foi possível compreender como esses temas se inserem em nossa atual organização política de atenção à saúde Compreender o Sistema Único de Saúde sua origem histórica seus princípios e diretrizes legais propicia a nós uma compreensão mais consistente sobre como pensar a saúde e a doença o ensinar e o aprender nesta realidade concreta e atual que vivemos Com isso a apresentação dos potenciais da Política Nacional de Educação Permanente em saúde suscita a possibilidade repensar a formação elementar e permanente dos profissionais que atuam na área da saúde 33 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE para uma prática educativa consciente que promova verdadeiramente a autonomia a emancipação humana e a liberdade de criação Desse modo tornase possível o desenvolvimento de um movimento espiral e crescente de construção de novas formas de pensar e agir em saúde Esta é de fato a grande finalidade de vivenciar uma prática educativa nessas bases conceituais apresentadas propiciar um movimento livre e emancipatório contínuo a caminho do alcance do bem estar físico psíquico e social Para resumir as bases conceituais até aqui apresentadas podemos dizer que a palavra síntese é a liberdade Liberdade necessária para o alcance da saúde como foi citado por Dejours 1986 e liberdade necessária para uma educação que rompe com as imposições hegemônicas e possibilita a descoberta e expressão de novas possibilidades de ser e agir no mundo Diante desse panorama explicitamos ainda as contradições nas quais vivemos e desenvolvemos as práticas educativas e de saúde De um lado o atual cenário econômico que atribui valor financeiro a atributos não valoráveis tais como a vida e a educação e de outro lado os princípios de integralidade equidade e emancipação humana Diante do exposto cabe a reflexão de cada leitor acerca das possibilidades micropolíticas de atuação para o alcance das mudanças necessárias ou seja da atuação cotidiana ocorrida em cada encontro humano no qual cada ato refletirá em frutos libertadores ou reiterativos do que pensamos em saúde e em educação Em uma consulta realizada pelo enfermeiro dentista fisioterapeuta profissional de educação física e todos os demais profissionais da área da saúde a consciência do respeito ao saber do outro e a sensibilidade em contextualizar o cenário de vida do outro fará certamente a diferença na condução desse encontro e nesse sentido teremos mais interação e não apenas informação e com isso acreditamos na possibilidade de mudanças reias nos hábitos de saúde e principalmente nos fatores de fortalecimento da nossa saúde Complementarmente nesta unidade evidenciamos a importância da comunicação nos processos de interação humana em especial nos encontros de cuidado à saúde e dialeticamente nos encontros de educação em saúde Para além das técnicas e conteúdos necessários para a informação correta há a real necessidade de conhecermos as habilidades de comunicação Saber sobre os conteúdos verbais e não verbais e o impacto disso na interação 34 Unidade I Verificamos as finalidades da comunicação não verbal frente à comunicação verbal e com isso percebemos que a tomada de consciência sobre o que sentimos é fator necessário para cuidarmos dos momentos de interação e portanto de comunicação com o outro As mensagens enviadas e recebidas em um processo de comunicação exercem influência no comportamento das pessoas dessa forma cuidar da comunicação é cuidar da influência que podemos ter frente àqueles que pretendemos educar em saúde Não basta dominar o conteúdo teórico técnico e científico mais do que isso é necessário que tenhamos habilidades de comunicação para que toda a bagagem de conteúdo possa ser efetivamente compartilhada e praticada Outra questão destacada foi a habilidade de escutar Para escutar é necessário esvaziar a mente é necessário humildade para valorizar o que o outro tem a dizer Isso não é algo comum e simples em especial em um mundo repleto de ruídos informações e pressa O desafio colocado é o estabelecimento de relações conscientes e reflexivas Desenvolvendo habilidades de comunicação que é em si o elo que une um ser ao outro Exercícios Questão 1 O binômio educação e saúde constituem práticas socialmente produzidas em tempos e espaços históricos definidos RUIZMORENO et al 2005 Nesse sentido analise as afirmativas a seguir I A compreensão dos condicionantes do processo saúdedoença não oferece subsídios para a adoção de novos hábitos e condutas de saúde II A educação influencia e é influenciada aspelas condições de saúde estabelecendo um estreito contato com todos os movimentos de inserção nas situações cotidianas em seus complexos aspectos sociais políticos econômicos e culturais III Educação em Saúde é também um conjunto de saberes e práticas orientados para a prevenção de doenças e promoção da saúde Dentre as afirmativas anteriores A Todas as afirmativas estão corretas 35 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE B Todas as afirmativas estão incorretas C Apenas a afirmativa I está incorreta D Apenas a afirmativa II está correta E Apenas as afirmativas I e II estão corretas Resposta correta alternativa C Análise da questão A afirmativa I está incorreta porque a compreensão dos condicionantes do processo saúdedoença oferece sim subsídios para a adoção de novos hábitos e condutas de saúde As afirmativas II e III estão corretas Questão 2 Observe a pesquisa de Bruno et al 2009 descrita no resumo a seguir Objetivo avaliar os aspectos epidemiológicos na reincidência de gravidez na adolescência Métodos estudo de coorte que incluiu 187 adolescentes grávidas atendidas e acompanhadas durante cinco anos após o parto em um serviço de atendimento de adolescentes do Estado do Ceará Foram analisados faixa etária estar ou não estudando morar com os pais escolaridade condição marital e condição do companheiro atual Os dados foram digitados e analisados no programa EPIINFO Foram feitas análises estatísticas das variáveis independentes idade escolaridade estudar trabalhar morar com os pais estado civil e mudança de parceiro e comparadas quanto à variável dependente ter ou não uma nova gravidez cinco anos depois O teste exato de Fisher foi utilizado para avaliar associação entre os fatores que poderiam influenciar a repetição da gravidez considerado como tendo associação quando o p005 Foram calculados os riscos relativos para a escolaridade condição marital e mudança de parceiro por serem fatores que se mostraram significativos para a reincidência de gravidez Resultados foi verificado que 61 das adolescentes engravidaram nos cinco anos seguintes ao primeiro parto Não foram fatores protetores idade estudar trabalhar ou morar com os pais Entretanto quando as adolescentes tinham oito anos ou menos de escolaridade o risco de engravidar quase duplicou risco relativo RR18 IC951326 Novas gestações foram mais frequentes entre as solteiras sem companheiro estável RR13 IC951116 e aquelas que mudaram de parceiro RR14IC951117 Conclusões a baixa escolaridade a mudança de parceiros e uniões não estáveis foram fatores de risco para reincidência de gravidez 36 Unidade I Assinale a alternativa correta A A falta de conhecimento dos métodos contraceptivos é o fator mais relevante na pesquisa citada para a reincidência de gravidez B A prática educativa em saúde pautada no modelo pedagógico da transmissão é o mais indicado para mudar a realidade apresentada na pesquisa C Conhecer o perfil epidemiológico da população e os fatores envolvidos em determinada situação de saúde é importante para planejar as estratégias educativas a serem utilizadas e subsidiar parâmetros para avaliação de resultados D Trabalhar e morar com os pais foram fatores protetores para reincidência de gravidez na adolescência E A escolaridade não interfere na nova ocorrência de gestação na adolescência Resolução desta questão na plataforma
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Texto de pré-visualização
Autora Profa Gabriela Rodrigues Zinn Colaboradora Profa Laura Cristina da Cruz Dominciano Práticas Educativas em Saúde Professora conteudista Gabriela Rodrigues Zinn Enfermeira graduada em 2001 pela Universidade de São Paulo especialista em Enfermagem Gerontológica pela Universidade de São Paulo mestre em Psicologia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e doutoranda do Programa de Gerenciamento em Enfermagem da Universidade de São Paulo onde desenvolve um trabalho sobre a Política de Educação Permanente em Saúde Atuou como enfermeira assistencial no Hospital Universitário da Universidade de São Paulo de 2002 a 2005 Atua como docente da Universidade Paulista UNIP desde 2004 e coordena o curso de enfermagem desde 2006 e alguns campi atualmente no campus de Sorocaba Todos os direitos reservados Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma eou quaisquer meios eletrônico incluindo fotocópia e gravação ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista Dados Internacionais de Catalogação na Publicação CIP Z78p Zinn Gabriela Rodrigues Práticas Educativas em Saúde Gabriela Rodrigues Zinn São Paulo Editora Sol 2021 72 p il Nota este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP Série Didática ISSN 15179230 1 Práticas educativas 2 Comunicação humana 3 Modelos de educação I Título CDU 616083 U51000 21 Prof Dr João Carlos Di Genio Reitor Prof Fábio Romeu de Carvalho ViceReitor de Planejamento Administração e Finanças Profa Melânia Dalla Torre ViceReitora de Unidades Universitárias Profa Dra Marília AnconaLopez ViceReitora de PósGraduação e Pesquisa Profa Dra Marília AnconaLopez ViceReitora de Graduação Unip Interativa EaD Profa Elisabete Brihy Prof Marcello Vannini Prof Dr Luiz Felipe Scabar Prof Ivan Daliberto Frugoli Material Didático EaD Comissão editorial Dra Angélica L Carlini UNIP Dr Ivan Dias da Motta CESUMAR Dra Kátia Mosorov Alonso UFMT Apoio Profa Cláudia Regina Baptista EaD Profa Deise Alcantara Carreiro Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos Projeto gráfico Prof Alexandre Ponzetto Revisão Carla Moro Geraldo Teixeira Jr Sumário Práticas Educativas em Saúde APRESENTAÇÃO 7 INTRODUÇÃO 7 Unidade I 1 BASES CONCEITUAIS E CONTEXTUAIS 9 11 Considerações iniciais 9 2 REFERENCIAIS TEÓRICOS PARA COMPREENSÃO DE PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE 13 21 O processo saúdedoença 13 22 O processo ensinoaprendizagem 15 23 Educação uma prática de liberdade e emancipação 17 24 A organização política dos serviços de saúde no Brasil 18 3 POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE 20 4 COMUNICAÇÃO HUMANA INSTRUMENTO ESSENCIAL PARA A PRÁTICA EDUCATIVA 24 41 Fundamentos da comunicação humana 24 42 Saber ouvir 29 Unidade II 5 MODELOS PEDAGÓGICOS NA EDUCAÇÃO EM SAÚDE 37 51 Evolução dos pensamentos pedagógicos 37 511 A promoção da saúde e os modelos de educação em saúde 41 512 O modelo preventivo de educação em saúde 43 513 O modelo radical de educação em saúde 43 6 MODELOS DE EDUCAÇÃO EM SAÚDE REFLEXO DO CONTEXTO HISTÓRICO46 Unidade III 7 PLANEJAMENTO E EXCECUÇÃO DE UMA AÇÃO EDUCATIVA 54 71 Elaboração de um projeto educativo 54 711 Diagnóstico 54 712 Plano de ação 59 8 AVALIAÇÃO 62 7 APRESENTAÇÃO O presente livrotexto almeja uma aproximação do leitor com o tema educação e saúde para isso apresentará alguns conceitos e discussões que possibilitem a construção de conhecimento na área e além disso vislumbra especialmente suscitar a reflexão sobre as possibilidades de atuação do profissional de saúde na prática educativa Compreender a relação indissociável entre educação e saúde contextualizar essa relação e descobrir caminhos que a transformem em uma prática consciente de cuidado com o outro é o que esperamos INTRODUÇÃO A disciplina Práticas Educativas em Saúde aborda conceitos do processo saúdedoença e do processo ensinoaprendizagem em um exercício de prática reflexiva privilegiando os elementos que podem diferenciar o futuro profissional na prática de educação em saúde A disciplina tem como objetivos compreender a evolução histórica dos conceitos de educação em saúde relacionar a educação em saúde com a promoção da saúde compreender a relação ensinoaprendizagem e suas implicações sociais compreender a posição do profissional da saúde no processo ensinoaprendizagem conhecer as diversas metodologias de ensino com destaque ao modelo dialógico habilitarse no desenvolvimento de um projeto educativo em saúde 9 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE Unidade I 1 BASES CONCEITUAIS E CONTEXTUAIS 11 Considerações iniciais Para discorrer sobre a relação entre educação e saúde tornase pertinente explicitar os referenciais teóricos nos quais estarão pautados os conceitos que serão discutidos Temos que a saúde envolve compreensões que evoluíram ao longo da história sofrendo grandes modificações Desde a crença nos aspectos sobrenaturais evoluindo para o outro extremo no qual a verdade é considerada apenas a partir de aspectos físicos e orgânicos concretamente comprovados sendo essa forma de perceber a saúde atrelada ao contexto filosófico positivista Nessa evolução chegase nas formas atuais de compreender a saúde que abrangem definições amplas e complexas o que não é surpreendente uma vez que se trata de um atributo humano e sendo humano tornase evidentemente complexo Olhar para a saúde como um processo já é um grande avanço e inserir nesse processo os aspectos contextuais em que ele ocorre amplia ainda mais o olhar para esse fenômeno Assim hoje temos que o processo saúdedoença é influenciado por questões de ordem política econômica ambiental cultural social emocional e até espiritual Ao encontro da forma de olhar o processo saúde doença descrito anteriormente podese trazer à discussão o processo ensinoaprendizagem que também sofreu mudanças conceituais e procedimentais ao longo da história Nesse sentido evoluiuse do olhar empírico e intuitivo no processo ensinoaprendizagem passando por práticas metódicas de transmissão de conteúdos até chegar às discussões mais atuais em educação que considera a participação e foca a formação crítica e política dos sujeitos envolvidos nesse processo Como ponto de partida para esse panorama teóricoconceitual que será apresentado colocase em destaque a reflexão que nos remete à existência na modernidade do processo progressivo e permanente de construção dos direitos democráticos em choque com a lógica do capital Este choque entre o que podemos chamar de cidadania ou democracia e o capitalismo não é um fato explosivo e concentrado em um único momento mas sim uma contradição existente em forma de processo marcado por avanços e recuos porém com uma tendência predominante da introdução cada vez maior de novas lógicas não mercantis na regulação da vida social COUTINHO 2000 Em síntese colocase como principal característica da modernidade a existência de um processo dinâmico e contraditório uma época histórica caracterizada pela promessa de emancipação do homem de todas as opressões e alienações contraditoriamente produzidas e reproduzidas pelo capitalismo e 10 Unidade I conclui que as possibilidades abertas na modernidade para a humanidade referentes à emancipação ainda não foram realizadas COUTINHO 2000 Observação Contextualizar o momento histórico com suas peculiaridades políticas econômicas e culturais é elementochave para a compreensão do que se pretende estudar Neste momento pretendemos contextualizar o cenário da educação em saúde e compreender que as possibilidades de emancipação do homem na modernidade ainda não foram realizadas e este é ponto de partida para problematizar e refletir sobre os caminhos possíveis para essa emancipação Nesse sentido trazemos à discussão uma questão central para o desenvolvimento deste trabalho que é a saúde Dejours 1986 questiona o conceito de saúde da Organização Mundial da Saúde OMS e coloca em foco uma nova possibilidade de compreender esse fenômeno Para OMS saúde é um completo estado de bemestar físico psíquico e social Destacase a crítica desse autor à definição internacional de saúde quando ele considera que a saúde não se trata de um estado de bemestar mas de um estado que se busca aproximar ou seja a saúde como um fim um objetivo a ser atingido e não como algo estático Assim saúde é um processo e não um estado DEJOURS 1986 Além da crítica o autor apresenta a contribuição de uma nova forma de conceituar a saúde a saúde para cada homem cada mulher ou criança é ter meios de traçar um caminho pessoal e original em direção ao bemestar físico psíquico e social Para o bemestar físico o autor acredita na liberdade de regular as variações que o organismo apresenta por exemplo dar ao corpo o direito de descansar quando está cansado Para o bemestar psíquico a liberdade proporcionada ao desejo de cada um na organização da sua vida e por fim para o bemestar social a liberdade de se agir individual e coletivamente na organização do trabalho DEJOURS 1986 Desse modo temos até aqui uma nova forma de olhar a saúde como um ideal a ser atingido e que o elemento fundamental para o alcance dessa meta é a liberdade Essa ideia vai ao encontro do que Merhy 2012 apresenta em relação ao sistema de saúde do Brasil O autor compreende o SUS como utopia o que traz a ideia de algo a ser alcançado mas para o autor esse SUS apresentado como utopia representa a base para o reconhecimento de que este campo de práticas sociais é pautado em disputas radicais impactando os modos de produzir o cuidado em saúde tanto no plano individual como coletivo Em consonância com a ideia de Deleuze 2010 Merhy 2012 destaca que não se trata de questões simplesmente conceituais mas algo a ser vivido e assim o SUS como utopia permite construir nas ações práticas cotidianas de construção de novos sentidos enriquecedores dos viveres como forma de produzir saúde MERHY 2012 Assim podemos correlacionar essa ideia de SUS utopia à ideia de saúde utopia no sentido de uma práxis pautada na liberdade que produz possibilidades de aproximação ao que seria o completo bemestar físico psíquico e social 11 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE Saiba mais Veja o seguinte filme que remete à reflexão e contribui para este mergulho no pensamento da liberdade como elemento da emancipação humana UM SONHO de liberdade Dir Frank Darabont Estados Unidos Warner Home Video 1994 Merhy 2012 levanta uma questão central e muito contraditória a aposta de que a vida de qualquer um vale a pena não como algo a ser representado no pensamento mas para ser vivida nos encontros com os outros especialmente no mundo do trabalho em saúde Os milhares de encontros que ocorrem entre usuários e trabalhadores de saúde constituem em si um ato vivo A tensão existente é expressa no questionamento de como conseguir operar o enfrentamento de que a vida de qualquer um vale em uma realidade material de produção que é evidentemente centrada em uma lógica invertida na qual a vida do outro interessa como consumidor e substrato para o lucro MERHY 2012 O desafio apresentado está em ultrapassar e vazar essa lógica a partir do agir micropolítico ou seja do trabalho vivo em ato que ocorre nos milhares de encontros entre profissionais de saúde e usuários nas diversas dimensões da produção do cuidado produzindo novas possibilidades de sentido MERHY 2012 Observação Nesse sentido inserimos a reflexão do trabalho em saúde e sua formação elementar e permanente compreendendo que aí está o potencial de transformar os encontros entre profissionais de saúde e usuários em novas possibilidades de liberdade e valorização da vida de qualquer um A intervenção profissional na área da saúde ocorre com o corpo vivo e em interação com o social e com o ambiente a partir de processos de subjetivação Entretanto a formação dos profissionais de saúde tende a enfrentar o corpo vivo apenas ao final da graduação o que gera uma tensão elementar entre a imagem de dessecação do corpo apreendida ao longo da formação e não pela escuta e contato com sua alteridade CARVALHO CECCIM 2009 Cabe citar o estabelecimento de discussões no âmbito éticopolítico acerca da formação em saúde ao longo das últimas décadas Podese pontuar como exemplo o estabelecimento do Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde PróSaúde em 2005 para os cursos de medicina enfermagem e odontologia com ênfase na integração entre instituições de ensino estruturas de gestão 12 Unidade I da saúde órgãos de representação popular e os serviços de atenção à saúde CARVALHO CECCIM 2009 Entretanto essas diretrizes políticas e curriculares relativamente recentes ainda são pontuais e não esgotam a demanda de discussão da formação em saúde aqui propostas Evidenciamos a necessidade de nos voltarmos para os sentidos valores e significados do que e para quem fazemos nossas ações em saúde As questões de natureza ética e humana têm sido preteridas na formação à medida que não se adotam metodologias de ensino que promovam a participação do aluno e a sua responsabilização no processo de formação CARVALHO CECCIM 2009 Como elemento concreto para discussão e concretização do SUS utopia pautada no conceito de saúde utopia e a partir de um trabalho vivo que considera a vida de qualquer um como algo a ser muito bem cuidada apresentase a Política Nacional de Educação Permanente em Saúde que em seu texto elucida conceitos coerentes com o que foi apresentado até aqui A Educação Permanente é aprendizagem no trabalho onde o aprender e o ensinar se incorporam ao cotidiano das organizações e ao trabalho A educação permanente se baseia na aprendizagem significativa e na possibilidade de transformar as práticas profissionais A educação permanente pode ser entendida como aprendizagemtrabalho ou seja ela acontece no cotidiano das pessoas e das organizações Ela é feita a partir dos problemas enfrentados na realidade e leva em consideração os conhecimentos e as experiências que as pessoas já têm Propõe que os processos de educação dos trabalhadores da saúde se façam a partir da problematização do processo de trabalho e considera que as necessidades de formação e desenvolvimento dos trabalhadores sejam pautadas pelas necessidades de saúde das pessoas e populações Os processos de educação permanente em saúde têm como objetivos a transformação das práticas profissionais e da própria organização do trabalho BRASIL 2009 p 20 Transformar diretrizes políticas em trabalho vivo é um desafio que passa pela necessidade de mobilizações éticopolíticas técnicocientíficas e psicossociais Há a possibilidade de mudanças que se tornarão reais nos atos vivos de cada profissional de saúde nos seus encontros seja no âmbito da gestão ou do cuidado direto com o usuário do serviço de saúde A proposta da educação permanente se alicerçada em estrutura favorável possibilitará a atuação de todos os sujeitos envolvidos na atenção das reais demandas locais e assim vislumbramos uma nova forma de conceber e agir em saúde Observação O desafio apresentado é complexo e enfrenta muitas contradições mas encontra na atuação micropolítica a possibilidade de transformações 13 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE Assim apresentase a seguir um panorama teórico sobre o processo saúdedoença o processo ensinoaprendizagem o contexto político e social da organização dos serviços de saúde com enfoque na PNEPS 2 REFERENCIAIS TEÓRICOS PARA COMPREENSÃO DE PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE 21 O processo saúdedoença A compreensão do conceito de processo saúdedoença é necessária para que possamos atuar de forma assertiva nos fatores que envolvem esse processo Podemos afirmar que a saúde e o adoecer são modos pelos quais a vida se manifesta eles remetem a experiências únicas e subjetivas que não podem ser reconhecidas e significadas integralmente pela palavra Contudo é por meio da palavra que a pessoa expressa seu malestar bem como o médico dá significação às queixas de seu paciente Nessa relação entre a ocorrência do fenômeno concreto de adoecer e as palavras do paciente e do profissional de saúde situase a tensão entre a subjetividade da experiência da doença e a objetividade dos conceitos que lhe dão sentido e propõem intervenções CZERESNIA 2003 O discurso médico científico não abrange a significação mais ampla da saúde e do adoecer pois a saúde não é objeto que se possa delimitar não pode ser traduzida em conceito científico bem como o sofrimento que envolve o adoecer Descartes considerado o primeiro formulador da concepção mecanicista do corpo reconheceu que há partes do corpo humano vivo que são exclusivamente acessíveis a seu titular CAPONI 1997 Nessa perspectiva ressaltamos que a questão da saúde não diz respeito à incorporação de um novo discurso que migra da dimensão da objetividade à da subjetividade do universal ao singular do quantitativo ao qualitativo Não se trata de optar por valores que ficaram subjugados no decorrer do desenvolvimento da racionalidade científica moderna submetendose agora aos que eram anteriormente hegemônicos A questão não é construir novos posicionamentos que mantêm a reprodução de antigas oposições mas de conseguir transitar entre diferentes níveis e formas de entendimento e de apreensão da realidade tomando como base os acontecimentos que nos mobilizam a elaborar e a intervir e não sistemas de pensamento CZERESNIA 2003 Entretanto com a finalidade de contextualização do processo saúdedoença ressaltamos a relação dialética entre o biológico e o social ou seja consideramos que a reprodução dos grupos sociais nas diversas etapas produtivas deve ser levada em conta na detecção do perfil epidemiológico das classes sociais BREILH 1980 Dessa forma tornase relevante a análise dos perfis epidemiológicos em uma dada formação social de classes e frações de classe em que se segmenta a sociedade A categoria classe social é base para uma análise da produção e distribuição das enfermidades LAURELL 1983 14 Unidade I Considerase que no modelo capitalista de organização social temos diferentes classes sociais que se inserem nos modos de produção de formas distintas e portanto reproduzem ou seja vivem conforme a inserção nesses modos de produção lhes possibilita Essas diferentes formas de produzir e reproduzir no cenário de uma sociedade capitalista geram fatores de fortalecimento e desgaste no que se refere ao processo saúdedoença ZINN 2007 Assim podemos relacionar as estratégias de promoção à saúde com as ações de fortalecimento das classes sociais nos modos de reprodução social A atuação do profissional de saúde consiste em focalizar o potencial da pessoa para o bemestar e encorajála a modificar ou fortalecer hábitos pessoais estilo de vida e ambiente de modo a reduzir os riscos e aumentar a saúde e o bemestar Para isso o princípio de corresponsabilização nas práticas terapêuticas tornase fundamental Saiba mais Uma importante leitura que resgata as diferentes teorias interpretativas do processo saúdedoença ao longo da história é o artigo OLIVEIRA M A C EGRY E Y A historicidade das teorias interpretativas do processo saúdedoença RevEscEnf USP São Paulo v 34 n 1 p 915 2000 Exemplo de aplicação Exemplo de aplicação Após a leitura do artigo sugerido anteriormente reflita sobre o último parágrafo das considerações finais transcrito a seguir Na medida em que se evitasse que as necessidades de saúde fossem reduzidas a processos fisiopatológicos em que se buscassem formas de assistir que fossem cada vez mais totalizadoras e não meramente a somatória de especificidades tecnológicas em que se resgatasse a subjetividade quer da coletividade quer dos trabalhadores em saúde como parte desse processo de inovação SCHRAIBER MENDESGONÇALVES 1996 apud OLIVEIRA EGRY 2000 p 15 Essa afirmação se refere ao questionamento de como as necessidades de saúde são consideradas para que sejam planejadas as ações de promoção e intervenção em saúde Tal levantamento decorre da compreensão do que seja saúde ou doença Dessa forma reflita O que você compreende por saúde O que você compreende por doença Qual seria a infraestrutura necessária de atenção à sua saúde hoje 15 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE 22 O processo ensinoaprendizagem A atuação na promoção da saúde envolve necessariamente a compreensão de educação em saúde pois através das práticas educativas em saúde os profissionais envolvidos podem concretizar as ações de fortalecimento da população frente aos riscos de agravos à saúde A educação é compreendida como mediação básica da vida social de todas as comunidades humanas SEVERINO 2000 A díade educação e saúde compreendem práticas socialmente produzidas em tempos e espaços históricos específicos RUIZMORENO et al 2005 Considerando a relação entre educação e saúde e compreendendo que esse binômio está diretamente relacionado com o amplo contexto de vida das pessoas ressaltamos a importância de modelos de intervenção adequados para uma prática educativa efetiva que possibilita uma aproximação à saúde utopia Refletimos sobre a reorientação do modelo hegemônico de educação em saúde para um modelo dialógico em que a diferença consiste basicamente na consideração do sujeito no processo de aprendizagem partindo do pressuposto de que os usuários dos serviços de saúde são portadores de saberes acerca do processo saúdedoençacuidado e de condições concretas do cotidiano ALVES 2005 Assim se o objetivo é o fortalecimento das populações para que as classes sociais possam fazer face de maneira mais adequada aos determinantes do processo saúdedoença é preciso lançar mão de uma pedagogia não normativa mas dialógica e emancipatória ZINN 2007 Entretanto esses pressupostos dialógicos e emancipatórios são contraditórios a muitas situações reais de atenção à saúde uma vez que os profissionais de saúde não têm praticado ações de fortalecimento mas sim a ministração de prescrições comportamentais utilizadas no verbo imperativo a exemplo de não fume use cinto de segurança dentre outros LEFÈVRE LEFÈVRE 2007 Em uma reflexão paradigmática sobre a assistência de enfermagem temos que o processo de formação acadêmica historicamente tem se baseado predominantemente nos conhecimentos oriundos das ciências biológicas de forma fragmentada Diante dessa limitação teórica sugerese a busca de subsídios que fundamentem um ensino que não apenas reitere nossas vivências mas que favoreça a formação profissional de enfermeiros capazes de apreender e praticar um cuidado pautado no pensamento complexo SILVA CIAMPONE 2003 Essa reflexão vai ao encontro do pensamento de Severino 2000 que elucida a educação como elemento gerador de novas formas de concepção de mundo potencialmente capazes de se contraporem à concepção de mundo dominante rompendo assim com a ideia de elemento de reprodução de determinado sistema social como sugerem as teorias reprodutivistas Severino 2000 nos traz uma concepção de educação que a compreende como a mediação da articulação intencionalizante entre o conhecimento e as práticas históricas O autor discute a educação como uma práxis cujo sentido é intencionalizar as práticas reais pelas quais os homens buscam implementar sua existência 16 Unidade I O autor coloca em pauta a relação visceral entre o processo educacional e o da sociedade a partir de uma atitude crítica e de superação em uma relação que pode ser reprodutora ou transformadora das ideologias e relações sociais dominantes Nesse sentido Severino 2000 lembra Gramsci que transportando para o campo educacional a filosofia políticosocial do marxismo concebe a educação como força de transformação social O fio condutor dessa discussão é a concepção de homem como um ser natural histórico determinado pelas condições objetivas e que atua sobre elas por meio de sua práxis Assim inferimos a compreensão do educador como um mediador da prática transformadora através de sua práxis O autor nos remete à discussão da educação como uma práxis técnica laboral política sociabilidade e simbólica SEVERINO 2000 Referente à perspectiva técnica o autor discute o teor laboral da educação questionando a produção de bens materiais concretos por meio deste trabalho Com efeito quando os homens desempenham suas práticas predominantemente simbolizadoras desenvolvemnas também para prover sua existência material Tanto é que nas modernas sociedades capitalistas as atividades intelectuais são remuneradas com o salário que assume a forma de um bem universal permutável por qualquer outro de que se necessite Sem dúvida o produto imediato da educação não é material mas é socialmente útil sob a forma de um serviço necessário à sociedade SEVERINO 2001 p 71 Quanto à dimensão política a prática educativa compreende o compromisso em preparar os educandos para o trabalho e mais do que isso aprender a viver e sobreviver O último aspecto referese ao fato de que a preparação para o mundo do trabalho se realizada a partir de práticas laborais torna a aprendizagem mais significativa É portanto por meio da prática que se educa e se aprende Toda a discussão aqui apresentada acerca da educação deve ser inserida em um contexto histórico uma vez que conforme apresentado por Pereira 2003 a evolução das abordagens pedagógicas acompanhando os diferentes momentos políticos e econômicos apresentou modelos compreendidos como tradicionais renovados por condicionamento e libertadores sendo estes últimos mais eficazes em seus resultados que os demais Acrescentamos ainda que ao dizer anteriormente de uma prática educativa dialógica e emancipatória tais características estão inseridas no conceito de educação libertadora 17 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE Saiba mais Para maior compreensão da evolução histórica dos modelos pedagógicos leia GADOTTI M História das ideias pedagógicas São Paulo Ática 2001 23 Educação uma prática de liberdade e emancipação Dejours 1986 nos apresenta como meio para o alcance da saúde a liberdade esta se torna questão singular na dinâmica de busca pelo estado de bemestar físico psíquico e social Em consonância com essa forma de pensar temos a necessidade da liberdade como elemento essencial no processo ensinoaprendizagem Freire 2005 diz que a libertação autêntica trata da humanização em processo ou seja não é algo que se deposita nos homens não é uma palavra mas sim uma práxis a qual demanda ação e reflexão dos homens sobre o mundo para transformálo A educação que se impõe aos que verdadeiramente se comprometem com a libertação não pode fundarse numa compreensão dos homens como seres vazios a quem o mundo encha de conteúdos não pode basearse numa consciência espacializada mecanicistamente compartimentada mas nos homens como corpos conscientes e na consciência como consciência intencionada ao mundo Não pode ser a do depósito de conteúdos mas a da problematização dos homens em suas relações com o mundo FREIRE 2005 p 77 A proposta pedagógica de Paulo Freire remete à crítica e à superação dos modelos educacionais hegemônicos A educação apresentase como um caminho para a mudança social para a formação de sujeitos históricos atores e autores de seus processos cotidianos de emancipação coletiva e individual OLIVEIRA et al 2008 Destacamos a importância do diálogo como meio dessa relação educador e educando em um processo ensinoaprendizagem libertador Freire 2005 nos traz elementos importantes para pensarmos o diálogo ele afirma que se não há profundo amor ao mundo e aos homens não há diálogo O autor ainda nos diz que sem humildade também não há diálogo pois a autossuficiência impede a aproximação necessária ao diálogo Nessa aproximação ou seja neste lugar de encontro não há ignorantes totais nem sábios absolutos mas sim homens em comunhão que almejam saber mais FREIRE 2005 Complementarmente no aspecto metodológico Freire 2005 destaca que a investigação desde o seu início necessita da presença crítica de representantes da comunidade do início ao fim desde a análise da temática levantada prolongandose na organização de conteúdo programático da ação educativa 18 Unidade I Partimos da ideia de educação como um ato de troca em que o educador é aquele que enquanto educa é educado em diálogo com o educando que ao ser educado também educa FREIRE 2005 Educar vem do latim educere que significa conduzir É preciso então entender que a proposta educativa de tipo condutivista na promoção da saúde deve ser abandonada em favor da proposta informativa porque as pessoas não devem ser educadas mas ao contrário com a ajuda da informação e dialogando com a informação técnica devidamente decodificada conduzir sua vida Em vez de educar conduzindo é preciso informar o cidadão de modo claro transparente LEFÈVRE LEFÈVRE 2007 Saiba mais Uma leitura fundamental FREIRE P Pedagogia da autonomia saberes necessários à prática educativa São Paulo Paz e Terra 1996 Exemplo de aplicação Exemplo de aplicação Como estratégia de reflexão e pertencimento ao tema aqui apresentado reflita a partir das seguintes direções 1 Pense em uma experiência de aprendizado positiva que você já vivenciou e tente compreender quais os fatores que tornaram essa experiência positiva 2 Pense em um professor que você teve ao longo da sua trajetória de vida e que você considerou como um ótimo educador Quais características desse docente fizeram com que você o admirasse 3 Em contraposição lembrese de um professor que você não considerou com bom desempenho Que características desse educador fizeram com que você não o admirasse 24 A organização política dos serviços de saúde no Brasil O SUS mais do que uma forma de sistematizar e portanto nortear a administração do setor saúde é um modelo de atenção à saúde e surge como um ideal contrahegemônico constituído a partir de um expressivo esforço da sociedade civil O SUS foi elaborado com base em intensas discussões que tiveram como marco o Movimento da Reforma Sanitária na década de 1970 exemplo de um movimento resultante da organização 19 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE da sociedade que em síntese criticava e lutava pela mudança nas práticas e na organização dos serviços de saúde Estas práticas na ocasião eram fundamentadas na dicotomia entre preventivo e curativo individual e coletivo com ênfase no âmbito curativo e individual restritas aos contribuintes previdenciários SALUM 1998 O cenário vigente no setor saúde não era portanto democrático uma vez que o acesso à saúde não era universal mas restrito a parcelas da população e além de não ser integral era reducionista centrado na patologia e fragmentado não atendendo à totalidade das necessidades de saúde do indivíduo ZINN 2007 A Reforma Sanitária constituiuse de um processo modernizador e democratizante de transformação nos âmbitos políticojurídico políticoinstitucional e políticooperativo para dar conta da saúde dos cidadãos entendida como um direito universal e suportada por um Sistema Único de Saúde constituído sob regulação do Estado permeado pela eficiência eficácia e equidade com foco de construção permanentemente através do incremento de sua base social da ampliação da consciência sanitária da implantação de um outro paradigma assistencial do desenvolvimento de uma nova ética profissional e da criação de mecanismos de gestão e controle populares sobre o sistema VILAÇA 1994 As discussões levantadas no Movimento da Reforma Sanitária foram oficializadas na VIII Conferência Nacional de Saúde CNS ocorrida em 1986 e foi baseada nessas discussões que a nova Constituição Brasileira de 1988 instituiu o SUS e elaborou o texto que rege a área da saúde A implantação de um sistema de saúde universal no Brasil foi iniciada em um contexto político e econômico não favorável em meio a um cenário neoliberal com evidente posicionamento de organizações internacionais contrárias ao financiamento público de sistemas de saúde nacionais e universais PAIM et al 2011 Apesar de todos os avanços o SUS é um sistema de saúde em desenvolvimento que permanece na luta para garantir a cobertura universal e equitativa A participação do setor privado no mercado é crescente e as interações entre os setores público e privado criam contradições e uma competição injusta culminando em ideologias e objetivos opostos a exemplo do acesso universal contrário à segmentação do mercado Isso gera resultados negativos na equidade no acesso aos serviços de saúde e nas condições de saúde Um dado importante para esta análise é que apesar do financiamento federal ter aumentado cerca de quatro vezes desde o início da última década a porcentagem do orçamento federal destinada ao setor de saúde não cresceu acarretando restrições de financiamento infraestrutura e recursos humanos PAIM et al 2011 É evidente a necessidade de um modelo baseado na promoção intersetorial da saúde e na integração dos serviços de saúde Nesse sentido o Pacto pela Saúde e sua proposta de uma rede de serviços de saúde organizada com fundamentos na atenção básica associado às recomendações da Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais da Saúde as quais orientam para a necessidade de abordar as causas primordiais dos problemas de saúde podem ajudar nessa conformação de modelos de atenção ampliados PAIM et al 2011 20 Unidade I Podese dizer que o maior desafio enfrentado pelo SUS é político Aspectos como o financiamento a articulação entre público e privado e as desigualdades persistentes não poderão ser resolvidas unicamente na esfera técnica PAIM et al 2011 Observação Inferimos aqui que a proposta de educação libertadora viabiliza a reflexão de atuação política de cada cidadão ultrapassando os aspectos técnicos e científicos assim corrobora com a ideia de transformação da realidade a partir de uma atuação éticopolítica reconhecidamente necessária para seguir na luta de manutenção dos princípios do SUS em especial os princípios doutrinários de universalidade equidade e integralidade 3 POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE A PNEPS foi instituída pela Portaria GMMS nº 198 de 13 de fevereiro de 2004 e foi alterada pela Portaria GMMS nº 1996 de 20 de agosto de 2007 que dispõe sobre novas diretrizes e estratégias para a implantação desta Essa política traz a proposta de constituir o SUS em uma redeescola modificando o pensamento do ensino transmitido de modo unidirecional dos detentores do conhecimento para os trabalhadores de saúde mas considerando o espaço concreto de trabalho como um local de ensinoaprendizagem compartilhado Além disso a Educação Permanente em Saúde constitui estratégia que viabiliza as transformações do trabalho na saúde para que este seja local de atuação crítica reflexiva propositiva compromissada e tecnicamente competente BRASIL 2009 CECCIM 2005 A Educação Permanente é aprendizagem no trabalho onde o aprender e o ensinar se incorporam ao cotidiano das organizações e ao trabalho A educação permanente se baseia na aprendizagem significativa e na possibilidade de transformar as práticas profissionais A educação permanente pode ser entendida como aprendizagemtrabalho ou seja ela acontece no cotidiano das pessoas e das organizações Ela é feita a partir dos problemas enfrentados na realidade e leva em consideração os conhecimentos e as experiências que as pessoas já têm Propõe que os processos de educação dos trabalhadores da saúde se façam a partir da problematização do processo de trabalho e considera que as necessidades de formação e desenvolvimento dos trabalhadores sejam pautadas pelas necessidades de saúde das pessoas e populações Os processos de educação permanente em saúde têm como objetivos a transformação das práticas profissionais e da própria organização do trabalho BRASIL 2009 p20 21 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE Cabe lembrar que a Organização PanAmericana de Saúde lançou no início dos anos 1980 a proposta de Educação Permanente em Saúde com vistas a uma nova conceituação e uma reorientação dos processos de capacitação de trabalhadores dos serviços de saúde DAVINI NERVI ROSCHKE 2002 Dessa forma a produção PNEPS representou o esforço de cumprir uma das metas da saúde coletiva de tornar a rede pública de saúde uma rede de ensinoaprendizagem no exercício do trabalho CECCIM 2005 Destacamos entretanto a necessidade de descentralizar e disseminar a capacidade pedagógica por dentro do setor para nos permitir constituir o SUS verdadeiramente como uma redeescola CECCIM 2005 Aquilo que deve ser realmente central à Educação Permanente em Saúde é sua porosidade à realidade mutável e mutante das ações e dos serviços de saúde é sua ligação política com a formação de perfis profissionais e de serviços a introdução de mecanismos espaços e temas que geram autoanálise autogestão implicação mudança institucional enfim pensamento disruptura com instituídos fórmulas ou modelos e experimentação em contexto em afetividade sendo afetado pela realidadeafecção CECCIM 2005b p162 Em estudo recente com o objetivo de analisar a prática de atividades educativas de trabalhadores da saúde em Unidade Básica de Saúde segundo as concepções de educação permanente em saúde e de educação continuada concluiuse que apesar da presença majoritária de estratégias de ensino participativas que indicam a preconização da reflexão sobre as práticas de saúde em espaços de discussão coletiva verificouse uma prática pautada na concepção de educação continuada a qual preconiza os fundamentos técnicocientíficos das áreas profissionais específicas para promover o desenvolvimento das instituições Ressaltase do trabalho realizado a necessidade de ampliação das ações educativas de trabalhadores no próprio espaço cotidiano de trabalho PEDUZZI et al 2009 Complementarmente ressaltamos que o conceito de educação continuada está atrelado ao saber técnicocientífico e utiliza a atualização do conhecimento específico das categorias profissionais com utilização recorrente da transferência de conteúdos o que conduz à fragmentação das práticas de saúde SILVA 2009 Constatamos que os conceitos de educação continuada e educação permanente possuem características técnicas teóricas e políticas diferentes Porém algo conceitualmente distinto pode eventualmente possuir semelhanças na aplicação prática uma vez que são os sujeitos envolvidos que dão vida em ato às propostas e diretrizes existentes Portanto há a necessidade de um cuidado peculiar na aplicação fidedigna da proposta de educação permanente em saúde a qual em detrimento de protocolos predefinidos apenas lança os princípios para uma construção coletiva e interdisciplinar do processo de ensinoaprendizagem 22 Unidade I Peduzzi e Montanha 2010 nos apresentam o resultado de um estudo referente ao levantamento de necessidades educacionais de trabalhadores de enfermagem O foco está nas falhas identificadas e nos problemas evidenciados resultando em ações educativas voltadas para os procedimentos técnicos de enfermagem o que se desdobra na reiteração do modelo de cuidado e de atenção hegemônico e biomédico à saúde e na concepção também dominante de educação continuada apesar de em menor escala também outras fontes serem utilizadas no planejamento das atividades educativas As autoras vislumbram em suas conclusões uma possível resposta ao questionamento de como seria possível investir em uma dimensão emancipatória a partir de um cotidiano restrito à reiteração do paroxismo técnicocientífico A possível resposta apresentase a partir dos resultados que apesar de atestarem o predomínio de ações educativas de trabalhadores de enfermagem orientadas pela concepção de educação continuada coexistem com a identificação por parte desses mesmos trabalhadores da necessidade e possibilidade de atividades educativas com novos formatos conteúdos e sentidos na perspectiva da educação permanente Isso corrobora com o entendimento de que ambas as concepções podem ser complementares e que a distinção clara entre elas permite o reconhecimento do espaço que devem ocupar na gestão do trabalho PEDUZZI MONTANHA 2010 A PNEPS sugere sem a intenção de esgotar as possibilidades um quadro para sistematizar uma sequência que vai da prática à informação da informação à aquisição de competências e capacidades e da aquisição à programação de soluções práticas Considerar esta sequência é importante uma vez que o acesso a informações e conhecimentos será pobre de significados se não houver reflexão e identificação na prática dos problemas BRASIL 2009 O quadro referido anteriormente é apresentado a seguir BRASIL 2009 Quadro 1 Problematizar as práticas Identificar problemas Açãoreflexão Investigaçãoação Estudo de casos Trabalho de campo Sistematização de dados locais Construção e priorização de problemas Ampliar o conhecimento Acesso bibliográfico Acesso a dados Acesso à educação virtual Acesso a outras experiências Seminário de estudos Estágio in loco Grupos de discussão Teleconferências e redes interativas Desenvolver competências específicas e da equipe Aquisição de competências e capacidades específicas Supervisãocapacitante Treinamentos focalizados específicos Oficinas de elaboração de projetos de trabalho Buscar soluções Colocálas em prática e avaliálas Coordenar condutas com outros e Trabalho em redes Grupos operativos de qualidade Oficinas de programação local Avaliação de processos e resultados 23 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE Saiba mais O artigo de Ricardo B Ceccim contribui para a compreensão da Educação Permanente em saúde CECCIM R B Educação Permanente em Saúde desafio ambicioso e necessário Comunic Saúde Educ v 9 n 16 p 16177 2005 Leia atentamente a situaçãoproblema abaixo Uma enfermeira que atua em uma Unidade Básica de Saúde UBS da periferia do Município de São Paulo recebeu esta semana para consulta de enfermagem o Sr JAB 72 anos morador do bairro em que está situada a UBS aposentado trabalhava na lavoura residente em uma casa de alvenaria de dois cômodos com um dos sete filhos a nora e três netos com idades abaixo de dez anos A renda familiar é de um salário mínimo e meio O Sr JAB é portador de Hipertensão Arterial Sistêmica HAS e Diabetes Mellitus DM É analfabeto e permanece a maior parte do tempo sozinho em sua casa Na consulta ao ser questionado sobre o uso dos medicamentos a enfermeira percebeu compreensão insuficiente do Sr JAB sobre o uso adequado dos medicamentos ele referiu uso irregular conforme sensação de bemestar ou malestar Como o Sr JAB possui vínculo com a enfermeira há mais de um ano sentiuse à vontade para dizer que parou de fazer uso do remédio de urinar Hidroclorotiazida pois estava sentindo muita fraqueza Referiu ainda muita dor em membros inferiores e dificuldade para enxergar Agora leia a seguinte afirmativa Exemplo de aplicação Exemplo de aplicação A educação influencia e é influenciada pelas condições de saúde estabelecendo um estreito contato com todos os movimentos de inserção nas situações cotidianas em seus complexos aspectos sociais políticos econômicos culturais dentre outros MENDES VIANA 2001 Faça a reflexão sobre as seguintes questões 1 Qual é a relação entre a situaçãoproblema apresentada e a afirmação dos autores Mendes e Viana 2001 2 Quais são os fatores sociais e econômicos encontrados na situaçãoproblema apresentada que podem influenciar a saúde do Sr JAB 3 Quais seriam as ações educativas possíveis de serem desenvolvidas nesta situação 24 Unidade I 4 Como colocar essas ações educativas em prática recursos tempo estratégias 5 Como mobilizar a equipe de saúde a trabalhar de forma coerente com a afirmação citada de Mendes e Viana 2001 6 O vínculo estabelecido entre o Sr JAB e a enfermeira configura uma relação profissional positiva ou negativa nessa situação Por quê 4 COMUNICAÇÃO HUMANA INSTRUMENTO ESSENCIAL PARA A PRÁTICA EDUCATIVA 41 Fundamentos da comunicação humana Sabemos que a comunicação destacase como o principal instrumento para que a interação e a troca aconteçam e consequentemente o processo de cuidar no seu sentido mais amplo tenha espaço para acontecer Segundo Mendes 1994 os componentes da comunicação formam o clima e a nutrição para a compreensão Etimologicamente a palavra comunicar originase do latim communicare que significa pôr em comum Mendes 1994 A comunicação interpessoal pode ser definida como um conjunto de movimentos integrados que calibra regula mantém e por isso torna possível a relação entre os homens SILVA 2001 Encontramos muitas definições para o que vem a ser comunicação afinal como afirmam Watzlawizk Beavin e Jackson 1967 não se comunicar é impossível mesmo na inatividade ou no silêncio tudo tem valor de mensagem a comunicação é o princípio natural que une um ser a outroRUESCH 1987 Segundo Silva 2006 a comunicação pode ser dividida em verbal associada às palavras expressas por meio da fala ou da escrita e em não verbal desenvolvida através de gestos silêncio expressões faciais postura corporal entre outros Ao compreendermos a educação em saúde como um elemento de cuidado humano percebemos logo a importância de uma comunicação com qualidade para que haja uma atenção efetiva e de qualidade Waldow 1998 ao fazer uma reflexão histórica sobre como o corpo e o toque são percebidos referese à possibilidade do mundo da tecnologia avançada substituir esse instrumento próprio do ser humano A autora lembra que o afago e o aperto de mão que oferecem apoio e suporte bem como o olhar carinhoso e amigo parecem não ser mais necessários A máquina assume o cuidado e o cuidador permanece ocupado e absorvido no manuseio desta tecnologia por vezes esquecendo o ser humano a ela conectado Na comunicação há o envolvimento do comportamento recíproco entre as pessoas que estão se relacionando o que significa que não existe um fluxo de comportamento numa só direção MENDES 1994 Com ou sem intenção sempre há a transmissão de mensagens uma vez estabelecida a interação 25 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE O indivíduo participa simultaneamente de duas dimensões existenciais que decorrem de duas formas de se relacionar com o mundo uma verbal que lhe confere um repertório psicolinguístico proporcionando uma exteriorização do ser social e outra não verbal que constitui um estatuto psicobiológico proporcionando uma exteriorização ser psicológico SILVA 2006 A comunicação é um processo pautado em compreender e compartilhar mensagens enviadas e recebidas estas mensagens exercem influência no comportamento das pessoas que vivenciam essa interação STEFANELLI 2005 Exemplo de aplicação Exemplo de aplicação Foi apresentada uma afirmação de Stefanelli 2005 importante para o eixo da nossa discussão pois se as mensagens enviadas e recebidas exercem influência no comportamento das pessoas que vivenciam essa interação apresentamos perguntas para reflexão Como estamos nos comunicando no exercício da nossa profissão Como influenciamos e somos influenciados pelos nossos colegas de trabalho Como influenciamos e somos influenciados pelas pessoas de quem cuidamos para quem prestamos um serviço de saúde Será que temos consciência das nossas expressões não verbais Será que estamos atentos às expressões não verbais das pessoas com quem nos relacionamos Vale destacar uma pesquisa desenvolvida com crianças cegas e surdas desde o nascimento e que apesar de nunca terem aprendido por imitação pois nunca puderam olhar o rosto da mãe elas demonstram as emoções da mesma maneira que nós que enxergamos Seus olhos brilham e sorriem quando estão felizes choram quando estão tristes ficam vermelhas e desviam a direção do olhar quando estão com vergonha levantam as sobrancelhas e abrem mais os olhos e conforme o grau de surpresa também a boca SILVA 2006 Silva 2002 constatou portanto que as emoções básicas são expressas da mesma maneira em qualquer ser humano A autora coloca em destaque que os pacientes olham para o rosto dos profissionais e não para as mãos porque esperam entender o que os profissionais da saúde sentem ao lhes prestar cuidados pois nem sempre têm condições de fazer a avaliação técnica desse trabalho Assim a autora nos ensina que A compreensão que os pacientes precisam ter do profissional da área da saúde passa principalmente pela compreensão de que quando nos comunicamos com as pessoas não temos apenas o compromisso de passar um conteúdo 26 Unidade I uma informação pois toda comunicação envolve um sentimento ou seja o que é que sentimos quando ficamos diante do outro o que é que sentimos quando ficamos diante daquela pessoa e diante da informação que temos a transmitir o quanto concordamos com Natagori quando ele diz Abandonarei todas as honras menos a de te servir SILVA 2002 p74 Silva 2006 nos lembra que toda comunicação tem duas partes de um lado o conteúdo o fato a informação que queremos transmitir de outro o que estamos sentindo quando nos comunicamos com a pessoa O conteúdo está intimamente ligado ao referencial de cultura e cabe lembrar que o profissional de saúde tem uma cultura própria diferente do leigo por isso é importante saber que quanto mais informações possuirmos sobre aquela pessoa e quanto maior a nossa habilidade em correlacionar esse saber do outro com o nosso melhor será o nosso desempenho no aspecto da informação e do conteúdo Aqui inferimos o quanto essa afirmação vai ao encontro das premissas de Paulo Freire que nos apresenta um modelo de educação dialógica na qual os saberes do outro são fundamentais para uma construção de novos saberes A comunicação pressupõe a informação e o domínio sobre o que queremos comunicar a nossa intenção emoção e o que pretendemos quando nos aproximamos do nosso cliente ou do nosso paciente O interessante é que nem sempre o profissional da área de saúde tem a consciência de que ao falarmos em comunicação não falamos apenas das palavras expressas para a outra pessoa que podem ser dimensionadas como comunicação verbal Acontece que toda comunicação humana face a face interpessoal também se faz através da comunicação não verbal ou seja de todas as formas de comunicação que não envolvem diretamente as palavras Até podemos afirmar que quando falamos de relacionamento interpessoal a comunicação verbal sozinha não existe pois além dela existe a maneira como falamos que podemos chamar de paraverbal os silêncios e grunhidos que utilizamos ao falar as pausas que fazemos entre as frases e palavras a ênfase que colocamos na voz Além do paraverbal temos as expressões faciais as nossas posturas corporais diante do outro a maneira como o tocamos as distâncias interpessoais que mantemos com essa outra pessoa SILVA 2006 apud SILVA 2002 p75 Dessa forma para afirmarmos que a comunicação está efetivamente ocorrendo temos que ter coerência nas nossas palavras e em toda nossa comunicação não verbal E aqui se destaca as quatro finalidades da comunicação não verbal SILVA 2002 1 A primeira é complementar a comunicação verbal Por exemplo quando dizemos bom dia sorrindo para o outro e olhando nos seus olhos 2 A segunda é contradizer o verbal Por exemplo quando dizemos muito prazer e apertamos a mão do outro com medo ou nojo de tocar 27 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE 3 A terceira é substituir o verbal Por exemplo o meneio positivo da cabeça olhando para a outra pessoa e dizendo não verbalmente estou te ouvindo estou atenta a você 4 A quarta finalidade do não verbal é a demonstração dos nossos sentimentos SILVA 2002 Comunicação não verbal SILVA 1996 Paralinguagem qualquer som produzido pelo aparelho fonador que não faça parte do sistema sonoro da língua usada Cinésica linguagem do corpo movimentos Proxêmica é o uso que o homem faz do espaço Tacêsica é tudo que envolve a comunicação tátil Características físicas são a própria forma e a aparência do corpo De maneira geral não temos consciência nem controle voluntário de toda essa sinalização não verbal Exemplo disso é uma situação de interação na qual gostamos do que está acontecendo a nossa pupila se dilata involuntária e inconscientemente Evidentemente em situações onde não existe alteração de luminosidade nem alterações químicas porém é fato comprovado que quando a interação é prazerosa para a pessoa a sua pupila se dilata É interessante que diante da contradição na dúvida entre a mensagem verbal e a não verbal as pessoas confiam na linguagem silenciosa que fala da essência do ser humano e do que estamos sentindo MCCASKEY 1999 Cabe aqui destacar que em um processo educativo eou em um processo de cuidado em saúde estamos tratando de interação humana e portanto a habilidade em se comunicar será elemento fundamental para qualificar a relação estabelecida Se o que foi apresentado até aqui evidencia que a comunicação não verbal transmite o que sentimos ao nos relacionarmos retomo o que Paulo Freire nos ensina ao dizer que educar exige querer bem aos educandos FREIRE 1996 e o parafraseio dizendo que cuidar exige querer bem àqueles de quem cuidamos Fica claro que se alguém está apenas preocupado em transmitir informações e não interessado na compreensão do que o outro apreende da informação o seu não verbal expressará mensagens de descuidado Dessa forma o outro que estará ouvindo a informação perceberá na sutileza do não verbal a impossibilidade de questionamento a impossibilidade de esclarecer dúvidas Então a dica é tomarmos consciência do que pretendemos fazer em uma prática de educação em saúde Queremos apenas cumprir uma meta institucional eou política Ou almejamos contribuir para uma efetiva reflexão e construção de modos saudáveis de vida Temos que ter a consciência de que o discurso sozinho tem pouco impacto se não acompanhado da confirmação não verbal E essa expressão não verbal não mente ela emite a mensagem do nosso real sentimento em determinada situação 28 Unidade I Saiba mais A leitura do livro Comunicação tem remédio é uma possibilidade de aprender sobre a comunicação e sobre como nos comunicarmos SILVA M J P Comunicação tem remédio a comunicação nas relações interpessoais em saúde 11 ed São Paulo Gente 2006 Leia atentamente a parábola O canto do galo Era uma vez um granjeiro Era um granjeiro incomum intelectual e progressista Estudou administração para que sua granja funcionasse cientificamente Não satisfeito fez um doutorado em criação de galinhas No curso de administração aprendeu que num negócio o essencial é a produtividade O improdutivo dá prejuízo deve portanto ser eliminado Aplicado à criação de galinhas esse princípio se traduz assim galinha que não bota ovo não vale a ração que come Não pode ocupar espaço no galinheiro Deve portanto ser transformada em cubinhos de caldo de galinha Com o propósito de garantir a qualidade total de sua granja o granjeiro estabeleceu um rigoroso sistema de controle da produtividade de suas galinhas Produtividade de galinhas é um conceito matemático que se obtém dividindose o número de ovos botados pela unidade de tempo escolhida Galinhas cujo índice de produtividade fosse igual ou superior a 250 ovos por ano podiam continuar a viver na granja como galinhas poedeiras O granjeiro estabeleceu inclusive um sistema de mérito galináceo as galinhas que botavam mais ovos recebiam mais ração As galinhas que botavam menos ovos recebiam menos ração As galinhas cujo índice de produtividade fosse igual ou inferior a 249 ovos por ano não tinham mérito algum e eram transformadas em cubinhos de caldo de galinha Acontece que conviviam com as galinhas poedeiras galináceos peculiares que se caracterizavam por um hábito curioso A intervalos regulares e sem razão aparente eles esticavam os pescoços abriam os bicos e emitiam um ruído estridente e ato contínuo subiam nas costas das galinhas seguravamnas pelas cristas com o bico e obrigavamnas a se agachar Consultados os relatórios de produtividade verificou o granjeiro que isso era tudo o que os galos esse era o nome daquelas aves faziam Ovos mesmo nunca jamais em toda a história da granja qualquer um deles botara Lembrouse o granjeiro então das lições que aprendera na escola e ordenou que todos os galos fossem transformados em cubos de caldo de galinha As galinhas continuaram a botar ovos como sempre haviam botado os números escritos nos relatórios não deixavam margens a dúvidas Mas uma coisa estranha começou a acontecer Antes os ovos eram colocados em chocadeiras e ao final de vinte e um dias eles se quebravam e de dentro deles saíam pintinhos vivos Agora os ovos das mesmas galinhas depois de vinte e um dias não quebravam Ficavam lá inertes Deles não saíam pintinhos E se ali continuassem por muito tempo estouravam e de dentro deles o que saía era um cheiro de coisa podre Coisa morta Aí o granjeiro científico aprendeu duas coisas Primeiro o que importa não é a quantidade dos ovos o que importa é o que vai dentro 29 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE deles A forma dos ovos é enganosa Muitos ovos lisinhos por fora são podres por dentro Segundo há coisas de valor superior aos ovos que não podem ser medidas por meio de números Coisas sem as quais os ovos são coisas mortas Fonte ALVES R Entre a ciência e a sapiência O dilema da educação 6 ed São Paulo Loyola 2001 pp 6771 Exemplo de aplicação Exemplo de aplicação Com base na leitura da parábola reflita Que associações podem ser feitas a partir da mensagem contida no texto e as práticas educativas em saúde que encontramos no cenário econômico e social em que vivemos 42 Saber ouvir Para refletir sobre o tema saber ouvir seleciono um texto que fala por si Escutatória de Rubem Alves com grifos para reflexão Sempre vejo anunciados cursos de oratória Nunca vi anunciado curso de escutatória Todo mundo quer aprender a falar Ninguém quer aprender a ouvir Pensei em oferecer um curso de escutatória Mas acho que ninguém vai se matricular Escutar é complicado e sutil Diz o Alberto Caeiro que não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores É preciso também não ter filosofia nenhuma Filosofia é um monte de ideias dentro da cabeça sobre como são as coisas Aí a gente que não é cego abre os olhos Diante de nós fora da cabeça nos campos e matas estão as árvores e as flores Ver é colocar dentro da cabeça aquilo que existe fora O cego não vê porque as janelas dele estão fechadas O que está fora não consegue entrar A gente não é cego As árvores e as flores entram Mas coitadinhas delas entram e caem num mar de ideias São misturadas nas palavras da filosofia que mora em nós Perdem a sua simplicidade de existir Ficam outras coisas Para ver é preciso que a cabeça esteja vazia Faz muito tempo nunca me esqueci Eu ia de ônibus Atrás duas mulheres conversavam Uma delas contava para a amiga os seus sofrimentos contoume uma amiga nordestina que o jogo que as mulheres do Nordeste gostam de fazer quando conversam umas com as outras é comparar sofrimento Quanto maior o sofrimento mais bonitas são a mulher e a sua vida Conversar é a arte de produzirse literariamente como mulher de sofrimentos Acho que foi lá que a ópera foi inventada A alma é uma literatura É nisso que se baseia a psicanálise Voltando ao ônibus Falavam de sofrimentos Uma delas contava do marido hospitalizado dos médicos dos exames complicados das injeções na veia a enfermeira nunca acertava dos vômitos e das urinas Era um relato comovente de dor 30 Unidade I Até que o relato chegou ao fim esperando evidentemente o aplauso a admiração uma palavra de acolhimento que supostamente ouvia Mas o que a sofredora ouviu foi o seguinte Mas isso não é nada A segunda iniciou então uma história de sofrimentos incomparavelmente mais terríveis e dignos de uma ópera que os sofrimentos da primeira Parafraseio o Alberto Caieiro Não é bastante ter ouvidos para se ouvir o que é dito É preciso também que haja silêncio dentro da alma Daí a dificuldade a gente não aquenta ouvir o que o outro diz sem logo dar um palpite melhor sem misturar o que ele diz com aquilo que a gente tem a dizer Como se aquilo que ele diz não fosse digno de descansada consideração e precisasse ser complementado por aquilo que a gente tem a dizer que é muito melhor No fundo somos todos iguais às duas mulheres do ônibus Certo estava Lichtenberg citado por Murilo Mendes Há quem não ouça até que lhe cortem as orelhas Nossa incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e sutil da nossa arrogância e vaidade no fundo somos os mais bonitos Tenho um velho amigo Jovelino que se mudou para os Estados Unidos estimulados pela revolução de 64 Pastor protestante não evangélico foi trabalhar num programa educacional da Igreja Presbiteriana USA voltado para minorias Contoume de sua experiência com os índios As reuniões são estranhas Reunidos o participante ninguém fala Há um longo longo silêncio Os pianistas antes de iniciar o concerto diante do piano ficam assentados em silêncio como se estivesse orando Não rezando reza é falatório para não ouvir Orando Abrindo vazios de silêncio Expulsando todas as ideias estranhas Também para se tocar piano é preciso não ter filosofia nenhuma Todos em silêncio à espera do pensamento essencial Aí de repente alguém fala Curto Todos ouvem Terminada a fala novo silêncio Falar logo em seguida seria desrespeito Pois o outro falou os seus pensamentos pensamentos que julgava essenciais Sendo dele os pensamentos não são Sãome estranhos Comida que é preciso digerir Digerir leva tempo É preciso tempo para entender o que o outro falou Se falo logo a seguir são duas as possibilidades Primeira Fiquei em silêncio só por delicadeza Na verdade não ouvi o que você falou Enquanto você falava eu pensava nas coisas que iria falar quando você terminasse sua tola fala Falo como se você não tivesse falado Ouvi o que você falou Mas isso que você falou como novidade eu já pensei há muito tempo É coisa velha para mim Tanto que nem preciso pensar sobre o que você falou Em ambos os casos estou chamando o outro de tolo O que é pior que uma bofetada O longo silêncio quer dizer Estou ponderando cuidadosamente tudo aquilo que você falou E assim vai a reunião Há grupos religiosos cuja liturgia consiste de silêncio Faz alguns anos passei uma semana num mosteiro na Suíça Grand Champs Eu e algumas outras pessoas ali estávamos para juntos escrever um livro Era uma antiga fazenda Velhas construções não me esqueço da água no chafariz onde as pombas vinham beber Havia uma disciplina de silêncio não total mas de uma fala mínima O que me deu enorme prazer às refeições 31 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE Não tinha a obrigação de manter uma conversa com meus vizinhos de mesa Podia comer pensando na comida Também para comer é preciso não ter filosofia Não ter obrigação de falar é uma felicidade Mas logo fui informado de que parte da disciplina do mosteiro era participar da liturgia três vezes por dia às 7 da manhã ao meiodia e às 6 da tarde Estremeci de medo Mas obedeci O lugar era sagrado era um velho celeiro todo de madeira teto muito alto Escuro Haviam aberto buracos na madeira ali colocando vidros de várias cores Era uma atmosfera de luz mortiça iluminado por velas sobre o altar uma mesa simples com um ícone oriental de cristo Uns poucos bancos arranjados em U definiam um amplo espaço vazio no centro onde quem quisesse podia se assentar numa almofada sobre um tapete Cheguei alguns minutos antes da hora marcada Era um grande silêncio Muito frio nuvens escuras cobriam o céu e corriam levadas por um vento impetuoso que descia dos Alpes A força do vento era tanta que o velho celeiro torcia e rangia como se fosse um navio de madeira num mar agitado O vento batia nas macieiras nuas do pomar e o barulho era como o de ondas que se quebram Estranhei Os suíços são sempre pontuais A liturgia não começava E ninguém tomava providências Todos continuavam do mesmo jeito sem nada fazer Ninguém que se levantasse para dizer Meus irmãos vamos cantar o hino Cinco minutos dez quinze Só depois de vinte minutos é que eu estúpido percebi que tudo já se iniciara vinte minutos antes As pessoas estavam lá para se alimentar de silêncio E eu comecei a me alimentar de silêncio também Não basta o silêncio de fora É preciso silêncio dentro Ausência de pensamentos E aí quando se faz o silêncio dentro a gente começa a ouvir coisas que não ouvia Eu comecei a ouvir Fernando Pessoa conhecia a experiência e se referia a algo que se ouve nos interstícios das palavras no lugar onde não há palavras É música melodia que não havia e que quando ouvida nos faz chorar A música acontece no silêncio É preciso que todos os ruídos cessem No silêncio abremse as portas de um mundo encantado que mora em nós como no poema de Mallarmé A catedral submersa que Debussy musicou A alma é uma catedral submersa No fundo do mar quem mergulha sabe a boca fica fechada Somos todos olhos e ouvidos Me veio agora a ideia de que talvez essa seja a essência da experiência religiosa quando ficamos mudos sem fala Aí livres dos ruídos do falatório e dos saberes da filosofia ouvimos a melodia que não havia que de tão linda nos faz chorar Para mim Deus é isto beleza que se ouve no silêncio Daí a importância de saber ouvir os outros há beleza lá também Comunhão é quando a beleza do outro e a beleza da gente se juntam num contraponto Está apresentado no texto acima um cenário de reflexão sobre a arte de ouvir de escutar Como percebemos não é fácil Vivemos em um mundo de muitos barulhos de muitas informações e de muita 32 Unidade I velocidade assim tornase cada vez mais difícil esvaziar nossas mentes para ouvir o outro e mais difícil ainda ter tempo para digerir a fala do outro Ressalto aqui a fala verbal e não verbal Fica então o desafio desafio de exercitarmos a escuta ao que o outro tem a nos dizer o educando o usuário do serviço de saúde Em um serviço de saúde repleto de pessoas para serem atendidas e ao mesmo tempo com todo o contexto de cobrança de produtividade quantitativa de serviço prestado como colocar em prática o exercício da comunicação que requer uma escuta reflexiva Vamos pensar que um caminho possível seria a tomada de consciência das nossas reais intenções Se realmente queremos educar bem aprender bem cuidar bem então isso será transmitido em cada ato não verbal e o mesmo tempo mesmo que curto utilizado em uma interação humana será qualificado pela consciência crítica do porquê estamos ali e o que pretendemos com esse encontro Resumo Nesta primeira unidade foi possível esboçar um panorama teóricoconceitual acerca dos temas que envolvem as práticas educativas em saúde focando o processo saúdedoença o processo ensinoaprendizagem a educação libertadora a organização dos serviços de saúde no Brasil e a Política Nacional de Educação Permanente em saúde Percebemos que contextualizar os temas a serem discutidos nos seus aspectos históricos políticos econômicos sociais e culturais é elemento que fundamenta e amplia a compreensão sobre o assunto Tornouse evidente a relação existente entre educação e saúde e o que entendemos por cada um desses conceitos que ao longo do tempo sofreu e ainda sofre modificações quanto às suas definições e práticas Mais do que compreender a relação entre educação e saúde foi possível compreender como esses temas se inserem em nossa atual organização política de atenção à saúde Compreender o Sistema Único de Saúde sua origem histórica seus princípios e diretrizes legais propicia a nós uma compreensão mais consistente sobre como pensar a saúde e a doença o ensinar e o aprender nesta realidade concreta e atual que vivemos Com isso a apresentação dos potenciais da Política Nacional de Educação Permanente em saúde suscita a possibilidade repensar a formação elementar e permanente dos profissionais que atuam na área da saúde 33 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE para uma prática educativa consciente que promova verdadeiramente a autonomia a emancipação humana e a liberdade de criação Desse modo tornase possível o desenvolvimento de um movimento espiral e crescente de construção de novas formas de pensar e agir em saúde Esta é de fato a grande finalidade de vivenciar uma prática educativa nessas bases conceituais apresentadas propiciar um movimento livre e emancipatório contínuo a caminho do alcance do bem estar físico psíquico e social Para resumir as bases conceituais até aqui apresentadas podemos dizer que a palavra síntese é a liberdade Liberdade necessária para o alcance da saúde como foi citado por Dejours 1986 e liberdade necessária para uma educação que rompe com as imposições hegemônicas e possibilita a descoberta e expressão de novas possibilidades de ser e agir no mundo Diante desse panorama explicitamos ainda as contradições nas quais vivemos e desenvolvemos as práticas educativas e de saúde De um lado o atual cenário econômico que atribui valor financeiro a atributos não valoráveis tais como a vida e a educação e de outro lado os princípios de integralidade equidade e emancipação humana Diante do exposto cabe a reflexão de cada leitor acerca das possibilidades micropolíticas de atuação para o alcance das mudanças necessárias ou seja da atuação cotidiana ocorrida em cada encontro humano no qual cada ato refletirá em frutos libertadores ou reiterativos do que pensamos em saúde e em educação Em uma consulta realizada pelo enfermeiro dentista fisioterapeuta profissional de educação física e todos os demais profissionais da área da saúde a consciência do respeito ao saber do outro e a sensibilidade em contextualizar o cenário de vida do outro fará certamente a diferença na condução desse encontro e nesse sentido teremos mais interação e não apenas informação e com isso acreditamos na possibilidade de mudanças reias nos hábitos de saúde e principalmente nos fatores de fortalecimento da nossa saúde Complementarmente nesta unidade evidenciamos a importância da comunicação nos processos de interação humana em especial nos encontros de cuidado à saúde e dialeticamente nos encontros de educação em saúde Para além das técnicas e conteúdos necessários para a informação correta há a real necessidade de conhecermos as habilidades de comunicação Saber sobre os conteúdos verbais e não verbais e o impacto disso na interação 34 Unidade I Verificamos as finalidades da comunicação não verbal frente à comunicação verbal e com isso percebemos que a tomada de consciência sobre o que sentimos é fator necessário para cuidarmos dos momentos de interação e portanto de comunicação com o outro As mensagens enviadas e recebidas em um processo de comunicação exercem influência no comportamento das pessoas dessa forma cuidar da comunicação é cuidar da influência que podemos ter frente àqueles que pretendemos educar em saúde Não basta dominar o conteúdo teórico técnico e científico mais do que isso é necessário que tenhamos habilidades de comunicação para que toda a bagagem de conteúdo possa ser efetivamente compartilhada e praticada Outra questão destacada foi a habilidade de escutar Para escutar é necessário esvaziar a mente é necessário humildade para valorizar o que o outro tem a dizer Isso não é algo comum e simples em especial em um mundo repleto de ruídos informações e pressa O desafio colocado é o estabelecimento de relações conscientes e reflexivas Desenvolvendo habilidades de comunicação que é em si o elo que une um ser ao outro Exercícios Questão 1 O binômio educação e saúde constituem práticas socialmente produzidas em tempos e espaços históricos definidos RUIZMORENO et al 2005 Nesse sentido analise as afirmativas a seguir I A compreensão dos condicionantes do processo saúdedoença não oferece subsídios para a adoção de novos hábitos e condutas de saúde II A educação influencia e é influenciada aspelas condições de saúde estabelecendo um estreito contato com todos os movimentos de inserção nas situações cotidianas em seus complexos aspectos sociais políticos econômicos e culturais III Educação em Saúde é também um conjunto de saberes e práticas orientados para a prevenção de doenças e promoção da saúde Dentre as afirmativas anteriores A Todas as afirmativas estão corretas 35 PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE B Todas as afirmativas estão incorretas C Apenas a afirmativa I está incorreta D Apenas a afirmativa II está correta E Apenas as afirmativas I e II estão corretas Resposta correta alternativa C Análise da questão A afirmativa I está incorreta porque a compreensão dos condicionantes do processo saúdedoença oferece sim subsídios para a adoção de novos hábitos e condutas de saúde As afirmativas II e III estão corretas Questão 2 Observe a pesquisa de Bruno et al 2009 descrita no resumo a seguir Objetivo avaliar os aspectos epidemiológicos na reincidência de gravidez na adolescência Métodos estudo de coorte que incluiu 187 adolescentes grávidas atendidas e acompanhadas durante cinco anos após o parto em um serviço de atendimento de adolescentes do Estado do Ceará Foram analisados faixa etária estar ou não estudando morar com os pais escolaridade condição marital e condição do companheiro atual Os dados foram digitados e analisados no programa EPIINFO Foram feitas análises estatísticas das variáveis independentes idade escolaridade estudar trabalhar morar com os pais estado civil e mudança de parceiro e comparadas quanto à variável dependente ter ou não uma nova gravidez cinco anos depois O teste exato de Fisher foi utilizado para avaliar associação entre os fatores que poderiam influenciar a repetição da gravidez considerado como tendo associação quando o p005 Foram calculados os riscos relativos para a escolaridade condição marital e mudança de parceiro por serem fatores que se mostraram significativos para a reincidência de gravidez Resultados foi verificado que 61 das adolescentes engravidaram nos cinco anos seguintes ao primeiro parto Não foram fatores protetores idade estudar trabalhar ou morar com os pais Entretanto quando as adolescentes tinham oito anos ou menos de escolaridade o risco de engravidar quase duplicou risco relativo RR18 IC951326 Novas gestações foram mais frequentes entre as solteiras sem companheiro estável RR13 IC951116 e aquelas que mudaram de parceiro RR14IC951117 Conclusões a baixa escolaridade a mudança de parceiros e uniões não estáveis foram fatores de risco para reincidência de gravidez 36 Unidade I Assinale a alternativa correta A A falta de conhecimento dos métodos contraceptivos é o fator mais relevante na pesquisa citada para a reincidência de gravidez B A prática educativa em saúde pautada no modelo pedagógico da transmissão é o mais indicado para mudar a realidade apresentada na pesquisa C Conhecer o perfil epidemiológico da população e os fatores envolvidos em determinada situação de saúde é importante para planejar as estratégias educativas a serem utilizadas e subsidiar parâmetros para avaliação de resultados D Trabalhar e morar com os pais foram fatores protetores para reincidência de gravidez na adolescência E A escolaridade não interfere na nova ocorrência de gestação na adolescência Resolução desta questão na plataforma